a percepção dos colaboradores de um supermercado em
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a percepção dos colaboradores de um supermercado em
3 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 INSTITUCIONAL DIREÇÃO DA MANTENEDORA Diretoria Gestão 2013 - 2015 Presidente: Ernani Carlos Boeck Vice-presidente: Ronaldo Fredolino Wendland Secretária: Dalva Lenz de Souza Vice-secretária: Telci Krause Tesoureiro: Hordi Núbio Felten Vice-tesoureiro: Flávio Huber Conselho Fiscal: Waldemar Blum Nelson de Oliveira Mario Tesche Ivo Novotny Arnaldo Schmitt Conselho Deliberativo: Marisa Sandra Allenbrandt Lori Cecatto Kedy Lopez Diretor geral: Flávio Magedanz Vice-diretor Faculdade Três de Maio: Sandro Ergang Vice-diretora Administrativa: Quedi Sônia Schmidt Vice-diretora Educação Básica e Ensino Médio: Marilei Assini Vice-diretora Educação Infantil: Dagma Heinkel Conselho Editorial: Ms Adalberto Lovato; Ms Alexandre Chapoval Neto; Dra Cinei Teresinha Riffel; Ms Douglas Faoro; Drdo Fauzi de Moraes Shubeita; Ms Gilberto Souto Caramão; Ms Jorge Antonio Rambo; Ms Lilian Winter; Ms Márcia Stein; Ms Marcos Caraffa; Ms Sandro Ergang; Ms Valsenio Gaelzer, Ms Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber; Ms Vera Lúcia Lorenset Benedetti. Comissão Científica Interna (avaliadores - sistema blindedrewiew): Ms Alexandre Chapoval Neto; Dra Cinei Teresinha Riffel; Ms Cláudia Verdun Viegas; Ms Evandir Bueno Barasuol; Drdo Fauzi Shubeita; Ms Gilberto Caramão; Ms Jeane Borges; Ms Lilian Winter; Ms Luciomar de Carvalho; Ms Márcia Stein; Ms Marcos Caraffa; Ms Paulo Pereira; Ms Sandro Ergang; Ms Valsenio Gaelzer; Ms Vera Lúcia Lorenset Benedetti; Ms Vera Pinto Zimermann Weber; Comissão Científica Externa (avaliadores – sistema blindedrewiew): Dra Cristiane Koehler – SENAC (RS); Dr Cristiano Henrique da Veiga – UFSM (RS); Dr João Bosco Sobral – UFSC (SC): Dr João Leonardo Pires – EMBRAPA (RS); Dr Jorge Luis da Cunha - UFSM (RS); Dr José Antonio Martinelli – UFRGS (RS); Dr Luciano Bedin da Costa - UFRGS (RS); Prof Drdo Luis Carlos Zucatto – (UFSM); Dra Márcia Soares Chaves – EMBRAPA (RS); Dr Mário Luis Santos Evangelista - UFSM (RS); Dra Marlene Gomes Terra –UFSM (RS); Dr Miguel Vicente Sellitto - UNISINOS (RS); Dr Rafael Marcelo Soder – UFFS (SC); Dr Roque da Costa GüllichUFFS (RS); Dr Sedinei Nardelli Beber – PUC (RS); Dra Soraia Napoleão Freitas - UFSM (RS); Drdo Valmir Heckler – FURG (RS); Ms Vera Lúcia Fortunato Fortes – UPF (RS). Capa: Assessoria de Comunicação SETREM Diagramação: Gráfica SR Revisão: Carla Matzembacher Ano XIII nº22 JAN/JUN 2013 - ISSN 1678-1252 Revista SETREM: Revista de Ensino e Pesquisa Sociedade Educacional Três de Maio Três de Maio: SETREM Publicação Semestral EDITORIAL A REVISTA SETREM, tem como objetivo estimular a produção científica e o debate acadêmico visando fomentar a disseminação e o aprimoramento de conhecimento nas áreas de Administração, Agronomia, Design de Moda, Enfermagem, Engenharia de Produção, Pedagogia, Psicologia, Sistemas de Informação e Redes de Computadores. A REVISTA SETREM, com periodicidade semestral, esta comprometida em divulgar os resultados das pesquisas desenvolvidas por discentes, docentes e profissionais da área, desta instituição bem como de outras instituições de ensino e pesquisa, estimulando uma das experiências necessárias à formação de futuros pesquisadores e de profissionais habilitados para atuarem em suas respectivas áreas. Acreditamos que a publicação científica quando da apresentação de referencial bibliográfico, métodos de pesquisa e resultados (teóricos e práticos) contribuem não apenas para o amadurecimento intelectual dos autores, mas também para o desenvolvimento profissional, das organizações e da sociedade em geral. Nossos leitores, constituídos por pesquisadores, professores, acadêmicos de graduação, programas de pós-graduação, empresários e profissionais atuantes nas áreas supramencionadas e em outras correlatas, tem a sua disposição esta revista que permite a difusão do saber científico, tecnológico e cultural. É com imensa satisfação que apresentamos a REVISTA SETREM, N° 22. Nesta edição, contamos com 15 publicações, frutos de um trabalho conjunto entre professores e acadêmicos, envolvendo as áreas de ensino, pesquisa e extensão. Esperamos que a confiança depositada na REVISTA SETREM, como um dos meios para a socialização desses resultados de pesquisa, se renove, propiciando uma maior visibilidade à produção acadêmica. Gostaríamos de agradecer a contribuição da comissão científica interna e externa que contribuem para a consolidação desta revista. Agradecemos, em especial, aos nossos leitores e leitoras. Afinal, sem esta interação, nosso trabalho não teria razão de ser. Uma boa leitura a todos! Prof Msc Sandro Ergang Vice-Diretor de Ensino Superior e Ensino Técnico REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 SUMÁRIO A INTERFERÊNCIA DOS CONFLITOS PROFISSIONAIS NA QUALIDADE DE VIDA DO TRABALHADOR PELO ATUAL SISTEMA DE TRABALHO....................5 Andreas Laurence Hirt Cecília Smaneoto Robson Weiss Machado SETREM A UTILIZAÇÃO DO CUSTEIO POR ABSORÇÃO PARA A FORMAÇÃO DE PREÇO DE UMA INDÚSTRIA DE ESQUADRIAS METÁLICAS.....................................17 Plínio Fredolino Unfer Yara Heck Alexandre Chapoval Neto SETREM COMPOSTAGEM DE DEJETOS LÍQUIDOS DE SUÍNOS..................................32 Nelson José Fonseca Smola Edileusa Kersting da Rocha Marcelo Rigo SETREM IMAGENS E REFLEXOS DA CAMINHADA ESCOLAR: O OLHAR DO ESTUDANTE SOBRE O/A PROFESSOR/A......................................................44 Cristiane Kirch Fritzen Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber SETREM INTERLOCUÇÕES SOBRE A PRESENÇA DO GÊNERO MASCULINO NO ESPAÇO ESCOLAR...................................................................................54 João Ricardo Prestes Froes Silvia Natália de Mello SETREM REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 POSSIBILIDADE DE ALFABETIZAR LETRANDO A PARTIR DA LITERATURA INFANTIL...............................................................................68 João Ricardo Prestes Froes Silvia Natália de Mello Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber SETREM ANÁLISE DO SISTEMA DE MEDIÇÃO EM UMA INDÚSTRIA METALÚRGICA.........................................................................77 Lucinéia Carla Loeblein, PPGEP, UFSM Leoni Pentiado Godoy, PPGEP, UFSM Adalberto Lovato, SETREM Universidade Federal de Santa Maria - UFSM e Programa de PósGraduação em Engenharia de Produção - PPGEP SETREM A PERCEPÇÃO DOS COLABORADORES DE UM SUPERMERCADO EM RELAÇÃO AO COMPROMETIMENTO ORGANIZACIONAL..............................84 Andréia Ziegler Lilian Ester Winter SETREM O FANTASMA DA ÓPERA SOB UMA VISÃO GESTÁLTICA..............................98 Arlete Salante Carlene Maria Dias Tenório Instituto de Gestalt-terapia de Brasília CLIMA ORGANIZACIONAL E SATISFAÇÃO DO COLABORADOR NO AMBIENTE DE TRABALHO: UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA DE CONFECÇÕES.........................................................107 Joseline da Silva Lilian Ester Winter SETREM PERCEPÇÃO DOS USUÁRIOS DE UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE DA FAMÍLIA SOBRE O PROCESSO TERAPÊUTICO...........................................120 Gabriela Fagundes Trentini Jacinta Spies Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber SETREM REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 HUMANIZAÇÃO NA SAÚDE COMO AÇÃO TERAPÊUTICA: ANÁLISE DE UM SERVIÇO DE ONCOLOGIA DO NOROESTE GAÚCHO ..................................131 Aline Josiele Follmann Paulo Fábio Pereira SETREM A ATUAÇÃO DA EQUIPE DE ENFERMAGEM NO ACOLHIMENTO DO PACIENTE EM DEPRESSÃO..................................................................142 Annelise Hübscher Trentini Maria Zoé H. Zimpel Solange de Castro Schorn Beatriz de Carvalho Cavalheiro SETREM O PESO ELEVADO AO NASCER INFLUENCIA NAS COMPLICAÇÕES DE SAÚDE NA INFÂNCIA.................................................................................153 Sofia Bronstrup Gisch Carlice Maria Sherer Beatriz Carvalho Cavalheiro SETREM ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DO HOMEM: UM DESAFIO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA............................................................................164 Aline Eduarda Maders Caroline Silveira Viana Carlice Maria Scherer Estela Maris Rossato SETREM REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 A INTERFERÊNCIA DOS CONFLITOS PROFISSIONAIS NA QUALIDADE DE VIDA DO TRABALHADOR PELO ATUAL SISTEMA DE TRABALHO Andreas Laurence Hirt 1 Cecília Smaneoto 2 Robson Weiss Machado 3 SETREM 4 RESUMO ABSTRACT O presente estudo considera, através de uma abordagem qualitativa, o envolvimento dos conflitos com o cotidiano das relações humanas de trabalho, considerando o modelo de sistema trabalhista em que estão inseridos, podendo estes, os conflitos, serem classificados como elementos que, se por um lado contribuem com o desenvolvimento das pessoas e organizações; por outro, podem também lhes causar sérios danos. Como a força que move as empresas é humana, o artigo buscou através da pesquisa bibliográfica e descritiva identificar as responsabilidades pela promoção, manutenção ou perda da qualidade de vida no trabalho. Sabe-se que qualquer transformação social apresenta passagens marcantes em algum momento da história, assim, também são exploradas as origens que levaram as relações humanas de trabalho ao cenário em que se encontram atualmente, identificados pela inovação e pelo capitalismo globalizado. This study considers, through a qualitative approach, the involvement of conflicts in human relations at work in the everyday life, considering the working system model in which they are inserted, so these conflicts could be classified as elements which, on the one hand, contribute to the development of people and organizations, on the other hand, they may also cause several damages. As the power which makes the company goes on is human, the paper aims at identifying the responsibilities by promotion, maintenance or life quality loss at work. It is known that any social transformation shows outstanding moments in any moment in history, thus, it is also explored the origins which guided the working human relations to the scenario where they are today, identified by the innovation and by the globalized capitalism. Keywords: Interpersonal conflicts. Working system and quality of life. Palavras-chave: Conflitos interpessoais. Sistemas de trabalho e qualidade de vida. 1 Bacharel em Educação Física da UNIJUÍ, pós -graduando do MBA em Gestão de Pessoas e Desenvolvimento de Talentos da SETREM. [email protected] 2 Mestra em Desenvolvimento pela UNIJUÍ, Administradora, Consultora, Professora e Coach, Orientadora do MBA em Gestão de Pessoas e Desenvolvimento de Talentos da SETREM. cissa@set rem.com.br 3 Mestra ndo em Desenvolvimento pela UNIJUÍ, Analista de Sistemas, Professor, INSF e Coach, [email protected] 4 Sociedade Educacional Três de Maio – Três de Maio – SETREM - Av. Santa Rosa, 2405 - Três de Maio - RS E-mail: [email protected] 5 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 atualmente. Os relacionamentos ocorrem mais intensamente nos locais nos quais as pessoas passam a maior parte do dia: empresas, organizações ou instituições. Do “nascimento” ao “túmulo”, a trajetória de existência dos conflitos profissionais provenientes das relações humanas ocorre nestes ambientes e vincula-se a um grande modelo de sistema de trabalho que interfere continuamente na qualidade de vida dos indivíduos que o compõe. Para compreender este sistema e os conflitos que através dele são gerados, é importante que se conheça suas origens e, se possível, seus limites, caso estes existam. Dessa forma, talvez seja possível descobrir se este modelo de sistema de trabalho ainda permite qualidade de vida, considerando que dentro dele tudo o que se faz ainda é pouco e deve-se fazer mais, sem que se considere o preço a pagar tendo em vista seu caráter aparentemente ilimitado de exigências. Neste âmbito, encontra-se o objetivo desta pesquisa: compreender quais e como acontecem os conflitos profissionais nas organizações, mensurando sua interferência na qualidade de vida do trabalhador. Para tanto, estará em voga o estudo das teorias sobre conflitos profissionais, qualidade de vida e sistemas de trabalho. Como resultado, almeja-se compreender os tipos de conflitos, sua forma de ocorrência e sua interferência na qualidade de vida dos trabalhadores. Por fim, pretende-se, através das teorias estudadas, explorar como o modelo de trabalho atual, pelos sistemas existentes, causam os conflitos e interferem na qualidade de vida. Por observação, percebe-se que não é mais somente o ambiente industrial de trabalho que vem sendo afetado pela necessidade de grande produtividade do trabalhador em seu turno laboral, também os indivíduos que exercem suas profissões em áreas educacionais e acadêmicas, de saúde, de prestação de serviços e diversas outras, são contínua e progressivamente exigidos a atingir seu desempenho. No entanto, o máximo parece não ser o suficiente, não se fala mais em “dar” tudo, e sim, em “dar” além, superarse. No intuito de encontrar estas respostas, propõe-se uma análise do atual modelo de sistema de trabalho e, para tanto, faz-se necessária uma revisão histórica para entender como se chega até aqui. INTRODUÇÃO O artigo buscou a compreensão dos conflitos organizacionais através de autores como Stephen Robbins (2002), o qual aborda a visão histórica de como os mesmos foram percebidos ao passar das décadas e como são vistos atualmente, estabelecendo uma classificação quanto a sua funcionalidade ou disfuncionalidade para o desenvolvimento do trabalho. Edina Bom Sucesso (2002) traz abordagem da qualidade de vida no trabalho a partir da corresponsabilidade de organizações e trabalhadores em busca da qualidade almejada. Atualmente, conflitos e qualidade de vida no trabalho estão intimamente ligados ao sistema de trabalho norteado pela inovação, o qual constantemente está presente a busca por novos, melhores e mais eficazes métodos de produção. Neste contexto, tarefas e processos (com forte contribuição dos avanços tecnológicos e pressão do capitalismo globalizado) elevam a competitividade a tal nível em que as questões humanísticas se tornam consideravelmente desvalorizadas. Tal enredo é descrito pelos autores Alan Cohen; Stephen Fink (2003), Jacob Gorender (1997), Isleide Fontenelle (2012) e Idalberto Chiavenato (2010) referenciados neste artigo. O artigo contempla um estudo teórico, privilegiando a pesquisa bibliográfica referente ao assunto. A interferência dos conflitos profissionais na qualidade de vida do trabalhador pelo atual sistema de trabalho pode ser percebida através de diversos modelos apresentados pelos autores consultados, os quais constituem a base de pesquisa para os autores deste trabalho. 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS Ao transcorrer dos séculos pode-se observar mudanças significativas na estrutura das relações sociais e de trabalho. A evolução destas, por via dos esforços nos estudos c i e n t í f i c o s , n o d e s e nvo l v i m e n t o d a s tecnologias e não obstante a criação e adequação de leis que regem as relações humanas fez surgir um cenário no qual uma gigantesca porção da população precisa trabalhar ou estudar em locais de convivência com outras pessoas. Relacionamento é tudo! Qualidade de vida através de interações com outros indivíduos constitui interessante e desafiador momento da sociedade 6 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 foi feita através da leitura e análise de estudos já publicados anteriormente em artigos, dissertações, livros e outra publicações, buscando “conhecer e analisar as contribuições culturais ou científicas do passado sobre determinado assunto, tema ou problema” (CERVO; BERVIAN; DA SILVA, 2007, p. 60). Como já mencionado acima, este estudo procura informações sobre assuntos já descritos anteriormente, sendo também por isso considerado pesquisa descritiva, definida por Cervo; Bervian; Da Silva (2007) da seguinte forma: 1.1 CAMINHO METODOLÓGICO Constituem os métodos utilizados para realização do presente estudo, caracterizados pelos seguintes elementos: abordagem, procedimentos e técnicas utilizadas. 1.1.1 Abordagem qualitativa Neves (1996, p. 1) orienta algumas características que julga essenciais para identificar este tipo de pesquisa: (1) Ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como instrumento fundamental. (2) O caráter descritivo. (3) O significado que as pessoas dão às coisas e a sua vida como preocupação do investigador. (4) Enfoque indutivo (NEVES, 1996, p. 1). A pesquisa descritiva observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los. Procura descobrir, com a maior precisão possível, a frequência com que um fenômeno ocorre, sua relação e conexão com outros, sua natureza e suas características. Busca conhecer as diversas situações e relações que ocorrem na vida social, política, econômica e demais aspectos do comportamento humano, tanto do indivíduo tomado isoladamente como de grupos e comunidades mais complexas (CERVO; BERVIAN; DA SILVA, 2007, p. 61). O tratamento metodológico do presente estudo recebeu a abordagem qualitativa. Para Neves (1996. p. 1), este tipo de abordagem “tem por objetivo traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo social”. 1.1.2 Procedimentos Movido pela busca do entendimento de um cenário de relações, pretende, o autor deste artigo, valer-se da pesquisa científica para tal. Cervo; Bervian; Da Silva (2007, p. 60) afirmam que “O interesse e a curiosidade do homem pelo saber levam-no a investigar a realidade sob os mais diversos aspectos e dimensões”. Dentre todos os aspectos possíveis de serem abordados pela pesquisa, cabe aqui ressaltar dois modelos muito utilizados; a pesquisa pura e a pesquisa aplicada. A primeira, utilizada nesta obra, visa à aquisição do conhecimento sobre determinado assunto para obtenção de um reposicionamento sobre o mesmo. Já a segunda, citada apenas para fins de diferenciação, procura através de ações práticas modificar algo baseado no resultado de sua pesquisa (CERVO; BERVIAN; DA SILVA, 2007, p. 60). Para Cervo; Bervian; Da Silva (2007, p. 60) “Qualquer espécie de pesquisa, em qualquer área, supõe e exige uma pesquisa bibliográfica prévia”. Assim, este artigo também se caracteriza como pesquisa do tipo bibliográfica, sendo que sua fundamentação Por último, o artigo é classificado ainda como pesquisa exploratória, considerando que não foram traçadas hipóteses; mas sim, estabelecidos objetivos e realizada a busca de informações sobre o assunto abordado, culminando com o estreitamento da relação e conhecimento acerca do mesmo, possibilitando assim, uma nova percepção do tema e dos fatos correlacionadas a ele (CERVO; BERVIAN; DA SILVA, 2007). 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA O tema qualidade de vida do trabalhador possui sua amplitude significativa substancialmente disseminada nas diferentes interpretações decorrentes do olhar aguçado e da realidade de cada pesquisador ou estudioso do assunto. Em se tratando da interferência 7 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 dos conflitos profissionais oriundos dos relacionamentos profissionais e moldados no modelo de sistema de trabalho, faz-se necessária a elaboração teórica argumentativa a fim de contemplar a complexidade envolta no tema em estudo. 2 . 1 I N O VA Ç Ã O E A N O VA FA S E D O CAPITALISMO Atualmente o meio organizacional tem seu discurso fortemente direcionado ao tema inovação. Os indivíduos estão constantemente sendo estimulados a fazer de forma diferente, sendo inerente ao ser humano o gosto pelo reconhecimento e pela valorização, fazendo-se necessário sair da mesmice, como afirma Fontenelle (2012): “as organizações estão vivendo o fenômeno da neofilia, o culto ao novo”. Tal tendência tem respaldo na evolução dos meios de produção e busca pela lucratividade, como relata o mesmo autor: “como os meios tradicionais de transformação organizacional e de maximização do lucro têm se mostrado insuficientes ou falhado completamente, o capitalismo se voltou para a ideia de que o velho é ruim, sendo o novo sempre melhor”. Fontenelle (2012) faz uso das ideias de Schumpeter (1982) quando este afirmou que a invenção se diferencia da inovação; “enquanto a primeira é a criação de ideias, e a segunda é a que permite que tais ideias sejam postas em funcionamento”, sendo que inovar sempre foi de grande importância para a afirmação e manutenção do sistema capitalista. No entanto, o cenário socioeconômico atual elevou o modelo capitalista a outro patamar: em constante mudança. Dentro deste contexto, gerado pelo modelo capitalista, fezs e n e c e s s á r i a a c r i a ç ã o d e d i ve r s o s mecanismos de controle humano, como argumenta Fontenelle (2012, p. 102 apud DIAS-ISENRATH, 2008): “os redutos das diferentes profissões passaram a ser atravessados por técnicas destinadas a exercer um controle da autoridade, notadamente as técnicas orçamentárias, de contabilidade e auditoria”. Observa-se que os elementos que tornam a questão do controle das ações do trabalhador tão complexas, podem estar na dificuldade de sua delimitação. Os elementos de controle (cálculo, monitoramento, avaliação) podem ser utilizados concomitantemente desde que a situação exija como é o caso de um procedimento médico ou a viabilidade de um departamento universitário (FONTENELLE, 2012 apud ROSE, 1996). Neste ínterim, surge o questionamento em relação a quais cenários devem ser aplicados, bem como o grau de necessidade, importância e possibilidade de execução do controle de ações em detrimento ao rendimento do trabalhador. 2.2 O PAPEL DA GLOBALIZAÇÃO Quando Alexander Graham Bell obteve a patente pela criação do telefone há mais de um século, talvez não imaginasse as inúmeras possibilidades e o impacto de sua invenção. O surgimento do computador em meados do século XX e logo após o aparecimento da Internet na década de 1960 – em meio às necessidades e a desafios militares instigados pela Guerra Fria entre Estados Unidos e a antiga União Soviética – causaram grandes transformações mundiais. Ao invés de meses, semanas ou dias para saber no Brasil o que acontece no Japão ou em qualquer outro lugar do mundo, bastam alguns segundos, quando não em tempo real, para visualizar ou ouvir sobre qualquer assunto que tenha ocorrido no Planeta, ou até mesmo fora dele (INFOESCOLA, 2012). Este processo de criação de ferramentas que facilitam a comunicação e a organização de pessoas e instituições do mundo todo foi chamado de revolução tecnológica, e seu papel foi determinante nas transformações sofridas pelo sistema capitalista mundial a tal ponto que houve a necessidade de se criar um conceito para a melhor aplicação e entendimento deste processo, surgindo assim, a chamada globalização. [...] a inovação continua sendo vital para o capitalismo contemporâneo e que estamos diante de uma nova etapa do desenvolvimento capitalista, produto da terceira revolução tecnológica que transformou o trabalho do conhecimento na principal f o r ç a p r o d u t i va (FONTENELLE, 2012, p. 101). A administração do trabalho e dos trabalhadores, ainda mais quando este está voltado para processos de inovação, parece não ser tarefa simples, já que o cenário está 8 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Para Gorender (1997 apud SCHAFF, 1993 e COUTINHO, 1995): Este quadro foi agravado nos anos 80, quando os microprocessadores e a automação eletrônica foram inseridos nas linhas de montagem, tornando o fordismo inadequado para acompanhar o modelo de produção da época, sendo necessária sua substituição por um sistema mais compatível com as necessidades das indústrias (GORENDER, 1997, p. 313). No período pós 2ª Guerra Mundial, muitas indústrias no Japão estavam desestruturadas e sem condições de efetuar investimentos em matéria-prima para reativar a produção. Como alternativa de solução, e n g e n h e i r o s d a To y o t a ( e m p r e s a automobilística) visitaram as montadoras norte-americanas para analisar o sistema de produção. Perceberam elevado nível de desperdício e de estoque de matéria-prima e desenvolveram um sistema produtivo que viria a ser chamado de “produção enxuta”: surge o sistema Just in Time (JIT). Esta “alternativa japonesa” chama a atenção de outros países como meio de organização do t ra b a l h o . L e va n d o e m c o n t a q u e a substituição de um modelo por outro acarreta mudanças, Gorender (1997) adverte sobre as consequências da transformação do sistema capitalista mundial no âmbito social, afetando as ideologias, estilos de vida e comportamentos individuais, bem como a luta de classes. Tais mudanças provenientes do estudo científico e das inovações tecnológicas modificam e intensificam as relações do comércio mundial. O cenário de relações mercantis japonês apresentava uma diferença bastante acentuada em relação ao americano, com um mercado consumidor ainda mais limitado. Para tanto, foi necessário que se pensasse um modelo inverso ao de produção em larga escala, como acontecia no fordismo, e que se enquadrasse em custos baixos sem perder a qualidade do produto. Assim, o modelo de produção enxuta estimulava e exigia que os trabalhadores tivessem um perfil diferenciado do vigente, o qual apresentava funcionários nas esteiras de montagem ditos “tarefeiros” que exerciam encargos repetitivos em que não eram estimulados a pensar. Para o bom andamento do sistema japonês, o perfil dos trabalhadores deveria ser dinâmico, com domínio de várias competências e desenvolvimento de habilidades polivalentes. Desta forma, o trabalho se torna mais [...] as transformações no sistema capitalista mundial decorrem da recente revolução tecnológica em vários âmbitos, mas, sobretudo, na informática e telecomunicações. Seus efeitos são observados na organização das empresas, nos métodos de produção, nas relações de trabalho e na política financeira dos governos (GORENDER, 1997, p. 311). Para entender o presente e ter capacidade de projetar o futuro faz-se necessária a análise do passado. O “fordismo”, desenvolvido por Henry Ford nos Estados Unidos no começo do século XX, traz grandes contribuições para a compreensão do atual sistema de produção, pois buscou (dentro da indústria automobilística) a substituição do sistema de produção artesanal pelo método científico de trabalho que visava à produção em massa com o menor custo possível. Contudo, para seu melhor ajustamento, foi necessária sua associação ao princípio “taylorista” (Taylor – administração científica) para distinguir o trabalho intelectual do trabalho manual. Com isso, foi possível manter a produção em larga escala a custos baixos, já que a maior parte d o s t ra b a l h a d o re s p o d i a s e r m e n o s qualificada; consequentemente, com mão de obra mais barata. No entanto, mesmo com a intervenção do Estado norte-americano, a crescente produção não foi acompanhada pela incapacidade de absorção dos produtos em um mercado consumidor com dimensões limitadas. A saída encontrada foi de abrir indústrias em outros países com mercado capaz de absorver a demanda produtiva. Associada â questão de limitação do mercado interno, havia outros entraves: a desmotivação dos operários, altos índices de abandono de trabalho, elevada rotatividade nos empregos, absenteísmo elevado, alcoolismo, fraco empenho nas tarefas e d i f i c u l d a d e d e a d a p t a ç ã o à s n o va s tecnologias. Esta última vinha na contramão da evolução da tecnologia (década de 70) representada por robustas máquinas necessárias à produção de um novo produto. 9 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Elementos negativos para os trabalhadores também estão presentes neste novo sistema de produção. A redução dos custos de produção oriunda do JIT trouxe como consequência a diminuição do número de empregados e aumento no volume de tarefas dos que continuavam trabalhando. Como se não bastasse, o JIT exigia ainda uma sincronia na execução das tarefas em um determinado intervalo de tempo não apenas entre os funcionários e setores da empresa, mas também entre fábrica e fornecedores. O enfoque proposto por Gorender (1997) destaca que o JIT exige uma readequação dos fornecimentos de matéria prima, solução de problemas de logística e de rigoroso ajuste entre fábrica e fornecedores. A interconexão entre os elementos de produção (fornecedores – fábrica – clientes) tornava-se ainda mais necessária e precisa. Revisada a questão histórica, volta-se o o l h a r p a ra o p e r í o d o a t u a l e d u ra s constatações podem ser feitas em relação ao mundo capitalista globalizado. A tecnologia e inovação podem aproximar pessoas que se encontram a longas distâncias e ao mesmo tempo afastar quem está ao lado. Tal fato pode ser percebido em “relações familiares modernas” em que cada indivíduo fica horas conectado a seu notebook, ocorrendo a redução massiva do diálogo familiar. Outra perspectiva negativa do avanço tecnológico está na redução da necessidade de se ter o trabalhador, na medida em que o trabalho é dinamizado pela tecnologia. O trabalhador não é mais senhor de si, é um produto moldado pelas empresas que estão cada vez mais poderosas, migrando de lugar para outro, sem se importar com os que ficam e como ficam, sendo que o importante é o lucro. Logo, este processo globaliza as empresas, m a s n ã o g l o b a l i z a o t r a b a l h a d o r, principalmente os empregados de classes economicamente inferiores que passam a ser mais pobres enquanto que os de classe alta se tornam ainda mais ricos (SMANEOTO; DOCKHORN, 2010). Considera-se ainda que não há mais a necessidade dos mandatários, executivos e diretores estarem presentes no ambiente de trabalho, já que as decisões podem ser tomadas em qualquer lugar e informadas aos funcionários encarregados de administrar os processos das empresas no formato on-line de tomada de decisão. Neste contexto, destaca- interessante na medida em que o trabalhador se sente como importante integrante do processo de produção, estimulando o trabalho em equipe e permitindo que cada trabalhador operasse várias máquinas ao mesmo tempo (GORENDER, 1997). Dentre as mudanças oriundas do JIT, destaca-se a extinção ou redução de pessoal em alguns setores, como o de reparos, já que não era preciso profissionais especializados para a função enquanto a própria equipe seria responsável pela qualidade da produção. A pluralidade de funções e de tarefas realizadas por um único trabalhador teve como consequência a redução de pessoal e acúmulo de funções. O JIT traz como características: autoinspeção, inspeção automatizada e Empowerment na linha de produção. O Empowerment visa dar poder às pessoas, ou seja, compartilhar o poder dentro da empresa tornando cada pessoa responsável pelas decisões e pelo resultado. Como o próprio conceito da palavra ( Empowerment = empoderamento) “empoderar” é dar poder e autonomia aos funcionários para aproveitar ao máximo o seu talento coletivo. Bem mais do que um sistema de produção diferenciado, o JIT constitui uma filosofia global de produção que trata desde a conservação do ambiente até a produção final, iniciando com a arrumação, limpeza, asseio e distribuição das decisões entre a equipe. Dentre as contribuições dos JIT, pode-se destacar: o maior cuidado e responsabilidade de cada trabalhador com o ambiente de trabalho, a mudança da lógica convencional (produzir para despois vender – produção empurrada) para a lógica da “produção puxada” (vender para depois produzir), dar poder às pessoas, motivar os colaboradores, desenvolver habilidades e treinar a liderança ( C H I AV E N AT O , 2 0 1 0 ) . C o m o f a t o r significativo, percebe-se o foco na qualidade, pois a redução do estoque exige maior qualidade das matérias primas existente. Para viabilidade da produção deve-se trabalhar com uma programação mensal firme de produção, pois não significa trabalhar sem estoque, mas sim trabalhar com estoques mínimos, reduzindo custos e desperdício de matéria prima. No JIT deve-se produzir o que é necessário, quando é necessário, nada mais. A partir destes elementos, o JIT tem como um d o s p r i n c i p a i s o b j e t i vo s a u m e n t a r a competitividade da empresa. 10 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 se o processo analítico on-line (OLAP) que se caracteriza por um conjunto de ferramentas de software que permitem a gerentes e analistas avaliar e manipular grandes volumes de dados consolidados e avaliados de várias perspectivas. Sem esta interatividade, ficam relegadas as preocupações e compromissos com o social, com o bem estar e qualidade de vida da comunidade local no qual a empresa está inserida, pois, decisões a distância são fáceis de serem tomadas e seus mentores estão isentos da pressão ou comoção social direta gerada por suas decisões. Smaneoto; Dockhorn (apud SANTOS 2010, p. 1) sugerem que para uma melhor compreensão do processo de globalização é preciso que se pensem três mundos em um só: “(1) O mundo tal como nos fazem crer: A globalização como fábula; (2) O mundo como é: A globalização como perversidade; (3) O mundo como pode ser: Outra globalização”. A primeira concepção seria de um mundo em que o discurso de que a globalização é necessária, inevitável, de que é preciso adaptar-se a ela e de que as relações evoluem, seria apenas uma ilusão em benefício dos interesses do império capitalista. A segunda percepção traz a globalização como causa e agravante dos problemas sociais no âmbito das necessidades e relações humanas. Por último, a terceira consideração atenta para que uma possível mudança nos objetivos inicialmente propostos pela globalização possa fazer que se desencadeie, pela união das massas populacionais, a utilização dos processos globais em benefício da humanidade, priorizando a valorização dos s e re s h u m a n o s e m s e u s c a ra c t e re s emocionais e físicos, dando o valor adequado e não exagerado à lucratividade econômica (SMANEOTO; DOCKHORN, 2010). 2.3 SISTEMAS DE TRABALHO Quando abordado o conceito de sistema, é possível se chegar a uma definição simplista ao dizer que o mesmo é a junção de elementos que se correlacionam entre si e que determinam as diretrizes de certas ações; no entanto, sua aplicação é abrangente e sua compreensão ainda mais difícil. Fernandes (2003, p.1) destaca que: “[...] um sistema pode ser definido com um conjunto de elementos inter-relacionados que interagem no desempenho de uma função”. Diz ainda que sua “definição é tão abrangente que pode ser usada em uma grande variedade de contextos, como por exemplo: sistema econômico, sistema solar, sistema digestivo, etc” (FERNANDES, 2003, p. 1). O desafio das relações dentro de um sistema qualquer pode ter suas origens nas decisões e atitudes geradas pelos indivíduos que o constituem, já que, dentro deste, qualquer ação que se tome irá incidir sobre todos, seja de forma mais ou menos contundente, podendo ainda se manifestar em forma de ganhos ou de perdas. No entendimento de Cohen; Fink (2003) a interligação de elementos mutuamente interdependentes constitui um sistema, ou seja, o agente que deu origem a uma ação qualquer não apenas será o autor da mesma como também será afetado por ela. Além disso, a interdependência mútua determina que uma alteração em um ou em todos os elementos provoca alguma mudança correspondente nos demais. Estes, por sua vez, terão impacto no elemento originalmente alterado. Dentro de um contexto profissional, pode-se tomar, por exemplo, um empresário que decide pela demissão de um funcionário. Sua decisão poderá sobrecarregar os demais empregados que terão que assumir as funções do colega desligado. Ao assumir mais funções, estes trabalhadores podem ainda comprometer o melhor rendimento em suas atividades diárias, impactando sobre o desempenho e resultados da empresa a qual pertence ao próprio empresário - agente causador da situação. 2.4 SISTEMAS DE TRABALHOS NOS DIAS ATUAIS A lógica do atual modelo de sistema de trabalho parece estar voltada para a maior produtividade do trabalhador no menor tempo possível – com implicações diretas no gradativo aumento do volume de funções e/ou tarefas a serem realizadas por um grupo cada vez menor de pessoas. Chiavenato (2010, p. 200) explica que “[...] a década de 1990 trouxe uma série de imposições externas que pressionaram as empresas a serem mais leves, ágeis e enxutas”. Ainda, segundo o autor, a globalização seria a causa mais impactante no desenvolvimento deste quadro, já que, para as empresas se manterem competitivas no mercado, houve a 11 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 indivíduos no seu ambiente de trabalho. 2.5 CONFLITOS ORGANIZACIONAIS A complexidade de um sistema de trabalho, com suas mais diversas formas de execução, controle e inovação de processos, juntamente com as atitudes e percepções dos trabalhadores que integram este sistema, torna-o terreno fértil para o aparecimento de conflitos. Neste ínterim, existem diversos tipos de conflitos; no entanto, para manter o foco nos objetivos inicialmente propostos, será apresentada apenas a dimensão que envolve conflitos oriundos da interação entre indivíduos ou instituições, estando o campo dos conflitos íntimos e pessoais relegados a uma possível futura abordagem. Para que um conflito exista, é necessário que haja interação entre duas partes envolvidas. Além disso, ambas precisam divergir sobre alguma posição ou entendimento qualquer quando uma delas sente que está sendo ou que poderá ser afetada de maneira negativa pela outra em algo considerado importante. Também é necessário que esse contraponto seja percebido por ambos, do contrário, ou quando apenas uma das partes está ciente do desacordo, pode-se afirmar que o conflito não se estabeleceu ou ainda que não exista. No entendimento de Robbins (2002) a definição de conflito possui alguns elementos determinantes: necessidade de unificação ou extinção de departamentos, diminuindo assim o número de colaboradores e ainda a redução de níveis hierárquicos. Em outro direcionamento, Chiavenato (apud DRUCKER 2010, p. 200), alerta que “[...] cada nível adicional de gerência tende a cortar pela metade a possibilidade de as informações serem transmitidas corretamente”, o que explicaria parte da redução de pessoal em nível gerencial de forma coerente. Este argumento é reforçado quando se considera fundamental que a gerência saiba o que cada colaborador faz – dentro de suas funções – para agregar valor à empresa, o que se torna mais viável em um modelo de gerência aberto; para tanto, um número elevado de áreas, cada uma com seu gerente, estaria na contramão deste processo. Neste contexto, surge uma tendência empresarial de reforçar os programas de treinamento dos colaboradores a fim de desenvolver habilidades necessárias ao trabalho, além de modificar a habitual gerência estreita e fechada por uma nova modalidade de gestão, alicerçada em uma cultura forte e compartilhada. Outro aspecto importante vinculado ao sistema de trabalho nos dias atuais diz respeito ao uso da tecnologia e layout para a i n t e ra t i v i d a d e d o s t ra b a l h a d o re s . A tecnologia estaria associada à forma pela qual o trabalho é realizado envolvendo suas mais diversas funções e etapas, seus processos, sua sequência, seu ritmo, seus prazos, o funcionamento e desempenho das máquinas, o controle dos estoques, etc. Já o layout referencia sobre a disposição dos objetos, pessoas e espaços para fins de eficácia do trabalho. Cohen; Fink (2003) defendem um posicionamento de influência tanto da tecnologia quanto do layout no comportamento dos trabalhadores dentro de uma empresa. Tais argumentos têm como premissa o fato de que esta influência (tecnologia e layout) determinam mudanças na quantidade de atenção individual, grau de interação, comunicação e cooperação exigidas para um trabalho moderno. Desta forma, as restrições impostas por este modelo afetam três elementos importantes: quem pode, quem deve ou quem não tem de interagir com quem e quando. Assim, tanto a tecnologia quanto o layout colocam limites às interações sociais e ao comportamento dos Engloba um amplo escopo de conflitos experimentados pelas pessoas nas o r g a n i z a ç õ e s – incompatibilidade de objetivos, diferenças de interpretações dos fatos, desacordos baseados em expectativas de comportamento e assim por diante. Finalmente nossa definição é suficientemente flexível para incluir todos os níveis de conflitos – dos atos explícitos e violentos até as formas mais sutis de desacordo (ROBBINS, 2002, p. 374). Historicamente existem conceituações diferentes de conflito. Por volta das décadas de 30 e 40 a chamada visão tradicional afirmava que os conflitos nas organizações eram sempre ruins e deveriam ser evitados, 12 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 2.6 QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO A exemplo da globalização, dos sistemas e dos conflitos, falar em qualidade de vida é tão complexo quanto, já que sua manifestação se dá em diversos âmbitos, podendo ser atribuída ao relacionamento no seio familiar e ambiente profissional, a forma de alimentação, a maneira como acontecem as relações em sociedade, as atividades físicas que são praticadas ou expectadas, ao acesso ou não a médicos e medicamentos, a possibilidade de viajar e conhecer outros lugares, participar ou não de eventos culturais e de lazer, o acesso à educação, a forma como se lida com conquistas e decepções, expectativas e objetivos. A partir desta base, Sucesso (2002, p. 30) revela sua concepção “[...] as diversas configurações da qualidade de vida mostram a complexidade de sua promoção. Viver com qualidade envolve a integração de enorme rede de atores sociais, com múltiplas demandas, de difícil equacionamento”. A orientação de Cavassani; Cavassani; Biazin (2006, p. 3 apud VASCONCELOS) para o contexto profissional é no sentido de que da qualidade de vida no trabalho ocorre a partir do momento em que se olha a empresa e as pessoas como um todo (enfoque biopsicossocial). Nos tempos contemporâneos, percebe-se claramente que as organizações estão cada vez mais preocupadas com a qualidade de vida de seus trabalhadores que passam mais tempo nas empresas do que com as próprias famílias. No entanto, o sistema de dependência mútua trazido pela globalização, e já mencionado anteriormente, também fez com que as tarefas e os processos de um trabalhador tenham que ser concluídos para que o próximo possa dar continuidade a seu trabalho; junte-se a isso o avanço tecnológico e obtém-se um cenário no qual se algo não pode ser concluído durante a jornada de trabalho, certamente poderá e deverá ser terminado em casa ou em qualquer lugar em que se esteja desde que haja um computador ou telefone celular à mão, o que pode ser um entrave para a promoção da qualidade de vida (CAVASSANI; CAVASSANI; BIAZIN, 2006). As empresas têm buscado mecanismos de promover a qualidade de vida através da tentativa de uma melhor organização com a divulgação de seus objetivos e missão de forma clara, pois seriam frutos da falta de confiança, falta de comunicação, falhas dos métodos de controle dos administradores, falta de atenção e menosprezo ou desconsideração entre os indivíduos nas organizações. Ao final da década de 40 até meados de 70, a visão tradicional foi substituída pela visão das relações humanas em que se preconizava que os conflitos são elementos naturais das relações humanas e que por isso não poderiam nem deveriam ser eliminados. Por fim, eis que surge a visão interacionista estabelecendo que o conflito devesse ser estimulado pelas gerências das organizações, já que sua ausência poderia criar um ambiente de trabalho pouco dinâmico, com trabalhadores acomodados, o que viria de encontro aos processos de inovação exigidos pelo modelo capitalista globalizado (ROBBINS, 2002). Para o mesmo autor “[...] fica evidente que dizer que todos os conflitos são bons ou ruins é uma afirmação ingênua e inapropriada. O que torna um conflito bom ou ruim é sua natureza.” Ainda dentro da visão interacionista, encontra-se outra subdivisão dos conflitos entre aqueles que são prejudiciais às relações dos grupos de trabalho; vindo assim em prejuízo de seu desempenho e os que, por outro lado, seriam capazes de estimular a capacidade produtiva dos grupos. Ao primeiro chamou-se conflito disfuncional, sendo o segundo definido como conflito funcional. A distinção entre um conflito funcional ou disfuncional, vincula-se a sua natureza, preexistindo três dipos:“O conflito de tarefa está relacionado com o conteúdo e os objetivos do trabalho. O conflito de relacionamento se refere às relações interpessoais. O conflito de processo relaciona-se à maneira como o trabalho é realizado” (ROBBINS, 2002, p. 375). De modo geral, apenas os conflitos de relacionamentos parecem estar dentro do grupo disfuncional, sendo que estes dificilmente trarão algum benefício para as empresas e seus colaboradores dentro de seu sistema de trabalho interdependente em que os indivíduos precisam cooperar uns com os outros para a obtenção dos melhores resultados em favor das organizações. Já os conflitos de tarefas e de processos, quando situados a patamares moderados, são considerados de ordem funcional, pois possibilitam a discussão de ideias e favorecem assim a inovação do trabalho. 13 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 CONCLUSÃO Diante do tema abordado e das contribuições dos autores consultados julgase que os objetivos foram alcançados, na medida em que foi possível, através do estudo das origens históricas que ajudaram a estabelecer o atual modelo de sistema de trabalho, caracterizado como capitalista globalizado e baseado nos processos de inovação contínua compreender quais os tipos de conflitos, sejam eles de tarefa, de processo ou de relacionamento e ainda como acontecem atualmente, de forma claramente identificada na visão interacionista em que estes podem, inclusive, ser estimulados para que os trabalhadores não entrem em uma zona de conforto que poderia prejudicar o desempenho do trabalho, como mencionado no capítulo 2. No que tange à questão da qualidade de vida no trabalho, parece estar cada vez mais difícil, mas, por enquanto, ainda é possível tê-la, pois as empresas têm se mostrado interessadas no bem estar de seus funcionários, mesmo que o móvel destas não esteja totalmente claro, seja por realmente querer o bem do ser humano ou querer o ser humano bem para aumentar o lucro da empresa, com uma maior propensão atual para a segunda afirmativa. Pode-se dizer que ambos são vítimas do atual modelo de sistema de trabalho, com a empresa tendo que se adaptar para sobreviver em um mercado cada vez mais competitivo e impiedoso, e o trabalhador necessitando do emprego para suprir adequadamente suas necessidades de vida em sociedade. A manutenção da qualidade de vida deve ser uma responsabilidade dividida, sendo que muitas empresas procuram fazer sua parte oferecendo programas de desenvolvimento pessoal e profissional. O trabalhador, por sua vez, deve estar disposto também a fazer seu papel, participando com interesse e afinco dos programas disponibilizados. Ao final deste artigo, verifica-se que foi possível a compreensão do atual modelo de sistema de trabalho, baseado nos sistemas de inovação que tem facilitado muitas tarefas e processos no dia a dia de trabalho, e que, em c o n t ra p a r t i d a , t a m b é m t ro u xe ra m o crescimento de volume do mesmo, já que houve o aumento substantivo das responsabilidades e funções de cada empregado; contudo, o tempo para a treinamento para que seus trabalhadores se desenvolvam, buscando a melhoria dos processos, permitindo mais responsabilidade e autonomia aos funcionários, ofertando promoções de cargo, investindo em tecnologia, dispensando de forma ética os funcionários que não se adaptam ao andamento da mesma, remunerando de forma adequada e diminuindo as diferenças salariais excessivas entre os cargos. Isto tudo, e mais, se dá principalmente através de palestras, cursos, debates, reuniões, vídeos, etc. Mesmo assim, diante das mais diversas expectativas de cada trabalhador, talvez os interesses individuais possam não ser contemplados (SUCESSO, 2003). Neste caso, as atribuições devem ser divididas, já que o indivíduo tem grande responsabilidade por sua própria qualidade de vida, já que a conquista da almejada qualidade de vida, em sua intimidade, depende do próprio indivíduo, a partir de elementos por ele determinados: valor que atribui à vida, autoestima e autoimagem, engajamento profissional, político e social. Dentro desta concepção, em que trabalhador e empresa são coautores do desenvolvimento da qualidade de vida, Sucesso (2003) orienta que: A empresa contrata a força de trabalho e pede resultados, lealdade e envolvimento. O homem busca remuneração justa e adequada, espera convivência sadia e oportunidade de crescimento. Essas expectativas afetam diretamente a análise da qualidade de vida nas organizações (SUCESSO, 2003, p. 34). Apesar de tudo, é válido mencionar que ainda existem muitas empresas que não foram “iluminadas” por esta ideologia de melhorar a qualidade de vida de seus trabalhadores e um grande número ainda mantém estes avanços apenas no campo discursivo. Por outro lado, parte considerável de trabalhadores não aproveitam as oportunidades oferecidas pelas empresas para seu desenvolvimento pessoal e profissional. 14 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 interessados em melhor compreender de que forma os conflitos profissionais interferem na qualidade de vida dos trabalhadores para que, através da reflexão argumentativa, possam ser propostas novas alternativas para solucionar os conflitos prementes, melhorando a qualidade de vida a despeito de toda a interferência proveniente dos avanços tecnológicos e novos modelos de gestão. execução permanece inalterado, isto é, como os processos são realizados mais rapidamente, o trabalhador deve agora fazer muitas atividades no mesmo tempo que se dispunha anteriormente. A dificuldade está em estabelecer um limite para o volume de trabalho realizado já que a inovação parece ser contínua. A pesquisa bibliográfica possibilitou ainda uma localização histórica e percepção das origens dos conflitos profissionais atuais que estão associados diretamente com o capitalismo globalizado em que as empresas rapidamente se transferem para locais nos quais as possibilidades de lucro são maiores, não se importando mais com as pessoas que não poderão acompanhar a mudança. Também consequência dos processos globais e seus avanços tecnológicos, as fusões de empresas, com as grandes instituições absorvendo as de menor porte, contribuíram para a criação de um cenário em que as decisões empresariais não são mais presenciais, os empresários não conhecem e nem convivem com seus funcionários, administram de longe acompanhando e avaliando o trabalhador apenas pela frieza dos números descritos em seus relatórios de produção. Isto faz lembrar a história do cavalo e do porco, na qual o cavalo estava doente em sua baia e por recomendação do veterinário ao seu dono, deveria ser sacrificado caso não melhorasse em três dias. Ao lado de sua baia ficava o chiqueiro do porco que ouviu a conversa do fazendeiro com o veterinário. Por três dias o porco foi o maior motivador e incentivador do cavalo, sem o qual, não se recuperaria. Passado o prazo indicado pelo veterinário, graças ao porco, o cavalo estava de pé e bem, o fazendeiro feliz pela recuperação de seu valioso animal que lhe traria muitos lucros, resolveu fazer uma festa e mandou matar o porco. Através das análises acima associadas a esta fábula, ficam evidentes os riscos e também as injustiças que nascem do processo de globalização e, por consequência, os possíveis conflitos que são gerados através dele (PLANETA EDUCAÇÃO, 2012). Diante da complexidade, dinamismo e necessidade de constante atualização acerca dos temas tratados, sugere-se que no momento oportuno mais pesquisas possam ser feitas por acadêmicos e profissionais REFERÊNCIAS CAVASSANI, Amarildo Pereira; CAVASSANI, Edlene Barbieri; BIAZIN, Celestina Crocetta. Qualidade de vida no trabalho: fatores que influenciam as organizações. 2006. D i s p o n í v e l e m : <http://www.simpep.feb.unesp.br/anais/an ais_13/artigos/ 784.pdf>. Acesso em: 27 Mai 2012. CERVO, Amado L.; BERVIAN, Pedro A.; DA SILVA, Roberto. Metodologia científica. 6. ed., São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. CHIAVENATO, Idalberto. Gestão de pessoas: o novo papel dos recursos humanos nas organizações. 3.ed., Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. COHEN, Alan R.; FINK, Stephen L. Comportamento organizacional: conceito e estudos de caso. Tradução: Maria José Cyhlar Monteiro. 3º reimpressão, Rio de Janeiro: Campus, 2003. FERNANDES, Jorge H. C. O que é um sistema. 2003. 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Relações interpessoais: e a qualidade de vida no trabalho. – Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. 16 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 A UTILIZAÇÃO DO CUSTEIO POR ABSORÇÃO PARA A FORMAÇÃO DE PREÇO DE UMA INDÚSTRIA DE ESQUADRIAS METÁLICAS Plínio Fredolino Unfer Yara Heck Alexandre Chapoval Neto SETREM 1 2 3 4 RESUMO ABSTRACT Diante das diversas teorias pesquisadas, identificou-se que muitas empresas não apuram seus custos e despesas de maneira precisa e os preços de venda são obtidos empiricamente. Ao conhecer a realidade da empresa em estudo foi possível confirmar tais teorias. Por essas razões este trabalho de conclusão de curso realizado em uma empresa de esquadrias em alumínio situada no município de Boa Vista do Buricá – RS teve como objetivo apurar e analisar o preço de custo e os tipos de custos de determinados produtos de alumínio, para propor um sistema científico de custeio para formação de preço de custo do produto, visando o seguinte problema de pesquisa: qual a interferência dos custos e despesas no preço final dos produtos? Quanto ao caminho metodológico, optou-se pelas abordagens dedutiva, quantitativa e qualitativa. Sendo dedutivo, o embasamento teórico de estudos já realizados, utilizando as principais teorias referentes ao tema proposto com os objetivos específicos. Quantitativa, estão nos valores levantados e identificados como responsáveis pela formação do preço. E qualitativa, as interpretações e discussão dos resultados obtidos. Quanto aos procedimentos, é uma pesquisa exploratória, sendo também um estudo de caso. Na coleta de dados foram utilizadas algumas técnicas sendo: ferramenta da qualidade diagrama de Pareto para identificar os três produtos principais de industrialização e usá-los no desenvolvimento da pesquisa; como também o fluxograma de processo para melhores explicações, inclusive visitas à empresa realizando entrevistas. Os objetivos traçados foram todos alcançados, resultando na sugestão para os gestores da empresa o uso do sistema de custeio por absorção para a formação do preço de custo dos produtos, tendo em vista sustentar de forma saudável a gestão financeira da mesma. Acredita-se que por meio deste, como nova forma de apurar o preço de custo dos produtos fabricados, serão os primeiro passos de evolução na gestão empresarial, referindose da importância de controles e registros de custos para adotar um método de custeio na formação dos preços. In front of a lot of theories surveyed, it was identified that many companies do not report their costs and expenses accurately and selling prices are obtained empirically. By knowing the reality of the company under study it was possible to confirm these theories. For these reasons this conclusion course work conducted in a company of aluminum frames in the city of Boa Vista do Buricá - RS aimed to determine and analyze the cost price and the costs of certain types of aluminum products, to propose a scientific system of funding for training cost price of the product, targeting the following research problem: what is the interference of the costs and expenses in the final price of products As for the methodological approach, it was opted for deductive, quantitative and qualitative approaches. It is being deductive, the theoretical basis of previous studies, using the main theories concerning the proposed topic with specific objectives. Quantitative, the values are obtained and identified as responsible for the pricing. And qualitative, the interpretations and discussion of the results obtained. As for the procedures, it is an exploratory research and it is also a study case. In the data collection some techniques were used as: quality tool Pareto chart to identify the three main products of industrialization and use them in the development of research, also with the process flowchart for better explanations, including visits to the company conducting interviews. The objectives were all achieved, resulting in the suggestion to the managers of the company using the system of absorption costing for the formation of the cost price of products in order to sustain a healthy financial management of the same. It is believed that through this, as a new way of determining the cost price of the products produced are the first steps of evolution in corporate management, referring to the importance of cost controls and records to adopt a costing method in training prices. Palavras-chave: Formação do preço de custo. Custeio por absorção. Gerenciamento dos custos. Keywords: Training cost. Absorption costing. Cost management. 1 Acadêmico do curso de Bacharelado em Administração. E-mail: [email protected] Acadêmica do curso de Bacharelado em Administração. E-mail: [email protected] 3 Professor Ms orientador do trabalho de conclusão do curso de Bacharelado em Administração. E-mail: [email protected] 4 Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM; Av. Santa Rosa, 2405, Três de Maio – RS. E -mail: E-mail: [email protected] 2 17 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO O presente estudo trata da utilização do custeio por absorção para a formação de preço de custo adaptado a uma indústria de esquadrias metálicas (alumínio) situada no município de Boa Vista do Buricá – RS, com o intuito de responder à seguinte problemática: qual a interferência dos custos e despesas no preço final dos produtos? Tendo como objetivo apurar e analisar o preço de custo e os tipos de custos de determinados produtos, estes foram identificados através de uma ferramenta da qualidade chamada Diagrama de Pareto. De acordo com diversos autores utilizados nas pesquisas bibliográficas, entre eles: Cogan (2002), Bornia (2002), Bruni e Famá (2008), Marques (2010), nota-se que muitas empresas não apuram seus custos e despesas de maneira precisa e os preços de venda são obtidos empiricamente. Essa prática mascara os custos e lucros da empresa, acarretando diversos problemas como preço de venda abaixo do real, o que diminui os lucros da empresa; preço de venda acima do real, o que dificulta as vendas; dificuldades para identificar e fixar ações para redução de custos e despesas, o que poderá levar a empresa a operar com custos e despesas mais altos do que deveria. Como consequências de um ou mais desses problemas, a empresa terá um lucro e uma rentabilidade menor, constituindo-se numa ameaça ao seu crescimento e até a sua própria estabilidade econômico-financeira. Diante deste fato, justifica-se o trabalho proposto. Relacionando este assunto com o ramo de atividade da empresa em estudo, nota-se através de entrevistas com diversos empresários, realizada pela revista Alumínio (2011), e pela própria experiência da empresa, que no mercado brasileiro de esquadrias existem muitos nichos potenciais por conta da soma de benefícios que os produtos fabricados em alumínio oferecem como segurança, isolamento térmico e acústico, design e praticidade em relação à manutenção. Deste modo, teve-se um diferencial no assunto proposto pela oportunidade de expor como são esses produtos e o que uma empresa neste ramo necessita ter para um bom gerenciamento de seus custos e formar adequadamente seus preços nos produtos. 2. METODOLOGIA A metodologia científica, para Güllich; Lovato e Evangelista (2007), tem por finalidade estudar os métodos que identificam os caminhos percorridos para alcançar os objetivos propostos pelo plano de pesquisa. E, de acordo com Lakatos e Marconi (2007), a metodologia deve explicitar “o que”, “como”, “quando” e “onde” vai ser realizada. O método de abordagem para Andrade (2002) são os métodos que possuem caráter mais geral. São responsáveis pelo raciocínio utilizado no desenvolvimento da pesquisa, ou seja, procedimentos gerais, que norteiam o desenvolvimento das etapas fundamentais de uma pesquisa científica. Para a realização desde estudo foi utilizada a abordagem dedutiva, pois, a pesquisa também dependeu de embasamento teórico de estudos já realizados, utilizando as principais teorias referentes ao tema e objetivos específicos; também a abordagem quantitativa que foi utilizada para identificar os valores responsáveis na formação dos preços como os custos fixos e variáveis, diretos e indiretos, e determinar estatisticamente a influência dos mesmos na formação do preço básico dos produtos em estudo; e a abordagem qualitativa que está presente no levantamento das informações, com também nas análises e discussão dos resultados obtidos através da base de estudo. Os métodos de procedimento, segundo Lakatos e Marconi (2007), constituem etapas mais concretas da investigação, com finalidade mais restrita em termos de explicação geral dos fenômenos menos abstratos. Para a elaboração da presente pesquisa foi utilizado o método exploratório, com a finalidade de buscar as informações de aspectos gerais focando os dados envolvidos na formação de preço básico dos produtos em estudo, como os tipos de custos e despesas. Sendo também um estudo de caso. Toda ciência utiliza inúmeras técnicas na obtenção de seus propósitos. Para Andrade (2002), técnica é a instrumentação específica de coleta de dados para o tipo de pesquisa. Na coleta dos dados qualitativos utilizaram-se entrevistas não estruturadas com os gestores e colaboradores da 18 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 empresa, e nos dados quantitativos os documentos cedidos pelos gestores como orçamentos, notas fiscais e recibos de pagamentos. Para analisar os dados quantitativos, utilizou-se do Digrama de Pareto a fim de identificar os principais produtos de um período e usá-los como referência e, na análise qualitativa, elaborous e u m f l u xo g ra m a d o p r o c e s s o d e negociação de compra e venda dos produtos da empresa. são também, hoje, compatíveis com obras destinadas a quaisquer públicos incluindo as moradias mais populares como a do programa Minha Casa, Minha Vida. Observa que muitos fabricantes de esquadrias já desenvolvem produtos específicos para esse segmento, esses são indícios que o alumínio é um material acessível e indicado para todos os padrões de obras. Por esses fatos, Magda Reis prevê o uso mais intenso de alumínio como matéria-prima de esquadrias. Também por mais uma vantagem que esse material oferece de praticamente não requerer manutenção, por ser compatível com o p o d e r d e c o n s u m o d o b ra s i l e i r o e esteticamente muito apreciado. Maurício Bianchi, diretor da construtora BKO, e o arquiteto Sidônio Porto, também destacam as diversas vantagens características do alumínio como: durabilidade, leveza, possibilidade de reciclagem, beleza, facilidade de montagem, facilidade de instalação do alumínio, capacidade de moldagem nas mais diversas formas. Sendo essas características diferenciadas é o que impulsiona a crescer a demanda de esquadrias de alumínio. Segundo o Diretor comercial da empresa Ebel, Homero Martinelli da Silva revela o resultado de Pesquisas internas mostrando que, na classe A, a decisão de compra fica na maioria das vezes a cargo das mulheres. Por isso, existe a preocupação em desenvolver um design diferenciado para encantar o público feminino. A preferência recai sobre a cor branca e as dimensões são dadas por engenheiros e arquitetos. A faixa média de consumo B também prefere o branco, que é uma tendência de mercado devido a sua beleza e qualidade. No entanto, a opção anodizado natural também tem grande procura. Os produtos devem ser mais robustos e o cliente possui o hábito de procurar a orientação do lojista. A adaptação da construção ao material e os preços promocionais definem a compra da classe C, que, por essa razão, consome esquadrias da cor anodizado natural. Por fim, os consumidores com menor poder de compra sempre pesquisam a relação custo-benefício e não abrem mão de qualidade e garantia. 3.2 CUSTOS Segundo Ribeiro (1999) e Bornia (2002), o estudo da contabilidade de custos ou contabilidade industrial é grande 3. REFERENCIAL TEÓRICO 3.1. ESQUADRIAS EM ALUMÍNIO Pesquisas recentemente publicadas pela revista Alumínio (2011), revelam dados relevantes sobre a aceleração da expansão no que se trata de indústrias cujo ramo de fabricação de esquadrias metálicas em alumínio por conta da intensa movimentação do mercado imobiliário e da construção civil. O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Esquadrias de Alumínio (AFEAL), Roberto Papaiz, estima que os produtos confeccionados em alumínio respondam atualmente a cerca de 20% dos n e g ó c i o s d o m e rc a d o b ra s i l e i ro d e esquadrias; o restante cabendo aos produtos fabricados com aço, madeira e cloreto de polivinila, popularmente chamado de PVC. Essas informações referentes à expansão da área fabril se materializam em empresas como a companhia de origem italiana Giesse, fabricante de sistemas e acessórios para esquadrias de alumínio, que agora conclui a instalação de sua primeira fábrica brasileira. Segundo o Diretor comercial da mesma, Luis Rosas, o Brasil tem aumentado a sua capacidade de produção. Percebe que no mercado brasileiro de esquadrias existem muitos nichos potenciais por conta da soma de benefícios que os produtos confeccionados em alumínio oferecem como: segurança, isolamento térmico e acústico, design, entre outras. Ressalta, ainda, que já são itens (portas e janelas, por exemplo) de luxo, o público brasileiro deixou de enxergá-los como apenas serviços de fechamento de vãos. Magda Reis, arquiteta e responsável pela área de marketing da Votorantim Metais – CBA, também concorda que não são mais avaliadas apenas por critérios funcionais, porém lembra que as esquadrias de alumínio 19 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 3.2.2. Custos Indiretos Para Ribeiro (1999) e Leone (2009), os custos indiretos compreendem os gastos como os materiais, mão de obra e gastos gerais de fabricação aplicados indiretamente no produto, já que não é possível uma segura identificação de seus valores e quantidades em relação a um produto, esses custos precisam de um parâmetro para serem identificados e debitados ao produto ou objeto do custeio. Também são debitados indiretamente por meio de taxas de rateio ou critérios de alocação de custo. ferramenta para as tomadas de decisões das empresas, pois quando se fala em custo industrial se refere aos procedimentos contábeis e aos extra contábeis desprendidos para se conhecer o custo para a empresa na fabricação dos produtos. O objetivo de calcular o custo dos produtos surgiu com a revolução industrial; até então somente era usado a contabilidade financeira basicamente para avaliação do patrimônio e apurar o resultado do período. Para Bornia (2002), o resultado é obtido subtraindo das vendas o custo das mercadorias vendidas ou produtos vendidos, apurando o lucro bruto e do lucro bruto desconta-se as despesas administrativas, as despesas comerciais e as despesas financeiras apurando assim o lucro líquido. Com o início da industrialização, os produtos passaram a não ser totalmente comprados, mas foram produzidos a partir de vários industrializados dificultando, assim, o cálculo dos produtos vendidos, surgindo desta forma a contabilidade de custos voltada inicialmente para a avaliação dos inventários. Desta maneira, o valor dos insumos consumidos para produção dos produtos vendidos se equivalia ao custo dos produtos vendidos. Entre os conceitos que são usados para diferenciar custos pode se destacar o custo unitário que nada mais é do que o custo total da produção dividido pela produção total, permitindo visualizar o montante despendido para se fabricar uma unidade de produto. 3.2.1. Custos Diretos Para Ribeiro (1999), Bornia (2002) e Leone (2009), os custos diretos compreendem os gastos com materiais, mão de obra diretamente ligada ao produto e gastos gerais de fabricação aplicados diretamente no produto desde que estejam especificados, bem como os custos indiretos que serão incorridos no produto a fim de facilitar a formação do custo total, ou seja, todo item de custo que é identificado naturalmente ao objeto do custeio é denominado de custo direto. Para Ribeiro (1999), e considerando uma fábrica de esquadrias, o alumínio é a matéria prima. Para Cogan (2002), preço ideal é aquele que cobre todos os custos de produção e comercialização do produto ou serviço, contendo ainda um percentual de lucro e s p e ra d o q u e m a n t e n h a a e m p r e s a competitiva no mercado. A classificação dos gastos como custos indiretos são dados tanto àqueles impossibilitados uma segurança e objetiva identificação com o produto também aqueles, mesmo integrados o produto (como corre com certos materiais secundários), pelo pequeno valor que representa em relação ao custo total, não compensa a relação dos cálculos para considerá-los como custo direto. (RIBEIRO, 1999, p. 28). No trabalho os custos indiretos foram identificados e coletados e distribuídos aos produtos, A, B e C obedecendo a um critério de rateio pré-estabelecido para facilitar a aplicação sistema de custeio escolhido. 3.2.4. Custo da Matéria Prima Para Ribeiro (1999) e Bornia (2002), e trazendo para uma fábrica de esquadrias metálicas, o alumínio é a principal matéria prima, e o vidro, parafusos e demais vedações entre outros componentes de uma janela ou porta são considerados como secundários. Conforme os mesmos, o custo da matériaprima pode ser determinado pela seguinte equação: Matéria prima = quantidade a ser consumida x preço unitário padrão. No presente estudo, a quantidade do alumínio é consumida em quilogramas, de acordo com as medidas das esquadrias especificadas pelo cliente. 3.3. CÁLCULO DO CUSTO DOS PRODUTOS Para Cogan (2002), a margem de 20 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 associados a cada produto e pela quantidade produzida. Identificar os custos diretos e indiretos se torna importante para a correta formação dos custos de produção. Considerando a análise dos custos diretos, ela é simples de ser feita, pois os custos estão diretamente ligados aos produtos fabricados, enquanto nos custos indiretos demanda procedimentos mais complexos para determinar a distribuição no custo dos produtos fabricados. A diferenciação dos custos fixos e variáveis e a separação dos desperdícios da parcela ideal do custo serão utilizadas para identificação dos princípios de custeio. De modo geral, deve ser decidida primeiramente qual informação é mais importante e de que forma essa informarão será operacionalizada. 3.3.2. Custeio por Absorção Segundo Bornia (2002), custeio por Absorção (também chamado “custeio integral”) é o método derivado da aplicação dos Princípios Fundamentais de Contabilidade. Consiste na apropriação de todos os custos (diretos e indiretos, fixos e variáveis) causados pelo uso de recursos da produção aos bens elaborados, e só os de produção, isto dentro do ciclo operacional interno. Todos os gastos relativos ao esforço de fabricação são distribuídos para todos os produtos feitos. Os estoques são levados em conta na hora de apurar os custos com o uso da contabilidade de custos servindo como apêndice para a contabilidade financeira. Pode-se identificar esse princípio com o atendimento das exigências da contabilidade financeira para avaliação de estoques e também para fins gerenciais. 3.4. O SISTEMA DE CUSTEIO DIRETO E CUSTEIO POR ABSORÇÃO: SUAS VANTAGENS E DESVANTAGENS 3.4.1. Custeio Direto (Variável) X Custeio por Absorção Segundo Bruni e Famá (2008) e Leone (1996), o sistema de custeio variável ou direto é um método que considera apenas os custos variáveis de apropriação direta como custo do produto ou serviço. Para Bruni e Famá (2008) muitas dúvidas surgem quando o objeto do sistema de custeio é um produto e, nesses casos, muitos custos diretos também são variáveis devido às demandas de produção, como por exemplo, matéria e embalagem são custos diretos e variáveis; por outro lado, custo como depreciação, seguros fabris e contribuição mostra-se útil quando se trata de simulações referentes ao estabelecimento da quantidade a ser produzida e preço de venda visando aumentar a lucratividade empresarial para determinada situação. Já o Custeio Baseado em Atividade – ABC se difere do custeio tradicional pela forma que os custos são acumulados. No tradicional os custos são acumulados por departamentos e depois rateados por um fator volumétrico de medição, tendo o foco nos produtos como geradores de custos. No ABC tem como foco os recursos e as atividades como geradora dos custos. Segundo Cogan (2002),o sistema ABC é fundamentado sobre seis hipóteses. - As atividades consumem recursos: e os recursos adquiridos criam custos. - Os produtos ou clientes consomem atividades. - No modelo ABC consomem ao invés de gastar. Existem numerosas causas para o consumo de recursos. - Os centros de acumulação dos custos em atividades são homogêneos. - Todos os custos em cada centro de atividade funcionam como se fossem variáveis mantendo a proporcionalidade com a respectiva atividade. Para Cogan (2002), o método ABC pretende principalmente ser utilizado como ferramenta de longo prazo, já que no curto prazo os custos modificam-se muito pouco. Somente no longo prazo é possível construir um alinhamento de uso /consumo e gastos. Segundo Nakagawa (2001) o principal papel do custo ABC é espelhar com maior facilidade e clareza as operações da empresa, de modo que as pessoas tenham acesso às causas e taxas de consumo de recursos em seus principais processos de negocio. 3.3.1. Princípios e métodos de custeio Segundo Bornia (2002), para efetuar a análise de um sistema de custos pode-se partir de dois pontos de vista. No primeiro princípio de custeio determina-se se o tipo de informações geradas é adequado às necessidades da empresa; no segundo método de custeio levam em consideração a parte operacional, ou seja, como os dados são processados para obtenção das informações; de maneira geral, o custo dos produtos é obtido pela divisão dos custos 21 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 aluguéis são custos indiretos e também são fixos. Contudo, nem sempre o gasto direto é variável ou vice-versa, e nem todo gasto indireto é fixo ou vice-versa. O uso deste sistema exige a clara distinção entre custos diretos e indiretos, o que pode gerar o uso da arbitrariedade. Na Figura 1, podem-se visualizar melhor as semelhanças e diferenças existentes entre o custeio direto ou variável e o custeio por absorção. Custeamento direto ou variável 1. Classifica os custos em fixos e variáveis. 2. Classificação dos custos em direto e indireto. 3. Debit a ao seguimento, cujo custo está sendo apurados , apenas os custos que são diretos ao segmento e as variáveis em relação ao parâmetro escolhido como base. 4. Os resultados apresentados sofrem influência direta do volume de vendas. 5. É um critério administrativo, gerencial, interno. 6. Aparentemente sua filosofia básica contraria os preceitos geralmente aceitos da Contabilidade, principalmente os fundamentos do regime de competência. 7. Apresenta a Contribuição Marginal - diferença entre as receitas e custos diretos e variáveis do segmento estudado. 8. O custeamento variável destina se a -auxiliar, sobretudo, a gerência no processo de planejamento e de tomada de decisões. 9. Como o custeamento variável trata dos custos diretos e variáveis de determinado segmento, o controle da absorção dos custos da capacidade ociosa não é bem explorado. Custeamento por absorção 1. Não há preocupação por essa classificação. 2. Também classifica os custos em direto e indireto. 3. Debita ao segmento cujo custo esta sendo apurados aos seus custos diretos e também os custos indiretos através de uma taxa de absorção. 4. Os resultados apresentados sofrem influência direta do volume de produção. 5. É um critério legal, fiscal, externo. 6. Aparentemente sua filosofia básica alia -se aos preceitos contábeis geralmente aceitos, principalmente aos fundamentos do regime de competências. 7. Apresen ta a Margem Operacional – diferença entre as receitas e os custos diretos e indiretos do segmento estudado. 8. O custeamento por ab sorção destina -se a auxiliar a gerência no processo de determinação da rentabilidade e da avaliação patrimonial. 9. Como o custeamento por absorção o trata dos custos diretos e indiretos de determinado segmento, se cogitar de perquirir se os custos são variáveis ou fixos, apresentando melhor visão para controle da absorção dos custos e da c apacidade ociosa. Fonte: Leone (2009). Figura 1: Diferenças e semelhanças entre dois critérios de custeio . básicas convivem ainda. Na formação de preço, várias estratégias podem ser levadas em consideração na hora de fixar o preço final ou de vendas. Estratégia de preços distintos ou variáveis são aquelas em que diferentes preços são aplicados a diferentes clientes, considerando um mesmo produto. Desconto em um segundo mercado basicamente é a venda de uma marca em um mercado alvo por um determinado preço, e em outro segmento do mercado vender a um preço reduzido, entre outras estratégias que podem ser usadas como desnatação de preço, na qual um produto inicia com um preço relativamente alto e é reduzido com o passar do tempo. No estudo presente, a fundamentação teórica atribuiu credibilidade ao trabalho, pois permitiu a prévia reflexão sobre o assunto em questão amparando-se nos conhecimentos já construídos e Para Bruni e Famá (2008), no sistema de custeio variável apenas os custos variáveis são atribuídos aos produtos elaborados, que juntamente com as despesas variáveis, serão subtraídos da receita, gerando um valor que é denominado de margem de contribuição e os custos e despesas fixas serão abatidos na margem de contribuição do período. Enquanto no custeio por absorção, os custos fixos são rateados aos produtos e/ou serviços, tomando como base todos os custos da produção, quer sejam fixos ou variáveis, diretos ou indiretos, são absorvidos pelos produtos. 3.5. FORMAÇÃO DE PREÇO Para Cogan (2002), os preços historicamente foram formados somando os lucros aos custos, ou como no atual paradigma rumo à competição perfeita em que o preço é determinado pelo mercado. Mas, na realidade, essas duas condições 22 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 à empresa e praticados pelos gestores da mesma. Ao conhecer o processo de comercialização de esquadrias, foi possível observar as principais etapas que são: - Venda. - Análise do pedido e orçamento. - Negociação. - Efetivação da negociação e assinatura do contrato. - Compra da matéria-prima. - Pintura do alumínio. - Recepção e separação do material. - Industrialização. - Expedição. - Instalação das esquadrias na obra. Todo esse processo necessita de no mínimo trinta dias, podendo ser mais tempo, pois, para a fabricação das esquadrias, depende de vários fatores como a forma de pagamento e entrega das mesmas, decididos no item negociação do contrato, disponibilidade de material junto aos fornecedores e também da disponibilidade de priorizações na fabricação. Deixando claro que os gestores da empresa, sabendo do tempo desse processo, comunicam ao cliente do prazo mínimo para o início da fabricação. 4.1.1 Principais produtos da Empresa Após conhecer os processos que envolvem as necessidades da empresa, foi determinante identificar os principais produtos de venda da empresa em estudo, pois estes serviram como base para a realização do estudo proposto. Para identificá-los foi elaborada uma planilha contendo a quantidade, a tipologia e o valor em reais das esquadrias no período de janeiro a setembro de 2011, que eram as informações armazenadas pelos gestores em forma de orçamentos e nota fiscais. Logo após, aplicou-se sobre esta planilha o diagrama de Pareto. Segundo Mark et al (2001) diagrama de Pareto são gráficos de barras especializados. A frequência da ocorrência de itens é organizada em ordem decrescente e, geralmente, adiciona-se uma linha de percentual acumulado, a fim de facilitar a determinação de como as categorias se acumulam. Os Diagramas de Pareto podem auxiliar no estabelecimento de prioridades publicados de diversos autores. A partir de agora, serão apresentados os resultados obtidos em virtude de ferramentas utilizadas, pesquisadas nos autores que estão dando base para a realização do mesmo. 4. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS. Neste momento da pesquisa, busca-se apresentar os dados coletados e analisados, procurando responder o problema da pesquisa através dos objetivos específicos levantados para a realização do mesmo. Será demonstrado em três etapas: apresentação dos resultados, discussão e análise dos resultados e a contribuição dos acadêmicos. 4.1. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS O estudo foi realizado em uma empresa com oito anos de experiência em fabricação de esquadrias em alumínio. A mesma situa-se no município de Boa Vista do Buricá, região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Atualmente atendem a obras da região da grande Porte Alegre pelas Construtoras como: Bolognesi Empreendimentos, Cádiz Construções. Também atendem a própria região na qual se situa a empresa em estudo e que, segundo a mesma, encontra-se em boa expansão. A sua matéria-prima, perfis de alumínio e principais acessórios específicos para esquadrias em alumínio são adquiridos de empresa como: Aluita Alumínio Porto Alegra Ltda; Alumiconte Componentes de Alumínio Ltda.; Alcont Alumínio Ltda.; Alcoa Alumínio e Cia; Belmetal, todas da região Porto Alegre. O processo de pintura e anodização passam respectivamente pela: Magecolor Pintura a Pó Ltda e Oxicolor Comércio e Beneficiamento de Metais. As esquadrias são vendidas completas; isto é, já com o vidro de preferência do cliente. O vidro também é uma matéria-prima nesse processo que é fornecido atualmente pela Real Vidros Distribuidoras Ltda., Tempermed Indústria e Comércio de Vidros Ltda.; e Templex Vidro Forte; estes se localizam respectivamente nos Estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. Durante um período de seis meses foram levantadas e coletadas algumas informações pertinentes para ser possível o alcance dos objetivos propostos para este estudo. Como a proposta principal se tratava de formação de preço, era necessário conhecer todos os processos que pertenciam 23 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 variáveis que ocorrem com maior frequência. O mesmo ilustra-se na figura 2. para a ação gerencial, focando a atenção naquelas categorias que se acumulam de Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 2: Principais esquadrias vendidas de janeiro a setembro de 2011. Dentre as desessete esquadrias vendidas no período de janeiro a setembro de 2011, o diagrama de Pareto ordenou de forma decrescente os três principais produtos, sendo eles: janela de correr (produto A); janela de correr com persiana de PVC (produto B) e janela maxim ar (produto C). Estes, portanto, foram usados como base para o desenvolvimento da pesquisa. 4.1.2 Formação do preço atual Utilizando-se desses produtos, o JANELA DE CORRER 2 FLS PERS. PVC 140x120. próximo passo foi analisar como ocorre a formação de preço atual praticado pelos gestores da empresa. Observou-se que a realização do orçamento ocorre em duas etapas: a primeira sendo o levantamento do material necessário para a industrialização e montagem das esquadrias e a segunda etapa a formulação do preço final para o cliente já com a margem de contribuição. Na figura 3 está ilustrada a primeira etapa do orçamento que é o preço de custo das três esquadrias. JANELA DE CORRER 2 FLS 120 x 120 JANELA MAXIM AR 1 FL 0,70x0,60 CUSTOS TOTAL R$ CUSTOS TOTAL R$ CUSTOS TOTAL R$ Alumínio 302,00 Alumínio 149,00 Alumínio 80,00 Acessório 95,00 Acessório 55,00 Acessório 30,00 Vidro 14.80 Vidro 14,79 Vidro 21,00 Talas PVC Colocação do contra marco (Col. CM). TOTAL 60,00 Col. CM 23,00 Col. CM 7,00 TOTAL 241,79 TOTAL 138,00 27,00 498,80 Fonte: Heck, Unfer, 2012 Figura 3: Preço de custo unitário atual 24 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Após o levantamento dos materiais necessários e seu custo para fabricar tais esquadrias, ainda têm-se a segunda etapa do Quant. 1 1 1 Descrição Janela de Correr, 1,20 x 1,20 e vidro incolor3mm Janela de Correr 2fls c/persiana de PVC, 1,40 x 1,20 e vidro incolor 3mm Janela Maxim ar, 0,70 x 0,60 e vidrominiboreal3mm Valor Total Do Vidro orçamento, no qual se calcula o preço final com a margem de contribuição escolhida pelo gestor. O preço final de venda pode ser analisado na figura 4. Valor unitário vidro R$ Valor Total vidro R$ Valor unitário esquadria s/vidro R$ Valor unitário esquadria c/vidro R$ Valor Total esquadrias c/vidro R$ 61,92 61,92 392,00 453,92 453,92 72,24 72,24 849,60 921,84 921,84 20,58 20,58 205,00 225,58 225,58 92,82 Valor Total Das Esquadrias Valor Total Das Esquadrias C/ Vidro 1.508,52 1.601,34 Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 4: Orçamento final das esquadrias. 4.1.3 Levantamento e classificação dos custos Para atender o objetivo da pesquisa, também é importante compreender os gastos que a empresa possui; esses foram possíveis classificar em custos fixos e variáveis, diretos e indiretos. Contanto com a disponibilidade dos gestores em fornecer as informações foi acessível em um período de dois meses, março e abril de 2012. Verificando através deste que, atualmente, a empresa está em falta com software que possa armazenar dados para melhor gestão da empresa. Na figura 5 demonstra o resumo da classificação dos custos no período de dois meses e seus respectivos valores em totais de reais. Nos produtos A, B, C, foi considerada uma margem média de 80%, informada pelo gestor da empresa, podendo variar para mais ou para menos, de acordo com a quantidade vendida, com a linha do alumínio escolhido pelos clientes e até mesmo pela forma de pagamento. Atualmente, a margem de lucro é acrescida empiricamente, deixando, assim, dúvidas se há ou não lucro em suas industrializações, ou seja, não se utiliza de nenhum método de custeio que justifique o levantamento dos custos. A partir deste ponto, inicia-se o propósito do presente estudo, a fim de revelar a maneira ideal para este tipo de empresa na formulação de seus preços com base em seus custos de produção e analisar demais custos que se encontram atualmente na empresa. CLASSIFICAÇÃO TOTAL DOS CUSTOS DE MARÇO E ABRIL DE 2012 DESPESAS TOTAL EM R$ TOTAL DE DESPESAS 32.765,48 DESPESA FIXA TOTAL DE DESPESA FIXA 280,00 CUSTOS VARIÁVEIS TOTAL DOS CUSTOS VARIÁVEIS 492.602,01 CUSTOS FIXOS TOTAL DOS CUSTOS FIXOS 8.957,20 INVESTIMENTOS TOTAL DE INVESTIMENTOS 3.535,92 TOTAL DO TOTAL 538.140,61 Fonte: Empresa de Esquadrias Metálicas 2012. Figura 5: Classificação dos custos e despesas do período de março e abril de 2012. 25 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Após a classificação dos custos, também é necessário separá-los em diretos e indiretos, pois, estes são custos que compõem a formação do preço de custo quando utilizado o método de custeio por absorção, conforme pode ser observada a classificação na figura 6. Para facilitar a utilização dos mesmos, os custos diretos devem ser apropriados adequadamente a cada produto de maneira que as distorções na formação do preço sejam minimizadas. Os custos indiretos, por sua vez, devem ser rateados nos produtos de acordo com sua representatividade. CUSTOS DIRETOS EM R$ CUSTOS INDIRETOS EM R$ TOTAL EM R$ Produto A Produto B Produto C Outros - - 124.094,03 247.545,22 73.776,12 47.036,63 42.152,68 534.604,68 Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 6: Apuração dos Custos Diretos e Indiretos. podendo assim analisar o posicionamento dos seus produtos frente aos concorrentes, conforme ilustra a figura 7, e auxilia na tomada de decisões e aplicação de ações para minimizar seus custos e maximizar os lucros. Através destes dados numéricos, chegou-se ao preço unitário pelo custeio por absorção. O preço de custo unitário apurado após aplicação do método de custeio por absorção permite ao empresário ter com mais clareza o custo real de seus produtos e Produto A CUSTO TOTAL PERÍODO R$ 134.012,31 QUANTIDADE UNIDADE 327 CUSTO UNITÁRIO R$ 409,92 Produto B 262.422,64 322 814,77 Produto C 83.694,40 306 273,49 145 375,74 PRODUTO 54.475,34 Outros Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 7: Preço unitário pelo custeio por absorção Os próximos passos será a comparação entre o método adotado pelos gestores da empresa com o método científico de custeio. 4.2. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 4.2.1. Comparação entre a formação de preço atual com a formação proposta Na atualidade, a empresa realiza sua formação de preço de custo e preço final sem a sustentação de um sistema de custeio, valendo apenas do empirismo. Essa formação de preço possui duas etapas básicas, sendo a primeira o levantamento do material necessário para a industrialização e montagem das esquadrias; e a segunda etapa a formulação do preço de custo e final para o cliente. Na primeira etapa é feito o levantamento de todo os materiais que c o m p õ e m a e s q u a d r i a e m q u e s t ã o, considerando o preço de custo total de alumínio consumido em cada produto, mais os acessórios necessários para a fabricação do produto final e colocação de contramarco na obra. Na segunda e última etapa da formação do preço de custo forma-se um somatório do preço final de todas as esquadrias encomendadas pelo cliente. No orçamento considera-se: instalação do contramarco e das esquadrias na obra; silicone para vedação; arremates internos em Alumínio; vidros e guarnições em EPDM para fixação dos vidros. É orçado conforme as escolhas feitas pelo cliente, como a linha do alumínio e tipos de vidros. Nesta etapa também é o momento da identificação da margem de lucro para fazer parte do cálculo. No cálculo é considerada uma margem que deve cobrir os custos e garantir lucros. Esta margem pode sofrer variação dependendo das negociações, prazos e formas de pagamento. Atualmente a margem de lucro é 26 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 diretos e indiretos aos produtos, bem como as despesas administrativas, de vendas e financeiras, sendo como do período. Para Martins (1998) pouco adianta para a empresa saber que seus custos aumentaram de um valor para outro se esse valor não possuir quantificações paralelas que informem volume físico consumido e produção realizada no período. A sistematização criada para registro dessas informações permite fazer uma análise mais exata dos custos e despesas da empresa permitindo tomadas de decisões mais assertivas. De posse dos custos e despesas da empresa e baseando-se na literatura, como mostra a figura 8, em forma de fluxograma, o esquema de custeio por absorção sem departamentalização visualizando os passos que devem ser seguidos para a correta aplicação do mesmo, em um primeiro momento é necessário identificar os custos e separá-los em custos diretos e indiretos. Os custos indiretos devem ser rateados através de um critério que seja o mais adequado para distribuir esses custos aos produtos manufaturados. Os custos diretos são diretamente aplicados aos produtos. acrescida empiricamente, deixando dúvidas sobre o real percentual de lucro aplicado pela empresa em suas industrializações, já que nesse cálculo não são levados em conta nem todos os custos diretos, os custos indiretos também ficam fora do cálculo de formação de preço. Na formação atual do preço de custo, aplica-se um percentual estipulado pelo responsável pelo orçamento. Esse percentual deve cobrir o restante dos custos e garantir uma margem de lucro para o empresário. A partir deste ponto se inicia o propósito do presente estudo, a fim de revelar uma proposta para este tipo de empresa na formulação de seus preços com base em seus custos de produção e analisar demais custos que se encontram atualmente na empresa. Buscando obras como Ribeiro (1999), Leone (2009), Bornia (2002), Cogan (2002), Nakagawa (2001), Martins (1998), Bruni e Famá (2008) e Leone (1996), os tipos os tipos de custeio analisados foram: sistema de custeio por custo unitário, sistema de custeio por absorção e sistema de custeio direto (variável). Estes sistemas foram estudados e analisados a fim de identificar o sistema de custeio adequado para se aplicar em uma indústria de esquadrias de alumínio e elaborar a formação do preço de custo pelos métodos científicos garantindo assim uma visualização mais real dos custos e despesas envolvidos na produção das esquadrias de alumínio, almejando dar à empresa uma ferramenta que a torne cada vez mais eficiente no concorrido mercado de alumínio. O sistema de custeio por absorção sem departamentalização foi a opção escolhida por tratar-se de um ambiente empresarial no qual os custos não são departamentalizados. A falta de tempo hábil para fazer tal classificação foi um dos fatores determinantes para a escolha do sistema de custeio por absorção sem departamentalização. No sistema de custeio por absorção são apropriados todos os custos Fonte: Martins, 1998. Figura 8: Esquema básico do custeio por absorção Através da aplicação do sistema de custeio por absorção ficou visível a diferença entre a formação de preço empírica e a formação de preço baseado na literatura. As diferenças entre o as duas formações de preço podem ser visualizadas nas figuras 9 que apresentam, em valores, os resultados obtidos em cada modelo de formação de preço permitindo comparar e analisar os resultados. 27 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Valor custeio atual R$ Classificação Produto A B C Janela de correr 2fls, 1.20 x 1.20. Janela de correr 2fls c/ pers. PVC 1.40 x 1.20. Janela maxim ar 1fl 0,70 x 0,60. Média % 241,79 498,8 138 Valor custeio por absorção R$ 409,92 814,77 273,49 Diferença em % 69,54 63,35 98,18 77,02 Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 9: Comparação entre a formação de preço empírico e cientifica. No produto A, percebeu-se uma variação de 69,54% do preço empírico para o preço baseado no método científico; no produto B, a diferença de valor foi de 63,35% e no produto C de 98,18%. Com uma média de 77,02% de variação entre o preço empírico e o preço baseado no método científico de custeio, que leva em conta todos os custos diretos e indiretos na sua formação. Para Martins (1998) é fácil visualizar onde começam os custos de produção, mas é bem mais difícil de perceber onde eles terminam. Kotler (1999) em sua obra diz que o preço de custos é quem define o piso, mas o teto do preço é definido pela percepção do cliente em relação ao produto. É de grande importância, além de conhecer seus custos e despesas, onde eles começam e onde eles terminam, para que o empresário tenha um bom conhecimento da estrutura do mercado em que atua, a fim de identificar quais valores percebidos pelos clientes, formas de competição dos mercados e a posição ocupada pela empresa nesse mercado. A partir daí é possível estruturar suas metas de manutenção, crescimento e lucratividade. Como percebido durante o desenvolvimento da pesquisa e a construção do trabalho, a empresa objeto de estudo, preocupa-se somente em agregar ao preço de custo dos produtos, os custos de matéria prima e componentes diretamente ligados à fabricação dos produtos, e de modo empírico aplica uma margem que supostamente cubra o restante dos custos e ainda possa garantir uma lucratividade sobre a venda do produto. Com esta maneira de formar o preço de custo, fica difícil de o empresário perceber algum tipo de desperdício, atividades que não agregam e até mesmo oportunidades de melhoria para o negócio. Para a formação de preço através do sistema de custeio por absorção na empresa e baseando-se em Martins (1998), este método que consiste na aplicação de todos os custos de produção aos produtos produzidos, neste sistema de custeio todos os gastos relativos aos esforços de fabricação são distribuídos de modo adequado a todos os produtos feitos. Para a aplicação do mesmo na empresa foi necessário fazer um levantamento de todos os custos e despesas, classificá-los em diretos e indiretos. A partir desse ponto, determinar que porcentagem destes custos que pertencem a cada produto, sendo para os custos indiretos é determinada um critério de rateio que altera o custo dos produtos fabricados e, para distribuir os custos aos produtos fabricados, sempre haverá uma subjetividade na escolha do critério de rateio, o que pode ser minimizado quando feito uma analise detalhada da natureza dos custos indiretos antes de aplicar o critério de rateio. Após a aplicação do sistema de custeio por absorção, o empresário tem em suas mãos de forma mais detalhada os custos e as despesas que incorrem na determinação dos custos de produção e pode tomar decisões mais sensatas na hora de determinar seus objetivos e metas. O empresário pode comparar os dois sistemas de custeio e analisar de forma detalhada os aspectos positivos e negativos entre os sistemas de custeio, baseados no conhecimento empírico e no método cientifico, no caso, o sistema de custeio por absorção. Essa análise permitirá a construção de um planejamento mais assertivo que permitirá nortear suas decisões de maneira mais estruturada a fim de melhorar o desempenho e o faturamento e tornar-se mais competitiva no mercado das esquadrias de alumínio. 4.2.2. Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) projetado No DRE projetado permite visualizar as receitas e os custos dos dois sistemas de 28 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 custeios e entender as particularidades de cada um. O mesmo pode ser observado na figura 10. No primeiro momento têm-se os resultados levantados de acordo com o sistema atual de custeio praticado pelos gestores da empresa em estudo, sendo os custos considerados na hora da formação de preço os da matéria prima envolvidos na fabricação dos produtos em um determinado período e os demais custos são cobertos pela margem aplicada sobre os custos de produção, a qual visa cobrir os demais custos e garantir o lucro planejado. No segundo momento têm-se os resultados obtidos de acordo com o sistema de custeio por absorção, ou seja, todos os custos, tantos diretos como os indiretos são contabilizados na formação do preço de custos permitindo agregar a cada produto os seus custos de maneira adequada evitando onerar um produto com despesas incorridas em outro produto. Os custos indiretos são agregados aos produtos obedecendo a um critério de rateio para distribuir os mesmos em todos os produtos fabricados no período. DRE / CUSTEIO ATUAL DESCRIÇÃO VALOR EM R$ Receita de Vendas 514.291,80 (-) Custos (281.906,93) Resultado Operacional Bruto 232.384,87 Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 10: Demonstração do Resultado do Exercício DRE / CUSTEIO POR ABSORÇÃO DESCRIÇÃO VALOR EM R$ Receita de Vendas 514.291,80 (-) Custos (480.129,35) Resultado Operacional Bruto 34.162,45 projetado. De acordo com o mesmo, mudar significa reunir todas as forças e habilidades param, com racionalidade e inteligência, buscar sair de uma situação atual, podendo ser inadequada, inconveniente ou ruim, para ir ao encontro de outra situação futura desejada; isto é, mais adequada, conveniente, boa. Algumas das questões a serem repensadas são: políticas, processos, tecnologia da informação, pessoas, modelo de gestão, entre vários fatores que podem ser melhorados em uma organização. Visando a possibilidade de melhorias à empresa em estudo, colocam-se algumas sugestões, como: - o método de custeio por absorção na formação do preço de custo dos produtos fabricados. - Software ou para de imediato uma tabela de depreciação elabora do Office Excel. Um dos itens necessários para o custeio por absorção é a depreciação, lembra Martins (1998). Com a falta desta atividade na empresa, sugere-se uma tabela para depreciação que permite adaptações à realidade da empresa, dando à empresa toda a evolução do seu imobilizado e custos. Basta preencher corretamente os campos da tabela, conforme ilustra a figura 11. Para Martins (1998) é fácil visualizar onde começam os custos de produção, mas é bem mais difícil perceber onde eles terminam. Na DRE, representada na Figura 10, percebese uma grande diferença entre os dois sistemas de custeio, mas como já foi demonstrado anteriormente, no sistema de custeio atual somente utiliza a matéria prima em sua formação. Já o custeio por absorção engloba em sua formação todos os custos do período. Tendo o conhecimento do custeio por absorção e podendo comparar os resultados com o custeio atual praticado na formação do preço dos produtos, os gestores da empresa podem analisar se há vantagens em adotar um sistema de custeio e quais seus benefícios que melhor ofereça segurança e confiabilidade na hora da formação do preço de custo dos seus produtos e serviços. 4.3. SUGESTÕES DE MELHORIAS PARA A EMPRESA Mudanças são necessárias, salienta Germano (2012), e é fundamental vê-la como um processo dinâmico, o qual deve ser planejado, organizado e conduzido com muito cuidado para produzir resultados claramente definidos a curto, médio e longo prazo. Quanto mais se retarda a decisão de mudar, mais complicado e difícil se torna o processo. 29 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Imobilizados - Ativo Não Circulante Data Atual Itens - Descrição dos bens Direito de Uso Linhas Telefônicas Telefone 1 Telefone 2 Telefone 3 Telefone 4 Edifícios e Construções Edifício 1 Data Inicial Data Final Compra (moeda reais) Período (mês) Depreciação Depreciação dd/mm/aa dd/mm/aaaadd/mm/aaaa 01/03/2012 01/03/2012 01/03/2012 01/03/2012 01/03/2017 01/03/2017 01/03/2017 01/03/2017 valor 635,00 150,00 95,00 340,00 50,00 20/06/2012 01/03/2012 01/03/2037 800.000,00 800.000,00 20/06/2012 20/06/2012 20/06/2012 20/06/2012 quant. atual total 1 1 1 1 3 3 3 3 1 3 Valor 60 60 60 60 Mensal 10,61 2,51 1,59 5,68 0,84 Acumulada 28,64 6,77 4,28 15,33 2,26 Residual 606,36 143,23 90,72 324,67 47,74 300 2.663,41 2.663,41 7.191,21 7.191,21 792.808,79 792.808,79 Fonte: Heck, Unfer, 2012. Figura 11: Tabela de depreciação. Para a aplicação do sistema de custeio por absorção é importante que a empresa utilize a tabela oferecida, como também providencie um software de controle e armazenagem de dados, facilitando assim aplicação do sistema de custeio. Sem o auxilio de ferramentas é muito demorada e trabalhosa a obtenção das informações necessárias para a correta formação do preço de custo usando o sistema de custeio por absorção objetivos específicos que, por sua vez, foram todos alcançados. Além disso, observado que para a utilização do sistema de custeio por absorção necessita o armazenamento de dados, principalmente de todos os custos e despesas que pertencem à empresa, foi pertinente sugerir para a empresa a aquisição de um software para auxiliar no armazenamento dessas informações, para que possam analisar seus custos, tomar decisões, planejar e, principalmente, para utilizar no sistema de custeio por absorção para a formação do preço de custo de seus produtos fabricados. Acredita-se que por meio deste, como nova forma de sugestão de apurar o preço de custo dos produtos fabricados, agora cientificamente comprovado, pois sempre se partia do empirismo, serão os primeiro passos de evolução na gestão empresarial, referindo-se da importância de controles e registros de custos para adotar um método de custeio. No caso presente, fica a ilustração do método de custeio por absorção, ficando a critério da empresa em adotá-lo ou não conforme o estudo realizado. 5. CONCLUSÃO Por meio deste, foi possível verificar que é essencial a clareza e os registros de todos os custos que pertencem a uma empresa podendo, inclusive, classificá-los e distinguindo o que são de fato as despesas, para que a formação do preço de custo na fabricação de um produto realmente seja o suficiente para sustentar de forma saudável a gestão financeira da mesma, ainda quando se tratando do sistema de custeio por absorção. O sistema de custeio por absorção tem como um de seus objetivos auxiliar os gestores no processo da rentabilidade e da avaliação patrimonial, pois, avalia os estoques e desperdícios da empresa e ajuda nas decisões de preço para os produtos e serviços, como também auxilia na distribuição dos custos aos produtos, conhecido como rateio. Para que isso seja possível, exige-se o levantamento de dados como, todos os custos e despesas de uma empresa, sendo classificados em custos variáveis e fixos, indiretos e diretos. Portanto, procurou-se responder ao seguinte problema de pesquisa: qual a interferência dos custos e despesas no preço final dos produtos? Para buscar a solução do problema proposto, tem-se como objetivo geral: apurar e analisar o preço de custo e os tipos de custos de determinados produtos de alumínio em uma empresa de esquadrias metálicas. Foi possível atendê-los através dos REFERÊNCIAS ALUMÍNIO, Revista. Preferência Nacional. 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A compostagem dos dejetos suínos pode ser uma alternativa como destino mais adequado deste material. Neste processo, os dejetos sofrem a ação de microorganismos que quebram e transformam as substâncias com efeito contaminante em substâncias mais simples que podem melhorar a fertilidade do solo. Assim, com o objetivo de buscar alternativas para o destino dos dejetos, foi realizada uma revisão bibliográfica sobre a compostagem de dejetos líquidos de suínos. Esta revisão abrange o processo e os tipos de compostagem, como a Compostagem Estática, a Compostagem Estática com Injeção de Ar, a Compostagem com Revolvimento e a Compostagem Automatizada, os princípios do processo e os microorganismos envolvidos, as emissões de gases de efeito estufa e seus possíveis controles, além das características do produto final da compostagem e o seu uso na agricultura. Pig farming is an activity of great social and economic importance in Brazil especially in the southern region. However the wastes generated by this activity are important environmental pollutants strongly impacting the agroecosystems this region. Composting of pig manure can be an alternative more appropriate as the destination of this material. In this process the waste products are the action of microorganisms that break down and transform the contaminant substances into simpler substances that can improve soil fertility. So in order to seek alternatives to the destination of the waste a literature review was carried out on the liquid pig manure composting. This review covers the process and the types of composting as the Static Composting, Static Composting with Air I n j e c t i o n , R e vo l ve d Co m p o s t i n g a n d Automated Composting, the principles of the process and involved microorganisms, greenhouse gas emissions ant their possible controls, in addition to the features of the final product of composting and its use in agriculture. Keywords: Liquid Waste. Composting Methods. Pig Farming Palavras Chave: Dejetos Líquidos. Métodos de Compostagem. Suinocultura. 1 Mestrando em Ciências do Solo pela UFSM; Professor da Faculdade Três de Maio - SETREM, e mail: nelsonsmola@gmail. com. 2 Mestre em Agronomia pela UFSM; Professora da Faculdade Três de Maio - SETREM, e -mail: [email protected] . 3 Mestre em Zootecnia pela UFSM ; Professor da Faculdade Três de Maio - SETREM, e -mail: [email protected] . 4 Sociedade Educacional Três de Maio –SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio –RS, e -mail: [email protected] .br. 32 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1 INTRODUÇÃO A compostagem pode ser definida como um processo de transformação biológica e aeróbica de materiais orgânicos sob condições que propiciem o desenvolvimento da atividade biológica (BUDZIAK et al., 2004; BUENO et al., 2008 ) . Devido a esses aspectos, a compostagem pode ser uma alternativa para o destino dos resíduos urbanos, industriais e da agropecuária (HUBBE et al., 2010). Dentre os principais objetivos da compostagem de materiais orgânicos está a diminuição do volume e da umidade desses materiais e, consequentemente, a diminuição do risco de manuseio e do efeito contaminante, facilitando seu transporte e obtendo um produto que proporciona maior fertilidade ao solo (SOUZA, 2003; ZALESKI et al. 2005; OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006). Devido às características benéficas da compostagem no tratamento de resíduos, a técnica pode ser uma alternativa para o destino mais apropriado dos dejetos gerados na suinocultura. Esses dejetos, por estarem na forma líquida na maioria dos sistemas de criação, tornam-se um importante poluente ambiental, principalmente na região Sul do Brasil, que concentra em torno de 55 % de um rebanho nacional de 31,2 milhões de cabeças (IBGE, 2006). Objetivou-se revisar o estado da arte da compostagem de dejetos líquidos de suínos abrangendo processo e tipos de compostagem, princípios, emissões de gases de efeito estufa e seu controle e as características do produto final e seu uso agrícola. 2 DESCRIÇÃO GERAL DE COMPOSTAGEM A compostagem consiste na mistura de materiais dos mais diversos tipos em unidades de compostagem constituídas por leitos, podendo ser definida como o processo de reciclagem onde há degradação biológica aeróbia ou anaeróbia de resíduos orgânicos de modo a proceder a sua estabilização, produzindo uma substância húmica, utilizável em algumas circunstâncias como condicionador do solo (RUSSO, 2003). A compostagem é um processo flexível, podendo ser realizada em sistemas abertos ou em sistemas fechados. No sistema aberto, o material orgânico é amontoado em leiras, as quais são revolvidas em intervalos de tempo para promover a aeração do meio. Já o sistema fechado envolve o uso de reatores, que permitem melhor controle das condições de aeração, temperatura e umidade, mas apresenta custos mais elevados (BALL, 1997; CAMPOS & BLUNDI 1998; SEDIYAMA et al. 2000; HUBBE et al. 2010). Durante a compostagem, a temperatura varia e podem-se definir três fases devido à atividade biológica, a mesófila, a termófila e a maturação. Estas fases não são estáticas, possuindo pontos de transição e variabilidades conforme as condições de umidade, oxigênio e resíduos (ANDREOLI, 2001). Portanto, no processo de compostagem há uma série de parâmetros que precisam ser controlados e é da eficiência deste controle que se obtém um composto de qualidade. 3 COMPOSTAGEM DE DEJETOS LÍQUIDOS DE SUÍNOS Dentre os países que desenvolvem a técnica de compostagem com dejetos líquidos de suínos destaca-se a China, cuja atividade suinícola contribui com aproximadamente 50 % da produção mundial de suínos com um rebanho estimado em 689 milhões de animais (HUAITALLA et. al., 2010; INDEX MUNDI 2011). No Brasil, onde o rebanho é de 38,45 milhões de animais, o uso da compostagem ainda é incipiente, bem como os estudos na área. Contudo, o país apresenta grande potencial de expansão da técnica de compostagem com vistas a destinar adequadamente o grande volume de dejetos gerados, que é de 3 aproximadamente 27 mil m por dia (KONSEN, 1993; INDEX MUNDI, 2011). No Brasil, a região Sul concentra a maior produção de suínos do país (IBGE, 2006), e é no Sul que a compostagem de dejetos líquidos de suínos vem sendo estudada e adotada principalmente na forma automatizada. Nesta região, a compostagem é ainda mais importante, já que o dejeto l í q u i d o s e c o n c e n t ra e m p e q u e n a s propriedades suinícolas e apresenta grande potencial poluidor, principalmente pela falta de áreas para destinação do resíduo e dificuldade de transporte (CERETTA et al. 2005; OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006). Embora os trabalhos sobre compostagem de dejetos líquidos de suínos 33 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 encontrados na literatura apresentem variações quanto aos métodos, algumas etapas são semelhantes, tais como aeração e formação das pilhas. Os diferentes métodos também proporcionam variações nas características do composto final (ZHU et al., 2004; ROS et al., 2006). revolvimento realizado duas vezes por semana (KUNTZ et al., 2008), podendo-se utilizar o revolvimento manual ou mecânico. A incorporação do dejeto pode ser realizada de diversas maneiras, como por exemplo, a aplicação com aproximadamente 80% da quantidade total de dejeto e mais duas aplicações posteriores para corrigir a umidade, mantendo-a próxima a 70% (KUNZ et al. 2004). Outra maneira é a aplicação de 40% do dejeto total na primeira aplicação, 30% na segunda, 20% na terceira e 10% na última. Nesses casos, o intervalo entre as aplicações é de uma semana e a relação dejeto/substrato apresenta comportamentos distintos para ambos os manejos (SARDÁ et al. 2010). 4.4 COMPOSTAGEM AUTOMATIZADA Recentemente implantada na região Sul do Brasil, a compostagem automatizada de dejetos líquidos de suínos apresenta algumas particularidades, como a gradual e constante incorporação de materiais através de máquinas (KUNTZ et al., 2008). Neste caso, a aplicação e o revolvimento do dejeto são simultâneos. A compostagem automatizada é o sistema preconizado atualmente nas pesquisas de países como China, Canadá, Estados Unidos e Brasil, caracterizando-se pela baixa demanda de mão-de-obra. 4 MÉTODOS DE COMPOSTAGEM DE DEJETOS LÍQUIDOS DE SUÍNOS Os diferentes manejos, formas de disposição e tipos de materiais a serem compostados influenciam o processo (KUNZ et al., 2008; HUBBE et al., 2010). De modo geral, para a compostagem de dejetos líquidos de suínos são construídas leiras, que se diferenciam principalmente pela frequência em que são incorporados os materiais e pela maneira como são aeradas e revolvidas. Existem leiras estáticas, leiras com aeração e leiras com revolvimento (DAI PRA, 2006; KUNZ et al., 2008; HUBBE et al., 2010). 4.1 COMPOSTAGEM ESTÁTICA Na compostagem estática, a aeração na massa a ser compostada ocorre naturalmente, com controle rigoroso de temperatura, umidade e teor de oxigênio. O processo proporciona várias vantagens, tais como desenvolvimento de uma população microbiana diversificada, diminuição da área física para a compostagem, eliminação de máquinas pesadas, diminuição de mão-deobra, melhoria na qualidade do material do produto final e diminuição do tempo de oxidação da matéria orgânica de 160 para até 30 dias (KUNZ et al., 2008). Esse método não é recomendado para a compostagem de resíduos com granulometria homogênea. 4.2 COMPOSTAGEM ESTÁTICA COM INJEÇÃO DE AR Na compostagem realizada com injeção de ar, a mistura é colocada sobre tubulação perfurada que aspira ou injeta ar na massa do composto sem revolvimento mecânico das leiras. Na fase de maturação as necessidades de oxigenação são baixas e o composto pode ficar em leiras sem aeração, sendo revolvido em maiores intervalos de tempo (KIEHL, 1998). 4.3 COMPOSTAGEM COM REVOLVIMENTO Na compostagem com revolvimento, a incorporação do dejeto é realizada por aspersão semanalmente durante um mês e o 5 PRINCÍPIOS DA COMPOSTAGEM DE DEJETOS LÍQUIDOS DE SUÍNOS O processo de compostagem de dejetos líquidos de suínos se desenvolve em duas fases, sendo a primeira a incorporação fracionada dos dejetos líquidos aos resíduos sólidos até a obtenção de uma biomassa com umidade e relação C/N adequadas; enquanto a segunda se caracteriza por uma aceleração do processo de degradação microbiológica da matéria orgânica (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006). O pleno desenvolvimento do processo de compostagem é dependente de diferentes fa t o r e s , t a i s c o m o a a t i v i d a d e d o s microorganismos (KIEHL, 1985), umidade (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006), aeração, pH (PEREIRA NETO, 1996), temperatura (ZALESKI et al., 2005), relação C/N e matéria prima (MARAGNO et al., 2007; HUBBE et al., 2010). 34 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 5.1 MICROORGANISMOS A compostagem é um processo microbiológico, sendo realizada por bactérias, fungos e actinomicetos em função da temperatura do substrato (Tabela 1). Além da temperatura, a atividade dos microorganismos depende da umidade, da relação C/N, do oxigênio e do pH. Tabela 1. Microorganismos encontrados no processo de compostagem. Bactérias Fungos Cellumonas folia Fusarium sp. Chondrococcus exiguus Coprinus sp. Myxococcus virescens Aspergillus sp. Myxococcus fulvus Talaromy ces variable Thiobacillus thiooxidans Helminthosporium sativum Mesófilos Thiobaccilus denitrificans Oospora variabilis Aerobacter sp. Mucor sp. Proteus sp. Glomerularia sp. Pseudomonas sp. Fisidium sp. Aspergillus fumigatus Humicola sp. Mucor pussillus Termófilos ou Bacillus stearothermophilis Talaromyces sp. termotolerantes Sporotrichum sp. Actinomicetos Micromonospora vulgaris Nocardia brasiliensis Pseudonocardia thermophila Streptomyces sp. Thermoactinomyces vulgaris Chaetomium thermophile Thermonospora sp. Byssochlamys ehrmophila Thermopolyspora polyspora Fonte: KIEHL, 1985. A partir de uma relação carbono/nitrogênio ótima dos materiais ocorre um aumento da população e um desenvolvimento do metabolismo dos microorganismos, que por sua vez aumenta sua atividade e assim a temperatura. No início da decomposição (fase mesófila < 45 °C), predominam bactérias e fungos mesófilos produtores de ácidos. Com a elevação da temperatura (fase termófila), a população dominante se torna a de bactérias, fungos e actinomicetos termófilos ou termotolerantes (45-60 °C). Os fungos termófilos ou termotolerantes geralmente se desenvolvem a partir do 10º ou 15º dia, enquanto os actinomicetos predominam nas últimas fases da compostagem. Passada a fase termófila, o composto retorna a uma fase mesófila mais longa com outra composição química, reaparecendo fungos e bactérias mesófilos (KIEHL, 1985; HUANG, 2006; CAMPOS & BLUNDI, 2010). As bactérias termófilas realizam seu principal papel decompondo açúcares, amido, proteínas e demais compostos orgânicos, enquanto fungos e actinomicetos desempenham importante papel na decomposição da celulose e lignina (PEREIRA NETO, 1996), embora muitas bactérias também ataquem a celulose (KIEHL, 1985). Esses microrganismos possuem uma faixa de temperatura ótima, na qual a atividade metabólica é maximizada (HERBETS et al., 2005). Segundo LI et al. (2011), a combinação de diversas espécies de microrganismos na compostagem de dejeto de suínos com serragem aumenta a temperatura da compostagem e o conteúdo de nutrientes disponíveis no composto final. 5.2 UMIDADE A presença de água é imprescindível para as necessidades fisiológicas dos organismos no processo de compostagem. A faixa adequada de umidade é entre 40 e 60%, sendo ótima de 50 a 55% (KIEHL, 1985; PEREIRA NETO, 1996). Teores de água inferiores a 35-40% inibem a atividade microbiana na compostagem, comprometendo a qualidade final do composto, sendo que abaixo de 12% a atividade microbiana cessa (KIEHL, 1985). Valores baixos de umidade causam a desidratação no interior da pilha de compostagem, enquanto umidade superior a 35 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 6% promove condições de anaerobiose no sistema e a liberação de maus odores (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006; MASSUKADO, 2008). Na compostagem de dejetos líquidos de suínos o elevado teor de água é observado pelo odor do gás sulfídrico liberado na anaerobiose, podendo ser facilmente corrigido por meio de revolvimentos (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006; MARAGNO et al., 2007), injeção de ar ou adição material seco nas pilhas (MASSUKADO, 2008). 5.3 AERAÇÃO A aeração tem por finalidade básica suprir a demanda de oxigênio requerida pela atividade microbiana e atuar como agente de controle da temperatura e umidade. A demanda de oxigênio situa-se entre 0,3 e 0,6 3 m de ar por quilograma de sólidos voláteis por dia (PEREIRA NETO, 1996; BUENO et al., 2008). Na fase termófila, o conteúdo mínimo de oxigênio deve ser de 5% para garantir a decomposição aeróbia. Materiais de consistência firme e granulometria grosseira garantem melhor aeração pelo fato de não se compactarem pela pressão das camadas superiores (KIEHL, 1985). 5.4 TEMPERATURA A temperatura é considerada um importante indicador da eficiência do p ro c e s s o d e c o m p o s t a g e m , e s t a n d o intimamente relacionada com a atividade dos microrganismos alterada pela taxa de aeração (KIEHL, 1985; ZALESKI et al., 2005). O metabolismo dos microrganismos é exotérmico e, na decomposição aeróbia, d e s e n v o l v e - s e u m n a t u ra l e r á p i d o aquecimento da massa com a multiplicação da população microbiana, produzindo temperaturas acima de 70ºC (KIEHL, 1985; OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006). O calor da oxidação biológica da matéria orgânica é retido na leira devido às características isolante-térmicas dos materiais e durante o revolvimento, o calor é liberado na forma de vapor de água (PEREIRA NETO, 1996). Durante a compostagem a temperatura varia, podendo-se definir três fases: mesófila, termófila e maturação. Estas fases não são estáticas possuindo pontos de transição e variabilidades conforme as condições de umidade, oxigênio, resíduos, etc. (ANDREOLI, 2001). De modo geral, o composto passa rapidamente por uma fase de temperatura mesófila (25-40 °C), criando c o n d i ç õ e s p a ra o s m i c r o o r g a n i s m o s termófilos. Na sequência, tem-se uma fase termófila (45-65 °C), que é caracterizada pelo alto consumo de oxigênio e pela intensa atividade microbiológica que degrada a matéria orgânica. A transição ocorre quando o substrato orgânico é, em sua maior parte, transformado, a temperatura diminui restringindo a população termófila, a atividade biológica global se reduz de maneira significativa e os mesófilos se instalam novamente (nova fase mesófila). Nessa fase termina a bioestabilização e inicia-se o processo de humificação e maturação da matéria orgânica (ANDREOLI, 2001), que ocorre após aproximadamente 100 a 120 dias. Na maturação, na qual a exigência de oxigênio é menor e a atividade biológica é lenta, a temperatura do composto diminui para próximo da temperatura ambiente (fase criófila). Temperaturas acima de 65°C restringem o número de microorganismos (PEREIRA NETO, 1996), e além de insolubilizar proteínas hidrossolúveis, provocam alterações químicas e desprendimento de amônia (KIEHL, 1985). Por outro lado, temperaturas baixas podem ocorrer em função da baixa umidade do composto e baixas concentrações de nutrientes no substrato, proporcionando maior perda de calor para o ambiente e risco da permanência de patógenos e de sementes de plantas daninhas no composto final (KIEHL, 1985; OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006). 5.5 RELAÇÃO CARBONO/NITROGÊNIO A relação carbono/nitrogênio (C/N) é um dos parâmetros essenciais para o crescimento das células microbianas, sendo de importância fundamental durante todo o processo de compostagem (MARAGNO et al., 2007), pois o carbono (C) é fonte de energia e o nitrogênio (N) é fundamental para a síntese das proteínas (HUBBE et al., 2010). A relação C/N inicial mais favorável para a compostagem é em torno de 30/1, e a relação C/N ideal do produto final humificado deve ser em torno de 12/1 (PEREIRA NETO, 1986; KIEHL, 2002). Durante a compostagem, a degradação da matéria orgânica leva a uma redução do carbono orgânico e o nitrogênio orgânico aumenta em virtude da mineralização (KIEHL, 1985; MARAGNO et al., 2007). Consequentemente, ocorre diminuição da relação C/N. Os 36 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 microorganismos absorvem os elementos C e N em uma proporção de 30 partes de C para cada parte de N, onde o C é utilizado como fonte de energia, e o N é assimilado na estrutura do microrganismo na proporção de JUN partes de C para uma de N. Daí a razão do húmus, que é produto resultante exclusivamente da ação desses microrganismos, ter a mesma relação C/N igual a 10/1 (KIEHL, 1985). 5.6 pH Durante a compostagem, o pH pode variar de 3,0 a 11,0, mas o ideal é mantê-lo entre 5,5 e 8,0. É importante, que o pH inicial esteja entre 5,0 e 6,0, pois pH baixo inibe atividade microbiológica e pH alto provoca deficiência de fósforo e perda de nitrogênio por volatização (MASSUKADO, 2008). Os microorganismos regulam o pH por meio da degradação de compostos que irão produzir subprodutos ácidos ou básicos (PEREIRA NETO, 1996). No Início da decomposição ocorre a formação de ácidos orgânicos que tornam o meio mais ácido do que o da própria matéria prima original. Entretanto, esses ácidos orgânicos e os traços de ácidos minerais que se formam, reagem com bases liberadas da matéria orgânica gerando compostos de reação alcalina (KIEHL, 1985). Como consequência, o pH do composto se eleva à medida que o processo se desenvolve, passando pelo pH 7,0 (neutro) e alcançando pH superior a 8,0 ( a l c a l i n o ) . ( M A R A G N O e t a l ., 2 0 0 7 ) . Geralmente a compostagem se caracteriza por produzir um composto final com pH entre 7, 5 e 9 , 0 ( P E R E I R A N E TO , 1 9 9 6 ) , permanecendo neste nível enquanto houver nitrogênio amoniacal e baixando um pouco quando este passar para a forma de nitrato (KIEHL, 2002). 5.7 MATERIAIS O tratamento dos dejetos via sistema de compostagem consiste na mistura dos dejetos de suínos em unidades de compostagem constituídas por leitos formados por maravalha, serragem, palha (IMBEAH, 1998; OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006), bagaço de cana-de-açúcar, capim (SEDIYAMA et al., 2000), entre outros. A serragem e a maravalha são materiais palhosos ideais para serem utilizados na compostagem de dejetos de suínos, devido às suas características de absorver umidade e fornecer porosidade adequada para o processo (MARAGNO et al., 2007; KUNTZ et al., 2008). A intensidade da decomposição da matéria-orgânica está ligada à área de exposição apresentada pelo material, sendo que na prática, o tamanho de partículas da massa de compostagem deve situar-se entre 1 e 5 cm (PEREIRA NETO, 1996). Materiais celulósicos derivados de plantas desempenham um papel fundamental quando os resíduos orgânicos são compostados (HUBBE et al., 2010). Materiais lignocelulósicos também contribuem para a permeabilidade ao ar, volume e retenção de água durante o processo de compostagem, além de ser o principal material para a formação de húmus (HUBBE et al., 2010). São várias as enzimas envolvidas na quebra da celulose dos grupos das endocelulases, exocelulases e celobiases. Já as hemiceluloses e ligninas, devido às suas características estruturais e heterogeneidade têm uma degradação mais difícil, sendo as precursoras da humificação do composto orgânico. O dejeto de suínos é composto basicamente de fezes e de urina, mais ou menos diluído segundo o tipo de manejo de água adotado nos sistemas de produção, sendo um produto líquido complexo com altas concentrações de matéria orgânica e nutrientes (KUNZ et al., 2008), cujo teor de matéria seca situa-se entre 50 e 80 g/L (OLIVEIRA, 2002). Portanto, devido à necessidade de remoção da umidade do dejeto, o manejo evaporativo do processo deve ser privilegiado de tal forma que se consiga incorporar um grande volume de dejetos ao substrato. Na utilização de maravalha e de serragem para a compostagem de dejetos de suínos têm sido alcançadas relações superiores a 1:8 (substrato/dejeto) (NUNES, 2003). 6 EFEITO SANITIZANTE DA COMPOSTAGEM A compostagem adequada elimina patógenos e sementes de ervas daninhas através da alta temperatura, em função do calor metabólico gerado pelos microorganismos (HANAJIMA et al., 2006). Para a inativação de microorganismos patogênicos presentes na biomassa de pilhas estáticas de compostagem são necessários 37 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 et al. (2010) encontraram uma redução de sete vezes na emissão de CH4 no processo de compostagem em relação à esterqueira, e a emissão de H2S, responsável pelo mau cheiro, foi inexpressiva comparada ao manejo dos dejetos na forma líquida. Embora a compostagem de dejetos líquidos de suínos promova a mitigação da emissão de gases, nesse processo também ocorrem importantes perdas de nitrogênio principalmente na forma de NH3 que podem atingir de 16 a 74% dependendo do processo (REN et al., 2010). Durante a compostagem ocorre a elevação da temperatura e do pH, que concomitantemente com o revolvimento ou aeração das pilhas, proporcionam a transformação do N-mineral em NH3, que é volatilizada (SANTOS, 2008; FUKUMOTO & INUBUCHI, 2009; HUBBE et al., 2010). A volatilização de NH3, além de representar uma significativa perda de nitrogênio, produz chuva ácida que pode acarretar sérios danos ambientais (DIESEL et al., 2002). Ainda que a NH3 seja o gás mais emitido na maioria dos sistemas de compostagem, outros gases como os GEE (N2O, CH4 e CO2) também são emitidos (CALDERÓN et al. 2004; FUKUMOTO & INUBUCHI, 2009; SARDÁ et al. 2010). Segundo o estudo de PAILLAT et al. (2005), as emissões de GEE em sistemas de compostagem de dejetos de suínos representam perdas de 57% do carbono inicial emitido sob a forma de CO2, 6% na forma de CH4 e 6% do nitrogênio inicial na forma de N2O. Devido à importância ambiental e econômica das emissões de gases produzidos nos sistemas de compostagem, trabalhos focados na mitigação desse problema vêm sendo desenvolvidos em vários países como o Brasil, China, Estados Unidos e Canadá. A redução nas emissões de GEE pode ser realizada com diferentes estratégias, interferindo-se em aspectos químicos, físicos e microbiológicos do processo (FERNANDES & SILVA, 2009; HABART et al., 2010). No controle da emissão de NH3, os trabalhos desenvolvidos focam principalmente o controle com uso de aditivos químicos e métodos físicos. BUENO et al. (2008) constataram que as perdas do N-NH3 podem ser evitadas significativamente com o manejo nas características físicas da compostagem, utilizando partículas de menor tamanho e com nível médio abaixo de aeração nas pilhas. Já o controle da emissão de NH3 três dias sob temperaturas acima de 55°C (ZALESKI et al., 2005). Já para os compostos produzidos em pilhas revolvidas, é necessário manter um mínimo de 55ºC por 15 dias consecutivos, revolvendo o material pelo menos cinco vezes neste período (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006). A elevação da temperatura é um indicativo do equilíbrio microbiológico nas pilhas (VALENTE et al., 2009). Contudo, além da temperatura, outros fatores que podem influenciar a inativação de organismos patogênicos são o tipo de matéria-prima e sua umidade, sendo necessário o monitoramento das condições das pilhas de compostagem para comprovar a eficácia do tratamento (TURNER et al., 2002). No processo de compostagem ocorre a diminuição de emissão de odores, desidratação dos resíduos, tornando-os mais seguros de manusear e transportar (LISKA & KIK, 2011). A aplicação de resíduos de origem animal em culturas destinadas à alimentação humana pode ser um risco para a saúde e higiene, se forem aplicados sem tratamento, devido à alta carga viral, bacteriana e patogênica (HANAJIMA et al., 2006). 7 EMISSÃO DE GASES DO EFEITO ESTUFA E SEU CONTROLE A geração e o uso irracional dos dejetos da atividade pecuária têm ocasionado a poluição e a degradação da atmosfera, principalmente pela emissão de amônia (NH3), dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e gás sulfídrico (H2S) (CALDERÓN et al., 2004; KUNZ et al., 2008; SARDÁ et al., 2010). No Brasil, segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia (2009), a emissão de gases do efeito estufa (GEE) foi de 2,2 bilhões de toneladas. A contribuição da agricultura nas emissões desses gases no Brasil é estimada em 75% das emissões de CO2, 91% das emissões de CH4 e 94% das emissões de N2O (CERRI & CERRI, 2007). Com vista a mitigar a emissão de gases pelos dejetos da suinocultura, a compostagem pode ser eficiente em comparação aos sistemas de armazenagem de dejetos em esterqueiras, ou quando aplicados diretamente no solo. Assim, a técnica reduz os impactos ambientais pela mitigação do efeito estufa e pela redução de odores. (CALDERÓN et al., 2004; FUKUMOTO & INUBUCHI, 2009). Como exemplo, SARDÁ 38 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 com uso de métodos químicos pode ser feito com a diminuição do pH, por meio da adição de substâncias acidificantes no dejeto (VANDERZAAG et al., 2011). Segundo KAI et al. (2008) a redução do pH de 7,5 para 6,3 proporciona uma diminuição de 65 % na emissão de amônia quando esses dejetos são aplicados no solo. Porém, com redução do pH para 6,0, esta redução chega a 82 % (STEVENS et al., 2009). Em sistemas de compostagem, os aditivos para redução do pH podem ser aplicados diretamente nas pilhas. WANG et al. (2006) obtiveram redução de 11,9% na emissão de N com uso de vinagre de bambu na proporção de 1:1000 em compostagem de dejeto de suínos. A adição de gesso e fosfatos na compostagem também diminui a emissão de NH3. Conforme PROCHNOW et al. (2001), essa diminuição na emissão de NH 3 é atribuída principalmente à aciJUN residual e à produzida pela decomposição desses aditivos. Outros métodos empregados na emissão da NH 3 utilizam materiais que adsorvem ou reagem com o amônio. Um destes é a zeólita, um aluminosilicato hidratado que possui a capacidade de absorver gases e cátions, podendo ser utilizada de maneira isolada ou juntamente a outros sais, como o alúmen, no controle das perdas de NH3, possibilitando a redução na emissão desse gás em até 90% durante a compostagem (SARDÁ 2006; BAUTISTA et al., 2011). Outros materiais utilizados são o hidróxido de magnésio e o ácido fosfórico, que adicionados à compostagem de dejetos de suínos reagem com o amônio formando o cristal estruvita, diminuindo a emissão de amônia em até 35 % (REN et al., 2010). A emissão de N2O durante a compostagem é menor que a emissão em esterqueiras; no entanto, ainda ocorre emissão durante o processo de compostagem. No sentido de mitigar essa emissão, FUKUMOTO & INUBUCHI (2009) adicionaram bactérias oxidantes de nitrato durante o processo de compostagem de dejetos de suínos e constataram a redução da concentração de NO2 e, consequentemente, a diminuição de 70 % da emissão de N2O comparado com a testemunha. O controle na emissão do CH4 pode ser eficiente aplicando o manejo adequado de revolvimento ou aeração, já que a formação do metano se dá em condições anaeróbicas (PARK et al., 2011). Esses autores verificaram emissões de CH4 em sistemas de compostagem com ar forçado, com revolvimento e sem revolvimento, na ordem de 1,6; 7,9; e 11,4, respectivamente. SZANTO et al. (2007) verificaram em sistemas de compostagem, emissões de CH4 variando entre 12,6 e 0,4% do volume sólido degradado em pilhas estáticas e revolvidas, respectivamente. A emissão de H2S, responsável pelo mau cheiro dos dejetos suínos depositados em esterqueiras é reduzida no processo de compostagem com aeração controlada (SARDÁ et al., 2010). Os métodos para controle de emissão de gases podem ser realizados de maneira integrada. Como exemplo, FUKUMOTO et al. (2010) constataram que o uso de estruvita associado a bactérias oxidantes de nitrito reduzem em até 43 % a emissão de NH3 e até 80 % da emissão de N2O. 8 USO DO COMPOSTO ORGÂNICO NA AGRICULTURA A aplicação de resíduos de origem animal, sem nenhum tratamento, em culturas para a alimentação humana, pode ser um risco em função da alta carga patogênica (HANAJIMA et al., 2006). Portanto, a qualidade do produto final da compostagem deve ser normatizada por legislações específicas, e sua qualidade depende dos resíduos orgânicos e dos processos empregados (VALENTE et al., 2009). No Brasil, a legislação em vigor para alimentos é regulamentada pela RDC nº 12, de 02 de Janeiro de 2001. Para hortaliças frescas, in natura, selecionadas ou não, estabelece-se apenas a ausência de Salmonella spp. em 25 gramas de produto (BRASIL, 2001). Entretanto, a utilização de dejeto na forma líquida em hortaliças para o consumo in natura, especialmente as folhosas, não é recomendado em função do alto risco de contaminação (SEDIYAMA et al., 2000). BAUMGARTNER et al. (2007) observaram contaminações com coliformes fecais e totais, em folhas de alface, em função da utilização de água residuária da suinocultura. A compostagem é uma forma segura e 39 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 eficaz de utilização de resíduos (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006), pois durante o processo, há destruição de patógenos e sementes de plantas daninhas através da alta temperatura (HANAJIMA et al., 2006). Assim, o produto final da compostagem pode obter alto valor agronômico pela sanitização e pela concentração de nutrientes (KUNZ et al., 2009), pois além de eliminar microorganismos patogênicos da matéria orgânica, o composto orgânico é um produto parcialmente mineralizado e de grande potencial na nutrição de plantas (ABREU JUNIOR et al., 2005). O composto orgânico proveniente da compostagem de dejeto líquido de suínos pode ser utilizando em pequenas (OLIVEIRA & HIGARASHI, 2006) e grandes áreas agrícolas (KUNZ et al., 2009). Dentre os principais usos, tem-se sua utilização em hortaliças tais como cebola (VIDIGAL et al., 2010), alface (SILVA et al., 2010) e pepino (NADDAF et al., 2011); em grandes culturas como o milho (KUNZ et al., 2009); no cultivo de flores (ATIYEH et al., 2002); e na área florestal, para a produção de mudas de diversas espécies (MAEDA et al., 2007). REFERÊNCIAS ABREU JUNIOR, C. H. BOARETTO, A. E.; MURAOKA, T.; KIEHL, J. C. 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A coleta de dados se deu a partir de uma intervenção com a produção de desenhos feitos pelos sujeitos de pesquisa e com um questionário organizado com questões abertas, o que permitiu ao/a entrevistado/a transcorrer livremente sobre o tema e também que todos eles/elas sejam comparados com o mesmo conjunto de perguntas. Muito tem se questionado sobre a relação professor/estudante e as implicações desta relação no processo de ensinar e de aprender. Oportunizar o/a estudante a expressar-se sobre a imagem que tem de seu/sua professor/a possibilitou a reflexão e análise acerca dessa imagem e perceber que ela interfere no processo de ensinar e de aprender. Pesquisar e refletir sobre a imagem que o/a estudante tem de seus/suas professore/as, com o intuito de produzir possibilidades de aprendizagem para todos. Esse trabalho poderá ainda contribuir com a escola, promovendo a reflexão e a superação das dificuldades vivenciadas pelos estudantes e professores/as, possibilitando mudança e transformação. No decorrer desse estudo, percebi que os estudantes raramente têm oportunidade de se expressarem em relação à escola e aos professores/as. Os resultados dessa pesquisa mostram ainda que são várias as imagens que os estudantes têm de seus/ suas professores/as, Imagens de professores/as despreparados, fechados em suas metodologias e repetitivos discursos. Outras imagens que os estudantes têm são de professores/as amigos/as, dinâmicos, qualificados e preocupados com os estudantes. O estudo foi embasado em teóricos como: Tardif (2005), Oliveira, Bossa (1998), Oliveira (2004) e Arroyo (2000). The study Images and reflexes about the school way: the student look about the teacher aimed to investigate and analyze the teachers images realized by students at th grade of Elementary School in relation to their teachers and their implications in the process of teaching and learning. It was a research of qualitative approach, data collection occurred from an intervention with the production of drawings made by research subjects and a questionnaire organized with open questions that allowed the interviewee elapse freely on the subject and they are all compared with the same set of questions too. Much has been asked about the teacher student relationship and its implications in the process of teaching and learning. Giving the opportunity of the student to express himself about the image he has of his teacher allowed reflection and analysis about this image and realization that it interferes in the process of teaching and learning. The objective is also searching and thinking about the image that the student has of his teachers, in order to produce learning opportunities for all. This work can also contribute to the school, promoting reflection and overcoming the difficulties experienced by students and teachers, enabling change and transformation. During this survey, I realized that students rarely have the opportunity to express themselves in relation to school and to teachers. The results also show that there are several images that students have of their teachers, Images of unprepared teachers, closed on their methodologies and repetitive speeches. Other images that students have are of friend, dynamic, qualified and concerned about the students. The study was based on theoretician as Tardif , Oliveira, Bossa , Oliveira and Arroyo . Palavras-chave: Imagem. Estudante. Professor. Keywords: Image. Student. Teacher. 1 Pedagoga Egressa do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia SETREM;[email protected] 2 Professora orientadora deste estudo, Mestre em Educação nas Ciências, professora da Faculdade Três de Maio – SETREM . Coordenadora do Núcleo de Pesquisa da Educação NUED e-mail: [email protected]. 3 Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM, Av. Santa Rosa, 2405; Três de Maio - RS, [email protected] 44 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO 2. ADOLESCÊNCIA E O PROCESSO DE ENSINAR E APRENDER Muito tem se questionado sobre a relação professor/estudante e as implicações desta relação no processo de ensinar e de a p r e n d e r. E s t u d o s d i r e c i o n a d o s a compreender o/a professor/a, ou então, a identificar qual a imagem que o/a professor/a tem de si próprio/a ou qual a imagem que a sociedade tem dos/as professores/as se inserem no contexto da Educação, discutindo a relação professor/estudante. Para entender a origem da adolescência, cabe ressaltar inicialmente que a infância é uma invenção do século XVII. Segundo Áries (1978), é a partir daí que infância começa a ter importância na sociedade e a família passa a se preocupar com a mesma. Essa temática passa a ter grande importância para a sociedade que antes não se preocupava com ela. To r n a - s e , p o r t a n t o , r e l e v a n t e investigar qual é a imagem que o estudante tem de seu/sua professor/a. Muitas reflexões, estudos buscando entender o/a professor diante de sua prática, voltando o olhar para si próprio/a, ou então, é o olhar da sociedade que se direciona para o/a professor/a em busca de compreensão. O estudante, inserido no contexto direto com o/a professo/a, não é, muitas vezes, questionado sobre o que pensa. A adolescência, por sua vez, é um tema ou invenção da contemporaneidade. Como diz Caligarris (2000), faz apenas um século que a adolescência se torna um tema a ser estudado, antes, porém, não era um fato social reconhecido. Era uma faixa etária, mas não por isso um grupo social. Ainda menos um estado de espírito e um ideal da cultura. A origem e o significado da palavra adolescência dão uma ideia de quem são esses sujeitos. Há algum tempo atrás a adolescência era considerada apenas uma etapa de transição entre a infância e a idade adulta. No entanto, segundo Osório (1989): Nesse sentido, busquei proporcionar aos estudantes um momento para se expressarem sobre a imagem que têm de seu/sua professor/a para que, a partir dessa investigação, pudessem refletir e analisar se essa imagem interfere no processo de ensinar e de aprender. Nas últimas décadas, contudo, a adolescência vem sendo considerada o momento crucial do desenvolvimento do i n d i v í d u o, a q u e l e q u e marca não só a aquisição da imagem corporal definitiva c o m o t a m b é m a estruturação final da personalidade. É uma idade não só com características biológicas próprias, mas como uma psicologia e até mesmo uma sociologia peculiar (OSÓRIO, 1989, p.10). Para este estudo, foi realizada uma pesquisa de campo com abordagem qualitativa e os sujeitos da pesquisa foram estudantes da 8ª série/ano do Ensino Fundamental de duas escolas, uma de Educação Básica e outra de Ensino Fundamental do município de Boa Vista do Buricá. A coleta de dados se deu a partir de uma intervenção com a produção de desenhos. Também foi realizada entrevista semiestruturada e a observação assistemática, que, segundo Marconi e Lakatos(2006), consiste em recolher e registrar os fatos sem que o pesquisador necessite fazer perguntas diretas Cada vez mais vem sendo realizados estudos sobre a adolescência a fim de conhecer e entender essa fase de transformações físicas e comportamentais, biopsicossociais. Segundo Calligaris (2000), o sujeito se torna adolescente quando: A partir dessa coleta de dados foi feita a discussão e a interpretação dos dados, na qual, tornou-se relevante conhecer e entender os sujeitos da pesquisa: os adolescentes. Conceituando alguns termos, trazendo também a historicidade dos mesmos. apesar de seu corpo e seu espírito estarem prontos para a competição, não é reconhecido como adulto. Aprende que, por volta de mais JUN anos, ficará sob a 45 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 tutela dos adultos, preparando-se para o sexo, o amor e o trabalho, sem produzir, ganhar ou amar; o u e n t ã o, p r o d u z i n d o, ganhando e amando, só que m a r g i n a l m e n t e (CALLIGARIS, 2000, p.15) O adolescente, por sua vez, encontrase em uma luta em busca de identidade. Nessa busca, as angústias, as inseguranças e os medos são companhias constantes. É por isso que os amigos são considerados tão importantes e mais procurados que os pais. Portanto, a relação que os pais e as mães têm com seus filhos é muito importante. É preciso ter compreensão, paciência, apoiar dialogar e amar, mas acima de tudo, dar limites e não superproteger o/a filho/a, para que tenham a capacidade de se tornarem autocríticos, seguros e autônomos. Segundo Outeiral (1994): Portanto, nessa fase surgem conflitos entre os adolescentes, seus familiares e a escola. Eles buscam compreensão e atenção. Cabe ao adulto mediar esse processo difícil para ambos. Sendo a adolescência, denominada como uma fase de transição entre ser criança e se tornar adulto, ou melhor, a etapa em que o indivíduo se desenvolve tanto física como psicologicamente, algumas características são comuns entre os mesmos, ou mudam dependendo do meio cultural em que vivem como afirma Zagury (1996): É necessário enfatizar que as crianças e os adolescentes “pedem limites” e que o “limite” os a j u d a a o rg a n i z a r s u a mente. Os adultos, às vezes, não colocam limites porque assim será mais “cômodo”. Colocar limites significa envolvimento, “conter” o adolescente, suportar suas reclamações e protestos, enfim enfrentar dificuldades (OUTEIRAL, 1994, p. 35). A adolescência caracterizase por uma fase de transição entre a infância e a juventude. É uma etapa extremamente importante do desenvolvimento, com características muito próprias, que levará a criança a tornar-se um ser adulto, acrescida da capacidade de reprodução. As mudanças corporais que ocorrem nesta fase são universais, com algumas variações, enquanto as psicológicas e de relações variam de cultura para cultura, de grupo para grupo e até entre indivíduos de um mesmo grupo (ZAGURY, 1996, p.24). Dar limites é muito mais do que impor algo. É preparar para vida. A falta de limites poderá prejudicar o adolescente no convívio em sociedade e até mesmo dificultar o aprendizado escolar. O olhar das pessoas que fazem parte da vida dos adolescentes, em relação aos estudos, à escola e ao saber, direciona o olhar do adolescente. A escola faz parte e, na maioria das vezes, é o primeiro contato da vida social, tanto das crianças quanto dos adolescentes. A escola é muito importante no processo de socialização do adolescente, segundo Outeiral (1994): Nessa fase do desenvolvimento intelectual se destacam a compreensão e o raciocínio rápido, que levam o adolescente a ter certa independência intelectual, maior capacidade para refletir, questionar. Os adolescentes não aceitam mais as coisas ditas como verdades, eles discutem, criticam e t i ra m a s p r ó p r i a s c o n c l u s õ e s . E s s e comportamento traz insegurança aos pais e às mães, que são frequentemente questionados e de certa maneira afrontados, percebem a súbita independência do/a filho/a. Acostumados a ser referência para os/as filhos/as, essa nova postura assusta e exige um preparo que muitos pais e mães não têm, pois ainda consideram o/a filho/a uma criança. O que confere à escola importância vital no p r o c e s s o d e desenvolvimento do adolescente é o fato dela ter a característica de ser uma simulação da vida, na qual existem regras a serem seguidas, mas que se pode transgredi-las sem sofrer as consequências impostas pela sociedade, e ser esta uma oportunidade de a p r e n d e r c o m a transgressão (OUTEIRAL, 1994, p.38). 46 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Possibilitando, desta forma, uma relação de socialização, na qual o adolescente vai em busca de sua identidade, segundo Outeiral (1994): filhos/filhas, transmitem valores para que o/a adolescente perceba a importância dos estudos e da escola em sua vida. O processo de ensinar e de aprender, na escola, envolve professores/as e estudantes. Juntos se tornam sujeitos deste processo, que passa por várias situações, seja de amizade e companheirismo ou de conflito, mesmo quando estes estudantes são adolescentes, que se encontram numa fase conturbada em busca de sua identidade. [...] encontra na micro sociedade da escola um sistema de forças que atuam sobre ele, onde, entre outras coisas, reedita seu ciúme fraterno, compete, divide, rivaliza, oprime e é reprimido, ou seja, reproduz o sistema social. É por esta razão que a escola, muitas vezes, pode detectar dificuldades no processo de desenvolvimento do aluno, que aparece por inteiro na busca de si mesmo, e seu olhar sobre o que ele é, em geral, menos comprometido emocionalmente do que acontece com os pais (OUTEIRAL, 1994, p.39). A ecola nessa fase tem importância considerável para o/a estudante adolescente. Segundo Outeiral (1994, p.39) “a escola não oportuniza somente a relação com o saber, e como uma atividade eminente grupal, tem também funções de socialização”. Os estudantes, muitas vezes, passam a maior parte do dia na escola. Como as mudanças sociais acontecem de forma muito rápida em relação ao contexto escolar, o estudante busca informações e sabe que a escola não é o único lugar no qual ele aprende. O/a professor se vê diante de situações em que o estudante tem muitas informações sobre muitas coisas, mas não tem o conhecimento. Diante disso, Tardif e Lessard (2005, p.143) afirmam que: “[...] toda a relação dos professores com seus alunos/as se transforma, atualmente”. Neste processo, a escola se torna caminho para as descobertas da vida em sociedade e da busca pela identidade, pela qual o adolescente procura. Conforme Outeiral (1994, p.36): a função da escola é educar, isto é, conforme o conceito etimológico da palavra, “colocar para fora” o potencial do indivíduo, ao contrário de ensinar, que é in + signo, ou seja, colocar “signos para dentro do indivíduo”. Evidentemente, quando a criança (e o adolescente) chega na escola ela tem, além de seus aspectos constitucionais, suas vivências familiares, mas o ambiente escolar será também uma peça fundamental em seu desenvolvimento. Estes três elementos – aspectos constitucionais, vínculos familiares e ambiente escolar – constituirão o tripé do processo educacional (OUTEIRAL, 1994, p.36). A r e l a ç ã o e n t r e p r o fe s s o r / a e estudantes é muito mais do que a relação ensino/aprendizagem. A afetividade interfere nesse processo, podendo contribuir ou não para a boa convivência em sala de aula. Se for uma relação afetiva boa, ajudarão ambos a alcançarem seus objetivos. Mas nem sempre a relação afetiva é positiva. Vários fatores podem ser considerados. Ao nos referirmos à afetividade na relação professor/estudante, se torna relevante destacar que o/a professor/a deverá ter cuidado e tentar o fe r e c e r t ra t a m e n t o i g u a l a o s s e u s estudantes, como explica Tardif e Lessard (2005): A escola é constituída por professores/as, coordenadores/as, diretores/as, enfim, por pessoas, capazes de erros e acertos, atitudes adequadas ou não, em relação a determinadas circunstâncias. Por isso, é fundamental que haja uma relação de confiança entre pais/mães e professores/as. Os pais e as mães, ao participarem da vida escolar dos/as outro dilema central de sua tarefa diz respeito à equidade do tratamento que os professores devem garantir a todos os alunos, apesar de suas diferenças individuais, sociais e culturais. Esse dilema é a consequência permanente e inevitável de um trabalho dirigido a uma coletividade, 47 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 mas que para ser eficaz, deve dizer respeito aos indivíduos e considerar suas diferenças para fazê-los progredirem (TARDIF e LESSARD, 2005, p.161). vez, quer estabelecer sua autonomia, sua identidade, em busca de objetivos que se difere em seus conceitos. Proporcionar aos/as professores/as e aos estudantes recursos para que possam sempre estar em busca de novos conhecimentos, novos saberes que os constituam, segundo Oliveira (2004): Portanto, o/a professor/a, na sua prática, com estudantes, cada qual com a sua singularidade, se veem diante de um desafio: trabalhar com a diferença sem que os/as estudantes se sintam diferentes. Os docentes devem buscar, construir e transformar seus ensinamentos, levando em consideração que se aprende e se ensina em qualquer lugar, lembrando também que cada aluno traz consigo uma bagagem muito rica, pois cada um vem de uma realidade cultural distinta, podendo, dessa forma, favorecer o processo de formação do conhecimento (OLIVEIRA, 2004, p.75). A escola tem responsabilidades sobre a aprendizagem dos estudantes, o/a professor/a deve auxiliá-los, ou seja, “a escola f i c a re s p o n s á ve l p o r s i s t e m a t i z a r o conhecimento cotidiano do/a aluno/a, auxiliando-o na elaboração e sistematização desse saber que, por hora, encontra-se fragmentado, necessitando de elaboração” (OLIVEIRA, 2004, p. 65). Sob a óptica do trabalho da escola e do/a professor/a, estão os interesses do estudante. O ensino nesse contexto consiste em alcançar alguns objetivos, sendo necessária a socialização e a interação entre professores e estudantes. Conforme Tardif e Lessard (2005): É necessário estar em constante busca de conhecimento e considerar o que o/a estudante já sabe, pois o/a professor/a não é dono do saber. O/a estudante quando está envolvido no processo de ensinar e de aprender, se torna mais atento e muito mais motivado a buscar e pesquisar. [...] a docência é o que se chama uma atividade instrumental, ou seja, uma atividade estruturada e orientada para objetivos a partir dos quais o ensino compreende, planeja e executa sua própria tarefa, utilizando e coordenando vários meios adequados para realizá-la. Em suma, ensinar é agir em função de objetivos no contexto de um t ra b a l h o re l a t i va m e n t e planejado no seio de uma organização escolar b u ro c r á t i c a ( TA R D I F e LESSARD, 2005, p.196). 3. O OLHAR DO ESTUDANTE SOBRE O/A PROFESSOR/A Tantos olhares se direcionam aos professore/as, críticas, opiniões, da sociedade e dos/as próprios/as professore/as. O que realmente me intriga é que os estudantes, sujeitos do fazer pedagógico dos/as professores/as, raramente têm a oportunidade de se expressarem sobre seu olhar referente à seus/suas professore/as. Nesse sentido, busco compreender as imagens docentes percebidas pelos estudantes de 8ª série do Ensino Fundamental com relação a seus/suas professores/as e as implicações destas no processo de ensinar e aprender. Ensinar, portanto, é considerar o estudante como foco, em busca de objetivos que são estruturados e orientados, mas que ao mesmo tempo, buscam envolver o sujeito desse processo. São seguidos os pressupostos estabelecidos, mas os objetivos que professores/as e estudantes buscam, podem não ser os mesmos. Cada qual na sua singularidade procura alcançar suas metas, o/a professor/a quer que o estudante aprenda, adquira conhecimento. Este por sua Para melhor organização das falas dos estudantes, foram usados a letra “E”, e os números de 1 a 40 para denominar os estudantes e, para as escolas, foram usadas as letras “A” e “B”. Para que este estudo se tornasse realidade, foi fundamental o consentimento das escolas, as quais foram campo de 48 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 com a prática cotidiana da sala de aula (CUNHA, 1989, p.71). pesquisa, e a participação dos estudantes, que se dispuseram a responder os meus questionamentos, e sem os quais esta pesquisa não poderia se tornar realidade. A forma como professor/a e estudante se relacionam perpassa o conteúdo de ensino. A afetividade, o interesse que o/a professor/a demonstra pelos estudantes, faz com que eles se sintam acolhidos e confiantes para que possam se expressar e participar das aulas. O E8 da escola A, diz que: “Gostaria que os professores fossem mais amigos dos alunos”. Demonstrando, dessa forma, que os laços de afetividade são considerados importantes para os estudantes, na relação com o/a professor/a na sala de aula. Investigando as imagens que o estudante tem de seus/suas professores/as, ressalto a importância de considerar que, segundo Cunha (1989): Não há dúvida de que existe entre o aluno e o professor um jogo de expectativas relacionadas aos respectivos desempenhos. A escola como instituição social determina aos seus próprios i n t e g r a n t e s o s comportamentos que deles se espera. Por outro lado, como instituição social, ela é determinada pelo conjunto de expectativas que a sociedade faz sobre ela (CUNHA, 1989, P.65). Os estudantes adolescentes demonstram em suas respostas, que já não aceitam mais qualquer discurso, eles questionam, exigem qualificação dos professores, conforme diz o E10 da escola A, “Gostaria que os professores fossem qualificados e capacitados, para que possam nos mostrar um bom aprendizado, mas também que respeitem todos os seus alunos.” Segundo Outeiral (1994, p. 18) “ o processo de estabelecimento de novos vínculos com a família e a sociedade, não mais em termos infantis e sim dentro de um modelo mais adulto, é uma das tarefas da adolescência.” Ta n t o p r o fe s s o r e s / a s c o m o o s estudantes seguem padrões e normas instituídas pela escola e pela sociedade, que determinam os valores, o que é certo ou errado e, principalmente, o que se espera de cada um em seu papel social como professor/a e estudante. Portanto, o estudante adolescente vê seus/suas professores/as de modo diferenciado, e também quer que ele próprio seja visto pelos/as professores/as não mais como criança, mas como alguém que tem suas ideias e opiniões, e quer ser respeitado, como diz o E19 (escola A): “Gostaria que entendessem os alunos, que não fossem tão rigorosos (alguns), que fossem legais.” E ainda segundo o E25 (escola A): “Que pensassem mais antes de falar as coisas, às vezes, porque um aluno desobedece, todos sofrem as consequências.” Cabe ressaltar o que Osório (1989) diz: Analisando as respostas dos estudantes, percebi diferentes olhares sobre o/a professor/a que gostariam de ter em sala de aula. O E1 da escola B diz que: “eu gostaria que os meus professores fossem mais exigentes nos trabalhos, mas no mais tudo bem.” Os estudantes adolescentes que falam que os/as professores/as devem ser mais exigentes demonstram a necessidade de serem cobrados, terem limites, características típicas da fase em que se encontram: adolescência. Muitas vezes o/a professor/a ou outro adulto que convive com o adolescente, não consegue impor limites. Mesmo que o estudante diga que prefira os/as professores/as “bonzinhos”, ele sabe da importância de ser cobrado, do/a professor/a impor responsabilidades a ele. Segundo Cunha (1989): Com demasiada frequência, tanto os pais como os professores caem no vezo de entupir as cabeças dos jovens com dados sobre o conhecimento humano, em lugar de ensinar-lhes a i n o va r. Tr a t a m o s s e u s intelectos como depósitos a serem preenchidos com informações e não como instrumentos a serem usados na aquisição de novos conhecimentos (OSÓRIO, 1989, p.93). É importante dizer que os alunos não apontam como melhores professores os chamados “bonzinhos”. Ao contrário. O aluno valoriza o professor exigente, que cobra participação e tarefas. Ele percebe que esta é também uma forma de interesse e se articula 49 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 você gosta? Por quê? Relate um pouco as diferentes formas do seu comportamento. Nesse aspecto, é interessante ressaltar que dos 45 estudantes das escolas A e B, 32 responderam que se comportam de modo diferenciado nas aulas que gostam e das que não gostam. Conforme Cunha (1989): Dessa forma, o/a professor/a, na visão dos estudantes, muitas vezes, não conseguem satisfazer seus anseios, em busca do conhecimento. Demonstram claramente que estão constituindo suas opiniões, e começam a analisar o que lhes é posto. Ao mesmo tempo, percebo que eles se tornam cuidadosos e atentos, mais seguros em relação àquilo que desejam. O E36 da escola A diz: “Eu gosto como eles são, todos tentam dar o máximo para que nós possamos a p r e n d e r.” D i fe r e n t e s o p i n i õ e s , q u e demonstram que entendem a importância dos estudos e do/da professor/a. Conforme Osório (1989, p.93): “O gosto pelo estudo só se desperta em um clima de liberdade e respeito ao desejo inato dos seres humanos de conhecer e compreender tudo que está a sua volta ou no seu próprio interior.” A forma como o professor se relaciona com a sua área de c o n h e c i m e n t o é fundamental, assim como sua percepção de ciência e d e p r o d u ç ã o d o conhecimento. E isto é passado para o aluno e interfere na relação professor-aluno; é parte dessa relação (CUNHA, 1989, p.71). Portanto, a forma como o/a professor se relaciona com o conteúdo, influencia no relacionamento professor/a estudante, fazendo com que gostem mais das aulas e dos/das professores/as. O E2 da escola A diz: “Nas aulas que eu gosto eu tento me comportar, porque eu gosto das aulas. Nas aulas ruins, dá sono, já nas aulas boas nós ficamos atentos.” E12 diz: “Sim, pois há aulas chatas, sempre a mesma coisa, e como se torna enjoativo e não presto muita atenção.” O/a professor/a lida com uma classe com estudantes diferentes, cada qual com suas características próprias; portanto, nem sempre conseguem interagir da mesma forma com todos. Segundo Cunha (1989, p.71) “Parece consequência natural para o professor que tem boa relação com os alunos, preocupar-se com os métodos de aprendizagem e procurar formas dialógicas de interação.” São geralmente professore/as com esse diferencial que conseguem maior atenção por parte dos estudantes. Po r t a n t o, q u a n d o o e s t u d a n t e adolescente se sente seguro e tem liberdade para se expressar, ele poderá discutir, criticar e manifestar sua opinião, mantendo uma relação tranquila com a escola e com os/as professores/as. A fim de analisar se a imagem que os estudantes têm de seus/suas professores interfere na aprendizagem, foram feitas as seguintes perguntas: você gosta de todos os professores? Por quê? Na escola A e na escola B, totalizando 45 estudantes, 23 responderam que sim, e destacam que percebem que os/as professores/as estão preocupados com o futuro deles, e têm qualificação e interesse em ensinar, sendo amigos e proporcionando aulas boas. Nesse sentido, concordo quando Cunha (1989) diz que: “[...] as atitudes e valores dos professores que estabelecem relação afetiva com os alunos, repetem-se e intrincam-se na forma como eles tratam o conteúdo e nas habilidades de ensino que desenvolvem (CUNHA, 1989, p. 70)”. Ainda com referência à questão acima mencionada, 13 dos estudantes, das duas escolas, dizem que não mudam seu comportamento, que é sempre o mesmo. O E17 da escola A diz: “Não. Em todas meu comportamento é igual, converso muito em todas as aulas.” Já o E31(escola A) diz: “Não, sempre antenada nos estudos e prestando muita atenção. Não tem diferentes formas de meu comportamento.” Percebo que alguns estudantes parecem ter atitudes mais sérias, até mesmo mais responsáveis, não veem os/as professores/as como culpados pelo comportamento dos estudante; pelo contrário, responsabilizam-se pelo que Pois é no convívio que o estudante poderá definir uma imagem de seus/suas professores/as, do envolvimento com o ensino/aprendizado, e nas relações em sala de aula. Do total de estudantes, 21 responderam que não gostam, por que alguns não explicam a matéria, ou por que não deixam fazer o que querem e por ser muito exigentes. Para complementar, os estudantes responderam à última questão: Você se comporta de forma diferente nas aulas que 50 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 dos/das próprios/as professores/as. Percebi, nesta pesquisa, que os estudantes não se deixaram influenciar. Expuseram a sua opinião, clara e objetiva, demonstrando a real imagem que tem de seus/suas professores/as. acontece em sala de aula. Valorizam o/a professor/a que exige e cobram conhecimento dos estudantes. A quarta e última questão era: represente através de um desenho, uma aula que você considera boa e uma aula que você considera ruim. Segundo Bossa e Oliveira (1998), o desenho livre costuma ser um recurso útil para despertar a possível estruturação da forma verbal de se expressar com facilidade, a partir do desenho. Por isso, o desenho se tornou instrumento de análise para interpretar as imagens que os estudantes têm de seus/suas professores/as. Alguns desenhos mostram que os estudantes consideram boas as aulas que eles mais gostam como Educação Física por exemplo. Mas a grande maioria dos estudantes demonstrou que, independente da matéria, todas as aulas poderão ser boas, dependendo da metodologia que o/a professor/a usar. Os estudantes querem professores/as que os desafiem a buscar, a superar seus limites, segundo Cunha (1989, p.158): “o que e l e s q u e r e m é u m / u m a p r o fe s s o r / a intelectualmente capaz e afetivamente maduro.” Afinal, são estudantes adolescentes, que estão em formação e transformação psicológica, e precisa de orientação para que possam se sentir parte do contexto social. Segundo Weber (1999): Foram analisados 45 desenhos, todos diferentes um do outro. Somente num aspecto notei grande semelhança: os estudantes estão cientes do que querem e precisam. Eles mostram claramente o que pra eles é uma aula ruim, e o que é uma aula boa. Demonstram também, que gostam e precisam ser desafiados a buscar o conhecimento. O estudante espera ser desafiado, que o/a professor o instigue a pesquisar, trabalhar em grupo e com dinâmicas diferenciadas. Eles demonstram que não se motivam com metodologias rígidas, monótonas e pesadas. A aprendizagem é responsável pela inserção da pessoa no mundo da cultura. Mediante a aprendizagem o sujeito se incorpora ao mundo cultural, com uma participação ativa, ao se apropriar de conhecimentos e técnicas, construindo em sua interioridade um universo de representações simbólicas (WEBER, 1999, p.53). As imagens relacionadas aos professores/as, muitas vezes são aquelas que a mídia ou a sociedade nos mostram e influenciam nossas próprias opiniões. Segundo Oliveira (2004): A imagem do magistério que a mídia veiculou nos últimos anos mostra como o professor ocupou o lugar social dos diferentes, dos heterogêneos, dos sagrados, ainda que não tenha sido esta a única imagem encontrada (OLIVEIRA, 2004, p.115). Portanto, o estudante adolescente tem na escola, nos/nas professores/as e até mesmo nas questões metodológicas um vínculo para se tornar adulto. Ele busca na escola e nos/nas professores/as espaço e liberdade para se expressar e mostrar quem ele é. O/a professor/a já teve muito prestígio e a mídia veiculou um status aos professores/as que durante muito tempo tornavam-nos heróis, inatingíveis. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Definir as imagens de professor/a não é fácil. Todos se acham no direito de opinar, de dizer o que pensam quando falamos do magistério. A mídia, a sociedade e os/as próprios/as professores/as, definem qual é a imagem de professor/a. Arroyo (2000, p.30) me faz pensar quando diz: “o desencontro entre imagens sociais e imagens pretendidas pela categoria e autoimagens pretendidas por cada um cria uma tensão, um mal-estar que Mas, segundo Oliveira (2004, p.116): “[...] os textos que antes exaltavam o magistério, colaborando na constituição de uma imagem de prestígio, passaram, a partir dos anos 60, a noticiar as mazelas, as dificuldades da categoria.” Hoje, a imagem do/da professor/a, tem influência da mídia, da sociedade e 51 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 professores/as, por vezes são imagens em que eles representam com crítica, apontam falhas, por outra, muito além disso, mostraram que a imagem que prevalece é a de professores/as preocupados/as com a aprendizagem e o crescimento deles/as. mantém sempre a pergunta: quem somos?” Portanto, é fundamental dar voz àqueles que são os sujeitos do fazer pedagógico dos/das professores/as: os estudantes. Analisando os questionários, os desenhos, pude perceber que a opinião deles não teve influência. Observei durante a realização da pesquisa, grande interesse por parte dos estudantes para participar desse estudo, por terem a oportunidade de serem ouvidos. Tiveram muita tranquilidade na hora de responderem às questões propostas. Percebi que raramente os estudantes têm oportunidade para se expressarem livremente sobre a escola e os/as professores/as. Se os/as professores/as soubessem o que de fato eles pensam de sua ação em sala de aula, poderiam fazer muito mais e melhor o seu trabalho, pois muitas vezes os/as professores/as não fazem ideia do quanto são importantes, e a diferença que um gesto de confiança direcionado ao estudante poderá fazer na vida deles. Várias são as imagens que os estudantes têm dos/das professores/as, algumas positivas e outras nem tanto. Imagens de professores/as despreparados, fechados em suas metodologias e repetitivos em seus discursos. Outras imagens que os estudantes têm, são de professores/as amigos/as, dinâmicos, qualificados e preocupados com os estudantes. Este trabalho proporcionou um outro olhar em direção aos/as professores/as e me fez perceber que a prática em sala de aula vai muito além dos conteúdos. É importante que professores/as e estudantes tenham respeito uns pelos outros, para que haja trocas entre ambas as partes. Enfim, para que o processo de ensinar e de aprender se torne prazeroso e possa atender aos objetivos de professores/as e de estudantes. Posso concluir que as respostas da primeira pergunta da entrevista demonstram que os estudantes adolescentes são exigentes e preocupados com seus estudos e com a relação professor/estudante. Ao mesmo tempo, reconhecem que os/as professores/as são importantes no processo de ensinar e de aprender. Percebi, com esse estudo, que a relação afetiva entre professor/a e estudante, está diretamente ligada na aprendizagem. Professores que não demonstram preocupação e que não têm uma relação de amizade com os estudantes, não despertam o mesmo interesse dos estudantes no conteúdo e nas aulas, fazendo com que ele se distraia facilmente com outras coisas, segundo ele, mais interessantes. REFERÊNCIAS ÁRIES, Philippe, História social da criança e da família, Rio de Janeiro: Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1978. CALLIGARIS, Contardo. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000. CUNHA, Maria Isabel da. O bom professor e sua prática. Campinas – São Paulo: Papirus, 1989. Já, os/as professores/as que mantêm uma relação de amizade com seus estudantes, conseguem maior interação e participação em suas aulas. Os estudantes valorizam muito a dinamicidade dos/das professores/as, pois eles querem ser ouvidos e questionados. Sentem-se mais confiantes quando o/a professor/a os instiga à pesquisa e acredita no seu potencial. MARCONI, Mariana de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2006. OLIVEIRA, Valeska Fortes de. Imagens de professor: significações do trabalho docente. 2ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2004. OUTEIRAL, José Ottoni. Adolescer: um estudo sobre adolescência. Porto Alegre: ARTES Médicas Sul, 1994. Ao concluir esse trabalho, posso afirmar que os resultados me surpreenderam em alguns aspectos. Os/as professores/as sempre tão criticados pela mídia e pela sociedade, aos olhos dos sujeitos do fazer pedagógico, dos estudantes, sobre os/as OSORIO, Luiz Carlos. Adolescente hoje. Porto Alegre: Artes médicas, 1989. 52 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. O trabalho docente: elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005. WEBER, Vera Beatriz Pinto Zimermmann. Um olhar psicopedagógico sobre o processo ensino- aprendizagem e as relações afetivas do adolescente na escola. Santo Ângelo: 1999. ____ O olhar dos estudantes do ensino médio sobre a biologia: possibilidades e dificuldades a partir do currículo vigente. Ijuí, 2004. ZAGURY, Tânia. O adolescente por ele mesmo. Rio de Janeiro: Record. 1996. 53 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 INTERLOCUÇÕES SOBRE A PRESENÇA DO GÊNERO MASCULINO NO ESPAÇO ESCOLAR João Ricardo Prestes Froes1 Silvia Natália de Mello 2 SETREM 3 RESUMO ABSTRACT A história da educação nos mostra que num determinado período o espaço escolar tinha uma representatividade grande de sujeitos masculinos. A partir deste fato, me propus a pesquisar e a investigar os fatores que estão contribuindo para o afastamento da figura masculina no Ensino Fundamental de escolas privadas e da rede pública, municipal e estadual. Ainda, o que aconteceu no percurso da história da Educação, na formação de professores que fez e ainda faz com que a figura masculina já não esteja tão presente no contexto escolar? Qual é o sentimento destes professores em relação ao abandono dos sujeitos masculinos das salas de aulas? A pesquisa de cunho qualitativo se desenvolveu no município de Três de Maio; região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Foi desenvolvida com professores que atuam no Ensino Fundamental de escolas privadas e públicas da rede municipal e estadual. Totalizando a participação de sujeitos de duas escolas estaduais, duas particulares e duas municipais. Para a coleta de dados foi utilizado questionário semiestruturado. Percebi que há resquícios dos discursos que são reforçados pela sociedade, o meu sentimento sobre estes sujeitos é que eles se expressam estimulando uma narrativa já existente e que está presente no cotidiano, nas ações dos sujeitos e que parecem estar muito bem alicerçadas às questões referentes à desvalorização do p r o f e s s o r, s a l á r i o s e o a s p e c t o paternal/afetividade. Os principais autores utilizados na discussão teórica são: COLLING (2004), FOUCAULT (2012), LOURO (1997), PERROT (2005), PRIORE (2000), SCOTT (1995), VEIGA-NETO (2003). The history of education shows that in a certain period the school had a large representation of male subjects. From this fact, I set out to research and investigate the factors that are contributing to the removal of the male figure of private, public or municipal Elementary School. Also, what happened in the course of the history of education, in the teachers formation that did and still does with the male figure is not so present in the school context What is the sense of these teachers in relation to the abandonment of the male subjects of the classrooms The qualitative research was developed in the city of Três de Maio; northwest region of Rio Grande do Sul state. It was developed with teachers working in Elementar y Education from public municipal and state and private schools. The participation of subjects is from two state schools, two private and two municipalities. For data collection it was used a semi structured questionnaire. I realized that there are remainders of the speeches that are reinforced by society, my feeling about these guys is that they express stimulating a narrative existing and is present in everyday life, in the actions of individuals and that appear to be well grounded questions concerning devaluation teachers, salaries and paternal affectivity aspect. The main authors of this theoretical discussion are: COLLING , FOUCAULT , LOURO , PERROT , PRIORE , SCOTT , VEIGA-NETO . Keywords: Gender. Magisterium. Poststructuralism. Palavras-chave: Gênero. Magistério. Pósestruturalismo. 1 Pedagogo egresso do Curso de Pedagogia da SETREM, e -mail: [email protected] Professora do Curso de Pedagogia da SETREM, Pedagoga, Mestre em Educação, e -mail: [email protected] 3 Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM, Av. Sa nta Rosa, 2405; Três de Maio - RS, [email protected] 2 54 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 INTRODUÇÃO 1 O TERMO “GÊNERO” E A CONSTRUÇÃO SOCIAL Em meados do século XXI ainda nos deparamos com questões culturais que habitam e transformam a realidade em que estamos inseridos. Questões ligadas ao estudo de Gênero no contexto escolar que se manifestam de forma oculta nos mais variados tipos de discursos e que ainda tendem a gerar segregação e conceitos equivocados em diferentes tipos de interpretações. O estudo de Gênero continua em pauta nos debates de temáticas atuais, apesar de ser pesquisado há algumas décadas. Primeiramente abordo, neste tópico, uma tentativa de definição do termo “Gênero” e sua historicidade. Durante o percurso da caminhada acadêmica, muitas questões me inquietaram. A que com mais veemência chamou minha atenção, como pode ter tão poucos professores de currículo do gênero masculino atuando no Ensino Fundamental? O que aconteceu ao longo da história da Educação e o que contribuiu para o afastamento da figura masculina da sala de aula? Também a falta de compreensão do termo gênero contribuiu para que eu me aproximasse ainda mais desta temática. Sabemos de antemão que no princípio da educação brasileira os homens ocupavam em grande maioria os espaços de salas de a u l a e n q u a n t o p r o f e s s o r e s . Fe z - s e necessário compreender o processo de feminização do magistério, desde o princípio até os dias atuais, as representações do novo profissional da educação e a busca de subsídios no movimento pós-estruturalista. Gênero é uma terminologia nova, usada a partir da segunda metade do século passado. Conforme Scott (1995), “o termo gênero faz parte da tentativa empreendida pelas feministas contemporâneas para reivindicar um certo terreno de definição, para sublinhar a incapacidade das teorias existentes para explicar as persistentes desigualdades entre as mulheres e homens” (p. 85). Mais precisamente na década de 70 do século XX. Anteriormente a este período, muitas das teorias sociais não conseguiram designar e produzir um termo que conseguisse traduzir as diferenças e conflitos entre gênero masculino e gênero feminino. As mulheres, principalmente do velho continente e estadunidense, buscam e propõem novos estudos etimológicos do termo gênero. Louro (1997), diz que “é através das feministas anglo-saxãs que Gender passa a ser usado como distinto de sex” (p.15). A palavra sexo que até então era usado para definir o substantivo masculino e feminino é substituído por gênero. Lembrando que Gender é uma versão de gênero na língua inglesa. Busquei, através da coleta de dados, analisar e compreender os dados subjetivos dos sujeitos referentes à temática que me propus investigar. Como os professores percebiam a participação do gênero masculino e feminino no Ensino Fundamental enquanto professor das diversas áreas do conhecimento? Considerando as estatísticas atuais que apontam números restritos de professores homens atuando na Educação Básica, principalmente na Educação Infantil e Ensino Fundamental, quais os fatores estão contribuindo para o afastamento da figura masculina deste espaço? Qual o sentimento, enquanto professor, em relação ao abandono dos sujeitos masculinos das salas de aula? É importante termos professores do gênero masculino atuando nas séries iniciais do Ensino Fundamental? Gênero foi utilizado durante muito tempo para designar os diferentes tipos de seres vivos, era mais uma nomenclatura utilizada para selecionar os grupos da Ciência. Com o advento da modernidade “surge o conceito de gênero, referindo-se à construção social e histórica dos sexos, ou seja, buscando acentuar o caráter social das distinções baseadas no sexo” (LOURO, 1995, p.103). No entanto, faço referência neste estudo para gênero, não enquanto categoria biológica, mas sim como o resultado de um produto social. A pesquisa realizada foi de abordagem qualitativa, com procedimento de pesquisa explicativa. Utilizei a técnica de questionário aberto (semiestruturado) como instrumento de investigação, apresentado por escrito aos sujeitos, composto por quatro questões. Foram selecionados três (3) professores da rede privada, oito (8) professores da rede municipal e estadual para responder ao questionário. Pontuo que vários destes professores atuam em duas redes de ensino simultaneamente. 55 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 O significado da palavra gênero (na versão cientificista) seria o nome dos seres agrupados pelo sexo, isto é, todos os indivíduos (animais e vegetais) que exibem ou mostram qualidades semelhantes. A autora enfatiza que a questão da construção do poder perpassa na percepção dos gêneros (feminino e masculino) a partir da discussão sobre as variáveis que o levam a conhecer a realidade do espaço em que habitam. “Poder” que pode aqui ser especificado como a dominação de um gênero sobre outro. Em meados do século XXI, o tema gênero é pesquisado, servindo de reflexões para especialistas e estudiosos em Educação, pois se trata de uma questão não tão contemporânea; posso afirmar que gênero é como um vulcão em erupção, o seu centro está cheio de lavas efervescentes que estão em constante movimento (se formando, construindo e desconstruindo), mesmo que sua aparência esteja em estado de dormência. É sim um tema polêmico e capaz de provocar questionamentos, produtor de novas concepções. Na sociedade brasileira existem alguns grupos e qualidades que se sobressaem em relação aos outros. Louro (1997), afirma que “devido à hegemonia branca, masculina, heterossexual e cristã, têm sido nomeados e nomeadas como diferentes aqueles e aquelas que não compartilham desses atributos” (p.49). Embora estejamos no século XXI, com forte inserção de campanhas e publicidade para terminar com a descriminação e com a exclusão de pessoas, ainda existem grupos conservadores que tentam cultivar algumas características hegemônicas de diferenças. Cito o exemplo da questão da orientação sexual (principalmente a cultura gaúcha), em que o sujeito que não se comporta com as características de forte e valentão, pode vir a ser considerado um “fracote”, gay e outros. Atualmente falar da atuação de sujeitos masculinos nos espaços escolares nos remete imediatamente a questões de gênero. Por isso, torna-se importantíssimo compreender esta terminologia. “O termo 'gênero' torna-se uma forma de indicar 'construções culturais', a criação inteiramente social de ideias sobre os papéis adequados aos homens e às mulheres” (SCOTT, 1995, p.75). O conceito nos remete a pensar sobre os fatores que constituem/iram as concepções de gênero, isto é, compreensões construídas historicamente, socialmente e culturalmente. A sociedade brasileira desde os princípios de sua colonização tem organizado os papéis de descriminação, de exclusão dos indivíduos que tentam não obedecer aos ideais machistas e dominantes. Os homens pensam serem os detentores do poder nas relações sociais e pessoais. Percebi esta questão nos diálogos entre os homens com os quais convivo diariamente em relação ao curso de Pedagogia. –Isto é coisa de mulher! Outro ponto é a questão da escolha da profissão, as pessoas que se aproximam de mim indagam constantemente: - O que te levou a fazer Pedagogia! Como se dissessem que ser pedagogo é estar fadado à miséria econômica e de status social. Os discursos se tornam tentadores e em muitas situações humilhantes. Ouvi muitas vezes de cidadãos, afirmações e exclamações de rotulação (qualificação simplista) e descriminação sobre os gêneros. - Ah, isto é coisa de mulher! - Isto é coisa pra homem fazer! Estas paráfrases denotam o prelúdio de um discurso rotineiro que habita grande parte dos grupos sociais. Esta relação de subjugação (ter sob domínio) discursiva entre os gêneros masculino e feminino é o que infere no reconhecimento de suas personalidades. Ser do gênero feminino ou do gênero masculino leva a perceber o mundo diferentemente, a estar no mundo de modos diferentes – e, em tudo isso, há diferenças quanto à distribuição de poder, o que vai significar que o gênero está implicado na concepção e na construção do poder (LOURO, 2005, p.106). Durante a elaboração deste estudo, deparei com um assunto até então inédito; por isso, tem se tornado um pouco confuso e em alguns momentos complexo. Encontrei em Pereira (2004) certo conforto: “na complexidade dessas abordagens de gênero, o que importa é o espaço em aberto para elaborarmos e reelaborarmos nossos 56 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 papéis, posições, atribuições sociais em que expressamos que assumimos, rejeitamos, reinterpretamos, reinventamos nossas relações” (p.196). A autora traz uma ideia pertinente. O mais importante é buscar compreensão e esclarecimento das nossas dúvidas que, às vezes, são traidoras e nos levam ao lado obscuro dos sentimentos e ideias. sempre um homem; na verdade é um religioso” (LOURO, 1997, p. 92). Estes homens religiosos tinham o objetivo de expandir o sistema da igreja (os descendentes e adeptos destes religiosos continuam em pleno século XXI expandindo, acumulando grandes fortunas e explorando a população ingênua) e conquistar assim novos fiéis nos países colonizados. Encontrar os sujeitos masculinos para o desenvolvimento do estudo não foi uma tarefa fácil. Estes professores circulam de uma escola pra outra; às vezes chegam a atuar nas três esferas: privada, pública municipal e estadual. A busca árdua em escolas da rede pública, estaduais e municipais tornou-se uma tarefa desafiadora em determinados momentos. Colling (2004) descreve que “situar o sujeito é reconhecer como este foi construído e, a partir daí, sugerir noções alternativas de subjetividade” (p. 14). Precisa-se conhecer o ambiente em que atuam estes professores, o que fazem e o que sentem; mais do que sentir é permiti-los falar do que pensam sobre suas atuações nestes espaços escolares. Com a vinda de sujeitos masculinos em grande escala para o Brasil e que abrangiam uma enorme diversidade de profissões (artistas, músicos, escultores e outros), entre estes estavam os primeiros professores. Então, conforme Louro (1997), descreve que no “Brasil a instituição escolar é, primeiramente, masculina e religiosa” (p. 94). Este fator começa por delinear o que seria o espaço educacional por longos séculos. Sejam eles pastores, padres ou irmãos, esses religiosos acabam por constituir uma das primeiras e f u n d a m e n t a i s representações do magistério. Modelos de virtudes, disciplinados, disciplinadores, guias espirituais, conhecedoras das matérias e técnicas de ensino, esses primeiros mestres devem viver a docência como um sacerdócio, como uma missão que exige doação. Afeição e autoridade, bom senso, firmeza e bondade, piedade e saber profissional são algumas das qualidades que lhes são exigidas. Seu papel de educador combina o exercício de uma “paternidade, uma magistratura, um apostolado e uma luta” (LOURO, 1997, p. 93). A procura por sujeitos masculinos que atuam no espaço escolar do Ensino Fundamental tem o objetivo de buscar a compreensão de alguns fenômenos dados e que parece não ter muita significância. “O modo mais eficiente para desconstruir algo que parece evidente, sempre dado, imutável, é demonstrar como esse algo se produziu, como foi construído” (COLLING, 2004, p.14). Com esta pesquisa pretendi ir além de conceitos já construídos, buscar a historicidades dos fatos, como eles germinaram, como atuaram e que/como continuam se desenvolvendo. 2 FEMINIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO: O PRINCÍPIO Estes professores jesuítas eram homens que dominavam muitas áreas do conhecimento, eram imbuídos de realizar diversas funções nas quais atuavam (as mulheres assumiram essas diversas funções sem muitas dificuldades, pois os discursos se ajeitaram e se acomodaram tranquilamente). Não era apenas uma profissão, eram considerados vocacionados para o cargo que exerciam e ideologizados pelas intenções da Igreja e principalmente do Estado. Desde o período da era Antiga as instituições de ensino vêm sofrendo mudanças em vários segmentos que abrangem seu campo de atuação. O descobrimento do Brasil em 1500 impactou as ordens religiosas que estavam em conflito na Europa. Os Jesuítas foram os primeiros mestres/professores a chegarem ao espaço brasileiro e permaneceram de 1549 e 1759, até sua expulsão do país. “O mestre que inaugura a instituição escolar moderna é Com o passar do tempo, o Brasil foi se 57 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 instituições de ensino foram fundadas, uma herança da colonização lusitana. desenvolvendo e “os discursos que se constituem pela construção da ordem e do progresso, pela modernização da sociedade, pela higienização da família e pela formação dos jovens cidadãos implicam a educação das mulheres - das mães” (LOURO, 1997, p. 96). Estas mães começaram a ter a oportunidade de sair do enclausuramento em que se encontravam em seus lares; pois até então eram tidas como domésticas e reprodutoras. Para a surpresa dos tradicionais e conservadores do espaço escolar, o aumento de inscrição das mulheres começava a superar a dos homens, tão logo as novas escolas formadoras começaram a funcionar. “Em 1784, por exemplo, relata o diretor geral da instrução que a Escola Normal da província do Rio Grande do Sul vinha registrando “um número crescente de alunas, a par da diminuição de alunos”” (LOURO, 2000, p. 449). O novo público feminino que começava a predominar no magistério logo deu sinais de adaptação a este espaço educacional; por isto, continuou aumentando. Os homens professores começavam a abandonar as salas de aula para ir trabalhar em outros espaços, faltavam professores qualificados para substituir os que saíam e a educação começa a perder/regredir em q u a l i d a d e ( i s t o n a p e r s p e c t i va d o s pensadores em educação naquele determinado momento). Louro (2000) retrata que “o abandono da educação nas províncias brasileiras, denunciado desde o início do Império, vinculava-se na opinião de muitos, à falta de mestres e mestras com boa formação. Reclamavam, então, por escolas de preparação de professores e professoras” (p. 448). Esta carência por escolas que formavam professores começa a se expandir pelo país, sendo que estas se localizavam nas capitais e cidades maiores. Em algumas regiões de forma mais marcante, noutras menos, os homens estavam abandonando as salas de aula. Esse movimento daria origem a uma “feminização do magistério” – também observado em outros países- fato provavelmente vinculado ao processo de u r b a n i z a ç ã o e industrialização que ampliava as oportunidades de trabalho para os homens (LOURO, 2000, p. 449). Com a chegada massiva de novos imigrantes advindos do velho continente, as cidades e vilas se desenvolvem rapidamente ao século XIX. E esta nova população que está se estabelecendo precisa de educação, a reclamatória por novas escolas e professores se desenvolve e dissemina rapidamente. “Em meados do século XIX, algumas medidas foram tomadas em resposta a tais reclamos e, em algumas cidades do país, logo começaram a ser criadas as primeiras escolas normais para formação de docentes” (LOURO, 2000, p. 448). A atitude de construir escolas formadoras de professores contribui de maneira significativa no desenvolvimento da educação brasileira, pois não precisaria sair do país pra estudar. Setores como a cafeicultura e a criação de gado não davam conta de empregar a população que crescia rapidamente. O consumo de bens e serviços avançava, obrigando a abertura de novas fábricas e postos de trabalhos. Todos estes fatores citados foram contribuindo para que o homem se afastasse das salas de aula lentamente. Fiquei surpreso ao começar as leituras sobre esta nova figura do professor. A primeira imagem é cruel, “é possível compreender que a moça que se considerava feia e retraída percebia-se, de algum modo, como que chamada para o magistério” (LOURO, 2000, p.465). Que frase forte, como se estas mulheres não tivessem lugar na sociedade e a partir de agora seriam um “quebra galho”; e ainda com a enorme responsabilidade do nobre ato de educar. Com o intuito de atender às reclamatórias e às demandas sociais as “tais instituições foram abertas para ambos os sexos, embora o regulamento estabelecesse que moças e rapazes devessem estudar em classes separadas, preferentemente em turnos ou até escolas diferentes” (LOURO, 2000, p. 449). Podemos perceber que questões de gênero se construíram e já ficaram explícitas logo que as primeiras As fotografias antigas também permitem reencontrar essas figuras austeras, elas com vestidos abotoados até o pescoço, 58 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 nem sempre seriam professoras, mas o curso era, de qualquer modo, valorizado. Isso fazia com que, para muitas, ele fosse percebido como um curso de espera marido” (LOURO, 2000, p.471). Mas algumas mulheres aproveitaram a oportunidade para lograrem êxito em vantagens pessoais, constituindo status a partir da profissão docente. cabelos presos e... óculos... Essa “secura”, produzida e demonstrada pela aparência física e pelo controle dos gestos, poderia esconder (e os contos e crônicas exploraram muitas vezes esse tema) um “enorme coração”, uma “infinita bondade” (LOURO, 1997, p.105). Um fato que tenho que considerar e que é algo um tanto meio estranho, é a questão de buscarem refúgio nas mulheres que não tinham vínculo com família. “As mulheres que vão se dedicar ao magistério serão, a princípio, principalmente as solteiras, as órfãs e as viúvas. Nos primeiros tempos, quem vai, efetivamente, exercer a profissão são as mulheres “sós”” (LOURO, 1997, p.105). Mas por que as mulheres sós? Seria o fato de tornar produtivas para a sociedade as mulheres consideradas ociosas para com deveres domésticos? Assim se constituíam as primeiras i m a g e n s d a r e p r e s e n t a ç ã o d o n o vo profissional da educação. Feia por fora e bela por dentro. Deveriam se parecer com os antigos mestres homens. Observa-se que os menos favorecidos pelos adjetivos idealizados da sociedade não tivessem capacidade de se tornar um profissional no mercado de trabalho (que exigissem uma melhor qualificação); isto refletiu na profissão docente. Essa representação de professora solteirona é, então, muito adequada para fabricar e justificar a completa entrega das mulheres à atividade docente, serve para reforçar o caráter de doação e para desprofissionalizar a atividade. A boa professora estaria muito pouco preocupada com seu salário, já que toda a sua energia seria colocada na formação de seus alunos e alunas. Esses constituiriam sua família; a escola seria o seu lar e, como se sabe, as tarefas do lar são feitas gratuitamente, apenas por amor. De certa forma essa mulher deixa de viver sua própria vida e vive através de seus alunos e alunas; ela esquece de si (LOURO, 2000, p.466). Para que o magistério se feminizasse fez-se necessário “tomar de empréstimo a t r i b u t o s q u e s ã o t ra d i c i o n a l m e n t e associadas às mulheres, como o amor, a sensibilidade, o cuidado, etc. para que possa ser reconhecida como uma profissão admissível ou conveniente” (LOURO, 1997, p. 9 7 ) . A l g u n s d o s p r o fe s s o r e s q u e responderam ao questionário desta pesquisa citam a importância do amor paternal (que lembra a proteção e o carinho de pai) no ato de educar. Com a conquista das mulheres no segmento escolar “as escolas de formação docente se enchem de moças, e esses cursos passam a constituir seus currículos, normas e práticas de acordo com as concepções hegemônicas do feminino” (LOURO, 1997, p.97). A partir de então, fez-se necessário organizar o espaço existente conforme as necessidades deste novo sujeito feminino, que ora foi considerado um “quebra galho”, ora foi tomado como substituto da atuação masculina. Esta visão de trabalho caritativo, realizado de forma gratuita, sem muito investimento, cria corpo e é aceita na sociedade brasileira, que ainda jovem é dependente de cópias de outros modelos sociais e civis. O que houve foi uma descaracterização da figura da mulher e dos profissionais da educação. E assim, com o passar do tempo, variando de uma região para outra, os homens foram abandonando as salas de aula. Esta ação “daria origem a uma “feminização do magistério” também o b s e r va n d o e m o u t ro s p a í s e s , fa t o provavelmente vinculado ao processo de urbanização e industrialização que ampliava as oportunidades de trabalho para os homens” (LOURO, 2000, p.449). À luz da A expectativa de fazer das mulheres uma substituta para ocupar o lugar dos homens na educação estava vinculado a um discurso de temporalidade. “As normalistas 59 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 teoria, compreendo que a Revolução Industrial do século XVIII foi um marco para uma nova era na Educação. A sociedade recebeu muito bem as mulheres no âmbito escolar. “A concepção do magistério como uma extensão da maternidade, como um exercício de doação e de amor como uma atividade que exigia uma entrega, vai constituí-la como a grande alternativa” (LOURO, 1997, p. 104). As questões referentes à afetividade, ternura e à própria natureza de reprodução foram dando sentido aos discursos, que rapidamente se propagaram sem muita resistência; pois eram a oportunidade das mulheres sair do espaço familiar e alcançar outras dimensões. O discurso sobre vocação auxiliou para “a saída dos homens das salas de aula dedicados agora a outras ocupações, muitas vezes mais rendosas - e legitimava a entrada das mulheres nas escolas - ansiosas para ampliar seu universo -, restrito ao lar e à igreja” (LOURO, 2000, p.450). Compreendo que este processo de feminização do magistério contribuiu para que as mulheres saíssem da situação de enclausuramento em que se encontravam. E assim as mulheres vão construindo uma nova figura e um novo rosto para o profissional da educação, combinando “elementos religiosos e “atributos” femininos, construindo o magistério como uma atividade que implica doação, dedicação, amor, vigilância” (LOURO, 1997, p.104). E esta ideologia sobrevive até os dias atuais, talvez alguns discursos mude na forma como é explicitado. Nesta nova representação da mulher na sala de aula, a questão salarial começa a ser dialogada. “Não há dúvida de que esse caráter provisório ou transitório do trabalho também acabaria contribuindo para que os seus salários se mantivessem baixos” (LOURO, 2000, p.453). Este fator parece ter sido determinante para que os discursos sobre remuneração se desenvolvessem. Com o homem trabalhando em setores industriais com longas jornadas de trabalho, coube às mulheres cuidar da educação e da família. “Dizia-se, ainda, que o magistério era próprio para mulheres porque era um trabalho de “um só turno”, o que permitia que elas atendessem suas “obrigações domésticas” no outro período” (LOURO, 2000, p.453). Os discursos sobre as mulheres na sala de aula firmaram a ideia disseminada pelos demais setores da sociedade e se apropriaram deste espaço sem muita resistência. 3 GÊNERO NO CONTEXTO ESCOLAR Analisando o contexto histórico das relações que perpassam o espaço escolar, estou conseguindo perceber que a temática 'Gênero' está implícita nas ações de sua constituição. A busca para compreender o q u e o c o r re u n o e s p a ç o e s c o l a r, d a feminização da Educação até ao fator contribuinte para o afastamento da presença masculina em sala de aula, além da subjetividade dos olhares destes sujeitos (que participaram da pesquisa) sobre a importância dos professores de currículo do gênero masculino na Educação Fundamental. Assim, a partir de algumas inquietações, propus-me a pesquisar este tema neste espaço. Como a questão da atuação do gênero masculino é percebida no espaço escolar? Deste questionamento surgiu o tema Interlocuções sobre a presença do gênero masculino no espaço escolar. O que era pra ser um processo transitório e provisório, de a mulher ocupar as salas de aula, acabaria criando corpo e tornando uma marca de mudança para o novo modelo educacional da educação. As escolas normais se enchem de moças. A princípio são algumas, depois muitas; por fim os cursos normais tornam-se escolas de mulheres. Seus currículos, suas normas, os uniformes, o prédio, os corredores, os quadros, as mestras e mestres, tudo faz desse um espaço destinado a transformar meninas, mulheres em professoras (LOURO, 2000, p.454). A pesquisa se desenvolveu no município de Três de Maio; região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Foi desenvolvida com professores que atuam no Ensino Fundamental de escolas privadas (particulares) e públicas da rede municipal e da estadual. Totalizando a participação de sujeitos de duas escolas estaduais, duas particulares e duas municipais. 60 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 (sujeito A); “Vejo que o gênero feminino está em maioria nas diversas áreas de ensino, mas há uma grande importância da participação do gênero masculinos nas diversas áreas de ensino” (sujeito C); “Percebo que o número de professores do gênero masculino é bem menor que o feminino, mas a sua participação e objetividade em buscar qualificação no Ensino fundamental é maior do que no gênero feminino” (sujeito E); “Acredito que a mescla, mesmo como o reduzido número de homens, é muito positiva, pois diversifica esta “presença” em sala de aula” (sujeito F); “Percebo que já se incorporou a cultura de que a educação, no ensino fundamental, se dá fundamentalmente pelo gênero feminino. Os alunos e s tranham a pre s e nça masculina. O homem parece dispensável ou até incompetente para atuar no processo educacional” (sujeito G); “É importante pela contribuição que cada um pode dar ao aluno como figura masculina e feminina” (sujeito K). Com a escassez de professores do gênero masculino no espaço escolar do Ensino Fundamental, não consegui definir os sujeitos por tempo de atuação, idade ou outros critérios de escolha. A grande maioria destes sujeitos circula entre estes espaços escolares, chegando a atuarem em até duas e três escolas das redes de ensino pesquisadas. Considerando as minhas intenções iniciais e os objetivos definidos, elaborei um questionário com perguntas semiestruturadas, acreditando que os sujeitos participantes pudessem ir além de respostas diretas. As perguntas foram produzidas com o intuito de recolher dados, opiniões e sentimentos sobre a temática, o abandono do professor da sala de aula. Foi um desafio analisar as respostas, pois as respostas se assemelham em muitos sujeitos, dando um sentido homogêneo ao discurso sobre a atuação destes profissionais no município de Três de Maio. Mesmo algumas respostas sendo parecidas, outras carecem de um conhecimento etimológico, não só de p a l a v ra s , m a s t a m b é m d a fa l t a d e aprofundamento sobre a temática. As respostas se enquadram em categorias como desvalorização do professor, salários e o aspecto paternal/afetividade. Na sequência, serão apresentados os dados coletados e organizados conforme as categorias de análise que me propus fazer. Neste primeiro momento, analisei que o s s u j e i t o s m a s c u l i n o s p e rc e b e m a significativa diminuição dos homens das salas de aula e que as mulheres são a maioria nas novas vagas ocupadas e que ambos os gêneros contribuem na formação dos alunos. Um dos sujeitos descreve que algumas pessoas têm a visão de que o homem é incompetente para gerir o processo educacional. Outro já vê a importância de mesclar e diversificar a presença de ambos os gêneros na sala de aula. 3.1 PERCEPÇÃO SOBRE A PARTICIPAÇÃO DO GÊNERO MASCULINO E FEMININO NO ENSINO FUNDAMENTAL Percebendo que os sujeitos da pesquisa poderiam desenvolver diversas compreensões sobre a temática “Gênero”, delimitei a questão para uma conceitualização mais ampla. Como você percebe a participação do gênero masculino e feminino no Ensino fundamental enquanto professor das diversas áreas do conhecimento? Os sujeitos serão representados por letras do alfabeto. Uma afirmação de que o homem é mais participativo e objetivo em relação à preocupação com sua qualificação e de que é importante ter professores do gênero masculino (mas não a descrevem), isto faz com que o discurso não tenha sentido, pois não se fundamenta. Conforme Veiga-Neto “tem-se de cuidar para não embarcar na ingenuidade de pensar que tudo já está ali no texto, independentemente daquele que lê. Visível e apreensível diretamente por aquele que lê” (2003, p.127). Desconfiar da falta de “Ao longo dos 20 anos que leciono, observei que houve uma diminuição significativa dos homens, muitos se aposentando e as nomeações e contratos novos são quase que sua maioria de mulheres” 61 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 coerência e dos elementos postos nos discursos auxilia no processo da ação de ler e de interpretar. apontam números restritos de professores homens atuando na Educação Básica, principalmente na Educação Infantil e Ensino Fundamental, na sua opinião, quais são os fatores estão contribuindo para o afastamento da figura masculina deste espaço?” Outro grupo percebe a participação do gênero masculino como inferior em quantidade, mas vê estes como um exemplo, de que os alunos o veem como a representação do pai e de que as mulheres têm mais amabilidade no trato com crianças e jovens. “O gênero feminino está em grande maioria, mas a presença do professor “homem” é tido muitas vezes como um exemplo” (sujeito B). “O fator salarial deve ser um dos principais, o fato de “relacionamento”, quando jovem na hora de optar pela formação também influi educar está muito relacionado a trocar conhecimento e desde a formação familiar, já está mais “destinado” à figura materna” (sujeito A); “A profissão exige muito, como planejamento e correção de atividades fora do horário (em casa). - O descrédito e a fal ta de valorização financeira. - Opções de trabalho mais rentável e menos estressantes” (sujeito B); “As várias opções que o mercado de t ra b a l h o o f e r e c e . - O comprometimento que a profissão exige. - O descrédito da profissão. Valorização financeira” (sujeito C); “Salários baixos. - Facilidades para fazer outros cursos superiores. Não fazem magistério” (sujeito D). -“Quanto menor são os níveis, menos professores masculinos. A grande maioria se encontra no nível superior. Vejo que a participação masculina na educação, tem-se como uma pouco, pelo salário recebido” (sujeito D já afirmava está questão salarial na primeira pergunta); “A falta de respeito com o profissional, que começa com a remuneração, com a desvalorização do Estado com a categoria, chegando até a retirada da autoridade da pessoa professor na sala de aula, onde os alunos podem abusar do professor sem aconteça nada” (sujeito F); “A falta de uma remuneração mais condizente em detrimento de uma formação cada vez maior” (sujeito I); “Criou-se uma cultura de ligação do papel da professora à figura “ Pe r c e b o q u e h á u m a presença maior do gênero feminino, e ouço comentários afirmando que a presença masculina interfere no cumprimento de normas disciplinares, principalmente porque os alunos veem no professor a representação do pai. Acredito que a atuação profissional independe de gênero” (sujeito H); “Em sua grande maioria, o magistério encontra-se nas mãos das mulheres, talvez, por uma questão histórica, as mulheres possuem maior amabilidade com crianças e jovens, embora a figura paterna seja essencial. O homem saiu a dedicar-se a outros a fazeres” (sujeito I). Este discurso de que o homem é o exemplo, cumpridor de normas disciplinares, da importância da figura do pai retrata um sentimento machista, de que existem relações de poder explícitas. “Poder este que intervém materialmente, atingindo a realidade mais concreta dos indivíduos - o seu corpo - e que o situa ao nível do próprio corpo social, e não acima dele, penetrando na vida cotidiana” (FOUCAULT, 2004, p.XII). Percebo que estes discursos estão presentes no cotidiano, nas ações dos sujeitos e que parecem estar muito bem alicerçadas. 3.2 FATORES QUE ESTÃO CONTRIBUINDO PA R A O A FA S TA M E N TO D A F I G U R A MASCULINA DO ESPAÇO ESCOLAR Nesta questão busco a opinião pessoal de cada um, partindo de um pressuposto enunciado pelas estatísticas atuais. “Considerando as estatísticas atuais que 62 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 de mãe (não sei quem e porque aconteceu); Podem não ter tido boas experiências como alunos, e consequentemente não querem trabalhar na escola; - Algumas pessoas pensam que não terão paciência de trabalhar com crianças e adolescentes; - O homem geralmente estuda menos anos e entra antes no mercado de trabalho, inclusive no mercado informal; - Os salários pouco atrativos, para uma formação superior” (sujeito H); “O espaço que as mulheres conquistaram atualmente e o homem procurando atividades no setor terciário mais exigido fisicamente do que intelectualmente” (sujeito J). -“Percebo desvalorizado pelos governantes Professor fazendo “bico” nas escolas. Procurando o u t ro s e m p re g o s p a ra sobreviver. Mas, acima de tudo, é uma profissão digna, de respeito e responsável pelo futuro da nação” (sujeito J descreve na primeira pergunta esta preocupação); “Acredito que os homens acabassem optando por outras profissões, que no momento tem um retorno econômico maior” (sujeito K). comportamento, enfim, fabrica o tipo de homem necessário ao funcionamento e manutenção da sociedade industrial, capitalista” (FOUCAULT, 2004, p.VXII). Compreendo que antes da Revolução Industrial os professores nem eram remunerados, mas que, a partir desta, criase todo este enredo em torno de um assalariamento, que se tornou necessário para a sobrevivência destes sujeitos. Situações de preconceito relacionado à figura masculina que é considerado até incapaz de educar, de ter qualidades que a sociedade designou às mulheres. “Percebo que na educação infantil o número de professores é bem menor pelo motivo do préconceito que somente professoras teriam capacidade de cuidar de crianças (afeto materno)” (sujeito E). Qualidades como afeto, amor, carinho, sensibilidade e outros; entendo que o homem pode sim desenvolver estes adjetivos. A sociedade delimitou as qualidades para os gêneros masculino e feminino. “O feminino caracterizado como natureza, emoção, amor, intuição, é destinado ao espaço privado; ao masculino – cultura política, razão, justiça, poder, o público” (COLLING, 2004, p.22). Por este discurso estar tão enraizado é que aparece como um denominador de verdades. Percebo no discurso deste sujeito uma dicotomia: se viam situações de machismo na educação de tempos passados, como pode citar que a figura materna é a mais apropriada pra educar? “Antigamente a educação estava nas mãos dos homens, porque se entendia que a disciplina e a racionalidade eram fundamentais para a educação. Também não existia a Educação Infantil. Ora, essas características eram próprias do homem e não da mulher. Nisso está presente também uma boa dose de machismo. Hoje se entende que a figura maternal é mais apropriada para a Educação. A mulher também é racional e disciplinadora, mas de um jeito próprio da feminilidade” (sujeito G). Nota-se que há questões de machismo disfarçado no discurso, por mais que se tente explicar, mesmo querendo delegar a questão para outros, está implícito também uma dose de machismo, assim como o descreve. São muitos os fatores que estão contribuindo para o afastamento da figura masculina do espaço escolar, mas cabe ressaltar o enorme percentual destes sujeitos que aderiram à questão salarial, relações com trabalho excessivo que demanda a profissão professor, falta de valorização financeira (salários baixos), opções de trabalho mais rentáveis e menos estressantes, o descrédito e a falta de incentivo. A questão de o homem entrar antes no mercado de trabalho, as experiências enquanto aluno às vezes podem não ter sido boas também contribuem para o afastamento da sala de aula. Todo este discurso em prol de um melhor rendimento salarial se volta na figura do homem como sujeito do capitalismo. “É o diagrama de um poder que não atua do exterior, mas trabalha o corpo dos homens, manipula seus elementos, produz seu 63 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 complicada devido ao pouco estímulo recebido pela categoria, o que leva a essa falta de professores homens na sala de aula. É muito triste mesmo” (sujeito K). 3 . 3 S E N T I M E N TO E M R E LA Ç Ã O A O ABANDONO DOS SUJEITOS MASCULINOS DAS SALAS DE AULA Busquei nesta pergunta perceber algo relacionado à subjetividade de cada sujeito. Qual é o teu sentimento, como professor, em relação ao abandono dos sujeitos masculinos das salas de aula? São muitos os sentimentos de abandono dos sujeitos masculinos das salas de aula que os sujeitos evidenciam. Entre eles cabe destacar o sentimento de desvalorização, de descrédito, de falta de incentivo, de um sentimento machista, sentem-se sozinhos e isolados, pouco estímulo pela categoria e veem com tristeza o desaparecimento de seus colegas desta atividade tão brilhante que é o ato de educar. “Isso acontece devido à pouca valorização do profissional da educação, enquanto temos outras alternativas mais rentáveis” (sujeito B); “O descrédito e a falta de incentivo levou a muitos a procurarem novas alternativas” (sujeito C); “Apesar de vivermos em país livre. O pensamento machista ainda é forte, e vejo que mulheres recebem menores salários. Isso faz que a remuneração seja baixa. Razão pela qual vejo poucas figuras masculinas nas salas de crianças pequenas (educação básica)” (sujeito D); “Gostaria que o número de professores fosse muito maio r, po is e m ce r to s momentos nos sentimos sozinhos e isolados, mas imagino que pelos baixos salários e a necessidade de sustentar a família, busquem áreas que tenham maior rentabilidade” (sujeito E); “Acredito que seja o mesmo que escrevi na pergunta acima. Ta m b é m a c r e s c e n t o a facilidade remunerável em outras profissões, o que faz da nossa categoria a última em questão” (sujeito F); "Não percebo que o professor sofra um abandono em relação ao gênero, portanto não consigo sentir nada a esta questão” (sujeito H); “Meu maior sentimento é de que o sujeito masculino está desaparecendo desta atividade tão brilhante de estar ligado com o ser humano, educando-o e preparando para a vida ativa. A desvalorização do professor também afasta o homem da educação” (sujeito J); “É uma situação Nas respostas seguintes, nota-se o sentimento de perda nas ações que demandam a Educação, mas sobre uma visão paternalista, não enquanto profissional professor. De novo se reforça a questão da sensibilidade, que segundo os sujeitos da pesquisa, é característica fundamental das mulheres, falta do poder disciplinador do homem nas mulheres e a perda da figura paterna. “O meu sentimento é de que há uma perda no processo educacional; a perda da figura paterna. Assim como na família o pai e a mãe são figuras indispensáveis para uma boa educação, assim também na escola não podemos dispensar nenhuma das duas figuras” (sujeito G); “As mulheres têm plena condição de serem educadas, até melhor que os homens, por terem maior sensibilidade e espontaneidade, mas muitas vezes falta “pulso” que os alunos “procuram” (as famílias delegam muitas ações à escola)” (sujeito A); “É uma pena, porque em algumas funções em específico, a escola e o próprio estudante se ressente da falta do professor homem” (sujeito I). Observando os argumentos sobre os sentimentos descritos acima percebi que há resquícios dos discursos que são reforçados pela sociedade, o meu sentimento sobre estes sujeitos é que eles se expressam estimulando uma narrativa já existente, porque as respostas se parecem. 64 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 temos que ter profissionais, independentemente de gênero. Acredito que qualquer profissão tem a ver com uma opção e não é uma questão de gênero. Acredi to que a escola contrata os profissionais independentemente do gênero e que isso não deve i n t e r fe r i r n o s procedimentos didáticos e pedagógicos” (sujeito H); “Sem dúvida somos iguais” (sujeito J). É preciso pôr em questão, novamente, essas sínteses acabadas, esses agrupamentos que, na maioria das vezes, são aceitos antes de qualquer exame, esses laços cuja validade é reconhecida desde o início; é preciso desalojar essas formas e essas forças obscuras pelas quais se tem o hábito de interligar os discursos dos homens; é preciso expulsá-las da sombra onde reinam ( F O U C A U LT, 2 0 1 2 , p.26). Os sujeitos acreditam que tendo professores homens atuando nas séries iniciais do Ensino Fundamental manteria o equilíbrio, mas não descrevem que tipo de equilíbrio, o que querem dizer? O outro sujeito demonstra ingenuidade em relação ao tema gênero, pois usa o termo “Acha” e “Acredito”, isto quer dizer que não tem certeza do que está descrevendo; assim como o sujeito J que afirma que somos todos iguais, mas até onde? Que igualdade é essa? Conforme os descritos de Foucault é preciso colocar em suspensão as ideias e opiniões existentes, retirando-as da escuridão e colocando-as sob a luz de novas análises. A grande maioria dos que responderam a esta pergunta se direcionam à importância da atuação do professor pela questão da disciplina, da ordem, de modelo de sujeito, em que se lembra da proteção e do carinho do pai: 3.4 É IMPORTANTE TERMOS PROFESSORES DO GÊNERO MASCULINO ATUANDO NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL? “Sim, pois o professor relembra a figura paterna, tornando-se em exemplo para os alunos” (sujeito B); “Sim. Como em qualquer etapa. Há muitas crianças que falta a figura paterna. Assim se identificaria com essa pessoa. Pra muitos a figura masculina é sinal de respeito” (sujeito D); “Considero que a presença do homem, representando a figura paterna, é muito importante. Ele representa, pelo menos em parte, a d i m e n s ã o d o comportamento regrado e a perseguição de um objetivo claro. Ela (feminina) representa o espaço do aconchego e acolhimento. O s d o i s s ã o complementares” (sujeito G); “Porque não, não vejo nenhum problema, eu sou um deles e nem por isso penso que meu trabalho valha menos, muito pelo contrário” (sujeito I); “Sim. Pra dar uma relação mais Referencio nesta questão se é pertinente na visão dos sujeitos da pesquisa de se ter professores homens trabalhando com alunos menores, sendo o caso dos anos iniciais. Você considera importante termos professores do gênero masculino atuando nas séries iniciais do Ensino Fundamental? “O equilíbrio sempre foi e é melhor receita para q u a l q u e r o r g a n i z a ç ã o, assim, a figura masculina não pode “desaparecer”, deste contexto educacional” (sujeito A); “Sim é importante a figura masculina dentro da escola, atuando no Ensino Fundamental, pois dá um maior equilíbrio e uma melhor força de ação” (sujeito C); “Acredito que sim, pois no ambiente de trabalho possibilita a troca de experiências entre os professores e ajuda as crianças a terem o contato com o gênero masculino” (sujeito E); “Acho que 65 REVISTASETREM REVISTA SETREM- Ano - AnoXII X nº nº 20 22 -JAN/JUN JAN/JUN2013 2013 ISSN ISSN 1678/1252 1678-1252 paternal ao aluno” (sujeito K); “Seria interessante, se bem que as mulheres possuam o lado “mãe”, muito importante nesta fase” (sujeito F). senti-me perdido em meio a um turbilhão de sentimentos, por muitas vezes larguei os l i v r o s e f i c a v a a d e v a n e a r. E s t a desestruturação de conceitos fez-se necessária, despir-se de algumas carapuças e vestir-se de outras para, a partir daí, permitirse a viver novas aprendizagens. Muito dolorido. Uma sensação de que estava sendo espionado, de estar em alguns momentos tateando no escuro. Muitas crianças convivem poucas horas com seus pais, devido à carga horária dos mesmos. Veem o homem como um sinal de respeito, do cumprimento de regras, de uma figura disciplinadora. Outros acham interessante ter mais homens atuando nas séries iniciais e ainda o que não vê nenhum problema, pois esta questão não o afeta. Todos estes discursos referentes a esta questão não se pautam em uma teoria determinada, é aparente e não se fundamenta numa linha de pensamento. Os meus objetivos específicos foram alcançados com êxito. O objetivo geral a que me propus pesquisar estava baseado na questão dos fatores que estão contribuindo para o afastamento da figura masculina no Ensino Fundamental de escolas privadas e da rede pública, municipal e estadual. Entre os fatores descritos a que a grande maioria respondeu foram: a desvalorização do p r o f e s s o r, s a l á r i o s e o a s p e c t o paternal/afetividade. Penso que as práticas discursivas moldam nossos saberes e práticas sociais. Os discursos se fundamentam em crenças diversas. O discurso é o caminho de uma contradição à outra: se dá lugar às que vemos, é que obedece à que oculta. Analisar o discurso é fazer com que desapareçam e r e a p a r e ç a m a s contradições; é mostrar o jogo que nele elas desempenham; é manifestar como ele pode exprimi-las, dar-lhes corpo, ou emprestar-lhes uma fugidia aparência (FOUCAULT, 2012, p.186). Percebi que é preciso colocar em suspensão as ideias e opiniões existentes, retirando-as da escuridão e colocando-as sob a luz de novas análises. Existe um sentimento machista, cito a questão em que um dos sujeitos respondeu de que o “homem é o exemplo, cumpridor de normas disciplinares”; nota-se que existem relações de poder explícitas. O corpo visível e invisível do discurso pode ser analisado a partir da observação e da experimentação para decidir ou destruir o que pode ser considerado verdadeiro; construindo assim novos saberes. Posso afirmar que os sujeitos são frutos dos saberes e as diversas formas que compõem a essência de um sujeito podem e devem ser destruídas para que possamos ver o lado opressor dos discursos. Posso afirmar que os sujeitos são frutos dos saberes, poderes e de uma ética dominante. E que as diversas formas que compõem o sujeito que podem e devem ser destruídas para que possamos ver o lado opressor dos discursos. Os discursos eram muito genéricos, superficiais, sem conhecimento sobre a temática em pauta, respostas generalizantes são burras. O que tem por detrás destes discursos? Por que são tão homogêneos? Qual a dinâmica social que se pretende desenvolver nestas redes de mecanismos e a quem servem? ASPECTOS RELEVANTES Considero relevante este trabalho para minha caminhada acadêmica, mas o aprendizado que tive no percurso desta pesquisa para a minha formação humana se sobressai sobre qualquer outro dado que se tenha criado expectativas em demasia relacionadas a trabalhos de conclusão de curso. Comecei a trabalhar um assunto no qual tinha informações superficiais e isto exigiu alguns sacrifícios, a cada passo que dava era necessário muitas leituras. REFERÊNCIAS CABEDA, Sonia T. Lisboa; PREHN, Denise Rodrigues; STREY, Marlene Neves (Orgs.). Gênero e cultura: questões c o n t e m p o r â n e a s . – Po r t o A l e g r e : EDIPUCRS, 2004. Confesso que por muitos momentos 5 66 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 _____. COLLING, Ana. A construção histórica do Feminino e do Masculino. CATANI, Denice Barbara. (Org.). Docência, Memória e Gênero: Estudos sobre formação. São Paulo: Escrituras Editora, 1997. _____. LOURO, Guacira Lopes. Gênero e Magistério: Identidade, História, Representação. COSTA, Lúcia Cortes Da. Gênero uma questão Feminina? Artigo (Http:www.uepg.br/nupes/genero.htm). Educação & Realidade. Porto Alegre V. 20 m. 2 - p. 9-255 –jul./JUN.1995. _ _ _ _ _ . S C OTT, J o a n . G ê n e ro : U m a categoria. Útil de Análise Histórica. FOUCAULT, Michel. MICROFÍSICA DO PODER. -20° Edição, 2004. Organização, introdução e revisão técnica de Roberto Machado. _____. A arqueologia do saber. 8ª edição, tradução Luiz Felipe Baeta Neves, Forense Universitária, Rio de Janeiro, 2012. GÜLLICH, Roque I. Da Costa; LOVATO, Adalberto; EVANGELISTA, Mário L. Santos; Metodologia da Pesquisa: normas para apresentação de trabalhos: redação, formatação e editoração. Três de Maio: SETREM, 2007. LOURO, Guacira Lopes. Gênero, Sexualidade e Educação: Uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1997. PRIORE, Mary Del (ORG). História Das Mulheres No Brasil. 3º Edição - São Paulo; Contexto, 2000. _____. Mulheres na sala de aula. Guacira Lopes Louro. VEIGA-NETO, Alfredo. FOUCAULT & A EDUCAÇÃO. Minas Gerais: Autêntica, 2003. 67 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 POSSIBILIDADE DE ALFABETIZAR LETRANDO A PARTIR DA LITERATURA INFANTIL João Ricardo Prestes Froes Silvia Natália de Mello Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber SETREM 1 2 3 4 RESUMO ABSTRACT Vivemos numa sociedade com variadas práticas sociais de leitura e de escrita. A literatura infantil é importante no processo de alfabetização e de letramento. É fundamental que a família e a escola (principalmente na Educação Infantil), durante a infância proporcione momentos e práticas de leitura para que as crianças tenham possibilidades de adquirir o gosto e o hábito pela mesma, além de oportunizar a formação de autores através da exploração de escrita e de gêneros textuais. Esta produção textual se desenvolveu a partir do projeto sobre a Possibilidade de alfabetizar letrando a partir da literatura infantil e foi desenvolvido numa Instituição de Ensino localizada no município de Três de Maio, com uma turma de Segundo ano do Ensino de Nove anos, composta por treze crianças. A pesquisa foi de abordagem qualitativa, procedimento descritivo, pesquisaação, fundamentação teórica e a técnica de observação. A elaboração do projeto e planejamento das situações de aprendizagens foi desenvolvida no decorrer das quarenta horas de intervenção pedagógica e oito horas de observação. Neste estudo objetivou-se analisar e realizar práticas de alfabetização e letramento, as relações de ensino-aprendizagem na matemática e do trabalho em grupo, e a literatura infantil como recurso fundamental no processo de alfabetização e letramento. A literatura infantil é um instrumento de apoio fundamental no processo de alfabetização e letramento; dar-se-á continuidade neste estudo em outra oportunidade. Os principais autores utilizados a discussão teórica são: Colello (2004), Grossi (2005/6), Soares (1998). We live in a society with different social practices of reading and writing. Children s literature is important in the process of literacy. It is important that family and school especially in kindergarten during childhood provides moments and reading practices for children to have opportunities to acquire the like and habit of reading, besides to nurture the formation of authors through the exploration of writing and textual genres. This text production developed from the project on the Possibility of literacy from children s literature and developed in an educational institution located in the city of Três de Maio, with a class of second school year of nine years teaching, consisting of thirteen children. The research was a qualitative approach, descriptive procedure, action research, theoretical and technical observation. The project design and planning of learning situations was developed in the course of the forty hours of pedagogical intervention and eight hours of observation. This study aimed to analyze and conduct literacy practices, the relationship of teaching and learning in mathematics and group work, and children s literature as a key resource in the process of literacy. Children s literature is a tool of key support in the process of literacy; this study will be continued on another occasion. The main authors of the theoretical discussion are: Colello , Grossi , Soares . Keywords: Literacy. Children s Literature. Palavras-chave: Alfabetização. Letramento. Literatura Infantil. 1 Pedagogo egresso do curso de Pedagogia da SETREM, e -mail: [email protected]. Professora do Curso de Pedagogia da SETREM, Pedagoga, Mestre em Educação, e -mail: [email protected]. 3 Professora orientadora deste estudo, Bióloga, Mestre em Educação nas Ciências e do Curso de Pedagogia da SETREM, e -mail: [email protected]. 4 Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM, Av. Santa Rosa, 2405; Três de Maio - RS, [email protected] 2 68 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1 INTRODUÇÃO Não há uma resposta concreta, porque não é uma simples questão. Durante a organização do projeto para a devida intervenção pedagógica, a preocupação com o alfabetizar letrando tornou-se uma problemática a mais na produção e organização das atividades. Como contribuir no processo de letramento das crianças abrangendo os propósitos da alfabetização: semântica, sintaxe e fonética? Esta produção textual se desenvolveu a partir do projeto sobre a “Possibilidade de alfabetizar letrando a partir da literatura infantil” e foi desenvolvido numa Instituição de Ensino localizada no município de Três de Maio, com uma turma de 2° ano do Ensino Fundamental de Nove anos, composta por treze crianças. A pesquisa foi de abordagem qualitativa, procedimento descritivo, pesquisa-ação, fundamentação teórica e a técnica de observação. A elaboração do projeto e o planejamento das situações de aprendizagens foram desenvolvidos no decorrer das quarenta horas de intervenção pedagógica e oito horas de observação. As crianças estão cansadas de saber que o “lobo mau” devorou a vovozinha, que os sapos viram príncipes e as bruxas castigam os meninos desobedientes. A partir do pretexto de que literatura não é só “ler sempre as mesmas histórias”, proporcionei para as crianças dois momentos de leitura com revistas e jornais com datas atuais. Fantástico! No primeiro instante as crianças correram para o “gavetão” das tesouras (gaveta no armário da escola na qual estão guardadas as tesouras), então expliquei que não haveria recortes e sim um momento de leitura livre, que poderiam folhear, ler, escolher uma reportagem e, em seguida, a respectiva socialização com os colegas. A ênfase da prática pedagógica desenvolvida e aplicada foi proporcionar situações de aprendizagens que pudessem contribuir e desenvolver o processo de apropriação e outras habilidades da língua escrita e da leitura. A literatura infantil é importante no processo de alfabetização e letramento. Através da literatura infantil podem-se desenvolver estratégias necessárias para a compreensão e produção de textos. Foi desenvolvida a escrita através da produção compartilhada de textos, de palavras e frases. Também foram promovidas situações de leituras em voz alta e silenciosa de palavras e frases dos mais diversos gêneros textuais. Além de ter oportunizado a formação de leitores e a constituição de autores através da exploração de escrita e de gêneros textuais. Conforme Soares, “letramento é informar-se através da leitura, é buscar notícias e lazer nos jornais, é interagir com a imprensa diária, fazer uso dela, selecionando o que desperta interesse...” (1998, p.42). As crianças até então não tinham tido contato com as revistas e jornais, pois tinham dificuldade em ler as letras gráficas impressas, somente usavam as revistas para r e c o r t a r. A a t i v i d a d e f o i b a s t a n t e emocionante e produtiva, pois a grande maioria já está alfabetizada e os colegas no processo silábico-alfabético tinham o auxílio do alfabeto móvel,5 confeccionado e utilizado durante a intervenção pedagógica. Os níveis de escrita são cinco: Estamos inseridos numa sociedade com variadas práticas sociais de leitura e de escrita. A criança antes do nascimento já entra em contato com a literatura infantil e que permeia toda a sua infância a disponibilidade de materiais de escrita e de leitura. Por isso é fundamental que a família e a escola - principalmente na Educação Infantil -, durante a infância proporcione momentos e práticas de leitura, para que as crianças tenham possibilidades de adquirir o gosto e o hábito pela leitura. A escrita pré-silábica é produzida por crianças que ainda não compreendem o caráter fonético do sistema... escrita com letras inventadas, com letras convencionais, mas sem valor sonoro convencional: pode aparecer com ou sem variação figural. ...com variação de símbolos numa mesma palavra. A escrita silábica... nessa fase, a criança compreendeu que o 2 PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO No processo de alfabetização e letramento o docente se depara com algumas inquietações, “Como alfabetizar letrando?”. 5 Alfabetos confeccionados com materiais de diferentes texturas e letras de modelos diferentes (cursiva, script, gráfica). 69 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 s i s t e m a é u m a representação da fala. Na tentativa de fazer compreender “partes da fala” com “partes da escrita”, ela faz valer uma letra pra cada sílaba... as variações da escrita silábica podem ocorrer pela presença de letras convencionais ou inventadas, usadas com ou sem o valor fonético convencional. A escrita silábico-alfabética é marcada por um momento de transição, no qual o indivíduo já percebeu a ineficácia do sistema alfabético, mas ainda não domina o sistema alfabético. Na tentativa de acrescentar letras, ela acaba usando, numa mesma palavra, os dois critérios, podendo se aproximar do silábico ou do alfabético. O resultado disso é u m a e s c r i t a aparentemente caótica, nem sempre legível. A escrita alfabética... quando a criança compreende o valor sonoro de cada letra, ela pode ainda estar distante da escrita convencional, na medida em que não domine as regras e as particularidades do sistema (COLELLO, 2004, p. 27/28). segundo momento, com leituras de poesias, que depois de lidas eram trocadas entre as crianças e o terceiro momento foi feito leitura de parlendas que também depois de lidas eram trocadas entre as crianças. O docente poderá produzir momentos e condições de letramento, com todos os tipos de textos, nos mais diversos temas e gêneros; e este processo começa na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. “Como não basta a capacidade de copiar palavras ou frases, a alfabetização traz implícito o desafio de escrever textos inteligentes, pessoais e criativos” (COLELLO, 2004, p. 90). O professor poderá produzir exercícios que provoque a curiosidade dos estudantes, que desafie os/as alunos/as a ler livros e textos de diversas épocas, além de tornar autores de suas escritas. Não é centrar-se em estudar algumas classes de palavras e sílabas apenas. Alfabetização e Letramento são indissociáveis e que pode trazer para dentro da escola a leitura do mundo real. Trabalhar os fatos, notícias, folders, painéis, outdoor e especialmente a literatura infantil no processo da aquisição da escrita e de leitura. Durante o momento de leituras de jornal, revistas e livros de diferentes gêneros textuais percebi que as crianças levantavam de seus assentos e iam até seus colegas mostrar as figuras e palavras que tinham descoberto. Palavras de diferentes contextos, como nome de carros, artistas, cidades foram socializadas nos debates posteriores ao momento da leitura. São níveis de escrita desenvolvidos por Emília Ferreiro (1999, Psicogênese da Língua Escrita) e que neste estudo são referenciados por Collelo; e que auxiliam os docentes a direcionar as suas práticas educativas. Pode-se encontrar numa mesma turma vários níveis de escrita. Na turma que foi realizada esta intervenção pedagógica pode-se presenciar a escrita silábicoalfabética e a escrita alfabética. A confecção do alfabeto móvel auxiliou na produção de palavras e frases, além das atividades específicas e dirigidas, mas com o mesmo conteúdo, abrangendo assim toda a turma de crianças. Não há um termo específico para traduzir o termo “Letramento”. Soares traz em sua perspectiva que “letramento é resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura e escrita; o estado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita e de suas práticas sociais” (2006, p. 39). Não é a pura decodificação de letras, palavras e sílabas, ser letrado é usar socialmente a escrita e a leitura. Conforme a Resolução n° 7, de 14 de JUNembro de 2010, Art. 7º e em conformidade com o art. 22 e o art. 32 da Lei nº 9.394/96 (LDB/1996), tem como base “O desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo”. São direitos e Foram realizados três momentos distintos de leitura com gêneros textuais: o primeiro, com a leitura de trava-línguas e a respectiva montagem, num banner, de um trava-línguas selecionado, ordenando as sequências produzidas em tiras gigantes; o 70 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 deveres do educando e do docente assegurados nas resoluções da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. no processo de alfabetização. Muitos jogos de formação de palavras, sílabas, sons foram levados até as crianças, sempre acompanhados do alfabeto móvel para aqueles no estágio silábico-alfabético. Foi realizada a escrita do nome, em que foram exploradas as letras do nome de cada criança, pois tinham que formar palavras que iniciavam e que continham as letras de seus nomes com auxílio do alfabeto móvel. E, assim, o alfabeto móvel se constituía num aliado importante durante as atividades de formação de palavras, nos ditados de verificação, em ditados interativos, nos autoditados com imagens significativas, nas janelas de figuras significativas. A cada descoberta de uma nova palavra, esta era socializada para os colegas, o que instigava os outros a formar outra palavra para socializar também. Em muitas situações a palavra era socializada no quadro de giz da sala de aula. Ser letrado é desenvolver habilidades, conhecimentos e demonstrar acima de tudo estar apto a fazer uso destes aspectos para exercer a cidadania, fazendo uso de seus ideais e valores, independente da função social que exerce. A escola precisa dar condições para que a criança se torne letrada na Educação Básica. Aumentar a disponibilidade e a distribuição de livros entre a população. Isto é, criar condições para o letramento. Alfabetização é a ação de alfabetizar e alfabetizar é tornar o indivíduo capaz de ler e de escrever (Dicionário Aurélio. 2003). Colello (2004) aborda que o processo de alfabetização precisa estar amparado pelo tripé: aluno, escola e alfabetização. Trabalhar com o aluno, principalmente a questão corporal “que tem sido desconsiderado em sala de aula” (p. 15). É fundamental para a escola fazer reflexões acerca de suas práticas pedagógicas, se realmente estão sendo gerados resultados capazes de transformar a sua realidade e a do aluno ou apenas um ato mecânico, privando o indivíduo de ter criticidade e autonomia. Respeitar as ideias e o conhecimento que o aluno traz em sua bagagem cultural é importantíssimo na construção da prática pedagógica. Trabalhar a linguagem coloquial das crianças numa perspectiva de ressignificação dos termos e palavras sem perder a riqueza dos conteúdos, e sim apenas fazendo as devidas correções. “Levar em consideração os conhecimentos, valores e as necessidades infantis significa atender o aluno como um todo, garantindo a ele a possibilidade da autêntica expressão, da manifestação de si e do intercâmbio com os outros” (COLELLO, 2004, p. 122). Esta diversidade cultural auxilia na construção das aprendizagens e saberes, dependerá da atitude do profissional docente em relação ao estabelecimento de um canal de comunicação e conhecimento entre a escola e a sociedade. A alfabetização pode ser considerada como um processo de construção da consciência metalinguística. Utilizando das dimensões sociais, psicológicas, psicomotoras, cognitiva e afetiva. “Alfabetizar é construir um sistema graças ao qual se pode combinar letras de diferentes modos, produzindo sílabas, palavras, sentenças ou períodos” (COLELLO, 2004, p. 37). Colocar a criança em contato com a leitura, palavras o mais cedo possível é fundamental para o bom desenvolvimento da leitura e da escrita. Uma das questões centrais é tornar o aluno um indivíduo autor de suas escritas e leitor dos mais diversos gêneros textuais. As crianças tinham o problema de copiar as respostas das atividades proporcionadas pelos colegas, percebi esta atitude no primeiro dia da intervenção e resolvi mudar os exercícios, trocava as figuras, as palavras e os números. As crianças reclamaram bastante no início, e isto até ajudou na união do grupo, pois uma queria ver o que a outra tinha e simultaneamente se ajudavam. Jogos de sequência lógica com gravuras e palavras diferentes para evitar a cópia e consequentemente desenvolverem a autonomia. Foi produzida uma caixa com Retomando a perspectiva de ensinar alfabetizar letrando “é fazer o aluno descobrir a escrita, usar a escrita e que aprenda a escrita” (COLELLO, 2004, p.113). O aluno precisa ser provocado durante o processo de alfabetização e nos diferentes níveis psicogenéticos. Um excelente provocador é o jogo, que depois de todo o estudo realizado em torno de determinado conteúdo pode ser usado como um complemento fundamental 71 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 fichas de sílabas de diversas letras e palavras, que consistia na retirada de uma ficha por criança e a consequente formação de uma palavra no quadro de giz, a turma era instigada posteriormente na coleta e registro das novas palavras. Durante a realização desta atividade produziram-se JUNenas de palavras formadas e com pleno êxito, pois as crianças adoravam contribuir e ajudar os colegas. crianças, elas ainda não tinham tido contato com as operações de multiplicação e divisão; demandaria mais alguns dias de prática pedagógica para abranger com qualidade as atividades e seus conteúdos deixados para trás. Percebi que as crianças tinham dificuldades em resolver os cálculos matemáticos que eram oferecidos, especificamente as operações matemáticas de adição e de subtração. “Compreende-se cada vez mais claramente que aprender não é memorizar, pedaço por pedaço, o conteúdo, mas construir um sistema de conceitos operatórios, com os quais se tenha condições de enfrentar e resolver novos problemas.” (GROSSI, 2006, p. 75). Então, elaborar atividades que fizessem as crianças aprender a fazer e não um fazer por fazer mecanicamente. Trabalhar com grãos de cereais e objetos torna a atividade atraente e concreta, em que as crianças vão elaborando suas concepções e aprendizagens. O/A aluno/a pode vir a desenvolver a capacidade de expressar-se, por isso é fundamental que a escrita e a leitura sejam trabalhadas na relação ensino aprendizagem “a compreensão a respeito das diferentes modalidades de escrita” (COLELLO, 2004, p. 51). Fazer com que o/a aluno/a se torne um/a pesquisador/a, é dar condições para buscar, interpretar, descobrir, explorar os conteúdos para que se possa produzir o senso crítico. 3 RELAÇÕES DE ENSINOAPRENDIZAGEM NA MATEMÁTICA E DO TRABALHO EM GRUPO Tra b a l h a r a m a t e m á t i c a n e s t a intervenção pedagógica era um desafio, foi preciso construir e reconstruir conceitos e paradigmas. No primeiro instante a ideia de como significar a aprendizagem matemática na vida das crianças, utilizando o saber que as crianças já tinham aprendido. Concordo com Grossi que diz: No decorrer do Estágio Supervisionado II foi realizado o estudo dos números de 0 a 20 e das operações de adição e de subtração com o auxilio do baralho de números, jogo do dodecaedro, bingo de números, utilização de copos, sementes, botões e pinturas. Conforme Kamii, “...Piaget e seus colaboradores demonstraram que o número é alguma coisa que cada ser humano constrói através da criação e coordenação de relações.” (1988, p. 26). A utilização de copos e sementes foi fantástica; ao final da atividade restavam poucos grãos em cima das mesas, as crianças não estavam habituadas a trabalhar desta maneira, até uns alunos reclamaram da bagunça e quando instigados sobre o porquê da reclamação, afirmaram categoricamente ao fato de não terem trabalhado com grãos. É impressionante como se ensina e como se aprende pouca matemática e como isso, politicamente, é grave. Surrupiamos da população um de seus mais elementares direitos, o de aprender a articular múltiplos elementos para sair do mero campo das familiaridades, das habilidades e das informações, para a fecunda esfera das conceituações, ou seja, do imenso e poderoso universo das ideias que movem o mundo (GROSSI, 2006, p. 81). Algumas atividades não foram possíveis realizar devido à falta de tempo. A atividade de produção textual na escrita de carta, jogos com dígrafos e o jogo com copos para trabalhar as operações matemáticas de multiplicação e divisão. “Ensinar matemática não é nem explicar detalhadamente (de fora para dentro) para os/as alunosas e nem esperar que eles/elas tenham a estrutura pronta, para então ensiná-la.” (KOCH, 2006, p. 35). É preciso respeitar o tempo das Trazer para o ambiente da sala de aula elementos e materiais que as crianças utilizam no dia-a-dia estabelece um diálogo entre a sociedade e a escola. Algumas crianças, durante a realização das atividades, citavam quantidades e valores de alguns alimentos (cereais e grãos) consumidos por suas famílias. A Matemática está implícita na 72 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 vida das crianças, a função enquanto docente foi ressignificar e reelaborar os conteúdos matemáticos. ambiente de sala de aula, precisam interagir com seus colegas e o docente também sobre os assuntos e conteúdos do cotidiano. Grossi afirma que “numa sala de aula, a organização dos alunos em pequenos grupos é uma forma de operacionalizar a interação entre eles, a qual é fundamental numa situação de ensino e aprendizagem”. (2005, p. 69). É preciso dar vez e voz às crianças; isto é, desenvolver autonomia, ética, respeito pelo próximo, cidadania, oportunidade de compartilhar valores e acima de tudo a humanização de si e do próximo. A sala foi organizada em grupos, duplas, trios, quartetos, semicírculo durante o período de intervenção pedagógica. No começo, houve algumas resistências das crianças que não queriam realizar as atividades em grupo ou que ficavam escolhendo os colegas, mas esta resistência durou pouco tempo, pois foram trabalhadas, organizadas, agrupadas as crianças conforme a necessidade de aprendizagem, mesclando os que tinham mais facilidade com os que tinham mais dificuldades nas realizações das tarefas. 4 A LITERATURA INFANTIL COMO RECURSO FUNDAMENTAL NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO A turma, conforme relatos das próprias crianças, raras vezes se organizavam em grupos. A dificuldade inicial para formar os grupos acabou gerando mais subsídios (materiais didáticos) e motivação para levar a ideia do trabalho em grupo para o restante de intervenção pedagógica. Freire fala que “um grupo se constrói na organização sistematizada de encaminhamentos, intervenções por parte do educador, para a sistematização do conteúdo em estudo”. (2000, p. 65). A função do docente é desenvolver a interação entre os indivíduos, promovendo a interlocução de saberes entre as crianças, fazendo com que as aprendizagens sejam significativas e possam ser compartilhadas entre as crianças. É fundamental utilizar recursos da literatura infantil nos Anos Iniciais e Infantis, no processo de alfabetização das crianças, o contato com as histórias perpassa desde a leitura até a ascensão da escrita, a codificação e a posse do alfabeto. Não obstante, leva o leitor a vivenciar outras realidades. “A literatura realiza seu papel social porque propicia um tipo de leitura que produz uma ruptura no interior das vivências do sujeito, apontando-lhe as possibilidades de outro universo e alargando suas oportunidades de compreensão do mundo” (ZILBERMAN, 2001, p. 55). O leitor pode descobrir e viajar por lugares nunca antes habitados por seu imaginário, conhecimento do mundo e de si. No início da intervenção pedagógica uma criança recusou-se a sentar com os grupos organizados. A decisão tomada foi de conversar com esta criança, tranquilizá-la, sem bajulação, explicar para ela que o seu lugar no grupo estava reservado e que quando se sentisse bem poderia sentar-se com seus colegas; e que ela era importante e que o grupo precisava dela. Passaram-se três dias e a criança não se sentou nos grupos organizados diariamente, no quarto dia durante a organização de um determinado grupo esta criança sentou-se tranquilamente sem o docente se dirigir a ela e não foi feito nenhum comentário a respeito de sua decisão para que não gerasse aborrecimento para a criança; e assim até o final da intervenção pedagógica a criança realizou com tranquilidade as atividades de grupos propostas. Durante a intervenção pedagógica foram desenvolvidas duas histórias infantis: primeira história “Galinha Ruiva” de Jaci José Dela e a segunda história “Festa no Céu” de Sandra Esteves de Souza. Na primeira, logo após o momento do conto, as crianças realizaram um desenho livre sobre a história e, em seguida, com o auxílio do alfabeto móvel, produziram um pequeno texto com os personagens da história da “Galinha Ruiva”. Em outro momento foi realizado o conto da segunda história “Festa no Céu”. Depois do conto, foi realizada a formação de palavras com nomes de animais, com o auxílio do alfabeto móvel e figuras de animais. Em seguida as crianças tiveram que dar continuidade à história e tiveram que representar, através do desenho e da escrita, como se sucedeu a história no céu. Atividade As crianças precisam se sentir bem no 73 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 com êxito, pois cada uma criou a sua história, momento riquíssimo de trocas de informações, tanto de histórias de festas que as próprias crianças já viveram, como de palavras novas. com os livros, mediando o processo de escolha dos livros e as situações de aprendizagens das crianças. Conforme citado anteriormente, o cuidado nas escolhas com as obras literárias é fundamental no desenvolvimento de valores e concepções pessoais. Qualquer texto “pode penetrar impunemente na privacidade e no mundo íntimo do leitor” (Zilberman, 2003, p. 54). Assim como o texto pode suscitar nas crianças a imaginação, pode também provocar conflitos e danos na personalidade das crianças. Desenvolver a imaginação, a autonomia, criticidade nas crianças, constitui-se particularmente em desafio para os docentes. Zilberman descreve que a literatura pode suscitar o “desnudamento da interioridade do eu, ela suscita a participação, bem como a identificação com seres fictícios” (2001, p. 118). Além da fantasia da realidade, mescla o lúdico com a realidade, sendo a infância um período no qual as crianças se identificam com outras personalidades, período de resolução dos dilemas pessoais e sociais, emancipação de personalidade. As crianças antes de adentrarem no sistema escolar estão sendo estimuladas através da diversidade de gêneros textuais que os segmentos da mídia oferecem. “O contato com a literatura infantil se faz inicialmente por seu ângulo sonoro: a criança ouve histórias narradas, podendo eventualmente acompanhá-las com os olhos na ilustração” (Zilberman, 2003, p. 170). Muitos pais e mães contam histórias para a criança durante o período de gestação, a criança neste período pode ouvir. Depois do nascimento, o contato ocorrerá visualmente através das representações gráficas nas roupas, brinquedos, toalhas, paredes e principalmente nos livros de histórias infantis. Ao professor cabe a seleção das obras literárias infantis de boa qualidade para trabalhar com suas crianças. Além de utilizar corretamente os estilos literários, não retirando a riqueza destes textos. O professor que se utiliza do livro em sala de aula não pode ser igualmente um redutor, transformando o sentido do texto num número limitado de observações tidas como corretas (procedimento que encontra seu limiar nas fichas de leitura, cujas respostas devem ser uniformizadas, a fim de que possam passar pelo crivo do certo e do errado. Ao professor cabe o desencadear das múltiplas visões que cada criação literária sugere, enfatizando as variadas interpretações pessoais, porque decorrem da compreensão que o leitor alcançou do objeto artístico, em razão de sua percepção singular do universo representado (ZILBERMAN, 2003, p. 28). É importante ressaltar que a literatura se desenvolveu com a elite, pois ela é que comandava e, por isso, para a elite era oferecido o contato com as obras literárias. “Sendo a literatura infantil um dos tantos produtos culturais oriundos da ascensão da camada burguês, sua instalação na sociedade brasileira teve de aguardar a emergência das classes médias urbanas” (Zilberman, 2003, p. 204). Nos países colonizados, o processo de democratização da literatura foi mais lento; para tanto, no Brasil, este processo se deu na passagem da monarquia à república e ainda a literatura com caráter moralizante. A Instituição no qual foi realizada a intervenção pedagógica possui com a turma o projeto “Sacola Mágica” no qual, a cada semana, uma criança leva a sacola com algumas obras literárias infantis para ler em casa. A realização da “Hora Cívica” uma vez por semana estimula as crianças a apresentar leituras como músicas, poesias, versos e rimas. Foi gratificante assistir as crianças declamando as poesias e parlendas que foram trabalhadas em sala de aula e que O texto tem que desenvolver o imaginário das crianças, não desprovê-la das p o s s i b i l i d a d e s d e d e s e n v o l v i m e n t o, padronizando-as a um modelo idealizado pelo sistema social ou escolar. A diversidade dos gêneros textuais permite a abertura de múltiplas possibilidades de aprendizagens e tem função formadora de ideias e conceitos próprios pela criança; cabe ao professor conduzir e orientar a crianças neste contato 74 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 foram declamadas no espaço externo da escola (pátio) durante a “hora cívica”. conhecerem e alargarem seus universos pessoais e sociais, em busca de novos significados, de maneira a compreenderem a realidade, em suas múltiplas dimensões. Logo nos primeiros encontros foi percebi que as crianças no nível psicogenético alfabético terminavam as atividades primeiroi, porque conseguiam ler sem auxílio do alfabeto móvel ou de alguém ajudando. A cada atividade terminada, eram oferecidos pequenos textos, poesias, travalínguas e parlendas para as crianças irem lendo enquanto o restante da turma terminava as atividades. Esta prática de oferecer materiais para ler foi aprovada pelas próprias crianças, que pegavam um livro de história ou o material disponível para leitura. Além de estimular a leitura, retirava as crianças da ociosidade, das algazarras e alguns conflitos que podiam ser gerados entre as crianças. No momento histórico em que a sociedade se encontra, saber ler e escrever não basta. É necessário que as crianças se apropriem do sistema da escrita e da leitura, compreendam seus usos e funções e a utilizem de maneira crítica, autônoma e criativa. Numa sociedade marcada pela escrita e imagem, propiciar situações efetivas de letramento é condição imprescindível para o aprendizado no exercício da cidadania, nas suas dimensões prática, política e ética. Pretendo dar continuidade neste estudo em outra intervenção pedagógica, pois vejo a literatura infantil como um instrumento de apoio fundamental no processo de alfabetização e letramento. Então, cabe utilizar-se de recursos literários didáticos selecionados e qualificados, sendo que a literatura infantil traz implícita e explicitamente a interdisciplinaridade de conteúdos, capacitando as crianças para a inserção no contexto social de um mundo, cada vez mais apoiado na leitura e na escrita. A literatura infantil deve permitir à criança sonhar, viajar, amar, sofrer, entender o mundo, resolver seus conflitos, criar ilusões, ter devaneios e controlar as sensações interiores pessoais. O sucesso de uma intervenção pedagógica começa pelo vínculo afetivo que o docente estabelece com a turma das crianças. Pesquisar como as crianças gostariam de trabalhar determinada atividade proposta, respeitar as crianças e seu tempo de aprendizagem, quando se comunicar com elas, deve-se tratá-las de forma a abranger todas com o mesmo nível de tratamento. Conversar sobre assuntos que estão na mídia, auxiliar na resolução dos problemas cotidianos pessoais e o mais importante dar feedback às crianças; pois muitas vezes elas só querem conversar, trocar ideias. Êxito pleno em relação ao processo de comunicação e relações interpessoais; vínculos afetivos, confiança, empatia, respeito mútuo e proximidade com as crianças, possibilitando uma aprendizagem significativa e a construção de novos saberes. REFERÊNCIAS BORDIN, Jussara; GROSSI, Esther Pillar. (organizadoras). Paixão de Aprender. 11° Edição, Editora Vozes; Petrópolis, RJ: 2000. ________. FREIRE, Madalena. O que é um grupo? COLELLO, Silvia Mattos Gasparian. Alfabetização em questão. 2° Edição revista e ampliada; Rio de Janeiro: Paz e Terra. 2004. ASPECTOS RELEVANTES, PARA NÃO CONCLUIR.. Neste breve estudo realizado sobre a intervenção pedagógica “possibilidade de alfabetizar letrando a partir da literatura infantil”, verificou-se a importância do uso da literatura infantil no processo de alfabetização e letramento. A prática educativa oportunizou a formação de leitores, a constituição de autores através da exploração de escrita e de gêneros textuais. Por isso, alfabetizar letrando é um dos requisitos básicos possíveis para as crianças GEEMPA, 2005. Grupos Áulicos: A Interação Social na Sala de Aula. / Organizado por Ana Luiza Carvalho da Rocha. Porto Alegre, setembro 2005. ________. GROSSI, Esther Pillar. A formação dos pequenos grupos nas salas de aula geempianas. 75 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 GEEMPA, 2006. Fórum Social pelas aprendizagens 2006: Por onde começar o ensino da matemática? ________. GROSSI, Esther Pillar. Como ensinar, de verdade, matemática? ________. GROSSI, Esther Pillar. O papel político do professor de matemática. ________. KOCH, Maria Celeste M. E com a matemática, como é que se faz. GÜLLICH, Roque Ismael da Costa; LOVATO, Adalberto; EVANGELISTA, Mário Luiz Santos; Metodologia da Pesquisa: normas para apresentação de trabalhos: redação, formatação e editoração. Três de Maio: SETREM, 2007. KAMII, Constance. A criança e o número: implicações educacionais da teoria de Piaget para a atuação junto a escolares de 4 a 6 anos. (Tradução: Regina A. de Assis). 9° Edição; Campinas: Papirus, 1988. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1998. ZILBERMAN, Regina. Literatura Infantil na Escola. 11° Edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Global, 2003. ZILBERMAN, Regina. Fim do Livro, Fim dos Leitores. São Paulo: Editora Senac, 2001. 76 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 ANÁLISE DO SISTEMA DE MEDIÇÃO EM UMA INDÚSTRIA METALÚRGICA Lucinéia Carla Loeblein, PPGEP, UFSM 1 Leoni Pentiado Godoy, PPGEP, UFSM 2 Adalberto Lovato, SETREM 3 Universidade Federal de Santa Maria – UFSM e Programa de Pós – Graduação em Engenharia de Produção –PPGEP 4 SETREM 5 RESUMO ABSTRACT A necessidade de atender os requisitos dos clientes e garantir a precisão nas medidas nas indústrias fornecedoras de peças para montadoras é algo estritamente necessário para a permanência das mesmas no mercado. Este trabalho tem por objetivo a Análise do Sistema de Medição, através dos estudos de Repetitividade e Reprodutibilidade (R&R) em uma indústria metalúrgica fornecedora de peças para montadoras automotivas. De acordo com os métodos empregados na pesquisa, esta se classifica em pesquisa bibliográfica e estudo de caso, estudaram-se os procedimentos estabelecidos pelas entidades de normatização de qualidade e as teorias relacionadas à pesquisa. As etapas do estudo de caso consistiram na preparação das amostras, definição dos colaboradores e orientação, medição, coleta de dados, aplicação dos estudos estatísticos e análise dos dados. O valor de R&R encontrado foi de 42,07%, com este resultado o sistema de medição não é aceitável, necessitando de melhorias. A variação entre os operadores foi superior à variação entre os equipamentos, o que indica que as causas podem estar relacionadas com os operadores. The need to meet customer requirements and ensure accurac y in measurements in industries that supply parts for automakers is something absolutely necessary, to stay in the same market. This paper aims to Measurement System Analysis, through the Repeatability and Reproducibility studies R R in a metalworking industry supplier of automotive parts to automakers. According to the methods used in the research, this is classified as a bibliographic research and study case, studied the procedures established by the standardization of quality and theories related to research. The steps of the study case consisted of sample preparation, definition and orientation of employees, measurement data collection, application of statistical studies and data analysis. The R R found was . , with the result that the measurement system is not acceptable as needing improvement. The variation between operators was greater than the variation between devices, which indicates that the causes may be related to the operators. Keyworks: Quality control. Measurement System Analyser. Repeatability and Reproducibility. Palavras-chaves: Controle de qualidade. Análise do Sistema de Medição. Repetitividade e Reprodutibilidade. 1 Mestranda em Engenharia de Produção, UFSM. Estudante Pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Enge nharia de Produção – NUPEP da UFSM. [email protected] . 2 Drª. Professora do Programa de Pós graduação em Engenharia de Produção, PPGEP. Pesquisadora responsável pelo Núcleo de Pesquisas em Engenharia de Produção – NUPEP da UFSM. [email protected] . 3 Msc. Professor do Curso de Graduação em Engenharia de Produção da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM. [email protected] . 4 Universidade Federal de Sant a Maria – UFSM, Programa de Pós - G raduação em Engenharia de Produção – PPGEP - Faixa de Camobi, Km 9 – Campus Universitário, Santa Maria, RS – 97.105-900. 5 Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM . Av. Santa Rosa, 2405 Três de Maio - RS - CEP 98910 -000 [email protected] 77 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO 2. REVISÃO DA LITERATURA As empresas nacionais têm a necessidade de atender padrões internacionais de qualidade e inovação, pois é comum que o processo produtivo de um produto ocorra em diversos países. Esta habilidade das indústrias nacionais em atender padrões internacionais permite que elas participem das redes globais de suprimento. Dentro destes requisitos a serem atendidos estão a garantia da qualidade dos produtos que depende da normalização e do controle metrológico (SALGADO, 2010). O ramo automotivo possui norma específica de qualidade baseada na ISO 9000. Essa norma específica leva o nome de ISO/TS 16949, onde acrônimo TS vem de Technical Specification – Especificação Técnica. É, portanto uma particularização de uma norma maior de qualidade. A TS 16949, que leva a chancela da ISO, é elaborada pela AIAG (Automotive Industries Action Group), uma equipe de especialistas formada por representantes das principais indústrias automotivas dos Estados Unidos, da Europa e do Japão. Essa norma fornece requisitos precisos para cada um dos tópicos apresentados pela ISO 9000. Devido às necessidades da utilização mais frequente dos dados de medição, temse buscado a melhoria dos valores de medição, sendo de fundamental importância o uso da Análise do Sistema de Medição (MSA). Um sistema de medição precisa garantir que os resultados estejam corretos; por isso a necessidade do controle e monitoramento do processo de medição. Realizar a Análise do Sistema de Medição é necessária, pois garante à empresa que o seu processo de medição é eficaz, garantido a qualidade dos produtos, ou seja, que as especificações do cliente sejam atendidas. Segundo a ISO/TS 16949:2009, a Análise do Sistema de Medição deve ser realizada para verificar a variação existente em cada sistema de medição e a empresa deve estabelecer processos para garantir que a medição e o monitoramento possam ser realizados de uma maneira coerente. No caso da Análise do Sistema de Medição, deve ser assegurada a repetitividade e a reprodutibilidade das medições, que é alcançada através da elaboração de estudos de R&R (Repetitividade e Reprodutibilidade). O requisito 7.6 da norma ISO TS 16949:2009 trata do controle de dispositivos de medição e monitoramento e o subitem 7.6.1 Análise do Sistema de Medição, estabelece que estudos estatísticos devem ser realizados para analisar a variação existente em cada sistema de medição e ensaio. Os métodos analíticos e os critérios de aceitação devem ser seguidos conforme os critérios do cliente. Os métodos estatísticos definidos na norma ISO/TS 16949: 2009 são abordados neste trabalho, enfatizando o estudo Repetitividade e Reprodutibilidade (R&R). A utilização dos estudos estatísticos e a análise correta dos mesmos permitem o aperfeiçoamento da qualidade e o aumento da produtividade, oportunizando a melhoria dos processos. Este artigo apresenta uma aplicação de métodos estatísticos definidos pela norma ISO/TS 16949:2009 e pelos requisitos dos clientes. 2.1 Análise do Sistema de Medição (MSA) O INMETRO (2000) denomina a medição como “conjunto de operações que tem por objetivo determinar um valor de uma granJUNa” (INMETRO, 2000, p. 23), e “a metrologia abrange todos os aspectos teóricos e práticos relativos às medições, qualquer que seja a incerteza, em quaisquer campos da ciência ou tecnologia” (INMETRO, 2000, p. 23). O presente trabalho apresenta um estudo de caso realizado em uma indústria metalúrgica, fornecedora de peças para montadoras do ramo automotivo. Esta, empresa visando atender aos requisitos da norma ISO TS 16949, precisa realizar os estudos estatísticos e, de acordo com os seus clientes, estes estudos devem ser os de Repetitividade e Reprodutibilidade. Portanto, este trabalho tem por objetivo aplicação dos estudos R&R em indústria metalúrgica a fim de verificar se o sistema de medição da empresa está adequado ao uso. A medição é utilizada como uma ferramenta para monitorar e acompanhar a produção, controlar ou investigar um processo, garantir a qualidade de produtos e processos de fabricação e a classificação das peças em conformes e não conformes 78 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 (ALBUQUERQUE, apud SALGADO, 2010). Determinar a capacidade de um sistema de medição é de suma importância para a melhoria da qualidade, pois nos processos de medição surgirão variabilidades que podem ocorrer em virtude do instrumento ou então do operador (BURDICK et al., 2003). de e s tudo : e s tabi l idade , te ndê ncia, linearidade, repetitividade e reprodutibilidade. Neste trabalho serão abordados os estudos de Repetitividade e Reprodutibilidade (R&R), pois são estes os exigidos pelo cliente da indústria metalúrgica. 2.2 Repetitividade De acordo com Pedott (2010), a Engenharia da Qualidade possibilitou a expansão do uso de técnicas e ferramentas da qualidade, as quais servem para evitar perdas e desperdícios nos processos fabris. Deste modo, a MSA é uma ferramenta da qualidade que contribui para a melhoria dos processos produtivos, através da garantia que a medição realizada está correta, ou seja, “determina a variação do sistema de medição proporcionalmente à variação do processo e/ou à tolerância permitida. É o processo pelo qual um sistema de medição é analisado para avaliar se a qualidade deste sistema está adequada ao uso” (AIAG, 2006, p. 141). A repetitividade pode ser definida como sendo a variabilidade de um único operador. É o resultado da variação das medições com um único equipamento de medição, o qual foi usado diversas vezes por apenas um operador, medindo uma determinada característica. É a variação própria do instrumento ou a sua capabilidade (AIAG, 2004). Ou seja, é a variação das medições obtidas através da utilização do mesmo equipamento de medição, utilizado várias vezes e medindo a mesma característica de diversas peças. Portanto, a repetitividade é uma variação casual proveniente de repetidas medições realizadas sob condições fixas e definidas. As causas que podem originar variações na repetitividade, segundo AIAG (2004), são: A MSA é um conjunto de operações, procedimentos, dispositivos de medição, equipamentos e pessoal usado para atribuir um número à característica que está sendo medida. E a MSA tem por objetivo conhecer as fontes de variação que podem afetar os resultados obtidos pelo sistema de medição (operador + instrumento + características). São as propriedades estatísticas dos resultados que definem a qualidade de um sistema de medição (AIAG, 2004). Pode ser usado para verificar o que está causando variações nas medições; estas variações podem ser relacionadas às pessoas, às peças ou mesmo ao próprio sistema de medição (AIAG, 2006). a) Variação dentro da peça: forma, posição, acabamento. b) Variação dentro do instrumento de medição: desgaste, falha do equipamento, manutenção precária. c) Variação dentro do padrão: qualidade, classe e desgaste. d) Variação dentro do método: no ajuste, na técnica, na fixação da peça. e) Variação do avaliador: falta de experiência, posição, treinamento, habilidade. Em relação aos benefícios da aplicação da Análise do Sistema de Medição pode-se dizer que a mesma, quando bem aplicada, proporciona confiança do sistema de medição e no equipamento que está sendo usado, além de proporcionar informações referentes às causas das deficiências do processo de medição (AIAG, 2006). Estas causas podem ser trabalhadas para que o sistema de medição possa ser melhorado. f) Variação dentro do ambiente: temperatura, umidade, luminosidade. g) Violação de alguma premissa: estabilidade, operação apropriada. h) Projeto do instrumento não robusto ou método não robusto, uniformidade precária. Canossa (2011) afirma que todo resultado de uma medição possui erros e desvios. Essa diferença dos valores de medição de uma peça é atribuída ao operador ou ao instrumento. A Análise do Sistema de Medição pode ser feita através de cinco tipos i) Dispositivo de medição errado para aquela aplicação. j) Deformação/ distorção da peça ou do dispositivo de medição. k) Aplicação: tamanho da peça, 79 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 posição, erro de observação. sistema de medição pode ser aceito. 2.3 Reprodutibilidade Erro acima de 30%, o sistema de medição não é aceitável, sendo necessário medidas para melhorá-lo. --- A reprodutibilidade é a variação entre as médias das medidas realizadas por diversos operadores, usando o mesmo equipamento de medição e medindo igual característica da peça (AIAG, 2004). Isto ocorre muitas vezes devido à habilidade de cada operador em manipular o instrumento. Conforme AIAG (2004), as possíveis causas para o erro de reprodutibilidade são: Existem vários métodos a serem empregados para a análise dos estudos de R&R, os quais de acordo com o AIAG (2006) podem ser: a) Contínuo. b) Método da Amplitude. a) Variação entre peças. c) Estimativa de Variância. b) Variação entre instrumentos. d) Porcentagem de Tolerância. c) Variação entre padrões. e) Método da Média e Amplitude. d) Variação entre métodos. f) Análise da Variância (ANOVA). g) Porcentagem de Tolerância da Análise da Variância (ANOVA). e) Variação entre avaliadores. f) Variação entre ambientes. Em virtude do objetivo do trabalho e o número de amostras, foi utilizado o método da Média e Amplitude, sendo este um dos sistemas mais empregados. “Neste método é possível quantificar os componentes de repetitividade e reprodutibilidade das variabilidades” (PEDOTT, 2010, p. 27). g) Violação de alguma premissa no estudo. h) Eficácia do treinamento do operador. i) Aplicação - tamanho da peça, posição, erro de observação. Em relação aos resultados referentes à aplicação dos estudos de Repetitividade e Re p r o d u t i b i l i d a d e , c a s o o va l o r d a repetitividade seja maior quando comparada com a reprodutibilidade, as causas podem ser em virtude do equipamento de medição necessitar de manutenção, ou o instrumento deveria ser reprojetado para uma maior robustez, ou o local para a realização da medição é inadequado, ou ainda pode haver uma grande variação na peça. E, no caso da reprodutibilidade ser alta quando comparada com a repetitividade, as causas podem estar relacionadas com o operador, o qual necessita ser melhor treinado em como ler e usar o equipamento de medição, ou existe a necessidade de um dispositivo para ajudar o operador na utilização do instrumento de medição (AIAG,1997). 3. MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA De acordo com os métodos empregados na pesquisa, esta se classifica em pesquisa bibliográfica e estudo de caso. Em pesquisa bibliográfica, pois primeiramente realizou-se um estudo em livros, normas, revistas, dissertações, anais de congressos referente ao assunto abordado na pesquisa, para após realizar o estudo de caso (GIL, 2010). Também estudou-se os procedimentos estabelecidos pelas entidades de normatização de qualidade e teorias subjacentes aos procedimentos estabelecidos. O estudo de caso foi realizado em uma indústria metalúrgica de baixo volume de produção, fornecedora de peças para o ramo automotivo. Para crescer e manter–se entre os fornecedores dessas montadoras, tem-se a necessidade de melhorar os processos, numa busca contínua de melhorias, dando ênfase à satisfação do cliente e ao atendimento dos requisitos exigidos. Para AIAG (1997), em sistemas de medição cuja finalidade seja a análise do processo de produção, é necessário seguir a seguinte regra prática para sua aceitação: Erro menor que 10%, o sistema de medição é aceitável. --- --- Este trabalho tem por objetivo a Análise do Sistema de Medição da indústria, Erro entre 10% e 30%, o 80 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 buscando atender os requisitos do cliente e também os requisitos da ISO TS 16949:2009. Neste caso, a exigência do cliente para assegurar este requisito da norma é que devem ser desenvolvidos estudos estatísticos q u e g a ra n t a m a r e p e t i t i v i d a d e e a reprodutibilidade das medições, a qual é controlada através da elaboração de estudos de R&R (Repetitividade e Reprodutibilidade). A figura 2 apresenta a média de cada peça, calculada após a efetivação de todas as medições pelos colaboradores. As etapas do estudo de caso consistiram na preparação das amostras, definição dos colaboradores e orientação, medição, coleta de dados, aplicação dos estudos estatísticos e análise dos dados. 4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Fonte: Dados da pesquisa Para a determinação do R&R foram selecionados todos os operados envolvidos com o processo de medição de peças na f á b r i c a , t o t a l i z a n d o 1 0 o p e ra d o re s . Instruíram-se os operadores em relação ao objetivo do desenvolvimento da atividade e o modo de execução da mesma. Figura 2: Média de cada peça Desse modo , a amplitude das médias das medidas dos operadores é: X dif = Max (Xa, Xb, X c...X j) – Min (X a, Xb, Xc...Xj) = 0,07 A média das amplitudes dos JUN operadores é: Foram selecionadas aleatoriamente 10 peças iguais, que foram numeradas de 1 a 10. A cota a ser medida para análise estatística é de 81,9 mm, com tolerância de ±2mm. O instrumento de medição utilizado foi o mesmo para todos os colaboradores, sendo este um paquímetro com resolução 0,02mm. R= (R a + Rb + Rc...Rj)/10 = 0,025 E a amplitude das médias das peças é: R p= Max (X1, X2, X3...X10) – Min (X 1, X2, X3…X 10) = 0,27 Após a obtenção destes dados, seguese para a análise da repetitividade e reprodutibilidade. Para fazer o cálculo da variação do equipamento (VE), ou seja a repetitividade da operação, faz-se a multiplicação da média das amplitudes médias (R) pela constante K1, que varia de acordo com o número de repetições das medidas dos operadores e, para este caso em que há três repetições, o valor é 0,5908. Cada operador mediu as 10 peças ao acaso e os resultados foram anotados em uma planilha, repetindo a operação por mais duas vezes, até cada operador ter medido três vezes cada peça. Na figura 01, apresenta-se os resultados da medição, cada operador foi classificado como A, B, C e assim sucessivamente. Calculou-se a média das medidas dos operadores e a média das amplitudes (maior medida - menor medida) de cada operador. VE= R x K1 VE= 0,025 x 0,5908 VE = 0,01477 A variação entre operadores (VO), considerada a reprodutibilidade é calculada pela seguinte fórmula: VO = ( X dif ´ K 2 ) 2 - (VE 2 ¸ n ´ r ) Fonte: Dados da pesquisa Figura 1: Média e amplitude das medições 81 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 O valor de K2 é determinado através do número de operadores. Neste trabalho são 10 operadores; portanto, o valor de K2 é 1,67, n é considerado o número de operadores e r o número de replicações. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Na indústria em que foi realizado o estudo de caso existe a necessidade da percepção da importância da Análise do Sistema de Medição e da utilização dos dados para a melhoria dos processos de produção. Atualmente a visão existente é de que o e s t u d o d e ve s e r fe i t o a p e n a s p a ra cumprimento de requisitos do cliente. Além da tabulação dos dados, é necessária a realização das análises, a tomada de decisão para ações corretivas ou melhoria do processo e acompanhamento dos resultados. VO = (0,07 ´ 0,5231) 2 - (0,01477 2 ) ¸ (10 ´ 3) VO = 0,0365 A variação entre repetitividade e reprodutibilidade é calculada através da fórmula: R & R = VE 2 + VO 2 R & R = 0,01477 2 + 0,0365 2 R & R = 0,0393 Na Análise do Sistema de Medição obteve-se um resultado no estudo de R&R de 42,07%, o que demonstra que o sistema de medição necessita de melhoria. Analisandose os dados, percebe-se que o problema se encontra na variação do operador e não peça a peça, pois o índice de reprodutibilidade do operador foi maior que o índice de repetitividade das peças. A variação da peça é calculada por: VP = R p ´ K 3 onde K3, refere-se ao número de peças, neste caso são 10 peças e o valor portanto 0,3146. VP = 0,27 ´ 0,3146 VP = 0,085 Deste modo, deve-se realizar um processo de melhoria no sistema de medição para que o mesmo se torne eficaz, pois, além da empresa não estar atendendo aos requisitos da ISO TS e os requisitos do cliente, também não está garantindo a qualidade dos seus produtos, pois o processo de medição não é eficaz, não garantindo que o resultado da medição efetuada pelo operador esteja correto. Sugere-se que seja aberta uma não conformidade interna para verificar a causa raiz do problema e ações para a resolução do problema. Para que após a implantação das melhorias seja realizada novamente a MSA, verificando se o problema foi solucionado. A variação total calcula-se: VT = R & R 2 + VP 2 VT = 0,0393 2 + 0,085 2 VT = 0,0936 A partir destes resultados pode se calcular em percentual os valores de VE, VA e R&R. % VE = 100 ´ (VE VT ) VE = 15,7% % VA = 100 ´ (VA VT ) VA = 39% % R & R = 100 ´ ( R & R VT ) R & R = 42,07% A MSA precisa ser bem entendida para que possa ser uma ferramenta que contribua para melhoria dos processos e do produto. Embora seja de complexidade técnica para quem seleciona e aplica a MSA, a compreensão de sua análise por parte de gestores é necessária para efetivar ações adequadas na correção do processo. Analisando-se os valores deste percentual pode-se determinar se o processo de medição é aceitável ou não. Determinado o resultado do R&R obteve-se um resultado de 42,07%, com este resultado o sistema de medição não é aceitável, pois de acordo com AIAG (1997) acima de 30% ele precisa ser melhorado. Além disso, a reprodutibilidade é superior à repetitividade, o que indica que as causas podem estar relacionadas com o operador. REFERÊNCIAS AIAG. Análise do Sistema de Medição – M S A . Tra d . I n s t i t u t o d a Q u a l i d a d e Automotiva. 3 ed. São Paulo, 2004. _____. Fundamentos de Controle Estatístico do Processo - CEP. Trad. 82 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Instituto da Qualidade Automotiva. 1 ed. São Paulo, 1997 _____. CQI – 10: Solução Eficaz de Problemas. Trad. Instituto da Qualidade Automotiva. 1 ed. São Paulo, 2006. BURDICK, R. K.; BORROR, C. M.; MONTGOMERY, D. M. A review of methods for measurement systems capability analysis. Journal of Quality Technology Session. Texas, out 2003. CANOSSA, S. Gerenciando o Sistema de Medição. Disponível em: < http://www.mantenimientomundial.com/site s/mmnew/bib/notas/Medi%C3%A7%C3%A 3o.pdf>. Acesso em: 04 de outubro de 2012. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2010. 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Esta pesquisa ocorreu num supermercado de uma cidade do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, no período de setembro a outubro de 2012. Quanto à abordagem, essa pesquisa foi quantitativa e, quanto aos procedimentos, um estudo de caso, uma pesquisa de campo e estatística. Conforme Medeiros (2003) são três os enfoques que mais são analisados no comprometimento organizacional: o enfoque afetivo, o enfoque instrumental e o enfoque normativo. Neste trabalho apresentam-se esses três enfoques em apenas um, que é o multidimensional. Para coleta dos dados, utilizou-se a Escala de Bases do Comprometimento Organizacional (EBACO), bem como foi empregada a pesquisa bibliográfica sobre o comprometimento. A pesquisa aponta que as bases do comprometimento que mais se destacam entre os trabalhadores da empresa em estudo são “a base afetiva”, em que os colaboradores se identificam com os valores e objetivos da organização; “a base obrigação pelo desempenho”, em que os trabalhadores devem se esforçar em benefício da organização; e, “a base linha consistente de atividade”, em que os funcionários acreditam que devem manter certas atitudes e regras da organização com o objetivo de se manter na mesma. The objective of this research was to investigate the involvement of bases that stand out among the members of the organization under study. This research took place at a supermarket in a town northwest of the state of Rio Grande do Sul, in the period September-October . A approach statistics. As Medeiros three are the approaches that are analyzed in more organizational this research was quantitative, as well as a study case, a field survey and commitment: the affective approach, the instrumental approach and the third approach is normative. This paper presents these three approaches in on, which is multidimensional. For data collection, the Scale Bases of Organizational Commitment EBACO were used as well as the bibliographic research search about commitment. The research shows that the bases of commitment that stand out among the company s workers in the study are the base affective , in which employees identify with the values and goals of the organization, the basic requirement for performance, in which workers must strive for the benefit of the organization and the consistent base line of activity in which bases employees believe they should maintain certain attitudes and rules of the organization with the goal of maintaining the same. Palavras-chaves: Comprometimento organizacional. Enfoque multidimensional. Keywords: Organizational commitment. Multidimensional approach. 1 Acadêmica de Bacharelado em Psicologia, SETREM, e -mail: [email protected] Psicóloga, Mestre em Desenvolvimento, Coordenadora do Curso de Psicologia e professora da SETREM, e -mail: [email protected] 3 Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS, e -mail: [email protected] 2 84 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO O presente estudo é um trabalho realizado no período de agosto de 2011 a outubro de 2012. O tema abordado é o comprometimento no trabalho em que foram investigadas quais as bases do comprometimento organizacional que mais se destacam em um supermercado situado em uma cidade na região noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. As pesquisas apontam que muito se tem investigado sobre comprometimento organizacional, como também sobre a relação entre o comprometimento organizacional com alguns comportamentos do sujeito. A atenção está voltada para o fato de que o comprometimento é um importante construto em pesquisar, gerenciar e conduzir o comportamento do funcionário nas organizações, ou seja, estar sempre aperfeiçoando, ajustando e analisando este comportamento. De acordo com Meyer e Allen (1997 apud MEDEIROS, 2003), o comprometimento tem se transformado muito conceitualmente nos últimos tempos e assim incitado muitas discussões referente à natureza das ligações entre trabalhador e organização. O novo panorama vivenciado na atualidade exige transformações das crenças e valores da organização e desencadeia uma intensa busca das organizações por colaboradores cada vez mais comprometidos com seu trabalho, pois nesse novo cenário, ser comprometido não é algo desejável e sim indispensável, ou seja, busca-se trabalhadores que se identifiquem com os objetivos da organização e que trabalhem na mesma como sendo seu próprio negócio. Bastos e Costa (2000 apud COSTA, 2005) destacam que o comprometimento no trabalho atualmente é percebido como uma condição para apresentar um adequado desempenho desejado pela organização, estabelecendo bons relacionamentos no ambiente de trabalho. Conforme Davis (1992 apud VALADARES, 2009) o comportamento das pessoas surge das necessidades do sujeito e de seus princípios, valores e, por isso, compreende-se que o comportamento não é algo estável, modifica-se, está sempre em transformação. Este artigo é constituído dos aspectos metodológicos da pesquisa, em que se encontram os métodos utilizados e os passos percorridos para atingir os objetivos da pesquisa. Em seguida, apresenta-se a fundamentação teórica, embasada por alguns autores sobre o tema discorrido. Posteriormente, faz referência à análise e discussão dos dados, em que serão expostos os resultados da pesquisa, e, em sequência, apresentam-se as considerações finais. 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 O UNIVERSO ORGANIZACIONAL As organizações representam um ambiente social como qualquer outro, apesar de que estas possuem suas próprias particularidades e especificidades e assim intercedem relações sociais entre atores sociais e têm seus mundos simbólicos e culturais exclusivos, frisando que as mesmas sempre estão diretamente atreladas ao contexto social. Constata-se que as modificações sociais provocam impactos nos padrões de gestão e nas políticas de recursos humanos, ressaltando que essas políticas fazem interface entre os aspectos da sociedade e o quadro interno das organizações (VELOSO, 2010). Motta e Vasconcelos (2006) explicam que é a partir das interações sociais que são construídas e institucionalizadas as regras, as normas e valores de uma organização, sendo que os que vivem nela são influenciados por esses valores e normas. Zanelli e Silva (2008) chamam a atenção ao fato de que a cultura de uma organização pode ser vista inconscientemente como sendo a única coisa certa e inquestionável nas organizações de trabalho. A partir desta base, a orientação de Zanelli e Silva (2008) é no sentido de que uma organização possui uma cultura, que os membros desta organização compartilham dos mesmos valores e normas, que nela há uma produção de elementos culturais, a criação de uma linguagem própria, de significados que são compartilhados e que orientam os comportamentos, os pensamentos e sentimentos no ambiente de trabalho. Nesse sentido, pode-se perceber uma organização como sendo algo socialmente construído. 85 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 As organizações, segundo Watson (2005), apresentam duas lógicas de funcionamento: a sistêmica controladora, que possui uma visão mecanicista de sujeito e de trabalho, na qual há um controle sobre os trabalhadores, e a processual-relacional, na qual valorizam mais as pessoas, todos que fazem parte da organização, procuram dar sentido ao que fazem, trabalhando com mais ânimo, podendo assim estar contribuindo para o desenvolvimento do comprometimento. Watson (2005) destaca, ainda, que essas duas perspectivas de funcionamento das organizações são formas básicas de falar, de atuar, de se expressar em relação à organização e à gestão. Dessa forma, este estudo considera uma organização como algo socialmente construído, que influencia os trabalhadores e vice-versa, estando relacionada com a forma que a gestão ocorre, a cultura, os valores e normas da organização. Estes são aspectos que influenciam as relações e interações no universo organizacional. requisito de bom desempenho, relações interpessoais adequadas, eficiência e eficácia individuais e organizacionais” Dentre tantas concepções encontradas para o comprometimento, percebe-se que todas possuem em comum, ter um vínculo ou ligação do indivíduo com a organização (MATHIEU; ZAJAC, 1990 apud GARCIA, 2007). Na mesma linha de pensamento, Allen e Meyer (1996, 2000 apud REGO; CUNHA; SOUTO, 2007, p.7), afirmam que “o comprometimento organizacional é o estado psicológico que caracteriza a ligação do indivíduo à organização, tendo implicações na sua decisão de nela continuar”. Portanto, o comprometimento é o diferencial, é a condição para a permanência do trabalhador na organização. Para os autores Zanelli e Silva (2008), comprometimento quer dizer o quanto uma pessoa está identificada com os valores e objetivos da organização e disposta a colaborar com a mesma. Brown (1996 apud Kuabara e Sachuk, 2010) chama a atenção para o fato de que todo o comprometimento está associado a algo, pode ser tanto a uma pessoa ou a um grupo, uma organização, uma opinião ou causa e, sendo assim, tem-se a necessidade de compreender como alimentar o comprometimento dos membros interessados. Para Flauzino e Borges-Andrade (2008) comprometimento organizacional é a identificação do indivíduo com os valores da organização, desde que esses valores e objetivos da mesma estejam bem esclarecidos e que os mesmos sejam conhecidos por todos os membros da organização. Porém, mesmo assim podem ser entendidas de outra maneira pelos indivíduos. No entendimento de Spector (2006), o comprometimento se refere à relação dos trabalhadores com a organização, apresentando intensa ligação com a satisfação no trabalho, porém conceitualmente diferente. O comprometimento organizacional também exibe várias correlações contendo características do trabalho, variáveis de função, como rotatividade, ausência e idade. De acordo com Rego, Cunha e Souto 2.2 COMPROMETIMENTO ORGANIZACIONAL No passar das décadas, alguns estudos foram realizados com a intenção de explicar as bases do vínculo que se constitui entre um empregado e a organização em que trabalha. Esse vínculo foi então nomeado de comprometimento organizacional (SIQUEIRA; GOMIDE JÚNIOR, 2004). Com as transformações no ambiente de trabalho, com o aumento da concorrência e do uso do conhecimento como um dispositivo a mais entre as organizações, percebe-se a necessidade de fortificar o comprometimento. Portanto, a implicação dos trabalhadores é fundamental para alcançar os objetivos almejados pela organização (ZANELLI; SILVA, 2008). Mas, para que a organização tenha um funcionário comprometido, é importante que a mesma permita que o indivíduo alcance seus objetivos pessoais (MÜLLER et al, 2005). D e m a n e i r a p o p u l a r, o comprometimento é usado para referir-se ao relacionamento de uma pessoa com outra, com um grupo ou com uma organização (SIQUEIRA; GOMIDE JÚNIOR, 2004). De acordo com Bastos e Costa (2000 apud COSTA, 2005, p. 6), “o comprometimento no trabalho vem sendo concebido como um 86 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 (2007), quando as organizações criam um espaço espiritualmente rico a seus colaboradores, em que lhes proporcionam um ambiente com mais motivação, fazendo com que as pessoas se sintam mais valorizadas, asseguradas emocionalmente, sentindo-se mais alegres, recebem em troca desses recursos oferecidos, o sentimento de lealdade e o aumento da produtividade acabam prevalecendo na organização em que estão inseridos. Nessa mesma linha de pensamento, no sentido de explicar a espiritualidade nas organizações como sendo algo diferente de religião, apresenta-se o conceito dado pelos autores Rego, Cunha e Souto (2007, p.3), em que espiritualidade nas organizações seria “a existência de oportunidades na organização para realizar trabalho com significado no contexto de uma comunidade, com um sentido de alegria e respeito pela vida interior”, ou seja, espiritualidade é dar um sentido, significado ao trabalho. Nesta perspectiva Rego, Cunha e Souto (2007) apontam que muitas ênfases teóricas e experiências práticas têm indicado que as pessoas com uma espiritualidade forte levam uma vida mais saudável, no sentido de que estas apresentam menos problemas de saúde relacionados ao estresse, menores chances de transtornos depressivos, possuem confiança em si próprio, ou seja, acreditam no seu potencial e estão mais satisfeitos com a vida que levam. A partir desta base, entende-se que as pessoas com espiritualidade forte, ou seja, que gostam do que fazem e, principalmente, por esse trabalho representar algum sentido, estão propensas a ser mais comprometidos. enfoque é o normativo, apresentado nos estudos de Wiener (1982 apud MEDEIROS, 2003), caracterizado pelas forças normativas, em que o indivíduo se sente na obrigação em permanecer. Neste trabalho, apresentam-se os três enfoques: o afetivo, instrumental e normativo, bem como o enfoque multidimensional, os quais serão descritos a seguir. 2.2.1.1 Enfoque Afetivo Por volta dos anos 1980 em um dos estudos de Mowday, Porter e Steers (1982 e apud BASTOS et al, 2008) nomeia-se de afetiva, apesar de os mesmos chamarem de atitudinal o método de identificação do trabalhador com os objetivos e valores da organização. Esses estudos se utilizam de três fatores para definir o comprometimento organizacional numa noção de identificação que são: “a) forte crença, aceitação dos valores e objetivos da organização; b) o forte desejo de manter o vínculo com a organização e c) a intenção de se esforçar em prol da organização” (MOWDAY, PORTER, STEERS apud BASTOS et al, 2008, p.50). Nesta perspectiva, entende-se que o comprometimento afetivo acontece quando o trabalhador se envolve e adota os valores da organização para si. E isso é possível de ser adquirido quando o indivíduo se sente respeitado e apoiado pela organização, confia na mesma, percebe a organização como um sistema humanizado, ou seja, que valoriza as pessoas, quando existe harmonia entre os seus objetivos e os da organização e quando esta se mostra responsável com seus compromissos (ALLEN e MEYER, 1996, 2000; MEYER, 1997 apud REGO; CUNHA; SOUTO, 2007). No entendimento de Organ e Paine (2000 apud REGO; CUNHA; SOUTO, 2007), supõe-se que os indivíduos mais afetivamente envolvidos com a organização sejam mais motivados para colaborar com o desempenho da mesma, apresentem menor turnover, menor absenteísmo e sigam mais condutas compatíveis com as organizacionais. Em contrapartida, as consequências negativas quando há um baixo comprometimento afetivo, segundo Siqueira e Gomide Júnior (2004), são os atrasos, o fraco desempenho e a diminuição 2.2.1 Tipos de Comprometimento Conforme Medeiros (2003) são três os enfoques que mais são analisados no comprometimento organizacional. Os mesmos são o enfoque afetivo, baseado nos trabalhos de Mowday, Porter e Steers (1982 apud MEDEIROS, 2003), que aponta a identificação, o envolvimento do trabalhador com os objetivos da organização e um desejo em continuar na organização. O enfoque instrumental, baseado nos estudos de Becker (1960 apud MEDEIROS, 2003), no qual surge o comprometimento devido à necessidade em continuar na empresa. E o terceiro 87 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 do esforço para o trabalho. Siqueira (2003 apud SIQUEIRA, GOMIDE JÚNIOR, 2004) em um de seus estudos analisou que quando os trabalhadores percebem que a empresa está comprometida, preocupando-se com o bem estar dos seus colaboradores, a ligação afetiva deles para com a organização pode se fortalecer. à organização quando percebe que pode confiar em seus líderes, que é apoiado, e quando é valorizado como ser humano e não como uma máquina. Meyer e Allen (1984 apud Kuabara e Sachuk, 2010) falam do comprometimento instrumental, ou como chama em um de seus trabalhos de “continuance commitment”, como algo importante que o trabalhador investe na organização, como seu tempo e empenho, assim como a experiência adquirida durante esse tempo na empresa,na qual o mesmo não acha conveniente perder se deixar a organização. 2.2.1.2 Enfoque instrumental O enfoque instrumental de avaliação do comprometimento organizacional provém dos estudos de B ecker (1960 apud MEDEIROS et al, 2003), em que o autor ressalta o enfoque instrumental como uma tendência do trabalhador em assumir “linhas consistentes de atividade”. Destaca também que o indivíduo se compromete com a organização devido aos custos e aos benefícios ligados a sua saída. Esse comprometimento é denominado de “side bet” ou pode ser chamado de trocas laterais entre o trabalhador e a empresa (MEDEIROS et al, 2003). Hrebiniak e Alutto (1972 apud Medeiros, 2003), definem o c o m p ro m e t i m e n t o c o m o s e n d o u m a consequência das ligações entre o indivíduo e a organização, e dos investimentos feitos pelo trabalhador em seu local de trabalho ao longo do tempo. Portanto, a noção de linhas consistentes de atividades provoca uma escolha, na qual o trabalhador tem que optar entre várias alternativas por uma que melhor acata suas finalidades. No comprometimento instrumental, conforme Siqueira e Gomide Júnior (2004), supõe-se que há um processo cognitivo avaliativo em que o indivíduo faz um cálculo de tudo o que ele investiu na organização, os objetivos alcançados e o que ele perderia deixando a mesma, o que por sua vez determinaria a permanência ou não na organização. A orientação de Rego, Cunha e Souto (2007), é no sentido de que é possível que aqueles com um vínculo instrumental mais intenso não sintam qualquer obrigação em fornecerem à organização mais do que já estão forçadas a oferecer. Rego, Cunha e Souto (2007) sugerem que é provável que o colaborador se torne leal 2.2.1.3 Enfoque normativo Wiener (1982 apud Medeiros, 2003) descreve o comprometimento como “a t o t a l i d a d e d a s p re s s õ e s n o r m a t i va s internalizadas para agir num caminho que encontre os objetivos e interesses organizacionais” (p.38). Wiener (1982 apud Kuabara e Sachuk, 2010) expressa que o intenso comprometimento está relacionado com uma predisposição do indivíduo de ser conduzido em seus atos. Assim, o trabalhador opera de determinada maneira, pois acredita que seja apropriado e moral agir assim. Na visão de Siqueira (2002 apud SIQUEIRA; GOMIDE JÚNIOR, 2004), o comprometimento normativo há quando o trabalhador acredita que possui uma dívida com a organização, ou que ele deve retribuir um favor que a mesma lhe proporcionou, e isso acaba fazendo com que ele permaneça na organização. Nessa mesma linha de pensamento, quando o colaborador infringe alguma norma, isso o leva a se sentir culpado, e esses sentimentos de culpa conduzem o comportamento das pessoas a agir conforme as normas, valores que é considerado correto para a organização. Ao pensar em deixar a organização em que trabalha, o indivíduo sente presente os sentimentos de culpa, porém não são somente estes sentimentos que aparecem, eles vêm acompanhados do reconhecimento de obrigações e deveres para com a organização, o que muitas vezes demanda sacrifícios pessoais, insistência, gerando incômodo, ansiedade, nervosismo e preocupação (SIQUEIRA; GOMIDE JÚNIOR, 2004). A internalização das pressões 88 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 normativas tem como consequência um modelo de comportamento que pode adotar diversas medidas em relação ao comprometimento (WIENER, 1982 apud KUABARA e SACHUK, 2010). A cultura da organização tem grande influência nas pressões normativas, pois na maioria das vezes estas pressões provêm da cultura (MEDEIROS et al, 2003). Rego, Cunha e Souto (2007) destacam que aqueles com sentimento de dever de lealdade junto à organização apresentam uma tendência em adotar comportamentos positivos para com a organização. Porém estas condutas podem não ser tão percebidas por ela. Marques e Siqueira (2003 apud Medeiros, Albuquerque e Marques, 2005), no qual, através da união de dois instrumentos utilizados para medir o comprometimento organizacional, foi possível identificar sete dimensões para o comprometimento organizacional. Um instrumento utilizado é o de Meyer, Allen e Smith (1993 apud Medeiros, Albuquerque e Marques, 2005), e o outro é o de O'Reilly e Chatman (1986 apud Medeiros, Albuquerque e Marques, 2005). Nessa perspectiva, Medeiros et al (2003 apud Medeiros, Albuquerque e Marques, 2005) expõem que o comprometimento organizacional é formado por sete dimensões ocultas que são: a) identificação com os valores e objetivos da organização; b) crença de que tem obrigação em continuar na organização; c) sentimento de que deve se esforçar em benefício da organização; d) sentimento de que é reconhecido como membro do grupo pelos colegas; e) sentimento de fal ta de recompensas e oportunidades; f) acredita que deve manter certas atitudes e regras para se manter na organização; e, g) poucas alternativas de trabalho. No entendimento de Meyer e Allen (1991 apud Kuabara e Sachuk, 2010), os três tipos de comprometimento fazem menção ao estado psicológico do trabalhador, como este sendo marcado pelo relacionamento do indivíduo com a organização e a decisão em continuar na empresa. Conforme cada forma e intensidade de comprometimento que o trabalhador conhece provocam diversas formas de comportamento no trabalho. Na visão de Bastos (1995 apud COSTA, 2005), diversos focos podem funcionar como alvos da ligação do trabalhador, mesmo que estes possuem fronteiras de investigação adequadas e próprias, é preciso integrá-los. A partir desta linha de pensamento, em que os elementos unidimensionais fazem parte do vínculo psicológico, que se atravessam e podem estar inseridos numa visão multidimensional dos elementos que contribuem para o comprometimento entre o trabalhador e a organização influenciando dinamicamente o comprometimento que se desenvolveu esta pesquisa. 2.2.1.4 Enfoque multidimensional Após alguns pesquisadores entenderem que os enfoques unidimensionais eram elementos presentes na ligação psicológica entre o trabalhador e a organização, passaram então a analisar os modelos multidimensionais (MEDEIROS, 2003). O modelo multidimensional mais aceito é o modelo de Meyer e Allen (1991 apud Medeiros, 2003), segundo o qual os autores definem o comprometimento em três elementos: o afetivo, no qual o comprometimento acontece através de um apego à organização; o instrumental, em que os custos e benefícios ligados em deixar a organização influenciam no comprometimento e o normativo, em que o sentimento de obrigação em continuar na organização contribui para o comprometimento. Conforme Medeiros et al (2002 apud COSTA, 2005), no Brasil as pesquisas sobre múltiplos focos do comprometimento não são amplas, porém são de grande profundidade e qualidade, estando representadas por estudos realizados por Bastos e colaboradores, que enfatizaram focos como carreira, sindicato e organização. Vale ressaltar que foco pode funcionar como alvos das relações formadas pelo sujeito, e difere de bases que são os motivos pelo qual o colaborador se vincula a organização, podendo ser estas bases afetiva, instrumental e normativa. Em decorrência de um trabalho desenvolvido por Medeiros, Albuquerque, 3. MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA Foi realizado um estudo de caso em 89 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 um supermercado da região noroeste do Rio Grande do Sul, com 38 amostras numa população de 119 colaboradores, no período de setembro a outubro de 2012, com a aplicação de uma escala (Escala de Bases do Comprometimento Organizacional), que avalia sete dimensões do comprometimento. Quanto à abordagem, essa pesquisa foi quantitativa, em que, segundo Güllich et al (2007), os resultados podem ser demonstrados em números. Em relação aos procedimentos, essa pesquisa foi do tipo descritiva, pois teve como objetivo investigar quais as bases de comprometimento mais s ig n i f ica tiva s e n tre o s m e m b ro s d a organização em estudo, bem como foi realizada uma pesquisa de campo, estudo de caso e estatística. Para a coleta dos dados foi utilizada a pesquisa bibliográfica, que consiste em fazer uma consulta em bibliografias já divulgadas sobre o assunto referente à pesquisa (LAKATOS; MARCONI, 1987) e a aplicação de uma escala com perguntas fechadas (GÜLLICH; LOVATO; EVANGELISTA, 2007), empregando o instrumento Escala de Bases do Comprometimento Organizacional (EBACO). A escala foi entregue pela responsável do RH da empresa a cada trabalhador e, em uma data previamente marcada, foram recolhidas pela pesquisadora junto ao RH da empresa as escalas respondidas. A Escala de B ases do Comprometimento Organizacional foi projetada para mensurar sete bases do mesmo, sendo que elas possuem alguns fatores que as definem. Elas são apresentadas a seguir com seus respectivos fatores: a) obrigação em permanecer (crença de que tem uma obrigação em permanecer; de que se sentiria culpado em deixar; de que não seria certo deixar; e de que tem uma obrigação moral com as pessoas da o r g a n i z a ç ã o ) ; b ) a f e t i va ( c r e n ç a e identificação com a filosofia, os valores e os objetivos organizacionais); c) afiliativa (crença que é reconhecido pelos colegas como membro do grupo e da organização); d) escassez de alternativas (crença de que possui poucas alternativas de trabalho se deixar a organização); e) obrigação pelo desempenho (crença de que deve se esforçar em benefício da organização e que deve buscar cumprir suas tarefas e atingir os o b j e t i vo s o r g a n i z a c i o n a i s ) ; f ) l i n h a consistente de atividades (crença de que deve manter certas atitudes e regras da organização com o objetivo de se manter na organização); e g) falta de recompensas e oportunidades (crença de que o esforço extra em benefício da organização deve ser recompensado e de que a organização deve lhe dar mais oportunidade). A EBACO foi aplicada pela primeira vez por Medeiros (2003). É composta de 28 itens, sendo 04 para cada uma das 07 bases. Os dados foram coletados pela pesquisadora no período de setembro a outubro de 2012. A EBACO foi aplicada individualmente, mas os resultados foram interpretados coletivamente. A proposta foi de uma avaliação de todo o universo de colaboradores (119), porém retornaram 38 escalas respondidas. Para a análise dos dados foi utilizada a técnica de análise estatística na tabulação d a s r e s p o s t a s ( G Ü L L I C H ; L O VATO ; EVANGELISTA, 2007). Para chegar aos valores dos resultados, primeiramente calculou-se a média que os respondentes deram para cada item da escala; posteriormente, multiplicou-se a média encontrada pelo peso de cada indicador que se encontra na interpretação da escala. Alguns indicadores possuem um coeficiente de correlação maior com a base do que outros, daí a necessidade de se realizar o procedimento de multiplicação pelos pesos, de modo que o escore obtido em cada base de comprometimento reflita a importância de cada item na definição do fator. A avaliação de cada base do comprometimento organizacional deve considerar, portanto, os quatro indicadores correspondentes que permaneceram na escala após as análises fatoriais. Em seguida, soma-se o resultado dos quatro indicadores multiplicados por seus respectivos pesos para avaliar cada base. Para a avaliação deve-se considerar como os resultados se encontram em relação a cada uma das bases do comprometimento, a partir dos níveis que se encontram na interpretação da escala. Nas bases afetiva, afiliativa, obrigação em permanecer e obrigação pelo desempenho é importante um alto comprometimento, já nas bases instrumentais, escassez de alternativas, linha consistente de atividade e falta de 90 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 objetivos da mesma, há um desejo dos trabalhadores em permanecer neste local. recompensas e oportunidades deseja-se que o indicador do comprometimento seja baixo (BASTOS et al, 2008). Quanto às questões éticas foi utilizado um termo de consentimento livre e esclarecido, em que a pesquisa aconteceu de forma espontânea, bem como foi utilizado um termo de concordância, em que o gestor da instituição autorizou a pesquisa. Nas bases obrigação em permanecer e na afiliativa, obteve-se um resultado abaixo da média, o que não indica um resultado bom, pois nestas bases, assim como na afetiva e na obrigação pelo desempenho, é importante que o comprometimento seja alto. Constata-se que os colaboradores não se sentiriam culpados em deixar a organização e não acreditam que tenham uma obrigação moral com as pessoas da organização, bem como o reconhecimento dos colegas como este sendo membro do grupo e da organização também não é fonte de comprometimento. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES Para melhor compreensão dos dados é importante mencionar que as bases afetiva, obrigação em permanecer, obrigação pelo desempenho e afiliativa para os autores Bastos et al (2008), devem aparecer com um índice de alto comprometimento. Já as bases falta de recompensas e oportunidades, linha consistente de atividade e escassez de alternativas é importante um indicador de baixo comprometimento. Em seguida, apresenta-se a média geral dos colaborados do supermercado em estudo, que apresentaram os seguintes resultados: Destaca-se que a base obrigação pelo desempenho obteve um alto comprometimento, ou seja, os trabalhadores se comprometem, pois acreditam que devem se esforçar em benefício da organização, cumprindo tarefas e buscam atingir os objetivos organizacionais. Gráfico1: Média Geral Escala de Bases do Comprometimento Organizacional. Já nas bases instrumentais como falta de recompensas e oportunidades, escassez de alternativas e linha consistente de atividade é importante que o comprometimento seja baixo, porém observa-se que a base linha consistente de atividade obteve um resultado acima da média, o que não sugere ser um bom resultado. Nesse sentido, constata-se que os sujeitos da amostra acreditam que devem manter certas atitudes e regras da organização para continuarem na mesma. A partir dos resultados da escala podese verificar que na base falta de recompensas e oportunidades o comprometimento está abaixo da média, significando que não acreditam que o esforço extra em benefício da organização deva ser recompensado e de que a organização deva lhe dar mais oportunidade. Fonte: Winter; Ziegler, 2012 Após a análise e tabulação da Escala de Bases do Comprometimento Organizacional, pôde-se constatar que, na média geral, a base afetiva obteve resultado acima da média, sendo que esse resultado indica que os colaboradores do supermercado se identificam com os valores, crenças da organização, acreditam nos Em relação ao fator escassez de alternativas, os resultados apontam que o 91 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 comprometimento é baixo, expressando que não acreditam que tenham poucas alternativas de trabalho se deixar a organização. civil, homens e estado civil, mulheres casadas e homens casados, mulheres solteiras e homens solteiros, mulheres união estável e homens união estável, tempo de serviço, idade e escolaridade, porém serão apresentados os que se destacaram. Além da média geral também foram feitas análise de gênero, estado civil, o cruzamento dos dados entre mulher e estado Figura 2: Mulheres Casadas X Homens Casados Fonte: Winter; Ziegler, 2012 Os dados revelam que as mulheres casadas se encontram menos comprometidas no fator obrigação em permanecer, pois estas demonstram um índice abaixo da média, indicando que não se sentiriam culpadas em deixar a organização e não possuem uma obrigação moral com as pessoas da organização. Os homens neste fator têm um índice acima da média. Na base afiliativa, tanto as mulheres casadas como os homens casados, demonstraram-se comprometidos abaixo da média, evidenciando que o reconhecimento pelos colegas como sendo membro do grupo e da organização não é fonte de comprometimento. No fator linha consistente de atividade os homens casados e as mulheres casadas exibiram um resultado acima da média, o que representa que eles acreditam que devem manter certas atitudes e regras da organização para continuarem na mesma. Os fatores com alto comprometimento para as mulheres são afetivo, obrigação pelo desempenho e linha consistente de atividade. Já para os homens os fatores com alto comprometimento são afetivo, obrigação em permanecer, obrigação pelo desempenho e linha consistente de atividade. Tanto para os homens casados como para as mulheres 92 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 casadas os fatores falta de recompensas e oportunidades e escassez de alternativas ficaram com índices baixos, sendo um bom resultado. Figura 3: Mulheres União Estável X Homens União Estável Fonte: Winter; Ziegler, 2012 união estável apresentaram um baixo comprometimento e os homens com união estável exibiram um comprometimento abaixo da média, demonstrando que o reconhecimento pelos colegas como estes sendo membro do grupo e da organização não é fonte de comprometimento para ambos. N o fa t o r l i n h a c o n s i s t e n t e d e atividade, ambos indicaram estarem comprometidos acima da média, significando que eles acreditam que devem manter certas atitudes e regras da organização para se manterem na mesma. As bases que indicam um alto comprometimento para as mulheres com união estável são obrigação pelo Constata-se que as mulheres com união estável estão menos comprometidas afetivamente que os homens com união estável, apresentando um resultado abaixo da média que indica que elas não acreditam e não se identificam com a filosofia, os valores e os objetivos organizacionais. No gênero masculino na base afetiva apresentam uma pontuação acima da média demonstrando estarem comprometidos afetivamente. No fator obrigação em permanecer, ambos obtiveram um baixo comprometimento, evidenciando que não se sentiriam culpados em deixar a organização e não possuem uma obrigação moral com as pessoas da organização. Na base afiliativa, as mulheres com 93 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 desempenho e linha consistente de atividade. Já para os homens com união estável as bases com alto comprometimento são afetiva, obrigação pelo desempenho e linha consistente de atividade. Os fatores falta de recompensas e oportunidades e escassez de alternativas obtiveram resultado baixo tanto para as mulheres com união estável como para os homens com união estável, sendo considerado um bom resultado. Figura 4: Escolaridade Fonte: Winter; Ziegler, 2012 pessoas da organização. Já os que possuem ensino superior incompleto estão comprometidos acima da média na base obrigação em permanecer. Na base afiliativa verificou-se que os trabalhadores com ensino fundamental completo e ensino superior incompleto estão comprometidos abaixo da média e os que têm ensino médio incompleto e ensino médio completo demonstram estar com um baixo comprometimento, ou seja, o Em relação à escolaridade, os resultados apontam que os colaboradores que possuem o ensino fundamental incompleto, ensino médio incompleto, ensino médio completo estão comprometidos abaixo da média, os que têm ensino fundamental completo estão com um baixo comprometimento no fator obrigação em permanecer; portanto, eles não se sentiriam culpados em deixar a organização e não possuem uma obrigação moral com as 94 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 reconhecimento pelos colegas como estes sendo membro do grupo e da organização não é fonte de comprometimento. Já os que têm ensino fundamental incompleto estão comprometidos acima da média neste fator. No fator falta de recompensas e oportunidades somente os que possuem ensino fundamental incompleto apresentaram um resultado acima da média, significando que os trabalhadores acreditam que o esforço extra em benefício da organização deve ser recompensado e que a organização deve oferecer-lhes mais o p o r t u n i d a d e . O s d e m a i s n í ve i s d e escolaridade obtiveram um resultado abaixo da média neste fator. No que diz respeito à base linha consistente de atividade, as pessoas com ensino fundamental incompleto, ensino fundamental completo, ensino médio incompleto, ensino médio completo e ensino superior incompleto encontram-se comprometidos acima da média, não indicando um bom resultado, pois eles acreditam que devem manter certas atitudes e regras da organização com o objetivo de se manterem na mesma. Os fatores com alto índice de comprometimento para os que têm ensino fundamental incompleto são afetivo, obrigação pelo desempenho, afiliativo, falta de recompensas e oportunidades e linha consistente de atividade. Já para os que têm ensino fundamental completo, ensino médio incompleto e ensino médio completo as bases com alto comprometimento são afetiva, obrigação pelo desempenho e linha consistente de atividade. Os que possuem ensino superior incompleto estão comprometidos com um alto índice pelas bases afetiva, obrigação em permanecer, obrigação pelo desempenho e linha consistente de atividade. A base escassez de alternativa ficou com resultado baixo para todos os níveis de escolaridade, sendo considerado um bom resultado. d e f o r m a m e n o s e x p r e s s i va , e s t ã o comprometidos pelas bases obrigação em p e r m a n e c e r, s e n d o q u e o s q u e s e apresentam comprometidos por essa base são os trabalhadores com idade entre 31 a 45 anos, os que possuem ensino superior incompleto e os homens casados. As outras bases que também apontam comprometimento, com uma amostra de sujeitos que tem ensino fundamental incompleto, são a afiliativa e a base falta de recompensas e oportunidades. Dessa forma, pode-se assegurar que os objetivos da pesquisa foram atingidos, uma vez que foi possível observar as bases de comprometimento que mais se destacam entre os membros da organização em estudo. Sugere-se que este estudo sirva como uma ferramenta de gestão, no qual a empresa possa verificar os aspectos positivos que interferem no comprometimento dos trabalhadores, bem como conhecer as lacunas em relação às bases do comprometimento e, desta forma, criar estratégias para desenvolvê-las. O contexto revelado na pesquisa permite associar à lógica de funcionamento dessa organização, no qual o reforço da lógica sistêmico-controladora (que vê o sujeito como máquina e que há um controle sobre os trabalhadores) está associada à base linha consistente de atividade que o trabalhador sente que precisa seguir normas e regras para permanecer na organização. Já a perspectiva processual-relacional é revelada por meio da base afetiva, ou seja, os trabalhadores se identificam com os valores, filosofia e objetivos da organização. Também é fundamental destacar a importância de criar estratégias para desenvolver a base afiliativa para que a perspectiva processualrelacional se fortaleça, pois é mediante a aceitação do outro enquanto sujeito no grupo de trabalho que as relações se fortalecem e a organização se torna mais humanizada. Sugere-se para as próximas pesquisas sobre esse tema que se utilize, juntamente com a Escala do Comprometimento Organizacional, uma pesquisa qualitativa, para averiguar de maneira mais aprofundada cada base medida nesta escala, no sentido de investigar os fenômenos que interferem nas bases de comprometimento que mais se destacam na empresa pesquisada. CONCLUSÃO Os resultados apontam que as bases que fazem com que os colaboradores se comprometam com a organização de maneira mais expressiva são a afetiva, obrigação pelo desempenho e linha consistente de atividade. Verifica-se, também, que os trabalhadores, 95 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 REFERÊNCIAS BASTOS, Antônio. Virgílio. Bastos. et al. Comprometimento organizacional. In: SIQUEIRA, Mirlene Maria Matias. Medidas do comprometimento organizacional: ferramentas de diagnóstico e de gestão. Porto Alegre: Artmed, 2008. COSTA, Fabíola Marinho. Múltiplos comprometimentos no trabalho: i d e n t i f i c a n d o p a d r õ e s e e x p l o ra n d o antecedentes entre trabalhadores de organizações agrícolas. Dissertação de PósGraduação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2005. FLAUZINO, Dulce Pires; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo. Comprometimento de servidores públicos e alcance de missões organizacionais. Revista de Administração Pública - RAP. Rio de Janeiro, v. 42, n. 2, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rap/v42n2/03.pd f>. Acesso em: 04 out. 2011. GARCIA, Cinara de Assumpção Nunes. Relação entre comprometimento organizacional e desempenho no trabalho. 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The Phantom of the Opera, film analyzed, represents the dilemma of a life choosing. The character Christine must decide between the Phantom and Raoul, between vocation for music or wedding. From some concepts and assumptions of the theory of Sartre, Rollo May, Maslow and Fritz Perls an analysis of the subjective process by which human beings make choices is proposed. Revisit these humanists and existentialists theorists allowed some reflections on the place of human choices before their existential dilemmas. RESUMO Os filmes emocionam pelas identificações que seus personagens e histórias causam de modo consciente e inconsciente a quem os assiste. As tramas revelam partes da vida das pessoas, do cotidiano, das memórias de infância, das crenças familiares, religiosas e ideológicas, dos conflitos sociais, os dramas amorosos e a infinidade de estereótipos que condicionam o dia a dia. O Fantasma da Ópera, filme analisado, representa o dilema de uma escolha de vida. A personagem Christine precisa decidir-se entre o Fantasma e Raoul, entre a vocação para música ou o casamento. A partir de alguns conceitos e pressupostos da teoria de Sartre, Rollo May, Maslow e Fritz Perls propõem-se uma análise do processo subjetivo pelo qual o ser humano faz suas escolhas. Revisitar esses teóricos humanistas e existencialistas possibilitou algumas reflexões sobre o lugar das escolhas humanas diante de seus dilemas existenciais. Keywords: Being. Existence. Creative adjustment. P a l a v r a s - c h a v e : S e r. E x i s t ê n c i a . Ajustamento criativo. 1 Psicóloga, Psicoterapeuta, Especialista em Psicologia Clínica na Perspectiva da GestaltTerapia. IBTB , [email protected] 2 Terapia Prof.ª Drª. Orientadora em Curso de Especialização em Psicologia Clínica na Perspectiva da Gestalt –, IGTB., [email protected] 3 Instituto de Gestalt-Terapia de Brasília – IGTB – SBN Qd.02 Bl.J Lj.01 Ed.Engº Paulo Maurício – Brasília, DF. 98 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO não é. Enganar-se que age quando na verdade não o faz. Em outras palavras, o indivíduo mascara e dissimula a verdade para si, a fim de não assumir a liberdade. Neste sentido, compreende-se a máxima de Sartre (ABBGNANO, 1960/1982) “o homem é condenado à liberdade”. Muitas vezes é mais cômodo ver a si mesmo pelos olhos dos outros e agir de acordo com o que esperam, do que encarar a consciência de ser livre e responsável pelas próprias escolhas. A existência humana no mundo consiste no projeto que Sartre considera continuamente modificável. Para ele, a angústia revelada manifesta à consciência sobre a liberdade que o homem tem e, por isso, é possível modificar o projeto inicial (ABBGNANO, 1960/1982). O psicanalista existencialista Rollo May (1983/1991) também abordou o ser e o nãoser. Para May, o ser se configura na autorrealização, a realização do projeto da alma e traz a característica da transcendência. A transcendência é compreendida pelos pensadores existencialistas como capacidade que cada pessoa tem de superar seus obstáculos rumo à realização do projeto existencial. O não-ser se relaciona ao conformismo, a adaptação do indivíduo ao meio em que se encontra. Nesta posição reina a homeostase, tudo em nome do equilíbrio, nada de mudança. Conforme Maslow (1962), a condição para a acomodação se forma mediante um contexto específico que tornará o indivíduo propenso a minimizar atrativos de vida, maximizando medos e perigos. As situações de impacto como perigo, ameaça, abandono, f ra c a s s o, f r u s t ra ç ã o o u t e n s ã o s ã o facilitadores de regressão ou fixação. Maslow aponta estes fatores intervenientes que favorecem o sujeito preferir a segurança em detrimento do desenvolvimento. A partir de Sartre e de May sobre a compreensão da condição do ser e do não-ser torna-se mais claro perceber que a intenção das escolhas parte de origens diferentes. Pode-se dizer que uma vem de uma cadeia complexual e atua para homeostase, outra vem de uma natureza humana que coloca o indivíduo na sua totalidade. Maslow (1962) distinguiu esses dois conjuntos de forças entre segurança e O dilema das escolhas humanas é questão estudada desde a filosofia à psicologia e expressa por diversas linguagens artísticas. Do cinema à poesia temos elementos de constante reflexão. É uma temática sempre atual, embora com diferentes linguagens. O Fantasma da Ópera é um filme que nos confirma que a arte imita a vida, é um musical que conta uma história. Digo história porque segundo extras do DVD do filme a obra foi escrita por Andrew Webber para sua amada Sara Brigtmann quando ela já dava sinais de deixá-lo. Ele compositor e, como seu companheiro, por anos compôs apenas para ela, para a elevação da sua voz, contribuindo enormemente para o seu sucesso. Porém, não se pretende aqui uma análise da história real de Andrew e Sara. O trabalho está pautado na discussão do filme com personagens fictícios. As possibilidades de trabalho a partir desta obra são várias. O amplo olhar da Gestal-terapia possibilitou compreender melhor o ser humano e o contexto que ele mesmo cria para sua vida. A partir desta perspectiva e através da analise das cenas e das letras do musical correlacionando com os conceitos de Sartre, Rollo May, Maslow e Fritz Perls, foi possível identificar e demonstrar o lugar subjetivo no qual o ser humano faz suas escolhas. 2. REVISÃO DA LITERATURA A Questão do Ser e da Existência Humana na Perspectiva de Sartre, Rollo May e Maslow A intencionalidade da consciência pode vir de dimensões diferentes de uma mesma pessoa. Jean-Paul Sartre, filósofo existencialista, afirmou que a consciência se divide entre ser e não-ser (PENHA, 1982). Para Sartre, o indivíduo acredita na mentira que diz, mas nem por isso desconhece a verdade que procura ocultar. Apenas se esconde numa máscara para não assumir sua liberdade. A liberdade traz a angústia da escolha e, por consequência, significa assumir a responsabilidade por alguma decisão. Sartre (PENHA, 1982) nomeia de má-fé este autoengano do indivíduo ser o que 99 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 crescimento: o Eu apegado à segurança faz regressão e coloca o sujeito na defensiva, receoso de independência, liberdade e separação; o Eu saudável empreende com espontaneidade e confiança, funcionando plenamente com suas capacidades. May (1983/1991) também compreendia que do lugar do ser, da natureza humana saudável, a consciência, as escolhas e atitudes são pouco convencionais para os padrões sociais e familiares. Inúmeros são os conflitos trabalhados no espaço psicoterapêutico que refletem vários estereótipos internalizados através da educação e da reprodução de crenças familiares e sociais. Estereótipos são modelos externos passados de geração a geração influenciando e reforçando escolhas complexuais. Ou seja, o não-ser, orientado pelo medo e pela mensagem que para haver aceitação de fato é preciso cumprir a ordem vigente. Cumpre o papel de uma adaptação ao meio em que vive. Assim, compreende-se que a fixação n a s c o nve n ç õ e s p o d e i nv i a b i l i z a r a autorrealização, afastando a existência de seu projeto original. O projeto é inerente ao humano. É pelo projeto existencial que nos tornamos humanos, nos realizamos, evoluímos e humanizamos o planeta. Remete a autenticidade da pessoa para realizar a vida. O Existencialismo na Gestalt-terapia permite uma profunda reflexão sobre o h o m e m e a e x i s t ê n c i a . Fa c i l i t a o desvelamento do ser, no sentido de encontrar sua individualidade. A partir daí, o homem tem a opção de definir o que pretende ser. Conforme Ribeiro (1985, p.37): dos talentos do indivíduo, tudo depende de suas escolhas até a fase adulta. “Em geral, somente uma criança que se sente segura se atreve a progredir saudavelmente (...) as necessidades de segurança insatisfeitas permanecerão para sempre subjacentes, exigindo sempre a sua satisfação” (MASLOW, 1962, p.76-7). É a subjetividade que dá o critério original de motivação (Maslow, 1962). A luta entre o medo e coragem permeia o conflito da individuação, ambos trazem angústias e prazeres. Compreende-se em Maslow (1962) individuação como vocação, processo de realização de potenciais, capacidades e talentos; refere-se à aceitação da própria natureza intrínseca que leva à integração. A ansiedade, segundo May (1977/1980), vem do medo dos próprios poderes e dos conflitos advindos desse medo. Forma-se com isso o caráter definidor da personalidade do neurótico: “o homem voltado para fora”. O resultado disso é um esvaziamento pela dispersão e as tentativas de adaptação à frustração. Mesmo assim, é dado ao indivíduo passar boa parte da sua existência buscando o sentido da vida que, ao encontrar, nem sempre se apropria. Mas, mesmo não se apropriando, a existência no mundo consiste num projeto continuamente modificável, renovando assim o sentido da vida. Os fatores que aumentam o medo sufocam o impulso para o saber e até o impulso criativo. O conflito entre ser e nãoser, entre medo do conhecimento e crescimento, conhecimento e ignorância de si, são paradoxos do mundo interno do homem que, ao se adaptar às constantes frustrações, serve para alimentar a própria psicopatologia no humano. Maslow (1962) aponta para a estreita ligação entre o saber e o fazer como causa do medo de saber pelo receio de ter que fazer. O saber traz a responsabilidade de fazer, é aí que o comodismo fica ameaçado e a batalha entre o medo e a coragem se instala. Coragem e Medo no Processo de Ajustamento Criativo e Conservativo Compreende-se que o conflito entre medo e coragem se instala porque a posição cômoda foi provocada pela consciência do saber de si, e este saber pede uma ação, ou seja, o saber de si responsabiliza o indivíduo E x i s t ê n c i a , etimologicamente, vem de ex-sistire: começar a ser, vir de alguma coisa e, neste sentido, o homem é o único que pode sair de si para projetar a si mesmo, pode fazer um projeto de si próprio, ele próprio é um projeto, realizando-se. O homem é uma existência porque ele é um projeto, isto é, o homem é um ser se fazendo. Compreende-se que a capacidade existe, porém fatores anteriores à fase adulta são determinantes para a realização ou não 100 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 para o crescimento. Sendo assim, temos ainda que compreender esta batalha a partir do contato da pessoa com o meio ambiente, pois é neste espaço vital que ela se depara com as soluções disponíveis. Pa ra Ku r t L e w i n ( 1 9 6 6 / 1 9 7 1 ) , psicólogo alemão que desenvolveu a Teoria de Campo, ao estudar um indivíduo, deve-se compreender o funcionamento de seu espaço vital, que é tudo que existe psicologicamente para ele. Esse espaço vital vai além das dimensões do espaço físico e do tempo cronológico. Nele estão o que poderia influenciar ou ser influenciado pelo indivíduo. Percebe-se aqui que a experiência de contato que se dá na fronteira entre o organismo e o meio resulta do modo de ser ou n ã o - s e r, c o n f o r m e p o s t u l a d a p e l o existencialista Rollo May em outras palavras. É na forma como se estabelece o contato com o meio que o ser tenta se realizar através de ajustamentos criativos ou de ajustamentos conservativos. O ajustamento conservativo se refere a fixações em necessidades de segurança insatisfeitas e as formas de buscar essas satisfações, ainda que sejam pela repetição. A preservação vem de um self diminuído ou “as áreas de contato podem ser restritas, como nas neuroses” (PERLS, HEFFERLINE & GOODMAN, 1951/1997, p.180). No verbete 'ajustamento criativo' do Dicionário de Gestalt-terapia - Gestaltês encontramos: causou, ou seja, a forma de reação frente aos fatos é mais importante que o conteúdo. O comportamento é entendido não somente como resultado da realidade interna da pessoa, mas passa a ser analisado em função do campo que existe quando ele ocorre. Perls et al. (1951/1997) postularam o fenômeno contato a partir da experiência na fronteira entre o organismo e o ambiente. Ribeiro (1997) define o contato como uma elaboração, um fenômeno, dado pela relação dinâmica que há na interação pessoa mundo, entre a pessoa e o meio. Essa interação passa por processos que modificam as relações e permite que essas pessoas continuem sua existência, seu desenvolvimento e autorrealização. Contato é uma das forças atuantes que define o campo. Há entre o homem e o mundo uma relação que influencia, modifica e transforma. É onde o meio psicológico pode alterar o mundo físico e vice-versa. Para que os fatos do meio físico se tornem realidade para a pessoa é preciso que estes sejam vivenciados por ela, ou seja, que se torne parte do meio psicológico assumindo um significado subjetivo e particular para ela, determinando assim, a forma pela qual a pessoa vai lidar com a situação ou ajustar-se a ela, de forma criativa ou conservativa. A forma criativa de lidar com os fatos do meio psicológico é definida como ajustamento criativo em Gestal-terapia. O ajustamento criativo a partir das funções do ego possibilita as escolhas existenciais, a forma de viver a vida diante dos contextos que se apresentam para cada pessoa. O ajustamento criativo se refere à sabedoria de administrar a situação instrumentalizando os recursos disponíveis para obter soluções favoráveis ao desenvolvimento próprio, por mais adversas que sejam as situações enfrentadas. O ajustamento promove mudança e crescimento quando possível, mas também conservação e preservação. Para Philippi (2004, p.72): “...o self fica entre a necessidade de preservação e a de mudança. Isso porque, para que o organismo cresça, t a m b é m t e m q u e s e c o n s e r va r.” O crescimento vem a partir daquele ponto em que se chegou, ou seja, existe crescimento a partir do que já se alcançou. Spangenberg (2007) compreende que ...os ajustamentos na fronteira podem, contudo, se cristalizar assumindo formas crônicas de reação em determinado âmbito de vivência, ou seja, formas alienadas das condições presentes e atuais. Sendo este o caso, o ciclo de autorregulação está interrompido neste p a r t i c u l a r, f i c a n d o o indivíduo incapaz de s a t i s f a z e r s u a s necessidades e em permanente estado de desequilíbrio e tensão temporária ou permanente da capacidade de ajustar-se de forma nova num campo sempre novo. (D'ACRI & ORGLER, 2007, p.21) A questão básica é a de como o comportamento se deu, e nem tanto do que o 101 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 é a tensão entre mudança e conservação o fator responsável por manter a integridade da identidade ao longo da vida. Assim, para cada movimento de mudança é preciso um de conservação e este processo não se completa até que ambos tenham uma nova síntese. Porém, exceto este aspecto em que a conservação tem sua função, é a conservação o mecanismo responsável pela formação da neurose, quando a conservação se torna cristalizada. Assim, fazendo repetir o que deu certo em algum momento, ela paralisa o processo de crescimento. A resistência é o resultado do conflito entre forças paradoxais, de um lado a necessidade de mudança, de outro a conservação que garante certa estabilidade. O conflito entre medo e coragem provoca os mecanismos de ajustamento conservativo e ajustamento criativo. Caso as forças preservativas vençam em nome da acomodação, o indivíduo se fixa ao modelo que um dia deu certo resultado, repetindo, atuando por uma memória e não pelas oportunidades do momento para realização, a partir da sabedoria do ajustamento criativo. dia a dia. Enfim, o cinema retrata histórias humanas e seus dilemas. A vida imita a arte, ou será que é a arte que imita a vida no cinema? O Fantasma da Ópera, além de apontar que é a arte que imita a vida, pela história que influencia o enredo, trouxe o questionamento sobre o lugar subjetivo no qual o ser humano faz suas escolhas. Opta-se, neste trabalho, por uma análise global da obra em perspectiva com visão gestáltica. Para isso, diversas cenas, trechos de falas e letras do musical são transcritas do próprio filme O Fantasma da Ópera (2004) e correlacionados com os conceitos, a fim de identificar e demonstrar o lugar subjetivo no qual o ser humano faz suas escolhas. Desejo e vontade de dar certo na vida, de uma maneira geral, todas as pessoas têm. Ninguém acorda e diz: “hoje vou fazer tudo errado para me dar mal”; no máximo, no máximo o sujeito diz: “mais um dia para enfrentar” ou “hoje vai ser difícil”. Pode-se dizer que até aquelas pessoas que escolheram e aprenderam enfrentar a vida na transgressão da lei buscam o reconhecimento e desejam acertar e vencer de alguma forma. Porém, para além da linguagem verbal, o desconhecimento de si promove escolhas sem resultado de realização efetiva e é assim que muitas escolhas são feitas. A falta do discernimento sobre a origem da motivação para escolher pode deixar o indivíduo cego diante de si mesmo e da vida. Assim, bons filmes, além de recreativos, são pedagógicos, quando compreendidos. Tornam-se vasto material de pesquisa a partir da comoção causada no telespectador, e num trabalho terapêutico, revelam à consciência do indivíduo a sua própria intencionalidade complexual ou existencial. 3. METODOLOGIA DE PESQUISA A Arte Cinematográfica como Reflexão da Existência Humana Os filmes nos emocionam, fazem-nos rir, chorar, assustar, criticar... Identificamonos com seus personagens e histórias. Encontramos “pedacinhos” da nossa vida, do cotidiano, das memórias de infância, das crenças familiares e religiosas, dos conflitos sociais, os dramas amorosos e a infinidade de estereótipos aos quais nos condicionamos no Síntese do Filme A história se passa num teatro de Paris em 1870. Christine faz uma triangulação amorosa com o Fantasma e Raoul. Christine, cujo pai era um famoso maestro, ficou órfã e foi para este teatro onde teve o Fantasma como seu mestre secreto na arte da música. Na noite oportunizada pelo Fantasma para Chistine estrear, Raoul reconhece em Christine a menina das brincadeiras de infância. A partir deste encontro, ela é As forças para mudança (Fm) e as forças para a preservação (Fp), em sua inter-relação são as que garantem o nosso crescimento. É a relação específica, a esta dança entre opostos, que d e n o m i n a m o s RESISTÊNCIA. Em alguns casos – na maior parte do que chamamos de Neurose – e n c o n t ra r e m o s e s t a relação num processo de estagnação, ao qual chamamos de IMPASSE, dentro da Gestalt. ( S PA N G E N B E R G , p . 5 1 , 2007). 102 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 agora e deixe a sua alma começar a se elevar e você viverá como nunca viveu antes, suave primorosamente a música vai acariciá-la, ouça-a, sinta-a acariciála suavemente. Abra a sua mente, liberte as suas fantasias, nesta escuridão que você não pode combater (...) Deixe a sua mente iniciar uma viagem através de um mundo novo e estranho. (...) deixe que o seu lado sombrio seja vencido pelo poder da música que eu componho (...) A noite aguça e acentua as sensações. A escuridão agita e desperta a i m a g i n a ç ã o , silenciosamente os sentidos abandonam as defesas (...) Esconda o seu rosto da ostensiva luz do dia, esconda os seus pensamentos da fria e insensível luz e ouça a música da noite, feche os olhos e se entregue aos seus mais obscuros sonhos. (O Fantasma da Ópera, 2004) disputada por dois amores, fica dividida e obrigada a fazer sua escolha. O Fantasma da Ópera é um espetáculo que mobiliza o público pela estória que conta. Há uma sequência de temas com efeitos dramáticos, contrastes sonoros e realidade exagerada. No filme, o mundo da ópera acontece no palco do teatro e também nos bastidores. No início do filme um senhor de cadeira de rodas arremata em um leilão realizado em um teatro um objeto que lhe fora descrito. Ao final do filme este mesmo senhor, no cemitério com o objeto em mãos, o deposita no túmulo de sua esposa, este senhor é Raoul. 4. ANÁLISE E DISCUSSÃO A Questão do Ser e do Não-Ser da Coragem e do Medo na Obra “O Fantasma da Ópera” Apesar da temática romântica, percebe-se que esta ópera pode ir além de um drama entre dois amores se compreendermos que cada um deles representa uma escolha. Os interesses são conflitantes, como numa realidade existencial do dilema humano sobre a maneira de viver a vida, nos momentos em que a escolha de um caminho exclui outras possibilidades. O mundo íntimo de Christine que encontra o mundo do Fantasma traz cenas de erotismo e vitalidade. O olhar de Christine é hipnótico diante de seu mestre. É um olhar que passa transcendência, parece estar em outro estado de consciência, parece que ela enxerga além; enfim, é uma cena que traz a representação de um encontro sublime. Ao seu Anjo da Música ela pede: Christine compreende, porém vê-se que ela teme este mundo novo e desconhecido. Desta forma o Fantasma, o próprio dom, representa terror. De fato, ele é implacável, não tolera desobediência. Isso é assustador e pouco comum para uma jovem romântica que se emociona ao reencontrar seu amor de infância, Raoul. Para Christine a escolha é bloquear o contato com o seu dom, em vez de apropriar-se dele. Talvez seja um tipo de ajustamento, ainda que esse dom tenha se desenvolvido por anos secretamente, ou seja, não era estranho a ela. Bloquear o contato ou entrar em resistência àquelas pessoas que propiciam a autorrealização para muitas pessoas é o caminho escolhido. Raoul representa uma escolha mais adaptada às suas crenças familiares e sociais. Ele é jovem, bonito, poderá ser um bom protetor para a órfã, que mesmo já adulta, ainda lamenta a morte do pai. Christine está diante de um paradoxo que nos coloca a questão: terá ela coragem de permitir sua autorrealização unida a este 'Conceda-me a sua glória' e canta ao descer ao espaço subterrâneo: 'Aqueles que viram o seu rosto se retiraram com medo, eu sou a máscara que você usa e é por mim que eles ouvem. O seu espírito e a minha voz, o meu espírito e a sua voz, misturados num só. O Fantasma da Ópera está dentro da minha mente' (O Fantasma da Ópera, 2004). E o Fantasma leva Christine ao seu mundo secreto: ...afaste os pensamentos da vida que conheceu até 103 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 homem que eleva seu talento e ao mesmo tempo a assusta: o Fantasma, ou o medo fará com que opte pela segurança de um casamento com Raoul? Christine, então, diante de Raoul percebe o Fantasma de forma contraditória e até, ameaçadora: crescimento. Ele cobra o preço da dedicação contínua. Sabe-se que cada escolha pede que se abra mão de tantas outras. Faz-se necessário o ajustamento criativo para contemplar o dom e escolher uma forma de vida pouco convencional, onde Christine ficaria essencialmente comprometida com seu talento e o aprimoramento contínuo dele. Porém, Chistine abre mão do seu talento musical e da sua carreira na ópera. Ela escolhe ser uma “ADORADA ESPOSA E MÃE” conforme está escrito na lápide do seu túmulo que revela seus anos de vida: 1854-1917. Na cena final, seu esposo Raoul deposita um mimo pertencente ao Fantasma que ele arrematou no leilão em 1919, cena que dá início ao filme. Em outras palavras o filme que teve nas suas cenas iniciais, em um teatro abandonado termina em um cemitério. As cenas iniciais e finais são em preto e branco contrastando com a rosa vermelha de laço preto deixada pelo fantasma no túmulo de Chistine. Além da trama principal, outros contrastes com mundos e personalidades diferentes são articulados nesta obra. Num processo gradual o filme evolui e insere realidades paralelas ao drama principal. Existem os administradores do teatro, a plateia lota o espetáculo, a mídia que vibra as notícias, a personalidade difícil da diva, dentre outros. A música do Baile de Máscaras nos fala de um contexto social que Christine e todos nós estamos inseridos. A representação de papéis ao se viver em sociedade conforme suas normas, costumes, farsas, enfim, uma busca estereotipada, um tipo de ajustamento ou adaptação. O mundo dele é de noite infinita, num mundo onde a luz do dia se dissolve na escuridão (...) Será que conseguirei esquecer aquela imagem? Conseguirei escapar daquele rosto? Mas a voz dele preenchia a minha alma com um som estranho e suave. Naquela noite havia música na minha mente, e através da música, a minha alma começou a se elevar (O Fantasma da Ópera, 2004). Percebe-se neste trecho da letra o conflito de Christine entre o medo e a coragem de assumir a posição do crescimento, mesmo reconhecendo que sua alma se eleva. O Fantasma considera Raoul um jovem insolente que quer participar de seu triunfo. O Fantasma foi por anos professor de Christine sem deixar sua imagem aparecer. Raoul desconsidera a existência do Fantasma ao dizer a Christine: O que ouvi foi apenas um sonho e nada mais (...) Chega de falar de escuridão. Esqueça todos os temores, eu estou aqui, nada pode machucá-la. As minhas palavras acalentarão e acalmarão você. Deixe que eu seja a sua liberdade. Deixe a luz do dia secar as suas lágrimas. Eu estou aqui com você ao seu lado para protegê-la e guiá-la... (O Fantasma da Ópera, 2004). Rostos de papel desfilando. Esconda o rosto, para que o mundo nunca o descubra (...) cada rosto uma sombra diferente (...) No carrossel numa corrida desumana (..). O verdadeiro é falso, quem é quem?(...) Bebam, bebam tudo até se afogarem. Na luz, no som, mas quem sabe dizer o nome? Mascarados! Amarelos dissimulados, vermelhos vibrantes (...) Escolha o seu e deixe o espetáculo maravilhar você (...) Sombra sem ebulição, mentiras sussurradas (...) você pode enganar mesmo A música da noite não é compatível com a luz do dia. Aqui temos uma das várias polaridades que a obra apresenta. Raoul representa a realização de um romantismo da menina Christine, um casamento, um protetor, algo da ilusão feminina que se transforma em necessidade. Raoul é a segurança, a preservação de um modelo recebido. O Fantasma, como elemento da psique, é o dom, o talento, o potencial, o grande promotor da mudança em nome do 104 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 o amigo que o conheça (...)Corra e esconda-se, m a s u m r o s t o o perseguirá... (O Fantasma da Ópera, 2004). da própria trajetória da civilização na sociedade, na família, na religião, no governo, etc. Os estereótipos, as máscaras e os papéis desempenhados jamais podem sobrepor-se ao ser e a sua autorrealização. Esse dilema da humanidade é dito por diversas linguagens artísticas, do cinema à poesia, como se pode ler no fragmento da poesia “Tabacaria”: Enquanto o Baile de Máscaras acontece, também há festa para os que trabalham atrás do palco. De forma caricaturada estão presentes elementos de crítica às desigualdades sociais, aos papéis impostos, à forma de se apresentar à sociedade com objetivo de ser aceito. Os administradores do Teatro vieram do negócio da sucata e na posição de administradores conseguem mais status social, são vistos e convidados pela elite de Paris. A obra apresenta nesta parte a “sociedade de espetáculo”, a necessidade construída pelo sistema em ter algum status para ser alguém reconhecido. Conforme Ribeiro: “Somos pessoas, máscaras vivas, porque vivemos uma totalidade precária e porque somente a totalidade é autêntica” (2006, p.167-8). O dilema da existência humana consiste no conflito entre as polaridades: ser e não-ser, medo e coragem, ajustamento criativo e ajustamento conservativo. ...Fiz de mim o que não soube, E o que podia fazer de mim não o fiz. O dominó que vesti era errado. Conheceram-me logo por q u e m n ã o e r a e não desmenti, me perdi. Quando quis tirar a máscara, Estava pegada à cara. Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido. Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado. Deitei fora a máscara e dormi no vestiário Como um cão tolerado pela gerência Por ser inofensivo E vou escrever esta história para provar que sou sublime. (PESSOA, 1888-1935/1992, p.217-218) 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O meio social constrói formas e estabelece os padrões, a sociedade reproduz o que está pronto por comodidade, adaptação ou medo. Assim, desprivilegia os talentos ao impor estes modelos estereotipados, ou seja, privilegia a forma desconsiderando o conteúdo de cada existência. Ao mesmo tempo em que escraviza provocando a normose, no sentido de uma normalidade doentia e, também, a própria neurose. É o paradoxo da existência: nesta mesma sociedade que impõe como se deve ser é o lugar onde o ser pode encontrar sua autorrealização vencendo as inseguranças. É na relação com o meio que as máscaras e os papéis aparecem. O grande perigo para o indivíduo é acreditar ser o que representa ou perder-se dentro do papel que desempenha. É preciso lembrar que o projeto existencial que traz autorrealização é anterior a tudo que constitui conceitos e normas, pois estes são resultantes dos convívios sociais e REFERÊNCIAS ABBGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. In:_____ existencialismo. Tradução Alfredo Bosi. São Paulo: Mestre Jou, 1982 (Trabalho original publicado em 1960). ABRÃO, Bernadette S. (Org.) A História da Filosofia. 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Normose: a patologia da normalidade – Campinas, SP: Verus Editora, 2003, 238 p. 106 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 CLIMA ORGANIZACIONAL E SATISFAÇÃO DO COLABORADOR NO AMBIENTE DE TRABALHO: UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA DE CONFECÇÕES Joseline da Silva 1 Lilian Ester Winter 2 SETREM 3 RESUMO ABSTRACT A presente pesquisa foi realizada com a finalidade de verificar a percepção dos c o l a b o ra d o re s e m re l a ç ã o a o c l i m a organizacional e à satisfação dos trabalhadores em relação a seu trabalho. O estudo ocorreu em uma empresa de confecções de roupas de uma cidade do Noroeste do R/S. Os dados foram obtidos mediante aplicação de duas escalas em 28 colaboradores. As escalas aplicadas foram: ECO – Escala de Clima Organizacional e EST – Escala de Satisfação no Trabalho. A pesquisa aponta um indicador de clima organizacional com nível mediano, considerado nem bom nem ruim. Para ser considerado um clima bom, a pesquisa deve pontuar acima de 4. O estudo revela que o maior nível concentrouse no item conforto físico com 3,67 e no fator controle/pressão que apontou 3,55 (que deveria ser inferior a 2,9 já que esse indicador deve ser analisado inversamente, ou seja, o resultado indica a existência de controle e pressão no trabalho), o item coesão entre colegas teve índice de 3,56, apoio da chefia e da organização marcou 3,37. Já o fator recompensa teve o menor índice com 3,21. Na escala de satisfação no trabalho o índice geral das dimensões foi de insatisfação, destacando-se os fatores satisfação com as promoções com índice de 3,33 e satisfação com o salário com 3,09 que estão sinalizando insatisfação convergindo com o resultado do fator de recompensa na pesquisa de clima. Nesta escala para indicar satisfação as dimensões deveriam apresentar pontuação entre 5 e 7 e insatisfação entre 1 e 3,9. This research was conducted in order to ascertain the perceptions of employees with regard to organizational climate and satisfaction of workers in relation to their work. The study took place in a clothing company clothing in a city in Northwest R S. The data were obtained by applying two scales at employees. The scales applied were: ECO OCS - Organizational Climate Scale and EST JSS - Job Satisfaction Scale. The research shows an indicator of organizational climate in a median level, which can not be considered good or bad. To be considered a good climate, research must score above . The study reveals that the highest concentrated on physical comfort with . item, the score should be higher on items and bad weather less than . , the factor being inverted control pressure, the item was peer cohesion index of . , the control factor pressure showed . , supporting the organization s leadership and scored , . The reward factor had the lowest rate with . . On the scale of job satisfaction dimensions of the overall index was dissatisfaction, highlighting the factors satisfaction with promotions . and satisfaction . earnings are signaling dissatisfaction, converging with the result of factor reward in organizational climate research. On this scale to indicate the dimensions should provide satisfaction score between and and dissatisfaction between and . . Palavras-chaves: Clima organizacional. Satisfação no trabalho. Keywords: Organizational Climate. Job Satisfaction. 1 Acadêmica de Bacharelado em Psicologia, SETREM Psicóloga, Mestre em Desenvolvimento, Coordenadora do Curso de Psicologia e professora da SETREM, e -mail: [email protected] 3 Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de Maio – RS, e -mail: [email protected] 2 107 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1.INTRODUÇÃO O cenário empresarial atual exige que as empresas mantenham bons resultados para sua sobrevivência no mercado, os quais passam pela colaboração e desempenho de seus trabalhadores. A presente pesquisa tem como objetivo conhecer os aspectos que a empresa de confecções pesquisada busca cultivar/melhorar no dia-a-dia de seus colaboradores para criar um ambiente saudável e agradável no trabalho. Assim, foi definido como tema do estudo “Clima Organizacional e Satisfação no Trabalho”, buscando investigar qual a percepção dos colaboradores em relação ao clima da empresa e a satisfação em relação ao seu trabalho. A pesquisa foi desenvolvida em uma empresa de confecção de roupas, situada em uma cidade do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, durante o período de JUNembro de 2011 a janeiro de 2012. A pesquisa de Clima Organizacional e Satisfação no Trabalho pode ser considerada como ferramenta importante para analisar o ambiente da empresa, permitindo a partir daí traçar estratégias para a melhoria da organização. Deve-se desconsiderar que o mercado empresarial está cada vez mais competitivo, impondo que as empresas estejam voltadas à captação de novos clientes. Desse modo, o problema definido para a monografia foi: “Como o clima organizacional influencia no nível de satisfação dos funcionários?” A resposta a essa indagação poderá contribuir para uma reflexão e o debate sobre f a t o r e s r e l e va n t e s e d e c i s i v o s q u e influenciam positiva ou negativamente no clima organizacional, oportunizando um espaço para os trabalhadores trazerem suas percepções e visões sobre o ambiente, as relações, o controle, o trabalho em equipe, entre outros e a organização, rever processos, a gestão, os incentivos e recompensas etc. Martins (2008) afirma que, em consequência das aceleradas mudanças constatadas, as empresas demonstram interesse em perceber melhor a vida organizacional, procurando descobrir quais as percepções similares e com significados idênticos quanto aos aspectos da dinâmica organizacional responsáveis pela base do clima organizacional. 2.REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 CLIMA ORGANIZACIONAL O estudo de clima tem o objetivo de contribuir com a organização para essa aumentar o desempenho e a eficiência a partir do comportamento do individuo. Segundo Gasparetto (2008), a melhoria no ambiente e nas condições de trabalho aumenta a p r o d u t i v i d a d e d e m a n e i ra b a s t a n t e acentuada. Para Martins (2008, p. 29), clima organizacional “é o modo como o contexto do trabalho afeta o comportamento e as atitudes das pessoas neste ambiente, sua qualidade e o desempenho da organização”. Ainda segundo Alvarez, (1992); Toro, (2001), apud Martins (2008), o clima organizacional pode influenciar a satisfação e o rendimento no trabalho. Martins (2008) diferencia clima organizacional do clima psicológico. Para a autora, o clima organizacional é constituído por elementos cognitivos e se refere a percepções ligadas a um aspecto particular do trabalho, partilhada pelos trabalhadores. Já clima psicológico se constitui de elementos afetivos e se refere a uma ligação individual no contexto do trabalho. Sendo assim, o clima psicológico apresenta relação entre o ambiente de trabalho e as relações afetivas a este ambiente. Nesse contexto, Martins (2008) afirma que o clima organizacional é formado pela percepção conjunta dos funcionários. Na satisfação quanto ao trabalho o que é avaliado é se o empregado gosta ou não de determinados aspectos da organização. [...] precisamos de espaço para que as pessoas falem e pensem o negócio da maneira descontraída, mas interessadas com entusiasmo e conforto – conforto em dizer ou perguntar abertamente e facilmente o que pensam sobre o negócio. (BOOG, 2001, p. 263). Chiavenato (2008) explicita o conceito, dizendo que “o Clima organizacional é a qualidade ou propriedade do ambiente organizacional que é percebida ou 108 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 experimentada pelos membros da organização e que influencia o seu comportamento”. Portanto, sabendo-se qual é a percepção que o funcionário tem da empresa, como se sente e o que pensa, a empresa pode assim buscar novas formas de gestão. A participação em uma pesquisa de clima organizacional deve ser espontânea e deve ser preservada a identidade de quem responder à pesquisa, para assim haver validade e mais verdade nos resultados dos funcionários em relação à empresa. Portanto, clima organizacional tem influência nos comportamentos, na motivação, na produtividade e na satisfação dos colaboradores. Segundo Luz (2001), “O clima retrata o grau de satisfação material e emocional das pessoas no trabalho. Observase que este clima influencia profundamente a produtividade do indivíduo e, consequentemente, da empresa. Assim sendo, o mesmo deve ser favorável e proporcionar motivação e interesse nos colaboradores, além de uma boa relação entre os funcionários e a empresa.” No clima organizacional identifica-se o ambiente físico, controle e pressão, liderança, trabalho coletivo, reconhecimento e remuneração. Portanto, com o grau de motivação elevado, o clima entre os colaboradores se traduz em satisfação, animação, interesse e colaboração, o que vem a ser um ponto positivo para a organização, pois é maior produtividade e menos rotatividade. Mas, quando há uma motivação baixa entre os colaboradores, por alguma situação como frustração ou uma dificuldade na satisfação das necessidades, o clima se torna negativo, podendo ser caracterizado por estados de depressão, desinteresse, apatia, insatisfação, podendo chegar a casos extremos como tumulto e greves. Fischer et al. (2009) sugere que os gestores utilizem uma ferramenta objetiva e segura para avaliar o clima organizacional como, por exemplo, uma pesquisa estruturada de clima organizacional. trabalhadores no seu local de trabalho. Segundo Spector (2005), a satisfação no trabalho é uma variável de atitude que mostra como as pessoas se sentem em relação ao trabalho que têm, seja no todo, seja em relação a alguns de seus aspectos. A satisfação no trabalho é avaliada perguntando-se às pessoas como elas se sentem em relação ao seu trabalho. De acordo com Bezerra (2009), o papel da qualidade de vida torna-se marcante quando se deseja o crescimento da produtividade e do bem-estar dos profissionais, considerando a obtenção de resultados crescentes pela organização como fundamental para que a busca de melhorias nas condições, organização, relações de trabalho e a satisfação dos funcionários ocorra permanentemente. Existem vários fatores que influenciam para a satisfação no trabalho. Dentre eles, pode-se destacar a atuação do líder na satisfação do trabalhador dentro das organizações. O líder deverá buscar não somente o resultado, mas também o lado humano do trabalho. De acordo com Macedo e Matos (2008), frequentemente são identificados nas organizações algumas manifestações de satisfação e insatisfação com algumas variáveis relacionadas ao trabalho, sendo que estas variáveis tendem a fortalecer ou enfraquecer a qualidade de vida, causando influência direta na produção do funcionário. Acredita-se que certos comportamentos importantes no trabalho sejam resultado da satisfação ou da insatisfação no trabalho. Quando o trabalho é interessante e agradável, as pessoas gostarão dele, estarão motivadas e terão um bom desempenho. De acordo com Spector (2005), as características do trabalho induzem aos três estados psicológicos que levam à satisfação, à motivação e ao desempenho. São estes: - va r i e d a d e d a s h a b i l i d a d e s , identidade da tarefa e importância da tarefa: fatores que levam à experiência do significado do trabalho; - autonomia: que leva ao sentimento de responsabilidade; - feedback: que leva ao conhecimento dos resultados. 2.2 SATISFAÇÃO NO TRABALHO Satisfação no trabalho é um tema que tem suscitado discussões no campo de pesquisa, visto que procura-se compreender os sentimentos que mobilizam os 109 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 no contexto de cada fator. Na escala de satisfação no trabalho EST foram verificados os itens: Satisfação com os colegas – Contentamento com a colaboração, a amizade, a confiança e o relacionamento mantido com os colegas de trabalho. É composta por 25 itens em 5 componentes: satisfação com os colegas de trabalho (fator 1, com 5 itens), satisfação com o salário (fator 2, com 5 itens), satisfação com a chefia (fator 3, com 5 itens), satisfação com a natureza do trabalho (fator 4, com 5 itens) e satisfação com as promoções (fator 5, com 5 itens). A interpretação dos resultados na escala EST deverá considerar que quanto maior for o valor do escore médio, maior será o grau de contentamento ou satisfação do empregado com aquela dimensão de seu trabalho. Assim, valores entre 5 e 7 tendem a indicar satisfação. Por outro lado, valores entre 1 e 3,9 tendem a sinalizar insatisfação, enquanto valores entre 4 e 4,9 informam um estado de indiferença, ou seja, nem satisfeito, nem insatisfeito. Quanto à abordagem, essa pesquisa é quantitativa, que expressou através de números os resultados. No que se refere aos objetivos, a pesquisa foi descritiva, pois teve como objetivo descrever as percepções que os colaboradores têm em relação à empresa e de sua satisfação no trabalho (GIL 2002). Quanto aos procedimentos, este estudo classificou-se como de campo, revisão bibliográfica, documental e estudo de caso. Os dados sociodemográficos apresentam os sujeitos da pesquisa dos quais a maioria (92,8%) é do gênero feminino e 7,14% do gênero masculino. A faixa etária dos entrevistados varia de 18 a 50 anos, sendo o predomínio com idade entre 21 a 35 anos perfazendo um total de 74,97% dos trabalhadores. Em relação à escolaridade boa parte dos colaboradores estudou até o final do Ensino Fundamental e Ensino Médio completo, atingindo um percentual de 71,42%. O tempo de serviço que prevalece entre os entrevistados é de 2 a 8 anos num percentual de 82,13%. A participação nesta pesquisa foi espontânea, sendo que as respostas foram tratadas de forma sigilosa, sem identificação nas folhas/resposta. Essas informações Spector (2005), afirma que esses fatores psicológicos são importantes para satisfação e motivação dos funcionários. “Quando o trabalho os induz, os indivíduos, se motivados e satisfeitos, têm um desempenho melhor”. Fernandes e Tófani (2008) apontam que valorizar o funcionário é o que as empresas devem ter em mente, além de a empresa estar em constante atualização ouvindo os funcionários, desenvolvendo estratégias de melhoria. Enfim, é no trabalho que se passa a maior parte do tempo, e esse espaço é de trocas, vínculos e busca de objetivos. Portanto, oportunizando um ambiente saudável com um clima organizacional positivo, possibilita-se ao trabalhador qualidade de vida e saúde. 3. MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA Foi realizado um estudo de caso em uma empresa de confecções da região noroeste do Rio Grande do Sul, numa população participante de 28 colaboradores, no período de JUNembro de 2011 a janeiro de 2012, com a aplicação de duas escalas ECO- Escala de clima organizacional e EST- Escala de satisfação no trabalho. Para a coleta de dados, a pesquisadora utilizou-se da observação e de ferramentas de diagnóstico. A escala ECO- Escala de clima organizacional é composta por 63 itens agrupados em 5 fatores, denominados: apoio da chefia e da organização (fator 1, com 21 itens), recompensa (fator 2, com 13 itens), conforto físico (fator 3, com 13 itens), controle/pressão (fator 4, com 9 itens) e coesão entre colegas (fator 5, com 7 itens). Para interpretar esta escala, deve-se considerar que quanto maior for o valor da média fatorial, melhor é o clima organizacional. Além disso, valores maiores que 4 tendem a indicar bom clima e menores que 2,9 a apontar clima ruim. Porém, isso é inverso no caso do Fator 4, controle/pressão. Neste caso, quanto maior o resultado, pior será o clima porque maior será o controle e a pressão exercidos sobre os empregados. Para o Fator 4, os valores maiores que 4 apontam clima ruim (porque existe muita pressão e controle excessivo). E os menores que 2,9, bom clima (existe pouca pressão e baixo controle). Isso deve ser considerado sempre 110 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 foram esclarecidas junto aos participantes, como também foi entregue a cada sujeito de pesquisa um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido sobre os objetivos da pesquisa, que foi assinado pelos participantes. O proprietário da empresa investigada assinou um termo de autorização da empresa. Segundo Alvarez (1992) e Toro (2001) (apud MARTINS, 2008) o clima organizacional pode influenciar a satisfação e o rendimento no trabalho. Em relação ao clima organizacional na empresa, as variáveis pesquisadas foram as seguintes: apoio da chefia e organização, recompensa, conforto físico, controle/pressão e coesão entre colegas. A figura ilustra os resultados obtidos, constatando-se o índice mais elevado na variável conforto físico (3,67) e o mais baixo na variável recompensa (3,21). 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES 4.1. - ESCALA DE CLIMA ORGANIZACIONAL Figura 1: Índice de Clima Organizacional Índice de Clima Organizacional 3,7 3,6 3,5 3,4 3,3 3,2 3,1 3 2,9 CONFOR COSÃO CONTRO APOIO RECOM TO ENTRE LE/PRES DA PENSA FÍSICO COLEGA SÃO CHEFIA S E DA ORGANI ZAÇÃO Índice de Clima Organizacional 3,67 3,56 3,55 3,37 3,21 colegas apresentou o índice de 3,56, o índice controle/pressão alcançou 3,55. O item apoio da chefia e da organização 3,37 e a recompensa apresentou um índice de 3,21. Pode-se observar que o clima organizacional da empresa se encontra com um nível mediano, pois para ser bom deveria ter alcançado 4, porém não pode ser considerado ruim, para isto deveria estar a baixo de 2,9. 4.1.1 - Conforto Físico A figura ilustra a pesquisa de clima organizacional respondida pelos colaboradores da organização estudada, no qual o nível de clima organizacional apresenta uma média geral 3,47 representando a média de todos os itens apurados na escala. Esse índice aponta para um clima mediano, nem bom e nem ruim. Observa-se que o item conforto físico teve o índice maior de 3,67, já o item coesão entre Figura 2: Fator Conforto Físico 20 15 10 5 0 35 Discordo Totalmente 3 Discordo 0 Não Concordo Nem Discordo 5 Concordo 15 Concordo Totalmente 5 36 1 1 5 15 6 37 4 11 7 6 0 111 38 0 3 5 19 1 39 1 2 5 15 5 40 0 2 4 15 7 41 0 2 10 12 4 42 0 2 1 18 7 43 0 3 4 15 6 44 1 1 3 16 7 45 0 1 9 13 5 46 5 2 6 10 5 47 0 3 6 16 3 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 A pesquisa aponta que o maior nível se concentrou no item conforto físico com 3,67 em sua média, sendo que grande parte dos trabalhadores pontuou nas questões 38 (71,42%), 42 (89,28%), 44 (82,14%) e 47 (67,85%) que abarcam o espaço físico, a iluminação e a limpeza, facilitando o desempenho das tarefas como aspectos positivos. Da mesma forma, destacou-se de forma negativa a questão 37 (53,57%) que aborda sobre a facilidade da mobilidade das pessoas com alguma deficiência física. Conforme Magalhães (1990), se no ambiente físico os elementos forem precários, as pessoas não irão trabalhar com moral elevado; conforme a natureza do trabalho, é necessária uma luminosidade, uma temperatura, um grau de umidade diferente, o que também deverá estar de acordo com a região na qual se trabalha e a época do ano. De acordo com a observação da pesquisadora, o que influenciou este resultado pode estar vinculado ao fato de a empresa possuir ambiente climatizado e oferecer os equipamentos de proteção necessários para preservar a segurança dos trabalhadores, bem como a utilização de cadeiras ergonômicas. Quanto à acessibilidade aos deficientes físicos, a empresa não possui estrutura adequada, como rampas de acesso para receber trabalhadores com necessidades especiais. 4.1.2 - Coesão Entre Colegas Figura 3: Fator Coesão entre colegas 20 15 10 5 Figura 3: Fator Coesão entre colegas 0 57 58 59 60 61 62 63 Discordo Totalmente 4 2 2 2 3 3 6 Discordo 2 3 0 3 0 1 2 Não Concordo Nem Discordo 5 5 2 6 6 9 9 Concordo 6 14 16 14 10 11 6 Concordo Totalmente 11 4 8 3 9 4 5 Fonte Silva, Winter, 2012. O fator coesão entre colegas apresentou um nível de 3,54 apontando para a questão de vínculos e colaboração entre colegas como mediano no ambiente de trabalho constituindo-se o segundo mais elevado da escala. As questões que abordam esse fator encontram-se da questão 57 à 63 como apresentado no gráfico acima. Podemse destacar as questões 58 (64,28%), 59 (82,14%), 60 (60,71%) em que mais da metade dos funcionários afirmou que há acolhimento e auxilio em relação as dificuldades de um novo funcionário, ajuda entre colegas quando se cometem erros e cooperação nas atividades. Também aparecem como pontos a serem verificados pela organização o baixo índice de relações de amizade, a pouca receptividade na chegada de um colega novo e a pouca a b e r t u ra q u e a s p e s s o a s t ê m p a ra conversarem sobre seus problemas com colegas. 112 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 4.1.3 - Controle/Pressão Figura 4: Fator Controle/Pressão 16 14 12 10 8 Figura 4: Fator Controle/Pressão 6 4 2 0 Discordo Totalmente 48 1 49 4 50 1 51 1 52 1 53 1 54 4 Discordo 7 2 1 Não Concordo Nem Discordo 4 8 3 Concordo 10 10 Concordo Totalmente 6 4 55 2 56 1 2 6 3 5 10 2 7 2 3 6 10 16 13 6 8 15 4 7 7 7 5 8 7 7 7 8 que os funcionários indicaram que a empresa exige que as tarefas sejam feitas dentro do prazo previsto, e os horários também são cobrados com rigor. Quanto à questão 56 que foi questionado se na empresa existe uma fiscalização permanente do chefe, pôde-se verificar que há uma divisão de opiniões: 8 pessoas não concordam e nem discordam, 8 pessoas concordam e 8 pessoas concordam totalmente. Aparece como ponto de investigação e atenção da organização o controle exagerado sobre os funcionários, bem como a fiscalização e a necessidade constante da autorização da chefia para qualquer mudança. 4.1.4 - Apoio Da Chefia E Da Organização No fator controle/pressão observa-se que o índice encontrado foi de 3,55, sendo que Siqueira e Martins (2008) afirmam que, neste caso, quanto menor a média, melhor o clima. A análise dos questionários permitiu observar que existe controle significativo sobre as atividades realizadas pelos funcionários, bem como a partir da observação da pesquisadora, verificou-se que o controle de tempo de realização das tarefas e horários também ocorre de forma constante. As questões que abordam esse fator encontram-se da questão 48 a 56, como apresentado no gráfico acima. Podem-se destacar as questões 50 (82,14%), 51 (71,42%) e 53 (78,57%) em Figura 5:Fator Apoio da chefia e da organização 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 1 2 3 Discordo Totalmente 2 0 0 Discordo 5 9 0 4 8 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 1 1 1 0 1 3 0 2 1 0 0 3 1 0 0 3 21 1 3 6 4 6 3 4 7 10 9 8 8 9 2 3 2 8 2 Não Concordo Nem Discordo 5 5 0 7 5 9 5 8 9 8 5 3 16 9 11 8 3 3 4 8 4 Concordo 15 14 20 10 15 9 16 13 14 11 11 11 2 9 9 8 14 16 18 9 15 Concordo Totalmente 1 0 8 3 4 3 2 1 1 2 5 2 0 2 0 0 8 6 4 0 6 Fonte Silva, Winter, 2012. 113 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 No fator apoio da chefia e da organização que aborda aspectos como suporte afetivo, estrutural e operacional, o nível encontrado foi de 3,37, permanecendo dentro do aceitável, porém próximo ao nível ruim. Na sua observação participativa, a pesquisadora obteve dados que corroboram com o resultado desse fator quando trabalhadoras narram fatos nos quais a chefia se mostra pouco flexível a mudanças e a inovações na empresa, já que em outras oportunidades houve outras pesquisas de clima em que elas trouxeram várias sugestões e não obtiveram retorno em relação a essas questões. As questões que abordam esse fator se encontram da questão 1 a 21 como apresentado no gráfico acima. Pode-se destacar as questões 3 (100%) 7(60,71%), 18 (71,42%) e 19 (78,57%) em que os funcionários responderam que recebem orientação do supervisor (ou chefe) para executar as tarefas. As mudanças que ocorrem na empresa são acompanhadas pelos supervisores (ou chefes), como também o chefe ajuda o funcionário quando ele precisa e colabora com a produtividade de seus funcionários. Merece atenção os aspectos que apresentaram índices baixos como: a baixa participação do funcionário nas mudanças, a falta de autonomia dos trabalhadores ao realizarem suas atividades e sugerirem melhorias, bem como a visão em relação à colaboração da chefia na produtividade dos funcionários. 4.1.5 - Recompensa Figura 6: Fator Recompensa 20 15 10 5 0 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 Discordo Totalmente 1 0 2 0 1 4 2 6 1 3 4 1 4 Discordo 7 8 4 7 4 6 7 6 8 10 3 1 0 Não Concordo Nem Discordo 13 13 6 2 3 8 8 12 9 7 6 9 2 Concordo 6 5 11 12 15 7 10 3 9 7 8 14 17 Concordo Totalmente 1 2 5 7 5 3 1 1 1 1 7 3 5 Fonte Silva, Winter, 2012. O fator recompensa apresentou o nível menor de clima, com um nível de 3,21. Este fator apresentou um nível baixo porque boa parte dos respondentes discorda totalmente que a empresa valoriza seu trabalho; demonstrando não se sentirem recompensados, discordando de que a quantidade de trabalho influencia no salário, bem como a quantidade de tarefas e a sua produtividade. As questões que abordam esse fator se encontram da questão 22 a 34, como apresentado no gráfico acima. Podem-se destacar as questões 26 (71,42%), 33 (60,71%) e 34 (78,57%) os funcionários apontaram que sabem por que estão sendo recompensados, concordaram também que a qualidade do trabalho influencia no salário do empregado e responderam que, para premiar o funcionário, a empresa considera a qualidade do que ele produz. Já nas questões 22 (46,42%), 23 (46,42%) e 29 (42,85%) os respondentes não concordam e nem discordam quando perguntados se realizam suas tarefas com satisfação, se o chefe valoriza os funcionários e as recompensas que recebem estão dentro de suas expectativas. A questão 31 apresenta que 10 dos 28 funcionários discordam que o salário dos funcionários depende da qualidade de suas tarefas. Para Chiavenato (2004), a recompensa é a retribuição dada ao funcionário de acordo com o seu trabalho, dedicação e esforço pessoal, através de seus conhecimentos e habilidades; portanto, o funcionário precisa receber essa valorização para sentir-se bem no trabalho, pois a recompensa é fonte de prazer que possibilita ao trabalhador ser reconhecido diante da sociedade. O funcionário, ao entrar em uma empresa, cria expectativas e dedica-se 114 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 esperando ser reconhecido, no momento em que ele não percebe essa valorização, sentindo-se desvalorizado, isto irá influenciar no seu comportamento e satisfação no trabalho. 4.2 - ESCALA DE SATISFAÇÃO NO TRABALHO – EST Através da Escala de Satisfação no Trabalho, foi possível avaliar a percepção dos colaboradores sobre a sua satisfação em relação ao seu trabalho, sendo que os fatores que permitiram essa análise foram: satisfação com os colegas, com o salário, com a chefia, com a natureza do trabalho e com as promoções. Figura 7: Índice de Satisfação no Trabalho ÍNDICE DE SATISFAÇÃO NO TRABALHO 5,00 4,50 4,00 3,50 3,00 2,50 2,00 1,50 1,00 0,50 0,00 SATISFAÇÃO SATISFAÇÃO SATISFAÇÃO SATISFAÇÃO SATISFAÇÃO COM A COM OS COM A COM AS COM O CHEFIA COLEGAS NATUREZA PROMOÇÕES SALÁRIO DE DO TRABALHO TRABALHO ÍNDICE DE SATISFAÇÃO NO TRABALHO 4,67 4,43 4,21 3,33 3,09 Fonte Silva, Winter, 2012. A média geral da escala de satisfação no trabalho apresenta um índice de 3,94; apontando insatisfação em relação ao trabalho. Observa-se que o fator satisfação com a chefia teve o índice maior 4,67; o item satisfação com os colegas de trabalho, com indicador de 4,43; o item satisfação com a natureza do trabalho apresentou um índice de 4,21; o índice satisfação com as promoções teve índice de 3,33 e o índice satisfação com o salário apresentou 3,09 como índice. Segundo Siqueira et al (2008), valores entre 5 e 7 indicam satisfação, valores entre 4 e 4,99 indicam estado de indiferença e valores entre 1 e 3,99 indicam insatisfação. Observa-se que o nível de satisfação dos respondentes se encontra entre os estados de indiferença e insatisfação, mostrando que a maioria não está satisfeita com o seu trabalho, pois nenhum se encontra acima de 5. 4.2.1 - Satisfação Com A Chefia Figura 8: Fator Satisfação com a chefia 20 15 10 5 0 Totalmente Insatisfeito Muito Insatisfeito Insatisfeito Indiferente Satisfeito Muito Satisfeito 2 0 1 4 6 14 2 9 3 0 4 8 11 2 Fonte Silva, Winter, 2012. 115 19 0 0 2 2 17 3 22 3 0 0 4 15 3 25 3 0 1 7 9 0 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 O maior índice encontrado está na satisfação com a chefia, este fator apresentou um índice 4,67 apontando que o colaborador se sente indiferente com a organização e a capacidade profissional do chefe, com o interesse do chefe sobre o que os funcionários estão desenvolvendo e o entendimento entre chefe e funcionário. As questões que abordam esse fator são a 2,9,19,22,25 como apresentado no gráfico acima. Podem-se destacar as questões 2 (60,71%), 19 (85,71%) e 22 (75,00%) em que os funcionários afirmaram que estão satisfeitos com o modo como o chefe organiza o trabalho do setor, com o entendimento entre funcionário e chefe, e com a maneira em que o chefe trata o funcionário. Também merece atenção, devido à baixa satisfação, o item 9 (39,28%) que diz respeito à percepção relativa ao interesse do chefe em relação ao trabalho dos trabalhadores. 4.2.2 - Satisfação Com Os Colegas De Trabalho Figura 9: Fator Satisfação com os colegas de trabalho 20 15 10 5 0 1 6 14 17 24 Totalmente Insatisfeito 1 3 2 1 3 Muito Insatisfeito 0 0 1 1 2 Insatisfeito 3 1 0 3 6 Indiferente 8 5 3 2 7 Satisfeito 15 15 16 16 6 Muito Satisfeito 1 3 5 2 4 Fonte Silva, Winter, 2012. Em relação à satisfação com os colegas de trabalho, o nível encontrado foi de 4,43, destacando-se que a maioria se sente indiferente com a colaboração, com a amizade, com a confiança e com o relacionamento mantido com os colegas de trabalho. As questões que abordam esse fator são 1, 6, 14, 17 e 24 como apresentado no gráfico acima. Podem-se destacar as questões 14 (78,57 %) e 17 (75,00%) em que boa parte dos funcionários respondeu que estão satisfeitos com a maneira de relacionamento entre si e os demais colegas e com a quantidade de amigos que têm entre os seus colegas de trabalho. Quanto à questão 24 aparecem percepções variadas e contrárias em relação à confiança que podem ter em seus colegas de trabalho. 4.2.3 - Satisfação Com A Natureza Do Trabalho Figura 10: Fator Satisfação com a natureza do trabalho 15 10 5 0 7 11 13 18 23 Totalmente Insatisfeito 3 3 2 5 3 Muito Insatisfeito 0 2 0 0 0 Insatisfeito 1 1 1 3 2 Indiferente 3 15 8 8 8 Satisfeito 15 6 12 10 12 Muito Satisfeito 4 1 5 1 3 Fonte Silva, Winter, 2012. 116 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 No fator satisfação com a natureza do trabalho o índice encontrado foi de 4,21, s e n d o c o n s i d e ra d o c o m o í n d i c e d e indiferença em relação com o interesse despertado pelas tarefas, com a capacidade de elas absorverem o trabalhador e com a variedade das mesmas. As questões que abordam esse fator são 7, 11, 13, 18, 23 como apresentado no gráfico anterior. Pode-se destacar as questões 7 (75,00%) que boa parte dos funcionários afirmaram que estão satisfeitos com o interesse que suas tarefas lhe despertam. Já na questão 11 (53,57%), os funcionários estão indiferentes com a capacidade de como o seu trabalho lhe absorve. O aspecto que é investigado na questão 18 e que complementa a questão 11 remete a satisfação em relação à preocupação exigida pelo trabalho, no qual um baixo número de respondentes está satisfeito e os outros se mostraram indiferentes ou insatisfeitos. 4.2.4 - Satisfação Com As Promoções Figura 11: Fator Satisfação com as promoções 12 10 8 6 4 2 0 3 4 10 16 20 Totalmente Insatisfeito 6 4 6 6 6 Muito Insatisfeito 0 2 1 1 3 Insatisfeito 7 7 5 6 6 Indiferente 6 5 12 12 11 Satisfeito 5 9 2 2 2 Muito Satisfeito 2 1 1 1 0 Fonte Silva, Winter, 2012. ficaram com maior índice em que o funcionário se sente indiferente como sua empresa realiza promoções de seu pessoal e com as oportunidades de ser promovido na sua empresa. Já na questão 3 as respostas foram diversas e (25,00%) indica que os colaboradores estão insatisfeitos quanto ao número de vezes em que já foram promovidos na sua empresa, bem como 25% demonstram estar satisfeitas ou muito satisfeitas em relação a esse aspecto. 4.2.5 - Satisfação Com O Salário Em relação à satisfação com as promoções, o índice 3,33 indica que os colaboradores se sentem insatisfeitos em relação ao número de vezes que já receberam promoções, com as garantias oferecidas a quem é promovido, com a maneira de a empresa realizar promoções e com o tempo de espera pela promoção. As questões que abordam esse fator são 3, 4, 10. 16 e 20 como apresentados no gráfico acima. Podem-se destacar as questões 10 (42,85%) e 16 (42,85%) que Figura 12: Fator Satisfação com o salário 14 12 10 8 6 4 2 0 5 8 12 15 21 Totalmente Insatisfeito 5 6 11 5 7 Muito Insatisfeito 2 2 1 0 0 Insatisfeito 8 11 10 11 13 Indiferente 5 4 3 4 5 Satisfeito 8 5 3 7 3 Muito Satisfeito 0 0 0 0 0 Fonte Silva, Winter, 2012. 117 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Quanto à satisfação com o salário, a pesquisa aponta como sendo o aspecto de maior insatisfação na escala, que revela uma média de 3,08 onde os funcionários estão insatisfeitos com o que recebem comparando o salário com o quanto trabalham, com sua capacidade profissional, com o custo de vida e com os esforços feitos na realização do trabalho. As questões que abordam esse fator são 5, 8, 12, 15 e 21 como apresentadas no gráfico acima. Pode-se destacar a questão 21 (46,42%) em que 13 funcionários afirmaram que estão insatisfeitos com seu salário comparado com os esforços que desempenham dentro da organização. A questão 12 (75,00%) aponta que a maioria dos respondentes está insatisfeita e indiferente com o salário que recebem comparados com o custo de vida. Nas demais questões a resposta de insatisfação também aparece de forma significativa. recompensa, e esta apresentou um índice 3,21 considerado nem bom e nem ruim. Na Escala de Satisfação - EST, a satisfação com as promoções apresentou índice de 3,03 e satisfação com o salário obteve índice 3,09. Complementando o item recompensa da escala de clima, a pesquisa aponta que os funcionários estão insatisfeitos com a forma de recompensa usada pela empresa, descontentes com o que recebem como salário comparado ao quanto trabalham. O item coesão entre colegas da escala de Clima Organizacional - ECO com um índice de 3,56 e satisfação com os colegas de trabalho da Escala de Satisfação no Trabalho EST com um indicador de 4,43 apontam um resultado mediano. As pontuações nas escalas que abordam as questões que envolvem união, vínculo, colaboração, amizade e confiança com os colegas de trabalho, aparecem como indiferentes, ou nem bom e nem ruim para os participantes. O aspecto do conforto físico na escala de Clima Organizacional - ECO pesquisou se a empresa oferece segurança e conforto aos empregados e que apresentou o índice 3,67, ficando com a melhor pontuação da escala, porém não aponta que há um conforto físico bom, sendo necessário esse índice estar acima de 4 pontos. O fator controle/pressão na escala de Clima Organizacional - ECO teve como índice 3,55 (acima de 2,9 para ser considerado como um fator positivo), diz respeito de como a empresa e os supervisores controlam e pressionam o comportamento e desempenho dos empregados. Esse índice aponta para um controle significativo quanto ao trabalho, a horários e para atingir as metas. O resultado deste fator traz novamente uma avaliação mediana, nem boa e nem ruim, pelos funcionários quanto ao controle/pressão. Na Escala de Satisfação EST, a satisfação com a natureza do trabalho, definida como o contentamento com o interesse despertado pelas tarefas, com a capacidade de elas absorverem o trabalhador e a variedade das mesmas teve como índice 4,21, informando que existe um estado de indiferença, ou seja, nem satisfeitos, nem insatisfeitos. 4.3 - RELAÇÃO ENTRE CLIMA ORGANIZACIONAL E SATISFAÇÃO NO TRABALHO Observou-se que a escala de clima organizacional apresentou um indicador geral mediano, o que aponta um clima nem bom e nem ruim. Já a escala de satisfação no trabalho apresentou índice geral que remete à insatisfação no trabalho, demonstrando haver uma coerência entre os resultados das escalas aplicadas, ou seja, se os funcionários não estão satisfeitos com o trabalho, o clima de trabalho não é positivo e vice-versa. Na escala de Clima Organizacional ECO encontra-se o item: apoio da chefia e da organização, o qual apresentou índice 3,37, representando um resultado nem positivo e nem ruim quanto ao clima e que pode ser analisado conjuntamente com o item satisfação com a chefia com índice de 4,67 na Escala de Satisfação no Trabalho – EST. Esta dimensão avalia o contentamento com a organização, a capacidade profissional do chefe, o seu interesse pelo trabalho dos subordinados e entendimento entre eles, o qual apresenta um resultado semelhante e complementar, ou seja, grande parte dos funcionários está indiferente ou insatisfeito em relação à chefia. A escala de Clima Organizacional ECO apresenta o item de análise da CONCLUSÃO O presente estudo procurou investigar a 118 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 percepção dos colaboradores em relação ao clima da organização e a sua satisfação no trabalho. Sendo que a coleta de dados trouxe informações relevantes quanto ao nível de satisfação do trabalhador com o trabalho, as percepções dos trabalhadores sobre os indicadores do clima organizacional, as potencialidades e aspectos da organização a serem melhorados. A pesquisa aponta de forma geral que na empresa pesquisada se faz necessária a gestão do clima organizacional, pois esta é uma importante ferramenta gerencial, que possibilita a abertura de um espaço de fala e escuta dos trabalhadores que, por intermédio da sua participação, poderão desenvolver um maior envolvimento com relação ao seu trabalho e ambiente de trabalho. Também auxilia na pró-atividade da gerência, antecipando e solucionando problemas relativos ao contexto do trabalho, prevenindo o surgimento de situações críticas que normalmente influenciam negativamente o fluxo normal de atividade das equipes. Da mesma forma, a satisfação dos trabalhadores em relação ao seu trabalho é fundamental, pois é por meio de um sentimento positivo com o trabalho que os colaboradores terão interesse em se manter na empresa, comprometer-se com a organização, bem como auxiliar a empresa em suas dificuldades e na melhoria produtiva. Como proposta de estratégias de intervenção e melhoria dos aspectos investigados, recomenda-se um trabalho referente à área de gestão de pessoas, melhorando aspectos relacionais entre c o l e g a s , c h e f i a e t ra b a l h a d o r e s , o desenvolvimento de uma política de carreira, cargos e salário, bem como a preparação dos líderes a trabalharem em equipe, desenvolvendo os trabalhadores e permitindo uma maior autonomia em sua atividade. Diante do estudo sobre “Clima Organizacional e Satisfação do Colaborador no Ambiente de Trabalho: um Estudo de Caso em uma Empresa de Confecções” é possível concluir que a presente pesquisa representou um esforço de compreensão dos incontáveis fatores que influenciam o comportamento humano nas organizações, por intermédio da aplicação e análise das escalas. Sugere- se, para futuros estudos nessa organização, um estudo qualitativo com o objetivo de desmembrar cada aspecto medido nessas escalas procurando desenvolver e aprofundar estratégias e ações de melhoria. REFERÊNCIAS BEZERRA, A.M. Qualidade de Vida no Trabalho. Portal da Administração, São Paulo, 17 Jun. 2009. Disponível em : http://w.administradores.com.br. Acesso em: 17 nov. 2012. BOOG, G. G. Manual de treinamento e desenvolvimento: um guia de operações. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2001. CHIAVENATO, I. Gestão de Pessoas: o novo papel dos recursos humanos nas organizações. 3.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. 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Porto Alegre: Artmed, 2008. 119 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 PERCEPÇÃO DOS USUÁRIOS DE UNIDADES BÁSICAS DESAÚDE DA FAMÍLIA SOBRE O PROCESSO TERAPÊUTICO 1 Gabriela Fagundes Trentini Jacinta Spies² 3 Vera Beatriz Pinto Zimmermann Weber 4 SETREM ABSTRACT RESUMO O presente estudo partiu do interesse em investigar sobre o processo terapêutico na percepção dos usuários em duas ESFs, da Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – RS, destacando a relação e a comunicação dos profissionais de saúde para com os usuários e como esta relação interfere no processo terapêutico. Trata-se de um estudo com abordagem qualitativa, do tipo exploratório descritivo. A coleta se deu por meio de uma entrevista com 12 questões abertas acerca do tema proposto. Para a análise dos dados recorreu-se à técnica de análise de conteúdo, proposta por Gomes (2004). Alguns dos principais autores que deram fidedignidade ao trabalho foram: Pessini; Bertachini (2004); Vasconcelos (2009); Schimith; Lima (2004); Rizzoto (2002) e Solla (2005). Participaram da coleta 25 usuários do serviço público de saúde. Através da análise dos dados coletados evidenciou-se que alguns usuários, participantes da pesquisa revelaram em suas falas que o atendimento médico muitas vezes deixa a desejar, mais especificamente no que se refere ao diálogo, acolhimento e vínculo. Por outro lado, percebeu-se satisfação na totalidade dos participantes quanto ao atendimento dispensado pelos profissionais de Enfermagem e Odontólogos. Quanto ao atendimento geral dos demais profissionais, alguns participantes se manifestaram satisfeitos; outros citaram a demora no atendimento, criticando as filas e as poucas fichas de atendimento dos diferentes profissionais disponíveis ao público. Outros ainda mencionaram a falta de empatia no atendimento, o estresse e a indiferença dos funcionários do fichário para com o público. Dentre os usuários participantes, raros souberam mencionar as atividades que o Enfermeiro realiza dentro da ESF, demonstrando na maioria das falas que veem o trabalho do Enfermeiro como um subsídio ao trabalho do Médico dentro das Unidades Básicas de Saúde da Família. Almeja-se que este estudo auxilie no processo terapêutico que envolve a equipe multiprofissional, fortalecendo os vínculos existentes entre equipe e usuários do Serviço Público de Saúde acerca da real necessidade para o desenvolvimento de uma assistência qualificada. This study was based on the interest in investigating the therapeutic process as perceived by users in two ESFs, the Northwest Region of the State of Rio Grande do Sul - RS, highlighting the relationship and communication with health professionals to users and how this relationship interferes in the therapeutic process. This is a study of qualitative approach, of exploratory and descriptive type. The collection was made by an interview with opened questions about the proposed theme. For data analysis the technique of subject analysis was used, proposed by Gomes . Some of the authors who gave trust to work were: Pessini; Bertachini ; Vasconcelos ; Schimith; Lima ; Rizzoto and Sola . users participated in the collection of public health. Through the analysis of the data collected it was showed that some users, research participants revealed in their speeches that health care often leaves something to be desired, specifically with regard to dialogue, acceptance and bond. Furthermore it was realized the full satisfaction of the participants regarding the care dispensed by Nursing Professionals and Dentists. As for the general care of other professionals, some par ticipants expressed satisfaction; others cited the delay in treatment, criticizing the queues and the few healthcare records of different professionals available to the public. Others mentioned the lack of empathy in care, stress and indifference of officials of the reception to the public. Among the participating users, just a few of them mention the activities that the nurse performs within the ESF. They think the nurse s work is only a help for the doctors within the Medical Basic Health Units of the Family. A goal of this study is to help in the therapeutic process that involves a multidisciplinary team, strengthening the links between users and staff of the Public Health Service about the real need for the development of a qualified assistance. Keywords: User. Health professionals. Communication. Palavras-chave: Usuário. Profissionais de saúde. Comunicação. 1 Acadêmica de Enfermagem – [email protected] Professora Co -orientadora- [email protected] om.br 3 Professora Orientadora - [email protected] 4 Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM, Av. Santa Rosa, 2405; Três de Maio - RS, [email protected] 2 120 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO O processo terapêutico, bem como a comunicação entre profissionais de saúde e usuários, tem como finalidade identificar e atender as necessidades de saúde do usuário e contribuir para melhorar a prática do serviço dos profissionais desta área, possibilitando também, despertar-lhes sentimentos de confiança, para que se sintam satisfeitos e seguros. Assim, o objetivo deste estudo consistiu em analisar a percepção dos usuários do serviço de saúde em relação à assistência dispensada pela equipe de profissionais de ESF. A comunicação é um processo pelo qual a equipe de profissionais oferece e recebe informações do indivíduo cliente/paciente¹ para planejar, executar, avaliar e participar com os demais membros da equipe de saúde, da assistência prestada no processo saúde/doença. Entretanto, nessa relação, existem influências como a cultura, a visão pessoal, as crenças, entre outros, que podem interferir de forma positiva ou negativa no processo terapêutico. O vínculo e a comunicação são fatores que proporcionam segurança, tanto para o cuidador, quanto para quem é beneficiado através do cuidado. Essa relação, quando franca e aberta, os auxilia a enfrentarem momentos de incerteza e ansiedade durante a realização de cuidados.¹ desenvolvido dentro dos parâmetros da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) do Ministério da Saúde (MS), que preconiza os padrões éticos, conforme as normas e diretrizes regulamentadoras de uma pesquisa envolvendo seres humanos (BRASIL, 1996). O projeto de pesquisa obteve parecer favorável do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) de uma Instituição de Ensino Superior (IES) da região. Para a escolha da população a ser pesquisada seguiu-se o modelo de amostragem definida pelo princípio da intencionalidade ou propositalidade. Como critérios de inclusão para participar desta pesquisa foram considerados os usuários de duas ESFs, de um município da Região Noroeste do RS, nas respectivas ESFs. Para participar da pesquisa foi necessário que o sujeito fosse maior de 18 anos, de ambos os sexos, que receberam atendimento na data e horário da coleta de dados e que consentiram participar da pesquisa. Nesta pesquisa a amostragem seguiu o critério da saturação de dados, sendo que uma categoria é considerada saturada quando parece não surgir nenhuma nova informação durante a codificação, ou seja, quando não se vê novas propriedades, dimensões, condições, ações/interações ou consequências nos dados (STRAUSS; CORBIN, 2008). Os sujeitos participantes da pesquisa receberam um Termo de Consentimento e Livre Esclarecido (TCLE), que foi assinado em duas vias, pelos que aceitaram participar do estudo, sendo uma via destinada ao entrevistado e outra, à autora do estudo. Para preservar a identidade dos sujeitos pesquisados, estes foram identificados no interior da pesquisa pelo termo “participante” (P), seguido de um numeral cardinal, de acordo com a sequência da aplicação das entrevistas e do ano da realização da pesquisa. Foi encaminhado ao Secretário Municipal da Saúde do respectivo município um pedido, solicitando autorização para realizar a coleta dos dados necessários nas duas ESFs, para análise e discussão posterior. Para analisar e interpretar as informações coletadas foi utilizado o método 2. MATERIAIS E MÉTODOS A pesquisa é de caráter qualitativo, do tipo exploratório descritivo, que refletiu sobre a percepção dos usuários do serviço público de saúde que foram submetidos a algum tipo de atendimento Médico, de Enfermagem e Odontológico, sobre o processo terapêutico em duas ESFs, situada na Região Noroeste do estado do Rio Grande do Sul – RS, abordando-os ao final do atendimento. O método adotado para coletar os dados que fundamentaram a pesquisa, foi através de uma entrevista, baseada em um roteiro previamente estruturado, com 12 questões abertas sobre a temática em questão. Cabe salientar que este estudo foi ¹ Salienta-se que, neste estudo, as palavras cliente, paciente e usuário têm o mesmo significado. 121 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 de análise de conteúdo, proposto por Minayo (2004), que tem por finalidade encontrar respostas para as questões formuladas e também confirmar ou não as hipóteses elencadas antes do trabalho de investigação. Salienta-se que a análise dos dados não foi separada porESFs, mas sim pelas falas dos entrevistados. comunicação está presente em todos os momentos e em todas as atividades. Existe a comunicação verbal e a não verbal. Para Souza (2006), a comunicação verbal é aquela que se refere às palavras faladas ou escritas. Já a comunicação não verbal se refere àquela que inclui gestos, silêncio, expressões faciais, postura corporal e até os objetos e adornos de uso pessoal. A comunicação franca e aberta auxilia qualquer pessoa, usuária ou não dos serviços de saúde, a enfrentar momentos de incerteza e ansiedade durante a superação de alguma doença ou não. Para Souza (2005), as estratégias que os profissionais de saúde adotam, mesmo que inconscientemente, podem afetar significativamente o quadro do paciente, seu estado geral e sua adesão ao tratamento. 3.3 O estabelecimento de vínculos Schimith; Lima (2004) comenta que o vínculo pode ser identificado no encontro do trabalhador com o usuário durante o trabalho em ação que está em processo de construção. Durante o trabalho, o profissional pode ser criativo e autônomo quanto aos instrumentos e a sua disposição, dentro de um objetivo que se pretende atingir. O mesmo afirma que Campos (1997) apud Schimidt; Lima (2004): 3.O PROCESSO TERAPÊUTICO E A INTERAÇÃO COM O USUÁRIO 3.1 O processo terapêutico Segundo Pessini; Bertachini (2004), a relação terapêutica é estabelecida entre uma pessoa que sofre, buscando um auxílio em alguém que supostamente pode aliviá-la. Ela pressupõe o tratamento de uma disfunção, de um distúrbio, com vistas ao restabelecimento de um estado anterior, considerado mais equilibrado. Faz parte do processo terapêutico o aprimoramento das relações humanas, algo essencial para a produção da saúde. É preciso existir interação com a comunidade para que o profissional também seja acolhido, pois esse acolhimento garante a resolubilidade do problema do usuário, que é o objetivo final do trabalho terapêutico (VASCONCELOS, 2009). A capacidade de escutar o usuário deve ser considerada elemento fundamental na trajetória do processo terapêutico. Pois assim, fica evidente ao usuário que o profissional que está atendendo se preocupa com ele, com sua família e com a comunidade com a qual se relaciona, gerando bons resultados para o trabalho terapêutico. 3.2 A comunicação no processo terapêutico Através da comunicação que, se estabelecida com o usuário dos serviços de saúde, é possível perceber sua visão de mundo, ou seja, seu modo de pensar, sentir ou agir. Apenas assim podem-se identificar os problemas sentidos por ele, e então tentar ajudá-lo a manter ou recuperar a saúde. O atendimento das necessidades humanas depende, em várias circunstâncias, do processo de comunicação que ocorre entre ambos. Para Kurcgant, et al. (1991), sem comunicação não existe trabalho, não existe relacionamento humano e, portanto, não há g r u p o, o r g a n i z a ç ã o e s o c i e d a d e . A o vínculo com os usuários do serviço de saúde amplia a eficácia das ações de saúde e favorece a participação do usuário durante a prestação do serviço. Esse espaço deve ser utilizado para a construção de sujeitos autônomos, tanto profissionais quanto pacientes, pois não há criação de vínculo sem que o usuário seja reconhecido na condição de sujeito que fala, julga e deseja (p. 1.488). Rizzoto (2002) afirma que, no âmbito da saúde, criar vínculos requer o estabelecimento de relações próximas e claras, de forma que o sofrimento do outro seja sensibilizador. Visa estabelecer processo que busca a autonomia do paciente, bem como o compartilhamento da responsabilidade por sua vida ou morte. 122 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 O profissional da área da saúde deve vincular-se ao usuário, para lhe transmitir todas as informações possíveis, tanto no d i a g n ó s t i c o, c o m o c o m p r e e n d e r a s peculiaridades de sua deficiência. Seguindo tal recomendação, poderá ocorrer melhor aceitação e adesão do usuário à terapia a ser implementada. Desta maneira, o usuário deposita confiança na relação com o profissional, além de sentir-se aceito e próximo dos que se responsabilizaram pelo seu bem-estar. As relações de vínculo em muito podem cooperar para o processo de adesão terapêutica do paciente, uma vez que este passa a entender a significância de seu tratamento, a confiar nas orientações e nas recomendações prescritas pelos profissionais que o atendem. 3.4 A equipe da ESF no processo terapêutico Segundo Silva (2011), em 1994, a ESF foi implementada como uma estratégia de reorganização do Sistema Único de Saúde (SUS) e implantação de seus princípios de universalização, equidade, integralidade, descentralização, hierarquização e participação da comunidade. Sendo assim, o mesmo afirma que “a equipe de ESF precisa estabelecer uma relação de parceria, confiança, comunicação regular e transparência, bem como cooperação para atender as necessidades da família” (p.1.251). A equipe da ESF deve trabalhar com a clientela, enfocando na família o estabelecimento de vínculos por meio da equipe multiprofissional. A equipe básica ou nuclear preconizada pela ESF é composta por um Médico generalista, um Enfermeiro, dois Técnico-Auxiliares de Enfermagem e cinco ou seis Agentes Comunitários de Saúde. Dependendo do município, conta também com o apoio de profissionais da equipe de saúde bucal, saúde mental e de reabilitação (MARQUI, 2010). 3.5 Atuações do Enfermeiro/a no processo terapêutico A ESF tem o/a Enfermeiro/a como um importante membro da equipe multidisciplinar, o que representa um campo de crescimento e de reconhecimento social deste profissional. O/A Enfermeiro/a tem o dever de executar suas práticas assistenciais com integralidade, percebendo o usuário como um todo, exercendo seu trabalho de forma humanizada e colaborativa. Por meio da consulta de Enfermagem que o usuário entra em contato com o/a Enfermeiro/a e tem a oportunidade de mencionar todas as queixas sobre o problema q u e e s t á l h e a g o n i a n d o. A s v i s i t a s domiciliárias fazem parte da prática do/a Enfermeiro/a, a qual é utilizada pelas equipes como forma de conhecer as condições de vida e saúde da população. É a partir do conhecimento da realidade em que vivem as famílias que as atividades da ESF são planejadas (BICCA; TAVARES, 2006). As mesmas autoras comentam sobre a prática de educação em saúde como uma técnica que tem muito valor, pois, através dessa atividade, informações sobre o processo saúde/doença são repassadas às famílias como forma de despertar a consciência para uma vida mais saudável, sendo esta uma atividade também mencionada pelo/a Enfermeiro/a. 3.6 Atuação do usuário na ESF Todo usuário do serviço de saúde tem direito a atendimento humano, atencioso e respeitoso por parte dos profissionais da saúde. Conforme Franco; Júnior (2004) a ESF tem responsabilidades sobre o cuidado. É ela que deve ser gestora do projeto terapêutico, garantindo o acesso aos outros níveis de assistência, assim como a “contratransferência” para que o vínculo continue com a equipe básica, que tem a missão de dar continuidade aos cuidados ao usuário. B ra s i l ( 2 0 0 6 ) a p r e s e n t a s e i s princípios básicos da cidadania, os quais, juntos, garantem ao usuário o direito de acesso no sistema de saúde. São eles: a) todo cidadão tem direito ao acesso ordenado e organizado aos sistemas de saúde; b) todo cidadão tem direito a tratamento adequado e efetivo para seu problema; c) todo cidadão tem direito ao atendimento humanizado, acolhedor e livre de qualquer discriminação; d) todo cidadão tem direito ao atendimento que respeite a sua pessoa, seus 123 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 valores e seus direitos; e) todo cidadão também tem responsabilidades para que seu tratamento aconteça da forma adequada; f) todo cidadão tem direito ao comprometimento dos gestores da saúde para que os princípios anteriores sejam cumpridos. participante procurou o atendimento por lesão no pé. Anversa; B astos; et al (2012) comentam que estudos realizados no Brasil revelaram que mulheres com menor renda familiar, menor escolaridade e não brancas são as que ingressam tardiamente no prénatal e, quando o realizam, este é o de mais baixa qualidade, revelando iniquidades sociais presentes na assistência. Em relação ao primeiro contato com equipe e acolhimento ao chegar à unidade, percebeu-se que 18 participantes, representando a maioria, declararam ser bem recebidos na unidade, evidenciado através da fala de P6 (2012): “Fui bem acolhida, sempre muito queridos e atenciosos com a gente”. Já através da fala de alguns participantes verificaram-se queixas, assim verbalizada na fala de P.5 (2012): “Não tem muito olho no olho”. P18 (2012) comenta: “Poderia ser melhor; às vezes parece que ficam com raiva quando a gente chega ao fichário”. Ve r i f i c a - s e q u e o a c o l h i m e n t o encontra dificuldades na apreensão de seus conceitos por parte dos trabalhadores em saúde, existindo diferenças na recepção com os usuários nas ESFs, embora a grande maioria tenha referido pontos positivos, há comentários relevantes do restante dos participantes. Solla, (2005), aponta que o acolhimento significa a humanização do atendimento, o que pressupõe a garantia de acesso a todas as pessoas. Diz respeito ainda à escuta de problemas de saúde do usuário, de forma qualificada, dando-lhe sempre uma resposta positiva. Para o mesmo autor, trabalhar o acolhimento pressupõe postura e uma atitude da equipe de saúde que permita receber bem os usuários e escutar de forma adequada e humanizada as suas demandas, inclusive solidarizando-se com o seu sofrimento. Dessa maneira, é possível construir relações de confiança e de apoio entre trabalhadores e usuários. A seguir, no quadro abaixo, é representada a frequência com que os usuários entrevistados utilizam a Unidade Básica de Saúde. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES O questionário foi aplicado a 25 usuários oriundos de duas ESFs de um município da região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. É importante salientar que a análise não será feita separadamente por cada ESF, mas serão consideradas as falas dos 25 sujeitos de pesquisa. Ao analisar os dados de caracterização dos sujeitos participantes, observa-se que a maioria é do sexo feminino. Quando verificada a faixa etária dos participantes, esta variou entre 18 e 72 anos, sendo a maioria entre 20 e 54 anos, e apenas a minoria entre a faixa dos 52 e 72 anos. Quanto à escolaridade dos participantes nas ESFs em questão, constatou-se que, dos 25 pesquisados, apenas 4 haviam concluído o Ensino Fundamental e 4 o Ensino Médio. Os demais informaram não ter concluído nenhuma destas etapas de escolaridade. Observando os profissionais que p r e s t a ra m a t e n d i m e n t o a o u s u á r i o, participante da pesquisa, pôde-se perceber que a maioria dos atendimentos realizados foi do profissional Enfermeiro (12), seguido pelos atendimentos médicos (10) e por último o atendimento Odontológico, com menor procura, pois apenas (3) usuários entrevistados tinham sido submetidos ao atendimento odontológico. A seguir se analisou o motivo que levou os usuários a procurarem atendimento na ESF. Constatou-se que a maioria, ou seja, 6 participantes haviam sido submetidas a consultas de pré-natal. Outros 3 usuários procuraram atendimento odontológico; 4 para realização de exame Papanicolau; 4 por inflamação das vias aeras superiores; 3 por processo alérgico e náuseas; 4 para apresentar exames e requerer outros; e um 124 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 PARTICIPANTES FREQUÊNCIA COM QUE UTILIZA A UNIDADE Toda semana P1; P2; P3; P4. P5; P11; P19; P24. Cada 2 ou 3 meses P6; P7; P14; P17. Cada mês P8; P9; P10; P12; P13; P15; P16; De 2 a 3 vezes por ano P18; P20; P21; P22; P23; P25. Fonte: Trentini; Weber;Spies, 2012. Observa-se que as pessoas mais jovens reclamaram mais da assistência prestada pelo atendimento médico, enquanto a maioria com idade mais elevada considera o atendimento bom. Percebe-se que as pessoas mais jovens sentem maior liberdade para expor o que sentem, sendo que as pessoas com mais idade, parece sentirem-se mais acanhadas para falarem o que pensam. Cabe salientar que as falas queixosas pelo atendimento médico foram registradas em apenas uma das ESFs, evidenciando que em uma das unidades o atendimento médico é mais humanizado do que na outra unidade. É fundamental que o médico valide a história do paciente, é importante dar atenção à história dele, isso irá contribuir para a interação e pode ajudar no diagnóstico, com a construção conjunta da doença e do seu tratamento. Através desse quadro, é possível perceber que os usuários são assíduos em suas visitas ao ESF, visto que algumas frequentam a unidade todas as semanas, lembrando que essas usuárias são as gestantes em fase final de pré-natal. Destacando, ainda, que essa frequência foi constatada somente em uma das unidades. Já a grande maioria dos sujeitos entrevistados revela que usam a ESF em torno de 2 ou 3 vezes por ano. Destes, grande parcela demonstrou que apenas procuram atendimento quando realmente necessitam e que não se sentem confortáveis em ambientes como Postos de saúde e hospitais. 3.1 AVALIAÇÃO DO ATENDIMENTO DOS PROFISSIONAIS 3.1.1 Profissional Médico A maioria dos participantes atendidos pelo profissional médico relata considerar o desempenho do atendimento m é d i c o c o m o b o m , c o n s i d e ra n d o o profissional competente em sua profissão, P1 (2012) diz: “Me atendeu super bem, ele é bastante competente no que faz”. Já os demais declaram que o atendimento médico deixou a desejar o que pode ser evidenciado nas falas do P5 (2012) quando diz: “o Médico interagiu pouco comigo, não explicou bem minhas dúvidas, acabei saindo de lá mais assustada do que quando cheguei”; Já o P11 (2012) comenta que: “Sequer olhou na minha cara, me deixou com várias dúvidas e não explicou bem o que eu perguntei”. 3.1.2 Profissional Enfermeiro/a Analisando as respostas, constata-se que todos os usuários participantes da pesquisa que foram submetidos a atendimentos de enfermagem, relatam estar satisfeitos com o atendimento deste profissional. Isso pode ser identificado na fala da participante p8 (2012): “a enfermeira me atendeu super bem, se mostrou bastante preocupada comigo, conversou bastante e me orientou”. Essas afirmações vêm de encontro 125 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Os relatos de queixas dos usuários a respeito do diálogo durante o atendimento médico demostram apreensão, como se verifica nestas falas de P5(2012): “Não houve diálogo, apenas recebi as respostas das minhas perguntas com “sim” e “não”. P11 (2012): “Teve muito pouco diálogo, porque ela igual não deu muita bola pra mim e pro meu problema”. Talvez, devida à sobrecarga e ao estresse que o profissional enfrenta dentro do seu trabalho, pode não apresentar uma comunicação satisfatória com as pessoas submetidas aos seus cuidados, passando assim a tratá-los como se fossem objetos e não sujeitos, esquecendo-se da humanização que obrigatoriamente deveriam possuir, pelo fato de estarem trabalhando com pessoas possuidoras de sentimentos e opiniões próprias. Cabe lembrar que na comunicação existem barreiras que tornam ineficiente o processo comunicativo, tais como, a falta de capacidade de concentração, a pressuposição de entendimento, a ausência de significação comum, a influência de mecanismos inconscientes e as limitações do emissor/receptor (SILVA, 2002). Assim como alguns participantes desqualificaram o atendimento recebido pelo médico, outros o elogiaram, sentindo-se satisfeitos com o diálogo e vínculo criados durante os atendimentos de Enfermagem e Odontológicos. Isto pode ser constatado em algumas das falas dos usuários participantes da pesquisa, P12 (2012), a usuária submetida ao atendimento médico: “Conversamos bastante, a doutora explicou tudo o que eu queria saber”; P17 (2012): “A conversa foi boa, me tratou bem, e sempre faz uma brincadeira comigo pra descontrair”. Sobre o atendimento Odontológico e de Enfermagem, as declarações dos usuários foram semelhantes. Conforme P18 (2012), usuária atendida pela Enfermeira, assim se manifesta em relação ao atendimento recebido: “[...] Nossa, foi muito bom, conversou bastante comigo, queria saber como eu estava, e ainda lembrava-se de mim da outra vez que com as afirmações de costa (200?), que fala que o atendimento não deve ser fragmentado durante o tempo em que o enfermeiro está de serviço. A totalidade dos cuidados deve ser prestada pela enfermeira afeta ao doente, embora não possa ser coordenado de um turno para o outro, ou de um dia para o outro, por ocorrerem alterações nas designações das tarefas e porque o número de doentes atendidos por um enfermeiro pode variar. 3.1.3 Profissional em Odontologia Nos relatos dos participantes verificou-se satisfação a respeito do desempenho do profissional, os informantes declararam terem tido um atendimento respeitoso e atencioso. P6 (2012): “Me atendeu muito bem, sempre muito atenciosa e dedicada”. Relatos importantes foram averiguados, como no caso da fala de P9 (2012): “Eu gosto do jeito que ela atende, porque sempre explica tudo antes de algum procedimento”. Frente às falas dos participantes apresentadas, pode-se perceber que os usuários reconhecem o trabalho odontológico e sentem-se satisfeitos com ele. Verifica-se, então, que nas ESFs ocorre atendimento humanizado sobre a odontologia. Emmi; Barroso (2008), afirmam que a saúde bucal é parte integrante e inseparável da saúde geral do indivíduo e está diretamente relacionada às condições de alimentação, moradia, trabalho, renda, transporte, lazer, acesso aos serviços de saúde e à informação. 3.1.4 Diálogo e formação de vínculo entre profissional e usuário A seguir são apresentados os comentários dos usuários acerca do diálogo durante a consulta atendimento. Frente às falas dos participantes pode-se constatar que apenas no atendimento médico há queixas a respeito do diálogo durante a consulta, identificando que os mesmos usuários que expuseram queixas sobre o desempenho do profissional, relataram também o diálogo como insuficiente e pouco esclarecedor, lembrando que estas queixas surgiram em apenas uma das ESFs pesquisadas. 126 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 consultei; ela explica tudo, não quer que eu fique com nenhuma dúvida” (P18; 2012). O participante P6 (2012), submetido ao atendimento odontológico, comenta que: “O diálogo foi bom, porque durante ele, ela esclareceu as minhas dúvidas, e ela sempre explica o que vai fazer e o que eu vou sentir antes de algum procedimento”. Com ênfase na humanização em saúde, ambos, profissional e paciente, se beneficiariam, pois tanto o profissional torna o seu trabalho mais prazeroso e gratificante, quando o paciente obtém mais segurança em ter por cuidador alguém que possa confiar em sua experiência de dor devido à doença. Lucena; Goes (1999) comentam que tudo que acontece com o paciente deve ser levado em conta, a comunicação é essencial, principalmente nos casos em que o paciente está mais vulnerável, para que seja possível tê-lo como aliado do seu tratamento. Segundo Cecílio (1994), o vínculo é algo que reflete na responsabilidade e no compromisso que a equipe tem com cada usuário da sua área de abrangência e com os tipos de problemas que eles apresentam, implica em ter relações tão próximas e tão claras que sensibilizam o sofrimento do outro. É sentir-se responsável pela vida do paciente. É ter relação e integrar-se com a comunidade em seu território, no serviço, no consultório, nos grupos e tornar-se referência para o usuário, individual ou coletiva. saúde está ligado às condições de vida, nutrição, habitação, poder aquisitivo e educação, englobando a acessibilidade aos serviços, abrangendo também o aspecto econômico, relativo aos gastos diretos ou indiretos do usuário com o serviço. Conforme a fala dos informantes, observa-se a falta de reconhecimento técnico sobre a perspectiva do usuário quando se aborda sobre a qualidade de serviços de saúde, pois os usuários participantes mencionaram a necessidade de haver mais fichas a disposição, já que a população é relativamente grande nas ESFs. Dessa maneira, as pessoas acabam por buscar as emergências e o problema da superlotação seguirá existindo. As informações dos participantes vêm de encontro a Franco; Magalhães Júnior (2004), quando mencionam que a integralidade começa pela organização dos processos de trabalho na atenção básica, em que a assistência deve ser multiprofissional, operando através de diretrizes como a do acolhimento e da vinculação de clientela, na qual a equipe se responsabiliza pelo seu cuidado. Já outros participantes entrevistados relatam estarem satisfeitos com a a s s i s t ê n c i a , t a l ve z p o r s e s e n t i re m constrangidos ou inseguros de exporem suas manifestações; participante P6 (2012): “Não tenho queixas, todos me tratam bem, são bem atenciosos”. Outro participante ressalta: “Por parte dos outros que trabalham aqui, acho a assistência boa” (P11; 2012). A integralidade de atenção à saúde deve ser vista sob o aspecto não apenas de organização dos recursos disponíveis, mas especialmente do fluxo do usuário para o acesso aos mesmos. Para garantir a integralidade, é necessário operar mudanças na produção do cuidado, a partir da rede básica, secundária, atenção à urgência e todos os outros níveis assistenciais (FRANCO; MAGALHÃES JÚNIOR, 2004). 3.2 SOBRE A ASSISTÊNCIA DAS ESFs Os participantes relatam sobre a assistência prestada pelos demais profissionais das ESFs.O que chama a atenção nos depoimentos é o fato de que a maioria dos participantes que declararam algum tipo de queixa, ao se expressarem insatisfeitos por motivos de longa espera e por ter poucas fichas para consultas, evidenciando em suas falas, “[...] perdemos muito tempo na fila esperando para conseguir uma ficha, e aí quando 'vê' elas já acabaram, e o tempo que esperamos foi de 'varde' ” (P3; 2012). Outro informante relata: “Podiam abrir mais fichas” (P16; 2012). Frente às afirmações Ramos; Lima (2003), os quais mencionam que o acesso à 3.3 PERCEPÇÕES SOBRE O TRABALHO DO ENFERMEIRO/A A seguir são expostas as declarações dos participantes da pesquisa, expressando suas percepções sobre o trabalho do Enfermeiro/a na equipe das ESFs. Analisando as respostas dos entrevistados no 127 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 PARTICIPANTES PERCEPÇÃO DOSPARTICIPANTES P1; P4; P7; P13; P14; P16; P17; P21. “Dá uma boa assistência, pois quando o médico falta, a Enfermeira nos atende.” P2; P6; P10; P12; P23; P25. “Faz um bom trabalho.” P3; P5; P8; P18; P20. “[...] É o profissional que mais se comunica com a população.” P9; P11; P15; P19; P22; P24. “[...] Identifica os casos graves e encaminha ao médico.” Fonte: Trentini; Weber;Spies, 2012. saúde comunitários. A enfermagem tem a possibilidade de operar, de forma criativa e autônoma, nos diferentes níveis de atenção à saúde, seja através da educação em saúde, seja na promoção ou na reabilitação da saúde dos indivíduos. Logo, o participante P5 (2012) faz uma distinção entre os demais profissionais que os atendem, verbalizando assim sua percepção: “A Enfermeira é quem faz a diferença, porque é a profissional que mais se conversa com a população e a que explica melhor que os outros profissionais”. A comunicação no relacionamento entre usuário e profissional de enfermagem é um instrumento básico na construção de estratégias que anseiam um cuidado humanizado. Para Morais; Costa; et al (2009), a comunicação em enfermagem vem exercendo um importante papel no que tange a um cuidado competente humanitário. Deve atingir um sentido mais amplo que privilegie o paciente por meio de um relacionamento terapêutico, entendido como um processo interativo e personalizado, envolvendo afinidade e compreensão. Os demais participantes da pesquisa demonstram entrosamento com o trabalho quadro anterior, percebe-se, assim, que esta maioria vê o trabalho do Enfermeiro/a como sendo um subsídio ao trabalho do Médico. É pertinente que a equipe da enfermagem realize um trabalho diferenciado para ser notado tanto na presença como na ausência do profissional médico e não somente na sua ausência como manifestado na fala. Mesmo pouco conhecida pelos usuários, Fernandes et al (2010), comenta que a enfermagem é uma das categorias da saúde mais mobilizadas para o gerenciamento das unidades básicas de saúde e cabe a essa o compromisso, junto aos demais profissionais, da viabilização do SUS, incentivando a participação da equipe na organização e produção de serviços de saúde para atender às reais necessidades dos usuários, trabalhadores e instituição. Já outros participantes consideram que a Enfermeira faz um bom trabalho dentro da equipe das ESFs, porém não sabem identificar exatamente as atividades da Enfermeira dentro das ESFs. Backes; Backes; et al (2012), comentam as evidências internacionais que acenam para a importância do papel profissional do enfermeiro na saúde coletiva, tanto no ambiente domiciliar quanto no ambiente comunitário ou nos centros de 128 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 da Enfermeira dentro das ESFs. Através desta percepção nota-se o entendimento dos usuários a respeito do serviço de enfermagem das ESFs. Compreende-se que assim o trabalho do Enfermeiro/a na saúde coletiva está tendo uma maior visibilidade. Backes; Backes; et al (2012) articulam que o papel do Enfermeiro/a é reconhecido, em suma, pela capacidade e habilidade de compreender o ser humano como um todo, pela integralidade da assistência à saúde, pela capacidade de acolher e identificar-se com as necessidades e expectativas dos indivíduos e famílias, pela capacidade de promover a interação e a associação entre os usuários e a comunidade. A participante P5 (2012) verbaliza assim: “Sim eu retornaria, porque aqui é o postinho mais perto da minha casa e gosto do atendimento”. Já P9 (2012): “Se eu tivesse outra opção, eu não viria mais aqui”. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo desta pesquisa observouse, nos diversos relatos, que há diferenças de atendimento por parte dos profissionais com os clientes/usuários dos serviços públicos de saúde. O estudo possibilitou interagir com inúmeras informações fornecidas pelos sujeitos participantes, o que possibilitou um olhar diferenciado sobre a atuação dos profissionais que atuam nas ESFs. Averiguou-se, através das falas dos participantes, que o atendimento Médico foi o único que demonstrou queixas no que se refere ao diálogo, acolhimento e vínculo. Em virtude da grande satisfação demostrada pelo atendimento da Enfermeira, mesmo existindo carência e conhecimento a respeito das atividades que a Enfermeira realiza dentro da equipe das ESFs. Quanto às hipóteses elencadas no início deste trabalho, pode-se afirmar que foram confirmadas, pois se concluiu que a maioria dos usuários das Unidades Básicas de Saúde, dá valor à atenção e às informações que lhes são prestadas pelo profissional de saúde, apesar de que estes nem sempre são bem acolhidos e esclarecidos sobre suas dúvidas e angústias. Ao finalizar esta pesquisa, pode-se afirmar que os objetivos propostos foram alcançados, dando a oportunidade aos usuários dos serviços públicos de saúde de expressarem seus sentimentos e suas percepções a respeito da temática. Vale ressaltar que ficam comprovados pontos importantes para a pesquisadora no que se refere à produção do conhecimento sobre o tema da pesquisa, bem como o crescimento pessoal/acadêmico e experiências vivenciadas pela autora no decorrer da produção do trabalho. Diante de tudo que foi exposto, conclui-se que a comunicação é essencial para todos os momentos da nossa existência e especialmente para o estabelecimento do relacionamento interpessoal profissionalusuário. 3.4 CONCLUSÕES DOS USUÁRIOS SOBRE AS ESFS Os participantes relataram em relação ao esclarecimento do profissional que lhe atendeu a respeito de sua doença/problema, dos cuidados com o tratamento e medicamentos. Percebeu-se nas falas dos participantes que a maioria considerou que foi bem esclarecido durante a consulta/atendimento, como se pode constatar na fala de P2 (2012): “Sim, fui esclarecida”. Já na fala de P11 pode ser percebido que o mesmo não foi devidamente esclarecido sobre tais cuidados, “Fui pouco esclarecida, sobre a doença e o tratamento” (P11; 2012). Em seguida, os participantes relataram se consideram a busca pelo atendimento resolvido, e significativamente todos os participantes declararam que foi sim resolvida. Destacando que apenas um participante relatou: “hoje sim, mas nem sempre é”(P14; 2012). Neste momento, a terminologia utilizada pelo profissional, suas habilidades pessoais de simpatia, compreensão, ouvir com atenção, transmitir respeito e prover esperança são condições importantes para o entendimento do usuário a respeito do que ele deve saber. A seguir, os participantes foram questionados se retornariam a esta Unidade de Saúde. Frente aos relatos, percebe-se que a grande maioria retornaria à Unidade de Saúde. Outros apenas 4 relatam que não re t o r n a r i a m p o rq u e c o n s i d e ra ra m o atendimento insuficiente, ou comentam que se tivessem outra opção de Unidade de Saúde que fosse de fácil acesso, não retornariam a esta mesma. 129 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 REFERÊNCIAS ANVERSA, E. T.; BASTOS, G. A.; NUNES, L. N.; PIZZOL, T. S. Qualidade do processo da assistência pré-natal: unidades básicas de saúde e unidades de estratégia de saúde da família em um município do sul do Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 28(4): 789-800, abr, 2012. BACKES, D. S.; BACKES, M. S.; ERDMANN A. L.; BÜSCHER, A. O papel profissional do enfermeiro no Sistema Único de Saúde: da saúde comunitária à estratégia de saúde da família. Ciência & Saúde Coletiva, 17(1):223-230, 2012. BICCA, L.H.; TAVARES, K.O. A Atuação da Enfermeira no Programa Saúde da Família: uma breve análise da sua prática assistencial. Revista Nursing, V. 92, n. 9, Janeiro de 2006. BRASIL. 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Frente a isso, o presente estudo objetiva compreender o impacto e as potencialidades de um ambiente humanizado na recuperação de pacientes oncológicos em um serviço de quimioterapia do noroeste gaúcho. Para o proposto, foi investigado um serviço reconhecido por seu ambiente humanizado. Para alcançar estes objetivos, o presente estudo adotou como linha metodológica a pesquisa qualitativa do tipo exploratório descritivo. Os dados foram obtidos através de observação e entrevista gravada realizada com usuários oncológicos da unidade sede da pesquisa. Para análise dos resultados utilizou-se a sistemática da análise de conteúdo. A pesquisa seguiu todos os preceitos éticos contidos na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Com a categorização e análise dos dados obtidos no campo empírico foi possível perceber que os pacientes reconhecem o bom atendimento prestado a eles no qual acolhimento é uma ferramenta que estrutura a relação entre a equipe e a população e se define pela capacidade de solidariedade de uma equipe com as demandas do usuário, resultando numa relação humanizada. Observa-se que o ambiente humanizado tem ação terapêutica. The conception of health and disease has passed by improvements that are being followed by changes of concepts and this way has produced alterations in therapeutics practices in hospital environments. A very important factor refers to the necessity of constructing human and affective entailments between users and professionals. Due to this the present study aims to understand the impact and potentialities of a humanized environment in the recovering of oncological patients in a service of chemical therapy from the northwest region. For the proposed it was investigated a service avowed by its humanized environment. In order to obtain these objectives the present study a d o p te d a s m e t h o d o l o g i ca l l i n e t h e qualitative research of exploratory descriptive type. The data were obtained through the observation and recorded interview, carried out with the oncological patients of the unit seat of the research. For the analysis of the results the systematic of analysis of contents was used. The research followed all the ethic precepts enclosed in the Resolution of the National Council of Health. With the categorization and analysis of the data obtained in the empirical field, it was possible to realize that the patients recognize the good serving given to them where welcoming is a tool that structures the relation between the staff and the population and defines itself by the capacity of solidarity of a staff with the demands of the user resulting in a humanized relation. It is observed that the humanized environment has therapeutic action. Palavras–chave: Enfermagem. Humanização da Assistência. Quimioterapia. Keywords: Nursing. Humanization of the Assistance. Chemical Therapy. 1 Enfermeira – SETREM; Enfermeiro, Mestre em Enfermagem. 3 Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM, Av. Santa Rosa, 2405; Três de Maio - RS, [email protected] 2 131 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1 INTRODUÇÃO O desenvolvimento científico e tecnológico tem trazido uma série de benefícios, mas muitas vezes tem como efeito adverso a desumanização. Um hospital pode ser considerado o melhor em tecnologia, mas se não tiver um atendimento humanizado se torna incapaz de prestar um serviço de qualidade. Ao longo da história brasileira, o câncer foi visto de diversas formas. De tumor maligno e incurável à neoplasia, de tragédia individual a problema de saúde pública, sua história foi marcada pelo incessante esforço da medicina em controlá-lo pela via da prevenção, aliada ao uso das mais modernas tecnologias médicas de tratamento. No entanto, as dificuldades técnicas para a cura de muitas de suas formas, o alto custo das tecnologias empregadas com esse objetivo e seu caráter individual mostram-se como limitadores da ação terapêutica, fazendo com que a doença se vincule cada vez mais ao campo da prevenção e da saúde pública (TEIXEIRA, FONSECA, 2007). Frente a isso, tem-se hoje no país um cenário múltiplo, marcado por distintos programas, distintas políticas e funcionamento. Em especial quando se fala em Humanização de pacientes oncológicos, pois são pessoas em situação de fragilidade devido a seu estado de saúde. Portanto, configuram-se como uma parcela que necessita de ações humanizadas. E, como já posto anteriormente, o cenário é marcado por uma multiplicidade de práticas que transitam entre aquelas que são exitosas e aquelas que ainda necessitam de desenvolvimento no tocante à humanização. Desta forma, o estudo tem como objetivo primordial compreender as ações voltadas à humanização de um serviço de quimioterapia a partir das vivências de usuários. Para tal, pesquisou-se um serviço de quimioterapia sabidamente exemplar nos aspectos que tangem as ações de humanização, focando na perspectiva dos usuários e quais ações desenvolvidas no serviço conferem qualidade de vida aos mesmos. uma série de sentimentos lesivos para a sua saúde. O estigma que a doença carrega vem de muitos anos atrás e ainda hoje causa prejuízos a quem recebe esse diagnóstico. Se o paciente não tiver uma boa cultura, um forte apoio e um tratamento humanizado, essa doença pode vir a acarretar uma série de fatores ainda mais danosos em sua vida, provocando sentimentos, desequilíbrios e conflitos internos, além de causar um sofrimento tão intenso, capaz de resultar em desorganização psíquica a esses pacientes. Transformar práticas de saúde exigem mudanças no processo de construção dos sujeitos dessas práticas. Somente com trabalhadores e usuários protagonistas e corresponsáveis é possível efetivar a aposta que o SUS faz na Universalidade do acesso, na integralidade do cuidado e na equidade das ofertas em saúde. Por isso, fala-se da 'Humanização' do SUS (Humaniza SUS) como processo de subjetivação que se efetiva com a alteração dos modelos de atenção e de gestão em saúde, isto é, novos sujeitos implicados em novas práticas de saúde. Define-se, assim, 'Humanização' como a valorização dos processos de mudanças dos sujeitos na produção de saúde (PEREIRA, 2008). Para Deslandes (2008), humanização parte de que os seres humanos são produtores de necessidades fisiológicas e psicológicas e o cuidado que se preocupa em provê-las pode ser entendido como humanizado. A autora chama a atenção quando caracteriza três guias como referência na prática de cuidado: o intrínseco valor da vida humana, a insubstituibilidade de cada ser humano e as pessoas consideradas em sua integralidade. De acordo com Pereira 2008, a Xl Conferência Nacional de Saúde, CNS (2000), que tinha como título “Acesso, qualidade e humanização na atenção à saúde como controle social”, procura interferir nas agendas das políticas públicas de saúde. De 2000 a 2002, o Programa Nacional de Humanização da Atenção Hospitalar (PNHAH) iniciou ações em hospitais com o intuito de criar comitês de 'Humanização' voltados para a melhoria na qualidade da atenção ao usuário e, mais tarde, trabalhadores. Tais iniciativas encontraram um cenário ambíguo em que a humanização era reivindicada pelos usuários e alguns trabalhadores. Por um lado, os usuários reivindicavam o que é de direito: atenção com 2 REFERENCIAL TEÓRICO O câncer no ser humano desencadeia 132 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 acolhimento e de modo resolutivo. O programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH) foi criado no ano de 1999, pela Secretaria da Assistência à Saúde do Ministério da Saúde, com os objetivos de melhorar a qualidade e a eficácia da atenção dispensada aos usuários da rede hospitalar; recuperar a imagem dos hospitais entre a comunidade; capacitar os profissionais dos hospitais para um conceito de atenção à saúde baseado na valorização da vida humana e da cidadania; conceber e implantar novas iniciativas de humanização beneficiando tanto os usuários como os profissionais da saúde; estimular a realização de parcerias e trocas de conhecimento; desenvolver um conjunto de indicadores/parâmetros de resultados e sistemas de incentivos ao tratamento humanizado (DESLANDES, 2008). Fazer com que o paciente se sinta bem acolhido, apoiado e rodeado de pessoas que lhe fazem bem, em um ambiente confortável, fará com que o paciente sinta mais valorização, conseguindo enfrentar melhor o seu estado saúde/doença, mantendo uma autoestima elevada, trazendo uma série de benefícios a sua saúde e ao seu tratamento. Deslandes (2008), afirma que o cuidador está firmemente comprometido com o objetivo de apoiá-lo na resolução de seus problemas de saúde. Mais do que isso, que o cuidador segue o objetivo de ajudar a promover uma dinâmica de multiplicação dos apoios, de modo que o usuário possa, progressivamente, apoiar a si mesmo e buscar apoio no seu próprio contexto vital. 2008), a construção da Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão à Saúde (PNH) partiu de uma análise do processo de construção do SUS, na qual se confrontaram o já instituído e as novas forças instituintes – “do SUS que temos ao SUS que queremos”, valorizando, tanto dentro como fora do Estado, as instâncias coletivas mais intimamente ligadas à experiência concreta de invenção de novos modos de existência, a partir dos desafios de produzir saúde, e sujeitos nas diferentes instâncias da rede pública de saúde. Foi possível, dessa forma, não apenas formular uma política transversal às diversas ações e instâncias gestoras do S U S , i n t e g ra n d o o b j e t i v o s e a ç õ e s fragmentadas e setorizadas em programas, como exercitar um novo modo de construir e de praticar políticas públicas de saúde, em que o público não diz respeito apenas ao Governo ou ao Estado, mas implica “a experiência concreta dos coletivos”, na qual “a saúde se apresenta como uma questão pública”, e, em sua relação com o SUS, envolve a participação dos diferentes atores: usuários, trabalhadores e gestores. Humanizar refere-se à possibilidade de uma modificação cultural da gestão e principalmente das práticas desenvolvidas nas instituições de saúde. Sonha-se com um SUS mais humanizado, com uma política mais humanizada, em que os usuários do SUS possam ser mais valorizados e escutados. Todos querem ser reconhecidos não só como consumidores de serviços de saúde, mas como cidadãos de bem no qual, por um motivo, estão mais necessitados da ajuda alheia e esperam que essa ajuda seja prestada com qualidade e principalmente equidade para todos. Segundo Rosa (2009), Humanizar na atenção à saúde é entender cada pessoa em sua singularidade, tendo necessidades específicas e, assim, criando c o n d i ç õ e s p a ra q u e t e n h a m a i o r e s possibilidades para exercer sua vontade de forma autônoma. 2.2 A PNH na Formação dos Profissionais de Enfermagem na Atenção Oncológica Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2008), a nova Política Nacional de Atenção oncológica, instituída em JUNembro de 2005, em consonância com as diretrizes e as estratégias de democratização institucional, instituídas no âmbito da construção do SUS, promove a 2.1 Políticas Públicas de Saúde As mudanças no Sistema Único de Saúde (SUS) continuam passando por um processo de organização, inovando e adotando medidas relevantes para o crescimento do país. Muito já se fez pela política de humanização, mas espera-se que muita coisa mude, para que a Humanização seja tratada de forma igual para todas as classes (DESLANDES, 2008). A temática de Humanização vem sendo apontada desde a criação do SUS. No começo era vista com desconfiança pelas forças políticas, mas com o tempo e a reforma sanitária foi, progressivamente, afirmando-se nos Serviços de Atenção a Saúde do SUS. Segundo o Ministério da saúde (BRASIL, 133 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 descentralização e a valorização da corresponsabilidade entre a rede de serviços e as equipes profissionais, visando à integralidade da atenção em oncologia. Qualificar a assistência e promover a educação permanente dos profissionais de saúde envolvidos com a implantação e a implementação da Política de Atenção Oncológica, em acordo com os princípios da integralidade e da Humanização. (BRASIL, 2008). A gravidade do adoecimento e a alta complexidade do tratamento dos diversos tipos de câncer, assim como o impacto da experiência para os profissionais envolvidos, expõem claramente a necessidade de cooperação de saberes e disponibilidades e, também, a importância de laços solidários entre a equipe e a rede social dos usuários (BRASIL, 2008). Assim, há que se considerar que a humanização da assistência nesse contexto pressupõe o cuidado com e realização pessoal e profissional dos trabalhadores de enfermagem. Deve existir um projeto coletivo, em que toda a organização se reconheça e se valorize, resgatando as relações entre profissional de saúde e usuários, entre os próprios profissionais, entre esses profissionais e a instituição e entre a instituição e a comunidade (MENEZES, 2006). bem estar do paciente, vendo ele como um ser que necessita de uma atenção especial. Cabe aos profissionais da saúde saber desenvolver essa sensibilidade maior com tais pacientes, visto que o câncer ainda é uma doença que causa muita dor, medo e temor da morte. Não se faz necessário grandes tecnologias no setor de oncologia. Muitas vezes a única coisa que o usuário espera é um pouco de atenção, um ambiente confortável, visto que este tratamento é muito demorado (na maioria das vezes a aplicação quimioterápica leva de 3 a 6 horas), o uso de camas e poltronas confortáveis, equipamentos audiovisuais, música, conversas, a possibilidade de poder estar sempre acompanhado de seus parentes queridos, tudo isso corrobora para um tratamento mais eficaz e menos dolente ao paciente oncológico. 3 METODOLOGIA A presente pesquisa foi desenvolvida com pacientes oncológicos de uma unidade de quimioterapia de um hospital de médio porte, localizado no Noroeste do Estado do Rio Grande de Sul. Para que pudesse produzir informações relevantes e fidedignas, seguiu um roteiro metodológico compatível com seu problema de estudo. De acordo com Minayo (2002, p.16), “metodologia é o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade que ocupa um lugar central no interior das teorias e está sempre referida a elas”. Ainda, para Minayo (2003, p.17), a pesquisa se configura em “a atividade básica da Ciência na sua indagação e construção da realidade. É a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e atualiza frente à realidade do mundo. Portanto, embora seja uma prática teórica, a pesquisa vincula p e n s a m e n t o e a ç ã o ” . Já para Polit; Beck; Hungler (2004, p. 20), a pesquisa é a investigação sistemática que usa métodos para responder às questões ou resolver os problemas. A meta final da pesquisa é desenvolver, refinar e expandir um corpo de conhecimentos. A partir disso, o presente projeto de pesquisa seguiu uma abordagem de cunho qualitativo que, segundo Minayo (2003), responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela 2.3 O uso de tecnologias leves na Atenção Oncológica Na reflexão acerca de humanização torna-se como referência um eixo principal o das tecnologias da relação ou tecnologias leves. Conforme MERHY (2006), esse é um território marcado pelo encontro que se estabelece entre duas pessoas em um contexto de intersubjetividade, cumplicidade e responsabilização diante de um dado problema. Ao problematizar o encontro com o usuário interessa focalizar três categorias que propõem o autor ao descrever as tecnologias leves: acolhimento, vínculo e autonomia. Assim, na unidade de quimioterapia, os encontros com usuários deste serviço são mais frequentes e contínuos, devido ao tratamento com quimioterápicos serem de longo prazo. Este espaço favorece na construção de um vínculo entre o paciente e o seu cuidador, bem como um acolhimento mais prestativo, mais humanizado, voltado ao 134 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (p.21) Estudos descritivos procuram especificar as propriedades, as características e os perfis importantes de pessoas, grupos, comunidades ou qualquer outro fenômeno que se submeta à análise. [...] Em um estudo descritivo, seleciona-se uma série de questões e mede-se ou coleta-se informação sobre cada uma delas, para assim (vale a redundância) descrever o que se pesquisa (COLLADO; LUCIO; SAMPIERI; apud DANHKE, 2006, p.101). As informações produzidas foram analisadas a partir da técnica de analise de conteúdo, descrita por Minayo (2002), “através da análise de conteúdo, podemos encontrar respostas para as questões formuladas e também podemos confirmar ou não as afirmações estabelecidas antes do trabalho de investigação “hipótese”” (p 74). A pesquisa foi desenvolvida seguindo as normas contidas na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, que dispõe sobre as diretrizes legais da pesquisa que envolve seres humanos (BRASIL, 1996). A referida resolução visa assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado. Minayo (20002) ressalta a importância da interação entre pesquisador e sujeitos pesquisados, sendo isso essencial para o desenvolvimento da pesquisa qualitativa. “Sua preocupação é de que todo o corpo e sangue da vida real componham o esqueleto das construções abstratas” (MINAYO, 1999, p. 105). Para isso, foi utilizada a técnica de entrevista e a observação participante, como meio de articulação da coleta de dados. Para o estudo em questão, a entrevista foi construída em torno de perguntas semiestruturadas relevantes ao tema proposto sendo que as falas dos informantes foram gravadas e posteriormente digitalizadas e, em seguida, foram transcritas na íntegra, utilizando as informações coletadas, exclusivamente, para fins de análise. 3.1 População em Amostra Para Polit; Beck; Hungle (2004), a amostragem é o processo de seleção de uma porção da população. Uma amostra, então, é um subconjunto dessa população. As entidades que formam as amostras e as populações são os elementos. Na pesquisa de Enfermagem, os elementos são geralmente os seres humanos (p. 237). A população que foi parte deste estudo foi composta por pacientes em tratamento quimioterápico de uma Unidade Hospitalar localizada no Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. O tamanho da amostra foi estabelecido a partir do método de saturação de dados que, segundo as autoras Polit; Beck; Hungler (2004), é amostrar até o ponto em que não é obtida nenhuma informação nova e é atingida a redundância. Normalmente é possível chegar à redundância com um número relativamente pequeno de casos, se a informação de cada um tiver profundidade suficiente. Chegou-se a essa população através de um questionário semiestruturado elaborado no decorrer do projeto de pesquisa. Os usuários do serviço de oncologia responderam a este formulário com o intuito de relatar a vivência do câncer em suas vidas. A referente pesquisa entrevistou nove pessoas que faziam uso de tratamento quimioterápico no mês de agosto de 2010, em uma clínica oncológica do Noroeste gaúcho. Para preservar as identidades dos entrevistados foram usados as palavras informante 1, informante 2, e assim sucessivamente. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO No perfil apresentado destaca-se que 9 pessoas fizeram parte desta pesquisa, sendo que a idade dos informantes variou entre 30 e 58 anos; 7 são do sexo feminino e 2 do sexo masculino. Suas profissões são todas de nível médio, nenhum possuindo curso superior. O tempo de tratamento dos informantes variou de uma semana a um ano. Isso também fez com que as respostas sofressem influências, como o estágio da doença, reações adversas aos fármacos quimioterápicos e ao psicológico dos informantes. Destaca-se que estes fatores de variação foram observados no momento de análise das informações. Segundo o INCA 2009, no Brasil, as 135 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 estimativas para o ano de 2010, serão válidas também para o ano de 2011, e apontam para a ocorrência de 489.270 casos novos de câncer. Os tipos mais incidentes, à exceção do câncer de pele do tipo não melanoma, serão os cânceres de próstata e de pulmão no sexo masculino e os cânceres de mama e do colo do útero no sexo feminino, acompanhando o mesmo perfil da magnitude observada para a América Latina. Descobrir-se com câncer talvez seja um dos maiores desafios para os seres humanos, principalmente pelo estigma que essa patologia carrega consigo. Quando começam a surgir os primeiros sintomas/sinais dessa doença, as pessoas, muitas vezes, preferem ignorar tais acontecimentos, acreditando que vai passar ou não é nada. Aí que começa ficar perigoso. O câncer diagnosticado logo em seu início tem praticamente 100% de cura, mas para isso é necessário que as pessoas procurem as unidades de saúde e atendimento especializados. Quando perguntado como a maioria descobriu estar com câncer, quatro das nove informantes responderam que, pelo autoexame, o que prova a importância do cuidado domiciliar com o corpo. O cuidado com o corpo é fundamental, mas o autoexame feito em casa não substitui o que deve ser realizado anualmente por um profissional da saúde, médico ou enfermeiro. Três dos nove informantes relataram que descobriram a doença pelos sintomas, sendo assim a doença um pouco mais e vo l u í d a d o s q u e d e s c o b r i ra m p e l o autoexame. Às vezes as pessoas acabam sendo omissas com a própria saúde, deixando para depois exames e cuidados que devem ter com o corpo. Isso pode ocasionar avanços de doenças muito sérias e, às vezes, irreversíveis. Muito se fala em prevenção de doenças e grupos de riscos, são várias as políticas públicas nesse sentido, sendo que as pessoas devem estar atentas ao seu estilo de vida, procurando assistência ao menor aviso que o corpo der. O vínculo com o serviço foi o relato por dois dos nove informantes, sendo que sempre procuravam o profissional enfermeiro de suas unidades de saúde, relatando a eles o que estava acontecendo. A informante 3 afirmou que tinha “fisgadas”, dor, sangramento durante a relação, aí foi para fazer o preventivo e voltou normal, aí a enfermeira encaminhou para o médico para fazer tratamento com pomadas e comprimidos. Para Schimith; Lima, 2004, acolhimento e vínculo dependem do modo de produção do trabalho em saúde. O acolhimento possibilita regular o acesso por meio da oferta de ações e serviços mais adequados, contribuindo para a satisfação do usuário. O vínculo entre profissional/paciente estimula a autonomia e a cidadania, promovendo sua participação durante a prestação de serviço. A informante 4 revelou: “eu tava trabalhando e senti que meu seio esquerdo saiu fora do sutiã e nisso levei a mão no seio e peguei e apalpei, os dois seios tinham nódulos, aí peguei e larguei tudo e fui no vestiário e liguei para a enfermeira do meu posto e marquei uma consulta, ela me olhava daquele jeito, mas dizia que não era c â n c e r , a í m e encaminhou para fazer uma mamografia e ecografia.” O vínculo com os usuários do serviço de saúde amplia a eficácia das ações de saúde e favorece a participação do usuário durante a prestação do serviço. Esse espaço deve ser utilizado para a construção de sujeitos autônomos, tanto profissionais quanto pacientes, pois não há construção de vínculo, sem que o usuário seja reconhecido na condição de sujeito que fala, julga e deseja. Merhy afirma que a relação humanizada da assistência que promove a acolhida, dá-se sob dois enfoques: o do usuário e o do trabalhador (SCHIMITH, LIMA 2004). Quando perguntado aos entrevistados os primeiros sentimentos vividos por eles quando descobriram estar com essa doença, o que mais foi relatado foi em como contar a família/filhos e os sentimentos de pavor, pânico, choque, tristeza e fracasso na vida. São vários os sentimentos que surgem quando a pessoa descobre que têm câncer; o medo da morte, de sofrer com as aplicações 136 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 quimioterápicas, de perder o cabelo, de não conseguir vencer essa doença tão temida. Isso tudo se deve a uma crença que essa doença não tem cura, de que ela, como diziam os antigos, era castigo dos deuses, e assim, jamais as pessoas conseguiriam sobreviver. Mas com a evolução das tecnologias tudo foi se tornando possível. Hoje em dia com tantas modernidades e acontecimentos, o câncer deixou de ser um castigo dos deuses e se tornou uma doença curável, ou pelo menos quando descoberta em seu inicio, na grande maioria dos casos. Segundo Bergamasco, Angelo (2001), o período de diagnóstico pode ser traumático, principalmente se é prolongado ou termina com a confirmação de uma doença que é ameaçadora à vida. A incerteza sobre a duração ou qualidade de vida no futuro requer da mulher um aprendizado, seja através da experiência ou de outra maneira, não somente sobre o que o diagnóstico significa em termos de sua vida, mas o que ela deve fazer para manter algum controle sobre ela. Uma das informantes referiu-se como um fracasso de sua vida o descobrimento dessa doença. Todos os informantes relataram com grande aviJUN a vivência da fé. Desde a antiguidade a fé é discutida pelos pesquisadores sobre a influência que esta provoca na vida cotidiana do ser humano. Conforme Matos (2004), diante de situações de angústia, solidão e sofrimento, o homem tende a questionar-se sobre o sentido da sua existência. Procura buscar respostas lógicas para compreender o que está acontecendo ou o que já ocorreu e, muitas vezes, não encontra respostas satisfatórias. Com isso, o ser humano passa a sentir-se frágil e inseguro. É nesse momento que ele busca algo confortante e transcendental, que forneça segurança e proteção. Esse ser superior, experimentado como transcendente vai além do seu existir. Essa experiência de proteção, embora não possa ser explicada, pode ser sentida e penetrada na existência humana, em inúmeras circunstâncias da vida cotidiana. Essa experiência de entrega ao transcendental é vivida como atitude de fé. A religião ocupa um importante espaço na vida das pessoas, e a religiosidade pode ajudar a encontrar o significado e a coerência no mundo. A função da religiosidade e da crença espiritual, no enfrentamento do câncer, destaca que a fé religiosa e a espiritualidade contribuem, de forma ativa, na luta cognitiva dos pacientes e as suas convicções religiosas fornecem significado e perspectiva, permitindo acumular experiências para o enfrentamento da doença. A religião é epidemiologicamente um fator de proteção (TEIXEIRA, LEFEVRE, 2008). Foi questionado aos entrevistados como eles foram acolhidos pelos profissionais de saúde, quando chegaram para fazer o tratamento quimioterápico e por unanimidade todos responderam que foram muito bem atendidos e acolhidos. Segundo o Ministério da Saúde (Brasil, 2009), a humanização e a qualidade da atenção em saúde são condições essenciais para que as ações de saúde se traduzam na resolução dos problemas identificados, na satisfação dos usuários, no fortalecimento da capacidade das pessoas frente à identificação de suas demandas, no reconhecimento e reivindicação de seus direitos e na promoção do autocuidado. A partir disso, pode-se determinar uma característica fundamental do trabalho em saúde, a de que esta é permeada de processos relacionais, isto é, acontece mediante a relação “Eu não sou mais a mesma pessoa (chora e se emociona), eu era uma mulher saudável, agora nem durmo mais direito, o meu braço dói, o sentimento de saber que tenho uma doença, u m f r a c a s s o ” (informante 1). Embora vários aspectos sobre os efeitos psicossociais do câncer sejam conhecidos, compreende-se que a experiência do câncer é ampla e envolve diferentes momentos com significados distintos e com implicações na vida diária e nas relações entre as pessoas do seu contexto social (BERGAMASCO, ANGELO, 2001). Quando questionado aos entrevistados como eles superam essa fase da vida, todos indicam a vivência da fé e o apoio da família como principal força para enfrentar esse momento. Embora a fé não seja reconhecida pelo conhecimento científico baseados no modelo das ciências naturais e exatas, ela possui uma forte influência na vida dessas pessoas. 137 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 de um espaço intercessor, constituído interseção como intervenção, ou seja, não se caracteriza como um somatório de um com o outro (usuário e profissional), mas sim, designa o que se produz nas relações entre sujeitos (usuário e profissional), no espaço de suas “interseções”, que é um produto que existe para “dois” em ato e não tem existência sem o momento da relação em processo, e na qual os interventores se colocam como instituintes na busca de novos processos. Cabe a ressalva de que este momento de e n c o n t ro e n e g o c i a ç ã o e m a t o d a s necessidades do usuário vale também para ações coletivas em saúde. Com isso tenta-se apagar a imagem de um processo estritamente individualizado (MERHY, 2006). aconchegantes e acolhedores os múltiplos ambientes coletivos se constituírem, tanto mais próximas poderão ser as relações afetivas e humanas. Para Miranda 2009, a Enfermagem, como ciência, é a arte e cuidar deve atentar para a qualidade de vida dos seres humanos por meio da percepção das reais necessidades humanas básicas afetadas, d e ve n d o o c u i d a r / c u i d a d o s e r u m a experiência vivida por meio de uma interrelação ser humano com ser humano, lembrando que tão importante quanto o cuidar, é estar atendo aos efeitos que o cuidado traz aos clientes. “tentam fazer o melhor possível para não machucar na hora de achar as veias” (informante 2). “As gurias são atenciosas, fazem perguntas, se tem dor, o que sente (se tem dor elas logo passam para o médico)” (informante 2). Ainda, para a mesma autora, o cuidar é a essência da atuação do profissional enfermeiro e, para uma atuação satisfatória, é necessário saber identificar essas reais necessidades do cliente e de sua família, ou seja, atender tanto os comprometimentos emocionais, psicológicos e sociais, quanto os comprometimentos físicos decorrentes do progresso e/ou tratamento da doença. Quando o profissional da saúde demonstra preocupação e afeto para seus clientes ele acaba conquistando o carinho e a confiança destes, e isso na relação entre cuidado e cuidador é muito importante, pois faz com que as pessoas se aproximem mais umas das outras. “sorriso que cativa, eu acho que isso também é importante, nenhuma sisuda, isso também agracia um pouco” (informante 9). “Muito bem, até o normal é que as pessoas tenham queixas do SUS, mas eu posso dizer que desde a minha primeira consulta foi 100%” (informante 5). Compreender as emoções do cliente e o que ela acarreta é acolhê-lo de maneira colaborativa, ajudando-o a modificar uma conduta ou criar estratégias para romper um costume que lhe esteja impedindo de relacionar-se consigo mesma ou com os outros. É um desafio alcançado através da capacidade da escuta sensível, que permite perceber as emoções dos clientes (BACKES, LUNARDI, LUNARDI, 2006). Muitas vezes profissionais de saúde não observam a importância de prestar um atendimento humanizado em um ambiente confortável e aconchegante. Quando questionado aos entrevistados o que eles tinham a dizer sobre o ambiente em que obtinham o tratamento, foi por unanimidade que todos responderam com muita convicção que era muito confortável. Ao longo de sua história o SUS foi sempre alvo de grandes criticas, nem sempre ele se preocupou em atender bem seus clientes, talvez por ser um serviço “gratuito”. As pessoas o desvalorizam, mas elas esquecem que ele é pago por todos os contribuintes através de impostos. Através de programas como a PNHAH, os hospitais vêm prestando um serviço muito eficiente, valorizando mais clientes e funcionários. Segundo Backes; Lunardi Filho; Lunardi, (2006), por ser um tratamento longo e cansativo, o hospital é um local em que os pacientes permanecem a cada dia de tratamento grande parte do seu tempo. Passa a ser considerado por muitos, como a sua segunda casa/família. Logo, quanto mais 138 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Para a obtenção do conforto, faz-se necessária a construção de um ambiente externo favorável: caloroso, atencioso, amoroso, que propicie crescimento, alívio, segurança, proteção, bem-estar, que inclua a presença de profissionais que transmitam segurança e empatia. Isto significa cuidado humano levando à sensação de conforto. Já o conforto oriundo do ambiente interno depende de cada ser e pode ser resultante do cuidado que favorece a ocorrência de integração, liberdade, melhor, segurança, proteção e comodidade (RODALM, SANTOS, RADÜNZ, 2008). “eu prefiro as poltronas, porque aí tem conversa, tem a TV, revistas, outras coisas para olha, você se distrai e não pensa no tratamento de quimioterapia”. Informante 2. cuidador deve compreender e valorizar o ser humano como sujeito histórico e social; para isso, não são necessários grandes investimento ou adaptações nos espaços físicos hospitalares. Esta pesquisa teve como por objetivo perceber se as ações humanizadas da equipe de saúde faziam diferença, ou mais, se eram reconhecidas pelos usuários desse serviço. Quando perguntado aos entrevistados se havia algo para ser mudado ou melhorado, todos responderam que estava tudo ótimo, que nada precisava ser mudado ou melhorado. Reconhecer que um serviço prestado à comunidade está dando certo, às vezes parece muito difícil. Um acolhimento humanizado, um ambiente agradável no qual p o s s a m r e c e b e r o t ra t a m e n t o c o m tranquilidade e serem vistos com dignidade e respeito, é tudo que as pessoas, que possuem qualquer tipo de doença, pedem e valorizam. Quando perguntado sobre o acesso ao serviço, foi por unanimidade que todos os informantes responderam que não podem se queixar de nada, pois são acolhidos e atendidos 100%. Reconhecem o esforço da equipe de enfermagem em lhes proporcionar aconchego e tranquilidade nas horas que fazem o tratamento nessa clínica oncológica. O reconhecimento a esse serviço prestado foi um dos motivos que instigou o desenvolvimento deste trabalho, pois, às vezes, é muito fácil criticar um serviço prestado gratuitamente às pessoas. A importância de se acolher as pessoas, proporcionando-lhes um ambiente h u m a n i z a d o, c o r r o b o ra p a ra q u e o tratamento seja menos penoso, aumentando a auto-estima dessas pessoas e, consequentemente, fazendo com que tenham uma maior esperança na sua cura. Quando as pessoas reconhecem um bom atendimento prestado, a equipe de saúde toda sente este reconhecimento, e se sente mais valorizada em seu ambiente de trabalho. Isso também é humanização com a equipe, pois humanização envolve a todas as pessoas, não somente os clientes que são atendidos, mas também a equipe que trabalha para que isso aconteça. Miranda 2009 argumenta que a humanização do cuidado indica que o “aqui elas animam a gente, e não colocam para baixo, lá na minha cidade, tão sempre de “Imagina se a cadeira fosse dura, como ia ser” informante 3. Na visão do paciente, o conforto é ressaltado pela sensação de apoio, ajuda, confiança, simpatia e pela perspectiva de recuperação da saúde, assim, associado ao bem-estar físico e mental e à diminuição do sofrimento (ROSA, MERCÊS, SANTOS, RADÜNZ, 2008). Para Fontes e Alvim 2008, na medida em que o conforto adquire significados diferentes para as pessoas, de acordo com as realidades experienciadas, há necessidade de se refletir acerca de suas diversas faces. Acredita-se que reconhecer os determinantes desse fenômeno pelos sujeitos que o vivenciam seja fundamental para que ocorra a interação entre os mesmos e as práticas profissionais que o proporcionam. Ainda, para as mesmas autoras, o ato de confortar tem valor para quem cuida e é cuidado oferecendo oportunidade de crescimento e de realização. A conscientização a respeito desse processo promove novas percepções do ser/estar, como cuidador ou ser-cuidado, permitindo o desenvolvimento mútuo em direção a uma condição de vida mais saudável e integrada. 139 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 mau humor. É 100% de diferença” informante 7. “na verdade o que faz bem é o sorriso no rosto, isso é fundamental, não precisa falar nada, é um negócio que te cativa, você tem segurança, carinho e amor” informante 9. vai melhorar seu estado de saúde, mas também, o acolhimento humanizado que vai ao encontro do bem estar dessas pessoas, fazendo com que se sintam mais valorizados e assistidos. Através desta pesquisa, provou-se que, quando a equipe de saúde é unida e trabalha em prol do bem estar dos outros, ela também se realiza profissionalmente, sentese mais valorizada, mais humana. Profissionais procuram mudar a realidade, muitas vezes triste, do local no qual trabalham, fazendo com que pessoas sejam vistas como pessoas na sua integralidade e equidade. Evidenciou-se ainda a importância das tecnologias leves no estabelecimento de vínculos entre a equipe profissional e os/as usuários/as; ressalta-se que as informantes demonstraram que têm fortes vínculos com profissionais de equipe de enfermagem. Pressupõe-se que esta seja uma valiosa ferramenta para a resposta aos atuais desafios às necessidades de saúde da população. É importante, também, salientar que todos responderam que na visão deles nada precisa ser melhorado. O que fortalece ainda mais o reconhecimento do bom serviço prestado. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Tratar câncer não é simples; é necessário preocupar-se com o paciente, com a família, acompanhando de perto todos os problemas, sinais e sintomas existentes, controlando a doença e mantendo a pessoa confiante e segura. E isso talvez seja um dos maiores desafios na atuação da equipe de enfermagem a essas pessoas. O olhar da equipe deve ser direcionado no sentido de auxiliá-los no enfrentamento, fornecendolhes mais informações sobre o câncer, as modalidades de tratamento disponíveis, como serão realizados os procedimentos, os efeitos colaterais que podem advir dos tratamentos ministrados, dentre outros. Foi identificado, através dessa pesquisa que, ao enfrentar o câncer e o tratamento, as pessoas que sofrem com essa e n fe r m i d a d e e l a b o ra ra m fo r m a s d e enfrentamento baseadas na doença. Alguns a percebem como algo ruim e se sentem infelizes, desanimados, podendo dificultar a melhora; já outros a encaram de forma positiva, com otimismo e confiança na cura, guiados pela emoção e pela crença. Humanizar e qualificar a atenção em saúde é aprender a compartilhar saberes e reconhecer direitos. A atenção humanizada e de boa qualidade implica no estabelecimento de relações entre sujeitos, seres semelhantes, ainda que possam apresentarse muitos distintos, conforme suas condições sociais, raciais, étnicas, culturais e de gênero (FONTES, ALVIN, 2008). É de fundamental importância que profissionais de saúde se preocupem no bem estar e no acolhimento das pessoas, pois não é somente o tratamento farmacológico que Referências BACKES D; S, LUNARDI Filho WD, LUNARDI VL. O processo de humanização do ambiente hospitalar centrado no trabalhador. Rev Esc Enferm USP 2006; Acessado em 15 de novembro de 2010. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v40n2/09. pdf BERGAMASCO, Roselena, Bazilli; ANGELO, Margareth. O Sofrimento de Descobrir-se com Câncer de Mama: Como o Diagnóstico é Experienciado pela Mulher. Revista Brasileira de Cancerologia, 2001. Acessado em 13 de outubro de 2010. D i s p o n í v e l e m http://www.inca.gov.br/rbc/n_47/v03/pdf/artigo 4.pdf. BRASIL. 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A pesquisa foi desenvolvida em um hospital geral de médio porte. Utilizou-se a abordagem qualitativa, do tipo exploratório descritivo. Lançou-se mão de um roteiro semiestruturado para a realização das entrevistas. A amostra foi composta por doze profissionais de Enfermagem, sendo eles técnicos e Enfermeiros, dos quais JUN eram do sexo feminino e dois do sexo masculino. Para análise e interpretação dos dados foi utilizada a técnica de análise de conteúdo. Desta análise emergiram JUN núcleos. Ao interpretar as informações coletadas, evidenciou-se que os profissionais de Enfermagem têm noção de que não estão adequadamente preparados para atender pacientes em depressão, que sua formação é deficiente, afirmam deixar as questões emocionais em segundo plano, afirmam também que o número muito reduzido de colaboradores dificulta o trabalho. Para a melhora do atendimento, sugeriram a realização de capacitação em saúde mental, educação em saúde, melhorias no ambiente abordando o tema e aumento do quadro de colaboradores. ABSTRACT This investigation had as main objective to identify the difficulties of the nurse team on reception and on ambulatory and integral care of the clinically depressive patient, identifying the relevant aspects about the patient and about the reality of the professionals preparation. The conception about depression of these professionals, formation categories, attitude, sentimentalism, opinion about the patient, needed improvements at the service to the clinical depressive patient were also investigated. The research was developed at a mid-sized hospital. The qualitative approach of the descriptive exploration type was used. A semistructured itinerary to make the interviews has been used. The sample was composed by twelve nursing professionals, among technicians and nurses, ten of them were females and two were males. For the data analyzes and interpretation it was used the technique to analyze the content. Ten nucleus emerged from this analyzes. The interpretation of the collected information showed that the nursing professionals have the perception that they are not prepared to take care of clinical depressive patients, that their formation is deficient, they claim that they lay emotional questions aside, they also claim that a very reduced number of collaborators makes the work difficult. To the service improvement, they suggested the mental health qualifying, the health education about the subject, working improvement and the raise of the collaborators board. Palavras-chave: Depressão. Equipe de enfermagem. Cuidados de enfermagem. Keywords: Depression. Nursing team. Nursing care. 1 Enfermeira formada pelo curso de Bacharelado em Enfermagem da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM. E-mail: [email protected] 2 Enfermeira Esp ecialista em Enfermagem Psiquiátrica. Enfermeira do Centro de Atenção Psicossocial da cidade de Horizontina. Professora do Curso Bacharelado em Enfermagem da Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, [email protected] 3 Mestre em Educação nas Ciên cias, especialista em Psicanálise na Cultura: Saber e Ética e Psicologia . 4 Mestre em Enfermagem pela Fundação Universidade de Rio Grande – FURG. Professora do curso de Bacharelado em Enfermagem da SETREM. E-mail: [email protected] 5 Sociedade Educacional Três de Maio - SETREM, Avenida Santa Rosa, 2405. Três de Maio – RS, [email protected] 142 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1 INTRODUÇÃO Para suprir as necessidades de saúde do paciente, os profissionais da Enfermagem buscam, em uma série de tecnologias, arsenais terapêuticos e, numa gama de saberes, as melhores formas de oferecer cuidado. Precisam usar de sua própria pessoa; porém, como instrumento terapêutico em busca de ir além da ciência, humanizando o atendimento. Em vista da crescente demanda de pacientes em sofrimento emocional no Hospital Geral, torna-se importante mencionar sobre a atuação da equipe de Enfermagem no acolhimento e cuidado do paciente em depressão. Ainda neste contexto, melhorar o trabalho das equipes de Enfermagem, ampliar sua capacidade de visão integrada das várias dimensões da vida do indivíduo. Pensando neste aumento da demanda de pacientes em sofrimento e observando no dia-a-dia a dificuldades que algumas pessoas apresentam em lidar com este tipo de agravo, intencionando oferecer subsídios para futuras discussões sobre a melhoria do atendimento de Enfermagem, este estudo foi delineado. Este trabalho teve como proposta de investigação analisar e compreender a atuação da equipe de Enfermagem no acolhimento ao paciente em depressão. A partir de busca bibliográfica, estudo de campo e análise de entrevistas foram investigadas as possíveis dificuldades presentes na equipe de Enfermagem quanto ao acolhimento do paciente em depressão. A pesquisa seguiu a abordagem qualitativa do tipo exploratório descritivo. Para coletar as informações necessárias foi utilizado um roteiro semiestruturado para a realização das entrevistas, aplicado aos profissionais componentes das diferentes equipes de Enfermagem da instituição, sendo eles técnicos em Enfermagem e Enfermeiros, após o consentimento livre e esclarecido dos participantes da pesquisa, baseado na resolução 196/96. intensidade. Muitas pessoas encontram-se ocasionalmente tristes, mas este sentimento tem curta duração e não resulta em desempenho prejudicado. Pessoas com depressão geralmente exibem sinais de um humor deprimido ou de um interesse diminuído em atividades agradáveis durante, pelo menos, duas semanas (SMELTZER; BARE, 2012). Os sintomas específicos da depressão incluem os sentimentos de tristeza, inutilidade, fadiga, culpa e dificuldade em se concentrar ou tomar decisões. Alterações no apetite, ganho ou perda de peso, distúrbios do sono e retardo psicomotor e agitação são comuns. Com frequência, os pacientes apresentam pensamentos recorrentes sobre a morte e o suicídio ou empreenderam tentativas de suicídio. É feito um diagnóstico de depressão quando uma pessoa apresenta, pelo menos, cinco dos nove critérios diagnósticos para a depressão (SMELTZER; BARE, 2012). Nos episódios típicos de depressão é possível identificar três graus, sendo eles: leve, moderado ou grave. Em ambos os graus visualiza-se no paciente um rebaixamento no humor, redução da energia e diminuição da atividade. Ocorre alteração da capacidade de experimentar o prazer, perda de interesse, diminuição da capacidade de concentração, associadas em geral à fadiga acentuada, mesmo após um esforço mínimo. Observamse problemas de sono, despertar matinal precoce, horas antes da hora habitual de despertar, diminuição do apetite, diminuição da autoestima e autoconfiança, ideias de culpabilidade e indignidade, agravamento matinal da depressão, lentidão psicomotora acentuada, agitação, perda de peso e libido (CID-10, 1998). No episódio depressivo leve, o paciente sofre com a presença dos sintomas, mas é capaz de realizar a maior parte das suas atividades. No episódio depressivo moderado, estão presentes quatro ou mais sintomas e aparentemente o paciente tem m u i t a d i f i c u l d a d e p a ra c o n t i n u a r a desempenhar as atividades de rotina. No episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos, vários dos sintomas são acentuados e angustiantes, tipicamente a perda de autoestima e ideias de desvalia e culpa. As ideias e atos suicidas são comuns e observam-se em geral uma série de sintomas 2 REVISÃO DA LITERATURA 2.1 O QUE É DEPRESSÃO A depressão distingue-se dos sentimentos cotidianos de tristeza por sua duração e 143 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 a pessoa tenha suficientes recursos físicos, boas relações interpessoais com adequadas vinculações emocionais, numa sociedade estável, que tenha mais instrumentos perceptivos, mais habilidades para resolver problemas e valores que a orientarão na luta pela vida. somáticos (CID-10, 1998). Já o episódio depressivo grave com sintomas psicóticos, [...] é o episódio correspondente à descrição de um episódio grave, mas acompanhado de alucinações, ideias delirantes de uma lentidão psicomotora ou de estupor de tal gravidade que todas as atividades sociais normais tornam-se impossíveis; pode existir o risco de morrer por suicídio, de desidratação ou de desnutrição (CID-10, 1998, p. 328). Stahl (2003), explica que a depressão é uma emoção universalmente sentida por quase todas as pessoas em algum momento da vida. O entendimento da diferença entre a emoção “normal” de depressão e uma doença que requer tratamento médico com frequência é problemático para pessoas sem capacitação em saúde mental. Com uma equipe que possui sintonia como orquestra, é possível criar um plano terapêutico construído e executado pela equipe multiprofissional, em que se visa a promoção da saúde do indivíduo. A depressão tem reflexos na escola e no trabalho, aumenta as taxas de mau desempenho e absenteísmo. Ela pode acontecer em qualquer idade, sendo mais comum entre mulheres. Para compreender o sujeito em depressão, é importante ter conhecimento de sua história pregressa e atual. Um os aspectos a ser beneficiado é poder identificar a possibilidade do fator de geniticidade. 2.2.1 Atenção à pessoa em sofrimento emocional Torna-se necessário que a equipe conheça a pessoa de forma individualizada, para ser capaz de compreender como ela se sente na situação em que está. Para que o profissional atinja essa compreensão de como a outra pessoa se sente, é necessário que haja empatia. Para Souza (2006), empatia é a capacidade de tentar ver o mundo como outra pessoa o vê. Dá-se em nível consciente, sendo um espaço dirigido para a compreensão do outro. Por meio de sentimento empático, a equipe transmite a sensação de que o paciente é aceito. Na busca do profissional por uma atenção integral e qualificada ao paciente em depressão, ele necessita desenvolver sua capacidade de visão integrada das várias dimensões da vida do indivíduo. Dedicar-se aos múltiplos âmbitos de intervenção, sendo eles educativo, assistencial, reabilitação e reinserção social, quando necessário. 2.2 CONHECENDO O SUJEITO EM SOFRIMENTO PSÍQUICO Para Souza (2006) saúde mental se caracteriza por um estado no qual o indivíduo integra suas tendências de maneira satisfatória para si mesmo, refletida em sua alegria de viver, na sua sensação de autorrealização, de adaptação ao ambiente social e na satisfação de relações interpessoais. Rodrigues (2006) relata os itens que são os suportes dos quais a pessoa necessita para crescer e desenvolver-se sadiamente. São recursos físicos como alimentação e moradia; os recursos psicossociais como estímulo ao desenvolvimento intelectual e afetivo, por meio de inter-relações pessoais, da família e da escola; os recursos sócioculturais como influência de costumes, valores, cultura e estruturas sociais sobre a personalidade do indivíduo. Ainda em Rodrigues (2006, p. 11), 2.3 ABORDAGEM DA PESSOA EM CRISE As emergências em saúde mental exigem um cuidadoso diagnóstico que possibilita à [...] assim, o esperado é que 144 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 equipe uma intervenção rápida, decisiva para a preservação da vida do paciente. Segundo Souza (2006, p. 147), Tentativa de suicídio é a falha do ato suicida, situação em que o paciente não morre em decorrência do ato. Risco de suicídio é a probabilidade de que a ação suicida leve ao ato suicida e tenha como desfecho a morte auto-induzida. A presença de uma ideação suicida constitui um risco de suicídio que deve obrigatoriamente ser avaliado e quantificado (KAPCZINSCKI et al., 2001). Independente da doença psiquiátrica de base, o comportamento suicida tem determinantes neurobiológicos, sendo a depressão a mais vulnerável a impulsos suicidas. Esta vulnerabilidade resulta da interação entre “gatilhos” ou precipitantes e o desencadeamento do ato suicida. Pode, ainda, o sujeito possuir suscetibilidade genética, mas esta apenas se manifestara na presença de estresse intenso ou durante a manifestação de uma doença psiquiátrica (KAPCZINSCKI et al., 2001). Contudo, é muito importante frisar que o sujeito está em estado depressivo e não deve ser identificado como deprimido, é como rotulá-lo e por fim formatá-lo. [...] as perturbações das emoções, dos sentimentos, do pensamento, do humor e da percepção podem colocar em risco a integridade do indivíduo, de sua família e de todos que estão a sua volta. Disponibilizar os cuidados necessários em um ambiente confiável, seguro e protetor pode ser decisivo para o sucesso das ações nos momentos de crise. O que impede que isso aconteça é a desatualização dos profissionais disponíveis a c e rc a d a s q u e s t õ e s q u e e nvo l ve m sofrimento psíquico. O momento da crise é um instante de fragilidade emocional para o paciente e seus acompanhantes. Todos eles devem ser tratados com a habilidade necessária, em busca de uma solução para a crise, levandose em conta o encaminhamento posterior para o tratamento de manutenção, que quase sempre é imprescindível (SOUZA, 2006). O fator relevante é a construção de um vínculo de confiança e aliança com o paciente, alcançado a partir de uma linguagem franca, atenta, interessada, sem qualquer tipo de ameaça. Assegura-se que o que foi combinado pela equipe com a pessoa e sua família serão cumpridos em todos os momentos do tratamento. A meta é ter paciência, disponibilidade e procurar acalmar o paciente, sua família e amigos. Em vista disso, torna-se possível perceber a grande relevância do ato de compreender e respeitar o paciente da maneira que ele é. Não prometer o que não possa ser cumprido e sim esclarecer os recursos disponíveis a ajudá-lo. 2.3.2 Papel da Enfermagem na reabilitação psicossocial Desde criança estamos rodeados de outras pessoas, muitas vezes dependendo delas. É fácil perceber que é impossível sobreviver sozinho, precisamos estar com outros para crescer e nos relacionarmos. Assim, para o sucesso de um tratamento, temos que levar em conta o contexto social do indivíduo no qual está inserido (ESCOLA POLITÉCNICA DE SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO, 2003). O homem é um ser social, relaciona-se com outras pessoas na família, no trabalho, na igreja e na escola vivemos em grupos. A depressão, por ser uma doença que altera a afetividade e o humor, aparece de forma significativa no grupo em que o indivíduo está inserido, sendo então necessário, juntamente com os demais passos do tratamento, auxiliar o paciente na (re)inserção do mesmo em seu grupo (ESCOLA POLITÉCNICA DE SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO, 2003). Para compreender o paciente a ser cuidado, precisamos compreender o contexto no qual vive, ou seja, o grupo ao qual ele pertence. Lembrar-se que tem ideias, valores, costumes, concepções sobre a vida, 2.3.1 Suicídio O suicídio é o resultado da interação de uma alteração no conteúdo do pensamento (ideação suicida) com uma alteração na conduta do paciente (ato suicida) que tem como resultado final a morte (KAPCZINSCKI et al., 2001). 145 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 saúde e doença que nem sempre são iguais as nossas. Com uma aliança entre a equipe de saúde/paciente e família, o trabalho torna-se efetivo. Incentivar a família para que seja participativa no tratamento, no cuidado e nas decisões referentes a seu familiar, talvez seja o principal passo na (re)inserção social, visto que o paciente, em seu estado de depressão, pode ter afetado ou rompido laços familiares. TE 7, TE 8), e na forma de Enf. 1 (Enfermeiro 1) e assim sucessivamente (Enf 2, Enf 3, Enf 4). Entrevistado Sexo Faixa Etária Escolaridade Tempo na Instituição TE 1 Fem. 44 anos Téc. Enf. 28 anos TE 2 Masc. 25 anos Téc. Enf. 2 – 4 anos TE 3 Fem. 33 anos Téc. Enf. - de 1 ano TE 4 Fem. 28 anos Téc. Enf. - de 1 ano TE 5 Fem. 19 anos Téc. Enf. - de 1 ano TE 6 Fem. 30 anos Téc. Enf. 6 anos TE 7 Masc. 38 anos Téc. Enf. 4 – 8 anos TE 8 Fem. 39 anos Téc. Enf. 8+ ENF 1 Fem. 30 anos Aux. e Enf. 8 + ENF 2 Fem. 28 anos Enf. 2 – 4 anos ENF 3 Fem. 24 anos Enf. - de 1 ano ENF 4 Fem. 28 anos Enf. - de 1 ano Fonte: Trentini; Zimpel; Schorn; Cavalheiro, 2012. 3 METODOLOGIA Para o desenvolvimento deste estudo optouse pela abordagem qualitativa, do tipo exploratório descritiva, tendo como objetivo identificar as dificuldades da equipe de Enfermagem no acolhimento e cuidado ambulatorial e integral ao paciente em depressão. O método de coleta dos dados utilizado foi à entrevista guiada por um roteiro semiestruturado. Foram entrevistados 12 profissionais componentes das equipes de Enfermagem, sendo eles técnicos e Enfermeiros de uma instituição hospitalar de médio porte, localizado na Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. O presente estudo foi elaborado conforme a resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que regulamenta a pesquisa com seres humanos. Tempo de Experiência 10 + 4-6 1 4-6 1 10 + 8 10 + 6-8 4 2-4 1 Quadro 1: Perfil dos entrevistados. Com o intuito de compreender melhor o universo de significados presentes nas falas dos entrevistados, foi necessário desprender grande esforço para captar nas falas as diferentes concepções sobre a atuação da equipe de enfermagem na abordagem do paciente em depressão. As informações coletadas são estruturadas a partir das questões do roteiro de entrevistas, o qual contempla JUN questões semiestruturadas, que serão apresentadas, fundamentadas e comentadas separadamente como segue. 4.1 CONHECIMENTOS SOBRE A DEPRESSÃO Neste núcleo são apresentados os depoimentos dos profissionais da equipe de Enfermagem participantes da pesquisa, expressando sua concepção em relação à patologia depressão, de acordo com sua formação e vivência do dia-a-dia. Conforme Hyman, Tesar (1994), a depressão se refere a uma síndrome psiquiátrica caracterizada por humor deprimido e sintomas neurovegetativos e sinais de duração significativa. Apresentamos os dados coletados a seguir. 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O capítulo aborda a discussão dos resultados da pesquisa após a análise dos dados coletados a partir de entrevistas guiadas por um roteiro semiestruturado, que foi realizado com componentes das equipes de enfermagem da instituição. A análise se dá abordando os conceitos de vários autores já apresentados no referencial teórico. Foram entrevistados doze profissionais, sendo eles técnicos e Enfermeiros, dos diferentes setores. Com o roteiro utilizado na entrevista foi possível coletar dados sobre o perfil do entrevistado e importantes informações sobre o contexto do estudo. Para fins de análise, os entrevistados fo ra m e n u m e ra d o s p e l a o r d e m d a s entrevistas, em forma de TE 1 (Técnico de Enfermagem 1), e assim os demais sucessivamente (TE 2, TE 3, TE 4, TE 5, TE 6, Tem tanta coisa que daria para dizer, mas o que a gente observa no paciente. Depressão é quando o paciente vem que ele está muitas vezes sem vontade de viver, não tem vontade de se alimentar, de fazer sua própria higiene, a pessoa fica para baixo, não tem vontade muitas vezes para nada, como também tem os pacientes depressivos que são agressivos, mas eu atendo quase mais os pacientes que ficam 146 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 depressivos sem vontade de viver, que perdem o sentido da vida pra eles (TE 1). Depressão ao meu ver é o estado que a pessoa precisa de certos cuidados (TE 2). percepção e atenção, que são qualidades pessoais, influenciem no aprendizado do aluno que cursa o Técnico em Enfermagem. Já três dos profissionais Enfermeiros entrevistados informaram que os aspectos emocionais foram sim valorizados tanto quanto os aspectos técnicos, Enf 1, Enf 2 e Enf 4. O entrevistado Enf 3 relata que achou insuficiente o preparo oferecido em sua formação, como seguem suas falas: Os entrevistados TE 1 e TE 2 trazem muito em suas explanações aspectos r e f e r e n t e s a o c u i d a d o, s e n d o e s s a preocupação de grande importância, pois m o s t ra q u e , m e s m o s e m t e r m u i t o conhecimento sobre a patologia, os profissionais têm preocupação em oferecer um cuidado eficaz. Isso é uma questão bem confusa na verdade, por que nem sempre os aspectos técnicos e emocionais estão juntos, tudo depende de cada caso, mas eu acho que eles precisam ser valorizados e levados em conta os dois juntos. Acredito que na minha formação os aspectos emocionais foram s i m l e v a d o s e m c o n s i d e ra ç ã o . P r o c u r o sempre levar em conta o lado emocional (ENF 1). Acho que sim (ENF 2). Infelizmente não somos suficientemente preparados para trabalhar com pacientes em depressão. Muitas vezes os aspectos técnicos são mais priorizados, para posteriormente analisarmos os aspectos emocionais, para então propormos um planejamento de enfrentamento e ajuda a esses pacientes (ENF 3). Depressão a gente vê como uma pessoa que se comporta triste, desamparada, solitária, sem estímulo para vida (ENF 1). Percebe-se no relato do entrevistado Enf 1 que há um entendimento dos sintomas da depressão como comportamento, ou seja, relaciona a depressão como forma comportamental. 4. 2 FORMAÇÃO: ASPECTOS EMOCIONAIS E TÉCNICOS Neste núcleo está sendo enfocada a formação dos profissionais, em que se questionou a importância dada pelo curso em trabalhar os aspectos emocionais assim como os técnicos. Os emocionais não são valorizados, mais os aspectos práticos (TE 2). Acho que são mais valorizados os técnicos do que os emocionais (TE 3). Eu acho que no meu curso teve muito sobre a questão do psicológico da pessoa, foi muito bem trabalhada essa parte. Eu gostei muito disso, de que não é só o físico e foi posto muito em evidência o psicológico e emocional da pessoa, não só a doença em si, mas também que a pessoa pode estar psicologicamente abalada devido à doença (TE 6). O enunciado de Enf 3 divulga claramente como se segue o atendimento na instituição, a falta de preparo técnico, humano e emocional adequados, deixando clara a lacuna dos serviços de saúde no tocante aos cuidados com os pacientes em sofrimento psíquico. 4.3 ATITUDE AO CUIDAR DE UM PACIENTE EM DEPRESSÃO Neste núcleo são enfocadas as atitudes dos profissionais ao se depararem com uma pessoa com depressão a ser cuidada na instituição que trabalha. A partir das falas dos entrevistados, estas podem estar relacionadas ao preparo do profissional, ao seu potencial empático e sua estabilidade emocional, conforme consta nas falas abaixo: Visualiza-se, a partir dos relatos dos entrevistados com formação técnica em Enfermagem, que apenas um, TE 6, relata terem sido trabalhadas as questões emocionais do paciente no seu curso. É possível que os fatores sensibilidade, 147 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 A gente sente que precisa dar um cuidado mais intensivo para ela, não tem muita diferença, mas a gente sente que precisa dar um cuidado a mais para ela (TE 2). A atitude minha é que o ponto de vista que a gente vê é que precisa dar mais atenção pra ela, que ela precisa de certos cuidados específicos que outros pacientes não necessitam tanto desses cuidados (TE 2). A gente sempre tenta levar em conta o estado desta pessoa respeitando ela e seus problemas, também a gente leva em conta o lado de a gente trabalhar este ser humano para motivá-lo à vida que é importante fazer o tratamento, envolver os familiares (ENF 1). Entende-se no dizer de TE 2 o conhecimento da importância de oferecer um cuidado diferenciado e mais humano ao paciente com depressão. Um pouco com medo (TE 3). Eu não gosto muito, pois é uma pessoa bastante chorosa, queixosa, eles já vêm pra internar por causa disso (TE 4). Sinto pena porque já passei por isso e sei como é e, ao mesmo temp,o eu me sinto motivada, pois vou lá, converso com a pessoa e tento passar a minha experiência a ela. E também acho que a pessoa com depressão não consegue se livrar dela sozinha, sempre vai precisar de ajuda (ENF 2). Nos relatos de TE 2 e Enf 1 é possível visualizar o entendimento dos mesmos quanto à importância da atenção, do respeito e da presença constante dos familiares junto ao paciente. Acho que precisa ter muita paciência com uma pessoa depressiva, para quem não convive com isso parece que ela está brincando, está se fazendo, não é uma pessoa fácil de lidar, uma doença bem complicada e bem forte (TE 6). Durante a realização das entrevistas, percebeu-se que a maior parte dos entrevistados desviou a questão sentimento, respondiam com falas relacionadas a assuntos diversos sobre a patologia, e apenas TE 3, TE 4 e Enf 2 citaram sentimentos como medo, pena e desgosto pelos sintomas da depressão. No enunciado de TE 6 está presente um ponto muito importante a ser discutido, referente à compreensão dos sintomas e à relação dos mesmos com o caráter do paciente, os quais são seguidamente confundidos. Para Stahl (2003, p. 2), “estigma e desinformação na nossa cultura criam uma concepção errônea popular de que a depressão não é doença mental e, sim, deficiência do caráter, que pode ser debelada com força de vontade”. 4.5 ASPECTOS MAIS IMPORTANTES NO CUIDADO Neste núcleo estão inseridos os relatos dos profissionais entrevistados referentes ao que consideram mais importantes no cuidado de um paciente em sofrimento emocional. Conforme Smeltzer; Bare, (2006), um importante aspecto do cuidado consiste em explicar aos pacientes que a depressão é uma doença clínica e não um sinal de fraqueza pessoal, e que o tratamento efetivo possibilitará que eles se sintam melhor e permaneçam emocionalmente saudáveis. 4.4 SENTIMENTO DO PROFISSIONAL Neste núcleo estão incluídas as informações coletadas referentes ao sentimento do profissional ao desprender cuidados a um paciente com sofrimento psíquico. Este núcleo, juntamente com o núcleo anterior, traz diferentes discursos, mas com os mesmos sentidos. Conforme as falas abaixo: Eu acho que tu deve sempre dizer o valor da vida, tentar explicar para ele que aqui 148 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 no hospital às vezes tem pessoas com uma doença grave incurável, que a depressão, se ele fizer o tratamento pode ter cura, e sempre tentar ajudar ele e dizer que ele é uma pessoa importante, que todo mundo conta com ele (TE 1). atitudes que a pessoa faz, faz com que a gente perceba que ela está abalada emocionalmente. Isso a gente consegue perceber na crise, mas claro, tem pessoas que demonstram de forma mais agressiva, outros já ficam mais calados. Então a gente consegue perceber tranquilamente (ENF 1). O lugar acho que tem que ter um lugar específico e pessoal preparado porque precisa ter preparo pra lidar com esse tipo de pacientes (TE 3). Acho que sim, acho que toda pessoa que trabalha na saúde consegue identificar quando uma pessoa está emocionalmente abalada (TE 7). Tentar ter a maior calma com eles, ser bem compreensivo com eles, pra eles não ficarem o tempo inteiro naquela emoção deles, tentar mudar de assunto, tentar botar outras conversas no meio, não ficar só naquela sensação deles (TE 4). Evidencia-se, nos relatos apresentados, que os entrevistados afirmam ter conhecimento da crise emocional. Reconhecer uma crise emocional não depende apenas de preparo e conhecimento, mas em especial da capacidade de ouvir, de ser empático, sensível e de saber respeitar o paciente. Compreende-se, a partir das palavras dos entrevistados, a presença de sua preocupação em oferecer no seu cuidado aconchego e conforto, tanto ao paciente quanto aos seus familiares. Também é muito presente em suas falas o reconhecimento da necessidade de preparo específico para que o cuidado seja eficiente. 4.7 PACIENTE QUE PLANEJA E TENTA O SUICÍDIO No presente núcleo serão apresentadas as explanações dos profissionais entrevistados quanto a sua visão do paciente que planeja e tenta o suicídio. Conforme as falas evidencia-se certo desprezo ao paciente suicida. Relatam vários aspectos, mas desconhecem a relação do suicídio com o sofrimento e a busca pela libertação da dor psíquica. 4.6 RECONHECENDO UMA CRISE Neste núcleo estão apresentados os dizeres dos profissionais entrevistados ao serem questionados se sabem reconhecer um paciente que se encontra em crise emocional. A nossa visão é quanto à falta de atitudes do cliente que tenta ou até mesmo pratica o suicídio (ENF 4). Deve ser porque eles têm aquele pensamento negativo que já têm o demônio com eles, é quando o diabo fala mais forte, por isso a pessoa se mata. E acho que quando a pessoa já está naquele fundo é difícil tu conseguir tirar ele de lá. Também não sei, às vezes é só uma depressão, ou a mente deles que está tão contaminada (TE 4). Não sei, acho que, não sei como falar, pois acho muito complicado e forte para o paciente, acho que ele encontra seus motivos, às vezes coisas que seriam Mendes (1995) define crise como uma súbita desorganização do indivíduo, em nível de comportamento, humor ou pensamento, levando à incapacidade, mesmo que momentânea, de controlar e desempenhar suas atividades usuais pessoais, laboratoriais e sociais. Isso a gente vê frequentemente, pessoas que estão no dia-a-dia colegas que às vezes estão com problemas, a gente percebe que a pessoa está com crise emocional. A gente vê que não é um caso de depressão, às vezes a pessoa não está bem, está um pouco deprimida, as 149 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 n a t u r a l m e n t e insignificantes se tornam motivos para a busca do suicídio (TE 6). conversar entender o que realmente este paciente tem (TE 6). Os entrevistados TE 2, TE 5 e TE 6 abordam uma preocupação com o número de colaboradores, que é muito reduzido na instituição para a demanda de pacientes, também trazem o treinamento como necessário, mas no momento ausente. C o m o é p o s s í ve l p e r c e b e r, o s entrevistados demonstram grande confusão em relação ao suicídio, realmente desconhecem sua importância e sua origem. Suas falas trazem certo preconceito à pessoa que planeja e tenta o suicídio. Realmente desconhecem sua relação com o sofrimento emocional. 4. 9 A S P E C TO S N E G AT I V O S N O AT E N D I M E N TO A O PA C I E N T E E M DEPRESSÃO No presente núcleo, são descritas as opiniões dos profissionais da enfermagem quanto aos aspectos negativos no atendimento ao paciente em depressão. As respostas recebidas englobam vários aspectos além do atendimento, tais como: número reduzido de colaboradores, ambiente inadequado para internação, despreparo, entre outros. 4.8 EM BUSCA DE MELHORAR O ATENDIMENTO No presente núcleo serão apresentados os dizeres dos profissionais componentes das equipes de Enfermagem quanto à busca de melhorias no atendimento ao paciente em sofrimento psíquico. Acho que a carga de funcionários precisa ser maior pra ter como dar um atendimento melhor, que o número de funcionários é muito pouco e acabamos por não dar a devida atenção. A carga de trabalho é muito grande para o número de pessoal, isso eu acho que deveria mudar. Também acho que deveria ser feito um treinamento com o pessoal, para aprender mais sobre como lidar com o emocional, pois isso não é muito abordado, o que mais contam aqui é a parte mais técnica (TE 2). Se tivéssemos mais profissionais da área, para que nosso trabalho fosse mais tranquilo, não fosse tanta correria, tanto trabalho, tantos pacientes para poucas pessoas cuidarem, porque a gente acaba não tendo tempo pra dar uma atenção específica, uma atenção maior pra esse tipo de paciente (TE 5). Acho que tem pouco profissional preparado pra lidar com doenças psicológicas. Vejo que estas pessoas muitas vezes precisam apenas de um apoio moral, um carinho e atenção e não só medicação. Acho também que falta tempo, poder A correria, o número de profissionais é pequeno (TE 6). Acho que nós como equipe não temos muito tempo para prestar o atendimento adequado a esse tipo de paciente, não temos instalações adequadas, quartos com grades, um exemplo é pacientes que tentam suicídio ficam no terceiro andar do hospital. Totalmente errado, falta muita coisa (ENF 2). Não tem local adequado para alojar estes pacientes, mas enquanto não tiver, precisamos pelo menos dar suporte básico para estas pessoas em sofrimento emocional (ENF 4). E v ide ncia - s e , na s e x pla na çõ e s transcritas, a consciência dos colaboradores perante a necessidade de treinamento. Este pode ser realizado por Enfermeiros juntamente com psicólogo e psiquiatra do hospital, como forma de garantir uma segurança aos profissionais de que estão fazendo a coisa certa e assim alcançar níveis mais altos na qualidade do atendimento ao paciente em sofrimento psíquico. 150 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 4.10 INTERNAÇÃO DE PACIENTE PSIQUIÁTRICO EM HOSPITAL GERAL Neste núcleo estão expostas as respostas dos profissionais entrevistados ao serem questionados se concordam com a internação psiquiátrica em hospital geral. Entende-se, ao estudar suas respostas, que os Enfermeiros têm conhecimento quanto à reforma psiquiátrica e todos concordam com a internação, dos profissionais técnicos, apenas dois concordam. depressão pudesse interferir na melhora daqueles. Outro ponto importante apresentado é o medo; estes dois fatores são oriundos da falta de conhecimento referente à depressão e à falta de compreensão do paciente em sofrimento psíquico. Observa-se ainda muito desconhecimento e preconceitos em relação aos pacientes em sofrimento psíquico. Apesar dos esforços praticados na conscientização dos trabalhadores e população em geral, sobre a internação em hospital geral e o fim dos hospitais psiquiátricos, muito ainda precisa ser feito. Sim, é uma doença como outra qualquer e o paciente não pode ser discriminado ou isolado porque está em depressão, acredito que isso a deixaria mais deprimida (TE 7). Eu concordo, mas precisa ter uma ala psiquiátrica (TE 8). Não, não concordo. Eu acho que tem paciente com depressão e problemas psíquicos que precisam ser internados em hospital psiquiátrico onde os médicos são preparados e a equipe de enfermagem também é preparada, porque é difícil, a gente não vê muitos casos aqui, e poucos casos de internação por causa disso. Então no caso eu particularmente tenho muito medo de lidar com esse tipo de paciente (TE 3). Acho que não, deveria ter um hospital especial pra eles, porque às vezes aqui te mos vár ios tipos de doentes internados e esses assim psiquicamente começam a gritar e agitar então descontrola todo o ambiente em que você trabalha, acho que deveria ter uma ala especial para aqueles pacientes (TE 4). Eu acho que deveria ter uma ala só pra eles, por que muitas vezes, em todos os casos, aqui na unidade tem desde crianças até idosos, quem sabe em uma unidade só pra eles se sentiriam mais acolhidos (TE 5). CONCLUSÃO A atuação da equipe de Enfermagem no acolhimento ao paciente em depressão é um fator muito marcante para quem busca cuidados no hospital. Um paciente em depressão precisa receber muito mais do que o cuidado propriamente dito, ele precisa encontrar a sua pessoa, a sua imagem, a sua autoestima, ele precisa voltar a se sentir necessário e especial. Durante a análise das informações coletadas para fundamentar a pesquisa, o b s e r v o u - s e q u e a g ra n d e m a i o r i a desconhece a patologia depressão, relatando quase que exclusivamente falta de preparo na sua formação e falta de educação em saúde que poderia ser realizada dentro da instituição. Constatou-se, através das explanações de todos profissionais entrevistados, que o número de colaboradores da instituição é insuficiente para a demanda, e os mesmos referiram negligenciarem o fator psicológico e emocional do paciente por falta de tempo. Em diversos relatos dos participantes do estudo pôde-se perceber a preocupação em oferecer conforto, segurança e cuidado integral. Mas esta preocupação não é suficiente para desenvolver o cuidado na sua totalidade, o conhecimento e a informação são as chaves para o sucesso no cuidado de um paciente em depressão. Evidenciou-se, nos relatos dos p r o f i s s i o n a i s e n t r e v i s t a d o s , g ra n d e insegurança em lidar com pessoas que sofrem com a depressão. Esta insegurança vem acompanhada de medo e desgosto por Os entrevistados TE 3, TE 4 e TE 5 apresentam em suas falas uma preocupação com os outros pacientes internados por outros motivos, como se o paciente em 151 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 cuidar deste tipo de paciente. Em alguns casos foi possível perceber certa discriminação ao doente mental, vendo este como ameaça à equipe e aos demais pacientes internados. Em relação a sua visão do paciente que planeja e tenta o suicídio, a totalidade desconhece a origem da busca pelo suicídio como única saída para o paciente quando se encontra em um estado extremamente grave da doença. Os pensamentos suicidas são fortes indicativos da gravidade do estado psicológico da pessoa, os participantes evidenciam vários fatores como desencadeantes de uma atitude suicida, entre estes a disfunção de caráter. Fato que evidencia sua falta de informação quanto à gravidade da depressão. Referente à importância da família no cuidado e tratamento do paciente em depressão, os entrevistados apresentavamse bem informados. Salientam não se doarem mais aos familiares e pacientes pela falta de conhecimento e tempo para atender toda demanda de trabalho diário. Ressalta-se, no entanto, que a pesquisa demonstra o quanto o fator humano e os trabalhos de educação em saúde são importantes e trazem inúmeras melhorias para o trabalho das equipes de Enfermagem. Com isto, os profissionais trabalham mais tranquilos e conscientes de que estão alcançando os objetivos do cuidado. Por fim, pode-se afirmar que, além do conhecimento específico adquirido sobre o tema, encontraram-se conhecimentos além do esperado. As hipóteses levantadas no início da pesquisa foram confirmadas, bem como os objetivos propostos satisfatoriamente alcançados. MENDES, Afrânio de Carvalho. Serviço de saúde mental no Hospital Geral. Campinas: Papirus, 1995. MINAYO, Cecília Maria. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 22. Ed. Petrópolis: Vozes, 2004. RODRIGUES, Antonia Regina Furegato. E n f e r m a g e m p s i q u i á tr i c a : s a ú d e mental - prevenção e intervenção. São Paulo: EPU, 2006. S M E LT Z E R , B A R E . T r a t a d o d e enfermagem médico-cirúrgica. 10 Ed. Vol. 1. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. SOUZA, Nilton Elias de. A Enfermagem na saúde mental. Goiânia: AB, 2006. STHAL, Stephen M. Psicofarmacologia. Depressão e transtornos bipolares. Rio de Janeiro: Medsi, 2003. REFERÊNCIAS CID - 10 Classificação Internacional de doenças. Vol 1, Editora da Universidade de São Paulo USP, 1998ESCOLA POLITÉCNICA JOAQUIM VANÂNCIO. Textos de apoio em saúde mental. 20 ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003. HYMAN, Steven; TESAR, George E. Manual de emergências psiquiátricas. 3. Ed. Rio de Janeiro: Medsi, 1994. KAPCZINSKI, Flávio et al. Emergências psiquiátricas. Porto Alegre: Artmed, 2001. 152 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 O PESO ELEVADO AO NASCER INFLUENCIA NAS COMPLICAÇÕES DE SAÚDE NA INFÂNCIA Sofia Bronstrup Gisch 1 Carlice Maria Sherer 2 Beatriz Carvalho Cavalheiro 3 S ETREM 4 ABSTRACT Fetal growth is associated with weight at the moment of birth and the gestational age, which are used to rate newborns. The study has as the objective to verify the growth of babies born Large for Gestational Age LGA in the year , under the health analysis, having as a methodological focus the research of documental analysis with a quantitative and qualitative approach. The LGA newborns in were firstly identified in medical records from a Hospital Institution in the Northwest region of Rio Grande do Sul. From the newborns LGA found in the medical records, were located in their houses. Afterwards, a house visit was performed for data collection, occurred through an interview with structured form with closed questions, applied to parents or responsible ones for the newborns. The ethical principles were respected according to the resolution from National Health Council in Portuguese CNS , which discusses the legal guidelines which regulate the research with human beings. For data analysis, the computer software Epi Info and Microsoft Office Excel were used, and the results are presented under the form of charts and graphs. It was possible to observe that in the research and in bibliographies that for the birth of a LGA many factors are associated, such as mother s age, weight increasing during pregnancy, multiparity, qualified prenatal care, to mention a few ones. It is possible to conclude that the exaggerated weight at birth along with sedentarism, lifestyle, genetics, all these lead the child to childhood and adolescence with overweight or obesity. It can be highlighted the importance of follow-ups of LGA newborns in their growth by the health team in order to avoid disorders like obesity throughout their life. Keywords: Newborns. Prenatal. Nursing. RESUMO O crescimento fetal está associado ao peso no momento do nascimento e a idade gestacional utilizado para classificar os recém-nascidos. O estudo tem como objetivo verificar o crescimento de crianças nascidas Grandes para a Idade Gestacional (GIG) no ano de 2002, sob a ótica da saúde, tendo como foco metodológico a pesquisa de análise documental com abordagem quantitativo-descritiva. Os recém-nascidos (RN) GIG do ano de 2002 foram identificados nos prontuários de uma Instituição Hospitalar da região Noroeste Gaúcha, dos 14 RNs GIG encontrados nos prontuários, 7 foram localizados em sua residência; após realizou-se visita domiciliar para a coleta de dados que ocorreu através de uma entrevista com formulário estruturado com perguntas fechadas, aplicado aos pais ou responsáveis. Os princípios éticos foram respeitados. Para análise dos dados utilizou-se o Epi Info e o Exel 2007 e os resultados estão apresentados sob forma de tabelas e gráficos. Evidenciou-se na pesquisa e em bibliografias que para o nascimento do RN GIG vários fatores estão associados, tais como a idade da mãe, aumento de peso na gestação, multipariedade, acompanhamento com pré-natal qualificado, entre outros. Conclui-se que o peso e x a g e ra d o a o n a s c e r a c o m p a n h a d o d e sedentarismo, estilo de vida, genética, leva a criança à infância e adolescência com sobrepeso ou obesidade. Podemos ressaltar da importância do acompanhamento dos RNs GIG no seu crescimento pela equipe de saúde para evitar transtornos como a obesidade no decorrer de sua vida. Palavras-chave: Recém-nascidos. Pré-Natal. Enfermagem. 1 Enfermeira da maternidade do Hospital São Vicente de Paulo da cidade de Três de Maio/RS. Mestre em Educação nas Ciências, Professora do Bacharelado em Enfermagem SETREM. E -mail: [email protected] 3 Mestre em Enfermagem, Professora do Bacharelado em Enfermagem SETREM. E -mail: [email protected] 4 Sociedade Educacional Três de Maio (SETREM), Avenida Avaí, nº 370, Três de Maio, Centro, Cep. 98910 -000, RS, Brasil. E -mail: [email protected] 2 153 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO O crescimento fetal está ligado ao peso ao nascer e à idade gestacional, sendo usados como padrão em neonatologia para classificar os recém-nascidos (RN). O peso ao nascer poderá influenciar no quadro de saúde do mesmo, pois quando é grande para idade gestacional (GIG) torna-se preocupante, pois são mais suscetíveis aos riscos associados. As gestantes que estão predispostas a dar a luz ao RN GIG, deverão ser acompanhadas com um pré-natal (PN) mais complexo, evitando que o feto ou a gestante desenvolvam alguma patologia que possa interferir ou prejudicar a gestação, sendo que em muitas ocasiões isso não é possível. O aumento da obesidade infantil nos últimos anos no Brasil tem sido associado a vários fatores como, diferentes condições de v i d a f a m i l i a r, h á b i t o s a l i m e n t a r e s , sedentarismo na infância e o peso ao nascer; também podem estar ligados ao sobrepeso, podendo acarretar em problemas de saúde mais sérios na idade adulta e tendo um impacto significativo na vida da criança (CABALLERO, 2005 apud MENEZES et al.,2011). O tema em questão torna-se relevante devido à deficiência de conhecimento na área, sendo uma temática envolvente que faz pensar em relação ao peso no momento do nascimento. Nas primeiras horas de vida os RNs GIG necessitam de assistência da equipe de saúde contínua para evitar complicações associadas. O presente estudo teve como objetivo verificar, na atualidade, o crescimento de crianças nascidas GIG no ano de 2002, sob a ótica da saúde. Objetivos específicos: Identificar e localizar os RNs GIG de 2002 nos prontuário de uma Instituição Hospitalar; Investigar se durante a gestação destes RNs houve alguma intercorrência ou doença associada; investigar a possível existência de doenças, obesidade ou outro transtorno nas crianças nascidas em 2002; traçar um paralelo entre os dados antropométricos dos RNs GIG e a situação dos mesmos na atualidade. 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1 ASSISTÊNCIA AO PRÉ-NATAL DURANTE A GESTAÇÃO Para ter um pré-natal com maior qualidade, estruturado e organizado, foi disponibilizado pelo Departamento de Informática do Sistema de Único de Saúde (DATASUS) o Sistema de Informação sobre o Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento (SISPRENATAL), sendo um programa de uso indispensável nas unidades de saúde, facilitando a avaliação e acompanhamento de todas as gestantes (BRASIL, 2006). Segundo Koffman; Bonadio (2005) apud Carmo (2006) a assistência ao PN adequado, torna-se importante durante a gestação e para o crescimento do feto, identificando possíveis complicações que possam surgir nesse período, minimizando assim os fatores de riscos associados. O PN é um momento oportuno em que a gestante pode esclarecer suas dúvidas e receber orientações da equipe de saúde. Torna-se extremamente importante que durante o PN sejam adotadas as medidas preventivas para prevenir o crescimento fetal exagerado, controlando o ganho de peso materno, realizar exames de glicemia para controlar a glicose e evitar diabetes melito gestacional, evitando complicações durante o parto e pós-parto, os fetos macrossômicos são identificados pelo exame físico e pela ecografia obstétrica (BITTAR; RAMOS; LEONE, 2003). As Unidades Básicas de Saúde e as Unidades Hospitalares precisam ter uma continuidade na assistência à saúde integral, uma complementando a outra para que o serviço em saúde seja mais eficiente, sendo que durante o PN é o período ideal para a preparação ao parto e a detecção de possíveis alterações na gestação, prevenindo doenças como a hipertensão e diabetes gestacional, entre outras complicações (BRASIL, 2001). 2.2 ASSISTÊNCIA A FAMÍLIA DO RN EM RISCO Com o nascimento de um RN de risco, os pais ficam desamparados, deprimidos, sem forças para seguir em frente, pois sonharam durante toda gestação no filho perfeito. Muitas vezes os RNs de risco ficam internados com cuidados intensivos por algum período, isso também se pode tornar um sofrimento para a família (KENNER, 2001). O nascimento de um recémnascido de alto risco pode parecer uma tragédia para a família que, durante o 154 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 transcurso da graviJUN, criou expectativas de um filho cujas características iriam refletir as suas, cuja capacidade eles poderiam adestrar e cujos interesses eles iriam compartilhar. Com o nascimento da criança a família experimenta a perda do filho “perfeito” dos seus sonhos (KENNER, 2001, p. 260). (KENNER, 2001). A adequada avaliação da idade gestacional e do peso ao nascer é importante, devido à forte associação sobre a morbidade e a mortalidade de RNs e o seu desenvolvimento durante a infância. Com a moderna tecnologia de equipamentos e profissionais capacitados, isso contribuiu positivamente na saúde e na sobrevivência em geral de todos os neonatos em risco (LOWDERMILK; PERRY; BOBAK, 2002). 2.4 FATORES QUE INFLUENCIAM PARA O NASCIMENTO GIG Inúmeros fatores são determinantes para o crescimento do feto. Podem interferir tanto negativamente quanto positivamente e têm influência direta com o peso ao nascer, tais como genética, ambiente, estado nutricional da gestante, desenvolvimento da placenta, doenças endócrinas, tabagismo, fontes de estresse que a gestante está exposta, idade da gestante, deficiência na assistência do PN e, em últimos casos, as condições socioeconômicas também poderão i n f l u e n c i a r ( M O N T E I R O, 2 0 0 0 a p u d CONTESINI;SINHORINI; TAKIUCHI, 2006). O estado nutricional materno no início da gestação e o ganho de peso gestacional se tornam muito importantes, e vêm sendo observados atualmente por vários estudos, pois seu papel é determinante sobre o desfecho gestacional. Dentre estes, destacam-se o crescimento fetal e o peso ao nascer, que podem trazer implicações para a saúde do indivíduo ao longo de sua vida (MELO et al., 2006). 2.5 COMPLICAÇÕES DECORRENTES DA CONDIÇÃO DE RN GIG. Os neonatos considerados GIG estão mais expostos a risco e problemas intraútero e perinatais, podendo romper a membrana uterina, acarretar em prolapso do cordão umbilical, distócia de ombro, fratura clavícula, paralisia facial e do plexo braquial, angústia respiratória devido à aspiração de mecônio, hipoglicemia, hiperbilirrubinemia neonatal, eritroblastose fetal, anomalias congênitas como transposição dos grandes vasos, elevado índice de morte intrauterina e outras doenças relacionadas à prematuridade (KENNER, 2001). Segundo Galvani (2003) os RNs com macrossomia, devido a sua condição, estão mais predispostos a desenvolver taquipneia O RN de risco é separado de sua mãe logo após o nascimento e transferido geralmente a um berço aquecido e/ou incubadora, para receber cuidados intensivos com equipamentos de suporte. Essa separação poderá interferir no processo de ligação normal de mãe-filho, o vínculo materno tem início antes da concepção, sendo fortalecido durante a gestação e completado no contato no período neonatal. Na primeira visita dos pais ao RN internado com cuidados intensivos deverá ser informado o estado clínico do RN e os equipamentos utilizados para tranquilizar os pais (WHALEY; WONG, 1999). 2.3 CRESCIMENTO FETAL E A CLASSIFICAÇÃO DOS RN Segundo Kenner (2001) os neonatos nascidos GIG são aqueles em que o peso está acima do percentil 90 no gráfico de crescimento intrauterino, independente da idade gestacional, geralmente pesando acima de 4.000 kg, tendo um aumento nas taxas de mortalidade, devido aos riscos e complicações que poderão ocorrer. A avaliação e a classificação dos neonatos têm como parâmetros iniciais o peso e a IG, que possa ser de baixo, médio ou alto risco. Como método de avaliação do RN existe o capurro, que por meio dele se avaliam aspectos somático e neurológico, sendo realizado entre 24 a 48 horas de vida. É avaliada a textura da pele, forma da orelha, glândula mamária, prega plantar e formação do mamilo (PIRES; MELLO, 2000). Os RNs GIG eram considerados saudáveis pelos indivíduos tradicionais e alguns acreditam nesta crença até os dias de hoje, mas clinicamente o crescimento acelerado do feto pode colocar em risco a vida do mesmo e da mãe ao longo da gestação e, no momento do parto, aumentando as complicações, o que pode levar à morte do neonato nas primeiras horas de vida 155 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 transitória. Outros fatores que podem estar associados são: sexo masculino, sedação excessiva, trabalho de parto prolongado. A taquipneia é uma síndrome de desconforto respiratória devido ao retardo na reabsorção do líquido pulmonar. Os neonatos GIG apresentam risco para hipoglicemia, mesmo os que não são filhos de mães diabéticas. A hiperinsulina aparece em alguns dos RN, os mecanismos ainda parecem desconhecidos (HARO; LYRA, 2003). Conforme os autores Parsons et al., (1999) apud Martins; Carvalho (2006) estudos realizados apontaram evidências que existe alguma influência entre o peso ao nascer com a obesidade infantil, sendo que os RNs de baixo peso também têm risco, mas os que nascem com o peso elevado o risco em desenvolver obesidade se torna ainda maior. Segundo Martins; Carvalho, (2006): “associação positiva na qual as crianças que nascem com peso elevado têm maior probabilidade de apresentar obesidade na infância; portanto, o baixo peso ao nascer atuaria como um fator protetor” (p. 2282). Torna-se interessante ressaltar que desde a geração, crescimento e desenvolvimento do indivíduo têm inúmeros fatores que possam estar envolvidos. Sabe-se que hoje a desnutrição está diminuindo e vem surgindo o sobrepeso e a obesidade, cabendo aos profissionais da saúde ter um olhar voltado ao RN GIG e acompanhá-lo no crescimento e desenvolvimento e não deixar que este passe despercebido. 3. METODOLOGIA Esta é uma pesquisa de análise documental com abordagem quantitativodescritiva, realizada durante o primeiro e segundo semestres de 2012, em uma Instituição Hospitalar de médio porte localizado na Região do Noroeste Gaúcho e nas residências dos entrevistados. Conforme Marconi; Lakatos (2008) pesquisa de análise documental é uma fonte d e c o l e t a d e d a d o s r e s e r va d o s e m documentos escritos ou não, compondo o que é denominado de fontes primárias. Essas fontes podem ser coletadas no tempo em que o fato ou fenômeno aconteceu ou depois de algum tempo. A abordagem quantitativa descritiva compreende uma investigação de pesquisa empírica, tendo como finalidade o delineamento ou análise das características de fatos ou fenômenos, a avaliação de programas, ou o isolamento de variáveis principais ou chave. Para a coleta dos dados da pesquisa documental realizou-se um pedido de solicitação para autorização formal à Instituição Hospitalar, na qual se recebeu a autorização para a pesquisa. Por meio do endereço encontrado no prontuário efetuouse uma busca ativa nas residências das crianças nascidas GIG no ano de 2002. No momento em que as crianças foram encontradas em suas residências, realizou-se uma visita domiciliar para a coleta dos dados antropométricos atuais e informações relacionadas à gestação e hábitos de vida da criança. Estes foram coletados com os pais ou responsáveis da criança, através de entrevista com formulário estruturado, com perguntas fechadas. Para traçar esses dados tem-se como base a curva de crescimento do MS de 2009 de uma criança com 10 anos, que consta na caderneta de vacina da criança e também se utilizou o cálculo de IMC para avaliar se a criança se encontra com peso adequado para a idade. Para a realização dessa pesquisa foram levados em conta os preceitos éticos da Resolução 196/96 de 10 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que dispõe sobre as diretrizes legais que regulamentam a pesquisa com seres humanos (BRASIL, 1996). Elaborou-se também um Termo de Consentimento Livre Esclarecido, por meio desse realizou-se a exposição dos objetivos e o caráter sigiloso da pesquisa. Os indivíduos foram devidamente esclarecidos sobre a pesquisa e o emprego das informações prestadas, tendo o direito de desistir de participar a qualquer momento da pesquisa. Os sujeitos que aceitaram a participar da pesquisa assinaram o documento acima citado em duas vias, permanecendo um via consigo e outra com o pesquisador. Para a análise dos dados, utilizou-se o software informatizado Epi Info 2005e também Microsoft Office Excel2007, para apresentar os resultados sob forma de tabelas e gráficos. A população alvo dessa pesquisa é constituída pelos pais ou responsáveis e os RNs GIG nascidos em uma Instituição Hospitalar do Noroeste Gaúcho. A população que compôs a amostra deu-se seguindo o 156 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 modelo de amostragem, foram encontrados 14 casos de RNs GIG nascidos no ano de 2002; o endereço foi extraído do prontuário. Mas, somente sete crianças foram encontradas nos endereços do prontuário e essas foram pesquisadas. 4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS Para a análise dos dados coletados da pesquisa 14 RN GIG que foram localizados nos prontuários da Instituição Hospitalar, somente sete foram localizados; portanto, a amostragem se compôs das sete crianças GIG encontradas, JUN anos após o nascimento. 4.1 DADOS ENCONTRADOS NOS PRONTUÁRIOS Dados encontrados nos prontuários dos sete RNs GIG do ano de 2002 da Instituição Hospitalar. A seguir, descreveu-se o sexo, o peso, os perímetros e o comprimento dos RNs pesquisados. 4.1.1 Sexo dos RNs GIG pesquisados A maioria das crianças nascidas GIG entrevistadas são do sexo masculino com 71% e 29% são do sexo feminino. Conforme Rudge; Calderon, (1997) apud Kerche et al.,(2005) a macrossomia normalmente se desenvolve mais nos fetos de sexo masculino, mulheres multíparas, IMC e estatura elevada, diabéticas, idade mínima de 30 anos, nos pós-datismo, entre outros fatores que interferem. 4.1.2 Peso e a Idade Gestacional dos RNs GIG pesquisados Peso 4000 a 4100 Kg 4100 a 4200 Kg 4200 a 4400 Kg Idade Gestacional 38 semanas 40 semanas Frequência 2 1 4 Porcentagem 29% 14% 57% 5 2 72% 28% foi de 38 semanas e dois nasceram com IG de 40 semanas que equivale a 28%. O peso e a IG são usados para classificar os neonatos. É um método seguro e satisfatório, sendo traçado em um gráfico padronizado com o peso, o comprimento e a circunferência cefálica que identifica a idade gestacional do RN (LOWDERMILK; PERRY; BOBAK, 2002). 4.1.3 Relação dos perímetros cefálico, torácico, circunferência abdominal e comprimento dos RNs GIG participantes da pesquisa Perímetro cefálico: 34 a 35 cm 36 a 38 cm Perímetro torácico: 34 a 35 cm 36 a 37 cm Circunferência abdominal: 33 a 34 cm 35 a 36 cm Comprimento ao nascer 52 a 53 cm 53 a 55 cm 55 a 56 cm Frequência 2 5 Frequência 4 3 Frequência 3 4 Frequência 4 2 1 Porcentagem 29% 71% Porcentagem 57% 43% Porcentagem 43% 57% Porcentagem 57% 29% 14% Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. Ao analisar a tabela acima, observa-se que o perímetro cefálico de dois participantes,ou seja, 29% estão entre 34 a 35 cm e os outros cinco o perímetro está entre 36 a 38 cm; portanto, 71%. O perímetro torácico de quatro RNs está entre 34 a 35 cm que equivale a 57% e os demais 43% ou três RNs estão na faixa de 36 a 37 cm. A circunferência abdominal geralmente é a menor medida; no entanto, três RNs ou 43% estão entre 33 a 34 cm e os outros 57% a circunferência é de 35 a 36 cm, ou seja, quatro RNs. No comprimento, percebe-se que a medida está em torno de 52 a 56 cm, prevalecendo quatro RNs, ou seja, 57% com 52 a 53 cm de comprimento, 53 a 55 cm dois RNs ou 29% e de 55 a 56 cm somente um RN que equivale a 14%. Conforme os autores Whaley; Wong (1999) diversas mensurações têm significado importante para o RN, sendo que a termo a medida normal do perímetro cefálico permanece em média de 33 a 33,5 cm. Normalmente pode ser menor logo após o nascimento, devido ao parto; se o mesmo for vaginal, geralmente é 2 a 3 cm maior do que o perímetro torácico, que fica em torno de 30,5 a 33 cm. O comprimento normal dos RN fica Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. A tabela que representa o peso dos RNs prevalece entre 4.000 Kg a 4.400 Kg, sendo que dois, ou seja, 29% dos RNs pesaram entre 4.000 Kg a 4.100 Kg, um RN, 14% pesaram 4.100 Kg a 4.200 Kg e quatro dos RNs pesaram 4.200 Kg a 4.400 Kg, que equivale a 57%, porém são classificados como RNs grandes para a idade gestacional ou macrossomicos. A IG está em torno de 38 e 40 semanas, cinco RNs, ou seja, 72% a IG 157 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 seu pré-natal. Ao responder a pergunta sobre o estado civil, as entrevistadas responderam que cinco são casadas, ou seja, 72%; uma é solteira 14% e uma tem uma união estável que equivale a 14%. 4.2.3 Problema de saúde antes da graviJUN Ao questionar as mães se elas tiveram algum problema de saúde antes de engravidar, das sete participantes, ou seja, 100% responderam que não apresentavam nenhuma doença e que estavam bem de saúde. A avaliação pré-gestacional é eficaz para identificar ou controlar doenças prévias que possam oferecem riscos à gestante e ao feto. As doenças crônicas são as que podem levar a maiores riscos como a DMG descompensada, hipertensão arterial, epilepsia, infecções HIV, situações como anemias, carcinomas do colo uterino e de mama (BRASIL, 2006). 4.2.4 Número de gestações em média é de 48 a 53 cm. 4 . 2 E N T R E V I S TA C O M A M Ã E O U RESPONSÁVEL 4.2.1 Idade da mãe na gestação Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. O gráfico acima representa a idade da mãe durante a gestação, percebe-se que 57% das mulheres entrevistadas estavam com mais de 35 anos de idade, 15% estavam com 30 a 35 anos, na faixa de 25 a 30 anos são 14% e os demais 14% estavam entre 20 a 25 anos, sendo idade um fator que pode interferir na gestação. Conforme afirma Andrade et al. (2004), as gestantes com mais de 35 anos têdem maior risco a complicações maternas e perinatais, como aumento de ganho de peso exagerado, DM, HAS, anormalidades cromossômicas, macrossomia, mecônio intraparto, restrição no crescimento fetal, sofrimento fetal, entre outras alterações. 4.2.2 A cor/raça, estado civil e escolardade da mãe De acordo com a cor/raça 100% das mães dos RNs GIG participantes são cor/raça brancas, tornando-se um fator de risco para o nascimento de GIG. Conforme Andrade; Duarte (sem ano) a cor/raças influencia no peso ao nascer do RN. As mães de cor/raça parda e negra têm maior risco em desenvolver RN de baixo peso. Ao questionar sobre a escolaridade das mães, quatro responderam que têm o Ensino Fundamental incompleto, ou seja, 57% das pesquisadas e três responderam que têm o Ensino Fundamental completo; portanto, 43%. As mães com pouca escolaridade podem ter influência no entendimento das informações orientadas pelos profissionais da saúde que realizaram o Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. A maioria das participantes respondeu que o neonato GIG foi seu primeiro filho, ou seja, 43%, 14% afirmam ser sua segunda gestação e outros 14% relatam que foi sua terceira gestação e sendo 29% o quarto filho. Conforme afirma Rudge; Calderom (2006), as gestantes multíparas estão predispostas a dar a luz ao neonato GIG, sendo que o IMC da mãe e a diabete gestacional também tem grande influência. 4.2.5 Consultas durante a gestação Questionadas as mães sobre as consultas durante a gestação e uma delas, ou seja, 15% realizaram de quatro a seis consultas e as outras seis, 85% realizaram 158 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 mais de sete consultas na graviJUN. Conforme preconiza o Ministério da Saúde toda a gestante tem direito de ser acompanhada no PN com no mínimo seis consultas, uma no primeiro trimestre que condiz até 12 semanas de gestação, duas consultas no segundo trimestre e no mínimo três no terceiro trimestre (BRASIL, 2006). 4.2.6 Intercorrências durante a gestação Ao questionar sobre as intercorrências na gestação, 57% das mães tiveram alguma complicação. Conforme o relato das mães, as complicações mencionadas foram ameaça de aborto, sangramento e contrações. O restante, 43% afirmam que foi uma gestação tranquila sem nenhum problema com ela ou com o bebê. De acordo com Melson et al. (2002) várias alterações podem ser percebidas na gestante, tanto anatômicas como fisiológicas e bioquímicas, sendo essas normais ou anormais, podem ser identificadas durante o acompanhamento do PN e diagnosticadas precocemente, medidas poderão ser implementadas para garantir uma gestação com o mínimo de intercorrências. 4.2.7 Aumento de peso durante a gestação mulheres que aumentam 16 kg ou mais na gestação. 4.2.8 Uso de Medicação Ao perguntar se fizeram uso de medicação, 57% das mães disseram que sim, mas somente uma delas soube identificar o motivo para o uso de tal medicação, o qual foi devido às contrações prematuras e 43% das entrevistadas responderam que não fizeram uso de medicação. Para Gomes et al., (1999) a gestante está sujeita a uma série de intercorrências de saúde, e faz com que use medicamentos prescritos pelo médico no PN. 4.2.9 Tipo de parto Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. No gráfico acima, observa-se que 29% das entrevistadas tiveram parto cesárea, 57% responderam parto normal e os 14% restantes relataram que foi um parto normal com fórceps. Conforme os dados do MS em 2010, o Brasil registrou mais cesarianas do que partos normais, sendo que a taxa aumentou para 52%. Na rede privada, o índice de parto cesáreo chegou a 82% e na rede pública está com 37% (BRASIL, 2012). Nessa análise é importante resaltar que os dados coletados nos prontuários sobre os pesquisados ocorreram há JUN anos, no ano de 2002; portanto, no passar desses anos obteve-se modificações da porcentagem de parto normal para cesárea. Na instituição pesquisada no ano de 2011, a porcentagem de cesárea foi de 78%. 4.2.10 Alojamento conjunto e amamentação Ao questionar as mães se o bebê foi logo ao quarto após o nascimento, 100% responderam que depois de realizado os primeiros procedimentos com o bebê, o mesmo foi encaminhado ao quarto sem intercorrências e sugou ao seio materno. Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. Quando as entrevistadas foram questionadas sobre qual foi o aumento de peso durante a gestação, 28% responderam que aumentaram até 8 kg, 29% afirmam que engordaram de 9 a 12 kg, 14% contam que foi de 13 a 18 kg e 29% relatam que aumentaram 19 kg ou mais, que foi o ganho de peso da mãe na gestação. De acordo com Ficak (2002) o ganho de peso na gestação é muito importante, sendo acompanhado durante o PN, com o aumento de peso exagerado o qual pode desenvolver RN GIG, principalmente nas 159 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Conforme o Ministério de Saúde, o alojamento conjunto é fundamental para o incentivo do aleitamento materno e a interação entre mãe e o bebê, uma vez que a mãe poderá oferecer o seu leite sempre que ela achar necessário. Além disso, o alojamento conjunto coletivo dá a puérpera a oportunidade de observar outras mães no cuidado do RN (BRASIL, 2001). O tempo que as mães amamentaram é de um mês a 18 meses ou mais. Duas mães amamentaram somente de um a quatro m e s e s , o u s e j a , 2 8 % , o u t ra s d u a s responderam de cinco a doze meses que equivale a 29%, e as demais que somam 42% relatam que amamentaram mais de 18 meses o seu filho. Ressalta-se a importância da amamentação no crescimento e desenvolvimento do neonato. De acordo com as orientações do MS o leite materno exclusivo é recomendado até os seis meses. Após, o bebê deve receber alimentos complementares, sendo importante que ele seja amamentado até os dois anos ou mais. Verifico-se que 72% das entrevistadas amamentaram o tempo preconizado pelo MS (BRASIL, 2009). 4.2.11 Idade que introduziu os alimentos Questionou-se a mãe sobre a idade que introduziu os alimentos, 86% responderam que começaram a oferecer alimentos a seu filho entre cinco a seis meses de idade e 14% relata que iniciou antes dos quatro meses. Conforme a preconização do MS (2009), crianças com mais de seis meses a amamentação deve ser complementada com outros alimentos, no mínimo duas vezes ao dia e, a partir dos nove meses, no mínimo três vezes ao dia. 4.2.12 Seu filho já esteve internado no hospital Dos sete entrevistados na pesquisa seis responderam que já internaram alguma vez, ou seja, 86%, e um deles 14% diz que nunca esteve internado. Os motivos de internação são problemas respiratórios, digestivos e outros motivos como cirurgias. Segundo a Secretaria Estadual da Saúde (BRASIL, 2010) as causas mais comuns de internações ocorridas em crianças de zero a JUN anos em 2008 foram as doenças respiratórias, com 39,8%, as doenças parasitárias com 18% e afecções originadas no período perinatal com 12,3% de internações e as principais causas de morte são as causas externas, neoplasias e doenças do sistema nervoso. 4.2.13 Peso atual de seu filho Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. Observou-se no gráfico que das sete crianças pesquisadas, duas pesaram de 35 a 45 kg sendo 29%, outras três pesaram de 45 a 55 kg, ou seja, 43%, de 55 a 65 kg somente um, ou 14% e de 85 kg também é o peso de uma criança ou 14%. De acordo com o MS (2009) o peso adequado para meninas de 10 anos de idade conforme o gráfico da caderneta de saúde da criança está entre 24 a 47 kg. Para os meninos, o peso adequado está entre 31 a 45 kg. Observando o gráfico dos pesquisados em torno de 70% está acima do peso recomendado. Segundo Caballero (2005) apud Menezes (2011) que traz sobre o aumento do peso na infância que está associada a vários fatores, como o estilo de vida, sedentarismo, consumo de dieta inadequada, renda e escolaridade dos pais, peso ao nascer entre outros. 4.2.14 Altura atual de seu filho . Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. Ao analisar a altura dos participantes no gráfico, percebe-se que duas crianças têm altura de 1,40 cm a 1,45 cm, sendo 28%, outras duas mediram de 1,45 cm a 1,50 cm, ou seja, 29% e três a altura é de 1,50 cm a 1,60 cm. Ao considerar a altura adequada para as meninas com 10 anos, conforme a caderneta de saúde da criança (2009) fica entre 1,26 cm a 1,52 cm, e, para os meninos, altura adequada é entre 1,38 cm a 1,51cm. 160 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Observando o gráfico acima se percebe que 43% dos pesquisados estão acima da altura adequada. 4.2.15 Índice de Massa Corporal das crianças participantes GIG 1 GIG 2 IMC das meninas Frequência 19,67 26,66 IMC dos meninos 1 1 GIG 3 GIG 4 16,32 21,28 1 1 GIG 5 22,38 1 GIG 6 24,65 1 GIG 7 33,2 1 bibliografia, este pode ser um parto de risco, devido à desproporção céfalo-pélvica. Quanto à amamentação, 72% das participantes amamentaram durante o período recomendado pelo MS, verificando que a amamentação é muito importante para o crescimento e desenvolvimento do neonato. Pôde-se ressaltar que todas as gestantes foram acompanhadas no pré-natal e as consultas estão dentro do indicado pelo MS, pois o PN com qualidade traz inúmeros benefícios, sendo que qualquer intercorrência pode ser identificada p re v ia m e n te . Po ré m , o cre s cim e n to exagerado não foi identificado. O ganho de peso durante a gestação é muito importante, pois das mães pesquisadas 43% estava acima do peso; isso poderá ter contribuído para o nascimento do RN GIG. Cerca de 70% das crianças pesquisadas estão acima do peso preconizado pelo MS, podendo se considerar que o fato deles terem nascido GIG contribuiu com que o peso da maioria que é superior ao esperado para a idade. Considerando o IMC, pode-se identificar que das sete crianças pesquisadas, somente uma está dentro do peso adequado para a idade, sendo que as demais estão com sobrepeso, obesidade e obesidade grave. Observou-se e analisou-se que vários fatores possam estar envolvidos com o peso elevado, como sedentarismo, genética, estilo de vida, perfil socioeconômico, peso ao nascer, entre outros, contribuindo assim com o peso que está acima do recomendado. Pode-se ressaltar da importância do acompanhamento dos RNs GIG no seu crescimento pela equipe multiprofissional e principalmente pela Enfermagem, fazer uso da referência e contra referência do Hospital à Rede Básica de Saúde, para evitar transtornos como a obesidade no decorrer de sua vida. Ao término da pesquisa, num contexto mais amplo, que oportunizou ao pesquisador o amadurecimento profissional e enriquecimento dos conhecimentos a respeito do tema pesquisado, tendo poucos trabalhos nessa área. Pode-se afirmar que os objetivos propostos no início do estudo foram satisfatoriamente alcançados e as hipóteses confirmadas. Fonte: Gisch; Scherer; Cavalheiro, 2012. O índice de massa corporal das crianças participantes foi calculado utilizando uma fórmula matemática, sendo usado o peso dividido pela altura ao quadrado (BRASIL, 2006). Ao traçar os dados do IMC, com o recomendado pelo MS que consta na caderneta de saúde da criança. Pode-se observar que o GIG 3 é a única criança que está com o IMC adequado, sendo que o GIG 1 e 4 estão com sobrepeso, o GIG 2, 5 e 6 na faixa da obesidade e o GIG 7 encontra-se com obesidade grave. Considerando os dados do IMC acima pode-se avaliar que a grande maioria das crianças pesquisadas estão acima do peso recomendado, sendo que poderá levá-las a adolescentes e jovens com sobrepeso. Um dos fatores que pode contribuir com o peso na atualidade é o peso ao nascer dessas crianças. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para a realização desta pesquisa contou-se com a participação de sete das catorze crianças nascidas GIG no ano de 2002 na Instituição Hospitalar pesquisada. Após a localização dos RNs, realizou-se uma visita domiciliar e as mães e/ou responsáveis que responderam o formulário. No texto exposto anteriormente tornase importante ressaltar que grande número dos RNs são do sexo masculino, trazendo com base na bibliografia que condiz que o sexo masculino está mais predispostos a nascer GIG. Ressalta-se que a taxa do parto normal, na pesquisa, foi de 71%. Conforme a 161 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 Esta é uma temática que pode trazer muitas contribuições às discussões ligadas à obesidade, tema atual e de grande preocupação dos pesquisadores e trabalhadores da área da saúde, haja vista que as raízes deste mal, que assola o mundo todo, podem estar relacionadas com a genética, condições de gestações e parto e o peso do RN ao nascimento. FICAK, L. B. O Recém-Nascido de Risco: Problemas Relacionados com a Idade Gestacional. In: LOWDERMILK, D. L.; PERRY, S. E.; BOBAK, I. M. O cuidado em Enfermagem Materna. 5ª ed. Editora Artmed. Porto Alegre, 2002. p.775-810. GALVANI, A. L. S. Taquipnéia Transitória de Recém-Nascido. In: MARCONDES, E. et al.Pediatria Básica: Pediatria Geral e Neonatal. 9º ed. Editora Savier. São Paulo, 2003. GOMES, K. R. O.; et al. Prevalência do uso de medicamentos na graviJUN e relação com as características maternas. Revista Saúde Publica. São Paulo, 1999. HARO, F. M. B.; LYRA J. C. Hipoglicemia Neonatal. In: MARCONDES, E. et al.Pediatria Básica: Pediatria Geral e Neonatal. 9º ed. Ed. Savier. São Paulo, 2003. KENNER, C. Enfermagem Neonatal. 2ª ed. Editora Reichmann e Affonso. Rio de Janeiro, 2001. KERCHE, L. T. R. L. Fatores de Risco para macrossomia fetal em gestações complicadas por diabete ou por hiperglicemia diária. Revista Brasileira Ginecologia e Obstetrícia. São Paulo, 2005. LOWDERMILK, D. 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Rio de Janeiro, RJ, 1999. 163 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DO HOMEM: UM DESAFIO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA ¹ Aline Eduarda Maders Caroline Silveira Viana Carlice Maria Scherer Estela Maris Rossato SETREM 2 2 3 3 4 ABSTRACT Knowing the importance that the men should give to their health emerged the motivation to study this population group, with the purpose of contributing to the implementation of Public Policy for Men s Health . It s a qualitative research of descriptive and exploratory approach that presents the major diseases of morbidity and mortality in men. An interview with a patient with testicular cancer was also conducted using a semi structured questionnaire. Through this interview with the participant it was possible to observe that the men feel difficulty to look for health service, by being inserted culturally in a society which the man is a provider and disease causes weakness. In the patient speech it was possible to notice a delay in looking for for health service, demonstrating denial for being sick. From the data analyzed confirming the statistics, most men don t look for health services, don t subject to preventive exams and when the look for services the disease is already installed and aggravated. Mobilizing the male population by fighting and granting their right to health is a social challenge of that policy. It intends to make men protagonists of their demands, fulfilling their citizenship rights. Therefore the results of this study affirm the disadvantage about the health programs to be targeted for all men. Keywords: Primary Attention. Health Program of the Man. Cancer. RESUMO Sabendo da importância que os homens devem dar a sua saúde, surgiu a motivação de estudar este grupo populacional, com o objetivo de contribuir para a efetivação da Política Pública de Saúde do Homem. É uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória e descritiva que apresenta as principais doenças de morbidade e mortalidade nos homens. Também foi realizada uma entrevista com um paciente com câncer de testículo, usando um questionário semiestruturado. Através da entrevista com o participante pôde-se observar que os homens sentem dificuldade de procurar os serviços de saúde, por estarem inseridos culturalmente em uma sociedade em que o homem é o provedor, e o adoecimento acarreta fraqueza. No discurso do paciente entrevistado pôde-se perceber uma demora na procura pelos serviços de saúde, demonstrando uma negação ao adoecer. A partir dos dados analisados confirmando as estatísticas, a maioria dos homens não procuram os serviços de saúde, não se sujeitam aos exames preventivos e quando procuram os serviços a doença já está instalada e agravada. Mobilizar a população masculina pela luta e garantia de seu direito social à saúde é um dos desafios dessa política. Ela pretende tornar os homens protagonistas de suas demandas, concretizando seus direitos de cidadania. Portanto, os resultados deste trabalho afirmam o desfavorecimento, quanto a programas de saúde direcionados para os homens. Palavras-Chave: Atenção Primária. Programa Saúde Homem. Câncer. ¹ Artigo do Projeto Interdisciplinar do ano 2012 do curso de Bacharelado em Enfermagem da Faculdade Três de Maio (SETREM). 2 Acadêmicas de Enfermagem. Sociedade Educacional de Três de Maio – SETREM. [email protected]; [email protected] . 3 Mestres em Bacharelado em Enfermagem da SETREM. e-mail: [email protected] ; [email protected] 4 Sociedade Educacional Três de Maio – SETREM, Av. Santa Rosa, 2504, Três de M aio – RS, e -mail: [email protected] 164 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 1. INTRODUÇÃO Em 2009, o Ministério da Saúde lançou a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), e um dos principais objetivos desta política é promover ações de saúde que contribuam expressivamente para a compreensão da realidade singular masculina nos seus diversos contextos socioculturais e políticoeconômicos; outro é o respeito aos diferentes níveis de desenvolvimento e organização dos sistemas locais de saúde e tipos de gestão. Este conjunto permite o aumento da expectativa de vida e a redução dos índices de morbimortalidade por causas preveníveis e evitáveis nessa população (BRASIL, 2009). Atualmente, a atenção primária encontra grande desafio: prestar assistência à saúde do homem. A proposição da PNAISH visa qualificar a saúde da população masculina na perspectiva de linhas de cuidado que protejam a integralidade da atenção (BRASIL, 2009). O reconhecimento de que os homens entram no sistema de saúde por meio da atenção especializada tem como consequência o agravo da morbidade pelo demora na atenção e maior custo para o Sistema Único de Saúde (SUS). É necessário fortalecer e qualificar a atenção primária garantindo, assim, a promoção da saúde e a prevenção aos agravos evitáveis (BRASIL, 2008). A pesquisa teve como eixo principal a discussão da saúde do homem em um município da Região Noroeste do Rio Grande do Sul, buscando conhecer as principais causas de morbidade e mortalidade que ocorrem na população masculina. Sabendo da importância que os homens devem dar a sua saúde surgiu a motivação de estudar este grupo populacional, com o objetivo de contribuir para a efetivação da Política Pública de Saúde do Homem, buscando-se conhecer o quanto os homens estão se preocupando com a prevenção, se estão seguindo os tratamentos recomendados, quando procuram o serviço de saúde, e como estão sendo atendidos nas unidades de saúde. Mobilizar a população masculina brasileira pela luta e garantia de seu direito social à saúde são os desafios dessa Política. Ela pretende tornar os homens protagonistas de suas demandas, concretizando seus direitos de cidadania. Dessa forma, o trabalho contribui para a produção de um sistema de saúde mais eficaz, com maior equidade entre as ações propostas para o homem. 2. METODOLOGIA Para o desenvolvimento deste estudo adotou-se a fundamentação a partir na Política de Atenção Integral à Saúde do Homem. Através de uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória e descritiva que apresenta as principais doenças que matam o homem. Segundo Minayo (2007, p. 21): A abordagem qualitativa permite compreender o universo de significados, motivações, aspirações, crenças, valores e atitudes correspondentes ao espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos, que podem ser aprendidos através do cotidiano, da vivência e da explicação do senso comum (MINAYO, 2007, p.21). As pesquisas exploratórias têm como finalidade o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições, enquanto as pesquisas descritivas salientam-se pela descrição das características de um determinado grupo. O método é uma forma de chegar a conhecimentos válidos, que neste estudo, acontecem de informações de pessoas diretamente vinculadas com a experiência estudada. (GIL, ANTÔNIO CARLOS; 2002 apud JULIÃO, GÉSICA G.; 2011). Os dados foram obtidos do site do DATASUS e Instituto Nacional do Câncer (INCA) através do sistema de informação. Os dados pesquisados de mortalidade e morbidade, apresentados em forma de tabelas da população de escolha, o sexo masculino, no período de 2010 a 2012. Dentre estes, a segunda opção de escolha foi doenças que mais acometem o sexo masculino e os principais tipos de morbidade das neoplasias, seguindo de uma análise dos quadros e, a partir deles, formando os gráficos em amostra. Para a formulação dos gráficos e o desenvolvimento do trabalho, utilizou-se também artigos científicos relacionados à 165 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 temática e bibliografias para buscar a aproximação da realidade da implementação dessa política de saúde em um município da região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Além disso, realizou-se entrevista com paciente acometido pelo câncer de testículo, que na sua trajetória de diagnóstico e tratamento aceitou gentilmente responder às questões formuladas pelas autoras com a intenção de identificar como ocorreu o diagnóstico, o que o pesquisado pensa sobre a implantação de política pública de saúde do homem, e assim enriquecer a necessidade da construção do programa voltado à saúde do homem. A pesquisa se desenvolveu dentro dos parâmetros da Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que dispõe sobre a pesquisa que envolve seres humanos (BRASIL, 1996). Elaborou-se o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, no qual se informa ao entrevistado a forma de participação, com o consentimento de participação ou não da pesquisa e, assim, preservada a identidade do sujeito em questão. 3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A saúde do homem não era considerada uma preferência das políticas públicas de saúde; mas, com a necessidade de uma maior atenção à população masculina, esta passou a ser uma das prioridades do governo nos últimos anos. Sendo assim, o Ministério da Saúde elaborou a Política de Atenção Integral a Saúde do Homem com o intuito de atingir todos os aspectos da saúde masculina. A década de 70 do século passado é considerada como o marco dos estudos norte americanos acerca da temática "homem e saúde". A partir dos anos 90 do século XX, a temática em questão começou a ser abordada sob uma perspectiva diferenciada. A discussão passou a refletir, dentre outros aspectos, a singularidade do ser saudável e do ser doente entre segmentos masculinos. Essa abordagem veio enfocar, sobretudo, a significação do masculino para buscar-se uma saúde mais integral do homem. (GOMES ROMEU; NASCIMENTO ELIANE FERREIRA DO; 2006 apud JULIÃO, GÉSICA G.; 2011). A política de atenção integral à saúde do homem é regida pelos seguintes princípios: universalidade e equidade nas ações e serviços, humanização e qualificação da atenção à saúde garantindo a promoção e proteção dos seus direitos, coresponsabilidade quanto à saúde e à qualidade de vida desta população, orientação à população masculina, aos familiares e à comunidade sobre a promoção, a prevenção, a proteção, o tratamento e a recuperação dos agravos das enfermidades masculinas (BRASIL, 2008). Além disso, a mesma orienta-se pelas diretrizes da integralidade, da organização dos serviços públicos de saúde de modo a acolher e fazer com que o homem sinta-se integrado, da implementação hierarquizada da política com foco na Estratégia de Saúde da Família, de reorganização das ações de saúde e integração da execução da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem às demais políticas, programas, estratégias e ações do Ministério da Saúde (BRASIL, 2008). Uma situação alarmante para o governo brasileiro é os altos índices de morbimortalidade entre a população masculina em relação à feminina, que apontam o reconhecimento de determinantes sociais que resultam na vulnerabilidade da população masculina aos agravos à saúde. Considerando que aspectos sociais sobre a masculinidade comprometem o acesso à atenção integral, isso pode refletir de modo crítico na vulnerabilidade dessa população a situações de violência e de risco para a saúde. As principais causas destes índices são a violência, o alcoolismo, o tabagismo, as neoplasias, a hipertensão, a diabete e a obesidade (BRASIL, 2008). Em 27 de agosto de 2009 criou-se a Portaria nº 1.944/GM que instituiu a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem e considerando a Portaria nº 1.945/GM, de 27 de agosto de 2009, que reformula os procedimentos urológicos da tabela de procedimentos, medicamentos, órteses/próteses e materiais especiais do SUS. Suas ações estarão concentradas nos homens na faixa etária de 25 a 59 anos, o que corresponde a 41,3% da população masculina ou a 20% do total da população do Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2005. Além disso, a política estará também integrada às outras políticas de saúde do país, 166 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 sobretudo à Política Nacional de Atenção Básica, em harmonia com o Programa de Saúde da Família, priorizando o serviço da Atenção Primária do SUS (BRASIL, 2009). No entanto, a política, na maioria dos casos, ainda está restrita no âmbito teórico e com poucas aplicações práticas. De acordo com a proposta apresentada pelo Ministério da Saúde para a Política da Saúde do Homem, as justificativas apresentadas centram-se nos dados dos sistemas de informações do SUS, os quais informam que, devido a sua vulnerabilidade, os homens apresentam custo maior para o sistema de saúde, devido ao fato de que são mais suscetíveis às doenças, acidentes de trânsito, enfermidades graves e crônicas. Tais dados apontam para a menor expectativa de vida dessa população com relação às mulheres. Outra questão apontada pelos homens para a não procura pelos serviços de saúde está atrelada a sua posição de provedor, alegando que o horário do funcionamento dos serviços coincide com a carga horária do trabalho (BRASIL, 2009). Figueiredo (2005) aponta que o modo de atendimento e a dificuldade de acesso às Unidades Básicas de Saúde (UBS) fortalece que o homem se distancie do serviço de saúde. O tempo de espera pela consulta também atrapalha a realidade masculina. Esse afastamento, a ausência de programas ou estratégias direcionadas aos homens, beneficiando a maior dificuldade de interação entre a população masculina e os serviços de saúde. Outro problema é em relação ao preconceito em relação ao homem, pois a saúde do homem ao longo dos anos foi pouco discutida e abordada, implicando ao mesmo de não ser assistido e o não cuidado (BRAZ, 2005). Sendo necessário que os serviços de saúde enfrentem esta situação identificando as necessidades de saúde dos homens e intervindo com ações preventivas e de promoção à saúde (FIGUEIREDO, 2005). De acordo com Gomes, Nascimento e Araújo (2007), Braz (2005) os serviços de saúde têm uma falha em absorver a demanda apresentada pelos homens, proporcionada pela não estimulação ao acesso destes homens nos serviços de saúde e pelo fato das campanhas de saúde pública não se voltarem p a r a e s t a p o p u l a ç ã o . To r n a m - s e imprescindíveis mudanças nas táticas dos serviços de saúde e na abordagem relacionadas aos homens. Na organização dos serviços de saúde pode ser evidenciada uma complexa teia de relações que envolvem três dimensões que interagem entre si, a saber: 1) os homens na qualidade de sujeitos confrontados com as diferentes dimensões da vida; 2) os serviços na maneira como eles se organizam para atender os usuários considerando suas particularidades; e 3) os vínculos estabelecidos entre os homens e os serviços e vice-versa (BRASIL, 2009). As causas do aumento das taxas de morbidade masculina poderiam ser controladas através de práticas cotidianas de promoção à saúde, destaca Figueiredo (2005). Essa atenção mais específica produziria melhor conhecimento das necessidades masculinas, tanto por parte dos profissionais quanto dos próprios homens (GOMES, 2003). Segundo dados do Ministério da Saúde, 68% das mortes registradas são acometidas na faixa etária de 20 e 59 anos no Brasil, ou seja, a cada três óbitos de pessoas em idade adulta, aproximadamente dois são de homens (incluindo aí as mortes por causas externas, como as causadas pela violência). Além disso, estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a expectativa de vida dos homens (69,8 anos em média) é 7,6 anos menor do que a das mulheres. Para Carrara, Russo e Faro (2009), os homens não são captados pelos serviços de atenção primária, como ocorre com as mulheres, idosos e crianças. Sua entrada no sistema de saúde se daria principalmente pela atenção ambulatorial e hospitalar de médias e altas complexidades, configurando um perfil que favorece o agravo da morbidade pela busca tardia ao atendimento. Isto confirma que culturalmente, os homens buscam por serviços de saúde quando o problema já está instalado, perpetuando a visão curativa do processo saúde-doença e deixando de lado as medidas de prevenção e de promoção da saúde disponíveis na atenção primária. Dentre os serviços oferecidos nas UBS, as únicas ações voltadas especificamente à população masculina são as de prevenção do câncer de próstata, atingindo principalmente homens com idade igual ou superior a 40 167 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 anos. Isto significa que não há serviços oferecidos à população masculina, exceto a dosagem de Antígeno Prostático Específico (PSA), exame de sangue que pode detectar o câncer de próstata. Os programas de acompanhamento de hipertensos e diabéticos que conseguem captar a disponibilidade dos homens acabam atraindo somente os idosos, principalmente por conta do horário que são desenvolvidos. Públicas de Saúde do Homem, aproximadamente 75% das enfermidades e agravos dessa população estão concentradas em cinco grandes áreas especializadas: cardiologia, urologia, saúde mental, gastrenterologia e pneumologia. Conforme dados do DATASUS, em 2010 no RS, na área de cardiologia houve um total de 11.445 óbitos, e as patologias que se destacaram foram de doenças isquêmicas do coração com 4.232 óbitos, logo em seguida vêm doenças cerebrovasculares com 3.800 óbitos e infarto agudo do miocárdio com 3.152 óbitos. Prevalecendo em homens com idade maior de 70 a 79 anos. Nessa faixa etária há maior incidência de fatores de risco (tabagismo, sedentarismo, obesidade, etc.), bem como de doenças crônicas (Diabetes Mellitus, Hipertensão Arterial Sistêmica, Dislipidemias, associadas ao nível de Colesterol). Entre as doenças do aparelho respiratório houve 4.994 óbitos. Os maiores índices que apareceram foram doenças crônicas das vias aéreas inferiores com 2.602 óbitos e pneumonia com 1.519 óbitos. O tabagismo é conhecido fator de risco para doenças do aparelho respiratório. As patologias do aparelho digestivo que se destacaram foram doenças do fígado com 1.160 óbitos, fibrose e cirrose com 447 óbitos. Sendo maior em homens com idades entre 50 a 59 anos, e o risco aumenta com o aumento da idade. As doenças alcoólicas, hepáticas (Cirrose, Fibrose) afetam consideravelmente os homens mais velhos. Doenças do aparelho geniturinário aparecem a insuficiência renal com 470 óbitos. E, por fim, os transtornos mentais e comportamentais aparecem no uso de substâncias psicoativas com 479 óbitos, e transtornos devido ao uso de álcool 371 óbitos. Os maiores índices aparecem na faixa etária de 50 a 59 anos. No quadro a seguir, encontram-se as principais causas de Morbidade Hospitalar do SUS, no estado do Rio Grande do Sul, 2011 e 2012. QUADRO 1: Morbidade Hospitalar em um Município do RS – jan. 2011 a set. 2012 A presente Política enfatiza a necessidade de mudanças de paradigmas no que concerne à percepção da população masculina em relação ao cuidado com a sua saúde e a saúde de sua família. Considera essencial que, além dos aspectos educacionais, entre outras ações, os serviços públicos de saúde sejam organizados de modo a acolher e fazer com que o homem sinta-se parte integrante deles (BRASIL, 2009, sp.). Em detrimento disso, é necessário que os profissionais de saúde, em relação à saúde do homem, adotem formas diferentes de pensar; rompam com atitudes, crenças e valores cristalizados ao longo de sua formação profissional e social e incorporem novos conceitos pertencentes à saúde do homem para, consequentemente, agirem de uma nova maneira, estimulando este homem para que ele se incorpore ao serviço de saúde (ALVARENGA, WILLYANE A; SILVA, SIMONE SANTOS E; 2010). 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES No que diz respeito à implementação dessa política na área de abrangência da Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), essa ainda se encontra restrita à construção conceitual proposta em concepção. As justificativas sobre a não execução da política recaem sobre a falta de ações e informações para que a mesma seja efetivada, bem como a capacitação da equipe de saúde. Desse modo, foram levantadas várias inquietações relacionadas aos motivos para a existência dessas lacunas bem como a baixa participação masculina nas ações de promoção da saúde. Segundo o manual de Políticas 168 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 . Fonte: Maders, Scherer, Viana, 2012. No terceiro lugar estão os transtornos mentais e comportamentais (565 casos). Nas ocorrências de transtornos mentais, aparecem transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool e transtornos mental e comportamental devido ao uso outras de substâncias psicoativas. Em seguida, doenças do aparelho circulatório (471 casos). Nos casos de doenças do aparelho circulatório, destacamse insuficiência cardíaca; logo em seguida, vêm outras doenças isquêmicas do coração e acidente vascular cerebral não específico hemorrágico ou isquêmico. Em quinto estão as doenças do aparelho geniturinário (330 casos). Nos casos de doenças do aparelho geniturinário aparecem insuficiência renal, urolitíase e hiperplasia da próstata. Posteriormente, algumas doenças infecciosas e parasitárias (324 casos). Nas ocorrências de doenças infecciosas e parasitárias está a septicemia. Por último estão as neoplasias (262 casos), os casos de neoplasias serão apresentados no quadro abaixo. QUADRO 2: Morbidade Hospitalar das Neoplasias em um Município do RS – Jan 2011 a Set. 2012. Quadro 01: Mortalidade hospitalar em um município no estão do Rio Grande do Sul – Jan 2011 a Set 2012. Os dados analisados são do período de janeiro 2011 a setembro de 2012 e traz as principais causas de morbidade hospitalar na população masculina em um município do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. A maior porcentagem de ocorrências observada deu-se em doenças do aparelho respiratório (1.103 casos). Entre os casos de doenças do aparelho respiratório, as que se destacam são as pneumonias; logo em seguida vêm as bronquites, enfisema e outras doenças pulmonares obstrutivas crônicas. Em segundo lugar está as doenças do aparelho digestivo com (600 casos). Nos casos de doenças do aparelho digestivo, as que se sobressaem são doenças do apêndice, hérnia inguinal e, também, colelitíase e colecistite. Também em segundo lugar estão lesões de envenenamento e algumas outras consequências, causas externas (600 casos). Nos casos de lesões, envenenamento e algumas outras consequências, causas externas aparecem, fratura de outros ossos dos membros e traumatismo intracraniano. 169 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 quanto mais precocemente a doença for detectada, aumenta as chances de cura. Conforme observado, as neoplasias de esôfago ocupam o terceiro lugar na lista de morbidade. Por ser a análise do noroeste do RS, está relacionada à tradição gaúcha, ouso do chimarrão é preparado na cuia à base de erva-mate e o líquido que se ingere é o preparo de água fervente, sugado através de uma bomba metálica. Segundo FAGUNDES (2005) "Entre os que fumam e tomam chimarrão, o índice era ainda maior". Fonte: Maders, Scherer, Viana, 2012. Quadro 02: Mortalidade hospitalar da Neoplasia em um município no estado do Rio Grande do Sul – Jan 2011 a Set 2012. Os dados analisados do período de janeiro 2011 a setembro de 2012, com as causas de morbidade hospitalar das neoplasias por local de internação na população masculina em um município do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. As maiores ocorrências de morte por neoplasias observadas no quadro acima são as neoplasias maligna de reto, ânus e canal anal (31 casos); em segundo lugar está neoplasia maligna de traqueia, brônquios e pulmão (26 casos); em terceiro lugar, está neoplasia maligna do esôfago (22 casos); em quarto lugar esta as neoplasias malignas do lábio, cavidade oral e faringe (18 casos); mais abaixo está neoplasia maligna de próstata (17 casos); e na mesma posição estão as outras neoplasias malignas em locais não definidos ou não especificados. Entre os casos de neoplasias, as de maior incidência são as de reto, ânus e canal anal. Devido as maiores causas do homem não realizarem os preventivos, a falta de informação e o preconceito, sendo o maior inimigo da prevenção, mas isso vem evoluindo, devido à criação de alternativas para diagnóstico, como o exame de sangue e, além disso, ao aumento do risco de outras doenças e o receio ao câncer vem levando os pacientes a buscarem os serviços de saúde, O câncer de esôfago é a sexta causa de morte por doença no mundo. Se forem considerados somente os p a í s e s e m desenvolvimento, este tipo de câncer aparece como a quarta causa de óbito. O Rio Grande do Sul, onde muitas pessoas mantêm o hábito de tomar chimarrão, é o estado com os maiores índices de câncer de esôfago no Brasil (BARROS; et al., 2000, p. 25). Também foram analisados dados da morbidade no mesmo período dos dados anteriores que mostram a faixa etária dos homens que mais são acometidas. Os maiores índices são de neoplasias malignas dos brônquios e pulmões, da idade entre 60 a 79 anos com total de 13 casos, neoplasia maligna de reto, ânus e canal anal entre 50 a 69 anos com 10 casos, neoplasias maligna da 170 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 confundido por orquiepididimites, que são inflamações dos testículos e dos epidídimos, geralmente transmitidas sexualmente (INCA). A baixa incidência o câncer de testículo é pouco trabalhado nas UBS, pode ser um dos fatores que prejudica na identificação precoce da patologia. Os principais fatores de risco para o desenvolvimento de câncer de testículo são: histórico familiar, lesões e traumas na bolsa escrotal e a criptorquidia. Na infância, é importante a realização do exame para verificar se ocorreu normalmente a descida dos testículos para a bolsa escrotal. Participou deste estudo um homem de 28 anos acometido pelo Câncer de Testículo em metástase retro peritoneal, que na trajetória de tratamento aceitou responder às questões formuladas pelas autoras com a intenção de entender os anseios frente à enfermidade e enriquecer a necessidade da construção do programa voltado à saúde dos homens. Estava presente também sua esposa que prontamente o ajudou a responder. Questionado o porquê de ter adiado a procura médica, ele respondeu que um pouco foi devido à vergonha, ao desleixo e também à falta de informação. “Faltou isso pra mim, orientação. Se eu tivesse tido informação não teria esperado tanto tempo e não estaria nesse estado” (2012). próstata entre 70 a 79 anos, total de 7 casos e as neoplasias malignas de esôfago, entre 50 a 69 anos, total de 3 casos. Portanto, pode-se perceber que as neoplasias atingem principalmente homens mais velhos, devido aos fatores de risco e também a não orientação a estes homens para a prevenção, que precisaria ser realizada nas UBS. Segundo dados do Ministério da Saúde, o câncer de próstata no Brasil aparece em segundo lugar em causador de mortes, atrás de tumores ligados ao aparelho respiratório (traqueia, brônquios e pulmão). Quanto ao registro de novos casos, o câncer de próstata também é vice, desta vez atrás de tumores de pele, não melanoma. Dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA) revelam que, em 2009, cerca de 12 mil homens morreram vítimas do câncer de próstata. Para este ano, a estimativa é de 60 mil novos casos da doença. Sendo possível afirmar que o câncer de próstata nos homens se equivale ao câncer de mama em mulheres, quando se considera o número de casos. Igualmente as neoplasias de pênis e testículo também ganham grande repercussão ao sistema público de saúde. O primeiro caso corresponde a 2% das neoplasias detectadas no público masculino, e o segundo, a 5%. Infelizmente, o Brasil é o campeão mundial do câncer de pênis e aparece como o país com maior incidência da d o e n ç a , s e g u n d o l e va n t a m e n t o d a Sociedade Brasileira de Urologia. O tumor de testículo avança dramaticamente na população jovem. É a neoplasia sólida mais frequente nos homens entre 15 e 35 anos (VIEIRA, SÉRGIO; 2012). Quando criança morava no interior com seus pais, o que para ele é um dos motivos que o fez procurar muito pouco os serviços de saúde, pois foi educado a usar métodos alternativos, como chás, ervas, etc., quando adoecia. 5. ENTREVISTA Segundo o Instituto Nacional do Câncer, dentre os tumores malignos do homem, 5% ocorrem nos testículos. O câncer de testículo atinge principalmente homens entre 15 e 50 anos de idade, considerando-se casos raros. Sua incidência é de três a cinco casos para cada grupo de 100 mil indivíduos. Comparando com outros cânceres que atinge o homem, como o de próstata, o câncer de testículo apresenta baixo índice de mortalidade. Devido à maior incidência em pessoas jovens e sexualmente ativas possibilita a chance do câncer de testículo ser De modo geral, a formação cultural influencia muitos aspectos da vida das pessoas, inclusive suas crenças, comportamentos, percepções, emoções, linguagem, religião, rituais, estrutura familiar, dieta, modo de vestir, imagem corporal, conceitos de tempo e espaço e atitudes frente à doença, à dor e a outras formas de infortúnio – podendo, todos, terem importantes implicações para a saúde e para a sua assistência ( HELMAN, 171 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 2003, p.13). e estimula a auto cura do organismo para que o corpo inicie o processo de eliminação. Através do micro palpação o fisioterapeuta procura no corpo onde estas memórias se instalaram e então realiza manualmente atos que simulam a agressão e estimulem o corpo a eliminar a doença promovendo a saúde (ROCHA, VIVIANE; 2012, sp.). O participante relatou também que após a realizar umas das cirurgias, muitos homens, amigos, colegas de trabalhos, conhecidos, procuraram-no para tirar dúvidas, contaram-lhe que também tinham suspeitas. Gomes et al. (2008) indicam ações que sensibilizem os homens sobre a detecção precoce de neoplasias, além de explicar sobre as formas de detecção, estimulando a procura pela atenção primária. O enfermeiro pode desenvolver o papel importante na educação para a saúde através de ações educativas de promoção da saúde e prevenção de doenças, esclarecendo dúvidas e incentivando os homens a se cuidarem, assim como é desenvolvido com crianças, mulheres e idosos através de programas e outras atividades (ALBANO E BASÍLIO, 2010). Referente às políticas voltadas para a Saúde do homem, o participante acredita que seria de muito valor, pois assim incentivaria o homem a procura mais os serviços de saúde, evitaria que chegasse ao extremo da doença, para só então começar a tratá-la e, muitas vezes, evitariam passar por todo o sofrimento que ele passou e esta passando. “Deveria ter um trabalho de conscientização em todas as empresas para os homens em particular” (2012). Também o participante relatou que procurou ajuda espírita, o Reiki, e até fez algumas sessões de microfisioterapia. Po r t a n t o , f a z - s e n e c e s s á r i a a realização de discussões mais amplas de todo o contexto no qual o homem está inserido, uma vez que o maior desafio das políticas públicas não é somente incluir o homem nos serviços de atenção primária, mas também sensibilizá-los sobre a importância do cuidado e da inexistência de invulnerabilidade. Nas situações em que o homem procura os serviços de saúde, aproveite-a de diferentes maneiras para garantir que o homem crie o hábito de utilizar os serviços existentes de forma rotineira e que diferentes meios sejam utilizados para alcançá-los através de ações de educação para a saúde dentro e fora do dos serviços de saúde. 6. CONCLUSÃO A introdução de políticas pública para os homens não teve o mesmo percurso como ocorreu com as crianças, mulheres e idosos, os indicadores sustentam a mortalidade por doenças preveníveis ao público masculino que não adere segundo as estatísticas à consciência da prevenção (LEDUR, 2009). Assim sendo, muitos agravos poderiam ser evitados caso os homens realizassem, com regularidade, as medidas de prevenção primária. A resistência masculina à atenção primária aumenta não somente a sobrecarga financeira da sociedade, mas também, o sofrimento físico e emocional do paciente e seus familiares na luta pela conservação da saúde e da qualidade de vida dessas pessoas (FREITAS; BIAGOLINI, 2011). A compreensão das barreiras socioculturais e institucionais é importante para a proposição estratégica de medidas que venham a promover o acesso dos homens aos serviços de atenção primária, a fim de proteger a prevenção e a promoção de Reiki pode ser então definido como “a arte e a ciência da ativação, do direcionamento e da aplicação da energia vital universal, para promover o completo equilíbrio energético, para prevenção das disfunções e para possibilitar as condições necessárias a um completo bem estar” (Espaço ABR, 2012, sp.). Os cuidados alternativos são um conjunto de técnicas e produtos que fogem da medicina convencional, e vêm cada vez mais conquistando pessoas. A microfisioterapia é uma técnica manual que identifica a causa primária de uma doença ou sintoma 172 REVISTA SETREM - Ano XII nº 22 - JAN/JUN 2013 ISSN 1678-1252 formas necessárias e fundamentais de intervenção (FREITAS; BIAGOLINI, 2011). Mobilizar a população dos homens pela luta e garantia de seu direito social à saúde é um dos desafios dessa Política. Ela pretende tornar os homens protagonistas de suas demandas, consolidando seus direitos de cidadania. Segundo os dados epidemiológicos apontados no presente estudo, os homens morrem mais cedo que as mulheres, sendo um dos motivos principais, a pouca procura pelo serviço de saúde. Foi possível verificar também que o homem está vulnerável diante das patologias ditas masculinas, ainda mais as que envolvem a sua masculinidade. Pôde-se perceber que 75% das enfermidades e agravos dessa população estão concentradas em cinco grandes áreas especializadas: cardiologia, urologia, saúde mental, gastrenterologia e pneumologia. Sendo que no município analisado no período indicado, os casos de mortalidade apresentaram na área de cardiologia um total de 11.445 óbitos, nas doenças do aparelho respiratório houve 4.994 óbitos, no aparelho digestivo que se destacaram foram doenças do fígado com 1.160 óbitos, doenças do aparelho geniturinário aparecem a insuficiência renal com 470 óbitos. E, por fim, os transtornos mentais e comportamentais aparecem: uso de substâncias psicoativas com 479 óbitos, e transtornos devido ao uso de álcool, 371 óbitos. Nos casos de morbidade prevaleceram as doenças do aparelho respiratório com 1.103 casos; logo em seguida vêm doenças do aparelho digestivo, 600 casos, igualmente esta, lesões de envenenamento e algumas outras consequências, causas externas; transtornos mentais e comportamentais apresentam 565 casos; doenças do aparelho circulatório, 471 casos; doenças do aparelho geniturinário, 330 casos; doenças infecciosas e parasitárias, 324 casos. Nas neoplasias houve um total de 262 casos, entre as que prevaleceram foram neoplasias malignas de reto, anus e canal anal, 31 casos; neoplasia maligna de traqueia, brônquios e pulmão, 26 casos; neoplasia maligna do esôfago, 22 casos; neoplasias malignas do lábio, cavidade oral e faringe, 18 casos; neoplasia maligna de próstata, 17 casos; igualmente estão as neoplasias malignas em locais não definidos ou não especificados. Os resultados deste trabalho afirmam o desfavorecimento quanto a programas de saúde direcionados para os homens. Através da entrevista com o participante, pôde-se observar que os homens sentem dificuldades de procurar os serviços de saúde por estarem inseridos culturalmente na sociedade em que o homem é o provedor e o adoecimento acarreta fraqueza. No discurso do participante foi possível perceber a demora na procura pelos serviços de saúde, demonstrando uma negação ao adoecer. Po r t a n t o, p r e c i s a - s e a d i c i o n a r qualidade de vida à população masculina, no aspecto do cuidado com a saúde, sendo a criação de programas de saúde voltados para atender os homens, a forma de alcançar a qualidade de vida, atendendo assim as suas necessidades em um contexto igualitário tanto para homens, quanto para mulheres (KOGLER, 2007). Segundo Braz (2005, p.103) “A mulher paga com a desvalorização de seu papel social, e o homem paga com sua vida”. Atualmente, os homens também são oprimidos pela sociedade. E necessário repensar sobre as questões levantadas em relação à saúde do homem, mudando o seu enfoque, que não beneficie apenas um dos lados. REFERÊNCIAS ALBANO, Bruno Ramos. BASÍLIO, Marcio Chaves. Desafios para a Inclusão dos Homens nos Serviços de Atenção Primária à Saúde. Revista Enfermagem Integrada. 2010, nº 02. Ipatinga: Unileste MG. Nov/JUN. ALVARENGA, Willyane de Andrade; Silva, Simone Santos e. 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