LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS
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LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS
FITOPATOLOGIA LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS ELIANE CRISTINA LOCALI 1, JULIANA FREITAS-ASTÚA 1,2 e MARCOS ANTÔNIO MACHADO 1 RESUMO A leprose dos citros, desde seu primeiro relato no Brasil, em 1933, segue sendo responsável por grandes danos à produção de citros, principalmente de laranja-doce [Citrus sinensis (L.) Osbeck], espécie mais suscetível à doença. Caracterizada por lesões locais em frutos, folhas e ramos, é causada pelo vírus da leprose dos citros (Citrus leprosis virus CiLV), e transmitida pelo ácaro Brevipalpus sp. O controle da transmissão do vírus pelo ácaro tem sido feito com altos custos de acaricidas e é a principal forma de controle da doença. Os métodos de diagnóstico mais comumente utilizados eram observação direta de sintomas ou exames de cortes ultrafinos de tecidos das lesões por meio de microscópio eletrônico de transmissão. Técnicas baseadas em análise e detecção de seqüências do genoma viral foram desenvolvidas, sendo usadas para diagnóstico da doença, com resultados mais rápidos e mais sensíveis. Termos de indexação: vírus da leprose dos citros - CiLV, Brevipalpus sp. 1 2 Centro APTA Citros Sylvio Moreira – IAC, Rod. Anhangüera, km 158, Caixa Postal 04, 13490-970 Cordeirópolis (SP). EMBRAPA Milho e Sorgo. ARTIGO TÉCNICO 54 ELIANE CRISTINA LOCALI et al. SUMMARY CITRUS LEPROSIS: BIOLOGY AND DIAGNOSIS Citrus leprosis, since its first report in Brazil, in 1933, has been responsible for severe damages in citrus production, mainly in sweet orange (Citrus sinensis L. Osbeck), the most susceptible species to the disease and represented in nearly 90% of scion varieties cultivated in São Paulo State, Brazil. Characterized by local lesions in fruits, leaves and stems, the disease is caused by Citrus leprosis virus - CiLV, transmitted by the false spider mite vector Brevipalpus sp. during its feeding. Millions of dollars are spent annually for the chemical control of the mites; which makes acaricides the most economically important pesticide used in citrus productions. The diagnosis of citrus leprosis was traditionally done by symptoms evaluation, transmission by the mite vector or electron microscopy. However, it was recently developed a molecular method to detect the virus and diagnose the disease, which has shown to be faster, more efficient, and reliable than others. Index terms: Citrus leprosis virus (CiLV); Brevipalpus sp. 1. INTRODUÇÃO O Brasil é o maior produtor mundial de citros, arrecadando cerca de 1,5 bilhão de dólares com exportação de suco concentrado e produtos afins (ABECITRUS, 2004). O país, porém, enfrenta problemas com a qualidade e sanidade da cultura, reduzindo significativamente a produção. Patógenos transmitidos por vetores (insetos e ácaros) são especialmente difíceis de serem controlados e, quando o são, a custos financeiros e ambientais extremamente elevados (GUIRADO, 2000). Provavelmente a leprose seja uma das poucas doenças virais na qual o controle da sua transmissão pelo vetor tem sido utilizado sistematicamente. Causada pelo vírus da leprose dos citros (Citrus leprosis virus - CiLV) e transmitida por espécies do ácaro Brevipalpus sp., a moléstia está presente em, praticamente, todas as regiões produtoras de citros do País, especial- LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS 55 mente no Estado de São Paulo, onde é mais severa nas regiões norte e noroeste, provavelmente associada ao clima e a períodos prolongados de estiagem que favorecem o aumento populacional do ácaro (BASSANEZI et al., 2002). SALVA & MASSARI (1995) estimaram entre 40 e 60 milhões de dólares por ano os prejuízos causados pela leprose à citricultura. Estudos mais recentes sugerem que cerca de 90% dos dispêndios totais gastos anualmente com os defensivos utilizados na citricultura referem-se aos acaricidas, sendo 80% destes para o controle específico do ácaro da leprose (NEVES et al., 2002). Uma vez que as perdas causadas pela doença podem ser elevadas e a enfermidade parece ter sua incidência aumentada nos últimos anos, pode-se supor que os prejuízos sejam ainda maiores que os relatados. Além do elevado custo, o uso constante de acaricidas é responsável por grande parte da contaminação do homem e do ambiente, bem como pelo aumento de indicações de populações de ácaros resistentes a eles (ALVES, 1999; CAMPOS & OMOTTO, 2002). Outros métodos, como uso de defensivos naturais (GUIRADO, 2000) e redução de fontes de inóculo do vírus nos pomares (RODRIGUES et al., 2001) têm sido propostos para o controle da doença. Estratégias para o controle da leprose foram abordadas em trabalhos recentes (OLIVEIRA et al., 1991; RODRIGUES et al., 2001; RODRIGUES, 2002; DRAGONE et al., 2003). Além de sua importância econômica no Brasil, a leprose dos citros tem despertado interesse e preocupação em outros países produtores de citros, principalmente pelo avanço da doença na América Central (Panamá, Costa Rica e Guatemala) (GONZÁLES, 2000; DOMINGUEZ et al., 2001), podendo atingir novamente a América do Norte, onde foi relatada pela primeira vez por FAWCETT (1911) na Flórida, causando severas perdas, mas que, de alguma forma, não é mais encontrada lá, provavelmente em vista de tratos culturais adequados (KNORR, 1968). Antigas descrições sobre sua ocorrência na África e na Ásia não foram confirmadas até o momento (COLARICCIO et al., 1995; MURAYAMA et al., 1998). LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 56 ELIANE CRISTINA LOCALI et al. 2. SINTOMAS, TRANSMISSÃO E GAMA DE HOSPEDEIRAS Os sintomas da leprose são caracterizados pelo aparecimento de lesões cloróticas e/ou necróticas, lisas ou salientes, circulares ou alongadas quando próximas às nervuras foliares (LOCALI et al., 2003). Em geral, os sintomas são visíveis a partir de 17 a 60 dias após a infecção do tecido vegetal, sempre nos locais onde o ácaro se alimenta (BASSANEZI et al., 2002). Nas folhas, os sintomas freqüentemente aparentam discos arredondados com um ponto central castanho-escuro, com 2 ou 3 mm de diâmetro, rodeados por um halo clorótico; folhas mais velhas apresentam, inicialmente, lesões cloróticas e lisas nas duas faces, que aumentam seu tamanho, tornando-se marrom-avermelhadas, podendo ser lisas ou salientes e com ou sem centro necrótico. Frutos verdes mostram lesões inicialmente amareladas, tornando-se escurecidas ou marrons rodeadas por um halo amarelado; em estádio avançado de amadurecimento, ocorrem manchas escuras e deprimidas, podendo ser rodeadas por halo esverdeado (FREZZI, 1940; BITANCOURT, 1955; ROSSETTI et al., 1969). O número de lesões e a época de aparecimento dos sintomas podem causar queda prematura de frutos e intensa desfolha na planta, reduzindo a capacidade fotossintética de variedades suscetíveis. Nos ramos, as lesões inicialmente são cloróticas e geralmente lisas. Com o tempo, tendem a apresentar-se de coloração castanha e tornam-se salientes e corticosas, levando ao escamamento da casca. Ramos afetados pela doença apresentam redução na produção de frutos e tornam-se sujeitos à instalação de parasitas secundários. Em casos extremos, os ramos podem secar completamente, levando à morte das plantas jovens altamente suscetíveis (BASSANEZI et al., 2002; LOCALI et al., 2003). Variações nos sintomas, no entanto, podem ser observadas não apenas em função da variedade infectada, mas, também, do estádio de desenvolvimento do órgão afetado, do ambiente (VERGANI, 1945; BITANCOURT, 1956) e do isolado do vírus (FREITAS-ASTÚA et al., dados não publicados). Até o momento, todas as hospedeiras naturais conhecidas do CiLV são do gênero Citrus. As laranjas-doces (C. sinensis) são consideradas as mais LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS 57 suscetíveis à leprose, enquanto limões (C. limon), limas verdadeiras (C. aurantifolia) e tangerinas (C. reticulata), mais resistentes ou tolerantes (BITANCOURT, 1955; ROESSING & SALIBE, 1967). Recentes trabalhos têm demonstrado a possibilidade de plantas da vegetação espontânea de pomares de citros, bem como cercas-vivas e quebra-ventos servirem como hospedeiras alternativas do CiLV (ULIAN & OLIVEIRA, 2001, 2002). No entanto, são necessárias maiores informações acerca do papel dessas plantas como fonte de inóculo do vírus e sua possível relevância na epidemiologia da doença. Em condições naturais de campo, o vírus da leprose pode ser transmitido de planta a planta somente mediante o ácaro vetor que se alimenta em planta infectada, adquirindo o vírus e transmitindo-o quando se alimenta em planta sadia (MUSUMECCI & ROSSETTI, 1963). Apesar de relatos sobre B. californicus e B. obovatus como vetores do CiLV em outros países (FREZZI, 1940; VERGANI, 1945; KNORR,1968), no Brasil, até o momento, só há confirmação da transmissão por B. phoenicis (MUSUMECCI & ROSSETTI, 1963; ROSSETTI et al., 1969), espécie polífaga, pertencente à família Tenuipalpidae, com cerca de 486 espécies de plantas hospedeiras (CHILDERS & DERRICK, 2003). As fases do ciclo de vida do B. phoenicis constituem-se de ovo, larva, protoninfa, deutoninfa e adulto (LAL, 1978). Esses ácaros se reproduzem por partenogênese telítoca, originando fêmeas haplóides geneticamente similares (HELLE et al., 1980). Machos raramente são encontrados (PIJNACKER et al., 1980, 1981). Experimentos realizados por KNORR (1968) demonstraram a transmissão de leprose por inserção de porções de tecidos caulinares sintomáticos, para plantas jovens e sadias de citros, sem a presença de ácaros. Confirmação de transmissão experimental de leprose foi também observada por CHAGAS et al. (1983), pela enxertia de topo com ramos jovens de laranja ‘Pêra’ sintomática para mudas de laranja “Caipira”. Além das transmissões obtidas a partir de implantação de tecido vegetal contaminado, COLARICCIO et al. (1995) lograram transmitir o vírus da leprose mecanicamente para plantas previamente sadias de citros e hospe- LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 58 ELIANE CRISTINA LOCALI et al. deiras herbáceas, como Chenopodium album, C. amaranticolor, C. foliosum, C. murale, C. polyspermum, C. quinoa e Gomphrena globosa. Deve-se ressaltar, no entanto, que não foi possível a transmissão do CiLV de volta de plantas herbáceas para citros (COLARICCIO et al. 1995). 2.1. O vírus da leprose dos citros As primeiras considerações sobre o agente etiológico da leprose dos citros surgiram juntamente com os primeiros relatos da doença por FAWCETT (1911), que a atribuiu à ação de fungos. VERGANI (1945), no entanto, propôs que a moléstia era causada por uma toxina expelida pela saliva do ácaro no momento da alimentação. Essa hipótese foi sustentada durante vários anos, até o surgimento da primeira evidência da etiologia viral da leprose mediante sua transmissão por enxertia (KNORR, 1968). As primeiras partículas virais associadas à leprose foram encontradas por KITAJIMA et al. (1972), em observação ao microscópio eletrônico de transmissão de cortes ultrafinos de lesões de folhas de laranja-doce. Tais partículas eram do tipo baciliforme, não envelopadas, semelhantes a rhabdovírus, medindo 100-110 nm de comprimento e 40-50 nm de largura, associadas a viroplasmas no núcleo da célula (KITAJIMA et al., 1972). Partículas baciliformes de 120-130 nm de comprimento e 50-55 nm de largura e associadas ao lúmen do retículo endoplasmático, no citoplasma de células do parênquima, também foram relatadas por COLARICCIO et al. (1995). DOMINGUEZ et al. (2001) detectaram dois tipos de partículas no núcleo do citoplasma de células infectadas, sugerindo a existência de duas formas distintas de vírus, provavelmente transmitidas pelo mesmo ácaro. O tipo prevalente de partículas virais encontradas em nossas condições é o citoplasmático (CiLV-C), sendo novamente encontrado, após o primeiro relato de 1972, apenas recentemente, o tipo nuclear (CiLV-N) no Estado de São Paulo (KITAJIMA et al., 2004). O CiLV-C caracteriza-se ainda por apresentar membrana envolvendo suas partículas, semelhante ao que ocorre com vírus da família Rhabdoviridae. No entanto, apesar de similaridades na morfologia, presença de membrana e LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS 59 locais de acúmulo nas células infectadas, o vírus da leprose apresenta inúmeras diferenças quando comparado com rhabdovírus típicos. Por isso, o CiLV é considerado apenas um membro tentativo da família e sua classificação definitiva ainda requer maior quantidade de informações sobre aspectos biológicos, serológicos e moleculares. De maneira análoga, outros rhabdovírus tentativos transmitidos por ácaros Brevipalpus sp. têm sido encontrados em inúmeras culturas de importância econômica, como café, maracujá e orquídea, ou ornamental, como dama-da-noite, bela-emília ou ligustre (CHAGAS et al., 1983; COLARICCIO et al., 1995; FREITAS-ASTÚA et al., 1999, 2002 a,b, 2004; KITAJIMA et al., 2000). A relação entre esses vírus e o da leprose dos citros ainda é desconhecida. Sabe-se apenas que todos os vírus desse grupo induzem o aparecimento de sintomas semelhantes aos da leprose (lesões locais circulares e elípticas) em seus hospedeiros, são transmitidos por Brevipalpus sp. e apresentam morfologia baciliforme, podendo acumular-se no núcleo ou citoplasma de células infectadas. A similaridade genética e a possível relevância epidemiológica desses vírus com relação à leprose são desconhecidas, mas estudos estão sendo efetuados visando esclarecer qual a ligação entre os diferentes vírus desse grupo (LOCALI et al., dados não publicados). As dificuldades na caracterização do CiLV devem-se ao fato de este ser um vírus incomum e induzir a formação de apenas lesões locais e não sistêmicas nas hospedeiras, apresentar baixo título e alta labilidade das partículas, o que torna difícil sua purificação e detecção. Informações sobre propriedades biológicas in vitro do CiLV evidenciaram ponto de inativação térmica de 55-60 oC; longevidade de 6 dias a 4o C e três dias a temperatura ambiente; ponto final de diluição de 10–3 e retenção à infectividade por 45 meses de preservação em folhas desidratadas (LOVISOLO, 2001). Em busca das primeiras informações moleculares sobre o CiLV, LOVISOLO et al. (1996) tentaram purificar o vírus utilizando tecidos com lesões de leprose de laranja-doce ‘Pêra’ e tangerina ‘Cleópatra’, mediante vários protocolos. No entanto, nenhuma das preparações obtidas foi infecciosa e partículas virais não foram detectadas por microscopia eletrônica. Os autores detectaram apenas algumas proteínas de, aproximadamente, 25 kDa, as quais não reagiram com nenhum dos antissoros testados contra rhabdovírus. LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 60 ELIANE CRISTINA LOCALI et al. COLARICCIO et al. (2000), tentando purificar CiLV, obtiveram partículas curtas e irregularmente baciliformes medindo cerca de 45-50 x 80-120 nm, sugerindo tratar-se de vírions do CiLV. Além das tentativas de purificação do CiLV, outra estratégia utilizada visando à análise molecular do vírus tem sido a extração de dsRNA (RNA dupla fita ou double stranded RNA) do CiLV (COLARICCIO et al., 2000; RODRIGUES, 2000). A presença de dsRNA vem sendo muito utilizada como indicativo de infecção viral para a diagnose de inúmeras enfermidades de plantas (DODDS et al., 1984; VALVERDE et al., 1990). Essa molécula está normalmente relacionada com uma fase intermediária da replicação de vírus cujo genoma é constituído de ssRNA (RNA fita simples ou single stranded RNA), o que representa a maioria dos vírus de plantas. A partir de dsRNAs extraídos de lesões de leprose e da ausência dos mesmos em material sadio, foi sugerida a associação entre a doença e a presença de dsRNA no tecido vegetal (COLARICCIO et al., 2000; RODRIGUES, 2000). No entanto, a comprovação de que essas moléculas são realmente de natureza viral, só foi possível mediante trabalhos desenvolvidos por LOCALI (2002). A associação de moléculas de dsRNA com material vegetal infectado com CiLV representou alternativa para a caracterização de seu genoma, bem como para o desenvolvimento de sistemas de diagnose da doença desenvolvidos por LOCALI et al. (2003). Estudos preliminares de variabilidade de duas regiões genômicas de diferentes isolados do CiLV, provenientes de variedades de laranja-doce [Citrus sinensis (L.) Osbeck] como ‘Pêra’, ‘Natal’ e ‘Valência’ e tangerina ‘Cleópatra’ (Citrus reshni Hort. ex. Tan) de diversas regiões geográficas do Brasil, têm indicado a presença de apenas um ou poucos haplótipos do vírus (populações variantes relacionadas geneticamente (AYLLÓN et al., 1999), sugerindo certa uniformidade dos isolados (LOCALI et al., 2004). Por outro lado, esses resultados iniciais demonstram padrão de variabilidade bastante diferente daqueles obtidos para o vírus da tristeza dos citros (Citrus tristeza virus, CTV), que apresenta elevado grau de variação e grande número de haplótipos em amostras de citros coletadas em diferentes condições (RUBIO et al., 1996, 2001; KONG et al., 2000; SOUZA et al., 2000a,b, 2002; D’ URSO et al., 2003). LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS 61 3. MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO Os sintomas da leprose dos citros são bastante característicos, facilitando muito sua identificação em regiões de alta incidência da doença; entretanto, em alguns casos, principalmente onde a leprose não é muito comum, os sintomas podem ser confundidos com outras moléstias, como “cancro cítrico” ou “clorose zonada dos citros”, virose também transmitida pelo ácaro B. phoenicis (ROSSETTI, 1980). Apesar disso, até recentemente, a diagnose da leprose era feita com base na análise dos sintomas ou na avaliação de cortes ultrafinos de tecidos lesionados ao microscópio eletrônico de transmissão. Mesmo sendo bastante útil, o método de diagnose com base em microscopia apresenta limitações, uma vez que demanda tempo, utilização de equipamentos sofisticados e custosos, e mão-de-obra altamente qualificada, tornando-se inviável quando é necessário processar grande número de amostras (LOCALI et al., 2003). Uma vez que não foi possível até o momento purificar o vírus, ainda não foram desenvolvidos antissoros contra o CiLV que possam ser adotados em testes serológicos de diagnóstico, como, por exemplo, “ELISA”. Entretanto, com o seqüenciamento parcial do genoma do CiLV (LOCALI, 2002), foram desenhados primers ou iniciadores que permitem a amplificação de regiões específicas do CiLV pela técnica molecular da transcrição reversa e reação da polimerase em cadeia (RT-PCR) (LOCALI et al., 2003). Por essa técnica, foi possível detectar o vírus de maneira simples, eficiente e altamente específica em folhas, frutos e ramos de diferentes espécies, variedades e híbridos, provenientes de dezenas de cidades e de vários Estados (LOCALI et al., 2003). Os tipos de tecidos vegetais lesionados (folha, fruto ou ramo) não interferem ou causam diferenças nos resultados do teste, sendo possível a utilização de qualquer um deles, para detecção da doença (FREITAS-ASTÚA et al., 2003); todavia,diferenças nos resultados do diagnóstico ocorrem, quanto ao tipo de lesão ou estádio de desenvolvimento dos sintomas. Material com lesões cloróticas ou iniciais é melhor para ser utilizado no teste molecular do que tecidos vegetais com lesões necróticas, ou seja, em estádio avançado. Amostras com ausência de sintomas ou em estádios avançados de oxidação (morte do tecido vegetal) não são adequadas para empregar nesse teste, uma LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 62 ELIANE CRISTINA LOCALI et al. vez que não produzem resultados eficientes com os “primers” específicos para o vírus (FREITAS-ASTÚA et al., dados não publicados). A manutenção dos tecidos vegetais coletados sob baixa temperatura ou secos por até duas semanas foram as melhores condições de armazenamento do material para diagnóstico (ANTONIOLLI et al., 2004). Resultados preliminares sugerem, mediante o método molecular, a detecção do vírus também no interior do ácaro vetor (FREITAS-ASTÚA et al., 2003), que poderá auxiliar no monitoramento de novas áreas de infecção, avaliando populações de ácaros contaminados em talhões onde os sintomas de leprose ainda não tenham sido manifestados ou em regiões sem incidência da doença. Tal monitoramento auxiliará nas medidas de controle do ácaro vetor, principalmente em relação ao número de pulverizações feitas com acaricidas e, conseqüentemente, na redução do custo desse controle. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A leprose dos citros, que, durante anos, foi considerada uma doença somente de pomares abandonados, atualmente é vista como a doença viral de maior importância econômica para a citricultura paulista, em vista dos altos custos com o controle químico do ácaro vetor. Muitos avanços foram obtidos nos últimos anos, nas pesquisas sobre a leprose, mas informações disponíveis sobre os agentes desse patossistema (vírus-ácaro-planta) ainda são limitantes. No entanto, com as primeiras seqüências do genoma do vírus, o desenvolvimento do primeiro método molecular de diagnóstico da doença, estudos sobre variedades e híbridos resistentes à leprose e um número crescente de informações sobre o ácaro vetor, espera-se aumentar, significativamente, o entendimento da doença visando obter resultados que contribuam para redução nos custos de controle, bem como o aumento da qualidade e produção da cultura. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABECITRUS – Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos (Internet:// www.abecitrus.com.br/inds.html, 19/04/2004) LARANJA, Cordeirópolis, v.25, n.1, p.53-68, 2004 LEPROSE DOS CITROS: BIOLOGIA E DIAGNÓSTICO DO VÍRUS 63 ALVES, E.B. Manejo da resistência do ácaro da leprose Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) (Acari: Tenuipalpidae) ao acaricida dicofol.1999. 91p. Dissertação (Mestrado ). Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”/USP, Piracicaba. 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