estado de minas

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ESTADO DE MINAS
Belo Horizonte,
04/ABR/2014
Guerreiras »
Fabiana Cozza traz a BH o show 'Canto sagrado', em homenagem a Clara Nunes
Cantora encarou um desafio para homenagear sambista: celebrar o legado da mineira sem
cair na armadilha do cover
EM Cultura Publicação:04/04/2014 08:00Atualização:04/04/2014 10:32
"O show 'Canto sagrado' é quase um musical”, avisa a paulistana Fabiana Cozza, de 38 anos. Domingo, ela traz a BH sua
homenagem à mineira Clara Nunes (1943-1983), registrada recentemente em CD e DVD. A produção caprichada é fruto de
pesquisa atenta que deu origem a um roteiro detalhado, explica a cantora. A domingueira de luxo contará com banda de primeira,
iluminação especial, figurinos elegantes e coreografias inspiradas em danças brasileiras. Tudo isso para celebrar o legado – autoral
e contemporâneo – da Guerreira.
A viagem passa por baião, moçambique, ijexá, samba de roda e jongo, levando para o palco um retrato musical de Clara Nunes.
“Ela é referência de interpretação brasileira: tem domínio técnico da voz, trouxe a negritude para a cena, propôs uma nova
consciência sobre a cultura do Brasil e a importância das raízes africanas. Ela fez do samba uma identidade”, enumera Fabiana.
“Clara é uma cartilha para quem quiser cantar. O show é homenagem, com o meu jeito, a essa artista luminosa.”
A paulista explica que usa o corpo – não apenas a voz – procurando valorizar as letras e fazer do texto música. “Sempre busco
revelar segredinhos contidos na canção, entrelinhas”, observa. Desde criança, Fabiana ouviu discos de Clara Nunes, mas teve d e
superar o medo de seu projeto soar como cover. “Já sabia o que não queria: vestir o figurino da Clara. Precisava achar um caminho
que expressasse o que sou”, explica. Para ajudá-la, chamou amigos e profissionais que admira: Olívia Araújo (direção cênica), o
coreógrafo J. C. Violla (direção corporal) e André Santos (direção musical). Coube a eles integrar aspectos musicais e cênicos à luz e
ao figurino.
Além de homenagear a Guerreira, 'Canto sagrado' traz a marca de Fabiana, que não deixou de experimentar algumas
transformações. “Ganhei em suavidade e segurança melódica. Mostro um repertório complexo”, explica. A artista cita afinidades
de temperamento entre as duas: “Sou uma pessoa com fé na arte e na vida, Clara Nunes tem isso também. O canto dela não passa
em branco, tem cor, é quente, guerreiro. Tem força e alegria”.
O repertório traz o “lado B” do repertório da mineira, mas Fabiana avisa: não deixou de contemplar o cancioneiro essencial de
Clara. A banda que a acompanha reúne André Santos (baixo), Douglas Alonso (bateria), Edson Sant’Anna (teclado), Henrique
Araújo (cavaco e bandolim), Léo Rodrigues (percussão), Lula Gama (violão) e Paulão 7 cordas (violão 7 cordas).
Além de 'Canto sagrado', a paulista lançou os discos solo 'O samba é meu dom' (2004), 'Quando o céu clarear' (2007) e 'Fabiana
Cozza' (2011), que lhe valeu o Prêmio Musica Brasileira.
Homens
Fã de Aracy de Almeida, Carmen Miranda, Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Elza Soares, Elizeth Cardoso, Leny Andrade, Elis Reg ina
e Nana Caymmi, Fabiana reverencia também os cantores. Gosta de Ciro Monteiro, Miltinho e, especialmente, de Paulinho da
Viola. “Ele canta de modo mais contido, sabe que o samba tem dolência e tristeza. Essa delicadeza torna o gênero nobre ainda
mais nobre”, elogia.
Paulista da gema
Fabiana Cozza, de 38 anos, nasceu no Bairro Pompeia e foi criada na Vila Madalena, na capital paulista. Seu primeiro professor de
música foi o pai, Oswaldo dos Santos. Por 15 anos, ele atuou como intérprete da Escola de Samba Camisa Verde e Branco, “dona
de batucada de respeito e referência do samba urbano paulista”, ressalta ela.
Foi lá que Fabiana aprendeu a cantar samba. Inicialmente, ela não planejava ser artista. Formada em jornalismo, tomou um sust o
ao ser aprovada em primeiro lugar na Universidade Livre de Música Tom Jobim, atual Escola de Música do Estado de São Paulo. Ela
cantou em corais, fez oficina com Jane Duboc e estreou cantando MPB, em 2009, no Bar Feitiço de Áquila, acompanhada pelo
violonista Antônio Mineiro. Quando o compositor Eduardo Gudin a viu, convidou-a para integrar seu grupo, com o qual Fabiana
gravou o primeiro disco.
Fabiana e a música
Cantar “Assim como estar no palco, cantar é exercício de comunhão com o sagrado. Cantar samba é essencial a qualquer cantora
que se diga brasileira. Significa contato com uma herança musical que é preciso conhecer. Não conhecer samba é como ser norteamericana e ignorar o blues. Sem blues, como cantar folk, reggae?”
Parceiros “Sempre trabalhei com músicos exigentes, eles não passavam a mão na minha cabeça. Sou movida a desafios, ouvia a
crítica como desafio. Se você não é cheia de melindres, trabalhar com gente assim traz muitas vantagens. Estudava feito uma
louca, até ouvir o ‘agora acertou’. Não quero gente dizendo que tudo o que faço é maravilhoso, já me iludi muito com isso. Prefiro
quem me faz sentir segura. Não é vaidade. Quero ser competente.”
São Paulo “Não é – e nunca foi – túmulo do samba. Ele está em comunidades como Samba da laje, Pagode da 27, Kolombolo Diá
Piratininga. Um projeto importante é o Samba autêntico, com sua música de qualidade, não só referenciada nos mestres, mas
trazendo novidades. Contemporaneizar o samba é necessário. O que não pode é, sob a desculpa de modernizá-lo, jogar areia em
anos de história.”
História “Precisamos criar espaços que contem a história do samba, que é a história do Brasil. E valorizar os artistas. Vários deles
passaram e continuam passando por dificuldades, vivem modestamente. Ainda há preconceito. Temos de dar respaldo ao
sambista popular: registrar, documentar, transcrever em partitura o que eles fazem, entrevistá-los. O meio ainda é muito
desorganizado.”
Saiba mais
A pioneira
Clara Nunes nasceu em 1943, em Caetanópolis (MG). De família simples, a cantora foi tecelã, trabalhou em rádios de BH nos anos
1960 (foto) e se mudou para o Rio de Janeiro em 1965. Em 1975, veio o primeiro hit: 'Conto de areia' (Romildo/Toninho) chamou a
atenção do Brasil. O disco da mineira vendeu 300 mil cópias, rompendo tabus que cercavam as mulheres no mundo do samba.
Clara abriu o caminho para Alcione e Beth Carvalho, entre outras colegas. Gravou clássicos do samba e lançou hits inspirados nos
terreiros de candomblé. Seu figurino afro – vestido branco, colares e miçangas – celebrou a negritude brasileira. Em 1983, Clara
morreu em decorrência de complicações cirúrgicas, no Rio de Janeiro.
CANTO SAGRADO
Cine Theatro Brasil Vallourec. Praça Sete, s/nº, Centro, (31) 3222-4389. Lançamento de CD e DVD. Domingo, às 19h. Ingressos: R$
30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada).