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FIOS E TRAMAS: A INDÚSTRIA TÊXTIL EM MARIANA E OURO PRETO :: P ROGRAMA DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL :: TREM DA VALE
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
Introdução 8
Abreviaturas 12
I – Duas Fábricas
Companhia Industrial Ouropretana 16
Fiação e Tecelagem São José 46
II – A Alma do Negócio
O Trabalho 78
Trabalhadores 120
Anexos 145
Acervos pesquisados 161
sumári
Apresentação 4
apresentaçã
Uma das linhas mestras do Programa de Educação Patrimonial Trem da Vale é a valorização
da história de Mariana e Ouro Preto. Iniciativa da Fundação Vale, o Programa busca identificar, conhecer e dar a conhecer aspectos importantes e comuns à memória, à cultura e ao
patrimônio histórico das duas cidades mineiras.
Este livro trata de um desses aspectos – a experiência de moradores cuja vida esteve,
em parte, entrelaçada com as fábricas de tecidos que funcionaram em Mariana e Ouro
Preto no século XX, a Fiação e Tecelagem São José e a Companhia Industrial Ouropretana,
respectivamente.
Os moradores – 42 entrevistados pelo subprograma Vale Registrar – se dispuseram a contar e a compartilhar lembranças do tempo em que foram funcionários das duas empresas.
Esses depoimentos, disponíveis para consulta na Biblioteca Infanto-Juvenil da Estação Ferroviária de Mariana, formam a trama da história que ora se apresenta.
Uma história capaz de nos levar a uma época simultaneamente tão diferente – em termos
de mundo do trabalho, de sua dinâmica interna, cotidiano e costumes – e próxima a nós,
pois cada um sabe as linhas com que se cose.
Fundação Vale
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Educação Patrimonial – TREM DA VALE, dá a conhecer a história de duas antigas fábricas
de tecidos: a FIAÇÃO E TECELAGEM SÃO JOSÉ, em Mariana, e a COMPANHIA INDUSTRIAL OUROPRETANA, em Ouro Preto.
Extensa documentação institucional sustenta a origem, o desenvolvimento e o desfecho da
história dessas empresas; os interesses, sonhos e expectativas dos seus idealizadores e sucessores, desde as vicissitudes iniciais do pioneirismo, os momentos fecundos de êxito até a
crise que as inviabilizou e lhes determinou o fim. Servindo de marco histórico, conjunturas
econômicas e sociopolíticas desafiadoras balizaram, durante o século XX, a história de
nosso país, e suas repercussões locais pesaram, sem dúvida, na decisão de extinguir aquelas
companhias em ambos os municípios mineiros.
O estudo abrange depoimentos qualificados de ex-trabalhadores dessas indústrias, alguns
inclusive com vivências que remontam às suas origens, nas décadas iniciais do século passado. Os depoimentos constituem, por eles mesmos, uma revelação, dentre outros, de um
elemento-chave da educação patrimonial: o reconhecimento da própria história. Neles se
faz ouvir a voz antes emudecida no intenso processo produtivo e na disciplina inerente ao
trabalho. Aspectos pontuais vinculados às condições de trabalho são lembrados – o barulho excessivo das máquinas e as nuvens de poeira dos resíduos, por exemplo. E, em algum
momento, até mesmo a falta de dinheiro para tomar o trem para o trabalho e as peripécias
do trajeto cumprido a pé.
Por outro lado, não estão ausentes as recordações festivas: o Primeiro de Maio, de cunho
religioso e de festa, e as comemorações do Natal, com suas bonificações concedidas e
lembradas como gesto de boa vontade das empresas. Os depoentes expressam também
sentimentos de gratidão a quem lhes propiciou a oportunidade de garantir a subsistência
mediante o emprego de seu trabalho – identificado como seu único patrimônio –, o que
de certa forma amplia o sentido de patrimônio histórico, nele dando maior visibilidade à
categoria “Trabalho”.
Com esta nova iniciativa, a Fundação Vale confirma seu compromisso de restituir à memória dos habitantes de Ouro Preto e Mariana parcela importante de sua história. E, ao dotá-la
de realidade existencial contemporânea, espera que este ato cultural contribua para o
fortalecimento da solidariedade e da identidade social dessas simbólicas cidades de Minas.
Santa Rosa Bureau Cultural
Parceiro executor do Programa de Educação Patrimonial Trem da Vale
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Esta publicação, concebida e realizada pelo Núcleo de História Oral do Programa de
introduçã
Fios e Tramas: a indústria têxtil em Mariana e Ouro Preto surgiu a partir do acervo de entrevistas realizadas pelo Núcleo de História Oral do subprograma Vale Registrar/Programa de
Educação Patrimonial Trem da Vale, com funcionários remanescentes das antigas fábricas de
tecidos de Mariana e Ouro Preto – a Fiação e Tecelagem São José e a Companhia Industrial
Ouropretana, respectivamente. Parte da memória das duas cidades, as fábricas são sempre
lembradas por moradores mais antigos, pela importância que tiveram na vida econômica
municipal, nos períodos de sua existência.
Tais entrevistas formam o eixo “Tecelagem”, da tipologia “História Temática”, composta ainda
dos eixos “Ferrovia”, “Mineração” e, em fase de gravação, “Clubes Socioesportivos”.Também
integram a metodologia do Núcleo as entrevistas “Histórias de Vida”, de cunho mais amplo,
abordando questões relacionadas ao cotidiano dos dois municípios ao longo do século XX.
A proposta de trabalho sobre as fábricas de tecidos foi feita em 2008 (depoimentos) e
2010 (livro), pelo então supervisor do Vale Registrar Jason Barroso Santa Rosa, e o início
do processo de pesquisa, escolha de nomes e realização de entrevistas esteve a cargo da
assessora técnica à época, Elodia Honse Lebourg, do pesquisador Eder Donizete de Melo
e dos estagiários Bráulio Gomes Felisberto e Giovani Barbosa Prado. Entre 2008 e 2010, o
eixo “Tecelagem” contemplou 42 pessoas ao todo – 21 em Ouro Preto e 21 em Mariana –,
com entrevistas que duraram, em média, uma hora.
A escolha dos entrevistados, feita com base em intensa pesquisa prévia, inicialmente levou
em consideração a disponibilidade para conceder a entrevista e a facilidade para discorrer sobre o tema em questão. A isso foram acrescidos outros aspectos relacionados ao
objetivo de garantir equilíbrio entre os gêneros e à busca de possíveis entrevistados que
ocuparam funções diversificadas no universo das fábricas. Nessa perspectiva, procurou-se
entrevistar fiandeiras, tecelãs, funcionários administrativos, gerentes, contramestres, telefonistas, eletricistas e representantes sindicais, por exemplo.
A realização das entrevistas seguiu um roteiro geral com perguntas sobre o funcionamento
da unidade fabril e a atividade (ou atividades) que o(a) entrevistado(a) exerceu. Quando
necessário, foram elaborados sub-roteiros que permitissem a exploração de áreas ou
facetas específicas de cada uma das duas fábricas. Foi o caso, por exemplo, dos sub-roteiros
sobre energia elétrica e telefonia, áreas que extrapolavam o mundo da produção dos
tecidos e colocavam as fábricas como fornecedoras de serviços às cidades.
Todas as entrevistas passaram pelo processamento técnico adotado no Núcleo de História
Oral, que consta das seguintes etapas: transcrição; conferência de fidelidade; pesquisa para
notas de rodapé; copidesque. Ao mesmo tempo, suas gravações foram devidamente armazenadas pelo Núcleo de Audiovisual do Vale Registrar, que também é responsável pela
cópia de cada uma delas em DVD, entregue aos entrevistados em um encontro promovido
ao término de cada ano trabalhado. Nesse mesmo encontro, as entrevistas processadas e
as gravações são incorporadas ao acervo da Biblioteca da Estação de Mariana, onde ficam
disponíveis para consulta.
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Seguindo os fios estabelecidos pelos entrevistados na relação entre lembrança e esquecimento, em cada reelaboração do passado no presente, a pesquisa abarcou outros documentos que pudessem ampliar, corroborar, esclarecer, relativizar aspectos e informações
sobre a história das duas fábricas.
Em parte, esses documentos são de cunho privado. De maneira geral, a preservação desse
tipo de documentação é ainda incipiente no Brasil. Na grande maioria dos casos, os atores/
produtores desses documentos os descartam assim que sua função cotidiana é cumprida,
sem atentar para a possibilidade de seu uso histórico, como testemunho de uma época, de
um fazer, de um viver. Com isso, perdem a memória e a história do país.
Quando preservados, o pesquisador muitas vezes ainda se depara com dois problemas:
saber se o acesso a esses documentos é franqueado e se sua preservação incluiu sua organização para consulta. Como são de natureza privada, o acesso depende de autorização
dos proprietários, o que nem sempre é fácil: desconfiança ou apego excessivo são entraves
sempre presentes na vida do pesquisador. De outro lado, às vezes o acesso é facilitado, mas
as condições para a pesquisa se mostram inadequadas: se um conjunto de centenas de documentos não apresentar uma mínima organização, é quase como se esse acervo não existisse, porque isso impede a busca e localização das informações desejadas em tempo hábil.
No caso do trabalho que ora se apresenta, a equipe pôde contar com a sensibilidade e senso
público dos administradores da Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense (à qual a
Companhia Industrial Ouropretana foi incorporada). Aqui agradecemos, em especial, a Luiz
Rogério Mitraud de Castro Leite, José Carlos Magalhães Motta e Patrícia Gonçalves Nogueira,
que, numa atitude rara, não apenas franquearam o acesso à documentação como permitiram
seu deslocamento até a Estação Ferroviária de Mariana, viabilizando a pesquisa dentro dos
prazos e metas estabelecidos pelo Programa. Assim, atas de instalação, de assembleias gerais,
de reuniões de diretoria, folhas de pagamentos, listagens de maquinários e equipamentos, relação de acionistas, entre outros, puderam ser consultadas. No que diz respeito à fábrica São
José, o caminho que se impôs para a obtenção de dados semelhantes foi o da consulta aos
documentos arquivados na Junta Comercial do Estado de Minas Gerais (Jucemg).
Outro acervo particular de fundamental importância para este trabalho é o de propriedade do professor Rafael Arcanjo dos Santos, composto de jornais marianenses do século
XX. Apesar de não possuir toda a seriação, essa coleção tornou-se fonte única, pois os
exemplares não podem ser encontrados em nenhum outro local. A consulta a esse acervo
forneceu preciosas informações sobre os primórdios da fábrica de tecidos São José e a
maneira como sua instalação foi vista nos meios de comunicação locais.
Simultaneamente, jornais de abrangência estadual e municipal (no caso de Ouro Preto),
anuários e almanaques com informações a respeito de atividades econômicas dos municípios foram consultados em instituições públicas estaduais e municipais. Ainda no que se
refere a periódicos, os pesquisadores foram gentilmente recebidos pela Associação Comercial de Minas Gerais (ACMG) e pelo Centro de Memória do Sistema Federação das
Indústrias do Estado de Minas Gerais (CMSFiemg) para consulta às revistas especializadas
de ambas as entidades.
Sobre o processo de instalação das fábricas, outros documentos também foram pesquisados: as atas das câmaras municipais, relatórios da Presidência da Província e do Estado, livros
de foros e de contratos (para o caso da concessão de energia elétrica e telefonia).
Dessa massa documental Fios e Tramas foi urdido. O livro é dividido em duas par tes.
A primeira – Duas Fábricas – compõe-se de dois capítulos, cada um deles dedicado a uma
das fábricas. Neles são apresentadas, com maior ênfase, as informações históricas sobre a
gênese e o fechamento das indústrias, entremeadas, quando possível, de depoimentos dos
entrevistados do Vale Registrar.
A segunda parte – A Alma do Negócio – também abrange dois capítulos: “O Trabalho” e “Trabalhadores”. Em “O Trabalho”, o processo de produção, as funções, os equipamentos, produtos
e relações sociais, entre outros aspectos, desvelam-se diretamente da voz dos agentes dessa
história e conduzem toda a narrativa, agora não mais seccionada em duas fábricas, mas como
experiências de vida que apresentam semelhanças. Assim, ao longo do texto, revezam-se as
falas de entrevistados de Mariana e Ouro Preto; quando há diferença, ela é indicada.
O último capítulo, “Trabalhadores”, é composto de trechos das entrevistas concedidas ao Vale
Registrar, os quais acrescentam informações ou temas que não couberam nos capítulos anteriores, mas igualmente revelam situações e acontecimentos que, de maneira variada, insistem
na memória de cada funcionário, seja por que motivo for. Aqui, nossos entrevistados mostram
seus rostos e permanecem de forma duradoura na história que ajudaram a construir.
É importante ressaltar que a equipe fez algumas escolhas. A primeira: optou por manter
as citações de documentos escritos com a grafia e a pontuação da época em que foram
produzidos. No que tange às citações de trechos das falas dos entrevistados, e como adotado metodologicamente pelo Núcleo de História Oral, elas nem sempre estão de acordo
com a norma culta da língua, para permanecerem o mais próximo possível do registro da
oralidade. A segunda: como esta não é uma obra de cunho acadêmico, indicaram-se apenas
os documentos efetivamente usados na construção do texto, em notas de referência.
Com isso, o Programa de Educação Patrimonial Trem da Vale cumpre mais uma tarefa no sentido de contribuir para a preservação do patrimônio cultural de Mariana e Ouro Preto, disponibilizando uma das várias e possíveis tramas que estes fios de lembranças podem conter.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Diante da importância das informações obtidas e do significado histórico, cultural e afetivo
que a memória das fábricas ainda traz consigo para Mariana e Ouro Preto, o Programa de
Educação Patrimonial Trem da Vale, por intermédio dos historiadores do Núcleo de História Oral, também chamou a si a tarefa de valorizar e difundir essas informações. Nessa
perspectiva, são os primeiros pesquisadores a se debruçar sobre tais fontes para delas produzir conhecimento organizado e acessível, especialmente à população das duas cidades.
Companhia industrial ouropretana
abreviatura
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ACMG - Associação Comercial de Minas Gerais
AEAM - Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana
AGPM - Arquivo Geral da Prefeitura de Mariana
AHCMM - Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Mariana
AIMFCII - Acervo Institucional da Massa Falida da Companhia
Industrial Itaunense
APMOP - Arquivo Público Municipal de Ouro Preto
CMSFiemg - Centro de Memória do Sistema Federação
das Indústrias do Estado de Minas Gerais
Jucemg - Junta Comercial do Estado de Minas Gerais
uas Fábrica
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Companhia Industrial
Ouropretana
RU AS
Na origem, Ouro Preto foi ouro, barroco e rococó. Em torno deles, imagens da cidade e de
seus habitantes foram construídas e reinterpretadas ao sabor de circunstâncias e sujeitos
históricos.
A “gente intratável” da terra, como falou certa vez o conde de Assumar, representante da
Coroa Portuguesa na capitania das Minas Gerais1, ainda haveria de esperar bem mais de
um século para merecer o reconhecimento como baluarte da liberdade – o nome de uma
praça e de um dia para Tiradentes, uma rua para Felipe dos Santos, padre Rolim e Chico Rei.
A rua do Aleijadinho, parece, sempre inconteste, seja quando os edifícios da cidade foram
vistos como destituídos de nobreza2, seja quando, na visita de 1924, Mário e Oswald de
Andrade e Tarsila do Amaral tomaram a cidade como preciosidade histórica.
Entre a origem e o título de Monumento Nacional, declarado em 1933, Ouro Preto abrigou o projeto modernizante da Escola de Minas, berço da formação técnica de engenheiros
que deveriam identificar as jazidas minerais em todo o território nacional e traçar linhas
políticas de atuação. Para seu fundador, a rua Henri Gorceix.
Todavia, houve quem buscasse na cidade a riqueza e a modernização por caminhos distantes de ouro e jazidas, nem sempre retilíneos, nem sempre previsíveis. Dessa iniciativa, surgiu
o nome da rua de um comendador, um coronel, um jornalista.
1. DISCURSO histórico e político sobre a sublevação que nas Minas houve no ano de 1720. Belo Horizonte: Fundação João
Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994. p. 59. (Col. Mineiriana, Série Clássicos).
2. TEIXEIRA COELHO, José João. Instrução para o governo da capitania de Minas Gerais; [1780]. Belo Horizonte: Fundação João
Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994. p. 61. (Col. Mineiriana, Série Clássicos).
Com “palavras repassadas de saudade”, um ano após o falecimento do comendador Victorino Antônio Dias seus companheiros de negócios se lembraram dele e pediram que
se lançasse em ata “uma lagrima pela morte de nosso saudoso diretor-gerente”, que seu
retrato a óleo fosse afixado na sala de sessões solenes da sede da empresa e que se erigisse
um busto na entrada do edifício da fábrica3.
O comendador falecera em 1930, ano de reviravoltas políticas no país, com a chegada de
Getúlio Vargas ao poder, e da crise econômica mundial, com a quebra da Bolsa de Nova
York e seus desdobramentos. Mal teve tempo de viver tudo isso, não se regozijou nem
sofreu com tais mudanças. Ali se encerrava sua destacada atuação em alguns empreendimentos em Ouro Preto, dentre eles a fábrica de tecidos.
A ideia de instalar uma indústria têxtil na cidade não fora dele, tampouco a incumbência
de encontrar o terreno no lugar certo e aforá-lo, erguer as paredes do edifício, formar o
capital social necessário, adquirir máquinas, contratar funcionários e dar início à produção.
Victorino Dias assumiu o negócio em 1912, quando tudo isso e mais alguma coisa já estavam resolvidos, bem ou mal resolvidos.
Sua casa foi o local escolhido para a reunião de maio, cujo objetivo era constituir a sociedade anônima incorporadora da fábrica. Como as conversações e os arranjos já haviam sido
realizados, o encontro foi profícuo.
Até então mais conhecida como fábrica de tecidos do Tombadouro – região onde está
ainda hoje a cachoeira do Tombadouro –, o nome do negócio foi oficializado como Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy4. O laudo de avaliação da fábrica e suas dependências,
“com todas as machinas existentes, acessórios, installações de força e agua potavel, casas
e terrenos descriptos na escriptura de compra”, registrava o valor de 370 contos de réis5;
acrescentaram-se 50 contos para “capital de gyro commercial, despezas de installação etc.”6,
e o capital social foi fixado em 420 contos de réis, dividido em 2.100 ações do valor nominal de 200 mil réis cada7. Em que pese o fato de a soma das ações não corresponder ao
número citado no documento, compunham o quadro de acionistas:
3. AIMFCII. Ata de 30 de março de 1931. In: Livro de actas das Assembleas Geraes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy
Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30 maio 1941. f. 28v.
4. AIMFCII. Ata de 12 de maio de 1912. In: Idem. f. 1-1v; AIMFCII. Estatutos sociaes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy;
15 maio 1912. In: Idem. f. 4.
5. Em novembro de 1912, esse valor foi assim detalhado: “immoveis 7:500$000; edificio da Fabrica e suas dependencias
80:000$000; machinas existentes 236:000$000; ferramentas 482$500; moveis e utensilios 385:000; agua potavel 4500$000;
installação de força 37:842$000 e mercadorias existentes 3:290$500.” Cf.: AIMFCII. Ata de 18 de novembro de 1912. In: Idem. f. 2v.
6. AIMFCII. Ata de 15 de maio de 1912. In: Idem. f. 1v-2v.
7. AIMFCII. Ata de 12 de junho de 1912. In: Idem. f. 2v-3v.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
UM NOVO NEGÓC IO
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NÚMERO DE AÇÕES
Comendador Victorino Antônio Dias
707
Major Raymundo Guido de Andrade
419
Burlamaqui, Mattos & Cia.
299
José Honório Mourão
251
Coronel Antônio Augusto de Oliveira
150
Randolfo Rodrigues Trindade
40
José Mendes de Magalhães
50
Clodomiro Augusto de Oliveira
25
Coronel Joaquim Severiano de Carvalho
25
Manoel Fiúza da Rocha Sobrinho
25
Joaquim Affonso Painhas
25
Bernardino de Oliveira Gomes
15
Marciano Pereira Ribeiro
10
Affonso Peixoto
Total
nossa fabrica ainda não sahiu do período de organização”10. A compra de matéria-prima,
feita “a dinheiro á vista”, e a exiguidade de capital de giro levavam Victorino Dias a se
prontificar “a supprir a sociedade das importancias necessarias, em conta corrente, á taxa
de seis por cento (6%) ao anno”11. E não houve como demover o diretor-presidente Clodomiro Augusto de Oliveira de seu propósito de renunciar ao cargo, alegando “falta de
conhecimentos especiaes da industria que estamos explorando”, alegação essa, completou
Victorino Dias, “certamente muito sincera, mas, que podia ser feita pela quase totalidade
dos nossos consocios, inclusive pelo diretor-gerente”12.
A P A C IÊ NCIA DE DOM S ILVÉR IO
A fábrica adquirida por Victorino Dias e seus sócios esteve nas mãos da Arquidiocese de
Mariana, representada por Dom Silvério Gomes Pimenta, durante cerca de 12 anos.
A transmissão da propriedade da empresa para o prelado, ao custo de 150 contos de réis,
foi feita por volta de 1899-1900, e a escritura pública, lavrada em 190113.
Nela, constam como outorgantes vendedores Santos, Irmão Rezende e Companhia, residentes em Ouro Preto, naquele ato representados pelo sócio-gerente doutor Gabriel de
Oliveira Santos. Dom Silvério é o outorgado comprador da fábrica de tecidos
5
denominada do Tombador e também conhecida por Itacolomy [...] com todos os
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seus machinismos de fiação, tecelagem, engomação de fio, tinturaria, officinas mechanicas de reparos, montados todos os machinismos [...] e assentes em um predio todo
construido de pedra, cal e cimento, cobrindo uma superficie de mil novecentos e vinte e quatro metros quadrados, com as paredes exteriores de cincoenta centimetros
Dentre os sócios proprietários foram escolhidos os membros efetivos e suplentes do conselho fiscal, bem como aqueles que deveriam ocupar a diretoria pelos três anos seguintes,
como definido em estatuto: Victorino Antônio Dias, diretor-gerente-tesoureiro; Clodomiro
Augusto de Oliveira, diretor-presidente; Raymundo Guido de Andrade, presidente da Assembleia Geral dos acionistas8.
O ano subsequente à reunião de maio de 1912 parece ter sido de adaptações dos acionistas ao novo negócio. Assim, por exemplo, em junho “sobrelevava a defficuldade de obter
pessoal devidamente habilitado, principalmente para a secção de tecelagem”9; em dezembro se afirmava a “inutilidade de um balanço na presente ephoca em que, infelizmente a
8. Idem. Ibidem.
9. AIMFCII. Ata de 13 de junho de 1912. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 jun. 1912-18 fev. 1928. f. 1.
de espessura, construido em blocos de calcareo de primeira rejuntados a cimento,
superestrutura toda de ferro em forma de dente de serra e coberta de telha francesa,
casa para operarios, situadas proximas a fabrica e respectivos terrenos [...]14
10. AIMFCII. Ata de 30 de dezembro de 1912. In: Idem. f. 2v.
11. AIMFCII. Ata de 30 de março de 1913. In: Livro de actas das Assembleas Geraes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy
Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30 maio 1941. f. 9.
12. AIMFCII. Ata de 12 de outubro de 1912. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 jun. 1912-18 fev. 1928. f. 2. Clodomiro Augusto de Oliveira torna-se membro do conselho fiscal, assumindo a
vaga deixada pelo acionista Marciano Pereira Ribeiro, que havia falecido. Raymundo Guido de Andrade assume a presidência
da fábrica e Desidério Gonçalves de Mattos torna-se o presidente da Assembleia Geral. Cf.: AIMFCII. Ata de 30 de março de
1913. In: Livro de actas das Assembleas Geraes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30
maio 1941. f. 9.
13. AIMFCII. Traslado de uma escriptura de compra e venda da fabrica do Tombadouro em Ouro Preto comprada pelo Exmo. Snr.
Dom Silverio Gomes Pimenta pelo preço e quantia de RS (150:000$000), Marianna, Cartorio do Primeiro Oficio, 07 mar. 1901. 5f.
14. Idem. Ibidem.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
ACIONISTAS
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1) “Somos informados de que no dia 12 do corrente será installada na Côrte esta
companhia, cujo fim é estabelecer nesta capital uma fabrica de tecidos de algodão.
São seus directores os Srs. Dr. Luiz de Carvalho e Mello, Augusto C. Grey
­Tavares e João Kastrup.
Acha-se encarregado da construcção das obras o Sr. engenheiro civil Henrique
de Oliveira Amaral.” (COMPANHIA Industrial de Ouro Preto. A Provincia de
Minas, Ouro Preto, 11 set. 1889. Gazetilha, p. 2.)
2) “A Companhia Industrial de Ouro Preto, por seo Director Presidente abaixo
assignado, precisando construir nos terrenos denominados – Cachoeira do Tombadouro, na freguesia de Antonio Dias, uma fabrica de fiação e tecelagem de algodão,
vem respeitosamente pedir a esta Camara Municipal que se digne conceder-lhe por
aforamento os referidos terrenos, á margem esquerda do Rio Funil, na extensão de
150 metros de frente, sendo nos terrenos altos de 100 metros de frente por 150
de fundo, e na parte baixa de 50 metros de frente por 40 de fundo; outrosim, pede
á mesma Camara o uso das aguas do mencionado rio Funil e da cachoeira situada
no mesmo local. Ouro Preto, 9 de outubro de 1889. L. de Carvalho Mello. Dir.
Presidente.” (APMOP. Aforamento de 45 braças de terreno sito no Tombadouro para
instalação de industria de tecelagem por José de Mello Freitas, contestado pelo foreiro
João Ferreira de Ulhôa Cintra; 1887-1889 (processo). (28 docs. avulsos não catal.)
3) “Um dos grandes melhoramentos prestados a esta capital é a fabrica de fiação e tecelagem que está sendo montada, no lugar denominado Tombadouro,
pela Companhia Industrial de Ouro Preto.
Página inicial do extrato para transação da “Fabrica de Tecidos do Tombadouro,
tambem conhecida por Itacolomy”, datado de 11 de fevereiro de 1907.
Acervo Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense. Foto equipe Vale Registrar.
Quem conhece as vantagens que auferem as fabricas de algodão em Minas Geraes não deixará de applaudir e de animar esta industria, louvando os esforços
empregados por aquella Companhia em favor do progresso de Ouro Preto.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Assim, antes de Victorino Dias, antes de Dom Silvério, a fábrica pertencia a uma firma.
O material a que se teve acesso permite dizer que essa firma foi sua proprietária por
um curto período e que adquiriu o negócio das mãos de outra empresa. Não é o nome
Santos, Irmão Rezende e Companhia que aparece em documentos e jornais de 1889 a
1893, dando conta de alguns aspectos do empreendimento, inclusive a energia elétrica para
movimentar os motores e ainda iluminar a própria cidade. Mas sim o nome Companhia
Industrial de Ouro Preto, sediada no Rio de Janeiro, dirigida por Luiz de Carvalho e Mello,
João Kastrup e Augusto Carlos Grey Tavares.
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Em breve, em julho do corrente anno, terá lugar a inauguração da fabrica, a qual
será servida de machinismos modernos e aperfeiçoados.
É nosso intento, com esta noticia, felicitar a directoria da Companhia e chamar
a attenção do povo ouro-pretano para o real serviço que a esta cidade está
prestando a mesma Companhia.” (A COMPANHIA Industrial de Ouro Preto.
Correio da Noite, Ouro Preto, 07 mar. 1890. p. 2.)
4) “Pelo representante da companhia industrial de Ouro Preto, sr. dr. Grey
­Tavares, vai ser assingnado o contracto para iluminação da capital á luz electrica.
A cachoeira do – Tombadouro – formada pelas aguas do corrego – Itacolomy –
confluente do – Ribeirão do Funil –, será aproveitada como motor para os machinismos.” (ILLUMINACÇÃO da capital. O Itacolomy, Ouro Preto, 10 out. 1890. p. 1.)
5) “A Companhia Industrial de Ouro Preto acaba de montar uma linha telephonica entre o seu escriptorio, à rua S. José 25, e a sua fabrica de fiação e tecelagem
de algodão, nesta capital.” (O MOVIMENTO. Ouro Preto, 24 mar. 1891. p. 2.)
6) “S. exc. o senador Gama Cerqueira, vice-presidente do Estado, acompanhado do sr. dr. Theophilo Ribeiro, director da secretaria do interior e de outros
cavalheiros visitou este importante estabelecimento industrial.
S. exc. e comitiva foram recebidos pelo director gerente, engenheiro Grey
­Tavares e pessoal technico do estabelecimento com todas as deferencias.
Depois de haver percorrido todas as dependencias da fabrica e assistido ao
funcionamento de todos os apparelhos por habilissimos operarios e operarias
foi lhe offerecido e a sua comitiva pelo engenheiro Tavares, em esplendido pic
nic, durante o qual manifestaram-se os convivas as mais significativas provas de
enthusiasmo pela maneira brilhante com que a companhia industrial de Ouro
Preto, procurou montar um estabelecimento modelo, aparelhado para competir com os seus congeneres europeus.
O sr. vice-presidente e comitiva regressaram á cidade as 3 horas da tarde, trasendo todos a grata recordação dos obsequios que receberam do engenheiro
Grey Tavares e pessoal da fabrica.” (FABRICA de tecidos do Tombadouro.
O Estado de Minas, Ouro Preto, 24 fev. 1892. Noticiario. p. 1.)
7) “Aos dezoito dias do mez de junho de mil oitocentos e noventa e três, no
paço municipal, entre os abaixo assignados, directores da Companhia Industrial de
Ouro Preto, e o Dr. Agente executivo da camara, ficaram definitivamente contractadas as estipulações do teor seguinte, adoptadas em sessão de doze de junho
proximo findo, relativamente ao serviço da illuminação electrica d’esta capital.
Primeira: A Companhia Industrial de Ouro Preto fica no direito de fazer passar
em qualquer das ruas, praças, caminhos e outras vias de comunicação, cabos,
fios aereos ou subterraneos, bem como supportes, apparelhos e acessorios
destinados ao transporte de fluido ou corrente electrica para a illuminação.
Segunda: O presente contracto subsistirá por vinte e cinco annos, durante os
quaes a companhia será obrigada a ministrar a cidade, pelos preços sob as
condições ora indicadas, a luz necessaria para a illuminação das ruas, praças
e vias de comunicação e assim tambem para os estabelecimentos publicos e
particulares da mesma cidade. [...]” (APMOP. Termo de contrato para a illuminação electrica da cidade; 17 jun. 1893. In: Livro de Registro de Contratos de
Arrematações; 1887-1896. f. 67v.-73.)
Não foi possível precisar como se deu o processo de transferência dos negócios da Companhia Industrial de Ouro Preto – fábrica e serviço de iluminação – para Santos, Irmão
Rezende e Cia. Mas, por uma notícia de jornal de outubro de 1896, sabe-se que
os Srs. Santos, Irmão Rezende e Cia., proprietarios da Fabrica Itacolomy, situada no
Tombadouro, bairro desta capital, têm grande variedade de tecidos de algodão, de
cor, trançados e lisos. Chamamos a attenção dos srs. negociantes para ás producções
daquelle estabelecimento industrial de primeira ordem15.
Sabe-se ainda que no mesmo ano de 1896 foram concedidos aos cidadãos Santos, Irmão Rezende e Companhia o aforamento do terreno situado no lugar denominado
15. O ESTADO DE MINAS. Ouro Preto, 28 out. 1896. p.1.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
As obras em construcção, sob a habil direcção dos distinctos engenheiros drs.
Venceslau Bello e Henrique Amaral, lentes da Escola Politechinica, estão em adiantado estado, offerecendo altamente aprazivel ponto de reunião aquelle lugar.
24
25
Gabriel Santos, o sócio-gerente da fábrica de tecidos, era “grande amigo e consultor”18 de
Dom Silvério. É provável que ambos tenham trocado impressões sobre aqueles anos iniciais
e conturbados da República brasileira. A fábrica estava hipotecada ao Banco do Brasil; Dom
Silvério, apreensivo com as finanças das instituições sob sua responsabilidade:
Com tudo isso em jogo, Dom Silvério aquiesceu, e, nos 12 anos em que a fábrica esteve
com a arquidiocese, “quis Deus provar a paciência do Prelado”22. Sabia-se que a administração do negócio não caberia a ele. Parece que o sócio mencionado por Gabriel Santos
se recusou. Parece que não deu certo o arrendamento, por tempo limitado, a uma firma
que compõe-se de distinctos industriaes do Rio de Janeiro e desta cidade, sendo seu
gerente technico o sr. J. C. Bragante, ex-director gerente da Fabrica de S. João em
Nictheroy, e gerente commercial o sr. Joaquim Affonso Baeta Neves, nome vantajo-
O Seminario de Marianna, o Collegio Providencia e o Recolhimento de Macahubas
samente conhecido no commercio23.
possuiam um bom numero de apolices federaes, de cujos juros se serviam estes
estabelecimentos de ensino para auxilio de suas não pequenas despezas. A situação
financeira do Governo da Republica, na occasião, era precaria, correndo voz entre pessoas auctorizadas, e bem depressa derramada pelas camadas populares, que
o Governo iria suspender o pagamento dos respectivos juros. Semelhante noticia
trouxe alarme a todos os que, na occasião, tinham economias pessoaes, ou sob sua
administração no Thesouro Federal19.
As apreensões de Dom Silvério diminuíram com a proposta de compra da fábrica – as
apólices federais seriam convertidas em ações aceitas pelo Banco do Brasil, no valor real,
ou seja, a hipoteca seria levantada com os títulos da dívida pública que possuía, sem que
ele precisasse desembolsar um tostão. Foi-lhe assegurado pelo amigo Gabriel Santos que a
fábrica era “negócio promissor de garantida e não pequena porcentagem”, e que um dos
sócios da empresa se encarregaria de sua administração20. A isso o Jornal Mineiro acrescentava que Dom Silvério poderia aplicar o estabelecimento industrial
Por algum tempo, de 1906 a 1912, a fábrica funcionou sob a forma de sociedade em
comandita – a Arquidiocese de Mariana como sócio comanditário e Orosimbo Gomes
Sabará de Vasconcellos como sócio solidário, “investido das funcções de gerente com plena
autonomia de administração tanto na parte technica como na commercial [...]”24. De fato,
assim a empresa aparece em estatísticas da época:
Cidade: Ouro Preto
Nome da fábrica: Fabrica do Tombadouro
Proprietário: Orozimbo Vasconcellos & Cia.
Capital e reservas: 300 contos de réis
Fusos: 1.640
Teares: 52
à obra meritoria a que tem dedicado todos os seus esforços, isto é, á proteção e amparo da infancia desvalida [...] fornecendo trabalho [...] a numerosas creanças pobres
de ambos os sexos que por ahi vivem na ociosidade, soffrendo privações crueis21.
Nº de operários: 60
Produção anual em metros: 600.000
Consumo anual de algodão em quilos: 55.000
Especialidade: tecidos brancos.25
16. APMOP. Aforamento 422. In: Livro de termos, medições, posse e obrigação de foros; 1885-1900. f. 205.
17. APMOP. Contracto para o serviço de illuminação electrica da cidade, entre a Camara Municipal e a firma Santos, Irmão
Resende & Cia.; 12 dez. 1899. In: Livro de Registro de Contratos da Câmara; 1896-1917. f. 36v.-38v.
18. OLIVEIRA, Alypio Odier de. Traços biographicos de D. Silverio Gomes Pimenta no centenario do seu nascimento; 1840-1940.
São Paulo: Escolas Profissionaes Salesianas, 1940. p. 79.
19. Idem. Ibidem.
20. Idem. Ibidem.
21. FABRICA de Tecidos do Tombadouro. Jornal Mineiro, Ouro Preto, 01 maio 1898. p. 1.
22. OLIVEIRA, Alypio Odier de. Op. cit. p. 79.
23. FABRICA do Tombadouro. Jornal Mineiro, Ouro Preto, 11 jun. 1899. Expediente. p. 3.
24. AEAM. Livro de escripturação diaria da Fabrica de Tecidos S. José do Tombadouro; 29 nov. 1907-30 mar. 1908. f. 1.
25. SENNA, Nelson de. Annuario de Minas Geraes. Bello Horizonte: Imprensa Official, 1906. Anno I. p. 129.; JACOB, Rodolpho.
Minas Geraes no XXº seculo. Rio de Janeiro: Gomes, Irmão & Cia., 1911. v. 1. p. 271.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Tombadouro16 e a queda d’água necessária à geração de energia, e que eles eram detentores de equipamentos elétricos e do contrato de iluminação pública da cidade em 189917.
26
27
IT A COLOMY ( 1 9 1 2 - 1 9 2 4 )
Não se tem notícia de que a Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy causou alguma amargura em Victorino Dias e seus sócios. Como foi dito, sabe-se que eles passaram por um
período de adaptação ao novo negócio, e tudo leva a crer que passaram bem.
Já no balanço relativo a 1919,
verificou-se com prazer que, a despeito de ter commeçado esse exercicio sob maos
auspicios, devido, principalmente, ao panico que se estabeleceu em seguida ao
Armisticio da grande guerra, assignado em Outubro de 1918, os lucros excederam á
expectativa, permittindo-nos um dividendo de 15% sobre o capital, o cumprimento
das verbas estatuidas, ficando ainda um saldo liquido de [150 contos de réis] creditado á conta de ‘Lucros Suspensos’28.
Os balanços imediatamente seguintes acusaram ora “magnifico”, ora “explendido” resultado, ou prometiam ser “o melhor da vida de nossa empresa”, e dividendos de 25% e 30%
puderam ser distribuídos aos acionistas, e 200 e 247 contos de réis levados aos “Lucros
Suspensos”29. Contribuíram para esse quadro “os preços de nossos tecidos em marcha ascendente e estes com boa acceitação” na praça “para onde continuamos a vender grande
parte de nossa produção”, o mercado de fazendas do Rio de Janeiro30.
A situação da empresa permitia investimentos na produção. Aos seus agentes em Londres
ela dirigia por carta o pedido de máquinas; eles entravam em contato com a casa Brooks
& Doxey, de Manchester, encomendavam o equipamento, acompanhavam a montagem31 e
o despacho de navio para o Brasil, e tudo levava bem mais de um ano.
Estatutos sociais da Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy, de 19 de junho de 1912.
Acervo Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense. Foto equipe Vale Registrar.
Ainda ficaram alguns papéis em mãos da arquidiocese, desfeitos anos depois pelo triplo do
valor nominal. “E assim se deu fim á compra desta Fabrica, que tantas lagrimas e amarguras
trouxe ao venerando Bispo de Marianna”27.
Já naquela época, a fábrica auxiliava a Santa Casa de Misericórdia de Ouro Preto. Combinando talvez o bom andamento dos negócios com o reconhecimento por parte de diretores
e acionistas de que “ha muito vem a Santa Casa de Misericordia d’esta cidade assistindo os
28. AIMFCII. Ata de 28 de fevereiro de 1920. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 jun. 1912-18 fev. 1928. f. 5.
29. Sobre esses dados, ver: AIMFCII. Atas de 30 de dezembro de 1920, 20 de fevereiro de 1921, 24 de fevereiro de 1922, 20
de fevereiro de 1923, 28 de fevereiro de 1924, 30 de setembro de 1925. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação
e Tecidos Itacolomy Sociedade Anonyma; 12 jun. 1912-18 fev. 1928. f. 6, 6-6v., 7v., 8v., 9v., 12v.
26. OLIVEIRA, Alypio Odier de. Op. cit. p. 80.
30. AIMFCII. Atas de 24 de dezembro de 1919, 30 de junho de 1920. In: Idem. f. 5, 5v.
27. Idem. Ibidem.
31. AIMFCII. Atas de 25 de agosto de 1921, 30 de março de 1925. In: Idem. f. 6v.-7, 11v.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Mas também aí alguma coisa não deu certo, a ponto de levar Dom Silvério a pagar 30 contos de réis para rescindir o contrato26. Nesse momento, Victorino Dias adquire a maioria
das ações do prelado e funda, com seus sócios, a Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy.
28
29
ampla, tratava-se do “movimento social que se vem operando no mundo com repercução
em nosso Paiz”, como disse Victorino Dias em 191940, talvez se referindo à Revolução Russa
e à atuação anarquista e às greves operárias ocorridas nos principais centros urbanos brasileiros. Seja como for, ele já tomara providências: a transformação da diária em salário-hora,
“com augmento de 50% para as horas de serviço accrescidas as 10 regimentaes”; a criação
de uma escola noturna para “nella aprenderem a ler os operarios menores de ambos os
sexos”41, experiência encerrada meses depois “por falta de frequencia”42.
Mesmo antes da criação oficial desse fundo, a Itacolomy realizava, junto com o pagamento
de dezembro, uma distribuição de gratificação “ao pessoal operario, chefes de secção e do
escriptorio”, para aquele “calculada em quantia aproximada á 10% de suas diarias durante
o anno e para estes á criterio da gerencia”35. Se mantinham a praxe da distribuição, os diretores Raymundo Andrade e Victorino Dias avisavam que não constituíam “as gratificações
direito de ninguem, podendo vir a ser suspensas de futuro, a criterio da diretoria”36.
A administração da Itacolomy às vezes encontrava Victorino Dias fora do país, quem sabe
revendo seu Portugal; às vezes ausente da própria fábrica, para tratar dos negócios de outra
empresa da qual era acionista e diretor-gerente.
A F USÃO
Mais avisos foram dados. Um deles aconselhava “o pessoal e chefes de secção a serem economicos e a faserem o seu peculio, mesmo no escriptorio da Fabrica, mediante o juro de
6% ao anno”37. Outro informava que, verificada a boa ordem e prosperidade em que vão
os negócios sociais, a empresa ficaria fechada “em regosijo pela data do primeiro centenario da independencia do Brasil”38. Sem regozijo, mas com preocupação, os seguintes dizeres
foram afixados nas diversas seções da fábrica: “A Directoria julga-se no dever de aconselhar
os seus operarios e empregados a não fazerem causa commum com o movimento produzido lá fora, no sentido de reducção do dia de trabalho [...]”39.
No Brasil do fim do século XIX, a iluminação elétrica de ruas e casas era uma novidade.
Predominavam a vela, o lampião, a tocha.
De maneira imediata, o movimento lá fora consistia na tentativa dos operários da construção civil de Ouro Preto de obterem a jornada de oito horas de trabalho. De forma mais
Como se disse, a fábrica e o serviço passaram para as mãos de Santos, Irmão Rezende
e Cia. Doutor Gabriel vendeu a fábrica para a arquidiocese, mas ficou com alternadores, dínamos, postes, cabos, motores, transformadores, isoladores e o contrato com a
Câmara Municipal de Ouro Preto para a iluminação. Quase ao mesmo tempo que se
transferia a unidade fabril para Dom Silvério, equipamentos elétricos e contrato eram
incorporados pela Companhia Luz Electrica Ouro Pretana no instante de sua constituição legal, janeiro de 190244.
32. AIMFCII. Ata de 30 de junho de 1917. In: Idem. f. 3v.
33. Idem. Ibidem.
34. AIMFCII. Ata de 20 de fevereiro de 1921. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 maio 1912-18 fev. 1928. f. 6-6v. Sobre outras doações feitas pela fábrica à Santa Casa, ver: AIMFCII. Ata de 24 de
fevereiro de 1922. In: Idem. f. 7v.; AIMFCII. Atas de 04 de março de 1945, 14 de março de 1948. In: Livro de atas das Assembleias
Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A; 21 jan. 1943-14
set. 1973. f. 15-15v., 25v.-26.
35. AIMFCII. Ata de 30 de dezembro de 1920. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 maio 1912-18 fev. 1928. f. 6. Em 1924, os chefes de seção receberam a gratificação em ações: Francisco Justo
Mitraud, José Juventino Costa e José Victor Gonçalves, 15 ações cada um; e Arbogasto de Andrade, quatro ações. Cf.: AIMFCII.
Ata de 29 de dezembro de 1924. In: Idem. f. 10-10v. A informação de gratificações feitas em outros anos pode ser vista em:
AIMFCII. Atas de 02 de janeiro de 1922, 20 de fevereiro de 1923, 03 de janeiro de 1924. In: Idem. f. 7, 8v., 9v.
36. AIMFCII. Ata de 20 de fevereiro de 1923. In: Idem. f. 8v.
37. Idem. Ibidem.
38. AIMFCII. Ata de 06 de setembro de 1922. In: Idem. f. 8.
39. AIMFCII. Ata de 05 de dezembro de 1920. In: Idem. f. 5v.
Quando a fábrica de tecidos foi instalada em 1890, o serviço de iluminação pública e particular – uma concessão do governo municipal – também passou a fazer parte dos negócios
da Companhia Industrial de Ouro Preto, e seu diretor Grey Tavares informava que “os
moradores desta cidade que desejarem a collocação de luz electrica em suas casas, queirão
communicar ao escriptorio d’esta companhia, á rua do Tiradentes, n. 25”43.
40. AIMFCII. Ata de 22 de julho de 1919. In: Idem. f. 4v.
41. Idem. Ibidem.
42. AIMFCII. Ata de 30 de dezembro de 1920. In: Idem. f. 6.
43. COMPANHIA Industrial de Ouro Preto. A Ordem, Ouro Preto, 20 dez. 1890. p. 4.
44. AIMFCII. Ata de 06 de fevereiro de 1902. In: Livro de actas das Assembléas da Companhia Luz Electrica Ouro Pretana;
06 fev. 1902-09 maio 1926. f. 1-2v. Segundo jornal da época, “já foram publicados no orgam official, em obediencia á lei
das sociedades anonymas, os estatutos da companhia luz electrica ouro-pretana que, felizmente, acha-se definitivamente
organisada. São seus directores o commendador Francisco Affonso Painhas, coronel Antonio Augusto de Oliveira, Antonio
José Netto e capitão Candido Augusto da Cruz. O conselho fiscal ficou composto dos srs. Arthur Rosemburg, José A. da
Fonseca e dr. Joaquim Candido da Costa Sena.” Cf.: A CIDADE. Ouro Preto, 25 fev. 1902. A Cidade. p. 1.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
operarios da fabrica com serviços medicos e medicamentos gratuitamente”32, a empresa
por várias vezes destinou certa quantia àquela benemérita instituição. Em 1917, a subvenção
correu por conta da “Caixa Beneficente da fabrica”, e para reforço dessa rubrica se propôs
“que se levasse d’ora em diante, á esta conta, o producto da venda dos reziduos de algodão, capas servidas de fardos, arames, arcos [...]”33. Em 1921, não se alterou a disposição de
ajudar a Santa Casa, mas a conta da qual sairia o dinheiro – foi então criado o Fundo de
Gratificações e Donativos34.
30
31
No seu desenvolvimento, a Companhia Luz Elétrica Ouropretana se tornou, em certo
sentido, bem próxima da Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy. Ambas tinham acionistas
em comum, além de membros do conselho fiscal e da diretoria51, bem como utilizavam a
mesma queda d’água para a geração de energia. Já em 1917, no bojo da reforma projetada
para a construção de uma segunda unidade hidroelétrica, Victorino Dias aventou, como
presidente da Luz Elétrica, a possibilidade de fusão dos dois negócios: nos terrenos da fábrica “se poderia obter uma diferença de nivel com capacidade para o augmento de 130
cavallos approximadamente”52.
Sua ideia ficou de ser estudada por uma comissão. Parece que o foi, e não se obteve, “na
occasião em que disso se tratou, unanimidade de vistas, como seria necessario [...]”53.
Todavia, a fusão ocorreu, em duas etapas. Primeiro, a fábrica comprou a maioria das ações
da Companhia Luz Elétrica, o que deu àquela “liberdade para resolver, quando julgar op-
49. AIMFCII. Acta da Assemblea Geral Ordinaria; 04 mar. 1906. In: Idem. f. 9.
Logomarca e carimbo da Companhia Luz Elétrica Ouro-Pretana.
Acervo Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense. Foto equipe Vale Registrar.
Formalizada a nova empresa, no ano seguinte ela já havia contratado o engenheiro eletricista responsável pelo serviço de custeio da iluminação45, bem como encaminhava o contrato
de iluminação do correio, do quartel e da cadeia46. Para fazer “funcionar outro dynamo e attender aos muitos pedidos que ha de installações em predios particulares”, um empréstimo
de 12 a 15 contos de réis foi necessário47. E na mesma época a empresa aceitou a redução
do pagamento anual que a Câmara Municipal lhe devia, de 20 para 18 contos de réis48.
45. AIMFCII. Ata de 24 de junho de 1903. In: Livro de actas das Assembléas da Companhia Luz Electrica Ouro Pretana; 06 fev.
1902-09 maio 1926. f. 3-4v.
46. Idem. Ibidem.
47. Idem. Ibidem.
48. “Essa modificação consistia em ficar reduzido de vinte contos a dezoito contos de reis annuaes o pagamento da
illuminação publica, reducção que a Camara Municipal via-se obrigada a fazer em consequência da diminuição de suas rendas
[...]” Cf.: Idem. Ibidem.
50. “Esse augmento tem a sua justificação na valorisação do activo da Companhia em virtude da nova installação hydroelectrica, caixa de areias etc., executada em 1907 [...], no pagamento feito aos representantes de Santos, Irmão Rezende
& Cia. [...] por saldo de materiaes incorporados pela acta da installação e de accordo com o que n’ella se estabeleceu;
no fundo de reserva [...] e finalmente na nova reforma em execução [...]. Para a execução d’esses serviços e pagamento
da divida acima referida dispôz a Companhia dos lucros accumulados até 31 de Dezembro de 1908 [...], dos lucros
excedentes dos dividendos de 5% destribuidos nos annos de 1909 1910 [...] e mais do fundo de depreciação de machinas
[...]. Não se trata pois, de um augmento de capital para accrescimo de obras [...], mas de serviços já executados e em via
de execução com lucros que não foram destribuidos e outros recursos sociaes [...].”Cf.: AIMFCII. Ata de 04 de fevereiro
de 1916. In: Idem. f. 22-23v.
51. Como participantes das duas empresas, destacam-se, dentre outros: Victorino Antonio Dias, Raymundo Guido de
Andrade, José de Castro Magalhães, José Honório Mourão, Carlos Thomaz de Magalhães Gomes, Joaquim Augusto de
Oliveira Santos, Gabriel de Oliveira Santos, Joaquim Affonso Painhas, Joaquim Severiano de Carvalho, Clodomiro Augusto
de Oliveira, Randolfo Rodrigues Trindade, João Baptista Fortes, Antônio José Netto, José Filippe de Santa Cecília, Desidério
Gonçalves de Mattos, Antônio Augusto de Oliveira. A esse respeito, ver: AIMFCII. Livro de transferências de acções da Fabrica de
Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade Anonyma; jul. 1912-dez. 1958; AIMFCII. Ata de 20 de fevereiro de 1915. In: Livro de actas das
Assembléas da Companhia Luz Electrica Ouro Pretana; 06 fev. 1902-09 maio 1926. f. 20-20v.; AIMFCII. Accionistas da Companhia
Luz Electrica Ouropretana em 31 de dezembro de 1919. 1f. Maço Assemblea geral ordinária, 1919.
52. AIMFCII. Ata de 14 de abril de 1917. In: Livro de actas das Assembléas da Companhia Luz Electrica Ouro Pretana; 06 fev.
1902-09 maio 1926. f. 24-24v. Também em reunião de 1918 se tratou da questão “de uma nova unidade hydro-electrica ou á
um accordo d’esta Companhia com a Fabrica de Tecidos Itacolomy, de modo a aproveitar-se a mesma queda d’agua de que
actualmente se utilisam as duas empresas.” Cf.: AIMFCII. Ata de 20 de fevereiro de 1918. In: Idem. f. 27-27v.
53. AIMFCII. Ata de 30 de março de 1924. In: Livro de actas das Assembléas Geraes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy
Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30 maio 1941. f. 19v.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Algumas dessas medidas podem ter trazido dificuldades no andamento dos negócios da
companhia. Mas parece que isso não foi por muito tempo. Ao renunciar a qualquer porcentagem a que tinha direito até dezembro de 1906, seu diretor-gerente Victorino Dias completou: “[...] attendendo que só agóra a Companhia entra em uma ephoca promettedora
de prosperidade [...]”49. Dez anos depois, a empresa estava com o capital social aumentado
de 125 para 250 contos de réis, justificado pela valorização de seu ativo – serviços já executados e em vias de execução com lucros que não foram distribuídos50.
32
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
portuno, a revelia dos dessidentes de todos os tempos [...]”54. Logo depois se configurou
com a companhia uma situação prevista em lei da época: quando da redução do número
de sócios a menos de sete, a sociedade deveria se entender dissolvida. Diante disso, a
Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy [...] tendo conhecimento [...] de que a Companhia [Luz Elétrica Ouropretana] admitte a possibilidade de proceder á sua liquidação,
ou venda de seus bens e direitos, vem propor a compra de todo o acervo constituido
pela Usina do Tombadouro, linhas primarias e secundarias, postes, transformadores,
predio á praça Tiradentes, esquina da rua das Flores, com o annexo que serve de distribuidora, materiaes em deposito no escriptorio e fora delle, dividas activas, moveis,
contracto corrente com a Camara Municipal desta cidade para illuminação publica e
particular e outras applicações de energia electrica, emfim, tudo quanto constitue o seu
activo, subrogando-se em todos os seus direitos e compromettendo-se por outro lado
a assumir todas as obrigações e liquidar o seu passivo, pela quantia global de duzentos
e cincoenta contos de reis, pagos á dinheiro á vista, no acto de passar a respectiva escriptura. Ouro Preto, vinte e quatro de Dezembro de mil novecentos e vinte e quatro55.
Ainda levaria algum tempo para que as questões burocráticas junto aos órgãos públicos
fossem concluídas – a Luz Elétrica seria declarada extinta em 192656, e um novo contrato
de iluminação pública e particular, fornecimento de energia elétrica e serviço telefônico
seria assinado com a Câmara Municipal em 192757.
Mas a fusão estava feita e, com ela, uma das primeiras medidas foi alterar em estatuto a
denominação da empresa: agora, a Companhia Industrial Ouropretana, com sede em Ouro
Preto, daria continuidade à “exploração das industrias de tecidos, distribuição de energia
electrica para força e luz, telephones e outras que não contrariem os seus fins principaes,
mantida a forma anonyma”58.
54. Idem. Ibidem.
55. AIMFCII. Ata de 25 de dezembro de 1924. In: Livro de actas das Assembléas da Companhia Luz Electrica Ouro Pretana; 06
fev. 1902-09 maio 1926. f. 34-34v.
56. “Nesses termos fica declarada extinta a sociedade anonyma Companhia Luz Electrica Ouropretana, devendo esta acta ser
lavrada em duplicata, publicada no orgão official dos poderes do Estado, e um exemplar archivado no Registro de Hypothecas
da Comarca.” Cf.: AIMFCII. Ata de 09 de maio de 1926. In: Idem. f. 35v.
57. APMOP. Termo de contracto para serviço de illuminação publica e particular, fornecimento de energia electrica e serviço
telephonico entre a Camara Municipal de Ouro Preto e a Companhia Industrial Ouropretana; 8 fev. 1927. In: Livro de Registro
de Contratos da Câmara; 1917-1927. f. 78-83v.
58. “A Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy, tendo adquirido todos os bens e direitos da Companhia Luz Electrica
Ouropretana, resolveu, em assembléa geral extraordinaria, hoje realisada, alterar os estatutos de 15 de Maio de 1912, a
principio pela sua denominação que passa a ser ‘Companhia Industrial Ouropretana’, com sede nesta cidade de Ouro Preto,
para a continuação dos fins das duas emprezas [...].” Cf.: AIMFCII. Ata de 28 de dezembro de 1924. In: Livro de actas das
Assembléas Geraes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30 maio 1941. f. 21v.-22.
Logomarca da Companhia Industrial Ouropretana.
Acervo Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense. Foto equipe Vale Registrar.
34
35
Ano
1924
1926
1930
Produção
(metros)
Número de operários
Janeiro
111.257
195
Fevereiro
102.677
186
Março
106.463
187
Abril
94.849
199
Maio
92.573
203
Junho
90.534
211
Julho
98.117
210
Agosto
101.562
200
Setembro
122.292
196
Outubro
148.469
189
Novembro
128.080
186
Dezembro
110.602
183
Janeiro
Sem informação
231
Fevereiro
Sem informação
201
Março
Sem informação
207
Abril
127.813
205 (+eletricidade: 9)
Maio
129.779
199 (+eletricidade: 9)
Junho
121.263
199 (+eletricidade: 9)
Julho
146.158
201 (+eletricidade: 11)
Agosto
132.720
199 (+eletricidade: 9)
Setembro
126.943
198 (+eletricidade: 10)
Outubro
124.462
199 (+eletricidade: 9)
Novembro
134.025
204 (+eletricidade: 9)
Dezembro
105.096
204 (+eletricidade: 9)
Janeiro
67.432
177 (+eletricidade: 12)
Fevereiro
Sem informação
176 (+eletricidade: 12)
Mês
Março
104.467
181 (+eletricidade: 13)
Abril
115.076
181 (+eletricidade: 16)
Maio
120.729
173 (+eletricidade: 13)
Junho
98.192
181 (+eletricidade: 12)
Julho
106.638
186 (+eletricidade: 12)
Agosto
Sem informação
181 (+eletricidade: 12)
Setembro
128.778
181 (+eletricidade: 12)
Outubro
Sem informação
198 (+eletricidade: 12)
Novembro
Sem informação
185 (+eletricidade: 13)
Dezembro
Sem informação
187 (+eletricidade: 12)
(AIMFCII. Folha de pagamento da Fiação e Tecidos Itacolomy; abr. 1917-set. 1925;
AIMFCII. C.I.O. - Folha de pagamentos; out. 1925-ago. 1933.)
As funções desempenhadas pelos trabalhadores não eram intercambiáveis. Mas, em pelo
menos uma ocasião, a turma da indústria esteve junto com a turma da eletricidade. Um
acidente fez com que o aparelho de guias de admissão da água da turbina hidráulica se
inutilizasse completamente, avariando também o rotor. Problema elétrico, paralisação do
motor da fábrica. Diante disso, o diretor-gerente Victorino Dias pediu e obteve o auxílio
de Arthur J. Bensusan, “nosso acionista e superintendente da Companhia Minas da Passagem”, em cujas oficinas se faria o reparo no prazo de 15 dias. Nesse período,
resolveu-se manter em serviço todos os operarios do sexo masculino, que serão
utilisados para intensificar o serviço de montagem de machinas e ajudar a turma de
pedreiros a melhorar a nossa tomada dagua no rio Funil e caixa de areia, ficando
igualmente resolvido abonar-se ás operarias os seus ordenados, como se estivessem em effectivo serviço, isto por equidade59.
SOB NOV A D IREÇÃO
Em janeiro de 1943, o coronel Desidério Gonçalves de Mattos afirmou que “os membros
da atual Diretoria são os unicos sobreviventes dos que assinaram a ata de fundação desta
Companhia, sendo isto uma garantia do grande amor que têm à mesma”60. O coronel se
59. AIMFCII. Ata de 26 de junho de 1925. In: Livro de actas da Directoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 jun. 1912-28 fev. 1918. f. 11v.-12.
60. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão,
Energia Elétrica e Telefones S/A, de 21 de janeiro de 1943. Arquivamento 22.407. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Além disso, mais trabalhadores passaram a responder a uma mesma direção, como se pode
ver na tabela a seguir:
36
37
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
referia a si próprio e a Randolfo Rodrigues Trindade, presentes em 1912 na constituição da
Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy e em 1943 ocupando os cargos de diretor-gerente e
diretor-presidente da empresa, respectivamente.
Entre um ano e outro, ambos foram acionistas atuantes nas reuniões, membros do conselho fiscal, presidentes de assembleias gerais. Participaram das decisões que fundiram fábrica
e luz. Viram Victorino Dias ir embora em 1930 e Raymundo Guido de Andrade em 1935.
Apuseram suas assinaturas aos documentos deliberativos quando a segunda geração assumiu a empresa – Jefferson Araújo Dias e José de Sales Andrade, diretores gerente e presidente61 – e quando, procedendo a mais uma alteração estatutária, todo o negócio foi posto
no próprio nome da sociedade: Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem
de Algodão, Energia Elétrica e Telephones S/A62.
Em 1943, Washington Araújo Dias, filho de Victorino, acionista da fábrica, fundador da
associação comercial da cidade e então prefeito de Ouro Preto, referiu-se ao coronel e a
Randolfo Trindade como aqueles que estavam em condições “melhormente que quaisquer
outros acionistas, pelas suas tradições nesta casa, de seguir a trilha até agora palmilhada e
manter esta sociedade no alto nível em que sempre viveu”63.
A sociedade seguiu em frente, mas algo mudou antes de restar apenas o coronel Mattos se
dirigindo para a fábrica, como de costume, a cavalo64. Na Assembleia Geral Extraordinária
de 1944, ocorreu a renúncia aos cargos dos dois remanescentes da velha-guarda, bem
como a mudança em algumas cláusulas do estatuto, elevando de dois para cinco o número
de diretores, com mandato de seis anos, e acrescentando um conselho consultivo65.
A direção da companhia passou, então, a espelhar a progressiva predominância de outros
acionistas, com tradição no ramo têxtil sem dúvida, mas construída na cidade mineira de
Itaúna (Ver Anexo I).
61. Em 1933, foram reeleitos Jefferson Araújo Dias (diretor-presidente), Raymundo Guido de Andrade (diretor-gerente),
Desidério Gonçalves de Mattos (presidente das assembleias gerais) e os seguintes membros do conselho fiscal: Coronel
Antonio José Netto, Randolfo Rodrigues Trindade, José Felippe de Santa Cecilia, Clodomiro Augusto de Oliveira, João Baptista
Fortes e Manoel Vieira da Silva. Cf.: AIMFCII. Ata de 30 de março de 1933. In: Livro de actas das Assembleas Geraes da
Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30 maio 1941. f. 30. Em 1935, Jefferson Araújo Dias
se torna diretor-gerente, e José de Sales Andrade, diretor-presidente, “não só pelos meritos pessoaes e como homenagem
aos optimos e relevantes serviços que, desinteressadamente, vem prestando a sociedade, ha largo tempo, como ainda em
homenagem a seu pae, e nosso saudoso director gerente Raymundo Guido de Andrade, há pouco fallecido.” Cf.: AIMFCII. Ata
de 20 de abril de 1935. In: Idem. f. 33-34v. Em 1936 e 1939, Jefferson Araújo Dias e José de Sales Andrade foram reeleitos. Cf.:
AIMFCII. Atas de 30 de abril de 1936 e de 30 de agosto de 1939. In: Idem. f. 35, 38.
62. AIMFCII. Ata de 30 de maio de 1941. In: Idem. f. 40-40v.
63. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão,
Energia Elétrica e Telefones S/A, de 21 de janeiro de 1943. Arquivamento 22.407. s.p.
64. VR-HT-OP-042 - Ephigênia Antônia de São José Ignácio dos Anjos.
65. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de
Algodão, Energia Elétrica e Telefones S/A, de 28 de junho de 1944. Arquivamento 24.930. s.p.
Propaganda veiculada no jornal Diário de Minas, em 25
de dezembro de 1952. seção 4. p. 5.
Acervo Hemeroteca Histórica da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
38
39
Nas décadas seguintes, os cargos variaram bastante. Por vezes, a diretoria se reduziu a
três ou aumentou para seis o número de cargos; um diretor comercial, um financeiro, um
industrial ou técnico assumiram o lugar da nomenclatura antiga; ora o conselho consultivo,
ora o conselho de administração, com sete, dez ou quatro membros, assistia a diretoria68.
À frente desses cargos, nem sempre as mesmas pessoas. De maneira pontual, alguém
renunciava porque se tornara difícil gerir a fábrica e uma federação, ou porque a lei não
permitia acumular a administração com o mandato legislativo ou a secretaria de Estado.
De maneira definitiva, o falecimento de alguém, restando o espólio para ser dividido69. No
meio-termo, a conjuntura econômica e os interesses pessoais determinavam a compra e a
venda de ações, a maior ou menor participação e poder de decisão nos negócios.
Em que pesem essas variações, duas figuras merecem destaque. Por ordem cronológica,
Theódulo Pereira, que chegou a residir em Ouro Preto por um tempo, tornou-se presidente da associação comercial da cidade e proprietário de jazidas de pirita70. Sua atuação
profissional não havia começado por aí, mas como jornalista dos Diários Associados e,
depois, promotor de Justiça justamente na comarca de Itaúna. Como disse Vida Industrial,
publicação da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg):
[...] quando mais se impunha como figura de evidência do Poder Judiciário, não teve
outro recurso senão abandonar sua promissora carreira, ante a insistência com que
os industriais de tecido foram ali buscá-lo, para entregar-lhe o comando de uma das
mais poderosas organizações das classes produtoras de Minas. Assumindo, então, a
direção geral da Companhia Industrial Ouropretana, Theódulo Pereira [...] pôde dar-lhe nova estrutura, traçando rumos definitivos ao seu desenvolvimento71.
A segunda figura foi o advogado Miguel Augusto Gonçalves de Souza, filho dos industriais
de tecidos de Itaúna, vale dizer, da Companhia Industrial Itaunense, diretor e presidente
Três dirigentes da Ouropretana emprestaram
o nome a logradouros de Ouro Preto.
Foto Eugênio Sávio.
66. Idem. Ibidem.
67. AIMFCII. Atas de 30 de março de 1944 e 28 de junho de 1944. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia
Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A.; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 6, 12v.-13.
68. Sobre essas mudanças, ver, por exemplo: AIMFCII. Ata da Assembleia Extraordinária de 30 de março de 1949; Atas de 20
de setembro de 1956, 22 de abril de 1957, 11 de abril de 1959, da assembleia extraordinária de 28 de novembro de 1961,
29 de abril de 1965, 17 de abril de 1971. In: Idem. f. 29-29v., 68, 78v.,86-87, 94v.-95, 115-115v., 136v.-140.
69. Alguns exemplos dessas situações: em 1947, José Maria Lopes Cançado se afasta temporariamente das funções de diretor
vice-presidente por ter sido eleito deputado federal; em 1949, o nome de Ranfolfo Rodrigues Trindade aparece em espólio;
em 1957,Theódulo Pereira se ausenta da sede da empresa em função de suas novas atividades como presidente da Federação
das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), e em 1961 renuncia ao cargo de diretor-presidente da Ouropretana,
permanecendo como acionista e membro do conselho consultivo; em 1963, Antônio Fortes ocupa, no conselho consultivo,
a vaga deixada em decorrência do falecimento de Theóphilo Marques Alvares da Silva; em 1964, Miguel Augusto Gonçalves
de Souza ocupa a Secretaria de Estado da Fazenda de Minas Gerais.
70. BOLETIM DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE MINAS. Belo Horizonte, Associação Comercial de Minas Gerais, dez.
1949, p. 20; EXPANSÃO Industrial. Vida Industrial, Belo Horizonte, Fiemg, abr. 1955, p. 15.
71. TEÓDULO Pereira. Vida Industrial, Belo Horizonte, Fiemg, set. 1956, p. 22-23.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Talvez como uma despedida, a reunião de 1944 propôs uma homenagem especial à
memória do comendador Victorino Dias e “à figura proba, honesta [...] do major Raymundo Guido de Andrade”, a quem “os ouro-pretanos e mineiros muito devem pela ação
realizadora” que desenvolveram nos setores econômico e industrial de Minas Gerais66.
Dito isso, um donativo foi destinado à Santa Casa de Misericórdia e tomaram posse José
de Cerqueira Lima (presidente), José Maria Lopes Cançado (vice-presidente), Theódulo
Pereira (superintendente), Desidério Gonçalves de Mattos (gerente) e Moacyr Gonçalves
da Costa (secretário), e, como membros do conselho consultivo, Dario Gonçalves de
Souza, Ignácio Valadares Ribeiro, José de Sales Andrade, Antônio Cosme Valentim Nery e
Aguinaldo Figueiredo67.
40
41
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
da Associação Comercial de Minas Gerais (ACMG), diretor do Sindicato das Indústrias de
Fiação e Tecelagem de Minas Gerais, do Banco Econômico de Minas Gerais e do Banco
Comércio e Indústria de Minas Gerais72. Na virada da década de 1960, ele tomou a frente
da Companhia Industrial Ouropretana e deu-lhe novos rumos.
LU Z E TELEFONE
Um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informava que,
em 1955, o município de Ouro Preto estava servido por 13 estações postais e uma postal-telegráfica, além do serviço telegráfico de estações ferroviárias. E completava: “É servido
também pela rêde de telefones interurbanos, com dois postos de telefones públicos e 249
aparelhos instalados, estes, porém, sem funcionamento, atualmente, por motivo de acidente
ainda não reparado, ao serem registrados os presentes dados”73.
O referido acidente foi assim lembrado por dois funcionários da Companhia Industrial
Ouropretana, concessionária do serviço telefônico:
“Um caminhão, de um tal Lourival Marota,
bateu no coisa, queimou a central, estourou
tudo! Aí acabou, não teve mais...”
(Pedro Müller Moutinho, eletricista
de 1953 a 1966. VR-HT-OP-047)
“Um caminhão bateu no poste ali na saída
para Mariana, nas Lages. O caminhão bateu,
deu um curto. Pronto! Queimou a central,
acabou o ‘Telefone’.”
(Alda Gualberto Teixeira, telefonista
e auxiliar contábil de 1952 a 1984.
VR-HT-OP-036)
Parece que não houve mesmo o reparo. Os assinantes particulares deveriam, então, se dirigir ao posto telefônico da praça Tiradentes, onde talvez já estivesse instalado o moderno
equipamento cuja aquisição havia sido informada pelo superintendente Theódulo Pereira
alguns anos antes do acidente74. No posto, solicitava-se a ligação interurbana e enfrentava-se uma espera de duas, três horas, conforme horário e linha, para completar a chamada.
Luminárias que pertenciam aos
postes de iluminação elétrica da
Companhia Luz Elétrica Ouropretana.
Acervo Wanderley Alexandre da Silva.
Foto Eugênio Sávio.
O acidente e, mais tarde, o fim da concessão do serviço telefônico a particulares foram
responsáveis pela redução do nome e dos negócios da empresa – Companhia Industrial
Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A, agora,
como disse Alda Teixeira, sem “Telefone”.
Antes de algo semelhante se verificar com a energia, houve um período de investimento
e expansão desse serviço, sob a superintendência de Theódulo Pereira. Desde pelo menos
1947, a construção de uma nova usina hidroelétrica foi aventada em reuniões (a usina do
Gualaxo)75, e a empresa adquiriu a Companhia Melhoramentos de Ponte Nova, “concessionária dos serviços de utilidade pública de energia elétrica nesse importante município”76.
Com essa aquisição, tornou-se proprietária da Usina do Brito e tratou de aumentar a sua
capacidade, construir o prédio da estação transformadora e distribuidora principal daquela cidade, reformar linhas de transmissão e erguer outras tantas, pois agora o serviço
72. VIDA INDUSTRIAL. Belo Horizonte, Fiemg, maio-junho 1964. s.p.; MENSAGEM ECONÔMICA. Belo Horizonte,
Associação Comercial de Minas Gerais, mar. 1956, p. 25.; ENTREVISTA. Miguel Augusto Gonçalves de Souza. Belo Horizonte:
UFMG/Programa de História Oral, fev. 1992.
73. ENCICLOPÉDIA dos Municípios Brasileiros. Rio de Janeiro: IBGE, 1959. v. 26. p. 235.
74. AIMFCII. Ata de 10 de março de 1951. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de
Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A.; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 45-45v.
75. Sobre a construção da nova usina, ver: AIMFCII. Atas de 22 de março de 1947 e da Assembleia Extraordinária de 30 de
março de 1949. In: Idem. f. 21v., 27v.-28v.
76. AIMFCII. Ata da Assembleia Extraordinária de 30 de março de 1949. In: Idem. f. 27v.-28v.
42
43
Para tudo isso, aumento de capital, empréstimos bancários, dividendos não distribuídos78;
turbina, gerador, quadros de comando importados da Alemanha e dos Estados Unidos79;
e o “dinamismo”, o “desassombro”, a “inteligência nova”80 do industrial Theódulo Pereira,
homenageado anos depois na placa afixada no muro da fábrica: “Ponte Theódulo Pereira”,
ligando dois passados, a rua Desidério Gonçalves de Mattos e a rodovia Rodrigo Melo
Franco de Andrade.
À expansão energética verificada na década de 1950 seguiu-se o término de mais essa
atividade nos negócios da Ouropretana, na década de 1960. Por meio de decretos presidenciais de 1966 e 1967, transferiu-se a concessão do serviço de energia elétrica para as
Centrais Elétricas de Minas Gerais (Cemig), transferência “recomendada e desejada” pela
diretoria da Ouropretana: “Extingui-se, assim, setor altamente deficitário da emprêsa”81.
Fizeram parte do processo de extinção a venda de imóveis não “necessários aos objetivos
sociais”82 da companhia e a desmontagem da antiga rede elétrica, com a retirada de fios de
cobre e alumínio, dos medidores, transformadores, isoladores, postes de aroeira-do-sertão e
outros materiais, tudo colocado à venda “pelos melhores preços encontrados”. O valor arrecadado com a transação foi destinado a “investimentos em nossa indústria têxtil” e ao pagamento de funcionários do setor elétrico que tiveram seu contrato de trabalho rescindido83.
Tendo restado apenas a unidade fabril, a empresa tornou-se, mediante estatuto, Ciosa –
Companhia Industrial Ouropretana S/A84.
77. Sobre esses investimentos, ver: AIMFCII. Atas da assembleia extraordinária de 05 de julho de 1949, 10 de março de 1951,
22 de agosto de 1954. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem
de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A.; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 41-41v., 45-45v., 62v.; AIMFCII. Ata da Assemblea
Extraordinaria da Companhia Melhoramentos de Ponte Nova, 06 dez. 1949. In: Livro de actas das reuniões da Companhia
Melhoramentos de Ponte Nova S.A.; 20 jul. 1925-06 dez. 1949. f. 50-53v.; AIMFCII. Ata de reunião da Diretoria e do Conselho
de Administração; 12 fev. 1952. In: Livro de atas da Companhia Industrial Ouropretana S.A.; 02 set. 1943-26 mar. 1982. f. 9-9v.
78. AIMFCII. Atas da assembleia extraordinária de 05 de julho de 1949, 22 de agosto de 1954. In: Livro de atas das Assembleias Gerais
da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A.; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 4141v., 62v.; Atas de reunião da Diretoria e do Conselho de Administração; 12 fev. 1952; 07 fev. 1953. In: Livro de atas da Companhia
Industrial Ouropretana S.A.; 02 set. 1943-26 mar. 1982. f. 9-9v.
79. AIMFCII. Ata de 10 de março de 1951. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de
Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A.; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 45-45v.
80. NOTAS e Informações – Dr. Teódulo Pereira. Vida Industrial, Belo Horizonte, Fiemg, out.-nov. 1955, p. 9.
81. A respeito da transferência e da posição da empresa, ver: AIMFCII. Atas de 29 de abril de 1967, 30 de abril de 1968. In: Livro
de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone
S/A.; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 122-123v., 124-124v.; AIMFCII. Ata de reunião da Diretoria e do Conselho Consultivo; 01 abr.
1967; 29 abr. 1968. In: Livro de atas da Companhia Industrial Ouropretana S.A.; 02 set. 1943-26 mar. 1982. f. 25v.-26v., 28-29v.
A F ÁBR IC A
“Deixa colocar uma data: até 1970, a fábrica tinha um panorama bonito, mas muito bonito!” – recorda-se Luiz Gordiano Gonçalves, funcionário de 1962 a 1982. Havia o bambuzal,
montes de lenha para a caldeira a vapor e o rio “que vinha lá de cima, fazendo os contornos, passando rente à fábrica”85.
Naquela década, a paisagem mudou para “a sociedade acelerar o seu próprio crescimento,
inclusive com a aquisição de novas e modernas máquinas e a ampliação da área construída
com a edificação de novos galpões”86. Sem bambu, com caldeira movida a óleo, o rio “foi
levado lá para o canto do barranco”87, onde se encontra atualmente, e um aterro ocupou o
lugar dos seus contornos rentes à fábrica. De três mil metros quadrados de área construída,
a companhia passou a dispor de 16 a 18 mil metros quadrados, espaço destinado ao depósito de algodão, ao prédio novo da tecelagem – e só dela – e ao escritório da empresa,
além do antigo galpão ampliado88.
Junto com as obras, o aumento da produção de cem para quatrocentas, quinhentas toneladas de pano por mês, com a compra de muitas máquinas. “Para o Brasil”, segundo o gerente
Fernando Antônio Affonso de Araújo, “máquinas atualizadas [...]. Enquanto lá fora eles já
estavam cem anos na nossa frente, nós estávamos com máquinas que nós achávamos que
eram modernas e que não eram mais. Mas, pelo menos em nível de competir dentro do
Brasil, nós nos igualamos. Compramos muitas máquinas”89.
Capitaneada por Miguel Augusto Gonçalves de Souza, a mudança na paisagem atendeu
também “ao imperativo de racionalidade administrativa”. Desde 1961, havia um escritório
em Belo Horizonte, mas a sede da empresa era o escritório da praça Tiradentes, no 32, em
Ouro Preto. A partir de 1976, a sede foi transferida para a capital mineira, precisamente no
imóvel próprio à rua São Paulo, 409, 23o andar, “eis que se concentram em Belo Horizonte as direções financeiras e comerciais da empresa, bem como a supervisão de todos os
setores de atividades da companhia”90. Sediada na capital, e com “um moderno e funcional
escritório junto à fábrica de tecidos em Ouro Preto”91, a sociedade vendeu o prédio da
praça Tiradentes.
85. VR-HT-OP-050 A / B - Luiz Gordiano Gonçalves.
86. AIMFCII. Ata de reunião da Diretoria; 03 dez. 1973. In: Livro de atas da Companhia Industrial Ouropretana S.A.; 02 set. 194326 mar. 1982. f. 33.
87. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
88. Idem; VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
89. VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
83. AIMFCII. Ata da reunião da Diretoria e do Conselho Consultivo; 01 abr. 1967. In: Idem. f. 25v-27. AIMFCII. Ata de reunião
da Diretoria e do Conselho Consultivo; 29 abr. 1968. In: Idem. f. 28-29v.
90. AIMFCII. Ata de reunião da Diretoria e do Conselho Consultivo; 28 nov. 1961. In: Livro de atas da Companhia Industrial
Ouropretana S.A.; 02 set. 1943-26 mar. 1982. f. 16-16v.; AIMFCII. Atas de 22 de março de 1976 e da Assembleia extraordinária
de 03 de dezembro de 1977. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana; 04 nov. 1973-30
jul. 1982. f. 36, 55-55v.
84. AIMFCII. Ata de 06 de abril de 1969. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação
e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 130-130v.
91. AIMFCII. Ata da Assembleia extraordinária de 03 de dezembro de 1977. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da
Companhia Industrial Ouropretana; 04 nov. 1973-30 jul. 1982. f. 55-55v.
82. AIMFCII. Ata de reunião da Diretoria; 05 ago. 1980. In: Idem. f. 46.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
extrapolava Ouro Preto para abarcar também Ponte Nova, Urucânia, Piedade, Oratórios, Amparo da Serra, Vau-Açu e Santa Cruz do Escalvado77.
44
45
que as levam a um bem próximo padrão de qualidade. São, também, comuns os mercados consumidores e as linhas de comercialização. Por outro lado,
a composição dos quadros acionários das empresas indica que, na sua expressiva
maioria, as ações do capital da Ouropretana pertencem a acionistas também participantes do quadro de acionistas da Itaunense. São, assim, favoráveis as condições
para a incorporação dessa Companhia pela Itaunense que, como companhia aberta
Ao que se sabe, em dois casos foram expostos motivos diferentes para a companhia se
desfazer de imóveis. Na primeira situação, “a Diretoria da empresa, imbuída dos melhores
propósitos de harmonia social e considerando o bom entendimento que existe e sempre
existiu entre a empresa e seus trabalhadores, entende que esta doação deve ser feita”93
– e um lote do terreno situado à rua Padre Faria foi entregue para que o Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria de Fiação e Tecelagem de Ouro Preto construísse sua sede,
como de fato o fez.
Na segunda situação, em 1978 a Prefeitura Municipal de Ouro Preto “desejava adquirir
uma área de terreno de aproximadamente 9.700 metros quadrados de propriedade da
empresa, próxima à fábrica de tecidos, à direita da Rua Desidério de Mattos”, para construir
“um Centro Social Urbano, obra de grande alcance social e da qual resultariam amplos benefícios, diretos e indiretos, para a empresa”94, coisa que o órgão público não fez por razões
não se sabe atinentes a quem ou a quê.
e possuidora de recursos patrimoniais maiores, poderá desenvolver melhor, com
benefício para todo o seu corpo de acionistas, a atividade fabril. Além disso, o próprio parque industrial da Ouropretana, passando a compor um complexo, poderá
ser melhor utilizado96.
Com a incorporação, a derradeira mudança de nome – Companhia Industrial Itaunense
Unidade III97 – e a desativação do setor de fiação e da tinturaria. Parte de um complexo, a
Ouropretana seguiu-lhe o caminho nos anos 80, “uma década quase perdida sob o ângulo
econômico”98, e teve o mesmo fim: a falência nos anos 90.
Cem anos, então, haviam se passado desde quando tudo começou – uma ideia de riqueza
na terra do ouro, do barroco e do rococó.
Nenhum dos dois casos significou desvios no programa de crescimento da sociedade.
A paisagem havia mudado na década de 1970 e, como afirmou Miguel Augusto Gonçalves
de Souza, a empresa estava preparada para ser incorporada e absorvida pela Companhia
Industrial Itaunense95, como ocorreu em 1982.
Após cuidadosos estudos, levando em conta os altos interesses da Companhia e de
seus acionistas e ponderando a situação atual da economia brasileira, vimos apresentar-lhes, com essa justificação, razões que aconselham a incorporação desta sociedade pela Companhia Industrial Itaunense. Tanto a Ouropretana como a Itaunense
atuam no ramo têxtil, desenvolvendo, na manufatura dos seus produtos, técnicas
92. AIMFCII. Ata de 14 de abril de 1973. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de Fiação
e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 148v.-149.
93. AIMFCII. Ata de 17 de dezembro de 1971. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Ouropretana de
Fiação e Tecelagem de Algodão, Energia Elétrica e Telefone S/A; 21 jan. 1943-14 set. 1973. f. 143v. Ver também: AIMFCII. Ata de
reunião da Diretoria; 06 dez. 1971. In: Livro de atas da Companhia Industrial Ouropretana S/A; 02 set. 1943-26 mar. 1982. f. 32v.
96. AIMFCII. Ata de 26 de março de 1982. In: Livro de atas das reuniões da Diretoria da Companhia Industrial Ouropretana; 26
mar. 1982-31 jun. 1982. f. 3v.-4. Ver também: AIMFCII. Ata de 29 de março de 1982. In: Livro de atas das reuniões da Diretoria
da Companhia Industrial Itaunense; 26 jun. 1978-26 dez. 1983. f. 67, 69v.; AIMFCII. Ata da Assembleia Geral Extraordinária de 10
de abril de 1982. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da Companhia Industrial Itaunense; 04 nov. 1973-30 jul. 1982. f. 72v.-73.
94. AIMFCII. Ata da Assembleia Extraordinária de 29 de novembro de 1978. In: Livro de atas das Assembleias Gerais da
Companhia Industrial Ouropretana; 04 nov. 1973-30 jul. 1982. f. 57v.-58.
97. AIMFCII. Ata de 13 de setembro de 1982. In Livro de atas das reuniões da Diretoria da Companhia Industrial Itaunense; 26
jun. 1978-26 dez. 1983. f. 80v.-81.
95. ENTREVISTA. Miguel Augusto Gonçalves de Souza. doc. cit.
98. ENTREVISTA. Miguel Augusto Gonçalves de Souza. doc. cit.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Sua venda, como a de alguns outros imóveis espalhados por Ouro Preto, foi assim justificada: tratava-se de “imóveis antigos que acarretam excessivos gastos para a conservação e
não eram necessários ao bom cumprimento dos objetivos sociais da empresa. A importância a ser percebida seria aplicada na compra de moderna maquinaria têxtil”92. Tudo dentro
do programa de crescimento.
46
47
Num tempo assim, a notícia de que uma fábrica de tecidos seria instalada em Mariana
quebrou a rotina, deu o que falar em praças, sessões solenes, jornal.
Fiação e Tecelagem
São José
Naquela época, a vida passava devagar. A notícia do início da Grande Guerra não chegaria
a Mariana em menos de seis horas, se viesse impressa num jornal de Belo Horizonte atravessando os 167 quilômetros da Estrada de Ferro Central do Brasil, que ligavam as duas
cidades. E Mariana, em comparação com outros lugares do país, era moderna, servida pelo
trem e pela estação ferroviária inaugurada em 1914.
O município compunha-se de 13 distritos de paz, onde predominavam a criação do gado
vacum e muar e o cultivo de cereais e cana-de-açúcar. Sob o título de estabelecimentos
industriais abrigavam-se 16 negócios de bebidas, nove de calçados, um de vela, 14 de queijos e requeijões e uma perfumaria. Estabelecimentos comerciais eram em maior número,
dispersos em bodegas, armarinhos e boticas. A extração do ouro ainda se fazia na bateia
dos garimpeiros e pela empresa que, fincada em Passagem de Mariana, mudou por vezes
de mãos e de nome99.
Os sinos das igrejas irmãs, Carmo e São Francisco, marcavam as horas, anunciavam missas e
morte, repicavam em dias festivos e na chegada de autoridades, como a de Dom Helvécio
Gomes de Oliveira, que assumiu a Arquidiocese em 1922. Entre as matinas e as completas,
“seminaristas de sotainas negras” cumpriam deveres e obrigações, caminhavam pelos logradouros e ficavam parados perto das lojas100.
Frio e indiferente a tudo, deslizava o ribeirão do Carmo101.
99. Sobre a economia de Mariana, ver: SENNA, Nelson de. Annuario de Minas Geraes. Bello Horizonte: Imprensa Official,
1913. Anno V. p.532; SILVEIRA, Victor. (org.). Minas Geraes em 1925. Bello Horizonte: Imprensa Official, 1926. p. 895-903, 1348.
A mina de ouro localizada no distrito de Passagem de Mariana pertenceu a Thomas Bawden (1859), à Anglo Brazilian Gold
Mining Company Limited (1863) e à The Ouro Preto Gold Mines of Brazil Limited (1875). No início do século XX, o controle
acionário da empresa passou para as mãos da família Ferreira Guimarães (Coronel Benjamin Ferreira Guimarães e seu filho
Júlio Mourão Guimarães), sob o nome Companhia Minas da Passagem.
100. Como registrou o viajante Richard Burton, em 1869. Cf.: BURTON, Richard Francis. Viagem do Rio de Janeiro a Morro
Velho. Belo Horizonte/São Paulo: Itatiaia/USP, 1976. p. 276.
101. As expressões “igrejas irmãs” e “no ribeirão do Carmo que desliza / Indiferente e frio [...]” são de: MENDES, Murilo.
Contemplação de Ouro Preto. In: Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 494, 495.
No segundo semestre de 1933, os trâmites burocráticos e administrativos do novo estabelecimento industrial estavam resolvidos. Antes deles, por certo, cumpriram-se outros
trâmites menos tangíveis, para unir sócios, alinhavar interesses, fazer escolhas.
A constituição legal da empresa ocorreu em novembro. Seu nome: Fiação e Tecelagem São
José, Limitada. Sua sede: avenida Gomes Freire, Mariana. Objeto: “exploração da indústria
de fabricação e comércio de tecidos, ou outras que lhe sejam conexas”. Capital: 600 contos
de réis. Duração prevista: trinta anos102.
Quatro foram os fundadores da fábrica, cada um dos quais dispondo de 150 contos de réis.
Oscar Magalhães Ferreira era “bisneto de Antonino Mascarenhas, portanto, Mascarenhas
da quarta geração”103, família associada, desde o século XIX, à primeira fábrica de tecidos
movida a força hidráulica, a Cedro, no município de Sete Lagoas, Minas Gerais104.
Oscar Ferreira havia se formado em engenharia em 1921 e trabalhado na Estrada de Ferro
Central do Brasil e na Prefeitura de Belo Horizonte. Pouco tempo depois, ingressou no setor
têxtil como gerente da Companhia Industrial de Belo Horizonte, prestigiosa fábrica da capital mineira. A atividade empresarial o levou a atuar nas entidades de classe então existentes
no estado, ampliando o círculo de contatos, relacionamentos, interesses – foi sócio e diretor
da ACMG e ocupou a vice-presidência da Federação das Indústrias de Minas Gerais105.
Nessa trajetória, é possível que Oscar Ferreira tenha encontrado as pessoas certas para a
fundação da São José. Emygdio Berutto, de ascendência italiana, nascido em Ouro Preto, foi
seu colega de turma no curso de engenharia e também trabalhou em estradas de ferro106;
102. JUCEMG. Contrato de sociedade por quotas de responsabilidade limitada sob a denominação FIAÇÃO E TECELAGEM
SÃO JOSÉ, LIMITADA, nov. 1933. Arquivamento 14.338. s.p.
103. TAMM, Paulo. Uma dinastia de tecelões. 2 ed., s/l: s/e. 1960. p. 227-228.
104. “Sem auxilio dos poderes publicos, contando somente com os proprios capitaes, os irmãos Mascarenhas, investindo
contra preconceitos, a rotina e a descrença geral, vencendo embaraços desanimadores, fundarão na freguezia do Taboleiro,
municipio de Sete Lagoas, em 1868 a primeira fabrica de tecidos movida a força hydraulica.” In: FALLA que o exmo. sr. dr.
Antonio Gonçalves Chaves dirigio á Assembleia Provincial de Minas Geraes, na 2ª sessão da 24ª legislatura, em 2 de agosto
de 1883. Ouro Preto: Typographia do Liberal Mineiro, 1883. p. 40.
105. Sobre Oscar Magalhães Ferreira, ver: ACMG. ACTA da sessão semanal da directoria, 9 set. 1932.In: Actas 1932 a 1934. f.
59; ACMG. Matrícula. p. 127; DR. OSCAR Magalhães Ferreira. Minas Gerais, Belo Horizonte, 17 maio 1941. Luto. p. 9; 18 maio
1941, p. 11; ESTADO DE MINAS. Belo Horizonte, 17 maio 1941. p. 3; FEDERAÇÃO das Industrias de M. Geraes. Revista da
Producção, Bello Horizonte: Secretaria da Agricultura, Industria, Commercio e Trabalho, abr. 1937, anno I, n. 2, p. 24; JUCEMG.
Contrato de sociedade por quotas de responsabilidade limitada sob a denominação FIAÇÃO E TECELAGEM SÃO JOSÉ,
LIMITADA, nov. 1933. Arquivamento 14.338. s.p.
106. JUCEMG. Contrato de sociedade por quotas de responsabilidade limitada sob a denominação FIAÇÃO E TECELAGEM
SÃO JOSÉ, LIMITADA, nov. 1933. Arquivamento 14.338. s.p.; CMSFiemg. ENTREVISTA Aristides Mário Rache Ferreira. CDR
nº reg.: 210, 21 maio 1998; DR. EMÍDIO Berutto. Minas Gerais, Belo Horizonte, 4 jul. 1950. Luto. p. 9.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
E A S MÁQUIN A S A NDA R A M . . .
48
49
O acordo entre os fundadores, concretizado no registro da firma junto aos órgãos competentes, se deu em um momento em que pelo menos duas outras questões já haviam sido
encaminhadas. A primeira, o maquinário. Ao que se sabe, Oscar Ferreira aceitou a oferta
de uma fábrica que fora fechada no Rio Grande do Sul, terra de seu pai, o que resultou na
aquisição de maquinismos usados, mas necessários109.
A segunda questão envolveu diretamente os agentes do poder público de Mariana. Data de
outubro de 1933 a petição dirigida ao prefeito municipal, em que os sócios,
pelo lado direito, limitam com a casa e terreno do Sr. Manoel Teixeira da Fonseca e
destas até o Ribeirão do Carmo, com terrenos municipais, incluindo toda essa confrontação do lado direito a extensão total de cento e vinte e quatro metros e cincoenta centimetros; pelo lado esquerdo, limitam com o lote nº dez (10), assinalado na
referida planta e deste até o Ribeirão do Carmo, com terrenos municipais, medindo
toda a linha divisoria, do lado esquerdo, a extensão total de cento e dezesseis metros; pelos fundos, limitam com o Ribeirão do Carmo. [...]112.
Vista panorâmica de Mariana.
Em primeiro plano, o complexo da
Fiação e Tecelagem São José.
Décadas de 1940-1950
(aproximadamente).
Acervo Maria Clara Celestino Souza.
[...] pretendendo estabelecer uma fabrica de tecidos nesta cidade, pedem a V. Exa.
se digne conceder-lhes, para si ou empresa que organizarem, por aforamento, os terrenos necessarios as suas installações, situados na Avenida Gomes Freire, ao lado do
Rio Carmo [...]. Aos peticionarios parece escusado ponderar a V. Exa., espirito clarividente e judicioso, os beneficios de ordem economica, que tal emprehendimento
trará a esta cidade, contribuindo efficazmente para sua prosperidade e augmentando
o coefficiente das rendas municipaes. Por este motivo, que por certo calará no animo
de V. Exa., pedem a isenção de fóros pela concessão pretendida, assim como dos
impostos de industria e profissão e das demais taxas municipais [...]110
De fato, o pedido calou fundo no espírito do prefeito e do conselho consultivo, todos se
congratulando “com os nossos municipes, em geral, e com os habitantes desta cidade, em
particular, pela iniciativa dos requerentes que vêm assignalar o nosso progresso”111.
Em dezembro, o terreno da fábrica estava medido e demarcado, e o contrato de aforamento, assinado, com isenção de impostos e taxas municipais pelo prazo de seis anos.
Os 18 lotes tinham as seguintes confrontações:
107. JUCEMG. Contrato de sociedade por quotas de responsabilidade limitada sob a denominação FIAÇÃO E TECELAGEM
SÃO JOSÉ, LIMITADA, nov. 1933. Arquivamento 14.338. s.p.; ACMG. Matrícula. p. 8.
108. JUCEMG. Contrato de sociedade por quotas de responsabilidade limitada sob a denominação FIAÇÃO E TECELAGEM
SÃO JOSÉ, LIMITADA, nov. 1933. Arquivamento 14.338. s.p.; ACMG. Matrícula. p. 61; ENTREVISTA Aristides Mário Rache
Ferreira. doc. cit.
Vista panorâmica da região
onde existia a Fiação e
Tecelagem São José, em 2012.
109. ENTREVISTA Aristides Mário Rache Ferreira. doc. cit.; VR-HT-MA-040 A/B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
Foto Eugênio Sávio.
110. AGPM. Contrato de aforamento de terrenos do patrimônio municipal, nesta cidade, entre a Prefeitura de Mariana e a
Sociedade “Fiação e Tecelagem São José Ltda”. In: Livro de aforamentos; 31 out. 1891-23 out. 1936. f. 109.
111. Idem. f. 109v.
112. Idem. f.110v.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
[...] pela frente, a ‘Avenida ‘Gomes Freire’, numa extensão de cento e oitenta metros;
José Antônio Assumpção, “que abreviadamente se assigna J. Assumpção”, era um comerciante natural de Belo Horizonte, eleito sócio da ACMG em 1915107; e Gercino Barbosa
da Silva, domiciliado no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, era aí o representante da
Companhia Industrial Belo Horizonte, provavelmente com bom trânsito comercial entre
os grossistas – cinco ou seis portugueses que, endinheirados, açambarcavam a produção
inteira de uma fábrica para repassá-la ao varejo108.
50
51
O início do período da seca, maio de 1934, encontrou o processo de instalação da fábrica
já bastante avançado, sendo possível ao jornal O Cruzeiro anunciar a data de sua inauguração – agosto –, adiantar o número de teares quando ela estivesse completa – “uns 150” – e
augurar prosperidade aos distintos industriais fundadores pelas inúmeras famílias que, com
tal atividade, obteriam o necessário ganha-pão115. A 15 de agosto, a Fiação e Tecelagem São
José Limitada foi inaugurada:
Não obstante as chuvas incessantes destes ultimos dias, os serviços tiveram o andamento que se lhes podia dar, só não prosseguindo com o desenvolvimento desejado
por motivo de demora na remessa do material necessario á construcção e, há muito,
Às 16 horas, na Praça fronteira à Estação da Central, onde se ergue o grande edificio
despachado. No entanto, há três dias já vem aportando aqui parte desse material, o
da Fabrica de Tecidos S. José, teve lugar a cerimonia de bênção e inauguração de mais
que faz crer que em janeiro se intensifiquem as citadas obras114.
esse importante melhoramento para a cidade de Marianna. Recebido o Snr. Nuncio Apostolico [D. Benedito Aloisio Masella], o Interventor [Benedito Valadares],
Secretarios, Bispos e Sacerdotes, pelos ilustres industriaes capitalistas, foram todos
introduzidos no recinto da grande fabrica, que estava caprichosamente ornada de
flores e bandeiras.
Terminada a cerimonia de bênção, que foi feita pelo Nuncio Apostolico, e auxiliada
por Dom Helvecio e Bispos presentes, usou da palavra o Dr. Augusto Freire de
Andrade, que discursou brilhantemente saudando os presentes [...]
Ao champagne falou o Dr. Oscar Assumpção [...] que, em ligeiras palavras, agradeceu
a honra da presença do Snr. Nuncio, Interventor e demais autoridades naquella util
realização que acabara de ser entregue ao bem comum da colletividade de Marianna,
demonstrando o quanto de progresso e vida adviria para a cidade desse centro de
atividade que acabara de ser inaugurado com as bênçãos de Deus e da Egreja116.
Provavelmente presente à cerimônia, o primeiro gerente da fábrica, Emygdio Berutto, não
deve ter se esquecido do sentimento de quase incredulidade que os maquinismos – usados, desmontados no Sul, transportados, remontados em Mariana – lhe causaram quando
postos em movimento, a ponto de lhe fazer enviar um telegrama para Belo Horizonte:
“Oscar, e as máquinas andaram...”117.
Fundadores da Fiação e Tecelagem São José inspecionado as obras de construção da
fábrica, na segunda metade da década de 1930. In: BERMAN, Debora; HABIB, Roseane
Luz. 150 Anos da Indústria Têxtil Brasileira. Rio de Janeiro: Senai-Cetiqt/Texto & Arte,
2000. p. 150. Acervo Centro de Memória do Sistema Fiemg. Foto Eugênio Sávio.
115. MARIANNA. O Cruzeiro, Marianna, 05 maio 1934. p. 4.
113. “Com o inicio da construcção do seu edificio; a ‘S. José Limitada’ teve que demarcar, no antigo campo da avenida ‘Gomes
Freire’, a area necessaria; de modo que o estaqueamento e a abertura das caixas para os alicerces do edificio já foram feitos,
ficando assim privado o treino naquelle campo.” M.F.C. O Germinal, Marianna, 26 dez. 1933. Columna esportiva. p. 2.
116. A fábrica foi inaugurada no mesmo dia em que se abriam as portas do Seminário de São José, obra de destaque levada
a efeito por iniciativa de Dom Helvécio Gomes de Oliveira. Cf.: A GRANDIOSA solennidade da inauguração do Seminario
S. José, em Marianna. O Cruzeiro, Marianna, 19 set. 1934. p. 4. Não foi possível precisar a atuação de Augusto Gomes Freire de
Andrade (agente executivo municipal de 1927 a 1931) no processo de instalação da fábrica, mas, por uma notícia da época,
sabe-se que foi relevante: “Que tenha sinceros imitadores o gesto patriótico do Dr. Augusto Gomes Freire de Andrade, a cujos
insistentes esforços se deve a fundação aqui da importante industria. Seu nome ficou tão ligado a este emprehendimento,
que não é possível falar-se de um sem lembrar o outro.” Cf.: FABRICA de Tecidos. O Germinal, Marianna, 10 nov. 1934. p. 1.
114. “S. José Limitada”. O Germinal, Marianna, 26 dez. 1933. p. 1.
117. ENTREVISTA. Aristides Mário Rache Ferreira. doc. cit.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Como hoje, dezembro era um mês chuvoso, mas isso não impediu o início das obras de
construção do prédio da fábrica. No terreno aforado – onde, até então, o time do Marianense Futebol Clube realizava seus treinos113 –, foi feito o estaqueamento e a abertura das
caixas para os alicerces do edifício. Um dia após o Natal, o jornal O Germinal informava que,
52
53
Na edição de abril de 1937, a Revista da Producção trazia alguns dados sobre a importância
da indústria têxtil em Minas Gerais. Havia 78 fábricas de fiação e tecelagem, número que
colocava o estado em segundo lugar dentre as regiões manufatureiras do Brasil (São Paulo
contava com 114 estabelecimentos)118. No interior do parque industrial mineiro, essas 78
fábricas só perdiam para o setor de laticínios, como se vê no gráfico a seguir.
REVISTA DA PRODUCÇÃO.
Bello Horizonte: Secretaria da Agricultura,
Industria, Commercio e Trabalho,
abril de 1937, anno I, n. 2, p. 49.
Acervo Centro de Memória do Sistema Fiemg.
Foto Eugênio Sávio.
118. REVISTA DA PRODUCÇÃO. Op. cit. p. 49.
A lista das empresas é extensa. Aqui se apresenta uma seleção, capaz de mostrar a dispersão delas por Minas Gerais, os dados concernentes à São José e sua posição relativa às
demais fábricas.
Número
de fusos
Número
de teares
Municípios
Firmas
1.
Barbacena
Cia. Fiação
e Tecidos
Barbacenense
5.620
201
2.
Bello
Horizonte
Cia. Industrial Bello
Horizonte
22.528
589
3.
Bello
Horizonte
Cia. Fiação e
Tecidos de Minas
Geraes S/A
12.044
371
4.
Bello
Horizonte
Cia. Minas Fabril
3.800
62
5.
Curvello
Cia. Fiação e
Tecidos Cedro e
Cachoeira
7.158
50
6.
Diamantina
Cia. Fiação e
Tecidos de Beriberi
4.806
142
7.
Itabira
Cia. Fabril da
Pedreira
1.670
65
8.
Itabirito
Cia. Itabirito
Industrial de Fiação
e Tecelagem
2.144
80
9.
Itabirito
Cia. Industrial
Itabira do Campo
3.600
130
10.
Itajubá
Cia. Industrial Sul
Mineira
8.000
324
11.
Itaúna
Cia. Industrial
Itaunense
6.772
250
12.
Itaúna
Cia. Tecidos
Santanense
5.350
200
13.
Juiz de Fóra
Irmãos Surerus
21.528
602
14.
Marianna
Fiação e Tecidos
São José Ltda.
4.312
135
15.
Montes
Claros
Fabrica da Cidade,
Luiz Pires
2.270
72
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
NOVA SEDE
54
55
Firmas
Número
de fusos
Número
de teares
Ouro Preto
Cia. Industrial
Ouropretana S/A
5.172
149
Paraopeba
Cia. Fiação e
Tecidos Cedro e
Cachoeira
5.260
200
Santa Lusia
Cia. Fiação e
Tecidos Cedro
e Cachoeira São
Vicente
7.000
224
19.
São João
del-Rei
Cia. Fiação e
Tecelagem São
João del-Rei
6.084
150
20.
Uberaba
Cia. Fabril
Triangulo Mineiro
2.100
133
16.
17.
18.
Tabela adaptada de: Fábricas de Fiação e Tecelagem existentes no Estado de
Minas Gerais. Revista da Producção, Bello Horizonte: Secretaria da Agricultura,
Industria, Commercio e Trabalho, abr. 1937, anno I, n. 2, p. 48.
O levantamento publicado pela Revista da Producção foi um dos poucos a que se teve
acesso no que diz respeito à especificidade da São José de Mariana. Quando a revista fez
sua pesquisa, talvez ainda não lhe tivesse chegado a informação de que os quatro sócios
fundadores haviam feito uma alteração contratual em 1936. Oito novos cotistas foram
admitidos, a maioria dos quais comerciantes domiciliados no Rio de Janeiro; apenas José
Edwards Ribeiro, cunhado de Oscar Ferreira, residia nessa época em Mariana119.
O capital social passou a ser de 2.400 contos de réis, dividido em 2.400 cotas de um conto
de réis cada. Metade do valor já havia sido realizada “com entradas em dinheiro e lucros
verificados no balanço encerrado em 31 de Dezembro de 1935”; a outra metade deveria
ser paga em dinheiro, em prestações mensais. A sociedade seria administrada por uma
diretoria composta por três diretores, tendo sido investidos nessa função Gercino Barbosa
da Silva, José Edwards Ribeiro (também gerente) e John McGowan Glen120.
119. Os novos sócios foram assim identificados: José Edwards Ribeiro, brasileiro, engenheiro, residente em Mariana; e,
domiciliados no Rio de Janeiro, João Ildefonso da Silva, brasileiro, industrial; John McGowan Glen, inglês, comerciante; José
Duarte Martins Caldeira, português, comerciante; Cícero Fernandes da Costa, brasileiro, comerciante; José Hermínio de
Castro, brasileiro, comerciante; Francisco Miranda, brasileiro, comerciante; Antônio Duarte Martins, português, comerciante.
JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada; fev. 1936. Arquivamento 15.440 A. s.p.
120. Idem. Ibidem.
A grande novidade, que parecia atestar o acerto do empreendimento, foi a abertura de
outra Fiação e Tecelagem São José Limitada, agora na cidade mineira de Barbacena, que
passou, então, a ser a sede da empresa121.
A listagem mais próxima à da Revista da Producção encontrada pela pesquisa traz dados
relativos ao ano de 1939, e nela a São José é uma só, independentemente do local de
funcionamento.
Nome
Fundação
Capital em
contos
Teares
Quilos
Produção
em contos
Cia. Fiação
e Tecidos
Beriberi,
Diamantina
1884
1.300
144
120.000
1.000
Cia. Cachoeira
de Macacos,
Sete Lagoas
1886
2.500
193
254.750
2.500
Cia. Têxtil
Bernardo
Mascarenhas,
Juiz de Fora
1888
1.600
312
461.311
7.000
Cia. Tecidos
Santanense,
Itaúna
1891
2.000
215
206.379
1.860
Cia. Industrial
São Joanense,
São João del Rei
1891
300
156
329.927
2.970
Cia. Industrial
Itabira do
Campo, Itabirito
1892
720
140
124.889
1.150
Cia. Industrial
Belo Horizonte,
Belo Horizonte,
Pedro Leopoldo,
Cachoeirinha
1906
9.000
689
950.701
10.000
Cia. Industrial
Itaunense,
Itaúna
1911
4.000
254
316.094
2.350
Cia. Industrial
Ouropretana,
Ouro Preto
1912
3.600
150
116.000
1.500
121. “A sociedade girará sob a denominação de Fiação e Tecelagem São José, tendo sua sede na cidade de Barbacena, Estado
de Minas Gerais.” Cf.: Idem. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Municípios
56
57
Fundação
Capital em
contos
Teares
Quilos
Produção
em contos
promoveu, com vibração, estupenda parada, cujo aspécto organisador valeu-lhe calorosas manifestações de júbilo por parte da população, tornando-se pelo seu ineditismo uma das maiores solenidades do dia.
Cia. de
Melhoramentos
Pará de Minas
1920
3.000
112
109.066
1.490
Pela manhã, às 8 horas, celebrou-se u’a missa na Igreja da Ordem 3ª de São Francisco
oficiando-a o revmo. Cônego Marcial Muzzi, Cura da Catedral, que falou ao Evange-
Fiação e
Tecelagem
São José Ltda.,
Mariana,
Barbacena
lho, produzindo magnifica oração congratulatoria ao trabalho.
1934
3.000
359
230.999
6.000
A essa ceremonia liturgica compareceram todos os operarios da cidade, tendo partido da sede da Fábrica São José, todos os operarios, operarias, Diretores e demais funcionarios do Escritorio, precedidos pela Corporação Musical ‘União 15 de
Tabela adaptada de: MOREIRA, Vivaldi. Panorama Industrial de Minas Gerais.
In: Anuário comercial e industrial de Minas Gerais.
Belo Horizonte: ACM/Fiemg, jan. 1946, ano I, n. 1, p. 80-1.
­Novembro’.
Terminado o Santo Sacrificio, em frente á igreja de São Francisco, usou da palavra o
sr. Benjamin Lemos, Redator-gerente desta Folha e Chefe do Escritorio da Fábrica, o
Entre 1936 e 1939, nova alteração contratual122 elevou o capital da empresa para três mil
contos de réis, como aparece na tabela acima. E é desse período o início das várias transferências de cotas: de J. Assumpção e Emygdio Berutto para o engenheiro e diretor da
Associação Comercial Vicente Assumpção; de Oscar Ferreira para sua mãe, Olga Magalhães
Ferreira; de John Glen para Oscar e Gercino Barbosa; e a parte que coube a Carmosina
França d’Assumpção quando do falecimento do primeiro dos quatro fundadores, seu marido José Antônio Assumpção, que mal teve tempo de ver a nova sede funcionar123.
qual, em nome desta, pronunciou bem elaborado discurso alusivo á data, com elucidar os primordios da organização social trabalhista nos moldes cristãos. A sua oração
foi calorosamente aplaudida.
A seguir, reorganizou-se a passeata trabalhista, acompanhando-a a Corporação Musical ‘União 15 de Novembro’ a qual percorreu as principais ruas da cidade na maior
vibração e perfeita organização.
[...]
ENTRE DUAS FESTAS
Oxalá que todos os anos se verifique com o mesmo entusiasmo essa virtuosa Festa
Trabalhista124.
Na lembrança de ex-funcionárias da fábrica de Mariana, o 1º de Maio costumava ser antes
festivo do que reivindicador, e isso mesmo em anos anteriores a 1955, quando o Papa Pio
XII consagrou o dia a “São José Operário, o trabalhador”.
Assim, em 1941 a Folha Mariana trazia, em hipérbole, detalhes da festa:
As classes trabalhistas se reuniram e confraternizaram-se amistosamente ao ensejo
da grande efeméride, promovendo grandes solenidades, a que não faltou o concurso
brilhante da Fábrica de Tecidos São José Ltd., desta cidade, que, em numero elevado,
122. JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, maio 1937. Arquivamento 16.391. s.p. Como
novo sócio, aparece o nome de Vicente Assumpção.
123. Sobre a transferência de cotas nesse período, ver, por exemplo: JUCEMG. Contrato de transferência de cotas da Fiação
e Tecelagem São José, Limitada, que entre si fazem Dr. Emygdio Berutto e Dr. Vicente Assumpção. Arquivamento 15.548; J.
Assumpção e Vicente Assumpção. Arquivamento 15.493. s.p.; John McGowan Glen e Gercino Barbosa da Silva. Arquivamento
16.649. s.p.; John McGowan Glen e Oscar Magalhães Ferreira. Arquivamento 16.650. s.p.; D. Carmosina França d’Assumpção e
Vicente Assumpção. Arquivamento 16.760. s.p.; Oscar Magalhães Ferreira e Olga Magalhães Ferreira. Arquivamento 16. 818. s.p.
Difícil saber se outro 1º de Maio conseguiu despertar igual entusiasmo. Sabe-se que a data
foi comemorada, com alegria, em anos subsequentes. Em geral, a fábrica oferecia um lanche
reforçado pela manhã, após a missa celebrada no amplo espaço ao redor de seu edifício.
Depois, brincadeiras, músicas, teatro.
Eva Lemos Paiva, prima de Benjamin Lemos e funcionária da São José de 1946 a 1959,
certa vez representou uma viúva. Roupa preta, sapato preto, meia preta, ela dizia: “Eu sou
é uma viúva muito feliz / Meu marido chamava Luiz / Era calado, obediente / Comia pouco
e não tinha dente”. E o coro das donas de preto entoava: “Quatro viúvas, quatro coitadas
/ Quatro viúvas desamparadas / Não têm marido, não temos nada / Têm perna bamba e
a cara enrugada”125.
124. O DIA do Trabalho comemorado brilhantemente em Mariana. Folha Mariana, Mariana, 22 maio 1941. p. 4.
125. VR-HT-MA-049 - Eva Lemos Paiva.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Nome
58
59
Partindo de lugares diferentes, dois discursos se encontraram na festa:
Nesta casa, Sr. gerente, onde existe uma
prece perene de cada dia, a par das sinfonias
das máquinas e do estrídulo magestoso que
move tôdas as atividades, não existe o desânimo e a tristeza; mas, sôbre tudo paira uma
visão mais ampla e significativa: - É o nosso
dever, o cumprimento sagrado de nossas
obrigações, a obediência aos postulados da
disciplina e da ordem, que gera a paz e a felicidade de tôdos.
(Senhorinha Maria José Teixeira, em nome
das moças operárias). In: CONFRATERNIZAÇÃO entre operários e dirigentes da
Fiação e Tecelagem São José S.A. de Mariana.
Diário de Minas, Belo Horizonte, 19 dez.
1952. p. 5.
O trabalho honesto que enobrece a quem o
pratica tem o seu exemplo sublime quando
o Menino Jesus ajudava seu Pai no ofício de
carpinteiro. É este quadro que toda família
católica tem em sua sala. Símbolo sagrado
do Trabalho, São José dando nome à nossa
organização, é, portanto, nosso patrono. [...]
Uma fábrica como a nossa é uma célula de
trabalho onde se forjam a nossa economia e
o bem-estar de todos; mas para isso é necessário que empregados e empregadores
compreendam que são eles os construtores,
de fato, do nosso progresso, marchando
lado a lado para frente e para cima.
(Caetano Barbosa Mascarenhas, gerente
geral). In: CONFRATERNIZAÇÃO entre
operários e dirigentes da Fiação e Tecelagem São José S.A. de Mariana. Diário de
Minas, Belo Horizonte, 19 dez. 1952. p. 5.
Olhando para trás, para o período decorrido entre uma festa e outra, vê-se que certas
coisas haviam mudado na São José. Oscar Ferreira, até falecer em 1941, permaneceu no
cargo de gerente da Cia. Industrial Belo Horizonte e proprietário da São José; Emygdio
Berutto manteve sua condição de cotista mesmo assumindo uma diretoria da então
Companhia Vale do Rio Doce, e faleceu em 1950; e sobre Gercino Barbosa da Silva, a
última notícia a que se teve acesso foi a de transferência de suas cotas em maio de 1952.
Funcionários e diretoria da Fiação e Tecelagem São José durante comemoração
de Natal, na escadaria da capela de São Francisco de Assis, em Mariana.
Década de 1950 (aproximadamente).
Acervo João Luiz dos Santos.
126. CONFRATERNIZAÇÃO entre operários e dirigentes da Fiação e Tecelagem São José S.A. de Mariana. Diário de Minas,
Belo Horizonte, 19 dez. 1952. p. 5.
127. De acordo com o jornal, participaram das competições: Rubens de Castro Magalhães, Amadeu da Silva, Ataliba da Silva,
Antônio Cirino Xavier da Silva, Wilson de Meira, José Adriano Severino, Adão Lemos, Adelino José de Souza, Waldenor Batista,
Alonso da Motta, José Miguel, Raimundo Inácio (corrida em marcha a ré); Juraci de Oliveira, Maria José T. Soares, Alvarina G.
Carvalho, Maria Imaculada Silva, Efigênia, Jair Dias, José Florentino Diniz, João Batista Ferreira, Rubens de Castro Magalhães,
José Raimundo da Costa (corrida do cigarro); Maria Aparecida da Silveira, Inês dos Santos, Emília de Souza, Maria José André
e Adalete Iva (jogo das maçãs). Idem. Ibidem.
Na trajetória de desaparecimento e substituição dos sócios fundadores, o aumento progressivo do número de cotistas – muitos dos quais parentes (esposas, filhos, irmãos,
cunhados) – não significou uma pulverização, já que as famílias Ferreira e Berutto se
tornaram majoritárias.
Outubro de 1952 é um bom momento para se observar esse e outros pontos de mudança na São José. Naquela data, o processo anterior de discussões e propostas adquiriu
a forma de escritura pública128 que trazia, como se pode ver no Anexo II, nome, estado
civil, profissão, domicílio e participação de cada um dos 59 proprietários da empresa.
128. JUCEMG. Escritura pública passada no Cartório do Segundo Ofício de Notas, em 10 de outubro de 1952, que transforma
a sociedade por cotas de responsabilidade limitada Fiação e Tecelagem São José em sociedade anônima. Arquivamento
58.871. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Uma década separa o 1º de Maio noticiado por Folha Mariana da festa de confraternização
de Natal promovida pela São José e estampada, página inteira, no Diário de Minas126.
O evento ocorreu em dia de máquinas paradas, domingo, 14 de dezembro de 1952. Como
de costume, primeiro a missa na igreja São Francisco, com a participação do coro formado
por moças da fábrica; às 9h30, concentração no pátio da empresa para as homenagens
sob a forma de discursos, de entrega de flores, distribuição do abono de Natal aos trabalhadores e brinquedos às crianças filhas de operários. A Corporação Musical União 15 de
Novembro marcou mais uma vez sua presença, e houve churrasco, baile, jogo de maçã,
corrida em marcha a ré e corrida do cigarro127.
60
61
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Essa participação se fazia, agora, por meio de ações, e não mais de cotas – a São José havia
deixado sua natureza Limitada e se tornado Sociedade Anônima.
A escritura também indicava uma alteração então recente. As propagandas encontradas
em nossa pesquisa permitem visualizar tal mudança.
Propaganda veiculada no
Diário de Minas, Belo Horizonte,
25 de dezembro de 1952. seção 5. p. 1.
Acervo Hemeroteca Histórica da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Moreira, Vivaldi W.
Anuário Comercial e Industrial
de Minas Gerais, Belo Horizonte,
jan. 1946, ano I, n.1, p. 85.
Acervo Arquivo Público Mineiro.
Foto Eugênio Sávio.
Não se sabe a época em que a fábrica se desfez do escritório do Rio de Janeiro. Sabe-se
que o que mudou em Mariana foi o nome da avenida onde a São José sempre esteve –
de Gomes Freire para Presidente Vargas129 − e que foi em 1952 que a sede da empresa
passou a ocupar, depois de um breve tempo na rua Caetés, as salas do edifício Acaiaca, o
mesmo que abrigava o Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem de Minas Gerais130.
129. Em 8 de novembro de 1938, com a promulgação do Decreto-Lei 12/38, a avenida Gomes Freire passou a se chamar
avenida Presidente Vargas.
130. Na escritura pública de outubro de 1952, há registro de localização da sede da empresa no edifício Acaiaca. Em dois
contratos de transferência de cotas, datados de maio do mesmo ano, a sede está na rua Caetés, 386, 6º andar, salas 602/4/6,
em Belo Horizonte. Cf.: JUCEMG. Contrato de transferência de cotas da Fiação e Tecelagem São José Limitada que entre si
fazem Gercino Barbosa da Silva e Íris Rache Magalhães Ferreira. Arquivamento 57.981. s.p.; Gercino Barbosa da Silva e José
França Gontijo. Arquivamento 57.986. s.p.
Propaganda veiculada
na revista Vida Industrial.
Belo Horizonte: Fiemg, abr. 1956, p. 13.
Acervo Centro de Memória do Sistema Fiemg.
Foto Eugênio Sávio.
62
63
Tais aumentos, via de regra, se faziam em prestações mediante chamadas da diretoria e/
ou com a transferência de determinadas importâncias para a conta de capital. Assim, em
1940, 750 contos de réis foram transferidos dos Fundos de Reserva e de Depreciação de
Imóveis e Maquinismos132. Para o ano de 1942, quando se transferiram 4.500 contos de réis
conforme balanço de 31 de dezembro de 1941, o quadro é mais detalhado.
Talvez uma forma de entender os números seja buscar em Mariana outros números, em
anos muito próximos a esses. Por exemplo, nas coisas mínimas, como a diária no Hotel
Central, que variava de 20 a 30 cruzeiros. Ou em dados mais robustos, de 1947 – o valor
total geral da produção agrícola do município: Cr$ 16.911.996,00; o valor da produção extrativa: Cr$ 15.318.719,00; o valor de sua indústria de laticínios: Cr$ 1.203.613,00; e o valor
da fiação e tecelagem: Cr$ 2.964.430,00134.
de Fundo de Reserva
559:212$528
Entre um ponto e outro, o imposto pago à prefeitura por alguns negócios da cidade, sem
computar o desconto. A tabela a seguir apresenta uma seleção das atividades então existentes em Mariana. A escolha dos três anos se explica por terem sido o momento em que o valor do imposto devido pela São José à prefeitura sofreu alteração. Para todos os anos consta
o negócio cujo valor do imposto está imediatamente abaixo daquele pago pela fábrica:
de Fundo de Depreciações
242:945$751
Imposto sobre Indústria e Profissões
de Maquinismos (Fabrica de Barbacena)
- valorização de 100% sobre o s/ custo em 31/12/1941
2.156:850$100
de Maquinismos (Fabrica de Mariana)
- valorização de 100% sobre o s/ custo em 31/12/1941
1.215:572$591
de Oficina de gravação e seção eletrolítica
- valorização de 100% sobre s/ custo em 31/12/1941
de Ações da Cia. Força e Luz Marianense - valorização de 1140
ações desta Cia., sobre o s/ custo considerado em 31/12/1941
TOTAL (quatro mil e quinhentos contos de réis)
Ano
Nome do
contribuinte
Especificação
Abdo Nahim
Faz.- armarinho etc.
953,00
Banco Minas Gerais S/A
Agência bancária
500,00
Benjamim Gomes de
Carvalho
Alfaiataria
360,00
Chaves e Irmãos
Gen. Beb. Faz. etc.
2.239,00
Cia. Minas da Passagem
Faz. Gen, Beb. etc.
5.650,00
Enoque do Carmo
Farmácia
Fiação e Tecelagem São
José Ltda.
Fábrica de tecidos
7.242,00
Marianense Foot-Bal Club
Jogos permitidos
255,00
Pio Porto de Menezes
Gerente da fábrica de
tecidos
60,00
Salvador Tropia e Irmão
Cinema
210,00
Vicente Cândido da Silva
Hotel com 16 quartos
385,00
Imposto
115:103$500
210:315$530
Rs 4.500:000$000
JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, jun. 1942.
Arquivamento 21.655. s.p.
E, em 1946, nove milhões de cruzeiros se realizaram com a transferência das seguintes
Contas, conforme Balanço encerrado em 31 de dezembro de 1945, a saber:
Saldo da Conta ‘Lucros e Perdas’ .......................... Cr$ 8.492.215,73
Parte da Conta ‘Fundo de Reserva ..................... Cr$ 507.784,27
TOTAL ................................................................................. Cr$ 9.000.000,00133.
131. Sobre esses aumentos, ver, respectivamente: JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada,
maio 1937. Arquivamento 15.391. s.p.; Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, fev. 1940. Arquivamento
18.701. s.p.; Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, jun. 1942. Arquivamento 21.655. s.p.; Alteração de
contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, mar. 1946. Arquivamento 28.770. s.p.
132. JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, fev. 1940. Arquivamento 18.701. s.p.
133. JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada, mar. 1946. Arquivamento 28.770. s.p.
1946
270,00
134. MUNICIPIO de Mariana. Boletim da Associação Comercial de Minas, Belo Horizonte: Associação Comercial de Minas
Gerais, jul. 1949, anno VIII, n. 105, p.51-53.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
A escritura ainda confirmava alterações ocorridas em anos anteriores. De 1937 a 1946, período no meio do qual a moeda brasileira mudou de réis para cruzeiros, houve por quatro vezes
aumento do capital social: de 2.400 para três mil contos de réis; de três mil para 4.500; de 4.500
para nove mil contos de réis, e 18 milhões de cruzeiros, valor mantido de 1946 a 1952131.
64
65
1948
1954
Nome do
contribuinte
Especificação
Imposto
Cia. Minas da Passagem
Faz. Gen. Beb. etc.
9.700,00
Cia. Siderúrgica Belgo
Mineira
Licença exportação
carvão
2.000,00
Clodomiro Silva
Gêneros, ferragens, etc.
4.300,00
Geraldo Ferreira
Carneiro
Farmácia
Irmãos Salim Mansur
Fazendas, etc.
3.366,00
Fiação e Tecelagem São
José Ltda.
Fábrica de tecidos
14.544,00
José Agostinho Mesquita
Marcenaria
810,00
Nicanor de Oliveira Mota
Sapataria
620,00
Pio Porto de Menezes
Gerente da fábrica de
tecidos
240,00
Rita de Souza
Pensão
340,00
Viúva José Verona
Padaria
780,00
Ary Ferreira
Diretor-presidente da
fábrica de tecidos
570,00
Amâncio Arinos de
Queiroz
Farmácia
810,00
Banco da Lavoura de
Minas Gerais S/A
Agência bancária
1.000,00
Cia. Minas da Passagem
Faz. Gen. Beb. etc
8.912,50
Clodomiro Silva
Gêneros, etc.
5.442,00
Fiação e Tecelagem São
José S/A
Fábrica de tecidos
16.000,00
Geraldo Cotta
Açougue
185,00
Idílio Cardoso Roriz
Selaria
279,00
Pedro Petrus
Fazendas, etc.
3.678,00
Raul José de Almeida
Botequim
1.122,00
Regina de Castro Queiroz
Livraria, etc.
1.020,00
360,00
Dados retirados de: AGPM. Imposto sobre Indústria e Profissões.
Passagem de Mariana: 1945-1947. Livro 01; 1948-1951. Livro 02; 1952-1955. Livro 03;
Mariana: 1945-1947. Livro 01; 1948-1951. Livro 02; 1952-1955 Livro 03.
Por fim, na escritura se estipulavam a existência do conselho fiscal e uma nova administração da sociedade – o diretor-presidente, o diretor vice-presidente e o diretor-secretário,
cargos em que foram investidos Ary Ferreira, Ildefonso Mascarenhas da Silva e Íris Rache
Magalhães Ferreira, respectivamente.
Ildefonso Mascarenhas da Silva: nascido em Taboleiro
Grande, formado em Direito e Medicina, professor
catedrático de Direito Civil na Universidade Federal
de Minas Gerais. Em 1946, assumiu a Secretaria de Educação de Minas Gerais, durante a interventoria de
Alcides Lins. Nomeado Desembargador do Tribunal de
Justiça do Estado da Guanabara em abril de 1969, faleceu em agosto do mesmo ano. Seus pais, João Ildefonso
da Silva e Francisca Mascarenhas da Silva, e os irmãos
Maria Mascarenhas Mendonça e Geraldo Mascarenhas
da Silva, foram acionistas da São José.
(Minas Gerais. Belo Horizonte, 7 ago. 1969. p. 4.)
Ary Ferreira: nascido em dezembro de 1896, seu pai
Cícero Ferreira foi médico da Comissão Construtora
de Belo Horizonte e liderou a fundação da Escola de
Medicina, da qual foi o primeiro diretor. Ary Ferreira
seguiu a carreira médica e foi professor da Escola de
Medicina de 1920 a 1956, quando se aposentou. Por 40
anos, chefiou a enfermaria de mulheres da Santa Casa
de Misericórdia de Belo Horizonte, e fundou e dirigiu a
Casa de Saúde Santa Clara durante 17 anos. Presidiu o
Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem e o Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Casas de Saúde de Minas
Gerais. Era casado com Maria Alice Magalhães Ferreira,
irmã de Oscar Ferreira, com quem teve sete filhos.
O escritor Pedro Nava se referiu a ele “como clínico
dos mais completos, o verdadeiro criador da Tisiologia
e Pneumologia em nosso Estado”.
(Minas Gerais. Belo Horizonte, 7 jun. 1978. Diário do
Legislativo. p. 8; Estado de Minas. Belo Horizonte,
13 maio 1978. p. 12.).
Dessa forma, as funções da administração antiga 135 foram rearranjadas, como a figura
do diretor-gerente que até então existia e durante vários anos teve o rosto de José
135. Na fundação da empresa, em 1933, ficou estabelecido que “a sociedade será administrada por um gerente, eleito entre
os sócios na reunião anual destes, tendo o mesmo gerente um substituto escolhido também entre os sócios, pela mesma
ocasião. [...] É desde já investido das funções de gerente da sociedade o sócio Dr. Emygdio Berutto e de seu substituto o sócio
J. Assumpção [...].” Cf.: JUCEMG. Contrato de sociedade por quotas de responsabilidade limitada sob a denominação FIAÇÃO
E TECELAGEM SÃO JOSÉ, LIMITADA; nov. 1933. Arquivamento 14.338. s.p. Em 1936, a sociedade era administrada por uma
diretoria composta de três membros, havendo ainda um gerente, “cargo que poderá ser ocupado por um dos directores
ou por pessoa nomeada pela Directoria [...].” Cf.: JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Limitada,
fev. 1936. Arquivamento 15.440 A. s.p. Na alteração contratual de 1942, consta que “a sociedade será administrada por três
diretores, sendo um diretor-gerente, um diretor-comercial e um diretor-secretário. [...] Ao diretor-gerente incumbe: a) – dirigir
todos os trabalhos do estabelecimento, providenciar a venda de seus produtos sempre que se tornar necessário, aquisição
da matéria prima e demais objetos necessários à sociedade, nomear e demitir livremente os empregados que trabalham sob
sua administração, marcar os ordenados e gratificações destes e autorizar os respectivos pagamentos, tudo de acordo
com a diretoria; b) – ter em boa guarda todos os bens, valores e documentos da sociedade; c) – fazer escriturar os
livros da sociedade. Ao diretor-comercial incumbe: dirigir e orientar comercialmente os negócios da empresa, juntamente
com o diretor-gerente. Ao diretor-secretário cumpre não só as funções que o próprio cargo indica, como também substituir
qualquer dos demais diretores e de acordo com a diretoria.” Cf.: JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São
José Limitada, jun. 1942. Arquivamento 21.655. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Ano
66
67
Abaixo da antiga e da nova administração, agindo de acordo com a diretoria e prestando-lhe contas, havia o gerente de cada fábrica. Em Mariana, por algum tempo dos idos de 40, a
função foi exercida por Pio Porto de Menezes, natural de Ouro Preto, professor da Escola
de Minas, vicentino fervoroso. Acompanhado de sua primeira esposa, Eneida Assunção Menezes, Pio Porto chegou a ocupar a Prefeitura de Mariana138 de 1945 a 1947. O casal é lembrado com carinho por funcionárias da São José, como a contramestre Juraci de Oliveira:
“Quando chegou um gerente, Doutor Pio, ele arranjou uma sala [...] com mesas forradinhas,
onde as pessoas deveriam entrar para a refeição. Arranjou tudo direitinho. Nessa época
é que eles arranjaram também uma professora para alfabetizar e tudo. [...] Quem entrava
para trabalhar às 14 horas chegava uma hora mais cedo. A professora estava lá e dava aula
para a gente. Quem saía às 14 horas ficava até as 15. Também era uma hora de aula. Era
bom mesmo, ajudou muito”139.
Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz, auxiliar de escritório, se lembra “muito bem de
Dona Eneida, uma senhora superdistinta [que] cuidou muito da parte espiritual do pessoal
[...] Seria, digamos assim, como uma assistente social-espiritual”140. Se alguém, por exemplo,
estivesse doente, Dona Eneida ia visitar, olhar o que precisava, como disse Juraci de Oliveira,
acrescentando: “Aqui não tinha hospital direito; às vezes arranjava internações em Belo
Horizonte para a pessoa que estava doente”141.
De outra parte, a Juventude Operária Católica (JOC)142 encontrou em Eneida Assunção o
apoio para deslanchar, reunir operárias aos domingos em um cômodo da fábrica, absorver
os ensinamentos da Bíblia e da igreja: “Eu sei muita coisa da religião que eu aprendi naquele
tempo, porque a gente bebia as palavras! [...] eu tinha sede de saber e via o pessoal mexendo com aquele assunto que eu queria saber. Era sobre religião. E lá eu fui com muita
vontade” – recordou Inês Brandão Pereira, fiandeira da fábrica de 1944 a 1950143.
Na confraternização de Natal em 1952, Pio Porto de Menezes havia cedido o cargo de
gerente para José Teófilo Vianna Clementino, que em seu discurso citou a JOC e ressaltou
o “movimento da Igreja pela dignificação do trabalho e para a formação de um clima [propício à] cordialidade entre patrões e empregados”144.
Ordem e disciplina, por certo, não eram valores novos cultivados especificamente pela
diretoria da São José, tampouco era novidade encontrar fundamentos para elas na religião
católica. Mas alguma coisa havia se passado entre as duas festas, alterado momentaneamente a marcha para a frente e para cima. Só assim se entendem as últimas palavras do gerente
geral Caetano Barbosa Mascarenhas, em 1952:
É necessário, também, que meus amigos compreendam que a Fiação e Tecelagem
136. Desde a alteração contratual de maio de 1937, José Edwards Ribeiro teve como domicílio a cidade de Barbacena. Em
1958, o vice-presidente Ildefonso Mascarenhas da Silva destacou o nome dele em reunião: “[...] grande acionista e antigo
diretor-gerente durante vários anos, cargo que deixou para ser prefeito de Barbacena [...]”. Cf.: JUCEMG. Ata da Assembleia
Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 15 mar. 1958. Arquivamento 88.334. s.p.
137. O nome de Ranor Thales Barbosa da Silva aparece na alteração contratual de março de 1946, como proprietário de
cinquenta cotas; depois, como adquirente das cotas do espólio de José Duarte Martins Caldeira. Seu nome consta como
contribuinte (diretor da Fiação e Tecelagem São José Ltda.) do Imposto sobre Indústria e Profissões da Prefeitura de Mariana.
E em ata da reunião ordinária da diretoria, de fevereiro de 1949, foi dito sobre ele: “[...] em face ao aumento de preços de
todas as utilidades e da elevação do custo de vida atual, seja concedida ao Diretor Comercial, Sr. Ranor Thales Barbosa da Silva,
a gratificação de treis mil cruzeiros mensais, a partir de janeiro do corrente ano, além dos honorários de cinco mil cruzeiros
mensais que o mesmo vem percebendo pró-labore.”. Ver: JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José
Ltda., mar. 1946. Arquivamento 28.770. s.p.; Contrato de transferência de cotas. Arquivamento 38.765. s.p.; AGPM. Imposto
sobre Indústria e Profissões. Mariana. 1948-1951. Livro 02; JUCEMG. Ata da reunião ordinária, anual, da Fiação e Tecelagem
São José, Ltda., 15 fev. 1949. Arquivamento 37.327. s.p.
138. O nome de Pio Porto de Menezes aparece na alteração contratual de março de 1946, como proprietário de quinhentas
cotas. No cargo de gerente da fábrica, foi contribuinte do Imposto sobre Indústria e Profissões da Prefeitura de Mariana
em 1946, 1948, 1949; na reunião da diretoria de fevereiro de 1949, o diretor-gerente José Edwards Ribeiro pediu um
voto de louvor ao “Dr. Pio Porto de Menezes, gerente da Filial em Mariana [...] pelos bons e eficientes serviços que vem
desempenhando [...].” Cf.: JUCEMG. Alteração de contrato da Fiação e Tecelagem São José Ltda., mar. 1946. Arquivamento
28.770. s.p.; AGPM. Imposto sobre Indústria e Profissões. Mariana. 1945-1947. Livro 01; 1948-1951. Livro 02; JUCEMG. Ata da
reunião ordinária, anual, da Fiação e Tecelagem São José, Ltda., 15 fev. 1949. Arquivamento 37.327. s.p. Ver também: ESTADO
DE MINAS. Belo Horizonte, 27 set. 1977, p. 22.
139. VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira.
São José S.A. não tem nenhum interesse em lesar a quem quer que seja, pois seus
administradores são descendentes de uma velha família que há mais de cinquenta
anos lida com tecelões e que sabem muito bem cumprir seus deveres patronais.
[...] As questões acaso surgidas foram oriundas de falta de compreensão de alguns
elementos e, agora, na maior harmonia, aqui estamos nesta festa tão bonita. E vós,
trabalhadores de Mariana, que tendes por solar esta lendária cidade que foi o berço
de nossa civilização, que conta uma história e tem uma tradição em cada canto, esta
cidade incrustada nestas montanhas que viu tirar de suas entranhas o ouro que fez a
140. VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz.
141. VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira.
142. No século XX, a Igreja Católica criou a Ação Católica Brasileira, movimento que buscava ampliar sua influência junto
aos leigos. Subdividia-se em: Juventude Agrária Católica (JAC), Juventude Estudantil Católica (JEC), Juventude Independente
Católica (JIC), Juventude Operária Católica (JOC) e Juventude Universitária Católica (JUC).
143. VR-HT-MA-057 A/B - Inês Brandão Pereira.
144. CONFRATERNIZAÇÃO entre operários e dirigentes da Fiação e Tecelagem São José S.A. de Mariana. Diário de Minas,
Belo Horizonte, 19 dez. 1952. p. 5.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Edwards Ribeiro – o qual permaneceu como acionista, presente às reuniões, e a isso acrescentou a carreira política em Barbacena, tornando-se prefeito da cidade de 1951 a 1955,
pelo Partido Social Democrático (PSD)136; e a figura do diretor comercial, cargo ocupado
durante parte da década de 1940 por Ranor Thales Barbosa da Silva137, parente de Gercino
Barbosa da Silva. Só o diretor-secretário se manteve inalterado, cargo e rosto de Íris Rache,
viúva de Oscar Ferreira.
68
69
E o ouro de vosso caráter veio mostrar-se de bom quilate quando repudiastes a
injustiça que quiseram cometer com o nosso sub-gerente, o dr. José Teófilo, com
a manifestação de vossa solidariedade, numa demonstração espontânea, traduzida
numa mensagem em que todos vós apusestes vossas assinaturas.
Nós vos agradecemos, pedindo a Deus que abençoe a todos para que possamos
continuar a luta pelo progresso do Brasil145.
Amém.
UM A CO INC IDÊNC IA
Festas são momentos excepcionais, que significam uma interrupção no cotidiano. O dia a
dia na fábrica era mesmo de trabalho.
O Germinal, uma vez, se referiu a José Teófilo como o “operoso gerente da Fiação e Tecelagem São José”. E listou algumas de suas obras: o novo pavilhão destinado ao cascamifício,
a distribuição gratuita de leite, a criação de uma despensa para fornecimento de gêneros
mais baratos e de melhor qualidade aos operários, os serviços médico e farmacêutico146.
“Tinha a hora do intervalo. Às nove
horas eles saíam com o leite, punham... Cada um tinha uma caneca
de alumínio [...] larga. Mas a gente não aguentava tomar o leite, era
muito leite que eles davam, com um
pãozinho.” (Alvarina Gomes de Carvalho, tecelã, VR-HT-MA-041)
“Ah, isso existia! O doutor Elias Salim
Mansur era o coisa. A gente pagava 10 cruzeiros de médico. Então a
gente tinha médico e remédio por 10
cruzeiros. Descontavam 10 cruzeiros
do pagamento e a gente tinha direito
a médico. O médico era muito bom.
Adoecia a criança em casa, ele ia em
casa e tal e coisa. Ah, 100%!” (Francisco Pedro da Silva, contramestre,
VR-HT-MA-042)
“O diretor [...] comprou um sítio
e começou a criar porco também.
Um sítio bonito, rapaz! Na saída de
Mariana aqui. [...] Então ele vendia a
carne para toda a fábrica. E matava
boi também. Ele comprava o boi, matava, trazia e vendia aí. Vocês podiam
comprar a carne que quisessem, na
quantidade que quisessem. Se comprasse muito, podia pagar de duas
vezes, descontado em folha. Se fosse
pouco, muito pouco, ele nem cobrava. Se fosse um quilo, um quilo e meio
– todo mundo comprava nessa média, que dava para passar quase uma
semana –, pagava.” (Augusto Amaral,
mestre, VR-HT-MA-038 A/B/C)
145. Idem. Ibidem.
146. DR. JOSÉ Teófilo Vianna Clementino. O Germinal, Mariana, 31 ago. 1953. p 1. Sobre ele, ver também: HOMENAGEM dos
empregados da Fábrica ‘São José’ ao seu gerente Dr. José T. M. Clementino e Senhora. O Germinal, Mariana, 30 jun. 1953. [p.4].
Consta que o operoso gerente chegou a acalentar outros planos. Um deles: “uma moderna
praça de esportes para os operários, com piscina, campos de vôlei, basket e ‘play-ground’
para as crianças”147. O segundo: a construção de casas para operários, na avenida Antônio
Pereira, cujos trâmites burocráticos se estenderam de 1952 a 1955148.
Ao que se sabe, nenhum dos dois planos se concretizou, talvez por razões que extrapolavam a área de decisões do gerente e se encontravam no âmbito da diretoria, dos proprietários, das prioridades da empresa e de avaliações de conjuntura.
Não houve praça nem casa, mas duas novas salas no edifício Acaiaca foram adquiridas pela
São José; um imóvel de 20 mil metros quadrados, aproximadamente, em frente à fábrica
de Barbacena, foi comprado; dois conjuntos do edifício Arariboia, no Rio de Janeiro, foram
vendidos, assim como a mata que a empresa possuía na cidade mineira de Antônio
Carlos149. Realizou-se estudo de reequipamento das fábricas e, sem mais necessidade deles,
a empresa vendeu um motor a diesel, sete cardas, uma calandra, dois passadores150.
E continuava a produzir e a vender e a aumentar seu capital, de 18 para 36 milhões de
cruzeiros, depois para 40, 43 e 50 milhões em 1958151.
Um pouco antes, em março de 1956, Ary Ferreira fez detalhada exposição sobre a situação
da empresa para os acionistas presentes à Assembleia Geral Ordinária. O balanço econômico relativo aos exercícios de 1951 a 1955 mostrava
147. CONFRATERNIZAÇÃO entre operários e dirigentes da Fiação e Tecelagem São José S.A. de Mariana. Diário de Minas,
Belo Horizonte, 19 dez. 1952. p. 5.
148. Representando a fábrica, José Teófilo solicitou, em 1952, o aforamento de 14 lotes com as seguintes divisas: “pelo lado
esquerdo com terrenos aforados ao Sr. Antônio Gonçalves Carneiro, pelo lado direito com terreno da Prefeitura e fundos
com a cerca da E.F.C.B. e pela frente com a Av. Antônio Pereira”. Em junho de 1954, dirigiu-se novamente ao prefeito: “Tendo
em vista o volume de serviços que representa a construção das casas para operários, à Avenida Antônio Pereira, conforme
contrato firmado por esta fábrica, e cujas obras desejávamos já ter iniciado e tendo em conta a dificuldade, no momento,
para a aquisição dos diversos materiais a serem empregados, solicitamos a V.S. a especial finêsa de nos conceder uma
prorrogação de prazo até fevereiro vindouro, para darmos como iniciada a construção do primeiro grupo de sete casas”.
Em agosto de 1955, o prefeito comunicava que “em entendimento pessoal com o Dr. Caetano Mascarenhas este se revelou
contrário ao cumprimento de quaisquer exigências de ordem legal, emanadas por esta Prefeitura, no tocante à apresentação
de plantas, demarcação e alinhamento, pelo que aguarde-se novo pronunciamento do interessado, enquanto não findar o
direito do requerente na concessão dos lotes”. Com o fim do prazo em novembro de 1955, tudo foi cancelado. AGPM.
Correspondências relativas ao requerimento nº 152, 25 jul. 1952; no 166, 9 jun. 1954; nº 262, 14 jun. 1955.
149. Sobre a transação dos imóveis citados, ver: JUCEMG. Atas da Assembleia Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São
José S/A, 28 fev. 1953. Arquivamento 60.484. s.p.; Assembleia Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 13 mar.
1954. Arquivamento 65.492. s.p.; Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 27 de nov. 1954.
Arquivamento 68.645. s.p.
150. Em setembro de 1956, a diretoria foi autorizada a vender esses equipamentos. Em dezembro do mesmo ano, diante da
possibilidade de investimento de capital mediante importação de máquinas, o presidente Ary Ferreira sugeriu a formação de
uma comissão para “estudar o assunto em seus aspectos técnicos e econômicos”, formada por Vicente Assumpção, Heitor
Barbosa Mascarenhas, Caetano Barbosa Mascarenhas e Aristides Mário Rache Ferreira. JUCEMG. Atas da Assembleia Geral
Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 29 set. 1956. Arquivamento 85.378. s.p.; Assembleia Geral Extraordinária
da Fiação e Tecelagem São José S/A, 30 dez.1956. Arquivamento 80.679. s.p.
151. Sobre esses aumentos, ver: JUCEMG. Atas da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 26
nov. 1952. Arquivamento 59.175. s.p.; 13 dez. 1953. Arquivamento 64.053. s.p.; 12 set. 1957. Arquivamento 85.379. s.p.; 12 fev.
1958. Arquivamento 87.531. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
riqueza de Portugal, tendes em vós mesmos um ouro muito mais precioso que são a
vossa bondade e o vosso caráter.
70
71
dice de solvabilidade de 1,48 para 1,75 – o que documenta a boa situação da Companhia. O Balanço Econômico evidencia ainda que nos exercícios de 1952-53-54 e
1955 foram distribuídos dividendos e bonificações no total de Cr$ 17.421.000,00
e que foram adquiridas máquinas e bens no valor de Cr$ 8.357.712,60 só no exercício de 1955152.
Mais uma vez, outros números podem ajudar a entender os apresentados pelo presidente
da São José. A diária de um hotel em Mariana, em 1955, variava entre 120 e 150 cruzeiros, se fosse quarto ou apartamento; pensão, 70 cruzeiros. Para o mesmo ano, o capital
empregado em toda a indústria extrativa mineral do município era de 24 milhões de
cruzeiros; na indústria manufatureira e fabril – tecidos de algodão, doce de leite, manteiga,
móveis de madeira e outras de menor importância –, o capital era de pouco mais de três
milhões de cruzeiros153. E o salário mínimo no país passou de Cr$ 2.400,00, em 1954, para
Cr$ 3.800,00 em 1956 e Cr$ 6.000,00 em 1959154.
A conjuntura desfavorável justificava mais um aumento de capital – “o capital social tornou-se [...] insuficiente e está exigindo o aumento proposto para facilitar a normalização
dos negócios da Companhia” (1958)156; ou “para evitar o pesado ônus decorrente dos
descontos bancários de duplicatas” (1959)157, ou ainda para a oportuna providência de
novas máquinas (1962). Nesse último ano, inclusive, dizia-se que “os balanços e contas
têm evidenciado que os negócios da Companhia prosseguem em ritmo ascensional,
tudo fazendo crer que esta situação não sofrerá solução de continuidade”158.
No meio de um quadro desfavorável, houve momentos em que dividendos não foram distribuídos para sua incorporação na conta Reservas; valores imobilizados, sem
vinculação com o andamento da indústria, foram vendidos “para reforço de capital de
giro”159; voltou-se atrás em avaliações do ativo imobilizado para fugir de nova carga
tributária160; contraiu-se empréstimo junto ao Banco do Brasil para financiamento de
matérias-primas161.
Parece que os anos imediatamente subsequentes à exposição de Ary Ferreira não mais
encontraram números tão favoráveis no desempenho da empresa. Estudos e avaliações
da época mostravam problemas que o setor têxtil em Minas Gerais enfrentava, de forma
pontual ou mais duradoura.
Em 1966, o relatório da diretoria sobre o exercício de 1965 afirmava ter sido esse um
ano muito difícil “não só pelos resultados, como pelas dificuldades de comercialização,
financiamento escasso e caro, mas também pelo contínuo esvaziamento do capital de
giro, assoberbado pela inflação e imobilizações financeiras compulsórias”162.
Assim, no próprio relatório da diretoria da São José, datado de dezembro de 1957,
lamentava-se
É bem verdade que a situação de crise extrapolava a São José e o relatório de sua diretoria. Um editorial do Diário de Minas tratava o alto custo do algodão, o aumento das
tarifas de eletricidade, a dependência das indústrias mineiras em relação aos grossistas
de São Paulo e Rio de Janeiro para a distribuição do produto e a ação dos bancos (descontam duplicatas a juros elevados e não concedem descontos de promissórias) como
explicações para a crise têxtil mineira163.
[...] o resultado negativo, explicável pela crise que atingiu toda a indústria têxtil do
ano de 1957 [...]. A elevação do preço dos salários, matéria-prima, acessórios, drogas e tintas etc. aumentaram necessariamente o custo da produção sem que tivesse
havido uma compensação no preço da venda da mercadoria manufaturada, sofrendo
esta até mesmo depreciação no comércio, em consequência do que trouxe um desajustamento na receita e na despesa observada nos balanços de grande número das
indústrias têxteis. A diretoria tem-se empenhado na remodernização das fábricas e já
conseguiu apreciável resultado em alguns setores e continua seriamente empenhada
156. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 12 fev. 1958. Arquivamento
87.531. s.p.
em estender esses melhoramentos às outras seções, principalmente à tecelagem.
157. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 21 mar. 1959. Arquivamento 95.090. s.p.
[...] Nas fábricas, apesar das dificuldades expostas, reina a melhor disciplina e um
compreendimento perfeito das dificuldades transpostas155.
158. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 20 set. 1962. Arquivamento
127.430. s.p.
159. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 14 set. 1965. Arquivamento
165.975. s.p.Ver também: JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 29 out. 1962.
Arquivamento 128.281. s.p.
152. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 02 mar. 1956. Arquivamento 75.543. s.p.
153. ENCICLOPÉDIA dos Municípios Brasileiros. Rio de Janeiro: IBGE, 1959. v 26, p. 49-57.
154. www.joaodefreitas.com.br. Acesso em: 10 out. 2012.
155. MINAS GERAIS. Belo Horizonte, 14 mar. 1958. p. 17. Consta do item “Imobilizado” do Balanço: Escritório Central
(imóveis, móveis e utensílios) – Cr$ 1.964.474,50; Fábrica Barbacena (imóveis, máquinas, móveis, utensílios, semoventes e
veículos) – Cr$ 33.617.321,60; Fábrica Mariana (imóveis, máquinas, móveis, utensílios e semoventes) – Cr$ 14.489.637,10.
160. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 12 set. 1957. Arquivamento
85.379. s.p.
161. JUCEMG. Atas da Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 30 dez. 1956. Arquivamento
80.679. s.p.; 21 mar. 1959. Arquivamento 94.981. s.p.
162. MINAS GERAIS. Belo Horizonte, 12 maio 1966. p. 14.
163. A CRISE têxtil. Diário de Minas, Belo Horizonte, 31 ago. 1965. p. 4.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
um acréscimo efetivo de Cr$ 32.930.391,60 no Patrimônio líquido, aumento no ín-
72
73
O estudo patrocinado pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais165 (BDMG)
diagnosticava o problema de maneira diferente. Havia que se considerar a baixa qualidade
da matéria-prima, a baixa produtividade da mão de obra, o obsoletismo da maquinaria têxtil
(48,3% com mais de trinta anos de uso) e a falta de capacidade empresarial, assim entendida:
O comportamento do empresário têxtil mineiro é típico das empresas induzidas pelo
mercado, o que vem ocasionar certa estabilidade estrutural, dificultando a introdução de melhorias técnicas que permitam a expansão da produção para a conquista
de novos mercados166.
As avaliações, como se vê, não eram concordantes. O que parecia fora de dúvida era a
capacidade ociosa da indústria têxtil mineira nos idos de 1960 (22,5%), bem como o fato
de ter sido um dos setores que mais haviam demitido funcionários167. E, mera coincidência,
a São José de Mariana ter tido a duração aproximada daquela estampada nos estatutos de
sua constituição, trinta anos.
Já então estava à frente da empresa a segunda geração dos fundadores: Aristides Mário Rache Ferreira, filho mais velho de Oscar Ferreira e Íris Rache, assumiu a gerência e, depois, a
presidência da São José logo que terminou o curso na Escola Técnica de Indústria Química
e Têxtil do Rio de Janeiro168; e Reynaldo Marques Berutto, filho de Emygdio Berutto e Edir
Vida Industrial.
Belo Horizonte: Fiemg, out. 1966.
Acervo Centro de Memória
do Sistema Fiemg.
Foto Eugênio Sávio.
O alto custo do dinheiro, a tributação excessiva, a queda do consumo intermediário, a restrição do crédito eram apontados como causas da crise, todas elas
fora do ambiente de ação dos empresários. O que eles puderam fazer já fizeram ou
estão fazendo: esforço de reequipamento, absorvendo toda a produção disponível
de máquinas têxteis do país, além de importar, nos últimos 5 anos, fusos e reformar
outros fusos, o mesmo ocorrendo em relação à tecelagem e acabamento; e racionalização da distribuição de seus produtos164.
164. INDÚSTRIA têxtil mostra que seu esforço não supera crise. Vida Industrial, Belo Horizonte: Fiemg, out. 1966, ano XIII. s.p.
165. MINAS GERAIS. BDMG. Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais. Diagnóstico da economia mineira. Belo Horizonte,
1968. v. 5. livro 7. p. 217-232.
166. Idem. p. 232. Com base no estudo do BDMG, afirmou Clélio Campolina: “O grau médio de utilização do equipamento,
considerados três turnos de trabalho, era de 47%, quando o padrão recomendado seria de 80%. Embora a indústria têxtil
brasileira também fosse atrasada, a mineira ainda o era mais [...]. Para o reequipamento da indústria, estimou-se um volume
de recursos da ordem de Cr$ 127,3 bilhões, a preços da época. Como o BDMG dispunha de um capital de apenas Cr$ 500
milhões, tendo naquele ano [1965] sido autorizado a aumentá-lo para Cr$ 5 bilhões, ficou demonstrada sua impossibilidade
de sustentar o programa. As tentativas de buscar recursos na esfera federal ou internacional não foram bem sucedidas, já que
aquela não era uma prioridade governamental. O momento era de ‘recessão programada’, com vistas a combater a inflação
e reordenar a casa para a nova fase expansionista, e, sob tais condições, a regra do jogo era ‘salve-se quem puder’. Foi de
fato o que ocorreu. As empresas entraram em processo de descapitalização e posteriormente começaram as falências. Entre
setembro de 1970 e 1971, o INDI efetuou nova pesquisa da indústria têxtil em Minas. Naquele ano, o número de unidades de
fiação e tecelagem em funcionamento era de 83. Portanto, entre 1965 e 1970, 15 estabelecimentos haviam sido paralisados.
O processo continuou. Após a última pesquisa, mais 11 fábricas cessaram suas atividades”. Cf.: DINIZ, Clélio Campolina.
Estado e capital estrangeiro na industrialização mineira. Belo Horizonte: UFMG/PROED, 1981. p. 143.
167. Segundo levantamento feito à época pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais. Ver: MAIS de 20 mil
pessoas desempregadas em Minas êste ano. Diário de Minas, Belo Horizonte, 16 set. 1965, p. 9.
168. Em 1957, Caetano Barbosa Mascarenhas deixou o cargo de gerente geral, permanecendo acionista da empresa. Em
1958, Aristides Mário Rache Ferreira é “assistente da diretoria” e, com o afastamento de Ary Ferreira da presidência, por
motivo de saúde, assume o seu lugar em 1959. ENTREVISTA. Aristides Mário Rache Ferreira. doc. cit.; JUCEMG. Atas da
Assembleia Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 12 fev. 1958. Arquivamento 87.531. s.p.; da Assembleia
Geral Extraordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 19 dez. 1959. Arquivamento 100.770. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Vida Industrial, revista da Fiemg, trazia o problema estampado em sua capa.
74
75
Às dificuldades que acometiam a indústria têxtil mineira em geral, no caso da São José de
Mariana acrescentavam-se os sérios problemas de energia que ela enfrentou como sócia
majoritária da Companhia Força e Luz Marianense, o que foi noticiado pelo correspondente Hélio Sampaio Mol no Diário de Minas de maio de 1966:
esteve instalada foi sendo fatiado – uma doação aqui para a construção de grupo escolar173,
a revisão do contrato de aforamento para erguer o fórum da cidade174, uma área para o
funcionamento de empresa de peças técnicas175 e, por fim, na década de 1980, a destruição
do prédio da fábrica para dar lugar a um modernoso ginásio poliesportivo.
Como disse a fiandeira e tecelã Terezinha de Jesus Mendonça, funcionária de Mariana e
Barbacena, “a mãe morreu e a filha ficou”176.
Há quase um ano, as máquinas da Cia Força e Luz Marianense não estão em condições
de fornecer a energia reclamada pela cidade, estando em péssima situação, o que vem
provocando o fechamento de indústrias, entre as quais a Tecelagem São José170.
Anos depois, a própria fábrica assim apresentaria a situação:
A década de 50, especialmente a segunda metade, foi extremamente difícil para a
empresa. O consumo havia caído e a concorrência se tornou acirrada. Em alguns
momentos, imaginou-se que a empresa poderia fracassar e ter suas fábricas fechadas.
No início dos anos 60, no entanto, reagindo às dificuldades do mercado, a empresa
buscou novos produtos – tecidos com largura acima de 1,20m e depois 1,40m e racionalizou sua produção, transferindo a fábrica de Mariana para Barbacena171.
Antes de fechar, a fábrica de Mariana convocou todos os cerca de 250 funcionários e ofereceu a possibilidade de continuarem trabalhando na unidade de Barbacena. Uns foram, uns
preferiram as fábricas mais próximas de Itabirito ou Ouro Preto, outros trataram de acertar
as contas e buscar novo afazer.
Depois de fechada a fábrica, alguns anos ainda se passaram até que fosse dada, na prefeitura, a baixa do lançamento da taxa de licença para o seu funcionamento172. O terreno onde
169. Em 1959, o nome de Reynaldo Marques Berutto aparece como “assistente da diretoria” e, em 1960, como vicepresidente da empresa. JUCEMG. Atas da Assembleia Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 21 mar. 1959.
Arquivamento 94.981. s.p.; da Assembleia Geral Ordinária da Fiação e Tecelagem São José S/A, 29 mar. 1960. Arquivamento
103.736. s.p.
170. MOL, Hélio Sampaio. Mariana continua sem luz elétrica. Diário de Minas, Belo Horizonte, 22-23 maio 1966, p. 13.
A Companhia Força e Luz Marianense será abordada adiante.
171. Breve perfil das peticionárias. In: www.bmfbovespa.com.br/empresas/consbov/ArquivosExibe.asp?site=B&protocolo
=25602. Acesso em: 15 out. 2012.
172. AGPM. Requerimento da Fiação e Tecelagem São José Ltda.; s.d. In: Livro de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza;
1974-1977. Livro n. 6.
173. Em reunião de abril de 1962, a diretoria da São José aprovou e ratificou “a doação de um terreno localizado em Mariana ao
Estado de Minas Gerais, para a construção de um Grupo Escolar”. Cf.: JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Fiação e
Tecelagem São José S/A, 4 abr. 1962. Arquivamento 122.472. s.p. No terreno foi construído o Grupo Escolar Gomes Freire.
174. A esse respeito, ver: AGPM. Lei nº 193/65; 2 abr. 1965; Lei nº 194/65; 2 abr. 1965; Lei no 195/65; 29 maio 1965; Lei no
198/65; 29 maio 1965. In: Livro de Registro de Lei; 1963-1967. n. 03. f. 38-38v., 40-41, 41-41v., 42-42v.
175. “Fica doada à Empresa Industrial de Peças Técnicas Ltda., a área de terreno de 50 metros de frente por 148,5 de
fundos parte da área livre total ocupada pela Avenida Getúlio Vargas, digo, pela Fiação e Tecelagem São José S/A, com frente
para a Avenida Getúlio Vargas, limitando-se à esquerda com o atual Grupo Escolar Dr. Gomes Freire, à direita com terrenos
contíguos a porteira de entrada da referida fábrica de tecidos, pelos fundos com o Ribeirão do Carmo.” Cf.: AGPM. Lei no
245/68; 31 ago. 1968. In: Livro de Registro de Lei; 1967-1970. n. 04. f. 89-91.
176. VR-HT-MA-051 - Terezinha de Jesus Mendonça.
Companhia industrial ouropretana
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Berutto (membro do conselho fiscal por muitos anos), se tornou seu vice-presidente169.
Inalterado, o cargo de diretor-secretário.
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alma do negóci
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O Trabalho
CAMINHO
Bem cedo, Maria Cecília Jeremias saía de casa para estar no serviço pouco antes das 6 horas, quando o portão era fechado. Ela era nova, 15 anos, e havia conseguido o emprego, em
1928, na Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy. Esse nome, no entanto, Maria Cecília não
guardou; seu trabalho foi sempre na fábrica de Victorino Dias, que “era rico [e] arrumou
essa fábrica para os pobres”1.
Durante três anos, de segunda a sábado, com sol ou com chuva, Cecília percorria a pé
cerca de quatro quilômetros para ir ao serviço e a mesma distância para voltar para casa,
que ficava em Passagem de Mariana. Arrumar emprego na casa dos outros em Passagem
era difícil porque pouca gente tinha empregada, e todo mundo já estava precisando trabalhar – a combinação desses fatores a fez pedir uma vaga na empresa. Pedido aceito, Cecília
iniciava o dia andando pela linha de trem afora, até chegar à Estação Ferroviária Itacolomy
(nos anos 40 renomeada Victorino Dias), diante da qual estava a fábrica.
Ia a pé porque ir de trem significava pagar, e “eu não podia pagar”. Então andava, assim
como outras moças companheiras. No caminho, a escolha entre o morro e o túnel: se estivesse tudo dentro do horário, o morro; o túnel para o caso de algum atraso. Se coincidisse
estar no túnel e a locomotiva passar, como de fato acontecia, “a gente encostava na parede
[...] fechava o olho porque estava com medo dela matar a gente. Ela passava agarradinha
assim. Não podia passar, mas a gente não queria perder o dia, não é? [...] A gente abusou
muito, bobo! Era Deus mesmo que olhava, que [via] que todo mundo precisava [...]”2.
Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy. s.d.
Acervo Instituto de Filosofia, Artes e Cultura da
Universidade Federal de Ouro Preto.
Após três anos, Cecília não mais escolheu morro ou túnel. Tendo se mudado para Ouro
Preto, fez outro trajeto para a fábrica durante os 12 anos seguintes em que lá permaneceu,
até sair para se casar.
É possível que esse outro caminho tenha sido aquele por onde tantos funcionários residentes na sede do município se aventuraram por décadas, como as de 1940 e 1950. Maria
Efigenia Bastos dos Santos, mais conhecida como Dona Sinhá, e Maria da Conceição de
Paula, a Maria Sabará, lembram-se de seu apelido – respectivamente, “Escorrega Lá Vai Um”
e “Buracão”3. E ainda há quem acrescente: “morro do Quiabo”4.
Certa vez, padre José Feliciano da Costa Simões disse que a alma de Ouro Preto é um
estilo, as montanhas tortas, as encostas, os cânions, um barroco que é a própria natureza5.
3. VR-HT-OP-032 A / B - Maria Efigenia Bastos dos Santos; VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
4. Como informalmente foi relatado pelo morador da região, Ênio Neves de Araújo.
1. VR-HT-OP-046 - Maria Cecília Jeremias.
2. Idem.
5. OP-001 A / B - José Feliciano da Costa Simões. Padre Simões foi pároco da Igreja de Nossa Senhora do Pilar, em Ouro
Preto, de 1963 a 2009.
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Não pensava no caminho para a Companhia Industrial Ouropretana, mas indicava, para o
que aqui interessa, uma característica da cidade cuja vida se faz em morros e ladeiras.
Entre a casa da maioria dos funcionários – nos bairros Padre Faria e Alto da Cruz – e a
fábrica, a distância mais curta era um declive acentuado, sem placa de sinalização. Não
havia estrada nem calçamento, mas um morro custoso até para os iniciados, como Dona
Sinhá e Maria Sabará. Custoso porque as moças usavam o que havia à época, o tamanco,
e carregavam suas marmitas; custoso porque, dependendo do horário em que se pegava
o serviço e da estação do ano, estava escuro, nada era iluminado, a não ser que, além da
marmita, se carregasse uma tocha. E tudo piorava muito com a umidade de Ouro Preto e
a chuva caindo: “[...] imagina Ouro Preto, tempo passado, a escuridão, a umidade que era!
[...] No Buracão, o buraco era tão grande que você tinha que saber se estava pisando na
pedra, na terra ou se já estava dentro do buraco! Você não tinha luz, não tinha! Sabe como
é você não ter percepção de uma coisa? [...] Você subia e descia segurando na mariazinha
para ficar em pé, porque parecia um quiabo!”6.
Chegar, todos chegavam ao portão da fábrica, por vezes molhados, sujos de barro, com a
marmita rolando para um lado, tocha para o outro. As preocupações eram tantas que não
sobrava tempo nem para pensar em cobras, lagartos e carrapatos.
Mas as coisas nem sempre foram assim, nem para todo mundo. Ephigênia Antônia de
Interior do escritório da Companhia Industrial Ouropretana,
na praça Tiradentes, em 1974 (aproximadamente).
Acervo Alda Gualberto Teixeira.
São José Ignácio dos Anjos, a Dona Léa, ia também a pé, mas se recorda do coronel
Mattos indo só a cavalo 7. “Senhor Otto era encarregado da gente”, lembrou dona
Sinhá. “Só que entornava muito, entornava mesmo, mas o jipe dele já era tão treinado
que o levava em casa! Ele ia tonto e o jipe ia direitinho! Ainda fazia aquela volta assim
para entrar na garagem! Foi um chefe muito bom que nós tivemos. Ele não era brasileiro.
Chamava-se Otto Polak”8.
Para quem não tinha carro, todavia, a empresa passou a oferecer condução, os ônibus que,
partindo do bairro São Cristóvão, conhecido como Veloso, transportavam os funcionários.
“Eu trabalhei tomando conta da turma no ônibus, para não fazer bagunça, para ter respeito
dentro do ônibus, ir em paz e voltar em paz, não ter briga, não ter confusão. Mas antes era
a pé” – como disse Neuza Terezinha da Silva Coelho10.
Na década de 1970, quem podia ia para o serviço de carro: o gerente Fernando Antônio
Affonso de Araújo; a representante do caixa da companhia Edite Augusta Guimarães
Almeida9, que, com a venda do prédio da praça Tiradentes, passou a despachar no “moder-
Independentemente de época e cargo, todo mundo saía de casa e fazia o caminho a pé
para pegar o serviço na Fiação e Tecelagem São José, em Mariana. Quando foi criada, a
fábrica não se instalou no que era o centro da cidade, mas bem próxima a ele, a cerca de
500 metros de uma das ruas mais importantes, a Direita. (Há bastante tempo, o centro se
expandiu e passou a abarcar a própria área da fábrica.) Muitos funcionários moravam nas
suas imediações e gastavam de 10 a 15 minutos para chegar ao serviço, a pé; aqueles que
moravam mais afastados, no bairro Chácara, por exemplo, levavam meia hora para percorrer a distância de cerca de 1.500 metros, sem morro, sem buraco.
no e funcional escritório junto à fábrica”.
6. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula. Mariazinha é a planta também conhecida como lírio-do-brejo ou
gengibre branco.
7. VR-HT-OP-042 - Ephigênia Antônia de São José Ignácio dos Anjos.
8. VR-HT-OP-032 A / B - Maria Efigenia Bastos dos Santos.
9. Ver, respectivamente: VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo; VR-HT-OP-045 - Edite Augusta
Guimarães Almeida.
10. VR-HT-OP-037 - Neuza Terezinha da Silva Coelho. Sobre o transporte oferecido pela empresa, ver também: VR-HTOP-041 - José Florentino de Castro; VR-HT-OP-039 - Waldir José dos Santos; VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira;
VR-HT-OP-049 A / B - Silvério Ventura Marinho; VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira.
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Vista panorâmica de Mariana, na década de 1940 (aproximadamente).
Em primeiro plano, a Fiação e Tecelagem São José.
Fiação e Tecelagem São José, em 1944.
Acervo Stela Gomes Chaves.
Acervo Arquivo Público Mineiro.
Alvarina Gomes de Carvalho, quando trabalhava no turno das 5 às 14 horas, “levantava às
4 horas; às 4 e meia, eu e minha irmã tínhamos que ficar na porta, esperando a turma da
Chácara descer [...] Porque desligava a luz da rua! Você vê! [...] Naquela época nossa [...]
tinha gente também, bobo, que corria atrás da gente de madrugada, às 4 e meia, por aí, ó”11.
Na hora em que Alvarina saía de casa, soava o primeiro apito da fábrica, longo, para acordar
quem ainda não estivesse acordado. Depois outro e mais outro, e o portão se fechava. Como
disse Levindo Gregório de Souza, “não existia quase relógio naquela época, quase ninguém
nem podia comprar um relógio, para falar a verdade. [...] O povo pegava serviço pelo apito”12.
Algumas vezes, José Lacerda Filho perdeu hora. Parecia que o vigilante que fazia o pernoite “dormia um pouquinho e, quando acordava, apitava depressa, achando que estava
perdendo a hora”.
José Lacerda, então, saía correndo de casa, segurando a calça, “não dava tempo nem de
apertar o correão, porque eu achava que fosse talvez o segundo apito [...]. E, no entanto,
conclusão: por várias vezes, eram três horas da madrugada!”13.
N Ú MERO
Dos 42 entrevistados pelo Vale Registrar sobre o tema tecelagem, dois nasceram
na década de 1910; sete na década de 1920; 24 nos anos 30; dois nos anos 40;
seis, nos anos 50 e um na década de 1960.
11. VR-HT-MA-041 - Alvarina Gomes de Carvalho.
Naturais de Ouro Preto: 14. Naturais de Mariana: 16. Os entrevistados nascidos
em outros municípios se mudaram muito novos para Ouro Preto e Mariana,
tendo sido aí praticamente criados. (As duas exceções são Fernando Antônio Affonso de
Araújo e Augusto Amaral.) Assim, para dez depoentes a transferência de domicílio não foi
motivada por oportunidades de emprego.
12. VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza. O apito da fábrica foi também lembrado por: VR-HT-MA-055 - Orlando
Müller Filho; VR-HT-MA-053 - Maria de Oliveira e Souza; VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira; VR-HT-MA-050 - Antônio dos
Reis Jacinto (“Aquela sirene urrava, que urrava mesmo! Quem estivesse dormindo acordava mesmo, viu?”); VR-HT-MA-046
- Raimundo Francisco Ribeiro (“E, naquele tempo, tinha a sirene que apitava, estourava a cidade toda [...] Era uma sirene
enorme que tinha.”).
13. VR-HT-MA-044 - José Lacerda Filho.
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maio de 1940. Ainda levaria algum tempo para seu valor ser o mesmo em todo o
Ouropretana ou na São José ainda menores de idade. Geralmente nesse momen-
território nacional e para que sua aplicação se tornasse corriqueira, sem necessidade
to se combinavam algumas situações: o término de um ciclo simbolizado pelo
do recurso à Justiça do Trabalho. Antes disso, é provável que os funcionários de uma
diploma de Grupo; a inexistência de condições para prosseguir os estudos no Ginásio; uma
empresa recebessem por dia, por hora, cujo valor ficava a critério dos donos, do mer-
família numerosa ou enviuvada, cujo sustento não era fácil; a vontade de ter um recurso pró-
cado, da conjuntura.
prio. “A gente tinha que pensar em trabalhar para ajudar os pais. Esse era o motivo. E também
para a gente começar a se sustentar” (Luiz Gordiano Gonçalves)14. “O meu sonho era estudar,
Na época do mínimo, a São José e a Ouropretana computavam dois tipos de salário, o
mas meu pai resolveu dar um passeio mais longe e eu fui trabalhar para ajudar minha família”
fixo e o móvel, digamos assim. O primeiro remunerava o almoxarife Antônio Gonçalves
(Terezinha de Paula Castro)15. “Eu estava ainda no Grupo e minha mãe me tirou do Grupo
Carneiro, os trabalhadores do escritório (chefe, contador, auxiliar, escriturário, office boy),
para me levar para trabalhar. Nessa ocasião, meu pai bebia demais e a vida estava muito
dos serviços gerais e da seção de apoio com suas funções diversificadas (mecânica, car-
difícil. A gente estava passando falta, não é?” (Neuza Coelho) . “Era o único meio de serviço
pintaria, obras, eletricidade, mestres, contramestres, pesador de linha, amarrador de rolo
que tinha aqui, não tinha alternativa [...]. Antes eu já trabalhava [...] na padaria e coisa e tal, mas
e cordão, controle de qualidade, chefe de turno)21. Se não houvesse hora extra, o salário
trabalhar fichado mesmo foi na fábrica” (Francisco Pedro da Silva)17.
era sempre o mesmo.
Havia a carteira de trabalho para menor e para maior de idade. Fichada com 14 anos,
O segundo tipo remunerava trabalhadores que atuavam no cerne das duas fábricas, a
Lalia Guilherme Teixeira já recebeu meio salário ao entrar . Como explicou Maria Sabará,
fiação e a tecelagem. O salário era X, o mínimo, acrescido de um Y – um prêmio de pro-
“Menor recebia como menor, maior recebia salário como maior [...] quando a gente era
dutividade, que podia variar de mês a mês. “[...] quem fizesse mais que o salário mínimo
menor recebia metade de um salário. Enquanto não completasse 18 anos, não tinha direi-
recebia mais, porque a gente trabalhava por tarefa, por produção [...]. Eles queriam que a
to ao salário, mesmo que a gente produzisse, mesmo que desse produção igual ou maior.
gente desse produção, não é? Uns eram bons de serviço e davam boa produção. Agora,
A gente não tinha idade, então o salário era metade” .
outros trabalhavam mesmo para ganhar salário mínimo” (Efigênia Sacramento Ferreira)22.
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Salário: na São José nunca houve 13º salário. Quando ele foi sancionado, em
1963, a fábrica já estava praticamente com os portões fechados, em Mariana.
Até então, lá como em Ouro Preto, existia um abono de Natal ou uma gratificação distribuída junto com o pagamento de dezembro, a qual, já dizia Victorino Dias, não era direito
de ninguém, podendo ser suspensa a juízo da diretoria20.
“Tinha dia que, quando eu chegava, já tinha três, quatro máquinas rodando. Essas eram as
campeãs, essas ganhavam mais do que todo mundo e davam uma sorte danada porque a
produção delas era maior que a de todo mundo. Adair da Paixão e Dalva Saldanha: essas
duas aí, eu vou te falar!” (Terezinha Castro)23. “Eu dava produção! O doutor Aristides, eu
recebi três telegramas dele, me dando parabéns pela produção. [...] A gente era esforçada, trabalhava muito mesmo, chegava cedo para trabalhar. Mandava almoço para mim, eu
Também nem sempre existiu o salário mínimo. O anúncio de sua criação, feito pelo
almoçava, já ia almoçando e já ia entrando para trabalhar. Não fazia hora de almoço! Fazia
presidente Getúlio Vargas no estádio de São Januário, Rio de Janeiro, data de 1º de
não, minha filha! Aí nós éramos ‘fominhas’, mas Deus sabe por que você era ‘fominha’”
(Maria de Oliveira e Souza)24.
14. VR-HT-OP-050 A / B - Luiz Gordiano Gonçalves.
15. VR-HT-MA-047 - Terezinha de Paula Castro.
16. VR-HT-OP-037 - Neuza Terezinha da Silva Coelho.
17. VR-HT-MA-042 - Francisco Pedro da Silva.
18. VR-HT-MA-045 - Lalia Guilherme Teixeira.
19. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
20. AIMFCII. Ata de 20 de fevereiro de 1923. In: Livro de actas da Diectoria da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy Sociedade
Anonyma; 12 maio 1912-18 fev. 1928. f. 8v.
21. Segundo Geraldo Pedro Coêlho, “Escritório, nós tínhamos salário fixo. [...] Almoxarifado, por exemplo, salário fixo; setor
de cardas, salário fixo; serviços gerais, salário fixo”. VR-HT-MA-056 - Geraldo Pedro Coêlho. Levindo Gregório de Souza
(contramestre) e Jair Pedro Cota (tintureiro) ganhavam um salário e meio; Augusto Amaral (mestre), três salários.Ver:VR-HTMA-043 - Levindo Gregório de Souza; VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota; VR-HT-MA-038 A / B / C - Augusto Amaral.
22. VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira.
23. VR-HT-MA-047 - Terezinha de Paula Castro.
24. VR-HT-MA-053 - Maria de Oliveira e Souza.
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Época de ingresso na fábrica: 3/4 dos entrevistados começaram a trabalhar na
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Havia ainda que fazer a soma diária da produção de quem trabalhava por produtividade.
O escritório recebia essa informação e, com a facilidade proporcionada pelas máquinas Facit,
ia acrescentando o valor até o dia do pagamento. Quem a gerava era o próprio funcionário
que “dava produção”. Como disse Eni da Cruz, “os próprios empregados, principalmente da
tecelagem, eram bem espertos naquele tempo. Apesar de não ter máquina, não ter nada, eles
mesmos tomavam conta. Quando terminava o mês, a tecelã já sabia quantos metros tinha tecido. Eles sabiam. Naquele tempo, todo mundo fazia conta de cor, não precisava de calculadora”29.
Contrato de trabalho de Efigênia
Sacramento Ferreira. 1969.
Contrato de trabalho
de Lalia Guilherme Teixeira. 1951.
Acervo Efigênia Sacramento Ferreira.
Foto equipe Vale Registrar.
Acervo Lalia Guilherme Teixeira.
Foto equipe Vale Registrar.
Pagamento: na São José sempre, na Ouropretana quase sempre, os funcionários
recebiam o salário em dinheiro, trocadinho, no dia 10 ou no dia tal. O escritório
em que trabalhavam Alda Gualberto Teixeira, Edite Almeida, Eni Esmeralda do
Nascimento da Cruz, Geraldo Pedro Coêlho e Neuza Aires do Nascimento – cada um em
seu tempo e fábrica – deixava tudo pronto para o funcionário chegar, pegar o envelope,
conferir o montante, assinar o recibo e sair.
Antes desse momento, eram realizadas algumas operações ao longo do mês. Uma delas:
“olhar os cartões de ponto do pessoal”25 ou passar “para um livro de ponto grandão”26 o
ponto que havia sido marcado no cartão – qualquer falta não justificada ou não abonada
se refletia no valor do salário, o mesmo ocorrendo com as horas extras.
Contracheque de Efigênia Sacramento Ferreira. 1982.
Acervo Efigênia Sacramento Ferreira. Foto equipe Vale Registrar.
27. Como disse Neuza do Nascimento, “a gente mandava essa previsão para o banco e eles mandavam o dinheiro para a
gente”. Idem.
25. VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz.
28. VR-HT-OP-045 - Edite Augusta Guimarães Almeida.
26. VR-HT-MA-054 - Neuza Aires do Nascimento.
29. VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz.
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Outra operação, lembrou Edite Almeida, era receber o dinheiro solicitado ao banco, contar,
recontar, separar as notas27. “Depois começou a melhorar e instituíram o cheque [na Ouropretana]. O banco contava aquela quantidade de talões, mandava para a minha seção e
eu preenchia todos os cheques”28 à mão.
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Com o salário no bolso, os trabalhadores saíam do escritório com opiniões diferentes.
“Ficava satisfeita com ele. A gente não tinha nada, aquele ali mesmo estava bom” (Juraci de
Oliveira)31. “Era um dinheiro muito abençoado. Ele rendia demais. [...] Era um pouco, mas
um pouco muito abençoado, não é?” (José Lacerda)32. “O salário não era muito bom, não.
A gente fazia às vezes hora extra para poder ficar mais ou menos tranquilo, para equilibrar
um pouquinho, mas era meio apertado!” (Raimundo Francisco Ribeiro)33. “O salário era
péssimo. Em todos os casos, era o que a gente tinha! Tinha que dar graças a Deus por ter
ele ainda, não é?” (Dona Léa)34. “O salário da fábrica de tecidos era um salário de Deus.
[...] As pessoas ganhavam pouco, mas o pouco com Deus é muito” (Vicente Juliano de
Oliveira)35. “Com o que você recebia, você fazia muita coisa, você fazia lista e fazia muita
coisa com o dinheiro. Ó, eu comprei dois barracos. [...] Comprei vaca na roça, tudo com
dinheiro de fábrica” (Jair Pedro Cota)36.
Tipos de pano: estreitos (80, 90 centímetros) ou de duas larguras. Na São José,
sempre um, o americano cru. Na Ouropretana, mais de um, em diferentes épocas:
americano cru, morim, cretone, fralda, opala, toalha, brim. Alda Teixeira “ficava triste” com o morim que levava seu nome: “Eles usavam muito sabe para quê? Forrar caixão!
[...] Tinha um senhor, acho que em Raul Soares, que tinha uma fábrica de caixão. Ah! Ele
vinha comprar, chegava e falava: ‘Quero tantos mil metros de Alda’”37.
Mulheres e homens: em ambas as fábricas, sempre mais mulheres do que homens;
aquelas, concentradas nas tarefas de fiar e tecer; esses, dispersos nos cargos de
chefia, setor elétrico e caldeira, mecânica, carpintaria e outras atividades de peso.
30. Idem. Segundo Juraci de Oliveira: “[...] na fiação, quem fizesse mais linha recebia mais. Tanto que eu era assistente do chefe
e, às vezes, ganhava menos do que aquelas que eram subalternas a mim. Eu ganhava menos do que elas e trabalhava mais
porque, quando elas iam embora, eu ficava lá olhando a folha de trabalho, marcando as horas das pessoas [...]”VR-HT-MA-035
- Juraci de Oliveira. Logo quando começou a atuar no controle de qualidade, Efigênia Ferreira ficou “meio embaraçada,
porque eu ficava com medo na hora de fazer a leitura dos relógios da máquina. As máquinas tinham um relógio que marcava
o tanto que a pessoa havia feito ali. Eu ficava com medo de ter marcado errado e tudo; voltava outra vez para olhar”. VR-HTOP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira.
Setores: nos seus trinta anos de existência, a São José se estruturou em função de
dois setores – a fiação e a tecelagem –, com uma sequência de operações variadas
e próprias a cada um deles. A Ouropretana, em sua centenária trajetória, conheceu esses
dois segmentos acrescidos da tinturaria. Só quando se tornou Companhia Industrial Itaunense Unidade III, na década de 1980, ela parou de fabricar o fio e de tingir o pano. (Ambos
os processos passaram a ser feitos em Itaúna.)
Famílias: parentes de cerca de 4/5 dos entrevistados também trabalharam na
fábrica de tecidos – a mãe, o pai, irmãos com certeza, primos e avós. “Ah, muitos
pais criaram os seus filhos ali [...] Desde meu avô: criou a família toda lá. Depois [...] minha
mãe criou a família também através da fábrica de tecidos. Então, que eu conheço”, disse
Waldir José dos Santos, “são três gerações praticamente: meu avô, minha mãe e eu”38. “Em
Ouro Preto, tem que perguntar quem não trabalhou na fábrica”, afirmou José Florentino de
Castro39, expressando opinião semelhante à de Terezinha Castro sobre a São José: “Aquilo
ali era uma maravilha em Mariana. Foi um Deus nos acuda quando a fábrica fechou, porque
empregava o povo quase todo de Mariana. Mariana era pequena, população pequena [...] a
maioria das pessoas trabalhava na fábrica”40.
Meios de transporte: como muitas fábricas de Minas Gerais, a São José e a
Ouropretana funcionaram em cidades distantes da região produtora de al41
godão . Num tempo mais remoto, o transporte dessa matéria-prima básica era feito
pelo trem. Vindos do norte de Minas Gerais ou do sul da Bahia, os fardos paravam na
Estação Itacolomy, defronte à fábrica de Victorino Dias, e eram levados nas costas dos
funcionários para dentro de seus muros; e, parando na estação ferroviária de Mariana,
lembrou Levindo de Souza, “nós recebíamos esse vagão aqui, esses fardos, e levávamos
para a fábrica na carroça”42. Com a progressiva ascensão do transporte automotivo
no país, o trem cedeu lugar ao caminhão. Correndo tudo bem nas estradas da época,
acontecia ter de parar o caminhão na altura da rodoviária de Ouro Preto, “fazer baldeação, jogar o material para um caminhão menor para passar na praça Tiradentes”; ou os
fardos tombarem no bairro Alto da Cruz e “você ter que voltar a carga toda em cima
do caminhão”, como fez algumas vezes Vicente Juliano43.
31. VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira.
32. VR-HT-MA-044 - José Lacerda Filho.
38. VR-HT-OP-039 - Waldir José dos Santos.
33. VR-HT-MA-046 - Raimundo Francisco Ribeiro.
39. VR-HT-OP-041 - José Florentino de Castro.
34. VR-HT-OP-042 - Ephigênia Antônia de São José Ignácio dos Anjos.
40. VR-HT-MA-047 - Terezinha de Paula Castro.
35. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
41. MINAS GERAIS. BDMG. Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais Diagnóstico da economia mineira. Op. cit. p. 226.
36. VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota.
42. VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza.
37. VR-HT-OP-036 - Alda Gualberto Teixeira.
43. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
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Se o funcionário, no dia a dia de serviço, gerava a produção, no entanto não era ele o responsável por anotá-la e repassá-la ao escritório. O contramestre e o apontador estavam ali,
com lápis e prancheta, para marcar “tantos metros de pano, tantos quilos de linha”30.
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Transformar a fibra natural em tecido é uma técnica milenar, já utilizada para embalar as múmias egípcias muito antes do nascimento de Cristo. A novidade consolidada no século XIX
foi a mecanização do processo, que, desde então e até hoje, não parou de se aperfeiçoar.
Entrar na São José e na Ouropretana quando de suas respectivas existências significava encontrar maquinismos próprios à época, à capacidade de investimento de cada uma delas, e operados por trabalhadores que, em sua maioria, aprendiam o serviço lá mesmo, na lida cotidiana.
Vista parcial da cidade de Mariana. Em destaque, a Fiação e Tecelagem
São José, o campo de futebol e a Estação Ferroviária de Mariana. 1944.
Acervo Stela Gomes Chaves.
No sentido inverso, saía de Mariana por trem ou caminhão o tecido “quase pronto”; seu
destino, a São José de Barbacena, onde era beneficiado, e daí vendido no Brasil inteiro, sobretudo para a área rural44. O pano produzido na Ouropretana, à época de Victorino Dias,
tinha boa aceitação no mercado de fazendas do Rio de Janeiro, “para onde continuamos a
vender grande parte de nossa produção”, como dito anteriormente. Anos depois, o mercado era outro e a distância, maior: em uma reunião da diretoria convocada para deliberar
sobre a abertura de uma filial em Montes Claros,
o Diretor Presidente fez uma exposição sobre o crescimento que vêm tendo os
negócios da Companhia no Nordeste do País, caracterizado, desde alguns anos, por
um ritmo ascendente muito animador, absorvendo já, o consumo daquela área, substancial parcela da produção da Companhia [...]45.
Operários no interior do setor da Fiação da Companhia
Industrial Ouropretana. 1974 (aproximadamente).
Acervo Alda Gualberto Teixeira.
“Mão de obra se fazia dentro da empresa”, disse o gerente de ambas as fábricas, Fernando
Araújo46, referindo-se ao funcionário da produção normal. A forma de ingresso já dizia um
pouco sobre isso: por indicação do pai ou da mãe, do tio, do padrinho, de um amigo; “Eu fui
lá e pedi”; “Fui no escritório e conversei”; preencher uma inscrição a aguardar a chamada;
era só levar um retrato e a certidão de idade; “Você sabe escrever?” “Não.” “Não tem problema [...] aguarda cinco dias aí que depois eu mando chamar”47.
46. VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
44. VR-HT-MA-O40 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
45. AIMFCII. Ata de reunião da Diretoria; 07 maio 1971. In: Livro de atas da Companhia Industrial Ouropretana S.A.; 02 set.
1943-26 mar. 1982. f. 31v.
47. VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota. Sobre as outras formas de ingresso citadas, ver, por exemplo: VR-HT-OP-046 - Maria
Cecília Jeremias; VR-HT-MA-047 - Terezinha de Paula Castro; VR-HT-MA-046 - Raimundo Francisco Ribeiro; VR-HT-MA-051
- Terezinha de Jesus Mendonça; VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira; VR-HT-OP-038 - Ilza Dalva Macedo Liberato;
VR-HT-MA-045 - Lalia Guilherme Teixeira; VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
TÉCN IC A
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Uma vez chamado, o funcionário ia aprender com os instrutores ou, o que era mais comum, observando os mais velhos de casa – o que e como faziam, os cuidados e movimentos necessários –, para então tentar, errar, conseguir. Dependendo da tarefa, se aprendia em
uma semana, um mês ou mais tempo.
Silvério Ventura Marinho escreveu seu nome completo, fez “algumas continhas” e começou
sua carreira trabalhando no batedor, área em que, como soube pelo técnico de segurança,
estava expressamente proibida a presença de um isqueiro, sequer um palito de fósforo,
“porque era perigoso incendiar a fábrica toda”48.
O batedor recebia os fardos de cem, duzentos quilos de algodão, que vinham amarrados,
apertados num arco de barril para ocupar menos espaço no caminhão ou no vagão que os
havia transportado. Na São José, lembrou Augusto Amaral, a máquina chamada abridor tinha inclusive o apelido de “capeta”, dado pelos funcionários: “Parece que o capeta está aí!”49.
Batedor simples
e machina de fazer mantas.
Idem. p. 112.
Acervo Coleções Especiais da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Após essa etapa, a fibra devia ser cardada, atividade que Silvério também desempenhou,
assim como Vicente Juliano, em épocas diferentes. O algodão entrava em uma esteira com
garras de aço, como disse Luiz Gordiano51, ou com um “eixo, tipo uma agulha”, segundo
o próprio Silvério, e saía do outro lado cardado – a imagem é a de uma manta, um “véu
fininho”52; o termo mais técnico, cardar = flocular o algodão53.
Abridor de algodão com semente, com
tambor, 40 pollegadas de largura a taboleiro
de reguas, de descargo.
In: CATALOGO descriptivo das machinas de
descaroçar, abrir, cardar, pentear, preparar,
fiar e tecer o algodão, construídas por Platt
Brothers & Co. Limited. Hartford Works,
Oldham, Inglaterra. s.d. p. 60.
Machina de cardar de ferro,
privilegiada, com chapeos rotativos.
Idem. p. 127.
Acervo Coleções Especiais da
Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Acervo Coleções Especiais da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Cortado o arco, aquele fardo mostrava seu tamanho e entrava no batedor, a máquina que
batia o algodão, que fazia sua limpeza, retirando sementes, caroços, cascame, toda sujeira
e impuridade. Ilza Dalva Macedo Liberato via de longe a tarefa: “Era um setor muito feio
[...] porque era muito algodão, aquele pó grosso, sabe? As pessoas que trabalhavam nesse
lugar – só trabalhavam homens, só masculino – usavam até um pano [...] porque era muito
pó que dava. Então nunca entrei lá. A gente passava só na porta. Você via a porta aberta,
um barulho muito forte”50.
Seguindo o processo e o termo, o passador paralelizava as fibras. Assim descreveu Maria Sabará: “Aí ele já fazia o agrupamento de fio. [...] Coletava os fios em umas latas grandes. Então
juntava todos aqueles fios para fazer um. Tinha um tanto de lata de um lado, outro tanto de
lata do outro; entravam aqueles fios ali no meio para dar uma forma mais consistente. Tinha
um aparelhinho que apitava quando a lata estava cheia. O passador desligava, ia lá, trocava a
lata, tudo manual. Aí passava para o outro passador, para fazer a segunda passagem”54.
51. VR-HT-OP-050 A / B - Luiz Gordiano Gonçalves.
48. VR-HT-OP-049 A / B - Silvério Ventura Marinho.
52. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
49. VR-HT-MA-038 A / B / C - Augusto Amaral.
53. Termo usado por Fernando Antônio Affonso de Araújo.
50. VR-HT-OP-038 - Ilza Dalva Macedo Liberato.
54. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
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A lata cheia de fibra paralelizada chegava até Marta, ou Marta a pegava, posicionava-a atrás
de sua máquina e enrolava a fibra na maçaroqueira. Acionado o pavieiro, as fibras passavam
por ele e iam assumindo a forma de uma mecha da grossura de um dedo. Nunca aconteceu
com Marta o que ela viu ocorrer com uma colega de serviço: “Na minha seção, uma menina
distraiu [...] tinha uma engrenagem na cabeceira mesmo da máquina. Não sei como ela arrumou, a mão dela foi nessa engrenagem. Acho que ela perdeu quatro pontinhas dos dedos”57.
Durante oito, dez ou mais horas, Marta e José Lacerda enchiam latas e latas de mecha, de
pavio. “Quando chegava no ponto em que já tinha uma quantidade de metro, então acendia
a luz”58 e a maçaroqueira desligava.
Enquanto Marta pegava outra lata para pôr atrás de sua máquina e fazer tudo recomeçar,
o pavio era levado para o filatório, o equipamento do qual saía a linha propriamente dita,
encerrando aqui, com todas essas variadas operações, o setor chamado fiação.
Inês Brandão Pereira pediu emprego na São José, esperou alguns dias para completar 14
anos, foi chamada para trabalhar e passou por um aprendizado na fiação: “Você ficava junto
com a dona da máquina, acompanhando para lá e para cá. Daí ela começava a deixar a
gente fazer as emendas e, com pouco, a gente estava tomando conta da máquina”59. Processo semelhante ocorreu com Terezinha Castro e Neuza Coelho; apenas para esta última
demorou um pouco mais, “porque as máquinas esquentavam muito. [...] Eu tinha medo de
mexer na máquina porque esquentava. Tinha medo, mas aprendi!”60.
A fiação, como lembrou Inês Pereira, “era um alarde, era muito barulho da máquina e as
meninas falavam muito. Menina pelos 14, 15 anos até 20 fala ‘feito pobre na chuva’ ”61.
As máquinas, os filatórios, eram de fato muitas em número. Em um documento da Ouropretana datado de 1946, constavam 14 filatórios62; na lembrança de Levindo de Souza, havia
18 na São José, nos anos 50. Máquinas compridas, “enormes”, com engrenagens, anéis, mais
de duzentos, trezentos fusos cada uma.
A mecha trazida do pavieiro passava por essas engrenagens e ia enchendo, em cada fuso,
a espula ou canela correspondente. Inês e Maria Sabará utilizaram a imagem da moenda
ao falarem sobre isso: “Aquelas moendas rodavam passando o algodão ali dentro; se você
desse bobeira com o dedo, ela levava. Mas aí era quase bobeira mesmo” (Inês)63. “Colocava
os pavios, puxava, enfiava na moenda [...] aí colocava a espula, levava a espula. Tinha um
anelzinho para prender o fio, então começava a rodar ali. Se arrebentasse, a luzinha acendia,
a pessoa ia lá, tirava só aquele fuso, levantava, puxava o fio que tinha sumido, enfiava ele no
anelzinho, tornava a enrolar ele na espula e continuava rodando. Quando estivesse cheio
[...] era tirado e colocado em um caixote” (Maria Sabará)64.
Juraci de Oliveira foi também fiandeira, tomou conta de máquinas com cilindros (no lugar
de moendas) e enrolou o fio enchendo canelas ou canelinhas (no lugar de espulas). Nomes diferentes para a mesma tarefa, com o mesmo cuidado ao pôr a mão na máquina e
emendar o fio, talvez com o mesmo cansaço quando o algodão estava ruim, muito ruim e
não parava e arrebentava toda hora.
Tempos depois, Juraci se tornou contramestre de fiação, e como tal resolveu os problemas
na falta do chefe, marcou o tempo de quem havia trabalhado por hora, anotou a produção
das moças que davam (ou não davam) produção. Não chegou a pesar linha – “as moças
ganhavam por quilo de linha”65 –, pois havia para isso o pesador de linha, como Levindo
de Souza no início da carreira na fábrica: “Eram 18 máquinas, 18 filatórios. Então ela dava
duas, três, quatro arriadas por dia. Você tinha que pesar e [...] selecionar”66. “Na hora em
que as canelas enchiam”, disse Ilza Liberato, “tinha que parar a máquina. Falava: ‘Vai descarregar uma máquina.’ [...] tinha os ajudantes que eram menores, geralmente. Mas tinha maior
também. A gente tinha que tirar rapidinho, tirar as canelas cheias e colocar as vazias”67. E o
filatório era novamente acionado.
É possível que, em sua primeira atividade na fábrica, Amadeu da Silva assistisse ao alarde
de máquinas e moças da fiação. Ele fazia faxina nos corredores, “juntando aquela sobra de
55. VR-HT-OP-035 - Marta Virgem Martins.
56. VR-HT-MA-044 - José Lacerda Filho.
57. VR-HT-OP-035 - Marta Virgem Martins.
58. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
59. VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
60. VR-HT-OP-037 - Neuza Terezinha da Silva Coelho. Como lembrou Luiz Gordiano: “Fiação tinha risco de queimar, de
provocar queimadura, porque a espula rodava em uma velocidade muito grande e a fiandeira tinha que ser muito profissional
para não se queimar com facilidade”. VR-HT-OP-050 A / B - Luiz Gordiano Gonçalves.
61. VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
62. AIMFCII. Companhia Industrial Ouropretana de Tecidos, Força, Luz e Telefone. Relação de imóveis, de edifícios, de terrenos. s.p.
63. VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
64. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
65. VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira.
66. VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza.
67. VR-HT-OP-038 - Ilza Dalva Macedo Liberato.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
A etapa seguinte era o pavieiro ou maçaroqueira. Marta Virgem Martins aí entrou ainda
menor de idade e só saiu trinta anos depois, quando se aposentou: “Minha irmã saiu para
se casar, eu fiquei no lugar dela [...] Era ajudante dela e depois continuei trabalhando na
mesma máquina”55. José Lacerda Filho também ficou por muito tempo no pavieiro: “Lá me
dei muito bem porque [...] era produção. Produção, você só ganha aquilo que produziu. [...]
Em vez de sair às 10 horas, às vezes eu saía às 3 horas da madrugada. Enquanto não fizesse
uma produção mais ou menos, eu não ia embora”56.
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se era uma sujeira, arrumar. Outra hora o fio concentrava só em um lugar na espuladeira:
você tinha que olhar o defeito, o que era”71.
Canneleira para trama.
Idem. p. 302.
Acervo Coleções Especiais da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Fiação Selfactina com o volante de
gornes pela parte de traz.
Idem. p. 206.
Acervo Coleções Especiais da
Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Com a linha devidamente enrolada, nem frouxa nem concentrada, Waldir dos Santos e
Francisco da Silva tratavam de realizar a operação que desempenharam logo que ingressaram nas fábricas: a de municiar, a de repartir espula para as tecelãs.
Até aqui, metade do processo milenar havia se cumprido – a fibra natural virou linha. Ainda
restava trançar esse fio de tal forma que ele se tornasse pano americano ou morim, ou cretone. Para tanto, o primeiro passo era levar o caixote cheio de fios enrolados nas espulas
ou canelas para o espaço onde ficavam umas máquinas também compridas, nomeadas por
Orlando Müller de “leesona”69, referindo-se à fabricante norte-americana de bobinadeiras.
As linhas eram então transferidas para as bobinas, ou balões, como chamaram Maria Sabará e Efigênia Sacramento, e daí percorriam dois caminhos: um tanto ia para a espuladeira;
outro tanto, para a urdideira.
Na espuladeira, a linha era enrolada em uma espula menor do que a utilizada no filatório,
do tamanho necessário para ser posta na lançadeira do tear. “As tecelãs”, disse Levindo
de Souza, contramestre da espuladeira, “tocavam três, quatro teares. Se a espula fosse
pequena, elas teriam muita mão de obra”70. Também contramestre, era função de José
Luzia Neto resolver possíveis problemas que aí surgiam: “Ao enrolar a linha na canela, ela
tinha que sair bem firme. Na espuladeira, às vezes o fio saía frouxo. Ao sair frouxo, só de
você esbarrar a mão assim, ele já desmanchava todo. Então você tinha que ir lá olhar, ver
Em outro espaço, um número considerável de bobinas era colocado na gaiola da urdideira
para que os fios fossem transferidos para um rolo, um grande carretel de linha. Mas, como
disse Efigênia Sacramento, o carretel só tem um fio, e o rolo da urdideira tem milhares. Além
disso, lembrou Vicente Juliano, uma sequência de montagem no carretel devia ser seguida:
Urdideira.
Idem. p. 48.
Acervo Coleções Especiais da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
68. VR-HT-MA-036 - Amadeu da Silva.
69. VR-HT-MA-055 - Orlando Müller Filho.
70. VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza.
71. VR-HT-OP-053 - José Luzia Neto.
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algodão”, para depois separar e mandar de volta às cardas. “Era muito bom, porque você
estava sempre nos corredores, varrendo ali, sempre as meninas [...] Brinca com uma, brinca
com outra. Eu, graças a Deus, sempre tive boas amizades”68. Amizades que não deixou de
ter mesmo quando se tornou o encarregado de meninas e máquinas, com a responsabilidade de garantir a boa produção do fio de qualidade.
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“De acordo com o número, a largura do tecido que você fosse produzir, de acordo com a
qualidade do tecido que você fosse produzir, você tinha que ter um determinado número de
bobina na gaiola da urdideira para ser urdido, para ser enrolado em uma determinada posição para, na hora de colocar no tear, dar origem ao tecido que precisava ser produzido”72.
Uma vez pronto, o fio urdido era engomado. “A engomadeira era uma máquina que
passava uma goma de amido de milho para fortalecer o fio e reter o pó”73. Passando no
meio de cilindros, a linha era mergulhada em um tanque e saía do outro lado seca com
o calor produzido pela caldeira. Era, inclusive, no calor da engomadeira que muita gente
esquentava a marmita.
Engommadeira de tambores.
Idem. p. 50.
Acervo Coleções Especiais da Biblioteca
Pública Estadual Luiz de Bessa.
Foto Eugênio Sávio.
Já engomado, o fio devia ser remetido no liço e no pente, havendo para isso a máquina
chamada remetedor. Nela trabalhou Eva Lemos Paiva, manipulando fios com a navette,
“sentada o dia inteirinho [...] com um rolo grande em cima da cabeça, e a gente remetendo. Eu jogava linha dia inteiro [...] mas tudo contado, hein?”74. Remetidas as linhas, geralmente um menor de idade colocava o liço e o pente e, em seguida, amarrava o rolo
no tear. “Era a função chamada amarrador de rolo: aquele que aprendia a colocar o rolo
na máquina, passar todinho, direitinho, regular o tear, pôr ele para rodar já começando a
tecer o pano, o tecido”75.
Assim estavam preparados os dois fios usados na São José e na Ouropretana: o fio da trama e o fio da urdidura, aquele depositado na lançadeira, esse amarrado ao tear. Era, então,
o momento de trançá-los.
Esquema do processo de tecelagem,
retirado de: ENCICLOPÉDIA COMPACTA
ISTOÉ - GUINNESS DE CONHECIMENTOS GERAIS.
São Paulo: Editora Três Ltda., 1995. p. 188.
72. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
73. VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
74. VR-HT-MA-049 - Eva Lemos Paiva.
75. VR-HT-OP-050 A / B - Luiz Gordiano Gonçalves.
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“As máquinas eram pertinho umas das outras. As quatro com as quais você trabalhava,
por exemplo, eram agarradas umas nas outras. Agora, tinha um corredorzinho para você
transitar para lá e para cá, para ir ao banheiro, para ir lá e tal.” Nesse espaço em que ficava
Maria Oliveira e Souza, a exemplo das demais tecelãs, “não podia parar, as máquinas tinham
que rodar oito horas! [...] Tinha que lubrificar. Dava muito pó de algodão. Às vezes você
vinha com o espanador e você mesma passava o espanador debaixo, para tirar, porque
dava muito pó. Então a gente comia pó mesmo, a tecelagem inteira era pó de algodão”78.
Andando de lá para cá, no meio do pó e da zoeira “que era tanta”, a tecelã olhava a máquina. Não podia faltar um fio, não podia ter fio duplo, não podia arrebentar um fio. Se isso
acontecesse – e isso acontecia em tempo de calor, de algodão de baixa qualidade, de fio
sem goma, de tear desregulado, de rolo mal amarrado –, “dava defeito”, e Maria Cecília
“tinha que parar o tear, desfiar aquela parte toda e emendar a linha com muito custo”79.
“Era um trabalho medonho emendar aquilo tudo, passar no pente, passar na pua tudo direitinho, acertar o pano para poder tecer”, completou Efigênia Sacramento80.
Enquanto a tecelã olhava suas máquinas, o contramestre olhava máquinas e tecelãs. Cabia a
Luiz Gordiano, José Florentino, Francisco da Silva, Levindo de Souza, Silvério Marinho, Waldir dos Santos, dentre outros contramestres que trabalharam em uma das duas fábricas,
verificar a falta de um funcionário do setor, anotar, providenciar um substituto; cobrar a boa
produção e o bom comportamento de seus subordinados; consertar os teares. “Quando
a máquina dava um defeito”, explicou Luiz Gordiano, “ele tinha que consertar. Todos os
teares tinham uma bandeirinha que ficava abaixada. Quando ele estava com defeito, a tecelã levantava aquela bandeira: o contramestre ia lá para arrumar o tear. Acabava de arrumar,
ele entregava para a tecelã de novo ele arrumadinho e ela continuava produzindo. Além
disso, ele tinha obrigação de olhar pela turma, pelas tecelãs que estavam trabalhando, para
que não faltasse material para elas, para que elas trabalhassem direito”81. “Todo mundo”,
disse Levindo de Souza sobre a São José, “tinha que fazer relatório [...] de todas as paradas
de máquina, de falta de material. Faltou material, a companhia pagava o achego, porque
elas ganhavam por produção. No momento em que a máquina estivesse parada por falta
de material, então a tecelã tinha que ganhar aquele teórico do tear, que o tear produzia”82.
Tear com suas bandeiras
sinalizadoras, da Companhia
Industrial Itaunense –
Unidade III. 2006.
Teares da Companhia Industrial
Itaunense – Unidade III. 2006.
Acervo e foto Cristiane Zago.
76. VR-HT-MA-O40 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo. Segundo Alvarina Carvalho, “tinha o motor que tocava a
fábrica e que ficava em um cômodo separado, porque o motor era enorme”. VR-HT-MA-041- Alvarina Gomes de Carvalho.
77. VR-HT-OP-052 - Adão Teixeira Barbosa. Maria da Conceição de Paula (VR-HT-OP-040 A / B), Efigênia Sacramento
Ferreira (VR-HT-OP-031) e Neuza Terezinha da Silva Coelho (VR-HT-MA-054) também se lembraram do tear Picanol, e Luiz
Gordiano Gonçalves (VR-HT-OP-050 A / B), do Howa.
78. VR-HT-MA-053 - Maria de Oliveira e Souza.
Acervo e foto Cristiane Zago.
79. VR-HT-OP-046 - Maria Cecília Jeremias.
80. VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira.
81. VR-HT-OP-050 A / B - Luiz Gordiano Gonçalves.
82. VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Na tecelagem, ser dona de máquina significava olhar mais de um tear, às vezes até seis. As
máquinas ficavam dispostas no amplo galpão de ambas as fábricas e, durante parte de sua
trajetória, “motores acionavam um eixo que atravessava a sala inteira. Esse eixo tinha polias
que, através de correias, movimentavam as máquinas”76. Datam da época desse “eixo grande lá em cima” uns teares antigos, como disse Adão Teixeira Barbosa, ou “teco-tecos”, como
chamou Maria Sabará. Depois vieram equipamentos mais modernos, Picanol e Howa, com
motor individual, que “davam menos mão de obra, menos trabalho, quebravam menos”77.
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E havia o alvejamento do pano, que o mesmo Jair fazia direto: “O pano cozinhava no vapor.
A gente enchia aquela caixa, tipo uma panela de pressão, dali a gente tinha que dar um banho nele, molhar ele e depois fazer o banho para cozinhar ele. Levava umas seis horas para
ele cozinhar. Depois soltava aquela água no rio e dava uma água fria nele. Depois a gente
puxava ele para o tanque. Eram dois tanques de tijolo, mas muito bem acabadinhos, tinham
acabamento. A gente punha ele ali, fazia o alvejamento com o cloro. Enchia ali e deixava
tantas horas, não lembro mais quantos minutos, quantas horas. Quando [...] a gente tirava,
ele estava branquinho igual a uma folha de caderno!”87.
Acima de tecelãs, máquinas e contramestres, havia o mestre da tecelagem, como Augusto
Amaral, que respondia pelo setor diante do gerente, conhecia o debuxo e sabia por que
saíam 220 quilos de tecido quando haviam entrado trezentos quilos de algodão84.
Só então o tecido chegava à sala de pano da Ouropretana, onde trabalharam Dona Léa e
Vicente Juliano, para passar pelos grandes cilindros da calandra, ser medido de acordo com
os pedidos do cliente, cortado, embalado, prensado e despachado no caminhão.
Em Mariana, o milenar processo praticamente se encerrava aqui – o tear parado; o rolo de
tecido pronto e sem defeito, algum menor de idade o transportando para a sala de pano;
os fardos de americano cru depositados no caminhão ou no vagão que deveria levá-los até
o lugar de seu beneficiamento, a São José de Barbacena.
Em Ouro Preto, o processo ainda se desdobrava. Havia o tingimento dos tecidos, com
autoclaves, caldeira, balancinha para pesar a tinta: “Se tivesse muita tinta, ficava vermelho
demais. Rosa: ficava rosa demais, feio. Então tinha um tanto. [...] Eu tingia pano direto! Agora,
o mais complicado para tingir era o marrom [...] porque eram três qualidades de tinta”,
explicou Jair Pedro Cota85.
Para Dona Sinhá, a complicação era outra: “[...] a tecelagem xadrez é que tecia ele xadrezado. Naquele tempo de Senhor Otto, quando entrava um pano novo, ele falava pra gente
assim: ‘Vocês é que vão escolher. As senhoras é que vão escolher o nome que vai ter este
pano’. Então, de acordo com o tecido que saía, era ‘miudinho’, era ‘caixão de defunto’...
‘Caixão de defunto’ era esse que tecia com mais lançadeiras. O quadro saía deste tamanho
[20 centímetros], amarelo, vermelho, preto, certo? [...] O ‘miudinho’ era miudinho mesmo,
a gente tecia com cinco lançadeiras, mas eram aquelas listrinhas fininhas, cada uma de uma
cor. De noite, minha filha, [...] aquela luz ruim, era um sacrifício passar aquele fio no tear!”86.
83. Acidentes com lançadeiras foram destacados, por exemplo, em: VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza, VR-HTMA-051 - Terezinha de Jesus Mendonça, VR-HT-MA-045 - Lalia Guilherme Teixeira, VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio
Affonso de Araújo, VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira, VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula, VR-HT-OP-050
A / B - Luiz Gordiano Gonçalves, VR-HT-OP-049 A / B - Silvério Ventura Marinho, VR-HT-OP-053 - José Luzia Neto, VR-HTOP-039 - Waldir José dos Santos.
Interior da Sala de Pano da Companhia
Industrial Ouropretana. s.d.
84. Trata-se da avaliação da qualidade do algodão, classificado de acordo com a espessura, comprimento, dureza e maturidade
da fibra. “Cansei de mostrar isso para eles: ‘Olha, nós entramos com 300 quilos de algodão e estamos colhendo 250, 220 quilos
de tecido’. Porque arrebentava muito e aquilo virava estopa. A gente não perdia a estopa, juntava, empacotava e mandava
para Barbacena. Lá pesava e fazia uns saquinhos para vender no comércio.” VR-HT-MA-038 A / B / C - Augusto Amaral.
Acervo Ephigênia Antônia de São José Ignácio dos Anjos.
85. VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota.
86. VR-HT-OP-032 A / B - Maria Efigenia Bastos dos Santos.
87. VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Dependendo do defeito do tear, recorria-se à oficina mecânica da fábrica, onde trabalhavam, por exemplo, Adão Barbosa e Raimundo Ribeiro; ou se consertava nele mesmo,
ajustando um mancal. Muita atenção devia ser dada à lançadeira, que invariavelmente
aparece na lembrança de quase todos quando se trata de riscos de acidentes. Como
sintetizou Maria Amarante Silva: “As lançadeiras dos teares voavam e costumavam machucar alguém, porque o bico delas era de aço. No momento em que ela passava para
lá e para cá, quando a máquina dava um defeito qualquer, ela subia, costumava ir parar
longe e atingir outro lá mais longe”83.
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Como em toda empresa, na Ouropretana e na São José havia regras. Assiduidade e pontualidade são, sem sombra de dúvida, as mais recorrentes na lembrança de seus ex-funcionários. Bastava o portão se fechar às costas para verificar a presença no horário – ao tempo
de Maria Cecília Jeremias, por meio de chamada; depois, pelo cartão de ponto. Quem faltou, faltou, perdeu o dia de trabalho, o dia de salário, a menos que conseguisse se justificar
no dia seguinte, de maneira convincente88.
Comprovada a presença, cada um se dirigia para sua seção. Todos vestiam roupa própria, comum, decente.“Só não podia trabalhar rasgado nem sujo”, como disse Adão Teixeira Barbosa89.
Mesmo aqueles que haviam sucumbido ao “Escorrega Lá Vai Um” davam um jeito: Seu Otto
arranjava pano para as meninas se secarem90. Ou, em Mariana, as próprias meninas vestiam
uma blusa reserva91, em dias de chuva.
A existência de uniformes na trajetória das duas fábricas é uma exceção, como o macacão
e boné dos funcionários do apoio da São José ou como a roupa que por pouco tempo Lalia Guilherme Teixeira usou em Mariana – um traje preto e branco de tal forma semelhante
ao bicho que “os homens da Central ficavam gritando: ‘As galinha-d’angola!’”92.
Dependendo da seção e da época, à roupa comum se acrescentavam ou retiravam alguns
aparatos. Tecelãs como Maria Sabará usavam lenço na cabeça e tiravam anel ou cordão.
“Se acontecesse um acidente, provocado porque você estava com cabelo solto ou porque
você abaixou e o cordão pegou em algum lugar, além deles passarem em você um sabão,
você ainda ficava suspenso por causa daquilo, porque você provocou aquele acidente”93.
E Vicente Juliano de Oliveira lembra ser “muito característico das mulheres usarem uma
faquinha no pescoço” para cortar a linha. “Andava armada a mulherada lá!”94.
Ambas as fábricas são do tempo em que não se falava de equipamento de proteção individual. Nem se falava, nem existia quase, a não ser para eletricistas como José Donato Lessa
e Pedro Müller Moutinho, que portavam luvas e cinto para subir em poste. Na seção de
Raimundo Francisco Ribeiro, a oficina mecânica da São José, havia torno, esmeril, furadeira,
máquina de serrar, forja para fazer, por exemplo, parafusos. Mas “a gente ia esmerilhar e no
esmeril [...] não tinha uma proteção para pôr nas vistas, óculos, uma coisa”95. No caso da
Ouropretana, os óculos para esmerilhar passaram a fazer parte da indumentária obrigatória
na virada da década de 1970, quando leis, Ministério do Trabalho e Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa) começaram a mostrar alguma eficácia em termos de segurança
para o trabalhador. Ainda assim, havia uma “cultura” a ser mudada: “Veio à memória aqui um
nosso colega da área de tinturaria, com quem eu tive a maior dificuldade”, lembrou Vicente
Juliano. “Para fazer um bom tingimento, a gente tem que ter o controle do pH da água, e
usava-se muito produto químico, soda cáustica, muita coisa. Ele tinha a prática de ver o pH
com a mão: batia a mão ali e olhava. Aquilo para mudar, menina, foi um sufoco! Tinha uma
fitinha no mercado que pegava e mudava de cor, dava o pH. E ele acreditava na fitinha!?”96.
Operários da Fiação e Tecelagem São José, diante da fábrica.
Sentados: Geraldo Quirino (encarregado), Pio Porto de Menezes (gerente)
e José Ribeiro Leite (encarregado geral). Ao fundo, a fachada da fábrica. s.d.
Acervo Amadeu da Silva.
90. VR-HT-OP-042 - Ephigênia Antônia de São José Ignácio dos Anjos. Em Ouro Preto, José Luzia Neto se lembrou de outro
expediente: “Tinha pessoa que chegava lá, rapaz, tudo enlameado de barro, barro purinho. [...] Então chegava lá o pessoal
todo molhado, às vezes não levava uma roupa, uma coisa. Então tirava a roupa, lavava, punha na caldeira para secar. Enrolava
em um pedaço de tecido e trabalhava até a roupa enxugar [...]”. VR-HT-OP-053 - José Luzia Neto.
91. VR-HT-MA-047 - Terezinha de Paula Castro.
88. Do ponto de vista do gerente Fernando Araújo, “Desses regulamentos, o que mais se destacava era a falta, porque os
faltosos sempre eram os mesmos [...] E as desculpas sempre eram as mesmas: um dia ele matava o pai, outro dia matava a tia,
outro dia ele matava a avó. Chegava a um ponto que a família acabava”. VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso
de Araújo. Segundo Terezinha Castro, “não podia faltar à toa. Se faltasse, tinha que justificar e tudo. Ultimamente, eles pediam
atestado quando faltava; falava que estava doente e tinha que consultar e levar atestado. No princípio, não”. VR-HT-MA-047
- Terezinha de Paula Castro.
89. VR-HT-OP-052 - Adão Teixeira Barbosa.
92. VR-HT-MA-045 - Lalia Guilherme Teixeira. Também se lembraram do apelido do uniforme: VR-HT-MA-051 - Terezinha de
Jesus Mendonça; VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
93. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
94. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
95. VR-HT-MA-046 - Raimundo Francisco Ribeiro.
96. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
REGR A
1 06
107
Acervo Efigênia Sacramento Ferreira.
Foto equipe Vale Registrar.
O uso do protetor auricular ou abafador de ruídos é da mesma época que os óculos. Até
então era “só Deus mesmo”97, a tecelagem sendo o lugar mais barulhento, segundo Ilza
Dalva Macedo Liberato, ou a fábrica como um todo, para Fernando Araújo: “O barulho
de fábrica de tecido é um negócio ensurdecedor, é coisa de 102, 105 decibéis, por aí. Era
um negócio violento e ninguém usava nada. E, engraçado, conseguia-se conversar lá dentro.
[riso] Nós conversávamos com aquela barulhada toda”98.
É provável que, como gerente, Fernando Araújo se refira a conversas de serviço. Porque
“não conversar durante o trabalho” era outra regra comum às duas fábricas, compondo um
quadro de restrições a serem observadas pelos funcionários, de forma a não prejudicar a
produção. Assim: não conversar99; não namorar100; não mangar, “molengando lá sem querer
tocar o serviço”101; “não ficar saindo do trabalho para ir ao banheiro”, que ficava longe102;
não fazer bagunça; “não sair da seção para ir para outra [...] a sua na sua, a minha na minha,
a de lá na de lá [...] Se eu saísse da minha seção e viesse para cá, queria dizer que ou a
máquina estava fazendo coisa errada [...] ou eu estava deixando as máquinas paradas”103.
97. “Bem para o finalzinho da década de 1970, os abafadores. Primeiramente era só Deus mesmo, não é?” VR-HT-OP-043
- Vicente Juliano de Oliveira.
Sair da seção não podia, mas “[...] quando acabou a [II] Guerra [Mundial], no dia em que
os soldados chegaram a Mariana... perto dos filatórios tinha uns caixotes em que punha
o algodão para depois recatar o algodão. Então, minha irmã com uma outra amiga minha
subiram para ver o trem passar [riso], porque as janelas eram altas. O chefe geral viu e
suspendeu, acho, umas sete moças”107.
Fazer bagunça também não podia, mas “uma vez apareceu lá [...] um assobio de futebol. [...]
Minha irmã, que era muito séria, mas muito séria mesmo, dessas certinhas, pegou o tal do
assobio que estava de mão em mão e fez ‘psh!’, soprou. Ela chamava Maria Auxiliadora. Aí o
contramestre veio chegando e mandou ela para casa: suspensão de três dias”108.
A suspensão do serviço – o chamado balão – era uma das formas de penalidade. Podia ou
não ser precedida pela advertência verbal e advertência por escrito, e por certo significava
não receber os dias parados. “[...] afastava de tudo: do trabalho e [riso] do dinheiro também!”, lembrou Marta Martins. Seduzida por uma “falsa amiga”, ela não pediu autorização
para falhar na Quinta-feira Santa, quando iria se apresentar com o Coral São Pio X, da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. Resultado: suspensão, sua única punição em trinta
anos de Ouropretana109.
Pior que o balão era quando o descumprimento da norma ameaçava a própria vida do funcionário. Formalmente, inexistia a regra “não se distrair” ou “não cochilar” em serviço. Para
Efigênia Sacramento, parece que a moça cochilou e pôs a mão em cima de uma bateria
grande, de 220 volts. “Aí ela agarrou e não soltava de jeito nenhum. [...] Ficou amarela que
nem cera!” Ela teve de ir “para Belo Horizonte trocar o sangue todo, porque o sangue dela
cozinhou [...] a coisa foi muita”110.
98. VR-HT-MA-040 A / B - Fernando Antônio Affonso de Araújo.
99. “Cada qual sabia que não podia conversar porque não dava jeito mesmo. Então, o regulamento era esse, você ficava
calada e trabalhando, porque não tinha outra coisa.”VR-HT-MA-053 - Maria de Oliveira e Souza.Ver também:VR-HT-MA-048
- Antônio Gonçalves Carneiro; VR-HT-OP-046 - Maria Cecília Jeremias.
104. VR-HT-OP-036 - Alda Gualberto Teixeira.
100. “Era bem rigoroso. [...] Se passasse uma lá e você mexesse com ela, estava na rua.” VR-HT-OP-052 - Adão Teixeira
Barbosa. “Isso era de jeito nenhum! [...] Bateu o cartão, passou da portaria para fora, não tinha nada a ver mais: podia namorar,
podia abraçar, podia beijar e tudo. Mas, lá dentro, não; lá dentro tinha o maior respeito o pessoal. Se o encarregado visse, ah!,
advertência na hora, balão. Lá dentro tinha respeito.” VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota.
106. VR-HT-OP-046 - Maria Cecília Jeremias.
105. VR-HT-MA-053 - Maria de Oliveira e Souza; VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza; VR-HT-OP-038 - Ilza Dalva
Macedo Liberato.
107. VR-HT-MA-035 - Juraci de Oliveira.
101. VR-HT-MA-041 - Alvarina Gomes de Carvalho.
108. VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
102. VR-HT-MA-054 - Neuza Aires do Nascimento.
109. VR-HT-OP-035 - Marta Virgem Martins.
103. VR-HT-OP-037 - Neuza Terezinha da Silva Coelho.
110. VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Carteira da Comissão Interna de
Prevenção de Acidentes, da Companhia
Industrial Itaunense – Unidade III.
Década de 1980 (aproximadamente).
O cumprimento da regra era atitude corriqueira nas fábricas, ou porque “o povo era muito obediente”104, ou porque “todo mundo precisava do serviço”105, ou pelas duas razões
combinadas com a existência de fiscalização e penalidades. Conversar não podia, mas “a
necessidade de falar era muita”. Então Maria Cecília e as colegas, girando a cabeça de olho
na aproximação do chefe, moviam os lábios umas para as outras, e assim estavam conversando no meio do barulho ensurdecedor. Se o chefe visse, “ele dava parte da gente com o
patrão”106. Se não visse, a mímica prosseguia.
1 08
109
FORÇA
Um tomatinho – essa é a imagem mais constante na lembrança de funcionários da Ouropretana e da São José que trabalharam nas fábricas em tempos anteriores à instalação da
Cemig nos dois municípios, nos anos 60.
Dentro de casa, a luz era um tomatinho. Às vezes, brincou Amadeu Silva, precisava acender
uma vela para ver se a luz estava acesa113. Para escutar “Jerônimo, o herói do sertão”, Dona
Sinhá “colocava o ouvido dentro do rádio [...] porque a luz não dava, certo?”114. Fora de casa,
se Vicente Juliano e seus amigos de infância quisessem se esconder dos pais, “era só ficar
entre dois postes, porque ela parecia dois tomatinhos lá em cima. Não iluminava nada”115.
A luz era (ou veio a ser) um tomatinho porque se instalou um desequilíbrio: a produção
de energia, até então a cargo, principalmente, das fábricas de tecidos e em grande parte a
elas destinada, não foi capaz de suprir a demanda crescente de cidades em expansão – mais
gente, mais casas, lâmpadas, chuveiro, ruas, comércio, um rádio, uma geladeira, o ferro de
passar roupa.
Resolver o desequilíbrio e garantir boa e constante energia para as próprias fábricas exigiam delas investimentos pesados no setor elétrico. Ações nesse sentido foram até ensaiadas, como se viu na Ouropretana sob a superintendência de Theódulo Pereira. Mas não
se mostraram suficientes para alterar “o estado primário dos sistemas elétricos mineiros”,
como disse Lucas Lopes, o primeiro presidente da Cemig, o tecnocrata escolhido pelo
então governador de Minas Gerais Juscelino Kubitscheck para traçar e executar políticas
que solucionassem um dos pontos de estrangulamento da economia mineira, a energia116.
Ou seja, a energia se tornou um problema não apenas para Mariana e Ouro Preto; tal
como existia nos anos 50, era um entrave ao desenvolvimento de Minas – suas cidades e
indústrias –, que só foi removido por meio da ação estatal.
Bem antes dessa ação, “a maioria das indústrias, que se instalaram no Estado, era obrigada a fazer o esforço de montagem de sistemas elétricos próprios”117. No caso de Ouro
Preto, como foi dito, a produção de tecidos e de energia esteve nas mãos de uma mesma
sociedade anônima – formada, em momentos diferentes, pela Companhia Industrial de
Ouro Preto, sediada no Rio de Janeiro, pela Santos, Irmão Rezende & Companhia e pela
Companhia Industrial Ouropretana –, com um breve interregno em que tecidos e força
estiveram separados – a cargo, respectivamente, da Fábrica de Fiação e Tecidos Itacolomy
e da Companhia Luz Eléctrica Ouropretana.
Em Mariana, fábrica e energia estiveram bem próximas, mas com nome, sede, objeto e
CNPJ diferentes. Em 1927, o jornal A Matraca, tão distante da ideia de tomatinho, assim
exaltava o nascimento da Companhia Força e Luz Marianense:
É estupendo, pasmoso o modo como todos tem amparado a ideia do illustre Conego
Cotta, que arrostando, destemeroso, com descrenças e pessimismos, aqui reinantes
ha longos annos, pretende superar um dos maiores obstaculos ao progresso da nossa terra, com o organizar uma sociedade anonyma que tem por objecto – força e luz.
Servida de força e luz, alcança a cidade o de que ha muito necessita para seu real
desenvolvimento e felicidade de seu povo.
Já não ha mais lugar para duvidas. A sessão preliminar demonstrou, á saciedade, que
a ideia do Revmo. Conego Cotta triumphou.
[...] Mau grado as acções subscriptas, tantas a attingir a somma citada [300 contos],
todavia não nos libertamos ainda do grupo dos pessimistas parvos que reputam
impossivel a fundação definitiva da sociedade.
Dizem ser facil subscrever acções, mas ás chamadas muitos fogem.
111. A baforada no peito foi um exemplo citado por Fernando Antônio Affonso de Araújo - VR-HT-MA-040 A / B. Com
Jair Cota, que trabalhou na tinturaria, ocorreu mais que uma baforada: “[...] o cilindro estourou em mim, queimou aqui assim,
queimou rosto, pele, fiquei internado sete dias [...].” VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota.
Que engano! [...]
112. VR-HT-MA-046 - Raimundo Francisco Ribeiro.
113. VR-HT-MA-036 - Amadeu da Silva.
114. VR-HT-OP-032 A / B - Maria Efigenia Bastos dos Santos.
116. DINIZ, Clélio Campolina. Estado e capital estrangeiro na industrialização mineira. Belo Horizonte: UFMG/PROED, 1981;
SIMÕES, Josanne Guerra. Sirênico canto; Juscelino Kubitscheck e a construção de uma imagem. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.
115. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
117. DINIZ, Clélio Campolina. Op. cit. p. 116.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Nesse caso, que não foi fatal, o cochilo ou a distração do funcionário ocorreu em um
ambiente e época em que a probabilidade de existir proteção para equipamentos elétricos, térmicos e girantes era nula ou quase isso. Assim, de vez em quando, um choque,
uma baforada do vapor da caldeira atingindo o peito de alguém111. Um dia, no entanto,
o acidente fatal na São José. Não se podia passar a correia na polia com o motor ligado.
Eurípedes, sozinho na sala, foi passar, a correia pegou seu braço, levou-o lá para cima,
e ele ficou rodando, rodando, até o membro se desprender. “Foi uma coisa horrorosa!
Nossa Senhora!” Por isso, completou Raimundo Ribeiro – um dos tantos que lembraram
o caso –, quando entrava debaixo de uma máquina para consertar, “eu punha um ferro
na engrenagem porque, às vezes, um ia lá, ligava o motor e como é que eu ficava? Aí eu:
‘Quebra a engrenagem, mas não me quebra o braço’”112.
110
111
paz, por se lhe ter deparado a ella esse Cultor, impenitente e fervoroso, que, ao lado
do coração grande do Dr. Augusto Freire, chamou, em boa hora, seus conterraneos
a essa obra ingente, a bem do berço commum118.
Constituída formalmente em julho de 1927, a empresa foi vista como marca do progresso
“para o municipio que se verá habilitado a movimentar as suas possibilidades productoras”119.
À frente dela, duas “figuras masculas”, “dous principaes paladinos”: cônego José Cotta e
Augusto Freire de Andrade120. Contra ela, “esses scepticos”121. A favor dela, no mínimo 188
subscritores das ações (Ver Anexo III).
No momento de sua constituição, a Companhia Força e Luz Marianense (CFLM) tinha já
garantido o privilégio de 25 anos para a produção e fornecimento de energia pública e
particular, a isenção de todos os impostos, taxas e contribuições municipais pelo prazo de
dez anos, e os terrenos necessários à construção da usina, colocação de postes, passagem
de fios e cabos122.
com aquella firma”124. Assim, os maquinismos necessários à “possante” usina de Furquim – “os
mais perfeitos e mais modernos existentes”125 – custaram à CFLM nascer já endividada.
Essa situação não se alterou nos anos seguintes. Como se viu anteriormente, em outubro
de 1933 Oscar Magalhães Ferreira, Gercino Barbosa da Silva e Emygdio Berutto solicitaram
terrenos à Prefeitura de Mariana para a instalação de uma fábrica de tecidos. No mesmo
dia, firmaram um contrato com a CFLM126, em que eles eram “os consumidores” e ela, “a
fornecedora”. Com esse contrato, que foi incorporado àquele que criou a Fiação e Tecelagem São José Limitada, a força e a luz necessárias ao funcionamento da indústria estavam
garantidas pelo prazo de dez anos, de maneira “permanente e ininterrupta, em todos os
dias do anno, entre cinco e vinte e quatro horas”127.
O contrato também afirmava que
Si a Cia. Força e Luz Mariannense, a fornecedora, não puder resgatar no vencimento
a divida hypothecaria a que se acham vinculados a sua usina electrica e demais bens
que a compõe, o resgate da mencionada divida desde que o credor hypothecario
não concorde em prorrogar o seu vencimento, poderá ser feito pelos contractantes
Para tudo começar a funcionar, no entanto, foi preciso mais de uma prorrogação de prazos123. Provavelmente em 1929, a primeira lâmpada da CFLM acendeu em Mariana: vinda
da usina hidroelétrica de Furquim, distrito a cerca de 35 quilômetros da sede do município,
a energia chegou à distribuidora e daí atingiu as ruas.
Mal o serviço foi inaugurado e já se aprovava o aumento de 20% no preço da luz particular. Na
mesma reunião em que isso ficou decidido, dezembro de 1929, cônego Cotta “pediu a assembleia authorização a Directoria no sentido de firmar esta quaesquer documentos com a firma
commercial Siemens Schuckert S.A. relativamente à divida da Cia. Força e Luz Mariannense
comsumidores ou seus successores, operando-se em favor de qualquer destes [...] a
competente subrogação, nos direitos do credor satisfeito128.
Não foi possível saber que fim levou dívida, resgate, vencimento. Sabe-se que, em pouco
tempo, acionistas e/ou dirigentes da São José tornaram-se diretores da CFLM, como José
Edwards Ribeiro (diretor-gerente), Emygdio Berutto (diretor-tesoureiro), Gercino Barbosa
da Silva (membro do conselho fiscal) 129.
124. JUCEMG. Ata da Assembleia Ordinaria dos acionistas da Companhia Força e Luz Mariannense, realizada em 31 de
dezembro de 1929. Arquivamento 12.709. s.p.
118. FORÇA e Luz. A Matraca, Marianna, 23 fev. 1927. [p.2]. Antes da fundação da Companhia Força e Luz Marianense e
desde 1910, o serviço de iluminação pública e particular na cidade esteve a cargo da empresa The Ouro Preto Gold Mines
of Brasil Limited, de Passagem de Mariana.
119. COMPANHIA “Força e Luz Mariannense”. O Germinal, Marianna, 31 maio 1928. p. 1.
120. COMENTARIOS. O Germinal, Marianna, 10 nov. 1928. p. 1.
121. FORÇA e Luz. A Matraca, Marianna, 23 fev. 1927. [p. 2].
122. AHCMM. Acta da 1ª sessão ordinaria da Camara Municipal de Marianna; 12 jan. 1927. In: Livro de actas das sessões da
Camara Municipal de Marianna; 1915-1929. cód. 334. f. 109-110. Cd 046, imagem 118; AHCMM. Resolução 184A de 12 de
janeiro de 1927. In: Livro para registro de resoluções e leis; 1917-1930. cód. 061. f. 119-119v. Cd 005, imagens 122-123.
123. A esse respeito, ver, por exemplo: AHCMM. Acta de 2ª sessão ordinaria da Camara Municipal de Marianna; 06 jun. 1927.
In: Livro de actas das sessões da Camara Municipal de Marianna; 1915-1929. cód. 334. f. 119. Cd 046, imagem 127; AHCMM.
Acta da 2ª sessão ordinaria annual da Camara Municipal de Marianna; 05 jun. 1928. In: Livro de actas das sessões da Camara
Municipal de Marianna; 1915-1929. cód. 334. f. 131v-132. Cd 046, imagem 140; AHCMM. Acta da 3ª sessão ordinaria annual da
Camara Municipal de Marianna; 30 set. 1928. In: Livro de actas das sessões da Camara Municipal de Marianna; 1915-1929. cód.
334. f. 137-138. Cd 046, imagens 145, 146; COMENTARIOS. O Germinal, Marianna, 10 nov. 1928. p. 1.
125. Como informava O Germinal: “A inauguração das possantes uzinas de Furquim marcará uma nova era de progresso para
o municipio [...]. Resta saber si as instalações das usinas estarão nas condições de prestar um serviço perfeito e que consulte
ás necessidades e aos interesses da cidade. Não temos, entretanto, o direito de pôr em duvida a pericia e honestidade da
Companhia contractante das obras, porque ninguém desconhece que a Cia. Siemens é uma Empresa que tem seu nome
feito e a sua honorabilidade garantida em inumeros trabalhos de tal natureza e de muito maiores vultos, accrescendo a
circunstancia de ser o conselho fiscal da C.F.L.M. constituido de profissionais idoneos e de pessoas de indiscutivel conceito,
Conselho que reconhece que os machinismos empregados nas nossas instalações são os mais perfeitos e mais modernos
existentes.” COMPANHIA “Força e Luz Mariannense”. O Germinal, Marianna, 31 maio 1928. p. 1.
126. MINAS GERAIS. MARIANA. CARTÓRIO DE REGISTRO DE TÍTULOS, DOCUMENTOS E CIVIL DAS PESSOAS
JURÍDICAS DE MARIANA. Contrato número 131; 14 out. 1933. s.p.
127. Idem.
128. Idem.
129. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Companhia Força e Luz Marianense, S/A, realizada aos 21 dias do mês
de Março de 1942. Arquivamento 21.313. s.p. Até 1950, José Edwards Ribeiro, Emygdio Berutto e Gercino Barbosa da Silva
permanecem nos cargos.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
[...] Marianna, tida como safara e semi-morta, poude mostrar o de quanto ainda é ca-
112
113
De fato, a usina foi inaugurada em dezembro de 1952. Agora havia a usina velha e a usina
nova de Furquim. À frente dos trabalhos de construção, o gerente Pio Porto de Menezes, que,
recordando-se do “serviço extraordinário prestado pelo pessoal do escritório durante a empreitada”, propôs uma licença especial ou gratificação extraordinária para Arlindo Godoy131.
Com essas obras e talvez outras mais, “o débito real da Força e Luz Marianense à Fiação e
Tecelagem São José [era] de Cr$ 2.898.922,10”132, num ano (1952) próximo àquele (1955)
em que o capital empregado em toda a indústria manufatureira e fabril de Mariana era de
pouco mais de três milhões, como se viu anteriormente.
Em nenhum momento a fábrica se fundiu à CFLM, nem mesmo quando se disse que “mais
de nove décimos da totalidade das ações desta Companhia pertencem à Fiação e Tecelagem São José, que tem sido a financiadora desta Companhia e com a qual está intimamente
ligada pelo fornecimento de energia que faz àquela empreza [...]”133. De origem diferente, as
sociedades se tornaram irmãs, no dizer de Antônio dos Reis Jacinto.
Os investimentos no setor elétrico feitos pela São José e pela Ouropretana nos anos 50 se
mostraram insuficientes. A promessa de desenvolvimento e progresso, acalentada no início
do século XX, virou um tomatinho nos anos 60. Em Mariana, precisamente em 1965, nem
130. JUCEMG. Ata da reunião ordinária, anual, da Fiação e Tecelagem São José, Ltda. Arquivamento 37.327. s.p.
131. Ildefonso Mascarenhas da Silva, “louvando os bons serviços prestados pelo Dr. Pio Porto de Menezes na construção da
Nova Uzina, que foi inaugurada solenemente em 21 de dezembro de 1952, propôs que lhe fosse concedida a gratificação
de Cr$ 100.000,00 (cem mil cruzeiros).” Cf.: JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Companhia Força e Luz
Marianense, S/A, realizada em 19 de abril de 1953. Arquivamento 61.442. s.p.
tomatinho: “Mariana passou o Natal deste ano completamente no escuro e suas indústrias
estão paradas, porque a concessionária de serviço de fôrça e luz não tem capacidade de
atender à demanda da cidade, trazendo prejuízo aos seus moradores”134.
P A US A
Depois de horas de serviço, havia uma pausa para a refeição, 30 minutos, 40, 60; quase
nunca e para quase ninguém, duas horas.
Nesse momento, o apetrecho característico era a marmita. A turma da produção, vale
dizer, a maioria dos funcionários, ficava responsável por providenciar seu almoço ou jantar
– aquele para quem pegava o serviço às 5 horas; esse para a jornada que começava às 14.
Como era comum a troca de turno, em uma semana Maria Amarante Silva, a exemplo de
tantos outros trabalhadores, almoçava na Ouropretana, e na outra semana jantava; o mesmo ocorria com Maria Oliveira e Souza na São José.
Nas duas fábricas, o próprio funcionário levava sua marmita ou pedia a alguém – uma vizinha, a mãe, o irmão – para fazê-lo. Havia quem ganhasse um trocado com esse transporte.
Com oito anos, portanto bem antes de se empregar na fábrica, José Luzia Neto já penava
no morro do Quiabo com oito a dez marmitas135; Vicente Juliano foi “menino formiguinha”
em 1969136; e Francisco de Assis, depois de descarregar na São José, ainda ia para Passagem
fazer entrega para os mineiros da Companhia Minas da Passagem137.
Por mais tempo na Ouropretana, por menos tempo na São José, no horário de almoço ou
jantar os trabalhadores pegavam as marmitas e tratavam de arrumar um canto para fazer
a refeição – no pátio, na frente, encostado à parede, próximo à escada, onde desse, onde
houvesse uma sombra ou abrigo da chuva.
No caso de Mariana, como foi dito, a gerência de Pio Porto de Menezes arrumou um cômodo, “atrás do escritório, entre o escritório e o almoxarifado. Era um galpão que existia
lá, uma área em que foi colocada uma mesa grande e uns bancos. Ali o pessoal revezava na
alimentação”, recorda-se Geraldo Pedro Coêlho138.
No caso da Ouropretana, já no final dos anos 70 houve um refeitório e, com sua incorporação pela Itaunense, um restaurante do tipo self-service. Se o funcionário quisesse desfrutar
132. JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Companhia Força e Luz Marianense, S/A, realizada em 19 de abril de
1953. Arquivamento 61.442. s.p.
133. José Edwards Ribeiro “explica que mais de nove décimos da totalidade das ações desta Companhia pertencem à Fiação
e Tecelagem São José, que tem sido a financiadora desta Companhia e com a qual está intimamente ligada pelo fornecimento
de energia que faz àquela empreza, motivo porque pensa que ambas devem ter a mesma diretoria ou, pelo menos, o mesmo
diretor-presidente, razão porque não deseja ser reeleito e propõe que, na renovação da diretoria a ser feita nesta Assembleia,
seja eleito diretor-presidente o atual diretor-presidente da Fiação e Tecelagem São José. Dr. Pio Porto de Menezes declara
ser da mesma opinião, informando que não poderá aceitar sua reeleição para o novo biênio.” Assim sendo, a Assembleia
elege Ary Ferreira (diretor-presidente) e Aristides Magalhães Ferreira e José Custódio Carvalho Drumond (diretores). Cf.:
JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Ordinária da Companhia Força e Luz Marianense, S/A, realizada em 19 de abril de 1953.
Arquivamento 61.442. s.p.
134. MARIANA sem luz no Natal. Diário de Minas, Belo Horizonte, 29 dez. 1965. p. 9.
135. VR-HT-OP-053 - José Luzia Neto.
136. VR-HT-OP-043 - Vicente Juliano de Oliveira.
137. VR-HV-MA-002 A / B - Francisco de Assis Moreira. Francisco de Assis Moreira é músico e alfaiate em Mariana. Também
trabalhou, por um período, na Fiação e Tecelagem São José.
138. VR-HT-MA-056 - Geraldo Pedro Coêlho.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Em 1949, era comunicado em reunião que a CFLM “receberá brevemente as máquinas encomendadas por intermédio da São José, para ampliação da Uzina em Furquim e que, para
seu pagamento, terá de despender elevada importância que a Cia. Força e Luz Marianense
não dispõe para a operação, sendo que a São José, por autorização da Assembleia, providenciará os pagamentos a débito da Cia. Força e Luz Marianense, em forma de empréstimo,
a juros de 8% anuais, recíprocos”130.
114
115
casa, construir gaiola de passarinho, cuidar de pai e mãe144. Em alguns casos, era o dia em
que se podia ganhar um extra, fazendo biscates ou fornecendo pensão145.
Feita a refeição, se desse tempo as pessoas descansavam, conversavam, saíam para tomar
um ar, davam uma volta na frente da fábrica, compravam pão de batata do menino cuja mãe
tratou da família com esse recurso139.
Afora isso, havia o costume de visitar um parente ou um amigo. E a missa como um dever –
“A gente não suportava pensar em não ter primeiro ido à missa”146 –, ou nem tanto assim:
“Coitadinho! Pobre vai à missa!”147.
Havia um lugar muito aprazível a Adão Teixeira Barbosa. No período em que trabalhou na
Ouropretana, de 1954 a 1962, ele não frequentou nem refeitório nem restaurante; carregava marmita e se acomodava em um canto. Como membro da seção de apoio, a oficina mecânica, seu horário era um pouco diferente: das 7 às 16, com uma hora de almoço. Assim,
podia passear na linha do trem diante da fábrica, em direção a um dos dois túneis próximos
a ela. Na entrada dele, havia uma nascente, “uma água maravilhosa”, “o local que todo funcionário da fábrica gostava de ir”140 – a chamada Água da Rainha, como disse Dona Sinhá.
Durante o dia, era possível jogar sinuca, jogo de malha ou futebol. As duas fábricas possuíam,
no interior de seus muros, uma área chamada de pátio ou gramado, ou simplesmente terreno, e era aí mesmo que se costumava jogar bola, com escrete composto pelos próprios
funcionários. Em Mariana, o time tinha até nome, Primeiro de Maio, e treinador, o encarregado geral José Ribeiro Leite, vulgo Zé Ratinho, “baixinhozinho, boné de couro”148.
O time de futebol Primeiro
de Maio no campo do Guarany
Futebol Clube, em 1953.
Nesse mesmo trecho, se fosse época de Carnaval, umas senhoras tecelãs até se esqueciam
do horário de entrar depois do almoço “e se enfeitavam com aqueles retalhinhos. Tinha
uns retalhinhos que a gente ganhava para fazer espanador, para espanar as máquinas. Elas
pegavam aqueles retalhinhos, faziam sainhas [...] amarravam na cabeça e se enfeitavam bem
e saíam na frente da fábrica [...] Ah, naquele trecho ali, elas faziam um carnaval! [...] Uma vez,
quase que o porteiro fecha o portão porque o pessoal não entrava! Foi a maior farra!”141
– relata Marta Martins, que não participou do cordão.
Terminada a refeição, retornava-se ao trabalho. Depois de seis dias de serviço, uma pausa
para a folga semanal. Aos domingos as máquinas não funcionavam. Por razões diferentes,
Maria Cecília e Antônio Gonçalves Carneiro gostavam muito já do sábado: ela, porque
nesse dia trabalhava uma hora a menos; ele, “porque o dia seguinte era para descansar”142.
Para o tempo, lugar e pessoas de que aqui se trata, a folga semanal era, primeiramente, o
momento do não trabalho na fábrica, podendo se combinar com algumas formas de diversão e dever. Domingo era o dia de fazer as coisas que não foram feitas, ou devidamente
feitas, durante a semana: arrumar casa, lavar roupa, passar com ferro a brasa – “Ai, que
horror!”143 –, arear vasilha empretecida pelo fogão a lenha, catar a própria lenha, adiantar o
feijão da semana, ajudar uma irmã nos estudos, fazer bainha, consertar qualquer coisa em
139. “Tinha esse carrinho dos meninos que vendiam doce para nós, no portão. [...] Tinha um cuja mãe fazia até pãozinho de
batata. Hoje ele é casado, já tem filha formada. Outro dia, ele ainda se lembrou de mim, falou assim comigo: ‘A senhora lembra,
dona Eva, quando eu vendia pãozinho de batata para a senhora lá no portão da fábrica?” – A gente comprava para merenda.
– ‘[...] Chegava com o dinheiro em casa, mamãe ia na venda comprar mantimento para tratar de nós. Era muito irmão e papai
não tinha cabeça, era só beber.’ Nós comprávamos na mão dele pãozinho e docinho.” VR-HT-MA-049 - Eva Lemos Paiva.
140. VR-HT-OP-052 - Adão Teixeira Barbosa.
141. VR-HT-OP-035 - Marta Virgem Martins.
142. VR-HT-OP-046 - Maria Cecília Jeremias; VR-HT-MA-048 - Antônio Gonçalves Carneiro.
143. VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz.
Acervo Amadeu da Silva.
Jogo de futebol realizado no Dia do Trabalhador
para confraternização entre membros do
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de
Fiação e Tecelagem de Ouro Preto
De uniforme azul, Calimério Simão Rosa, último gerente
da Companhia Industrial Itaunense – Unidade III.
Década de 1990 (aproximadamente).
Acervo José Florentino de Castro.
144. Sobre essas atividades, ver, por exemplo: VR-HT-MA-049 - Eva Lemos Paiva; VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz; VR-HT-MA-044 - José Lacerda Filho; VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira; VR-HT-OP-045 - Edite
Augusta Guimarães Almeida; VR-HT-OP-035 - Marta Virgem Martins; VR-HT-OP-032 A / B - Maria Efigenia Bastos dos Santos.
145. “Olha, a gente lutava com muita dificuldade. A gente ainda dava tipo pensão de comida. Então a gente trabalhava
muito domingo! A minha mãe ficou viúva com 35 anos e sete filhos. Não era brincadeira! A gente tinha que trabalhar!”
VR-HT-MA-054 - Neuza Aires do Nascimento.
146. VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
147. VR-HT-MA-042 - Francisco Pedro da Silva.
148. VR-HT-MA-036 - Amadeu da Silva. Ver também: VR-HT-MA-050 - Antônio dos Reis Jacinto; VR-HT-MA-056 - Geraldo
Pedro Côelho.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
desse serviço, ele pagava uma porcentagem e a empresa, outra; se não quisesse, era só levar
a marmita, esquentar e pronto.
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Isso só não acontecia aos domingos quando, por alguma requisição extra, o funcionário
era convocado para fazer “espanação do teto da fábrica 152; ou simplesmente porque havia
decidido ficar em casa, almoçar, jantar, para no dia seguinte começar tudo de novo.
Depois de horas e dias, depois de um ano de serviço, uma pausa para festas – a Páscoa
celebrada por Dom Barroso na Ouropretana, o churrasco promovido por ela no 1º de
Maio, a banda União 15 de Novembro animando as comemorações na São José. E uma
pausa para as férias – teoricamente, pelo menos.
Augusto Amaral trabalhou 11 anos sem tirar férias; Luiz Gordiano e Levindo de Souza,
dez; Maria Sabará, 18; Efigênia Sacramento e Maria de Oliveira e Souza, nove. Havia, por
certo, a lei de férias, mas havia igualmente uma margem de manobra elástica o bastante
para permitir adequações convenientes e necessárias.
Família passeia na Estação Ferroviária de Mariana. 1949.
Acervo Stela Gomes Chaves.
À tarde, às vezes Maria Sabará promovia domingueiras – “a gente punha um disco para
tocar em casa e dançava em casa mesmo, juntava as colegas”150; às vezes Pedro Moutinho
assistia ao seriado de faroeste no cinema, para depois fazer o footing na rua São José, em
Ouro Preto. Em Mariana, a paquera acontecia na praça Gomes Freire, mais conhecida
como Jardim, com hora marcada. E o namoro em casa tinha ordem da mãe: “Só namorar
até 9 horas. [riso] Às 9 horas, ela arranjava uma soneira que o moço já sabia que tinha que
ir embora, não é?”151.
Missa de Páscoa na Companhia Industrial Ouropretana,
celebrada em 1976.
Acervo Efigênia Sacramento Ferreira.
149. VR-HT-MA-052 - Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz.
150. VR-HT-OP-040 A / B - Maria da Conceição de Paula.
151. VR-HT-MA-057 A / B - Inês Brandão Pereira.
152. “Às vezes, tinha domingo que nós tínhamos que fazer espanação. Fábrica sobe muita poeira, muito pó; se você não fizer
a espanação... Então, todo domingo você tinha que fazer a espanação: espanar o teto da fábrica todinho. A gente, às vezes, não
costumava nem ter quase folga nenhuma.” VR-HT-MA-043 - Levindo Gregório de Souza.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Além de jogos, havia caminhadas pelos morros de Ouro Preto, como Luiz Gordiano costumava fazer, ou por bairros repletos de frutas em uma Mariana bem menos povoada, como gostava Amadeu da Silva.Terezinha de Paula Castro preferia ir com as amigas tomar sol de maiô,
em um córrego na saída da cidade; e Eni da Cruz não perdia o trem do meio-dia, que chegava
trazendo o jornal, para ler a parte feminina “que contava essas coisas do Rio de Janeiro”149.
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Os funcionários que trabalhavam nas férias recebiam por isso. O “corpo ficava cansadinho”153,
como disse José Lacerda, mas era um dinheiro a mais com o qual se podia contar para
despesas corriqueiras, para trazer pai e mãe do distrito e construir-lhes uma casa154, para
adquirir algo extra, como uma roupa, um cobertor para os meninos155. Do ponto de vista
da empresa, ela não precisava se preocupar com quem iria cobrir o trabalhador de férias.
Enquanto a margem de manobra existiu, assim foi feito.
Outros funcionários gozavam férias de 10, 15, 20 dias. O eletricista Pedro Moutinho fazia
então biscates156; Geraldo Coêlho aproveitava para colocar os estudos em dia157; Jair Pedro Cota cuidava das vacas no sítio158; Waldir Santos ficava em casa mesmo, já que suas
férias não coincidiam com as dos filhos159; e Terezinha Castro “queria sair, queria cuidar
das minhas roupas, comprar mais tecidos para parecer com a Terezinha Morango, já que
eles tinham me dado [esse] nome. [...] Eu comprava pano, levava para minha costureira
fazer. Eu tirava as minhas férias e no mês seguinte era um aperto feio, mas a gente dava
a volta por cima”160.
Na volta, depois de muito fiar, Terezinha continuava a molhar as mãos, a tirar o algodão
que agarrava na roupa, “para sair bonitinha lá fora, penteando o cabelo”161. E Maria
Cecília, depois de muito tecer, cheia de algodão na cabeça, voltava velha para casa, com
15 anos162, pouco antes de uma lágrima ser derramada por Victorino Dias163.
153. VR-HT-MA-044 - José Lacerda Filho.
154. VR-HT-MA-053 - Maria de Oliveira e Souza.
155. VR-HT-OP-031 - Efigênia Sacramento Ferreira.
156. VR-HT-OP-047 - Pedro Müller Moutinho.
157. VR-HT-MA-056 - Geraldo Pedro Coêlho.
158. VR-HT-OP-051 - Jair Pedro Cota.
159. VR-HT-OP-039 - Waldir José dos Santos.
160. VR-HT-MA-047 - Terezinha de Paula Castro.
161. Idem.
162. VR-HT-OP-046 - Maria Cecília Jeremias.
163. AIMFCII. Ata de 30 de março de 1931. In: Livro de actas das Assembleas Geraes da Fabrica de Fiação e Tecidos Itacolomy
Sociedade Anonyma; 12 maio 1912-30 maio 1941. f. 28v.
Livro de pagamentos dos operários da Fábrica de Tecidos Itacolomy, em 1922.
Acervo Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense.
Foto equipe Vale Registrar.
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Trabalhadores
entrev is tado s
maria n a
Alvarina Gomes de Carvalho
“Eu já vi dois acidentes: esse e o outro, que
também a correia levou ele lá em cima,
caiu cá embaixo. Até eles falam que aqui
é assombrado. [...] Eles falam aí que essa
fábrica é assombrada. A minha sobrinha
morou onde era a gerência, onde era o
escritório. Ela morou muito tempo ali. Eu
nem sei por que ela foi morar ali. Ela disse
que escutava barulho a noite inteirinha.
[...] Uai, a minha sobrinha falou que morou
lá e que escutou muito barulho. Deve ser
o homem que caiu lá de cima. Coitado!
Deus o tenha em bom lugar lá, ó!”
Código da entrevista: VR-HT-MA-041
Data da entrevista: 10/03/2009
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Amadeu da Silva
Antônio dos Reis Jacinto
“Eu era subordinado ao Olímpio Lázaro
da Silva, que era encarregado da Fiação
na época. O encarregado geral chamavase Geraldo Quirino. Mas tinha outro
acima dele que se chamava José Ribeiro,
Zé Ribeiro, apelido Zé Ratinho. Homem
bravo, lá dos lados de Sete Lagoas.
Homem bravo! Eles corriam até do boné
dele! Se ele deixasse o boné em cima da
mesa e a pessoa, de longe, visse o boné
em cima da mesa, tinha medo! O homem
era bravo e gaguejava ainda [...]. Ele ia
chamar a atenção da pessoa, ele gaguejava
[...]. Homem bravo, bravo mesmo!”
“O que era o fio aqui? [...] Fio de cobre.
Hoje é alumínio. Então partia muito fio
na estrada daqui a Furquim. Arrebentava.
Sabe por que arrebentava? [...] Com o
frio, ele encolhia; quando vinha o calor, ele
espichava. Ao espichar, ele arrebentava,
aí acabava a luz. [...] Pegava aquele rolo
de fio [...] punha no caminhão [...] Não
tinha estrada também. Estrada de burro,
de cavalo, de boi, por aí. Com a enxada,
o cara cavando. O caminhão passava
por onde o fio estivesse arrebentado, ali
encontrava, para emendar o fio.”
Código da entrevista: VR-HT-MA-036
Código da entrevista: VR-HT-MA-050
Data da entrevista: 28/10/2008
Data da entrevista: 08/06/2010
Antônio Gonçalves Carneiro
Augusto Amaral
“Almoxarifado era um serviço delicado,
árduo e responsável, porque eu era a
pessoa que tinha que dar conta de todo
o material necessário ao consumo da
Fiação e da Tecelagem. Não podia faltar.
Ali tinha o fichário e o estoque nas prateleiras adequadas. Eu ia acompanhando:
quando ia diminuindo, eu fazia o pedido
para sempre renovar o estoque. Assim fui
levando, levando, até adquirir a prática ou
a familiarização necessária com as coisas,
não é? E me saí bem!”
“No dia em que eu dei sinal na sirene,
chamando todo mundo para uma área
maior, todo mundo foi querendo saber
o que era. [...] Aí eu falei: ‘Infelizmente, o
doutor Aristides está aí e está chamando
todo mundo lá na frente do escritório’.
[...] Doutor Aristides, um homem de uns
45 anos, por aí... [...] Era uma pessoa boníssima. Antes nós tínhamos falado pelo
telefone. Ele falou: ‘[...] O que eu vou fazer em Mariana eu vou fazer metade em
Barbacena. Vou dispensar gente lá para
colocar os que quiserem ir daqui’. E fez
a proposta.”
Código da entrevista: VR-HT-MA-048
Código da entrevista: VR-HT-MA-038 A / B / C
Data da entrevista: 11/05/2010
Data da entrevista: 27/01/2009
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Eni Esmeralda do Nascimento da Cruz
Eva Lemos Paiva
Fernando Antônio Affonso de Araújo
Francisco Pedro da Silva
“E quando tinha que chamar no escritório, que a gente sabia que ia mandar embora? [...] Saber que a pessoa está sendo
chamada no escritório para ser mandada
embora é doído, viu? É doído! Ainda mais
que aqui não tinha outro meio de vida
[...] Às vezes não dava produção direito, às vezes faltava mais durante o mês.
Você sabe, todo setor tem isso, qualquer empresa tem aqueles que não são
tão entregues à profissão, que trabalham
mas não estão tão ligados naquilo, não é?
Então era bem doído saber.”
“Ali eles partiam para a gente um pão, e
aquele canecão cheio de leite, leite com
cálcio e açúcar queimado, sabe? Gostoso
mesmo! Eu não aguentava beber tudo.
Eu punha no vidro, levava para casa um
bocado, deixava só um golinho para tomar.
A gente não bebia porque o canecão era
deste tamanho. Na semana da noite, eu já
levava direto, tomava lá em casa. A gente
recebia quentinho; a gente ia acabando
de marcar o cartão, já tinha o porteiro
despachando. Eu levava para casa, fazia
broa com ele, ficava gostosa a broa!”
“Vou usar um termo meio bravo, mas é
esse que cabe. Quando você chegava a
roubar um funcionário de uma empresa
era porque ele era muito especializado,
muito bem treinado para funções
específicas: pegar um cara bem treinado
para trazer para cá para ser instrutor,
por exemplo. [...] Para fazer um instrutor
você leva 15 anos, vinte anos, se não tiver
aula. Naquela época não tinha, quer dizer,
o cara era autodidata naquela atividade.
Então ele tinha que ter certa tendência
para aquilo, ele tinha que gostar daquilo,
ele tinha que ter facilidade para fazer
aquilo. Aí a gente roubava.”
“Eu entrei lá como auxiliar de eletricista:
media luz, entregava conta de luz para o
povo de Mariana e atendia o pessoal. [...]
As casas tinham um fusível e, às vezes,
a gente ia lá para trocar esse fusível.
[...] E outra coisa: não existia telefone
também. Telefone era o da fábrica para a
Companhia Força e Luz e da Companhia
Força e Luz para o gerente da fábrica, para
o gerente da companhia, lá na rua Direita.
Só tinha esse telefone, não tinha mais
telefone. Depois vieram os telefones.”
Código da entrevista: VR-HT-MA-052
Código da entrevista: VR-HT-MA-049
Código da entrevista: VR-HT-MA-040 A / B
Código da entrevista: VR-HT-MA-042
Data da entrevista: 17/02/2009
Data da entrevista: 30/06/2009
Data da entrevista: 10/08/2010
Data da entrevista: 11/05/2010
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Geraldo Pedro Coêlho
Inês Brandão Pereira
“Nós tínhamos alguns cursos de reciclagem na área. Quando ia subindo de
função, a gente sempre ia para o escritório central em Belo Horizonte, bem
na Afonso Pena, edifício Acaiaca. A gente
ficava uma semana ali com a parte administrativa, aprendendo o ser viço [...].
Em vez de fazer em Belo Horizonte, ia
daqui prontinho para Belo Horizonte.
Nós fazíamos tudo aqui, todos os relatórios, prestações de contas, fechamento de
mês, parte financeira, receita e despesa.
Tudo isso era feito aqui no escritório, por
nós mesmos.”
“Quando eu já estava dentro da fábrica,
comecei a ver ele lá dentro. [riso] Aí a
gente começou, ele começou a me ver
também. Um dia, ele parou perto de
mim na rua. Daí para frente, a gente
não brigou mais. [...] Casamos em 1950.
Logo que eu cheguei aqui, o veneno já
tinha acontecido, não é? O veneno ou o
milagre. A gente namorou quatro anos
porque não tinha jeito de casar, não tinha
meios. Falava assim: ‘Com que roupa?’”
Código da entrevista: VR-HT-MA-056
Código da entrevista: VR-HT-MA-057 A / B
Data da entrevista: 19/10/2010
Data da entrevista: 15/12/2010
José Lacerda Filho
Juraci de Oliveira
“Inclusive, quando eu estava com 14 anos,
eles me tiraram umas três vezes do meu
serviço para levar moça em casa. Elas
moravam para o lado de um tal de Rosário
Velho. Não tinha luz naquela ocasião, a luz
era só aqui dentro da cidade; nessas ruas
mais retiradas era tudo no escuro. Aí eu
ia. [...] Para levar elas, a gente ia brincando,
caçoando, aquela coisa toda. Na hora de
voltar no escuro, sozinho. Eu ia rindo e
voltava chorando! [...] O negócio era feio!
A gente ia devagar e voltava correndo!
Doido para chegar em casa!”
“Mais no final, apareceu um movimento
sindical. Uma vez, eles até convidaram os
funcionários para fazer uma greve [...]
O salário não atingia, porque o material
era ruim. Então o sindicato vinha para
poder regularizar esse negócio aí, não é?
Às vezes, não atingia porque o material
era ruim, então a gente não conseguia
fazer muita coisa. Então nessa época, eu
não lembro o ano, mas eu lembro que
teve um movimento sindical na fábrica.
[...] Um dia paralisou, ninguém veio trabalhar, não.”
Código da entrevista: VR-HT-MA-044
Código da entrevista: VR-HT-MA-035
Data da entrevista: 22/09/2009
Data da entrevista: 28/10/2008
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Lalia Guilherme Teixeira
Levindo Gregório de Souza
“Ela tinha a usina em Furquim, não é?
De lá é que vinha para cá. Tinha empregado na usina lá. Mas faltava luz demais!
Aí, quando ia entrar a Cemig em Mariana,
teve reunião. Aí, não sei se maltrataram o
dono da fábrica, ele não quis mais entrar
na Cemig – a Cemig ia entrar aqui, era
reunião da Cemig. A fábrica não funcionava mais porque a força puxava demais
e as luzes apagavam em seguida.”
“O fim das máquinas, eu não sei o
que foi, mas certo é que depois eles
venderam o prédio. Entrou uma fábrica,
uma borracharia aí e acabou. Eu não sei
se a prefeitura pegou o terreno, porque
o terreno era praticamente da prefeitura.
Para mim, vendeu os lotes todos. Essa
parte toda, daqui até lá em cima naquele
Zé Raimundo, onde tem aquela loja, tudo
pertencia à fábrica. Aqui tinha um muro
de fora a fora, um muro de cipreste.”
Código da entrevista: VR-HT-MA-045
Código da entrevista: VR-HT-MA-043
Data da entrevista: 22/09/2009
Data da entrevista: 30/06/2009
Maria de Oliveira e Souza
Neuza Aires do Nascimento
“Tinha uma que trabalhava perto de
mim, uma mais de idade um pouquinho.
Acho que ela não tinha namorado.
Então, quando dava meio-dia, sei lá, [...]:
‘Ô, meu Deus! Me dá um casamento!’
[...] mas você não escutava porque o
barulho era demais. [...] E ela falava: ‘Ô
vontade de casar!’. Isso me fazia rir, boba!
Ela trabalhava perto de mim, a máquina
dela, perto da minha, e ela falava: ‘Ô
vontade de casar!’. Acho que era mais
de idade. Hoje ela mora em Ouro Preto.
Ela casou mesmo.”
“Tinha gramado, espécie de um campo,
muito espaço. Tinha um ambulatório
de emergência: quando as pessoas se
sentiam mal, adoeciam, iam para lá. Tinha
um médico que atendia todos os dias. As
pessoas que tomavam injeção levavam o
medicamento. Tinha tipo uma enfermeira
prática que aplicava. [...] Era como se
fosse uma casinha anexa, sabe? Separado.
Tinha uma cantinazinha, onde se fazia um
café, e o ambulatório com o espaço para
o médico, que ia lá também.”
Código da entrevista: VR-HT-MA-053
Código da entrevista: VR-HT-MA-054
Data da entrevista: 18/08/2010
Data da entrevista: 18/08/2010
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Orlando Müller Filho
Raimundo Francisco Ribeiro
“Sempre dava algum problema, tinha que
vir um técnico de Barbacena, que se chamava Senhor Ênio. Aí ficava dois, três
dias sem energia. A cidade, a fábrica,
parava tudo. [...] A usina de Furquim, na
época de seca, a água diminuía; os equipamentos também foram ficando muito
velhos; esse técnico de Barbacena morreu. Então a fábrica teve que parar, não é?
Me lembro disso.”
“Os teares são o seguinte: eles têm dois
braços, um jogava a lançadeira, uma recebia, e o outro jogava. E ele tinha embaixo...
Essa engrenagem que eu te falo é que
tocava uma parte de baixo. Como coração: um para lá e o outro para cá. Dois
corações mesmo, um desencontrado do
outro. Um rodava para lá, jogava o braço
para cá, e o outro jogava para cá. A hora
que ele virava para cá, o outro voltava.
Ficava o dia inteiro assim. [...]”
Código da entrevista: VR-HT-MA-055
Código da entrevista: VR-HT-MA-046
Data da entrevista: 19/10/2010
Data da entrevista: 27/10/2009
Terezinha de Jesus Mendonça
Terezinha de Paula Castro
“Falar com a senhora a verdade: eu gostei
muito de Barbacena. Achei lá melhor. Eu
gostei do maquinário, achei o maquinário
bom, o material bom, encarregados
bons. Gostei de lá. [...] [O equipamento]
era a mesma marca, mas os de lá eram
melhores. [...] Lá tecia também americano
cru, o liso. Tecia brim, lá tinha tecido bom.
Tinha estamparia, umas estampas muito
boas, bonitas. Tinha muito tecido bom
lá. [...] Eu gostava muito de trabalhar em
Mariana, na fábrica de Mariana, mas lá em
Barbacena também eu gostei.”
“De cá da Tecelagem a gente piscava
para os rapazes lá da bobinadeira. E os
da Tecelagem também: os contramestres,
que queriam a gente, também ficavam de
lá como se estivessem tomando conta
assim, mas a gente via que o olho dele
estava lá na gente, sabe? Era bom porque
não tinha ambiente fechado, a gente se
sentia à vontade. Os banheiros eram no
fundo. A gente pedia para uma colega: ‘Ó,
se arrebentar aqui, emenda para mim que
eu vou ao banheiro’. Voltava correndo.
Mas era bom demais!”
Código da entrevista: VR-HT-MA-051
Código da entrevista: VR-HT-MA-047
Data da entrevista: 08/06/2010
Data da entrevista: 03/11/2009
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
entrev is tado s
o uro preto
Adão Teixeira Barbosa
“Só tinha um grupo de casas, por volta de umas vinte casas, mais ou menos.
Tinha um grupo de casas em frente à
companhia, onde moravam aqueles funcionários de maior capacidade profissional, para atender às necessidades da
firma. E tinha algumas casas, assim, como
vaca no pasto: uma aqui, outra ali e tal.
[...] Morei em uma casa na parte de cima
da fábrica. Tem o rio, do lado de cima,
em um montezinho, tem uma casa. Lá eu
morei. [...] Tinha, aproximadamente, três
quartos, sala, cozinha e banheiro.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-052
Data da entrevista: 26/10/2010
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Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Alda Gualberto Teixeira
Edite Augusta Guimarães Almeida
“Eram três linhas só: duas falavam para
Belo Horizonte; uma, Rio, São Paulo. [...]
Tinha uma mesa muito velha, não como
essas centrais de hoje, não é? E tinha
umas ‘pegas’: Belo Horizonte, Rio de
Janeiro, São Paulo. Você enfiava a ‘pega’
lá no buraquinho e dava um sinalzinho;
aí a telefonista do Rio te atendia e
completava a ligação. Mesmo para Belo
Horizonte a gente não completava
ligação, não; pedia para a telefonista de
Belo Horizonte completar.”
“Tinha as máquinas, as moças todas
trabalhando com os lencinhos na cabeça,
e o movimento dos teares. Era lindo!
Lindo, lindo! Você via aquilo que era linha
virar pano! Isso aí a gente via porque ia
lá de vez em quando para ver, não é?
Eu fazia também muita excursão com
as crianças do Grupo [...] da escola em
que eu dava aula. [...] Fazia uma visita. Eles
viam o trabalho da Tecelagem, da Fiação,
de todas as áreas [...]”
Código da entrevista: VR-HT-OP-036
Código da entrevista: VR-HT-OP-045
Data da entrevista: 03/03/2009
Data da entrevista: 17/11/2009
Efigênia Sacramento Ferreira
“Uai, eu senti muito pelos outros que
trabalhavam, que estavam precisando
trabalhar ainda! Muito adolescente trabalhava lá, não é? [...] A fábrica era uma
mãe para todo mundo. O menino saiu
da escola com 14, 15 anos e estava indo
para a fábrica para tirar pano, limpar as
máquinas... [...] Hoje em dia não tem lugar. Uma, porque não pode empregar
menor de 16, de 18 anos. Isso já é uma
bobagem, porque trabalho não mata
ninguém, não é? Livra de muita bobagem, porque fica o tempo todo ocioso
aí, inventando moda.”
Ephigênia Antônia de São
José Ignácio dos Anjos
“Lá teve um sindicato, mas eu nunca
gostei de sindicato. [...] Trabalhando direitinho, andando direitinho [...] Como
eu falava com as meninas: ‘Sindicato para
quê, gente?’. Se a gente precisa trabalhar,
vamos trabalhar direitinho, não dar o
que falar. Estou andando no meu direito, não estou fazendo nada de errado,
como é que eles vão me mandar embora? Não vão mandar! Eu trabalhei lá
muito tempo!”
Código da entrevista: VR-HT-OP-031
Código da entrevista: VR-HT-OP-042
Data da entrevista: 07/10/2008
Data da entrevista: 20/10/2009
1 36
137
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Ilza Dalva Macedo Liberato
Jair Pedro Cota
“Assistência médica fornecia. Era uma
assistência assim: um médico atendia os
empregados da fábrica, mas tinha aquele
horário; em um horário específico o
médico estaria atendendo no consultório
dele. Quer dizer, se a pessoa adoecesse
fora daquele horário, não tinha médico.
Não tinha um médico sobre quem se
falasse assim: ‘Durante 24 horas pode
procurar um médico porque esse médico
é da fábrica’. Não, não tinha.”
“Eu trabalhava até dia de domingo, como
ronda. [...] A gente tinha que ficar a noite
inteira olhando, não podia cochilar, porque
não tem cerca para ladrão, não tem fecho
para ladrão. [...] O lugar mais perigoso era
perto da cachoeira. [...] Eles costumavam
entrar por ali [...]. Uma vez eles roubaram
um rolo de pano [...]. Mais de mil metros
de pano, uai! E não era paninho daquele
estreitinho. Era aquele cretone de dois
metros de largura ou 1 metro e 80, não
sei. Levaram com rolete e tudo.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-038
Código da entrevista: VR-HT-OP-051
Data da entrevista: 14/07/2009
Data da entrevista: 24/08/2010
José Donato Lessa
José Florentino de Castro
“À noite, se estivesse escurecendo às
6 horas, acendia a luz. Se estivesse claro,
não ia acender, deixava escurecer um
pouquinho para acender. Agora, durante
o dia, quando a cerração estava baixa e
você não enxergava, tinha que acender [...].
Como é que você ia passar com a cerração
baixa? Tinha que acender a luz [...]. Acendia
muitas vezes na cidade. Antigamente,
novembro? Quem fala que esse tempo
assim era no... Que coisa! Cerração, essa
serra toda cheia de mato e no escuro, a
cidade no escuro, tinha que acender.”
“Logo, logo, quando assumi o sindicato,
eu tive a oportunidade de trocar os
horários, a primeira coisa foi trocar esses
horários. Então ficou: de 6 às 14, das 14 às
22 e das 22 às 6, e manteve esse horário
de 7 às 16 horas. [...] Eu acho que esse aí
foi aquele chute da linha de fundo que
você bate a bola e a bola entra, não é?
Acho que foi esse aí. Acabar com esse
horário [de 5 horas da manhã], porque
era complicado esse horário.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-044
Código da entrevista: VR-HT-OP-041
Data da entrevista: 17/11/2009
Data da entrevista: 04/08/2009
138
139
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
José Luzia Neto
Luiz Gordiano Gonçalves
“Olha, na época foi muito difícil para todo
mundo, viu? Foi muito difícil. Na fábrica
era um salário até razoável; profissão de
contramestre, de mecânico, ganhava um
salário razoável. [...] Esse pessoal que
tinha essa profissão, o que aconteceu?
Tinha que começar a trabalhar como
servente de pedreiro, como ajudante.
Então o salário foi lá embaixo, começou
com o salário lá embaixo. [...] Mesmo
para a economia de Ouro Preto, não
é? A arrecadação caiu demais, uai! Não
é nada, não é nada, quando ela fechou,
eu acho que ainda tinha uns duzentos
funcionários. Então, uma queda muito
grande, foi muito doloroso, não é?”
“Antes, ninguém ensinava nada para ninguém, a pessoa tinha que aprender era
ali, olhando. [...] Então eu comecei. Ele
[o gerente, Jonas Militão] me levou para
lá, organizamos tudo, organizei os papéis,
como eu deveria mostrar para ele tudo
aquilo que a gente tinha aprendido e que
a máquina pedia. Comecei a ensinar. Assim
eles tinham a aula como aprendizes, para
receberem metade do salário, os menores
também. Metade do salário para aqueles
que estavam entrando e para aqueles que
já estavam lá, que já eram maiores, mas
ainda não sabiam... A gente passou a dar
essas aulinhas para eles.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-053
Código da entrevista: VR-HT-OP-050 A / B
Data da entrevista: 14/12/2010
Data da entrevista: 24/08/2010
Maria Amarante Silva
Maria Cecília Jeremias
“Todo ano comemorava festa no Dia do
Operário e o Natal também. No final
apareceu um inglês, o primeiro que deu
para a gente o 13º. Não se usava isso lá.
Ele foi o primeiro que deu para a gente
e fez um festão no Natal, bom mesmo.
E tinha umas festas, umas brincadeiras,
o pessoal desfilava, cantava, fazia umas
brincadeiras lá. Tem até aquela: ‘Varre,
varre, vassourinha / Deixa a fábrica
limpinha / O chão que varre é do Senhor
/ Como é bom ser trabalhador’.”
“Quando a gente ia casar, comprava lá
mesmo, comprava baratinho na mão
deles, fazia o enxoval todo. Tinha gente
que falava assim: ‘Eu não faço enxoval
com pano da fábrica, não!’. Mas lá, boba,
comprava aqueles panos, assim, de
algodão, mas muito fortes. Comprava
aquele morim cá fora, que vinha de outros
lugares, fininho, que em um instantinho
rasgava, não é? Mas aquela ilusão que
a gente tinha de beleza, não é? Eu não
podia comprar lá fora, em outras lojas,
porque eu ganhava pouco e minha mãe
ficou viúva e eu precisava ajudar. Então eu
fiz com o pano de lá mesmo.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-048
Código da entrevista: VR-HT-OP-046
Data da entrevista: 22/06/2010
Data da entrevista: 28/04/2010
1 40
141
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Maria da Conceição de Paula
Maria Efigenia Bastos dos Santos
“Trabalhei 24 anos como tecelã. Nos
últimos anos, seis anos, foi como instrutora.
Aí eu ensinava, dava uma aula teórica. Por
exemplo, eu ia explicar como chegava
o algodão, como acontecia para poder
sair o algodão. [...] Eu dava essa parte de
teoria só para a pessoa ter uma noção.
Como se fosse um padeiro: o padeiro
tem um processo até chegar ao pão [...]
Tinha a parte prática. [...] a primeira coisa
que a pessoa tinha que aprender: dar um
nó. Às vezes, tinha gente que ficava uma
semana para aprender a dar um nó! Nó
de tecelã não é um nó que se pega assim
e amarra. É um nó cruzado.”
“Mas, com o problema do pessoal, os
associados em cima de mim por causa
de insalubridade... Chamei o diretor uma
vez, duas, três. Nada! Levei a fábrica na
Justiça. Foi o fim da picada para mim! [...]
Foi a razão pela qual eu saí do sindicato,
porque o pessoal foi chamado por ele: se
eu ganhasse, eu ia fechar a fábrica. Quem é
que queria que a fábrica fechasse? Eles não
queriam, muito menos eu! [...] Mas, como
presidente do sindicato, eu não podia ficar.
Eles deram o terreno para fazer a sede
do sindicato, eu não podia me vender para
eles por conta de um terreno. Eu tinha
que dar assistência aos associados.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-040 A / B
Código da entrevista: VR-HT-OP-032 A / B
Data da entrevista: 04/08/2009
Data da entrevista: 07/10/2008
Marta Virgem Martins
Neuza Terezinha da Silva Coelho
“Era mais de um prédio, mais de um prédio.
Tinha a parte externa, que era embaixo,
onde funcionava a mecânica e também
a caldeira. Depois subia para a parte de
cima, onde funcionava a fiação, pavieiro,
tecelagem. Em outro prédio, menorzinho,
tinha uma seção só para aprender :
quem entrava para a tecelagem aprendia,
primeiramente, nessa seção. Depois descia
para tomar conta de máquina.”
“Tinha festa em Itaúna. Eles traziam ônibus
de lá, enchiam os ônibus e iam os funcionários daqui para a festa. A gente tinha
aquele dia de lazer, os funcionários daqui
com os de lá. Era muito bom e era com
muita fartura: as coisas, almoço, refrigerante, tudo com muita fartura. Agora, a gente
era muito amigo. Os funcionários eram
muito amigos uns dos outros e a gente
tinha aquelas amizades muito sinceras.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-035
Código da entrevista: VR-HT-OP-037
Data da entrevista: 03/03/2009
Data da entrevista: 03/03/2009
1 42
143
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Pedro Müller Moutinho
Silvério Ventura Marinho
“De dia a gente trabalhava na rede.
Tinha a turma, trocava turma. [...] Tinha o
plantão [...] para atender reclamação. [...]
E tinha semana para rondar a cidade, para
trocar as lâmpadas na rua. Queimava
lâmpada dos postes, não é? Tinha que
saber os trechos em que estava faltando
para a gente... Marcava tudo lá. Aí eu
pegava no almoxarifado. Tinha o dia de
atender reclamação, mas tinha que trocar
as lâmpadas também.”
“Na parte de Tecelagem já tinha a parte
de estamparia, onde alvejava tecido.
Todo tecido passava por um processo
de alvejamento, que chamava estamparia,
onde fazia aquelas pinturas, bichinhos [...].
Fralda, outros tecidos mais, sabe? Lá eles
alvejavam o tecido, punham a cor que
quisessem, a estamparia que quisessem.
[...] Vira a cor que for: ou vermelho ou
verde ou azul. E depois ele já está com
o desenho dos bichinhos que a gente
quiser: uma borboleta, um porquinho, um
troço qualquer, um passarinho qualquer,
um grilo, todo tipo de desenho.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-047
Código da entrevista: VR-HT-OP-049 A / B
Data da entrevista: 25/05/2010
Data da entrevista: 22/06/2010
Vicente Juliano de Oliveira
Waldir José dos Santos
“Um exemplo: Arthur Lundgren era um
dos clientes fortes, as Casas Pernambucanas [...]. Ele pedia panos de várias cores;
época de Copa do Mundo pedia panos
para fazer enfeite, verde e amarelo. [...]
Era responsabilidade minha cuidar de
produzir dentro da demanda do cliente
para não sobrar no estoque. Você atendia
de acordo com a demanda do cliente [...]
o cliente precisava de peças de cinquenta
metros, peças de vinte metros, peças de
dez metros. O pessoal de Expedição fazia
esses cortes e a gente embalava, prensava,
fazia os volumes, colocava no caminhão e
mandava, entendeu?”
“Dizem que o algodão estava vindo de
fora e estava chegando aqui muito caro;
o Brasil não estava aguentando produzir.
E não houve a atualização de equipamentos. Por exemplo, já tinha o tear a jato de
pinça, que eu não conheci (dizem que um
excelente tear); o tear a jato de ar e tal.
Eles não modernizaram nada e nós ficamos na época da pré-história ainda. Então
a concorrência estava meio… E também
tinha o tecido que estava vindo da China,
o que atrapalhou bem.”
Código da entrevista: VR-HT-OP-043
Código da entrevista: VR-HT-OP-039
Data da entrevista: 20/10/2009
Data da entrevista: 14/07/2009
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
anexo
145
144
146
147
NOME
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
NÚMERO
DE AÇÕES
VALOR EM
Cr$
ENTRADA
INICIAL EM
Cr$
SUBSCRITORES DO AUMENTO DE CAPITAL DA COMPANHIA INDUSTRIAL OUROPRETANA
DE TECIDOS, FORÇA, LUZ E TELEFONES – 1949
NOME
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
NÚMERO
DE AÇÕES
VALOR EM
Cr$
ENTRADA
INICIAL EM
Cr$
22
Clodoveu de
Oliveira
Casado
Médico
Belo
Horizonte
100
20.000,00
3.000,00
23
Dario Gonçalves
de Souza
Casado
Industrial
Belo
Horizonte
910
182.000,00
27.300,00
24
Desidério
Gonçalves de
Mattos
Casado
Industrial
Ouro Preto
1.600
320.000,00
48.000,00
25
Diogo Borges de
Magalhães
Casado
Comércio
Ouro Preto
66
13.200,00
1.980,00
1
Ademar
Gonçalves de
Souza
Casado
Médico
Itaúna
43
8.600,00
1.290,00
2
Alfredo Alves de
Albuquerque
Casado
Advogado
Belo
Horizonte
100
20.000,00
3.000,00
26
Domingos
Fidêncio Fortes
Casado
Comércio
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
3
Almiro de Lima
Pedreira
Casado
Engenheiro
Niterói
100
20.000,00
3.000,00
27
Domingos Fleury
da Rocha
Casado
Engenheiro
Ouro Preto
725
145.000,00
21.750,00
4
Amadeu Barbosa
Casado
Engenheiro
Ouro Preto
32
6.400,00
960,00
28
Domingos Martins
Fleury da Rocha
Casado
Engenheiro
Campina
Grande
100
20.000,00
3.000,00
5
Antonio Viana
Calabria
Solteiro
Comércio
Belo
Horizonte
33
6.600,00
990,00
29
Viúva
Doméstica
200.000,00
30.000,00
Antonio de Matos
Casado
Engenheiro
Santanésia
50
10.000,00
1.500,00
Belo
Horizonte
1.000
6
Edelweiss
Moretzsohn
Andrade
7
Antonio Alves
Parreiras
Casado
Fazendeiro
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
30
Edna de Castro
Solteira
Doméstica
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
31
Edite de Castro
Solteira
Doméstica
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
8
Otavio Penido
Guimarães
Casado
Serventuário
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
32
Elias Salim Mansur
Solteiro
Médico
Mariana
100
20.000,00
3.000,00
9
Antonio Fortes
Casado
Farmacêutico
Ouro Preto
100
20.000,00
3.000,00
33
Elpídio de Lacerda
Werneck
Casado
Engenheiro
Ouro Preto
250
50.000,00
7.500,00
10
Antonio de Castro
Figueirôa
Casado
Engenheiro
Sabará
16
3.200,00
480,00
34
Elza da Veiga
Oliveira
Solteira
Normalista
Ouro Preto
66
13.200,00
1.980,00
11
Aristides Mendes
Lins
Casado
Médico
Ponte Nova
500
100.000,00
15.000,00
35
Emília Maria Diniz
Solteira
Proprietária
Belo
Horizonte
34
6.800,00
1.020,00
12
Artur Drumond
Guimarães
Casado
Cirurgiãodentista
Ouro Preto
130
26.000,00
3.900,00
36
Ernani Menescal
Campos
Casado
Engenheiro
Ouro Preto
250
50.000,00
7.500,00
13
Astolfo Dornas
Casado
Fazendeiro
Itaúna
300
60.000,00
9.000,00
37
-
-
Belo
Horizonte
333
66.600,00
9.990,00
Casado
Industrial
Belo
Horizonte
Espólio Brasiliana
Gonçalves Baêta
14
Augusto
Gonçalves de
Souza
38
-
-
Ouro Preto
146
29.200,00
4.380,00
Augusto C.
Martins Fleury da
Rocha
Espólio Randolfo
Rodrigues
Trindade
Solteiro
39
Ester Diniz
Solteira
Proprietária
Belo
Horizonte
33
6.600,00
990,00
16
Badih Salim
Mansur
Solteiro
Comércio
Mariana
100
20.000,00
3.000,00
40
Evangelina de
Castro
Solteira
Doméstica
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
17
Benedito dos
Santos Saraiva
Casado
Funcionário
público
Ouro Preto
32
6.400,00
960,00
41
Fajardo Nogueira
de Souza
Casado
Advogado
Itaúna
75
15.000,00
2.250,00
18
Carlos dos Reis
Carvalho
Casado
Comércio
Belo
Horizonte
200
40.000,00
6.000,00
42
Flavio de Carvalho
Casado
Industrial
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
19
Celia Diniz
Solteira
Proprietária
Belo
Horizonte
33
6.600,00
990,00
43
Francisco de
Queiroz Almeida
Casado
Industriário
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
20
Cia. Industrial
Itaunense
-
-
Itaúna
2.000
400.000,00
60.000,00
44
Francisco Pereira
Saldanha
Casado
Comércio
Itaúna
75
15.000,00
2.250,00
21
Cleir Maria Vaz de
Melo
Solteira
Normalista
Juiz de Fora
5
1.000,00
150,00
45
Gabriel Martins
Fleury da Rocha
Casado
Bancário
Rio de
Janeiro
100
20.000,00
3.000,00
15
Engenheiro
Ouro Preto
333
100
66.600,00
20.000,00
9.990,00
3.000,00
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
ANEXO I
148
149
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
NÚMERO
DE AÇÕES
VALOR EM
Cr$
ENTRADA
INICIAL EM
Cr$
NOME
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
NÚMERO
DE AÇÕES
VALOR EM
Cr$
ENTRADA
INICIAL EM
Cr$
46
Geraldo Aurélio
Fortes
Solteiro
Estudante
Ouro Preto
100
20.000,00
3.000,00
71
José Batista de
Oliveira
Casado
Engenheiro
Juiz de Fora
200
40.000,00
6.000,00
47
Geraldino Ferreira
Xavier
Casado
Comércio
Ouro Preto
1.682
336.400,00
50.460,00
72
José Candido
Gonçalves
Casado
Comércio
Ouro Preto
66
13.200,00
1.980,00
48
Godofredo
Gonçalves de
Souza
Casado
Fazendeiro
Itaúna
133
26.600,00
3.990,00
73
José de Cerqueira
Lima
Casado
Industrial
Itaúna
1.550
310.000,00
46.500,00
49
Guarani Nogueira
Casado
Comércio
Itaúna
275
55.000,00
8.250,00
74
José Gonçalves
Drumond
Casado
Farmacêutico
Belo
Horizonte
100
20.000,00
3.000,00
50
Haidéa da Veiga
Oliveira
Solteira
Normalista
Ouro Preto
66
13.200,00
1.980,00
75
José Alves Diniz
Andrade
Casado
Fazendeiro
Mateus
Leme
134
26.800,00
4.020,00
51
Hélio Gonçalves
de Souza
Casado
Advogado
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
76
José Santiago de
Queiroz
Casado
Industriário
Ouro Preto
32
6.400,00
960,00
52
Heli Soares
Saldanha
Casado
Comércio
Itaúna
75
15.000,00
2.250,00
77
Juvêncio Florêncio
Pinto
Viúvo
Industriário
Ouro Preto
32
6.400,00
960,00
53
Jayme Bastos
Casado
Industrial
Ouro Preto
100
20.000,00
3.000,00
78
Laci Nogueira de
Assis
Casado
Industrial
Itaúna
1.166
233.200,00
34.900,00
54
João Batista Fortes
Viúvo
Comércio
Ouro Preto
102
20.400,00
3.060,00
João Pereira de
Castro Figueirôa
79
Proprietária
100.000,00
15.000,00
Comércio
Ouro Preto
266
53.200,00
7.980,00
Belo
Horizonte
500
Casado
Laura Gonçalves
de Souza
Solteira
55
56
João Salim Mansur
Solteiro
Comércio
Mariana
100
20.000,00
3.000,00
80
Lídia Gonçalves de
Souza
Solteira
Proprietária
Belo
Horizonte
500
100.000,00
15.000,00
57
João de Cerqueira
Lima Jr.
Casado
Industrial
Itaúna
133
26.600,00
3.990,00
81
Lucy Moreira
Solteira
Normalista
Belo
Horizonte
100
20.000,00
3.000,00
58
João Augusto de
Oliveira
Casado
Comércio
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
82
Luiz Ferreira da
Silva
Viúvo
Contador
Ouro Preto
33
6.600,00
990,00
59
João José Ferreira
Casado
Guarda-livros
Itaúna
110
22.000,00
3.300,00
83
Maria Gonçalves
de Souza Moreira
Viúva
Proprietária
Belo
Horizonte
266
53.200,00
7.980,00
60
João Nogueira dos
Santos
Casado
Comércio
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
84
Maria Gonçalves
da Silva
Solteira
Escriturária
Itaúna
66
13.200,00
1.980,00
61
João Firmiano
Fortes
Médico
Rio de
Janeiro
100
20.000,00
3.000,00
85
Maria Augusta de
Carvalho Matos
Casada
Doméstica
Ouro Preto
50
10.000,00
1.500,00
16
3.200,00
480,00
86
Maria dos Anjos
Baêta
Viúva
Doméstica
Itabirito
333
66.600,00
9.990,00
87
Maria José Saraiva
de Carvalho
Viúva
Professora
Ouro Preto
32
6.400,00
960,00
88
Maria Fortes
Alvares da Silva
Casada
Doméstica
Ouro Preto
100
20.000,00
3.000,00
89
Maria José Fortes
da Costa
Casada
Doméstica
Uberlândia
100
20.000,00
3.000,00
90
Maria de Castro
Solteira
Doméstica
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
91
Maria de Lourdes
Vaz de Melo
Solteira
Normalista
Juiz de Fora
5
1.000,00
150,00
92
Mário de Sales
Andrade
Casado
Industrial
Ouro Preto
1.651
330.200,00
49.530,00
93
Mário de Castro
Figueirôa
Solteiro
Médico
Belo
Horizonte
16
3.200,00
480,00
Casado
62
Joaquim Maia
Casado
Engenheiro
Passagem
Mariana
63
Joaquim Nogueira
Penido
Solteiro
Fazendeiro
Itaúna
200
40.000,00
6.000,00
64
Joel Marcelino de
Sales
Casado
Industriário
Ouro Preto
83
16.600,00
2.490,00
65
Jofre Gonçalves de
Souza
Casado
Cirurgiãodentista
Belo
Horizonte
400
80.000,00
12.000,00
66
José Ovídio Fortes
Casado
Farmacêutico
Ouro Preto
100
20.000,00
3.000,00
67
José dos Santos
Saraiva
Casado
Funcionário
público
Belo
Horizonte
32
6.400,00
960,00
68
José Aguinaldo
Mourão
Casado
Engenheiro
Belo
Horizonte
194
38.800,00
5.820,00
69
José Russo
Casado
Industriário
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
70
José Vitor
Gonçalves
Casado
Industriário
Ouro Preto
50
10.000,00
1.500,00
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
NOME
150
151
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
NÚMERO
DE AÇÕES
VALOR EM
Cr$
ENTRADA
INICIAL EM
Cr$
NOME
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
NÚMERO
DE AÇÕES
VALOR EM
Cr$
ENTRADA
INICIAL EM
Cr$
94
Magdala Mourão
Casada
Doméstica
Belo
Horizonte
80
16.000,00
2.400,00
117
Vivian Jack
Bensusan
Casado
Industrial
Rio de
Janeiro
66
13.200,00
1.980,00
95
Mercês Saraiva
Salgado
Casada
Doméstica
Ouro Preto
32
6.400,00
960,00
118
Zuleika da Veiga
Oliveira
Solteira
Normalista
Ouro Preto
66
13.200,00
1.980,00
96
Miguel Augusto
Gonçalves de
Souza
Solteiro
Acadêmico
Belo
Horizonte
15
3.000,00
450,00
119
William Schofield
Casado
Industrial
Cataguazes
166
33.200,00
4.980,00
-
-
-
30.000
6.000.000,00
900.000,00
97
Mirtes Maira
Mourão
Casada
Doméstica
Belo
Horizonte
138
27.600,00
4.140,00
98
Mozart Nogueira
Machado
Casado
Funcionário
público
Itaúna
452
90.400,00
13.560,00
99
Moacir de Castro
Figueirôa
Solteiro
Estudante
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
100
Nadia da Veiga
Oliveira
Solteira
Normalista
Ouro Preto
66
13.200,00
1.980,00
ANEXO II
101
Oromar Moreira
Casado
Médico
Belo
Horizonte
100
20.000,00
3.000,00
ACIONISTAS DA FIAÇÃO E TECELAGEM SÃO JOSÉ S/A EM 1952
102
Otto Polak
Solteiro
Industriário
Ouro Preto
16
3.200,00
480,00
103
Paulo Emílio
Gonçalves de
Souza
Solteiro
Acadêmico
Belo
Horizonte
400
80.000,00
12.000,00
104
Paulo Andrade
Magalhães Gomes
Casado
Engenheiro
Ouro Preto
50
10.000,00
1.500,00
105
Raimundo Luiz
Foureaux
Casado
Industriário
Itaúna
25
5.000,00
750,00
106
Raimundo Dias
Coelho
Casado
Médico
Belo
Horizonte
200
40.000,00
6.000,00
107
Rubens Vaz de
Melo
Casado
Engenheiro
Itaúna
100
20.000,00
3.000,00
108
Rubens de Castro
Figueirôa
Casado
Oficial da
Marinha
Rio de
Janeiro
16
3.200,00
480,00
109
Sadi Nogueira
Machado
Casado
Fazendeiro
Itaúna
333
66.600,00
9.990,00
110
Semiramis
Gonçalves Baeta
Solteira
Doméstica
Belo
Horizonte
200
40.000,000
6.000,00
111
Theodorico da
Cruz
Casado
Engenheiro
Ouro Preto
25
5.000,00
112
Theódulo Pereira
Casado
Industrial
Ouro Preto
3.581
113
Tereza de Jesus
Magalhães Gomes
Solteira
Doméstica
Belo
Horizonte
114
Tomaz Alves Diniz
Solteiro
Proprietário
115
Vitor Gonçalves
de Souza
Casado
116
Vitor de Souza
Campos
Casado
TOTAL
Dados retirados de: JUCEMG. Ata da Assembleia Geral Extraordinária da Companhia
Industrial Ouropretana de Tecidos, Força, Luz e Telefones; 5 jul. 1949.
Arquivamento 38.265. s.p.
NOME
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
Nº DE
AÇÕES
1
Íris Rache Magalhães Ferreira
Viúva
Proprietária
Distrito Federal
(RJ)
3.800
2
Vicente Assunção
Viúvo
Engenheiro
Belo Horizonte
2.900
3
José Edwards Ribeiro
Casado
Engenheiro
Barbacena
1.778
4
Edir Marques Berutto
Viúva
Prendas
domésticas
Distrito Federal
1.050
5
Carmosina França d’Assumpção
Viúva
Proprietária
Distrito Federal
820
6
José Walter de Miranda
-
Advogado
Distrito Federal
560
7
Ary Ferreira
Casado
Médico
Belo Horizonte
518
8
Reynaldo Marques Berutto
Solteiro
Estudante
Distrito Federal
500
9
Roberto Marques Berutto (menor)
-
-
-
500
10
Ildefonso Mascarenhas da Silva
Solteiro
Professor
Distrito Federal
450
750,00
11
Policena Magalhães Ferreira
Solteira
Prendas
domésticas
Belo Horizonte
432
716.200,00
107.430,00
12
Aristides Magalhães Ferreira
Casado
Médico
Belo Horizonte
420
10
2.000,00
300,00
13
Espólio de Moacyr Bruno von Sperling
-
-
-
328
14
Alfredo Antônio Berutto
Solteiro
Corretor
Belo Horizonte
250
Belo
Horizonte
33
6.600,00
990,00
15
Rubem Magalhães Ferreira
Casado
Bancário
Belo Horizonte
202
Industrial
Itaúna
250
50.000,00
7.500,00
16
Celso Augusto Ferreira Ribeiro
Solteiro
Estudante
Belo Horizonte
200
Belo
Horizonte
17
Otávio Augusto Ferreira Ribeiro
Casado
Industriário
Barbacena
200
Banqueiro
1.333
266.600,00
39.990,00
18
José Públio Rache Ferreira (menor)
-
-
-
184
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
NOME
152
153
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
Nº DE
AÇÕES
19
Oscar Augusto Rache Ferreira
(menor)
-
-
-
184
20
Maria Elza Rache Ferreira (menor)
-
-
-
176
21
Maria Olga Rache Ferreira (menor)
-
-
-
22
Vera Lídia Rache Ferreira (menor)
-
-
NOME
ESTADO
CIVIL
PROFISSÃO
DOMICÍLIO
Nº DE
AÇÕES
51
José Custódio Carvalho Drumond
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
10
52
Judith Ferreira Drumond
Casada
Prendas
domésticas
Belo Horizonte
10
176
53
Lydia de Lemos Rache
Viúva
Prendas
domésticas
Distrito Federal
10
-
176
54
Frederico Antônio Rache (menor)
-
-
-
5
Belo Horizonte
172
55
Hélio França Gontijo
Casado
Dentista
Belo Horizonte
5
56
Luiz Russo
Casado
Médico
Distrito Federal
5
57
Marcos Barbosa Mascarenhas
Casado
Comerciante
Belo Horizonte
5
58
Mario Alvaro Rache (menor)
-
-
-
5
59
Pedro Demóstenes Rache Neto
(menor)
-
-
-
5
23
Maria Alice Magalhães Ferreira
Casada
Prendas
domésticas
24
Noemi Ferreira Ribeiro
Casada
Prendas
domésticas
Barbacena
172
25
Vera Ferreira von Sperling
Viúva
Prendas
domésticas
Belo Horizonte
172
26
Aristides Mário Rache Ferreira
Solteiro
Estudante
Distrito Federal
170
27
Clélia Ildefonso da Cunha
Casada
Prendas
domésticas
Distrito Federal
140
28
Maria Ildefonso de Mendonça
Casada
Prendas
domésticas
Belo Horizonte
140
29
Violeta Mascarenhas da Silva
-
Prendas
domésticas
Distrito Federal
140
30
Faustino Assumpção
Viúvo
Proprietário
Belo Horizonte
100
31
João Eunápio Borges
Casado
Professor
Belo Horizonte
100
32
Maria de Ulhôa Vieira
Viúva
Prendas
domésticas
Belo Horizonte
100
33
Pio Porto de Menezes
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
100
34
Cid Rache
Casado
Engenheiro
Distrito Federal
90
35
Geraldo Ildefonso Mascarenhas da Silva
Casado
Advogado
Distrito Federal
80
36
Caetano Barbosa Mascarenhas
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
55
37
Augusto França Gontijo
Casado
Médico
Goiânia
50
38
Iwan Ferreira
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
50
39
Lauro Ferreira
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
50
40
Maria da Conceição Corrrêa
Assumpção Ribeiro
Casada
Prendas
domésticas
Oliveira
40
41
Dinorah Guadalupe Soli
Casada
Prendas
domésticas
Distrito Federal
42
Ernani Menescal Campos
Casado
Engenheiro
43
José França Gontijo
Casado
44
Maria do Carmo França Botelho
45
Dados retirados de: JUCEMG. Escritura Pública passada no Cartório
do Segundo Ofício de Notas, em 10 de outubro de 1952.
Arquivamento 58.871. s.p.
ANEXO III
Subscritores da Companhia Força e Luz Mariannense
Subscritor
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
1.
Cônego José Cotta
Mariana
75
15:000$000
2.
Dr. Augusto Freire de Andrade
Mariana
75
15:000$000
3.
Antonio Lopes Camello
Mariana
75
15:000$000
4.
Dr. Gomes Freire de Andrade
Mariana
75
15:000$000
5.
Estevão Pedro Cotta
Mariana
75
15:000$000
30
6.
Dr. Henrique Gomes Freire de Andrade
Mariana
10
2:000$000
Ouro Preto
30
7.
Dr. Augusto Gomes Freire de Andrade
Mariana
35
7:000$000
Bancário
Santos Dumont
30
8.
Cônego Geraldino Ferreira Xavier
Mariana
5
1:000$000
Casada
Prendas
domésticas
Montes Claros
30
9.
Padre José Maria de Castro
Belo Horizonte
15
3:000$000
Raimundo Silva de Assis
Casado
Advogado
Belo Horizonte
30
10.
Padre Antonio Emygdio Corrêa
Rio Branco
5
1:000$000
46
Evandro França Corrêa
Solteiro
Comerciante
Distrito Federal
20
11.
Antonia Ursula C. de Queiroz
Mariana
25
5:000$000
47
Capitão José Nazareno França Corrêa
Casado
Militar
Distrito Federal
15
12.
Amador de Castro Queiroz
Mariana
50
10:000$000
48
Fernando Otto von Sperling
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
10
13.
Maria Guilhermina A. Costa
Mariana
1
200$000
49
Heitor Barbosa Mascarenhas
Casado
Engenheiro
Uberaba
10
14.
Agripino Claudino dos Santos
Mariana
1
200$000
50
José Barbosa Mascarenhas
Casado
Engenheiro
Belo Horizonte
10
15.
Salim João Mansur
Mariana
75
15:000$000
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
NOME
154
155
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
Subscritor
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
16.
Quintino Alves Neves
Mariana
50
10:000$000
50.
José Pedro Celestino da Silva
Mariana
1
200$000
17.
Olímpio Gomes de Araújo
Mariana
5
1:000$000
51.
José Tito da Silva
Mariana
5
1:000$000
18.
João Salim Mansur
Mariana
10
2:000$000
52.
José Maria Vieira
Mariana
5
1:000$000
19.
Synval Baptista dos Santos
Mariana
2
400$000
53.
Cyrillo Vieira do Sacramento
Mariana
1
200$000
20.
Lavino de Padua Coelho
Mariana
2
400$000
54.
Capm. Carlos de Assis Gomes
Mariana
2
400$000
21.
Francisco Antunes da Silva
Mariana
100
20:000$000
55.
Alfredo Alves de Almeida
Mariana
10
2:000$000
22.
Phco. Francisco A. de Carlos Gomes
Mariana
5
1:000$000
56.
Leandro Lino Mól
Mariana
2
400$000
23.
Daniel Carlos Gomes
Mariana
1
200$000
57.
João de Oliveira Mesquita
Mariana
2
400$000
24.
Senhorita Zizina Carlos Gomes
Mariana
1
200$000
58.
Padre José Cupertino Vieira
5
1:000$000
25.
Cônego Amando Adeus dos Santos
Mariana
50
10:000$000
[Diogo de]
Vasconcellos
26.
Augusto de Carvalho Castro
Mariana
10
2:000$000
59.
Norberto Rodrigues Monção
Mariana
2
400$000
27.
Padre Carlos Antonio de Souza
Teixeiras
5
1:000$000
60.
Da. Leontina Godoy
Mariana
1
200$000
28.
Salomão Ibrahim da Silva
Mariana
75
15:000$000
61.
Francisco Queiroz de Almeida
Mariana
3
600$000
29.
Antonio Marinho Gomes
Mariana
5
1:000$000
62.
Yara Maria dos Anjos Fonseca
Mariana
3
600$000
30.
Camillo Abdo Aun
Mariana
35
7:000$000
63.
Belarmino Daniel de Abreu
Mariana
1
200$000
31.
João Chrisostomo Vieira
Mariana
75
15:000$000
64.
Augusto Rodrigues Silva
Mariana
50
10:000$000
32.
Francisco Claudino dos Santos
Mariana
5
1:000$000
65.
José Pedro Claudino dos Santos
Mariana
2
400$000
33.
Francisco Cezimbra
Mariana
5
1:000$000
66.
Julio Cezar de Godoy
Mariana
1
200$000
67.
Miguel & Irmão
Mariana
2
400$000
34.
Salvador de Castro Queiroz
Belo Horizonte
10
2:000$000
68.
José Calisto dos Anjos
Mariana
5
1:000$000
35.
José Augusto Gomes
Mariana
50
10:000$000
69.
Joaquim Cardoso Pereira
Acaiaca
2
400$000
36.
Dom. Helvécio Gomes de Oliveira (part.)
Mariana
5
1:000$000
70.
Miguel Daher
Mariana
27
5:400$000
37.
Cônego Severiano Anacleto Varella
Mariana
50
10:000$000
71.
José de Oliveira Mesquita
Mariana
2
400$000
38.
José Augusto Gomes Filho
Mariana
10
2:000$000
72.
José Teixeira Chaves
Mariana
5
1:000$000
39.
Menandro de Almeida Machado
Mariana
3
600$000
73.
Elias Izac
Acaiaca
55
11:000$000
40.
José de Carvalho Rolla
Mariana
75
15:000$000
74.
José Elias Izaac
Acaiaca
15
3:000$000
41.
Monsenhor Alypio Odier de Oliveira
Mariana
5
1:000$000
75.
Alexandre Elias Izaac
Acaiaca
15
3:000$000
42.
Antonio de Oliveira Moraes
Mariana
5
1:000$000
76.
Camillo Izaac
Acaiaca
25
5:000$000
43.
Antonio Ferreira Carneiro
Belo Horizonte
2
400$000
77.
Joaquim Ferreira da Silva
Mariana
5
1:000$000
44.
Sebastião Tavares
Belo Horizonte
5
1:000$000
78.
Monsenhor José Silvério Horta, em favor da
Caixa Escolar de Mariana
Mariana
1
200$000
79.
Arlindo Godoy
Mariana
2
400$000
80.
Ricardo Ferreira Xavier
Casa Branca
15
3:000$000
81.
José dos Santos Oliveira
Rodeiro de Ubá
5
1:000$000
82.
Antonio de Faria
Mariana
27
5:400$000
45.
Severo Ferreira Lima
Mariana
10
2:000$000
46.
Carmélio de Queiroz Ferreira
Mariana
5
1:000$000
47.
Alfredo Peixoto de Moraes
Mariana
3
600$000
48.
Lindouro Augusto Gomes
Belo Horizonte
25
5:000$000
49.
Phco. Olegário Nardy Chaves
Mariana
2
400$000
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Subscritor
156
157
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
Subscritor
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
83.
Benedicto de Lima
Mariana
5
1:000$000
117.
Da. Maria Josephina de Castro Queiroz
Mariana
2
400$000
84.
José Ottoni Soares
Mariana
2
400$000
118.
Da. Olívia de Castro Queiroz
Mariana
2
400$000
85.
Franklin Teixeira da Fonseca
Mariana
2
400$000
119.
Da. Philomena de Castro Queiroz
Mariana
2
400$000
86.
Jovino de Castro Queiroz
Mariana
1
200$000
120.
Padre Duarte Cotta
Cataguazes
5
1:000$000
87.
José Gomes da Silva
Mariana
5
1:000$000
121.
Carnot Ribeiro de Castro
Mariana
1
200$000
88.
Salvador Moysés
Mariana
10
2:000$000
122.
Mariana
5
1:000$000
89.
Ephigênia Moysés
Mariana
5
1:000$000
Da. Jacintha Gomes Pimenta, em benefício
das Obras Pias
90.
Geralda Moysés
Mariana
5
1:000$000
123.
Padre Agostinho de Souza
Guarany
2
400$000
91.
Laurindo do Espírito Santo
Mariana
5
1:000$000
124.
Da. Plautilla Nunes Horta
Mariana
1
200$000
92.
Antonio de Padua Coelho
Mariana
3
600$000
125.
Agricola Camello
Mariana
5
1:000$000
93.
Manoel Teixeira Júnior
Mariana
2
400$000
126.
Dr. Pedro Motta
Mariana
10
2:000$000
94.
Antonio Quirino de Sant’Anna
Mariana
1
200$000
127.
Da. Maria Albina Lopes Camello
Mariana
25
5:000$000
95.
Boaventura Ferreira de Lemos
Mariana
2
400$000
128.
Da. Maria Bawdem Freire de Andrade
Mariana
5
1:000$000
96.
Olympio Donato Corrêa
Mariana
1
200$000
129.
Da. Etelvina Starling
Mariana
1
200$000
Da. Maria das Mercês Trindade
Mariana
1
200$000
Dr. Dante de Guimarães Sampaio
[Diogo de]
Vasconcellos
130.
97.
5
1:000$000
131.
Te. Themistocles Izidoro Teixeira dos Reis
Mariana
5
1:000$000
98.
Américo Vespúcio dos Santos
Mariana
2
400$000
132.
Da. Olympia Santos
Mariana
1
200$000
99.
Pacífico Augusto de Mello
Melo
5
1:000$000
133.
Da. Josina Lopes Camello
Mariana
15
3:000$000
100.
Da. Rosa Luzia da Silva
Mariana
2
400$000
134.
Abel de Almeida Gomes
Mariana
1
200$000
101.
Phco. Joaquim Breyner
Mariana
1
200$000
135.
Cônego Tobias B. de Souza Cunha
Mariana
1
200$000
102.
José Miguel
Mariana
5
1:000$000
136.
Cônego Estevão Pedro Cotta
Caraça
1
200$000
103.
Da. Cesarina de Castro
Mariana
5
1:000$000
137.
Da. Rita de Cássia Godoy
Mariana
1
200$000
104.
Da. Maria G. de Castro
Mariana
5
1:000$000
138.
Da. Philomena Muzzi do Espírito Santo
Mariana
1
200$000
105.
Da. Rita de C. Castro
Mariana
5
1:000$000
139.
Olyntho Godoy
Mariana
1
200$000
106.
Dr. Christóvão Breyner
Belo Horizonte
1
200$000
140.
Da. Marianna Lessa Cesimbra
Mariana
1
200$000
107.
Domingos Gonçalves Machado
[Bento] Rodrigues
1
200$000
141.
Da. Albertina Godoy Neves
Mariana
1
200$000
108.
José Jorge
Mariana
1
200$000
142.
Eduardo Moreira Cotta
Mariana
1
200$000
109.
Juvenil de Padua Coelho
Mariana
2
400$000
143.
João Claudio Aguiar
Mariana
2
400$000
110.
José de Padua Coelho
Mariana
2
400$000
144.
Joaquim Gomes da Silva
Mariana
1
200$000
111.
Joaquim de Araújo Silva
Mariana
2
400$000
145.
José Martins
Mariana
1
200$000
112.
José Estanislau da Silva
Mariana
1
200$000
146.
Anna Maria de Souza Barros
Mariana
1
200$000
113.
Augusto de Castro Queiroz
Mariana
5
1:000$000
147.
Dr. Cornelio Rozemburg
Mariana
6
1:200$000
114.
Da. Leonídia de Castro Queiroz
Mariana
15
3:000$000
148.
Furgino Alves dos Santos
Mariana
1
200$000
115.
Da. Regina de Castro Queiroz
Mariana
2
400$000
149.
Da. Rita Goulart
Mariana
1
200$000
116.
Da. Honorina de Castro Queiroz
Mariana
2
400$000
150.
Da. Luiza Adelaide de Oliveira Faria
Mariana
1
200$000
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Subscritor
158
159
151.
Da. Rita Carneiro
152.
Da. Antonina Cotta de Queiroz Camello
153.
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
Subscritor
Residência
nº de
ações de 200$000
Total
Mariana
1
200$000
185.
Padre Antonio Philomena de Ola. Moraes
Mariana
1
200$000
Ouro Preto
15
3:000$000
186.
Dr. Raymundo de Oliveira Moraes
Furquim
1
200$000
José Francisco Cotta
Mariana
1
200$000
187.
Phco. Professor Jacyntho Bruno Godoy
Ouro Preto
2
400$000
154.
Jacob Scortegagni
Mariana
1
200$000
188.
Jorge Marques da Silva
Mariana
3
600$000
155.
Jeremias Antonio de Azevedo
Mariana
1
200$000
Total
2.000
400:000$000
156.
Alcino Vieira
Mariana
1
200$000
157.
Estevão Ferreira Lima
Mariana
2
400$000
158.
Cônego Caetano Donato Corrêa
Mariana
2
400$000
159.
Torquato José Lopes Camello
Mariana
5
1:000$000
160.
Amancio Duarte
Mariana
2
400$000
161.
Phco. Henrique de Souza Novaes
Mariana
10
2:000$000
162.
José Ferreira Guimarães
Mariana
1
200$000
163.
Antonio Augusto Gomes
Mariana
5
1:000$000
164.
Francisco Luiz Gomes
Mariana
1
200$000
165.
Raymundo Constantino Gomes
Mariana
1
200$000
166.
Washington Souza
Mariana
2
400$000
167.
Manoel Teixeira da Fonseca
Mariana
10
2:000$000
168.
Francisco Raymundo S. Anna
Mariana
2
400$000
169.
José Muzzi do Espírito Santo
Mariana
1
200$000
170.
Francisco Pimenta
Silvério
5
1:000$000
171.
Antonio Germano Cotta
Fonseca
5
1:000$000
172.
Dr. Domingos de Souza Novaes
Queluz
2
400$000
173.
Firmo Antonio de Souza
Claudio Manoel
10
2:000$000
174.
José Lourenço Motta
Mariana
3
600$000
175.
Augusto Daniel de Abreu
Mariana
10
2:000$000
176.
Da. Regina de Abreu Vieira e Araújo
Mariana
3
600$000
177.
Dr. Henrique Bawdem
Paraisópolis
10
2:000$000
178.
Levindo Barbosa Leite
Ouro Preto
2
400$000
179.
Capm. Luiz Hilário Pereira Garro
Mariana
35
7:000$000
180.
Luiz Alves Cardoso
Mariana
3
600$000
181.
Elza Scortegagni
Mariana
2
400$000
182.
Felippe Malvini
Mariana
1
200$000
183.
Achilles Malvini
Mariana
1
200$000
184.
Mariano Casimiro Pereira
Mariana
1
200$000
Dados retirados de: JUCEMG. Sociedade Anonyma “Comp. Força e Luz
Mariannense”. Acta de sua constituição; 10 jul. 1927.
Arquivamento 10.819. s.p.
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Subscritor
acervo
pesquisado
162
163
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Acervo Rafael Arcanjo Santos
Acervo Vale Registrar
Arquivo da Câmara Municipal de Mariana
Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana
Arquivo Geral da Prefeitura de Mariana
Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Mariana
Arquivo Público Mineiro
Arquivo Público Municipal de Ouro Preto
Associação Comercial de Minas Gerais
Cartório do 2º Ofício de Mariana
Centro de Memória do Sistema Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
Coleções Especiais da Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa
Hemeroteca Histórica da Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa
Instituto de Filosofia, Artes e Cultura da Universidade Federal de Ouro Preto
Junta Comercial do Estado de Minas Gerais
Massa Falida da Companhia Industrial Itaunense
gradecimento
1 66
167
Cristiano Cassimiro dos Santos
Cristiane Zago
Ênio Neves de Araújo
Ephigênia Antônia de São José Ignácio dos Anjos
Ernani de Melo Rocha
Fernando Antônio Affonso de Araújo
Francisco José de Oliveira
Geraldo Pedro Coêlho
Gizele Maria dos Santos
Helenice Afonso de Oliveira
Ilca Helena Magalhães Ferreira
José Carlos Magalhães Mota
José Geraldo Begname
Luciana Ribeiro
Luiz Rogério Mitraud de Castro Leite
Maria Clara Celestino Souza
Marlene Alves Ferreira da Silva
Patrícia Gonçalves Nogueira
Rafael Arcanjo Santos
Rejane Márcia Freitas Oliveira
Rosa Maria de Melo
Solange Ferreira
Stela Gomes Chaves
Terezinha de Paula Castro
Wanderley Alexandre da Silva (Vandico)
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
Amadeu da Silva
ficha técnic
170
171
FUNDAÇÃO VALE Presidente: Murilo Ferreira
CONSELHO CURADOR
Diretor Executivo de Ferrosos e Estratégia: José Carlos Martins
Presidente: Vania Somavilla
Diretor Operacional de Ferrosos Sudeste: Antonio Padovezi
Conselheiros: Adriana Bastos, Luciano Siani, Luiz Mello, Marcio Godoy,
Maria Gurgel, Ricardo Gruba e Silmar Silva
Gerente Geral do Complexo Mariana: Rodrigo Melo
Diretora-Presidente: Isis Pagy
Gerente Geral de Geração de Renda, Cultura e Ativos: Marco Barros
DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES COM COMUNIDADE
Gerente de Ativos e Cultura: Andreia Gama
Diretora de Relações com Comunidade: Isis Pagy
Analistas de Cultura: Thiago Saldanha e Rodrigo Barreto
Gerente Geral de Territórios Sul e Sudeste: Christiana Costa
Gerente de Relações com Comunidade de Minas Gerais: Flávia Soares
Analista de Relações com Comunidade: Antonio Costa
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO
Diretor de Comunicação: Sergio Giácomo
Gerente Geral de Comunicação: Rodrigo Soares
Gerente Geral de Comunicação Brasil: Cássia Cinque
Gerente Regional de Comunicação de Minas Gerais: Luciene Cristina
Analista de Comunicação Regional: Fabiana Castro
Assessora de Imprensa: Cláudia Siúves
Gerente de Patrocínios: Christiana Saldanha
Analistas de Patrocínios: Flavia Rocha, Willman Miranda e Eveline Maria
Gerente Geral de Relações Intersetoriais,
Saúde, Educação e Planejamento Urbano: Andreia Rabetim
Desenvolvimento Institucional: Vivian Medeiros e Patricia Braga
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
VALE
1 72
173
FIOS E TRAMAS
PARCEIRO EXECUTOR: SANTA ROSA BUREAU CULTURAL
EQUIPE TÉCNICA
Direção: Eleonora Santa Rosa
Ideia Original: Jason Barroso Santa Rosa
Gerência Executiva: Ana Domitila
Coordenação Editorial: Santa Rosa Bureau Cultural
Gestão Financeira: Sílvia Tironi
Coordenação Técnica: Josanne Guerra Simões
Produção: Patrícia Campolina
Pesquisa: Eder Donizete de Melo
Assessoria Administrativa e Financeira: Christiane A. Xavier Carvalho
EQUIPE VALE REGISTRAR
Maria Angélica Vieira Bonome
Rodrigo Lima Ferreira (estagiário)
Textos: Josanne Guerra Simões
NÚCLEO DE HISTÓRIA ORAL
Assessora Técnica: Josanne Guerra Simões
Gerente Operacional: Eder Donizete de Melo
Historiadores: Eder Donizete de Melo
Josanne Guerra Simões
Maria Angélica Vieira Bonome
Suporte Editorial: Ana Domitila
Patrícia Campolina
Design Gráfico: Lúcia Nemer
Josanne Guerra Simões
Maria Angélica Vieira Bonome
Produção Gráfica: Nemer Fornaciari Design
Estagiários: Rafael Veloso Goulart
Rodrigo Gonçalves Benevenuto
NÚCLEO DE AUDIOVISUAL
Diretor: Jason Barroso Santa Rosa
Gerente Operacional: Rafael Bouças Couto
Câmera: Rafael Bouças Couto
Assistente de Câmera: Leonardo Oliveira Penna
Estagiária: Dalila Carneiro Silva
APOIO TÉCNICO E ADMINISTRATIVO
Produção: Rosilene Magda Figueiredo
Assistente de Produção: Cristiane Fernandes Evangelista
Martuse Fornaciari
Produção Editorial: Roseli Raquel de Aguiar
Revisão de Texto: Irene Ernest Dias
Companhia industrial ouropretana
Companhia industrial ouropretana
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL TREM DA VALE
Fundação Vale
Fios e tramas: a indústria têxtil em Mariana e Ouro Preto. /
Fundação Vale; Coordenação editorial: Santa Rosa Bureau Cultural –
Belo Horizonte: Fundação Vale, 2013.
176 p. : il. ; 21 cm.
Programa de Educação Patrimonial Trem da Vale. Vale
Registrar.
ISBN 978-85-64301-01-6 (broch.)
1. Indústria têxtil – Ouro Preto. 2. Indústria têxtil – Mariana.
3. Fiação – Ouro Preto. 4. Fiação – Mariana. 5. Minas Gerais – História.
I. Indústria e Tecelagem São José. II. Companhia Industrial
Ouropretana. III. Título.
CDD 677.2
Publicação sem fins lucrativos, distribuição gratuita
176
Companhia industrial ouropretana
Esta obra foi produzida num sistema de
editoração eletrônica Macintosh, usando os
programas InDesign, Illustrator e Photoshop.
O texto foi composto na fonte Gill Sans, corpo 11. A impressão foi executada pela Rona
Editora, em papel Offset 120g, com tiragem
de 1000 exemplares, para a Fundação Vale.