1 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
Transcrição
1 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
Volume 13 • nº 1 Janeiro/Março 2001 ISSN 0103-507X Novo Ciclo Volume 13 - Número 1 - Janeiro/Março 2001 Fundada em 1980 CONTENTS Diretoria para o Biênio 2000-2001 Presidente Cid Marcos Nascimento David Editorial New Cicle Cleovaldo T. S. Pinheiro 4 Artigo Intensive Care Units in São Paulo differences among patients of regional health divisions and governmental and non-governmental hospitals Maria Cláudia Moreira da Silva, Regina Márcia Cardoso de Sousa 6 Vice-Presidente Norberto Antonio Freddi 1º Secretário Roberto Lúcio de Gusmão Verçoza 2º Secretário José Maria da Costa Orlando 1º Tesoureiro Rosa Goldstein Alheira Rocha Deep Venous Thrombosis in Pediatric Group Sandra Doria, Denise Tiemi Noguchi, Jacira Doralice Paccez 15 2º Tesoureiro Marcelo Moock Associação de Medicina Intensiva Brasileira Rua Domingos de Moraes, 814 Bloco 2 – Conj. 23 Vila Mariana – CEP 04010-100 São Paulo – SP Tel.: (0xx11) 5575-3832 [email protected] The Attitude of the Brasilian Intensive Care Physicians to Wards the Decisions of Withdrawal or Withholding Treatments Decision Rachel Duarte Moritz, Adriano Dantas, Jorge Dias de Matos Fernando Osni Machado 21 Laryngotracheal Post-Extubation Complications In Children Lídia Maria Alano de Carvalho, Policarpo Blanco Lopez, Adriana Becker, Giane Elias Mesko, Jaqueline dos Santos Perottoni, Milene de Moraes Sedrez 28 Vasopressor Therapy in Cardiopulmonary Resuscitation Sebastião Araújo, Izilda Esmênia Muglia Araújo, Renato Giuseppe Giovanni Terzi, Desanka Dragosavac, Antônio Luiz Eiras Falcão. 34 Relato de caso Blunt cardiac injury Emídio Jorge Santos Lima 42 Indexada na base de dados Lilacs A REVISTA BRASILEIRA DE TERAPIA INTENSIVA reservase todos os direitos, inclusive os de tradução, em todos os países signatários da Convenção PanAmericana e da Convenção Internacional sobre os Direitos Autorais. Os trabalhos publicados terão seus direitos autorais resguardados pela AMIB, que em qualquer situação agirá como detentora dos mesmos. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 3 NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA RBTI REVISTA BRASILEIRA DE TERAPIA INTENSIVA Editor Cleovaldo T. S. Pinheiro (RS) Secretário Luciano de Brito Editor Associado Werther Brunow de Carvalho (SP) Conselho Editorial Álvaro Réa Neto (PR) Antonio Nuno da Conceição (BA) Cid Marcos Nascimento David (RJ) Edson Stefanini (SP) Eliezer Silva (SP) Fernando Osni Machado (SC) Flávio de Barros Maciel (SP) Gilberto Friedman (RS) José Luiz Comes do Amaral (SP) José Luiz do Amorin Ratton (MG) José Raimundo de A. Azevedo (MA) Odin Barbosa da Silva (PE) Paulo César Ribeiro (SP) Paulo Gabriel Bastos (RJ) Paulo Sérgio S. Beraldo (DF) Rosane Goldweisser (RJ) Sayonara de Fátima F. Barbosa (SC) Vera Regina Fernandes (SC) Jornalista Responsável Marcelo Sassine - Mtb 22.869 Diretora de Arte Anete Salviano A Revista Brasileira de Terapia Intensiva é publicada trimestralmente (março, junho, setembro a dezembro) em um único volume anual, editada pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) e destina-se a publicar artigos originais, conferências, editoriais, notas prévias, resumos selecionados, temas de atualização e de revisão, relatos de casos, notas sobre novas técnicas e novos aparelhos, condensação de teses, cartas ao editor e outras matérias concernentes à terapia intensiva e especialidades correlatas. Os textos devem ser inéditos, escritos preferencialmente em português. Serão aceitos os trabalhos escritos em inglês ou em espanhol, quando os mesmos forem realizados em serviços estrangeiros de língua inglesa ou espanhola, ou quando forem escritos por experts convidados. Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resenha condensada), necessariamente em inglês, com 150 a 300 palavras para artigos maiores, e até 150 para menores, a fim de oferecer aos leitores estrangeiros ampla idéia do tema estudado. O texto deve se fazer seguir de um resumo na língua em que foi escrito (resumo, summary, resumen). O texto deve ser digitado em espaço duplo e apresentado na seguinte ordem: Página de rosto, Título em inglês, Abstract, Key Words, Introdução (deve ser feita, mas o título “Introdução” deve ser omitido), Material e Métodos, Resultados, Discussão, Resumo, Unitermos, Agradecimentos, Referências, Tabelas, Figuras, Legendas das Tabelas e das Figuras. A Página de Rosto deve ocorrer: Título de artigo; Nome(s) do(s) autor(es) e respectivos títulos; Nome do Serviço ou Instituição em que foi realizado o trabalho; Nome e endereço do autor principal para correspondência (a sair publicado); Telefone do autor para contato com o editor de texto; Fonte de patrocínio (bolsas, subvenções, ofertas de produtos). Abaixo do resumo na língua em que foi escrito, enumerar, até um máximo de cinco, as palavras ou expressões indicativas do conteúdo do artigo (Unitermos), de preferência com base no Index Medicus, para maior facilidade na indexação. Os trabalhos deverão ser enviados em três vias e em disquete (sendo o texto salvo em Word, letra Times New Roman, tamanho 12 e espaço 1,5). Não deverão ultrapassar 15 páginas digitadas, salvo casos autorizados pelo Conselho Editorial. Esses trabalhos serão apreciados pelo Conselho Editorial que se reserva o direito de recusá-los e de fazer sugestões quanto à sua estrutura ou à sua redação. As Referências devem incluir o material estritamente necessário, realmente citado no texto. As revistas devem ser referidas de forma abreviada, segundo critérios internacionais. As citações no texto devem ser feitas por números índices, correspondendo às respectivas referências listadas por ordem cronológica, não-alfabética. Os livros devem ser referidos pelo autor, título, cidade-sede da casa editora, nome da casa editora, número da edição (a partir da 2ª), volume, ano da impressão, e páginas inicial e final citadas. Se se tratar de capítulo de livro, fazer constar: autor do capítulo, título do capítulo, a palavra In (grifada), dois pontos, nome dos editores indicando com a abreviação eds., título do livro (grifado), cidade da editora, nome da editora, nº da edição (a partir da 2ª), volume, ano da publicação, páginas citadas. Quando o artigo tiver mais de três autores deverão ser citados os três primeiros seguidos de et al. EXEMPLOS: Referências 1. Leppänieme A,Haapiainen R,Kiviluoto T, et al. Pancreatic trauma: acute and late manifastations. Br J Surg 1988; 75: 165-7. 2. Carter DC. Pancreatitis and the biliary tree: the continuing problem. Am J Surg 1988; 155: 10-7. 3. Buchler M, Malfertheiner P, Berger HG. Correlation of imaging procedures, biochemical parameters and clinical stage in acute pancreatitis. ln: Malfertheiner P, Ditschuneir H. eds. Diagnostic procedures in pancreatic disease. Berlin: Springer-Verlag 1986; 123-9. 4. Crystal RG. Interstitial lung disease. In: Wyngaarden JB, Smith LH. eds. Cecil textbook of medicine. Philadelphia: WB Saunders & Co., 18th ed., 1988; 421-35. Para fim desta Revista, tabelas e quadros correspondem à mesma coisa e são convencionados sob o nome Tabelas, numeradas em arábicos. Figuras, também em arábicos, incluem desenhos, fotografias, esquemas e gráficos. À margem de cada Tabela ou Figura, ou no verso, devem ser grafados a lápis sua numeração, título do trabalho e nome do autor, ou outras indicações que facilitem sua absoluta clareza. Cada Tabela e cada Figura devem estar montadas ou feitas em folhas separadas (uma para cada elemento) e também em disquetes. As legendas das Tabelas e das Figuras devem ser digitadas com claras indicações a que se referem. Esta Revista deve ser referida com as seguintes abreviações: Rev Bras Terap Intens. Capa ImageBank A correspondência para publicação deve ser endereçada para: Projeto Gráfico e Produção Editorial MWS Design Fone: (11) 3399-3028 www.mwsnet.com.br 4 RBTI - Revista Brasileira de Terapia Intensiva AMIB Rua Domingos de Moraes, 814 – Bloco 2 – Conj. 23 Vila Mariana – CEP 04010-100 – São Paulo – SP Tel.: (0xx11) 5575-3832 Email:[email protected] Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva EDITORIAL Novo ciclo D esde sua fundação, a AMIB tem sido norteada Ao assumir o posto de editor da RBTI, já encontrei por sua vocação científica, embora possua uma uma estrutura diligentemente montada pelos que me an- interface de classe bem definida e atuante. Nesse con- tecederam; todavia, haviam problemas: a distribuição da texto, os congressos têm sido suas manifestações maio- revista e a demanda da empresa gráfica, então contratada res; todavia, baseada na premissa de que numa entida- pela AMIB para realizar a impressão e distribuição da de madura, há a necessidade de registros e divulgação RBTI. escrita, a entidade criou dois instrumentos para tal tare- Já nos primeiros momentos, optei pela manutenção fa: a Revista Brasileira de Terapia Intensiva e o Bole- dos prazos de edição, procurando dar aos leitores a segu- tim. Nessas mais que duas décadas de atividade na rança de um instrumento confiável; esse escopo, contu- AMIB, e estou com ela desde sua primeira hora, já pas- do, não foi atendido. sei por várias posições em seus escalões diretivos, mas Através de uma monitoração da entrega dos quatro nenhuma delas me deu mais prazer – e mais trabalho – números da revista editados no ano 2000, observei que a do que ser editor do boletim e, agora, editor chefe da maioria dos sócios continuava sem receber seus exem- RBTI. Esse prazer senta-se sobretudo no desafio, que plares, o que sob qualquer ponto de vista era inadmissí- essas tarefas representam. vel. Estávamos num impasse: após um esforço enorme Numa sociedade em que não há hábito de preservar história, não é costume registrar fatos e não há um corpo para a captação de material publicável, esse não atingia a ponta do leitor. de produção científica de vulto, uma pergunta se impu- Estamos mudando e dentro desse novo perfil, solici- nha: tem sentido criar-se mais uma publicação e depois tamos aos autores que enviem seus originais para o en- sair a cata de material publicável? Ocorre que estamos dereço da AMIB: Rua Domingos de Moraes, 814 – blo- na contramão do processo natural. Nos países de primei- co 2 – conj. 23, Vila Mariana, São Paulo, SP. CEP: 04010- ro mundo, criam-se novas revistas e jornais quando os já 100. Da mesma forma, aqueles, que porventura tenham não comportam o material que recebem, havendo, con- enviado seu material para antiga editora, o façam nova- seqüentemente, um represamento da produção. Nós não; mente para AMIB, que avaliados para a publicação. criamos o transporte e depois procuramos os passageiros... Nesse cenário, a posição de editor é pelo menos um grande desafio e deles eu gosto. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 Dr. Cleovaldo T. S. Pinheiro Editor Chefe 5 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Unidades de T erapia Intensiva do Município Terapia de São Paulo: difer enças entr e pacientes dos entre diferenças núcleos rregionais egionais de saúde e dos hospitais gover namentais e não gover namentais governamentais governamentais Intensive Care Units in São Paulo differences among patients of regional health divisions and governmental and non-governmental hospitals Maria Cláudia Moreira da Silva*, Regina Márcia Cardoso de Sousa** ABSTRACT This study aimed at comparing adult patients admitted to Intensive Care Units (ICUs) of Sao Paulo Regional Health Division, and in governmental and non-governmental hospitals. Ten percent of the ICUs of Sao Paulo city were selected by a casually stratified sample analysis, taking into account the five Regional Health Divisions (RHDs) and the type of hospital. The sample studied was composed of 200 patients and the collected data referred to one day in the ICU. Several associations were observed in the analysis of the characteristics of the patients and RHDs: age, origin, length of stay in ICU, discharge, some reasons of admission in ICU and antecedents. Differences were observed in therapeutic interventions. When comparing patients admitted in governmental and non-governmental ICUs, associations were observed in origin, TISS-28 scoring and discharge. There were associations among type of hospital and reasons of admission related to circulatory system diseases and immediate postoperative period antecedent of cancer. The TISS-28 categories, Cardiovascular Support and Renal Support were most frequently in patients of governmental hospitals, and this difference got the significance level established. Key words: Intensive Care Units, Hospital. *Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. **Profª Drª do Depto de Enfermagem Médico-cirúrgica da Escola de Enfermagem da USP. 6 O Município de São Paulo concentra parcela importante das UTIs do País, porém, a distribuição geográfica é irregular e a disponibilidade de equipamentos por leito é também diferenciada nos Núcleos Regionais de Saúde (NRSs)2,6,10,11. Por outro lado, diferenças entre as características dos pacientes de hospitais particulares e públicos vêm sendo empiricamente percebidas na prática clínica e também mostradas no estudo realizado por PIERIN et al16. Dentro da proposta de comparar os pacientes das UTIs do Município de São Paulo, de diferentes NRSs e dos hospitais governamentais e não governamentais, cabe sumarizar resultados de publicações em nosso meio que direcionaram a elaboração da proposta do presente estudo. KIMURA; MIYADAHIRA10 mostraram que, no âmbito nacional, nas regiões sudeste e sul estavam localizadas 76,4% de instituições com UTI, sendo que só na região sudeste concentrava-se metade desses estabelecimentos do País (54,5%). Dados mais recentes da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MEDICINA INTENSIVA2 sobre a distribuição geográfica das UTIs brasileiras revelaram que a região sudeste concentra cerca de 57,7% das UTIs do país. KIMURA; MIYADAHIRA10 constataram ainda que, particularmente, o Estado de São Paulo concorria com 279 estabelecimentos com serviços de terapia intensiva ou 55,5% do total de instituições com UTI na região sudeste, sendo que destas, 94 (33,7%) localizavam-se no próprio Município de São Paulo. Essas autoras, analisando a distribuição de hospitais com UTI no Município, observaram que tais estabelecimentos concentravam-se na região central da cidade (Regional Centro). Mais recentemente, KIMURA et al 11, comple- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva mentando esse estudo, revelaram que, quando se analisou a distribuição das UTIs nas regiões do Município, verificou-se uma concentração no Núcleo Regional de Saúde (NRS) 1 - região centro-oeste, a qual englobava a região Centro a Butantã da regionalização proposta anteriormente dentro do Município. Esse estudo também mostrou que o número de UTIs nos hospitais variou de um a quatro, sendo a maioria aqueles com uma única unidade; 79,2% pertenciam a hospitais particulares. PADILHA et al 14 observaram que, em termos de planta física, essas UTIs estavam aquém dos padrões mínimos estabelecidos a considerados seguros para o atendimento e que havia muito para se investir em sua melhoria. Indicou também algumas diferenças entre instituições públicas e particulares: as públicas foram aquelas que apresentaram melhores condições de espaço físico por leito. Porém, seis (66,7%) das nove UTIs públicas ti- nham somente até três ambientes de apoio, do total de 12 preconizados, enquanto que nas 34 UTIs privadas, 13 (38,2%) encontravam-se em tal situação. Em relação à dotação de equipamentos, CRUZ et al6 descreveram que o NRS 1 foi a região que manteve mais constante a média de aparelhos de monitorização por leito e que nem todos esses tipos de equipamento foram encontrados nas UTIs do NRS3 (região leste) e NRS4 (região norte). No geral, o número médio de equipamentos por leito, segundo Núcleos Regionais de Saúde (NRSs) apresentado nesse estudo, mostrou que a disponibilidade de equipamentos por leito das UTIs diferia entre regiões do Município. Para KIMURA et al11, os recursos humanos, materiais e estruturais de que dispunham as UTIs do Município eram bastante diversificados e fatores como a má distribuição geográfica e a predominância de UTIs particulares certamen- ARTIGO te dificultariam o acesso da maioria da população. Além disso, diferenças estruturais, presentes na comparação entre os NRSs, são importantes indicadores de diferenças nas características dos pacientes já que os recursos existentes determinam a possibilidade de assistência ao doente, assim como características do paciente determinam a necessidade de recursos para atendimento. O perfil, ainda pouco delineado dos pacientes com indicação de UTI em nosso meio, e o conhecimento das diferenças anteriormente comentadas, motivaram os seguintes objetivos: • Comparar as características dos pacientes adultos atendidos em UTI de instituições hospitalares dos diferentes NRSs do Município de São Paulo. • Comparar as características dos pacientes adultos atendidos em UTI de instituições hospitalares governamentais e não governamentais desse mesmo Município. Figura 1. Distribuição geográfica dos NRSs do Município. São Paulo, 1996. Nº 4 Nº 1 Nº 5 Nº 3 Nº 2 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 Núcleo Regional de Saúde 1- Centro Aclimação, Alto de Pinheiros, Barra Funda, Bela Vista, Bom Retiro, Brás, Butantã, Cambuci, Cerqueira César, Consolação, Itaim Bibi, Jaguará, Jaguaré, Jardim Paulista, Lapa, Liberdade, Morumbi, Pari, Perdizes, Pinheiros, Raposo Tavares, República, Rio Pequeno, Santa Cecília, Sé, Vila Leopoldina, Vila Sônia. Total da população: 1.456.498. Núcleo Regional de Saúde 2 - Santo Amaro Campo Belo, Campo Grande, Campo Limpo, Capão Redondo, Cidade Ademar, Cidade Dutra, Grajaú, Jardim Angela, Jardim São Luiz, Marsilac, Parelheiros, Pedreira, Santo Amaro, Socorro, Vila Andrade. Total da população: 1.991.814. Núcleo Regional de Saúde 3 - Itaquera Cidade Líder, Cidade Tiradentes, Ermelindo Matarazzo, Guaianazes, Iguatemi, Itaim Paulista, Itaquera, Jardim Helena, José Bonifácio, Lajeado, Parque do Carmo, Ponte Rasa, São Miguel Paulista, São Mateus, São Rafael, Vila Curuçá, Vila Jacuí. Total da população: 2.287.319. Núcleo Regional de Saúde 4 - Mandaqui Anhanguera, Brasilândia, Cachoeirinha, Casa Verde, Freguesia do Ó, Jaçanã, Jaraguá, Limão. Mandaqui, Perus, Pirituba, Santana, São Domingos, Tremembé, Tucuruvi, Vila Guilherme, Vila Jaguará, Vila Maria, Vila Medeiros. Total da população: 1.976.253. Núcleo Regional de Saúde 5 - Belém Água Rasa, Aricanduva, Artur Alvim, Belém, Cangafba, Carrão, Cursino, Ipiranga, Jabaquara, Moema, Moóca, Penha, Sacomã, São Lucas, Sapopemba, Saúde, Tatuapé, Vila Mariana, Vila Matilde, Vila Prudente. Total da população: 2.508.899. 7 ARTIGO MÉTODO Este estudo foi realizado com dados relativos a 200 pacientes adultos internados em 14 UTIs sediadas no Município de São Paulo, sendo as unidades selecionadas através de uma amostragem casual estratificada, considerando-se os cinco NRSs do Município e a fonte mantenedora dos hospitais. A Figura 1 mostra a distribuição geográfica dos cinco NRSs do Município de São Paulo, subdistritos pertencentes e o total da população de cada núcleo de acordo com a divisão administrativa do Sistema Único de Saúde apresentada por BASEGGIO et al3. A amostra foi obtida a partir do levantamento das UTIs do Município de São Paulo realizado por BASEGGIO et al 3. Com base em dados fornecidos pelo Centro de Informações da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, as UTIs do Município foram caracterizadas no que se refere à quantidade e distribuição geográfica, ao número de leitos, entidade mantenedora, tipo de atendimento, de clientela e de tratamento. Nesse estudo, foram identificados 173 hospitais, sendo que um encontrava-se desativado e dois foram excluídos por possuírem número de leitos inferior a 50. No total, restaram 170 instituições: 85 com UTI e 85 sem. Das que possuíam UTI, 83 forneceram informações sobre suas unidades, sendo então identificadas 169 UTIs no Município. Quanto ao tipo de clientela, das 169 UTIs foram constatadas 86 que atendiam somente adultos, 60 que atendiam crianças e 23, ambos. Foram excluídas para amostragem as 60 unidades que atendiam somente crianças totalizando, assim, 109 unidades amostrais. A amostragem casual estratificada foi feita considerando os 8 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva 10 estratos resultantes das distribuições das 109 UTIs, segundo NRS e fonte mantenedora. Foi estabelecido o critério de sorteio de 10% das UTIs de cada estrato, sendo assegurada a participação de pelo menos uma unidade naqueles estratos que tinham menos de 10 unidades. A quantidade de pacientes participantes do estudo foi estabelecida em função dos 1084 leitos de UTI ativos no Município3. Assim, determinou-se o percentual de 20% que totalizou cerca de 200 participantes. Estabeleceu-se a participação de número similar de pacientes por NRS, fixando-se em 40 os participantes de cada núcleo, além disso, o número de pacientes por UTI da amostra foi pré-determinado tendo em vista o número de leitos das unidades sorteadas. Houve escolha aleatória dos participantes quando o número de internados na unidade, no dia da coleta de dados, superava o estabelecido para a UTI, e em caso de menor quantidade, retornava-se à unidade uma semana depois e assim, sucessivamente, até que se completasse o total pretendido. Pacientes menores de 12 anos internados nas UTIs da amostra sorteada foram excluídos do presente estudo. Para se obter os dados referentes às características dos pacientes, foi utilizado o método de coleta de dados “snapshot” descrito por GROEGER et al9, em que os participantes do estudo foram os internados nas UTIs, selecionados no momento da coleta de dados e as informações sobre as condições dos pacientes foram captadas considerando um único dia de internação na unidade. O instrumento utilizado para coleta de dados foi um formulário composto de quatro partes, onde foram registrados dados de identificação do paciente, referentes à internação na UTI, intervenções terapêuticas do TISS-28 a condição de saída do paciente da UTI. No instrumento foi apresentada a versão simplificada do TISS com 28 itens, proposta por MIRANDA et al 13 . Constitui-se de uma relação de intervenções terapêuticas que recebem escores de um a oito, de acordo com a complexidade e a utilização em situação de maior ou menor gravidade para o paciente. Tais intervenções são agrupadas e incluídas nas seguintes categorias: Atividades Básicas, Suporte Ventilatório, Suporte Cardiovascular, Suporte Renal, Suporte Neurológico, Suporte Metabólico e Intervenções Específicas (Anexo A). O prontuário do paciente foi utilizado basicamente como fonte de dados. Como já foi mencionado, o índice de escolha para caracterizar a gravidade dos pacientes e a intensidade de cuidados requeridos foi o TISS-28. Os dados obtidos na sua aplicação permitiram também a descrição das intervenções terapêuticas às quais os pacientes de UTI foram submetidos. Os dados sobre as intervenções terapêuticas foram registrados pela autora, sempre referentes às últimas 24 horas que antecederam o momento da coleta de dados do paciente na UTI, conforme preconiza MIRANDA et al 13, sobre a aplicação do TISS-28. A coleta de dados foi realizada em dois momentos: inicialmente procedeu-se à captação das condições dos pacientes internados nas UTIs selecionadas e, durante um período, que variou de uma semana a 11 meses, houve retorno às referidas unidades até que se completasse a informação sobre a data de alta da UTI e o destino (alta, óbito ou transferência) dos pacien- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva tes estudados. Por meio do livro de registros, ou mesmo consulta aos enfermeiros, foram obtidas essas informações nas unidades. Os dados foram inseridos em banco de dados e processados eletronicamente, os resultados apresentados em quadros. A análise estatística foi realizada na comparação das características dos pacientes, segundo NRS e tipo de hospital (governamental e não governamental). A associação entre NRS a as variáveis descritivas dos pacientes e entre tipo de hospital a as mesmas variáveis foram avaliadas, empregando-se o teste Qui-quadrado, sendo seu valor corrigido conforme as indicações realizadas por BERQUÓ et al 4. O nível de significância utilizado para os testes foi de 5%. RESULTADOS E DISCUSSÃO Comparação das características dos pacientes dos NRSs do Município de São Paulo Os pacientes do Município, agrupados segundo NRS, foram comparados de acordo com suas características como sexo, idade, dados referentes à internação na UTI, antecedentes clínicos a cirúrgicos e intervenções terapêuticas. Para tanto, os dados foram trabalhados considerando-se os seus valores absolutos, distribuídos em tabelas cruzadas e submetidos a provas estatísticas. A seguir serão apresentados a discutidos os Quadros 1, 2, 3 e 4 que mostram os resultados obtidos. O Quadro 1 mostra que, excetuando as variáveis sexo e pontuação do TISS-28, diferenças significativas foram observadas nas outras características quando se analisa os pacientes distribuídos nos NRS. Quanto à idade, o NRS2 (Santo Amaro) destacou-se por apresentar Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 ARTIGO Quadro 1. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças nas características dos pacientes, segundo NRS. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO* SIGNIFICÂNCIA Sexo x NRS 2,74 9,48 Não Faixa etária x NRS 39,06 26,29 Sim Procedência x NRS 58,16 21,02 Sim Pontuação do TISS-28 x NRS Não aplicável Não aplicável Não aplicável Tempo de Permanência x NRS 37,37 21,02 Sim Condição de saída x NRS 9,48 Sim 11,05 *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. Quadro 2. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças nos motivos de internação dos pacientes na UTI, segundo NRS. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO SIGNIFICÂNCIA Doenças do aparelho circulatório x NRS 3,80 9,48 Não Doenças do aparelho respiratório x NRS 5,05 9,48 Não 9,48 Sim 9,48 Sim Pós-operatório imediato x NRS 19,37 Outros 21,89 *Admilindo-se erro de 1ª espécie de 5%. Quadro 3. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças na presença de antecedentes clínicos e cirúrgicos, segundo NRS. São Paulo, 1998/99. Neoplasias x NRS 18,53 9,48 Sim Doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas x NRS 6,32 9,48 Não Doenças do aparelho circulatório x NRS 18,56 9,48 Sim Doenças do aparelho respiratório x NRS 7,02 9,48 Não Doenças do aparelho geniturinário x NRS 3,18 9,48 Não Outros x NRS 17,87 9,48 Sim *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. Quadro 4. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças na presença de intervenções terapêuticas, segundo NRS. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO SIGNIFICÂNCIA Atividades Básicas x NRS Não aplicável Não aplicável Não aplicável Suporte Ventilatório x NRS Não aplicável Não aplicável Não aplicável Suporte Cardiovascular x NRS 5,31 9,48 Não Sim Suporte Renal x NRS 16,46 9,48 Suporte Neurológico x NRS Não aplicável Não aplicável Não aplicável Suporte Metabólico x NRS 23,07 Intervenções Específicas x NRS 9,84 9,48 Sim 9,48 Sim *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. 9 ARTIGO a maior parte dos pacientes na faixa etária entre 21 e 40 anos. Nos demais núcleos, os pacientes mais idosos predominaram. Embora essa seja a terceira região mais populosa do município e a maior em extensão geográfica é a com menor número de UTIs, sendo todas com oito leitos ou menos3. O pequeno número de leitos destinado á assistência intensiva na região acirra a busca pelas vagas existentes podendo ser os indivíduos idosos preteridos nessa disputa. Além disso, sabe-se que esse núcleo atende uma das regiões mais violentas da cidade, o que também pode contribuir para esse resultado. Segundo estatísticas de mortalidade, a grande maioria das vítimas de violência do Município tem idade inferior a 40 anos 5. Em relação à procedência, as UTIs do NRS 1 (Centro), NRS3 (Itaquera), NRS4 (Mandaqui), tinham pacientes vindos predominantemente do Pronto Socorro/ Pronto Atendimento, enquanto que as unidades dos NRS 2 (Santo Amaro) e 5 (Belém) recebiam mais pacientes provenientes do Centro Cirúrgico. Os pacientes do NRS3 (Itaquera), além de distinguirem-se pela maioria ser oriunda do Pronto Socorro/Pronto Atendimento, apresentaram longos períodos de internação nesse núcleo a os pacientes com mais de 60 dias internados alcançaram o percentual de 32,50%. O NRS4 (Mandaqui) destacou-se pela menor mortalidade. Na análise dos pacientes distribuídos nos NRSs, segundo a pontuação do TISS-28, a aplicação do teste Qui-quadrado não foi indicada, uma vez que as condições de sua aplicação não foram satisfeitas. No entanto, observando-se a distribuição dos pacientes, verifica-se que o NRS4 (Mandaqui) apresentou o menor número de pa- 10 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva cientes com pontuação maior que 30 e a maior freqüência (42,5%) de pacientes com pontuação inferior a 16. Dois dos mais freqüentes motivos de internação entre os pacientes internados nas UTIs do Município de São Paulo, as doenças do aparelho circulatório e respiratório, estiveram presentes de forma similar nos NRSs do Município. Diferença significativa foi observada quando se analisou como motivo de internação o pós-operatório imediato a outros motivos. O NRS2 (Santo Amaro) a NRS5 (Belém) diferenciaram-se pela maior presença de pacientes no pós-operatório imediato, assim como se destacaram na freqüência de pacientes procedentes do centro cirúrgico. Quando foram analisados os antecedentes dos pacientes a NRS, Quadro 3, constatou-se que houve significância nas diferenças entre os NRS quanto à presença de neoplasias, doenças do aparelho circulatório e outros antecedentes. O NRS 1 (Centro) a NRS5 (Belém) foram os que mais se destacaram pela a presença de neoplasias e de doenças do aparelho circulatório. O NRS3 (Itaquera) destacou-se pela presença de outros antecedentes como doenças do aparelho digestivo, infecciosas e parasitárias, doenças do sistema osteomuscular e tecido conjuntivo, do sistema nervoso, entre outros. Quando se analisa o Quadro 4, observa-se que as provas estatísticas indicam diferença na presença de intervenções das categorias Suporte Renal, Suporte Metabólico e Intervenções Específicas. O NRS5 (Belém) a NRS2 (Santo Amaro) destacaram-se na freqüência de procedimentos da categoria Suporte Renal e o NRS4 (Mandaqui), na ocorrência das Intervenções Específicas propostas no TISS-28. As intervenções relacionadas com o Suporte Metabólico foram mais freqüentes nos NRS2 (Santo Amaro) a NRS3 (Itaquera). Observando-se o tempo de permanência dos pacientes internados em unidades desses dois últimos núcleos, nota-se freqüência elevada de pacientes com mais de cinco dias de internação. A relação desses resultados pode ser estabelecida quando se considera que o suporte nutricional não é habitualmente priorizado na assistência intensiva, sendo introduzido mais tardiamente durante a internação. Em relação aos itens em que a prova estatística não foi aplicável, cabe salientar que, na categoria Atividades Básicas, todos os pacientes foram pontuados, ao passo que na categoria Suporte Neurológico, com exceção de um único paciente, não se observou essa intervenção. A categoria Suporte Ventilatório esteve presente na grande maioria dos pacientes de todos os NRSs do Município. COMPARAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS DOS PACIENTES DAS UTIS DOS HOSPITAIS GOVERNAMENTAIS A NÃO GOVERNAMENTAIS Os pacientes, agrupados em internados em hospitais governamentais e não governamentais, foram comparados considerando as mesmas variáveis da análise feita em relação aos NRSs. Os quadros 5, 6, 7 e 8 mostram os resultados dos testes estatísticos utilizados nessa comparação. Conforme os resultados do quadro 5, o grupo de pacientes dos hospitais governamentais apresentaram diferenças em relação aos não governamentais nas características: procedência, pontuação do TISS-28 a condição de saída. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Quadro 5. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças nas características dos pacientes, segundo tipo de hospital. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO SIGNIFICÂNCIA Sexo x tipo de hospital 2,49 3,84 Não Faixa etária x tipo de hospital 7,49 11,07 Não Procedência x tipo de hospital 17,12 7,81 Sim Pontuação do TISS x tipo de hospital 6,23 5,99 Sim Tempo de permanência x tipo de hospital 3,20 11,07 Não Condição de saída x tipo de hospital 5,35 3,84 Sim *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. Quadro 6. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças nos motivos de internação dos pacientes na UTI, segundo tipo de hospital. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO SIGNIFICÂNCIA Doenças do aparelho circulatório x tipo tipo de hospital 4,42 3,84 Sim Doenças do aparelho respiratório x tipo tipo de hospital 0,04 3,84 Não Pós-operatório imediato x tipo de hospital 8,79 3,84 Sim Outros x tipo da hospital 0,04 3,84 Não *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. Quadro 7. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças na presença de antecedentes clínicos a cirúrgicos, segundo tipo de hospital. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO SIGNIFICÂNCIA Neoplasias x tipo de hospital 9,42 3,84 Sim Doenças endócrinas, 0,98 nutricionais e metabólicas x tipo de hospital 3,84 Não Doenças do aparelho circulatório x tipo de hospital 0,01 3,84 Não Doenças do aparelho respiratório x tipo de hospital 2,63 3,84 Não Doenças do aparelho geniturinário x tipo de hospital 1,76 3,84 Não Outros x tipo de hospital 1,01 3,84 Não *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 Nos hospitais públicos, a maioria dos pacientes foi admitida do Centro Cirúrgico seguidos por aqueles que foram admitidos do Pronto Socorro/Pronto Atendimento, já nos hospitais particulares ocorreu o inverso, a maioria foi proveniente do Pronto Socorro/ Pronto Atendimento seguida por aqueles vindos do Centro Cirúrgico. Tal achado contrapõe-se à relação encontrada por PIERIN et al16 onde, no hospital público, a maioria era proveniente do Pronto Socorro/Pronto Atendimento e no particular, do Centro Cirúrgico. Visto que o encaminhamento de pacientes para hospitais especializados é geralmente conseqüente à triagem anterior em outras instituições, pode-se relacionar os resultados do presente estudo com a distribuição das UTIs especializadas no Município de São Paulo. Segundo dados apresentados por BASEGGIO et al3, a maioria das UTIs públicas eram especializadas (37 de 72 unidades), enquanto que cerca de um terço das particulares apresentavam essa modalidade (32 de 97 unidades). Os pacientes das UTIs dos hospitais governamentais apresentaram maior pontuação no TISS-28, assim como maior mortalidade quando comparados às não governamentais. Tais resultados apóiam o pressuposto de CULLEN et al7, de que quanto mais elevado o número de intervenções, mais grave é o estado do paciente, base para o desenvolvimento do TISS-28 para índice de gravidade. Estudos como o de REYES; D’EMPAIRE17 e de ARTUCIO et al1 mostraram que a mortalidade teve boa correlação com a pontuação do TISS. PARADA et al15 mostraram que os escores APACHE a TISS foram significantemente maior nos pacientes que morreram quando comparados com aqueles 11 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Quadro 8. Resultados da prova de associação Qui-quadrado (X2) para verificar eventuais diferenças na presença de intervenções terapêuticas, segundo tipo de hospital. São Paulo, 1998/99. VARIÁVEIS X2 OBSERVADO X2 CRÍTICO SIGNIFICÂNCIA Atividades Básicas x tipo de hospital Não aplicável Não aplicável Não aplicável Suporte Ventilatório x tipo de hospital 0 3,84 Não Suporte Cardiovascular x tipo de hospital 6,70 3,84 Sim Suporte Renal x tipo de hospital 4,11 3,84 Sim Suporte Neurológico x tipo Não aplicável de hospital Não aplicável Não aplicável Suporte Metabólico x tipo de hospital 0 3,84 Não Intervenções Específicas x tipo de hospital 3,39 3,84 Não *Admitindo-se erro de 1ª espécie de 5%. que sobreviveram, durante o seguimento, concluindo-se, então, que o uso desses métodos de avaliação permitiria estabelecer resultado a prognóstico a curto e médio prazo. Também nos estudos de GOMEZ et al 8, o grau de gravidade dos doentes quantificado pelo TISS nas primeiras 24 horas foi altamente correlacionado com a morte, sendo que não houve mortalidade naqueles com escore menor que dez a nos demais, a mortalidade foi crescente paralela à pontuação do TISS-28. No que diz respeito ao motivo de internação na UTI, houve associação das doenças do aparelho circulatório e pós-operatório imediato com o tipo de hospital que o paciente encontrava-se internado. As doenças do aparelho circulatório foram mais freqüentes nas unidades dos hospitais particulares e o pós-operatório imediato, nas dos hospitais governamentais. Conforme verifica-se no Quadro 7, quando se analisa os antecedentes e o tipo de hospital, diferença significativa foi observada somente na presença de neoplasias. Esse antecedente, mais fre- 12 qüente entre os pacientes internados em UTIs de hospitais não governamentais foi o mais presente nesse grupo de pacientes após as doenças do aparelho circulatório. PIERIN et al16, na análise do diagnóstico médico principal na admissão na UTI, mostraram que as neoplasias predominaram na UTI particular e era o terceiro diagnóstico principal mais freqüente na unidade governamental. Pelos dados do Quadro 8 observa-se que, considerando a variável tipo de hospital, ocorreu diferença significativa na distribuição dos pacientes nas categorias de intervenções Suporte Cardiovascular e Renal, sendo ambas mais freqüentemente observadas em UTIs dos hospitais governamentais. Essa diferença entre os tipos de hospital pode ser justificada pela contenção de custos mais rígida nas instituições particulares. No geral, as unidades dos hospitais governamentais distinguiram-se dos não governamentais pela maior presença de intervenções nessas categorias, mortalidade mais alta e pontuação do TISS-28 mais elevada. Tendo em vista que hospitais governamentais atendem pessoas de nível socioeconômico mais baixo, pode-se relacionar tais resultados com os apresentados por LATOUR et al12. Esses autores, analisando a associação entre condição socioeconômica e mortalidade em pacientes de UTI, verificaram uma relação inversa entre essas variáveis. Demais resultados desse mesmo estudo indicaram que a maior mortalidade nos pacientes de nível socioeconômico mais baixo pode ser explicado pela maior gravidade de doença; em contrapartida, não houve evidências estatísticas de desigualdade no empenho terapêutico dos pacientes, segundo condição social. A desigualdade nas condições de saúde das classes sociais têm sido atribuídas às adversidades ambientais, alienação social, estilo de vida pouco saudável e cuidados médicos inadequados dos grupos sociais menos privilegiados12. Nesse sentido, os resultados do presente estudo são indicativos de que diferenças sociais não interferem na realização de intervenções terapêuticas na UTI, prevalecendo, assim, o pressuposto da assistência intensiva em que maior gravidade requer maior intensidade de intervenções. CONCLUSÕES O estudo sobre as diferenças das características dos pacientes internados nas UTIs do Município de São Paulo segundo NRS e tipo de hospital permitiu as seguintes conclusões: • Verificou-se que houve associação entre os NRSs a as características: idade, procedência, tempo de permanência, condição de saída. Entre os motivos de internação houve diferença significativa quando se analisou o pós-operatório imediato a outros motivos pouco Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO ANEXO A THERAPEUTIC INTERVENTION SCORING SYSTEM (TISS-28) Atividades básicas Pontuação - Monitorização padrão. Sinais vitais horários, registros e cálculo regular do balanço hídrico ................................................. 5 - Laboratório. Investigações bioquímicas a microbiológicas ...................................................................................................... 1 - Medicação única. Endovenosa, intramuscular, subcutânea, e/ou oral (por exemplo, sonda nasogástrica) ............................ 2 - Medicações endovenosas múltiplas. Mais do que uma droga. Injeções únicas ou contínuas ................................................ 3 - Troca de curativos de rotina. Cuidado e prevenção de úlceras de decúbito e troca diária de curativo ................................... 1 - Trocas frequentes de curativos. Troca frequente de curativo (pelo menos uma vez por turno de enfermagem) e/ou cuidados com feridas extensas ....................................................................................................................................... 1 - Cuidados com drenos. Todos (exceto sonda nasogástrica) .................................................................................................... 3 Suporte ventilatório - Ventilação mecânica. Qualquer forma de ventilação mecânica/ventilação assistida com ou sem pressão expiratória positiva final, com ou sem relaxantes musculares; respiração espontânea com pressão expiratória positiva final ................ 5 - Suporte ventilatório suplementar. Respiração espontânea através do tubo endotraqueal sem pressão expiratória positiva final; oxigênio suplementar por qualquer método, exceto aplicação de parâmetros de ventilação mecânica ........... 2 - Cuidados com vias aéreas artificiais. Tubo endotraqueal ou traqueostomia ........................................................................... 1 - Tratamento para melhora da função pulmonar. Fisioterapia torácica, espirometria estimulada, terapia de inalação, aspiração endotraqueal ........................................................................................................................................................... 1 Suporte cardiovascular - Medicação vasoativa única. Qualquer droga vasoativa ........................................................................................................... 3 - Medicação vasoativa múltipla. Mais de uma droga vasoativa, independente do tipo e dose ................................................. 4 - Reposição endovenosa de grandes perdas volêmicas. Administração de volume >31/m2/dia, independente do tipo de fluido administrado ............................................................................................................................................................. 4 - Cateter arterial periférico ......................................................................................................................................................... 5 - Monitorização do átrio esquerdo. Cateter de artéria pulmonar com ou sem medida de débito cardíaco ............................... 8 - Via venosa central ................................................................................................................................................................... 2 - Ressuscitação cardiopulmonar após parada cardiocirculatória nas últimas 24 horas (soco precordial único não incluído) .. 3 Suporte renal - Técnicas de hemofiltração. Técnicas dialíticas ........................................................................................................................ 3 - Medida quantitativa do débito urinário (por exemplo, sonda vesical de demora) .................................................................... 2 - Diurese ativa (por exemplo, Furosemide >0,5mg/Kg/dia por hipervolemia) ............................................................................ 3 Suporte neurológico - Medida de pressão intracraniana ............................................................................................................................................ 4 Suporte metabólico - Tratamento da acidose/alcalose metabólica complicada ........................................................................................................ 4 - NPT - Nutrição Parenteral Total endovenosa .......................................................................................................................... 3 - Nutrição enteral através da sonda nasogástrica ou outra via gastrointestinal (por exemplo jejunostomia) ............................ 2 Intervenções específicas - Intervenção específica única na UTI. Intubação naso ou orotraqueal, introdução de marca-passo, cardioversão, endoscopia, cirurgia de emergência nas últimas 24 horas, lavagem gástrica: não estão incluídas intervenções de rotina sem consequências diretas para as condições clínicas do paciente, tais como radiografias, ecografias, eletrocardiograma, curativos, introdução de cateter venoso ou arterial .................................................................................. 3 - Intervenções específicas múltiplas na UTI. Mais do que uma conforme descritas acima ...................................................... 5 - Intervenções específicas fora da UTI. Procedimentos diagnósticos ou cirúrgicos .................................................................. 5 “Medicação endovenosa múltipla” exclui “medicação única”, “ventilação mecânica” exclui “suporte ventilatório suplementar”, “medicação vasoativa múltipla” exclui “medicação vasoativa única” e “intervenções específicas múltiplas na UTI” exclui “intervenção única na UTI”. TOTAL:______________pontos freqüentes. Houve associação entre a presença dos antecedentes: neoplasias, doenças do aparelho circulatório e outros menos freqüentes e a variável NRS. Diferença na presença de intervenções te- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 rapêuticas foi observada nas categorias Suporte Renal, Metabólico e Intervenções Específicas do TISS-28. • Na comparação dos pacientes atendidos em UTI de instituições hospitalares governamentais e não governamentais, verificou-se associação entre esses tipos de hospitais a as seguintes características dos pacientes: procedência, pontuação do TISS a condição de saí- 13 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO da. Quanto ao motivo de internação na UTI, houve associação das doenças do aparelho circulatório e pós-operatório imediato com o tipo de hospital que o paciente encontrava-se internado. Em relação aos antecedentes clínicos e cirúrgicos houve associação apenas entre tipo de hospital e a presença de neoplasias. As categorias do TISS-28, Suporte Cardiovascular e Renal foram mais freqüentes em pacientes de hospitais governamentais, e essa diferença alcançou o nível de significância estabelecido. RESUMO O objetivo deste estudo foi comparar as características dos pacientes adultos internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) dos diferentes Núcleos Regionais de Saúde (NRS) do Município de São Paulo, além de comparar pacientes de hospitais governamentais e não governamentais. Por meio de amostragem casual estratificada, considerando-se os cinco Núcleos Regionais de Saúde (NRSs) e o tipo de hospital , foram selecionados 10% das UTIs do Município. A amostra estudada foi de 200 pacientes, sendo os dados coletados referentes a um dia de internação na unidade. Na análise, as seguintes características apresentaram associações com os NRSs: idade, procedência, tempo de permanência na UTI, condição de saída da UTI e alguns motivos de internação e antecedentes. Observou-se também diferença nas intervenções terapêuticas. Em relação à comparação dos 14 pacientes assistidos em UTIs de instituições hospitalares governamentais e não governamentais, associações foram observadas com procedência, pontuação do TISS-28 e condição de saída. Houve associação entre tipo de hospital a as causas de internação relacionadas a doenças do aparelho circulatório e pós-operatório imediato assim como o antecedente neoplasia. As categorias do TISS-28, Suporte Cardiovascular a Renal foram mais freqüentes em pacientes de hospitais governamentais, e essa diferença alcançou o nível de significância estabelecido. UNITERMOS: Unidade de Terapia Intensiva, Hospital, Município de São Paulo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ARTUCIO, H. et al. Utilización de los indices APACHE y TISS en una unidad de medicina intensiva. Paciente Crítico, v.1, n.2, p.142-58,1988. 2. ASSOCIAÇÃO DE MEDICINA INTENSIVA BRASILEIRA. Anuário Brasileiro de Unidades de Terapia Intensiva. São Paulo, 1999/2000. v.1. 3. BASEGGIO, D. et al. Unidades de Terapia Intensiva: situação atual no Município de São Paulo. São Paulo, 1997/ Mimeográfado/. 4. BERQUÓ, E S. et al Bioestatística. São Paulo, EPU, 1981. 5. BRASIL. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde. Mortalidade Brasil. Brasília, 1995. 6. CRUZ, D. A. L. M. et al. Disponibilidade de equipamentos em unidades de terapia intensiva do Município de São Paulo. Rev. Bras. Terap. Intens., v.9, n.2, p.82-6, 1997. 7. CULLEN, D. J. et al. Therapeutic Intervention Scoring System: a method for quantitative comparision of patient care. Crit. Care Med., v.2, n.2, p.57-60, 1974. 8. GOMEZ, et al. Análisis de la mortalidad en función de la gravedad: estudo comparativo en 2 unidades de cuidados intensivos. Revista Colombiana de Cirugia, v.4, n.3, p.129-34, 1989. 9. GROEGER, J. S. et al. Descriptive analysis of critical care units in the United States Crit. Care Med., v.20, n.6, p.846-63, 1992. 10. KIMURA, M.; MIYADAHIRA, A. M. K. Aspectos da assistência hospitalar no Município de São Paulo - A situação da assistência intensiva. Rev. Esc. Enf. USP, v.25, n.1, p.61-72, 1991. 11. KIMURA, M. et al. Caracterização das unidades de terapia intensiva do Município de São Paulo. Rev. Esc. Enf. USP, v.31, n.2, p.304-15, 1997. 12. LATOUR, J. et al. Inequalities in health in intensive care patients. J. Clin. Epidemiol., v.44, n.9, p.889-94, 1991. 13. MIRANDA, D. R. et al. Simplified Therapeutic Intervention Scoring System: the TISS-28 itens Results from a multicenter study. Crit. Care Med, v.24, n. 1, p.64-73, 1996. 14. PADILHA, K. G. et al. Estrutura fisica das unidades de terapia intensiva do Município de São Paulo. Rev. Bras. Terap. Intens, v.9, n.2, p.71-6, 1997. 15. PARADA, M. T. et al. Aplicacion de dos sistemas de evaluacion, APACHE y TISS, en pacientes bronquiticos cronicos ingressados a una unidad de cuidados intensivos. Enferm. Respir. Cir. Torac., v.4, n.43, p.15-7, 1988. 16. PIERIN, A. M. G. et al. Caracterização dos pacientes de duas unidades de terapia intensiva (UTI): condições biossociais, processo de internação e intervenções terapêuticas. Rev. Esc. Enf. USP, v.24, n.3, p. 371-88, 1990. 17. REYES, J.; D’EMPAIRE, G. Indices de severidad y prognostico en una unidad de medicina critica privada. Med. Crit. Venez, v.7, n.1, p. I 1-22, 1992 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Tr ombose V enosa Pr ofunda Venosa Profunda na Faixa Etária Pediátrica Deep Venous Thrombosis in Pediatric Group Sandra Doria*, Denise Tiemi Noguchi**, Jacira Doralice Paccez*** ABSTRACT Deep vein thrombosis (DVT) has been recognized in the pediatric age group. It is possible that the diagnosis of DVT is overlooked because the index of suspicion for the presence of this disease is low or the symptoms and signs of DVT are minimal or absent. According to Andrew et al, while 40% of DVT cases in adults is idiopathic, 96% to 98% of DVT cases in neonates and children is associated to predisposing clinical conditions. The most common association is the presence of a central venous catheter (CVC). DVT is less frequent on upper limb than on lower limb, but the incidence on upper limb has been increasing because of the use of CVC for a long time. Although venography remains the reference test for diagnosis of DVT, the non-invasive method most frequently used is the doppler ultrasound. The anticoagulant treatment is necessary in almost all cases of DVT, except in the case which there is contraindication. There is scant literature and data on prophylaxis of DVT for pediatric patients, and for this reason, there is not a consensus about this issue. Since CVC are the most common risk factors associated with the development of thrombosis, information concerning the effectiveness and validity of the prophylaxis as well as the profile os the pediatric patient who might receive it, are being more required each time. Key words: Thrombosis - catheterization, central venous – child *Acadêmica do 6° ano da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. **Acadêmica do 4° ano da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. ***Mestre em Pediatria pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Médica Responsável pela Unidade Semi Intensiva do Departamento de Pediatria e Puericultura da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Trabalho realizado no Departamento de Pediatria e Puericultura da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Endereço para correspondência: Jacira Doralice Paccez - Rua Oneyda Alvarenga, 35 apto 132 A - Jardim da Saúde - São Paulo - S.P. - CEP: 04146-020 - Telefone: (011) 5584-9304 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 H á muito tempo reconhecida como uma importante causa de morbidade em pacientes adultos, a trombose venosa profunda (TVP) tem sido cada vez mais objeto de estudo na faixa etária pediátrica. Em adultos hospitalizados em unidades de terapia intensiva, tromboembolismo pulmonar é reconhecido como uma importante causa de morbidade a mortalidade. Nestes pacientes, a profilaxia contra TVP é rotineiramente aplicada. Muitos estudiosos acreditam que a faixa etária pediátrica esteja “imune” a esse tipo de complicação e, desse modo, profilaxia raramente é feita. Por outro lado, os sintomas encontrados na TVP muitas vezes podem se confundir com sintomas pertinentes a outras patologias sistêmicas a infecciosas, ou mesmo são mínimos ou ausentes, acarretando subdiagnóstico de TVP em crianças1. No entanto, na última década, TVP em crianças começou a ser reconhecida como incomum, porém significante causa de morbidade. Embora ainda não intensivamente estudada, tem despertado interesse para estudos mais segmentados1,2. Vários estudos demonstram que a incidência de TVP em crianças a adolescentes é inferior à encontrada nos adultos, mas as razões pelas quais existe esta diferença não está ainda claramente definida. Na população adulta, o envelhecimento já é estabelecido como importante fator de risco para o desenvolvimento de TVP o que sugere que os indivíduos mais jovens tenham alguma qualidade intrínseca que vai se perdendo com o passar dos anos3,4. Esta revisão tem por objetivo discorrer sobre os aspectos mais relevantes a respeito de TVP assim como demonstrar as controvérsias que ainda existem a respeito da TVP em crianças através de um estudo retrospectivo de uma década. INCIDÊNCIA A incidência populacional da TVP não é bem conhecida. Dados baseados em diagnóstico clínico indicam, para os EUA, 1,25 caso por 1.000 habitantes anualmente5. Na 15 ARTIGO Suécia, com base em diagnóstico clínico a flebográfico, foi feita uma estimativa de 0,9 caso por 1.000 habitantes ao ano6. A incidência de TVP em doentes internados é de estimativa mais fácil. Estudos iniciais mostraram, entretanto, uma discrepância entre os dados obtidos pelo exame clínico a os dados verificados em autópsias, sugerindo a existência de casos assintomáticos da doença7. No Canadá, há registro de 0,07 por 10.000 crianças a incidência de 5,3 por 10.000 admissões hospitalares8. Registro internacional de TVP em RN mostra incidência de 0,24/ 10.000 admissões em unidade de cuidados intensivos neonatal9. Na Alemanha um estudo prospectivo de 2 anos relata a incidência de tromboembolismo pulmonar de 0,51 por 10.000 nascimentos, com aproximadamente metade dos casos venoso e metade arterial10. EPIDEMIOLOGIA Grande parte dos dados a respeito deste assunto deve-se a estudos canadenses realizados em 1994 por Andrew e col8. Utilizando-se de dados fornecidos por quinze centros terciários de atendimento pediátrico, Andrew e col encontraram incidência de TVP de 5,3 em 10.000 admissões hospitalares ou 0,07 por 10.000 crianças canadenses. Em comparação, em adultos, a incidência de TVP é estimada em 2,5% a 5,0% na população em geral. Em um outro estudo realizado por Andrew e col em 199811, foram estudadas 244 crianças de 1 mês de vida até 18 anos de idade que se submeteram, durante internação hospitalar, a cateter venoso central (CVC) e desenvolveram TVP. A incidência desta complicação foi muito mais freqüente nos lactentes. A proporção sexo masculino e feminino foi 1,2:1, respectivamente11. Condições predisponentes foram encontradas em 100% dos casos, 16 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva sendo as principais as neoplasias (42,2%) e as doenças cardíacas (19,7%), entre outras como infecção (7%), trauma (4,9%), nutrição parenteral (4,5%), falência renal (3,7%), síndrome nefrótica (2,9%), cirurgia (2,5%) e displasia broncopulmonar (2%). As veias mais comumente envolvidas foram femoral (22,1%), subclávia (20, 5%), veia cava superior (18,4%), jugular (14,3%), veia cava inferior (10,2%), ilíaca (7,8%), átrio direito (4,9%), axilar (4,5%), braquiocefálica (4,5%), poplítea (2,9%) e inominada (2,9%). Tromboembolismo pulmonar foi diagnosticado em 16% das crianças, sendo 6,2% associado à TVP em jugular ou membros superiores, 5,4% com TVP em membros inferiores e 4,6% sem associação com TVP. Vinte e três por cento dos 244 pacientes foram à óbito, sendo 84% por doença adjacente e 16% como resultado direto de TVP (tromboembolismo pulmonar em 12,5% e trombose intracardíaca em 3,5%). A idade das crianças que evoluíram desta maneira variou de 2 meses a 12 anos, sendo a maioria das TVP originárias dos membros superiores, jugular e veias cava superior e inferior. Os autores deste estudo, frente à alta mortalidade e morbidade (3,7% a 15,9%, respectivamente) encontrada em casos de TVP associado à CVC, acreditam ser necessário formular protocolos para se identificar prontamente os fatores de risco mais importantes a fim de realizar uma terapia profilática adequada. FATORES DE RISCO Atualmente, determinados fatores genéticos podem levar a situações de hipercoagulabilidade, facilitando o desenvolvimento de TVP. Diminuição de antitrombina III12, de proteína C 13, de proteína S 14, do co-fator II da heparina 15 e de atividade fibrinolítica16 foram descritos em famílias com tendência à trombose. Não há relato na literatura sobre o significado desses defeitos na faixa etária pediátrica. Enquanto 40% das TVP nos adultos são idiopáticas, 96% a 98% das TVP em neonatos a crianças estão associadas às condições clínicas predisponentes1,8, conforme relato de Andrew e col. De longe, a associação mais comum é a presença de CVC. Em neonatos, excluindo aqueles com trombose de veia renal, 89% dos eventos trombóticos têm associação com CVC17 e, em menor porcentagem, mas em segundo lugar em importância nesta faixa etária, a infecção sistêmica. Uma variedade de fatores pode influenciar na incidência de trombose associada a CVC incluindo composição, tamanho, comprimento, duração de uso, número de portas de entrada a tipo de solução infundida18. Em muitos doentes com TVP aparentemente idiopática verifica-se, posteriormente, o desenvolvimento de doença neoplásica, sendo possível que a TVP tenha aparecido como Tromboembolismo pulmonar foi diagnosticado em 16% das crianças, sendo 6,2% associado à TVP em jugular ou membros superiores, 5,4% com TVP em membros inferiores e 4,6% sem associação com TVP. Vinte a três por cento dos 244 pacientes foram à óbito, sendo 84% por doença adjacente e 16% como resultado direto de TVP (tromboembolismo pulmonar em 12,5% e trombose intracardíaca em 3,5%). A idade das crianças que evoluíram desta maneira variou de 2 meses a 12 anos, sendo a maioria das TVP originárias dos membros superiores, jugular e veias cava superior e inferior. Os autores deste estudo, frente à alta mortalidade e morbidade (3,7% Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva e 15,9%, respectivamente) encontrada em casos de TVP associado à CVC, acreditam ser necessário formular protocolos para se identificar prontamente os fatores de risco mais importantes a fim de realizar uma terapia profilática adequada. FATORES DE RISCO Atualmente, determinados fatores genéticos podem levar a situações de hipercoagulabilidade, facilitando o desenvolvimento de TVP. Diminuição de antitrombina III12, de proteína C13, de proteína S14, do co-fator 11 da heparina 15 a de atividade fibrinolítica16 foram descritos em famílias com tendência à trombose. Não há relato na literatura sobre o significado desses defeitos na faixa etária pediátrica. Enquanto 40% das TVP nos adultos são idiopáticas, 96% a 98% das TVP em neonatos e crianças estão associadas às condições clínicas predisponentes1,8 , conforme relato de Andrew e col. De longe, a associação mais comum é a presença de CVC. Em neonatos, excluindo aqueles com trombose de veia renal, 89% dos eventos trombóticos têm associação com CVC 17 e, em menor porcentagem, mas em segundo lugar em importância nesta faixa etária, a infecção sistêmica. Uma variedade de fatores pode influenciar na incidência de trombose associada a CVC incluindo composição, tamanho, comprimento, duração de uso, número de portas de entrada e tipo de solução infundida18. Em muitos doentes com TVP aparentemente idiopática verifica-se, posteriormente, o desenvolvimento de doença neoplásica, sendo possível que a TVP tenha aparecido como fenômeno paraneoplásico, antes da manifestação clínica da própria neoplasia. Destacam-se outros fatores de risco, entre eles: ♦ Idade: a TVP é mais comum após os 40 anos, havendo aumento Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 ♦ ♦ ♦ ♦ progressivo com a idade. Uma hipótese levantada para explicar esse fato foi a de que a diminuição da resistência da parede venosa, com a idade, poderia propiciar a dilatação da veia e, conseqüentemente, a diminuição da velocidade do fluxo sangüíneo, facilitando o desenvolvimento da trombose19. Imobilização: o tempo de imobilização no leito é um fator clínico também importante. Tromboembolismo venoso prévio: a ocorrência prévia de TVP aumenta de três a quatro vezes o risco de TVP em pacientes submetidos à cirurgia19. Se a história prévia inclui embolia pulmonar, o risco de uma nova TVP é de 100%19. Obesidade: parece ser um fator de risco para o desenvolvimento de TVP em pacientes acamados19, possivelmente devido à dificuldade de mobilização do paciente. Neoplasia: a presença de neoplasia parece aumentar a incidência de TVP em duas vezes, particularmente em pacientes submetidos a condições desencadeantes da TVP, como cirurgia, imobilização, fratura de quadril, etc19. PATOLOGIA E PATOGENIA Os trombos podem desenvolver-se após uma agressão direta à parede venosa, como traumas, cateterismo ou injeção venosa, ou podem desenvolver-se, sem qualquer lesão venosa aparente, em um indivíduo normal ou em pacientes submetidos à cirurgia, repouso prolongado, pós-parto etc. Já em 1856, Virchow20 indicava que, para o desenvolvimento da trombose, seria necessário haver alteração da parede vascular, do fluxo sangüíneo e de componentes do próprio sangue. No primeiro componente desta tríade, quando existe uma lesão ARTIGO endotelial com exposição do subendotélio, plaquetas e glóbulos brancos rapidamente se acumulam sobre este, havendo também ativação dos mecanismos de coagulação. As plaquetas liberando ADP e tromboxana A2 promovem a agregação de novas plaquetas. Forma-se trombina, que contribui para a agregação de novas plaquetas a leva à formação de fibrina, que dará consistência ao trombo, apreendendo os elementos celulares. Em relação ao segundo componente da tríade de Virchow, tanto a diminuição da velocidade de fluxo como de volume de fluxo, que se incluem no termo geral de estase sangüínea, provavelmente têm papel importante no desenvolvimento da trombose. A diminuição da velocidade de fluxo pode dever-se a uma queda no débito cardíaco durante o repouso; relaxamento muscular durante o repouso, anestesia ou em paralisias e não acionamento dos músculos da panturrilha que auxiliam na impulsão do sangue para o coração. Segundo Sevitt 21, a diminuição de fluxo no interior das veias levaria a uma perturbação do fluxo laminar, criando redemoinhos nos seios valvulares a em dilatações venosas, os quais levariam ao acúmulo local de hemácias, plaquetas a leucócitos. A estabilidade desses depósitos seria garantida pela formação de uma rede de fibrina que prenderia esses elementos. Formar-se-ia o núcleo do trombo e seu crescimento ocorreria pela sucessiva deposição de mais camadas de fibrina a de agregados plaquetários, hemácias e leucócitos. Com o crescimento do trombo e a oclusão da veia pode ocorrer a formação de trombose secundária, agora em direção retrógrada. Se a existência de um estado de hipercoagulabilidade é indispensável para a existência de TVP, ainda é um assunto controverso. Na hipercoagulabilidade inclui: aumento de 17 ARTIGO fatores que promovem a coagulação ou diminuição de fatores inibidores da mesma como a antitrombina III, proteína C e proteína S. Provavelmente os três fatores, estase, hipercoagulabilidade e lesão tecidual agem sinergicamente, variando em cada caso o grau de participação dos mesmos20,21. QUADRO CLÍNICO A DIAGNÓSTICO Diagnóstico clínico Cinqüenta por cento ou mais dos casos com TVP confirmada não apresentam sinais clínicos18. Entretanto, é preciso lembrar que, quanto mais extensa e portanto mais grave a trombose, mais freqüente o aparecimento dos sintomas e sinais. De outro lado, em 30-50% dos casos que apresentam sinais ou sintomas sugestivos de TVP, esta não é confirmada pelo exame flebográfico, sendo os mesmos devidos a outras patologias como infecções extensas de subcutâneo em fase inicial, ruptura muscular, miosites, fadiga muscular, hematomas musculares etc22. O sintoma mais comum de TVP nos membros inferiores é a dor, que é causada pela própria distensão da veia, pelo processo inflamatório vascular e perivascular e pelo edema muscular que expande o volume dos músculos no interior da fáscia muscular pouco distensível, ocasionando pressão sobre terminações nervosas. Outra queixa importante dos doentes é a do aparecimento de edema. Deve-se sempre suspeitar fortemente de TVP quando um paciente apresentar edema em um só membro ou quando, embora exista edema bilateral, ele já é ou se torna maior em um dos membros. São referidos febre, taquicardia e mal-estar como podendo ser o primeiro sinal de TVP23. A TVP ocorre menos freqüentemente no membro superior que no inferior, mas sua incidência vem 18 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva aumentando em virtude de maior utilização de cateteres venosos centrais a longo prazo. O quadro clínico de TVP em membros superiores geralmente tem início com o aparecimento abrupto de edema não inflamatório de uma das extremidades superiores 21 . Em certas ocasiões esse sintoma pode ser precedido por dor em queimação profunda na região clavicular. Alterações da cor da extremidade, tais como palidez ou cianose, não são freqüentes. Concomitante com o edema, ou em seguida a este, aparece freqüentemente uma rede de veias colaterais superficiais que persiste evidente a dilatada por tempo prolongado23. No exame físico, podem ser vistos trajetos venosos superficiais, cianose, palidez em alguns casos, edema subcutâneo, edema muscular, dor à palpação muscular e à palpação dos trajetos venosos. O sinal de Homans é uma manobra feita para pesquisar os sinais acima descritos, que consiste na dorsiflexão dolorosa passiva do pé, com a perna estendida23,24. MÉTODOS AUXILIARES DE DIAGNÓSTICO Existe hoje um consenso mundial de que apenas o diagnóstico clínico não é suficiente para o diagnóstico de certeza da TVP, devendo ser realizado um exame auxiliar que demonstre direta ou indiretamente a presença do trombo23,24. A flebografia permanece como método diagnóstico de referência para confirmação de TVP, na qual é necessário que haja um defeito ou ausência de enchimento das veias profundas para estabelecer-se o diagnóstico. No entanto, o exame não-invasivo mais freqüentemente utilizado para diagnosticar TVP é a ultra-sonografia venosa com doppler. O valor preditivo positivo de uma ultra-sonografia venosa com doppler aproxima-se de 95% no caso de trombose proximal de veias profundas. Na panturrilha, por ser mais difícil visualizar suas veias que as veias proximais, a sensibilidade da técnica é de 50% a 75%, embora sua especificidade seja de 95%24. Estudos validando o use do ultra-som doppler no diagnóstico de TVP em crianças não são encontrados. O Subcomitê de Homeostase Perinatal da Sociedade Internacional de Trombose a Homeostase ainda recomenda um estudo angiográfico e para o acompanhamento clínico do paciente, o ultra-som doppler 25. A ressonância nuclear magnética é outra forma não-invasiva de detectar TVP. Sua precisão diagnóstica para avaliar TVP proximal assemelha-se à da ultra-sonografia com doppler. É útil em pacientes com suspeita de trombose das veias cava superior e inferior ou pélvicas. O ideal seriam exames laboratoriais que pudessem, apenas pela retirada e análise do sangue, fazer a suspeita de uma trombose em formação. Grande número de pesquisadores tem se dedicado a desenvolvimento de tais exames, mas os resultados ainda não são animadores do ponto de vista prático25. TRATAMENTO O tratamento de TVP tem como objetivo, além de aliviar os sintomas agudos da doença e evitar sua recidiva, evitar a ocorrência de embolia pulmonar e de insuficiência venosa crônica, ou pelo menos diminuir a gravidade dessas complicações pelo impedimento do crescimento do trombo em formação e, se possível, conseguir a desobstrução da veia. As indicações de tratamento baseiam-se não só no quadro clínico do doente, mas também nos achados flebográficos ou ultra-sonográficos. Quando, entretanto, existe a impossibilidade da realização de exames auxiliares, o doente com diagnósti- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva co clínico deve ser tratado como portador de TVP 26. TRATAMENTO ANTICOAGULANTE O tratamento anticoagulante é constante em quase todas as circunstâncias, quer como tratamento único, quer como tratamento coadjuvante, excluindo-se os casos em que há contra-indicação para seu uso. Deve ser iniciado tão logo seja confirmado o diagnóstico de TVP. Esse tratamento não é curativo, pois não destrói ou retira o trombo. A ação anticoagulante consiste em impedir sua extensão, mantendo-o limitado, e em evitar a formação de sua cauda, que tende a desprender-se, ocasionando embolia pulmonar. O tratamento anticoagulante deve ser iniciado sempre com heparina não fracionada, que tem ação imediata, tornando o sangue hipo ou incoagulável segundos após sua administração. É sempre utilizada por via parenteral com dosagem alta, variando de 30.000 a 40.000 unidades diárias em adultos26, e em crianças na dose de 50-100 U/kg/dose de 4 em 4 horas27. Algumas heparinas de baixo peso molecular têm sido usadas para tratamento de TVP e mesmo de embolia pulmonar, com resultados comparáveis aos da heparina não fracionada28. O tratamento anticoagulante é usado por 2 a 3 meses em casos de tromboses limitadas às pernas, mantendo por 4 a 6 meses nos casos de trombose iliofemoral e/ou embolia pulmonar. Utilizam-se anticoagulantes por via oral. Estudos sobre o manejo da TVP na faixa etária pediátrica não são completos, os trabalhos disponíveis detêm-se a expor o tratamento nos adultos. O American College of Chest Physicians desenvolveu um consenso em 1995, que diz que em crianças acima de 2 meses de idade Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 a terapia com heparina a anticoagulante oral é a mais indicada. A heparina de baixo peso molecular é uma opção e seu uso, devido a suas vantagens em relação à heparina não fracionada, tem sido cada vez maior29. TRATAMENTO FÍBRINOLÍTICO A droga ideal para o tratamento da TVP seria a que dissolvesse totalmente o trombo, permitindo a recuperação completa da veia a de suas válvulas. Revisões de ensaios clínicos controlados, incluindo trabalhos mais recentes, têm mostrado mortalidade maior com o uso de fibrinolíticos que com heparina30 que, associada ao preço do tratamento, não justifica a utilização do tratamento fibrinolítico para TVP como rotina em nosso meio27. PROFILAXIA A decisão de se iniciar em um paciente pediátrico a profilaxia para TVP deve ser embasada nos riscos pró-trombóticos. Estudos sobre esse assunto nesta faixa etária são escassos e, por isso, até então não se chegou a um consenso. A complexidade da doença primária em muitas crianças com TVP relacionada aos CVC, se clínica ou cirúrgica ou mesmo associadas, aumentam o potencial de complicações por sangramentos secundários à profilaxia com anticoagulação. A incidência de trombose, mesmo em crianças com fatores de risco para tal, é baixa. Deste modo, para se obter uma pesquisa de boa cobertura e confiabilidade é necessário que haja grande número de pacientes31. Uma vez que os CVC são os fatores de risco mais comuns associados ao desenvolvimento de TVP, informações a respeito da eficácia a validade da profilaxia bem como o perfil do paciente pediátrico que deve recebê-la, estão sendo cada vez mais requeridas 29. ARTIGO CONCLUSÃO Apesar de muito menos freqüentes na faixa etária pediátrica, a incidência e conseqüências da TVP devem ser analisadas de modo mais abrangente pelo meio médico a fim de se formular um consenso a respeito da necessidade de se realizar profilaxia e quais os pacientes que mais se beneficiariam com a mesma. RESUMO A trombose venosa profunda (TVP) tem sido cada vez mais objeto de estudo na faixa etária pediátrica. É possível que haja subdiagnóstico de TVP em crianças, seja pelo fato de pouco se suspeitar desta patologia ou pelo fato de que muitas vezes os sinais e sintomas serem mínimos ou ausentes. De acordo com Andrew e col, enquanto 40% das TVP nos adultos são idiopáticas, 96% a 98% das TVP em neonatos e crianças estão associadas às condições clínicas predisponentes. De longe, a associação mais comum é a presença de cateter venoso central (CVC). Ocorre menos freqüentemente no membro superior que no inferior, mas sua incidência vem aumentando em virtude de maior utilização de CVC por tempo prolongado. A flebografia permanece como método diagnóstico de referência para confirmação de TVP, no entanto, o exame nãoinvasivo mais freqüentemente utilizado é a ultra-sonografia venosa com Doppler. O tratamento anticoagulante é constante em quase todas as circunstâncias, excluindo-se os casos em que há contra-indicação para seu uso. Estudos sobre a indicação de profilaxia para TVP na faixa etária pediátrica são escassos e, por isso, até então não se chegou a consenso sobre o assunto. Uma vez que os CVC são os fatores de risco mais comuns associados ao desenvolvimento de TVP, informações a respeito da eficácia e validade da profilaxia bem como o perfil do paciente 19 ARTIGO pediátrico que deve recebê-la, estão sendo cada vez mais requeridas. Unitermos: Trombose - cateterismo venoso central - criança REFERÊNCIAS 1. David M, Andrew M. Venous thromboembolism complications in children: a critical review of the literature. J Pediatr 1993; 123: 337-346. 2. Lambie JM, Mahaffey RG, Barber DC, Karmody AM, Scott MM, Matheson NA. Diagnostic accuracy in venous thrombosis. BMJ 1970; 22:142-143. 3. Horwitz J, Shenker IR. Spontaneous deep vein thrombosis in adolescence. Clin Pediatr 1977; 16:787-90. 4. Tracy T Jr, Posner MP, Drucker DEM, et al. Use of the Greenfield filter in adolescents for deep vein thrombosis and pulmonary embolism. J Pediatr Surg 1988; 23:529-32. 5. Kakkar VV, Flanc C, Howe CT, Clark MB. Natural history of postoperative deep vein thrombosis. Lancet 1969; 2:230. 6. Nylander G, Olivecrona H. The phlebography pattern of acute leg thrombosis within a defined urban population. Acta Chir Scand 1976; 142:505. 7. Carter C, Gent M. The epidemiology of venous thrombosis. In: Colman RW, Hirsh J, Marder VJ, Salzman EW. Eds. Hemostasis and Thrombosis. Basic Principles and Clinical Practice. Philadelphia: J.B. Lippincott 1982; 805. 8. Andrew M, David M, Adams M, Ali K, Anderson R, Barnard D, et al. Venous Thromboembolic Complications (VTE) in children: first analyses of Canadian Registry of VTE. Blood 1994; 83: 1251-1257. 9. Schmidt B, Andrew M. Neonatal thrombosis: report of a prospective Canadian and international registry. Pediatrics 1995; 96:939-43. 10. Nowak-Gohl U, von Kries R, Gobel U. Neonatal sumptomatic thromboembolism in Germany: two year survey. Arch Dis Child Fetal Neonatal Educ 20 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva 1997; 76:F163-7. 11. Massicotte MP, Dix D, Monagle P, Adams M, Andrew M. Central venous catheter related thrombosis in children: analysis of the Canadian Registry of Venous Thromboembolic Complications. JPediatr 1998; 133:770-776. 12. Egeberg O. Inherited antithrombin III defficiency causing thrombophila. Thromb Diath Haemorrh. 1965; 13: 516. 13. Bauer G. A venographic study of thromboembolitic problems. Acta Chir Scand (suppl.) 1940; 61:5. 14. Comp PC, Esmon CT. Recurrent venous thromboembolism in patients with a partial deficiency of protein S. NEngl JMed 1984; 311:1.525. 15. Sie P, Dupouy D, Pichon J, Boneau B. Constitutional heparin co-fator II deficiency associated with recurrent thrombosis. Lancet 1985; II:414. 16. Johansson L, Hedner V, Nilsson IM. A family with thromboembolic disease associated with deficiet fibrinolytic activity in vessel wall. Acta Med Scand 1978; 203:477. 17. Schmidt B, Andrew M. Neonatal thrombosis: report of a prospestive Canadian and international registry. Pediatrics 1995; 96:939-943. 18. Andrew M, Michelson AD, Bovill E, Leaker M, Massicotte MP. Guidelines for antithrombotic therapy inpediatric patients. Am J Respir Crit Care Med 1998; 158:470-476. 19. Kakkar VV, Howe LT, Nicolaides AN et al. Deep vein thrombosis of the leg: is there a “high risk”group? Am J Surg 1970; 120: 527. 20. Virchow, 1856. Citado por Allenby F. Site of origem venous thrombosis. Am Heart J. 1975; 89:123. 21. Sevitt S. Pathology and pathogenesis of deep vein thrombosis. In: Poller L Ed. Recent Advances in Thrombosis. Edinburgh: Churchill Livingstone 1973;17. 22. Stamatakis JD, Kakkar VV, Lawrence D, Bentley PG. The origin of thrombi in the deep veins of the lower limb. A venographic study. Br J Surg 1978; 65:449. 23. Yoshida WB. Trombose Venosa Profunda dos Membros Superiores. In: FHA 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. Maffei. Eds. Doenças Vasculares Periféricas. Botucatu: Editora Medsi, 2° ed., 1995; 885-890. Creager MA,Dzau VJ. Doenças vasculares dos membros. In: Fauci AS, Braunwald E, Isselbacher KJ, Wilson JD, Martin JB, Kasper DL, Hauser SL, Longo DL. Eds. Harrison Medicina Interna. Rio de Janeiro: Editora McGrawHill Interamericana do Brasil Ltda., 14° ed., Volume II, 1998; 1490-1499. David M, Manco-Johnson N, Andrew M. on behalf of the Subcommittee on Perinatal Haemostasis of the Scientific and Standardization Committee of the ISTH: Diagnosis and treatment of venous thromboembolism in children and adolescents. Thromb Haemost 1995; 74:791-792. Maffei FHA, Lastória S, Rollo HA et al. Trombose Venosa Profunda dos Membros Inferiores: Tratamento Clínico. In: Maffei FHA. Eds. Doenças Vasculares Periféricas. Botucatu: Editora Medsi, 2° ed.,1995; 863-877. Tannuri U, Brunow de Carvalho W. Trombose Venosa Profunda a Embolia Pulmonar. In: Matsumoto T, Brunow de Carvalho W, Heirschheimer MA. Eds. Terapia Intensiva Pediátrica. São Paulo: Editora Atheneu, 2° ed., 1997; 773777. Moser KM, Le Moine Jr. Is embolic risk conditioned by location of deep venous thrombosis? Ann Int Med 1981; 94:439. Donnelly KM. Venous thromboembolic disease in the pediatric intensive care unit. Curr Opin Pediatr. 1999; 11: 213-217. Moura ME, Maffei FHA, Lastória S et al. Trombose venosa profunda dos membros inferiores em crianças e adolescentes. 28° Congresso da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular. São Paulo, 1989. Andrew M, Monagle PT, Brooker L. Epidemiology of venous thromboembolic events. In: Andrew M, Monagle PT, Brooker L. Eds. Thromboembolic Complications during Infancy and Childhood. Hamilton London: BC Decker Inc 2000; 111-146. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO O comportamento do médico intensivista brasileir o diante da decisão de rrecusar ecusar ou brasileiro suspender um tratamento The Attitude of the Brasilian Intensive Care Physicians to Wards the Decisions of Withdrawal or Withholding Treatments Decision Rachel Duarte Moritz*, Adriano Dantas**, Jorge Dias de Matos***, Fernando Osni Machado**** ABSTRACT The decision to forgo life-sustaining treatment is among the most challenging problems that physicians and patients face. Objective: To examine the attitudes of the critical care physicians regarding the end-of-life decisions. Design: An anonymous questionnaire was given to the physicians who participated in the National Congress of the Brasilian Society of Critical Care Medicine. Results: A total of 82 questionnaires were answerds. The majority of the ones who answred the questionnaire (94%) had withheld and withdrawn lifesustaining medical treatment. Decisions were more commonly made by physicians and the younger physicians were more likely to admit patients with no survival expectancy. Dialylis was the therapy most frequently withheld and withdrawn. Sedation or analgesia were less frequently withheld or withdrawn. The most frequently factors taken under consideration for no admission in the intensive care were diagnosis and prognosis. To ensure comfort to the patient with no survival expectancy is the most important factor in his admission in na ICU. Conclusions: Despite the discomfort in forgoing treatment, the majority of critical care professionals have been di sc ussing about forgoing treatment in irreversible, terminally ill patients. It is a serious ethical matter that needs to be sudied. Key Words: Withdrawing / Withholding / Terminal illness / Ethics / Critical Care *Coordenadora da Residência de Medicina Intensiva do HU/UFSC - Professora do Departamento de Clínica Médica HU/UFSC **Residente de Medicina Intensiva do HU/UFSC ***Coordenador da Residência de Medicina Intensiva do HGCR/FHSC - Professor do Departamento de Clínica Médica HU/UFSC ****Diretor Geral do HU/UFSC - Professor do Departamento de Clínica Médica HU/UFSC Rua João Paulo 1929 - 88030300 - Florianópolis/SC/ - Fone (48) 2385700 E-mail [email protected] ou [email protected] FONTE DE PATROCÍNIO O material gráfico foi fornecido pelo Laboratório Lilly Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 A o tratar dos objetivos da medicina, Hipócrates (aproximadamente 400 AC) já relacionava entre eles a necessidade de reconhecer a impotência terapêutica diante de certos casos a de recusar o tratamento de doentes já vencidos pela enfermidade1. Nesses casos, cada vez mais, existem dúvidas sobre até quando um tratamento deve prosseguir ou quando o mesmo será considerado fútil e/ou inútil. Pode ser avaliada na literatura2-6 a necessidade crescente da definição de qual tratamento é fútil ou inútil. Segundo o consenso elaborado pelo Comitê de Ética da Society of Critical Care Medicine, tratamento fútil é definido como aquele que não atinge as metas pretendidas, enquanto tratamento inútil ou desaconselhável é aquele que possui pouca probabilidade de trazer benefícios ao paciente2. Com o desenvolvimento tecnológico, principalmente no que concerne ao suporte avançado de vida, têm vindo à tona questões morais a práticas quanto à habilidade de prolongar artificialmente a vida de pacientes sem expectativa de recuperação7-9. Especialmente nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) essa discussão se torna evidente, desde a admissão de um paciente com prognóstico reservado até a percepção de uma evolução indesejável e a avaliação de que os limites terapêuticos foram ultrapassados. Diante de tais situações é necessário optar entre manter um tratamento provavelmente fútil, retirá-lo ou recusar novas terapêuticas10. No Brasil, o número de leitos públicos em UTI representava, em 1999, apenas 0,4% do total de leitos hospitalares 11. Na Europa a nos Estados Unidos da América do Norte esses percentuais variam de 5 a 10%12-13. Diante desse fato, e somando a isso a escassez de recursos para a saúde como um todo, a admissão de doentes com prognóstico reservado, além de prolongar o sofrimento dos mesmos e de seus familia- 21 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO res, exclui ou limita o tratamento de pacientes que sofram de enfermidades potencialmente curáveis. Os índices prognósticos atualmente conhecidos não mostraram acurácia e valor preditivo suficientes para definir condutas14-16. Esse fato torna a tomada de decisão sobre a recusa ou a retirada de tratamento uma questão de julgamento médico, além de um pesado fardo nas mãos do intensivista ou da equipe envolvida nesse processo. Trabalhos norte americanos a europeus 17-19 questionam sobre quem deveria decidir sobre a recusa ou retirada de um tratamento considerado fútil ou inútil. A importância da vontade manifesta do paciente e de seus familiares nessa decisão é também bastante controversa, sendo evidenciadas diferenças regionais particularmente relacionadas à legislação vigente nos diferentes países13,17. Ao decidir recusar o início de um tratamento ou retirar uma terapêutica já instituída, o médico enfrenta ainda outros dilemas: Existem diferenças éticas entre as duas condutas? Existe diferença moral quando se avalia qual tratamento deva ser retirado ou recusado? Apesar dessas decisões serem tomadas nas UTIs brasileiras, não existem normas que qualifiquem essas ações. Este trabalho foi proposto visando um melhor conheci- mento do comportamento dos profissionais de saúde que trabalham em UTI, diante do paciente com prognóstico reservado. MÉTODO Este é um trabalho de corte transversal para o qual foram distribuídos 1.000 questionários (anexo 01) aos participantes do IX CONGRESSO BRASILEIRO DE TERAPIA INTENSIVA, realizado no período de 8 a 12 de abril de 2000, em Belo Horizonte - Minas Gerais. Esses questionários foram respondidos de forma anônima por profissionais da saúde envolvidos no âmbito da terapia intensiva (médicos, enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas) bem como acadêmicos das mesmas áreas. Os testes estatísticos foram realizados através do programa Epi Info@ Version 6 (center for desease control, Atlanta), utilizando-se os testes χ2 e exato de Fisher para a análise. Foram considerados significantes os resultados com p<0.05. RESULTADOS Dos 1000 questionários distribuídos, foram respondidos 107 (10,7%). Desses, 11 foram respondidos por pediatras e 14 por profissionais não médicos. Como o número dos profissionais não médicos foi muito pequeno, esses grupos não foram analisados neste estudo. Da mesma forma como a decisão de retirar e/ou recusar um tratamento em crianças foi considerada como tendo características particulares, somente foram computadas as respostas dos médicos que atuavam em UTIs de adultos. Foram então avaliados os 82 questionários restantes, que foram respondidos por intensivistas que atuavam em UTIs de adultos. Os dados demográficos dos participantes do estudo podem ser observados na tabela 1. A grande maioria dos médicos (86%) trabalhava em cidades com mais de 250.000 habitantes. Na tabela 2 podem ser avaliados os resultados sobre o perfil profissional dos participantes. Setenta e oito por cento daqueles que responderam aos questionários atuavam em UTIs privadas a 54,9% em UTIs públicas. Do total, 31,8% dos médicos trabalhava em unidades de ensino. Quando questionados se alguma vez já haviam participado de discussões sobre a retirada ou a recusa de um tratamento, 94% dos médicos responderam afirmativamente. Na figura 1 são vistos os resultados que evidenciam com que freqüência a quem costuma participar dessas decisões. Dos profissionais envolvidos, os médicos sempre participavam das discussões. Em 29,5% dos questionários as deci- Tabela 1 - Dados demográficos dos participantes do estudo Idade (anos) n (%) Sexo n (%) Estado civil n (%) < 40: 53 (64.6) Feminino: 34 (41.4) Casado: 52 (63.4) Católico: 40-50: 25 (30.5) Masculino: 48 (58.6) Solteiro: 25 (30.4) Agnóstico: >50: 04 (4.9) Religião n (%) Procedência n (%) Etnia n (%) 58 (70.7) Sudeste: 41 (50,0) Português: 33 (40,0) 10 (12.2) Sul: 14 (17.1) Italiano: 09 (11,0) Separado: 04 (4.8) Protestante: 01 (1.2) Nordeste: 13 (15.8) Alemão: 08 (9.8) Outros: Outros: 10 (12.2) Centro-oeste: 07 (8.5) Africano: 02 (2.4) Norte: 03 (3.7) Asiático: 01 (1.2) Mista: 13 (15) 01 (1.2) Não respondido: 03 (3.7) Não respondido: 04 (4.9) Não respondido: 09 (11,0) 22 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Tabela 2 - Dados profissionais dos participantes do estudo Tempo de Atuação em UTI (anos) n (%) Regime de trabalho na UTI n (%) <10: Diarista: 13 (15.8) até 25%: 10 (12.2) 41 (50.6) Percentagem do tempo dedicado à UTI n (%) 10 - 2 34 (42,0) Plantonista: 31 (37.8) 25 - 50%: 23 (28,0) >20: 06 (7.4) Ambos: 37 (45.1) 51 - 75%: 27 (33,0) Não respondido: 01 (1.3) 76 - 100%: 20 (24.4) Não respondido: 02 (2.5) Figura 1 - Participação dos diversos segmentos da sociedade nas discussões quanto à retirada ou à recusa de um tratamento Figura 2 - Terapêuticas mais comumente recusadas ou suspensas. sões eram de responsabilidade médica exclusiva e em 31,6% envolviam a equipe multidisciplinar. As terapêuticas mais freqüentemente suspensas e/ou recusadas por aqueles que participaram do estudo são observadas na figura 2. Na tabela 3 é mostrada a freqüência com que alguns fatores in- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 fluenciaram a recusa de internação do paciente em UTI. Como pode ser evidenciado na figura 3, diante de um paciente com mau prognóstico e chances quase nulas de recuperação, mesmo que haja vaga disponível, 69,5% dos médicos participantes nunca ou raramente internariam esse doente numa UTI. Ao serem agrupados os participantes do trabalho segundo a idade, foi constatado que 53,8% dos profissionais com idade menor de 30 anos não internariam um paciente com mau prognóstico, a que 65,8% daqueles com idade entre 30 a 40 anos teriam conduta semelhante. Do grupo dos médicos com mais de 40 anos 88,4% não admitiriam esse paciente numa UTI. Pode-se observar uma tendência dos profissionais com mais idade a não internar em UTI um paciente com prognóstico reservado (p= 0.043). Quanto a influência de tempo de atuação dos médicos em UTI, ficou evidenciado que os profissionais com menos de 10 anos de trabalho nesse setor apresentavam maior tendência a internar pacientes com prognóstico reservado em comparação com aqueles com mais de 10 anos dedicados ao atendimento de pacientes graves (34,2% vs. 21%). Foram avaliados ainda fatores como sexo, religião e percentagem do tempo dedicado a UTI em relação a tendência a internar o paciente de mal progóstico porem nenhum deles mostrou significância estatística. Na tabela 4 pode ser avaliado o quanto essa decisão é influenciada pela pressão familiar, pela pressão dos médicos assistentes a pela necessidade do bem-estar do paciente. DISCUSSÃO Pode ser observado neste estudo que a maioria daqueles que responderam as perguntas do questioná- 23 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Tabela 3 - Freqüência das variáveis levados em consideração na recusa da internação de um doente em UTI Sempre n (%) Às vezes: n (%) Nunca n (%) Não respondido n (%) Idade 17 (20,7) 34 (41,5) 24 (29,3) 07 (8,5) Diagnóstico 46 (56,1) 23 (28) 10 (12,2) 03 (3,6) Prognóstico 54 (65,8) 20 (24,4) 06 (7,3) 02 (2,4) Qualidade de vida prévia 33 (40,3) 29 (35,4) 15 (18,3) 05 (6,1) Escassez de leitores na UTI 29 (35,3) 35 (42,7) 15 (18,3) 03 (3,6) rio (64,6%) tinha idade inferior a 40 anos, característica que pode ser atribuída ao fato de a Medicina Intensiva ser uma especialidade relativamente jovem no Brasil. Embora possa ser interpretado que a baixa idade dos profissionais pode estar ligada à pouca experiência dos mesmos, a metade dos participantes tinha um tempo de atuação em UTI maior ou igual a 10 anos e 57,4% dos mesmos dedicavam um tempo maior que 50% do seu trabalho a essa unidade, atuando como diarista, plantonista ou em ambas as funções. Acompanhando as características históricas nacionais relacionadas à nossa colonização, 70,7% dos participantes desse estudo eram católicos sendo a maioria de origem portuguesa. Apesar de existirem vários estudos relacionando a religiosidade e a etnia dos médicos com a tendência de retirar ou recusar o tratamento de pacientes com prognostico reservado 12-13 , neste trabalho não houve significância estatística ao se comparar os diversos grupos. Uma questão levantada neste estudo evidencia o quanto está sendo discutida a interrupção do tratamento de doentes sem expectativa de recuperação e, por conseqüência, o quanto são retiradas ou recusadas novas terapêuticas para tais pacientes. A vasta maioria dos médicos que respondeu ao questionário (94%), em algum momento já havia participado desse debate. A revisão da literatura mostra que a interrupção ou a recusa de um tratamento tem sido um tema amplamente debatido. Entretanto, a decisão de retirar ou de recusar um tratamento e, mais objetivamente, a de considerar que o mesmo se torna fútil permanece sendo um capítulo de extrema controvérsia em ética médica, havendo a necessidade antes da definição de qualquer conduta que haja um amplo debate entre todos os segmentos envolvidos e, que qualquer decisão seja consensual 20-21. Deve ser ressaltado que esses debates podem gerar conflitos entre as expectativas dos familiares e as da equipe de saúde, podendo também haver divergência quanto aos objetivos terapêuticos das diversas especialidades médicas2. Para esse tipo de debate, a determinação de quem seria envolvido na tomada de decisões se toma de extrema importância. Neste trabalho, os médicos estavam sempre presentes nas discussões sobre a retirada ou a recusa de um tratamento e foram os únicos a participar das mesmas em 29,5% das respostas, o que aponta uma tendência para considerar que esses fatos seriam da alçada exclusiva da área médica. Resultados similares foram encontrados por Asch e cols.21, quando mostraram que um terço dos médicos americanos decidiu por interromper um tratamento sem conhecer a opinião do doente ou do seu representante legal. Em um trabalho europeu13, apenas um quinto dos participantes tomava a decisão de ma- Figura 3 - Conduta dos médicos intensivistas, quanto à internação de pacientes com mau prognóstico e com chances de recuperação praticamente nula, em uma UTI onde haja vaga disponível. 24 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva neira isolada. Resultados semelhantes podem ser encontrados na literatura revisada 12,21-22. Quarenta e sete por cento dos médicos brasileiros que responderam ao questionário envolviam os familiares nas discussões a somente em 8,5% das vezes o próprio paciente participava das decisões. Apesar da alta freqüência da exclusão da família ou do paciente nas decisões de interrupção de um tratamento, dado que entra em conflito com os princípios de autonomia do indivíduo, esses resultados são concordantes com os de estudos norte americanos a europeus12,13,20,21,23. Neste trabalho, não foram determinadas as razões da não participação do paciente que, em um grande número das vezes, se encontra impossibilitado de expressar sua vontade. Deve ser ressaltado ainda que a doença aguda pode levar a alterações psicológicas importantes, podendo advir o questionamento de quem seria o responsável pelas decisões sobre o tratamento de um paciente agudamente enfermo24. Também não foi analisado se os familiares do paciente ou o seu representante legal deveriam ser solicitados a revelar os desejos desse paciente ou se deveriam ser utilizados documentos emitidos pelo paciente, quando capacitado para tal. Neste trabalho, os médicos a enfermeiros foram as categorias que mais participaram das decisões sobre a recusa ou a retirada de um tratamento. Em 36% das respostas toda a equipe de saúde esteve envolvida nessas decisões. O conselho de ética médica estava envolvido em 7,3% das respostas, um baixo índice se comparado ao de trabalhos europeus nos quais em até 50% das vezes esses conselhos participavam das discussões 12-13. Apesar de não existirem dados consistentes na literatura nacional, Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 consultores éticos como aqueles citados em trabalhos estrangeiros12-13, envolvendo vários níveis da sociedade, não são comumente vistos em nosso meio, e mesmo os conselhos de ética, nos quais participam médicos de várias especialidades, ainda não possuem um raio de atuação amplo na grande maioria dos hospitais brasileiros, o que explicaria tais diferenças. Embora filosoficamente não exista diferença entre recusar o início de um tratamento ou retirar um tratamento já instituído, existe classicamente uma maior dificuldade dos médicos de retirar uma terapêutica já em andamento do que de não iniciar um novo tratamento25. Alguns estudos mostram que os pacientes morrem mais rápido após a suspensão de um tratamento do que após a negação do mesmo, podendo ser esta a explicação para o fato acima citado. Neste trabalho, quando foram avaliadas as diversas modalidades terapêuticas foram evidenciados comportamentos diferentes as mesmas. Sedação e analgesia foram em menos de 5% das vezes recusadas ou retiradas sendo, então, as intervenções menos negadas, o que corrobora com a certeza de que o conforto físico a psíquico do paciente é uma prioridade, não devendo nunca ser ser considerado fútil ou inútil24. O suporte ventilatório foi recusado em quase 25% das vezes e se já instituído foi retirado por 4% dos participantes, tendo sido a intervenção menos retirada. Smedira e cols 23 mostraram que médicos e enfermeiras só retirariam a ventilação mecânica, substituindo-a por tubo em T, se essa ação não resultasse em morte rápida do paciente. Podese sugerir que esse tenha sido o fator que influenciou nas decisões dos que participaram deste trabalho. Corroborando com essa sugestão constatou-se, neste trabalho, ARTIGO que os métodos dialíticos foram os tratamentos mais recusados, sendo também freqüentemente retirados. Rhymes e cols 25 relataram o conflito quanto à distinção entre o ato de permitir ou de provocar a morte de um paciente. Embora essas condutas sejam totalmente diversas, em momentos de decisão elas podem ser confundidas causando conflitos éticos. No momento da admissão numa UTI, alguns enfermos já apresentam indícios de mau prognóstico e chances quase nulas de recuperação. Nesse caso, o tratamento intensivo poderia ser definido como futilidade a em pouco alteraria a história natural da doença. A grande dificuldade tem sido a determinação desse prognóstico, dependente não só do quadro clínico, mas também de fatores como a idade, a qualidade de vida prévia do doente, as suas expectativas, a dos seus familiares, do seu médico assistente e do próprio intensivista quanto à sua qualidade de vida futura. Os custos emocionais a até financeiros envolvidos nessa admissão também são fatores que podem influenciar na tomada de decisões. Neste trabalho, o prognóstico, o diagnóstico e a qualidade de vida prévia foram os fatores que mais influenciaram quanto à decisão da internação de um paciente na UTI. Segundo um trabalho canadense prospectivo e multicêntrico26, mau prognóstico e expectativa de má qualidade de vida foram os dois fatores mais relevantes ao se negar a progressão de um tratamento. O comitê de ética da Society of Critical Care Medicine22 realizou um estudo que avaliou 600 questionários distribuídos durante um encontro anual da entidade. Nesse trabalho foram considerados como fatores importantes para a admissão na UTI a qualidade de vida do paciente (67%) seguido do diag- 25 ARTIGO RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva Anexo 1 - Questionário distribuído aos participantes do estudo 26 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva nóstico a do prognóstico das patologias (54%). Entretanto, mesmo acreditando que um paciente não tenha indicação para receber suporte intensivo de vida, o intensivista muitas vezes decide internar esse doente na UTI. Neste estudo 52% dos intensivistas sentiam-se, em determinadas situações, pressionados pelo médico assistente ou pelos familiares de um enfermo a internálo na UTI, dados que são condizentes com o estudo de Danis e cols 19 . No estudo de Vincent 12 pode ser observado que 73% dos médicos admitiam doentes sem expectativa de recuperação, embora só 33% desses profissionais acreditassem que o doente devesse realmente ser admitido. No mesmo estudo ficou evidenciado que os médicos com mais idade eram mais propensos a aceitar que um tratamento devesse ser negado a pacientes sem chances de recuperação. Neste estudo foi observada a mesma tendência em relação à internação de doentes sem chance de recuperação, tanto quando se avaliou a idade quanto o tempo de atuação dos médicos na UTI. É válido concluir diante dos resultados apresentados, que a retirada ou suspensão de um tratamento em UTI é um tema bastante discutido entre os médicos desse setor. A sedação e analgesia são as medicações menos comumente recusadas ou suspensas a os métodos dialíticos constituem a terapêutica mais comumente recusada ou suspensa. Diante da negativa de admissão de um paciente em UTI, os fatores levados em consideração com maior freqüência são o diagnóstico e o prognóstico de uma enfermidade. O bem-estar do indivíduo é o fato que mais influi quando o médico admite um paciente mesmo sabendo que são pratica- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 mente nulas as suas chances de recuperação. Deve ser enfatizado que os dados apresentados neste estudo devem ser interpretados com cautela, visto que são provenientes de um questionário de múltipla escolha, o que poderia induzir o participante a determinadas respostas representando opiniões e não uma avaliação prospectiva de condutas médicas. Outra limitação é o fato de que o questionário foi aplicado durante um congresso nacional onde uma grande maioria dos participantes estão envolvidos em atividades acadêmicas ou possuem um interesse maior em discussões científicas, não representando portanto toda a comunidade de médicos intensivistas brasileiros. Deve ser ressaltado que houve um baixo número de resposta dos questionários, podendo ser sugerido que somente os médicos mais interessados no assunto tenham participado do trabalho. Apesar de tais limitações, é válido admitirse que este estudo assume um papel importante ao evidenciar que a interrupção do suporte avançado de vida é uma prática avaliada por médicos intensivistas com freqüência, porém ainda um tema timidamente discutido no âmbito nacional. RESUMO Os médicos intensivistas sofrem um dilema diário sobre a manutenção de um tratamento considerado fútil ou inútil. Objetivos: Avaliar a atitude dos médicos intensivistas diante da decisão sobre a retirada ou a suspensão de um tratamento. Desenho: Aplicação de um questionário anônimo, distribuído durante o IX Congresso Brasileiro de Terapia Intensiva. Resultados: Foram respondidos, por médicos intensivistas, 82 ARTIGO questionários. A maioria dos profissionais (94%) já havia participado de discussões sobre a retirada ou a suspensão de um tratamento. Essas decisões foram mais freqüentemente tomadas por profissionais com mais idade. Os sedativos e analgésicos foram as medicações menos comumente recusadas ou suspensas e os métodos dialíticos constituíram a terapêutica mais comumente recusada ou suspensa. Diante da negativa de admissão de um paciente na UTI, os fatores levados em consideração com maior freqüência foram o diagnóstico e o prognóstico da enfermidade. O bem-estar do paciente sem chances de recuperação foi o fato que mais influiu na sua admissão. Conclusão: Apesar dos dilemas éticos a respeito da retirada ou da suspensão de um tratamento considerado fútil ou inútil, a maioria dos médicos intensivistas já enfrentou esse problema durante a sua vida profissional. Esse é um tema que deve ser mais estudado em nosso meio. Palavras Chave: Suspensão / Recusa / Tratamento Intensivo / Ética / Doença Terminal BIBLIOGRAFIA 1. Hansen-Flaschen JH. When life suport is futile. Chest 1991; 100: 1191-2 2. Consensus statement of the Society of Critical Care Medicine’s Ethics Cornittee regarding futile and or other possibly inadvisible treatments. Crit.Care Med. 1997; 25: 887-91 3. Youngner SJ. Who defines futility ? JAMA 1988; 260: 2094-95 4. Lantos JD , Singer PA , Walker RM , et al. The ilusion of futility in clinical practice. Am. J. Med. 1989; 87: 811-4 5. Schneiderman LJ, Jecker NS, Jonsen AR. Medical futility:its meaning and ethical complications. Ann Intern Med 1990; 112: 949-53 6. Prendergast TJ. Futility and the common cold. How request for antibiotics can illuminate care at the end of life. Chest 1995; 107: 836-44 27 ARTIGO 7. Cordeiro F. Prolongar artificialmente a vida: quando a como? Rev Ass Med Brasil 1993; 39: 59-60 8. Prendergast TJ, Luce JM . Increasing incidence of withholding and Withdrawing of life support from the critically ill. Am J Respir Crit Care Med 1997; 155: 15-20. 9. Slomka J. The negociation of deth: clinical decision making at the end of life. Soc Sci Med 1992; 35: 251-9 10. Levin PD, Sprung CL. End of decisions in intensive care. Intens Care Med 1999; 25: 893-5 11. Departamento de informática do SUS, DATASUS; Site oficial do Ministéro da Saúde, www.datasus.gov.br 12. Vincent JL . Ethical issues in critical care medicine: United States and European Views and differences. Intens Care World 1996; 13:142-4 13. Vincent JL. Forgoing life support in western Europe intensive care units: The results of na ethical questionnaire. Crit Care Med 1999, 27:1626-33 14. Knaus WA, Draper EA, Wagner DP, Zimmerman JE. APACHE II: A severity of disease classification system. Crit 28 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva Care Med 1985; 13: 818-29 15. Champion HR, et al The injury severity score revisited. The Journal of Trauma 1988; 28: 69-76 16. Boyd CR, Tolson MA, Copes WS : Evaluating Trauma Care: The TRISS method. The Jounal of Trauma 1987; 27: 370-8 17. Nilstun S, Berggren S. Withdrawal of life support who would decide ? Intensive Care 1999; 25:949-54 18. Sprung CL, Eidelman LA, Steinberg A. Is the patient’s right to die envolving into a duty to die ?: Medical decision making and ethical evaluations in health care . J Eval Clin Pract 1997; 3: 69 73 19. Luce JM. Physicians do not have a responsibility to provide futile or unreasonable care if a patient or family insists. Crit Care Med 1995; 23 : 760-70 20. Danis M, Gerrity MS, Southerland LI et al. A comparison of patients, family, and physician assessments of the value of medical intensive care. Crit Care Med 1988; 16 : 594 600 21. Asch DA, Hansen-Flaschen J, Lanken PN. Decisions to limit or continue life- sustaining treatments by critical care physicians in the United States: Conlicts between physicians’ practices and patients wishes. Am J Respir Crit Care Med 1995; 151 288-292 22. The society of Critical Care Medicine Ethics Committee. Attitudes of critical care medicine professionals concerning forgoing life-sustaining treatments. Crit Care Med 1992; 20: 320-6 23. Smedira NG, Evans BH, Grais LS et al. Withholding and withdrawal of life support from the criticaly ill. N Engl J Med 1990; 322: 309-15 24. Task Force on Ethics of the Society of Critical Care Medicine. Consensus report on the ethics of foregoing lifesustaining treatments in the criticaly ill. Crit Care Med 1990; 18: 1435-9 25. Rhymes JA, McCullough B, Juchi RJ et al. Withdrawing very low-burden interventions in chronically ill patients. JAMA 2000; 283: 1061-3 26. Wood GG, Martin E. Withholding and Withdrawing life-sustaining therapy in Canadian intensive care unit. Can J Anaesth 1995; 42: 186-91 Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Complicações laringotraqueais pós-extubação em crianças Laryngotracheal Post-Extubation Complications In Children Lídia Maria Alano de Carvalho1, Policarpo Blanco Lopez1, Adriana Becker2, Giane Elias Mesko2, Jaqueline dos Santos Perottoni2, Milene de Moraes Sedrez2 Abstract Objective: To determine immediate and late laryngotracheal complications, post-extubation, in children in a pediatric ICU. An attempt was also made to define the demographic characteristics of the patients, to identify the pathologies and the reason for tracheal intubation, to verify risk factors for post-extubation complications and assess the need for reintubation. Type of study: cohort. Place: Pediatric ICU at Hospital da Criança Conceição Porto Alegre, RS, Brazil, from March 1 to September 30, 1999. The patients were followed from the time of intubation until the thirtieth day post-extubation, in hospital or at the outpatient clinic, on the 7th, 15th and 30th day post-extubation and, whenever necessary, the pediatric surgeon was asked to assess the situation. Main results: sixty-six patients were studied. Of these, 57.6% were from other cities. As to age, 57.6% were less than 7 months old. The time of intubation was up to 10 days in 78.3% of the patients. Ten patients had to be re-intubated, 70% of them during the first two hours. Thirty-seven per cent of the patients studied did not present any immediate complication post-extubation. At the assessment on the 7th day, 26% of the patients cried with a hoarse voice, 2.2% were aphonic, and 8.7% had stridor. Conclusions: it was not possible to determine the risk factors for complications that occurred after extubation, since the variables analyzed were not statistically significant. There were many complications immediately after extubation; the late complications were less than those mentioned in literature. There were difficulties in the prospective follow-up of the patients. Uniterms: laryngotracheal complications, post-extubation, children 1 Médico pediatra, plantonista e preceptor da UTI Pediátrica do Hospital da Criança Conceição 2 Médico residente do 3º Ano da UTI Pediátrica do Hospital da Criança Conceição Grupo Hospitalar Conceição - Hospital da Criança Conceição - Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica Endereço para contato: Lídia Maria Alano de Carvalho - Av. Teresópolis, 3236 apto. 206 -Teresópolis - POA/RS CEP 90870 000 - Fone: (51) 341-1300 Ramal: 2180 - E-mail: [email protected] Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 A ventilação mecânica (VM) foi um avanço tecnológico importante na medicina. Entretanto, é ilusório imaginar que a partir do momento em que se coloca o paciente em VM terminam-se os problemas, ao contrário, podem surgir outros a até mais graves1. Dentre as complicações da VM estão as relacionadas à intubação, que podem se manifestar durante o procedimento e/ou após a extubação. As complicações imediatas da intubação são laceração, sangramento, hematoma de cordas vocais e dissecção da mucosa retrofaríngea; as complicações tardias podem envolver laringe e/ou traquéia1. As complicações laríngeas consistem em edema de glote, dano à cartilagem aritenóide, paralisia de cordas vocais e granulomas subglóticos (3-69%), com conseqüente estenose e obstrução de via aérea superior1. Alguns trabalhos tentam correlacionar as complicações a fatores de risco. Ho, num estudo de 77 pacientes, verificou que o sexo feminino apresentou maior incidência de edema laríngeo 2. São citados ainda como fatores de risco para edema laríngeo a rota de intubação 3,4,5 , o número do tubo endotraqueal (TET) 5,6,7, a idade do paciente e procedimento traumático na intubação 2. Estudos prospectivos têm mostrado que a intubação por período maior que 7 a 10 dias é o fator de risco mais significativo para estenose subglótica, conforme Manning 8. Matsumoto, em sua revisão, encontrou a incidência de 14% de estenose de laringe nos pacientes que ficaram por mais de dez dias intubados 1. Para necrose de cricóide, Hannion aponta pacientes em coma a baixa imunidade, ressaltando a importância da prevenção por meio da sedação, uso de técnica “gentil” na intubação e adequada fixação do TET 9. Dentre as complicações na traquéia está o edema endotraqueal, para o qual um tempo de intubação maior que 36 horas mostrou-se fator de risco, segundo Darmon 3. Para a prevenção das complicações da intubação é importante utilizar técnica de intubação correta, 29 ARTIGO cânula de calibre adequado, sem cuff, cânula de material adequado e não reutilizável, intubação nasotraqueal a avaliação periódica da laringe 10. A incidência de complicações pós-extubação varia de 7% a 35%, segundo diversos autores1. Stauffer encontrou 93% de inflamação e/ou edema de vias aéreas superiores e 54% de úlceras de cordas vocais em pacientes intubados11 . Burns observou a incidência de 2% a 15,4% de edema ou estridor12. Na revisão bibliográfica, Matsumoto citou o estudo de Loeser e colaboradores, que relatam uma incidência de 12% a 58% de rouquidão pós-extubação1. Darmon verificou a necessidade de reintubação de aproximadamente 1% dos pacientes 3. Em nosso meio, dados desse tipo são desconhecidos. O presente estudo visa identificar as complicações laringotraqueais imediatas e tardias pós-extubação de crianças internadas em UTI Pediátrica. Objetiva também definir as características demográficas destas crianças, identificar as patologias e o motivo determinantes da intubação traqueal, detectar os fatores de risco para as complicações e avaliar a necessidade de reintubação, bem como a causa da mesma. MATERIAL E MÉTODOS Um estudo prospectivo tipo coorte foi realizado na UTI Pediátrica do Hospital da Criança Conceição (HCC)-Porto Alegre, RS, com autorização da chefia da unidade e direção do hospital, bem como com o aval do Centro de Aperfeiçoamento e Pesquisa (CAP) do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), para os quais foi enviado o projeto de pesquisa. Foi realizada coleta de dados de 1º de março a 30 de setembro 30 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva de 1999, por meio do preenchimento de um protocolo previamente elaborado e que foi posteriormente aplicado pelos médicos residentes do 3º ano da UTI Pediátrica, por ocasião da intubação, da extubação e nas revisões do 7º, 15º e 30º dias pós-extubação. O protocolo era composto de três partes. A primeira parte era referente a dados obtidos por ocasião da intubação: sexo, idade, peso, procedência e origem do paciente; data da internação hospitalar e na UTI Pediátrica; diagnóstico na internação; data da intubação, causa e rota da mesma; diâmetro do TET, presença ou não de cuff a condições clínicas por ocasião da intubação. Na segunda parte do protocolo, que era preenchida por ocasião da extubação, foram verificados a duração da intubação, sinais clínicos sugestivos de comprometimento das vias aéreas superiores logo após a extubação e a eventual necessidade de reintubação. Já a terceira parte consistia do controle pós-extubação, realizado nas revisões do 7º, 15º e 30º dias pós-extubação, durante as quais observou-se a presença e/ou persistência de sinais que sugerissem comprometimento de vias aéreas altas. Foram incluídos todos os pacientes que necessitaram intubação traqueal no período do estudo, inclusive os que chegaram intubados de outros serviços. Aqueles que necessitaram ser reintubados até 30 dias após a extubação foram novamente protocolados. Foram excluídas do trabalho crianças que permaneceram intubadas por menos de 24 horas, aquelas que tinham história prévia de intubação endotraqueal e as que já estavam sendo estudadas e necessitaram ser reintubadas após 30 dias da extubação. Os pacientes foram acompa- nhados durante a hospitalização e/ou em nível ambulatorial no 7º, 15º e 30º dias pós-extubação. Quando os sinais indicativos de comprometimento de via aérea superior, tais como disfunção respiratória, choro rouco a estridor, persistiram até o 30º dia e/ou quando houve necessidade de duas ou mais reintubações, o paciente era encaminhado ao cirurgião pediátrico para avaliação e realização de broncoscopia. O estudo não ofereceu risco adicional aos pacientes, exceto àqueles para os quais estava indicada a broncoscopia, devido aos riscos inerentes ao procedimento. É importante salientar que, nestes, casos a broncoscopia teria indicação independentemente do estudo. Os pais ou responsáveis pelos pacientes foram previamente informados a respeito do procedimento, bem como dos seus riscos e benefícios, tendo todos autorizado a realização do exame. Os dados foram processados e analisados pelos médicos residentes do 3º ano em UTI Pediátrica, empregando o programa EPI INFO 6.0., com auxílio de um profissional qualificado no ramo de estatística. RESULTADOS De todos os pacientes que necessitaram intubação traqueal no período do estudo, somente 66 pacientes preencheram os critérios de inclusão. Destes, 28 pacientes (42,4%) eram procedentes de Porto Alegre, 11 (16,7%) de Alvorada, 4 (6%) de Novo Hamburgo, 3 (4,5%) de Canoas, 3 (4,5%) de Taquara, 3 (4,5%) de Viamão e 14 (21,2%) de outros municípios. Quanto à origem, 27 pacientes (40,9%) já estavam hospitalizados na instituição, 15 (22,7%) eram provenientes do serviço de emergência do HCC e 24 (36,3%) eram Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva provenientes de outras instituições. Em relação à idade, 19 pacientes (28,8%) tinham de 1 a 2 meses de idade, 6 (9,1%) de 2 a 3 meses, 6 (9,1%) de 3 a 4 meses, 7 (10,6%) de 4 a 6 meses e os 28 restantes (42,4%) entre 7 meses e 11 anos e 8 meses. Quanto ao sexo, 42 pacientes (63,6%) eram meninos e 24 (36,4%) eram meninas. No momento da internação, as crianças apresentavam diversas patologias, conforme se pode observar na Tabela 1. É importante lembrar que o mesmo paciente apresentava, às vezes, mais de uma patologia associada. Constatou-se que 47 crianças (71,2%) necessitaram ser intubadas por insuficiência respiratória, seja do tipo I e/ou II; 4 (6%) por obstrução de vias aéreas superiores; 4 (6%) por parada cardiorrespiratória; 3 (4,5%) por mal convulsivo e 8 (12,1%) por outras causas. O tempo de intubação foi de até 6 dias em 47,8% dos pacientes, de 7 a 10 dias em 30,5% e de 11 a 24 dias em 21,7% dos pacientes. Dos 66 pacientes incluídos inicialmente, 22 faleceram no decorrer do estudo, tendo sido avaliados 46 pacientes no período imediato e no 7º dia, 45 no 15º dia e 44 no 30º dia. Na avaliação imediata, 10 necessitaram ser reintubados, 70% deles até a segunda hora pós-extubação. Sete crianças (70%) foram reintubadas por disfunção respiratória e/ou estridor, uma por apresentar-se comatosa, uma devido a extubação acidental e outra por reintervenção cirúrgica. Dois pacientes necessitaram reintubação pela segunda vez por disfunção respiratória. As complicações imediatas apresentadas pelas 46 crianças estudadas foram estridor, disfunção respiratória, Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 ARTIGO Tabela 1 - Diagnóstico no momento da internação na UTI Pediátrica do HCC* Diagnóstico N (66) % Sepse 21 31,8 Pneumonia 19 28,7 Bronquilite 18 27,3 Asma 6 9,1 Desidratação 6 9,1 Cardiopatia 5 7,5 Outros 35 53,0 *O mesmo paciente poderia apresentar mais de uma doença no momento da internação Tabela 2 - Complicações clínicas imediatas pós-extubação traqueal* Complicação N (46) % Estridor 18 39,1 Rouquidão 14 30,4 Afonia 5 10,9 Disfunção respiratória 4 8,7 Nenhuma 17 37,0 *O mesmo paciente poderia apresentar mais de uma complicação clínica Tabela 3 - Complicações clínicas tardias pós-extubação* Complicação 7º dia (N= 46) 15º dia (N= 45) 30º dia (N= 44) % % % Choro normal 63,0 49,0 45,5 Choro rouco 26,0 13,3 4,5 4,5 Estridor 8,7 6,7 Afonia 2,2 2,2 0 Perdas 8,7 35,5 50,5 *O mesmo paciente poderia apresentar mais de uma complicação clínica rouquidão e afonia, sendo que um mesmo paciente podia apresentar mais de uma manifestação clínica (Tabela 2). Os pacientes foram revisados, em nível hospitalar e/ou ambulatorial, no 7º, 15º e 30º dias pós-extubação. Houve 8,7% de perdas, por não comparecimento, na revisão do 7º dia; no 15º dia, o total de perdas foi de 35,5% e no 30º dia o número de perdas foi de 50%. As complicações tardias pós-extubação, detectáveis clinicamente, estão arroladas na Tabela 3. Conforme o protocolo, foram indicadas cinco broncoscopias. O primeiro paciente, por apresentar estridor persistente e disfunção respiratória; durante o exame, observou-se laringomalácia leve e edema subglótico discreto. O segundo paciente, portador da Trissomia do 21, foi submetido à broncoscopia por necessitar de mais de duas intubações. O exame mostrou presença de papilomatose laríngea; esse paciente evoluiu para óbito por choque séptico. O terceiro paciente necessitou ser reintubado no 20º dia pós-extubação por apresentar disfunção respiratória; durante o procedimento, houve grande dificuldade na progressão do tubo endotraqueal, sendo necessária a utiliza- 31 ARTIGO ção de guia, o que fez pensar em estenose subglótica. A broncoscopia foi realizada no dia seguinte e não mostrou alterações. O quarto paciente, que apresentava alteração na voz, foi encaminhado ao exame, mas não compareceu. Finalmente, o quinto paciente não apresentou condições clínicas para a realização do procedimento. DISCUSSÃO Foi propósito deste trabalho estudar em uma amostragem de crianças as condições de intubação e as complicações relacionadas à extubação, bem como a correlação entre elas. Na UTI Pediátrica do HCC internam crianças de 1 mês até 12 anos de idade. No trabalho realizado, aproximadamente 50% das crianças que necessitaram ser intubadas tinham até 3 meses de idade, sendo que 69,7% eram menores de um ano. Este dado é compatível com a literatura, segundo a qual 2/3 dos casos de insuficiência respiratória ocorrem no primeiro ano de vida 13. Observou-se uma predominância do sexo masculino. Segundo Ellovitch, não costuma haver diferenças significativas quanto ao sexo na incidência de insuficiência respiratória, a não ser em determinadas patologias 13. No momento da internação, as doenças respiratórias foram responsáveis por 65% das admissões na UTI. É importante lembrar que esses dados podem ser remetidos apenas para a época na qual foi realizado o estudo, já que é sabido que muitas dessas doenças têm uma distribuição sazonal. A sepse foi responsável por 31,8% das internações, dado esperado, pois essa patologia pode ser causa de internação em UTI, bem como acometer os pacientes internados 32 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva por outra causa, podendo ser responsável por até 50% dos óbitos ocorridos nessas unidades 14. Constatou-se que 57,6% das crianças estudadas haviam sido transferidas da região metropolitana e do interior para a UTI Pediátrica. Se, de um lado, tal dado caracteriza a Unidade como um serviço de referência no Estado, de outro, é possível que esse tenha sido o principal motivo da dificuldade encontrada no seguimento dos pacientes após a alta hospitalar, principalmente no 15º a 30º dias pós-extubação. Segundo a literatura, o tempo de intubação acima de 7 a 10 dias é o fator de risco mais importante para estenose subglótica8. No grupo estudado, aproximadamente 80% dos pacientes permaneceram intubados no máximo por 10 dias, o que talvez explique o fato de não ter havido tal complicação nesta amostra de pacientes. Na presente casuística, observou-se um percentual de 22% de necessidade de reintubação, índice superior ao encontrado por Darmon, que foi de 1%, embora seu estudo tenha sido realizado em adultos 3. Este percentual parece elevado, mas não foram encontrados na literatura dados específicos em relação à necessidade de reintubação em crianças. É importante lembrar que as crianças apresentam características anatômicas que as diferenciam dos adultos, tais como espaço supraglótico relativamente menor e epiglote mais elástica e, portanto, com menos estabilidade 15,16, o que talvez possa justificar a maior necessidade de reintubação na amostra de crianças avaliadas do que na amostra de adultos estudada. Disfunção respiratória e/ou estridor foram a causa de 70% das reintubações. Dos 10 pacientes que necessitaram ser reintubados, 70% o foram até a segunda hora pós-extubação, o que está de acordo com o encontrado por Darmon 3. Portanto, as duas primeiras horas mostraram-se críticas em relação à necessidade de reintubação, motivo pelo qual os pacientes possivelmente mereçam cuidados ainda mais intensivos nesse período. Novos estudos em crianças são necessários para avaliar essa especulação. Encontrou-se também um percentual elevado (63%) de complicações imediatas pós-extubação, índice semelhante ao registrado na literatura1. Manning destaca que tal fato está relacionado à extrema gravidade dos pacientes por ocasião da internação na UTI, bem como ao manejo prévio a que muitos são submetidos, muitas vezes por profissionais com pouca experiência em intubação8. Além disso, muitas vezes, em situações de emergência, torna-se difícil obter condições ideais para intubação; nesse sentido, a literatura destaca a importância da sedação e analgesia adequadas, que pode ser avaliada pelas condições das cordas vocais (grau de relaxamento e de movimento) e reflexo de tosse18. Somando-se a isso, é preciso lembrar que, no local do estudo, grande parte das intubações são realizadas pelos médicos residentes, que têm a orientação de dar preferência à via nasotraqueal de intubação. Apesar de Roppolo apontar a importância desta via como alternativa à orotraqueal, ele comenta que os residentes em emergência nos Estados Unidos intubam apenas 2,8 pacientes por via nasotraqueal durante todo o período de residência19. Sabe-se que a via nasotraqueal diminui a chance de complicações laringotraqueais, assim como a ausência de cuff no TET 10. Na amostra estudada, a maior parte dos pa- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva cientes recebeu intubação via nasotraqueal e somente em dois foi usado cuff, o que talvez tenha contribuído para o pequeno número de complicações tardias. Quanto às complicações tardias, 20 (45,5%) das crianças revisadas no 30º dia apresentavam choro de tonalidade normal e apenas 2 (4,5%) persistiam com choro rouco. Para as últimas foi indicada broncoscopia, conforme o protocolo. Uma das crianças, que apresentava alteração de voz, não compareceu para realizar o exame. A outra, que permanecia com estridor e rouquidão na revisão clínica do 30º dia pós-extubação, apresentava-se com broncoespasmo e infecção de vias aéreas superiores, provavelmente de etiologia viral. Por isso, a broncoscopia foi postergada até que a paciente apresentasse condições para o exame. Contudo, a criança precisou retornar à ventilação mecânica, o que contra-indicava a realização do exame por não se enquadrar nos critérios de inclusão do estudo. No período anterior ao trigésimo dia pós-extubação, foram indicadas três broncoscopias. A primeira, porque o paciente apresentava estridor persistente e disfunção respiratória, no qual foi visualizado laringomalácia leve e edema subglótico discreto. Um segundo paciente foi submetido à broncoscopia porque necessitou ser reintubado, ocasião em que houve grande dificuldade na progressão do TET, o que fez pensar em estenose subglótica e também porque encontrava-se no período em que costuma ocorrer essa complicação. O exame foi realizado no dia seguinte e descartou a hipótese diagnóstica. O outro paciente submetido à broncoscopia era portador da Trissomia do 21; nele, foi visualizada papilomatose laríngea. Ludemann observou que esta Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 síndrome não apresentou significante influência no sucesso do tratamento de reestenose laringotraqueal 20. Isso leva a crer que, não fosse o choque séptico e a papilomatose laríngea, possivelmente a criança acima citada teria semelhante prognóstico em relação às demais, no que tange à permeabilidade da via aérea. Dentre as três broncoscopias realizadas, somente em uma foi verificado endoscopicamente complicação relacionada à intubação, complicação que veio a somar-se à sua anormalidade congênita (laringomalácea). Nos demais pacientes não foi possível constatar nenhuma complicação relacionada à intubação traqueal. CONCLUSÕES Não foi possível determinar fatores de risco para complicações pós-extubação, pois as variáveis analisadas não apresentaram significância estatística devido ao pequeno número de crianças que preencheram os critérios de inclusão. Encontrou-se número elevado de complicações imediatas pósextubação, provavelmente devido às condições em que ela é realizada, às características anatômicas dos pacientes pediátricos e às suas condições clínicas. Em relação às complicações tardias, o número foi menor que o referido na literatura, provavelmente em virtude da pequena amostra estudada e também porque os pacientes permaneceram pouco tempo intubados. Além disso, houve grande número de perdas, em especial nas revisões do 15º e 30º dias pós-extubação, porque muitos pacientes já haviam tido alta hospitalar a eram provenientes do interior. Os pacientes que permanecem com choro rouco por mais de 30 dias merecem investigação, devi- ARTIGO do à maior probabilidade de apresentarem alterações relacionadas à intubação que possam ser detectadas endoscopicamente. Em estudos futuros, conviria buscar estratégias para resgatar os pacientes, tais como auxílio para o transporte de pacientes procedentes de outros municípios e oportunidade de um acompanhamento pediátrico posterior. RESUMO Objetivo: Determinar as complicações laringotraqueais imediatas e tardias pós-extubação traqueal em crianças internadas em UTI Pediátrica. Além disso, buscou-se definir as características demográficas dos pacientes, identificar as patologias e o motivo determinante para a intubação traqueal, verificar fatores de risco para complicações pós-extubação e avaliar a necessidade de reintubação. Tipo de estudo: coorte. Local: UTI Pediátrica do Hospital da Criança Conceição - Porto Alegre, RS, no período de 1º de março a 30 de setembro de 1999. Os pacientes foram acompanhados desde o momento da intubação até o 30º dia pós-extubação, em nível hospitalar e/ou ambulatorial, no 7º, 15º e 30º dias pós-extubação, tendo sido solicitada avaliação do cirurgião pediátrico quando necessário. Principais resultados: foram estudados 66 pacientes. Destes, 57,6% eram procedentes de outras cidades. Em relação à idade, 57,6 % tinham menos de 7 meses. O tempo de intubação foi de até 10 dias em 78,3% dos pacientes. Dez pacientes necessitaram ser reintubados, 70% dos quais nas primeiras duas horas. Trinta e sete por cento dos pacientes estudados não apresentaram nenhuma complicação imediata após a extubação. Na avaliação no 7º dia, 26% dos pacientes apresentavam choro rouco, 2,2% afonia e 33 ARTIGO 8,7% estridor. Conclusões: não foi possível determinar os fatores de risco para complicações pósextubação, pois as variáveis analisadas não apresentaram significância estatística. Houve elevado número de complicações imediatas pós-extubação; as complicações tardias foram em número menor ás citadas na literatura. Houve dificuldades no acompanhamento prospectivo dos pacientes. Unitermos: complicações laringotraqueais, pós-extubação, crianças AGRADECIMENTOS Ao Dr. Paulo Sérgio Gonçalves da Silva, pela avaliação dos pacientes e realização dos procedimentos endoscópicos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Matsumoto T, Giacopini SE. Complicações da ventilação pulmonar mecânica. In: Matsumoto T, Carvalho WB, Hirschheimer MR. Eds. Terapia Intensiva Pediátrica. São Paulo: Atheneu, 2ª ed., 1999; 418-25. 2. Ho LI, Harn HJ, Lien TC, et al. Postextubation laryngeal edema in adults: risk factor evaluation and prevention by hydrocortisone. Intensive Care Med 1996; 22: 933-36. 34 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva 3. Darmon JY, Rauss A, Dreyfuss D, et al. Evaluation of risk factors for laryngeal edema after tracheal extubation in adults and its prevention by dexamethasone. Anesthesiology 1992; 77: 245-51. 4. Donnelly WH. Histopathology of endotracheal intubation. Arch Pathol Lab Med 1969; 88: 511-20. 5. Koka BV, Jeon JS, Andre JM, et al. Postintubation croup in children. Anesth Analg 1977; 56: 501-05. 6. Deming MV, Oech SR. Steroid and antihistaminic therapy for postintubation subglottic edema. Anesthesiology 1961; 22: 933-36. 7. Way WL, Sooy FA. Histologic changes produced by endotracheal intubation. ANN Otol 1965; 744: 799-803. 8. Manning SC, Brown OE. Sequelae of intubation. In: Levin DL, Morris FC. Eds. Essentials of Pediatric Intensive Care. New York: Churchill Livingstone Inc., 2nd ed., 1997; 164-69. 9. Hannion X, Legros M, Schmidt P, et al. Chondronécrose du cricoide après intubation. A propos de 2 cas. JFr Oto-Rhino Laryngol 1989; 38: 328-31. 10. Gonçalves MEP. Intubação Traqueal. In: Matsumoto T, Carvalho WB, Hirschheimer MR. Eds. Terapia Intensiva Pediátrica. São Paulo: Atheneu, 2ª ed., 1997; 1071-76. 11. Stauffer JL, Olson DE, Petty TL. Complications and consequences of endotracheal intubation and tracheotomy. Am JMed 1986; 70: 65-76. 12. Burns HP, Dayal VS, Scott A, et al. Laryngotracheal trauma: observations on its pathonegenesis and its prevention following prolonged oro- tracheal intubation in the adult. Laryngoscope 1979; 89:1316-24. 13. Ellovitch MEF. Insuficiência respiratdria aguda. In: Matsumoto T, Carvalho WB, Hirschheimer MR. Eds. Terapia Intensiva Pediatrica. São Paulo: Atheneu, 2ª ed., 1999; 254-84. 14. Carvalho PA, Garcia PC, Piva JP, et al. Sepse/Sindrome da Resposta Inflamatória Sistêmica. In: Piva JP, Carvalho P, Garcia PC. Eds. Terapia Intensiva Pediatrica. Rio de Janeiro: MEDSI, 4ª ed., 1997; 321-46. 15. Brilli RJ, Benjing G, Cotcamp DH. Epiglottitis in infants less than two years of age. Pediatric Emerg Care 1989; 5: 16-21. 16. Daum RS, Smith AL. Epiglottitis (supraglottites). In: Feigin RD, Cherry JR. Eds. Textbook of Pediatric Infectious Diseases. Philadelphia: WB Saunders, 2ª ed., 1987; 224 37. 17. Piva JP, Gazal CHA, Müller H, et al. Obstrução das vias aéreas superiores. In: Piva JP, Carvalho P, Garcia PC. Eds. Terapia Intensiva Pediatrica. Rio de Janeiro: MEDSI, 4ª ed., 1997; 133-52. 18. NG KP, Wang CY. Alfentanil for intubation under halothane anaesthesia in children. PaediatrAnaesth 1999; 9(6): 491-4. 19. Roppolo LP, Vilke GM, Chan TC, et al. Nasotracheal intubation in the emergency department, revisited. J Emerg Med 1999; 17(5): 791-9. 20. Ludemann JP, Hughes CA, Noah Z, et al. Complications of pediatric laryngotracheal reconstruction: prevention strategies. Ann Otol Rhinol Laryngol 1999; 108: 1019-26. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ARTIGO Terapêutica V asopr essora na Vasopr asopressora Ressuscitação Car diorr espiratória diorrespiratória Cardiorr Vasopressor Therapy in Cardiopulmonary Resuscitation Sebastião Araújo*, Izilda Esmênia Muglia Araújo**, Renato Giuseppe Giovanni Terzi***, Desanka Dragosavac*, Antônio Luiz Eiras Falcão*. Abstract The prompt diagnosis of heart arrest, the early institution of basic and advanced life supports, including electrical defibrillation and the agressive use of vasopressor agents, and intensive care of the initially resuscitated patients are, undoubtedly, essential principles for a successful cardiopulmonary resuscitation (CPR). Considering that anterograde blood flow generated by the classical closed-chest CPR maneuvers is usually very low, the use of especific pharmacological agents can improve the efficacy of such maneuvers, resulting in high rates of restoration of spontaneous circulation and improved neurological outcome. In the present issue, physiological basis for the use vasopressor agents during advanced life support in cardiac arrest, with especial attention to epinephrine (the standard adrenergic vasopressor) and vasopressin (a non-adrenergic vasopressor) are reviewed and discussed By increasing peripheral vascular tone, and consequently increasing the coronary and cerebral perfusion pressures, the early and agressive use of vasopressor agents in CPR is emphasized Key Words: cardiac arrest, cardiopulmonary resuscitation, vasopressors, adrenaline, vasopressin. (*) Prof.Assistente Doutor- Disciplina de Fisiologia e Metabologia CirúrgicaDepartamento de Cirurgia - FCM-UNICAMP (**) Prof. Assistente Doutor - Departamento de Enfermagem- FCM UNICAMP (***) Prof.Adjunto- Disciplina de Metabologia e Fisiologia Cirúrgica- Departamento de Cirurgia - FCM-UNICAMP INSTITUIÇÃO: Unidade de Terapia Intensiva - Hospital das Clínicas - Faculdade de Ciências Médicas - UNICAMP Endereço para correspondência: Dr. Sebastião Araújo Rua Padre Almeida- 451/apto 12 - Cambuí - Campinas (SP) -CEP -13025-251 - Fone: (0xx19) 253-7148 – E-mail: [email protected] Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 N o atendimento da parada cardiorrespiratória (PCR), alguns princípios são considerados básicos a fundamentais para o sucesso das manobras de ressuscitação, quais sejam: 1°) diagnóstico precoce da condição de PCR; 2°) uma pronta e rápida instituição dos suportes básico e avançado de vida, incluindo a desfibrilação elétrica e o uso precoce e agressivo de agentes farmacológicos vasopressores e 3°) o suporte intensivo de vida nos pacientes inicialmente ressuscitados. Assim, as maiores taxas de sucesso e alta hospitalar têm sido relatadas naqueles pacientes em que as manobras básicas de ressuscitação cardiorrespiratória (RCR) foram instituídas em menos de quatro minutos e as manobras avançadas foram iniciadas nos primeiros oito minutos desde o início da PCR1. Tendo em vista que o fluxo sangüíneo anterógrado gerado pelas manobras tradicionais de RCR a tórax-fechado é usualmente muito baixo 2, o uso de agentes farmacológicos específicos poderia melhorar a eficácia destas manobras, permitindo um aumento nas taxas de recuperação da circulação espontânea a de sobrevivência dos pacientes vítimas de PCR. Desta forma, o presente artigo tem por finalidade revisar e discutir as bases fisiológicas para o uso de agentes vasopressores durante o suporte avançado de vida no atendimento da PCR, com especial enfoque para a adrenalina (ADR), o vasopressor adrenérgico-padrão3, em uso há mais de um século, e a vasopressina (AVP), um dos mais promissores vasopressores não adrenérgicos da atualidade4. CONSIDERAÇÕES ACERCA DA IMPORTÂNCIA DO AUMENTO DO TÔNUS ARTERIAL PERIFÉRICO PARA O SUCESSO DAS MANOBRAS DE RCR Muito embora ainda não haja consenso quanto ao exato mecanismo de geração do fluxo sangüíneo anterógrado durante a RCR a tórax-fechado2,5,6, encontra-se bem documentado que todas as pressões intravasculares dentro do tórax são semelhantes durante as compressões 35 ARTIGO externas, sendo, portanto, virtualmente nula a possibilidade de fluxo coronariano nesta condição7,8. O nível de fluxo sangüíneo miocárdico necessário para suprir as demandas metabólicas do coração e manter a viabilidade tissular é de aproximadamente 75ml/min/100g durante o ritmo sinusal, 25ml/min/ 100g durante a fibrilação ventricular e de 10ml/min/100g durante a assistolia e a dissociação eletromecânica9. O fluxo sangüíneo para o miocárdio está na dependência da pressão diferencial através do leito coronariano dividida pela resistência vascular. O fluxo coronariano anterógrado durante as manobras de RCR a tórax-fechado ocorre principalmente durante a fase de relaxamento (descompressão) e é determinado pelo gradiente de pressão através do miocárdio, isto é, a diferença entre a pressão diastólica na raiz da aorta e a pressão diastólica no átrio direito2. Durante as manobras convencionais de RCR a tórax-fechado sem o uso de vasopressores, os fluxos sangüíneos miocárdico e cerebral encontram-se em níveis menores que 5-15% do estado basal8,11, portanto, insuficientes para manter a demanda metabólica destes órgãos, mesmo por poucos minutos. Desta forma, vários autores têm demonstrado, tanto em estudos experimentais quanto em humanos, que uma pressão de perfusão coronariana (PPCor) maior que 15 a 20mmHg, durante as manobras de RCR, é necessária para a restauração da circulação espontânea12-16. Ademais, muitos pacientes submetidos à RCR têm doença coronariana obstrutiva, necessitando provavelmente níveis de PPCor bem mais elevados para terem uma chance razoável de retorno da circulação espontânea. Esta assertiva tem sido defendida por Kern e col, 36 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva que têm estimado que pressões de perfusão coronariana de 40 a 80mmHg podem ser necessárias para uma adequada irrigação miocárdica na presença de doença arterial coronariana 17. Obviamente, apenas as manobras básicas de RCR são insuficientes para atingir tal objetivo18. O USO DE VASOPRESSORES ADRENÉRGICOS Uma vez que as pressões intravasculares dentro do tórax tanto na compressão quanto na descompressão são muito semelhantes durante as manobras de RCR, sendo praticamente nula a possibilidade de fluxo coronariano nesta situação7,8, a única maneira efetiva de se promover fluxo sangüíneo miocárdico durante as compressões torácicas externas seria pelo aumento do tônus arterial periférico, elevando-se a pressão na raiz da aorta e criando-se um diferencial pressórico aorta-átrio direito, conforme já claramente documentado no início deste século por Crile e Dolley19. Os agentes alfa-adrenérgicos, ao induzirem vasoconstricção periférica seletiva, aumentam a PPCor e, conseqüentemente, aumentam a chance de restauração da circulação espontânea durante a RCR20-23. Assim, com esta finalidade, diversos agentes farmacológicos simpatomiméticos com potentes atividades alfa-adrenérgicas como a adrenalina, noradrenalina, fenilefrina, metoxamina etc, têm sido estudadas nas últimas três décadas, permanecendo a ADR como o medicamento-padrão para uso nessa condição clínica3,24,25. A) ADRENALINA A adrenalina é uma catecolamina com efeitos alfa (α-1 e α-2) a beta-adrenérgicos (β-1 e β-2) balanceados, porém sua maior utili- dade na RCR dá-se por conta dos seus efeitos ao nível dos receptores alfa-1-periféricos. Os efeitos hemodinâmicos benéficos da ADR nas perfusões cerebral e miocárdica durante a RCR, em modelo animal, são claramente dose dependentes26. A recomendação atual de ADR na RCR em adultos (1mg, intravenosamente, a cada 5min), perfazendo aproximadamente 0,014mg/kg, pode não ser hemodinâmicamente ótima, pois, em estudos animais, a dose mais efetiva desta catecolamina, que melhora efetivamente as perfusões cerebral a miocárdica durante os esforços de ressuscitação, parece situar-se entre 0,1 e 0,2mg/kg de peso27,28. Com base nestes dados, doses mais elevadas de ADR (até 0,2mg/ kg ou mais) têm sido propostas para uso na RCR em humanos. Contudo, recentemente, estudos prospectivos e randomizados conduzidos nos Estados Unidos, Canadá e França, totalizando mais de 6.000 pacientes, comparando doses-padrão (média de 0,014mg/kg) com altas doses (em média, 0,2mg/kg) de adrenalina, durante a RCR em humanos, apesar de indicarem uma discreta tendência a uma maior taxa de restauração da circulação espontânea com as doses altas, falharam em demonstrar a superioridade da segunda dosagem em relação à primeira, quando os resultados finais se basearam nas taxas de alta hospitalar29-33. Na verdade, os resultados finais podem ser considerados insatisfatórios com ambas as doses, haja visto que as taxas de alta hospitalar foram em geral inferiores a 10% em ambos os grupos29,30,33. Em outros estudos, curiosamente, a ADR, tanto em dose-padrão quanto em altas doses, não se mostrou superior ao placebo na RCR em humanos34,35. Ademais, um estudo retrospectivo recente realizado por Behringer e col36 sugere que doses altas de ADR durante a RCR pare- Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva cem correlacionar-se negativamente com a evolução neurológica dos pacientes. Também na ressuscitação de pacientes pediátricos, Carpenter a Stenmark37, numa série de pacientes que apresentaram PCR intrahospitalar, não conseguiram demonstrar a superioridade de altas doses de ADR (0,12 +/- 0,05mg/ kg, em 24 episódios de PCR) quando comparadas à dose-padrão (0,01 +/- 0,01mg/kg, em 34 episódios de PCR). Assim, a recomendação atual de ADR para uso durante as manobras de RCR, em adultos, permanece sendo de 1mg, intravenosamente, a cada 3-5 min.3,24,25,38-43 sendo que a utilização de doses maiores (até 0,2mg/ kg de peso, ou mais) permanece controversa41,43, ou até mesmo considerada deletéria36,44. Um esquema alternativo, sugerido por alguns autores, consiste no uso de doses progressivas de ADR, intravenosamente, iniciando-se com 1mg, aumentando-se a dose a cada 3-5min de ressuscitação (1mg, 3mg, 5mg ...), até a dose total de aproximadamente 0,2mg/kg de peso. Com o uso desse esquema terapêutico, evitamos dar doses excessivas de ADR aos pacientes que não necessitam (aqueles que são recuperados rapidamente) e, por outro lado, não deixamos também de administrar medicação suficiente para aqueles que teoricamente só responderiam a doses elevadas (RCR prolongada)45,46. B) OUTROS AGENTES SIMPATOMIMÉTICOS: METOXAMINA, FENILEFRINA E NORADRENALINA Como muitos estudos experimentais haviam demonstrado que os efeitos alfa e não os beta-adrenérgicos tinham importância primária na ressuscitação tanto da parada cardíaca asfixica21,22 quanto da PCR por Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 fibrilação ventricular47, e que os efeitos beta-adrenérgicos poderiam ainda ser potencialmente deletérios na RCR21,48-50, especialmente na condição de fibrilação ventricular23,48, diversos agentes alfa-adrenérgico puros, como a fenilefrina e a metoxamina, têm sido testados durante as manobras de ressuscitação, tanto em animais quanto em humanos, porém com resultados conflitantes, não havendo, até o presente momento, nenhuma evidência concreta de que tais medicamentos sejam superiores à ADR na RCR25,41,43,45. A noradrenalina (NOR), uma catecolamina com efeitos alfa-1 e alfa-2 semelhantes, porém com efeitos beta-2 adrenérgicos menos potentes quando comparada à ADR51, poderia ser, pelo menos teoricamente, superior à segunda como vasopressor na RCR. Contudo, raramente havia sido utilizada com este propósito nas décadas passadas, tendo sido seu uso experimental e clínico na RCR retomado recentemente, porém com resultados ainda controversos 31,52-57. Um grande estudo em humanos foi realizado por Callaham e col31 num ensaio clínico randomizado, prospectivo e duplo-cego, comparandose altas doses de NOR (11 mg) e de ADR (15mg) com dose-padrão de ADR (1 mg), não sendo encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os três grupos, no que se referiu às taxas de alta hospitalar ou evolução neurológica. Desta forma, também a NOR não é indicada de rotina como substituta da ADR na RCR25,41-43,46,47. O USO DE VASOPRESSORES NÃO ADRENÉRGICOS Considerando-se que: a parada cardíaca é o estado clínico de máximo estresse biológico conhecido, estando associado aos mais elevados níveis plasmáticos documentados tanto de adrenalina quanto de nora- ARTIGO drenalina58-62; durante os estados de hipóxia grave, acredita-se existir uma “depressão” dos receptores alfa1-adrenérgicos9,63; e que o aumento da PPCor é de vital importância para a restauração da circulação espontânea, então, teoricamente, qualquer agente farmacológico vasopressor, mesmo não adrenérgico, poderia ser útil na RCR. De fato, recentemente, em nível experimental, agentes vasopressores não adrenérgicos, como a angiotensina II 56,64-72, a vasopressina (AVP)72,79 e a endotelina-180,81, têm sido estudados como medicamentos coadjuvantes na RCR em alguns modelos animais, demonstrando alta eficácia para aumentar a PPCor e as taxas de restauração da circulação espontânea. Muito embora a angiotensina II 56,64,72 e a endotelina-180,81 tenham se mostrado bastante efetivas (e mesmo superiores à ADR) em aumentar a PPCor e as taxas de RCE em estudos experimentais, elas ainda não foram utilizadas na RCR em humanos até a presente data. Em nível experimental, a AVP, especialmente quando combinada a uma catecolamina82,83, parece ser um dos mais promissores agentes farmacológicos na atualidade para uso como vasopressor durante a RCR84,85. Recentemente, com base nestes promissores estudos laboratoriais, o seu uso clínico tem sido ensaiado86-88. Em junho de 1996, Lindner e col86 relataram os casos de oito pacientes com parada cardíaca refratária às manobras terapêuticas tradicionais e que foram tratados com a administração IV, em bolus, de 40U de AVP, a desfibrilados se necessário. Após a administração de AVP, a circulação espontânea foi prontamente restaurada em todos os pacientes, sendo que três deles receberam alta hospitalar com funções neurológicas intactas. Em outro estudo randomizado e duplo-cego (1997), Lindner e col87 37 ARTIGO compararam a AVP com a ADR na RCR extra-hospitalar. Quarenta pacientes com fibrilação ventricular resistente aos esforços iniciais de RCR e desfibrilação receberam ADR (1 mg) ou AVP (40U) intravenosamente. Caso a circulação espontânea não fosse restaurada, o tratamento continuava segundo a normatização da AMERICAN HEART ASSOCIATION (AHA) e do EUROPEAN RESUSCITATION COUNCIL (ERC). Vinte pacientes receberam ADR e 11 deles (55%) apresentaram restauração da circulação espontânea. Sete pacientes (35%) sobreviveram até a admissão hospitalar, quatro (20%) sobreviveram mais de 24 horas e três (15%) tiveram alta hospitalar. Dos 20 pacientes no grupo da AVP, 16 (80%) apresentaram restauração da circulação espontânea, 14 (70%) sobreviveram até a admissão hospitalar, 12 (60%) sobreviveram mais de 24 horas (p < 0,05 comparado com o grupo da ADR), e 8 (40%) receberam alta hospitalar. Este ensaio mostrou uma tendência de melhor sobrevivência com o uso da AVP comparado com o da ADR, mas diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos só foram detectadas na sobrevivência de 24 horas e na restauração da circulação espontânea com o medicamento-estudo isolado, ou seja, sem outras medidas adicionais de suporte avançado de vida [sete pacientes (35%) com a AVP e dois (10%) com a ADR (p < 0,001) apresentaram restauração da circulação espontânea com o medicamento-estudo isolado]. Também não foram observados efeitos adversos sérios que pudessem ser atribuídos à administração de AVP, tanto no período imediato pós-RCR quanto durante a evolução clínica subseqüente87. Morris e col88 realizaram um estudo clínico piloto, prospectivo, não-randomizado e aberto (1997), utilizando a AVP durante a RCR. Dez 38 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva pacientes apresentando-se em PCR receberam, inicialmente, manobras ressuscitativas de médicos emergencistas de acordo com as orientações da AHA. Um cateter venoso central para a administração de fluidos e medicamentos, e um cateter arterial femoral para a mensuração da PPCor (definida como pressão arterial sistêmica menos pressão venosa central, na fase de relaxamento das compressões torácicas) foram posicionados. Quando cada paciente foi considerado não recuperável, 1mg de ADR foi administrado e a PPCor mensurada por 5min. A seguir, uma dose de AVP (1U/kg) foi administrada e a mensuração da PPCor continuou por outros 5min. A duração média da PCR-RCR (intervalo de tempo pré-hospitalar + intervalo hospitalar) foi de 39,6 +/-16,5min. Não houve melhora da PPCor após a administração de ADR. A administração de AVP resultou num aumento significativo da PPCor em quatro (40%) dos 10 pacientes. Os pacientes que responderam à AVP apresentaram um aumento médio na PPCor de 28,2 +/- 16,4mmHg (faixa de 10,0 a 51,5mmHg), com estes picos de aumento ocorrendo de 15seg a 4min após sua administração. Os autores concluíram que neste modelo de parada cardíaca prolongada em humanos, pelo fato de 40% dos pacientes que receberam AVP terem apresentado aumento da PPCor, a investigação do uso precoce de AVP como uma alternativa terapêutica na PCR seria desejável. Os mecanismos de ação da AVP na condição de PCR ainda não se encontram definidos. Curiosamente, sabe-se que os efeitos hipertensivos induzidos pela infusão de AVP exógena em animais normais a no homem intacto, mesmo em doses consideradas altas, são relativamente fracos89,91. Contudo, em animais crônica ou agudamente denervados e em seres humanos com hipotensão ortostática, seu efeito pressórico encontra-se extremamente exacerbado 92,93 . Cowley e col 92, em cães anestesiados a decapitados, mantidos em ventilação mecânica artificial e sob infusão contínua de NOR para manter a pressão arterial média em tomo de 100mmHg, demonstraram que a susceptibilidade pressórica à AVP, nestes animais, utilizando-se doses em níveis fisiológicos, foi amplificada em até 8.000 vezes. Desta forma, estes dados parecem sugerir que o sistema nervoso central intacto, com um controle reflexo cardiovascular completamente operante, age como um “tampão” sobre os efeitos pressóricos da AVP90,92,93, que não se manifestariam plenamente em condições normais. De fato, corroborando as observações experimentais de Cowley e col92, a ausência total de reflexos cardiovasculares devido à destruição completa do sistema nervoso central, como visto na condição clínica de morte encefálica em seres humanos, poderia explicar a elevada sensibilidade à AVP e a total dependência de sua infusão continua para se conseguir a manutenção da estabilidade hemodinâmica em tais pacientes, por períodos tão incrivelmente longos quanto um mês ou mais, como descrito por Yoshioka e col94 e Iwai e col95. Na PCR as funções do sistema nervoso central desaparecem por completo poucos segundos após o seu início, resultando numa condição clínica semelhante à do “animal decapitado” 92 ou à dos pacientes em morte encefálica94,95, explicando assim, possivelmente, a grande sensibilidade aos efeitos pressóricos da AVP observados na RCR. Entretanto, ainda não está claro se este aumento do efeito pressórico se deve à ação direta da AVP sobre os receptores V1, a uma potencialização dos receptores alfa-adrenérgicos ou mesmo a uma interação destes efeitos. A última assertiva parece ser uma Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva hipótese bastante plausível já que os níveis de catecolaminas encontram-se elevados na PCR/RCR60,62, corroborada pelo fato de que alguns estudos em diferentes espécies animais a no homem têm relatado uma significativa interação positiva das ações vasoconstrictoras das catecolaminas com a AVP96-101. Recentemente, com a finalidade de investigar essa possível ação sinérgica entre as catecolaminas e a AVP, Mulligan e col82, utilizando um modelo suíno de PCR/RCR em fibrilação ventricular, demonstraram que a combinação de AVP (0,3U/kg) + ADR (40mg/kg) resultou numa elevação mais sustentada da PPCor quando comparada com a AVP isolada, além de uma elevação mais duradoura da PPCor que a observada com a ADR isolada, concluindo que os efeitos sinérgicos destes dois potentes vasoconstrictores poderiam ser benéficos durante a RCR. No entanto, no mesmo trabalho, mensurando-se o fluxo sangüíneo cerebral, notou-se um menor aumento do mesmo com a combinação AVP + ADR, quando comparado com o uso isolado da primeira, fato este que poderia representar um efeito deletério da combinação de medicamentos durante a RCR82. De fato, estes achados foram confirmados por Wenzel e col102, que, utilizando também um modelo suíno de PCR/RCR, comparam os efeitos da AVP isolada (0,8U/kg) com AVP (0,8U/kg) + ADR (0,2mg/kg) na pressão de perfusão coronariana, pressão de perfusão cerebral, fluxo sangüíneo para o ventrículo esquerdo e fluxo sangüíneo cerebral total, concluindo que a associação AVP+ADR diminuiu a perfusão cerebral nestes animais quando comparada com a AVP isolada. Em um estudo recentemente realizado em nosso laboratório, nós comparamos o uso isolado de ADR (0,2 mg/kg), NOR (0,2mg/kg), AVP (0,8U/kg) com o uso combinado de Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 ADR (0,2m/kg) + AVP (0,8U/kg) e NOR (0,2mg/kg) + AVP (0,8U/kg), num modelo canino de PCR em fibrilação ventricular, observando uma nítida potencialização de seus efeitos, com um aumento mais intenso e sustentado da PPCor com o uso combinado dos medicamentos (especialmente com a NOR + AVP), resultando numa alta taxa de restauração da circulação espontânea nestes animais83. No entanto, nem o fluxo sangüíneo cerebral nem a evolução neurológica foram avaliados neste estudo. CONCLUSÃO Apesar de todos os avanços ocorridos nestas últimas quatro décadas, desde a publicação original de Kouwenhoven et al103, a taxa de sobrevivência dos pacientes submetidos à RCR a tórax-fechado permanece praticamente inalterada e muito aquém do desejável, situando-se na faixa de 15% naqueles vítimas de PCR intra-hospitalar e entre 1 e 8% naqueles vitimados fora do ambiente hospitalar41. Tendo em vista que o fluxo sangüíneo anterógrado gerado pelas manobras tradicionais de RCR a tórax-fechado é usualmente muito baixo, o uso de agentes farmacológicos específicos talvez seja a única maneira prática a logisticamente viável em larga escala para melhorar a eficácia dessas manobras, permitindo um aumento nas taxas de restauração da circulação espontânea e de sobrevivência dos pacientes vítimas de PCR. Apesar de a adrenalina ainda ser considerado o agente farmacológico vasopressor-padrão para uso na RCR, sérias dúvidas têm sido levantadas sobre o seu real beneficio nessa condição. Por outro lado, estudos recentes parecem indicar que vasopressores não adrenérgicos, como a angiotensina II, a AVP e a endotelina, em uso isolado ou combinado com ARTIGO catecolaminas, podem ter um importante papel no arsenal terapêutico da parada cardiorrespiratória. Dentre estes, na atualidade, a AVP parece ser um dos mais promissores agentes farmacológicos para uso nesta grave condição clínica. Desta forma, tendo em vista os resultados pouco satisfatórios até agora obtidos com o uso de vasopressores adrenérgicos na RCR104, acreditamos que estudos adicionais para se avaliar o potencial beneficio de drogas vasopressoras não adrenérgicas na RCR, em humanos, encontram-se plenamente justificados. RESUMO O diagnóstico rápido da parada cardiorrespiratória (PCR), a pronta instituição dos suportes básico e avançado de vida, incluindo a desfibrilação elétrica e o uso precoce e agressivo de agentes farmacológicos vasopressores, seguidos de cuidados especiais em unidade de terapia intensiva, são princípios considerados básicos e fundamentais para o sucesso da ressuscitação cardiorrespiratória (RCR). Tendo em vista que o fluxo sangüíneo anterógrado gerado pelas manobras tradicionais de RCR a tórax-fechado é usualmente muito baixo, o uso de medicamentos específicos pode melhorar a eficácia destas manobras, permitindo um aumento nas taxas de recuperação da circulação espontânea e de boa evolução neurológica nos pacientes vítimas de PCR. O presente artigo tem por finalidade revisar e discutir as bases fisiológicas para o uso de vasopressores durante o suporte avançado de vida no atendimento da PCR, com enfoque especial para a adrenalina (vasopressor adrenérgico-padrão) e a vasopressina (vasopressor não adrenérgico). Pelo fato de aumentarem o tônus vascular periférico, 39 ARTIGO aumentando conseqüentemente as pressões de perfusão coronariana e cerebral, o uso precoce e agressivo de agentes farmacológicos vasopressores na RCR é enfatizado. Unitermos: parada cardiorrespiratória, ressuscitação cardiorrespiratória, vasopressores, adrenalina, vasopressina. Referências 1. Eisenberg MS, Bergner L, Hallstrom AP. Cardiac resuscitation in the community: importance of rapid provision and implications for program planning. JAMA 1979; 241:1905-7. 2. von Planta M & Trilló G. Closed-chest compression: a review of mechanisms and alternatives. Resuscitation 1994; 27:107-15. 3. Guidelines for Cardiopulmonary Resuscitation (CPR) and Emergency Cardiac Care (ECC). JAMA 1992; 286: 2172-250. 4. Frishman WH, Vahdat S, Bhatta S. Innovative pharmacologic approaches to cardiopulmonary resuscitation. JClin Pharmacol 1998; 38:765-72. 5. Maier GW, Tyson GS, Olsen CO, et al. The physiology of external cardiac massage: highimpulse cardiopulmonary resuscitation. Circulation 1984; 70: 86-101. 6. Sanders AB, Ewy GA, Taft TV, et al. Prognostic and therapeutic importance of the aortic diastolic pressure in resuscitation from cardiac arrest. Crit Care Med 1984; 12:871-3. 7. Chandra N, Weisfeldt ML, Tsitlik J, et al. Augmentation of carotid flow during cardiopulmonary resuscitation by ventilation at high airway pressure simultaneous with chest compression. Am J Cardiol 1981; 48:1053-63. 8. Ditchey RV, Winkler JV, Rhodes CA. Relative lack of coronary blood flow during closedchest resuscitation in dogs. Circulation 1982; 66:297-302. 9. Brown CG & Werman HA. Adrenergic agonists during cardiopulmonary resuscitation. Resuscitation 1990; 19:1-16. 10. Lindner KH & Ahnefeld FW. Sympathomimetic amines in cardiopulmonary resuscitation. Intensive & Critical Care Digest 1991; 10:33-6. 11. Koehler RC, Chandra N, Guerci AD, et al. Augmentation of cerebral perfusion by simultaneous chest compression and 40 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva lung inflation with abdominal binding following cardiac arrest in dogs. Circulation 1983; 67:266-75. 12. Sanders AB, Ogle M, Ewy GA, et al. Coronary perfusion pressure during cardiopulmonary resuscitation. Am JEmergMed 1985; 3:11-4. 13. Niemann JT, Criley JM, Rosborough JP, et al. Predictive indices of successful cardiac resuscitation after prolonged arrest and experimental cardiopulmonary resuscitation. Ann EmergMed 1985; 14:521-8. 14. Raessler KL, Kern KB, Sanders AB, et al. Aortic and right atrial systolic pressures during cardiopulmonary resuscitation: a potential indicator of the mechanism of blood flow. Am Heart J 1988; 115:1021-9. 15. Deshmukh HG, Weil MH, Gudipati CV, et al. Mechanism of blood flow generated by precordial compression during CPR. I. Studies on closed-chest precordial compression. Chest 1989; 95:1092-9. 16. Paradis NA, Martin GB, Rivers EP, et al. Coronary perfusion pressure and the return of spontaneous circulation in human cardiopulmonary resuscitation. JAMA 1990; 263:1106-13. 17. Kern KB, Lancaster L, Goldman S, et al. The effect of coronary artery lesions on the relationship between coronary perfusion pressure and myocardial blood flow during cardiopulmonary resuscitation in pigs. Am Heart J 1990; 120:324-33. 18. Rubertsson S, Grenvik A, Zemgulis V, et al. Systemic perfusion pressure and blood flow before and after administration of epinephrine during experimental cardiopulmonary resuscitation. Crit Care Med 1995; 23:1984-96. 19. Crile G & Dolley DH. An experimental research into the resuscitation of dogs killed by anesthetics and asphyxia. J Exp Med 1906; 8:713-25. 20. Pearson JW & Redding JS. Influence of peripheral vascular tone on cardiac resuscitation. Anesth Analg 1965; 44:746-52. 21. Yakaitis RW, Otto CW, Blitt CD. Relative importance of alpha and beta-adrenergic receptors during resuscitation. Crit Care Med 1979; 7:293-6. 22. Otto CW, Yakaitis RW, Blitt CD. Mechanism of action of epinephrine in resuscitation from asphyxial arrest. Crit Care Med 1981; 9:321-4. 23. Michael JR, Guerci AD, Koehler RC, et al. Mechanism by which epinephrine 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. augments cerebral and myocardial perfusion during cardiopulmonary resuscitation in dogs. Circulation 1984; 69:822-35. Guidelines for Advanced Life Support. A statement by the Advanced Life Support Working Party of the European Resuscitation Council. Resuscitation 1992; 24:111-23. Bleske BE & Billi JE. Comparison of adrenergic agonists for the treatment of ventricular fibrillation and pulseless electrical activity. Resuscitation 1994; 28:239-51. Paradis NA & Koscove EM. Epinephrine in cardiac arrest: a review. Ann Emerg Med 1990; 19:1288-301. Kosnik JW, Jackson RE, Keats S, et al. Dose-related response of centrally administered epinephrine on the change in aortic diastolic pressure during closed-chest massage in dogs. Ann Emerg Med 1985; 14:204-8. Brown CG, Werman WA, Davis EA, et al. The effects of graded doses of epinephrine on regional myocardial blood flow during cardiopulmonary resuscitation in swine. Circulation 1987; 75:491-7. Stiell IG, Hebert PC, Weitzman BN, et al. High-dose epinephrine in adult cardiac arrest. N Èngl JMed 1992; 327:1045-50. Brown CG, Martin DR, Pepe PE, et al. A comparison of standard-dose and high-dose epinephrine in cardiac arrest outside the hospital. NEngl JMed 1992; 327:1051-5. Callaham M, Madsen CD, Barton CW, et al. A randomized clinical trial of high-dose epinephrine and norepinephrine vs standard-dose epinephrine in pre-hospital cardiac arrest. JAMA 1992; 268:2667-72. Abramson NS, Safar P, Sutton-Tyrell K, et al. A randomized clinical trial of escalating doses of high-dose epinephrine during resuscitation (abstract). Crit Care Med 1995; 23:A-178. Gueugniaud P-Y, Mols P, Goldstein P, et al. A comparison of repeated high doses and repeated standard-doses of epinephrine for cardiac arrest outside the hospital. N Engl J Med 1998; 339:1595-601. Herlitz J, Ekstrom L, Wennerblom B, et al. Adrenaline in out-of-hospital ventricular fibrillation. Does it make any difference? Resuscitation 1995; 29:195-201. Woodhouse SP, Cox S, Boyd P, et al. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva High-dose and standard-dose adrenaline do not alter survival compared with placebo in cardiac arrest. Resuscitation 1995; 20:243-9. 36. Behringer W, Kittler H, Sterz F, et al. Cumulative epinephrine dose during cardiopulmonary resuscitation. Ann Intern Med 1998; 129:450-6. 37. Carpenter TC & Stenmark KR. High dose epinephrine is not superior to standard-dose epinephrine in pediatric in-hospital cardiopulmonary arrest. Pediatrics 1997; 99:403-8. 38. Lindner KH & Koster R. Vasopressor drugs during CPR. A statement of the Advanced Life Support Working Party of the European Resuscitation Council, 1992. Resuscitation 1992; 24:147-53. 39. Ornato JP. Use of adrenergic agonists during CPR in adults. Ann Emerg Med 1993; 22(part 2):411-6. 40. Albarran-Sotelo R. Farmacologia. In: Lane JC & Albarran-Sotelo R. Reanimação Cardiorrespiratória Cerebral. Rio de Janeiro: MEDSI 1993; 247-58. 41. Varon J, Marik PE, Fromm Jr RE. Cardiopulmonary resuscitation: a review for clinicians. Resuscitation 1998; 36:133-45. 42. Robertson C, Steen P, Adgey J, et al. The 1998 European Resuscitation Council (ERC) guidelines for adult advanced life support. Resuscitation 1998; 37:81-90. 43. Adgey AAJ & Johnston PW. Approaches to modern management of cardiac arrest. Heart 1998; 80:397-401. 44. Cummins RO & Hazinski MF. The next chapter in the high-dose epinephrine history: unfavorable neurologic outcome? [editorial]. Ann Intern Med 1998; 129:501-2. 45. Araújo S. Farmacologia no suporte avançado de vida. Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 1997; 7:71-8. 46. Zago AC, Nunes CE, Cunha VR, et al. Ressuscitação cardiorrespiratória: atualização, controvérsias e novos avanços. Arq Bras Cardiol 1999; 72:363-74. 47. Holmes HR, Babbs CF, Voorhees WD, et al. Influence of adrenergic drugs uppon vital organ perfusion during CPR. Crit Care Med 1980; 8:137-40. 48. Livesay JJ, Follete DM, Fey KH, et al. Optimizing myocardial supply/demand balance with alpha-adrenergic drugs during cardiopulmonary resuscitation. J Thorac Cardiovasc Surg 1978; 76: 244-51. 49. Otto CW & Yakaitis RW. The role of epinephrine in CPR: a reppraisal. Ann Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 Emerg Med 1984; 13:840-3. 50. Otto CW. Cardiovascular pharmacology. II. The use of catecholamines, pressor agents, digitalis and corticosteroids in CPR and Emergency Cardiac Care. Circulation 1986; 15:112-20. 51. Hoffman BB & Lefkowitz RJ. Catecholamines, sympathomimetic drugs, and adrenergic receptors antagonists. In: Hardman JG & Limbird LE (eds). Goodman & Gilman’s: The Pharmacological Basis of Therapeutics. New York: McGraw Hill, 9th ed., 1996; 199248. 52. Lindner KH & Ahnefeld FW. Comparison of epinephrine and norepinephrine in the treatment of asphyxial or fibrillatory arrest in a porcine model. Crit Care Med 1989; 17:437-41. 53. Robinson LA, Brown CG, Jenkins J, et al. The effect of norepinephrine versus epinephrine on myocardial hemodynamics during CPR. Ann EmergMed 1989; 18:336-40. 54. Hoekstra JW, van Ligten P, Neumar R, et al. Effect of high-dose norepinephrine versus epinephrine on cerebral and myocardial blood flow during CPR. Resuscitation 1990; 19 227-40. 55. Lindner KH, Ahnefeld FW, Schuermann W, et al. Epinephrine and norepinephrine in cardiopulmonary resuscitation. Effects on myocardial oxygen delivery and consumption. Chest 1990; 97:1458-62. 56. Araújo S, Gómez MI, Terzi RGG, et al. Efficacy of epinephrine, norepinephrine and angiotensin II in CPR: experimental study in asphyxial arrest (abstract). In: Aochi O, Amaha K & Takeshita H (eds): Intensive and Critical Care Medicine, Ireland: Elsevier 1990; 997. 57. Lindner KH, Ahnefeld FW, Grunert A. Epinephrine versus norepinephrine in pre-hospital ventricular fibrillation. Am J Cardiol 1991; 67:427-8. 58. Wortsman J, Frank S, Cryer PE. Adrenomedullary response to maximal stress in humans. Am JMed 1984; 77:779-84. 59. Wortsman J, Foley PJ, Tacker WA, et al. Cerebrospinal fluid changes in experimental cardiac arrest (maximal stress). Am JPhysiol 1987; 252: E756-61. 60. Huyghens LP, Calle PA, Moerman EJ, et al. Plasma norepinephrine concentrations during resuscitation in the dog. Am JEmergMed 1991; 9:426-31. 61. Lindner KH, Ahnefeld FW, Bowdler IM, et al. Influence of epinephrine on ARTIGO systemic, myocardial and cerebral acid-base status during cardiopulmonary resuscitation. Anesthesiology 1991; 74:333-9. 62. Prengel AW, Lindner KH, Ensinger H, et al. Plasma catecholamine concentrations after successful resuscitation in patients. Crit Care Med 1992; 20: 609-14. 63. Watanabe Y, Lai R-T, Yoshida H. Increase in (3H)-clonidine binding sites induced by adenosine receptor agonists in vas deferens in vitro. Eur JPharmacol 1983; 86:265-9. 64. Araújo S, Araújo IEM, Terzi RGG. Effects of angiotensin II (AII), a non-adrenergic vasopressor drug, on coronary perfusion pressure (CPP) and resuscitation in fibrillatory arrest (FA). Annals of the Il th International Symposium on Intensive Care and Emergency Medicine, Brussels, Belgium 1991; 52. 65. Araújo IEM. Efeitos da angiotensina II na parada cardiaca induzida por fibrilação ventricular: estudo experimental. Dissertação de Mestrado, FCM/ UNICAMP, 1992. 66. Araújo S. Eficácia da epinefrina, norepinefrina a angiotensina II na ressuscitaçao cardiopulmonar: estudo experimental na dissociaçao eletromecânica. Dissertação de Mestrado, FCM/UNICAMP, 1993. 67. Lindner KH, Prengel AW, Pfenninger EG, et al. Effect of angiotensin II on myocardial blood flow and acid-base status in a pig model of cardiopulmonary resuscitation. Anesth & Analg 1993; 76:485-92. 68. Little CM & Brown CG. Angiotensin II improves myocardial blood flow in cardiac arrest. Resuscitation 1993; 26:203-10. 69. Little CM, Hobson JL, Brown CG. Angiotensin II effects in a swine model of cardiac arrest. Ann EmergMed 1993; 22:244-7. 70. Little CM & Brown CG. Angiotensin II administration improves cerebral blood flow in cardiopulmonary arrest in swine. Stroke 1994; 25:183-6. 71. Araújo S. Eficácia da epinefrina, norepinefrina e angiotensina II na ressuscitação cardiopulmonar: estudo experimental na fibrilação ventricular. Tese de Doutorado, FCM/UNICAMP, 1996. 72. Araújo S, Araújo IEM, Ceccarelli MJNB, et al. Eficácia da adrenalina, noradrenalina, angiotensina II a vaso- 41 ARTIGO pressina na ressuscitação cardiorrespiratória: estudo experimental na fibrilação ventricular prolongada. Rev Bras Terap Intens 1998; 10:29-41. 73. Lindner KH, Prengel AW, Pfenninger EG, et al. Vasopressin improves vital organ blood flow during closed-chest cardiopulmonary resuscitation in pigs. Circulation 1995; 91:215-21. 74. Lindner KH, Brinkmann A, Pfenninger EG, et al. Effects of vasopressin on hemodynamic variables, organ blood flow, and acid-base status in a pig model of cardiopulmonary resuscitation. Anesth Analg 1993; 77:427-35. 75. Prengel AW, Lindner KH, Keller A, et al. Cardiovascular function during the postresuscitation phase after cardiac arrest in pigs: a comparison of epinephrine versus vasopressin. Crit Care Med 1996; 24:2014-9. 76. Prengel AW, Lindner KH, Keller A. Cerebral oxygenation during cardiopulmonary resuscitation with epinephrine and vasopressin in pigs. Stroke 1996; 27:1241-8. 77. Babar SI, Berg RA, Hilwig RW, et al. Vasopressin versus epinephrine during cardiopulmonary resuscitation: a randomized swine outcome study. Resuscitation 1999; 41:185-92. 78. Wenzel V, Lindner KH, Krismer AC, et al. Repeated administration of vasopressin but not epinephrine maintains coronary perfusion pressure after early and late administration during prolonged cardiopulmonary resuscitation in pigs. Circulation 1999; 99:1379-84. 79. Wenzel V, Lindner KH, Prengel AW, et al. Vasopressin improves vital organ blood flow after prolonged cardiac arrest with postcountershock pulseless electrical activity in pigs. Crit Care Med 1999; 27:486-92. 80. Haynes WG, Hamer DW, Robertson CE, et al. Plasma endothelin following cardiac arrest: differences between survivors and non-survivors. Resuscitation 1994; 27:117-22. 81. DeBehnke DJ, Spreng D, Wickman LL, et al. The effects of endothelin-1 on coronary perfusion pressure during cardiopulmonary resuscitation in a canine model. Acad Emerg Med 1996; 3:137-41. 82. Mulligan KA, McKnite SH, Lindner KH, et al. Synergistic effects of vasopressin plus epinephrine during cardio- 42 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva pulmonary resuscitation. Resuscitation 1997; 35:265-71. 83. Araújo S, Araújo IEM, Ceccarelli MJNB, et al. Eficácia da vasopressina (AVP), isolada e combinada com adrenalina (ADR) a noradrenalina (NOR), na ressuscitação cardiorrespiratória (RCR): estudo experimental na fibrilação ventricular. Arq Bras Cardiol 1999; 72 (supl II):14. 84. Chug SS, Lurie KG, Lindner KH. Pressor with promise: using vasopressin in cardiopulmonary arrest. Circulation 1997; 96:2453-4. 85. Kelly CM & Ponzillo JJ. Vasopressin use in cardiopulmonary resuscitation. Ann Pharmacother 1997; 31:1523-5. 86. Lindner KH, Prengel AW, Brinkmann A, et al. Vasopressin administration in refractory cardiac arrest. Ann Intern Med 1996; 124:1061-4. 87. Lindner KH, Dirks B, Strohmenger HU, et al. Randomized comparison of epinephrine and vasopressin in patients with out-of-hospital ventricular fibrillation. Lancet 1997; 349:5357. 88. Morris DC, Dereczyk BE, Grzybowski M, et al. Vasopressin can increase coronary perfusion pressure during human cardiopulmonary resuscitation. Acad Emerg Med 1997; 4:878-83. 89. Gaskill III HV, Sirinek KR, Levine BA. Hemodynamic effects of vasopressin. Can large doses be safely given? Arch Surg 1983; 118:434-7. 90. Ebert TJ, Cowley Jr AW, Skelton M. Vasopressin reduces cardiac function and augments cardiopulmonary baroreflex resistance increases in man. J Clin Invest 1986; 77:1136-42. 91. Jackson EK. Vasopressin and other agents affecting the renal conservation of water. In: Hardman JG & Limbird LE (eds). Goodman & Gilman’s: The Pharmacological Basis of Therapeutics. New York: McGraw Hill, 9th ed., 1996; 715-31. 92. Cowley Jr AW, Monos E, Guyton AC. Interaction of vasopressin and the baroreceptor reflex system in the regulation of arterial blood pressure in the dog. Circ Res 1974; 34:505-14. 93. Möhring J, Glänzer K, Maciel Jr JA, et al. Greatly enhanced pressor response to antidiuretic hormone in patients with impaired cardiovascular reflexes due to idiophatic orthostatic hypotension. JCardiovasc Pharmacol 1980; 2: 367-76. 94. Yoshioka T, Sugimoto H, Uenishi M, et al. Prolonged hemodynamic maintenance by the combined administration of vasopressin and epinephrine in brain death: a clinical study. Neurosurgery 1986; 18:565-7. 95. Iwai A, Sakano T, Uenishi M, et al. Effects of vasopressin and catecholamines on the maintenance of circulatory stability in brain-dead patients. Transplantation 1989; 48:6137. 96. Bartelstone HJ & Nasmyth PA. Vasopressin potentiation of catecholamines actions in dog, rat, cat and rat aortic strip. Am JPhysiol 1965; 208:754-62. 97. Karmazyn M, Manku MS, Horrobin DF. Changes óf vascular reactivity induced by low vasopressin concentrations: interactions with cortisol and lithium and possible involvement of prostaglandins. Endocrinology 1978; 102: 1230-6. 98. Guc MO, Furman BL, Parrat JR. Modification of alpha-adrenoceptor mediated pressor responses by N Gnitro-L-arginine methyl ester and vasopressin in endotoxin-treated pithed rats. EurJPharmacol 1992; 224:63-9. 99. Derad I, Pauschinger P, Born J. Norepinephrine amplifies effects of vasopressin on the isolated rat heart. Regul Pept 1992; 39:35-41. 100. Medina P, Noguera I, Aldasoro M, et al. Enhancement by vasopressin of adrenergic responses in human mesenteric arteries. Am JPhysiol 1997; 272:H1087-93. 101. Medina P, Acuna A, Martinez-León JB, et al. Arginine vasopressin enhances sympathetic constriction through the V 1 vasopressin receptor in human saphenous vein. Circulation 1998; 97:865-70. 102. Wenzel V, Lindner KH, Augenstein S, et al. Vasopressin combined with epinephrine decreases cerebral perfusion compared with vasopressin alone during cardiopulmonary resuscitation in pigs. Stroke 1998; 29:1462-8. 103. Kouwenhoven WB, Jude JR, Knickerbocker GG. Closed chest cardiac massage. JAMA 1960; 173:1064-7. 104. Ornato JP, Paradis N, Bircher N, et al. Future directions for resuscitation research. III. External cardiopulmonary resuscitation advanced life support. Resuscitation 1996; 32:13958. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva RELATO DE CASO Contusão car díaca cardíaca Blunt cardiac injury Emídio Jorge Santos Lima* Abstract In contrast to penetrating injury, which is often diagnosed and even treated within minutes of admission, blunt cardiac injury is far less evident diagnosis. The best approach to deal with blunt cardiac injury is first: suspect cardiac contusion in any patient who has sustained a high-energy impact to the thorax and second: submit those patients, if stable, to ECG, Troponin assay and Echocardiography. S-T or T wave changes on ECG and elevated Troponin level, after thoracic trauma, confirm cardiac contusion. Patients sustained a high-energy impact to the thorax with: cardiac arrest, imminent cardiac arrest, pericardial fluid or unstable with signs of thoracic bleeding are immediately operated on (emergency thoracotomy). Stable patients who are found to have elevated Troponin and S-T or T waves changes on ECG must be monitored in the ICU (Intensive Care Unit) until resolution of their clinical signs and return of ECG/Troponin to normal. Key Words: cardiac contusion; cardiac trauma; blunt cardiac injury Trabalho realizado na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Geral e Urgências (HGU), em Petrolina - Pernambuco. *Coordenador das Unidades de Terapia Intensiva dos Hospitais: HGU a Memorial de Petrolina - Pernambuco. Endereço para correspondência: Emídio Jorge Santos Lima Rua Milton Menezes, 345, Loteamento Cidade Jardim. CEP: 56300.000 Petrolina - PE. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 E m contraste com a lesão penetrante, que é freqüentemente diagnosticada e tratada dentro de minutos da admissão hospitalar, a contusão cardíaca é uma entidade clínica bem menos evidente, cuja apresentação pode variar desde ausência de sintomas até choque cardiogênico 1. A falta de padronização a uniformização dos critérios para o diagnóstico, dificulta a determinação da real incidência de contusão cardíaca 1. Em decorrência da variação na apresentação clínica dos casos de contusão cardíaca é fundamental que diante de trauma torácico, em que ocorreu alta transferência de energia, haja a suspeita de trauma cardíaco 1. Uma vez levantada a hipótese de contusão cardíaca, deve-se realizar ECG e dosagem de Troponinas cardíacas (I ou T)2. O ECG é altamente sensível, porém de pouca especificidade 3,4,5. As Troponinas cardíacas são específicas a quando elevadas selam o diagnóstico 2,6,7. Todos pacientes que apresentarem evidências clínicas, eletrocardiográficas ou bioquímicas de lesão cardíaca deverão ser submetidos a ecocardiografia transtorácica em busca de lesões estruturais a derrame pericárdico 8,9. Os pacientes com evidências de trauma torácico grave que apresentarem: parada cardíaca, sinais de tamponamento cardíaco ou hipotensão secundária a sangramento torácico deverão ser submetidos imediatamente a toracotomia de emergência 1,11. Havendo instabilidade hemodinâmica, na ausência de sangramentos ou de tamponamento cardíaco, esta indicada a monitorização invasiva, com cateter na artéria pulmonar, para nortear a terapia do choque cardiogênico traumático 1. Naqueles enfermos estáveis, porém com elevação de Troponinas e/ou alterações ao ECG é fundamental a observação em UTI, até a normalização daqueles parâmetros laboratoriais 7. RELATO DE CASO Paciente do sexo masculino, RJS, 17 anos, foi admitido na UTI do HGU, em 14/06/00 as 5:40 horas, pro- 43 RELATO DE CASO RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva Figura 1 - Corrente de Lesão (Supradesnivelamento de ST) em Di, D2, AVL, V4, V5 e onda T negativa em D3 veniente de um hospital em Remanso - BA. No hospital de origem, atendido após queda ao solo da carroceria de um automóvel, foi submetido a drenagem de pneumotórax a direita e devido a falta de recursos hospitalares foi transferido para nossa UTI. Ao ser admitido na UTI, há cerca de 8 horas do acidente, apresentava: dispnéia, sede, drenagem improvisada do hemitórax direito com uma sonda vesical, enfisema subcutâneo sobre o hemitórax direito e diminuição universal do murmúrio vesicular em ambos os hemitóraces. Bulhas normais, sem sopros. PA: 140/90 mmHg, FC: 130 bpm e descorado. Fratura fechada da clavícula esquerda. O abdome sem anormalidades e o exame neurológico normal. A oximetria de pulso demonstrava 87% de saturação com FiO2 = 50% em uso de máscara de Venturi. Substituído o dreno torácico à direita por um dreno específico de 36 F, venóclises nos membros superiores, sondagem vesical de demora, solicitado controle radiológico e exames laboratoriais de rotina. O controle radiológico demonstrava, expansão do pulmão direito e extenso derrame pleural 44 à esquerda. Colocado dreno no hemitórax esquerdo drenando-se 800 ml de sangue. Infundido rápido, através de venóclises periféricas 2000 ml de Ringer Lactato e mantida monitorização rigorosa das perdas pelos drenos torácicos. Após cerca de 2 horas da admissão, o paciente manteve-se: taquipneico, SaO2 = 91% com FiO2 de 50% por máscara, pálido e com PA: 110/60 mmHg. Rx de controle demonstrava: expansão de 90% do pulmão direito a de 40% do pulmão esquerdo, apesar de drenado 900 ml de sangue deste último. As 8:50 horas, cerca de 2:50 h da admissão, totalizou-se uma perda de sangue pelo hemitórax esquerdo de 1600 ml, além da ocorrência de hipotensão ortostática (PA: 80/50 mmHg), revertida com posição de Trendelenburg a infusão rápida de R Lactato. O Rx de controle, neste momento, demonstrou velamento na base esquerda. As 10:30 horas, cerca de 4:50 horas da admissão, totalizou-se uma perda de 2200 ml de sangue pelo hemitórax esquerdo, recorrendo-se a hipotensão (PAS: 80 mmHg). Aumentada a infusão de Ringer Lactato, solicitada transfusão de Concentrado de Hemáceas e indicada toracotomia de urgência. O paciente foi transferido para o centro cirúrgico e as 11:20 horas, foi submetido a toracotomia anterolateral no 6° espaço intercostal esquerdo, constatando-se lesão com cerca de 1,5 cm, na parede anterior do ventrículo direito que apresentava sangramento pulsátil, parcialmente tamponado pelo pericárdio. Foi realizada com êxito miocardiorrafia e manutenção da drenagem torácica bilateral. Durante a cirurgia, com duração de 1:40 horas, o paciente manteve PAS entre 80 a 110 mmHg a SaO2 > 90%. Fizera use de 1 litro de cristalóide e 2 unidades de concentrado de hemáceas. Retornou para UTI no pós-op imediato, instituindo-se: reposição de 3 unidades de concentrado de hemáceas, correção de acidose metabólica, fisioterapia respiratória, antibiótico profilático (Cefalotina), analgesia e profilaxia contra hemorragia digestiva alta (bloqueador H2). Mantido em ventilação mecânica assistida, por 2 horas no POI, após o que foi extubado estando vigil a eupneico. Exames laboratoriais no POI: Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ECG: supradesnivelamento do segmento ST em D1, D2, AVL, V4, V5; onda T invertida em D3 e taquicardia sinusal (Figura 1). Hemoglobina: 5,50, K: 3,9 mEq/l, glicemia: 225 mg%. Uréia a creatinina normais.CKmb: 112 U.I (VN: até 25), TGO: 188 U.I ( VN: até 46), LDH 403 U.I (VN: até 240). No pós-operatório na UTI evoluiu com: estabilidade hemodinâmica, diurese normal, eupnéia, drenos torácicos com débito em regressão. Rx de tórax demonstrou atelectasia na base do pulmão esquerdo. Hemoglobina: 9. Conduta: intensificada a fisioterapia respiratória a iniciada dieta oral. Ecocardiograma transtorácico demonstrou boa função sistólica e diastólica, sem arnomalidades morfológicas. Alta da UTI no 3° DPO, apresentando pequena área de atelectasia na base do pulmão esquerdo e pico febril de 38°, atribuído a infecção na área atelectásica. Leucograma: 11500, bastões: 2% e segmentados: 91%. Iniciada Cefalosporina de 1ª geração. Evoluiu com: bom apetite, picos febris de 38°, parada da drenagem no hemitórax esquerdo no 6° DPO, quando retiramos o referido dreno. A partir do 8° DPO, passou 48 horas sem febre. No 10° DPO: retiramos o dreno torácico à direita (improdutivo), retorno da febre com pico de 39° e Rx demonstrou apagamento do costofrênico esquerdo, sugerindo piora da infecção respiratória em área de atelectasia de base. Conduta: substituímos a cefalosporina de 1ª geração por Ciprofloxacina, a partir do 11° DPO. Evoluiu com desaparecimento da febre em lise, leucograma, após 24 h de uso do Quinolônico: 11400, bastões: 1% e segmentados: 91%. No 16° DPO convalescente: Volume 13 - Número 1 - Abril 2001 leucograma normal, Rx demonstrava re-expansão pulmonar e sem febre, há 5 dias. Alta para casa, em uso de Ciprofloxacina via oral por mais 5 dias. Revisão após 30 dias da cirurgia, bom estado geral, sem anormalidades, inclusive Rx de tórax normal. DISCUSSÃO O traumatismo cardíaco relacionado a contusão torácica é uma condição de expressão clinica variada cujo diagnóstico depende de um alto grau de suspeição clínica a da busca sistemática do comprometimento cardíaco em todo paciente vítima de trauma torácico grave 1. Ao contrário das lesões cardíacas por trauma penetrante, cuja manifestações iniciais de instabilidade hemodinâmica são dramáticas, as alterações decorrentes dos traumatismos fechados sobre o coração podem ser sutis inicialmente ou mascaradas por várias alterações comuns aos pacientes politraumatizados1,2. Em decorrência da falha em se estabelecer critérios para o diagnóstico, as estimativas da incidência de contusão cardíaca são precárias, podendo variar, após trauma torácico, de menos de 10% a 76%10,11. No trauma torácico fechado o coração poderá ser atingido por vários mecanismos de transmissão de energia, sendo o mais comum o impacto através do precórdio sobre o coração, porém este poderá ser comprimido entre o esterno e a coluna vertebral, ser lacerado por um fragmento de costela fraturada, ser lesado por desaceleração ou pela transmissão de alta pressão a partir da veia cava inferior nos casos de trauma abdominal1. As lesões secundárias a contu- RELATO DE CASO são cardíaca podem variar desde lesões miocárdicas assintomáticas a grave ruptura cardíaca 1,2. Na avaliação dos pacientes com trauma torácico grave, deve ser sempre considerada a possibilidade de lesão cardíaca, particularmente estando presentes sinais da transmissão de alta carga de energia, tais como: fratura de esterno, fratura de várias costelas a sinal do cinto de segurança sobre o precórdio 1. Havendo a suspeita de contusão cardíaca devem ser realizados, nos pacientes estáveis: ECG, dosagem de Troponina cardíaca ( TnI ou TnT) e ecocardiograma transtorácico 1,2. O ECG, apesar de inespecífico é altamente sensível no diagnóstico de lesão cardíaca, sendo comum os desvios do segmento ST (supra ou infra), inversão de onda T e as arritmias 3,4,5. No paciente em estudo estiveram presentes supradesnivelamento de ST a inversão de onda T. As Troponinas cardíacas elevam-se na contusão miocárdica e pela sua alta especificidade selam o diagnóstico de lesão cardíacas, mesmo nos casos assintomáticos2,6,7. Na era anterior a dosagem de Troponinas cardíacas a dosagem de CKMB (fração MB da creatino cinase) era utilizada no diagnóstico de lesão miocárdica, na atualidade em decorrência de maior especificidade, as Troponinas ocuparam o lugar da dosagem de CKMB. Estando presentes alterações eletrocadiográficas e/ou elevação de Troponina cardíaca, mesmo nos pacientes estáveis, está indicada a observação em serviço de terapia intensiva, com monitorização do ritmo cardíaco, até a normalização daqueles parâmetros 7. A principal utilização do ecocardiograma transtorácico na con- 45 RELATO DE CASO tusão cardíaca, é a procura, nos pacientes estáveis, de lesões com potencial de complicação, suspeitadas pelas alterações ao ECG a elevação de Troponina 8,9. Os pacientes que chegarem a emergência em parada cardíaca ou na eminência de parada cardíaca, com sinais de contusão torácica, deverão ser imediatamente toracotomizados na emergência, através de incisão inframamária esquerda, seguindo o 5° espaço intercostal, para imediata massagem cardíaca e reparo de provável laceração miocárdica 1. Quando o quadro de deteriorização hemodinâmica é menos dramático, a exemplo de sangramento intratorácico progressivo durante a admissão associado ou não a sinais de tamponamento cardíaco, a toracotomia poderá ser realizada no centro cirúrgico e de preferência através de uma esternotomia 1. No paciente em estudo a deteriorização hemodinâmica foi de evolução lenta e progressiva, decorrente do efeito oclusivo do pericárdio, tal fato possibilitou que a miocardiorrafia fosse realizada com êxito cerca de 13 horas após o trauma. Ficou claro no caso apresentado a importância do acompanhamento em UTI de pacientes que foram vítimas de traumatismo grave, os quais por sofrerem comprometimento de órgãos a sistemas vitais, necessitam de observação intensiva para o diagnóstico rápido e a in- 46 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva tervenção adequada frente a graves descompensações orgânicas. Nos pacientes submetidos a drenagem de hemotórax traumático, a constatação de sangramento torácico progressivo com instabilidade hemodinâmica é indicação formal de toracotomia de urgência, uma vez que tal situação denota a presença de lesão visceral grave somente reparável através de cirurgia 11. Em conclusão, o diagnóstico de contusão cardíaca, habitualmente não é evidente à admissão do paciente, todavia sinais de traumatismo torácico que denotem a transmissão de alta carga de energia devem suscitar a pesquisa de lesão cardíaca, ressaltando-se que aqueles pacientes em parada cardíaca e contusão torácica está indicada a toracotomia imediata na emergência. RESUMO A contusão cardíaca é uma entidade clínica, cujo diagnóstico necessita de um alto grau de suspeição a de sistematização, uma vez que possui apresentação clínica variada, cujo espectro é de lesões miocárdicas assintomáticas à ruptura cardíaca com indicação para toracotomia na emergência. O autor apresenta um caso de Contusão Cardíaca, diagnosticado e tratado na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital HGU, em Petrolina - PE. Unitermos: contusão cardíaca; trauma cardíaco; contusão torácica REFERÊNCIAS 1. Sava Jack, Demetriades Demetrios. Penetrating and blunt cardiac trauma: Diagnosis and management. Emergency Medicine 2000; 12 (2): 95-102 2. Foil MB, Mackersie RC, Furst SR et al. The asymptomatic patient with suspected myocardial contusion. Am. J. Surg. 1990; 160: 63 8-43 . 3. Illig KA, Swierzewski MJ, Feliciano DV, Morton JH. A rational screening and trea tment strategy based on electrocardiogram alone for suspected cardiac contusion. Am. J. Surg. 1991; 162: 537-43. 4. Hossack KF, Moreno CA, Vanway CW et al. Frequency of cardiac contusion in nonpenetrating chest injury. Am. J. Cardiol. 1998; 61: 391-4. 5. Potkin RY, Werner JA, Trobaugh GB et al. Evaluation of noninvasive tests of cardiac damage in suspected cardiac contusion. Circulation 1982; 66: 627-31. 6. Leinoff HD. Direct nonpenetrating injuries of the heart. Ann. Intern. Med. 1940; 14: 653-65. 7. Newman PG, Feliciano DV. Blunt cardiac injury. New Horizons 1999; 7: 26-34. 8. Frazee RC, Mucha P, Farnell MB et al. Objective evaluation of blunt cardiac trauma. J. Trauma 1986; 26: 510-20. 9. Karalis DG, Victor MF, Davis GA et al. The role of echocardiography in blunt chest trauma: A transthoracic and transoesophageal echocardiographic study. J . Trauma 1994; 36: 53-8. 10. Michalodimitrakis EN, Tsatsakis AM. Vehicular accidents and cardiac concussion: A traumatic connection. Am. J. Forensic Med. Pathol. 1997; 18: 282-4. 11. American College of Surgeons Committee on Trauma. Thoracic Trauma. Advanced Trauma Life Support for Doctors (ATLS). 1997: 153. Volume 13 - Número 1 - Abril 2001