Infra-estruturas em África

Transcrição

Infra-estruturas em África
Visao Global
Infra-estruturas em África:
Tempo para a Mudança
O
Diagnóstico sobre as infra-estruturas dos
países africanos é uma tentativa sem precedentes de recolha compreensiva de dados
sobre os sectores das infra-estruturas em África –
energia eléctrica, transportes, irrigação, água potável
e saneamento básico, e tecnologias de informação e
comunicação – e a fornecer uma análise integrada
dos desafios que os mesmos enfrentam. Com base
num extensivo trabalho de campo em África, foram
encontrados os seguintes resultados:
•
•
•
•
•
A energia eléctrica é de longe o maior desafio
em termos de infra-estruturas, com 30 países
que sofrem de cortes de energias regulares, e a
pagar um elevado preço pelas infra-estruturas de
produção de energia de emergência.
•
Os sectores das infra-estruturas foram responsáveis por mais de metade do recente crescimento
que se registou em África, e têm o potencial de vir
a ter um papel ainda mais importante no futuro.
O custo da resolução dos problemas ao nível
das infra-estruturas em África é mais do dobro
do que foi estimado pela Comissão para África
(2005): cerca de 93 mil milhões por ano, sendo
que cerca de um terço desse valor se destina apenas à manutenção.
•
As redes de infra-estruturas em África registam
um atraso em relação às de outros países em vias
de desenvolvimento, e caracterizam-se pela falta
de ligações a nível regional e pelo acesso relativamente estagnado por parte dos utilizadores
domésticos.
O desafio das infra-estruturas em África varia
muito de acordo com o tipo de país – enquanto
os estados mais pobres estão perante uma tarefa
impossível, os estados mais ricos em recursos
permanecem atrasados apesar da sua riqueza.
•
Uma grande parte das infra-estruturas em
África é financiada pelos utilizadores domésticos, com os orçamentos dos governos centrais a
representar o maior motor do investimento nas
infra-estruturas.
•
Ainda que sejam alcançados grandes ganhos em
termos de eficiência, África enfrenta ainda uma
falta de fundos para investir em infra-estruturas
na ordem dos 31 mil milhões de dólares por ano,
sobretudo no sector de energia eléctrica.
A difícil geografia económica de África apresenta
um particular desafio em relação ao desenvolvimento das infra-estruturas.
A utilização de infra-estruturas em África custa
cerca do dobro do preço que em qualquer outro
lugar, reflectindo a deseconomia de escala no lado
da produção e as elevadas margens de lucro existentes devido à falta de competição.
1
2
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
•
As reformas institucionais ao nível de regulamentação e a nível administrativo em África
estão apenas a meio caminho, mas já se fazem
sentir os seus efeitos ao nível da eficiência
operacional.
Resultado 1: As infra-estruturas
contribuíram com cerca de metade do
aumento no crescimento económico
em África.
O crescimento económico em África melhorou bastante na última década. Os países africanos viram as
suas economias crescer a um sólido ritmo de 4% ao
ano, entre 2000 e 2005. Os países ricos em recursos,
que foram beneficiados com o aumento do preço
das matérias-primas, apresentaram as maiores taxas
de crescimento económico. Todavia o crescimento
económico total ainda está longe dos 7% necessários
para atingir a redução substancial da pobreza e alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio
(ODM). As infra-estruturas, dado o seu peso na
reviravolta económica em África, necessitam vir a
ter um papel ainda mais importante no alcance dos
objectivos de crescimento do continente.
Por toda a África, os sectores das infra-estruturas contribuíram em 99 pontos percentuais para
o crescimento económico per capita no período
de 1990 a 2005, comparados com os 68 pontos
percentuais de outras políticas estruturais (Calderón 2008). Essa contribuição é quase inteiramente
atribuída aos avanços na penetração nos serviços
de telecomunicações. A deterioração na quantidade
e qualidade da rede de distribuição eléctrica no
mesmo período atrasou o crescimento, subtraindo
11 pontos base ao crescimento económico per capita
do continente e cerca de 20 pontos base no sul de
África.
Os efeitos de um maior esforço na melhoria das
infra-estruturas em África teriam um impacto ainda
maior no crescimento. As simulações sugerem que
se todos os países africanos se aproximassem das
Maurícias (o líder regional em infra-estruturas) o
crescimento per capita da região poderia aumentar
2,2 pontos percentuais. Uma aproximação ao nível
da República da Coreia aumentaria o crescimento
per capita em 2,6 pontos percentuais ao ano. Na
Costa do Marfim, na República Democrática do
Congo e no Senegal o efeito seria ainda maior.
Na maior parte dos países africanos, particularmente naqueles de mais baixos rendimentos, as
infra-estruturas emergem como a maior barreira
para a realização de negócios, diminuindo a produtividade das empresas em cerca de 40% (Escribano,
Guasch e Pena 2008).
Na maior parte dos países, o efeito negativo
das deficientes infra-estruturas é, no mínimo, tão
grande como o da criminalidade, da burocracia, da
corrupção e dos constrangimentos dos mercados
financeiros. Para um conjunto de países, a energia
eléctrica surge, de longe, como o factor mais limitante, tendo sido citado por mais de metade das
empresas em mais de metade dos países como o
maior obstáculo aos negócios. Para um segundo
conjunto de países, o mau funcionamento dos sectores portuário e alfandegário é igualmente significativo. Deficiências ao nível dos transportes e das
TIC são menos prevalentes mas não deixam de ser
substanciais em alguns casos.
Os sectores das infra-estruturas não só contribuem para o crescimento económico, como
também são um importante factor para o desenvolvimento humano (Fay e outros, 2005). As infraestruturas são o ingrediente-chave no alcance dos
ODM. Uma rede segura e adequada de abastecimento de água faz poupar tempo e previne o alastramento de uma série de doenças – incluindo a
diarreia, uma das maiores causas de mortalidade
infantil e de desnutrição. A energia eléctrica alimenta
o sector da saúde e da educação e aumenta a produtividade das pequenas empresas. A rede rodoviária
proporciona as ligações entre os mercados locais e
globais. As TIC democratizam o acesso à informação e reduzem os custos de transporte ao permitirem
que as pessoas efectuem transacções não presenciais.
Resultado 2: As infra-estruturas
em África estão em desvantagem
relativamente aos outros países em
vias de desenvolvimento
Em quase todos os indicadores de medida da cobertura de infra-estruturas os países africanos encontram-se em desvantagem comparativamente com
os outros países em desenvolvimento (Yepes, Pierce,
and Foster 2008). Esta desvantagem é perceptível
nos países com baixo e médio rendimentos da África
subsaariana, comparados com outros países de baixo
e médio rendimentos (Quadro O.1). As diferenças
são particularmente grandes no número de estradas
asfaltadas, rede de linhas telefónicas e produção de
energia eléctrica. Em qualquer das três infra-estruturas mencionadas, o continente africano tem desenvolvido a criação dessas infra-estruturas de forma
muito mais lenta que outras regiões em desenvolvimento. Por isso, a não ser que algo mude, o fosso continuará a crescer.
Até que ponto as deficiências nas infra-estruturas em África se devem ao momento em que
as mesmas começaram a ser implementadas?
África começou por ter infra-estruturas que não
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
diferiam muito daquelas que existiam no sudeste
asiático nos anos 60 em relação à rede rodoviária,
nos anos 70 para as linhas telefónicas, e nos anos
80 para a rede de energia eléctrica. A comparação
com o sudeste asiático, cujo rendimento per capita
é semelhante, e particularmente interessante. Em
1970, a África subsaariana tinha quase o triplo da
capacidade de produção de energia por milhão
de habitantes que o sudeste asiático. Em 2000, o
sudeste asiático já tinha ultrapassado largamente
a África subsaariana – com quase o dobro da
capacidade de produção de energia por milhão de
habitantes. Também em 1970, a África subsaariana
tinha o dobro da densidade de linhas telefónicas
em relação ao sudeste asiático, em 2000 as duas
regiões estão em situação de igualdade.
Desde 1990, a cobertura dos serviços domésticos praticamente não sofreu alterações (Figura O.1
Quadro a). É pouco provável que o continente africano atinja os ODM em relação à água potável e
saneamento básico. De facto, com os dados actuais,
o aceso universal a estes e a outros serviços está
mais de 50 anos atrasado na maioria dos países africanos (Banerjee, Wodon, e outros 2008). Mesmo
nos locais onde as infra-estruturas existem, uma
percentagem significativa de lares permanece sem
ligação às redes de distribuição, o que sugere que há
barreiras do lado da procura e que o referido acesso
universal requer mais do que a existência física das
redes de infra-estruturas. Como era de esperar, o
acesso às infra-estruturas nas zonas rurais é apenas
uma fracção daquela que existe nas zonas urbanas,
mesmo sabendo que a cobertura urbana a este nível
é também baixa de acordo com os padrões internacionais (Banerjee, Wodon, e outros 2008) (Figura
O.1 b).
Quadro O.1 Défice de infra-estruturas em África
Países
Subsaarianos com
rendimentos
baixos
Outros
Países com
rendimentos
baixos
31
134
137
211
Densidade de Rede Fixa
10
78
Densidade detelefones
móveis
55
76
Densidade de internet
2
3
Capacidade de geração
37
326
Cobertura de energia
eléctrica
16
41
Água melhorada
60
72
Saneamento melhorado
34
51
Unidades
Normalizadas
Densidade de estradas
pavimentadas
Densidade total de
estradas
Fonte: Yepes, Pierce, e Foster 2008.
Nota: A densidade do sistema rodoviário é medida em quilómetros por cada 100 quilómetros quadrados de terra arável; a densidade de linhas telefónicas é medida por linha por cada 1000 habitantes; a geração de energia eléctrica é medida em megawatts
por milhão de habitantes; a cobertura da rede eléctrica, da rede
de distribuição de água potável e saneamento básico, é medida
em percentagem da população..
Resultado 3: A difícil geografia
económica de África representa um
desafio para o desenvolvimento das
infra-estruturas
Relativamente a outros continentes, África caracteriza-se por uma baixa densidade populacional (36
habitantes por quilómetro quadrado), baixas taxas
de urbanização (35%), mas com taxas relativamente
rápidas de crescimento urbano (3,6% ao ano), um
número relativamente grande de países sem acesso
ao mar (15), e de numerosas pequenas economias.
a. Tendências estagnadas
40
Percentagem da população
Percentagem da população
Figura O.1 Acesso aos serviços domésticos
30
20
10
0
1990–95
1996–2000
2001–05
Água canalizada
Energia eléctrica
Sanita com autoclismo
Telefone de rede fixa
Fonte: Banerjee, Wodon, e outros 2008.
b. Clivagem Rural/Urbana
80
60
40
20
0
Água
canalizada
Energia
eléctrica
Nacional
Sanita com
autoclismo
Rural
Telefone
de rede fixa
Urbano
3
4
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Outro inconveniente do continente tem que ver
com a variabilidade hidrológica, particularmente
elevada e com grandes oscilações na precipitação
em algumas zonas, estações do ano, e circunstância,
que as alterações climáticas podem vir a intensificar. A visível fragmentação dos estados-nação em
África vê-se também reflectida no tipo também
fragmentado das redes de infra-estruturas. A África
subsaariana compreende 48 estados-nação, muitos
dos quais são muito pequenos. A maioria desses
países tem uma população inferior a 20 milhões
de habitantes e economias internas abaixo dos 10
mil milhões de dólares. As fronteiras internacionais
têm pouca relação quer com as características do
meio (como as bacias hidrográficas), quer com as
características artificiais (como cidades e a acessibilidade das mesmas a vias de comunicação para o
comércio, como os portos). A ligação intra-regional
é por isso bastante baixa, quer seja medida em ligações transcontinentais, como as ligações rodoviárias
(auto-estradas), quer em ligações entre redes de distribuição de energia eléctrica ou de redes de fibra
óptica. Os acessos em que existe maior continuidade
são os corredores de acesso aos portos marítimos,
de resto as ligações rodoviárias intra-regionais
caracterizam-se por uma enorme descontinuidade.
Apesar de muitos dos países serem demasiado
pequenos para produzirem de forma rentável a sua
própria energia eléctrica, existem poucos pontos de
ligação fronteiriços que tornem possível o intercâmbio de energia eléctrica. Até há bem pouco tempo,
o Leste africano não dispunha de acesso a um cabo
submarino global que pudesse proporcionar comunicações internacionais e o acesso à internet a um
custo mais baixo. A rede intra-regional de fibra
óptica, apesar do crescimento rápido, está também
incompleta. Devido ao isolamento geográfico, os
países sem acesso ao mar sofrem particularmente
com a falta de ligações regionais.
Tanto a distribuição espacial como a rápida migração da população africana representam grandes desafios para que se alcance o acesso universal. Nas áreas
rurais, mais de 20% da população vive em povoações
dispersas onde a densidade populacional típica é de
menos de 15 pessoas por quilómetro quadrado; desse
modo, os custos do acesso às infra-estruturas são
comparativamente elevados. Nas áreas urbanas, as
taxas de crescimento da população com uma média
anual de 3,6% estão a deixar os fornecedores de infraestruturas numa situação bastante severa. Daí resulta
que a taxa de cobertura de serviços urbanos tem de
facto diminuído na última década, e as alternativas de
baixo custo estão a dar cobertura às faltas existentes
(Banerjee, Wodon e outros 2008; Morella, Foster, e
Banerjee 2008). Em conjunto, a densidade populacional nas cidades africanas é relativamente baixa, de
acordo com os padrões internacionais, não beneficiando de grandes economias de aglomeração na imple-
mentação de infra-estruturas. Daí resulta também que
os custos do fornecimento de um pacote básico de
infra-estruturas possa facilmente custar o dobro que
em quaisquer outras cidades em desenvolvimento
(Dorosh e outros 2008).
Os recursos hidrológicos em África são abundantes, mas devido à falta de armazenamento de
água e de infra-estruturas para a sua distribuição
os mesmos são muito pouco aproveitados. Por
isso a segurança em relação à água – reserva e fornecimento de água confiáveis, risco aceitável no
caso de cheias ou de outros eventos imprevisíveis,
incluindo os das alterações climáticas – requer no
futuro o aumento considerável na capacidade de
armazenamento de água dos actuais 200 metros
cúbicos per capita (Grey e Sadoff 2006). Noutras
partes do mundo essa capacidade é da ordem dos
milhares de metros cúbicos. O custo associado ao
aumento da capacidade de armazenamento de
água é extremamente elevado em relação à dimensão das economias dos países africanos, o que
sugere um faseamento dos investimentos, com a
preocupação em atingir primeiro a segurança em
relação à água nos locais onde o crescimento é
mais acentuado.
É necessário estender também a distribuição da
água para fins agrícolas. Numa mão-cheia de países
apenas 7 milhões de hectares estão equipados para
a irrigação. Apesar de os terrenos equipados para a
irrigação representarem menos de 5% da área cultivada em África, aí são produzidos 20% da riqueza
agrícola do continente. Mais 12 milhões de hectares
poderiam ser economicamente viáveis para a irrigação se houvesse um maior controlo nos gastos
(You, 2008).
Resultado 4: A utilização das infraestruturas em África custa o dobro do
preço que em qualquer outro lugar
As infra-estruturas em África não são apenas deficitárias nas redes de cobertura, mas também o
custo da utilização dos serviços é excepcionalmente
elevado se comparado com os padrões internacionais (Quadro O.2). Quer seja a energia eléctrica, a
água, os transportes de mercadorias, os telemóveis
ou os serviços de Internet, as tarifas pagas em África
são várias vezes superiores àquelas que se pagam em
qualquer outro lugar dos países em desenvolvimento. A explicação para os elevados preços em África
reside, por vezes, nos genuinamente elevados custos de produção, outras vezes nas elevadas margens
de lucro aplicadas. As recomendações da política a
seguir em cada um dos casos são bastante diferentes. A energia eléctrica é o exemplo mais flagrante
de infra-estrutura com custos genuinamente mais
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Table O.2 Africa’s High-Cost Infrastructure
nologia via satélite para o acesso a ligações internacionais, e o custo destes serviços é normalmente o
dobro que nos países com acesso ao referido cabo
submarino. Mesmo quando existe o acesso a cabo
submarino, nos países em que há o monopólio
desta via de acesso internacional as tarifas são
mais elevadas que as dos países em que não há
monopólio (Minges e outros 2008).
África
Subsaariana
Outras
regiões em
desenvolvimento
Tarifas de energia eléctrica
($ por quilo watt-hora)
0.02–0.46
0.05–0.10
Tarifa da Água
($ por metro cúbico)
0.86–6.56
0.03–0.60
Tarifas de transporte terrestre
($ por tonelada-quilometro)
0.04–0.14
0.01–0.04
Telefones móveis
($ por cabaz por mês)
2.60–21.00
9.90
Telefones internacionais
($ por chamada de 3 – minutos para os Estados Unidos)
0.44–12.50
2.00
Uso da internet
($ por mês)
6.70–148.00
11.00
Sector de Infraestrutura
Fonte: Estimativas dos autores baseadas em Africon 2008; Bannerjee,
Skilling, e outros 2008; Eberhard e outros 2008; Minges e outros
2008; Teravaninthorn e Raballand 2008; Wodon 2008a e b.
Nota: A variação refleta os preços nos diferentes Países e os varios
níveis de consumo. Os Preços para os serviços de telefone e internet
são representativos para todas as regiões em desenvolvimento,
África incluída.
elevados em África do que em qualquer outro lugar.
Muitos dos pequenos países africanos têm sistemas
de energia eléctrica abaixo do limiar dos 500 megawatts, e é por essa razão que confiam a produção de
energia a pequenos geradores a diesel que podem
custar até 0,35 dólares por quilowatt por hora, cerca
do dobro do custo existente em países grandes com
sistemas de produção de energia eléctrica baseados
no carvão ou na energia hidráulica (Eberhard e outros 2008).
As elevadas tarifas para o transporte de mercadorias em África têm muito mais a ver com as
grandes margens de lucro aplicadas que com os
valor dos custos (Teravaninthorn e Raballand
2008). Os custos para as empresas de camionagem
em África não são muito mais elevados que os
mesmos em outros lugares do mundo, mesmo se
considerarmos os pagamentos não declarados. As
margens de lucro, pelo contrário, são excepcionalmente elevadas, particularmente no Centro e
no Oeste africanos, onde chegam a atingir valores
entre os 60% e os 160%. A causa desta situação está
na falta de competição, a que se associa o mercado
altamente regulamentado baseado num sistema
rotativo de distribuição, que atribui o transporte de
mercadorias através do método de listas de espera,
em vez de deixar os operadores efectuarem contratos bilaterais directamente com os clientes.
Os elevados custos das chamadas telefónicas
internacionais e dos serviços de Internet reflectem
uma mistura dos factores do custo e das margens
de lucro. Os países sem acesso a cabo submarino
vêem-se forçados à utilização da dispendiosa tec-
Resultado 5: A energia eléctrica é de
longe o maior desafio a nível das infraestruturas em África
Quer seja medida em capacidade de geração, de consumo de electricidade ou de fiabilidade do abastecimento, a rede de produção e distribuição de energia
eléctrica em África satisfaz apenas uma fracção do
que se observa em qualquer outro lugar nos países
em desenvolvimento (Eberhard e outros 2008). Os
48 países da região subsaariana (com 800 milhões de
habitantes) produzem aproximadamente a mesma
energia eléctrica que Espanha (com 45 milhões de
habitantes). O consumo anual de energia de 124
quilowatts/hora – ou menos – per capita, representa
apenas 10% do que se pode encontrar em qualquer
outro lugar nos países em vias de desenvolvimento,
e chega apenas para manter acesa uma lâmpada de
100 watts por pessoa, três horas por dia.
Mais de 30 países africanos sofrem de cortes de
energia e interrupções regulares no abastecimento
(Figura O.2). As causas variam: falhas no aumento
da capacidade da rede para dar resposta à procura
proveniente do crescimento económico; os períodos de seca que reduziram a capacidade hidroeléctrica no Leste africano; as convulsões no mercado
petrolífero que inibiram as importações de diesel
em muitos dos países do Oeste africano; e os conflitos que assolaram as infra-estruturas de produção
de energia nos Estados mais frágeis. As empresas
africanas afirmam ter perdido cerca de 5% das suas
vendas devido aos frequentes cortes no abastecimento – um valor que sobe até 20% nas empresas
de mercado informal que não têm capacidade para
manter um sistema de abastecimento de emergência. Em suma, o custo económico das falhas de abastecimento de energia eléctrica facilmente pode subir
até a 1 % ou 2% do PIB.
A resposta mais frequente para o problema
é o aluguer, de curta duração, de geradores de
emergência. Na África subsaariana há pelo menos
750 megawatts de energia eléctrica que são produzidos por geradores de emergência, o que em alguns
países representa uma grande fatia do total da
produção nacional. Todavia o custo de produção
de energia por este meio é caro, entre 0,20 a 0,30
5
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Figura O.2 As causas da Crise de Abastecimento de Energia Eléctrica em África
ÁL
IA
M
CAMARÕES
MAYOTTE
ÁSC
DAG
Crescimento alto, baixo nível de investimento /
Problemas estruturais
AR
MB
ZIMBÁBUE
NAMÍBIA
S
LE
HE
IC
SE
TANZÂNIA
ZÂMBIA
Choque do preço do petróleo
SO
QUÊNIA
ANGOLA
Causa naturas (Secas)
Sistema afectado por conflito
UGANDA
BOTSUANA
MAURÍCIO
MA
Causa principal
GABÃO
MALAUÍ
SAO TOME AND PRINCIPE
REPÚBLICA
DEMOCRÁTICO
DO CONGO
(ZAIRE)
RUANDA
BURUNDI
E
TOGO
GUINÉ EQUATORIAL
ETIÓPIA
REPÚBLICA
AFRICANA CENTRAL
IQU
LIBÉRIA
NIGÉRIA
ÇA
SIERRA LEONE
DJIBUTI
MO
BURQUINA
FASO
GUINÉ
ERITREA
SUDÃO
CHADE
ME
RO
ON
GUINÉ BISSAU
L
NÍGER
CA
GÂMBIA
GA
MALI
BENIN
NE
GANA
SE
RE
DO PÚBLI
CON CA
GO
MAURITÂNIA
CABO VERDE
CÔTE
D'IVOIRE
6
SUAZILÂNDIA
ÁFRICA
DO SUL
Fonte: Eberhard e outros 2008.
dólares por quilowatt/hora, e nalguns países os
custos com a produção de energia pode chegar a
4% do PIB. O pagamento do aluguer dos geradores
de energia de emergência absorve significativos
recursos financeiros dos orçamentos nacionais e
compromete o investimento em soluções de longo
prazo.
Resultado 6: São precisos mais de 93
mil milhões de dólares de investimento
por ano em infra-estruturas em África,
mais do dobro do que havia sido
previsto anteriormente pela Comissão
para África
A resolução dos problemas ao nível de infra-estruturas em África requer um sólido plano de investimentos e de manutenção:
•
Um aumento de 7000 megawatts na capacidade
de produção de energia eléctrica por ano (cerca
de metade a partir de novas formas de armazenamento de água para diversas finalidades).
LESOTO
•
Permitir o intercâmbio regional de energia eléctrica através da implementação de linhas eléctricas
transfronteiriças, com capacidade de transmissão
de 22 000 megawatts.
•
Completar a rede inter-regional de fibra óptica
e o cabo submarino de ligação internacional.
•
Interligar as capitais, os portos, as passagens
fronteiriças e as cidades secundárias através de
uma boa rede de ligações rodoviárias.
•
Proporcionar o acesso aos campos agrícolas
de grande produtividade através de estradas
pavimentadas.
•
•
Mais do que duplicar a área irrigada em África.
•
•
Subir a taxa de electrificação doméstica em 10%.
Atingir os ODM para a água potável e saneamento básico.
Proporcionar o acesso a sistemas globais
de comunicação móvel por voz e a serviços
de banda larga a 100% da população.
A implementação de um programa tão ambicioso
para resolver as necessidades de infra-estruturas em
África custará 93 mil milhões de dólares por ano
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
(cerca de 15% do PIB do continente). Cerca de dois
terços deste valor referem-se a gastos de capital, o
restante, um terço, refere-se a custos de operações
e manutenção (Quadro O.3; Briceño-Garmendia,
Smits, and Foster 2008).
Os custos apresentados são bem mais do dobro
dos 39 mil milhões de investimento em infra-estruturas, estimados no relatório de 2005 da Comissão
para África. O valor baseava-se no estudo econométrico que envolvia vários países, e não num
modelo microeconómico mais detalhado ao nível
do país (Estache 2005). Uma recente actualização
do estudo inicial da Comissão para África apresenta
uma revisão dos custos, apontando para valores na
ordem dos 80 a 90 mil milhões de dólares, muito
mais próximo dos valores aqui apresentados
(Yepes 2007).
Cerca de 40% do total das necessidades de investimento estão associadas à energia eléctrica, o que
reflecte o grande défice do continente nesta área.
Cerca de um terço do investimento na energia eléctrica (cerca de 9 mil milhões de dólares por ano)
está associado a novas formas de armazenamento
de água para produção de energia hidroeléctrica,
e gestão dos recursos hídricos. A seguir à energia
eléctrica, o abastecimento de água potável, o saneamento básico e depois a rede de transportes são os
aspectos mais importantes.
Dado os recentes aumentos nos custos de
produção, as estimativas apresentadas podem estar
abaixo da realidade. Apesar das estimativas de investimento se basearem em dados precisos em relação
aos custos, as agências de desenvolvimento têm
apresentado aumentos significativos nos custos dos
projectos em fase de implementação. Nos projectos
rodoviários, por exemplo, os aumentos atingiram em
média os 35%, e em alguns casos foram até superiores, chegando a 50 ou 100%. Uma observação mais
atenta revela que nenhum factor isolado pode explicar tais aumentos. A inflação nacional, as apertadas
condições vividas pela indústria de construção, as
convulsões no mercado petrolífero e a falta de competição entre os agentes, todos estes factores têm
os seu papel, com o último a ser de longe o mais
importante.
A crise financeira global de 2008 pode vir a
originar a diminuição da procura de certo tipo de
infra-estruturas, mas não deve alterar demasiado
as necessidades estimadas em termos de custos.
O planeamento e os objectivos sociais, mais que o
crescimento económico, absorvem uma larga fatia
nas necessidades de investimento, por exemplo, as
relacionadas com os transportes (baseadas grandemente em objectivos de ligações rodoviárias) e as
relacionadas com a água potável e o saneamento
básico (baseadas nos ODM). As necessidades de
investimento mais directamente ligadas ao crescimento económico são aquelas que se relacionam
com o sector de energia eléctrica. Todavia, devido
aos atrasos no investimento neste sector, as estimativas de investimento necessário contêm uma grande
componente de recuperação e actualização do que já
existe. Desta forma, mesmo reduzindo para metade
as estimativas de crescimento económico para a
região, apenas se verificaria uma redução de 20%. A
recessão global pode também vir a afectar a procura
de serviços relacionados com as TIC, bem como as
infra-estruturas relacionadas com os fluxos comerciais, como as linhas ferroviárias e os portos. Não
obstante o peso destas infra-estruturas nas necessidades totais de investimento representam pouco
mais de 10%.
Quadro O.3 Necessidades totais de investimento em
infra-estruturas na África subsaariana
$ Milhares de milhões de dólares anuais
Sector de
Infra-estrutura
FuncionaDespesas de
mento e
capital
manutenção
Gastos
totais
TIC
7.0
2.0
9.0
Irrigação
2.9
0.6
3.4
26.7
14.1
40.8
8.8
9.4
18.2
ASB
14.9
7.0
21.9
Total
60.4
33.0
93.3
Energia Eléctrica
Transportes
Fonte: Estimativas dos autores baseadas em Banerjee, Wodon e
outros 2008; Carruthers, Krishnamani, e Murray 2008; Mayer, e
outros 2008; Rosnes e Vennemo 2008.
Nota: Os totais de cada coluna podem não ser exactos devido a
erros de arredondamento. TIC = Tecnologias da Informação e da
Comunicação; ASB = Água Canalizada e Saneamento Básico.
Resultado 7: Os desafios em relação
às infra-estruturas variam muito de
acordo com o tipo de país
O desafio em relação às infra-estruturas varia
muito de acordo com os diferentes grupos de países
(Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008). Devido
à ampla variedade de circunstâncias, é importante
distinguir entre os países de médios rendimentos
(como Cabo Verde e a África do Sul), países ricos
em recursos com economias altamente baseadas no
petróleo ou em minérios (como a Nigéria e a Zâmbia), países frágeis que acabam de sair de conflitos
armados (como a Costa do Marfim ou a República
Democrática do Congo), e os restantes países com
baixos rendimentos que não são nem frágeis nem
ricos em recursos (como o Senegal e o Uganda).
O mais preocupante desafio em termos de
infra-estruturas encontra-se nos chamados Países
Frágeis (Figura O.3). Os recentes conflitos que
7
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Figura O.3 Peso das Infra-estruturas em termos de Custos
40
Percentagem do PIB
8
35
30
25
20
15
10
5
0
PRB - Frágil
PRB - Não Frágil
Capital
Ricos em
Recursos
PRM
Funcionamento e Manutenção
Fonte: Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008.
Nota: Os valores referem-se ao investimento (excepto o Sector Público) e
incluem os gastos correntes. O Sector Público compreende o Governo em
geral e as empresas não financeiras PRB = País com Rendimentos Baixos;
PRM = País com Rendimentos Médios
afectaram estes países, na maioria dos casos resultaram na destruição ou delapidação das suas (já
de si modestas) infra-estruturas nacionais. Na
República Democrática do Congo, cerca de 50% das
infra-estruturas existentes precisam de obras de
reabilitação. As necessidades de investimento em
infra-estruturas nos Países Frágeis são particularmente elevadas, em particular se forem comparadas
com a dimensão das suas economias nacionais. Estes
países necessitariam, em média, de aplicar cerca de
37% do seu PIB na construção de uma rede sólida
de infra-estruturas. Dadas as dificuldades internas,
estes países acabam por ter pouca capacidade de
atrair investimento exterior, captando apenas 10%
de apoio internacional ao desenvolvimento e apenas
6% de capital privado é dedicado às infra-estruturas.
A somar ao enorme peso dos problemas de
financiamento, os Países Frágeis não utilizam adequadamente os recursos de que dispõem; investem
pouco em manutenção e contam com fornecedores
de serviços pouco eficientes.
Os países de baixos rendimentos necessitam de
dedicar, em média, cerca de 23% do PIB na construção e manutenção de infra-estruturas básicas,
na prática, um nível difícil de alcançar. Por isso,
terão de fazer escolhas difíceis sobre as prioridades
dos seus investimentos, e a maior parte destes países
tem ainda um longo caminho a percorrer, no sentido de melhorar a eficiência das infra-estruturas em
funcionamento.
Os países ricos em recursos estão, em princípio,
muito mais bem posicionados para alcançar as
suas metas em termos de investimento de infraestruturas, muito embora no passado não se tivesse
verificado essa tendência. Estes países poderiam
alcançar as suas necessidades de investimento em
infra-estruturas num valor muito mais manejável
de cerca de 12% do PIB. Na verdade, a enorme
entrada de capital proveniente de royalties que
receberam durante a recente escalada dos preços
das matérias-primas proporciona uma fonte segura
de financiamento. No entanto, os países ricos em
recursos estão actualmente atrasados em relação
às suas infra-estruturas, e investem menos nesses
sectores quando são comparados com os países de
baixos rendimentos. Essa riqueza tem sido aplicada
no pagamento da dívida externa, e não nas infraestruturas. Os desafios políticos, mesmo num ambiente rico em recursos, podem também impedir a
transformação da riqueza em infra-estruturas.
Satisfazer as necessidades de infra-estruturas
dos países de médios rendimentos parece ser uma
tarefa bastante mais fácil. Estes países deverão ser
capazes de responder às suas necessidades de investimento em infra-estruturas com cerca de 10% do
PIB. Os mesmos são também muito mais fortes na
manutenção das infra-estruturas e na eficiência
institucional. As suas populações, mais urbanas,
também facilitam o desenvolvimento do sistema.
Resultado 8: Uma grande parte das
infra-estruturas em África é financiada
pelas famílias
Os gastos com infra-estruturas em África são mais
elevados do que se pensava anteriormente, chegando aos 45 mil milhões de dólares por ano se
consideramos os gastos orçamentados e fora do
orçamento (incluindo empresas do estado e fundos
não orçamentados), e os financiamentos externos.
Os últimos incluem o sector privado, os apoios oficiais ao desenvolvimento e os financiamentos que
não pertencem à Organização para a Cooperação
e o Desenvolvimento Económico (OCDE). Dois
terços destes gastos são pagos internamente: 30 mil
milhões de dólares são pagos anualmente pelos contribuintes africanos e pelos utilizadores das infraestruturas, os restantes 15 mil milhões de dólares
são pagos pelo exterior (Quadro O.4).
O sector público continua a ser a principal fonte
de financiamento da água, da energia, e dos transportes em todos os países, à excepção dos mais
frágeis. O investimento público é largamente financiado pelos impostos e executado através dos orçamentos de estado, ao passo que o funcionamento e
a manutenção das infra-estruturas são financiados
pelas tarifas aplicadas aos utilizadores, e executados
pelas empresas do estado. Os níveis actuais de financiamento público são substancialmente elevados em
relação ao PIB nos países de baixos rendimentos,
normalmente absorvem entre 5% e 6% do total do
PIB. (Figura O.4). Em termos absolutos, todavia, os
gastos mantém-se bastante baixos, não superando
os 20 ou 30 dólares per capita ao ano (Briceño-Garmendia, Smits, and Foster 2008).
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Quadro O.4 Gastos em Infra-estruturas para Enfrentar as Necessidades Infra-estruturais da Áfria subsaariana
$ Milhares de milhões de dólares anuais
Funcionamento
e manutenção
Sector de
Infra-estrutura
Despesas de Capital
AOD
Financiamento o
Não OCDE
Sector
Privado
1.3
0.0
0.0
5.7
7.0
7.0
2.4
0.7
1.1
0.5
4.6
7.8
4.5
1.8
1.1
1.1
8.4
7.6
3.1
1.1
1.2
0.2
2.1
4.6
0.9
0.6
0.3
—
—
—
0.3
45.3
20.4
9.4
3.6
2.5
9.4
24.9
Gastos
Totais
Sector
Público
Sector
Público
9.0
2.0
Energia
11.6
Transportes
16.2
ASB
Irrigação
TIC
Total
Total
Fonte: Briceño-Garmendia, Smits, and Foster 2008..
Nota: Baseado nas médias anuais de 2001-2006. Médias ponderadas pelo PIB de cada país. Os valores são extrapolações baseadas na
amostra de 24 países utilizada na primeira fase da AICD. Os valores totais podem não estar correctos devido a erros de arredondamento.
TIC = Tecnologias da Informação e da Comunicação; AOD = Apoios Oficiais ao Desenvolvimento; OCDE = Organização para a Cooperação
e o Desenvolvimento Económico; ASB = Água canalizada e Saneamento Básico; – Valor não disponível.
Figura O.4 Percentagem do PIB do Investimento
Público em Infra-estruturas
7.0
6.0
percent
5.0
4.0
3.0
2.0
1.0
idd
leco inco
un m
tri e
ra
es
gil
el
ow
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gil
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ow
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un m
tri e
Su
es
bSa
ha
ra
n
Af
ric
a
0
no
nf
m
Olhando apenas o investimento, verifica-se que
o apoio oficial ao desenvolvimento, a participação
privada nas infra-estruturas e os financiamentos que
não fazem parte da OCDE, todos juntos, excedem
o investimento público financiado internamente
(Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008). O sector privado é de longe a maior fonte de financiamento a par do investimento público interno. Muito
mais pequenos, mas ainda assim significativos, são
os fluxos de capitais provenientes dos apoios oficiais
ao desenvolvimento e, com menor peso, os financiamentos vindos de países que não pertencem à
OCDE, como a China, a Índia e os países Árabes. A
direcção dos financiamentos varia muito de acordo
com cada caso. Os apoios oficiais ao desenvolvimento dirigem-se grandemente ao sector da água e dos
transportes, particularmente nos Países Frágeis. Os
financiamentos vindos de fora da OCDE dirigem-se
essencialmente ao sector da energia e da rede ferroviária, especialmente nos países ricos em recursos.
O investimento privado nas infra-estruturas concentra-se sobretudo no sector das TIC.
capital
operation and maintenance
Fonte: Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008.
Resultado 9: Mesmo com ganhos em
eficiência, ficam ainda a faltar 31 mil
milhões de dólares de financiamento
em infra-estruturas por ano em África,
sobretudo no Sector da Energia
Eléctrica.
A resolução das falhas ao nível da eficiência permitiria um melhor aproveitamento dos recursos
existentes – com um ganho de cerca de 17 mil milhões de dólares por ano. Esta é a maior lacuna registada na eficiência do sector das infra-estruturas
que África enfrenta (Briceño-Garmendia, Smits,
e Foster 2008).
Em primeiro lugar, alguns países estão a aplicar
mais recursos em certo tipo de infra-estruturas do
que parecia ser necessário (Briceño-Garmendia,
Smits, e Foster 2008). Este “gasto excessivo”, no total,
chega a atingir os 3,3 mil milhões de dólares anuais,
e a maior parte destas despesas estão relacionadas
com o investimento público nas infra-estruturas
para as TIC, que o sector privado poderia assumir,
em particular nos países com médios rendimentos.
Apesar de uma parte deste “gasto excessivo”
poder ser justificado como tratando-se de uma
9
10
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
fase ou de uma sequência, pelo menos parte destes
recursos poderiam, provavelmente, ser dedicados a
sectores subfinanciados. É necessário monitorizar
melhor os gastos com as infra-estruturas, de acordo
com necessidades e prioridades e considerando a
expectativa de retornos económicos.
Em segundo lugar, os países tipicamente africanos executam apenas cerca de dois terços do orçamento destinado ao investimento público nas infraestruturas (Briceño-Garmendia, Smits, e Foster
2008). Posto de outra forma, o investimento público
poderia teoricamente aumentar em 30% sem
nenhum aumento nos gastos, apenas resolvendo
bloqueios que inibem a execução do orçamento
financeiro. As mudanças supõem um melhor planeamento dos projectos de investimento, a elaboração antecipada de estudos de viabilidade, processos
de adjudicação mais eficientes e a mudança para um
tipo de orçamentação que compreenda um período
médio de vários anos. Aumentar a execução orçamental do capital para 100% poderia também captar
mais 1,9 mil milhões de dólares por ano em investimento público.
Em terceiro lugar, em média, 30% das infraestruturas existentes num país tipicamente africano necessitam de reabilitação (Figura O.5). Este
valor é ainda maior nas infra-estruturas das zonas
rurais e nos países afectados por conflitos violentos.
A necessidade acumulada de reabilitação reflecte
um legado de subfinanciamento na manutenção, o
que constitui um enorme desperdício de recursos
dado que o custo da reabilitação é várias vezes superior ao custo cumulativo da manutenção preventiva.
Por exemplo, cada dólar gasto na manutenção das
Figura O.5 Necessidades de Reabilitação Acumuladas
Índice médio de reabilitação
50
40
30
20
10
ur
ais
ria
s
viá
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s
Lin
Es
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Fe
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0
Fonte: Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008.
Nota: O índice de reabilitação representa a percentagem média de cada infra-estrutura que se encontra em más condições nos diversos países, e por isso necessita de reabilitação.
estradas, faz poupar quatro dólares na reabilitação
das mesmas. É por esta razão que investir alguns
recursos na manutenção é uma medida necessária,
particularmente nos países com baixos rendimentos
e que investem pouco na manutenção. No caso das
estradas, estima-se que poderiam ter sido poupados
2,4 mil milhões de dólares em despesas de reabilitação, se tivesse havido a referida manutenção.
Em quarto lugar, em África, os serviços de energia eléctrica e de água apresentam um grande défice
de eficiência, ao nível de perdas na distribuição,
de incapacidade de cobrar os serviços e de excesso
de pessoal (Figura O.6). Em geral, estes serviços
conseguem cobrar apenas entre 70% a 90% das
facturas, e as perdas na distribuição podem facilmente ser o dobro do que tecnicamente se espera.
De acordo com inquéritos efectuados às famílias,
aparentemente cerca de 40% das pessoas que estão
a usufruir destes serviços não os estão a pagar, um
valor que atinge os 65% numa minoria dos países.
A incapacidade de cobrança é também um problema
em alguns fundos rodoviários em África (Gwilliam
e outros 2008). Os dirigentes das companhias de telecomunicações do estado dão emprego a um número
considerável de pessoas com quem têm algum vínculo, cerca de seis vezes superior ao dos operadores
privados nos países em desenvolvimento.
No sector das TIC, os países que mantêm empresas controladas pelo estado incorrem muitas vezes
em prejuízos significativos devido ao excesso de
nomeações, que rondam os 0,2% do PIB. Semelhante
situação, apesar de ter menor peso, ocorre com o
excesso de pessoal nos serviços de abastecimento de
água ou de energia eléctrica, variando de 20% a 80%
acima dos níveis de outras áreas em desenvolvimento. No total, os lucros perdidos devido a estas faltas
de eficiência podem facilmente exceder várias vezes o
valor do retorno obtido. No caso da energia eléctrica,
esses prejuízos são também visíveis a nível nacional,
absorvendo 0,5% do PIB, em média, na África subsaariana, ou 3,4 mil milhões de dólares anualmente
(Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008). No
caso do abastecimento de água, o valor absoluto das
faltas de eficiência é menor, com uma quantia média
calculada em 0,2% do PIB, ou seja, de mil milhões
de dólares por ano.
Em quinto lugar, os preços pagos pelos serviços
são substancialmente baixos. Ainda que as taxas
de utilização das infra-estruturas sejam elevadas,
de acordo com os padrões internacionais, também
o são os custos com as próprias infra-estruturas.
Mesmo as tarifas relativamente elevadas não chegam para cobrir mais do que os custos operacionais. Os montantes não cobrados devido aos
baixos preços da energia eléctrica e da água, em
conjunto, chegam aos 4 mil milhões de dólares
por ano, um subsídio implícito aos utilizadores das
infra-estruturas, sem ter em conta os consideráveis
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Figura O.6 Custos Escondidos das Ineficiências dos Serviços
a. Energia Eléctrica
b. Água
5
Percentagem do PIB
4
3
2
1
0
4
3
2
1
S
AS
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PR
B
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B
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PR
B
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PR
M
cu
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s
gil
0
PR
B
Percentagem do PIB
5
Perdas não contabilizadas
Ineficiência das cobranças
Despedimentos de mão-de-obra
Note: PRM = Países com rendimentos médios; PRB = Países com rendimentos baixos; ASS = África subsaariana
Fonte: Briceño-Garmendia, Smits, and Foster 2008
subsídios aos grandes consumidores industriais
que não podem ser tão facilmente quantificáveis
(Briceño-Garmendia, Smits, e Foster 2008). Devido
ao atraso do acesso às infra-estruturas em África,
cerca de 90% daqueles que têm acesso a água
canalizada ou a electricidade pertence aos 60% de
ricos entre a população (Figura O9, a); Bannerjee,
Wodon, e outros 2008). Por essa razão, as famílias
mais abastadas ficam com a maior parte dos subsídios de algum tipo de serviço doméstico. De facto,
o processo de atribuição é tão deficiente que um
processo completamente aleatório para distribuir
os subsídios pela população seria três vezes mais
eficiente a chegar aos mais pobres.
O total das insuficiências de financiamento
para enfrentar as necessidades de infra-estruturas
em África calcula-se pela diferença entre o custo
estimado do investimento em infra-estruturas e
o potencial pacote de recursos que considera o
investimento existente e os potenciais aumentos de
eficiência. Mesmo se este aumento se concretizasse,
o défice orçamental de cerca 31 mil milhões de
dólares subsistiria (Quadro 0.5). Esta falta de fundos
só poderá ser enfrentada recorrendo à angariação
de financiamentos adicionais, à adopção de tecnologias de custo menor, ou à definição de objectivos
menos ambiciosos para o desenvolvimento das
infra-estruturas.
Tendo em vista todos os sectores, é de notar que
60% da insuficiência de financiamento é referente a
energia eléctrica (Figura 0.7, Quadro a). O remanescente diz respeito a água e irrigação. Não há falta de
financiamento significativa para as TIC ou para as
redes de transportes.
Olhando a situação dos países, globalmente, o
valor em dólares da insuficiência de financiamento
é dividido uniformemente pelos grupos de rendimento. Embora as maiores insuficiências estejam
relacionadas com capital de investimento, a falta de
fundos para fazer face às despesas de funcionamento e
manutenção é substancial, particularmente nos Estados mais frágeis. Se a falta de fundos de investimento
para infra-estruturas é considerada como uma percentagem do PIB, o grau de dificuldade na resolução
dessa insuficiência torna-se de imediato visível. O
ónus associado à solução desta carência de meios
é insuperável para os Estados frágeis. Seria necessário
investir mais de 25% do seu PIB em infra-estruturas
para inverter o cenário. Em relação à dimensão das
economias, nos Estados frágeis as mais importantes
faltas de financiamento estão situadas nos sectores da
energia eléctrica, das redes de transportes e da água
(Figura 0.9, quadro b).
Como é demonstrado, a dimensão do défice de
financiamento nos países de baixos rendimentos
é provavelmente muito maior do que a verba que
poderiam obter através das fontes de financiamento
disponíveis. Para esse grupo de países, particularmente problemáticos, poderá ser necessário tomar
medidas adicionais.
Uma opção passaria por alargar o prazo previsto no programa de investimento proposto. Algumas simulações realizadas sugerem que os países de
baixos rendimentos podem vir a atingir os objectivos de investimento propostos no prazo de 20
anos, sem aumento dos investimentos existentes, se
conseguirem aproveitar plenamente os benefícios
do combate a ineficiência.
Todavia não se pode dizer o mesmo dos países
frágeis, que iriam continuar a necessitar de um
aumento substancial de fundos até atingirem os
objectivos de investimento num prazo razoável,
11
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Quadro 0.5 Encontrar Recursos: A falha de eficiência e de financiamento $ mil milhões de dólares anuais
$ Milhares de milhões de dólares anuais
Energia
TIC
Irrigação
Transporte
ASB
Ganho todos
sectores
Total
Necessidades de investimento das
infra-estruturas
(40.8)
(9.0)
(3.4)
(18.2)
(21.9)
n.a.
(93.3)
Financiamento dirigido as necessidades
11.6
9.0
0.9
16.2
7.6
n.a.
45.3
Ganhos da redução das enificiências
6.0
1.3
0.1
3.8
2.9
3.3
17.4
Ganho da melhoria da excecução
do capital
0.2
0.0
0.1
1.3
0.2
n.a.
1.9
Ganho da eliminação das ineficiências operacionais
3.4
1.2
0.0
2.4
1.0
n.a.
8.0
Ganho da recuperação dos custos
2.3
0.0
0.0
0.1
1.8
n.a.
4.2
Potencial de realocação
n.a.
n.a.
n.a.
n.a.
n.a.
3.3
n.a.
(23.2)
1.3
(2.4)
1.9
(11.4)
3.3
(30.6)
Item
Falha de Financiamento
Fonte: Briceño-Garmendia, Smirhs and Foster 2008.
Nota: Tecnologias de Infomação e Comunicação; n.a.= não aplicável; ASB = Água Canalizada e Saneamento Básico. Os parêntesis indicam
valores negativos..
10
5
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Capital
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B
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15
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2
25
co
Percentagem do PIB (%)
3
b. Por tipo de País
30
Ri
a. Por Sector
4
ica
Percentagem do PIB (%)
Figura O.7 A Falha de Financiamento das Infra-estruturas, por Sector, por tipo de País
En
12
Funcionamento e Manutenção
Nota: TIC = Tecnologias de informação e comunicação; PRB = Países com rendimentos baixos;
PRM = Países com rendimentos médios; ASB = Água Canalizada e Saneamento Básico.
Fonte: Briceño-Garmendia, Smits, and Foster 2008.
mesmo que tenham conseguido controlar todas as
ineficiências.
Outra possibilidade seria a adopção de tecnologias de relativo baixo custo, diminuindo assim o
investimento necessário. Desta maneira, os países
frágeis poderiam economizar aproximadamente
um terço do investimento exigido para as redes de
transportes e para água e saneamento, adoptando
traçados de estradas de custo mais baixo e soluções
mais simples para água e saneamento (como pontos
de água públicos ou latrinas melhoradas). Os países
estabeleceriam assim uma compensação entre o nível
de qualidade dos serviços propostos e a rapidez com
que conseguem servir a sua população.
Resultado 10: O Processo de Reforma
Institucional, Regulamentar e
Administrativo em África só está a
meio caminho
No decorrer da última década, os estados africanos
esforçaram-se no planeamento de reformas
institucionais das suas infra-estruturas. Podemos
afirmar, com justiça, que o processo de reforma
institucional está a meio caminho (Vagliasindi e
Nellis, 2009). Fizeram-se progressos, mas poucos
países possuem uma estrutura institucional
moderna para esses sectores. Em termos
globais, o maior progresso foi alcançado nas
telecomunicações, mas são as redes de transportes
que acusam o atraso maior (Figura 0.8). O foco
também varia. No sector das telecomunicações,
a ênfase foi dada na implementação da reforma
do sector, no da água o destaque foi dado no
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Figura O.8 A Situação da Reforma Institucional nos Sectores das Infra-estructuras
80
70
70
60
50
40
30
60
50
40
30
20
10
10
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20
Reforma
Regulamentação
Administração
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Valor Indicador
90
80
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es
Valor Indicador
90
Te
b. Transportes
100
Fe
a. Serviços
100
Nota: No eixo-y não rotulado deve ler-se “valor indicador”
Fonte: Vagliasindi and Nellis 2009.
melhoramento da administração das empresas
estatais.
A participação do sector privado tem variado
imenso (Vagliasindi e Nellis, 2009). Na segunda
metade dos anos de 1990, vários países africanos
iniciaram uma série de experiências tendo em vista
diversas formas de participações do sector privado
nas suas infra-estruturas, com resultados muito heterogéneos (Quadro 0.6).
O sector privado tem demonstrado vontade
de investir apenas em telefones móveis, centrais
geradoras de energia e terminais de contentores. O
número de utilizadores de telefones móveis e a cota
da população alcançada pelas redes móveis atingiu
um crescimento de factor 10 em 5 anos, como resultado da concorrência entre os operadores privados.
Os investidores privados contribuíram também,
e significativamente, para a produção de energia térmica (3000 megawatts) e para a existência de terminais de contentores nos portos, mesmo ficando
os números aquém das exigências. As concessões de
portagens são limitadas à África do Sul; o volume
de tráfego em qualquer outro lugar é insuficiente
para viabilizar o autofinanciamento de iniciativas
deste tipo.
No que se refere aos sectores de energia eléctrica,
água e ferroviário, o sector privado introduziu melhorias no desempenho operacional, mas nenhum
financiamento novo. As numerosas concessões
(e tipos de contratos relacionados) que abrangem
os caminhos-de-ferro, energia e distribuição de
água não produziram investimentos significativos.
Devido à combinação de tarifas baixas e volumes
baixos, nenhum destes negócios produziu um fluxo
de liquidez suficientemente elevado para financiar
os investimentos. Todavia, os acordos têm sido
frequentemente (nem sempre) positivos para o
desempenho operacional, mesmo quando caracterizados pela renegociação e cancelamento prematuro. Uma área de experimentação em crescimento é
a dos contratos multianuais de manutenção das vias
rodoviárias, baseados no desempenho e celebrados
com o sector privado, que apresentam promessas
na salvaguarda das actividades de manutenção e na
contenção dos custos.
Algum progresso foi alcançado com as reformas
na administração das empresas estatais, nas quais a
utilização tanto de contratos que oferecem incentivos com base no desempenho como de auditorias
externas parece estar a dar bons resultados. As reformas na administração das sociedades, que incluem
a implementação de um concelho administrativo
com alguma independência, estão a tornar-se mais
frequentes em todos os sectores, mesmo quando
são poucas as empresas que atingem o corporativismo total, que inclui limitação de responsabilidade,
taxas de rendimento e políticas de dividendos. Nos
sectores de energia eléctrica e água, o uso desses
contratos e de auditorias externas independentes
tornou-se dominante no processo de reforma da
administração das empresas estatais. Quando combinadas com incentivos à performance executiva,
estas medidas parecem ter resultados relevantes
no desempenho. A introdução de auditorias independentes contribuiu também para o aumento de
eficiência nos serviços públicos de energia eléctrica
e da água.
Os indícios da relação entre a introdução de
um controlador independente e a melhoria na
desempenho são actualmente mistos. Alguns críticos sustentam que esses órgãos de controlo têm
13
14
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
Quadro O.6 Total da Participação Privada nas Infra-estruturas
Sector de
Infra-estrutura
Dimensão da
participação privada
Natureza da
experiência
Perspectivas
TIC
Telefones móveis
Mais de 90 porcento dos
países emitiram licencias a
múltiplos operadores
Extremamente benéfica
com aumento exponencial da cobertura e
penetração
Vários países ainda tem
potencial para emitir mais
licencias
Telephones de
rede fixa
Cerca de 60 porcento dos
países alienaram seus
sistemas de telecomunicações estatais
Em alguns casos objecto
de controvérsia, mas
ajudou globalmente a
melhoria da eficiência
no sector
Vários países ainda tem
potencial para mais
alienações
34 projectos independentes
fornecem 3,000 MW of
nova capacidade. Investimento: 2.5 mil milhões de
doláres
Poucos cancelamentos,
renegociações frequentes; os acordos de compra de energia eléctrica
tem sido caros para os
fornecedores de serviços
Deverá prosseguir, tendo
em vista a enorme procura
instisfeita e a capacidade
limitada de resposta do
sector público
16 concessões e 17 contratos de administração ou
concessão em 24 países
Problemático e controverso; um quarto dos
contratos foi anulado
antes do termo
Tendência a dirigir-se
para modelos híbridos
envolvendo o sector
privado local em estruturas
similares
Aeroportos
4 concessões, investimento:
menos de 0.1 mil milhões
de doláres, e algumas some
alienações
Nenhum cancelamento
mas algumas lições
aprendidas
Número limitado de aeroportos ainda viáveis para
concessões
Portos
26 concessões de terminais
de contentores, investimento: 1.3 milhares de
milhões de doláres
Os procedimentos
podem ser controversos,
mas houve poucos cancelamentos e os resultados são positivos
Bom potencial para
continuar
14 concessões de linhas,
investimento: 0.4 mil milhões de doláres
Renegociações frequentes, tráfego baixo, e caras
obrigações de serviço
público mantém o
investimento aquém das
expectativas
Deverá continuar mas
o modelo tem de ser
adaptado
10 projectos de estradas
com portagens, quase
todas na África do Sul,
investimento 1.6 milhares
de milhões de doláres
Não ha cancelamentos
conhecidos
Limitado, somente 8
porcento da rede rodoviária
tem o tráfego mínimo
necessário, quase todos na
África do Sul
26 transacções, principalmente contratos de administração ou concessões
Problemática e controversa; 40 porcento dos
contratos cancelados
antes do termo
Energia
Geração de energia
eléctrica
Distribuição de
energia eléctrica
nua a ser ardilosa: em certos países, a rotatividade
dos comissários tem sido alta, e o fosso entre a lei
(ou regulamento) e a prática manteve-se profundo.
Para o sector da água, onde a grande maioria dos
fornecedores de serviços são empresas estatais, não
há nenhum indício de benefícios trazidos por esta
regulamentação. No sector de energia eléctrica e das
telecomunicações nota-se algum efeito, mas longe
de ser inequívoco. A fraca autonomia da regulamentação e as limitações das suas competências minam
a credibilidade dos controladores independentes.
De facto, a maioria das agências de controlo
africanas é ainda rudimentar, tendo em conta a falta
de fundos e, em muitos casos, a ausência de funcionários qualificados.
Recomendações Fundamentais
Com base nessas conclusões, podem ser feitas as
seguintes 10 recomendações fundamentais:
•
A solução do problema da falta de eficiência
nas infra-estruturas africanas constitui uma
prioridade absoluta das políticas, com potenciais dividendos na ordem dos 17 mil milhões
por ano. Uma das ineficiências mais flagrantes
é o fracasso da manutenção do património de
infraestruturas – a manutenção tem de passar a ser entendida como um investimento na
preservação desse património.
•
Mantém-se a necessidade de reformas institucionais para confrontar as carências operacionais
dos serviços públicos, com a ajuda de participações privadas e de reformas administrativas nas
empresas estatais.
•
Essas reformas deveriam ir mais longe e não
apostar apenas nos serviços públicos, fortalecendo assim as funções de planeamento dos
ministérios de tutela e lidando com as deficiências sérias do processo orçamental.
•
Reformas leves são necessárias para rentabilizar
o mais possível as infra-estruturas existentes,
onde muitos constrangimentos administrativos
e regulamentares impedem a maximização do
uso dos serviços públicos.
•
A integração regional pode contribuir de modo
significativo para a redução dos custos de infraestruturas, ao permitir o benefício de economias de escala e gestão eficaz dos bens públicos
regionais.
•
O desenvolvimento das redes de infra-estruturas
tem de ser estrategicamente instruído pela distribuição espacial das actividades económicas e por
economias de aglomeração.
Transportes
Linhas ferroviárias
Estradas
Água
Água
Tendência a dirigir-se
para modelos híbridos
envolvendo o sector
privado local em estruturas
similares
Fontes: Elaboração dos autores baseada em Bofinger 2009; Bullock 2009; Eberhard e outros 2008;
Gwilliam e outros 2008; Minges e outros 2008; Mundy e Penfold 2008; e Svendsen,
Ewing, e Msangi 2008.
Nota: TIC= Tecnologias de Infomação e Comunicação; MW = mega watts.
apenas criado riscos adicionais, ao emitirem conclusões imprevisíveis, em consequência de prudência excessiva e em objectivos demasiado alargados
(Eberhard 2007). A autonomia do controlo conti-
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
•
A política social referente ao sector de infraestruturas tem de ser repensada, e dar ênfase a
uma recuperação de custos que onere aqueles
que têm os meios para isso e na atribuição dos
subsídios para acelerar o acesso.
•
Para atingir o acesso universal, será necessário
dar mais atenção à remoção de barreiras que
impedem o melhoramento dos serviços e a oferta
de soluções alternativas práticas e interessantes.
•
Resolver a falta de financiamento de infra-estruturas é crítico para a prosperidade da região, e a
crise financeira global só tem tornado a questão
das infra-estruturas mais fulcral.
Recomendação 1: Solucionar o problema
da falta de eficiência de infra-estruturas
em África é uma prioridade urgente das
políticas.
As conclusões apresentadas realçam a magnitude
da ineficiência com a qual África gasta os recursos
das suas infra-estruturas. Da totalidade dos cerca de
93 mil milhões de dólares de que necessita para gastos em infra-estruturas, cerca de 17 mil milhões de
dólares poderiam ser poupados tendo em atenção
a utilização mais eficiente dos recursos existentes.
Recolher esses dividendos de eficiência tem de ser
uma política prioritária para a região, e os esforços
para aumentar o financiamento de infra-estruturas
têm de ser feitos num contexto de genuíno compromisso de lidar com a eficiência.
Introduzir financiamentos adicionais em sectores caracterizados por altos níveis de ineficiência não
faz grande sentido. Todavia, esperar que a eficiência
melhore para efectuar aumentos de financiamento
também não é uma opção válida: os custos para o
crescimento económico e para o desenvolvimento
humano são simplesmente altos demais. Ao invés,
os esforços dos parceiros de desenvolvimento para
assegurar recursos adicionais ao financiamento de
infra-estruturas têm de ser correspondidos com o
empenho dos governos em melhorar a sua eficiência
no uso desses recursos. É necessária uma progressão
paralela nas duas frentes.
Além de mais, em alguns casos são necessários
investimentos que permitiam o controlo das ineficiências (por exemplo, quando algumas estradas
têm de ser reabilitadas para poder reverter para um
estado que viabilize a sua manutenção, ou quando
têm de ser instalados contadores para melhorar a
cobrança de rendimentos). Este tipo de investimento
relacionado com a eficiência merece prioridade, devido aos retornos importantes que costuma trazer.
A actual crise financeira global só vem reforçar a
motivação para enfrentar questão das ineficiências.
Agora que os países africanos começam a sentir o
aperto da crise financeira global, e que as outras fon-
tes de financiamento começam a secar, as medidas
que melhorem a eficiência da utilização dos recursos existentes tornam-se particularmente atraentes.
Estas medidas fornecem uma fonte interna adicional
de financiamento a um custo monetário relativamente baixo. É claro que em alguns casos há investimentos significativos que podem ser necessários até
se conseguir obter ganhos em eficiência (por exemplo, na redução de percas na distribuição de energia eléctrica ou de água). Noutros casos, o contexto
económico da crise pode simplesmente aumentar o
custo político resultante da tomada de medidas, tais
como o aumento da recuperação de custos ou o despedimento de empregados dispensáveis.
Os potenciais ganhos em eficiência tomam
assim uma grande variedade de formas, que são
desenvolvidas nas recomendações que se seguem.
Sucintamente, as recomendações abrangem as áreas
seguintes:
•
Salvaguardar os gastos em manutenção para
evitar o desperdício na repetida reabilitação dos
recursos existentes, o que permitiria economizar
cerca de 2,6 mil milhões por ano em despesas de
capital, só no sector rodoviário.
•
Reformar as instituições para maior eficácia
operacional dos serviços públicos e de outros fornecedores de serviços que desperdiçam
actualmente 6 mil milhões de dólares devido a
ineficiências como o excesso de mão-de-obra,
falhas na cobrança de rendimentos e quebras na
distribuição.
•
Confrontar as ineficiências na estrutura da
despesa pública, onde 3,3 mil milhões de dólares
por ano de recursos em infra-estruturas parecem
ser alocados de maneira deficiente em todos os
sectores, e onde o deficiente cumprimento dos
orçamentos impede que sejam utilizados cerca
de 1,8 mil milhões de dólares por ano de fundos
de investimento público.
•
Modernizar as estruturas administrativas
e regulamentares em todas as redes de infraestruturas de modo a reduzir as obstruções que
impedem o fornecimento eficiente dos serviços
e impor custos substanciais aos utilizadores das
infra-estruturas.
•
Aproveitar as economias de escala e os benefícios
de coordenação associados à integração regional,
que só no caso da energia eléctrica pode significar 2 mil milhões de dólares por ano.
•
Conseguir o maior rendimento dos investimentos em novas infra-estruturas ao serem utilizadas para assegurar economias de aglomeração
e facilitar assim o desenvolvimento de actividades produtivas nos corredores económicos
fundamentais.
15
16
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
•
Repensar a política social das infra-estruturas
no sentido de colocar mais ênfase na recuperação de custos a partir daqueles que podem
efectivamente suportá-los e redireccionar os
4 mil milhões de dólares de actuais subsídios
para acelerar o acesso dos grupos de rendimentos mais baixos.
•
Reduzir o custo necessário para atingir os objectivos fundamentais das infra-estruturas ao adoptar tecnologias de custo inferior que forneçam
níveis de serviço razoáveis e com preços acessíveis tanto ao consumidor como ao governo.
Recomendação 2: Aumentar o esforço
para salvaguardar os gastos com a
manutenção
O tradicional desleixo com as despesas de manutenção tem de ser revertido ao repensar a manutenção
como preservação de património. Um terço do património de infra-estruturas em África necessita de
reabilitação, o que indica que o histórico desleixo
na manutenção é endémico. Para estados frágeis e
para infra-estruturas rurais, a cota de património
degradado é muito maior. O défice de 0,6 mil milhões de dólares anuais em gastos de manutenção
das estradas está a custar a África 2,6 mil milhões de
dólares por ano em despesas que se podiam evitar;
por outras palavras, 1 dólar gasto em manutenção
pode fazer poupar aproximadamente 4 dólares em
reabilitação.
Por conseguinte, a falha no financiamento das
infra-estruturas em África não tem apenas a ver
com a angariação de capital de investimento; uma
parte substancial desse buraco relaciona-se com a
manutenção. Todavia, a manutenção oferece um dos
retornos mais altos aos gastos nas infra-estruturas,
logo, pode ser mais útil pensar nela como um tipo
de investimento na preservação de património.
O sector rodoviário demonstra que a manutenção pode ser melhorada com reformas institucionais adequadas. Desde a segunda metade dos anos
de 1990, a maioria dos países africanos tem vindo
a criar fundos rodoviários na tentativa de canalizar
as taxas cobradas aos utentes para a manutenção
da rede. Os países que possuem fundos rodoviários
conseguem resultados melhores na obtenção de
financiamentos de manutenção adequados se,
no entanto, o valor dos impostos ligados ao combustível, e que são pagos a esses fundos, for estabelecido a um nível suficientemente elevado para
poder fornecer um financiamento substancial. Além
disso, os países que possuem fundos rodoviários
e entidades responsáveis para a rede rodoviária
obtêm resultados significativamente melhores na
salvaguarda da qualidade da sua rede rodoviária. O
uso no sector rodoviário de contratos multianuais
baseados no desempenho contribuiu ainda mais
para a eficácia e eficiência na manutenção das estradas. Essas conclusões deixam ver que a combinação
de mecanismos de financiamento, competência
institucional e incentivos contratuais é necessária
para responder ao desafio da manutenção.
Os provedores de fundos, tradicionalmente,
evitam o financiamento da manutenção, com o
argumento de que é mais adequada para o financiamento directo dos orçamentos nacionais.
É um bom argumento. Todavia, a boa vontade
dessas entidades em financiar a reabilitação do
património pode incentivar os países, de maneira
perversa, a negligenciar a manutenção, porque os
governos acabam por ter de escolher entre subir
os impostos hoje para financiar a manutenção ou
simplesmente aguardar uns anos para obter subsídios de reconstrução. Em ambientes de rendimentos e competências baixos, onde a manutenção
é escassa, os doadores seriam bem avisados de tomar
esta escolha explicitamente em conta na realização
de projectos, em vez de assumirem simplesmente
que a manutenção será feita. Uma maneira de proceder seria a utilização de tecnologias mais caras,
que necessitem de menor manutenção. Mesmo que
representem no curto termo um custo de investimento maior, os custos globais do ciclo de vida dos
equipamentos serão mais baixos se for evitada ou
adiada a sua reconstrução. Ao escolher dar apoio ao
orçamento da totalidade de um sector, os financiadores terão a oportunidade de assegurar que os gastos
na manutenção serão suportados adequadamente
pelo pacote orçamental. De qualquer modo, e regra
geral, o estabelecimento de uma estrutura sã para
o financiamento da manutenção deveria ser um
pré-requisito na elaboração dos principais programas de capitais.
Recomendação 3: Introduzir reformas
institucionais (conceito amplio) para
combater a ineficiência
Desde a metade dos anos de 1990, o programa institucional alargou-se e aprofundou-se (Vagliasindi e
Nellis 2009). Nessa altura, o foco da reforma institucional centrava-se na reestruturação do sector e
na participação privada, e tentou-se transplantar
para África experiências de outras partes do mundo
em vias de desenvolvimento. Essa política obteve
resultados espectaculares no sector das telecomunicações, mas nos outros sectores os benefícios foram
mais limitados e as experiências mais problemáticas.
Mesmo assim, o financiamento privado às infraestruturas africanas veio oferecer um fluxo inédito
de recursos financeiros de dimensão comparável ao
da ajuda ao desenvolvimento vinda do estrangeiro.
Hoje em dia, uma visão mais subtil e menos dogmática do sector privado prevaleceu. Esta perspectiva
valoriza o financiamento privado nos sectores das
redes telefónicas móveis, da geração de energia e dos
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
portos, mas identifica no entanto as suas limitações
nos sectores rodoviários, ferroviários, de energia eléctrica e da água. (Ver Quadro 0.6). Vemos assim que,
para as infra-estruturas, sector onde o apetite para o
financiamento privado é muito limitado, a potencial
contribuição privada para combater as dispendiosas
ineficiências administrativas (deficiente cobrança
dos rendimentos dos serviços públicos, baixa produtividade da mão-de-obra, negligente manutenção
das estradas) mantém-se valiosa. Com efeito, os
ganhos em eficiência obtidos com essas melhorias
no desempenho são por si uma fonte significativa de
financiamento dos sectores. Além disso, o conceito de
participação privada alargou-se significativamente.
Atribui-se hoje mais importância ao sector privado
local (não ao internacional) e a modelos híbridos
que experimentam maneiras diferentes de distribuir as responsabilidades entre parceiros públicos
e privados.
Outro âmbito a qual o programa de reforma
institucional se alargou é o crescente foco na qualidade da administração das empresas que permanecem na propriedade do estado (Vagliasindi e Nellis
2009). O reconhecimento de que o sector privado
nunca será um fornecedor de serviços omnipresente
fez entender que as empresas pertencentes ao estado
estão para ficar. Portanto, torna-se necessário um
novo empenho no difícil processo de reforma dessas
mesmas empresas.
Os renovados esforços na reforma das empresas estatais deveriam favorecer o estabelecimento
de controlo, em vez de propor soluções técnicas.
Um melhor controlo das empresas estatais pode
melhorar o desempenho. No passado, os esforços
produzidos no sentido de tentar melhorar a gestão
dos serviços públicos centraram-se em demasia
em questões técnicas, em detrimento do controlo
administrativo e da prestação de contas. Ainda se
justificam as reformas nas empresas estatais, mas
apenas se focarem os problemas institucionais mais
profundos. As medidas principais que deveriam ser
tomadas incluem a autonomia de poder de decisão
para os concelhos de administração, critérios de
selecção mais objectivos na escolha de altos cargos
executivos, declaração rigorosa dos conflitos de interesses, e processos de recrutamento mais transparentes e baseados no mérito.
Em paralelo, deveria ser fortalecida a monitorização financeira e operacional das empresas estatais
por organismos de supervisão, sejam eles os ministérios da tutela ou das finanças. A transparência e a
prestação de contas das empresas estatais dependem
de sólidos sistemas de gestão financeira, de aquisições
e da informação da administração. Hoje em dia, os
dados básicos operacionais e financeiros referentes
ao desempenho das empresas não são apresentados
nem incluídos em relatórios, e não são fiscalizados.
Sem informação, ou talvez ainda pior, sem reacção à
informação que venha a ser produzida, não se pode
esperar melhores resultados. As medidas principais a
tomar incluem auditorias, publicação de resultados e
o uso de sistemas de apresentação de relatórios completos e baseados nos custos, que permitam efectuar
a separação funcional dos custos e obter uma visão
mais clara das suas localizações. Uma vez esse alicerce
no lugar, mecanismos de contratação podem melhorar o desempenho dentro do sector público ou com
o sector privado.
No sector público os contratos com bases em
incentivos necessitam de fortes estímulos ao desempenho. As primeiras tentativas de melhorar
empresas estatais africanas com a utilização desse
tipo de contractos, celebrados com os ministérios
de tutela ou outras entidades de supervisão, foram
pouco eficazes. Todavia, esforços recentes no sector
da água (Uganda) obtiveram resultados mais positivos. A característica principal desses contratos é que
incorporam incentivos à boa prestação dos gestores
(e equipa) e, mais raramente, sanções para casos de
insucesso ao atingir objectivos.
Criar estímulos eficazes para o sector público
pode ser um desafio, o que torna os contratos de
gestão com o sector privado uma opção pertinente.
Podem ser contratadas equipas de gestão locais ou
internacionais, ambas as opções oferecem vantagens.
A visão objectiva das potencialidades e limitações de
um contracto é fundamental, devido a sua limitação
no tempo. No melhor dos casos, um contrato de
gestão melhorara o desempenho de uma mão-cheia
de aspectos de eficiência relativamente controláveis,
como a cobrança e a produtividade laboral. Mas não
é a solução para as deficiências da própria estrutura
institucional. Idealmente, essas deficiências deveriam
ser eliminadas antecipadamente. Não é um contrato
de gestão que vai trazer aumentos de fundos de
investimento ou conseguir efeitos importantes na
qualidade dos serviços, se esses necessitam de substanciais investimentos ou de gestações demoradas.
Em princípio, a regulamentação pode fazer
muito; mas na prática, regulamentar tem sido difícil.
Por essa razão, autoridades reguladoras foram instaladas em África para proteger os serviços públicos
das ingerências políticas e ao mesmo tempo monitorizar as empresas. Melhorar a eficiência da regulamentação é um processo de longo prazo que tem
que ser implementado onde a participação privada
e as pressões da competitividade são significativas.
O desafio que pode representar a criação de novas
instituições públicas em países em desenvolvimento
é frequentemente subestimado. A regulamentação
independente requer um forte compromisso político,
assim como instituições e pessoas competentes.
Quando esses factores não são total ou parcialmente
reunidos, seria sensato considerar opções de transição ou complementares que reduzam a liberdade de
critérios nas decisões de regulamentação, com regras
17
18
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
ou procedimentos mais explícitos, ou que transfiram
as funções de regulamentação para organismos consultivos ou painéis de especialistas. (Eberhard 2007).
Recomendação 4: Assegurar que a
Reforma Institucional abrange os
ministérios de tutela e os processos de
orçamentação
Nas recentes reformas, a ênfase foi dada principalmente à reestruturação do fornecedor de serviços ou
do serviço público, usando a introdução de gestão
privada, aplicação de medidas de controlo, e assim
por diante. Pouca ou nenhuma atenção foi prestada
ao fortalecimento dos ministérios de tutela dos sectores. Esses ministérios têm responsabilidades que caso
não sejam adequadamente cumpridas podem pôr em
risco o funcionamento do sector. Os mesmos ministérios lideram o planeamento no sector, participam
na elaboração dos orçamentos públicos, e realizam
investimentos. Todavia, existem deficiências em todas
essas áreas, que não sendo confrontadas, limitarão o
efeito das reformas sobre os fornecedores de serviços.
No sector das infra-estruturas torna-se necessário
um planeamento mais forte por parte dos ministérios
de tutela, a fim de garantir que a construção de novos
equipamentos essenciais se inicie suficientemente
cedo para que estejam funcionais atempadamente.
O planeamento é uma função fundamental, e foi
muitas vezes esquecido ou enfraquecido no decorrer dos esforços de reestruturação dos sectores.
É essencial restaurar essa capacidade nos ministérios
de tutela e desenvolver métodos tecnológicos sãos
para a identificação e selecção dos projectos de infraestruturas. Uma selecção mais rigorosa dos projectos
pode assegurar que os investimentos em infra-estruturas sejam escolhidos consoante a previsão dos seus
rendimentos, devidamente agendados e sincronizados entre eles e com planos mais abrangentes, de
forma a maximizar sinergias e evitar constrangimentos dispendiosos.
A geração de energia eléctrica é disso um exemplo
claro. Tradicionalmente, o planeamento e a aquisição
de novas infra-estruturas no sector da energia eram
da alçada dos serviços públicos estatais. Com as
reformas do sector e o surgimento de produtores de
energia eléctrica independentes, essas funções foram
frequentemente transferidas para o Ministério da
energia ou da electricidade. No entanto, e como nem
sempre houve transferência de competências em
simultâneo, os planos não contemplavam as complexidades existentes no terreno. Em muitos casos,
o planeamento falhou. As novas centrais raramente
cumprem os prazos temporais, situação que cria
falhas energéticas e promove o recurso à energia
eléctrica temporária e desencoraja os investidores.
E quando a aquisição é por fim iniciada, pode acontecer que as autoridades não se preocupem em lan-
çar ofertas internacionais competitivas. Essa situação
impede um processo de oferta rigoroso que traria
credibilidade e transparência à aquisição e resultaria
em preços mais competitivos na energia eléctrica.
Assim, e como a maior parte dos investimentos
em infra-estruturas em África são suportados pelo
investimento público doméstico, os parceiros de
desenvolvimento precisam de ter uma visão mais
ampla da qualidade do mesmo. Em todos os sectores
de infra-estruturas, a maior parte dos investimentos é
realizada pelos ministérios de tutela seguindo o processo de orçamentação. A deficiente alocação do resto
do orçamento do sector pode afectar os financiamentos de desenvolvimento que se centrem de maneira
demasiadamente estreita em intervenções em projectos específicos. Portanto, esses fundos seriam melhor programados como ajudas orçamentais ou em
projectos que visam a totalidade de um sector. Sendo
assim, os parceiros no desenvolvimento necessitam
de tomar maior atenção à qualidade global do investimento público. As intervenções em infra-estruturas têm que se basear, em cada sector, numa melhor
compreensão da estrutura do investimento público.
O processo de orçamentação é muitas vezes caracterizado por prioridades políticas pontuais com
pouco ou nenhum fundamento económico e o
ciclo anual dos orçamentos impede o acompanhamento adequado do financiamento dos projectos
de infra-estruturas que são multianuais. Na fase de
implementação, muitos países confrontam-se com
problemas importantes na execução dos orçamentos, com constrangimentos ao nível das aquisições
a impedirem que a totalidade das verbas alocadas
se materialize em financiamentos reais.
As orientações fundamentais do investimento
público têm de ser confrontadas. É necessário transferir o processo de orçamentação para uma estrutura
intermédia e interligar objectivos do sector e alocação de recursos, com base em de planos de sector
claros que tomem em conta actividades específicas
e os custos associados. A incorporação cautelosa
da manutenção nos instrumentos de planeamento
sectorial a médio prazo pode prevenir a crescente
necessidade de reabilitação de equipamentos. Para
garantir que todos os investimentos postos à consideração política atinjam o patamar mínimo de viabilidade económica, o processo de orçamentação dos
investimentos públicos deveria fundamentar-se na
análise dos projectos. Os procedimentos administrativos que atrasam o desbloqueamento das verbas
orçamentadas têm de ser revistos, e as regras para
aquisições, pagamentos, gestão financeira e contabilidade têm de ser modernizadas e simplificadas.
O sector da água dá exemplos interessantes de
como constrangimentos no processo de orçamentação podem incapacitar o uso de recursos existentes.
Na África Ocidental, o problema não reside na falta
de recursos orçamentais, mas sim, muitas vezes, na
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
incapacidade de os desbloquear em tempo útil (Prevost 2009). Na Tanzânia, após a identificação da água
como prioridade da estratégia para a redução da
pobreza no país, grandes aumentos de atribuições
foram feitos nos orçamentos para esse sector, mas
o ritmo dos pagamentos das verbas não acompanhou
essa tendência, impedindo qualquer efeito imediatamente perceptível no acesso (Van den Berg 2009).
Também são necessárias melhorias paralelas na
maneira como são canalizados os financiamentos dos
investidores. Dada a importância dos fundos externos, para os países africanos, um sólido sistema de
administração dos investimentos públicos requer que
os financiadores melhorem a previsibilidade dos seus
apoios e simplifiquem os seus procedimentos. Nesse
sentido, seria preferível dar primazia às iniciativas de
grupos de vários doadores que reunam fundos para
providenciar o apoio financeiro geral a um específico
programa de intervenções na globalidade do sector.
A existência de postos de fronteira que permitam uma só paragem é essencial para evitar grandes
demoras no tráfego nos corredores de estradas
internacionais. As condições das estradas ao longo
dos principais corredores internacionais são boas, e
os camiões conseguem atingir a velocidade de 50-60
quilómetros/hora, mas os longos atrasos reduzem as
velocidades reais para pouco mais de 10 quilómetros por hora. Uma viajem de 2,500 quilómetros de
Lusaca, Zâmbia, até ao porto de Durban, na África
do Sul, demora em média oito dias – quatro dias
de viajem e quatro dias passados nas fronteiras. É
de comparar com tempos de passagens de fronteiras iguais ou inferiores a meia hora em países
industrializados. O custo do atraso para um camião
encadeie de oito eixos foi estimado em aproximadamente 300 dólares por dia. Investimentos na criação
de postos alfandegários que permitam uma única
paragem e na modernização dos seus procedimentos são relativamente modestos e seriam amortizados em menos de um ano. Sem essas reformas,
investimentos adicionais na rede rodoviária poucos
efeitos terão no tempo global de trânsito.
Nos corredores ferroviários internacionais, a
criação de serviços de interconexão mais confiáveis
pode evitar atrasos ainda mais importantes. As
locomotivas oriundas de um país não são na generalidade autorizadas a viajar na rede de outro país,
principalmente devido à incapacidade de fornecer
a um operador estrangeiro a devida assistência no
caso de uma avaria. Assim, as cargas ferroviárias que
atravessam uma fronteira demoram a ser recolhidas
por uma locomotiva diferente. Esses atrasos podem
ser extensivos: uma viajem de 3,000 quilómetros
de Kolwezi, na fronteira da República do Congo,
até ao porto de Durban, na África do Sul, demora
38 dias, nove dos quais são de tempo de viajem
e outros 29 associados principalmente a carregamentos e intercâmbio de carga. Esse atraso reflecte,
em parte, a falta de locomotivas fiáveis e em bom
estado, mas sobretudo a ausência de claros incentivos contratuais para prestar assistência ao tráfego
das redes dos países vizinhos. A redução desses atrasos exige o repensar das relações contratuais e dos
direitos de acesso que ligam as vias ferroviárias ao
longo do corredor. É também provável que a criação
de um órgão regularizador regional seja requerida,
para assegurar a transparência e justiça nos direitos
recíprocos de acesso às linhas.
A lentidão da circulação de contentores e cargas nos portos africanos impõe custos económicos
muito altos. Muitas empresas citam os constrangimentos nos portos como o maior condicionalismo
da infra-estrutura, em países tão diversos como
Burkina Faso, Malawi, Maurícias e África do Sul. Os
tempos de espera na África Oriental e Ocidental são
de 12-15 dias, o dobro da melhor prática internacional – 7 dias. A maioria dos atrasos é antes causada
Recomendação 5: Usar reformas leves
para conseguir maximizar as infraestruturas existentes
África tem falhado em atingir o pleno potencial de
desenvolvimento das suas estruturas. As ineficiências a nível administrativo e regulamentar criam
constrangimentos e impedem o fornecimento dos
serviços. Esses problemas são particularmente
visíveis no sector de transportes, onde são urgentemente necessárias reformas de profundo impacto.
Na África Central e Ocidental, a liberalização da
indústria de camionagem pode reduzir o custo altíssimo do transporte rodoviário. Não é a qualidade
da rede de estradas, mas antes as regulamentações
e estruturas do mercado da indústria de transporte
rodoviário que criam graves constrangimentos nos
corredores internacionais (Teravaninthorn and
Raballand 2008). As tarifas de transporte rodoviário,
que podem atingir 0,08 -0.13 dólares por tonelada/
quilómetro na África Central e Ocidental, são o
reflexo das altas margens de lucros praticadas pelas
empresas de camionagem (60-160 por cento).
O sistema rotativo de distribuição, baseado na
divisão do mercado e na atribuição centralizada de
cargas, limita a quilometragem dos veículos e afecta
negativamente os incentivos para o melhoramento
da qualidade das frotas. A solução do problema
passa pela libertação do mercado, pela fixação dos
preços, e a regulamentação das regras de qualidade
e comportamento operacional. Essas reformas, já
em vigor na África do Sul, podem fazer baixar as
tarifas de transporte rodoviário até 0,5 dólares por
tonelada/quilómetro. Sem essas reformas, os investimentos adicionais para a requalificação da rede
rodoviária levarão simplesmente ao aumento das
margens de lucro da indústria de camionagem, sem
baixa de custos para os consumidores.
19
20
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
pelas demoras nos procedimentos e administração,
e pela movimentação deficiente nas áreas congestionadas dos portos, do que por qualquer limitação
real das competências básicas dos cais. Esses atrasos podem ser muito caros. Um dia extra no porto
custava, em 2006, mais de 35 mil dólares para um
navio de 2,200 TEU (unidade equivalente a um contentor de 20 pés), e proporcionalmente mais para
navios de maior porte. As companhias responderam
com a introdução de “taxas por congestionamento”:
para um contentor de 20 pés, em 2006, 35 dólares
por dia em Dakar, Senegal até 420 dólares por dia
em Tema, Ghana.
A solução reside na modernização da administração alfandegária e no melhoramento da eficiência da movimentação das cargas. Estes são os dois
maiores pontos de estrangulamento dentro dos portos e teriam de ser confrontados em simultâneo. Um
dos problemas são as gruas inadequadas, mas renovar o equipamento não trará, só por si, um melhor
desempenho, a não ser que se modernize também
as práticas do pessoal. Os portos com concessões de
terminais de contentores fizeram aumentar as tarifas de movimentação. A modernização da administração aduaneira requer tecnologias de informação
modernas e sistemas de bases de dados associados.
Esse tipo de infra-estrutura leve é tradicionalmente
subfinanciada, o que contribui para a fraca eficiência. A administração alfandegária pode também ser
afectada por questões de governação.
As infra-estruturas de distribuição portuárias
e terrestres têm de ser integradas. À falta de um
sistema integrado de distribuição terrestre, especialmente no que diz respeito ao tráfego de passagem,
dificulta ainda mais o tráfego de contentores. Os
progressos mais importantes são os das exportações
de secos e líquidos a granel, área onde as instalações
portuárias são privadas e integradas num sistema
de logística completo. O comércio de contentores,
por contraste, é muitas vezes superficial. Como os
conteúdos são carregados e descarregados perto dos
portos, os benefícios dos corredores de transporte
multimodal e completamente integrados associados
a adopção desse tipo de transporte não são obtidos. Por essa razão, o tráfego de contentores que
atinge as regiões insulares é limitado, e a maioria
das importações desses países é transportada como
carga normal.
Em suma, a estrutura reguladora e administrativa do sector dos transportes necessita de promover,
de modo mais consciente, redes de transporte multimodal completas. As correntes de transportes não
podem ser mais fortes que os seus elos mais fracos,
que são geralmente os intercâmbios entre as diferentes modalidades, como de transporte rodoviário
para ferroviário e de ferroviário para marítimo. Os
pontos fracos são em parte físicos, nos lugares onde
não existem conexões físicas entre os diferentes
modos de transporte e onde não existe nenhuma
infra-estrutura de transbordo disponível. Todavia,
os pontos fracos são também em parte institucionais, já que a responsabilidade para os intercâmbios
não é atribuída de maneira clara a um ou a outro
organismo modal. E por fim, os pontos fracos são
também parcialmente operacionais, com os governos a cobrarem impostos e direitos alfandegários,
ou os trabalhadores a exigirem subornos, reduzindo a circulação e agravando os custos. Mesmo ao
nível da política do sector e do seu planeamento,
os meios de transporte em África são muitas vezes
divididos por vários ministérios de tutela, o que
impede a criação de uma estrutura coesa de transporte intermodal.
Recomendação 6 : Desenvolver a
integração regional para diminuir os
custos de infra-estrutura
A integração regional faz baixar os custos de todos
os aspectos das infra-estruturas. Em África, o custo
elevado dos serviços das infra-estruturas é devido,
em parte, à fragmentação do território e às fronteiras
nacionais que não permitem a realização de economias de escala.
Nos sectores das TIC, da energia eléctrica,
dos portos e dos aeroportos a colaboração a nível
regional viria viabilizar as economias de escala, que
reduziriam os custos dos serviços. Mas a maioria dos
países africanos são pequenos de mais para poderem
desenvolver isoladamente infra-estruturas que tenham uma boa relação custo/rendimento. No sector
das TIC, a colaboração regional na área dos cabos
submarinos continentais de fibra óptica podem vir
a reduzir para metade os custos das comunicações
telefónicas internacionais e internet, em comparação com a actual dependência nacional nas comunicações por satélite. No sector da energia eléctrica,
21 países têm sistemas nacionais de energia eléctrica abaixo da escala de eficiência mínima de uma
única central. Ao partilhar recursos energéticos de
grande escala e rentabilidade por vários países, a
prática do comércio regional diminuiria os custos
da energia eléctrica em 2 mil milhões de dólares
por ano. O fluxo de tráfego na maioria do portos e
aeroportos nacionais africanos não é suficiente para
permitir economias de escala atraentes para os serviços das grandes companhias internacionais aéreas
e de navegação. Neste sector também, a colaboração
regional na criação de grandes aeroportos centrais
poderia solucionar o problema. A cooperação na
administração de bens públicos regionais, tais como
os corredores rodoviários e ferroviários, e as bacias
de cursos de água transfronteiriços, têm efeitos na
redução de custos. Uma boa parte do património
em infra-estruturas e dos recursos naturais da África
são bens públicos regionais que atravessam as fron-
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
teiras e que só podem ser eficazmente desenvolvidos
e mantidos por uma colaboração internacional.
Os corredores rodoviários e ferroviários necessitam de uma administração colaborativa para ajudar a levar serviços de transportes e comércio aos
15 países insulares, e evitar os enormes atrasos nas
fronteiras que reduzem a velocidade do transporte
de carga rodoviário a 10 quilómetros por hora. As
63 bacias de cursos de água internacionais pedem
uma gestão cooperativa dos recursos hídricos e
investimentos coordenados para poderem aumentar
a produção de alimentos, energia eléctrica, e outras
oportunidades económicas, ao mesmo tempo que
seria reforçada a sustentabilidade ambiental e suavizados os efeitos de secas e inundações.
Colher estes benefícios posa numerosos desafios
institucionais. Entre eles, a mobilização da vontade
política, o desenvolvimento de instituições políticas
efetivas, fixar prioridades profundamente e facilitar
a preparação de projeto e finanças.
A integração regional, mobilização das boas vontades políticas, enfrenta obstáculos consideráveis. A
criação de infra-estruturas regionais implica atingir
um alto nível de confiança entre países, e não menos,
por causa da implícita dependência dos países vizinhos no acesso a recursos fundamentais, como a
energia eléctrica e a água. Vemos, por exemplo, que
se o comércio regional de energia eléctrica fosse
completamente adoptado, 16 países africanos iriam
importar menos de metade das suas necessidades
energéticas. Uma grande cota dessa energia eléctrica
seria oriunda de países considerados frágeis, como a
República Democrática do Congo e a Guiné.
As instituições regionais são indispensáveis para
negociar acordos e implementar mecanismos de
compensação. Alguns países irão beneficiar, mais
que outros, dessa integração regional. Mas se a integração regional garante dividendos económicos
importantes, devia ser possível estabelecer mecanismos de compensação que assegurassem que todos
os países envolvidos colhessem benefícios económicos. A experiência da partilha de benefícios foi feita
aquando dos tratados das bacias de cursos de água
internacionais, como foi o caso no Senegal, e poderia
ser aplicada de modo mais abrangente a outras situações de criação de infra-estruturas regionais. África
possui uma estrutura importante de órgãos regionais, tanto políticos como técnicos, mas nesses órgãos
há conflitos de interesses, aptidões técnicas limitadas
e poderes de execução limitados. São poucos os que
têm neste momento a capacidade de implementar
mecanismos de compensação transfronteiriços.
É importante avançar com projectos regionais
que facilitem ganhos rápidos. Perante este intimidativo programa de investimentos, é preciso melhorar a ordenação e o diagnóstico das prioridades
dos projectos regionais. As abordagens políticas,
económicas e espaciais foram todas amplamente
discutidas. Os projectos regionais vão desde a cooperação bilateral à volta de uma linha de transmissão
ou um posto fronteiriço, até intervenções abrangentes e complexas, muitas vezes de alcance continental. Encarada a extensão dos desafios, recomenda-se
dar início a projectos mais pequenos que produzam
grandes retornos e construir, por acréscimo, na base
dos sucessos iniciais.
A harmonização da regulamentação tem que
estar em sintonia com a integração física, e a menos
que se consiga harmonizar os sistemas de regulamentação e de administração que permitam o livretrânsito dos serviços pelas fronteiras nacionais, a
integração física das redes de infra-estruturas continuará ineficiente. Conseguir avanços significativos na área da reforma regulamentar tem um custo
monetário relativamente baixo, mas pode vir a ter
retornos muito importantes. Vemos o bom exemplo
da decisão de Yamoussoukro: libertar o espaço aéreo
e permitir o transporte aéreo por toda a África, essa
decisão levou a uma maior liberdade na negociação
de acordos bilaterais.
Serão no entanto necessários esforços muito
maiores para facilitar a preparação de projectos
regionais mais complexos, cuja preparação é especialmente pesada em custos monetários e temporais.
Ainda mais quando os projectos têm dimensões
grandes em relação ao volume da economia de acolhimento ou quando dependem essencialmente de
financiamentos de beneficiários a jusante. A preparação desses projectos pode também afectar os sistemas de financiamentos de provedores de fundos que
estão mais preparados para investimentos nacionais.
Recomendação 7: Conseguir uma
visão espacial das prioridades do
desenvolvimento das infra-estruturas
As redes de infra-estruturas são espaciais por
inerência, elas são o reflexo e a base da distribuição
espacial da actividade económica. Por isso têm um
papel predominante em tornar as cidades aptas a
beneficiar das economias de aglomeração. As redes
de transportes interligam os centros urbanos entre
si e com as redes de comércio internacionais, fornecendo a base para o intercâmbio entre as economias
urbanas e rurais. Os sectores da energia eléctrica,
da água e as TIC, acentuam a produtividade dentro dos espaços urbano e rural. Portanto, os planos
e as prioridades das infra-estruturas deveriam ser
estrategicamente instruídos e ter um entendimento
esclarecido da distribuição espacial da actividade
económica e do potencial existente. Um bom exemplo dessa abordagem reflecte-se no Nova Parceria
para o Desenvolvimento em África (NEPAD, pelas
suas sigla em inglés).
A objectiva espacial é um fundamento útil para
a atribuição de prioridades nos investimentos de
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INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
infra-estruturas e oferece discernimento sobre as
ligações entre os diferentes sectores. Olhar para o
sector das infra-estruturas com uma visão espacial
permite a identificação dos constrangimentos fundamentais ao longo dos vários corredores comerciais, que são tipicamente intervenções de elevado
rendimento. As ligações entre os vários sectores
também se tornam assim mais nítidas, e trazem
à luz as necessidades de coordenação dos sectores de infra-estruturas entre si e com os sectores
económicos dos utentes. Artigos recentes sugerem
que devido aos efeitos das sinergias, o retorno da
combinação de múltiplas intervenções nos sectores
de infra-estruturas, numa específica área espacial
(Torero e Escobal 2009b) ou ao longo de um determinado corredor espacial (Briceño-Garmandia e
Foster 2009 a), 2009b) são mais elevados. Em África,
a limitada infra-estrutura existente está muitas dispersa, o que não permite o aproveitamento dessas
sinergias.
O processo de urbanização requer uma perspectiva das infra-estruturas de desenvolvimento
regional que considere cada cidade e sua zona rural
interior como uma unidade económica integrada.
África encontra-se num processo de urbanização
rápido, que tem vindo a gerar mudanças previsíveis
e benéficas tanto para as áreas urbanas como para
as áreas rurais. Prosperidade e densidade estão em
igualdade, e como tal as mudanças na produtividade
requerem economias de aglomeração, mercados
maiores e melhor conectividade. A concentração e a
urbanização despertam a prosperidade em todas as
áreas, sendo que cidades que funcionam bem facilitam a evolução da agricultura de sobrevivência ao
oferecer um mercado importante para os produtos
rurais e ao suportar actividades não agrícolas. A
discussão entre desenvolvimento rural e desenvolvimento urbano deve portanto transformar-se num
entendimento da interligação entre ambos, e na
percepção da integração económica das áreas rurais
e urbanas como um caminho único para produzir
crescimento e desenvolvimento.
Nas áreas urbanas, as deficiências ao nível das
políticas de ocupação do solo e do ordenamento do
território têm-se tornado um impedimento à extensão dos serviços das infra-estruturas. As cidades
africanas estão em crescimento rápido mas têm
infra-estruturas insuficientes e instituições deficientes, e a maioria das novas povoações é informal
e sem acesso a serviços básicos. O planeamento
urbano deve ser fortalecido para limitar a expansão
e promover a densificação, prevenir o desenvolvimento em zonas ambientais precárias e providenciar
o equilíbrio certo entre terrenos públicos e privados,
para salvaguardar as redes de junções fundamentais. Os direitos patrimoniais devem ser claramente
definidos de modo a permitirem o funcionamento
do mercado imobiliário. É frequente que as cidades
não disponham de bases financeiras para poderem
desenvolver a infra-estrutura indispensável ao seu
sucesso. A base de tributação local, apesar de ser
potencialmente importante, é tipicamente inexplorada, o que deixa os municípios dependentes de
financiamentos vindos do governo central e muitas
vezes inadequados ou imprevisíveis.
Os grandes sectores agrícolas e as economias
rurais continuam a ser vitais para o crescimento
económico e para a redução da pobreza em África.
Todavia, o acesso das populações rurais às infraestruturas é extremamente fraco. As estradas rurais
e os sistemas de irrigação são, no seu conjunto, as
maiores necessidades de infra-estrutura rural. Os
dois temas estão em igualdade, e seu desenvolvimento deveria acompanhar a valorização dos terrenos agrícolas e o nível de proximidade espacial dos
mercados urbanos. As TIC deram grandes passos na
expansão do acesso rural, com uma em duas cidades
africanas agora cobertas pelo sinal de um sistema
global de telecomunicações móveis. Esta plataforma
pode contribuir para a produtividade agrícola, com
a extensão de serviços de simples mensagens de
texto, como a divulgação de boletins sobre preços
dos mercados agrícolas e condições meteorológicas,
e ainda como veículo de transacções financeiras.
As potencialidades desta plataforma estão apenas
no início.
Recomendação 8: Repensar a política
social das infra-estruturas
Apesar dos serviços de infra-estruturas serem relativamente caros, o seus custos permanecem ainda
maiores que o seus preços. Esta falta de rentabilidade
tem consequências negativas importantes. A subcotação de preços nos sectores das infra-estruturas está
a custar a África 4,2 mil milhões de dólares por ano
em rendimentos não recebidos. Além de que devido
ao acesso não equitativo aos serviços das infra-estruturas, as subvenções são altamente regressivas, na sua
grande maioria passando ao lado dos pobres (Figura
0.9). A falta de recuperação de custos afecta a saúde
financeira dos serviços públicos e atrasa a expansão
dos mesmos serviços.
As preocupações com a acessibilidade são usualmente o pretexto para praticar a subcotação de
preços nos serviços, mas sem ser objecto de grande
análise (Figura 0.9). Uma factura mensal de serviços com preços baseados na recuperação dos custos iria apresentar um valor de 6-10 dólares mensais.
Nos países de rendimentos médios, facturas desta
importância não parecem representar um problema
de disponibilidade em nenhuma parte do espectro
de rendimentos. Nos países de baixos rendimentos,
facturas desse valor também não causam problemas
de disponibilidade nos grupos com maior poder de
compra, que são os principais a ter acesso aos ser-
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
viços. A disponibilidade só se tornaria um problema
nos países de baixos rendimentos quando a cobertura do serviço ultrapassar os 50%. E só mesmo nos
países mais pobres, assim como naqueles com custos
de infra-estruturas excepcionalmente elevados, é que
a plena recuperação dos custos se torna impossível
de pagar para os consumidores com maior poder
de compra, e mesmo nesses casos, a recuperação
dos custos operacionais deveria ser um objectivo
atingível, com subsídios limitados aos custos de
capitalização. Simulações sugerem que incrementar
tarifas ao nível da recuperação dos custos só teria,
na maioria dos casos, efeitos mínimos nas taxas de
pobreza.
A sustentabilidade das tarifas dos serviços não
depende apenas do preço a pagar, mas também do
modo de pagamento posto a disposição do utente.
O pré-pagamento (utilizado de maneira pioneira
no sector dos telefones móveis) pode ajudar as
famílias a controlar o seu consumo e reduz os ris-
cos na cobrança de receitas para os fornecedores.
A mesma metodologia pode ser facilmente adaptada para a energia eléctrica, e um número crescente de fornecedores de energia eléctrica estão
a adoptá-la.
Os subsídios são importantes, mas a finalidade
dos subsídios tem de ser repensada, e focar mais
estritamente as conexões, tornando-se mais justa
e mais eficaz para a expansão da cobertura. Os
problemas de aceitabilidade ligados aos preços de
conexão são frequentemente mais sérios do que
os problemas com os preços de uso do serviço.
Contudo, a ausência de conexão pode vir a ser,
por si só, uma boa variável de identificação das
famílias desfavorecidas, apesar de mais limitada
em ambientes de baixo acesso onde a cobertura
não seja universal, mesmo entre famílias de maior
poder de compra.
Um teste importante à coerência de uma
política de subsídios reside em descobrir se o
serviço poderia ser sustentado pelo país numa
situação de cobertura universal. A existente subcotação de preços dos serviços dos fornecedores que
beneficia apenas de uma pequena minoria custa a
muitos países africanos até 1 ponto percentual do
PIB. Com a progressão dos países na via do acesso
universal, o peso dos subsídios cresce em proporção, e irá tornar-se rapidamente insustentável para
os orçamentos nacionais. Consequentemente, os
países deveriam considerar os efeitos do aumento
das coberturas no cálculo dos custos de qualquer
política de subsídio. Este teste à sustentabilidade
fiscal de um subsídio é uma importante chamada
de atenção que pode impedir que certos países se
lancem em políticas que simplesmente não podem
ser escalonadas e irão manter a cobertura a um
nível baixo.
Figura O.9 Baixo Acesso dos Pobres aos Serviços
Domésticos Insustentáveis
a. Acesso por quintil
Percentagem de lares
80
60
40
20
0
Q1
Q2
Q3
Q4
Quintil do orçamento
Percentagem de lares
abaixo do patamar de 5% de
acesso a um preço aceitável
Água canalizada
Q5
Energia Eléctrica
b. Curva de Sustentabilidade
100
Recomendação 9: Encontrar medidas
práticas para alargar o acesso aos
serviços das infra-estruturas
80
60
40
20
0
2
4
6
8
10
Dólar/mês
12
14
16
PRB
PRM
ASS global
Fonte: Banerjee, Wodon, e outros 2008.
Nota: Q1 = primeiro (ou mais pobre) quintil; Q2 = segundo quintil; Q3 = terceiro (do meio) quintil; Q4 = quarto quintil Q5 = top
(ou mais rico) quintil. PRB = País com rendimentos baixos; PRM =
País com rendimentos médios; ASS = África subsaarianaPercentagem de lares abaixo do patamar de 5% de sustentabilidade.
Para a maior parte dos países africanos o acesso universal aos serviços das infra-estruturas mantém-se
distante. Ainda hoje, a grande maioria das famílias
africanas não tem acesso a energia eléctrica moderna, água canalizada, esgotos e até mesmo a estradas alcatroadas que liguem as suas comunidades. A
lentidão do progresso de expansão do acesso, desde
de meados dos anos 90, sugere que o acesso universal às infra-estruturas está a mais de 50 anos de
distância para a grande parte dos países africanos.
Esta situação pede uma abordagem diferente
para a expansão dos serviços de infra-estruturas
modernos e uma maior atenção às alternativas de
segunda opção. Deixar as coisas como estão não irá
ajudar a acelerar o acesso às infra-estruturas de que
África precisa. E mais, mesmo que o acesso venha a
23
24
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
ser acelerado, muitos terão de continuar a confiar,
durante largos anos, em soluções alternativas, em
vez de beneficiarem dos serviços de infra-estruturas modernas. Logo, as políticas sociais de infraestruturas em África tem de se dedicar a melhorar
e aumentar alternativas de segunda linha.
Ao expandir redes de infra-estruturas modernas, uma atenção mais pormenorizada deveria ser
dada ao lado da demanda, na equação. A revolução
criada pelo telefone móvel demonstrou claramente
que África pode adoptar serviços de infra-estruturas modernos rápida e extensivamente. A prática
de custos baixos para as conexões iniciais torna a
entrada no mercado suportável. Os planos de prépagamento eliminam os riscos de crédito e dão aos
consumidores o controlo absoluto sobre os seus
gastos. Os serviços estão adaptados na procura do
consumidor. Outras redes de serviços, nomeadamente os sectores da energia eléctrica e da água,
encaram o acesso simplesmente como a implantação de novas redes, negligenciando o facto de que
nos lugares onde essas redes estão disponíveis, as
taxas de conexão são relativamente baixas. Esses
sectores terão de se preocupar mais com questões
vindas do lado da procura e que impeçam os utentes
de se conectar: tarifas de conexão que ultrapassam
os rendimentos das famílias, assim como questões
ligadas à propriedade e ao desenvolvimento urbano.
A maneira mais rentável de aumentar o acesso pode
passar, para muitos serviços públicos, pela implementação de programas de incentivo que iriam
aumentar as ligações às redes existentes e, ao interagir com as comunidades, entender melhor o lado
da procura no mercado.
As alternativas de segunda linha podem ser
adaptadas para fornecer possíveis e atraentes serviços de infra-estruturas àqueles que de outra forma
não teriam acesso. A grande maioria dos que não
podem ter acesso aos serviços das infra-estruturas
modernas é dependente das alternativas tradicionais como velas, poços ou latrinas rudimentares.
Bem que funcionais, essas alternativas tendem a
ser inconvenientes, inferiores, ou mesmo perigosas. Soluções de segunda linha, como iluminação
pública, lanternas solares e latrinas melhoradas ofereceriam às famílias serviços de melhor qualidade e
a preços um pouco mais caros que as alternativas
tradicionais, mas todavia muito mais económicas
do que os serviços modernos. É surpreendente que
estas soluções não estejam ainda prevalentes em
África, e, quando existem, têm tendência a estar
apenas disponíveis para os grupos com maior poder
de compra.
Um dos problemas principais parece residir na
natureza pública e gratuita de muitas destas soluções
(como os pontos de água e a iluminação pública),
o que dificulta a recuperação de custos dos fornecedores de serviços e complica seriamente a gestão
dos equipamentos. Acordos institucionais eficientes
têm de ser procurados para apoiar a implementação
destas alternativas. Um outro problema reside no
facto de que algumas destas alternativas, apesar de
mais baratas, não o são suficientemente para serem
acessíveis a todos.
Recomendação 10: Colmatar a falha do
financiamento das infra-estruturas
Não obstante a importância de todas estas medidas de eficiência, uma importante falha de 31 mil
milhões de dólares por ano mantém-se no financiamento das infra-estruturas. Um desfasamento tão
importante é intimidativo, e já o era mesmo antes
do início da crise financeira global.
Desde 2007, vários factores se reuniram para
introduzir rápidos e constantes aumentos nos
orçamentos das maiores fontes de financiamento
externo para as infra-estruturas em África. A seguir
à Cimeira de Gleneagles, a ajuda ao desenvolvimento da OCDE deu maior ênfase ao apoio às
infra-estruturas africanas. O fluxo de ajuda oficial
ao desenvolvimento quase duplicou, passando de
4,1 mil milhões de dólares em 2004 para 8,1 mil
milhões de dólares em 2007. O ressurgimento do
crescimento económico no continente trouxe uma
melhoria considerável da participação privada.
Desde o fim dos anos de 1990, o valor dos investimentos na infra-estrutura subsaariana quase
triplicou, passando de cerca de 3 mil milhões de
dólares em 1997 para 9,4 mil milhões de dólares em
2006/2007 (cerca de 1,5 pontos percentuais do PIB
regional). Em acréscimo, países não pertencentes a
OCDE – nomeadamente a China e a Índia – demonstraram interesse crescente em financiar infra-estruturas dentro do sistema de cooperação Sul-Sul. Os
seus compromissos cresceram do zero, no início dos
anos de 2000, até ao financiamento de cerca de 2,6
mil milhões de dólares por ano em infra-estruturas
africanas, entre 2001 e 2006. Mesmo sabendo que
os pagamentos tiveram tendência para demorar
vários anos a serem efectuados, se os compromissos recordistas de 2007 são plenamente honrados,
o financiamento externo para as infra-estruturas em
África deverá continuar a aumentar nos próximos
anos.
Na ausência de medidas de compensação, o
investimento doméstico nas infra-estruturas iria
provavelmente baixar, comprometendo a recuperação económica e agravando a pobreza. O actual
défice de 31 mil milhões de dólares poderia ser ainda
maior com os orçamentos públicos exaustos, o fluxo
dos capitais externos em declínio e a incapacidade
dos consumidores de pagar os custos do uso dos
equipamentos em erosão. A aptidão para construir
novas infra-estruturas, confrontar constrangimentos regionais e manter o património existente seria
INFRA-ESTRTURAS EM ÁFRICA: TEMPO PARA A MUDANÇA
gravemente reduzida. Na América Latina, durante
os anos 1990, cerca de 50 % da pressão fiscal utilizada para equilibrar o orçamento de estado veio de
cortes na despesa em infra-estruturas. Na Indonésia,
a seguir à crise asiática, o investimento público em
infra-estruturas diminuiu de 7 pontos percentuais
do PIB para 2 pontos percentuais. O crescimento na
América Latina e na Ásia foi comprometido numa
“década perdida.”
Muitos países, incluindo a China, Índia, Argentina e Cidade do México têm utilizado, em períodos de crise económica, estímulos fiscais baseados
em infra-estruturas. Se bem direccionados para
confrontar constrangimentos económicos fundamentais e acompanhados por reformas de políticas,
os investimentos em infra-estruturas podem preparar o caminho para o posterior ressurgimento do
crescimento económico. Mais ainda, alguns tipos
de contratos públicos são de trabalho intensivo,
criando emprego a curto prazo para combater a
pobreza. África poderia beneficiar de um programa
desse tipo, mas o continente não possui os recursos
para financiar sem ajuda externa. Estimativas sugerem que um pacote de incentivos de 50 mil milhões
de dólares seria necessário para combater o impacto
da crise económica em África, e que concentrar um
tal pacote em investimentos em infra-estruturas
teria o maior efeito a curto prazo no crescimento do
PIB, incentivando projecções para 2010 de 4 pontos
percentuais, comparados com os 1,7 pontos percentuais do período a seguir à crise. A longo prazo,
África iria conhecer um crescimento sustentado de
2,5 pontos percentuais do PIB (ODI 2009).
Qualquer aumento de financiamento para as
infra-estruturas deveria ter em atenção o sector da
energia e os países frágeis. Os financiadores têm
menosprezado o sector da energia desde os anos
de 1990. E mesmo se o sector privado pode contribuir para o financiamento da criação de energia
eléctrica, esses provedores de fundos vão precisar de
aumentar os seus investimentos, substancialmente,
para enfrentar a crise no sector. Este aumento de
financiamento já estava a ser assegurado antes do
início da crise, com compromissos que somaram
pela primeira vez mil milhões de dólares por ano
em 2005 e atingiram o seu pico, com 2,3 mil milhões
de dólares, em 2007. Os estados frágeis destacamse por estar a receber muito menos do que a sua
justa parte em financiamento de doadores para as
infra-estruturas. Devido à magnitude do défice de
financiamento que esses países enfrentam, comparada com o tamanho das suas economias, e vista
a importância que tem as infra-estruturas na regeneração do seu desenvolvimento, estes países têm
argumentos para que sejam canalizados financiamentos adicionais na sua direcção.
Alguns dos maiores países africanos de baixos
rendimentos detêm o potencial para conseguir
reunir quantidades significativas de finanças locais
para as infra-estruturas, se os instrumentos adequados são desenvolvidos. Numa mão-cheia de
países africanos os mercados de capitais domésticos começam a parecer capacitados em fornecer
volumes importantes de financiamentos em infraestruturas, a Nigéria é o exemplo mais visível
(Irving e Manroth 2009). Todavia, a maior partes
desses financiamentos consiste em empréstimos
bancários comerciais de maturidade recente, muitas vezes inadequados ao investimento em infraestruturas. Existe a necessidade de desenvolver um
mercado financeiro e bolsista e de criar condições
regulamentares para permitir maior participação
de investidores institucionais no financiamento das
infra-estruturas.
Nota
Cecilia Briceño-Garmendia e Vivien Foster são
os autores deste capítulo.
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26
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