9 MB 10/07/2013 Semanario 15 Junho 2013
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9 MB 10/07/2013 Semanario 15 Junho 2013
DIRECTOR SALAS NETO [email protected] Kz 250,00 EDIÇÃO 519 ANO VII w w w. s e m a n a r i o -a n g o l e n s e . co m SÁBADO • 15 de Junho de 2013 CRÉDITO BANCÁRIO Grande trafulha no BPC do Zengá MIA COUTO, PRÉMIO CAMÕES DE LITERATURA «A escrita é casa que visito mas onde não quero morar» A vez de António Sita no «caldeirão» de Luanda MAIKE-ALFA-LIMA Embora seja bem apetitoso, o cadeirão de comandante da Polícia de Luanda acaba por se transformar num «caldeirão», em face da complexidade dos problemas que o seu ocupante tem de enfrentar, numa cidade em que os níveis de criminalidade são sazonalmente assustadores, como agora, em que a situação está verdadeiramente «maike-alfa-lima». Não há nenhum que se tenha saído em grande na senda pela ordem e tranquilidade da capital. Será que António Maria Sita o conseguirá? É o que vamos ver. «Bravo Tango», Comandante! 2 Sábado, 15 de Junho de 2013. Em Foco Teimosas esperanças A selecção nacional de futebol hipotecou em grande as suas possibilidades de qualificação ao Mundial de 2014, no Brasil, depois de não ter conseguido melhor que um empate (1-1) na recepção à sua similar senegalesa, sábado último, em Luanda. Neste desafio, os angolanos jogavam a liderança do seu grupo de qualificação na zona africana da competição, que integra ainda ugandeses e liberianos, todos então com possibilidades de chegarem à fase ulterior das eliminatórias regionais. Em caso de vitória, a selecção nacional assumiria a primazia no grupo, desde que os liberianos não chegassem a um triunfo na sua deslocação à casa dos ugandeses. Os jogos contavam para a quarta jornada da competição e o desfecho era importante para o início da definição das eventuais posições finais. Os angolanos tinham necessidade imperiosa do triunfo no jogo de Luanda, para dependerem exclusivamente de si no que faltaria disputar até ao fim desta penúltima fase do torneio africano de qualificação, mas o melhor que fizeram foi a repartição de pontos, um resultado favorável aos senegaleses, já que lhes permitiu seguir na liderança, com seis pontos, beneficiando da vitória (1-0) dos ugandeses sobre os liberianos. Os ugandeses, por seu lado, foram quem melhor tirou proveito da ronda, descolando da última para a segunda posição, agora com cinco pontos. Os angolanos não se moveram, continuando na terceira posição, agora com quatro pontos, igual pecúlio dos liberianos, que saíram do segundo posto para a cauda do grupo. Embora precisassem vitalmente da vitória diante dos senegaleses, os angolanos pouco fizeram para consegui-la, ao protagonizarem uma actuação descabelada, sem tino nem nexo, enfim, desastrada. E isto muito por conta de erros de concepção graves do próprio selecionador, que continua a espelhar incompetência para armar uma equipa com algum jeito. O futebol que a selecção nos tem apresentado não é muito diferente do que qualquer do girabairro é capaz de produzir, passe o exagero. O combinado nacional (se assim se lhe pode chamar, uma vez que tudo parece descombinado) continua sem a ligação desejada entre os três sectores (defesa, meio e ataque) e denota alguma falta de ambição e mesmo empenhamento. Os jogadores mais pareciam estar numa «passarela» ou a tratar das unhas num salão de beleza. Em face disso, era impossível que os angolanos se impusessem Depois desta ronda, os angolanos passaram para aquela velha condição em que gostam de estar nos torneios qualificativos do continente, quer para provas de âmbito africano, como para as de cariz mundial (caso vertente): a depender de terceiros a uma equipa bem arrumada como a dos senegaleses, de longe superior em todos os capítulos. No fundo, o empate conseguido até acabou por ser um resultado lisonjeiro para os anfitriões. Depois desta ronda, os angolanos passaram para aquela velha condição em que gostam de estar nos torneios qualificativos do continente, quer para provas de âmbito africano, como para as de cariz mundial (caso vertente): a depender de terceiros. E está assim: para reacenderem as esperanças na qualificação, além de precisarem de ganhar em Kampala já neste sábado, os angolanos têm ainda que esperar que os senegaleses percam pontos na deslocação à Monróvia. A situação não está nada simpática. Primeiro, porque Kampala não traz boas recordações aos angolanos, já que quase sempre regressam de lá com derrota. Algumas bem pesadas mesmo. E depois porque não é lógico esperar que os senegaleses se deixem praticamente morrer na praia, pelo que é suposto que os liberianos sequer conseguirão respirar mesmo a contarem com os benefícios que a condição caseira lhes oferece. No entanto, o fundamental, para já, é ganhar em Kampala. Sendo possível, não nos parece provável, mais ainda quando não acreditamos em milagre. Mas, como o futebol não quer saber de lógicas, tudo ainda pode acontecer. E lá vão os angolanos (agora em menor número) ainda com esperanças de irem ao Brasil em 2014. Sonhos teimosos que alguém continua a querer alimentar, ao invés de caírem já na real, como diriam os manos do país do samba. Nota: mais logo, a situação estará já mais clarificada – uma derrota significaria o fim dessas teimosas esperanças. ■ QUI 06 JUN SEX 07 JUN SÁB 08 JUN DOM 09 JUN SEG 10 JUN TER 11 JUN QUA Director: Salas Neto Editores — Editor Chefe: Ilídio Manuel; Economia: Nelson Talapaxi Samuel Sociedade: Pascoal Mukuna; Desporto: Paulo Possas; Cultura: Salas Neto; Grande Repórter: joaquim Alves Redacção: Rui Albino, Baldino Miranda, Adriano de Sousa, Teresa Dias, Romão Brandão, e Edgar Nimi Colaboradores Permanentes: Sousa Jamba, Kanzala Filho, Kajim-Bangala, António Venâncio, Celso Malavoloneke, Tazuary Nkeita, Makiadi, Inocência Mata, e António dos Santos «Kidá» Correspondentes: Nelson Sul D’Angola (Benguela) e Laurentino Martins (Namibe). Paginação e Design: Sónia Júnior (Chefe), Patrick Ferreira, Carlos Inácio Fotografia: Nunes Ambriz e Hélder Simões Impressão: Lito Tipo Secretário de Redacção: Dominigos Júnior Adminstracção: Marta Pisaterra António Feliciano de Castilho n.o 119 A • Luanda Registro MCS337/B/03 Contribuinte n.o 0.168.147.00-9 Propriedade: Media Investe, SA. República de Angola Direcção: [email protected]; Edição: ediçã[email protected]; Política: [email protected]; Economia: [email protected]; Sociedade: [email protected]; Cultura: [email protected]; Desporto: desporto@@semanario-angolense.com; Redacção: [email protected]; Administracção e Vendas: [email protected]; Publicidade e Marketing: [email protected]; sítio: www.semanario-angolense.com As opiniões expressas pelos colunistas e colaboradores do SA não engajam o Jornal. 12 JUN QUI 13 JUN JES FALOU São raras a vezes em que o presidente da República fala em publico. Para os jornalistas então!... Neste dia JES falou à SIC e suscitou muitas reacções. A corrupção, pobreza, sucessão presidencial e manifestações dos jovens foram alguns do temas abordados. CAUSAS DE CRIMES A Polícia Nacional no Huambo apontou como causas principais da criminalidade, o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e de liamba. Revelou-se ainda que ali surgem a cada dia novos grupos de marginais. É já «epidemia» nacional o crescimento do fenómeno? NGONGO DE LUTO Maria Eulália Leal Monteiro, mãe do deputado e general Roberto Monteiro «Ngongo», faleceu neste dia, aos 106 anos. A anciã repousa no Alto das Cruzes. Descrita como optimista, que gostava de viver e sempre transmitiu isso ao resto da família, teve oito filhos, 20 netos e 34 bisnetos. «DIMIXIS» EM FORMAÇÃO O Instituto de Formação da Administração Local (IFAL) encerrou neste dia um curso sobre contratos administrativos, em que participaram 23 funcionários da Administração Municipal de Menongue. O curso foi dirigido a directores das repartições municipais, chefes de secção e técnicos. MBANZA CONGO EM ALTA A classificação de Mbanza Congo como Património Cultural Nacional aconteceu neste dia, em cerimónia presidida pela ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva. O próximo passo será elevar a localidade a Património da Humanidade. Para tal, Rosa Cruz e Silva já pediu apoio à Itália. MENOS IMPOSTOS A taxa do imposto industrial vai ser reduzida de 35 para 30 por cento, uma das propostas apresentadas pela equipa que coordena a reforma tributária. O Conselho de Ministros já apreciou um conjunto de diplomas da reforma do Sistema Fiscal. BÓNUS NO BIC O BIC vai em breve bonificar as taxas de juros dos créditos aos funcionários públicos, para permitir que estes adiram massivamente aos financiamentos que esse banco oferece aos clientes. Fernando Teles, o seu PCA, revelou isso no Huambo. MANIF DE CENTRALIDADES Dezenas de pessoas que adquiriram casas nas centralidades de Cacuaco e o Kilamba manifestaram-se à entrada da Sonangol, reivindicando a entrega das chaves dos seus apartamentos. «Por telefone, não explicam as razões do atraso, agora, a SONIP aguenta-se com as manif’s.» 4 Sábado, 15 de Junho de 2013. Em Foco Para manter-se como de director de gabinete do Governador… José Filipe diz ter recusado convite de Isaac dos Anjos Nelson Sul D’Angola U m mês depois de Armando da Cruz Neto ter visto confirmado o seu pedido de demissão do cargo de governador provincial de Benguela, José Chilonga Filipe, até então director do seu gabinete, sai a terreiro para revelar que acabava de declinar o convite de Isaac Maria dos Anjos, o novo titular, para se manter no posto. José Chilonga Filipe reagia assim ao artigo publicado na nossa última, em que ele também era referenciado como um dos «órfãos» Armando da Cruz Neto. No artigo, referia-se que este coronel das FAA «emprestado» ao executivo benguelense era uma das figuras que mais se ressentia da saída do general da governação local, de quem era um dos principais colaboradores. Interrogávamos-nos igualmente se José Chilonga Filipe conseguiria fazer corredores para ser manter como director do gabinete do actual governador ou se não seria melhor antecipar-se, pedindo a sua demissão, antes que fosse afastado por Isaac dos Anjos, cenário apontado como o mais provável. C Entre as diversas cogitações, sustentávamos que a melhor saída para ele seria o regresso ao activo nas Forças Armadas. E esta foi mesmo a melhor saída que José ChilongaFilipe encontrou, como ele próprio confirmou ao Semanário Angolense, Crise na CASA-CE om apenas dez meses na função de secretario provincial executivo da CASA-CE em Benguela, Florêncio Canjamba está em vias de ser exonerado do cargo, por alegada má gestão financeira e incapacidade para desempenhar cabalmente o seu papel como representante da coligação na oposição política local, soube o Semanário Angolense de boa fonte. Florêncio Canjamba é ainda acusado de violação dos estatutos da organização, ao proceder a exonerações «anárquicas» dos quadros da coligação, com base no amiguismo, trocando militantes experientes por figuras próximas a si, apenas por isso mesmo, o que tem causado um mal-estar no seio da CASA-CE em Benguela, com evidentes prejuízos para os seus interesses políticos. O mal-estar é tanto que muitos militantes estão já a preparar as «imbambas» para baterem com a porta, com destino ao Galo Negro, o maior partido da oposição angolana, que verá com bons olhos esta crise entre os «casados» de Benguela. As fontes do SA dizem ainda que há muito que o conselho presidencial da CASA-CE vinha protelando a exoneração de Florêncio Canjamba, devido às noticias publicadas por este jornal, dando conta da «inoperância» da coligação de Abel Chivukuvuku em Benguela. Contudo, após um grupo de militantes ter, alegadamente, enviado a Luanda um dossier que detalhava o clima de crispação reinante no secretariado de Benguela, o conselho presidencial da coligação passou a encarar a manutenção de Canjamba no posto como sendo um risco, dado o facto de Benguela ser considerada como segunda praça política do país. A vinda a Benguela do inspector nacional da CASA-CE, Rui Isaac, para as nossas fontes, será a prova mais evidente de que a exoneração de Florêncio Canjamba é uma questão de dias, podendo vir a ser substituído por um antigo deputado da UNITA identificado apenas por Caetano. Contactado pelo SA, Florêncio Canjamba, refutou as acusações sobre as alegadas exonerações «anárquicas» que procedera, afirmando mesmo que, à luz dos estatutos, estão proibidas defecções de quadros por iniciativa do secretário provincial da coligação. «A única coisa que os estatutos admitem é mudarmos um quadro de um sector para outro e nunca exonerá-lo. Portanto, essa acusação não corresponde à verdade, até porque não fizemos sair nenhum comunicado publico que indique isso», disse. Questionado sobre as razões que estariam na base da vinda do inspector nacional da CASA-CE a Benguela, Florêncio Canjamba afirmou que a sua visita se enquadrava nas actividades domesticas rotineiras da estrutura de fiscalização da coligação, para averiguar apenas o funcionamento da sua representação em Benguela, sem ter algo a ver com supostas crises no seu seio . ■ NSA, em Benguela reiterando, no entanto, que fora convidado para manter-se, ao que acabou por declinar, sem apontar as razões da sua decisão. Antes disso, refutou categoricamente que estivesse a ressentir no «bolso» com a saída de Armando da Cruz Neto, como indicáramos no mesmo artigo. «Não tenho porquê estar a ressentir no bolso com saída do general Armando, até porque, se quer que lhe diga, ganho melhor nas forças armadas do que no governo. E mais: se há coisas que ganhei durante a minha passagem pelo governo, gostaria de destacar as boas amizades que fiz com as pessoas com quem privei durante esses anos todos, assim como o prestígio grangeado. Fora disso, nada mais ganhei», disse José Chilonga Filipe. E confirma: «Irei sim voltar às Forças Armadas Angolanas, donde havia sido requisitado pelo governador cessante para que pudesse dar o meu contributo na função executiva do Estado». José Chilonga Filipe e Armando da Cruz Neto têm uma relação antiga, tendo já sido director de gabinete do general ao tempo em que ele era embaixador de Angola em Espanha. ■ (*) Em Benguela 5 Em Foco Sábado, 15 de Junho de 2013. Por alegada campanha difamatória MPLA de Luanda contra semanário «O Continente» O comité provincial de Luanda do MPLA distribuiu à imprensa nesta semana um comunicado em que se manifesta indignado com uma alegada campanha de calúnia e difamação empreendida pelo jornal «O Continente», para sujar a imagem da instituição, em particular a do seu primeiro secretário, o «cda» Bento Bento. Há dias, Bento Bento fora citado pela publicação como estando a subverter o processo de renovação das estruturas municipais do partido no poder em Luanda, referindo que ele estaria mesmo a inibir, em meio a ameaças, os potenciais candidatos aos postos em disputa, para que eles sejam ocupados por figuras da sua conveniência. Mas, a direcção do partido dos camaradas em Luanda contesta as alegações, considerando-as como absolutamente infundadas, uma vez que o processo assembleário nos diversos distritos da circunscrição estará a decorrer normalmente ao nível local, sem intromissões de quaisquer espécies da estrutura partidária provincial no que toca às candidaturas que se têm apresentado para a disputa dos cargos em jogo. Segundo o comunicado, produzido a meio desta semana, tão logo foram criadas as condições procedimentais, conducentes à realização do processo constitutivo dos comités dos distritos, as subcomissões de candidaturas estiveram prontas e disponíveis para receberem as intenções dos concorrentes ao cargo electivo de 1.º secretário distrital, avaliando-se depois se eles reuniam os requisitos exigidos pelos Estatutos e demais Regulamentos do Partido, facto que ocorreu sem qualquer problema. Entretanto, diz o comunicado, o Comité Central do MPLA, o Bureau Político e o Comité Provincial trataram desta matéria, orientando que o processo assembleiario fosse levado a cabo sob obediência das normas estatutárias, regulamentos e demais directivas do MPLA, no sentido de adequar a sua estrutura à nova divisão político-administrativa da província. Diz ainda o comunicado que o Grupo de Acompanhamento do Secretariado do Bureau Político à província de Luanda visitou os comités municipiais e os distritais em formação, para constatar o seu estado de organização e processos de candidaturas, tendo concluido com satisfação que tudo estava a decorrer bem, Segundo o comite provincial do MPLA em Luanda, diante de «factos tão inéquivocos como estes», não restam dúvidas de que o jornal de Henriques Miguel continua incessante a sua campanha especial contra a instituição, dirigida especialmente contra o seu 1.º secretário, Bento Bento, considerado, ao contrário, como um «fiel cumpridor das orientações superiores» do MPLA. «Quer o 1.º secretário províncial, quer os demais integrantes da direcção do partido na província deram autonomia para que as subcomissões de candidaturas decidissem por si sobre o processo ao nível das suas circuncrições territóriais, cabendo apenas ao respectivo orgão superior o papel de fiscalizador e aconselhador, ali onde algo estivesse errado», sublinha o comunicado. A concluir, garante queo espírito democrático e a transparência no processo de candidaturas decorreu com a maior normalidade e sem sobresalto algum. «O que nos leva a caracterizar o comportamento do Jornal ‘O Continente’ como sendo não sério, caluniador e (...) nocivo ao estado democrático e de direito, que se quer justo, equilibrado e eficaz, aonde o cidadão deve ser informado com verdade», remata o comunicado do «M» de Luanda. ■ 6 Sábado, 15 de Junho de 2013. Capa Cidadãos estão cada vez mais intranquilos Bandidos «mijam» em Luanda A cidade capital está, desde há umas semanas, fortemente policiada, particularmente nas zonas urbanas. O aparato policial que se vê nas ruas, que incluiu forças especiais, assim como a polícia militar, deixa alarmada a população, quase se parecendo com uma cidade em estado de sítio Kim Alves A província de Luanda, nomeadamente as suas zonas urbana e periférica, tem sido assolada, nos últimos dias, por uma crescente onda de criminalidade que está a tomar contornos alarmantes. A população está assustada e não sabe ao certo a que se deve tal situação, que preocupa também as autoridades. Estas foram, no entanto, apanhadas de surpresa quando, há cerca de duas semanas, três agentes policiais foram mortos por homens armados não identificados no seu posto de trabalho, ao Kikolo. Uma semana depois, mais dois policiais foram igualmente mortos em diferentes zonas da cidade: um, por atropelamento criminoso, já que os seus autores acabaram por levar a sua arma, ao Cazenga, e outro, a tiro, por ter resistido a uma abordagem de bandidos que lhe queriam a sua motorizada. A população sente que a cidade está militarizada, o que a deixa apreensiva, por carência de uma informação concreta. A preocupação das pessoas que trabalham no centro da cidade e habitam na periferia, principalmente em zonas mais distantes, é regressar à casa tão logo terminem as suas actividades. Diversas pessoas têm sido molestadas e algumas mortas em acções de delinquentes que visam, geralmente, os seus bens materiais ou monetários. Em algumas áreas da cidade, viaturas paradas no engarrafamento têm sido abordadas, em pleno dia, por bandidos armados, que exigem dos utentes dinheiro, telemóveis e joias, entre outros bens. A resistência pode custar a vida ou, no mínimo, um ferimento e a destruição dos vidros da viatura. Os transeuntes têm sido igualmente alvos de assalto pelos mesmos motivos, tanto nas zonas urbanas, como na periferia. Com o cair da noite, a insegurança aumenta e o perigo espreita em qualquer esquina ou passagem menos iluminada. Para além dos assaltos, há ainda a violação de mulheres e espancamento quando alguém assaltado não tenha nada que interesse aos bandidos. Transportes nocturnos A falta de transporte público de passageiros a noite agrava a situação, principalmente de trabalhadores e estudantes nocturnos. Ultimamente, muitos trabalhadores e não só aproveitam os cursos nocturnos para aumentar o seu conhecimento e quando saem dos estabelecimentos escolares para regressarem à casa, não há autocarros ou outro meio de transporte que facilite o seu trajecto. Os autocarros públicos e de empresas privadas similares recolhem-se com o cair da noite. Alguns táxis ainda fazem umas corridas durante a noite e, apesar do preço elevado, vão ajudando os que podem. Com o estado de in- segurança dos últimos dias, também esses vão ficando raros e os que labutam até mais tarde, assim como os estudantes, nada mais podem fazer senão caminhar, enfrentando os perigos da via. O problema da falta de circulação de transportes públicos de noite na cidade de Luanda e periferias não é novo e dificulta imenso a vida da população, sobretudo em caso de uma emergência por questões de saúde ou outra. O incremento de crimes diversos em Luanda verifica-se, sobretudo, nas zonas periféricas, onde diversas jovens têm sido molestadas e violadas, quando não são mortas também. Há cerca de duas semanas, entre as 21 e as 22 horas, um jovem foi morto por espancamento no bairro das Mangueirinhas, zona da Caop A, município de Viana, quando regressava à sua casa. De acordo com a vizinhança, os meliantes queriam apoderar-se do seu telemóvel e possíveis valores que o malogrado teria em sua posse. Como ele opôs resistência, seria forte e barbaramente espancado, acabando por falacer horas depois por obra da violência que os bandidos descarregaram sobre ele. Foi o quarto caso do género no bairro só neste ano. A população daquela área atira as culpas para a falta de policiamento nocturno naquele bairro. «Durante o dia, aparecem muitos agentes da Polícia aqui só para ‘pentearem’ os que fazem táxi e prender as motas, que nem vão para a unidade; mas, das dezoito horas em diante se, só se vê agentes por aqui a beberem nesta ou naquela barraca», acusa um morador do bairro. Na mesma esteira, um outro cidadão foi morto nesta terça-feira, 11 do corrente, no bairro da Boa Fé, município de Viana, por meliantes que lhe roubaram a mota em que se fazia transportar. Moradores locais dizem que a vítima resistiu ao assalto, o que derivou na sua morte. ■ 7 Capa Sábado, 15 de Junho de 2013. Para contrapor-se à sofisticação do «modus operandi» dos bandidos Adaptação policial precisa-se O s bandidos, geralmente armados, estão cada vez mais destemidos, ao ponto de enfrentarem os agentes da polícia. Porém, a população, sobretudo a que reside em bairros de risco, diz que a corporação faz muito pouco para conter a situação, apontando mesmo o dedo acusador a certos agentes por alegada conivência com os bandidos. Actualmente, já se fala de crime organizado em Angola, sobretudo em Luanda. Esses delinquentes estão ligados ao tráfico de droga e à crimes de «colarinho branco», em que são geralmente apoiados por figuras bem cotadas no país. Essa delinquência, não admite interferências nas suas actividades e age com extrema crueldade. Ela está a crescer e a enraizar-se a uma velocidade estonteante que, brevemente, será muito difícil controlar. Neste contexto, os métodos de trabalho e actuação da Polícia Nacional tem que se adaptar à evolução da própria criminalidade. Hoje por hoje, salvo em alguns casos, o policial, agente ou oficial, age como um mero funcionário público: apresenta-se ao local de trabalho pela manhã e a meio da tarde vai-se embora para casa ou para outros caminhos. Os poucos que ficam destacados nas unidades, em caso de alguma ocorrência durante a noite, em regra, sob os mais variados pretextos (não temos isso, não temos aquilo), não acodem aos cidadãos, não patrulham coisa alguma e alguns até fogem ao choque com os delinquentes. Os cidadãos questionam esta postura e comentam: «Actualmente, a polícia já não paga tão mal assim. É mesmo dos sectores públicos que melhores ordenados oferece. Em contrapartida, é só normal ver-se agentes na rua durante o dia. Depois da hora de expediente público, eles também vão desaparecendo e, ao cair da noite, já não se vê nenhum polícia nas ruas de Luanda, salvo raras excepções. Tudo fica entregue aos lobos. E na periferia então, já nem adianta falar. Se aparecem de dia, é mais para ‘pentear’ do que outra coisa. E com o seu desaparecimento, os bandidos fazem a festa». ■ Chefe de Estado quer melhor desempenho Viana, Cacuaco e Ingombota Perigo em alta O s populares dos bairros da Caop A e B, no município de Viana, que segundo uma fonte da Polícia, é um dos mais afectados actualmemente pela criminalidade, queixam-se dos chamados ralis de motas de duas e quatro rodas, que fazem um barulho infernal, estendendo-se pela noite e madrugada. Queixam-se também da poluição sonora causada por inspirados «dj’s» que não querem saber do sossego dos seus concidadãos, incluindo doentes, que são incomodados pela barulheira, Quem reclama é violentado. «A Polícia nunca aparece, nunca vimos um só carro de patrulha nas ruas deste bairro, nem de dia nem de noite e há mesmo polícias que aqui vivem e que deviam fazer o chamado trabalho de sector, mas nada fazem, apesar de conhecerem os delinquentes e prevaricadores», conta Alberto Ngalula, funcionário público. O cidadão acrescenta que nesse bairro, associada às «rachas» de motas e de carros, a delinquência fala alto, incluindo a violação de meninas. «Há dias, mataram aqui um jovem, junto da entrada para a passagem aérea que dá para a Vila, passava pouco das 19 horas, mas a Polícia só apareceu no dia seguinte de manhã», lamentou. É assim em outros bairros de Viana, mas também igual acontece no Cazenga, em Cacuaco, no Rangel, Sambizanga, Prenda, e um pouco por toda Luanda. De acordo com a fonte da Polícia Nacional já citada, os municípios de Viana e Cacuaco e o distrito urbano da Ingombota são os mais afectados pela criminalidade. A fonte explicou que há áreas específicas nessas localidades em que o crime é alto e violento. Em Viana distinguiu os bairros da Caop A e B, Capalanga e Boa-fé, especialmente na área conhecida como «Rasta». No Cacuaco, referiu o Kikolo em toda a sua extensão, o Paraíso e o Mulenvos como zonas onde o crime é que manda. Quanto à Ingombota, a nossa fonte diz que há focos criminosos um pouco por todo o distrito, embora a Polícia conheça as mais críticas. ■ F ace ao estado de inquietação e insegurança em Luanda, o Chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, ao exonerar a comissária-chefe Elisabeth Rank Frank «Bety» do cargo de comandante provincial de Luanda e nomear para o seu lugar, o agora comissário-chefe António Maria Sita, terá querido implantar uma nova dinâmica no desempenho da Polícia Nacional na província que alberga a capital do país e, em consequência, as mais altas instâncias do Governo e do Estado. Certamente, não terão faltado orientações precisas do Chefe de Estado ao titular da pasta do Interior, Ângelo Veiga, e ao novo comandante, porque o seu trabalho não será fácil. É grande a expectativa em torno do eventual desempenho do novo comandante de Luanda. «A população espera por si para enriquecer a mensagem de segurança que pretendemos passar (...) e para isso deverá também interagir com ela», referiu o ministro, realçando que «os grupos que ousam, de armas na mão, procurar alterar de forma profunda a ordem e a tranquilidade públicas, para esses a nossa mensagem é clara: devemos ser implacáveis. A corporação será bastante implacável com os que se dedicam ao crime, ao invés de trabalharem de forma honesta». ■ 8 Sábado, 15 de Junho de 2013. Capa Para, finalmente, colocar ordem em Luanda Será o comissário-chefe António Sita o homem de quem se estava à espera? saber, lembrando-se apenas de um ou outro nome. Também o próprio site da Polícia Nacional não tem nenhuma referência sobre o assunto. Contudo, o SA saber que já chefiaram o CPL, desde a passagem da corporação para o Comando-Geral, os seguintes comandantes: Gaspar da Silva, Ferreira Neto, Mussolo, Panda, António P. J. Candela, Quim Ribeiro e Elizabeth Rank Frank. Portanto, António Maria Sita é o oitavo titular da corporação na «era moderna». província numa situação de instabilidade social muito grave. Para acabar ou diminuir com o alto nível de criminalidade que se registava na província de Benguela, o agora comandante de Luanda, muito mais do que impor o uso da força, havia adoptado a fórmula do diálogo para se alcançar a solução do problema. E uma das fórmulas encontradas pelo comissário-chefe, António Maria Sita foi promover a reinserção social de boa parte dos elementos desses grupos que, um pouco mais tarde, eles se descompuseram. Alguns chegaram mesmo a fazer parte da corporação, com resultados animadores. Mas, em face das características específicas de Luanda, a partir da sua grandeza, os observadores acreditam que a fórmula aplicada em Benguela não teria muitas hipóteses de vingar. No campo político, o comissário-chefe António Maria Sita teve um desempenho positivo, se tivermos em conta as declarações favoráveis ao seu desempenho dos líderes dos partidos políticos (situação e oposição), se bem que não tenha conseguido acabar com a instrumentalização da polícia ao nível dos municípios do interior da província, nos quais os agentes da corporação mais pareciam activistas do partido no poder ou criados dos administradores. Agora nas vestes de novo comandante da Polícia de Luanda e delegado do Ministério do Interior, há pouco menos de 3 semanas, em substituição da comissária-chefe Elizabeth Ranque Frank (Bety), os luandenses procuram saber o que é que António Maria Sita irá fazer para tirar a cidade capital do sufoco em termos de criminalidade em que se encontra. Vamos esperar pela concretização dos planos que ele tem preparado, no afã de tentar sair-se melhor que os seus antecessores, na sua maioria sem histórias bem sucedidas para contar. Será que António Maria Sita conseguirá quebrar o «enguiço»? Kim Alves (*) Em Benguela Nelson Sul D’Angola (*) T ido como um dos melhores comandantes que já passaram por Benguela, o agora comissário-chefe António Maria Sita, fora nomeado comandante provincial da policia nacional e delegado do Ministério do Interior, no ano de 2007, em substituição do comissário-chefe Mário de Oliveira Santos, actual Director Nacional para Ordem Pública da Policia Nacional. Antes de dirigir a corporação na província de Benguela, António Maria Sita exercera iguais funções na província mais a norte do país, em Cabinda. Quando chegou à Benguela, a criminalidade apresentava um quadro preocupante, não apenas para as autoridades, mas, sobretudo, para a população em geral. Entre 2007 e 2009, Benguela chegou mesmo a ser considerada a segunda província mais insegura do país, em termos de criminalidade, depois da capital. Assaltos à mão armada e violações sexuais constavam no topo dos crimes registados pelas autoridades policiais naquela altura, cujos autores, à semelhança de outras paragens, eram jovens de tenra idade. Há 4 anos, o terror fazia parte do quotidiano dos benguelenses. Se, no centro das cidades do Lobito e Benguela, os assaltos eram praticados descaradamente à luz do dia, nas zonas periféricas o panorama piorava. Por alguma influência de Luanda, Benguela também já foi morada das chamadas «squad’s», cuja actividade principal era (é) realizar acções criminosas nos bairros e comunidades, com os assaltos a resi- dências a liderarem as estatísticas. Contudo, em Benguela, foram prontamente combatidos pela corporação, então liderada pelo comandante António Maria Sita, tido como um policial de boa competência operativa. Já na «era moderna» O 8.º Comandante O Comando Provincial da Polícia de Luanda (CPL), pela especificidade do território em que se encontra, é o de maior responsabilidade e consequentemente o que detém o maior efectivo. Dispõe igualmente de instalações condignas para o seu funcionamento e que prestigiam a sua condição de mais importante comando do país. Pelo CPL já passaram diversos comandantes, alguns deles carismáticos oficiais de carreira policial. O SA tentou por diversos meios obter o nome e o tempo em que estiveram ao leme do CPL, mas mesmo altos e antigos oficiais da corporação disseram não Um dos grupos de delinquentes mais temidos na província de Benguela e que fora desmantelado na vigência do agora comandante de Luanda, respondia pelo nome de BF. A actuação dessa «squad» era forte que quase colocava a 9 Capa Sábado, 15 de Junho de 2013. O que espera o povo do novo comando policial em Luanda? Mais formação e menos corrupção O Semanário Angolense procurou saber também o que pensa a população à respeito. A maior parte dos interlocutores, contando com os que não aceitaram ser identificados, concordou em dizer que o desafio, de agora em diante, deve estar ligado à formação de mais agentes da polícia e a diminuição da corrupção nesta classe. Entretanto, há, inclusive, quem corrobora com a ideia de se voltar a formar as brigadas populares de vigilância como elementos básicos para o sucesso do combate aos bandidos, que estao demais. Celso dos Santos, 26 anos, estudante - Durante os últimos tempos tem-se visto mais polícias nas ruas, mas em alguns locais o índice de criminalidade não reduziu. Com o novo comandante, esperamos que haja melhoria. É necessário que se dê formação contínua aos agentes. Outra coisa, muito importante, seria: nós já não estamos em guerra, deviam resgatar aquele pessoal que estava a combater e integrá-lo na polícia, de modo com que possa ajudar também. Não adianta recrutar novos jovens enquanto estes que combateram, e têm mais tácticas de defesa, ficam sem emprego. Relativamente aos crimes que estamos a registar, nos últimos tempos, por mim, não é novidad alguma. O que se passa é que, com as redes sociais, já não dependemos apenas da TPA para deles termos conhecimento. Por isso é que quase todo mundo sabe dos crimes que acontecem. A nossa sociedade está com muitos problemas, começando mesmo pelo elevado índice de criminalidade, o que faz com que não consigamos andar seguros. A criminalidade está em todo sítio, por isso, é preciso que a polícia aja mais e tenha maior controlo, porque, o que se regista, infelizmente, é ela estar mais preocupada em parar os carros – já fui parado várias vezes por agentes que não eram reguladores de trânsito, com a intenção de saberem se estava documentado ou não. Penso que isto é trabalho da polícia de trânsito. Os demais deviam preocupar-se com outras coisas. Acho que estes aspectos devem ser melhorados. Nelson Jacinto (não disse idade), professor - Enquanto existir mudança, a tendência é sempre a de melhorar. A mudança só acontece porque algo está mal. Espero que o novo comandante venha dar um outro alento naquilo que é o combate à criminalidade em Luanda, visto que tem acontecido muitos crimes, sendo que boa parte deles não é esclarecida, o que não deixa de ser preocupante. A polícia não trabalha isolada, pelo que é fundamental o apoio da população na denúncia dos malfeitores. E o programa do governo no sentido de iluminar as vias deverá fazer também com que diminua a criminalidade. Existem bairros com muitos becos, o que impede o desempenho da polícia em termos de patrulhamento. O novo comandante deve ver os aspectos ligados à educação dos seus quadros. Por exemplo, este novo recrutamento que está a ser feito, em que se está a pedir pessoas com um nível de escolaridade um bocado elevado para um simples agente de rua, pode provocar que muitos candidatos enveredem pela falsificação de certificados de habilitações, o que pode fazer com que se possa alistar pessoas com tendências delituosas, em desfavor da integridade moral que a corporação. Pode ser um atentado. O polícia deve saber lidar com o munícipe, deve saber entender quando estiver a interpelar, e para isto ele deve ter, pelo menos, o médio concluído. E não só: está-se a dar formação em 6 meses , o que, em minha opinião, é pouco tempo. Então, a polícia deve trabalhar neste sentido: formar devidamente os seus quadros. Generosa F. Tomás, 29 anos, independente - Sinceramente, devia haver mais polícias nos bairros, para garantirem a nossa segurança. Actualmente, a população luandense não se sente segura, porque há zonas em que ninguém consegue circular normalmente no período da noite. E não precisa ser muito tarde: mesmo entre as 18 e as 19 horas, já constitui um perigo. Então, o novo comandante devia ver isto: colocar mais agentes em todo e qualquer canto de Luanda, para inibir a acção dos bandidos. No meu bairro, dificilmente vejo polícia e o índice de roubos tem vindo a aumentar cada vez mais. A polícia devia estar ali, para que nos sintamos mos seguros, mas nunca é vista. A população clama por socorro e ninguém nos dá ouvido. Acredito que com este recrutamento que está a ser feito na polícia, talvez tenhamos este problema resolvido. Oxalá que assim seja! Agnelo Augusto, 44 anos, mecânico - Mudam de comandante, mas nada sealtera. Para mim, não tem lógica estarem a trocar de comandantes e mais comandantes, quando o problema está nos que dirigem o país. Primeiro, o nosso governo devia implementar políticas boas para baixar o índice de desemprego na juventude, coisa esta que o Estado não faz. Ao contrário, faz vista grossa à penetração de estrangeiros, que acabam por ocupar os postos de trabalho que deviam ser ocupados pelos nossos jovens, fazendo com que eles se sintam frustrados. que faz com que os jovens se sintam frustrados,a se preocupar em trazer os estrangeiros,resultando isso no aumento da criminalidade. O novo comandante devia primeiramente mudar a rede de agentes que se encontram na rua, porque há polícias que não sabem se comportar como polícias: basta verem um jovem com uma mochila e interprelam-no logo como bandido. Os jovens que conduzem motos passam mal nas mãos dos polícias, quando muitos deles são estudantes. A polícia tem agido mal, nos últimos tempos. A delinquência para mim aumentou 80%, mas eu acredito que com fé isto vai mudar. Principalmente, se a liderança do nosso país modificar a sua forma de agir. Fábio António Noélio, 16 anos, estudante - Há tempos fui assaltado atrás do Jumbo e naquela zona tem acontecido muitos assaltos a estudantes: os gatunos chegam até mesmo a levar as nossas roupas, caso não tenhamos dinheiro ou telefone. No meu ponto de vista, a polícia devia colocar mais esquadras móveis nas zonas recônditas da cidade, de modo a diminuir o índice de criminalidade. Eu vivo na FTU e antes a polícia patrulhava a nossa rua até tarde, mas agora parou. E os gatunos voltaram a entrar em acção, principalmente a partir das duas horas da manhã. Espero que o novo comandante venha melhorar estes aspectos. No entanto, tenho conhecimento, por intermédio da minha mãe (ela é polícia), que a comandante anterior queria mudar muita coisa. Às vezes, as pessoas só criticam sem saber o que realmente se está a passar e acabam estragando o bom desempenho dos outros. Ribeiro Figueira, 42 anos, pedreiro - A realidade deve ser dita: a delinquência em Luanda aumentou a 100 por cento. E prova disto são os últimos acontecimentos que relatam a morte de polícias. O novo comandante terá um trabalho tremendo daqui para frente porque tomou posse numa fase crítica. É bom que ele tenha boas políticas para minimizar esta situação. Eu sugiro que se forme, tal como antigamente, a defesa civil - que chamávamos ODP(Organização da Defesa Popular) para que cada um dos munícipes guarde o seu bairro de modo com que possa ajudar também a polícia.O comandante devia se preocupar também em colocar mais esquadras móveis, não com três polícias apenas, mas sim com mais (15, pelo menos). Colocando este número ínfimo (3) de polícias, quando o grupo de delinquente é composto por mais de três elementos, os agentes serão sempre driblados. Três munições contra mais de 7 é demais, pelo que o polícia ou recua ou morre. Recuar não é fugir, mas sim uma estratégia de ataque. Só para teres noção, caro jornalista, eu estava em Kapanda no 28.º regimento de infantaria motorizada e aprendi que o tropa nunca pode ter só uma munição. E acrescento: isto é inadmissível! Então, a polícia deve ver esta situação. Outra coisa que deve mudar é a corrupção. A polícia está a brincar com os delinquentes. Então, você prendeu o delinquente e amanhã solta-o porque deu dinheiro? É claro que depois ele virá contra ti. E os delinquentes não brincam de matar, como a polícia brinca de prender. Eles matam a sério. Deste jeito, a delinquência nunca vai acabar. Por outro lado, deve haver também entendimento entre o agente e o cidadão. Fico por aqui. Maura Solange, 23 anos, contabilista - É obvio que o índice de delinquência aumentou, pois hoje até mesmo os polícias estão a ser mortos pelos bandidos, tendo sido declarada uma guerra entre eles. Espero que o novo comandante procure fazer o seu melhor, coisa que acredito que fará. Para mim, desde que ele subiu, a polícia está mais activa quanto à questão dass rondas nas ruas. Romão Brandão (entrevistas e fotos) 10 Sábado, 15 de Junho de 2013. Capa Assaltos à mão armada são o prato do dia Zonas de alto risco no centro de Luanda «Quem será a próxima vítima?» - assim se interroga o autor (desconhecido) desse bom trabalho de informação sobre algumas zonas altamente perigosas da cidade capital, que alguém tem tratado de disseminar via net e que nos pareceu de extrema serventia pública. Daí que o tenhamos retomado, com a devida vénia U m cidadão, certamente, com boas intenções colocou em circulação na net um interessante trabalho sobre algumas zonas perigosas no centro da cidade de Luanda e em alguns distritos urbanos, nos quais serão frequentes os assaltos à mão armada, sendo, portanto, áreas onde se tem de andar com o maior cuidado. Será uma campanha de sensibilização sobre os cuidados que devemos tomar quando em circulação pelas zonas enumeradas, que inclui, pasmem, o parque de estacionamento do «Bela Shopping». O autor deste projecto sui generis até lista os bens e equipamentos que os bandidos mais apreciam: dinheiro, cartões de crédito, laptops, máquinas de fotografar ou filmar, telemóveis e outros. Com a devida vénia do autor, a quem desde já parabenizamos pela excelência desse trabalho, o SA publica-o (com ligeiras adaptações) nessa sua edição, certo de que terá bastante serventia para o público. Pelo que deu a ver, para ele, o desarmamento da população é um dos principais passos que se tem que dar no sentido da «pacificação» da capital do país. E isto é para ontem. ■ 11 Capa Sábado, 15 de Junho de 2013. 12 Sábado, 15 de Junho de 2013. Entrevista «A escrita é uma casa que visito mas onde não quero morar...» Após ter sido atribuído ao «pai» da literatura moçambicana, José Craveirinha, o Prémio Camões consagra agora a figura central da geração seguinte, Mia Couto, autor de uma obra que irriga o português com as invenções poéticas das línguas bantus. Define-se nesta entrevista como um ser entre fronteiras: «um branco que é africano», «um poeta que escreve prosa», «um escritor em terra de oralidade» Luís Miguel Queirós (*) D epois de um primeiro livro de poesia, Raiz do Orvalho (1983), Mia Couto publicou um volume de contos — Vozes Anoitecidas (1986) — que definiu o seu estilo, marcado pelo modo como recorre aos idiomas e às oralidades tradicionais de Moçambique para alimentar uma incessante subversão criativa da língua portuguesa. Ainda reincidiria no conto, com uma recolha intitulada Cada Homem É Uma Raça (1990), antes de publicar, em 1992, o seu romance de estreia, Terra Sonâmbula, que muitos consideram ser a sua obra-prima e que dificilmente deixará de ser visto, no futuro, como um clássico da ficção africana. Escreveu- o no período final de uma sangrenta guerra civil que durava há 16 anos, e quando o livro se aproximava da sua conclusão, conta nesta entrevista (feita por e-mail), iniciavam- se as conversações que conduziriam ao Acordo de Paz entre a Frelimo e a Renamo. Em 2002, Terra Sonâmbula era escolhido por um júri internacional de académicos e políticos africanos como um dos 12 melhores livros africanos de sempre, lista que não inclui nenhuma outra obra em língua portuguesa. Trinta anos após o seu livro de estreia, Mia Couto recebeu agora o Prémio Camões, tornando-se o segundo autor moçambicano, depois de José Craveirinha, a ser distinguido com o mais importante prémio literário de língua portuguesa. Se o júri reconheceu a qualidade de uma obra que já conta dezenas de títulos nos mais variados géneros, da poesia ao conto e ao romance, e da literatura para crianças à crónica, este reconhecimento coincide também com um momento alto da criação de Mia Couto, que em livros como Jesusalém (2009) e o recente A Confissão da Leoa (2012) consegue, sem atraiçoar a sua voz, libertar-se de alguns efeitos de escrita que ameaçavam se tornar repetitivos. Filho de um jornalista português, Fernando Couto (1924-2012), que se tornaria, como poeta, jornalista e editor, uma figura de relevo das letras moçambicanas, Mia Couto já nasceu no país de adopção do pai — mais precisamente na cidade da Beira, a 5 de Julho de 1955 —, e era ainda estudante universitário quando se envolveu na luta contra o co- lonialismo português, militando na Frelimo. Um passado que não o tem impedido de manter, desde que Moçambique reencontrou a paz, uma atitude de autonomia crítica face aos responsáveis políticos do seu país. Preza tanto a sua independência que chega a recear sentir-se demasiado preso da sua condição de escritor. «Não me fascina a ideia de ser escritor a tempo inteiro», garante. E não é este Prémio Camões que o vai fazer mudar de ideais. Enquanto prepara um novo romance, baseado na história de Gungunhana, prossegue tranquilamente o seu trabalho como biólogo e responsável de uma empresa especializada em estudos de impacto ambiental. No fim de contas, talvez o escritor e o biólogo façam a mesma coisa: exaltar a diversidade. - Já tinha recebido vários prémios importantes, quer em Moçambique, quer em Portugal. Atribui uma importância diferente ao Prémio Camões, que até agora só contemplara um autor moçambicano, José Craveirinha? - Sim, atribuo. Cada prémio tem a sua individualidade, a sua geografia. Este traduz uma constelação de países e sensibilidades que supera os limites do meu país, do continente africano. Não se tratou apenas de «mais» um prémio. Mas de um galardão que tinha um nome e uma carga emocional muito própria. - O seu pai era poeta e o Mia Couto estreou-se com um livro de poemas. Embora se possa alegar que nunca deixou a poesia, já que a sua prosa tem óbvias dimensões poéticas, o facto de não ter voltado a publicar poemas durante muitos anos e de ter privilegiado a ficção foi simplesmente algo que aconteceu, ou sentiu que a ficção era a forma que lhe convinha para o que tinha a dizer, e designadamente para o que tinha a dizer sobre e para o seu país? - Acho que fui conduzido para este tipo de escrita pela realidade do meu país, onde uma enorme carga poética está patente nos assuntos da chamada «realidade». Essa carga esbate a fronteira entre o real e o surreal. As histórias que se contam e que compõem a oralidade rural e urbana não fazem essa distinção entre poesia e relato factual. Por outro lado, as falas em português são traduções muito livres e criativas das línguas bantus de Moçambique. Ao longo do tempo, fui percebendo como essas distinções entre prosa e poesia, entre realismo e fantasia eram construções tão inventadas quanto a minha própria ficção. E isso me encorajou a caminhar com um pé naquilo que, 13 Entrevista Sábado, 15 de Junho de 2013. por comodidade, chamamos de “mundo mágico” e outro pé naquilo que se convencionou chamar de «realidade». A expressão “realismo mágico” foi inventada por quem não compreendia como magia e realidade se mestiçam não apenas aqui, em África, ou na América Latina, mas em todo o universo humano. - A geração vista como fundadora da literatura moçambicana tem como figura tutelar um poeta, José Craveirinha, e é sobretudo formada por poetas. Embora o Mia Couto seja já da geração seguinte, e ainda que Craveirinha e outros autores também tenham escrito ficção, as futuras histórias da literatura irão inevitavelmente apontá-lo como um dos fundadores da ficção moçambicana. Sente essa responsabilidade? - Penso pouco nisso. Aliás, penso-me pouco como escritor. Os meus melhores momentos na literatura aconteceram quando não fui escritor. A escrita é uma casa que visito, mas onde não quero morar com receio que ela me devore. A minha responsabilidade é continuar a escrever exactamente como vinha fazendo. - É filho de um português, ainda que já tenha nascido em Moçambique, e escreve em português, por muito que se desvie deliberadamente da norma. Como é que encara o facto de ser um autor moçambicano, inserido no contexto de uma literatura ainda jovem e em fase de consolidação, e ao mesmo tempo, escrever na língua de Camões, de Eça, de Pessoa, e também de Machado de Assis, Guimarães Rosa, Drummond de Andrade? - Em muitos aspectos me aprendi como um uma criatura entre fronteiras: um branco que é africano; um ateu não praticante; um poeta que escreve prosa; um homem que tem nome de mulher; um cientista que tem poucas certezas na ciência; um escritor numa terra de oralidade. No início, esses mundos que em mim se cruzavam dificultavam uma visão unitária daquilo que pudesse ser a minha identidade. E isso atrapalhava-me. Depois, fui entendendo que essa pertença a múltiplos universos ajudava a me descobrir na minha condição plural, contrabandeando valores entre fronteiras. «Sou um poeta que conta histórias» - Publicou o seu primeiro romance, Terra Sonâmbula, no final da guerra civil, em 1992. Para narrar esse parto doloroso de uma nova nação, recorre a uma história dentro da história, com um constante jogo de espelhos entre ambos os planos. O protagonista, Muidinga, é uma criança que perdeu a memória (e com ela o fundamento da identidade), e que de algum modo a recupera através dos diários de um morto, que vai lendo alto a um velho, Tuahir. Noutro plano, este romance finta o português, criando uma língua que será ao mesmo tempo pura invenção e recriação da oralidade popular. É um livro que parece responder a tudo quanto se poderia exigir de um romance nacional «fundador». Foi deliberado? - Não foi. Nenhum livro meu obedeceu a um plano ou sequer a uma intenção que fosse consciente. Até começar a escrever esse livro eu estava convicto que nunca escreveria sobre a guerra enquanto ela decorresse. Só em paz se escreve sobre a guerra: era assim que eu pensava. Mas aconteceu que fui sendo assaltado, quase visitado por vozes e histórias, e comecei a escrever em finais de 1991. O romance Terra Sonâmbula foi o meu único livro que me doeu escrever. Eu acordava a meio da noite e era conduzido, como se a mim mesmo me desconhecesse, para um quarto onde escrevia de forma quase sonâmbula. O título do livro tem também a ver com essa condição de delírio em que a trama foi surgindo. Havia mortos recentes, amigos meus que perderam a vida de forma dramática no decurso da violência que assaltou o país. Não posso dizer que houve premonição mas à medida que eu ia fechando o livro se anunciaram as conversações que conduziram à assinatura do Acordo de Paz. Quando finalizei o livro, eu entendi: a escrita daquela história era a minha busca de sobrevivência depois de 16 anos de uma guerra civil que nos sufocou até à exaustão. Quem vive uma história assim sabe que a guerra, enquanto memória ferida, nunca mais sai de dentro de nós. - Terra Sonâmbula teve muito boa recepção crítica e é tido como um dos grandes romances africa- nos. Sentiu, depois de o publicar, a proverbial ansiedade do segundo romance? - Não me recordo. Eu tenho sempre a ansiedade do próximo romance. Não existe para mim carreira quando se trata de escrita literária: começa-se sempre do zero, desarmado e frágil como um menino que está no mundo para ser espantado. - Em declarações após a atribuição do Prémio Camões, Luís Carlos Patraquim afirmou que o considera «sobretudo um grande contista». De um ponto de vista apenas quantitativo, parece ter sido, de facto, mais contista do que romancista durante os anos 90, mas a tendência inverteu-se durante a última déca- da. Acha que Patraquim tem alguma razão? - Talvez. Mas eu acho que sou, sobretudo, um poeta. Um poeta que conta histórias. - Tem sido aproximado de Guimarães Rosa, com quem partilha, entre outros aspectos, o gosto pela invenção vocabular e sintáctica e a atenção à oralidade popular. No entanto, apesar destes óbvios sinais exteriores, não lhe parece que a sua obra terá talvez mais afinidades com a arte de contar histórias, com certo lirismo e humor, e também com o empenhamento social, de um Jorge Amado, do que com o mais estranho universo do autor de Grande Sertão: Veredas? - A ambição de um escritor (ou de qualquer outro artista) é cons- truir um universo tão próprio e único que não pode ser comparado a qualquer outro escritor. Eu tive influências várias e muitas, confesso, vieram do Brasil. Guimarães Rosa foi uma influência. Jorge Amado foi uma referência. Mas ambos me despertaram para a possibilidade de fazer uma outra coisa, de outra maneira. O Brasil convidava- nos para um caminho que era marcado pela desobediência aos padrões europeus e portugueses num momento em que nos procurávamos demarcar da portugalidade. Digo isto e devo salientar, ao mesmo tempo, que fui muito marcado pela poesia portuguesa: de Fernando Pessoa a Eugénio de Andrade, passando por Sophia de Mello Breyner, a Herberto Helder e O’Neill. 14 Sábado, 15 de Junho de 2013. Entrevista «Vivo a condição misturada de pai e filho desta Nação» - Talvez possa ver-se Terra Sonâmbula (1992), A Varanda do Frangipan (1996) e O Último Voo do Flamingo (2000) como uma espécie de trilogia que acompanha a história recente de Moçambique, da guerra civil aos problemas e contradições dos primeiros anos de paz. Com Vinte e Zinco (1999) a funcionar como um flashback ao final do período colonial. Apesar de muitas características se manterem nos romances posteriores, acha legítimo sugerir-se que, a partir de Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra, as suas histórias começam a estar mais soltas da história recente de Moçambique? - Para alguém que é mais velho que o seu próprio país, para alguém que combateu pela independência e que, por isso, vive uma condição misturada de pai e filho dessa nação, torna-se impossível distinguir a história pessoal da história do país. E há mais detalhes: eu sou um dos autores da letra do hino nacional. Quando revelei isto num encontro com jovens do Canadá, um deles perguntou-me: e o senhor ainda está vivo? Enfim, em Moçambique é tudo tão recente e tão intenso que tanto eu como a gente da minha geração sente que a mesma tinta que escreveu sua ficção é aquela que redigiu essa outra ficção que é a História nacional com H maiúsculo. - Quer A Varanda do Frangipani, com o assassinato de Vasto Excelêncio e subseqüente inquérito, quer, mais parodicamente, O Último Voo do Flamingo, com a investigação em torno da misteriosa morte dos capacetes azuis da ONU, aproximam-se do policial, género que hoje em dia parece estar a disseminar-se mais ou menos por toda a ficção. Mas, no seu caso, parece ter sido uma contaminação mais ou menos episódica. - Alguém disse que os romances tinham apenas dois temas: a viagem e um crime. Não sei se esta redução é correcta. Mas gosto de pensar que é necessário interrogar a realidade como se ali estivesse escondido um crime oculto. E esse crime é a idéia que nos fizeram criar da própria realidade: uma visão simplista, redutora e mecanicista. Para além disso, disseram-nos que havia apenas uma versão do que são o nosso mundo e a nossa história. Essa imposição é um crime porque nos impede de viajar para outras dimensões da vida. Que o leitor seja convidado a perder familiaridade com o seu próprio universo e passe a actuar como um detective procurando evidências do que não é visível e apenas pode ser adivinhado: talvez isso seja um jogo que me apraz criar. - Um elemento presente em toda a sua obra é a tendência para nomes que nos dão indicações sobre as personagens que nomeiam, como o já referido Vasto Excelêncio. Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra é, nesse aspecto, exemplar, com os seus Abstinêncio, Miserinha ou Ultímio. A pergunta é se este expediente não acaba por condicionar as personagens, tornando-se eventualmente inadequado para figuras complexas e contraditórias, e se não é por ter consciência disso que raramente o aplica aos seus protagonistas. - A ideia que quero transmitir é que esse nome é falso, que os personagens estão para lá da realidade de uma identidade simples, que não podem responder perante um teste de veracidade. Eu estou, à partida, a anunciar que aquilo é mentira, e que não quero ajuizar o que se conta pela sua verosimilhança. Mas devo dizer também que, em Moçambique, é quase regra as pessoas terem dois nomes, o de casa e o da rua; o da privacidade e o nome público. Na maior parte das vezes, esses dois nomes não têm nada a ver um com o outro. Eu sou um exemplo dessa dualidade. O meu nome é António, mas eu sou Mia. Como se essa multiplicidade de nomes autorizasse uma pluralidade de vidas. 15 Entrevista Sábado, 15 de Junho de 2013. «Não há colonialismo sem racismo» - Falando agora um pouco do seu trajecto mais político e de cidadão. Aderiu à Frelimo quando era estudante universitário. O que é que o levou à militância? - Eu nasci e cresci numa cidade em que não foi preciso ninguém vir consciencializarme politicamente. A realidade era crua e dura e as injustiças estavam à flor da pele do quotidiano. É verdade que os meus pais nos educaram com princípios que entravam em choque com a ideologia colonial e a ordem fascista. Mas o primeiro sinal de consciência foi o racismo. Há quem defenda que a colonização portuguesa foi menos racista que as outras colonizações. Não é verdade, não há colonialismo sem racismo. Nenhum povo é «naturalmente» racista. São os regimes que manipulam e valorizam a discriminação social e racial. E era isso que sucedia e eu entrei cedo em conflito com os sinais dessa desigualdade. - Vinte anos depois do acordo que devolveu a paz a Moçambique, parece estar bastante desencantado com alguns aspectos do rumo que o país tem levado. No seu livro Pensatempos, que recolhe textos de opinião, critica, por exemplo, o crescente abismo entre as cidades e o país rural, o novo-riquismo ou a corrupção. Sentese defraudado? - Defraudado não com o passado de militância mas com o que se tornou a realidade dominante no país e na Frelimo, onde combati por valores que me parecem agora esquecidos. Aconteceu com a Frelimo o mesmo que sucedeu com organizações revolucionárias que defendiam mudanças radicais a favor dos trabalhadores e dos oprimidos e que, depois de tomarem o poder, acabaram por gerir as sociedades que proclamavam querer mudar. Mas eu estou grato a um processo longo de aprendizagem. Não acho que haja culpados e entendo que havia, dentro de mim, uma grande ingenuidade, não nas intenções de mudar o mundo mas no entendimento simplificado desse mundo. - «A maior desgraça de uma nação pobre é que em vez de produzir riqueza, produz ricos», escreve num texto em que retrata bastante impiedosamente os novos “endinheirados” do seu país. Não lhe parece que, descontadas algumas especificidades menores, a sua descrição se adaptaria a muitos outros países que conhece, incluindo Portugal? - Não quero comentar sobre a realidade de um país em particular. Mas vivemos globalmente um sistema que é fabricador de miséria e de desigualdades. - Um dos membros do júri que lhe atribuiu o Prémio Camões, José Carlos Vasconcelos, disse que a sua obra «foi, inicialmente, muito valorizada pela criação e inovação verbal», mas que tem vindo a mostrar «uma cada vez maior solidez na estrutura narrativa e capacidade de transportar para a escrita a oralidade». Se pensarmos no seu romance mais recente, A Confissão da Leoa, parece haver, de facto, uma certa atenuação dessa «ino- vação verbal» mais ostensiva, talvez secundarizada pelo desejo de contar bem uma história digna de ser narrada. Admite que manter o grau de invenção vocabular habitual na sua obra poderia levar a um efeito de esgotamento? - Eu mesmo me esgotaria perante mim mesmo se escrevesse sempre do mesmo modo. O meu intuito é que me surpreenda e coloque em causa algo que possa funcionar como uma zona de conforto, um estilo acomodado e previsível. A contenção é uma das conquistas que o escritor alcança com o tempo. E isso sucedeu comigo. Só continuarei a escrever se encontrar modos de me questionar e ousar novos estilos e narrativas. - O que é que pensa do Acordo Ortográfico? - Já respondi a essa pergunta tantas vezes que deixei já de pensar sobre um assunto que, para mim, é quase um «não assunto». Eu acho que perdemos uma oportunidade para debater assuntos que serão talvez mais sérios que o acordo ortográfico. Por exemplo: por que razão ainda nos desconhecemos tanto entre os países de língua portuguesa? O que podia ser feito para incentivar a circulação dos livros e das produções culturais? - Na literatura de língua portuguesa, quem são os seus autores de referência? - Já respondi. - E que autores moçambicanos recomenda aos leitores portugueses? - Recomendo todos. «A Biologia não atrapalha o exercício da Literatura» - Está a escrever um novo livro, que evocará a figura de Gungunhana. Vamos ter o seu primeiro romance histórico? - Não será exactamente um romance histórico, mas um texto que dialoga com a História. Antes, eu já tinha escrito O Outro Pé da Sereia. Que também não tinha a pretensão de ser um texto histórico. A minha intenção é mostrar como a História oficial, enquanto construção social e ideológica, responde a necessidades e interesses de classe. E o caso de Gungunhana é muito curioso: porque a sua figura foi ficcionada por interesses em Portugal e Moçambique. No final do século XIX, o regime colonial português precisava confirmar internacionalmente a sua capacidade de ocupação e domínio dos territórios africanos. Por isso empolou a importância de Gungunhana num momento em que este estava em pleno declínio. Quanto maior fosse o inimigo maior seria a glória da sua vitória. A nova nação moçambicana, por outro lado, procurava heróis que se apresentassem como “resistentes nacionalistas”. Ora a ideia de nação moçambicana nunca esteve na mente de Gungunhana que geria com dificuldades um império que, como todos os impérios, se fez com glória e sangue. E esse império tinha uma geografia e uma narrativa que em nada coincidiam com a nação moçambicana. - O sucesso da sua obra nunca lhe pareceu razão suficiente para se dedicar à escrita a tempo inteiro. É biólogo e gere uma empresa de estudos de impacto ambiental. Um trabalho que terá contribuído para esse conhecimento profundo do país que os seus livros revelam, e que no fim de contas talvez partilhe com a sua escrita o mesmo propósito de preservar a diversidade… - Não quero nem levar-me muito a sério como “escritor” e nem eliminar em mim a diversidade de coisas que gosto de fazer. Sou o que sou porque me distribuo por afazeres múltiplos. A exaltação da diversidade é algo que me move como cidadão, como escritor e como biólogo. Na verdade, a capacidade de produzir diversidade é o segredo maior da sobrevivência da nossa espécie. Veja-se a amplitude das diferenças entre irmãos e entre gerações de uma mesma família. Estamos oferecendo à vida alternativas várias que possam funcionar como resposta a mudanças do ambiente que se verifiquem. - O biólogo ajuda o escritor? - Não vejo como a biologia pode atrapalhar o exercício da literatura. O que mais me fascina na biologia é que ela conta uma história, e possivelmente a mais fascinante de todas as narrativas: a história da vida e da nossa própria espécie. Não me fascina a ideia de ser escritor a tempo inteiro. Como já disse: gosto de ser escritor exactamente na mesma medida em que gosto de deixar de ser escritor. E nesse distanciamento poder olhar a escrita a partir de fora, com a enriquecedora lonjura de um viajante antes de iniciar a viagem. Nota: Entrevista publicada a 7 de Junho. Alguns títulos são da responsabilidade do SA. 16 Sábado, 15 de Junho de 2013. Opinião Direito de Resposta BNA contesta «imprecisões» do colunista Paulo de Carvalho Prezado Sr. Director, Antes de mais queira aceitar os nossos melhores cumprimentos. Em artigo de opinião publicado na vossa edição de 8 de Junho de 2013, tendo como pano de fundo uma visita imaginária ao Banco Nacional de Angola, são abordadas matérias que, pela imprecisão e susceptibilidade de induzir o público leitor em erro, solicitamos, ao abrigo do direito de resposta, a publicação desta breve nota. O Banco Nacional de Angola tem procurado manter a sociedade regularmente informada sobre o conjunto de reformas que vem introduzindo no sistema financeiro, sobretudo com o sentido de preservar o equilíbrio entre os objectivos de crescimento das instituições financeiras e os direitos dos consumidores de produtos e serviços financeiros. Assim, dadas as imprecisões e descuidos do artigo de opinião acima referido, capazes de induzir os leitores em erro, gostaríamos de esclarecer o seguinte: Nova família do Kwanza Foi preocupação do Banco Nacional de Angola, ao introduzir uma nova família do Kwanza, assegurar a melhoria dos padrões de segurança, tornando a confirmação de autenticidade mais fácil a todos, mas realçando tanto nas notas, como nas moedas metálicas, o património e a identidade cultural do nosso país. No caso das moedas metálicas, destaca-se a ornamentação com elementos de cestaria e de tecelagem que serviram como meios de pagamento pelos nossos ancestrais. Confundir estes elementos distintivos da nossa identidade cultural com os existentes em qualquer outra moeda, parece-nos exagerado e forçado. No entanto, se se pretende referir à opção do bimetal, devemos então esclarecer não se tratar de uma inovação. De facto, por questões de segurança, a mesma tem sido adoptada por muitas das entidades emissoras de moeda. Na nossa região, podemos citar os casos actuais da África do Sul, Botswana, Moçambique, Malawi, Namíbia e Zimbabué. Apesar da aceitação bastante positiva pelos cidadãos, o Banco Nacional de Angola mantém a monitorização da reintrodução da moeda metálica na economia, avaliando e ajustando o curso e as opções de colocação, com o sentido de garantir e intensificar o uso da mesma. Subsistema de Pagamento Automático A rede Multicaixa é, actualmente, uma realidade incontornável e uma das histórias de sucesso do nosso sistema de pagamentos, não obstante o reconhecimento das possibilidades de melhoria, algumas dependentes dos serviços de telecomunicações e do fornecimento de energia eléctrica da rede pública, e outras da eficiência dos próprios bancos comerciais. No final do mês de Maio, o sistema contava com 1.330.381 cartões activos, ou seja, com movimentos regulares nos Terminais Automáticos de Pagamento (TPA) e Caixa Automático (CA). Somente no mês de Maio último, registámos um aumento de transacções, em CA, de cerca de 18,3%, comparado com o mês homólogo, em 2012, enquanto que nas transacções em TPA o aumento foi de 65,5%. Ainda na rede Multicaixa, o crescimento em pagamento de serviços foi de 41,8% e nas transferências bancárias, o mesmo foi equivalente a 147,5%. Não estando em causa a utilidade e a importância do subsistema de pagamentos automático, e não sendo o mesmo uma preocupação nova, está em curso a revisão de procedimentos operacionais para a melhoria dos indicadores de disponibilidade da rede Multicaixa, com o engajamento do Conselho Técnico do Sistema de Pagamentos de Angola, órgão de aconselhamento integrado pelos bancos comerciais e pela Empresa Interbancária de Serviços. Quanto à designação «Multicaixa», trata-se apenas de uma marca e não da natureza do serviço de pagamentos. As marcas, regra geral, são registadas e não admitem cópias ou réplicas não autorizadas. Em Cabo-Verde, por exemplo, a rede de pagamentos chama-se «Rede Vinti4», em Moçambique «Rede Ponto 24» e no Brasil «Banco 24 Horas». Tratamento de Reclamações Convindo assegurar a protecção dos direitos dos consumidores de serviços financeiros, o BNA estabeleceu regras específicas para o tratamento de reclamações, pelas instituições por si reguladas, de acordo com o Aviso n.º 02/11 de 1 de Junho, e criou também uma unidade orgânica para tratamento das reclamações apresentadas. Para além da via escrita, está disponível o Portal do Consumidor de produtos e serviços financeiros na página electróni- ca: www.consumidorbancario. bna.ao, onde o consumidor pode apresentar quaisquer reclamações e ter acesso a um conjunto de elementos com pendor educacional sobre o funcionamento do sistema financeiro bancário, pelo que recomendamos a sua consulta. Os resultados da acção de inspecção comportamental do BNA podem ser consultados no seu relatório e contas de 2012 ou nos relatórios semestrais de estabilidade financeira, disponíveis na página electrónica www.bna.ao. Finalmente, e porque os canais de comunicação do BNA são conhecidos e se mantêm à vossa disposição, solicitamos que, em situações futuras, ao invés de viagens e entrevistas imaginárias, sejam contactados os nossos serviços para esclarecimentos que entendam de interesse público e assim melhor contribuir para o fortalecimento e melhoria dos serviços prestados pelo nosso sistema financeiro. ■ Luanda, 12 de Junho de 2013 Gabinete de Comunicação Institucional 17 Opinião Sábado, 15 de Junho de 2013. N A invasão chinesa à África a semana passada, houve uma notícia que foi manchete em vários órgãos de comunicação internacionais - a expulsão, pelo governo ganense, de centenas de chineses que estavam envolvidos no garimpo de ouro. Até o «New York Times» fez uma reportagem em que falava-se de como muitos chineses que sonhavam fazer fortunas com o ouro do Gana tinham que regressar para a sua terra-mãe sem nada. ~ Em certas reportagens, sentia-se certa atitude contra as autoridades ganenses, especialmente as policiais, que são descritos como corruptas e ineficientes. O mundo talvez esteja muito interessado no relacionamento entre os chineses e africanos, porque quer se saber quanto tempo é que a lua de mel entre a China e a África vai durar. Felizmente, há muitos africanos que estão conscientes de que este relacionamento vai ter que ser na base do respeito dos interesses mútuos. Como vários africanos vão afirmando, a China não está no continente por uma questão de benevolência. Os chineses precisam de recursos naturais que se encontram em abundancia no continente africano. E os qfricanos precisam do «know-how» e tecnologia chineses, assim como o seu capital. Há sempre o risco da dinâmica dos acontecimentos favorecer uma parte da equação - neste caso, a parte chinesa. Os africanos vão ter que ser capazes de defender os seus interesses. O Gana é um país cada vez mais democrático, onde os cidadãos comuns têm, cada vez mais, uma voz de peso na gestão das suas vidas. Na BBC, ouvi camponeses ganenses na área em questão que disseram que temiam pelo meio-ambiente da sua região. É que, segundo eles, , a exploração ilegal do ouro estava a resultar numa degradação do solo e das florestas; aqui não era só a existência de buracos por todo o lado, mas também a poluição da água pelos químicos que os garimpeiros usavam para extrair o ouro. Os ganenses estavam quase desesperados; o que estava em questão era a sua própria sobrevivência. Conheço certos casos de países africanos, como a Tanzânia, onde a disputa sobre as terras e exploração de ouro resultou na utilização pelas autoridades de mão de ferro para conter os camponeses. Ainda na Tanzânia, já vi camponeses africanos a serem agredidos por guardas nepaleses. Eles queixavam-se das empresas que estavam a explorar o ouro, mas estas diziam que lá estavam com a «bênção» do governo central – o que é que contava mais. Neste caso do Gana, felizmente, o governo central parece estar do lado dos camponeses. Usualmente, em casos destes, prefiro sempre imaginar a situação ao contrario. Há alguns anos atrás, a revista «The New Yorker» fez uma reportagem sobre pequenos empresários nigerianos na China. As autoridades chinesas, naturalmente, queriam que o influxo nigeriano no país fosse limitado, por uma questão de manutenção da paz social, contenção do c rime e por aí. Li, recentemente, uma reportagem sobre empresários africanos que se instalaram na Índia. Estes sofrem com o ra- cismo mais primitivo que se pode imaginar: abusos verbais e físicos, numa constante marginalização. Mas, o mundo não se inquieta assim tanto com a sorte destes africanos. Suspeito que muitos defenderão que eles devem ser mesmo deportados para o continente donde saíram e ponto final. No Iraque, Síria, Líbano e mesmo em Israel, há imigrantes africanos que são forçados á regressar às suas áreas de origem, por causa do racismo. Há esta noção, bastante errada, de que o africano tem muito pouco a dar ao resto do mundo. Fala-se de um mundo globalizado, no qual as pessoas podem ir à procura de fortunas seja lá onde for. Temos, então, o investidor que vai aplicando o seu capital por todo lado. Os chineses no Gana chegaram depois de toda a pompa que seguiu ao investimento chinês no sector da eletricidade, fornecimento de água, estradas, etc.. Kwame Nkrumah, primeiro Presidente do Gana e grande panafricanista, sonhava ter um país industrializado. Desta vez, parecia que os chineses haveriam de ajudar na realização deste sonho. Só que o investimento chinês trazia consigo mão de obra própria; ate os carrinhos de mão eram operados por chineses. E estes chineses foram, naturalmente, identificando outras oportunidades – incluindo o garimpo de ouro. Segundo a lei do Gana, só os nativos é que podem explorar o ouro em pequena escala – mas eles podem interagir com estrangeiros que invistam nas operações. De repente, passou haver muitos chineses a explorar o preciso metal, usando ganenses como testas de ferro. Muitos nativos não viam isto com bons olhos, tendo havido atritos que obriaaram os chineses a armarem-se. De repente, havia chineses armados até aos dentes – as armas vinham principalmente da polícia – a vigiarem o que eles viam como suas minas de ouro. Uma da autoridade ganense disse que se tinha atingido o ponto a partir do qual se passara a tratar a coisa como uma questão de segurança. Agora imaginem milhares de trabalhadores ganenses armados numa região da China! Quando, no século dezoito, certos exploradores europeus viajavam pelo o interior de África, a sua riqueza natural implantava neles sonhos de imensas fortunas. Os africanos, claro, serviriam de um elenco lá no fundo para a realização destes sonhos. O Rei belga tratou o Congo e os seus nativos como se fosse propriedade sua: os africanos que não atingissem as quotas de produção eram punidos severamente. Mas isto tudo era justificado na base de que o soberano, numa missão civilizadora, estava a espalhar o cristianismo e o saber. Os estereótipos dos africanos de então ainda existem hoje: são tidos como preguiçosos e não inspiradores de confiança. Dizia-se que o preto só ia mesmo à chicotada. Há alguns meses atrás, falando sobre as tensões nas minas entre gerentes chineses e trabalhadores zambianos, ouvi um chinês a dizer que havia uma questão de cultura: os chineses e zambianos, segundo ele, não partilhavam a mesma cultura de trabalho. Claro que os zambianos tinham, neste contexto, que se adaptar à cultura dos chineses, os santos investidores. Voltemos, porém, ao Gana. Os ganenses são pequenos-grandes comerciantes; eles singram em toda parte do mundo. Suspeito que mesmo o capital que fez com que certos chineses surgissem para a exploração de ouro existe no país. O que deve faltar é uma cultura de transparência. Há ganenses com licenças de exploração de ouro, mas que não estão minimamente interessados em saber sobre os pormenores dos processos – como o seu efeito no meio ambiente. Para certos possuidores destas licenças, o que contava mais eram as ligações com as autoridades políticas no governo central. O processo da concessão de licenças para a exploração de minerais está a agora a ser revisto no Gana. Fala-se actualmente de exploração que envolve a comunidade, em que as coisas são feitas propriamente. Os chineses podem lá ir, mas terão que ser enquadrados num sistema do qual todos ficam a ganhar. Mesmo tarde, os africanos comuns estão a despertar! ■ 18 Sábado, 15 de Junho de 2013. Opinião A lei da contratação pública e a fiscalização das obras O maior mérito subjacente na publicação da lei da contratação pública, parece ainda está por se apurar: a transparência a que sujeita os agentes da administração pública, ou o enquadramento correcto das obrigações e deveres dos vários «actores» em obras públicas? Contudo, julgo haver nesta lei não apenas um mérito, mas notáveis e múltiplos avanços para o alcance dos objectivos a que qualquer Estado se deve propor alcançar em matéria de sã concorrência, transparência e defesa do interesse público. Já algumas vezes tentei elucidar o público leitor deste semanário acerca das grandes linhas de força deste dispositivo legal, que considero mais que perfeito. A sua aplicação, com competência e sabedoria, pode trazer ao empresariado nacional novas conquistas e vantagens, quer económicas como técnicas e realmente práticas há muito esperadas. Do ponto de vista meramente prático, a lei da contratação pública trás enormes vantagens ao empresariado porque o estimula e oferece garantias de igualdade e isenção na tomada de decisão para as adjudicações que sempre foram um verdadeiro quebra-cabeças, um processo gerador de conflitos e de maus presságios, suspeições semeadoras de ambientes de insegurança quanto ao futuro. Tudo, pela forma promíscua em como se processava, em vários lugares e instituições completamente encobertos por uma medonha escuridão, os quais deitavam por terra a lealdade concorrencial e afastavam injustamente muitos empresários de boa-fé. Com a lei 20/10 em movimento, o cenário dantesco atrás descrito toma outro rumo. É agora possível promovermos um cerrado combate à ineficácia concorrencial e aos desperdícios financeiros. Mais do que uma simples norma legal, a lei da contratação pública faz renascer a paz no sector da construção e endireita a «árvore» que estava torta, dando novo fulgor aos seus «troncos» empresariais mais promissores. Mas a constatação pode não passar de simples formulação de princípios. Precisamos agora processar os mecanismos práticos da aplicabilidade dos seus mandamentos e recomendações, agora mais destacados, para atingirmos o desiderato. A recente pronúncia do governo central de que haverá bolsas de consultores para uma materialização mais segura dos princípios e regras, agora melhor reconhecidas, é um sinal de bom começo, e, para complementar, a fiscalização prévia do Tribunal de Contas associada à fiscalização das empreitadas com profissionais de fiscalização de empreitadas de obras públicas, conhecedores da lei, completará de forma exitosa o quadro. Ficaríamos todos imensamente gratos à Assembleia Nacional pela publicação da lei se na prática ela for aplicada. No caso contrário, seria uma decepção, tal como por vezes acontece cm determinados diplomas legais que caem no esquecimento ou em desuso. Ao referirmo-nos à central de compras para uma gestão parcimoniosa e tecnicamente sustentável nos processos de contratação pública, estamos dando um indício de grande valia para incentivar investidores nacionais e estrangeiros. Ao fazermos referência às obrigações do dono da obra pública posta a concurso, estamos a responsabilizar o agente do Estado. Ao procedermos deste modo, podemos agir com impugnação judicial e proceder em conformidade contra a falta de transparência e contra a corrupção nos processos de adjudicação de obras. Aqui está um ganho. Quem tem acompanhado as últimas palavras, e os actos do Chefe de Estado angolano, não pode desmentir que as preocupações deste para com o fenómeno da corrupção aumentaram sobremaneira, sobretudo no domínio da construção, e não é por acaso que foi muito recentemente orientado um seminário neste sentido mais crítico da situação, com reflexos na lei 20/10, de modo a colocarmos os traços nos tês e os pontos nos seus devidos lugares. Faço votos de que a luta pela valorização e inclusão mais substancial do empresariado nacional no ramo da construção civil e engenharia em Angola seja um facto a breve trecho. O país está em festa. Aliás, os construtores estão em festa: ainda mal se procedeu à remodelação do elenco governativo do sector para dar lugar a novas transformações sob a liderança de uma plêiade de novos cérebros, e logo de seguida o governo sublinha e faz eco da lei da contratação pública. O que pode isto significar? Em primeiro lugar, a expressão de uma nova vontade de alterar o rumo do crescimento para caminhos mais sérios e responsáveis. Em segundo lugar reanimar os pequenos e médios empresários nacionais para aderirem ao investimento no sector. Em terceiro lugar conferir aos órgãos da justiça um instru- mento mais esclarecido em pormenor e no seu todo, com o claro propósito de garantir uma responsabilização e sancionamento mais expedito daqueles que teimarem em prevaricar e obstruir o desenvolvimento no sector da construção e obras públicas. Já me habituei a críticas e ao apontar de dedos quando me refiro à transparência e à fiscalização profissionalizada. Algumas vozes discordantes, que me abordam directa ou indirectamente, referem que o nível de exigências que defendo com tanto entusiasmo não moverá um único fio de cabelo ao mais pequeno dos teimosos agentes do Estado daqueles que faltam à palavra e violam a lei para colherem fabulosos dividendos. Dizem também que a formação de ilhas não garante um combate à corrupção de modo eficaz, e, portanto, só uma acção generalizada de combate combinado ao nível de toda a extensão multifacetada da vida social e cultural poderá ajudar a alterar o quadro no sector. Eu insisto na esperança de que com uma lei do calibre a que nos referimos, pela contratação pública com maior rigor e responsabilização, é possível sim alcançarmos novos horizontes e novos indicadores de transparência e eficácia no processo de adjudicação de obras. A lei da contratação pública dá pistas e explica os métodos a adoptar para conduzir com êxito e montar estratégias de salvaguarda do interesse público como nenhuma outra lei que conheça o faz. Basta uma consulta às suas alíneas e artigos para nos darmos conta que tudo vem devidamente explicado. E é só seguir a rigor os passos que se apontam à cada um dos intervenientes: o dono da obra; o projectista; o empreiteiro e o fiscal, para atingirmos níveis de eficácia e eficiência máximos. A cada um destes actores é especificado o seu papel e a cada um é definido um quadro de responsabilidades. A par disso, a lei explica como podemos guindar aos maiores patamares os empresários nacionais para que se observem equilíbrios na defesa dos interesses em jogo, quer para dar mais fôlego ao desenvolvimento da nossa classe empresarial, quer para forçar a aproximação amistosa e salutar entre empresários com disparidades tecnológicas ou financeiras acentuadas, por vezes colossais e esmagadoramente inconcebíveis. A ver vamos se com a sua aplicação, sobretudo ao nível da fiscalização, a lei da contratação pública vingará. ■ 19 Opinião Sábado, 15 de Junho de 2013. Fundamentos para a educação dos surdos angolanos (2) «A identidade surda não se constrói no vazio. Forma-se no encontro com os pares e apartir do confronto com novos ambientes discursivos. No encontro com os outros, os surdos começam a narrar-se, e de forma diferente daquela através da qual são narrados pelos que não são surdos», sustenta Nídia de Sá Nuno Álvaro Dala Jr. (*) O entendimento sobre a questão das identidades está directamente relacionado com a noção de linguagem, porque a constituição da subjectividade dã-se pelo exercício do poder da linguagem. Para Nídia de Sá (1998, p. 170), «as principais mudanças […] começaram a se delinear quando o entendimento sobre a linguagem e as possibilidades abertas por ela na criação da cultura passaram a colocar a intersubjectividade como categoria epistémica principal». Segundo ela, «a identidade surda não se constrói no vazio, forma-se no encontro com os pares e apartir do confronto com novos ambientes discursivos. No encontro com os outros, os surdos começam a narrar-se, e de forma diferente daquela através da qual são narrados pelos que não são surdos. Começam a desenvolver a identidade surda, fundamentada na diferença. Estabelecem, então, contactos entre si e, através destes, fazem trocas de diferentes representações sobre a identidade surda. Assim, autoproduzem significados a partir de informações intelectuais, artísticas, técnicas, éticas, jurídicas, estéticas, desenveolvendo, então, certa cultura; é dessa autoprodução que surgem as culturas surdas». Prosseguindo: «Quando as pessoas surdas se conscientizam de que pertencem a uma comunidade/cultura diferente […] essa consciência as fortalece para oferecer resistências às imposições de outras comunidades/culturas dominantes […] é dado conhecido que cerca de 96% da população surda no mundo constitui-se de de surdos filhos de pais ouvintes. Diante dessa realidade, o aspecto fulcral não é tanto o linguístico, o comunicativo ou o cognitivo, mas o aspecto identitário, pois os surdos, desde o nascimento, se deparam com uma série de cons- truções identificatórias que se iniciam com as expectativas dos pais – geralmente ouvintes usuários de uma língua à qual os surdos não podem ter acesso natural. A imagem e as representações sociais sobre a surdez e os surdos começam a se construir desde as primeiras experiências na família, e sob forte influência de especialistas. Não é raro em países em ‘desenvolvimento’ verificarmos diagnósticos tardios e atitudes de desinteresse e impotência diante da surdez, expressos por pais e educadores. Inúmeras crianças surdas são deixadas à própria sorte, sem expectativas de obterem educação e sucesso na vida, principalmente em regiões mais carentes. A esmagadora maioria dos surdos nasce em famílias afastadas da sua identidade ‘nativa’ … Isso perturba o estabelecimento da identidade de qualquer criança». O caso de Angola Em Angola, ainda impera a visão anatómico-físio-patológica sobre os surdos inseridos na es- cola, e a quase totalidade dos professores, defectólogos, psicólogos e sociólogos «ligados» à educação de surdos nem sequer admite o conceito de identidade surda. Apenas alguns surdopedagogos e linguistas correspondem ao quadro de conhecimentos transversais, amplos e profundos sobre os surdos como pessoas possuidoras de identidade própria. O diagnóstico tardio da surdez e a visão médico-terapêutica, ou anatómico-físio-patológica, da surdez inviabilizam a vida escolar precoce do surdo angolano, dificultando seriamente a possibilidade de construção da identidade surda. Por outro lado, o oralismo e a comunicação total são dois obstáculos à construção da identidade dos surdos angolanos inseridos na escola (o uso da Lingua Angolana de Sinais por parte dos professores é exíguo, pois a quase totalidade deles não tem sólida e exaustiva formação académico-científica na LAS, que lhes daria possibilidades de compreender os lementos identitários surdos, pois, tal como já foi apontado, a língua de sinais é o principal portal de acesso à cultura surda, esta que é um reflexo material e imaterial da identidade surda). Por outro lado, «não devemos ficar plenos de escrúpulos para reconhecer que os surdos vivem em condições de subordinação, como em uma terra de exílio» Nídia de Sá, 2006, p. 129; Perlin, 1998, p. 11. Língua natural A língua de sinais é o idioma natural dos surdos por ser produto da surdez como substrato cultural e identitário das pessoas nessa condição. A língua oral é adquirida através da audição e é articuldada e desenvolvida por via dos órgãos da fala (lábios, dentes, língua, palato, etc.). No caso da língua de sinais, esta é adquirida através da visão e é articulada e desenvolvida por via dos membros superiores. De modo que a língua oral é auditivo-oral; a língua de sinais é viso-gestual. Assim como pela combinação de um número restrito de sons (fonemas) cria-se um leque vasto de unidades dotadas de signifi- cado (palavras), com a combinação de um número restrito de unidades mínimas na dimensão gestual (queremas) pode-se produzir um grande número de unidades com significado (sinais)’ – Stokoe, W., Sign Language Structure: a outline of the Visual Communication System of the American Deaf Studies Linguistics, 1960, V. 8. «Os trabalhos da linguística pós-estruturalista avaliaram o estatuto linguístico das línguas de sinais como línguas naturais e como sistemas a serem diferenciados das línguas orais: o uso do espaço como valor sintáctico e a simultaneidade de aspectos gramaticais são das restrições levantadas pela modalidade viso-espacial, que determinam sua diferença estrutural e funcional em relação às línguas auditivo-orais» - Skliar, 1998b, p. 24. Portanto, as línguas de sinais são idiomas autênticos, dotados de elementos que os definem como tal, e frise-se que «língua natural, aqui, deve ser entendida como uma língua que foi criada e é utilizada por uma comunidade específica de usuários, transmitida de geração em geração e que muda - tanto esrtrutural como funcionalmente – com o passar do tempo […] qualquer língua pode ser considerada natural independentemente da modalidade que utilize» - Nídia de Sá, 2006, p. 134. Concordamos com Nídia de Sá e Carlos Skliar que alertam que «se costuma enfatizar que a dificuldade no uso da língua de sinais no sistema educacional reside no facto de esta língua não ser a língua dos professores. Mas o questionamento deve vir exactamente por via contrária: são os professores ouvintes que não conhecem a língua de sinais dos alunos surdos […] a questão é muito mais ampla: não é o facto de os surdos utilizarem outra língua que deve ser discutido com ênfase, mas o poder linguístico que exercem os professores e o consequente processo de deseducação». ■ (*) Linguista. Surdopedagogo 20 Sábado, 15 de Junho de 2013. Opinião Nós e o Português que mal falamos e pior escrevemos! Isaac Paxe A s redes sociais ( particularizamos aqui o Facebook) têm se revelado numa fonte útil para questões de estudos. No caso deste texto, elegemos o Facebook e o uso que nele se faz da língua portuguesa e toda «conversa» à sua volta como tema a abordar. O Facebook tem-nos proporcionado dois segmentos de análise. O primeiro é o grupo de pessoas «conscientes» que já andam sem fôlego devido aos constantes maus tratos que a língua portuguesa é submetida pelos utentes angolanos nas suas publicações nas redes sociais, na imprensa e, a mais extasiante, a pobreza linguística demonstrada por muitos estudantes universitários e até licenciados nos seus discursos escritos e/ou falados. O segundo é a tormenta de erros de muitos utentes do Facebook. O sistema de escrita nas redes sociais, via corrector ortográfico automático e outras ferramentas linguística disponíveis, permite a edição dos textos. Porque então a publicação de textos com tantos erros? Não vamos nos juntar aos coros de lamentações ou de julgamento sobre a qualidade do domínio da língua portuguesa dos outros. Pelo contrário, como o braço que recua para dar consistência e eficácia ao arremesso a fazer, viajaremos na história da língua portuguesa entre nós. É do conhecimento geral que o Português foi introduzido em Angola durante o período da colonização portuguesa, com o seu triste projecto civilizatório. Logo, o Português chegou entre os povos que antes habitaram este território que chamamos Angola como uma língua estrangeira. E como são adquiridas as línguas estrangeiras numa determinada comunidade? As línguas estrangeiras podem ser adquiridas por processos formais ou informais. Os processos informais são aqueles que resultam da interacção natural dos actores sociais durante o processo de socialização. Neste processo, devido às necessidades imediatas de comunicação, privilegia-se a aquisição de vocabulário suficiente para estabelecer a ponte, desde que não se verifique um bloqueio comunicativo. Por isso, a correcção linguística é substituída pela imediata necessidade de comunicação para se levar o negócio adiante. Já nos processos formais, as línguas são estudadas em estabelecimentos afins, como a escola, e supervisionada por instrutores que garantem que a sua integridade, em todas as dimensões, seja salvaguardada. Para além dos supervisores, o processo é sustentado por especialistas que concebem os conteúdos do estudo, a didáctica necessária e também as especificidade de cada grupo de instruendos. Não é um processo simples e requer a contribuição de várias áreas do saber cientifico, como a linguística, a sociolinguística, a psicolinguística, a neurociência, a antropologia, a sociologia, a história, a fisiologia, a filosofia, etc.. Para o caso do Português em Angola, ele foi o principal instrumento de discriminação colonial. O estatuto do indígena, entre outros factores, apoiava-se no não domínio da língua portuguesa para recusa da outorga da cidadania portuguesa aos milhões de angolanos. Em 1960, mais de 90% da população negra angolana era indígena e não instruída. Se a população não era instruída, qual era o processo de aquisição da língua portuguesa? Era o processo informal resultante da interacção com os portugueses, com os colonos. Porém, acontece que a maior parte dos portugueses que povoaram Angola, eram eles próprios analfabetos, logo, com fraco domínio da língua portuguesa. É assim que em 1975, ano da independência, os mais de 90% de analfabetos angolanos continuavam presentes nas estatísticas. Com a independência, pensamos um novo país, mas a língua portuguesa manteve-se como o instrumento linguístico oficial, exigindo para isso o seu uso nos actos oficiais, entre eles a educação. Na educação, a escola abriu-se para todos angolanos. A massificação do ensino levou para a escola todos aqueles outrora segregados. Porém, a imposição da língua portuguesa colocou outros desafios ao processo de educação. A língua portuguesa foi o principal factor do fracasso escolar dos poucos nativos que chegavam à escola. O que foi pensado, no âmbito da política de educação de então, para que a língua portuguesa fosse de domínio dos utentes da escola e, com isso, de melhor domínio da sociedade no geral? A ameaça maior veio da própria escola. Com a saída dos portugueses, os professores nas escolas eram eles próprios limitados no domínio da língua portuguesa. Em 1977, 52% dos professores tinham a 4.ª classe. A sua limitada formação, geralmente feita no ensino rudimentar paralelo ao ensino primário oficial da era colonial, não garantia que, pelo menos para o ensino da língua portuguesa, se auxiliassem os alunos sob sua tutela a adquirirem as competências necessárias. O ensino livresco e reprodutor não conferiu as devidas competência e habilidades aos milhões que entusiasticamente buscaram a escola para aquisição de saber científico. A geração que foi submetida a esta educação é a mesma que depois assumiu o oficio de professor nos anos subsequentes à independência. Devido à profunda crise económica da década de 80 em Angola, os professores, como muitos outros funcionários públicos, eram mal pagos e ficavam largos meses sem essa já pobre remuneração. Isso impediu o ingresso ao sistema de ensino de pessoas com algumas habilitações para o oficio. Como resultado, em 1991, cerca de 50% dos professores que serviam o ensino primário não tinha sequer 12 anos de escolarização. Podemos acrescentar o facto de que a maior parte dos cidadãos (ainda 61% em 2012!) não tem, como no período colonial, a língua portuguesa como sua língua materna. Por isso, acreditamos que o que vemos hoje são os sinais evidentes de erros cometidos, no que a educação diz respeito, ao longo dos anos. Os falantes do Português que o atropelam constantemente são, por atacado e varejo, vítimas duas vezes. São vítimas porque não se acautelou devidamente as necessidades de aprendizagem da língua portuguesa, como qualquer sistema formal que se preza busca. Por outro lado, eles hoje pagam o preço por exporem o que lhes foi proporcionado, isto é, uma experiência educativa deficiente, preço este que resulta na perda de empregos, na não aceitação social em alguns grupos, entre outros. A nossa revolta ou a nossa indignação não é o remédio para este desafio. É preciso repensar, para além das reformas badaladas e politicamente motivadas, os propósitos da nossa educação. As universidades, mesmo com as suas limitações, já têm autores com algum conhecimento que são úteis. Mas, é preciso também valorizar o homem, aqueles que têm por missão a produção de saberes para sustentar a nossa produção material , imaterial e histórica. Enfim, compete ao Estado pelo seu capital social conferir ao cidadão condições para que desenvolva o seu capital social. Os efeitos do português mal falado não devem ser simplesmente e cinicamente arremessados aos «falantes sem virtude», porque da mesma maneira que quem padece com a cólera é vitima da falta de condições de sanidade do meio, estes falantes são também vitimas da falta de sanidade em algum ponto da educação que lhes foi proporcionada; educação deficiente que por si só constitui-se numa violação dos seus direitos de cidadania. ■ Sábado, 15 de Junho de 2013. 21 De avião a bonecas, impressoras 3-D mudam a manufatura Fabrizio constantini para the wall street journal (2); Associated press (Mattel) A Ford usa as impressoras para produzir moldes de peças (1 e 2) . Os brinquedos da Mattel também usam a tecnologia (3) Clint Boulton The Wall Street Journal Empresas como a General Electric Co., a Ford Motor Co. e a Mattel Inc. estão usando a impressão 3-D com mais frequência do que as pessoas imaginam. Também conhecida como manufatura aditiva, porque os objetos produzidos dessa forma são construídos com a adição de uma camada de material por vez, essa tecnologia está permitindo que os fabricantes tenham os produtos prontos para a entrega de forma mais rápida. Ao contrário das técnicas tradicionais, pela qual os objetos são cortados ou perfurados a partir de moldes, o que gera desperdício de material, a impressora 3-D permite que os trabalhadores projetem o objeto no computador e o imprimam usando plástico, metal ou materiais compostos. “Ela nos permite ser muitos mais produtivos, eficientes e inovadores em design”, diz Scott Goodman, diretor de desenvolvimento global de produtos da Mattel. Embora os preços tenham caído, os materiais usados nas impressoras 3-D são mais caros que os de processos tradicionais de manufatura. Pete Basiliere, analista do Gartner Inc., diz acreditar que os preços desses materiais vão cair à medida que cresça a demanda por impressoras 3-D. A receita global com impressoras 3-D deve atingir US$ 3,7 bilhões em 2015. Em 2012, foi de US$ 2,2 bilhões, segundo a firma de pesquisa Wohlers Associates. A Ford já vislumbra um futuro onde os consumidores da montadora serão capazes de imprimir suas próprias peças de reposição. Teoricamente, um cliente poderá se conectar à Web, escanear um código de barras ou imprimir um pedido, levá-lo a um local próximo que tenha uma impressora 3-D e, assim, ter a peça que precisa em horas ou minutos. A Ford já vinha usando impressoras 3-D para produzir protótipos de peças para veículos de teste desde os anos 80. Os engenheiros da montadora no Centro Técnico Beech Daly, no Estado americano de Michigan, hoje usam equipamentos de nível industrial que custam até US$ 1 milhão para fabricar protótipos de cabeças de cilindros, rotores de freio e eixos traseiros em menos tempo do que pelos métodos tradicionais de manufatura, diz Paul Susalla, supervisor da seção de manufatura rápida da Ford. Ao usar a impressão 3-D, a Ford ganha, em média, um mês na produção de um molde de uma cabeça de cilindro para a sua família de motores EcoBoost, projetados para uma melhor eficiência no consumo de combustível. Essa peça complexa inclui numerosos portos, dutos, passagens e válvulas para controlar o fluxo de ar e combustível. A indústria aeroespacial também tira proveito. A unidade de aviação da GE imprime injetores de combustível e outros componentes do sistema de combustão de uma turbina de avião que está sendo construída pela CFM International, uma joint venture entre a GE e a francesa Snecma SA. Em 2016, o motor Leap deve ser montado para aeronaves como o Boeing 737 Max e o Airbus A320neo, que ainda estão sendo desenvolvidos. Mark Little, diretor do grupo de pesquisa global da GE, diz que produzir moldes de uma peça complexa pelo derretimento de pó do metal camada por camada pode ser mais preciso do que fazer e cortar as partes de um molde de cerâmica. A GE também está experimentando produzir um dispositivo médico, a sonda de ultrassom, por meio de impressoras 3-D. O equipamento transmite sinais que geram imagens de ultrassom em exames de pacientes. Métodos tradicionais de produção exigem horas de corte e refinamento da peça para que ela possa reproduzir as imagens. Pesquisadores da GE dizem que a impressora 3-D pode ajudar a reduzir os custos de algumas peças da sonda em 30%. As impressoras 3-D também estão revolucionando a indústria dos brinquedos. A Mattel costumava esculpir protótipos de cera e argila antes de produzir seus brinquedos de plástico. Hoje, seus engenheiros usam uma das 30 impressoras 3-D para criar partes de praticamente todo tipo de brinquedo, incluindo marcas populares como Barbie, Max Steel e os carros Hot Wheels. Mas a Mattel diz não ter planos para vender software a consumidores que permita que eles imprimam seus próprios brinquedos em impressoras 3-D caseiras. Um porta-voz diz que a empresa não pode garantir que brinquedos impressos em casa sejam seguros para crianças, “questão essa que toda indústria terá que enfrentar e abraçar” à medida que o uso das impressoras 3-D se amplia. 22 Sábado, 15 de Junho de 2013. The Wall Street Journal Multinacionais mudam de tática em países emergentes Lilly Vitorovich The Wall Street Journal, de Londres A Europa foi a pioneira da tecnologia de telefonia celular 15 anos atrás. Hoje, ela está atrasada na implantação de serviços móveis de alta velocidade e tenta desesperadamente se recuperar. O continente está atrás dos Estados Unidos e partes da Ásia na adoção de tecnologias de quarta geração como o padrão LTE (“Long Term Evolution”, ou evolução de longo prazo), que tornam mais rápidas a navegação na internet e a transmissão de vídeo para computadores, tablets e smartphones. As operadoras de celular culpam a economia fraca e as regras rígidas da Europa pela falta de investimento em suas redes nos últimos anos, embora algumas já estejam lançando serviços mais rápidos à medida que os governos leiloam faixas de frequência para a quarta geração. Investimentos em redes 4G são necessários para que a economia da Europa se mantenha competitiva no cenário global. Eles também ajudam as operadoras a reter clientes enquanto lutam para conter a queda de receita causada pela redução no número de ligações das pessoas. Para os consumidores, a falta de investimento poderia resultar em redes mais lentas. “Há um amplo consenso de que o mercado de telefonia celular da UE [União Europeia] está com baixo desempenho em relação a outras economias avançadas, inclusive os EUA”, afirmou num relatório a GSMA, uma associação do setor. O documento ilustra o estado precário da Europa: 19% das linhas nos EUA devem estar em redes LTE até o fim do ano, comparado com menos de 2% na UE. As velocidades dos EUA também são 75% maiores do que a média da UE, e a GSMA prevê que esta diferença vai crescer. “É humilhante — ficamos para trás”, disse Pierre Louette, vice-diretor-presidente da France Télécom SA. “A internet foi praticamente inventada por um europeu, mas as grandes empresas são americanas e as redes mais rápidas estão nos EUA e na Ásia.” Os EUA tinham cerca de 31 milhões de assinantes em redes LTE e a Coreia do Sul, 16 milhões no fim de 2012. Já a Alemanha tinha 570.000 usuários 4G e o Reino Unido, só 41.000, segundo a firma de pesquisa Idate. No Brasil, que começou recentemente a adotar as redes de quarta geração, a proporção das linhas com a tecnologia LTE ainda é pequena, mas está crescendo rápido. O número de usuários em redes LTE mais do que triplicou entre março e abril, de 14.702 para 48.459, ou 0,02% do total de linhas celulares no país, informou a Anatel. (Os números de maio ainda não foram divulgados.) A agência reguladora brasileira estabeleceu o prazo de 30 de abril para que as quatro grande operadoras — Claro, Oi, TIM e Vivo — implantassem o serviço em 50% da área urbana das seis capitais que sediarão os jogos da Copa das Confederações, que começa no dia 15 deste mês. As empresas declararam que cumpriram o prazo, segundo a Anatel, que acrescentou que a fiscalização está em andamento e seus resultados serão conhecidos em breve. A Anatel planeja disponibilizar outras regiões do espectro nos próximos anos, na faixa de 700 MHz (a mesma usada nos EUA), que oferece um sinal mais robusto que a faixa empregada hoje, de 2,5 GHz, segundo a agência. A GSMA afirmou que a Europa também deveria reformar suas políticas de espectro e consolidar mais o setor. Neelie Kroes, comissária da UE para a Agenda Digital, que define as políticas de tecnologia, se comprometeu a abordar essas questões este ano com propostas para reformar o mercado das tele- comunicações do bloco e incentivar o investimento. “Precisamos com urgência tirar o atraso [...] e dar às pessoas as ferramentas tecnológicas de que elas precisam”, disse ela num congresso este ano. Num momento em que era necessário investir, os gastos de capital com infraestrutura de telecomunicações caíram 14% de 2005 a 2009, para 40 bilhões de euros (US$ 52 bilhões), segundo a consultoria McKinsey, o equivalente a apenas dois terços dos níveis de investimento nos EUA. As operadoras afirmam que não investiram em redes mais rápidas devido aos problemas econômicos da Europa, à concorrência entre muitas empresas e à regulação pesada da UE, que afetaram a receita. Analistas também dizem que as empresas desanimaram depois de pagar um preço alto por espaço no espectro 3G, no ínicio de 2000, o que aumentou suas dívidas, prejudicou os resultados e fez com que quisessem rentabilizar os ativos o maior tempo possível. Aquisições de participações em empresas europeias por estrangeiras — como as que o bilionário mexicano Carlos Slim fez em 2012 na holandesa KPN e na austríaca Telecom Austria — também poderiam levar as operadoras do bloco a investir mais para se fortalecerem. (Colaboraram Frances Robinson e Luis Garcia.) África é o novo alvo do setor aéreo Marietta Cauchi e Daniel Michaels The Wall Street Journal A aviação na África, até recentemente dominada por companhias de ex-potências coloniais europeias, está se tornando um mercado aberto para todos, ajudando a tornar o continente um dos mercados aéreos que cresce mais rapidamente no mundo. Grandes companhias do Golfo Pérsico estão liderando esse processo. A Qatar Airways, a Emirates, de Dubai, e a Etihad Airways, de Abu Dhabi, veem o mercado africano como uma presa fácil no seu quintal. A brasileira Gol também está de olho no continente. A empresa anunciou que está analisando a possibilidade de lançar uma rota entre o Brasil e a Nigéria, mas a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) informou que deu, no dia 27 de maio, autorização para três frequências semanais da Gol rumo ao país africano. Empresas americanas, que nunca ofereceram voos para a África, estão agora descobrindo o continente. E num sinal de renovação da região, um número crescente de companhias aéreas locais está expandindo suas operações, embora a competição com gigantes globais esteja se mostrando difícil. As potenciais perdedoras são as companhias europeias, que até recentemente eram as únicas que ofereciam conexões para muitos países africanos. “Os europeus, de repente, começaram a acordar”, disse o presidente da Emirates, Tim Clark. Enquanto as aéreas europeias desaceleraram sua expansão na África nos últimos anos, “nós vimos [a região] como uma grande oportunidade”. A Emirates está se aproximando da Air France na posição de empresa não africana com maior número de voos para o continente, segundo a consultoria Innovata LLC. A Air France-KLM SA “continua a aumentar voos, rotas e a dimensão das aeronaves na África para alimentar os seus centros de conexão da Europa”, diz Pierre Descazeaux, vice-presidente sênior da empresa para a África e o Oriente Médio. O grupo, que detém 26% da Kenya Airways Ltd. e 20% da Air Côte d’Ivoire, aumentou sua capacidade na África em mais de 8% desde o meio do ano passado. Companhias aéreas se deram conta do potencial da África graças ao avanço do Brasil, Rússia, Índia e China, que representam uma parte crescente do comércio internacional da África. E esses países também estão entre os mercados de aviação que mais crescem no mundo. Apesar de a aviação africana ainda sofrer com décadas de negligência, sua infraestrutura e histórico de segurança estão melhorando. O tráfego de passageiros nos 12 meses encerrados em 30 de abril subiu 7,3% ante um ano antes, segundo a AITA, associação internacional do setor. E a riqueza africana está crescendo. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico prevê que a economia da África cresça 4,8% este ano e 5,3% no próximo. “Ao lado dos países do BRIC, esse é o principal mercado de crescimento, com economias em rápida expansão, riqueza e investimentos estrangeiros da China e de outros países”, diz o diretor-presidente da Etihad, James Hogan. A operadora ampliou recentemente a sua presença na África e fechou acordos com a South African Airways Pty. Ltd. e a Kenya Airways, pelo qual elas podem vender passagens umas das outras. Os viajantes se beneficiam, mas a chegada de companhias globais “coloca as operadoras africanas em desvantagem”, diz Rapha- el Kuuchi, diretor de assuntos industriais da Associação das empresas Aéreas em Nairobi, no Quênia. As companhias aéreas africanas responderam por apenas 35% do tráfego de aviões que chegaram e partiram do continente no ano passado e sua quota de capacidade em rotas no exterior caiu 16 pontos percentuais nos últimos dez anos, segundo a associação. Ainda assim, algumas companhias aéreas africanas decidiram enfrentar o desafio, investindo em aviões modernos e adotando estratégias criativas. Várias delas estão concentrando seus voos dentro do continente “e para regiões onde a competição não é tão forte e há alto potencial de crescimento”, como Ásia e América Latina, disse Kuuchi. A Europa ainda tem 60% da capacidade de voos do exterior para a África e as companhias do Oriente Médio detêm 30%, segundo a Innovata. Mas o tráfego com o Oriente Médio está crescendo 10% por ano e “não mostra nenhum sinal de desaceleração”, disse Roeland van den Bergh, analista sênior da consultoria do Centre for Aviation, de Sydney, Austrália. (Colaborou Bart Koster.) 23 The Wall Street Journal Sábado, 15 de Junho de 2013. Envelhecimento da população é grande desafio para a China Tom Orlik The Wall Street Journal de Pequim Os idosos da China são pobres, doentes e deprimidos em um número alarmante, de acordo com o primeiro estudo em grande escala feito com pessoas de mais de 60 anos. Isso é um desafio imenso para Pequim e umas das maiores vulnerabilidades de longo prazo da economia chinesa. O levantamento sobre as condições de vida dos 185 milhões de idosos do país mostra um quadro desolador que desafia os esforços do governo para construir o que chama de “sociedade harmoniosa”, dedicada ao bem-estar humano em vez de somente ao crescimento econômico. Da geração que construiu o boom econômico da China, 22,9% — ou 42,4 milhões de pessoas — vivem na pobreza, com uma renda de menos de 3.200 yuans por ano (US$ 522). O medo de ficar velho e pobre, o que leva muitos chineses a economizar seus ganhos, também vai contra outra prioridade de Pequim: reequilibrar a economia para um consumo mais forte. A pesquisa, liderada por acadêmicos chineses e internacionais, incluiu 17.708 indivíduos de 28 das 31 províncias da China e foi parcialmente financiada pelo governo chinês através de uma fundação científica. Sem deixar de cuidadosamente dar crédito ao governo pelo progresso na expansão da cobertura de benefícios médicos e de aposentadoria, o levantamento também mostrou que deficiências físicas e doenças mentais são comuns no país. Dos entrevistados, 38,1% relataram dificuldades para exercer atividades diárias e 40% apresentaram sintomas fortes de depressão. Comparações internacionais se tornam difíceis por problemas de definição. Mas as taxas de pobreza, invalidez e depressão na China parecem ser todas relativamente altas. A taxa de pobreza dos americanos com idade superior a 65 anos é de 8,7%, segundo dados do censo. O Estudo da Saúde e Aposentadoria dos EUA descobriu que entre 26% e 27% dos idosos americanos apresentam algum tipo de invalidez e que as taxas de depressão também são significativamente menores do que na China. John Strauss, professor da Universidade do Sul da Califórnia e um dos líderes do projeto, apontou o baixo nível de desenvolvimento da China como parte da explicação para os níveis mais elevados de pobreza no país. “Precisamos lembrar que a China ainda é uma economia em desenvolvimento, ainda não é um país de alta renda”, disse ele. O envelhecimento da população significa que os problemas se agravam. O número de idosos para cada cem pessoas em idade ativa da população — o chamado índice de dependência — passará de 11 em 2010 para 42 em 2050, de acordo com projeções da Organização das Nações Unidas. Outros países também verão um aumento do índice de dependência. Mas o ritmo do envelhecimento na China é particularmente alto em consequência da política de um só filho. O levantamento revela que 88,7% dos idosos que necessitam de assistência para atividades diárias a recebem de membros da família. Mas a política de um único filho e a migração de muitos jovens para cidades grandes em busca de trabalho ameaçam corroer a tradição dos filhos cuidarem dos pais idosos. O problema da China é peculiar porque a população está envelhecendo enquanto o país ainda é pobre. “Outros países são velhos e ricos”, disse Albert Park, professor da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong, outro líder da pesquisa. Yu Baihui é uma das idosas que está enfrentando dificuldades. Com 73 anos, Yu vive com o marido em uma casa dilapidada em Rensha, cidade de 31 mil habitantes nas redondezas de Chongqing, no oeste da China. Como muitos dos idosos pobres da China, ela é uma ex-lavradora, velha demais para se beneficiar do boom econômico que levou as gerações mais jovens para as fábricas, e ficou de fora de um sistema de benefícios que favorece a população urbana. “Meus pais não têm qualquer pensão ou outro benefício”, disse Luo Zhengfeng — filho de Yu que vende guarda-chuvas e mapas para turistas em Chongqing para sustentar sua esposa, filho e pais idosos. A turbulenta história da China também parece ter tido um impacto na geração que a enfrentou. “Os idosos da China passaram fome nos anos 50 e enfrentaram as turbulências da Revolução Cultural”, disse Park. “Essas experiências deixam uma marca na saúde física e mental.” Em teoria, o respeito pelos mais velhos está profundamente enraizado na cultura chinesa. Confucius, o líder cultural da China, que tem desfrutado um renascimento em popularidade à medida que líderes buscam novas fontes de legitimidade, defendeu a veneração das pessoas mais velhas. Em uma visita a um asilo de idosos em Tianjin, em 2009, o ex-presidente Hu Jintao expressou os sentimentos. “Respeitar e cuidar dos idosos não é apenas uma tradição chinesa, mas também um símbo- lo da civilização e do progresso nacional”, disse ele. Mais de 90% da população idosa possui seguro saúde, mas os custos extras permanecem elevados. “Minha mãe teve um derrame no ano passado, o hospital cobrou 18 mil yuans (US$ 2,9 mil) e o seguro pagou apenas 1.000 yuans”, disse Luo, o vendedor de guarda-chuvas de Chongquing. O saldo de 17 mil yuans ele teve que pagar do próprio bolso e equivale a quase metade do seu salário anual. Colaborou Olivia Geng Tablet da Sony pode ir da sala à piscina Katherine Boehret No mercado atual de tablets, um aparelho sobressai claramente aos demais: o iPad, da Apple. Com este tablet, a Apple fez o que sempre faz: criou um dispositivo inovador e essencial numa outrora insossa categoria. Mas isso foi há três anos. Agora, uma empresa que fez o seu nome com eletrônicos de consumo de alto nível quer impor à Apple um desafio real. O tablet Xperia Z, da Sony, usa a última versão do sistema operacional Android, tem uma tela de 10,1 polegadas e é o tablet mais fino já lançado até hoje, superando até o iPad Mini, da Apple. Com um peso 494,4 gramas, esse tablet é também mais leve do que o iPad — que pesa 653,2 gramas — e tem infravermelho, o que o transforma num controle remoto universal. E só por diversão, ele funciona mesmo submerso até três metros de profundidade, por 30 minutos. O Xperia, que segundo a Sony chega ao Brasil em meados de agosto, só está disponível em modelos com conexão Wi-Fi, assim como o iPad quando foi lançado. Os preços são similares aos de modelos comparáveis do iPad: nos Estados Unidos, onde até julho só estão disponíveis em lojas on-line, o Xperia de 16 gigabites de memória (na cor preta) custa US$ 499 e o modelo de 32 gigabites (em preto ou branco), US$ 599. A Sony ficou de fora da tecnologia móvel por um longo tempo, mas o design e o preço do tablet Xperia Z pode reposicionar a empresa no mercado se ela souber usar as suas cartas. A Sony também tem um smartphone com o mesmo nome, o Xperia Z, que está sendo vendido nos EUA por US$ 630 sem con- O tablet Xperia Z funciona por meia hora a até três metros debaixo dágua trato com operadoras (uma versão ligeiramente simplificada do celular, o Xperia ZQ, já foi lançada no Brasil). Venho usando o novo tablet por mais de uma semana e o considero um sério concorrente do iPad. O design elegante, a velocidade, a tela, a boa qualidade da câmera e do som, tudo isso torna fácil gostar do aparelho. O sistema operacional Android OS, chamado de Jellybean, funciona sem problemas e é melhor que outras versões anteriores do Android. Mas o Xperia Z não se saiu bem no meu teste da duração da bateria. Algumas pessoas também podem achar a traseira de plástico do tablet frágil comparado com a resistência do alumínio escovado do iPad. Tenho um tablet Android e já testei vários outros, mas gostei mais do design físico do Xperia Z. A sua pequena espessura e leveza tornam fácil carregá-lo numa bolsa. As aberturas do alto-falante do Z estão inteligentemente situadas nas extremidades inferiores e laterais, proporcionando um som ambiente que não é abafado quando o aparelho está sobre uma mesa. 24 Sábado, 15 de Junho de 2013. The Wall Street Journal Testei a resistência do Xperia Z à água. Primeiro, certifiquei-me que todas as suas entradas e saídas estavam cobertas com suas respectivas tampas. Isso incluiu o compartimento do cartão de memória Micro SD, a porta USB e a saída para o fone de ouvido. Aí, submergi o tablet numa pia cheia de água enquanto ele tocava uma música, por dez minutos. A maioria das pessoas não vai dar um mergulho com seu tablet, mas vai usá-lo em lugares onde líquidos espirram ou são derramados com frequência, como cozinhas e banheiros. Mesmo com os dedos molhados, o Xperia reconheceu comandos por gestos e seleções na tela, embora de forma inconsistente. No uso cotidiano, não notei nenhum problema no tempo de duração da bateria do Xperia. Mas no meu teste, a bateria deixou a desejar. Ajustei o brilho da tela em 75%, mantive o Wi-Fi funcionando para continuar recebendo emails e coloquei um vídeo que se repetia automaticamente até a bateria acabar. O Xperia Z morreu depois de apenas 5,5 horas meia de uso; o iPad dura quase 11,5 horas. Na sala da minha casa, testei o infravermelho embutido do Xperia Z abrindo um aplicativo de controle remoto pré-carregado. Selecionei o tipo de dispositivo e fabricante, os controles apareceram na tela. Testei-os para ter certeza de que estava com a minha TV LG, TiVo e o sistema de som da Sony conectados. Isto levou apenas alguns minutos e é prático para aqueles acostumados a usar o tablet enquanto assistem à TV. Para a maioria, pode ser apenas um interessante truque de mágica. A câmera traseira de 8 megapixels do Xperia Z e câmera frontal de 2 megapixels tem mais megapixels que a câmera traseira de 5 megapixels do iPad e câmera frontal de 1,2 megapixels, embora uma câmera não deve ser julgada apenas pelo critério de megapixels. Tirei fotos do mar, da praia e amigos e elas ficaram bonitas e nítidas. Ao revisar as fotos, elas demoraram um pouco para entrar em foco, da mesma maneira que acontece com uma câmera digital. Se você é um fã do sistema operacional Android e estava esperando um tablet com um ótimo design, o Xperia Tablet Z é uma boa pedida. Só não espere que a sua bateria dure o mesmo tanto que a do iPad. Anglo American ainda espera lucrar com projeto Minas-Rio John W. Miller e Paul Kiernan The Wall Street Journal, de Conceição do Mato Dentro, MG As montanhas que cercam esta cidade do interior de Minas Gerais contêm ricas jazidas de minério de ferro e as sementes de um dos maiores estouros de orçamento da história da mineração. A Anglo American PLC está gastando US$ 8,8 bilhões numa imensa mina de ferro aqui — mais que o triplo do valor inicialmente orçado, e sequer uma única tonelada foi extraída. O projeto, que foi concebido por alguns dos melhores geólogos e engenheiros do mundo e emprega hoje 12.000 pessoas, está três anos atrás do cronograma. “Penso o tempo todo no que poderíamos ter feito diferente”, disse a ex-diretora-presidente Cynthia Carroll ao The Wall Street Journal. Carroll, que ainda acredita que a mina será lucrativa, deixou o comando da Anglo American em abril, cedendo à pressão de acionistas insatisfeitos com estouros de orçamento, principalmente nesta mina, batizada de Minas-Rio. A Anglo American sabia que extrair minério de ferro nos subterrâneos de fazendas de gado — e logo processar e despachar a produção — seria um desafio. E ela não é a única mineradora sob pressão. Com as áreas costeiras se esgotando, as multinacionais do setor estão tendo cada vez mais que explorar áreas remotas, muitas vezes em países voláteis, com moedas instáveis e legislação incerta. A maior razão para essas apostas é a forte demanda da China, que em 2012 importou 745,5 milhões de toneladas — quase seis vezes mais que dez anos atrás. Isso fez os preços do minério de ferro mais do que triplicarem desde que a Anglo American comprou a Minas-Rio. A economia da China, porém, vem se desacelerando, e economistas agora preveem que a demanda por aço vai subir entre 2% e 3% em 2013, ante os cerca de 10% anuais de 2006 a 2011. “Ainda acreditamos num mundo em que [extrair] minério de ferro pode ser lucrativo ao custo de 50 dólares a tonelada”, diz o diretor-presidente, Mark Cutifani, que substituiu Carroll em abril. A trajetória do projeto vem sendo uma dura curva de aprendizado. A Anglo American não previu completamente a extensão das negociações com dezenas de agências brasileiras, prefeitos, promotores locais e perto de 1.600 proprietários de terras em 32 municípios. Carlos Nogueira da Costa Júnior, secretário federal de Geologia, Mineração e Transformação Mineral, diz que poderia ter alertado a empresa: “A Anglo American nunca nos consultou antes de fazer o primeiro investimento para entender o processo de licenças”, diz. Carroll disse que o Brasil é um país cujas políticas e regras mudam todo dia e que não sabe se poderia ter antevisto alguns dos problemas. A Anglo American, que tem um valor de mercado de US$ 33 bilhões, prevê que a mina será lucrativa depois que entrar em produção, em 2014. Embora executivos da empresa reconheçam que vai levar seis anos só para pagar o preço inicial de aquisição de US$ 4,6 bilhões mais US$ 8,8 bilhões em gastos de capital, eles dizem que a mina vai gerar um forte fluxo de caixa por pelo menos 45 anos depois disso. A questão, dizem analistas, é se esse prazo permitirá aos acionistas recuperar seu investimento. O maior problema diante dos engenheiros da Anglo American era transportar o minério até a costa. A firma não tinha uma ferrovia no Brasil. Ela podia usar a da Vale, mas isso significaria depender de uma concorrente e talvez pagar um aluguel alto. A Anglo decidiu, então, construir um duto para transportar o minério diluído em água por 522 quilômetros até um porto no norte do Rio de Janeiro, atravessando 32 cidades e 1.555 propriedades privadas. Será o maior mineroduto do mundo. A Anglo American, que não quis revelar detalhes da composição de custo da Minas-Rio, afirma que o mineroduto virou a parte mais problemática do projeto, afetando 350.000 pessoas. Além da complicada questão da remoção de moradores, os engenhei- ros, em alguns casos, tiveram que redirecionar a tubulação devido à topografia ou a pessoas que não queriam vender suas propriedades ou se mudar, diz Paulo Castellari, diretor-presidente da Anglo American no Brasil. “Em ambos os casos, esses atrasos nos obrigaram a gastar com novas estruturas e equipamentos.” O secretário Costa Júnior diz que o governo acha que até agora a Anglo American agiu conforme a lei. “Eles estão obtendo as licenças necessárias, de modo que as comunidades não se sentem enganadas ou perturbadas.” Além dos moradores, a empresa também teve que negociar com autoridades locais. “O projeto é o resultado de forças muito maiores e globais. Houve um momento em que concluímos que não podíamos parar uma força global, então decidimos tentar impor o maior número de condições possível para conseguir o que queríamos”, diz Sandro Lage, 31 anos, secretário do Meio-Ambiente da cidade. Em março de 2012, Marcelo Mata Machado, 39 anos, promotor do Ministério Público de Minas Gerais, uniu-se a quatro outros promotores locais para abrir três processos contra a Anglo American. Sua lista de reclamações, compilada em reuniões com moradores, incluía a alegação que a Anglo American não havia feito uma catalogação adequada das pinturas e artefatos pré-históricos presentes na área a ser escavada. Machado apoia o direito de mineração da empresa desde que “feito corretamente”. Ele descreve a ação judicial como “uma medida preventiva; decidimos que o projeto não poderia avançar até que os estudos arqueológicos fossem concluídos”. “A legislação ambiental brasileira é bem intencionada e de alta qualidade”, diz Castellari. “Mas as infraestrutura, o processo, os sistemas e até as pessoas dificultam a sua aplicação na prática.” Castellari diz ter gastado 80% do seu tempo em 2012 lidando com liminares que custaram à Anglo American US$ 1 bilhão em despesas legais, trabalhos arqueológicos e monitoramento. Em dezembro, as liminares haviam sido retiradas. A companhia concordou em construir um museu para abrigar os artefatos arqueológicos e restaurar a Igreja Matriz, de 211 anos, a um custo de US$ 2 milhões, segundo a Anglo. A empresa também foi prejudicada pela mesma alta dos custos que atingiu outras grandes do setor. Os caminhões mineradores, por exemplo, custam hoje 70% mais que em 2007, quando a Anglo começou a orçar o projeto. E os preços da terra estão dez vezes mais altos. O porto apresentou desafios maiores e mais caros. A empresa teve que construir um quebra-mar de US$ 400 milhões para impedir que tempestades e ondas danifiquem os navios e criou sua própria pedreira para a obra, que deve terminar em 2014. “Estamos gastando bastante agora para economizar bastante depois”, diz o gerente geral do porto, Luiz Pereira Nunes. anglo american Atrasos na obra da imensa mina custaram bilhões de dólares, mas a companhia afirma que ela ainda será lucrativa 25 Cronica Sábado, 15 de Junho de 2013. O apetite dos ortóperos A o fundo da sala, um homem ainda novo muda o disco na aparelhagem e volta a sentar-se comodamente no sofá para fumar o cigarro interrompido. As aspirais de fumo evoluem graciosamente em direcção ao tecto, exactamente como costumam ser descritas na literatura de cordel. Até eu, que me delicio há mais de meio século com este perigoso recurso tabagista, vislumbro nas acrobacias aéreas do tabaco cremado fantasias extraordinárias: pássaros sem pressa, marés calmas, mulheres esguias e voluptuosas a desafiarem a minha imaginação, que é vulnerável à beleza e ao inesperado. Mas, por vezes, também fantasmas grotescos, cuja configuração num balet de fumo apenas me indica que os monstros, deste mundo ou da parapsicologia, podem afinal ser boa companhia. A noção de monstro é talvez um mito que resulta da manipulação dos medos e preconceitos humanos. A vida é para viver, desejavelmente em boa convivência com os mitos sobre monstros, as malfeitorias do Inferno e os jardins suspensos da Babilónia, que na verdade eram haréns de plantas. Mas o homem que escuta a música, calmo e sem exposição visível aos mil e um problemas do quotidiano, aparenta uma paz de espírito que lhe permite enfrentar, sem temor excessivo, as armadilhas e dissabores sociais com que lida no dia a dia. Vive em Luanda, e isso resolve metade dos seus problemas: pelo menos, o coração tem onde se alimentar. Nas cores da cidade, nas amizades espontâneas. Senta-se no cadeirão, com a mesma pose. A exacta eficiência. Com personalidade. Não pensemos em deduções muito complicadas. Ele é, nitidamente, o dono da casa e a sua aparência repousante, satisfeita, tranquila. O homem do sofá mantém-se no mais absoluto silêncio para escutar o cantor do disco, mas no canto oposto milhares de pequenas mas voluptuosas antenas da mais fina sensibilidade, num zumbido estrídulo, quase musical, sibilam, denunciando a presença de um outro tipo de vida, uma outra realidade, entre papéis velhos que o tempo e o esquecimento, aliados, tornaram inúteis. Uma sobrevivência subterrânea se agita. Milhares de olhos de ascendência multissecular, na obscuridade da casa do homem com música. Bocas famintas que pastam o possível, o impossível e o inacreditável. O som alto da música abafa a poluição sonora que chega das resmas de papel, livros e fotografias dilacerados. Roem, avidamente, rostos fotográficos desconhecidos, sem qualquer respeito ou reservas. Não são filhos nem filhas dos pais do dono da casa que preguiçosamente se deixa absorver pela música, da qual recolhe uma estranha tranquilidade. Na realidade, os ruídos partem de uma tribo de configuração pré-histórica que ali se reproduz, vive e morre sem outros horizontes que não sejam, regra geral, o apertado espaço entre as quatro paredes de uma gaveta de excelente madeira. Baratas! O homem acende novo cigarro, recosta-se melhor no sofá e a voz do artista, gravada a milhares de quilómetros, retoma um verso romântico. Contudo, ali mesmo, ao abrigo da discreta e serena penumbra da segunda gaveta do armário da sala, uma ortóptera petisca, insensível e com evidente apetite, um ângulo mais tenro da inflamada declaração de amor que foi o princípio de tudo naquele lar. Sempre foi assim, desde a invenção da escrita: as palavras de mais apaixonante grafia enlouquecem com facilidade. E, por estranho que pareça, na sua voracidade, estas obscuras e repelentes criaturas jurássicas voadoras ocupam territórios, alheias à música que perfuma de sons e melodia a casa que criminosamente invadiram. A gaveta está cheia, mas desarrumada. Ali subsistem, quase aprisionados, correspondência vária, misturada com recibos para liquidação de consumos domésticos, cachimbos com alguns anos de apagada sobrevivência, quatro ou cinco livros que por certo já mitigaram a fome a várias gerações de clandestinos habitantes da penumbra do armário e, até mesmo, um velho álbum de fotografias que, como nos filmes medíocres, conta apenas histórias felizes. Duas pequenas baratas, de antenas nervosas e velozes, atacam sem grande convicção as últimas quatro letras de um amarelado recibo de renda de casa, onde, sobre um carimbo a óleo, se estende a assinatura de um tal Manuel não sei quê, feito em Luanda aos tantos de tal. Caso estranho, pelas razões que a seguir adianto: os ortópteros, embora de apetite voraz, nunca tiveram grande inclinação para a escrita comercial ou financeira. Preferem a caligrafia sentimental. As palavras amáveis. O pudor da ternura. A aventura do sonho. O amor. A prova está naquela barata mais exigente e progenitora de várias gerações de semelhantes e repelentes seres alados, que ali se atira com compulsiva predilecção a uma missiva na qual um anterior dono da casa escreveu frases como se fossem música, prometendo o Céu a alguma mulher, como se isso fosse fácil, numa folha dobrada manualmente com arabescos a insinuar paixão. Esse espécime humano devia ter sido da mais fina sensibilidade por baixo daquela capa de aparente competência funcional durante a juventude. Por isso, a carta de amor atrai as tenazes articuladas e pré-históricas das baratas de paladar mais afinado, num banquete de sofisticado menú. O jovem homem do sofá, impaciente e com o mesmo indiscutível grau de apetite dos insectos, acende novo cigarro. Já morderia qualquer coisa. Olha para as paredes e repara que estão a precisar de pintura nova. Presta melhor atenção às gravuras encaixilhadas e, como de costume, não lhes acha qualquer piada: são resquícios do colonialismo. Não lhe dizem nada, tem preferências mais actualizadas: o poder popular, a música da época, os novos rostos da política nacional. Por sorte, não lhe custaram dinheiro. A casa foi ocupada por necessidade social, quem fugiu, fugiu. Porque é que o antigo dono nem levou as fotos de família? Vá lá, ficarem os móveis. O anterior locatário ou fugiu muito à pressa ou não teve arquitectura financeira para fazer uns grandes caixotes tipo contentor para «exportar» os tarecos, apesar de garantido transporte para Lisboa a custo zero. Mas o novo ocupante, qualquer dia, tem que adquirir novo mobiliário mais a seu gosto! É indispensável. Estes trastes são feios. As baratas limitam-se, por enquanto, ao seu limitado território e ainda não viraram as atenções culinárias para umas velhas estampas de calendário. Talvez por serem ásperas e com desagradável sabor a tintas de tipografia a que nem o salalé se habitua. E têm razão. Enquanto subsistir pasto fresco e mais mole, essa inebriante frescura da correspondência sentimental antiga, jamais degustarão outra coisa. As baratas têm uma personalidade digestiva extremamente rigorosa. São caprichosas e exigentes. Escolhem bem o menú alimentar, de preferência fotos antigas, recibos de contabilidade e cartas de amor com remetente e destinatário desconhecidos. O amor é considerado um bom alimento pelos ortópteros. De súbito, uma mulher também relativamente jovem entra na sala, liberta um pequeno suspiro de cansaço e dirige a palavra ao homem refastelado no sofá com a barriga a dar horas. - António, vem jantar. A comida está na mesa. O tipo levanta-se, lesto e em sobressalto, para atacar um pitéu que estava a demorar. Mas as baratas, na sua azáfama comestível, prosseguiram na maior tranquilidade o repasto antes iniciado, porque, apesar de serem invertebradas, também possuem estômago... ■ 26 Sábado, 15 de Junho de 2013. Economia Giro económico Nosso Kumbu Sem escoamento café está a sobrar A falta de escoamento e investimento está a condicionar a cultura de café na província de Malanje, reduzindo a produção. Conforme o Departamento Provincial do Instituto Nacional do Café. Por falta de escoamento encontra-se armazenado na Estação de Desenvolvimento Agrário (EDA) do município de Calandula cerca de 18 toneladas de café, desde 2009.O café armazenado foi adquirido pelo Instituto Nacional do Café aos cafeicultores das comunas de Kinge, Kateco-Kangola e Kota (Calandula), para que estimulasse cada vez mais a produção, o que não aconteceu. A par da falta de escoamento e comercialização do café, actualmente verifica-se em Malanje várias fazendas abandonadas, por descapitalização dos proprietários e desinteresse na produção. Na província de Malanje existem cerca de 150 toneladas de café para comercializar, desde 2010, por essa razão está condicionada, este ano, a abertura da campanha de produção de café. Investir no mínimo são USD 5.000.000 O valor mínimo para o investimento privado no país, para empresários nacionais, no entender da Associação Industrial de Angola (AIA), deveria ser Angola Invest: só 19 projectos de 500 milhões de Kwanza. Segundo José Severino, presidente da entidade, um investimento equivalente ou abaixo dos 100 milhões de Kwanzas não se compatibiliza com a realidade objectiva do país. Para ele o investimento de 100 milhões de Kwanzas está a dificultar a aceleração do desenvolvimento. Na Lei de Investimento Privado, em vigor no país, cada investidor fica obrigado a aplicação de 100 milhões de Kwanzas (um milhão de dólares norte-americano), caso o projecto de investimento fique ao abrigo do regime dos investimentos privados. Centros logísticos nos «confins» Os municípios do Moxico (sede), Luau e Alto-Zambeze vão ganhar, a médio prazo, centros de Logística e de Distribuição de alimentos para ala- BNA - EXECUÇÃO DOS MERCADOS Semana de 03 a 07 de Junho de 2013 Venda de divisas ao sistema bancário: USD 400,0 milhões. Taxa de câmbio média de referência, de venda (USD / Kwz): 96,453. Operações de mercado aberto (de venda de títulos com acordo de recompra): Kz 13,1 mil milhões. Para a gestão da despesa corrente do Tesouro Nacional o Banco Nacional de Angola colocou no mercado primário Títulos do Tesouro no montante de Kz 4,3 mil milhões, sendo Kz 1,1 mil milhões em Bilhetes do Tesouro e Kz 3,28 mil milhões em Obrigações do Tesouro. As taxas de juro médias apuradas foram de 3,00% e 6,00%, ao ano, para os Bilhetes do Tesouro com 91 e 364 dias de maturidade. Para as Obrigações do Tesouro as taxas de juro apuradas foram de 7,00% e 7,25%, ao ano para as maturidades respectivas de 2 e 3 anos. E vancar a economia da província, refere uma nota do Gabinete de Estudos e Planeamento do governo da província do Moxico. Vão ser construídos igualmente um pavilhão para a feira do Luena, infra-estruturas para as estações de desenvolvimento agrário nos municípios do Alto-Zambeze, Bundas e Luchazes. Está previsto também a criação de um Pólo Agro-pecuário no município de Kameia, um centro de experimentação florestal na cidade do Luena, um Matadouro, bem como uma unidade de congelação, conservação e embalagem de pescado. Segundo a nota, o projecto contempla a construção de um mercado municipal, laboratório para análises de produtos alimentares (município do Luau) e uma incubadora de empresas. Estimular empreendedorismo O presidente da Associação dos Empreendedores de Angola (AEA), Jorge Baptista, considerou imprescindível que se estimule cada vez mais o empreendedorismo no país, para haver mais inovadores, empreendedores e criação de mais emprego aos jovens. Segundo Jorge Baptista, «África tem alguma dependência na questão da inovação e tudo o que for inovado e tiver sempre um valor acrescentado acaba por ser um diferencial para a construção do futuro, sobretudo agora que os jovens estão nas universidades». A AEA realizou a Feira do Empreendedorismo na semana passada no Estádio dos Coqueiros. Lenha e carvão por gás butano Angola tem um forte potencial para promover gradualmente a substituição do consumo de lenha e de carvão vegetal por gás butano e outras fontes renováveis geradoras de energia segundo a assessora do Ministério da Agricultura, Vitoria Bragança. Para ela Angola possui uma matriz energética nacional que permite uma visualização do planeamento a longo prazo e uma geração de energia de acordo com as crescentes necessidades. 60 Porcento da população angolana que vive no meio rural usa a lenha e o carvão vegetal como principal fonte energética. A necessidade anual de lenha e de carvão vegetal rode os seis milhões de metros cúbicos/ano, o que corresponde a aproximadamente 51 bilhões de kwanzas em desperdício do produto. ■ Centenário da descoberta de diamantes em Angola m alusão ao centenário da descoberta dos primeiros em Angola, a Empresa Nacional de Diamantes - ENDIAMA E.P., vai promover na próxima semana, nos dias 20 e 21 de Junho, em Luanda, uma conferência internacional. Para o efeito, foram convidadas várias entidades e companhias nacionais e estrangeiras ligadas à indústria diamantífera, nomeadamente ministros dos Recursos Minerais de países produtores e exportadores e presidentes das grandes mine- radores do sector e das bolsas de diamantes de Nova Iorque, Xangai (China), Dubai, Bombaim (Índia) e de Antuérpia. A produção de diamantes em Angola começou em 1917 com o surgimento, a 16 em Outubro deste ano, da Companhia de Diamantes de Angola “Diamang”, uma empresa de capitais mistos de grupos financeiros de Portugal, Bélgica, Estados Unidos, Inglaterra e África do Sul. Em 1981, as autoridades angolanas passaram a ter o controlo total da produção de diamantes no país e criam a Empresa Nacional de Diamantes (Endiama). ■ Sábado, 15 de Junho de 2013. 27 Economia Exploração à serio Petróleo «Total» em campos de «flores» Com a exploração nos quatro campos do Bloco 17- que atendem pelos nomes floridos de Cravo, Lírio, Orquídea e Violeta - a empresa «Total» planeia dar um salto na produção. Os custos operacionais estão acima de um milhão de dólares. O investimento para aumentar a capacidade de produção varia entre os três e quatro milhões por ano.E o resultado esperado é de 160 mil barris por dia. os próximos 15/20 anos e com potencial de ir mais longe se a projecto da bacia do novo kwanza por positiva», desabafou Jorge Abreu. A Total produz mais de 600 mil barris de petróleo/dia, o que representa um terço da produção nacional. Adriano de Sousa A té ao final do primeiro trimestre do próximo ano a produção nacional de petróleo terá uma subida de pelo menos 160 mil barris/dia com a entrada em funcionamento do CLOV, um conjunto de plataformas situado no bloco 17 que engloba o desenvolvimento de quatro campos (Cravo, Lírio, Orquídea e Violeta). O complexo será operado pela Total, de acordo com Jean-Michel Lavergne, director-geral da filial angolana da empresa francesa. Os custos operacionais no Bloco 17 estão acima de um milhão. Ao todo, o investimento para aumentar a capacidade de produção da Total varia entre os três e quatro milhões/anos. «Estes são investimentos importantes que são feitos a prazo. Para exemplificar, as primeiras descobertas no bloco 32 foram feitos no princípio do ano 2000 e nós estamos a prever o primeiro retorno do investimento em 2017/2016. É uma industria de capital intensivo mas de um ciclo longo», explicou Jorge Abreu, Director-Geral Adjunto da Total EP. O projecto CLOV situa-se o Bloco 17 e é explorado por um consórcio liderado pela Total (40%) e que integra ainda a norueguesa Statoil (23,3%), a americana Esso (20%) e a britânica BP (16,67%). De acordo ainda com a Total, o «Jardim petrolífero» desenvolvimento do CLOV serve-se de tecnologias que já se provaram eficazes no Girassol, Dalia e Pazflor. Um total de 34 poços submarinos serão conectados ao FPSO CLOV, com uma capacidade prevista de produção de cerca 160.000 barris de petróleo por dia e uma capacidade de armazenamento de cerca de 1,8 milhões de barris. O FPSO CLOV, através de um único sistema de processamento e armazenamento, produzirá dois tipos de petróleo de reservatórios do Oligoceno (Cravo-Lírio) e de reservatórios do Mioceno (Orquídea-Violeta). Actualmente, o Bloco 17 é um dos que mais produz no mundo e tem dos desenvolvimentos mais ambiciosos jamais realizados em águas profundas, em média a 1500 metros de profundidade. No passado a Total operou activos no onshore da bacia do Congo e, durante 25 anos, do prolífico Bloco 3 antes de transferir progressivamente a sua operação para a Sonangol P&P. O Grupo também é operador do Bloco 32 no offshore ultra profundo, no qual detém 30%. Treze descobertas confirmam o potencial deste Bloco e estudos conceptuais de desenvolvimento estão em curso para o primeiro projecto na região centro sudeste do Bloco (Kaombo), com o início da produção previsto para 2016. Outros desenvolvimentos estão previstos na região norte do referido Bloco. Todavia, a empresa tem depositado esperança e dinheiro pela via do investimento na Bacia do Kwanza. «O novo desafio que já estamos a preparar há cerca de dois anos é a exploração na bacia do Kwanza. Nós hoje temos um portfólio que nos dá uma garantia de actividade em Angola para As descobertas em águas profundas no Bloco 17 e nos Blocos vizinhos (Blocos 14, 15 16) marcaram o ponto de virada da produção de petróleo em Angola. Em 1996, com a descoberta do poço Girassol – também no Bloco 17, em águas profundas, Angola deixou de ser um simples produtor médio de petróleo para se tornar num dos pontos principais para busca de novas reservas. Com a entrada em produção do Girassol, os índices de sucesso cresceram. Uma tendência que se previa contínua para os anos seguintes, a medida que mais poços em águas profundas fossem descobertos e entrassem em produção. As descobertas em águas profundas da costa Atlântica angolana têm alcançado sucesso. No Bloco 17, além dos campos da Total, encontrou-se petróleo em todos poços ali perfurados - Rosa, Dália, Orquídea, Jasmin, Tulipa e Girassol. ■ Pioneiro em África Á A Total é o primeiro produtor de petróleo em África e está presente em mais de 33 países. Cerca de 30% de toda a gasolina vendida em África trazem a sua marca. frica é o segundo pólo (depois do médio oriente) mais importante para o grupo. «A Total foi criada nos anos 1520 para gerir os activos do governo francês no médio oriente. Nasceu no Iraque, foi o primeiro lugar de actividade», revelou Jean-Michel Lavergne, director-geral da Total EP Angola. «África é de grande importância para o grupo e. como Angola é actualmente o segundo maior produtor no continente é relevante nas suas considerações. «Em Angola somos os primeiros em termos de volume de operações, mas no final dessa operação, o somatório de óleo que recebemos nos coloca em segundo lugar na quantidade de petróleo disponível para vender», continuou. Esse facto regista-se porque no nosso país a modalidade de contrato com as empresa engloba a partilha de produção com o Estado. «Dito de outra forma, todo petróleo produzido é repartido com o governo angolano e a parte que recebemos não nos coloca em primeiro lugar», reforçou Jean-Michel Lavergne. O nosso interlocutor explicou que na industria petrolífera um governo tem dois meios de obter lucros com a actividade de extracção de petróleo. O primeiro é através de impostos. Isso significa que as empresas vão ficar com todo óleo produzido mas vão pagar impostos depois das vendas. O outro jeito é através da partilha do óleo produzido. Desse jeito o governo fica com o lucro físico, ou seja, com o próprio produto. No caso de Angola a escolha foi a utilização dos dois métodos ao mesmo tempo. Há os impostos e a partilha de produção entre as empresas que operam no nosso país. É a Sonangol que representa os interesses do Estado. Actualmente, Angola produz, em média, cerca de 1,75 milhões de barris diários. ■ 28 Sábado, 15 de Junho de 2013. Economia «Efeito cascata» Investimento petrolífero Fundo Soberano «escorrega» no OGE BP-Angola: USD 10 bilhões em águas profundas Com a maior infra-estruturas submarina do mundo e a maior de águas profundas de África a empresa de petrolífera BP-Angola investiu pesado no Projecto PSM, no Bloco 31 da costa angolana. A produção nesse reduto já ultrapassa os 100 mil barris por dia. Novos horizontes se avizinham. Manuel Filho A petrolífera BP-Angola, de origem britânica, acaba de aumentar a sua capacidade de produção e exploração de petróleo, com a inauguração no passado dia 10 do corrente mês, do projecto PSM no Bloco-31. O projecto, em águas profundas, possui a maior infra-estruturas submarina do mundo e a maior de águas profundas de África, segundo declarou Paulo Pizarro, vice-presidente da companhia para a área de comunicação e relações externas. O projecto que consumiu cerca de dez bilhões de dólares, como calculou o responsável, começou a sua produção e operação em Dezembro de 2012 e, neste momento, produz mais de cem mil barris/ dias. «Hoje estamos aqui a celebrar o nosso projecto Bloco-31 em águas profundas que é a maior infra-estruturas submarina do mundo e que é a maior de águas ricas profundas de África, ontem, 10, foi a inauguração do offshore pelo Ministro dos Petróleos Botelho de Vasconcelos», confirmou o gestor que cuida da comunicação e relações externas da BP-Angola. Com representação em Angola a partir dos anos 70, a BP-Angola, segundo Paulo Pizarro, iniciou os trabalhos em meados dos anos 90 com as descobertas e operações em 2002 e 2004. Desde então a produção já não parou mais. «Tivemos acesso a parte de exploração e produção de hidrocarbonetos a partir dos finais dos anos 90 e as primeiras descobertas foram feitas ainda na mesma década», recordou. A BP-Angola faz trabalhos de operações e produção e tem parcerias em diversos blocos a destacar: o 18, descoberto em 2007; e 31, que começou a operar no ano passado, no projecto DSM nas sondas 15,17,19,20,24,25 e 26 em fase de pesquisa. A petrolífera británica trabalha em parceira com varias firmas nacionais e internacionais que em conjunto fazem pesquisa. Exposição petrolífera Com a inauguração do Offshore, a BP-Angola promove uma exposição tecnológica de ponta sobre o ramo petrolífero nas suas instalações do Museu de Historia Natural, na baixa de Luanda Contudo, Paulo Pizarro disse que a mostra tem como finalidade dar a conhecer as imagens, vídeos e simulações do projecto sobre a BP-ANGOLA. «Temos muita informação sobre a indústria petrolífera, sobre os desafios da indústria petrolífera, temos informações de projectos sociais e de Angola», descreveu. O responsável pela comunicação da BP-Angola apela aos pais e encarregados de educação a levarem as suas crianças - principalmente aquelas que amanha desejem enveredar pelo mundo dos petróleos -a conhecerem melhor o que é a industria petrolífera e como o petróleo é produzido. ■ Por causa das eleições gerais que ocorreram no ano passado, o Orçamento Geral do Estado (OGE) foi aprovado com atraso pelo Assembleia Nacional. A tomada de posse dos próprios membros do Parlamento e do Executivo também atrasou. E, por consequência, o Fundo Soberano também «escorregou». A aprovação da política de investimento do Fundo Soberano de Angola (FSDEA) está em atraso, de acordo com o comunicado de imprensa divulgado, na semana transacta, por José Filomeno dos Santos, que é membro do Conselho de Administração daquela instituição. A desculpa pelo facto, apresentada pelo documento, aponta como causas desse atraso a aprovação tardia do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2013 pelo Parlamento e da tomada de posse dos membros da Assembleia Nacional e do Executivo, na sequência das eleições gerais do ano passado. De acordo com José Filomeno dos Santos enquanto o Governo revê a estratégia de investimento do Fundo, o FSDEA vai continuar a trabalhar na consolidação das bases operacionais e prudenciais necessárias para a gestão profissional da instituição. «Vivenciamos uma série de ocorrências que, infelizmente, levaram a um atraso na aprovação da política de investimento do FSDEA, entre as quais se destaca a aprovação tardia do OGE/2013 e a tomada de posse dos membros da Assembleia Nacional e do Executivo, na sequência das eleições concluídas no ano passado», disse o gestor. Segundo ele, em conformidade com o compromisso de se operar de forma transparente, vão se fornecer informações regulares e actualizadas ao mercado, inerentes à actuação do Fundo Soberano. «Neste curto prazo, estamos empenhados na fortificação da nossa equipa com a contratação e capacitação de quadros nacionais», salientou. José Filomeno dos Santos informa, neste contexto, segundo ainda o documento a que a Angop teve acesso, que se vai continuar a pesquisar também sobre a definição do real papel de um fundo na sociedade, enquanto promotor de desenvolvimento sustentável, em conformidade com as aspirações dos cidadãos. Por outro lado, informou que o FSDEA dispõe de cerca de 500 biliões de Kwanzas (mas de mo- mento sob o controlo do Banco Nacional de Angola) para serem investidos, maioritariamente, em infra-estruturas. José Filomeno dos Santos salientou ainda que o Executivo Angolano está a trabalhar em estreita colaboração com os vários órgãos do Fundo para eleger um novo PCA. «Uma vez concluída a análise e aprovada a sua política de investimento pelo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, o FSDEA definirá as prioridades específicas em termos de despesas que irão apoiar o crescimento socioeconómico de Angola e a geração de reservas adicionais para o Estado», rematou, sem avançar datas. O Fundo Soberano de Angola (FSDEA) é um fundo autónomo pertencente integralmente ao Estado Angolano, tendo sido criado à luz dos padrões internacionais de governação e deverá diversificar, gradualmente, a sua carteira de investimentos em vários sectores e classes de activos. ■ Sábado, 15 de Junho de 2013. 29 Economia Falta de experiência Falências assombram o meio empresarial A dinâmica da nossa economia tem feito com que muita gente procure os caminhos legais para a abertura de empresas. E com isso uma nova realidade começa a atormentar quem não consegue sair-se bem como empresário. O aumento do número de falências. O Instituto Nacional de Apoio às Pequenas e Médias Empresas mostra-se preocupado com essa «maka». A falta de cultura empresarial e de acesso a financiamentos constituem algumas das principais razões que levam muitas empresas angolanas à falência, na opinião do presidente do Conselho de Administração do Instituto Nacional de Apoio às Pequenas e Médias Empresas (INAPEM), António Assis. A propósito das razões que fazem muitas empresas falir ou cessar a actividade empresarial no país, António Assis disse que existem vários factores que contribuem para tal, entre os quais inclui-se a necessidade de os empresários estudarem e conhecerem bem o foco do negócio. O responsável disse que o crédito é um problema real da economia mas não é o único. «Talvez muitas pessoas classifiquem a questão do financiamento como sendo fundamental mas o dinheiro não é tudo, porque se a questão do posicionamento de uma em- presa fosse só dinheiro, então há muitas pessoas que têm dinheiro e não são empresários de sucesso», justificou. Afirmou ser claro que uma empresa quando criada tem objetivos como a obtenção de lucros, mas chamou atenção para a necessidade de se perceber que os bancos estão a passar por um processo de reorganização e de reestruturação às novas necessidades da economia de mercado. «Temos visto no nosso país que o que move as pessoas para algumas actividades são alguns instintos de sobrevivência e subsistência. Precisamos de cultivar mais o lado empresarial estudando e interagindo para que as empresas possam consolidar o processo», elucidou. Realçou também que o modelo de economia existente no país, o mercado qualifica as empresas e as melhores permanecem, entretanto aquelas que não derem resposta às dinâmicas do mercado abrem falência e desaparecem. O gestor realçou que ser empresário é uma responsabilidade muito grande e não consiste em apenas produzir bens e prestar serviços aos clientes, mas também com as obrigações com os trabalhadores e para com o Estado (pagamento de imposto). «Ser empresário não é uma tarefa fácil que qualquer um pode fazer desenvolver», acentuou o PCA do INAPEM. Referiu que não é de estranhar o facto de muitas empresas que desenvolvem a sua actividade em Angola não resistam no mercado, por ser também um fenómeno por que passaram as economias mais avançadas. Buscando antecedentes da economia angolana, a fonte argumentou que para fazer uma análise acerca das falências de muitas empresas é preciso ver também o processo empresarial dinâmico do país. «Quando se fala em empresariado nacional e local em Angola é preciso considerar factores de natureza histórica. A actividade empresarial privada é nova, disse, fundamentando que é preciso não esquecer que durante a fase da colonização a actividade privada estava destinada aos colonos. Os nativos desenvolviam a agricultura de subsistência enquanto o comércio e a indústria estavam nas mãos dos colonos». Justificou também que depois da independência, em 1975, teve-se uma economia centralizada em que o Estado era providência e ocupava-se de toda esfera da economia e que com o advento da paz começou-se a notar um pouco de mais notoriedade de Angola. ■ Entre a AEA e o Grupo Terrovia Protocolo promove empreendedorismo internacional Empresa que actua em Angola, Portugal e Brasil estabelece uma perceria com a Associação dos Empreendedores de Angola que poderá levar empresas angolanas a internacionalizar-se para o Brasil e a trocar experiências com o empresariado brasileiro. O s empresários aliados a Associação dos Empreendedores de Angola (AEA), a partir de agora, vão ter a possibilidade de encontrar muitas facilidades para internacionalizar-se, mais precisamente estabelecer negócios com o Brasil e ter um conhecimento mais profundo sobre o mercado daquele país. Miguel Machado do Grupo Terrovia, citado pela Angop, deu a conhecer a novidade Angop, após ter assinado um protocolo de cooperação com Jorge Baptista, presidente da AEA (Associação dos Empreendedores de Angola). O protocolo visa dar maior mobilidade a actuação dos associados desta agremiação empresarial, que existe há dois anos. «A nossa empresa actua aqui em Angola, através do Grupo Romagest, estamos também em Portugal e no Brasil. A estratégia de actuação é operar nos países de língua portuguesa, em consulta a uma empresa especializada no mercado brasileiro», explicou ressaltando o desenvolvimento da economia angolana e a potencial dos empresários nacionais. Tendo em conta que o Brasil possui a quinta maior economia mundial, Miguel Machado entende ainda que a cooperação vai ser uma vantagem para a projecção da competência empreendedora angolana. AEA é uma associação com personalidade jurídica, autonomia administrativo-financeira e sem finalidade lucrativa e resulta de uma visão comum para o empreendedorismo em Angola. A Associação dos Empreendedores de Angola tem como objectivo contribuir para o fomento e desenvolvimento do empreendedorismo, a melhoria da informação e troca de experiências entre organizações e associações públicas ou privadas, que na sociedade angolana ou fora dela pugnem pela busca dos nobres interesses da defesa e dos empreendedores. Promover a formação de jovens e estimular o espírito de liderança e empresarial e a participação do empreendedor do país, bem como promover seminários, debates, colóquios, palestras, cursos, conferências simpósios e outras acções de natureza científica,” com vista a contribuir para a capacitação dos empreendedores e consequentemente a competitividade nacional da classe, fazem parte dos objectivos da AEA. ■ 30 Sábado, 15 de Junho de 2013. Sociedade ISKA também quer províncias Uma instituição apostada na qualidade de ensino Em cumprimento a uma das exigências do Ministério do Ensino Superior (MES) em relação às instituições de ensino desse nível em Angola, o ISKA aposta principalmente na qualidade e condições de ensino, assim como na sua expansão da a outros pontos do país. Kim Alves Hélder Simões: (Fotos) O Instituto Superior Kangunjo de Angola (ISKA) é uma das mais novas e promissoras instituições do ensino superior no país. Situado no município de Cacuaco, em Luanda, próximo da autoestrada, começou a sua actividade lectiva em 01 de Janeiro de 2011, precisamente há três anos. O ISKA conta já com dois laboratórios em pleno funcionamento, nomeadamente um de engenharia informática e o outro de saúde. Numa visita efectuada pela reportagem do Semanário Angolense (SA) àquela instituição, pode constatar que o laboratório de saúde reúne todos os equipamentos necessários, como aparelhos de análises, microscópios, lavatórios, bonecos e esqueletos para as aulas práticas de anatomia do corpo humano, entre outros. Este último laboratório incorpora ainda as salas de esterilização, enfermagem e fisioterapia, realizando os estudantes aulas práticas nas respectivas salas logo a partir do primeiro ano. Quanto ao de engenharia informática, o cenário é idêntico: os estudantes têm igualmente à disposição todos os equipamentos imprescindíveis para aulas práticas, além de outra sala de Internet em banda larga para pesquisas. Falando ao SA, o director do ISKA, António Ngola, disse que a academia que dirige tem feito um esforço muito grande, visando corresponder às exigências dos órgãos competentes do Estado. De acordo com a sua explicação, no capítulo da formação, o instituto superior lecciona treze cursos, mas actualmente estão a funcionar apenas doze, excepto o curso de fisioterapia, porque, este ano, houve poucos candidatos inscritos, «razão que nos levou a primar por outros cursos». Capacidade da instituição Neste momento, estão em fun- cionamento três áreas de formação: a primeira abrange as áreas de ciências económicas, ciências jurídico-económicas, sociais de tecnologia e engenharia. Esta área absorve uma série de cursos, nomeadamente direito, economia, gestão, ciências políticas, telecomunicações, informática e relações internacionais. António Ngola informou ainda que a segunda área de formação abarca a saúde, que conta com os cursos de enfermagem, análises clínicas, fisioterapia e ciências farmacêuticas, ao passo que as ciências de educação incorporam os cursos de sociologia, psicologia e pedagogia. O responsável revelou que a instituição tem capacidade para acolher 4.500 estudantes, mas apenas 2.124 estão a estudar, repartidos pelos turnos da manhã, tarde e noite. Os turnos da tarde e noite são os que verificam o maior número de estudantes. Em termos de docentes, «estamos bem, temos um total de 120 para todos os cursos, sendo quatro estrangeiros. Dois estão na área de saúde, enquanto os outros dois, leccionam nos cursos de engenharia informática, ciências jurídico-económicas, sociais e tecnologia». O director aproveitou a ocasião para apelar a todos que se queiram inscrever para a docência no ISKA, «que o façam, apresentando as suas candidaturas». Relativamente ao processo de selecção dos estudantes, a instituição obedece, de forma normal, ao calendário do ano académico orientado anualmente pelo Ministério do Ensino Superior. Secretário de Estado aprovou «A nossa perspectiva visa melhorar cada vez mais a qualidade do ensino superior», declarou, frisando que o preço das propinas é o mesmo praticado por outras instituições. «Por exemplo, os cursos de engenharia e ciências de saúde são 30 mil Kwanzas e para os restantes cursos 25 mil. No entanto, aguardamos que haja uma legislação por parte do ministério de tutela, visando a sua regulari- zação», acrescentou. No âmbito da supervisão que o Ministério do Ensino Superior tem levado a cabo junto de instituições similares, o ISKA recebeu recentemente a visita do secretário de Estado para supervisão do MES, António Miguel, que avaliou as condições infraestruturais, académicas e pedagógicas, do instituto. António Ngola considerou positivo, «uma vez que a visita do dirigente coincidiu com a altura em que se deu o arranque das aulas do ensino superior em todo o país». O director realçou ainda que um país só chega ao desenvolvimento quando o Estado aposta na formação do cidadão. «É esta a aposta que o ISKA, como instituição privada, criada através do decreto nº 115, com os cursos que lecciona, publicados no decreto nº 89, tem. Para tal, primamos pela qualidade dos quadros formados». Recordou que há dois anos, a instituição carecia de algumas condições em infraestruturas, situação já ultrapassada. Promete para os próximos anos, mudanças de vulto, anunciando que haverá aposta em outras províncias, sendo uma delas a do Bié, onde já foi erguido um edifício, que, até ao próximo ano pode entrar em funcionamento. A expansão da instituição é apoiada pelo grupo Manico Henda e Filhos LDA. Apenas se aguarda pela autorização de quem de direito. ■ Sábado, 15 de Junho de 2013. 31 Sociedade Por prática ilícita BPC vai expulsar funcionário A troco de comissões, o visado concedia créditos a uma rede de indivíduos, um dos quais se gaba de estar ao serviço da gerente e de outros funcionários, usando abusivamente o dinheiro dos solicitantes. A mulher desmente, mas o PCA diz que não tolera irregularidades e que tomará medidas drásticas. Pascoal Mukuna O Banco de Poupança e Crédito dispensar um empregado, por ter praticado um ilícito que visou obter comissão pessoal e outros à margem da lei, anunciou o presidente do seu Conselho de Administração, Paixão Júnior, em declarações ao Semanário Angolense. O gestor bancário falava a propósito de um caso ocorrido na agência desse banco no edifício da Administração Municipal do Cazenga, em que o cidadão Abel Wilson Chivela, sub-chefe (sargento) da Polícia de Guarda Fronteiras, solicitou dois créditos, um salário e o outro futuro, através de um indivíduo, identificado simplesmente como «Matrix», que sequer lá trabalha, mas faz parte de uma rede com funcionários daquela agência do BPC. O cliente recebeu um dos créditos, que «Matrix», depois de ter retirado uma comissão de Kz. 50.000, encarregou um seu amigo de entregar ao legítimo dono, mas o outro dinheiro, o indivíduo, que se mantinha com o Bilhete de Identidade de Abel Chivela, falsificou a assinatura deste e levantou-o, gastando-o. «Foi-me dando voltas, recusava-se a dar-me o dinheiro, até que decidi vir conversar com a senhora gerente do banco, porque ele se gaba de trabalhar com a gerente e de ser o gerente da rua», contou o sargento da Guarda Fronteiras ao SA Paixão Júnior adiantou que daria instruções para que a gerente daquela agência, conhecida como Elisa, e Fabrício,o funcionário que concedeu os valores a «Matrix», fossem convocados para a sede a fim de apurar responsabilidades. «O funcionário que entregou o dinheiro vai ser imediatamente expulso, não podemos permitir que manchem desta forma o nome do banco», asseverou o PCA. «Matrix»: «gerente da rua» Afirmou que ninguém tem direito a exigir comissões a um cliente que peça crédito, que é um direito que lhe assiste. «Ainda por cima, falsificaram a assinatura do cliente, isso é muito grave. Temos de separar as batatas podres das boas, esse funcionário vai já para a rua», reiterou Paixão Júnior. Abel Chivela, intercedeu junto da gerente, que chamou Fabrício, a quem pediu que entregasse ao cliente a quantia de 200 mil Kwanzas, valor que «Matrix» tardava a dar ao primeiro. Dona Elisa declarou que tal valor será descontado do salário de Fabrício. Acompanharam o homem, a esposa, Letícia José Martins, operada a um tumor, intervenção cirúrgica que seria paga com o di- nheiro resultante daqueles créditos, e um irmão. A enferma, que continua a fazer curativo à operação, recebeu alta no passado domingo, 09, estando a cuidar de um bebé de dois meses, que às vezes a magoa. «Matrix», que chefia a rede de jovens que, segundo ele próprio, possui conexão com a gerente Elisa, a quem se refere como «Mãe-grande» ou «Velha» e outros trabalhadores da agência, diz ser o «gerente da rua» da referida instituição bancária. «Ainda há bocado gabou-se de que esteve há pouco tempo com a ‘Mãe-grande’, no seu gabinete, toda gente aqui na rua sabe disso», denunciou Abel Chivela. Certa vez, depois de pressionado pelo dono do dinheiro, o «gerente da rua» desafiou-o nos seguintes termos: «podes ir queixar à Polícia, todos eles pedem kilápi, até o comandante.» Ele e o grupo concentram-se num cadeirão junto a uma casa nas proximidades do banco, sendo solicitados por quem queira obter créditos ou outros serviços. A rede mantém-se intacta Confrontada com essas alegações, a gerente pediu a comparência de «Matrix», que, numa espécie de acareação, desmentiu tudo e, cabisbaixo, manifestando-se arrependido. Facto curioso e que suscitou suspeitas, foi o de, em diversas ocasiões, dona Elisa ter ordenado a «Matrix» «cala a boca. O senhor está a sujar o meu nome. Disse não ser a primeira vez que recebeu queixas similares sobre «Matrix», mas, estranhamente, nunca a gerência sancionou um(a) funcionário(a) por tais actos à margem da lei. Um outro cliente confirmou a este jornal que o «gerente da rua» levantou 600 mil Kwanzas de um cliente e 300 mil seus e que reluta em entregar-lhes, arranjando muitos subterfúgios. Alegou que é bancária há já 27 anos, tendo antes sido gerente da agência da Precol, distrito do Rangel, depois de ter ocorrido na Ingombota e que o jovem não lhe ia estragar o seu «pão». A gerente adiantou que o funcionário que disponibilizou o dinheiro, no caso Fabrício, será responsabilizado Entretanto, Abel Chivela exige que «Matrix» o indemnize, pois para pagar a intervenção cirúrgica da esposa, no valor de quatro mil dólares, teve de contrair dívida, que agora precisa de liquidar. ■ 32 Sábado, 15 de Junho de 2013. Sociedade Algo não vai bem em matéria de segurança O que diz a criminologia em relação a situações criminais? Em matéria de crimes, o país tem vindo a seguir e somar significativamente nos últimos dias. São homicídios que culposo como doloso. Os órgãos competentes perderam o controlo da situação e muita gente vai morrendo de forma cruel. Baldino Miranda O s angolanos têm vindo a acompanhar, na capital do país e não só, a um aumento significativo do cometimento de diversos crimes, particularmente, homicídios, estando até os efectivos da própria Polícia Nacional também a ser vitimados. Ultimamente, parece que matar tornou-se moda entre os cidadãos deste país, que ruma para níveis de criminalidade sem igual. Há semanalmente mortes por homicídios um pouco por todo o país, pois, para além daqueles que são apresentados publicamente pela Polícia através dos órgãos de Comunicação Social, existem as que não vêm à superfície. Um exemplo vivo desta situação foi o facto que ocorreu recentemente no Kwanza-Norte, onde uma cidadã, que regressava da lavra, num dos municípios da província, foi surpreendida por dois jovens, que a estupraram, seguindo-se o acto de execução ou seja, para além de terem cometido o crime de violação, tiraram também a vida à humilde mulher. De acordo com informações a que o Semanário Angolense teve acesso a partir da província, os presumíveis autores já se encontram a contas com a justiça. Vários outros delitos têm sido cometidos de forma assustadora na capital do país, onde diária ou semanalmente há casos de homicídio doloso e culposo. O primeiro caso ocorre quando alguém tira a vida a outrem de forma dolosa ou com a intenção de matar. Os crimes e os culposos O dolo consiste, porém, no facto de alguém agir com o intuito de, propositadamente, fazer mal a outra pessoa e, o segundo caso, que é o homicídio culposo, é aquele em que um sujeito tira a vida a alguém, sem a mínima intenção de matar. Deste modo, no homicídio culposo, o autor do crime é dado como culpado no sentido de ter cometido o crime. O que se tem vindo a registar nos últimos tempos é, crimes de homicídio doloso ou seja, o chamado homicídio qualificado, em que existe premeditação do crime cometido, traça-se planos e, consequentemente, os elementos de execução são esses que resultam nos chamados crimes hediondos ou bárbaros. Independentemente das desavenças políticas que os partidos possam ter, tais não se devem repercutir de forma alguma na vida ou na liberdade individual de cada cidadão, que parece ter sido o caso dos cinco polícias mortos, recentemente, por cidadãos, ainda não identificados, que após o acto, se puseram em fuga. Realmente, essa não deixa de ser uma situação criminal, cuja natureza não se enquadrada nos homicídios dolosos, porque houve antes de mais uma premeditação, foi projectada e bem planificada pelos autores. De uma forma geral, existem motivos que, realmente, concorrem para o aumento dos índices de criminalidade na cidade de Luanda, e não só, o que devia motivar os dirigentes governamentais e estatais a pautarem por uma profunda investigação e consequentemente aplicarem meios para a prevenção desses crimes. O que motiva um indivíduo a cometer crime? Várias são as causas que levam um indivíduo a cometer crimes, fundamentalmente, dos pontos de vista sociológico, biológico, psicológico, entre outros ramos do saber. Dessas motivações, no âmbito da própria sociologia, sobressaem as desigualdades sociais, o facto de muitos, a maioria, terem nada ou pouco e outros, uns poucos, terem mais, o que provoca um espírito de revolta no seio social. Para percebermos perfeitamente as razões fundamentais do indivíduo criminoso, numa perspectiva científica, este jornal insere aqui ditos de Cesare Lombroso, um estudioso italiano, que nasceu na cidade de Verona, e do qual pouco se fala, mas cujos escritos, do ponto de vista do Direito Penal, permanecem actuais. Cesare Lombroso (1835-1909) foi um homem polifacético: médico, psiquiatra, antropólogo e político, com uma extensa obra abarcando temas médicos (“Medicina Legal”), psiquiátricos (“Os avanços da Psiquiatria”), psicoló- gicos (“O gênio e a loucura”), demográficos (“Geografia Médica”), criminológicos (“L’Uomo delincuente). Lombroso entendia o crime como um facto real, que perpassa todas as épocas históricas, natural e não como uma fictícia abstração jurídica. Como fenómeno natural que é, o crime tem que ser estudado primacialmente em sua etiologia, isto é, a identificação das suas causas como fenómeno, de modo a poder-se combatê-lo na sua própria raiz, com eficácia e programas de prevenção realistas e científicos. Para Lombroso, a etiologia do crime é eminentemente individual e deve ser buscada no estudo do delinqüente, sendo dentro da própria natureza humana que se pode descobrir a causa dos delitos. Sábado, 15 de Junho de 2013. 33 Sociedade Caracterização dos ctiminosos Lombroso parte da idéia da completa desigualdade fundamental dos homens honestos e criminosos. Preocupado em encontrar no organismo humano traços diferenciais que separassem e singularizassem o criminoso, Lombroso vai extrair da autópsia de delinqüentes uma «grande série de anomalias atávicas, sobretudo uma enorme fosseta occipital média e uma hipertrofia do lóbulo cerebeloso mediano (vermis) análoga a que se encontra nos seres inferiores.» Assim, surgiu a hipótese, sujeita a investigações posteriores, de que haveria certas afinidades entre o criminoso, os animais e, principalmente, o homem primitivo, que ele considerava diferente, psicológica e fisicamente, do homem dos nossos tempos. Aquele cientista empreendeu um longo estudo antropológico no seu livro «L’Uomo delincuente», acerca da origem da criminalidade. Professando um particular evolucionismo, Lombroso procurou demonstrar que o crime, como realidade ontológica, pode ser considerado uma característica que é comum a todos os degraus da escala da evolução, das plantas aos animais e aos homens; dos povos primitivos aos civilizados; da criança ao homem desenvolvido. O «crime» teria como característica ser extremamente freqüente, brutal, violento e passional nos níveis inferiores dessas escalas. Assim, Lombroso teorizou acerca dos equivalentes do crime nas plantas e nos animais («L’Homme Criminel, chapitre premier»), a morte de insectos pelas plantas carnívoras («homicídio»), a morte para ter o comando da tribo entre os cavalos, cervos e touros («homicídio por ambição»), a fêmea do crocodilo que mata seus filhotes que ainda não sabem nadar («infanticídio»), as raposas que se devoram entre si e algumas vezes mesmo devoram suas progenitoras («canibalismo e parricídio»). Entre os chamados «selvagens» ou «povos primitivos», Lombroso encontra também a incidência generalizada do crime. O incremento excessivo da população, comparativamente aos meios naturais de subsistência, explicaria os abortos e os infanticídios. Predisposição infantil para o crime São ainda comuns e frequentes, segundo Lombroso, os homicídios dos velhos, das mulheres, dos doentes, os homicídios por cólera, por capricho, de parentes por oca- sião do funeral de morto importante, por sacrifícios religiosos, os cometidos por brutalidade ou por motivo fútil, os causados por desejo de glória etc.. São igualmente comuns entre os selvagens, o canibalismo, o roubo, o rapto, o adultério e os crimes contra a autoridade (chefes, deuses ou a própria tribo). Dentro da idéia evolucionista lombosiana (de passagem física ou psíquica do organismo mais simples para o mais complexo), os germes da loucura moral e do crime encontram-se de maneira normal na infância.Lombroso advogava a existência na infância de uma predisposição natural para o crime. As analogias entre o imaturo e o criminoso dar-se-iam na fase da vida instintiva, através da qual se observa a precocidade da cólera, que faz com que a criança bata nos circunstantes e tudo quebre, em atitudes comparáveis ao compartamento violento criminoso. O ciúme, a vingança, a mentira, o desejo de destruição, a maldade para com os animais e os seres fracos, a predisposição para a obscenidade, a preguiça completa, excepto para as actividades que produzem prazer, são, entre outros, índices que Lombroso apontou, das tendências criminais na infância. A educação conduziria, porém, a criança ao período de «puberdade ética», submetendo-a a profunda metamorfose. Identificando pois a origem da criminalidade, como ontologia, nessas «fases primitivas» da humanidade, Lombroso entende que o criminoso é uma subespécie ou um subtipo humano (entre os seres vivos superiores, porém, sem alcançar o nível superior do homo sapiens) que, por uma regressão atávica a essas fases primitivas, nasceria criminoso, como outros nascem loucos ou doentios. A herança atávica explicaria, a seu ver, a causa dos delitos. O criminoso seria então um delinqüente nato (nascido para o crime), um ser degenerado, atávico, marcado pela transmissão hereditária do mal. O atavismo (produto da regressão, não da evolução das espécies) do criminoso seria demonstrado por uma série de «estigmas.» De acordo com o seu ponto de vista, o delinqüente padece de uma série de estigmas degenerativos, comportamentais, psicológicos e sociais. O criminoso nato seria caracterizado por uma cabeça sui generis, com pronunciada assimetria craniana, fronte baixa e fugídia, orelhas em forma de asa, zigomas, lóbulos occipitais e arcadas superciliares salientes, maxilares proeminentes (prognatismo), face longa e larga, apesar do crânio pequeno, cabelos abundantes, mas barba escassa, rosto pálido. ■ S. Pedro da Barra Moradores pedem presença da Polícia Telma Dias N os últimos dias, a circulação durante o período das 17 horas em diante, na zona de São Pedro da Barra, Distrito Urbano do Sambizanga, pracinha junto à linha férrea, tem sido encarada como sendo muito crítica naquela comunidade. Na noite de quarta-feira, 12, houve três disparos, supostamente feitos dentro de uma das cantinas de um oeste africano, vulgo «Mamadou», de onde foi assaltado todo dinheiro resultante das vendas do dia. Segundo residentes, não tem sido fácil circular por aquelas paragens, sobretudo para os estudantes nocturnos, que têm visto os seus bens assaltados pelos amigos do alheio. Por esse cenário, as vítimas clamam a quem de direito, que se crie políticas visando encontrar soluções para assegurar a integridade física aos milhares de cidadãos que circulam pela referida zona, apontando, sobretudo, os períodos da manhã e noite, em que permanece mais isolada. Os af litos pretendem que o Comando da Divisão do Sambizanga instale uma Esquadra Móvel no referido local, no intuito de devolver o sentimento de segurança e paz aos habitantes, e não só. Meliantes actuam a bel-prazer De acordo com o morador Manuel de Carvalho, durante os períodos referenciados, os malfeitores têm tomado de assalto a localidade, tudo devido à inexistência de iluminação nas vias do bairro, apesar de ter melhorado muito. Segundo contaram as distintas fontes, os mais visados pelos meliantes têm sido as raparigas, às quais, retêm e abusam sexualmente, sob pena de serem assassinadas. Tudo devido ao multiplicar do número de marginais, que privatizam a via pública e se expropriam do que não lhes pertence. Os malfeitores preferem, sobretudo, pessoas que trazem consigo dinheiro, telefones e outros artigos valiosos, que após assaltarem, vendem-nos para comprarem objectos valiosos, para além de drogas. Os populares apelaram às autoridades que velem pela ordem pública a nível do município e encarem o assunto com muita ponderação, no intuito de garantirem a ordem e a tranquilidade aos cidadãos. Orlando de Almeida, munícipe, morador da circunscrição há mais de 20 anos, contou que, raramente durante o período da noite, verifica uma patrulha da polícia na região, situação que tem levado inúmeros de jovens a abraçarem a vida de marginais. Acrescentou que, o crescimento da delinquência no bairro tem vindo a forçar os comerciantes a encerarem muito cedo a sua actividade, devido ao risco a que são submetidos pelos meliantes. Não poupam crianças Isabel Mendes é de opinião que, com a instalação de um posto policial ao longo deste troço e da linha férrea, os malfeitores vão retirar-se e procurar uma ocupação honesta e não virar as suas atenções para quem procu- ra algo para alimentar a família. Durante a sua estada na aludida zona, a reportagem do Semanário Angolense, constatou uma cena dramática, protagonizada por delinquentes. Assaltaram uma criança, de 11 anos, quando esta se dirigia para casa, depois ter sido orientada pela mãe a levar o jantar do mercado. Alguns indivíduos circunstantes limitaram-se a assistir, impávidos e serenos, perguntando depois à vítima: «levaram-te o que?» Antónia Machado salientou que também já foi vítima dos marginais, em duas ocasiões, quando os malfeitores lhe receberam todo o seu comércio que exercia na famosa praça. Reiterou que é fundamental a intervenção das autoridades da ordem pública no sentido de melhorar a circulação dos habitantes que, dia e noite, vivem num estado de perturbação. As vias de acesso naquela circunscrição, a partir da praça até ao Instituto Médio Politécnico do Sambizanga, São Pedro da Barra, segundo dizem os populares, têm sido as que mais facilitam o desdobramento dos malfeitores, pela ausência de postos policiais. De acordo os moradores, a essa situação também se encontra associada a fraca iluminação, com que se debate a população residente, para não falar da escassez de água potável, que está relegada para as calendas gregas. Saneamento básico inexistente, também tem sido apontado como o fulcro de bastantes doenças, causadoras de tantas mortes, particularmente de crianças, que têm sido as mais atingidas pelas enfermidades. ■ 34 U Sábado, 15 de Junho de 2013. Americano tem 22 filhos com 14 mulheres m americano de 33 anos de idade tem 22 filhos, o mais velho dos quais a completar 18 anos. Como se não bastasse esse número elevado de filhos, é preciso acrescentar que eles foram feitos com 14 mulheres diferentes. Entrevistado pela estação televisiva NBC, Orlando Shaw declarou que ama as mulheres e considera que não deve ser condenado por isso. Mas a verdade é que tanto amor custa dinheiro. As mães dos filhos entraram com uma acção judicial, exigindo o pagamento de milhares de dólares de pensão. Como não tem como pagar, o mais provável é que tanto amor o leve à cadeia. Até agora, o Estado americano gasta mensalmente cerca de 7 mil dólares (700 mil kwanzas) com os 22 filhos de Orlando. Casamento cancelado porque o noivo estava excitado U m padre deixou noivos e convidados perplexos, quando decidiu cancelar uma cerimónia de casamento devido ao facto de o noivo estar “visivelmente” excitado. O facto ocorreu numa igreja de Plácido de Castro (estado brasileiro do Acre), com o pároco Avelino Dalcântara. O noivo (na foto) confirmou estar realmente excitado, pois ansiava pela chegada da noite de núpcias. É que do namoro de dois anos não resultou qualquer relação sexual, de modo que era grande a ansiedade do jovem de 19 anos. O padre declarou à imprensa que não pode “dar a bênção a um casal que, ao invés de pensar na graça do Senhor, está a imaginar a graça que vai fazer depois da celebração”… Por: Makiadi Sémen humano é saudável U m estudo científico demonstra que o sémen de vários animais é rico em enzimas e proteínas, de modo que o excedente é normalmente consumido por várias espécies. O estudo, conduzido por Benjamin Wegener da Universidade Monash (na Austrália) e publicado na revista “Biology Letters”, dá conta de (após o acasalamento) as fêmeas da lula, sanguessuga e da mosca consumirem o sémen excedentário como se fosse alimento. No que respeita ao sémen humano, está provado que contém água, ácido ascórbico, ácido cítrico, enzimas, proteínas, fru- tose e zinco. Mas atenção, que o investigador não defende o consumo indiscriminado de sémen humano, tanto que está provado que isso pode causar dissabores no momento de tentar engravidar. Profissões que engordam D entre as profissões com maior probabilidade de provocarem aumento de peso, contam-se várias profissões sedentárias. Um estudo feito junto de 3.600 americanos, pelo site Career Builder, demonstra que as profissões que mais “engordam” são: secretária, engenheiro, professor, enfermeiro, gerente ou administrador de redes informáticas, advogado ou juiz, operador de máquinas, cientista, biólogo e sociólogo. Os autores do estudo recomendam a estes mudança de hábitos, como ir trabalhar de autocarro e descer uma ou duas paragens antes do destino, ganhar o hábito de comer legumes e frutas e manter-se sempre hidratado. Tentou ludibriar para não pagar a refeição U m inglês de 40 anos foi preso por fraude num restaurante indiano de Middlesbrough (Inglaterra). Tentou ludibriar para não pagar a refeição consumida. Mas a câmara instalada no local exibiu a prova de que Lee Tyers terá introduzido a mão por dentro da calça para arrancar um pelo púbico, que colocou de seguida sobre o prato com restos de comida. A intenção do cliente era não pagar a conta de 39,55 libras (cerca de 6 mil kwanzas). Mas teve o azar de a cor do seu pelo não colidir com a de nenhum dos funcionários do restaurante, de modo que se apelou para a câmara de vigilância. Para além de ter de pagar a conta, a tentativa de burla vai custar-lhe 2 semanas de prisão. Curiosidade Como surgiu o aperto de mão O aperto de mão é dos mais antigos cumprimentos em toda a história da humanidade. Só que apertamos a mão a outras pessoas, sem sabermos de onde provém tal hábito. No início, as pessoas estendiam a mão para mostrar que não levavam consigo qualquer arma. Era, portanto, um sinal de paz numa época em que as pessoas andavam armadas. Daí se percebe também a razão pela qual o aperto de mão é um hábito tipicamente masculino. É que eram os homens que andavam armados, sendo portanto os homens que tinham de demonstrar que não estavam armados. 35 Cultura Sábado, 15 de Junho de 2013. A propósito do romance de Tazuary Nkeita O enigma do «Último Segredo» e a lenda de «Santo Graal» Carlos Paradona (*) T azuary Nkeita surpreende com este seu último romance. Que palavras se oferecem dizer para desvendar este baú, que tem dentro de si a flama de O Último Segredo? Bastarão algumas palavras, sejam de quem for, para apresentar a público a mais recente obra deste escritor de mão cheia, que viu a luz do dia pela primeira vez na magnífica cidade de Luanda? Será uma voz do Índico suficientemente audível pata tecer considerações, ainda que breves, sobre esta proposta literária fermentada em terrras de Angola, onde o Atlântico contorna com a sua magia as suas virgens e donzelas? É que o escritor Tazuary Nkeita bebeu muito do seu povo para produzir a presente obra. José da Costa Soares Caetano, de seu nome completo, tem um percurso literário marcado pelo seu tempo, tempo esse que caracteriza a literatura angolana, uma literatura pujante e bastante expressiva que remonta desde época não independente de Angola. Não se deve esquecer que a literatura produzida em Angola derivou de uma época contestatária, onde o escritor suscitava as realidades históricas e sociais do seu povo. A sua temática variava desde o amor e a angustia existencial, às vivências do quotidiano do povo de Angola. Por isso, falar desta obra de Nkeita constitui um desafio. E como qualquer desafio que se preze como tal, impõe-se apresentar uma incursão pelas páginas deste livro, para dele buscarmos os segredos que se consubstanciam num último segredo. Começo por referir-me à lenda de Santo Graal. Uma lenda de mistérios e segredos. Segredos aglutinados na Taça de José de Arimateia, do Sangue de Cristo, que, estando na cruz, jorrou para o seu interior. Anos mais tarde, essa taça foi alvo de uma busca sem precedentes. Foi procurada por cavaleiros de vários reinos, precisamente porque nela estava o segredo. Queriam descobrir os seus segredos. Transcorridos milhares de anos, Tazuary Nkeita convida-nos a buscar «O último segredo», já não propriamente na Taça de José, mas sim dos mistérios e enigmas de uma família angolana deste século que vai simbolizar a passagem de testemunhos de geração em geração. Esta magnífica obra de Nkeita começa com Tulu Dibaia, ou Jipata, ou qualquer outro adjectivo a confrontrar-se com a génese do enredo por desvendar, escondido algures, numa espécie de papiros bíblicos, no fundo da Rua S-12. Ele próprio confundia-se com os mistérios da sua vida, com os enigmas que afloravam do seu ego, muito incompreendido pela sociedade que o rodeava. Parecia um farrapo despregado dele próprio. Era um homem que estava presente em todos lugares, mas nenhum desses ia ao encontro do que ele era, da sua essência e existência. Dedicado aos seus negócios, conhecia a terra dos seus ancestrais de lés a lés e era testemunha privilegiada do «modus vivendi» dos seus concidadãos, do pão de cada dia que, para muitos, era distante, das suas vidas inconformadas. Tulo Dibaia, ou seja quem for, prosperava nos negócios. A sua prosperidade distanciava-o da sua companheira, que se sentia ofuscada pelas suas constantes viagens, para expandir os seus empreendimentos, que chegaram às terras do Índico e às outras paragens. A estória desenrola-se em vários mundos. No primeiro mundo, Luanda, onde a sua ausência cria fissuras no tecido familiar, abala a coerência e a transparência da gestão empresarial dos seus negócios, que vai minar sucessos alcançados com muita dedicação. Nos outros mundos, desenrolam-se amizades e devaneios, criam-se amores e incertezas que o afastam do quotidiano do primeiro mundo. A figura central da obra apercebe-se do vazio que marca constantemente a sua ausência no primeiro mundo, que cria situações incontroláveis e decide retomar as rédeas, aplicando-se mais à sua família. E um manto de segredos sucede-se como uma areia movediça, que afunda a tudo e a todos, e parece recuperar-se uma harmonia que era ameaçada por constantes ausências. Mas os segredos vão habitar em todos os cantos, passam a constituir-se em inúmeros mistérios. E assim aparece o último segredo que convido a todos os amantes da literatura a descobrir. É caso para se dizer que em Angola há uma produção literária muito consolidada, dentro do conjunto das literaturas africanas de expressão portuguesa. Bem haja, Tazuary Nkeita, por esta esplêndida obra. Lisboa, aos 25 de Abril de 2013 (*) Carlos Paradona Rufino Roque, escritor, foi Secretário geral adjunto da Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO), entre 2008 e 2013, e é membro do Corpo de Jurado do Grande Prémio SONANGOL de Literatura. A 8 de Junho lançou na conceituada livraria Bertrand, em Lisboa, o romance Ntsai Tchassassa – A Virgem de Missangas. O romance da colecção Karingana da Associação dos Escritores Moçambicanos foi editado pela Editora portuguesa Fonte da Palavra e teve a apresentação da «Professora Fátima Mendonça da Universidade Eduardo Mondlane. Dentre os livros publicados, destacam-se A Gestação do Luar, poemas, 1992, e Tchanaze, a Donzela de Sena, romance, em 2009. ■ 36 Sábado, 15 de Junho de 2013. Cultura CCR Kilamba celebra Dia de África com Francó, Roucheraux & outros O ■ Fotos Salas Neto Administrador do Centro Cultural e Recreativo Kilamba teve a feliz iniciativa de celebrar o 50.º aniversário da fundação da Organização da Unidade Africana (OUA), antecessora da actual União Africana (UA), com um cartaz recheado de atractivos musicais africanos, sobretudo do vizinho Congo Democrático e, claro está, de Angola. Se assim pensou o bom do Estevão Costa, melhor o fez. O último «Muzonguê da Tradição» foi preenchido com gratas recordações de músicas africanas muito apreciadas, cantadas e dançadas num passado recente, notadamente pelas gerações das décadas de 60/70 e 80. A começar com o «monstro sagrado» da música africana, Francó Lwambu Makiadi, e o não menos fenomenal Roucheraux. De esquebra, mas também muito apreciado, o Dr. Nicó (lembram-se dele?). Tudo isso, com o competente acompanhamento da «Orquestra Olímpia», fundada em 1982, pelo saudoso Diana Spray.E com uma actuação soberba do mestre Pakome, na viola solo. Mestre Teddy (da Banda Movimento) emprestou também a sua colaboração. Mas tudo começou da melhor maneira possível e de forma nostálgica. «Os Novatos da Ilha» fizeram uma exibição de encher os olhos. Em pouco mais de meia hora, reeditando as rodas da rebita de outros tempos, brindaram os presentes com uma apresentação cheia de cores, ritmo e massembas. Dom Caetano, o apresentador residente do «Kilamba», afirmou, depois, que a rebita pode estar a correr um sério risco de desaparecer, se nada for feito no sentido da sua revitalição, fazendo um apelo emotivo afim à administração da dessa casa de cultura, lembrando que o actual CCRK é o sucessor do Centro de Rebita Dr. Agostinho Neto, que, por sua vez, é antecessor da antiga «Maria das Escrequenhas». Então, dançava-se a rebita, regularmente, naquele recinto. A surpresa ficou por conta do histórico Raúl Tulinga, que «dedilhou» a concertina com mestria e mostrou que tem intimidade com o instrumento, sem o qual o compasso da rebita não existe. Resta aqui um apelo ao Ministério da Cultura no sentido de fazer alguma coisa e tomar iniciativas, ou pelo menos patrocinar a «refundação» da rebita. Pelo palco, foram lembradas grandes canções de Francó, Nicó e Roucheraux, nomeadamente, além do conjunto cabindense Super Coba, cujo ex-líder, Teddy Muanateca, homenageado pela Administração do Centro Cultural e Recreativo Kilamba, fez questão de questão de exibir alguns números musicais. Coube a honra de atribuir a distinção (um diploma de mérito), que reconhece o contributo dado pelo artista no engrandecimento da música angolana, ao sociólogo Simão Helena. «Desde a minha meninice que cresci a ouvir Teddy Muanateca», lembrou o também assessor presidencial com uma ponta de nostalgia. Outro homenageado foi o cantor Tony Caetano, que recebeu o diploma de mérito, pela «promoção e divulgação da música nacional», das mãos do coronel Camilo, um «habitué» do muzonguê. Presença ilustre e sempre assinalável do Ministro da Administração Pública, Emprego e Segurança Social, Dr. Pitra Neto. Para esta edição do muzonguê, constou também o craque do nosso futebol, Daniel Ndunguidi, uma presença que se tornou já habitual, desta vez sem os inseparáveis amigos Julião e Vieira Dias, assoberbados com a da boda de aniversário do Ti Bula, um antigo «marçalista» também militante do «Muzonguê». Uma malta muito animada esteve igualmente no «Kilamba»:o afável Plácido Van-Dúnem, que esteve ladeado, pelo «inevitável» Ti Borito (agora, sim, em grande forma!) e ainda pelo Zé Gouveia e muita outro pessoal fixe da «nguimbe». «Muzonguê» no Brasil? É uma ideia (ainda) vaga. A princípio, por ocasião dos festejos da nossa «Dipanda», uma «edição especialíssima» poderá ter lugar no Brasil, com todos os ingredientes característicos e semelhantes ao que é servido, normalmente, pelo Centro Cultural e Recreativo Kilamba, aos primeiros domingos de cada mês. Com direito a tudo: as bessanganas, o semba, a rebita, os quitutes da nossa terra, e, claro está, o nosso rico muzongue. Equacionados os necessários e indispensáveis patrocínios, apoios e ajudas, a ideia poderá ser levada avante. O Semanário Angolense apurou, de fonte segura, que, uma vez reunidas as condições ideiais, a iniciativa poderá vingar. Que venham os incentivos! ■ 37 Desporto Sábado, 15 de Junho de 2013. Apesar de ter dado o litro e mais qualquer coisa pelo país Jean Jacques da Conceição sem dinheiro para ir ao «Hall of Fame» da FIBA-Mundo A federação angolana da modalidade ofereceu-lhe míseros 400 dólares para a deslocação a Lausana, na Suíca, onde integra um grupo de 12 figuras mundiais desse desporto a serem homenageadas Paulo Possas (*) O maior basquetebolista angolano de todos os tempos, Jean Jacques da Conceição, recusou-se a receber um humilhante apoio de 400 dólares oferecido pela Federação angolana da modalidade, para ir à Lausana, na Suiça, onde será um dos homenageados da edição de 2013 do «Hall da Fama» da FIBA-Mundo, soube o Semanário Angolense de fonte próxima do antigo internacional. Embora não esteja mais ligado oficialmente à federação, quer como jogador ou ainda como dirigente, em princípio, não há sustentação legal para exigir «ajudas de custo» da instituição, mas, por tudo o que ele fez em prol da modalidade, tendo prestado elevados serviços ao país como atleta de eleição, não ficaria nada mal se beneficiasse de um apoio digno desse nome para se deslocar à Lausana, até porque o nome de Angola sempre estará em causa, numa tribuna prestigiante. Ao que soube o Semanário Angolense, até quarta-feira, a federação não havia dado sinais de recuar na sua pretensão de apenas conceder os míseros 400 dólares com que o seu presidente, o também antigo internacional (e agora jurista) Paulo Madeira, lhe havia acenado inicialmente, uma atitude tida por humilhante para alguém da estatura de Jean Jacques da Conceição, que até já foi vice-presidente da instituição que rege o basquetebol em Angola. Em face disso, algumas pessoas de boa fé, cientes de que Jean Jacques da Conceição merece melhor consideração, têm estado a mover-se junto de entidades públicas e privadas no sentido de conseguirem um apoio efectivo para que ele se possa exibir em Lausana no «Hall of Fame» ou «Palco da Fama» da Fiba-Mundo. Falava-se que umas das figuras que já manifestaram a intenção de ajudar o jogador nesse sentido era o «inevitável» Bento Kangamba, mas fontes que acompanham o assunto disseram que isto estava tremido por ausência do país do patrão do Kabuscorp do Palanca, embora se esperasse que ele pudesse regressar em tempo útil para dar a mão a Jean Jacques da Conceição. Dada a dimensão do acto, jornalistas de alguns órgãos de comunicação social angolanos irão a Lausana reportar a cerimónia, muito por conta da inclusão de um angolano entre o grupo de agentes do basquetebol a homenagear. De acordo com o site oficial da FIBA-Mundo, Jean Jacques, a maior referência do basquetebol angolano, integra um grupo de 12 personalidades mundiais de 10 países (entre jogadores, treinadores e apoiantes da modalidade) que serão homenageados na edição de 2013 do «Hall of Fame». O principal objectivo do «Hall of Fame» da FIBA-Mundo é reflectir a história da modalidade e das suas personalidades. O principal critério de selecção para se figurar entre os homenageados é a realização proeminente a nível internacional e a contribuição para o desenvolvimento do basquetebol. Jean-Jacques Nzadi da Conceição, nascido em Kinshasa, a 3 de Abril de 1964, mas de nacionalidade angolana pura, com os seus 2,02 metros, praticou basquetebol entre 1982 e 2003. Iniciou-se no 1.º de Agosto, passando depois pelo Sport Lisboa e Benfica (Portugal), Unicaja Malaga (Espanha), Limoges (França) e Portugal Telecom, assim nesta ordem, antes de abandonar o activo. Conquistou com a selecção nacional de Angola sete Afrobasket’s, designadamente em 1989, 1992, 1993, 1995, 1999, 2001 e 2003. Também representou a selecção nos campeonatos do mundo de 1986, 1990 e 1994 e nos Jogos Olímpicos de 1992. Em 2011, em Antananarivo, no âmbito das comemorações do 50.º aniversário da FIBA África, Jean Jacques da Conceição foi nomeado o jogador de basquetebol mais valioso do continente. Além dele, compõem o grupo de antigos jogadores a homenagear no «Hall of Fame» de 2013 o australiano Andrew Gaze, a brasileira Paula Gonçalves, o servo Zoran Slavnic e os norte-americanos David Robinson e Teresa Edwards. Juntam-se a eles, os lendários treinadores Pat Summitt (EUA), bem como o falecido John ‘Jack’ Donohue (Canadá) e Cesare Rubini (Itália). Serão ainda homenageados os oficiais Valentin Lazarov (Bulgária) e Costas Rigas (Grécia) e ainda o mecenas Aldo Vitale (Itália). O «Hall of Fame» ou «Palco da Fama» da FIBA-Mundo foi instituído em 2007. ■ (*) Com Angop 38 Sábado, 15 de Junho de 2013. Desporto Palancas Negras, este sábado, em Kampala Se a vitória fugir, será o fim! Paulo Possas O jogo entre as Palancas Negras de Angola e os Cranes do Uganda, marcado paras as 16 horas deste sábado (15), no estádio Mamboole, em Kampala, é ainda de grande importância para qualquer dos contendores, uma vez que quem o ganhar continua na corrida ao Mundial. Os angolanos, apesar de tudo, continuam a sonhar com o Brasil, algo que se esfumará definitivamente ainda hoje, caso não consigam vencer em Kampala, terreno em que normalmente se dão mal, talvez por razões ligadas à elevada altitude da capital ugandesa. No entanto, se conseguirem superar-se, vencendo os Cranes, as Palancas Negras continuariam com chances de chegarem à última etapa do torneio africano de qualificação, mas isto só se os liberianos fizerem o favor de travar a inspiração senegalesa em Monróvia, não deixando o visitante ganhar. Se esta hipótese se concretizar, os angolanos podem mesmo chegar ainda à liderança do gru- Arbitragem marroquina po, com sete pontos, ao lado dos senegaleses, desde que estes não se deixem surpreender com uma derrota, pois isso abriria caminho a aqueles na primazia absoluta da classificação do grupo. Mas, não sendo impossível, é um cenário pouco provável, em função do que já se disse acima. Como está a jogar, já não são muitos os angolanos que ainda acreditam na possibilidade da selecção vir a ganhar nessa sua dificílima deslocação à Kampala. No entanto, isso não quer dizer que não possam surpreender tudo e todos. E se assim acontecer, até se poderá dizer que Deus é angolano. O Comité de Arbitragem da Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA) indicou uma equipa de arbitragem do Marrocos para o desafio entre o Uganda e Angola. Trata-se de Redouane Jied (principal), Adelaziz Mehrag e Mohamed Lohamid (assistentes). Antes, este comité tinha indigitado como chefe o árbitro egípcio Ghead Grisha, que teria como assistentes os seus compatriotas Ayman Degaish e Salam Abd El Dorry. O também egípcio Yasser Younis seria o quarto árbitro. O Comité de Arbitragem da FIFA indicara já para árbitro assessor o marfinense Zeli Sinko e como comissário Yusuf Ismael Kemal, da Etiópia. Não se sabe quais as razões que estiveram na base destas modificações de última hora, esperando-se então que não tenham nada a ver com «jogadas de bastidores», que possam prejudicar os angolanos, como tem acontecido muitas vezes. ■ Uganda abre cordões à bolsa para motivar os seus jogadores N a ânsia de vencer as Palancas Negras, a Federação Ugandesa de Futebol premiou os seus jogadores com dois mil dólares pela vitória (1-0) obtida no sábado passado, 08, contra a Libéria, com golo de Tonny Mawejje, esperando que façam o mesmo este sábado, 15, contra a equipa orientada por Gustavo Ferrín. «Estou orgulhoso por vocês porque animaram o país cuja selecção pode bater Angola», disse em Kampala, na terça-feira, 11, o presidente da Federação Ugandesa de Futebol, Lawrence Mulindwa, num encontro com jornalistas locais. «O empate de Angola com o Senegal», disse, «dá-nos esperança de ainda podermos avançar à próxima eliminatória. Ainda não podemos celebrar, mas estamos optimistas». O Uganda concentrou-se logo no domingo, 09, para preparar com cuidado o jogo contra Angola, reunindo o grosso de jogadores que triunfaram diante da Libéria. Segundo classificado do Grupo J, o Uganda está apostado a não conceder facilidades a Angola, que ainda não obteve vitória alguma. Tem um guarda-redes muito atento, Robert Odongkara, que entre os postes frustra as acções dos adversários. A defesa também dá boa conta de si, com Dennis Iguma, um atleta que, segundo a imprensa do seu país, joga no centro de forma discreta, fazendo as coisas básicas como ordinariamente devem ser executadas. Godfrey Walusimbi é outro. Actua no lado esquerdo, mas, segundo as últimas informações, ele não tem esta- do no seu melhor. À direita, os Cranes contam com Isaac Isinde, um bom marcador. No último jogo frente à Libéria, parou bem os avançados Wleh Patrick, Ronaldinho, Oliseh Sekou e Anthony Laffor. No meio campo, o pensador do Uganda é Andy Mwesigwa, sendo desde já uma forte aposta do técnico Milutin Sredojević. Na mesma zona, actua Hassan Wasswa, que não deixa aos seus créditos em mãos alheias quando se entende com Geoffrey Baba Kizito. Geoffrey Baba Kizito, no ataque, tem boa leitura de jogo, bom controlo de bola, passes calculados e certeiros. Está a entender-se bem com Kizito Luwagga, que ascendeu este ano a sénior. Este jovem está a dar contado recado. Ele corre muito, é muito veloz e nisso bate muitos adversários. No jogo passado foi substituído por Martin Mutumba. Outro craque dos adversários das Palancas é Tony Mawejje, que joga bem à frente dos defesas. Dono de uma apurada visão de jogo, é organizador e distribuidor de jogadas. Há ainda Geoffrey Massa, um atacante com bom poder de remate, como se viu ainda contra a Libéria, embora não tenha marcado. A dúvida para este sábado por estar a contas com uma lesão é Emma Okwi. É lento, mas uma lentidão calculista. Tem sempre a bola colada ao pé e quando a solta vai para o sítio certo. O técnico Milutin Sredojevich «Micho» disse, na quarta-feira, 11, ao jornal «Weekly Observer» que estava alegre com o empate entre Angola e Senegal, por lhes ter aberto o caminho para continuar a sonhar. ■ 39 Desporto Sábado, 15 de Junho de 2013. Adeptos sugerem mudanças A deptos do futebol na província do Cunene sugeriram terça-feira, em Ondjiva, mudanças no 11 inicial da selecção nacional que sábado defronta o Uganda, em Kampala, para a quinta jornada do grupo J, qualificativa ao Mundial 2014 no Brasil. Em declarações à Angop, defendem ser importante que o seleccionador Gustavo Ferrin escale um conjunto com alterações relativamente ao que empatou (1-1) no dia 8 com o Senegal, no estádio 11 de Novembro. Para o estudante Eugénio Chitumba, existem jogadores entre os convocados que tornariam a equipa inicial mais forte do ponto de vista competitivo, tais como Mabiná, Adawa, Mingo Bille, Gomito e Guilherme Afonso. Disse ter notado fraca produtividade no meio campo da selecção no jogo com o Senegal que, em sua opinião, se deveu à pouca experiência dos jogadores que evoluíram naquela posição e ao esgotamento físico dado o porte físico dos oponentes. Janota de Carvalho, funcionário público, defende igualmente mudanças na equipa inicial, acrescentando que, com o empate de sábado último, Angola perdeu a oportunidade de depender apenas de si, «por má abordagem do selecionador», ao abdicar de jogadores experientes, sobretudo no meio campo. «Nada ainda está perdido, porque a diferença de dois pontos relativamente ao líder Senegal se mantém», disse, acrescentando que com trabalho, humildade e sorte ainda é possível a qualificação ao mundial de 2014 no Brasil. ■ Suazilândia para o CHAN Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades... FAF e jogadores em rota de colisão A o que se comenta no «inner circle» do futebol angolano, não é bom o ambiente que grassa nas hostes da Federação Angolana de Futebol, que estará a viver uma das maiores crises de liderança desde a sua criação em 1979. Fontes que andam pelos corredores da FAF sustentam que a gota de água que fez transbordar o copo foi lançada depois CAN de 2013 realizado na África do Sul, onde as Palancas Negras, tal como em 2012, no Gabão e Guiné Equatorial. Um núcleo de jogadores mais antigos, como Gilberto, Lama, Manucho, Djalma e também Mateus, se insurgiu contra algumas medidas impostas pelos dirigentes da FAF. Na altura, muitos dirigentes entraram em choque com os jogadores por questões ligadas a dinheiro que estes consideravam prejudiciais a si. Conta a nossa fonte que antes do jogo contra o Marrocos, já a FAF tinham o dinheiro para subsídios, mas não o dava aos jogadores. Isso levantou vários questionamentos por parte dos jogadores, depois de saberem que, afinal, o atra- so no pagamento dos subsídios que lhes eram devidos, era causado por um Esquema capcioso de aplicação dos dólares no mercado negro, para depois se pagar aos atletas em rands ao câmbio oficial, engenharia que rendia chorudos lucros ilícitos a favor de alguém que os tinha sob sua responsabilidade. E este esquema, segundo a nossa fonte, vigora até hoje sempre que a seleção nacional se desloque ao estrangeiro. Será para não surgirem ondas nestes particulares que os jogadores chamados de «problemáticos» não foram convocados. Ao que diz a nossa fonte, embora conhecedor do esquema, o selecionador Gustavo Ferrín vai-se «marimbando», preferindo ganhar o «seu» sem complicar, não vá o diabo tecê-las. Alegados problemas de desorganização têm estado também a desmotivar o técnico uruguaio. Ele não entende, por exemplo, por que razão é que, apesar da Federação ter recebido do Governo 9 milhões de dólares para a campanha do CAN, a selecção continue a ter problemas de equipamento. A nossa fonte diz que, se Djalma Campos vir rasgada a sua camisola 7, não há outra para substituí-la, o que não deixa de ser anedótico. A nossa fonte recorda que, no CAN deste ano, ao fim de um dado jogo, o guarda-redes Lamá, como é da praxe, trocou a sua camisola com o seu homólogo da África do Sul, como é da praxe, o guarda-redes Lama trocou a sua camisa com o guardião da África do Sul, mas depois, já nos balneários, foi obrigado a desfazer o «acordo» por não haver mais uma outra da mesma cor de reserva para si. Para nossa vergonha, o guarda-redes sul-africano, diante disso, resolveu prescindir da sua, oferecendo-a a Lamá sem contrapartida alguma. Enfim, afinal, é este o mau ambiente instalado no seio da selecção, que tem de ser melhorado, sob pena de se instalar um caos autêntico. Na última segunda-feira, houve mais uma: muitos jogadores partiram descontentes por terem recebido os seus subsídios em kwanzas... É assim que se quer ir ao «Mundial»? Fazer o quê? ■ D epois do desafio como Uganda, as Palancas Negras jogam já no sábado seguinte contra a Suazilândia, em partida pontuável para primeira mão da eliminatória de apuramento à terceira edição do Campeonato Africano das Nações (CHAN), em 2014, na África do Sul. O CHAN é uma competição africana reservada apenas aos atletas que actuam nos campeonatos nacionais dos respectivos países. A Confederação Africana de Futebol (CAF) indicou o árbitro Achille Madila que será auxiliado pelos seus compatriotas Olivier Kabene Safari e Martin Mukala. O quarto árbitro é Ignace Mupemba Nkongolo e para comissário foi nomeado o malaui Bester Kalombo. A 29 deste mês, em Luanda, disputa-se a segunda mão, no estádio nacional 11 de Novembro, com arbitragem de um quarteto das Ilhas Comores, chefiado por Mohamed Ali Adelaid. Os seus assistentes serão Soulaimane Amaldine e Mmadi Faissoil. O quarto árbitro é Soulaimane Ansudane e a comissário Kasolo Kunda Anthony, da Zâmbia. ■ Sábado, 15 de Junho de 2013. Cdte Luís Sita ■ Gustavo O administrador do «Kilamba», Estêvão Costa, terá acertado na mosca, ao decidir promover, no último domingo, um «Muzonguê da Tradição» diferente dos habituais, com rumbas e bolingós no lugar do semba, o que parecia vir a resultar em prejuízos para a casa. No programa constava a lembrança de canções de alguns «monstros» da música congolesa, como Francó, Rocheraux e Dr. Nicó, em meio a uma homenagem ao Super-Coba de Cabinda e a Tony Caetano. Olha, ao contrário do que se esperava, os bolingós e rumbas acabaram por cair no goto dos caldistas, ao ponto de muitos afirmarem que haviam desfrutado de um dos melhores «muzonguês». Palmas! Havíamos dito que Gustavo Ferrín, ao negar-se incluir o «ponta» Manucho Gonçalves na equipa que haveria de defrontar os senegaleses, em desafio decisivo, teria alguma «arma secreta» capaz de fazer esquecer a ausência do «capitão». Infelizmente, nada que se viu, como diria o coiso, apesar de lançar depois Guilherme Afonso, o homem que acabaria por marcar o golo salvador de uma derrota que parecia iminente. Voltou a inventar, por exemplo, com Yano, a quem fez jogar mais como extremo que ponta, entre outras opções esquisitas, e deu no que deu: um quase-desastre. A continuar assim, é melhor acordarmos, que não chegaremos lá. Nem em sonhos... Costa Fernando Na última edição, o Comandante Sita, novo chefe da Polícia de Luanda, então estreante nessa secção (e logo na sua parte má), fora zurzido por, alegadamente, ter destratado o líder do Galo Negro, em declarações que fizera sobre as estranhas mortes no «Paraíso» do Kikolo. O homem garante que isso foi injusto, uma vez que em momento algum assim procedera. Afirma que não sabe aonde fôramos buscar as palavras a si atribuídas em como tendo desrespeitado Samakuva. Lembrou que apenas dissera que no seu posto haveria de tratar todos por igual, independentemente de colorações partidárias. É possível que tenha havido um problema de interpretação. Pronto já, está reparado. Estêvão «Papy, Angola só vai avançar com gente como o senhor, sempre preocupada em fazer acções filantrópicas e não com essa malta de fato e gravata que anda por aí sem nada fazer». Era assim – mais palavra, menos palavra - como diria alguém no mural de Luís Fernando, a propósito de mais uma campanha a favor de um cidadão desamparado lançada por este jornalista e escritor, desta para acudir a um rapazito que padece de anemia falciforme que nada tinha para comer na terça-feira. LF tratou de lançar um «sos» via facebook e a coisa pegou: muita gente, incluindo no estrangeiro, aceitou o repto e está apoiando o rapazito com o que pôde. Ó Luís, a sociedade agradece-te! ■ Paulo Ferrín ■ Madeira ■ 40 ENANA O melhor basquetebolista angolano de todos os tempos foi convidado pela Fiba-Mundo para o «Hall da Fama», uma cerimónia de homenagem a figuras da modalidade que este ano se vai realizar, quarta-feira, 19, em Lausana, na Suíça. Não estando, afinal, muito bem de vida, Jean Jacques da Conceição precisa de apoios para a deslocação, tendo para esse efeito resolvido ir bater a porta da federação, agora liderada por Paulo Madeira. Alguém advinha com quanto a FAB lhe quis apoiar? Não? Aí vai: 400 dólares para cinco dias! Pelo que Jean Jacques já fez em benefício do basquetebol angolano, este tratamento da FAB não deixa de ser humilhante. Paulo, Paulo, Paulo... ■ Na quinta-feira da semana passada, aconteceu um escândalo no aeroporto internacional de Luanda, que deve ter atirado o país, mais uma vez, para a lama: o complexo não dispunha de uma única ambulância para acudir a uma emergência. Um dos tripulantes da Houston Express chegou a Luanda em estado crítico. A tripulação e os assistentes de terra foram surpreendidos com a falta de ambulâncias no local. Uma estava avariada, e a outra tinha sido usada minutos antes por um casal, que lá decidira proteger-se do calor e dos mosquitos, ligando o ar condicionado. Assim, quando os assistentes de terra tentaram pôr o carro a andar, estava sem gasolina. Isso pode? ■ EUA espionam computadores da China P or meses, a China rebate os EUA pelas suas acusações de que Pequim lança ataques cibernéticos contra os seus computadores e sistemas. Agora, um ex-funcionário terceirizado da CIA, Edward Snowden, pode ter dado uma moeda de troca a Pequim. Em entrevista ao jornal South China Morning Post, Snowden afirma que os EUA têm «hackeado» uma universidade de Hong Kong que encaminha todo o tráfego de internet dentro e fora da região semiautônoma da China. Snowden diz que os 61 mil alvos da Agência Nacional de Segurança (NSA, sigla em inglês) ao redor do mundo incluem centenas em Hong Kong e na China, informou o jornal na quarta-feira (12). O The Post, o principal jornal de língua inglesa em Hong Kong, disse que Snowden apresentou documentos para apoiar essas alegações, mas a publicação não os descreveu e disse não ser possível verificar a sua autenticidade. Essas foram as primeiras novas revelações de Snowden desde que o americano de 29 anos afirmou ser a fonte do vazamento de programas de monitoramento secretos da agência americana. Ele deixou o Havaí rumo a Hong Kong antes de revelar ao mundo a sua identidade e, segundo o Post, deve permanecer fora de vista em meio às especulações de que os EUA tentarão extraditá-lo . Snowden, que trabalhou para a CIA e depois como terceirizado para a NSA, revelou detalhes sobre programas de monitoramento americanos que co- lectam milhões de registos telefônicos americanos e conteúdos de email e actividades online de estrangeiros para caçar terroristas. As autoridades prepa- ram um inquérito contra Snowden, mas ainda discutem as acusações. Autoridades americanas debatem sobre algumas das afirmações feitas por Snowden, particularmente uma ao jornal britânico The Guardian, para o qual ele afirmou que «tinha autoridade de fazer escutas de qualquer um». As afirmações de Snowden sobre a espionagem dos EUA acrescentam uma nova contenda na longa batalha entre Washington e Pequim sobre cibersegurança. Os EUA apresentaram uma série de relatórios acusando o governo chinês e o seu exército de realizarem invasões nos sistemas e computadores americanos. O The Post citou Snowden dizendo que a NSA «hackeia» computadores em Hong Kong e na China desde 2009, citando documentos que ele teria mostrado ao jornal, mas que, segundo a publicação, não poderiam ser verificados. A públicação não deu mais detalhes sobre os documentos. Ele disse que entre os alvos estava a Universidade de Hong Kong, que abriga a Internet Exchange de Hong Kong, o principal eixo do tráfego da rede na cidade. Estabelecida em 1995, permite que os dados entre os servidores locais sejam encaminhados localmente em vez de ter que passar pelas comunicações de outros países, incluindo os EUA. ■