B - UFRGS

Transcrição

B - UFRGS
Termodinâmica
para processos da pirometalurgia
– método direto
(Versão compacta)
N.C. Heck
NTCm
Núcleo de Termodinâmica Computacional para a Metalurgia
http://www6.ufrgs.br/ct/ntcm/
Copyright © Nestor Cezar Heck
Os direitos sobre os textos e figuras – exceto onde mencionada a fonte – contidos neste material são reservados ao seu autor. Esta é uma edição
eletrônica não comercial, que não pode ser vendida nem comercializada em hipótese nenhuma, nem utilizada para quaisquer fins que envolvam interesse
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Porto Alegre - 2007
Termodinâmica para processos da siderurgia
N.C Heck – NTCm / UFRGS
Para minha esposa Rosaura
e filhos: Rodrigo, Guilherme e Vicente
ii
Termodinâmica para processos da siderurgia
N.C Heck – NTCm / UFRGS
Sumário
1. Introdução.....................................................................................................................
1
1.1 Para o quê serve a termoquímica?..........................................................................
1
1.2 Propriedades conhecidas e propriedades menos comuns.......................................
1
1.3 Características da termodinâmica...........................................................................
2
1.4 Principal objetivo....................................................................................................
2
1.5 Algumas definições.................................................................................................
2
2. Equação de estado, trabalho e calor..............................................................................
5
2.1 Equação de estado de um gás ideal.........................................................................
5
2.2 Trabalho mecânico..................................................................................................
5
2.3 Trabalho mecânico em um processo isobárico.......................................................
6
2.4 Trabalho mecânico em um processo isotérmico.....................................................
6
2.5 Calor........................................................................................................................
7
3. Variação das funções U e H, calor específico..............................................................
8
3.1 Variação da energia interna....................................................................................
8
3.2 Variação da entalpia................................................................................................
8
3.3 Calor específico e a sua relação com a variação da entalpia e da energia
interna.....................................................................................................................
9
3.4 Expressão de Cp como uma função da temperatura................................................
10
4. Processo adiabático e o ciclo de Carnot........................................................................
12
4.1 Processo adiabático.................................................................................................
12
4.2 Ciclo de Carnot e a variação da entropia................................................................
13
5. Processos – uma resenha...............................................................................................
15
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Termodinâmica para processos da siderurgia
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5.1 Processo isobárico...................................................................................................
15
5.2 Processo isocórico...................................................................................................
15
5.3 Processo isotérmico................................................................................................
15
5.4 Processo adiabático.................................................................................................
16
6. Variação da energia de Gibbs........................................................................................
17
6.1 Definição da energia de Gibbs...............................................................................
17
6.2 Variação da energia de Gibbs nos quatro diferentes tipos de processo..................
17
7. Valor das funções termodinâmicas................................................................................
18
7.1 Valor das funções termodinâmicas em função da temperatura..............................
18
7.2 Valor das funções termodinâmicas em função da pressão.....................................
19
7.3 Valor da energia de Gibbs dos gases ideais como uma função da pressão............
19
7.4 Valor da energia de Gibbs dos gases reais em função da pressão.........................
20
8 Transformação de fase e critérios de espontaneidade.....................................................
22
8.1 Transformação de fase isotérmica..........................................................................
22
8.2 Critérios de espontaneidade....................................................................................
23
9. Equilíbrio termodinâmico, sistema unário.....................................................................
25
9.1 Critérios de equilíbrio.............................................................................................
25
9.2 Equilíbrio entre fases, sistema ‘unário’ (monocomponente)..................................
26
10. Reações estequiométricas............................................................................................
27
10.1 Variação das propriedades termodinâmicas.........................................................
27
10.2 Critério de espontaneidade....................................................................................
28
10.3 Equilíbrio entre fases e a constante de equilíbrio.................................................
28
10.4 Equação de van’t Hoff..........................................................................................
29
10.5 Diagrama de Ellingham........................................................................................
30
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Termodinâmica para processos da siderurgia
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11. Equilíbrio termodinâmico, sistema multicomponente.................................................
31
11.1 Equilíbrio entre fases do tipo composto, sistema multicomponente.....................
31
11.2 Regra da alavanca (ou da balança)......................................................................
32
12. Fases do tipo mistura...................................................................................................
34
12.1 Definição de fase do tipo mistura.........................................................................
34
12.2 Componentes do sistema e constituintes de fases mistura....................................
34
12.3 Composição de uma fase do tipo mistura.............................................................
35
12.4 Mistura ideal ou ‘raoultiana’................................................................................
35
12.5 Composição da fase gasosa em equilíbrio com uma mistura líquida...................
37
12.6 Mistura não-ideal – lei de Henry..........................................................................
37
12.7 Afastamento da linearidade..................................................................................
38
13. Aplicações da equação de Gibbs-Duhem....................................................................
39
13.1 A equação de Gibbs-Duhem
39
13.2 Cálculo da atividade de A pelo conhecimento da atividade de B na mistura........
40
13.3 Cálculo do coeficiente de atividade de A pelo conhecimento do coeficiente de
atividade de B na mistura.....................................................................................
41
14. Outros estados de referência........................................................................................
43
14.1 Estado padrão henriano ‘solução infinitamente diluída’......................................
43
14.2 Valor da variação da energia de Gibbs de formação da ‘solução infinitamente
diluída’.................................................................................................................
43
14.3 Estado padrão henriano ‘solução à 1%’................................................................
44
14.4 Valor da variação da energia de Gibbs de formação da ‘solução à 1%’...............
44
15. Misturas com múltiplos solutos...................................................................................
46
15.1 Atividade de constituintes de soluções diluídas de vários solutos........................
46
15.2 Atividade de constituintes de soluções concentradas de vários solutos...............
48
16. Funções termodinâmcas de fases do tipo mistura........................................................
49
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Termodinâmica para processos da siderurgia
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16.1 Valor das funções termodinâmicas de fases mistura............................................
49
16.2 Variação da entropia decorrente da ação de se misturar dois gases ideais...........
49
16.3 Energia de Gibbs de uma fase mistura de gases ideais.........................................
50
16.4 Representação gráfica de funções termodinâmicas de fases mistura...................
51
16.5 Potencial químico e valor de G de uma fase mistura............................................
51
17. Equilíbrio com fases do tipo mistura...........................................................................
53
17.1 Determinação do equilíbrio com representações gráficas de G em sistemas
multifásicos..........................................................................................................
53
17.2 Fases metaestáveis................................................................................................
54
17.3 Força motriz e atividade de uma fase...................................................................
54
17.4 Equilíbrio condicionado pelo potencial químico..................................................
55
17.5 Coeficiente de partição de um soluto entre duas fases mistura............................
55
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Termodinâmica para processos da siderurgia
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0
Uma palavra inicial...
Dentre os nomes notáveis que deram o impulso inicial ao que se conhece hoje como
termodinâmica clássica, se destacam os de Nicolas Léonard Sadi Carnot (1796-1832) e de
Josiah Willard Gibbs (1839-1903).
O primeiro deles está relacionado ao rendimento das máquinas térmicas e ao que, anos
mais tarde, Rudolf Clausius (1822-1888) denominou de entropia. Esta fase do conhecimento
bem que foi relacionada com a dinâmica (das máquinas) e com o calor (assim:
termodinâmica!).
Já Gibbs viu neste tipo de análise uma ferramenta muito poderosa, capaz de auxiliar na
compreensão da química (daí o segundo nome pelo qual nós a conhecemos: termoquímica!).
E foi com o estudo do equilíbrio entre as fases que ele deixou aberta a porta que dá para a
termodinâmica dos metais (termodinâmica metalúrgica) que, mais tarde, passou a abranger os
materiais em geral (termodinâmica dos materiais). Por seu trabalho, teve seu nome eternizado
na energia de Gibbs – que permite a determinação do estado de equilíbrio termodinâmico
entre as fases.
A termodinâmica está, hoje, consorciada com o ramo da Ciência que se dedica ao
estudo dos fenômenos de transporte, na esperança de que, desta síntese – fortemente assistida
pela computação –, seja possível diminuir ainda mais a distância entre as previsões e os
resultados dos processos que idealizamos.
N.C. Heck
outubro de 2007
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Termodinâmica para processos da pirometalurgia
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1
Introdução
1.1 Para o quê serve a termoquímica?
Pode uma chapa de aço – como, por exemplo, a lataria de um automóvel – se oxidar ao
ar? Qual a temperatura máxima obtida na combustão do gás liquefeito de petróleo com ar,
combustível comumente usado nos fogões de uso doméstico?
Para dar resposta a esta e a muitas outras perguntas, a primeira informação útil pode
ser obtida no ramo da Ciência que se denomina termoquímica ou termodinâmica química. A
termoquímica, contudo, só pode ser útil se algumas propriedades da matéria que constitui o
universo forem conhecidas.
1.2 Propriedades conhecidas e propriedades menos comuns
Associa-se à matéria de um corpo propriedades comuns tais como a massa (que, sob a
ação de um campo gravitacional, é percebida na forma de uma força – o peso) e o volume.
Com o estudo da física, aprende-se que a ela também pode ser associada uma
propriedade ‘menos visível’, à qual chamamos energia. Uma maçã, ao desprender-se do galho
de uma árvore, aumenta a sua velocidade na queda e pode espatifar-se no chão. Aos olhos de
Newton, e de outros cientistas que o sucederam, essa seqüência de fatos é interpretada como
sendo a transformação da energia potencial, contida na maçã, em cinética. Ao chegar ao solo
– valor zero (arbitrário) para a escala da energia potencial –, a transformação estará completa
e a energia cinética atingirá o seu valor máximo. A fragmentação da maçã em pedaços – nas
frações de segundo seguintes – pode ser entendida como sendo a realização de trabalho. Uma
das definições de energia1 nos diz que ela ‘é a capacidade de realizar trabalho’. Isso remete
nosso pensamento diretamente à questão seguinte: como é definido, então, trabalho? Trabalho
pode ser entendido como a transformação que um corpo pode sofrer quando se transfere
energia a ele (para uma abordagem inicial, essa é a melhor definição de trabalho).
Cientistas, dando seqüência à interpretação da queda da maçã, poderiam sugerir que
seus pedaços provavelmente teriam a sua temperatura aumentada! Uma cena freqüentemente
vista no cinema, a de um meteorito caindo sobre um planeta e, na seqüência, explodindo,
numa ‘bola de fogo’, teria origem neste fenômeno. Apesar da fantasia que permeia este meio
de expressão artística, essa representação não está longe da verdade, e já foi até observada
quando, em julho de 1994, entre os dias 16 e 22, mais de vinte fragmentos do cometa
Shoemaker-Levy 9 colidiram com o planeta Júpiter. Os impactos foram observados por
astrônomos em centenas de observatórios ao redor do mundo, e pelo ‘telescópio espacial’
Hubble, como pontos luminosos – de elevada temperatura – no hemisfério do sul de Júpiter
1
Atribuída a Rudolf Clausius
Termodinâmica para processos da pirometalurgia
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(observações similares, porém menos espetaculares, já foram feitas através de telescópios
sobre a superfície da Lua1).
Assim, uma análise mais profunda poderia sugerir que nem toda a energia potencial da
maçã foi ‘convertida’ em trabalho2 – parte dela permaneceu ‘estocada’ na maçã (ou melhor,
nos seus fragmentos) sob uma outra forma de energia, menos reconhecida, a energia interna.
A variação da energia interna, nos exemplos citados, seria percebida no aumento da
temperatura dos corpos (ou, melhor, de seus restos).
A energia interna – importante forma de energia para a termodinâmica – serve muito
bem para ilustrar a idéia principal desta introdução: aquela de que nem todas as propriedades
termodinâmicas associadas a um determinado corpo fazem parte da nossa experiência
quotidiana – até mesmo algumas de grande importância.
1.3 Características da termodinâmica
A termodinâmica clássica não é uma disciplina que se preocupa com a parte
microscópica, fenomenológica, da natureza, sendo essencialmente macroscópica e empírica!
Outra característica de fundamental importância na termodinâmica – em que pese o
paradoxal uso dos termos inicial e final – é a absoluta ausência da variável tempo! Apesar
disso, o estudo das taxas3 – uma importante área da ciência e da engenharia, denominada
fenômenos de transporte – se relaciona visceralmente com a termodinâmica, uma vez que
quanto mais afastado do estado de equilíbrio (ver, adiante, definição) o sistema estiver, maior
será a força motriz disponível para a transferência da propriedade em estudo.
1.4 Principal objetivo
O objetivo principal da termodinâmica é a determinação da ‘situação’ – estritamente,
do estado – na qual mais nenhuma modificação macroscópica será percebida!
A este estado denominamos estado de equilíbrio termodinâmico. O estado de
equilíbrio – de uma forma sintética – é a situação limite para a qual um sistema tende a
convergir de forma espontânea, a partir de uma determinada situação inicial. Se essa
tendência não existe, é porque o estado inicial já é o próprio estado de equilíbrio.
Barreiras de natureza cinética naturalmente podem impedir que este estado seja
alcançado; assim, o estado que for efetivamente alcançado – mais estável ‘antes’ do estado de
equilíbrio – é chamado de estado de equilíbrio metaestável.
1.5 Algumas definições
A termodinâmica estuda o universo com o foco naquilo que se denomina sistema.
Para que se possa distinguir o sistema daquilo que o cerca, define-se uma fronteira –
real ou imaginária – entre ele e a sua vizinhança; assim, o universo é composto pelo sistema
mais a sua vizinhança.
A fronteira pode ser permeável à energia e à matéria, ou não. Sistemas com fronteiras
impermeáveis à matéria são ditos fechados; impermeáveis a ‘tudo’ (matéria e energia) são
chamados isolados. No caso contrário, são ditos abertos.
Somente duas formas de energia podem trafegar através da fronteira: o calor e o
trabalho.
1
http://science.nasa.gov/headlines/y2006/13jun_lunarsporadic.htm
Um corpo não armazena ou estoca trabalho, somente energia; trabalho – nas suas mais diferentes facetas – é
energia em trânsito!
3
Quociente que quantifica o valor, de uma determinada propriedade, que é transferido por unidade de tempo.
2
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3
Fronteiras impermeáveis ao calor são ditas adiabáticas.
Em relação à matéria contida no sistema, pode-se dizer que, nele, apenas fases
coexistem. E, podem existir tanto sistemas monofásicos quanto multifásicos.
Por fase entende-se uma porção homogênea da matéria, capaz de ‘criar’ uma interface
com a fase vizinha. Somente a fase possui propriedades termodinâmicas tais como: massa,
volume, etc. As propriedades do sistema apenas refletem as propriedades das fases.
Pode-se diferenciar entre dois tipos de fases: aquele de composição fixa – as
substâncias ou compostos químicos – e aquele de composição variável – ou misturas.
Quando, na mistura, é possível distinguir-se um solvente, fala-se em solução. Os solutos, em
qualquer um dos tipos de mistura, são denominados constituintes.
Genericamente, usamos o termo espécies químicas para designar compostos químicos.
Por outro lado, ‘não existem’ elementos químicos na termodinâmica – mas sim, espécies
atômicas.
A composição do sistema é dada em termos de seus componentes – que são como os
blocos de um brinquedo para a construção de casas ou castelos. É importante ressaltar: um
teste seguro para um conjunto de componentes é a verificação da sua ‘capacidade de
construir’ todas as espécies químicas do sistema.
Na metalurgia, os componentes do sistema são tipicamente espécies atômicas como,
por exemplo, C-O-H. Concordando com a regra mencionada acima, com elas podemos
‘construir’ as espécies químicas moleculares CH4, CO, C2H5OH, etc.; contudo, há sistemas
que podem ser descritos com o uso de espécies químicas. Um sistema típico, usado no estudo
de escórias, tem como componentes as espécies químicas: SiO2 e CaO. As fases comuns no
sistema como, por exemplo, CaO·SiO2, 2CaO·SiO2, CaO(l), entre outras, podem ser
facilmente ‘construídas’ a partir desses componentes.
Este tema – de qualquer modo – possui certa complexidade e será retomado,
oportunamente, em pontos apropriados do texto.
Os valores finitos da massa, do volume, da temperatura e da pressão – entre outras
variáveis – definem o estado – já referido anteriormente – de um sistema e são, por isso,
denominados variáveis de estado (ou funções de estado) de um sistema.
Gibbs determinou que, em um sistema com n1, n2, n3, ..., ni componentes, há
C+2
variáveis independentes, onde C é igual ao número de componentes.
As variáveis de estado se dividem em extensivas e intensivas. Aquelas do primeiro
tipo aumentam (ou diminuem) o seu valor, acompanhando o aumento (ou diminuição) do
‘tamanho’ do sistema. Assim, quando a massa do sistema é multiplicada por dois, o volume
dobra (outras variáveis mantidas constantes). Já a temperatura não se altera e, por isso, ela é
um exemplo de variável intensiva! Por outro lado, uma variável extensiva pode dar origem a
outra, intensiva. Assim, o quociente entre o volume e o número de mols é um exemplo de
variável intensiva, e é conhecido como volume molar.
Para um sistema multifásico, o valor de uma propriedade extensiva do sistema é o
resultado do somatório do valor desta propriedade em cada uma das fases.
Um sistema pode sofrer uma transformação, partindo de um estado inicial até chegar a
outro, final. A isso se denomina processo. Quando, após passar por vários estados, o sistema
retorna ao estado inicial, diz-se que o sistema passou por um ciclo. Num ciclo, os valores
finais menos os iniciais de todas as variáveis de estado são necessariamente iguais à zero! No
caso contrário, a variável é dita de processo. Calor e trabalho são tipicamente variáveis de
processo. Diz-se que elas dependem do ‘caminho’ seguido entre os estados inicial e final.
Um processo que se constitui de uma sucessão de estados de equilíbrio é dito um
processo reversível e, no caso contrário, é dito processo irreversível (ou espontâneo). No
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processo reversível – como o nome sugere – pode-se ‘voltar sobre os próprios passos’, ou
seja, fazer a reversão do processo.
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Equação de estado,
trabalho e calor
2.1 Equação de estado de um gás ideal
O estado de um sistema composto apenas por um gás ideal 1 tem um comportamento
que pode ser descrito pela equação de estado dos gases ideais – uma equação empírica,
também chamada de equação de Clapeyron:
PV = n RT
onde R é a constante universal dos gases, os demais termos são variáveis: pressão, P, volume,
V, número de mols, n e a temperatura (numa escala absoluta), T. Ela permite a determinação
de qualquer uma das quatro incógnitas (P, V, n ou T) quando os valores das outras três, num
determinado estado, são conhecidos.
Equação de estado para os gases ideais
Seis relações entre as variáveis P, V, n e T e podem ser escritas para os gases ideais;
algumas delas foram observadas há muito tempo e são consideradas Leis – das quais, talvez, a
mais famosa (e certamente a mais antiga) seja a lei de Boyle-Mariotte2:
PV = cte.
Do produto destas relações pode-se obter a equação de estado dos gases ideais –
escrita pela primeira vez por Benoît-Pierre-Émile Clapeyron, em 1834.
Para um valor de n finito, mantendo-se ou o valor de P, de V ou de T constante, podese descrever, respectivamente, os estados de um sistema ao longo de três tipos de processos:
isobárico, isocórico e isotérmico.
2.2 Trabalho mecânico
Conforme foi visto anteriormente, além do calor, somente o trabalho – outra forma de
energia – é capaz de atravessar a fronteira do sistema fechado.
Há muitos tipos de trabalho: elétrico, magnético, mecânico, etc.; o mais importante,
1
Um gás ideal é um gás hipotético que consiste de partículas idênticas, de ‘volume zero’, que não apresentam
forças de atração ou repulsão entre elas. Adicionalmente, as partículas apresentam colisões perfeitamente
elásticas entre si e com as paredes do recipiente que contém o gás.
2
Robert Boyle estabeleceu, em 1662, a lei da compressibilidade de um gás: “o volume de um gás é inversamente
proporcional à pressão que recebe”. Em 1667, Edme Mariotte complementou a lei de Boyle ao especificar “sob
uma temperatura constante”.
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nesta parte da termodinâmica, é o trabalho mecânico:
w = F ⋅d ,
onde F é a força e d é o deslocamento.
Pode-se estudá-lo com o auxílio de um pequeno cilindro dotado de um pistão (sem massa,
que se movimenta sem atrito dentro do cilindro) contendo um gás ideal com pressão
idêntica à externa (não necessariamente constante!). Como a pressão é dada por
F
,
A
(onde A é a área do pistão) pode-se escrever
w = Pext . ⋅ A ⋅ d .
Com o deslocamento do pistão, o volume – dado pelo produto entre A e d – varia; assim, em
termos infinitesimais,
δ w = Pext.dV .
(2.1)
Pext . =
Sobre a diferença entre as notações d e δ empregadas neste texto
A diferença entre uma pequena quantidade (ou quantidade elementar) de calor – ou de
trabalho –, δ , e uma variação infinitesimal, d, de uma função de estado como, por exemplo, a
energia interna, pode ser entendida com o auxílio das seguintes integrações (entre os estados
‘1’ e ‘2’):
∫ δ q = ∑δ q = q ,
∫ dV = ∆V = V − V
2
1
2
1
2
1
.
2.3 Trabalho mecânico em um processo isobárico
Quando a pressão externa é constante, da integração de (2.1) entre os estados ‘1’ e ‘2’
resulta
w = Pext . cte. ⋅ (V2 − V1 ) = Pext . cte. ⋅ ∆V .
(2.3)
2.4 Trabalho mecânico em um processo isotérmico
Num processo isotérmico, a pressão não possui um valor finito, mas varia em função
do volume. Buscando-se na equação de estado dos gases ideais (unimolar) uma expressão
para P como uma função de V e, substituindo-a na equação (2.1), obtém-se:
RT
δ w=
dV .
V
Integrada entre os estados ‘1’ e ‘2’, resulta em:
⎛V ⎞
(2.4)
w = RT ln⎜⎜ 2 ⎟⎟ .
⎝ V1 ⎠
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2.5 Calor
Calor é a forma de energia que se transfere apenas por causa da existência de uma
diferença de temperatura entre o sistema e a sua vizinhança.
Convenção de sinais para q e w
No presente trabalho, o valor do calor será positivo quando entrar no sistema;
enquanto que o valor do trabalho será positivo quando o sistema realizá-lo sobre a vizinhança.
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Variação das funções U e H,
calor específico
3.1 Variação da energia interna
Conforme já foi visto, um sistema pode conter energia de muitos tipos. Energia
cinética (sistema em movimento) e energia potencial (sistema localizado num ponto
específico de um campo gravitacional, elétrico, etc.) – entre outras – não são importantes
nesta análise e não serão consideradas. Já a energia interna, U, é uma das formas relevantes
de energia para a termodinâmica.
Quando se fornece calor ao sistema (isso também vale para quando dele se retira calor)
a sua energia interna sofre uma variação. Se a parede do sistema for rígida, a variação da
energia interna será dada exclusivamente por
∆U = q ;
mas, se ele se expande realizando trabalho w sobre a vizinhança, a variação da energia interna
será menor, pois dela será descontado o trabalho feito:
∆U = q − w .
(3.1)
Finalmente, obtém-se
∆U = q − Pext . cte. ⋅ ∆V ,
(3.2)
ao ser substituído, na expressão (3.1), o valor do trabalho mecânico sob uma pressão
constante, dado por (2.3).
3.2 Variação da entalpia
A entalpia é definida como sendo (daqui para frente não mais serão usados os
subscritos da pressão):
H ≡ U + PV .
Assim, a variação da entalpia de um sistema é igual à
∆H = ∆U + ∆(PV )
e
∆ ( PV ) = P2V2 − P1V1 .
No caso da pressão ser constante,
∆ ( PV ) = P(V2 − V1 ) = P∆V
e
∆H = ∆U + P∆V
(com P cte.)
(3.3)
A equação (3.2) permite escrever:
q = ∆U + P∆V .
(3.4)
Então, por semelhança entre (3.3) e (3.4), temos que
∆H = q .
(com P cte.!)
(3.5)
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3.3 Calor específico e a sua relação com a variação da entalpia e da energia interna
Experimentalmente, sabe-se que a introdução (ou retirada) de calor em um sistema
simples, sob pressão constante, produz um aumento (ou diminuição) na sua temperatura.
Para um sistema unimolar, o quociente entre o valor do calor trocado e a variação da
temperatura é o calor específico molar:
q
= cte. = C p .
∆T
Da mesma forma, uma pequena quantidade de calor, δ q, adicionada ao (ou extraída
do) sistema ocasionará uma variação infinitesimal na sua temperatura, dT. Portanto,
q
δq
=
= Cp .
∆T dT
Infelizmente, o valor de Cp não é constante para todo o intervalo de temperaturas
sendo, portanto, uma função dela. Como
δ q = C p dT ,
q = ∫ C p dT .
Por comparação com (3.5), fica claro que
∆H = ∫ C p dT (P cte.!) .
(3.6)
(3.7)
Convenção para o uso de ∆
Alguns autores salientam uma diferença entre o valor de uma variação (em uma dada
função de estado) que ocorre sob uma isoterma, dos outros casos, adotando a seguinte
convenção:
∆X quando a variação da propriedade X se dá de forma isotérmica, e,
X 12 quando se dá entre as temperaturas T1 e T2 .
Para sistemas multimolares, com Cp (aproximadamente) constante, (3.6) transforma-se
na conhecida expressão:
q = n C p ∆T .
Por outro lado, quando o sistema troca calor sob volume constante,
q
= cte. = Cv
∆T
e,
q = ∫ Cv dT .
Como a fronteira do sistema, neste caso, é rígida, o valor do trabalho mecânico será
nulo. Assim,
∆U = q
(3.8)
e
∆U = ∫ Cv dT .
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Relação entre Cp e Cv para os gases ideais
A equação (3.1) pode ser escrita em termos infinitesimais. Substituindo-se nela a
expressão (2.1), obtém-se:
dU = δ q − Pext . ⋅ dV
ou
Cv dT = δ q − Pext . ⋅ dV .
Dividindo-se todos os membros da equação por dT, à pressão constante, fica:
⎛ dV ⎞
⎛δ q ⎞
Cv = ⎜
⎟
⎟ − Pext .const . ⋅ ⎜
⎝ dT ⎠ P
⎝ dT ⎠ P
ou,
⎛ dV ⎞
Cv = C p − Pext .const . ⋅ ⎜
⎟ .
⎝ dT ⎠ P
Derivando-se a equação de estado dos gases ideais (para um mol de gás) em relação à
T, obtém-se a expressão
R
⎛ dV ⎞
⎜
⎟ =
⎝ dT ⎠ P P
que, ao ser substituída na equação anterior, dará como resultado uma expressão relacionando
Cp e Cv:
Cv = C p − R
3.4 Expressão de Cp como uma função da temperatura
Conforme já foi visto, para grandes intervalos de temperatura o calor específico
raramente é uma constante. Assim, para facilitar cálculos, seu valor em função da temperatura
é dado por um polinômio. Com base na experiência e no trabalho de Kubaschewski, ficou
acordado o uso de uma expressão única:
d
(3.9)
C p = a + bT + cT 2 + 2 .
T
Com isso, para cada uma das espécies químicas do sistema, ‘apenas’ os valores de a, b, c e d
necessitam ser registrados.
Infelizmente, contudo, nem mesmo esta função é capaz de representar adequadamente
o valor do calor específico num intervalo muito grande de temperaturas. Para sanar isto, usase dividir o intervalo original em faixas menores; isso feito, ajustar-se o valor do Cp para cada
uma delas, por meio de uma equação idêntica àquela mostrada. Ao final, tem-se um conjunto
de valores a, b, c e d – um para cada uma das seções do intervalo original de temperaturas.
Lembrete: como integrar Cp como uma função da temperatura?
Conforme foi visto, a quantidade de calor que atravessa a fronteira durante um
processo isobárico é igual à integral da função Cp em T (expressão 3.6).
Se a função Cp (T) for dada pela expressão sugerida em (3.9):
d
C p = a + bT + cT 2 + 2 ,
T
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a integral indefinida será igual à:
T2
T3 d
C
dT
=
aT
+
b
+
c
− .
∫ p
2
3 T
Da integração entre dois estados ‘1’ e ‘2’ resulta:
2
(T22 − T12 ) + c (T23 − T13 ) − d ⎛⎜ 1 − 1 ⎞⎟ .
(
)
C
dT
a
T
T
b
=
−
+
2
1
∫1 p
⎜T T ⎟
2
3
1⎠
⎝ 2
11
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40
12
Processo adiabático e o
ciclo de Carnot
4.1 Processo adiabático
Um processo resulta adiabático quando a fronteira do sistema submetido a uma
transformação é adiabática – ou seja, é impermeável ao calor.
No processo adiabático, a determinação dos valores de P, V ou T do estado final, a
partir dos valores do estado inicial, não pode ser feita com a equação de estado dos gases
ideais. Para isso deve-se lançar mão da seguinte expressão:
γ
P2 ⎛ V1 ⎞
=⎜ ⎟ ,
P1 ⎜⎝ V2 ⎟⎠
(4.1)
com
γ=
Cp
.
Cv
Uma vez que o valor de P2 (ou, alternativamente, de V2) seja determinado, volta-se a
usar a equação de estado dos gases ideais para a determinação de T2 – a incógnita restante.
Derivação da equação (4.1)
Como, num processo adiabático, o valor de q é igual à zero,
dU = − Pext . ⋅ dV ;
ou,
Cv dT = − Pext . ⋅ dV .
Substituindo-se nesta a expressão o valor de P dado pela equação de estado dos gases ideais
(unimolar), fica:
RT
dV .
Cv dT = −
V
Separando-se as variáveis,
Cv
R
dT = − dV
T
V
e, integrando-se entre estados ‘1’ e ‘2’ (considera-se, aqui, o valor de Cv constante), obtém-se
(trocando-se, adicionalmente, ln(x) por log(x)):
⎛V ⎞
⎛T ⎞
Cv log⎜⎜ 2 ⎟⎟ = − R log⎜⎜ 2 ⎟⎟
⎝ V1 ⎠
⎝ T1 ⎠
ou
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13
⎛V ⎞
⎛T ⎞
(4.2)
Cv log⎜⎜ 2 ⎟⎟ = R log⎜⎜ 1 ⎟⎟ .
⎝ V2 ⎠
⎝ T1 ⎠
Esta expressão mostra a temperatura que se estabelece no sistema submetido a uma
expansão ou contração (variação do volume) adiabática.
Para a determinação da temperatura como uma função da pressão – ao invés do
volume – é necessária uma pequena transformação algébrica. Partindo-se da equação de
estado dos gases ideais, pode-se escrever:
V1 T1 P2
= ⋅
V2 T2 P1
e, também,
⎛P ⎞
⎛T ⎞
⎛V ⎞
log⎜⎜ 1 ⎟⎟ = log⎜⎜ 1 ⎟⎟ + log⎜⎜ 2 ⎟⎟ .
⎝ P1 ⎠
⎝ T2 ⎠
⎝ V2 ⎠
Substituindo-se esta expressão na equação (4.2), obtém-se:
⎛P ⎞
⎛T ⎞
⎛T ⎞
Cv
log⎜⎜ 2 ⎟⎟ = log⎜⎜ 1 ⎟⎟ + log⎜⎜ 2 ⎟⎟
R
⎝ P1 ⎠
⎝ T2 ⎠
⎝ T1 ⎠
ou,
⎛P ⎞
⎛T ⎞
⎛ Cv
⎞
⎜ + 1⎟ log⎜⎜ 2 ⎟⎟ = log⎜⎜ 2 ⎟⎟ .
⎝ R
⎠
⎝ P1 ⎠
⎝ T1 ⎠
Como, para os gases ideais,
Cv = C p − R ,
então:
⎛ Cv
⎞ Cp
⎜ + 1⎟ =
⎝ R
⎠ R
e
⎛P ⎞
⎛T ⎞
(4.3)
C p log⎜⎜ 2 ⎟⎟ = R log⎜⎜ 2 ⎟⎟ .
⎝ P1 ⎠
⎝ T1 ⎠
Esta expressão, da mesma forma que a (4.2), mostra a temperatura que se estabelece
com uma compressão ou descompressão adiabática (variação da pressão) do sistema.
Dividindo-se a equação (4.3) pela (4.2), obtém-se a mais importante delas (na
descrição de um processo adiabático) – conforme se queria demonstrar:
γ
P2 ⎛ V1 ⎞
=⎜ ⎟ ,
P1 ⎜⎝ V2 ⎟⎠
onde
γ=
Cp
Cv
.
4.2 Ciclo de Carnot e a variação da entropia
Um sistema constituído por um gás ideal submetido a um ciclo composto
sucessivamente por: um processo isotérmico, um processo adiabático, um segundo processo
isotérmico e um último, adiabático – todos reversíveis –, descreve o assim chamado: ciclo de
Carnot.
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14
Rudolf Clausius reconheceu, em 1850, que o quociente
q
,
T
ao final de um ciclo (na verdade, dentre os quatro processos, o sistema somente troca calor ao
longo dos dois processos isotérmicos), era zero. Ora, uma propriedade cuja variação é igual à
zero ao fechar-se um ciclo será uma função de estado! Quinze anos mais tarde, o próprio
Clausius deu a ela o nome de: entropia (junção de palavras da língua grega significando algo
como ‘conteúdo transformador’), símbolo S.
A variação da entropia, ∆S, resultante de um processo isotérmico, é dada por:
q
∆S = rev. .
T
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50
Processos
– uma resenha
5.1 Processo isobárico
Já foi visto que, no processo isobárico,
∆H = q = ∫ C p dT .
O trabalho mecânico – realizado com P externa constante – é igual à:
w = Pext .const . ∆V .
Assim,
∆U = ∆H − Pext .const . ∆V .
Como o calor trocado é expresso por
q = ∫ C p dT ,
então
∆S = ∫
Cp
T
dT .
5.2 Processo isocórico
Foi visto, também, que, no processo isocórico,
w=0 ;
portanto,
∆U = q = ∫ Cv dT
e,
∆S = ∫
Cv
dT .
T
5.3 Processo isotérmico
O processo isotérmico é dos mais importantes; sabe-se que:
q
∆S = rev. .
T
Como não há variação na temperatura1,
1
A temperatura é uma medida macroscópica da energia cinética das moléculas do gás (fenômeno
microscópico!). A energia cinética do gás permanece constante se a temperatura do gás não variar durante o
processo. Como a energia cinética é a única forma de energia que um sistema constituído por um gás ideal
pode conter, então, numa expansão isotérmica, não haverá mudanças na energia interna.
15
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16
∆U = 0 ,
e, por conseqüência,
q=w .
Foi visto que o trabalho mecânico (para um sistema unimolar) é dado por:
⎛V ⎞
w = RT ln⎜⎜ 2 ⎟⎟ .
⎝ V1 ⎠
Sabe-se que a variação da entalpia é dada por:
∆H = ∆U + ∆( PV ) .
(5.1)
Como
P2V2 = P1V1 = cte.
– lei de Boyle-Mariotte –, então
∆( PV ) = 0 .
Assim, considerando-se os valores expostos, a expressão (5.1) reduz-se à expressão
∆H = 0 .
5.4 Processo adiabático
No processo adiabático,
∆U = − w ,
pois
q=0 .
Por causa disso, também
∆S = 0 .
O valor do trabalho (para um sistema unimolar) pode ser determinado por meio da
expressão:
( γ −1)
⎛
⎞
RT1 ⎜ ⎛ P2 ⎞ γ
⎟
⋅ ⎜ ⎜⎜ ⎟⎟
− 1⎟ .
w=
γ − 1 ⎜ ⎝ P1 ⎠
⎟
⎝
⎠
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17
Variação da energia de Gibbs
6.1 Definição da energia de Gibbs 1
A energia de Gibbs (uma função auxiliar) é definida como sendo:
G ≡ H − TS .
Assim, a variação da energia de Gibbs é igual à:
∆G = ∆H − T ∆S .
(6.1)
A energia de Gibbs e a sua relação com a variação da entropia do universo
A variação da energia de Gibbs de um sistema (isobárico) pode ser associada com a
variação da entropia do universo. Para demonstrar isso, deve-se primeiro observar que a
variação de entropia do universo é dada pela soma das variações da entropia da vizinhança e
do sistema:
∆SU = ∆SV + ∆S S .
A variação da entropia da vizinhança é idêntica à quantidade de calor que entra ou sai
do sistema, porém com o sinal invertido. Tomando-se a temperatura do processo como sendo
aproximadamente constante, pode-se escrever:
∆H S
.
∆SV = −
T
Assim,
∆H S
∆SU = −
+ ∆S S .
T
e
− T ∆SU = ∆H S − T ∆S S .
Portanto, da comparação com a equação (6.1), pode-se escrever:
∆GS = −T ∆SU .
(6.2)
6.2 Variação da energia de Gibbs nos quatro diferentes tipos de processos
Para um sistema constituído por um gás ideal, o cálculo da variação da energia de
Gibbs sempre se dará segundo a equação (6.1). Note que, num processo isotérmico,
∆H = 0 .
1
Conhecida anteriormente pelo nome ‘energia livre de Gibbs’; http://www.iupac.org/goldbook/G02629.pdf
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70
18
Valor das funções
termodinâmicas
7.1 Valor das funções termodinâmicas em função da temperatura
Já foi visto, nas seções anteriores, que, a determinação da variação de uma
propriedade de estado entre os estados ‘final’ e o ‘inicial’ de um processo é possível. Num
processo isobárico, por exemplo, a variação da propriedade entropia é dada por
C
∆S = ∫ p dT .
T
Contudo, conforme comentado no início deste texto, para poder responder questões
importantes, relacionadas com fenômenos naturais e com processos tecnológicos, dentre
outros fatores, é necessário o conhecimento do valor das propriedades da matéria – e não
somente de quanto foi a sua variação ao longo do processo!
O cálculo infinitesimal mostra que a determinação do valor de S do sistema no estado
‘2’ (P2, V2 e T2) é possível quando o seu valor no estado ‘1’ (P1, V1 e T1) é conhecido, pois,
matematicamente,
2 Cp
∆S = S 2 − S1 = ∫
dT .
1
T
O valor da entropia à temperatura 0 [K] é considerado como igual à zero1. Com base
nisto, aplicando-se o raciocínio apenas desenvolvido, pode-se determinar, por exemplo, o
valor de S para a temperatura de 500 [°C]. Na verdade, é usual tomar-se como referência o
valor de S à temperatura de 298,15 [K], sob a pressão unitária (em [atm] ou [bar]) para então
se determinar a entropia à qualquer outra temperatura, T. Neste caso,
T Cp
dT ;
(7.1)
ST = S o298 + ∫
298 T
o superscrito ‘o’ refere-se à pressão do estado de referência.
Quando o mesmo raciocínio é utilizado para a entalpia, vê-se rapidamente que não há
sequer um único valor absoluto conhecido para esta propriedade! Isso indica a necessidade de
se usar valores artificiais de referência – um para cada substância. Por convenção, adota-se o
valor zero para todas as ‘substâncias elementares’ (compostas apenas por uma única espécie
atômica2) à temperatura de 298,15 [K]. Para todos os outros compostos, adota-se o valor da
‘variação da entalpia de formação’ à temperatura de 25 [°C] e pressão unitária [atm] ou [bar].
Uma vez isto feito, pode-se determinar o valor da entalpia para qualquer outra temperatura:
H T = ∆ f H o298 + ∫
T
298
1
2
C p dT .
(7.2)
Embora haja controvérsias, esta afirmação deriva da terceira lei da termodinâmica.
Esta afirmação – conforme se verá mais adiante – deve ser tomada como verdadeira apenas no âmbito
introdutório desta disciplina.
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19
Pela definição de G, vê-se que o valor da energia de Gibbs, em qualquer temperatura,
pode ser calculado a partir dos valores das funções H e S recém determinados1:
GT = H T − TST .
7.2 Valor das funções termodinâmicas em função da pressão
Algumas funções de estado mudam de valor para diferentes pressões no sistema –
mesmo que a temperatura seja mantida constante ao longo do processo.
Do estudo dos processos, sabe-se que o valor de U de um sistema composto por um
gás ideal, ao longo de uma isoterma, é finito e independente da pressão.
A partir desta afirmação, pode-se analisar a variação da função de estado entalpia em
função da pressão. Assim, como
H = U + PV ,
e o produto PV (para uma isoterma) é constante (lei de Boyle-Mariotte), então o valor da
entalpia também será finito. Disso decorre que não haverá mudanças no valor de HT, qualquer
que seja a pressão do sistema.
Por outro lado, sabemos que o valor de S necessariamente se modifica ao longo de
uma isoterma. Isto está de acordo com a quantidade variável de calor trocado ao longo do
processo isotérmico, fato que modifica o valor de ∆S :
q
∆S = rev. .
T
Pode-se calcular o valor da entropia do sistema gasoso unimolar, sob uma pressão
qualquer, substituindo-se nessa expressão o valor de qrev. trocado entre o sistema e a
vizinhança. Uma vez que o valor ‘inicial’ da entropia, ST i, seja conhecido (à pressão P1),
pode-se calcular o seu valor ‘final’ (à pressão P2):
⎛P⎞
ST f = ST i + R ln⎜⎜ 1 ⎟⎟ .
⎝ P2 ⎠
A partir das observações das variações das propriedades de estado H e S feitas acima,
e, como
GT = H T − TST ,
pode-se concluir que, para um sistema gasoso, mesmo num processo isotérmico, em que pese
a constância de HT, o valor de GT irá se modificar em função da pressão do sistema. Isso será
visto a seguir, por meio de uma análise que usa uma aproximação diferente para este tema.
7.3 Valor da energia de Gibbs dos gases ideais como uma função da pressão
Partindo-se das definições da entalpia e da energia de Gibbs, pode-se determinar o
valor da energia de Gibbs em função da pressão.
H ≡ U + PV
assim,
dH = dU + P dV + V dP .
Como
dU = δ q − P dV
e
δq
dS =
,
T
1
Estritamente, os valores de H, S e G, recém vistos, se referem unicamente à pressão unitária – escolhida para o
estado de referência.
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20
pode-se escrever:
dH = T dS + V dP .
A energia de Gibbs foi definida como sendo:
G ≡ H − TS
então,
dG = dH − T dS − S dT .
Substituindo-se nesta expressão o valor dH obtido acima, tem-se:
dG = V dP − S dT .
Para um sistema isotérmico,
dG = V dP .
Embora esta expressão esteja relacionada com uma variação da propriedade G, sua
integração também possibilita a determinação do valor da energia de Gibbs em função da
pressão. Para isso, é necessário, inicialmente, que o volume, V, seja expresso como uma
função de P. A expressão oriunda da equação de estado dos gases ideais, para um mol de gás,
é a alternativa mais freqüentemente usada. Uma vez aplicada, resultará em:
RT
dG =
dP .
(7.3)
P
Neste ponto, fica clara a necessidade de se conhecer o valor de G em um determinado
estado ou, alternativamente, que seja definido um estado padrão. A segunda opção – recém
utilizada no caso da entalpia – inclui igualmente uma pressão de referência, P°. A integração
da expressão (7.3) resulta em:
⎛ P⎞
G = G o + RT ln⎜ o ⎟ .
(7.4)
⎝P ⎠
O argumento da função logaritmo, o quociente
P
a= o ,
(7.5)
P
recebe o nome de atividade 1. Como, normalmente, o valor escolhido para P° é unitário
(1 [atm] ou 1 [bar]), escreve-se usualmente apenas
G = G o + RT ln (P ) .
(7.6)
7.4 Valor da energia de Gibbs dos gases reais em função da pressão
Quando o valor da pressão de um gás real não produz o efeito desejado, ela é
substituída por outra de valor mais adequado, chamada fugacidade (como esperado, f ° terá o
valor unitário):
G = G o + RT ln ( f ) .
(7.7)
Há, portanto, uma correspondência – normalmente não-linear – entre as fugacidades
(gases ideais) e as pressões (gases reais). Quando a relação é linear (lamentavelmente, isso é
raro), a inclinação da equação, chamada coeficiente de atividade, γ, é finito e, então,
f = γ⋅P .
Se o valor de γ for igual à unidade, por conveniência, pode-se falar apenas em ‘pressão’ –
como vinha sendo feito até este momento – e os gases são apropriadamente denominados
‘ideais’.
1
Atividade é um nome comum a outras expressões – conforme será visto adiante!
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21
Tendo-se em vista a relação entre a fugacidade e a pressão, a equação (7.6) pode ser
reescrita para os gases reais como
G = G o + RT ln (γ ⋅ P )
ou
G = G o + RT ln (P ) + RT ln (γ ) .
(7.8)
Uma análise desta expressão mostra que três termos contribuem para o valor da
energia de Gibbs de um gás real. Ao primeiro deles (à direita do sinal de igualdade) é usual a
denominação ‘contribuição padrão’, ao segundo, ‘contribuição ideal’ e, ao terceiro, a
denominação ‘termo de excesso’.
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80
22
Transformação de fase e
critérios de espontaneidade
8.1 Transformação de fase isotérmica
A transformação isotérmica de uma fase em outra como, por exemplo, aquela da fusão
do chumbo, pode ser estudada com a ajuda do conceito de estado inicial e final de um
sistema. Assim, no exemplo dado, o estado inicial do sistema será chumbo na fase sólida, e o
final será chumbo na fase líquida. Quando a transformação representar a solidificação do
metal, os estados inicial e final serão, evidentemente, os opostos.
Com o auxílio de diagramas (ou tabelas) contendo valores das funções
termodinâmicas (normalmente são valores molares) em função da temperatura, pode-se
determinar facilmente o valor da variação de uma dada propriedade de estado, X, na
transformação de fase isotérmica, ∆Xtr., com o uso da seguinte expressão:
∆X tr . = X f − X i ,
(8.1)
onde X é a propriedade em questão para os dois estados, a uma temperatura desejada. Assim,
por exemplo, a determinação de ∆Htr. pode ser feita de uma forma rápida e direta, para
qualquer isoterma, com um diagrama que contenha os valores de H (de cada uma das fases
em questão), em função da temperatura, dispostos lado a lado. Da mesma forma, um diagrama
contendo os valores de S permitirá saber quais serão os valores de ∆Str.. E, da relação entre a
variação da entalpia e da variação da entropia, será possível a determinação de ∆Gtr..
Deve se ressaltar, contudo, que os valores determinados nestas transformações
isotérmicas valem apenas para a pressão do estado padrão. Assim, seu valor é, rigorosamente,
∆Xtr.º. Isso é especialmente importante se uma das fases for a gasosa, pois, conforme se viu, o
valor de algumas funções de estado se alteram em função da pressão; por conseqüência, para
estas, o valor de ∆Xtr. (sempre à mesma temperatura) será uma função da pressão escolhida.
Assim, como o valor da entalpia só é função da temperatura, nesse caso não haverá
mudanças no valor de ∆Htr. calculado acima, qualquer que seja a pressão escolhida para a
transformação.
Por outro lado, sabe-se que o valor de S de um gás ideal – além de ser dependente da
temperatura – apresenta uma dependência também com a pressão. Portanto, o valor da
variação da entropia, ∆Str., será válido apenas para a pressão do estado padrão. No entanto, se
os valores da entropia das diferentes fases forem conhecidos em função da pressão, ∆Str.
poderá ser facilmente calculada para qualquer uma delas.
Partindo-se das observações recém feitas sobre as variações nas propriedades de
estado H e S, e, tendo-se em vista que
∆Gtr . = ∆H tr . − T ∆Str . ,
pode-se concluir que, para uma transformação isotérmica, em que pese a constância de ∆Htr.,
por causa de ∆Str., o valor de ∆Gtr. irá se modificar em função da pressão escolhida.
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23
8.2 Critérios de espontaneidade
Uma das grandes metas da Ciência (e da Engenharia) consiste em descobrir se uma
dada transformação, ou processo, será espontânea – ou seja, se ocorrerá sem a intervenção de
agentes externos. E esta é uma das grandes funções da termodinâmica.
Pensava-se antigamente que o valor de ∆H era um fator seguro para identificar esta
situação, porém, a experiência mostrou que tanto transformações exotérmicas quanto
endotérmicas podiam ser espontâneas. Descobriu-se, mais tarde, que o valor de ∆S fornecia o
critério apropriado para esta finalidade.
Este tema pode ser compreendido com o auxílio de um sistema simples, consistindo
apenas de um gás ideal. Quando um sistema desse tipo passa por um processo isotérmico, a
seguinte expressão é verdadeira:
q=w.
Por conseqüência da desigualdade entre o trabalho decorrente de um processo
reversível e o de um irreversível, aparece uma diferença entre o calor trocado reversivelmente
(valor maior) e o trocado irreversivelmente (valor menor). Como o trabalho atinge o valor
máximo num processo isotérmico reversível, também o calor que um gás ideal absorve (ou
fornece) o atingirá; ou seja:
qrev. > qirrev. .
Como a variação de entropia do sistema entre um mesmo par de estados (final e
inicial) tem um valor único – independentemente do tipo de processo (seja ele reversível ou
irreversível), resulta que:
q
∆S = rev.
T
e
q
∆S > irrev. ;
T
ou seja, o verdadeiro valor da variação de entropia do sistema será sempre maior do que
aquele que se pode medir através de um processo real (irreversível, ou espontâneo)!
As duas equações mostradas são normalmente sumarizadas na expressão conhecida
como desigualdade de Clausius:
q
∆S ≥ .
(8.1)
T
Por outro lado, para um processo qualquer, a variação de entropia do universo pode ser
descrita por:
∆SU = ∆SV + ∆S S .
(8.2)
No processo isotérmico mencionado, se a transformação for reversível, a variação de
entropia da vizinhança, ∆SV, pode ser facilmente determinada. Para isso é necessário dividirse a quantidade de calor que entra ou deixa o sistema, com o ‘sinal’ invertido – pois a
convenção é dada com relação ao sistema –, pelo valor da temperatura (a vizinhança, por
possuir uma capacidade térmica infinita, nunca tem a sua temperatura alterada durante o
processo):
q
∆SV = − .
T
Como, para o sistema vale
q
∆S S = ,
T
substituindo-se, os valores encontrados, em (8.1), resulta em
Termodinâmica para processos da pirometalurgia
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24
∆SU = 0 .
Contudo, se o processo for irreversível (real, ou espontâneo), conforme visto
anteriormente, o calor extraído da vizinhança pode ser menor que o máximo (ideal). Assim,
para compensar, o sistema cria entropia, de modo que, no total, sua variação de entropia será
maior do que aquela da vizinhança.
Disso tudo resulta que, para um processo espontâneo,
∆SU > 0 .
(8.3)
Um segundo critério de espontaneidade pode ser identificado. Conforme visto
anteriormente, pode-se associar a variação da entropia do universo com a variação da energia
de Gibbs de um sistema:
∆Gs = −T∆SU .
Como a temperatura (absoluta) é sempre positiva, segue-se que ∆GS – por sua vez –
será sempre menor do que zero (negativa) para um processo espontâneo:
∆GS < 0 .
(8.4)
Esta informação é muito importante – e se constitui numa das maiores contribuições
de Willard Gibbs à termodinâmica –, pois traz para o âmbito do sistema a verificação da
espontaneidade – algo que anteriormente só podia ser feito (por meio de S) considerando-se
uma variação que se dava no universo!
Outra maneira de se demostrar a associação de G com a espontaneidade é através da
combinação da primeira lei da termodinâmica com a segunda. Assim,
∆U = q − w ,
ou
∆U + w = q .
Como, pela desigualdade de Clausius
q ≤ T∆S ,
∆U + w ≤ T∆S
tendo-se, ao final,
∆U + w − T ∆S ≤ 0 .
Mas, pela definição de H, pode-se escrever
∆H − T∆S ≤ 0
e, fazendo-se uso da definição de G, conclui-se que
∆G ≤ 0
– ou seja, ∆G será menor do que zero para um processo espontâneo1!
1
Observe que o valor de ∆G deve ser menor do que zero, mas não necessariamente o de ∆Gº!
Termodinâmica para processos da pirometalurgia
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90
25
Equilíbrio termodinâmico,
sistema unário
9.1 Critérios de equilíbrio
Um processo espontâneo leva, eventualmente, o sistema a um estado no qual não há
mais nenhuma alteração – também chamado de estado de equilíbrio termodinâmico.
Pelas razões expostas anteriormente, quando
∆S > 0 ,
o processo será espontâneo. Pelo mesmo motivo, se esta variação for menor do que zero, o
processo contrário é que será espontâneo. Assim, simplesmente pela conjunção das duas
idéias, no estado de equilíbrio termodinâmico, tem-se que
∆S = 0 ;
e, simultaneamente, o valor de S do universo será máximo!
Ao contrário, para a função energia de Gibbs, somente se
∆G < 0
é que o processo será espontâneo; da mesma forma,
∆G = 0
no equilíbrio, e, portanto, o valor de G do sistema será mínimo 1!
Decorre daí a grande importância de G – aquela de ser a função freqüentemente
utilizada para a determinação do estado de equilíbrio do sistema.
Qual fase estará presente no equilíbrio?
Para se verificar qual (ou mesmo quais) fase estará presente no estado de equilíbrio,
deve-se avaliar, inicialmente, por meio do valor de ∆Gtr., se o sistema pode se transformar
espontaneamente do estado ‘1’ ao estado ‘2’.
Três resultados são possíveis:
(i) ∆Gtr. > 0 ; o sistema permanecerá no estado ‘1’ (G, deste estado será mínimo) e a
única fase presente será a original.
(ii) ∆Gtr. < 0 ; o sistema passará ao estado ‘2’ (G, deste outro estado será mínimo) e a
única fase presente será aquela do sistema no estado ‘transformado’, ou seja, estado ‘2’.
(iii) ∆Gtr. = 0 ; o sistema pode permanecer tanto no estado ‘1’ quanto passar
parcialmente ou integralmente ao estado ‘2’ – a extensão da transformação dependerá de
outros fatores (G possui o mesmo valor em qualquer uma destas combinações).
Consequentemente, o sistema pode apresentar: (i) apenas a fase do estado ‘1’, (ii) apenas a
fase do estado ‘2’ ou, mais comumente, (iii) ambas! Todas essas alternativas expressam o
equilíbrio termodinâmico. É bem verdade que associamos comumente ao ‘estado de equilíbrio
1
É fácil compreender que este é um ponto de mínimo, pois se (na direção do estado de equilíbrio) G do estado
final é menor do que o G do estado inicial, G tende a diminuir. Note, no entanto, que mínimo não significa
valor de G igual à zero!
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26
termodinâmico’ a noção de que há ‘equilíbrio entre fases’ – ou seja, a terceira das
alternativas!
9.2 Equilíbrio entre fases, sistema ‘unário’ (monocomponente)
Conforme o texto introdutório, um sistema simples, de apenas um componente, pode
apresentar, no equilíbrio, unicamente fases1 originadas a partir desse componente. Se o
componente fosse, por hipótese, a espécie atômica A, as fases poderiam ser: A(s), A(l) e
A2(g), etc.; sendo a espécie química AB2, poderiam ser, entre outras, AB2(s1), AB2(s2),
AB2(l) e AB2(g).
Pode-se analisar, para qualquer um desses sistemas, locii (em função da temperatura e
da pressão) onde
∆Gtr . = 0
– o que significa dizer, pontos (ou linhas) onde apenas algumas (ou todas) fases mencionadas
do sistema (dentre as fases ‘candidatas’) estarão em equilíbrio.
A determinação destes locais normalmente é feita seguindo-se uma trajetória
isotérmica (variando-se, consequentemente, a pressão) ou uma isobárica (variando-se a
temperatura).
O diagrama que expõe as regiões (campos) onde uma única fase é estável2, em função
apenas dos eixos temperatura e pressão do sistema, é conhecido pelo nome de diagrama
unário de fases. As linhas, ou pontos, onde os diferentes campos se tocam, denotam as
pressões e temperaturas onde as fases (estáveis) adjacentes estão em equilíbrio.
Gibbs nos deixou um método para determinar o número máximo de fases no estado de
equilíbrio do sistema, sob determinadas condições – hoje conhecido pelo nome de ‘regra das
fases de Gibbs’:
F +V = C + 2 ;
onde: F é o número máximo de fases em equilíbrio no sistema sob determinadas condições; V
é o número de graus de liberdade (ou variância) do sistema e C é o número de componentes
do sistema – no caso do sistema unário, um único.
1
É importante salientar que o elenco das fases ‘candidatas’ a participar do estado de equilíbrio depende
exclusivamente do interesse do pesquisador e é função da sua experiência no tema de trabalho.
2
Note: isto implica no critério de G mínimo!
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10
27
Reações estequiométricas
10.1 Variação das propriedades termodinâmicas
As transformações isotérmicas de algumas fases em outras como, por exemplo, aquela
da transformação da CaCO3 em CaO e CO2, recebem o nome especial de ‘reações químicas’
ou – mais apropriadamente – ‘reações estequiométricas’ e também podem ser estudadas com
a ajuda do conceito de estado inicial e final de um sistema. Assim, no exemplo dado, no
estado inicial o sistema conterá apenas a fase sólida CaCO3 e, no final, conterá CaO e CO2
como fases sólida e gasosa, respectivamente (quando a transformação representar a formação
do carbonato, os estados inicial e final serão os opostos a estes).
A reação estequiométrica recém vista pode ser descrita por:
CaCO3 (s) = CaO (s) + CO2 (g)
e as fases1 envolvidas na reação são chamadas reagentes (à esquerda do sinal de igualdade) e
produtos (à direita). A palavra estequiométrica ressalta bem o aspecto (fundamental) de que o
número de mols de cada uma das espécies atômicas deve ser conservado – mesmo que o
número de mols das espécies químicas possa se alterar, do estado inicial para o final2.
O valor da variação de uma dada propriedade X, na qual estamos interessados, ∆Xr.,
que se dá pela reação estequiométrica, é dado genericamente por:
∆X r . = ∑ X produtos − ∑ X reagentes .
(10.1)
Deve-se ressaltar que, via de regra, as propriedades nas quais estamos interessados são
extensivas – ou seja, são dependentes da extensão do sistema (em outras palavras, do número
de mols dos reagentes e dos produtos que compõem os estados inicial e final) – e devem ser
ponderadas de acordo.
Da mesma forma que nas transformações de fase, havendo diagramas (ou tabelas) com
valores das funções termodinâmicas em função da temperatura, para as fases que compõem os
reagentes e os produtos, será fácil a determinação de ∆Xr. de uma forma rápida e direta para
qualquer isoterma.
É importante ressaltar que a variação calculada corresponde àquela que ocorre sob a
pressão do estado padrão. Assim, seu valor é, novamente, ∆Xr.º. Para outras pressões,
especialmente se uma das fases for a gasosa, vale a mesma observação já feita anteriormente:
dependendo da função de estado – já que algumas têm seu valor alterado em função da
pressão – o valor de ∆Xr. pode não ser constante, modificando-se em função daquela variável.
1
Embora a reação estequiométrica relacione fases entre si, existe uma importante exceção: as misturas gasosas!
Nas misturas gasosas costumamos distinguir os seus constituintes como se fossem fases reagentes e fases
produtos – isto não é estritamente verdadeiro, mas pode ser utilizado com esse sentido.
2
A ênfase está sendo dada apenas aqui, mas esta regra também vale para o caso das transformações de fase
isotérmicas – tema recém visto.
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28
10.2 Critério de espontaneidade
Do mesmo modo que nas transformações de fase isotérmicas, aqui também a variação
de G é o melhor critério para se saber se uma reação estequiométrica será espontânea ou não.
A explicação de como determinar a variação da energia de Gibbs de uma reação
estequiométrica será feita com o emprego de um exemplo genérico.
Os compostos (fases) A e AB (onde A e B são espécies atômicas) podem ser
relacionados estequiometricamente com o gás B2 através da seguinte reação:
2 AB = 2A + B2 .
Utilizando-se a equação (7.6),
G = G o + RT ln (P )
– muito embora duas das fases sejam condensadas –, pode-se calcular G de cada uma das
fases à temperatura T e pressão P.
Então, para 2 mols de A:
2G A = 2G Ao + RT ln (a A2 ) ,
para 1 mol de B2:
GB2 = GBo2 + RT ln PB2 ,
( )
e, para 2 mols de AB:
2
o
2G AB = 2G AB
+ RT ln a AB
.
Nestas equações, as atividades das fases representam uma situação qualquer, dentre
elas, por exemplo, os estados inicial e final.
Somando-se as duas primeiras equações (produtos) e, subtraindo-se da soma a terceira
equação de G (reagente), obtém-se:
⎛ a A2 ⋅ PB ⎞
o
2G A + GB2 − 2G AB = 2G Ao + GBo2 − 2G AB
+ RT ln⎜ 2 2 ⎟ . (10.2)
⎜ a AB ⎟
⎝
⎠
Os termos à esquerda do sinal de igualdade são idênticos à equação (10.1) e expressam
o valor de ∆G; os primeiros três termos à direita do sinal de igualdade também expressam
uma variação de G, mas, como tratam do estado referência, ou padrão, o símbolo empregado
aqui será ∆G°. O último termo recebe o nome de quociente de reação, Q. Assim,
genericamente,
∆G = ∆G o + RT ln (Q ) .
(10.3)
Conforme já foi visto, para a situação escolhida, caso
∆G < 0 ,
então a reação será espontânea.
( )
10.3 Equilíbrio entre fases e a constante de equilíbrio
Sabe-se que um processo espontâneo leva, eventualmente, a um estado no qual mais
nenhuma alteração espontânea será possível – também chamado de estado de equilíbrio
termodinâmico.
Raramente o estado final (ou o inicial) coincide com o estado de equilíbrio que,
portanto, se encontra em um ponto entre aqueles dois e contempla a presença – no mesmo
sistema – das fases reagentes e produtos!
Pode-se estudar o equilíbrio entre fases de um sistema simples, para o caso das reações
estequiométricas, considerando-se o mesmo método do ponto anterior.
Conforme já foi visto, quando as fases do sistema estão em equilíbrio,
∆G = 0 .
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29
Aplicando-se esta condição às expressões (10.2) e (10.3) combinadas, obtém-se:
⎛ a A2 ⋅ PB2 ⎞
o
0 = ∆G + RT ln⎜ 2 ⎟
(10.4)
⎜ a AB ⎟
⎝
⎠
ou, genericamente,
∆G o = − RT ln (K ) .
(10.5)
Isto permite reescrever a equação (10.3) como:
∆G = − RT ln (K ) + RT ln (Q ) .
(10.6)
K é conhecido pelo nome de constante de equilíbrio e é adimensional. Seu valor é
idêntico à:
⎛ − ∆G o ⎞
⎟⎟ .
(10.7)
K = exp⎜⎜
⎝ RT ⎠
Observando-se a expressão (10.7), pode-se concluir que o valor de K de uma reação
estequiométrica será uma função apenas da temperatura!
O conhecimento do valor de K é importante, pois permite antever ‘para que lado’ o
equilíbrio da reação ‘se deslocará’. Se ‘para à direita’, ou ‘para à esquerda’ – denotando-se,
com isto, respectivamente, um favorecimento (no primeiro caso) ou não da conversão de
reagentes em produtos.
Além disso, para o exemplo dado, da comparação entre as equações (10.4) e (10.5),
pode-se escrever:
a A2 ⋅ PB2
.
K=
2
a AB
Não se trata mais, neste ponto, de atividades de fases numa situação qualquer, mas
daquelas no estado de equilíbrio. A equação, portanto, não tem por finalidade o cálculo do
valor de K, mas orienta-se justamente para o contrário, ou seja, empregar o valor de K na
determinação da atividade de algum dos reagentes ou produtos.
Para o caso do exemplo em estudo, onde as fases condensadas A e AB são ‘puras’,
pode-se substituir as suas atividades pelo valor da unidade 1. Restam, assim, apenas os termos
K = PB2 ,
e o valor de K refletirá aquele da pressão parcial2 do gás B2 em equilíbrio com as fases A e
AB.
10.4 Equação de van’t Hoff
A questão: “será uma dada reação estequiométrica endotérmica (ou exotérmica)?”
pode ser de grande importância para uma determinada aplicação tecnológica. Se o processo
decorre à pressão constante – como é comum –, a resposta será dada pela variação da entalpia.
Esse valor pode ser encontrado a partir da expressão (10.2) combinada com aquela da
variação da energia de Gibbs (6.1) (escrita para as condições do estado padrão):
∆H o − T∆S o = − RT ln (K ) .
Assim,
− ∆H o 1 ∆S o
ln (K ) =
+
.
R T
R
A partir dela, pode-se ver que:
1
2
O verdadeiro significado desta substituição será visto mais adiante.
Trata-se, estritamente, da atividade do gás B2.
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30
d ln (K ) − ∆H o
(10.8)
=
R
d1
T
– expressão que é conhecida pelo nome equação de van’t Hoff.
Assim, o valor da constante de equilíbrio expresso como uma função da temperatura
permite determinar se uma reação será endotérmica ou exotérmica.
10.5 Diagrama de Ellingham
Um diagrama que expõe o valor de ∆G° (em função da temperatura) de uma série de
reações entre um metais (entre outras substâncias) e um reagente comum a todas elas – como,
por exemplo, oxigênio, cloro, nitrogênio, enxôfre ou carbono – é conhecido pelo nome de
diagrama de Ellingham.
Tendo em vista que a energia de Gibbs é uma propriedade extensiva, para que se possa
ordenar as reações segundo o grau de afinidade do metal (ou substância) pelo reagente, é
necessário que o número de mols do reagente seja único para todas as reações – normalmente
normalizado em 1 [mol].
O diagrama de Ellingham mais conhecido é aquele que expõe a reação entre metais
(ou outras substâncias) e o oxigênio, genericamente:
x Me + O2 = x MeO .
Uma vez construído, o diagrama mostra uma série de linhas aproximadamente retas,
que podem ser interpretadas como sendo representações gráficas da expressão:
∆G o = ∆H o − T∆S o .
É importante ressaltar que o valor de ∆S° da reação se modificará caso a temperatura
ultrapasse um ponto de fusão (ou de outra transformação de fase) de qualquer um dos
reagentes ou produtos. Este fato provoca, no diagrama, a aparente ‘quebra’ da linha, na
temperatura da transformação, acentuando ou atenuando a sua inclinação.
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31
Equilíbrio termodinâmico,
sistema multicomponente
11.1 Equilíbrio entre fases do tipo composto, sistema multicomponente
Embora a determinação do estado de equilíbrio de um sistema com a ajuda das
equações derivadas das expressões das constantes de equilíbrio seja possível, infelizmente,
nem sempre apenas este conhecimento é suficiente1.
Duas situações simples podem ser lembradas para ilustrar esta afirmação. Na primeira
delas – a mais ‘natural’ –, o número de incógnitas supera o número de equações linearmente
independentes, desenvolvidas com base nas expressões das constantes de equilíbrio,
impossibilitando a resolução do sistema. Na segunda, o número de fases do tipo composto que
participam do estado de equilíbrio é muito elevado, violando a ‘regra das fases’ de Gibbs.
A primeira dessas situações é resolvida agregando-se às equações das constantes de
equilíbrio outras como, por exemplo, equações que descrevem a conservação da matéria – as
espécies atômicas que compõem o sistema. Depois dessa intervenção, o sistema de equações
pode ser solucionado. Um exemplo clássico é aquele onde o sistema tem uma única fase – a
gasosa – com um grande número de constituintes.
Especialmente para o segundo caso, pode-se adotar um esquema gráfico que se mostra
muito útil tanto na compreensão quanto na solução do problema.
Para demonstrá-lo pode-se imaginar um sistema binário com componentes A e B e as
seguintes fases, do tipo composto, candidatas a tomar parte do estado de equilíbrio: A, A3B,
AB e B2. Marca-se, inicialmente, ao longo de um eixo A-B, as posições correspondentes às
respectivas frações molares de A (ou, alternativamente, de B) de cada uma das fases,
Figura 11.1. Anotam-se, na seqüência, no eixo das ordenadas, os valores de G de cada uma
delas – na temperatura e pressão de interesse –, tomando-se o cuidado para que o sistema
contenha sempre, na soma dos seus componentes, exatamente um mol de matéria! Por fim,
deve-se unir com segmentos de retas os menores valores de G, de modo que a ‘envoltória
inferior’ seja delineada. Uma vez construído dentro destas diretrizes, o diagrama estará pronto
para ser utilizado.
Para uma dada composição, o sistema – no estado de equilíbrio – tanto pode ser
monofásico quanto multifásico. O valor de G de um sistema monofásico será sempre igual ao
valor de G da própria fase. No caso contrário, ele será dado pela média ponderada entre os
respectivos valores de G de cada uma das fases que o compõem (as fases presentes são
aquelas das extremidades do segmento de reta). Os pesos – proporcionais à quantia de cada
uma delas – serão proporcionais à proximidade (ou afastamento) entre o valor da composição
do sistema e a composição de cada uma das fases limítrofes.
1
De fato, nem mesmo a simples determinação da pressão da fase gasosa, mostrada anteriormente, poderia ter
sido feita sem outras considerações.
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Figura 11.1:
32
Diagrama esquemático mostrando o valor da energia de Gibbs, G,
(pontos negros) para as diferentes fases do sistema binário A-B e a
‘envoltória inferior’ – ou seja, o valor de G do sistema, em função da
fração molar dos componentes A e B, XA ou XB
Para o exemplo dado na Figura 11.1, um sistema multifásico com a fração molar de B,
XB, maior do que 0,25 e menor do que 1 será composto – no máximo – pelas fases: A3B e B2.
Este raciocínio segue estritamente os ensinamentos de Gibbs, que preconizou, para o
sistema no estado de equilíbrio, um valor mínimo para a função G – respeitando-se
concomitantemente a restrição dada pela conservação da matéria (no caso de sistemas
fechados). Vê-se, pela observação do diagrama, que o valor da função G do sistema, em
função da composição, sempre corresponderá ao mínimo ao longo dos segmentos de retas
traçados entre as fases A-A3B e A3B-B2. Assim, a fase AB não participará de nenhum dos
estados de equilíbrios do sistema.
Para sistemas de mais alta ordem (ternários, quaternários, etc.), vale o mesmo
raciocínio; contudo, a reta – no caso do sistema ternário – ‘transforma-se’ num plano, e,
assim por diante. Assim, infelizmente, nem sempre será possível representar graficamente os
sistemas de interesse.
11.2 Regra da alavanca (ou da balança)
A quantidade (ou fração) de cada uma das fases presentes no estado de equilíbrio,
como, por exemplo, das fases A3B e B2, pode ser determinada por meio do método
denominada regra da alavanca.
A regra da alavanca nada mais é do que a solução de um sistema composto por duas
equações. A primeira delas se refere ao simples fato de que a soma das frações molares1 das
fases em equilíbrio deve que ser igual à unidade. Para o caso de apenas duas fases, α e β, em
equilíbrio tem-se:
Xα + X β = 1
A outra equação se refere a um balanço de massa para um dos componentes do
sistema termodinâmico. Num sistema binário, para o caso do escolhido ser o componente A,
1
O mesmo raciocínio poderia ser feito com base na massa!
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33
ela é dada por:
X α ⋅ X A, α + X β ⋅ X A, β = X A
onde X C , ϕ é a fração molar do componente C na fase φ , para todas as fases em equilíbrio, e
X A é a fração molar do componente A no sistema.
Isolando-se a fração molar da fase α, tem-se:
Xα =
(X
A
− X A, β )
.
− X A, β )
Como as frações molares das duas fases somadas fornecem o valor da unidade, podese, com isto, calcular o valor de Xβ segundo:
(X
A, α
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12
34
Fases do tipo mistura
12.1 Definição de fase do tipo mistura
Mistura1 é uma porção de matéria consistindo de duas ou mais substâncias químicas
chamadas constituintes. O termo solução se aplica quando, por conveniência, um dos
constituintes (ou mais) é tratado de forma diferente, por causa da sua grande abundância: o
solvente – neste caso, os outros recebem o nome de solutos. Tanto mistura quanto solução
podem se referir a porções da matéria em qualquer um dos estados: sólido, líquido ou gasoso.
Os constituintes de uma mistura e os componentes de um sistema podem coincidir,
porém, nem sempre isso acontece, nem é necessário.
12.2 Componentes do sistema e constituintes de fases mistura
Pode-se confundir, sem prejuízo algum para o entendimento, os componentes do
sistema com os constituintes da fase gasosa quando se descreve o sistema monofásico ‘nãoreativo’ no qual os constituintes são simplesmente os gases (monoatômicos) nobres Ar e He.
Já com o sistema ‘não-reativo’ constituído pelos gases O2 e N2 há mais possibilidades
– e mais complexidade – na escolha de seus componentes. Seja O e N, ou o O2 e N2 (o último
conjunto é mais ‘natural’ embora não seja o de maior compatibilidade termodinâmica – como
será visto adiante).
O sistema ‘reativo’ constituído pelos gases CO, CO2 e O2 mostra um grau de
complexidade ainda maior. Os componentes mais simples para o sistema (ternário) são as
espécies químicas gasosas CO, CO2 e O2. Ele também pode ser descrito como sendo um
sistema binário. Neste caso, a escolha dos componentes pede maior atenção: as espécies
atômicas C e O constituem a escolha mais simples. Outra possibilidade reside nas espécies
químicas CO e O2 – mas não nos conjuntos O2 e CO2 ou CO e CO2. A menos do primeiro par
binário – as espécies atômicas C e O – todos os outros conjuntos de componentes do sistema –
incluindo o ternário – não têm a capacidade de representar simultaneamente outras fases
quaisquer.
Esta capacidade será fundamental para a determinação gráfica do estado de equilíbrio
termodinâmico multifásico de sistemas, especialmente daqueles que incluem fases do tipo
mistura2.
1
2
Ver http://www.iupac.org/goldbook/M03949.pdf e, também, http://...S05746.pdf
Esta condição, de fato, não é nova – já foi aplicada ao equilíbrio multifásico de compostos, Seção 11.
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35
12.3 Composição de uma fase do tipo mistura
A composição de uma mistura é dada pelo teor dos seus constituintes – que
normalmente são espécies atômicas ou químicas – em porcentagem ponderal, volumétrica ou,
então, atômica (que é idêntica à fração molar) – dependendo do caso em questão.
Uma mistura de gases ideais no estado de equilíbrio, em uma dada temperatura T e
pressão P, obedece à seguinte equação (lei de Dalton):
P = ∑ Pi ,
(12.1)
onde Pi é a pressão parcial de cada constituinte.
A fração molar, xi, de um constituinte i da fase gasosa – à semelhança de todas as
outras fases mistura – é dada por:
n
(12.2)
xi = i ,
nt
onde ni é igual ao número de mols da espécie química i, enquanto nt é igual ao número total
de mols da fase gasosa. Note que
∑ xi = 1 .
Para os gases ideais, a aplicação da equação de estado à equação (12.2) permite
escrever uma segunda expressão para a fração molar:
P
xi = i .
(12.3)
P
12.4 Mistura ideal ou ‘raoultiana’
À semelhança de um líquido puro, uma mistura líquida está em equilíbrio com seu
vapor.
Sobre uma mistura líquida ideal, a pressão parcial do constituinte i da atmosfera é
dada por
Pi = P º i ⋅ xi
(12.4)
onde xi é a fração molar do constituinte i no líquido e Pºi é a pressão de equilíbrio sobre o
líquido quando constituído apenas por i . A lei de Dalton fornece a pressão total.
A atividade do constituinte i da mistura líquida é dada por
P
ai = i
(12.5)
Pºi
Da comparação entre (12.4) e (12.5) vê-se que
ai = xi .
Esta proporção identifica a mistura ideal. Para poder contornar pequenos desvios da
idealidade, faz-se uso de um coeficiente de atividade, γ; assim,
ai = γ ⋅ xi
(12.6)
(vê-se logo que a mistura ideal é caracterizada pelo coeficiente angular igual à unidade).
Dá-se à atividade associada ao estado ideal o nome de raoultiana – em homenagem a
Raoult. A equação (12.6) é conhecida pelo nome de ‘lei de Raoult’.
O experimento de Raoult
François Marie Raoult observou experimentalmente, em 1886, que a pressão parcial de
equilíbrio do solvente de uma mistura líquida diminui na medida em que se adiciona um
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36
soluto a ele. Para uma mistura binária líquida entre A (solvente) e B (soluto), a equação que
descreve este comportamento pode ser escrita como:
PA = − PAo ⋅ xB + PAo ,
(12.7)
onde xB é igual à fração molar do soluto no líquido, e P°A é igual à pressão do gás (vapor) da
substância A na fase gasosa quando em equilíbrio com o solvente ‘puro’.
É fato que
xB = 1 − x A .
Substituindo-se esta expressão em (12.7), generalizando-a para um solvente i qualquer,
obtém-se a equação:
Pi = xi ⋅ Pi o .
(12.8)
Pode-se comprovar que, a lei de Raoult é válida quando as duas misturas se
comportam idealmente. Considera-se, inicialmente, uma mistura líquida binária formada
pelos constituintes A e B, onde a fração molar do componente A é xA.
O valor da energia de Gibbs de um constituinte i de uma mistura raoultiana – como
será visto adiante – tem a seguinte expressão:
(12.9)
Gi = Gio + RT ln xi ,
onde Gi° é a energia de Gibbs do componente i ‘puro’ (a referência ao componente ‘puro’
denota que este é o estado padrão da atividade) e xi é a sua fração molar na mistura.
Também será visto adiante, que o potencial químico do componente A (bem como o
de qualquer outro) tanto na mistura líquida quanto na gasosa (vapor em equilíbrio com a
mistura líquida), no estado de equilíbrio, deve ser o mesmo (único), isto é:
G A, l = G A, g .
(12.10)
Como a mistura líquida é ideal, pode-se escrever
GA,l = G Ao ,l + RT ln x A .
(12.11)
Da mesma forma, com base no pressuposto de que a fase gasosa tem o comportamento
de um gás ideal, pode-se escrever:
⎛P ⎞
(12.12)
G A, g = G Ao , g + RT ln⎜ Ao ⎟ ,
⎝P ⎠
onde PA é a pressão do vapor (pressão parcial) do componente A e P° é a pressão do estado
padrão – normalmente 1 [atm].
Combinando-se as equações (12.11) e (12.12), segundo (12.10), tem-se:
⎛P ⎞
(12.13)
G Ao ,l + RT ln x A = GAo , g + RT ln⎜ Ao ⎟ .
⎝P ⎠
Para o caso limite, quando o líquido for composto apenas pelo constituinte A (xA = 1),
a pressão no sistema será justamente a pressão do vapor em equilíbrio com o líquido puro,
PA°, de modo que
⎛ Po ⎞
(12.14)
G Ao ,l = GAo , g + RT ln⎜⎜ Ao ⎟⎟ .
⎝P ⎠
Subtraindo-se, da equação (12.13), a equação (12.14), obtém-se:
⎛ Po ⎞
⎛P ⎞
RT ln x A = RT ln⎜ Ao ⎟ − RT ln⎜⎜ Ao ⎟⎟
⎝P ⎠
⎝P ⎠
– donde se conclui que
⎛P ⎞
ln x A = ln⎜⎜ Ao ⎟⎟ .
⎝ PA ⎠
Logo,
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xA =
37
PA
PAo
ou
PA = x A ⋅ PAo
– que é a expressão (12.4) encontrada por Raoult em seus experimentos!
12.5 Composição da fase gasosa em equilíbrio com uma mistura líquida
Quando o valor da pressão de equilíbrio do vapor sobre duas substâncias ‘puras’
líquidas para uma série de temperaturas é conhecido – a partir de experimentos –, pode-se
calcular qual será a composição da atmosfera sobre uma mistura (caso ela exista) destas
substâncias, em qualquer uma daquelas temperaturas.
Pela justaposição das informações coletada em muitas temperaturas – na condição de
uma única pressão total – pode-se construir aquilo que se conhece por diagrama de equilíbrio
vapor-líquido, EVL. Se o valor da pressão total for 1 [atm], pode-se observar a temperatura
de ebulição da mistura em função da sua composição.
Este diagrama – independentemente da pressão total escolhida – dará informações
muito úteis para a realização de um processo de destilação.
12.6 Mistura não-ideal – lei de Henry
Muito freqüentemente, a concentração do soluto – ao contrário daquela do solvente –
tende a apresentar um forte desvio da lei de Raoult. Por causa disso, o coeficiente de atividade
não pode mais ser considerado apenas ‘uma correção’; recebe, então, um índice “o” e passa a
fazer parte da descrição da atividade de um par específico soluto-solvente:
ai = γ o ⋅ xi .
(12.15)
o
Nessa expressão, o coeficiente angular, γ – coeficiente de atividade raoultiana em diluição
infinita –, é o valor para o qual tende a atividade do soluto (lida na escala raoultiana da
atividade) quando a sua fração molar tender ao valor máximo (a unidade). O valor de γ°,
naturalmente, é sempre muito afastado da unidade.
A equação (12.15) é chamada ‘lei de Henry’. É um fato observado que, enquanto o
solvente tende a seguir a lei de Raoult, o soluto segue a lei de Henry.
O experimento de Henry
Ainda que, por razões didáticas, este tema seja apresentado somente após a descrição
da lei de Raoult, ele foi reconhecido antes, em 1803, por William Henry, quando fazia
experimentos sobre a quantidade de gases absorvidos pela água em diferentes temperaturas e
sob diferentes pressões.
Ao contrário de Raoult, Henry pesquisou o comportamento do soluto, i. Ele observou
que a seguinte relação entre a pressão do vapor e a fração molar de i na mistura líquida era
válida:
Pi = k H , xi ⋅ xi .
O valor de kH,xi , ao contrário da lei de Raoult, é diferente do valor de equilíbrio Pi° e
deve ser determinado experimentalmente a partir da solução – e não do líquido i ‘puro’ –
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38
muito embora o valor de kH,xi possa ser associado ao valor de Piº por intermédio da constante
γº:
k H , xi = Pi o ⋅ γ o .
Assim,
Pi = Pi o ⋅ γ o ⋅ xi
e, conforme a definição de atividade de um constituinte i de uma mistura líquida, equação
(12.5), é possível escrever:
ai = γ o ⋅ xi
– que é a expressão da lei de Henry.
12.7 Afastamento da linearidade
Seja na lei de Raoult, seja na Lei de Henry, pode-se chega-se a um ponto onde a
atividade e o teor de um soluto, i, não seguem mais um comportamento linear. Por causa
disso, o coeficiente de atividade não pode mais ser expresso por um valor único, mas sim
como uma função da composição (teor do soluto) da mistura,
γ i = f ( xi ) .
Este caso e outros, mais complexos, serão vistos adiante, na Seção de número 15.
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13
39
Aplicações da equação de
Gibbs-Duhem
13.1 A equação de Gibbs-Duhem
No equilíbrio termodinâmico, o estado de um sistema composto por C componentes
(como na regra das fases de Gibbs), n1, n2, n3,... nC, é definido por C + 2 variáveis: n1, n2,
n3,...nC, T, P (ou, alternativamente, V).
Qualquer propriedade de estado extensiva, X, do sistema pode ser expressa como uma
função delas:
X = f (n1 , n2 , n3 ,... nC , P, V ) .
Assim, matematicamente, a diferencial exata de X será dada por:
C
⎛ ∂X ⎞
⎛ ∂X ⎞
⎛ ∂X ⎞
⎟⎟
dX = ⎜
dP + ⎜
dT + ∑ ⎜⎜
d ni .
⎟
⎟
⎝ ∂P ⎠T , P , ni
⎝ ∂T ⎠ P ,V , ni
i =1 ⎝ ∂ni ⎠T , P , n
j
A diferencial exata da função de estado energia de Gibbs, para o caso de dois
componentes (sistema binário), A e B, à T e P constantes, se reduz à:
⎛ ∂G ⎞
⎛ ∂G ⎞
⎟⎟
⎟⎟
dB .
(13.1)
dA + ⎜⎜
dG = ⎜⎜
⎝ ∂nA ⎠T , P , B
⎝ ∂nB ⎠T , P , A
Como
⎛ ∂G ⎞
⎟⎟
≡ µi
dG = ⎜⎜
⎝ ∂ni ⎠T , P ,i
(também denominado potencial químico do componente i), pode-se reescrever a equação
(13.1), o que resulta em
dG = µ A dn A + µ B dnB .
(13.2)
Admitindo-se que, sob condições isotérmicas e isobáricas,
G = ∑ µi ni ,
sua diferencial exata será:
dG = µ A dn A + dµ A n A + µ B dnB + dµ B nB .
(13.3)
Da comparação entre (13.2) e (13.3), fica evidente que
0 = n A dµ A + n B dµ B
(13.4)
– que é uma das formas da equação de Gibbs-Duhem:
0 = ∑ ni dµi .
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40
13.2 Cálculo da atividade de A pelo conhecimento da atividade de B na mistura
Separando-se os termos referentes ao componente A daqueles referentes ao B, na
equação de Gibbs-Duhem, obtém-se:
n A dµ A = − n B dµ B .
(13.5)
Já foi visto que a energia de Gibbs de um gás ideal (puro) em função da pressão é dada
por:
⎛ P⎞
G = G o + RT ln⎜ o ⎟ .
⎝P ⎠
Por outro lado, a energia de Gibbs (energia de Gibbs parcial molar) de um constituinte
i de uma fase mistura gasosa é dada por:
⎛ P ⎞
Gi = Gio + RT ln⎜⎜ io ⎟⎟
⎝ Pi ⎠
ou,
Gi = Gio + RT ln ai .
– que também pode ser escrita como:
(13.6)
µi = µio + RT ln ai .
Sua diferencial exata é dada por:
dµi = RTd ln ai .
(13.7)
Substituindo-se a expressão (13.7) em (13.5) obtém-se:
n A d ln a A = −n B d ln a B .
Dividindo-se ambos os termos por nt – número total de mols – tem-se a equação em
função das fração molares de A e B:
x Ad ln a A = − xB d ln aB
(13.8)
e, isolando-se o termo que contém a atividade do componente A, chega-se em:
x
(13.9)
d ln a A = − B d ln aB .
xA
Integrando-se a equação (13.9) – desde que se saiba o valor de xA / aB em função de aB
– pode-se determinar o valor de aA. Normalmente a integração é realizada numericamente, por
isso não se busca uma expressão analítica para a função xA / aB.
Deve-se ressaltar que se a fração de um dos componentes é igual à unidade, a do outro
é igual à zero, e a integração fica prejudicada. Por exemplo, se xA = 1 (o que implica em
aA = 1), xB = 0 (e aB = 0). Neste ponto,
ln aB = ln 0 = −∞ .
Mesmo assim, a integração é efetuada entre os limites xA = 1 e xA – composição para a
qual se quer determinar aA :
x A →a A
x A → xB →aB
xB
∫x A =1→a A =1 d ln a A = −∫x A =1→ xB =0→aB =0 x A d ln aB .
Como, no limite inferior,
ln a A = ln 1 = 0
e, conforme já foi visto,
ln aB = ln 0 = −∞ ,
resulta que:
ln a B x
B
ln a A = − ∫
d ln aB .
−∞
xA
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Uma segunda – e menor – dificuldade, reside no fato de que, se xA = 0,
xB
=∞ .
xA
13.3 Cálculo do coeficiente de atividade de A pelo conhecimento do coeficiente de
atividade de B na mistura
Para soluções onde o coeficiente de atividade de B, γB, é conhecido, pode-se calcular o
coeficiente de atividade de A, γA .
Como a atividade de um constituinte i é igual à:
ai = γ i ⋅ xi ,
o valor do seu logaritmo será dado por:
ln ai = ln γ i + ln xi .
Assim sendo, a derivada do logaritmo da atividade pode ser escrito como:
d ln ai = d ln γ i + d ln xi .
Aplicando-se esta expressão aos constituintes A e B e, substituindo-se o resultado em
(13.8), tem-se
x A d ln γ A + x A d ln x A = − xB d ln γ B − xB d ln xi .
Lembrando que
du
d ln u =
,
u
pode-se escrever:
dx A
dx
x A d ln γ A + x A
= − xB d ln γ B − xB B
xA
xB
ou,
x A d ln γ A + d x A = − xB d ln γ B − d xB .
(13.10)
Como
x A + xB = 1 ,
d x A + d xB = 0 ,
e a expressão (13.10) assume a sua forma definitiva:
x A d ln γ A = − xB d ln γ B ,
ou seja,
x
(13.11)
d ln γ A = − B d ln γ B .
xA
A integração da equação (13.11) entre os limites xA = 1 e xA fornece o valor de γA –
uma vez conhecido o valor de γB – e, por conseguinte, uma segunda maneira de se determinar
o valor de aA conhecendo-se aB :
xA →γ A
x A → xB →γ B
x
∫x A =1→ γ A =1 d ln γ A = −∫x A =1→ xB =0→ γ B = γ oB xBA d ln γ B .
Como, no limite inferior,
ln γ A = ln 1 = 0
e, conforme já foi visto,
ln γ B = ln γ o ≠ 0 ,
resulta que:
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xB
d ln γ B .
(13.12)
− ln γ x
A
Esta integração tem a vantagem, sobre a expressão do cálculo de aA pelo valor de aB,
de poder ser feita desde um limite finito, ln γº, ao invés de partir de um valor ∞.
ln γ A = − ∫
ln γ
o
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14
43
Outros estados de referência
14.1 Estado padrão henriano ‘solução infinitamente diluída’
Pode-se expressar a atividade de um constituinte B de uma solução binária A-B
segundo vários estados de referência. Para o estado de referência ‘solução pura’ (raoultiana), a
expressão usada é a seguinte:
a B = γ ⋅ xB .
Para o estado de referência da ‘solução infinitamente diluída’ (o índice “H” denota o
comportamento henriano), a atividade é:
aBH = γ H ⋅ xB .
Atenção extra deve ser dispensada a essa atividade henriana (e ao seu coeficiente de
atividade) pois, quando a solução se comporta ‘idealmente’, isto é, quando
γH = 1 ,
aBH = xB .
Isto equivale a dizer que a atividade henriana não é lida na escala raoultiana da atividade!
A referência henriana não teria outro interesse – além do teórico – se não pudesse ser
relacionada à referência raoultiana.
Assim, considerando-se o caso em que xB → 0, ou seja,
γ = γo
e
γ H = 1,
tem-se:
a B = γ o ⋅ xB
e
aBH = xB .
O quociente entre as duas atividades será igual à
aB γ o
=
.
(14.1)
aBH
1
14.2 Valor da variação da energia de Gibbs de formação da ‘solução infinitamente
diluída’
O valor da energia de Gibbs do soluto B para o sistema de referência raoultiano é dado
por:
GB = GBo + RT ln (aB ) .
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Já para o sistema de referência henriano, é igual à:
GB = GBo( H ) + RT ln aBH ,
( )
ou seja, o valor da atividade de um constituinte de uma solução qualquer está
indissoluvelmente associado a um estado de referência! Mudando-se o estado de referência,
muda o valor da atividade. Desta forma, um dos valores compensa o outro, de tal modo que o
valor de GB sempre será o mesmo – independentemente do estado padrão escolhido.
Disso resulta, que a variação da energia de Gibbs de formação da solução com padrão
infinitamente diluído corresponde, na realidade, a uma mudança de estado de referência, e é
dada por:
GB = GBo( H ) + RT ln aBH = GBo + RT ln (aB )
( )
ou seja:
⎛a ⎞
(14.2)
GBo( H ) − GBo = RT ln⎜⎜ HB ⎟⎟ .
⎝ aB ⎠
Substituindo-se na equação (14.2) a expressão (14.1), tem-se:
∆G H = GBo( H ) − GBo = RT ln γ o .
( )
14.3 Estado padrão henriano ‘solução à 1%’
Na prática industrial, a concentração do soluto, na maioria das vezes, é dada em pontos
percentuais em massa como, por exemplo, o teor de carbono no aço líquido. Assim, duas
modificações foram introduzidas na lei de Henry para torná-la mais objetiva: a primeira diz
respeito ao uso da percentagem ponderal para denotar a concentração de qualquer soluto; a
segunda consiste na adoção do valor unitário para a atividade quando a concentração em
massa do soluto apresentar exatamente o valor de 1 por cento – por isso, ‘solução à 1%’. A
simbologia empregada para os componentes da equação da atividade é a seguinte:
hA = f ⋅ [ A] ,
(14.3)
onde hA é a atividade henryana, [A] é o valor do teor do soluto A na solução, dado em pontos
percentuais em massa, e f é o novo coeficiente de atividade.
14.4 Valor da variação da energia de Gibbs de formação da ‘solução à 1%’
Pode-se, novamente, expressar a atividade de um soluto B de uma solução binária A-B
segundo dois estados de referência: solução pura (raoultiano) e ‘solução à 1%’ (henriano):
a B = γ ⋅ xB
e
hB = f ⋅ [B ] .
Considerando-se o caso em que a solução obedece à lei de Henry,
γ = γo
e
f =1 ,
tem-se:
a B = γ o ⋅ xB
e
hB = [B ] .
O quociente entre as duas atividades é:
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a B γ o ⋅ xB
.
(14.4)
=
hB
[ B]
Vê-se que a mudança de escala, neste caso, é mais complexa que no anterior, pois
envolve também uma relação entre as concentrações do soluto – fração molar e teor em
massa.
A fração molar de B é dada por:
[ B]
MB
xB =
,
[ B] [ A]
+
MB MA
onde Mi é o valor da massa de um mol do constituinte i.
Multiplicando-se e dividindo-se a expressão anterior por MB e, como
[ A] + [ B] = 100 ,
obtém-se:
[ B]
xB =
.
MB
[ B ] + (100 − [ B]) ⋅
MA
Quando [B] → 0 (solução infinitamente diluída), essa relação pode ser simplificada
para:
[ B] M A
xB =
⋅
.
(14.5)
100 M B
Substituindo-se na equação (14.4) a expressão (14.5), tem-se:
aB
γo M A
=
⋅
.
(14.6)
hB 100 M B
O valor da energia de Gibbs do soluto B para o sistema de referência raoultiano é dado
por:
GB = GBo + RT ln (aB )
e, para o sistema de referência henriano com base na solução à 1%, é igual à
GB = GBo(1%) + RT ln (hB ) ,
– ou seja, aqui também o valor de GB permanece sempre o mesmo, independentemente do
estado padrão escolhido.
Portanto, a variação da energia de Gibbs de formação da solução à 1% também
corresponde a uma mudança de estado de referência, dada, neste caso, por:
GB = GBo(1%) + RT ln (hB ) = GBo + RT ln (aB )
ou,
⎛a ⎞
(14.7)
GBo(1%) − GBo = RT ln⎜⎜ B ⎟⎟ .
⎝ hB ⎠
Substituindo-se na equação (14.7) expressão (14.6), tem-se:
⎛ γo M A ⎞
⎟⎟ .
GBo(1%) − GBo = RT ln⎜⎜
⋅
⎝ 100 M B ⎠
Caso o solvente (A) seja o ferro, ela ganha a seguinte versão final:
⎛ γ o ⋅ 0,5585 ⎞
⎟⎟ .
(14.8)
∆Gi1% = Gio(1%) − Gio = RT ln⎜⎜
Mi
⎝
⎠
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46
Misturas com múltiplos solutos
15.1 Atividade de constituintes de soluções diluídas de vários solutos
Conforme sugerido na seção 12, se a atividade, ai, e o teor de um soluto, i, de uma
solução binária não seguem um comportamento linear, o coeficiente de atividade não pode ser
expresso por uma constante, mas deve ser tratado como uma função da composição (teor do
soluto) da mistura.
Para soluções onde o número de constituintes é maior do que dois, o coeficiente de
atividade do soluto i será função da sua própria concentração e da concentração dos demais
solutos:
γ i = f ( xi , x j , xk , ... xn ) .
Wagner1, em seus estudos com soluções diluídas, descreveu o logaritmo natural do
coeficiente de atividade do soluto i em uma solução de múltiplos solutos usando uma
expansão em série de Taylor com coeficientes de primeira ordem. Lupis and Elliott2
estenderam a idéia, introduzindo coeficientes de segunda ordem, de modo que a equação
assumiu a seguinte expressão final:
⎡ ∂ ln γ i
⎤
∂ ln γ i
∂ ln γ i
+ ...⎥ +
+ xk
+ xj
ln γ i = ln γ io + ⎢ xi
∂xk
∂x j
∂xi
⎣⎢
⎦⎥
⎡ 1 ∂ ln γ
⎤
∂ ln γ i
∂ ln γ i
+ ...⎥ ,
+ xi xk
+ ⎢ xi2 2 i + xi x j
(15.1)
∂xi ∂xk
∂xi ∂x j
∂ xi
⎣⎢ 2
⎦⎥
onde γi e γ°i são o coeficiente da atividade do soluto i em circunstâncias normais e em diluição
infinita, respectivamente, e xz representa a fração molar do elemento z.
Se as derivadas são tomadas para o caso limite de concentração de todos os solutos
tendendo a zero, pode-se definir o coeficiente de interação de primeira ordem do elemento j
sobre o elemento i como:
ε ij =
∂ ln γ i
∂x j
.
x j =0
Se os valores das concentrações dos solutos são suficientemente pequenos, os termos
contendo as derivadas segundas, e outras de mais alta ordem, podem ser eliminados.
Tomando-se isto em conta, substituindo-se os coeficientes de interação de primeira ordem nos
termos correspondentes da equação (15.1), para uma solução diluída com vários
componentes: 1, 2, 3, ... n, onde 1 representa o solvente, obtém-se:
1
2
C. Wagner, Thermodynamics of alloys, Addison-Wesley, Reading, Mass., 1952, p. 19-22
Lupis, C.H.P.; Elliott, J.F. Acta Metallurgica, 1966, vol.14 (4), p. 529-538
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ln γ 2 = ln γ o2 + x2ε 22 + x3ε 23 + x4ε 24 + ...
ln γ 3 = ln γ 3o + x2ε 32 + x3ε 33 + x4ε 34 + ...
...
Genericamente,
n
ln γ i = ln γ io + ∑ j = 2 ε ij x j ,
(15.2)
Wagner demonstrou que:
ε i j = ε ij ;
deste modo, alguns coeficientes de interação podem ser determinados a partir de outros,
oriundos de experimentos.
A aplicação desta idéia ao conceito de ‘solução à 1%’ resulta em:
∂ ln f i
eij =
∂[% j ] [% j ]=0
e,
ln f 2 = e22 [% 2] + e23 [% 3] + e24 [% 4] + ...
ln f 3 = e32 [% 2] + e33 [% 3] + e34 [% 4] + ...
...
Genericamente,
n
ln f i = ∑ j = 2 eij [% j ] .
(15.3)
Wagner também demonstrou que:
M
e ij = eij ⋅ j ,
(15.4)
Mi
onde Mj é a massa molar do elemento j e Mi é a massa molar do elemento i.
É possível converter os coeficientes de interação, de um sistema de referência para o
outro, com o uso da seguinte equação:
⎞
⎛M
⎜ [100 ⋅ ln (10)]⎟
⎠ ,
(15.5)
eij = ε i j ⋅ ⎝
Mj
onde M é a massa molar do solvente e Mj é a massa molar do elemento j. Para o ferro líquido,
ela vale:
0,24254
.
eij = ε i j ⋅
Mj
O formalismo de Wagner e a solução binária
O formalismo de Wagner pode descrever perfeitamente uma solução apenas binária.
Assim, para o caso da ‘solução à 1%’,
h2 1% = f 2 [% 2]
e,
ln f 2 = e22 [% 2] .
Enquanto a primeira equação garante apenas uma proporção direta entre a atividade e
a concentração do soluto, a segunda permite proporções não-lineares, Figura 15.1. Para isso, é
necessário que
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e22 ≠ 0 .
A Figura 15.1 mostra a atividade do constituinte “2” de uma solução binária, em
função do seu teor, quando o coeficiente de auto-interação e22 = 0,2 .
1.6
1.4
1.2
Atividade h 2
1
0.8
0.6
0.4
0.2
0
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
1.4
1.6
Teor do soluto 2 [%]
Fig. 15.1:
Relação entre a atividade h2 e o teor do soluto 2 de uma solução binária 1-2;
coeficiente de auto-interação e22 = 0,2
15.2 Atividade de constituintes de soluções concentradas de vários solutos
Outras aproximações – além daquela proposta por Wagner, em 1952, – foram
desenvolvidas para descrever a termodinâmica das soluções metálicas de forma a superar a
sua maior desvantagem, isto é, a inconsistência em soluções com concentrações moderadas de
solutos.
Pelton e Bale1 propuseram, em 1986, uma correção capaz de superar este obstáculo.
Por ser uma espécie de unificação de todas as teorias expostas até então, propuseram chamá-la
de ‘Formalismo Unificado do Parâmetro de Interação’ 2. Quando limitada aos coeficientes de
primeira ordem, pode ser expressa genericamente por:
n
ln γ i = ln γ io + ln γ solvente + ∑ j = 2 ε ij x j ,
e o coeficiente de atividade do solvente é dado por:
1 n
n
γ solvente = − ∑ j =1 ∑k =1 ε kj x j xk .
2
Os coeficientes de interação dos elementos em soluções metálicas, com base no
formalismo de Wagner, que foram acumulados gradualmente durante a metade do século
passado, constituem uma importante fonte de dados e não são perdidos com este novo
formalismo.
1
Pelton,A.D.; Bale,C.W. Metall. Trans. A, 1986, vol. 17A, p. 1211-1215
2
Na língua inglesa: Unified Interaction Parameter Formalism - UIPF
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16
49
Funções termodinâmicas de
fases do tipo mistura
16.1 Valor das funções termodinâmicas de fases mistura
Se os valores das funções termodinâmicas que descrevem as substâncias ‘puras’ são
relativamente bem conhecidos, e podem ser encontrados em publicações da área, isso não se
repete com as fases do tipo mistura. Essa dificuldade é facilmente explicada, e não reside na
medição experimental da propriedade – que é, em princípio, a mesma encontrada na medição
das propriedades de uma fase de composição fixa. O problema está justamente centrado no
fato de que estas fases não têm a composição fixa. Assim, mesmo com a temperatura e a
pressão constantes, haveria a necessidade de ‘infinitas’ medições para que uma determinada
propriedade fosse conhecida em toda a extensão da variável composição – ou seja, em ‘todas’
as composições possíveis da mistura.
Ao invés de se empregar este método, o problema foi resolvido de uma forma
diferente e engenhosa. A resolução fundamenta-se na determinação experimental dos valores
da função para todos os seus constituintes “puros” – muitas vezes já conhecidos –, combinada
com um esquema matemático de manipulação destes valores. O sistema é basicamente o
seguinte: em uma composição qualquer, de interesse, o valor da função é tomado inicialmente
como sendo igual à média ponderada dos valores da função para cada um dos seus
constituintes ‘puros’. Este valor pode ser uma aproximação grosseira. De posse de alguns
valores experimentais da função para a mistura, pode-se aproximar os valores teóricos dos
verdadeiros adicionam-se à equação resultante termos matemáticos que sejam capazes de
diminuir o afastamento entre os valores calculados e os valores obtidos experimentalmente.
Esta etapa é a mais importante e difícil, pois, além de ser experimental, deve ser capaz de
satisfazer, de uma forma simultânea, a todas as composições de interesse.
Quando a função for a energia de Gibbs, uma correção fundamental é possível, e deve
ser feita pela contabilização da variação da entropia decorrente da ação de se misturar os
constituintes entre si (veja tópico seguinte) – antes da correção com base nos valores
experimentais. A simplicidade desta idéia, contudo, é apenas aparente. Por exemplo: valores
experimentais de G de soluções metálicas intersticiais no estado sólido e de soluções salinas,
para serem descritos adequadamente, infelizmente, exigem esquemas matemáticos mais
complexos, e estão muito além do escopo deste texto.
16.2 Variação da entropia decorrente da ação de se misturar dois gases ideais
Uma análise da expressão da energia de Gibbs de uma mistura de gases ideais – que
poderá ser vista adiante – mostra que parte dela, surpreendentemente, é igual à variação da
entropia, ∆S, que se dá quando dois gases, A e B, em um único recipiente, mantidos separados
inicialmente apenas por um septo, se misturam ao ser retirada a barreira mecânica! Por este
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50
motivo, a determinação analítica desta variação será feita neste ponto, antecipando-se àquela
da determinação do valor de G da mistura.
Sabemos que o valor de ∆S numa transformação isotérmica depende do calor trocado
ao longo do processo, segundo:
q
∆S = rev. .
T
O valor da variação da entropia de um sistema gasoso unimolar pode ser calculado
facilmente substituindo-se, nesta expressão, o valor de qrev. trocado entre o sistema e a
vizinhança:
⎛V ⎞
(16.1)
∆S = R ln⎜⎜ 2 ⎟⎟ .
⎝ V1 ⎠
Conforme já mencionado, A e B são dois gases; A tem, inicialmente, um volume VA e
B, um volume VB . Considerando-se apenas o subsistema constituído pelo gás A, pode-se
admitir que o sistema tenha inicialmente o volume
V1 = VA .
Ao final, após a retirada do septo, o volume do subsistema será idêntico à
V2 = VA + VB .
Substituindo-se estas expressões em (16.1), tem-se:
⎛ V + VB ⎞
⎟⎟ ,
∆S A = R ln⎜⎜ A
⎝ VA ⎠
⎛ VA ⎞
⎟⎟ ,
∆S A = − R ln⎜⎜
⎝ VA + VB ⎠
ou
∆S A = − R ln (x A )
– que vem a ser a variação da entropia resultante da expansão de um mol do gás A.
Pode-se aplicar o mesmo raciocínio ao subsistema ‘gás B’.
A variação total será a soma das variações individuais. Como o sistema é unimolar,
cada uma das variações dos constituintes deverá ser ponderada pela sua fração molar no
sistema. Disso resulta que a variação total, para um mol da mistura, será:
∆S S = x A ⋅ ∆S A + xB ⋅ ∆S B .
Assim,
∆S S = − R ( x A ⋅ ln ( x A ) + xB ⋅ ln ( xB ))
– que é a variação que ocorre no valor da entropia quando há uma mudança de estado do
sistema, de dois gases separados por um septo (estado inicial), para uma mistura de dois
gases (estado final).
Genericamente,
(16.2)
∆S S = − R ∑ xi ln ( xi ) .
16.3 Energia de Gibbs de uma fase mistura de gases ideais
Já foi visto que G molar de um gás ideal ‘puro’ a uma determinada temperatura e
pressão pode ser calculada por meio da expressão
⎛ P ⎞
G = G o + RT ln⎜ o ⎟ .
⎝P ⎠
A composição de uma fase mistura de dois gases A e B pode ser dada pelas frações
molares xA e xB .
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51
Individualmente, suas energias de Gibbs serão:
o
GA = x AGA + RT x A ln ( x A )
e
GB = xB GB + RT xB ln (xB ) .
G molar da fase mistura pode ser expressa pela soma das expressões anteriores:
o
o
G m = x AG A + RT x A ln ( x A ) + xBGB + RT xB ln ( xB )
que, rearranjada, dá a expressão
o
o
G m = x AG A + xBGB + RT ( x A ln ( x A ) + xB ln ( xB ))
– ou, genericamente,
o
G m = ∑ xiGi + RT ∑ xi ln ( xi ) .
(16.3)
o
Associa-se, ao primeiro termo – conforme foi feito com o valor de G em função da
pressão –, a expressão ‘contribuição padrão’, e, ao segundo, a expressão ‘contribuição
entrópica’ – ou ‘ideal’.
Além disso, podem ser salientados, nessa equação, dois aspectos interessantes: o valor
da função G da fase mistura, numa isoterma, (i) é igual à média ponderada entre os valores
dos constituintes ‘puros’ da mistura (ii) subtraída do valor da variação da entropia (conforme
foi salientado anteriormente) decorrente da ação de se misturar os gases A e B multiplicada
pela temperatura, ou seja, subtraída de T·∆SS :
o
G m = ∑ xiGi − T∆S S .
(16.4)
16.4 Representação gráfica de funções termodinâmicas de fases mistura
Para a representação gráfica de funções termodinâmicas de fases mistura, é importante
ressaltar a necessidade de se revisar e entender perfeitamente o conceito de componente de
um sistema. Isso é importante, pois os valores das funções termodinâmicas do sistema são
mostrados como função da fração molar dos seus componentes – sejam eles espécies atômicas
ou espécies químicas.
16.5 Potencial químico e valor de G de uma fase mistura
Para uma solução ideal, o valor do potencial químico de um componente i, quando o
sistema é monofásico e a fase é do tipo mistura, é dado por:
µ i = µ io + RT ln xi .
Pode-se demonstrar, geometricamente, que, para um sistema binário A-B, o potencial
químico é igual à
dG
µ B = G + (1 − xB ) ⋅
.
d xB x
B
Geometricamente, também se pode escrever:
dG
µB − µA =
d xB x
B
e, uma vez que
x A + xB = 1 ,
então:
µ B = G + x A (µ B − µ A ) .
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52
A partir desta expressão pode-se calcular o valor de µA. Contudo, mais relevante é a
possibilidade de se determinar o valor de G a partir das expressões do potencial químico dos
componentes:
G = µ B − x A (µ B − µ A )
G = µ B + ( xB − 1) µ B + x A µ A
G = xB µ B + x A µ A .
Genericamente,
G = ∑ xiµ i .
Ou seja, o valor de G do sistema é obtido pela média ponderada entre os valores dos
potenciais químicos dos componentes do sistema.
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17
53
Equilíbrio com fases do tipo
mistura
17.1 Determinação do equilíbrio com representações gráficas de G em sistemas
multifásicos
Uma vez que a representação de várias fases – inclusive daquelas do tipo mistura –
num único eixo de componentes seja possível – normalmente pelo uso das espécies atômicas
– faz-se uso da condição indicada por Gibbs. Ela diz que, no equilíbrio termodinâmico, o
sistema é composto ou por uma única, ou por uma combinação de fases, tal que o valor de G
do sistema seja o mínimo (normalmente acrescida pela condição restritiva de conservação da
matéria).
Fig. 17.1 Curvas de energia de Gibbs das fases α e Líquida em função da composição, para
várias temperaturas, T1 até T5, diagramas (a) até (e), e diagrama de fases em
equilíbrio em função da temperatura e composição, (f), para o sistema A-B
Fonte: American Society for Minerals, Metals and Materials,
A Figura 17.1 mostra, de forma didática, o uso desta condição para várias
temperaturas, e o conseqüente diagrama de fases em função da temperatura, Fig. 17.1(f) daí
resultante.
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54
Quando há mais de uma fase tomando parte do equilíbrio, pode-se ver que o potencial
químico de cada um dos componentes é o mesmo em todas as fases:
µαA = µ βA = µ γA = µ δA ...
µαB = µ βB = µ γB = µ δB ...
Se o valor mínimo de G, para sistemas binários, é facilmente determinado
graficamente, para sistemas de mais alta ordem, ao contrário, ele se revela extremamente
complexo de ser obtido. Somente esquemas baseados na matemática conseguem determinar
estados de equilíbrio nessa ordem de complexidade.
Alguns casos – mesmo para sistemas binários – são mais difíceis de serem
determinados matematicamente como, por exemplo, quando a função G de uma determinada
fase condensada apresenta mais de um ponto de mínimo – ou seja, apresenta mínimos locais –
em função da composição.
17.2 Fases metaestáveis
Quando uma determinada fase presente no equilíbrio termodinâmico apresentar uma
resistência de natureza cinética elevada, capaz de impedir a sua nucleação, alguma outra (ou
outras), mais favorecida cineticamente, tomará o seu lugar. Este princípio é conhecido por
‘regra de Ostwald’.
Para adequar o estado de equilíbrio termodinâmico à realidade, pode-se suprimir a fase
estável, que terá o seu lugar tomado por uma ou mais fases – sendo então denominadas
metaestáveis.
17.3 Força motriz e atividade de uma fase
A atividade de uma fase qualquer do sistema, especialmente se ela não toma parte do
equilíbrio termodinâmico, pode ser determinada tomando-se em consideração o grau de
afastamento entre potenciais químicos.
Pode-se exemplificar isto para um sistema binário A-B, constituído pelas fases α, β e γ,
no qual apenas as fases α e β tomam parte do estado de equilíbrio.
Os potenciais químicos referidos anteriormente devem ser determinados em relação a
um mesmo componente do sistema como, por exemplo, o componente B. Além disso, a sua
determinação deve obedecer a uma restrição. No caso da fase γ, ela pode ser expressa pela
seguinte equação:
d Gγ
= µαB - µαA .
d xB
Para o estado de equilíbrio, sabe-se que
µαB = µ Bβ ,
e, que
µαB ≠ µ Bγ .
Define-se, então, força motriz da fase γ em relação à fase α, participante do estado de
equilíbrio1, com a ajuda da seguinte expressão:
µ Bγ − µαB = RT ln α γ .
A atividade da fase γ em relação à fase α pode ser calculada com a mesma expressão.
Embora calculada em relação à fase α, o resultado seria o mesmo, qualquer que fosse a fase tomada como
referência – contanto que ela estivesse tomando parte do estado de equilíbrio.
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Tanto a força motriz quanto a atividade dão a medida da ‘possibilidade de
participação’ da fase γ no equilíbrio em questão.
17.4 Equilíbrio condicionado pelo potencial químico
O estado de equilíbrio de um sistema com uma composição única pode ser
completamente distinto de outro, dependendo do fator que o está condicionando.
Normalmente o equilíbrio é condicionado pela quantidade de cada um dos
componentes do sistema nele contida. A grande maioria dos casos cai dentro desta classe.
Um segundo tipo de equilíbrio se dá quando este estado é condicionado pelo potencial
químico. Este é o caso de sistemas submetidos a uma fase gasosa sob uma pressão constante –
como, por exemplo, fases sólidas e líquidas expostas ao contato com o ar.
17.5 Coeficiente de partição de um soluto entre duas fases mistura
Havendo uma composição adequada, pode-se imaginar facilmente a coexistência de
duas fases mistura, α e β, no estado de equilíbrio de um sistema binário A-B.
A adição de um componente C, ao sistema inicial, não produzirá necessariamente
novas fases ao estado de equilíbrio. Pode acontecer que componente C simplesmente participe
das fases α e β, previamente existentes, em uma concentração baixa.
Com a ajuda deste exemplo, pode-se definir o coeficiente de partição como sendo o
quociente entre a atividade do componente C na fase mistura α e a atividade do componente C
na fase mistura β, no estado de equilíbrio.1
Esta definição, aparentemente simples, pode, em termos práticos, ser complicada pela
diferença na natureza das duas misturas. Um caso muito comum na pirometalurgia, por
exemplo, pode envolver as fases escória e banho metálico. A natureza de um banho é a de um
metal, enquanto que a da escória é a de uma solução parcialmente iônica, parcialmente
molecular.
1
Note que o estado de referência para cada uma das misturas, em relação ao componente C, pode não ser o
mesmo.
Termodinâmica para processos da pirometalurgia
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Termodinâmica para processos da pirometalurgia (Versão compacta)
Copyright © Nestor Cezar Heck
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Porto Alegre, outubro de 2007
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