considerações sobre a importância da patologia
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considerações sobre a importância da patologia
CARACTERIZAÇÃO DA MORFOLOGIA PLACENTÁRIA NAS GESTAÇÕES DE CONCEPTOS COM SÍNDROME DE DOWN ATRAVÉS DE REVISÃO DA LITERATURA CIENTÍFICA. BENJAMIN HECK Monografia apresentada ao Centro de estudos e pesquisas clínicas de São Paulo e à Faculdade de Medicina do ABC para a obtenção do título de especialista em Síndrome de Down. Orientadora: Dra. Maria Ophélia Galvão de Araújo São Paulo 2008 FICHA CATALOGRÁFICA Heck, Benjamin Caracterização da morfologia placentária nas gestações de conceptos com Síndrome de Down através da revisão da literatura científica / Benjamin Heck -- São Paulo, 2008. 41p. Monografia (Especialização)-Centro de Estudo e Pesquisas Clínicas de São Paulo e Faculdade de Medicina do ABC Curso de Pós-Graduação em Síndrome de Down. Orientadora: Maria Ophélia Galvão de Araújo Descritores: 1. SÍNDROME DE DOWN. 2. DOENÇAS CONGÊNITAS, HEREDITÁRIAS E NEONATAIS E ANOMALIAS. 3.GENÉTICA MÉDICA. 4. PATOLOGIA FETAL. 5. PLACENTA. AGRADECIMENTOS Ao Dr Zan Mustacchi por mostrar-me seu esforço na assistência médica integral para as crianças portadoras da Síndrome de Down. Permitir melhor conhecer estas crianças, suas angústias e alegrias, seus desafios e oprotunidades, junto aos quais sempre buscamos forças para continuar melhorando nossa formação como jovem médico. Mas sobretudo por mudar paradigmas. A Dra Ophélia, a amiga de sempre, que me faz acreditar, cada dia mais na patologia placentária, participando em todos os momentos de minha jornada médica. A Alessandra Paola por sua compreensão e paciência neste vários finais de semanas nos quais estive ausente. A equipe do CEPEC e em especial a Sra. Fátima Aventurato pela excelente organização do curso. Aos colegas de turma por compartilhar conhecimentos nas mais variadas áreas do conhecimento em saúde. RESUMO Heck B. Caracterização da morfologia placentária nas gestações de conceptos com Síndrome de Down através de revisão da literatura científica. São Paulo; 2007. [Monografia de Especialização – Centro de Estudo e Pesquisa Clínica de São Paulo]. INTRODUÇÃO. O exame anátomo-patológico da placenta apresenta, em sua maioria, lesões morfológicas relevantes, sugerindo e/ou confirmando doenças maternas ou fetais. As principais doenças identificáveis consistem nas alterações do desenvolvimento vilositário que sugerem etiologia genética. A Síndrome de Down é considerada a alteração congênita associada à deficiência mental mais comum. Ocorre em média de 1:800-1000 nascimentos, e compromete ambos sexos, todas as etnias e níveis socioeconômicos. OBJETIVO. O presente estudo busca caracterizar os achados morfológicos da placenta e mecanismos fisiopatológicos do trofoblasto nas gestações de conceptos com síndrome de Down através de revisão da literatura científica. METODOLOGIGA e RESULTADOS. Foi obtido do banco internacional de artigos científicos indexados PUBMED, 223 artigos com as palavras chaves “Down syndrome” e “Placenta”. Destes foram incluídos nesta revisão 14 artigos referentes a achados morfológicos e histopatológicos da placenta, assim como aqueles que caracterizam mecanismos fisiopatológicos do trofoblasto em placenta com SD. DISCUSSÃO e CONCLUSÃO. Os achados morfológicos da placenta nas gestações de conceptos com síndrome de Down correspondem a lesões vilosas que refletem principalmente um atraso no desenvolvimento placentário. As lesões vilosas caracterizadas são: atraso na diferenciação de citotrofoblasto em sinciociotrofoblasto e maior proporção de dupla camada trofoblástica; depósito basofílico na membrana basal trofoblástica; degeneração hidrópica e edema vilositário; menor número de capilares por vilos e hipoplasia vilositária. Não foram relatadas lesões envolvendo tronco arterial e lesões das artérias deciduais maternas. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Freqüência relativa das alterações cromossômicas encontradas em abortos espontâneos. Resultados de 6 trabalhos utilizando técnica de bandamento cromossômico Quadro esquemático da classificação dos achados dismórficos. ...................................................................................................... 11 Figura 2 – Fotomicrografias de alterações vilositárias encontradas nas cromossomopatias. .......................................................................................... 15 Figura 3 – (A) Corte macroscópico de placenta revelando área vinhosa caracterizando corangioma gigante. (B) Fotomicrografia evidenciando proliferação de vasos caracterizando corangioma. (C) Placenta Abruptio presente no descolamento prematuro da placenta. (D) Nó verdadeiro de cordão umbilical...........................................................................................................16 Figura 4 – (A) Corioamnionite em infecção ascendente. (B) Vilosite proliferativa em infecção hematogênica. (C) Citotrofoblastos “espumosos” na doença de acúmulo de Gaucher. (D) Hemoglobinopatia materna por alfa talassemia........................................................................................................17 Figura 5 – Achados físicos que compõem o fenótipo da síndrome de Down. .................. 21 Figura 6 – Mapa molecular de 24 sinais clínicos da Síndrome de Down no cromossoma 21.....................................................................................................................23 LISTA DE TABELAS TABELA 1 – Condições médicas associadas à síndrome de Down...................................... 26 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................6 1.1. Avaliação das perdas fetais precoces..............................................................................8 1.2. O exame da placenta......................................................................................................14 1.3. A Síndrome de Down......................................................................................................18 2. OBJETIVOS.......................................................................................................................26 3. METODOLOGIA................................................................................................................27 4. RESULTADOS...................................................................................................................28 5. DISCUSSÃO......................................................................................................................34 6. CONCLUSÃO....................................................................................................................36 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................37 1. INTRODUÇÃO Os avanços em obstetrícia e neonatologia modificaram a epidemiologia da mortalidade perinatal. Técnicas não-invasivas para avaliação fetal e o aumento do uso da ultra-sonografia no diagnóstico pré-natal de doenças fetais acentuaram a necessidade de exames anátomo-patológico e postmortem pormenorizados. A acurácia das técnicas corroborando para diagnósticos prénatais cada vez mais apurados dos defeitos congênitos enfatizou a necessidade da verificação de achados dismórficos e diagnósticos genéticos durante o exame anátomo-patológico. A determinação da idade gestacional, o número de fetos, a localização da placenta, defeitos congênitos e a viabilidade e vitalidade fetais são as principais razões para a implementação dos exames de ultra-sonografia fetal na prática obstétrica. Ao mesmo tempo, a demanda de controle de qualidade do exame ultrassonográfico teve de ser melhorado. Assim, a participação do patologista junto à equipe de pré-natalista e neonatologista engloba a avaliação de perdas fetais precoces (“restos ovulares”) e óbito fetal, o exame macro e microscópico da placenta e a autópsia perinatal. As causas de óbito fetal são complexas. Necessitam de exames macro e microscópico detalhados associados aos achados histopatológicos da placenta; além de correlacioná-los com os antecedentes maternos, história familial e a evolução clínica durante o pré-natal. Freqüentemente, o patologista é solicitado para avaliar fetos menores, obrigando o estabelecimento de técnicas 6 apropriadas. A dissecação de órgãos fetais com o auxílio de estereomicroscópio tornou-se rotina durante a avaliação do patologista. O exame postmortem de fetos do final do primeiro trimestre e início do segundo trimestre está evoluindo para uma especialidade da patologia e representa um desafio contínuo através do exame de fetos cada vez menores (embriopatologia). Recentemente, parecer do Conselho Regional de Medicina de São Paulo -CREMESP considerou importante a avaliação anátomo-patológica do material obtido como, "restos ovulares"; pois um percentual relevante pode apresentar afecções que mudariam a conduta subseqüente. Portanto, as patologias fetal e perinatal têm fundamental importância na vigilância da mortalidade perinatal, na avaliação da causa de morte, no diagnóstico de anomalias congênitas, no aconselhamento genético com informações relacionadas ao risco em futuras gestações, além de oferecer um controle de qualidade do diagnóstico pré-natal de defeitos congênitos através do exame ultrassonográfico. ALTSHULER (1996) aponta de maneira pertinente, que embora a literatura científica sobre patologia placentária nos últimos 25 anos seja ampla, clínicos e patologistas são pouco atentos no papel dessa durante a prática clínica diária. Atualmente, o conhecimento em patologia placentária é crescente, assim os clínicos necessitam saber o significado das alterações placentárias relacionando-as com a evolução do feto e do recém-nascido. Desta forma, o 7 patologista precisa adquirir maior conhecimento em perinatologia e melhor compreensão das lesões placentárias e suas patogenias. 1.1. AVALIAÇÃO DE PERDAS FETAIS PRECOCES A grande maioria das perdas fetais precoces ou abortamentos ocorre durante o primeiro trimestre gestacional. Suas causas nem sempre são elucidadas, sendo dificilmente identificáveis. Entre as causas de perdas fetais no primeiro trimestre, a mais freqüente é de origem genética, correspondendo, sobretudo a alterações cromossômicas. O abortamento espontâneo é considerado um processo patológico freqüente, ocorrendo em 15% das gestações clinicamente reconhecidas (WABURTON e FRASER 1964). Incidências superiores foram identificadas por BIERMAN et al (1965), 24% e ERHARDT (1963), 29%. Outro estudo postulou que a taxa de perda é da ordem de 78%, considerando que grande parte ocorre antes da primeira falha menstrual (ROBERT e LOWE 1975). EDMONDS et al (1982) verificou incidência de 62% de abortos precoces ocorrendo antes da 12ª semana gestacional, sendo cerca de 90% de maneira subclínica, i.e., sem o conhecimento da mulher. Recentemente, em parecer do CREMESP (Consulta 30.077/04 homologada em 11/05/2004) “A Câmara Técnica de Saúde da Mulher” considerou importante a avaliação anátomo-patológico dos fragmentos de placenta obtidos na curetagem. O estudo anátomo-patológico constitui um documento fundamental 8 que endossa a necessidade do ato médico na eventualidade de complicações referentes à curetagem. Os achados histopatológicos em “restos ovulares” podem, em alguns casos, sugerir alterações da morfologia vilositária de provável origem genética. É importante notar que se devem correlacionar esses achados com os dados clínicos e a história familial, possibilitando por vezes identificar possível doenças genéticas. Os fatores genéticos são as causas mais comuns de abortos espontâneos. Cerca de 50% a 80% dos abortos do primeiro trimestre apresentam alterações cromossômicas. Mas também notamos causas distintas para estes abortamentos. As doenças gênicas são praticamente inexploradas como causa de abortos precoces. Entretanto, são as que mais contribuem como causa de defeitos congênitos em recém-nascidos. Muitas causas de aborto precoce classificadas como “não-genéticas”, mas na realidade, são a conseqüência de mutações em genes específicos; como, o que ocorre com o Fator V de Leiden e outros genes associados a tromboembolismo. Cerca de 25% dos embriões morfologicamente normais apresentam alterações cromossômicas (aneuploidia e poliploidia). Estas alterações são mais freqüentes em embriões morfologicamente anormais, atingindo entre 50% a 75% dos casos, através de estudos de FISH (MUNNÉ et al. 1995). 9 Uma revisão de seis estudos para avaliar a freqüência relativa das alterações cromossômicas encontradas em abortos espontâneas, utilizando técnica de bandamento cromossômico, mostrou uma incidência de 43,5% de alterações cromossômicas; correspondendo a 1229 casos de um total de 2822 casos estudados (CAVALCANTI 1986) (Figura 1). O estudo brasileiro de CAVALCANTI (1986) mostrou incidência de 44,4% de alterações cromossômicas, além de evidenciar correlações entre os achados citogenéticos e histopatológicos, ressaltando “a importância do estudo conjunto para orientação do diagnóstico etiológico do abortamento espontâneo”. 25 FREQÜENCIA RELATIVA 20 15 10 5 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 45X 3n 4n DT AE TIPO DE ALTERAÇÕES CROMOSSÔMICAS Fonte: Baseado em CAVALCANTI (1986). FIGURA 1. Freqüência relativa das alterações cromossômicas encontradas em abortos espontâneos. Resultados de 6 trabalhos utilizando técnica de bandamento cromossômico [KAJII et al (1973), McCONNELL e CARR (1975), LAURISTEN (1976), CREASY et al (1976), KAJII et o al (1980) e HASSOLD et al (1980)] (N . Trissomias autossômicas, 45X Monossomia X, 3n Triploidia, 4n Tetraploidia, DT Dupla trissomia, AE Alterações estruturais, M Mosaicismo). 10 M As trissomias autossômicas compõem aproximadamente 50% das alterações citogenéticas observadas em abortos espontâneos. Trissomias de todos os cromossomos foram observadas. As trissomias mais comuns são as dos cromossomos 16, 22, 21, 15, e 14 (em ordem decrescente). A trissomia do cromossomo 16 é a causa mais comum de alteração citogenética em abortos. A maioria das trissomias revela correlações com a idade materna devido ao erro na meiose I, considerado a explicação citogenética mais comum para a trissomia. Mosaicos diploide/triploide são encontrados em 30% dos blastocistos. As tetraploidias são pouco comuns e raramente evoluem além da 2a-3a semana de vida embrionária. A monossomia do cromossomo X engloba 15-20% das alterações cromossômicas. Quando sobrevivem, os fetos apresentam características da síndrome de Turner que incluem higroma cístico, edema generalizado e defeitos cardíacos. Polissomias dos cromossomos sexuais são pouco mais freqüentes (10%) em abortos do que em nascidos-vivos. Técnicas modernas como CGH (“comparative genomic hybridization”) e análise por “microarray” também identificaram alterações que não foram detectadas nos métodos citogenéticos convencionais. SCHAEFFER et al (2004) através da técnica de ensaios por CGH em 41 abortos previamente estudados por análise de cariótipo evidenciaram alterações não idenificadas em 4 dos 41 casos. No segundo trimestre, as alterações cromossômicas são menos freqüentes. Estas alterações são semelhantes àquelas observadas em nascidos 11 vivos: trissomias 13, 18 e 21; monossomia X e polissomias dos cromossomos sexuais. A incidência de alterações cromossômicas é estimada em cerca de 15%. Em perdas fetais do terceiro trimestre (natimorto), a freqüência de alterações cromossômicas é de 5% (KULESHOV 1976). Esta incidência é menor do que aquela observada em abortos precoces, embora seja maior do que a observada em nascidos-vivos, de 0,6%. As aneuploidias podem ser recorrentes? Em abortos do primeiro trimestre, a recorrência de aneuploidia ocorre mais freqüentemente do que o esperado. Não há consenso sobre o assunto. Para alguns autores, a recorrência de aneuploidia é uma explicação a ser considerada nos casos de até 4 abortos repetidos (SIMPSON 2007). O estudo de BIANCO et al (2006) revela aumento progressivo da incidência de aneuploidia com o aumento do número de aborto espontâneos anteriores. Este autor comparou a taxa de aneuploidia com o desfecho das gestações anteriores em 64.939 mulheres submetidas a exame genético pré-natal (amniocentese e biópsia de vilos coriônicos). As taxas de aneuploidia foram: 1,39% nos casos sem abortos anteriores; 1,67% com um aborto anterior; 1,84% com dois abortos anteriores e 2,18% com três abortos anteriores. Diante desses fatos, alguns autores preconizam a realização do exame citogenético (cariótipo) nos casos de abortos de repetição, considerado o único procedimento diagnóstico, até o momento. Alterações cromossômicas são 12 aventadas como causas de abortos recorrentes devido às anomalias estruturais, como, translocações recíprocas e Robertsonianas, assim como em mosaicismo de alterações numéricas. Estes casos podem ocorrer em até 10,8% das mulheres com abortos recorrentes, embora a maioria dos estudos identificam incidência entre 3-5%. (CRAP et al 2004). O exame histológico através da avaliação das vilosidades placentária permite avaliar alterações morfologicas compatíveis com cromossomopatias. Os achados histopatológicos identificáveis em conceptos aneuplóides consistem de restrição do crescimento intra-uterino do feto e de alterações placentárias; tal como placenta com espessura diminuída. Verificam-se ainda como principais manifestações de alterações cromossômicas: aumento do volume das vilosidades, edema intravilositário, inclusões trofoblásticas ou invaginações, contornos irregulares das vilosidades e citotrofoblastos intravilositários (Figura 2). Na maioria dos casos, a realização do cariótipo é necessária para o diagnóstico. A avaliação anátomo-patológica das perdas fetais precoces é fundamental nos casos em que não foi realizado o exame de cariótipo por se tratar de um aborto retido ou por haver contaminação do tecido fetal. 13 FIGURA 2. Fotomicrografias de alterações vilositárias encontradas nas cromossomopatias: (A) iIrregularidades dos contornos vilositários, (B) calcificação da membrana basal trofoblástica em um caso de monossomia X, (C) citotrofoblasto intravilositário e (D) citotrofoblasto “gigantocelular” em caso de triploidia em mosaico. 1.2. O EXAME DA PLACENTA O exame anátomo-patológico da placenta apresenta, em sua maioria, lesões morfológicas relevantes, sugerindo e/ou confirmando doenças maternas ou fetais. As principais doenças identificáveis consistem nas alterações do desenvolvimento vilositário que sugerem etiologia genética, nas infecções congênitas estabelecendo sua via 14 de transmissão (ascendente ou hematogênica) e seu agente etiológico, e nas doenças maternas como a doença hipertensiva específica da gravidez - DHEG e diabetes, além das doenças imunológicas e neoplásicas (Figura 3 e 4). Ademais, torna-se cada vez mais freqüente o estudo da placenta em casos de óbitos fetais inexplicados sujeitos à ação judicial. PLACENTA ABRUPTIO - DPP FIGURA 3. (A) Corte macroscópico de placenta revelando área vinhosa caracterizando corangioma gigante. (B) Fotomicrografia evidenciando proliferação de vasos caracterizando corangioma. (C) Placenta Abruptio presente no descolamento prematuro da placenta. (D) Nó verdadeiro de cordão umbilical 15 Alterações na placenta ou cordão umbilical contribuem para 60% das causas de morte nos casos de natimortos, seguidas por defeitos congênitos. Das lesões placentárias encontradas como causa de óbito intra-uterino verificam-se 37,8% por lesão da interface útero-placentária, 22,5% por dismaturidade placentária, 22,5% por lesão do cordão umbilical, 14,1% por inflamação placentária e 3,1% por outras causas (HORN et al 2004). FIGURA 4. (A) Corioamnionite em infecção ascendente. (B) Vilosite proliferativa em infecção hematogênica. (C) Citotrofoblastos “espumosos” na doença de acúmulo de Gaucher. (D) Hemoglobinopatia materna por alfa talassemia. 16 Estas considerações na área de patologia feto-placentária demonstram o papel crescente desta especialidade desde a década de 70, caracterizando a placenta como órgão essencial a ser avaliado pelo patologista. A placenta pode ser comparada ao “diário de bordo” ou a “caixa preta” da gestação, conferindo informações valiosas para o prognóstico do “paciente”, seja gestante, puerpera, feto ou recém-nascido. Muitos desafios ainda existem, sobretudo na interpretação das lesões placentárias nos casos de paralisia cerebral, deficiência mental, distúrbios do aprendizado e na área de reprodução assistida. O futuro da patologia e em particular perinatal dependerá da habilidade do profissional em aceitar os desafios crescentes proporcionados pela ultrasonografia e pela medicina fetal. A cooperação destas especialidades permitirá desenvolver o conhecimento necessário para a aplicação adequada das diversas tecnologias disponíveis. Ressaltamos que a SD tem sido a patologia genética que mais tem contribuído para o desenvolvimento do diagnóstico pré-natal utilizando-se da análise da bioquímica sérica, da análise do líquido amniótico, de estudo citogenético, da genética molecular e do diagnóstico por imagem (MUSTACCHI 2000). A avaliação bioquímica sérica corresponde à dosagem sérica materna de hormônio gonadotrófico (HCG), estradiol livre (uE3) e alfa1fetoproteína (AFP). A dosagem destas substâncias esta alterada devido a comprometimento dos metabolismos placentário e hepático fetal. Estes dados são importantes 17 indicadores de alterações da fisiologia placentária e fetal. Consideramos oportuno relacioná-los com a morfologia celular da placenta. 1.3. A SÍNDROME DE DOWN Por muitas razões a síndrome de Down (SD) é considerada a parte das demais síndrome de deficiência mental. É considerada a causa cromossômica de deficiência mental mais prevalente com mais de 130 anos de história e extensiva pesquisa na área médica e comportamental. Os indivíduos com SD apresentam uma expectativa de vida, embora menor que a população geral que quintuplicou ao longo do século passado (DYKENS 2000). A SD foi inicialmente descrita em 1866 por J. Langdon Down, médico britânico que trabalhava no asilo em Earlwood, Inglaterra. Em seu breve artigo, ele descreveu estes indivíduos cujas características clínicas correspondem à prega epicântica, perfil facial achatado, língua protrusa, com problemas de linguagem, esperança de vida diminuída e personalidade “bem humorada”. Ele também notou que estes indivíduos apresentavam flutuações em seu desenvolvimento, com “ganhos” seguido de “perdas”. John Down apresentou cuidadosa descrição clínica da síndrome, entretanto erroneamente estabeleceu associações com caracteres étnicos (mongolismo), seguindo a tendência, em parte preconceituosa, da época Vitoriana britânica. A história da SD também reflete as inúmeras modificações que ocorreram no campo dos estudos em deficiência mental. Em 1933, Penrose estimou que o indivíduo médio com a esta síndrome vivia cerca de nove anos; 18 entretanto na década de noventa, a média da expectativa de vida dos indivíduos com SD estava estimada em 60 anos. A SD é considerada a alteração congênita associada à deficiência mental mais comum. Ocorre em média de 1:800-1000 nascimentos, e compromete ambos sexos, todas as etnias e níveis socioeconômicos. As características faciais da SD incluem braquicefalia com perfil facial achatado, orelhas pequenas, língua protrusa, pescoço curto e fenda palpebral oblíqua para cima, com prega epicântica (Figura 5). JACKSON e cols. (1976) determinaram uma lista de 25 sinais clínicos determinantes e estabeleceram que a avaliação do paciente com mais de 13 sinais físicos permitiria diagnosticar a SD com mais de 80% de certeza. 19 Fonte: Baseado em NYHAN (1983). FIGURA 5. Achados físicos que compõem o fenótipo da síndrome de Down. A causa da SD é uma alteração genética devido à presença de todo ou parte de uma cópia extra do cromossomo 21. A trissomia livre do cromossomo 21 corresponde a 96% das ocorrências de SD ao nascimento. Embora este número corresponde a uma fração do total concebido, pois 75% dos conceptos com trissomia do cromossomo 21 resultam em perdas gestacionais precoces ou natimorto. Cerca de 2% dos indivíduos com SD apresentam a forma de mosaico, com parte das células evidenciando trissomia 20 do cromossomo 21. A SD pode ser conseqüência de translocação não- balanceada em 2% dos casos, sendo alguns casos familiais. Os demais indivíduos podem apresentar cromossomos poucos comuns que apresentam uma parte de cromossomo 21, tais como no cromossomo em anel e cromossomo marcador. Vários fatores ambientais tem sido reportados como agentes corroboradores desta síndrome cromossômica, no entanto sabemos que o fator ambiental universalmente reconhecido como favorecedor, é a idade dos pais , e principalmente a idade materna (MUSTACCHI 2000). A maioria dos sinais clínicos estariam relacionados com a região “crítica” 21q22.2-22.3 (KORENBERG 1993 e RAHMANI et al 1990), embora no caso da trissomia livre outros genes não pertencentes à região “crítica” podem participar na definição do fenótipo. O estudo realizado por DELABAR (1993) com 10 pacientes com trissomia parcial do cromossomo 21 estabeleceu 6 regiões mínimas para 24 sinais clínicos a partir da correlação fenótipo-genótipo (figura 6). A triplicata das regiões abaixo definiriam: • Região 1 – gene D21S55 – raiz nasal baixa, língua protrusa, palato estreito e em ogiva, orelhas displásicas, mãos pequenas e largas, clinodactilia do quinto dedo da mão, intervalo aumentado entre primeiro e segundo artelhos, frouxidão ligamentar e hipotonia muscular. 21 • Região 2 – genes D21S55 e MX1 – fendas palpebrais oblíquas, epicanto, manchas de Bruschfield e prega de flexão única. • Região 3 – genes SOD1 e D21S55 – quinto dedo curto. • Região 4 – genes SOD1 e CRYA1 – pescoço curto e anomalias cardíacas congênitas. • Região 5- genes D21S16 e D21S55- língua fissurada. • Região 6 – genes pter-D21S42 – braquicefalia. Fonte: Baseado em DELABAR (1993). FIGURA 6. Mapa molecular de 24 sinais clínicos da Síndrome de Down no cromossoma 21. 22 Recentemente, vários modelos de camundongos foram identificados e produzidos, dando a oportunidade a uma melhor interpretação e viabilização dos processos que envolvem o conhecimento da expressão dos genes responsáveis pela SD. Dos modelos animais para experimentos, o primeiro descrito foi o MMU16, camundongo portador da trissomia do cromossomo 16 que em sua porção distal do braço longo congrega uma seqüência gênica idêntica à existente na porção distal do cromossomo 21 humano (MUSTACCHI 2000). Em extensa revisão do funcionamento dos genes envolvidos no cromossomo 21, ATONARAKIS e cols (2004) verificaram três mecanismos de funcionamento genômico caracterizados por: (1) genes dose dependente para os quais cópias em triplicatas responderiam para o fenótipo da síndrome; (2) genes dose não dependente sem envolvimento no fenótipo; e (3) a triplicata de certas regiões não codificadoras de genes e que têm participação no fenótipo da SD. Os indivíduos com síndrome de Down apresentam um risco aumentado para diversas condições médicas associadas que estão resumidas na tabela 1. Defeitos cardíacos congênitos estão presentes em 50% dos casos e a maioria pode ser corrigido cirurgicamente. Aumento de risco também é encontrado para deficiência auditiva e visual, alterações gastrointestinais, alterações tireoidianas, problemas odontológicos e instabilidade das vértebras cervicais. Muitos dos indivíduos com síndrome de Down estão acima do peso ou obesos, provavelmente por apresentar metabolismo basal reduzido e pelo estilo de vida sedentário. 23 Diante destas inúmeras condições médicas associadas, a American Academy of Pediatrics (1994) estabeleceu protocolos específicos de acompanhamento dos pacientes para melhor monitoramento. Outros protocolos foram sugeridos para o acompanhamento do portador de SD, dentre estes, ressaltamos o protocolo da experiência conjunta de BURNS e MUSTACCHI no momento da suspeita clínica: Ecodopplercardiografia bidimensional colorida; Eletrocardiograma; Raio X de tórax; TSH, T4 e T3; Ultra-sonografia de abdômen global; Ultra-sonografia de sistema nervoso central; Fundo de olho; B.E.R.A (Audiometria de tronco cerebral); Eventual Avaliação com especialistas; Iniciar estimulação precoce. 24 Tabela 1. Condições médicas associadas à síndrome de Down. CONDIÇÕES MÉIDCAS % comprometidos Defeitos congênitos cardíacos Deficiência auditiva Alterações oftalmológicas Condições gastrointestinais Condições endocrinológicas (e.g. hipotireoidismo) Alterações odontológicas Condições ortopédicas (e.g. subluxação atlantoaxial) Obesidade Alterações cutâneas (e.g. eczema) Epilepsia Leucemia 50 66-89 60 5 50-90 60-100 15 50-60 50 6-13 0,6 A SD é uma das anomalias cromossômica mais freqüentes encontradas e, apesar disso, continua envolvida em idéias errôneas, sendo que muitos profissionais encontram dificuldades em lidar com esse diagnóstico. Mudanças positivas nas atitudes dos médicos durante os últimos 15 anos foram influenciadas por grupo de defesa de pais, decisões judiciais e estudos mostrando que as derradeiras habilidades sociais e intelectuais de crianças com SD são maiores que as anteriormente supostas despertando e impondo estas mudanças. Portanto, se deve aumentar a educação dirigida em cursos universitários e de complemento de formação médica no campo de deficiência e bioéticas a fim de promover bem-informada a defesa do deficiente (MUSATCCHI 2000). 25 2. OBJETIVO O presente estudo busca caracterizar os achados morfológicos da placenta e mecanismos fisiopatológicos do trofoblasto nas gestações de conceptos com síndrome de Down através de revisão da literatura científica. 26 3. METODOLOGIA Através da pesquisa online do banco internacional de artigos científicos indexados PUBMED foi relacionados artigos obtidos com as palavras chaves “Down syndrome” e “Placenta”. Estes artigos foram categorizados nos seguintes grupos: (1) anatomia patológica, (2) fisiologia e fisiopatologia e (3) métodos de imagem. Foram selecionados somente artigos que caracterizarem achados morfológicos e histopatológicos da placenta, assim como aqueles que caracterizaram mecanismos fisiopatológicos do trofoblasto. Foram excluídos os artigos que tratam de achados ultrassonográficos e outros métodos de imagem. Os achados morfológicos foram classificadas da seguinte forma: 1. Lesões vilosas 1.1. envolvendo o trofoblasto 1.2. envolvendo a membrana basal trofoblástica 1.3. envolvendo o estroma vilositário 1.4. envolvendo os vasos vilosos 1.5. lesões generalizadas das vilosidades 2. Lesões envolvendo tronco arterial 2.1. esclerose fibromuscular 2.2. endarterite obliterativa 2.3. endovasculite hemorrágica 3. Lesões das artérias deciduais maternas 27 4. RESULTADOS Foram obtidos 223 artigos com as palavras chaves “Down syndrome” e “Placenta” do banco internacional de artigos científicos indexados PUBMED. Destes foram incluídos nesta revisão 14 artigos referentes a achados morfológicos e histopatológicos da placenta, assim como aqueles que caracterizam mecanismos fisiopatológicos do trofoblasto em placenta com SD. Estudos histomorfológicos do tecido placentário obtidos de abortamentos espontâneos e provenientes de produtos de interrupções médicas da gestação são à base do conhecimento do desenvolvimento placentário. De modo geral, as vilosidades mesenquimais se desenvolvem em vilosidades intermediárias imaturas com escasso estroma, caracterizando o principal tipo de vilosidades encontradas no final do primeiro trimestre. Os vilos terminais resultam da maturação destas vilosidades intermediárias imaturas. Inúmeros estudos revelaram que existem diferenças qualitativas entre gestações cromossomicamente normais e aneuploides. SEBIRE e cols (2000) sugerem que as aneuploidias fetais estão associadas a hipovascularidade vilositária, presença de citotrofoblasto intraestromal, persistência de eritrócitos nucleados, degeneração hidrópica estromal / edema vilositário e anormalidades da camada trofoblástica. Entretanto, não há padrão característico descrito de alterações relacionadas ao cariótipo fetal. Com o advento da biópsia de vilos coriais em gestações com transluscência nucal (TN) aumentada ao ultra-som torna-se possível avaliar a morfologia destes vilos nas gestações em curso, tanto as 28 gestações normais quanto as aneuploides, assim como correlacionar estas alterações morfológicas com o aumento da TN. Estes mesmos autores avaliaram histomorfometricamente vilos coriais obtidos de biópsia de vilos em gestações em curso com idade gestacional entre 11-14 semanas, contabilizando 34 gestações com trissomia 21, 38 gestações com outras trissomias e 61 gestações normais. Nas trissomias 21, determinaram uma relação inversa entre o valor da TN e o diâmetro das vilosidade, assim como o número de capilares por vilos. Em metade dos casos havia presença de fibrina perivilosa sendo que a quantidade aumentava com a idade gestacional. Além do mais, verificaram aumento percentual da presença de duas camadas trofoblásticas e o aumento da proporção de vilos com capilares preenchidos por eritrócitos nucleados. Em 55% das gestações com trissomia 21, foi identificado aumento de depósito basofílico na membrana basal trofoblástica. Este achado foi mais prevalente nas trissomias 18 e 13. Estudo in vitro da diferenciação do citotrofoblasto em sinciciotrofoblasto em gestações com SD demonstraram que há falência ou atraso nesta diferenciação, assim como uma redução acentuada de hCG produzidos pelos sinciciotrofoblastos (MASSIN et al 2001). Considerações feitas por BANERJEE e cols (2002) e FRENDO e cols (2002) postulam que o aumento de superóxido dismutase (SOD) nas gestações com SD impediria a formação do sinciciotrofoblasto. PIDOUX e cols (2004) mostraram que o aumento de SOD e os parâmetros oxidativos dos citotrofoblastos nas gestações com SD explicariam a fusão comprometida dos 29 citotrofoblastos em sinciciotrofoblastos. O processo de diferenciação e fusão dos citotrofoblastos é inibido em condições de hipóxia e má perfusão. Este mesmo grupo de pesquisadores verificou que via de sinalização promovidas pelo hCG estão deficientes em citotrofoblastos de gestações com SD e teriam implicações diretas no comprometimento da formação de sinciciotrofoblastos nestes casos (PIDOUX et al 2007). Em gestações com SD, o perfil sérico materno normal de vários marcadores fetoplacentários está alterado. Estes marcadores têm implicações clínicas importantes na identificação de gestações com risco aumentados para SD, sobretudo no segundo trimestre. Dentre estes marcadores o UE3 (estradiol não conjugado) está diminuído no caso de SD quando comparado com gestações normais tanto no primeiro quanto no segundo trimestre gestacionais. A alfa fetoproteína (AFP) fetal é outro marcador cuja concentração está diminuído no soro materno. Por outro lado, outros marcadores tais como a gonadotrofina coriônica humana (hCG), a subunidade beta do hCG e a glicoproteína beta-1 específica da gestação (SP1) são encontradas em níveis elevados nestas gestações. NEWBY e cols (1994) avaliaram a relação dos níveis de estradiol (UE3) e seus precursores a dehidroepiandrosterona (DHEAS) e a sulfatase (STS) no tecido fetal e placentário, comparando-os com os níveis séricos maternos. Os níveis placentários, maternos e em líquido amniótico de UE3 estão diminuídos nas gestações com SD comparado com gestações normais. Há uma correlação significante dos níveis de UE3 entre tecido placentário, soro materno e líquido 30 amniótico no segundo trimestre gestacional nos casos de SD. Os precursores de UE3 estudados, a DHEA e STS, também apresentaram níveis reduzidos nos tecidos fetais e placentários. Portanto, a possibilidade do suprimento fetal destes precursores pode ser a causa subjacente que explique os níveis reduzidos de UE3 no soro materno de gestações com SD. Por ser o sítio de maior produção de DHEA, a glândula adrenal fetal nos casos de SD deve, provavelmente, apresentar alterações funcionais ou até mesmo anormalidades estruturais que expliquem a redução dos níveis de UE3 nestas gestações. Correlações entre tecido palcentário e soro materno já haviam sido comprovados para outros marcadores tais como hCG. Variantes de hCG tais como a hCG hiperglicosilada também forma demonstradas como aumentadas em gestações com SD (COLE 2007). BRIZOT e cols (1996) verificaram a diminuição dos níveis séricos maternos da proteína A plasmática associada à gestação (pregnancy-associated plasma protein-A / PAPP-A) em oito gestação com trissomia 21, entretanto não caracterizaram alterações na concentração de PAPP-A em tecido placentário, assim como da expressão de mRNA PAPP-A. Estes autores concluíram que provavelmente as alterações séricas maternas se devem a eventos póstranslacionais tais como mecanismos de liberação da proteína, seu transporte através da placenta ou a modificações da estabilidade protéica no soro materno. Além do mais, pode haver outras fontes de PAPP-A que não seja a placenta alteradas pela trissomia fetal. 31 DALGLIESH e cols (2001) avaliaram níveis séricos maternos de Inibina A em gestações com SD e demonstraram aumento deste marcador, assim como aumento da marcação de Inibina A por imunoperoxidase em trofoblastos, postulando o aumento da produção da Inibina A na placenta como responsável. Entretanto DEBIEVE e cols (2001) não verificaram aumento do mRNA da Inibina A e suas subunidades em gestações com SD. Assim, não há evidência de mecanismos translacionais para explicar os níveis séricos maternos aumentados de Inibina A em gestações com SD. DEBIEVE e cols (2001) verificaram concentração do fator de crescimento placentário diminuído (PLGF), embora os níveis de fator de crescimento vascular (VEGF) não fossem alterados. Recente estudo de análise de expressão gênica através de técnica de microarray demonstraram padrão gênico específico do tecido placentário de gestação com SD (KLUGMAN et al 2008). Dois genes de interesse apresentaram-se superexpressos no casos de SD quando comparado com gestações euploides: Keratin 8 (KRT8) e TNF-Related Apoptosis-I Inducing ligand (TRAIL). KRT8 é um filamento intermediário associado à diferenciação da camada do trofoectoderma do blastocisto, assim como um potencial sinalizador de apoptose. Estes autores evidenciaram uma relação inversa entre KRT8 e TRAIL em casos de placenta com SD que não ocorre em placentas euploides. Com a mesma metodologia, ROZOVSKI e cols (2007) evidenciaram uma lista de cerca de 750 genes superexpressos na placenta com SD, sendo que a maioria daqueles que se mostraram 4.5 vezes mais expressos estão mapeados no 32 cromossomo 21. Os 10 genes mais expressos foram capazes de discriminar as placentas com SD das placentas normais. 33 5. DISCUSSÃO Nas trissomias, o número de vasos fetais por vilos, a porcentagem de dupla camada trofoblástica e a proporção de capilares vilositários com eritrócitos nucleados estão alterados, quando comparada com gestações com cariótipo normal. No caso específico da trissomia 21, há um aumento da proporção de dupla camada trofoblástica e de capilares com eritrócitos nucleados quando comparados com demais aneuploidias. Estes achados podem ser conseqüentes do atraso do desenvolvimento placentário, pois estes parâmetros diminuem com a evolução em gestações normais. A TN está aumentada nos casos de aneuploidias, embora seu mecanismo não está inteiramente esclarecido. Alguns fatores contributivos foram postulados tais como falência cardíaca e alteração de elementos do tecido colágeno. SEBIRE e cols (2000) notaram relação inversa entre o diâmetro vilositário e do número de capilares por vilos com o valor da TN. Estes achados sugerem que o desenvolvimento placentário atrasado, causando o aumento da resistência vascular periférica, podem ser um fator adicional contributivo para o aumento da TN nestes casos. O aumento do depósito basofílico na membrana basal trofoblástica dos vilos de gestações trissômicas está relacionado à taxa de letalidade intra-uterina destas gestações. Este achado foi evidenciado em cerca de 80% das 34 gestações com trissomia 18 e 13 e em 55% das trissomias 21. Podemos considerar a possibilidades de que estes depósitos basofílicos estejam relacionados à “falência placentária” culminando com o óbito intra-uterino. A presença de depósito de fibrina perivilositário é descrita nas placentas de gestações normais no terceiro trimestre e aumentam com a idade gestacional. Provavelmente, estes achados têm um papel estrutural neste período gestacional. Outras evidências de um desenvolvimento placentário falho ou pelo menos atrasado nas gestações com SD correspondem aos ensaios in vitro da diferenciação de citotrofoblasto em sinciciotrofoblasto. Estes estudos mostram redução na formação do sinciciotrofoblasto, assim como a diminuição das substâncias secretadas por estas células. O processo de diferenciação e fusão dos citotrofoblastos é inibido em condições de hipoxia e má perfusão (PIDOUX et al 2004). Provavelmente, eventos de má perfusão e provavelmente de hipóxia sustentadas nas gestações com SD, expliquem achados morfológicos como a redução do diâmetro vilositário (hipoplasia) e a redução do número de capilares por vilos. A proporção aumentada de dupla camada trofoblástica deve ser interpretada como a incapacidade da diferenciação adequada de citotrofoblasto em sinciciotrofoblastos. Estes danos ao trofoblastos seriam causados pelo estresse oxidativo devido a superexpressão de SOD. 35 6. CONCLUSÃO Os achados morfológicos da placenta nas gestações de conceptos com síndrome de Down correspondem a lesões vilosas que refletem principalmente um atraso no desenvolvimento placentário. As lesões vilosas caracterizadas estão: > envolvendo o trofoblasto: atraso na diferenciação de citotrofoblasto em sinciociotrofoblasto e maior proporção de dupla camada trofoblástica; > envolvendo a membrana basal trofoblástica: depósito basofílico na membrana basal trofoblástica; > envolvendo o estroma vilositário: degeneração hidrópica e edema vilositário; > envolvendo os vasos vilosos: menor número de capilares por vilos; > lesões generalizadas das vilosidades: hipoplasia vilositária. Não foram relatados lesões envolvendo tronco arterial e lesões das artérias deciduais maternas; Os mecanismos fisiopatológicos envolvendo o trofoblasto demonstraram que as substâncias produzidas pela placenta caracterizadas como marcadores no soro maternos que estão alteradas não se devem, na maioria, a eventos translacionais, mas a eventos pós-translacionais. 36 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Antonarakis SE, Lyle R, Dermitazakis ET et al. Chromosome 21 and Down syndrome: from genomics to pathophysiology. Nature Reviews Genetics. 2004; 5: 725-737. Altshuler G. Role of the palcenta in perinatal pathology. Ped Path Lab Med. 1996; 16: 207-233. Banerjee S, Smallwood A, Nargund G, Campbell S. Placental morphogenesis in pregnancies with Down's syndrome might provide a clue to pre-eclampsia. Placenta. 2002;23(2-3):172-4. Barr P e Hunt R. An evaluation of the autopsy following death in a level IV neonatal intensive care unit. J Pediatr Child Health. 1999; 35: 185-189. 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