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1er SIMPOSIO DE GEOGRAFÍA DEL CONO SUR: Desafíos para la integración de la Geografía del Cono Sur Simposio de Geografía del Cono Sur MONTEVIDEO - URUGUAY 2015 ISBN: ISSN: Coordinación editorial Ana Estela Domínguez Sandoval Carmem Rejane Flores Wizniewsky Tatiane Almeida Netto Lucía Eluén E-book Primera Edición Volumen 1 Versión digital aquí Entidad Responsable Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio-Geografía Instituto de Ecología y Ciencias Ambientales (IECA) Facultad de Ciencias -UdelaR Dirección: Iguá 4225 piso 14 ala sur CP: 11400 Montevideo-Uruguay É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem a devida citação. Esta é uma obra coletiva baseada em artigos enviados pelos autores e apresentados no 1er Simposio de Geografía del Cono Sur, realizado entre 20 e 22 de agosto de 2015. Os direitos e responsabilidades sobre os artigos e suas opiniões são dos autores que os enviaram para publicação neste e-book. INSERIR FICHA CATALOGRÁFICA 1er SIMPOSIO DE GEOGRAFÍA DEL CONO SUR: Desafíos para la integración de la Geografía del Cono Sur De 20 a 22 agosto 2015 Instituto de Perfeccionamiento y Estudios Superiores-IPES Montevideo - Uruguay La comisión organizadora del 1er Simposio de Geografía del Cono Sur está formada por un Comité Científico y un Comité de Organización. Comisión Organizadora Comité Científico UDELAR y UFSM Comité de Organización UDELAR, CFE y UFSM MsC. Aline Fernandez da Fonseca Dra. Ana Estela Domínguez Sandoval Dr. André Weissheimer de Borba Dra. Ane Carine Meurer Dr. Benhur Pinós da Costa Dr. Bernardo Sayão pena e Souza Dr. Cassio Arthur Wollmann Dr. Eduardo Schiavone Cardoso Ms.C. Feline Schön Dr. Fernando Pesce Ms.C. Gabriela Fernández MsC. Ismael Díaz Dr. José Carlos Guerrero Dr. Marcel Achkar Dra. Meri Lourdes Bezzi Dr. Roberto Cassol MsC. Victor Cantón Dr. Waterloo Pereira Filho Dra. Andrea Valli Nummer Dra. Eliane Maria Foleto Dra. Carmen Rejane Flores Wizniewsky Dra. Giancarla Salamoni MsC. Beatriz Sosa Lic. Lucía Eluén Prof. César Cutinella Prof. Mónica Pizarro Fernanda Follmann Marilze Beatriz Losekann Janete Cancelier Webler Tatiane Almeida Netto Kelly Perlin Cassol Franciele da Silva Daniel Junges Menezes Leonice Aparecida Mourab Alecsandra Cunha PRESENTACIÓN 1er SIMPOSIO DE GEOGRAFÍA DEL CONO SUR: Desafíos para la integración de la Geografía del Cono Sur Como una forma de consolidar la cooperación técnico-científica entre Universidades en el marco del Convenio entre la Universidad Federal de Santa María (UFSM, Brasil) y la Universidad de la República (UdelaR, Uruguay) es que se celebró el 1er Simposio de Geografía del Cono Sur, en Montevideo, Uruguay, los días 20 y 21 de agosto de 2015. Este simposio convocó a docentes y estudiantes del Programa de PosGraduación en Geografía (PPGEO) de la UFSM, el Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio (LDSGAT) del Instituto de Ecología y Ciencias Ambientales de la Facultad de Ciencias de la UdelaR y el Departamento de Geografía del Consejo de Formación en Educación de la Administración Nacional de Educación Pública (CFE-ANEP). Los trabajos presentados estuvieron centrados en cuatro ejes de investigación: Eje 1- Territorios urbanos y rurales Eje 2- Biodiversidad y área protegida Eje 3- Geografía Física y Sistemas de Información Geográfica Eje 4- Experiencias de educación 4 SUMÁRIO CONFERENCIA INAUGURAL: DESAFÍOS PARA LA INTEGRACIÓN DE LA GEOGRAFÍA EN EL CONO SUR ..................................................................................................... 8 EJE 1- TERRITORIOS URBANOS Y RURALES.......................................................................... 18 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................... 19 TRANSIÇÃO AGROECOLÓGICA: AS VIVÊNCIAS DOS AGRICULTORES FAMILIARES CAMPONESES NO MUNICÍPIO DE AGUDO/RS ..................................... 20 A IMPORTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA E CULTURAL DA PRODUÇÃO DO QUEIJO CANASTRA – MINAS GERAIS – BRASIL ......................................................................... 33 NOTAS SOBRE AGRONEGÓCIO DA SOJA NO BRASIL ................................................ 46 LA RELACIÓN INTRÍNSECA ENTRE LA SOBERANÍA ALIMENTARIA Y LA AGROECOLOGÍA EN EL CONTEXTO DE LA CRISIS ALIMENTARIA ........................ 60 A POLÍTICA DE ASSENTAMENTOS RURAIS NO BRASIL: A REFORMA AGRÁRIA CONSERVADORA E A LUTA “NA” TERRA..................................................................... 73 O TURISMO RURAL NO DISTRITO DE ARROIO GRANDE – SANTA MARIA/RS ..... 84 GEOGLIFOS NO ALTO CAMAQUÃ, RS: PERSPECTIVAS PARA O APROVEITAMENTO TURÍSTICO ...................................................................................... 97 TRANSFORMAÇÕES NO PAMPA ADVINDAS DA GLOBALIZAÇÃO: UM RECORTE PARA A FRONTEIRA BRASIL –URUGUAI .................................................................... 113 PAISAJES AGRARIOS EN LA CUENCA DEL RÍO TACUAREMBÓ CHICO ............... 125 TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 140 A FRUTICULTURA COMO UM NOVO CENÁRIO REARTICULADOR DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL NA MICRORREGIÃO GEOGRÁFICA DA CAMPANHA MERIDIONAL .............................................................................................. 141 A PECUÁRIA LEITEIRA NO MUNICÍPIO DE ITUIUTABA - MINAS GERAIS/BRASIL E OS REFLEXOS NA REORGANIZAÇÃO PRODUTIVA AGROPECUÁRIA ............... 152 VITIVINICULTURA NA REGIÃO DE BENTO GONÇALVES: MUDANÇAS SOCIOECONÔMICAS EM DECORRÊNCIA DO ACORDO MERCOSUL. .................... 164 CIDADES DOENTES, CIDADÃOS DOENTES: MICROTERRITORIALIDADES DE SUJEITOS COM CÂNCER NA FEIRA ECOLÓGICA DA REDENÇÃO, PORTO ALEGRE-RS. ........................................................................................................................ 177 OS EFEITOS DAS EXPANSÕES DAS MONOCULTURAS DE CAFÉ, LARANJA E CANA-DE-AÇÚCAR NO MUNICÍPIO DE TABAPUÃ, SP – BRASIL PARA OS AGRICULTORES FAMILIARES ....................................................................................... 190 OS MOVIMENTOS SOCIAIS E A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: UM OLHAR PARA O ASSENTAMENTO CONQUISTA DA FRONTEIRA ........................................................ 201 IDENTIDADE MISSIONEIRA: ELEMENTOS DIFUSORES ........................................... 214 LAS TRANSFORMACIONES TERRITORIALES URBANAS EN EL BARRIO JACINTO VERA. ................................................................................................................................... 225 EJE 2- BIODIVERSIDAD Y ÁREA PROTEGIDA ...................................................................... 236 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................. 237 UNIDADE DE CONSERVAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE MANUTENÇÃO DA SOCIOBIODIVERSIDADE NOS CAMPOS SULINOS DO BIOMA PAMPA ................. 238 AS ÁREAS PROTEGIDAS NA REGIÃO DE FRONTEIRA BRASIL – URUGUAI: OPORTUNIDADES PARA A CONSERVAÇÃO INTEGRADA ....................................... 250 5 ÁREAS PROTEGIDAS BINACIONALES, ¿UNA NECESIDAD POSIBLE O UNA REALIDAD INFRANQUEABLE?” .................................................................................... 264 ECOPROVÍNCIAS DO PAMPA URUGUAIO-SUL-RIO-GRANDENSE: UMA PROPOSTA DE REGIONALIZAÇÃO ................................................................................ 291 DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO GÊNERO FRAILEA BRITTON & ROSE .............. 305 NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SANTA MARIA, RS. ......................................... 305 TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 320 PLANEJAMENTO E ADEQUAÇÃO DE TRILHAS NO CORREDOR ECOLÓGICO DA QUARTA COLÔNIA, RS .................................................................................................... 321 PESCA ARTESANAL NO RIO VACACAÍ, RS. AS INFLUÊNCIAS DA ORIZICULTURA IRRIGADA E OS POTENCIAIS TERRITÓRIOS DE CONFLITOS. ................................ 332 A FLORA RELICTUAL COM ESPÉCIES ENDÊMICAS NO CERRO DO ITAQUATIÁ E CERRO DO RIBEIRÃO NO OESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO PEDRO DO SUL/RS ... 343 EJE 3- GEOGRAFIA FÍSICA Y SISTEMAS DE INFORMACIÓN GEOGRÁFICA .............. 355 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................. 356 COMPARAÇÃO ENTRE DADOS GEOGRÁFICOS: AS OTTOBACIAS DA AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (ANA) E AS CARTAS TOPOGRÁFICAS DO EXÉRCITO .... 357 ANÁLISE DE ERROS ASSOCIADOS A MODELOS DIGITAIS DE ELEVAÇÃO DECORRENTES DO PROCESSO DE VETORIZAÇÃO DA REDE DE DRENAGEM ORIUNDA DE CARTAS TOPOGRÁFICAS ...................................................................... 369 POTENCIALIDAD DE LAS IMÁGENES SATELITALES DE ALTA RESOLUCIÓN EN LA DETECCIÓN DE ESPECIES LEÑOSAS INVASORAS .............................................. 393 ANÁLISE E MAPEAMENTO DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA NO MUNICÍPIO DE SORRISO, MATO GROSSO ............................................................................................... 405 TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 418 ANÁLISE DE UM TRECHO DE 1,9 KM DO ARROIO DO VEADO EM SILVEIRA MARTINS, RS ...................................................................................................................... 419 SÍNTESE DA EVOLUÇÃO DOS AREAIS DA BACIA DO ARROIO PUITÃ, OESTE DO RS, NO PERÍODO DE 1984 À 2014 .................................................................................... 430 OS DADOS SRTM E SUA APLICABILIDADE NA REPRESENTAÇÃO DO CENÁRIO GEOGRÁFICO CAPINÓPOLIS/MG/BRASIL ................................................................... 441 ANÁLISE DE DISTINTAS BASES CARTOGRÁFICAS NO MAPEAMENTO DE ÁREAS DEALTA DECLIVIDADE ................................................................................................... 452 RELAÇÃO ENTRE VARIÁVEIS LIMNOLOGICAS, DADOS METEOROLÓGICOS E USO DA TERRA: ABORDAGEM MÚLTIPLOS SENSORES .......................................... 461 CARACTERIZAÇÃO E MAPEAMENTO DAS UNIDADES DE RELEVO DO MUNICÍPIO DE MATA/RS ................................................................................................. 475 EJE 4- EXPERIENCIAS DE DUCACIÓN..................................................................................... 486 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL ................................................................................................. 487 ANÁLISE DE DISCURSO E GEOGRAFIA: POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS .. 488 EDUCAÇÃO E PERCEPÇÃO AMBIENTAL: O QUE DIZEM OS MAPAS MENTAIS DOS ALUNOS DE 1º ANO DO ENSINO MÉDIO DO MUNICÍPIO DE QUEVEDOS/RS ............................................................................................................................................... 498 EDUCAÇÃO DO CAMPO: EMANCIPAÇÃO SOCIAL DE SUJEITOS ........................... 511 TRABAJOS POSTERS .................................................................................................................... 525 O ESPAÇO AUSENTE: UM CONCEITO CHAVE PARA A GEOGRAFIA ESCOLAR NO CONE SUL ........................................................................................................................... 526 6 ENSINO DE CARTOGRAFIA UTILIZANDO DIFERENTES RECURSOS DIDÁTICOS ............................................................................................................................................... 539 ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL ATALIBA RODRIGUES DAS CHAGAS: UM NOVO TEMPO SE APROXIMA CONSTRUINDO UMA ESCOLA COMVIDA! ................................................................................................................................... 551 CONFERENCIA DE CIERRE: TENSIONES ENTRE BIENES COMUNES Y TRANSFORMACIONES AGRARIAS A DIVERSAS ESCALAS .............................................. 561 7 CONFERENCIA INAUGURAL: DESAFÍOS PARA LA INTEGRACIÓN DE LA GEOGRAFÍA EN EL CONO SUR Prof. Dr. Fernando Pesce (UdelaR) Este ensayo fue escrito para ser presentado a modo de disertación en la mesa de apertura del 1° Simposio de Geografía del Cono Sur: Desafíos para la integración de la Geografía del Cono Sur. El Simposio estuvo organizado de manera conjunta por el Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio- Geografía de la Facultad de Ciencias - UDELAR (Uruguay), el Programa de Pos-Graduación en Geografía y Geociencias (PPGGEO) de la Universidad Federal de Santa María, Río Grande del Sur (Brasil) y el Departamento de Geografía del Consejo de Formación en Educación de la Administración Nacional de Educación Pública (Uruguay). El evento tuvo lugar en Montevideo entre el 20 y el 22 de agosto del año 2015 en el Instituto de Perfeccionamiento y Estudios Superiores Juan Pivel Devoto. Las finalidades del Simposio fueron consolidar la cooperación técnico-científica entre las Instituciones participantes y promover el debate académico en torno a las principales líneas de investigación y proyectos derivados de las mismas como mecanismo de integración académica entre estudiantes y profesores de las tres instituciones organizadoras. A lo largo del ensayo se intentó responder a las siguientes interrogantes: a) ¿Cuál es la Geografía abarcativa del Cono Sur? O sea, recurriendo a los principios metodológicos de localización y extensión geográfica, se intentará precisar fundadamente el territorio o los territorios definidos como Cono Sur. b) ¿Qué características geográficas presentan los territorios del Cono Sur que le confieren singularidad en la diversidad socio- ambiental de la región? c) ¿Cuál sería el estatuto epistemológico para una Geografía del Cono Sur? d) ¿Cómo se enmarcaría la producción académica desde el estatuto epistemológico definido para la integración de la Geografía en el Cono Sur? El “topos” como punto de partida En la antesala a la firma del Tratado de Asunción que dio lugar, en el año 1991 a la creación del MERCOSUR como dispositivo geopolítico a los efectos de profundizar el neoliberalismo en la región, el Capitán Oscar Lebel, del Centro de Estudios Estratégicos del Uruguay definió el topos del Cono Sur. En la monografía titulada "Una visión geopolítica de la integración, desde una perspectiva 8 comprometida" presentada en el I Coloquio de Estudios Fronterizos, realizado en Rivera en el año 1988, el autor sostuvo: "En nuestras latitudes, la historia camina a lo largo y ancho de la Cuenca del Plata, ya que ella fue desde el comienzo de la colonización, una estratégica entrada al corazón del continente. Es esa misma historia, quien creó una geografía unitaria para el gran eje fluvial de la cuenca, con sus ríos Paraná, Paraguay, Uruguay y de la Plata. (...) la historia de nuestras áreas, es la historia de su integración dependiente de las potencias navales hegemónicas. A esos efectos, pueden distinguirse tres grandes períodos: Primero, el de la colonia típica bajo dominio de las coronas de España y Portugal. Segundo, el de la dependencia liberal, con hegemonía británica. Tercero, la incorporación al área de dependencia e influencia de los Estados Unidos". El autor definió de esa forma su visión geopolítica del topos. El Cono Sur fue considerado como una construcción dialéctica entre la geografía/la historia/y la nueva geografía que, a modo de transcurso temporal en espiral, se fue conformando a partir de nuevos territorios que se fueron dibujando sobre grafías preexistentes, al impulso del motor de la geopolítica global, cuyos actores, pretendidamente hegemónicos, han impulsado diferentes modelos de desarrollo siempre enmarcados en el modo de producción capitalista. Dando continuidad a la tesis de Lebel y proyectando la investigación sobre la construcción de los territorios en el Cono Sur Latinoamericano a fines del siglo XX, Pesce (2003) “ (…) en las últimas años del siglo XX, momento histórico en el que se están produciendo transformaciones territoriales importantes en el contexto de la denominada "Globalización", acordes con las condicionantes geopolíticas impuestas por el capitalismo financiero internacional que impulsa modelos económicos basados en el neoliberalismo, valiéndose de los adelantos técnicos en los medios de información y comunicación, exigiendo la flexibilidad de las fronteras no sólo desde el ámbito económico, sino también político, dibujando nuevas regionalidades en las grafías del Cono Sur”. Se vislumbraba la intervención de los estados en la construcción de equipamiento e infraestructura territorial, financiada por los organismos multilaterales de crédito, que a modo de mega obras, cumplieran con la finalidad de generar las condiciones generales necesarias para la reproducción del capital trasnacional en el entonces embrionario Orden Agroeconómico Internacional. En este nuevo estadio de la historia del capitalismo en la geografía unitaria de la región, la inversión de capitales en el modelo de desarrollo extractivo articula actores económicos y políticos globales, con actores económicos y políticos regionales, con actores económicos, políticos y sociales nacionales, que están grafando los territorios a partir de los agronegocios y la 9 producción de commodities acorde a los requerimientos del mercado global. La inversión de capital en la adquisición por compra o arrendamiento de superficie, tierras fértiles, ecosistemas productivos y agua resulta lucrativa y sitúa a los territorios del Cono Sur como uno de los reductos de mayor relevancia a tales efectos. Desde el punto de vista geográfico, el Cono Sur puede circunscribirse a la región articulada por los ríos Paraguay - Paraná y Uruguay, - que desembocan en el Río de la Plata- y que definen fluvialmente la Cuenca Hidrográfica homónima, localizada al centro y sudeste de América del Sur, abarcando un área aproximada de 4.350.000 Km2. En la actual coyuntura global los inversores del capital trasnacional observan a la Cuenca del Plata a partir de tres requerimientos esenciales: La red de drenaje tiene aptitud navegable en casi toda su extensión, dadas las características topográficas de la cuenca, "(…) particularmente cuando es tan pequeña la pendiente media de la superficie de las aguas de los ríos. El Paraguay - Paraná, desde Corumbá al estuario del Plata presenta una suave pendiente y es navegable para pequeñas embarcaciones en unos 2.400 kilómetros". (Shanahan E.W) La conectividad territorial, facilitada por los cursos fluviales es geopolíticamente trascendental para Bolivia y Paraguay, dada la condición de países mediterráneos que los mismos ostentan en el continente suramericano; también la interconexión fluvio marítima a través de la Cuenca del Plata es importante para los productores rurales de la región centro occidental del Brasil, que con una producción agrícola - forestal destinada principalmente a la exportación, los cursos fluviales le significan una salida marítima más competitiva que los corredores terrestres hacia los puertos brasileños del Atlántico. A su vez, Argentina y Uruguay gozan de una ubicación geopolítica estratégica como "puertas de ingreso" a los territorios de la Cuenca del Plata, con sus dos puertos ultra marinos históricamente competitivos: Buenos Aires y Montevideo. La localización geográfica de los territorios interconectados fluvialmente por los ríos Paraná, Paraguay y Uruguay, determina una gran diversidad de paisajes y ambientes naturales, dentro de los que se incluye el Bioma Pampa y cuya especialización productiva se fue construyendo a partir de la valorización de los recursos naturales que a lo largo de los distintos períodos históricos fueron articulando los territorios de la cuenca al sistema capitalista internacional. a) Extensividad, lo que permite disponer de enormes extensiones de espacio físico para maximizar la producción de commodities con el soporte tecnológico que la sustenta, convirtiendo los paisajes pampeanos, mesopotámicos, chaqueños, pantanalenses y matto grossenses en tecnosistemas monoproductivos. 10 b) Compacticidad, o sea la conformación de territorios compactos, promoviendo la eliminación de escotaduras fronterizas que impidan poner en práctica la extensividad. En este sentido los territorios del Cono Sur se presentan permeables desde el punto de vista político, institucional e ideológico al capital transnacional inversor. Las décadas de los años 70 al 90 del siglo pasado se caracterizaron, desde el punto de vista político por la sucesión de gobiernos cuyas políticas económicas consolidaron el modelo neoliberal emergente del denominado Consenso de Washington, lo que Ramonet (1998) denominó imposición de los regímenes “globalitarios”, identificando como tales, a aquellos gobiernos que impulsaron los dogmas del libre mercado y que subordinaron las economías, las sociedades y las culturas nacionales a la razón competitiva de los mercados financieros transnacionales. Las Geografías resultantes en el Cono Sur se consolidaron en torno a tres premisas económicas básicas señaladas por Vilas (2008) : a) que era necesario promover la inversión extranjera para que los países de la región alcanzaran el crecimiento económico sostenido, b) que para atraer las inversiones era necesario la más amplia apertura de los mercados internos y c) que se debían efectuar las reformas institucionales que levantaran restricciones, subsidios y regulaciones por parte de los estados nacionales que fueran de competencia desleal al capital. Svampa (2011) por su parte sostiene que el neoliberalismo se impuso en los territorios a través de reformas estructurales que acentuaron las brechas políticas, económicas, sociales y culturales, generando una redistribución del poder social, desfavoreciendo a los sectores populares y a las clases medias al concentrarse el poder en élites económicas internacionales. Se podría definir que los territorios resultantes y que dibujan la Geografía del Cono Sur se sostienen en a) la generalización de un modelo extractivo- exportador, b) la degradación ambiental y c) la extranjerización de la tierra y sus consecuencias tanto a nivel rural como urbano. En el transcurso de la primera década del siglo XXI la geografía política latinoamericana se ha ido modificando con el surgimiento y consolidación de nuevos gobiernos electos democráticamente, que tienen como imagen objetivo alcanzar escenarios sociales, económicos y políticos que, manteniendo las relaciones sociales de producción y sin alterar las condiciones estructurales de distribución de la renta, en los que se superen las consecuencias sociales, políticas e institucionales, producto de la aplicación de las transformaciones neoliberales. 11 El actual patrón de acumulación del capital transnacional ha adicionado a la inversión de capital en el sector financiero, el de la explotación de los tres recursos naturales fundamentales en el mundo contemporáneo y que son los recursos hídricos, edáficos y biogenéticos cuya extensión geográfica en la Cuenca del Plata presentan calidad ambiental para hacer viable al modelo y una posibilidad de acumulación en los que Harvey denominó en por desposesión. Los países del cono sur latinoamericano, que han sido tradicionalmente exportadores de materias primas y alimentos, con una fuerte especialización productiva de los territorios rurales, no han permanecido ajenos al proceso de imposición de un modelo económico extractivo exportador a gran escala territorial y con fuerte inversión de capitales transnacionales. La división territorial del trabajo en materia agropecuaria se ha sustentado en base a la disponibilidad y características cualitativas de los llamados recursos naturales – tierras fértiles, accesibilidad hídrica y condiciones climáticas-, la extensión geográfica y la posición estratégica. Los bienes ambientales y las diversas ofertas ecosistémicas de los territorios del sur se han transformado, desde la lógica capitalista, en las variables económicas de mayor rentabilidad. Principalmente la posibilidad de extender la frontera agrícola a expensas de grandes extensiones ecosistémicas nativas y la imposición de los agronegocios en los territorios rurales de los países de la Cuenca del Plata es realizada bajo el impulso dado por mega corporaciones trasnacionales. Las propuestas de infraestructura y equipamiento en el territorio van jerarquizándolos en función de su potencialidad para articularse al mercado global sucediéndose la sumatoria de propuestas de mega emprendimientos y mega obras. La mayor limitante para alcanzar la sustentabilidad socio- ambiental territorial sea la planteada por Petras (2002) cuando sostiene que la conquista ideológica más relevante del neoliberalismo es la de que el modelo extractivo se impuso como un sistema autoritario, convalidado por el proceso electoral para concretar las reformas estructurales y aparentar ser tan solo un programa económico. A su vez sostiene que para revertir los impactos políticos y sociales del neoliberalismo es necesario primero, considerarlo como un proyecto político más amplio que un simple programa económico que tuvo consecuencias sociales, pues desde ese lugar se desestima como proyecto ideológico y como propuesta política. La adopción del modelo y sus lógicas inherentes, tales como la permeabilidad política y cultural para adaptarse a la innovación, la apertura a las inversiones del capital, producir para exportar, incrementar los excedentes, especializar la producción de bienes alimentarios, constituyen las bases promisorias para convertir las economías atrasadas de los países del cono sur latinoamericano en “geografías ganadoras”. (Achkar et.al, 2008). 12 El develar la ideología que subyace a los discursos oficiales dominantes es fundamental al momento de pensar el estatus epistemológico para la Geografía ciencia en el Cono Sur de la región, pues obliga a la academia a definirse políticamente en torno a qué geografía investigar, desde qué lugar ideológico hacerlo y con qué finalidades producir conocimiento sobre los territorios. El estatuto epistemológico para la Geografía en el Cono Sur Entre la descripción, la explicación y la transformación de los fenómenos geográficos, señalaba David Harvey (1985) "(…) la geografía histórica del capitalismo ha de ser el objeto de nuestra teorización, y el materialismo histórico-geográfico el método de investigación". Por su parte Dalby (1990a, 1990b) propuso el desarrollo de una "teoría crítica de la Geopolítica", que definió como "la investigación de cómo un conjunto particular de prácticas llega a ser dominante y excluye otro conjunto de prácticas. En donde el discurso convencional acepta las circunstancias actuales como dadas, 'naturalizadas', una teoría crítica se plantea preguntas sobre cómo han llegado a ser tal cual son". Siguiendo la tradición epistemológica socio- crítica con raíces en el Cono Sur latinoamericano en la década de 1970, que tuvo en el 1º Congreso de Geografía en Salto, Uruguay en 1973 y en Neuquén, Argentina el 1º Encuentro de Geografía latinoamericana dos espacios referenciales para la definición de un estatuto científico para la disciplina. Ese movimiento intelectual, reunido en Neuquén, en el que participó Milton Santos y Pierre George envió una ponencia, fue muy crítico con la investigación y la enseñanza geográfica vigente en la región, a la que acusaba de “(…) no haber pasado la fase de los estudios temáticos y parcializados exentos de cuantificación precisa y por tanto con validez científica discutible…”1 Y proponían una refundación disciplinar para “(…) que la investigación y la enseñanza geográfica y científica irrumpa como un instrumento más en la transformación revolucionaria de la sociedad”. En esa afirmación se encuentra el pilar ontológico del paradigma crítico, o sea el involucramiento de quienes practican la investigación y la enseñanza geográfica en la transformación radical de la sociedad. Sostenía el Prof. Daniel Vidart (1967) sobre la construcción social del espacio, “Los geógrafos lo descuidan a menudo. Consideran a las formas geoculturales – espacios naturales, paisajes humanizados- en primer plano y a las sociedades, como 1 ANPG (1969)- Hacia Una Geografía Regional- Colección Nuestra Tierra, Nº 33. Montevideo, Uruguay. 13 un homogéneo telón de fondo. Esta visión es incorrecta, simplista y al final, falaz. El espacio social señala que en las sociedades existen jerarquías, estratificaciones (…) El espacio social salta las barreras geográficas, planetariza el orbe de las sociedades globales. Aunque los separen miles de leguas comparten un mismo espacio los dueños de los cafetales paulistas y los propietarios de la United Fruit del Caribe, y por igual son integrantes del submundo de los explotados el pelado mexicano, el roto chileno, el fellah de Egipto. Dicho espacio social, estructurado y dispuesto en pirámides clasistas el geógrafo debe utilizarlo y descifrarlo, si se propone buscar en la construcción de los paisajes humanizados los grupos sociales que sobrellevan el peso de las penosas tareas musculares mal retribuidas, si califica debidamente la condición clasista de los grandes balnearios de lujo, si descubre en las configuraciones de la ecología humana, en su sentido de localización espacial, de los grupos provocadas por la “acción competitiva” como se llama eufemísticamente por los sociólogos de USA a la lucha de clases”. Desde esos antecedentes lejanos en el tiempo pero aún válidos ontológicamente, se propusieron que el geógrafo como investigador y como docente debe posicionarse socialmente en forma comprometida para lograr transformaciones sociales, económicas y políticas de tipo estructural, o de lo contrario, seguirá contribuyendo con el mantenimiento del orden instituido. “Para la geografía radical, los geógrafos no son pues espectadores neutrales de la sociedad en la que viven. Debido a la posición social que tienen de hecho o la que reivindican, su geografía está influida por dimensiones personales. Estas dimensiones personales guían la elección de sus temas de investigación y las formas de expresión que adoptan; están inspiradas por opciones fundamentales que no vienen impuestas por la práctica de la disciplina, sino por adhesiones más o menos explicitas o críticas a tal o cual gran sistema de pensamiento”. (Herin, 1992) Los geógrafos y profesores de Geografía deberían adoptar a los territorios como categoría analítica, entendiendo a estos como configuraciones espaciales a distintas escalas producto de la interrelación de diferentes actores políticos, institucionales, sociales, económicos, que operan a partir de diferentes proyectos de desarrollo a escala local, regional, global. Las finalidades para la investigación y la docencia geográficas podrían delimitarse a partir de los siguientes ejes estructurantes: - Interpretar las complejas configuraciones de los territorios y reconocer la interrelación dinámica de diferentes actores que intervienen en su configuración. 14 - Asociar las relaciones existentes entre las estructuras y dinámicas territoriales locales, articuladas a dinámicas regionales, nacionales y globales, para comprender los factores que las favorecen y las impulsan. - Abordar la estructura y dinámica de la Biosfera para comprender la manifestación de los ciclos biogeoquímicos en los territorios y cómo las actividades antrópicas se articulan e inciden en los mismos (Impactos Ambientales). - Estudiar los impactos que las sociedades introducen en los sistemas ambientales y sus manifestaciones territoriales para comprender cómo los efectos “naturales” sobre la sociedad son producto de factores y procesos complejos en los que diferentes agentes intervienen con responsabilidades diferenciales. - Abordar los procesos, modelos y funciones de los asentamientos humanos a los efectos de identificar las características ambientales que afectan diferencialmente a los agentes sociales y cómo éstos construyen diferencialmente ambientes y territorios. Para finalizar, la pregunta efectuada al inicio ¿para quién producir Geografías? se responderá apelando a dos profesores de Geografía uruguayos pioneros en la construcción del pensamiento geográfico crítico en el Cono Sur, los profesores Eliseo Salvador Porta y Pablo Fierro Vignoli, quienes en nombre de la Sala de Geografía de Paysandú, exponían en el Primer Congreso de Profesores de la asignatura (1967) la comunicación El profesor e investigador de Ciencias Geográficas ante los problemas de Uruguay y América Latina, en la que se preguntaban ¿qué papel cabe al profesor de Geografía?, y respondían a ella de manera categórica “(…) Ningún profesor como el de Geografía puede tentar la urgente aventura de despertar conciencia de los problemas latinoamericanos, crear un espíritu crítico, combatir el subdesarrollo de mentes (…) y para ello debe documentarse en forma seria y con la mejor bibliografía, (…) tenemos aquí en Uruguay, nosotros los docentes, una estupenda arma de transformación; podemos educar, podemos hacer que los problemas se conozcan y se sientan. (…) Queremos un curso comprometido como deseamos un profesor comprometido. Comprometido primero en lealtad a los patrones internacionales del saber y en lealtad a su pueblo, comprometido en crear dentro de su clase un espíritu de tolerancia y de comprensión crítica de la realidad geográfica en la que está inmerso para poder interpretarla, comprenderla para como ciudadano, transformarla. Bibliografía Achkar, M.; Domínguez, A., Díaz, I. y Pesce, F. (2010a) La intensificación del uso agrícola del suelo en la última década en el Litoral Oeste del Uruguay. Revista 15 Interuniversitaria de Estudios Territoriales. Pampa Nº 10. Edición Especial. AUGM. La Plata. Achkar, M.; Domínguez, A. y Pesce, F. (2008) Agronegocios Ltda. Nuevas modalidades de colonialismo en el Cono Sur de América. FWW- REDES - AT. Montevideo. Achkar, M; Domínguez, A; Pesce, F (2011). Evolución del pensamiento geográfico en el Uruguay. Breve ensayo historiográfico. Ediciones Zona Libro, Montevideo, Uruguay. 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Com o uso de entrevistas semiestruturadas, foi possível perceber que tal transição parte de uma necessidade do agricultor familiar camponês, em utilizar um modelo agrícola que não cause danos a sua saúde e a do consumidor. A agricultura agroecológica é praticada, de modo geral, há dois anos no município e está obtendo êxito na produção. Introdução A presente pesquisa busca a reflexão sobre a sustentabilidade através da agroecologia no que tange os aspectos ecológicos, econômicos e socioculturais. Tal estudo tem como temática central a transição da agricultura convencional para a agricultura agroecológica, no município de Agudo, localizado na região Central do estado do Rio Grande do Sul. A agroecologia surge, segundo Gomes (1999), como a construção de um novo paradigma, o qual representa uma ruptura do modelo produtivista baseado na Revolução Verde e uma orientação na produção e na circulação do conhecimento na agricultura. A Revolução Verde, segundo Martins (1999), surge no espaço rural brasileiro em meados dos anos 1960 e 1970, trazendo consigo a industrialização rural na forma de pacotes tecnológicos, os quais, incentivaram a monocultura em larga escala e a produção de commodities para a exportação. Além da produção em larga escala, a introdução de culturas geneticamente modificadas e hibridas, o intenso uso de agrotóxicos e insumos, bem como o emprego de maquinas agrícolas, resultam no empobrecimento e exclusão de um numero importante de famílias de agricultores. Empobrecimento este não apenas no âmbito econômico, mas também cultural, pois durante este processo, numerosos saberes, 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia – PPGGEO / Universidade Federal de Santa Maria – UFSM / [email protected] 3 Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia – PPGGEO / Universidade Federal de Santa Maria – UFSM / [email protected] 20 técnicas e culturas tradicionais deram espaço ao saber e as culturas produzidas e comercializadas por industrias sementeiras. Neste sentido, a soberania alimentar dos povos se viu também ameaçada, uma vez que as unidades de produção familiar foram se introduzindo no modelo de modernização. Tendo em vista a dicotomia entre a modernização da agricultura no contexto da agroecologia, a presente pesquisa, faz uma caracterização das vivências dos agricultores em transição agroecológica no município de Agudo, Rio Grande do Sul. A problemática atenta-se a compreender os principais aspectos que levaram os sujeitos da pesquisa a optarem pela agroecologia. Como objetivo geral, pretende-se compreender como os agricultores em questão optaram pela produção agroecológica. Mais especificamente busca-se conhecer as estratégias de produção agroecológica nas unidades de produção familiar em questão; e caracterizar o viver e o produzir destes agricultores. Quanto aos aspectos metodológicos, a pesquisa utiliza uma abordagem qualitativa, buscando compreender o fator motivador de se de esta opção pela agroecologia. Tal abordagem deve ser ressaltada, diante as dificuldades e essencial contribuição para a verificação, análise e diagnóstico referente à temática abordada. Foram elaboradas entrevistas semiestruturadas, as quais, conduziram a conversa com informantes chave, previamente identificados pelo extensionista do escritório da EMATER/RS de Agudo. Durante o trabalho de campo, realizado nas unidades de produção familiar em transição agroecológica do município de Agudo, além das entrevistas, foram utilizadas técnicas como a observação sistemática e o caderno de campo. Para citar a fala dos agricultores no texto, fora utilizada a abreviação AFC (Agricultor Familiar Camponês) e o respectivo número da ordem de sua entrevista. Reflexões conceituais Agricultura familiar camponesa Há uma diversidade de entendimentos acerca do espaço rural, que se explica em parte, pelas diferentes formas de ocupação do território, ligadas ao tempo, espaço e culturas. Dessa forma, a delimitação do espaço rural se caracteriza, em alguns casos, por um núcleo que agrupa moradias, instituições públicas e privadas ligadas ao lugar. Em outros casos há maior complexidade em delimitar o espaço rural, devido a dispersão das residências. Independente das delimitações, ambos possuem algo em 21 comum: o agricultor. Tal sujeito se insere como personagem principal no espaço rural (WANDERLEY, 2000). De modo mais recente, as transformações que tangem o rural, estão ligadas a fatores externos, como as relações políticas e econômicas, em um mundo no qual a globalização da economia avança, trazendo consigo empresas transnacionais que remoldam o campo; e internos, no qual o processo de mudança no espaço rural abarca em uma complementariedade deste para o urbano (WANDERLEY, 2000). Do ponto de vista teórico, segundo Wanderley (2003), há uma dificuldade em atribuir valor conceitual à categoria agricultura familiar no Brasil. Com a implantação do PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), a conceituação de agricultura familiar acabou se confundindo com a definição usada por este programa de créditos. Outros autores defendem que a agricultura familiar corresponde a uma categoria de agricultores que se moldaram em relação a modernização da agricultura, adequando-se as exigências do mercado. Inegavelmente, há um processo de mudança profunda no meio rural brasileiro, a qual afeta precisamente as vivências dos agricultores e, em por vezes, a lógica familiar. Porém, para muitos agricultores, a lógica imposta pela modernização da agricultura não se introduz de forma completa na unidade de produção familiar, visto que não reproduz o modelo de empresa capitalista, e sim, o modelo familiar. Mesmo integrada ao mercado, o fato de permanecer familiar evidencia a origem camponesa de sua evolução (WANDERLEY, 2003) Wanderley (1996) em sua obra nos traz o termo agricultor familiar camponês, ou agricultura camponesa que pode ser entendida como Uma das formas sociais de agricultura familiar, uma vez que ela se funda sobre a relação entre propriedade, trabalho e família. No entanto, ela tem particularidades que a especificam no interior do conjunto maior da agricultura familiar e que dizem respeito aos objetivos da atividade econômica, às experiências de sociabilidade e à forma de sua inserção na sociedade global. (WANDERLEY, 1996, p.3) É dentro desta perspectiva que se centra esta pesquisa, visto a identificação do conceito com os agricultores de Agudo, mais especificamente, os que estão passando por uma transição agroecológica. Contudo, a concepção de agricultura familiar camponesa, vai além da relação propriedade, trabalho e família, ligada aos saberes sociais e a identificação com o lugar e com a agricultura. Na caracterização dos estabelecimentos rurais, Wanderley (1996), trata a agricultura familiar camponesa como uma atividade que se caracteriza pelo cultivo da 22 terra nas unidades de produção familiar, utilizando-se de mão de obra familiar. Outra característica importante é o uso de saberes sociais a diversificação da produção, o que auxilia na diminuição de gastos com alimentos, os quais podem ser cultivados pela família, e se aproveita do ambiente que o circunda para suprir suas necessidades. A modernização do campo Desde os primeiros tempos da civilização, a agricultura é a principal forma de interação do homem com a natureza, tal interação resultou em impactos, os quais se intensificaram nos últimos anos com o advento do desenvolvimento rural. Para Lima (2003), a necessidade do aumento na produção de alimentos, fibra e riqueza, resultou na criação, aperfeiçoamento e adaptação de maquinas e implementos que auxiliassem a transformar o campo em prol do benefício econômico. No século XX, houve um avanço considerável das tecnologias ligadas a agricultura, bem como um avanço nos impactos ambientais dela resultantes. O ideário vigente se referia a limitação que os agricultores possuíam em produzir alimentos, necessitando assim, de insumos químicos e maquinários para desenvolver a sua produção. A evolução e a estrutura rural na década de 1970 no Brasil, reflete um setor industrial, produtor de bens voltado a agricultura. Marafon et al (2012, p.4) explica que “paralelamente à implantação desse setor ocorreu a modernização de um mercado para os produtos industriais do sistema agroindustrial fruto de modificações significativas na forma de se produzir”. Graziano da Silva (1999) se refere a esta fase denominando que estava assentada no tripé indústria - agricultura – agroindústria, sendo constituído nesta época os complexos agroindustriais, ligado a modernização da agricultura. Assim, a agricultura está cada vez mais subordinada à indústria, que dita as regras de produção, tornando o agricultor cada vez mais dependendo do capital. Sobre essa questão, Gonçalves Neto (1997, p. 78), ressalta que “a década de 1970 foi impulsionada por uma política de créditos facilitados, e que a agricultura brasileira, não apenas respondeu às demandas da economia, mas foi profundamente alterada em sua base produtiva”. Nesse sentido, o maciço crescimento do uso da tecnologia mecânica, de agrotóxicos e adubos, a assistência técnica, êxodo rural, nos permite afirmar que o campo brasileiro mudou. 23 Segundo Hespanhol (2008), a modernização da agricultura e o estabelecimento da Política Agrícola Comum (PAC), contribuem em uma gama de países que necessitavam importar alimentos. Para Hespanhol (2008, p. 372) “tais países, não apenas se tornaram autossuficientes, como se converteram a exportadores líquidos de produtos agrícolas a partir dos anos de 1980”. Em contraponto a estas vantagens, o autor afirma que os problemas ambientais decorrentes desta modernização são preocupantes. A qualidade ambiental de vastas áreas, foram comprometidas com a expansão de monoculturas e o uso indiscriminado de máquinas, implementos, fertilizantes químicos e de biocidas, (HESPANHOL, 2008). Além dos problemas ambientais, os problemas sociais promulgados pelo modelo produtivista da agricultura moderna, não proporcionou a superação da pobreza nas zonais rurais, nem proporcionou a melhoria da qualidade de vida. Tal forma de agricultura também não levou a erradicação da problemática da fome no mundo, apesar de ter ampliado a oferta de alimentos, os problemas de distribuição se perduraram e até se agravaram, (HESPANHOL, 2008) Para Hespanhol (2008), tal modernização, associada ao modelo de desenvolvimento produtivista, passou a ser contestada nos anos de 1970 e 1980, surgindo assim, “novas abordagens, nas quais tem se valorizado as potencialidades locais, a diversidade, o meio ambiente bem como envolver os atores sociais nos projetos de desenvolvimento. ” Hespanhol (2008, p. 371). Todavia, voltar ao modelo agrícola anterior a agricultura moderna seria, segundo Gaiovicz e Saquect (2006) “um retrocesso na revolução tecnológica”. No entanto, é necessário buscar alternativas que amenizem os impactos causados por tal modernização. Assim, a agroecologia surge como a solução para a pratica de um desenvolvimento rural sustentável que beneficie igualmente a todos, não apenas no aspecto econômico. Agricultura Agroecológica Frente aos problemas ambientais, sociais e econômicos, provocados pela agricultura modernizadora, a agroecologia eclode com o intuito de socializar com os agricultores alternativas ecológicas. Assim, Gliessman (2000, p. 54) define a agroecologia em um primeiro momento como um “importante representante do processo de princípios ecológicos no desenho e manejo de agroecossistemas sustentáveis”. Em uma visão voltada para os aspectos socioculturais é aprofundada por Sevilla Guzmán (2002). Este autor, traz a ideia que há a necessidade de a 24 organização agroecológica partir de dentro da comunidade ou unidade de produção. Assim, percebe-se a necessidade da valoração da cultura local, da identidade da comunidade, indo de encontro com o modelo desenvolvimentista da agricultura moderna. Todavia, Sevilla Guzmán (2002) e Caporal e Costabeber (2004) reconhece algumas limitações pelas quais a prática agroecológica tem enfrentado, tais como a supervalorização dos aspectos técnicos, a pouca inclusão de questões socioculturais, e uma visão voltada a questões estritamente agronômicas, tem gerado o que Sevilla Guzmán chamou de agroecologia restrita. Assim, a produção de produtos orgânicos, que seguem esta lógica, se destina à exportação ou a uma pequena parcela da população que possa pagar por este alto custo. Neste viés, os produtos orgânicos não contribuem para a segurança alimentar dos povos, principalmente das massas marginalizadas pelo sistema capitalista, uma vez que estas são as mais vulneráveis frente a questão alimentar, e os orgânicos ainda são ofertados no mercado a preços muito distantes da maior parte da população. É possível perceber que a produção orgânica é diferente da agricultura agroecológica. Podemos classifica-la de duas formas, uma, que se aproxima dos nichos de mercado, das parcelas corporativas da produção em larga escala; a outra, é de caráter político e cultural, focada na preservação da saúde, do ambiente, buscando a autonomia e a soberania alimentar. Os sujeitos da presente pesquisa se adequam a esta última denominação, uma vez que, mesmo estando no estágio inicial de transição agroecológica, pretendem, segundo o relato do representante do escritório da EMATER/ASCAR, de forma progressiva, melhorar e adaptar o modo de produzir, a ponto de serem considerados agroecológicos. A transição agroecológica é uma construção social que surge da compreensão das limitações e os riscos existentes no atual modelo hegemônico. Tal transição cria alternativas que apoiam o processo de transformação da agricultura, com enfoque sustentável. Altieri (1998) e Gliessman (2000), abordam o processo de transição agroecológica, o qual se dá de forma gradual, contínua e multilinear. Os autores dissertam sobre a complexidade desta transição, visto que cada agricultor possui uma realidade específica e vivencia graus diferentes de transição. Assim, foram delimitados três níveis fundamentais do processo de transição agroecológica, do mais simples ao mais complexo, sendo eles: o menor uso de insumos, a substituição de insumos até chegar ao redesenho do agroecossistema. O agroecossistema é redesenhado com o intuito de buscar níveis de maior sustentabilidade. 25 Esta transição, para Costabeber (2006) é um processo gradual de modificações nas formas de manejo dos agroecossistemas utilizados pelos agricultores. É importante que o processo seja construído com o uso dos saberes dos agricultores, bem como, com o auxílio de extensionistas ou educadores da área. As consequências do processo de transição são a preservação do meio ambiente, a redução do custo de produção, o uso de produtos com maior qualidade nutricional e com redução ou ausência de químicos. Esta nova forma de agricultura não requer apenas uma substituição de insumos e técnicas, requer também uma mudança de valores, práticas e ideias de quem se compromete a praticá-la, em relação ao manejo dos recursos disponíveis (COSTABEBER, 2006). O processo de transição não deve ser compreendido como retrocesso, e sim como um caminho rumo ao desenvolvimento rural sustentável. Resultados parciais O município de Agudo está localizado na região central do estado do Rio Grande do Sul. Sua população é de 17.161 habitantes segundo o senso do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2010), sendo que destes, 7.723 residem no meio urbano e 9.438 residem no campo. Seus limites municipais são ao norte com Ibarama e Lagoa Bonita do Sul, a leste com Paraíso do Sul e Cerro Branco, a sul com Restinga Seca, a oeste com Dona Francisca e Nova Palma, como pode ser observado na Figura 1. 26 Figura 1: Mapa de localização do município de Agudo. Fonte: IBGE, 2010 A base econômica do município está centrada na agropecuáia, suplementada com atividades industriais as quais, subsidiam as relações comerciais. É a agricultura que movimenta a economia local, tendo na fumicultura e na orizicultura a principal fonte de renda para o município. Nos últimos anos, alguns agricultores do município, vêm produzindo outra forma de agricultura, a qual não agride o ambiente e possui características sustentáveis: a agricultura agroecológica. Estes agricultores, possuem características heterogêneas quanto a sua produção. Cultivam em suas unidades de produção familiar, cultivos como banana, laranja, morangos, arroz, soja, cana de açúcar, e verduras. Vale ressaltar que todas 27 essas culturas se enquadram no primeiro e segundo níveis de transição agroecológica, defendidos por Altieri (1998) e Gliessman (2000), referidos anteriormente. Se heterogêneas são suas culturas, semelhantes foram suas motivações a parar de produzir de forma convencional. Segundo relatos dos sujeitos da pesquisa, a questão norteadora para esta mudança está pautada na saúde humana. De modo geral, todos os agricultores foram diagnosticados com patologias possivelmente relacionadas ao uso de agroquímicos. Sintomas como estado depressivo, dores de cabeça constantes, náuseas, alergias, foram citados pelos sujeitos da pesquisa como constantes, antes da transição agroecológica. Além da preocupação com a saúde da família, sempre houve a inquietação com a saúde do consumidor de seus produtos, como pode ser percebido na fala do agricultor (AFC 2) Se nós passamos mal e ficamos doentes só mexendo nos venenos, imagina quem come isso todos os dias? Se faz mal só de encostar na pele, imagina dentro do estômago? Foi pensando nisso que conversei com meu marido e decidimos parar de usar veneno, todos estávamos doentes e ajudávamos outras pessoas a adoecer com o que produzíamos (AFC 2 – Trabalho de campo, junho de 2015). Outro fator motivacional está nos cuidados com o ambiente, todos os agricultores possuem conhecimento das consequências danosas do modelo agrícola vigente para com o ambiente. Sendo assim, além de utilizar pouco ou nenhum químico em sua produção, esses agricultores, preservam a maioria das plantas e animais existentes em suas unidades de produção familiar, utilizando as características benéficas que esses podem oferecer, e repelindo, de forma natural, os organismos que ainda não forma adequados no agroecossistema. A produção é desenvolvida com a mão de obra familiar. Em média os agricultores utilizam um hectare para a prática agroecológica. Dentre as unidades de produção, algumas são utilizadas apenas para o plantio de forma agroecológica, já em outras, o plantio livre de agrotóxicos ocupa parcelas de terra próximas às do plantio convencional. Segundo entrevistas, a área destinada a produção agroecológica varia de 300 metros a quatro hectares. No que se refere as técnicas utilizadas pelos agricultores, estes recebem o auxílio de extensionistas do escritório da EMATER/RS, os quais esclarecem os questionamentos acerca da produção agroecológica. Vale ressaltar que o auxílio destes extensionistas é fator determinante para esta transição, uma vez que eles dão o suporte para que os sujeitos da pesquisa consigam progredir na transição. 28 Além do uso do conhecimento transmitido pelos extensionistas da EMATER/RS, o uso de saberes geracionais também se faz presente na vida destes agricultores. A reprodução destes saberes é percebida nas práticas cotidianas, como na lavoura, nos serviços domésticos, bem como no uso de ervas medicinais. Nas unidades de produção familiar o uso de maquinário se faz restrito, são utilizados apenas tratores para o preparo do solo. No que se refere ao uso de agroquímicos, alguns agricultores ainda fazem o uso de adubos químicos e/ou pesticidas quando não conseguem repelir insetos como a lagarta do cartucho, Spodoptera frugiperda, e o pulgão do milho Rhopalosiphum maidis, ou o pulgão da couve, Brevicóryne brássicae. Em geral, os agricultores usam adubos orgânicos, produzidos na unidade de produção familiar e outros adquiridos no comércio. O manejo do solo é realizado com adubação verde, uso de plantas recuperadoras de solo, consórcio de plantas e pó de rocha, os quais auxiliam na fertilidade do solo. Os insetos são repelidos das culturas com o uso de plantas praguicidas, estas com forte odor, que afasta os insetos; e compostos orgânicos que podem ser produzidos na unidade de produção familiar. Os agricultores apontam algumas dificuldades na produção agroecológica, relacionados ao acesso a determinadas mudas para o cultivo de algumas variedades, como é o caso do morango (fragaria vesca), cuja muda é importada do Chile. O acesso a adubos de origem orgânica e o alto preço de alguns produtos orgânicos também estão dentro das desvantagens destacadas pelos sujeitos da pesquisa. A colheita é feita conforme a cultura. Além do autoconsumo, a comercialização ocorre diretamente ao consumidor, sendo comercializada em feiras, na rua, nas casas dos consumidores, na casa dos agricultores, abastecem também restaurantes, bares e supermercados. De modo geral, a produção é comercializada dentro do município. Conclusões Frente aos resultados já obtidos, é possível fazer uma reflexão no que tange os aspectos ecológicos, econômicos e socioculturais da pesquisa. A transição agroecológica, para os familiares camponeses no município de Agudo têm auxiliado estes sujeitos a mudar seus hábitos e construir novas vivências. Práticas de cuidado e conservação dos recursos naturais, se tornaram corriqueiros ao passo que os sujeitos da pesquisa se ascendem na transição. Cuidados com a saúde, uso de ervas medicinais e saberes geracionais em seus hábitos diários são aspectos retomados por estes agricultores familiares camponeses. 29 No que se refere a questão econômica, há a valorização dos produtos comercializados pelos agricultores, os quais são vendidos a preços acessíveis. Tal iniciativa garante que mais pessoas tenham acesso a alimentos de qualidade, bem como favorece e incentiva os agricultores a seguir na produção de alimentos livres de agrotóxicos e insumos químicos. Dado o exposto, é possível afirmar que a transição agroecológica é um sistema vantajoso para os agricultores familiares camponeses de Agudo. É perceptível a mudança benéfica que existe no viver destes agricultores, uma vez que isso é constatado em suas falas. Para estes agricultores, a continuação da produção é almejada, visto que eles se identificam e se completam com o que estão fazendo. Quando questionados sobre as perspectivas futuras, a resposta unanime foi a continuação progressiva deste processo de agricultura agroecológica, com o intuito de aumentar seus conhecimentos acerca da agroecologia, diversificar sua produção, possuir maior autonomia frente a produção, e atingir a segurança alimentar na propriedade. Referências bibliográficas ALTIERI, M. (1998). Agroecologia, as Bases Científicas da Agricultura Alternativa. Rio de Janeiro: Editora PTA/FASE. ALTIERI, M.; TOLEDO, V. M. (2011). La revolución agroecológica en Latinoamérica. Rescatar la naturaleza, asegurar la soberanía alimentaria y empoderar al campesino. Sociedad Científica Latinoamericana de Agroecología. CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. (2004). 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Palavras-chave: Queijo Canastra; patrimônio imaterial; produção familiar. Objetivo Demonstrar a importância social, econômica e cultural da produção do queijo Canastra. Metodologia Para estruturação do trabalho foram utilizados os dados dos censos demográficos e dos censos agropecuários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de publicações de outros órgãos, instituições e associações, tais como: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMPRAPA Gado de Leite), Instituto de Laticínios Cândido Tostes (ILCT), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER/MG), Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de Minas 4 O nome Canastra advém do grego kanastron, e do latim cannastrum, que significa recipiente, deve-se à semelhança existente entre o imenso chapadão e um grande baú (mobiliário antigo e ainda utilizado), que os antigos chamavam de canastra (NETTO, 2014). 33 Gerais (SEBRAE/MG), Associação dos Produtores de Queijo Canastra de Medeiros (APROCAME) e Associação dos Produtores de Queijo Canastra (APROCAN). INTRODUÇÃO “[...] quando o mineiro parte, leva a família, os animais, as sementes, a saudade e um pedaço de queijo”. Rocha, 1995, p. 2. A produção e o consumo do queijo Canastra se confundem com a própria história do povoamento local, iniciado no período colonial, onde se buscava minerais e pedras preciosas. Os relatos dos naturalistas que percorrem Minas Gerais entre o final do século XVII e meados do século XIX descrevem detalhadamente os hábitos e costumes alimentares dos habitantes das Minas Gerais. Saint-Hilaire (1975; 2004); Pohl (1976) destacam que era comum a fabricação do queijo artesanal no século XIX e mencionam o queijo como produto de expressão na alimentação e na economia. Outros registros históricos descrevem que da formação dos primeiros rebanhos utilizando a pastagem nativa de campo e as pastagens naturais existentes nas áreas desmatadas, surgiu a necessidade da produção do queijo. O produto era consumido pelas famílias e/ou comercializado junto aos tropeiros que passavam pela região e distribuíam estes produtos para diversas comarcas. O processamento era rudimentar, sendo o coalho natural, obtido da raspagem do estômago seco do tatu, porco ou do bezerro macho. Como fermento láctico, usava-se o “pingo”, ou seja, o soro que escorre do queijo no prazo de 12 a 24 horas, sendo que usualmente este “pingo” era trocado entre os produtores de queijo. A produção era guardada em malas de couro (bruacas ou buracas) e transportada em lombo de muares ou em carros de boi. Naquela época, devido às dificuldades de transporte, o queijo chegava a ser comercializado com 30 a 60 dias de maturação. (ALMEIDA; FERNANDES 2004). Explica Meneses (2006) que a elaboração do queijo Canastra é estabelecida a partir de leite cru, de uma tradição familiar e de uma economia local que o associa à atividade fundamental da fazenda mineira típica. Complementa Almeida; Fernandes (2004) que na região da Canastra a produção do queijo artesanal é um fator cultural de significativa importância sócio-econômica para grande parte das famílias rurais. Em toda a região é significativa a presença da agricultura familiar, com sua diversificação de produtos e seu consequente envolvimento na atividade leiteira. É principalmente 34 dessa região que sai cerca de 4.470 toneladas/ano de queijo Canastra para abastecer os mercados locais, regionais e estados vizinhos. A produção de queijo Canastra nunca cessou, pois se trata de uma atividade que se consolidou historicamente, pertence ao “modus vivendi” das famílias locais que desde o início da ocupação dos campos da região viam na fabricação do queijo uma alternativa segura de renda e de sobrevivência. (ALMEIDA; FERNANDES 2004). As condições socioambientais da região onde é produzido o queijo Canastra, segundo os autores supracitados, são favoráveis à sua produção. Isso se deve ao fato do ambiente ser propício ao desenvolvimento de bactérias específicas do lugar, que contribuem para o sabor característico do queijo Canastra. Cabe destacar que o estabelecimento dos produtores familiares de queijo Canastra e a da sua produção configuram a paisagem local, estabelecem na população um sentimento de pertencimento ao lugar e uma identificação territorial5. 1 ASPECTOS GERAIS DA REGIÃO E DA PRODUÇÃO DO QUEIJO CANASTRA A região onde é produzido o queijo Canastra pode ser visualizada no Mapa de Localização da Microrregião da Canastra. Essa região localiza-se no sudoeste do Estado de Minas Gerais, limitando-se ao norte/noroeste com a região do Triângulo Mineiro, ao sul com a região do Lago de Furnas e a oeste com a região Centro-Oeste de Minas. 5 Haesbaert (2007) salienta que não existe atualmente uma forma geral de identificação territorial, e que é fundamental a contextualização histórico-geográfica de cada movimento de construção identitárioterritorial. “A identidade territorial só se efetiva quando um referente espacial se torna elemento central para a ação política do grupo, um espaço em que a apropriação é vista em primeiro lugar a partir da filiação territorial, e onde tal filiação inclui o potencial de ser ativada, em diferentes momentos, como instrumento de reivindicação política [...]”. (HAESBAERT, 2007, p. 45). “A identidade territorial sem dúvida toma por base um contexto muito mais complexo do que a simples “paisagem”, imbricando fatores como a diferenciação sócio-econômica e cultural dos espaços [...]”. (HAESBAERT, 2007, p. 46). 35 A região compõe junto com as demais o denominado Território do Queijo Minas Artesanal (ver Mapa Território do Queijo Minas Artesanal). Para diferenciá-la foi denominada e delimitada geograficamente de Microrregião da Canastra pelo Instituto Mineiro de Agropecuária - IMA (2004) através da Portaria nº 694, de 17 de novembro de 2004, que em seu Art. 1º determinar: “Fica identificada a microrregião da Canastra como produtora do Queijo Minas Artesanal, composta pelos municípios de Bambuí, Delfinópolis, Medeiros, Piumhi, São Roque de Minas, Tapiraí e Vargem Bonita” (IMA, 2004), (ver Mapa do Queijo Minas Artesanal Canastra). TERRITÓRIO DO QUEIJO MINAS ARTESANAL 36 Fonte: EMATER/MG. Fonte: EMATER/MG. Segundo Almeida; Fernandes (2004) as características agroclimáticas da microrregião podem ser assim estabelecida: o clima caracterizado na área delimitada é classificado como tropical de altitude, típico do cerrado, com temperatura média 37 anual em torno de 22,2 °C, com a média mínima de 16,7 ºC e a média máxima de 27,6 ºC, com chuvas distribuídas entre os meses de outubro a março, com índice pluviométrico médio em torno de 1.390 mm anuais; a altitude varia de 637 a 1.485 m, tendo um relevo com aproximadamente 25% de área plana, 40% de área ondulada e 35% de área montanhosa; a umidade do ar típica de cerrado, com inverno seco e verão úmido, podendo ir de valores inferiores a 40% no inverno e superiores a 85% no verão. Os autores destacam uma variação acentuada dos tipos de solos, dependendo dos limites geográficos analisados. Ainda acrescentam que a região da Serra da Canastra apresenta um grande potencial hidrológico em virtude da sua geomorfologia, principalmente pelo fato da presença de escarpas rochosas. As águas emergentes de formação de rochas quartzíticas apresentam-se, além de cristalinas, com oxigenação propiciada por quedas d’água de diferentes dimensões. As condições favoráveis relativa à qualidade da água, à vegetação tanto nativa (próprias de campos e cerrados) quanto às espécies forrageiras exógenas cultivadas contribuem para as características e a qualidade do queijo Canastra. Complementando a descrição da região, faz-se necessário reconhecer particularidades geoeconômicas e demográficas. Ao analisar os estratos da estrutura fundiária6 dos municípios que compõem a microrregião da Canastra (Quadro I), verifica-se um número expressivo de estabelecimentos em uma área inferior a 100 ha, sendo acompanhado por estabelecimentos com área entre 100 ha e menos de 500 ha, configurando uma estrutura que tem como base a pequena e média propriedade. QUADRO I - ESTRUTURA FUNDIÁRIA DOS MUNICÍPIOS QUE COMPÕEM A MICRORREGIÃO DA CANASTRA - 2010 Município Extratos Nº de Estab. Área (ha) 0 a menos de 100 ha 1.079 100 a menos de 500 ha 182 Bambuí Mais de 500 ha 23 Total 1.284 0 a menos de 100 ha 318 100 a menos de 500 ha 143 Delfinópolis Mais de 500 ha 23 Total 484 0 a menos de 100 ha 402 Medeiros 100 a menos de 500 ha 163 Mais de 500 ha 14 34.347 34.760 17.785 86.892 10.455 31.456 20.460 62.371 15.220 31.956 6.688 6 A estrutura fundiária de qualquer município é estabelecida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA através do módulo fiscal, delineando, assim, as dimensões do minifúndio, da pequena, da média e da grande propriedade. A Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, dispõe, no artigo 16, que a reforma agrária tem como objetivo estabelecer um sistema de relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra, possibilitando a promoção da justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural, bem como o desenvolvimento econômico do país, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio. (SIMONCINI, 2011). 38 Piumhi São Roque de Minas Tapiraí Vargem Bonita Total 0 a menos de 100 ha 100 a menos de 500 ha Mais de 500 ha Total 0 a menos de 100 ha 100 a menos de 500 ha Mais de 500 ha Total 0 a menos de 100 ha 100 a menos de 500 ha Mais de 500 ha Total 0 a menos de 100 ha 100 a menos de 500 ha Mais de 500 ha Total 579 839 149 23 1.011 557 207 11 775 246 51 7 304 154 53 7 214 53.864 24.406 26.972 17.842 69.220 23.885 40.896 6.777 71.558 8.170 11.240 3.604 23.014 5.300 10.825 3.878 20.003 Fonte: IBGE, 2013 - Atlas do Censo Demográfico 2010. Elaboração: SIMONCINI, 2015. Pode-se afirmar com base nos dados do Quadro II, que mais de 2/3 do total de estabelecimentos rurais estão voltados para pecuária bovina e configuram-se como pequenos e médios, seguindo a tendência do Quadro I. QUADRO II - A PECUÁRIA NA MICRORREGIÃO DA CANASTRA NÚMERO E ÁREA DOS ESTABELECIMENTOS CONDIÇÃO DO PRODUTOR: PROPRIETÁRIO Município Extratos Mais 0 a menos de 100 ha Bambuí 780 58,31 24.789 24,18 149 11,13 28.085 27,39 TOTAL 13 942 0,97 70,41 11.165 64.039 10,89 62,46 Mais 0 a menos de 100 ha 262 54,13 8.710 13,96 120 24,8 26.677 43 TOTAL 18 400 3,72 82,65 15.665 51.052 25,11 82,07 Mais 0 a menos de 100 ha 297 51,22 11.176 18,18 120 20,69 21.319 34,67 TOTAL 5 422 0,86 72,77 1.840 34.335 2,99 55,84 Mais 0 a menos de 100 381 37,53 11.383 15,66 De 100 a menos de 500 ha De 500 a mais Delfinópolis Medeiros De 100 a menos de 500 ha De 500 a mais De 100 a menos de 500 ha De 500 a mais Piumhi Nº de Área (ha) Nº de Estab. Estab. Área (ha) (Percentua (Unidades) (Percentua (Unidades) l) l) 39 ha De 100 a menos de 500 ha 71 7 11.154 15,36 TOTAL 4 456 0,40 44,93 X 22.537 X 31,02 Mais 0 a menos de 100 ha 417 53,75 17.594 24,59 De 100 a menos de 500 ha 148 19,08 28.066 39,21 7 572 0,90 73,73 4.107 49.767 5,74 69,54 173 56,17 5.925 22,46 28 9,1 6.055 22,95 TOTAL 5 206 1,64 66,91 3.059 15.039 11,60 57,01 Mais 0 a menos de 100 ha 103 47,25 3.914 17,05 De 100 a menos de 500 ha 38 17,43 7.578 33,01 3 144 1,38 66,06 2.268 13.760 9,88 59,94 De 500 a mais São Roque de Minas De 500 a mais TOTAL Mais 0 a menos de 100 ha De 100 a menos de 500 ha Tapiraí De 500 a mais Vargem Bonita De 500 a mais TOTAL Nota: 1 - Os dados das Unidades Territoriais com menos de 3 (três) informantes estão desidentificados com o caracter X. 2 - A categoria Total inclui os estabelecimentos que declararam ter mais de uma Condição legal das terras. Fonte: IBGE - Censo Agropecuário 2006 - Elaboração: SIMONCINI, 2015. De acordo com o “CADASTRO GEORREFERENCIADO DOS PRODUTORES DE QUEIJO MINAS ARTESANAL DA REGIÃO DA SERRA DA CANASTRA7”, 73% da área das propriedades rurais produtoras de queijo Canastra têm como extensão até 100 hectares, estando os outros 27% restante assim dividido: 101 a 200 (ha) 14%, 201 a 300 (ha) 4%, 301 a 500 (ha) 5% e 4% acima de 500 ha, reforçando assim, a constatação efetuada sobre o Quadro II. A partir desta constatação e tendo como base a Lei nº 11.326, de 24 de julho de 20068 e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF 7 Pesquisa elaborada de julho de 2013 a abril de 2014 pelos pesquisadores Prof. Dr. Ronaldo Perez, Alessandro Regino (agrônomo - UFV), e Cássio Geraldo Pinto (administrador de empresas - UFV) a pedido do SICOOB - Saromcredi; SEBRAE/MG; APROCAN. 8 Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. 40 - pode-se dizer que a maioria dos produtores do queijo Canastra é classificada como produtores familiares9. Ao analisar e inter-relacionar os dados do IBGE (2002) organizados e expostos nos Quadro III e IV, percebe-se que a população rural é mais significativa onde há maior produção e número de produtores familiares de queijo Canastra. O que permite inferir que a produção do queijo é responsável pela permanência de parte da população destes municípios no campo. Como se pode observar no Quadro III, do total de 75.613 habitantes, 14.481 vivem no meio rural, ou seja são quase 19,2% do total, porém, desses 19,2% há municípios com maior expressividade de população rural, é o caso de Vargem Bonita com 47%, Medeiros 43%, Tapiraí 42% e São Roque de Minas 37%. QUADRO III - POPULAÇÃO URBANA E RURAL DOS MUNICÍPIOS PRODUTORES DO QUEIJO CANASTRA - 2010 2 Município Área (Km ) População Urbana % População Rural % Bambuí 1.457 19.325 85 3.409 15 Delfinópolis 1.171 4.846 70,95 1.984 29,05 Medeiros 969 1.948 57 1.496 43 Piumhi 905 28.564 90 3.319 10 São Roque de 2.107 4.222 63 2.464 37 Minas Tapiraí 434 1.085 58 788 42 Vargem Bonita 409 1.142 53 1.021 47 Total 7.452 61.132 14.481 9 Agricultores e produtores rurais familiares que compõem as unidades familiares de produção rural e que comprovem seu enquadramento mediante apresentação da Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP) válida, e: a - explorem parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário, comodatário, parceiro ou concessionário do Programa Nacional de Reforma Agrária, ou permissionário de áreas públicas; b residam na propriedade ou em local próximo; c - não disponham, a qualquer título, de área superior a quatro módulos fiscais, contíguos ou não, quantificados segundo a legislação em vigor (este item não se aplica quando se tratar de condomínio rural ou outras formas coletivas de propriedade, desde que a fração ideal por proprietário não ultrapasse os quatro módulos fiscais); d - obtenham, no mínimo, 50% da renda familiar da exploração agropecuária e não agropecuária do estabelecimento; e - tenham o trabalho familiar como predominante na exploração do estabelecimento, utilizando apenas eventualmente o trabalho assalariado, de acordo com as exigências sazonais da atividade agropecuária, podendo manter empregados permanentes em número menor que o número de pessoas da família ocupadas com o empreendimento familiar - exceto na Linha PRONAF Microcrédito (Grupo “B”), em que não se admite a manutenção de qualquer empregado assalariado, em caráter permanente; f - tenham obtido renda bruta anual familiar de até R$ 360 mil nos últimos 12 meses que antecedem a solicitação da DAP, considerando neste limite a soma de todo o Valor Bruto de Produção (VBP), 100% do valor da receita recebida de entidade integradora e das demais rendas provenientes de atividades desenvolvidas no estabelecimento e fora dele, recebidas por qualquer componente familiar, exceto os benefícios sociais e os proventos previdenciários decorrentes de atividades rurais. (BNDES, 2015). 41 Fonte: IBGE, 2013 - Atlas do Censo Demográfico 2010. Elaboração: SIMONCINI, 2015. QUADRO IV - MUNICÍPIOS, PROPRIEDADES RURAIS, PRODUTORES E PRODUÇÃO ANUAL DO QUEIJO CANASTRA Municípios Prop. Rurais Produtor de Queijo Queijo Produção Ano (Ton.) (Nº) (Nº) Bambuí 1.438 149 576 Delfinópolis 484 25 70 Medeiros 537 430 1.600 Piumhi 956 50 165 São Roque de 933 852 1.537 Minas Tapiraí 258 89 162 Vargem Bonita 207 200 360 Total 4.813 1.795 4.470 Fonte: IBGE - Pesquisa da Pecuária Municipal - 2002. Elaboração: SIMONCINI, 2015. Ao analisar os dados do Quadro IV percebe-se que nos município de Vargem Bonita, São Roque de Minas e Medeiros o número de produtores familiares de queijo Canastra é próximo do número de propriedades rurais. É justo nestes três municípios que se verifica maior porcentagem da população rural, o maior número de produtores e a maior quantidade de queijo produzido na microrregião. O Quadro V a seguir indica o número de estabelecimentos agropecuários e quantidade de leite produzida no de 2006. QUADRO V - NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS AGROPECUÁRIOS E QUANTIDADE DE LEITE PRODUZIDA - 2006 Município Número de estabelecimentos agropecuários (Unidades) Quantidade produzida (Litros) Agricultura Agricultura não Total familiar - lei familiar 11.326 Total Agricultura familiar - lei 11.326 Agricultura não familiar Bambuí 822 686 136 35.672.535 20.665.225 15.007.310 Delfinópolis 296 175 121 15.360.692 6.193.761 9.166.931 Medeiros 372 275 97 20.608.165 12.753.990 7.854.175 Piumhi 400 280 120 22.048.809 8.873.155 13.175.654 São Roque de Minas 615 464 151 30.747.511 18.089.502 12.658.009 Tapiraí 157 127 30 4.049.670 2.629.255 1.420.415 Vargem Bonita 118 80 38 1.114.120 1.264.400 2.780 2.087 2.378.520 130.865.90 693 2 70.319.008 60.546.894 TOTAL 42 Fonte: IBGE - Censo Agropecuário - 2006. Elaboração: SIMONCINI, 2015. Com base na análise de dados do Quadro V, pode-se confirmar que a pecuária leiteira nos sete municípios que compõe a microrregião da Canastra é de base familiar, sendo parte dessa produção direcionada aos laticínios, como é o caso dos municípios de Bambuí, Delfinópolis e Piumhi. A este quadro físico-natural e geoeconômico que configura a região da Canastra somam-se os aspectos sócio-culturais que contribuíram e estabeleceram um modo de fazer próprio na manipulação do leite, dos coalhos, das massas, das formas de prensagem, da cura, e da tradição comercial. A esse modo de fazer acrescentamse formas de viver e significados atribuídos. (MENESES, 2006). CONSIDERAÇÕES FINAIS Pode-se afirmar que a produção do queijo Canastra contribui e fortalece o modo de fazer, a tradição e os vínculos dos produtores familiares com o território. É a sua produção/comercialização que garante renda e emprego, que possibilita a permanência dos produtores no meio rural e contribui para o estabelecimento e valorização dos saberes tradicionais. (SIMONCINI; DAVID, MACHADO, 2014). Como patrimônio cultural imaterial, traz consigo todo um conhecimento incutido na “arte de fazer”, passado de geração em geração, materializando-se no “saber fazer”10 (elemento principal da caracterização de um terroir11). Ressalta-se que a sua produção, ao constituir-se como um dos elementos que configuram a organização social local, contribui com a geração de renda e emprego, funcionando como fator econômico positivo não só em escala local, mas também regional e nacional. Acrescenta-se a estes aspectos, o fato de que a produção do queijo Canastra contribui para o estabelecimento e manutenção de questões simbólicas, responsáveis pela (re)produção cultural e, o mais importante, configura-se como possibilidade de permanência dos produtores no meio rural. 10 Conhecimentos, aptidões e técnicas adquiridos individualmente ou por um grupo, através da experiência. 11 O termo Terroir veio a ganhar conotação positiva nos últimos 60 anos, quando a valorização da delimitação dos vinhedos nas denominações de origem de vinhos na França veio a balizar critérios associados à qualidade de um vinho, incluindo o solo e a variedade, dentre outros. A palavra Terroir passa a exprimir a interação entre o meio natural e os fatores humanos. E esse é um dos aspectos essenciais do Terroir, de não abranger somente aspectos do meio natural (clima, solo, relevo), mas também, de forma simultânea, os fatores humanos da produção - incluindo a escolha das variedades, aspectos agronômicos e aspectos de elaboração dos produtos. Na verdade o Terroir é revelado pelo homem através do saber-fazer local. O Terroir se opõe a tudo o que é uniformização, padronização, estandardização e é convergente ao natural, ao que tem origem, ao que é original, ao típico, ao que tem caráter distintivo e ao que é característico. (TONIETTO, 2007). 43 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Elmer Ferreira Luiz de; FERNANDES, Maurício Roberto. Caracterização da microrregião da canastra como produtora do queijo minas artesanal. São Roque de Minas, MG: EMATER/MG, 2004. BNDES. Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - Pronaf Investimento. Disponível: < http://www.bndes.gov.br/apoio/pronaf.html> - Acesso: 04 mai. 2015. EMATER/MG. Queijo minas artesanal. Guia técnico para implantação de boas práticas de fabricação em unidades de produção do queijo minas artesanal. Disponível: <http://www.emater.mg.gov.br/doc/intranet/upload/queijo_site/cartilha_queijo%202.pdf > - Acesso: 27 jun. 2014. HAESBAERT, Rogério. Identidades territoriais: entre a multiterritorialidade e a reclusão territorial (ou: do hibridismo cultural à essencialização das identidades). In. ARAUJO, Frederico Guilherme Bandeira de; HAESBAERT, Rogério. (Orgs.). Identidades e territórios: questões e olhares contemporâneos. Autores: Amélia Cristina Alves Bezerra... [et al.]. - Rio de Janeiro: Access, 2007. p.33-56. INSTITUTO MINEIRO DE AGROPECUÁRIA - IMA. Portaria nº 694, de 17 de novembro de 2004. Microrregião da Canastra. Belo Horizonte, 2004. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Atlas do censo demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2013. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Censo agropecuário 2006 - Agricultura Familiar - Primeiros Resultados - Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; Ministério do Desenvolvimento Agrário; Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2009. MENESES, José Newton Coelho. Queijo Artesanal de Minas: patrimônio cultural do Brasil. Brasília, DF: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN; Ministério da Cultura, 2006. NETTO, Marcos Mergarejo. A geografia do Queijo Minas Artesanal. Belo Horizonte, MG: M. M. N., 2014. POHL, Johann Emanuel. Viagem no Interior do Brasil. Tradução de Milton Amado e Eugênio Amado. Apresentação e notas de Mário Guimarães Ferri. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1976. (Reconquista do Brasil, v.14). ROCHA, Tião. (Org.). Afinal, o que é ser mineiro? Belo Horizonte: SESC/MG, 1995. SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem às nascentes do Rio São Francisco. Tradução: Regina Regis Junqueira. Prefácio: Mário Guimarães Ferri. 2. ed. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 2004. (Reconquista do Brasil, v.235). 44 ______. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Tradução: Vivaldi Wenceslau Moreira. Belo Horizonte: Editora Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1975. SEBRAE. CADASTRO GEORREFERENCIADO DOS PRODUTORES DE QUEIJO MINAS ARTESANAL DA REGIÃO DA SERRA DA CANASTRA. Coordenadores: Ronaldo Perez, Alessandro Regino e Cássio Geraldo Pinto. Viçosa, MG: SEBRAE; SICOOB Saromcredi; APROCAN, 2014. SIMONCINI, João Batista Villas Boas; DAVID, Cesar De; MACHADO, Luciano Carvalho. Queijo Canastra: bom, limpo e justo. In: ANAIS do Congresso Internacional de Gastronomia - Mesa Tendências 2014. Conexão essencial: o produtor familiar e a cozinha. Santo Amaro, SP: Centro Universitário Senac, 04 e 05 de Novembro de 2014. p. 9-10. SIMONCINI, João Batista Villas Boas. Produção alimentar no município de Visconde do Rio Branco - MG. Rio Grande, RS: FURG, 2011. Dissertação de Mestrado. TONIETTO, Jorge. Afinal, o que é Terroir? Flores da Cunha, RS: Bon Vivant. v. 8, n. 98, p. 08, abr. 2007. 45 NOTAS SOBRE AGRONEGÓCIO DA SOJA NO BRASIL12 Leandro Jesus Maciel de Menezes – Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria- Rio Grande do Sul – [email protected] Kelly Perlin Cassol - Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria- Rio Grande do Sul – Brasil. [email protected] RESUMO Ao longo das últimas cinco décadas é possível observar o expressivo aumento na produção do cultivo de soja no Brasil, principalmente em termos econômicos e comerciais. Diante deste fato, propõe-se, neste artigo, realizar uma breve discussão teórica sobre o desenvolvimento desta atividade, mais especificamente pretende-se tratar do sistema agroindustrial ligado a este cultivo e de que modo os grupos empresariais atuam no financiamento da produção. Assim, inicialmente faz-se uma discussão sobre o poder concentrador da atividade sojicultora, e, em seguida, buscase abordar as relações entre os produtores e os complexos agroindustriais que dão suporte ao financiamento desta atividade. Palavras-chave: Agronegócio. Soja. Agroindustrial. Concentração. INTRODUÇÃO O desenvolvimento da sojicultora no Brasil tem sido observado ao longo das últimas décadas e claramente pode-se notar uma expressiva expansão para todas as regiões do país a partir da segunda metade da década de 1960. A produção de soja tornou-se, em pouco tempo a principal atividade agrícola, tanto no que se refere à área plantada como tambémno que se refere aos valores econômicos e sociais. Além disso, destaca-se a forte integração da agricultura à indústria, que passa a ditar as regras de produção, distribuição e comercialização. A expansão desta atividade no Brasil se deve inicialmente ao incentivo do 13 Estado através de políticas de crédito rural e também devido a investimentos do setor privado, onde se destaca o financiamento da produção rural. Enquanto o setor público incentiva a produção de uma das principais comodities exportadas pelo país, o setor privado tem visível interesse na continuidade desta atividade devido a forte utilização de insumos modernos que se articulam a produção e também devido ao fornecimento desta matéria prima. Neste sentido, verifica-se que o cultivo da soja 12 Este artigo foi apresentado na disciplina de Geografia do Cone Sul, ofertada no 1º semestre de 2015 pelo Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria – RS. 13 Destaca-se aqui que o período de 1964 a 1985 no Brasil, foi marcado por governos militares que buscaram enquadrar a economia do país em um projeto globalizado. 46 encontra-se com os interesses do capital, transformando a cultura agrícola em agronegócio. Entende-se como agronegócio, o complexo espaço econômico onde convergem investimentos econômicos transnacionais em todo conjunto das atividades e setores ligados a produção, distribuição e comercialização dos produtos agrícolas em escala global(ACHKAR, DOMÍNGUEZ e PESCE, 2008). A soja em grãos representa grande parcela da exportação de commodities do Brasil. De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 1990 até 2011, a quantidade produzida de soja em grão apresentou crescimento de 7,2%, da área colhida e de aumento de produtividade14. Dentre os grandes produtores mundiais de soja (Estados Unidos, Brasil e Argentina), o Brasil é o que tem o maior potencial de expansão da área cultivada (DALL'AGNOL et al., 2004). A soja em grão e seus derivados, de acordo com Siqueira et al (2013) representam importante parcela do mercado brasileiro de oleaginosas em produção, uso e comércio. Neste contexto, é objetivo deste trabalho descrever e refletir teoricamente sobre osistema agroindustrial da soja e aforma como tem se dado a aproximação entre produtores e os grupos empresariais que atuam nofinanciamento da produção. Inicialmente faz-se uma discussão sobre opoder concentrador que se encontra em meio a atividade sojicultora, e, em seguida, trata-se das relações entre os produtores e os complexos agroindustriais que dão suporte em termos de financiamento a esta atividade. A CONCENTRAÇÃO DE PODER EM MEIO À ATIVIDADE SOJICULTORA NO BRASIL No decorrer da década de 1970, momento em que no Brasil ocorria uma forte regulação estatal e que de forma intensa desencadeava a modernização agrícola, o setor agroindustrial diretamente vinculado ao processamento da soja destacou-se num cenário variado em termos de transformações produtivas pela dinamização que apresentava. Nesse momento, ocorreram mudanças profundas na sua capacidade instalada. Tratava-se, sobretudo, do aumento expressivo da capacidade das agroindústrias esmagadoras15, por meio dos mecanismos de intervenção do Estado, 14 Porcentagem se refere a Taxa Geométrica de Crescimento (TGC) - Calculada pelo antilog do parâmetro β1 da regressão ln(Y1) = β0 + β1T + ui, em que Yi é o valor da quantidade produzida de soja em grãos, ou a área ou a produtividade e T ( SIQUEIRA, 2013). 15 A indústria de esmagamento da soja extrai, refina e processa derivados do óleo e seus principais produtos são o óleo bruto, o óleo refinado e o farelo de soja, além de outros em produção ou potencialmente passíveis de produção. Este segmento proporciona as maiores 47 como os subsídios fiscais e creditícios. Com o financiamento e/ou patrocínio por parte do Estado, os empreendimentos nos grandes parques industriais chegaram a gerar uma considerável capacidade ociosa, fruto da perspectiva de beneficiar-se ao máximo do apoio governamental dado ao setor. O final dessa década é considerado um marco no perfil das agroindústrias esmagadoras de soja, uma vez que esses empreendimentos ficaram sujeitos a uma nova dinâmica advinda das transformações tecnológicas e da conversão dos mercados regionais em nacionais (WESZ JUNIOR, 2011). Essa ampliação da escala geográfica de atuação de algumas agroindústrias do setor implicou na redução do número de estabelecimentos processadores e o aumento do tamanho médio das plantas dos estabelecimentos (KAGEYAMA et al., 1990). A eminente expansão da capacidade de esmagamento ocorrida no decorrer da década supracitada não teve sequencia na década posterior, quando as transformações no setor praticamente se estagnaram. Conforme Castro (1996) e Mazzali (2000), essa estagnação esteve relacionada a uma conjuntura diversificada que engloba: 1) o término da venda de óleos e gorduras para alguns mercados europeus, pois estes optaram pela proteção da sua indústria doméstica, importando somente a matéria-prima; 2) aumento da participação da Argentina na exportação de produtos processados devido aos seus custos mais reduzidos pela sua logística eficiente, pela queda dos tributos que pesavam contra a exportação e pela fertilidade natural da região agrícola; 3) maior lucratividade na comercialização do grão brasileiro frente ao óleo e ao farelo de soja; 4) emergência de matérias-primas substitutas diretas (girassol, palma, colza, etc.;); 5) instabilidade dos preços. O quadro de estagnação evidenciado, no decorrer da década de 1980, sofreu uma alteração abrupta no início da década de 1990. A partir desta última década, consolidaram-se neste setor algumas empresas lideres (Sadia, Perdigão e Ceval) e, ao mesmo tempo, ocorreu de forma mais contundente o “entrelaçamento” dos setores da soja e de carnes que, passaram a se organizar em redes16. Neste momento, o cenário da estrutura industrial do complexo da soja poderia ser caracterizado pela existência de: a) grandes grupos nacionais que atuavam nas cadeias de oleaginosas e de carnes (como, por exemplo, as empresas Sadia, Perdigão e Ceval); b) grandes grupos internacionais (Cargill, Santista e Gessy Lever) que buscaram adotar um comportamento mais conservador, sem grandes investimentos na ampliação da capacidade de processamento industrial da soja; c) potencialidades de competitividade da cadeia produtiva, pelas possibilidades de diferenciação e da consequente agregação de valor (BUAINAIM et al., 2000). 16 Sobre o tema ver: MAZZALI, L. O processo recente de reorganização agroindustrial: do complexo à organização “em rede”. São Paulo: Editora da Unesp, 2000. 48 empresas regionais de menor porte (Caramuru, Bianchini e Granóleo) e cooperativas que investiram no processamento industrial da soja ou na produção de farelo (CASTRO, 2002). Esta caracterização, no entanto, denota tal cenário até o inicio do Plano Real. Trata-se de um cenário diverso englobando empresas internacionais e nacionais de grande e pequeno porte sendo estas últimas as que majoritariamente o dominavam. Um domínio que estava ligado ao protecionismo em vigor na economia nacional que induzia as filiais das multinacionais instaladas no país a controlarem seu próprio processo de incorporação do progresso técnico, o que permitia que vicejassem as empresas nacionais de médio e pequeno porte mesmo atuando em mercados regionais. Contudo, este cenário passou por importantes alterações, na medida em que os planos do governo federal passaram a não ter como compromisso central a busca pelo desenvolvimento como ocorria no período dos governos ditatoriais. Objetivavasea estabilização econômica direcionada fundamentalmente ao combate inflacionário. Com o surgimento do Plano Real, a inflação é estabilizada, ao mesmo tempo em que se rompe em grande medida com a proteção tarifária e com a presença estatal, implantando um modelo pautado na competitividade e na abertura comercial. Logo, há um retorno abundante de capital internacional que passa a ser utilizado pelo governo federal para adotar uma política neoliberal com atração de capital externo. Este novo ambiente fez com que os grupos internacionais decidissem explorar as potencialidades do mercado brasileiro. E sua entrada no mercado brasileiro, na visão de Benetti (2004), teve como reflexo o aumento da competição rompendo o equilíbrio com que se repartia o mercado interno entre a tríade das empresas então operantes, obrigando-as a revisarem suas estratégias e a mudarem seu comportamento de atuação. De acordo com esta autora: As filiais das empresas estrangeiras aqui já instaladas se reestruturaram e promoveram novos investimentos; as nacionais de grande porte, visando garantir suas posições no mercado, aceitaram as novas regras do jogo, transitando bruscamente para o padrão de crescimento baseado na diferenciação acelerada da produção. (...) As pequenas e as médias empresas, por seu lado, viveram um período de dificuldades dramáticas, ao sofrerem a concorrência direta e intensificada dos grandes grupos nacionais e internacionais, sem que tivessem, como os grandes brasileiros, as mínimas condições de acompanhar o novo jogo vigorando no mercado (BENETTI, 2004, p. 23). Nesse cenário, os grupos internacionais por meio do capital estrangeiro fizeram novos investimentos, adotando como principais mecanismos de transações a fusão e aquisição de empresas situadas à jusante da agricultura. A partir disso, tais grupos 49 tornaram-se os protagonistas de um processo intenso de concentração e centralização de capital, desnacionalização das empresas, internacionalização dos mercados. Este fenômeno aparentemente novo, no entanto, representa a aceleração de situações que já estavam presentes no período da constituição dos complexos agroindustriais e que, com a liberalização comercial, a estabilização monetária e a atração de capitais estrangeiros deixam de ser tímidas e minoritárias (FLEXOR, 2006). Também, é apenas aparente, uma provável mudança na complementação e diversificação da estrutura produtiva. O que ocorreu como aponta Benetti (2004) é um simples avanço sobre as plantas já existentes, trocando os empresários nacionais por estrangeiros. Sobretudo, esse movimento revela a necessidade das empresas estrangeiras em: 1) eliminar concorrentes, aumentando a presença da empresa compradora no mercado; 2) saltar etapas no processo de crescimento horizontal das empresas; 3) construir escalas de produção compatíveis com o novo padrão de desenvolvimento, altamente exigente quanto à incorporação continuada de tecnologia; 4) assegurar o suprimento de matérias-primas e de canais de distribuição dos bens finais, já estruturados pela empresa adquirida; e 5) entrar rapidamente no mercado doméstico, aproveitando a fase promissora de negócios que se desenhava, alargada pela integração do Brasil ao Mercosul (BENETTI, 2004). Esse movimento expressa um dos principais objetivos das empresas, sobretudo, das empresas internacionais, o de adquirir as estruturas industriais de seus concorrentes. Ao alcançar tal objetivo, a partir de fusões e aquisições, tem-se como consequência a concentração empresarial. A profundidade da concentração empresarial a jusante da cadeia da soja, já pode ser observada no período entre 1995 e 2005, ao analisar-se a participação das cinco maiores empresas sobre o percentual da capacidade de esmagamento no Brasil. Isso porque, como conforme demonstra a tabela 1, os cinco líderes passaram de uma participação percentual de 36% em 1995 para 53% em 2005. Tabela 1: Participação das cinco maiores empresas no esmagamento da soja no Brasil entre 1995 e 2005. 1995 2005 Colocação Empresa Participação Origem do no esmaga- capital mento da soja (%) Colocação Empresa Participação Origem do no esmaga- capital mento da soja (%) 1ª 2ª 3ª Ceval Santista Cargill 14% 6% 6% 1ª Nacional 2ª Internacional 3ª Internacional Bunge ADM Cargill 22% 10% 9% Internacional Internacional Internacional 50 4ª 5ª Sadia Incobrasa Total 5% 5% Nacional Nacional 36% 4ª 5ª Total Coinbra Imcopa 7% 5% Internacional Nacional 53% Fonte:Wesz Junior (2011). Como se pode observar, também, nesse período as quatro posições iniciais ampliam significativamente seu percentual de participação, passando de 31% para 48%. Essa ampliação deu-se por parte de grupos estrangeiros que, em 1995, concentravam apenas 12%.Em contrapartida, os grupos nacionais retrocederam em termos de controle de 24 para 23%. A participação de novas tradings é reflexo do elevado número de fusões e aquisições responsável pela maior alteração na estrutura patrimonial e nominal do que pela construção de novas plantas industriais. E parece expressar muito claramente que determinados grupos ampliaram seu poder político-econômico no setor jusante da agricultura ao transformar um cenário e, a partir disso, dominar o setor de processamento da soja com processo de desnacionalização, concentração empresarial e centralização do capital. Todavia, o poder político-econômico de determinados grupos que atuam no setor a jusante não se restringe e nem pode ser vislumbrado na sua totalidade a partir de observações sobre as transformações nesse único setor. Isso ocorre porque na consolidação no fortalecimento das empresas líderes, as mesmas atrelaram um conjunto de estratégias produtivas, econômicas e comerciais que permitiram, a partir dos contextos encontrados, promover a integração entre os elos a montante (fertilizantes) e a jusante (esmagamento) da produção agropecuária. Ou seja, uma estratégia onde os mesmos grupos responsáveis pela etapa de agroindustrialização da oleaginosa, simultaneamente, também passaram a atuar concomitantemente na produção e distribuição de insumos. Por conseguinte, há, não apenas uma atuação paralela, mas uma reprodução no segmento a montante, por parte desses mesmos grupos que passaram a dominar as etapas da agroindustrialização da oleaginosa, do processo de desnacionalização, concentração empresarial e centralização de capital. Porém, ao que tudo indica, de forma ainda mais intensa. Neste contexto, a maior expressão desta realidade é encontrada na expansão do Grupo ABCD (ADM, Bunge, Cargill, Dreyfus (Coinbra)) que através de fusões e aquisições passou a dominar tanto o setor à jusante quanto alguns segmentos à 51 montante. Em 2002, somente a Cargill e a Bunge dominavam respectivamente 11,1% e 29,3% deste último setor. Bastaram-se dois anos para a primeira chegar a 14% e a segunda a 30%. O crescimento percentual dessas duas empresas de 2002 a 2004 demonstra que a atuação da Cargill se fez de forma mais agressiva do que a da Bunge. O que não ocorreu de 2004 a 2007 quando a Cargill teve seus percentuais de crescimento praticamente estagnados chegam a 14,1%, enquanto que os percentuais de crescimento da Bunge chegam a 13,4%. Ou seja, essa última empresa, em aproximadamente três anos (2004 a 2007), tem o domínio sobre o setor a montante ampliado de 30% para 43,4% (SOUZA, 2007). Somente essas duas empresas que compõem o grupo ABCD já, em 2007, dominavam 57,5% de segmentos específicos do setor a montante da agricultura. E mais, seus avanços em direção a concentração empresarial se dão sobre os demais grupos que reduziram seu percentual do período de 2002 a 2007 de 59,6% para 42,5%. Ou seja, em 2007, os números percentuais da Bunge já são maiores do que o percentual de todos os demais grupos desde que se exclua deste universo o grupo Cargill. Em linhas gerais, a conjuntura de concentração do setor a montante na sua totalidade, na visão de Benetti (2004), demonstra que existe uma forte tendência à geração de um monopólio pelo elevado grau de concentração do setor. Nesta concentração, por meio das estratégias de fusões e aquisições, não se dá apenas, ou não se visa unicamente, o domínio sobre mercado, mas sim o domínio sobre as fontes de recursos naturais e da produção de matérias-primas básicas. Benetti (2004) é um entre tantos autores que demonstra muito claramente a expansão dos grandes grupos estrangeiros sobre a economia do agronegócio através de aquisições de ativos existentes e de novos investimentos. Para essa autora: [...] esse processo permitiu-lhes controlar setores estratégicos das cadeias de produção agropecuária relacionados a suprimentos à agricultura — pesquisa agrobiotecnológica e indústria sementeira, fertilizantes, defensivos, produtos de saúde animal e equipamentos agrícolas. Como tais grupos usualmente integram, formal ou informalmente, produtores agrícolas, financiando-os, transmitindolhes inovações tecnológicas e adquirindo sua produção; como são processadores de matéria-prima; e, finalmente, dado que constituem poderosas tradings internacionais, principalmente responsáveis pelo comércio exterior das commodities em seus vários ramos, então, é razoável concluir que desempenharam um papel estratégico na internacionalização da produção brasileira agropecuária. (BENETTI, 2004, p. 170). Isso nos permite concluir, também, que esse fenômeno fez emergir, na cadeia da soja como um todo, um processo, ainda em curso, de concentração de poder e um 52 poder de concentrar sem precedentes. Essa concentração de poder e esse poder de concentrar praticamente estão presentes nos quatro mercados que compõem uma cadeia agroindustrial típica. Ou seja, no mercado entre produtores de insumo e produtores rurais, mercado entre produtores rurais e a agroindústria, mercado entre agroindústria e distribuidores e, finalmente, mercado entre distribuidores e consumidores finais (BATALHA, 1997). Essa concentração de poder por parte de poucos grupos internacionais nos dois primeiros mercados, onde os agentes buscam agregar valor a seus produtos e obter maiores lucros, manifesta-se em cada momento em que se estabelecem relações com os produtores de distintas partes do campo brasileiro. Essas relações, que tem se disseminado nos últimos anos, contribuem significativamente para que a produção de soja desenvolva-se e se territorializeno campo brasileiro de forma cada vez mais dinâmica. A seguir dar-se-á ênfase para a atuação de determinadas em empresas de setores distintos do complexo agroindustrial no financiamento da produção rural no Brasil. Também, serão feitas considerações sobre a disseminação de relações entre empresas do complexo agroindustrial e os produtores de soja. O FINANCIAMENTO DA PRODUÇÃO RURAL: AS RELAÇÕES ENTRE PRODUTORES E EMPRESAS DOS COMPLEXOS AGROINDUSTRIAIS (CAIS) No decorrer da década de 1980, o Estado,que até então era o principal protagonista do financiamento da produção agrícola no Brasil, passou a dar cada vez mais espaço para quenesse âmbito empresas do complexo agroindustrial assumissem um importante papel.A partir disso, há uma reconfiguração das relações estabelecidas com os produtores rurais, sobretudo com os produtores de soja. O Estado, diante do agravamento do processo inflacionário e principalmente de uma crise fiscal enfrentada na década de 1980, impôs drásticos cortes a politica de crédito rural considerada como o principal instrumento de financiamento direcionado a produção rural. Tais cortes decretaram o decréscimo dos recursos direcionados a agricultores de diferentes segmentos via crédito rural. Enfraquecia-se com isso uma politica de créditorural concebida como a principal propulsora da modernização da agricultura brasileira, base da articulação entre agricultura e indústria. E em um contexto de incerteza quanto ao financiamento da produção rural, as empresas do setor a montante e a jusante da agricultura passaram a ocupar um papel importante no financiamento da produção rural. Para Mazzali (2000), tais empresas 53 tornaram-se os novos protagonistas do financiamento da produção rural, constituindosenos principais agentes financeiros no campo. Com a participação de forma mais efetiva dos agentes privados no financiamento da produção rural emergem formas de financiamento e de comercialização da safra. A partir de novas formas de financiamento as empresas buscavam essencialmente garantir que não ocorresse uma redução da área plantada e consequentemente da produção da soja. Com esta perspectiva foram criados e utilizados novos mecanismos e criadas fontes alternativas ou informais de financiamento da produção rural. Dentre as formas de financiamento podemos citar o sistema troca-troca, os contratos de soja verde, osistema de equivalência de trocas, a Cédula de Produtor Rural (CPR). Há, entre essas formas de financiamento distinções, que não serão aqui ressaltadas, e em praticamente todas elas um ponto em comum: essas formas dão as empresas o direito de apropriar-se da produção dos sojicultores que a elas recorrem ao buscar financiamento para a produção rural. Cada forma de financiamento formaliza uma relação estabelecida entre produtores e empresas. Nos últimos anos, essas relações têm se disseminado de forma bastante significativa. Tanto que, a oferta de financiamento pelas tradingse agroindústrias, em 2005, já cobriam 67% da produção nacional de soja (RODRIGUES et al., 2009). Uma vez que, há empresas que como se enfatizou anteriormente dominam setores diretamente relacionados à produção de soja, a concentração de poder por parte de alguns grupos lhes permite o poder de concentrar a apropriação da produção e, consequentemente, da riqueza produzida pela via do financiamento. Exatamente por isso, as empresas de maior representatividade em termos de concentração empresarial são justamente as que mais têm investido no financiamento da atividade sojicultora. Para ter-se uma noção da representatividade de certas empresas faz-se uso das palavras de Wesz Junior (2009, p. 87): Em 2008, a Bunge disponibilizou cerca de US$ 700 milhões para o financiamento da soja no Brasil, o que representa mais de 40% do montante de recursos ofertados pelas tradings no país. A Cargill, por sua vez, investiu US$ 400 milhões (23,5%) em crédito aos produtores e a Amaggi, US$ 200 milhões (11,8%) (Valor Econômico, 28/05/2009 e 22/06/2009). Apesar de não ter conseguido dados da ADM e Dreyfus, já é possível perceber o peso e a importância das três empresas citadas anteriormente na oferta de financiamento, pois representavam 76,3% do volume liberado pelas tradings ao cultivo da soja, em 2008. 54 Esse cenário aponta para a expressividade da modalidade de investimento privado nas lavouras de grãos. No entanto, ela não alcança da mesma forma todos os produtores da monocultura. Sobretudo, pois, como destacam Rodrigues et al. (2009), antes de ser formalizada as relações entre produtores e empresas por intermédio de contrato, as estratégias utilizadas pelas empresas no financiamento alteram-se conforme o perfil do produtor, dependendo do volume produzido de soja, do patrimônio disponível e da trajetória de inadimplência. Nesse sentido, pondera o último autor citado: Os contratos com preços fixos estabelecidos, em real ou dólar, em geral são direcionados a produtores com baixo poder de negociação, que conforme avaliação de cadastro tem registros de inadimplências, pouca ou nenhuma garantia, ou seja, estão descapitalizados. Bem como quanto maior o poder de barganha do produtor maior será sua oportunidade de negociar o preço de venda, podendo ter pouca ou nenhuma quantidade de grãos pré-fixados, lhe sendo permitido acompanhar o mercado a fim de definir a época e a quantidade a ser comercializada (RODRIGUES et al., 2009, p. 12). Essa é uma maneira das empresas financiadoras da produção evitar perdas e potencializar ganhos. Nesse sentido, muitas vezes, de acordo com Fernández (2009), as empresas realizam o monitoramento individual da situação econômica do agricultor e buscam informações se os produtores não fazem parte da chamada “lista negra”, relação que é controlada e compartilhadas pelas e entre as empresas, daqueles produtores que não cumpriram os contratos com as tradingspelo desvio da produção, por questionamentos de contratos, ou por outros motivos. Embora haja esse monitoramento por parte das empresas, muitas vezes, ser um produtor inadimplente, com pouca garantia e descapitalizado – o que os eliminam da possibilidade de acessar o Sistema Nacional de Crédito Rural brasileiro – é um fator importante, mas não é impeditivo ao financiamento junto às tradingsporque elas estão interessadas, principalmente, na garantia da oferta de grãos (WESZ JUNIOR, 2011). O que fazem muitas vezes essas empresas é construir mecanismos que ao diminuir as possiblidades de perda ou prejuízos, tornam os contratos menos vantajosos aos produtores rurais. Nesse sentido, como alerta Wesz Junior (2011, p. 90), “as tradingsse relacionam entre si para alcançar suas metas particulares, manter o preço da soja mais baixo e obter informações a respeito dos agricultores”. Em meio a tudo isso os produtores de soja inadimplentes e/ou descapitalizados tem na viabilidade de financiamento com baixa exigência de garantia, menor burocracia, elevada agilidade e grande disponibilidade de recursos, algumas 55 vantagens em estabelecer relações com as empresas em comparação com o sistema público. Outros aspectos importantes são a proximidade dos armazéns com a empresa que negociarão as safras, o tempo de relacionamento com a firma, o melhor preço pago pela soja, a diversidade de serviços (REZENDE e ZYLBERSZTAJN, 2007). Dentre esses aspectos econômicos a assistência técnica é considerada como um diferencial. De certa forma, ela é um aspecto interessante para as empresas, uma vez que, por meio dela podem monitorar o momento da colheita e direcionar ao seu armazém a parte da produção correspondente ao contrato. O que no entendimento de Fernández (2009) explica, em certa medida, a menor taxa de inadimplência e de dívidas dos financiamentos contraídos das tradingsquando comparado com as dívidas bancárias. Para além dos aspectos econômicos supracitados, não menos importante, é a existência, em meio às relações e que as fazem disseminar-se, da construção de parâmetros sociais “como a confiança, a tradição, o respeito, a compreensão que a empresa teve com o agricultor em momentos de dificuldades, negociando as dívidas, enfim, um conjunto de elementos que qualifica e dá sentido a relação” (Fernández, 2009, p. 73). Essa possibilidade de conseguir financiamento com as empresas do complexo agroindustrial faz com os produtores da monocultura soja expandam a sua produção cada vez mais. E, no momento atual, é uma alternativa importante para os produtores que não acessam e também para os que acessam o crédito rural que provem do setor publico. A partir do final da década de 1990, há uma recuperação do credito rural em termos de volume de recursos destinados a produção rural. E isso tem permitido que os produtores de soja acessem tantos recursos do setor publico quanto do setor privado. O primeiro, assim como o segundo, tem interesse direto na produção de umadas principais commodities agrícola e a terceira mais importante commoditie no quadro geral de exportações. Por fim, é importante destacar que, longo das últimas décadas, a produção de soja vem concentrando-se em grandes estabelecimentos rurais. E, a expansão da produção vincula-se diretamente com a concentração da terra, o domínio cada vez maior da indústria sobre a agricultura e a pouca geração de ofertas de emprego em determinadas atividades agrícolas. Logo, em meio aos ganhos econômicos das empresas que monopolizam o processo produtivo surgem múltiplas implicações sociais, tais como a perda de autonomia, principalmente dos pequenos produtores e o seu endividamento, bem como também os insere em uma atividade que, muitas vezes, 56 degrada os recursos naturais tão importantes para o desenvolvimento de qualquer atividade agrícola. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando-se a expansão da atividade sojicultora nas últimas décadas, no Brasil, é possível inferir que a mesma está fortemente pautada no entrelaçamento entre a agricultura e a indústria. Neste sentido, observa-se que com as alterações ocorridas durante a década de 1980, no cenário nacional, que oportunizou a entrada de agentes privados, fortaleceu-se e expandiu –seestaarticulação.O que se percebe a partir disso é a importância do desenvolvimento da sojicultura no contexto de acumulação de capital via complexos agroindustriais. De um lado, por ser uma das atividades agrícolas em que mais se tem utilizado inovações tecnológicas e biotecnológicas de origem industrial e, por outro lado, por fornecer uma matéria – prima que movimenta o mercado mundial de alimentos e seus derivados. Neste contexto, é possível observarque a monopolização exercida por algumas empresas, em diferentes setores do complexo agroindustrial, permite a tais empresas lucrar com a comercialização de produtos de origem industrial, como por exemplo, os fertilizantes e as sementes geneticamente modificadas. E, a partir de formas de financiamento privados, que são diferentes das oferecidas pelo setor público, apropriam-se de uma produção que tem se intensificado e se expandido em partes distintas do território brasileiro. Logo, apropriam-se da mais valia produzida por uma diversidade de atores rurais envolvidos com o desenvolvimento da sojicultora. Por fim, deve-se ressaltar que, dependendo do contexto em que se encontram os agricultores atrelados a atividade sojicultora, o financiamento viabilizado pelo setor privado contribui, seja para dar continuidade a esta atividade, que demanda de altos investimentos, ou para ampliá-la. No entanto, isso não significa que não haja um comprometimento da autonomia dos agricultores ao se estabelecer relações comerciais com determinadas empresas, que como foi enfatizado ao longo do texto, tem buscado tanto monopolizar, quanto aumentar seus ganhos e assim ampliar o campo dessas relações, que torna, principalmente os pequenos produtores reféns da lógica capitalista. REFERÊNCIAS ACHKAR, M. DOMÍNGUEZ, A. & PESCE, F. (2008). Agronegocios LTDA. Nuevas modalidades de colonialismo enelConoSur de América Latina. FWW y Redes. Montevideo. 57 BUAINAIM, A. M., VIEIRA, A. C. P. e VIEIRA JUNIOR, P. A. (2000) Análise da Governança da Cadeia da Soja.[conectado/on-line]. Disponível em <http://ebookbrowsee.net/28-gt-antonio-marcio-buainaim-vieira-junior-docd281337348>. [2015, 10 de julho]. BATALHA, M. O. (Org.) (1997)Gestão Agroindustrial. São Carlos: Ed. Atlas, Vol. 1, p.139-212. BENETTI, M. D.(2004) .Globalização e desnacionalização do agronegócio brasileiro no pós 1990. 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En este sentido, el texto pone de relieve la importancia de la Soberanía Alimentaria para erradicar el hambre y la pobreza en el mundo, teniendo en cuenta que está dotado con una connotación política tal que promueve el empoderamiento de las poblaciones en riesgo en todo el mundo. Y una estrategia clave en el camino hacia la Soberanía Alimentaria es la Agroecología, que implica una serie de acciones que proporcionan situaciones que impulsan la Soberanía Alimentaria. A partir de una revisión de la literatura fue posible identificar el contexto sociopolítico en el momento en que surgió la perspectiva de la Soberanía Alimentaria, su relación con la Agroecología y el contexto actual. Palabrasclave: La globalización; Comida Sana, Autonomía Familiar; Movimientos Sociales. Introducción La matriz productiva hegemónico de Brazil es la agricultura intensiva capitalizada, el monocultivo, el consumo de una gran cantidad de insumos químicos, incluyendo varios tipos de pesticidas. Esta matriz productiva no garantiza la Soberanía Alimentaria, ya que está directamente vinculado a lo capital, que a su vez, transforma la producción de alimentos en medio de la acumulación de riqueza. Actualmente, bajo el punto de vista capitalista, la comida no és más comida hacia la supervivencia humana, hacia convertirse en mercancía. A partir de esta matriz productiva, presente en varios países además de Brazil, una crisis alimentaria se ha instalado en todo el mundo. Sin embargo, esta crisis no está vinculado a la cantidad de alimentos que se producen, sino más bien en la forma en que se produce y se distribuye. Desde el contexto global, los movimientos sociales empezeron un proceso de oposición a los grandes conglomerados que dominan la producción de alimentos en todo el mundo, rechazando paquetes tecnológicos y se pegan a una “nueva” matriz productiva basada en la producción orgánica y los principios de Agroecología, uno 60 campo del conocimiento científico, asesor de la agricultura sostenible. Por lo tanto, representada por Vía Campesina, los diversos movimientos sociales proponen el concepto de Soberanía Alimentaria, en el que las personas pueda recuperar el control sobre su producción y distribución de la comida. En este sentido, el presente trabajo pretende conocer los antecedentes históricos para la emergencia del concepto de Soberanía Alimentaria, así como contextualizarlo en la actualidad, sobre el choque de las dos formas de producción - la agroindustria y la agricultura familiar de base ecológica - en el corazón la discusión de las instituciones conectada al problema de la crisis alimentaria y el hambre en el mundo. La investigación se desarrolló impiezo de la recopilación de datos secundarios. Los análisis presentados en este documento se tomaron de documentos tales como libros, tesis, disertaciones y otras publicaciones que se ocupan de cuestiones relacionadas con el objeto del mismo. Eran parte de la colección de datos secundários de la búsqueda, la realización de selección y lectura de publicaciones sobre la soberanía alimentaria, los movimientos sociales, la agroecología, la producción orgánica y la agricultura familiar. Una revisión de la literatura de los temas tratados fue hecho y consideró también la experiencia en el campo desarrollado en el curso de post-grado y el trabajo diario de los autores. Este texto está tomado de otro original construido para la evaluación en el assunto "Principios de Agroecología" en el Especialización en la Agricultura Familiar Campesina y Educación del Campo II de la Universidad Federal de SantaMaria. Soberanía Alimentaria y el advenimiento conceptual El concepto de Soberanía Alimentaria surgió de la necesidad de hacer frente a la matriz productiva hegemónica de los principales países en los que está en la base económica, la agricultura. El primer término que surgió en este sentido fue el de Seguridad Alimentaria y Nutricional: de acuerdo a la Ley Orgánica de Seguridad Alimentaria y Nutrición - LOSAN (Ley N ° 11.346, 2006), Seguridad Alimentaria y Nutricional (SAN) es la realización de el derecho de todos al acceso regular y permanente a alimentos de calidad en cantidad suficiente, sin comprometer el acceso a otras necesidades esenciales, basado em las prácticas de alimentos que promueven la salud, que respeten la diversidad cultural y que son el medio ambiente, cultural, económica y socialmente sostenible (Ministerio de Desarrollo Social - Sitio Oficial). A partir de este concepto incorporado por el Ministerio de Desarrollo Social (MDS), es la Secretaría Nacional de Seguridad Alimentaria y Nutricional (SESAN), 61 plan, ejecutar, coordenary supervisar los programas, proyectos y acciones de SAN, de acuerdo con las directrices de la Política Nacional de Seguridad Alimentaria y Nutrición, creado por el Decreto Nº 7.272 / 2010. Sin embargo, el contexto global muestra que lo capital se ha apropiado de la producción de alimentos, convertió esta actividad em más una forma de acumulación, de rentabilidad y de explotación laboral. La comida ya no es una necesidad para la supervivencia humana y se convierte en una simple mercancía. En este sentido, la necesidad de ampliar el concepto de Seguridad Alimentaria y Nutricional se hizo urgente y necesario. Por lo tanto, los movimientos sociales impezaron a manifestarse sobre el tema, representados por Vía Campesina. La Vía Campesina es un movimiento internacional que converge a millones de campesinos, productores de alimentos pequeños y medianos, los sin tierra, los pueblos indígenas, los migrantes, los trabajadores y las trabajadoras agrícolas de todo el mundo. Ella aboga por una agricultura sostenible y en pequeña escala como una forma de promover la justicia social. Se opone y enfrenta la agroindustria y las multinacionales que están extinguiendo la gente del campo y de los recursos naturales. La Vía Campesina comprende en torno a 164 organizaciones locales y nacionales en 73 países de África, Asia, Europa y América. En total, representa a alrededor de 200 millones de campesinos y campesinas. Es un movimiento autónomo, pluralista y multicultural, sin ninguna afiliación política, económica o de cualquier otro tipo (La Via Campesina – Site Oficial). La Vía Campesina fue fundada en Bélgica en 1993 por grupos de campesinos y campesinas de todo el mundo. La hora tenía una nueva era para la sociedad mundial, la globalización, y en este contexto los grupos campesinos reclamavan que fueron reconocidos y que su voz estaba presente en la toma de decisiones que influyen de manera efectiva sus vidas. (...) a grande perversidade na produção da globalização atual não reside apenas napolarização da riqueza e da pobreza, na segmentação dos mercados e das populações submetidas, nem mesmo na destruição da Natureza. A novidade aterradora reside na tentativa empírica e simbólica de construção de um único espaço unipolar de dominação. A tirania do Dinheiro e da Informação, produzida pela concentração do capital e do poder, tem hoje uma unidade técnica e uma convergência de normas sem precedentes na história do capitalismo (Santos, 2003, p. 03). Por lo tanto, para lograr la Soberanía Alimentaria y detener los efectos destructivos del neoliberalismo, que pueden ser considerados una de los mayores 62 recursos en la naturaleza del nombramiento a favor del capital, se encuentran entre los objetivos de la Vía Campesina. Que sostiene que los pueblos de la cantidad de campo a unos 200 millones de habitantes, con esto en mente, capaces de producir alimentos de calidad para ellos y el resto del mundo de una manera sana y sostenible. Además, según la FAO, las mujeres producen aproximadamente el 70% de los alimentos en todo el mundo, tenendo papel clave en este proceso. Este papel es reconocido por Vía Campesina, que se refiere al proceso histórico de dominación/opresión de la mujer por el neoliberalismo y el patriarcado, defensa "los Derechos de las Mujeres y la Igualdad de género a todos los Niveles y lucha contra todas las formas de violencia Hacia Las Mujeres "(La Vía Campesina - Sitio Oficial, 2015). En este contexto y de acuerdo con la Vía Campesina por la Soberanía Alimentaria se entiende que: É o direito dos povos a definir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação a toda a população, com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses de produção, de comercialização e de gestão, nos quais, a mulher desempenha um papel fundamental (La Vía Campesina). Por lo tanto, la Soberanía Alimentaria está directamente relacionada con la producción de alimentos. Pero no sólo producir, es necesario producir alimentos de calidad, diversa, libre de venenos con el fin de proteger la salud de los agricultores, la salud de los consumidores y no destruir los recursos naturales. La crisis alimentaria en el mundo globalizado La economía globalizada intenta homogeneizar todos los sujetos, actores sociales, colocándolos en una posición dependiente del mercado. La Soberanía Alimentaria, por otro lado, prioriza la producción y el consumo de alimentos saludables locales, el desarrollo de una matriz productiva diversa al modelo hegemónico, la producción campesina sostenible que promueve la salud del medio ambiente y la sociedad. Una producción campesina en la que el modo de vida, las expectativas y las necesidades de las personas que viven em el/de el campo se encuentran entre las prioridades. Además de controlar la producción y proteger a los productores locales de las importaciones y el dominio del mercado de negocios, la ideología de la Soberanía Alimentaria busca asegurar que “los derechos de uso y gestión de tierras, territorios, 63 agua, semillas, ganado y biodiversidad estén en manos de quien produce alimentos y no del sector empresarial.”(La Vía Campesina - sitio Oficial, 2015). La Soberanía Alimentaria puede ser un canal de búsqueda de la solución de la crisis alimentaria y la pobreza global. La crisis mundial de alimentos se sabe que no tienen nada que ver con la cantidad de alimentos producidos en el mundo exterior. La FAO (Informe de 2014), estima que actualmente se producen tres veces la cantidad de alimentos necesarios para alimentar a toda la población del planeta. Así que el problema no está en la producción, sino en la forma de esta producción y su distribución. Pero si la comida no es la comida más y convertirse en mercancía, si la comida no es la comida más y es una parte del proceso de acumulación de capital, se puede inferir que estas son las razones de la crisis alimentaria. Y hacia la comida se convirtir en mercancía y medio de acumulación, estrategias se implementaron en los campos y em las relaciones que involucran esta producción. Por lo tanto, los paquetes tecnológicos basados en una serie de insumos químicos agrícolas, altamente dependientes de las inversiones se realizaron en la agricultura en todo el mundo. A partir de 1950, a mal designada Revolução Verde, que preconizava a moto-mecanização, o uso de insumos químicos e a adoção de material genético modificado, mudou o panorama do campo, sem, contudo, contribuir para superar o quadro de fome e desigualdades sociais. A industrialização da agricultura trouxe consequências como a mudança da matriz energética da energia solar para o petróleo, a concentração fundiária, a expansão das monoculturas, a contaminação da água, dos solos, a redução da diversidade biológica e cultural e a elevação dos custos de produção (Meirelles, 2008, p. 03). El patrón de producción basado en la agricultura para la exportación admite monocultivos en grandes áreas, alto grado de mecanización y el consumo de agua, así como los insumos químicos como pesticidas y fertilizantes y semillas modificadas genéticamente. El modelo hegemónico, toda la cadena de producción es altamente dependiente del petróleo, porque además de la composición química de la mayoría de estos produtos, aún existe el consumo de combustible utilizado tanto en la adquisición de paquetes tecnológicos como el flujo de la producción para todos el mundo. E todavia esa dependencia del petróleo, un recurso natural no renovable, la agroindustria se expande con el fin de dominar el territorio que podría ser la producción de alimentos saludables para el mercado interno. 64 O avanço do agronegócio pode ser constatado a partir de vários enfoques, entre os quais o aumento da produção/produtividade e da área plantada com produtos de exportação, o crescimento da participação do agronegócio no PIB brasileiro que já ultrapassa os 30%, pela crescente mecanização e tecnificação dos processos produtivos no campo, pelo aumento da integração entre os capitais agropecuários-industriais-financeiros, bem como pela ampliação das cadeias produtivas agroalimentares e de insumos sob controle de conglomerados econômicos, via de regra multinacionais, que dominam parcelas cada vez mais significativas dos mercados em que atuam (Campos, 2011, p. 101). El Brasil está entre los países que consumen más pesticidas en sus cultivos, por lo tanto, tiene su suelo empobrecido y dañado, los suministros de agua contaminados, alimentos enfermos, la salud de los campesinos atacados por carga de veneno que los que están expuestos, y por último, la población consume alrededor de 3,5 L de estos venenos enun año (Oliveira, 2010). Los riesgos para la salud humana tanto por el consumo a través de los alimentos, como por contacto a través de la aplicación - son altos y han comenzado a ser informado de casos de contaminación en la leche materna, además, enfermidades pulmonar y neurológicas se han relacionado con casos específicos de los agricultores que utilizan pesticidas en sus cultivos (Palma, 2011). En este sentido, se puede inferir que el modelo de producción agrícola que se encuentra en Brazil desde la aplicación de la Revolución Verde sobre todo, puede estar a punto de colapsar. Que si tenemos en cuenta la contaminación y la sobreexplotación de los recursos naturales, el ataque a los ecosistemas, los diversos efectos causados a la salud humana, la concentración de la tierra y la riqueza, entre otros. Según Campos (2011), la agroindustria es responsable de la creación y consolidación de la pobreza en el campo y, teniendo en cuenta el éxodo rural que hace que esta pobreza generada por ésta se extiende a la ciudad. Quanto à dimensão espacial, o agronegócio busca continuamente ampliar seus territórios e, nos espaços apropriados, tem o poder de condicionar a produção e distribuição da maior parte da riqueza, contribuindo também para o seu reverso, a produção da pobreza (Campos, 2011, p.109). Por otra parte, la agroindustria corrobora la hegemonía del campo, eliminando la diversidad de este entorno social, que no puede ser considerado sólo como un lugar de producción, pero sobre todo es un lugar de experiencia y la reproducción social campesina. Destacado entonces, sin embargo, sin análisis más profundas, las características del mal que la agroindustria impone a la sociedad en las dimensiones 65 político, cultural, económico, ambiental y social, se considera necesaria e inminente nueva forma de producción de alimentos que tiene condiciones para revertir todo este proceso de explotación, la contaminación y el agotamiento de la naturaleza, considerando el ser humano como una parte integrante de la naturaleza y la búsqueda de una reconexión. La Agroecología como una matriz productiva alternativa En este contexto de autonomía precaria de la sociedad a costa del capital, los movimientos sociales contribuyen como parte fundamental en la lucha contra el modelo hegemónico de la producción agrícola, y por lo tanto en contra del sistema capitalista. Y una de las maneras de hacer frente al modelo hegemónico es la Agroecología, por el cual está destinado a ser un campo científico del conocimiento que guía el uso sostenible de los recursos naturales renovables. En esta forma de producir, bajo esa orientación, la producción de alimentos está en armonía con la naturaleza, utilizando los recursos naturales em forma adecuados y controlados. Existe la preocupación por el uso del agua, el suelo, la ausencia total de plaguicidas e insumos químicos. Con la orientación de Agroecología se aprovecha del sistema todo lo que tiene que ofrecer, teniendo en cuenta su potencial: A agroecologia valoriza os conhecimentos locais e colabora efetivamente para a sustentabilidade plena na agricultura. Surge diante da necessidade de transformação do modelo agrícola dominante, na qual propostas alternativas englobam nesse contexto a agricultura orgânica, ecológica, regenerativa, biodinâmica, entre outras (Cunha, Fagundes, Rodrigues, 2011, p. 02). Y aún: O saber agroecológico é essencial para a construção de um novo paradigma produtivo ao mostrar que é possível produzir "com a natureza". Este saber pela sustentabilidade põe em questão um complexo processo de recuperação, hibridação e inovação dos saberes, em uma política de reapropriação cultural da natureza (Leff, 2002, p. 44). Por lo tanto, la Agroecología está intrínsecamente ligada a la trayectoria de la Soberanía Alimentaria. Lo que nos lleva a pensar en una característica notable y esencial de la producción de alimentos de manera sostenible, la diversificación. La vulnerabilidad económica, productiva y alimentar de la familia campesina es 66 erradicada mediante la diversificación de la producción que garantiza la biodiversidad del ecosistema local, contribuyendo a la conservación y el equilibrio de los recursos naturales, la promoción de una dieta rica en nutrientes y complejos vitamínicos diversas. Existe uma enorme variedade de consórcios, o que reflete a ampla variedade de culturas e práticas de manejo que os agricultores de todo o mundo utilizam para atender às suas necessidades de alimentos, fibras, medicamentos, combustível, materiais de construção, forragem e renda (Altieri, 2012, p. 221). Varias técnicas pueden ser utilizadas, el cultivo mixto se mencionó anteriormente, por ejemplo, permite un mejor uso de la instalación de producción, la productividad aumenta sin necesidad de grandes inversiones. La pérdida de los cultivos causados por el mal tiempo, el ataque de plagas y las fluctuaciones del mercado también se puede controlar a través de la diversificación de la producción. Otra dimensión de policultivo y la producción en la agricultura basada en la agroecología con una base sostenible, y también tan importante como la generación de ingresos (ingresos generados por la venta de los excedentes) y el auto de la familia, es la calidad de los alimentos que se consumen de esta matriz productiva. Como se mencionó anteriormente, los productos alimenticios producidos en la agroindustria están cargados de insumos químicos como fertilizantes y pesticidas, así como los transgénicos, que causan una serie de problemas para la salud humana. Específicamente en relación con una categoría de plaguicidas, organoclorados, Palma (2011, p. 42-43) establece que: O alvo de ação dos organoclorados é o sistema nervoso motor e sensorial e o córtex motor (GRISOLIA, 2005). Sua toxicidade compromete a transmissão do impulso nervoso central e autônomo, provocando alterações comportamentais, sensoriais, do equilíbrio, da atividade da musculatura voluntária e de centros vitais, particularmente da respiração (OPAS, 1996). Podem penetrar no organismo humanopor via dérmica, pulmonar, gástrica e respiratória (RODRIGUES, 2006).Em casos de intoxicação aguda, após duas horas aparecem sintomas neurológicos de inibição, hiperexcitabilidade, parestesia na língua, nos lábios e nos membros inferiores, desassossego, desorientação, fotofobia, escotomas, cefaleia persistente, fraqueza, vertigem, alterações do equilíbrio, tremores, ataxia, convulsões tônico-crônicas, depressão central severa, coma e morte. Já as manifestações crônicas salientam-se neuropatias periféricas, inclusive com paralisias, discrasias sanguíneasdiversas, inclusive aplasia medular, lesões hepáticas com alterações das transaminases e da fosfatase alcalina, lesões renais, arritmias cardíacas a dermatoses,como cloroacne (OPAS, 1996). 67 La autora también menciona en su investigación de la toxicidad, síntomas y consecuencias para la salud humana, animal y ambientales otras categorías de pesticidas tales como las piretrinas y piretroides, además de dinitroanilinas. Es necesario, por lo tanto, de forma inminente, erradicar el uso de pesticidas en los cultivos. Comida de alta calidad, producido de una manera saludable es una parte integral y fundamental para el logro de la Soberanía Alimentaria a través de la Agroecología, no hay autonomía y soberanía si la población está enferma por el consumo de alimentos contaminados. Por lo tanto, la agricultura sostenible, además de ser libre de venenos, tiene una producción diversificada de alimentos, haciendo que la tabla del productor y el consumidorcontiene muchas variedades de alimentos diferentes, contribuyendo así a la plena salud. La biodiversidad que se encuentra en la naturaleza es la base de una comida rica y saludable, además de satisfacer otras necesidades básicas para el desarrollo de la humanidad. Y esta biodiversidad se corta cuando los pesticidas, fertilizantes químicos y transgénicos se convierten en la principal forma de actividad en la producción de la agricultura capitalista. En esta misma línea de pensamiento se puede ver que las consecuencias de las acciones de los seres humanos en la naturaleza son evidentes en todas las partes del mundo. Una de las actividades quemás cambia, explora y degrada el medio ambiente es la agricultura modernizada, es decir, que a gran escala, se centró en la producción de comida con valor en el mercado, especialmente internacional (Veiga, Silva, Veiga, 2005). Además de los estragos de los pesticidas, como el exterminio de varias especies de flora y fauna fundamentales para el complejo funcionamiento de los ecosistemas locales, el uso intensivo de los recursos hídricos y del suelo provoca diversos tipos de degradación. Los seres humanos degradan su calidad de vida mediante la degradación de la naturaleza y los recursos naturales. O usointensivo do solo, aliado a um manejo inadequado, potencializa um processo naturalde erosão e assoreamento dos cursos de água. Associado ao problema da erosão estáo uso indiscriminado dos agrotóxicos. O uso desses produtos químicos é um dosmais graves fatores de deterioração da qualidade dos recursos hídricos. Estudos em várias regiões do país demonstram que acontaminação dos recursos hídricos por agrotóxicos representa um problema real quepode trazer sérias consequências para o meio ambiente e para a saúde humana(VEIGA et al., 2005, p. 4260). Además de las dimensiones de la salud humana, la preservación de la flora, la fauna y los recursos naturales, otra dimensión de gran importancia en la producción de base sostenible y diversificada es el mercado. El establecimiento de pequeñas ferias y 68 mercados, cerca del sitio de la producción, la adhesión a una nueva condición socioeconómico de consumo es fundamental. De este modo se eliminan los intermediarios, el alto consumo de petróleo para el transporte a largas distancias, y establece otras relaciones, si no la única, económica. Esta proposta de soberania alimentar enfatiza os circuitos locais de produção-consumo […] a ideia de uma aliança entre agricultores e consumidores é considerada estratégica. Os consumidores devem tomar consciência de que sua qualidade de vida está intimamente associada aos modelos agrícolas e seus múltiplos serviços ambientais. Esta multifuncionalidade só emerge quando as paisagens estão dominadas por unidades produtivas pequenas e biodiversificadas, sendo, no fim dascontas, mais produtivas que as grandes monoculturas (Marques, 2010, p. 83). En este sentido, las políticas sociales, culturales, económicos y ambientales deben ser articuladas con el fin de establecer un proceso de rediseño de las relaciones de producción, suministro, elaboración y consumo de alimentos (Perez-Cassarino, 2012). Las medidas públicas y las políticas de formación inicial y continua son necesarios para asegurar que los agricultores son capaces de organizarse para construir mercados locales que puedan garantizar el flujo de exceso de producción, sin intermediarios, fortalecimiento del productor y beneficiando al consumidor. Considerações Finais Las Formas y estrategias para buscar la Soberanía Alimentaria pasa por varias dimensiones, desde la producción de alimentos a través de los sistemas de producción sostenibles guiadas por Agroecología, a la educación política para las personas que viven en el/de el campo pueden ser reconocidos como sujetos de la historia, los sujetos socioculturales que mantienen una relación directa con los aspectos políticos, económicos y ambientales de la producción de alimentos y el afrontamiento del capital. La necesidad de establecer, ampliar y consolidar formas alternativas de producción de alimentos, pasando por toda la cadena de producción, es inminente. La propuesta de la Vía Campesina, con el lanzamiento del concepto de Soberanía Alimentaria, serpentea cadena de producción en su totalidad. Es una propuesta innovadora para enfrentar el capital y el modelo hegemónico de producción de alimentos. Pensando en las dimensiones involucradas en el camino hacia el logro de la Soberanía Alimentaria, proponiendo la autonomía de lãs personas involucrados en toda la cadena de producción es de suma importancia para profundizar el debate 69 sobre semillas modificadas genéticamente, insumos químicos y el mercado global. Semillas transgénicas excluen la capacidad de la agricultura familiar a controlar su producción, dejando como rehenes de las multinacionales a través de paquete tecnológico involucrado en esta lógica de producción. Creemos que las políticas públicas son necesarias que promuevan la transición del modelo de producción hegemónico hacia la Agroecología. Sin embargo, se necesita este tipo de políticas públicas que realmente son eficaces e involucran a todos los agricultores familiares. El derecho a controlar sus semillas, el manejo de sus cultivos y de la forma de distribución es fundamental en la producción de alimentos sanos y la preservación de los recursos naturales. Además, hay que luchar contra la concentración de la tierra y la concentración de la riqueza, que genera las desigualdades sociales en Brasil. Es necesario garantizar la dimensión de la salud de los alimentos, así como el uso de bio-fertilizantes y control de plagas a través de prácticas y manejos de los recursos naturales de manera sostenible. Ellos pueden y deben ser producidos en la unidad de producción, reduciendo los costes de producción y la reducción de la contaminación a cero. Además, la gestión sostenible y adecuada protege los recursos naturales y reduce los efectos dañinos de las actividades humanas sobre ellos. La construcción de los mercados locales - ejemplificado por ferias - elimina los intermediarios, los costos de transporte a larga distancia y el uso de sustancias que mantienen los alimentos con "aspecto saludable" el tiempo suficiente para que puedan ser vendidos en grandes cadenas de supermercados. Tenga en cuenta que, actualmente, la mayoría de los consumidores de alimentos procedentes de la agricultura sostenible (base ecológica) está en las clases media y alta, que debido a que estos productos fueron elitizados por grandes cadenas de supermercados, que impiden a la población de bajos ingresos comprarlos, por lo que también la importancia de los mercados locales, mercados alternativos. En todo este contexto, la dimensión cultural está intrínsecamente relacionada con el derecho de los campesinos a existir como sujetos sociales, dotados de muchos conocimientos tradicionales que trascienden las zonas rurales como medio de producción, para construirlo como un espacio vivido. Y, sin embargo, el concepto de la Soberanía Alimentaria lleva consigo la importancia de las mujeres en el contexto del mundo del trabajo en el campo, la construcción de una visibilidad que rompe con la presentación que el patriarcado les impone. La Soberanía Alimentaria, por lo que depende de una compleja reorganización de los sistemas de producción y distribución, depende principalmente de una nueva visión de la sociedad con respecto al consumo. Mediante pequeñas redes de 70 solidaridad que proporcionan las transformaciones locales, puede revolucionar el conjunto en la búsqueda de un mundo con mayor equidad. Referencias Altieri, M. (2012). Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável. São Paulo/Rio de Janeiro, Brasil: Expressão Popular. Campos, C. S. S. (2011). A face feminina da pobreza em meio a riqueza do agronegócio: trabalho e pobreza das mulheres em territórios do agronegócio no Brasil: o caso de Cruz Alta/RS.Buenos Aires, Argentina: CLACSO. Cunha, A. S., Fagundes, L. A., Oliveira, P. R. (2011). Agroecologia: um modo de vida sustentável – Assentamento Conquista da Liberdade – Piratini/RS. En A: Prof. Dr. João Santos Nahum (Coordenador Geral), SINGA – V Simpósio Internacional de Geografia Agrária. 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Desde as ocupações de terra, principal forma de luta camponesa a criação dos assentamentos rurais pelo Estado, questionando o quão eficaz é o processo da reforma agrária no País. Além de ponderar a luta na terra, fator relevante para a manutenção e desenvolvimento futuro desses assentamentos. Lançando mão dos dados fornecidos pelo Dataluta, faz-se uma retomada histórica de 1988 a 2012, das ocupações e implantação de assentamentos e por fim uma breve análise das condições para o desenvolvimento deste. Palavras-chave: luta pela terra, reforma agrária, assentamentos rurais, luta na terra. Introdução O Brasil, desde o início de sua colonização, tem sua história marcada por políticas que beneficiamo crescimento da desigualdade social. Sãoséculos de favorecimento a latifúndios e grandes propriedades rurais em detrimento dos minifúndios e das pequenas propriedades, muitas vezes incapazes de permitir a reprodução de seus proprietários, agricultores familiares. A partir de 1960 o debate a cerca da questão agrária Brasileira ganha força principalmente entre os intelectuais da época e passa a ser defendido por alguns partidos políticos como o Partido Comunista Brasileiro (PCB); setores reformistas da Igreja Católica; a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal); ealguns economistas conservadores. O assunto ganha força no cenário nacional e impulsiona a criação do Estatuto da Terra em 1964, considerado um marco na luta pela reforma agraria no país. Porém apesar dos esforços e avanços neste setor, ainda pode-se considerar que a tão sonhada reforma agrária, reivindicada por muitos, principalmente pelos 73 movimentos socioterritorias, não ocorrera de fato, ou pelo menos não como planejada. Embora tenham ocorrido inúmeras ocupações de terra por todo o país desde então, a resposta do Estado é tímida, foram cerca de nove mil assentamentos criados no país, e em numero desproporcional a cada região geográfica brasileira. A região Centro sul que concentra a maior parte da população brasileira e da riqueza nacional, além de milhões de expropriados e camponeses em vias de desintegração devido à modernização da agricultura e industrialização do país, foi a menos favorecida na implantação dos assentamentos, enquanto a região Norte, com menor contingente populacional, e menor número de ocupações, além de pouca estrutura para a criação dos assentamentos, recebeu um numero considerável de novos assentamentos, haja visto que para se implantar um assentamento rural, inúmeras variáveis devem ser levadas em consideração para garantir seu desenvolvimento futuro. Portanto, a reforma agrária apresenta um aspecto não reformista de fato, pois preserva as regiões de capital consolidado como o Sudeste, Sul e parte do Centro Oeste e aposta na fronteira agrícola da Amazônia para a implantação desses assentamentos rurais. Assim temos no Brasil uma reforma agrária conservadora, que apesar de criar novos assentamentos, conserva a estrutura agrária já consolidada no capital e maquia os reais problemas do rural brasileiro. A política de assentamentos rurais no Brasil e aReforma Agrária conservadora O Brasil se caracteriza como um país que apresenta imensas desigualdades sociais e regionais resultantes da concentração da riqueza. Fato que pode ser comprovado ao se analisar o processo de formação da estrutura agraria do país, que desde o inicio favoreceu o desenvolvimento da grande propriedade em detrimento a pequena. De acordo com Giraldi e Fernandes (2008, p. 73) os problemas da questão agrária, relativos à vida e produção no campo, compõem o conjunto de questões que barram outro modelo de desenvolvimento para o país, mantendo suas características contraditórias em favor de um pequeno número privilegiados que detém os meios de produção e controlam a política e as finanças. Segundo Stedile (2006, p.35) principalmente após 1964, com o país enfrentando uma profunda crise econômica, três questões se apresentavam como principais exigências para acelerar o processo de desenvolvimento capitalista do Brasil, são elas: o combate à inflação, a alteração da politica externa e a “modernização” da agricultura. Em relação ao combate a inflação, o governo militar implantou a chamada politica de “recessão calculada”, que tinha como principal pressuposto a superexploração seletiva da força de trabalho e o arrocho salarial 74 seletivo. Quanto à politica externa, ficou mais evidente a aproximação já esperada com os Estados Unidos, e por fim quanto à “modernização”, colocava-se como inevitável a reforma agrária. Um dos primeiros atos do governo militar foi então a criação do Estatuto da Terra, que foi apresentado no dia 26 de outubro de 1964 e aprovado no dia 30 de novembro de 1964. O estatuto então apresentado como umas das prioridades governamentais levanta a questão da reforma agraria como chave para a resolução dos problemas agrários da época, dando a terra uma nova regulamentação, modificando-se a estrutura agrária do País. De acordo com o então presidente Castelo Branco, honrando também os compromissos internacionais assumidos na Carta de Puntadel Este, a qual em seu Título Primeiro, art. 6°, dispõe: [...] que as Repúblicas Americanas procurarão, entre outros objetivos a serem atingidos nesta década Impulsionar, respeitando as particularidades de cada País, programas de reforma agrária integral, encaminhada à efetiva transformação onde for necessária a modificação das estruturas dos injustos sistemas de posse e uso da terra, a fim de substituir o regime de latifúndios e minifúndios por um sistema justo de propriedade, de maneira que, complementada por crédito oportuno e adequado, assistência técnica, comercialização e distribuição dos seus produtos, a terra se constitua, para o homem que a trabalha, em base da sua estabilidade econômica, fundamento do seu crescente bem-estar e garantia de sua liberdade e dignidade”. No entanto de acordo com Ianni (1981), a reforma agraria proposta por Castelo Branco, tida como “democrática e cristã”, voltava-se para o aumento da produção e da produtividade, bem como para a consolidação da propriedade privada no campo. Ainda, segundo Graziano da Silva (1982), o Estatuto da Terra teve como especificidade o fato de conter em seu bojo duas estratégias distintas: uma “distributivista”, voltada a democratização da propriedade da terra; e a outra “produtivista”, concentradora, sinalizando a opção que prevaleceria nos anos 1970, a chamada “modernização conservadora”. A criação e a implantação de assentamentos rurais no território nacional deixa evidente que a prometida reforma agraria, não se consolidou como deveria se apresentando de maneira tímida, ou como afirma Girardi (2008) uma “reforma agraria conservadora”. A implementação desses assentamentos rurais se consolidaram principalmente após as duras reivindicações dos movimentos socioterritorias espalhados por todo o País, porem essa etapa constitui apenas uma parte da luta, a conquista da terra, posteriormente o então assentado ainda precisa conquistar condições de vida e produção na terra; resistir na terrae lutar por um outro tipo de desenvolvimento que permita o seu estabelecimento estável, o processo de “luta na terra”. 75 No Brasil, a ocupação é a principal estratégia de luta pela terra realizada pelos movimentos socioterritoriais. Os dados do Banco de Dados da Luta Pela Terra (DATALUTA) de 2012, mostram que no país entre os anos de 2000 e 2012 foram cerca de 5.344 ocupações, mobilizando um total de 708.706 famílias. Geralmente, as propriedades ocupadas são aquelas que apresentam indicativos de descumprimento da função socialda terra, definida no artigo 186 da Constituição Federal, que diz: [...] A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta Lei, aos seguintes requisitos: aproveitamento racional e adequado; utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; observância das disposições que regulam as relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores(MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, 2007. p.391). Pinto Jr. e Farias (2005 p. 48) afirmam que não basta que a propriedade rural seja produtiva (art. 185) no sentido economicista para que não seja passível de desapropriação; ela deve serprodutiva respeitando simultaneamente os princípios do art. 186. A produtividade não pode ser alcançada sob consequência de desrespeito aos aspectos da função social, de forma que essas duas características são indissociáveis e “a função social écontinente e conteúdo da produtividade”. A reforma agrária historicamente é defendida como a solução dos problemas agrários Brasileiros. No entanto a realidade esta longe de atender a essas expectativas. Em uma analise do período de 1988 até 2006, quando ela foi intensificada, é possível perceber o quão tímido foram os avanços. As então ações de reforma agrária no Brasil têm sido baseadas principalmente nas políticas de criação de assentamentos rurais e de concessão de crédito aos camponeses. Nota-se que essas ações ocorrem principalmente em regiões que já apresentam uma estrutura agraria consolidada, como afirma Girardi (2008, p. 79) “pois a forma como é conduzida a política de assentamentos conserva a estrutura das regiões de ocupação consolidada, isto é, Centrosul e Nordeste, de forma que o cumprimento dos princípios constitucionais é muito restrito”. A partir de 1988, foram contabilizadas no país mais de oito mil e setecentas ocupações de terra,(gráfico 01) levando mais de um milhão de famílias a viverem por um longo tempo nos acampamentos, em condições precárias de vida. Em resposta, os governos criaram desde então nove mil e setenta assentamentos rurais. Assentando novecentos e trinta e três mil famílias em uma área superior a oitenta e um milhões de hectares. 76 Mesmo parecendo um numero elevado, ele ainda se configura como uma característica da reforma agraria conservadora, pois ao analisarmos os dados da geografia dos assentamentos rurais neste período agrupando os números da luta pela terra e de sua conquista por macrorregião. Entre 1988 e 2012, de todas as famílias que participaram de ocupações de terra no Brasil, (figura 01) apenas 9,30% o aconteceu na região Norte. Figura 01: Número de Ocupações e de famílias nas ocupações. Dados: DATALUTA 2012. Porém, ao contabilizar o numero de famílias “assentadas” pelos governos no mesmo período (figura 02), 22,9% receberam lotes na região Norte. 77 As regiões Centro Oeste e Nordeste apresentam equilíbrio entre a proporção numérica de famílias em ocupações e famílias assentadas em relação ao total brasileiro. Já no caso do Sul e do Sudeste, ao contrário do que ocorre no Norte, a participação nas ocupações é superior ao assentamento de famílias. Na região Sul o numero de ocupações é de 12,54%, assentando apenas 9% das famílias, enquanto no Sudeste o numero de ocupações é superior a 26%, porém assentando 9% do total das famílias (Tabela 01). Figura 02: Número de assentamentos e de famílias assentadas de 1988 a 2012. Dados: DATALUTA 2012 Região Ocupações Famílias em Assentamentos Famílias Área dos de terra ocupação criados assentadas assentamentos Hectares Norte 817 109.900 2.079 404.242 61.232.525 Nordeste 3.352 448.314 4.123 310.332 10.194.484 Centro-Oeste 1.184 194.722 1.237 137.636 8.053.941 Sudeste 2.334 295.242 815 45.412 1.486.148 Sul 1.102 173.480 816 36.214 814.730 BRASIL 8.789 9.070 933.836 81.781.828 1.221.658 Tabela 01: Número de ocupações e assentamentos criados discriminados por regiões. Dados: DATALUTA ORG: Iolanda Lopes de Oliveira 78 De acordo com Girardi e Fernandes (2008, p. 80) As regiões Centro-Sul e Nordeste são as áreas onde a reforma tem sentido e é necessária, pois desconcentra as terras e aperfeiçoa a sua utilização; pois são as regiões em que se concentra a maior parte da população brasileira, se concentram os milhões de expropriados e camponeses em vias de desintegração devido à modernização da agricultura e industrialização do país, não planejadas de forma adequada para garantir a distribuição da riqueza e absorção desta população por outros setores. Além da concentração populacional, as regiões de ocupação consolidada, onde se concentram as ocupações de terra, são caracterizadas pela melhor infraestrutura para produção, maior mercado consumidor e acesso a serviços básicos como educação, saúde, eletricidade e saneamento básico. Tendo isso em mente, as ocupações na metade meridional do país são as que mais contribuem para a realização da reforma agrária, pois é nessas regiões que a estrutura concentrada já estabelecida deve ser reformada. O processo da luta “na” terra Apesar, do considerável número de assentamentos rurais implantados ao longo deste período, é de fundamental relevância levar em consideração variáveis que possam influenciar futuramente no desenvolvimento e manutenção desses assentamentos. O Ministério Extraordinário de Política Fundiária afirma que assentamentos estão apoiados por uma política de crédito própria, através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), que financia a implantação dos lotes, com recursos para a construção da moradia, manutenção da família no primeiro ano, além de financiar o custeio da produção e disponibilizar crédito para investimento, com prazos e carências. Além disso, foi implementado o Projeto Lumiar, que deixou de funcionar ao final do ano de 1999. Esse projeto objetivou fornecer assistência técnica aos assentados, pois esta era uma das suas reivindicações históricas. Tinha por finalidade maior: o desenvolvimento das famílias assentadas; a consolidação dos projetos de assentamento e sua inserção no Município ou região como unidade de produção competitiva, geradora de renda e emprego; suprir a necessidade de assistência técnica e a capacitação das famílias assentadas, no que diz respeito à implantação e desenvolvimento de culturas e pastagens, armazenamento e comercialização, criação de animais e introduzir novas tecnologias e ações de estímulo à organização dos assentados (Ministério Extraordinário de Política Fundiária, 2001). 79 Em estudo realizado por Bittencourt, Castilho, Bianchini e Silva (1999), sobre os principais fatores que afetam o desenvolvimento dos assentamentos de reforma agrária no Brasil, os autores concluíram que a qualidade físico-química dos solos, a disponibilidade de água, a frequência das chuvas e o relevo têm sido aspectos importantes para determinar o nível de desenvolvimento dos assentamentos. Consequentemente tais aspectos podem ser considerados como pré-condições para o êxito dos projetos de assentamento. Portanto, o aspecto natural é um fator central que pode não só determinar a diferença entre os assentamentos com maior ou menor nível de desenvolvimento, mas também, impossibilitar o próprio desenvolvimento produtivo. Um item da analise faz referencia ao distanciamento dos projetos de assentamento dos centros comerciais, as vias de acesso, quando existem, são de extrema precariedade. Tal aspecto foi sublinhado por Bittencourt e colaboradores (1999 p.22), que evidenciaram que os projetos de assentamentos “localizados em entorno com produção agropecuária mais dinâmica – que contam com a presença de mercados específicos interligados com agroindústrias - tendem a se beneficiar desse entorno”, conseguindo inserir a produção dos assentados nessas cadeias produtivas. Ou seja, a proximidade do mercado consumidor e o seu acesso são fatores relevantes para o êxito do assentamento. Compreende-se que após passarem por um longo processo de luta “pela” terra, vivendo em condições precárias em acampamentos por longos períodos, os assentados se veem obrigados a enfrentar outro processo, o de luta “na” terra, pois apenas conceder o direito a terra não significa que esse assentado consiga se reproduzir socialmente. Ao serem inseridos na realidade dos assentamentos, os assentados geralmente detentores de nenhum ou pequeno capital, logo se empobrecem, ao se depararem com as precárias condições, já apresentadas anteriormente. Entretanto, esta preocupação é recente. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a partir dos anos 1990 e do Governo Fernando Henrique Cardoso, menciona em um relatório apresentado no ano 2000, que o processo de assentamento somente estaria completo quando os beneficiários estivessem inseridos no mercado de forma competitiva, reconhecendo a fundamental importância à viabilização de serviços e infraestrutura básicos. Isso comprova que apenas o acesso a terra não é suficiente, é preciso apoio governamental para que os assentados possam permanecer nela, assim a luta “pela” terra passa a ser a luta “na” terra. Assim, as propostas de politicas para a criação dos assentamentos rurais, são de fundamental importância para que após a implantação e consolidação destes, os 80 então moradores ali assentados, consigam alcançar o desenvolvimento, como afirmam as propostas do II Plano Nacional de Reforma Agraria (PNRA), onde busca-se combinar viabilidade econômica com sustentabilidade ambiental, integração produtiva com desenvolvimento territorial, qualidade e eficiência com massividade. Criando as condições para que o modelo agrícola possa ser alterado, introduzindo-se maior preocupação com a distribuição de renda, a ocupação e o emprego rural, a segurança alimentar e nutricional, o acesso a direitos fundamentais e o meio ambiente. Desta forma o II PNRA propõe que a criação e o desenvolvimento dos novos assentamentos passarão a se orientar por um projeto regional produtivo associado a um plano de desenvolvimento territorial, definido conjuntamente com os beneficiários e acompanhado pela assistência técnica. Significando uma oportunidade para ampliar a oferta de alimentos na região e para promover a diversificação produtiva, como em função da destinação dos seus produtos e subprodutos – alimentos e geração de energia. Ao integrar-se aos arranjos produtivos locais, os assentamentos contribuirão para a expansão das cadeias produtivas existentes ou para a formação de novas cadeias, dinamizando o desenvolvimento dos municípios e das regiões. Considerações finais Ao analisar o cenário rural brasileiro, remete-se a questão agrária no Brasil, a qual é fruto de um processo histórico que envolve o debate sobre as formas de ocupação, expansão das fronteiras territoriais e agrícolas e de acúmulo de riquezas por parte das forças hegemônicas.Um espaço construído socialmente para tender à expansão mundial do modo capitalista de produção, uma expansão calcada na exploração, na apropriação do tempo de trabalho e na partilha desigual de riqueza produzida. Para tanto, há a necessidade de se contrapor a esses elementos que resultam no êxodo rural, pois o campo, além de espaço produtivo, é lugar de vida, de interação social, condição muitas vezes colocada em segundo plano. Apesar do grande esforço dos movimentos socioterritorias pela conquista da terra, a resposta do Estado ainda pode ser considerada tímida. De 1988 a 2012 foram criados e implantados mais de 9000 assentos rurais, assentando um pouco mais de um milhão de famílias, porém esses números apesar de parecerem otimistas, ao ser analisados do ponto de vista geográfico, não se caracteriza como animadores para a tão sonhada reforma agraria, ao contrario revela um cenário maquiado, caracterizando um processo de reforma agraria conservadora. Pois para não modificar a estrutura agraria atual e consolidada do país de favorecimento ao grande capital que se concentra principalmente na região Centro sul 81 e Nordeste, a região de fronteira agropecuária na Amazônia passa a ser a válvula de escape para a criação dos assentamentos rurais. A maioria das ocupações de terra ocorre nas regiões Sul e Sudeste, porém são as regiões com menor número de implantação de assentamentos, caso contrário da região Norte que apresenta o menor numero de ocupações, mas ganha no número de assentamentos e famílias assentadas. Esta frente pioneira na Amazônia não apresenta boas condições para a implantação dos assentamentos, pois tembaixa densidade de infraestrutura, precariedade de serviços básicos e pouco mercado consumidor. Assim os assentamentos são precariamente instalados, o que faz com que a estratégia de gastar menos com a reforma agrária na fronteira agropecuária funcione, já que o interesse é o número de famílias assentadas e não a qualidade de vida dessas famílias. Em relação à criação dos assentamentos e a qualidade de vida dessas famílias, Inúmeras variáveis devem ser observadas antes desta implantação, respeitando especificidades locais, a fim de atender as demandas futuras destes assentados, como por exemplo, boas condições de topografia e solo, favorecendo a produção e o melhor desenvolvimento das atividades agropecuárias. A presença de um mercado consumidor próximo, onde esta produção possa ser comercializada, e boas condições das vias de acesso essas localidades, assim como o transporte. A presença da assistência técnica e da extensão rural, para facilitar e sanar duvidas dos assentados referentes a problemas encontrados durante o processo produtivo, haja visto que uma realidade dos assentamentos rurais brasileiros atualmente é a grande diversidade de pessoas, originarias de varias regiões do pais, que não conhecem as especificidades locais, dificultando a adaptação dos mesmos aos cultivares locais, atrapalhando o desenvolvimento da produção e consequentemente a obtenção de renda através das atividades agropecuárias. Entre outras tantas variáveis a serem observadas. Assim, após passarem por um longo processo de luta “pela” terra, vivendo em condições precárias em acampamentos por longos períodos, os assentados se veem obrigados a enfrentar outro processo, o de luta “na” terra, pois apenas conceder o direito a terra não significa que esse assentado consiga se reproduzir socialmente e permanecer no assentamento. Referências BERGAMARCO, S.; PAMARD, C. B.; CHONCHOL, M. E. (1997). Por um Atlas dos assentamentos brasileiros: espaços de pesquisa. Rio de Janeiro: DL Brasil. 82 BITTENCOURT, G. A., CASTILHO, D. S. B., BIANCHINI, V., & SILVA, H. B. C. (1999). Principais fatores que afetam o desenvolvimento dos assentamentos de reforma agrária no Brasil. Brasília: Coordenação de Comunicação Social do Ministério do Desenvolvimento Agrário. BRASIL, Instituto Nacional De Colonização e Reforma Agrária. Disponível em: <http://www.incra.gov.br/>. Acesso em: 16 de julho de 2014. BRASIL. (2003). Ministério do Desenvolvimento Agrário. II Plano Nacionalde Reforma Agrária: paz, produção e qualidade de vida no meio rural. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário. BRASIL. (2003). CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. 20.ed. Brasília: Câmara dos Deputados. MEDEIROS, L. S; LEITE, S. (Orgs.). (1999).A formação dos assentamentos rurais no Brasil: processos sociais e políticas públicas. Porto Alegre/Rio de Janeiro: Ed. UFRGS/CPDA. MENDONÇA, S.R. (2006). 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Rio de Janeiro: UFRRJ/CPDA, p.73-112. 83 O TURISMO RURAL NO DISTRITO DE ARROIO GRANDE – SANTA MARIA/RS LISANE REGINA VIDAL CONCEIÇÃO 17 JANETE WEBLER CANCELIER18 Resumo A inserção da pluriatividade na agricultura familiar assinala a presença de novas territorialidades, baseadas nas atividades do turismo rural que contribuem para a reprodução e permanência do homem no campo. Neste contexto, o turismo rural é visto como o conjunto de atividades desenvolvidas no meio rural, comprometido com a produção agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, bem como promovendo o resgate do patrimônio cultural e natural da comunidade envolvida. Neste sentido, o trabalho tem por objetivo analisar os processos e as dinâmicas colocadas no espaço rural do Distrito de Arroio Grande, município de Santa Maria – RS desenvolvidas pela agricultura familiar. Palavras-chave: Pluriatividade; Agricultura Familiar; Território. Resumen La inserción de la pluriactividad en la agricultura familiar señala la presencia de nuevas territorialidades, basadas en las actividades del turismo rural que contribuyen para la reproducción y permanencia del hombre en el campo. En este contexto, el turismo rural es visto como el conjunto de actividades desarrolladas en el medio rural, comprometido con la producción agropecuaria, agregando valor a los productos y servicios, bien como promoviendo el rescate del patrimonio cultural y natural de la comunidad. En este sentido, el trabajo tiene como objetivo analizar los procesos y las dinámicas colocadas en el espacio rural do Distrito de Arroio Grande, condado de Santa María-RS desarrolladas por la agricultura familiar. Palabras clave: pluriactividad, agricultura familiar, territorio. Introdução Diversos autores ao longo dos anos têm se interessado pelos estudos do espaço rural ocupado pela agricultura familiar, entre outras questões, estes buscam demonstrar a importância deste segmento para o Brasil. Na contemporaneidade a característica essencial das unidades familiares é constituída pela necessidade constante de adaptação a novos cenários. “As explorações familiares que se mantiveram são as que souberam, ou puderam adaptar-se às exigências impostas por situações novas e diversas” (LAMARCHE,1993, p.21). Neste contexto, a pluriatividade para a agricultura familiar caracteriza a presença de novas territorialidades, baseadas em atividades como o turismo rural que contribuem para a reprodução e permanência do homem no campo. O turismo rural é visto como o conjunto de atividades desenvolvidas no meio rural, comprometido com a 17 Doutoranda do programa [email protected] 18 Doutoranda do programa [email protected]. de Pós-Graduação em Geografia da UFSM. Contato de Pós-Graduação em Geografia da UFSM. Contato 84 produção agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural da comunidade. (MINTUR, 2003, p.07). O turismo rural esta sendo adotado pelo agricultor familiar como recurso para encontrar, na diversificação de suas atividades econômicas, o meio de viabilizar sua permanência e continuidade as suas atividades no meio rural. Neste sentido, este artigo se propõe a compreender os processos e as dinâmicas colocadas no espaço rural do Distrito de Arroio Grande, município de Santa Maria/RS, especificamente para a agricultura familiar. Inicialmente trazem-se algumas colocações acerca do conceito e definição de território, na seqüência procura-se discutir as novas tendências colocadas para os territórios rurais de Santa Maria/RS, principalmente com atividades relacionadas ao turismo rural. Metodologia A pesquisa caracteriza-se pela abordagem qualitativa. Apresenta uma abordagem interpretativa que se propõe traduzir e expressar o fenômeno estudado, também se constitui em um trabalho laborioso, visto que registra as informações, coleta dados, organiza e realiza as análises (MATOS; PESSÔA, 2009, p. 282). A pesquisa qualitativa está veiculada à Geografia Crítica, busca, acima de tudo, a compreensão da essência dos fenômenos estudados. Para seu desenvolvimento, utilizou-se a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental, a pesquisa de campo e as análises. Realizou-se um levantamento bibliográfico para caracterizar a área de pesquisa com a leitura de artigos científicos e livros relacionados às questões de natureza teórica que abordem a temática, assim como leituras que possibilitaram a contextualização e discussão do termo território. A estruturação teórica possibilita a interpretação da realidade percebida; identificar e representar os fenômenos socioeconômicos e culturais responsáveis pela manifestação de determinados eventos (MENDES; PESSÔA, 2009). Num segundo momento, de fase exploratória, a pesquisa documental, o levantamento de dados empíricos em fontes secundárias e primárias, junto a órgãos públicos e associações entre as quais se destacam o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Censos Agropecuários e Demográficos na Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE), a Secretaria de Desenvolvimento Rural de Santa Maria – RS. Esta fase do estudo permitiu acesso a informações históricas, econômicas, sociais e estruturais sobre a região. Os dados levantados forneceram subsídios para 85 compreensão das relações que se estabelecem na área de estudo, possibilitando um esforço de apreensão do espaço geográfico. Os dados qualitativos foram obtidos por meio de entrevistas semiestruturadas dirigidas ao Secretário de Desenvolvimento Rural e ao Secretário de Turismo de Santa Maria – RS. O objetivo foi conhecer os projetos e as ações direcionadas para o Distrito de Arroio Grande. As entrevistas ocorreram de forma direta e seguiram um roteiro determinado de questões. Optou-se pela entrevista semiestruturada procurando oferecer ao informante a possibilidade de discorrer sobre o tema de forma espontânea e abrangente. No momento posterior a coleta de dados qualitativos, através de um processo investigativo, foi possível eleger o espaço que seria foco de nossas análises. Elegeu-se a Rota turística e gastronômica de Santa Maria – Silveira Martins como o foco central da análise no que se refere às atividades atreladas ao turismo rural. Posterior a esse momento, realizaram-se trabalhos de campo percorrendo o trajeto entre Santa Maria, especificamente o distrito de Arroio Grande, até Silveira Martins. A técnica utilizada para a coleta de dados, nesta fase, foi a observação simples. A observação simples coloca-se num plano cientifico, pois vai além da simples constatação dos fatos, a coleta de dados é seguida de um processo de análise e interpretação, o que lhe confere a sistematização e o controle requeridos dos procedimentos científicos (GIL, 2010, p. 101). Discussão Conceituando e definindo território Do ponto de vista geopolítico, o território é compreendido como Estado-Nação, a partir do momento em que há uma organização em sua defesa. O termo território abrange o sentido de um campo de forças ou uma rede de relações sociais, econômicas, culturais e políticas, que se projetam no espaço. É moldado a partir das combinações de condições e forças internas e externas, que devem ser compreendidas e entendidas em sua totalidade espacial. No território se inclui a interação entre duas categorias - base da Geografia: sociedade – natureza e onde se projetou trabalho, seja por meio de energia, informação, conhecimento ou técnica, e que, devido a isso, revela relações de poder. O território não é simplesmente um elemento que contém recursos naturais e pessoas. Para Gonçalves (2002, p.230) “o território é uma categoria espessa que pressupõe um espaço geográfico que é apropriado e esse processo de apropriação territorialização – enseja identidades – territorialidades”. Na seqüência ainda destaca 86 que a sociedade se territorializa sendo o território sua condição de existência natural. Desta forma, vão se materializando em diferentes temporalidades determinadas configurações territoriais. Já Clavijo (2011, p.139) coloca que El territorio es, por tanto, el espacio que acoge y encuyo seno se desarrollala vida social, la actividad económica, la organización política, el presente y el futuro de una comunidad social. El territorio se presenta, por tanto, como un sistema activo em continua evolución. Na formação do território assumem importância as relações culturais entre um grupo ou lugares particulares, ou seja, apropriação de uma porção do espaço por um grupo, definindose como elemento constitutivo de sua identidade. Portanto, as diferenças e/ou desigualdades dos territórios são resultantes das características físicas, humanas e culturais, moldadas a partir da combinação e das forças internas e externas (relações de poder) de uma espacialidade. A influência cultural e histórica do grupo social molda no espaço uma feição distinta, como que o personalizando, tornando-o sua propriedade, na qual o espaço se revela como a identidade deste tipo humano (o grupo sociocultural) que sobre ele se movimenta, atua e se perpetua, reproduzindo o próprio espaço, agora transformado em sua morada de vida, o seu território. Na concepção de território e de seu entendimento, VALE, SAQUET e SANTOS (2005, p.13), mencionam-no como um processo de conjugação de forças, relações e produções interconectadas, com articulações de aspectos econômicos, políticos e culturais, no tempo e no espaço. Neste aspecto, cabe ressaltar que as três noções relacionam-se reciprocamente, ou seja, existe um mutualismo entre idéia e matéria, em que uma ora outra, em cada lugar ou em cada momento histórico, pode predominar frente às demais. A importância da dimensão econômica no território está centrada na dinâmica econômica em processo de expansão, enquanto que a dimensão cultural do território deve levar em consideração as origens de cada grupo social, bem como a sua história ao longo dos tempos, a fim estabelecer seus valores e costumes, os quais marcam o espaço onde vivem. Neste contexto, Clavijo (2011): La identidad de un lugar significa el reconocimiento de una trama colectiva de significados o representaciones ambientales y culturales, históricamente legada y socialmente adquirida, de la cual derivan formas particulares de pensar y valorar el entorno y modos de diferenciarse frente a los otros. De ahí que la identidad territorial conjugue un tejido de representaciones propias del territorio que la sociedad adquiereen razón de habitarlo y modelarlo en el transcurso del tiempo. Múltiples territorios que interactúan de múltiples formas, se entremezclan en la representación cultural del espacio geográfico. Por tanto, es importante considerar diferentes enfoques que se 87 ajustan a las variaciones y especificidades ecológicas, geohistóricas, antropológicas y económicas de los territórios (CLAVIJO, 2011, p.140). Contemporaneamente, neste território estão presentes os “mais” e os “menos” desenvolvidos, os “avançados” ou “dinâmicos” e os “atrasados” ou “tardios”, permitindo que no seu entendimento esteja presente a ótica tridimensional sociedade- espaçotempo. (RAFFESTIN, 1993, p.160). Desta maneira, cabe ressaltar que os territórios podem se organizar ou se dissolver de modo relativamente rápido. Ser antes instáveis do que estáveis, ou ter existência em alguns momentos. Além disso, possuem capacidade diferenciada de oferecer competitividade aos investimentos, ocasionando distintas vantagens de localização produtiva, que podem variar de lugar para lugar ou no decorrer do tempo. Desta forma, se insere a capacidade de cada território em gerar ou absorver inovações, maior ou menor capacidade disponível de infra-estrutura e de mão-de-obra adequadas à localização dos segmentos econômicos intensivos em conhecimento. A última década do Século XX foi palco de profundas mudanças na política econômica mundial implicando em transformações nas relações de produção em nível externo e interno dos países que compõem o grande eixo econômico. Sauer (1998) entende que o espaço rural teria conhecido transformações como decorrentes deste novo patamar de internacionalização e de rearranjo na forma de acumulação do capital que se materializava no processo de globalização, o qual tem por objetivo a mudança na natureza e intensidade da revolução científica e tecnológica, como igualmente a liberalização e integração dos mercados. Esta estrutura globalizante não só interferiu alterando significativamente os padrões de concorrência e as condições de acumulação do capital e dos mercados também vêm provocando a valorização das vantagens comparativas referentes à qualidade, preço e origem da oferta. Este novo processo em sua marcha desloca o foco da abundância de matéria-prima barata e da disponibilidade de mão-de-obra para o domínio das tecnologias e dos recursos humanos. Isto não só tem desarticulado regiões tradicionalmente fornecedoras de matérias-primas e de mão-de-obra como também aquelas que não estavam preparadas, tecnicamente, para novos desafios, como foi o caso de inúmeras regiões brasileiras. Desequilibraram-se as relações no meio rural, afetando profundamente o setor da produção dirigido ao atendimento do consumo interno que de uma hora para outra se viu concorrendo, no abastecimento interno, com produtos similares importados em pleno território nacional. Entretanto, ao mesmo tempo em que a globalização abriu os mercados e gerou crises no meio rural e na produção agrícola, também determinou a busca por um novo 88 paradigma para o desenvolvimento local, através da valorização do lugar em contraposição ao cenário internacional, pois o processo que globalizou a economia mundial, contraditoriamente, valorizou as diferenças regionais, ao priorizar mercadorias exóticas e de procedências fora do circuito das transformações padronizadas pela tecnologia em curso. Neste contexto, a pluriatividade tem sido uma estratégia de sobrevivência do homem do campo nos últimos anos. Nesta linha de pesquisa é válido salientar que o espaço rural não é somente o espaço destinado produção da agropecuária é um espaço em constante transformação onde novos usos e funções vão surgindo constantemente. O trabalho de Domingues (2011) especifica que; ... la agricultura no es solamentela que cambia, sino también la sociedad. La sociedad es la que expresa nuevas exigencias, reclama alimentos sanos y de calidad, medios rurales bellos y acogedores, corrientes de agua limpias, um patrimonio rural mantenido y un ambiente natural preservado. Los territórios rurales se han convertido para la población urbana en lugares de reposo y recreación, por lo tanto, esta situación representa para el autor una buena oportunidad para conocer mejor el trabajo de los productores y todas sus facetas. Por otra parte, se están generando cambio sem los lugares de residencia de algunos sectores de la población urbana que pasan a residir en el campo, buscando mejores condiciones de calidad ambiental, lo que también incidiría en estas nuevas oportunidades para los productores. (LAMBERT apud DOMINGUES, 2011, p. 210) Assim, novos modos de vida passaram a ser valorizados por serem pautados em sistemas de produção particulares e de especificidade local, principalmente os do meio rural, passaram a ganhar espaço nos mercados e identificar um lugar, uma região e até mesmo um modo de único. Observa-se, ainda que o setor agrícola, especificamente o determinado pela presença da agricultura familiar, vem sendo entendido como uma estratégia de manutenção do emprego e da recuperação e de distribuição de renda. Isso é entendido na medida em que a agricultura familiar emprega mais de 80% da mão-deobra rural, possui melhor potencialidade de preservação dos recursos naturais, abastece o mercado interno e gera divisas que permanecem no país. A valorização do local, de alimentos mais saudáveis e de produtos naturais, também é visto como positivo. Assim, verifica-se nos anos 90 uma intensificação de “novas” atividades agrícolas e não-agrícolas no campo brasileiro, impulsionadas por demandas específicas das classes média e alta urbana. Essas atividades atuam em nichos específicos de mercado, diferenciando-se das tradicionais “commodities” direcionado 89 ao mercado nacional e internacional, respondendo, assim, por uma produção “pósfordista”. Entre essas atividades pode-se citar: piscicultura; criação de animais de alto valor agregado, como rã, scargort; produção orgânica de ervas medicinal e de temperos e condimentos; produção orgânica de verduras e legumes; turismo rural; fazenda-hotel e revitalização crescente de atividades tradicionais como o artesanato e agroindústria artesanal rural (SILVA et al, 1997, p. 62). O turismo rural no Distrito de Arroio Grande, município de Santa Maria/RS e a construção de novas territorialidades O município de Santa Maria - RS está localizado na região central do Estado do Rio Grande do Sul, conforme Figura 1. Possuiu uma população de 262.368 mil habitantes, sendo que mais de 95% desta população vive na área urbana (IBGE, 2011). Sua configuração territorial está associada ao processo de ocupação e formação socioeconômica da região central do Rio Grande do Sul. Neste município, assim como na região, ocorre o predomínio dos estabelecimentos agrícolas familiares. A forma como foram ocupadas e distribuídas as terras refletem a atual estrutura fundiária do município e da região. Figura 1 – Localização do município de Santa Maria no estado do Rio Grande do Sul. As características naturais e o tamanho dos estabelecimentos são 90 determinantes no uso e ocupação do solo, pois determinam o tipo de atividade agrícola que poderá se desenvolver. Neste sentido, cada distrito apresenta características especificas o que possibilita o desenvolvimento de diferentes atividades. O espaço rural de Santa Maria - RS é um espaço heterogêneo, pois, comporta uma diversidade de atores sociais. Materializam-se no espaço a pequena propriedade19, a média propriedade e a grande propriedade. Cada tipo de propriedade possui especificidades que as diferenciam entre si. A complexidade de realidades existentes dentro do espaço geográfico está evidenciada nas características distintas presentes no território. Em toda a região do Rio Grande do Sul, assim como em Santa Maria/RS, a impossibilidade que os agricultores familiares encontram para adquirir novas terras ocasiona à exploração desenfreada dos recursos naturais. Ao longo dos anos, esse processo tem ocasionado à perda da fertilidade natural dos solos e a contaminação dos recursos hídricos, ocasionando queda na rentabilidade da agricultura. Dentro dessa perspectiva, os espaços rurais estão em constante transformação, modificados diariamente pelas atividades realizadas em seu espaço. Na contemporaneidade o foco das discussões para o desenvolvimento dos espaços rurais embasa-se na análise do território e ambiente. A valorização dos recursos naturais e das potencialidades locais tem possibilitado novas dinâmicas econômicas para os territórios. Os agentes territoriais interessados neste novo mercado evidenciam-no como um espaço onde se tem qualidade da vida e bem-estar, criando novos usos, principalmente através dos condomínios rurais fechados, das chácaras de lazer e do turismo rural. Reiterando estas afirmativas Graziano Silva et al. (1997, p.14) salienta que; ... o processo de geração de “novas” atividades no meio rural brasileiro mostra pelo menos duas características comuns. A primeira refere-se ao fato de que elas se originaram de importações de outros Países, e a segunda se refere às atividades que antes não eram comerciais, isto é tinham apenas valores de uso e não valores de troca. Em ambos os casos o importante é que se criam novos espaços de reprodução do capital no meio rural brasileiro, muitas vezes revigorando regiões e/ou atividades tradicionais que se mostravam decadentes .... Constata-se que no Distrito de Arroio Grande em Santa Maria/RS está mais inserida na segunda opção. Muitas atividades que outrora tinham somente valor de 19 Pequena propriedade é aquela que possui área entre um quatro módulos fiscais. Média propriedade aquela que possui área superior quatro e até 15 módulos fiscais. Grande propriedade aquela que possuir mais que 15 módulos fiscais (Lei 8629/93). 91 uso passaram a ter valor de troca, exemplos são as atividades relacionadas ao turismo rural. O turismo é um fenômeno social que consiste no deslocamento voluntário e temporário de indivíduos ou grupos de pessoas que, fundamentalmente por motivos de recreação, descanso, cultura ou saúde, saem de seu local de residência habitual para outro, no qual não exercem nenhuma atividade lucrativa nem remunerada, gerando múltiplas inter-relações de importância social, econômica e cultural (DE LA TORRE, 1992, p.15). Desta forma, novos usos e funções surgem e ressurgem cotidianamente para a agricultura familiar, no Distrito de Arroio Grande estas tendências também se manifestam nos territórios, através de diversas atividades entre elas o turismo rural. O Ministério do turismo compreende que o turismo rural representa o “conjunto das atividades turísticas desenvolvidas no meio rural, comprometidas com a produção agropecuária, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural da comunidade”. Ainda evidencia que o meio rural pode ser “aproveitado para o turismo, mas não só as propriedades, como também os atrativos e produtos existentes no campo podem ser uma opção para os turistas e uma oportunidade para os que nele vivem”. Neste contexto, são passíveis de serem explorados economicamente nos territórios atividades como: Bebidas e alimentos in natura – cereais, peixes, frutas, legumes, verduras orgânicas – ou processadas – vinho, doces, mel, pão, Artesanato e outros produtos associados ao turismo, criação de animais, atividades eqüestres e de pesca, atividades de ecoturismo, esportes de aventura, caminhadas, atividades folclóricas, música, dança, tradições religiosas, gastronomia, saberes e fazeres locais, atividades recreativas no meio rural, visitação a fazendas, casas de cultura e ao patrimônio (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2014). De forma geral, pode-se dizer que estas atividades estão presentes nos espaços rurais e urbanos de Santa Maria. As distintas características encontradas em seu território tornam o município atrativo ao desenvolvimento de diversas atividades entre elas o turismo rural. Santa Maria possui segundo o Plano Municipal de Turismo (2009, p. 10) “uma atratividade peculiar em virtude de sua privilegiada localização geográfica, permitindo contemplar cenários formados por montanhas, morros e vales em uma única imagem”. Nos distritos, especialmente em Arroio Grande, há uma natureza exuberante e herança histórico-cultural, que garante um lazer recheado de tipicidades. Atualmente, tramitam na Prefeitura de Santa Maria vários projetos que procuram dar visibilidade aos distritos rurais, esses buscam acima de tudo tornar os espaços mais dinamizados e atrativos ao público urbano. Contudo, de forma 92 consolidada para o turismo rural se tem somente a Rota Gastronômica de Santa Maria – Silveira Martins. Esta rota possui 43 pontos de visitação, que vão segundo o Plano Municipal de Turismo (2009, p. 59) do Distrito de Arroio Grande a Silveira Martins, o berço da colonização italiana. “No roteiro, há fábricas de facas, restaurantes, agroindústrias, balneários, belvederes, monumentos, igrejas, capelas, um museu e espaços dedicados ao Turismo ecológico, de aventura e rural”. Esta rota de turismo rural é estruturada e dinamizada, sua potencialidade de crescimento está relacionada à infraestrutura de acesso. A maior parte do trajeto é asfaltada e bem sinalizada, no caminho estão dispostas várias placas direcionando os turistas aos pontos onde os serviços são ofertados. A disponibilidade dos serviços de telefonia, rede elétrica, assim como a produção primária diversificada e a produção artesanal de produtos de origem local são elementos que contribuem de forma significativa para o desenvolvimento da Rota Gastronômica. A procura ocorre principalmente pelos restaurantes que oferecem comida típica italiana, assim como, a beleza das paisagens naturais existentes na região. A valorização da cultura por meio da gastronomia está agregando valor na renda dos agricultores e produzindo oportunidades de emprego no espaço rural, tornando o espaço atrativo principalmente para os jovens residentes. Além de contribuir para o aumento da auto-estima dos agricultores, pela melhoria do visual e do ambiente rural. É também uma estratégia para preservar a cultura e a tradição colonial. O que se percebe é que no Distrito de Arroio Grande novas territorialidades vão surgindo e o capital ao longo dos anos vem articulando alguns territórios e fragmentando/marginalizando outros. Neste contexto, os espaços dinamizados são aqueles que apresentam infraestrutura e serviços adequados para o turismo rural. Conclusões De forma geral no Brasil, percebe-se que nos mais diferenciados territórios ocorre o desenvolvimento desigual e contraditório. E o agricultor familiar inserido nesse processo historicamente é confrontado com problemas de ordem estrutural e funcional. Os projetos que incentivam a produção familiar, assim como, as atividades implementadas, têm gerado maior dinamismo econômico aos estabelecimentos agrícolas. Atualmente, não existem alternativas prontas, construídas para a agricultura familiar, o que existe são estratégias que em curto prazo mantém os produtores no espaço rural. As alternativas colocadas para a diversificação no meio rural devem 93 acima de tudo qualificar a atividades desenvolvidas pelos agricultores familiares. Para viabilizar o estabelecimento os agricultores investem em várias atividades e posteriormente mantem o foco em atividades que oferecem maior retorno. Este fato comprova a multifuncionalidade e a pluriatividade do espaço rural de Santa Maria, cujos agricultores realizam uma busca constante de alternativas para garantir a reprodução social das famílias. Dentro destas alternativas, está o turismo rural. O turismo rural é uma atividade que surge nos distritos do município, e está se tornando uma alternativa de renda complementar, contribuindo para o aumento da auto-estima dos agricultores, pela melhoria do visual e do ambiente rural. No entanto, não se pode deixar de evidenciar que esta atividade também se consolida pelo interesse que o capitalismo tem em se apropriar do espaço através dos mais diferentes tipos de atividades. Atualmente esta é uma atividade pouco promissora em termos de desenvolvimento socioeconômico, pois a procura pelas rotas do turismo rural ainda é pequena. A precariedade na infra-estrutura é um agravante ao desenvolvimento da atividade. As diferenças econômicas e sociais encontradas dentro dos diferentes espaços rurais de Santa Maria são expressivas, o que leva a constatação de que os programas implementados pelo Governo Municipal não estão atingindo de fato todos os espaços. Muitos espaços rurais vêm perdendo sua vitalidade econômica, tornando-se vazios e pouco atrativos aos agentes que mobilizam o território. E a agricultura familiar, para sobreviver neste modelo econômico excludente precisa se reinventar constantemente, se adaptar aos novos rearranjos espaciais. Neste sentido, pode-se destacar que o espaço geográfico não é inerente às ações humanas, ele próprio é parte dessas ações, é reflexo e condição das materializações do processo de reprodução da sociedade. Referencias CLAVIJO, G. El território em tiemposposmodernos y de globalización: una visión crítica. In: Domingues, A. y Pesce, F. (Org).Lecturas y Analisis: desde La (s) geografia (s) 2. San Martin:ANEP, 2011. DE LA TORRE, P.O. 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Tais estruturas, vistas do alto, podem ser enquadradas como geoglifos, instigando a curiosidade e despertando interesse em relação a historia de sua construção e funcionalidade no RS. Nesse sentido, o presente trabalho apresenta o mapeamento destas estruturas e discute seu potencial de aproveitamento turístico no território do Alto Camaquã, onde a existência de um vasto geopatrimônio e a possibilidade de criação de um futuro geoparque, pode agregar valor a partir da incorporação de alguns destes sítios culturais tipicamente pampeanos. Na área estudada foram identificados 211 geoglifos, distribuídos em um alinhamento preferencial de sentido NW – SE, coincidindo com a direção geral de muitas estruturas tectônicas do Escudo Sul-Rio-Grandense, o que pode indicar um certo favorecimento geomorfológico para uma das possíveis rotas utilizadas durante o ciclo tropeiro no Sul do Brasil no século XIX. Ressalta-se a necessidade de estudos mais aprofundados sobre esta temática, salientando seu valor patrimonial e o respectivo potencial de qualificação turística para este território. Palavras-chave: geoglifos; valor turístico; Alto Camaquã; Pampa. Introdução O processo histórico de ocupação moderna do Rio Grande do Sul teve início com a introdução do gado pelos jesuítas no século XVII. Este processo, marcado pela evangelização das populações indígenas, incluíam as atividades de preia do gado no campo e a sua guarda em estruturas conhecidas como currais (encerras) e cercas utilizadas para o manejo destes animais. Vistos do alto, os vestígios de tais estruturas (muitas das quais reconstruídas nos séculos seguintes e materializadas até hoje na paisagem) podem ser enquadradas como geoglifos, semelhantes às estruturas descobertas na Amazônia ocidental na última década (SCHAAN et al, 2007, 2010), 20 Doutoranda em Geografia pela UFSM, [email protected] Mestranda em Geografia pela UFSM, [email protected] 22 Prof. Dr. Departamento de Geociências da UFSM, pesquisador do Grupo de Pesquisas em Patrimônio Natural, Geoconservação e Gestão das Águas (PANGEA) [email protected] 21 97 porém, supostamente com outras finalidades. Assim, os geoglifos podem ser entendidos como estruturas geométricas marcadas no solo, em alto ou baixo relevo, que despertam a curiosidade sobre suas verdadeiras origens e funções e que representam um patrimônio cultural do território. A partir do conhecimento do grande número de geoglifos encontrados no sudoeste do RS, especificamente no território do Alto Camaquã, o presente trabalho tem a finalidade de apresentar o mapeamento destas estruturas e discutir o aproveitamento turístico das mesmas, como atrativos adicionais, associados ao já conhecido potencial geoturístico deste território (BORBA et al, 2013; GARCIA et al, 2013; BORBA, 2014). A metodologia de trabalho partiu de fontes bibliográficas e documentais, que permitiram a revisão dos temas em estudo. Para o mapeamento das estruturas foram revisados e filtrados os dados sobre os geoglifos da região Sudoeste do RS23 produzidos por Farias (2010). A partir destas informações, os dados foram salvos em formato KML e através da utilização do software GPSTrackMaker® PRO, foram extraídas as informações de coordenadas geográficas de cada geoglifo existente dentro da área do Alto Camaquã. Através do software ArcGIS® 10 com o aplicativo ArcMap™ esses dados foram organizados em shapefile (extensão e formato de dados no software citado) com a ferramenta “Editor”, para posterior espacialização. Para conferência das informações, os geoglifos marcados foram verificados um a um através do software Google Earth®, com imagens de satélite datadas de junho de 2014, tendo havido modificações em relação a demarcação inicial dos geoglifos realizada por Farias (2010). A constatação nas imagens demonstrou que algumas demarcações não estavam relacionadas com a presença de geoglifos, tendo sido estes pontos em desacordo editados pela ferramenta “Editor” do ArcGIS®. Os Geoglifos do Rio Grande do Sul No Rio Grande do Sul (RS), uma grade quantidade de cercas ou mangueiras (currais) construídos com pedras, madeiras e árvores plantadas em alinhamento circular ou apenas em formato de valas na terra, representam, na sua maior parte, testemunhos atuais de estruturas pretéritas da atividade pecuária, desenvolvida no estado a partir da introdução do gado no século XVII. Estas estruturas teriam sido 23 4https://www.google.com/maps/d/u/0/viewer?mid=zQgcM1ziUZ-Y.kYRgScb1gD8&hl=en_US, acessado em julho de 2015. 98 construídas, conforme fontes históricas e documentais, entre os séculos XVII e XIX, antes da chegada do arame de aço ao RS, que ocorreu por volta de 1870. Farias (2010, p.1-2) esclarece a funcionalidade e como eram construídas estas estruturas, antes da chegada do arame de aço: (...) Antes disso, as cercas eram feitas com muros de pedra ou com outros materiais como valas cavadas no chão, madeira beneficiada, ananás, bananeiras, pessegueiros e outras árvores frutíferas, bromélias, espinheiros, cana, cactos e até de pau-a-pique. Diferentes fontes falam das rotas usadas para transporte de vacas, cavalos e mulas passando por essa região já a partir do século XVIII, e foi encontrada em um antigo inventário menção a uma Estrada Real passando pelo local no século XIX. (...) Existem também inúmeras citações dos currais sendo usados pelos colonizadores da região durante o século XVIII, na época da preia do gado cimarrón, antes pertencente aos jesuítas. Segundo mapas antigos e outras referências, os tropeiros que transportavam esses animais realmente passavam por ali, além de fotos e textos situarem alguns desses currais de pau-a-pique e de pedra nos atuais municípios gaúchos de Pelotas, Capão do Leão, Aceguá, Bagé e em outras cidades próximas. Os currais ou mangueiras, como são comumente denominados pela cultura gaúcha, tinham sua funcionalidade associada ao gado, construídos em locais estratégicos (rotas) que eram utilizadas por tropeiros24 que viajavam levando o gado, ou como encerras para o simples manejo dos animais (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2006). Maestri (2010, p.78) aborda o início desta atividade no Sul do Brasil: O ciclo tropeiro do Sul do Brasil desenvolveu-se, sobretudo, a partir do transporte e comercialização de mulas. (...) Nos séculos 16, 17 e 18, as mulas foram utilizadas intensamente em múltiplas atividades de transporte de homens e mercadorias, sobretudo nas zonas de mineração da América hispânica e lusitana. (...) No século 18, os muares foram utilizados intensamente nas regiões auríferas e diamantíferas do Brasil. A partir século XVIII, o tropeiro partia da região Sudeste até os campos do Pampa, em busca do gado. Após a preia, seguiam em grandes comitivas, interrompendo suas viagens durante a noite para descansar e se alimentar, surgindo assim, postos de descanso e pernoite, com currais e casas de moradia, que mais tarde comumente se orientaram à criação animal (MAESTRI, 2010). A região Sudoeste do RS concentra a maior parte dos currais e cercas construídas para a encerra do gado vacum, de muares e equinos, mas também podem ser encontradas no Uruguai e Argentina (de onde grande parte dos animais eram contrabandeados das possessões espanholas) e nos Estados de Santa Catarina e 24 O termo tropeiro, conforme destaca Maestri (2010, p.78) descreve “o financiador e os trabalhadores, especializados ou não, que se dedicavam ao transporte de quantidades de animais, sobretudo muares, cavalares e vacuns, de uma região para outra, através de longas distâncias”. 99 Paraná. O tropeirismo, durante o ciclo minerador, articulou as regiões Centro-Sul do Brasil, através os atuais territórios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, justificando a construção destas estruturas utilizadas para encerra do gado, em rotas que seguiam até Sorocaba (SP), onde os animais eram comercializados em grandes feiras, e depois levados a outros estados brasileiros. A construção destas estruturas pode ser classificada em quatro tipos distintos: currais circulares construídos a partir do empilhamento de pedras; currais circulares formados a partir de valas e muretas de terra; currais circulares configurados a partir de árvores plantadas em alinhamento circular e, ainda, cercas retilíneas, formadas pelo empilhamento de pedras. Além das estruturas em formato circular e das cercas retilíneas, podem ser encontrados currais em formatos retangulares. Na figura 1, algumas destas estruturas originais estão representadas nas pinturas do jesuíta Florian Paucke (1719-1780), missionário no Pampa hispânico do século XVIII. Algumas destas antigas estruturas, utilizadas no manejo do gado em diferentes períodos, tanto pelos indígenas quanto pelos espanhóis, foram aproveitadas e reconstruídas pelos tropeiros do século XIX, preservadas até hoje na paisagem do Pampa. 100 Figura 1 – Pinturas de Florian Paucke, em Iconografía Colonial Rioplatense (1749-1767), que ilustram a atividade de manejo com o gado em diferentes tipos de currais. Fonte – FARIAS, B. M. (2014). Vistas do alto, estas estruturas apresentam geralmente grandes dimensões, podendo ser enquadradas como geoglifos. Os geoglifos compreendem estruturas ou grandes figuras construídas na superfície do solo, “criando uma espécie de relevo”, facilmente visíveis a partir de locais altos, observações aéreas ou imagens de satélite, possuindo formas variadas, que vão desde configurações geométricas, até formas humanas (antropomorfas) ou de animais (zoomorfas). Presentes em diversos países e construídos com diferentes materiais, formas e tamanhos, o desconhecimento sobre seus significados torna o assunto intrigante e envolto em mistérios, existindo diversas teorias que vão desde explicações místicas, cerimoniais, calendários astronômicos, uso agrícola, ou como no caso do RS, construções destinadas a encerra para o gado. Uma grande quantidade de geoglifos podem ser encontrados especialmente na região Andina, em países como Peru, Chile e Bolívia. No sul do Peru, geoglifos 101 localizados no Deserto de Nasca25, descobertos em 1927, são os mais conhecidos e impressionantes exemplos destas estruturas, pois apresentam linhas que tomam formas bastante complexas. Conforme destacam Schaan, Bueno e Ranzi (2010), no início dos anos 1970 foram descobertas, através de vôos comerciais, algumas estruturas geométricas na Amazônia brasileira, no Estado do Acre. Estas estruturas, compostas por monumentais trincheiras e muretas de terra, foram identificadas por ocasião de um levantamento inicial de sítios arqueológicos realizado na região. Na época, pouca atenção lhes foi dada, uma vez que os pesquisadores estavam mais interessados em estudar restos de artefatos cerâmicos, com a finalidade de montar sequências seriadas que produzissem cronologias de ocupação (SCHAAN; BUENO; RANZI, 2010). Entretanto, com o intenso processo de desmatamento e construção de estradas, para o assentamento de fazendas e desenvolvimento da agricultura, revelaram-se sítios arqueológicos que estavam até então protegidos dentro da floresta (SCHAAN; BUENO; RANZI, 2010). A partir dos anos 1990, foi possível a identificação de centenas de geoglifos, concentrados na Amazônia Ocidental, localizados na porção leste do estado do Acre, atingindo o sul do estado do Amazonas, oeste de Rondônia e norte da Bolívia. No RS, as diversas estruturas, tem despertado a atenção de pesquisadores sobre sua origem e datação. A grande maioria parece ter sido originalmente construída entre os séculos XVIII e XIX, mas a delimitação de um período, bem como a origem das obras, comumente associada à mão de obra escrava, ainda é um ponto em discussão (ROSTAN, 2015). Algumas destas estruturas, visíveis através de softwares como o Google Earth, embora muito parecidas com os antigos currais, em razão do formato circular, possuem origem mais recente, resultado da atividade de doma de cavalos. Até pouco tempo, os currais construídos em formato circular eram interpretados apenas como locais recentes construídos para a encerra do gado. Essa função e origem, amplamente aceita por pesquisadores e pela cultura gaúcha, vem sendo questionada devido a semelhança com os geoglifos do Acre. A ideia lançada por pesquisadores que trabalham no estudo dos geoglifos do Acre de que nem todos os currais gaúchos tenham surgido a partir do ciclo tropeiro no Sul do Brasil ou as atividades de preia do gado do século XIX, mas que tenham origem anterior a isso, apimentou as discussões, levantando a hipótese de que os currais circulares de terra 25 Os geoglifos do Peru, também são conhecidos como as “linhas de Nasca”. 102 (em forma de vala) do RS, também pudessem estar associadas a povos précolombianos, como vem sendo apontado por estudos na Amazônia. Existem muitas controvérsias acerca da origem dos currais circulares de terra, já que nenhuma das estruturas do RS foi estudada através de escavações ou outros métodos de investigação arqueológica. Porém, o que se pode afirmar é que estudos aprofundados precisam ser realizados, bem como garantir a proteção e conservação dos “geoglifos gaúchos”, já que, estando associados ao início da atividade pecuária no RS ou à ocupação do território antes disso, por povos pré-colombianos, são símbolos culturais e evidências arqueológicas de extrema importância histórica e cultural, que incrementa valor turístico ao território do Alto Camaquã. Geoglifos no Alto Camaquã Uma grande quantidade de currais enquadrados como geoglifos neste estudo, pode ser encontrada nos municípios que compõem o território conhecido como Alto Camaquã, localizado na Metade Sul do RS. O Alto Camaquã compreende o terço superior da Bacia Hidrográfica do Rio Camaquã, inserido no contexto geológico do Escudo Cristalino Sul-rio-grandense e da Bacia Sedimentar do Camaquã, abrangendo os municípios de Bagé, Caçapava do Sul, Lavras do Sul, Santana da Boa Vista, Piratini, Pinheiro Machado, Dom Pedrito e Hulha Negra. Em virtude dessa complexidade do embasamento geológico e da diversidade de paleodinâmicas associadas, o conjunto de municípios que compõem este território apresenta feições geomorfológicas que lhe conferem um caráter singular na configuração da paisagem regional, formada pela diversidade de vales e serras, afloramentos rochosos e vegetação típica do Pampa (SEPLAG, 2008). A economia destes municípios é bastante diversificada, se destacando a pecuária extensiva com a criação de bovinos e ovinos, desenvolvida sobre campo nativo. Conforme salienta Neske (2009), na interface da evolução agrária do território do Alto Camaquã entre o período de colonização no século XVII até os dias atuais, a pecuária de corte permanece sendo a principal atividade produtiva, e foi a partir dessa atividade e das formas sociais coletivas a ela associadas, que se constituiu a identidade cultural deste território. Além das características naturais da paisagem, marcada pela grande quantidade de afloramentos rochosos que limitaram o desenvolvimento de uma agricultura moderna e mecanizada em grande parte do território, a própria história de ocupação explica a importância da atividade pecuária e da existência das cercas e currais nessa porção do Pampa. 103 Antes do interesse das Coroas Ibéricas pelo atual território do RS, o território do Pampa era habitado por povos indígenas caçadores, coletores, pescadores e horticultores incipientes, caracterizados pelas boleadeiras e pelas grandes lanças. O nome genérico desses povos, os charruas, era também o de um dos seus dois grandes braços – charruas e minuanos (MAESTRI, 2010). Após a introdução do gado por jesuítas espanhóis, no início do século XVII nas Missões Jesuíticas, uma grande área compreendida entre a Laguna dos Patos e os rios Jacuí no RS e Negro, no Uruguai, onde o gado chimarrão (selvagem) havia procriado em grande medida, passou a fazer parte da denominada Vaquerías del Mar (Vacaria do Mar) (MAESTRI, 2010), onde se situa o Alto Camaquã. Este gado solto nos campos era regularmente capturado por espanhóis e portugueses que buscavam, incialmente, o couro e o sebo para exportar para a Europa, e também por índios que habitavam o território. A partir desta origem geográfica e histórica, associada ao início da atividade tropeira no Sul do Brasil, se explica a grande quantidade de currais e cercas (geoglifos) para o trabalho com o gado, encontrados nos municípios que compõem o território do Alto Camaquã, conforme podemos observar na figura 2 (Mapa dos Geoglifos no Alto Camaquã-RS). Como pode ser observado na figura 2, há uma grande concentração de geoglifos em um alinhamento de direção NW – SE, coincidindo com a direção geral de muitas estruturas tectônicas do Escudo Sul-Rio-Grandense (VIERO e SILVA, 2010), o que pode indicar um certo favorecimento geomorfológico para uma das possíveis rotas utilizadas durante o ciclo tropeiro no Sul do Brasil no século XIX, tal como já apontado por Pereira e Cassol-Pinto (2014) para as rotas tropeiras do primeiro e segundo planaltos paranaenses. Ao todo foram identificados 211 geoglifos no Alto Camaquã, sendo que nos municípios de Caçapava do Sul e Santana da Boa Vista não foram encontrados geoglifos. Os municípios que mais contabilizaram geoglifos foram Piratini, com 91 geoglifos e Pinheiro Machado, com 45 geoglifos mapeados. Os demais municípios, como Bagé, totalizaram 34 geoglifos, Lavras do Sul, 19 geoglifos, Dom Pedrito 15 geoglifos e em Hulha Negra 7 geoglifos. A grande maioria dos geoglifos encontrados no Alto Camaquã está situado em propriedades rurais, sendo que alguns estão localizados em meio às áreas agrícolas. Quanto ao formato, predominam os circulares, sendo que também foram encontrados 5 geoglifos em formato retangular. Também foram encontrados alguns geoglifos situados na área urbana do município de Bagé. A figura 3 apresenta alguns exemplos de geoglifos do Alto Camaquã, com diferentes formatos e materiais de construção. 104 Através das imagens é possível observar que alguns apresentam árvores em sua circunferência, outros, constituem-se por valas circulares ou ainda muros de pedras. Figura 2 – Mapa dos Geoglifos dentro dos municípios que compõe o território do Alto Camaquã-RS. Org. – ANSCHAU, M. R. (2015). Em algumas propriedades rurais, onde se encontram geoglifos, estas estruturas vêm sendo danificadas e até mesmo destruídas devido ao 105 desinteresse ou mesmo à falta de conhecimento dos proprietários. Em Santa Vitoria do Palmar, onde currais de palmas26 (Butia capitata) são encontrados, o plantio de lavouras de arroz vem ameaçando este patrimônio e os condenando ao desaparecimento. Os agrotóxicos, bem como a grande quantidade de água, utilizados para o plantio do arroz nas lavouras, prejudicam e matam as antigas palmeiras (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2006). Figura 3 – Exemplos de geoglifos encontrados em municípios do Alto Camaquã, RS. Fonte – Google Earth, datadas em junho de 2014. Estes monumentos sobrevivem ao tempo sem que haja estudos mais detalhados ou mesmo iniciativas de preservação viabilizada por órgãos como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) ou Estadual (IPHAE), responsável pela proteção deste tipo de patrimônio no Brasil ou no estado. Até o momento, nenhum destes geoglifos integram o livro de tombo do IPHAN. 26 Os currais de palmas, encontrados em Santa Vitória do Palmar, possuem características bastante particulares em relação ao restante dos currais ou geoglifos encontrados no restante do RS. O material utilizado para a elaboração destas encerras para o gado, a palma, era transplantada, e depois as plantas eram balizadas com tiras de couro, formando uma barreira que impedia que o gado fugisse (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 2006). Na cidade de Castillo, Departamento de Rocha (Uruguai), existem currais de palmas semelhantes aos de Santa Vitória do Palmar. 106 Perspectivas para o aproveitamento turístico dos Geoglifos no Alto Camaquã A configuração natural da paisagem do Alto Camaquã, caracterizada pela marcante presença de aspectos macroestruturais do patrimônio natural, apresenta um grande potencial para o desenvolvimento territorial baseado no aproveitamento turístico. A importância e diversidade do geopatrimônio presente nestes municípios, pode ser exemplificada através de formações geológico-geomorfológicas singulares como as Guaritas e a Pedra do Segredo, em Caçapava do Sul ou a Casa de Pedra e o Rincão do Inferno, em Bagé, entre outras, que se destacam pela beleza cênica e pelo potencial de desenvolvimento do Geoturismo. O Geoturismo pode ser definido como uma tipologia do turismo de natureza, onde o principal interesse do turista centra-se no conhecimento e na interpretação de aspectos geológicos e geomorfológicos de um determinado local. Para Hose (2000, p. 136) o Geoturismo caracteriza-se pela: (...) provisão de facilidades interpretativas e serviços para promover o valor e os benefícios sociais de lugares e materiais geológicos e geomorfológicos e assegurar sua conservação, para o uso de estudantes e turistas e outras pessoas com interesse recreativo ou de lazer. Nesse sentido, o Geoturismo centra seu interesse no conjunto de elementos geológico-geomorfológicos de um território, identificados como de especial importância cultural, científica, educacional e/ou turística, denominados de geopatrimônio, devendo ser conservados pelo seu valor patrimonial. Além das características naturais citadas, o conjunto de referências culturais, associadas aos recursos paisagísticos disponíveis e ao saber fazer local das comunidades, conferem ao Alto Camaquã um potencial turístico especial. No RS alguns roteiros turísticos temáticos integram os municípios que compõem o Alto Camaquã, entre os quais se destaca o roteiro “Caminho Farroupilha Cultura e Tradição Gaúcha”, incluído na Região Turística do Pampa. Neste roteiro são ressaltadas as características da cultura gaúcha ligadas ao Pampa e à figura do gaúcho. Além dessa peculiaridade é enaltecido o resgate da história da formação das estâncias, das charqueadas, das lidas campeiras e da produção pecuária, da Revolução Farroupilha e Federalista, das características ambientais do Pampa, da hospitalidade do povo gaúcho e sua cultura. Este conjunto de referências, em termos de patrimônio natural e históricocultural, englobaria, também, os diversos geoglifos (currais e cercas) encontrados 107 nestes municípios, enriquecendo as oportunidades de geração de renda através do desenvolvimento do turismo, de forma sustentável e diferenciada de outros roteiros do Estado do RS. Ao encontro desta perspectiva, contemplando a conservação e valorização de paisagens e principalmente como uma estratégia de desenvolvimento territorial sustentável, tem se destacado a criação de geoparques. Geoparques são territórios com área bem delimitada, que integram uma estratégia de desenvolvimento territorial baseada no Geoturismo, através da atração turística desempenhada pelo geopatrimônio, visando a sua conservação e a melhoria da qualidade de vida das comunidades locais (FARSANI et al., 2012). A incorporação de um geoparque na Rede Global de Geoparques (Global Geoparks Network/GGN), criada em 2004, conta com o reconhecimento da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), através de uma marca atribuída às áreas com significativo geopatrimônio e que efetivamente o utilizem para a geração de desenvolvimento local. Em estudos recentes, alguns pesquisadores com o apoio da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais ou Serviço Geológico do Brasil (CPRM) vêm propondo o reconhecimento de geossítios inventariados no Alto Camaquã, a exemplo das Guaritas, de caráter sedimentar e especial relevância geomorfológica e das Minas do Camaquã, vinculado à história da mineração em Caçapava do Sul, com potencial para a criação de um geoparque27. Dentro de um geoparque, além de locais que se destacam em termos de patrimônio natural, é valorizado também o patrimônio cultural das comunidades locais, sendo incentivada a promoção e comercialização de produtos tradicionais, como no caso do artesanato, gêneros alimentícios ligados à gastronomia típica, condução turística, entre outros, que contam com certificação atrelada ao geoparque28. Conforme salienta Schobbenhaus (2010), o impacto local é imediato, reforçando a identificação da população com sua região e promovendo a criação de empreendimentos locais inovadores, como pequenos negócios de hospedagem e alimentação, gerando novos empregos e fontes de renda. Neste sentido, acreditamos que a criação de um Geoparque no Alto Camaquã pode oferecer ao território uma alternativa de aproveitamento sustentável de seu 27 Além dos estudos realizados pela SIGEP e CPRM em Caçapava do Sul, outros pesquisadores que trabalham com o geopatrimônio no Alto Camaquã, integrantes do grupo PANGEA da UFSM, vem apontando o potencial geoturístico do território e a possibilidade de criação de um geoparque integrando os municípios. 28 Os produtos promovidos e comercializados dentro de um geoparque, recebem a denominação de “geoprodutos”. 108 patrimônio natural e histórico-cultural pelas comunidades locais. Atrelado a este geoparque deveria ser pensada a valorização e visitação a alguns destes geoglifos aqui identificados, como sítios de interesse cultural, associados à memória da preia do gado, à introdução da pecuária no RS e às rotas criadas pelos tropeiros no Sudoeste do RS. Assim, roteiros integrados, considerando de um lado o patrimônio natural, e de outro, o patrimônio cultural, incluindo a visitação aos geoglifos existentes no Alto Camaquã, constitui uma opção bastante inovadora dentro do contexto turístico do RS, principalmente se configurada dentro do território de um geoparque. Conclusões A análise e mapeamento dos currais no Alto Camaquã pode confirmar sua característica de geoglifos, assumida por suas evidências em alto e baixo relevo, deixadas como marca na superfície do solo. Através da pesquisa do referencial teórico sobre a temática deste estudo foi possível constatar que há uma carência em estudos relativos aos geoglifos do RS, principalmente no que se refere a vinculação dessas estruturas a sua funcionalidade, associada, muito provavelmente, ao início da atividade pecuária no Sul do Brasil. Apesar da carência de estudos para a identificação da origem dos geoglifos, as hipóteses levantadas sobre sua origem, instigam por si só a curiosidade e o interesse de visitantes, desempenhando um forte papel de atratividade turística. Através do mapeamento dos currais e da sua verificação através de imagens pelo software Google Earth®, pode-se constatar a localização da maioria destas estruturas próxima a estradas, assinalando também a observação de condições apropriadas de relevo às atividades tropeiras, sendo, portanto, características que podem confirmar a utilização de antigas rotas no alinhamento estrutural NW – SE no território do Alto Camaquã. Além disso, salienta-se que os currais apresentados neste estudo, acabam por integrar o patrimônio cultural do RS, associado ao manejo do gado pelos antigos povos que habitavam o estado. Para tanto, são necessários estudos específicos sobre os currais, com pesquisas arqueológicas que fortaleçam essa hipótese, ou como no caso de pesquisas mais avançadas sobre o tropeirismo, desenvolvidas por Pereira e Cassol-Pinto (2014) no Paraná, onde estas estruturas associados às rotas dos tropeiros, foram condicionadas pela geomorfologia da região. 109 As características singulares da paisagem do Alto Camaquã apresentam um conjunto de referências naturais e culturais de grande potencial para o aproveitamento geoturístico, evidenciando a proposição e criação do “Geoparque Alto Camaquã”. A partir do conhecimento e divulgação deste tipo de patrimônio, especialmente devido à conotação intrigante associada ao tema “geoglifos”, entende-se que medidas de conservação e proteção destas estruturas devam ser seguidas de planos de interpretação direcionados aos turistas, fornecendo informações que levem ao seu entendimento e devida valorização. BIBLIOGRAFIA BARRETTINO, D.; WINBLEDON, W. A. P. GALEGO, E. (Eds.). (2000). Geological Heritage: Its Conservation Management. Madrid: Sociedad Geologica de Espana/Instituto Technologico GeoMinero de Espana/ProGeo. BORBA, A.W. (2014). Perspectivas para a pesquisa e a atuação em geoconservação na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) com foco nas áreas menos desenvolvidas do Brasil meridional. Ciência e Natura, Santa Maria, 36, 66-172. BORBA, A.W.; SOUZA, L.F.; MIZUSAKI, A.M.P.; ALMEIDA, D.P.M.; STUMPF, P.P. (2013). 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Porto Alegre: CPRM. 112 TRANSFORMAÇÕES NO PAMPA ADVINDAS DA GLOBALIZAÇÃO: UM RECORTE PARA A FRONTEIRA BRASIL –URUGUAI Tatiane AlmeidaNetto 29Programa de Pós-Graduação em Geografia-PPGGEO/UFSM; E-mail: [email protected] RESUMO Ao longo do século XIX o território do Pampa apresenta alteração em seu cenário com a introdução de uma política de desenvolvimento economicista que compreende tensões territoriais e apresenta a multiterritorialidade como característica. O objetivo do trabalho é promover a reflexão sobre as tensões territoriais advindas da globalização e da influência do capital que acarretam as transformações na dinâmica produtiva do território do Pampa e apresenta como recorte empírico a fronteira BrasilUruguai, especificamente as cidades gêmeas Santana do Livramento e o Departamento de Rivera. Metodologicamente utilizam-se de instrumentos como a pesquisa documental, bibliográfica, observação direta e entrevista semiestruturada com informantes qualificados. Os resultados apontam o espaço rural compreendido como território de incorporação do capital derivados da transformação agrária e das inter-relações sociais do mesmo com o ambiente. Conclui-se que os territórios são formados por uma relação híbrida entre global e local e a dinâmica agrícola presente neste espaço fronteira Brasil-Uruguai influencia diretamente as relações sociais, portanto os sujeitos presentes e resultantes desta dinâmica. A transformação na dinâmica territorial é observada na diversidade de sujeitos, na modernização das atividades, inserção de tecnologias e introdução de novos cultivos. Palavras chave: Território; Pampa; Rural; Relações sociais; Sujeitos. RESUMÉM En el territorio del siglo XIX Pampa presenta cambios en su situación con la introducción de una política de desarrollo economicista que comprende las tensiones territoriales y presenta la multiterritorialidade tan característico. El objetivo es promover la reflexión sobre las tensiones territoriales derivados de la globalización y la influencia de la capital que causan los cambios en la dinámica productiva del territorio de la Pampa y tiene el corte empírico de la frontera entre Brasil y Uruguay, específicamente las ciudades gemelas de Santana do Livramento y Departamento de Rivera. Metodológicamente se utilizan instrumentos como investigación documental, la literatura, la observación directa y entrevistas semi-estructuradas con informantes calificados. Los resultados indican el campo entendido como el territorio de incorporación de la capital derivados de la transformación agraria y las interrelaciones sociales de la misma con el medio ambiente. Llega a la conclusión de que los territorios son formados por una relación híbrido entre presentes agrícola y dinámica global y local en este espacio de frontera entre Brasil y Uruguay influye directamente en las relaciones sociales, por lo que el presente y el resultado de este tema dinámico. La transformación de las dinámicas territoriales se observa en la diversidad de los sujetos, en la modernización de las actividades, la integración de las tecnologías y la introducción de nuevos cultivos. Palabras-clave: Territorio; Pampa; Rural; Relacionessociales; Sujetos. INTRODUÇÃO 29 Engenheira Florestal (UFSM), Especialista em Geomática (UFSM), Mestre em Extensão Rural (PPGExR/UFSM), Doutoranda em Geografia (PPGGEO/UFSM). Santa Maria, RS/Brasil. 113 O Bioma Pampa hoje adentra as discussões na academia devido a sua biodiversidade e riqueza sociocultural, na qual está diversidade, paisagens e saberes estão ameaçados pela introdução de novas alternativas que descaracterizam a evolução social e biológica do Bioma Pampa (SUERTEGARAY e SILVA, 2009). O Bioma Pampa está localizado entre 34º e 30º latitude sul e 57° e 63° latitude oeste, abrange regiões pastoris de planícies em três países da América do Sul, sendo estes: cerca de dois terços do estado brasileiro Rio Grande do Sul, as províncias argentinas de: Buenos Aires, La Pampa, Santa Fé, Entrerríos e Corrientes e a República Oriental do Uruguai. (SUERTEGARAY e SILVA, 2009, p. 45) (Figura1). Figura1- Localização do Bioma Pampa na América Latina. Elaboração do autor, 2013. Observa-se no Pampa a formação de múltiplos territórios formados a partir das classes sociais presentes e suas relações em conflito e disputa pelo poder e controle. Nesse sentido, podemos identificar multiterritórios, não somente aqueles identificados pelo uso como o trinômio que representa a produtividade: bovino, rizicultura e silvicultura e sim a presença de um território formado também pela identidade do gaúcho. Território formado a partir da integração entre o homem e a natureza, interação esta que pode ser constatada nas letras das canções nativas, no artesanato 114 com lãs, na gastronomia e festas típicas que ultrapassam as fronteiras de Estados interligando três nações distintas, o Sul do Brasil, o Uruguai e a Argentina. Os temas da globalização, da presença de capital estrangeiro, da industrialização, da agricultura flexível interferem diretamente na estrutura social agrária provocando tensões territoriais.O trabalho presente tem como objetivo a reflexão sobre as tensões territoriais advindas da globalização e da influência do capital que acarretam as transformações na dinâmica produtiva do território do Pampa. O presente estudo apresenta como recorte empírico a fronteira Brasil-Uruguai, especificamente as cidades gêmeas Santana do Livramento e o Departamento de Rivera. METODOLOGIA A pesquisa considera-se um estudo exploratório e descritivo e se utiliza de ferramentas como a pesquisa bibliográfica, observação direta e pesquisa documental através da coleta de dados dos Censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Censo 2011 Uruguay Instituto Nacional de Estadística (INE), do Censo Agropecuário 2011 Estadísticas Agropecuárias (DIEA) vinculados ao Ministerio de Ganadería, Agricultura y Pesca (MGAP). A área de estudo desta pesquisa se concentra no espaço denominado território do Pampa e apresenta recorte intencional para análise a fronteira Brasil-Uruguai. O recorte se faz necessário para apresentação da transformação da dinâmica agrária na fronteira nas últimas duas décadas, para tanto, foram realizadas 10 entrevistas semiestruturadas através da Mobilidade acadêmica da AUGM em setembro de 2014, com informantes chaves, entre eles: técnicos privados e/ou públicos, órgãos diretivos de fomento, instituições públicas e de ensino. Os entrevistados foram indicados pela UDELAR através da Unidade de Extensión e pela Sociedade de Fomento Rural de Rivera pela efetiva participação dos informantes na fronteira Brasil-Uruguai, especificamente nas cidades gêmeas30de Santana do Livramento e Departamento de Rivera. A INFLUÊNCIA DO CAPITALISMO NA DINÂMICA AGRÍCOLA 30 Segundo o Ministério da Integração Nacional do Brasil são considerados cidades-gêmeas os municípios cortados pela linha de fronteira, seja seca ou fluvial, integrada ou não por obra de infraestrutura, que apresentem grande potencial de integração econômica e cultural, podendo ou não apresentar a unificação de malha urbana com a cidade do país vizinho (DOU, 2014). 115 O processo de globalização, desde final do século XIX acarreta uma nova lógica industrial orientando o setor agrícola através de empresas agroindustriais transnacionais, que modificam as funções da agricultura em um setor com propósitos diversos. O Bioma Pampa ao longo do século está sendo alterado com a introdução e homogeneização de culturas agrícolas, quer seja silvicultura ou grãos. Monoculturas impostas pelo sistema capitalista na busca de produtividade, onde a paisagem pampeana está vivenciando uma crise na tradicional economia de criação de gado extensiva. (SUERTEGARAY e SILVA, 2009, p. 59). A modernização e a presença do capitalismo resultam em uma agricultura com um modelo de crescimento vinculado a uma estrutura produtiva, fordista e tecnológica, com pacotes tecnológicos difundidos/exigidos pelas empresas processadoras de alimentos. Incorpora-se na agricultura moderna o trabalho industrial exigindo dos produtores um comportamento empresarial e não mais familiar, condicionando a presença de trabalhadores assalariados (FLORES, 1998). A referida autora aponta que a dinâmica agrícola se transforma a partir da abordagem do capitalismo agrário, através da flexibilização da agricultura e das complexas relações da natureza com a sociedade que moldam as formas de produção e mercado presentes neste espaço. A agricultura flexível acarreta na diversificação produtiva, na incorporação de novas tecnologias e descentralização das empresas transnacionais com formação de redes e novas formas de organização do trabalho que se adaptam e se reorganizam e até refuncionalizam formas de produção tradicionais. Flores (1998) ao realizar uma análise social, desta produção agrícola observa distintas classes presentes, destacando-se o campesinato apoiado na lógica produtiva familiar. Para a referida autora a pobreza rural e a falta de alternativas para a manutenção de uma produção tradicional e de subsistência levam esses produtores a inserirem-se como trabalhadores eventuais, assalariados rurais, buscando uma complementação de renda, fenômeno este conhecido como a pluriatividade. Ao identificarmos a introdução de novos cultivos no território fronteira Brasil/ Uruguai, ligados às cadeias globais de valor31, tais como a soja e a silvicultura, observamos a reorganização deste espaço com a introdução de novas relações sociais. A partir de 2000 intensificam-se os estudos das cadeias globais de valor 31 Define-se cadeia de valor a representatividade das empresas e pessoas envolvidas na produção de um bem ou serviço, desde a sua concepção até o consumo final. Cadeias globais de valor podem ser compreendidas como a fragmentação, pelas empresas, de suas etapas de produção, distribuídas pelo mundo conforme vantagens de custos, insumos e logística (REIS e ALMEIDA, 2014). 116 (CGV), nas quais através da fragmentação da produção em âmbito mundial, possibilitariam aos países em desenvolvimento uma via rápida de industrialização através da captura de etapas ou tarefas dos elos das cadeias de valor. Para tanto, organizações econômicas internacionais como OCDE, Banco Mundial, OMC e UNCTAD estimulam a intensificação das políticas de liberalização comercial (VEIGA e RIOS, 2014). Embora as cadeias globais de valor, como o nome mesmo descreve, estejam inseridas mundialmente, autores como Baldwin, destacam uma regionalização destas cadeias em relação aos custos de deslocamento e às políticas comerciais (VEIGA e RIOS, 2014). A política de desenvolvimento economicista acarreta em acordos comerciais entre países vizinhos favorecendo o surgimento de cadeias regionais que alteram a dinâmica espacial frente à diversificação de sujeitos e compreendem tensões territoriais, uma vez que o território é fruto das relações de poder da diversidade destes sujeitos presentes neste espaço. As relações impostas no território não são derivadas somente dos seres humanos e seu espaço, e sim de diversos atores, entre eles e o espaço, na qual as relações de inclusão e exclusão resultantes desta dinâmica definem o território e a territorialidade. A organização em redes observada como exemplo na cadeia de soja insere-se no Bioma Pampa desterritorializando-o, modificando a relação entre os produtores e orientando novas espacializações (GUIBERT et al, 2011). A agricultura hoje enfrenta cada vez mais mudanças tecnológicas em virtude do produtivismo do paradigma do capitalismo agrário. Flores (1998) aponta que as mudanças tecnológicas, e a intensificação de pacotes tecnológicos emergem sempre no intuito de criar uma natureza com imagem e semelhança do capital, como exemplo a inserção de transgênicos, nanotecnologia e agricultura de precisão. Atualmente se tem presente a influência da globalização, da informação, da tecnologia que dão origem ao capital virtual, resulta no território na inserção de redes, onde os gigantes coorporativos se apropriam da biodiversidade desterritorializam comunidades e destroem culturas (BARTRA, 2006). AS TRANSFORMAÇÕES DO PAMPA: FRONTEIRA BRASIL-URUGUAI Brasil e Uruguai através das políticas de incentivos realizadas pelo MERCOSUL32 aumentaram na última década os números de produção de 32 OMercado Comum do Sul é um bloco econômico criado pelo Tratado de Assunção, em 1991, e conta atualmente com Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e, mais recentemente, com a 117 commodities. Entre 2000 e 2011, as reservas internacionais do Brasil e Uruguai cresceram 958% (de US$ 33,4 bilhões para US$ 353,8 bilhões) e 270,2% (de US$ 2,8 bilhões para US$ 10,4 bilhões), respectivamente (PINTO, 2013). Tanto no Brasil como no Uruguai a priorização de exportação segue em produtos do setor primário com níveis relativamente baixos de processamento. O avanço do agronegócio pode ser percebido no espaço rural da fronteira BrassilUruguai. Através das entrevistas percebe-se uma maior intensificação da cadeia de soja no lado brasileiro e da silvicultura no lado Uruguaio, embora ambas estejam presentes na fronteira. O território a partir da globalização apresenta múltiplas significações e uma crescente complexidade em referência às relações sociais presentes, onde novas categorias e novas vivências são reproduzidas constantemente formam-se então territórios-rede marcados pela descontinuidade e fragmentação. Haesbaert (2004) contextualiza multiterritorialidade como consequência do capitalismo e acumulação flexível dos sujeitos sociais que formam as relações presentes nestes territórios-rede. Na Fronteira Brasil/Uruguai observamos a inserção de uma agricultura capitalista que se territorializa com as cadeias globais de valor, promovendo conflito e desenvolvimento e ao mesmo temo expropriando o campesinato. Inicialmente no Brasil essa alteração ocorre na década de 60 com a introdução da soja, e no Uruguai com a introdução da silvicultura a partir da “LeyForestal” de 1987 (Ley 15.939/1987) favorecendo a homogeneização de cultivos agrícolas. Na fronteira Brasil/Uruguai, assim como na Bacia do Prata, a globalização proporciona a intensificação de terras agrícolas em detrimento de áreas de pastagens e uma transformação empresarial do setor agropecuário reduzindo a incidência de produtores familiares (GAUTREAU,2014). Os temas da globalização, da presença de capital estrangeiro, da industrialização, da agricultura flexível, nos últimos 10 anos, interferiram diretamente na estrutura social agrária. A partir da abordagem do capitalismo agrário se moldam as formas de produção e mercado presentes neste espaço. Na figura 02 representa a diversidade da produção agrícola presente na fronteira Brasil-Uruguai. Configura-se como representativo deste espaço o trinômio: bovino, rizicultura e silvicultura. Venezuela como países-membros. A política imposta pelo Mercosul objetiva a reorganização espacial e a especialização do agronegócio, na produção de commodities, especialmente da cadeia de proteína animal avançando na inserção global (WILKINSON, 2009). 118 Figura 2- Mapa temático Dinâmica Agrária na Fronteira Brasil- Uruguai Fonte: Elaboração do autor, 2015 A estrutura social apresentada na região da fronteira está diretamente ligada a estrutura agrária e conforme Piñeiro (2012) não houve significativa modificações nos últimos 20 anos em toda a América Latina, ou seja, continuam a representar a distribuição desigual em termos de posse da terra. Podemos identificar os sujeitos sociais presentes como: assalariados rurais, empresários rurais, campesinos e/ou produtores familiares. A transformação na dinâmica territorial é observada na diversidade de propriedades e na modernização das atividades. Ainda se observa propriedades tradicionais, com baixo investimento e consequentemente baixa rentabilidade, em contraste com outras empresariais, com maior grau de investimento, como exemplo deste tipo de racionalidade empresarial se identifica as cabanhas que investem em aprimoramento zootécnico. Podemos apontar as cabanhas como uma fase inicial na mudança do comportamento do pecuarista adotando um perfil mais empresarial, onde se iniciou a adoção do consórcio com a agricultura e o arrendamento da terra para a rizicultura (COSTA, 1987). O empresário rural é o que tem a posse da terra e emprega mão de obra assalariada (assalariados rurais), apresenta como dois subtipos distintos: o tradicional 119 estancieiro que resiste a inversão tecnológica, domina e se mantém pelas grandes quantias de posse de terra. E o mais recente ator, o empresário “agrícola-ganadeiro”, presente nas últimas quatro décadas do século XX (PIÑEIRO, 2012). As entrevistas realizadas com as informantes chaves destacaram uma transformação na dinâmica produtiva na fronteira, o tradicional sistema produtivo, a pecuária de corte, que está dando espaço a agricultura, seja a silvicultura ou a soja. A soja aparece consorciada com a cultura de arroz, perdendo espaço para esta em razão da rentabilidade. O empresário agropecuarista, ou seja, aquele que consorcia atividades agrícolas com pecuária realiza constantes inversões tecnológicas sobre a terra para garantir a produtividade, complementa sua produção pecuária com diversos cultivos agrícolas (arroz, cereais, oleaginosas, silvicultura). Nesse sentido apontamos a inserção das cadeias globais de valor. No Uruguai destacam a inserção de tecnologias, de novos modelos de gestão, junto a cadeia de agronegócio de cereais e oleaginosas, na produção de celulose e cadeia leiteira impulsionadas por políticas públicas e agropecuárias ampliando o mercado de compra e venda, assim como o arrendamento de terras e o trabalho assalariado rural (PAOLINO, 2014). A expansão agrícola no Uruguai aponta que até o ano de 2006 isto se dava em áreas de pecuária tradicional e recentemente, após 2006 já se integram a áreas novas e com aptidão agrícola (ACHKAR et al, 2011) As áreas de pecuária de corte se consolidam com a introdução de técnicas e manejos, onde o produtor cada vez mais se atualiza em busca da produtividade e sustentabilidade de seu sistema. Tal informação é comprovada com os dados do Censo Agropecuário do Uruguai que apresenta um aumento em pastagens artificiais, campos melhorados fertilizados, e com a introdução de cultivos forrageiros anuais, no ano de 2004 em Rivera apresentava uma área de 55.414 ha e em 2012 apresenta uma área superior com 96.071 ha (DIEA, 2006). A estrutura agrária presente na fronteira não é modificada, mas através desta nova dinâmica agrária surgem novas relações sociais, favorecendo o surgimento da pluriatividade e da multifuncionalidade do espaço rural. Os produtores familiares presentes podem ser tipificados em dois tipos: os capitalizados e os pluriativos. Portanto, se inserem na lógica produtivista para se manter na atualidade, diversificando a produção e utilizando de tecnologias, e quando não possuem capital de giro oferecem sua força de trabalho como mão de obra (pluriatividade). Através das entrevistas e dos dados do censo identifica-se que os produtores familiares presentes na fronteira Brasil-Uruguai em sua maioria são os pecuaristas, e os mesmos além de diversificação na produção com fumo e fruticulturapara se 120 manterem produzem também novas relações sociais, como o arrendamento de áreas de empresas florestais para o pastoreio do gado e a venda da força de trabalho na cadeia florestal, seja no momento do plantio ou da colheita. CONSIDERAÇÕES FINAIS O território do Pampa está sendo modificado em sua paisagem em decorrência das diversas relações de poder estabelecidas pela dinâmica produtiva e mercantilistas atreladas a política de desenvolvimento. Apresenta-se múltiplos territórios: o território da soja, da silvicultura, da pecuária. Muitos são os indícios e indicadores de uma transformação na dinâmica produtiva agrícola no espaço de fronteira Brasil/Uruguai, impulsionados pelas políticas e acordos comerciais advindos da abertura ao capital internacional. As perspectivas e alternativas de desenvolvimento do território estão cada vez mais dependentes das características dominantes, da economia mundial, e dos modelos produtivos vigentes. A demanda por alimentos e matéria prima favorecem países como Uruguai e Brasil a investirem na produção de matérias primas aliadas as cadeias globais de valor, na qual os países apostam em acordos de liberalização comercial, inovações nas tecnologias da informação e de comunicações e na logística, principalmente de transporte. Essa lógica não fica fora do território fronteira Brasil/Uruguai, prova disso é o aumento crescente da cadeia de soja e o fortalecimento da cadeia de silvicultura no Departamento de Rivera. A partir das observações de uma transformação na dinâmica produtiva agrícola na fronteira Brasil-Uruguai partimos para o entendimento de que um rural dinâmico está ressurgindo das organizações sociais advindas da atividade agrícola, um movimento de reorientação da capacidade produtiva da população rural com a absorção de novos componentes econômicos, culturais e sociais. Haja vista, que os territórios são formados por uma relação híbrida entre global e local a dinâmica agrícola presente neste espaço fronteira Brasil/Uruguai influencia diretamente as relações sociais, portanto os sujeitos presentes e resultantes desta dinâmica. Os entrevistados relataram a persistência de produtores na pecuária de corte pela tradição em manter a atividade e estarem voltados a vida campeira. Mas a atividade de pecuária está cada vez mais ameaçada seja pela diminuição de área de pastagem o que afeta diretamente os produtores familiares para a permanência na atividade e acabam por ter de relacionar-se com a cadeia florestal através de arrendamentos. Estes arrendamentos não são superiores a onze meses e não garantem o reconhecimento da sua classe. 121 As transformações territoriais podem resultar em perda da identidade local, na qual gera espaços produtivos, mas espaços sem representação política, social e totalmente dependente da economia global. Para o desenvolvimento sustentável emerge hoje que os territórios possuam as bases e poderes dissipados pela cooperação e reconhecimento da diversidade, da realidade e do contexto histórico presente neste espaço. Emerge então a reformulação de um novo paradigma, que possibilite um desenvolvimento sustentável, com participação dos atores e sujeitos sociais, um modelo endógeno baseado no diálogo, na participação para a promoção de abertura política e não econômica que faça a releitura da diversidade cultural e social do Território do Bioma Pampa para que não se perca a identidade e a valorização dos sujeitos representantes deste espaço, além da proteção da biodiversidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACHKAR,M. DOMINGUEZ A., DÍAZ I, PESCE F. La intensificacióndel uso agrícola delsueloenel litoral oeste delUruguayenla última década Pampa nº 07 . Suplemento especial temático. 2011. BARTRA, A. Del Capitan Swing a José Bové: lostrabajadoresdel campo contra elhombre de hierro. 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De Argentina a Uruguay: espacios y actoresen una nueva lógica de producción agrícola. Pampa nº 07 .Suplemento especial temático. 2011. HAESBAERT, R. da C. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004 PAOLINO, C. LasTransformacionesEstructuralesenel Sector Agroalimentario: el caso de Uruguay REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, v.35, n.127, p.79-97, jul./dez. 2014 PINTO.E.C. A dinâmica dos Recursos Naturais no Mercosul na década de 2000:“efeito China”, estrutura produtiva, comércio e investimento estrangeiro. Texto para discussão IE-UFRJ.2013. PIÑEIRO, D. E. Más allá de fronteras: qué une y qué separa a los actores sociales agrarios de la cuenca del Río de la Plata. In: Le bassin du Río de la Plata. Developpement local et intégration régionale. Guibert, M. Carrizo, S., Ligrone, P. Mallard, B. Ménanteau, L. Uribe, G. (éd.). Presses Universitaires du Mirail. Collection Hespérides. MSHS-Toulouse et l’ IPEALT. Toulouse. France. 2009. pp.529-544 SUERTEGARAY, D. M. A.; SILVA, L. A. P. Tchê Pampa: histórias da natureza gaúcha. In: Campo Sulinos – conservação e uso sustentável da biodiversidade. PILLAR, V. de P., et al. [editores]. Brasília, MMA. 2009, p. 42-59. VEIGA, P. DA M.; RIOS, S. P. Cadeias globais de valor e implicações para a formulação de políticas. Texto para Discussão produto do projeto de pesquisa O Brasil nas cadeias globais de valor: políticas comerciais e industriais para estimular a inserção internacional brasileira, da Diretoria de Estudos em Relações Econômicas e Políticas Internacionais (Dinte) do Ipea. Dez. 2014. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.- Brasília : Rio de Janeiro : Ipea , dez 2014. WILKINSON, J. (Coord.). Perspectivas do investimento no agronegócio. Rio de Janeiro: UFRJ, Instituto de Economia, 2008/2009. 306 p. Relatório integrante da pesquisa “Perspectivas do Investimento no Brasil”, em parceria com o Instituto de Economia da UNICAMP, financiada pelo BNDES. Disponível em: http://www.projetopib.org/?p=documentos 123 124 PAISAJES AGRARIOS EN LA CUENCA DEL RÍO TACUAREMBÓ CHICO Selva KUSTER 33 Diego SILVEIRA 34 Resumen: El trabajo presenta el relevamiento y análisis de las transformaciones en los territorios rurales de la cuenca del río Tacuarembó Chico, durante los últimos 20 años (19952015). Ese cambio en el uso del suelo, de una ganadería extensiva y una incipiente agricultura dispersa en el territorio de dicha cuenca y destinada al mercado local, coevolucionó a territorios que en la actualidad son ganaderos-agrícolas-forestales, que responden a requerimientos de mercados globales, generando nuevas ruralidades en los paisajes, aparición de empresas multinacionales y un proceso de intensificación agrícola. Es así pues que la lógica capitalista del mundo globalizado, se instala en los países en desarrollo, la región norte y más precisamente los territorios de la cuenca del río Tacuarembó Chico no escapan a ésta realidad. Palabras clave: Territorio, Paisaje Agrario, Nuevas Ruralidades, Agronegocio, Intensificación Agraria. Introducción Es la mayor cuenca interior de nuestro departamento, cuyas Coordenadas Geográficas son: Lat. S. entre 31º18´ y 32º, Long. W. entre 55º34´ y 56º21´, con una superficie de 3600 km2, integrada por tres subcuencas que corresponden a los Arroyos: Tres Cruces (con 1084 km2), Tranqueras (con 540 km2) y Batoví (con 671 km2). Concentra la mayor cantidad de habitantes del departamento, por encontrarse en la misma la ciudad capital del departamento de Tacuarembó, con 54.757 habitantes de un total de 90.053 del departamento (según datos I.N.E. 2011). Otros centros poblados y caseríos dispersos dentro de la cuenca son: Paso de los Novillos, Martinote, Sauce de Batoví, Los Rosanos, Valle Edén, Rincón de la Aldea, Zapará, Paso Ceferino, Paso de las Carretas, Paso del Medio y Bañado de Rocha. Siendo la densidad de población en el medio rural menor a 5 hab./km2. Las principales actividades industriales del departamento relacionadas con la carne, la madera, el arroz y la producción de energía a partir de biomasa se ubican en la misma. Importante superficie de dicha cuenca está dentro del área de recarga del Sistema Acuífero Guaraní (SAG). 33 Egresada Profesorado de Ciencias Geográficas. Cursando Diplomado de Geografía Docente de Geografía en I.F.D. y Liceo 1 de Tacuarembó. 34 Egresado Profesorado de Ciencias Geográficas. Cursando Diplomado de Geografía Docente de Geografía en I.F.D. y Liceo 4 de Tacuarembó. 125 Objetivos El trabajo tiene por objetivos identificar y analizar las transformaciones territoriales en la cuenca del Río Tacuarembó Chico durante los últimos 20 años (1995-2015). Metodología Se aplicó una metodología cualitativa, con revisión bibliográfica, relevamiento en campo, entrevistas a diferentes actores sociales en el medio rural involucrados a la temática de estudio, visita a emprendimientos agroindustriales y entrevistas a los responsables de las mismas, documentación fotográfica de los respectivos cambios en los paisajes rurales, comparación de dichos cambios en imágenes satelitales. Paisajes rurales en la Cuenca del río Tacuarembó Chico Los territorios rurales de la Cuenca del río Tacuarembó Chico han sufrido transformaciones en los últimos 20 años, producto del cambio en el uso del suelo a partir de los años 90 del S. XX; territorios dedicados a la ganadería extensiva y a una incipiente agricultura de consumo destinada al mercado local, son compartidos por la actividad forestal a partir de los años 90 y en los primeros años del S. XXI. por la intensificación agrícola que se está produciendo en el país y en el contexto regional, con la aparición de empresas multinacionales agrícolas dedicadas a cultivos de granos (soja, sorgo y arroz). Según Achkar (2012) …“El Paisaje Agrario (PA) es un área heterogénea del territorio compuesta por un mosaico de parches interconectados que se repiten en el espacio, integrado por factores físicos, vegetación, antrópicos y de riesgo; implica la transformación de un sistema ambiental y adaptarlo para cubrir los requerimientos la población”… La Intensificación Agraria (IA) es un proceso asociado al uso más intensivo y eficiente de los factores de producción como lo son la tierra, el trabajo, el capital y la tecnología. La IA “es la materialización de las señales del mercado en el sistema ambiental, mediado por el aumento de la tecnología y el capital”… (Gazzano y Achkar , 2013) 126 Según Díaz (2010) …“los factores macroeconómicos redireccionan los procesos de IA desafiando rubros alternativos y conlleva a que la frontera agrícola se expanda sobre ecosistemas naturales de mayor fragilidad”… El paisaje geográfico “es un texto (apariencia) que al ser decodificado, revela la valoración, modalidades de apropiación, formas de gestión y de distribución de los bienes comunes en una sociedad acotada espacial y temporalmente (esencia). El resultado de ello es la configuración espacial de Territorios” (Pesce, 2011). Los agronegocios constituyen un complejo espacio económico en el que convergen inversiones de capital transnacional en el conjunto de las actividades y sectores vinculados a la producción, distribución y comercialización de productos agrarios a escala global (Achkar 2011). Los agronegocios forestal y agrícolas sojero y sorguero buscan territorios que tienen una serie de ventajas en los aspectos físico, político y cultural con respecto a otros territorios. Es decir que ese espacio sea “competitivo” o sea contar con determinadas aptitudes y actitudes que lo habiliten a la competencia. La competitividad no se va a ver solamente en la eficiencia productiva sino que tendrá en cuenta las relaciones exitosas entre las demandas y la eficiencia de cumplir el objetivo de la empresa. No debemos olvidar que la competitividad se relaciona con la preferencia del cliente por determinado productoservicio frente a otras alternativas. Esos “territorios eficientes” están sustentados sobre algunos parámetros como: el mercado global, la gestión de eficiencia y eficacia del capital, existencia de todos los eslabones del circuito productivo, la aplicación de la tecnología a todos ellos, la homogeneización de la producción y lo insustancial de la producción agrícola local. Las empresas que manejan los agronegocios concentran el capital y nos conducen a un análisis acerca de la seguridad y soberanía alimentaria de los territorios, porque ocupan el territorio de antiguas y tradicionales formas de trabajar la tierra. Es así pues que la lógica capitalista se instala en el mundo en desarrollo, la región norte y más precisamente los territorios de la cuenca del Río Tacuarembó Chico no escapan a ésta realidad. De las distintas fases que están presentes en los agronegocios (pre-agrícola, agrícola, distribución, industrial, comercial y de servicios), no todas están presentes en el territorio de la cuenca con la misma impronta. 127 El trabajo pretende analizar qué está cambiando, dónde se están produciendo dichos cambios en los territorios de la cuenca en estudio, qué actores sociales son los que impulsan los mismos, para qué y por qué. El nivel de artificialización que adquieran esos paisajes agrarios depende de las superficies prediales relativas, del paquete tecnológico que se aplique, del encuadre político del momento, de la dimensión físico-biológica del ambiente y de las nuevas funciones. Los paisajes agrícolas ocupan el S.E. de la cuenca en estudio, en tanto la franja central de la misma en dirección N.-S. está ocupada por paisajes forestales y los paisajes ganaderos quedan relegados al W. de dicha cuenca. Paisajes Agrícolas Hasta iniciado el S. XXI los paisajes agrícolas en la cuenca predominaban al S.E. de la misma y en la margen derecha del curso inferior del río Tacuarembó Chico, con plantaciones de arroz alternada con cría de ganado bovino. 128 Es a partir del año 2010 que comienza el proceso de intensificación agraria relacionada con el agronegocio sojero y actualmente el territorio coevoluciona hacia paisajes de agricultura continua, aparece un mosaico de parches interconectados que se repiten en el territorio con cultivos de soja, arroz y sorgo en la margen izquierda del río Tacuarembó Chico, en tanto en la margen derecha cultivos de soja; que se combinan con cultivos forrajeros invernales (raisgrás y avena). El escenario presenta un uso intensivo del suelo sin campos en barbechos, con cultivos de soja que posterior a la cosecha incorpora escasa cantidad de materia orgánica al suelo, paquetes tecnológicos de siembra directa con aplicación de agroquímicos, practican la agricultura en los suelos más fértiles, caso de Brunosoles (praderas negras). Aparecen dos tipos de actores sociales: los grandes empresarios ganaderos con tierras en propiedad o bajo arrendamiento y que frente al boom agrícola, dedican los suelos más fértiles a cultivos y el resto a la ganadería; y por otro lado los nuevos empresarios – gerenciadores – que sin o con poco activo fijo, buscan y compiten por las mejores tierras bajo arrendamiento, contratan los servicios de maquinaria, trabajan con personal asalariado y zafrales, desplazando a productores locales que muchas veces quedan hasta fuera del sector. La calidad y fertilidad de suelos, disponibilidad de agua, precios atractivos de tierras y baja densidad de población rural, permiten que como en el caso de Aldea San Joaquín, apareciera la Unión Agriculture Group (UAG), gestionando dentro de la cuenca inferior en estudio unas 30.000 hás., dedicadas a ganadería de carne, soja y arroz. Dentro de la cuenca en estudio, apareció hasta el año 2014 plantaciones de soja dispersas en las planicies aluviales más o menos extensas del área correspondiente al Frente de Retroceso de la Cuesta Basáltica, caso de las subcuencas del Arroyo Tambores y del Arroyo Tres Cruces; frente al rendimiento de la soja según la fertilidad del tipo de suelo y el bajo precio internacional actualmente, ¿las empresas continuarán sembrando en ésta área?. Los cultivos de soja, arroz, sorgo y forraje coevoluciona en territorios que hasta hace 10 años eran dedicados a una ganadería extensiva. Dentro de las nuevas ruralidades en los paisajes agrícolas aparecen: camiones cisternas acarreando combustible al campo, conteiners con fertilizantes y agroquímicos, casas rodantes, flujo variable de mano de obra que acompaña a las zafras, servicios aéreos de fumigación. Paisajes Ganaderos 129 En cuanto a la ganadería predomina dentro de la cuenca una ganadería mixta en campo natural hacia el W. de la misma, con incipiente aplicación de paquetes tecnológicos de praderas forrajeras invernales y en emprendimientos con tierras de propiedad. En el resto de la cuenca la ganadería comparte los territorios con la forestación creando vínculos de mutua dependencia, ya que es importante la presencia del ganado con menor densidad por hectárea, para el control de la vegetación en las áreas buffer y con esto evitar posibles focos de incendios principalmente en la estación estival y la forestación brinda abrigo al ganado. En los cultivos agrícolas, bajo modalidades diversas en cuanto a la cartera de tierras, ésta dependencia ganadería – agricultura no es tan necesaria. La empresa planta soja – forraje, ensila el forraje y va para otra región del país. Actualmente la ganadería ve relegado su territorio frente a la agricultura y la forestación, ¿la cantidad de cabezas de ganado disminuyó junto a la superficie de territorios ganaderos ó acompañarán la aplicación de nuevos paquetes tecnológicos para mantener dicha productividad, caso de los feed lodts?. Paisajes Forestales La mayor parte del territorio forestado del departamento de Tacuarembó está dentro del corredor forestal de la región Norte y la cuenca del río Tacuarembó Chico está inmersa en el mismo; la cuenca con una superficie de 3600 km2, tiene un 15% de la misma forestada en el transcurso de los últimos 20 años. Condiciones que permitieron dicho desarrollo forestal -- en primer lugar las relacionadas con la disponibilidad de tierras, un alto porcentaje que corresponde al 52% de la cuenca tiene suelos concordantes con las areniscas de la Fm. Tacuarembó, son suelos de aptitud forestal del tipo 7.32 (según datos de la Carta de Reconocimiento de Suelos – Escala 1:1.000.000), con características de profundos, de fácil laboreo, permeables, de baja a extremadamente baja fertilidad, con Índices CO.N.E.A.T. entre 70 a 88; corresponde a los Suelos Desaturados Lixiviados, Luvisoles y Acrisoles; las formas de relieve que predominan son colinas con pendientes de 6 – 10% y lomadas con pendientes entre 3-6%. Dichos suelos permiten el desarrollo tanto de Eucalyptus como de Pinus (éstos últimos principalmente en los suelos que contienen más aluminio intercambiable en el horizonte B, es decir los de mayor acidez - Acrisoles). 130 -- baja densidad de población rural, con predios de extensiones importantes con pocos productores rurales dueños de dichas tierras, eso favoreció la negociación de las multinacionales con los actores locales. -- disponibilidad de agua, hay que tener presente que al centro-oeste de la cuenca está el área de recarga del Acuífero Guaraní; hay etapas en la fase de producción de la madera como el caso de los viveros que necesitan de abundancia de agua y se abastecen de la misma por medio de pozos semisurgentes. -- el territorio de la cuenca es un “territorio eficiente” para el anclaje del capital transnacional de las madereras, ya que tenía consolidada una infraestructura terrestre (las rutas 5, 26, 31 y 59 atraviesan en las diferentes direcciones los territorios de dicha cuenca y la vía férrea en dirección Sur-Norte). Además a nivel departamental se ejecutan proyectos que consisten en el mejoramiento de la caminería de penetración para facilitar el flujo de la entrada de insumos y salida de la producción maderera. Como consecuencia del mejoramiento de la caminería de penetración y la nueva construcción de la caminería interna de los predios forestados, se reactivó en la cuenca la actividad extractiva de materiales como el balasto (proveniente del basalto de la Fm. Arapey y de la diabasa de la Fm. Cuaró). – la ciudad de Tacuarembó como un nodo de jerarquía regional, que proporcionó mano de obra calificada y no calificada para la cadena productiva agroindustrial de la madera; así como la infraestructura ya existente que favoreció la instalación de los emprendimientos industriales madereros en el área de la microrregión de Tacuarembó, complementado con la generación de energía de biomasa a partir de los subproductos forestales y la instalación de todos los servicios que apoyan dicha cadena productiva que van apareciendo rápidamente a comienzos de los años 2000 en el eje de la Ruta 5, concentradas en el área de logística y de actividades múltiples según POT 2009. -- territorios que están en un Estado con estabilidad política y social, con población alfabetizada y que es posible capacitarlas a corto plazo. Principales empresas de agronegocios en el rubro madera que han invertido en la Cuenca del Río Tacuarembó Chico en los últimos 20 años Hasta los años 90 del S.XX, en el uso productivo del suelo de la cuenca predominaba la ganadería bovina al centro y este de la misma, en tanto hacia el oeste ganadería ovina; con territorios puntuales y reducidos de agricultura (papa y maní) y una escasa forestación, de aproximadamente unas 2600 hectáreas (según datos de la Dirección Forestal) principalmente siguiendo el eje de Ruta 26 al E. de la ciudad, que 131 se utilizaba como fuente de energía para abastecer las calderas de la principal industria, el Frigorífico Tacuarembó. Es en el transcurso de 20 años que el sistema agrario ganadero extensivo coevoluciona rápidamente hacia sistemas monoproductivos forestales de rápido crecimiento destinado a la transformación mecánica (debobinado – aserrado) ó química (celulosa) de acuerdo a la demanda mundial. Actualmente la cuenca cuenta con unas 52.500 hás. forestadas, tanto en predios propiedad de las empresas o bajo los proyectos de integración productiva. Tres empresas multinacionales forestadoras que aparecen en el escenario nacional como: Forestal Oriental – UPM; Montes del Plata y Weyerhaueser Productos S.A., y dos Administradoras de Fondos de Inversión (GMO Renewable Resources y GFP - Global Forest Partners LP) han considerado a los territorios de la cuenca del río Tacuarembó Chico, como muy estratégicos y son las que dominan las fase de producción. Weyerhaueser Productos S.A. es la empresa que entró en el año 1996 en el escenario de las plantaciones forestales en la cuenca. En el año 2001 aparecen las Administradoras de los Fondos de Inversión, primero GMO y luego GFP. En el año 2006 entra en el escenario Forestal Oriental con grandes plantaciones y replantaciones; es decir compró tierras de aptitud forestal, ó a través de los Proyectos Fomento se asoció a productores que querían diversificar su producción y asegurarse la venta de la producción de la madera al momento de la cosecha ó compró campos ya forestados. Por último en el año 2010 comienza las plantaciones Montes del Plata principalmente con los Proyectos de Integración Productivo. Aparece un escenario cada vez más competitivo para las industrias madereras, por lo que las correspondientes empresas forestadoras optan por estos caminos: la compra de tierras, arrendamientos de campos con diversos convenios con los productores agropecuarios ó asociarse a los productores, de tal forma de asegurarse la futura producción de madera. El tiempo de producción de un bosque para la transformación mecánica (aserrado o debobinado) insume de 15 años para los Eucalyptus a 20 años en el caso de los Pinus; mientras que el tiempo de desarrollo de un bosque para producir celulosa insume unos 10 años; es decir los ciclos de producción de madera para éstas industrias son diferentes y los productores agropecuarios prefieren obtener una renta a más corto plazo. Los escenarios de las industrias del aserrado y debobinado son diferentes con los escenarios de la industria de la celulosa; por lo que se puede afirmar que los territorios de aptitud forestal son territorios muy requeridos por éstas empresas, produciéndose una gran competencia por los mismos, de ahí la reciente aparición de proyectos de integración productiva que se perciben; dichos proyectos están localizados en la ecoregión del Frente de 132 Retroceso de la Cuesta Basáltica con suelos desarrollados sobre areniscas intertrapp ó basaltos masivos lajosos muy meteorizados. Éste escenario de competitividad de los suelos de aptitud forestal condujo a un dinamismo del mercado inmobiliario rural producido por la forestación en la cuenca en estudio; basados en datos de la Dirección de Estadística Agropecuaria (DIEA) de Uruguay, en la última década (2000 – 2010), el precio promedio de la tierra se multiplicó por cinco, en el año 2000 como promedio la hectárea de tierra estaba en los 448 dólares, en el año 2010 en 2633 dólares la hectárea. En el departamento campos de suelos de aptitud forestal rondan los 3000 dólares la hectárea; pero eso se traduce en una cadena, un productor ganadero que vende campos de aptitud forestal con esos precios de la tierra, puede comprar a precio más elevado que su real valor de producción, por ejemplo campos en suelos superficiales como los basálticos y esto lleva a un elevado precio de la tierra que nada tiene que ver con la real productividad de los mismos. En la misma se observa que el predominio de las plantaciones correspondientes a Weyerhaeuser, se encuentran localizadas principalmente al Norte de la Cuenca en estudio; Forestal Oriental tiene predominio de sus plantaciones en torno al eje de Ruta 26 al Oeste y Ruta 5 al Sur; en tanto las plantaciones de Montes del Plata predominan en el eje de la Ruta 59. Las plantaciones correspondientes a empresas forestadoras que administran Fondos de Inversión, caso de Global Forest Partners LP (GFP) y GMO Renewable Resources, están localizadas principalmente al Norte de la cuenca. Se resalta el carácter estratégico de éstos territorios, tanto para las plantaciones dentro de la cuenca como la instalación de los emprendimientos industriales, la nueva área de logística y actividades múltiples; que aprovecharon la infraestructura terrestre ya existentes (rutas y vía férrea). De las empresas mencionadas anteriormente, solamente Weyerhaueser es la empresa de agronegocios que prácticamente tiene todas las fases que intervienen en el mismo dentro de la cuenca en estudio, mientras que Forestal Oriental – UPM, Montes del Plata y los Fondos de Inversión tienen muy bien representada la fase de producción. El caso Weyerhaeuser se trata de un agronegocio con integración vertical (tener el máximo control posible de las diferentes etapas de la cadena productiva que sean de máxima rentabilidad ó de aquellos que sean estratégicos) ya consolidada y tendencia hacia la integración horizontal (alianzas o fusiones de empresas para lograr el dominio de un determinado mercado). En la integración vertical en el rubro madera cubre el conjunto de actividades de la cadena productiva: vivero clonal con investigación y tecnología de punta, plantaciones con todas sus etapas, cosecha, industrialización de las trozas de madera transformándola en tableros contrachapados 133 también con tecnología de punta en su maquinaria y distribución en el mercado mundial. Valorizó los subproductos industriales a través de la cogeneración y generación de energía y busca alianzas estratégicas con otras empresas multinacionales para el desarrollo horizontal. A partir de febrero del 2010, Weyerhaeuser, tiene una planta de generación de energía aprovechando los residuos industriales, con una capacidad de 10 MWh, de eso consume unos 6,5 MWh y el restante 3,5 MWh lo vende a UTE. Con la planta de generación de energía valoriza los residuos que salen de la producción de tableros y le asegura la energía necesaria para esa producción, siendo más competitivo. La independencia en la matriz energética es fundamental para el desarrollo del emprendimiento industrial, apoyado por la política del Estado en los convenios públicoprivado que se firman, ya que el Estado apunta a buscar las condiciones de generar escenarios energéticos autogestionados y sustentables en las industrias. La empresa proyecta a futuro el desarrollo de bioproductos, en éste caso incluye una alianza estratégica con otra multinacional Chevron, para el desarrollo de biocombustibles. Nuevas Ruralidades Dentro de las nuevas ruralidades que han ido surgiendo en los paisajes forestales encontramos: -- Maquinaria forestal de gran porte, principalmente en las etapa de raleo y de cosecha de los bosques, tales como Feller, Harvester y Forwarder; asociado a esto camiones cisternas acarreando combustibles al campo. -- Cartelería predial y señalización de rutas secundarias y caminos vecinales, para ordenar el tránsito. -- Conteiners, transformados y adaptados a oficinas, talleres móviles, depósitos de agroquímicos y de fluídos hidraúlicos para mantenimiento de maquinaria. -- Servicios aéreos que cumplen función de supervisión y control de incendios y de fumigación. -- en el aspecto social, aparecen trabajadores rurales con una gran movilidad; según informe 2013 del Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, los trabajadores rurales a nivel del país tuvieron un incremento en el período 1996-2011 que correspondió al 18,8%, en el departamento de Tacuarembó pasó de 5% en el 2006 a 5,4% en el 2011; la realidad visualizada en la cuenca a través de los trabajos de campo nos indican que los trabajadores rurales del sector forestal, en su gran mayoría son no residentes en el medio rural, a diario son trasladados en camionetas ó micros 134 al lugar de trabajo y residen en centros poblados ó en la ciudad de Tacuarembó. Éste fenómeno genera un flujo de vehículos y personas que diariamente sólo trabajan en el medio rural, no residiendo en él, pudiéndose observar casas abandonadas “taperas” en las áreas forestadas. Esto coincide con los datos del informe 2013: existe un vaciamiento de residentes en áreas rurales forestadas, pero no del número de trabajadores. En cuanto al salario líquido por hora del trabajador rural forestal ronda los 59 pesos en el caso de un peón práctico; un capataz especializado como el oficial mecánico/electricista ronda los 89 pesos, según el informe 2013, pero en entrevistas realizadas en febrero 2015 se supo que: -- es difícil saber la remuneración de un trabajador por hora, ya que los datos oficiales no coinciden con la realidad, porque el “incentivo” que reciben por parte de la empresa es “el trabajo a destajo”, es decir buscan la productividad del obrero, cuanto más produce el trabajador mayor es su salario. Los trabajadores se diferencian por categorías; pueden ser trabajadores mensuales ó zafrales, existe variación en las remuneraciones de los trabajadores que pueden ir con valores muy superiores ó inferiores a la media nacional, dependiendo de la categoría y calificación del trabajo. -- las empresas madres tienen Certificaciones Nacionales (ISO 9100) e Internacionales FSC (Forest Stewardship Council) y PEFC (Program for the Endorsement of Forest Certificacion), lo que exige a las empresas tercerizadas cumplir con las mismas normas: la seguridad del trabajador que tengan los aportes correspondientes a la Seguridad Social, cobertura médica, canasta alimenticia y seguro de vida. – por lo mencionado anteriormente han aparecido en campo los cargos técnicos de supervisores de campo; además de determinadas condiciones que se le exige a la empresa para la comodidad de sus trabajadores, por ejemplo si alquilan casas para que el personal pernocte cercano al área de trabajo, las mismas deben de tener ventanales que permitan una buena aireación e ilumación en las habitaciones y baños con agua caliente. Esto condujo a una revalorización en los alquileres de casas en los centros poblados inmersos en las áreas forestales y a un dinamismo comercial, esta bonanza tiene vaivenes que dependen del tiempo de estadía en el lugar de los trabajadores. -- existe un mayor número de trabajadoras femeninas en campo, porque realizan un trabajo muy cuidadoso, no son competitivas favoreciendo la integración de los equipos de trabajo. -- en las empresas tercerizadas, un mismo trabajador puede cumplir diferentes funciones, es decir trabajar como fumigador, para matar hormigas ó en la poda; de 135 ésta manera se busca evitar trabajos zafrales y transformarlos en más ó menos permanentes durante el año. Cambios producidos por el Paisaje Forestal según componentes ambientales La actividad forestal produce un primer impacto que es en lo paisajístico, producto de la uniformización del paisaje con los mosaicos de las especies plantadas y la edad de los bosques. Si bien en un predio forestado existe un 30% que corresponde a áreas buffer y cortafuegos, cuya pastura es aprovechada por el ganado; es decir actualmente se realiza el silvopastoreo, los territorios forestales compartido con la ganadería bovina, pero en un número menor de cabezas de ganado por hectárea. Esos cambios producidos por las propias plantaciones, dependen de las especies plantadas y de la edad de los bosques, que van avanzando sobre ecosistemas de pastizales en la Cuenca Sedimentaria del Noreste en el centro-este de la cuenca en estudio o fragmentando a la vegetación serrana de bajo porte en la Escarpa Basáltica, hacia el oeste de la misma. En el caso de la especie del Pinus Taeda aparece como especie invasora sobre la vegetación serrana, caso de la Gruta de los Cuervos. En lo faunístico, la fauna típica de los pastizales va cediendo paso a una mayor presencia de cotorras, palomas y jabalíes (principalmente en zonas forestadas cercanas a áreas de bañados, montes fluviales ó serranos), que encuentran en los bosques áreas de refugio y alimentación cercana a los mismos. Frente a monocultivos de esta magnitud ¿qué impactos pueden tener los suelos y el agua? En suelos, nos referimos a impactos en lo relacionado a propiedades químicas de los mismos, a la extracción de nutrientes, acidificación y salinización. Existen estudios realizados por la UDELAR (2006) que dan por resultados con respecto a la acidificación de los suelos una disminución del pH entre 0,5 y 1 y que varía según sean plantaciones de Pinus o de Eucalyptus. En cuanto al agua ¿cómo afectan el ciclo hidrológico?, ¿el agua de escorrentía superficial y el drenaje profundo?. INIA y la empresa Weyerhaueser realizan estudios en conjunto en cuencas forestadas y no forestadas, cuyos primeros resultados fueron puestos al conocimiento público en el año 2008, si bien las investigaciones son a largo plazo; existe una tendencia a la disminución del escurrimiento superficial que puede variar entre un 22 y 31%, dependiendo de las precipitaciones anuales; además se tiene presente otras variables, por ejemplo evaporación en el período estival e invernal. Hay que tener 136 presente también que las areniscas de la Fm. Tacuarembó, coinciden con el área de recarga del Acuífero Guaraní. Relación territorios rurales – territorio urbano (ciudad de Tacuarembó) La relación entre los territorios rurales ganaderos, forestales y agrícolas con la ciudad de Tacuarembó, están en los servicios relacionados al sector financiero tanto público como privados, en el caso del sector ganadero con la venta de ganado con plazos flexibles tanto a los vendedores como a los compradores. Aparecen en la ciudad de Tacuarembó comercios dispersos, tanto en el centro como en determinados barrios, de insumos al sector agropecuario. En el eje de Ruta 5 principalmente al S. de la ciudad y eje Ruta 26, en el área de logística y actividades múltiples, aparecen en los años 2005 con una fuerte expansión a partir del año 2010, son grandes áreas con infraestructuras relacionadas a servicios de los rubros forestal, agrícola y ganadero. Componentes Patrimoniales de los Paisajes Rurales Dentro de los objetos culturales a conservar en los paisajes rurales de la cuenca del Río Tacuarembó Chico encontramos: cercos y corrales de “piedras del lugar”, en las cuencas superiores de los Arroyos Tres Cruces y Tacuarembó Chico existen ocho corrales construídos con la roca del lugar (basalto), se justifica ya que el área correspondió al reparto de tierras realizado entre 1807 y 1809 por Artigas, para justificar la tenencia de la tierra debían construir un rancho y un corral; pulpería del S. XIX justificada por el camino de tropas que unía la región N. del país con el Sur, ubicada en la margen derecha del Río Tacuarembó Chico en la localidad de Paso de los Novillos; cementerios y panteones que datan del S. XIX en lugares que no contextualizan con la ubicación de la población en el actual paisaje rural, algunos de ellos se perciben como agrupamiento de árboles nativos; casa de piedra (arenisca) en camino a Paso de las Carretas en la subcuenca del Arroyo Tres Cruces, que fue campamento Artiguista entre 1804 a 1806 del Tacuarembó Chico, para el reparto de tierras entre 1807-1809 (según documentos históricos del Archivo Municipal de Tacuarembó). En el área correspondiente al Frente de Retroceso de la Cuesta Basáltica encontramos microgeoformas bien representativas y características como: paleodunas y marmitas en Valle Edén, cerros chatos aislados en Batoví, cascadas y cañones en 137 los cursos superiores de los arroyos como el caso del Arroyo de la Jabonería, pilares como en la Gruta de los Cuervos. Un paisaje rural histórico correspondiente a una infraestructura agroindustrial de las décadas de los 60 y 70 fue la tabacalera, ubicada en Rincón de Tranqueras. Conclusión Es indudable que el paisaje rural en la cuenca del río Tacuarembó Chico, ha tenido transformaciones importantes durante los últimos 20 años, relacionada al cambio en el uso del suelo en los rubros forestal y agrícola; en tanto la ganadería quedó relegada a suelos de menor productividad al W. de la cuenca; ó compartiendo el territorio con la forestación y lo agrícola, al centro y S.E. de la misma. Bibliografía: -- ACHKAR, Marcel et al. (2004) – “Diagnóstico Socioambiental Participativo en el Uruguay” – Ed. El Tomate Verde. -- AREZO, C. (2015) – “Tacuarembó: Gobierno y Cultura” – Pag. 191 – Cuchilla Casa de Piedra – Campamento Artiguista – Editado por I.M.T. -- BOSSI, J. y NAVARRO, R. (1981) – “Geología del Uruguay” – Tomo I y II – Universidad de la República. -- Carta Geográfica de la República Oriental del Uruguay – Escala 1:500.000 – Edición 1981. -- Diccionario Vocabulario GEOMORFOLÓGICO – 1994 - Ed. Akal. -- Documento histórico del Archivo Municipal de Tacuarembó sobre Campamento Artiguista. -- GARCÍA PRÉCHAC, F. et al. (2010) – “Intensificación Agrícola: oportunidades y amenazas para un país productivo y natural” - Uruguay --VEROSLAVSKY, G. et al. (2004) – “Cuencas Sedimentarias de Uruguay” – Cap. I y V – DIRAC – 2º Edición. 138 Webgrafía: www.uag.com.uy www.google earth.com www.magp.gub.uy/Forestal/Estadística www.inia.org.uy/listado Proyecto 102 FPTA “Efectos del establecimiento de áreas forestadas en el comportamiento hidrológico de una cuenca en Tacuarembó. Uruguay. www.ine.gub.uy www.tacuarembó 2030.com/agropecuarias. www.mgap.gub.uy / diea. www.guiaforestal.com www.renare.gub.uy http://visualizadorgeominero.dinamige.gub.uy 139 TRABAJOS POSTERS 140 A FRUTICULTURA COMO UM NOVO CENÁRIO REARTICULADOR DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL NA MICRORREGIÃO GEOGRÁFICA DA CAMPANHA MERIDIONAL Ana Luiza Pinto Alves Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Geografia/Universidade Federal de Santa Maria (PPGGEO/UFSM), membro do Núcleo de Estudos Regionais e Agrários (NERA). [email protected] Thales Silveira Souto Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Geografia/Universidade Federal de Santa Maria (PPGGEO/UFSM), membro do Núcleo de Estudos Regionais e Agrários (NERA). [email protected] Meri Lourdes Bezzi Prof.ª Dr.ª Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), coordenadora do Núcleo de Estudos Regionais e Agrários (NERA). [email protected] RESUMO A presente pesquisa visa analisar a cadeia produtiva da fruticultura na Microrregião Geográfica da Campanha Meridional, a qual surge com uma perspectiva para viabilizar o desenvolvimento local/regional. Metodologicamente, a pesquisa foi estruturada em etapas, partindo inicialmente de um levantamento bibliográfico e de coleta de dados. No segundo momento, realizou-se o trabalho de campo, no qual foi possível verificar a problemática em questão. E por fim, analisaram-se e interpretaram-se os resultados. Salienta-se que a economia da microrregião está baseada no setor agropecuário, principalmente na pecuária bovina (corte e leite) e nas lavouras de arroz e da soja. Ressalta-se que o recorte espacial em estudo, é considerado atrasado economicamente se comparado a outras microrregiões do Estado Gaúcho. Desta forma, a fruticultura tornou-se uma possibilidade para alicerçar a economia, gerando renda e empregos, além de contribuir para a diversificação produtiva regional. Palavras-chave: Geografia Agrária. Desenvolvimento regional. Olivicultura. Vitivinicultura. INTRODUÇÃO O espaço geográfico apresenta em cada momento histórico as características da sociedade que o produz e/ou reproduz. Esta dinâmica é constante no processo evolutivo das sociedades, acarretando transformações profundas, originando novas formas e fazendo com que velhas formas assumam novas funções (SANTOS, 1978). Neste sentido, pode-se citar as atividades agropecuárias, as quais têm passado por diversas e importantes transformações, mediante a modernização de suas atividades. Assim, o espaço rural se redesenha e se reorganiza na medida em que novos atores econômicos e tecnologias são incorporados à sua produção, rearticulando econômica e socialmente o local e o regional. 141 Ressalta-se a pertinência deste estudo, pois a Microrregião em análise está localizada na Metade Sul do Estado do Rio Grande do Sul, a qual é composta por cinco municípios (Aceguá, Bagé, Dom Pedrito, Hulha Negra e Lavras do Sul). Ela é considerada como um dos recortes espaciais mais atrasados economicamente, se constituindo em uma microrregião que alia sob a ótica da cultura, a política, com a formação de lideranças regionais que se perpetuam no poder e na economia por meio da coexistência da pecuária extensiva tradicional e a inserção de novos atores econômicos, que marcam a influência do capital como um agente que “tenta” romper as barreiras impostas por tradições seculares (Figura 1). Desta forma, a fruticultura insere-se neste recorte espacial, o qual é marcado historicamente pela presença da pecuária e do latifúndio, diversificando o espaço rural e viabilizando novas alternativas aos produtores, gerando empregos e nichos de mercado através da produção de uvas e oliveiras. A pesquisa tem como objetivo geral analisar as transformações espaciais da Microrregião Geográfica da Campanha Meridional (MRG 031) mediante a inserção da fruticultura (vitivinicultura e oliveiras). Especificamente, buscou-se: (a) analisar a reorganização espacial da Campanha Meridional e (b) identificar as potencialidades e as fragilidades das cadeias produtivas da uva e da azeitona no recorte espacial em estudo. Como procedimento metodológicos, optou-se por estruturá-la em etapas. No primeiro momento, realizou-se o levantamento bibliográfico, o qual possibilitou abordar os principais conceitos norteadores. Paralelamente, coletaram-se dados em fontes secundárias, tais como: Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA) e Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER/RS). A segunda fase consistiu no trabalho de campo, no qual foram realizadas entrevistas com produtores e os órgãos gestores. Para tal atividade, foram elaborados dois formulários (entrevistas estruturadas). A partir do resgate conceitual e das informações obtidas em campo, na última etapa, foi possível analisar e interpretar os resultados. 142 Figura 1 - Mapa de localização da MRG da Campanha Meridional (MRG 031) Fonte: IBGE, 2015. Org.: ALVES, A. L. P., 2015. DESENVOLVIMENTO Políticas Públicas para a inserção da Fruticultura na Campanha Meridional A economia da Microrregião Geográfica da Campanha Meridional está estruturada no setor primário, principalmente na pecuária bovina, ovina e equina, e pela agricultura com base na lavoura de arroz, e mais recentemente, no cultivo da soja. Ressalta-se que esses produtos estão na melhor fase econômica já ocorrida neste setor ao longo da história. No entanto, apesar do excelente momento econômico, alguns produtores são excluídos deste processo. Desta forma, foram criados programas de incentivo ao desenvolvimento da fruticultura, para que os mesmos tivessem novas possibilidades, além de diversificar os produtos do campo na microrregião e em toda Metade Sul do Rio Grande do Sul. A fruticultura começou a receber incentivos a partir da década de 90, com o objetivo de diminuir as desigualdades econômicas, sociais e regionais da Metade Sul do Estado gaúcho. Para essa finalidade, vários setores governamentais juntamente 143 com iniciativas privadas vêm elaborando estratégias de desenvolvimento, via aproveitamento da vocação regional agrícola, diversificando as atividades do setor primário. Entre as medidas, pode-se citar o Programa de Desenvolvimento da Fruticultura Irrigada na Metade Sul/RS, criado em 1997 e o Programa Estadual de Fruticultura (PROFRUTA/RS), no ano de 2001 (RATHMANN; HOFF; PADULA, 2006). Ressalta-se que ambos os programas têm como portfólio, o incentivo para a adesão de agricultores a cadeias produtivas com rendimentos acima do padrão das tradicionais culturas da região, além de ter entre suas metas reverter o processo de importação de frutas, através de novos polos econômicos. Entre as particularidades desses, pode-se citar de acordo com Rathmann; Hoff; Padula (2006, p. 18) a) o crescimento da demanda mundial de frutas na ordem de 5% ao ano, com tendência crescente; b) mais de 70% das frutas consumidas no mundo são de clima temperado, tendo o Brasil pequena participação neste mercado; c) existência de capacidade ociosa em câmaras frias de frigoríficos que podem servir para o armazenamento da produção; d) o Rio Grande do Sul tem potencialidades para tornarse um grande produtor e exportador de frutas de clima temperado, dadas suas condições edafoclimáticas e disponibilidade de terras para o cultivo. Os projetos de incentivo à fruticultura na Metade Sul do Estado podem ser considerados como alternativas para o desenvolvimento local/regional. A fruticultura é desenvolvida geralmente em médias e grandes unidades produtivas. Na pequena propriedade, normalmente o produtor é capitalizado com outras fontes de renda distintas do campo. Neste sentido, é importante enfatizar que alguns pequenos produtores não se propõem a desenvolver este tipo de atividade, já que possuem menores espaços para produção, não podendo colocar em risco partes de sua propriedade para uma cultura sem lucro garantido. Então, torna-se fundamental, saber o papel do poder público na regulamentação, gestão e criação de políticas públicas, a qual difere entre lugares, regiões e até mesmo dentro de um país. Neste sentido, resgata-se Farah Júnior (2012, p. 39), quando o autor afirma O Estado moderno tem vários papéis a desempenhar em uma sociedade como a brasileira, que tem características multiculturais, sociais, econômicas e produtivas. São realidades bastante diferentes em cada região, estados federados e, dentro destes, em suas diversas regiões. Portanto, não há uma regra e orientação única para que o poder público, em seus três níveis de poder, atue para atender as necessidades e demandas da sociedade. 144 Neste sentido, é importante a realização de diagnósticos e prognósticos para a execução de um planejamento, pois de acordo com Campanhola; Graziano da Silva (2000, p. 20) Mediante um diagnóstico bem elaborado, pode-se identificar os principais problemas e reivindicações e propor as principais linhas de uma política de desenvolvimento para o município. Entre essas linhas destacam-se: a qualidade de vida; a renda dos agricultores familiares; o acesso a novas tecnologias e alternativas de produção que garantam a qualidade e a conservação do meio ambiente; a infraestrutura produtiva e social; a assistência técnica e a formação profissional dos agricultores; a qualidade da educação rural; o acesso à saúde gratuita; a valorização do conhecimento e da cultura da população local, a participação dos jovens, mulheres e idosos; e a organização dos agricultores e sua participação nas decisões que envolvam as políticas para o município. [...] A elaboração de planos e políticas, porém, é apenas o início do processo. Resta saber como essas políticas serão implantadas e, mais que isso, como elas serão monitoradas e avaliadas. Considerando o planejamento, não basta atrair grandes empresas, é necessário o planejamento das políticas públicas por parte do poder público para que elas sejam eficientes. É essencial que haja uma análise social, econômica e cultural de cada região e/ou lugar que se possa planejar. Para isso é necessário a contribuição da população, para que se construa juntamente a este grupo, propostas que venham a minimizar e/ou resolver as dificuldades locais/regionais. Contudo, o planejamento para a gestão das políticas públicas torna-se um fator determinante, em que essas devem ser mais do que a geração de intenções, e sim a geração de ações, pois se sabe que existem inúmeras políticas públicas, e que se fossem executadas trariam diversos benefícios coletivos, porém, nem sempre são de fácil acesso a todos que necessitam. Pode-se afirmar que a fruticultura representa uma possibilidade e/ou alternativa para o desenvolvimento econômico local/regional das atividades agropecuárias, pois a fruticultura não concorre com as lavouras e a pecuária, uma vez que, são realizadas de forma consorciada. Entre os principais frutos cultivados na Campanha Meridional, tem-se: uva vinífera, uva de mesa, azeitona, melancia, pêssego e figo. Ainda em pequena escala, tem-se o cultivo de melão e frutas cítricas, tais como a laranja e a bergamota35. Entre os diversos fatores que contribuíram para a inserção da fruticultura na Campanha Gaúcha, o fator determinante foi o clima favorável a esta atividade 35 Neste trabalho optou-se em abordar as cadeias produtivas da uva e da oliveira, pois essas são representativas e com potencialidades de expansão. 145 apresentando características similares ao clima da região do Mediterrâneo, criando condições propícias principalmente para o cultivo de uvas viníferas. O Programa Estadual de Fruticultura aponta alguns problemas quanto a cadeia produtiva da fruticultura. Entre os principais entraves estão a alta perecibilidade das frutas. Desta forma, projetos mais modernos deveriam ser instaurados para a conservação dos frutos. Para que isso seja possível, é necessária a implantação de câmaras frias, o que resulta em um maior prazo de validade dos frutos até chegar ao mercado consumidor interno ou para a exportação (GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 2003). Neste sentido, João et al (2002, p. 76) afirmam que É sobremaneira importante que cada fruta tenha a sua cadeia produtiva devidamente estruturada, fato que começa pelo seu estudo. Os diversos segmentos, desde viveiristas, fruticultores, comerciantes e industriais devem ter relações fortes entre si e formarem parcerias com entidades públicas e privadas. Somente unidos em torno do seu produto e buscando qualidade é que estarão preparados para os desafios, ameaças e oportunidades vindas do mercado (local, estadual, nacional e exterior). É importante enfatizar também que esta proposta de diversificação da produção, não substituem os cultivos tradicionais. Elas coexistem com a matriz econômica (pecuária-arroz-soja), sendo um complemento e/ou alternativa produtiva, uma vez que, os períodos de safras da fruticultura são distintos aos da lavoura. Assim, é possível ao produtor, uma distribuição dos rendimentos ao longo do ano. Análise da atual situação da fruticultura na Microrregião Percebe-se, de acordo com as entrevistas realizadas com os produtores, que os diversos programas e incentivos governamentais para a expansão desta cadeia produtiva na microrregião, acabam beneficiando produtores que possuem uma economia estável, que não dependem exclusivamente do campo, pois são médicos, militares, aposentados, advogados, entre outros. Ressalta-se que a fruticultura quando instaladas em pequenas propriedades, por meio de políticas públicas e por doação de mudas, tais como o PROFRUTA e o Olivais do Pampa. Desta forma, essas produções possuem pouco ou nenhum acompanhamento técnico, ou então, não estão adequadas para aquele tipo de solo. É importante salientar que tentar inserir cadeias produtivas de alto custo e ainda sem indústrias de beneficiamento aos pequenos produtores, é colocá-los em uma situação de risco, tanto econômico quanto social, pois no início, os produtores recebem apoio 146 técnico e incentivo, no entanto, pela escassez de técnicos, acabam não sendo acompanhados nas demais etapas de produção, o que pode gerar grandes perdas da produção e/ou o desestímulo dos mesmos (Figura 2). Figura 2 - Parreirais de uva no Município de Bagé Fonte: Trabalho de Campo, 2015. Org.: ALVES, A. L. P., 2015. O alto valor do custo de plantio e manutenção dos parreirais de uva fez com que o cultivo declinasse nos últimos anos, pois todo custo de produção são de responsabilidade dos produtores. Assim, as únicas beneficiadas, com esta produção, são as vinícolas. É importante salientar que existem, ainda que poucos produtores de uva, que estão produzindo vinhos artesanais e comercializando localmente. Estes produtores não vivem exclusivamente da vinícola, pois são também pecuaristas, agricultores de hortigranjeiros, de arroz e de soja. É importante salientar que no Município de Hulha Negra, está ocorrendo o desenvolvimento de um projeto de vitivinicultura orgânica, em 22 pequenas propriedades, meio hectare por produtor, destinado à uva para suco. A ideia é que o suco seja produzido localmente, juntamente com o Município de Candiota, com a finalidade de ser comercializado localmente e para merenda escolar. O 147 desenvolvimento deste projeto contará com a ajuda técnica da EMATER local e regional, UFPel e Governo do Estado do Rio Grande do Sul. É importante destacar também que os produtores repassam suas safras para as vinícolas da Serra Gaúcha, entre elas a Salton e a Miolo e, também para a vinícola local Peruzzo. Há ainda, a presença de indústrias de beneficiamento situadas nos municípios vizinhos, o que torna a produção de uva, uma alternativa produtiva na microrregião, mas com muitas dificuldades a serem superadas. Em relação aos produtores de oliveiras – geralmente antigo produtor de uva – salienta-se que estão se organizando por meio de associativismos, tendo como objetivo a estruturação de uma pequena agroindústria para produção do Azeite de Oliva Extra Virgem do Pampa. Entretanto, não existem dados desta iniciativa local, uma vez que, ainda não houve colheita (Figura 3). Figura 3 - Plantio de Oliveiras na Microrregião Fonte: Trabalho de campo, 2015. Org.: ALVES, A. L. P., 2015. Entre os entraves ao desenvolvimento da fruticultura, destaca-se a questão da mão de obra, sendo difícil manter os trabalhadores no campo. As facilidades e confortos da cidade acabam atraindo os mesmos. Desse modo, está cada vez mais 148 escassa a mão de obra para trabalhar no meio rural, pois muitas vezes, eles preferem trabalhar informalmente na cidade, morando em áreas suburbanas, com trabalho braçal, com baixa remuneração, para ficar próximo da família. Outro problema observado no trabalho de campo é a necessidade do produtor da Campanha Meridional em aprender à utilizar a assistência técnica, pois muitos reclamam da falta de ajuda, mas raramente solicitaram auxílio técnico da EMATER, prefeitura e/ou outros órgãos. Em relação ao acompanhamento técnico disponível pela EMATER, este não é suficiente, devido aos poucos profissionais disponíveis e ao grande número de propriedades, com também pelas grandes distâncias entre as mesmas. Os médios e grandes produtores contratam assessorias e técnicos, ou também recebem auxílio dos vendedores de insumos. Os pequenos produtores precisam de auxílio constante, pois muitas vezes, acabam sendo desestimulados pela baixa produtividade ou pela perda de suas produções. Em relação às linhas de crédito, a maioria dos produtores de fruticultura realizam financiamentos, geralmente os oriundos do PRONAF (Mais Alimentos). No entanto, os entrevistados reclamam da burocracia existente nos bancos e a demora na liberação do crédito. Quanto ao agricultor familiar, este sofre mais que o assentado para ter acesso ao crédito, pois este último dispõe de um número maior de programas do governo. Ressalta-se ainda, a precariedades das estradas do interior dos municípios que compõem esta microrregião. Este fato acaba interferindo no escoamento da produção, na locomoção do produtor e, também, na acessibilidade dos técnicos chegarem até as propriedades, o que se torna um dos principais problemas a ser superado. CONCLUSÕES A fruticultura vem sendo desenvolvida em todos os municípios da Campanha Meridional, devido principalmente, às boas condições edafoclimáticas e a disponibilidade de terras para o plantio. Desta forma, busca-se desenvolver novos nichos de mercado e manter os que já estão estruturados, o que exige dinamismo e interação entre todos os atores da cadeia produtiva da fruticultura, ou seja, desde os produtores, os comerciantes até os industriais, para que possam formar parcerias. O acompanhamento técnico do plantio à colheita é de extrema importância, pois os resultados sendo satisfatórios estimularão os produtores. Assim, se teria uma cadeia produtiva mais segura e estável. 149 Sabe-se que existem programas que visam dinamizar a fruticultura, no entanto, cabe aos governantes locais, regionais e estaduais, acompanhar como esses estão sendo executados. Ou seja, verificar se estão sendo eficazes ou se precisam ser melhorados, identificar os principais entraves e as potencialidades a serem sanadas e/ou aproveitadas, para que se alcance o desenvolvimento regional, tendo a cadeia produtiva da fruticultura como um membro integrante deste processo, fornecendo mão de obra e dinamizando principalmente as pequenas unidades produtivas do recorte espacial em estudo. BIBLIOGRAFIA Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (n.d.). Pronaf. Recuperado em 20 de março, 2015, de http://www.bndes.gov.br/apoio/pronaf.html. Campanhola, C. & Graziano da Silva, J. (2000). Desenvolvimento local e a democratização dos espaços rurais. Cadernos de Ciência & Tecnologia, 17(1), 11-40. Farah, M. F., Jr. (2012). Orçamento público e gestão governamental. In SILVA, C. L. da. (Org.). Políticas Públicas e Desenvolvimento Local (pp. 39-68). Petrópolis: Vozes. Governo do Estado do Rio Grande do Sul. (2003). 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São Paulo: Hucitec. 151 A PECUÁRIA LEITEIRA NO MUNICÍPIO DE ITUIUTABA - MINAS GERAIS/BRASIL E OS REFLEXOS NA REORGANIZAÇÃO PRODUTIVA AGROPECUÁRIA Thales Silveira Souto Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Geografia – PPGGEO / Universidade Federal de Santa Maria – UFSM / e-mail: [email protected] Ana Luiza Pinto Alves Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia – PPGGEO / Universidade Federal de Santa Maria – UFSM / e-mail:[email protected] Meri Lourdes Bezzi Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia – PPGGEO / Universidade Federal de Santa Maria – UFSM / e-mail: [email protected] Palavras-chave: Transformações; Pecuária leiteira; Ituiutaba/MG. Resumo: A produção de leite em Ituiutaba obteve um crescimento de 795,4% entre os anos de 1974 a 2013 (IBGE, 2013). Salienta-se que tal incremento produtivo é reflexo da instalação de uma transformadora de leite multinacional no ano de 1974 no município, bem como, devido a demanda das demais fábricas de Ituiutaba e região. Portanto, objetivou-se analisar as transformações socioespaciais provenientes da expansão produtiva do leite em Ituiutaba entre os anos de 1974 a 2013. Especificamente, buscou-se compreender a importância desta atividade para o município; verificar o estágio de evolução e/ou estagnação deste setor; averiguar o cenário produtivo leiteiro, frente a expansão de soja e cana de açúcar.Metodologicamente, a investigação foi realizada em etapas. Na primeira, fez-se o levantamento teórico, auxiliando a interpretação dos principais conceitos norteadores da pesquisa. Posteriormente,coletou-se dados secundários nos Censos tanto Agrícola de 1960, quanto Agropecuários de 1970, 1980, 1996 e 2006 do IBGE, dentre outros dados existentes no site do IBGE. Na terceira etapa, fez-se o trabalho de campo, neste realizou-se entrevistas aos sujeitos da pesquisa. Por fim, procedeu-se a análise e interpretação dos dados e informações coletadas, buscando a compreensão dos principais aspectos balizadores da organização/reorganização espacial, produtiva e econômica deste município. Introdução A metamorfose socioespacial em Ituiutaba/MG foi fundamentalmente proporcionada pela agricultura, enfatizando-se as culturas do arroz, milho, algodão, soja e da cana de açúcar. Na pecuária destaca-se aprodução leiteira, de carne bovina, suína e de frango. Este setor agropecuárioatende a necessidade das agroindústrias, as quais centraram-se no beneficiamento de grãos e gramíneas, bem como, do processamento de leite bovino, carne bovina, suína e galinácea(Mapa 1). 152 Mapa 1: Localização do município de Ituiutaba/MG na Microrregião Geográfica de Ituiutaba (MRG 017) No que tange a pecuária leiteira, ressalta-se o incremento deste setor nesta unidade territorial. O reflexo da expansão desta atividade gerou a reorganização produtiva agropecuária, resultando a redução da área plantada de importantes culturas, como relacionado ao arroz. Este foi o principal cultivo comercial em Ituiutaba até a década de 1980, o qual entre 1970 a 1980 diminuiu a área plantada em 55,9%. Em contrapartida, neste mesmo período, houve o crescimento da área destinada a pastagem plantada de 274,3%, aumentando também o número de bovinos em 98,7% (IBGE, 1960/1980), bem como, o número de vacas ordenhadas, 249,1%, entre 1974 e 1984 (IBGE, 2013). As transformações proporcionadas pelo crescimento da produção de leite foram condicionadas, a partir da década de 1970, devido a instalação da unidade industrial multinacional transformadora de leite da Nestlé. Neste sentido, houve o redirecionamento da produção de alguns estabelecimentos agropecuários, tendo como intuito atender a demanda desta agroindústria. Ressalta-se que, além da Nestlé, existem a Fazendeira, que foi fundada em 1938, e a Canto de Minas, que iniciou suas atividades em 1994. Destaca-se também, as agroindústrias leiteiras existentes nos municípios limítrofes que captam leite dos produtores de Ituiutaba. Salienta-se que, por meio do processo de modernização do setor agrícola, algumas atividades obtiveram maiores destaques, tanto relacionado às políticas públicas desenvolvidas, quanto ao interesse no mercado mundial. Destaca-se a soja, a partir da década de 1980 e, a cana de açúcar, a partir da década de 2000. 153 A pecuária leiteira, nesta unidade territorial,mantém o crescimento produtivo e, principalmente, de produtividade. Tal fato, refere-se a inserção de métodos, tecnologias e amparo técnico para a manutenção deste setor, frente a expansão do cultivo de grãos e gramíneas essencialmente importantes no cenário comercial brasileiro. Para compreender as metamorfoses resultantes da expansão da pecuária leiteira nesta unidade territorial, objetivou-se analisar as transformações socioespaciais provenientes da expansão produtiva do leite em Ituiutaba, entre os anos de 1974 a 2013. Especificamente, buscou-se (a) compreender a importância desta atividade para o município; (b) verificar o estágio de evolução e/ou estagnação deste setor e (c) averiguar o cenário produtivo leiteiro, frente a expansão de soja e da cana de açúcar. Metodologicamente, realizou-se esta investigação por meio de etapas. No que tange a primeira, houve a pesquisa bibliográfica, auxiliando a interpretação dos principais conceitos norteadores. Posteriormente, coletou-se dados secundários nos Censos tanto Agrícola de 1960, quanto Agropecuário de 1970, 1980, 1996 e 2006 do IBGE, dentre outros dados existentes nos bancos de dados do site do IBGE. Na terceira etapa, fez-se o trabalho de campo, realizando-se as entrevistas estruturadas em questionários aos sujeitos da pesquisa. Aplicou-se 64 entrevistas aos produtores de leite, bem como, às processadoras de leite do município, aos órgãos e instituições de fomento e promoção da agropecuária e, as empresas do setor agropecuário de Ituiutaba. Por fim, analisou-se e interpretou-seos dados e informações coletadas, resultando a compreensão dos principais aspectos balizadores da organização/reorganização espacial, produtiva e econômica desta unidade territorial. O desenvolvimento da pecuária leiteira no Brasil e as principais limitações A pecuária leiteira é um importante setor produtivo para o Brasil. Ressalta-se que esta atividade ocorre desde o principio da colonização, sendo que a criação de gado de acordo com Valverde (1967) foi a principal atividade econômica no período do Brasil-Colônia. Inicialmente o gado era criado com mínimos aparatos técnicos, viviam à solta, sem estabulação, silagem ou melhoria dos pastos, faziam apenas queimadas periódicas do capim. No que tange a expansão da pecuária bovina, Valverde (1967) destaca o sul do estado de Minas Gerais (Ituiutaba localiza-se a oeste destaUnidade Federativa). Dentre os fatores preponderantes para o desenvolvimentodesta atividade, alguns aspectos devem ser considerados, como os relacionados aos físicos-naturais, pois o 154 clima tropical que é amenizado pelas altitudes, a pluviosidade que é elevada e os rios perenes desta região, foram fundamentais. Por meio do incremento territorial, juntamente com o processo de independência e desdobramento político, aliado a necessidade de atividades produtivas alicerçadas ao uso do solo rural e beneficiamento agroindustrial para a evolução econômica, priorizou-se, a ampliação das atividades ligadas ao campo, as quais, até então, eram desenvolvidas pelos modos tradicionais. Utilizavam-se os aparatos técnicos pertinentes ao período. Neste contexto, aponta-se que a agricultura brasileira não se desenvolveu de forma sistêmica, ou seja, houve a expansão de algumas atividades, principalmente as que tangem a necessidade do mercado externo, deixando a margem os setores de menor interesse. Vilela; Bressan; Cunha (2001) consideram que neste cenário, a agricultura, que até meados da década de 1980 era desenvolvida em grande parte do território nacional de forma tradicional, com o desenvolvimento de políticas públicas, juntamente com o interesse do capital internacional, priorizou a inserção de técnicas e tecnologias, juntamente com a realização de estudos para maior e melhor produtividade. Entretanto, no que tange a pecuária leiteira, Vilela; Bressan; Cunha (2001, p. 9) ressaltam, Em meio a essas histórias de sucesso, o leite mal cobriu o fundo do copo. Qualquer que seja o índice de eficiência que se olhe, o setor de lácteos aparece à frente de uma lista de exceções no processo de modernização das atividades agroindustriais. Desta lista fazem parte alguns produtos típicos de consumo doméstico, como feijão, mandioca, batata-doce, entre outros, e mesmo o conjunto das atividades de algumas áreas menos desenvolvidas, notadamente do Nordeste. Alguns problemas são verificados frente a atividade leiteira. Peche Filho (2004, p. 34)aponta a existência de restrições técnicas, como pastagens degradadas, caracterizando em áreas que possuem “sulcos de erosão, altas infestações de plantas invasoras, principalmente as arbustivas e lenhosas substituindo boa parte do capim que desapareceu”. Além disso, existe a questão do baixo padrão genético dos animais para a produção de leite. Outro problema se refere à falta de tecnologias para adequar às diferentes realidades do país e, também, poucas pesquisas em zootecnia de precisão (Ribeiro; Lírio, 2006). Neste contexto, verificam-se ainda outras dificuldades enfrentadas por este setor, os quais se alicerçam ao tipo de transporte utilizado, as estradas precárias no 155 meio rural, falta de refrigeração do leite em algumas propriedades, assim como, a carência de fornecimento regular de energia elétrica (Ribeiro; Lírio, 2006). Salienta-se que o setor leiteiro passou por problemas até o fim da década de 1980. Este período foi marcado pela inserção dos interesses internacionais no campo brasileiro e, também, ações desenvolvidas pelo Estado. Aponta-se que, a iniciativa privada, juntamente com o poder público, priorizaram o desenvolvimento da atividade agrícola. Além disso, havia restrições ao setor leiteiro, como por exemplo, tabelamento do preço do litro do leite produzido. A pecuária leiteira neste cenário, obteve significativa depreciação, devido, principalmente, a importância dada a poucos segmentos produtivos agrícolas, como os relacionados a soja, a cana de açúcar e ao milho, os quais são reflexos das ações e interesses do mercado externo, congruente às políticas de desenvolvimento agrícola. Neste período ocorreu ainda a redução do programa de crédito rural subsidiado. Houve também, elevação da taxa de juros (Gobbi, 2006). Nesta perspectiva,Souza (1999, p. 41) salienta, A expansão ou retração da produção leiteira está relacionada às políticas econômicas adotadas. Ao analisar a conjuntura econômica brasileira, observam-se reduções da produção de leite no início dos anos 1980, em função da crise econômico-financeira ocorrida nesse período. Esse foi um período conturbado, cujos efeitos para o setor leiteiro foram de atraso tecnológico, baixa competitividades e perda de mercados. Dentre os fatores que causaram esta situação desfavorável, destacam-se: endividamento externo, déficit fiscal, inflação e redução de investimentos. No entanto, a partir da década de 1990 houve o crescimento do setor leiteiro no país, o qual se vinculou a expansão da necessidade deste produto no mercado interno e externo. Neste sentido, destaca-se que o sistema agroindustrial leiteiro passou por mudanças importantes. Jank;Galan (1997, p. 199) enfatizam, O sistema agroindustrial do leite brasileiro sofreu profundas mudanças de caráter estrutural desde a virada dos anos 90. Primeiro, veio a desregulamentação do mercado logo no início do Governo Collor, liberando os preços do produto após mais de quatro décadas de controle estatal. Simultaneamente, ocorreu a abertura comercial ao exterior e a consolidação do Mercosul, que representaram um incremento da concorrência com produtos importados. A produção de leite nesta perspectiva passou por um significativo incremento(Jank;Galan, 1997). Destaca-se que “A Cadeia Agroindustrial do Leite se configura como uma das mais importantes do agronegócio brasileiro, tanto sob a ótica econômica como social” (Campos;Piacenti,2007, p.9).Neste sentido, a cadeia 156 produtiva do leite, em abrangência nacional, vem desempenhando um relevante papel no suprimento de alimentos, na geração de empregos e de renda para a população (Gomes, 2001). No cenário produtivo agropecuário, Campos ePiacenti (2007, p. 4) referem que, “[...] a atividade leiteira participa na formação da renda de grande número de produtores, além de ser responsável por elevada absorção de mão de obra rural (contratada e familiar), propiciando a fixação do homem no campo”. Nesta perspectiva, verifica-se a importância desta atividade no cenário econômico nacional. Gobbi (2006, p. 38)aponta, [...] pode-se observar que o setor leiteiro mostra um comportamento representativo da economia brasileira, tanto na década de 1980, quando as políticas econômicas estavam voltadas para o controle da inflação, quanto na década de 1990, em que o setor passou por sérias mudanças estruturais decorrentes de fatores tais como: abertura econômica via globalização e Mercosul, estabilização econômica proporcionada pelo Plano Real e fim do tabelamento de preço. Portanto, verifica-se a importância da pecuária leiteira no panorama produtivo brasileiro, bem como relacionado às transformações socioespaciais. Contudo, observa-se que ainda há necessidade de desenvolvimento de políticas eficazes para esse setor, as quais proporcionarão melhorias no processo de produção, sobretudo para atender a necessidade do crescente mercado interno e, também, do exigente mercado consumidor externo. Aumentando a competitividade e, principalmente, a qualidade do produto final. Resultados Na perspectiva de tradição da bacia leiteira do estado de Minas Gerais e, por conseguinte, de Ituiutaba, o qual obteve um crescimento de 795,4% da produção de leiteentre os anos de 1974 a 2013 (IBGE, 2013). Faz-se importante compreender o cenário produtivo, bem como, a realidade vivenciada pelos produtores. Neste sentido, destaca-se a quantidade de vacas em produção nos estabelecimentos produtores de leite de Ituiutaba (Tabela 1). Tabela 1: Distribuição percentual do número de estabelecimentos produtores de leite com a quantidade de vacas em produção no município de Ituiutaba/MG Quantidade de vacas em produção 1 a 10 11 a 20 Estabelecimentos (%) 3,12% 23,43% 157 21 a 30 26,56% 31 a 40 18,75% 41 a 50 10,93% Mais de 51 17,18% Total 100% Fonte: Trabalho de campo realizado nos estabelecimentos produtores de leite do município de Ituiutaba/MG (2015). Org.: SOUTO (2015). Dos produtores entrevistados, verificou-se que 71,86% possuem menos de 41 vacas em produção. Neste viés, verificou-se a importância do pequeno e médio produtor. De acordo com a entrevista realizada no trabalho de campo, averiguou-se a percentagem da produção de litros de leite por estabelecimento em Ituiutaba (Tabela 2). Tabela 2: Percentagem da produção/dia de leite por estabelecimento no município de Ituiutaba/MG Quantidade de litros produzidos Quantidade de Produção por dia por produtor Estabelec. (%) 1 a 100 18 28,12% 101 a 200 20 31,25% 201 a 300 8 12,5% 301 a 400 3 4,68% 401 a 500 2 3,12% 501 a 600 5 7,81% 601 a 700 2 3,12% 701 a 800 2 3,12% Mais de 801 4 6,25% Total 64 100% Fonte: Trabalho de campo realizado nos estabelecimentos produtores de leite do município de Ituiutaba/MG (2015). Org.: SOUTO (2015). Analisando a tabela 2, ressalta-se a quantidade de produtores que, em sua maioria, produzem por dia entre 1 a 100 litros e 101 a 200 litros, os quais, correspondem ao total de 59,37% de toda a produção leiteira desta unidade territorial, isto referente a amostra estabelecida nesta pesquisa. Verificou-se que o pequeno e médio produtor de leite são importantes para a manutenção do setor leiteiro nesta unidade territorial. De acordo com a entrevista realizadas às agroindústrias leiteiras, 66,66% possuem fornecedores de leite referentes a pequeno e médio produtor e, 33,33% responderam que seus fornecedores são pequenos, médios e grandes produtores. Nesta perspectiva, 158 observa-se a área em hectares dos estabelecimentos agropecuários produtores de leite em Ituiutaba (Tabela 3). Tabela 3: Área do estabelecimento produtor de leite (ha) no município de Ituiutaba/MG Área (ha) de 10 a Estabelecimento( Área (ha) de 100 a Estabelecimento menos de 100 ha %) menos de 1000 ha (%) 10 a 20 39,06% 101 a 200 3,12% 21 a 50 42,18% 201 a 500 6,25% 51 a 100 7,81% 501 a 1000 1,56% Total 89,05% 10,93% Fonte: Trabalho de campo realizado nos estabelecimentos produtores de leite do município de Ituiutaba/MG (2015). Org.: SOUTO (2015). No que tange a área do estabelecimento agropecuário produtor de leite em Ituiutaba, ressalta-se que 39,06% possuem de 10 a 20 (ha) e 42,18% possuem entre 21 a 50 (ha). Neste sentido, verifica-se que, a maioria dos produtores de leite, desta unidade territorial, encontram-se no extrato de área entre 10 e 51 (ha), ou seja, 81,24% caracterizando a relevância destes estabelecimentos, os quais, em sua maioria, referem-se aos pequenos e médios produtores.Relacionando a tabela 3(Área do estabelecimento produtor de leite) com a tabela2 (Quantidade de litros de leite produzido por dia), pode-se dizer que os pequenos e médios produtores que possuem de 10 a 20 (ha) referem-se a 39,06% e os que possuem de 21 a 50 (ha) referem-se a 42,18% dos produtores de leite. Deste modo, visualizou-se que,28,12%produzem de 1 a 100 litros/diae 31,25% produzem de 101 a 200 litros/dia, representando 59,37% do total do leite produzido no município para atender a demanda das agroindústrias instaladas em Ituiutaba. De acordo comVilela; Bressan& Cunha (2001) em relação aos estabelecimentos produtores de leite no Brasil, verificou-se que em Ituiutaba, existe uma quantidade expressiva de pequenos e médios produtores de leite. Neste sentido, a quantidade de fornecedores de leite do município, bem como, a capacidade produtiva, juntamente com as atuais necessidades do setor agroindustrial leiteiro, contribuem para uma desvinculação das normas essenciais e aplicação de técnicas para melhor rendimento tanto produtivo, quanto econômico dos produtores, gerando insatisfações frente à comercialização do produto in natura. Contudo, as políticas e ações das agroindústrias nesta unidade territorial tem como finalidade melhorar a produtividade e, ao mesmo tempo, aumentar os lucros dos fornecedores que conseguem se adaptar, frente a realização de investimentos, proporcionando melhorias no processo produtivo. 159 Entre as contribuições, fomento e auxílio aos produtores de leite, salienta-se algumas, agroindústrias como a Nestlé, a qual realiza assistência técnica aos estabelecimentos, destacando-se o projeto Pró-sólidos, que busca incentivar a produção de leite com mais proteína e gordura, portanto de maior valor nutricional. Este tem como objetivo fornecer subsídio na dose de sêmen de touros provados para o crescimento de sólidos no leite. O programa Boas Práticas na Fazenda, foi estruturado tendo como referência experiências realizadas em países como França, Espanha, Austrália e Nova Zelândia, seu objetivo é o de garantir a segurança e a qualidade da matéria prima, bem como, a sustentabilidade ambiental e econômica das fazendas. Em Ituiutaba, 73% dos fornecedores da Nestlé fazem parte deste projeto, tendo como objetivo chegar ao ano de 2016 a 86% dos fornecedores inseridos no projeto (Trabalho de campo, 2015). Entretanto, observa-se a falta de incentivos, principalmente públicos, para a realização de financiamentos a baixos juros, com maior prazo voltado para este setor da economia. Através da realização das entrevistas e, por meio de conversas informais com os produtores e, também, nos encontros realizados, constatou-se diversas reclamações a respeito do pouco apoio governamental em nível municipal, estadual e federal, bem como, das instituições de pesquisa e fomento da atividade agropecuária. No entanto, mesmo apresentando dificuldades na produção desta matéria prima, vale ressaltar os principais fatores que contribuíram para o aumento da produtividade do leite, contribuindo para as metamorfoses no panorama produtivo, espacial e econômico. Entre elas, destacam-se a melhoria na alimentação do animal vinculado ao uso de ração, manejo do pasto, utilização de complementos alimentares capazes de oferecer maior rendimento à produção leiteira, como o milho, a silagem, entre outros, bem como, devido às melhorias da infraestrutura dos estabelecimentos, como o uso de cochos adequados para melhor indução do animal à alimentação, a instalação da ordenha mecanizada, utilização de tanques refrigeradores para armazenamento do leite, melhorias nas técnicas do trato e até mesmo o conforto do animal. Verificou-se, também, a redução do pessoal ocupado nos estabelecimentos agropecuários produtores de leite de Ituiutaba, resultado do processo de modernização responsável pela utilização de tecnologias como a ordenha mecanizada, a qual é presente em 39,07% dos estabelecimentos onde foram realizadas entrevistas por meio do trabalho de campo. Salienta-se que tal incremento produtivo é reflexo da instalação da Nestlé no ano de 1974 no município, bem como, devido a demanda das demais fábricas de 160 Ituiutaba e região, primando as transformações socioespaciais provenientes da expansão produtiva do leite em Ituiutaba. Considerações A produção leiteira em Ituiutaba é fundamental para o processo de organização e reorganização socioespacial, sendo responsável pelas transformações ocorridas na estrutura socioeconômica deste recorte espacial, principalmente após a década de 1970, período em que houve a implantação da Nestlé no município. Em relação ao produtor de leite, ressalta-se que este atua como o alicerce desta cadeia produtiva. Neste sentido, faz-se fundamental a organização de políticas públicas, ações do setor privado, bem como, aumento de subsídios e fomento para auxiliá-los, tanto para a manutenção da atividade produtiva, quanto para o favorecimento à modernização e expansão da produção, possibilitando o atendimento com qualidade e, produtividade agregada, para atender as demandas das fábricas processadoras de leite implantadas no município e nas demais existentes nas unidades territoriais limítrofes. Entretanto, mesmo diante o cenário de dificuldades encontradas para o desenvolvimento da pecuária leiteira, deve-se ressaltar o crescimento da utilização de importantes métodos para a manutenção desta atividade, como a utilização de tanques refrigeradores para armazenamento do leite in natura, utilização da ordenha mecanizada, manejo do pasto, suplementação alimentar, melhoramento genético do gado, os quais são fundamentais para a continuação no atendimento da demanda das agroindústrias na atualidade. Mesmo diante do atual cenário agropecuário, o qual se alicerça no cultivo da cana de açúcar e da soja, a pecuária leiteira segue mantendo a produção e, até mesmo, aumentando-a no período analisado. Salienta-se que existem interesses na realização de ações por meio das agroindústrias deste município, as quais estão voltadas para melhorar a produtividade, ao mesmo tempo que gera retornos positivos para os fornecedores, pois, aumentamos lucros dos mesmos. Entretanto, muitas vezes observa-se a falta de incentivos, por vezes, públicos, para a realização de financiamentos a baixos juros, com maior prazo. Por meio da realização de entrevistas e, também, a partir de informações obtidas com os produtores, constatou-se muitas reclamações, as quais se concentram no apelo da falta de políticas públicas e/ou de apoio governamental em nível municipal, estadual e federal. Reivindicaram também, maior atuação das instituições de pesquisa e fomento da atividade agropecuária no meio rural. 161 Em Ituiutaba, a agroindústria leiteira está em processo de desenvolvimento, principalmente na expansão da coleta de leite. Neste município, bem como nos demais limítrofes, verificou-se também a expansão das instalações prediais destas unidades. Consequentemente, este crescimento a partir da pecuária leiteira gera reorganizações do espaço, tanto urbano, quanto rural, poisa medida em que cresce a necessidade da oferta de leite in natura, os produtores devem atender a demanda, proporcionando a valorização do produto e a metamorfose socioespacial. Referências Campos, K. C.&Piacenti, C. A (2007). Agronegócio do leite: cenário atual e perspectivas. In XLV Congresso da SOBER, Londrina (pp. 1 – 18). Londrina: Universidade Estadual de Londrina. Gobbi, W. A. de O. (2006). A pecuária leiteira na comunidade da Canoa – Ituiutaba (MG): persistência e resistência. Dissertação de Mestrado em Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia. Gomes, S. T (1999). Diagnóstico e perspectiva da produção de leite no Brasil. In: Vilela, D. Bressan, M.; &Cunha, A. S. (Org). Restrições técnicas, econômicas e institucionais ao desenvolvimento da cadeia produtiva do leite no Brasil. (pp. 19-35). 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Cadeia de lácteos no Brasil: restrições ao seu desenvolvimento. Brasília: MCT/CNPq, Juiz de Fora: Embrapa Gado de Leite. Recuperado em 20 novembro 2014. 163 VITIVINICULTURA NA REGIÃO DE BENTO GONÇALVES: MUDANÇAS SOCIOECONÔMICAS EM DECORRÊNCIA DO ACORDO MERCOSUL. Doutorandos - Programa de Pós-Graduação Geografia Universidade Federal de Santa Maria/RS CECHIN, DILSON NICOLOSO [email protected] SAMPAIO, FRANCISCO MONTE ALVERNE DE SALES. [email protected] PEREIRA, FRANK GONÇALVES. [email protected] Acadêmicas –Curso de GeografiaBacharelado Universidade Federal de Santa Maria/RS XISTO, JÉSSICA MEDIANEIRA. [email protected] FERNANDES, SUZANA BIANCHIN. [email protected] RESUMO Este trabalho, produto do trabalho de campo na disciplina Geografia do Cone Sul/PPGEO-UFSM/2015, teve por objetivo observar a reação cooperativista frente às diversidades competitivas dos pequenos produtores de uva no município de Bento Gonçalves/ RS - Brasil.Conforme evidências, a região do vale dos vinhedos passou por um severo processo de esvaziamento populacional, decorrente da desvalorização da viticultura e vinicultura local, bem como da produção agrícola. Este, resultante da evolução tecnológica do modo de fazer e da competição com grandes empresas do setor, inclusive internacionais. Neste sentido, houve uma importante mudança nos processos de produção, comercialização e marketing: os produtores deixaram de vender a uva para as grandes vinícolas, somente o excedente, e passaram a produzir e comercializar seu próprio vinho e outros produtos, muitos de forma ecológica e sustentável. Somados a estas mudanças e com o reconhecimento da Indicação de Procedência do Vale dos Vinhedos, em 2002 houve forte valorização imobiliária na região, com índices entre 200% e 500%, e o reconhecimento do mercado diante dos vinhos produzidos no Vale, onde nos últimos 11 anos o número de turistas na região multiplicou, passando de 45 mil, em 2001, para quase 250 mil, em 2012. Palavras-chave: Vitivinicultura; Cooperativismo; MERCOSUL. Vale dos Vinhedos; Espaço Produtivo; INTRODUÇÃO Muitas são as descobertas e inventos que têm aplicação direta ou indireta no cultivo da uva e no fabrico do vinho. Da produção artesanal à mecanização, da meteorologia à microbiologia, da indústria pesada ao computador, beneficia-se a 164 indústria do vinho. A possibilidade de intervir numa das fases mais cruciais da produção, a fermentação, permitiu ao homem ordenar, disciplinar e manipular as características do vinho. O vinhateiro-artesão tornou-se figura rara diante da competição com grandes empresas nacionais e multinacionais e a produção automatizada em larga escala. Conforme Rossatto (2009), abertura do mercado mundial, com a globalização, provocou um apuro operacional da produção, mas com restrições a normas internacionais. Os acordos bilaterais ao longo de anos prejudicaram a comercialização dos produtos brasileiros; um exemplo: o vinho – a diminuição e isenção da tarifa para importação de vinhos e espumantes – já que os vinhos e espumantes importados contam com subsídios dos governos locais. Nos meses de colheita da uva (dezembro a março) a definição dos preços mínimos é periódica. Quase sempre, sem decisão, é adiada para pós-safra. Este problema é percebido na região do Vale dos Vinhedos, na serra do nordeste do estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Uma área onde predominam suaves colinas cobertas por parreirais, plátanos e araucárias. A região brasileira mais tradicional na produção de vinhos, cujo legado cultural e histórico se faz presente por parte da cultura italiana, há mais de 135 anos (FALCADE; MANDELLI, 1999). A região com destaque para a vitivinicultura foi pioneira ao buscar a Denominação de Origem (DO) para seus rótulos.Em termos de reconhecimento internacional, foi dado um grande passo pela vitivinicultura brasileira quando, no ano de 1995, o país aderiu ao OIV, organismo internacional que rege direitos do vinho pelo mundo. A Serra Gaúcha, como principal e mais tradicional região produtora de vinhos do Brasil, é responsável por cerca de 90% da produção nacional, com aproximadamente doze mil pequenas propriedades rurais que cultivam trinta mil hectares de vinhedos. A produção vinícola deve-se a cerca de 600 produtores, entre indústrias, cooperativas e cantinas familiares que elaboram mais de 350 milhões de litros por ano. Desde sua origem, esta vitivinicultura esteve assentada na produção de vinhos de consumo corrente (vinhos de mesa) provenientes de cultivares não-viníferas (burquinas e labruscas) e que, ainda hoje, representam mais de 80% do volume produzido. Nos últimos anos, todavia, tem havido uma diversificação de produtos com o crescimento dos segmentos de vinhos finos, espumantes e sucos de uva. Ao mesmo tempo, há um esforço renovado de qualificação da produção vinícola regional com vistas a retomar competitividade frente à “invasão” dos importados, a qual tem afetado, sobretudo, mas não exclusivamente, o segmento nacional de vinhos finos (NIEDERLE, 2009). 165 A região denominada como Vale dos Vinhedos é uma Rota Enoturística que envolve três municípios do Estado do Rio Grande do Sul: Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul. De uma agricultura diversificada, onde se comercializava apenas o excedente da produção, passou-se a uma especialização da produção, sendo direcionada especialmente ao cultivo da uva. A partir da segunda metade do século XX a produção passou por um revigoramento técnico, havendo assim, um aumento na produtividade e na qualidade da uva e consequentemente de seus derivados, especialmente o vinho e os espumantes. Em 2001, o resultado de toda essa evolução começava a se pronunciar. Com bastante sucesso chegaram ao mercado os primeiros vinhos com selo de Indicação de Procedência do Vale dos Vinhedos, região de Bento Gonçalves, onde se concentram as mais destacadas vinícolas da Serra Gaúcha (ROSSATO, et al, 2010). A Rota do Vale dos Vinhedos oferece mais de 50 empreendimentos, sejam eles vinícolas, hospedagem diversificadas, opções gastronômicas e outros empreendimentos comerciais que se beneficiam diretamente e indiretamente da atividade turística, possibilitando ao próprio visitante escolher os atrativos que lhe chamam mais atenção e o usufruto das atividades de seu maior interesse” (LAVANDOSKI, 2008). O estado do Rio Grande do Sul é responsável por mais de 90% da produção vinícola nacional. Considerando-se o total produzido verifica-se que em 2014 houve um pequeno acréscimo, 0,996%, na produção total de vinhos, suco e derivados, em relação ao ano anterior, decorrente da redução da produção de uvas devido às condições climáticas de baixa precipitação pluviométrica e retração de mercado. Tabela1: Quantidade de vinho e derivados produzidos do Rio grande do Sul. Elaboração de Vinhos e Derivados no Rio Grande do Sul - 2004 a 2014milhões de litros Vinhos Vinhos ANO Outros Derivados TOTAL Viníferas Comuns 2004 42,96 313,70 51,87 408,53 2005 45,45 226,08 53,50 325,04 2006 32,12 185,08 59,13 276,33 2007 43,18 275,25 70,89 389,32 2008 47,33 287,44 93,19 427,97 2009 39,90 205,42 96,50 341,82 2010 27,85 195,25 98,96 321,21 2011 52,20 258,73 151,15 461,07 2012 48,60 213,10 167,28 428,98 2013 48,40 197,90 125,15 371,45 2014 38,46 196,07 140,19 374,72 Fonte: IBRAVIN/MAPA/SEAPA/RS - Cadastro Vinícola - 2014 166 Quanto ao consumo per capita de vinhos no país, conforme tabela acima, situou-se em 1,91 litros no pior ano, 2006. O crescimento tem sido lento e o produto nacional continua perdendo mercado para os importados. Os vinhos de mesa vêm apresentando tendência crescente nos últimos anos, no entanto apresentaram redução na quantidade comercializada. No segmento de vinhos finos, para mudar este quadro, tem havido investimentos significativos na melhoria da qualidade nos últimos anos, com tendência a formação de várias indicações geográficas, a exemplo do Vale dos Vinhedos. Quanto ao modo de produção, o sistema de condução latada, este feito por uma pérgola com moirões ou postes, onde os cabos correm no topo, por aonde troncos e ramos vão se estendendo, formando a ramada. A impressão visual desse sistema é um telhado verde, onde os cachos, entretanto os ramos crescem e se fecham, e os cachos de uvas que pedem por baixo não recebem boa insolação. Além disso, no verão, quando chove, o caramanchão forma uma estufa quente e úmida, propiciando o aparecimento de doenças. Enquanto, o sistema espaldeira, também chamado deGuyot, utiliza moirões ou postes de cimento ou madeira, fincados a espaços regulares, pelos quais correm dois ou mais cabos de arame, um acima do outro. Os ramos são conduzidos através desses cabos e frutificam sem necessidade de outras escoras. Esse sistema lembra uma parede verde, onde os cachos dispõem em alturas diferentes recebendo boa aeração e insolação. Sobre o processo de produção, as principais etapas são: a colheita, o desengaçamento, a prensagem, a fermentação, a filtragem, e o armazenamento.Ao mesmo tempo em que, hoje a criação de novas vinícolas combina a funcionalidade de um programa industrial com a tecnologia, o design e a arte, já que a paixão por vinhos esta se estendendo por todo o mundo, onde os produtores de vinho estão se esforçando para fortalecer suas posições no mercado com uma imagem corporativa original, que ilustra o espírito da vinícola. Do rótulo na garrafa até o edifício de produção, a programação de cada elemento visual recebe atenção meticulosa. As novas vinícolas, suas áreas de produção e suas salas de vendas estão se tornando espaços aconchegantes de convivência para retratar a marca. A popularização da cultura do vinho tem transformado vinícolas em centros para lazer e turismo, para isso alguns incluem nos programas restaurantes e hotéis com vinho terapia.No final da década de 1990, surgiu o desejo de mudar, então os antigos vinhedos, estes plantados pelo sistema tradicional de "latada", que não favorecia a produção de uvas de qualidadepassaram para o sistema de espaldeira simples ou em forma de lira, o que facilita uma boa insolação e, consequentemente, a produção de uvas de excelente qualidade. 167 Este trabalho foi iniciado em 2000 e hoje cerca de 400 hectares de vinhedos já estão enquadrados no novo padrão de plantio, tanto na Serra Gaúcha quanto nos novos vinhedos da empresa localizados na região da Campanha, na divisa com o Uruguai, em Bagé e em Santana do Livramento. Optando sempre pela qualidade, os vinhedos têm rendimento controlado e os produtores tiveram que se adaptar às novas regras. HIPÓTESES A falta de associativismo/cooperativismo na produção da viticultura e vinicultura pode vir a interferir no modo de produção e rendimento local.E, de que formas os acordos firmados no MERCOSUL influenciariam no espaço produtivo da área. METODOLOGIA O trabalho em análise refere-se a uma saída de campo realizada no Vale dos Vinhedos, região nordeste do Estado do Rio Grande do Sul. O trabalho foi referente a uma observação in locopara entender como se deu a inserção cooperativista entre os produtores da região. A partir dos conhecimentos prévios,foi possível identificar uma série de informações conceituais que serviram como um suporte teórico-metodológico para a referida pesquisa onde as mesmas, foram descritivamente analisadas e entãoincorporadas por meio de umquestionário não estruturado, decorrente das exposições dos produtores de uva do local.Portanto, o trabalho de campo serviu de base para avistar a realidade do espaço em estudo e assim, constatar as divergências que há entre o espaço de ideias e espaço de produção. E, a partir destas bases a elaboração deste estudo. DESENVOLVIMENTO A região do Vale dos Vinhedos tem uma tradição de mais de 135 anos no cultivo da uva e na produção de vinhos. É atualmente uma das áreas mais prósperas do Rio Grande do Sul. O Vale dos Vinhedos (Figura 1) situa-se a nordeste do estado do Rio Grande do Sul e sua área total compreende 81,23 Km², sendo a maior parte localizada em Bento Gonçalves e estendendo-se sobre os municípios de Garibaldi e Monte Belo do Sul (FALCADE; MANDELLI, 1999). 168 Figura 1: Área geográfica Vale dos Vinhedos. Fonte:Falcade; Tonietto, 2010. As condições naturais da região são heterogêneas, com relevo que se apresenta em patamares e as vertentes formam escarpas, o que designa a denominação de região serrana, além disso, apresenta grande variabilidade de solos (SARMENTO et al., 2006); (FALCADE; MANDELLI, 1999). Quanto ao uso e ocupação vincula-se à imigração italiana, especialmente a viticultura, que é o cultivo de uvas. Esta atividade, por sua vez, é desenvolvida em pequenas propriedades rurais, com média de 15 ha de área total e 2,5 ha no caso dos vinhedos. A topografia acidentada, a pouca mecanização e o predomínio da mão de obra familiar são também características locais (PROTAS et al., 2004). O uso e cobertura do solo, as áreas agricultadas para os vinhedos representam 2.123, 95 hectares, totalizando 26,14 % da cobertura total do solo do Vale dos Vinhedos, sendo assim a atividade que mais significativa em termos de área ocupante. Para concluir a importância dessa concepção, que por definição e como objeto de estudo, tem na relação entre Sociedade/Homem e Natureza, seu fazer científico, exemplificamos o caso do objeto de análise desse artigo.A relação do Vale dos Vinhedos de sua economia, com a cultura dos imigrantes italianos, seus fazeres e 169 saberes, juntamente com a paisagem da serra, tornou esse sistema único e sob o ponto de vista do patrimônio cultural e imaterial, passível de conservação e por consequência apropriada para atividades turísticas. Sua situação econômica e social vigente, chama à atenção, e como principais propulsores econômicos da região estão a viticultura e a vinicultura. Atividades que predominam na zona rural e impulsionam também a agroindústria, de modo que além de fonte de renda para famílias que vivem desta cultura, proporciona que o dito êxodo rural tão comum em todo Brasil, em alguns casos transforme-se em êxodo urbano, no entanto, mais pelos fatores atrativos do campo do que repulsivos da cidade. Conforme foi evidenciado em trabalho de campo, a região do vale dos vinhedos passou por um severo processo de esvaziamento populacional, sobretudo da população mais jovem, em decorrência da desvalorização da viticultura e vinicultura locais, bem como toda produção agrícola. Esse fato foi decorrente também da evolução tecnológica do modo de fazer e da competição com grandes empresas do setor. Conforme Falcade e Mandelli, a evolução da vitivinicultura no RS e no Vale dos Vinhedos, esta diretamente ligada a identidade do imigrante italiano, [...] a evolução tecnológica ao longo das ultimas três décadas, aplicada ao processo produtivo vitícola e vinícola, tem resultado em produtos que estão conquistando mercados mais exigentes e alcançando renome. (1999, p. 24). Nesse contexto de mudanças e modernização, nos anos 90, houve o fortalecimento das vinícolas familiares no Vale dos Vinhedos. Nesse sentido houve uma importante mudança: os produtores deixaram de vender a uva para as grandes vinícolas e passaram a produzir e comercializar seu próprio vinho. Esse fato, aliado ao desejo da maioria dos descendentes de imigrantes italianos de ter sua própria vinícola, foi somado ao de que algumas vinícolas de grande porte da cidade de Bento Goncalves e de toda a Serra gaúcha passaram por crises setoriais, sendo que muitas faliram nos anos 90. Essa crise, por sua vez, foi consequência da entrada de vinhos importados com custo inferior, fato conhecido pelos produtores de uva da Serra gaúcha como “febre da garrafa azul” e por problemas administrativos; financeiros, como foi o caso da Cooperativa Vitivinícola Aurora e Companhia Vinícola Rio-grandense, no inicio e meados dos anos 90 (VALDUGA, p. 83). Aliado à crise, a implantação do acordo MERCOSUL trouxe uma nova realidade socioeconômica para a Região Sul do Brasil, na medida em que promoveu mudanças nas relações econômicas, principalmente nas regiões de fronteiras entre os países signatários deste Tratado. Os primeiros a sentirem o reflexo desse bloco 170 econômico foram às empresas vinícolas de pequeno e médio porte, ameaçadas principalmente por produtos de baixo custo.Em decorrência disso, os pequenos produtores vinícolas da região de Bento Gonçalves, por volta do início das décadas de 1990 e 2000, sentiram a diminuição das vendas de seus produtos tradicionais, como a uva em natura, sucos de uvas e a graspa. Esta situação de desorganização no sistema produtivo da viticultura, antes produtiva, ocasionou, também, a desvalorização dos ativos patrimoniais, notadamente, as terras – as propriedades já bastante fracionadas em função dos herdeiros. As propriedades rurais, que em maioria se constituem pequenas, em torno de 4,0 hectares, ficaram com valor de mercado entorno de R$5.000,00 por hectare.Tradicionalmente os produtores familiares trabalhavam de forma individual e desorganizada ficando passíveis a sofrerem mais os efeitos das adversidades comerciais: a concorrência com vinícolas médias e grandes já consolidadas. Apesar da forte integração do Mercosulo setor de uva e vinho no Brasil oferece também uma resistência. “... encontram uma concorrência que cresce com base no desenvolvimento das pequenas empresas vinícolas e das cantinas rurais, que aproveitam o crescimento do mercado de vinhos comuns e o aumento de demanda nas classes mais populares” (WRIGHT, et al, 1992). Eis então o início do surgimento das pequenas vinícolas, cujo foco é na qualidade em detrimento da quantidade, como forma de sobrevivência em um mercado extremamente competitivo. Esse cenário de crise fez com que muitas vinícolas deixassem de pagar aos produtores que por sua vez tiveram que se adaptar à nova realidade e estruturar empresas próprias, organizar associações e produzir vinhos. O ano de 1995 representou um marco para o setor, pois foi criada Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (APROVALE), fruto da organização de seis vinícolas da região. Os principais objetivos eram: a qualificação dos produtos vinícolas e derivados e o estimulo e a promoção do potencial turístico da região.A APROVALE é responsável também pelo controle dos produtos protegidos pela Indicação Geográfica do Vale dos Vinhedos e sua gestão; responsável pelas condições organizacionais que operacionalizaram e permitiram a consumação da Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, reconhecida em 2002 e concedida em 2012, pelo Instituto Nacional de Pesquisa Industrial (INPI) (EMBRAPA, 2012). Agora, já em forma associativa e ou cooperativa de trabalhos, os pequenos produtores de uvas e vinhos também passaram a adotar sistemáticas modernas, muitos de forma sustentável, de cultura orgânica, de organização do parreiral e do processamento da uva. Caracterizam-se por: mudanças de algumas espécies viníferas; adoção de forma de plantio do tipo espaldar – que proporciona atividades 171 mecanizadas e rapidez funcional, gerando bagas de melhor qualidade; equipamentos de última geração e técnicas melhoradas otimizando custos de produção. Assim, agregando valor e qualidade a toda produção processada, se constitui num dos primeiros elementos de ingresso no mercado, mesmo em pequena escala, mas competitivo com os produtos de outras vinícolas renomadas da região e também de importados. Uma importante pesquisadora sobre a temática afirma que, a partir da Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, transformações ocorreram, como o incremento na área cultivada de Vitisvinifera, com novas formas de condução (espaldeira e latada aberta); a qualificação dos vinhos produzidos; a instalação de novas vinícolas com elevado padrão tecnológico e a diversificação das atividades econômicas, como o enoturismo, incluindo a instalação de pousadas e hotéis e gerando aumento do número de empregos; o surgimento de novas relações de produção, como a integrada; a pavimentação das estradas e o aumento do trânsito de automóveis e ônibus; a modernização das habitações e o embelezamento do entorno das residências e vinícolas; a valorização das propriedades e da produção qualificada, elevando a renda (FALCADE, 2006). Seguindo o processo de mudanças que foi adotado em conjunto, como forma de superar os problemas detectados, os pequenos produtores passaram a abandonar as técnicas antigas de vitivinicultura, processos artesanais, herança dos primeiros imigrantes. Adotaram técnicas de processos mais atualizados que proporcionam mais eficiência no manejo e nos resultados dos produtos processados da uva. Para promover estas mudanças os pequenos produtores, além de terem se associado como já enfatizado, passaram a atuar como tal na busca de apoio juntos aos órgãos governamentais locais, estadual e nacional. Esta busca resultou frutífera, pois, as cooperativas/associações passaram a ter mais incentivos, implementação de apoio – não só financeiro, mas de treinamento técnico, suporte de produção e novas estratégias de comercialização. CONCLUSÃO Mesmo que ocorram algumas mudanças na variação do uso tradicional da terra percebem-se modificações, não só na produção, como também na cultura, nas formas de vida e na forma de se relacionar com o espaço. Porém, estas mudanças ao mesmo tempo em que introduzem novas formas de relacionar-se com o território – novas territorialidades, novas identidades – provocam um fortalecimento do espaço 172 local pela afirmação enquanto indivíduos e/ou grupo unido e pertencente àquele território, ainda típico de seus ancestrais. Diante de todo este conjunto de problemas relatados os pequenos produtores se deram conta que o maior problema deles era a falta de união e organização. Passaram a adotar como forma de enfrentamento a todas as adversidades o cooperativismo/associativismo como ferramenta de superação. Com a implantação das cooperativas e associações os problemas e as estratégias de mudanças e superação dos mesmos, em geral comum a quase todos, passaram a ser identificados, de forma sistemática, atacados para serem superados e ou contornados. Neste sentido, foram adotadas as estratégias a seguir abordadas na tentativa de superar os problemas identificados. Como a produção quantitativa na pequena propriedade era inviável foi adotada a qualidade como estratégia operacional. Ficou comprovado pela prática dos produtores concorrentes locais e do exterior que o uso da uva produzida de boa qualidade era de suma importância para, mediante processamento/industrialização, produzir-se resultados de boa aceitação como os produtos do tipo: vinhos finos e sucos finos, que são importados dos países vizinhos do MERCOSUL e vendidos no mercado local e nacional com excelente aceitação. Muitos viticultores, conforme relatos, em função de uma rentabilidade mais rápida, estão transformando o uso do território. Até mesmo eliminando espécies viníferas (VitisVinifera), para dar lugar àquelas para suco, como as americanas ou híbridas. Outros mudam até mesmo para outro tipo de produção agrícola – que na área em questão se limita muito em função do relevo acidentado. Diante das diferenças, principalmente a grandes proprietários produtores, muitos adotaram técnicas de superação dos problemas relatados, como a introdução da prática da cultura ecológica, que é caracterizada pela produção sustentável. Prática esta também adotada por pequenos produtores de hortaliças, que através de cooperativa/associação que coordena ações, macros, de política organizacional, estratégicas de marketing, logística de comercialização e entrega dos produtos, permanecendo a independência de ação de cada associado. Outra grande conquista obtida pelos produtores foi a obtenção do Registro da Denominação de Origem do Vale de Vinhos, cujoSelo era aguardado há quase 10 anos pelos produtores da serra gaúcha. A certificação vale para os vinhos e espumantes das variedades merlot e chardonnay. Segundo a Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), os produtos devem valorizar em até 30%. A expectativa é que o selo já possa ser visto nas mercadorias nas prateleiras em dois 173 meses. O selo, que foi concedido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), é uma forma de proteger e valorizar a identidade dos produtos da região. Segundo Falcade (2006), a partir da Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, muitas transformações ocorreram: incremento na área cultivada de Vitisvinifera, com novas formas de condução (espaldeira e latada aberta); a qualificação dos vinhos produzidos; a instalação de novas vinícolas com elevado padrão tecnológico e a diversificação das atividades econômicas, como o enoturismo, incluindo a instalação de novas pousadas e hotéis, gerando aumento do número de empregos; o surgimento de novas relações de produção, como a integrada; qualificação na infraestrutura dos municípios, como a acessibilidade por estradas pavimentadas; a modernização das habitações e o embelezamento do entorno das residências e vinícolas; a valorização das propriedades e da produção qualificada, elevando a renda. Um dos principais sintomas percebidos do sucesso das modificações introduzidas nos sistemas produtivos das pequenas propriedades da região de Bento Gonçalves foi a valorização espetacular das mesmas, que alcançaram valores estratosféricos, variando de R$600.000,00 a R$800.000,00 por hectare, conforme informações dos próprios pequenos produtores visitados. Ainda com base nas informações dos pequenos produtores visitados e entrevistados, seus novos produtos processados nas propriedades, estão a com produção aumentada e sendo bem aceitos pelos consumidores, que destacam a excelente qualidade dos mesmos, o que não acontecia no passado. Outra demonstração da boa qualidade dos novos produtos é atestada pelos prêmios que os mesmos vêm ganhando em feiras de exposição e degustação de vinhos, sucos, graspas e espumantes. Para alegria das famílias dos pequenos produtores muitos membros que tinham migrado para as cidades, agora já estão voltando para a lida no campo. Muitos deles com formação e treinamento específicos para atuarem de forma objetiva e eficiente nos sistema produtivo das pequenas propriedades, além das escolas técnicas que estão sendo fundadas para treinamento dos filhos dos pequenos produtores, que de forma consciente e objetiva à formação dos futuros produtores rurais, jovens que certamente com mentes abertas às mudanças, diferentemente dos seus ancestrais que eram resistentes às quebras dos paradigmas. BIBLIOGRAFIA CASTRO, I. E. Paisagem e turismo. De estética, nostalgia e política. In: YÁSIGI E. (Org.) Turismo e paisagem, São Paulo, Contexto, 2002. (Turismo Contexto) 174 CRUZ, R. C. A. As paisagens artificiais criadas pelo turismo. In: YÁSIGI E. (Org.) Turismo e paisagem, São Paulo, Contexto, 2002. (Turismo Contexto) EMBRAPA: Uva e Vinho. Disponível em: http://www.cnpuv.embrapa.br/tecnologias/ig/valedosvinhedos.html Acesso 24/07/2015. FALCADE, I.; TONIETTO, J. 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Resumo Leonardo Pinto dos Santos36 Elizandra Voigt37 Jaqueline Lessa Maciel38 O artigo visa salientar as mudanças no estilo de vida da população decorrentes do atual sistema globalizante, onde o sedentarismo e má alimentação muitas vezes influenciam no aparecimento de algumas doenças. Enfatiza-se a microterritorialidade de pessoas com câncer na Feira Ecológica da Redenção, as quais buscam um estilo de vida mais saudável e de acordo com o tratamento estabelecido para a cura da doença. Os objetivos específicos buscaram: (a) Destacar os problemas existentes nas cidades; (b) Descrever a influência do atual modelo capitalista na alimentação e saúde das pessoas; (c) verificar a microterritorialidade de sujeitos com câncer existente na Feira Ecológica da Redenção. A relevância da pesquisa justifica-se pela importância dos estudos referentes à temática, visando demonstrar as transformações no modo de vida das pessoas por meio dos hábitos alimentares. Metodologicamente a pesquisa foi estruturada em etapas. Inicialmente realizou-se o resgate conceitual. A segunda etapa se constituiu em levantamentos de dados em fontes secundárias. A terceira esteve relacionada ao trabalho de campo. Nesta perspectiva, aliando os conceitos aos dados coletados e a observação in loco, foi possível compreender a microterritoriadade das pessoas com câncer na Feira Ecológica da Redenção. Palavras-chave: Cidades; Microteritorialidade; Feira Ecológica da Redenção; Porto Alegre; Globalização. Um bicho estranho chamado cidade! Engraçada essa “coisa” que chamamos de cidade. Lugar onde ocorre a mais perversa segregação é também o espaço por onde florescem diversidades. A cidade é um objeto de estudo complexo. Estudada por muitas ciências é alvo de antropólogos, sociólogos, geógrafos, arquitetos, historiadores, das artes, da arqueologia entre outras. Pela própria diversidade e embates ali existentes se torna objeto fecundo de reflexões. É na urbe que sonhos emergem e são destruídos, é na cidade que convivem a diversidade, é nela que coabitam doutores e analfabetos, ricos e pobres, negros e brancos, idosos e jovens, homens, mulheres, transgêneros... punks, anarquistas, emos, roqueiros, patricinhas, hippies... é na cidade que as cores, os odores, os sonhos 36 Doutorando em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Endereço: Avenida Roraima, 1000, Departamento de Geociências Prédio 17, Campus UFSM, Santa Maria, RS, 97105-900. E-mail: [email protected]. 37 Doutoranda em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Endereço: Avenida Roraima, 1000, Departamento de Geociências Prédio 17, Campus UFSM, Santa Maria, RS, 97105-900. E-mail: [email protected]. 38 Doutoranda em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Endereço: Avenida Roraima, 1000, Departamento de Geociências Prédio 17, Campus UFSM, Santa Maria, RS, 97105-900. E-mail: [email protected]. 177 e emoções se misturam. A cidade se transforma como um calidoscópio da diversidade que constrói esse urbano em sua prática e em suas próprias imaginações. Na diversidade de sonhos e interesses se (des)constroem lugares, se definem caminhos, se organizam racionalidades dominantes e contrarracionalidades. A cidade pode ser comparada a um organismo vivo, em constante mudança, ou seria melhor metáfora pensá-la como uma hidra de muitas cabeças, um organismo vivo que pulsa que se reconstrói constantemente. Uma cabeça da hidra é arrancada e logo surge outra, diferente, incomum, não familiar ao velho habitante, surgida a partir da reprodução do capital essa nova cabeça configura uma organização espacial urbana que pratica a perversidade de transformar seres iguais em seres desiguais. As cidades são realmente um “bicho estranho” onde são produzidas vivências e onde se busca a concretude de diversos sonhos. Mas este “bicho estranho” está ficando doente, e com ele enfermo os cidadãos do mundo também ficam. O escritor Eduardo Galeano (2009, p. 87) bem resume o atual momento da sociedade urbana. Meio século depois, os seres urbanos estamos todos mais ou menos loucos, embora quase todos vivamos, por razões de espaço, fora do manicômio. Desalojados pelos automóveis, encurralado pela violência, condenados ao isolamento, estamos cada vez mais amontoados e cada vez mais sozinhos e temos cada vez menos espaços de encontro e menos tempo para nos encontramos. Cada vez mais a população se refugia nas cidades. No Brasil 85,43% (IBGE, 2014) da população reside na área urbana, e essa grande parcela populacional se encontra com uma infraestrutura deficitária impedindo a manutenção de uma qualidade de vida aceitável. O processo de urbanização no Brasil, bem como, na maioria das nações da América Latina se desenvolveu de forma descontrolada. Sem planejamento e controle algum, caímos na (re)produção de uma cidade, mas essa cidade é uma cidade doente produzindo sujeitos doentes. Esse é o enfoque presente neste artigo. Ou seja, a discussão centrará na questão da “microterritorialidade” e/ou “microterritorializações” (COSTA, 2008; 2010; 2013) com destaque para uma pequena parcela territorial do espaço urbano de Porto Alegre, Brasil. Desse modo, centrar-se-á o foco de análise na Feira Ecológica da Redenção, a qual ocorre todos os sábados pela manhã na capital do estado do Rio Grande do Sul, Brasil, enfocando a presença da microterritorialização de pessoas com câncer. “O desenvolvimento desse bicho estranho!” Entre a época neolítica, quando houve a grande revolução que gerou o homo sapiens, até os inícios da cristandade, um período que se 178 conte em milênio (três? cinco?), a população do planeta apenas dobra, passando de 100 ou 120 milhões a 250 milhões de habitantes. Para que a população dobrasse outra vez, foram necessários quase quinze séculos, entre a época romana e o reinado de Luís XIV, quando os efetivos humanos somavam 500 milhões, para alcançar 545 milhões em 1750. A nova duplicação do estoque humano vai darse em apenas um século, pois em torno de 1850 havia entre 1,1 bilhão e 1,2 bilhão milhões de homens. Desde a fase em que Bismarck e Cavour constroem a unidade da Alemanha e da Itália e o fim da Segunda Guerra Mundial, a população mundial duplica de novo, chegando a 2,4 bilhões de 1950. Daí para cá, a aceleração se torna prodigiosa. Quinze anos depois, em 1965, contamos 3,5 bilhões de criaturas sobre a face da terra. Somos, hoje, quase 5 bilhões e admite-se que na virada do século a sociedade humana estará formada por quase 6,5 bilhões de viventes (SANTOS, 2014, p. 43). Como na previsão de Santos (2014), atualmente existem mais de sete bilhões de habitantes (ONU, 2013) no mundo, sendo que grande parcela destes, volta-se a habitar os grandes centros urbanos. O crescimento populacional deu um salto com os avanços, principalmente no campo da saúde, transporte e alimentação. Este avanço técnico permitiu uma mudança no perfil demográfico, o que possibilitou como característica preponderante, um claro envelhecimento da população. A esta nova característica da população brasileira se imprimi novas características de relação homem X natureza advindas principalmente do processo conhecido como globalização. Esse processo tende homogeneizar estilos de vida, visando padronizar (e conseguindo!) principalmente os “maus hábitos” de vida, os quais expandem os fatores de risco do mundo contemporâneo. “É este discurso, desta forma específica de globalização, que é um importante componente da contínua legitimização da visão de que há um modelo específico de “desenvolvimento”, um caminho para uma forma de “modernização”” (MASSEY, 2013, p.129). Com a globalização agindo, muitas vezes de forma perversa, como abordado no estudo de Santos (2000), está sendo percebida na sociedade, a diminuição das doenças infectocontagiosas e o aumento alarmante das doenças crônico- degenerativas. Além disso, esse processo acaba causando gastos elevados com a saúde pública, mas ao mesmo tempo insuficientes, para o tratamento deste número crescente de pacientes, muitas vezes impedindo, o investimento em outras áreas tais como a educação e a segurança. A partir dessas reflexões, enfatiza-se o problema do câncer no Brasil, o qual está, cada vez mais, conquistando lugar nas agendas de discussão, tanto do poder público, quanto da população em geral. Com a expectativa de vida aumentando, a melhoria e a evolução dos métodos de diagnósticos e com o padrão de vida 179 “ocidental” que a globalização delineou em diversos pontos do planeta, está ocorrendo uma elevação nos casos de diagnóstico de câncer. Convêm destacar que o câncer é o nome dado a um conjunto de mais de cem tipos diferentes de doenças, as quais apresentam como ponto comum o crescimento desordenado de células anormais com potencial invasivo. Além disso, sua origem se dá por condições multifatoriais. Esses fatores causais podem agir em conjunto ou em sequências para iniciar ou promover o câncer (cancinogênese). (INCA, 2015). O Instituto Nacional de Câncer (INCA, 2015) projeta que em 2030 o montante de novos casos de câncer em escala global será de 21,4 milhões, sendo que desses, haverá 13,2 milhões de óbitos. Assim entende-se, ser extremamente importante, que sejam implementadas ações preventivas para reduzir a carga do câncer. Ações contra o tabagismo (relacionado ao câncer de pulmão, entre outros); promoção de uma alimentação saudável (para a prevenção dos cânceres de estômago e intestino, entre outros); vacinação para Papilomavírus humano (HPV) e hepatite (contra o câncer do colo do útero e de fígado) entre outras ações, que visem ir de encontro, às práticas ofensivas a saúde humana, estabelecidas pelo atual sistema capitalista. (INCA, 2015). Além dos exemplos das ações supracitadas, a população pode buscar a adoção de um estilo de vida mais saudável, com hábitos alimentares benéficos a saúde. Esse é um importante ponto que será enfatizado neste artigo. A busca por uma alimentação saudável elevou a circulação de pessoas na Feira Ecológica da Redenção, dentre os indivíduos que por ali passam a uma grande quantidade de pessoas diagnosticadas com algum tipo de câncer e que buscam ali uma alimentação “limpa” da carga de agrotóxicos, que abastecem principalmente as áreas de cultivo dominadas pela monocultura. Com base nas reflexões apresentadas, pode-se afirmar que há uma microterritorialização de homens e mulheres que partilham um diagnóstico positivo para doenças cancerígenas. Ao realizar observações in loco, aos sábados pela manhã na área do Parque Farroupilha, bem como entrevistas informais aos donos das bancas, é possível perceber que houve nos últimos anos um aumento no número de consumidores da feira, os quais apresentam características de pessoas que estão se recuperando da doença, como por exemplo, a falta de cabelo e/ou lenços cobrindo a cabeça. Ainda sobre a questão das microterritorialidades, destaca-se que o prefixo “micro” atrelado ao território busca atrelar o sentido de “ação individual e coletiva que leva a apropriação de certas partes do espaço produzido/usado por outros sentidos diversos que anteriormente pensado” (COSTA, 2013, p.63). 180 A partir desse ponto, o trabalho apresentará a caracterização histórica da área de estudo, ou seja, a Feira Ecológica, e posteriormente uma revisão sobre o conceito de território e seus desdobramentos (HAESBAERT, 2002; 2005; 2014; e COSTA, 2008; 2010; 2013). Características da área de estudo: A Feira Ecológica da Redenção A Cooperativa Coolmeia, criada em 1978, possuía como princípios básicos o ecologismo (preocupação e cuidado com a preservação ambiental, utilizando tecnologias moderadas), naturismo (modo de vida fundamentado no retorno à natureza, através de práticas ecológicas) e cooperativismo (valorizar o coletivo tanto na produção quanto na organização da feira). Reunia três categorias de associados: produtores, operacionais e consumidores, os quais trabalhavam para zelar as atividades da cooperativa. Toda essa sapiência foi passada adiante quando, em 16 de outubro de 1989, para comemorar o Dia Mundial da Alimentação e o Dia Mundial de Luta Contra os Agrotóxicos, foi idealizada e organizada a Feira Orgânica dos Agricultores e Ecologistas (FAE). Com o fechamento do Núcleo de Ecotecnologias da Coolmeia, em 2004, instrumento que era responsável por visitas aos produtores e assistência da produção ecológica, surgiu a Associação dos Agricultores Ecologistas Solidários do Rio Grande do Sul. Corporação com caráter jurídico que salienta a qualidade da produção, nos mesmos moldes da Coolmeia, garantindo a certificação dos produtos orgânicos através da rede Ecovida – Organismo Participativo de Avaliação de Conformidade – que em dezembro de 2010, ante o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) passou a ter o mesmo crível que possui uma certificadora convencional. Nas revisões de literatura sobre o assunto, é importante destacar o pensamento de Lutzenberger (1998, p.01) quando afirma que: Os agricultores regenerativos modernos estão aprendendo a se tornar cada vez mais sustentáveis, com colheitas ótimas e métodos localmente adaptados, enquanto recuperam e mantém a biodiversidade nos seus cultivares e na paisagem circundante. Vamos chamá-los agricultores regenerativos, e não biológicos, orgânicos ou alternativos. Quando se trata de vida, seja bom ou mau, tudo é biológico, é orgânico, mesmo grandes massacres. Alternativo apenas significa diferente, poderia ser pior. Mas regenerativo significa regeneração do que tem sido perdido ou destruído. A FAE, que também é conhecida como Feira Ecológica da Redenção, foi fundada por José Lutzenberger, Sebastião Pinheiro, Jacques Saldanha, Nélson Diehl, Glaci Campos Alves, e outros, em 1989. Desde então funciona aos sábados no 181 Parque Farroupilha das 07h30min às 13 horas, reunindo produtores agrícolas de Porto Alegre e do interior do Rio Grande do Sul, organizados por cooperativas. Na feira, são comercializados produtos hortigranjeiros e agroindustrializados livres de agrotóxicos ou substâncias sintéticas. Através do comprometimento dos consumidores, operacionais e produtores rurais e urbanos, a Feira conquistou, por intermédio da imprensa, ampla divulgação. A primeira realização da feira contou com um público superior a cinco mil pessoas, o que levou ao término dos produtos em menos de quarenta minutos. Foi a partir de então, que os envolvidos decidiram que deveriam dar continuidade. Pelo fato de não haver produtores, produção e gerência suficientes para atender a demanda, ficou decidido que a feira aconteceria somente uma vez por mês. Então foi se estruturando e passou a ser quinzenal no segundo ano e, somente no terceiro ano de existência, se tornou semanal. Hoje, os agricultores se dividem em aproximadamente cento e cinqüenta bancas, posicionadas ao longo de duas quadras. Por esta área, passam centenas de pessoas, em busca de uma variada gama de alimentos, como: cereais, frutas, legumes, verduras, mel e derivados, sucos, laticínios, massas, pães, entre outros. Dentre as cooperativas e entidades presentes na feira atualmente cita-se: Cooperativa Arco-íris, Cooperativa de produtos orgânicos Pão da Terra, Associação dos Produtores Ecologistas da Linha Pereira de Lima, entre outras. As bancas agroecológicas: algumas considerações Destaca-se algumas bancas e produtos presentes na área em estudo, entre eles a Banca dos Ovos que está presente na FAE desde 2011, especializada em ovos orgânicos, é composta pelas famílias de Alessandra Coser, Airton Otton e Flávio Figueiredo, que atuam, há cerca de, 14 anos criando galinhas sem a utilização de hormônios e antibióticos, e o pasto onde as mesmas se alimentam é livre de produtos químicos. A Banca da Associação dos Colonos Ecologistas da Região de Torres (ACERT) é um núcleo formado pelas famílias Martins, Evaldt, Mengue, Carlos e Cassol. Foram convidados pela Coolmeia para participar da Feira dos Agricultores Ecologistas, onde tiveram um elevado crescimento e, em 1992 fundaram a ACERT Três Passos. Na atualidade, suas propriedades - localizadas na Vila Três Passos, em Morrinhos do Sul - são abertas a escolas, universidades e consumidores, que podem aprender e até trabalhar, cientes de estar em um ambiente que respeita a natureza, livre de produtos químicos. 182 A Associação dos Produtores Ecológicos da Linha Pereira de Lima (APEMA) também possui uma banca na Feira Ecológica da Redenção. A associação foi fundada por um grupo de 11 famílias, e hoje é composta por agricultores como Vilmar Menegat, Bermil Zampieri e Valmor Zampieri que se revezam semanalmente no atendimento da banca. O grupo começou a produzir organicamente há 24 anos e quando descobriram a existência da Feira tiveram a oportunidade de vender seus produtos diretamente ao consumidor. Outra banca presente na Feira é a Quinta do Livramento. José Azevedo era quem cuidava da banca a qual tem como produtos os cogumelos orgânicos. Em 2014, Azevedo passou sua banca para o casal Roberto e Neli Sicoli que estavam em busca de um novo desafio e, desde então, estão procurando aprender e estudar sobre o assunto, contando com o auxílio do antigo dono. A Feira possui também a banca das Flores. Conhecida como “Jeito Natural”, tem como proprietário Germano Bettio, Valdomiro Silveira dos Santos, Luis Antônio Silveira dos Santos e Everton Garcia. A banca é especializada em flores do campo, mas os agricultores também cultivam frutas ecologicamente, dentre as quais os pêssegos são os que, possuem maior destaque. O Grupo Coelho é responsável por uma banca com diversos produtos orgânicos. O Grupo Coelho foi resultado da união dos irmãos Jonato e Jonas Moreira Coelho, e seu pai, Agostinho de Freitas Coelho que produzem há 24 anos. Tudo começou quando Jonato foi convidado para vender seus produtos em um prédio e conheceu Luiz Jacques Saldanha. Posteriormente o grupo entrou para a agricultura orgânica e começou a fazer parte da FAE. Há 4 anos Edimar Moreira Coelho, juntamente com sua esposa Claudete Correa Coelho, são responsáveis pela banca que comercializa caldo de cana e também, pela produção de Semente Crioula, sobre as quais realizam palestras na Associação Rio-Grandense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER). Para o cultivo dos alimentos eles utilizam técnicas de cama de aviários e compostagem e a irrigação é feita com água de vertentes naturais. Cabe destacar que, ao longo dos anos a agricultura vem sofrendo transformações devido ao avanço das tecnologias e acarretando uma série de impactos. Por esse motivo enfatiza-se a necessidade de resgatar a relação do ser humano com os alimentos, que são os princípios básicos da agroecologia: o resgate da alimentação orgânica, agricultura familiar e a busca por voltar a viver em contato com o campo e se manter dele. Ajuda a ampliar a visão de todos quanto ao sentido da vida, promover a reflexão sobre a alimentação, o ato de levar uma vida mais saudável e como consequência reduzir o uso de medicamentos. 183 No período atual, onde os alimentos estão cada vez mais, repletos de agentes nocivos a saúde, há uma necessidade de se pensar a alimentação, através de alimentos e hábitos alimentares mais saudáveis. Existem diversas possibilidades, uma delas é a Alimentação Viva, também conhecida como crudivorismo ou “raw food” (comida crua), é um “estilo de vida” que surgiu na década de 90 nos Estados Unidos, que é o consumo de alimentos crus, grãos germinados e frutos frescos e secos, influenciando na ingestão de alimentos orgânicos. Os alimentos crus são ricos em enzimas, estas são os ‘incansáveis trabalhadores’ que levam os nutrientes às células. Essa forma de alimentação busca a reconexão com a natureza, fonte primordial dos alimentos. Ao reduzir o consumo de alimentos cozidos, processados, com pesticidas e conservantes, açucares e gorduras diminuem-se o risco de doenças crônicas, como obesidade, diabetes, problemas cardiovasculares, entre outros. Pesquisas científicas demonstram que a “alimentação viva” possui alto potencial terapêutico, mesmo quando os tratamentos médicos convencionais não são tão eficazes. Esse tipo de alimentação, como terapia principal ou complementar, pode reverter quadros clínicos graves de doenças crônicas. Isso se dá devido ao restabelecimento da integridade do sistema biológico, ocorre uma reestruturação e uma desintoxicação profunda no organismo. Do território as microterritorializações É perceptível o número pessoas que se encontram em tratamento ou recémrecuperados de algum tipo de câncer. A falta de cabelo e/ou lenços cobrindo a cabeça se tornam perceptíveis, mais ainda quando é numerosa a aglomeração de pessoas com este tipo de “vestimenta”. Como o tipo de roupa é um fator identitário do grupo social ao qual se faz parte, também o é a falta ou mesmo a pouca quantidade de cabelos. Um dos primeiros passos a seguir após o diagnostico da existência de algum tipo de câncer é a mudança na alimentação. Assim, o caminho até a Feira Ecológica da Redenção se torna ponto de encontro de usuários que necessitam encontrar alimentos cultivados de forma sustentável. Na feira orgânica, sábado pela manhã, é possível perceber a movimentação dessas pessoas, andando de uma banca a outra em um lócus de interação constante. Este é um ambiente diferente do qual estamos acostumados nos centros urbanos, ali os odores exalados pelos produtos e a conversa entre cliente/vendedor são o tom maior. Diferentemente das grandes redes de mercado onde o cheiro de limpeza sobrepõe-se ao dos alimentos e a conversa com o atendente se resume a: “CPF na 184 nota?” e “mais alguma coisa?”, encontramos na feira além do consumo uma troca de saberes. Alves, (1992, p. 09) faz uma bela reflexão quando destaca que: Hoje, cercados de poluição, barulho, concreto e todo tipo de produtos químicos e artificiais, olhamos, com saudade, a vida de nossos antepassados no campo e, com certa inveja, a dos atuais moradores de pequenas cidades, deliciando-se com as possibilidades de ainda poderem olhar o céu e vê-lo cheio de estrelas, sentir o cheiro da terra e de seus frutos, ouvir o som dos riachos e bichos e usar alimentos que ainda preservam odores e sabores naturais. Nesse ambiente de cheiros e sabores diferenciados é que se define uma microterritorialização de sujeitos em tratamento que permanecem na busca por alimentos e produtos que mantenham os odores e sabores naturais. Território e territorialidades se contornam de sentidos bem distintos. Enquanto o território se atrela fortemente em um limite mais ou menos definido, quando falamos de territorializações não pensamos em uma espacialidade definida, podendo ela ser formada em distintas escalas seguindo ou não uma continuidade. Assim, podem-se encontrar dentro de um único território múltiplas territorialidades, formando o que Haesbaert (2005, p.6786) denomina de multiterritorialidades. Multiterritorialidade inclui assim uma mudança não apenas quantitativa – pela maior diversidade de territórios que se colocam ao nosso dispor (ou pelo menos das classes mais privilegiadas) – mas também qualitativa, na medida em que temos hoje a possibilidade de combinar de uma forma inédita a intervenção e, de certa forma, a vivência, concomitante, de uma enorme gama de diferentes territórios. Nesse sentido, as territorialidades se ligam de forma intrínseca a diversidade, pois a vivência de grupos distintos se dá de forma concomitante. Há nesse momento um movimento de pertencimento e constante integração que organiza os grupos identificados com características culturais, sociais ou econômicas. Assim, tem-se a produção de uma serie de práticas que concedem fatores identitários como grupo, o que leva a criação de espaços de poder simbólico, de apropriação, de pertença, ainda que não claramente de dominação, controle e demarcação. Nessa linha de raciocínio resgata-se o entendimento de Goulart; Antunes (2014, p. 49): As territorialidades são espaços e relações constituídos por identidades culturais e políticas, não necessariamente configurando territórios. Ou seja, a territorialização corresponde à projeção sobre e a partir do espaço das representações mentais de um indivíduo ou grupo de indivíduos. Essas representações muitas vezes materializam-se através das formas de uso que se faz do espaço, como o econômico, o artístico, o religioso e outros. Outras vezes, há 185 somente uma apropriação afetiva do espaço, normalmente motivada por sentimentos de identificação e pertencimento. Assim se constituem as territorialidades, as quais podem não ser delimitadas, demarcadas e controladas como os territórios. As territorialidades podem se sobrepor, dando lugar a multiterritorialidades que ora se mesclam, ora se separam, ora se fundem para depois separar-se novamente. Desse modo, dentro das territorializações existe a possibilidade de distintos atores sociais permanecerem em determinado espaço de forma concomitante, ou mesmo em horários distintos, podendo formar um ambiente de prostituição à noite e de dia um lugar de lazer ou de comércio, por exemplo. Assim, em um mesmo espaço físico, manifestam-se distintas territorialidades. Nesse sentido, pode haver territorializações formadas em um curto período de tempo, relativamente efêmeras, que acarretam a produção de áreas de convivência permeáveis, podendo existir uma expansão ou retração desta área em conjunto com territorializações formadas por outros grupos sociais. Esse fato permite que haja a sobreposição ou divisão do espaço em períodos de tempo diferenciados. O próprio sociólogo francês Michel Maffesoli (2002), destaca o processo que vem ocorrendo nas cidades onde distintas tribos urbanas produzem microterritorializações fluidas e efêmeras. “O território é, antes de tudo, uma “convivialidade”, o lugar de encontro e de reunião, com a reunião apropriando-se de parte do espaço, mesmo que seja pequena, uma esquina: um quadrante de uma praça, um banco da praça” (COSTA, 2008, p.143144). Por tratar-se da territorialidade de uma pequena parcela territorial em Porto Alegre-RS, concorda-se em utilizar o termo “micro” atrelado a ideia de territorialidade, ideário este presente em estudos como de Costa (2008; 2010; 2013). Entende-se que a microterritorialidade pode servir como uma forma de contraracionalidade do pensamento globalizante, que se identifica com um espírito individualista e de segregação. Quando maior pressão para segregar e homogeneizar processos, existem em determinados lugares da vida urbana certos refúgios onde se mantém agregações sociais singularizadas por suas práticas culturais (construindo muitas microterritorializações) (COSTA, 2008, p.143). Nesse sentido, fortalecemos a ideia das microterritorializações urbanas, estabelecidas pelas relações cotidianas dos grupos culturais dentro da cidade, ou seja, conjuntos de lugares de reunião ou encontro e redes de trajetos firmados pela agregação de pessoas que compartilham gostos, desejos, necessidades relacionais, comportamentos e estéticas comuns. Cabe novamente ressaltar o caráter fluido em mutante dessas microterritorializações e de suas fronteiras de convivência. 186 As microterritorializações acabam se constituindo por fatores identitários dos grupos sociais, por esse motivo entende-se que na Feira Ecológica da Redenção há um processo visível de microterritorialização de pessoas que estão e/ou passaram pelo grande desafio que é enfrentar uma doença como o câncer em todos os seus âmbitos. Tais afirmações sobre as microterritorializações vêm ao encontro do que foi colocado por Costa (2008, p.145) quando o autor enfatiza que: As identificações podem ser processadas por motivos bem simples, como uma reunião de pessoas que passeiam com seus cachorrinhos de estimação, ou podem demonstrar complexas convivências, como grupos de “punks”, “gays”, prostituto(a)s, travestis, “hippies”, garotos de rua, mendigos entre outros. Por fim, entende-se que as microterritorializações podem emergir da presença de um pequeno agregado de pessoas que se relacionam de forma diferente, como no caso da Feria Ecológica da Redenção. Sendo que as cidades vão se formando, como retalhos das vivências de distintos grupos socias, que possuem na urbe o espaço de reconhecimento de si como sujeitos e como grupos sociais que se relacionam (re)produzindo as cidades e criando culturas que diversificam o “organismo cidade”, que uma vez doente produz cidadãos doentes, uma vez “feliz” produz mulheres e homens felizes. Sistematizando alguns pontos Ao término desse trabalho alguns pontos podem ser sistematizados como reflexões. O primeiro ponto a ser destacado diz respeito a problemática existente nas cidades. A população mundial está aumentando, sendo que maior parte habita os centros urbanos. Com os avanços técnicos e a globalização, está havendo uma mudança no estilo de vida da população, inclusive no tocante aos hábitos alimentares, com uma diminuição das doenças infectocontagiosas e o aumento alarmante das doenças crônico-degenerativas. O segundo ponto diz respeito a área de estudo, a Feira Ecológica da Redenção a qual torna-se um ambiente ímpar, se comparado ao atual modelo capitalista. Nessa área existem bancas agroecológicas, onde os alimentos comercializados são livres de produtos químicos. A Feira torna-se uma alternativa para as pessoas com diagnóstico de câncer e outras doenças, bem como para as pessoas que buscam uma alimentação mais saudável para suas famílias. O último ponto a ser destacado diz respeito a microterritorialização existente com a presença de sujeitos em tratamento de câncer que frequentam a Feira na busca 187 por alimentos e produtos livres de substâncias químicas. Agindo como uma forma de contraracionalidade do pensamento globalizante, o qual se identifica com um espírito individualista e de segregação. Referências ALVES, Julia Falivene. (1992). Metrópoles: cidadania e qualidade de vida. São Paulo: Moderna. COSTA, Benhur Pinós da. 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Sendo assim, o objetivo deste trabalho é compreender a dinâmica da agricultura familiar frente as expansões da cafeicultura, citricultura e canade-açúcar. Para tanto realizou-se levantamento bibliográfico e documental, entrevistas e registros fotográficos. Contudo percebeu-se que a agricultura familiar sempre esteve presente no município, que os agricultores buscam alternativas para permanecerem no campo. A cultura da agricultura patronal é presente devido a políticas de desenvolvimento regional que fecundaram cultivos como o do café por meio da expansão da ferrovia, a laranja com a criação de agroindústrias voltadas para extração do suco e formação da Área Canavieira de Catanduva, por meio de instalações de destilarias e usinas sucroalcooleiras, expandindo a cultura da cana-de-açúcar. Palavras-chave: agricultura familiar; monoculturas; Tabapuã INTRODUÇÃO O presente estudo traz uma reflexão sobre as expansões de monoculturas desenvolvidas no município de Tabapuã e os efeitos causados na área rural. E tem como objetivo compreender a dinâmica da agricultura familiar frente as expansões da cafeicultura, citricultura e cana-de-açúcar. Para tanto realizou-se levantamento bibliográfico e documental, entrevistas e registros fotográficos. Esses três cultivos foram selecionados por terem gerado para o município prestígio, riqueza, mas, de forma contraditória, forçou a agricultura familiar a desenvolver formas de resistência a fim de oportunizar aos agricultores meios de recursos para manter suas atividades, garantindo sua permanência no campo. Neste estudo, entende-se como agricultores familiares aqueles indivíduos que constituem uma base familiar para manter a propriedade rural e que se enquadram na Lei nº 11.326, de 24 de Julho de 2006, ou seja, possuem até quatro (4) módulos fiscais, o que em Tabapuã corresponde a 64 hectares. Passa-se então a conhecer a localização da área de estudo, para assim, entender a dinâmica da mesma. 190 LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO Tabapuã encontra-se localizada no Estado de São Paulo, na Microrregião Geográfica de Catanduva, que por sua vez insere-se na Mesorregião Geográfica de São José do Rio Preto, na porção do estado geralmente designada apenas como Noroeste Paulista, como pode ser visualizado na figura 1. O município de Tabapuã faz divisa com os municípios de Catiguá, Uchoa, Novais, Olímpia, Catanduva, Cajobi e Embauba. De acordo com o IBGE (Censo Demográfico, 2010), o município de Tabapuã possui uma área de 345,581Km² e uma população de 11.366 habitantes, dos quais 10.522 (92%) vivem no perímetro urbano e 844 (8%) habitantes na área rural. E com uma população estimada em 2014 de 12.027 (IBGE, 2015)39. Desta forma, em 2010 tinha-se 32,88 habitantes por Km², o que indica baixa densidade demográfica. Vê-se, portanto, que se trata de um município de pequeno porte e com população reduzida. Figura 1 - Localização do município de Tabapuã, SP Fonte de dados: IBGE (2010) Organização: DA SILVA, L. F. (2014) Em Tabapuã com a variação (dos picos de crescimento e decréscimo) do número de habitantes do município de acordo com os censos demográficos do IBGE ao longo das décadas de 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991, 1996, 2000 e 2010 pode-se observar que na década de 1940 teve o maior número de habitantes, a 39 Fonte: Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais. 191 população era eminentemente rural e já na década de 1991 essa realidade se inverte, onde a maior parte da população passa a ser urbana. Com esses dados fica evidente o êxodo rural se consolidando a partir da década de 1950. Os maiores valores de crescimento populacional foram nas décadas de 1940 e 1991 e os menores em 1976 e 2000. Uma hipótese plausível para o êxodo rural é a industrialização, mecanização de produtos agrícolas (devido ao pacote tecnológico eminente na época, que visava uma ampliação da produção com a finalidade de aumentar a exportação do país). Esses que migravam do campo, tinham como destino a cidade, dirigiram-se, provavelmente, para a cidade do município, demais municípios de São Paulo ou de outros estados, pois a área urbana não só não absorveu o contingente migratório, como também perdeu volume de moradores fixos. Atualmente, constata-se baixa concentração populacional no meio rural porque o arredamento da cana-de-açúcar ocupa pouca mão-de-obra, assim como os tipos de cultivos agrícolas mecanizados que se desenvolveram no município. Ao longo do período 1999-2011 o PIB (Produto Interno Bruto) municipal cresceu em todos os setores analisados: agropecuária, indústria e serviços. No que se refere ao meio rural, mesmo com o número reduzido de trabalhadores no setor primário, houve aumento de produção devido à alta tecnificação empregada no processo produtivo de cultivos relacionados ao agronegócio, como a cana-de-açúcar, por exemplo, porém todas as áreas cresceram (exceto agropecuário nos dois últimos anos analisados) mas a que mais teve crescimento nessa análise foi a de serviços, uma explicação para isso é que a sociedade está indo buscar mais serviços, como turismo e alimentação fora do domicílio. Migliorini (1950), o estudo da evolução histórica de determinado cultivo proporcionará o conhecimento pleno da organização agrícola. A AGRICULTURA FAMILIAR E A EXPANSÃO DAS MONOCULTURAS DE CAFÉ, LARANJA E CANA-DE-AÇÚCAR DE 1940 A 2013 NO MUNICÍPIO DE TABAPUÃ, SP – BRASIL A difusão da monocultura pelo interior paulista deu-se no início com o café, principalmente, com a iniciativa do governo de trazer imigrantes europeus para trabalhar nesta lavoura. O que ocasionou em um aumento de mão de-obra e, consequentemente, houve a expansão da produção de café pelo estado. Monbeig (1998) descreve sobre a faixa pioneira do estado de São Paulo, na qual a região deste estudo ainda se encontrava em processo de início de exploração e necessitava de 192 mão de obra para o plantio do café, pois para expandir suas lavouras era necessário derrubar as florestas para arar a terra e plantar. E com o desenvolvimento das ferrovias (EFA) adentrando o estado (do município de Araraquara à estação de Presidente Vargas em Rubinéia). A ferrovia contribuiu para levar os imigrantes europeus pelo território paulista, além do seu objetivo principal que era agilizar o escoamento da produção de café. E uma dessas estações era a do Japurá, localizada onde se encontra o atual município de Tabapuã, já havendo nos arredores algumas famílias presentes no futuro município que foram pioneiras na exploração das terras pertencente a atual configuração municipal. No café, uma das dinâmicas encontradas nas propriedades entrevistadas do município de Tabapuã propriedades, era por meio da meação, em que o chamado “meeiro”, recebia permissão do dono das terras para cultivá-las em troca do fornecimento de 50 % da produção colhida. O café era então vendido em sacas, após o período de secagem dos grãos nos “terreirões”, era ensacado e vendido para as beneficiadoras de café, o produto final era voltado à exportação. O gráfico 1 exemplifica, o quão foi explorado esse cultivo em Tabapuã e a atual conjuntura que se encontra. Gráfico 1: Área plantada de café (em hectares) 12000 10000 9764 7803 8000 6000 5338 4363 4363 4000 2000 183 25 2006 2013 0 1960 1970 1980 1985 1995/96 -2000 Área Plantada de Café (em hectares) Lineal (Área Plantada de Café (em hectares)) Fonte: Censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1960, 1970, 1980, 1985, 1995/96, 2006 e Produção Agrícola Municipal de 2013. Org.: PELISSON, G. V. (2015) 193 Atualmente o café deixou de ser um cultivo expressivo devido a inserção no meio rural de outras monoculturas e da modernização da agricultura, além de questões climáticas e de mercado. Segundo Graziano da Silva (2003) a modernização da agricultura “era a necessidade de expansão da oferta agrícola para fazer frente ao crescimento industrial (matéria-prima) e da urbanização (alimentos) ” (p. 95). Inocêncio e Calaça (2010) ainda salientam que “a década de 1970, no Brasil, é caracterizada por forte concentração urbana, consequência da migração campo-cidade, que se acentuou devido ao desenvolvimento industrial” (p. 284). “Na década de 70, com a expansão e consolidação da indústria de suco de laranja concentrado e congelado, para atender basicamente ao mercado externo, a agroindústria citrícola passou a ter papel de destaque na economia brasileira” (MAIA, 1996, p. 8). Esse cultivo foi bem aceito no local deste estudo e, sobretudo, pelos agricultores familiares, que tinham como mão de obra para arar a terra, o plantio, adubação, os familiares residentes na propriedade ou não, porém na colheita da fruta necessitam de contribuição. Os autores Amaro, Vicente e Baptistella (2001) descrevem sobre esse fato e a contratação de mão de obra extra. Cabe destacar que a partir da safra agrícola 1995/96, ela passou a ser quase totalmente de responsabilidade e administração dos próprios citricultores, os quais devem encarregar-se de contratar as turmas de colheita e transporte das frutas. Anteriormente, durante a vigência do “contrato de participação” (1985/86 a 1994/95), a colheita, geralmente, era administrada pela indústria, que empregava pessoal especializado e, posteriormente, descontava dos produtores os custos incidentes e previamente fixados nos contratos de compra e venda da fruta. (p. 19) Esses apontamentos dos autores são confirmados pelos agricultores entrevistados do município de Tabapuã, que relataram a contratação de boias-frias para a colheita do fruto, pois havia a necessidade de mão de obra extra. Dessa forma, eram contratados por um período determinado, principalmente em períodos de colheita. O gráfico 2 demonstra a exploração do cultivo de laranja no município, que tem seu auge principalmente nas décadas de 1980 e 1990. 194 Gráfico 2: Área Plantada de Laranja (em hectares) 12000 9984 10000 7692 8000 5896 6000 4000 2503 1535 2000 41 431 0 1960 1970 1980 Área plantada de laranja (em hectares) 1985 1995/96 2006 2013 Lineal (Área plantada de laranja (em hectares)) Fonte: Censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1960, 1970, 1980, 1985, 1995/96, 2006 e Produção Agrícola Municipal de 2013. Org.: PELISSON, G. V. (2015) Adentrando a questão da cana-de-açúcar, nas últimas décadas do século XX, esta cultura é que ganha proeminência e transforma o cenário rural do município, devido a instalações de Usinas Sucroalcooleiras na área canavieira de Catanduva, tendo atualmente como municípios fornecedores e usineiros: Catanduva, Catiguá, Paraíso, Ibirá, Itajobi, Novo Horizonte, Pindorama, Palmares Paulista, Santa Adélia, Ariranha, Tabapuã, Uchoa, Urupês, Irapuã, Cândido Rodrigues, Borborema, Fernando Preste, Itápolis e Vista Alegre do Alto40. “A área de Catanduva é considerada o sexto núcleo canavieiro do estado de São Paulo a se consolidar, após as regiões de Piracicaba, Ribeirão Preto/Sertãozinho, Araraquara, Jaú e Vale do Paranapanema” (BRAY, 2014, p.42). E é constituída por quatro usinas de açúcar e álcool e quatro destiladas autônomas de álcool, como pode ser verificado na tabela 3. E esse crescimento foi devido à expansão da cana-de-açúcar em área antes destinadas à cultura alimentar. E Bray (2014), deixa claro o porquê: O reequipamento industrial das usinas e a relocalização para áreas diversas, menos disputadas e de terras mais baratas, provocou naturalmente, a concentração de renda, uma vez que os empréstimos eram feitos a juros negativos e com período de 40 Localização da Área Canavieira de Catanduva: “localiza-se no Médio Planalto Ocidental Paulista, no setor Centro-Norte do estado, denominado de Média Araraquarense. Esse complexo agroindustrial canavieiro, açucareiro e alcooleiro de Catanduva, é constituído por 19 municípios usineiros e fornecedores” (BRAY, 2014, p. 42). 195 carência ponderáveis, fazendo expandir a cana-de-açúcar por áreas anteriormente dedicadas às culturas alimentares. (p.55) O gráfico 3 mostra a proporção da presença do cultivo de cana no município. Gráfico 3: Área Plantada de Cana-de-Açúcar (em hectares) 25000 21800 19900 20000 15000 10000 5890 4678 5000 557 332 1960 1970 4100 0 1980 1985 1995/96 2006 2013 Área plantada de Cana-de-Açúcar ( em hectares) Lineal (Área plantada de Cana-de-Açúcar ( em hectares)) Fonte: Censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1960, 1970, 1980, 1985, 1995/96, 2006 e Produção Agrícola Municipal de 2013. Org.: PELISSON, G. V. (2015) Dessa forma tem-se que a cana é o cultivo que mais cresceu, no período analisado deste trabalho e o que consequentemente ocasionado no aumento do êxodo rural. Sobre os agricultores familiares, de acordo com o IBGE (Censo Agropecuário de 2006) em Tabapuã há 276 unidades de estabelecimentos agropecuários de agricultura familiar em 4.132 hectares e 124 unidades de estabelecimentos agropecuários não-familiares que ocupam uma área de 23.531 hectares, ou seja, há concentração de terras, onde se tem muitos hectares em mãos de poucos. E ao mesmo tempo têm-se muitos agricultores familiares com poucas terras. Nesse sentido, fica perceptível a forte presença no município da agricultura patronal e uma economia rural voltada à produção de commodities. O território da agricultura familiar para Santos (2011) “se distingue pelo seu processo histórico de intensa organização política de homens e mulheres em torno de uma agricultura de base familiar, fundamentada na produção da policultura e, muitas vezes na produção integrada, na própria monocultura do pacote tecnológico” (p. 322). E Santos (2011), complementa: 196 A concepção de território é compreendida no caso da agricultura familiar como uma forma de resistência e sobrevivência, para homens e mulheres que desde a década de 1940 tem construído sobre este espaço relações de empoderamento do espaço a partir da política, da economia, da cultura e também de acordo com as condições naturais (p. 322). “A agricultura familiar afigura-se como uma peça-chave, embora não exclusiva, do desenvolvimento integrado e sustentável, a ser definido em escala local, tornandose como unidade territorial o município ou eventualmente consórcio de município” (SACHS, 2001, p. 79). Para Candiotto (2011) apesar de haver a existência dessa polaridade no cenário rural entre agronegócio e agricultura familiar. O autor não vê duas realidades como contrapostas, para o mesmo é possível à incorporação de técnicas e métodos de cultivo e manejo agropecuário provenientes do agronegócio, por parte de diversas unidades produtivas familiares, como por exemplo: “a integração dos agricultores familiares com grandes agroindústrias, para a criação de aves, suínos, leite, fumo, entre outros produtos”. “Dessa forma não se pode negar que o agronegócio vem influenciando as atividades e o modo de vida familiar e, que há uma tendência de ampliação desta influência” (CANDIOTTO, 2011, p. 277). Frederico (2014) completa, colocando que o agronegócio, como foi escalado pelo Estado, como já o fizera anteriormente, “a tabula salvadora da política macroeconômica externa brasileira, exigindo fortes alterações na organização e no uso do território das áreas de agricultura moderna” (p.2134). E ainda Frederico (2014) explica que, Dentre as principais alterações territoriais destacam-se: a aceleração no ritmo de expansão da fronteira agrícola em substituição à vegetação nativa e a pequena produção de base familiar; a intensificação da produção e o aprofundamento da especialização regional produtiva; o aumento da concentração fundiária; a estruturação de uma nova divisão territorial do trabalho das grandes empresas e das atividades do agronegócio e o planejamento e a construção de infraestrutura praticamente monofuncionais com o intuito de viabilizar o escoamento da produção (p.2134). Com essas adulterações no campo, o agricultor tenda se inserir e participar da dinâmica do “desenvolvimento agrícola” com financiamentos proporcionados pelo PRONAF, que custeiam safras, as atividades agroindustriais, seja para investimento em maquinário, equipamento ou mesmo em infraestrutura. E por microcrédito rural que 197 é voltado para a produção e geração de renda das famílias agricultoras de mais baixa renda do meio rural (BRASIL, 2015). CONSIDERAÇÕES FINAIS O contexto atual do campo brasileiro é marcado pelo quadro de exclusão social e exige uma readequação das políticas voltadas ao desenvolvimento rural. “É fundamental criar políticas e programas orientados para um desenvolvimento combinado com a distribuição de renda e de riqueza” (DAVID, 2008, p. 17). E “adotar políticas agrícolas e sociais direcionadas ao fortalecimento da agricultura familiar, associadas à efetiva reforma agrária, capaz de promover a desconcentração da propriedade da terra, garantindo o trabalhador rural acesso à terra e ao trabalho” (DAVID, 2008, pp. 16-17). A partir da análise dessas três culturas, pode-se perceber os efeitos provocados de forma diferenciada no suceder dos tempos na agricultura familiar. Contudo percebeu-se que a agricultura familiar sempre esteve presente no município, que os agricultores buscam alternativas para permanecerem no campo e cultura da agricultura patronal é presente devido a políticas de desenvolvimento regional. Percebe-se então que as forças exercidas pelas monoculturas no município veem se expandindo em áreas anteriormente dedicadas às culturas alimentares, especialmente a da cana-de-açúcar. O avanço sobre as terras da agricultura familiar, devido sua forte valorização no mercado, instalação de usinas na região e formação da Área Canavieira de Catanduva, causa um aumento no êxodo rural e força o agricultor a buscar alternativas para resistir no campo. A produção de cana-de-açúcar hoje se volta, sobretudo, em atender as metas diretamente ligadas ao açúcar (mercado interno e externo) e ao álcool combustível (mercado interno). O agricultor se encontra pressionado pelo grande capital e acaba arrendando suas terras para as usinas, e se deslocando para a cidade. Os que persistem, e submetem-se ao arrendamento, utilizam seus poucos hectares, ou o que resta próximo as suas residências, para cultivar hortaliças ou frutas (como o limão, a manga e a tangerina, por exemplo) para o consumo próprio ou mesmo para atender o mercado local e/ou regional. Dentre os entrevistados, a maioria que resiste no campo alegando que “vive do sítio”, “trabalho”, “a única coisa que sabe fazer”, “nasceu na área rural”, “que foi o pai que ensinou a lida”, “porque gosta do lugar onde nasceu” e até mesmo “para não 198 abandonar o sítio”, esses foram alguns dos argumentos levantados pelos que continuam morando na área rural. Sendo assim, fica evidente a paixão dos agricultores familiares pelo local e a afirmação de sua identidade, mesmo citando problemas do cotidiano, necessidades referentes à infraestrutura (conservação de pontes, estradas) pelo poder público. REFERÊNCIAS Amaro, A. A.; Vicente, M. C. M.; Baptistella, C. D. S. L., (2001), Citricultura paulista: tecnologia e mão-de-obra (pp. 1-37). Cordeirópolis: LARANJA. Brasil. Lei Federal nº. 11.326/2006, (2014). Recuperado de: http://www.in.gov.br/materiais/xml/do/secao1/2237771.xml Brasil. Como funciona o Pronaf?, (2015). Recuperado de : http://www.mda.gov.br/sitemda/secretaria/saf-creditorural/como-funciona-o-pronaf Bray, S. C. (2014). As políticas do Instituto do Açúcar e do Álcool e do Programa Nacional Álcool e suas influências na área açucareira – alcooleira de Catanduva. En.: ruas, D. G. G.; Ferreira, E. R.; Bray, S. C. (Ed.) A agroindústria sucroalcooleira nas Áreas Canavieira de São Paulo e Paraná (pp. 42 – 73). 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Recuperado de http://r1.ufrrj.br/cpda/ideas/revistas/v04/n02/IDeASv04_n02Artigo_INOCENCIO_e_CA LACA.pdf 200 OS MOVIMENTOS SOCIAIS E A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: UM OLHAR PARA O ASSENTAMENTO CONQUISTA DA FRONTEIRA 41 Antônio Valmor de Campos Aluno do PPGEO/UFSM [email protected] RESUMO Este texto apresenta relatos de uma atividade de pesquisa iniciada no Assentamento Conquista da Fronteira, em Dionísio Cerqueira/SC, na Mesorregião da Fronteira Sul – Brasil. A pesquisa é realizada por professores e estudantes da Universidade Federal da Fronteira Sul – Campus Chapecó. Este relato diz respeito a visita realizada no mês de dezembro de 2014. Visualiza-se no assentamento, uma organização ancorada na metodologia do MST, que já no acampamento acompanhou dando suporte e estrutura. Com a conquista da terra iniciou a organização para a produção de alimentos e ocupação do território, de forma sustentável. Houve a opção pela produção coletiva, cooperada e solidária, modelo que as famílias assentadas aderem ao projeto coletivo. A aplicação da proposta tem se mostrado exitosa, atualmente a produção de alimentos é sem utilização de agroquímicos e não produção de commodities. Há também a preocupação com o desenvolvimento sustentável, com a preservação ambiental e recuperação de áreas degradadas. Verifica-se uma integração das ações no Assentamento, com as diretrizes dos movimentos sociais da Via Campesina, especialmente do MST, o qual mantém permanente reflexão sobre o processo produtivo e organizacional do local. Esta posta a disposição dos assentados na produção orgânica, agroecológica e o desenvolvimento sustentável. Palavras-chave: Movimentos Sociais. Assentamento. Desenvolvimento Sustentável. Camponeses. INTRODUÇÃO Diversas são as preocupações da humanidade atualmente, mas uma não perpassa a qualquer pessoa, a disponibilidade de alimentos. Nada é mais importante a um país do que garantir que seu povo tenha comida na quantidade e qualidade necessárias para o bem estar da população. A produção de alimentos depende hoje de inúmeros elementos, entre eles a disponibilidade de sementes, pois sem elas não há produção. A política dos governos em favor das patentes da vida, com garantia aos transgênicos ameaça o equilíbrio não apenas da produção de alimentos, mas da própria qualidade do solo, que está sendo contaminado. Também a agricultura tecnologizada, principalmente com sementes transgênicas representa uma preocupação constante a respeito dos seus impactos ambientais, sobre as sementes nativas e sobre a manutenção dos ciclos vitais. 41 Iº Simpósio de Geografia Del Cono Sur – 20 a 22 de agosto de 2015. Montevideu – Uruguay. Desafios para la integración de la Geografia del Cono Sur. O Autor é Professor do Magistério Superior da UFFS – Campus Chapecó/SC, Brasil. É membro do Grupo de Pesquisa em Gestão e Inovação educacional – GEPGIE. Endereço residencial: Rua Eloi Ferreira de Souza, 206E, Bairro EFAPI, Chapecó/SC, CEP 89809-542. 201 Ao mesmo tempo em que a tecnologia na agricultura provoca incertezas na soberania alimentar e no equilíbrio ambiental, organizam-se movimentos que se contrapõem ao problema. Diversos movimentos sociais, mas especialmente os da Via Campesina42, os quais se organizam para o constante debate acerca da produção de alimentos. Um exemplo importante para contribuir com este debate é a experiência do Assentamento Conquista da Fronteira, no Município de Dionísio Cerqueira/SC. Esses assentados da Reforma Agrária têm a intenção de produzir alimentos de qualidade, de forma coletiva e solidária e estão preocupados com o equilíbrio ambiental. Entre as discussões emerge um dos elementos fundamentais na produção alternativa: o conhecimento. No entanto, para eles, não basta qualquer conhecimento é preciso que o mesmo seja integrado às intenções do grupo, atendendo às demandas de produção agroecológica e orgânica e do desenvolvimento sustentável. O presente ensaio apresenta relatos de uma atividade de pesquisa iniciada no Assentamento Conquista da Fronteira, no Município de Dionísio Cerqueira/SC, localizado na Mesorregião da Fronteira Sul – Brasil. O projeto de pesquisa é coordenado por este autor, e realizada por professores e estudantes da Universidade Federal da Fronteira Sul – Campus Chapecó. A atividade inicial foi com uma visita ao local por um grupo de estudantes e professores da UFFS. Portanto o apresentado neste trabalho refere-se especificamente a visita realizada ao Assentamento no mês de dezembro de 2014, sendo que as atividades de pesquisa estão em andamento e pretende analisar mais profundamente as questões do acesso à terra, a produção de alimento de qualidade e o desenvolvimento sustentável. Está posta também a pretensão de estabelecer o debate entre os elementos que fazem parte da relação da produção de conhecimento, da resistência dos movimentos sociais e da intervenção destes na produção de alimentos, na melhoria e distribuição de sementes, sem descuidar de lançar olhares sobre os aspectos do melhoramento genético, do patenteamento de seres vivos e da sua dominação pelo agronegócio. Tenho convicção que por mais discussões que se façam, ainda vai ser insuficiente para dimensionar corretamente a importância do tema, mas apresento como uma provocação além das existentes. 2 OBJEITVOS 2.1 Objetivo Geral 42 Os movimentos sociais da Via Campesina no Brasil são: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST; Movimento das Mulheres Camponesas – MMC; Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB; Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA (este último com divergências). 202 Analisar as contribuições da organização da luta pela terra do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST e dos assentados, na produção de alimentos saudáveis e no desenvolvimento sustentável, no Assentamento Conquista da Fronteira/SC. 2.2 Objetivos Específicos - Identificar os elementos orientadores da organização do Movimento Trabalhadores sem Terra – MST, para garantia do acesso à terra; - Avaliar as potencialidades e limitações do movimento pela terra no Brasil, no acesso à terra e na permanência dos assentados; - Analisar as condições de produção de alimentos saudáveis nos territórios reocupados pelos acampados e assentados; - Identificar as “políticas” dos movimentos sociais, para a agricultura alternativa, presentes no Assentamento Conquista da Fronteira. 3 METODOLOGIA Inicialmente a identifição do espaço territorial, definindo os procedimentos envolvidos, seguido da revisão bibliográfica e a busca por fontes confiáveis de informações acerca da organização dos trabalhadores rurais sem terra, na luta pelo acesso a terra e permanência na mesma, com a produção de alimentos orgânicos e agroecológicos. Deslocamento até o Assentamento Conquista da Fronteira, buscando contextualizar as características regionais, como a falta de democracia e da violação dos direitos humanos na região, tendo em vista que a mesma é fronteiriça e esteve submetida ao regime de exceção (ditadura civil-militar, 1964/80), por mais tempo do que as demais regiões do país. Na sede do assentamento, uma equipe de assentados apresentará o histórico de luta e dificuldades pela conquista da terra na região da fronteira, a estrutura organizacional dos assentados, as conquistas e o aspecto da valorização educacional no processo (Educação Infantil e Ensino Fundamental). Posteriormente elaboração do relatório, com detalhamento das atividades desenvolvidas, pontuando os principais elementos identificados na atividade. Também a realização de pesquisa bibliográfica e documental de obras relacionadas e afins, buscando elementos que permitam a afirmação da concepção presente nos envolvidos e no processo de organização para a luta pela terra, a organização interna 203 do ponto de vista social e de trabalho. Os procedimentos metodológicos empregados perpassam por mais de uma alternativa metodológica, tendo em vista a complexidade do tema. O presente texto relata uma visita realizada no dia 06 de dezembro de 2014, com a participação de professores e estudantes da Universidade Federal da Fronteira Sul. Esta atividade faz parte do início dos trabalhos de pesquisa iniciada, de acordo com projeto de pesquisa em institucionalização na Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS – Campus Chapecó. 4 DESENVOLVIMENTO Em seguida serão apresentados resultados da atividade in loco, com aprofundamento da pesquisa documental e bibliográfica, buscando situar o leitor acerca da realidade do Assentamento Conquista da Fronteira, quanto ao acesso à terra e o sistema produtivo agroecológico, observando a concepção do desenvolvimento sustentável. 4.1 O contexto histórico da Mesorregião da Fronteira Sul O momento agrícola no Brasil é de profundas contradições entre o desenvolvimento econômico, com objetivos estritamente econômicos e o sustentável. De um lado, os adeptos do primeiro modelo não apresentam preocupação com as condições ambientais, bem como dos efeitos da produção sobre a natureza, ou seja, enfrentamos um processo de grande destruição dos recursos naturais. De outro lado, os que pretendem produzir de forma relativamente harmônica com a natureza. Para estes, o importante está na qualidade dos alimentos produzidos e no respeito com a natureza. Este processo resulta na chamada produção agroecológica e no desenvolvimento sustentável. A presente realidade é visível na Mesorregião da Fronteira da Fronteira Sul. No local há um avanço esmagador sobre as pequenas propriedades impondo sobre elas um processo de expropriação dos conhecimentos tradicionais os quais são indispensáveis a produção agrícola para o auto-sustenho. Com esta postura, os grandes produtores provocam diversos efeitos colaterais, como o êxodo rural e a contaminação ambiental, da água, do solo e das sementes. Corrobora com esta visão, os registros de instituições identificadas no combate a este procedimento dominador, alienante e excludente: 204 Os grandes problemas da Mesorregião, na atualidade, podem ser resumidos nos seguintes itens: crescente perda de dinamismo da economia regional, frente ao contexto de globalização e competitividade; dificuldade de inserção da pequena propriedade rural no mercado e as precárias condições de moradia de parcela significativa da população, com deficiências de saneamento básico, acesso à saúde e educação. Como consequência dos fatores elencados, advém a baixa capacidade de absorção de mão de obra e retenção da população, gerando êxodo rural e emigração regional. (Projeto CRDH/UFFS, p. 5) (grifei) Pela observação dos modelos de produção agrícola, em ascensão no mundo, percebe-se que quase na sua totalidade não há preocupação com os efeitos da produção, bem como, com os destinos dos alimentos produzidos e sua qualidade. O que realmente importa é a quantidade e o lucro obtido com a comercialização. A falta de consideração com os recursos naturais e a utilização de meios de produção baseados nas sementes transgênicas e nos agroquímicos, tem levado ao esgotamento do solo e da diversidade biológica, sem sinalizar para a redução da fome no mundo, como era/é prometido. Então, é preciso construir alternativas, capazes de configurar possibilidades de superação do modelo hegemônico e, ao mesmo tempo garantir a alimentação da população, com alimentos menos agressivos à saúde e produzidos com o mínimo de agressão ao equilíbrio ambiental. Uma alternativa é o desenvolvimento de pesquisas que tratem de elementos estruturantes dessa nova condição, da produção de alimentos saudáveis, isso se reveste de grande importância, pois desencadeia a construção de possibilidades. Também é possível visualizar as inúmeras ações realizadas no sentido de dificultar o aprofundamento da crise na agricultura mecanizada e de alta tecnologia, propondo alternativas plenamente viáveis e exequíveis, como é o caso da experiência do Assentamento Conquista da Fronteira, no Município de Dionísio Cerqueira/SC. Estas contribuições no campo prático, também têm ressonância sobre os conceitos envolvidos. Há uma dimensão acadêmica galgando os difíceis degraus da academia, nesse sentido, contando com os ensinamentos e a extraordinária visão de um entusiasta da causa, que realça de forma muito simples, no entanto contundente a relação indispensável da visão técnica, acadêmica e científica com o conhecimento sob o domínio dos povos que desafiam a hegemonia para ver mantida a sua tradição, como respalda a lição: “Já discuti em diversos textos e quanto há necessidade de nós professoras e professores de disciplinas científicas fazermos a migração do esoterismo para o exoterismo” (CHASSOT, 2001, p. 38). Atualmente é possível visualizar estudantes e professores que exteriorizaram suas experiências, compartilhando com a comunidade, através de feiras, dia de 205 campo, júris, palestras e exposição de trabalhos sobre as experiências alternativas e criativas. É possível destacar alguns movimentos sociais comprometidos com estas ações, como o MPA – Movimento de Pequenos Agricultores, MMC – o Movimento das Mulheres Camponesas e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST. Estes e outros movimentos apresentam uma riqueza de conhecimentos tradicionais relacionados com discussões acerca dos organismos transgênicos, da produção agroecológica, dos medicamentos fitoterápicos e da Educação Ambiental, com debates sempre mais visíveis e coerentes no sentido de construir alternativas, com vistas ao desenvolvimento sustentável. É reconhecido o quanto é forte o debate, bem como violenta é a relação entre a agricultura camponesa e o agronegócio na Mesorregião da Fronteira Sul. Destaca-se as palavras de Moreira (2013, p. 50), ao tratar do campesinato na região: “Se de um lado a terra transformou-se em um grande negócio para latifundiários, de outro, para os camponeses, a terra é considerada uma parte extensiva ao prolongamento da vida.” No mesmo sentido, ao tratar da definição do camponês o autor afirma: A realidade do camponês no Brasil foi se construindo de acordo com algumas definições conceituais. Entendemos que ele não é um produtor ou simples trabalhador rural que responde a estímulos, mecanicamente pensados pela engenharia moderna urbanizada; ele é um ser que possui muita sabedoria, repassada de geração a geração, que percebe e se sensibiliza com seu entorno natural e social. […] No seu cotidiano desenvolve ações, com criatividade e espontaneidade, que lhes permitem pensar, refletir e repensar, enfim, filosofar sobre o espaço construído e reconstruído (MOREIRA, 2013, p. 50). Essa definição é o relato cristalino dos assentados em Dionísio Cerqueira, que reconstroem os seus espaços e recriam organização e forma de vida. 4.2 Os desafios no Assentamento Conquista da Fronteira Uma breve análise é suficiente para identificar que os assentados - no Assentamento Conquista da Fronteira - têm uma trajetória de quase três décadas de luta pela terra e de organização e de reorganização da produção, sempre preocupados com qualidade dos alimentos produzidos e com a preservação dos recursos naturais da área. Conhecer, analisar e refletir sobre essas concepções têm influenciado as comunidades regionais e também na formulação de políticas que potencializem as experiências inovadoras. 206 Os conflitos agrários no Brasil têm sido tema de grande repercussão social e política. Talvez o movimento com maior impacto ideológico. Os posicionamentos contrários estão pautados ainda em visões autoritária e aristocrática. De outra banda, os membros do movimento apontam que, para uma efetiva democracia é indispensável a garantia da atuação dos movimentos sociais, pois, sem participação não há democracia e a democracia somente se sustenta com participação, assim afirma Sauer, (2010, p. 115): “[...] os movimentos sociais agrários em particular, são indispensáveis à consolidação da democracia no Brasil. [...] a Constituição brasileira é fonte de legitimidade e de legalidade desses movimentos.” A era pós-ditadura – no Brasil – acena para um período de efetivação de direitos fortemente negados e combatidos no período ditatorial, de ordem civil, políticos, sociais, culturais e ambientais, todos devidamente contemplados e respaldados pela Constituição brasileira. Também há preocupação com o acesso à terra e alimentação de qualidade. Para Sauer (2010, p. 117): “A democracia se dá somente através de uma efetiva igualdade socioeconômica e do acesso efetivo às fontes de informação e aos bens culturais.” Os temas do acesso à terra e da garantia de produção de alimento saudável, representam uma preocupação emergente das instituições, como as que tratam dos direitos humanos e da qualidade de vida. Nesse sentido, é visível o comprometimento dos assentados. No território estudado há indícios de uma profunda ligação com a Geografia Agrária e Humana, portanto, permitindo uma reflexão profunda da interação dos assentados com os aspectos relacionados aos territórios que ocupam. O momento favorável aos assentados e sua credibilidade é demonstrada nas falas dos mesmos, como se observa: A cada final de mês o assentamento Conquista na Fronteira, em Dionísio Cerqueira (SC), recebe caravanas de diferentes partes do Brasil e do mundo. “Sempre tenho visitas aqui na minha horta”, brinca a assentada Maria Gonçalves, que coordena a produção de hortaliças. Os visitantes são estudantes, pesquisadores, integrantes de governos, militantes sociais e demais interessados em conhecer a exitosa experiência do assentamento localizado no oeste de Santa Catarina, na fronteira com a Argentina, que faz da Cooperunião uma referência internacional (DOCUMENTÁRIO, 26 anos do Assentamento Conquista da Fronteira, 2015). Da mesma forma, o foco na produção de alimentos e na construção de alternativas é evidente nas manifestações dos assentados: “Começamos a discutir primeiro a produção do que comer. Depois veio a questão da comercialização e da industrialização da nossa produção”, conta o assentado Neudi Guindani. “Mas já 207 saímos do acampamento decididos a trabalhar coletivamente”, reforça (DOCUMENTÁRIO, 26 anos do Assentamento, 2015). A proposta é de alto significado, tendo em vista a importante organização dos assentados, a qual vem demonstrando a conquista, a ampliação e a garantia de direitos humanos elementares. A proposta perseguida pelos assentados estava pautada, inicialmente na conquista da terra e por consequência o direito de nela estabelecer residência e prover o sustento próprio e da família. Com o assentamento veio a possibilidade do trabalho cooperativo, privilegiando o crescimento individual e coletivo das pessoas que ali chegam e transforma aquelas terras em seu local para viver. No Brasil é reconhecida a permanente luta dos movimentos sociais, especialmente os da Via Campesina no sentido de inserir a discussão do conhecimento tradicional com os componentes curriculares tradicionais institucionalizados, sem privilegiar um ou outro. Neste sentido leciona Chassot (2001, p. 50): “Assim, hoje, talvez uma das maiores contribuições que aqueles e aquelas que fazem a Educação através do ensino das Ciências podem fazer é emprestar uma contribuição para uma adequada seleção do que ensinar.” Para os militantes dos movimentos sociais a Educação também não pode perder de vista a superação do excesso de individualismo com a construção de um ser mais humano, com preocupações solidárias e coletivas, tendo por horizonte mais fraternidade e dignidade. 4.2.1 A luta pelo controle das sementes O desafio desses agricultores e dos movimentos sociais é impedir que as sementes sejam transformadas em mera mercadoria, através de patentes, pelas transnacionais da biotecnologia, sendo utilizadas como mero processo produtivo, o que já ocorre em muitas outras situações semelhantes: “A biotecnologia, como serva do capitalismo na era pós-industrial, torna possível a colonização e controle daquilo que é autônomo, livre e auto-regenerativo” (Shiva, 2001, p. 69). As dimensões que merecem análise dizem respeito as atividades de resgate, cultivo, classificação e melhoramento das sementes de milho crioulo realizadas por agricultores camponeses, verdadeiros pesquisadores. No entanto, isso não é suficiente, pois é preciso discutir como preservar o direito desses agricultores manterem o controle sobre as sementes, agregando a elas melhorias, como diz Shiva (2001, p. 70): “O reconhecimento das diversas tradições de criatividade é um componente essencial para manter vivos diferentes sistemas de conhecimentos.” No 208 entanto, não basta o reconhecimento individual, pois é preciso respeitar sua história e compromisso, nas palavras de Shiva (2001, p. 70): “A negação de direitos de criatividade preexistentes é essencial para a posse da vida”. Ainda, segundo Shiva (2001, p. 89): “A semente biotecnológica que é tratada como criação a ser protegida pelas patentes não poderia existir sem a semente dos lavradores.” É interessante registrar o quanto esse grupo está empenhado em garantir o predomínio de sua cultura, de sua preocupação com o desenvolvimento sustentável. Isso é visível no Assentamento, que preserva com mata nativa em torno de 50% da área. Não são agroquímicos no cultivo de alimentos e não há produção de commodities. De outra banda, impressiona a forma predadora como as empresas da tecnologia procuram se apropriar dos conhecimentos produzidos pela humanidade. Os movimentos de resistência, representados pelas organizações populares, têm mantido permanentes enfrentamentos com as multinacionais e entre os próprios agricultores que utilizam a tecnologia das transnacionais da biotecnologia que se apropriaram sem nenhum pudor do acúmulo de conhecimento e experiências da humanidade, afirma com muita propriedade Shiva (2001, p. 93): “Conhecimentos e recursos são, portanto, sistematicamente usurpados dos guardiões e doadores originais, tornando-se o monopólio das multinacionais.” A manutenção de direitos depende da troca de experiências e debates de estratégias de continuidade da resistência, na tentativa de garantir a apropriação coletiva dos conhecimentos por eles cultivados, corrobora nesse sentido Shiva (2001, p. 93/94): “A valorização do conhecimento local, a negação dos direitos locais e, simultaneamente, a criação dos direitos monopolistas de uso da diversidade biológica pela alegação da novidade, estão no centro da privatização do conhecimento e da biodiversidade.” Esse comprometimento dos assentados está respaldado pelos movimentos sociais, através da luta diária, mesmo desigual pela manutenção daquilo que é mais sagrado para o camponês: as sementes em suas mãos para produzir alimentos. Produzir sementes é a forma de garantir a produção de alimentos, não há soberania de qualquer nação sem a garantia de produzir, armazenar e replantar suas próprias sementes. 4.2.2 A produção de alimentos saudáveis e o desenvolvimento sustentável É impossível imaginar uma produção neutra, desinteressada, pois quem produz tem seu olhar voltado para o destino que vai dar a ela. Portanto, produzir alimentos 209 saudáveis, significa também uma opção por um modelo de desenvolvimento sustentável, com o menor impacto ao ambiente. A opção por um modelo que coloque em xeque a mecanização é vista com desdém, tanto no cenário acadêmico quanto por uma parte dos próprios agricultores. No entanto, fazer essa reflexão é uma forma de alargar a discussão acerca da produção e da socialização dos conhecimentos empregados na produção, para que as pessoas, cada vez mais possam se apoderar dele para se tornarem cidadãos e cidadãs em plenitude. Nesse sentido, importante observar a seguinte consideração: [...] tem se desenvolvido uma abordagem em que se consideram os agricultores familiares tomando decisões num contexto complexo e conflituoso, no qual as decisões e escolhas são orientadas ao mesmo tempo pela racionalidade econômica e pelo progresso técnico e contra estes, impulsionados pelas necessidades de reprodução social da família, pelo desejo de liberdade, de autonomia, pelo exercício de suas crenças e pela prática de seus valores (ALMEIDA in FERREIRA e BRANDENBURG, 2006, p. 37). Por sua vez, os agricultores que optam por uma prática camponesa, estão convictos da importância de sua opção, fazendo de sua prática uma ação pela sustentabilidade, com a consciência dos conflitos que a mesma carrega como diz Almeida in Ferreira e Brandenburg (2006, p. 44): “As escolhas e decisões, em particular o uso de agrotóxicos e a agricultura orgânica, revelam lógicas caracterizadas pela coexistência de orientações diversas constituídas em processos de mudança que articulam sujeito e conteúdo.” As dificuldades de adesão ao projeto de produção sustentável são grandes. Os motivos vão desde a própria desmotivação dos agricultores, por falta de incentivos e apoio até a ação das empresas multinacionais, que intervieram no processo cultural e impuseram seus híbridos e os venenos, como receita obrigatória aos agricultores. Esta situação determinou/determina a perda de um grande número de variedades e faz de outras sementes “sementes que não são sementes”. Isso tem consequências sociais e culturais: “A biologia reducionista também é a expressão do reducionismo cultural, na medida em que desvaloriza muitas formas de conhecimentos e sistemas éticos” (SHIVA, 2001, p. 48). Outro elemento a ser considerado está relacionado diretamente com a propriedade, o seu tamanho e a prática agrícola adotada na mesma, pois dependendo dessas condições será a característica da agricultura nela desenvolvida. Porém, há um consenso, a sustentabilidade e a produção agroecológica e de qualidade somente é possível na pequena propriedade. Portanto, é indispensável o desenvolvimento da reforma agrária, para que se torne possível esta proposta em larga escala. 210 Tratando-se de propostas que envolvem a Reforma Agrária, também é indispensável analisar os aspectos que envolvem a questão o tamanho da propriedade rural, no sentido de garantir o desenvolvimento, mas o especialmente no desenvolvimento sustentável: Neste contexto, a equidade é um importante aspecto a ser considerado, principalmente no que se refere aos recursos naturais, e, no caso a concentração fundiária, fere este princípio. Na medida em que há concentração de terra, se observam maiores impactos em relação a sua exploração (DAVID e WIZNIEWSKY, 2015, p. 85). No aspecto da qualidade da produção ela não pode ser dependente dos agroquímicos, pois, neste caso estaria se negando a possibilidade do equilíbrio ambiental e do desenvolvimento sustentável. Uma perspectiva que se apresenta como alternativa é o da agroecologia, pois ela se apresenta como uma possibilidade real, tendo em vista que: “A agroecologia é uma ciência, e esta assume uma importante responsabilidade no resgate dos saberes reproduzidos socialmente, como também na assimilação dos conhecimentos científicos das mais diferentes disciplinas, conforme afirma Wizniewsky (2004, p. 181)”. Na perspectiva que se apresenta, a reforma agrária mostra-se indispensável, pois o tamanho da propriedade apresenta-se como limitador do desenvolvimento sustentável como afirmam David e Wizniewsky (2015, p. 167): “Diante deste contexto, acreditasse que a produção familiar na agricultura representa o espaço que possui as condições adequadas para realizar a transição para um processo de desenvolvimento rural sustentável.” No mesmo sentido (p. 167): “Algumas experiências têm demonstrado que a viabilização econômica e social da produção familiar deve basearse em propostas que aliam a produção agrícola com a conservação dos recursos naturais.” Pelas convicções preliminares, no Assentamento, visualiza-se um conjunto social comprometido com as concepções e conquistas coletivas, acreditando na sua organização e transmitindo essas proposições para toda a sociedade. É possível sugerir que a experiência do Assentamento Conquista da Fronteira representa uma alternativa de organização, de produção e de convivência social, capaz de assegurar o acesso aos direitos humanos como a terra e à produção de alimentos saudáveis para todos. É notória a motivação dos assentados para a produção agroecológica e orgânica. No entanto, há também são compreendidas as dificuldades presentes no contexto apresentado, do enfrentamento com o agronegócio e as próprias dificuldades internas ao grupo. 211 CONSIDERAÇÕES FINAIS Está posto um conjunto de elementos preocupantes sob o ponto de vista da sustentabilidade e da produção de alimentos de qualidade na Mesorregião da Fronteira Sul. No entanto, no Assentamento Conquista da Fronteira está sendo construída mais uma referência da resistência à mecanização e à artificialização da agricultura. Por exemplo, durante milênios, foi a produção a partir das sementes crioulas que garantiu a base alimentar para a sobrevivência da humanidade. A trajetória soberana dos crioulos acontece até o início do século XX, quando o capitalismo descobriu uma nova forma de colonização e exploração: a transformação da biodiversidade em mercadoria. A experiência dos assentados da reforma agrária, no Assentamento Conquista da Fronteira procura evitar uma dimensão mercantilista sobre a disponibilidade das sementes, buscando sua garantia de forma solidária, com a troca entre as famílias, das sementes que eles próprios produzem. Também discutem o seu direito, na condição dos povos autóctones, ou seja, garantir as sementes em seu poder, isso é respaldado pelos movimentos sociais. A tentativa de garantir a produção de sementes crioulas não é pacífica, da mesma forma é incomoda para o capital a posse por parte dos pequenos agricultores, pesquisadores dos conhecimentos necessários ao melhoramento genético das sementes de crioulas. Está posto um confronto desigual, os agricultores são poucos e frágeis se comparados ao poderio das transnacionais, mas estão dispostos a utilizar todos os meios para garantir a sua sobrevivência, biológica, cultural, social e econômica. Percebe-se, nesta tarefa a ação dos movimentos sociais com impulso fundamental, pois além de fortalecer a luta coletiva promove a motivação individual com vistas a organização da resistência e superação das dificuldades. Renova-se a cada dia fé e a esperança de manter viva a produção de sementes, a produção de alimentos de forma independente e autônoma, trilhando os caminhos da soberania alimentar da nação brasileira. Esta experiência se somará a outras tantas pelo mundo, pois o modo de cultivar a terra sustentável é resultado de um longo e tortuoso caminho histórico experimentado e vivenciado por milhões de camponeses. Essa é uma demonstração de que homens e mulheres que se desafiam a proteger, com todas as suas forças o conhecimento da produção de alimentos, de 212 forma socializada e solidária, contínua, na ampliação da experiência de milhares de anos de luta incessante pela disponibilidade e acesso à alimentação de qualidade, da atual e das futuras gerações, identificando-se com o campesinato e o desenvolvimento socioambiental sustentável. A academia deve demonstrar o seu comprometimento com a causa do acesso à terra, com a produção de alimentos agroecológicos e orgânicos e com a sustentabilidade, firmando parcerias com os camponeses e os movimentos sociais, alinhando e validando as pesquisas – por eles desenvolvidas – para que possam ser reconhecidas e valorizadas. REFERÊNCIAS CHASSOT Attico. 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MOREIRA, Antônio Carlos. Conquista da Fronteira: desenvolvimento territorial com sustentabilidades. Frederico Westphalen: Ed. da URI, 2013. DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE: Crise agroambiental e desenvolvimento rural sustentável de saberes e percepção ambiental. Curitiba, PR; Ed. da UFPR, n. 14, 2006. 213 IDENTIDADE MISSIONEIRA: ELEMENTOS DIFUSORES Luiz Felipe Sausen de Freitas – Universidade Federal de Santa Maria [email protected] Iolanda Lopes de Oliveira – Universidade Federal de Santa Maria [email protected] Vera Maria FavilaMiorin – Universidade Federal de Santa Maria [email protected] Resumo O presente trabalho visa analisar o papel de alguns elementos que agem localmente como difusores da identidade missioneira no noroeste do Rio Grande do Sul. O apego natural ao lugar e o sentimento de pertencimento que se verificam na região, são também impulsionados por alguns elementos, que induzem a população local a sentir parte de um lugar que possui uma história riquíssima e que constantemente é evidenciada. A história age como o elemento central, porém a mesma é ressaltada por elementos secundários, tais como a música, o turismo e os símbolos que estão impregnados na paisagem, os quais ao agirem em conjunto, levam a população a sentir um apego muito grande com relação ao lugar. Palavras-Chave: Identidade Missioneira, Elementos Difusores, Apego ao Lugar. Introdução Muito tem se falado em Identidade Missioneira no Rio Grande do Sul. Pommer (2008) é de certo modo quem introduz o debate, trazendo a tona informações sobre a formação de determinada identidade, surgida forçosamente nas áreas onde no passado se instalaram e prosperam as Reduções Jesuítico-Guaranis. A autora explica que a região missioneira, situada no noroeste do Rio Grande do Sul, teve nas décadas de 70 e 80 uma ressignificação de seu passado colonial, criando novo sentido ao imaginário social missioneiro. O movimento que se iniciou no município de São Luiz Gonzaga, visava explorar a riqueza histórica do local e ter um subterfúgio para períodos de crise agrícola, como o que se verificava localmente quando do estopim do movimento. O chamado “missioneirismo” nas palavras da autora acabou ganhando força nos municípios vizinhos, os quais também possuíam total relação com a história missioneira. Com a valorização da história local, alguns elementos passaram a difundir a mesma desde então, gerando elos de pertencimento das populações que atualmente habitam o lugar, que no passado serviu de palco para Guaranis e Jesuítas nas reduções. A História vem a ser o elemento chave, visto que é ela que é explorada por todos os demais, é ela que é invariavelmente enaltecida, sendo constantemente incentivada a se fazer lembrar. Logo, elementos como o turismo, a música e os símbolos impregnados na paisagem, possuem sempre certo direcionamento para a história missioneira, valorizando cada dia mais a mesma, induzindo a população local 214 a se sentir pertencente aquele passado histórico, independente de seus antepassados terem feito parte ou não dos acontecimentos de outrora. A valorização de tal passado é ainda mais destacável na medida em que se buscam elementos do passado para justificar as ações do presente. A música local, por exemplo, a partir do período de ressignificação do passado local, sempre tentou se diferenciar, criando uma corrente musical classificada por seus artistas como “missioneira”. Elementos Difusores de uma Identidade Artistas locais imbuídos em “cantar as Missões” acabaram estudando a história local, trazendo informações a população em suas canções, sendo uma espécie de mensagem para os locais, que muitas vezes a partir da música se sentem identificados com as letras e melodias, as quais entram no imaginário da população missioneira. A musicalidade local traz reminiscências do período histórico, visto que a música foi praticada com excelência nas reduções, muito através do Padre Antônio Sepp, considerado o grande maestro das Missões segundoFurlong (1933). Barbosa (2012) explica que quatro artistas locais são os grandes expoentes do reconhecimento local através da música. De acordo com o autor, Jayme Caetano Braun, Noel Guarany, CenairMaicá e Pedro Ortaça lançaram em 1988 um LP intitulado de “Troncos Missioneiros”, o qual serviu de base para projetar a música da região missioneira, diferenciando a mesma das demais correntes regionais da música gaúcha. Tais artistas a partir do lançamento do LP “Troncos Missioneiros” passaram a ser conhecidos como “os quatro troncos missioneiros”. Conforme Pommer (2008) a partir da década de 1960 os artistas locais intensificaram em suas canções a abordagem do passado local, já visando distinguir o que era por eles produzido, como música missioneira, a qual se caracterizava principalmente pelo forte tom de denuncia e protesto. A partir da década seguinte, com a tentativa de dar importância maior a história local, os artistas que já praticavam esse tipo de música, acabaram se tornando, de certo modo, os porta-vozes do movimento, com canções cada vez mais endereçadas as Missões. Nas letras dos artistas locais, principalmente dos conhecidos “troncos missioneiros”, não é difícil perceber tal direcionamento. Personagens históricos são enaltecidos, a terra é extremamente valorizada, as ruínas dos antigos povoados são sempre lembradas, assim como os mais variados símbolos do passado regional. Ao tentarem propor uma música missioneira, os artistas locais não somente cantavam a história local, mas também buscavam algo particular na mesma, tentando trazer do passado, algumas heranças que pudessem a tornar única. Nedel (2004) 215 relata a experiência do “tronco missioneiro” Noel Guarany que após se profissionalizar acabou alterando seu repertório na busca de uma música legitimamente missioneira. A autora relata a experiência de Noel Guarany por países vizinhos, onde o mesmo fez uma grande busca, trazendo resquícios de antigas canções guaranis. A partir da incursão do artista por países com Argentina e Paraguai, o mesmo passou a diferenciar a música que fazia, como missioneira, com letras que sempre se notabilizavam pelo forte tom de denúncia. Barbosa (2012) revela que os chamados “troncos missioneiros”, os quais sempre ressaltaram uma possível descendência Guarani, inicialmente seguiram artistas já reconhecidos localmente como Tio Bilia e Reduzino Malaquias e deram seguimento ao que consideravam música missioneira com a introdução de seus filhos na carreira artística. Além destes, outros artistas locais, inspirados pelos pioneiros, também deram continuidade para a música missioneira e seguem até hoje cantando a história e a terra local, é o caso de Jorge Guedes e Família, com uma música com uma essência guarani bastante peculiar. Barbosa (2012) ressalta que o principal legado dos “troncos missioneiros” está em seu pioneirismo, visto que a música exerceu um papel diferenciado na construção de uma identidade missioneira. Atualmente, decorridos mais de três décadas da ressignificação do passado colonial, percebe-se a música como um dos elementos que mais agem junto ao imaginário local, tendo a mesma o papel de informar cada vez mais a população sobre a gloriosa história local. As canções entram no imaginário dos indivíduos, os quais cada vez mais, se sentem pertencentes aquele contexto, gerando sentimentos de apego e de orgulho com relação ao lugar. Se no passado célebres artistas tiveram a missão de cantar as missões, no presente a música local continua sendo valorizada. Dos “quatro troncos”, Pedro Ortaça é o único vivo e juntamente com seus filhos segue sendo o principal, porta voz da música missioneira. Na busca de dar continuidade a musicalidade local, alguns eventos locais merecem atenção, como é o caso do “Canto Missioneiro”, que vem ocorrendo nos últimos anos no município de Santo Ângelo. A figura 1 exposta a seguir, traz o banner de propaganda do “Canto Missioneiro 2015”, onde se percebe a valorização da cultura missioneira, tida como identidade local. 216 Figura 1: Banner Alusivo ao Canto Missioneiro 2015. Fonte: www.cantomissioneiro.blogspot.com.br A importância da música local, forte elemento da identidade missioneira, não fica restrita ao “Canto Missioneiro” realizado em Santo Ângelo. O município de São Luiz Gonzaga se orgulha de ser berço de alguns dos artistas mais reconhecidos localmente, dentre eles Pedro Ortaça, Jayme Caetano Braun e Noel Guarany. Devido ao fato, o município carrega com orgulho a alcunha de “Capital Estadual da Música Missioneira”, como enfatizado na figura 2 a seguir. 217 Figura 2: Folder de São Luiz Gonzaga. Fonte: Site da Prefeitura Municipal de São Luiz Gonzaga. Outro elemento que age localmente na construção de uma identidade missioneira é o turismo, o qual se evidenciou com força na região a partir do tombamento do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, como Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade pena UNESCO desde 1983. Com o crescimento do turismo, verificado principalmente após o tombamento, a identidade local passou a ser cada vez mais alavancada, visto que a região passou a ter maior reconhecimento externo, sendo intensamente propagandeada. Para os locais, o turismo agiu fortemente também, visto que os mesmos passaram a ter contato direto com símbolos representativos que faziam alusão ao período histórico, o que acabava se inserindo no imaginário coletivo, despertando ligações pessoais dos indivíduos para com o lugar e sua história. As transformações geradas pelo turismo em determinada área podem ser bastante complexas. O contexto de exploração patrimonial é explorado por Menezes (2014) que afirma que trabalhar com a memória é de certo modo entende-la juntamente com seu processo de construção, visto que a mesma vem a ser um processo dinâmico que sempre continua em andamento, sendo uma representação social que leva a constante inserção identitária. De acordo com o autor, a interpretação patrimonial se dá pela explanação histórica juntamente com as relações do passado vivido e do momento atual. No caso missioneiro, o contexto vivido pode 218 ser abordado por quem fez parte de períodos marcantes como o do tombamento e de quem vivenciou as transformações ocorridas desde o período até hoje. Segundo Figueiredo (2013) o patrimônio histórico cultural é responsável por materializar um sentimento que é evocado pela cultura e pela memória, auxiliando a formação de identidades coletivas, que acabam sendo reforçadas por laços de origens comuns, sendo esse um fator decisivo para a sobrevivência de uma comunidade. Ainda nesse sentido o autor complementa que o patrimônio cultural se remete a herança coletiva que deve ser repassada a futuras gerações, para que faça relação do passado com o presente a partir de elementos históricos. Stello (2013) ressalta a importância do patrimônio, o qual para o autor é resultado da dialética do ser humano com seu meio, não sendo composto apenas por objetos do passado que obtiveram reconhecimento, mas também por tudo aquilo que faz referência à memória coletiva de um povo, que de certo modo acaba conferindo identidade para seus membros. Com isso, percebe-se que o patrimônio é uma espécie de herança comum em que elementos culturais e naturais, tanto materiais quanto imateriais acabam sendo herdados de antepassados ou até mesmo criados no presente, fazendo com que os sujeitos locais se relacionem com os mesmos e transfiram tal relação para gerações futuras. Além do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, a região missioneira gaúcha preserva ainda outros três sítios; São Nicolau, São João Baptista e São Lourenço Mártir, todos considerados patrimônios nacionais. As ruínas dos antigos povoados são atrações turísticas, atraindo visitantes e divulgando a região. Pelo estado de conservação e pela grandiosidade, nenhum sítio arqueológico se compara ao de São Miguel, que age simbolicamente fazendo sempre uma alusão direta ao período histórico.O simbolismo entorno da imagem da igreja de São Miguel Arcanjo é considerável. A figura é constantemente ressaltada em propagandas turísticas e calendários, sendo uma imagem que imediatamente vem a mente quando se fala em Missões. Além de valorizar intensamente a história regional, o Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo serve de referência para os nativos, visto que o mesmo da vida a acontecimentos do passado, trazendo a historiadores, guias turísticos e visitantes, uma gama de detalhes sobre o passado Jesuítico e Guarani no local. Devido ao fato de a imagem do frontispício da igreja da antiga redução ser intensamente explorada, a mesma tem um papel de propagandear toda uma região, divulgando a mesma externamente. Para o turista ou para as pessoas de fora, aquelas que não vivem o dia-dia local, as Missões acabam sendo representadas por essa imagem, da qual os missioneiros acabam fazendo uso, no sentido de informar e de localizar as pessoas sobre seu lugar. O que se percebe na relação da população 219 missioneira para com a imagem da igreja da antiga redução e de outros símbolos locais é de certo modo evidenciado por Lefebvre (2006) que alega que os corpos dos indivíduos, que agem como usuários, estão de certa maneira, presos a engrenagens espaciais, sendo análogos em termos filosóficos a imagens, símbolos e signos. Atrelado a história local, ressaltada pela música com mais força desde a década de 1960 e pelo turismo a partir do tombamento do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, surgiram símbolos e signos que fazem alusão ao período histórico e estão impregnados localmente na paisagem, passando uma mensagem aos locais e ressaltando que naquele lugar ocorreu uma história muito rica num passado distante. O símbolo que é mais constantemente perceptível nas Missões é o da Cruz de Caravaca, popularmente conhecida com Cruz de Lorena ou Cruz Missioneira. Tal cruz, que se diferencia por possuir “quatro braços”, foi usada localmente no passado para marcar a presença jesuítica na região. Atualmente a Cruz Missioneira é enfaticamente usada na região, porém a mesma tem seu uso diferenciado no presente, servindo como marco de uma história diferenciada que ali ocorreu no passado e para diferenciar os municípios locais como “missioneiros”. A famosa cruz está presente no dia-dia dos municípios da região, fazendo parte dos cenários urbanos, estando a mesma evidenciada nas logomarcas comerciais e principalmente nos trevos de acesso aos municípios locais, onde é comum a presença do elemento simbólico. Na figura 3, apresentada a seguir, percebe-se o símbolo local missioneiro no trevo de acesso ao município de Entre-Ijuís-RS. 220 Figura 3: Cruz Missioneira, trevo de acesso ao município de Entre-Ijuís-RS. Foto: Autor Saquet e Briskievicz (2009)fazem relação da identidade para com o território, o qual é para os autores, envolvido em diferentes graus de intensidade por uma dimensão simbólica e cultural que vem a se constituir de uma identidade atribuída por grupos sociais do espaço de vida dos indivíduos, possuindo assim uma dimensão concreta, que acaba se inserindo numa lógica de controle espacial como alternativa de dominação dos sujeitos.A identidade missioneira é nesse sentido ressaltada por Brum (2006) que informa que na região, muitas representações do passado têm sido acionadas no presente, visando diferenciar a área de regiões circundantes, induzindo os sujeitos locais a viveram as mesmas histórias através de elementos simbólicos presentes na paisagem. Claval (2007) fala de tomada de posse de determinado território, que segundo o autor se dá com a introdução de marcas que exprimem e orientam a uma identidade comum, sendo normal a fixação de cruzes, monumentos e arquiteturas tipificadas, que de certo modo proclamam a identidade que se quer. A introdução de símbolos e marcas em determinada porção do espaço acaba por se inserir numa lógica de mercado, visto que a visualização de um dominante na paisagem, marcado pela repetição, faz com que os indivíduos comprem a partir da imagem produzida, como enfatiza Lefebvre (2006). Para o autor a produção do espaço através de marcas se orienta pelo caráter visual, o qual é evidenciado, tornando os sujeitos envolvidos por essa dinâmica que se apresenta na paisagem. Outro autor que 221 da importância para marcas na paisagem, sobretudo para as representações sociais é Claval (2007), que ressalta que os sistemas de representações induzem ao pensar, fazendo com que a prática de batizar lugares possa reproduzir um objeto discursivo, pois a introdução de marcas simbólicas as torna uma categoria social. De acordo com Jodelet (2001) as representações sociais trazem consigo uma relação de “simbolização”, interpretando o lugar e trazendo significados para o mesmo. Para a autora tal prática de representação se insere na “construção” do sujeito, o qual como já referido anteriormente por Lefebvre (2006) está preso a engrenagens do espaço. Para o autor, o espaço urbano é destacável nesse sentido, sendo o mesmo, o ponto de encontro, reunindo no mesmo lugar, seus indivíduos, suas ações e seus símbolos. Sobre o contexto urbano, Corrêa (2007) afirma que é pelas formas simbólicas que a cidade evidencia determinada cultura, a qual é ressaltada de acordo com objetivos dominantes, identificando assim o papel de transformação espacial. O autor ainda ressalta que quando se (re) significa a paisagem urbana, a mesma passa a possuir valor simbólico, se tornando um tipo especial de mercadoria, manifestando a representaçãoda realidade social e viabilizando a circulação de mercadorias, se inserindo num contexto eminentemente político. García Canclini (2000) revela a importância dos símbolos, que para o autor servem para resgatar o passado, fazendo com que a identidade tenha sua continuidade através de monumentos, que fazem relembrar histórias longínquas. Saquet e Briskievicz (2009) enfatizam que os símbolos que compõe determinada identidade não são construções sem intenção, pois os mesmos sempre mantém certa relação com a realidade concreta. Os autores ainda afirmam que a memória coletiva de um grupo social precisa de referências territoriais, para quepossa reafirmar suas identidades. Considerações Finais Percebe-se diante do exposto no presente trabalho, que a identidade missioneira ganha força devido a forte presença de alguns elementos difusores, que agem localmente, induzindo a população local a se sentir pertencente ao lugar e a todo contexto histórico que ali ocorreu no passado. A música se destacou por tentar se diferencial como “missioneira”, tentando trazer resquícios guaranis, buscando autenticidade que a legitimasse. Atualmente a mesma é propagada por artistas locais e passa uma mensagem a população, induzindo a mesma a ter orgulho de sua história e de seu chão, se notabilizando também pelo forte tom denunciativo, uma característica marcante nas canções guaranis. O turismo incentiva a população local a 222 fazer uso do patrimônio histórico e serve como meio de tornar a região conhecida externamente. O simbolismo da imagem do Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo e da Cruz Missioneira estão presentes no dia-dia dos locais, agindo automaticamente no cotidiano dos sujeitos, induzindo a relações de apego e pertencimento para com o lugar e sua riquíssima história, a qual é constantemente ressaltada. Referências BARBOSA, I.D. Os Troncos Missioneiros e a Construção da Identidade Missioneira a partir da Música. Revista Para Onde!?vol.6, n°2, p.171177. Instituto de Geociências. Programa de Pós Graduação em Geografia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Jul/dez 2012. ISSN 19820003. BRUM, C. K.“Essa terra tem dono”. Representações do passado missioneiro no Rio Grande do Sul. Santa Maria, Ed. UFSM, 2006. 280p. CLAVAL, P.A Geografia Cultural. Florianópolis. 3ª edição. Editora da UFSC, 2007. 453p. CORRÊA, R. L. A Geografia Cultural e o Urbano. In: Introdução a Geografia Cultural. Orgs: Corrêa, R.L. Rosendahl, Z. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2007. p.244. 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BRUSADIN, L.B., PIRES, M. C. 1.ed. São Paulo. Outras Expressões. 2012. 264p. NEDEL, L. B. Regionalismo, historiografia e memória: Sepé Tiaraju em dois tempos. Anos 90. Porto Alegre. V.11. n°19/20. p-347-389. 2004. POMMER, R. M. G. Missioneirismo: A Produção de uma Identidade Regional. Tese de Doutorado. Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo. 2008. PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO LUIZ GONZAGA. Capital Estadual da Música Missioneira. Disponível www.saoluizgonzaga.rs.gov.br/VisualizaConteudo.aspx?ID=794. em: Acesso em: 28 fev.2014. SAQUET, M. A. BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e Identidade: Um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, n°31, vol.1, 2009. p.3-16. STELLO, V. F. Além das Reduções: A Paisagem Cultural da Região Missioneira. Tese de Doutorado. UFRGS. Porto Alegre. 2013. 224 LAS TRANSFORMACIONES TERRITORIALES URBANAS EN EL BARRIO JACINTO VERA. Gladys Graciela Schiavone Cánepa C.F.E- IINN. [email protected] Resumen. La gestión del territorio urbano incide en la ciudad, al cambiar espacios ineficientes o insostenibles económicamente por estructuras que buscan competitividad económica y uso colectivo, mejorando la oferta, rehabilitando tejidos urbanos y dinamizando el intercambio, por encima de la conservación de estructuras pasadas que eran parte del paisaje barrial cotidiano. Montevideo no es ajena a este agiornamiento de los barrios, una muestra de este proceso dinamizador es Jacinto Vera. Lo hemos seleccionado por su rico pasado y por su presente en transformación. Recordemos que este barrio residencial de arquitectura baja, exceptuando algunos galpones donde en el pasado funcionaron industrias. Al sacar la planta de C.U.C.T.S.A. la empresa privada prima la organización de ese lugar antes deprimido social y económicamente, por la instalación de un Shopping que producirá una dinámica de avance y eficiencia al aprovechar los flujos y nudos de transportes y comunicaciones que hay allí. Y hoy es un nudo central de servicios, transporte y comercio, a partir de la instalación del Nuevocentro Shopping. Palabras clave: barrio, cambios, permanencias, Nuevocentroshopping, Jacinto Vera. 1-Introducción. La Sociedad humana se ha apropiado de la naturaleza mediante la técnica y el trabajo,al mismo tiempo va unificando y padronizando los espacios, creando territorios urbanos con ciudades y barrios; que acumulan formas heredadas del pasado en comunión con las creadas en el presente,las cuales van condicionando nuestra vida cotidiana con sus diversas funcionalidades y servicios. 2-Objetivos. Para el siguiente trabajo nuestro objetivo general es el de analizar las diferentes transformaciones que se han realizado en este barrio,debido a la instalación del Nuevocentro Shopping. Como objetivos específicos: a)- realizar una investigación bibliográfica y en territorio,de los cambios ocurridos en el barrio; b)- observar los cambios y permanencias del barrio; c)- reflexionar sobre las transformaciones territoriales ocasionadas en Jacinto Vera, que dan lugar a su gentrificación. 225 3-Metodología de trabajo. Este trabajo es parte de una tesina, que se está elaborando en el marco del Diploma de Geografía, por lo tanto lo que se está presentando aquí es la primera instancia de investigación bibliográfica de: libros, periódicos, revistas y portales web, para informarnos sobre la situación del barrio a partir de la construcción de este megaemprendimiento. La misma está al final del trabajo, para luego comenzar a realizar el análisis de las transformaciones encontradas establecer conclusiones. Al presentar el trabajo consideramos partir de un marco conceptual que se inicia en el ítem a desarrollar a continuación, para luego focalizarnos en nuestra temática. 4-Desarrollo. 4.1-¿A qué se llama territorio urbano? Los territorios urbanos se definen por la alta concentración de población por unidad de superficie edificada, con alta concentración de servicios y donde la población trabaja principalmente en el sector secundario y terciario. En ellos se asienta la ciudad, en nuestro caso Montevideo,la metrópolis, cosmopolita y turística, que centraliza servicios, bienes,tecnología e infraestructura. Y como territorio está limitada, para poder controlar y ejercer su soberanía mediante normas, conformando un mallado que se intersecta en áreas (otras ciudades, barrios) y líneas ( de transporte,comunicación). Para Elissalde43 es de la geografía de los territorios, establece que es un espacio organizado, ordenado, producto de las interrelaciones entre los actores y una relación compleja, que combina el medio físico natural y el espacio “humanizado, que comprende a las personas que se apropian de el “44(Raffestin, 1986). Comes45 considera que: “el concepto de territorio es consecuencia de la delimitacion espacial de un proceso de apropiacion de una parte de la superficie terrestre por un grupo social. Esta definicion tiene sus referentes en caracteres deducidos de la Antropologia, Sociologia, Psicologia, etc. Pero tambien podemos encontrar la vinculacion del termino al dominio juridico, y este actua en la expresion ordenacion del territorio. Porque un territorio no es solo un trozo de espacio apropiado por un grupo social, sino que corresponde a una 43 revistas.ucr.ac.cr/index.php/reflexiones/article/viewFile/1505/1514 (junio 2014) 44 Vargas Ulate, Gilbert .”Espacio y territorio en el análisis geográfico”.Reflexiones, vol. 91, núm. 1, 2012, pp. 313-326 .Universidad de Costa Rica San José, Costa Rica 45 www.educ.ar/ sitios/educar/recursos/ver?id=102733 (junio 2014) 226 extension espacial ordenada por este grupo con una unidad de funcionamiento donde vendran los actores (estado, colectividad territorial, empresa, grupo o individuo) con sus percepciones y sus estrategias. El territorio es el espacio de una sociedad; es pues un espacio de vida”.46 En relación a estas conceptualizaciones nuestro concepto de territorio, para el abordaje de este trabajo, debe considerar la apropiación del espacio por los vecinos, que son los que habitan en él, dicho proceso se ha ido realizado desde su fundación y hasta el presente, donde muchos espacios verdes y zonas de accesibilidad han sido desarrolladas por el accionar de comisiones barriales y propuestas votadas en los consejos vecinales. Pero también el presente y el proyecto a futuro es transformado y planificado por quienes no son habitantes del barrio y que invierten en mega estructuras y torres habitacionales. Al respecto Massey47 afirma que dentro del territorio existen actores que pueden ejercer territorialidad sin el hecho necesario de vivir y ser parte activa de la construcción del territorio, donde sus intereses priman y lo transforman para acondicionarlo a una modernidad que le genere ganancias con sus modificaciones. La gestión del territorio urbano incide en la ciudad, al cambiar espacios ineficientes o insostenibles económicamente , por estructuras que buscan competitividad económica y uso colectivo, mejorando la oferta, rehabilitando tejidos urbanos y dinamizando el intercambio, por encima de la conservación de estructuras pasadas que eran parte del paisaje barrial cotidiano. Al sacar la planta de C.U.C.T.S.A. la empresa privada prima la organización de ese lugar antes deprimido social y económicamente, por la instalación de un Shopping que producirá una dinámica de avance y eficiencia al aprovechar los flujos y nudos de transportes y comunicaciones que hay allí. Desde las potencialidades que tiene este barrio se diseña y planifica un nuevo ambiente urbanístico, donde la renta y el privilegio económico y social será la ruta de avance a seguir. En este barrio el Nuevocentro Shopping impone su presencia cambiándole su perfil, para proyectarlo desde su ubicación hacia un papel de nudo y enclave comercial, laboral, de transportes y comunicación multiescalar. 46 Adaptado de Cristòfol Trepat y Pilar Comes. “El tiempo y el espacio en la didáctica de las ciencias sociales”. Ed.Graó. Barcelona, 1998. 47 www.ub.edu/geocrit/b3w-1023.htm (junio 2014) 227 Esta nueva urbanización, no solo realizará la transformación física del territorio donde está emplazado el barrio, sino que condicionará mirando a futuro la sociedad y la cultura barrial de las nuevas generaciones. 4.2-¿Qué es un barrio? Ya consideramos que el territorio urbano está compuesto por una malla entrelazada de áreas y líneas, las primeras son los barrios. Si buscamos su significado etimológico barrio proviene " del árabe hispánico barri, ‘exterior’, y este del árabe ّّ[ﺏ ّﺭﻱbarrī ], ‘salvaje 48“’. Pero el concepto de barrio va más allá de ser una fracción geográfica de la ciudad, es una unidad provista de servicios comerciales,sanitarios, culturales,deportivos. Y si bien su origen puede deberse a una decisión administrativa,un barrio son sus habitantes, sus plazas,sus monumentos, sus calles principales, su historia , su cultura y personalidades, que le dan una identidad única y diferente a los demás. 4.3-El barrio Jacinto Vera. Para este trabajo proponemos una mirada primero a sus orígenes fundacionales, para luego ir al pasado y lo que aún conserva de él, posteriormente trataremos el presente con sus cambios y gentrificaciones que se proyectan al futuro. De esta forma iremos aportando una mirada procesual e integrada de las transformaciones que se han ido gestando en este barrio, con sus cambios y permanencias. 4.4-Ubicación y características generales. Jacinto Vera se distingue y caracteriza por ser residencial y de arquitectura baja, exceptuando algunos galpones donde en el pasado funcionaron industrias. Está ubicado entre la Avenida Br. Artigas, la Avenida Garibaldi y la Avenida General Flores. Se encuentra bajo la dependencia de la comisaría 13º de Montevideo, e integra el Comunal Zonal Nº3, junto con barrios aledaños como Reducto, La Comercial o Villa Muñoz. 48 http://lema.rae.es/drae/srv/search?key=barrio ( junio, 2014) 228 Dio nombres ilustres al fútbol, entre los que se destacan los campeones del mundial de 1950 Míguez y Schubert Gambetta. El poeta Líber Falco que de niño vivió en la zona en un ranchito de una tía. En sus libros “Equis Andacalles” y “Cometas sobre los muros” ,describe las callecitas de tierra y adoquines del antiguo Jacinto Vera así: Yo naci en Jacinto Vera / que barrio Jacinto Vera ranchitos de lata por fuera y por dentro de madera. De noche blanca corria blanca corria la luna y yo corria tras ella.De repente se perdia,de repente aparecia entre los ranchos de lata y por adentro madera Ah luna, mi luna blanca luna de Jacinto Vera !.49 4.5-Sus orígenes e historia. Según Aníbal Barrios Pintos50 dentro de esa zona se realizó en setiembre de 1811 la primera asamblea patriótica, en la entonces "Panadería de Vidal", actuales calles Lorenzo Fernández, Pedernal, Yaguarí y Joaquín Requena. El 11 de septiembre de 1811 también se realizó aquí la primera Asamblea de los Orientales, convocada por José Artigas, a la que asistieron más de un centenar de hombres. Fue en esa oportunidad que los diputados de Buenos Aires expusieron las causas por las que firmaron el armisticio y obligaron al retiro del ejército sitiador del Montevideo español y amurallado, ante la amenaza de una inminente invasión portuguesa a la Banda Oriental En 1895 Francisco Piria, el pionero del urbanismo montevideano, creó el barrio, al lotear y rematar lo que hasta entonces era un paraje de chacras (la ex quinta Platero), con zanjones y hondonadas, le puso por nombre el de monseñor Jacinto Vera, primer obispo de la ciudad (1813-1881)debido a que el Sr. Piria tenía gran amistad con el primer vicario de Montevideo. En su origen lo poblaron gallegos e italianos,humildes obreros que habían sido la mano de obra en las enormes construcciones de Don Emilio Reus en el barrio Sur y Villa Muñoz, que al terminar esos proyectos se quedaron viviendo en Jacinto Vera, en unos lotes que Piria les había rematado a precios muy bajos en su local de la Ciudad Vieja. Los obreros construyeron unas pequeñas viviendas que le dieron su identidad al barrio; humildes ranchitos de rústica madera de la carpintería de Martínez y con techos 49 50 municipioc.montevideo.gub.uy/node/18 (junio 2014) http://municipioc.montevideo.gub.uy/node/18 (junio 2014) 229 de hojalata sacada de los envases metálicos del querosén y todo era unido con un pegamento a base de yuyos y harina mojada, que se decía era de origen celta. Hacia 1912 en el transporte se crea una sociedad anónima que fusiona a todas la líneas de cooperativas privadas, se la denomina C.U.T.C.S.A. Y por razones casi folklóricas, el origen étnico de la mayoría de los accionistas cooperativistas, choferes y guardas, fue eminentemente gallega. Hay un testimonio de aquella época que lo ilustra “ ...cuando se embarca Manolo en La Coruña, le preguntan a dónde va y contesta: a Cutcsa51”. Desde 1941 a 1973 se crea el permiso para la construcción de viviendas por particulares con plano gratuito y exención de tasas. La Ley 13.728 del 17 de diciembre de 1967 ,permite la creación de viviendas con fondos sociales, como en el caso de Cutcsa en las calles Suárez y Micenas. Por la calle Lafinur se ubicaba el boliche “Uruguayo”, donde los parroquianos degustaban el aromático café y la quemante caña en copitas de grueso vidrio. En otro emblemático boliche “El Sol”, se cuenta la leyenda, que una mañana se trenzaron en un bravo contrapunto los payadores López y Clodomiro Pérez. Jacinto Vera tenía fama de ser semillero de cracks e ídolos del fútbol uruguayo, que jugaban en el potrero frente a la iglesia de San Antonino. El Carnaval latió en sus calles, un corso salía por la actual Lorenzo Fernández, se dirigía a Garibaldi hasta llegar a Cuñapirú. Por la calle Lafinur se levantaba un tablado alegórico que ganó muchas veces el premio de la Comisión de Fiestas del Municipio. Su murga locataria La Milonga Nacional, en sus poéticas retiradas varias veces mencionó al querido barrio, con sus “ranchos de lata por fuera y por dentro de madera”. Los domingos de matiné eran en los cines “Ateneo” y “Edinson” de la calle Garibaldi. Y de deporte en los clubes El Zapicán y El Victoria. 4.6- El barrio en el presente: permanencias y cambios. Actualmente el barrio conserva parte de su pasado que lo identifica y que es parte de su patrimonio cultural, como la Iglesia San Antonino, algunas calles conservan su empedrado; todavía las casas con jardines y de un solo piso son mayoría, los trazados dentro del barrio en parte son irregulares y hasta caóticos, quedando muy pocos terrenos baldíos y las reducidas plazoletas aparecen en los lugares más inesperados. 51 ”Una información urgente sobre la historia de Montevideo”. El País. Octubre 1976. 230 Pero se han incorporado : dos escuelas publicas, un liceo público de segundo ciclo, una estación de servicio,la sede de la Administración de los Servicios de Salud del Estado A.S.S.E. (en la ex casa de gobierno,antes llamado Edificio Libertad), el hospital Filtro dependiente de A.S.S.E., una dependencia del Ministerio de Transporte y la antigüa carpintería Martínez, hoy abandonada. También destaca una plaza que recuerda el antigüo sitio de la panadería de Vidal. Estos cambios acompasaban el ritmo de un barrio tranquilo, de población obrera y no afectaban mucho la rutina ni la identidad cultural de sus habitantes. 4.7-Las transformaciones del barrio debido a su gentrificación. Cuando hablamos de gentrificación estamos aludiendo a la transformación de un sector de la ciudad que debido a la influencia de la economía, la globalización,las fuentes de empleo, las tecnologías y la información,traerá como consecuencia un cambio drástico en las relaciones sociales, no sólo desde los planos económicos y culturales, sino también desde la organización de la ciudad. En las últimas décadas hemos presenciado un proceso de transformación urbana, por la instalación en diferentes barrios de megasuperficies e infrastructuras modernas para vivienda, oficinas,etc; producto todas de la búsqueda de “ inserción y participación en el circuito mundial de acumulación del capital, que ha cambiado la estructura y la morfología de las urbes52”. De Mattos (2006)señala que las metrópolis latinoamericanas se encuentran inmersas en una etapa de reorganización, debido a una nueva fase de modernización capitalista, donde la reestructuración productiva altera la geografía económica a escala global, impactando no sólo la estructura urbana, sino también la social. Donzelot53 ha mencionado que la reestructuración enfocada en la tercerización de la economía, genera nuevas formas de urbanización, con distintas velocidades según las condiciones de vida de los grupos sociales que asumen estos procesos. Las zonas gentrificadas generalmente están localizadas en los barrios centrales de las ciudades, siendo el producto de planes de renovación urbana, en el marco de ejes asociativos entre agentes urbanos públicos y privados. La gentrificación se ha convertido en un componente fundamental de las estrategias de regeneración urbana. 52 De Mattos et al, 2004 53 ses.ens-lyon.fr › Dossiers › Les grands dossiers, En la traducción de : la cuestón urbana. (junio 2014) 231 Esta intervención pretende poner de manifiesto los estrechos vínculos existentes en entre los programas de revitalización urbana, que se han estado llevando a cabo en nuestra ciudad. Y que forma parte integral de las iniciativas para la regeneración o rehabilitación de determinadas zonas de la ciudad, que buscan ser desarrolladas en diversas formas y dinámicas en este barrio en particular. En Jacinto Vera comienza cuando se edifica el hoy ex Edificio Libertad, que fue sede de la Presidencia de la República, mejorando el predio que estaba baldío y acondicionando a su alrededor una plaza con esculturas e iluminación. Esto trae como consecuencia que la Escuela Pública que está allí se pinte y refaccione, al igual que el monumento que está en la rotonda de acceso. La Avenida Boulevard Artigas se ensancha en doble mano hasta el entronque con Luis A. De Herrrera y J.P. Varela. Ocasionando que las casas tengan mayor valor inmobiliario y se vendan los predios baldíos que existían, desocupando a aquellos que estaban de ilegales. Desde el 2012 este barrio alejado del bullicio comercial, tiene después de cinco años de trabajo el Nuevocentro Shopping, donde estaba antes la planta José Añón de Cutcsa. Las nuevas transformaciones de Jacinto Vera son el producto de nuevas actividades y de la demanda de espacios diferentes, lo que trae como consecuencia un aumento del costo del suelo urbano comandado por el mercado inmobiliario. La ubicación de un nuevo centro comercial ha reconvertido a un barrio tranquilo en un área comercial, que se dinamiza con funciones administrativas y financieras, aprovechando el nodo de comunicaciones y transportes que convergen en él. La renovación de este territorio se enfocó en reemplazar al gran taller de C.U.T.C.S.A.,por un gran emprendimiento que moderniza la urbanidad. Pero este proceso de gentrificacion no se detiene, está en obras la continuación de la Avenida Boulevard en su ensanche, la finalización de las torres de viviendas que comparten el predio del Nuevocentro Shopping y aún está en remodelación el edificio de DISSE, donde estaba antes el Edificio Libertad. Ante este fenómeno de transformación, Sandroni54 ha sostenido que “la relacion entre renovacion urbana y gentrificacion –entendida como consecuencia negativa- es premeditada ya que la renovacion vendria a constituir se como un estimulo para cambiar el uso de barrios degradados y aumentar la inversion privada en ellos”. 54 www.kellogg.northwestern.edu/.../ sandroni alvaro.a.(junio 2014) 232 La ubicación del Nuevocentro Shopping ha cambiado la dinámica del barrio para siempre, es estratégico, es un nudo donde se conectan las principales Avenidas: Boulevard Artigas, Luis Alberto de Herrera, José Pedro Varela, Propios, Gral Flores y San Martín. Está en medio de la ruta turística de quienes ingresan al país por Colonia y está más cerca que otros Shopping. Compite con otros establecimientos comerciales pequeños, medianos como La Pasiva y grandes como: Devoto, Tienda Inglesa, Macro Mercado, Tres Cruces terminal y shopping. Su área de influencia trascendió los límites de Jacinto Vera y va más allá de sus barrios vecinos. 5-A modo de conclusión. A lo largo del tiempo desde su fundación, hasta el presente, el barrio Jacinto Vera ha tenido variadas transformaciones en su infraestructura, que le han modelado sus rasgos identitarios. Los procesos de cambio han acompasado la modernización y las necesidades e intereses de los ciudadanos. La inversión económica ha dado lugar a obras de trabajo, de esparcimiento y de servicios. Las comisiones vecinales y clubes del barrio, en conjunto con la Intendencia Municipal, a lo largo del tiempo ha promovido la implementación de programas de recuperación de áreas centrales y centros históricos, además de inversión en el mantenimiento y promoción del patrimonio histórico y cultural, todo ello con el objetivo de hacer atractivo el espacio urbano para la inversión de capital privado. Lo cual trae como consecuencia revalorizar el valor inmobiliario, densificando la zona al construir las torres habitacionales en el predio del Shopping y desplazando aquella población que no le atrae el nuevo perfil que va tomando el barrio y su apariencia. También se ha observado tanto el cierre progresivo de aquellos negocios pequeños (almacenes, kioscos) ante la competencia de una oferta mejor, pero también están aquellos negocios que no les ha afectado o han visto mejorar sus ventas, porque es mayor el público que acierta a transitar por el barrio y que busca restaurantes y bares alejados del centro comercial. 233 El Shopping instala en el cotidiano nuevas formas de vida y costumbres, que van más allá de la escala local del barrio Jacinto Vera, es un espacio de compras, de reunión , de esparcimiento, de trabajo, de comunicaciones ,servicios y transportes. La gentrificación del barrio Jacinto Vera, deriva de la implementación de una política social y económica de revitalización funcional de una zona deprimida como era la planta de C.U.T.C.S.A, en una ubicación central, que se direccionada a la ejecución de una mega estructura moderna y al desarrollo de proyectos inmobiliarios, sin considerar la explotación, promoción e implementación de rutas que traen y llevan ciudadanos de todas partes de Montevideo, mediante los sistemas de transporte de C.U.C.TS.A y de las demás compañías. Y como se esquematiza más abajo, se promueve y desarrolla la plusvalía de su ubicación, al configurarse como punto articulador y cohesionador del sistema urbano y asume este rol protagónico, promocionándose por separado y en conjunto con las otras megasuperficies, para el arribo de grupos de ingresos medios, principalmente jóvenes y familias que gustan de estas superficies comerciales y que aún no han sido captados por su lejanía o precios de los otros Shopping montevideanos. 6-Bibliografía empleada. De Mattos, C. (2006): “Modernizacion capitalista y transformacion metropolitana” en “America Latina. Cinco tendencias constitutivas”. En: GERAIGES, A. El País. Octubre 1976. “Una informacion urgente sobre la historia de Montevideo”. Gurevich,R. (2005)“Geografia.Territorios y ambientes en el mundo contemporaneo” 3er Ciclo EGB. Editorial Aique. Bs. As. Lacoste,Y. (1983) “Geografia general fisica y humana”. Editorial Oikos-Tau. Barcelona. Raffestin, Claude.(1995) “Por uma Geografia do poder. Sao Paulo” Ática. Santiago.”Mercado metropolitano de trabajo y cambios socio territoriales en el Gran Santiago”. Instituto de Estudios Urbanos y Territoriales – INE. PUC. Sassen, S. (1991).” La ciudad global: Nueva York, Londres, Tokio. Buenos Aires.” Eudeba. Vergara, C. (2013).”Gentrificacion y renovacion urbana. Abordajes conceptuales y expresiones en America Latina” . 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En la traduccion de: la cueston urbana.(junio 2014) www.kellogg.northwestern.edu/.../ sandron i alvaro.a . (junio 2014) www.ub.edu/geocrit/b3w-1023.htm (junio 2014) 235 EJE 2- BIODIVERSIDAD Y ÁREA PROTEGIDA 236 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL 237 UNIDADE DE CONSERVAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE MANUTENÇÃO DA SOCIOBIODIVERSIDADE NOS CAMPOS SULINOS DO BIOMA PAMPA Marilse Beatriz Losekann¹ Fernanda Maria Follmann² ¹Universidade Federal de Santa Maria/UFSM; Prédio 17, Av. Roraima, nº 1000; [email protected] ²Universidade Federal de Santa Maria/UFSM; Prédio 17, Av. Roraima, nº 1000; [email protected]; Resumo Os campos sulinos do Bioma Pampa se caracterizam por possuir uma vasta biodiversidade, sendo que parcela ainda não foi estudada. Além dessa há a diversidade cultural e social específica dos locais, que se estruturam, principalmente através da pecuária extensiva, atividade que conformou as características atuais do pampa gaúcho. No entanto, a expansão do agronegócio sobre o Bioma, através da soja e da silvicultura, vem causando inúmeros impactos sobre a sociobiodiversidade local. Neste sentido, busca-se aqui realizar uma discussão acerca do processo de avanço do agronegócio e sobre o papel das Unidades de Conservação, especificamente da APA do Ibirapuitã, RS, enquanto espaços de resistência a esse processo. Para isso, utilizou-se a pesquisa documental e bibliográfica. Assim, percebese que devido a pecuária sobre campo nativo representar mais de 87% das atividades na APA do Ibirapuitã, esta representa importante espaço de resistência ao agronegócio, visto que se configura na maior área protegida no Pampa gaúcho. Palavras-chave: Agronegócio. Bioma Pampa. Resistência, Unidade de Conservação. Área de Proteção Ambiental. Resumen Los pastizalesdelsurdel bioma Pampa se caracterizan por tener una amplia biodiversidad, siendo que parte no se haestudiado. Además de estohayladiversidad cultural y social de los lugares específicos que se estructuran principalmente a través de una extensa actividadganadera que ha garantido las características actuales de la pampa gaucha. Sin embargo, laexpansióndelagronegocioenel Bioma por laproducción de soja y silvicultura, ha provocado numerosos impactos enelsocio-biodiversidad local. En este sentido, se busca abrir un debate sobre elproceso de avance de losagronegocios y el papel de las áreas protegidas, específicamente de la APA Ibirapuitã, RS, como espacios de resistencia a este proceso. Para ello, hemos utilizado el documental y lainvestigación bibliográfica. Por lo tanto, laganaderíaen pastos nativos representa más del 87% de lasactividades de la APA Ibirapuitã, o que hace de esta un importante espacio de resistencia al agronegocios, ya que enella se estableceel área protegida más grande de Pampa gaucho. Palabrasclaves: Agronegocio. Bioma Pampa. Paisaje Protegido. Resistencia. Áreas Protegidas. 238 Introdução Por mais de duzentos anos a atividade pecuária se desenvolve nos campos do RS, conformando as características do Bioma Pampa através da coexistência entre homem e natureza. Por muito tempo, houve uma relação harmoniosa entre estes, uma vez que os sujeitos do campo tinham uma exploração que não produzia grandes impactos, como é o caso principalmente da pecuária extensiva em campo nativo. Atualmente, o Bioma Pampa, em especial no Estado do Rio Grande do Sul, vem sofrendo alterações com o avanço do agronegócio, através das atividades silvícolas e a sojicultora, e pela extranjeirização da terra. Este modelo de desenvolvimento para o Pampa significa uma mudança radical de sua matriz produtiva e alterações dos ecossistemas que compõem o Bioma. Ao encontro destas alterações das características dos ambientes locais, tornaram-se destaque, a partir do século XX, discussões internacionais e nacionais sobre as ações do homem em relação ao meio ambiente. Em contexto brasileiro, surgem assim, os Espaços Territoriais Especialmente Protegidos (BRASIL, 1988). No cenário brasileiro, asUnidades de Conservação (UCs) ganham destaque a partir da década de 1960 e, segundo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC(2000) a UC “é um espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”. Estes espaços constituem-se numa das principais formas de intervenção governamental, visando reduzir as perdas da biodiversidade face à degradação ambiental.Ao encontro dos objetivos das Unidades de Conservação, traz-se a contribuição destas na conservação do Bioma Pampa, especificamente o caso da Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã. Neste artigo, tem-se por objetivo discutir os impactos do agronegócio sobre o Bioma Pampa do Rio Grande do Sul e analisar a eficácia da APA do Ibirapuitã enquanto espaço de resistência a esse modelo hegemônico de desenvolvimento55. Ao propor esta discussão, utilizou-se a pesquisa documental e bibliográfica, pois segundo 55 Ver mais em: SACHS, Ignacy. Dicionário do Desenvolvimento. Ed. Vozes. 2001. 239 Marconi e Lakatos (2010,p.48) "o levantamento de dados, primeiro passo de qualquer pesquisa científica, é feito de duas maneira: pesquisa documental (ou de fontes primárias) e pesquisa bibliográfica (ou de fontes secundárias)". Assim, utilizou-se informações contidas em relatórios da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Sul (Emater), legislações ambientais brasileiras como o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, 2000), Decreto de criação da APA do Ibirapuitã e referências bibliográficas em relação as discussões nacionais e internacionais sobre proteção ambiental no século XX e especificamente a expansão e pressão que o agronegócio exerce sobre o Bioma Pampa Gaúcho. Bioma Pampa: o agronegócio e seus efeitos territoriais O Pampa abrange regiões pastoris de planícies nos três países da América do Sul – cerca de dois terços do Estado brasileiro Rio Grande do Sul (17,6 milhões de hectares da metade sul), as províncias argentinas de Buenos Aires, La Pampa, Santa Fé, Entrerríos e Corrientes e a República Oriental do Uruguai, como pode ser visto na figura 1. Figura 01 - Abrangência do Bioma Pampa Fonte:Picolli e Schnadelbach, 2007. Entre os anos de 1970 e 2005, segundo Picolli e Schnadelbach (2007), estimase que 4,7 milhões de hectares de pastagens nativas do Bioma Pampa foram convertidos em outros usos agrícolas, como lavouras e plantações de árvores 240 exóticas. Da sua vegetação campestre e dos seus banhados característicos, restam apenas 39%. No Estado do Rio Grande do Sul, a Campanha ou Planalto da Campanha (IBGE, 1986), á a região de maior extensão de campos, dedomínio morfo-estrutural das bacias e coberturas sedimentares. A altitude varia entre 70 e 150 m. O relevo varia de plano a suavemente ondulado (coxilhas). Ocorrem solos de origem do arenito Botucatu, principalmente a oeste do município de Quaraí e a sul e sudeste do município de Alegrete, onde se constata o fenômeno da arenização. Os solos são, em geral, de baixa fertilidade natural, estando muito suscetíveis à erosão. Este Bioma é formado por um mosaico de áreas campestres, matas de galeria, areais, banhados (alagadiços), capões de mata nativa, cerros-testemunhos, serras, áreas de recarga e ou de descarga de aquíferos subterrâneos, matas aluviais, rios e sangas, afloramentos rochosos, entre outras particularidades resultantes da combinação geológica, climática e vegetal presente neste Bioma. Deste mosaico resulta a ocorrência de uma diversidade de espécies microbianas, vegetais e animais associadas ao Pampa, bem como de uma diversidade de tipos humanos. É inevitável considerar a importância das questões históricas (disputas por território entre Espanha e Portugal, ciclos econômicos, Revolução Farroupilha, etc) e da colonização por imigrantes de diferentes etnias (açoriana, espanhola, ucraniana, polonesa, alemã, italiana e outras), como fatores que também definiram a diferenciação dos tipos humanos presentes no Pampa. É por esta razão que ao tratarmos da conservação da diversidade pampeana devemos tomar o cuidado de incluir, além da diversidade ambiental, a diversidade sociocultural presente neste Bioma. A pecuária extensiva tem sido a forma tradicional de aproveitamento econômico destes campos, indicando uma maior sustentabilidade ambiental da atividade em comparação a outras ligadas à agricultura convencional. A necessidade de considerar o papel do homem na conservação da sociobiodiversidade do Bioma Pampa, no caso na Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã, se justifica pelo fato de que foi a coexistência entre o homem e natureza que garantiu a conformação e manutenção das características deste Bioma (Bencke, 2009), e por isso se institucionalizou uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável. Contudo, a expansão do agronegócio sobre o Bioma Pampa, vêm causando impactos negativos aos ecossistemas e desestruturando as comunidades locais. Estas corporações atuam em diversas escalas, que vão desde a produção até a comercialização, seguindo a lógica capitalista, característica do agronegócio. Nesse sentido, Achkar, Domínguez e Pesce(2008, p. 07) mencionam o agronegócio como 241 Los agronegocios constituyen un complejo espacio económico en el que convergen inversiones de capital transnacional en el conjunto de las actividades y sectores vinculados a la producción, distribución y comercialización de productos agrarios a escala global. No Estado do Rio Grande do Sul, este processo de inserção do capital internacional está se intensificando com a implantação de empresas estrangeiras em busca de terras para a plantação das variedades de pinus, eucaliptos e acácia negra. Estas empresas buscam áreas prioritariamente na região da Campanha Gaúcha, no Bioma Pampa, principalmente pelo baixo custo de compra da terra. O governo do Estado do Rio Grande do Sul criou no ano de 2004, o Programa de Financiamento Florestal Gaúcho - “Proflora”, com o apoio do Banco Nacional do Desenvolvimento Social – BNDES. A criação deste programa teve como objetivo conceder financiamento para o plantio de monocultura de acácia negra, pinus e eucaliptos no Estado o que resultou em um acréscimo aproximado de 57% sobre a área total. A expansão recente da silvicultura em território gaúcho veio antecedida da compra de grandes áreas na parte centro-sul do Estado, a baixo custo, por parte de três grandes empresas produtoras de celulose (Aracruz Celulose, StoraEnso e Votorantim Celulose e Papel – figura 2) que iniciaram a implantação de extensos plantios de árvores exóticas sem o prévio estudo de impactos socioambientais na região, incitando a preocupação da sociedade local. Figura 2. – Território de abrangência das empresas de celulose e Tendência atual da soja no RS. Fonte: FEE (2007) e Emater/RS (2012). O avanço do cultivo de soja na campanha gaúcha também representa o avanço do agronegócio e da monocultura sobre os campos sulinos do pampa. De acordo com a 242 Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do RS (Emater, 2012), conforme figura 2 acima, ocorreu um aumento de 180% da área plantada de soja na região Sul e de 120% na Campanha na última década. Além da diminuição da área de campos naturais utilizada pela pecuária, o avanço da soja também traz consequências para outras culturas, principalmente para o milho, as culturas do arroz e feijão. Com este aumento considerável da plantação de soja no Estado, concomitantemente tem-se uma diminuição da biodiversidade local, neste caso diminuição da diversidade biológica e cultural do Pampa. Este processo é ocasionado pela exportação de entropia realizada pelos chamados países desenvolvidos, ou seja, estes exploram territórios alheios sob o discurso de produção alimentar, mas ao produzir matéria prima e alimentos, deixam o passivo ambiental no país subdesenvolvido. La utilización de espacios ambientales en los denominados territorios del “sur” a lós efectos de producir alimentos para abastecer a la población de los países del “norte” pone en evidencia que el sobreconsumo y el subconsumo son dos caras de la misma moneda. Desde ese lugar es que se discute la viabilidad de la seguridad y soberanía alimentaria de lós pueblos acorde a sus necesidades de alimentos culturalmente determinadas y a las potencialidades productivas de los territorios (ACHKAR, DOMÍNGUEZ, PESCE, 2008, p.9). A forma como o capitalismo explora e degrada a natureza e a sociedade são fatores que fazem refletir sobre o quão negativo esta maneira de viver está se tornando. No aspecto ambiental, tem-se uma contradição quanto ao agronegócio implantado mundialmente e a proteção de características locais da natureza e cultura local das populações. Nessa perspectiva, seria necessária uma possível mudança, que estaria fundamentada em uma nova maneira de viver. Neste contexto, conforme aborda Mendonça (2011), é possível vislumbrar sinais que delineiam uma reorganização do território, esta que estaria baseada na gestão de áreas de preservação ambiental e nos consórcios intermunicipais de bacias hidrográficas, pois, explicitam exemplos de reorganização territorial e administrativa da sociedade em face da apropriação da natureza e dos recursos naturais. Entretanto, são sinais incipientes considerando a cadeia complexa que a exploração da natureza se encontra. Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã: Unidade de Conservação como forma de resistência à expansão do agronegócio no Pampa do RS 243 A Constituição Federal do Brasil, instituída no ano de 1988, define os espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos (BRASIL, 1988). Esta definição indica que o poder público deve criar áreas protegidas e Unidades de Conservação garantindo que estas contribuam para a existência de um meio ecologicamente equilibrado (NURIT, 2006).Assim,no ano 2000 cria-se o Sistema Nacional de Unidades de Conservação o qual estabelece as Unidades de Conservação, contemplando áreas de Proteção Integral e de Uso Sustentável. A Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã integra as Unidades de Conservação de Uso Sustentável. Estas, caracterizam-se como, em geral, áreas extensas, com um certo grau de ocupação humana. São dotadas de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida das populações humanas e, têm como objetivos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade dos recursos naturais (BRASIL, 2000). Esta APA, que se encontra inserida no Bioma Pampa, localizada no Rio Grande do Sul nos municípios de Alegrete, Quaraí, Rosário do Sul e Santana do Livramento, tem por objetivo: Garantir a conservação de expressivos remanescentes de mata aluvial e dos recursos hídricos ali existentes; melhorar a qualidade de vida das populações residentes através da orientação e disciplina das atividades econômicas locais; fomentar o turismo ecológico, a educação ambiental e a pesquisa científica; preservar a cultura e a tradição do gaúcho da fronteira; além de proteger espécies ameaçadas de extinção a nível regional (BRASIL, 1992). Salienta-se que esta região possui potenciais histórico-culturais, com atributos particulares, com possibilidade de se integrarem a atividades de turismo rural, em áreas de fazendas com prédios centenários que poderiam ser alvo dessas ações, juntamente com a grande riqueza da paisagem natural Devido à acelerada inserção do capital internacional através de atividades externas ao ambiente local, as quais provocam a descaracterização dos campos sulinos pertencentes ao Bioma Pampa, as Unidades de Conservação se constituem em importante instrumento para tentar garantir a conservação dos bens naturais e culturais do pampa gaúcho brasileiro. A forte relação verificada entre o desenvolvimento de culturas locais do Pampa, como a produção de gado, faz com que o pisoteio do gado mantenha os campos na região, logo a conexão entre os aspectos culturais e naturais estão estreitamente integrados. A partir disso, observa-se que a Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã 244 condiz com a devida conservação ambiental que se necessita no Bioma Pampa, pois integra uma bacia hidrográfica e é uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável. A APA56 do Ibirapuitã foi criada em 20 de maio de 1992, e seu território abrange a porção superior da Bacia Hidrográfica do Rio Ibirapuitã abrangendo uma área de 316.882,75 ha (figura 3). De acordo com os gestores da APA, ela é formada, dentre outras, por propriedades rurais privadas, escolas municipais rurais, Piquetes de Tradição Gaúcha, pequenos estabelecimentos comerciais (“bolichos”), uma propriedade de pesquisa agropecuária (Fundação Maronna) e uma propriedade rural de treinamentos da Brigada Militar (Estância Lolita). Figura 3: Localização da APA do Ibirapuitã. Esta heterogeneidade57 que compõem o território APA do Ibirapuitã epropicia diferentes usos da terra e diferentes concepções de natureza, provêm de um contexto 56 APA do Ibirapuitã é Área de Proteção Ambiental, a qual é considerada uma Unidade de Conservação (UC) de Uso Sustentável de acordo com a classificação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) do Ministério do Meio ambiente do Brasil. 57 A formação espaço-temporal do território agrário do Rio Grande do Sul nos permite compreender a presença de agricultores familiares camponeses, com suas diversidades inerentes a cada lugar, ao mesmo tempo em que o latifúndio persiste. Os sistemas de distribuição de terras, como a das sesmarias e das datas juntamente com a Lei de Terra, 245 histórico e cultural de disputas territoriais, possuindo assim, atores sociais distintos em uma mesma área que se propõem a ser de uso sustentável dos recursos naturais e culturais. Neste contexto, a APA vai ao encontro do que menciona Diegues (2000, p.1), que “a diversidade biológica não é simplesmente um conceito pertencente ao mundo natural. É também uma construção cultural e social”. Estudo desenvolvido pela Fundação Zoobotânica do RS (TORGAN, 2013) demonstra que a APA do Ibirapuitã apresenta como principal atividade econômica a pecuária extensiva sobre campo natural (mais de 87% do território) e pecuária extensiva sobre pastagem cultivada (menos de 1%), além do cultivo de arroz irrigado (menos de 3,5%). Portanto, verifica-se que no território da Unidade de Conservação denominada APA do Ibirapuitã, ainda predomina a pecuária extensiva sobre o campo natural, configurando a manutenção das características culturais e ambientais locais. Em relação a biodiversidade local, estudos de Pillar, Andrade e Dadalt (2015, p.117) ressaltam que a conservação dos campos nativospropicia inúmeros serviços ecossistêmicos: São exemplos a regulação hídrica e o fornecimentode água limpa, a produção de forragem para a atividade pecuária,a manutenção de polinizadores e de predadores de pragas deculturas agrícolas, o potencial para a recreação ao ar livre, a estocagemde carbono no solo que ajuda a mitigar as mudanças climáticasglobais, dentre tantos outros. Somando-se a esses fatores, Vélez-Martin, Chomenko, Madeira e Pillar (2015, p. 169) apontam que “os estabelecimentos rurais dedicados à pecuária sustentável têm maiores possibilidades de explorar atividades econômicas complementares”. Dentre as atividades, são destacadas o turismo rural, o turismo ecológico e a observação de aves, a apicultura, a produção de plantas medicinais e de plantas ornamentais, a produção comercial de sementes nativas e o desenvolvimento de cosméticos, fitoterápicos e fármacos são possibilidades que precisam ser incentivadas e melhor exploradas nos Campos Sulinos. Assim, a partir deste estudo, observa-se que a Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã atua como forma de resistência a expansão do agronegócio nos campos sulinos do Bioma Pampa, uma vez que é a maior Unidade de Conservação do Pampa do Rio Grande do Sul. A APA, por possuir como principal atividade econômica a geraram uma enorme desigualdade e exclusão ao acesso a esta, originando um grande rol de posseiros, agregados dos latifúndios, ex-peões que se instalaram em pequenos sítios baldios, além de ex-escravos e indígenas que ocuparam áreas de difícil acesso, seja por estas serem as que “sobraram”, ou seja, por optar pelo isolamento. A APA do Ibirapuitã expressa essa heterogeneidade sendo constituída por territórios da agricultura familiar e patronal. 246 pecuária extensiva sobre campo natural, configura um exemplo de que a criação de Unidades de Conservação e Áreas Protegidas proporcionam limites a expansão do agronegócio, principalmente às atividades silvícolas e da soja, logo, observa-se a importância da criação de UCs como estratégia de manutenção das características locais. Considerações No modelo econômico que pauta a sociedade atualmente, com bases na exploração dos recursos oferecidos pela natureza, torna-se necessário a criação de alternativas para que se minimizem os impactos que este processo de desenvolvimento capitalista do modo de produção causa. Entretanto, o ideal seria uma mudança de paradigma, no qual o afeto, o pertencimento e a ética estivessem presentes. Mas, no momento atual, em que esta mudança de paradigma ainda não avança, a opção é iniciar as discussões e alterações de alguns espaços que são necessários para a manutenção da biodiversidade de espécies e culturas. As Unidades de Conservação podem ser utilizadas, desde que respeitem o disposto nas legislações, sendo que no caso do Pampa, a inserção de atividades características do gaúcho é fator importante para que se tenha uma coexistência entre a cultura e a biodiversidade. Assim, no Rio Grande do Sul nas áreas pertencentes ao Bioma Pampa, no qual existem disputas sobre o uso da terra deste o momento de sua colonização, a proteção de áreas se torna fundamental. Esta preocupação em proteger determinados espaços, deriva da grande inserção de atividades externas ao ambiente local, como a monocultura da soja, pinus, eucaliptos e acácia negra. Este novo cenário é de um rural sem agricultores, de substituição da produção de alimentos por produtos do agronegócio onde agentes externos comandam o lugar homogeneizando a paisagem, desestruturando as comunidades locais, causando perda da memória coletiva e individual, aumento dos impactos ambientais e perda da biodiversidade. Neste contexto, no caso particular da terra gaúcha, não se trata apenas de valorizar os exíguos ecossistemas naturais primários remanescentes, existe algo mais relacionado com as raízes do povoamento – áreas culturais fortemente imbricadas – e com a dinâmica dos agroecossistemas (AB’ SABER 2003, p. 112). Dessa maneira, a Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã, como Unidade de Conservação de uso sustentável permite essa coexistência entre homem e natureza, contribuindo para conservação tanto dos bens naturais como culturais. 247 Nessa perspectiva, a APA do Ibirapuitã, UC de uso sustentável, configura-se como um território de resistência a expansão do agronegócio no que se refere às atividades silvícolas e da soja. Assim, as Unidades de Conservação enquanto territórios representam importante papel da relação homem/meio, contribuem na manutenção de serviços ecossistêmicos e na conservação da sociobiodiversidade. Contudo, faz-se necessária a implementação de políticas públicas de valorização das Unidades de Conservação e, no caso específico da APA do Ibirapuitã, o estímulo a pecuária sustentável e a cadeia produtiva oriunda dos campos nativos. Referências Bibliográficas AB‟SABER, A. N. Os Domínios de Natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003. ACHKAR, M.; DOMÍNGUEZ, A.; PESCE, F..AGRONEGÓCIOS LTDA. Nuevas Modalidades de Colonialismo em El ConeSur de América Latina.FWW. REDES, Montevideo, 2008. BRASIL. CF, de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Presidência da República - Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos, Brasília, DF, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 05 jul. 2014. BRASIL. Decreto 529 de 20 de maio de 1992. Declara como Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã, no Estado do Rio Grande do Sul. 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Reportagem de Jornal, 27/08/2012.Disponível em: http://g1.globo.com/rs/rio-grande-dosul/noticia/2013/08/area-destinada-ao-plantio-de-soja-aumentara-622-no-rsdizemater.html. Acesso em 11 de junho de 2014. 249 AS ÁREAS PROTEGIDAS NA REGIÃO DE FRONTEIRA BRASIL – URUGUAI: OPORTUNIDADES PARA A CONSERVAÇÃO INTEGRADA Franciele da Silva58 Eliane Maria Foleto59 Resumo: este trabalho possui como objetivo analisar as Áreas Protegidas e demais locais destinados à conservação localizados próximos à região de fronteira entre Brasil e Uruguai, pontuando estratégias que possam integrar essas “ilhas protegidas”, pensando na manutenção dos remanescentes do bioma Pampa para a região de fronteira. No total foram identificadas sete Unidades de Conservação no lado brasileiro e cinco Áreas Protegidas uruguaias, além das Áreas Prioritárias para Conservação do bioma Pampa no Rio Grande do Sul (totalizando 105 áreas) e a Reserva da Biosfera Bañados del Este e Reserva da Biosfera Quebradas del Norte, ambas pertencentes ao território uruguaio. Através da análise foi possível concluir que existe a possibilidade de se pensar uma proposta de Reserva da Biosfera que integre Brasil e Uruguai, tendo em vista a espacialização das áreas destinadas à conservação na região de fronteira, considerando, principalmente, a região dos departamentos de Artigas e Rivera, além de municípios como Quaraí, Santana do Livramento e Barra do Quaraí, visto que são áreas estratégicas para a conservação do bioma, e, ao mesmo tempo, com a menor representatividade de Áreas Protegidas. Palavras-chave: bioma Pampa; Reserva da Biosfera; Áreas Prioritárias. INTRODUÇÃO Historicamente, para Bentancor (1995), os povos tiveram forte apreço na demarcação de suas fronteiras, sem outras preocupações com o lado externo destas, a não ser do ponto de vista das possíveis ameaças de perda de território. Nesse aspecto, a questão de soberania das nações foi o motivo para a falta e, até mesmo, o desinteresse por trocas de informações de caráter fronteiriço, prevalecendo apenas a preocupação específica de cunho geopolítico. Todavia, no decorrer da consolidação política das linhas de fronteiras e a preocupação e o aprofundamento das discussões voltadas ao meio ambiente e a sociedade, começa-se intergovernamental. a Surgindo, questionar assim, os problemas inquietações ambientais pertinentes aos a nível aspectos ambientais, culturais e sociais, na perspectiva de promover um despertar de integração possível nas regiões de fronteira. Essa integração torna-se necessária, principalmente, sob o viés ambiental, uma vez que existem ecossistemas similares, com problemas ambientais parecidos e 58 Aluna do curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Geografia – UFSM. E-mail: [email protected] 59 Professora do departamento de Geociências – UFSM. E-mail: [email protected] 250 que, no entanto estão separadas por limites políticos. Neste contexto, há que se analisar, com mais atenção, as unidades territoriais transfroteiriças, especialmente as áreas que compartilham características de identidade cultural, econômicas e/ou ambientais. Sob a perspectiva exposta, pode-se citar como unidade territorial transfronteiriça e semelhante o bioma Pampa, principalmente na porção que abriga parte do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil e a República do Uruguai. Nessa região, além de um ecossistema integrado, existe uma cultura e economia que se assemelham. No entanto, por mais parecidos que possam ser esses dois territórios, não existe uma política ambiental integrada e efetiva de conservação que possa abarcar essa região do bioma. O bioma Pampa é composto por ecossistemas naturais com alta diversidade de espécies vegetais e animais. É formado por um mosaico de áreas campestres, matas de galeria, areais, banhados (alagadiços), capões de mata nativa, morros testemunhos, serras, áreas de recarga e/ou descarga de aquíferos subterrâneos, rios, afloramentos rochosos, entre outras particularidades resultantes da combinação geológica, climática e vegetal presente neste bioma. Deste mosaico resulta a ocorrência de uma diversidade de espécies microbianas, vegetais e animais associadas ao Pampa (PILLAR et. al, 2009). No entanto, a sua conservação tem sido ameaçada pela conversão dos campos em culturas anuais e pela degradação associada à invasão de espécies exóticas e uso inadequado do solo. Entre os anos de 1970 e 2005, segundo Picolli e Schnadelbach (2007), estima-se que 4,7 milhões de hectares de pastagens nativas do bioma Pampa foram convertidos em outros usos agrícolas, como lavouras e plantações de árvores exóticas. Da sua vegetação campestre e dos seus banhados característicos, restam apenas 39%. Achkar et al. (2006) expõe a situação do Uruguai frente ao cenário de avanço das práticas de silvicultura, transformando brutalmente os sistemas agrícolas do pais através de marcos legais: El fomento de los monocultivos forestales se produjo a través de la promulgación de la ley de promoción forestal el 28 de diciembre de 1987, cuya finalidad principal fue convertir al Uruguay en un “país forestal”. A partir de la fecha en que se reglamentó la ley hubo un notorio incremento de la forestación bajo la modalidad de plantaciones en régimen de monocultivos con espécies de rápido crecimiento y de alto requerimiento en el mercado nacional e internacional.En los últimos dieciséis años la forestación ha sido la actividad del sector primario de la economía com mayor impulso en el país, abarcando 19.402 explotaciones y una superfície de 660.667 hectáreas y convirtiendo a Uruguay en país forestal emergente en el escenario económico global (Achkar et al. 2006, p. 222) 251 No Rio Grande do Sul, o avanço da silvicultura se apresenta da mesma forma que no país vizinho. Em 2004, o governo do Estado do Rio Grande do Sul criou o Programa de Financiamento Florestal Gaúcho “Proflora”, com o apoio do Banco Nacional do Desenvolvimento Social – BNDES. A criação deste programa teve como objetivo conceder financiamento para o plantio de monocultura de acácia negra, pinus e eucaliptos no Estado (IBGE, 2010). Em decorrência deste cenário, passa a ocorrer uma significativa mudança da matriz produtiva do Pampa, passando da atividade pecuária nos campos a uma intensa exploração silvícola, além do aumento das áreas de lavouras de soja e arroz, descaracterizando o ambiente que há séculos se complementa com a figura do homem pampeano. De tal modo, questões que envolvem o meio ambiente, as ações do homem e a sustentabilidade tornaram-se algumas das maiores preocupações atuais e, nessa perspectiva, surgem os questionamentos deste trabalho, como uma possível proposta de Reserva da Biosfera do Pampa, com o propósito de tornar sustentável a relação entre ser humano e natureza em áreas de relevância natural e que ainda possuem suas características tradicionais, conservando o meio natural e uma cultura tão importante, tentando quebrar, em síntese, o conceito de “ilhas protegidas”, e promovendo, assim, a integração das Áreas Protegidas situadas na região de fronteira entre Uruguai e Brasil. OBJETIVOS Analisar as Áreas Protegidas e demais locais destinados à conservação localizados próximos à região de fronteira entre Brasil e Uruguai, pontuando estratégias que possam integrar essas “ilhas protegidas”, pensando na manutenção dos remanescentes do bioma Pampa. METODOLOGIA Para a execução deste trabalho, primeiramente, foi feito um levantamento das áreas destinadas à conservação, e, que estejam localizadas na região de fronteira entre Brasil e Uruguai. Posteriormente, foram elaborados os mapas, através dos bancos de dados já dispostos pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio), Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Sul, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e UdelaR, que demonstram a localização e forma de cada área a ser protegida, bem como a descrição de suas características e as tipologias que as compreendem. DESENVOLVIMENTO 252 O Conceito de Áreas Protegidas adotado no Brasil, conforme se interpreta no Plano Nacional de Áreas Protegidas (Decreto n° 5.758/2006), consiste em: Áreas naturais e seminaturais definidas geograficamente, regulamentadas, administradas e/ou manejadas com objetivos de conservação e uso sustentável da biodiversidade. Enfoca prioritariamente o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, as terras indígenas e os territórios quilombolas. Sendo que as demais Áreas Protegidas, como as Áreas de Preservação Permanente e as Reservas Legais são tratadas no planejamento da paisagem, no âmbito da abordagem ecossistêmica, com uma função estratégica de conectividade entre fragmentos naturais e as próprias Áreas Protegidas (DELELIS; REHDER; CARDOSO, 2010, p. 25). Portanto, as Áreas Protegidas brasileiras são regulamentadas pelo Código Florestal (Lei nº 4.771/1965), pelo Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/1973), pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Lei nº 9.985/2000) e Decreto nº 4.887/2003, que trata das terras ocupadas por remanescentes quilombolas. Neste trabalho, o foco será dado para as Unidades de Conservação (UC), no lado brasileiro, sendo estas definidas, segundo o SNUC: Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (BRASIL, 2000). Com a criação do SNUC, ficou definida a criação de 12 categorias de Unidades de Conservação (UC), reunidas em dois grupos: Unidades de Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável: - Unidades de Proteção Integral: nesta categoria estão as UCs que possuem maior restrição quanto ao uso dos recursos naturais, sendo o uso permitido apenas de forma indireta. É o caso da Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio da Vida Silvestre. - Unidades de Uso Sustentável: objetivam integrar a conservação da natureza com o uso sustentável dos recursos naturais. Nesta categoria se enquadram a Área de Proteção Ambiental, Área de Relevante Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista, Reserva da Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e a Reserva Particular do Patrimônio Natural. No Uruguai, as Áreas Protegidas equivalem, em síntese, as Unidades de Conservação brasileiras, e estão sistematizadas no Sistema Nacional de Áreas Protegidas (SNAP), através da Lei n° 17.234, promulgada em março de 2000, a qual estabelece como: Conjunto de áreas naturales del territorio nacional, continentales, insulares o marinas, representativas de lós ecosistemas del país, que por sus valores ambientales, históricos, culturales o paisajísticos singulares, merezcan ser 253 preservados como patrimonio de la nación, aun cuando éstas hubieran sido transformadas parcialmente por acciones antrópicas (Ley 17.234, Uruguay). As categorias de Áreas Protegidas que englobam o SNAP, estabelecidas na Lei 17.234 são: Parque Nacional, Monumento Natural, Paisaje Protegido, Sitios de Protección, Áreas de manejo de hábitats y/o especies, Área Protegida con recursos manejados. Deste modo, SNUC e SNAP dialogam no que tange seus objetivos de conservação, todavia as tipologias que cada sistema adota são diferenciadas, principalmente pela quantidade de categorias dispostas no SNUC. Independente das peculiaridades de cada sistema, destaca-se a importância de políticas ambientais como estas, principalmente para o contexto de degradação vivenciado pelo bioma Pampa. As Áreas Protegidas localizadas próximas à região de fronteira entre Brasil e Uruguai podem ser observadas na figura 01. 254 Figura 01 - Mapa das Áreas Protegidas no bioma Pampa, na Fronteira entre Brasil e Uruguai. Elaboração: Franciele da Silva, 2015. (1) Parque Estadual do Espinilho Criado em 1975 e localizado no município de Barra do Quaraí, extremo sudoeste do Rio Grande do Sul, na divisa com Uruguai e Argentina, o Parque que contempla a categoria de proteção integral, possui uma área de 1.617,14 hectares, abrigando uma vegetação que não ocorre em outra área do país, sendo caracterizada 255 pelo IBGE (1992) como savana estépica. Deste modo, o Parque é importante para a conservação da formação vegetal única, além das várias espécies da fauna que estão associadas a esse tipo de formação, e dependem dessa Unidade de Conservação para a manutenção de suas populações (MASSIA, 2003). (2) Reserva Biológica Estadual do Ibirapuitã Localizada às margens do rio Ibirapuitã, no município de Alegrete, a Reserva Biológica possui uso restrito, sendo, também, uma categoria de proteção integral. Na área de aproximadamente 350 hectares, predominam os campos com espécies de gramíneas e a presença esparsa de espinilhos, além de uma mata ciliar densa e preservada (SIMAS et al. 2002). São ainda encontrados afloramentos de rocha onde se destacam espécies de cactáceas. (3) APA Federal do Ibirapuitã A Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã integra as Unidades de Conservação de Uso Sustentável, sendo permitido seu uso desde que de forma sustentável. A APA possui uma extensão de 316.790,42 hectares e está localizada nos municípios de Alegrete, Quaraí, Rosário do Sul e Santana do Livramento. A região possui potenciais histórico-culturais, com atributos particulares, como prédios centenários, além da grande riqueza da paisagem natural (SILVA, 2009). O desenho dos limites da APA do Ibirapuitã foi pensado de forma a abrigar a porção superior da Bacia Hidrográfica do Rio Ibirapuitã. Ela está localizada na fronteira internacional Brasil-Uruguai, na região conhecida como Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, e seu limite sul coincide com o limite internacional, não havendo acidentes geográficos (rios, vales, etc.) e nem muros ou barreiras físicas separando-a do território uruguaio. (4) RPPNs do município de Dom Pedrito e RPPN de Santa Vitória do Palmar No município de Dom Pedrito estão localizadas três Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), e, apesar de estarem inseridas na tipologia de Unidade de Conservação de uso sustentável, seu uso é restrito, objetivando, somente, a proteção do meio. As três áreas possuem atributos de paisagens tipicamente do Pampa, contemplando cursos d’água e áreas de mata ciliar, banhados e campos. São elas: RPPN Reserva dos Mananciais, com uma área de 11 hectares; RPPN Fazenda Caneleira, possuindo uma área de 45 hectares e; RPPN Fazenda Branquilho, com 13 hectares (SEUC, 2013). 256 Já a RPPN localizada no município de Santa Vitória do Palmar, denominada Estância Santa Rita, possui uma área de 340 hectares, estando inserida em um contexto de banhado, com a presença de cursos d´água e lagoas. (5) Reserva Biológica Estadual Mato Grande Já contemplando as áreas úmidas que integram o bioma Pampa, na porção sul do Rio Grande do Sul, pode-se destacar a Reserva Biológica Mato Grosso. Integrando a categoria de Proteção Integral, a Reserva foi criada com o objetivo de proteger áreas úmidas presentes na região denominada Banhado do Mato Grande, abrigando banhados, campos arenosos e matas de restinga. É de extrema importância para a conservação, principalmente da avifauna associada aos ambientes alagados, sendo local de espécies endêmicas do bioma Pampa, espécies ameaçadas de extinção e aves migratórias do Hemisfério Norte e Hemisfério Sul (SEUC, 2013). (6) ARIE Federal Pontal dos Latinos e Pontal do Santiago Localizada no município de Santa Vitória do Palmar, a Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) é uma Unidade de Conservação de uso sustentável, com uma área de 2.992,26 hectares. Foi criada em 5 de junho de 1984, objetivando preservar uma região do bioma Pampa que contempla áreas de banhados e campos em bom estado de conservação (ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, 2011). (7) Estação Ecológica Federal do Taim Unidade de Conservação de proteção integral, localizada ao sul do Rio Grande do Sul, contemplando os municípios de Rio Grande e Santa Vitória do Palmar, a Estação Ecológica do Taim foi criada em 1979, com uma área de 34.038 hectares. A Estação está situada numa faixa de terra entre o oceano Atlântico e a Lagoa Mirim, originada pelo avanço e recuo do mar. Os banhados do Taim apresentam ecossistemas diversificados e estão representados por praias lagunares e marinhas, lagoas, campos, cordões de dunas, além dos próprios banhados. Sua finalidade é a preservação de um grande viveiro natural de animais e plantas, sendo um importante berçário de aves migratórias (ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, 2011). (8) Rincón de Franquía Rincón de Franquía pertence à tipologia de Área de Manejo de Hábitat e/ou Espécies. Encontra-se ao norte da cidade de Bella Unión, departamento de Artigas, na zona de confluência do rio Uruguai e rio Quaraí. Está ambientalmente inserida em um contexto de alta naturalidade, incluindo o Parque Estadual do Espinilho e as áreas úmidas de várzea, contendo matas ciliares que constituem uma das principais 257 riquezas de flora e fauna do local. Além disso, contempla bosques de espinilhos e algumas lagoas valiosas para pesca, com diversidade de avifauna aquática (RÍOS E ALDABE, 2012). (9) Valle del Lunarejo Compreende a categoria de Paisagem Protegida, em um território de 29.286 hectares, localizado no extremo noroeste do departamento de Rivera, próximo à divisa entre Artigas e Salto e a zona conhecida como Rincón de Artigas, no limite contestado com o Brasil. O Valle está cercado por vários cursos d’água, como o Arroio Lunarejo e cerros com altitude superiores a 350 metros. Em 2009 foi incorporada ao SNAP (UNESCO, 2013). Além de seus atributos ambientais somam-se importantes valores históricos e culturais, intimamente ligados às características do território, como construções de pedra em bom estado de conservação do período das revoluções do Uruguai e Rio Grande do Sul (UNESCO, 2013). (10) Laureles-Cañas Localizada no extremo norte do departamento de Tacuarembó e no noroeste de Rivera, com 62.500 hectares, é uma das áreas mais extensas que se propõe para ingressar no SNAP. Forma parte de uma região maior, as Quebradas del Norte, que também inclui o Valle del Lunarejo. Distingue-se por uma paisagem única no país, que inclui numerosas cascatas, cânions, paredões e uma exuberante vegetação, possuindo, assim, grande potencial para o desenvolvimento do turismo de natureza. O ingresso dessa área no SNAP permitirá proteger e promover uma superfície de pradaria natural, a qual constitui a base do sistema produtivo da pecuária que modela a paisagem e pertence à cultura regional que integra o patrimônio. Na área já foram registradas quase 60 espécies de animais e plantas prioritárias para a conservação em nível nacional, incluindo algumas que se consideram em extinção (MINISTERIO DE GANADERÍA, AGRICULTURA Y PESA DEL URUGUAY). (11) Paso Centurión Paso Centurión encontra-se em processo de elaboração de sua proposta de candidatura. Está localizada no departamento de Cerro Largo e se caracteriza por apresentar espécies pouco comuns da fauna uruguaia. Seu processo de execução está orientado a fomentar o ecoturismo e a valorização e recuperação de sítios de interesse para biodiversidade. 258 (12) Parque Nacional San Miguel O Parque Nacional de Reserva de fauna y flora San Miguel foi criado em 1937, e integra o SNAP desde 2010. Está situado na região nordeste do departamento de Rocha, próximo à fronteira entre Brasil e Uruguai, compreendendo uma área de 1.542 hectares. O Parque está situado principalmente sobre a serra de San Miguel, e, devido a sua proximidade com a Estação Ecológica do Taim, suas características são muito semelhantes, com a presença de banhados, cordões de areias e lagoas. Dentre seus objetivos de conservação, além da manutenção da flora e fauna local, destaca-se a preservação do patrimônio genético do gado crioulo selvagem, único local do Uruguai que contempla sua presença, sendo, inclusive, protegido pela UNESCO. 300 cabeças de gado crioulo se reproduzem livremente no Parque, preservando as mesmas características que os primeiros que ali habitaram o local, no século XVII (LEZAMA E ROSSADO, 2012). Além das Áreas Protegidas propriamente ditas, amparadas pelos conceitos descritos, existem também, na faixa de fronteira, a Reservas da Biosfera Bañados del Este e Reserva da Biosfera Quebradas del Norte, no Uruguai, e as Áreas Prioritárias para Conservação do bioma Pampa, no Rio Grande do Sul. 259 Figura 02 – Áreas Prioritárias e Reservas da Biosfera na região de fronteira Brasil-Uruguai. Elaboração: Franciele da Silva (1) Áreas Prioritárias para conservação no Rio Grande do Sul As Áreas Prioritárias para Conservação, Uso Sustentável e Repartição de Benefícios da Biodiversidade Brasileira, atualizadas em 2007, resultaram na identificação de 105 áreas do bioma Pampa, destas, 41 (um total de 34.292 km2) foram consideradas de importância biológica extremamente alta para a conservação segundo o Programa RS Biodiversidade (2018). Estes números contrastam com apenas 3,3% do bioma que encontra-se protegido através de Unidades de Conservação (2,4% de uso sustentável e 0,9% de proteção integral), com grande lacuna de representação das principais fisionomias de vegetação nativa e de espécies ameaçadas de extinção da fauna e da flora. A criação de Unidades de Conservação, a recuperação de áreas degradadas e a criação de mosaicos e corredores ecológicos foram identificadas 260 como as ações prioritárias para a conservação, juntamente com a fiscalização e educação ambiental do bioma Pampa. (2) Reserva da Biosfera Quebradas del Norte As Reservas da Biosfera são zonas de ecossistemas terrestres, costeiros/marinhos, ou uma combinação de ambos, reconhecidas em âmbito internacional, através do Programa Homem e Biosfera (MAB) da Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura (UNESCO), desde 1976. Conceitualmente, as Reservas da Biosfera constituem sítios destinados a demonstrar enfoques da conservação e do desenvolvimento sustentável em escala regional (JAEGER, 2005). Lino (2010) complementa que as Reservas referem-se a iniciativas de gestão territorial tendo em vista “harmonizar a convivência entre o homem e seu espaço vital”. O objetivo dessas reservas é proteger a diversidade biológica em biorregiões estratégicas do planeta, conciliando a conservação com o desenvolvimento, e promover o conhecimento científico sobre essas áreas. Sob esse argumento, em 2014, a UNESCO reconheceu a área da Reserva da Biosfera Quebradas del Norte, possuindo características únicas do ponto de vista paisagístico, contemplando um mosaico de ecossistemas que fornecem habitat para inúmeras espécies de flora e fauna. Na área da Reserva foram identificados 12 ambientes diferentes, dentre os quais se destacam ecossistemas típicos do Pampa, com uma vasta diversidade de campos e matas galeria.(UNESCO, 2013). Sua zona núcleo é representada pela Área Protegida Valle del Lunarejo, contemplando ainda uma porção da Área Protegida Lauredes-Cañas, que aguarda ingresso no SNAP. (3) Reserva da Biosfera Bañados del Este Reconhecida pela UNESCO em 1976, a área da Reserva da Biosfera inclui em seu território Monumento Histórico y Parque Nacional Fortaleza de Santa Teresa, Parque Nacional y Reserva de Fauna y Flora de El Potrerillo de Santa Teresa, Monumento Histórico y Parque Fuerte San Miguel, Refugio de Fauna Laguna Castillos, Reserva Forestal de Cabo Polonio y Aguas Dulces, Monumento Natural de Dunas y Costa Atlántica, Parque Nacional Lacustre de las Lagunas de Rocha y Garzón. Possuindo uma extensão de 1.250.000 hectares, esta região compreende um notável complexo de ecossistemas de alta diversidade biológica, abrigando refúgios de aves migratórias e destacando áreas de banhados, cordões de dunas, complexos lagunares e áreas litorâneas. Ainda dentro da Reserva pode-se encontrar uma vasta área de palmares de butiá, em torno de 70.000 hectares, sendo a maior área do planeta em extensão e quantidade de exemplares (PEZZANI, 2007). 261 Com base nas áreas destinadas a conservação que integram o bioma Pampa, na região de fronteira entre Brasil e Uruguai, observa-se oportunidades para a conservação integrada do bioma, principalmente na região de Artigas, Rivera, Santana do Livramento, Quaraí e Barra do Quaraí, tendo em vista a pouca representatividade destas áreas quanto as Áreas Protegidas e considerando a extrema importância e prioridade que essas áreas apresentam para biodiversidade. Deste modo, para manter a soberania de cada país, uma estratégia de conservação integrada poderia ser a implantação de uma Reserva da Biosfera para o bioma Pampa, que contemplasse tanto o território brasileiro, quanto o uruguaio. Assim, conciliando áreas destinadas somente a preservação do ecossistema (equivalente às zonas núcleo de uma Reserva, contemplando Áreas Protegidas de uso restrito) com aquelas que oportunizem o desenvolvimento sustentável, privilegiando a cultura do gaúcho e suas formas de desenvolvimento. Cria-se, dessa forma, uma proposta que tenha por objetivo o desenvolvimento de um mosaico de Áreas Protegidas, promovendo, assim, uma efetivação da conservação de remanescentes do bioma Pampa brasileiro-uruguaio, não prevalecendo “ilhas de conservação”, bem como a associação com áreas de desenvolvimento sustentável, onde não ocorra a inserção de agronegócios e suas implicações no território. CONCLUSÕES Através da elaboração deste trabalho pretende-se despertar uma maior percepção da necessidade de uma base cooperativa entre Brasil e Uruguai, tendo em vista o contexto de degradação vivenciado nesses dois territórios. Deste modo, através de diálogos e construções conjuntas de estratégias e metodologias focadas nos remanescentes do bioma Pampa, pode-se chegar a resultados que permitam às futuras gerações conhecerem e usufruírem das áreas de Pampa, imbricadas de história e cultura de um povo tão importante para a constituição da figura do gaucho. BIBLIOGRAFIA ACHKAR, M.; DOMÍNGUEZ, A.; PESCE, F.. AGRONEGÓCIOS LTDA. Nuevas Modalidades de Colonialismo en el Cono Sur de América Latina. BENTANCOR, G. T. Frontera e Integración. In: BENTANCOR, G. T (Org.). Práticas de Integração nas Fronteiras: temas para o Mercosul. Porto Alegre: UFRGS, 1995. LEZAMA, F.; ROSSADO, A. Efectos del pastoreo en la estructura de los pastizales naturales del Parque Nacional San Miguel y la Estación biológica Potrerillo de Santa Teresa. Documentos de Trabajo. Programa de Investigación para las áreas protegidas Potrerillo de Santa Teresa y Parque Nacional San Miguel. Rocha: 2012. 262 LINO, C. Reservas da biosfera, sítios do patrimônio natural, sítios Ramsar e outras designações internacionais para conservação da biodiversidade. In: SEMINÁRIO ANO INTERNACIONAL DA BIODIVERSIDADE, 2010, Brasília. [Anais...] Brasília: Câmara dos Deputados, 2010 MASSIA, A. T. Levantamento da flora arbórea/arbustiva e epífitos vasculares do Parque Estadual do Espinilho. Revista da FZVA Uruguaiana, v. 10, n. 1, p. 42-62. 2003. PEZZANI, F. Reserva de Biosfera Bañados del Este, Uruguay. Documento de trabajo n° 37. UNESCO, 2007. PICOLLI, L.R., SCHNADELBACH, C. V. [coord.] O Pampa em Disputa: A biodiversidade ameaçada pela expansão das monoculturas de árvores – Amigos da Terra Brasil. Porto Alegre, 2007. PILLAR, V. P. Campos Sulinos: conservação e uso sustentável da biodiversidade. Brasília: MMA, 2009. 403 p. PROJETO RS BIODIVERSIDADE. Projeto conservação da biodiversidade como fator de contribuição ao desenvolvimento do estado do Rio Grande do Sul. 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Disponível em: http://www.parlamento.gub.uy/leyes/AccesoTextoLey.asp?Ley=17234&Anchor. Acesso em 02 de jul. 2015. 263 ÁREAS PROTEGIDAS BINACIONALES, ¿UNA NECESIDAD POSIBLE O UNA REALIDAD INFRANQUEABLE?” Prof. M. del Rosario Bottino Bernardi [email protected] Resumen: Las actividades antrópicas han llevado a la degradación o destrucción total de ecosistemas. La preservación y protección de los ambientes naturales y sociales son razones que llevan a proteger determinadas áreas de planeta, a lo que se ha previsto la creación de una red de Áreas Naturales Protegidas (ANPs). Los ambientes naturales no poseen límites, más allá de los que su propia dinámica lo establece; solo los demarcados por la sociedad, como el límite entre dos Estados, como los que establecen diferencias en la gestión de ambientes compartidos por esas entidades políticas, con consecuencias para todos ellos, es necesaria e importante, la creación de Áreas Protegidas Binacionales, y Áreas de Conservación Transfronterizas. En la región fronteriza de Uruguay y Brasil, existen superficies susceptibles de formar parte de áreas protegidas transfronterizas, las que se podrían crear tras consensuar entre ambos Estados sobre la gestión de tales espacios, ya que las normativas, e incluso el reconocimiento de qué debe ser un área a preservar, es diferente en estos dos países. La realidad de frontera abierta entre Brasil y Uruguay, en parte del Departamento de Rivera con el Municipio de Santana do Livramento, donde las actividades humanas, en especial las económicas agropecuarias, son similares; plantea la necesidad de conocer la viabilidad de creación de áreas binacionales transfronterizas entre ambos. Para ello es necesario observar normativas y programas de gestión que establecen estos países para áreas de protección, y buscar una posible armonización entre ellas, con los grados de flexibilidad de las políticas sobre áreas protegidas. Solo se logrará con una buena disposición y compromiso en diversos ámbitos: político, económico y social, no solo apostando a la protección de la naturaleza, sino que junto a ello lograr un desarrollo sustentable con la participación de los habitantes que en ella residen. Palabras claves: Preservación – Protección transfronteriza – Normativas - Flexibilidad INTRODUCCIÓN Existen en el planeta multiplicidad de ambientes, formados por elementos bióticos, abióticos y sociales, con diferentes complejidades, así como el conocimiento y la información que se dispone de ellos también es diversa y variada. Esta multiplicidad tiene, a su vez, diversas dimensiones espaciales y temporales. El sistema natural al que pertenecen los ambientes, cambia en forma natural, obedeciendo leyes y ciclos propios de la naturaleza. Cuando a ello se le agrega el factor antrópico, estos cambios se aceleran o retardan y se agregan nuevos, con múltiples consecuencias que llevan mayoritariamente a un proceso de deterioro del sistema. Las actividades antrópicas han llevado a la degradación o destrucción total de ecosistemas, con alteraciones en ciclos bioquímicos, cambios en el uso del suelo, contaminación de cursos fluviales; no dejando de lado el consumo de los recursos naturales, que llegan a casi un 40% de la producción primaria neta del globo. (Achkar et al 2010). 264 En las sociedades modernas son muchas las razones que llevan a proteger determinadas áreas de planeta, en primer lugar siempre se cuentan las ecológicas y las estéticas, pero a ellas se agregan las económicas, éticas, históricas, espirituales. Para contrarrestar la acción antrópica, se ha previsto la creación de una red de Áreas Naturales Protegidas (ANPs). Las causas que motivan la conservación y protección pueden ser de diversa índole: protección de elementos naturales, de determinados paisajes, de estilos de vida tradicionales. La preservación de la diversidad de la vida nunca fue tan evidente como en la actualidad, cuando la presión social y económica en especial, lleva al ambiente a un deterioro creciente. Esta presión se encuentra asociada a políticas de desarrollo que siguen un modelo lineal de crecimiento económico, el que ha fomentado el uso y la apropiación de recursos naturales en forma insustentable. Se considera Área Protegida a una determinada superficie susceptible de conservación y protección. La Unión Internacional de Conservación Natural (UICN) define a las áreas protegidas como: «Un espacio geográfico claramente definido, reconocido, dedicado y gestionado, mediante medios legales u otros tipos de medios eficaces para conseguir la conservación a largo plazo de la naturaleza y de sus servicios ecosistémicos y sus valores culturales asociados» (Dudley, 2008). Actualmente, alrededor de un 12% de la superficie del planeta tiene algún tipo de protección, con diferentes grados de distribución. Mientras los gobiernos elaboran proyectos para la conservación, existen a nivel global, regional y local Organizaciones No Gubernamentales (ONGs) de carácter ecologista y que buscan implicar cada vez más a la sociedad en la lucha conservacionista. Hoy hay más de cien mil ANPs, se las asocia comúnmente a grandes superficies y que han sido poco modificadas por la sociedad; pero esta visión está cambiando en los últimos veinte años, pasándose a tener en cuenta comunidades humanas, con un carácter de preservación cultural y su relación con la bioconservación. En 2003, en Durban, se amplía la concepción de la áreas integrando estrategias de desarrollo sustentable y disminución de la pobreza (Achkar et al, 2010). Junto a ello, se propone integrar las zonas aledañas a las áreas protegidas, con enfoques novedosos de bajo impacto en el uso del suelo, como turismo, ciudades, minería, energía y profundizar en la vinculación de estos territorios con las áreas protegidas. Según el Programa de las Naciones Unidas para el Medio Ambiente (PNUMA) en el mundo existen diferentes categorías de áreas protegidas a distintas escalas: nacional, subnacional y local. Además, en los últimos años, se crean áreas protegidas binacionales. También se han desarrollado categorías reconocidas internacionalmente (Reservas de Biosfera, Sitios de Patrimonio Mundial, Sitios Ramsar). 265 La UICN busca cumplir los siguientes objetivos: Facilitar la planificación de áreas protegidas y de sistemas de áreas protegidas. Mejorar la gestión de la información sobre áreas protegidas. Ayudar a regular las actividades en áreas protegidas. La UICN reconoce 5 grupos de áreas protegidas: áreas de protección de flora y fauna, parques nacionales áreas de protección de recursos naturales, reservas de la biósfera y áreas de recreación urbana. La UICN define seis categorías de manejo de las áreas protegidas: CATEGORÍA I Protección estricta: I.a Reserva natural estricta. I.b OBJETIVO PRINCIPAL DE MANEJO Investigación científica Área natural silvestre. Conservación de ecosistemas. Protección II Parque nacional. III Monumento natural. IV Área de gestión de hábitats/especies. Manejo de ecosistemas y especies. V Paisaje terrestre/marino protegido. Protección de paisajes y recreación. VI Área protegida con uso sostenible de Uso sostenible. de vida silvestre. Recreación. Conservación de rasgos naturales específicos. los recursos naturales. Existen variaciones en nombres locales de las categorías de manejo, como ser parque natural se corresponde con parque nacional. No todos los países adoptan todas las categorías; la de manejo más desarrollada en el mundo es el parque nacional. Los ambientes naturales no poseen límites, más allá de los que su propia dinámica lo establece; los demarcados por la sociedad, como el límite entre dos Estados, establecen diferencias en la gestión de ambientes compartidos por esas entidades políticas, con consecuencias para estos; la naturaleza no reconoce límites humanos. Ante esto, es necesaria e importante, la creación de Áreas Protegidas Binacionales, y Áreas de Conservación Transfronterizas. La diferencia entre ambas estriba en la gestión de las mismas, en las primeras se reconoce una gestión compartida por los 266 Estados en que estas se encuentran; debiendo llegar a acuerdos, consensos, responsabilidades compartidas, flexibilizando normativas. La IUCN define un Área de Conservación Transfronteriza como: "Un área de tierra y/o mar que traspasa uno o más límites entre países, unidades subnacionales como provincias y regiones, áreas autónomas y/o áreas más allá de los límites de soberanía nacional o jurisdicción, áreas manejadas cooperativamente legalmente o de otra manera efectiva". Para ello es necesario conocer las normativas de ambos países sobre el tema, para determinar su viabilidad. Las propuestas pueden ser varias y diversas. Las áreas de conservación transfronterizas son lindantes, pero pueden ser gestionadas según las normativas que establece cada país. Como ejemplos la Fraternidad compartida por Guatemala, Honduras y El Salvador; en Perú hay varios ejemplos con sus países limítrofes, a excepción de Chile; y Paraguay puede formar el área de conservación del Lago de la Represa de Itaipú, con Brasil. Junto a áreas de protección compartidas, se establece el concepto de “Corredor de conservación”, propuesto por la UICN, como corredores que tienden a unir áreas protegidas, con la finalidad de ordenamiento territorial, de articular y de integrar áreas protegidas, fortaleciendo los objetivos que se persiguen con las ANPs. Ejemplo: Corredor Vilcabamba-Amboró (Perú-Bolivia). Dentro de ejemplos de integración fronteriza se encuentran aquellas que son resultado de una cooperación pacífica entre los Estados que integran, con algún grado de coordinación o gestiones combinadas y de una cooperación pacífica. Se lo denominan Parques para la Paz; el primer ejemplo lo constituye el Parque Internacional para la Paz Waterton-Glacier, entre EUA y Canadá, en 1932. OBJETIVOS: General: Conocer los grados de flexibilidad de las políticas sobre áreas protegidas en Uruguay y en Brasil y las posibilidades de establecer criterios binacionales de protección de ambientes transfronterizos significativos. Específicos: Indagar sobre la existencia de áreas protegidas transfronterizas a nivel mundial y sus criterios de gestión. Determinar la viabilidad de creación de áreas protegidas binacionales entre Uruguay y Brasil en la región de frontera. Identificar categorías de áreas protegidas binacionales para el sistema “Frente de retroceso de la cuesta basáltica” (Quebradas del Norte en Uruguay). MARCO METODOLÓGICO: 267 El problema de investigación que se plantea, se enmarca en la identificación e interpretación de las normativas vigentes. Por lo tanto se propone una aproximación metodológica deductiva y una investigación cualitativa. Se tendrá en cuenta materiales bibliográficos (libros, artículos, páginas web), sobre la temática de áreas protegidas, y en especial aquellas que hagan mención a las áreas transfronterizas. Búsqueda y análisis de normativas sobre áreas protegidas en Brasil y en Uruguay. Comparación entre estas normativas. Recolección y análisis de información sobre encuentros binacionales entre la Universidad de la República (UdelaR), a través del Centro Universitario de Rivera (CUR), y la Universidad Federal de Santa María, relacionados al tema a investigar. Entrevistas abiertas a actores locales que se relacionan con el tema. Sistematización de la información. DESARROLLO: LA POSIBILIDAD DE UNA PROTECCIÓN COMPARTIDA: La posibilidad de crear áreas protegidas entre Uruguay y sus países limítrofes, pasa por una coordinación en la gestión, en que se deberá ceder y aceptar pautas para la construcción de normativas específicas para el mejor manejo de cada área en particular. Se podrán crear áreas protegidas en partes de la extensión de frontera formada por Uruguay y Brasil, consensuando y aunando criterios. Pero asumiendo que la evolución que han seguido ambos países en la creación de áreas protegidas y en la caracterización de las mismas, ha sido distinta. Se deben comparar categorías y gestiones para aunar criterios de protección. Se pueden citar múltiples ejemplos de modificación del ambiente, que no son exclusivas de uno de los países, sino que su continuidad se da a través de la frontera, siendo la conformación de áreas protegidas binacionales, la posible solución. Tales ejemplos pueden ser: la intensificación de monocultivos o desarrollo de actividades de megaminería. En nuestro país, la creación de la primera área protegida, data de 1916, Ley N° 1492, se crea el Parque Nacional, posteriormente denominado Franklin D. Roosvelt, con fines recreativos. Se avanzó muy lentamente en el tema áreas protegidas. Hace pocos años se creó el Sistema Nacional de Áreas Protegidas (SNAP), en el año 2000. En Brasil, con una gran superficie y diversidad de ecosistemas, las “unidades de conservación”, denominación dada a las áreas protegidas, han tenido un desarrollo 268 territorial importante, siendo una herramienta de gestión ambiental y de política internacional. Las unidades de conservación son protegidas por ley, son bienes comunes, públicos, que tienen una determinada función y utilidad en el mantenimiento del equilibrio ambiental y en el bienestar de la sociedad. Pueden localizarse en áreas públicas o privadas, federales, estaduales o municipales. Según las actividades antrópicas en ellas, en Brasil se dividen en dos grandes grupos: Unidades de protección integral. Unidades de uso sustentable. En las primeras se busca la preservación de la naturaleza, mientras que en las otras se busca compatibilizar conservación con uso sustentable de parte de los recursos que allí existen. La Reserva Forestal del Territorio del Acre puede ser considerada como la primera área protegida de Brasil, creada en 1911, aunque no perduró. Sí se toma como la primera unidad de conservación al parque Nacional de Itatiaia, creado por Decreto Federal N° 1.713 en 1937, entre los Estados de Río de Janeiro y Minas Gerais, con un área de 120Km2, dentro del devastado sistema de la Mata Atlántica. En el año 2000 el Sistema Nacional de Unidades de Conservación (SNUC). Brasil cuenta con el 25% de su territorio bajo distintos niveles de protección siendo unidades federales, estaduales y tierras indígenas. La gestión uruguaya: En el Artículo 1° de la Ley 17.234, se indica que el SNAP tiene por finalidad “armonizar los criterios de planificación y manejo de las áreas a proteger, bajo categorías determinadas, con una regulación única que fije las pautas de ordenamiento”. En el Artículo 3° de la Ley 17.234, mediante la cual se crea en Uruguay el Sistema Nacional de Áreas Protegidas, S.N.A.P., en el año 2000, se establecen las categorías de definición y manejo de las áreas. Cada área protegida, posee un Plan de Manejo, el que indica cuáles son las actividades, productivas, recreativas, etc., que se puedan realizar allí; elaboradas en consenso entre técnicos y pobladores de ese espacio. El Plan de Manejo rige la preservación de las poblaciones locales, de las especies de flora y/o fauna, del agua, de los suelos, de formaciones geológicas y geomorfológicas relevantes, regula las actividades recreativas del área, la explotación racional y sustentable de los recursos. (En Brasil, cada AP deber tener un Plan de Manejo, aunque no todas lo poseen). Las áreas protegidas en Uruguay son gestionadas por el Ministerio de Vivienda y Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente, a través de la Di.Na.M.A. (Dirección Nacional de Medio Ambiente), junto a ellos participan algunas organizaciones públicas y privadas, y sectores sociales involucrados. El control directo dentro del lugar es 269 llevado a cabo por el guardaparques. La primera zona que ingresó al SNAP fue la Quebrada de los Cuervos, en el departamento de Treinta y Tres, en el año 2008, en la categoría “Paisaje protegido”. Las últimas a incorporarse fueron el área Rincón de Franquía, en Abril de 2013, en la categoría de “Área de manejo de hábitat y/o especies”, localizada en la desembocadura del río Cuareim en el río Uruguay, en el departamento de Artigas; y las Grutas del Palacio, en el departamento de Flores, en Mayo de 2013, en la categoría de Monumento Natural. El siguiente cuadro muestra categorías y manejo de áreas protegidas para Uruguay, según la Ley 17.234, aprobada en el año 2000. CATEGORÍAS DE DEFINICIÓN Y MANEJO DE LAS ÁREAS QUE INTEGRAN EL S.N.A.P. Áreas donde existen uno o varios ecosistemas que no se encuentran significativamente alterados por la PARQUE explotación y ocupación humana; flora y fauna, sitios NACIONAL geomorfológicos y hábitats que presentan un especial interés científico, educacional y recreativo, o comprenden paisajes naturales de gran belleza. EJEMPLOS P. Nacional Esteros de Farrapos; Cabo Polonio. Áreas que contienen uno o varios elementos naturales específicos de gran importancia nacional, como una MONUMENTO formación geológica, sitios naturales únicos, especies, Grutas del NATURAL hábitats, que podrían estar amenazados. La Palacio. intervención humana será escasa y estará bajo estricto control. Área territorial continental o marina, en cual las interacciones del ser humano y la naturaleza, a lo PAISAJE largo de los años, han resultado en una zona de PROTEGIDO características definidas, de singular belleza, o con valor de testimonio natural, y que podrá contener valores culturales o ecológicos. Valle del Lunarejo, Quebrada de los Cuervos. Áreas relativamente pequeñas que contienen un valor SITIOS DE PROTECCIÓN crítico, porque poseen especies o grupos poblacionales relevantes de flora y fauna, y en ellas se cumplen etapas claves del ciclo biológico de las especies, tienen gran importancia para el ecosistema 270 que integran, contienen manifestaciones geológicas, geomorfológicas o arqueológicas relevantes. ÁREAS DE Áreas terrestres o marinas, sujetas a intervención Cerro MANEJO DE activa con fines de manejo, para garantizar el Verde. HÁBITAT Y/O mantenimiento del hábitat y/o satisfacer las Rincón de ESPECIES necesidades de determinadas especies. Franquía. Son espacios que contienen predominantemente ÁREAS sistemas naturales no modificados, que es objeto de PROTEGIDAS actividades de manejo para garantizar la protección y CON el mantenimiento de la diversidad biológica a largo RECURSOS plazo, y proporcionar un flujo sostenible de productos MANEJADOS naturales y servicios para satisfacer las necesidades de la comunidad. En el país no hay aún una completa representatividad de la diversidad natural del territorio en las áreas protegidas, como las praderas naturales, los ecosistemas oceánicos y de estuarios. Junto a esto, se debe mencionar que falta un mayor compromiso de la sociedad en la protección y conservación de la naturaleza. Hace parte de las políticas públicas la articulación entre conservación y uso productivo, pero también debería hacer parte de políticas privadas. La gestión brasileña: En Brasil, el Sistema Nacional de Unidades de Conservación (SNUC), es el conjunto de Unidades de Conservación (UC) federales, estaduales y municipales, creado por la Ley N° 9.985 /2000. La Ley que da origen al SNUC busca contemplar la conservación de la biodiversidad genética, de especies y de ecosistemas, así como garantizar el uso sustentable de los recursos naturales, fomentar la participación de la sociedad y lograr la distribución equitativa de los beneficios obtenidos de la creación, implementación y gestión de Unidades de Conservación. Está constituido por doce categorías diferenciadas en su forma de protección y de usos permitidos, divididos en dos grupos: grupo de unidad de conservación de protección integral, con cinco categorías, y el grupo de unidad de conservación de uso sostenible, con siete categorías. El siguiente cuadro muestra categorías y manejo de las UC: 271 GRUPO DE CATEGORÍA MANEJO DE MANEJO Estación Ecológica Reserva Biológica OBJETIVOS N° DE ÁREAS Preservar la naturaleza y realizar investigaciones EJEMPLO Estación 95 Ecológica do científicas. Taím Preservar la biota y los Reserva demás elementos naturales 57 existentes en el área. biológica das Araucárias Preservar ecosistemas naturales de relevancia ecológica y belleza UNIDADES Parque escénica, investigaciones Nacional científicas, actividades de DE educación e interpretación PROTECCIÓN ambiental, recreación y INTEGRAL turismo ecológico. Monumento Natural Parque 338 Iguazú Preservar sitios naturales raros, singulares o de gran Nacional do 38 belleza escénica. Gruta do Lago Azul Proteger ambientes Refugio de Vida Silvestre naturales para asegurar Refugio de condiciones para la Vida existencia y reproducción 30 Silvestre de especies o comunidades Campos de de flora y fauna residente o Palmas migratoria. Proteger la diversidad Área de Protección Ambiental biológica, disciplinar el proceso de ocupación y asegurar la sostenibilidad APA de la 271 del uso de los recursos Bahía de Todos los Santos naturales. Área de Mantener ecosistemas UNIDADES Relevante naturales de importancia DE USO Interés regional o local, y regular el SOSTENIBLE Ecológico uso permitido de estas 47 ARIE do Guará 272 áreas. Por lo general son de pequeña extensión, y con poca o ninguna ocupación humana. Bosque Nacional Áreas con uso sostenible de los recursos forestales e 103 investigación científica. Floresta do Araguaia Protección de los medios de vida y la cultura de poblaciones extractivistas Reserva tradicionales, de agricultura Extractivista de subsistencia, Reserva 87 asegurando el uso extractivista Chapada Limpa sostenible de los recursos naturales Área natural con poblaciones nativas, terrestres o acuáticas, Reserva de Fauna residentes o migratorias, adecuadas para estudios 0 ---- técnico-científicos sobre manejo económico sostenible de los recursos faunísticos. Área natural con poblaciones tradicionales, que basan su existencia en sistemas sostenibles de Reserva de Reserva de explotación de los recursos Desarrollo Desarrollo naturales, y que Sostenible desempeñan un rol del Río fundamental en la Madeira 33 Sostenible protección de la naturaleza y en el mantenimiento de la diversidad biológica. Reserva Área privada con el objetivo 681 Reserva 273 Particular de de conservar la diversidad Particular del Patrimonio biológica, donde se puede Patrimonio Natural realizar investigación Natural científica, visitas turísticas, Pedra da recreativas y educativas. Águia Son creadas por iniciativas del propietario, y puede obtener apoyo del SNUC en su gestión. Según la tenencia de la tierra el SNUC permite una ocupación y explotación de las UC que se pueden agrupar de la siguiente forma: UNIDADES DE CONSERVACIÓN TENENCIA DE LA TIERRA Estación Ecológica Reserva Biológica Son de dominio público y no se permite la Parque Nacional presencia de poblaciones humanas, si las Reserva de Fauna hay deben ser reasentadas. Bosque Nacional Reservas Extractivistas Reservas de Desarrollo Sostenible De dominio público, pero pueden ser habitadas y sus recursos pueden ser explotados por poblaciones locales. Pueden poseer áreas privadas en su Monumento Natural interior, pero los usos privados deben ser Reserva de Vida Silvestre compatibles con el poder público, sino serán desapropiados por dicho poder. Área de Protección Ambiental Área de Relevante Interés Son tierras públicas y privadas Ecológico Reservas Patrimonio Natural Particulares de Son áreas privadas. Cerca de 1.100.000 Km² se encuentra protegida como “Tierras Indígenas”, pero las mismas no se encuentran dentro del SNUC, sino que son gestionadas por la Fundación Nacional del Indio (FUNAI). Están incluidas dentro de las estrategias de conservación, y son reconocidas por el Estado como áreas protegidas. 274 El SNUC propone que después de ser creada una UC, se debe elaborar un plan de manejo, en función de los objetivos generales por lo cual se creó esa unidad. El Plan de Manejo establece las normativas, las restricciones, las acciones a desarrollar, el manejo de los recursos dentro de cada unidad, según las características de las mismas, y deben abarcar el área de la unidad, su zona de amortiguación (Buffer zone), y los corredores ecológicos de los que hagan parte. Se denomina Corredores Ecológicos a las áreas Corredor Central de la Mata Atlántica, de 12,5 millones de hectáreas, y al Corredor Central de la Amazonia, con más de 52 millones de hectáreas; abarcan UC de diferentes categorías de manejo, tierras indígenas y áreas de intersticio, sometidas a diferentes formas de uso de la tierra. El PNAP (Plan Nacional de Áreas Protegidas) ha innovado al incluir a las UC, las tierras indígenas y las tierras de las comunidades remanentes de quilombos, como partes de la política de conservación de la biodiversidad brasileña. En números, Uruguay cuenta con 21 áreas protegidas, correspondientes a un 1,6% del territorio, incluyen sierras, ríos, pastizales, humedales, montes, quebradas, costas, islas, áreas marinas, incluyéndose los valores culturales que se encuentran asociadas. El Catastro Nacional del SNUC, con fecha de Agosto de 2013 registra en Brasil 1781UC, correspondientes a 1,5 millones de Km², las que pueden ser admiminstradas por municipios, estados o la Unión Federal en todas las categorías. La última UC creada el 20 de Junio de 2012, fue el Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Currais, en Paraná, el que puede ser usado para actividades como turismo, extractivismo o agricultura. 887 UC son federales, de las que 828 son áreas terrestres y 59 marítimas. Son gestionadas por el Instituto Chico Méndes de Conservación de la Biodiversidad (ICMBio), creado en 2007 y vinculado al Ministerio del Medio Ambiente e integra el Sistema Nacional del Medio Ambiente (Sisnama). El ICMBio ejecuta las acciones del SNUC, proponiendo, gestionando, protegiendo, fiscalizando, monitoreando las UC federales, ejerciendo el rol de policía ambiental, además de investigar, preservar y conservar la biodiversidad. 735 UC son estaduales, de las que 683 son áreas terrestres y 52 marítimas. 159 gestión municipal, de las que 146 son áreas terrestres y 13 marítimas. Según el Ministerio del Medio Ambiente, en la útlima década, Brasil ha creado alrededor de 700.000 Km² de áreas protegidas, ubicándolo como primero en la creación de las mismas a nivel global. La posibilidad de establecer AP binacionales entre Uruguay y Brasil, se debe dar no solo en la categoría de gestión, sino que pasa por la gestión misma de las áreas. 275 Los organismos de gestión de ambos países difieren también en cantidad y en funciones. (Organigramas) En Uruguay, la Ley 17.234, creadora del SNAP, establece que es el Poder Ejecutivo el que fija la política nacional para las áreas de protección, a través del Ministerio de Vivienda, Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente (MVOTMA) que formula, ejecuta, supervisa y evalúa las políticas al respecto, mediante un órgano específico para ello, la Dirección Nacional de Medio Ambiente (DINAMA.). La administración de las áreas en específico, pueden ser realizadas por otros organismos o personas públicas o privadas. Al MVOTMA lo orienta la Comisión Nacional Asesora de Áreas Protegidas, integrada por delegados del Poder Ejecutivo, de las intendencias departamentales, de la UdelaR, de ANEP, y de organizaciones representativas de productores rurales y de ONGs ambientalistas. A su vez, cada área protegida posee una Comisión Asesora, con delegados de los distintos actores involucrados, públicos y privados. La DINAMA, cuenta con una Unidad Ejecutora que asegura la coordinación entre las instituciones públicas: MVOTMA, MGAP (Ministerio de Ganadería, Agricultura y Pesca), el MTD (Ministerio de Turismo y Deporte), el PROBIDES (Programa de Conservación de la Biodiversidad y Desarrollo Sustentable en los Bañados del Este) y el PPD (Programa Pequeñas Donaciones). En Brasil la gestión de áreas protegidas posee más figuras que en Uruguay, ya que además del gobierno central, de los estados federales, de los municipios, de fundaciones instituidas por el Poder Ejecutivo, hay fundaciones formadas desde el Ejecutivo, que se encargan de la protección y evolución de la calidad ambiental. En primer lugar desde el Ejecutivo, Brasil posee un Ministerio del Ambiente, que en Uruguay posee además otros cometidos; el Ministerio es el que formula, ejecuta, coordina, supervisa, controla las políticas nacionales ambientales, y es la figura central del Sistema Nacional del Medio Ambiente (SISNAMA). Parte de él lo integra un Consejo de Gobierno, que cumple iguales cometidos que la Comisión Nacional Asesora de Áreas Protegidas en Uruguay; el Consejo Nacional del Medio Ambiente (CONAMA), el que asesora en las políticas para el ambiente al Consejo de Gobierno y al SNUC y es su instancia superior, comparable a la DINAMA. La figura del SISNAMA no posee igualdad en la gestión ambiental de Uruguay. Órganos ejecutores lo constituyen: el Instituto Brasileño del Medio Ambiente y de los Recursos Naturales Renovables (IBAMA), el Instituto Chico Mendes de Conservación de la Biodiversidad (ICMBio). Vinculados al Ministerio del Ambiente, hay otras instituciones no vinculadas directamente al SISNAMA, pero que por sus actividades se relacionan con él, como el Instituto de Investigaciones del Jardín Botánico de Río de Janeiro, y la Agencia Nacional de Aguas (ANA). 276 A su vez, en los estados federales, en los municipios, en el Distrito Federal, hay órganos ejecutores de políticas ambientales, en sus respectivas áreas. Hay además Consejos Estaduales y Municipales de Medio Ambiente, con atribuciones en lo ambiental específicos de cada estado o municipio. El conjunto de las unidades de preservación en Brasil, lo constituye el SNUC, comparable al SNAP de Uruguay, con diferencias en categorías de áreas de protección. Las unidades de conservación poseen, a su vez, Consejos consultivos, con representantes de órganos públicos, de organizaciones civiles y de los habitantes del área protegida. Estos Consejos cumplen la función que poseen en Uruguay la Comisión Asesora dentro de cada área. Organigrama de las formas adoptadas para la gestión ambiental en Uruguay y en Brasil: Uruguay: MVOTMA Órgano ejecutor DINAMA Unidad Ejecutora Con Integra Comisión Asesora de Áreas Protegidas SNAP SISNAMA de Brasil: MINISTERIO DEL AMBIENTE CONAMA Órganos Ejecutores 277 ICMBio IBAMA Órg. estaduales y municipales Órgano consultivo y deliberativo SNUC Como se observa en la comparación de ambos sistemas de gestión ambiental, las formas que adquieren las mismas se ven determinadas por las unidades planificadoras y de ejecución de los planes, junto a ello por las organizaciones no gubernamentales, en su libertad de acción mayor o menor y en su injerencia en las mismas. Los objetivos que se proponen con la creación del SNAP y del SNUC comparten algunas características, pero difieren en otras, como lo muestra el siguiente cuadro: OBJETIVOS SNAP SNUC Compartidos • Proteger ecosistemas, fauna y flora nativas, geología, geomorfología relevante, paisajes naturales y culturales. Promover investigación científica, educación ambiental y monitoreo de áreas de protección. Fomentar un turismo responsable en las áreas permitidas. Contribuir a una explotación sustentable de los recursos en áreas habitadas. No compartidos • Evitar deterioro de cuencas hidrográficas y asegurar la calidad y cantidad de las aguas. Recuperar y restaurar ecosistemas degradados. Proporcionar medios e incentivos para actividades de investigación, estudios y monitoreo ambiental. Valorizar económica y socialmente la diversidad biológica. Proteger los recursos naturales necesarios para la sobrevivencia de poblaciones tradicionales, respetando y valorizando sus conocimientos y su cultura promoviéndolas social y económicamente. 278 y En la frontera Uruguay-Brasil, se encuentran tres unidades de conservación brasileñas, dos de ellas son federales y una estadual, al Área Protegida del Río Ibirapuitá, la Estación Ecológica del Taím y el Parque Estadual do Espinilho, respectivamente; mientras la primera es la única que llega al límite entre los dos países, las dos últimas se encuentran en la región fronteriza. El Área de Protección Ambiental del río Ibiratpuitá, al suroeste del Estado de Río Grande del Sur, fue creada el 20 de Mayo de 1992 mediante el Decreto Federal N°529. Abarca un área de 318.767 has en los municipios de Alegrete (15,22%), Quaraí (12,22%), Rosario do Sul (15,75%) y Santana do Livramento (56,81%). Los objetivos de su creación son preservar la biodiversidad y los recursos hídricos y edáficos en los ecosistemas originales remanentes de vegetación herbácea y arbustiva; junto a ellos también se busca mejorar la calidad de vida de las poblaciones humanas allí existentes, desarrollar programas de educación ambiental y de investigación científica, fomentar el turismo y preservar las tradiciones. Las áreas de protección que Uruguay posee en su región fronteriza con Brasil, son el Parque Nacional de San Miguel, el Paisaje Protegido del valle del arroyo Lunarejo y el Área de Protección del Rincón de Franquía . En Uruguay, el valle del arroyo del Lunarejo fue creada como área protegida el 8 de Octubre de 2009, situado al Oeste del departamento de Rivera, abarcando un área de 28.952 has de propiedad privada y del Instituto Nacional de Colonización, en la categoría Paisaje Protegido. Con su creación se pretende que la interacción entre las poblaciones humanas allí establecidas y la naturaleza del lugar resulte en beneficio para ambos, con protección hacia los ecosistemas, la fauna y la flora, y el uso sostenible de los recursos, transformando y mejorando la calidad de vida de sus habitantes. El valle posee un alto valor paisajístico resultante de la interacción hombrenaturaleza, pero sumamente frágil, lo que lleva a promover su protección a través de una labor conjunta con los habitantes del lugar, a través de proyectos de desarrollo social, económico y cultural, en consonancia con la sostenibilidad. Su situación fronteriza, sus características naturales y las actividades humanas realizadas, tienen continuidad en el territorio brasileño. Son factores que llevan a proponer la creación de un área binacional, integrada por el APA del Ibirapuitá en Brasil y un área de mayor extensión del lado uruguayo, propuesta como Quebradas del Norte. Del 10 al 13 de Junio de 2014, se desarrolló en Suecia, la vigesimosexta Sesión del MAB (programa del Hombre y la Biosfera de la UNESCO), en la que se aprobó la creación como reserva de la biosfera bioma pampa y Quebradas del Norte; la última con abarcando una superficie desde el valle de los arroyos Laureles y Las Cañas, en el departamento de Tacuarembó, hasta el Parque gran Bretaña, en el 279 departamento de Rivera, limítrofe con Brasil, con una dirección suroeste-noreste, siguiendo la región de quebradas formadas por los cursos fluviales de estas cuencas en el frente de retroceso de la cuesta basáltica y con un total de 110.843 hás. El área binacional que se propone abarca una superficie de 420.000 hás. aproximadamente, en el que se encuentran cascadas, paredones, cañones, y los denominados “balcones” desde donde se obtienen amplias vistas de los valles, así como una extensa y exuberante vegetación tropical y subtropical de quebradas alternando con praderas, con numerosas especies de la flora y la fauna autóctonas a conservar. En ella se desarrollan tradicionalmente actividades ganaderas extensivas, las que mantienen a una población arraigada a un patrimonio cultural que se debe amparar. A esto se agregan actividades económicas no tradicionales en la región, como la forestación y el turismo natural, lo que reafirma una necesidad urgente de planificación y de lograr un desarrollo sustentable. Las cuencas de los arroyos Laureles, Las Cañas y Lunarejo son subcuencas del río Tacuarembó; nacen en el sector oriental de la cuchilla de Haedo, siguiendo una dirección noroeste-sureste. Por su parte, la cuenca del río Ibirapuitá, con numerosos afluentes, discurre en una dirección sur-noroeste y pertenece a la cuenca del río Ibicuí. La posibilidad de llevar adelante la creación de un área de protección ambiental binacional, en el que la categoría de la misma sea igual a ambos lados del límite entre ambos territorios, implica que la gestión se dé en forma semejante y que las poblaciones que allí se asientan, compartan la voluntad de integrar el área y de trabajar en forma sustentable. Las legislaciones de protección que los países adoptan para gestionar sus espacios dependen de distintos factores, como ser: ¿cuál es la categoría de manejo? ¿Qué objetivos se persiguen? ¿Qué tipo de protección se establecerá? ¿Qué medios son necesarios para aplicarla? En el establecimiento del APA del río Ibirapuitá, situada en la frontera con Uruguay, la decisión de su establecimiento fue tomada por Brasil, sin consultar al Estado uruguayo, en 1992. De igual forma las áreas que posee Uruguay en sus regiones fronterizas con Brasil. También se debe tener en cuenta que aún está muy arraigada la visión de las fronteras como una región de seguridad, a la que se aplican normativas específicas. La implementación de un área binacional entre Uruguay y Brasil debe articular ambos sistemas de protección, a fin de salvar las diferencias en cuanto a la visión y misión de la frontera y de un área de protección. En el ámbito del MERCOSUR los países que lo integran, han buscado en los últimos años generar políticas comunes dirigidas a la protección ambiental y al desarrollo sostenible en la región. En Junio de 2001, los representantes del poder Ejecutivo de 280 los Estados que lo integran, aprobaron la Decisión N° 2/01 Acuerdo Marco sobre el Medio Ambiente, en el que se propone la cooperación dentro del Bloque, intercambio de información, de equipos técnicos y experiencias en áreas protegidas, así como la implementación de acciones que profundicen en el tratamiento de problemas ambientales, en la conservación de la biodiversidad, el uso sostenible de recursos y la participación justa y equitativa de los beneficios que se deriven de los recursos genéticos. Entre los objetivos propuestos se destaca la necesidad de desarrollar mecanismos comunes de planificación de áreas con ecosistemas compartidos, desarrollando planes conjuntos de protección, recuperación e incremento de biomas y ecosistemas; aunque no se ha nombrado específicamente áreas binacionales, los acuerdos establecidos, son base para la creación de las mismas. En 2013 se realizaron encuentros60 entre actores públicos y privados de los municipios que comprende el APA del Ibirapuitá y del PP del valle del Lunarejo, la que tuvo por finalidad intensificar estudios y analizar el desarrollo socio-económico y una explotación sustentable de los recursos naturales dentro de ambas áreas de protección, como la explotación del acuífero Guaraní y la implementación de un parque eólico, en parte ya en funcionamiento, desde la Villa Thomaz Albornoz, en límite contestado entre ambos países, hasta el APA del Ibirapuitá. Si bien la reunión significó un avance en cuanto a buscar una mayor integración ambiental, no se buscó la creación de un área binacional. La integración del área propuesta del Parque Natural de las Quebradas del Norte en Uruguay y el APA del río Ibirapuitá en Brasil, se deben articular en lo posible dentro de su categoría, creando un área de protección ambiental o un parque natural binacional. Brasil y Uruguay no poseen la figura Parque Natural dentro de las categorías reconocidas por el SNUC y el SNAP, respectivamente; para ello deberán compatibilizar sus objetivos de conservación, profundizando en los mismos, integrando también a los habitantes de esas áreas. Ya la figura de Área de Protección Ambiental es común a ambos sistemas, con objetivos similares. Se requiere como “conditio sine qua non” encontrar la forma jurídica legal más adecuada, con un plan de manejo61 ambiental desarrollado por ambos. El APA del Ibirapuitá no posee un plan de manejo aprobado, no siguiendo la normativa del SNUC, aunque tuvo inicio su elaboración en 2011. Ya el área que comprende la propuesta del Parque Natural Quebradas del Norte, en su porción dentro del 60 El día 28 de Febrero de 2013, en el Núcleo de Estudios Fronterizos del Centro de Integración del MERCOSUR/UFPel, en santana do Livramento. 61 Un Plan de Manejo de un área es el documento técnico, que señala y regula el uso que se debe hacer de la misma y el manejo de sus recursos naturales, Toma como base los objetivos de creación del área, dividiéndola en zonas. 281 departamento de Rivera, fue aprobada en 2004 por la Junta Departamental, el plan de manejo de la misma. Estas diferencias son obstáculos a superar para la conformación del área transfronteriza propuesta. Otra posible figura que podría adoptar el área binacional propuesta es la creación de un Corredor de Protección Binacional, en el que se creara una categoría en que ninguno de los dos sistemas de protección posee. Para ello se necesitan crear normativas específicas y coordinadas entre los países. El MAB ha solicitado al aprobar la reserva de la biosfera para Uruguay mapas más detallados de la zonificación del área, la creación de un plan de gestión por un año, y, en especial, considerar mayor coordinación con la Reserva de la Biosfera de la Mata Atlántica de Brasil, existiendo potencial para crear una reserva de la biosfera transfronteriza. CONCLUSIONES Cualquiera sea la categoría que se adopte para la conformación de un área binacional protegida, se debe aunar criterios, esfuerzos, educación ambiental, preparación de técnicos y en especial la colaboración de los pobladores del lugar, actores unidos indefectiblemente al área a proteger, ya que sus acciones pueden ser benéficas o no para el lugar. Preservar biomas, recursos, actividades humanas están indisolublemente entrelazados, son los tres lados de un triángulo, que van a estar presentes y posibilitar la vida, es una prioridad que no se puede postergar. La formación y consolidación de un área de protección ambiental binacional, se logrará con una buena disposición y compromiso en diversos ámbitos: político, económico y social, en el que no solo se apueste a la protección de la naturaleza, sino que junto a ello lograr un desarrollo sustentable con la participación de los habitantes que en ella residen. Uruguay y Brasil disponen de espacios de protección en sus regiones de frontera, que se podrían convertir en áreas binacionales. Para ello se deben aunar criterios y normativas, delimitar una superficie a proteger que amplíe las que ya existen en sus fronteras, logrando una contigüidad y adoptar una figura dentro de las categorías que poseen, compartida por ambos sistemas de protección, o crear una nueva para ambos. Deben haber acciones de desarrollo conjunto, así como también crear las condiciones, las infraestructuras, preparar personal para guardaparques y de guías de las áreas naturales. 282 La reciente creación de la reserva Quebradas del Norte, en Uruguay, tomando la ya existente en el Valle del Lunarejo y creando nuevas con las cuencas de los arroyos Laureles y Las Cañas, en el frente de retroceso de la cuesta basáltica, se puede ampliar a una binacional, formando junto con el APA del río Ibirapuitá, en Brasil, una superficie contigua, en la que las poblaciones humanas allí existentes sean partícipes en su construcción y conservación. ¿Es posible ampliar la propuesta del Área de Protección Binacional anexando el Rincón de Artigas, límite contestado entre Uruguay y Brasil? ¿Se debe resolver primero la cuestión del límite contestado? ¿Podría crearse el Área de Protección Binacional sin dejar de ser límite contestado? ¿Bajo qué normativas? Por ser un límite contestado ¿Podría impedir la creación de un Área de Protección? ¿Hay antecedentes en otras partes? La soberanía de Uruguay y Brasil ¿se vería afectada? ¿Cómo lo perciben las personas que allí habitan? Tenemos la obligación de salvaguardar los recursos que nos ofrece la naturaleza, la que no conoce los límites entre los Estados. No importa el lado del límite en que estemos, es la forma como usemos los recursos, la que nos afectará directa o indirectamente. Es un derecho como seres humanos el disfrutar de la naturaleza, somos parte de ella; debemos siempre tener presente que estamos de paso, y que la herencia que dejamos será el presente y el futuro del planeta. ANEXOS 1. Fuente: http://www.mma.gob.cl/biodiversidad/1313/w3-propertyvalue-15607.html 283 2. Mapa de áreas protegidas en las distintas etapas de desarrollo. Fuente: Plan Ceibal 284 3. ÁREAS PROTEGIDAS DE BRASIL Fuente: IBGE. 2013 285 4. Fuente: www.biodiversidade.rs.gov.br 286 5. Áreas de protección en la región fronteriza Uruguay.Brasil, cercanas al límite. Fuente: Proyecto Quebradas del Norte. Diciembre 2012 Propuesta del Parque Nacional Quebradas del Norte 6. 287 7. Cuenca del arroyo y área del Paisaje Protegido del valle del Lunarejo. 8. 288 Área de Protección Ambiental del río Ibirapuitá y parte de su cuenca. BIBLIOGRAFÍA: ACHKAR, M. et al. (2010). “Áreas protegidas. Un desafío en el ordenamiento ambiental del territorio”. Montevideo: Departamento de publicaciones. UCUR. BOCCO, G., URQUIJO, P. y VIEYRA, A. (Coordinadores). (2011). “Geografía y ambiente en América Latina”. México: Centro de Investigaciones en Geografía Ambiental. CASAUBOU, C., OLVEIRA, A. y SEQUEIRA, A. (2010). “Santuario de biodiversidad. Áreas protegidas”. Áreas protegidas del Uruguay, 01(01), 12-15. DIRECCIÓN NACIONAL DE MEDIO AMBIENTE. (Junio 2009). “Propuesta de proyecto de creación y delimitación de un área protegida en las cuencas de los arroyos Laureles y de Las Cañas para su incorporación al Sistema Nacional de Áreas Protegidas”. ELBERS,J. (Editor). (2011). “Las áreas protegidas de América Latina. Situación actual y perspectivas para el futuro”. Ecuador: UICN. GONCALVES, M.A. (2007). “Informe nacional sobre áreas protegidas no Brasil”. Serie áreas protegidas de Brasil, 5. Ministerio del Medio Ambiente. Secretaría de Biodiversidad y Bosques. Departamento de Áreas Protegidas. Brasil. GUDYNAS, E., HONTY, G. y GHIONE, S. (2010). “Ambiente y desarrollo en América del Sur. Tendencias y emergentes en cambio climático, biodiversidad y políticas ambientales”. Montevideo: CLAES. 289 SABATINI, M. C., VERDIELL, A., RODRÍGUEZ IGLESIAS, R. M. y VIDAL, M.C. (2003). “Zonificación de áreas naturales protegidas: una propuesta cuantitativa”. Aportes y Transferencias, I(7), 29-44. TOLEDO, V.M. 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Roraima, 1000, Prédio 17, CEP 97105-900 Resumo: Este trabalho apresenta uma proposta de regionalização do Pampa Uruguaio-Sul-rio-grandense tendo como base as características geológicogeomorfológicas que compõem sua paisagem. As escalas de abordagem utilizadas foram as de biorregião, ecorregião e ecoprovíncias. Através de uma compilação de dados e interpretações de diversas pesquisas já realizadas, bem como de observações de campo e de imagens de satélite, nota-se que a realidade paisagística da região não condiz com a visão homogênea de pampa construída no imaginário social da população. Como resultado, obteve-se uma compartimentação em cinco ecoprovíncias que poderão auxiliar na busca de estratégias de conservação e manejo mais adequadas à diversidade paisagística desta ecoregião: pampa dos matacões, pampa serrano, pampa ondulado, pampa do espinilho e pampa das mesetas.. Palavras-chaves: Biorregião; Ecorregião; Ecoprovíncias; Pampa Uruguaio-Sul-riograndense. Por uma outra concepção de identidade: a biorregião Com menos de 1% de sua área protegida e mais de 80% de sua paisagem já transformada por cultivos agrícolas, o Pampa demanda preocupações com questões de conservação, de redução de impactos ambientais e de sustentabilidade da geo-biosociodiversidade. Conforme Figueiró (2012) “não são apenas as espécies que estão desaparecendo, junto com elas desaparecem também as formas de patrimônio que possuem estreita ligação com as comunidades bióticas ao longo da história: a geodiversidade e a diversidade cultural”. Os habitats que sustentam as espécies biológicas precisam ser considerados nas estratégias de conservação; novos processos e métodos de conservação – que envolvam a complexidade das paisagens, as comunidades, seus saberes, suas histórias e sua cultura – precisam ser pensados. Uma das abordagens que melhor contemplam esta perspectiva é a do biorregionalismo. De acordo com Martino (2004), o conceito oferece um novo olhar sobre o território, pois permite incorporar aspectos sociais e econômicos ao contexto ecológico, resultando em propostas de desenvolvimento econômico preocupadas com a conservação do ambiente e com a melhoria da qualidade de vida das populações locais. O “regionalismo autônomo”, proposto por Gudynas (2002), se aproxima muito da ideia de biorregionalismo, pois está baseado em questões de conservação e de 291 qualidade ambiental, de relações humanas e culturais em regiões geográficas determinadas por atributos tanto ecológicos quanto culturais, econômicos e políticos (GUDYNAS, 2002). Assim, um espaço geográfico relativamente homogêneo do ponto de vista ecológico como é o pampa, somado à identidade cultural presente nos gaúchos da Argentina, do Uruguai e do Rio Grande do Sul e a forma como esta população ocupa e transforma seu espaço, nos leva à compreensão e individualização de uma “Biorregião do Pampa”. Essa biorregião compartilha grandes características fisionômicas e estas condicionam uma forma de uso e consequente uma cultura com enorme grau de identidade em todo seu território, e é essa cultura projetada no espaço que demarca as fronteiras da biorregião. Dentro desta biorregião, Martino (2004) aponta a existência de seis grandes unidades de paisagem que expressam, especialmente, os diferentes graus de umidade e, consequentemente, a resultante ecológica destas diferenças dentro do Pampa, definindo, portanto, as ecoregiões, aqui denominadas de: Pampa UruguaioSul-rio-grandense, Pampa Mesopotâmico, Pampa Inundável, Pampa Úmido, Pampa Espinhento e Pampa Semi-árido. Dentre estas ecoregiões, o presente trabalho se propõe a discutir e apresentar as heterogeneidades internas ligadas às variações estruturais e à geodiversidade da primeira ecoregião referida, o Pampa Uruguaio-Sulrio-grandense. Tais diversidades representam a chave interpretativa para a definição de ecoprovíncias no seu interior (Figura 01). Esta delimitação hierárquica é importante porque auxilia na compreensão dos limites de resiliência e do potencial de atratividade turística de cada ecoprovíncia. Cabe ainda reforçar que, apesar das diferenças internas da ecorregião, os usos e a cultura são muito próximos ao de toda a biorregião, tornando o recorte ecorregional ou mesmo o ecoprovincial possuidor de um apelo muito mais ecológico-estrutural do que propriamente cultural, não no sentido de exclusão, mas sim de complementaridade. Por uma nova escala de conservação: a ecorregião Na medida em que se avança na compreensão da necessidade de conservação da natureza, avançam também os questionamentos sobre as melhores estratégias a serem utilizadas. Novas formas de compreender o meio natural e outras escalas de abordagem passam a ser pensadas. Uma das iniciativas que surgem para subsidiar uma nova discussão sobre estratégias de conservação do patrimônio natural, por exemplo, é a proposta de ecorregião. Na intenção de aprimorar o mapeamento da biodiversidade, Olson et. al. (2001) propõem o uso desta terminologia e a definem 292 como uma grande unidade de terra ou água que contém uma mescla geograficamente distinta de espécies, comunidades naturais e condições ambientais. De acordo com os autores (op. cit.), os mapas existentes de biodiversidade global têm sido ferramentas ineficazes para pensar a conservação, pois dividem a Terra em unidades que desconsideram as associações de espécies e a história geológica (como a forte influência das glaciações ou das pontes de terra do Pleistoceno) sobre a distribuição de plantas e animais. Neste sentido, a proposição de ecorregiões constitui uma nova maneira de espacializar a diversidade da vida na Terra, colocando-se como alternativa ao conceito de Bioma, o qual, segundo FIGUEIRÓ (2012), caracteriza-se pela absoluta ausência de qualquer referência às formas de ocupação humana existentes dentro de cada um dos conjuntos naturais delimitados, quando na verdade muitos têm o componente humano como definidor da diversidade. De acordo com o autor (op. cit.), Não podemos simplesmente aceitar que alguns milhares de anos de desenvolvimento da sociedade humana em interação direta com as comunidades vegetais e animais do planeta não tenham resultado em estruturas e processos co-evolutivos entre umas e outras. São as nossas geo-grafias humanas (marcas humanas sobre a terra) entremeadas às estruturas naturais, tanto quanto as geo-grafias da natureza têm condicionado nossas formas de produzir, de viver e de sonhar (FIGUEIRÓ, 2012, p.66). 293 Figura 01: Ecoprovíncias do Pampa Uruguaio-Sul-rio-grandense. Proposta de regionalização com base na geodiversidade e na sua influência sobre os aspectos ecológicos e paisagísticos. Fonte: Elaborado pelos autores Este é o caso, de uma forma geral, da região do Pampa Uruguaio-Sul-rio- grandense que é representada no mapa dos biomas brasileiros e das ecorregiões globais, como uma unidade homogênea. Em abordagens globais, continentais ou mesmo nacionais, como as de Olson et al. (2001) ou de IBGE (2004), essa homogeneidade do pampa uruguaio-sul-rio-grandense é compreensível, uma vez que, na escala de maior abrangência, a área é dominantemente caracterizada por vegetação rasteira e arbustiva em relevo suave ondulado com clima subtropical. No entanto, em escala de maior detalhe, a suposta homogeneidade dessa extensa região não se sustenta frente à realidade observada no campo, onde o que existe na prática é uma substancial diversidade paisagística que expressa heterogeneidades geológicas, geomorfológicas, de solo e de vegetação. Diante da necessidade de considerar as demais formas de diversidade e também as diferentes formas de interação entre a sociedade e natureza, é de extrema importância realizar um maior detalhamento desta ecorregião. Neste sentido, uma 294 nova proposta de divisão em ecoprovíncias62 será apresentada neste trabalho, considerando as particularidades reais existentes, mas que se tornam invisíveis na escala global. Regionalização do Pampa uruguaio sul-rio-grandense: ecoprovíncias Para obtenção dessa regionalização, inicialmente foram analisadas imagens de satélite de diferentes sensores e composições, mapas geológicos do Rio Grande do Sul (CPRM, 2009) e do Uruguai (DINAMIGE, 1985), além de inúmeras publicações com sínteses regionais de geologia (BOSSI e NAVARRO, 1991; CHEMALE Jr. et al., 2000; HARTMANN et al., 2000), meio ambiente (ACHKAR et al., 2013; GUDYNAS e EVIA, 2000; RIO GRANDE DO SUL, 2010; MMA, 2000 e 2007; PILLAR, 2009) e fisionomia vegetal (HASENACK et al., 2010). Por fim, foram percorridos mais de 6 mil quilômetros de rodovias e estradas vicinais no Rio Grande do Sul e no Uruguai, tomando-se fotografias e informações relevantes sobre a geologia e o relevo do pampa uruguaio-sul-rio-grandense. Na construção dessa regionalização é preciso ponderar que Hasenack et al. (2010) e Boldrini et al. (2011), com base em características fisionômicas e de composição florística, já subdividem a área de abrangência do “Bioma Pampa” (coincidindo com o Pampa Uruguaio-Sul-Rio-Grandense aqui analisado) em uma série de sistemas ecológicos ou tipos de vegetação campestre, demonstrando apenas uma das facetas da heterogeneidade da região analisada. No entanto, além da descrição e regionalização tomando por base as formações vegetais, é preciso também aportar uma série de subsídios da geodiversidade e da evolução geológica que, ao se somarem às heterogeneidades fisionômicas, florísticas, culturais, sociais e econômicas irão auxiliar no sentido de uma nova regionalização ambiental e paisagística para essa região. Pretende-se, com isso, que futuras iniciativas e estratégias de conservação da natureza levem em consideração, também, as heterogeneidades geológico-geomorfológicas e as características que elas emprestam ao Pampa Uruguaio-Sul-Rio-Grandense. A geodiversidade, interpretada como a diversidade geológica, geomorfológica, edáfica e de recursos hídricos de uma determinada região ou território, possui significativa influência sobre a distribuição de formações vegetais e ecossistemas, bem como sobre a estruturação e manutenção de habitats para uma série de espécies de 62 Compreende-se a ecoprovíncia como uma regionalização da ecorregião, caracterizada por um padrão distinto de organização macro e mesoestrutural da paisagem, envolvendo relevo, geologia, geomorfologia, solo e respostas bióticas. 295 fauna e flora, inclusive no condicionamento dos endemismos. Adicionalmente, a geodiversidade influencia e, em certos casos, condiciona, os padrões de ocupação humana, inclusive impondo sérios limites a essa, como nas áreas de alta declividade, suscetíveis a movimentos de massa, e nas áreas marginais a cursos d’água, suscetíveis a inundações. Ainda no que se refere à sociedade, a geodiversidade pode inspirar os costumes, as lendas e as tradições, além de fornecer o material para as construções históricas e determinar as vocações econômicas das comunidades, suas culturas agrícolas, rebanhos e bens minerais. Diante disso, se optou em utilizar a geodiversidade como critério balizador para a proposição desta regionalização na escala das ecoprovíncias. a) O Pampa dos Matacões A primeira ecoprovíncia identificada com base nas características de geodiversidade é a de cerros e planaltos graníticos com floresta estacional, paisagem aqui denominada de Pampa dos Matacões, que se estende como uma faixa de cerca de 300 quilômetros de extensão, com orientação NE-SO, desde os municípios de Herval e Arroio Grande, no extremo sul gaúcho, até Encruzilhada do Sul e Porto Alegre, em sua terminação norte/nordeste (Figura 01). Corresponde, aproximadamente, à área mapeada como floresta estacional por Hasenack et al. (2010), estendendo-se um pouco mais ao sul. Essa região possui como substrato rochoso uma série de corpos ígneos plutônicos, de diferentes dimensões, compostos por granitos e granodioritos diversos, reunidos sob a designação de Batólito Pelotas (PHILLIP et al., 2000). Essas unidades ígneas foram formadas entre 630 e 550 milhões de anos, e registram as raízes de uma antiga cadeia de montanhas que se estendia do sul do Uruguai até o norte do litoral catarinense, produzida pela colisão entre os crátons La Plata e Kalahari. A exposição desses corpos intrusivos à superfície, no entanto, produziu-se somente a partir do Cretáceo, durante os processos de soerguimento relacionados à quebra de Gondwana e à abertura do Oceano Atlântico sul. A relativa homogeneidade do substrato (apenas rochas graníticas), somada ao caráter relativamente recente do substancial soerguimento e da consequente exposição dessas rochas, faz com que toda essa região seja uma área mais alta e plana, chegando aos 500 metros de altitude. Esse fato tem levado diversos pesquisadores a propor designações geomorfológicas como “planalto (uruguaio) sul-rio-grandense” (JUSTUS et al., 1986; SUERTEGARAY et al., 2004). Mesmo dentro desta área soerguida, algumas elevações se destacam ainda mais, por possuírem composições muito ácidas e 296 resistentes ao intemperismo diferencial, como os granitos da crista de Porto Alegre e as elevações da serra do Herval. As rochas graníticas dessa região afloram na forma de grandes concentrações de matacões arredondados (Figura 2B), entremeados de floresta, como no Parque Estadual do Podocarpus, em Encruzilhada do Sul, ou onde há presença do gado em meio a pastagens nativas de baixa capacidade de suporte. A fisionomia originalmente florestal pode até mesmo ser atestada pela toponímia nativa, uma vez que os indígenas se referiam a essa região como caa-guaçú (“mato grande”), expressão que foi adaptada para compor o nome de um dos maiores e mais populosos municípios da região, Canguçu. Ainda sobre a abrangência da vegetação florestal, é possível supor que durante o último período interglacial (há aproximadamente 5 mil anos), quando o nível do mar estava cerca de 5 metros mais alto que o atual (TOMAZELLI e VILLWOCK, 2000) e o litoral atlântico do Rio Grande do Sul se posicionava mais próximo à região focalizada, essa floresta ocupasse uma área maior e estivesse conectada à floresta atlântica da encosta do planalto meridional brasileiro, mais a norte. b) O Pampa do Espinilho A ecoprovíncia formada por planícies fluviais da bacia do rio Uruguai com parque de espinilho, ou “pampa do espinilho” (Figura 01), coincide com as áreas cuja vegetação original se constitui, além do estrato herbáceo campestre, de um estrato de arvoretas esparsas (espinilho, algarrobo, inhanduvá, entre outras – Figura 2B), bastante representativo no Uruguai, mas preservado no Rio Grande do Sul apenas no Parque Estadual do Espinilho, em Barra do Quaraí e no Cerro do Jarau, em Quaraí. Coincide com a área mapeada como campo com espinilho por Hasenack et al. (2010), possuindo duas manchas principais, uma desde São Borja até a cidade de Salto, e outra entre Paysandú e a porção noroeste do Departamento de Colonia, principalmente acompanhando o trecho final do rio Negro. Corresponde, em território argentino, à ecorregião do Pampa Espinhento, que bordeja a ecorregião do Pampa Úmido. (BURKART et. al., 1999). A principal característica geológica que permite a individualização dessas áreas é o substrato sedimentar, formado por depósitos continentais, aluviais e coluviais, acumulados desde o Paleógeno até o Quaternário (ou seja, nos últimos 35 milhões de anos) sobre as rochas vulcânicas da Formação Serra Geral, acompanhando as variações do nível do mar e seus reflexos sobre a mesopotâmia argentina e o estuário do Prata, incluindo grandes transgressões marinhas. As unidades estratigráficas às 297 quais se vinculam tais depósitos recebem, no Uruguai, designações como Formación Salto e Formación Fray Bentos (DINAMIGE, 1985), enquanto no Rio Grande do Sul há referências a designações como Formação Touro Passo e aloformação Guterres (DAROSA, 2009). Grande parte dessa ecorregião é caracterizada por solos orgânicos de alta fertilidade química (os chernossolos e argissolos), alguns ricos em carbonatos e sais, desenvolvidos exatamente sobre os depósitos quaternários aluviais do rio Uruguai e dos trechos finais de seus afluentes Butuí, Ibicuí, Quaraí/Cuareím, Arapey e Negro. Figura 02 – A – O pampa do espinilho – fisionomia de savana-parque, no Parque Estadual do Espinilho, no município de Barra do Quaraí, RS; B – matacões arredondados de granito em área campestre com pastejo de gado bovino, no município de Herval, RS.; C – Campos úmidos típicos da ecoprovíncia do Pampa Ondulado. Fonte: Trabalho de campo realizado em outubro de 2014. c) O Pampa Ondulado A ecoprovíncia de maior extensão dentro da área de estudo é aquela das planícies e colinas onduladas com campos diversos, ou “pampa ondulado” (Figura 2C), que compreende a Depressão Central (ou Periférica) do Rio Grande do Sul, a maior parte da fronteira oeste gaúcha e a Cuesta do Haedo, bem como os terrenos cristalinos do cráton Rio de La Plata, no Uruguai. Em linhas gerais, compreende as áreas mapeadas por Hasenack et al. (2010) como campo com flechilhas, campo de solos rasos e campo misto de andropogôneas e compostas. Optou-se, aqui, por não 298 subdividir essa grande área que, ainda que possua importantes heterogeneidades geológicas, guarda as características mais prontamente associadas ao Pampa pelo público em geral, pois se considera que as características de geomorfologia e fisionomia dependem muito menos do substrato geológico (geodiversidade) e muito mais de fatores ligados ao clima, à evolução das vertentes, à sucessão ecológica em si e à forma de ocupação humana. d) O Pampa das Mesetas A ecoprovíncia de cerros tabulares e areais com campos, ou “pampa das mesetas”, estende-se como uma grande faixa de orientação norte-sul, com cerca de 300 quilômetros de comprimento e até 50 quilômetros de largura (Figura 1), desde a cidade de Tacuarembó, no Uruguai, até Unistalda, próxima a Santiago, no Rio Grande do Sul. Essa região guarda pouca correlação com as subdivisões propostas por Hasenack et al. (2010), a não ser por sua porção mais ao norte, onde aqueles autores mapearam o campo com areais. O substrato rochoso dessa região é formado pelas diferentes camadas de rochas sedimentares avermelhadas do Permiano e do Mesozóico, da chamada Bacia do Paraná, referidas na literatura pelas designações estratigráficas Rosário do Sul, Pirambóia, Sanga do Cabral, Santa Maria, Guará e Botucatu, estando por vezes recobertas por finas camadas de basaltos. As rochas sedimentares citadas apresentam-se, de um modo geral, em camadas tabulares e horizontais, com características variáveis de porosidade, permeabilidade e capacidade de transmitir água. Além disso, algumas dessas rochas sedimentares são pouco litificadas e muito friáveis, tornando-se suscetíveis ao intemperismo físico e químico. Em termos de geomorfologia, o caráter tabular e horizontal das camadas levou à formação de cerros dominantemente em forma de mesa (ou cerros chatos, em castelhano), com desnível de até 200 metros e topos planos. As áreas da serra do Caverá, em Rosário do Sul, do Cerro Palomas, em Santana do Livramento (Figura 3A), e dos Tres Cerros de Cuñapirú, a NE da cidade de Tacuarembó, são emblemáticas desse caráter de “meseta”. Quando vistas em planta, tais elevações podem se apresentar com formatos desde circular até retilíneo, muito alongado ou recortado por fraturas, dependendo do controle tectônico. Ainda que a maior parte da região seja caracterizada por vegetação rasteira, as faces sul e sudoeste desses cerros tabulares, bem como os vales encaixados em fraturas, são ocupados por formações arbustivas e, em certos locais, até mesmo florestais, ilustrando a importância daquelas formas de relevo sobre a fisionomia. Uma característica importante desta ecoprovíncia é o predomínio de neossolos, quartzosos e muito rasos, pobres em nutrientes, em grande parte expostos à ação do 299 intemperismo físico (chuva e vento), formando as manchas de areia livre conhecidas como areais (Figura 3B). Durante o último máximo glacial, há cerca de 18 mil anos, supõe-se que tais areais tenham sido muito mais extensos (SUERTEGARAY e SILVA, 2009), constituindo hoje, juntamente com a presença marcante de cactáceas, um registro importante dos climas mais frios e secos do passado. Além dos areais, a região se destaca pela atuação de processos erosivos importantes, como ravinas e voçorocas, em função tanto do uso inadequado da terra quanto dos contrastes naturais de permeabilidade entre as diferentes camadas do solo e do subsolo. É particularmente interessante que a região seja cortada e sirva como área fonte da carga sedimentar do rio Ibicuí, palavra cujo significado em guarani remete ao “rio das areias finas”. e) O Pampa Serrano A ecoprovíncia de serras e cerros cristalinos com mosaicos de campo-floresta e formações arbustivas, ou “pampa serrano”, ocorre em duas áreas distintas: (1) uma na porção ocidental do Escudo Sul-rio-grandense, englobando os municípios de Caçapava do Sul, Lavras do Sul e Santana da Boa Vista, na região do Alto Camaquã; e (2) a segunda entre os departamentos de Rocha, Maldonado e Lavalleja, no leste/sudeste do Uruguai. Correspondem, aproximadamente, às áreas mapeadas por Hasenack et al. (2010) como Campo arbustivo. A mais importante característica física, compartilhada por ambas as áreas, é a elevada geodiversidade: rochas metamórficas, como xistos, quartzitos, filitos, anfibolitos e mármores, com muitas estruturas deformacionais, encontram-se intrudidas por corpos graníticos isolados (plútons como os de Caçapava, Lavras, Jaguari, Capané, Carapé e Aiguá) e recobertas por sucessões sedimentares antigas (como as Guaritas de Caçapava do Sul) e rochas vulcânicas de diversas composições e idades (BORBA et al., 2013; PRECIOZZI et al., 1993). Essa significativa geodiversidade, com rochas de resistência variável ao intemperismo químico e os soerguimentos ocorridos ao longo do Fanerozóico, levaram à formação de um relevo irregular, com cerros e serras de forte declividade (Figura 3C). Além disso, os solos desenvolvidos sobre essas rochas são muito diversificados, desde ausentes ou muito delgados, sobre granitos, quartzitos ou arenitos, até solos profundos e bem estruturados sobre as rochas vulcânicas ou metamórficas mais ricas em minerais ferromagnesianos. Por isso, nas Sierras de Rocha, nas Sierras de Minas ou nas serras que compõem a parte mais alta da bacia hidrográfica do rio Camaquã, é comum de se observarem, a poucos quilômetros de distância, cerros com grandes 300 matacões graníticos arredondados, vales fluviais de solo fértil, cristas de quartzito ou xisto, cerros vulcânicos com disjunções colunares, ou ainda formas de relevo ruiniformes (Figura 3D) produzidas sobre arenitos e conglomerados muito litificados. Essa geodiversidade também implica em uma diversidade florística e fisionômica maior, com gramíneas, leguminosas, arbustos, florestas de encosta e de galeria, além da ocorrência notável de cactáceas e bromeliáceas. Figura 3 – Destaques do pampa das mesetas: (A) o Cerro Palomas, em Santana do Livramento, RS; (B) areais no município de Alegrete, RS, com vegetação muito esparsa; (C) Feições destacadas do pampa serrano, as elevações da Sierra de Minas, no Departamento de Lavalleja, Uruguai, desenvolvidas sobre rochas metamórficas de composições diversas; (D) a Casa de Pedra, em Bagé, RS, composta por feições ruiniformes desenvolvidas sobre conglomerados muito litificados; Fonte: Trabalho de campo realizado em julho de 2014 (A, B, D) e janeiro de 2015 (C). Considerações Finais 301 Com este trabalho, além de alertar sobre a necessidade de novas estratégias de conservação da paisagem do pampa, objetivou-se demonstrar outras propostas de regionalização e articulação do ambiente gaucho. No anseio de diminuir o distanciamento entre sociedade e natureza, foi proposto um zoneamento territorial a partir da perspectiva da biorregião – que parte das características ecológicas mas que incorpora também as demais dimensões da sociedade humana; um aprofundamento na compreensão da complexidade desta biorregião, leva à delimitação de diferentes ecoregiões e, dentro destas, diferentes ecoprovíncias. Tais esforços, além de tentar desconstruir o imaginário de um pampa monótono e homogêneo, presente em diferentes discursos e concepções, buscam dar conta da complexidade deste território com elevada diversidade natural (bio e geodiversidade) que, articulado com a cultura da população local, resulta em paisagens singulares e ainda pouco estudadas e conservadas. Referências Bibliográficas Achkar, M., Domínguez, A. & Pesce, F. (2014). Cuencas hidrográficas del Uruguay: situación y perspectivas ambientales y territoriales. Montevideo: REDES AT – Uruguay Sustentable, 165p. Borba, A.W. 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Brasília: MMA. 304 DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO GÊNERO FRAILEA BRITTON & ROSE NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SANTA MARIA, RS. Anabela Silveira de Oliveira Deble1; Luis Eduardo de Souza Robaina2; Romário Trentin3 1 Pós-doutoranda do Programa de Pós-graduação em Geografia e Geociências LAGEOLAM/UFSM. Bióloga, Dra. Prof. Adjunta dos Cursos de Tecnologia em Gestão Ambiental e Ciências Biológicas da URCAMP. [email protected]; 2, 3 LAGEOLAM/UFSM - Universidade Federal de Santa Maria - Programa de Pósgraduação em Geografia/UFSM Instituto de Geociências/IG/UFSM - Prédio 43136 - Av. Roraima, 1000 - Bairro Camobi - Santa Maria,RS CEP 97105-900 RESUMO De importância ornamental, as fraileas são muito procuradas por horticultores e colecionadores de cactos, o que leva as populações do gênero a sua redução e posteriormente a quase extinção de algumas espécies. Este trabalho tem por finalidade fazer um levantamento, bem como investigar a distribuição geográfica do referido gênero na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria. Para o levantamento das populações de Frailea foram identificadas imagens de afloramentos rochosos através de geoprocessamento de imagens, Google Earth e da posição no local de estudo através de GPS. As áreas identificadas foram visitadas para confirmação de ocorrência das populações. A determinação das espécies foi baseada em descrições originais, análise dos tipos, bem como em fotografias digitais disponíveis na rede internacional de computadores (Internet) de holótipos de Herbários internacionais GDC (Conservatoire et Jardin Botaniques de la Ville de Genève), P (Muséum National d'Histoire Naturelle), K (Royal Botanic Gardens), NY (New York Botanic Garden), US (Smithsonian Institution), além de fotótipos do F (Field Museum), acessados através do Instituto Botánica Darwinion (SI – Buenos Aires) e consulta a estudos anteriores, herbários, cactários e especialistas da família. Durante o levantamento foram encontradas seis espécies do gênero entre as quais Frailea castanea, F. gracilima, F. lepida, F. mammifera, F.pygmea e Frailea sp1. Na Bacia Hidrográfica do rio Santa Maria as espécies do gênero Frailea foram encontradas em afloramentos areníticos e devido ao seu hábitat muitos espécimes estão vulneráveis a extinção em função de empreendimentos como barragens, pecuária, silvicultura e mineração entre outras ações antrópicas que se beneficiam de paisagens rupestres. Palavras chave: afloramentos rochosos, hábitat, região da Campanha, Cactaceae. ABSTRACT The genus Frailea is much sought after by gardeners and collectors of cacti, which leads your reduction and subsequently the near extinction of some species. This study aims to survey and investigate the geographic distribution of that genus in River Basin Santa Maria. To survey the populations of Frailea were identified outcrops using images, Google Earth and GPS position at the study site. The identified areas were visited for the populations occurring confirmation. The determination of the species was based on original descriptions, analysis of the types, as well as digital photos in the international computer network (Internet) of holotypes international Herbaria G-DC (Conservatoire et Jardin Botaniques de la Ville de Genève), P ( Muséum National d'Histoire Naturelle), Royal Botanic Gardens (K), New York Botanic Garden (NY), Smithsonian Institution (US), and phototypes of the Field Museum (F), accessed through the Botany Darwinion Institute (SI - Buenos Aires ) and refers to previous studies, herbarium, cactarios and specialists. During the survey found six species of the genus including Frailea castanea, F. gracilima, F. lepida, F. mammifera, F.pygmea and Frailea sp1. In Basin River Santa Maria the Fraileas were found in sandstone 305 outcrops and due to their habitat many species are vulnerable to extinction due to new developments like dams, livestock, forestry and mining and other human activities that benefit from rocky landscapes. Key words: sandstone outcrops , habitat , Campanha region , Cactaceae. 1. INTRODUÇÃO As fraileas são de extrema raridade e muito difíceis de serem encontradas, pois seu hábitat é extremamente hostil vivendo entre rochas, por vezes, em afloramentos rochosos nas nascentes associadas a morrotes e canhadas63. Estas plantas também são extremamente variáveis em relação à cor, tamanho, disposição e quantidade de espinhos. Neotropical, o gênero Frailea foi descrito por Britton & Rose em 1922 para abrigar espécies diminutas de cactos que anteriormente haviam sido descritos para o gênero Echinocactus. Atualmente, o gênero é reconhecido para flora brasileira com cerca de 12 espécies (OLIVEIRA-DEBLE, 2011), encontradas em locais com afloramentos rochosos úmidos, em áreas abertas (campos) no sul do Brasil, Paraguai, Uruguai, sudeste da Bolívia e nordeste da Argentina. O centro de diversidade do gênero no Brasil é o Rio Grande do Sul onde há muitas espécies endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção devido à destruição do seu habitat natural (MACHADO, 2007). Embora frequentes no espaço regional, são muito escassos levantamentos, estudos taxonômicos, ecológicos e fitogeográficos sobre a família Cactaceae no Rio Grande do Sul, mais especialmente o gênero Frailea, a maioria dos trabalhos estão relacionados a gêneros e espécies epífitas e terrestres para o norte e centro do território sul riograndense, os trabalhos florísticos de Brack et al. (1985), Waechter (1986), Dislich & Mantovani (1998), Taylor & Zappi (1991); Bruxel, J. & Jasper, A. (2005), Machado (2007), Pontes et al. (2014) apresentam espécies epífitas e terrestres de Cactaceae, mas apenas os dois últimos se referem às espécies rupestres encontradas em afloramentos rochosos e paredões. As Cactáceas podem ser encontradas associadas a formações florestais (espécies epífitas), campos nativos e rupestres e afloramentos rochosos (espécies terrestres ou rupestres), mas é principalmente na vegetação rupestre associada aos campos de vegetação de savana que se encontram muitas cactáceas endêmicas do Rio Grande do Sul (BOLDRINI, 2009). Das oitenta espécies estimadas para o Estado setenta e três constam na Lista de Espécies da Flora Ameaçadas de Extinção do Rio 63 Planície estreita entre montanhas. 306 Grande do Sul (2002). Oliveira-Deble (2011) reconheceu 42 espécies e 8 gêneros para o Bioma Pampa, com principal centro de ocorrência e diversidade nos afloramentos rochosos da serra do sudeste e campos rupestres da campanha, tendo sido citados pela primeira vez para o Brasil duas espécies: Gymnocalycium schroederianum e Monvillea sp. Observadas em campo Cereus hildmanianus (tuna), Opuntia monacantha (opúntia) e Notocactus ottonis (tuna) são espécies terrestres comuns na paisagem do Bioma Pampa, enquanto que os gêneros mais raros ou endêmicos (Echinopsis, Frailea, Gymnocalycium, Notocactus e Wigginsia) possuem populações reduzidas, normalmente em afloramentos rochosos, notadamente na Serra do Sudeste, Depressão Central e Campanha. Jacinto & Oliveira Deble (2012) através de levantamento de Cactáceas para o Cerro do Graxaim em Dom Pedrito, reconheceram 10 espécies pertencentes a 7 gêneros, distribuídos em 4 tribos, sendo 3 da subfamília Cactoideae (Cereae, Notocacteae, Trichocereeae) e 1 da subfamília Opuntioideae, registrando para o local Frailea mammifera citada na literatura (MACHADO,2007) como endêmica na região, tendo sido encontrados apenas dois indivíduos, comprovando a raridade da espécie no local estudado. A Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria localiza-se, entre as coordenadas 29°47' e 31°36' de latitude Sul e 54°00' e 55º32' de longitude Oeste, seus principais formadores são o rio Santa Maria-Chico, o arroio Taquarembó, arroio Santo Antônio, o rio Cacequi, o arroio Ponche Verde, o rio Ibicuí da Armada e o arroio Saicã. Entre as atividades econômicas da Bacia estão a orizicultura moderna juntamente com à pecuária extensiva tradicional e a extração de areia. Parte da Bacia hidrográfica do Rio Santa Maria encontra-se infestada por capim annoni (Eragrostis plana Ness.), principalmente em campos antropizados devido às lavouras de arroz, soja, milho, trigo e introdução de espécies exóticas para silvicultura. Do ponto de vista ambiental, são extremamente escassos os inventários sobre a flora e a fauna na região e principalmente sobre a família das Cactáceas que frequentemente habitam os afloramentos rochosos existentes nas nascentes do rio Santa Maria, bem como em áreas esparsas aos arredores. A região tem relevo levemente ondulado, representado por colinas (regionalmente conhecidas por coxilhas), que se caracterizam como formas de relevo com amplitudes ao redor de 40m e declividade das encostas entre 5 e 10%. As espécies estudadas ocorrem em elevações isoladas, associadas ao relevo de colinas, com amplitudes variando de 40 a 140m e declividades das encostas de 30% ou mais, 307 constituindo formas classificadas como Morrotes quando a amplitude é inferior a 100m e Morros quando superior. Há um predomínio na paisagem de vegetação herbácea, todavia a flora original está afetada pela agricultura, presente em quase toda a extensão campestre. Os campos naturais, em geral, estão restritos a pequenas faixas de transição entre o banhado e as coxilhas. A floresta de galeria pode atingir dimensões consideráveis, de um lado a outro do rio Santa Maria e Ibicuí da Armada, assumindo, por vezes, caráter aluvial. 2. METODOLOGIA Para o levantamento das populações de Frailea na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria, foram identificadas imagens de afloramentos rochosos através de geoprocessamento de imagens, Google Earth e de posicionamento através de equipamento GPS. As áreas identificadas foram visitadas para confirmação de informação e escolha dos locais para os levantamentos. A determinação das espécies foi baseada em descrições originais, análise dos tipos, bem como em fotografias digitais disponíveis na rede internacional de computadores (Internet) de holótipos de Herbários internacionais G-DC (Conservatoire et Jardin Botaniques de la Ville de Genève), P (Muséum National d'Histoire Naturelle), Royal Botanic Gardens (K), New York Botanic Garden (NY), Smithsonian Institution (US), além de fotótipos do Field Museum (F), acessados através do Instituto Botánica Darwinion (SI – Buenos Aires) e consulta a estudos anteriores (Briton & Rose, 1942, Scheinvar, 1985; Barthlott e Taylor, 1993; Hunt 1999; Kiesling, 2005), herbários, cactários e especialistas da família. A consulta ao material bibliográfico foi feita nas seguintes instituições: Instituto de Botánica Darwinion (SI), Instituto de Biociências (UFRGS), Instituto Anchietano (UNISINOS), Museu Nacional (UFRJ), Jardim Botânico do Rio de Janeiro (R), Herbário Barbosa Rodrigues (HBR) e Biblioteca da Universidade Federal do Paraná (UFPR), além de intercâmbio com bibliotecas internacionais. Para levantamento das espécies foram realizadas excursões de coleta em diferentes áreas da Bacia na época de floração e frutificação entre os anos de 2013/2015, as espécies foram fotografadas com câmara Sony 21 mega pixel e georreferenciadas com aparelho GPS/Etrex garmin. O mapa foi confeccionado através da espacialização dos pontos de coletas de campo utilizando o software SIG ArcGIS 10.1, utilizando como bases cartográficas as malhas digitais do IBGE (2010). 3. RESULTADOS E DISCUSSÕES 308 Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria, foram encontradas seis espécies ocorrendo em fendas dos afloramentos areníticos na região, com exceção de Frailea mammifera. Este grupo de plantas também é citado por Machado (2007) para solos areníticos no território sul riograndense. A seguir estão disponíveis a descrição, distribuição geográfica, hábitat e status de conservação das fraileas encontradas na área de estudo. 3.1 Descrição do gênero Frailea Briton & Rose Plantas geralmente diminutas, por vezes de hábito solitário, globosas a cilíndricas. Costelas pouco desenvolvidas e espinhos muito pequenos retos ou curvos, aureoladas. Flores cleistógamas ou casmógamas, bastante efêmeras, amarelas ou amarelo-creme, brácteas florais com densa lanosidade e muitas cerdas. Frutos secos, com muitas sementes com até 1,5 cm de comprimento. 3.1.1 Frailea castanea Backeberg (fig. 1 a, b) Planta de hábito herbáceo semi-enterrado com corpo globoso, tuberculado de 4 cm de altura e 3-4 cm de diâmetro; apresenta costelas proeminentes e auréolas de espinhos marrom escuros ou pretos muito curtos. Flores amarelo creme, de 4 cm de comprimento, as nervuras são bastante variáveis entre as populações, bem como a forma das flores e geralmente são de cor castanho-avermelhada ou verde dependendo da intensidade da luz que recebem (MACHADO, 2007). A espécie cresce em áreas de solo raso em fendas de afloramentos rochosos de arenito e pode ser encontrada convivendo em simpatría com Frailea phaeodisca. Distribuição Geográfica: No sul do Brasil e norte do Uruguai. Na Bacia Hidrográfica do rio Santa Maria, ocorre na região da Serra do Caverá, entre Rosário do Sul e Santana do Livramento, preferencialmente associada a córregos com afloramentos de arenito, sua ocorrência também é registrada para a região sudoeste do estado, em Quaraí na região do Passo da Guarda, associada a afloramentos nas nascentes dos rios e no Palmar do Coatepe, bem como afloramentos areníticos na região de Alegrete. Status de Conservação: Criticamente ameaçada (CR) 3.1.2 Frailea gracilima (Lemaire) Britton & Rose (fig. 1 c, d) Planta de hábito herbáceo, de corpo cilíndrico verde-acinzentado, com costelas tuberculadas de até 10 cm de altura e 2,5 de diâmetro, com um ou dois espinhos centrais de cor escura e espinhos radiais brancos. As flores são amarelo-creme, com tépalas agudas de 3 cm de comprimento. Os frutos esverdeados são de 6 mm de 309 diâmetro. A espécie é bem variável, originando populações com diferenças. Cresce em solos de arenito, sob arbustos e gramíneas no meio, ou em solo associado a Polytrichum commune (musgo) e outras plantas herbáceas formando comunidades vegetais nos afloramentos rochosos. Há inúmeras variações nas populações de F. gracilima, muitas plantas têm espinhos centrais em linha reta, enquanto outros podem ter espinhos curvados. As diferenças entre as subespécies descritas para F. gracilima, não apresentam caracteres definitivos para separação das mesmas, a espécies apresentam variações ao longo da área de ocorrência, podendo esta variação estar associada a fatores físicos, como intensidade da luz, solo e clima entre outros (MACHADO, 2007). Distribuição Geográfica: Paraguai, Uruguai e no Brasil. Ocorre no estado do Rio Grande do Sul, em afloramentos rochosos na no Escudo sul riograndense (Bagé, Caçapava do Sul, Canguçu, Encruzilhada do Sul, Piratini, Pinheiro Machado e Santana da Boa Vista). Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria é bastante comum desde Bagé até Santana do Livramento em afloramentos areníticos, juntamente com outras espécies herbáceas. Status de Conservação: Em Perigo (EN). 3.1.3 Frailea lepida Buining & Brederoo (fig. 1 e, f) Planta de hábito herbáceo de corpo cilíndrico verde-acinzentado, com costelas tuberculadas de até 5 cm de altura e 1-1,5 de diâmetro, espinhos radiais brancos. Flores infundibiliformes, infundibuliformes 1,9 cm de comprimento e 2,2 de diâmetro, amarelas. Frutos esverdeados de 6 mm de diâmetro com sementes de 2,2 -2,4 mm de comprimento, 1,5-1,7 mm de largura. Na bacia do rio Santa Maria foi encontrada no município de Dom Pedrito no extremo SE da bacia sobre afloramentos rochosos. As duas populações encontradas estavam sobre Polytrichum commune (musgo) a pleno sol. Distribuição Geográfica: Brasil. A espécie atualmente figura como sinonímia de F. gracilima, porém neste trabalho decidiu-se por manter como espécie pelas diferenças marcantes relacionadas ao hábito, tamanho e diferenças nos espinhos. Status de Conservação: Criticamente ameaçada (CR) 310 a b c d e f Figura 1: a) População de Frailea castanea em solo arenítico evidenciando o hábito semi-enterrado em meio a musgos e outras plantas herbáceas; b) Frailea castanea, destacando o hábito solitário em rochas areníticas; c) Flor amarelo-creme de Frailea gracilima; d) Frailea gracilima subs. albifusca junto a Polytrichum commune. e) Frailea lepida frutificada em afloramento arenítico; f) População de Frailea lepida em Polytrichum commune (musgos) a pleno sol, próximo a BR 293. 3.1.4 Frailea mammifera Buining & Brederoo (fig. 2 a, b) Planta de hábito herbáceo, geralmente solitária de tamanho diminuto, apresentando forma globosa, brevemente colunar, verde escura até púrpura de até 3 cm de altura e 1-2,5 cm de diâmetro. Possui flores infundibuliformes, maiores do que a própria planta, de cor amarelo de 2,5 cm de comprimento; tépalas acuminadas, longas e delgadas, com estigma com 5-7 lobos. De fruto seco de até 8 mm de diâmetro. Espécie restrita as nascentes do Rio Santa Maria, crescendo em solo raso com outras 311 espécies herbáceas nas fendas dos afloramentos rochosos areníticos próximos ao arroio Taquarembó. Distribuição Geográfica: Brasil, no Rio Grande do Sul, ao norte de Dom Pedrito. Na Argentina cresce uma entidade infraespecífica distinta (ssp. angelesiae R. Kiesling & Metzing). Status de Conservação: Criticamente ameaçada (CR). a c e b d f Figura 2: a) População de Frailea mammifera frutificada, juntamente com outras espécies herbáceas; b) Frailea mammifera em afloramento arenítico demonstrando hábito solitário; c) População de Frailea pygmea, juntamente com herbáceas; d) Afloramento granítico, área de ocorrência de Frailea pygmea; e) Frailea sp1, com hábito solitário em afloramento arenítico; f) População de Frailea sp1 em afloramento arenítico. 3.1.5 Frailea pygmea (Spegazzini) Britton & Rose (fig. 2 c, d) Plantas herbáceas, por vezes solitárias, de tamanho variável, globosas a cilíndricas de até 7 cm de altura e 3 cm de diâmetro, sempre verdes. De flores 312 amarelas, de 2-2,5 de comprimento e tépalas acuminadas. Frutos geralmente com 1,5 cm de largura. A espécie é frequente em fendas de afloramentos rochosos areníticos, ou esporadicamente em solos rasos vivendo em simpatria com outras espécies herbáceas, além de algumas populações de Wigginsia sellowii. Distribuição Geográfica: sul do Brasil, argentina e Uruguai. Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria, foram encontradas algumas variações nas populações, havendo espécies de espinhos brancos e também de espinhos amarelos. Ocorre na porção S e SE da Bacia nos municípios de Dom Pedrito (Torquato Severo), Lavras do Sul e sul de São Gabriel até Santana do Livramento em afloramentos rochosos. Status de Conservação: Em perigo (EN). 3.1.6 Frailea sp1. (fig. 2 e, f) Planta herbácea, diminuta, globosa de até 1-2 cm de altura e 1,5 cm de diâmetro, geralmente verde com espinhos avermelhados. Encontrada em cerros de arenito entre fendas de rochas, juntamente com herbáceas de pequeno porte. Não foram encontradas flores e frutos. Distribuição: Brasil no Rio Grande do Sul. Ocorre no limite W da bacia hidrográfica do Rio Santa Maria em fendas de serros areníticos na Serra do Caverá. Status de Conservação: Dados insuficientes (DI) Distribuição geográfica do gênero Frailea Britton & Rose e sua relação com os aspectos geomorfológicos na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria Geomorfologicamente a BHRSM encontra-se inserida nas unidades geomorfológicas da Depressão Periférica do Rio Grande do Sul, do Planalto da Serra Geral e, ainda, uma pequena parte, a sudeste, do Escudo Sul-riograndense (ROBAINA et al. 2010). As áreas planas são caracterizadas por declividades inferiores a 2% e estão dominantemente associadas a planície de inundação do rio Santa Maria, na unidade geomorfológica da Depressão Periférica. As colinas são as formas predominantes na área de estudo e caracterizam-se por amplitudes entre 20 e 60m e por declividades variando de 2% inferiores a 15%. Ocorrem associadas as rochas sedimentares da Depressão periférica, rochas cristalinas do Escudo, a sudeste, e no extremo sul da bacia, com rochas vulcânicas do Planalto. 313 Os morros e morrotes são formas caracterizadas por declividades das encostas superiores a 15%, sendo diferenciados por amplitudes superiores a 100m nas formas de morros e inferiores nos morrotes. Ocorrem de forma isolada, marcando o recuo da escarpa do Planalto e formando um alinhamento estrutural denominado “Serra do Caverá” que marca os divisores da bacia do rio Santa Maria a oeste. O substrato litológico que forma a BHRSM está representado, principalmente, por rochas do Maciço cristalino e por sequências de rochas sedimentares e vulcânicas da Bacia do Paraná, além de rochas e sedimentos recentes. As rochas do Maciço cristalino, em uma pequena porção, a SE da bacia e são representadas por granitos, gnaisses e, com menor representação, xistos e vulcânicas ácidas. As primeiras unidades sedimentares da Bacia do Paraná, aflorantes na BHRSM, estão depositadas sobre e na borda do Escudo Sul Rio-grandense. Em direção a oeste passa para lamitos marinhos, com intercalações carbonáticas, formando uma faixa N-S de exposição, na região SE da bacia. Estes afloramentos dão lugar, a uma sequência litológica, representado por arenitos e lamitos, distribuída ao longo de faixas laterais caracterizados por Lavina (1988) como continentais. O avanço de depósitos continentais é marcado por uma espessa sucessão flúvio-eólica que corresponde à Formação Sanga do Cabral (Lavina,1988), que está muito bem representada e, apesar de ocorrer intercalações, podem ser separadas em duas porções: uma primeira, localizada mais a leste, com predominância de arenitos eólicos; e uma segunda de arenitos com características fluviais que predominam para oeste e norte da bacia, e que se caracterizam pela presença comum de micas. As rochas vulcânicas ocorrem aflorando na porção mais a sul e oeste da BHRSM com variações de estrutura, textura e químicas. Os depósitos recentes estão representados por depósitos fluviais de canal e planície de inundação. Considerando a distribuição geográfica das espécies em estudo (Figura 3 – Mapa da distribuição geográfica das espécies), nota-se que as mesmas foram encontradas a sudeste e oeste da Bacia, notadamente Frailea mammifera ocorre em rochas vulcânicas, demonstrando certo endemismo, enquanto que Frailea gracilima e Frailea pygmea tem ocorrência em rochas vulcânicas e sedimentares. Frailea lepida, F. castanea e F. sp1, tem ocorrência restrita a afloramentos areníticos na BHRSM. CONSIDERAÇÕES FINAIS 314 Foram reconhecidas seis espécies do gênero Frailea Britton & Rose na Bacia Hidrográfica do rio Santa Maria. Entre as espécies mais comuns estão F. gracilima e F. pygmea, que possuem distribuição geográfica ampla habitando afloramentos areníticos desde a Serra do Sudeste até a região da Campanha e Sudoeste do Rio Grande do Sul. Na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria as espécies de distribuição restrita são F. lepida e F. mammifera que possuem populações localizadas nos somente nos afloramentos rochosos dentro da região de estudo, o que comprova a necessidade de conservação das áreas de ocorrência dessas duas espécies. F. castanea tem distribuição geográfica mais a sudoeste do estado, tendo sido encontrada somente no limite da Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria e Frailea sp1. foi registrada apenas uma população habitando afloramentos areníticos próximo ao limite da área de estudo. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a Rodrigo Pontes e Leonardo Paz Deble pela colaboração na identificação das espécies e pela companhia nas excursões de campo. 315 Figura 3: Mapa da distribuição geográfica do gênero Frailea na Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria. 316 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, E. F. The cactus family. Timber Press, Portland, Oregon, 2001. BRACK, P.; BUENO, R. M.; FALKENBER, D. B.; PAIVA, M. R. C.; SOBRAL, M.; STEHMANN, J. R. 1985. Levantamento florístico do Parque Estadual do Turvo, Tenente Portela, RS, Brasil. Rossleria 7 (1): 69-94. BRITTON, N. L., ROSE, J. N. The Cactaceae. v. I, II, III, IV. Washington. The Carnegie Institution, 1920. BRUXEL, J.; JASPER, A. 2005. A família Cactaceae na Bacia Hidrográfica do rio Taquari, RS, Brasil. Acta Bot. Bras. 19 (1): 71-79. DISLICH & MANTOVANI (1998),FILGUEIRAS, T. S.; BROCHADO, A. L.; NOGUEIRA, P. E.; GUALA II, G. F. Caminhamento um método expedito para levantamentos florísticos qualitativos. 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Departamento Multidisciplinar- UFSM, [email protected] Elisangela Lopes, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia – UFSM, [email protected] MarilimMazui, Acadêmica do C.S de Tecnologia em Gestão Ambiental- UFSM, [email protected] RESUMO- Os corredores ecológicos são concebidos como forma de conectar áreas protegidas, possibilitando a conectividade da paisagem e facilitando o fluxo genéticos entre as populações por meio de alternativas para o desenvolvimento de práticas de pouco impacto nas áreas de interstícios. Este trabalho tem por objetivo planejar e delimitar um sistema de trilhas na região do Corredor Ecológico da Quarta Colônia, RS, utilizando estruturas facilitadoras para o uso público em atividades de recreação e interpretação da natureza. O trabalho consistiu no reconhecimento das condições atuais dos percursos existentes no local e definição de ações necessárias para adequação ou recuperação do trajeto para a trilha. Para tal, foram realizadas vistorias de campo, obtenção de coordenadas geográficas com GPS, pesquisa bibliográfica, consulta e manuseio de base de dados georreferenciada. Como resultados verificouse a necessidade de implantar os seguintes segmentos de segurança e conforto: sinalização e orientação, elementos facilitadores, valas de drenagem e travessias e passadiços elevados.Concluiu-se que itens de segurança e conforto associados a uma padronização de equipamentos e placas informativas cumprem a função de suporte para envolver e melhorar a relação da população com os recursos naturais da região por meio da realização de atividades em trilhas ecológicas. PALAVRAS-CHAVE: uso público, conservação de áreas naturais, beleza cênica. INTRODUÇÃO A perda da biodiversidade causada pelas atividades humanas nos ecossistemastorna urgente a aplicação de estratégias e formas de manejo sustentáveis das áreas naturais. Neste sentido, o Estado do Rio Grande do Sul é uma região de transição entre biomas e zonas biogeográficas apresentando paisagens e ecossistemas diversificados para uma área relativamente pequena, abrigando animais e vegetais com diferentes centros de origem, além de um número considerável de espécies vegetais e animais endêmicos. Contudo, estas distintas características ambientais estão sofrendo graves impactos ambientais resultantes do manejo inadequado e de fatores geológicos e climáticos relacionados aos movimentos naturais de massa do rebordo do planalto da Serra Geral. Desta forma, é de extrema importância formular estratégias e ações de conservação desta natureza no sentido de garantir a riqueza das espécies e de seus ecossistemas para com isto reduzir as ameaças existentes sobre a biodiversidade gaúcha. A incorporação da proteção e 321 conservação da biodiversidade junto aos principais setores produtivos do meio rural, por meio de ações extensionistas e fomentos de métodos sustentáveis no uso e manejo da biodiversidade nativa, são práticas usadas para o desenvolvimento das comunidades. No ano de 2012 foi implementado pela EMATER no Rio Grande do Sul, o projeto RS-Biodiversidade, o qual visa promover a conservação e recuperação da biodiversidade, mediante o gerenciamento integrado dos ecossistemas e a criação de oportunidades para o uso sustentável dos recursos naturais, com vista ao desenvolvimento regional. Foram selecionadas quatro áreas de importante relevância biológica no Estado (Figura 1), nas quais serão estabelecidos corredores de conservação, bem como identificação e recomendações de proteção a algumas áreas, e a promoção de ações práticas que visem à recuperação e conservação da biodiversidade. Figura 1. Áreas de atuação do Projeto RS-Biodiversidade. Fonte: Projeto RS Biodiversidade 2012. Uma das estratégias de conservação que o projeto RS-Biodiversidade vem implementandona região da Quarta Colônia é a promoção de ações de educação ambiental, onde se inclui o tema: corredores ecológicos e suas interações positivas com a conservação da biodiversidade e salvaguarda do patrimônio cultural. Dentre as ações desenvolvidas, atividades de educação e lazer, em ambientes com relevante potencial paisagístico e grande biodiversidade, estão se tornando importantes ferramentas para conservação e preservação desses espaços (JESUS; RIBEIRO, 2006). Neste sentido, as trilhas interpretativas são consideradas estratégias 322 de conscientizaçãoambiental visando à conservação das características naturais do local. As trilhas são caminhos que podem ser percorridos ao ar livre. Para a criação dessas trilhas temos que levar em conta a segurança e o conforto necessários para que os visitantes percorram estas, juntamente com as características físicas e bióticas para que as trilhas sejam traçadas sem prejudicar o meio ambiente. O planejamento de uma trilha depende da identificação de um ambiente capaz de despertar o interesse em relação ao ambiente natural, observando componentes debeleza cênica,tais como árvores frondosas, formações rochosas, seres de sucessão ecológica, fauna, nidificações e corpos d’água, ou seja, aspectos biofísicos bem como os aspectos sociais. A implantação das trilhas pode contribuir para um melhor relacionamento da população local com os recursos naturais de sua região, tomando conhecimento de sua importância por meio de programas de educação ambiental (CARREIRO et al, 2009). Por outro lado,ao ser considerado como parte integrante do ambiente natural,o indivíduo pode,com maior facilidade, refletir sobre suas responsabilidades no quesitopreservação,eentão buscarmudanças deatitudes em seu cotidiano. Contudo, para que ocorram essas modificações no indivíduo, é necessário que o local apresentealguns atributos para que os visitantes vivenciem diversos tipos de experiências que os sensibilizem no sentido de sua integração com a natureza. Assim, a presença de uma infraestrutura que proporcione segurança e conforto que permitam a observação e contemplação da paisagem é de grande valia nesse processo de sensibilização. Além da adequação das trilhas, um bom planejamento é fundamental para o sucesso das atividades de educação ambiental em locais com essa vocação. Neste contexto, a propriedade Raddatz, localizada no município de Agudo, apresenta sua área inserida no Corredor Ecológico da Quarta Colônia, sendoreconhecida pela comunidade do entorno e região como um dos principais atrativos turístico de áreas naturais com a presença de uma cachoeira com queda d'água com 32 metros em meio à mata nativa. Assim, em virtude do interesse de seus proprietários em tornar o local uma ferramenta para conservação do ambiente natural e oferecer aos visitantes um programa de uso público adequado, o presente projeto propõe o planejamento e a delimitação de trilhas interpretativas, as quais possibilitem os visitantes conhecer o ecossistemao qual a queda d’água está inserida, tornando a visita um instrumento pedagógico, o qual propicia o contato mais próximo entre o homem e a natureza. 323 OBJETIVO Este trabalho tem por objetivo planejar e delimitar um sistema de trilhas utilizando estruturas facilitadoras para o uso público em atividades de recreação e interpretação da natureza. METODOLOGIA Caracterização da área do estudo A região central do Rio Grande do Sul está localizada entre a Encosta da Serra Geral e a Depressão Central, inserida em parte da Área Núcleo da Mata Atlântica no estado, interconectando remanescentes florestais da região da Floresta Ombrófila Mista, Floresta Estacional Decidual e florestas de origem Atlântica. Esta composição contempla uma das regiões Prioritárias Para Conservação, Uso e Repartição de Benefícios da Biodiversidade Brasileira, do Ministério do Meio Ambiente (MMA 2007). A Quarta Colônia Italiana (figura 2) localizada no centro do Estado do Rio Grande do Sul, faz parte da junção de três regiões geomorfológicas: Depressão Periférica (denominada como Depressão Central), Serra Geral e Borda Meridional do Planalto das Araucárias com altitudes que variam entre 50 e 450 m, apresentando relevo muito variável correspondente à interface entre a Serra e a Depressão. Figura 2: Área da Quarta Colônia 324 Fonte: Projeto RS-Biodiversidade 2012. Em virtude de suas características geomorfologicas e contendo uma grande biodiversidade, a região da Quarta Colônia de imigração italianacompõe uma das áreas prioritárias no projeto RS Biodiversidade do estado do Rio Grande do Sul, realizado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA) em parceria com a EMATER. Este trabalho é produto do programa “Estratégias de conservação na região do Corredor Ecológico da Quarta Colônia” cuja solicitação à UFSM foi realizada por intermédio da EMATER/RS da cidade de Agudo, buscando consolidar ações de conservação na região do corredor por meio da implantação de um sistema de trilhas ecológicas, tendo como área demonstrativa neste contexto à propriedade Raddatz, inserida no Corredor Ecológico (Figura 3). Esta propriedade servirá de modelo para um desenvolvimento territorial sustentável, contribuindo para a consolidação da conservação da biodiversidade bem como o uso fruto da mesma, sem causar grandes impactos e tendo um manejo adequado. Figura 3: Corredor Ecológico da Quarta Colônia. Fonte: Projeto RS Biodiversidade 2012. 325 A propriedade Raddatzestá localizada na Linha Nova, interior do Município de Agudo, RS, distante aproximadamente 10 Km da área urbana, na direção leste, coordenadas aproximadas de latitude 29º37’37 S e longitude 53º14’41 O, lote 10 (ColôniaSanto Ângelo).Apropriedadeé de 35 hectares, onde a agricultura é baseada na plantação de fumo e dispõe de um representativo remanescente de Floresta Estacional Decidual conservado.Junto à área de floresta,uma cachoeira com queda d'água de 32 metros é um dos pontos atrativos para visita, bem como uma benfeitoria que funciona como centro de visitantes e base de apoio para área de camping. O clima segundo a classificação de Köppen é Subtropical, pertencente à variedade específica “Cfa”, assim definida por apresentar temperatura média do mês mais frio entre -3º e 18ºC (de junho a agosto) e, do mês mais quente, superior a 22ºC (em janeiro) (NIMER, 1990). Os solos da região são predominantemente pouco desenvolvidos, rasos, apresentando o horizonte pouco espesso, sendo que estão diretamente assentados sobre a rocha e contêm material de rocha em decomposição (PEDRON; DALMOLIN, 2011). De acordo com o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos, o solo da região é classificado como NeossoloLitólico (EMBRAPA, 2006). MATERIAL E MÉTODOS A idealização de atividades e estudos que objetivem alcançar uma situação adequada no percurso datrilha que leva a cascata deve ser entendida por meio de frentes de ação relacionadas à intervenção física e oferta de infra-estrutura, equipamentos de apoio e sinalização. O trabalhoconsistiu no reconhecimento das condições atuais dos percursos existentes no local e definição de ações necessárias para adequação ou recuperação do trajeto para a trilha. Para tal, foram realizadas vistorias de campo, obtenção de coordenadas geográficas com GPS, pesquisa bibliográfica, consulta e manuseio de base de dados georreferenciada, pesquisa e análise de materiais construtivos confeccionados com madeira da retirada de espécies exóticas invasoras e rochas e seixos em abundância no local.Posteriormente, realizou-se a investigação das condições de solo e topografia do terreno para definir o traçado da trilha. Os percursos e seus elementos constituintes foram organizados em fichas, caracterizados por segmentos e pontos de controle. Os segmentos foram estabelecidos em função da identificação de características relativamente uniformes de paisagem, desenho e estrutura do leito da trilha. Os pontos de controle constituem 326 os locais onde se encontra infra-estrutura instalada e os pontos de atrativos identificados em campo. Cada segmento ou ponto de controle foi observado por meio de indicadores de segurança, conforto, manutenção e uso. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na etapa de realização do desenho de implantação das trilhas, foi definido o piso, isto é, a superfície da trilha sobre a qual os visitantes transitam a qual deverá apresentar a largura de 1,2-1,5 metros, se mantendo natural, salvo trechos de alta declividade os quais necessitem da construção de degraus, sendo estes estruturados de madeira e rochas. Bem como a linha central da trilha deverá apresentar 2,0-3,0 metros de altura, onde esta área deve ser livre de vegetação. A declividade de drenagem deverá ser desenvolvida de modo quepossibilitea drenagem natural, variando de 5 a 10%. Adicionalmente a essas recomendações, verificou-se a necessidade de considerar os seguintes parâmetros a serem implantados no sistema da trilha: a) Sinalização e orientação: É necessária a indicação da trilha, as distâncias até os vários destinos, bem como as regras e regulamentos pertinentes ao local; b) Facilitadores:equipamentos de apoio para garantir segurança e conforto dos visitantes, caracterizados pela estrutura de escadas marinheiro, cabo guia e guarda corpo em escada de pedra; c) Limpeza do local da trilha: pequenas árvores, galhos e outros deverão ser retirados para o corredor da trilha, para que aja um melhor fluxo de visitantes no local, diminuindo assim o impacto possível na vegetação; d) Chanframento de encosta: trata-se do corte de encosta para aumentar a largura do piso da trilha; e) Valas de drenagem: técnica efetiva para o manejo da água, no sentido de mantê-la fora da trilha, evitando a erosão; f) Travessias de água: utilizados em áreasonde a trilha corta olhos d'água, nascentes ou pequenos rios; g) Escadas e passarelas: é indicado para sua construção materiais como pedras e madeira, os quais estejam presentes na área em abundância; h) Passadiços e pisos elevados: são leitos de trilhas elevados pormadeira serrada, toras, pedra, argila ou outro material de preenchimento. São eficientes em áreas baixas ou úmidas. Via de regra, relacionado ao item de sinalização e orientação, definiu-se a fixação de placas de orientação em trechos de bifurcação, indicando a trilha correta a 327 seguir, bem como placas informativas contendo o nome das espécies da flora de relevância pela raridade, porte, beleza e interações com a fauna daquele ecossistema. O material utilizado para confecção das placas será da madeira das espécies arbóreas exóticas presentes no local como Psidiumguajava (goiabeira) e Hoveniadulcis(uva-do-japão), uma vez que estas espécies devem ser retiradas do sistema devido as consequências negativas acarretadas pelas mesmas em função da modificação da composição florística original em virtude de sua monodominância. Da mesma forma, sobre o ítem de faciltitadores, será utilizada a madeira destas espécies para fabricação de barrotes para construção de escadarias em trechos íngremes ou mesmos apoio para os degraus. Em alguns trechos, onde a trilha acompanha um córrego, será realizada a instalação de cabos guia, proporcionando ao visitante o conforto de uso.Adicionalmente,a avaliação das condições de manutenção foi determinada em função das situações relacionadas a necessidade de poda de vegetação, limpeza e retirada de galhos e troncos caídos no leito da trilha, os pontos averiguados perfazem 25 situações. De forma geral, em todo o trajeto observou-se a necessidade de trabalhos de manutenção e limpeza. Essa situação merece destaque, pois muitos dos problemas relacionados às condições de uso e necessidade de intervenções estruturais podem ser atribuídos à falta de um programa de manutenção continuado. Com relação ao item de chanframento, em torno de cinco pontos é necessária a realização desta atividade, devido à necessidade de aumentar a largura do leito da trilha, trazendo maior segurança para o público. Por sua vez, entende-se que a realização de obras corretivas, principalmente relacionadas ao sistema de drenagem, é uma necessidade constante em trilhas, seja para interferir nas soluções propostas, pois o fluxo da água pode não estar percorrendo da forma prevista pelo projeto, ou mesmo, para prevenir o comprometimento dos canais e valetas que pode encontrar-se com acúmulo de sedimentos e folhas e não atender a vazão de água prevista. A falta de atenção para essas questões gera um efeito em cadeia, definindo ambientes impactados e problemas mais difíceis de serem solucionadas, exigindo com o tempo a reformulação ou necessidade de elaborar novos projetos. Assim, para minimizar esses problemas foram determinadas ações corretivas classificadas pela natureza da intervenção. A instalação de valas de drenagem foi determinada em segmentos de trilha localizados em terrenos com declividades suaves, cujo caminho da água acontece sob o leito da trilha e o percurso encontra-se com pontos de alagamento nas partes planas. As valas devem ser implantadas ao longo do segmento buscando reduzir a velocidade e desviar a água antes dela 328 alcançar as áreas que atualmente encontram-se inundadas. A instalação de diques de contenção foi determinada emsegmentos de trilha localizados em terrenos com declividades médias, cujo caminho da água acontece sob o leito da trilha e o percurso encontra-se com pontos de e erosão e alagamento nas partes planas. Os diques devem ser implantados ao longo do segmento, buscando reduzir a velocidade, conter os processos erosivos e desviar a água. Por fim, verificou-se a necessidade de implantar passadiços elevados e em dois trechos do percurso. O critério para selecionar os locais para a instalação dessas estruturas consistiu na identificação de áreas, cuja capacidade de suporte do ambiente é inferior a demanda de visitação pública permitida. Ou seja, são percursos que não conseguem manter condições ambientais adequadas em função dos impactos ocasionados pela intensidade de visitação atualmente realizada. Nestas condições, a trilha suspensa minimiza os impactos ambientais ocasionados pelo pisoteio dos visitantes, tais como: erosão, assoreamento, ampliação da área da trilha e diminuição do efeito de borda. Entretanto, deve ser ressaltado que a instalação da trilha suspensa modifica o ambiente de intervenção, interferindo, principalmente, na insolação. Esta situação pode, entre outros aspectos, propiciar condições favoráveis para a ocorrência deespécies invasoras ou dificultar a revegetação da área que ficará sombreada pela trilha suspensa. Desta forma, é necessário realizar um projeto específico que avalie a performance da revegetação sob as trilhas suspensas. Contudo, além das possíveis interferências relacionadas com a instalação das estruturas suspensas, também devem ser observadas as raízes expostas. A trilha suspensa irá contribuir para minimiza os processos erosivos e, consequentemente, evitar o agravamento e o surgimento de novos pontos de raízes expostas. Entretanto, deve-se considerar que as raízes expostas existentes estão neste momento fragilizando a estrutura da vegetação e, por consequência a estrutura dos terrenos íngremes que faceiam o percurso da trilha e áreas de mirantes. Desta forma, é necessário realizar um projeto específico que avalie a necessidade de preencher com solo ou serapilheira os locais com ocorrência de raízes. CONCLUSÃO Concluiu-se após a realização do presente trabalhos que itens de segurança e conforto associados a uma padronização de equipamentos e placas informativas cumprem a função de suporte para envolver e melhorar a relação da população com os recursos naturais da região por meio da realização de atividades em trilhas ecológicas. 329 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARREIRO, P.; TABANEZ, M. F.; SOUZA, S. A. Contribuições do roteiro interpretativo da Trilha das Árvores Gigantes às práticas pedagógicas de professores que visitam o Parque Estadual de Porto Ferreira. III Seminário de Iniciação Científica do Instituto Florestal, 2009. Disponível em: Http://www.iflorestal.sp.gov.br/pibic/003SeminarioPIBIC/RESUMOS%20EXPAN DIDOS/CARREIRO.pdf. Acessado em: 22/10/2014. EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA (EMBRAPA). Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos. 2. ed. Rio de Janeiro: EMBRAPA, 2006. 306 p. JESUS, J. S.; RIBEIRO, E. M. S. 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Tiago Rossi de Moraes Universidade Federal de Santa Maria Campus Universitário – Prédio 17- Santa Maria, RS - Brasil ([email protected]) Eduardo Schiavone Cardoso Universidade Federal de Santa Maria Campus Universitário – Prédio 17- Santa Maria, RS - Brasil ([email protected]) Resumo A presente pesquisa tem como temática central a pesca artesanal praticada no rio Vacacaí, RS. Buscou-se identificando sua relação com as demais atividades econômicas que também se utilizam das águas do rio, em especial a orizicultura irrigada, a partir da visão dos pescadores artesanais e com o aporte de pesquisas bibliográficas e documentais. A partir do uso de dados oficiais de produção de arroz e área plantada, pluviometria e cotas altimétricas do rio Vacacaí, entre os anos de 2004 a 2013, estabeleceu-se a relação entre o consumo hidrointensivo da orizicultura irrigada e a diminuição do nível do rio. Através de três expedições onde foram percorridos os mais de 200 navegáveis do rio Vacacaí onde o nível da água permite a navegação, foram mapeadas 64 bombas de irrigação das lavouras de arroz e mais 24 estruturas desativadas. Para se identificar os pesqueiros do Vacacaí foi utilizada a cartografia participativa, onde os pescadores artesanais entrevistados reconheceram seus pesqueiros com o auxílio de mosaicos de imagens de satélite. Assim, dezessete pesqueiros foram mapeados pelos pescadores do Vacacaí, sendo que em dez há a presença de bombas de irrigação. Estes locais foram considerados potenciais territórios de conflito entre as duas atividades analisadas. Palavras-Chave: Pesca Artesanal. Território Pesqueiro. Orizicultura Irrigada. Conflitos. Introdução A água é um bem vital a sobrevivência do planeta, insubstituível no funcionamento, regulação e equilíbrio de todos os seres vivos, assim como tem sido fundamental no desenvolvimento das sociedades ao longo do tempo. Pela abundância de água em nosso planeta, raramente nos damos conta que a escassez desse recurso pode levar a um comprometimento ecológico e econômico, gerando conflitos em variadas escalas, inclusive mortes. Atualmente as diferentes formas de apropriação da água, algumas mais impactantes que outras, implicam a fundamentação de leis que devem acompanhar os instrumentos de gestão dos recursos hídricos, para que se garanta a qualidade da água existente e para que se tenha a satisfação desses 332 diferentes usos, bem como a resolução dos conflitos que venham existir nos períodos de escassez. O acelerado desenvolvimento tecnológico e industrial nas últimas décadas têm gerado grandes impactos ambientais que a partir da década de 1970 vêm sendo amplamente discutidos pelas nações do mundo, levando a sucessivos tratados de restrição de emissão de poluentes, na maioria das vezes não cumpridos ou nem sequer assinados por alguns países. Na atual configuração da sociedade moderna, as formas de relações exercidas com os recursos naturais se diferem em muito das existentes nas sociedades ditas tradicionais, onde as muitas formas de degradação da natureza, presente nas atividades das sociedades urbanas industriais, não foram absorvidas e a relação das pessoas com a natureza é diferente. O homem moderno tem diversificado as suas formas de dominação da natureza em prol da geração de bens de consumo, produção de alimentos, possibilidades de locomoção, entre outros. As profundas mudanças ocorridas na agricultura nas últimas décadas, frutos da tecnologia que se desenvolve em ritmo cada vez mais acelerado, é um exemplo do esforço do ser humano em domesticar a natureza, impondo-a o seu ritmo de consumo, ao invés de adaptar-se ao ritmo biológico das plantas e animais. A agricultura é responsável atualmente pelo uso de 70 % da água doce disponível no planeta (Rebouças, 2001), todo esse uso se deve em grande parte a necessidade excessiva de irrigação de determinadas culturas, geralmente cultivadas no modelo de monoculturas de grande escala. Tal modelo de agricultura também é marcado pelo grande uso de fertilizantes e biocidas organosintéticos (agrotóxicos) que geram diversos problemas ambientais e de saúde da população. Por outro lado, comunidades tradicionais residentes em áreas rurais e altamente dependentes dos recursos naturais são encontradas em diversas regiões do mundo. Essas comunidades, no Brasil, diferenciadas em indígenas e não-indígenas, buscam na defesa de seus territórios a garantia de sua reprodução social. Os pescadores artesanais, reconhecidos como um dos 14 povos tradicionais existentes no Brasil, fazem parte de um modelo de produção extrativista que se utiliza de um conhecimento empírico sobre o comportamento do meio ambiente, pois nele estão inseridos em seu dia a dia de trabalho, reproduzindo e criando gêneros de vida distintos das sociedades modernas urbano/industriais. Entre as modalidades de cultivo (Aquicultura) e pesca extrativa, esta última responde por 45% da produção de pescado brasileiro, sendo que 99% dos trabalhadores empregados nessa modalidade e cadastrados no Registro Geral de Pesca – RGP são pescadores artesanais (MPA, 333 2014), somando mais de 1 milhão de pessoas que proveem seu sustento da pesca artesanal no Brasil. No caso dos pescadores artesanais, a defesa dos territórios pesqueiros no Brasil é bandeira de luta há décadas, que culminou no ano de 2012 com a criação da Campanha pela Regularização do Território das Comunidades Tradicionais Pesqueira pelo Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais - MPP, um projeto de lei de iniciativa popular que visa o reconhecimento, proteção e garantia do direito ao território dessas comunidades. Aliados a isso, se constituem alguns mecanismos legais de defesa destes territórios, por parte das comunidades e do Estado. A orizicultura irrigada, bastante desenvolvida no Rio Grande do Sul, estado que contribui com cerca de 54% da produção nacional (MAPA, 2014), e também praticada em larga escala em toda a Bacia Vacacaí Vacacaí-Mirim, está caracterizada pela alta tecnologia empregada em equipamentos e estruturas de produção, pelo grande consumo de água na irrigação e pelo uso de uma variedade de insumos e pesticidas que, ao serem usados, são incorporados às águas que retornam aos corpos d’água podendo contaminar toda a biota aquática. Atualmente, para se instalar uma bomba de irrigação em algum rio do Rio Grande do Sul é necessária obter uma licença ambiental específica para esse fim, o órgão que fica a cargo da emissão da licença é a Fundação de Proteção Ambiental – FEPAM. Neste contexto, estamos diante de duas atividades econômicas que se utilizam dos mesmos recursos naturais, e muitas vezes dos mesmos territórios, para se desenvolver. De um lado a pesca artesanal, atividade que emprega profissionais reconhecidos no Brasil como populações tradicionais, possuidores legítimos de direitos sobre seus territórios tradicionais, reproduzindo gêneros de vida onde as relações com a natureza diferem em muito das sociedades urbano/industriais, um imenso contingente de trabalhadores, responsáveis por grande parte da produção do pescado brasileiro. Por outro lado, a orizicultura irrigada, atividade que nasce de forma artesanal, onde o homem utilizava-se apenas dos desníveis do terreno e pela gravidade guiava a água para seus cultivos. Ao longo do tempo, e mais recentemente com a globalização e aumento demográfico mundial, a necessidade de elevar a produção de alimentos abriu espaço para a tecnologia e a ciência a desenvolverem em prol desse aumento de produção. Os efeitos desse desenvolvimento tecnológico científico foram, entre outros, a troca da mão de obra do homem pela da máquina desde o plantio, colheita e processamento dos produtos agrícolas e a criação e uso de inúmeros fertilizantes sintéticos e pesticidas que causam degradação aos recursos naturais e afetam as populações de diversas maneiras. 334 Quando alguma atividade potencialmente impactante do ponto de vista ambiental e social é desenvolvida em algum território onde outras atividades menos impactantes também ocorrem, e de certa forma veem-se prejudicadas por essa outra, pode-se dizer que esse território abriga uma situação de potencial conflito entre seus usuários. É o que acontece com a pesca artesanal e orizicultura irrigada quando desenvolvidas concomitantemente em um mesmo território. No Rio Grande do Sul, a orizicultura irrigada é apontada como uma das principais problemas da pesca artesanal desenvolvida em águas interiores. Esse modelo de atividade pesqueira vem passando por diversos problemas, em alguns casos, não garantindo mais as necessidades dos trabalhadores, que necessitam realizar outras funções como sirvam de auxílio na renda família. Cardoso (2009) enfatiza a situação precária dos pescadores de municípios como Cachoeira do Sul e Rio Pardo, reflexo dos diversos problemas enfrentados pelos pescadores de pequena escala, que vão desde a escassez do pescado até a falta de apoio governamental perante a classe. Assim, estudos que venham realizar uma análise dessas duas atividades dentro de uma área de estudos, identificando os territórios potencialmente conflituosos no que se refere ao uso da água, mostram-se de grande importância no planejamento e gestão dos recursos hídricos e consequentemente na preservação ambiental e também da existência da atividade da pesca e dos pescadores artesanais. Nesse sentido, a presente pesquisa indaga quais são as relações de influências da orizicultura irrigada sobre a pesca artesanal no rio Vacacaí, RS, como os pescadores artesanais percebem essas influências e também se pode se falar na existência de potenciais territórios de conflito entre pescadores e arrozeiros. Objetivo Geral Compreender como se desenvolve a pesca artesanal no rio Vacacaí, RS, identificando as influencias exercidas pela orizicultura irrigada e os potencias territórios de conflitos existentes entre ambas atividades. Objetivos Específicos (a) Caracterizar a pesca desenvolvida na área de estudo, bem como as condições de vida e de trabalho dos pescadores artesanais; (b) Conhecer a atual situação de conservação do leito e das margens do rio Vacacaí, ao longo de seu percurso navegável; 335 (c) Verificar a distribuição espacial dos recursos pesqueiros e dos pescadores ao longo do rio Vacacaí (d) Identificar e mapear as potenciais áreas de conflito existentes entre arrozeiros e pescadores; Metodologia Considerando a análise da dinâmica presente nas relações homem – meio como princípio da ciência geográfica e que essas relações podem gerar conflitos entre os diferentes grupos sociais que se utilizam dos mesmos espaços e bens naturais, esta pesquisa apresenta dois objetos de estudos distintos: os pescadores artesanais, como se organizam e desenvolvem a atividade pesqueira, sua problemática, relações com a natureza; e a produção de arroz irrigado, localização e quantidade de bombas de sucção, conservação das margens, dados de produção e área plantada, modo de produção. Para se analisar as condições de vida e de trabalho dos pescadores artesanais, bem como seus saberes e percepções sobre a pesca no rio Vacacaí, optou-se pela documentação direta e indireta. A documentação indireta se fez pelas pesquisas bibliográficas e pelas informações obtidas em conversas com alguns pescadores antes da elaboração e aplicação das entrevistas. Na documentação direta a técnica utilizada foi a entrevista com aplicação de questionários aos representantes de pescadores de Santa Maria, Colônia Borges (Restinga Seca), Restinga Seca (cidade), Passo do Rocha (Vila Nova do Sul) e São Gabriel. Além disso, na documentação direta com os pescadores foi utilizada a cartografia participativa, onde os mesmos puderam cartografar seus territórios de pesca, moradia, etc. Para que se pudesse conhecer a localização dos pesqueiros do rio Vacacaí, optou-se pela prática da cartografia participativa. A partir da utilização de imagens de satélite como ferramentas, enquanto eram entrevistados, os pescadores artesanais foram convidados a identificar e mapear, de forma colaborativa, seus espaços de vivência. Para cobrir toda a área de interesse numa escala onde se fosse possível reconhecer objetos e feições naturais, foram construídos três mosaicos de imagens quickbird do Google Earh no tamanho A0 (841mm × 1189mm). Na montagem dos mosaicos foi utilizado o software CorelDraw X6, onde cada imagem final agregou em média 36 imagens, A escala final das três imagens mosaicos ficaram aproximadamente em 1:50.000, com pequenas variações de uma para outra, nessa 336 escala e com a boa qualidade das imagens, ficou fácil para os pescadores se localizarem e assim apontarem seus pesqueiros. O uso de imagens de satélite possui como aspecto positivo a facilidade de se trabalhar com pessoas que não estão habituadas a interpretar mapas topográficos ou não possuem alfabetização. Isso se confirmou ao se entrevistar o pescador mais antigo entre os entrevistados, com 82 anos e residente na comunidade do Passo de Barca, o mesmo não possui alfabetização e rapidamente, assim como todos os demais, soube se localizar na imagem, identificando sua residência e seus locais de pesca. Na maioria dos casos esses pescadores nunca tinham analisado uma imagem de satélite, com bastante curiosidade os mesmos analisaram atentamente as imagens, conversando entre si na identificação das feições do terreno e de seus locais de vivência. Com a finalidade de conhecer in loco a área de estudos, reconhecendo as atuais condições das margens e do leito do rio, mapear a localização exata das bombas de sucção das lavouras de arroz e encontrar pescadores para um pré-contato, foram realizadas três expedições pelo rio Vacacaí. A partir de uma análise minuciosa de imagens de satélite e do auxílio de algumas pessoas que já haviam navegado pelo rio Vacacaí, estabeleceu-se o local mais à montante possível para que se pudesse navegar, devido ao baixo nível do rio. Esse local localiza-se à cerca de 30 quilômetros da área urbana de São Gabriel e a extensão do leito do Vacacaí deste ponto até sua foz é superior a 200 quilômetros. Ao se planejar a logística pela qual se daria a execução das expedições definiu-se três recortes, do ponto inicial até o Balneário do Verde, deste ponto até o Balneário das Tunas e por fim, do Balneário de Tunas até a foz. Estabelecido esses recortes, a execução se deu primeiramente dos dois recortes à jusante e por último se navegou o trajeto mais à montante do Vacacaí. Para as duas primeiras foi utilizado uma embarcação do modelo “chata” de fabricação artesanal com capacidade para quatro passageiros, na primeira expedição o trajeto foi cumprido com propulsão a remo, já na segunda expedição a embarcação foi equipada com motor de popa marca Suzuki de 4 Hp . Na terceira expedição a embarcação utilizada foi um modelo “Marujo 430” da marca Levefort, também com capacidade para quatro passageiros, essa embarcação foi equipada com motor de popa da marca Branco Marine com potência de 15 Hp.. As três expedições contaram com um carro de apoio, outras ferramentas utilizadas foram uma câmera fotográfica semiprofissional para registro de imagens e um GPS da marca Garmin modelo 76 para marcação do trajeto e dos pontos relevantes. 337 Desenvolvimento De um lado os pesqueiros do rio Vacacaí, locais definidos a partir da percepção dos pescadores artesanais sobre seus territórios de vivência e mapeados com o auxílio da cartografia participativa. Locais conhecidos por todos e de livre acesso a qualquer pescador que neles chegar. Portanto, são locais de uso coletivo entre os pescadores, onde a relação de respeito com o próximo predomina na mitigação de conflitos entre os mesmos. De outro, a territorialidade expressa pela orizicultura irrigada ao longo do leito do rio através da instalação das bombas de sucção, locais que na maioria das vezes são caracterizados pela degradação das margens do rio. Ambas as atividades possuem pontos específicos onde realizam suas funções. No caso dos pesqueiros, segundo as informações obtidas com os pescadores, os mesmos não possuem uma área de influência específica, tecnicamente o raio de influência de cada pesqueiro será o comprimento e a quantidade de redes de emalhe e/ou espinhéis utilizados. No entanto, como os efeitos negativos, principalmente na degradação das margens proporcionado pela instalação das bombas de sucção pra lavoura de arroz, muitas vezes podem alcançar muitos metros, até quilômetros de extensão, e o assoreamento causado pela erosão dessas margens interfere na dinâmica do rio como um todo, optou-se por identificar as bombas mais próximas de cada pesqueiro. Em outras palavras, buscaram-se identificar os pesqueiros que possuem mais bombas de sucção próximas de si. A partir da proximidade e da densidade de bombas de sucção em relação aos pesqueiros, identificou-se alguns locais com maior potencialidade de se tornarem geradores de conflitos (Figura 1). Dos quatorze pesqueiros mapeados no rio Vacacaí e que se encontram no trecho navegado durante a pesquisa, nove deles possuem bombas de sucção localizadas até 1000 metros de sua localização. Destes, destacam-se três que possuem bombas de sucção localizadas a menos de 100 metros de distância, o pesqueiro “Largão”, que possui uma bomba nesta proximidade e os pesqueiros “Foz do Rio São Sepé” e “Prateleira”, que possuem duas bombas localizadas a menos de 100 metros cada. O pesqueiro “Prateleira”, além de disputar sua localização com duas bombas muito próximas, também possui outras quatro bombas localizadas na faixa dos 500 aos 1000 metros, uma delas à montante e três à jusante. 338 Figura 1: Pesqueiros e bombas no rio Vacacaí. Org.: Moraes, 2015. O pesqueiro “Passo do Camisão”, que foi apontado por todos os pescadores entrevistados como um importante pesqueiro do Vacacaí, é marcado pela presença de três bombas de sucção na faixa de análise, uma delas localizada entre 100 e 500 metros de distância e duas delas na faixa dos 500 aos 1000 metros. O pesqueiro “G”, que localiza-se à montante do pesqueiro “Passo do Camisão, possui quatro bombas localizadas entre 500 e 100 metros de distância, duas a montante e duas a jusante. Neste último também há a presença de mais três bombas distantes pouco mais de 1000 metros a montante. As imagens anexas ao mapa final mostram o nível de degradação das margens do rio Vacacaí nos locais onde estão instaladas as bombas localizadas próximas a este pesqueiro, mesmo que estejam todas localizadas a mais de 500 metros de distância, o impacto para o rio e para a pesca potencializa-se pelo elevado número de bombas próximas entre si. 339 “Foz do Arroio Arenal” e o pesqueiro “O” também possuem duas bombas localizadas entre 100 e 500 metros de distância cada, neste último encontram-se uma a jusante e outra a montante, e no “Foz do Arenal” ambas encontram-se a montante. Os pesqueiros “Paredão” e o pesqueiro “M” possuem uma bomba localizada entre a faixa dos 500 aos 1000 metros de distância cada. Conclusões A possibilidade de estar observando em loco o objeto de estudo proporcionou um alcance amplo sobre a realidade da pesca artesanal no rio Vacacaí, o contato com os pescadores possibilitou obter uma imensa quantidade de informações que não seriam encontradas em nenhum outro lugar, senão ouvidas da boca dos próprios pescadores artesanais, além é claro da possibilidade de se visualizar as condições ambientais das margens do rio Vacacaí ao longo do seu curso navegável. Como fruto das entrevistas, podemos realizar uma caracterização dos principais elementos relacionados ao desenvolvimento da pesca artesanal no Vacacaí, desde a captura e processamento do pescado até a venda, além de se ter noções sobre as condições de vida e de trabalho destes pescadores. Essas informações são importantes para que se evidencie a existência do pescador artesanal dos rios e lagos do Rio Grande do Sul, ratificando a importância da sua contribuição para a conservação desses ecossistemas e o quanto é necessária uma maior atenção, por parte dos gestores públicos, a esse modelo de atividade econômica. Observou-se que os pescadores artesanais possuem amplo conhecimento histórico sobre o Vacacaí, compreendendo a situação atual de conservação desse curso d’água e a contribuição de cada atividade econômica nele desenvolvida para a sua deterioração, inclusive a própria pesca, quando praticada de forma desordenada e em períodos de defesa, o que constitui crime ambiental. Ficou clara a grande preocupação dos pescadores do Vacacaí com a contaminação das águas por agroquímicos utilizados tanto na orizicultura quanto nas lavouras cultivadas com soja, pois esta é a cultura agrícola que domina as áreas de lavouras permanentes nos municípios por onde o rio Vacacaí percorre. Quanto ao consumo excessivo de água na irrigação das lavouras de arroz, esta também está entre as principais preocupações dos pescadores. No entanto, por possuírem amplo conhecimento sobre os fenômenos naturais, esses pescadores conseguem situar o fator determinante dos níveis pluviométricos nos períodos de déficit hídrico, bem como compreendem a importância da orizicultura para a economia dos municípios em que vivem. Talvez por isso o problema de consumo excessivo de água na irrigação das lavouras de arroz seja visto 340 como menos prejudicial que a pesca predatória praticada por pescadores amadores. Mesmo assim, durante as entrevistas muitos pescadores levantaram a necessidade de se estabelecer limites na quantidade de água retirada do rio para a irrigação em períodos onde se passe por estiagem severa. Essa possibilidade de se estabelecer limites no consumo de água pela orizicultura em períodos de estiagem, levantada pelos pescadores artesanais do Vacacaí, pode e deve ser amplamente discutida pelos gestores dos recursos hídricos. Além disso, devem ser levadas em consideração nas tomadas de decisões as informações aqui obtidas, qual sejam a localização dos pesqueiros do Vacacaí e sua proximidade com as bombas de irrigação das lavouras de arroz. Pois estas são o símbolo da ligação dessa atividade econômica com o rio Vacacaí e com a pesca artesanal e demais atividades desenvolvidas neste ambiente e, através dessa análise, fica evidente que essa proximidade entre pesqueiros e bombas de irrigação constituem potenciais territórios de conflitos. A fundo o que se buscou aqui foi trazer a visão dos pescadores artesanais sobre os principais problemas enfrentados em sua faina pesqueira. Portanto, devem ser desenvolvidos muitos estudos que embasem as tomadas de decisões, pesquisas que aprofundem a análise das dinâmicas naturais, da complexidade dos usos dados para o rio Vacacaí e que também deem enfoque à percepção dos pescadores artesanais sobre esse curso de água tão importante para a região e para o estado. Criado um grande mosaico de informações e fontes de conhecimento sobre o rio Vacacaí, poder-se-á se ter uma gestão apropriada desse ecossistema. Com isso deve-se buscar a solução de conflitos existentes entre os usuários do rio ou mitigação de possíveis conflitos que possam vir ocorrer. Essa talvez seja a principal contribuição da presente pesquisa, sob a perspectiva da categoria do território, mostrar os potenciais territórios de conflitos existentes entre dois do total de usuários do rio Vacacaí, qual sejam, os pescadores artesanais e os orizicultores. Bibliografia BRASIL; Ministério da Agricultura. Disponível em <www.agricultura.gov.br>. BRASIL; Ministério da Pesca e Aquicultura. Disponível em: <www.mpa.gov.br>. CARDOSO, E. S. et al.; Pesca e Atividades Complementares em Águas Interiores do Rio Grande do Sul. In: XII Encontro de Geógrafos da América Latina. EGAL. Montevideo, 2009. 341 Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler. Disponível em <www.fepam.rs.gov.br>. Movimento dos Pescadores Artesanais – 2012. Território Pesqueiro: Biodiversidade, Cultura e Soberania Alimentar do Povo Brasileiro. Disponível em: <http://caritas.org.br/novo/tag/movimento-de-pescadores-e-pescadoras-artesanais-dobrasil/>. REBOUÇAS, A. C.; Água e Desenvolvimento Rural. In. Revista Estudos Avançados, vol. 15, n. 43, p. 327-344, 2001. 342 A FLORA RELICTUAL COM ESPÉCIES ENDÊMICAS NO CERRO DO ITAQUATIÁ E CERRO DO RIBEIRÃO NO OESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO PEDRO DO SUL/RS Rodrigo Corrêa Pontes1,2 Leonardo Moreira Aguiar1,3 Prof.Ms. Leopoldo Witeck Neto1,4 Prof. Dr. Mauro Werlang Kumpfer1,5 1 Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) 2 [email protected] 3 [email protected] 4 [email protected] 5 [email protected] Resumo: o presente trabalho busca apresentar a relevância da florística relictual da encontrada no município de São Pedro do Sul, que se estabeleceu em razão da geomorfologia propícia para a formação deste tipo de vegetação. Palavras-chave: endemismo, fitogeografia, Geomorfologia, relictos. INTRODUÇÃO A interferência antrópica tem afetado diretamente os diversos tipos de ambientes em razão da apropriação e uso desenfreado dos ecossistemas naturais. Em razão do aumento da população durante os últimos cinqüenta anos, a produção agrícola buscou expandir suas áreas para desta forma atender a nova demanda do mercado internacional. Desta forma, a expansão agrícola, a criação de gado extensiva, o florestamento com espécies exóticas (silvicultura) e a modernização do homem no campo adentraram em espaços que anteriormente não eram visados para atividades agrícolas. Assim, muitos ambientes têm sido agredidos diretamente, sendo alguns considerados muito frágeis por estarem representados em pequenas áreas e abrigarem espécies endêmicas e ameaçadas de extinção. De acordo com Troppmair (2012) a paisagem modificada pelo homem coloca em risco a sobrevivência de espécies da fauna e flora que a constituem. Sem o conhecimento e a compreensão dos complexos mecanismos de sobrevivência das espécies não há como cobrar da sociedade uma atitude justa perante a causa. Em razão da situação presente, tornam-se necessários estudos fitogeográficos, buscando divulgar a riqueza florística presente em nossos ecossistemas. A paisagem do Cerro do Itaquatiá e do Cerro do Ribeirão, no distrito de Xiniquá, no município São Pedro do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul, favorece a formação de um ambiente propícios para o surgimento de endemismos, verdadeiros 343 relictos vegetacionais. Representantes da família Bromeliaceae e Cactaceae são verdadeiros testemunhos de paleoclimas anteriores ao atual, e ao longo dos milhares de anos ficaram isolados em locais que reproduzem as condições necessárias para sua permanência e reprodução. Estas áreas são o que conhece-se como refúgios ecológicos, que por razões geomorfológicas e pedológicas o homem ainda não conseguiu impactá-los ao avançar sobre eles. Estes locais geralmente são escarpas íngremes, afloramentos rochosos e solos muito pobres em nutrientes, onde não é rentável e por esta razão há pouco interesse para a agricultura. OBJETIVOS Perante a atual problemática ambiental, este trabalho possui como objetivo geral a identificação dos endemismos do Cerro do Itaquatiá e do Cerro do Ribeirão, a oeste de São Pedro do Sul, buscando enfatizar a importância destes frágeis ecossistemas com fins conservacionistas e preservacionistas Como objetivos específicos, o trabalho busca: a) identificar e representar cartograficamente a área de estudo; b) descrever a situação em que se encontra a área de estudo perante a ação antrópica e c) inventariar o contingente de espécies endêmicas na área de estudo, confirmando a importância fitogeográfica da área. METODOLOGIA O trabalho iniciou-se com a adoção da proposta metodológica da proposição da análise sistêmica da paisagem e o método hipotético-dedutivo para uma maior aproximação da realidade com a pesquisa. Após a seleção da área de estudo, buscou-se um levantamento bibliográfico sobre a temática proposta a investigação dos objetivos, para desta maneira definir os subsídios para o desenvolvimento do tema, orientação teórico-metodológica e organização dos procedimentos ao longo do trabalho. A revisão bibliográfica realizou-se a partir de leituras sobre fitogeografia, onde foram consultados artigos, dissertações e livros os quais permitiram definir o marco conceitual deste trabalho. Os procedimentos metodológicos foram organizados em quatro fases: a) localização geográfica, delimitação da área de estudo e sua caracterização; b) coleta de dados à campo e investigação (levantamento); c) organização e interpretação dos dados coletados e d) elaboração dos resultados e conclusões. A área de estudo encontra-se a oeste do município de São Pedro do Sul, Com a definição da área de estudo, iniciou-se a delimitação da área e de localização 344 geográfica, baseando-se na carta topográfica da Diretoria do Serviço Geográfico do Exército Brasileiro, correspondente à Carta Topográfica de Mata, Folha SH.21-X-D-VI1, MI-2964/1, Rio Grande do Sul, na escala 1:50.000, localizada entre as coordenadas geográficas 29º 30’ e 29º 45’ de Latitude Sul e 54º 15’ e 53º 30’ de Longitude Oeste. Figura 1: Modelo digital da elevação da área de estudo a oeste de São Pedro do Sul. Fonte: Autores. Os dados foram coletados com um aparelho receptor de GPS (Sistema de Posicionamento Global), modelo eTrexLegendHCx. Foram definidos os limites da área, formando um polígono. Utilizou-se o Datum WGS-84 e o programa Google Earth 6.1. As coordenadas geográficas coletadas em campo pelo receptor GPS foram inseridas no programa GPS Trackmaker Professional (GTM PRO, versão 4.8) sobre a 345 base cartográfica vetorial contínua do Rio Grande do Sul, esta com escala de 1:50.000, na carta topográfica referida acima, constituindo um mapa de localização. Para a base cartográfica foram utilizados arquivos digitais para uso em SIG, Base Cartográfica digital do Rio Grande do Sul, escala 1:250.000. Foi utilizada uma imagem SRTM (Shuttle Radar Topography Mission), com resolução de 90 metros. A adição da base cartográfica com dados coletados a campo permitiu a criação do mapa base da área em estudo. A partir desse mapa base foi desenvolvido o mapa hipsométrico da área. Em seguida, após a interpretação de imagens de satélite fornecidas pelo programa Google Earth e do mapa geológico produzido pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (2010), caracterizou-se as litologias presentes. Durante trabalho de campo buscou-se a confirmação ou correção, dos contatos das formações geológicas presentes. Posteriormente todas essas informações foram selecionadas e reunidas através da confecção de mapas demonstrando as características ambientais da área de estudo. Os mapas foram confeccionados através do programa ArcGis 10, onde foram digitalizadas as curvas de nível, apresentando as cotas altimétricas da área de estudo. A respeito da análise da vegetação, adotou-se do método de Caminhamento, proposto por Filgueiras et al. (1994), que consiste em três etapas: a) reconhecimento dos tipos de vegetação na área a ser amostrada, b) elaboração da lista das espécies encontradas e c) análise dos resultados. A identificação das espécies vegetais foi realizada in situ e posteriormente no Herbário Florestal do Departamento de Ciências Florestais da Universidade Federal de Santa Maria. DESENVOLVIMENTO Para a caracterização da flora relictual no Cerro do Itaquatiá e no, Cerro do Ribeirão primeramente devemos entender a sua forma geomorfológica. De acordo com a proposta de Ross (1996) a geomorfologia nessa área corresponde a macroforma estrutural denominada Bacia Sedimentar do Paraná, onde são reconhecidas duas grandes unidades esculturais como Depressão periférica sul-riograndense e os Planaltos e Chapadas da Bacia do Paraná. De acordo com Sartori (2009) na Depressão periférica sul-rio-grandense, ocorrem as Formações Sanga do Cabral, Santa Maria e Caturrita e a unidade Planaltos e Chapadas da Bacia do Paraná abrange as Formações Botucatu e Serra Geral. O Cerro do Itaquatiá e o Cerro do Ribeirão são morrotes testemunho de topo plano com a altitude aproximada, respectivamente, de 204 e 256 metros. Ambos possuem nas escarpas íngremes no seu entorno. Conforme os dados coletados em campo e referencial teórico da CPRM 346 (2014), a litologia de ambos morrotes consiste em três tipos distintos. Na sua base pode-se encontrar a Formação Caturrita, que consiste em arenitos finos, médios e grossos a conglomerados, róseos a alaranjados, com laminação cruzada de médio à grande porte, podendo conter vertebrados fósseis (terápodes), fragmentos vegetais (troncos silicificados) e perfurações de invertebrados (icnofósseis). Os sedimentos foram oriundos de ambiente continental, associado a canais fluviais e corpos lacustres depositados durante o Triássico Superior. Figura 2. Perfil do Cerro do Itaquatiá, com escarpa de arenito. Fonte: Autores Na porção intermediaria encontra-se a Formação Botucatu, apresentando arenitos finos a grossos, de coloração avermelhada, grãos bem arredondados e com alta esfericidade, com estratificações cruzadas de grande porte. A formação corresponde à ambiente continental desértico. Foi depositado durante a segunda metade do Jurássico. Nas escarpas do cerro pode-se visualizar as estratificações cruzadas de grande porte. Talvez por esta feição que o morrote leva a denominação “Itaquatiá”, significando no tupi-guarani “pedra-pintada”. No topo, apenas no Cerro do Itaquatiá apresenta-se uma fina camada da rocha da Formação Serra Geral, composta por derrames basálticos, granulares finos a médios, maciços de cor cinza escuro. 347 Inseridos neste tipo de forma geomorfológica estão os redutos ecológicos de flora, verdadeiros testemunhos de eventos paleoclimáticos. As espécies ali se estabeleceram em razão de condições edáficas e ambientais. Conforme Hauck (2009) reduto é uma área atual que abriga vegetação que se expandiu no passado (durante o Pleistoceno) e com o aumento da temperatura e umidade não foi capaz de competir por espaço permanecendo em lugares onde resiste na paisagem como um ecossistema. Já refúgio reporta-se à flora confinada em setores mais úmidos, permitindo seu mantenimento durante os tempos áridos do Pleistoceno. O estudo da vegetação relitcutal do Cerro do Itaquatiá e Cerro do Ribeirão exigem, primeiramente, observações sobre o meio físico e a dinâmica da vegetação. No Rio Grande do Sul é curiosa a predominância de áreas campestres em um clima favorável para o desenvolvimento de florestas. A mescla de vegetação herbácea, arbustiva e arbórea e seus arranjos já despertaram o interesse de pioneiros do estudo fitogeográfico do Rio Grande do Sul, como pode-se observar no trabalho de Rambo (1956) e de Lindmann (1906). Marchiori (2004, p.16.) afirma que os campos nativos foram interpretados por Lindman como relíctos de climas pretéritos mais secos do que o clima atual, concordando com os eventos climáticos do Pleistoceno. Nos estudos fitogeográficos de Marchiori (2002) e Rambo (1956) é notório que a vegetação do estado do Rio Grande do Sul situa-se em um período transitório induzido pelos padrões climáticos firmados entre os períodos do Pleistoceno e do Holoceno. Marchiori (2004) propõe que para deduzir a distribuição da vegetação do Estado, no caso da transição campo - floresta, deve-se dar ênfase na biologia das espécies representativas dessas áreas, assim como suas relações com o relevo. Na mescla de fisionomias vegetacionais distintas podem ocorrer pequenas áreas com vegetação aberta, como campos e campos rupestres, verdadeiras ilhas ricas em endemismo, apresentando geralmente espécies xerofíticas e heliófilas. Conforme Romariz (2012) uma espécie heliófila é um ser vivo que necessita de alta intensidade de luz para efetuar a fotossíntese e garantir seu ciclo vital. No Cerro do Itaquatiá foram encontradas sete espécies ao todo. Foram encontradas ao todo sete espécies endêmicas: Parodia ottonis, Parodia linkii, Echinopsis oxygona (Cactaceae), Dyckia ibicuiensis, Tillandsia lorentziana (Bromeliaceae), Sinningia macrostachya (Gesneriaceae) e Eugenia hamiltonii (Myrtaceae). No Cerro do Ribeirão foram encontradas ao todo dez espécies endêmicas: Parodia ottonis, Parodia glaucina, Parodia linkii, Echinopsis oxygona (Cactaceae), Dyckia racinae, Dyckia selloa, Tillandsia lorentziana, Sinningia macrostachya (Gesneriaceae) e Schlechtendalia luzulifolia (Asteraceae) e Trithrinax brasiliensis (Arecaceae). 348 Figura. 3. Encosta com escarpa abrutpa no Cerro do Ribeirão. Fonte: Autores. As espécies encontram-se em afloramentos rochosos no topo e nas escarpas com orientação nordeste e norte, onde é maior o índice lumínico e de temperatura. Em razão das espécies se encontrarem nas partes elevadas, há pouca interferência antrópica. Analisando a flora dessas ilhas vegetacionais pode-se perceber as diversas formas anatômicas devido à adaptação. Holz (2003) relata que as mudanças no tipo de ambiente no passado influenciavam na distribuição e na morfologia da vegetação. Em razão de pressões ambientais no passado as espécies adquiriram estruturas que permitem sua sobrevivência em um substrato seco, com uma raiz para se sustentar e tirar nutrientes, além de habitar os mais distintos nichos ecológicos. Waechter (2002) cita gêneros chaquenhos presentes na flora do Rio Grande do Sul, como Dyckia (Bromeliaceae), Echinopsis, e Parodia (Cactaceae), entre outras. Estes elementos migraram da Província Chaquenha (Argentina e Paraguai) durante tempos áridos no passado geológico, quando foi propício para seu avanço, colonizando amplamente ambientes xerófitos como afloramentos rochosos, solos arenosos e até escarpas abruptas. 349 Sobre a espécie Trithrinax brasiliensis, Marchiori (2004) faz importantes considerações: Cabe salientar que a presença da espécie nestes locais assume um grande interesse fitogeográfico, pois certamente antecede a invasão holocênica da floresta pluvial na região, a semelhança da criúva (Leucothoe eucalyptoides) e da Schaefferia argentinensis), constituindo verdadeiras relíquias do período xerotérmico pleistocênico junto as florestas Estacional, Atlântica e mista. (MARCHIORI, 2004, p. 76). Este tipo de vegetação está intimamente associado a uma formação campestre (mais aberta) do que a formação florestal (mais fechada) por necessidades fisiológicas de sobrevivência. Nestas composições relictuais, predominam elementos xerófitos, adaptados a escassez de água e nutrientes, à insolação e à temperatura. Representantes das famílias Bromeliaceae e Cactaceae são alguns exemplos. Estudos sobre a dinâmica climática do Pleistoceno explicam a presença dessas xerófitas nos tempos atuais. De acordo com Marchiori (2004) a vegetação no Estado é formada por campos e florestas, em constante competição por espaço e influenciada por fatores ambientais. As áreas campestres, sendo a maioria, são verdadeiros relictos do clima do Pleistoceno, onde atualmente sofre o avanço das florestas em razão do clima do Holoceno correspondente a temperaturas mais quentes e umidade. Conforme Romariz (2012) uma área relíquia ou relictual é uma extensão geográfica onde ocorrem espécies cuja presença não pode ser explicada pelas condições climáticas e ecológicas atuais, sugerindo que sua ocorrência nessa área ocorreu em condições diferentes, em tempos pretéritos. As espécies que ali ocorrem são chamadas de relíquias. Conforme Melo et al. (2009) é Schlechtendalia luzulifolia, uma espécie endêmica, com ocorrência restrita. Foi encontrada uma grande população no topo do Cerro do Ribeirão. Sobral (2003) cita a presença de Eugenia hamiltonii para os campos rupestres da Depressão Central no Rio Grande do Sul. Marchiori (2004) também cita os órgãos subterrâneos espessos, caules modificados como xilopódios de muitas espécies de mirtáceas, armazenadores de nutrientes, contribuem com a sobrevivência de espécimes em ambientes com pouca disponibilidade de macro e micronutrientes essenciais à sobrevivência. O autor também enfatiza que estas características indicam xeromorfismo, o que discorda da vegetação do entorno, com caráter arbóreo. Rambo (1956) enfatiza em seus estudos fitogeográficos sobre a vegetação do Rio Grande do Sul a presença de plantas xerófitas, como nos morros graníticos em torno de Porto Alegre e em alguns tabuleiros areníticos da Depressão periférica sul- 350 rio-grandense e do sudoeste do Estado. O autor mencionado relata a vegetação dos encontrada “Ao pé dos paredões, as sociedades silváticas se abrigam a sobra dos rochedos, que lhes fornecem solo humoso e água em abundância. Sobre os próprios rochedos verticais alinham-se os litófilos, cactos redondos em forma de ouriço (Echinocactus), tunas colunares (Cereus) e gravatás (Dyckia) e um mundo de líquenes crustosos e foliáceos” (RAMBO, 1956, p. 129). Esses protagonistas constituintes do ecossistema atual apresentam características morfológicas adaptadas em tempos passados e atualmente mostramse inadequadas às condições climáticas atuais; são como testemunhos das restrições a que foram submetidos no passado. Dessa forma essas áreas são nichos ecológicos, oumelhor, dizendo, relictos vegetacionais. Como exemplo de endemismo do Rio Grande do Sul, Aziz Ab’Saber resalta as cactáceas nos campos: Onde quer que apareçam, constituem mini-refúgios de uma flora outrora mais extensa e biodiversa. Eles todos restaram amarrados em minúsculos espaços ecológicos, constituídos por lajedos emergentes de arenitos ou chão pedregosos, que funcionam como litobiomas, sítios de aridez rochosa e resistentes bancos genéticos para a sobrevivência de gerações de cactáceas. (Ab’Saber ,1995, p. 26) É indispensável comentar sobre a fragilidade destes ecossistemas, que algumas ocasiões não permitem o emprego de métodos tradicionais de monoculturas e silvicultura por motivos edáficos (solos rasos) e declividade. A exploração destas áreas é limitada devido à grande rochosidade e a pouca oferta de nutrientes no solo. Mesmo assim, populações estão sendo devastadas. Deble (2012, p. 67) cita a introdução da silvicultura, pecuária e ecoturismo. Deve-se ressaltar a presença de fanerófitas invasoras nestes ambientes, que introduzidas pelo homem, descontroladamente colonizam solos pobres, terrenos rochosos e áreas degradadas, colocando em risco a sobrevivência de espécies nativas endêmicas. Marchiori (2004) cita diversas espécies fanerófitas invasoras como Pinus elliotii, Pinus taeda, Ulex europeus, entre outras. Estas espécies invasoras são fortes competidoras por ambiente e que de certa forma ganham a competição perante espécies. A imposição deste tipo de elemento acaba comprometendo as necessidades nutricionais e principalmente lumínicas das espécies nativas. CONCLUSÃO A flora endêmica dos morrotes do Cerro do Itaquatiá e do Cerro do Ribeirão está associada com a geomorfologia dos morrotes, que apresentam ambientes 351 adequados para abrigar espécies relictuais, endêmicas e ameaçadas de extinção com necessidades particulares de sobrevivência como calor, luminosidade e drenagem. O contingente florístico é formado por espécies xerófitas e endêmicas, sendo algumas ameaçadas de extinção. Foi abundante a presença de elementos chaquenhos, como as espécies pertencentes aos gêneros Echinopsis e Parodia (Cactaceae), Trithrinax brasiliensis (Arecaceae) e Dyckia ibicuiensis, Dyckia racinae, Dyckia selloa (Bromeliaceae), demonstrando que o conjunto geomorfológico do oeste de São Pedro do Sul de alguma forma serviu como abrigo e rota destas espécies, que provavelmente, migraram durante condições climáticas mais propícias para sua expansão. O estudo também observou que a ação antrópica não avançou totalmente a estes espaços em razão de condições impróprias para agricultura, em razão da declividade, de solos rasos ou paupérrimos em nutrientes e a presença de pedregosidade dos mesmos. A presença de Parodia linkii, Parodia ottonis, Echinopsis oxygona, Tillandsia lorentziana e Sinningia macrostachya é justificada pelos seus eficientes mecanismos de propagação, característica apresentada por espécies dominantes. Schlechtendalia luzulifolia (Asteraceae), Dyckia ibicuiensis, Dyckia selloa, Dyckia racinae (Bromeliaceae) e Trithrinax brasiliensis (Arecaceae) são espécies mais raras, com poucos indivíduos e em uma área de ocorrência. Com a exceção de Dyckia ibicuiensis, todas as outras espécies foram encontradas apenas no Cerro do Ribeirão. O trabalho enriqueceu para o conhecimento da flora de São Pedro do Sul e espera-se também que este possa contribuir de alguma maneira como referência a ser considerada em trabalhos posteriores, relacionados à fitogeografia e estudos referentes à vegetação no município São Pedro do Sul. REFERÊNCIAS AB’SABER, A. N, (1995). A Revanche dos Ventos: Derruição de solos areníticos e formação de areais na Campanha Gaúcha. Ciência & Ambiente, 11, p. 7-31 DEBLE, A. O, DEBLE, L. P; LEÃO, A.L.S, (2012). O Bioma Pampa: ambiente X sociedade, 200 p. FILGUEIRAS, T; et. al, (1994). Método de Caminhamento: um método expedito para levantamentos florísticos qualitativo. Caderno de Geociências, 12, p.39-44 HAUCK, P. A, (2009). Cerrados, campos e araucárias: a teoria dos refúgios florestais e o significado paleogeográfico da paisagem do Parque Estadual de Vila Velha, Ponta 352 Grossa, Paraná. 2009.146 f. Dissertação (Mestrado em Geografia). Universidade Federal do Paraná. HOLZ, M, (2003). 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Ciência & Ambiente, 24, p. 93-108 354 EJE 3- GEOGRAFIA FÍSICA Y SISTEMAS DE INFORMACIÓN GEOGRÁFICA 355 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL 356 COMPARAÇÃO ENTRE DADOS GEOGRÁFICOS: AS OTTOBACIAS DA AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (ANA) E AS CARTAS TOPOGRÁFICAS DO EXÉRCITO Maurício Rizzatti Acadêmico do Curso de Geografia da Universidade Federal de Santa Maria ([email protected]) Roberto Cassol Prof. Dr. do Programa de Pós-graduação da Universidade Federal de Santa Maria ([email protected]) Natália Lampert Batista Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria ([email protected]) Nadinne da Silva Fernandes Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria ([email protected]) Resumo: O presente trabalho tem como objetivo a comparação dados geográficos, referentes a Bacias Hidrográficas, oriundos das Ottobacias,daAgência Nacional de Águas (ANA),e da delimitação dos divisores de água em Cartas Topográficas do Exército. Além disso, com base nos bancos de dados mencionados,verificaram-se as diferenças nas delimitações de bacias e analisou-se a confiabilidade e a acurácia cartográfica em relação à realidade. Por meio dos mapas da Bacia Hidrográfica do Rio Vacacaí-Mirimconstatou-se queasOttobacias da ANA possuem a presença de nascentes, de afluentes, de outras bacias hidrográficas, além disso,em determinadas coordenadas o rio principal não está contido na bacia hidrográfica em estudo o que revela uma menor confiabilidade nos dados, mesmo sendo dados oficiais. Em contrapartida, o mapa elaborado através das cartas topográficas do exército possui uma área mais coerente com a realidade, abrangendo somente os rios de sua bacia. Contudo, para a correta delimitação das bacias é necessário que o mapeador/usuário conheça a teoria cartográfica e realize corretamente a delimitação do divisor de águas.Baseado nisso, concluiu-se que o mapa elaborado tendo como base cartográfica as cartas topográficas apresentaram maior acurácia e confiabilidade que mapa em que se utilizaram os dados das Ottobacias, da ANA. Palavras-chaves: Comparação de mapas, bacias hidrográficas, ottobacias, cartas topográficas, QGIS. 1. INTRODUÇÃO A representação cartográfica da superfície terrestre é muito relevante para a organização e planejamento do espaço, pois possibilita a geração de informações que servem como auxílio na tomada de decisões na gestão territorial. O mapa, que é um 357 modelo conceitual de representação da realidade, permite o planejamento e a tomada de decisão de forma mais coerente e adequada. O estudo das bacias hidrográficas, por meio da Cartografia, também é importante porque permitem o entendimento de fatores naturais (como a topografia e a natureza de drenagem) e artificiais (como a influência que a atividade antrópica) causam em um determinado local. As bacias hidrográficas são áreas separadas topograficamente, ou seja, pelos pontos de maior altitude do terreno que recebe o nome de divisor de água. É constituída por um conjunto de rios que drenam suas águas das áreas das maiores altitudes para as menores. Santos (2004) propõe a bacia hidrográfica como unidade de planejamento por ser um sistema bem delimitado, composto por um conjunto de terras topograficamente drenadas por um curso de água e seus afluentes, cujas interações são integradas, sendo mais facilmente interpretadas. Lanna (1995) adota a unidade territorial “bacia hidrográfica” como uma das opções para o planejamento ambiental, mostrando algumas vantagens e desvantagens. Sobre as vantagens mostra que a rede de drenagem de uma bacia pode ser capaz de indicar relações de causa-efeito. Como desvantagens, relata que nem sempre os limites municipais e estaduais respeitam os divisores da bacia. Para Christofoletti (1980), o estudo hidrológico e das características físicas de uma bacia hidrográfica tem aplicação nas seguintes áreas: escolha de fontes para abastecimento de água, projeto e construções de obras hidráulicas, projetos de drenagem, irrigação, regularização de corpos d’água e controle de inundações, controle da poluição, controle de erosão; navegação; aproveitamento hidroelétrico, operação de sistemas hidráulicos complexos, recreação e preservação do meio ambiente e preservação e desenvolvimento da vida aquática. Neste contexto, a bacia hidrográfica se torna uma unidade de estudo ambiental essencial ao entendimento da configuração do espaço geográfico. Esse estudo pode ser realizado por meio de levantamentos cartográficos ou com base em dados disponibilizados por órgãos oficiais. Entre os órgãos que possuem bancos de dados geográficos sobre as bacias hidrográficas, destaca-se aAgência Nacional de Águas (2013), que mapeia o Brasil continental em até seis diferentes níveis de codificação ou graus de classificação, segundo o método desenvolvido por Otto Pfastatter.Esse sistema de codificação associa um identificador único para cada bacia, que são organizadas em uma estrutura hierárquica. Cada um desses níveis associa-se a um diferente grau de detalhamento, consequentemente, agrega variadas quantidades de Ottobacias ou unidades de gestão, conforme se pode observar na tabela 1. 358 Tabela 1: Nível de codificação e número de Ottobacias da ANA Nível de codificação Número de Ottobacias 1 6 2 39 3 351 4 2.541 5 14.921 6 60.001 Fonte: OLIVEIRA-GALVÃO, 2012. De acordo com Rubert (2000), trata-se de um método natural, baseado na topografia da área drenada e na topologia (conectividade e direção da rede de drenagem). Ainda, a metodologia é aplicada inicialmente para o continente e consiste em agrupar a rede de drenagem em três classes: aquelas que drenam diretamente para o mar (podendo ser uma bacia ou uma região hidrográfica), aquelas que drenam para bacias fechadas e aquelas que são tributárias dos dois primeiros casos (RUBERT, 2000). Os códigos (Nunivotto) são aplicados às quatro maiores bacias hidrográficas identificadas que drenam diretamente para o mar, sendo-lhes atribuídos os algarismos pares 2, 4, 6, e 8, seguindo uma ordem no sentido horário em torno do continente. À maior bacia fechada é atribuída o código 0 (zero). As demais áreas do continente são as regiões hidrográficas restantes, as quais são atribuídos os algarismos ímpares 1, 3, 5, 7, e 9, e são denominadas interbacias (RUBERT, 2000). Tais dados podem subsidiar os mapeamentos e os planejamentos das bacias hidrográfica, porém, observam-se determinados ruídos na delimitação de bacias disponibilizada pela ANA. Uma alternativa para melhorar a acurácia dos geográficos utilizados é a delimitação manual das bacias hidrográficas com base em Cartas Topográficas, com as quais é possível observar localidades, vias de circulação, limites, áreas urbanas, bem como a altitude e a rede de drenagem. Para a delimitação manual, Finkler (2014) aponta as etapas indicadas por Sperling (2007). Nestas etapas, primeiramente, define-se o ponto inicial (exutório) a partir do qual será feita a delimitação da bacia. Após, reforça-se a marcação do curso d’água principal e dos tributários. Em próximo momento, começa-se a delimitação da bacia hidrográfica partindo do exutório e conectando os pontos mais elevados com 359 base nas curvas de nível. O limite da bacia circunda o curso d’água e as nascentes de seus tributários. Para facilitar a definição dos limites é importante diferenciar os talvegues64 dos divisores de águas65. A delimitação da bacia deve retornar ao ponto inicial definido como exutório, além disso, a rede fluvial de drenagem pode ser classificada segundo uma hierarquia como, por exemplo, a estabelecida por Horton (FINKLER, 2014). 2. OBJETIVOS Com base na contextualização inicial e em mapeamentos realizados com as diferentes bases de dados geográficos, propôs-se os seguintes objetivos: 1) Comparar dados geográficos, referentes a Bacias Hidrográficas, oriundos das Ottobacias, da Agência Nacional de Águas (ANA), e da delimitação manual dos divisores de água em Cartas Topográficas do Exército. 2) Identificar as diferenças entre as bacias hidrográficas nos mapas elaborados. 3) Analisar a confiabilidade e a acurácia cartográfica dos mapeamentos em relação à realidade e a teórica cartográfica. 3. METODOLOGIA Para a concretização dos objetivos desta proposta em primeiro momento foi realizada a leitura de textos referentes a bacias hidrográficas e sobre Ottobacias, da ANA, para aprofundar a fundamentação teórica sobre o tema.Após elaborou-se o mapa da bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim delimitado através do método de Otto Pfastatter. Para isso, foi utilizada a malha digitalOttobacias nível seis, código é 776912. Para a hipsometria da área em estudo, utilizou-se o Modelo Digital de Terreno (MDT)da Missão do ônibus espacial de topografia por radar Shuttle Radar TopographyMission (SRTM), disponibilizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), com escala de 1:250.000 e 90 metros de resolução 64 Os talvegues são depressões (vales), representados graficamente onde as curvas de nível apresentam a curvatura contrária ao sentido da inclinação do terreno, indicando que nestes locais ocorre concentração de escoamento (FINKLER, 2014). 65 Os divisores de água são representados pelo inverso de um talvegue, no qual as curvas de nível apresentam curvatura voltada para o sentido da inclinação do terreno, sobre a qual as águas escoam no sentido ortogonal às curvas em direção aos talvegues(FINKLER, 2014). 360 espacial. A unidade de altitude é em metros, sendo o formato do arquivo GEOTIFF (16 bits) e o datum é o WGS-84 (sistema de coordenadas geográficas). A rede de drenagem utilizada é disponibilizada por Hasenack; Weber (Org.), Base cartográfica vetorial contínua do Rio Grande do Sul, escala 1:50.000. O software utilizado para elaboração dos mapas é o QGISPisa(2.10.1). As camadas serão reprojetadas para o datum SIRGAS 2000/UTM 22 S. O SRTM foi cortado utilizando a camada máscara da bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim (código 776912), extraído da ottobacias nível seis, da ANA. Da mesma maneira, a rede de drenagem foi cortada utilizando a mesma camada máscara. Por fim, usa-se a ferramenta novo compositor de impressão para a finalização. Para realizar a comparação foi elaborado o mapa com base as Cartas Topográficas, na escala de 1:50.000, elaboradas pelo Exército Brasileiro. Serão utilizadas as seguintes cartas para a vetorização dos dados: Agudo (SH-22-V-C-V-2), Arroio do Só (SH-22-V-C-IV-4), Camobi (SH-22-V-C-IV-2), Faxinal do Soturno (SH-22V-C-V-1), Jacuí (SH-22-V-C-V-4), Restinga Seca (SH-22-V-C-V-3), Sanga da Laranjeira (SH-22-V-C-IV-3) e Santa Maria (SH-22-V-C-IV-1). Todas as cartas topográficas citadas possuem de uma extremidade a outra 15’ de longitude por 15’ de latitude. Para elaborar o mapa da mesma bacia por meio da delimitação manual, todas as Cartas foram georreferenciadas utilizando tipo de transformação linear e o método de reamostragem vizinho mais próximo. Foi georreferenciado no sistema de referência SAD-69/UTM 22 S. Após serem todas georreferenciadas, foi feita a criação de um mosaico, afim de unir todas em um arquivo só, sendo reprojetado para SIRGAS 2000/UTM 22 S. A partir disso, efetuou-se a digitalização bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim, a rede de drenagem, bem como as curvas de nível e pontos cotados da mesma. Com as curvas de níveis e pontos cotados digitalizadas deu-se a criação de um MDT por Interpolação triangular (TIN) para representar a hipsometria do terreno. Usou-se o novo compositor de impressão para a finalização do mapa. Ambos os mapas, o elaborado a partir da ottobacias e pelas cartas topográficas, têm oito classes para a classificação da hipsometria, com o intervalo de classes de 60 metros. Na elaboração do mapa de localização da bacia hidrográfica, foi utilizada a malha digital do IBGE 2013, a camada com o limite municipal (43MUE250GC_SIR) e o limite da bacia é o elaborado através da digitalização das cartas topográficas. As camadas foram reprojetadas para SIRGAS 2000/UTM 22 S. Para finalizar o mapa, usa-se o compositor de impressão. 361 Por fim, calculou-se a área e o perímetro das duas bacias e sobrepôs-se os layersde ambas a fim de comparar e identificar as diferenças entre ambas, analisandose a confiabilidade e a acurácia cartográfica em relação a realidade. 3.1. A área de estudo A bacia hidrográfica do rio Vacacaí-Mirim localiza-se na região central do estado do Rio Grande do Sul. O rio principal nasce no município de Itaara e tem seu exutório no rio Jacuí, em Restinga Seca -RS. Está situada entre as coordenadas geográficas 53° 46’ 30” a 53° 49’ 29” de longitude Oeste e 29° 36’ 55” a 29° 39’ 50” de latitude Sul. Conforme Gastaldinie Oppa (2011), a bacia hidrográfica possui 1.120 km², abrangendo os municípios de Santa Maria, Restinga Seca, Itaara, São João do Polêsine, Silveira Martins e Júlio de Castilhos(conforme a figura 1). Figura 1. Mapa de localização da Bacia Hidrográfica do Vacacaí-Mirim 4. DESENVOLVIMENTO 362 Com o estudo em questão foi possível comparar os dados geográficos e apontar as diferenças entre ambos. O mapa elaborado através do shapefiledas Ottobacias da ANA (figura 2a), apresentou 250.833 metros de perímetro e uma área de 1.096 km². O mapa elaborado através da digitalização da base cartográfica baseada nas cartas topográficas (figura 2b) apresentou 205.753 metros de perímetro e 1.116 km² de área. 363 Figura 2. Mapa hipsométrico da Bacia Hidrográfica do Vacacaí-Mirim: a) ottobacias e b) cartas topográficas. 364 Posteriormente a elaboração dos mapas, realizou-se uma superposição das camadas para se apontar as diferenças entre limites de cada bacia hidrográfica (figura 3). Figura 3. Superposição dos layers Comparando os dois layers, percebe-se que os limites da bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim são diferentes. Observando o mapa elaborado através da Ottobacias, nota-se que o mesmo ele agrupa rios que estão presentes em outra bacia hidrográfica, como as áreas próximas as coordenadas: 257.610mE e 6.696.120mN, na qual os afluentes são do rio Vacacaí e não do Vacacaí-Mirim. Também, ao entorno das coordenadas 272.235mE e 6.708.335mN, além de 283.340mE e 6.695.330mN, essa última próxima a foz da bacia, ambas são afluentes do rio Jacuí, mas as nascentes, conforme a Ottobacia, utilizada para elaboração do mapa fazem parte da bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim. Observa-se também, por volta da coordenada: 230.000mE e 6.714.780mN, na porção mais a oeste da bacia, a presença de um corpo de água. Trata-se da Barragem do Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS), também conhecida como Barragem do Vacacaí Mirim. No mapa elaborado 365 com base na Ottobacia, a barragem em sua maior parte é cortada e o rio principal (Vacacaí-Mirim) desaparece da bacia, voltando a aparecer na coordenada de 232.170mE e 6.712.000mN, ou seja, o rio principal, em um determinado momento deixa de fazer parte da bacia hidrográfica que nomeia. Observando o mapa baseado nas cartas topográficas, observa-se que o divisor de água é bastante sinuoso/detalhado, que buscou os pontos cotados para delimitação do mesmo, isto é, ele passa exatamente onde é a área mais elevada do terreno. Também não agrupa nascentes de outras bacias, como no caso do delimitado pela Ottobacias. Comparando a área obtida através dos shapefiles, apresentou uma diferença de 20 km². A área abrangente pela Ottobacia é de 1.096 km² e a vetorizada a partir das cartas topográficas é de 1.116 km². Com a pesquisa em referenciais teóricos, foi encontrado que a bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim possui uma área de 1.120 km², logo, delimitação baseada em cartas topográficas apresenta maior coerência com a realidade. Pela digitalização feita manualmente, também pela aproximação da área da bacia por parte do limite elaborado através das cartas topográficas, e pelo fato de não apresentar ruídos, como a presença de nascentes de outras bacias, conclui-se que o mapa elaborado com base cartográfica do exército possui uma melhor confiabilidade e a acurácia cartográfica em relação a realidade. 5. CONCLUSÃO Por meio dos mapas da Bacia Hidrográfica do Rio Vacacaí-Mirim constatou-se que as Ottobacias da ANA possuem a presença de nascentes, de afluentes, de outras bacias hidrográficas, além disso, em determinadas coordenadas o rio principal não está contido na bacia hidrográfica em estudo o que revela uma menor confiabilidade nos dados, mesmo sendo dados oficiais. Em contrapartida, o mapa elaborado através das cartas topográficas do exército possui uma área mais coerente com a realidade, abrangendo somente os rios de sua bacia. Contudo, para a correta delimitação das bacias é necessário que o mapeador/usuário conheça a teoria cartográfica e realize corretamente a delimitação do divisor de águas. Com base nessas observações, concluiu-se que o mapa elaborado tendo como base cartográfica as cartas topográficas apresentaram maior acurácia e confiabilidade do que mapa em que se utilizaram os dados das Ottobacias, da ANA. 6. AGRADECIMENTOS 366 A Universidade Federal de Santa Maria pela infraestrutura disponibilizada para a elaboração do trabalho e pela bolsa PROLICEN do primeiro autor e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo auxílio da bolsa de mestrado a terceira autora. 7. REFERÊNCIAS ANA. Agência Nacional de Águas. Bases de Dados Georreferenciadas; Ottobacias. Disponível em: <http://www.ana.gov.br/bibliotecavirtual/solicitacaoBaseDados.asp>. CHRISTOFOLETTI, A. – Geomorfologia. 2. ed. São Paulo: Edgard Blücher, 1980. 188p. FINKLER, Raquel. A bacia hidrográfica. Curso: Planejamento, Manejo e Gestão de Bacias. Agência Nacional das Águas. 2014/2. Disponível em: http://eadana.hospedagemdesites.ws/> GASTALDINI, Maria do Carmo Cauduro; OPPA, Lorenza Ferreira. Análise de Alternativas de Enquadramento do Rio Vacacaí Mirim Utilizando Modelo Matemático de Qualidade da Água. Disponível em: < https://www.abrh.org.br/sgcv3/UserFiles/Sumarios/9ebd54cc89c8442deba3aac15f7c4d 7c_c8719c0566a4baff479c06c4bc1a89f1.pdf> LANNA, A. E. L. Gerenciamento de bacia Hidrográfica: aspectos conceituais e metodológicos. Brasília, IBAMA, 1995. LIMA, Jorge Enoch Furquim Werneck. Recursos hídricos no Brasil e no mundo / Jorge Enoch Furquim Werneck Lima. - Platina: Embrapa Cerrados, 2001. OLIVEIRA, Manuel de. Manual de leitura de mapas e de orientação para combatentes de incêndios florestais. Disponível em: < http://www.terrabrasilis.org.br/ecotecadigital/pdf/manual-de-leitura-de-mapas-eorienta cao-para-combatentes-de-incendios-florestais-.pdf> OLIVEIRA-GALVÃO, Ana Lúcia Costa de. As relações espaciais entre os dados de localização de cavernas e ottobacias – base hidrográfica geocodificada do 367 Brasil. Disponível em: < http://www.icmbio.gov.br/revistaeletronica/index.php/ RBEsp/article/view/315/pdf> RUBERT, O. A. V. Codificação automática de regiões hidrográficas utilizando Sistemas de Informações Geográficas. 2000. 67p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Florestal) - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. 2000. SANTOS, R. F. Planejamento Ambiental: teoria e prática. Editora Oficial de Textos. São Paulo, 2004. 183p. 368 ANÁLISE DE ERROS ASSOCIADOS A MODELOS DIGITAIS DE ELEVAÇÃO DECORRENTES DO PROCESSO DE VETORIZAÇÃO DA REDE DE DRENAGEM ORIUNDA DE CARTAS TOPOGRÁFICAS Daniel Junges Menezes ¹ Romario Trentin ² Luís Eduardo de Souza Robaina 3 123 Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Departamento de Geociências PPGGeo 1 [email protected] 2 [email protected] 3 [email protected] Resumo Uma das fontes mais utilizadas para delimitação de bacias hidrográficas e análise do relevo por meio de SIG, no Brasil, tem sido as cartas planialtimétricas. Considerando que grande parcela destas cartas topográficas foram disponibilizadas de forma impressa, para o uso em ambiente SIG, se faz necessário a digitalização, georreferenciamento e, então, vetorização de suas informações. Associadas a todas estas etapas, podem ocorrer erros que prejudicam a acurácia e precisão das informações. O presente trabalho tem como objetivo comparar Modelos Digitais de Elevação gerados com a interpolação de redes de drenagem vetorizadas de maneiras distintas e a sua aplicabilidade na obtenção de atributos físicos de uma bacia hidrográfica. A partir dos MDEs gerados foram obtidos parâmetros morfométricos da bacia hidrográfica e comparados visualmente e de forma quantitativa as respostas oriundas perante cada MDE. O Trabalho mostrou que a vetorização da rede de drenagem, no sentido foz para nascentes, compromete a obtenção de um MDE modelo hidrológicamente consistente. Foi possível verificar que a resposta a parâmetros morfométricos se deu diferenciada quando comparados os MDEs gerados, destacando-se as grandes variações nas análises de hiposometria e declividade, informações básicas para a caracterização do relevo e estudos de processos associados a dinâmica de bacias hidrográficas. Palavras-chave: Carta topográfica; Rede de drenagem; Bacias hidrográficas; Morfometria Introdução Com os avanços tecnológicos e desenvolvimento significativo nas áreas de sensoriamento remoto e geoprocessamento, não somente a produção de mapas, mas também a análise geográfica foi otimizada e acrescida de significativos ganhos de qualidade. Tendo sua utilização cada vez mais ampla, e sendo cada vez mais difundidas também entre as demais ciências, as chamadas geotecnologias, trouxeram avanços quanto a obtenção de informações e a integração de vários elementos espaciais, como também contribuem muito com a aplicabilidade destas análises. Considerada uma unidade fundamental no planejamento e apreensão da dinâmica ambiental, seja a sua caracterização ou o estudo integrado de suas 369 características, a análise de bacias hidrográficas, tornou-se uma tarefa mais ágil por meio das novas tecnologias de obtenção e disponibilização de Modelos Digitais de Elevação – MDEs, juntamente com avanço dos Sistemas de Informação Geográfica – SIGs. O Modelo Digital de Elevação (MDE) é uma representação digital de uma seção da superfície, por meio de uma matriz de células com coordenadas planimétricas (x,y) e um valor da célula, correspondente à elevação (LUIZ et al, 2007). Com o desenvolvimento de modelos digitais de elevação (MDEs) e de técnicas mais precisas de extração de drenagem numérica e delimitação de bacias hidrográficas, tornou-se propício o uso dos sistemas de informações geográficas para obtenção automática das características físicas das bacias hidrográficas (MARQUES, 2006). Da mesma forma, o surgimento dos Sistemas de Informações Geográficas (SIGs), caracterizaram uma evolução no desenvolvimento dos modelos hidrológicos estimulando a construção de diversos sistemas integrados, conectando os modelos hidrológicos às bases de dados espaciais (CHAVES, 2002). Teodoro et al (2007), colocam que a caracterização morfométrica de uma bacia hidrográfica é um dos primeiros e mais comuns procedimentos executados em análises hidrológicas ou ambientais, e tem como objetivo elucidar as várias questões relacionadas com o entendimento da dinâmica ambiental local e regional. De maneira geral, uma das fontes mais utilizadas para delimitação de bacias hidrográficas e análise do relevo por meio de SIG, no Brasil, tem sido as cartas planialtimétricas nas escalas de 1:50000 a 1:250000, oriundas dos levantamentos topográficos realizados, principalmente no final da segunda metade do século passado, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Exército Brasileiro (DSG). Estes produtos cartográficos apresentam informações referentes à altimetria, rede de drenagem, sistema viário, manchas urbanas, uso do solo e, ainda, toponímias. Considerando que grande parcela destas cartas topográficas foram disponibilizadas de forma impressa, para o uso em ambiente SIG, se faz necessário a digitalização, georreferenciamento, e então vetorização de suas informações. Associadas a todas estas etapas, podem ocorrer erros que prejudicam a acurácia e precisão das informações, além dos quais a escala do documento cartográfico permite. Estes erros podem ter caráter espacial, tais como deslocamentos, relacionados à inclusão equivocada de valores de atributos ou, ainda, associados à geometria dos elementos representados, sendo comuns na etapa de vetorização das informações das cartas topográficas. A imprecisão se dá por limitações da própria tarefa de vetorização e incluem equívocos do operador e também metodológicos, que muitas 370 vezes respondem na aplicação destas informações e, consequentemente, nos resultados oriundos de sua análise. Neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo comparar Modelos Digitais de Elevação gerados com a interpolação de redes de drenagem vetorizadas de maneiras distintas e a sua aplicabilidade na obtenção de atributos físicos de uma bacia hidrográfica. A área de estudo corresponde à bacia hidrográfica do arroio Guassupi, localizada no município de São Pedro do Sul, porção central do Rio Grande do Sul (Figura 1). A partir dos MDEs gerados foram obtidos parâmetros morfométricos da bacia hidrográfica e comparados visualmente e de forma quantitativa as respostas oriundas perante cada MDE. Figura 1 - Localização da bacia hidrográfica do Arroio Guassupi. Org.: Os autores, 2015 371 Materiais e métodos A primeira etapa deste trabalho constituiu-se no levantamento bibliográfico, procurando-se estabelecer um referencial teórico sobre a temática abordada, delimitado por conceitos norteadores e buscando trabalhos anteriores que remetem à discussão em escopo. Através desta, aprofundaram-se os conceitos e abordagens da temática investigativa. Com esse propósito, e subsidiada por diversos autores, é que se estabeleceu a estrutura teórica e metodológica a respeito da análise de bacias hidrográficas a partir de MDEs e identificação de erros associados a estes modelos. Para obtenção de um primeiro MDE oriundo de cartas topográficas, foi utilizado a Base cartográfica vetorial contínua do Rio Grande do Sul na escala 1:50.000 (HASENACK; WEBER, 2010). Esta base vetorial contém elementos da altimetria (pontos cotados e curvas de nível), hidrografia, sistema viário, manchas urbanizadas e limite do Estado, resultantes da vetorização de 462 cartas da Diretoria de Serviço Geográfico do Exército (DSG) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sendo 460 na escala 1:50.000 e duas na escala 1:100.000. Os dados espaciais digitais encontram-se georreferenciados em SIRGAS 2000 (Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas, realização 2000), de acordo com os parâmetros oficiais do Sistema Geodésico Brasileiro e encontram-se no sistema de projeção UTM (Universal Transversa de Mercator), fusos 21 e 22. Os dados vetoriais estão armazenados no formato shape (ESRI©) (HASENACK; WEBER, 2010). Para cobertura do arroio Guassupi foram utilizadas as cartas topográficas de São Pedro do Sul e Quevedos com índice de nomenclatura SH.21-X-D-VI-2 e SH.21X-D-III-4, respectivamente. A área de cobertura destas cartas foi utilizada como limite da área interpolada. As informações oriundas das cartas topográficas foram processadas, gerando assim um MDE, através da ferramenta topo to raster do Arc Toolbox disponível no software ArcGis (ArcMap) 10.1 (ESRI, 2012). Este é baseado no programa ANUDEM desenvolvido por Michael Hutchinson (1988, 1989, 1996, 2000, 2011). Através desta ferramenta, é possível gerar um Modelo Digital de Elevação Hidrologicamente Consistente (MDEHC). Foram interpolados, a partir do software, pontos cotados e curvas de nível para determinação de altimetria, drenagens no formato linha, como áreas de fluxo preferencial, drenagens no formato polígono para área rebaixadas. Sendo assim, o MDE se deu a partir da geração de uma grade retangular corresponde a uma matriz (raster) com espaçamento fixo, onde cada ponto da grade apresenta um valor estimado a partir da interpolação das amostras. 372 Na etapa seguinte foram realizados procedimentos empregados para a delimitação da bacia hidrográfica a partir do MDE, seguindo proposta de Jensen e Domingue (1988) e ainda as aplicações de Paz e Collischonn (2008), Buarque (2008), Medeiros (2009), Rocha et al (2015), entre outros estudos de caso. São utilizadas funções do módulo Spatial Analyst - Hydrology do software ArcGIS versão 10.1 (ESRI, 2012). A bacia hidrográfica em formato vetorial foi utilizada para o recorte de seu respectivo MDE. Portanto, a delimitação automática da área captação obtida MDE passou a corresponder à geometria das informações obtidas. A próxima etapa esteve associada à análise do MDE obtido, sendo analisados a amplitude altimétrica, perímetro e área da bacia hidrográfica, além da distribuição de classes hipsométricas e obtenção de classes de declividade. O mapa hipsométrico teve suas classes definidas através das linhas de quebra do relevo, compostas de altitudes contínuas considerando a equidistância de 60 metros. Foram estabelecidas as classes: < 120m; 120 – 180m; 180 – 240m; 240 – 300m; 300 – 360m; 360 – 420m; O mapa de declividade foi elaborado, a partir da ferramenta slope, dividindose o terreno em seis classes: < 2%; 2% - 5%; 5% - 15%; adaptadas do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo). Ainda as classes sugeridas por De Biase (1992): 15% - 30%; 30 – 47%; áreas com declives superiores a 47%. Para uma melhor análise do comportamento do relevo, foi traçado um perfil topográfico com cerca 8,5 quilômetros de extensão, com um exagero vertical de cinco vezes, com o intuito de mostrar o comportamento altimétrico da superfície e algumas variações quanto ao desenho das vertentes e vales na bacia hidrográfica. Este perfil se deu a partir de uma linha que estendeu-se no sentido NE – SO, interseccionando o curso médio da bacia hidrográfica, passando por interflúvios a calha do arroio Guassupi. Concluídas as etapas descritas, o conhecimento prévio da área de estudo permitiu avaliar que a resposta quanto aos parâmetros obtidos, não se deu de forma satisfatória e condizente com as características da bacia hidrográfica. Foi então, identificado inconsistência hidrológica no Modelo Digital de Elevação em função do processo de vetorização da rede de drenagem utilizada, cuja se deu, em alguns segmentos da rede de drenagem, no sentido foz para montante. Portanto, se fez necessário uma correção topológica da drenagem vetorial disponível na base utilizada. Adaptando a proposta de Luiz e Faria (2013), foi identificado primeiramente os chamados end points, para verificação da foz de cada drenagem, e então identificação da inconsistência topológica. Posteriormente foi 373 utilizado a ferramenta flip, que consiste na alteração do sentido de digitalização da rede de drenagem, e então, novamente obtidos os endpoints para verificação das correção topológica automática e também para identificação das drenagens que necessitam de nova vetorização. Digitalizada uma nova rede de drenagem vetorial, foram repetidos os procedimentos para obtenção do de um novo MDE e também para obtenção de informações a partir deste. Estabelecidos os MDEs em resolução equivalente, este foram comparados sob o aspecto visual e quantitativo, quanto a resposta aos parâmetros obtidos e analisados. Em todo o banco de dados foi utilizado Sistema de Coordenadas UTM – 21S, Datum vertical Sirgas 2000 (Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas). Resultados Quanto a delimitação automática da área de captação, diante a metodologia proposta, os dois modelos obtiveram respostas satisfatórias quanto ao desenho da bacia hidrográfica, considerando os interflúvios e drenagens que compõem o sistema até a sua foz. O MDE gerado com a inclusão das drenagens vetorizadas originalmente identificou uma área de captação de 77,28 km², enquanto o MDE gerado com as drenagens corrigidas obteve uma área de 77,86 km², indicando um aumento de 0,54% na área após o segundo processamento. Quanto ao perímetro total da bacia hidrográfica gerado, os MDEs apresentaram, respectivamente, os valores de 45,54 km e 43,74 km, indicando uma diminuição de 3,95% em relação ao primeiro processamento, caracterizando uma suavização no delineamento da bacia hidrográfica. Quanto a análise dos MDEs na obtenção de características físicas como altimetria e declividades, uma primeira análise se dá pelas altitudes máxima e mínima encontradas na bacia hidrográfica, e consequente amplitude total, dada por cada MDE. Os parâmetros obtidos a partir de cada MDE e a sua variação percentual podem observados na Tabela 1. Tabela 1 - Parâmetros da bacia hidrográfica do arroio Guassupi obtidos partir de MDEs gerados com a rede de drenagem vetorizada originalmente e corrigida. Área da bacia hidrográfica MDE - drenagem original MDE - drenagem corrigida Variação percentual 78,28 km² 77,86 km² 0,54% 374 Perímetro da bacia hidrográfica 45,54 km 43,74 km -3,95% Altitude máxima 443 m 432 m -2,48% Altitude mínima 92 m 92 m 0,00% Amplitude total 351 m 340 m -3,13% Org.: Os autores, 2015 As variações entre os dois MDEs gerados se deu em função da altitude máxima e consequentemente, na amplitude total. O MDE gerado com a inclusão das drenagens de vetorizadas originalmente identificou 443 metros como maior altitude, enquanto o MDE gerado com as drenagens corrigidas obteve 432 metros na mesma análise, indicando uma diminuição de 2,48%. A altitude mínima obtida junto à foz foi equivalente (92 metros), caracterizando uma variação na amplitude altimétrica de 3,13%. Esta variação está associada à inclusão de valores diretos de ponto cotados no primeiro MDE gerado, que em função da direção de fluxo estabelecida de forma errônea, estabeleceu divisores de água mais angulares e menos suavizados, em relação ao segundo MDE, que foi gerado a partir da drenagem e, consequente, direção de fluxo, corrigidos. A partir da Figura 2 é possível observar a delimitação da bacia hidrográfica a partir dos dois Modelos Digitais de Elevação gerados, juntamente com a resposta de ambos diante a análise da hipsometria e também da declividade para bacia hidrográfica do arroio Guassupi. 375 Figura 2 - Distribuição espacial das classes hipsométricas (A e B) e de declividade (C e D), da bacia hidrográfica do arroio Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida. Org.: Os autores, 2015. A análise visual da distribuição espacial das classes de hipsométricas, obtida a partir do MDE gerado com as drenagens vetorizadas originalmente (Figura 2A) e obtida a partir do MDE gerado com as drenagens corrigidas (Figura 2B), permite verificar que no Modelo Digital de Elevação gerado com a presença de drenagens vetorizadas originalmente e, portanto, em grande maioria, no sentido foz para montante, apresenta um demasiado entalhamento dos vales em função da inversão da direção de fluxo preferencial. Portanto, o processo de digitalização da rede de drenagem estabelecido na base vetorial utilizada, quando submetido ao processo de interpolação, ocasionou o rebaixamento dos vales e mostrou-se equivocado na obtenção da hipsometria, o que não se deu após a correção topológica da rede de drenagem e obtenção de um novo MDE. 376 Este fato respondeu, consequentemente, na distribuição e representatividade de cada classe hipsométrica na bacia hidrográfica, sendo que no MDE gerado com as drenagens vetorizadas originalmente, obteve-se uma superestima das classes compreendidas entre as altimetrias inferiores a 120 metros e até 240 metros, em função do entalhamento do rebaixamento dos vales, sendo as altimetrias compreendidas entre os 240 metros até os 420 metros subestimadas, em relação ao MDE gerado com as drenagens corrigidas. Quanto a representatividade da altimetria superior a 420 metros, o segundo MDE apresentou uma menor área em relação ao primeiro, tendo em vista a menor homogeneização dos interflúvios descrita anteriormente. A área compreendida em cada classe e sua representatividade perante a área de bacia hidrográfica do arroio Guassupi pode ser observada a partir da Tabela 2: Tabela 2 - Distribuição das classes hipsométricas da bacia hidrográfica do arroio Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida. Classes MDE - drenagem original MDE - drenagem corrigida < 120 m 4,21 km² 5,38% 3,00 km² 3,87% 120 - 180 m 18,31 km² 23,39% 17,51 km² 22,49% 180 - 240 m 18,18 km² 23,22% 17,51 km² 22,49% 240 - 300 m 17,47 km² 22,32% 18,54 km² 23,82% 300 - 360 m 13,41 km² 17,13% 14,51 km² 18,64% 360 - 420 m 6,41 km² 8,19% 6,60 km² 8,48% > 420 m 0,28 km² 0,36% 0,16 km² 0,22% TOTAL Org.: Os autores, 2015. 78,28 km² 100,00% 77,86 km² 100,00% Quanto a resposta perante a obtenção das declividades da bacia hidrográfica, a análise visual da distribuição espacial das classes de declividade, obtida a partir do MDE gerado com as drenagens vetorizadas originalmente (Figura 2C) e obtida a partir do MDE gerado com as drenagens corrigidas (Figura 2D), permite verificar que no Modelo Digital de Elevação gerado com a presença de drenagens vetorizadas originalmente e, portanto, em grande maioria, no sentido foz para montante, apresenta um demasiado declive junto aos vales em função do rebaixamento dos vales originado na inversão da direção de fluxo preferencial. Portanto, da mesma forma que na obtenção das classes de hipsometria, o processo de digitalização da rede de drenagem estabelecido na base vetorial utilizada, quando submetido ao processo de interpolação, mostrou-se equivocado na obtenção da declividade e ocasionou o demasiado encaixe da rede de drenagem, o que não se deu após a correção topológica da rede de drenagem e obtenção de um novo MDE. Esta condição evidencia-se quando analisados a distribuição percentual das classes de declividade em cada um dos MDEs gerados, conforme mostra a Tabela 3. 377 Tabela 3 - Distribuição das classes de declividade da bacia hidrográfica do arroio Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida. Classes MDE - drenagem original <2% 2%-5% 5 % - 12% 12 % - 30 % 30 % - 47 % > 47 % TOTAL Org.: Os autores, 2015. 5,81 km² 5,82 km² 14,82 km² 25,86 km² 11,96 km² 14,00 km² 78,28 km² 7,42% 7,44% 18,93% 33,03% 15,28% 17,88% 100,00% MDE - drenagem corrigida 4,26 km² 9,35 km² 19,86 km² 27,86 km² 11,86 km² 4,66 km² 77,86 km² 5,47% 12,02% 25,51% 35,78% 15,24% 5,98% 100,00% É possível observar que no primeiro MDE gerado há uma grande representatividade na classe de menor declividade (<2%) e também nas classes de maior declividade (entre 30% e 47% e maior que 47%), em relação ao segundo MDE. Isto se dá justamente pelo processo de rebaixamento das nascentes e consequentemente dos vales, o que superestima as áreas planas de fundo de vale e, da mesma forma, evidencia os gradientes das vertentes, gerando um aumento das declividades nas áreas próximas às drenagens. Todavia, com a correção topológica há uma suavização dos vales e, consequentemente, das declividades médias da bacia hidrográfica, sendo que no segundo MDE obtido há uma diminuição na representatividade das classes descritas acima e uma maior representatividade nas classes compreendidas entre 2% e 30% de declividade, em relação ao MDE gerado inicialmente. Outra análise comparativa, entre o MDE gerado com as drenagens vetorizadas originalmente e o MDE gerado com as drenagens corrigidas, se deu pelo traçado de uma seção transversal do terreno, no sentido NE – SO, junto ao curso médio da bacia hidrográfica do arroio Guassupi. Os respectivos perfis topográficos obtidos a partir do MDEs gerados com a drenagem vetorizada no sentido foz para nascente e, posteriormente, com a drenagem corrigida, caracterizam no primeiro, o entalhamento das vertentes e o um demasiado encaixe dos vales, inconsistentes com a topografia da área de estudo, o que não acontece no segundo perfil traçado, conforme pode ser observado na Figura 3. 378 Figura 3 - Perfis topográfico NE – SO da bacia hidrográfica do arroio Guassupi, a partir de MDEs gerados com a drenagem vetorial original e corrigida. Org.: Os autores, 2015. Conclusões A partir do objetivo proposto e metodologia estabelecida para comparação dos dois MDEs gerados, evidenciou-se que o processo de vetorização da rede de drenagem oriunda de cartas topográficas pode vir a induzir erros associados a Modelos Digitais de Elevação, comprometendo assim, os resultados obtidos e informações geradas. O Trabalho mostrou que a vetorização da rede de drenagem, como realizada em grande parte dos segmentos da base vetorial utilizada, no sentido foz para nascentes, compromete a obtenção de um MDE modelo hidrológicamente consistente a partir dos interpolador topo to raster. Da mesma forma, a resposta a parâmetros morfométricos se deu de forma diferenciada quando comparados os MDEs gerados, destacando-se as grandes variações nas análises de hiposometria e declividade, informações básicas para a caracterização do relevo e estudos de processos associados a dinâmica de bacias hidrográficas. No entanto, o processo de correção topológica, realizado a partir da metodologia proposta, mostrou-se eficiente para a base cartográfica utilizada, caracterizando-se um processo rápido e eficiente para adequação da drenagem vetorial para fins de obtenção de Modelos Digitais de Elevação para estudos de relevo em bacias hidrográficas. Ressalta-se ainda que o presente trabalho não caracteriza uma crítica ou invalida a base vetorial utilizada no estudo, tendo em vista que esta caracteriza-se com uma excelente base cartográfica para estudos das mais variadas tipologias do âmbito geográfico. Portanto, os resultados obtidos buscam contribuir com as 379 discussões referentes à obtenção de bases vetoriais e a utilização de bases já disponíveis, somando-se aos avanços das geotecnologias cada vez mais presentes na análise geográfica. Referências CHAVES, M. de A. Modelos digitais de elevação hidrologicamente consistentes para a bacia Amazônica. Tese (Doutorado em Ciência Florestal) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG. UFV, 2002. DE BIASI, M.; A Carta Clinográfica. Os Métodos de Representação e Confecção. Revista do Departamento de Geografia, São Paulo,n. 6, p.45 -60, 1992. ELESBON, A. A. E.; GUEDES, H. A. S.; SILVA, D. D. DA; OLIVEIRA, I. 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Revista Uniara, v.20, p.137-157, 2007. 381 Potencialidad de las imágenes satelitales de alta resolución en la detección de especies leñosas invasoras Beatriz Sosa; Carlos Chiale, Gabriela Fernández, Marcel Achkar Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio Facultad de Ciencias UdelaR Beatriz Sosa, [email protected]; Carlos Chiale, [email protected]; Gabriela Fernandez, [email protected]; Marcel Achkar,[email protected] Resumen Conocer el patrón de distribución de una especie invasora resulta esencial para definir estrategias de control eficientes. Las técnicas de teledetección constituyen una herramienta de apoyo apropiada para identificar y cartografiar patrones de distribución de las especies vegetales. Actualmente las imágenes satelitales de alta resolución espacial brindan nuevas oportunidades para el mapeo de la vegetación por lo que resulta pertinente evaluar la potencialidad de su aplicación. En el Parque Nacional Esteros de Farrapos e Islas del Río Uruguay la leñosa invasora Gleditsia triacanthosconstituye una de las principales amenazas para la conservación de la biodiversidad. Identificar su patrón de distribución se constituye en un insumo relevante para definir estrategias de control. En este trabajo se evaluó el potencial de detección de G.triacanthos mediante el procesamiento de tres imágenes satelitales de alta resolución: pancromática 0,5m; multiespectral 2m y fusionada 0,5m. Se utilizó el método de clasificación por objetos basado en ejemplos. La imagen fusionada presenta el mayor potencial para la detección de G.triacanthoscon una fiabilidad del 60%. La clasificación obtenida sobreestima la presencia de G.triacanthos en el bosque, pero resulta muy fiable en la identificación de áreas no invadidas brindando información relevante para el diseño de estrategias de gestión proactiva. Palabras clave: imagen satelital de alta resolución, imagen pancromática, imagen multiespectral, imagen fusionada, especie invasora. 382 Introducción Las invasiones biológicas constituyen uno de los principales factores en la pérdida de diversidad biológica y en la alteración de la capacidad de los ecosistemas para proveer servicios ambientales (Vitousek et al. 1997).Conocer el patrón de distribución de una especie invasora resulta esencial para definir estrategias de control eficientes, visualizar la posible dinámica del proceso de invasión (Bradley &Mustard 2006; Byers et al. 2001; Rew et al.2005) y prever el potencial desarrollo del proceso invasivo. Además permite identificar potenciales mecanismos de dispersión así como definir la susceptibilidad de distintos tipos de hábitat al proceso de invasión (Andersen et al. 2004; Cohen &Goward 2004; Parker et al. 1999). Las técnicas de teledetección constituyen una herramienta de apoyo apropiada para identificar y cartografiar los patrones de distribución de las especies vegetales. Desde el lanzamiento del satélite IKONOS-2 en Setiembre de 1999 surgieron nuevas oportunidades para el mapeo de la vegetación (Carleer& Wolff 2004) como la identificación de comunidades vegetales e incluso especies (Turner et al 2003).La identificación de tipos de vegetación mediante el procesamiento de imágenes pancromáticas ha permitido identificar una especie leñosa del conjunto de la comunidad boscosa (Tsai&Chou 2006). En otros estudios las posibilidades de discriminación de la imagen pancromática ha resultado menor; en los bosques de montaña de los alpes japoneses la clasificación con imágenes pancromáticas permitió distinguir dos tipos de comunidades vegetales mientras que el uso de las imágenes multiespectrales permitió discriminar seis (Kosaka et al 2005). Esta variedad de resultados apoyan lo planteado por Chuvieco (1995) quien señala que la clasificación digital no pretende la definición absoluta de cada cubierta sino más bien que la misma es válida para una determinada imagen en un territorio y momento dados. Por lo tanto no resulta razonable estandarizar las técnicas de procesamiento en relación a sus resultados pero si evaluar la potencialidad de su aplicación en el uso de los recursos naturales y la gestión del territorio. Las características espectrales de la vegetación se deben al tipo de pigmentos de sus hojas, a la estructura de la planta y a su estado de salud (Gilmore et al. 2008). Por tal motivo, si la especie invasora presenta una fenología distinta a la de la comunidad de especies nativas existe una ventana temporal que optimiza la identificación de la especie invasora mediante teledetección (Wilfong, 2009). Gleditsia triacanthos es una especie leñosa perteneciente a la familia de las fabáceas, originaria de Norte América. En la actualidad se la considera como especie invasora en Argentina y Uruguay 383 (Chaneton et al. 2004; Nebel &Porcile 2006). En el Parque Nacional Esteros de Farrapos e Islas del Río Uruguay (PNEF) G.triacanthosse ha constituido en la especie dominante en varias áreas del bosque nativo(DINAMA 2014). Esta especie se diferencia del conjunto de la comunidad de leñosas nativas por su estructura fustal y su comportamiento caducifolio. En tal sentido se plantea como hipótesis orientadora que las diferencias estructurales y fenomenológicas de G.triacanthos en relación a la comunidad de especies nativas permitirán su identificación mediante técnicas de teledetección. En este marco este trabajo se desarrolló con el objetivo de evaluar el potencial de la imagen pancromática, multiespectral y fusionada en la identificación de G.triacanthos. Metodología Sistema de estudio El PNEF pertenece al Sistema Nacional de Áreas Protegidas de Uruguay; ubicado sobre la costa del Río Uruguay 32°37’36.308”S- 58°09’40.920”O. abarca 5.760 ha de bosque fluvial, praderas con régimen de inundación semipermanente, áreas paludosas, lagunas y arenales fluviales. El área de estudio comprende 135 ha de bosque fluvial. Constituye un ambiente de características hidromórficas y topografía plana. El área es atravesada por un pequeño curso de agua que define dos zonas: al norte del curso área sin invasión y al sur del mismo área invadida (Fig. 1). Gleditsia triacanthoses un árbol caducifolio de copa amplia (10-12 metros) y poco densa, porte ovoide que se vaabriendo con la edad y termina aparasolado. Presenta hojas alternas pinati o bipinaticompuestas; su fruto es una legumbre lineal-comprimida (Sabattini et al. 2009). Es una especie caducifolia; florece en la primavera del hemisferio sur; la fructificación se inicia a comienzos del verano (Diciembre) y se prolonga hasta entrado el otoño (Mayo) (Rossi et al 2008). Imágenes satelitales Se utilizó una imagen pancromática de 0,5m de resolución espacial y una multiespectral (Rojo, Verde, Azul, Infrarrojo cercano) de 2 m de resolución espacial. Fueron captadas por el satélite Geoeye lanzado en setiembre de 2008 y equipado con la más avanzada tecnología para los satélites comerciales (SEMAR, 2015). La nubosidad de las imágenes fue menor al 15% y su calidad mayor al 50%. Las imágenes corresponden a Mayo del 2013 fecha en la cual las diferencias espectrales entre G.triacanthos y el bosque nativo se acentúan debido a su comportamiento caducifolio. 384 Procesamiento de imágenes Los métodos tradicionales de clasificación de imágenes se basan en la respuesta espectral de cada pixel.El método de clasificación basado en objetos utiliza tanto datos espectrales como espaciales (tamaño, forma, textura y asociación con los objetos vecinos); su utilización ha resultado satisfactoria cuando la clasificación se realiza sobre tipos de vegetación que presentan una respuesta espectral similar (Gibbes et al 2010). Si bien las diferencias fenomenológicas debieran maximizar la diferencia espectral entre la comunidad de nativas y G.triacanthoseste método presenta mayor 385 potencialidad para discriminar entre clases similiares y por tanto será utilizado en el presente trabajo. La clasificación se realizó en el programa ENVI 5.0 utilizando los algoritmos Edge en el proceso de segmentación y Full Lambda Schedule en el de unión. La imagen multiespectral fue preprocesada mediante una clasificación de máxima verosimilitud extrayéndose las áreas de sombra e hidromorfismo permanente. La imagen pancromática no fue preprocesadamediante la mencionada clasificación ya que se entendió que la clasificación por objeto que integra la información espectral y espacial resulta más apropiado para el tratamiento de una imagen pancromática. La imagen fusionada se generó mediante el proceso PCSpectralSharpeningcon aplicación de máscara en la banda 2. Se obtuvo así una imagen multiespectral de 0,5m de resolución. Sobre esta imagen se aplicó otro proceso de fusión (proceso Gram Schmidt Pan Sharpening); este procedimiento optimizó la visualización de la imagen fusionada. En las imágenesmultiespectral y fusionada se realizó una primera clasificación por objeto basada en ejemplos seleccionando 4 categoríasque fueron identificadas en la pantalla de previsualización: (1) Bosque, área boscosa al norte de la cañada; (2) G.triacanthos: área boscosa con alta densidad de individuos de G.triacanthos identificada durante trabajo de campo; (3) Sauce: área boscosa con alta densidad de Sauces (Salixhumboldiana) identificada durante trabajo de campo; (4) Pastizal.En laimagen pancromática (sin preprocesamiento) se incluyó la categoría Hidromorfismo permanenteque se corresponde con áreas paludosas. Las clasificaciones obtenidas presentaron 4 clases: sin clasificar, bosque, sauce, G.triacanthos, pastizal. Laimagen pancromática presentó baja capacidad de discriminación; por tal motivo se resolvió culminar con su proceso de clasificación. Las imágenes multiespectral y fusionada fueron reclasificadas utilizando la opción de inclusión de archivo de campo verdadero. Para ello se creó un nuevo vector con las siguientes categorías: (1) G.triacanthos; corresponde a la clasepredominante identificada en el área de alta densidad de G.triacanthos. (2)No G.triacanthos; polígonos identificados en la clase G.triacanthospero que no se corresponden con esa especie ya que se encuentran en el área sin invasión. (3) Pastizal; polígonos que efectivamente se ubican en áreas de pastizal (4) Árboles; polígonos incluidos en la clase pastizal pero que son árboles. Se generó así una nueva clasificación en la que se identificaron las categorías: sin clasificar, bosque, sauce, G.triacanthos y pastizal. 386 Para validar los resultados de la clasificación se utilizaron datos de terreno que consta de un total de 86 puntos de los cuales 49 corresponden a áreas de Bosque y 37 a áreas de G.triacanthos. Se construyó una matriz de confusión con la que se calculó la fiabilidad de la clasificación como el cociente entre el número de áreas bien clasificadas y el número total de áreas muestreadas. Se calculó la fiabilidad de comisión y omisión para las clases de Bosque y G.triacanthos. La fiabilidad de comisión se calculócomo el cociente entre el número de aciertos para una clase dada y el total de predicciones realizadas para esa clase. La fiabilidad de omisión fue calculada como el cociente entre el número de puntos acertados de una clase dada y el total de puntos muestreados para esa clase. Fig. 2 Metodología de clasificación utilizada para las imágenes pancromática, multiespectral y fusionada Resultados y Discusión La visualización de la imagen pancromática permite la identificación de grandes tipos de vegetación así como su categorización en relación a la densidad. Esta visualización es posible con la imagen multiespectral pero la imagen pancromática brinda mayor nivel de detalle (Fig. 1). No obstante, el proceso de clasificación por objetos sobre la imagen pancromática no brindó buenos resultados ya que no presentó capacidad para discriminar la ausencia de G.triacanthos en el área sin invasión y presentó poca 387 capacidad para detectar a G.triacanthosen el área invadida. (Fig. 2). Estos resultados mejoran con la clasificación sobre la imagen multiespectral que presenta mayor potencialidad para la detección de G.triacanthos en el área invadida y pequeños polígonos clasificados como G.triacanthos en el área sin invasión. Cabe señalar que muchos de estos polígonos no corresponden a áreas boscosas sino a áreas de pastizal. Además la imagen multiespectral presentó mejor capacidad en la detección del área de sauces visualizándosela como una zona homogénea. En la clasificación sobre la imagen pancromática esta zona está comprendida fundamentalmente por la clase que también comprende a G.triacanthos(áreas rojas Fig.2.a) Sauces Área no invadid a a Área no invadid a b Figura 3. Clasificación por objetos. (a) Imagen pancromática (b) Imagen multiespectral. Los círculos blancos muestran las áreas clasificadas como G.triacanthos en áreas invadidas. La clasificación sobre la imagen fusionada presenta mayor capacidad para detectar al conjunto de la masa boscosa. De hecho, ésta se ajusta casi completamente a la masa boscosa e incluso identifica individuos leñosos aislados (Figura 4). Sobre la imagen multiespectral un conjunto importante de individuos leñosos quedan fuera de la clasificación (Figura 4). No obstante la clasificación sobre la imagen fusionada presenta aún problemas para discriminar entre áreas de pastizales y áreas boscosas (Figura 4). 388 Figura 4. Clasificación por objetos. (a) Imagen multiespectral (b) Imagen fusionada. La imagen fusionada presenta mayor potencial para la identificación de G.triacanthossiendo su capacidad de acierto total del 80% en comparación con la imagen multiespectral cuya capacidad de acierto fue del 74% (Tabla 1). Además presenta mayor potencialidad para detectar a G.triacanthos su fiabilidad de comisión fue del 62% mientras que la imagen multiespectral alcanzó solo el 51% (Tabla 1). Tabla 1. Validación de la clasificación Fiabilidad de la clasificación Imagen Fusionada Imagen Multiespectral Acierto Total 0,80 0,74 Fiabilidad de comisión Bosque 0,94 0,92 Fiabilidad de comisión G.triacanthos 0,62 0,51 Fiabilidad de omisión Bosque 0,77 0,71 Fiabilidad de omisiónG.triacanthos 0,88 0,83 Por otra parte la fiabilidad de comisión para el Bosque fue muy alta en ambas clasificaciones (93% para la imagen fusionada y 91% para la imagen multiespectral) indicando que estas clasificaciones son buenas para detectar áreas en las que la especie invasora no se encuentra presente. Se plantea que la estrategia más eficiente para el control de una especie invasora es la de limitar su establecimiento ya que se evitan sus impactos y se previene la conformación de nuevos focos de invasión. Por lo tanto la información que proveen estas clasificaciones resulta un insumo útil para la implementación de estrategias de gestión proactivas. 389 En ambas clasificaciones las clases definidas como G.triacanthos sobreestiman la distribución real de la especie. En este punto se identifican tres problemas: (1) esta clase incluye además de áreas boscosas áreas de pastizales que no fue posible discriminar mediante la metodología utilizada. Estas áreas son fácilmente identificables mediante el análisis visual de la imagen, especialmente en la imagen fusionada, por lo que su exclusión resulta más o menos sencilla. (2) un conjunto diverso de factores que podrían generar variabilidad en la firma espectral de los individuos de G.triacanthoscomo su altura, densidad del dosel, posición, vigor, y tipo de ambiente en el que se ubica y (3) la presencia de otras especies leñosas con una firma espectral semejante a la de la invasora debido a que presentan una morfología y/o fenomenología similar. Este punto es especialmente relevante si se considera que el patrón espectral entre las áreas actualmente discriminadas como Bosque y G. triacanthospresenta variaciones muy pequeñas; para una longitudde onda de 0,50 micrométros el valor registrado fue de 150DN para G.triacanthosy de 180 para las áreas de Bosque (Fig.5). Esta diferencia se acentúa para longitudes de onda mayores a 0,80 que presentaron valores de 350 y 600 para las áreas de G.triacanthos y Bosque respectivamente (Fig.5).En tal sentido resulta pertinente continuar evaluando procesamientos que permitan identificar y maximizar las diferencias espectrales que sólo consideren a la clase definida como G.triacanthos. La imagen fusionada parece presentar la mayor potencialidad para continuar con los análisis mejorando su capacidad de detección. Figura 5. Patrón espectral sobre imagen fusionada. (a) Patrón sobre área de bosque (b) Patrón sobre G.triacanthos Conclusiones Los tres tipos de imágenes analizadas brindan información relevante pero diferencial sobre el patrón de distribución de los principales tipos de vegetación en el área de estudio. El método de clasificación por objetos basado en ejemplos no presentó 390 capacidad de discriminación sobre la imagen pancromática. La capacidad de discriminación mejora cuando la clasificación se realiza sobre la imagen multiespectral pero la fiabilidad en la detección de G.triacanthos es muy baja. Los resultados de la clasificación mejoran utilizando la imagen fusionada pero aún la fiabilidad de detección de G.triacanthos resulta baja. La presencia de G.triacanthos en esta clase resulta sobreestimada. Identificary maximizar las diferencias espectrales de los objetos dentro de esta clase constituyen el principal desafío para mejorar la capacidad de detección de la especie invasora. El método utilizado presenta un alto porcentaje de fiabilidad sobre las áreas de bosque por lo que la clasificación utilizada resulta apropiada para identificar áreas en las que el proceso invasivo no se ha consolidado aún. Esta información resulta relevante en el marco de la gestión proactiva. Bibliografía Andersen, M., Adams,H., Hope, B. & Powell, M. (2004). Risk analysis for invasive species: general framework and research needs. 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POTENCIALIDAD DE LAS IMÁGENES SATELITALES DE ALTA RESOLUCIÓN EN LA DETECCIÓN DE ESPECIES LEÑOSAS INVASORAS Beatriz Sosa; Carlos Chiale, Gabriela Fernández, Marcel Achkar Laboratorio de Desarrollo Sustentable y Gestión Ambiental del Territorio Facultad de Ciencias UdelaR Beatriz Sosa, [email protected]; Carlos Chiale, [email protected]; Gabriela Fernandez, [email protected]; Marcel Achkar,[email protected] Resumen Conocer el patrón de distribución de una especie invasora resulta esencial para definir estrategias de control eficientes. Las técnicas de teledetección constituyen una herramienta de apoyo apropiada para identificar y cartografiar patrones de distribución de las especies vegetales. Actualmente las imágenes satelitales de alta resolución espacial brindan nuevas oportunidades para el mapeo de la vegetación por lo que resulta pertinente evaluar la potencialidad de su aplicación. En el Parque Nacional Esteros de Farrapos e Islas del Río Uruguay la leñosa invasora Gleditsia triacanthosconstituye una de las principales amenazas para la conservación de la biodiversidad. Identificar su patrón de distribución se constituye en un insumo relevante para definir estrategias de control. En este trabajo se evaluó el potencial de detección de G.triacanthos mediante el procesamiento de tres imágenes satelitales de alta resolución: pancromática 0,5m; multiespectral 2m y fusionada 0,5m. Se utilizó el 393 método de clasificación por objetos basado en ejemplos. La imagen fusionada presenta el mayor potencial para la detección de G.triacanthoscon una fiabilidad del 60%. La clasificación obtenida sobreestima la presencia de G.triacanthos en el bosque, pero resulta muy fiable en la identificación de áreas no invadidas brindando información relevante para el diseño de estrategias de gestión proactiva. Palabras clave: imagen satelital de alta resolución, imagen pancromática, imagen multiespectral, imagen fusionada, especie invasora. Introducción Las invasiones biológicas constituyen uno de los principales factores en la pérdida de diversidad biológica y en la alteración de la capacidad de los ecosistemas para proveer servicios ambientales (Vitousek et al. 1997).Conocer el patrón de distribución de una especie invasora resulta esencial para definir estrategias de control eficientes, visualizar la posible dinámica del proceso de invasión (Bradley &Mustard 2006; Byers et al. 2001; Rew et al.2005) y prever el potencial desarrollo del proceso invasivo. Además permite identificar potenciales mecanismos de dispersión así como definir la susceptibilidad de distintos tipos de hábitat al proceso de invasión (Andersen et al. 2004; Cohen &Goward 2004; Parker et al. 1999). Las técnicas de teledetección constituyen una herramienta de apoyo apropiada para identificar y cartografiar los patrones de distribución de las especies vegetales. Desde el lanzamiento del satélite IKONOS-2 en Setiembre de 1999 surgieron nuevas oportunidades para el mapeo de la vegetación (Carleer& Wolff 2004) como la identificación de comunidades vegetales e incluso especies (Turner et al 2003).La identificación de tipos de vegetación mediante el procesamiento de imágenes pancromáticas ha permitido identificar una especie leñosa del conjunto de la comunidad boscosa (Tsai&Chou 2006). En otros estudios las posibilidades de discriminación de la imagen pancromática ha resultado menor; en los bosques de montaña de los alpes japoneses la clasificación con imágenes pancromáticas permitió distinguir dos tipos de comunidades vegetales mientras que el uso de las imágenes multiespectrales permitió discriminar seis (Kosaka et al 2005). Esta variedad de resultados apoyan lo planteado por Chuvieco (1995) quien señala que la clasificación digital no pretende la definición absoluta de cada cubierta sino más bien que la misma es válida para una determinada imagen en un territorio y momento dados. Por lo tanto no resulta razonable estandarizar las técnicas de procesamiento en relación a sus resultados pero si evaluar la potencialidad de su aplicación en el uso de los recursos naturales y la gestión del territorio. 394 Las características espectrales de la vegetación se deben al tipo de pigmentos de sus hojas, a la estructura de la planta y a su estado de salud (Gilmore et al. 2008). Por tal motivo, si la especie invasora presenta una fenología distinta a la de la comunidad de especies nativas existe una ventana temporal que optimiza la identificación de la especie invasora mediante teledetección (Wilfong, 2009). Gleditsia triacanthos es una especie leñosa perteneciente a la familia de las fabáceas, originaria de Norte América. En la actualidad se la considera como especie invasora en Argentina y Uruguay (Chaneton et al. 2004; Nebel &Porcile 2006). En el Parque Nacional Esteros de Farrapos e Islas del Río Uruguay (PNEF) G.triacanthosse ha constituido en la especie dominante en varias áreas del bosque nativo(DINAMA 2014). Esta especie se diferencia del conjunto de la comunidad de leñosas nativas por su estructura fustal y su comportamiento caducifolio. En tal sentido se plantea como hipótesis orientadora que las diferencias estructurales y fenomenológicas de G.triacanthos en relación a la comunidad de especies nativas permitirán su identificación mediante técnicas de teledetección. En este marco este trabajo se desarrolló con el objetivo de evaluar el potencial de la imagen pancromática, multiespectral y fusionada en la identificación de G.triacanthos. Metodología Sistema de estudio El PNEF pertenece al Sistema Nacional de Áreas Protegidas de Uruguay; ubicado sobre la costa del Río Uruguay 32°37’36.308”S- 58°09’40.920”O. abarca 5.760 ha de bosque fluvial, praderas con régimen de inundación semipermanente, áreas paludosas, lagunas y arenales fluviales. El área de estudio comprende 135 ha de bosque fluvial. Constituye un ambiente de características hidromórficas y topografía plana. El área es atravesada por un pequeño curso de agua que define dos zonas: al norte del curso área sin invasión y al sur del mismo área invadida (Fig. 1). Gleditsia triacanthoses un árbol caducifolio de copa amplia (10-12 metros) y poco densa, porte ovoide que se vaabriendo con la edad y termina aparasolado. Presenta hojas alternas pinati o bipinaticompuestas; su fruto es una legumbre lineal-comprimida (Sabattini et al. 2009). Es una especie caducifolia; florece en la primavera del hemisferio sur; la fructificación se inicia a comienzos del verano (Diciembre) y se prolonga hasta entrado el otoño (Mayo) (Rossi et al 2008). Imágenes satelitales 395 Se utilizó una imagen pancromática de 0,5m de resolución espacial y una multiespectral (Rojo, Verde, Azul, Infrarrojo cercano) de 2 m de resolución espacial. Fueron captadas por el satélite Geoeye lanzado en setiembre de 2008 y equipado con la más avanzada tecnología para los satélites comerciales (SEMAR, 2015). La nubosidad de las imágenes fue menor al 15% y su calidad mayor al 50%. Las imágenes corresponden a Mayo del 2013 fecha en la cual las diferencias espectrales entre G.triacanthos y el bosque nativo se acentúan debido a su comportamiento caducifolio. Procesamiento de imágenes 396 Los métodos tradicionales de clasificación de imágenes se basan en la respuesta espectral de cada pixel.El método de clasificación basado en objetos utiliza tanto datos espectrales como espaciales (tamaño, forma, textura y asociación con los objetos vecinos); su utilización ha resultado satisfactoria cuando la clasificación se realiza sobre tipos de vegetación que presentan una respuesta espectral similar (Gibbes et al 2010). Si bien las diferencias fenomenológicas debieran maximizar la diferencia espectral entre la comunidad de nativas y G.triacanthoseste método presenta mayor potencialidad para discriminar entre clases similiares y por tanto será utilizado en el presente trabajo. La clasificación se realizó en el programa ENVI 5.0 utilizando los algoritmos Edge en el proceso de segmentación y Full Lambda Schedule en el de unión. La imagen multiespectral fue preprocesada mediante una clasificación de máxima verosimilitud extrayéndose las áreas de sombra e hidromorfismo permanente. La imagen pancromática no fue preprocesadamediante la mencionada clasificación ya que se entendió que la clasificación por objeto que integra la información espectral y espacial resulta más apropiado para el tratamiento de una imagen pancromática. La imagen fusionada se generó mediante el proceso PCSpectralSharpeningcon aplicación de máscara en la banda 2. Se obtuvo así una imagen multiespectral de 0,5m de resolución. Sobre esta imagen se aplicó otro proceso de fusión (proceso Gram Schmidt Pan Sharpening); este procedimiento optimizó la visualización de la imagen fusionada. En las imágenesmultiespectral y fusionada se realizó una primera clasificación por objeto basada en ejemplos seleccionando 4 categoríasque fueron identificadas en la pantalla de previsualización: (1) Bosque, área boscosa al norte de la cañada; (2) G.triacanthos: área boscosa con alta densidad de individuos de G.triacanthos identificada durante trabajo de campo; (3) Sauce: área boscosa con alta densidad de Sauces (Salixhumboldiana) identificada durante trabajo de campo; (4) Pastizal.En laimagen pancromática (sin preprocesamiento) se incluyó la categoría Hidromorfismo permanenteque se corresponde con áreas paludosas. Las clasificaciones obtenidas presentaron 4 clases: sin clasificar, bosque, sauce, G.triacanthos, pastizal. Laimagen pancromática presentó baja capacidad de discriminación; por tal motivo se resolvió culminar con su proceso de clasificación. Las imágenes multiespectral y fusionada fueron reclasificadas utilizando la opción de inclusión de archivo de campo verdadero. Para ello se creó un nuevo vector con las siguientes categorías: (1) G.triacanthos; corresponde a la clasepredominante identificada en el área de alta densidad de G.triacanthos. (2)No G.triacanthos; polígonos identificados en la clase G.triacanthospero que no se corresponden con esa 397 especie ya que se encuentran en el área sin invasión. (3) Pastizal; polígonos que efectivamente se ubican en áreas de pastizal (4) Árboles; polígonos incluidos en la clase pastizal pero que son árboles. Se generó así una nueva clasificación en la que se identificaron las categorías: sin clasificar, bosque, sauce, G.triacanthos y pastizal. Para validar los resultados de la clasificación se utilizaron datos de terreno que consta de un total de 86 puntos de los cuales 49 corresponden a áreas de Bosque y 37 a áreas de G.triacanthos. Se construyó una matriz de confusión con la que se calculó la fiabilidad de la clasificación como el cociente entre el número de áreas bien clasificadas y el número total de áreas muestreadas. Se calculó la fiabilidad de comisión y omisión para las clases de Bosque y G.triacanthos. La fiabilidad de comisión se calculócomo el cociente entre el número de aciertos para una clase dada y el total de predicciones realizadas para esa clase. La fiabilidad de omisión fue calculada como el cociente entre el número de puntos acertados de una clase dada y el total de puntos muestreados para esa clase. Fig. 2 Metodología de clasificación utilizada para las imágenes pancromática, multiespectral y fusionada Resultados y Discusión La visualización de la imagen pancromática permite la identificación de grandes tipos de vegetación así como su categorización en relación a la densidad. Esta visualización 398 es posible con la imagen multiespectral pero la imagen pancromática brinda mayor nivel de detalle (Fig. 1). No obstante, el proceso de clasificación por objetos sobre la imagen pancromática no brindó buenos resultados ya que no presentó capacidad para discriminar la ausencia de G.triacanthos en el área sin invasión y presentó poca capacidad para detectar a G.triacanthosen el área invadida. (Fig. 2). Estos resultados mejoran con la clasificación sobre la imagen multiespectral que presenta mayor potencialidad para la detección de G.triacanthos en el área invadida y pequeños polígonos clasificados como G.triacanthos en el área sin invasión. Cabe señalar que muchos de estos polígonos no corresponden a áreas boscosas sino a áreas de pastizal. Además la imagen multiespectral presentó mejor capacidad en la detección del área de sauces visualizándosela como una zona homogénea. En la clasificación sobre la imagen pancromática esta zona está comprendida fundamentalmente por la clase que también comprende a G.triacanthos(áreas rojas Fig.2.a) Sauces Área no invadid a a Área no invadid a b Figura 3. Clasificación por objetos. (a) Imagen pancromática (b) Imagen multiespectral. Los círculos blancos muestran las áreas clasificadas como G.triacanthos en áreas invadidas. La clasificación sobre la imagen fusionada presenta mayor capacidad para detectar al conjunto de la masa boscosa. De hecho, ésta se ajusta casi completamente a la masa boscosa e incluso identifica individuos leñosos aislados (Figura 4). Sobre la imagen multiespectral un conjunto importante de individuos leñosos quedan fuera de la clasificación (Figura 4). No obstante la clasificación sobre la imagen fusionada presenta aún problemas para discriminar entre áreas de pastizales y áreas boscosas (Figura 4). 399 Figura 4. Clasificación por objetos. (a) Imagen multiespectral (b) Imagen fusionada. La imagen fusionada presenta mayor potencial para la identificación de G.triacanthossiendo su capacidad de acierto total del 80% en comparación con la imagen multiespectral cuya capacidad de acierto fue del 74% (Tabla 1). Además presenta mayor potencialidad para detectar a G.triacanthos su fiabilidad de comisión fue del 62% mientras que la imagen multiespectral alcanzó solo el 51% (Tabla 1). Tabla 1. Validación de la clasificación Fiabilidad de la clasificación Imagen Imagen Fusionada Multiespectral Acierto Total 0,80 0,74 Fiabilidad de comisión Bosque 0,94 0,92 Fiabilidad de comisión G.triacanthos 0,62 0,51 Fiabilidad de omisión Bosque 0,77 0,71 Fiabilidad de omisiónG.triacanthos 0,88 0,83 Por otra parte la fiabilidad de comisión para el Bosque fue muy alta en ambas clasificaciones (93% para la imagen fusionada y 91% para la imagen multiespectral) indicando que estas clasificaciones son buenas para detectar áreas en las que la especie invasora no se encuentra presente. Se plantea que la estrategia más eficiente para el control de una especie invasora es la de limitar su establecimiento ya que se evitan sus impactos y se previene la conformación de nuevos focos de invasión. Por lo tanto la información que proveen estas clasificaciones resulta un insumo útil para la implementación de estrategias de gestión proactivas. 400 En ambas clasificaciones las clases definidas como G.triacanthos sobreestiman la distribución real de la especie. En este punto se identifican tres problemas: (1) esta clase incluye además de áreas boscosas áreas de pastizales que no fue posible discriminar mediante la metodología utilizada. Estas áreas son fácilmente identificables mediante el análisis visual de la imagen, especialmente en la imagen fusionada, por lo que su exclusión resulta más o menos sencilla. (2) un conjunto diverso de factores que podrían generar variabilidad en la firma espectral de los individuos de G.triacanthoscomo su altura, densidad del dosel, posición, vigor, y tipo de ambiente en el que se ubica y (3) la presencia de otras especies leñosas con una firma espectral semejante a la de la invasora debido a que presentan una morfología y/o fenomenología similar. Este punto es especialmente relevante si se considera que el patrón espectral entre las áreas actualmente discriminadas como Bosque y G. triacanthospresenta variaciones muy pequeñas; para una longitudde onda de 0,50 micrométros el valor registrado fue de 150DN para G.triacanthosy de 180 para las áreas de Bosque (Fig.5). Esta diferencia se acentúa para longitudes de onda mayores a 0,80 que presentaron valores de 350 y 600 para las áreas de G.triacanthos y Bosque respectivamente (Fig.5).En tal sentido resulta pertinente continuar evaluando procesamientos que permitan identificar y maximizar las diferencias espectrales que sólo consideren a la clase definida como G.triacanthos. La imagen fusionada parece presentar la mayor potencialidad para continuar con los análisis mejorando su capacidad de detección. Figura 5. Patrón espectral sobre imagen fusionada. (a) Patrón sobre área de bosque (b) Patrón sobre G.triacanthos Conclusiones Los tres tipos de imágenes analizadas brindan información relevante pero diferencial sobre el patrón de distribución de los principales tipos de vegetación en el área de estudio. El método de clasificación por objetos basado en ejemplos no presentó 401 capacidad de discriminación sobre la imagen pancromática. La capacidad de discriminación mejora cuando la clasificación se realiza sobre la imagen multiespectral pero la fiabilidad en la detección de G.triacanthos es muy baja. Los resultados de la clasificación mejoran utilizando la imagen fusionada pero aún la fiabilidad de detección de G.triacanthos resulta baja. La presencia de G.triacanthos en esta clase resulta sobreestimada. Identificary maximizar las diferencias espectrales de los objetos dentro de esta clase constituyen el principal desafío para mejorar la capacidad de detección de la especie invasora. El método utilizado presenta un alto porcentaje de fiabilidad sobre las áreas de bosque por lo que la clasificación utilizada resulta apropiada para identificar áreas en las que el proceso invasivo no se ha consolidado aún. Esta información resulta relevante en el marco de la gestión proactiva. Bibliografía Andersen, M., Adams,H., Hope, B. & Powell, M. (2004). Risk analysis for invasive species: general framework and research needs. Risk Analysis 24:893–900. Bradley, B. & Mustard, J. (2005) Identifying land cover variability distinct from land cover change: Cheatgrass in the Great Basin. Remote Sensing of Environment. 94, 204–213. Byers, J., Reichard, S., Randall, J., Parker, I., Smith, C., Lonsdale, W., Atkinson, I., Seastedt, T., Williamson, M., Chornesky, E. & Hayes, D. (2001).Directing research to reduce the impacts of exotic species.Conservation Biology. 16:630–640. Carleer, A. & Wolff, E. (2004).Exploitation of Very High Resolution Satellite Data for Tree Species Identification.Photogrammetric Engineering & Remote Sensing. 70(1):135–140. Chaneton, E., Mazia, C., Machera, M., Uchitel, A & GHERSA, C. (2004). Establishment of Honey Locust (Gleditsia triacanthos) in Burned Pampean Grasslands. WeedTechnol, 18:1325-1329 Chuvieco, E. (1995). Fundamentos de Teledetección Espacial. Madrid, España, Editorial RIALP, S.A, 430 p. Cohen, W. &Goward, S. (2004). Landsat’s role in ecological applications of remote sensing.Bioscience 54:535–545. 402 DINAMA (2014). Plan de manejo del Parque Nacional Esteros de Farrapos e Islas del Río Uruguay. División Sistema Nacional de Áreas Protegidas Uruguay Gibbes, C., Sanchayeeta, A., Rostant, L., Southworth, J. &Qiu, Y. (2010). Application of Object Based Classification and High Resolution Satellite Imagery for Savanna Ecosystem Analysis. Remote Sensing 2, 2748-2772. Gilmore, M., Wilson, E., Barrett, N., Civco, D., Sandy Prisloe, S., Hurd, J. & Chadwick, C. (2008) Integrating multi-temporal spectral and structural information to map wetland vegetation in a lower Connecticut River tidal marsh.Remote Sensing of Environment. doi:10.1016/j.rse.2008.05.020 Kosaka, N., Akiyama, T., Tsai, B., Kojima, T. (2005).Forest Type Classification Using Data Fusion of Multispectral and Panchromatic High-Resolution Satellite Imageries.07803-9051-2/05 Nebel, J. &Porcile, J. (2006). 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Estación Virtual de Imágenes Satelitales de Muy Alta Resolución. http://www.semar.gob.mx/s/informacion-sector/ciencia/evismar.html Tsai, F &Jhong Chou, M. (2006) Texture augmented analysis of high resolution satellite imagery in detecting invasive plant species. Journal of the Chinese Institute of Engineers. 29(4): 581-592 Vitousek, P., Mooney, H., Lubchenco, J., Melillo, J. (1997) Human Domination of Earth's Ecosystems. Science, New Series 277 (5325) pp. 494-499. Wilfong, B., Gorchov, D. & Henry, M. (2009).Detecting an Invasive Shrub in Deciduous Forest Understories Using Remote Sensing.WeedScience 2009 57:512–520. 404 ANÁLISE E MAPEAMENTO DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA NO MUNICÍPIO DE SORRISO, MATO GROSSO Tiéle Lopes Cabral Universidade Federal de Santa Maria – UFSM [email protected] Luis Eduardo de Souza Robaina Universidade Federal de Santa Maria – UFSM [email protected] Ivaniza de Lourdes Lazzarotto Cabral Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT [email protected] Resumo – A ação do homem sobre a “natureza” se manifesta de inúmeras formas conforme os meios adotados para a busca constante de elementos que possibilitam a sua existência. A produção do espaço agrário em Mato Grosso se fundamenta na apropriação das diferentes unidades de paisagem, resultando em inúmeras intervenções, principalmente a eliminação da cobertura vegetal original. Sendo assim, a intenção do trabalho foi a de estabelecer o mapeamento do uso e ocupação do município de Sorriso-MT, a fim de avaliar as restrições da paisagem frente à ocupação. O mapeamento de uso e ocupação da terra permitiu analisar informações a partir da interação de atributos físicos com o apoio do Sistema de Informação Geográfica - SIG e recursos do geoprocessamento, se detendo ainda ao levantamento bibliográfico e dados obtidos dos produtos do Sensoriamento Remoto e trabalho de campo. A importância do trabalho tem relação com a própria dinâmica do avanço da agricultura na região Centro-Oeste do Brasil que traz consigo inúmeras intervenções nos ambientes do Cerrado e da Pré-amazônia vinculadas às práticas agrícolas. Os resultados principais obtidos indicam que os setores de maiores intervenções estão concentrados nas áreas de lavouras representando 75,8% da extensão do município. Palavras-chaves: Degradação ambiental; Geoprocessamento; Sensoriamento Remoto; Cerrado e Pré-amazônia. INTRODUÇÃO O crescente aumento da utilização dos recursos naturais exige, cada vez mais, a elaboração de estudos voltados à harmonização das interações entre a sociedade e o ambiente em que se vive. Desta forma, o planejamento não deve apenas limitar-se aos aspectos socioeconômicos, mas é de fundamental importância, levar em consideração a análise das características dos elementos componentes do meio físico (VEDOVELLO, 2004). O uso e ocupação da terra é um fator bastante importante, já que, o município de Sorriso e o norte de Mato Grosso vêm sofrendo nas últimas décadas do século XX, com o avanço da fronteira agrícola, o que provoca progressivas alterações nos diferentes ambientes que constituem os sistemas dessa região. 405 Já na etapa inicial de implantação do agronegócio, os elementos sistêmicos da cobertura vegetal, junto com o biológico, hídrico e antrópico, são substituídos e/ou alterados pela monocultura. Paralelamente a este fluxo interventor, numa escala mais específica da questão, estão os fatos relacionados à dinâmica de superfície, responsáveis pela geração do recurso apropriado pela referida atividade, ou seja, intervenção na dinâmica dos sistemas morfopedológicos. A região da Chapada e Planalto dos Parecis vem sendo submetida desde o início da década de 1960, a um acelerado processo de ocupação, fruto da expansão das fronteiras agrícolas para a Amazônia Ocidental, onde o tema degradação ambiental reveste-se de importância, à medida que, a realização de estudos nessas áreas, relaciona-se às situações de maior preocupação ecológicas no Estado. Cabral (2011) considera que o setor Sul do município de Sorriso-MT apresenta uma área com restrição ambiental atrelada a prática dos agricultores de construir canais para remover o excesso de água que se acumula durante o período das chuvas. Este procedimento é comum nas amplas superfícies planas com atividade agrícola, não só no estado de Mato Grosso, mas em toda a superfície do Planalto Central Brasileiro. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é desenvolver o mapeamento do uso e ocupação do município de Sorriso-MT, a fim de avaliar as restrições da paisagem frente à ocupação. O município de Sorriso (Figura 1) corresponde uma área de aproximadamente 9.330km² e faz parte da região Norte do estado de Mato Grosso, possui uma população de 72.521 habitantes (IBGE, 2014). Situa-se entre as coordenadas 11º 43` 38”; 13º 40` 10” de latitude Sul e 56º 06` 27”; 55º 06` 36” de longitude Oeste. 406 Figura 1 – Área de estudo: município de Sorriso-MT. Fonte: Cartas Topográficas DSG 1:100.000; SEPLAN/MT, 2009. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O levantamento dos dados refere-se ao primeiro nível de análise, pesquisas bibliográficas e informações sobre o material cartográfico disponível para a área de estudo. Os dados foram obtidos através de trabalhos de campo, laboratório e pesquisas secundárias. A delimitação da área de estudo, bem como informações sobre hidrografia, malhas viárias, curvas de nível, pontos cotados, manchas urbanas e drenagem artificial foram obtidas através dos arquivos do banco de dados da Secretaria de Planejamento do estado de Mato Grosso – SEPLAN/MT e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, contendo as malhas cartográficas dos municípios da federação. Além disso, foram obtidas informações das cartas topográficas DSG 1:100.000. Para o levantamento de informações socioeconômicas e históricas de ocupação foram buscados dados de órgão oficiais como a Secretaria de Estado do Meio Ambiente - SEMA/MT, Instituto Nacional de Reforma Agrária – INCRA, SEPLAN- 407 MT e IBGE. Estes dados foram importantes para entender a relação dos usos antrópicos, principalmente o agrícola e sua influência na transformação da paisagem. Para a elaboração do mapa de uso e ocupação da terra utilizou-se como base de recobrimento da área, a imagem orbital do sensor “Thematic Mapper" do LANDSAT-8, bandas 432 de composição colorida, com 30 metros de resolução espacial, Órbita-Ponto 227/68, 227/69 e 226/69, de maio de 2013. Essas imagens foram adquiridas no site da U.S. Geological Survey (USGS Gobal Visualization – http://glovis.usgs.gov). A aquisição das imagens com esse período ocorreu em função do clima da área, onde nos meses de novembro a março ocorre o cultivo de grãos caracterizandose por ser uma época bastante chuvosa, tal fato restringiu a obtenção de imagens com melhor visualização espacial, o que levou a utilização de imagens do mês de maio, porém com trabalhos de campo e analises geomorfológicas e pedológicas junto ao conhecimento prévio da área de estudo, onde se tem informações sobre a fase dos cultivos da região, pode-se efetuar um mapeamento de uso e ocupação sem mais problemas. Nesse período do mês maio a grande maioria das espécies cultivadas já foram colhidas ou estão na fase madura, isso resulta em melhor diferenciação das áreas utilizadas com cultivos, devido à refletância do solo exposto e dos cultivos maduros que neste caso se resume ao cultivo do milho safrinha, serem bem diferentes da vegetação arbórea. Como todas as imagens disponibilizadas já possuem correção geométrica (ortorretificadas) e, também, já georreferenciadas passou-se diretamente para a mosaicagem. Para tal etapa, utilizaram-se as ferramentas “mosaicking” e “masking” do software ENVI 5.0, as quais serviram respectivamente para unir e recortar as imagens a fim de selecionar apenas a área de interesse. Todas as imagens estão com sistema de coordenadas projetadas (Universal Transversa de Mercator - UTM), Datum Horizontal SAD 69 e Fuso 21S. O limite utilizado da malha da SEPLAN foi atualizado de acordo com os limites naturais existentes, como estradas e principalmente a rede hidrográfica. Os resultados obtidos referentes aos usos da terra implicaram em etapas de classificação automática e ajustes manuais. As classes de uso da terra foram definidas através de trabalho de campo na área e por fotointerpretação da imagem orbital, sendo identificados cinco principais tipos de uso, ou seja, floresta, água, pecuária, lavoura e área urbana. 408 Posteriormente a importação e processamento da imagem no ENVI, foi realizado o treinamento (reconhecimento da assinatura espectral das classes) das amostras para cada classe identificada, o que consiste em coletar amostras na área da imagem representante de uma das classes, traçadas diretamente sobre região segmentada da imagem. Para determinação da classe lavoura foram adquiridas 48 amostras de aquisição e 41 amostras teste, para determinação da classe floresta foram adquiridas 24 amostras de aquisição e 21 amostras de teste, para a classe pecuária foram adquiridas 12 amostras de aquisição e 10 de amostras teste e para a classe água foram adquiridas 15 amostras de aquisição e 12 de amostras teste. Foi criado um banco de dados com as categorias de uso da terra, criando as classes dos temas observados. Em seguida, com o auxilio do software ArcGis 9.3, realizou-se o mapeamento, associando cada tema a sua respectiva classe na imagem classificada. A partir do mapa matricial das classes, foi transformada a matriz em vetor. Com esse mapa pode-se refazer a edição vetorial das classes, através de uma revisão das regiões classificadas. Nessa revisão aplicou-se o conhecimento prévio da região podendo ser ajustadas áreas que houve classificação errônea, por exemplo, as áreas de solo exposto pertencentes às lavouras após a colheita; e os campos sujos anexados as pastagens. No que se refere à ocupação do município de Sorriso, obteve-se duas classes envolvendo as áreas urbanas e os drenos artificiais. As áreas urbanas foram mapeadas manualmente de acordo com a imagem de satélite Landsat-8, mencionada anteriormente, devido à confusão na classificação automatizada com a classe de solo exposto. Depois de mapeadas, as áreas urbanas foram subtraídas desta classe de uso e tomadas como forma de ocupação. A rede de drenagem artificial foi mapeada a partir de fotointerpretação, utilizando as imagens de satélite SPOT-5 (junho de 2007), órbitas MI-1814, MI-1869, MI-1870, MI-1923, MI-1924, MI-1925, MI-1974, MI-1975, MI-1976 e MI-2023, com resolução espacial de 5m, o que foi bastante importante para a identificação do alvo. As imagens de satélite foram obtidas através da SEPLAN/MT. RESULTADOS E DISCUSSÕES Os diferentes usos da terra desenvolvidos no município de Sorriso estão associados com a estrutura fundiária, com a cultura dos colonizadores e com o relevo das propriedades rurais presentes na área. 409 As informações referentes as ações de ocupação advindas de um processo histórico-evolutivo que ao longo dos anos desencadeou os diferentes usos da terra no município de Sorriso, vem resultando nas últimas transformações da paisagem local. No estado de Mato Grosso a difusão da soja se origina nos anos de 1970, quando programas implantados pelo governo brasileiro visavam o aumento da produção e da produtividade no setor agropecuário com o objetivo de abastecer os centros urbanos e de inserir a produção nacional no contexto mundial através da exportação. Entre os programas, o POLOCENTRO - Programa de Desenvolvimento do Cerrado, PRODOESTE - Programa de Desenvolvimento do Centro Oeste e POLONOROESTE Programa de Desenvolvimento Rural Integrado do Noroeste do Brasil, proporcionaram o desenvolvimento agropecuário nos cerrados da região Centro-Oeste e a criação de corredores de exportação com infraestrutura (SCHWENK, 2013). Decorrentes desse fato foram implantadas então, entre 1971 e 1974, as rodovias federais Transamazônica, Perimetral Norte que foi inserida parcialmente, e, sobretudo, a Cuiabá-Santarém e incorporadas novas regiões agrícolas através do Programa Nacional de Desestatização. Sorriso é um dos municípios resultantes desse processo, onde sua colonização inicia-se com imigrantes do Estado do Paraná, Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, mais precisamente gaúchos da região de Passo Fundo. Esses imigrantes foram trazidos pela Colonizadora Feliz, composta pelo colonizador Claudino Francio, o qual havia adquirido vasta área no Médio Norte mato-grossense. As primeiras famílias a se fixarem na atual cidade de Sorriso, foram as famílias Silva e Santos (FERREIRA, 2008). Em 1980, a pequena agrovila mato-grossense foi elevada à categoria de Distrito, pertencente ao Município de Nobres. Mais tarde, em 1982, foi instalada a subprefeitura no Distrito de Sorriso, tendo como subprefeito o Sr. Genuíno Spenassatto. Foi emancipado do município de Nobres pela Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso em 13 de maio de 1986. Logo após a emancipação veio ocorrer a explosão demográfica em Sorriso e, concomitantemente, a pavimentação asfáltica da BR-163 cooperou com esse fato, pois proporcionou uma redução nos custos com escoamento dos grãos, possibilitando, assim, a expansão do potencial agrícola da região, devido o aumento da competitividade dos produtos agrícolas do setor Norte do Estado, perante o mercado nacional e internacional (FERREIRA, 2008). A sede municipal de Sorriso, em 1979, era apenas uma vila, possuindo apenas algumas casas ao longo da BR-163. Atualmente é um importante centro urbano regional e está em ritmo acelerado de crescimento urbano, inclusive apresentando 410 vários indícios em relação ao fenômeno de verticalização urbana, com a construção de prédios residenciais. Assim, em pouco mais de duas décadas, Sorriso deixou de ser um simples vilarejo, para se tornar o município que, atualmente, ocupa o posto de maior produtor de soja por município do Brasil. A cidade de Sorriso conta com boa prestação de serviços, vários escritórios de multinacionais ligadas ao ramo do agronegócio, empresas essas de beneficiamento de produtos agrícolas, e também de insumos e maquinários, Shopping Center, hospital regional, clínicas especializadas de saúde, bons supermercados e outros comércios de alto padrão. O município cresceu consideravelmente nos últimos 20 anos, desde 1985 a população vem crescendo e atinge atualmente, cerca de 66.521 mil habitantes IBGE (2013). Entre 2000 e 2010, a população teve uma taxa média de crescimento anual de 6,45%. Na década anterior, de 1991 a 2000, a mesma taxa foi de 9,96%, ou seja, nas últimas duas décadas a taxa de urbanização cresceu 20,32% (IBGE, 2014). Análise do uso e ocupação da terra e cobertura vegetal no município de Sorriso A intensificação do uso da terra, especialmente em termos de atividades agrícolas, em geral provoca a eliminação da cobertura vegetal natural e promove o desencadeamento de processos de erosão acelerada dos solos se não forem utilizadas técnicas adequadas de uso. A caracterização e espacialização do potencial e predisposição aos impactos hídricos, pode ser conduzida utilizando tecnologias de Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas – SIG, que possibilitam à aquisição, manipulação, integração e espacialização dos dados tratados. O uso da terra no município de Sorriso está predominantemente atrelado às atividades agrícolas, sendo esta classe identificada por lavouras, seguidas ainda das classes de florestas e água. A vegetação arbórea no município em questão concentrase nas áreas de maiores declividades, próximas às redes de drenagens. Nesta análise, o uso da terra está composto de acordo com a figura 2. O quadro 1 apresenta a variação quantitativa dos tipos de uso, em quilometro quadrado e em percentual, com destaque para a predominância da existência de lavouras na área de estudo. Quadro 1: Quantificação do uso e ocupação no município de Sorriso. 411 Org: CABRAL, T. L., 2014. Figura 2: Uso e ocupação da terra do município de Sorriso - MT. Org: CABRAL, 2014. Na classificação das imagens, as lavouras estão associadas com as áreas de solo exposto por estarem em fase de pós-colheita. Desse modo, constatou-se que a situação do uso da terra apresentava-se com o predomínio de lavouras medindo uma área de 7.081,056 km², correspondendo a 75,8 % da área total do município. Portanto, essa classe de uso é predominante no município de Sorriso e apresenta-se em áreas bastante planas com declives em torno de <2% em altitudes que variam de 340 a 440 m. 412 Em função das características climáticas presentes em Sorriso, todo o processo de uso e ocupação se torna totalmente adaptado e estruturado para que, principalmente, a atividade agrícola obtenha altos índices de sucesso ao longo do ano. Os índices pluviométricos médios anuais estão distribuídos durante sete meses do ano, ou seja, ocorrem cinco meses de seca, durante os meses de maio, junho, julho, agosto e setembro. Dessa maneira, o ano está dividido em duas estações características, uma relacionada às chuvas - verão-outono, com grandes precipitações e outra ligada à seca - inverno-primavera, com baixos índices pluviométricos (TARIFA, 2011). A estação das chuvas ocorre geralmente no mês de novembro até o mês de abril. Segundo Peretto (2012, apud Bittencourt Rosa et al., 2002) os meses de dezembro a março, correspondentes ao verão se caracterizam por um aumento acentuado nas chuvas regionais e 80% delas caem durante este espaço de tempo. Esta configuração climática permite a atividade agrícola por todo ano, com apoio da irrigação nos períodos de baixa precipitação, já no período chuvoso surge a necessidade de escoamento do excesso de água nas áreas de plantio, promovendo a frequente presença de drenos observados em campo, tanto paralelos quanto interrompidos, tal forma de manejo exerce um papel fundamental para o sucesso da produção, pois retira todo o excesso de água acumulados nas imensas áreas planas, uma vez que as mesmas não estão adaptadas aos meios onde ocorre acúmulo de água, fazendo com que a planta não se desenvolva da melhor forma. Cabe destacar, que de acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA (2012), o município de Sorriso possui três Projetos de Reforma Agrária reconhecidos pela esfera federal (Figura 2), sendo eles: a) Assentamento São Vicente, criado em 28 de fevereiro de 2000, com uma área de 169,3 km², tem capacidade para comportar 630 famílias, mas possui atualmente 384 famílias assentadas. Está localizado ao extremo sul do município de Sorriso, no distrito de Boa Esperança e faz divisa com o município de Santa Rita do Trivelado. b) Assentamento Santa Rosa I, com 71 famílias foi criado em 31 de dezembro de 1997, possui uma área de 246,5 km². Localiza-se ao sul do município de Sorriso, no distrito de Boa Esperança, faz divisa com o município de Santa Rita do Trivelado e com o Assentamento São Vicente. c) Assentamento Jonas Pinheiro, criado em 17 de dezembro de 2001, possui 213 famílias assentadas e uma área de 73,6 km², está localizado a 18 km da cidade de Sorriso, seguindo a norte a BR-163, possui parte de seu território no município de Vera. 413 Observa-se, a partir da interpretação das imagens Landsat, que tais projetos de assentamentos estão localizados em áreas menos favoráveis as atividades agrícolas se comparado ao restante do município. O Assentamento Jonas Pinheiro encontra-se na classe dos Plintossolos, isto é, solo pouco favorável aos cultivos de soja e milho. Já os assentamentos Santa Rosa I e São Vicente localizam-se ao extremo sul do município, em áreas mais dissecadas, com a densidade de rios maior. Em campo observou-se nessas áreas pequenas manchas de cultivos de soja e milho e áreas de pastagem - pecuária. A atividade de pecuária normalmente tem-se em áreas próximas as florestas, drenagens e está atrelada aos campos sujos, representa 439,370 km², correspondente a 4,7% da área de estudo. Os corpos d’água existentes na área de estudo referem-se a açudes, utilizados para atividade agrícola e bebedouros, represas para a criação de peixes e rios. Essa classe abrange uma área total de 63,499 km², o que representa - 0,7% da área de estudo. As áreas identificadas como florestas, algumas vezes estão ligadas a atividade da silvicultura, que se localiza próximo aos rios que perfazem a área. O plantio de eucalipto na região norte do estado de Mato Grosso se tornou bastante frequente e está vinculado a recuperação de áreas de preservação permanente – APPs. Desse modo, os proprietários optaram por espécies que futuramente forneçam retorno financeiro, como eucalipto, teca, mamão e seringueira. A classe de florestas nativas estão associadas às áreas com declividades de 515% e >15% e representam remanescentes do Cerrado e da Pré Amazônia matogrossense, uma vez que a vegetação nativa do município se restringe a cinco tipos Savana Florestada ou Cerradão, Savana Arborizada ou Cerrado, Savana Parque ou Campo Cerrado, Floresta associada ao Planalto dos Parecis, Floresta associada ao Planalto dos Parecis/Savana, Formações Justafluviais. Poucas são as áreas de remanescentes a maioria foi substituída por atividades econômicas importantes introduzidas nessas formações vegetais, principalmente baseadas na utilização do Cerrado, como as culturas de arroz, milho e soja, muitas vezes praticada em associação com a criação de gado bovino. De acordo com Schwenk (2005) grande parte da área foi tomada pela expansão da soja levando ao desaparecimento da vegetação nativa com a derrubada das matas, provocando gradativa diminuição da fertilidade dos solos. Disso, também resultam a erosão, a compactação e a perda de matéria orgânica. CONSIDERAÇÕES FINAIS 414 Com a modernização da agricultura, aconteceram mudanças nas técnicas de produção, como uso de insumos externos químicos, mecanização e tecnificação agrícola, tendo como consequência o aumento da degradação do ambiente, uma vez que, nem sempre as ocupações são precedidas de estudos que considerem as restrições dos recursos naturais, especialmente com relação à fragilidade das litologias, dos solos, do relevo e das drenagens, quando submetidos a determinados usos. Por esse motivo, um conhecimento sistemático e ordenado ligado a dinâmica ambiental se faz necessário, pois fornecem alternativas que tenham como premissa recuperar ou preservar a paisagem em suas dimensões natural e antrópica. Diante dessa conjuntura, o município de Sorriso apresenta-se em um contexto econômico junto ao estado do Mato Grosso à frente da atividade econômica local, regional e nacional na perspectiva do agronegócio, onde as intervenções nos ambientes naturais, em especial, o do Cerrado e o da Pré Amazônia, são diversificados nos diferentes elos que perfaziam a “paisagem” antecedente. A análise das imagens dos satélites Landsat e Spot foram importantes para o estudo, possibilitando dados com qualidades espaciais e espectrais recentes. O uso praticado na área é caracterizado predominantemente por áreas com agricultura moderna e áreas de pecuária extensiva. A agricultura tem intensificado o uso de áreas do Cerrado brasileiro e mato-grossense, ocupando grandes áreas, suprimindo a vegetação primária, interferindo desta forma na biodiversidade local e regional, no caso de Sorriso, a agricultura ocupa uma área acima de 7.000 km² contrapondo a classe de floresta que representa apenas 18% da área total do município. Nos usos pecuário e floresta, apresentam-se respectivamente com pastagens em zonas com solos plínticos e nas áreas próximas aos rios encontram-se zonas de regeneração e o consequente surgimento de floresta secundária. Apesar de apresentarem áreas úmidas próximas as nascentes em praticamente todas as classes do município, seu uso tem se intensificado com a aplicação de maquinários agrícolas que constroem drenos artificiais escoando o excesso d’água, facilitando o uso dessas áreas. Existe ainda, baseado em observações de campo uma aparente manutenção de alguns remanescentes florestais, bem como a recomposição de algumas áreas próximas aos rios de maior ordem. Portanto, na área de estudo verificou-se que as atividades agrícolas atualmente representam uma matriz antrópica com poucos fragmentos de vegetação natural e que representam os últimos remanescentes da biodiversidade local, onde sua extensão condiciona a existência de problemas e potencialidades cujos limites estão relacionados a variáveis naturais. Nesse sentido, as limitações atribuídas para a 415 ocupação do espaço físico tendem a apresentar diferenças dignas de destaque em qualquer política que vise à elaboração de diretrizes capazes de atenuar a degradação ambiental. REFERÊNCIAS CABRAL, T. L. Drenagem Artificial em interflúvios amplos no setor Sul do município de Sorriso-MT: Uma intervenção ambiental da prática agrícola. Trabalho de Conclusão de Curso – Departamento de Geografia. Universidade Federal de Mato Grosso UFMT. Cuiabá - MT, 2011. CABRAL, T. L. Zoneamento e mapeamento geoambiental do município de Sorriso-MT. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia PPGGeo, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria - RS, 2014. FERREIRA, J. C. V. Cidades de Mato Grosso. Pe. José de Moura Silva e João Carlos Vicente Ferreira. J. C.V. Ferreira: Cuiabá - MT, 2008. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais. Estimativas da população residente com data de referência 1º de julho de 2014. Diário Oficial da União. Agosto de 2014. Disponível em: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=510792&search=mato grosso|sorriso. Acesso em: fev. 2015. INCRA, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Projetos de Reforma Agrária Conforme http://www.incra.gov. Fases de Implementação. 2012. Disponível em: br/index.php/reforma-agraria-2/questao-agraria/numeros-da- reforma-agraria/file/31-relacao-de-projetos-de-reforma-agraria. Acesso em: mar. 2013. PERETTO, A. Bacia hidrográfica do Ribeirão Grande: sua dinâmica natural e a relação com a produção do espaço geográfico. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de mato Grosso – UFMT. Cuiabá - MT, 2012. 416 SCHWENK, L. M. Conflitos Sócio-Econômicos-Ambientais relativos ao avanço ao cultivo da soja, em áreas de influência dos eixos de integração e desenvolvimento no estado De Mato Grosso. Tese de Doutorado – UFRJ. Rio De Janeiro - RJ, 2005. SCHWENK, L. M. Transformações decorrentes do processo de expansão da soja em mato grosso: algumas reflexões no contexto ambiental, econômico e social. Revista Mato-Grossense de Geografia, nº 16. Cuiabá - MT, 2013. SEPLAN. Secretaria de estado de Planejamento - Mato Grosso. Projeto sócioeconômico ecológico: Projeto de desenvolvimento agroambiental do estado do Mato Grosso – PRODEAGRO. Cuiabá-MT, 1997. TARIFA, J. R. Mato Groso: Clima: Análise e representação cartográfica. (Série recursos naturais e estudos ambientais). Entrelinhas: Cuiabá - MT, 2011. VEDOVELLO, R. Aplicações da Cartografia Geoambiental. In: 5º Simpósio Brasileiro de Cartografia Geotécnica e Geoambiental. Anais: São Carlos - SP, 2004. 417 TRABAJOS POSTERS 418 ANÁLISE DE UM TRECHO DE 1,9 KM DO ARROIO DO VEADO EM SILVEIRA MARTINS, RS Guilherme Cardoso da Silva66; Indiara Bruna Costa Moura Moraes² Resumo - A ocupação antrópica em APP é muito recorrente na América do Sul. As Áreas de Preservação Permanente são áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, localizadas nas faixas marginais de qualquer curso d’água natural, também conhecida como mata ciliar ou mata galeria, entre outros locais. No presente artigo, a análise tem como foco a APP de margem de rio, desta forma o objetivo do trabalho é analisar a situação da Área de Preservação Permanente de um trecho de 1,9 km do Arroio do Veado na localidade de Val Feltrina em Silveira Martins, RS. Utilizou-se as referências de temáticas relacionadas à APP, além de leis e o Código Florestal, para dar embasamento às análises posteriores. O SIG foi uma importante ferramenta do geoprocessamento empregada no tratamento dos dados para geração de outras informações e mapeamentos que colaborassem com a pesquisa. Utilizou-se, fundamentalmente, o software QGIS para elaboração de um buffer e a classificação das temáticas de acordo com a cobertura do solo. Percebeu-se a existência de habitações e estradas dentro da APP de 30 metros. Conclui-se que a dinâmica natural pode ser alterada, resultando em maior compactação do solo, escoamento superficial, supressão de vegetação, diminuição da infiltração, entre outros fatores. Palavras-Chave – Área de Preservação Permanente; Ocupação antrópica; Código Florestal Abstract – Human estabilishment in preservation areas is a recurrent fact in South America. Permanent Preservation Areas (PPAs) are protected areas, that could or could not be covered by native vegetation located in the marginal belts of any water course also known as riparian forest or gallery forest among other places. In this study, the analysis focus on river bank PPAs also known as riparian forests. The aim this study is to analyse the situation of a 1,9km long stretch in the PPA of “Veado” stream, located in Val Feltrina, Silveira Martins, Rio Grande do Sul. PPAs - related thematics, as well as legislation-manly the Forest Code - were used as references for further analysis. GIS was an important geoprocessing tool used for handling data, thus generation new informations and maps that could help in this research. QGIS software was used to create a buffer as well as to soil cover. It was observed roads and houses, inside the 30m-wide PPA. It could be concluded that the natural dynamics might be changed as a result of the misuse, rendering higher soil compaction runoff, vegetation suppression, lower water infiltration, among other factors. 66 Geógrafo, doutorando em Geografia, Universidade Federal de Santa Maria-RS, (55) 9118-8474, [email protected] ² Engenheira agrimensora, doutoranda em Geografia, Universidade Federal de Santa Maria – RS, (55) 81095042, [email protected] 419 Keywords – Permanent Preservation Areas; Human Estabilishment; Forest Code. 1. INTRODUÇÃO Com o desenvolvimento do município e a intensificação do uso das encostas relacionadas à viticultura, tem-se a presença dos primeiros impactos ambientais mais significativos. Neste contexto é interessante analisar a cobertura do solo e a interferência das atividades da população local com relação aos cursos d’água. Por muitas vezes as populações se estabelecem em locais inapropriados, como nos casos de áreas de preservação, sejam elas em topo de morro, declividade acentuada, proximidade com corpos d’água, entre outros. É interessante destacar que o Código Florestal brasileiro sofreu modificações por algumas vezes, o que causa um pouco de confusão tanto para habitantes locais quanto para autoridades. Áreas de Preservação Permanente (APP) são áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, localizadas nas faixas marginais de qualquer curso d’água natural, também conhecida como mata ciliar ou mata galeria, entre outros locais (Código Florestal, 2012). No caso do presente estudo, vale destacar as particularidades do estado do Rio Grande do Sul, presente na região do Cone Sul, que apresenta características que não devem ser deixadas de lado. Desta forma, além de analisar a área de estudo dentro das leis que regem a relação entre homem e natureza, deve-se avaliar o contexto da região. As funções das Áreas de Preservação Permanente são as mais diversas, tais como: Preservação dos recursos hídricos, estabilidade geológica, biodiversidade, beleza da paisagem, conter a erosão do solo, diminuir os riscos de enchentes e deslizamentos de terra e rocha nas encostas, facilitar o desenvolvimento da fauna e flora e, especialmente, assegurar e preservar o bem-estar das populações humanas (Código Florestal, 2012). A dinâmica ambiental não se dá de forma fragmentada, desta forma busca-se analisar o solo, litologia, hidrografia, vegetação, entre outros, além da ação antrópica, visando à dinâmica da população local. Assim, o objetivo deste trabalho é analisar a situação da Área de Preservação Permanente de um trecho de 1,9 km do Arroio do Veado na localidade de Val Feltrina em Silveira Martins, RS. 2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 420 O município de Silveira Martins está localizado na região central do Rio Grande do Sul, Brasil, sendo sempre fortemente atrelado à região da Quarta Colônia, um local com características italianas, devido à migração, a qual é marcada pela agricultura, como exemplo o cultivo do vinho. A cultura de plantar em encostas e áreas altas foi trazida da Itália, onde os imigrantes plantavam uva nas extensas montanhas de Vêneto. Silveira Martins foi emancipada de Santa Maria no dia 11 de dezembro de 1987, tendo como base da economia o cultivo do feijão, soja, milho e batatinha, além da atividade turística, que atrai muitos visitantes que visam à gastronomia e os atrativos religiosos, naturais e históricos (Sampaio, Ouriques & Robaina, 2014). A economia de Silveira Martins é baseada principalmente no setor primário, com destaque para a agricultura. A estrutura fundiária esta centrada nas pequenas propriedades com até 50 ha, minifúndio diversificado, com integração entre agricultura e pecuária (Sampaio et al., 2014). O município tem uma população total de 2.449 pessoas, em uma área de 118,273 km² (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2010). Neste contexto, a localidade de Val Feltrina possui algumas famílias que vivem em uma área de 172,62 há, ou, aproximadamente, 1,73 km² (Sampaio et al., 2014). Pode-se compreender melhor a localização do município da localidade referida com a Figura 1. 421 Figura 1 – Mapa de localização do município de Silveira Martins e da localidade de Val Feltrina. Como pode ser percebida, a localidade de Val Feltrina fica na porção oeste do município de Silveira Martins. Silveira Martins localiza-se no Rebordo do Planalto, na transição entre o Planalto e a Depressão Central. A sua topografia caracteriza-se por ser formada por escarpas abruptas e a drenagem fluindo no sentido da Depressão Central e padrão dendrítico (CASAGRANDE, 2004). A altitude do município é de cerca de 430 metros, quanto à geologia se observam rochas vulcânicas ácidas da Formação Serra Geral, e com a diminuição da altitude tem-se a presença, em menor proporção, de arenitos da Formação Botucatu. Nas áreas planas o município apresenta também arenitos médios finos róseos, com estratificação cruzada, acanalada e planar, intercalados com siltitos vermelhos, de ambiente fluvial e troncos vegetais fósseis silicificados, da formação Caturrita (Bisso, 2008; Sampaio et al., 2014; IBGE, 2010). Conforme uma análise realizada no software de SIG, com arquivos no formato shapefile disponibilizados pelo IBGE, constatou-se que Silveira Martins possui cinco diferentes tipos de formações litológicas, sendo elas: Botucatu (Arenito fino e Quartzo arenito), Caturrita (arenito e pelito), Caxias (Riodacito e Quartzo Latito), e Gramado 422 (Rochas Basálticas e Latitos). Já o Arroio do Veado, no trecho analisado, perpassa por três delas, Botucatu, Gramado, e, uma pequena porção, Caturrita. A hidrografia é bastante limitada, não possuindo rios de grande porte, somente arroios, sangas e fontes d'água, fato justificado pela presença de topografia dobrada, movimentada e de altitude. São evidenciadas duas sub-bacias hidrográficas, a do Rio Soturno e do Rio Vacacaí, ambas pertencentes ao sistema Jacuí-Guaíba, que completa a hidrografia de inúmeros arroios, sangas e banhados (Sampaio, Ouriques & Robaina, 2014). 3. METODOLOGIA Para o desenvolvimento deste trabalho foi realizada um pesquisa a artigos e trabalhos teóricos gerais relacionados ao tema em questão, a busca por dados, mais diversos, em sites conceituados como os dos órgãos IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísitca, CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, SEMA – Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentáveis, entre outros, além da utilização de alguns software como o Google Earth Pro, e o QGIS 2.8.2, este último que é um SIG (Sistema de Informação Geográfica) livre para a elaboração de mapas, quantificação de áreas, esclarecimento de dúvidas, entre outras funções. Foi realizado o download de arquivos no formato shapefile nos sites referidos, para posterior utilização no software QGIS 2.8.2. Inicialmente utilizou-se o Google Earth Pro para o download de imagens em alta resolução da área em questão. Após este procedimento, fez-se a elaboração de um mosaico no software Photoshop CS5. Com a imagem pronta, fez-se o georreferenciamento da imagem no QGIS, sendo então gerada uma imagem no formato TIF. Com a imagem georreferenciada, vetorizou-se o trecho do arroio que se encontra na localidade de Val Feltrina, para posteriores procedimentos. O primeiro deles foi a geração de um “buffer” de 30 metros, de acordo com a legislação brasileira, na intenção de representar a Área de Preservação Permanente – APP correta para este arroio. Outro procedimento executado de suma importância para a pesquisa foi a classificação de temáticas dentro dos limites do buffer referido na pesquisa. Assim, com uma análise visual, foram classificadas as temáticas APP (que é seria representada pelo buffer); vegetação arbórea; campo, que seria basicamente vegetação rasteira, como gramíneas; habitação; estrada e água. Esta última temática foi criada para porções mais largas do arroio, visando não haver problemas com a 423 quantificação das áreas posteriormente, sendo que o restante do rio foi representado apenas com uma linha (tipo de camada linha), pois devido à escala não seria representativo na quantificação de áreas. Após a vetorização de todas as temáticas, utilizou-se a tabela de atributos de cada camada shapefile criada e gerou-se uma coluna intitulada “Área”. Visando a quantificação em m². Também se elaborou um mapa com a litologia da área para localizar o Arroio do Veado conforme questões geológicas, além de compreender a sua ligação dentro de um sistema hídrico mais amplo. Isso foi permitido com a utilização de arquivos shapefile disponibilizados pelos órgãos já referidos no trabalho. 4. RESULTADOS Observou-se uma variação significativa de altitude no trecho analisado do Arroio do Veado, com uma diferença de cerca de 60 metros, de acordo com o software Google Earth Pro. Elaborou-se uma carta-imagem com imagens Google Earth Pro, e por meio do software de SIG vetorizou-se um trecho do corpo d’água presente na região de Val Feltrina. O trecho selecionado é de 1,9 km, e conforme os arquivos hidrológicos do IBGE, o corpo d’água faz parte do Arroio do Veado, que é um tributário do Rio Vacacaí-Mirim, como pode ser percebido da Figura 1. Com a utilização da ferramenta “buffer” gerou-se a Área de Preservação Permanente de 30 metros, de acordo com o Código Florestal Brasileiro, levando em consideração áreas que não se enquadram nas áreas consolidadas, tratadas no Código anterior ao de 2012. Neste sentido a APP nas faixas marginais de qualquer curso d’água natural, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular devem obedecer 30 metros de largura em cada margem do corpo d’água, para cursos hídricos de até 10 metros, como é o caso do trecho do Arroio do Veado. A partir disso, fez-se uma classificação temática de todas as classes presentes na área de APP. As classes foram: Vegetação arbórea, campo, estrada, habitação e água, como pode ser observado na Figura 2. 424 Figura 2 – Classificação das temáticas no interior da Área de Preservação Permanente. As áreas foram quantificadas, obtendo-se 110.925 m² de APP, 882,8 m² de água, 594,82 m² de residências, 1.739,25 m² de estradas, 36.928,60 m² de campo e 70.791,56 m² de vegetação. Para melhor compreensão dos dados, tem-se a Tabela 1. Tabela 1 - Quantificação das áreas Temática Área Val Feltrina 1.726.200 m² Área de Preservação 110.925 m² Permanente Vegetação 70.791,56 m² Campo 36.928,60 m² Residência 594,82 m² Estradas 1.739,2 m² Água 882,80 m² 425 De acordo com os dados gerados pelo SIG, percebe-se que do total da área da localidade de Val Feltrina, a APP do presente trabalho ocupa 6,42%. Mudando a escala de avaliação, e levando em consideração apenas a APP, percebe-se que a maior parte da área, 64%, é constituída por uma vegetação de porte mais elevado, o que a priori é positivo ao meio ambiente e vai ao encontro do Código Florestal. Ainda neste sentido, 33% da área é constituída por campo, comum no Rio Grande do Sul, sendo uma vegetação de pequeno porte, como exemplo as gramíneas. Desta forma, a grande maioria da área de APP é positivamente constituída por vegetação, de forma geral, totalizando 97%. No local também se presenciam alguns exemplares da espécie Platanusoccidentalis (Plátano), sendo que a vegetação predominante no local se caracteriza por pertencer à tipologia de Floresta Estacional Decidual, caracterizada por apresentar-se em estágios iniciais, médios e avançados de sucessão. Por apresentar vegetações em diferentes estágios, destaca-se uma vegetação de mata mais fechada, de porte adulto e espécies clímax, correspondendo ao estágio sucessional avançado, e um segundo tipo de vegetação, esta mais limitada por um plantio de plátanos, em estágio primário de sucessão, ou seja, algumas espécies arbóreas presentes, substituindo o estágio anterior da vegetação local. São encontradas mais de 20 espécies arbóreas e arbustivas na localidade (Sampaio, Ouriques & Robaina, 2014). As outras temáticas são constituídas por estradas, 1,57%, água (extensões maiores do arroio) 0,79%, e residência, 0,53%. Todas as percentagens podem ser observadas na Figura 3. Figura 3 – Percentagens das temáticas quantificadas no interior da Área de Preservação Permanente. 426 Apesar de ocupar uma área pouco representativa, as temáticas Habitação e Estrada merecem atenção. Mesmo que as habitações tenham sido expressadas no gráfico da Figura 3 por 0%, especificamente o total é 0,53%, sendo que o valor no terreno é de aproximadamente 595 m², o que não pode ser desprezado. Ainda neste sentido, as Estradas, representadas por 2% no gráfico, totalizam aproximadamente 1740 m². Com a carta-imagem elaborada na pesquisa, nota-se que algumas famílias de Val Feltrina se estabeleceram nas proximidades do arroio, e por conta disso algumas residências se fazem presentes dentro da Área de Preservação Permanente. De acordo com o Código Florestal brasileiro, não é permitido o estabelecimento de estradas, mesmo que seja “de terra”, pois isso representaria a retirada da vegetação local. E da mesma forma seria proibido o estabelecimento de residências, pois também representaria a retirada da vegetação e o estabelecimento de habitações que mudariam, em diferentes escalas, a dinâmica natural do ambiente. É válido destacar as áreas consolidadas, que são áreas rurais que possuem ocupação antrópica consolidada até 22/07/2008 com edificações, benfeitorias e atividades agrosilvipastoris, admitida neste último caso a adoção do regime de pousio. Assim, se garante a manutenção das atividades desenvolvidas nessas áreas rurais consolidadas, respeitados os termos de compromisso ou de ajustamento de conduta eventualmente assinados, até que os Programas de Regularização Ambiental (PRAs) sejam promulgados pela União, estados ou DF e observadas as condições especificadas no projeto (Código Florestal, 2012). No caso das áreas consolidadas há diferenças de acordo com o tamanho em módulos fiscais da propriedade rural. Neste sentido, para os imóveis rurais com área de até um módulo fiscal (de acordo com cada região) ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição de faixas menores que 30 metros. Nesta situação, as margens em 5 metros, contados a partir da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d´água. Já nas APPs são definidos os limites mínimos sem possibilidade de redução ou ampliação pelos estados e DF, e obriga que seja recomposta a vegetação em APP que tenha sido suprimida sem autorização, ressalvados os casos que estejam sendo tratados no âmbito dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs), os quais poderão regularizar as atividades rurais consolidadas em APP com fundamento nos levantamentos e estudos socioambientais definidos na lei. Na hipótese de regularização das atividades, os PRAs deverão prever medidas compensatórias pelos proprietários ou possuidores (Código Florestal, 2012). 427 5. CONCLUSÕES Conclui-se que as Áreas de Preservação Permanente merecem um cuidado especial devido à complexidade das relações dentro das dinâmicas da natureza. Cabe destacar que a área merece análises mais aprofundadas, visto que o Código Florestal brasileiro faz especificações de acordo com o tamanho das propriedades rurais e seus módulos, podendo haver alterações no tamanho da APP. No presente trabalho, utilizando-se da norma geral, 30 metros para cursos d’água menores de 10 metros de largura, percebeu-se a presença de habitações irregulares, que podem alterar a dinâmica local, seja pelo escoamento superficial, diminuição da infiltração das águas da chuva, diminuição da fauna e flora, compactação dos solos, qualidade do ciclo hidrológico, entre outros fatores. É válido destacar que caso a APP permitida seja menor que 30 metros, isso não isenta a situação de interferência ao ambiente, apenas não apresenta questões conflitantes com as leis do país em alguns locais. Ainda que em pequena proporção, a existência de entradas abertas dentro da APP pode também alterar a dinâmica natural, seja pelo trânsito de pedestres ou automóveis, que varia de acordo com a intensidade do fluxo. Na região o tráfego é pouco intenso, mas de qualquer forma há de se considerar a compactação do solo e a supressão da vegetação. Percebeu-se a relação de diferentes vegetações como algo bastante particular, visto que na região Cone Sul é comum a presença de vegetações rasteiras, como gramíneas, que muitas vezes são permitidas como APP, não sendo necessário especificamente vegetações de portes maiores, desde que nativas, considerando-se positiva a heterogeneidade da vegetação local, desde que não haja uma interferência significativa na introdução de vegetação exótica. Notou-se que a preocupação se dá não só com o que já foi estabelecido, mas também com o que ainda pode acontecer no local. Com o crescimento populacional e expansão de manchas habitacionais, apesar do êxodo rural forte no Brasil, não se pode menosprezar uma eventual intensificação das ocupações na localidade de Val Feltrina e, principalmente, dentro dos limites das Áreas de Preservação Permanente. Embora a construção feita em Área de Preservação Permanente seja proibida pela legislação ambiental atual, a denominada área consolidada deve ser mantida. Em área rural, além de se considerar o marco temporal, é necessário que a intervenção tenha se dado por meio de edificações ou benfeitorias ou atividades agrossilvipastroris para continuidades de atividades ligadas ao turismo rural ou ao ecoturismo. 428 Logo, a lei não pode retroagir para atingir uma situação já concretizada. Precisamente por este motivo a lei supõe e preserva as ocupações antrópicas, porquanto uma legislação posterior não pode julgar as intervenções ocorridas antes das definições legais. REFERÊNCIAS Bisso, A. (2008). Diagnostico Sócio ambiental de Silveira Martins, RS. (Trabalho de Graduação). Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, UFSM. Casagrande, L. (2004). Avaliação do parâmetro de propagação de sedimentos do modelo de williams (1975) na bacia do rio Vacacaí-Mirim com o auxílio de técnicas de geoprocessamento. Dissertação (Mestrado). Santa Maria: Centro de Tecnologia – UFSM. Novo Código Florestal. (2012). Paraná: Sistema FAEP – Federação da Agricultura do Estado do Paraná. IBGE. 2010. Disponível <http://ibge.gov.br/cidadesat/xtras/perfil.php?lang=&codmun=432065>. em: Acesso em: 03/07/2015. Lei Nº 12.727, DE 17 DE OUTUBRO DE 2012. Presidência da República Casa Civil. Sampaio, F. M. A. S., Ouriques, R. Z., Robaina, L. E. S. (2014). Diagnóstico das Ocorrências de Movimentos de Massa e Deslizamentos Verificados na Localizada de Val Feltrina, Zona Rural do Município de Silveira Martins/RS. Santa Maria: Engeambih. 429 SÍNTESE DA EVOLUÇÃO DOS AREAIS DA BACIA DO ARROIO PUITÃ, OESTE DO RS, NO PERÍODO DE 1984 À 2014 Angélica Cargnin de Souza Carlos Alberto da Fonseca Pires Universidade Federal de Santa Maria ¹ angé[email protected] ² [email protected] Resumo O Sudoeste do Estado do Rio Grande do Sul apresenta áreas de intensa degradação do solo, com extensas porções de terra recobertas por areias submetidos aos condicionantes climáticos locais, sendo denominadas de areais. Nesse contexto, o objetivo desse trabalho foi realizar uma síntese da evolução dos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã no período 1984 a 2014, através de mapeamento multitemporal. Assim se seguiram algumas etapas: primeiramente se deu a coleta de dados; após o trabalho de campo; a seguir se deu a etapa de geoprocessamento com a confecção dos mapas de uso e cobertura da terra dos anos de 1984, 1994, 2004 e 2014 de toda a Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã, a validação das classificações e as análises geográficas. A partir do mapeamento dos areais da bacia verificou-se uma expansão de área nos períodos correspondentes de 1984-1994 e 1994-2004, porém a redução de área num terceiro período, de 2004-2014. Analisando-se todo o período tem-se a expansão dos areais em 1,87 km² de área. O comportamento dos areais no período está diretamente relacionado com os condicionantes climáticos e de relevo do local, tendo como principais agentes naturais responsáveis pela manutenção desse processo a água e o vento. Palavras-chave: Arenização. Arroio Puitã. Mapeamento Multitemporal. Uso e Cobertura da Terra. Sensoriamento Remoto. INTRODUÇÃO O Sudoeste Estado do Rio Grande do Sul é caracterizado por apresentar áreas de intensa degradação do solo. Essas áreas foram classificadas como áreas de atenção especial tomando como base o mapa elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente e Recursos Hídricos e da Amazônia Legal (1992), que localiza as áreas com risco de desertificação. O processo de desertificação é caracterizado pela degradação da terra em áreas áridas, semiáridas e secas, onde há dificuldade de fixação da cobertura vegetal, resultante de inúmeros fatores que incluem as atividades antrópicas. Nas áreas de degradação do solo no Sudoeste do RS a dinâmica dos processos aí envolvidos é derivada de um clima úmido onde há abundância de água. Esse processo de degradação é conceituado por Suertegaray (1987) como arenização. 430 Na região Oeste do RS encontra-se a Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã (Figura 1) marcada pela presença de inúmeros areais que recobrem extensas porções da superfície no interior da mesma, constituindo assim numa das principais áreas da região em ocorrência de areais. Figura 1 – Mapa de localização da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã Segundo Robaina et al (2010) nessa região há ocorrência de “processos geomorfológicos controlados pela drenagem do Rio Ibicuí e seus afluentes, atuando sobre substrato de rochas sedimentares de diferentes tipos, onde há a predominância de arenitos” (p. 15). Conforme o mesmo autor essa área de ocorrência dos areais é constituída por formas de relevo do tipo colinas associadas à morrotes isolados de arenitos. Há a presença de arenitos pouco coesos e solos arenosos que facilitam a ação hídrica e eólica facilitando a formação de feições como areais, ravinas e voçorocas. Quanto aos areais existentes na Bacia do Arroio Puitã, segundo Trentin (2007) os campos de areia “desenvolvem-se a partir de cabeceira de drenagens desmatadas e, principalmente, em vertentes convexadas junto à base das colinas, em geral, associados, na meia encosta, a arenitos pouco coesos” (p. 117). A degradação desses ambientes corresponde á um problema uma vez que a fertilidade do solo é reduzida e a erosão também aumenta, sendo assim necessário que haja o conhecimento da localização, gênese, evolução e comportamento desse 431 processo em cada local específico, bem como o conhecimento dos principais agentes da dinâmica superficial envolvidos no processo nesses locais. O levantamento e análise do uso e cobertura da terra de determinada área é um instrumento imprescindível para estudos ambientais, uma vez que possibilita o seu melhor gerenciamento e planejamento, de modo que possibilita se conhecer a utilização dada por parte do homem à terra ou a situação da vegetação que reveste o solo, além de permitir o desenvolvimento de técnicas e projetos que visem um melhor planejamento e gestão do ambiente em questão. Segundo o IBGE (2006) “ao retratar as formas e a dinâmica de ocupação da terra, esses estudos também representam instrumento valioso para a construção de indicadores ambientais e para a avaliação da capacidade de suporte ambiental, diante dos diferentes manejos empregados na produção, contribuindo assim para a identificação de alternativas promotoras da sustentabilidade do desenvolvimento” (p.20). Nesse contexto o mapeamento e levantamento do uso e cobertura da terra de uma determinada área, segundo Cavalheiro e Rassier (1998), vêm demonstrar a distribuição espacial das atividades nela realizadas. Para Silva et al. (2013) “o mapeamento do uso do solo mediante técnicas de análises espaciais são o meio mais rápido e fácil para análise dos fenômenos naturais nas mais variadas escalas” (p. 02). Fontes básicas para o mapeamento da cobertura da terra são os dados de imagens orbitais, podendo ser utilizados dados de diversos sensores dependendo de fatores como o objetivo, a escala e o custo do mapeamento. Segundo Keller (1969), “somente o registro dos fatos em mapas poderá mostrar as áreas e a distribuição real das diferentes formas de uso do espaço rural” (p. 151). Porém, para que se possa entender as mudanças nas relações entre uso e cobertura da terra, é necessário que seja feita a classificação da cobertura da terra, a caracterização de sua função e o entendimento dos agentes envolvidos OBJETIVOS O objetivo principal desse trabalho é realizar uma síntese da evolução (expansão, estagnação ou redução) dos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã num período de 30 anos (1984 a 2014). Como objetivos específicos foi proposto elaborar um mapeamento do uso e ocupação do solo da bacia do Arroio Puitã a partir de imagens de satélite dos últimos 30 anos e analisar as principais mudanças no uso e ocupação do solo no entorno das áreas dos areais. 432 METODOLOGIA Os dados coletados para a realização da pesquisa podem ser subdivididos em dois grupos, os bibliográficos e os cartográficos. Os dados bibliográficos foram utilizados principalmente para fundamentar teoricamente a pesquisa e compreenderam principalmente trabalhos científicos e órgãos de pesquisa. Já os dados cartográficos foram utilizados principalmente na etapa de geoprocessamento na compilação de outros dados e geração de informações. Dentre os dados cartográficos estão: a base vetorial do RS, elaborada por Hasenack e Weber (2010), da UFRGS, em formato shapefile, com elementos de altimetria, hidrografia, sistema viário, manchas urbanizadas e limites do Estado: a malha municipal digital do RS (IBGE, 2010) em shapefile na escala 1:250.000, sistema de coordenadas geográficas Lat/Long e datum SIRGAS2000; três imagens do sensor TM do satélite Landsat 5 em formato digital, órbita-ponto 224-080, de 2 de Julho de 1984, 12 de Junho de 1994 e 09 de Julho de 2004, respectivamente; uma imagem do sensor OLI e TIRS do satélite Landsat 8, de 06 de Agosto de 2014, com órbita-ponto 224-080; e outras bases vetoriais já existentes. Na etapa correspondente ao geoprocessamento foram utilizados os softwares Environment for Visualizing Images - ENVI 4.8 no processamento digital das imagens e o software ArcGIS 10 na realização de análises geográficas e geração dos layouts finais de apresentação. Quanto à classificação das imagens primeiramente se deu o reconhecimento de padrões espectrais dos alvos e a posterior determinação das classes de uso e cobertura da terra, que nesse caso para o mapeamento de toda a área de estudo foram sete: água; agricultura; areais; campos; florestas; silvicultura; e, solo exposto. Após foram coletadas amostras de treinamento nas imagens a fim de classifica-las por meio de classificação supervisionada, verificando-se após o grau de separabilidade das mesmas. Por fim foi aplicado o método classificador pixel a pixel Maxima Verossimilhança – MAXVER buscando a classificação das imagens. Para validar as classificações, ou seja, para que elas condigam com a verdade do terreno foram geradas matrizes de confusão para as classificações cruzando os dados oriundos da classificação com os dados de campo. A verdade do terreno corresponde ao que há de real no terreno sendo que para realizar o confronto desses dados necessitou-se da ida a campo. A matriz de confusão gera produtos como a Acurácia Global da classificação e o Coeficiente Kappa. Na Acurácia Global são considerados no calculo apenas os pixels corretamente classificados, ou seja, apenas os localizados na diagonal principal 433 da matriz. Já o Coeficiente Kappa considera em seu cálculo todos os pixels da matriz, ou seja, os corretamente e os não corretamente classificados dando assim maior confiabilidade ao resultado. O Coeficiente Kappa gera valores que vão até um (1), onde para a avaliação considera-se o que foi proposto por Landis e Koch (1977) quanto à qualidade da classificação, sendo: < 0,00 – Péssima; de 0,00 à 0,20 – Ruim; de 0,20 à 0,40 – Razoável; de 0,40 à 0,60 – Boa; 0,60 à 0,80 – Muito Boa; e, de 0,80 à 1,00 – Excelente. Posterior à validação das classificações houve a transformação dos resultados das mesmas do formato raster para vetor e a quantificação de áreas de cada classe. Posteriormente houve a transformação para o formato shapefile e feitas as análises geográficas cruzamento de informações das classificações de 1984 – 1994, 1994 – 2004, 2004 – 2014 e 1984 – 2014. RESULTADOS Como resultado do mapeamento multitemporal da Bacia Hidrgráfica do Arroio Puitã obteve-se quatro mapas de uso e cobertura da terra bacia referentes às quatro datas estudadas, ou seja, dos anos de 1984, 1994, 2004 e 2014, considerando as seguintes classes temáticas: Água, Agricultura, Areais, Campos, Florestas, Silvicultura e Solo Exposto. Durante todo o período analisado houve a predominância da classe Campos em mais da metade da área da bacia, onde essa predominância se deve às características naturais da área inserida no Bioma Pampa com vegetação característica de gramíneas. Apesar de serem predominantes na bacia as áreas de campos diminuíram no período analisado, ou seja, 1984 à 2014, passando de 278,2 km² para 253,12, uma redução de 24,9 km² de área. Em análise geral do uso e cobertura da terra de 1984 e 2014 percebe-se que essas áreas de campos cederam espaço principalmente para a agricultura e silvicultura. As áreas de agricultura na época de captura das imagens são representadas em sua maioria por cultivos de invernos como trigo, sorgo ou aveia, ou pastagens cultivadas em intermediário e avançado de desenvolvimento. As porções de área ocupadas pela classe Agricultura aumentaram 48.02 km² no período, passando de 6.91 km² em 1984 para 50,58 km² em 2014, aumento devido principalmente à expansão da lavoura de soja, vindo de encontro com a redução das áreas de campo já citadas. 434 A classe Solo Exposto corresponde principalmente à solos descobertos, ou seja, com ausência de vegetação que estão sendo preparados para a implementação de cultivos agrícolas. Também compreende a solos em que há presença de vegetação, porém rala, podendo corresponder a áreas onde os cultivos agrícolas estão em estágio inicial de desenvolvimento. As áreas de Solo Exposto apresentaram redução em 2,59 km², passando de 39,32 km² em 1984 para 36,73 km² em 2014. Essa redução condiz em grande parte com a data das imagens, ou seja, devido ao fato de a imagem de 1984 ter sido captada no mês de Julho e a imagem de 2014 ter sido captada no mês de Agosto conferindo assim um mês de diferença entre as datas, considerando que em Agosto parte dos cultivos de verão já foram implementados. As áreas da classe Florestas compreendem vegetação natural de grande porte, em geral árvores de médio à grande porte e arbustos de grande porte. Estas correspondem em parte matas galeria dispostas ao longo de cursos d’água, mas em maior proporção estão localizadas em áreas declivosas como encostas. As Florestas compreendiam um total de 55,6 km² de área em 1984 e apenas 22,0 km² em 2014 representando uma diminuição de 33,06 Km² de área. Essa diminuição na área florestal se deve a dois fatores principais, o aumento das áreas agrícolas e o desmatamento. A classe Silvicultura é representada por plantações de pinus e principalmente de eucalipto. Essa classe em 1984 recobria 5,6 km² de área da bacia e em 2014 recobria 15,79 km² de área, cerca de 4% do total da área da bacia, representando um aumento de 10,19 km² de área. Esse aumento se dá principalmente no período de 2004 a 2014 onde o investimento de empresas multinacionais de celulose é o principal responsável. A classe Água é representada por cursos d’água e por açudes e represas. Essa classe apresenta pequenas porções de área se comparadas ao total da bacia devendo-se principalmente ao não elevado número de corpos d’água existentes no interior da bacia.Verifica-se ao longo do período um aumento gradual dessas áreas onde em 1984 tinha-se apenas 0,33 km² e já em 2014 0,80 km², representando assim um aumento de 0,47 km² de área. Esse aumento se deve principalmente ao aumento no número de açudes e represas durante o período na área de estudo. Quanto aos areais da bacia os processos relacionados ao clima que são mais atuantes nessas áreas são o vento e a água (Figura 2 – A, B, C). A água por meio da erosão e lixiviação com importante papel na ativação de processos da dinâmica superficial como o ravinamento e o voçorocamento através do 435 escoamento superficial concentrado. Já o vento constante que sopra na região atua como agente erosivo e também no transporte de desagregados de solo e rocha, gerando depósitos arenosos e mantendo os depósitos já existentes em constante mobilidade. Em sua maioria esses areais estão localizados em declividades baixas de até 5% e nas mais baixas elevações dentro da bacia que variam dos 87 m a 215 m de altitude. Estão associados em sua maioria a cabeceiras de drenagem, à meia encosta de vertentes geralmente côncavas e a morrotes de arenito comuns na área (Figura 2 – D, E, F). De maneira geral a ocorrência de areais em dado local limita a realização de atividades econômicas, porém o que se observa a campo é a tentativa constante da implantação da silvicultura sobre áreas arenosas e também à bovinocultura, devido ao fato dessas áreas encontrarem-se geralmente no interior de campos destinados à atividade comum na região (Figura 2 – G, H, I). Figura 2: Diferentes cenários nos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã: A) ação da água; B) deflação; C) processos de ravinamento e voçorocamento; D) areal em meia encosta; E) blocos de arenitos sob ação do intemperismo; F) morrote de arenito; 436 G) silvicultura sobre áreas arenosas; H) cerca enterrada pela areia e reconstruída sobre areais; I) presença de bovinos soltos em areais. Os areais da bacia do Arroio Puitã possuem semelhanças quanto ao seu comportamento (expansão e retração) devido ao fato de serem regido pelo mesmo tipo de clima e, portanto, por um regime de chuvas e ventos semelhantes. Esse fato condiciona processos da dinâmica superficial parecidos neste ou naquele areal dentro da bacia. E em sua maioria dentro da bacia os areais tem origem dos arenitos fluviais, com processos eólicos associados, da Formação Guará que possuem coloração bege à esbranquiçada e granulometria grossa a media pouco selecionada. Partindo para uma análise quantitativa, verifica-se que durante os 30 anos em estudo as áreas recobertas pelos areais nos revelam em um primeiro e segundo momento uma expansão e num terceiro momento a retração (Figura 3). Em 1984 os areais da BHAP computavam 7,29 Km² de área correspondendo a 1,9 % da área total de estudo, em 1994 as áreas somavam 9,06 km², 2,3 % da área total e em 2004 a área correspondia quase que ao dobro do primeiro ano analisado correspondendo a 13,4 km² de área, ou seja, 3,4 % do total da área de estudo. Porém em 2014 a área era menor em relação ao ano anterior considerado, somando 9,16 km² de área, 2, 3% do total. Considerando todo o período de estudo identificou-se uma expansão de 1,87 km² nas áreas recobertas por areais dentro da bacia. 437 Figura 3: Mapa da evolução dos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã por ano de mapeamento A dinâmica desses areais se dá principalmente no seu entorno onde as expansões se dão geralmente sobre áreas de campo e solo exposto. Verificou-se também que a redução das áreas dos areais de 2004 à 2014 se deu em função da expansão de áreas de campo, solo exposto e principalmente de silvicultura implantada geralmente sobre áreas em processo de arenização. O dinamismo no comportamento dos areais está relacionado também com a influência dos fenômenos ENOS que atingem o estado influenciando seja através de estiagem ou do aumento significativo nos níveis pluviométricos. Ressalta-se por fim quanto à validação das classificações geradas para 1984, 1994, 2004 e 2014 ressalta-se que as mesmas apresentaram índice Kappa correspondentes a 0,976, 0,9604, 0,9384 e 0,9762, respectivamente, validando as classificações e aferindo-lhes grau de eficiência segundo o proposto por Landis e Koch (1977) como excelente. CONCLUSÕES A partir do mapeamento multitemporal dos areais da Bacia Hidrográfica do Arroio Puitã pode-se perceber mudanças consideráveis nos mesmos durante as fases estabelecidas para o estudo. Tem-se assim um pequeno aumento de área no período de 1984 a 1994, um aumento consideravelmente maior no período de 1994 a 2004 e uma redução considerável, quase que de mesma proporção a este último aumento, no período que vai de 2004 a 2014. Porém ao analisar o período como um todo considerando apenas as datas inicial e final do estudo, ou seja, o período entre 1984 e 2014, tem-se que os areais sofrem pequeno aumento de área considerando o período de 30 anos, mascarando o comportamento do mesmo ao longo do período estudado. Assim o mapeamento de uma mesma área considerando apenas duas datas buscando a análise num longo período de tempo, como no caso da presente pesquisa num período de 30 anos, pode mascarar o resultado obtido a respeito de determinados alvos em estudo, uma vez que o comportamento desses alvos ao longo do período analisado pode ter sido absolutamente diferente dos dados encontrados nos períodos inicial e final do estudo. Dessa forma pode-se inferir que o mapeamento multitemporal de alvos da superfície terrestre com a utilização de mais de duas datas de mapeamento, reduzindo 438 o intervalo de obtenção de dados, possibilita maior eficiência e confiabilidade ao monitoramento do comportamento desses alvos. BIBLIOGRAFIA Cavalheiro, A. P.; rassier, W. T. (1998) Uma aplicação de SIG/IDRISI num estudo ambiental da zona sul do RS. 1998. (Monografia de conclusão de curso, Análise de Sistemas, Universidade Católica de Pelotas, 1998). Instituto brasileiro de geografia e estatística (2006). Manual Técnico de Uso da Terra. 2 ed. Rio de Janeiro: IBGE. Keller, E. C. de S. (1969) Mapeamento da utilização da terra. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, 31 (3), 151-160. Landis, J. R.; koch, G. G. (1977) The measurement of observer agreement for categorical data. Biometrics, 33 (1), 159-174. Robaina, L. E. S et al. (2010) Compartimentação Geomorfológica da Bacia Hidrográfica do Ibicuí, Rio Grande Do Sul, Brasil: proposta de classificação. Revista Brasileira de Geomorfologia, São Paulo, 11 (2),11-23. Silva, A. M. et al. (2013) Análise multitemporal e atualização do mapa de uso e ocupação do solo do município de Monteiro - PB. 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Dissertação (Mestrado em Geografia e Geociências, Universidade Federal de Santa Maria, 2007). 142. 439 440 OS DADOS SRTM E SUA APLICABILIDADE NA REPRESENTAÇÃO DO CENÁRIO GEOGRÁFICO CAPINÓPOLIS/MG/BRASIL Eduardo Marques Silveira Discente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria E-mail: [email protected] Meri Lourdes Bezzi Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria E-mail: [email protected] Roberto Barboza Castanho Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia E-mail: [email protected] Resumo: O desenvolvimento de novas metodologias é de extrema importância para se espacializar diversas temáticas, onde, a partir de mapeamentos, por exemplo, obtem-se a tradução da realidade, bem como, uma proximidade da mesma, demonstrando a organização espacial de qualquer parte do território. Através destes, e de outros acontecimentos, foram criadas novas tecnologias, podendo citar a computacional, através da qual foi possível gerar uma série de novas técnicas para se efetuar a espacialização das mais diversas regiões. Partindo deste pressuposto, a pesquisa teve como objetivo central efetuar uma análise sobre as utilidades dos dados The Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), bem como, seu uso e aplicabilidade na Geografia. Especificamente, buscou-se: a) elaborar exemplos de utilização de dados SRTM no município em estudo; b) verificar a aplicabilidade destes dados em Capinópolis. Por fim, entende-se que ocorreu uma crescente utilização dos dados SRTM, nos últimos anos. Destaca-se que ao se utilizar deste tipo de mecanismo, fazse necessário uma avaliação detalhada no tipo de procedimento realizado na sua organização, pois se o mesmo não for analisado e utilizado corretamente, a metodologia empregadatende a ser ineficaz não correspondendo aos para os resultados esperados pelo pesquisador. Palavras chaves: SRTM; Aplicabilidade, Geoprocessamento Introdução Com o desenvolvimento tecnológico mundial, as novas tecnologias estão cada vez mais, presentes não somente na vida cotidiana, mas na área urbana e rural, ou seja, no globo como um todo. Assim, tecnologias como o Geoprocessamento, o SIG (Sistema de Informação Geográfica) e a Cartografia Digital, na atualidade, são valiosos instrumentos para se compreender e analisar a utilização do espaço. Através disto, destaca-se a importância da junção destas tecnologias entre si, ou seja, se um pesquisador efetuar a utilização do Geoprocessamento e do SIG, para a elaboração de um mapeamento, o mesmo tende a ficar cada vez mais preciso, propiciando, um trabalho com maior riqueza nos detalhes, o que facilita a compreensão e observaçãodas informações. 441 O trabalho expõem quais são as aplicabilidades das imagens The Shuttle Radar Topography Mission (SRTM) no cenário geográfico como um todo. Desta forma a pesquisa apresenta como objetivo central efetuar uma análise sobre as utilidades dos dados The Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), bem como, seu uso e aplicabilidade na Geografia. Especificamente, buscou-se: a) elaborar exemplos de utilização de dados SRTM no município em estudo; b) verificar a aplicabilidade destes dados em Capinópolis. A utilização de técnicas para a compreensão do cenárioGeográfico Na atualidade a análise e compreensão do uso solo tem se tornado de suma importância para a potencialização da produção agropecuária e compreensão das dinâmicas que ocorrem no espaço como um todo. Desta forma, cada vez mais, novas tecnologias são agregadas para espacialização destas áreas, proporcionando melhor aproveitamento do espaço rural ou urbano. Neste sentido, pode-se afirmar que as transformações dos dados reais para os virtuais devemobedecer certas condições, pois os mesmos propõem demonstrar exatamente o que é observado no espaço. Fitz (2008, p. 70) discorre sobre esta questão dizendo A introdução de dados em um SIG deve seguir determinadas condições específicas. Os dados espaciais possuem características próprias, cuja percepção por parte do usuário definirá formas diferenciadas de interpretações. A passagem dos dados do mundo real para um mundo virtual deverá ocorrer a partir da utilização de modelos, os quais deverão seguir padrões conceituais vinculados à maneira como o indivíduo concebe o espaço observado. Tal estrutura, portanto, não pode ser desvinculada do paradigma epistemológico envolvido na questão. Nesse sentido, a aclamada “neutralidade cientifica” acaba por perder seu principal aporte filosófico Assim, entende-se que é de fundamental importância a compreensão do termo sensoriamento remoto, uma vez que este passou a ser utilizado com o desenvolvimento de outras tecnologias, como por exemplo o Geoprocessamento. Este processo foi muito utilizado até o início da Primeira Guerra Mundial, porém apenas a partir da Segunda Guerra Mundial, que houve um enorme desenvolvimento tecnológico, no que tange ao sensoriamento remoto. Entretanto a partir do lançamento de objetos não tripulados é que houve um aumento na utilização do sensoriamento 442 remoto. Rosa (2009, p.13), elaborou a seguinte evolução histórica referente a esta ferramenta. Em 4 de outubro de 1957, pela primeira vez na história de nossa civilização, um objeto não tripulado foi lançado ao espaço exterior e pôs-se a gravitar em torno da terra. Na década de 60 deu-se início aos experimentos espaciais tripulados, como por exemplo, a série de espaçonaves Gemini e Apolo, a National Aeronautics and Space Administration (Nasa), o que motivou o desenvolvimento de uma série de sensores com o objetivo de obter informações sobre a superfície terrestre. Em 1972 os EUA deram um salto e colocaram em órbita o primeiro satélite de sensoriamento remoto com finalidade civil, destinado à obtenção de dados de forma rápida, confiável e repetitiva dos alvos terrestres. Neste sentido o desenvolvimento desta tecnologia e significativa e agregada a outros sistemas implantados, permite na atualidade se obter diversas informações através dos sensores dos satélites. O imageamento, na atualidade, funciona através de sensores acoplados aos satélites, os quais emitem uma espécie de laser, efetuando escaneamento da superfície terrestre. Deve-se levar em consideração também a ideia de que, para o sensoriamento efetuar a aquisição de dados é necessário utilizar energia para se efetuar a transferência de informação do objeto para o sensor. Para Novo (1993, p. 2), a definição de sensoriamento remoto é, [...] a utilização conjunta de modernos sensores, equipamentos para processamento de dados, equipamentos de transmissão de dados, aeronaves, espaçonaves etc., com o objetivo de estudar o ambiente terrestre através do registro e da análise das interações entre a radiação eletromagnética e as substâncias componentes do planeta Terra em suas mais diversas manifestações. Assim, pode-se afirmar que a evolução das tecnologias fiz com que o desenvolvimento de novas técnicas trouxesse uma maior evolução para a elaboração de mapas e de outros produtos cartográficos. Através destes pressupostos deve-se levar em consideração a eficácia de outros mecanismos e/ou ferramentas, tais como, o geoprocessamento, cartografia digital e Sistema de informação Geográfica (SIG) que contribuíram para a espacialização das dinâmicas que ocorrem no uso da terra. Levando em consideração que para alguns autores, como Rosa; Brito (1996), Fitz (2008), Rosa (2009) dentre outros, o SIG é um conjunto de instrumentos que tem por finalidade a análise do 443 espaço geográfico e, por si só, acaba englobando as outras ferramentas citadas aqui, com isto, faz-se necessário a compreensão deste sistema operacional. Assim, para se compreender como funcionam estas ferramentas, deve-se analisar sua história. Para Rosa; Brito (1996, p. 8) é importante enfatizar que, O Sistema de Informação Geográfica (SIG) é um caso especifico do Sistema de Informação. Seu desenvolvimento começou em meados da década de 60. O primeiro sistema a reunir as características de um SIG foi implementado no Canadá, em 1964, sendo chamado de “Canadian Geographic Information System). Em seguida foram desenvolvidos outros sistemas. Dentre eles podemos destacar os sistema de New York Landuse na Natural Resources Information Systems (1967) e Minnesota Land Management Information System (1969). Nas décadas posteriores ocorreram consideráveis avanços em equipamentos e software, permitindo o desenvolvimento de sistemas mais potentes e novas aplicações, popularizando principalmente os CAD s (Computer Aided Design), cujos objetivos são diferentes dos SIG s. No começo da década de 80, a evolução da tecnologia foi afetada pelos avanços em hardware e software, com o uso mais efetivo na manipulação das informações geográficas, bem como a ligação entre a base de dados gráfica e alfanumérica Neste sentido, o Sistema de Informação Geográfica deve possuir diversas funções, as mesmas, muitas vezes, são entendidas como os próprios módulos do sistema a elas relacionados. Fitz, (2008, p. 80), destaca que um SIG deve conter: Aquisição de dados; Gerenciamento do banco de dados; Análise geográfica de dados e Representação de dados. Entende-se, por aquisição de dados coleta de informações virtuais, ou até mesmo os reais, ou seja, documentos que podem ser “palpáveis”, como exemplo pode-se destacar fotografias aéreas, imagens de satélite, cartas topográficas, mapas, relatórios estatísticos e outras fontes de informação. Estas informações podem ser processadas de diversas formas, por meio de teclado, scanner CD-ROM, dentre outros. (ROSA 2009) Para utilizar qualquer tipo de ferramenta seja ela, SIG ou geoprocessamento, ou até mesmo para a elaboração de um MDT, é fundamental a compreensão de alguns parâmetros cartográficos. SegundoJoly (2004, p. 7) “[...] cartografia é a arte de conceber, de levantar, de redigir e de divulgar os mapas”, isto para Também para Rosa (2004, p. 4) a cartografia [...] é considerada como a ciência e a arte de expressar (representar), por meio de mapas e cartas, o conhecimento da superfície terrestre. É ciência porque, para alcançar exatidão, depende basicamente da astronomia, geodesia e matemática. É arte porque é subordinada as 444 leis da estética, simplicidade, clareza e harmonia. O conceito de mapa, por si só, acaba sendo incompleto para a compreensão da ideia de cartografia, ou seja, é de fundamental importância entender o que é um mapa. Assim para, Joly (2004, p. 7) Um mapa é uma representação plana, simplificada e convencional, do todo ou de parte da superfície terrestre, numa relação de similitude conveniente denominada de escala. Um mapa é a representação, sobre uma superfície plana, folha de papel ou monitor de vídeo, da superfície terrestre, que é uma superfície curva. A passagem de uma para outra suscita várias dificuldades. Uma delas é a definição exata da forma e das dimensões da terra. Este é o objeto da geodésia, que se encontra assim na origem de toda cartografia. Uma outra dificuldade consiste em transferir para o plano a superfície assim mensurada. Este é o problema das projeções Desta maneira, entende-se que a análise e elaboração de um mapa torna-se cada vez mais complexa se não forem levados em consideração alguns elementos cartográficos, como por exemplo, a escala, as projeções, as coordenadas e a localização. Rosa; Brito (1996, p. 25) destacam que uma escala é [...] a relação entro o tamanho dos elementos representados em um mapa e o tamanho correspondente sobre a superfície da Terra (E=d/D. É indicada da seguinte forma: 1:25.000 ou 1/25.000 (está escala indica que uma unidade no mapa eqüivale a 25.000 unidades sobre o terreno) A escala é uma informação que deve constar em qualquer mapa ou carta e, pode ser representada, geralmente pela escala numérica e/ou escala gráfica. Com isto, compreende-se a importância da evolução computacional, pois através desta foi possível um melhor desempenho no que tange a espacialização do cenário geográfico como um todo. Os dados SRTM Para se compreender este tipo de instrumento e necessário se analisar seus fundamentos, pois sem esta compreensão não é possível a verificação e o entendimento de suas importâncias. Assim, osdados são vitais espacialização geográfica. Diante deste pressuposto, para Valeriano; Rosseti (2010, p. 19) o desenvolvimento dos dados SRTM, foi de suma importância para o mapeamento de algumas áreas, pois 445 Os Modelos Digitais de Elevação (MDE) são representações de dados topográficos passíveis de tratamento em Sistemas de Informações Geográficas (SIG). O processamento destes dados em SIG permite a caracterização do estado e de processos do sistema terrestre em abordagem espacializada. Uma vez estruturados em colunas e linhas, em analogia às imagens de satélite, os valores de altitude podem ser integrados a outras informações diretamente ou após serem operados para a determinação de variáveis topográficas derivadas da altimetria. Nesse contexto, a tomada de dados em cobertura global pela SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) representa uma oferta até então inédita de MDE, por áreas relativamente desprovidas de mapeamentos topográficos. A partir disto, entende-se que a utilização de uma boa base é de fundamental importância para execução e exposição de um produto cartográfico. O site Jet Propulsion Laboratory (JPL) da National Aeronautics and Space Administration (NASA) destaca que, On February 11, 2000, the Shuttle Radar Topography Mission (SRTM) payload onboard Space Shuttle Endeavour launched into space. With its radars sweeping most of the Earth's surfaces, SRTM acquired enough data during its ten days of operation to obtain the most complete near-global high-resolution database of the Earth's topography. To acquire topographic (elevation) data, the SRTM payload was outfitted with two radar antennas. One antenna was located in the shuttle's payload bay, the other on the end of a 60meter (200-foot) mast that extended from the payload pay once the Shuttle was in space. The Shuttle Radar Topography Mission is an international project spearheaded by the National GeospatialIntelligence Agency (NGA) and the National Aeronautics and Space Administration (NASA). Outros aspectos podem ser compreendidos, se levarmos em conta o funcionamento deste mecanismo. De acordo com Valeriano (2004, p. 20) A missão usou o mesmo instrumento utilizado em 1994 no programa Spaceborne Imaging Radar-C/X-Band Synthetic Aperture Radar (SIRC/X-SAR), a bordo do ônibus espacial Endeavour. Porém o arranjo foi projetado para coletar medidas tridimensioanis da superfície terrestre através de interferometria. Para tanto, a nave foi munida de um mastro de 60m, em cuja extremidade foram instaladas antenas para bandas C e X, além de melhorados os dispositivos de controle e navegação Para o site Brasil em Relevo EmbrapaMonitoramento por Satélite, as imagens de satélite têm como objetivo 446 [...] produzir e disponibilizar informações sobre o relevo do território nacional, a partir dos dados gerados pelo projeto SRTM (em inglês, Shuttle Radar Topography Mission). A partir do processamento digital dessas imagens, a EMBRAPA-Monitoramento por Satélite recortou os mosaicos estaduais, compatibilizando-os também com os produtos LANDSAT da série Brasil visto do espaço. Além de organizar todas as informações obtidas numa base digital de fácil consulta, CD ou internet, compatível com a maioria dos softwares de navegação utilizados pelo público em geral, também foram disponibilizados os dados numéricos originais para download, direcionados aos usuários especializados em geoinformação. Finalmente, essa nova integração e disponibilização de produtos do sensoriamento remoto com propósito múltiplo continuará à contribuir para a ampliação do mercado de observação da Terra no Brasil, apresentando diversas aplicações para o desenvolvimento sustentável da agricultura e do país. Por meio desta ferramenta, efetuou-se a cobertura de 80% do total da área terrestre, sendo que está varredura foi efetuada nas áreas de 60º N e 56º S, e o satélite perpassou de 14 vezes nestas regiões, como pode ser observado na figura 031 Figura 01: Cobertura das imagens SRTM pelo globo Fonte: NASA,2000 Destaca-se, que algumas ciências são importantes e exercem um papel fundamental para elaboração destes e outros produtos cartográficos. A ciência da Cartografia é um exemplo que deve ser levado em consideração no que tange à elaboração destes tipos de materiais. Alguns exemplos de utilização dos dados SRTM 447 A utilização destas ferramentas, na atualidade, é de suma importância para a elaboração de qualquer tipo de produto cartográfico, ou seja, mecanismos, como o Sistema de Informação Geográfica, o Geoprocessamento, a Cartografia Digital, as imagens por satélite, imagens SRTM dentre outras. Elas são indispensáveis para a compreensão e elaboração de produtos cartográficos como o Modelo Digital de Terreno (MDT) e entendimento do espaço. Assim, nesta pesquisa será exposto alguns tipos de produtos cartográficos que podem ser alcançados através da junção dos dados SRTM e do Sistema de Informação Geográfica, visando sempre que o SIG também deve englobar os softwares como outro meio de utilização para a confecção de produtos Cartográficos, como por exemplo, o Modelo Digital de Terreno (MDE). Segundo, Luiz; Santos; Brenner (2007, p. 582), MDE e/ou DEM”[...]é uma representação digital de uma seção da superfície, dada por uma matriz de pixels com coordenadas planimétricas (x,y) e um valor de intensidade do pixel correspondente à elevação”. Salienta-se que a utilização do mesmo se restringe à modelagem de relevo. Um exemplo de MDE, pode ser observado na figura 02, a qual demonstrando a aplicabilidade deste tipo de ferramenta Figura 02: Modelo Digital de Elevação (MDE) Este tipo de produto é gerado através de das curvas de nivel que também são adiquiridas por intermédio das imagens SRTM.Deve-se destacar que este processo somente é possivel através da utilização de alguns softwares específicos. 448 Outros exemplos podem ser citadas no que se refere a utilização das imagens SRTM, um deles seria o Modelo Digital de Terreno (MDT).Assim, este produto cartográfico para Viviane; Manzato (2005, p. 27) “[...]é uma representação matemática computacional da distribuição de um fenômeno espacial que ocorre dentro de uma região da superfície terrestre”. Convém salientar que existem diversas maneiras para elaboração de um MDT, dentre essas, pode-se destacar a triangulação de dados, a interpolação dos dados coletados. A qual foi utilizada neste trabalho é a Geração automática do MDT. Assim, segundo Barbosa (1999, p. 25), Com a fotogrametria digital, as técnicas fotogramétricas para a geração do Modelo Digital do Terreno têm sido automatizadas. A geração automática do MDT, a partir de um par de fotos digitais (imagens) com superposição adequada, compreende os seguintes passos: - determinação de pontos correspondentes (matching); interpolação e densificação da superfície; - conferência e edição do MDT (controle de qualidade) Diferentemente do MDE, que demonstra a elevação de uma localidade qualquer através das curvas de nível o Modelo Digital de Terreno, busca representar a hipsometria do espaço através dos pixels presentes na imagem dos dados SRTM, ou seja, quanto menos pixel mais plana é área em estudo. A figura 03 demonstra de forma final o MDT que foi extraído das imagens SRTM. Figura 06: Modelo Digital de Terreno (MDT) 449 Assim pode-se salientar que há diversas outras finalidades para as imagens SRTM. Cita-se como exemplo, efetuar a confecção da rede hidrográfica de uma área qualquer, levando em consideração os cursos d’água que aparecem na imagem. Temse também a possibilidade de elaborar mapas geomorfológicos de uma localidade qualquer e diversas outras formas de utilização desta ferramenta. Deve-se destacar que, para que haja sucesso neste tipo de elaboração de produtos cartográficos, geralmente tende-se a necessidade da utilização de outras tecnológicas, ou seja, o pesquisar não deve se atentar em utilizar apenas os dados SRTM, mas também é executável a utilização de, por exemplo, imagens LANDSAT. CONSIDERAÇÕES FINAIS E de fundamental importancia destacar que deve ser levado em consideração a grande necessidade do desenvolvimente tecnológico, principalmente no que se refere ao avanço computacional na década de 90, para que assim, houvesse a possibilidade e utilização destas e de outras tecnologias visando a espacialização do cenário geográfico. Os dados SRTM, foram uma inovação no que se refere ao mapeamanto de pequenas escalas, ou seja, por ter sua extenção de 90x90 metros o mesmo tende a ser utlizado apenas em pequenas áreas em que a escala não seja muito grande, pois se o mesmo não for realizado desta maneira e possivel que ocorra alguns erros principalmente no que se refere o mapeamento destas regiões. Para que ocorra uma melhor utilização dos dados SRTM é fundamental que os mesmos sejam utilizados, com outras tecnologias, como por exemplo, imagens de satélite, GPS dentre outras, pois somente assim haverá uma maior precisão nos dados e no mapeamento realizado pelo pesquisador, ou seja, deve-se efetuar uma junção de tecnologias. Por fim, entende-se a importância deste tipo de material, mas o pesquisador que se utilizará deste aparato deve compreender pelo menos, o mínimo dos conceitos da ciência cartografica e isto, não deve ser levado em consideração apenas para os dados SRTM, mas para todo e qualquer tipo de mapeamento realizado. Desta maeira sem o entendimento destas ideias é possivel que todo o trabalho efetuado passa a ser errônia, pois a certas formalidades que devem ser cumpridas no que se refere ao mapemanto de forma geral. A utilização dos dados SRTM permitiram a representação do espaço geográfico do município de Capinópolis. Alguns exemplos podem ser citadaos, no que se refere a 450 aplicabilidade desta instrumento, tais como: mapas hipsometricos, modelo digital de terreno, hidrografica relevo dentre outros. Através das metodologias empregadas foi possivel verificar que o municipio de Capinópolis, possui uma variação no seu relevo e isto se da por conta da proximidade de um curso d’água o que ocasiona em uma área onde o declive e mais acentuado é o restante do municipio possui um relevo ligeiramente plano. REFERÊNCIAS Barbosa, R. L. Geração de modelo digital do terreno por aproximações sucessivas utilizando câmaras digitais de pequeno formato. 1999. 96f. Dissertação (Mestrado em Ciências e aquisição, Análise e Representação de Informações Espaciais) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Presidente Prudente, São Paulo, 1999. Embrapa. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. (2015)Brasil em Relevo EmbrapaMonitoramento por Satélite. Acedido em 10 de Junho de 2015: http://www.relevobr.cnpm .embrapa .br/conteudo/projeto.htm. Felicismo, A. M. (2015) Conceptos básicos, modelos y simulación. Acedido 10 de Junho de 2015: http://www6.uniovi.es/~feli/CursoMDT/Tema_1.pdf. Fitz, B. R. 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Uberlândia. Rosa, R. (2004). Cartografia Básica. Uberlândia, 2004. Rosa, R. (2009) Introdução ao sensoriamento remoto. 7 ed., Uberlândia. Valeriano, M. de M; Rossetti. S. de F. (2015). Topodata: seleção de coeficiente geoestatísticos para o refinamento unificado de dados SRTM. São José dos Campos, 2010. (Apostila). Acedido em 15 de Junho de 2015 em: http://mtcm19.sid.inpe.br/col/sid.inpe.br/mtc- m19%4080/2010/ 05.10.18.35 /doc/publicacao.pdf 451 ANÁLISE DE DISTINTAS BASES CARTOGRÁFICAS NO MAPEAMENTO DE ÁREAS DEALTA DECLIVIDADE Analysis of different cartographic databases for the mapping of high slope areas Bruno Zucuni Prina67; Romario Trentin68 Resumo: O objetivo geral desse trabalho é o de mapear as áreas de alta declividade por meio da utilização de distintas bases cartográficas e de diferentes resoluções espaciais. Assim, há como suporte teórico a Lei nº 12.651 de 25 de maio de 2012 (BRASIL, 2012), na qual, em seu Artigo 4º V destaca que as áreas com declividade superior a 45° são consideradas de preservação. Como bases cartográficas utilizadas, destacamse: arquivosmatriciais do SRTM e do ASTER (oriundas do USGS), além de dados vetoriais de curvas de nível e pontos cotados das cartas topográficas na escala 1:50.000 (HASENACK; WEBER, 2010). Com isso, a partir dos mapas de altimetria, foram confeccionados mapas clinográficos. Para analisar os dados, segmentou-se a declividade em 3 classes ("<30º", "30 a 45°" e "> 45º”), e, posteriormente, os dados foram analisados, por meio de uma planilha eletrônica. Quanto aos resultados, destaca-se que as informações clinográficas sofreram as principais diferenças ao analisar a mudança da resolução espacial das imagens registradas. Assim, destaca-se que a geração da cartografia da declividade é altamente dependente da resolução espacial acerca das informações altimétricas, bem como de sua fonte de origem. Palavras-chave: Área de Preservação Permanente. Geoprocessamento. SIG. Introdução O mapeamento de áreas de alta declividade é de grande importância, pois, entre suas aplicações destaca-sea delimitação das Áreas de Preservação Permanente (APP), as quais são caracterizadasnas áreas com declividade acima de 45º. A proteção dessas áreas é de grande importância, a fim de resguardaras áreas que são ambientalmente frágeis. Assim, o presente trabalho tem como proposta realizar uma discussão a respeito do mapeamento clinográfico com distintas fontes topográficas e com diferentes resoluções espaciais. O objetivo geral desse trabalho é o de mapear as áreas de alta declividade por meio de distintas bases cartográficas e de diferentes resoluções espaciais. Assim, tem-se como área de estudo o território municipal de Itaara, e, tem-se como foco, inclusive, a discussão das formas de realizar o mapeamento de áreas de APP (declividade acima de 45° ou 100%). 67 68 Mestrando, Universidade Federal de Santa Maria, (55) 9651-9828, [email protected] Professor Dr., Universidade Federal de Santa Maria, (55) 9904-9087, [email protected] 452 A fim de englobar o entendimento desse trabalho, faz-se necessário contextualizar o entendimento conceitual da legislação vigente acerca do intervalo clinográfico o qual caracteriza áreas de APP. No que tange a legislação vigente, destaca-se a Lei nº 12.651 de 25 de maio de 2012 (BRASIL, 2012) na qual, entre vários objetivos, há o respaldo quanto a questão de estabelecer normas gerais sobre a proteção da vegetação, entre elas, referenciando as áreas de alta declividade como áreas de APP. Entre as áreas que são caracterizadas como áreas de APPs, a Lei exposta anteriormente, destaca, no Artigo 4º V que "as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive" são consideradas de preservação (BRASIL, 2012). Deve-se destacar que o mapeamento a ser destacado nesse trabalho ocorreu no município de Itaara pelo fato do mesmo possuir uma grande amplitude altimétrica, com áreas de alta declividade. Em relação ao município de Itaara, pode-se citar que o mesmo está localizado na porção central do estado do Rio Grande do Sul, e possui uma população de 5.010 (em 2010), espaçada em um território de 172,989 km², com uma densidade populacional de 28,96 habitantes/km² (IBGE, 2015). Metodologia A fim de evidenciar todas as rotinas metodológicas dessa pesquisa faz-se necessário, inicialmente salientar todos os aplicativos e bases cartográficas utilizadas. Dentre os aplicativos, pode-se destacar o ArcGIS®, versão 10.1, importante para toda a implementação da análise dos dados em ambiente SIG, além de uma planilha eletrônica (Excel®), para analisar os dados. Referente às bases cartográficas, destaca-se a utilização de arquivos matriciais: SRTM e ASTER; além de dados vetoriais de curvas de nível e pontos cotados oriundos das cartas topográficas na escala 1:50.000 (HASENACK; WEBER, 2010). Os arquivos matriciais, tanto do ASTER como do SRTM, foram obtidos por meio do sítio do Serviço Geológico Americano (United StatesGeologicalSurvey'sUSGS). O arquivo do ASTER refere-se ao GDEM versão 2, com resolução espacial de 30 m. O SRTM utilizado referencia o modelo global de 1 arco-segundo, com resolução espacial de 30 m. Todos os dados cartográficos, ao serem importados para o aplicativo em ambiente SIG, foram tratados. Com isso, atribuiu-se as informações para o sistema de referência SIRGAS 2000, coordenadas UTM, fuso 22 J Sul. 453 Toda a modelagem foi realizada em uma área maior do que a do limite do território municipal de Itaara, a fim de excluir o problema referente ao "efeito de borda", na qual pode ser gerado ao realizar a modelagem da superfície.Deve-se enfatizar que o“efeito de borda” é um grande problema a trabalhos que envolvam interpolações de dados. Mais informações podem ser consultadas em Frisomet al. (2006) e emLucas et al. (2012), os quais destacam alguns dos problemas referente ao tema. A modelagem do SRTM e do ASTER é a própria imagem, ou seja, não é necessário implementar um algoritmo e remodelar a superfície. Porém, para gerar o modelo da carta topográfica, a mesma necessitou da aplicação de um interpolador. Assim, por meio do algoritmo Topo toRaster, do ArcGIS®, gerou-se a modelagem, utilizando as curvas de nível e os pontos cotados da carta topográfica na escala 1/50.000. Deve-se destacar que a hidrografia não foi utilizada na geração da modelagem, uma vez que a mesma não estava previamente orientada no sentido do fluxo da drenagem, ou seja, não foram vetorizadas no sentido montante a jusante (no sentido de escoamento do trecho hídrico). A fim de comparar os dados referente a declividade, todos os modelos gerados possuíam uma resolução espacial padrão, no caso das imagens ASTER E SRTM era de 30m, e, assim, para fins de comparação, adotou-se o mesmo valor para a carta topográfica. Assim, para comparar os dados, os modelos SRTM, ASTER e da Carta Topográfica foram reamostrados para os valores de 90 m (generalização cartográfica em três vezes) e para 10 m (hiperdetalhamento dos dados - em três vezes). Assim, resumidamente, houve a construção de três modelos oriundos de cada uma das bases cartográficas, com as resoluções espaciais de 10, 30 e 90 m. Alertase, que, os dados (curvas de nível e pontos cotados) da carta topográfica sofreram uma interpolação pelo algoritmo Topo to Raster. Com todos os modelos prontos, gerou-se o mapeamento da declividade da área de estudo. Nessa etapa fez-se o uso do algoritmo Slope (do ArcGIS®). Assim, houve a geração do mapeamento da declividade por meio de 3 distintas bases cartográficas, além dos dados reamostrados, alguns generalizados (com pixels de maior dimensão), e dados hiperestimados (com pixels menores do que o tamanho padrão). Sabe-se que as áreas de APP são aquelas superiores a 45º ou 100% de declividade, porém, os dados foram subdivididos em classes a fim de aumentar as análises. Com isso, dividiram-se os valores em declividades menores de 15º, entre 30 a 45° e superiores a45º, por meio da ferramenta "Reclassify" do ArcGIS®, sendo possível, nesse momento, a quantificação das feições. 454 Por fim, todos os dados foram analisados, por meio de uma planilha eletrônica, e, posteriormente os mesmos foram discutidos, a fim de entender toda a questão envolvida junto a geração de áreas de APP com declividade superior a 45º. Resultados Com a implementação de todos os procedimentos metodológicos, foram geradas todos os produtos cartográficos referentea declividade, oriundas da carta topográfica, do SRTM e do ASTER.Inicialmente serão apresentadostodos os resultados do mapeamento com as imagens do ASTER e do SRTM, além da interpolação com os dados altimétricos das cartas topográficas.Assim sendo, os resultados referentesa quantificação das classes de declividade do ASTER, do SRTM e da carta topográfica estão dispostos a seguir, por meio da Figura 1. Declividade: < 30º 30 - 45º > 45º (APP) Total Declividade: < 30º 30 - 45º > 45º (APP) Total ASTER Resolução espacial 10m 30m 90m 90,2% 95,6% 98,8% 7,7% 4,2% 1,2% 2,1% 0,2% 0,0% 100% 100% 100% SRTM Resolução espacial 10m 30m 90m 91,1% 96,0% 98,8% 7,3% 3,9% 1,2% 1,6% 0,1% 0,0% 100% 100% 100% 455 Declividade: < 30º 30 - 45º > 45º (APP) Total CARTA Resolução espacial 10m 30m 90m 98,0% 99,2% 100,0% 2,0% 0,9% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 100% 100% 100% Figura 2 - Resultados obtidos. Deve-se destacar que na modelagem da clinografia, para cada uma das bases cartográficas,foram geradas três imagens, uma original, com resolução espacial de 30 m; outra com pixel de 90 m, ou seja, com generalização dos dados altimétricos (em três vezes); e outra com informações altimétricas hiperestimadas (em três vezes), com resolução de 10m. Ao comparar os resultados acerca da clinografia pode-se constatar que as áreas delimitadas como APPs no município de Itaara contempla uma mínima porção, com uma área de no máximo 2,1% (para o ASTER com resolução de 10 m). Tal resultado demonstra que no município, apesar de possuir uma alta discrepância altimétrica, apresenta poucas áreas de APPs devido, pelo menos é o que foi constatado com as bases altimétricas analisadas. Ainda, pode-se enumerar a alta similaridade obtida entre os modelos ASTER e SRTM, ambos com resolução espacial de 30 m. Já ao comparar os dados com a carta topográfica, pode-se constatar que a mesma apresenta um percentual significativo de diferenças, constatando uma mínima porcentagem na classe clinográfica intermediária que foi adotada. Deve-se destacar que as principais diferenças ocorrem ao analisar a mudança da resolução espacial das imagens registradas. Essa análise, visualmente pouco modifica no mapa de altimetria, porém ao gerar o mapeamento da declividade há uma mudança significativa. Em síntese, quanto maior for o tamanho do pixel do modelo altimétrico, maior será o poder de generalização, logo, haverá menores porções de áreas com alta declividade. E, se houver um maior adensamento de informações (diminuir a resolução espacial), maior será a porcentagem de áreas íngremes, uma vez que a declividade é calculada por meio da relação matemática entre distância horizontal e vertical. Ou seja, generalizando os dados altimétricos, e mesmo que se mantenha as diferenças altimétricas, a distância horizontal é alterada, e, dessa forma, explica-se a minimização de áreas com maior declividade, e, assim ocorre no fato 456 contrário, quando há a minimização do tamanho do pixel, aumentando as áreas de alta declividade. Em resumo, analisa-se que para mapear a declividade de uma determinada área, ha uma grande preocupação à resolução espacial a ser adotada, pois essa é altamente correlata ao resultado final. Deve-se ter atenção no que tange as áreas com inclinação superior a 45º, as quais, conforme legislação vigente, caracterizam-se como áreas de APP, e, precisam ser preservadas. Assim, deslumbra-se, que, dependendo dos dados utilizados, com a escala de mapeamento dos mesmos, o dimensionamento de áreas de APP pode sofrer maximizações ou minimizações, ou até mesmo inexistir, idôneo a modelagem da carta topográfica, seja ela com qualquer uma das resoluções espaciais. Com o intuito de analisar, de forma visual os resultados acerca da declividade, tem-se, por meio da Figura 2, a visualização do comportamento da mesma para todas as bases cartográficas, em relação a uma área específica de Itaara. Figura 3 - Análise visual comparativa da declividade em uma área específica. Por fim, deve-se apresentar as informações dos dados altimétricos de cada uma das bases cartográficas, pois, esses originaram a cartografia da declividade. Assim, tem-se na Figura 3 a apresentação dos mesmos. No que tange a imagem ASTER, a mesma registrou 57 m como menor valor altimétrico e 536 m como maior, gerando uma amplitude de 479 m. Já a imagem SRTM registrou 63 m como menor valor altimétrico e 531 m como o maior, gerando 457 uma amplitude de 468 m. Por fim, a interpolação dos dados da carta topográfica resultou no valor de 58,9 m como o menor e 514,9 m como maior valor altimétrico, gerando uma amplitude de 456 m. Na Figura 3 está identificado os três produtos cartográficos acerca da altimetria, os quais foram bases à geração da declividade. Analisando tais mapas no geral, com toda a delimitação da área de estudo a mesma apresenta-se insuficiente a fim de verificar a diferenciação dos dados, porém, ao apresentá-los em uma área sintetizada, verificam-se as distinções geradas ao verificar os dados com valores de pixels distintos. Essas diferenças são as apontadas por alterar os resultados da declividade. Figura 4 - Informações altimétricas das bases cartográficasem uma área específica. Conclusões A partir de todas as análises segmentadas anteriormente, conclui-se que a geração da cartografia da declividade é altamente dependente da resolução espacial acerca das informações altimétricas bases. Ou seja, ao realizar o mapeamento da declividade de uma determinada área, dependendo da base cartográfica utilizada, o resultado pode sofrer grandes variações. Há uma preocupação nessa temática, pelo fato da definição de áreas de APP em áreas de alta declividade, metodologias que precisam ser implementadas em 458 propriedades rurais que realizarem o Cadastro Ambiental Rural (CAR), uma vez que áreas íngremes, por legislação, devem ser preservadas e não utilizadas para usos (pecuária, agricultura, moradia, etc.). Explicita-se que o referido trabalho não se sustenta na análise dos dados, muito menos na conversão dos mesmos, mas sim na discussão acerca da problemática tangente a declividade, a qual é altamente dependente da resolução espacial do pixel referente a altimetria do terreno. Assim, com a análise dos dados, em forma geral, possibilitou identificar que dependendo da base cartográfica utilizada, o resultado da declividade pode sofrer variações, principalmente se as mesmas possuírem resoluções espaciais diferentes. Assim, deve-se destacar que a delimitação de áreas de APPs são claramente subjetivas, sem haver um dimensionamento padrão. Com esse foco, verifica-se que a delimitação de áreas de APPs são altamente dependentes da base cartográfica de entrada, e, se a mesma fosse obtida a campo, com coleta de dados in loco (com receptores de sinal GNSS), os dados poderiam ser mais precisos, e, provavelmente, as áreas íngremes estariam com maiores porções, uma vez que haveria o detalhamento dos dados altimétricos. Porém, coletas a campo para delimitar APPs em áreas declivosas são de difícil acesso, principalmente ao fato das condições desfavoráveis de coleta de dados, pela declividade do terreno e pelo adensamento de vegetação. Por fim, destaca-se que, seria muito importante não apenas mapear áreas de APP em áreas de alta declividade, mas também ser obrigatório a transparência das metodologias que os profissionais utilizam, as bases cartográficas e, principalmente a resolução espacial dessas. Referências bibliográficas FRISOM, S.; FILHO A. C. P.; CORRÊA, L. C.; CAVAZZANA, G. H. 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Acesso em: 19 fev. 2015. 460 RELAÇÃO ENTRE VARIÁVEIS LIMNOLOGICAS, DADOS METEOROLÓGICOS E USO DA TERRA: ABORDAGEM MÚLTIPLOS SENSORES Fábio Marcelo Breunig1 Waterloo Pereira Filho2 Flávio Wachholz³ 1Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Departamento de Engenharia Florestal, linha Sete de Setembro s/n, CESNORS/UFSM. 98400-000, Frederico Westphalen, RS, Brasil; Estudante de pós-doutorado do PPGGEO, UFSM. [email protected] ² Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Departamento de Geociências, Av. Roraima, prédio do INPE, campus da UFSM. 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil. [email protected] ³ Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Escola Normal Superior. Avenida Djalma Batista – 2470, Bairro Chapada, 69050-010, Manaus, AM – Brasil. [email protected] Resumo: O estudo apresenta uma abordagem integrada, baseada em múltiplas fontes de dados para avaliar a relação entre parâmetros limnológicos da represa de Passo Real, dados meteorológicos e variações interanuais de uso da terra. Para tal, foram conduzidas 12 campanhas de campo em 2009 e 2010, para aferir o total de sólidos em suspensão, transparência, clorofila e temperatura. Os dados meteorológicos de reanálise foram utilizados (NCEP_Reanalysis 2). Para o período de 2000 a 2015 foi calculado o verdor das principais bacias de captação, a partir dos seguintes produtos MODerate-resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS): MOD13Q1; MYD13Q1 e MCD43A4. Após o pré-processamento, todos os dados foram analisados em uma abordagem temporal para identificar as principais variáveis que promovem modificações nos parâmetros limnológicos da represa. Os resultados mostraram que as variações estão associadas a um efeito combinado de altas precipitações e maior vulnerabilidade de produção de sólidos do ecossistema terrestre durante o período de entressafras. Contudo, mesmo em períodos de alto verdor das bacias, na ocorrência de maiores índices de precipitação, há uma modificação relevante nas variáveis limnológicas como total de sólidos em suspensão, transparência e clorofila na água. Palavras Chave: Sensoriamento remoto; resposta espectral; total de sólidos suspensos; transparência da água; clorofila. Introdução O estudo de ambientes aquáticos a partir de sensores orbitais tem sido considerado como uma alternativa às atividades de campo e laboratório, muitas vezes exaustivas, financeiramente onerosas e espacialmente limitadas (Bergamino et al., 2009; Chavula et al., 2009; Dalu et al., 2015; Dekker et al., 2002; Lobo et al., 2014; Min et al., 2012; Palmer et al., 2015; Park and Latrubesse, 2014; Duan et al., 2014; Rolim et al., 2015). Nesse sentido, diversas abordagens têm sido propostas para estimar os constituintes opticamente ativos presentes na água com base em modelos empíricos e 461 físicos e para de compreender a resposta espectral da água com distintos níveis de eutrofização (Gitelson et al., 2007; Gitelson et al., 2008; Dall'Olmo et al., 2005; Le et al., 2009; Le at al., 2011; Lobo et al., 2014; Hestir et al., 2015). O uso de produtos orbitais passa a viabilizar o monitoramento de grandes áreas, como por exemplo, as águas interiores no sul do Brasil. Página 2 de 12 No Brasil, as represas são amplamente utilizadas para a geração de energia, regulação do fluxo de água e abastecimento água (Tundisi et al., 2007; Tundisi e Tundisi, 2008). Contudo, essas represas atualmente estão sendo indicadas como grandes fontes de metano e outros gases do efeito estufa (Tranvik et al., 2009; Fearnside and Pueyo, 2012; Raymond et al., 2013; Fearnside, 2015a; Fearnside, 2015b), de forma a contribuir para os problemas ambientais associados a mudanças climáticas. Assim, entender como as variáveis meteorológicas e de uso e cobertura da terra afetam a qualidade da água é fundamental para definir estratégias de mitigação de impactos, ajustes de conduta do ecossistema terrestre envolto e tratamento de água (Wang et al., 2004; Hestir et al., 2015). Recentes abordagens de estudo da represa de Passo Real, na bacia hidrográfica do Alto Jacuí têm indicado uma relação entre as variáveis de uso do solo e dados meteorológicos com a qualidade da água da represa (Pereira Filho et al., 2005; Santos e Pereira Filho, 2013; Kramer et al., 2009; Kramer e Pereira Filho, 2011; Wachhoz, 2011; Silveira et al., 2013; Pereira Filho et al., 2013; Kaiser et al., 2015; Santos et al., 2015; Sarmento e Pereira Filho, 2015). Entretanto, uma abordagem integrada de todas as variáveis ainda não foi desenvolvida. Nessa perspectiva, sensores de amplo campo de visada com alta repetitividade levam a uma maior probabilidade de se obter cenas sem cobertura de nuvens. O sensor MODerate-resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS) gera imagens quase diárias do sul do Brasil, considerando os diversos produtos e especificações disponíveis (Lucht, 1998; Friedl et al., 2000; Schaaf et al., 2002; Barnes et al., 2003; Xiong et al., 2009; Ju et al., 2010). Objetivos O objetivo é apresentar uma abordagem integrada das relações entre dados meteorológicos, uso do solo e modelagem hidrodinâmica com os dados limnológicos da represa de Passo Real, no sul do Brasil. Metodología 462 Área de estudo O trabalho foi desenvolvido no reservatório de Passo Real (233,39 km²), localizado na bacia hidrográfica do alto Jacuí, no estado do Rio Grande do Sul, Brasil (Figura 1). A área apresenta um clima subtropical tipo Cfa (de acordo com a classificação de Köppen-Gaiger), com quatro estações bem definidas ao longo do ano. A precipitação média anual é de 1.737,63 mm (±80,94 mm) e a temperatura média é de 20,03 °C (± 5,14 °C) (CEEE-GT, 2011; COAJU, 2009). A vazão média anual do reservatório é de 209,37 m³/s (± 243,45 m³/s) com base em 75 anos de medidas (1939-2014). Nas bacias de captação predominam solos derivados de basalto, em especial o Latossolo. Quanto ao uso e cobertura da terra, a característica geral da região é de dois ciclos agrícolas anuais, com cultura de verão (soja e milho) e de inverno (trigo). Entre as áreas agrícolas existem vários fragmentos florestais, em especial nas áreas de mata galeria e campos de pastagem (Kramer et al., 2009; Kramer e Pereira Filho, 2011; Wachhoz, 2011; Silveira et al., 2013). Figura 1. Localização da represa de Passo Real no estado do Rio Grande do Sul, Brasil. As principais áreas de amostragem são indicadas dentro dos limites do reservatório. O limite do reservatório foi elaborado a partir de uma cena Landsat-5 Thematic Mapper (TM). Dados de campo 463 Para caracterizar as variáveis limnológicas do reservatório, forma conduzidas 12 campanhas de campo de março de 2009 a julho de 2010. Foram medidas variáveis em campo e feitas determinações a partir de coletas, em laboratório. Entre as variáveis levantadas citam-se: Total de Sólidos em Suspensão (TSS); Clorofila a; Temperatura da água; transparência e profundidade em 25 estações amostrais (localização dos compartimentos representativos dos pontos é indicada na Figura 1). Detalhes sobre os procedimentos metodológicos adotados para a determinação de cada variável são descritos em (Wachhoz, 2011). Imagens de satélite e dados meteorológicos Para o estudo foram utilizados dados do sensor MODIS, plataformas Terra e Aqua. Os seguintes produtos da coleção cinco foram utilizados: MOD13Q1 (MODIS/Terra Vegetation Indices 16-Day L3 Global 250-m SIN Grid V005); MYD13Q1 (MODIS/Aqua Vegetation Indices 16-Day L3 Global 250-m SIN Grid V005) (Solano et al., 2010) e MCD43A4 (Nadir BRDF-Adjusted Reflectance 16-Day L3 Global 500m) (Friedl et al., 2000; Shaaf et al., 2002; Lucht et al., 2000; Lucht, 1998; Lucht and Lewis, 2000) foram utilizados. Os dados foram adquiridos através do Bulk Download Application (BDA) (USGS, 2015) na projeção sinusoidal e convertidos para um sistema planar através do algoritmo MODIS MRT (Dwyer and Schmidt, 2006) em associação com a linguagem IDL (Excelis Vis, 2014). O período de aquisição das cenas foi de 2000 a 2015, de acordo com a disponibilidade. Os dados meteorológicos referentes a temperatura e precipitação foram obtidos a partir do NCEP_Reanalysis 2, disponibilizados pela NOAA/OAR/ESRL PSD, Boulder, Colorado, USA, através da página http://www.esrl.noaa.gov/psd/ (Kalnay et al., 1996; ESRL/PSD - NOAA, 2015; Kanamitsu et al., 2002). Análise dos dados Para a análise dos dados foram elaborados perfis temporais de das variáveis limnológicas e comparados com os resultados das variáveis meteorológicas (baseado na análise gráfica e estatística dos dados). Com base nos dados MODIS foi calculado o índice de vegetação Normalized Difference Vegetation Index (NDVI) (Rouse et al., 1973) para a bacia hidrográfica que 464 representa a área de captação do reservatório de Passo Real, para o período de 2000 a 2015 (produto composição 16 dias). Os dados permitiram identificar os períodos de maior verdor da bacia de captação e relacionar esses resultados com os parâmetros limnológicos. Para compreender algumas flutuações que ocorrem dentro do reservatório de Passo Real, foi utilizado o modelo hidrodinâmico IPH-ECO (Cardoso et al., 2011; Fragoso Jr. et al., 2011; Fragoso Jr. et al., 2010; Pereira, F.F. 2010; Fragoso Jr. et al., 2009; Ferreira et al., 2008; Fragoso Jr. et al., 2008; Fragoso Jr. et al., 2007a; Fragoso Jr. et al., 2007b; Fragoso Jr., 2005) com foco na variável velocidade da água. Com base nesse modelo, foram simuladas algumas condições de contorno extraídas dos dados de campo, informações meteorológicas e imagens de satélite. Resultados Análise das variáveis limnológicas Para facilitar a interpretação dos resultados, os gráficos das variáveis limnológicas de apenas dois setores distintos são apresentados (setor montante e setor jusante na Figura 1). Em geral se verifica uma transição das variáveis limnológicas da parte montante para a parte jusante do reservatório (Figura 2). A concentração de TSS reflete bem essa transição, conforme média de todas as campanhas de campo para os três principais setores do reservatório (Figura 2a). A temperatura da água acompanha as variações sazonais da temperatura do ar na região sul do Brasil, em concordância com resultados apresentados por Rolim et al. (2015) (Figura 2b). A transparência da água nitidamente mostra a existência de dois períodos distintos nos setores ilustrados (Figura 2c). Em ambos os setores foi encontrada uma maior transparência e variância no período de verão e outono e uma diminuição no inverno e primavera. No setor montante se verifica uma menor transparência e variância, considerando que esse setor recebe a maior parte da captação do reservatório (Wachholz, 2011). A concentração de clorofila apresenta uma maior variabilidade a partir da transição do inverno para a primavera, resultando ainda na maior concentração deste componente opticamente ativo. Em geral, as maiores concentrações de clorofila são encontradas no segundo semestre do ano. 465 Figura 2. Variabilidade dos parâmetros limnológicos no reservatório de Passo Real. (a) média do TSS para os três principais setores do reservatório; (b) variação anual da temperatura de sub-superfície da água; (c) variabilidade anual da transparência da água e; (d) variação anual da concentração de clorofila na água, considerando dois setores do reservatório. Os dados se referem a fevereiro de 2009 a julho de 2010. As manchas transparentes referem-se ao desvio padrão. Em alguns pontos amostrais, foi verificada uma maior concentração de TSS quando comparado com as amostras adjacentes (Wachholz 2011). Em uma análise através da modelagem hidrodinâmica como IPH-ECO, verificou-se que nesses pontos ocorre um aumento da velocidade da água, associado a um estrangulamento do corpo do reservatório. Tudo indica que esse aumento da velocidade da água provoca a resuspensão dos sedimentos e altera as características dos parâmetros limnológicos analisados. Dinâmica meteorológica e do NDVI (verdor) Com base dos dados reprocessados e centrados no centro da represa, verificase uma maior ocorrência de chuvas a partir de agosto dos anos analisados (Figura 3a), bem como uma variação sazonal da temperatura (Figura 3b). A precipitação acumulada mostra que ocorre um aumento das chuvas de agosto a dezembro, coincidindo com o aumento da concentração de TSS e clorofila. A temperatura da água (Figura 2b) acompanha as variações da temperatura do ar (Figura 3b). 466 Ao analisar os 15 anos de verdor das três principais bacias de captação da represa de Passo Real, é possível constatar a presença de duas culturas anuais, com um mínimo nos meses de março/abril e setembro/outubro (períodos de entressafra) (Figura 4). Em geral, todas as bacias apresentam o mesmo padrão de verdor ao longo dos anos, com pequenas variações associadas a magnitude do NDVI. Figura 4. Variação interanual do NDVI para as três principais bacias de captação da represa de Passo Real. Quando confrontamos os dados de verdor com os de parâmetros da água como clorofila e TSS (inversamente correlacionada com a transparência), verifica-se que a exposição do solo não necessariamente implica em aumento nos parâmetros da água, mas, quando o fenômeno ocorre associado a chuvas intensas, há indícios de um forte carreamento de material do ecossistema terrestre para o aquático, promovendo alterações nos parâmetros limnológicos em estudo. Conclusões Os resultados mostram que tanto as variáveis meteorológicas quanto as formas de uso e cobertura da terra interferem nos parâmetros limnológicos do reservatório. Em geral, condições favoráveis a perda de sólidos do ecossistema terrestre ou o verdor da bacia não implicam necessariamente em relações diretas com a qualidade 467 da água. Contundo na presença de condicionantes meteorológicos favoráveis, ocorrem mudanças nas características da água do reservatório. Um melhor entendimento poderá ser obtido através de avanços no uso de modelos hidrodinâmicos. Agradecimentos Os autores agradecem a NASA Land Processes Distributed Active Archive Center (LPDAAC) e a NOAA/OAR/ESRL PSD. A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) pelo apoio para a realização do estágio de Pós-doutoramento. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (processos 168869/2014-4, 305914/2014-6, 502287/2014-4, e 484712/2007-1). Bibliografía Barnes, W. L., Xiong, X. & Salomonson, V. V. (2003). Status of terra MODIS and aqua MODIS, Advances in Space Research, 32(11), 2099–2106. Bergamino, N., S. Horion, S. Stenuite, Y. Cornet, S. Loiselle, P. D. Plisnier, & others. (2010). Spatio-Temporal Dynamics of Phytoplankton and Primary Production in Lake Tanganyika Using a MODIS Based Bio-Optical Time Series, Remote Sensing of Environment, 114, 772–780. Cardoso, L.S., Fragoso Jr., C.R., Souza, R.S., Motta Marques, D.M.L. (2011). 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Universidade Federal de Santa Maria, Departamento de Geociências (UFSM/PPGGEO) – [email protected] 1 Resumo: O presente trabalho tem como objetivo geral identificar e caracterizar as principais unidades de relevo presentes no município de Mata.Para atender a isso, o trabalho tem como objetivos específicos: Caracterizar a hipsometria e as declividades do município, definir as principais unidades de relevo presentes no município de Mata e por fim, definir e espacializar cada unidade de relevo, a fim de entender a dinâmica ambiental do município de Mata. A metodologia baseou-se primeiramente em um breve levantamento bibliográfico, posterior a isso, realizou um cruzamento entre a hipsometria e a declividade do município, gerando-se assim, o mapa das unidades de relevo do município de Mata. As unidades de relevo encontradas no município foram as seguintes: Colinas Levemente Onduladas de Altitude, Colinas Onduladas, Morros e Morrotes Isolados, Áreas Escarpadas do Rebordo e Áreas Planas. Por fim, destaca-se que os resultados mostraram que a metodologia e a escala de análise foram satisfatórias, cumprindo os objetivos e as expectativas esperadas. A análise permitiu a compartimentação da área de estudo em seis unidades. Essas unidades foram definidas e mapeadas de acordo com a estrutura espacial dos parâmetros utilizados. Palavras-chave: Espaço Geográfico, Unidades de Relevo, Mata. INTRODUÇÃO Enquanto denominada como a ciência da terra, a Geografia tem como princípio fundamental, o estudo do Espaço Geográfico. Embora esteja associado a definições complexas e abrangentes, o Espaço Geográfico pode ser entendido de uma forma mais ampla, como a relação entre a sociedade e a natureza. Schirmer (2012) destaca que o Espaço Geográfico é resultado da ação do homem, e dessa forma, constitui-se de aspectos ambientais, econômicos e sociais. Diante das alterações ambientais vivenciadas até o presente momento, nota-se que cada vez mais, não se pode pensar o espaço de forma fragmentada. Compreender que as mudanças ambientais além de terem sua origem natural e que, além disso, também são influenciadas pela ação antrópica é um fato muito importante para a análise do relevo que compõem a paisagem. A dinâmica do ambiente, está relacionada as modificações causadas pela ação antrópica. Desta forma, trabalhos que retratam a relação sociedade/natureza se revestem de grande importância, pois se hoje considerarmos todos os meios de atuação antrópica, pode-se dizer que não mais existe natureza que ainda não tenha sofrido algum tipo de influência ou alteração antrópica. As ações que o homem exerce 475 sobre a natureza, apresentam um padrão de localização próprio de cada sociedade. Essas marcas geradas pela apropriação e transformação do meio natural, são responsáveis pela organização do Espaço Geográfico. Para Sccoti (2015), as diferentes formas de avaliar o ambiente modificado permitem o surgimento de estudos, onde muitos deles, estão relacionadas a interação sociedade/natureza, que visam buscar alternativas para um uso racional (menos agressivo) e ordenado do meio ambiente. Diante disso, nos últimos anos o estudo das formas de relevo tem adquirido novas dimensões.Cabral (2014) destaca que o relevo como objeto de estudo da geomorfologia, é o resultado da atuação das forças antagônicas sintetizadas pelas atividades tectônicas e estruturais e pelos mecanismos morfoclimáticos ao longo do tempo geológico, podendo ocorrer de forma simultânea ou sucessiva. O relevo refere-se às saliências e reentrâncias da superfície terrestre, que podem ser descritas e caracterizadas em diferentes escalas. O relevo de uma região é caracterizado por diferentes atributos, como as altitudes, as declividades, o comprimento e a amplitude das encostas, sendo que é a partir das cartas topográficas que podem-se obter e gerar essas informações. Dando continuidade aos trabalhos de caracterização do relevo, apresenta-seum estudo sobre as unidades de relevo de Mata, município localizado entre as coordenadas geográficas de 29º27’01” e 29º38’08” (latitude sul) e 54º20’01” e 54º34’20” (longitude oeste), limitando-se com os seguintes municípios: Jaguari ao norte e a oeste, Jari ao norte, São Pedro do Sul ao leste e a sul, São Vicente do Sul ao oeste e a sul e Toropi ao leste. De acordo com dados do IBGE (2010) o município possui uma área territorial de 311,8 km² e uma população total de 5.111 habitantes. A Figura 1 traça a localização do município de Mata. 476 Figura 1: Mapa de Localização do município de Mata. Assim, o presente trabalho tem como objetivo geral identificar as principais unidades de relevo presentes no município de Mata. Para atender a isso, têm-se os objetivos específicos: (1) Caracterizar a hipsometria e as declividades do município, (2) Definir as principais unidades de relevo presentes no município de Mata, (3) Caracterizar cada unidade de relevo, a fim de entender a dinâmica ambiental do município de Mata. METODOLOGIA Inicialmente realizou-se o levantamento bibliográfico, procurando estabelecer um breve referencial teórico do trabalho, através de bibliografias específicas que retratem a temática em questão. Posterior a isso, iniciou-se o processo de mapeamento dos atributos a serem analisados. Diante disso, as informações referentes a hipsometria, declividade e mais tarde as unidades de relevo, foram obtidas a partir da Base Vetorial Contínua do Estado do Rio Grande do Sul desenvolvida pelo Centro de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Hasenack & Weber, 2010), além do Modelo Digital de 477 Elevação (MDE) construído através de imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission). Com relação aos trabalhos de campo, estes foram realizados através de perfis, seguindo estradas e caminhos que cortam a área de estudo, utilizando o receptor GPS (Global Position System) modelo Garmim 62SX. Nos trabalhos de campo são observadas e descritas as formas de relevo, a litologia da área, os tipos de solos e o uso e ocupação da área de estudo. Para a elaboração dos mapas temáticos (hipsometria, declividade e unidades de relevo), utilizou-se os softwares ArcGIS10.2.2 desenvolvido pela ESRI e o CorelDRAW X6 desenvolvido pela Corel Inc. na etapa de finalização do layout dos mapas. O mapa hipsométrico teve suas classes definidas através das linhas de quebra do relevo, compostas de altitudes contínuas e pela amplitude altimétrica (260 metros). Dessa forma, estabeleceram-se as seguintes classes hipsométricas: 80 – 120 metros; 120 – 170 metros; 170 – 220 metros; 220 – 280 metros; 280 – 340 metros; acima de 340 metros. O mapa de declividade foi elaborado dividindo-se o terreno em cinco classes: áreas com declives inferiores a 2%, correspondendo as áreas onde predominam os processos de acumulação; de 2 – 5% de declividade denominada como áreas de acumulação; de 5 – 15% sendo que a partir desta começam a predominar os processos erosivos, além de ser considerado o limite para o processo de mecanização agrícola, conforme o IPT e as classes sugeridas por De Biasi (1992); de 15 – 45%, onde dentro dessa classes, a declividade de 30% definida pela legislação federal (Lei nº 6.766 – Lei de Lehman) vai definir o limite máximo para a urbanização sem restrições, a partir do qual toda e qualquer forma de parcelamento far-se-á através de exigências específicas; áreas com declives maiores que 45%, sendo que de acordo com o Código Florestal, as áreas com declives de 47% são definidas como o limite máximo de corte raso, a partir do qual a exploração só será permitida se sustentada por cobertura de florestas (Lei nº 4.771 de 15/09/1965). Áreas com declives superiores a 47%, o artigo do Código Florestal define que não é permitida a derrubada de florestas, só sendo tolerada a extração de toras, quando em regime de utilização racional e que vise rendimentos permanentes. Por fim, o mapa de unidades de relevo foi elaborado a partir da base cartográfica desenvolvida pela UFRGS juntamente com imagens de satélite de alta resolução, onde estabeleceu-se um Modelo Digital de Elevação (MDE) da área de estudo, além dos trabalhos de campo no município de modo a validar as informações obtidas no decorrer do trabalho. Dessa forma, foram estipuladas as seguintes classes de unidades de relevo: Colinas Levemente Onduladas de Altitude, Colinas Onduladas, 478 Morros e Morrotes Isolados, Áreas Escarpadas do Rebordo e Áreas Planas. A variável visual cor seguiu um padrão ordenativo em tons de preto a cinza, onde os tons claros representavam as classes com altitudes mais baixas próximas ao Rio Toropi, enquanto que os tons mais escuros representam as áreas com maiores altitudes. RESULTADOS O produto final do trabalho, ou seja, o mapeamento das unidades de relevo, consistiu no cruzamento entre o mapa de hipsometria e o mapa de declividade do município, obtendo-se assim, as unidades de relevo do município de Mata. Hipsometria De acordo com Guerra (1978), a hipsometria pode ser definida como a “representação altimétrica do relevo de uma região no mapa, pelo uso de cores convencionais”. É através da hipsometria que é determinada a altitude de um lugar em relação ao nível do mar. O conhecimento da hipsometria de uma região nos permite reconhecer os fenômenos que podem ocorrer, destacando-se principalmente a relação da altitude com a ocorrência dos tipos climáticos, além do tipo de vegetação predominante em cada porção. O município de Mata apresenta como menor altitude o nível de 80 metros, junto à planície do rio Toropi, onde nesta área, também encontra-se a área urbana do município. Já a maior altitude, aproximadamente 350 metros, situa-se na porção nortenordeste do município, resultando em uma amplitude altimétrica de 270 metros. Essa diferença altimétrica pode ser explicada pelo fato de que o município de Mata, encontra-se na transição de uma área de Depressão (áreas mais rebaixadas) para uma área de Planalto (áreas mais elevadas). As porções de menores altitudes do município, ou seja, entre 80 e 120 metros, limitam-se com o rio Toropi e correspondem a 21,6% da área total do município. Essa área sofre influência deposicional de sedimentos transportados pela rede de drenagem, formando uma planície de inundação. No intervalo predominante, encontra-se as altitudes correspondentes a 120 e a 170 metros localizam-se nas porções centrais e noroeste do município. Essa classe hipsométrica corresponde a 29,3% da área total do município. As altitudes entre o intervalo de 170 a 220 metros correspondem a faixa noroestenordeste do município, dando início a um relevo mais íngreme. Essa classe hipsométrica corresponde a 15% da área total do município. 479 O intervalo de 220 a 280 metros também corresponde a faixa noroeste-nordeste do município, caracterizando um relevo íngreme correspondente a encosta do Planalto Meridional Brasileiro. Essa classe hipsométrica corresponde a 12,9% da área total do município. A classe hipsométrica que corresponde aos intervalos de 280 a 340 metros localiza-se nas porções mais ao norte e nordeste do município, caracterizando um relevo bastante íngreme situado no Rebordo do Planalto Meridional Brasileiro. Essa classe corresponde a 12,7% da área total do município. Por fim, as maiores altitudes correspondem a uma área de 8,5% do município, tendo suas altitudes superiores a 340 metros, localizando-se na região conhecida como Topo do Planalto. Declividade A declividade indica o grau de inclinação de uma encosta expressa em grau ou porcentagem. Sendo assim, quanto maior for o ângulo formado pela diferença de altitude entre o ponto mais baixo e o ponto mais alto, maior a inclinação e maior a declividade do terreno compreendido entre esses dois pontos. O estudo da declividade de um determinado local é e extrema importância, pois além de ser um atributo importante para caracterizar o relevo, permite antever processos que possam ali ocorrer, sendo relevante para as atividades agropecuárias e obras de engenharia. O mapa de declividade do município de Mata foi elaborado dividindo-se o terreno em cinco classes, tendo em vista os processos naturais predominantes, além do uso e ocupação recomendados considerando-se o grau de inclinação de cada parcela do terreno. Áreas com declives inferiores a 2%: correspondem as áreas planas onde predominam os processos de acumulação. Representam 14,3% da área total do município. Áreas com declives entre 2-5%: correspondem as áreas de acumulação. Representam 18,7% da área total do município. Áreas com declives entre 5-15%: correspondem as áreas onde começam a atuar os processos erosivos, além de ser considerada o limite para a mecanização agrícola. É nessa classe que se encontra inserida a área urbana de Mata. Representam 44% da área total do município. Áreas com declives entre 15-45%: conforme a Legislação Federal (Lei nº 6.766), também chamada de Lei de Lehmann, as áreas com 30% de declividade servirão como o limite máximo para o processo de urbanização sem restrições, a partir do qual 480 toda e qualquer forma de parcelamento far-se-á através de exigências específicas. Correspondem a 22,5% da área total do município. Áreas com declives superiores a 45%: o Código Florestal prevê que em áreas acima de 25º de inclinação (47%) não é permitido a derrubada de florestas, só sendo permitida a extração de toras de madeiras que visem rendimentos permanentes. Correspondem a apenas 0,5% da área total do município. Unidades de Relevo A interação entre as informações obtidas a partir das características das vertentes, como declividade, hipsometria, amplitude altimétrica, análise da presença de rede de drenagem e o traçado de alguns perfis topográficos, permitiram a delimitação de unidades de relevo no município de Mata. O município de Mata apresenta uma boa diversidade de formas de relevo, pois é possível encontrar desde áreas planas junto as drenagens até áreas escarpadas do Rebordo de Planalto. Diante disso, foram encontradas e classificadas cinco unidades de relevo: Colinas Levemente Onduladas de Altitude, Colinas Onduladas, Morros e Morrotes Isolados, Áreas Escarpadas do Rebordo e Áreas Planas. A Figura 2 mostra o mapa das unidades de relevo mapeadas no município de Mata. 481 Figura 2: Mapa das Unidades de Relevo do município de Mata. Colinas Levemente Onduladas de Altitude: caracteriza-se por apresentar um relevo suavemente ondulado, ou seja, com declividades entre 2 e 5%. Localizam-se na porção que compreende ao Planalto Meridional Brasileiro, ou seja, nas porções mais altas do município. Apresenta amplitudes altimétrica de aproximadamente 60 metros. Essa unidade representa 12,4% da área total do município. Colinas Onduladas: caracteriza-se por apresentar um relevo suavemente ondulado com declividades em torno de 15%, caracterizando uma área onde os processos erosivos passam a atuar de forma significativa, além de marcarem o limite para a mecanização agrícola. Corresponde a 38,7% da área total do município. Morros e Morrotes Isolados: responsável por 7,5% da área total do município, essa unidade constitui-se por áreas íngremes situadas em porções isoladas do município, destacando-se entre as formas de colinas. Caracterizam-se por apresentar uma topografia escarpada e indicam os processos que provocam o recuo do planalto que é controlado pela resistência dos materiais e as linhas de fraturas. 482 Os morrotes são formas de relevo com declividades de encostas superior a 15% e amplitude altimétrica inferior a 100 metros. Indicam os processos da atuação dos processos erosivos sobre as áreas elevadas topograficamente e apresentam uma maior resistência com relação aos processos degradacionais. Cabe destacar, que em alguns casos os morrotes podem apresentar algumas diferenças relacionadas aos tipos de litologias, pois os morrotes com topos planos em geral são compostos por rochas areníticas, enquanto que os com topos arredondados podem indicar a presença de rochas vulcânicas. Por sua vez, os morros diferenciam-se dos morrotes em pouco fatores, um deles é com relação a amplitude altimétrica, onde para os morros, esta deve ser superior a 100 metros. Assim como os morrotes, os morros também se destacam na paisagem por apresentarem porções resistentes aos agentes intempéricos e erosivos. Áreas Escarpadas do Rebordo: corresponde as áreas mais íngremes do município, típicas da região do Rebordo do Planalto. Caracterizam-se por apresentarem as encostas bem preservadas com a presença da vegetação nativa. Essa unidade corresponde a 19,5% da área total do município. Áreas Planas: caracteriza-se por apresentar um relevo plano que ocorre junto as principais drenagens, como o rio Toropi, estando sujeitos a processos deposicionais, sendo consideradas como áreas de acumulação ou várzeas. Nessa unidade as declividades não ultrapassam os 2% É nessa unidade que localiza-se a área urbana do município. Essa unidade corresponde a 21,9% da área total do município. Com relação a quantificação das classes (Tabela 1), observa-se que as unidades que predominam no município são as Colinas Onduladas e as Áreas Planas, sendo que juntas, representam quase 60% da área total do município. Por sua vez, os Morros e Morrotes Isolados são os que detém a menor área dentro do município de Mata. Unidades Área em km² Porcentagem (%) Colinas Levemente Onduladas de Altitude 38,98 12,4 Colinas Onduladas 120,84 38,7 Morros e Morrotes Isolados 5,84 7,5 Áreas Escarpadas do Rebordo 68,57 19,5 Áreas Planas 77,89 21,9 Tabela 1: Quantificação das Unidades de Relevo do município de Mata. 483 CONCLUSÃO O relevo do município de Mata foi descrito com base em dois parâmetros que foram a hipsometria e a declividade. A integração desses dados possibilitou um breve reconhecimento sobre as formas de relevo e a sua relação com os processos atuantes na superfície. O estudo descreve as diferentes formas de relevo que compõem a paisagem e aponta suas principais características quanto a fisionomia e até mesmo possíveis processos que possam ser desencadeados, sejam eles naturais ou através da ação antrópica. Dessa forma, além de enriquecer a geomorfologia, também permite evoluir nos estudos ligados a dinâmica sociedade/natureza, sendo que com essas informações é possível ocorrer a tomada de decisão consciente, quando se aborda como temática o planejamento e oreordenamento territorial. Com isso, destaca-se que os resultados mostraram que a metodologia e a escala de análise foram satisfatórias, cumprindo os objetivos e as expectativas esperadas. A análise permitiu a compartimentação da área de estudo em seis unidades. Essas unidades foram definidas e mapeadas de acordo com a estrutura espacial dos parâmetros utilizados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CABRAL, T. L. (2014). Zoneamento e Mapeamento Geoambiental do município de Sorriso-MT. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil. DE BIASI, M. (1992). A Carta Clinográfica: os métodos de representação e sua confecção.Revista do Departamento de Geografia, v. 6, p. 45-60. GUERRA, A. 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Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil. SCHIRMER, G. J. (2012). Mapeamento Geoambiental dos municípios de Agudo, Dona Francisca, Nova Palma e Pinhal Grande-RS. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil. 485 EJE 4- EXPERIENCIAS DE DUCACIÓN 486 TRABAJOS EXPOSICIÓN ORAL 487 ANÁLISE DE DISCURSO E GEOGRAFIA: POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS Edipo Djavan dos Reis Göergen (Universidade Federal de Santa Maria/[email protected]) Taiane Flores do Nascimento (Universidade Federal de Santa Maria/[email protected]) Benhur Pinós da Costa (Universidade Federal de Santa Maria/[email protected]) RESUMO: A Geografia desde sua gênese convive com conflitos teóricos e metodológicos que abarcam grande parte da sua estruturação enquanto ciência. Dessa forma, cada olhar do pesquisador que conta sua evolução é diferente em determinadas fases de seu processo de afirmação, e resultado da heterogeneidade de visões, gera um mútuo e constante debate. Em níveis gerais, a ciência geográfica intensificou seus estudos de acordo com os acontecimentos de períodos de nossa história e contextualiza diferentes opiniões no que se refere ao processo histórico, cultural, político, econômico e social. Neste sentido, o objetivo central desse artigo, é compreender a eficiência de novas metodologias às abordagens contemporâneas da Geografia, destacando principalmente a análise de discurso dentro das abordagens de gênero e sexualidade na ciência geográfica. Considera-se que o gênero e a sexualidade são questões presentes nas relações sociais, sendo estas representadas no espaço por diferentes visões da própria sociedade, justificando a relevância deste artigo, que pode contribuir como aporte teórico a novas discussões relacionadas a esta temática. Palavras-chave: Geografia; Gênero; Sexualidade; Análise de Discurso. RESUMEN: La Geografía desde su génesis viven con conflictos teóricos y metodológicos que abarca gran parte de su estructura como una ciencia. Por lo tanto, la perspectiva de cada investigador que cuenta su evolución es diferente en ciertas fases de su proceso de reclamación, y el resultado de la heterogeneidad de opiniones, genera un debate mutuo y constante. Generalmente los niveles, la ciencia geográfica intensificaron sus estudios de acuerdo a los acontecimientos de los períodos de nuestra historia y contextualiza las diferentes opiniones con respecto al proceso histórico, cultural, política, económica y social. En este sentido, el objetivo principal de este artículo es comprender la eficacia de los nuevos enfoques de los enfoques contemporáneos de la geografía, destacando especialmente el análisis del discurso en el género y la sexualidad enfoques en la ciencia geográfica. Se considera que el género y la sexualidad son temas en las relaciones sociales, que están representados en el espacio por diferentes visiones de la sociedad misma, que justifican la relevância de este artículo, que puede contribuir como soporte teórico a los nuevos debates relacionados com este tema. Palabras claves: Geografía; Género; Sexualidad; Análisis Del Discurso. INTRODUÇÃO A Geografia desde sua gênese convive com conflitos teóricos, epistemológicos e metodológicos que abarcam grande parte da sua estruturação enquanto ciência. Dessa forma, cada olhar do pesquisador que conta sua evolução é diferente em determinadas fases de seu processo de afirmação, e resultado da heterogeneidade de visões, gera um mútuo e constante debate. 488 Em níveis gerais, a ciência, inclusive a geográfica, intensificou seus estudos de acordo com os acontecimentos de períodos de nossa história e contextualiza diferentes opiniões no que se refere ao processo histórico, cultural, político, econômico e social. Gomes, analisando o processo de transformação epistemológica da Geografia afirma, A principal vocação da epistemologia é pois, desde o início, constituir um campo de discussão, de questões sobre métodos e limites de validade, sua inclinação não é normalizar nem restringir as iniciativas. Podemos, de forma muito geral, dizer assim que a epistemologia é um campo crítico de discussões sobre as formas de pensamento científico. Isto quer dizer que essas discussões epistemológicas dizem respeito antes de mais nada aos métodos, aos objetivos e as finalidades de um conhecimento científico. Discutir criticamente as formas de construir um pensamento científico não quer absolutamente dizer se transformar em um tribunal para julgar da sua conformidade ou não em relação a um modelo único e ideal, ao contrário (GOMES, 2009, p. 14-15). Na geografia, assim como nos demais campos do conhecimento científico, tais concepções ainda não são muito bem aceitas, tendo muitos de seus pesquisadores arraigados às concepções tradicionais de ser compreender o espaço. Contrariando a isso, Gomes reafirma, A epistemologia pretende ser justamente um domínio aberto ao reconhecimento da pluralidade de recursos e orientações nas diferentes disciplinas científicas. Ser um domínio de discussões significa exatamente não estar orientado de forma exclusiva e não agir como se detivéssemos algum tipo de certeza que legitimasse a priori esse ou aquele caminho, em detrimento de outros possíveis. O objetivo de uma discussão epistemológica não é, portanto, estabelecer, ao final, uma orientação que deve ser seguida por todos ou quase todos. Trata-se, sobretudo, de demonstrar que a maneira de fazer ciência é também um produto histórico e contextual, mais importante ainda, trata-se de demonstrar que a cada momento as respostas são múltiplas e que essa pluralidade crítica é a razão mesmo da existência da ciência (grifo nosso) (GOMES, 2009, p. 14-15). Para tanto, Gomes conclui dizendo que não se pretende encontrar uma forma “ideal e absoluta pela qual a geografia deve ser pensada ou tampouco apontar a boa direção para trabalharmos geograficamente”, mas sim que, na Geografia, assim como na ciência em si, que não se deve evitar discussões, principalmente porque “dúvidas não nos enfraquecem, ao contrário, elas são o testemunho e os elementos pelos quais a geografia pode ser reconhecida como uma ciência, viva e dinâmica, aberta e plural (GOMES, 2009, p. 14-15). 489 A geografia contemporânea, por exemplo, é muito mais que uma simples descrição. Ela abarca temáticas interessantes no contexto espaço-tempo de sua trajetória, sempre colocando a sociedade em evidência e como agente transformador do espaço. Neste sentido, considera-se que a sociedade, em geral, foi construída a partir de discursos, regras, normas e de tradições culturais. Se ela é construída de discursos, normas e saberes culturais, pode-se inserir a subjetividade e a intersubjetividade do sujeito aos estudos geográficos, uma vez que suas ações estão intrínsecas nas representações espaciais. Para tanto, o gênero e a sexualidade são questões presentes nas relações sociais, sendo estas representadas no espaço por diferentes visões da própria sociedade. Visões que são padronizadas e que priorizam, conforme nos assegura Butler, a heteronormatividade69 invisibilizando outros gêneros e manifestações sexuais que constituem o ser humano. Mas há uma grande questão que permeia certa temática: esse fenômeno é atual ou só estava ocultado no espaço? Para Silva, As ausências e os silêncios de determinados grupos sociais são resultantes de embates desenvolvidos na comunidade científica, que criam hierarquias e dependências, ratificando o poder de grupos hegemônicos e, consequentemente, de suas próprias teorias científicas (2009, p. 25). Complementando, A ciência geográfica hegemônica é marcada por privilégios de sexo e de raça, características que dificultam a expressão das espacialidades dos grupos das mulheres, dos não-brancos e dos que não se encaixam na ordem heterossexual dominante (...) Durante muito tempo, as existências espaciais desses grupos ou de suas ações concretas não foram consideradas “adequadas” como objetos de estudos do campo da geografia. (...) A razão de suas ausências no discurso geográfico deve ser entendida pela legitimação naturalizada dos discursos hegemônicos da geografia branca, masculina e heterossexual, que nega essas existências e também impede o questionamento da diversidade de saberes que compõem as sociedades e suas mais variadas espacialidade (SILVA, 2009,p. 25) . Para tanto, as temáticas relacionadas ao gênero e sexualidade tem sido com certa relutância, objeto de interesse da geografia em diferentes esferas e em todos os cantos do globo. No Brasil ela ainda é incipiente e conta com poucos trabalhos relacionados a esta temática. Ainda é um campo dentro da ciência geográfica a ser explorado, e que oferece uma gama de interpretações com relação ao espaço. Ainda 69 Heteronormatividade é um termo utilizado para descrever situações nas quais orientações sexuais diferentes da heterossexual são marginalizadas, ignoradas e até mesmo perseguidas por práticas sociais, crenças ou políticas. Ver em: BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. 490 que haja inúmeras possibilidades de se verificar e analisar a diversidade no que se refere ao gênero e suas espacialidades, a geografia pouco se utiliza desta temática para compreender o espaço sob a perspectiva de relações sociais, justificando a importância de discussões acerca desse campo na ciência geográfica. Para tanto, o objetivo da apresentação desse trabalho, é muito mais que uma simples revisão teórica, mas também compreender a eficiência de novas metodologias às abordagens contemporâneas da Geografia. METODOLOGIA Metodologicamente, a pesquisa é baseada no mapeamento de conceitos que subsidiou a pesquisa. Neste sentido, ela teve como primeiro passo, a ampla procura pelo referencial teórico-metodológico que sustenta a temática em questão. Considera-se a Análise do Discurso (AD) como uma possibilidade de captar o sentido não explícito no discurso. Neste sentido, a interpretação da linguagem propriamente dita vem como uma forma de aproximação sujeito-pesquisador, pois é nesse espaço da linguagem que se podem explicar diferentes fenômenos e conceitos, sendo a palavra uma condição de ponte difundida entre um ou mais locutores e um ou mais interlocutores. Pode-se considerar que a palavra é o modo mais autêntico e também legítimo das relações sociais, configurando-se como um fenômeno ideológico por excelência. Neste sentido, destaca-se Orlandi (2013, p. 15) quando diz que, A Análise de Discurso, como seu próprio nome indica, não trata da língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a palavra discurso, etimologicamente, tem em si, a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando. A autora ao mencionar em suas palavras o “homem”, ela se refere ao homem em geral, o homem como espécie humana, desconsiderando o gênero, ou seja, ela sugere que a AD conceba a linguagem como mediação necessária entre o homem e a realidade natural e social (ORLANDI, 2013). Para se trabalhar com esta técnica de análise é importante considerar a linguagem exteriorizada do sujeito, uma vez que ela pode refletir as ideologias levando em conta o sentido, enquanto simbologias constituídas do próprio indivíduo e sua história. Para tanto, destaca-se as observações de Orlandi (2012, p. 83) sobre a 491 questão da materialização do corpo, ou ainda, sobre o processo de significação do mesmo. Considerando a materialidade do sujeito, o corpo significa. Em outras palavras, a significação do corpo não pode ser pensada sem a materialidade do sujeito. E vice-versa, ou seja, não podemos pensar a materialidade do sujeito sem pensar em relação com o corpo. Por isso nos interrogamos: como juntar corpo, sujeito, sentido, pensado a questão da materialidade discursiva? Quando a autora fala em materialidade do corpo, ela faz uma relação entre sujeito/corpo/linguagem/sociedade, visando compreender o discurso, pensando na sua historicidade, dando significado em um ou outro espaço de existência, considerando o espaço de vivência. Neste sentido, Orandi (2013, p. 21) destaca: Para a Análise de Discurso, não se trata apenas de transmissão de informação, nem há essa linearidade na disposição dos elementos da comunicação, como se a mensagem resultasse de um processo assim serializado: alguém fala, refere-se alguma coisa, baseando-se em um código, e o receptor capta a mensagem, decodificando-a. É importante destacar que a AD tem o objetivo de questionar os sentidos estabelecidos em diferentes formas de produção, que podem ser verbais e não verbais, contanto que a materialidade da fala e expressões produzam sentidos para a interpretação. A geografia como ciência apresenta possibilidades de atrelar teoria e prática na construção ou renovação de conceitos, paradigmas e metodologias, onde se definem diante de novos fatos geográficos que se apresentam na atualidade, bem como abre caminhos para novas perspectivas de interpretações. Ao enfatizar o espaço geográfico em suas análises, a geografia estabelece uma conexão de modo interdisciplinar, assumindo a integração das diferentes espacialidades que se formam a partir das relações sociais. DESENVOLVIMENTO GÊNERO E SEXUALIDADE NA ANÁLISE GEOGRÁFICA As temáticas relacionadas ao gênero e sexualidade tem sido objeto de interesse da geografia em diferentes esferas e em todos os cantos do globo. No Brasil ela ainda é incipiente e conta com poucos trabalhos relacionados a esta temática. Ainda é um campo dentro da ciência geográfica a ser explorado, e que oferece uma gama de interpretações com relação ao espaço. Ainda que haja inúmeras possibilidades de se verificar e analisar a diversidade no que se refere ao gênero e 492 suas espacialidades, a geografia pouco se utiliza desta temática para compreender o espaço sob a perspectiva de relações sociais, justificando a importância de discussões acerca desse campo na ciência geográfica. As Geografias Feministas e Queer surgem pela necessidade de inovações e diferentes problematizações que são postas no cotidiano, direcionando fatos geográficos mais significativos na atualidade (ou marginalizados até os dias de hoje) e que exigem novas perspectivas de interpretação. Ela vem para trabalhar com a invisibilidade da mulher e de grupos sociais que não se incluem na sociedade heteronormativa. De acordo com Silva, esse novo ramo de estudos da ciência geográfica é fruto dos movimentos sociais, principalmente o feminista, Dentre os vários movimentos sociais emergentes nos anos 60, o movimento feminista, notadamente aquele reconhecido como a “segunda onda”, foi fundamental para a inspiração da ação de geógrafas que iniciaram um movimento interno à geografia nos anos 70, sob a perspectiva de três objetivos principais: [1] construir a igualdade entre homens e mulheres no âmbito da disciplina; [2] centrar as investigações geográficas sobre as mulheres; e [3] desafiar as filosofias, conceitos e metodologias que sustentavam a hegemonia da geografia masculina (SILVA, 2009, p. 27). Dessa forma, Assim como as mulheres brancas reivindicavam, na década de 70, espaços teóricos e políticos de hegemonia masculina, as mulheres negras oriundas de países em desenvolvimentos reivindicavam, agora, o reconhecimento de suas experiências específicas nem contexto de globalização que deveria contemplar a multiplicidade étnica, racial e sexual (SILVA, 2009, p. 39). Considerar a pluralidade da sociedade requer uma atenção especial, pois se sabe que alguns padrões sociais ainda são conservadores. De uma forma semelhante Gomes afirma, De forma global, podemos dizer que a partir dos anos 50 uma grande parte dos geógrafos passa a reconhecer a insuficiência e fraqueza das bases teóricas que pretendiam sustentar o projeto científico da geografia naquele momento. Essa insuficiência provinha em grande parte da resistente ideia de que a ciência geográfica se identificava inteiramente com o conhecimento empírico dos lugares e não precisava necessariamente ultrapassar esse estágio, ou seja, não precisava criar teorias ou explicações abstratas gerais. Ela seria, portanto, uma ciência diferente das demais pois, não só privilegiava o conhecimento concreto como se limitava a ele (GOMES, 2009, p. 17). Neste sentido, basta falar em gênero (a priori, feminino e masculino) que se iniciam as discussões e principais problemas referentes as padronizações sociais. Para tanto, a pesquisa sobre as Geografias Feministas e Queer, juntamente com a temática religiosa, são estudos emergentes no âmbito da ciência geográfica, uma vez 493 que os fenômenos estão surgindo em proporções notáveis e estão intimamente ligados a atual configuração do espaço. De acordo com Silva, A adoção do conceito de gênero pelas geógrafas feministas permitiu avanços teóricos e metodológicos, além da ampliação do campo de estudos, já que o espaço passou a ser um importante elemento para a compreensão das relações de gênero instituídas socialmente, contudo, hierarquizada, com primazia dos homens em relação às mulheres (SILVA, 2009, p. 35). Da mesma forma, tratando da teoria queer, A teoria queer, portanto, além de sua importância capital em reconhecer a formação de comunidades e culturas sexuais, é um espaço teórico no qual se pode evidênciar a exclusão e a marginalização de determinados grupos sociais nas atividades econômicas e políticas, frutos da homofobia. Segundo eles, mais do que leitura queer do espaço, é necessário empreender uma leitura queer da própria geografia, que tem banalizado esse campo de produção científica (SILVA, 2009, p. 44). A potencialidade da teoria queer, vem da abordagem a qual leva à compreensão de culturas sexuais e a evidenciar a exclusão e a marginalização de determinados grupos sociais, resultado de práticas homofóbicas nas atividades econômicas e políticas. Neste sentido, a subversão pode desestruturar os espaços, ou seja, as práticas e também estudos subversivos podem ser fundamental para ressaltar esses grupos marginalizados. Conclui-se que gênero é uma construção cultural e social e, como tal, sua representação e disseminação pelos meios comunicacionais é responsável pela construção de ideais sociais, valores, estereótipos e preconceitos. UMA NOVA POSSIBILIDADE METODOLÓGICA NA ANÁLISE GEOGRÁFICA O processo de construção de novas formas de metodologias que podem ser aplicadas na geografia não é um caminho fácil. São inúmeras possibilidades que resultam em diferentes resultados ao final de cada pesquisa. Neste sentido, destacamse dois exemplos de pesquisas geográficas que estão sendo realizadas na área de gênero e sexualidade, utilizando a AD. Salienta-se que as duas tem perspectivas diferentes, mas a metodologia escolhida para alcançar os objetivos das mesmas tem pilares basilares que entrelaçam a AD juntamente com outras perspectivas metodológicas. 494 Relacionando gênero, sexualidade e religião, a primeira pesquisa a ser exemplificada neste artigo tem cunho fenomenológico e Análise de Discurso como método e procedimento metodológico, respectivamente. Desta forma, o presente trabalho a ser exemplificado, tem como questão central compreender como as travestilidades/transsexualidades compõem as práticas religiosas nos centros de cultos afro-brasileiros. Os caminhos constituídos de reflexão buscam compreender o conjunto de relações estabelecidas entre o que é ser travesti/transexual a partir da vivência cotidiana nos terreiros, e identificar as maneiras pelas quais essas vivências são mediadas pela representação de gênero dentro da religião afro. Como o trabalho tem como sujeitos as travestis nos terreiros de cultos afrobrasileiros e de origem africana, considera-se importante a análise de discurso das mesmas, uma vez que no campo da fenomenologia como método de abordagem, são os sujeitos que determinam o objeto, pois ela parte do pressuposto de que os sujeitos constituem a realidade, que é singular do próprio sujeito. De uma forma semelhante, relacionando gênero e sexualidades, o foco da segunda pesquisa desenvolvida busca compreender a construção de identidades homoeróticas na territorialidade tradicionalista, a espacialidade que agrega o Movimento Tradicionalista Gaúcho. Para tanto, compreende-se os centros de tradições gaúchas e demais eventos como os territórios a serem estudados, e o Movimento Tradicionalista Gaúcho uma territorialidade. Nota-se, ao “adentrar” tal espacialidade, a existência de uma identidade tradicionalista dotada de uma performance (BUTLER, 2008) característica. Esta última não só é percebida pelo limite espacial, que remete a um tempo passado, e às vestimentas folclóricas que os indivíduos, que do MTG são adeptos, são obrigados a portar, mas, aos atos e discursos fortemente conservadores, machistas, elitistas e heteronormativos ali disseminados. Levando em conta que cada território não é comporto homogeneamente, e sim, também por disputas internas de poder, permitindo notar assim porções espaciais centrais e marginais (SILVA, 2013). Porções marginais, às vezes, paradoxais às concepções identitárias e performáticas esperadas. Percebendo a grande quantidade de homossexuais, ou então, indivíduos que se auto-denominam não-heterossexuais, habitando a territorialidade do MTG, e que sua sexualidade não se encaixa no propagado pela referida entidade, vem-se questionar a esses indivíduos, de que maneira tais indivíduos convivem nesses espaços tendo suas identidades (HALL, 2005) em constante conflito. (ORNAT, 2009, p. 203-204). 495 Para se alcançar os objetivos propostos por ambas as pesquisas, buscou-se uma forma (possível metodologia) de interpretar os objetos de estudo a partir de uma perspectiva qualitativa. Escolheu-se a técnica de análise, Análise de Discurso (AD), sob a perspectiva de responder os questionamentos que resultaram neste trabalho. O processo de AD tem o objetivo de interrogar os sentidos estabelecidos em diversas formas de produção, que podem ser verbais e não verbais, desde que sua materialidade produza sentidos para interpretação. Ela será importante na pesquisa pois demonstrará a partir das falas, das travestis e transexuais, e dos homossexuais tradicionalistas, uma forma diferenciada de se analisar o espaço dentro da ciência geográfica. CONSIDERAÇÕES FINAIS A ideia em se trabalhar com novos métodos de abordagem, dá maior visibilidade à ciência a se propor em realizar pesquisas que podem ir muito além do conhecimento do pesquisador. A Geografia, assim como os demais campos do conhecimento científico, rompendo as barreiras epistemológicas, avançando a espaços não visitados, assimilando novas concepções de ciência, possibilitadas por interdisciplinares alternativas metodológicas. Ao estabelecer essas relações sociais com o espaço, a ciência geográfica adquire a cada evento espaço-temporal, uma forma diferente de se inserir nos fenômenos mais atuais. Nesta perspectiva da construção social do pensamento científico, as teorias e paradigmas que vão surgindo estão atrelados a um determinado contexto histórico e os embasamentos de interpretação vão sendo construídos pelos pesquisadores. Considerando todas as possibilidades de interpretação dentro da ciência geográfica nesta temática, não se pode dizer que ela é uma ciência fechada, mesmo que atualmente suas características ainda estejam entrelaçadas com o tradicionalismo científico que a sustenta. A interdisciplinaridade dá a geografia uma maior força em se manter como a ciência que relaciona tudo com todos e todos com tudo. As adaptações que a temática de gênero e sexualidade que sofreu e ainda sofre, são consequências de uma sociedade modernizada de diferentes espacialidades, que valoriza a estrutura social heteronormativa, imposta pela cultura e também pelas questões religiosas. Para tanto, ao se destacar a AD como uma possível forma de metodologia para se analisar as temáticas envolvendo as tendências geográficas, abre-se novas possibilidades de interpretação dentro da Geografia, sempre considerando as relações sociais e espaciais. 496 Diante de todas as informações de pesquisadores desta linha, aliando-a com a ciência geográfica (sendo geógrafos ou não) tem-se uma ciência ampla, complexa e livre para abrir ainda mais caminhos, transformando, reformulando e até mesmo criando novos paradigmas e novas teorias. Afinal, se descobrir a resposta para todo dinamismo de um determinado tema, considera-se a ciência como encerrada. Diante desta perspectiva de ciência ampla, com possibilidades ilimitadas, é viável este estudo de gênero e sexualidade, pois a geografia é uma ciência espacial, e tudo que acontece no espaço (relações socioespaciais), pode se tornar objeto de estudo da ciência geográfica. REFERÊNCIAS BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. __________. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. GOMES, Paulo Cesar da. Um lugar para a Geografia: contra o simples, o banal e o doutrinário. In, MENDONÇA, Francisco de Assis, LOWEN-SAHR, Cicilian Luiza, SILVA, Márcia da (org.). Espaço e tempo: complexidade e desafios do pensar e do fazer geográfico. Curitiba: Associação de Defesa do Meio Ambiente e Desenvolvimento de Antonina (ADEMADAN), 2009, p. 13-30. HALL, S. A identidade cultural da pós-modernidade. 10ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 11ª ed. Campinas: Pontes, 2013. ORNAT, Marcio Jose. Espacialidades travestis e a instituição do território paradoxal. In, SILVA, Joseli Maria (org.). Geografias Subversivas: discursos sobre espaço, gênero e sexualidades. 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Drª. do Curso de Geografia do Centro Universitário Franciscano ([email protected]) Resumo: Os mapas mentais são uma forma de linguagem que refletem o espaço vivido e possibilitam que o mapeador expresse sentimentos topofílicos e topofóbicos, representados em nuances cujos signos e símbolos são construções sociais. Assim, tem-se como objetivo no presente trabalhocontribuir para estudos geográficos enfatizando a percepção ambiental local dos alunos de 1º ano, do Ensino Médio, da Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I, por meio da elaboração de mapas mentais.Essa investigação encontra-se embasada teoricamente no método fenomenológico, proposto por Husserl, e a análise das representações mentais está apoiada na “Metodologia Kozel”. Constatou-se que práticas vinculadas ao entendimento ambiental local se fazem necessárias para a construção de um entendimento do espaço que possibilite a leitura e a compreensão dos fatos de modo articulado, inter-relacional e sistêmico, permitindo um pensar mais reflexivo e despertando o sentimento de pertencimento e a identidade dos educandos, bem como contribuindo para a valorização e cuidado do lugar. Palavras-chave:Ensino de Geografia; Educação Ambiental; Pertencimento. 1.INTRODUÇÃO “Enriquecemo-nos pela utilização pródiga dos nossos recursos naturais e podemos, com razão, orgulhar-nos do nosso progresso. Chegou, porém, o momento de refletirmos seriamente sobre o que acontecerá quando as nossas florestas tiverem desaparecido, quando o carvão, o ferro e o petróleo se esgotarem, quando o solo estiver mais empobrecido ainda, levado para os rios, poluindo as suas águas, desnudando os campos e dificultando a navegação” (Théodore Roosevelt, Conferência sobre a Conservação dos Recursos Naturais, 1908). O fragmento de texto é parte integrante de uma conferência sobre conservação dos recursos naturais, em 1908, na qual o então presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt, alertava sobre o desequilíbrio ambiental do mundo moderno. 498 Também, é o primeiro parágrafo da introdução do livro “Antes que a natureza morra”, de Jean Dorst, publicado em 1973. A principal mensagem é a de que os recursos naturais disponíveis no Planeta Terra estão sendo amplamente explorados pela sociedade, sem levar em consideração a sua exaustão nem os impactos produzidos ao ambiente. Nesse sentido, no século XXI, a mensagem continua muito adequada aos atuais parâmetros de (in)sustentabilidade no Planeta. Emerge, então, a necessidade de um novo paradigma70 e de um novo conhecimento, embasado nos saberes ambientais, desacomodando os atuais paradigmas do conhecimento disciplinar e desafiando para o conhecimento integrado e complexo. Essa discussão, apesar de constituir-se como um tema transversal e interdisciplinar, é uma questão chave no discurso da Geografia, pois a inter-relação sociedade natureza é fortemente marcada em seu discurso e em seu objeto de estudo. A temática ambiental, neste contexto, mostra-se um exercício indispensável às descobertas de novas passagens e de novos encontros, fortalecendo o desejável e o imprescindível trânsito dos sujeitos do conhecimento. Segundo Leff (2001, p. 17), o conceito de ambiente apresenta-se justamente nessa interseção (sociedade e natureza), pois “o ambiente não é a ecologia, mas a complexidade do mundo; é um saber sobre as formas de apropriação do mundo e da natureza através das relações de poder que se inscreveram nas formas dominantes de conhecimento”. O autor ainda menciona que o ambiente não é um processo perdido na diferenciação/especificação das ciências, nem um espaço integrável pelas trocas interdisciplinares, mas é antes de tudo a “casa comum” ou Ethos71 de todas as formas de vida e de sociedade. “O ambiente e a falta insuperável do conhecimento, esse vazio onde se aninha o desejo de saber gerando uma tendência interminável para a completude das ciências, o equilíbrio ecológico e a justiça social” (LEFF, 2001, p.17). No âmbito escolar, as questões ambientais podem embasar a abordagem geográfica e contribuir para a compreensão de muitos conceitos relevantes para esta disciplina. Os mapas e as representações cartográficas, como os mapas mentais, assim como o enfoque ambiental, são nativos ao ensino de Geografia, tornando-se 70 Para Thomas Kuhn, no livro “A estrutura das Revoluções Científicas”, um paradigma é um modelo ideológico. Um “novo paradigma implica uma definição nova e mais rígida do campo de estudo” (KUHN, 2001, p. 39), sendo que a transição entre um paradigma e outro é marcada por uma revolução científica (série de acontecimentos que resultam em mudanças/saltos qualitativos na ciência). 71 “Ethos, em seu sentido original do grego, significa a toca do animal ou casa do humano, ou seja, a Terra” (BOFF, 2002, p. 27). 499 seus grandes aliados, pois materializam a representação de diversos fenômenos no espaço geográfico. Com essa mesma conotação, Simielli (1999) aponta que a abordagem da Cartografia Escolar pode percorrer dois caminhos principais: o primeiro conduz a um aluno como leitor crítico da representação cartográfica, por meio da leitura de mapas, cartas e plantas, e o segundo a um aluno mapeador consciente, com a elaboração de mapas mentais, maquetes e croquis. No eixo que conduz a ideia de aluno mapeador consciente, o mapa mental72, pode ser uma alternativa eficiente para a compreensão do lugar e das características ambientais do município, conduzindo o aluno a uma leitura consciente e subjetiva da realidade (ambiental). Segundo Richter (2011, p. 17), ele “é analisado como um recurso que permite a construção de uma expressão gráfica mais livre, tendo a perspectiva de que o estudante possa transpor para essa representação espacial” elementos importantes de sua realidade e assim compor um entendimento mais profundo e complexo de seu espaço vivido, pois pode utilizar a escrita, a imagem ou o próprio mapa convencional/tradicional. Ao construir os mapas mentais, os alunos necessitam “dar-se conta” dos elementos do espaço vivido. Isso, não é uma tarefa fácil. Exige conhecimento do lugar, do ambiente local. Segundo Bello (2006), esse processo é a percepção ou o resultado do “dar-nos conta”, isto é, da tomada de consciência dos fenômenos circundantes. Kozel (2006, p.115) aponta que “os mapas mentais como construções sígnicas requerem uma interpretação/decodificação (...), lembrando que essas construções sígnicas estão inseridas em contextos sociais, espaciais e históricos coletivos referenciando particularidades e singularidades”. Neste sentido, com o uso dos mapas mentais, para a representação da realidade ambiental, cada signo (as “palavras” do mapa) poderá servir de referência para um elemento que conduz ao entendimento da percepção ambiental dos estudantes. Os mapas mentais possibilitam a inclusão de elementos subjetivos que, geralmente, não estão presentes nos mapas tradicionais e remetem aos sentimentos topofílicos e 72 Pode-se definir como mapa mental um signo que transmite uma mensagem, por meio de uma forma verbal e/ou gráfica. Em um mapa mental o mapeadorregistra os elementos do espaço que são mais significativos, “com as quais mais se identifica, ou elementos dos quais mais faz uso no seu dia-a-dia ou, ainda aqueles elementos que mais lhe chama a atenção por serem exóticos, ou por seu valor histórico, ou porque tem uma relação de afetividade” (ROCHA, 2007, p. 161). 500 topofóbicos73, fazendo com que o mapeador expresse sua afetividade e, muitas vezes, seu inconsciente. “Essa característica torna mais rica essa representação de próprio punho, por incluir contextos que podem ampliar a compreensão do espaço” (RICHTER, 2011, p.125). De acordo com Nogueira (2009),os mapas mentaisdizem respeito aos mapas elaborados pela mente humana. Eles são imagens guardadas na mente que levam em conta informações sobre o ambiente que cerca os seres humanos, ou então podem ser novas imagens de lugares nunca vistos, as quais a mente cria a partir de algum estímulo externo. (...) Os mapas mentais influenciam, frequentemente, em vários aspectos da tomada de decisão (NOGUEIRA, 2009, p. 46). Assim, a abordagem contextualizada dos mapas mentais com os mapas tradicionais (ou convencionais), aqueles que possibilitam a uma leitura crítica da realidade, auxilia na compreensão das possibilidades de resgatar a ação coletiva pela justiça social no momento histórico em que, segundo Bauman (2001), a pósmodernidade torna-se cada vez mais individualizada e privatizada, onde o espaço público torna-se esvaziado das funções de tradução das questões individuais em coletivas e os próprios indivíduos ficam cada vez mais sujeitos a darem uma solução biográfica para problemas que remetem à amplitude maior do tecido social. 2. OBJETIVO A partir do exposto na contextualização inicial, o presente estudo possui como objetivo contribuir para estudos geográficos enfatizando a percepção ambiental local dos alunos de 1º ano, do Ensino Médio,da Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I, por meio da elaboração de mapas mentais. 3. METODOLOGIA Essa investigação encontra-se embasada teoricamente no método fenomenológico, proposto pelo filósofo alemão Edmund Husserl, pelo qual é realizada a descrição e análise da consciência, isto é, o estudo dos fenômenos e dos objetos que se mostram “a nós”, e compreender o sentido, tanto de ordem física quanto de caráter cultural (CHAUÍ, 2006). 73 As palavrastopofilia e seu oposto topofobia são neologismos que se referem aos laços afetivos positivos e negativos, respectivamente, dos seres humanos com o ambiente (TUAN, 2013). 501 Os sujeitos da pesquisa foram os alunos matriculados em 2015 nos 1º anos, do Ensino Médio, da Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I74, localizada em Quevedos/RS (figura 1), ou seja, 24 alunos. Todos os alunos construíram mapas mentais do município durante uma manhã do Seminário Integrado da Escola. Ressalta-se que eles foram orientados a desenhar elementos que constituem o ambiente local. Após, foram selecionados aleatoriamente 6 mapas mentais (por meio de sorteio), resultando em 20% do total os quais constituíram a amostra de descrição e de análise, conforme os resultados e as considerações a seguir. Figura 1: Mapa de localização da Escola Estadual de Educação Básica Dom Pedro I, Quevedos, RS, Brasil. Org.: Batista, N. L, 2015. A análise dos mapas mentais foi apoiada na metodologia proposta por Kozel (2007). Segundo a autora, “visando decodificar os textos referendados nos mapas mentais e em sua construção sígnica elaboramos uma metodologia como aporte para as análises desenvolvidas a partir dessas representações” (KOZEL, 2007, p. 133). 74 Cabe destacar que está é a única Escola que possui Ensino Médio no município de Quevedos, RS. 502 Segundo a “Metodologia Kozel” (2007), os mapas foram decodificados e analisados pelos seguintes quesitos: a) Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem: observaram-se em um primeiro momento as formas que aparecem como: ícones, letras, mapas e linhas. b) Interpretação quanto a distribuições dos elementos na imagem: analisaram-se como as formas estão dispostas no mapa, isto é, se estão isoladas, dispersas, horizontais, em perspectiva. c) Interpretação quanto às especificidades dos itens: neste item a leitura aprofundou-se, subdividindo-se em: Representação dos elementos naturais da paisagem Representação dos elementos da paisagem construída Representação dos elementos móveis Representação dos elementos humanos d) Apresentação de outros aspectos ou particulares: apresentou-se de outros elementos que permitem a decodificação da informação. Incluiu-se na metodologia baseada em Kozel (2007), as percepçõessobre as questões ambientais inspiradas nas noções de ética e do saber cuidar (BOFF, 2002) e as noções de identidade e de pertencimento(TUAN, 2013). 4. DESENVOLVIMENTO O desenho de mapas é evidência incontestável do poder de conceituar as relações espaciais. É possível determinar o caminho por meio do cálculo de posição sem usar observações astronômicas e mediante a considerável experiência sem procurar desenhar as relações globais da localidade (TUAN, 2013, p.100). Os mapas mentais são uma forma de linguagem que reflete o espaço vivido e possibilitam que o mapeador expresse sentimentos topofílicos e topofóbicos, representados em nuance cujos signos e símbolos são construções sociais. Assim, para Bertin (2014), o estudo da percepção, por meio de representações, como os mapas mentais, faz-se necessário nas investigações geográficas, sobretudo para entender as relações e interações entre o homem e o ambiente, influenciando as decisões e a representação espacial e social. Em sala de aula, podem ser utilizados nos momentos iniciais do trabalho sobre um determinado tema ou conteúdo, quando o objetivo é trazer os conhecimentos e as representações prévias dos alunos. De forma similar, é um procedimento importante 503 nos momentos finais de uma unidade de estudo, já que oportuniza a retomada e a verificação dos conhecimentos construídos. Neste sentido, Richter (2011) aponta que as representações oriundas das imagens mentais não existem dissociadas do processo de leitura que se faz do mundo. Logo, os mapas mentais são considerados uma representação do mundo real observado por meio do olhar particular de um ser humano, com uma história, uma cultura, um aporte cognitivo e emocional, pela visão de mundo e por intencionalidades que permite identificar como esse ser compreende o lugar em que está inserido e como ele se relaciona com o mesmo. Desse modo, conforme Bertin (2014, p. 66) Perante um estímulo externo ou interno o sujeito seleciona na memória a imagem mental correspondente ao seu entendimento, o que resulta em um nível de compreensão que constitui num tipo de filtro de representação subjetiva, intersubjetiva e social. Dentre os elementos que influenciam na percepção e consequentemente na construção dos mapas mentais está à idade, o tempo, mas principalmente, as sensações, ou seja, os sentimentostopofílicos e topofóbicos onde estão imbricados valores, atitudes e vivências. A idade dos alunos participantes da pesquisa (figura 2A) revela a fase da adolescência e varia entre 14 e 17anos. Com relação aotempo de residência dos participantes da pesquisa evidenciou-se que 80% residema mais de 10 anos no município, conforme apresentado na figura 2B. Figura 2: A) Idade dos alunosdo 1º ano do Ensino Médio; B)Tempo de residência dos alunos no município de Quevedos/RS. Fonte: Dados da pesquisa. Jun/2015. Org.: Batista, N. L, 2015. Os mapas mentais construídos pelos alunos são imagens que representam uma articulação entre os elementos constitutivos do espaço vivido, demonstrando como eles entendem o ambiente local. A linguagem dos mapas é a semantização que 504 os alunos fazem de seu município enquanto espaço de vivência, de sensações e de percepções (figura 3). Figura 3: Mapas mentais dos alunos de 1º anos do Ensino Médio (com alto contraste). Fonte: Atividade realizada com os alunos. Jun/2015. Org.: Batista, N. L, 2015. 505 4.1. Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem Como proposto por Kozel (2007), a primeira análise dos mapas mentais consiste em reconhecer as formas impressas nas representações. É uma primeira observação, mas importante para auxiliar a compreensão nas análises posteriores. Assim, a linguagem presente nas imagens construídas pelos alunos do 1º ano (figura 3) evidencia uma pluralidade quanto à forma de representação. As figuras 3A, 3B, 3C, 3D e 3E são marcadas pela presença predominante de ícones que demostram os elementos da realidade. Já o mapa mental da Figura 3F é marcado pela presença de mapas (convencionais). Nas figuras 3B75, 3C76, 3D77 e 3F78, destacam-se também a presença de letras, isto é, de textos explicativos para facilitar a compreensão do leitor. 4.2. Interpretação quanto a distribuições dos elementos na imagem Em uma segunda fase de observação ainda há uma leitura incipiente, onde se destacam as distribuições dos elementos. No caso dos mapas mentais construídos pelos alunos de 1º ano, observa-se que a figura 3A apresenta uma distribuição assimétrica, isto é, apenas um lado da folha foi utilizado. As figuras 3B e 3E apresentam uma representação horizontal, o que remete a um entendimento do espaço em um nível de abstração bidimensional, ou seja, não há visualização vertical dos elementos constitutivos do lugar. A figura 3C apresenta o mapa em perspectiva, estabelecendo assim um referencial central na folha e as noções iniciais de distância em relação às bordas da mesma. Já as figuras 3D e 3F compreendem representações isoladas, isto é, que não demostram relação direta com os demais elementos do ambiente e, por isso, precisam ser lidas enquanto elementos com significados mais amplos e com relações mais abstratas. 4.3. Interpretação quanto às especificidades dos itens Nesta etapa a leitura começa a aprofundar-se, destacando as representações dos elementos naturais e dos da paisagem construída, dos elementos móveis e dos humanos. No caso dos mapas mentais analisados, percebe-se que o imaginário nos mapas mentais (figura 3A, 3B, 3C, 3D e 3E) remonta claramente os elementos da 75 [Texto explicativo do aluno] Sede Campeira do CTG Mangueira de Pedra [Texto explicativo do aluno] Dom Pedro I 77 [Texto explicativo do aluno] Wi-Fi Praça 78 [Texto explicativo do aluno] Internet 76 506 paisagem natural acrescida da paisagem construída,bem como a presença da representação dos elementos humanos e móveis. O primeiro mapa mental (3A) traz a noção de estações do ano, características do clima Subtropical, pois o estudante representou uma árvore sem as folhas, remetendo a vegetação decidual e a estação do inverno. Os elementos móveis e humanos ficam claramente evidenciados na figura 3B. A vida no campo, o contato com os animais, destacando aspectos da lida79 campeira gaúcha, atrelada ao cavalo e a pecuária, são os elementos dispostos nesta figura formando a imagem do aluno mapeador. A figura 3C e 3E remete aos elementos humanos e naturais constituintes de parte da área urbana do município, ressaltando a escola, a Igreja Católica, a residência e a praça (espaço de convivência dos jovens no local). A figura 3D aponta apenas os elementos construídos. Já a figura 3F, não faz referência àsrepresentações dos elementos naturais e dos da paisagem construída nem aos elementos humanos, mas vincula-se aos elementos móveis, ou seja, ao vínculo lugar-mundo. 4.4. Apresentação de outros aspectos ou particulares Nesta etapa faz-se a leitura subjetiva, das entrelinhas dos mapas mentais. Assim, a linguagem presente nos mapas mentais dos alunos de 1º ano (figura 3) evidencia uma pluralidade de concepções espaciais que relacionam percepções vinculadas ao lugar e ao ambiente, mas também reproduzem elementos característicos do mundo globalizado. Essa representação plural imbrica com a própria concepção da Geografia que apresenta o espaço geográfico como o espaço da vida, onde natureza e sociedade se relacionam e se influenciam. As figuras 3A, 3B E 3C remontam a realidade do lugar de vivência e da relação mapeador-ambiente. Já a figura 3D vincula a ideia de ambiente à religiosidade e a crença na figura divina.Como constatado em uma pesquisa anterior, o que acaba construindo uma cultura de defender a necessidade de preservar/conservar sem saber o porquê remetendo os problemas ambientais a ordem das crenças e dos mitos, isto é, vistos como castigo divino (BATISTA, 2013). Com relação ao quinto e ao sexto mapa mental (figura 3E e 3F), fica evidente a relação ambiente-mundo globalizado, e a representação dos elementos móveis, o que permite apontar que os referenciais de problemas ambientais não estão atrelados ao lugar, mas sim aos espaços ausentes, aqueles trabalhados no livro didático, as notícias na mídia e as informações disponíveis no mundo virtual. 79 Termo regional para se referir a trabalho. 507 Embora a grande maioria dos alunos (80%) resida no município a mais de 10 anos, demonstram que não há uma leitura ambiental local atrelada às características peculiares ao município e ao espaço de vivência, bem como o descompasso entre os recursos cartográficos existentes que tratam das questões ambientais com a realidade local. Essa interface é observada na pesquisa de Richter (2011), quando o autor aponta que a Cartografia vem ganhando espaço na sala de aula de tal modo que os mapas chegam a se tornar símbolos do Ensino de Geografia, porém seu uso, muitas vezes, é inadequado ou desvinculado com o cotidiano do aluno, exigindo abstração e não contribuindo para a apreensão do espaço local e sua compreensão, nem para a visualização gráfica dos elementos que compõe o ambiente. 5. CONCLUSÕES Com base no exposto, observa-se que nos mapas mentais dos alunos de 1º ano do Ensino Médioapresentam múltiplas concepções espaciais que relacionam percepções vinculadas ao lugar e ao ambiente, mas também reproduzem elementos característicos do mundo globalizado, dos espaços ausentes trabalhados no livro didático e na mídia. Em relação às referências ambientais dos alunos vinculadas aos espaços vividos, demonstram dificuldades para definir o que é e como se apresenta o quadro ambiental do município de Quevedos/RS, enquanto totalidade. Há uma leitura ambiental mais pontual do espaço de vivência. Nesse sentido, pode-se inferir que a abordagem generalizada dos temas ambientais produz certa cegueira80 para a percepção ambiental local e, consequentemente, surge à dificuldade de relacionar conceitos sobre questões ambientais com o espaço vivido. Quando os problemas ambientais não são mencionados em uma perspectiva do local, o educando não constrói uma cultura ambiental ou um desejo de preservação com o espaço vivido. Defende a preservação da Mata Atlântica, na Serra do Mar, e da Amazônia, na Região Norte, mas não defende a mata galeria que protege as águas que abastece seu município e sua casa. Isso acaba construindo uma cultura de defender a necessidade de preservar/conservar sem saber o porquê ou ainda a atribuição de problemas ambientais a ordem das crenças e dos mitos. 80 A sociedade enxerga a realidade, mas não consegue fazer uma análise e uma reflexão mais profunda sobre as situações. A cegueira, então, não está relacionada em não enxergar, mas em 'ser cego' de consciência, de intuição, de pensamento crítico sobre o ambiente, sobre a realidade. 508 Portanto, a partir das constatações apresentadas, aponta-se que a construção de mapas mentais, como um procedimento pedagógico, caracteriza-se pela realização de representações pessoais. Esse procedimento é bastante adequado ao ensino pela sua possibilidade de desencadear processos mentais importantes para o desenvolvimento dos alunos, por oportunizar condições de expressão do mundo vivido. Além disso, as práticas vinculadas ao entendimento ambiental localse tornam urgentes para a construção de umentendimento do espaço que possibiliteuma leitura e uma compreensão das verdades temporárias sobre o “mundo” de modo articulado, inter-relacional e sistêmico, permitindo um pensar mais reflexivo e despertando o sentimento de pertencimento e a identidade dos educandos, bem como contribuindo para a valorização e cuidado com o lugar. 6. REFERÊNCIAS BATISTA, N. L. Atlas Geográfico do Município de Quevedos/RS. (Trabalho Final de Graduação). Centro Universitário Franciscano, Curso de Geografia, Santa Maria, RS: 2013. BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. 2001. BELLO, A. A. Introdução à fenomenologia. Bauru, SP: Edusc, 2006. BERTIN, M. O ensino da geografia na Tríplice Fronteira (Puerto Iguazú/AR, Foz do Iguaçu/BR e Ciudaddel Este/PY), e o turismo como possibilidade de reflexão das representações sociais e espaciais. (Tese de doutorado). 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Nesse sentido, esse artigo tem como objetivo compreender a existência e atuação dos sujeitos inseridos nas escolas do campo, indivíduos esses carregados social e culturalmente a partir de suas práticas cotidianas sucessivas, que criam espaços e reproduzem suas bases humanas. Como resultado, busca-se garantir visibilidade enquanto sujeito, permitindo a emancipação social e a insurgência de sua cultura enquanto luta contrahegemônica. De forma a contribuir com esse debate, buscaremos as discussões levantadas por teóricos que trabalham sobre o viés cultural/educacional, perspectivas que torne os sujeitos como protagonista de sua história e criadores de sua própria existência. Assim, a Educação do Campo torna-se como lugar possível do desenvolvimento da interculturalidade, de espaço que emerge os ausentes, possibilitando a realização de trocas sociais e culturais, em favorecimento de sua formação. Palavras-Chaves: Educação do Campo; Emancipação social; Interculturalidade; Sujeito; Sociologias da Ausências/Emergências. INTRODUÇÃO Dentro da perspectiva da historicidade da Educação do Campo, percebe-se a presença de sujeitos fundamentais na sua gênese, representados pelos movimentos sociais. Estes, a partir de suas lutas, reivindicaram por educação aos seus membros, pois consideravam que através do sistema educacional, poderiam perpetuar suas ideologias e lutar contra a questão agrária brasileira. Assim, apesar da consistência de uma luta recente, sua contribuição conseguiu reorganizar algumas questões pedagógicos ao meio rural. Nessa discussão, percebe-se que a Educação do Campo ocorreu a partir de reivindicações de movimentos sociais camponeses, e que por serem constituídas pela exclusão social e educacional, e o processo de ensino-aprendizagem nas escolas do campo ser relegado ao plano secundário pelas esferas governamentais, possibilitou a criação de debates que dessem visibilidade para os sujeitos pertencentes a esse espaço. Além disso, permitiu repensar as bases do campo brasileiro em seus aspectos gerais, desde questões educacionais, como também cultural, produtivo e social, ou seja, todos os elementos essenciais para os sujeitos na constituição enquanto seres 81 Aluno de Pós-Graduação em Geografia em nível de Mestrado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 511 humanos. Porém, dentro dessa análise surge a questão de discutir a emancipação do sujeito, enquanto indivíduo constituído por bases culturais e produtor de espaço, que reafirma em seu território de ação, sua percepção de mundo e suas necessidades. Por constituir grupos/movimentos sociais, que reivindicam por lutas que se encontram distantes dos planos políticos, chamados de “movimentos minoritários”, surge a necessidade de alterar as bases de exclusão social e política, transformando para uma esfera cultural, a possibilitar a construção de práticas sociais mais igualitárias e interculturais. Nesse sentido, esse artigo tem como objetivo compreender a existência e atuação dos sujeitos inseridos nas escolas do campo, indivíduos esses carregados social e culturalmente a partir de suas práticas cotidianas, que criam espaços e reproduzem suas bases humanas. De forma específica, possibilitar a visibilidade aos sujeitos das comunidades escolares que desenvolvem educação do campo, permitindo a emancipação social e a insurgência de sua cultura enquanto luta contrahegemônica. De forma a contribuir buscou-se discussões levantadas por teóricos que possam contribuir para essa questão. Inicialmente, realizaremos um levantamento da construção histórica entre os movimentos sociais, que através de ações traçaram planos de reivindicações por um sistema educacional de qualidade para seus membros. Além disso, análise das políticas públicas, que regularizam perante a legislação brasileira, essa educação diferenciada, que atende sujeitos do campo. A discussão encaminha-se para um pensamento que proporcione debater espaços para os excluídos/minorias, e da questão cultural dos indivíduos. Destes, iniciamos com Alain Toiraine, em seus livros “Um novo paradigma: para compreender o mundo de hoje” e “Iguais e Diferentes: podemos viver juntos?”; percebe-se também a contribuição de Néstor García Canclini em seu trabalho “Diferentes, desiguais e desconectados” e de Boaventura de Sousa Santos em “Renovar a teoria crítica e reinventar a emancipação social”. A EDUCAÇÃO DO CAMPO: QUESTÃO POLÍTICO-PEDAGÓGICA EM CONSTRUÇÃO Sua construção foi marcado por lutas diante de um siste