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ISSN 2236-0468 Fundação Educacional Guaçuana – FEG Presidente – Marcos Antonio Faculdade Municipal Prof. Franco Montoro - FMPFM Diretor Geral – Prof. Dr. Estéfano Vizconde Veraszto Vice-Diretor – Prof. Dr. Odail Pagliardi Coordenador Geral – Prof. Me. Fabiano Correa da Silva Secretária Geral – Profa. Kátia Elaine da Silva Coordenador do Curso de Administração – Prof. Dr. José Celso Sobreiro Dias Coordenador do Curso de Ciências da Computação – Prof. Dr. José Tarcísio Franco de Camargo Coordenador do Curso de Engenharia Ambiental – Prof. Dr. Alexandro Batista Ricci Coordenador do Curso de Engenharia Química – Prof. Dr. Paulo Roberto Alves Pereira Coordenadora do Curso de Nutrição – Profa. Daniela Soares de Oliveira Coordenadora do Curso de Psicologia – Profa. Me. Flávia Urbini dos Santos Editores: Profa. Dra. Maria Suzett Biembegut Santade Prof. Dr. Moacyr Rodrigo Hoedmaker de Almeida Conselho Editorial Profa. Dra. Ana Olivia Barufi Franco de Magalhães Prof. Dr. Antonio Medina Rivilla – Universidad Nacional de Educación a Distáncia (España) Profa. Dra. Daniela Melaré – Universidade Aberta de Lisboa (Portugal) Prof. Dr. Erico Fernando Lopes Pereira-Silva Prof. Dr. Estéfano Vizconde Veraszto Prof. Me. Fabiano Correa da Silva Prof. Dr. Francisco García García – Universidad Complutense de Madrid (España) Prof. Dr. João Alexandre Bortoloti Prof. Dr. Jomar Barros Filho Prof. Dr. José Celso Sobreiro Dias Prof. Dr. José Tarcísio Franco de Camargo Prof. Esp. Luiz Carlos Aceti Junior Profa. Dra. Maria Suzett Biembegut Santade Prof. Dr. Moacyr Rodrigo Hoedmaker de Almeida Prof. Dr. Norian Marranghello - UNESP Prof. Dr. Paulo Roberto Alves Pereira Pareceristas Prof. Dr. Ademilde Silveira Sartori - UDESC Prof. Dr. Antonio Roberto Saad - UNG Profa. Dra. Carolina Del Roveri - UNESP / UNICASTELO Prof. Dr. Claudio Manoel de C. Correia - PUC / UFAM Profa. Dra. 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Vania Lúcia Rodrigues Dutra - UERJ/UFF Profa. Dra. Vera Lucia M. dos Santos Nojima - PUC-RJ Prof. Me. Bruno Brandão Fischer – UCM/Madrid/Espanã Diagramação e Arte Antonio Valdomiro Mucciolo Junior Gilson Anacleto da Mota Guilherme de Oliveira Martins Marco Antonio Ramos Editora FMPFM Impressão e Acabamento Gráfica Azul – Fone: (19) 3549-5010 Tiragem 1.000 exemplares, em 28 de Março de 2011. I49 Interciência e Sociedade. v.1, n.1 (2011). – Mogi Guaçu : Faculdade Municipal Professor Franco FICHA CATALOGRÁFICA Montoro, 2011. Semestral 1. Divulgação científica – Periódicos. 2. Ciência. 3. Cultura. 4. Gestão. 5. Sustentabilidade. 6. Educação. 7. Saúde. 8. Tecnologia. 9. Multidisciplinar CDD-050 ISSN 2236 - 0548 Ficha Catalográfica: Adriano Madaleno Miossi – CRB 8 / nº 6981 Os textos publicados na revista são de inteira responsabilidade de seus autores. Permite-se a reprodução desde que citada a fonte e o autor. Endereço para correspondência e contato: REVISTA INTERCIÊNCIA & SOCIEDADE Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM Rua dos Estudantes, s/nº, Cachoeira de Cima, Caixa Postal 293, CEP: 13843-971 - Mogi Guaçu - SP. Fone: (19) 3861-6255 e 3861-6606 Homepage: www. fmpfm.edu.br e-mail: [email protected] EDITORIAL A revista Interciência & Sociedade nasce como concretização de um trabalho de mais de uma década de desenvolvimento e consolida a qualidade de ensino alcançada pela Faculdade Municipal “Professor Franco Montoro” (FMPFM) nas diversas áreas de atuação de seus cursos. Visa incentivar e promover o desenvolvimento de uma cultura científica na instituição, abordando temas relacionados à Gestão, Planejamento, Sustentabilidade, Educação, Saúde, Tecnologia e áreas afins. Com isso, a meta é abranger plenamente um dos principais objetivos da educação superior: a integração entre ensino, pesquisa e extensão. E mais: é importante que este objetivo una-se à responsabilidade social da FMPFM, utilizando o conhecimento científico em apoio às soluções dos problemas e necessidades da sociedade, auxiliando a formação de profissionais qualificados e com cidadania. A comissão editorial da Revista Interciência & Sociedade agradece a toda comunidade acadêmica e demais pessoas que contribuíram para que esta publicação se tornasse realidade. Abraços, Moacyr Rodrigo H. de Almeida Editor SUMÁRIO ANÁLISE DAS DIFICULDADES E VIABILIDADES PARA A INCLUSÃO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA VISUAL EM AULAS DE TERMOLOGIA CAMARGO, Eder Pires 09 AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL DE FUNCIONÁRIAS DO SERVIÇO DE NUTRIÇÃO DE UM HOSPITAL FILANTRÓPICO GONÇALVES, Juliana Fermino; PIMENTEL, Gustavo Duarte; PEREIRA, Elaine Cristina Leite; MOTA, João Felipe 19 CAPITALISMO E TECNOLOGIAS: implicações para o trabalhador FERREIRA, Simone; SARTORI, Ademilde Silveira 27 CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES ACERCA DO MATERIAL DIDÁTICO UTILIZADO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA MIRANDA, Nonato Assis de; SILVA, Dirceu da 35 CONCESSÃO DE CRÉDITO E MODELAÇÃO DA TOMADA DE DECISÃO SANTADE, Hélio Oliva do Amaral; BIEMBENGUT SANTADE, Maria Suzett 45 CONSTRUÇÃO DE UM CONTROLADOR DIGITAL DE PROCESSOS DINÂMICOS: possibilidades para educação tecnológica CAMARGO, José Tarcísio Franco de; BARROS FILHO, Jomar; BORTOLOTI, João Alexandre; VERASZTO, Estéfano Vizconde; MAIA, Daltamir Justino 57 DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA (DFC): conceitos e estrutura COSTA, Rodrigo Simão da 67 EVOLUÇÃO DO SETOR ELÉTRICO: uma breve reflexão PAGLIARDI, Odail; SOBREIRO DIAS, José Celso 77 INTERATIVIDADE E EDUCAÇÃO: reflexões acerca do potencial educativo das TIC VERASZTO, Estéfano Vizconde; GARCÍA, Francisco García 85 LEITURA, ESCRITA E NOVAS MÍDIAS SILVA, Fabiano Correa da 97 PARTICIPAÇÃO PÚBLICA E PLANEJAMENTO AMBIENTAL: proposta de um modelo para organização do diálogo SCARABELLO FILHO, Sinésio; SANTOS, Rozely F. 103 PLANO DE NEGÓCIOS: o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas SILVA, Kátia Elaine 113 RESERVA LEGAL E APP – ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE: áreas de relevante importância ao município. ACETI JUNIOR, Luiz Carlos 119 REUTILIZAÇÃO DE GARRAFAS PET PARA PRODUÇÃO DE MÓVEIS E DESENVOLVIMENTO SOCIOAMBIENTAL CORRÊA, Rony Felipe Marcelino 129 SISTEMA DE REMEDIAÇÃO POR BOMBEAMENTO E TRATAMENTO EM ÁGUAS SUBTERRÂNEAS CONTAMINADAS PEREIRA, Paulo Roberto Alves; BARRAZA LARIOS, Mario Roberto; SARTORI, Marcelo Vanzella; ALMEIDA, Moacyr Rodrigo Hoedmaker; TOLEDO, Patrícia Caveanha Tavares; COSTA, Ana Caroline 137 SUCESSÃO ECOLÓGICA E O USO DE NITROGÊNIO EM FLORESTAS TROPICAIS PEREIRA-SILVA, Erico F. L.; HARDT, Elisa; JOLY, Carlos A.; AIDAR, Marcos P. M. 149 ANÁLISE DAS DIFICULDADES E VIABILIDADES PARA A INCLUSÃO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA VISUAL EM AULAS DE TERMOLOGIA CAMARGO, Eder Pires Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho (UNESP)” [email protected] RESUMO: O presente artigo encontra-se inserido dentro de um estudo que busca compreender quais são as principais barreiras e alternativas para a inclusão de alunos com deficiência visual no contexto do ensino de física. Apresenta e discute as dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno cego de nascimento em aulas de termologia. Por meio de análise de conteúdo, identifica quatro classes funcionais implicadoras de dificuldades e viabilidades. Como conclusão, enfatiza a importância da criação de ambientes comunicacionais adequados, a função inclusiva do elemento interatividade, bem como, a necessidade da destituição de ambientes segregativos no interior da sala de aula. PALAVRAS-CHAVE: ensino de física, inclusão, deficiência visual, termologia. ABSTRACT: This article is part of a study that seeks to understand what are the main barriers and alternatives for inclusion of students with visual impairments in the context of physics education. Presents and discusses the difficulties and feasibility to include the blind for birth student in thermology’ classes. Through content analysis identifies four classes of functioning implies difficulties and feasibility. In conclusion, emphasizes the importance of creating appropriate communication environments, the inclusive function of element interactivity, as well as the need for dismissal of a segregated environment within the classroom. KEYWORDS: physics education, inclusion, visual impairment, thermology. 1. INTRODUÇÃO O presente artigo relata o panorama das viabilidades e dificuldades para a inclusão de aluno com deficiência visual em aulas de termologia. De acordo com Carvalho e Monte (1995) para incluir os alunos com deficiências no ambiente social da sala de aula, as práticas educacionais devem ser alteradas no sentido da valorização da heterogeneidade humana, o que implica a aceitação individual de todos os alunos levando-se em conta suas condições pessoais. A inclusão posiciona-se de forma contrária aos movimentos de homogeneização e normalização (SASSAKI, 1999). Defende o direito à diferença, a heterogeneidade e a diversidade (RODRIGUES, 2003). Efetiva-se por meio de três princípios gerais, a presença do aluno com deficiência na escola regular, a adequação da mencionada escola às necessidades de to- dos os seus participantes, e a adequação, mediante o fornecimento de condições, do aluno com deficiência ao contexto da sala de aula (SASSAKI, op. cit.). Implica numa relação bilateral de adequação entre ambiente educacional e aluno com deficiência, em que o primeiro gera, mobiliza e direciona as condições para a participação efetiva do segundo (MITTLER, 2003). Na lógica da inclusão, as diferenças individuais são reconhecidas e aceitas e constituem a base para a construção de uma inovadora abordagem pedagógica. Nessa nova abordagem, não há mais lugar para exclusões ou segregações, e todos os alunos, com e sem deficiências participam efetivamente (RODRIGUES, op. cit.). A participação efetiva é entendida em razão da constituição de uma dada atividade escolar que dá ao aluno com deficiência, plenas condições de atuação. A participação efetiva, pode, portanto, servir como parâmetro sobre a ocorrência ou não de inclusão, além de explicitar as reais neInterciência & Sociedade 9 CAMARGO, E. P. cessidades educacionais do aluno com deficiência. Concluir que, incluir alunos com deficiências em aulas de física, química, biologia, matemática, história, língua portuguesa, etc, deve ir além dos princípios gerais indicados, é reconhecer a necessidade do investimento em pesquisas que revelem propriedades ativas das variáveis específicas. A partir do exposto, o presente texto identifica, classifica e analisa algumas das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de física que enfocaram temas de termologia. Para tanto, tomou-se como parâmetro a participação efetiva desse discente nas atividades. A participação efetiva é avaliada em função da relação: discente com deficiência visual/conteúdos conceituais e procedimentais de termologia (COLL apud ZABALA, 1998). Segundo esse autor, os conteúdos de ensino são compreendidos em termos conceituais, procedimentais e atitudinais. Como explica Zabala (op. cit.), os conteúdos conceituais estão relacionados ao conhecimento de fatos, conceitos e princípios, os procedimentais ligados às regras, técnicas, habilidades, e os atitudinais a valores, atitudes, princípios éticos. Em outras palavras, conteúdos conceituais relacionam-se ao saber, os procedimentais ao saber fazer, e os atitudinais ao ser (ZABALA, op. cit.). Em relação aos conteúdos atitudinais, várias pesquisas indicam que a presença do aluno com deficiência em uma classe regular contribui positivamente ao desenvolvimento de valores de caráter colaborativo, de respeito às diferenças, ligados à construção de uma sociedade menos excludente e para a identificação de uma natureza humana heterogenia (CARVALHO E MONTE, 1995). Esse é o motivo pelo qual, no presente texto, as atenções sobre o processo de inclusão estão voltadas à participação efetiva do aluno com deficiência visual naquelas atividades próprias ao ensino de conteúdos conceituais e procedimentais de termologia. Em outras palavras, serão discutidos os problemas reais oriundos da relação docente/discente com defici- 10 ência visual, discentes com e sem deficiência visual, discente com deficiência visual/ conhecimento de termologia, discente com deficiência visual/atividades experimentais, discente com deficiência visual/operações matemáticas, etc. 2. O contexto das atividades Sob a coordenação de um grupo de licenciandos, foram aplicadas quatro atividades de termologia em ambiente educacional que contou com a presença de alunos com e sem deficiência visual. As atividades ocorreram num Colégio Técnico Industrial (CTI). Elas fizeram parte de um curso denominado “O Outro Lado da Física” oferecido pela Licenciatura em Física da UNESP de Bauru em 2005. Inicialmente os licenciandos organizaram um período de divulgação junto aos alunos do CTI. Estudam nesse colégio alunos da cidade e da região de Bauru com idade média de 15 anos. O número de participantes do CTI foi de 35. Entrou-se também em contato com uma Escola Estadual a fim de convidar alunos com deficiência visual para participarem do curso. A Escola escolhida possuía uma sala de recursos pedagógicos. Dois alunos com deficiência visual interessaram-se em participar do curso. Ambos eram cegos; um possuía 15 anos de idade e cursava a 8ª série do ensino fundamental, e o outro possuía 34 anos e cursava a oitava série do EJA. O aluno de 15 anos era cego de nascimento e o de 34 perdera a visão aos vinte e quatro anos. Por questão de espaço, os resultados apresentados enfatizam as viabilidades e dificuldades do aluno que nasceu cego (identificado como aluno B). 3. Metodologia de análise e técnica para a coleta dos dados Adotando os procedimentos: exploração do material; tratamento dos resultados e interpretação (BARDIN, 1977), foram identificadas dificuldades e viabilidades de inclusão do aluno (B). No processo de exploração, realizou-se a fragmentação do material de análise. Para tal, foram selecionados trechos que continham a mesma viabilidade ou dificuldade. Após a fragmenInterciência & Sociedade Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de termologia tação, as dificuldades e viabilidades foram agrupadas de acordo com a classe que as caracterizam. Como decorrências foram identificadas quatro classes de dificuldades e viabilidades de inclusão. (a) Dificuldades: comunicação, segregação, operação matemática e experimento. (b) Viabilidades: comunicação, hipótese, experimento e modelos (ver quadro 1). Quadro 1. Panorama de dificuldades e viabilidades de inclusão para o aluno cego de nascimento. Classe/dificuldade/ inclusão Quantid. Porcent. Classe/viabilidade/inclusão Quantid. Porcent. Comunicação 73 83,9% Comunicação 368 89,7% Segregação 10 11,5% Segregação 0 0 Operação matemática 3 3,4% Operação matemática 0 0 Experimento 1 1,1% Experimento 12 2,9% 0 0 23 5,6% 0 0 7 1,7% 87 100% 410 100% Apresentação de hipótese Apresentação de modelos Total vertical Fonte: elaborado pelo autor. O quadro 1 mostra que as classes: comunicação e experimento foram comuns às dificuldades e viabilidades. As classes: segregação e operação matemática representaram somente dificuldade. As classes: hipótese e modelo representaram apenas viabilidade. O entendimento dos fatores determinantes para a condição de dificuldade e/ou viabilidade será feito em função da explicitação do perfil lingüístico utilizado pelos licenciandos (categoria linguagem), bem como, do contexto em que a veiculação de significados ocorreu (categoria momento). 4. Categorias para a análise dos dados 4.1. Categoria 1: Linguagem Objetiva compreender se as informações veiculadas pelos licenciandos foram acessíveis ao aluno com deficiência visual. A acessibilidade será avaliada em razão das estruturas empírica e semântico-sensorial das linguagens. Estrutura Empírica: refere-se ao suporte material da linguagem (MARTINO, 2005), isto é, a forma por meio da qual uma determinada informação é materializada, armazenada, veiculada e percebida. Pode-se organizar em termos fundamentais e Apresentação de hipótese Apresentação de modelos Total vertical mistos. As estruturas fundamentais são constituídas pelos códigos visual, auditivo e tátil articulados de forma autônoma e/ou independente uns dos outros. As estruturas mistas surgem quando os códigos fundamentais se combinam de forma interdependente, ou seja, estruturas áudio-visual, tátil-visual, etc. Estrutura Semântico-sensorial: refere-se aos efeitos produzidos pelas percepções sensoriais no significado de fenômenos (DIMBLERY & BURTON, 1990). Esses efeitos são entendidos por meio de quatro referenciais associativos entre significado e percepção sensorial: significados indissociáveis são aqueles cuja representação mental é dependente de determinada percepção sensorial. Nunca poderão ser representados internamente por meio de percepções sensoriais distintas da que os constituem; significados vinculados são aqueles cuja representação mental não é exclusivamente dependente da percepção sensorial utilizada para seu registro. Sempre poderão ser representados por meio de percepções sensoriais distintas da inicial; significados sensorialmente não relacionáveis: não possuem vínculo ou associação com qualquer percepção sensorial. Embora o aprendiz possa construir representações Interciência & Sociedade 11 CAMARGO, E. P. mentais sensoriais acerca de idéias com a presente característica, as mesmas nunca corresponderão de fato aos fenômenos/conceitos que se visam comunicar; significados de relacionabilidade sensorial secundária: são aqueles cuja compreensão estabelece com o elemento sensorial uma relação não prioritária. Embora ocorram construções de representações mentais sensoriais por parte do aprendiz, as mesmas não representam pré-requisito à compreensão do fenômeno/conceito abordado. A idéia de representação utilizada nesta categoria de análise é aquela contida em EISENCK & KEANE (1991). Segundo os autores (op. cit. p. 202) representação é “qualquer notação, signo ou conjunto de símbolos capaz de representar, mesmo na ausência do representado, algum aspecto do mundo externo ou de nossa imaginação”. De forma mais específica, a presente categoria fundamenta-se no conceito de “representações internas” ou “representações mentais”, que ocorrem no nível subjetivo da cognição, do pensamento. Em outras palavras, tais representações referem-se às formas em que codificamos características, propriedades, imagens, sensações, etc, de um objeto percebido ou imaginado, bem como, de um conceito abstrato (EISENCK & KEANE, 1991, p. 202). A caracterização das linguagens obedeceu à relação: linguagem = (estrutura empírica) + (estrutura semântico-sensorial). A avaliação de uma viabilidade ou dificuldade comunicacional levou em conta o fato de uma dada linguagem ter ou não tornado acessível ao aluno cego de nascimento os significados de termologia por ela veiculados. 4.2. Categoria 2: Contexto Refere-se a duas características inerentes à presença do aluno com deficiência visual nas atividades: (a) espaço instrucional que contemplou a presença do aluno cego; e (b) nível de interatividade desse espaço. Espaço instrucional: episódio e episódios particulares Episódios: referem-se a espaços instrucionais comuns aos alunos com e sem 12 deficiência visual, isto é, momentos em que todos os discentes envolveram-se nas mesmas tarefas coordenadas pelos licenciandos. Uma característica fundamental dos episódios é a não diferenciação de conteúdos, estratégia metodológica e recurso instrucional para aluno com e sem deficiência visual. Episódios particulares: dizem respeito aos espaços instrucionais que contaram apenas com a participação do aluno cego, ou seja, ocorreram de forma separada e simultânea à aula dos alunos videntes. Uma característica central desses episódios é a diferenciação dos recursos instrucionais utilizados, das estratégias metodológicas empregadas e do conteúdo ou de sua abordagem. Nível de interatividade: discurso interativo e discurso não-interativo: segundo Mortimer e Scott (2002) a diferenciação entre os discursos interativo e não-interativo se dá pela identificação do número de “vozes” que participam de uma determinada relação discursiva. Discurso interativo: ocorre com a participação de mais de uma pessoa. Discurso não-interativo: ocorre com a participação de única pessoa. O contexto é definido pela relação: (espaço instrucional) + (nível de interatividade). 5. Análise dos dados 5.1. Classes que representam dificuldade e viabilidade à inclusão do aluno com deficiência visual Dificuldade de comunicação: foram identificados 73 momentos comuns a todos os alunos em que ocorreram essas dificuldades. Elas foram agrupadas em função de 8 linguagens: (1) áudio-visual interdependente/significado vinculado às representações visuais (80,8%), (2) fundamental auditiva/ significado vinculado às representações visuais (6,8%), (3) fundamental auditiva/ significado indissociável de representações visuais (4,1%), (4) auditiva e visual independentes/significado vinculado às representações visuais: (2,7%), (5) tátil-auditiva interdependente/significado indissociável de Interciência & Sociedade Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de termologia representações visuais (1,3%), (6) auditiva e visual independentes/significado indissociável de representações visuais (1,3%), (7) áudio-visual interdependente/significado de relacionabilidade sensorial secundária (1,3%) e (8) áudio-visual interdependente/ significado indissociável de representações visuais (1,3%). Exemplos dos significados geradores de dificuldades: (1) vinculados às representações visuais: transformação de escalas termométricas, dilatação térmica nos líquidos e sólidos, relação matemática entre trabalho, calor e energia interna, etc; (2) indissociáveis de representações visuais: luz solar e fumaça, relação entre radiação e luz, relação entre aquecimento e emissão de luz, cor das chamas; (3) de relacionabilidade sensorial secundária: nomes de escalas termométricas, datas de determinado acontecimento histórico, informações gerais. Características marcantes das linguagens: (a) presença majoritária de dificuldades relacionadas à estrutura empírica áudio-visual interdependente; (b) presença majoritária de dificuldades relacionadas aos significados vinculados às representações visuais; (c) presença majoritária de dificuldades nos episódios não-interativos; (d) foram verificadas, de forma majoritária, dificuldades provenientes da relação: não-interatividade/linguagem de estrutura empírica áudio-visual interdependente; (e) significados indissociáveis de representações visuais e de relacionabilidade sensorial secundária participaram de forma minoritária do conjunto de dificuldades; (f) em episódios particulares não foram verificadas dificuldades; (g) a interatividade mostrou-se fator minoritário de dificuldades; (h) foram verificadas, de forma minoritária, dificuldades provenientes da relação: interatividade/ linguagens de estruturas empíricas fundamental auditiva e auditiva e visual independentes. Viabilidade de comunicação: foram identificados 368 momentos em que ocorreram viabilidades de comunicação (entre episódios e episódios particulares). Elas foram agrupadas em função de 10 linguagens: (1) fundamental auditiva/significado indissociável de representações não-visuais (44,0%), (2) fundamental auditiva/significa- do vinculado às representações não-visuais (14,9%), (3) auditiva e visual independentes/significado indissociável de representações não-visuais (9,2%), (4) auditiva e visual independentes/significado vinculado às representações não-visuais (7,0%), (5) tátil-auditiva interdependente/significado vinculado às representações não-visuais (6,2%), (6) fundamental auditiva/significado de relacionabilidade sensorial secundária (5,4%), (7) fundamental auditiva/significado sem relação sensorial (4,6%), (8) auditiva e visual independentes/significado de relacionabilidade sensorial secundária (3,5%), (9) tátil-auditiva interdependente/significado indissociável de representações não-visuais (3,2%) e (10) auditiva e visual independentes/significado sem relação sensorial (1,6%). Exemplos dos significados geradores de viabilidades: (1) indissociáveis de representações não-visuais: idéia de quente, frio, sensação térmica, calor, etc; (2) vinculados às representações não-visuais: idéia de temperatura como nível de agitação das moléculas, calor como onda eletromagnética (referente à geometria da onda), etc; (3) sensorialmente não relacionáveis: idéia de calor como energia em trânsito entre corpos de diferente temperatura, relação entre temperatura e energia interna, etc; (4) significados de relacionabilidade sensorial secundária. Exemplos de tais significados foram apresentados anteriormente. Características marcantes das linguagens: (a) predominância de viabilidades nos contextos comunicacionais comuns a todos os discentes; (b) predominância de viabilidades nos contextos comunicacionais interativos; (c) predominância de viabilidades relacionadas ao emprego de linguagens de estrutura empírica fundamental auditiva; (d) linguagens de estruturas empíricas auditiva e visual independentes e tátil-auditiva interdependentes foram identificadas de forma minoritária; (e) predominância de viabilidades relacionadas à veiculação de significados indissociáveis de representações não-visuais; (f) ocorrência significativa da relação viabilidade/significado vinculado às representações não-visuais; (g) ocorrência minoritária de viabilidades relacionadas à veiculação dos significados de relacionabiInterciência & Sociedade 13 CAMARGO, E. P. lidade sensorial secundária e sem relação sensorial; (h) os episódios comuns a todos os alunos proporcionaram condições para a utilização de linguagens de estrutura empírica tátil-auditiva interdependente; (i) não ocorrência da relação: viabilidade/estrutura empírica áudio-visual interdependente. Dificuldade experimento: foi identificada em uma ocasião. Refere-se à não participação efetiva do aluno cego em atividade experimental. Esse tipo de dificuldade esteve ligada à realização de experimento demonstrativo, em episódios não-interativos e com o emprego de linguagem áudio-visual interdependente/significado vinculado às representações visuais. O experimento realizado enfocou o estudo dos gases (experimento 1). Inicialmente, o licenciando apresentou os equipamentos experimentais à frente da sala, em seguida, realizou experimento demonstrativo sobre a dilatação dos gases. Foram utilizados os seguintes equipamentos experimentais: Erlenmeyer, borrachas de conexão, bacia, gelo, copo e detergente. Viabilidade experimento: foi identificada em 12 ocasiões. Refere-se à participação efetiva do aluno com deficiência visual em atividades experimentais. Esse tipo de viabilidade esteve ligada à realização de experimentos participativos, em episódios interativos e com o emprego de linguagens de estruturas empíricas tátil-auditiva interdependente e fundamental auditiva. Os experimentos realizados foram os seguintes: (2) diferença entre calor e temperatura, (3) relação entre calor, temperatura e massa, (4)equilíbrio térmico, (5) transferência de calor por condução, (6 e 7) transferência de calor por convecção, (8) transferência de calor por radiação, (9) dilatação linear dos sólidos, (10) dilatação térmica dos líquidos, (11) dilatação térmica dos gases, (12 e 13) dilatação superficial dos sólidos. 5.2. Classes que representam dificuldade ou viabilidade à inclusão do aluno com deficiência visual Dificuldade segregação: foi identificada em 10 ocasiões: diz respeito à criação, no interior da sala de aula, de ambientes segregativos de ensino. Esses ambientes con- 14 taram com a participação apenas do aluno com deficiência visual e de um licenciando colaborador. Os referidos ambientes foram constituídos devido às dificuldades oriundas da aula principal. Ocorreram prioritariamente durante episódios não-interativos e com o emprego de linguagem áudio-visual interdependente. Nos ambientes segregativos, temas discutidos durante a aula principal diferenciaram-se daqueles trabalhados por todos os alunos. Em tais ambientes, os diálogos ocorreram em voz baixa, o que explicita sua característica de “incômodo” à aula principal. Dificuldade operação matemática: foi identificada em 3 ocasiões. Refere-se à não participação efetiva do aluno com deficiência visual em atividades que envolveram a efetuação de cálculos. Essas atividades foram realizadas em episódios não-interativos e com o emprego de linguagem áudio-visual interdependente/significado vinculado às representações visuais. Fundamenta-se na relação triádica caracterizadora das operações matemáticas, ou seja, simultaneidade entre raciocínio, registro do cálculo e sua observação. Os cálculos que representaram dificuldades foram os seguintes: equação do trabalho termodinâmico, rendimento de máquinas térmicas e relação entre calor e temperatura no ciclo de Carnot. Viabilidade apresentação de hipótese: foi verificada em 23 ocasiões. Sua ocorrência esteve relacionada a episódios interativos e ao emprego de linguagens de estrutura empírica fundamental auditiva. Como nesses ambientes os alunos com e sem deficiência visual alternaram a função de interlocutor, o discente cego teve condições de expressar-se. Essa viabilidade refere-se a situações em que o discente apresentou relações de causa e efeito para um determinado fenômeno. Essas hipóteses foram as seguintes: (1) explicação para sensação térmica ao sair da piscina, (2) explicação para a variação da temperatura da água, (3, 4) explicação para a variação de temperatura em vasilhas cheia e pela metade de água, (5, 6) explicação para a evaporação da água, (7) explicação para o que ocorrerá com a água aquecida na latinha e na vasilha plástica, (8) explicação para o Interciência & Sociedade Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de termologia esfriamento da água na latinha e o aquecimento da água na vasilha plástica, (9) explicação do derretimento da parafina no fio aquecido, (10) explicação para o movimento do cata-vento próximo à chama, (11) explicação para o movimento ascendente da gota de leite aquecida, (12) explicação para a diferença de temperatura nas regiões laterais e acima da vela, (13, 14 ) explicação para a dilatação do prego aquecido, (15) explicação para a relação dilatação/aquecimento, (16) previsão para o que vai ocorrer com um prego após sua temperatura diminuir, (17) (explicação para o que ocorrerá com o prego colocado numa chapa metálica aquecida, (18) explicação para o que ocorrerá com esfera de metal após ser aquecida, (19) explicação para a dilatação do gás dentro de uma bexiga, (20) explicação para a dilatação nos sólidos, (21, 22 ) explicação sobre pressão atmosférica, (23) explicação para a relação pressão/profundidade. Viabilidade apresentação de modelos: foi identificada em 7 ocasiões. Refere-se à apresentação de modelos explicativos de fenômenos de termologia. Ocorreu em episódios interativos e com o emprego de linguagens de estrutura empírica fundamental auditiva. Os modelos apresentados foram os seguintes: (1) modelo para a troca de calor, (2) modelo para a transferência de calor por radiação, (3) modelo de dilatação dos sólidos, (4) modelo de dilatação dos gases, (5, 6, 7) modelo para pressão. Em síntese, são apresentados os quadros 2 e 3 . Esses quadros explicitam as classes de dificuldades e viabilidades, bem como, suas características intrínsecas marcantes. Quadro 2. Classes e características intrínsecas das dificuldades de inclusão. Classe/dificuldade/ inclusão Comunicação Estrutura empírica predominante Áudio-visual interdependente Estrutura semântico-sensorial pre- Contexto predodominante minante Significados vinculados às representações visuais Episódios não-interativos Segregação Áudio-visual interdependente Significados vinculados às representações visuais Episódios não interativos Experimento Áudio-visual interdependente Significados vinculados às representações visuais Episódios não-interativos Operação mateÁudio-visual mática interdependente Fonte: elaborado pelo autor. Significados vinculados às representações visuais Episódios não-interativos Quadro 3. Classes e características intrínsecas das viabilidades de inclusão. Natureza/viabilidade/inclusão Comunicação Experimento Apresentação de hipótese Apresentação de modelo Estrutura empírica predominante Fundamental auditiva. Fundamental auditiva e Tátil-auditiva interdependente Fundamental auditiva Fundamental auditiva Contexto meEstrutura semântico-sensorial todológico prepredominante dominante Significados indissociáveis de Episódios interepresentações não-visuais. rativos Significados indissociáveis de Episódios interepresentações não-visuais rativos Significado indissociável de representações não visuais Significado indissociável de representações não-visuais Episódios interativos Episódios interativos Fonte: elaborado pelo autor. Interciência & Sociedade 15 CAMARGO, E. P. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com as análises, foram identificadas 4 classes de dificuldades de inclusão. A classe “comunicação” (83,9%) esteve relacionada majoritariamente a episódios não-interativos comuns a todos os alunos. Centrou-se na veiculação, por meio de linguagem de estrutura empírica áudio-visual interdependente, dos significados vinculados às representações visuais. A dificuldade “segregação” (11,5%) esteve diretamente relacionada à criação, no interior da sala de aula, de episódios particulares que contaram apenas com a participação do discente com deficiência visual. Nesses episódios os temas trabalhados eram distintos dos abordados na aula principal, que não previa atendimentos particularizados. Sobre a dificuldade “operação matemática” (3,4%) cabem os seguintes comentários. Docentes de física dificilmente sabem como lidar com esse tipo de situação. O problema envolve a relação triádica raciocínio/registro/ observação dos cálculos. Como o deficiente visual não observa simultaneamente o que escreve, a relação é destituída. É preciso o investimento no desenvolvimento de materiais que proporcionem condições para que este discente, de forma simultânea, registre, observe aquilo que registra e raciocine. Já os experimentos que representaram dificuldade à inclusão de (B) (1,1%) foram os visualmente demonstrativos e observáveis. Durante a realização de tais experimentos, não foram verificadas as interações discentes com e sem deficiência visual e discente com deficiência visual/licenciando. As viabilidades de inclusão também se ligaram a 4 classes funcionais. Comunicação (89,7%), apresentação de hipótese (5,6%), experimento (2,9%) e apresentação de modelo (1,7%). Essas viabilidades ocorreram majoritariamente em episódios interativos e com a utilização de linguagem fundamental auditiva/significado indissociável de representações não-visuais. Em outras palavras, as condições favoráveis à inclusão foram verificadas em contextos interativos comuns a todos os discentes e ao emprego de linguagem auditiva que veiculou significados não-visuais. A partir dos padrões de viabilida- 16 des e dificuldades expostos, apresentam-se 4 recomendações para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de termologia: (1) destituição da estrutura empírica áudio-visual interdependente caracterizadora de boa parte das linguagens empregadas em sala de aula; (2) criação de material instrucional de interface visual e não-visual (registros visuais e não-visuais sobrepostos); (3) interação entre discentes com e sem deficiência visual, utilizando os materiais de interfaces visuais e não-visuais; (4) reconhecer e explorar as potencialidades comunicacionais das linguagens fundamental auditiva, auditiva e visual independentes e tátil-auditiva interdependente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. CARVALHO, E. N. S.; MONTE, F. R. F. A educação inclusiva de portadores de deficiências em escolas públicas do DF. Temas em Educação Especial III, São Paulo, ed. Universidade de São Carlos, 1995. 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Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 5ª edição, Rio de Janeiro: WVA editora, 1999. ZABALA, A. A prática Educativa: como ensinar. Porto Alegre, Artmed Editora S.A., 1998. Interciência & Sociedade Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de termologia Éder Pires de Camargo é Físico pela Universidade Estadual Paulista, Campus de Bauru/Sp, Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é Professor Doutor do Departamento de Física e Química da Faculdade de Engenharia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, campus Ilha Solteira – SP-, e Programa de Pós-graduação em Educação para a Ciência (Área de Concentração: Ensino de Ciências) da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Bauru/São Paulo/Brasil. Interciência & Sociedade 17 18 Interciência & Sociedade AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL DE FUNCIONÁRIAS DO SERVIÇO DE NUTRIÇÃO DE UM HOSPITAL FILANTRÓPICO GONÇALVES, Juliana Fermino Universidade São Francisco (USF) PIMENTEL, Gustavo Duarte Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) PEREIRA, Elaine Cristina Leite Universidade Paulista (UNIP) [email protected] MOTA, João Felipe Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Universidade São Francisco (USF) [email protected] RESUMO: Os objetivos do presente trabalho foram avaliar o consumo alimentar e o estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição e dietética de um hospital filantrópico de Bragança Paulista/SP. Metodologia: A amostra foi composta por 31 mulheres (42,8 ± 11,2 anos). A composição corporal foi determinada por meio da medida de circunferências, peso e estatura. Os dados nutricionais foram coletados através de questionário de freqüência alimentar (QFA). Foi aferida a pressão arterial seguindo as Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial. Os testes utilizados para determinar diferenças nas variáveis com o estado nutricional foram ANOVA/MANOVA, seguido por Spearman para analisar as associações entre a circunferência da cintura e a QFA. Adotando como significância p<0,05. Resultados: As voluntárias mostraram-se com excesso de peso e com circunferência da cintura e do quadril aumentada. Em relação aos hábitos alimentares, foram observadas baixa ingestão de leite e derivados, cereais integrais e fibras alimentares. Conclusão: Os resultados do presente estudo sugerem a necessidade de mudança do estilo de vida neste grupo populacional, visando prevenção de doenças crônicas não transmissíveis e melhora na qualidade de vida. PALAVRAS-CHAVE: Consumo alimentar, Estado Nutricional, Sobrepeso, Hipertensão, Qualidade de vida. ABSTRACT: The aim of this study were to evaluate the dietary intake and nutritional status of employees of nutrition and dietetics service of a philanthropic hospital in Bragança Paulista/SP. Methods: The sample comprised 31 women (42,8 ± 11,2 years old). Body composition was determined through of measurement of circumference, weight and height. Dietary data were obtained through dietetic frequency questionnaire (DFQ). Blood pressure measurement was made following the recommendations of Brazilian Guidelines on Hypertension. ANOVA/MANOVA was used to determine differences in variables with the nutritional status and Spearman was used to analyse the association between waist circumference and the DFQ. Adopting as significant p<0.05. Results: The volunteers showed up overweight and waist and hip circumference increased. In relation to dietary habits were observed low intake of dairy products, whole grains and dietary fiber. Conclusions: The results of this study suggest the need for a change of lifestyle in this population, aimed at prevention of chronic diseases and improved quality of life. KEYWORDS: Food Consumption, Nutritional Status, Overweight, Hypertension, Quality of Life. Interciência & Sociedade 19 GONÇALVES, J. F.; PIMENTEL, G. D.; PEREIRA, E. C. L.; MOTA, J. F. 1. INTRODUÇÃO Em decorrência da transição nutricional e tecnológica o número de indivíduos acima do peso não para de aumentar, sendo que na população adulta brasileira os índices superam 50% (IBGE, 2010), fazendo com que haja maior preocupação com as doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão, obesidade e diabetes. Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) demonstram que as doenças crônicas não transmissíveis são responsáveis por 58,5% dos óbitos e por 45,9% das morbidades em todo o globo (MONTEIRO, 2005). Outros estudos também mostram que as doenças crônicas não transmissíveis são caracterizadas por longo período de latência, com evolução da doença, que podem levar o indivíduo a incapacidades e até ao óbito (MARIATH et al., 2007). O elevado número de indivíduos obesos constitui problema de relevância para saúde pública por estar associada direta ou indiretamente com o aumento da incidência das doenças crônicas não transmissíveis e redução da expectativa de vida (OLIVEIRA et al., 2006). Paralelo a isto, sabe-se que os indivíduos obesos apresentam maior relação síntese/oxidação de ácidos graxos intramuscular, o que evidencia ainda mais o desenvolvimento das doenças crônicas não transmissíveis (BERGGREN et al., 2004). Assim, é importante avaliar as reservas corporais especificamente, o acúmulo de gordura na região abdominal, que é considerado fator de risco grave para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis, sendo associados também à hipertensão arterial, dislipidemias, diabetes melittus tipo 2 e aceleração do processo de aterosclerose (MARTINS & MARINHO, 2003; OLINTO et al., 2006; MARIATH, 2007). Outro fator envolvido com o desenvolvimento das doenças crônicas não transmissíveis e relacionado com o estado nutricional é a ingestão alimentar inadequada. Segundo VALERO (2004), o método mais utilizado para avaliação do consumo alimentar é o questionário de freqüência de 20 consumo alimentar (QFCA). MONTEIRO (2000), afirma que a “dieta ocidental”, ou seja, rica em gorduras (principalmente de origem animal), açúcar e alimentos refinados, com redução de carboidratos complexos e fibras alimentares está associada concomitantemente com o aumento da obesidade. Assim sendo, o objetivo deste trabalho foi avaliar o consumo alimentar e o estado nutricional de um grupo de funcionárias do Serviço de Nutrição e Dietética de um Hospital Filantrópico do Município de Bragança Paulista/SP. 2. Metodologia O estudo foi do tipo transversal descritivo. Participaram do estudo 31 funcionárias do sexo feminino do Serviço de Nutrição e Dietética de um Hospital filantrópico de Bragança Paulista/SP. Todas as voluntárias receberam orientações sobre as avaliações a que foram submetidos e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco. 2.1. Avaliação antropométrica Para avaliação do peso corporal e estatura foi realizada utilizando balança antropométrica tipo plataforma (Filizola®, Brasil, com precisão de 0,1 kg para peso e 0,1 cm para estatura). Para esta avaliação, as voluntárias foram orientadas a usar roupas leves e estar sem sapatos. Na avaliação da estatura os indivíduos foram posicionados descalços sobre a balança (superfície plana) em ângulo reto com a haste vertical, os calcanhares deveriam estar juntos, tocando a haste vertical do estadiomêtro, a cabeça deve ficar ereta, com os olhos fixos à frente (HEYWARD & STOLARCZYK, 2000). Posteriormente, foi calculado o Índice de Massa Corporal (IMC) de acordo com os critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO, 2002), A circunferência da cintura (CC) foi mensurada com fita milimétrica de metal inextensível e inelástica, com precisão de 0,5 cm. A medida foi realizada no ponto méInterciência & Sociedade Avaliação do estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição de um hospital filantrópico dio entre o último arco intercostal e a crista ilíaca (HEYWARD e STOLARCZYK, 2000). Como valores de referência para CC, foram utilizados os propostos pelo Internacional Diabetes Federation (IDF) (ALBERT, 2005), sendo considerada elevada a CC maior igual que 80 cm para mulheres. Outro indicador antropométrico utilizado para classificação foi à relação cintura-quadril (RCQ). A medida de circunferência de quadril foi realizada na região de maior perímetro do quadril entre a cintura e a coxa (CUPPARI, 2005) e foram considerados como alterados relações acima de 0,85 (OMS, 2002). não ingestão de bebidas alcoólicas e café antes da aferição, sentar-se, ficar em repouso por cinco minutos, para então realizar a aferição da pressão arterial. Foram feitas duas medidas, sendo estabelecida como valor final a média entre elas. Foram consideradas anormais as medidas da pressão arterial acima de 130/85 mmHg, seguindo as normas estabelecidas pelo Terceiro Painel de Tratamento do Adulto (National Cholesterol Education Program’s Adult Treatment Panel III, 2001). 2.2. Avaliação do consumo alimentar 2.4. Análise Estatística O consumo alimentar foi avaliado por meio da aplicação de Questionário de Freqüência Alimentar (QFA). Tal questionário já foi aplicado e validado para população adulta, apresentando similaridades com a população deste estudo (RIBEIRO et al., 2006). Após a aplicação da QFA, alguns alimentos foram agrupados em variáveis representativas de uma dieta de boa ou má qualidade. Além disso, este agrupamento facilitou a análise dos dados, já que os 56 itens alimentares contidos no QFA ficaram divididos em 14 grupos a serem analisados: 1) QFA Leite/derivados integrais; 2) QFA/ Leite/derivados desnatados; 3) QFA Ovos; 4) QFA Carnes; 5) QFA Peixes; 6) QFA Embutidos e enlatados; 7) QFA Óleos vegetais; 8) QFA Gordura animal; 9) QFA Petiscos (pizzas, salgadinhos de pacote, lanches); 10) QFA Cereais integrais (fibras e cereais); 11) QFA Cereais não integrais (pão branco, cereais refinados, tubérculos e raízes); 12) QFA Vegetais e leguminosas; 13) QFA Frutas e sucos naturais e 14) QFA Doces em geral (bolos, sorvetes, chocolates), onde QFA refere-se à freqüência do consumo em número de vezes por semana. Foram empregadas provas estatísticas para análise quanto à simetria. As características gerais dos participantes foram expressas em valores médios e desvios-padrão, mediana e P25-P75. Foi realizada estatística descritiva básica para o cálculo de prevalências. ANOVA/MANOVA foi usado para diferenciação dos grupos, divididos de acordo com estado nutricional e correlações de Spearman, com o intervalo de confiança de 95%, para verificar as associações entre a CC e freqüência de consumo alimentar. Valores de p<0,05 foram considerados estatisticamente diferentes. Todas as análises foram realizadas utilizando o software STATISTICA® for Windows (version 5.1, Statsoft, Tulsa, USA). 2.3. Avaliação da pressão arterial A pressão arterial foi aferida com esfignomanômetro digital da marca BD® por avaliador treinado, seguindo as normas estabelecidas pela IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial (2002). As voluntárias foram orientadas a 3. Resultados Foram avaliadas 31 funcionárias, com idade média de 43 anos. Quanto ao estado nutricional foi verificado que 75% das participantes apresentavam excesso de peso, ou seja, 23% sobrepesos e 52% obesas. A prevalência de adiposidade abdominal foi observada na maioria das funcionárias avaliadas. De acordo com a CC, 77% das funcionárias apresentavam circunferência alterada. A prevalência de hipertensão arterial na amostra estudada foi de 30%. Das funcionárias que apresentaram hipertensão, 9% foram classificadas como eutróficas, 27% sobrepeso e 63% obesidade. Quando associada à CC alterada, 90% Interciência & Sociedade 21 GONÇALVES, J. F.; PIMENTEL, G. D.; PEREIRA, E. C. L.; MOTA, J. F. apresentavam hipertensão. Quando associada às mulheres sobrepeso ou obesas, 91% apresentaram hipertensão. As características gerais da amostra podem ser ob- servadas na Tabela 1. Tabela 1. Caracterização geral da amostra (n=31) *IMC: Índice de Massa Corporal; QFA: Freqüência do consumo em vezes por semana. Após a divisão de acordo com o IMC foi verificado que o grupo classificado como obesas tendeu a relatar menor consumo de leite e derivados integrais (p=0,06), ovos (p=0,07) e gordura animal (p=0,02), além de tender a relatar maior consumo de cereais integrais (p=0,06) e vegetais e leguminosas (p=0,06) (Tabela 2). Tabela 2. Comparação das variáveis alimentares em relação ao Índice de Massa Corporal, dados apresentados em média e desvio-padrão (mediana com semi-amplitude interquartílica), (n=31) 22 Interciência & Sociedade Avaliação do estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição de um hospital filantrópico Tabela 2. Continuação QFA: Freqüência do consumo em vezes por semana. QFA: Questionário de Freqüência Alimentar (vezes por semana). †ANOVA, p<0,05. Na Tabela 3 foram apresentadas as correlações entre a CC e a freqüência de consumo alimentar. Houve correlação negativa entre a CC e QFA gordura animal (r=-0,38, p=0,03) e positiva com QFA vegetais e leguminosas (r=0,38, p=0,03). Tabela 3. Correlações entre a circunferência da cintura e a freqüência de consumo alimentar (n=31). QFA: Questionário de Freqüência Alimentar (vezes por semana); †: correlação linear de Spearman; ns: não significativo. 4. Discussão Com base nos dados antropométricos obtidos, podemos observar alta prevalência de sobrepeso e obesidade (75%) no grupo estudado, refletindo o quadro da transição nutricional. Estudos mostram que a prevalência de sobrepeso e obesidade é cada vez mais preocupante. GIGANTE et al. (1997) constataram, em seu estudo que 21% da população estudada apresentaram obesidade, 40% com sobrepeso e que a prevalência da obesidade mostrou-se mais elevada em mulheres. Já em relação à CC, 77% das mulheres apresentaram esse indicador elevado. Segundo OLINTO et al. (2006), o aumento da obesidade abdominal associado à idade nas mulheres têm sido apontados em vários estudos com a população brasileira. Outro indicador antropométrico que apresentou alta prevalência de alteração foi Interciência & Sociedade 23 GONÇALVES, J. F.; PIMENTEL, G. D.; PEREIRA, E. C. L.; MOTA, J. F. a relação cintura-quadril (58%). A pressão arterial mostrou-se normal na maioria da população estudada (70%). A hipertensão foi observada em 30% da população estudada estando associada somente aos altos valores de CC e IMC, apresentando índices de 90% e 91%, respectivamente. Em estudo realizado por SARNO & MONTEIRO (2007), com homens e mulheres, foi verificada associação positiva entre pressão arterial, CC e IMC. GUS et al. (1998) verificaram que as medidas de CC e RCQ estiveram associadas à hipertensão arterial. A OMS afirma que a associação entre hipertensão e obesidade é bem estudada e documentada. Estudos mostram que as pressões sistólica e diastólica aumentam com a elevação do IMC e que os indivíduos obesos apresentam maior risco de desenvolver a hipertensão quando comparado aos indivíduos magros (STAMLER et al., 1980; STAMLER et al., 1978). A duração da obesidade aumenta o risco de desenvolver a hipertensão, especialmente em mulheres, e a conseqüente perda de peso leva a redução da pressão sangüínea (OMS/WHO, 2003). CARNEIRO et al. (2003), em estudo com predominância de mulheres (432 mulheres e 67 homens), verificou que a maior prevalência de hipertensão arterial estava entre os indivíduos com elevado IMC. Assim, os autores sugeriram que a obesidade apresentou impacto muito mais evidente sobre a hipertensão arterial quando comparado a outros fatores de risco para doenças cardiovasculares, como dislipidemia e intolerância à glicose. Sabe-se que as doenças crônicas também levam a inabilidade física, proporcionando maior absenteísmo, prejuízo na qualidade do serviço prestado e maiores gastos para empresa. Em estudo longitudinal, os pacientes identificados como moderadamente hipertensos foram acompanhados por 10 anos, sendo estabelecida mudança dietética positiva associada à interrupção do tabagismo e aumento da atividade física. Os resultados foram redução do peso corporal e da pressão arterial (STAMLER et al., 1980). Os resultados obtidos pelo QFA no presente estudo podem ter sido subestima- 24 dos, devido à população estudada trabalhar em um Serviço de Nutrição e Dietética e ter noções de como deve ser uma alimentação saudável. Segundo SCAGLIUSI & JUNIOR (2003), subestimações podem ocorrer, se os indivíduos apresentarem maior consciência sobre alimentação. Segundo DRUMMOND et al. (1998), muitos estudos que utilizam diferentes técnicas de inquéritos apresentaram subestimação nos relatos de consumo, tanto em homens como em mulheres, porém essa subestimação é encontrada principalmente em indivíduos obesos e do sexo feminino em sua maioria. No presente estudo, a população é somente do sexo feminino e a subestimação dos dados fica bem descrita quando analisada as correlações estatísticas. Além disso, a CC apresentou correlação negativa com o consumo de alimentos ricos em gordura animal e positiva com o consumo de alimentos como vegetais e leguminosas. Segundo SCAGLIUSI & JUNIOR (2003), a dificuldade em se mensurar o consumo alimentar de forma acurada é uma das limitações para a detecção de associações entre a ingestão alimentar e o risco de desenvolvimento de doenças. O autor ainda afirma que isso acontece devido aos métodos para avaliação da ingestão alimentar dependerem do relato individual. Vários indicadores para a subestimação já foram estudados, porém a obesidade é o que melhor se relaciona com a subestimação alimentar (Taren et al., 1999). SCAGLIUSI & JUNIOR (2003) afirmam que o gênero com tendência à subestimação é em sua maioria do sexo feminino. Ainda existem poucos estudos nacionais disponíveis sobre a avaliação do consumo alimentar da população brasileira (MARCHIONI et al., 2003), o que dificulta a comparação entre os dados deste estudo. Sabemos que o alto consumo de alimentos ricos em gordura animal, doces em geral e baixo consumo de cereais integrais, contribuem para o excesso de peso e de seus indicadores antropométricos como o IMC, a CC e a RCQ. (MONTEIRO, 2000). Conclui-se que o excesso de peso tem alta prevalência no grupo estudado, superando o número de eutróficas. Fator Interciência & Sociedade Avaliação do estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição de um hospital filantrópico preocupante, pois 91% das hipertensas apresentavam IMC acima de 25kg/m2. Ao considerar que estas funcionárias trabalham em estabelecimento de nutrição e dietética, foi observado que os resultados obtidos com os dados do QFA foram subestimados, pois não apresentaram valores de significância entre alimentos envolvidos potencialmente com o aumento do sobrepeso e obesidade. Ao contrário, os indivíduos obesos apresentaram maior consumo de vegetais, leguminosas, cereais integrais e, menor consumo de gordura animal. Acredita-se que isso tenha ocorrido devido às funcionárias trabalharem em um serviço de nutrição e dietética e terem as mínimas noções de como deve ser uma alimentação saudável. Assim sendo, incentivos à mudança do estilo de vida devem ser implementados com o intuito de melhora na qualidade de vida, podendo repercutir em melhor desempenho no trabalho. Sugerimos que esta área de pesquisa seja explorada para se determinar o perfil de saúde de funcionários e traçar estratégias de promoção à saúde no próprio ambiente de trabalho. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBERT, K. G. M. M.; ZIMMET, P.; SHAW, J. The metabolic syndrome-a new worldwide definition. Lancet, 366, p. 1059-1062, 2005. BERGGREN, J. R.; et al. Weight loss and exercise: implications lipid metabolism and insulin action. Med Sci Sports Exerc; 36: 1191-5, 2004 CARNEIRO, G.; et al. Influência da distribuição da gordura corporal sobre a prevalência de hipertensão arterial e outros fatores de risco cardiovascular em indivíduos obesos. Rev Assoc Med Bras, v.49, n.3, p. 306-31, 2003. CUPPARI, L. Nutrição clínica no adulto. 2. ed. Ver. Amp. Manole, Barueri, 2005. DRUMMOND, S. E.; et al. Evidence hat eating frequency is inversely related to body weight status in male, but not female, non-obese adults reporting valid dietary intakes. Int J Obes v.22, p.105112, 1998. 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Juliana Fermino Gonçalves, Nutricionista graduada pela Universidade São Francisco (USF), Bragança Paulista/ SP (2007). Gustavo Duarte Pimentel, Nutricionista pela UNIMEP (2006), especialista em Cuidados Nutricionais do Paciente e do Desportista pela UNESP. Mestrando em Fisiologia da Nutrição da UNIFESP/SP. Elaine Cristina Leite Pereira, Fisioterapeuta pela UFSCar (1997). Doutora em Anatomia pela UNICAMP (2005). Professor titular da Universidade Paulista-Jundiaí/SP. Coordenadora da Especialização em Fisioterapia Esportiva (CEFAI-IBRAMED)-Amparo/SP, Coordenadora Pedagógica do Instituto de Nutrição e Ciências da Saúde (INECS)-Campinas/SP. João Felipe Mota, Nutricionista pela PUC-Campinas (2002), Especialista em Bioquímica Nutricional e Dietética (UNESP) e em Cuidados Nutricionais ao Paciente Desportista (UNESP), Mestre em Patologia (UNESP). Doutorando em Fisiologia da Nutrição (UNIFESP/EPM). Coordenador do Curso de Nutrição da Universidade São Francisco (USF)-Bragança Paulista, Diretor do Instituto de Nutrição e Ciências da Saúde (INECS)-Campinas/SP. 26 Interciência & Sociedade CAPITALISMO E TECNOLOGIAS: implicações para o trabalhador FERREIRA, Simone Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) [email protected] SARTORI, Ademilde Silveira Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) [email protected] RESUMO: O presente trabalho apresenta algumas considerações sobre o capitalismo, as tecnologias e suas implicações para a vida do trabalhador. Discutem-se visões e conceitos sobre o trabalho e sua organização. Além disso, traça-se um panorama sobre as mudanças ocorridas na sociedade e na organização do trabalho quando o capitalismo alia-se às tecnologias. PALAVRAS-CHAVE: Trabalho, Tecnologias, Capitalismo. ABSTRACT: This paper presents some considerations about capitalism, technology and its implications for the lives of workers. We discuss visions and concepts about work and your organization. Also, draw a picture about the changes in society and the organization of work when capitalism joins technologies. KEYWORDS: Labor; Technologies, Capitalism. 1. INTRODUÇÃO A acelerada mudança em todos os níveis da humanidade nos leva a ponderar sobre o fato de que as transformações econômicas, políticas e sociais são irreversíveis e as exigências do mundo moderno trazem conseqüências que nem sempre se pode prever. O trabalho tornou-se central nas nossas vidas, o capitalismo globalizou-se e as tecnologias trouxeram um avanço tecnológico sem igual. Neste sentido, é importante uma análise (ainda que breve) destas questões, por isso, as páginas que seguem tratam do capitalismo, das tecnologias e de suas implicações para a vida do trabalhador na sociedade contemporânea, sem a pretensão de dar respostas para todas as questões levantadas. 2. O trabalho e o trabalhador Nossa vida gira basicamente em torno das nossas relações afetivo-sociais e profissionais. Dentre estas, não é novidade que o trabalho tem grande representatividade, pois nos confere uma identidade social na medida em que somos aquilo que fazemos. Contudo, isto nem sempre foi assim. Benjamin citado por Matos (2008) esclarece que na Grécia antiga o trabalho era reprovado e proscrito; embora fosse executado essencialmente por mãos escravas, era condenado principalmente por revelar uma aspiração vulgar por bens terrenos (riqueza). Tudo o que era artesanal, ou envolvia o trabalho manual, trazia vergonha e deformava ao mesmo tempo o corpo e a alma. Ainda hoje para muitos trabalhadores o trabalho é apenas um sacrifício necessário para garantir a sobrevivência e não passa de uma atividade degradante uma vez que ele não é visto somente enquanto condição ontológica do ser humano, mas também, enquanto condição alienante e degradante o que tem implicações diretas na subjetividade do trabalhador e no seu engajamento com a tarefa que realiza. Para Dejours (2009) trabalho é aquilo que implica: gestos, saber-fazer, um engajamento do corpo, a mobilização da inInterciência & Sociedade 27 FERREIRA, S.; SARTORI, A. S. teligência, a capacidade de refletir, de interpretar e de reagir às situações; é o poder de sentir, de pensar e de inventar etc. Para ele o trabalho não é em primeira instância a relação salarial ou o emprego; é o «trabalhar», isto é, um certo modo de engajamento da personalidade para responder a uma tarefa delimitada por pressões (materiais e sociais). Em outros termos, é o objetivo (fazer algo/ação) e o subjetivo (inteligência/ pensamento/reflexão) interligados. O trabalho gera no trabalhador o sentimento de ser útil. Diz Minicucci (1982) que ele dá a sensação de pertencer à sociedade, conduz a pessoa a fazer amigos, proporciona o sentimento de ter um propósito na vida e, uma das mais fortes necessidades de um homem é sentir-se importante e que realiza algo de valor. Para as autoras Navarro e Padilha (2007) o trabalho é central na vida das pessoas e dá-se não só na esfera econômica, na medida em que ele é a fonte de renda da maioria da população mundial, como também na esfera psíquica por ser uma importante fonte de saúde psíquica e sua ausência, pelo desemprego ou pela aposentadoria, é causa de abalos psíquicos. Abalos como a insegurança que o desemprego gera frente às questões objetivas que envolvem a sobrevivência do trabalhador, suas necessidades básicas (alimentação/moradia). Abalos na sua subjetividade (auto-estima e necessidade de pertencimento/reconhecimento), pois ao cessarem as atividades profissionais em função da aposentadoria instala-se, para os indivíduos que não tiveram tempo e nem a oportunidade de readaptarem-se a esta nova fase de suas vidas, a falta de sentido, o isolamento, a tristeza e não raro a depressão. Daí a importância dos programas de preparação para a aposentadoria que permitem uma reflexão sobre as novas possibilidades de ocupação e convivência social. Navarro e Padilha (op. cit.) mencionam ainda que é por meio do trabalho que o homem torna-se um ser social, ele é central na vida do ser humano e esta centralidade está apoiada em idéias marxistas. Assim, o trabalho é compreendido como momento decisivo na relação do homem com a natureza, pois ele modifica a sua própria 28 natureza ao atuar sobre a natureza externa quando executa o ato de produção e de reprodução. Nesse sentido, o trabalho é um ato que pressupõe a consciência e o conhecimento dos meios e dos fins aos quais se pretende chegar. Pode-se afirmar que não há trabalho humano sem consciência (enquanto finalidade), na medida em que todo trabalho busca a satisfação de uma necessidade. Em outras palavras, seu fazer, sua ação, tem para o trabalhador um significado que lhe é particular, seja ele objetivo como a satisfação de necessidades básicas, seja subjetivo, como o orgulho pelo reconhecimento de um feito. E quando executa uma atividade sem conferir-lhe um significado (finalidade) corre o risco de viver uma vida profissional sem sentido. Comparando o trabalho no mundo contemporâneo ao da Idade Média, Milan Kundera, citado por Matos (2008, p. 251252) reconhece no presente o tédio, pois ofícios de outrora, em parte, não poderiam ser concebidos sem um apego apaixonado: os camponeses por sua terra; o carpinteiro era o mágico das belas mesas, os sapateiros conhecendo de cor os pés de todos os aldeões; os guardas-florestais; os jardineiros. O sentido da vida estava em suas oficinas e campos, cada oficio criara sua própria maneira de ser. Esta maneira de ser nada mais era do que a identificação e a identidade que o ofício conferia ao trabalhador, mas houve modificações nesta relação no séc. XIX, pois a Revolução Industrial trouxe como conseqüência a necessidade de transformar os seres humanos em máquinas e isto, aos poucos, fez com que se perdesse a visão humana do trabalho. Ele passou a ser visto não somente como uma condição inerente ao homem, mas também, como uma condição degradante através de um trabalho alienado. Neste sentido, Minicucci (op. cit.) afirma que a subdivisão do trabalho trouxe vantagens e desvantagens para o trabalhador como, por exemplo, aborrecimentos, perda do sentimento da importância pessoal, do orgulho de estar fazendo algo importante. Para o autor o trabalho ao longo do tempo passou por importantes transforInterciência & Sociedade Capitalismo e tecnologias: implicações para o trabalhador mações principalmente com a Revolução Industrial que tornou a vida mais fácil para nós, mas com sacrifício das recompensas (lazer), satisfações (prazer) e relacionamento humano no trabalho (convivência). De Masi (2000) faz uma crítica à sociedade industrial quando refere que ela não só fez com que, para muitos, se tornasse inútil o cérebro como fez com que somente algumas partes do corpo fossem utilizadas. Para ele, isto era diferente na sociedade rural na qual o camponês, para usar a enxada ou a pá, assim como o pescador para pescar, além de utilizar o corpo inteiro, usava talvez um pouco mais de cérebro. Mas não foi afetado apenas o trabalhador operário por processos advindos da era industrial e do capitalismo. Afirma-nos Matos (op.cit) que na contemporaneidade os indivíduos não são mais sequer engrenagens na máquina de produção, mas compõem um mercado para o consumo, de tal forma que a modelação dos comportamentos visando o mercado implica uma destruição programada do savoir-vivre (saber-viver). E, assim como o operário submetido à máquina perde seu savoir-faire (saber-fazer), reduzindo-se à condição de proletário, da mesma forma, o consumidor, padronizado em seus comportamentos de consumo pela fabricação artificial de desejos, perde seu savoir-vivre. É ainda esta autora quem nos diz que a produção em excesso de mercadorias com respeito à necessidade do mercado e não do consumidor, corresponde a um estado de exasperação das carências reais da sociedade e a uma nova modalidade de exasperação de aturdimento da mente, conseqüência do capitalismo contemporâneo e da cultura que ele engendra. Não há duvidas de que o capitalismo, que por definição “significa mudança constante e desenvolvimento” (WOOD, pág.9), e os seus excessos geram dicotomias. Navarro e Padilha (op. cit.) dizem que o capitalismo traz consigo uma série de contradições. Ao mesmo tempo em que o trabalho é a fonte de humanização e é o fundador do ser social, sob a lógica do capital se torna degradado, alienado, estranha- do. O trabalho perde a dimensão original e indispensável ao homem de produzir coisas úteis (que visariam satisfazer as necessidades humanas) para atender as necessidades do capital. Cafiero (1985, p. 97 e 98) menciona com muita propriedade que: A lei na sociedade capitalista, segundo a qual uma massa sempre crescente de meios de produção mobiliza progressivamente uma quantidade sempre menor de força de trabalho, quer dizer que quanto maior a produtividade do trabalho, tanto maior a pressão dos trabalhadores sobre os seus empregos e, portanto, tanto mais precária sua condição de existência, ou seja, as condições para a venda da própria força para aumentar a riqueza alheia ou a expansão do capital. Seria então o capitalismo o grande responsável por produzir um trabalhador degradado, explorado? O que está posto na sociedade é que o trabalho juntamente com o capitalismo são os grandes algozes do trabalhador, quando, na verdade, sua degradação está muito mais relacionada às condições desumanas do trabalho a que se submeteram e ainda são submetidos muitos trabalhadores e ao modo como o trabalho é organizado. Sobre a organização do trabalho Dejours (1992), esclarece que ela é concebida por um serviço especializado da empresa, estranho aos trabalhadores, choca-se frontalmente com a vida mental e, mais precisamente, com a esfera das aspirações, das motivações e dos desejos. Isso porque, em muitos casos, essa organização do trabalho não é deixada a cargo do trabalhador, mas é algo que ele tenha que se adaptar por ‘imposição’ da empresa e que acaba confrontando com suas aspirações e desejos. Para esse autor, o sofrimento começa quando a relação homem-organização do trabalho está bloqueada, quer dizer, quando o trabalhador não consegue fazer modificações neste trabalho. Ele afirma que não são tanto as exigências mentais ou psíquicas do trabalho que fazem surgir o sofrimento, mas sim esse bloqueio na sua organização. Ou seja, sua impossibilidade de Interciência & Sociedade 29 FERREIRA, S.; SARTORI, A. S. participar de modo mais ativo e amplo nas decisões que influenciam diretamente sua vida profissional implica na frustração de onde resulta o descontentamento, a desmotivação. Neste sentido, nossa atenção deve voltar-se também para a organização do trabalho e não somente para o trabalho enquanto atividade física/intelectual, pois o contexto e a sistematização das atividades também interferem no modo de funcionamento (modus operandi) do trabalhador e consequentemente em sua subjetividade. 3. Reflexões sobre as tecnologias Também é preciso refletirmos em torno da introdução da tecnologia, mais especificamente da eletrificação que marca mudanças significativas na organização do trabalho, Benjamim, citado por Matos (2008, p.255) não hesita em indicar as patologias que surgiram a partir da luz elétrica, considerando o mundo do capital um asilo de cegos e loucos: “Vamos aos fatos. A luz jorrando da eletricidade serviu primeiro para iluminar as galerias subterrâneas das minas; no dia seguinte as praças e as ruas; depois as fábricas, as oficinas, as lojas os espetáculos, os quartéis; e, finalmente as casas de família”. Pode-se perceber aí a mão-dupla da eletrificação que além de trazer luz e outras facilidades para a sociedade trouxe também a produção desmedida e o comprometimento do repouso do trabalhador, neste sentido, Matos (op. cit., p. 256) menciona: A economia, em sua forma atual de acumulação (cuja infra-estrutura são as nanotecnologias, a microeletrônica e suas inovações), exige a extensão e a intensificação da atividade até os últimos limites físicos e biológicos do indivíduo. Razão pela qual, com a eletrificação, o dia iluminado terá vinte e quatro horas, estabelecendo-se o estresse como modo de vida, seja para aqueles ligados a um trabalho, seja para a massa crescente de trabalhadores precários e desempregados. Aliando estas questões apontadas com o modo de organização da vida pessoal do trabalhador percebe-se que raramente sobrava tempo para que ele pudesse pensar e refletir sobre o que se estava fazendo. Fato que se repete ainda hoje entre muitos trabalhadores que se deixam absorver por tudo isto, anulando uma parte que é somente do próprio homem, sua subjetividade. A subjetividade aqui não é entendida apenas como a maneira com que o sujeito, o trabalhador, vive e dá sentido às suas experiências de trabalho, mas num sentido mais amplo e profundo. Subjetividade deve ser entendida como o exercício da escolha daquilo que se quer ou não para a sua vida. O autor De Masi (op. cit.) a conceitua como um fenômeno complexo, relacionando-a com autonomia de julgamento, onde o ser humano pode permitir-se uma escolha baseada em suas próprias necessidades e recursos, e não no fato de pertencer a algum grupo. Resumindo, subjetividade e escolha estão intimamente interligadas e sendo o homem um ser auto-determinante1, isto significa que ele pode escolher, o que contraria a tese psicanalítica de que ele é apenas instinto e pulsão. Se ele pode fazer escolhas por que alguns escolhem sentirem-se vitimas atacadas em sua subjetividade pelo capitalismo e pelas tecnologias? Isto requer mais estudos, mas uma saída para que os trabalhadores não coloquem em risco sua subjetividade é perceber os instrumentos de manipulação que estão presentes na atual sociedade e buscar conhecimento e criar estratégias para superá-los. Por falarmos em criar, observamos que a palavra tecnologia possui sua raiz no verbo grego tictein que significa criar, produzir. Há muito o homem cria, produz e inventa, portanto, há uma ligação histórica entre homem e tecnologia. Conta a lenda grega que Prometeu, Deus do Fogo, revoltado com Zeus pela onipotência deste, confiou o fogo aos humanos para garantir-lhes o conhecimento, o poder sobre a matéria e o saber técnico. A simbologia prometêica traz à tona a reflexão sobre a relação dos homens com Autodeterminação baseia-se na concepção do ser humano como organismo ativo, dirigido para o crescimento. Para saber mais acesse: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-79722004000200002 1 30 Interciência & Sociedade Capitalismo e tecnologias: implicações para o trabalhador a técnica e seus resultados nos modos de produção material e simbólica da sociedade ao mostrar que desde os primórdios, as possibilidades de uso, reinvenção e construção de sentidos na relação ontológica do homem com o mundo têm se estabelecido pela mediação tecnológica. (ALVES ; MANCEBO, 2006). A história da humanidade é permeada por invenções constituindo-se em diferentes formas de expressão da atividade humana justamente porque o ser humano sente a necessidade de criar a todo instante. E o século XII d.C foi um período em que começou uma grande explosão de invenções tecnológicas similar à ocorrida na Mesopotâmia quatro mil anos antes. De acordo com De Masi (op. cit), no referido século inventou-se a pólvora, redescobriu-se o moinho d’água, difundiu-se a bússola e os arreios modernos dos cavalos. O cavalo, com o novo arreio, rendia mil vezes mais do que com o velho tipo de freio. Foram inventados os óculos, que logo duplicam a vida intelectual da humanidade. Uma invenção tecnológica que merece destaque é o relógio e, neste sentido, Postman (1994) afirma que sem o relógio teria sido impossível haver capitalismo. Ele teve sua origem nos mosteiros beneditinos dos séculos XII e XIII. Foi inventado por homens que queriam se dedicar mais rigorosamente a Deus, porém, diz o autor, terminou como a tecnologia de maior uso para os homens, que desejavam dedicar-se a acumulação de dinheiro. Hoje somos escravos desta tecnologia chamada relógio que, embora seja aparentemente simples, controla tudo e todos e personifica o tempo, o grande regulador das nossas vidas. E por falarmos em tempo... Durante muito tempo a tecnologia fez com que deixassem de existir alguns empregos para os seres humanos, mas ao mesmo tempo criou outros e em maior proporção. Para projetar e construir máquinas eram necessários, de fato, outros tipos de trabalhadores. Além disto, a riqueza produzida graças às máquinas era reinvestida na criação de outras fábricas ou usada para o consumo. Em ambos os casos, direta ou indiretamente, contribuíam para au- mentar a oferta de emprego. Porém, com o advento da eletrônica, sobretudo com a introdução dos microprocessadores, este equilíbrio se rompeu e os empregos que desapareceram com o uso da tecnologia não são mais compensados por novos investimentos e novos tipos de emprego (DE MASI, 2000. pág. 104 - 105). Será possível afirmar que as tecnologias criam então um novo tempo, um novo modo de produção, um novo trabalhador e sociedade? Trazemos o seguinte pensamento para auxiliar na reflexão desta questão: O velho fordismo usava a linha de montagem para substituir os altos custos do trabalho artesanal especializado e para estreitar o controle sobre o processo do trabalho pelo capital, com o objetivo óbvio de extrair mais valor do trabalho. Hoje, as novas tecnologias são utilizadas para o mesmo fim: tornar os produtos mais fáceis e mais baratos para a montagem (...), controlar o processo de trabalho, eliminar ou combinar várias especialidades tanto no setor de serviços como no de manufatura, substituir os altos por baixos salários, promover o “downsizing”(enxugamento) dos trabalhadores de modo geral – sempre tendo em vista a extração de mais valor do trabalho (WOOD, p.10). Em resumo, Wood diz que as tecnologias permitem que a lógica da velha economia da produção de massa se diversifique e se estenda ao atingir setores inteiramente novos e trabalhadores que não afetava antes. Uma vez que todos direta ou indiretamente são atingidos por este modo de produção. É o que a autora chama de universalização, ou seja, é a totalização do próprio capitalismo, de suas relações sociais, suas leis de movimento, suas contradições – a lógica da mercantilização, da acumulação, da maximização dos lucros penetrando todos os aspectos de nossas vidas. Certamente, por isso, Wood afirma que as novas tecnologias deram origem a um novo tipo de sistema capitalista, com linhas de montagem globais com uma burguesia internacional e um capital de alta e livre mobilidade que pode chegar a qualquer parte do mundo onde o trabalho é barato, Interciência & Sociedade 31 FERREIRA, S.; SARTORI, A. S. cativo e abundante, ultrapassando os estados nacionais e deixando no seu rastro uma classe operária sem poder, pois quanto mais há a internacionalização da produção mais a classe operária torna-se fragmentada e mais poder transfere para uma classe capitalista transnacional. Estas considerações chamam a atenção para o fato de que as tecnologias estariam então a serviço do capitalismo e contribuindo para sua globalização. Isto nos mostra que as tecnologias não são neutras. Novais e Dagnino (2010) também alertam para a tecnologia como o meio para se atingir fins, ou seja, ciência aplicada em equipamentos para aumentar a eficácia da produção de bens e serviços. Andrew Feenberg, citado por estes dois autores, menciona que a tecnologia que nos é apresentada como politicamente neutra, eterna, a-histórica, sujeitas valores estritamente técnicos e, portanto, permeada pela luta de classe, é uma construção histórico-social. Contudo, há outro aspecto das tecnologias que cabe refletirmos, uma vez que elas também podem auxiliar no resgate no humano, do subjetivo. Vejamos: Nós vivemos construindo para nós mesmos combinações e arranjos pessoais. Por um motivo objetivo: a tecnologia nos permite isto. E também por motivo subjetivo: todos nós somos mais viajados, mais lidos, logo temos melhores condições para nos orientarmos sozinhos. Talvez seja um fenômeno oscilante, mas, se o observarmos num intervalo de vinte e trinta anos, constatamos que certamente está em ascensão. O homem sempre oscilou entre dois desejos: o de se distinguir e o de homogeneizar. Após duzentos anos de homogeneização forçada, industrial, hoje a tecnologia nos permite diferenciar-nos. E é o fazemos ( DE MASI, 2000, p. 116/117). E podemos acrescentar que permitem proximidade também, uma vez que os avanços tecnológicos na área da comunicação, por exemplo, criam cada vez mais possibilidades de diálogo entre as pessoas. Nesta perspectiva as tecnologias parecem auxiliar nosso modo de vida, sejam nos conferindo facilidades ao tornar nossa vida mais confortável, sejam permitindo um (re) encontro do ser humano com o outro, com 32 ele próprio e com sua subjetividade. Seguindo a visão de De Masi (op. cit.) ele afirma que a tecnologia é uma oportunidade, não é uma obrigação. E diz ainda que quem se perturba diante dela pode limitar-se a não usá-la, mas não tem o direito de impedir seu uso pelos outros. Por exemplo, se alguém tem medo de andar de avião, nem por isso pode proibir a aviação. Mas isto não significa dizer que as tecnologias estão livre das influências políticas, culturais e históricas e justamente por isso, é importante desenvolvermos nossa capacidade de contextualizarmos e de fazermos a crítica, em termos de meios e fins, das tecnologias. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao tratarmos do capitalismo, das tecnologias e suas implicações para a vida do trabalhador pode-se notar que a produção desenfreada, ancorada pela tecnologia, visa atender a demanda do consumismo e do mercado. Isto implica num dilema para o trabalhador, pois é vital o atendimento de suas necessidades básicas através do seu trabalho, mas não com o sacrifício do seu lazer, das suas satisfações, convivência social e subjetividade. Dada a centralidade do trabalho nas nossas vidas, o trabalhador encontra-se, diante de sentimentos ambivalentes, pois, ao mesmo tempo em que o trabalho o transforma num ser social, com sentimento de pertença, por outro lado, a lógica do capitalismo lhe trás aborrecimentos e a perda do sentimento de importância pessoal (autoestima). Porém são as condições desumanas de trabalho, a que muitos são (e foram) submetidos, que geram, em alguns, degradação e alienação. Constatamos que as tecnologias também geraram e geram dicotomias no trabalhador, pois elas não são neutras. Assim como aproximam, facilitam sua vida, permitem que a lógica da economia e da produção em massa ganhasse força e se globalizasse. A tecnologia da eletrificação, por exemplo, foi um marco significativo para a sociedade, mas comprometeu a qualidade de vida do trabalhador. Além disto, a impossibilidade do Interciência & Sociedade Capitalismo e tecnologias: implicações para o trabalhador trabalhador de participar da organização do seu próprio trabalho implica no surgimento do sofrimento, da falta de sentido. Isto não atinge a todos, mas aqueles que se sentem parte tão somente de uma engrenagem, que não pensam, reproduzem, e que abriram mão dos seus próprios desejos para satisfazer os de outros. Por tudo isto, o que precisa ser compreendido e repensado é o atual modo de vida da sociedade que é orientada pela sedução e por necessidades nunca satisfeitas. O ser humano atua no mundo para satisfazer seus desejos e necessidades, desta forma, no capitalismo, os avanços tecnológicos não são algozes cruéis, mas podem ser considerados instrumentos que auxiliam na busca incessantes de preenchimento e sentido. Deste modo, o desejo humano merece atenção e estudo mais aprofundado, pois tudo aquilo que criamos para nós, de que não temos necessidade, pode transformar-se em sofrimento. Em desequilíbrio o desejo trará problemas: seu excesso resulta em consumismo compensatório e sua falta em baixa autoestima. Ao trabalhador é necessário o entendimento do seu papel na construção de si, a consciência de auto e co-responsabilidade frente ao trabalho e a sociedade, mas também adaptabilidade e autonomia, pois, diante de novos paradigmas, as pessoas precisam aprender a adaptar-se e a intervir. Assim sendo, cabe ao trabalhador (que é autodeterminante) fazer a crítica, aceitando, ou não, o que está posto sem vitimizar-se, sem ficar, por vezes, ancorado na impotência, mas permitir-se quebrar o status quo. A questão a ser resolvida é o quanto a classe trabalhadora se empenhará nisto, sem esquecermos obviamente que a busca da própria liberdade de dominação advém de um longo processo político-histórico. 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Interciência & Sociedade 33 34 Interciência & Sociedade CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES ACERCA DO MATERIAL DIDÁTICO UTILIZADO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA MIRANDA, Nonato Assis de Universidade Paulista (UNIP) [email protected] SILVA, Dirceu da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) [email protected] RESUMO: Esse texto apresenta os resultados de uma pesquisa de natureza quantitativa realizada com alunos de Pós-Graduação Latu Sensu oferecidos pela Universidade Paulista. Os dados, obtidos por meio de um instrumento tipo escala de likert, foram tratados estatisticamente pela técnica multivariada conhecida como análise de cluster cujo objetivo foi agrupar os participantes segundo suas características, formando grupos ou conglomerados homogêneos. Para tanto, utilizou-se do método de ward. A partir do dendrograma, pudemos visualizar dois clusters distintos sendo que o primeiro é formado por 89 participantes e o segundo por apenas 10. O cluster 1 (89 participantes) prefere trabalhar com textos impressos e consideram os textos on-line desconfortáveis, principalmente aqueles com mais de três páginas, pois os considerados cansativos. Enquanto isso, o cluster 2 (10 participantes) prefere ler textos on-line. PALAVRAS-CHAVE: Educação à distância; análise de cluster; texto on-line. ABSTRACT: This text presents the results of a quantitative nature research performed with Post-graduate students offered by the Paulista University in a distance way. The data, obtained through a Likert scale, were statistically treated by the technique known as multivariate analysis of cluster whose aim was to group the participants according to their characteristics, forming homogeneous groups or conglomerates. In this research we use the ward method. From the dendrogram, we see two distinct clusters of which the first is comprised of 89 participants and the second one by just 10. The cluster 1 (89 participants) prefers working with printed texts and consider the on-line texts very uncomfortable, especially those that have more than three pages because their reading is boring. Meanwhile, the cluster 2 (10 participants) prefers reading on-line texts. KEYWORDS: Distance education; cluster analysis; on-line text. 1. INTRODUÇÃO Atualmente, tem-se observado, em termos globais, que a ampliação das oportunidades educacionais, com que tanto se sonha, está ligada à institucionalização da modalidade da educação à distância (NISKIER, 2000). Contudo, acredita-se que a EAD não pode ser encarada como uma panacéia para todos os males da educação brasileira, posto que nessa perspectiva, a colocaríamos em segundo plano em relação à modalidade presencial e sabemos que isso não é prudente. Muito provavelmente isso aconteça em função dos problemas que a educação tem enfrentado nos últimos anos em decorrência de um cenário que está em constantes mudanças e em função das dificuldades que a escola de educação básica, em particular a pública e gratuita, tem em se adequar a esse novo contexto. Por outro lado, tem-se observado que são muitos os esforços realizados por parte de educadores, gestores e pesquisadores da educação na tentativa de mostrar que os problemas da educação brasileira não se concentram somente no interior do sistema educacional, posto que, antes de tudo, refletem uma situação de desigualdade e polaridade social, produto de um siste- Interciência & Sociedade 35 MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da ma econômico e político perverso e desequilibrado. Diante disso, [...] a educação, nas suas mais diversas modalidades, não tem condições de sanear nossos múltiplos problemas nem satisfazer nossas mais variadas necessidades. Ela não salva a sociedade, porém, ao lado de outras instâncias sociais, ela tem um papel fundamental no processo de distanciamento da incultura, da acriticidade e na construção de um processo civilizatório mais digno do que este que vivemos (LUCKESI, 1989, 10). Portanto, é inegável que a busca de mecanismos que contribuam para que esse quadro possa se minimizado é uma necessidade iminente e muito provavelmente a EAD poderá fazer parte dessa forma tarefa. Não se pode esquecer que a utilização de tecnologias de informação e comunicação nos processos comunicacionais e educativos na configuração de redes implica, necessariamente, em uma mudanças de valores e atitudes na sociedade do mundo do trabalho (RODRIGUES, 2006). Mas quando se analisa que a educação não é alheia ao que acontece na sociedade como um todo, percebe-se que, no setor educativo, essas mudanças são acentuadas pelo comportamento de alguns docentes, discentes e de gestores frente a novas formas de ensinar e aprender mediadas pelas tecnologias. Portanto, entende-se que os docentes necessitam aprender a se articularem simultaneamente em diferentes níveis de ensino por meio de ferramentas de comunicação antes usadas apenas para o convívio social, além, é claro, a elaborar materiais didáticos com linguagens específicas, construídos em redes de saberes significativos (MORAN, 2004; RODRIGUES, 2006). É nesse contexto que o ensino presencial se aproxima do ensino à distância no que concerne às atitudes e valores atribuídos à educação, mas não é só isso, pois a combinação de tecnologias em rede e inovações no ensino presencial está modificando as formas de organização da edu- 36 cação a distância (MORAN, 2004). Mas como será que os cursos oferecidos na modalidade à distância têm se organizado? Qual tem sido a preocupação com os materiais didáticos? De acordo com Moran, até pouco tempo atrás, o importante era o conteúdo uma vez que toda a ênfase era dada ao design dos materiais, para que fossem auto-instrucionais, para que o aluno, sozinho, conseguisse acompanhar e se motivar para continuar aprendendo. Não obstante, tem-se observado que esse paradigma, aos poucos, está sendo repensado, pois se verifica, na atualidade, que muitos cursos de EAD estão percebendo que o material sozinho não é suficiente para a maior parte dos alunos. Portanto, bons materiais auto-explicativos, mesmo feitos com multimídia, não costumam ser suficientes para que os alunos se motivem e aprendam, a longo prazo. Frente ao exposto, esse texto apresenta os resultados de uma pesquisa realizada com um grupo de alunos de pós-graduação latu sensu da Universidade Paulista (UNIP) acerca da leitura de materiais impressos e on-line. 2. Ambiente virtual de aprendizagem Um ambiente virtual de aprendizagem é um sistema que reúne uma série de recursos e ferramentas, permitindo e potencializando sua utilização em atividades de aprendizagem através da Internet em um curso a distância (VAVASSORI & RAABE, 2003). Existem inúmeros AVA no mercado, sendo alguns gratuitos tais como o Moodle e o TelEduc, mas há outros que são pagos. No caso específico da instituição investigada é utilizado um recurso pago que o Blackboard. Trata-se de um ambiente de autoria com interface amigável, de fácil utilização, desenvolvido para educadores e profissionais interessados em aplicar as novas tecnologias interativas via Internet na educação, contribuindo para a metodologia de ensino presencial e potencializando o processo de ensino e aprendizagem à distância. A área de trabalho é acessível tanto Interciência & Sociedade Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância aos alunos como aos professores e, por ela, os usuários acessam os principais recursos tais como: avisos, calendário de aulas, tarefas, informações, programa do curso, link de avaliações, perfis, conteúdo das aulas, material complementar, fórum, chat, e- mail, sala de aula virtual e home-pages pessoais. Os participantes do curso investigado frequentam 50% das disciplinas presencialmente e 50% a distância. No caso das disciplinas a distância, essas são organizadas em unidades, sendo que cada unidade traz um livro texto que corresponde ao texto on-line elaborado pelo professor responsável pela disciplina e às vezes textos complementares, as vídeo-aula que o aluno pode acessar de qualquer local, desde que tenha acesso à Internet e atividades que deverá resolver e que farão parte da avaliação do curso. 3. Percurso metodológico Essa investigação caracteriza-se por ser pesquisa quantitativa, cuja vantagem do método consiste em levantar informações com confiabilidade estatística. Sobre esse assunto, Demo (2000) afirma que se trata, na realidade, é do emprego da quantificação da coleta de dados e o tratamento destes por meio de técnicas estatísticas (simples ou complexas). Neste estudo, os dados foram obtidos por meio de levantamento amostral (survey), com escala de atitudes de Likert1 realizado em amostra não probabilística composta por 99 alunos de vários cursos de Pós-Graduação Latu Sensu da Universidade Paulista e tratados pelo Statistical Packet for Social Sciences)2. Partindo-se do pressuposto que há uma grande probabilidade de alunos de fazem parte de grupos teoricamente homogêneos apresentarem opiniões divergentes acerca de um mesmo assunto, os autores optaram pelo emprego da análise de cluster. Segundo Hair Jr. et al. (2005), a análise de cluster, também conhecida como análise de conglomerados, é um conjunto de técnicas estatísticas cujo objetivo é agrupar objetos segundo suas características, formando grupos ou conglomerados homogêneos. Dessa forma, os objetos em cada conglomerado tendem a serem semelhantes entre si, porém diferentes dos demais objetos dos outros conglomerados. Os conglomerados obtidos devem apresentar tanto uma homogeneidade interna (dentro de cada conglomerado), como uma grande heterogeneidade externa (entre conglomerados). Portanto, se a aglomeração for bem sucedida, quando representados em um gráfico, os objetos dentro dos conglomerados estarão muito próximos, e os conglomerados distintos estarão afastados. Para Hair Jr. et al. (2005), a análise de cluster é uma técnica do tipo de interdependência, pois não é possível determinar antecipadamente as variáveis dependentes e independentes. Ao contrário, examina relações de interdependência entre todo o conjunto de variáveis. Neste ponto, esta técnica é similar à análise fatorial, no entanto, a diferença é que, enquanto a análise de cluster trata os objetos, a análise fatorial se preocupa com as variáveis. Segundo Malhotra (2006), as etapas para a aplicação da análise de cluster estão descritos na figura 1. Para Mattar (1997), uma escala Likert, proposta por Rensis Likert em 1932, é um instrumento em que os respondentes são solicitados não só a concordarem ou discordarem das afirmações, mas também a informarem qual é o seu grau de concordância ou de discordância acerca do assunto indagado. 1 2 SPSS - Statistical Packet for Social Sciences. Base 10.0 User’s Guide. Chicago:SPSS, 1999. Interciência & Sociedade 37 MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da Formular o problema Escolher uma Medida de distância Escolher um Processo de Aglomeração Decidir Quanto ao Número de Conglomerados Interpretar e Perfilar os Conglomerados Avaliar a Validade do Processo de Aglomeração Figura 1. Etapas para aplicação da análise de clusters. Fonte: Malhotra (2006, p. 575). Nestes termos, inicialmente, é necessário definir o problema de aglomeração e as variáveis a serem tratadas estatisticamente. Feito isso, escolhe-se, uma medida de distância dos conglomerados. Após, defini-se o processo de aglomeração que dependerá das variáveis em estudo e do problema em foco. Para Malhotra (2006), neste ponto, a intuição do pesquisador deve ser utilizada para a escolha do melhor processo e definição do número de conglomerados na pró- xima etapa. Os conglomerados resultantes devem ser interpretados em termos das variáveis usadas para constituí-los e de outras variáveis adicionais importantes. Finalmente, o pesquisador precisa avaliar a validade do processo de aglomeração (ROSES e LEIS, 2002). Um passo importante na análise de cluster é a escolha de uma medida para avaliar o quão semelhantes ou diferentes são os casos analisados. Assim, escolhemos como medida de semelhança à distância euclidiana quadrática, por ser uma das mais utilizadas neste tipo de análise (MALHOTRA, 2006, PESTANA e GAGEIRO, 2000). Nesta análise não existe nenhum critério estatístico interno que possa ser usado para inferir qual o número de clusters que deve ser retido. Desta forma, a definição dos critérios para a tomada de decisão fica a cargo do pesquisador. Assim, procuramos clusters que possuam grande homogeneidade entre si. Como não possuímos, a priori, um número de cluster que deveria ser retido, precisamos explorar os dados e testar vários métodos. Assim, testamos sete métodos de aglomeração hierárquicos (apresentados com fundo cinza na figura 2 – Processos de Aglomeração Hierárquicos): Processo de Aglomeração Hierárquicos Aglomerativos Método de Encadeamento Não Hierárquicos Divisivos Limiar Limiar Particionamento Seqüencial Paralelo Otimizador Métodos de Variância Métodos de Centróide Métodos de Ward Encadeamento Único Encadeamento Completo Figura 2. Classificação dos Procedimentos de Aglomeração (Clusters). Fonte: Malhotra (2006, p. 577) 38 Interciência & Sociedade Encadeamento Médio Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância O método que mostrou boa separação entre os clusters foi o método Ward. Desta forma, a seguir, apresentamos os resultados da análise de cluster encontrados através deste método. A partir do dendrograma, podemos visualizar dois clusters distintos sendo que o primeiro é formado por 89 participantes e o segundo por apenas 10 (Tabela 1). 4. Descrição da amostra Foram pesquisados 99 sujeitos de Cursos de Pós-Graduação Latu Sensu, sendo 45 do sexo masculino e 58 do sexo feminino. A média de idade foi de 35 anos e a distribuição por curso é apresentada na Tabela 1. Tabela 1. Distribuição dos participantes Segundo o Curso Curso Gestão Financeira Avançada Estratégia Empresarial Direito Empresarial Controladoria Empresas Formação de Professores Ensino Superior Total Freqüência 11 8 8 17 59 99 Fonte: os autores Conforme se observa, mais da metade dos sujeitos pesquisados são oriundos do curso de Formação de Professores Ensino Superior, pois é um dos cursos mais procurados na instituição investigada. 5. Tratamento dos dados Pelo teste de Kolmogorov-Smirnov, concluímos que nenhuma das assertivas da escala de Likert pode ser considerada normal ao nível de significância de 0,05. Desta forma, utilizamos o teste não paramétrico de Mann-Whitney para verificar quais são as variáveis discriminadoras, isto é, em quais variáveis podemos constatar alguma diferença de opinião entre os clusters. Este teste é apresentado na tabela 2. Tabela 2. Teste de Mann-Whitney Assertivas Mann-Whitney U Z Significância 1. Palavras destacadas no texto on-line tiram a atenção do aluno. 197.000 -2.952 .003 2. Quando estudo, prefiro imprimir os textos a lê-los on-line. 121.000 -4.080 .000 3. O texto impresso gera mais interatividade que o texto on-line. 121.500 -3.875 .000 4. Todo material impresso leva o aluno a desenvolver capacidades autônomas. 48.500 -4.692 .000 5. Prefiro ler textos on-line com diferentes fontes (tamanhos e tipos). 341.500 -1.218 .223 6. O material impresso torna o processo de aprendizagem mais rico e significativo. 131.000 -3.720 .000 7. Quando leio textos on-line, apenas passo os olhos nas palavras-chave. 206.000 -2.868 .004 8. O tamanho da fonte não interfere na leitura do texto on-line. 162.000 -3.366 .001 Interciência & Sociedade 39 MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da Tabela 2. Continuação 9. Todo material impresso permite que o aluno exercite sua capacidade crítico-reflexiva. 81.000 -4.291 .000 10. A leitura de textos on-line é desconfortável. 151.500 -3.459 .001 11. Material impresso ajudar a desenvolver habilidades. 77.500 -4.334 .000 12. O material impresso mediatiza a relação aluno-tutor ou orientador da aprendizagem. 48.000 -4.693 .000 13. Prefiro textos on-line que tragam o conteúdo com mais detalhes. 408.000 -.436 .663 14. Todo material impresso permite a flexibilidade necessária para que o aluno exercite a sua criatividade. 193.000 -2.976 .003 15. Textos escritos em letra maiúscula são mais fáceis de ler. 106.000 -3.987 .000 16. Textos on-line com mais de três páginas tornam-se cansativos. 104.000 -4.021 .000 17. As cores da fonte e fundo nos textos on-line não interferem na leitura. 200.500 -2.909 .004 443.000 -.024 .981 19. Marcadores de texto quebrando blocos prejudicam a leitura dos textos on-line. 309.500 -1.594 .111 20. O material impresso tem a função de repassar informações. 79.000 -4.331 .000 Fonte: SPSS 18. Todo material instrucional leva o aluno adquirir conhecimentos relevantes. Pela tabela 2, observamos que as opiniões dos participantes do cluster 1 se diferenciam das do cluster 2 em quase todas assertivas, exceto nas de número 5, 13, 18 e 19. Nestas assertivas, as diferenças encontradas não são significantes, ou seja, podem ser consideradas devido ao erro amostral. Contudo, julgamos prudente tecer alguns comentários sobre esse resultado, pois a literatura traz algumas orientações nesse sentido. Nestes termos, considerando-se que o instrumento foi composto por uma escala de 1 a 7, nota-se (Tabela 3) que os participantes não gostam de ler textos on-line com diferentes fontes. Para justificar esse resultado, recorremos a Vieira (2006) que realizou uma pesquisa que analisa a questão da formatação do texto para e-learning e sinaliza que isso acontece porque as fontes têm muitas funções para propiciar formas de letras que podem facilitar a leitura. Portanto, assim como outros elementos visuais, as fontes organizam ou criam uma disposição particular (PARIZOTTO, 1997). No caso da assertiva 5, por exemplo, “Prefiro ler textos on-line com diferentes fontes” é prudente que haja um certo consenso entre os participantes sobre o assunto, pois as preferências de leituras de textos 40 dessa natureza variam significativamente entre as pessoas por questões de preferência. Com isso, é importante que os profissionais responsáveis pela produção de textos veiculados on-line estejam atentos, pois, Schriver (1997) apud Parizotto (1997), para fazer as escolhas sobre o tamanho da fonte para documentos on-line, devem ser consideradas as características das fontes propriamente ditas, ou seja, a largura e o espaçamento das letras e o comprimento da linha e entrelinhas com vistas a verificar se o texto está espaçado adequadamente. Ademais, essas escolhas devem ser feitas de acordo com o tipo de características de usuário (idade, ponto de vista, nível de motivação ou vontade de ler um texto contínuo). Nestes termos, na dúvida, é melhor errar para fontes maiores do que para fontes menores, pois a maior parte dos usuários acha os tipos maiores mais legíveis e calmantes para os olhos (SCHRIVER, 1997 apud PARIZOTTO, 1997). Há muito mais a ser dito sobre o assunto, mas vamos retomar a análise dos dados obtidos na pesquisa quantitativa que é o objeto precípuo desse trabalho. Diante disso, na tabela 3, apresentamos a média e o desvio padrão dos clusters para cada assertiva sendo que as médias acima de 4 indicam concordância e abaixo desse número discordância. Interciência & Sociedade Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância Tabela 3. Diferenças entre os clusters Cluster 1 Variáveis Cluster 2 M DP M DP 1. Palavras destacadas no texto on-line tiram a atenção do aluno. 3.25 1.836 1.40 .516 2. Quando estudo, prefiro imprimir os textos a lê-los on-line. 5.89 1.668 2.90 1.912 3. O texto impresso gera mais interatividade que o texto on-line. 5.51 1.618 2.30 2.058 4. Todo material impresso leva o aluno a desenvolver capacidades autônomas. 5.09 1.571 1.50 1.080 5. Prefiro ler textos on-line com diferentes fontes (tamanhos e tipos). 3.58 1.924 2.90 2.283 6. O material impresso torna o processo de aprendizagem mais rico e significativo. 5.29 1.639 2.20 2.098 7. Quando leio textos on-line, apenas passo os olhos nas palavras-chave. 3.29 2.101 1.50 1.581 8. O tamanho da fonte não interfere na leitura do texto on-line. 3.62 2.177 1.30 .675 9. Todo material impresso permite que o aluno exercite sua capacidade crítico-reflexiva. 4.75 1.805 1.60 .966 10. A leitura de textos on-line é desconfortável. 4.73 1.993 2.20 1.619 11. Material impresso ajudar a desenvolver habilidades. 4.85 1.825 1.60 1.075 12. O material impresso mediatiza a relação aluno-tutor ou orientador da aprendizagem. 4.61 1.542 1.40 .699 13. Prefiro textos on-line que tragam o conteúdo com mais detalhes. 4.55 1.699 4.10 2.470 14. Todo material impresso permite a flexibilidade necessária para que o aluno exercite a sua criatividade. 4.76 1.574 2.80 1.989 15. Textos escritos em letra maiúscula são mais fáceis de ler. 3.98 1.977 1.30 .483 16. Textos on-line com mais de três páginas tornam-se cansativos. 4.94 1.903 2.00 1.155 17. As cores da fonte e fundo nos textos on-line não interferem na leitura. 3.27 2.049 1.40 .699 18. Todo material instrucional leva o aluno adquirir conhecimentos relevantes. 4.84 1.637 4.50 2.593 19. Marcadores de texto quebrando blocos prejudicam a leitura dos textos on-line. 3.69 1.928 2.70 2.058 20. O material impresso tem a função de repassar informações. 5.30 1.503 2.40 1.350 Fonte: SPSS Analisando a tabela 3, percebemos que os participantes do cluster 1 tendem a concordar que, quando estudam, preferem imprimir os textos a lê-los on-line, pois o texto impresso gera mais interatividade, leva o aluno a desenvolver habilidades e capacidades autônomas e permite o exercício sua capacidade crítico-reflexiva, tornando o processo de aprendizagem mais rico e significativo. Ademais, a leitura de textos on-line é desconfortável e quando têm mais de três páginas tornam-se cansativos. Já o material impresso mediatiza a relação aluno-tutor, permite a flexibilidade necessária para que o aluno exercite a sua criatividade, mas tem a função de repassar informações. Por outro lado, o cluster 2 tende a discordar destas afirmações. Além disso, observamos também que os participantes dos dois clusters tendem a concordar que quando lêem textos on-line, não passam apenas os olhos nas palavras-chave e que as palavras destaca- das nesses textos não tiram a atenção do aluno. Afirmam também que as cores da fonte e fundo, assim como o tamanho da fonte de textos on-line interferem na leitura. Por fim, sinalizam que os textos escritos em letra maiúscula não são mais fáceis de ler. No entanto, os participantes do cluster 2 tendem a apresentar um grau de concordância mais alto acerca dessas idéias. Os resultados mostram também que os participantes dos dois clusters preferem textos on-line que tragam o conteúdo com mais detalhes e com a mesma fonte (tamanhos e tipos). Entendem que os marcadores de texto quebrando blocos não prejudicam a leitura e todo material instrucional leva o aluno adquirir conhecimentos relevantes. Para justificar esses resultados, verificamos que são inúmeros os recursos aos quais os participantes se referem. Segundo Parizotto (1997), dentre eles, o uso do negrito, do itálico ou uma mudança na cor ou no brilho é, provavelmente, a melhor Interciência & Sociedade 41 MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da opção para realçar o texto do que o sublinhado. Mas não podemos esquecer que opção por um ou por outro recurso é uma questão de estilo ou preferência e com isso, a atenção do usuário pode ser atraída com a utilização do itálico, por exemplo. Segundo Robertson (1993), este estilo é útil e não causa quebras severas no ritmo de leitura. Outra maneira de atrair a atenção do usuário, na concepção desse autor, é usar o sublinhado, pois este estilo atrai a atenção sem causar quebras significativas no ritmo da leitura, mas deve ser usado somente para textos curtos (ROBERTSON, 1993). Entretanto, no caso específico de páginas na Web, o uso do sublinhado deve ser utilizado somente para links (PARIZOTTO, 1997). Em síntese, podemos constatar que o cluster 1 (89 participantes) prefere trabalhar com textos impressos e consideram os textos on-line desconfortáveis, principalmente aqueles com mais de 3 páginas considerados cansativos. Enquanto isso, o cluster 2 (10 participantes) prefere ler textos on-line. 6. CONCLUSÕES Para apresentarmos algumas considerações acerca do texto ora proposto, entendemos que seria prudente resgatar os objetivos que nortearam a pesquisa, ou seja, o de conhecer as concepções que os estudantes de Pós-Graduação Latu Sensu têm acerca dos materiais didáticos, mais precisamente, textos impressos e on-line. Pois bem. Conforme pudemos observar, os resultados mostraram que a maior parte dos participantes prefere textos impressos em detrimento do texto on-line. Portanto, é partir desse quadro que teceremos alguns comentários a guisa de conclusão. Diante dessa realidade, acreditamos que talvez, algumas pessoas possam estranhar essa preferência desse grupo de alunos e até mesmo os taxarem de retrógrados ou algo similar. Todavia, não podemos esquecer que o ser humano é resistente às mudanças e o texto on-line ainda é novidade para nós, pois a educação a distância, 42 mais precisamente a ministrada através da Internet, ou seja, on-line, ainda engatinha no país. Outro aspecto a ser destacado é que, quando nos referimos à educação, não podemos esquecer as coisas são lentas, conforme é sinalizado por Pierre Lévy. Segundo esse pesquisador, [...] a escola é uma instituição que se baseia, desde há cinco mil anos, no falar/ ditar do mestre, na escrita manuscrita do aluno e, desde há quatro séculos, no uso moderado da imprensa, nestes termos, uma verdadeira integração da informática (e do audiovisual) implica, portanto, o abandono de um habitus antropológico mais do que milenário (sic), algo que não se poder fazer em poucos anos (LÉVY, 1990, p.11)”. Frente ao exposto, não poderíamos esperar um posicionamento muito diferente de nossos participantes que estão iniciando na educação a distância. Mas isso não significa que esse resultado não represente para nós educadores e demais profissionais da educação a distância um indicador de que estamos no caminho certo e que o aluno, muito em breve, se adequará a esse novo contexto e bem como aos novos materiais. Não obstante, enquanto profissionais da EAD, concordamos com Parizotto (1997) que alguns cuidados devem ser tomados por ocasião da elaboração de textos que serão disponibilizados na Internet. Segundo essa pesquisadora, para evitar a poluição visual de uma página na Web, devemos privar pela simplicidade e clareza do conjunto de elementos que a compõem. Não obstante, para alcançar esse objetivo, é importante que o projetista de páginas na Web não se deixe levar pelos recursos das ferramentas gráficas, utilizando-os em excesso, nem use somente tecnologia de ponta, fazendo com que alguns usuários, por problemas técnicos, não tenham acesso a esta informação (PARIZOTTO, 1997). Frente ao exposto, destacamos Interciência & Sociedade Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância que “além dos fatores da compreensão da leitura derivados do autor e do leitor, há os derivados do texto que dizem respeito à sua legibilidade, podendo ser materiais, lingüísticos ou de conteúdo (ALLIENDE & CONDEMARÍN, 2002 apud KOCH & ELIAS, 2007, p.28)”. Mas podemos acrescentar a esse conjunto, os fatores técnicos que representam uma forte barreira a muitas pessoas que não dominam o uso de determinadas ferramentas tecnológicas, pois “as novas tecnologias digitais não oferecem aos seus usuários um novo mundo, sem problemas”. Afinal “estamos no início de uma nova e revolucionária era tecnológica e pagamos um preço alto pelo pioneirismo” (KENSKI, 2007, p.53). Pioneirismo? Será que somos pioneiros em alguma coisa? De certa forma sim, pois apesar de nosso atraso tecnológico temos os nossos méritos e não somos de um todo analfabetos digitais, afinal desde que as tecnologias de comunicação e informação começaram a se expandir pela sociedade, aconteceram muitas mudanças nas maneiras de ensinar e aprender e é inegável que há um grande esforço por parte das pessoas para se adequarem a esse novo contexto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DEMO, P. Metodologia do conhecimento científico. São Paulo: Atlas, 2000. HAIR, J. F.; et al. Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Bookman, 2005. KENSKI, V. M. Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação. Campinas-SP: Papirus, 2007. KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2007. LUCKESI, C. C. Democratização da educação: ensino à distância como alternativa. Tecnologia Educacional n°. 89/90/91, jul/dez. 1989, Rio de Janeiro, ABT. MALHOTRA, N. K. Pesquisa de marketing: uma orientação aplicada. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2006. MORAN, J. M. Avaliação das mudanças que as tecnologias estão provocando na educação presencial e a distância. Anais do II Seminário Virtual UniEAD “Utilizando Ferramentas e Ambientes para EAD”. São Paulo, 06 a 18 de dezembro de 2004. NISKIER, A. Educação à distância: a tecnologia da esperança. 2.ed. São Paulo: Loyola, 2000. NUNES, I. B. Noções de educação a distância. Revista Educação a Distância, nºs 4/5, dez.1993, abr./1994. Instituto Nacional de Educação a Distância, p. 7-25. PARIZOTTO. R. Elaboração de um guia de estilos para serviços de informação em ciência e tecnologia via web. (1997). Dissertação (Mestrado em Engenharia) – Departamento de Engenharia e Sistemas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Disponível em: < http://www.eps.ufsc.br/disserta98/rosam/cap2.htm#2.4 >. Acesso em: 19/01/2009. PESTANA, M. H.; GAGEIRO, J. N. Análise de dados para ciências sociais: a complementariedade do SPSS. 2. ed. Lisboa: Edições Silabo, 2000. 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Interciência & Sociedade 43 44 Interciência & Sociedade CONCESSÃO DE CRÉDITO E MODELAÇÃO DA TOMADA DE DECISÃO SANTADE, Hélio Oliva do Amaral Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) Instituição de Ensino São Francisco (IESF) Empresa Vita Suco – Mogi Guaçu [email protected] BIEMBENGUT SANTADE, Maria Suzett Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) Faculdades Integradas Maria Imaculada (FIMI) Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Universidade do Minho (UMINHO-Braga-Portugal) [email protected] RESUMO: O texto delimita-se na Tomada de Decisão e apresenta a informação como matéria-prima para a decisão de crédito. A obtenção de informações confiáveis e o competente tratamento das mesmas constituem uma base sólida para uma decisão de crédito segura. O trabalho parte do princípio de que é possível construir modelos matemáticos para avaliação de riscos na concessão de empréstimos para pessoas físicas em cooperativas de crédito, e as questões que surgem nesse sentido são: (i) que informações necessita-se saber para criar um escoreamento de crédito?; (ii) como avaliar quantitativamente cada informação coletada?; (iii) qual o nível aceitável de risco para liberação de crédito?; (iv) como classificar os riscos? Assim, diante desses questionamentos, o trabalho objetiva-se em criar, desenvolver, aplicar e avaliar um modelo de credit scoring para a avaliação de crédito a pessoas físicas em cooperativas de crédito. Agregam-se ainda ao objetivo central os seguintes objetivos específicos: desenvolver uma metodologia que leva em consideração particionamentos áureos. PALAVRAS-CHAVE: tomada de decisão; cooperativas de crédito; número ouro. ABSTRACT: This work is on Decision Making and presents “Information” as a raw material for Credit Decision. Getting reliable information and working it adequately constitute a solid basis for a secure credit decision. This work is based on a principle that it is possible to build-up mathematical models for evaluating risks on loans for people in credit cooperatives. The questions that arise in this sense are: (i) what are the information we may need for creating a secure support for credit? (ii) how to evaluate quantitatively each information that is obtained ? (iii) what is the acceptable risk for liberating a credit ? (iv) how to classify the risks ? So, before these questions, this work is for create, develop, apply and evaluate a model of “credit scoring” for evaluating credit for people in credit cooperatives. To this main objective this work aggregates the following specific objectives: to develop a methodology which takes into consideration the aureate partition. KEYWORDS: decision making; credit cooperatives; aureate number. 1. INTRODUÇÃO O trabalho delimita-se na Tomada de Decisão e apresenta a informação como matéria-prima para a decisão de crédito. A obtenção de informações confiáveis e o competente tratamento das mesmas constituem uma base sólida para uma decisão de crédito segura. Adicionalmente, nesse tópico de introdução às informações para crédito, cabe descrever sobre a tomada de decisão e seus métodos (SILVA, 1997:1456). É relevante assinalar que a Tomada de Decisão pode ser entendida como a escolha entre alternativas. Todas as pessoas, em seu cotidiano, tomam decisões optando entre as alternativas de que dispõem Interciência & Sociedade 45 SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S. e conhecem. A análise do processo decisório é algo complexo, envolvendo experiência anterior, conhecimento sobre o que está sendo decidido, método para tomar decisão e uso de instrumentos e técnicas que auxiliem o administrador. Ao se tomar uma decisão, escolhendo entre alternativas, haverá um impacto sobre o objetivo que se pretende atingir. Ao se tratar dos objetivos da administração financeira, a decisão de usar uma matéria-prima de baixa qualidade com o objetivo de maximizar o lucro poderá levar os clientes a reagirem e, em longo prazo, a empresa perder mercado. No entanto, há objetivos concorrentes entre si, pois poderá não ser possível maximizar as vendas e minimizar os incobráveis. A decisão de conceder crédito numa empresa comercial ou industrial está relacionada ao volume de vendas que se quer atingir em determinado produto e em determinada época. Uma vez tomada a decisão de conceder o crédito, o administrador não encerrou o processo decisório, sendo necessário tomar outras decisões, como as relativas à cobrança, por exemplo. Numa instituição financeira, a decisão de crédito está diretamente relacionada a diversos fatores, tais como: taxas, prazos e garantias. A boa capacidade de julgamento foi considerada durante muito tempo característica de um bom administrador. No mundo atual, entretanto, apenas uma boa capacidade de julgamento não é suficiente. Isto porque a evolução da ciência e dos métodos científicos que vem sendo transmitida de geração para geração com aperfeiçoamento progressivo constitui-se numa ferramenta de grande utilidade na tomada de decisão. Os métodos quantitativos são considerados muito eficientes, pois se baseiam em registros e cálculos. O uso da estatística, especificamente a teoria das probabilidades, é um valioso instrumento para a tomada de decisão. Os modelos de previsão de insolvência e outras técnicas de classificação de risco desenvolvidas são resultados do tratamento e proces-samento de grande quantidade de informações, a partir de metodologia estatística (análise discriminante), 46 com o objetivo de auxiliar na decisão de crédito. Outros recursos, como o teorema de Bayes, análise fatorial e pesquisa operacional, por exemplo, têm sua aplicabilidade nas áreas de crédito. As simulações constituem-se também em valiosos métodos de tomada de decisão, à medida que permitem ao tomador de decisões simular as situações prováveis e a obtenção de expectativas de resultados. Na área de análise e concessão de crédito, podem-se fazer simulações de diversas alternativas em determinada projeção para se fazer uma análise de sensibilidade. A decisão de crédito envolve diversos fatores, alguns objetivos e outros subjetivos. Dessa forma, a experiência do analista ou do gestor de crédito constitui-se poderoso instrumento. Para formação de um analista de empresas, leva-se cerca de dois anos para obter um profissional com razoável capacidade de interpretação das complexas e múltiplas facetas da atividade empresarial. Há casos, evidentemente, de profissionais com experiência nas áreas contábil e financeira que conseguem desenvolvimento relativamente rápido, como profissionais de crédito, em face da sua bagagem técnica acumulada. A visão de um gestor de crédito deve ser ampla, envolvendo, além da análise econômico-financeira, conhecimento na área de administração de empresas, bem como certo grau de domínio acerca dos fatores políticos e macroeconômicos, inclusive em nível internacional. Mesmo um analista com experiência, ao mudar de uma instituição para outra, precisa passar por um processo de integração e adaptação às características da nova empresa e de seu conjunto de clientes. O chamado feeling é algo que só é adquirido com o tempo e tal experiência é o que valoriza o analista. Há uma série de fatores na análise de crédito que não são necessariamente quantificáveis e que por si só podem definir uma decisão de crédito. A chamada experiência anterior é o método mais antigo e mais usado; há apenas dificuldade de ser transferida para outras gerações, em face das diferenças de condições ao longo do tempo, pois a experiência de um gerente de crédito de duas décadas passadas poderá não ser adequada para Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão os nossos dias. Assim, a necessidade do gestor de crédito utilizar também outros métodos como simulações e recursos quantitativos que, adicionados a uma experiência atualizada. A tomada de decisão de crédito fundamenta-se em informações e os métodos para tomada de decisão referem-se às formas de tratamento e organização das informações. 1.1. Objetivos do Trabalho Este texto parte do princípio de que é possível construir modelos matemáticos para avaliação de riscos para empréstimos para pessoas físicas em cooperativas de crédito, as questões que surgem nesse sentido são: (i) que informações necessitam-se saber para criar um escoreamento de crédito? (ii) como quantitativamente avaliar cada informação coletada? (iii) qual o nível aceitável de risco para liberação de crédito? (iv) como classificar os riscos? Diante desse questionamento surge o objetivo principal do texto: Criar, desenvolver, aplicar e avaliar um modelo de credit scoring1 para a avaliação de crédito para pessoas físicas em cooperativas de crédito. Agregam-se ainda ao objetivo central os seguintes objetivos específicos: - Desenvolver uma metodologia que leva em consideração particionamentos áureos2; - Comparar a metodologia desenvolvida com algum outro modelo nor- malmente em uso; - Validar a metodologia proposta. 1.2. Importância da Tomada de Decisão Analisando a tomada de decisão sob um ponto de vista histórico, encontra-se a ideia de Adam Smith (1982), que aponta que cada qual deve decidir sempre em seu próprio favor tomando as decisões de modo que ele próprio seja o maior beneficiado (SIMONSEN, 1986), sem se importar muito com o que o concorrente decide. Basicamente a ideia torna-se ainda mais vil quando da teoria dos jogos de Von Neumann e Morgenstern (VON NEUMANN e MORGENSTERN, 1944) em que o concorrente é basicamente um “inimigo”, talvez isto influenciado pelas guerras mundiais. Com o equilíbrio de Nash3, surge uma nova perspectiva que se concentra na tomada de decisão que atenda o grupo e não apenas um ou outro interessado, ideia central das cooperativas de crédito, ou seja, fazer o melhor pelos cooperados, sejam eles investidores sejam eles tomadores de recursos. Assim sendo quanto maiores forem os cuidados na concessão de crédito, mais seguros se sentirão os investidores, por outro lado há que haver uma metodologia e que está esteja alicerçada em pontos que ofereçam a possibilidade de crédito para que os empréstimos realmente ocorram, mas que também tranquilizem os investidores sobre o modo de como seu dinheiro está sendo aplicado; afinal, os dividendos que o investidor recebe são oriundos dos juros pagos pelos tomadores, e o dinheiro disponibilizado para empréstimos pela cooperativa tem como fonte o investidor, neste sentido há que se procurar pelo equilíbrio. Esse estudo toma este cenário como seu principal argu- 1 Credit Risk ou Risco na Concessão de Crédito. 2 Refere-se ao uso de seções áureas, ou seja, aproximadamente 62% de um total de pontos (BIEMBENGUT, 1999). O Equilíbrio de Nash representa uma situação em que, em um jogo envolvendo dois ou mais jogadores, nenhum jogador tem a ganhar mudando sua estratégia unilateralmente. O Equilíbrio de Nash representa uma situação em que, em um jogo envolvendo dois ou mais jogadores, nenhum jogador tem a ganhar mudando sua estratégia unilateralmente. John Forbes Nash Jr. (Bluefield, 13 de junho de 1928) é um matemático norte-americano que trabalhou na Teoria dos Jogos, na Geometria diferencial e na Equação de derivadas parciais, servindo como Matemático Sénior de Investigação na Universidade de Princeton. Compartilhou o Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel de 1994 com Reinhard Selten e John Harsanyi. 3 Interciência & Sociedade 47 SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S. mento e sobre ele cria a sua metodologia. 1.3. Metodologia do Estudo O objetivo do credit scoring é classificar solicitantes de crédito de acordo com seu risco (probabilidade) de inadimplência. Sua aplicação mais comum é a concessão ou renovação de crédito a pessoas físicas ou jurídicas. O credit scoring recebe denominações de alternativas em função dos objetivos e da estrutura de informações utilizadas para determinar o risco de inadimplência. O termo credit scoring é, em geral, reservado para a classificação das solicitações de crédito de novos proponentes (SICSÚ, 2003). Nos casos de renovação de crédito, usual em créditos rotativos, a experiência anterior com o cliente pode ser incluída na elaboração do credit scoring. Nesse caso, prefere-se a denominação behavioral scoring, pois as variáveis refletem o comportamento do proponente diante de crédito em transações passadas. Os ratings de crédito ou risk scores de pessoas jurídicas são, basicamente, modelos de credit scoring para avaliar o risco-cliente em determinado mercado. Neste texto, foi utilizado o termo credit scoring (CS) para caracterizar o processo de cálculo do risco de inadimplência de um proponente ou de uma operação. O termo sistema de credit scoring (SCS) caracteriza um sistema composto pela regra para o cálculo do escore (credit score), regras de decisão de crédito baseadas nesse escore e nas políticas de crédito da instituição financeira e um sistema de informações gerenciais que permita acompanhar a adequação das decisões de crédito e forneça informações adicionais para o aprimoramento do próprio sistema e para outras áreas envolvidas com a decisão do crédito (marketing, cobrança etc.). A metodologia básica para o desenvolvimento do credit scoring não difere entre aplicações para pessoa física ou jurídica, quer envolvam apenas o risco cliente ou o risco operação. Por simplicidade, afina-se esse texto ao conceito de credit scoring stricto sensu, ou seja, a avaliação do risco de uma solicitação de crédito com o objetivo de aprová-la ou não. A utilização do credit 48 scoring para outros fins, como precificação da operação, determinação de garantias ou processo de cobrança, não será aqui discutida. Inicialmente, a proposta é avaliada por meio de critérios qualitativos. Por exemplo, a política de crédito da cooperativa irá restringir o crédito a pessoas cuja renda seja inferior a determinado valor, ocupação, propriedades, idoneidade, local e tempo de trabalho, moradia, dependentes, etc. para conceder ou não crédito ao proponente, sem claro ser preconceituoso em algum atributo. Se o cliente passa por esses filtros, seu escore é calculado e comparado com um valor predeterminado, denominado ponto de corte. Se o escore supera esse valor, a proposta é “aprovada”. Caso contrário, o crédito é “negado”. Esse fluxo, como se observa, é o mais simples possível. Decisões mais “inteligentes” não se restringem a esse sistema “passa - não passa” (LEWIS, 1992). Utilizam o valor do escore para precificar a operação, definir garantias, requerer uma avaliação mais criteriosa baseada em informações adicionais realizada por analistas de crédito experientes, entre outras. Nesse foco é que se encaminha esse texto. 1.4. Estrutura do Estudo Trata-se de um apanhado do atual estado da arte em que são tomados diversos autores e deles é extraída a essência desta ciência. A fundamentação teórica do credit risk faz a análise de crédito à pessoa física, e, em seguida, são comentados alguns pontos relevantes sobre cooperativas de crédito, em especial a que serviu de objeto de estudo. Por último, e não menos importante, fez-se a discussão dos possíveis avanços desse tema. 2. Sobre a Tomada de Decisão A expressão ‘tomada de decisão’, no sentido amplo, significa dar uma ruptura em determinado momento em quaisquer situações da vida de uma pessoa ou grupo de pessoa para novas possibilidades de ação. Sabe-se que uma mesma pessoa toma Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão decisões múltiplas no cotidiano. Goffman (2003) afirma que uma pessoa representa várias máscaras durante um dia, dependendo da fachada, toma decisões várias em ambiências diferentes. O autor utiliza a metáfora da ação teatral como estrutura de sua exposição, dizendo que todo homem, em qualquer situação social, apresenta-se diante de seus semelhantes, tenta dirigir e dominar as impressões que possam ter dele, empregando certas técnicas para a sustentação de seu desempenho, tal qual um ator que representa um personagem diante do público. A etimologia do verbo ‘tomar’ pode migrar por diversos significados e sentidos segundo o discurso proposto por qualquer pessoa ou por um gestor administrativo. Verbo ‘tomar’ significa receber (aquilo que nos é dado); pegar em; encontrar; achar; adaptar; segurar; agarrar; comer ou beber; desejar com veemência; considerar; encher; ocupar; interpretar; julgar; conquistar; ganhar militarmente; cativar; avaliar; aceitar; reputar; apanhar; alcançar; aguentar; tolher; extorquir; seguir por; assumir; etc. Já a palavra ‘decisão’ origina-se do Latim decisione(m)> ação ou resultado da ação de decidir; deliberação; resultado; intrepidez; sentença do tribunal; resolução do júri. Dessa feita, “tomada de decisão” vem desde os primórdios da vida hominídea. Acredita-se que a partir do momento em que o ser humano deixou de viver de modo nômade, somente na luta pela sua própria sobrevivência, passou a tomar decisões. Maturana (2001) relata que quando os hominídeos começaram a viver em grupo passaram a praticar coordenações de condutas consensuais. E é relevante assinalar nesse contexto que, no viver em grupo, muitas decisões em acoplamentos consensuais foram acontecendo para que as dimensões humanas, em todas as áreas, com resoluções de problemas e tomadas de decisões contínuas fortaleceram-se no cotidiano (BIEMBENGUT SANTADE, 2008; 2002:69-76). Lazzati (997:5-6) define ‘decisão’ como “escolha de um curso de ação determinado entre vários cursos de ação alternativos. Entende-se que o curso de ação elegido pode compreender uma configuração de vários cursos de ação”. Lazzati objetiva em várias definições básicas o processo decisório dizendo que quando surge um problema deve haver uma brecha entre uma situação atual ou projetada e um objetivo. O autor conota essa ‘situação projetada’ como aquela que pode chegar a ocorrer, independente do objetivo. Assim, quando necessita tomar uma decisão dentro dos problemas existentes, Lazzati distingue quatro tipos, a colocar na seguinte ordem: • O problema ‘negativo’, quando a situação atual não satisfaz o objetivo prefixado; • O problema ‘potencial’, quando a situação projetada pode ser insatisfatória; • O problema ‘de implementação’, quando já se há fixado um objetivo e não necessariamente se observa um problema negativo ou potencial, porém é preciso definir como se vai concretizar o objetivo estabelecido; • O ‘aproveitamento de oportunidades’, quando a partir de um objetivo geral (explícito ou implícito), usualmente a raiz de nova informação, se estabelece a possibilidade de desenvolver novos objetivos. Neste caso, de todos modos, se gera uma abertura entre a situação atual ou projetada e o objetivo, o qual equivale a um problema. O mesmo autor estabelece uma sinonímia entre o conceito ‘decisão’ com ‘resolução de problemas’. Define ‘resolução de problemas’ como “curso de ação que corrige a lacuna entre a situação atual ou projetada e o objetivo; aquilo que permite alcançar o objetivo”. Desse modo, Lazzati afirma que os conceitos de ‘resolução de problemas’ (RP) e de ‘tomada de decisões’ (TD) confluem-se, isso porque ambos representam um mesmo processo. Dizendo de outra forma, a resolução de qualquer problema requer a tomada de decisões; e, toda decisão implica necessariamente a existência prévia de um problema a resolver. Para o autor RP/TD significam o mesmo processo. Lazzati afirma que um gerente, dentro Interciência & Sociedade 49 SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S. qualquer nível da organização, dedica a maior parte de seu tempo à RP/TD, e que a eficácia e a eficiência gerenciais dependem em grande medida de como o gerente leva a cabo esse processo. Para o autor, vale distinguir: a quem, ou seja, as pessoas que participam no processo; o quê ou conteúdo do processo, que compreende a informação que se incorpora, as ideias que se geram, os conceitos que se produzem e as conclusões que se alcançam; o como ou desenvolvimento do processo em si, que inclui o clima das relações interpessoais (se as houver) e o método que se aplica para administrar o conteúdo (PADOVEZE, 2003: 25-32). Segundo Stoner e Freeman (1999:182), a ‘tomada de decisão’ - identificação de um problema específico e escolha de uma linha de ação para se resolvê-lo ou aproveitar uma oportunidade - é uma parte importante do estudo de todo administrador. Afirmam os autores que a tomada de decisão dá forma aos planos estratégicos e operacionais de uma empresa e que todo administrador precisa desenvolver a habilidade de tomar decisões e de resolver problemas. Para eles um problema surge quando uma situação existente difere da situação desejada. Ressaltam que em muitos casos um problema pode ser uma oportunidade disfarçada. Citam, por exemplo, uma empresa com o problema de empregados demais que isso passa a ser uma grande oportunidade de reestruturar a organização, salvando empregos e aumentando a eficiência ao mesmo tempo. Para Chiavenato (2000:416-417), ‘decisão’ é o processo de análise e escolha entre as alternativas disponíveis de cursos de ação que a pessoa deverá seguir. Para esse autor, a decisão envolve seis elementos nesta ordem: • Tomador de decisão: é a pessoa que faz uma escolha ou opção entre várias alternativas futuras de ação; • Objetivos: são os objetivos que o tomador de decisão pretende alcançar com suas ações; • Preferências: são os critérios que o tomador de decisão usa para fazer sua escolha; 50 • Estratégia: É o curso de ação que o tomador de decisão escolhe para atingir seus objetivos. O curso de ação é o caminho escolhido e depende dos recursos de que pode dispor; • Situação: são os aspectos do ambiente que envolve o tomador de decisão, alguns deles fora do seu controle, conhecimento ou compreensão e que afetam sua escolha; • Resultado: é a consequência ou resultante de uma estratégia. Ele constata que, o tomador de decisão está inserido em uma situação, pretende alcançar os objetivos, apresenta preferências pessoais e segue estratégias (cursos de ação) a fim de alcançar resultados. Desse modo, a decisão envolve uma opção e o gestor para seguir um curso de ação, deve muitas vezes abandonar outros cursos que surjam como alternativas. Para isso, existe constantemente um processo de seleção, ou melhor, de escolha de alternativas. O processo de seleção pode ser uma ação reflexa condicionada (como digitar as teclas do computador) ou produto de raciocínio, planejamento ou projeção para o futuro. O autor ressalta que todo curso de ação é orientado para um objetivo a ser alcançado e segue uma racionalidade. Se o tomador de decisão escolhe uma alternativa entre outras e se escolhe os meios apropriados para alcançar um determinado objetivo, a sua decisão está embasada na racionalidade, conforme será abordaredo mais à frente. Os tomadores de decisão ou gestores, no exercício de sua função, conduzem suas áreas de responsabilidade e respectivas atividades, de modo formalizado e estruturado por um processo de gestão. Assim, as decisões são demarcadas nas etapas de planejamento (estratégico e operacional), execução e controle. Essas decisões são tomadas para solucionar problemas ou aproveitar oportunidades (ALMEIDA, In: CATELLI, 2001:308). Nas colocações de Pereira da Silva (1997:145), a tomada de decisão pode ser entendida como a escolha entre alternativas. Para esse estudioso, todas as pessoas, em todos os dias, tomam decisões optando Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão entre as alternativas de que dispõem e conhecem. A análise do processo decisório é algo complexo, e sempre envolve experiência anterior, conhecimento sobre o que está sendo decidido, método para tomar decisão e uso de instrumentos e técnicas que auxiliam o gestor e/ou administrador. É notório que pessoas a todo o momento têm que decidir ante as mais diversas situações e sobre problemas o mais diferentes possível, utilizando-se, para isso, de suas experiências passadas, seus valores e crenças, seus conhecimentos técnicos, suas habilidades e filosofias, as quais norteiam a forma pela qual se tomam decisões. Algumas pessoas são mais conservadoras; outras possuem características inovadoras e empreendedoras e estão mais dispostas a assumir riscos em potencial. Essas diversas maneiras de tomar uma decisão podem representar tanto o sucesso como o fracasso das pessoas que a tomam e daqueles que dependem desse processo, bem como da organização na qual estejam insertas, quando são investidas do poder decisório (SOLINO e EL- AOUAR, 2001:16). Nessa afirmação acima, os autores afirmam que a tomada de decisão faz parte da vida de cada pessoa e que, na evolução da humanidade perante situações várias, o ser humano sempre esteve fazendo escolhas na melhoria de seu próprio crescimento e do destino da civilização. No caminhar do mundo empresarial, “o papel dos administradores torna-se relevante e primordial, repousando em suas mãos o futuro da civilização moderna, uma vez que tomam decisões que afetam a vida das pessoas e modelam até mesmo o seu destino” (2001:16). Portanto, na realidade da vida de um pequeno grupo de pessoas ou na realidade das empresas, o processo de tomada de decisão é bastante complexo. Isso porque o cotidiano dessas realidades, até usualmente semelhantes, concretiza-se por um emaranhado de decisões entre diferentes alternativas dinâmicas e complexas. Chega-se aqui que as definições etimológicas revelam a diversidade de conceitos na amostragem das palavras ‘tomada’ e ‘decisão’, conclamando que a expressão sintag- mática ‘tomada de decisão’ não se define por um só caminho. 2.1. Decisões programadas e não-programadas Sabe-se que a tomada de decisão não pode acontecer no acaso em uma empresa. Isso porque os problemas diferentes exigem uma diversidade de tomada de decisões. Faz-se necessário destacar, entretanto, que há as decisões programadas e as não-programadas. As decisões programadas são soluções para problemas rotineiros, que são determinadas por regras, procedimentos ou hábitos. E também, as decisões programadas são tomadas conforme as bases políticas, procedimentos ou regras, as quais podem ser escritas ou orais. Essas, muitas vezes, simplificam a tomada de decisão em situações repetitivas, limitando ou excluindo alternativas. As decisões programadas servem para enfrentar situações simples ou complexas. No entanto, elas limitam a liberdade do administrador, pois há as amarras organizacionais que condensam o tempo no intuito de economizar a sua atenção para outras atividades mais excepcionais e importantes na empresa (STONER e FREEMAN, 1999:184). As decisões não-programadas são soluções específicas criadas por meio de um processo não-estruturado para resolver problemas não-rotineiros. Essas se destinam a problemas incomuns ou excepcionais que necessitam de atenção mais acurada do administrador e merecem tratamento especial porque, na verdade, a maioria dos problemas significativos da empresa perpassa pela hierarquia organizacional. Isso significa que quanto mais um administrador ascende na estrutura da empresa, mais suas decisões serão não-programadas, e ainda, essas passam pelo processo racional. Por isso que o administrador deve estar capacitado para esse tipo de decisão. Ressalta-se, nesse contexto, que os administradores ao tomarem decisões enfrentam e pesam diferentes alternativas, que envolvem acontecimentos futuros de difícil previsão no processo decisório. Tais procedimentos vão das certezas às incerInterciência & Sociedade 51 SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S. tezas e vice-versa. Por um tempo previsto, as condições de certeza dão-lhes um certo grau de controle. Nesse sentido, o papel do administrador torna-se significativo no como transita entre as situações programadas e não-programadas por situações em turbulências. O controle do administrador torna-se grande quando se aproxima e/ou chega à certeza. E o contrário acontece quando da incerteza à turbulência leva-o ao controle bastante pequeno. Os autores definem (1999:184-5) certeza, risco, probabilidade, incerteza e turbulência da seguinte forma: • certeza: condição para tomada de decisão em que os administradores têm informações precisas, mensuráveis e confiáveis sobre os resultados das várias alternativas que estão sendo consideradas. • risco: condição para tomada de decisão em que os administradores conhecem a probabilidade de que uma determinada alternativa leve a um objetivo ou resultado desejado. • probabilidade: medida estatística da chance de que um determinado evento ou resultado venha a ocorrer. • incerteza: condição para tomada de decisão na qual os administradores enfrentam situações externas imprevisíveis ou não têm as informações necessárias para estabelecer a probabilidade de determinados eventos. • turbulência: condição para tomada de decisão que ocorre quando as metas não são claras ou quando o meio ambiente muda muito depressa. Vale lembrar que, em face da complexidade do mundo moderno e atual, as decisões são plausíveis de mudanças porque a instabilidade da economia atinge direta ou indiretamente o cotidiano das pessoas, e dessa maneira, o controle dos administradores por meio das decisões programadas permanece-se no intuito de libertar, com discernimento, suas próprias decisões em relação a situações diversas. Nas palavras de Solino e El-Aouar (2001:16), conclama-se “a análise das habilidades gerenciais requeridas pelas empresas globalizadas”, assim: 52 Insertas em um contexto de incerteza e de rápidas mudanças, as empresas estão buscando, cada vez mais, mecanismos que possibilitem maior capacidade de adaptação e até mesmo de antecipação a essas mudanças, para tornarem-se mais competitivas e, desse modo, continuarem atuando em um mercado cada vez mais dinâmico. Os autores acima destacam que extensas mudanças estão ocorrendo nas estruturas organizacionais, processos, sistemas, participação, delegação, liderança, culturas corporativas e na administração do talento humano, fazendo do administrador um tomador de decisões sólidas e dominantes, mostrando sua capacidade de saber lidar com as novas exigências, que são feitas às organizações pelos mercados mais competitivos que buscam maior responsabilidade das pessoas na organização empresarial. Para Chiavenato (2000), essa organização é um complexo de sistema de decisões em que não só o administrador quem toma as decisões, mas todas as pessoas, nesse contexto, em todas as áreas de atividades e níveis hierárquicos e em todas as situações estão de modo contínuo tomando decisão relacionadas ou não com o trabalho. Segundo esse mesmo autor, o comportamento humano nas organizações é visualizado de modo diferente por meio das diversas teorias de Administração. Para ele, ressaltam-se três teorias, a saber: • Teoria Clássica de Administração: Considera os indivíduos participantes da organização instrumentos passivos cuja produtividade varia e pode ser elevada mediante incentivos financeiros (remuneração de acordo com a produção) e condições físicas ambientais de trabalho favoráveis. É uma posição simplista e mecanicista. • Teoria das Relações Humanas: Considera os indivíduos participantes da organização possuidores de necessidades, atitudes, valores e objetivos pessoais que precisam ser identificados, estimulados e compreendidos para obter sua participação na organização, condição básica para sua eficiência. É uma posição limitada. Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão • Teoria Comportamental: Os indivíduos participantes da organização percebem, raciocinam, agem racionalmente e decidem a sua participação ou a não-participação como tomadores de opinião e decisão e solucionadores de problemas. (CHIAVENATO, 2000:416) Dentro de uma organização, cada pessoa participa consciente e racionalmente, traçando sua função nas escolhas e decisões entre diferentes alternativas de acordo com sua personalidade, motivações e atitudes. Cada pessoa influencia e recebe também influências em rede de informações e interpretações porque cada pessoa em congruência com a outra, no conjunto sistêmico, são tomadoras de decisões, processadores de informação e criadores de opinião em constantes mutações estruturais e organizacionais (CHIAVENATO, Op. cit.). 2.2. Modelo racional de tomada de decisão O modelo racional torna-se uma opção mais acertada e útil para as decisões não-programadas e para auxiliar os administradores a ultrapassarem um raciocínio a priori, que este mesmo passa a ser uma solução lógica e/ou correta aos procedimentos decisórios. Nenhuma abordagem do processo decisório pode garantir que o administrador tome sempre a decisão certa, mas os administradores que usam uma abordagem racional, inteligente e sistemática têm mais probabilidade de chegar a soluções de alta qualidade. (STONER e FREEMAN, 1999:185) Para efetuar o modelo racional de tomada de decisão, faz-se necessário passar pelo processo de quatro etapas ou estágios que colaboram aos administradores a pesar alternativas e selecionar aquela que houver chance de sucesso. Desse modo, o processo genérico de tomada de decisão racional envolve o diagnóstico, a definição e a determinação das origens do problema, a coleta e a análise dos fatos significativos ao problema, o desenvolvimento e a avaliação de soluções alternativas, a seleção da alternativa mais satisfatória e a conversão des- sa alternativa em ação, conforme afirmam Stoner e Freeman (Op. cit.). Para eles, o processo racional é composto de quatro estágios: • Examinar a situação • Criar alternativas • Avaliar as alternativas e selecionar a melhor • Implementar e monitorar a decisão Ao examinar a situação, a investigação subjacente perpassa por três aspectos: primeiramente, a definição do problema - quando o administrador deve discernir os acontecimentos ou questões que descrevem sintomas de dificuldade espraiados pela organização. Em seguida, a identificação dos objetivos da decisão - quando o administrador deve decidir o que poderia ser considerado como uma solução efetiva e deve determinar que partes do problema ele tem de resolver e quais deveriam resolver. No terceiro aspecto, deve se fazer um diagnóstico das causas - o administrador deve determinar as ações necessárias para realizar a solução satisfatória. No entanto, deve antes obter uma compreensão firme de todas as origens do problema a fim de formular hipóteses sobre as causas. Essas causas muitas vezes estão camufladas no sistema organizacional e, assim, passa a exigir do administrador a intuição para identificá-las. Ao criar alternativas, o administrador deve saber discernir as alternativas relevantes daquelas não viáveis para o problema delimitado. Quando se faz a escolha pelas alternativas mais viáveis e criadas, o administrador corre menos risco de cair em tentação de solucionar problemas, propondo alternativas espontâneas sem o aparato racional e sem a preocupação com a realidade ou a tradição. Ao avaliar as alternativas e selecionar a melhor, o administrador, depois de ter criado um conjunto de alternativas, e para cada uma delas, deve perpassar por três perguntas fundamentais: 1. Esta alternativa é exequível? 2. Esta alternativa é uma solução satisfatória? 3. Quais são as consequências possíveis para o resto da orInterciência & Sociedade 53 SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S. ganização? Para cada uma dessas perguntas, surgem outras questões conectadas, dando caminhos mais claros para se chegar à seleção da melhor alternativa que apresentará a tomada de decisão racional para a solução e/ou avaliação mais acertada. A partir do momento em que uma alternativa for considerada melhor, ela mesma gera outra dicotomia “sim” ou “não” na busca de outra alternativa positiva e assim por diante até se chegar uma alternativa bem selecionada nesse estágio do modelo racional. Ao implementar e monitorar a decisão, o administrador já estará, neste estágio, com a melhor alternativa para enfrentar as exigências e os problemas que podem ser suscitados em sua implementação. Isso significa que a implementação de uma decisão um conjunto de fatores e recursos que devem ser apontados de acordo com a necessidade do administrador monitorar a decisão. Nesse contexto, o administrador estabelece orçamentos e cronogramas para a operacionalização da decisão. E esse processo decisório deve ser medido em termos específicos pelas tarefas atribuídas com responsabilidade para haver, em seguida, os procedimentos na feitura de relatórios sobre o processo e para, na sequência dele, fazer as correções caso surjam novos problemas. Conclui-se que “orçamentos, cronogramas e relatórios de processo são essenciais para o desempenho das funções dos administradores” (STONER e FREEMAN, 1999). Durante todo o processo decisório nas quatro etapas, identificaram-se os riscos e as incertezas, que jamais podem ser esquecidas ou descartadas no momento de avaliação. Muitas vezes, acredita-se que o que emerge na decisão deve ser lembrado. No entanto, as incertezas possíveis e os riscos potenciais dão caminhos para reexaminar sua decisão para, assim, elaborar planos mais afinados e detalhados a fim de lidar melhor com riscos e incertezas que podem advir no sistema organizacional. Vale salientar, nesse momento, que uma decisão pode ser tomada como a melhor pelo administrador, mas os subordinados, no organograma empresarial, não estarem preparados para realizá-la de maneira eficaz. Assim, toda a decisão deve ser monitorada 54 em processo contínuo pelo(s) gestor(es). Ao tomar decisões que precisem da aceitação por parte dos outros, os administradores eficazes compartilham as responsabilidades da tomada de decisão com os subordinados quando as prováveis melhoras da qualidade e do moral do pessoal ultrapassem os prováveis custos em tempo e dinheiro, sabendo que os administradores continuam com a responsabilidade final pela tomada e pela aplicação das decisões. (STONER e FREEMAN, 1999:195) 2.3. Caminhos intuitivos na empresa No âmbito empresarial, as decisões constituem o núcleo de grande responsabilidade administrativa porque cabe ao tomador de decisão a ação de decidir no momento em que surgem os problemas. Isso implica a ele saber selecionar entre uma multiplicidade de alternativas aquela que melhor pareça adequada para o momento. E, muitas vezes, mesmo com um modelo racional de tomada de decisão, não se sanam os problemas de modo estabilizante. Embora, no poder decisório, o fracasso ou o sucesso não esteja explícito, há a necessidade de tirar o endurecimento das decisões racionais e prontas. Apesar do modelo racional de tomada de decisão dar suporte para a identificação de problemas, para o estabelecimento de objetivos e metas específicas e de medida de resultados, para desenvolvimento de alternativas, para escolha de uma alternativa, para implantação da decisão e para o controle e avaliação, há constantemente ‘buracos negros’ no processo decisório. Na verdade, o processo raciocinar nasce do emocionar, segundo Maturana (2001). Na travessia entre o emocionar e o racionar, surge a intuição em qualquer atividade da vida comum ou da organização empresarial. A intuição é a percepção imediata das coisas e ela é um saber que antecede ao raciocínio lógico. De nada serve guardar arquivos com conhecimentos que não vão ser compar- Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão tilhados com nossos congêneres. Não há razão para manter informação que não vai enriquecer a vida cotidiana da existência singular. Nenhum sentido tem acumular verdades que não se transformam em padrões de vida e critérios certos para relacionar-nos com as outras espécies viventes. Não é possível continuarmos pensando o técnico como sede do saber, porque o conhecimento não está aqui nem ali, nem no sujeito nem no objeto, mas num lugar intermediário, lugar da interação e da construção conjunta. Um modelo de conhecimento que não exclua a ternura ingressa necessariamente pela racionalidade ecológica, considerando fundamental a dependência, a descentralização e a singularidade, aberto à interação e sem fechar-se em nenhum momento com a arrogância de um gesto imperial. (RESTREPO, 1998:85) Conforme esse autor, o texto contempla as formas perceptivas e emocionais, contrapondo com o profissional que só toma suas decisões racionais num relacionamento frio e objetivo. Isso porque “a vivência da rotina é, antes de tudo, um problema perceptual” (1998:98). 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS O texto que aqui foi exposto possui vários pontos que devem ainda serem explorados, a saber: (i) o modelo não é estático, ou seja, a pontuação deve ser ajustada no tempo e no espaço, ou seja, ele deve ser dimensionado com a região em que se aplica e também ser revisto de tempos em tempos, pois é certo que pequenas flutuações irão ocorrer. Além disso, há como mudar o nível de risco que neste trabalho foi assumido em 50%, ou seja, conforme algum “termômetro econômico” ou grupo de especialistas, este nível pode variar para mais ou para menos, conforme os interesses no instante; (ii) haveria que se fazer uma análise estatística das componentes principais para determinar vetores que adimplentes e inadimplentes possuem em comum; (iii) há como fazer um tratamento difuso das informações e daí criar medidas de “possibilidade”, diferentes das criadas neste estudo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, L. B. Sistema de informação de gestão econômica. In: CATELLI, Armando (coord.). Controladoria: uma abordagem da gestão econômica – GECON. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2001. pp. 308-322. BIEMBENGUT, M. S. Número de ouro e secção áurea. FURB: Blumenau, 1996. BIEMBENGUT SANTADE, M. S. A organização da vida nas dimensões do ser humano. In: Apreciações semânticas de relatos de aprendizagem. Tese de Doutorado em Educação. 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RESTREPO, L. C. O direito à ternura. Trad. Lúcia M. Endlich Orth. Petrópolis,RJ: Vozes, 1998. SICSÚ, A. L. Desenvolvimento de um sistema de credit scoring. In: Gestão de riscos no Brasil. São Paulo: FCE, 2003. SILVA, J. P. Análise e decisão de crédito. São Paulo: Atlas, 1988. SILVA, J. P. Gestão e análise de risco de crédito. São Paulo: Atlas, 1997. SIMONSEN, M. H. Análise do “modelo” brasileiro. v. 92. 8.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1986. SMITH, A. A Riqueza das Nações. Vol. 1, Livro 2º, Interciência & Sociedade 55 SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S. São Paulo: Abril Cultural, 1982. SOLINO, A. S.; EL-AOUAR, W. A. O processo de tomada de decisões estratégicas: entre a intuição e a racionalidade. Caderno de Pesquisas em Administração. São Paulo, v. 08, nº 3, julho/setembro 2001. STONER, J. A. F.; FREEMAN, R. E. Administração. 5.ed. Trad. Alves Calado. Rio de Janeiro, RJ: LTC, 1999. VON NEUMANN, J.; MORGENSTERN, O. The Theory of Games and Economic Behavior. Princeton University Press, Princeton, NJ., 1944. Hélio Oliva do Amaral Santade é Mestre em Administração pela Universidade Metodista de Piracicaba-UNIMEP. Especialista em Controladoria pelo Instituto Paulista de Ensino e Pesquisa - IPEP, Mantenedora da Faculdade de Ciências Empresariais – FACEMC. Graduado em Economia pela Universidade de Marília-UNIMAR-SP. Atualmente é professor de Contabilidade e Administração Financeira do Curso de Administração da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro-FMPFM e do Curso de Administração da Instituição de Ensino São Francisco-IESF em Mogi Guaçu-SP. Consultor de Empresa e Gerente Administrativo da GS Informática e Gerente Geral da Empresa Vita Suco de Mogi Guaçu-SP-Brasil. Possui larga experiência na área de Administração, com ênfase em Administração Empresarial como Gerente de Custos e Vendas, atuando principalmente nos seguintes temas: produção; qualidade; custos; crm; relacionamento; marketing. Maria Suzett Biembengut Santade é Pós-Doutora em Letras na Linha de Pesquisa: Ensino da Língua Portuguesa: história, políticas, sentido social, metodologias e pesquisa, no Instituto de Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro-UERJ-Brasil. Pós-Doutora em Educação na área de Metodologia do Ensino do Português, no Instituto de Educação da Universidade do Minho-UMINHO, Braga-Portugal. Doutora em Educação pela UNIMEP. Mestre em Educação pela PUC-Campinas. Graduada em Letras Vernáculas - Francês e Inglês em Línguas e Literaturas pela FFCL-UNESP. Graduada em Pedagogia com Habilitação em Administração e Supervisão. Atualmente é professora colaboradora da UERJ e Pesquisadora do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil / CNPq / Grupos de Pesquisa: Semiótica, leitura e produção de textos e Crítica Textual e Edição de Textos (UERJ-CNPq). Coordenadora e Professora Titular do Curso de Letras na Graduação & Pós-Graduação Lato Sensu das Faculdades Integradas Maria Imaculada-FIMI e Professora Titular da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro-FMPFM de Mogi Guaçu-SP-Brasil. 56 Interciência & Sociedade CONSTRUÇÃO DE UM CONTROLADOR DIGITAL DE PROCESSOS DINÂMICOS: possibilidades para educação tecnológica CAMARGO, José Tarcísio Franco de Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal (CREUPI) Centro Guaçuano de Educação Profissional “Gov. Mário Covas” [email protected] BARROS FILHO, Jomar Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) [email protected] BORTOLOTI, João Alexandre Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) [email protected] VERASZTO, Estéfano Vizconde Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) Instituição de Ensino São Francisco (IESF) [email protected] MAIA, Daltamir Justino Faculdade Comunitária de Campinas (FAC) [email protected] RESUMO: Este projeto apresenta um controlador programável flexível, eficiente e de baixo custo, construído com o propósito de fornecer um instrumento alternativo para o controle digital de processos dinâmicos. Dentro deste escopo, apresentamos a sua concepção eletrônica, sua proposta para programação, alguns módulos de interfaceamento e possíveis aplicações para o mesmo. Particularmente, esta proposta se direciona ao desenvolvimento de trabalhos de iniciação científica com características interdiciplinares, envolvendo o curso de Ciência da Computação, permitindo que os alunos de graduação revejam e implementem boa parte dos conceitos teóricos já estudados, ao mesmo tempo em que proporciona aos alunos uma visão mais ampla das implicações sociais do uso da tecnologia na qual estão envolvidos. PALAVRAS-CHAVE: controle, automação, informática, eletrônica. ABSTRACT: This project presents a flexible programmable controller, efficient and with low cost, built to provide an alternative instrument to digitally control a dynamical process. Within this scope, we present the electronic conception, its programming paradigm, some interface modules and possible applications for the device. In particular, this proposal is driven to the development of scientific works with interdisciplinary characteristics, involving the Course of Computer Science, allowing the under graduation students to review and implement a large range of theoretical concepts already studied, at the same time it offers to the students a wider view of the social impacts of the use of the technology they are involved. KEYWORDS: control, automation, informatics, electronics. Interciência & Sociedade 57 CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA, D. J. 1. INTRODUÇÃO O custo relativamente alto de um controlador lógico programável (CLP) muitas vezes torna o seu uso proibitivo para determinadas aplicações, tornando-o basicamente um elemento presente apenas em empresas de médio ou grande porte que necessitam do controle automático de seus processos. Assim, uma grande classe de potenciais usuários torna-se excluída do uso desta tecnologia, se levados em consideração os seus custos. Além disso, os CLPs oferecem aos alunos dos cursos das áreas ligadas à Ciência da Computação a oportunidade de desenvolvimento de diversos trabalhos com características mais interdisicplinares, através de tecnologias capazes de trabalhar na interface de várias disciplinas dos cursos de graduação promovendo assim uma primeira oportunidade de integração. Ressalta-se que os custos não se encontram, necessariamente, no hardware do dispositivo, mas inclusive no software que gerencia o mesmo, o qual muitas vezes apresenta um custo bastante superior ao do hardware. Neste sentido, torna-se bastante atraente a ideia de se desenvolver um controlador que seja, simultaneamente, acessível em termos de seus custos e flexível em termos de suas aplicações. Para se alcançar este objetivo, é interessante adotar como modelo uma estrutura modular, onde a um bloco fundamental (o controlador em si) são adicionados módulos com funções específicas conforme a necessidade do processo a ser controlado. Por exemplo, para o controle de um servomotor poderá ser utilizado um módulo diferente daquele que seria utilizado para o controle de um aquecedor. Assim, a necessidade de um determinado módulo não implica na aquisição compulsória de outros. A possibilidade de o sistema cole- 58 tar dados e, baseando-se nestas informações, tomar decisões de controle gera um processo automatizado muito mais sofisticado que um mero sistema mecanizado cujo objetivo é realizar uma série de ações por repetidas vezes. Sob o ponto de vista do software, pode-se adotar postura semelhante, considerando-se que rotinas específicas podem ser desenvolvidas para aplicações específicas. Esta postura certamente contribui para a redução do custo do software, pois: • atende apenas às particularidades de uma determinada necessidade de controle; • reduz a probabilidade de ocorrência de bugs no software desenvolvido; • reduz o tempo de criação do software e • contribui para a facilitar o aprendizado do uso do sistema de controle. As seções seguintes apresentam detalhes sobre a proposta deste artigo. 2. Definição do modelo para o controlador Conforme indicado pela Figura 1, este controlador atua sobre um processo em regime de malha fechada. De acordo com esta Figura, o controlador pode atuar em modo “autônomo”, quando todo o processo de controle é realizado pelo mesmo, ou em modo “supervisionado”, quando o controle do processo é dividido entre o controlador e um computador. Como pode ser observado através da Figura 1, o controlador é capaz de coletar informações (dados) provenientes das “variáveis de estado” do processo sob controle e atuar sobre este processo mediante a análise das instâncias destas variáveis. Interciência & Sociedade Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação tecnológica Nesta arquitetura, os módulos auxiliares são os elementos que efetivamente coletam informações e atuam sobre o sistema. O módulo de controle, por sua vez, é capaz de receber informações dos módulos auxiliares de entrada, processá-las internamente e acionar os devidos módulos auxiliares de saída, atuando diretamente sobre o controle do processo, caso este se encontre em modo “autônomo”. Caso o controlador encontre-se em modo “supervisionado”, este deverá repassar informações sobre o estado do processo para um computador externo, aguardando comandos deste computador para o acionamento dos módulos auxiliares adequados. A correta seleção entre os modos de operação “autônomo” ou “supervisionado” para o controle do processo é importante pois, considerando-se a relativa simplicidade do controlador, em determinados casos o módulo de controle será incapaz de processar em tempo hábil um certo volume de informações de entrada. Neste caso, torna-se imprescindível a utilização de um computador externo de forma a não ser comprometido o desempenho do processo a ser controlado. Figura 1. Representação do modo de atuação do controlador (elaborado pelos autores). Tendo por base a proposta de utilização de uma estrutura modular, a arquitetura do controlador pode ser esboçada de acordo com a Figura 2. 3. Implementação do hardware do controlador Figura 2. Estrutura modular proposta para o controlador (elaborado pelos autores). Seguindo a linha da flexibilidade desejada para o controlador, pode-se propor ao menos duas soluções simples, eficientes e de baixo custo para o Módulo de Controle. Caso o processo a ser controlado admita apenas variáveis digitais, ou caso a atuação sobre este necessite apenas de um controle por PWM (Pulse Width Modulation), um microcontrolador apenas com entradas e saídas digitais pode ser suficiente. A Figura 3 apresenta esta versão mais simples para o Módulo de Controle. Interciência & Sociedade 59 CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA, D. J. Figura 3. Módulo de controle exclusivamente digital (elaborado pelos autores). Este circuito tem como elemento principal um microcontrolador PIC 16F628A (MICROCHIP TECHNOLOGY, 2009) com duas portas, sendo que a “Porta A”, de 5 bits, é utilizada como canal de comunicação entre este microcontrolador e um computador, e a “Porta B”, de 8 bits, é utilizada como canal (digital) de comunicação entre o microcontrolador e os módulos auxiliares. A “Porta A” não se comunica diretamente com um computador externo. Esta comunicação é realizada através de um circuito integrado MAX232 (TEXAS INSTRUMENTS, 2002), o qual se conecta a uma porta serial padrão RS-232 do computador, tal que a comunicação microcontrolador / microprocessador possa ser efetivamente realizada. 60 Por sua vez, a “Porta B” do microcontrolador pode ser diretamente conectada a linhas digitais convencionais, importando ou exportando dados para os módulos auxiliares. Na implementação apresentada, a “Porta B” encontra-se preparada para também atuar como geradora de sinais PWM para o acionamento de servomotores adequados. Conforme mencionado previamente, esta implementação não prevê o controle de sinais analógicos, o que a torna significativamente limitada. De forma a compensar esta limitação, a Figura 4 apresenta uma implementação que prevê a utilização de sinais analógicos e digitais. Interciência & Sociedade Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação tecnológica Figura 4. Módulo de controle com capacidade analógica (elaborado pelos autores). Esta implementação se fundamenta na utilização de um microcontrolador PIC 16F877A (MICROCHIP TECHNOLOGY, 2002), dotado de cinco portas, com capacidade de tratamento de sinais digitais e analógicos. Nesta arquitetura, além do microcontrolador em si, há basicamente um circuito integrado MAX232, responsável pela comunicação do controlador com um computador externo, além de dois circuitos integrados reguladores de tensão. A “Porta A” do microcontrolador pode ser utilizada como via de entrada e saída digital, além de entrada analógica de dados. A “Porta B” foi concebida para fornecer sinais PWM para servo-motores eventualmente conectados ao controlador. Esta configuração pode ser revertida para o uso de sinais digitais ordinários sem necessidade de alteração no hardware da placa. A “Porta C” concentra o canal de comunicação do controlador com o computador externo, através da interface RS-232. A “Porta D” foi concebida para operar em modo puramente digital, podendo ser acionada de forma “bit-a-bit” ou como uma porta paralela de oito bits. Finalmente a “Porta E” pode operar como entrada/saída digital, entrada de controle digital ou entrada analógica. 3.1. Módulos auxiliares Conforme mencionado anteriormente, os módulos auxiliares são constituídos pelos elementos eletrônicos adicionais necessários para que o módulo de controle possa interagir adequadamente com o processo sob controle do mesmo. Dada a proposta de arquitetura flexível, não há um número fixo e previsível de módulos para este projeto. Assim, os módulos devem ser criados em função das necessidades de controle de cada processo. A Figura 5 ilustra um possível módulo auxiliar de entrada, que pode ser utilizado como parte do mecanismo de monitoramento da temperatura de um processo, por exemplo. Interciência & Sociedade 61 CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA, D. J. Figura 5. Módulo auxiliar de entrada para verificação de temperatura (elaborado pelos autores). Trata-se de um módulo bastante simples, baseado em um sensor de temperatura LM35 (NATIONAL SEMICONDUCTOR, 2000), acoplado a um amplificador operacional que promove um ganho no sinal proveniente deste sensor e o entrega a uma das entradas analógicas do microcontrolador. Como exemplo de um módulo auxiliar de saída, podemos ter um driver de motor de passo, conforme apresentado na Figura 6. Este módulo é composto exclusivamente por um circuito integrado ULN2003 (ST MICROELECTRONICS, 2007) que funciona como um driver para o motor de passo. O sinal digital proveniente do microcontrolador é amplificado pelo driver, sendo posteriormente entregue ao motor de passo. O controle da sequência de acionamento do motor (full step / half step) é gerado previamente pelo microcontrolador. Alguns dispositivos não necessitam de interfaces ou módulos auxiliares para serem acionados pelo controlador. É o caso, por exemplo, de pequenos servomotores, acionados por PWM, que podem ser conectados diretamente no módulo de controle. Neste caso, o acionamento de um ou mais servo motores exigirá que o microcontrolador seja devidamente programado e, também, que o módulo de controle opere em “modo supervisionado”. Em várias engenharias como de produção e química estes processos são largamente empregados. O interfaceamento está presente no controle de reatores, linhas de alimentação, monitoramento, controladores de pressão, amostradores e linhas de descarte. Algumas outras implementações interessantes para este tipo de controlador podem ser observadas em (IOVINE, 2004). A seção seguinte descreve como os elementos de software se encaixam no contexto deste controlador. 4. O software do controlador O software do controlador pode ser dividido em duas partes: Figura 6. Módulo auxiliar de saída para acionamento de um motor de passo (elaborado pelos autores). 62 1. um firmware, interno ao microcontrolador, que efetivamente receberá e enviará comandos aos módulos auxiliares, além de efetuar o controle do fluxo de informações entre o próprio controlador e um microcomputador e 2. uma “interface com o usuário”, caso o controlador venha a atuar em modo “supervisionado”, através da qual um “operador” desta interface poderá efetivamenInterciência & Sociedade Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação tecnológica te atuar sobre o processo a ser controlado. As subseções seguintes apresentam mais detalhes sobre o firmware e sobre a interface com o usuário. 4.1. O firmware do microcontrolador O firmware que ficará embutido no microcontrolador deverá ser implementado de acordo com o modo de operação em que se pretende utilizar o controlador. Caso este deva funcionar em modo “autônomo”, todas as rotinas de tratamento do processo sob controle deverão ser previstas neste firmware, tornando o controlador independente de um computador externo. Ao contrário, caso o controlador venha a atuar em modo “supervisionado”, o firmware deverá ser implementado de forma a encaminhar ao computador externo as devidas instâncias das variáveis de controle do processo, recebendo deste os comandos exatos para a atuação sobre o processo, acionando os módulos auxiliares adequados. Como exemplo ilustrativo, considere o controlador apresentado na Figura 3, operando em modo supervisionado, sendo utilizado para controlar simultaneamente a posição de oito servomotores. Neste caso, o firmware deverá ser desenvolvido de forma a receber “comandos” provenientes da interface com o usuário, os quais indicarão as ações a serem executadas pelos servomotores acoplados ao controlador. Para tanto, o microcontrolador da interface de controle foi configurado tal que sua “Porta A” seja utilizada para a comunicação serial entre este e um microcomputador e sua “Porta B” seja utilizada para o acionamento dos servos. As instruções de comando deverão ser descritas sob a forma de um ou dois bytes, dependendo da ação a ser realizada. Normalmente, em uma instrução de dois bytes o primeiro indicará a ação a ser executada (“byte de comando”) e o segundo será o parâmetro deste comando (por exemplo, o ângulo de rotação do servomotor). Um “byte de comando” é dividido em dois nibbles, sendo que os quatro bits mais significativos indicam o comando propriamente dito e os quatro bits menos signifi- cativos indicam o “canal” (servomotor) a ser acionado. O firmware reconhece os seguintes tipos de instrução: • Reinicialização do dispositivo: todas as saídas são desligadas e os servos são desabilitados (um byte). • Habilitação de servomotor: torna um determinado servomotor apto a receber comandos de posicionamento. O microcontrolador começa a gerar pulsos para um dado servomotor (um byte). • Desabilitação de servomotor: torna um determinado servomotor incapaz de receber comandos de posicionamento. O microcontrolador pára de gerar pulsos para um dado servomotos (um byte). • Ajuste de centro (offset) de servomotor: determina a posição central de um determinado servomotor. A partir desta posição o servomotor poderá se deslocar de 45o para a direita ou para a esquerda (dois bytes). • Ajuste de posição de servomotor: determina a orientação do eixo do servomotor a partir do “ponto de offset” previamente ajustado (dois bytes). O fluxograma seguinte indica o funcionamento básico do firmware do controlador nesta situação. 1. Desabilita todas as interrupções do microcontrolador. 2. Configura “Porta A” do microcontrolador como porta de I/O serial. 3. Configura a “Porta B” do microcontrolador como porta de saída para os servomotores. 4. Desabilita a recepção de dados mantendo a via CTS em nível alto. 5. Transmite mensagem de “power on” para a interface com o usuário. 6. Inicializa os servomotores. 7. Habilita a interrupção de “Timer 0” do microcontrolador. 8. Inicializa o “timer” de 20ms (ciclo dos servomotores). 9. Habilita a recepção de dados mantendo a via CTS em nível baixo. 10. Captura um comando através da porta serial. 11. Desabilita a recepção de dados e mantendo a via CTS em nível alto. 12. Processa o comando recebido e atualiza o estado dos servomotores se necesário. 13. Aguarda a conclusão do ciclo de 20ms e retorna a (8.). Interciência & Sociedade 63 CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA, D. J. Pode ser notado que, além dos parâmetros de configuração do sistema, o firmware consiste em uma rotina que, a cada 20 ms (período de trabalho dos servomotores), faz uma leitura da porta serial em busca de um comando e, com este, efetua, se necessário, a atualização dos servomotores conectados ao controlador. A programação e a verificação do firmware do microcontrolador poderá ser realizada através de um sotware fornecido pelo próprio fabricante (MICROCHIP TECHNOLOGY, 2009). 4.2. A interface com o usuário Conforme mencionado, a interface com o usuário só tem sentido se o controlador atuar em modo “supervisionado”. Neste caso, de acordo com o exemplo inicialmente apresentado na seção anterior, a interface com o usuário tem por finalidade obter do “usuário” parâmetros para o devido posicionamento de cada um dos servomotores conectados ao controlador. Através da inter- face o usuário pode: • Configurar a porta de comunicação serial onde está conectado o controlador. • Habilitar ou desabilitar cada um dos servomotores conectados aos controlador. • Ajustar a posição central (offset) de cada servomotor. • Ajustar a posição de cada servomotor. • Memorizar as posições do conjunto de servomotores (em arquivo). • Executar “roteiros” que descrevem um conjunto de “posições-alvo” para cada um dos servos. • Ajustar a velocidade de transição de posições dos servomotores durante a execução de um roteiro. A Figura 7 apresenta o aspecto da interface com o usuário. Figura 7. Aspecto da interface com o usuário (elaborado pelos autores). 64 Interciência & Sociedade Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação tecnológica Após carregar a interface o usuário deve, inicialmente, estabelecer a conexão da mesma com a placa de controle. Para tanto, ele deve ajustar os devidos parâmetros da porta serial de conexão: número da porta, velocidade de transmissão / recepção, paridade, número de bits de dados e número de bits de parada. Após o ajuste desta configuração, pode-se iniciar a comunicação entre a interface e o controlador. O indicador “Connected” mostra que a conexão foi estabelecida com sucesso. Tendo sido estabelecida a conexão com a placa de controle, a partir deste ponto o usuário poderá ajustar e gravar a posição de cada um dos servomotores, criar um “roteiro” de movimento dos servos ou mesmo executar (“play” ou “soft play”) um roteiro previamente armazenado. Como pode ser observado, o ajuste dos servomotores pode ser realizado individualmente. Previamente à execução de um roteiro de posicionamento dos servos, o parâmetro “Resolution” deve ser ajustado para que o movimento dos servos ocorra da forma desejada. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este texto apresentou uma proposta para implementação de um controlador programável, flexível e de baixo custo, que pode ser facilmente adaptado para o controle de diversos tipos de processos. O protótipo mostrado na Figura 8 consiste em uma implementação de baixíssimo custo (inferior a U$30.00) do circuito apresentado na Figura 3, sendo capaz de controlar de forma eficiente oito servomotores simultaneamente. 5. O controlador e suas possibilidades educativas No âmbito de um curso de graduação em Ciência da Computação, este controlador permite o desenvolvimento de trabalhos de iniciação científica com características interdiciplinares. Por exemplo, a partir dos circuitos apresentados, pode-se projetar uma estação meteorológica de baixo custo que permita realizar o monitoramento de variáveis ambientais tais como temperatura, pressão atmosférica, humidade relativa do ar, etc. Ou ainda medidas de parâmetros indicativos da qualidade da água em rios como o pH e intensidade da radiação ultravioleta solar. Tais dados podem ser tomados diariamente ao longo de um semestre inteiro gerando um banco de dados que, por exemplo, pode ser usado nas aulas de estatística do curso de engenharia ambiental e mesmo, disponibilizados para as escolas que estão na mesma região geográfica da faculdade. Figura 8: Foto de uma placa de controle (elaborado pelos autores). A arquitetura modular permite que sejam implementados apenas os módulos realmente necessários para o controle de determinados sistemas, o que pode vir a reduzir significativamente os custos e o próprio tempo de desenvolvimento do controlador, tanto no nível do hardware, quanto do software. Da mesma forma, a possibilidade de operação nos modos “autônomo” ou “supervisionado” contribui para a simplificação e flexibilização do seu uso. Um ponto a ser atacado futuramente, na sequência deste projeto, consiste na necessidade de tornar este controlador operável de forma remota, por exemplo, através de uma conexão por rádio-frequência ou mesmo através do acionamento via internet. Interciência & Sociedade 65 CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA, D. J. Tomando como norte estas diretrizes e pensando na utilização deste controlador em atividades práticas de ensino, o desenvolvimento de um projeto deste tipo, além de permitir que os alunos de graduação revejam e implementem uma boa parte dos conceitos teóricos de algumas disciplinas específicas do curso de Ciência da Computação, também permite que estes estudantes formem uma visão mais ampla das implicações sociais a respeito do uso da tecnologia na qual estão envolvidos. Vale também notar que com o domínio da tecnologia e sua aplicação naturalmente cria-se a expectativa do aperfeiçoamento dos modelos empregados e a geração de novas linhas de pesquisa. Esta conseqüência é importante, pois permite que empresas da região automatizem seus processos e que novos canais com o meio acadêmico sejam gerados para o desenvolvimento de novas tecnologias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS IOVINE, J. PIC Robotics: A Beginner’s Guide to Robotics Projects Using the PICmicro. Mc-Graw-Hill, 2004. ISBN: 0-07-139455-9. MICROCHIP TECHNOLOGY INC.; PIC 16F87XA Data Sheet; 2002. MICROCHIP TECHNOLOGY INC.; MPLAB IDE Quick Start Guide; 2007. MICROCHIP TECHNOLOGY INC.; 16F627A/628A/648A Data Sheet; 2009. PIC NATIONAL SEMICONDUCTOR INC.; Precision Centigrade Temperature Sensors; 2000. ST MICROELECTRONICS GROUP; Seven Darlington Array; 2007. TEXAS INSTRUMENTS INC.; Dual EIA-232 Drivers/ Receivers; 2002. José Tarcísio Franco de Camargo é graduado em Engenharia Elétrica (UNICAMP – 1989), possui mestrado em Engenharia Elétrica na área de Eletrônica e Telecomunicações (UNICAMP – 1992) e doutorado em Engenharia Elétrica na área de Computação e Automação (UNICAMP – 1995). Atua como professor universitário desde 1990, sendo atualmente professor e coordenador de cursos na Faculdade Municipal “Professor Franco Montoro” (Mogi Guaçu – SP) e no Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal (Espírito Santo do Pinhal – SP). Seus interesses de pesquisa abrangem as áreas de controle e automação e computação gráfica, aplicados ao ensino de engenharia. Jomar Barros Filho é graduado em Física (Unicamp – 1997), mestre em Educação na área de Metodologia de Ensino (Unicamp – 1999) e doutor em Educação na área de Educação, Ciência e Tecnologia (Unicamp - 2002). Professor universitário desde 2001, ministra disciplinas das áeras de física e matemática em cursos de engenharia. Como pesquisador publica nas áreas de ensino de engenharia e de tecnologia, avaliação da aprendizagem e formação de professores. João Alexandre Bortoloti é graduado em Química (Unicamp – 1998), Mestre em Físico-Química (Unicamp – 2001) e Doutorado em Ciências (Unicamp – 2006). Atua como professor universitário desde 2002 em disciplinas da área de Química, Estatística e Matemática em cursos de engenharia. Como pesquisador publica nas áreas de Química Analítica, Quimiometria, ensino de Engenharia e Tecnologia. Estéfano Vizconde Veraszto possui graduação em Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e é Mestre e Doutor em Educação, Ciência e Tecnologia pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Possui estágio doutoral no exterior na Facultada de Ciencias de la Información da Universidad Complutense de Madrid (UCM). Atualmente é diretor e professor da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”, pesquisador do Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, pesquisador colaborador da Universidad Nacional de Educación a Distáncia (UNED/España), pesquisador colaborador da Facultad de Ciencias de la Información da Universidad Complutense de Madrid e docente da Instituição de Ensino São Francisco (IESF). Daltamir Justino Maia é graduado em Química (Unicamp – 1991), Mestre em Química Inorgânica (Unicamp – 1993) e Doutorado em Ciências (Unicamp – 1999). Atua como professor Titular na Faculdade Comunitária de Campinas (FAC III), lecionando as disciplinas Química Geral e de Materiais metálicos para Engenharia. Além disso, é autor de livros didáticos na área de Química: Livro texto aprovado no PNLEM 2008 – Universo da Química. 66 Interciência & Sociedade CONCESSÃO DE CRÉDITO E MODELAÇÃO DA TOMADA DE DECISÃO COSTA, Rodrigo Simão da Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos (UNIFEOB) [email protected] RESUMO: A Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) se tornou obrigatória no Brasil com a criação da Lei 11.638/2007 e, desde então, todos os profissionais que fazem parte do ambiente empresarial precisaram conhecer essa demonstração e saber interpretar os seus resultados. Com o presente estudo, procurou-se através de uma pesquisa bibliográfica abordar os conceitos e a estrutura da DFC e, ao final, apresentar a resolução passo-a-passo de um exemplo prático para demonstrar as suas técnicas de elaboração. PALAVRAS-CHAVE: Fluxo de Caixa, Contabilidade, Finanças, Demonstração. ABSTRACT: The Statement of Cash Flows (CFD) became mandatory in Brazil with the creation of Law 11638/2007, and since then, all professionals who are part of the business environment needed to go through this demonstration and to interpret their results. In fact, the control box has always been practiced by companies, but the CFD brought a standardization to that tool. As the present study, we sought through a literature search addressing the concepts and structure of the CFD and at the final table the resolution step by step in a practical example to demonstrate their techniques of manufacture. KEYWORDS: Cash Flow, Accounting, Finance, Demo. 1. INTRODUÇÃO No atual mundo competitivo e globalizado, cada vez mais se torna necessária a utilização de ferramentas que garantam a sobrevivência das empresas no mercado. Com a criação da Lei 11.638, em 28 de Dezembro de 2007, a Contabilidade brasileira passou a ser convertida nos moldes do padrão internacional, isto é, das IFRS – International Financial Reporting Standards e, somada ao intenso processo de informatização do sistema de fiscalização, tornou a Contabilidade, mais do que nunca, peça chave para a sobrevivência das empresas. Uma das novidades apresentada por essa lei foi a obrigatoriedade da Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC), em substituição à antiga DOAR – Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos. Mesmo antes da aprovação da lei, o IBRACON (Instituto dos Auditores Independentes do Brasil), pela NPC 20, de abril de 1999, e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), já recomendavam a apresentação da DFC como informação complementar. (FIPECAFI, 2010, p.565). Salotti e Yamamoto (2008, p.48) elaboraram uma pesquisa onde constataram que as companhias abertas que negociam suas ações na BOVESPA, divulgavam a DFC de forma voluntária antes da adoção da Lei 11.638/2007 porque já a divulgavam em período anterior e também porque dão mais importância às percepções dos seus outsiders (usuários externos). Nem todas as empresas estão obrigadas a apresentar a DFC, por exemplo, ficam dispensadas as sociedades anônimas de capital fechado com patrimônio líquido reduzido (inferior a R$ 2.000.000,00 na data do balanço) e as sociedades limitadas de pequeno e médio porte (as que possuem ativo total igual ou inferior a R$ 240.000.000,00 ou receita bruta anual igual ou inferior a R$ 300.000.000,00). A utilização da DFC pode proporcionar todo um gerenciamento do caixa, Interciência & Sociedade 67 COSTA, R. S. da onde as empresas podem identificar os períodos de sobra e escassez de recursos. Sobre esse aspecto, Marion (2009, p.446) diz que “por meio do planejamento financeiro o gerente saberá o montante certo em que contrairá empréstimos para cobrir a falta (insuficiência) de fundos, bem como quando aplicar no mercado financeiro o excesso de dinheiro, evitando, assim, a corrosão inflacionária e proporcionando maior rendimento à empresa”. O objetivo desse artigo é apresentar os conceitos de caixa e a estrutura da DFC, elaborando-se um exemplo prático no final. Pretende-se demonstrar uma linha de raciocínio para acompanhar o passo-a-passo da elaboração de uma DFC. Como metodologia, foi realizada uma pesquisa bibliográfica para se identificar os conceitos utilizados na DFC nos mais recentes materiais publicados sobre o assunto e através de sua conclusão, espera-se contribuir para um melhor entendimento sobre essa tão importante demonstração contábil, e que o material sirva para posteriores estudos. 2. A Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) O objetivo da DFC é evidenciar as variações ocorridas no disponível das empresas entre um determinado período de tempo. Observe que apesar do nome “fluxos de caixa”, farão parte dessa demonstração todas as contas do grupo do disponível, isto é, caixa, bancos e aplicações de liquidez imediata (como a caderneta de poupança, por exemplo). Segundo a FIPECAFI (2010, p.565) “o objetivo primário da Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) é prover informações relevantes sobre os pagamentos e recebimentos, em dinheiro, de uma empresa, ocorridos durante um determinado período”. O conceito trabalhado na DFC é o regime de caixa onde se evidencia o que realmente entrou e o que realmente saiu de recursos no disponível das empresas. As informações históricas do fluxo de caixa são extremamente importantes para o planejamento futuro de qualquer em- 68 presa, onde através de projeções, é possível construir cenários e se antecipar na execução das ações. Os resultados da DFC também são importantes para auditar as informações contábeis na busca por erros e possíveis fraudes contábeis, conforme comentado por Lamas e Gregório (2009, p.101) e Marion (2009, p.446). Serão alvos da DFC todos os recebimentos, ou entradas, e pagamentos, ou saídas, de caixa (ou disponível). Quando uma operação representar uma entrada de caixa, deverá ser somada na demonstração e, quando representar uma saída, deverá ser subtraída na demonstração. No próximo capítulo, serão abordadas a estrutura e as formas de apresentação da DFC. 3. Estrutura e Formas de Apresentação da DFC A elaboração de um fluxo de caixa pode ser feita de várias maneiras, pois cada pessoa ou empresa poderia realizar o controle dos recebimentos e pagamentos de caixa conforme seus próprios entendimentos. Porém, segundo Lamas e Gregório (2009), ao se elaborar uma DFC estruturada em normas, é possível comparar o desempenho operacional entre diferentes empresas, uma vez que elimina os efeitos desiguais dos possíveis tratamentos contábeis. Em razão dessa necessidade de uniformização das demonstrações contábeis, torna-se necessário que algumas regras sejam respeitadas na elaboração da DFC. A norma contábil responsável por esta normatização no Brasil é o Pronunciamento Técnico CPC 03 – Demonstração dos Fluxos de Caixa. Esse pronunciamento determina a estruturação da DFC em três atividades: operacionais, de investimentos e de financiamentos. As atividades operacionais se referem ao montante dos recursos que a empresa gerou através de sua atividade-fim. Farão parte dessas atividades os elementos relacionados com a DRE (DemonstraInterciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão ção do Resultado do Exercício). As contas pertencentes ao Balanço Patrimonial, mas que foram originadas de transações ligadas às receitas, custos e despesas, também deverão ser consideradas, por exemplo: as contas a receber (relacionadas com as vendas a prazo), os estoques (relacionados com os custos), os fornecedores (relacionados com as compras a prazo) e as contas a pagar (relacionadas com as despesas). Segundo a FIPECAFI (2010, p.567), as atividades operacionais “envolvem todas as atividades relacionadas com a produção e entrega de bens e serviços e os eventos que não sejam definidos como atividades de investimento e financiamento”. Como exemplos de atividades operacionais, poderão ser classificadas como entradas as vendas à vista, o recebimento de clientes e o recebimento de juros, e como saídas, o pagamento de fornecedores, o pagamento de impostos e o pagamento de despesas diversas. As atividades de investimento se referem às transações onde a empresa utilizou as sobras de caixa e aplicou, investiu recursos visando um benefício futuro. Dessa forma, quando há recurso disponível que possa ser investido pela empresa, ela pode emprestá-lo para terceiros ou investi-lo na compra de ativos fixos classificados como investimentos, imobilizado ou intangíveis no Balanço Patrimonial. Quando a empresa adquiri um determinado ativo fixo, isso representará uma saída de caixa e, quando vende algum desses ativos, representará uma entrada de caixa. Na IAS 7, a importância da divulgação separada de fluxos de caixa de atividades de investimentos é destacada, onde diz ser “importante porque os fluxos de caixa representam a extensão dos gastos efetuados com recursos destinados a gerar receita e fluxos de caixa futuros” (IASCF, 2008, p.862). Farão parte das atividades de investimentos todas as transações relacionadas com o ativo não circulante do Balanço Patrimonial. Como exemplos de entradas têm-se as vendas de investimentos, as vendas de imobilizado e o recebimento de empréstimos, e como exemplos de saídas, têm-se as aquisições de investimentos, de imobilizado e de ativos intangíveis. Já as atividades de financiamento, ao contrário das atividades de investimento, referem-se às transações onde a empresa toma recursos emprestados, geralmente, quando há uma escassez de caixa. Os recursos podem ser captados tanto de terceiros, quanto dos próprios proprietários ou sócios das empresas. Farão parte das atividades de financiamento todos os elementos relacionados com o exigível a longo prazo, o patrimônio líquido e os financiamentos e empréstimos de curto prazo, localizados no passivo circulante, todos localizados no Balanço Patrimonial. Para as atividades de financiamento, podem-se citar como exemplos de entradas de recursos, os aumentos de capital, as emissões de novas ações e os empréstimos e financiamentos tomados, e como exemplos de saídas, os pagamentos de dividendos, as recompras de ações da empresa e os pagamentos de empréstimos e financiamentos. Algumas transações podem não ser percebidas somente pelas informações do Balanço Patrimonial e da DRE, necessitando da utilização de uma outra demonstração contábil, como a Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido. O resultado final da DFC será a soma algébrica dos resultados líquidos de cada uma das atividades, que deverá ser conciliada com a diferença entre os saldos respectivos das disponibilidades, isto é, entre o início e o fim do período considerado (FIPECAFI, 2010, p.573). Lustosa e Santos (2004) dizem que essa classificação em três atividades é muito útil em termos informativos, mas também existem alguns aspectos polêmicos que devem ser melhor estudados para algumas transações financeiras, por exemplo, as reservas de capital. Algumas situações podem apresentar transações onde os fluxos de caixa serão classificados em mais de uma atividade, por exemplo, quando há um desembolso de caixa para pagamento de empréstimo, onde os juros podem ser classificados como atividade operacional e o valor do Interciência & Sociedade 69 COSTA, R. S. da principal deve ser classificado como atividade de financiamento (BRASIL2, 2008). Existem ainda algumas operações que não deverão fazer parte da DFC, pelo fato de não afetarem o caixa, por exemplo, as depreciações, as provisões, os ganhos e perdas de equivalência patrimonial, entre outros. Também podem acontecer transações de investimento e financiamento sem efeito no caixa, como por exemplo, as dívidas convertidas em aumento de capital, mas essas, devem ser evidenciadas em notas explicativas (FIPECAFI, 2010, p.569). A DFC pode ser elaborada se- gundo dois métodos, o direito e o indireto. A diferença entre eles está nas atividades operacionais. No método direto as atividades operacionais são elaboradas utilizando os reais recebimentos de clientes, pagamentos de fornecedores e pagamentos de despesas. Segundo a FIPECAFI (2010, p.573), “o método direto explicita as entradas e saídas brutas de dinheiro dos principais componentes das atividades operacionais, como os recebimentos pelas vendas de produtos e serviços e os pagamentos a fornecedores e empregados”. BALANÇO PATRIMONIAL – EMPRESA ALFA ATIVO (em R$) 31/12/X1 Circulante Disponível Dupl. a receber Estoques Total Circulante Não Circulante Investimentos Part.outras cias Imobilizado Móveis e utensílios (-) Depr. acum. Terrenos Total Não-Circul. Total PASSIVO (em R$) 31/12/X2 1.500 500 1.000 2.300 1.000 1.500 3.000 4.800 500 500 2.640 2.640 1.200 (200) 2.000 3.000 1.500 (320) 3.000 4.180 3.500 6.820 6.500 11.620 Circulante Fornecedores Empr. bancários I.R. a recolher Total Circulante Patrimônio Líquido Capital social Lucros retidos Total do P.L. Total 31/12/X1 31/12/X2 1.000 1.000 - 2.000 1.470 1.050 2.000 4.520 4.500 4.500 6.000 1.100 7.100 6.500 11.620 DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO FINDO EM 31/12/X2 (em R$) 70 Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão Receita Bruta 10.000 (-) CMV (5.500) Lucro Bruto 4.500 (-)Despesa Operacional Desp.Vendas (500) Desp. Administração (380) Desp.c/Depreciação (120) Outras Despesas (500) 1.500 Lucro Antes Impostos 3.000 (-) Provisão p/ I.R. (1.050) Lucro Líquido 1.950 Movimentações Saldo Inicial em 31/12/X1 Aumento de capital Capital Social 4.500 1.500 L. Retidos - Total 4.500 1.500 Lucro Líquido 1.950 1.950 Distribuição Dividendos Saldo final em 31/12/X2 (850) 1.100 (850) 7.100 6.000 DEMONSTR. DAS MUTAÇÕES DO PATRIM. LÍQUIDO FINDO EM 31/12/X2 (em R$) O primeiro método a ser elaborado será o método direto. Para se iniciar a DFC, primeiramente é preciso conhecer a variação do disponível. O valor encontrado é de R$ 800,00, obtido pela diferença do disponível entre os dois períodos, ou seja, R$ 2.300,00 menos R$ 1.500,00. Uma vez encontrada a variação do disponível, o próximo passo é elaborar as atividades operacionais, as quais possuem, basicamente, três elementos: recebimento de clientes, pagamento de fornecedores e pagamento de despesas. Para se encontrar o valor que foi realmente recebido dos clientes é preciso realizar um pensamento lógico, considerando todas as vendas como sendo a prazo. Isso porque não é possível identificar de forma direta qual seriam os valores à vista e a prazo, pelo fato da Contabilidade ser elaborada por regime de competência, ou seja, os fatos contábeis são contabilizados independentemente do seu recebimento ou pagamento. No ano de X1, a empresa tinha para receber R$ 500,00 (duplicatas a re- ceber – ativo) e vendeu em X2 mais R$ 10.000,00 (receitas brutas – DRE), tendo para receber, portanto, um montante de R$ 10.500,00. Como o valor a receber no ano de X2 é de R$ 1.000,00 (duplicatas a receber – ativo), significa dizer que a empresa recebeu a diferença, isto é, R$ 9.500.00 de seus clientes. Depois de encontrado o valor do recebimento dos clientes, é preciso calcular o valor do pagamento das compras. O raciocínio é bem semelhante ao utilizado no recebimento dos clientes, com a única diferença, que para se encontrar o valor dos pagamentos dos fornecedores, primeiramente é preciso encontrar o valor das compras, o qual está embutido no valor do CMV na DRE. O procedimento é utilizar a fórmula do CMV e substituir os valores que podem ser encontrados nas demonstrações contábeis. A fórmula está descrita abaixo, já com os valores rastreados do Balanço Patrimonial e da DRE: Interciência & Sociedade 71 COSTA, R. S. da CMV = ESTOQUE INICIAL + COMPRAS – ESTOQUE FINAL R$ 5.500,00 = R$ 1.000,00 + COMPRAS – R$ 1.500,00 COMPRAS = R$ 6.000,00 Encontrado o valor das compras, deve-se também considerá-lo como sendo todo a prazo. O raciocínio é o seguinte: Se a empresa devia ao seu fornecedor R$ 1.000,00 (passivo circulante) em X1, e comprou a prazo em X2 mais R$ 6.000,00, teria que pagar um montante de R$ 7.000,00 a ele, mas como aparece no saldo da conta de fornecedores em X2 apenas R$ 2.000,00, significa dizer que a empresa realmente pagou aos seus fornecedores a diferença, ou seja, R$ 5.000,00. Em relação ao pagamento das despesas, é preciso relacionar as despesas da DRE com as contas do passivo. Caso uma determinada despesa conste na DRE e também conste, no mesmo valor, no passivo, significa que a mesma ainda não foi paga, não havendo a necessidade de evidenciá-la na DFC e, caso ocorra o contrário, deverá ser evidenciada. As despesas constantes na DRE são as de vendas, administração, com depreciação, outras despesas e provisão p/ I.R. É possível verificar que além das despesas operacionais, também foi incluída a provisão para imposto de renda, pois também se trata de uma despesa, porém classificada de uma outra forma. Dentre as despesas elencadas na DRE, a única conta que não deverá fazer parte da DRE é a com depreciação, pelo fato de não afetar o caixa (não representar um desembolso). Fazendo a relação com as contas de passivo, não é possível verificar nenhuma conta intitulada “contas a pagar” ou alguma coisa parecida, o que demonstra que todas essas contas foram realmente pagas pela empresa, com exceção da provisão para imposto de renda, pois aparece a conta de “I.R. a recolher”, cujo valor é exatamente o demonstrado na DRE, o que significa que tal imposto ainda não foi pago. Dessa forma, somente serão con- 72 sideradas pagas as despesas com vendas, administração e outras despesas, cujo montante soma R$ 1.380,00. Utilizando os valores dos recebimentos dos clientes, pagamento dos fornecedores e pagamento das despesas, as atividades operacionais totalizam, portanto, R$ 3.120,00. Encerradas as atividades operacionais, o próximo passo é elaborar as atividades de investimentos, onde serão utilizados os grupos do ativo não circulante, com exceção do ativo realizável a longo prazo, onde será utilizado apenas quando tiver valores relacionados com as vendas de mercadorias a longo prazo. Na empresa ALFA, todas as contas do ativo não-circulante tiveram uma variação positiva (aumento), devendo ser consideradas como aquisições da empresa e saídas de caixa na DFC. A única conta que não será utilizada é a da depreciação acumulada, pois não afeta o caixa. Aliás, pode-se verificar que a diferença entre os saldos dessa conta é de R$ 120,00, exatamente o mesmo valor evidenciado na DRE na conta de despesas com depreciação. Considerando as variações das contas do ativo não-circulante, com exceção da depreciação acumulada, as atividades de investimento totalizam um montante de R$ 3.440,00 que deve ser subtraído na DFC por representar uma saída de caixa. As últimas atividades a serem encontradas são as de financiamento, as quais se referem aos grupos do exigível a longo prazo, patrimônio líquido e os empréstimos e financiamentos do passivo circulante. Observando o grupo do passivo circulante, percebe-se que existe uma conta de empréstimos bancários, a qual apresenta uma variação positiva de R$ 470,00. Isso quer dizer que a empresa necessitou captar recursos e pegou mais essa quantia dos bancos, representando assim, uma entrada de caixa na DFC. Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão Já no patrimônio líquido, a conta capital social também sofreu uma variação positiva de R$ 1.500,00, representando assim, um aumento de capital realizado pelos sócios e uma entrada de caixa na DFC. A outra conta é a de lucros retidos que em X1 não possuía saldo e em X2 passou a ficar com R$ 1.100,00. Como não tinha nada e agora tem um saldo, subentende-se tratar do lucro líquido do exercício que foi transportado para essa conta, porém, o valor do lucro líquido demonstrado na DRE é de R$ 1.950,00. A diferença é de R$ 850,00 e se justifica pela retirada desse valor da conta lucros retidos para a constituição de dividendos (localizada no passivo circulante), que está discriminada na Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido. Como os dividendos não aparecem no passivo circulante, entende-se que os mesmos foram pagos pela empresa e, portanto, devem ser evidenciados na DFC como uma saída de caixa. As variações na conta de lucros retidos não devem ser utilizadas na DFC, pois, na verdade, as transações que afetaram o seu resultado já foram contempladas pelas atividades quando foram utilizados os valores relacionados com a DRE. Considerando as variações dos empréstimos de curto prazo, do capital social e o valor dos dividendos, as atividades de financiamento totalizaram R$ 1.120,00, uma vez que os valores das aquisições de empréstimos de curto prazo e aumento de capital foram somados e o pagamento de dividendos foi subtraído. Para se elaborar a DFC, basta somar as três atividades e verificar se o resultado é o mesmo identificado pela variação do disponível, no caso, R$ 800,00. A DFC pelo método direto fica estruturada da seguinte forma: DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA DA EMPRESA ALFA MÉTODO DIRETO ATIVIDADES OPERACIONAIS Recebimento de clientes Pagamento de fornecedor Pagamento de despesas Caixa líquido atividades operacionais R$ R$ R$ R$ 9.500,00 (5.000,00) (1.380,00) 3.120,00 ATIVIDADES DE INVESTIMENTO Aquisição de Ações (Part.Outras Cias) Aquisição de Móveis e Utensílios Aquisição de Terrenos Caixa líquido atividades de investimento R$ R$ R$ R$ (2.140,00) (300,00) (1.000,00) (3.440,00) ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO Aquisição empréstimos curto prazo Aumento de capital Pagamento de dividendos Caixa líquido atividades de financiamento R$ R$ R$ R$ 470,00 1.500,00 (850,00) 1.120,00 Variação de Caixa e Equivalentes Saldo Inicial de Caixa e Equivalentes Saldo Final de Caixa e Equivalentes R$ R$ R$ 800,00 1.500,00 2.300,00 Interciência & Sociedade 73 COSTA, R. S. da Para se elaborar a DFC pelo método indireto, a diferença está nas atividades operacionais. Ao invés de apresentarem os reais recebimentos de clientes e pagamentos de fornecedores e despesas, serão elaboradas ajustando-se o lucro líquido e considerando as variações das contas patrimoniais relacionadas com a DRE. As atividades de investimento e de financiamento serão idênticas às do método direto. A primeira coisa a se fazer no método indireto é verificar o valor do lucro líquido na DRE, no caso, R$ 1.950,00. Nesse valor, é necessário fazer alguns ajustes referentes às contas que não afetam o caixa. Na DRE da empresa ALFA, a única conta que não afeta o caixa é a despesa com depreciação, no valor de R$ 120,00. Para eliminar o seu efeito sobre o lucro líquido, é preciso inverter o seu sinal na DFC, isto é, se na DRE a despesa com depreciação foi subtraída, na DFC ela será somada. Caso existam outras contas que também não afetem o caixa, é preciso que se faça o mesmo procedimento na DFC. Feitos os ajustes no lucro líquido, é preciso verificar as variações nas contas patrimoniais relacionadas com a DRE. Essas variações serão favoráveis (aumento) ou desfavoráveis (diminuição) para o caixa, utilizando-se conta por conta do Balanço Patrimonial. No ativo, a primeira conta é a do disponível e já foi utilizada para verificar a variação de quanto tem que dar a DFC. A próxima conta é duplicatas a receber e ela tem relacionamento com a DRE, pois se origina das vendas a prazo. A variação de X1 para X2 é um aumento de R$ 500,00, e é desfavorável para o caixa, ao passo que a empresa abriu mão de parte de suas vendas à vista para recebê-las em um momento futuro, e representará uma saída de caixa. Logo após, tem-se a conta dos estoques que também está relacionada com a DRE, pois se origina das compras 74 de mercadorias. A variação foi positiva em R$ 500,00, e também é desfavorável para o caixa, uma vez que a empresa, para aumentar seus estoques, precisou tirar dinheiro do caixa. As outras contas do ativo não possuem relação direta com a DRE e não farão parte das atividades operacionais, pois já foram utilizadas na atividade de investimento. No passivo, a primeira conta é fornecedores que está relacionada com a DRE, pois é originada pela compras a prazo de mercadorias. Ela traz um aumento de X1 para X2 no valor de R$ 1.000,00, sendo favorável para o caixa e representará uma entrada na DFC, ao passo que a empresa está, de certa forma, postergando um pagamento. A próxima conta é a de empréstimos bancários, e essa não tem relação direta com a DRE, pois pertence às atividades de financiamento. Já a conta de imposto de renda a recolher possui relacionamento direto com a DRE, pois recebe os valores da provisão de imposto de renda. A variação de X1 para X2 dessa conta foi um aumento de R$ 1.050,00 e também significa uma entrada na DFC, pois é favorável para o caixa, isto é, uma postergação de pagamento do seu imposto de renda. As outras duas contas do passivo não se referem às atividades operacionais, pois a conta capital social pertence às atividades de financiamento e a conta de lucros retidos já foi computada, pois é composta pelo lucro da DRE que já foi considerado na DFC. O resultado encontrado deve ser o mesmo do método direto, ou seja, R$ 3.120,00, pois se trata do mesmo caixa, da mesma empresa, só que elaborado de uma outra forma. Portanto, a DFC elaborada pelo método indireto fica representada dessa forma: Interciência & Sociedade Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA DA EMPRESA ALFA MÉTODO INDIRETO ATIVIDADES OPERACIONAIS Lucro Líquido (+/-) Ajustes Depreciação Variações nos Ativos e Passivos Variação em duplicatas a receber Variação em estoques Variação em fornecedores Variação em imposto de renda a recolher Caixa líquido atividades operacionais R$ 1.950,00 R$ 120,00 R$ R$ R$ R$ R$ (500,00) (500,00) 1.000,00 1.050,00 3.120,00 ATIVIDADES DE INVESTIMENTO Aquisição de Ações (Part.Outras Cias) Aquisição de Móveis e Utensílios Aquisição de Terrenos Caixa líquido atividades de investimento R$ (2.140,00) R$ (300,00) R$ (1.000,00) R$ (3.440,00) ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO Aquisição empréstimos curto prazo Aumento de capital Pagamento de dividendos Caixa líquido atividades de financiamento R$ R$ R$ R$ 470,00 1.500,00 (850,00) 1.120,00 Variação de Caixa e Equivalentes Saldo Inicial de Caixa e Equivalentes Saldo Final de Caixa e Equivalentes R$ R$ R$ 800,00 1.500,00 2.300,00 O método indireto é o mais utilizado pelas empresas, pois sua elaboração é mais simples, mas, é o método direto o preferido para a tomada de decisão, uma vez que para os usuários seria muito mais interessante conhecer os reais recebimentos de clientes e os pagamentos de fornecedores e de despesas. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O controle do fluxo de caixa sempre foi e ainda é amplamente utilizado por qualquer tipo de pessoa ou negócio, pois o gerenciamento das entradas e saídas de caixa é a base para todo planejamento e posterior tomada de decisão. Para que seja possível a comparação entre a posição financeira dos recursos de caixa das empresas, foi criada a Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC), que no Brasil, passou a ser exigida como demonstração contábil obrigatória com a criação da Lei 11.638/2007, embora já fosse evidenciada como informação complementar pelas instruções do IBRACON. Interciência & Sociedade 75 COSTA, R. S. da A segregação da DFC em atividades operacionais, de investimento e de financiamento torna possível uma melhor análise da composição da variação de caixa. Para se elaborar a DFC é preciso seguir algumas técnicas que utilizam as informações de outras demonstrações contábeis, como o Balanço Patrimonial, a Demonstração do Resultado do Exercício e a Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido. Com a realização dessa pesquisa, procurou-se elaborar uma DFC explicando cada passo e relacionando cada conta com sua origem nas demonstrações contábeis. Esse tipo de estudo torna-se importante não só para os profissionais relacionados com a Contabilidade das empresas, mas para todas as pessoas que estejam relacionadas com o ambiente de negócios no qual a empresa esteja inserida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Lei n. 11.638, de 27 de dezembro de 2007. Altera os arts. 176 a 179, 181 a 184, 187, 188, 197, 199, 226 e 248 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 28 dez.2007. BRASIL2. Pronunciamento Técnico CPC 03. Demonstração dos Fluxos de Caixa. Ata CPC, Brasília, DF, 13 jun.2008. FIPECAFI. Manual de Contabilidade Societária. São Paulo: Atlas, 2010. IASCF INTERNATIONAL ACCOUNTING STANDARDS COMMITTEE FOUNDATION. Normas Internacionais de Relatório Financeiro (IFRSs). Incluindo Normas Internacionais de Contabilidade (IASs) e Interpretações , aprovadas em 1º de Janeiro de 2008. Volume 1. IASCF – International Accounting Standards Committee Foundation e IBRACON – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil, 2008 LAMAS, F. R.; GREGÓRIO, A. A. Demonstração dos Fluxos de Caixa e Contabilidade Criativa. Revista Universo Contábil, Blumenau, v5, n.3, p.99-115, jul./ set. 2009. LUSTOSA, P. R. B.; SANTOS, A. Como Classificar as Reservas de Capital na Demonstração dos Fluxos de Caixa? In: XXVIII EnANPAD. Curitiba-PR, 2004. MARION, J. C. Contabilidade Empresarial. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2009. SALOTTI, B. M.; YAMAMOTO, M. M. Divulgação Voluntária da Demonstração dos Fluxos de Caixa no Mercado de Capitais Brasileiro. Revista de Contabilidade e Finanças USP., São Paulo, v.19, n.48, p.3749, set./dez.2008. Rodrigo Simão da Costa possui graduação em Ciências Contábeis pelo UNIFEOB - Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos (2001), e também Pós Graduação em Gestão Empresarial (2003). Concluiu seu Mestrado em Ciências Contábeis e Atuariais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2006). Atualmente é professor titular do UNIFEOB onde atua como coordenador dos cursos de Ciências Contábeis e Administração e é Gestor da Escola de Negócios. Tem experiência na área Contábil, com ênfase em Contabilidade Ambiental. É autor de vários artigos científicos e palestrante em diversos assuntos relacionados à Contabilidade, Administração e Finanças. 76 Interciência & Sociedade EVOLUÇÃO DO SETOR ELÉTRICO: uma breve reflexão PAGLIARDI, Odail Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] SOBREIRO DIAS, José Celso Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] RESUMO: O setor elétrico brasileiro passou por uma reformulação de sua estrutura na década de 1990, marcando a transição para um ambiente mais competitivo nos serviços de eletricidade com participação ativa das empresas privadas. O racionamento de eletricidade em 2001/02 interrompeu esse processo, originando a segunda reforma do setor, coordenado pelo Estado que concentrou o comércio de eletricidade em um pool de distribuidores em um sistema de leilões públicos. Este artigo analisa a evolução do setor e as duas reformas, mostrando que as soluções apresentadas foram frutos de crises institucionais. PALAVRAS-CHAVE: Setor elétrico, sistemas de leilões públicos, reformas, estatização. ABSTRACT: The Brazilian electric sector went through an overhaul of its structure in the 1990s, marking the transition to a more competitive in the electricity services with active participation of private companies. The rationing of electricity in 2001/02 interrupted this process, resulting in the second sector reform, coordinated by the State that concentrated trade in electricity in a pool of distributors in a public auctions system. This paper examines the development of the sector and the two reforms, showing that the solutions presented were the result of institutional crises. KEYWORDS: Power sector systems, public auctions systems, reform, nationalization. 1. INTRODUÇÃO As instituições governamentais têm resistido às mudanças, devido aos custos políticos e também econômicos que as envolvem. A história das reformas do setor elétrico no Brasil ilustra bem esse fato, mostrando que as mudanças institucionais só ocorreram em face da crise, que exigia uma profunda reforma setorial. A crise do final da década de 90 envolveu além da privatização das empresas, uma reforma estrutural e regulatória. As soluções para a crise no setor foram de caráter ad hoc, sempre motivado por uma resposta “imediatista” ao problema enfrentado. Uma reflexão desta evolução é o motivo deste trabalho, analisando os antecedentes do processo de reforma na indústria de eletricidade brasileira, até chegar à adequação da nova política energética implementada para restaurar o nível de investimento, em particular o investimento privado. No Brasil, em face de seus enormes recursos hídricos, a hidroeletricidade tem ocupado um papel de destaque na geração de energia. No seu desenvolvimento, este setor passou por duas fases, uma com a participação ativa do Estado e outra, após a reforma que promoveria mudanças institucionais em decorrência da reestruturação e privatização do setor elétrico. Enquanto a demanda de eletricidade no Brasil crescia, cada vez mais aumentavam as preocupações sobre a qualidade da oferta, com o governo controlando o setor da eletricidade. Até início dos anos 1990, grande parte do setor elétrico estatal foi controlado com limitado investimento privado. As empresas estatais assumiram a função de empresas de distribuição, na maioria dos estados, enquanto a Eletrobrás, gerenciava Interciência & Sociedade 77 PAGLIARDI, O.; SOBREIRO DIAS, J. C. a transmissão, além de assumir também a maior parte do setor de geração. Contudo, nesta segunda fase, podem-se citar duas grandes reformas. A primeira ocorreu entre 1995 e 2003, com introdução do modelo clássico de reforma no mercado atacadista de eletricidade de curto prazo, tendo como exemplo de países que o aplicaram, Chile, Inglaterra e País de Gales, e os países nórdicos. O modelo consiste, basicamente, na fragmentação da infraestrutura, na privatização dos serviços estatais, para favorecer a concorrência, na criação de entidades reguladoras e, gradualmente, na criação de mercados para serviços de geração e varejo. A segunda reforma do setor elétrico brasileiro começou durante os anos de 2004 e 2005 com a introdução do mercado de longo prazo, substituindo o mercado atacadista de curto prazo introduzido na primeira reforma. Na evolução histórica, o trabalho lança luz, principalmente, nos períodos em que o setor de eletricidade no Brasil passou de um modelo clássico para um modelo de contratos de longo prazo de reforma. 2. Os primeiros passos da eletrificação Pouco tempo após ter sido concedido, por Dom Pedro II, a Thomaz Alva Edson o privilégio de inserir processos destinados à utilização da luz elétrica no Brasil, entra em operação, no ano de 1883, a primeira usina hidrelétrica do país, localizada no Ribeirão do Inferno, afluente do Rio Jequitinhonha, na cidade de Diamantina, Estado de Minas Gerais (ELETROBRÁS, 2010). Contudo, somente a partir de 1897, deu-se início aos empreendimentos marcantes no desenvolvimento da energia elétrica no país, consolidados pelas concessões em São Paulo e Rio de Janeiro, com a criação das empresas: São Paulo Railway, Light and Power (1899) EmpresaCliente Ltd - SP RAILWAY e Tramway, Light and Power EmpresaCliente - RJ TRAMWAY (1904), como mostram CEMIG (2010) e Eletrobrás (2010), realizando projetos de grande porte para a época. O que caracteriza institucionalmente a primeira fase da indústria elétrica 78 brasileira é a ausência de uma legislação específica, sendo que em 1903 foi aprovado pelo Congresso Nacional o primeiro texto de lei disciplinando o uso da energia elétrica no país (ELETROBRÁS, 2010). Nesta primeira fase, o modelo pode ser considerado privado sendo que o poder concedente era o Estado e os concessionários os investidores estrangeiros. Não havendo legislação específica, as relações entre os concessionários e os usuários dos serviços limitavam-se ao poder público, em qualquer uma das suas três esferas: Federal, Estadual ou Municipal, atraindo o capital externo e celebrando atos de concessão através de contratos com tarifas corrigidas pela “cláusula ouro”, a qual preservava os investimentos em divisas estrangeiras com o objetivo de compensar os efeitos da desvalorização da moeda nacional (FARIA, 2003). O marco do período foi o Decreto 5.407 de dezembro de 1904 que estabelecia regras para os contratos de concessão sem exclusividade, cujo prazo máximo da concessão seria de 90 anos, sendo revertido para a União sem indenização do patrimônio constituído pelo concessionário. A revisão das tarifas ocorria a cada cinco anos. O crescimento da capacidade de geração foi notável: em 1883, a capacidade instalada era de 52 kW e, em 1920, ultrapassou 367.000 kW. Surgiram às pequenas usinas geradoras decorrente da necessidade de fornecimento de energia para serviços públicos de iluminação e para atividades econômicas como mineração, beneficiamento de produtos agrícolas, fábricas de tecido e serrarias. A grande maioria das unidades era de pequena potência com cerca de 10 usinas geradoras e ampliou-se com a construção das primeiras usinas hidrelétricas no país: Marmelos-Zero, Fontes Velha e Delmiro Gouveia (FARIA, 2003). A Grande Depressão de 1929 veio impactar fortemente a economia brasileira provocando uma profunda recessão e despertando a insatisfação da classe média com relação ao governo vigente, culminando na instalação de um governo revolucionário com um extremo sentimento nacionalista. Neste contexto, ocorre um crescente protecionismo do setor industrial brasileiro, com os nacionalistas defendendo o papel Interciência & Sociedade Evolução do setor elétrico: uma breve reflexão estratégico da indústria de energia elétrica e, portanto, não poderia estar sob controle estrangeiro. 3. Estatização do setor A Lei da Água, em 1934, atribuindo ao Governo Federal a propriedade e direitos sobre os recursos hídricos e a autoridade de regular os serviços relacionados à energia elétrica, além de introduzir o regime tarifário pelo custo do serviço. Houve muitos conflitos na interpretação dessa lei. O novo regime tarifário utilizado foi um fator que desestimulou os investidores estrangeiros enquanto a demanda por energia continuava a aumentar em função do desenvolvimento industrial, exigindo racionamento em várias cidades do país. A energia sempre teve lugar de destaque nos programas econômicos de desenvolvimento do Brasil, que colocava a produção de energia elétrica como insumo prioritário nas metas governamentais, diante da impossibilidade do setor empresarial nacional promover projetos de grande porte. Neste sentido, o Plano SALTE destinava 11% do PIB de 1947, para a área de energia (SILVA, 2010). Além dos recursos externos, o governo cria o Imposto Único sobre a Energia Elétrica – IUEE e o Fundo Federal de Eletrificação, destinado a prover e financiar instalações de produção, transmissão e distribuição de energia elétrica, assim como o desenvolvimento de materiais elétricos. Mesmo com o Plano de Metas destinando 9,3% do PIB de 1956, para o setor elétrico, advindos do IUEE, não se atingiu totalmente a meta prevista, contudo houve um esforço considerável para se romper definitivamente seus estrangulamentos quase quadruplicando a capacidade instalada entre 1945 e 1961 (PAGLIARDI, 1990). A evolução do padrão de financiamento do setor elétrico os anos 80, apresentou-se em duas fases: um fiscal, até 1967, na qual os recursos provinham de fundos públicos e pós-67, a fase “empresarial”, em que a empresa capacitava-se para gerir recursos próprios. A política traçada para o setor de energia elétrica para atender a demanda no pós-64, que até 1967 pode ser considerada como uma fase de transi- ção para o setor possibilita sua consolidação graças ao esquema de financiamento oferecido, tanto em nível fiscal (empréstimo compulsório, IUEE ad valorem) quanto em nível de capacidade de autofinanciamento de empresas (realidade tarifária, correção monetária do ativo fixo para efeito de tarifa), além da redução de imposto de renda e isenção do imposto de importação de equipamentos. A Eletrobrás, criada em 1962, assumiu a coordenação do desenvolvimento da indústria de energia elétrica, e criou taxas e buscou recursos nos fundos multilaterais de investimento para financiar a expansão da capacidade de geração. O monopólio, sob controle, federal, e a integração vertical do setor promoveram a economia de escala, aumentando a produtividade das empresas e consequentemente reduzindo custos. Além disso, o governo também criou a Conta de Resultados a Compensar a fim de reduzir os riscos do financiamento de novos projetos e manter os investimentos na expansão do setor. O novo regime tarifário para todo o país a partir de 1977 faz com que as empresas, presentes em áreas de concessão, econômica e industrialmente desenvolvidas, contando com densidades de carga elevadas e custos de operação mais baixos, fossem obrigadas a transferir parte de seus resultados para as empresas deficitárias. Esta medida incentivou ao descontrole dos custos dessas empresas e como resultado as tarifas aumentaram. A expansão do setor de infraestrutura no Brasil se dava à custa de endividamento externo e por forte participação do Estado na solidificação de suas indústrias. Mesmo com os dois Choques do Petróleo, a grande oferta de recursos financeiros no mercado internacional possibilitava que o país mantivesse elevadas taxas de crescimento através de endividamento externo e política fiscal expansionista. Contudo, a crise dos países em desenvolvimento no início dos anos 80, fez com que ocorresse uma forte recessão mundial e a inflação crescesse. Internamente, o governo reajustava as tarifas abaixo da inflação com o objetivo de frear o processo inflacionário. Ademais, o desempenho das Interciência & Sociedade 79 PAGLIARDI, O.; SOBREIRO DIAS, J. C. empresas do setor elétrico deteriorou com os anos em “decorrência do gigantismo, da falta de flexibilidade e da excessiva interferência política na gestão de seus negócios” (OLIVEIRA, 2006). Como consequência, as empresas decidiram suspender os pagamentos aos geradores elétricos federais sob a alegação de não conseguirem mais suportar a retenção do repasse de seus custos. A partir disso, em 1987, o governo identificou o problema crítico de que as tarifas eram reajustadas para atender às políticas econômicas e sociais e não atendiam a necessidade crucial da viabilidade financeira das empresas. Diante desse quadro, e tendo em vista a transformação do setor elétrico em âmbito mundial, os organismos financeiros internacionais passaram a recomendar a reformulação do setor, ou seja, além da privatização das empresas, fazer uma reforma estrutural e regulatória. A política macroeconômica do Plano Real implementa as privatizações, cruciais para atrair capital externo, fechar o balanço de pagamentos, sustentar a taxa de câmbio, manter baixa a inflação e, inclusive, diminuir as interferências políticas nas empresas. No setor elétrico, a estratégia inicial foi privatizar as empresas distribuidoras, seguidas das empresas geradoras e finalmente as transmissoras. Contudo o BNDES, não possuía uma estratégia para a reforma do setor como um todo, sendo necessário um regime tarifário que representasse baixo risco regulatório a fim de atrair investidores privados. Assim, era necessário criar incentivos para estimular a inserção da iniciativa privada na indústria principalmente na expansão da oferta, para possibilitar a criação de um mercado atacadista de energia, que ocorreriam com duas reformas do setor. 4. Processo de Reforma do Setor Para que se obtivesse êxito num mercado atacadista competitivo de energia, algumas mudanças estruturais deveriam ser implementadas, sendo necessário promover a desverticalização da geração, com criação empresas de geração ou subsidiárias. Existem duas motivações principais para a primeira reforma implantada em 1995 a 2003. A primeira foi à tentativa de atrair o capital privado para investir na infraestrutura e, com isso, recuperar financeiramente as empresas debilitadas financeiramente. A outra, era a tendência mundial de implementação do modelo clássico de reforma como ocorrido na Inglaterra e Gales (OLIVEIRA, 2006). O arrocho financeiro das companhias estaduais fez da privatização, um instrumento importante para aumentar o capital financeiro. Assim, “a privatização e a reestruturação foram realizadas independentes umas das outras a qual era sintomático para a natureza ad hoc das reformas naqueles dias iniciais. O governo estava tão necessitado de recursos e de se apresentar como um governo reformante, que começou a alienação antes de uma entidade reguladora de eletricidade ter sido instituída. Antes mesmo de um regulador ser cria- A reforma do setor elétrico teve início em 1993 com recuperação tarifária e criação do Sistema Nacional de Transmissão com o objetivo de assegurar o livre acesso às linhas do sistema nacional de transmissão. Essa medida refletia os princípios básicos do livre acesso às redes, de separação das supridoras das distribuidoras, favorecendo uma competição na geração de energia elétrica. Foi dada a permissão para a entrada de investidores autoprodutores de energia permitindo que as empresas pudessem se consorciar na geração de energia para consumo próprio, e caso houvesse excedente, poderiam vendê-lo às concessionárias. Ainda, em 1993, iniciava o processo de abertura do setor permitindo o livre acesso ao sistema de transmissão na esperança de atrair investimento privado na expansão. Neste contexto, as tarifas de geração quase dobraram. As medidas não foram suficientes para alterar profundamente a estrutura da indústria de energia elétrica e, em 1995, o governo aprova emendas para facilitar a liberalização do mercado e privatização das empresas de energia. 80 4.1. Mercado atacadista de curto prazo com base em um modelo clássico Interciência & Sociedade Evolução do setor elétrico: uma breve reflexão do, cerca de dez empresas de distribuição foram alienadas” (ALMEIDA e PINTO JÚNIOR, 2005; ARAÚJO et al., 2008). Em 1997, medidas legais permitiram que as concessionárias, que antes podiam importar energia somente para consumo próprio, agora poderiam fazê-lo para negociar com os consumidores livres. Outra novidade advinda desta medida era a possibilidade do autoprodutor vender seu excedente de energia também aos consumidores livres. Portanto, as principais mudanças já introduzidas na indústria seguiam as tendências mundiais de reestruturação: livre acesso às linhas de transmissão, a introdução de produtores independentes e consumidores livres. Também, foi adotado o regime de price cap para melhorar o desempenho do setor, a exemplo do ocorrido na Inglaterra. Embora fosse assegurada uma justa taxa de retorno ao setor, persistia a falta de confiança dos investidores quanto à regulação. A fim de solucionar o impasse, e promover as mudanças institucionais em decorrência da reestruturação e privatização do setor elétrico, novas responsabilidades institucionais seriam atribuídas ao governo com a criação, em 1996, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Seu principal papel seria o de regulamentar e fiscalizar a indústria, cabendo proteger o interesse dos consumidores cativos em relação ao preço, dar continuidade ao fornecimento e qualidade do serviço; assegurar a viabilidade financeira de longo prazo dos concessionários. Ainda, promover competição onde possível e prover incentivos para a eficiência econômica; assegurar o cumprimento de leis e regulamentações; lidar com as reclamações dos consumidores; garantir transparência nas transações entre as companhias reguladas; e incentivar a conservação de energia, através de mecanismos regulatórios criados com essa finalidade. Em 1998, era criado um Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS, com a atribuição de coordenar e controlar a operação das instalações de geração e transmissão de energia elétrica no sistema interligado, instituição de papel crucial no novo modelo. Um operador de mercado “a gra- nel” foi implantado como um organismo de auto regulação dos agentes de mercado seguindo o modelo da Califórnia. Além disso, todos os contratos de longo prazo, da produção à distribuição, foram cancelados (ARAÚJO, 2006). Esta primeira onda de reformas teve a maioria dos ingredientes de um modelo clássico: um regulador, um operador independente, um operador de mercado a granel e separação funcional entre geração, transmissão, distribuição e comercialização. Portanto, a criação do Mercado Atacadista de Energia – MAE se constituiu na principal novidade desse novo modelo, em que deveriam ser realizadas todas as transações de compra e venda de energia de cada sistema interligado entre produtores, empresas varejistas e grandes consumidores. Também eram aplicados o conceito de Energia Assegurada e o Mecanismo de Realocação de Energia – MRE, com o intuito de diluir o risco comercial dos investidores em todas as hidrelétricas. Sob o aspecto comercial, foi estabelecido um período de transição através da assinatura dos Contratos Iniciais - CIs, que permitiu transações bilaterais livremente negociadas entre distribuidores, geradores e consumidores livres e essas operações liquidadas no MAE, permitindo inclusive a comercialização de curto prazo no mercado spot. Quando instituídos, os CIs atendiam plenamente às necessidades das distribuidoras e esta regra de transição foi considerada necessária devido ao preço da energia das usinas existentes serem aproximadamente a metade do custo estimado das novas fontes de suprimento de energia naquele momento. Desse modo, era preocupante o risco de um aumento intolerável das tarifas e pressão inflacionária caso fosse imediatamente introduzida a livre negociação de energia. Neste contexto, o processo de reestruturação ocorreu rapidamente com a privatização de 16 distribuidoras e quatro geradoras, as linhas de transmissão passaram a serem licitadas pela ANEEL e vários investidores privados solicitavam licença para construir novas centrais elétricas (OLIVEIRA, 2006). Para enfrentar a crise de energia elétrica de 2001-02, devido às severas secas, foram implementadas medidas de naInterciência & Sociedade 81 PAGLIARDI, O.; SOBREIRO DIAS, J. C. tureza emergencial para compatibilizar a demanda e a oferta de energia elétrica. Às concessionárias, dentre as principais medidas, cabiam suspender o atendimento: às novas cargas; casas de diversões; realização de eventos esportivos noturnos e para fins ornamentais; além da redução, em pelo menos 35% da iluminação pública. O racionamento havia mudado o comportamento dos consumidores, alterado os processos industriais e incentivado a substituição de equipamentos mais eficientes, e, portanto, provocando uma queda significativa no consumo de energia, cuja consequência era forte impacto no equilíbrio financeiro das empresas distribuidoras. 4.2. Mercado de Leilões e Contratos de Longo Prazo. A produção de energia hidroelétrica diminuiu drasticamente na seca de 2001, impactando a gestão de energia elétrica no Brasil, com os operadores sendo obrigados a racionar a sua oferta por quase um ano. Apesar do programa de incentivos para as usinas térmicas, havia poucas iniciativas por parte dos investidores. Isso levou o novo governo a proceder a uma segunda reforma durante os anos de 2004 e 2005, com controle centralizado no setor elétrico, introduzindo os leilões regulados e os contratos de longo prazo. Os resultados desta reforma são a criação de um pool para aquisição por parte dos distribuidores, a criação de dois ambientes de contratação de longo prazo (regulado e livre) e a criação das instituições necessárias para apoiar as tarefas de coordenação e de planejamento (ALMEIDA e PINTO JÚNIOR, 2005). As empresas de distribuição, com seus consumidores cativos, necessitavam contratar toda a demanda de geradores existentes feitos por leilões no ambiente de contrato regulado. No mercado de curto prazo previa-se um sistema de compensação para as diferenças entre a energia contratada e a energia consumida. Neste contexto, o governo implementou um complicado processo de leilões regulados de três a cinco anos para a compra futura de energia nova e um ano de antecedência para o leilão de energia existente. Os resultados deste novo 82 modelo de mercado estão ainda a ser visto. Embora bem projetado possa levar à revelação de preços e custos dos ativos e há temores de que a falta de informação adequada entre os licitantes pode levar à perda potencial de eficiência (DUTRA e MENEZES, 2005). No entanto, o mecanismo de leilão parece ser um passo positivo na resolução dos problemas de adequação, mas existem outras questões que precisam ser abordadas, como o licenciamento ambiental de novos projetos, a necessidade de equacionar o setor do gás e da operação de aumento na contratação livre. Além disso, somente com o amadurecimento e crescimento do mercado de capitais do país, pode vir à alavancagem necessária para os ajustes exigidos na atual estrutura de comercialização do mercado da eletricidade. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A história do Brasil mostra que mudanças institucionais são realizadas apenas quando há um senso de urgência devido a algum tipo de crise no país ou gerada pela pressão externa por parte de instituições financeiras internacionais. A primeira reforma foi motivada pela crise econômica da década de 1990 e quebra de receitas das empresas estatais, levando ao desinvestimento de seus bens. A reforma da indústria de energia elétrica estava pautada no processo de privatização caracterizando a saída do Estado do papel de produtor para a entrada do capital privado. Contudo, a agressividade da reforma atribuía ao Estado o papel de regulador, demandando ações no sentido de criar incentivos e na sinalização correta para estimular a inserção da iniciativa privada na indústria principalmente na expansão da oferta. A recente introdução do mercado atacadista competitivo foi uma grande mudança institucional na estrutura monopolista verticalmente integrada. Esta mudança aumenta os custos e exige a fragmentação, privatização e regulação do setor. A transferência do preço de mercado para os consumidores finais também implica em riscos políticos consideráveis. Apesar destes riscos, avança-se com esta concepção de mercado, sendo importante destacar a urgência Interciência & Sociedade Evolução do setor elétrico: uma breve reflexão de sua implantação já que a privatização das empresas estaduais começou mesmo antes da introdução de um órgão regulador, motivada pela crise financeira dos serviços públicos estatais por volta de 1990. Outra grande mudança institucional aconteceu com a introdução de um mercado de leilões de longo prazo em substituição ao pré-existente mercado spot de curto prazo. “Esta mudança na concepção do mercado atacadista consiste de custos de transação mais elevados e um aumento da carga regulamentar, devido à sua complexa natureza administrativa. Apesar destes custos e desafios, à decisão de avançar com o novo modelo de mercado mostra novamente um sentido de urgência. Neste momento a necessidade de mudança foi desencadeada pela crise de eletricidade provocada pelas secas e pelo baixo investimento em outras tecnologias” (KARMACHARYA, 2008). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, E. L. F.; PINTO JUNIOR, H. Q. Reform in Brazilian Electricity Industry: The search for a new model. International Journal of Global Energy Issues, Geneve, v. 23, n. 2-3, p.169–87, 2005. ARAUJO , J. L. R. H. Reform of reforms in Brazil: Problems and Solutions. In: SIOSHANSI, F. P.; PFAFFENBERGER, W. Ed(s). Electricity Market Reform: An International Perspective . Amsterdam: Elsevier, 2006, p. 565–94. ARAUJO , J. L. R. H. The case of Brazil: Reform by Trial and Error? In: SIOSHANSI, F. P.; PFAFFENBERGER, W. Ed(s). Electricity Market Reform: An International Perspective . Amsterdam: Elsevier, 2006, p. 565–94. ARAUJO , J. L. R. H.; et al. Reform of reforms in Brazil: Problems and Solutions’, in F. P. Sioshansi, Ed. 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É professor de pós-graduação em Latu Sensu e MBA da UNIFEOB e da Sedução - Sistemas de Educação Continuada, atuando em diversos cursos. Exerce atualmente as funções de Coordenador do Curso de Administração da FMPFM. É diretor geral da Benedeti & Benedeti Ltda. Odail Pagliardi é bacharel em Economia e também em Matemática, ambas as graduações realizadas na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e é Mestre em Planejamento de Sistemas Energéticos pela Faculdade de Mecânica da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Possui doutorado pela Faculdade Agrícola da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com enfoque em mercados futuros de commodities agrícolas. Atualmente é vice diretor e professor da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” e atua como pesquisador do Núcleo de Energia da Universidade Estadual de Campinas. Interciência & Sociedade 83 84 Interciência & Sociedade INTERATIVIDADE E EDUCAÇÃO: reflexões acerca do potencial educativo das TIC VERASZTO, Estéfano Vizconde Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) Instituição de Ensino São Francisco (IESF) [email protected] GARCÍA, Francisco García Universidad Complutense de Madrid/España (UCM) [email protected] RESUMO: Este trabalho apresenta uma abordagem geral das contribuições que as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) podem trazer para o contexto educacional ao aliar conteúdo, contexto real e aplicativos interativos de uma forma atrativa e pedagógica. Para atingir essa finalidade, o artigo apresenta fundamentos históricos e embasamentos teóricos para mostrar a evolução das TIC, bem como apresentar uma visão própria de interatividade a partir da análise de conteúdo de estudos desenvolvidos na área. Somente assim, poderá concluir apresentando noções de como os aplicativos interativos podem ser úteis para a esfera educacional, como também mostrar discussões sobre como uma Educação Tecnológica efetiva pode ser pensada. PALAVRAS-CHAVE: interatividade, aplicativos interativos, educação, tecnologia, TIC. ABSTRACT: This paper presents a general approach of the contributions that the information and communication Technologies (ICT) can bring to the educational context to combine content, real context and interactive applications in an attractive and pedagogic way. To do this, the article presents historical and theoretical basis to show the ICT development as well to provide an own vision of interactivity from the content analysis of studies developed in the area. Only thus it could finish presenting notions of how the interactive applications may be useful in the educational sphere and also to show discussions about how an effective technological education can be thought. KEYWORDS: interactivity, interactive applications, education, technology, ICT. 1. INTRODUÇÃO O século passado trouxe ao mundo profundas modificações resultantes de um avanço científico e tecnológico sem precedentes na história da humanidade. Uma verdadeira revolução tecnológica, presente em todos os setores da sociedade, se fez sentir de forma intensa em todo o sistema de comunicação e de troca de informações, rompendo barreiras espaciais e temporais e conectando o mundo inteiro. No conforto do lar, ao mesmo tempo em que se pode ver familiares que moram em continentes distantes, também é possível fazer movimentações bancárias e agendar consultas médicas, quase sem precisar deixar de ler as notícias da última hora. Hoje se está muito mais informado e se pode adquirir conhecimento de maneira bastante mais prática do que nossos pais conseguiam (MIRANDA et al., 2007; VERASZTO; 2004, 2009). Esta breve introdução aponta que o conhecimento tecnológico é primordial. Não apenas para interagir com os novos aparatos que a cada dia ganham as estantes do comércio, como principalmente para ser capaz de emitir juízos de valor acerca de algo que cada vez mais é parte intrínseca do nosso cotidiano. Este é o principal motivo para apontar que um sistema educacional não pode apenas priorizar conteúdos transmitidos de forma tradicional, mas que deve desenvolver novas metodologias que utilizem em seu proveito as ferramentas que os alunos e a sociedade já utilizam há Interciência & Sociedade 85 VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G. algum tempo (CARDOSO, 2001). É levando este ponto em consideração que este trabalho se propõe a fazer uma breve reflexão das contribuições que as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) podem trazer para o contexto educacional. Serão dados indícios teóricos concretos de como se pode aliar conteúdo curricular e recursos tecnológicos de forma atrativa, em um processo de ensino-aprendizagem capaz de valorizar a interatividade e os diferentes recursos textuais e audiovisuais, sem deixar de lado todo o conhecimento conquistado pela humanidade. 2. TIC e Educação: possibilidades de renovação curricular Com a revolução da microeletrônica na segunda metade da década de 1970, o desenvolvimento e o aprimoramento das TIC fez com que a linearidade das tecnologias de informações anteriores fosse substituída. Algumas tecnologias híbridas, como computadores, celulares, e os atuais televisores digitais, trouxeram para o cotidiano uma aproximação com um termo que passou a se tornar moda: a interatividade. Isso fez com que uma série de trabalhos e estudos fosse desenvolvido com o intuito de mostrar a importância de tecnologias interativas para a sociedade (WALKER, 2009). Desde o final do século passado, e ainda crescendo de forma vertiginosa, as tecnologias interativas ganham cada vez mais espaço e conquistam o público pelo fato principal de permitir ver, falar e ouvir pessoas distantes ou por proporcionar uma forma de conhecimento e entretenimento diferenciada, ao aliar, em um só dispositivo, a capacidade de assistir filmes, ouvir música, bater papo, escolher programas, fazer pesquisas escolares ou até mesmo jogar sozinho ou em rede (VERASZTO et al. 2008a, 2009b). E por proporcionarem uma ruptura no modo de conceber e transmitir informações que as TIC ganham espaço e simpatia cada vez maior de toda a sociedade, principalmente das novas gerações. Assim, torna essencial destacar que essas transformações parecem apenas não ecoar em parte considerável do sistema 86 educacional, que ainda não compreendeu os sinais vindos do lado de fora dos muros da escola. 2.1. O que precisa ser revisto Há algum tempo a constante perda de interesse dos alunos pela escola, e pela forma de ensino tradicional, vem sendo objeto de preocupação e estudo por parte de muitos educadores em diferentes países. Estudos que apontam que uma reestruturação curricular e metodológica se faz imprescindível (CALDERARO, 2000). A falta de habilidade para conseguir perceber a utilidade dos conteúdos que a escola tenta ensinar é o maior problema que os estudantes enfrentam hoje em dia. Em uma sociedade de consumo, os alunos precisam conseguir ver ou serem convencidos de que os conhecimentos que a escola pretende ensinar são importantes. Não que o consumo seja mais importante que a escola, muito pelo contrário, mas sim que as avançadas técnicas de pesquisas mercadológicas conseguem ser mais eficientes que o passivo sistema educacional, que em muitos casos é incapaz de mostrar a utilidade dos conhecimentos que tenta ensinar (VERASZTO, 2004). Grande parte do êxito, ou da frustração, dos estudantes está relacionado com o ambiente produzido em sala de aula. A preocupação excessiva dos professores em cumprir o conteúdo curricular e transmitir aos alunos fórmulas e conceitos, regras e datas, acaba minando a curiosidade intrínseca dos alunos. Isso faz com que a escola, e todo aquilo que ela representa, passe a não ter nenhum significado para aqueles que deveria ensinar (SIMON et al. 2004). Assim, se a escola começar a prestar mais atenção naquilo que a sociedade e seus alunos estão valorizando, poderá perceber que as TIC, e todo seu potencial educativo, podem trazer novos rumos para o processo educativo. 2.2. As TIC e os desafios para a Educação Com o advento tecnológico e as expansões dos multimeios e da internet, novas formas de se tomar contato com o Interciência & Sociedade Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC saber foram colocadas à disposição de toda sociedade. Informações das mais diferentes áreas são disponibilizadas sob formas dinâmicas, interativas, carregadas de imagens e sons. Com um vasto campo de pesquisa para a obtenção de conhecimentos, paulatinamente a escola perde o monopólio da transmissão do saber. Saber este que hoje é valorizado como bem máximo da humanidade. Em nossos dias, as crianças acabam chegando à escola com um capital de conhecimentos de uma forma nunca antes possível. Frente a esta situação, as instituições educacionais enfrentam o desafio de incorporar essas tecnologias não só como parte do conteúdo, mas principalmente como ferramentas de apoio na construção do saber. Ferramentas que podem contribuir para elaborar, desenvolver e avaliar práticas educativas, capazes de promover o desenvolvimento intelectual a formação do indivíduo como cidadão consciente e participante. É preciso romper com a postura tradicional vigente há décadas, pois hoje não mais nos servem os pacotes de saber institucionalizados, fragmentados e apostilados. A estática das metodologias tradicionais deve abrir espaço para o dinamismo de um ensino diferenciado. Contudo, em momento algum a intenção é aqui deixar transparecer que o saber acumulado pela humanidade ao longo da história não seja importante de se ensinar e se aprender, mas sim, que a rigidez de um sistema escolar que prioriza avaliações objetivas deve ser substituída por uma metodologia que prioriza idéias e que proporcionem ao aluno relações com o mundo real. Porém, é sabido que somente o discurso não gera mudanças. É preciso ação. Mas para que estas sejam planejadas de forma eficiente, também é preciso ter um norte. E é um caminho para este norte o que este artigo se propõe a fazer, apontado a seguir o potencial educativo das tecnologias interativas. Contudo, antes se faz necessário fazer uma rápida apresentação da evolução histórica do conceito de interatividade para somente então, apontar indícios de como tecnologias com esta característica podem ser incorporadas e aplicadas na educação. 3. Classificando a interatividade: aspectos metodológicos Interação e interatividade. Termos que muitas vezes são empregados como sinônimos. Utilizados nas mais diferentes áreas do saber, foi somente na década de 1960 que a interatividade, relacionada a tecnologias digitais foi empregada. Segundo Primo & Cassol (2008) o termo interação é um conceito bem mais antigo que interatividade e vem sendo usado utilizado nos mais diversos ramos do conhecimento científico como as relações e influências mútuas entre dois ou mais fatores ou entes, etc. Assim, pode-se dizer que cada fator altera o outro, a si próprio e também a relação entre ambos. A transformação da palavra interação para interatividade se deu no momento que a informática reelaborou um termo cuja gênese vem da Física, que ganhou conotações diferenciadas ao passar pela Sociologia e posteriormente pela Psicologia Social (FEITOSA, ALVES & NUNES NETO, 2008). Segundo Bonilla (2002), o termo surgiu no contexto das críticas aos meios e tecnologias de comunicação unidirecionais, que teve início da década de 1970. Todavia, Fragoso (2001) aponta que o tema surgiu na década de 1960 quando estudiosos da Informática procuravam novo significado para a comunicação entre computador e o homem, tendo como princípio a agilidade, a facilidade e maiores possibilidades de comunicação. A palavra interatividade, derivada do neologismo inglês interactivity, foi cunhada para denominar uma qualidade específica da chamada computação interativa. [...] diz-se que a computação interativa tornou possível estabelecer uma primeira forma de diálogo entre o homem e a Unidade Central de Processamento [...] (FRAGOSO, 2001, p. 2). A então chamada computação interativa não era suficiente para deixar claro como as relações entre usuário-computador Interciência & Sociedade 87 VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G. iria se modificar pela incorporação de periféricos e pelas trocas de dados em tempo real. A computação sempre fora interativa, pois mesmo com cartões perfurados sistema e usuários já interagiam. Não fazia sentido simplesmente empregar o termo pelo fato do computador ter passado a um conjunto pequeno de CPU-teclado-monitor. Contudo, ainda é muito comum ver ambos os termos serem empregados com o mesmo sentido. Assim, através da análise de diferentes estudos realizados e de pesquisas sobre o significado dos termos inte- ração, interativo e interatividade, foi elaborado o Quadro 1 baseado em pressupostos qualitativos de Análise de Conteúdo para organização de dados segundo aspectos da formulação teórica de Bardin (1991), organizando e categorizando os dados, após a transformação e a diferenciação de informações brutas. Esta estratégia foi adotada no intuído de, por condensação, obter representações simplificadas dos dados brutos para facilitar a análise. Quadro 1. Interatividade, interação e interativos: definições e utilizações existentes. Definição ou utilização dos termos: Interação e inteÁrea de saber Referência ratividade Física Interação entre a matéria através da atuação de quatro tipos de forças básicas: gravidade, eletromagnetismo, a força nuclear forte e a força nuclear fraca. Interação das ondas eletromagnéticas com a matéria. Filosofia O pragmatismo, tomado como um exemplo considera o homem não como mero espectador separado da natureza, mas como um constante e criativo interagente. PRIMO & CASSOL, 2008 Interações entre os homens e sociedade, proporcionando surgimento de relações sociais e culturais. Sociologia A relação entre duas ou mais pessoas que, em determinada situação, adaptam seus comportamentos e ações JENSEN, 1998 uns aos outros A meteorologia se ocupa, por exemplo, das interações entre componentes dos oceanos e a atmosfera terrestre. Geografia Interação das placas tectônicas na formação das montanhas. PRIMO & CASSOL, 2008 Interação de ventos e ondas provocando pequenos abalos sísmicos. Interações entre genótipo e ambiente provocando variações fenotípicas. Biologia 88 Os conhecimentos não partem, com efeito, nem do sujeito (conhecimento somático ou introspecção) nem do objeto (porque a própria percepção contém uma parte considerável de organização), mas das interações entre PIAGET, 1996 sujeito e objeto, e de interações inicialmente provocadas pelas atividades espontâneas do organismo tanto quanto pelos estímulos externos. Interciência & Sociedade Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC Química Interações intramoleculares. Zoologia Interações hormonais. Farmacologia Interações medicamentosas. Antropologia Interações inter culturais entre civilizações. Interatividade é uma nova forma de interação técnica, de característica eletrônico-digital, e que se diferencia da interação analógica que caracteriza a mídia tradicional. Cibercultura Interatividade se define como a extensão em que os usuários podem participar modificando a forma e o conteúdo do ambiente mediado em tempo real. Interatividade é uma variável direcionada pelo estímulo e determinada pela estrutura tecnológica do meio. Interatividade pode ser definida como uma atividade mútua e simultânea da parte dos dois participantes, normalmente trabalhando em direção de um mesmo objetivo. PRIMO & CASSOL, 2008 Discute a problemática da interatividade na Web: Para um site ser verdadeiramente interativo – uma necessidade para que a potencialidade do meio seja aproveitada – deve facilitar a comunicação entre os seres humanos. Como a Internet é um meio claramente de dupla via, os sites plenamente interativos são aqueles que unem as pessoas, que facilitam a comunicação entre usuários e entre os usuários e a equipe de produção do site. A implementação da interatividade é uma arte pois ela exige a compreensão da amplitudes de níveis e demandas, incluindo a o entendimento do aluno, uma apreciação das capacidades de engenharia de software, a importância da produção rigorosa de contextos instrucionais e a aplicação de interfaces gráficas adequadas. Isto é, interatividade deveria ser mais do que "apontar e clicar" Interatividade deve ser descrita como uma atividade entre dois organismos, e com um aplicativo informático, SIMS, 1995 envolvendo o aluno em um diálogo verdadeiro. Nesse caso emerge uma interação de qualidade, desde que as respostas do computador sejam adequadas com as necessidades informativas do usuário. Quanto mais dialógicas forem as interfaces, melhores serão os níveis de interação em courseware. Para que uma interface seja plenamente interativa, ela necessita trabalhar na virtualidade, possibilitando a ocorrência da problemática e viabilizando atualizações Interatividade pode ser tida como comunicação bidirecional e imprevisível em seu processo. GABOCORP/FAInteratividade é como um diálogo homem-máquina, que COM/UFBA, 2008 torna possível a produção de objetos textuais novos, não completamente previsíveis a priori. Interciência & Sociedade 89 VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G. Interatividade não é somente uma troca de comunicação, mas também geração de conteúdo. Como propriedade, interatividade pode ser abordada como sendo um RICHARDS, 2006; atributo da tecnologia. “conseqüentemente, o foco do SUNDAR, 2004 resultado é no design (de interface) e na técnica (usabilidade). Interatividade é o grau com o qual uma tecnologia de comunicação pode criar um ambiente mediado no qual usuários podem se comunicar sincronizada ou assincronamente e participar em trocas de mensagens recíprocas. Interatividade também se refere à habilidade do usuário de perceber a experiência como uma simulação da comunicação interpessoal. Operacionalmente, conclui-se que interatividade é estabelecida por três fatores: estrutura tecnológica do meio usado (velocidade, alcance, flexibilidade do sincronismo e complexidade sensorial); característica do ajuste da comunicação; e percepção dos indivíduos (proximidade, velocidade percebida, ativação sensorial e tele-presença). KIOUSIS, 2002 A interatividade é promovida através de um meio que permite a interação entre as pessoas. A interatividade seria um tipo de comunicação possível graças às potencialidades específicas de umas particulares configurações tecnológicas, cujo objetivo é imitar, ou simular, a interação entre as pessoas. A interatividade está na disposição ou predisposição para mais interação, para uma hiper-interação, para bidirecionalidade (fusão emissão-recepção), para participação e intervenção, tendo em vista que um indivíduo pode se predispor a uma relação hipertextual com outro indivíduo. FEITOSA; ALVES & NUNES NETO, 2008 Interatividade mediática geral ultrapassa a situação concreta de espaço e tempo em que alguém produz; ou alguém "lê" (usa) um produto; ou alguém reage a um produto; ou alguém age de tal forma a fazer chegar às instâncias produtoras suas reações, etc. Deve-se perFRAGOSO, 2001, ceber a interatividade social em uma sociedade de cop. 4 municação como um conjunto de todas estas (e outras) ações de tal forma que uma parte significativa das interações em sociedade se desenvolve em conseqüência e em torno de "mensagens" (proposições, produtos, textos, discursos, etc.) diferidas no tempo e no espaço. A interatividade é a extensão de quanto um usuário pode participar, influenciar ou modificar a forma e o conteúdo de um ambiente computacional, sendo vista como uma variável direcionada pelo estímulo e determi- WAISMAN, 2006, nada pela estrutura tecnológica do meio. 2008 A interatividade é uma atividade mútua e simultânea da parte de dois participantes normalmente trabalhando em direção de um mesmo objetivo. 90 Interciência & Sociedade Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC A interação é uma série complexa de mensagens trocadas entre as pessoas. Porém, o entendimento de comunicação vai além das trocas verbais, sendo assim, todo comportamento uma comunicação. PRIMO & CASSOL, 2008 Para ficar mais claro, poderíamos substituir a palavra ‘interação’ pela palavra ‘relação’. O conhecimento é, portanto fruto de uma relação. E relação nunca tem um sentido só. Comunicação e Semiótica Interatividade é um conceito que quase sempre está associado às novas mídias de comunicação. DEFLEUR & BALL-ROKEACH, 1989 Interatividade pode ser definida como uma medida do potencial de habilidade de uma mídia permitir que o usuário exerça influência sobre o conteúdo ou a forma da comunicação mediada. JENSEN, 1998 Interatividade é a disponibilização consciente de um mais comunicacional de modo expressivamente complexo, ao mesmo tempo atentando para as interações existentes e promovendo mais e melhores interações – seja entre usuário e tecnologias digitais ou analógicas, seja nas relações “presenciais” ou “virtuais” entre seres humanos. BONILLA, 2002 Interatividade é uma expressão da extensão que, em uma determinada série de trocas comunicativas, qualquer terceira (ou posterior) transmissão (ou mensagem) RAFAELI, 1988. é relacionada ao grau com o qual trocas anteriores se referem mesmo a uma transmissão mais antiga. A interatividade, ou seja, o exercício de interação ocorre entre emissor e receptor que devem estar numa mesma sintonia no processo de comunicação. A interatividade é uma peculiaridade de alguns sistemas informáticos que permitem ações recíprocas de modo dialógico com outros usuários ou em tempo real com artefatos. A interatividade pode ser entendida como a quantidade de controle que a audiência tem sobre as ferramentas (serviços) e o conteúdo; ou a quantidade de opções que este controle oferece e a habilidade de usar uma ferramenta ou um conteúdo de forma que seja produtivo ou criativo. WAISMAN, 2006. Interatividade é o fenômeno da comunicação que ocorre entre pessoas. Máquinas simulam a interatividade e precisam ser ensinadas ou munidas de informações para que possam desempenhar este papel. Interciência & Sociedade 91 VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G. Interativo: 1. Aquilo que procede por interesse; 2. Informática. Diz-se dos programas que permitem uma interação a modo de diálogo, entre o computador e o usuário. Definições de interação Educação Interação é ação que se exerce mutuamente entre duas ou mais coisas ou pessoas; ação recíproca. Interação é ação; influência recíproca entre dois elementos. Interação é ação exercida reciprocamente entre dois objetos, pessoas etc. Interação é influência recíproca; fenômeno que permite a um certo número de indivíduos constituir-se em grupo e que consiste no fato de que o comportamento de cada indivíduo se torna estímulo para outro. Interativo é atividade desenvolvida mútua ou reciprocamente. 2. Relação entre dois sistemas comunicativos (como um telefone, uma TV a cabo ou um computador) que envolve usuários de outras ordens (seja para troca de informações, seja para propaganda) ou responsabilidades (como uma enquete) Interatividade: 1. Uma atividade que envolve interação; 2. Propriedade de ser interativo. A interatividade é o elemento-chave para a construção do conhecimento, pois nenhum conhecimento, mesmo que através da percepção, é cópia do real. O conhecimento não se encontra totalmente determinado pela mente do indivíduo, mas é produto de uma interação. Logo o conhecimento é construído interativamente entre o sujeito e o objeto. TIMÓN, 1998 GABOCORP/FACOM/UFBA, 2008 RICHARDS, 2006. PIAGET, 1996 Fonte: elaborado pelos autores. Analisando os conceitos apresentados para diferentes áreas de concentração, é possível observar que dentre uma série de citações, a grande maioria pertence à Cibercultura, reforçando os estudos entre homens e máquinas que têm, nestas, as coadjuvantes para as relações sociais. Todavia, o conceito de interatividade pode ir muito além da mera e simples comunicação entre homem e computador. 4. Afinal, o que é interatividade? Fazendo uma releitura de todas as citações postadas anteriormente, e inferin92 do segundo uma visão particular, apoiada pela formulação teórica, este trabalho entende a interatividade como o nível com o qual uma tecnologia permite criar um ambiente mediado, no qual diferentes entes, de diferentes naturezas, podem se comunicar de forma sincronizada ou não, trocando mensagens recíprocas (MURRAY, 1999; KIOUSIS, 2002). Complementando, vale ressaltar que uma tecnologia interativa deve permitir trocas entre máquina, softwares e usuários, através de periféricos ou de menus e links audiovisuais ou hipertextuais, com a capacidade de proporcionar aprendizagem, Interciência & Sociedade Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC entretenimento, aquisição de informações e comunicação em tempo real ou remota. Assim, pode-se dizer que uma tecnologia interativa interatividade precisa que o sistema virtual seja dinâmico, forneça possibilidades variadas de escolha e feedbacks, com auxílio de animações, filmes, músicas, hipertextos, jogos, simulações, holografias e verossimilhança com o meio real, permitindo ainda que usuário tenha capacidade de imersão no meio virtual de forma passiva ou ativa, individual ou coletiva, com opções de transformar o ambiente de forma livre, em consonância com sua vontade, suas preferências, crenças e valores (VERASZTO et al. 2009a, 2009b). Mesmo sabendo que todos estes pontos ainda não coexistem em uma única tecnologia, existem estudos para sua efe- tivação, dando indícios de todo o seu potencial, que aqui deve-se lembrar, pode ser empregado no contexto educacional (AMARAL, 2004; BASSO & AMARAL, 2006; BATTAIOLA & ELIAS, 2002; CAMPOS, 2008; CLUA & BITTENCOURT, 2008; COSTA & FRANCO, 2005; MISKULIN, 2008; MIT, 2008; MUGNAINI; 2007; PASSERINO, 2010; UFMT, 2008; VERASZTO et al 2009a, 2009b, 2009c). 5. Aplicativos interativos e suas contribuições educacionais Conforme apontado anteriormente, é sabido que tecnologias interativas podem ser desenvolvidas para apoiar intervenções educacionais. Algumas das possibilidades podem ser vistas no resumo do Quadro 2. Quadro 2. Possibilidades educativas das tecnologias interativas As tecnologias interativas desenvolvidas para o contexto educativo, um aluno é capaz de • se beneficiar de simulações para compreender melhor processos reais; • tomar decisões; • fazer escolhas, a partir de distintas possibilidades, que reflitam suas idéias, código de ética e valores; • selecionar procedimentos e verificar suas funcionalidades; • compreender o sentido de mensagens escritas e audiovisuais atribuindo-lhes significado ou re-significando seus conteúdos; • utilizar códigos e símbolos para interagir com a realidade virtual; • interagir virtualmente através de diferentes processos interativos; • explorar e resolver situações-problema virtuais que envolvam contagens, medidas e códigos numéricos, construindo, a partir deles, os significados das operações fundamentais; • identificar relações de posição entre objetos no ambiente virtual; • perceber semelhanças e diferenças entre objetos e identificar formas superficiais ou espaciais, em situações que envolvam simulações, construções e representações virtuais e audiovisuais; • confiar na própria capacidade de elaborar estratégias e obter soluções para situações-problema virtuais e audiovisuais, estabelecendo comparações com a realidade e o meio no qual está inserido; • estimar resultados e expressá-los por meio de representações não necessariamente convencionais; • valorizar a troca de experiências entre máquinas, sistemas e homens como forma de aprendizagem e aquisição de conhecimentos; • comparar as formas geométricas encontradas na natureza, nas artes, nas edificações e fazer associações com as representações dos ambientes virtuais e audiovisuais; Interciência & Sociedade 93 VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G. • valorizar medidas e estimativas para resolver problemas virtuais e interativos; • conhecer, interpretar e produzir mensagens, que utilizam formas gráficas e audiovisuais para apresentar informações; • organizar e elaborar estratégias para solucionar problemas lógicos; • utilizar informações obtidas no ambiente virtual para justificar suas idéias ou adquirir conhecimentos novos; • interpretar as informações estabelecendo regularidades e relações de causa e efeito, semelhanças, diferenças e seqüências de fatos; • reconhecer, no espaço virtual e no ambiente real, referenciais espaciais de localização e orientação de modo a estabelecer representações espaciais; • situar acontecimentos históricos e localizá-los no tempo; • assumir posições segundo seu próprio juízo de valor, considerando diferentes pontos de vista e aspectos de cada situação simulada; • construir objetos virtuais, ou seja, construir imagens, plantas de casas, cidades hipotéticas, etc.; • modelar fenômenos, planejando e realizando experiências químicas e físicas, por meio da simulação de situações, que se modificam em função de diferentes variáveis; • interagir com uma grande quantidade de informações, que se apresentam de maneira atrativa, por suas diferentes notações simbólicas (gráficas, lingüísticas, sonoras etc.); • desenvolver processos metacognitivos, na medida em que o instrumento permite pensar sobre os conteúdos representados e as suas formas de representação, levando o usuário a “pensar sobre o pensar”; • formar parcerias de trabalho (duplas ou trios), que servirão também para promover a troca de informações. Fonte: elaborado pelos autores. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O vínculo entre tecnologia e educação pode ser estabelecido historicamente desde o surgimento do primeiro dos nossos antepassados. O surgimento e o desenvolvimento de atividades próprias do ser humano como a memória, a cognição, o pensamento, a linguagem, a escrita, bem como o posterior surgimento da impressão e da informática, são eventos que dão indício da paralela evolução tecnológica e intelectual da humanidade. Dentro do contexto apresentado ao longo de todo o trabalho, a educação precisa buscar a compreensão e interpretação da realidade para então situar o educando na compreensão do mundo que o abriga. E por termos hoje um mundo plural, e em constante mudanças, graças ao advento tecnológicos, a utilização das TIC tem muito a contribuir. Tecnologias interativas, que se valem de recursos audiovisuais e textuais diversificados, podem vir a convergir em aplicativos, jogos ou softwares com carac- 94 terísticas multidisciplinares assim como o nosso entorno é constituído. Assim, o objetivo deste trabalho se cumpre ao apresentar uma série de contribuições que as tecnologias interativas podem trazer à educação. Contudo, não é o bastante. As bases da reflexão aqui estão lançadas e estas, devem deixar como desafio futuro a utilização desta teoria para o desenvolvimento de atividades educativas concretas. Desta forma, é possível ultrapassar a barreira dos discursos bem intencionados colocando em prática aquilo que a teoria apregoa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARAL, S. F.; et al. Serviço de apoio a distância ao professor em sala de aula pela TV Digital interativa. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Campinas, v. 1, n. 2, p. 53-70 , jan../jun. 2004 – ISSN: 1678-765X. BARDIN, L. Análise de Conteúdo. 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Atualmente é diretor e professor da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”, pesquisador do Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, pesquisador colaborador da Universidad Nacional de Educación a Distáncia (UNED/España), pesquisador colaborador da Facultad de Ciencias de la Información da Universidad Complutense de Madrid e docente da Instituição de Ensino São Francisco (IESF). Francisco García García é Profesor Doutor, Catedrático de Comunicación Audiovisual y Publicidad de la Facultad de Ciencias de la Información de la Universidad Complutense de Madrid-España. 96 Interciência & Sociedade LEITURA, ESCRITA E NOVAS MÍDIAS SILVA, Fabiano Correa da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) Instituição de Ensino São Francisco (IESF) [email protected] RESUMO: O presente artigo faz parte de uma pesquisa maior que procurou compreender como acontecem as relações entre leitura e escrita, leitores e escritores com o advento das novas tecnologias da informação e da comunicação – NTICs. A redefinição destes novos lugares com a valorização da interatividade por meio destes inovadores recursos tecnológicos faz do leitor não mais um simples receptor de conteúdos, mas também um participante com capacidade de interferir nos rumos da própria escrita do texto, o chamado escrileitor. PALAVRAS-CHAVE: Leitura, Escrita, Novas Mídias, Interatividade. ABSTRACT: This article is part of a larger research project that sought to understand how the relationship between reading and writing, readers and writers with the advent of new information technologies and communication – NICTs. The redefinition of these new places with the enhancement of interactivity through these innovative technological features makes the reader no longer a mere recipient of content, but also a participant with the capacity to interfere in the course of the actual writing of the text, called escrileitor. KEYWORDS: Reading, Writing, New Media, Interactivity. A escrita metódica me distrai da presente condição dos homens. A certeza de que tudo está escrito nos anula ou faz de nós fantasmas (BORGES, 2007). Questões como a escrita e a leitura muitas vezes estiveram em pauta nas discussões a respeito das manifestações artísticas e culturais do homem, pois são formas primordiais de comunicação e inter-relação entre os seres humanos. Dessa forma, torna-se importante pensarmos a respeito de como a atual “revolução” das novas mídias, como diz FURTADO (2002), tem modificado as maneiras de produzir (escrever) e consumir (ler) textos. Desde o surgimento da escrita, há aproximadamente seis mil anos, com os primeiros hieróglifos até o presente das chamadas escritas eletrônicas, o que o homem busca são maneiras de se comunicar, se expressar e se fazer presente numa sociedade em mudança. A escrita tornou-se o aparato pri- mordial e mais importante de expressão da humanidade, visto que dá a impressão de eterno em contrário ao sentimento de efemeridade do oral. Um exemplo marcante disso foi, segundo diz Horcades (2007), o apoio que os reis e a Igreja deram à imprensa quando do seu surgimento, visto que os interesses em manter viva as suas doutrinas e poderio sobre a sociedade medieval. Por esse motivo, as sociedades letradas passaram a escrever as suas histórias, como aconteceu com a Bíblia Sagrada judaico-cristã, ou mesmo o alcorão mulçumano. Todas as histórias ali presentes e carregadas de imagens abstratas e figuras de linguagem, antes de serem escritas, foram narradas de geração para geração durante muitos séculos. Um exemplo concreto disso é a celebração da Páscoa judaica, à qual foi cristianizada pelos seguidores de cristo, de acordo com a sua nova doutrina. A perpetuação da escrita como forma principal de manifestação da humanidade fez surgir o que é chamado de sociedades letradas, havendo uma super vaInterciência & Sociedade 97 SILVA, F. C. da lorização da escrita, em detrimento do oral. A palavra dita e acordada já não é mais válida, sendo necessária a escrita de um documento legal que legitime tal acordo, o que demonstra uma mudança social importante, pois a escrita torna-se algo supremo, só perdendo este status com o surgimento das mídias eletrônicas já no final do século XX, relata Mourão em suas análises sobre o hipertexto. Com o surgimento da imprensa de Gutenberg no final da idade média a escrita inicia o seu apogeu e domínio, pois a facilidade de acesso aos textos impressos vai se tornando, com o passar do tempo, cada vez mais fácil. Os romances do século XIX são exemplos de como a sociedade tem, no suporte escrito, o maior aliado na propagação de idéias, culturas e conhecimentos. A supremacia da escrita, portanto, faz surgir os leitores, consumidores deste tipo de comunicação que, para fazerem parte desta sociedade, precisam dominar a decodificação destes sinais gráficos, as letras. Assim, o domínio da leitura e da escrita torna-se algo de fundamental importância, pois aqueles que não tiverem o conhecimento letrado são impedidos de ter acesso as mais diversas áreas do saber e da cultura. Desde então, saber ler e escrever tornam-se requisitos básicos e primordiais para pertencer à sociedade e ter acesso a gama de conhecimentos desenvolvidos por quem a elas pertencem. Dentre tantos exemplos dessa supremacia da escrita, os tratados filosóficos, representações escritas do que antes era oralmente expresso nas praças públicas, são marcas de como o acesso ao conhecimento é feito por meio do código impresso. O ensino da escrita e o incentivo à leitura como forma de aquisição de saberes torna-se algo essencial em muitas culturas, com o ensino regular de língua e leitura na maioria das escolas em muitos países. Ser um bom escritor e um bom leitor são premissas importantes para que a pessoa faça parte da sociedade e possa gozar de todos os privilégios. Vejamos o caso do romance, gênero literário dominante na sociedade burguesa emergente do século XVIII, em contraste com a poesia, gênero lírico representante 98 da nobreza decadente, que se tornou o estilo literário mais lido, estudado e conhecido a partir de então. Assim, prova-se que o domínio da escrita e da leitura está vinculado com a aquisição de conhecimento e, consequentemente, com o acesso aos bens político-culturais e ao poder. Nas artes plásticas, na pintura mais especificamente, muitas obras representavam nas telas essa supremacia da escrita e da leitura. No teatro, a imagem de pessoas lendo e ou escrevendo simbolizam, por meio de personagens-tipo, a valorização e o culto à palavra escrita. Mesmo nas diferentes religiões, por meio da teatralização das celebrações, existe a “adoração” à Palavra de Deus, simbolizada pela Bíblia Sagrada impressa, disponível de manejar apenas aos sacerdotes, mostrando assim a sacralização deste objeto. Importante lembrar que, apesar de todas as mudanças culturais, religiosas, políticas e sociais, ainda hoje existe essa sacralização do livro sagrado impresso. Fazendo uma pesquisa mais apurada a respeito da valorização da leitura e da escrita, podemos verificar que em muitas manifestações artísticas, tais como a pintura, a escultura, a música, e muito marcadamente a literatura (pois é a arte da escrita), encontramos o culto à escrita e à leitura. Todas essas obras são capazes de demonstrar a valorização de toda uma sociedade ao culto da palavra escrita, impressa e também da decodificação da mesma. O pintor flamengo pré-renascentista Robert Campin, um dos grandes pintores da sua época, demonstra em várias de suas telas essa admiração, culto e valorização da escrita e da leitura, por meio de imagens de pessoas com livros, ou mesmo naquelas obras em que o livro aparece como objeto que pertence à cena retratada. Em “A Virgem e o Menino diante de um guarda fogo” o artista leva ao ápice a valorização da cultura letrada por meio da imagem de um livro sobre um móvel, o qual, possivelmente, Maria, a mãe de Jesus, estaria lendo quando antes de amamentar seu filho. Impressionante é ver que uma santidade leia, a sacralização da leitura. Já em outra obra de Robert Campin, intitulada “Retábulo de Mérode”, no qual retrata a cena da anunciaInterciência & Sociedade Leitura, escrita e novas mídias ção do anjo à Maria, esta, agora sim, está lendo um livro bem posto em suas mãos, e ainda em cima da mesa existe outro também aberto, como se a Virgem estivesse a desfrutar da leitura de ambos. Isso presente numa cena clássica das histórias evangélicas, visto que este episódio é uma marcante data no calendário católico. Também em outras tantas obras de arte, de outros autores e em diferentes épocas representam a valorização da escrita, tais como as pinturas de Henri Fantin-Latour (1836-1904), “A Leitura”, 1870, Óleo sobre tela, 95 x 123 cm, já no final do século XIX; ou mesmo a música “Língua” (1972) do cantor brasileiro Caetano Veloso, a qual faz diferentes alusões a respeito dos usos da língua por meio da escrita, referindo-se a autores brasileiros e portugueses, como Guimarães Rosa, Camões, Fernando Pessoa, dentre outros. Na literatura, mais do que em qualquer manifestação artística, a palavra escrita/impressa é super valorizada. Exemplos de obras que fazem um trabalho de metalinguagem ao homenagear a própria língua e também a enaltecer o ofício do criar não faltam na literatura universal. Camões, em os Lusíadas, por exemplo, pede inspiração às ninfas do Tejo para que a pena em suas mãos corra pelo papel em branco e seu canto possa alcançar o objetivo que é a exaltação aos feitos portugueses. Isso tudo demonstra, mais uma vez, que desde que surgiu, a escrita impressa é algo que ganhou muito status e, por esse motivo, hoje na chamada revolução digital (Santaella) a escrita eletrônica pode encontrar barreiras por parte de muitas pessoas que acreditam no fim da escrita impressa/linear, o que não é uma verdade que venha a ocorrer. O surgimento das novas mídias, porém, vem desestabilizar a “cultura livresca” (Furtado), na qual a escrita tradicional impressa é a guardiã da memória, da ordem e da lei que mantém as relações hierárquicas e de poder. Por esse motivo é que é chamado, por muito teóricos da comunicação e das artes, de “Revolução” este momento em que surgem a escrita eletrônica e seus dispositivos de leitura: Estamos, sem dúvida, entrando numa revolução da informação e da comunicação sem precedentes que vem sendo chamada de revolução digital. O aspecto mais espetacular da era digital está no poder dos dígitos para tratar toda informação, som, imagem, vídeo, texto, programas informáticos, com a mesma linguagem universal, uma espécie de esperanto das máquinas. Graças à digitalização e compressão dos dados, todo e qualquer tipo de signo pode ser recebido, estocado tratado e difundido, via computador. Aliada à telecomunicação, a informática permite que esses dados cruzem oceanos, continentes, hemisférios, conectando potencialmente qualquer ser humano no globo numa mesma rede gigantesca de transmissão e acesso que vem sendo chamada de ciberespaço (SANTAELLA, 2004: 71). Esse momento de mudança estabelece temas cruciais, segundo Furtado, da transição do texto impresso para o suporte eletrônico, sendo questões que o autor discute em seus estudos procurando entender como é a natureza do livro no mundo digital como forma de comunicação; como ocorre o controle dos livros, da autoria, dos consumidores e mesmo como gerir a herança cultural; e como reestruturar as economias de autoria e edição. Esses questionamentos fazem parte de um momento em que são precisas respostas que justifiquem o aparecimento do eletrônico numa sociedade historicamente marcada pela escrita impressa/ linear. A palavra Interatividade é um conceito importante quando falamos em Leitura e Escrita nas Novas Mídias, pois a relação entre escritores e produtores de informação com seus leitores e receptores é baseada na interação entre ambos. Dessa forma, Interatividade não é algo novo ou que surgiu com o advento das novas mídias, pois pode haver interação entre um escritor de obras impressas e seus leitores. O que, no entanto, é importante saber é em que sentido usamos o termo em questão, como diz SANTAELLA, 2004 p. 153: diante dessa proliferação ilimitada de sentidos, é preciso recuperar uma noção mais estreita, porém mais significativa do termo ‘interatividade’. Toda palavra quando muito usada Interciência & Sociedade 99 SILVA, F. C. da por uma grande parcela de pessoas, sendo que a usam de diferentes maneiras possíveis, gera um desconforto e até mesmo uma grande confusão. A palavra Interatividade está sendo correntemente usada neste momento que vivemos da chamada Revolução Digital (SANTAELLA, 2004). Diversas definições foram dadas ao termo, o que fez com que muitos estudiosos criassem resistência ao seu uso em obras de pesquisa de caráter científico. Numa pesquisa rápida pelos livros e pela Internet podemos confirmar esta infinidade de usos da palavra Interatividade: Como pudemos perceber, é necessário que saibamos em que sentido e para qual objetivo usamos a palavra em questão. O que é marcante saber, é que esta pesquisa dos significados da palavra interatividade já demonstra por si só o que é viver em uma sociedade que tem nos dias atuais a interação como palavra chave, ou seja, a relação entre pessoas, entre pessoas e máquinas são exemplos da necessidade de compreendermos o uso deste termo que se tornou fundamental para o entendimento da sociedade atual. Apesar de sabermos que faz parte da própria condição humana não viver isoladamente, o que afirmamos aqui é que este conceito Interatividade está ainda mais presente nos dias atuais devido ao avanço tecnológico e suas possibilidades de interação. É fácil perceber que ao fazer uma pesquisa rápida sobre um termo em livros ou mesmo e mais rapidamente na Internet, estamos interagindo com um número infinito de pessoas que também, por algum motivo, tenha procurado saber o significado desta palavra. Assim sendo, percebemos que o que parece ser uma simples pesquisa na qual isoladamente eu procuro saber o sentido de um termo, torna-se, graças às novas tecnologias, a internet no caso, uma grande teia de interatividade. Da mesma forma é importante notar que interagimos constantemente com os demais seres humanos e máquinas que fazem parte da sociedade. A interatividade na sociedade já é algo inerente na vida das pessoas que o fazem muitas vezes sem nem sequer notarem que o estão fazendo. A revolução digital a qual se refere 100 SANTAELLA (2004) é algo que já presenciamos até de forma tranqüila e natural, visto que nossas crianças já nascem com a mão no mouse e os olhos nas telas da TV e do computador, ouvindo nossas músicas e sonhando com nossas histórias. Dessa forma, apesar do substantivo revolução, essas mudanças ocorrem de forma um tanto quanto aparentemente natural, no entanto, ainda existem realidades bastante distantes desta revolução e que estão à margem das novas tecnologias. A vivência na sociedade em rede nos proporciona uma reflexão a respeito das mudanças de paradigmas que enfrentamos neste momento, chamado por muito teóricos da atualidade, da terceira revolução, afirma CASTELLS (2001) que o que é caracterizado na atual revolução tecnológica não é a centralidade de conhecimentos e informação, mas a aplicação desses conhecimentos e dessa informação para a geração de conhecimentos e de dispositivos de processamento/comunicação da informação, em um ciclo de realimentação cumulativo entre a inovação e seu uso. Portanto, a Interatividade no seu sentido mais amplo é a interação entre humano-humano por meio do diálogo com uso ou não de inovações tecnológicas e também a interação entre homem-máquina: ...uma definição mais básica de interatividade nos diz que se trata aí de um processo pelo qual duas ou mais coisas produzem um efeito uma sobre a outra ao trabalharem juntas. Uma definição menos genérica e mais simplificada diz que interação é a atividade de conversar com outras pessoas e entendê-las. Nesta última definição está explícita a inserção da interatividade em um processo comunicativo, que, na conversação, no diálogo, encontra sua forma privilegiada de manifestação (SANTAELLA, 2004: 154). Dessa forma, a interatividade pode ocorrer por meio de diferentes tecnologias, desde as mais simples e conhecidas como o texto impresso de leitura linear no qual o autor propõe um diálogo com seu leitor, quanto àquelas com suporte hipermidiático, nas quais a máquina oferece muitas ferra- Interciência & Sociedade Leitura, escrita e novas mídias mentas que colaboram no dialogismo entre os envolvidos na interação. A palavra “Mídia” tem sua origem no Latim e significa “meios” em português. O acesso a esse conceito ocorreu via língua inglesa (media que pronuncia-se mídia) e que foi apropriado no português do Brasil todas as vezes que se quer referir aos meios de comunicação em geral, tais como os recursos tecnológicos que dispomos em nossos processos comunicacionais: rádio, TV, entre outros. O uso destas ferramentas, isoladamente, corresponde a uma determinada mídia, por exemplo: a TV. Atualmente muito se fala em novas mídias, mas o que seria isso? Em seu artigo intitulado “Novas mídias como tecnologia e idéia: dez definições”, MANOVICH (2009) busca compreender o que seriam estas novas mídias, afirmando que esta pergunta ainda não é fácil de ser respondida, mas que o autor o tentará fazer elaborando dez respostas possíveis, desde a diferenciação entre novas mídias e cibercultura – sendo a primeira mais uma questão cultural e de máquina computacional e a segunda mais redes sociais – passando por questões de novas mídias atreladas a organização de dados por softwares até chegar a discussão sobre a relação das novas mídias com a arte, ao afirmar que os novos criadores de softwares é quem são os novos artistas. Outro fator importante na reflexão de Manovich em seu artigo é o que ele chama de “etapas da nova mídia”, o que pode ser encontrado em diferentes manifestações de usos destes novos recursos. O que autor afirma é que existem, como é sabido, ideologias a permearem os usos destes novos recursos midiáticos (como o computador, por exemplo), e que todo recurso já foi um dia uma nova mídia. Por exemplo, o cinema, o rádio, a televisão já foram assim intitulados e hoje estão em um outro momento, deixaram de ser uma novidade, mas já tiveram o seu título de nova mídia. Sendo assim, o uso do termo Novas Mídias é, muitas vezes, utilizado como estratégia para que uma obra, um texto ou mesmo um recurso tecnológico seja difundido como algo inovador e ganhe repercussão. Portanto, utilizar este título pode ser algo mais ideológico, com intenções de propagação do recurso/obra, do que propriamente uma inovação no sentido mais restrito da palavra. As novas mídias, assim chamadas, apesar das dificuldades ainda hoje de responder o que sejam, encontram em Manovich uma definição interessante: “as novas mídias são objetos culturais que usam a tecnologia computacional digital para distribuição e exposição”. Aqui o autor faz uma distinção importante entre mídia e novas mídias: não é o uso ou não dos recursos computacionais que definem as novas mídias, mas sim a distribuição e exposição. Sendo assim, os objetos culturais que usam a computação apenas para produzir e armazenar dados não são classificadas como novas mídias. No percurso evolutivo das mídias às novas mídias (uma constante evolução como vimos em Manovich), torna-se interessante verificar as diferenças entre a Multímidia e a Hipermídia. O uso de diferentes mídias para um mesmo propósito, seja em uma aula, numa apresentação da empresa, numa apresentação teatral, dentre tantas outras, chama-se de multimídia. Como exemplo, imaginemos uma peça teatral na qual o diretor faz uso das seguintes mídias: o aparelho de rádio que executa CD (Compact Disc) para reproduzir músicas românticas de acordo com o enredo da obra; um projetor para reproduzir imagens de lugares paradisíacos e bucólicos, com o intuito de sensibilizar a platéia; entre outros recursos disponíveis, demonstram que há nesta dramatização o uso de um aparato multimidiático. O próprio aparelho de televisão é considerado uma multimídia, pois agrupa som e imagem num mesmo aparato. Portanto, multimídia corresponde à integração de diferentes modalidades de mídias sendo, como afirma FERREIRA (1999) uma combinação de diversos formatos de apresentação de informações, como textos, imagens, sons, vídeos, animações, etc., em um único sistema. Com o surgimento do computador houve um salto na evolução das mídias, causando a chamada convergência das mídias – as hipermídias: Interciência & Sociedade 101 SILVA, F. C. da A aliança entre computadores e redes fez surgir o primeiro sistema amplamente disseminado que dá ao usuário a oportunidade de criar, distribuir, receber e consumir conteúdo audiovisual em um só equipamento. Uma máquina de calcular que foi forçada a virar máquina de escrever há poucas décadas, agora combina as funções de criação, de distribuição e de recepção de uma vasta variedade de outras mídias dentro de uma mesma caixa (SANTAELLA, 2004:20). A diferença entre a multimídia e a hipermídia é que a segunda pode ter diferentes mídias sendo utilizadas de uma única vez no mesmo espaço, ou seja, o computador. Essa miscelânea de aparatos midiáticos presentes num único aparelho revolucionou toda a Tecnologia da Informação e da Comunicação, estabelecendo uma postura ainda mais inovadora em seus usuários, já que, em tese, qualquer pessoa que conheça um pouco de cada uma das mídias, pode usá-las conjuntamente tendo como suporte o computador. Todas estas inovações requerem de nós, leitores/consumidores e escritores/ produtores uma postura diferenciada em relação às definições de leitura e escrita nas novas mídias. Afinal, diferentes suportes requerem diferentes leitores, sendo que com as novas mídias os papéis de ambos (escritor e leitor) são redesenhados e redefinidos, fazendo surgir os chamados escrileitores (leitor/escritor), mais ativos na construção e definição da própria noção de texto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BORGES, J. L. O Livro de Areia. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. CASTELLS, M. A Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999. FERREIRA, A. (org.) Relatos de Experiência de Ensino e Aprendizagem de Línguas na Internet. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004. FURTADO, J. A.. Livro e Leitura no Novo Ambiente Digital. Porto: Porto Editora, 2002. HORCADES, C. M. A Evolução da Escrita. Rio de Janeiro: Senac Rio, 2 ed., 2007. MANOVICH, L. Novas Mídias como Tecnologia e Ideia: dez definições. 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Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) [email protected] RESUMO: As vantagens e a conveniência da participação pública nas atividades de planejamento têm sido intensamente discutidas. Administradores, empresas e órgãos públicos que fomentam este debate apontam a participação pública como algo vantajoso, conveniente e necessário. No entanto, as dificuldades para se incorporar a participação pública nos processos de tomada de decisão são muitas e igualmente reconhecidas, o que tem mantido o assunto sob discussão. Este trabalho parte do pressuposto de que a participação pública é, de fato, necessária. Tem por objetivos identificar os requisitos para que ela ocorra de forma positiva e efetiva e, principalmente, investigar a possibilidade de manutenção de uma aliança estável entre os atores sociais. Porém, para obter sucesso é necessário que o processo de participação tenha uma clara linha metodológica condutora e avaliadora das tomadas de decisão. Nessa direção, este estudo apresenta a proposta de um instrumento de auxílio ao processo participativo, designado MOD - Modelo de Organização do Diálogo, que procura reunir os requisitos considerados indispensáveis para assegurar a participação autêntica dos atores sociais. O modelo foi construído a partir de considerações e conclusões extraídas da bibliografia e de sua aplicação em um estudo de caso, desenvolvido na Serra do Japi, em Jundiaí (SP, Brasil). PALAVRAS-CHAVE: participação, comunidade, oficina ABSTRACT: The advantages and suitability of citizen participation in the management of protected areas have been discussed intensely. Managers, companies and public agencies that foment this debate point the citizen participation as something advantageous, convenient and even necessary. However, the difficulties to incorporate the public participation in the process of making decisions are many and equally recognized, what has been keeping the subject on intense discussion. This study takes for granted that public participation is, in fact, necessary. But, it tries to identify the requirements so that it happens in positive and efficient way and, mainly, to investigate the possibility of maintenance of a stable alliance among the citizen participants. For that, this study proposes a model designated MOD – Model of Organization of the Dialogue, conceived from considerations and conclusions derived of the bibliography and applied in a study case, with the community of Serra do Japi, at Jundiaí (São Paulo, Brazil). KEYWORDS: participation, community, workshop. 1. INTRODUÇÃO A participação pública na gestão local tem sido preconizada e defendida por pesquisadores, planejadores e administradores, ora como um direito, desejável ou conveniente, ora como um dever e, muitas vezes, como uma necessidade. A participação pública não se restringe ao simples exercício de uma dessas faces, mas diante desse conjunto, em busca de um processo de mútuo aprendizado e muita solidariedade. A participação pública tem como finalidade última a busca do consenso, quanto ao que se deseja e quanto à forma de obtê-lo. Nessa busca muitas vezes ocorrem conflitos e confrontos, que não devem ser temidos, pois em muitas situações é a partir deles que surgem as condições propícias para o estabelecimento do diálogo (Connolly & Richardson 2004). Contudo, reconhecem-se as dificuldades que os planejadores enInterciência & Sociedade 103 SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F. frentam em encontros públicos diante da expectativa de obter solidariedade e consenso. Conforme citam Margerum & Whitall (2004) “a colaboração tem se tornado rapidamente o paradigma dominante no gerenciamento de recursos naturais, mas existem muitos dilemas sobre como ela é efetivamente aplicada”. Por um lado trabalham-se os interesses de cada ator ou grupo social que comumente não combinam e, por outro, tem-se as agências estatais que planejam sob condições de alta complexidade e incerteza, mas necessitando conduzir o processo com transparência, flexibilização de procedimentos e credibilidade (Pequeno & Marques 2004). Em síntese, ter entre os grupos sociais a pré-disposição para dialogar e pactuar um consenso inicial não é uma tarefa simples. Para melhor conduzir o processo de participação é necessário estabelecer um forte diálogo entre os participantes que deve ser cuidadosamente preparado. Não bastam a simples comunicação entre os participantes e a explicitação dos seus interesses. A instalação do diálogo entre eles pressupõe que eles compartilham de conhecimentos comuns e, sobretudo, que eles se compreendem. A compreensão não “cai do céu”, nem se estabelece com a simples troca de informações (Morin 2000). A compreensão precisa ser construída, ensinada e aprendida, em um processo lento, interativo e iterativo. Trata-se de um processo de educação e de aprendizado, no qual as informações não passam de matéria prima e, desta maneira, não podem ser confundidos com o resultado. A compreensão está alicerçada no senso comum, nos preconceitos e no cotidiano dos indivíduos. Crespo (1998), Reigota (1994), Santos et al. (2001) e Santos (2004), concordam que é comum verificar propostas de “consenso” cujos conceitos que norteiam o seu entendimento e fundamentam-se em diferentes interpretações sobre o mesmo fato. Desta forma, o consenso mínimo inicial, em relação aos objetivos do planejamento e as condições de conservação ambiental definidas no diagnóstico ainda correspondem à fase de compreensão dentro do processo de participação. Estudos sugerem que o senso de 104 comunidade e o senso de poder são fatores capazes de estimular uma população (Julian et al. 1997), conduzindo a um consenso. O senso de comunidade pode ser descrito como o senso de pertencer e de ser parte de uma grande coletividade. Zimmerman & Rappaport (1988) descrevem o senso de poder, ou de conseguir influenciar, como a conexão entre o senso de capacidade pessoal e a disposição para atuar. Julian et al. (op.cit.), concluem que as instituições responsáveis por planejamento e preocupadas coma a participação devem considerar, efetivamente, o grau de capacitação dos partícipes para tomar. Para Scarabello Filho (2005) o senso de poder instala-se entre os participantes se o processo contar com credibilidade, se de fato existir uma pré-disposição determinada pelo senso de comunidade e, de se fato existir um certo grau de distribuição do poder. Além dessas condições, os partícipes devem ter uma visão clara da variedade de alternativas e dos efeitos prováveis das escolhas disponíveis (Taylor 1998). Deve-se considerar que julgamentos de interesses são julgamentos de valores. É importante que as pessoas reconheçam que seus interesses são problemas de valor, e que as decisões interferem no coletivo. Assim, uma vital condição para que os indivíduos se tornem juizes competentes dos seus interesses é o estabelecimento do diálogo com outros, o que implica em um processo de deliberação interpessoal e não individual. A idéia de que se obtém uma reflexão coletiva mantida pelo diálogo e traduzida em deliberações de consenso a partir de reuniões ordinárias ou questionários semi-estruturados é altamente suspeita. Quando se trata de identificar interesses sobre questões complexas que envolvem a qualidade de vida o diálogo direto com as pessoas é demorado e muitas vezes repetido, para que represente, com riqueza e precisão, os reais interesses da população. Em outras palavras, é necessário atender a um conjunto de requisitos fortemente estabelecidos ao longo do processo de participação, para que ela efetivamente aconteça, com a manifestação da espontaneidade e dos interesses de todos os envolvidos. Por todas essas razões, o objetivo deste estudo foi Interciência & Sociedade Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do diálogo construir um modelo metodológico que pudesse nortear a participação pública a partir de seus princípios teóricos primários. Para averiguar a efetividade dessa proposta, o modelo foi aplicado e revisado ao longo de oficinas públicas que tinham como meta construir um cenário de expectativa para a preservação das áreas da Serra do Japi, no Município de Jundiaí. A hipótese é que, se o modelo for consistente, ele permite a participação de forma positiva e efetiva e, principalmente, conduz a uma aliança estável entre os grupos sociais. 2. Material e Métodos Para a construção de um modelo metodológico de participação pública foi realizado um levantamento bibliográfico dentro de um processo de “garimpagem” (PIMENTEL, 2001). Foram consultados banco de dados digital de diversas universidades e periódicos eletrônicos. As referências foram organizadas e interpretadas de acordo com os objetivos da investigação proposta. Foram também levantados dados digitais sobre a área foco junto a Prefeitura de Jundiaí (SP). Foi feito um levantamento de termos-chave que foram utilizados para instrumentalizar a análise dos fatos e conceitos fundamentais apresentados nesses documentos. O resultado foi a obtenção de um esboço de um modelo para participação pública, cuja efetividade foi ajustada a partir de um estudo de caso. O modelo foi aplicado e ajustado por meio de quatro ciclos de oficinas desenvolvidos durante dois anos com a comunidade da Serra do Japi, envolvendo em torno de 20 participantes. O objetivo dos encontros foi construir, a partir do modelo, o cenário de expectativas da comunidade sobre os usos adequados para as áreas da Serra do Japi, em Jundiaí. Foram convidados representantes das vertentes institucional, técnico-científica e comunitária do município de Jundiaí e áreas vizinhas. 3. Resultados Os estudos pesquisados permitiram concluir que a participação pública deve ocorrer estruturada em ciclos de re- alimentação e que, em cada ciclo completo, devem ser satisfeitos, no mínimo, cinco princípios básicos para organizar o diálogo: Pré-compreensão: cada participante do processo deve, a partir do seu ponto de vista, assimilar e compreender a natureza da atividade de planejamento, suas características e os seus objetivos, de longo e de curto prazos, considerando que o processo desenvolve-se sempre orientado para a tomada de decisão. Consenso Mínimo: deve ser obtido a partir da discussão dos conceitos importantes para o debate e dos seus significados para os participantes, o que implica no levantamento e interpretação das representações sociais. O consenso mínimo garante a participação contributiva, tanto na formulação das propostas como na prática que as sucede. Senso de poder: corresponde ao senso de capacidade acrescido da motivação, ou da disposição para participar. O senso de poder instala-se entre os participantes se o processo contar com credibilidade; se de fato existir uma pré-disposição determinada pelo senso de comunidade e se, de fato, existir certo grau de distribuição de poder. Deliberação e escolhas racionais: ocorrem quando todos os participantes têm conhecimento do conjunto de alternativas possíveis e do conteúdo e dos efeitos de cada alternativa. Além disso, a partir da consciência da falibilidade individual, cada participante deve estimular a própria capacitação e abrir-se para o diálogo. Reflexão coletiva útil: entendida como a reflexão que produz resultados, isto é, que identifica e especificam alternativas e soluções. A reflexão coletiva útil instala-se entre participantes aptos, comprometidos com os resultados do processo, a partir de um diálogo permanente desenvolvido sob condições racionais de apresentação de argumentos, de identificação e aprimoramento de alternativas e de deliberação. Tais condições ou princípios cor Interciência & Sociedade 105 SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F. respondem aos elementos ligados por vínculos causais, em um arranjo circular de realimentação, conforme representado na Figura 1. O arranjo circular permite que os resultados obtidos em cada ciclo de debate e discussões sejam imediatamente incorporados pelos participantes como novos conteúdos que ampliam os níveis de conhecimento, compreensão e consciência dos partícipes do processo naquele momento. Desta forma, ao se concluir um determinado ciclo, pode ocorrer que os resultados obtidos permitam avançar na direção de questões mais complexas ou, simplesmente, realimentem um novo ciclo de debate sobre as mesmas questões tratadas no ciclo que se encerrou. Neste caso, trata-se de reavaliar deliberações anteriores a partir de um novo nível de consciência, mais amplo e mais profundo. Assim o arranjo circular de realimentação assegura condições para um avanço contínuo, regulado pelo próprio processo, na direção de maior complexidade e maior consciência. 5 6 Reflexão Coletiva útil Resultado ss 4a 1c 4 MOD Condições Racionais de Deliberação e Escolha 1 1b Précompreensão 4b 1a 3a 3 Senso de Poder 2 Consenso Mínimo 2b 3c 3b 1 Pré-compreensão 1a Conhecimento da natureza do problema 1b Conhecimento das características do problema 1c Conhecimento dos objetivos 2 Consenso mínimo 2a Identificação e discussão de conceitos específicos 2b Identificação das representações sociais 3 Senso de poder (capacidade e disposição) 3a Credibilidade do processo 3b Senso de comunidade 3c Distribuição do poder 2a 4 Condições racionais de deliberação e escolha 4a Conhecimento das alternativas 4b Consciência da falibilidade individual 5 Reflexão coletiva útil Diálogo orientado para a tomada de decisão 6 Resultado Expressão do nível de consciência alcançado no final do ciclo, permitindo a tomada a decisão ou a realização de diálogo. Figura 1. Modelo de Organização do Diálogo. 106 Interciência & Sociedade Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do diálogo O primeiro e mais importante requisito para o desenvolvimento de um processo de participação é a compreensão. De fato, a necessidade da compreensão impõe-se em todo o processo de participação e é dela que derivam os demais requisitos. No processo de planejamento, preliminarmente, a pré-compreensão envolve o conhecimento e o entendimento dos conceitos associados à atividade, suas características, objetivos e possibilidades. Trata-se de entender o que se pretende fazer e alcançar, isto é, quais são os resultados esperados com o desenvolvimento do processo de planejamento, com os respectivos riscos e condições. O conhecimento de que os processos de planejamento desenvolvem-se sempre orientados para a tomada de decisão deve ser transmitido e enfatizado, assegurando o entendimento de que a deliberação e a escolha constituem a meta final do processo. Além disso, a pré-compreensão deve incluir o entendimento sobre a situação da área objeto do processo de planejamento e sobre a importância dos resultados pretendidos. A compreensão, portanto, precisa ser construída, ensinada e aprendida, em um processo lento, interativo e iterativo. Enfatiza-se que a pré-compreensão é para o indivíduo o alicerce de todo o processo de compreensão, tendo por sua vez a influência das suas representações sociais ou senso comum que se tem sobre um determinado tema, onde se incluem também os preconceitos e características específicas das atividades cotidianas, sociais e profissionais dos indivíduos (Reigota 2001). Assim, o consenso mínimo inicial, em relação aos objetivos, diagnóstico, e conceitos associados às questões em discussão, ainda corresponde a essa primeira fase do modelo, ou seja, da compreensão. Desde a década de 1990, estudos sugerem que o senso de comunidade e o senso de poder são fatores capazes de estimular a população a considerar-se parte de uma grande coletividade e de conseguir influenciar uns aos outros (Julian et al. 1997, Zimmerman & Rappaport 1988). O senso de poder instala-se entre os participantes se o processo contar com credibilidade, se de fato existir uma pré-disposição determinada pelo senso de comunidade e se, de fato, existir certo grau de distribuição do poder. Os três requisitos antes descritos, isto é, a pré-compreensão, o consenso mínimo e o senso de poder parecem a princípio ser suficiente para o estabelecimento da discussão, ou de um processo completo de participação pública. Contudo, mesmo sob tais condições, o processo pode enfrentar sérias dificuldades e conduzir a equívocos no momento da deliberação, resultando em decisões que contrariam os interesses dos próprios participantes. Segundo Taylor (1998), as pessoas estão mais preparadas para fazer julgamentos competentes sob condições de deliberação e escolha racionais, isto é, sob condições de autonomia pessoal relativa. Assim, concluída a etapa de identificação de alternativas e de formulação de propostas, o processo assume um caráter predominantemente estratégico e se desenvolve orientado para a implementação das ações correspondentes às escolhas feitas. A aplicação do MOD com seus seis ciclos para o estudo de caso obteve excelentes resultados, com deliberações fortemente consensuadas, retratadas em um cenário desejado, além da construção de uma aliança estável entre os grupos sociais. Porém, deve-se considerar algumas outras questões que foram limitantes para sua aplicação. Assim, o modelo proposto exige que as pessoas envolvidas disponham de tempo, dedicação e capacitação. Essa condição limita o processo que dificilmente pode ser desenvolvido no contexto de uma grande participação popular, com a mobilização de um grande número de pessoas. Por outro lado, a seleção prévia dos participantes se configura em uma tarefa complexa, que exige decisões que também não devem ser tomadas por um ou outro grupo social. Assim, a identificação dos grupos sociais que são participantes potenciais constitui-se em um problema que não admite uma resposta única, ou uma fórmula que pode ser seguramente empregada em qualquer caso. Por essa razão, no encaminhamento do processo aplicado em Jundiaí, os atores inicialmente convidados participaram na identificação de outros que, inclusive, tinham eventualmente sido Interciência & Sociedade 107 SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F. excluídos na pré-seleção. Em síntese, coube aos próprios participantes identificar os representantes mais aptos e interessados, constituindo uma equipe que participaria de todas as atividades do processo em um ciclo reiniciado pelos integrantes. Em suma defende-se que a escolha dos participantes, sua seleção ou exclusão, deve ser realizada dentro do próprio processo, que se mantém sempre aberto à participação, mas que se auto-regula pela comunidade diretamente envolvida. Este estudo evidenciou também que, diante da impossibilidade de responder às exigências do processo, alguns partícipes que se consideraram prejudicados desistiram ou promoveram discussões no sentido da alteração de critérios e Identificação Preliminar dos Atores Sociais ↓ Desencadeamento do Processo de Participação Reuniões Preliminares : ONGs, Associações, Conselhos Comunitários e interessados em geral ↓ Identificação e Qualificação dos Atores Sociais ↓ Identificação dos Representantes dos Grupos Sociais e Constituição da Equipe da Comunidade ↓ Estabelecimento da Reflexão Coletiva ← ↓ → C I C L O C O N T Í N U O D E P A R T I C I P A Ç Ã O P Ú B L I C A métodos. No entanto, o princípio adotado durante os encontros foi que, em qualquer hipótese, as decisões sempre deveriam ser determinadas e legitimadas pelos participantes. Nessa linha, a formação da equipe consolidou-se no decorrer do processo e em conseqüência das dificuldades enfrentadas, ou como já observava Senge (1998) ... “A equipe que se tornou excelente não começou excelente, ela aprendeu a produzir resultados extraordinários”. A aplicação do modelo MOD na Serra do Japi necessitou dois anos para exercitar todo seu conteúdo e foi aplicado em quatro ciclos de rotação de oficinas, com a inserção de vários métodos voltados à participação, conforme resume a Figura 2. E Q U I P E D A C O M U N I D A D E Preparação do Questionário Estruturado → 1.º Ciclo de Participação Pública Preparação do 1.° Relatório ← ↓ Reuniões de Apresentação e Distribuição do Questionário e do 1. ° Relatório ↓ Assessoramento aos Grupos Sociais e Recebimento dos Questionários Respondidos ↓ 2.º Ciclo de Participação Pública Preparação do 2.° Relatório :Consolidação dos Resultados em Matrizes de Acertos e Conflitos ↓ Reuniões de Apresentação, Distribuição E Discussão do 2.° Relatório ↓ Estabelecimento do Processo de Seleção dos Objetivos ou Usos Consensuados ← ↓ → Discussão dos Resultados do 2.° Relatório → Discussão dos Conceitos / Causas dos Conflitos ← ↓ Deliberação sob Condições Racionais ↓ Cenário das Expectativas da Comunidade e Elaboração do 3.° Relatório ↓ Reuniões de Apresentação do Cenário das Expectativas da Comunidade e do 3.° Relatório e de Divulgação das Propostas 3.º Ciclo de Participação Pública 4.º Ciclo de Participação Pública Figura 2. Etapas para a Construção do Cenário das Expectativas da Comunidade. 108 Interciência & Sociedade Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do diálogo É importante ressaltar que o tempo de duração do envolvimento dos participantes representa o principal fator para o sucesso do processo. Assim, por exemplo, a fase de “reflexão coletiva útil”, isto é, da reflexão que avança produzindo resultados, exige que as todas as condições articuladas no arranjo circular que constitui o MOD sejam, efetivamente atendidas - o que pressupõe muito tempo para sua efetivação. No início do processo a pré-compreensão, o consenso mínimo e o senso de poder podem ser estabelecidos, em níveis satisfatórios, para o conjunto de questões envolvidas, ou seja, em relação ao objetivo final de todo o debate. Porém, em relação às questões sobre as quais há, efetivamente, conflitos entre os grupos sociais, tais requisitos somente serão atendidos após uma determinada duração do diálogo direto entre os partícipes envolvidos. Em conseqüência, é preciso insistir que os representantes dos grupos sociais constituam um grupo estável, com a participação e assiduidade dos mesmos indivíduos. Havendo esta estabilidade e desde que o processo tenha duração suficiente, surge a coesão entre os participantes e o grupo torna-se efetivamente uma equipe. Durante os dois anos de aplicação do MOD procurou-se verificar como se dava a evolução dos elementos envolvidos na transformação de um grupo em uma equipe. As conclusões obtidas estão graficamente representadas na Figura 3. Figura 3. Evolução do Processo Participativo. Dm= duração mínima do processo Dc=duração crítica. Foi constatado que nas questões sobre as quais não havia entendimento suficiente entre os participantes, os conflitos aumentavam no início do processo de discussão até um valor máximo, associados a uma determinada duração dos debates, que pode ser chamada de “duração crítica”. Neste momento foi importante considerar que o consenso não é possível e se o processo for encerrado restará a impressão de que os resultados que podem ser obtidos com a participação pública são extre- mamente limitados. Se houver persistência e o processo de discussão for conduzido além da duração crítica, os participantes passam a se empenhar na busca de alternativas conciliadoras, ocorrendo a redução das intransigências tanto quanto o aumento da abertura para o diálogo e, finalmente os conflitos são superados. Sem dúvida, o instante que determina a duração crítica certamente varia de uma questão para outra ou entre diferentes locais, não podendo ser pré-determinado. No entanto, no caso Interciência & Sociedade 109 SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F. Jundiaí ele foi facilmente percebido pelos participantes. Além disso, a apresentação de alternativas de input aos participantes contribuiu para o surgimento de propostas conciliadoras, reiterando as conclusões de Taylor (1998) sobre as condições racionais de deliberação e escolha. 4. CONCLUSÕES O MOD – Modelo de Organização do Diálogo procurou estabelecer um processo que reúne as condições consideradas importantes para o desenvolvimento do diálogo, com minimização dos erros no momento das deliberações. Ele propiciou o exercício da dialética, ou da arte de raciocinar com método entre os membros de uma equipe que pode compartilhar conhecimentos e adquirir habilidade para fazer uso adequado das ferramentas e dos instrumentos disponíveis. Trata-se, assim, de um instrumento de auxílio para a organização da participação pública em processos de planejamento ambiental e para orientar os processos de tomada de decisão em grupo, objetivando o consenso entre os participantes. Ele contribui na obtenção do consenso na medida em que propõe o diálogo repetitivo diante de cada novo conceito ou alternativa apresentada. O estudo de caso demonstrou que foram necessários quatro ciclos de encontros para perfazer as seis fases que compõem um ciclo completo de participação. Este é, sem dúvida, o principal fator determinante do sucesso do processo e sua maior limitação, uma vez que exige um longo tempo de duração para o efetivo envolvimento dos partícipes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CONNOLLY, S. E.; RICHARDSON, T. Exclusion: The necessary difference between ideal and practical consensus. Journal of Environmental Planning and Management, v. 47, n. 1, p 3-17 (15), 2004. meio ambiente, do desenvolvimento e da sustentabilidade. 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O quanto o brasileiro pensa do 110 Interciência & Sociedade Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do diálogo Sinésio Scarabello Fiho. Possui graduação em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da USP (1978), Mestrado em Engenharia Civil pela Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da UNICAMP (2003) e Doutorado em Engenharia Civil pela Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da UNICAMP (2005). Atualmente é professor e coordenador do curso de gestão ambiental na Instituição Educacional Professor Luiz Rosa e Secretário de Obras da Prefeitura do Município de Jundiaí. Tem experiência na área de Engenharia Civil, com ênfase em Planejamento Urbano e Ambiental. Rozely Ferreira dos Santos. Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (1975), mestrado em Ciências Biológicas (Botânica) pela Universidade de São Paulo (1981) e doutorado em Ciências Biológicas (Ecologia Vegetal) pela Universidade de São Paulo (1988). Atualmente é professora associada da Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Planejamento Ambiental e Ecologia da Paisagem. Interciência & Sociedade 111 112 Interciência & Sociedade PLANO DE NEGÓCIOS: o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas SILVA, Kátia Elaine Universidad de la Empresa de Montevideo (UDE) [email protected] RESUMO: O presente trabalho apresenta algumas considerações que se devem tomar quando o empreendedor deseja abrir seu negócio. O contexto leva em consideração a importância do plano de negócio para o sucesso das micro e pequenas empresas (MPE). Também é proposto uma pequena estrutura de plano de negócio como modelo para os iniciantes. A partir da formulação teórica, este trabalho propõem utilizar o plano de negócios para oferecer diretrizes para os micro empresários criarem metas e disponibilizar aos seus colaboradores o seu objetivo para com estes estabelecimentos. PALAVRAS-CHAVE: Plano de negócio; Empreendedorismo; Oportunidade; Pequenos Negócios. ABSTRACT: This paper presents some considerations should be taken when the entrepreneur wants to open her business. The context takes into account the importance of the business plan for the success of micro and small enterprises. Also proposed is a small structure of the business plan as a model for beginners. From the theoretical formulation, this paper proposes to use the business plan to provide guidelines for the micro and small enterprises create goals and provide its employees with his goal for these establishments KEYWORDS: Business plan; Entrepreneurship; Opportunity, Small business. 1. INTRODUÇÃO Os mais recentes levantamentos feitos pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (MPE), apontaram que 22% (vinte e dois porcento), das pequenas empresas brasileiras encerram suas atividades todo ano. Busca-se o fator principal para esse problema crônico brasileiro, já que essas mesmas MPE são reconhecidamente responsáveis pela maior parcela de empregos gerados no país. Diversas pesquisas e reportagens que veiculam na mídia focam vários aspectos considerados como sendo os grandes causadores desses números (SEBRAE, 1998a). Pode-se citar a falta de incentivos e subsídios do governo, altas taxas de juros, acesso restrito ao crédito, exigência de contrapartidas elevadas ao se pleitear financiamentos junto a bancos, a crescente concorrência estrangeira, entre outros que são diariamente discutidos em vários pontos do país. É constante a preocupação em se buscar culpados para os próprios erros e a exagerada preocupação com fatores intangíveis para o empreendedor (DORNE- LAS, 2010). Todos esses exemplos citados são verídicos, importantes e preocupantes, porém são fatores de ordem macro e de difícil influência por parte do empreendedor isoladamente. As entidades representativas de sua classe estão aí para defender seus interesses e buscar melhores condições que viabilizem um cenário propício à criação e crescimento de novos empreendimentos. Não há fórmula mágica para consertar uma empresa que está indo à falência, mas é possível prevenir que ela fracasse prestando atenção em alguns detalhes durante a abertura. E a pergunta é: Qual a responsabilidade do empreendedor, o que ele deve fazer? E a resposta é: planejar, planejar e planejar. Entretanto segundo Dornelas (2010), é visível a falta de cultura e de planejamento do brasileiro, que por outro lado é sempre admirado por sua criatividade e persistência. Quantas vezes você já deve ter falado ou pensado uma dessas frases: Eu não tenho tempo para planejar. Eu não necessito de um de um plano de negócio, pois Interciência & Sociedade 113 SILVA, K. E. eu tenho um em minha cabeça. Eu não sei como começar. Eu não sou bom com os números, etc. Agora chegou a hora de colocar essas convicções em dúvida: Será que o planejamento não é importante? Transformar uma idéia em um negócio pode parecer assustador em um primeiro instante, mas depois você terá a certeza que tudo faz parte de uma aventura, com muitas passagens de suspense e agonia, mas também de conquistas, a cada passo do planejamento novos obstáculos irão aparecer e tentar fazer com que você volte de onde veio, mas a cada obstáculo vencido, será um passo a mais para o sucesso. (DORNELLAS, 2010). Tudo pode ser menos tenebroso, basta para isto você ter conhecimento suficiente para reduzir constantemente os riscos, os fatos devem ser encarados de maneira objetiva, as principais razões para o falecimento das empresas é a falta de planejamento. (BERGMANN, 2010). Agora surge a seguinte questão problematizadora: O Plano de Negócio é realmente uma ferramenta que pode determinar o sucesso ou o fracasso de uma empresa? Levando essa pergunta em consideração, esse artigo vai discutir e propor estruturas de planos de negócios e ainda focar a importância da revisão periódica do plano de negócio, para que essa ferramenta deixe de ser um empecilho e auxilie o empreendedor alcançar o tão sonhado sucesso. E o primeiro passo é identificar condições para melhores oportunidades de negócio. 2. Identificando a oportunidade de negócio Para ser bem-sucedido, o empreendedor precisa planejar o seu negócio improvisar jamais. Saltar no escuro não é exatamente uma boa pedida. Segundo Chiavenato (2008), os empreendeores tendem a negligenciar o estágio de planejamento seja pela ansiedade de iniciar o novo negócio, seja por falta 114 de confiança no instrumento ou mesmo pela falta de informação sobre como elaborar um plano de negócio. O empreendedor deve começar seu planejamento identificando a oportunidade de negócio, que pode ser encontradas em todos os lugares sob as mais diversas formas, exigindo predisposição e criatividade. Segundo Degen (2005), a predisposição para identificar a oportunidades é de fundamental importância para os que desejam ser empreendedores. Todas as pessoas estão diariamente expostas a centenas de empreendimentos, mas a grande maioria vê somente os anúncios e as fachadas. O empreendedor de sucesso é aquele que não se cansa de observar negócios, na constante procura por novas oportunidades, analisa cada detalhe, seja no caminho de casa, nas compras, lendo jornais ou de férias com a família. Sempre está atento e curioso. Degen (2005) ainda coloca que é pela predisposição que o futuro empreendedor aprende a observar e avaliar o negócio. Mas é através da criatividade que ele começa a associar as observações dos mais diversos tipos e formas de empreendimentos. O mundo empresarial precisa cada vez mais de empreendedores e trabalhadores de mente aberta e independente, capazes de responder imaginativamente aos novos desafios. Mais do que nunca, necessitamos fazer uso de nosso potencial para criar. Esse potencial ilimitado, que permanece muitas vezes adormecido ou em estado latente, é o recurso mais precioso que indivíduos e organizações dispõem para lidar com os desafios que acompanham nossa época, em que a incerteza, o progresso e a mudança são uma constante (JOSÉ PREDEBON, 1998, p.202). 3. Elaborando o plano de negócio O plano de negócio não é mais do que uma descrição detalhada do planejamento de uma empresa. As seções que compõem um plano de negócios geralmenInterciência & Sociedade Plano de negócios: o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas te são padronizadas para facilitar o entendimento. Cada uma das seções do plano tem um propósito específico. Segundo Soler (apud BERGMANN, 2010), existem cinco armadilhas comuns do plano de negócios: 1. Menos é mais. O plano de negócios não deve exceder 30 páginas, pois informação demais pode criar um documento muito grande que ninguém lê. 2. Simplifique suas projeções financeiras para duas páginas. Focalize em números-chave para o investidor compreender o negocio: fluxo de caixa projetado para 5 anos, a TIR Taxa Interna de Retorno, ponto de equilíbrio e período de recuperação. Os investidores olham os números “grandes” não os detalhes. 3. Incluir os pressupostos além das previsões. São muito mais importantes e mais informativos do que as previsões em se mesmas. 4. Demonstre que conhece as chaves da indústria e por que os clientes irão comprar o seu produto ou serviço. 5. O plano não é imutável: A pior coisa que um empresário pode fazer é escrever um plano e, em seguida, seguir à risca só porque é o “plano”. Muitas organizações de sucesso têm mudado seu plano de negócios durante o lançamento. Uma das características mais importantes que deve ter um plano de negócios é a flexibilidade. Já Dornelas (1999b), entende que um plano de negócio para pequena empresa pode ser menor que o de uma grande organização, não ultrapassando talvez 10-15 (dez a quinze) páginas. Muitas seções podem ser mais curtas que outras e até menor que uma única página de papel. Ele ainda afirmar que para que seja um bom plano de negócio, antes de chegar ao formato final deve ser feitas muitas versões e revisões até que esteja adequado ao público-alvo, não existindo uma estrutura rígida e específica, porém qualquer plano de negócio deve possuir entendimento completo do negócio. Segue abaixo um roteiro considerado como essencial para a confecção de um plano de negócio, segundo o manual do empreendedor (IPL, 2010). 3.1. Introdução/Sumário Executivo O sumário executivo é a parte mais importante do plano de negócios, visto que é a primeira coisa a ser lida pelos potenciais investidores. Desta forma, se não for claro, poderá desencorajar os analistas a rever o plano completo. Não obstante a sua importância, este não deverá conter mais de 500 palavras, sensivelmente 1 a 2 páginas, pelo que deverá ser uma radiografia do negócio. Esta radiografia apenas é possível de fazer, após a elaboração do plano, pois só nesta fase a informação se encontra totalmente organizada e compilada. 3.2. Apresentação da Empresa • • • • • • • • • • • • • • • Identificação da Empresa Nome/denominação social Logótipo Direção da Empresa Contactos e página web (se existir) CAE – código de atividade econômica Forma jurídica Participações sociais e repartição pelos sócios (montante e percentagem) Identificação dos Promotores Dados pessoais (Nome, naturalidade, residência, etc.) Formação acadêmica Formação complementar Atividade profissional atual Experiência profissional Tudo o que seja pertinente para em termos pessoais se demonstrar capacidades empreendedoras. 3.3. Análise do Meio Envolvente Esta análise permite conhecer o mercado da empresa, com a finalidade de identificar os elementos que afetam a generalidade das empresas e a empresa em objeto de estudo. Baseia-se assim no conhecimento dos fatores gerais (conhecimento dos elementos que afetam todas as empresas, tais como: dimensão, características e evolução futura do mercado nacional e dos mercados externos) e específicos (conheciInterciência & Sociedade 115 SILVA, K. E. mento dos elementos que afetam o funcionamento da empresa). 3.4. Análise do Mercado Esta análise consiste na identificação do mercado alvo e tipo de segmentação de clientes. Em primeiro lugar, deve-se identificar e caracterizar os concorrentes atuais e potenciais, os consumidores atuais e potenciais, e uma análise da indústria em geral, em seguida deve-se explicar em que medida é que o produto ou serviço tem condições de sucesso naquele mercado, apresentando as necessidades de mercado que satisfaz e como se diferencia da concorrência (qualidade, preço ou outras variáveis relevantes). Esta análise pressupõe assim uma análise da procura e uma análise da oferta. 3.5. Estratégia da Empresa Na estratégia da empresa deverá constar a visão, missão, os objetivos da empresa, a diferenciação do negócio, a análise SWOT e a estratégia adaptada. 3.6. Plano de Marketing Neste ponto define-se como se vende o produto e ou serviço que a empresa produz ou comercializa, não é mais do que definir o modelo de negócios. Trata-se de definir a estratégia global de marketing e as diversas políticas do Marketing – Mix (Produto, Preço, Distribuição e Comunicação) 3.7. Plano de Organização e de Recursos Humanos Apresentação da estrutura organizativa e planificação dos recursos humanos passa por apresentação da equipa de trabalho, número de trabalhadores, funções e estrutura, organograma, capacidades necessárias e perfil desejado, política de recursos humanos (como recrutar, selecionar e contratar pessoal) e programa de forma- 116 ção de pessoal. 3.8. Plano de Produção ou de Operações Descrever como se realiza a fabricação dos produtos ou a prestação de serviços, isto é, como realiza o lay-out de produção e explicar cada uma das fases do processo de produção/prestação de serviços. 3.9. Plano Econômico – Financeiro Este plano visa avaliar a viabilidade do negócio e a sua probabilidade de sucesso. Desta forma deve incluir todas as demonstrações financeiras (balanço, demonstração de resultados, mapas de aplicações e origem de fundos) quer para análise histórica, quer para a projeção da evolução do negócio nos próximos anos (em regra, três a cinco anos). Deverá incluir também um orçamento de tesouraria (previsão de recebimentos e pagamentos a realizar num determinado período) pelo menos para o primeiro ano de atividade e, eventualmente, uma análise do ponto crítico das vendas (volume de vendas em valor e em quantidade para o qual a empresa obtém “lucro zero”). O plano econômico-financeiro engloba o plano de investimentos e o plano de financiamento. 3.10. Calendário de Execução Por último deve-se planejar no tempo o desenvolvimento das principais atividades necessárias para a atividade da empresa. Dornelas (1999b), complementa que cada seção deve ser elaborada sempre visando a objetividade, sem perder sua essência e os aspectos mais relevantes a ela relacionados. Ainda cita que a capa apesar de não parecer é uma das partes mais importantes do plano de negócios, pois é a primeira parte que é vista por quem lê o projeto, devendo portanto ser feita de maneira limpa e com informações necessárias e pertinentes. Interciência & Sociedade Plano de negócios: o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas 4. A importância do plano de negócio 5. Acompanhe o plano de negócio Muitas empresas ainda não entendem a necessidade de um planejamento e, por isso, acabam fechando suas portas. Segundo Sahlman (apud DORNELAS, 2010), poucas áreas têm atraído tanta atenção dos homens de negócios nos Estados Unidos como o plano de negócio. Essa ferramenta de gestão pode e deve ser usada por todo e qualquer empreendedor que queira transformar seu sonho em realidade, seguindo o caminho lógico e racional que se espera de um bom administrador. É evidente que apenas razão e raciocínio lógico não são suficientes para determinar o sucesso do negócio. O cuidado que se deve tomar é o de se escrever um plano de negócios com todo conteúdo que se aplica a um plano de negócio e que não contenha recheados de entusiasmo ou fora da realidade. Nesse caso pior do que não planejar é fazê-lo erroneamente. (Dornelas, 2010). A arte estará no como o empreendedor traduzirá esses passos realizados racionalmente em um documento que sintetize e explore as potencialidades de seu negócio, bem como os riscos inerentes a esse mesmo negócio. O plano de negócios é uma ferramenta que se aplica tanto no lançamento de novos empreendimentos quanto no planejamento de empresas já existentes. Outro paradigma que precisa ser quebrado é o fato de achar-se que o plano de negócios depois de feito pode ser esquecido. Este é um erro imperdoável e as conseqüências serão mostradas pelo mercado que está em constante mutação. A concorrência muda, o mercado muda, as pessoas mudam. E o plano de negócios, sendo uma ferramenta de planejamento que trata essencialmente de pessoas, oportunidades, do contexto e mercado, riscos e retornos também muda. Sahlman,1997 (apud CAVASSOTO, 1999). O plano de negócios é uma ferramenta dinâmica, um guia que deve ser atualizado constantemente, pois o ato de planejar é dinâmico e corresponde a um processo cíclico. Depois de finalizar o plano de negócio o empreendedor precisa usá-lo como um instrumento eficaz de gerenciamento. Para isso é importante que as informações nele existente sejam divulgadas para todos os colaboradores da empresa e isso de uma forma satisfatória. Boas informações trancadas em uma gaveta não são propriamente utilizadas e acabam fatalmente por cair no esquecimento. O empreendedor deve divulgar essas informações de forma simples e bastante eficiente, podendo fazer isso com a criação de painéis de metas, disponibilizando por toda a empresa. Um sistema visível e de fácil entendimento para guiar no processo de melhoria. Deve também existir um monitoramento periódico da situação, para acompanhar o desenvolvimento da empresa, guiando e validando os esforços de melhoria, nunca esquecendo que o plano de negócio é uma ferramenta flexível e pode ser adaptada de acordo com a situação. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Na maioria das vezes sem nenhum preparado as pessoas têm se aventurado em montar seu próprio negócio, seja pela falta de emprego, com o sonho de independência financeira, de liberdade ou de ficar rico. Mas esses aventureiros, também chamados de empreendedores, encontra decepção e acaba conhecendo uma realidade cruel quão vil é o mercado com aqueles que não estão preparado. Fica claro que utilizar somente o plano de negócio não é garantia de sucesso imediato e de uma empresa sólida e lucrativa, contudo, a possibilidade de se cometer erros é reduzida drasticamente e a chance de se aproveitar as oportunidades é otimizada. O Plano de Negócios quando bem elaborado consegue caracterizar a concorrência e o cliente, o produto e a produção, as estratégias e os investimentos, levando a uma tomada de decisão mais segura e racional, com riscos calculados. A palavra central que resume o Plano de Negócios é PLANEJAR! Interciência & Sociedade 117 SILVA, K. E. O caminho pode se tornar menos árduo quando se tem um plano de negócio, mas não significa que irá dispensar muito preparo, sabedoria, percepção e acima de tudo determinação. Um bom negócio é reflexo da competência dos responsáveis por ele. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERGMANN, C. Como montar um plano de negócio. Disponível em <http://opinionsur.org.ar/joven/ Como-montar-um-plano-de-negocios,1316> Acesso 03 Set 2010. CAVASSOTO, C. Qual a importância do plano de negócio. Disponível em < http://www.clicrbs.com.br/ blog/jsp/default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDat aServer,getBlog&uf=1&local=1&template=3948.dwt& section=Blogs&post=233387&blog=793&coldir=1&to po=3994.dwt > Acesso 07 Set. 2010. DEGEN, R. J. O empreendedor: fundamentos da iniciativa empresarial. São Paulo: Makron Books, 2005. DORNELAS, J. C. A. Plano de negócios: Estrutura e Elaboração. Apostila. São Carlos – SP. Maio. 1999b. DORNELAS, J. C. A. Plano de negócios: O segredo do sucesso do empreendedor. mito ou realidade?. Disponível em < http://www.planodenegocios.com. br/dinamica_artigo.asp?tipo_tabela=artigo&id=20 > Acesso em 01 Set. 2010. IPL, Instituto Politécnico de Leira. Manual do Empreendedor. Disponível em < http://www.eo-net.org/pt/ eon_info/documentos/VI_o%20plano%20de%20negocios.pdf> Acesso 01 Set. 2010. PREDEBON, J. Criatividade: abrindo o lado inovador da mente. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1998 SEBRAE. Indicadores da Mortalidade das MPEs Paulistas. Região Metropolitana de São Paulo. Pesquisas Econômicas, São Paulo-SP, dez. 1998ª. (Relatório Preliminar). CHIAVENATO, I. Empreendedorismo: dando asas ao espirito empreendedor. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. Kátia Elaine da Silva é bacharel em Administração pela Instituição de Ensino São Francisco e mestranda em Administração pela Universidad de la Empresa de Montevideo (UDE). Cursa ainda especialização Lato Sensu em Planejamento Educacional e Docência do Ensino Superior pela Escola Superior Aberta do Brasil. 118 Interciência & Sociedade RESERVA LEGAL E APP – ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE: áreas de relevante importância ao município. ACETI JUNIOR, Luiz Carlos Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] RESUMO: Este trabalho apresenta uma abordagem geral da importância das áreas verdes para as cidades. Para atingir essa finalidade, o artigo apresenta fundamentos históricos e embasamentos teóricos para mostrar a evolução e a importância dessas áreas. PALAVRAS-CHAVE: áreas verdes, áreas de preservação permanente, reserva legal. ABSTRACT: This paper presents a general approach to the importance of green areas to the cities. To this end, the article presents the historical and theoretical grounds to show to show the evolution and evolution and importance of these areas. KEYWORDS: green areas, areas of permanent preservation and legal reserve. Nos termos do Código Florestal em vigor, Lei 4.771/1965, a RESERVA LEGAL é: “Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas”. Em princípio, é a área de reserva legal uma limitação administrativa, onde o proprietário / possuidor somente poderá utilizá-la sob manejo florestal sustentado, em tese, mediante projeto próprio confeccionado e prévia autorização de órgão ambiental competente. A Lei 4.771/65, com a nova redação dada pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001, no artigo 16 prevê: “Art. 16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo: (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001). I - oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001). II - trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do § 7o deste artigo; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) III - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) IV - vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 1o O percentual de reserva legal na propriedade situada em área de floresta e cerrado será definido considerando separadamente os índices contidos nos incisos I e II deste artigo. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 2o A vegetação da reserva legal não pode ser suprimida, podendo apenas ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, Interciência & Sociedade 119 ACETI JUNIOR, L. C. de acordo com princípios e critérios técnicos e científicos estabelecidos no regulamento, ressalvadas as hipóteses previstas no § 3o deste artigo, sem prejuízo das demais legislações específicas. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 3o Para cumprimento da manutenção ou compensação da área de reserva legal em pequena propriedade ou posse rural familiar, podem ser computados os plantios de árvores frutíferas ornamentais ou industriais, compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio com espécies nativas. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 4o A localização da reserva legal deve ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente ou, mediante convênio, pelo órgão ambiental municipal ou outra instituição devidamente habilitada, devendo ser considerados, no processo de aprovação, a função social da propriedade, e os seguintes critérios e instrumentos, quando houver: (Incluído pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001) I - o plano de bacia hidrográfica; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) II - o plano diretor municipal; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) III - o zoneamento ecológico-econômico; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001) IV - outras categorias de zoneamento ambiental; e (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 8o A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as exceções previstas neste Código. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 9o A averbação da reserva legal da pequena propriedade ou posse rural familiar é gratuita, devendo o Poder Público prestar apoio técnico e jurídico, quando necessário. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001) § 10. Na posse, a reserva legal é assegu- 120 rada por Termo de Ajustamento de Conduta, firmado pelo possuidor com o órgão ambiental estadual ou federal competente, com força de título executivo e contendo, no mínimo, a localização da reserva legal, as suas características ecológicas básicas e a proibição de supressão de sua vegetação, aplicando-se, no que couber, as mesmas disposições previstas neste Código para a propriedade rural. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001) § 11. Poderá ser instituída reserva legal em regime de condomínio entre mais de uma propriedade, respeitado o percentual legal em relação a cada imóvel, mediante a aprovação do órgão ambiental estadual competente e as devidas averbações referentes a todos os imóveis envolvidos. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)” Importante frisar que os leigos podem entender que a previsão legal – RESERVA LEGAL - como uma restrição administrativa recente; o que não é verdade. O tema ambiental já era motivo de preocupação para vários povos da antiguidade! Desde o Código de HAMURABI, a Bíblia e em vários outros ordenamentos jurídicos, inclusive nas Ordenações Filipinas que previam no Livro Quinto, Título LXXV, pena gravíssima ao agente que cortasse árvore ou fruto, sujeitando-o ao açoite e ao degredo para a África por quatro anos, se o dano fosse mínimo, caso contrário o degredo seria para África em definitivo. Frise ainda que anterior às Ordenações Filipinas, houve a Ordenações Afonsinas, que tanto uma quanto à outra, estava em vigor em Portugal na época do descobrimento do Brasil. A Ordenação Afonsina continha determinações proibitivas de que não se podia atirar aos rios e lagos material que pudesse matar os peixes ou perturbar seu desenvolvimento. Sabe-se, também, que o termo madeira de lei popularizou-se porque uma carta do rei português (carta regia) considerava determinadas árvores nobres como de propriedade da corte e proibia o corte delas. Além desses ordenamentos supra, existiram vários outros documentos que construíram a história do direito ambiental, como o Código de Hamurabi, o Livro dos Interciência & Sociedade Reserva legal e app – áreas de mortos do Antigo Egito, o hino persa de Zaratustra, e a Lei Mosaica que determinava que em caso de guerra que fosse poupado o arvoredo; ou seja, desde as civilizações mais antigas existe um respeito imaculado à natureza, porque a água e as florestas eram vitais para as atividades econômicas e bélicas daquelas épocas. As primeiras leis escritas existentes no mundo, foram verdadeiros códigos que regulavam o uso da água, há 4000 a. C sobre a regência de Hamurabi; em 1700 a. C., a Mesopotâmia produziu o primeiro código de leis abrangentes da história que compreende sem ordenamento rígido, 282 parágrafos para regulamentar a vida social. No parágrafo 53 diz: “se alguém se exime de manter seu dique em boas condições, se este dique se romper e todas as lavouras forem alagados, então o responsável pelo dique rompido será vendido como escravo, e a renda em dinheiro deve repor os cereais cuja destruição causou”. Destaque-se ainda a Carta Magna outorgada por João Sem – Terra em 1215 havia dispositivos que consagravam a proteção em relação as matas e florestas. Tal documento posteriormente à sua outorga foi dividido em duas partes, isso é, a Carta das Florestas e a Carta das Liberdades, que hoje é reverenciada em todos os ordenamentos jurídicos. Na Carta das Florestas era determinada que todas as florestas pertenciam ao rei, vedando aos súditos de praticar a caça e a exploração de madeiras nas mesmas. Note-se que em toda a história da humanidade, sempre existe relatos com a preocupação com o ambiente equilibrado, para que não existissem riscos de falta de alimentos, secas, pragas, doenças, etc. No Brasil a preocupação não diverge. Em 1934 foi editado o primeiro Código Florestal, que criou o limite do direito de uso da propriedade, a chamada “quarta parte”, ou seja, a reserva obrigatória de vinte e cinco por cento de vegetação nativa preservação permanente: áreas de relevante importância ao município. de cada propriedade rural. Em 1938 houve a edição do Código de Águas. Em 1965 o Código Florestal, que no texto original (art. 16), dizia “nas regiões Leste Meridional, Sul e Centro Oeste, esta na parte sul, as derrubadas de florestas nativas, primitivas ou regeneradas, só serão permitidas, desde que seja, em qualquer caso, respeitado o limite mínimo de 20% da área de cada propriedade com cobertura arbórea localizada, a critério da autoridade competente”. Em 1967 o Código de Pesca e também o Código de Mineração, e em 1980 o Código Brasileiro do Ar. Em 1981 surge a Política Nacional do Meio Ambiente, sendo a primeira com exclusiva preocupação ambiental. Logo depois, em 24 de Julho de 1985 surge a Lei que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, trazendo instrumentos processuais para coibir e reparar danos à natureza. Em 05 de outubro de 1988, com a promulgação da Constituição Federal Brasileira, surge um capitulo exclusive sobre meio ambiente, tendo o artigo 225 a previsão que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e á coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Importante lembrar as palavras do Doutor Celso Antonio Pacheco Fiorillo1, também presente nesse II Congresso Brasileiro da Advocacia Ambiental, ocorrido em São Luis – MA no ano de 2008, onde considera que: Assim, temos que o art. 225 estabelece quatro concepções fundamentais no âmbito do direito ambiental: a) de que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; b) de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equi- Agropecuária Sustentável em Face do Direito Ambiental Brasileiro, páginas 99 / 114, in ACETI JR., Luiz Carlos; BRAGA FILHO, Edson de Oliveira; AHMED, Flávio; GRAU NETO, Werner; MURAD, Samir Jorge (Organizadores); diversos autores. Advocacia Ambiental: Segurança Jurídica para Empreender. 01ª Edição. 2009. Rio de Janeiro. Editora Lumen Júris. 1 Interciência & Sociedade 121 ACETI JUNIOR, L. C. librado diz respeito à existência de um bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, criando em nosso ordenamento o bem ambiental; c) de que a Carta Maior determina tanto ao Poder Público como à coletividade o dever de defender o bem ambiental assim como o dever de preservá-lo; d) de que a defesa e a preservação do bem ambiental estão vinculadas não só às presentes como também às futuras gerações. Neste estudo o enfoque é apontar na questão ambiental, a restrição administrativa sobre o direito de propriedade denominada como RESERVA LEGAL. A Lei 7.803, de 18 de julho de 1989, que alterou o art. 16, entre outros, do Código Florestal de 1965 é que criou o termo reserva legal, conforme já citado acima. Em 1991, a Lei Agrícola, de 17 de janeiro de 1991, assinada por Fernando Collor de Melo, previa: Art. 99. A partir do ano seguinte ao de promulgação desta lei, obriga-se o proprietário rural, quando for o caso, a recompor em sua propriedade a Reserva Florestal Legal, prevista na Lei n° 4.771, de 1965, com a nova redação dada pela Lei n° 7.803, de 1989, mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos um trinta avos da área total para complementar a referida Reserva Florestal Legal (RFL). 122 reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas; Agora, não se está mais a falar de áreas de florestas que devam ser recuperadas ou preservadas; se está, pela nova redação legal, prevendo que uma parte da propriedade, ou posse rural, deve, necessariamente ser preservada, mantendo-se ou recuperando-se as matas originarias ali existentes. E esta Medida Provisória determina, pela nova redação, conforme acima já citado, que haverá percentuais diferentes nos diferentes biomas, sendo no mínimo 20%, descontado as áreas de APPs (áreas de preservação permanentes). Assim, todos os proprietários estão obrigados a demarcar uma área mínima, de acordo com o bioma onde sua propriedade ou posse rural estiver inserida, para instituição da Reserva Legal que deverá ser averbada na matrícula do respectivo imóvel rural. Para constituir a Reserva Legal dentro da propriedade ou posse rural deve-se observar o que determina a citada Medida Provisória: Conclui-se pelo obvio, que o intuito do legislador era atingir aquelas propriedades que não tivessem observado a restrição de 20% prevista no Código Florestal, e não a toda e a qualquer propriedade, senão o legislador não teria colocado as expressões “recompor” e “quando for o caso”. Posteriormente foi editada a Medida Provisória 2.166-67, de 24.08.2001, que novamente alterou o Código Florestal e definiu Reserva Legal de forma mais abrangente: § 4o A localização da reserva legal deve ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente ou, mediante convênio, pelo órgão ambiental municipal ou outra instituição devidamente habilitada, devendo ser considerados, no processo de aprovação, a função social da propriedade, e os seguintes critérios e instrumentos, quando houver: I - o plano de bacia hidrográfica; II - o plano diretor municipal; III - o zoneamento ecológico-econômico; IV - outras categorias de zoneamento ambiental; e V - a proximidade com outra Reserva Legal, Área de Preservação Permanente, unidade de conservação ou outra área legalmente protegida. III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e Já quanto as APPs – Áreas de Preservação Permanente, possui previsão legal nos arts. 2º e 3º da Lei Federal nº 4.771/65 (alterados pela Lei Federal nº 7.803/89), coberta ou não por vegetação nativa, com a Interciência & Sociedade Reserva legal e app – áreas de função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. Assim, destacam-se para efeito desse estudo as intervenções humanas e a conseguinte obrigação de recomposição das áreas de preservação permanente. Desta forma a intervenção em APP, ocorre quando o homem, sem autorização prévia do agente ambiental competente modifica no todo ou em parte as áreas definidas como APP (arts. 2º e 3º da Lei Federal 4771/65 (alterados pela Lei Federal nº 7.803/89), sendo tal intervenção crime ambiental, conforme dispõe a Lei Federal nº 9.605/98, passível de pena de detenção de 01 (um) a 03 (três) anos e multa administrativa que em média conforme vemos no dia a dia, pode chegar até R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) por hectare danificado. A intervenção em APP mais comum é a supressão da vegetação nativa, e o que vem a ser exatamente isso? Qualquer atividade que envolva a supressão de vegetação nativa depende de autorização, seja qual for o tipo da vegetação (mata atlântica, floresta estacional, cerrado, floresta mista de araucária, campos naturais, vegetação de restinga, manguezais, e outras) em qualquer estágio de desenvolvimento (inicial, médio, avançado ou clímax). Mesmo um simples bosqueamento (retirada da vegetação do sub-bosque da floresta) ou a exploração florestal sob regime de manejo sustentável, para retirada seletiva de exemplares comerciais (palmito, cipós, xaxim, espécies ornamentais, espécies medicinais, toras de madeira, etc) não podem ser realizados sem o amparo da licença do órgão ambiental competente. A pena pelo crime varia de 3 (três) meses a 1 (um) ano de detenção; e, multa administrativa, que na pratica é aplicada de R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) por hectare (existem nos últimos meses autuações em valores muito superiores a esse, sendo essa uma tendência). Os documentos exigidos para o licenciamento ambiental para intervenção em APPs em geral são os seguintes: Requerimento; Certidão da Matrícula ou Trans- preservação permanente: áreas de relevante importância ao município. crição do Imóvel; Roteiro de acesso; Planta de localização; Planta do imóvel; Fotografia aérea ou imagem de satélite do local do empreendimento; Laudo de caracterização da vegetação; Laudo de fauna; Projeto de recuperação ambiental; Projeto executivo da obra; Licença expedida pelos órgãos competentes; Certidão de Diretrizes Municipais; Comprovante de regularização de infração florestal; Plano de Manejo Florestal; Especificamente em São Paulo, pagamento do preço da análise, exceto para os casos previstos no Dec. Est. (SP) nº 48.919/04. Frise-se que a relação de documentos poderá variar de acordo com a complexidade ou extensão do projeto. Deve-se observar atentamente as leis e normas ambientais incidentes para que o procedimento administrativo para a intervenção em APPs seja o mais rápido possível, passamos a citar as mais comuns: Ajustamento de Conduta; Áreas de Preservação Permanente; Áreas de Proteção Ambiental – APAs; Árvores Isoladas; Auto de Infração Ambiental; Atividade Agrícola; Cerrado; Cobrança de Análise - Cobrança Judicial; Código Florestal; Espécies da Flora Protegida; ET’s e Divisões Regionais; Fauna Silvestre; Licenciamento Ambiental; Rodovias; Saneamento; Unidades de Conservação; Mananciais – Várzea; Manejo Florestal; Marinas – Pesca; Mata Atlântica; Microbacias; Mineração; Parcelamento do Solo / Loteamentos / Condomínios; Políticas de Meio Ambiente; Procedimentos internos dos agentes ambientais; Recursos Hídricos; Reflorestamento; Reposição Florestal; Reserva Legal; Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN; Transporte / Escoamento de Produtos Florestais; Uso do Fogo; entre muitas outras. Frise-se que a Resolução CONAMA 237, de 19 de dezembro de 1997, regulamentou a atuação dos órgãos competentes do SISNAMA (Sistema Nacional do Meio Ambiente), no exercício do licenciamento previsto no art. 10 da Lei nº 6.938/81. E essa mesma Resolução, em seu Artigo 2º, §1º, prevê: “Estão sujeitos ao licenciamento ambiental os empreendimentos e as atividades relacionadas no Anexo 1, parte integrante desta Resolução.” Estando descrita assim, nesse Interciência & Sociedade 123 ACETI JUNIOR, L. C. anexo 1 supra, que a “recuperação de áreas contaminadas ou degradadas;”, necessitam de licenciamento ambiental! Sendo assim, tanto a implantação de reserva legal, quanto a recuperação de áreas degradadas, dentro ou fora de APPs, necessitam de licenciamento prévio do órgão ambiental competente. Esse licenciamento tem toda uma sistemática, devendo conter o todo previsto na legislação competente, e ainda, conforme o caso, deverá conter um programa de recuperação de área degradada, muito próximo ao formato instituído pelo Decreto Federal nº 97.632, de 10 de abril de 1989 e suas atualizações; bem como as previsões da Lei Federal nº 9.985/00, e da Resolução CONAMA nº 371/2006, dentre outras não menos importantes. Digno de destaque é o teor da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, que dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal. No artigo 10 dessa Lei supra, estão previstas o que são áreas não aproveitáveis á agricultura e pecuária, dizendo: “/.../ Art. 10. Para efeito do que dispõe esta lei, consideram-se não aproveitáveis: /.../ IV - as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação relativa à conservação dos recursos naturais e à preservação do meio ambiente. /.../”. Todas essas áreas descritas como não aproveitáveis, podem ficar isentas de ITR – Imposto Territorial Rural, mediante o preenchimento anual da ADA – Ato Declaratório Ambiental perante o IBAMA e ao depois protocolado o respectivo documento junto ao INCRA. A Instrução Normativa IBAMA Nº. 96 de 30/03/2006, faz a seguinte previsão em seu artigo 9º: “As pessoas físicas e jurídicas que desenvolvem atividades classificadas como agrícolas ou pecuárias, incluídas na Categoria de Uso de Recursos Naturais constantes no Anexo II, deverão apresentar anualmente o Ato Declaratório Ambiental.” Muito importante destacar que para ser realizado todo o procedimento administrativo da ADA junto ao IBAMA para o 124 produtor rural, posteriormente poder ficar isento do ITR nas respectivas áreas não aproveitáveis, o produtor rural fará uso de consultorias especializadas, sendo necessário que o respectivo profissional tenha o cadastro no CTF / IBAMA – Cadastro Técnico Federal do IBAMA. Porém, importante lembrar que o Código Florestal (Lei n.º 4.771, de 15.09.1965) dispõe, no inciso II do §2º do art. 1º como sendo área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas (incluído pela Medida Provisória n.º 12.166-67 – de 2001). O art. 2º prescreveu: “Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) – ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será (Lei 7.803/89): 1. de 30ms. para os cursos d’água de menos de 10 metros de largura; 2. de 50ms. para os cursos d’água que tenham 50 a 200ms. de largura (Lei 7.803/89); 3. de 100ms. para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros (Lei 7.803/89); 4. de 500ms. para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros (Lei 7.803/89); b) – ao redor de lagoas, lagos ou reservatórios naturais ou artificiais; c) – nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados “olhos d’água”, qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 metros de largura. d) – no topo de morros, montes, montanhas e serras; e) – nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45%, equivalente a 100% na linha de maior declive; f) – nas restingas, como fixadoras Interciência & Sociedade Reserva legal e app – áreas de de dunas ou estabilizadoras de mangues; g) – nas bodas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100ms. em projeções horizontais; h) – em altitude superior a 1.800ms., qualquer que seja a vegetação. Parágrafo único – No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo (Lei 7.803/89). Art. 3º - Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural, destinadas: a) a atenuar a erosão das terras; b) a fixar as dunas; c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias; d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares; e) a proteger um sítio excepcional beleza ou de valor científico ou histórico; f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçadas de extinção; g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas; h) a assegurar condições de bem-estar público. O §1º dispõe: A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social. O art. 4º, com a redação dada pela M.P. n.º 2.166-67, de 2001, praticamente repete o §1º acima. Diz o art. 4º - A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quan- preservação permanente: áreas de relevante importância ao município. do inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto (M.P. 2.16667 de 2001). §1º - A supressão de que trata o caput deste artigo dependerá de autorização do órgão estadual ambiental competente, com anuência prévia, quando couber, do órgão federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o disposto no §2º deste artigo (incluído pela M.P. 2.166-67). O §2º aí citado dispõe: A supressão de vegetação em área de preservação permanente, dependerá do órgão ambiental competente, desde que o Município possua conselho de meio ambiente com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico (M.P. 2.166-67 – 2001). O §3º dispõe que o órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo impacto ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação em área de preservação permanente (incl. M.P. 2.166-67/2001). O §4º: O órgão municipal competente indicará, previamente à emissão de autorização para a supressão de vegetação em área de preservação permanente, as medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser adotadas pelo empreendedor (M.P. 2.166-67/2001). O § 5º - A supressão da vegetação nativa protetora de nascentes ou de dunas e mangues, de que tratam, respectivamente, as alíneas “c” e “f” do art. 2º deste Código, somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública (M.P. 2.166-67 de 2001). O §6º - Na implantação de reservatório artificial, é obrigatória a desapropriação ou aquisição, pelo empreendedor, das áreas de preservação permanente criadas no seu entorno, cujos parâmetros e regime de uso serão definidos por resolução do CONAMA. O §7º - É permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente, para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa (M.P. 2.16667 de 2001). Sobre o assunto, o CONAMA exInterciência & Sociedade 125 ACETI JUNIOR, L. C. pediu a Resolução n.º 369, de 28 de março de 2006 que “Dispõe sobre os casos excepcionais, de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental”. O Eminente Professor Dr. Toshio 2 Mukai , também presente no Congresso Brasileiro da Advocacia Ambiental, realizado em São Luis – MA em 2009, assevera acertadamente sobre o tema, dizendo: “/.../ várias disposições foi dado ao órgão ambiental estadual (outra vez, inconstitucionalmente), o poder de autorizar supressões de vegetação permanente). Quando se tratar de área urbana, o Município é que dará a autorização, desde que observado o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo (Lei n.º 7.803/89). O CONAMA, regulamentando essas disposições do Código Florestal, em primeiro lugar, baixou a Resolução n.º 303, de 20 de março de 2002, que “Dispõe sobre parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente /.../ Todas as ações, obras, projetos, planos e intervenções em APP, de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental, dependem de autorização do órgão ambiental competente, devidamente caracterizada e motivada mediante procedimento administrativo autônomo e prévio, e atendidos os requisitos previstos na Resolução nº 369/2006 e noutras normas federais, estaduais e municipais aplicáveis, como o Plano Diretor, Zoneamento econômico-ecológico e Plano de Manejo das Unidades de Conservação, se existentes. /.../ Importante salientar que para a autorização de intervenção ou supressão de vegetação em APP situada em área urbana possa ser concedida pelo órgão ambiental municipal a Resolução nº 369/2006 exige que o Município possua Conselho de Meio Ambiente, com caráter deliberativo, e Plano Diretor ou Lei de Diretrizes Urbanas, no caso de municípios com menos de vinte mil habitantes, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente, fundamentada em parecer técnico. /.../ Os conteúdos ambientais desta Resolução nº 369/2006 devem ser considerados na elaboração do Código Municipal de Meio Ambiente, considerando especialmente sua aplicação em face das peculiaridades e singularidades locais, pois em matéria de defesa do meio ambiente os entes federativos devem atuar como parceiros nos termos estabelecidos pela Constituição Federal. /.../ Suas principais disposições podem integrar o novo Código Ambiental como normas legais municipais a serem aplicadas pelo Município no exercício do poder de polícia ambiental. De qualquer modo, deve-se proceder uma avaliação dos conteúdos ambientais desta Resolução em face das normas do Plano Diretor Municipal a fim de, no que couber, ser efetuada a compatibilização recíproca de ambos os conjuntos de normas. /.../” (negrito e grifo nosso). Assim, fica fácil observar que as áreas de Reserva Legal e APP – áreas de preservação permanente possuem relevante importância não apenas para as zonas rurais, mas também para as zonas urbanas, devendo não apenas a União e os Estados e o Distrito Federal legislarem quanto ao tema, mas também os municípios para que possam exercem o direito constitucional de legislarem quanto a temas existentes no interior de seus domínios. Para tanto basta observar o teor do artigo 02º da Lei 10.257/2001, que prevê diretrizes para a política urbana municipal, senão vejamos: Art. 2º /.../ VI – Ordenação e controle de uso do solo, de forma a evitar: a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos; b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes; /.../ A Proteção Ambiental do Meio Ambiente Urbano, página 265 / 271, In ACETI JR., Luiz Carlos; BRAGA FILHO, Edson de Oliveira; AHMED, Flávio; GRAU NETO, Werner; MURAD, Samir Jorge (Organizadores); diversos autores. Mecanismos Legais para o Desenvolvimento Sustentável. 01ª Edição. 2010. Belo Horizonte – MG. Editora Fórum. 2 126 Interciência & Sociedade Reserva legal e app – áreas de f) a deterioração das áreas urbanizadas; g) a poluição e a degradação ambiental; /.../ XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico; XIII – audiência do Poder Publico Municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população; /.../” (negrito e grifo nosso). Assim, é de uma clareza hialina que a previsão contida no “Estatuto de Cidade”, prevê que essas e as demais diretrizes são obrigatórias não apenas na elaboração do Plano Diretor Municipal (artigo 39 do Estatuto da Cidade), mas também deverá o município criar leis ambientais e até um código municipal ambiental, válido para todo o território municipal, que detalhe as normas de proteção ambiental. Desta forma, fica fácil observar que os munícipes, bem como os poderes executivo e legislativo municipais, têm papel de relevante importância na sustentabilidade do município, criando normas de conduta e proporcionando educação ambiental, fazendo com que as áreas verdes localizadas nas zonas rurais e nas zonas urbanas sejam locais de proteção e preservação dos recursos naturais existentes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACETI JR., L. C.; et al. (org.); diversos autores. Mecanismos Legais para o Desenvolvimento Sustentável. 01ª Edição. 2010. Belo Horizonte – MG. Editora Fórum. ACETI JR., L. 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Juruá. 2008. Interciência & Sociedade 127 ACETI JUNIOR, L. C. Luiz Carlos Aceti Junior é Advogado. Pós-graduado em Direito de Empresas. Especializado em Direito Empresarial Ambiental. Professor de Legislação Ambiental e Políticas Públicas de Meio Ambiente; de Legislação Social e Tributária; de Ética e Cidadania da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM). Professor de Direito Ambiental de Cursos de Pós-graduação da METROCAMP de Campinas - SP, ESDC de São Paulo – SP, MEMES de São Paulo - SP, ESUD de Cuiabá - MT, EXCELLENCE de São Luis - MA, UNIFEOB de São João da Boa Vista - SP, FAEP de Araras – SP, UNIFEG de Guaxupé - MG, entre outras. Professor e Co-coordenador da Pós-graduação em Direito Ambiental e Sustentabilidade da EPD - Escola Paulista de Direito de São Paulo. Consultor da Consultoria ACDP - Ambiental, Comunicação e Desenvolvimento Profissional www.acdp.com.br . Titular da Aceti Consultoria Jurídico Ambiental www.aceti.com.br . 128 Interciência & Sociedade REUTILIZAÇÃO DE GARRAFAS PET PARA PRODUÇÃO DE MÓVEIS E DESENVOLVIMENTO SOCIOAMBIENTAL CORRÊA, Rony Felipe Marcelino Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) [email protected] RESUMO: O presente trabalho teve como um dos objetivos sensibilizar as pessoas para a preservação ambiental através da reutilização de garrafas Pet dois litros transformando-as em móveis. Outro objetivo foi mostrar para as populações menos favorecidas outra forma de obter lucro a partir dos resíduos, com a venda desses móveis. A venda de um resíduo, como a garrafa Pet, transformado em um móvel, pode gerar um lucro até 31 vezes maior que vender a garrafa Pet para empresas de reciclagem. Este trabalho foi implantado nas escolas municipais do programa de Atendimento Integral à Criança e ao Adolescente de Mogi Guaçu-SP (AICA). Apesar da dificuldade inicial em obter número desejado de garrafas, observou-se grande motivação das crianças em participarem do trabalho, colaborando com a arrecadação de Pet no bairro em que residem e com as atividades práticas para a construção dos móveis. PALAVRAS-CHAVE: Material Reciclável, Educação Ambiental, Criança e Adolescente, Sustentabilidade, Reutilizar. ABSTRACT: This work was one of the aims at raising awareness about environmental conservation through the reuse of plastic bottles by transforming them into furniture. Another objective was to show the low-income people another way to earn a profit from waste, with the sale of these piece of furniture. The sale of a waste, such as plastic bottle, transformed into a piece of furniture, can generate an income 31 times greater than to sell the plastic bottle to recycling companies. This work was implemented in municipal schools the program of Integral Care of Children and Adolescents of Mogi-SP (AICA). Despite the initial difficulty in obtaining desired number of plastic bottles, there was great motivation for children to participate in the work, collaborating with the collection of bottles in the neighborhood where they reside and with the practical activities to build the furniture. KEYWORDS: Recyclable Material, Environmental Education, Children and Adolescents, Sustainability, Reuse. 1. INTRODUÇÃO Os problemas socioambientais, encarados como ameaçadores à sobrevivência do homem na terra, são relativamente novos no planeta Terra. Passou a se agravar a partir do momento em que o homem se distanciou da natureza e tornou a encará-la como uma fonte de recursos disponíveis e ilimitado (PENTEADO, 1999). O desenvolvimento de um projeto ambiental é apenas um caminho, porém importantíssimo para todo cidadão, multiplicando o saber e desencadeando ações em conjunto em busca de um ambiente harmonioso a todos (PADUA & TABANEZ, 1997). O problema da destinação adequada e produção de lixo é um desafio a ser abordado na educação ambiental e ser compreendido por cada individuo por ser ele parte atuante desse que é um dos mais preocupantes problemas ambientais (PADUA & TABANEZ, 1997). Segundo dados da Associação Brasileira da Industria do Pet (ABIPET, 2010), em 2008 o Brasil consumiu 462.000 toneladas de Pet para a produção de garrafas. De acordo com Cempre (2010), em 2008 aproximadamente 54,8% das embalagens que foram consumidas tiveram sua reciclagem consumada, o que equivale a quantidade de 253.000 toneladas das 462.000 toneladas produzidas em 2008. As garrafas são recuperadas principalmente através de catadores. Apesar de existir muitos catadores no Brasil, o grande problema é o baixo retorno da atividade de recolhimento e comerInterciência & Sociedade 129 CORRÊA, R. F. M. cialização da sucata, fato que leva as cooperativas a tentarem agregar maior valor aos produtos manufaturando-os (SILVA et. al., 2003). Observando os problemas ambientais no Brasil e no mundo, a problemática do lixo no Brasil, os aterros sanitários cada vez mais saturados e aumentando do número de catadores com a remuneração injusta pelo esforço, o presente trabalho apresentará uma forma ambientalmente correta e socialmente justa de recuperar garrafas Pet. Os resultados deste trabalho servirão de exemplo para que cooperativas, comunidades carentes, ONGs, empresas, prefeituras e outras escolas encontrem na garrafa Pet descartada, uma oportunidade de conscientizar, conservar o meio ambiente e obter lucro com isso. 1.1. Garrafa Pet O Pet (politereftalato de etileno) é um poliéster, polímero termoplástico, sendo o melhor e mais resistente plástico para a produção de embalagens, gerando tanto resistência mecânica e química como formando uma barreira de gases e odores (ABIPET, 2010). Os químicos ingleses Whinfield e Dickson em 1941 foram os que desenvolveram o Pet, porém só começaram a ser fabricados em grande escala a partir de testes de segurança e meio ambiente na década de 70 (CEMPRE, 2010). Chegou ao Brasil em 1988 primeiramente sendo usado na industria têxtil e logo depois, em 1993, no mercado de embalagens para refrigerantes (ABIPET, 2010). Analisando a uso do Pet sobre aspectos econômicos é muito interessante tanto para quem produz como para quem consome. Porém, em aspectos ambientais é muito preocupante, sendo 10 milhões de garrafas fabricadas por dia, havendo poucos dias entre produção, uso e descarte, e séculos para a degradação (SILVA et. al., 2007). O grande problema é sua resistência à biodegradação, sendo resistente à radiação, calor, ar e água, permanecendo no meio ambiente durante dezenas de anos conservando suas propriedades físicas, até 130 irem se degradando após centenas de anos (NASCIMENTO et. al., 2005). 1.2. Destinação de garrafas Pet utilizadas no Brasil No Brasil, após seu uso e reciclagem, sua maior utilização é na produção de fibra de poliéster para indústria têxtil, que segundo a Cempre (2010) gera diversos produtos tais como, fios de costura, forrações, tapetes e capacetes, mantas de TNT, entre outras utilidades. Entretanto, a manufatura da garrafa Pet é uma alternativa muito interessante, tendo diversas vantagens sobre a reciclagem, como por exemplo, não necessita gastos com equipamentos caros e aumenta o lucro devido o valor agregado ao produto final (SILVA et. al., 2003). Segundo Silva et. al. (2007) além do aspecto positivo ambiental, o aspecto social é fortemente afetado positivamente, gerando empregos as classes menos favorecidas que não tem oportunidade de estudo e encontram dificuldade de colocação profissional. Estima-se que no Brasil 500 mil pessoas vivam da coleta seletiva e venda do material reciclado. 1.3. Produção de móveis em garrafa Pet A produção de móveis a partir de garrafas Pet se tornou realidade graças à criatividade e dedicação do professor de Ciências, do Rio de Janeiro, Sebastião Feijó. A produção é possível graças a invenção desse professor da “célula” que é produzida através do corte e encaixe entre garrafas. Segundo Estrada (2003) a invenção foi registrada em 1998, e a tal célula aumenta a firmeza para construir o que quiser a partir dela. De acordo com a mesma fonte o professor ministra diversos cursos em comunidades carentes, contribuindo muito com o meio ambiente e desenvolvimento social de comunidades. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Tecnologia (INT) do Rio de Janeiro-RJ apóia cooperativas de catadores em projetos na construção de móveis feitos em garrafa Pet. De acordo com Silva et. al. (2007) um dos projetos tem três Interciência & Sociedade Reutilização de garrafas pet para produção de móveis e desenvolvimento socioambiental objetivos comuns básicos: gerar trabalho e renda para catadores em comunidades carentes com os novos produtos; aumentar o ciclo de vida da garrafa Pet; melhorar a auto estima dos catadores através de trabalhos criativos, quebrando a rotina de seus trabalhos de coleta. Outro projeto situado em Vigário Geral, Rio de Janeiro-RJ, recebe financiamento da Fábrica de Catalisadores Carioca, que abrange quatro aspectos básicos dos móveis: o design, a resistência, avaliação e melhoria da ergonomia e divulgação na mídia. O projeto também tem parceria com outras cooperativas que comercializam os produtos (MOVERGS, 2010). 2. Material e métodos mento das relações pessoais, familiares e sociais; a valorização das necessidades e interesses das crianças e dos adolescentes de acordo com o sexo, faixa etária, condições de vida, grau de desenvolvimento físico e mental, a valorização da escola, evitando assim, a evasão escolar, facilitando a inserção social das crianças. Para poder dar atendimento mais eficiente e ter um trabalho com melhores resultados, o trabalho selecionou 9 turmas dentro de 5 núcleos do AICA. Foram envolvidas 9 professoras e uma média de 140 crianças e adolescentes, com uma faixa etária média de 10 anos. Os bairros selecionados foram os seguintes: Jardim Guaçuano, Jardim Ypê II, Itacolomy II, Itamarati e Planalto. 2.1. Local de estudo 2.3. Objetos utilizados e forma de trabalho O presente trabalho foi realizado no município de Mogi Guaçu-SP, localizado a latitude 22º22’20’’ e a longitude 46º56’32’’, estando a uma altitude de 591 metros, tendo uma população de aproximadamente 140.000 habitantes em uma área de 885,00 km2 (WIKIPEDIA, 2010). O trabalho foi desenvolvido no programa de Atendimento Integral à Criança e ao Adolescente (AICA) que é coordenado pela Secretaria de Educação de Mogi Guaçu-SP. A Secretaria de Educação de Mogi Guaçu-SP deu total apoio ao trabalho, apostando e incentivando para que o trabalho obtivesse êxito. Os materiais utilizados foram: tesouras, fitas adesivas largas e garrafa Pet. As tesouras utilizadas foram as dos próprios alunos e mais algumas adquiridas na Secretaria de Educação. Fita adesiva foi o único gasto do trabalho. A fita adesiva larga era necessária para fixar as garrafas Pets cortadas umas nas outras e dar firmeza aos móveis produzidos. As garrafas Pet tinham que ser de dois litros e padronizadas com o mesmo formato para dar o encaixe correto quando eram cortadas. A forma de trabalho utilizou-se da técnica de agrupamento de garrafas desenvolvida pelo professor Sebastião Feijó da Escola Municipal Érico Veríssimo do Rio de Janeiro. O Trabalho era realizado pelas próprias crianças, com auxílio do coordenador e dos professores responsáveis (Figuras 1 e 2). 2.2. Programa AICA O programa atualmente conta com 20 núcleos, 53 turmas e 53 professores, atendendo uma média de 1.200 alunos da rede municipal de ensino, em horários extra-escolares. O programa tem como diretriz o fortaleci- Figuras 1 e 2. Crianças dos AICAs desenvolvendo os trabalhos em equipe. Fonte: do autor. Interciência & Sociedade 131 CORRÊA, R. F. M. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1. Garrafas utilizadas O trabalho reutilizou, entre maio e setembro, cerca de 1.200 garrafas Pet dois litros arrecadada pelas 9 turmas dos 5 núcleos do AICA. O peso total aproximado é de 68 kg, o que levaria até 400 anos para degradar no meio ambiente. 3.2. Arrecadação de garrafas A arrecadação de garrafas foi feita através de campanhas com as crianças das escolas do programa AICA, que logo, fizeram campanhas de arrecadação no bairro onde estudam. O trabalho apresentou dificuldades em arrecadar número suficiente de garrafas para produção dos móveis por principalmente três motivos: as garrafas para a produção dos móveis tem que ser padronizadas com o mesmo formato (quase sempre do mesmo fabricante); há formatos de garrafas Pet que não dão o encaixe correto para a produção dos móveis, limitando o projeto na região a quase praticamente marca de dois fabricantes; muitas das crianças integrantes do programa AICA são de baixa renda, e algumas das famílias delas utilizam-se da comercialização de garrafa Pet para a complementação da renda familiar, o que fazia com que os familiares não as deixassem levar garrafas para o trabalho. Dos três problemas, o mais interessante para o trabalho foi o ultimo, pois, com o resultado deste trabalho, essas famílias poderão perceber que é mais rentável transformar a garrafa Pet em um produto do que vendê-la por um preço não muito atrativo. 3.3. Móveis gerados A princípio o trabalho iniciou-se ensinando as crianças a construir pufes, que é a base para a construção de diversos outros móveis. A partir do momento que as crianças iriam se aperfeiçoando na técnica e arrecadando mais garrafas, novos móveis iriam se transformando, como por exemplo, cadeiras, mesas, sofás e poltronas (Figuras 3 e 4). De acordo com Silva et. al. (2007) um projeto semelhante implantado em uma Cooperativa de catadores no Rio de Janeiro, ministrava o curso em quatro aulas com aulas teóricas pela manhã e pela tarde aula prática, sendo que no final do curso o catador teria produzido um pufe. O trabalho pretende ir inovando e produzindo móveis maiores à medida que as crianças forem arrecadando mais garrafas. Figura 3. Sofá, mesa e pufes de garrafa pet revestidos com retalhos. Fonte: do autor. 132 Interciência & Sociedade Reutilização de garrafas pet para produção de móveis e desenvolvimento socioambiental Figura 4. Sofá em processo de produção. Fonte: do autor. Os móveis que foram produzidos em garrafa Pet são tão quanto e até mais confortável e resistentes que móveis produzidos a partir de outras recursos naturais. Segundo testes realizados no Instituto Nacional de Tecnologia (INT) apresentou que, um sofá construído da mesma forma ao do trabalho, tem resistência semelhante a um sofá de madeira (SILVA et. al., 2003). 3.4. Retorno e comercialização dos produtos O resultado esperado no início foi alcançado, havendo-se a transformação de um resíduo que uma vez poderia ser descartado de forma irregular na natureza ou ser reciclado a um preço que não poderia ser tão atraente aos catadores. O trabalho promoveu a agregação de valor ao produto, proporcionando a multiplicação em várias vezes do valor de venda do produto final. Há um projeto no Rio de Janeiro chamado CoopManga que tem a mesma linha de trabalho, que, segundo Silva et. al. (2003) a expectativa do projeto foi a de gerar novos trabalhos na comunidade que o projeto esta localizado e aumentar os lucros dos catadores com a venda dos produtos. O presente trabalho teve vários interessados na compra dos produtos, por valores muito atraentes, mas devido a falta de demanda no início do trabalho, achou-se melhor mantê-los, a princípio, para exposição. Para exemplificar o valor agregado ao produto, um pufe produzido pelas turmas do AICA do Jardim Guaçuano (Figuras 5 e 6) teve o valor estimado em R$40,00 depois de devidamente revestido com retalhos de um material usado na produção de tapetes da empresa Rayza da cidade de Inconfidentes-MG, que colaborou com o trabalho. Comparando a diferença de valores, com a mesma quantidade de garrafas gastas para construir um pufe, um catador ganharia uma média de R$1,26 levando em consideração o valor de R$0,50/kg de garrafa Pet, consequentemente o catador ganharia 31 vezes a mais com o produto pufe. Interciência & Sociedade 133 CORRÊA, R. F. M. Figuras 5 e 6. Pufes da Turma do Jardim Guaçuano revestidos com retalhos. Fonte: do autor. Conforme as crianças forem criando mais móveis durante o ano, os mesmos serão vendidos e, com o recurso adquirido, elas poderão comprar materiais necessários para outras atividades, financiar viagens culturais e educativas, etc, aprendendo também o valor do trabalho e dinheiro e tendo noção de como administrá-lo para suprir as necessidades. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o trabalho pôde-se apresentar uma solução ambientalmente correta para a destinação final das garrafas Pet usadas e, também uma forma mais rentável para catadores e outras pessoas arrecadarem dinheiro com a manufatura de garrafas Pet. A transformação das garrafas em móveis não é tão complicada, visto que até crianças de faixa etária baixa conseguiram produzir os móveis trabalhando em equipe. Levando em consideração que o coordenador do trabalho incentivou as crianças a revestir os móveis com tecidos que eram descartados da industria, o trabalho ficou ainda mais ecológico. Além de contribuir com a destinação adequada da garrafa Pet, dava um destino adequado aos resíduos industriais também, consequentemente agregando mais valor ao produto ainda. Com a exposição dos móveis e comercializações futuras dos mesmos, mais pessoas serão estimuladas a separar e dar destino certo as garrafas e, 134 serão conscientizadas sobre a questão do lixo e seus deveres como cidadãos para preservar o meio ambiente. O trabalho despertou o interesse da empresa COARE, que trabalha com produtos recicláveis no município. A empresa está empenhada em ajudar as crianças com a disponibilização de garrafas Pet necessárias para as atividades e em divulgar os trabalhos desenvolvidos pelas crianças na cidade para fortalecer a conscientização ambiental. Espera-se que ações de cunho socioambiental se multipliquem no município para inserir e dar dignidade as classes menos favoráveis. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABIPET. O que é Pet? Associação Brasileira da Industria do Pet. Disponível em: <http://www.abepet. com.br/oqepet.php> acesso em 31 de agosto de 2010. CEMPRE. O Mercado para Reciclagem. Disponível em: <http://www.cempre.org.br/fichas_tecnicas. php?lnk=ft_pet.php> acesso em 31 de agosto de 2010 ESTRADA, J. D. A cápsula da mudança. Entrevista ao site EcoPop Rio de Janeiro, 2003. Disponível em: <http://www.ecopop.com.br/publique/cgi/cgilua.exe/ sys/start.htm?sid=5&infoid=70 >. Acesso em 01 de setembro de 2010. MOVERGS. Móveis Recicláveis. Reportagem publicada em 18 de maio de 2006. Disponível em: <http:// www.movergs.com.br/noticias/noticia_detalhe.php? gCdCategoriaNoticia=16&gCdNoticia=271 > Acesso Interciência & Sociedade Reutilização de garrafas pet para produção de móveis e desenvolvimento socioambiental em 30 de agosto de 2010 NASCIMENTO, A. M.; et al. Reciclagem do Lixo e Química Verde. Curso de Formação Continuada. Julho a outubro/2005. PADUA, S. M.; TABANEZ, M. F. Educação Ambiental: Caminhos Trilhados no Brasil. Instituto de Pesquisas Ecológicas. 283p. Brasília-DF, 1997. PENTEADO, M. J. A. C. Conceitos pra se fazer Educação Ambiental. 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Interciência & Sociedade 135 136 Interciência & Sociedade SISTEMA DE REMEDIAÇÃO POR BOMBEAMENTO E TRATAMENTO EM ÁGUAS SUBTERRÂNEAS CONTAMINADAS PEREIRA, Paulo Roberto Alves Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] BARRAZA LARIOS, Mario Roberto Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] SARTORI, Marcelo Vanzella Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] ALMEIDA, Moacyr Rodrigo Hoedmaker Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] TOLEDO, Patrícia Caveanha Tavares Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] COSTA, Ana Caroline Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM) [email protected] RESUMO: O presente trabalho apresenta as etapas que envolveram a determinação das plumas de contaminação e a implementação de um sistema de remediação por bombeamento e tratamento, para um site onde a água subterrânea foi contaminada por metais, provenientes das operações industriais de uma empresa de galvanoplastia localizada na região de Campinas, cujo nome é mantido em sigilo por questões contratuais. As etapas que compreenderam este trabalho foram fundamentadas no histórico de estudos ambientais realizados no local como a Avaliação Preliminar, a Avaliação Confirmatória e a Avaliação Detalhada dentre outros estudos, em atendimento aos requisitos legais estabelecidos pelo “Manual de Gerenciamento de Áreas Contaminadas (CETESB, 1999)”. Conforme preconiza este manual, foram perfurados poços de monitoramento simples e multiníveis em locais estratégicos no empreendimento, para a coleta e a análise química quantitativa dos contaminantes presentes no solo e na água subterrânea, além de poços de extração para o bombeamento da água contaminada. De posse dos resultados analíticos foram determinadas as plumas de contaminação horizontais e verticais da fase dissolvida no lençol freático, para os compostos químicos que apresentaram concentração superior aos limites estabelecidos pela legislação vigente. Os resultados obtidos não indicaram a contaminação do solo, confirmaram a contaminação do lençol freático local e permitiram sugerir a estratégia de bombeamento e tratamento como tecnologia de remediação, em função das condições favoráveis existentes no local, principalmente em termos das condições favoráveis da estrutura fabril que contribuem para a redução de custos associados ao sistema de remediação. PALAVRAS-CHAVE: passivo ambiental, remediação por bombeamento e tratamento, plumas de contaminação, poços de monitoramento simples e multinível. Interciência & Sociedade 137 PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.; TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C. ABSTRACT: The present work is concerned with the determination of contamination plumes and implementation of a remediation system based on pump-and-treat technology for a site where groundwater was contaminated by metals. This contamination was caused by the activities performed by an electroplating industry located at region of Campinas, which had its name kept in secrecy due to contractual requirements. The steps taken during this work were based on the historic environmental studies developed in the industrial area and surroundings. These studies denominated preliminary assessment, confirmatory evaluation and detailed evaluation, were performed in accordance with legal requirements established by a management manual for contaminated areas (Manual de Gerenciamento de Áreas Contaminadas) published by CETESB (São Paulo state environment agency) in 1999. In accordance with this manual, the soil was perforated in strategic points in the contaminated area for the installation of simple and multilevel monitoring wells, in order to collect samples and determinate quantitatively the concentration of contaminants present in soil and groundwater, besides extraction wells for pumping contaminated groundwater. The analytical results showed that there was no contamination in the soil but in the groundwater, ratifying the conclusion of previous studies realized in the area. Based on these results, the horizontal and vertical contamination plumes from dissolved phase in groundwater were determined for the chemical species, which the concentration values were superior to limits established by the current state legislation. The results indicated no contamination of the soil, confirmed the contamination of local groundwater and allowed to confirm the strategy of pump-and-treat as a remediation technology, due to the favorable conditions in the property, mainly in terms of suitable conditions of the industrial structure that contribute to the reduction of costs associated with the remediation system. KEYWORDS: environmental liability, pump-and-treat cleanup system, contamination plumes, multilevel and simple monitoring wells. 1. INTRODUÇÃO Os poluentes ou contaminantes quando entram em contato com o solo, com o ar, com a água superficial ou subterrânea, alteram as características naturais de qualidade destas matrizes e na grande maioria das vezes, representam riscos e causam severos impactos sobre os bens a proteger localizados na área atingida e em suas circunvizinhanças. Segundo a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), são considerados bens a proteger: i) a saúde e o bem-estar da população; ii) a fauna e a flora iii) a qualidade do solo, das águas e do ar; iv) os interesses de proteção à natureza e à paisagem; v) a ordenação territorial e o planejamento regional e urbano, e; vi) a segurança e a ordem pública. Para assegurar que a lei supracitada seja respeitada e cumprida, no Estado de São Paulo, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB, 2009), publicou o “Procedimento de Gerenciamento de Áreas Contaminadas”, que estabelece as diretrizes que devem ser rigorosamente seguidas para a investigação, a remediação e o ge- 138 renciamento de áreas contaminadas. Na realidade, entende-se que este documento representa um imenso avanço na prevenção da contaminação e no restabelecimento gradativo das condições naturais das áreas contaminadas, possível devido ao grande avanço tecnológico das metodologias de remediação reconhecidas pela comunidade científica e pelas agências ambientais, como a CETESB no Brasil e a EPA (Environmental Protection Agency) nos Estados Unidos da América. Deste modo, o presente estudo tem como objetivo apresentar as etapas que envolveram a determinação das plumas de contaminação, a instalação de poços multiníveis e de extração, e a instalação do sistema de remediação por bombeamento e tratamento para a água subterrânea contaminada por metais provenientes das operações industriais de uma empresa de galvanoplastia localizada na região de Campinas. As etapas envolvidas neste estudo foram realizadas em conformidade com o procedimento supramencionado e são sucintamente apresentadas ao longo do trabalho. Interciência & Sociedade Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas contaminadas 2. Gerenciamento de Áreas Contaminadas O gerenciamento de áreas contaminadas (ACs) visa minimizar os riscos a que estão sujeitos a população e o meio ambiente por meio de um conjunto de medidas que assegurem o conhecimento das características dessas áreas e dos impactos por elas causados. A finalidade é proporcionar os instrumentos necessários à tomada de decisões quanto às formas de intervenção mais adequadas, de forma gradativa. As ações do gerenciamento de ACs adotadas neste trabalho estão fundamentadas nas etapas: 1) definição da região de interesse; 2) identificação de áreas potencialmente contaminadas; 3) avaliação preliminar; 4) investigação confirmatória; 5) investigação detalhada; 6) análise de risco; 7) investigação para remediação; 8) projeto de remediação; 9) Remediação, e; 11) monitoramento. 3. Metodologia de Remediação Esta seção tem por finalidade apresentar brevemente a tecnologia de bombeamento e tratamento, escolhida dentre diversas tecnologias mundialmente utilizadas para a remediação de águas subterrâneas contaminadas, tendo como foco principal a contaminação por metais. 3.1. Remediação por Bombeamento e Tratamento Convencional O desempenho de sistemas de bombeamento e tratamento depende diretamente das condições do site e dos contaminantes químicos presentes. À medida que aumenta a complexidade dos sites, a probabilidade de que o sistema seja capaz de descontaminá-lo até que a água atinja os padrões estabelecidos diminui. O Quadro 1 mostra a facilidade relativa de descontaminação ou limpeza das águas subterrâneas como uma função das características químicas dos contaminantes e da hidrogeologia subterrânea. Os sites são classificados em 4 diferentes categorias: (1) indica os sites com maior facilidade de limpeza, enquanto (4) representam o maior desafio técnico. A seguir é apresentada uma breve explicação sobre a facilidade de limpeza para as categorias de (1) a (4): •Limpeza dos sites da categoria 1: sistemas bem projetados podem ser capazes de restaurar as condições da água do lençol freático para a qualidade de água conforme os padrões legais estabelecidos, no entanto, esse sucesso não é atingido para a maioria dos sites contaminados. •Limpeza dos sites da categoria 2: também é possível promover a limpeza de sites desta categoria por bombeamento e tratamento, mas o alcance dos objetivos de remedição estão mais sujeitos a uma grande incerteza do que em sites na categoria 1. É possível que as metas sejam atingidas após um maior tempo de operação do site. •Limpeza dos sites da categoria 3: também é possível promover a limpeza de sites desta categoria, mas o alcance dos objetivos de remedição estão sujeitos a uma incerteza bastante significante frente aos da categoria 1. A limpeza parcial é um cenário mais realista para os sites desta categoria. •Limpeza dos sites da categoria 4: é improvável promover a limpeza de sites desta categoria de modo que a qualidade de água atinja os padrões legais estabelecidos, mas é possível que a contenção da contaminação seja alcançada. O Quadro 1 é um instrumento muito útil para comparar a eficácia relativa de sistemas de bombeamento e tratamento para a limpeza de sites com diferentes hidrogeologias subterrâneas e características dos contaminantes químicos. Segundo a National Academy Press (1994), é importante perceber que as categorias do Quadro 1 são baseadas na experiência e no desempenho de sistemas de bombeamento e tratamento implementados em sites contaminados nos Estados Unidos, na revisão de dados experimentais preexistentes, e não em novas análises quantitativas. Ainda mais importante, é perceber que a viabilidaInterciência & Sociedade 139 PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.; TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C. de da limpeza pode variar em todo o site. Um simples site pode conter algumas regiões onde é difícil a operação de extração e os contaminantes continuam a se dissolver na água subterrânea, enquanto em outras regiões, os contaminantes estão essencialmente dissolvidos e são fontes insignifican- tes de contaminação em longo prazo. Deste modo, a parte do site que contém contaminantes essencialmente dissolvidos poderia ser enquadrada na categoria 1 ou 2 (Quadro 1), enquanto a parte do site que contém significantes fontes de contaminação poderia ser categorizada como 3 ou 4. Quadro 1. Facilidade Relativa de Descontaminação de Aquíferos Contaminados em Função da Química dos Contaminantes e da Hidrogeologia Subterrânea. Tipos de Hidrogeologia Subterrânea Homogêneo, Simples Camada Homogêneo, Múltiplas Camadas Heterogêneo, Simples Camada Heterogêneo, Múltiplas Camadas Fraturada Instável, dissolvido (degrada / volatiliza) 1a 1 2 2 3 Instável, dissolvido 1-2 1-2 2 2 3 2 2 3 3 3 Fortemente adsorvido, dissolvido 2-3 2-3 3 3 3 Fase LNAPL Separada 2-3 2-3 3 3 4 Fase DNAPL Separada 3 3 4 4 4 Química dos Contaminantes Fortemente adsorvido, dissolvido (degrada / volatiliza) Fonte: National Academy Press, 1994. Facilidade relativa de limpeza: (1) mais fácil; (4) mais difícil. LNAPL – Ligther Non-Aqueous Phase Liquids; DNAPL – Dense Non-Aqueous Phase Liquids. a 3.2. Poços Multiníveis A Figura 1 (Einarson, 2006) mostra dois tipos de concepção de um poço multinível em comparação com um poço de monitoramento simples. Há um desnível entre os pontos de amostragem de água subterrânea nos poços multiníveis, que fornecem dados para o delineamento de plumas verticais dos contaminantes. A Figura 2 (Einarson, 2006) apresenta uma pluma vertical de contaminação típica, obtida através de poços multiníveis para o monitoramento vertical da pluma de contaminação (Einarson, 2006). As letras na Figura 15 indicam respectivamente: L – poço de monitoramento simples com longa zona de amostragem; M – conjunto de três poços construídos em diferentes profundidades com curta zona de amostragem, e; N – tubulação contínua multicanal com zonas de captação em diferentes níveis. 140 Figura 1. Tipos de Poços (Einarson, 2006) O poço de monitoramento simples (L) produz uma amostra que representa uma mistura de altas concentrações de soluto que adentra na parte superior e de bai- Interciência & Sociedade Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas contaminadas xas concentrações que adentram na base da zona de amostragem do poço. Figura 2. Pluma Vertical (Einarson, 2006) O poço de monitoramento simples (L) produz uma amostra que representa uma mistura de altas concentrações de soluto que adentra na parte superior e de baixas concentrações que adentram na base da zona de amostragem do poço. O conjunto de três poços multiníveis (M) produz amostras que refletem com maior precisão a real distribuição dos contaminantes na fase dissolvida do aqüífero do que a amostra de um poço de monitoramento simples. O poço multinível N fornece amostras que mais se assemelham a distribuição real e efetiva dos contaminantes na fase dissolvida do aqüífero. Por questões comerciais, optou-se neste trabalho por instalar na empresa poços multiníveis do tipo M, compostos por tubos geomecânicos conforme ilustrado na Figura 8. A construção dos poços multiníveis e também de extração, contou ainda com a inserção de pré-filtro de areia graduada quartzosa arredondada pré-lavada própria para poços tubulares, com selo de proteção de bentonita para prevenir o aporte de eventuais contaminações superficiais, com o preenchimento de solo retirado durante a perfuração e o selamento final com cimento. A Figura 2 mostra a simulação da captura hidráulica de uma pluma de contaminação vertical, tipicamente obtida a partir de amostragens em poços de monitoramento multinível. 4. Etapas do Estudo 4.1. Caracterização da Empresa A empresa objeto de estudo atua no setor de galvanoplastia voltada ao desenvolvimento de peças de plástico ABS (Acrilonitrila Butadieno Estireno). Localizada na região de Campinas, a empresa desenvolve a Cromação em ABS, Estanhagem, Fosfocromatização e Niquelação Química. Faz o tratamento superficial, processo chamado de eletrodeposição, que consiste em recobrir objetos ou peças técnicas, em geral plásticos ABS e metálicos, com um ou mais metais. Dentre os tipos de eletrodeposição, nesta indústria prevalece a atividade principal de galvanoplastia, definida como a deposição eletrolítica de metais sobre a superfície dos objetos. Trata-se de um tratamento de superfície que consiste em depositar um metal sobre o outro, através da redução química ou eletrolítica, e visa a proteção, a melhoria da condutividade e a captação para a solda, sobre a superfície tratada. É ainda aplicada para melhorar a aparência, a aglutinação de partículas não condutoras à camada eletrodepositada, e a resistência ao atrito e à dureza superficial. Em qualquer tipo de eletrodeposição, a superfície que irá receber o depósito metálico deve ser convenientemente limpa, removendo-se da superfície, impurezas tais como graxas e óxidos do próprio metal. Dentre os materiais utilizados neste processo, destacam-se: solução alcalina (NaOH) para a remoção de gorduras orgânicas; solventes hexana e xilol para a remoção de óleos minerais, e; ácidos H2SO4, HCl e HNO3, para a remoção de óxidos no processo de decapagem. Após o banho com ácido, as placas são esfregadas com esponja de aço com água e sabão. Com relação aos banhos, cita-se: a) a cobreação (com sulfato de cobre e ácido sulfúrico); b) a niquelação (com sulfato de níquel, cloreto de níquel e ácido bórico); c) a cromação (com ácido crômico e ácido sulfúrico), e; d) a zincagem (com sulfato de zinco, cloreto de amônio e acetato de sódio). Portanto, devido à natureza das atividades em questão, considera-se que todos os setores industriais representam um potencial de risco de contaminação do solo e das Interciência & Sociedade 141 PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.; TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C. águas subterrâneas e merecem um monitoramento contínuo para que não se tornem fontes de contaminação. 4.2. Histórico da Contaminação Devido ao potencial poluidor das atividades desenvolvidas pela empresa, estudos técnicos recentes foram realizados para a elaboração de um diagnóstico ambiental das condições do solo e lençol freático na área industrial e em seu entorno. Inicialmente foi realizada a Avaliação Preliminar por uma empresa especializada, a qual indicou os pontos de interesse potencialmente poluidores nas áreas produtivas e operacionais. Com base nos resultados obtidos, procedeu-se com a Investigação Confirmatória, também realizada por empresas especializadas, em Setembro de 2006. Neste estudo, foram instalados 5 poços de monitoramento no local e coletadas 20 amostras de solo e água subterrânea. Os resultados analíticos das amostras de solo indicaram concentrações superiores aos limites de intervenção estabelecidos pela legislação ambiental vigente para o solo e para a água subterrânea. No solo foram encontrados os metais Ba, Cd, Cr total, Fe total, Ni e Zn, enquanto na água subterrânea os metais Al, Ba, Cd, Pb, Co, Cr total, Fe total, Mn, Ni e Zn, além de TPH total. Na etapa seguinte procedeu-se com a Investigação Detalhada realizada em Abril de 2007. Neste estudo, foram perfurados e instalados 5 novos poços de monitoramento e executadas 6 sondagens rasas para a coleta de amostras de solo. Os resultados das análises laboratoriais no solo indicaram a presença dos metais Ba, Cd, Cr, Ni e Zn, e na água subterrânea Al, Sb, As, Ba, Cd, Pb, Co, Cu, Cr III, Cr VI, Fe, Mn, Ni, Ag, Zn, cis-1,2-Dicloroeteno e PCE (Tetracloroeteno), todos em concentrações acima dos valores orientadores para solo industrial. Na Investigação Detalhada, foram elaborados os mapas de isoconcentração com os resultados das análises da água subterrânea. As plumas de metais foram identificadas como amplamente distribuídas pela área, muitas vezes delimitadas fora dos limites dela tanto a jusante como a montante. Neste estudo também foram avaliados os riscos à saúde 142 humana em 5 cenários diferentes. Os resultados indicaram risco à saúde humana para os receptores: trabalhador efetivo, trabalhador temporário, trabalhador efetivo vizinho e morador residencial criança e adulto, respectivamente. Foram também calculadas as metas CMEAs (Concentrações Meta Específicas para a Área) para os cenários críticos, conforme preconiza a legislação vigente. Vários compostos apresentaram concentrações acima desta meta na água subterrânea e se tornaram o foco principal da remediação. Uma vez delimitadas as Plumas de Contaminação dos compostos de interesse na água subterrânea, foram realizados ensaios pilotos para a remediação em Fevereiro de 2008, por meio da tecnologia de bombeamento e tratamento associada à técnica de eletrocinese, que promove a eletrodeposição dos metais em eletrodos. Esta decisão se baseou na hidrogeologia subterrânea que é heterogênea com múltiplas camadas e nos contaminantes que são instáveis e completamente dissolvidos na água subterrânea (categoria 2 do Quadro 1). Este sistema de remediação operou por algum tempo com modesta eficiência quando comparado aos custos empreendidos para a sua montagem e manutenção contínua. Para dar continuidade à investigação na área contaminada, a Consultoria Geoma S/S Ltda foi contratada para realizar uma nova campanha para a atualização das plumas de contaminação, implementar o sistema de remediação por bombeamento e tratamento e efetuar periodicamente o seu monitoramento. Neste sistema, a água contaminada é bombeada para a estação de tratamento de efluentes (ETE) existente na empresa e tratada com o efluente industrial, contribuindo para uma redução expressiva dos custos associados à remediação, com efetividade significativa na diminuição da concentração de contaminantes na água subterrânea. 4.3. Remediação e Poço Multinível A implementação do sistema de remediação englobou a instalação de poços de extração de 4 polegadas (Figura 3), que associados aos poços 4 poços existentes, perfazem um total de 8 poços de extração Interciência & Sociedade Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas contaminadas definitivos. Nesses poços de extração foram instaladas bombas ANAUGER, adequadas ao bombeamento da água subterrânea até a ETE. Para assegurar uma operação adequada das bombas ANAUGER, em alguns trechos, foi necessária a abertura do solo a uma profundidade superior a 50 cm, para a introdução de tubos de PVC de 10 cm ou 5 cm de diâmetro, para a passagem das mangueiras de sucção e fiação elétrica das bombas e dos sensores de nível. Figura 4. Tubo PVC–PE–07 (Geoma, 2009) Figura 3. Poço de Extração (Geoma, 2009) Para promover o rompimento do asfalto e do solo compactado no local pela passagem de veículos pesados e realizar as aberturas no solo, foi necessária a utilização de máquinas escavadeiras e pás carregadeiras. A Figura 4 mostra na área externa à empresa, a rua lateral que dá acesso a sua portaria, com a abertura onde passa a tubulação que vai em direção ao poço de extração PE-07, instalado próximo ao ribeirão existente no local. Os tubos de PVC instalados têm a função de isolar da terra as mangueiras e a fiação, além de assegurar uma proteção mínima a esses componentes, por estarem sujeitos a movimentação de veículos pesados na superfície do solo, acima de onde foram instalados. A Figura 5 ilustra a instalação das tubulações e dos sensores no poço de extração PE-06. A Figura 6 demarca todos os 6 poços de extração instalados, além dos 2 poços de extração previamente existentes, atualmente todos em operação de bombeamento de água subterrânea para a ETE da empresa. Neste trabalho também foram instalados 7 dos 10 poços multiníveis previstos (Figura 7). Não foi possível a instalação de 3 deles, devido à existência de material impenetrável (rocha) detectada durante a perfuração. Várias referências foram utilizadas como base para a implementação dos poços multiníveis (Claire Technical Bulletin; Cadwagan et al., 1993; Lewis, 2001; Einarson &Cherry, 2002; Sterling et al., 2005; Parker et al., 2006; Einarson, 2006). Figura 5. Instalação PE-06 (Geoma, 2009) Interciência & Sociedade 143 PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.; TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C. 5. Resultados Esta seção apresenta as plumas de contaminação obtidas através dos resultados analíticos das campanhas de novembro de 2009 (antes da instalação do sistema de remediação por bombeamento e tratamento) e maio de 2010 (seis meses após a instalação do sistema). 5.1. Plumas Horizontais e Verticais Figura 6. Instalação PE-06 (Geoma, 2009) Figura 7. Poços Multiníveis (Geoma, 2009) A etapa de perfuração, inserção de tubulação, inserção de pré-filtro de areia e finalização dos poços multiníveis é ilustrada pela Figura 8. As plumas de contaminação podem ser caracterizadas como mapas de isoconcentrações dos compostos objeto de investigação, cujos valores das análises químicas das amostras de água subterrânea e/ou solo foram superiores aos limites de intervenção dos padrões orientadores da CETESB. As plumas representam a distribuição espacial dos contaminantes na área objeto de estudo e foram geradas a partir do georeferenciamento das coordenadas espaciais obtidas no levantamento topográfico e das concentrações dos contaminantes, ambas tratadas pelo método computacional conhecido como krigagem. Este método realiza a interpolação dos dados e calcula a distribuição das curvas de isoconcentração e delimita as plumas de contaminação. A sobreposição das plumas de contaminação geradas para cada uma das 3 profundidades dos poços multiníveis, representa a delimitação total da pluma (vertical e horizontal) das fases dissolvidas identificadas. Diversas plumas de contaminação horizontal e vertical foram elaboradas, no entanto, somente algumas delas são exemplificadas neste artigo. A Figura 9 ilustra a pluma de contaminação horizontal por cobre para os resultados analíticos de novembro de 2009 (antes da instalação do sistema de remediação), enquanto a Figura 10 se refere ao mesmo composto para resultados analíticos de junho de 2010 (seis meses após a instalação do sistema de remediação). Observa-se uma drástica redução na concentração de cobre em seis meses de operação de 87000 μg/L (região mais escura da Figura 9) para uma concentração em torno de 7000 μg/L (região clara da Figura 10). Figura 8. Pré-filtro Para o PMN-07 144 Interciência & Sociedade Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas contaminadas Figura 9. Cobre Nov/2009 (Geoma, 2009) Figura 12. Níquel Nível 2 (Geoma, 2009) Figura 10. Cobre Jun/2010 (Geoma, 2010) As Figuras 11 a 13 mostram as plumas horizontais de concentração do níquel nos poços multiníveis em três diferentes cotas abaixo da mesa de água (desnível de 1m entre cada profundidade). A maior concentração em torno de 17000 μg/L está localizada no nível 1 (Figura 11), enquanto a maior concentração do nível 3 está em torno de 3800 μg/L (Figura 13). Figura 13. Níquel Nível 3 (Geoma, 2009) A Figura 14 ilustra a superposição das três plumas horizontais supracitadas, para a composição da pluma vertical de contaminação por níquel (campanha de junho de 2010). A Figura 15 confirma a redução na concentração dos contaminantes após a instalação do sistema de remediação, neste caso, ilustrando o composto Níquel, cuja concentração no nível 1 caiu aproximadamente de 17000 μg/L (Figura 11), para cerca de 7500 μg/L no mesmo nível 1 (Figura 15). Figura 11. Níquel Nível 1 (Geoma, 2009) Interciência & Sociedade 145 PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.; TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C. Figura 14. Pluma Vertical (Geoma, 2009) plastia. Para tanto, as etapas e os requisitos legais do “Manual de Gerenciamento de Áreas Contaminadas (CETESB, 1999)” foram adotados como referência para este trabalho, concluído com êxito. A despeito de todas as dificuldades e restrições relatadas na bibliografia especializada sobre o sistema de bombeamento e tratamento para a remediação de sites, é evidente que esta tecnologia tem se mostrado neste caso, bastante adequada e eficaz para a descontaminação de metais do lençol freático da área, objeto deste estudo. Assim, recomenda-se, portanto, que a empresa mantenha o monitoramento semestral nos moldes das campanhas de novembro de 2009 e dezembro de 2010, com a elaboração das plumas de contaminação para os compostos de interesse, como forma de ratificar a verdadeira eficácia do sistema ora instalado no site em atingir as metas de remediação e assegurar que as fontes de descontaminação foram realmente estancadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABGE, 1995. Curso de Geologia Aplicada ao Meio Ambiente. IPT Série Meio Ambiente, 247 p. Figura 15. Níquel Nível 1 (Geoma, 2010) Portanto, é notório que o sistema de remediação ora instalado na empresa mostra-se adequado ao propósito de promover a limpeza ou descontaminação do lençol freático e deverá permanecer em funcionamento até que as metas de remediação sejam atingidas. CETESB – Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental. Decisão de Diretoria Nº 195-2005 – Estabelecimento de Valores Orientadores para Solos e Água Subterrânea no Estado de São Paulo. São Paulo, 2005. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS IPT– Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de S. Paulo, Divisão de Minas e geologia Aplicada. Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo, v. 1, 1981. O presente trabalho teve como principal objetivo apresentar as etapas que envolveram a perfuração de poços de extração e multiníveis, a determinação das plumas de contaminação verticais e horizontais, e a instalação de um sistema de remediação por bombeamento e tratamento, para um site onde a água subterrânea foi contaminada por metais, provenientes das operações industriais oriundas da galvano- 146 BADILLO, E. J.; RODRIGUES, A. R. Mecânica de Suelos. Editorial Limusa. México. CETESB – Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental. Manual de Gerenciamento de Áreas Contaminadas. São Paulo, 1999. LIBARDI, P. L. Dinâmica da água no solo. 2a edição. Piracicaba, 2000: o autor. 509p. SILVA, J. X. Geoprocessamento para análise Ambiental. Rio de janeiro. Ed. do autor. 2001. 228p. U.S. EPA REGION 9. Table Preliminary Remedial Goals (PRG’s) User Guide’s/Technical Background Document – U.S. Environmental Protection Agency, 2004. Interciência & Sociedade Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas contaminadas COHEN, R. M.; et al. Design Guidelines for Conventional Pump-and-Treat Systems. EPA, USA, 1997. EINARSON, M. D. Practical Handbook of Environmental Site Characterization and Ground-water Monitoring. Taylor & Francis, 2006. COHEN, R. M.; et al. Methods for Monitoring Pump-and-treat Performance. EPA, USA, 1994. MICHAEL LEWIS, R. G. Installing Continuous Multi-Chamber Tubing Using Sonic Drilling. Water Well Journal, July 2001. ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY. Options for Discharging Treated Water from Pump and Treat Systems. EPA, USA, 2007. CADWGAN, M. R.; et al. Improving Monitoring Efficiency of Deep Wells. GWMR/Winter, 1983. CLAIRE TECHNICAL BULLETIN. Multilevel Sampling. TB1, 2006. EINARSON, M. D.; CHERRY, J. A. A New Multilevel Ground Water Monitoring System Using Multichannel Tubing. Ground Water Monitoring & Remediation 22, no. 4/ Fall 2002/ pages 52-65. PARKER, B. L.; et al. A Multilevel System for High-Resolution Monitoring in Rotasonic Boreholes. Ground Water Monitoring & Remediation 26, no. 4/ Fall 2006/pages 57–73 STERLING, S. N.; et al. Vertical Cross Contamination of Trichloroethylene in a Borehole in Fractured Sandstone. Vol. 43, No. 4 – GROUND WATER – July – August 2005 (pages 557–573). Paulo Roberto Alves Pereira é Doutor em Engenharia pela Universidade de Campinas – UNICAMP, Mestre em Engenharia Química pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, graduado em Engenharia Química pela Universidade estadual de Maringá – UEM, e Black Belt Seis Sigmas pela Escola de Extensão da Unicamp - Extecamp. Atualmente é Coordenador do curso de Engenharia Química e professor dos cursos de Engenharia Química e Ambiental da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM, Professor dos cursos de Engenharia do Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino – UNIFAE, professor dos cursos de MBA em Gestão da Qualidade e Perícia Ambiental do Instituto de Aperfeiçoamento Tecnológico – IAT e Responsável Técnico da Empresa Consultoria Geoma S/S Ltda. Mario Roberto Barraza Larios é Doutor em Ciências da Engenharia Ambiental pela Universidade de São Paulo – USP, Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Viçosa – UFV, Graduado em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Viçosa – UFV e Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho pelo Instituto de Aperfeiçoamento Tecnológico – IAT. Atualmente é Professor do Curso de Engenharia Ambiental da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM, Professor dos cursos da Escola de Engenharia de Piracicaba EEP–FUMEP, professor do curso de Engenharia Civil da Universidade Adventista de São Paulo – UNASP e Responsável Técnico da Empresa Gerenciamento Ambiental Ltda. Marcelo Vanzella Sartori é Mestre em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos – UNISANTOS, Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Especialista em Gestão e Práticas Ambientais pelas Faculdades Integradas de São Paulo – FISP, Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP e Graduado em Direito pelas Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU. Atualmente é Professor do curso de Direito da Faculdade de Direito de Mogi Mirim/ SP, da Associação Educacional e Assistencial Santa Lúcia, professor do curso de Administração da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM e Diretor Jurídico da Consultoria Geoma S/S Ltda. Moacyr Rodrigo Hoedmaker de Almeida é Doutor em Ciências (Área de concentração: Química Analítica) pelo Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. Mestre em Química (Área de concentração: Química Analítica) pelo Departamento de Química da UFSCar. Bacharel em Química pela UFSCar. Atualmente é professor dos cursos de Engenharia Ambiental, Engenharia Química e Nutrição da Faculdade Municipal “Professor Franco Montoro” - FMPFM. Professor e Coordenador dos Cursos de Ciências-Habilitação Química, Química Industrial e da Comissão Própria de Avaliação (CPA) das Faculdades Integradas Maria Imaculada - FIMI. Avaliador Institucional e de Cursos INEP/MEC. Patrícia Caveanha Tavares de Toledo é Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho pelo Instituto de Aperfeiçoamento Tecnológico – IAT e graduada e Engenharia Ambiental pela Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM. Atualmente atua como Engenheira Ambiental Autônoma em parceria com a Consultoria Geoma S/S Ltda e Gerenciamento Ambiental Ltda. Ana Caroline Costa é aluna do 8º semestre de Engenharia Ambiental da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM. Atualmente é estagiária de Engenharia Ambiental na Consultoria Geoma S/S Ltda. Interciência & Sociedade 147 148 Interciência & Sociedade SUCESSÃO ECOLÓGICA E O USO DE NITROGÊNIO EM FLORESTAS TROPICAIS PEREIRA-SILVA, Erico F. L. Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) [email protected] HARDT, Elisa Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM) [email protected] JOLY, Carlos A. Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) [email protected] AIDAR, Marcos P. M. Instituto de Botânica de São Paulo (IBot - SP) [email protected] RESUMO: Uma ferramenta que auxilia no entendimento do processo de sucessão ecológica em ambientes florestais, sobretudo da Mata Atlântica do Estado de São Paulo, é o conjunto de estratégias de aquisição e do transporte de nitrogênio utilizadas pelas espécies arbóreas. As pesquisas realizadas têm se fundamentado na hipótese de que o metabolismo primário do nitrogênio permite a organização de espécies em grupos funcionais de sucessão ecológica. Os resultados têm mostrado que espécies pioneiras apresentam níveis relativamente altos de atividade de redutase de nitrato foliar (ARN), elevada quantidade de nitrato (NO3-) nas folhas e transportam nitrogênio predominantemente através de NO3- e Asparagina (ASN), enquanto que, em secundárias iniciais, os níveis de atividade enzimática são menores e predominam transportadores de longa distância como Glutamina (GLN) e Arginina (ARG) e, em secundárias tardias, os níveis de ARN são muito baixos e predominam na seiva aminoácidos como ASN e ARG e um baixo conteúdo de NO3-. Esse tipo de abordagem vem sendo feita em diversos ecossistemas e se mostra bastante importante quando se verifica que plantas de ambientes tropicais tendem a depender menos da absorção do nitrato através das raízes. Apesar das evidências supracitadas, são necessárias mais investigações sobre as principais fontes de nitrogênio utilizadas em comunidades florestais tropicais, uma vez que a maioria dos estudos tem sido realizada em ecossistemas de clima temperado. São necessários mais estudos sobre a ecofisiologia de uso do nitrogênio de tal forma a se gerar ferramentas que contribuam futuramente para a recuperação de áreas degradadas e que complementem as informações sobre a sucessão ecológica em ambientes tropicais. PALAVRAS-CHAVE: sucessão ecológica, nitrato, amônio, aminoácidos, atividade de redutase do nitrato, espécies arbóreas tropicais. ABSTRACT: The strategies for acquisition and transport of nitrogen used by tree species, especially in the Atlantic Forest of São Paulo, that a one way to understanding the process of ecological succession in forest environments. The researches have been based on the primary metabolism of nitrogen allows the organization of these functional groups of species in ecological sucession. The relationship between the observed strategies and the successional categories revealed that pioneer species promoted the acquisition of nitrate (NO3-) from the soil and transported nitrogen assimilated in the roots as Asparagine (ASN). The early secondary species use Glutamine (GLN) for long distance transport and nitrate as an alternative form of nitrogen transport. The late secondary species use strategies of storage and remobilization of nitrogen in the form of Asparagine and Arginine and assimilate ammonium. The results presented complement the information available relating to ecological succession in tropical forests and in the future could be useful for the recovery of degraded areas. KEYWORDS: ecological succession, nitrate, ammonium, amino compounds, nitrate reductase activity, wood species. Interciência & Sociedade 149 PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M. 1. INTRODUÇÃO O conceito de sucessão ecológica foi tratado inicialmente como a seqüência de comunidades de plantas marcadas por mudanças de formas de vida de simples a complexas em uma condição de monoclímax (Clements 1916 apud Gandolfi 2007). Com o passar do tempo, diversos pontos de vista complementaram esse conceito. Gleason (1926) propôs que o fator mais importante para a composição sucessional de uma comunidade seria a interação entre as espécies, em que a estrutura final seria policlímax. Witthaker (1953) reconheceu que vários fatores ambientais variavam espacialmente, refletindo em gradientes na vegetação. Dentre muitos outros conceitos formulados, reformulados e complementados, um dos mais recentes foi proposto por Begon (1996) que discute sucessão como um padrão de colonização e extinção promovido por populações de espécies em uma determinada área. Para Gandolfi (2007), a sucessão em floresta tropical seria um conjunto de transformações que ocorrem na composição e na estrutura de uma vegetação em escala temporal. Esse panorama histórico deixa evidente que o entendimento da sucessão ecológica e dos sistemas de classificação de grupos sucessionais está cada vez mais cientificamente fundamentado, ficando de lado o caráter subjetivo das primeiras classificações, incluindo agora propostas de investigação de evidências que influenciam o caráter sucessional e as estratégias de regeneração das espécies, procurando melhorar o entendimento desse processo em comunidades vegetais. Os estudos sobre sucessão ecológica requerem tempo pelo fato de ser um processo natural que ocorre de modo ininterrupto durante um longo período até que a comunidade vegetal atinja uma condição de equilíbrio (Hartshorn 1980), ou seja, são processos dinâmicos que dependem de diversos fatores e que determinam quais espécies da comunidade terão êxito no estabelecimento (Bazzaz & Picket 1980, Whitmore 1996). As investigações iniciais sobre a dependência da luz no interior da floresta (Vázquez-Yanes et al. 1990), a adaptação de diferentes espécies aos regimes de luz 150 (Chazdon & Pearcy 1991), os processos de substituição em escala temporal (Brokaw 1985), as respostas ecofisiológicas às condições do meio e diversos outros fatores têm constituído um arcabouço de informações sobre a sucessão ecológica em diversos ecossistemas. Na região neotropical tem sido estudada a organização de espécies de plantas em tipos funcionais, famílias botânicas e caracteres taxonômicos relacionados ao uso de nitrogênio (Stewart & Schmidt 1998, Aidar et al. 2003). Além disso, o uso de nitrogênio pelas plantas tem representado uma forma de entendimento do processo de sucessão ecológica. Alguns autores (Aidar et al. 2003, Pereira-Silva 2008 e Campos 2009) têm investigado mais a fundo a caracterização dos compostos nitrogenados de baixo peso molecular presentes na seiva do xilema, a atividade de redutase do nitrato (ARN) foliar in vivo e a determinação do conteúdo de nitrato (NO3-) na seiva do xilema e nas folhas de espécies arbóreas da Mata Atlântica paulista. Até o momento já pôde ser caracterizado o metabolismo primário de nitrogênio de mais de cem espécies arbóreas de diferentes fitofisionomias florestais que responderam ao modelo proposto por Aidar et al. (2003). A constatação de estratégias quanto ao uso de nitrogênio sob a ótica dos estágios de sucessão em floresta tropical representa um conjunto de informações que atendem à necessidade de avanços na determinação de categorias sucessionais. Trata-se de investigações que devem servir como critérios complementares à classificação em grupos de sucessão ecológica e oferecer de forma satisfatória subsídio à recuperação de áreas degradadas. Diante do exposto, esse trabalho apresenta uma revisão sobre os estudos a respeito das estratégias das espécies arbóreas tropicais e apresenta alguns resultados obtidos para duas fisionomias florestais de Mata Atlântica do Estado de São Paulo. 2. Influência do nitrogênio e as estratégias de uso pelas plantas A diversidade e a disponibilidade de nutrientes no ambiente têm sido aponInterciência & Sociedade Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais tadas como fatores importantes que influenciam a interação, a distribuição, a abundância, a diversidade, a composição local e o desempenho individual das plantas (Bell & Lechowicz 1994), além de serem algumas das causas das variações do estado nutricional de espécies vegetais (Glass et al. 2002). Essa heterogeneidade nutricional ocorre em virtude das modificações estruturais do solo em escalas temporal e espacial e da influencia dos fatores bióticos e abióticos, de tal forma que a sinergia entre tempo, espaço e fatores institui aspecto chave para a disponibilidade de nutrientes na solução do solo e direciona a ocupação e o sucesso das plantas no ambiente (Pereira-Silva 2008). Em ecossistemas naturais terrestres, o nitrogênio é o elemento que mais limita o desenvolvimento vegetal e, por essa razão, sua transformação e disponibilidade no solo e sua aquisição e uso pelas plantas têm se tornado o ponto comum de muitas pesquisas. O uso limitado desses recursos com máxima eficiência mostra que as plantas possuem uma variedade de estratégias que pode ser resultante das adaptações dos mecanismos metabólicos em milhares de anos de evolução (Stewart & Schmidt 1998), em função das formas nitrogenadas particulares e das quantidades limitadas de nitrogênio nos ecossistemas. Essas adaptações permitem a aquisição e o uso eficientes e garantem uma estreita economia de nitrogênio durante o ciclo de vida da planta (Cánton et al. 2005). As relações naturais entre nitrogênio e comunidades vegetais têm sido investigadas em diversas regiões e têm sustentado a idéia de que as espécies vegetais diferem quanto à habilidade de utilizar as fontes orgânicas e inorgânicas desse elemento (Stewart et al. 1992, Schmidt et al. 1998, Aidar et al. 2003, Pereira-Silva 2008, Campos 2009). Em ecossistemas áridos e semi-áridos, por exemplo, onde o nitrogênio é disponibilizado no ambiente concomitante aos raros eventos climáticos de precipitação, as plantas desenvolveram habilidades competitivas para evitar que a escassez desse recurso afetasse sua sobrevivência (James & Richards 2006). Da mesma forma, em ecossistemas temperados, embora a chuva não seja um evento raro e por isso não influencie diretamente a disponibilidade de nitrogênio, as espécies de estádios sucessionais inicial e tardio utilizam estratégias para competir entre si pelo nitrogênio disponível no solo (Tilman & Wedin 1991). Isso também ocorre nos ecossistemas mediterrânicos em que as plantas utilizam estratégias de uso do nitrogênio na recolonização pós-fogo (Casals et al. 2005, Paula et al. 2009). A baixa disponibilidade de formas de nitrogênio inorgânico influencia na diversidade de comunidades vegetais e o uso de nitrogênio pelas espécies permite organizá-las em tipos funcionais (Cruz et al. 2006). Em ecossistemas neotropicais existem algumas semelhanças no metabolismo do nitrogênio das plantas que coincidam com o agrupamento de caracteres taxonômicos, o que evidencia que famílias botânicas apresentam padrões quanto à redução do nitrato (Stewart & Schmidt 1998, Aidar et al. 2003) e, além disso, nesses ambientes, espécies arbóreas podem ser organizadas em tipos funcionais (Stewart & Schinidt 1998) relacionados ao uso de nitrogênio. Como exemplo, diversos trabalhos mostram que famílias botânicas como Amaranthaceae, Chenopodiaceae, Polygonaceae e Urticaceae apresentam uma taxa de redução do nitrato bastante elevada quando comparadas com Ericaceae, Epacridaceae (Stewart & Schimidt 1998) e Proteaceae (Aidar et al. 2003, Pereira-Silva et al. 2006). Em uma breve revisão, Pereira-Silva et al. (in prep.) verificou que espécies arbóreas da família Lauraceae, ocorrentes em diversos ecossistemas tropicais, podem ser organizadas como um grupo que apresenta o comportamento intrínseco de baixa atividade de redução de nitrato nas folhas. A possibilidade de ordenação de grupos taxonômicos em função da assimilação de nitrato foliar deixa evidente que as plantas respondem às variações externas das concentrações das formas de nitrogênio orgânico e inorgânico, ou seja, utilizam um eficiente esquema de absorção e transporte do nitrogênio que satisfaz a demanda desse elemento (Raghuram et al. 2006). São estratégias voltadas à obtenção do nitrogênio do solo, via sistema radicular, nas formas de nitrato (NO3-), de amônio (NH4+), Interciência & Sociedade 151 PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M. de uréia e de aminoácidos e de dinitrogênio (N2) pela fixação e de amônia (NH3), via cavidade sub-estomática foliar (Stulen et al. 2006). Além das estratégias de uso do nitrogênio disponibilizado no meio terrestre, outras formas nitrogenadas ocorrentes na atmosfera, como o nitrito (NO2-) e o óxido nítrico (NO), também podem ser capturados via cavidade sub-estomática e serem transportadas, sob a forma de nitrito ou nitrato, via apoplasto e absorvidos e assimilados no citoplasma através de um complexo enzimático (Stulen et al. 2006). A capacidade de assimilação de uma forma particular de nitrogênio varia de espécie para espécie (Crawford & Glass 1998) e existem diversos autores que buscam o entendimento dessas estratégias (Smirnoff et al. 1984, Abuzinadah & Read 1986, Stewart et al. 1988, Fredeen & Field 1992, Traw & Ackerly 1995, Aidar et al. 2003, James & Richards 2005, 2006, Stulen et al. 2006, Cruz et al. 2003, Cruz et al. 2006, Pereira-sIlva et al. 2006, Casals et al. 2005 e Paula et al. 2009 ). Dessa forma, são importantes as investigações da existência de preferências por uma ou outra forma de nitrogênio e se isso é decorrente de diferenças genéticas ou se as plantas absorvem predominantemente a forma nitrogenada disponível no meio em que melhor se desenvolvem (Rodrigues & Coutinho 2000). 3. Estratégias de uso de nitrogênio e a sucessão ecológica: estudo de caso em duas florestas tropicais Para a Mata Atlântica, Aidar et al (2003) aprofundaram as investigações sobre as estratégias de regeneração e uso de nitrogênio e evidenciaram a existência de estratégias utilizadas por grupos sucessionais de espécies arbóreas para adquirir, transportar e assimilar o nitrogênio inorgânico disponível no ambiente. Nesse trabalho apresentaram um modelo de sucessão ecológica de espécies arbóreas que está 152 embasado em estudos ecofisiológicos e mostra que espécies pioneiras têm preferência ao íon nitrato como fonte de nitrogênio e possuem níveis relativamente altos de atividade de redutase do nitrato, enquanto que as espécies secundárias tardias têm preferência ao amônio como fonte primária e apresentam níveis relativamente baixos dessa enzima (Smith & Rice 1983, Smirnoff & Stewart 1985, Stewart et al. 1990, 1992, Aidar et al. 2003, Cruz et al. 2006, Pereira-Silva 2008 e Campos 2009). Com base nesse modelo, em estudos realizados em duas fisionomias florestais de Mata Atlântica, Pereira-Silva (2008) verificou sua validade e propôs um esquema complementar quanto à complexidade estrutural do nitrogênio metabolizado pelas plantas de acordo com cada grupo sucessional (Figura 1). Na Floresta Ombrófila Densa Submontana (FODSub) do Sul do Estado de São Paulo (Parque Estadual de Carlos Botelho), os resultados indicaram, além da categorização sucessional das espécies, que os eventos de chuva são essenciais para a disponibilização do nitrogênio no solo e para a aquisição pelas plantas, as quais se mostram adaptadas à condição sazonal dos processos de mineralização e de nitrificação no solo. Nos resultados para a Floresta Estacional Semidecídua (FESem) do interior do Estado (Reserva Municipal de Santa Genebra), as espécies arbóreas também puderam ser organizadas em grupos de sucessão em função do uso do nitrogênio. Além disso, pôde ser observado que as características do solo e a estacionalidade da precipitação são fatores limitantes do processo de nitrificação no solo nessa floresta e as estratégias de utilização do nitrogênio pelas espécies estudadas estão condicionadas à forma mais apropriada e eficiente de nitrogênio inorgânico disponível no solo. Interciência & Sociedade Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais Figura 1. Complexidade estrutural do nitrogênio inorgânico assimilado e metabolizado pelas plantas de acordo com o grupo sucessional. ARN foliar (Atividade de Redutase do Nitrato foliar), NO3- (nitrato), ASN (Asparagina), ARG (Arginina) e GLN (Glutamina). De acordo com Pereira-Silva (2008), o que foi observado na FESem e na FODSub está fortemente correlacionado com o regime de chuvas que condiciona o caráter intrínseco de limitação de nutrientes comum nas zonas tropicais (Pimentel 1998). A distribuição das chuvas tem grande significado ecológico para as formações vegetais e, apesar das diferenças de distribuição entre as áreas estudadas, foi verificada a essencialidade da água para a demanda de nitrogênio das espécies. Em florestas ombrófilas, a precipitação anual aparentemente tem maior importância do que o regime sazonal de chuvas, já nas florestas semidecíduas, que abrigam um sub-conjunto da flora das florestas ombrófilas, a estacionalidade marcante das chuvas pode ocasionar déficit hídrico e atuar na manutenção de espécies capazes de enfrentar um estado de seca mais prolongado (Oliveira-Filho & Fontes 2000). As investigações realizadas nas duas fisionomias de Mata Atlântica mostram que as espécies arbóreas estudadas investem na aquisição e assimilação de nitrogênio através das raízes, transportando esse elemento predominantemente através de quatro moléculas, NO3-, ASN, GLN e ARG, as quais otimizam o uso de nitrogênio que pode ser destinado ao armazenamento e posterior remobilização interna. Pode-se dizer que nas duas áreas as espécies utilizam mecanismos ecofisiológicos semelhantes para absorver, transportar, assimilar, armazenar e remobilizar esse elemento que puderam ser organizados em grupos de sucessão ecológica. Além disso, as espécies também utilizam as folhas para efetuar a assimilação do nitrato adquirido do solo. As espécies pioneiras respondem às variações dos conteúdos de nitrogênio disponível no solo, sobretudo na forma do nitrato. Esse grupo teve níveis relativamente altos de atividade de redutase do nitrato foliar, elevada quantidade de nitrato nas folhas, realiza o transporte de nitrogênio predominantemente através do nitrato e de ASN e tem baixa relação carbono-nitogênio nas folhas (C:N foliar). As secundárias tardias demonstraram ser pouco responsivas à disponibilidade sazonal de nitrogênio no solo. Seus níveis de atividade de assimilação do nitrato foram muito baixos em relação ao grupo pioneiro, na seiva do xilema predominaram aminoácidos como ASN e Interciência & Sociedade 153 PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M. ARG, baixo conteúdo de nitrato e a relação C:N foliar foi maior em relação às pioneiras. As secundárias iniciais mostraram níveis médios de atividade de redutase do nitrato foliar, na seiva do xilema predominaram transportadores de longa distância como GLN e ARG. Esse grupo ainda apresentou características intermediárias na sucessão ecológica, ou seja, algumas espécies são próximas às pioneiras e mais responsivas às variações sazonais de nitrogênio no solo enquanto outras são menos responsivas e mais semelhantes às espécies tardias da sucessão. A análise do conjunto total das espécies evidenciou dois mecanismos fisiológicos de uso do nitrogênio, a assimilação de nitrato na folha, especialmente aquelas do grupo pioneiro, e o processo transpiratório para o transporte do nitrato desde a raiz até a parte aérea da planta. Nas duas florestas, as variáveis ecofisiológicas das espécies selecionadas se condicionam ao desempenho de estratégias para a utilização do nitrogênio inorgânico disponível no solo, podendo ser distribuídas em um continuum de respostas ecofisiológicas de uso do nitrogênio entre pioneiras, secundárias iniciais e tardias (Tabela 1). A hipótese do continuum de respostas ecofisiológicas de uso do nitrogênio mostra que nas duas formações florestais, nos períodos úmido e seco, o grupo de pioneiras tem maior atividade de redutase do nitrato que diminui na medida em que se avança na sucessão até as secundárias tardias. Isso pode ser sustentado pelos conteúdos de nitrato na seiva do xilema que indicaram o grupo de pioneiras como assimilador preferencial desse íon. O conteúdo de nitrato foliar por grupo de sucessão foi significativamente diferente entre as duas florestas, com maiores concentrações nos grupos FESem em função da maior fertilidade do solo mesotrófico dessa área. Quanto ao conteúdo de nitrogênio total foliar, observa-se uma diminuição no decorrer dos grupos de sucessão em ambas as áreas, indicando maior investimento no uso desse elemento pelo grupo pioneiro, refletindo em uma menor taxa de C:N (Tabela 1). Para o grupo de secundárias tardias foi verificado um padrão inverso ao grupo pioneiro, com 154 maior razão C:N por exemplo, o que sugere a reabsorção de nitrogênio e uma maior longevidade foliar (Eckstein et al., 1999). Durante o período úmido, não foram observadas diferenças significativas entre as duas áreas em relação aos compostos nitrogenados da seiva do xilema característicos de cada grupo sucessional (Tabela 1). Contudo, as médias foram diferentes para ASN no grupo de espécies pioneiras, evidenciando maior taxa desse aminocomposto na seiva das espécies da FODSub. Foi observada diferença para GLN no grupo de secundárias iniciais, indicando maior taxa para as espécies da FESem, o que sugere o investimento em estratégias relacionadas ao uso de amônio. Para o grupo de secundárias tardias, a média de ARG foi significativamente diferente, indicando que as espécies da FODSub possuem maiores taxas desse aminocomposto na seiva. As diferenças significativas observadas nas taxas de ARG entre as duas formações deixam clara a estratégia de remobilização no grupo de secundárias tardias do da FODSub nos dois períodos de amostragem, o que pôde ser evidenciado pelas elevadas taxas desse aminoácido na seiva do xilema (Tabela 1). A organização dos mecanismos ecofisiológicos de aquisição, transporte e assimilação do nitrato permitiu identificar grupos com padrões de uso de nitrogênio distribuídos em um continuum de sucessão ecológica e confirmar a hipótese de que, na FODSub e na FESem, as espécies pioneiras possuem níveis relativamente altos de atividade de redutase do nitrato foliar, elevada quantidade de nitrato nas folhas e transportam nitrogênio predominantemente através do nitrato e de ASN. Em uma posição intermediária desse continuum, as espécies secundárias iniciais possuem níveis médios de atividade de assimilação de nitrato nas folhas, com o predomínio de transportadores de longa distância como GLN e ARG na seiva do xilema. No outro extremo, estão posicionadas as secundárias tardias, com níveis de atividade de assimilação do nitrato muito baixos, com o predomínio de aminoácidos como ASN e ARG e com baixo conteúdo de nitrato na seiva do xilema (Figura 2) Interciência & Sociedade Interciência & Sociedade ARG GLN ASN NO3- seiva do xilema aa seiva do xilema C:N Ntotal 15 δ N NO3 - NRA Período Grupo Variável Pioneiro Área LSD Média A 647,5 ± 390,6 b B 462,2 ± 89,1 A 6,5 ± 1,4 b B 8,3 ± 0,8 A 2,9 ± 1,4 a B 2,8 ± 1,5 A 3,0 ± 0,5 a B 3,1 ± 0,2 A 15,4 ± 2,7 a B 14,7 ± 0,7 A 0,8 ± 0,2 a B 0,8 ± 0,5 A 4,7 ± 3,1 b B 1,8 ± 2,5 A 52,9 ± 6,9 a B 42,0 ± 18,6 A nv B A nv B 0,11 32,4 39,4 12,7 5,8 ± ± ± ± nv 36,5 30,7 19,9 7,9 a a 0,291 0,568 Secundário Inicial p-valor LSD p-valor Média 89,2 ± 58,2 0,05 b 0,005 183,0 ± 89,1 7,0 ± 2,1 0,41 b 0,438 7,9 ± 3,0 1,5 ± 0,8 0,03 b 0,003 3,1 ± 1,5 2,8 ± 0,7 0,06 a 0,484 3,0 ± 0,7 18,2 ± 5,1 0,487 a 0,546 17,2 ± 4,5 1,2 ± 0,8 0,06 a 0,855 1,2 ± 1,0 1,2 ± 1,1 0,034 a 0,056 0,9 ± 0,6 Úmido 26,7 ± 26,1 9,8 ± 16,7 nv b 0,046 Secundário Tardio LSD p-valor Média 107,8 ± 46,8 a 0,153 151,3 ± 72,5 6,0 ± 1,9 b 0,002 8,8 ± 2,3 1,2 ± 0,9 b <0.0001 2,9 ± 0,9 2,0 ± 0,4 b 0,025 2,5 ± 0,5 23,4 ± 6,1 a 0,127 20,1 ± 4,8 0,7 ± 0,6 b 0,036 1,8 ± 1,8 0,8 ± 0,5 a 0,479 0,9 ± 0,5 13,3 ± 20,2 a 0,119 30,0 ± 30,1 Pioneiro Secundário Inicial Secundário Tardio LSD p-valor LSD p-valor Média Média Média LSD p-valor 525,2 ± 201,4 159,8 ± 157,5 56,7 ± 24,1 a 0,21 a 0,99 b 0,024 561,8 ± 68,4 158,9 ± 91,2 68,2 ± 50,1 8,2 ± 6,1 *6.7 ± 3,1 6,7 ± 2,0 a 0,15 a 0,41 b 0,001 7,3 ± 0,4 *7.7 ± 3,2 9,4 ± 1,8 2,2 ± 0,6 1,8 ± 0,7 1,4 ± 0,9 a 0,025 b 0,01 b 0,001 2,3 ± 1,3 2,9 ± 1,7 3,0 ± 1,2 2,3 ± 0,3 2,6 ± 0,6 2,0 ± 0,3 a 0,01 a 0,58 a 0,28 2,7 ± 0,4 2,7 ± 0,6 2,2 ± 0,6 21,2 ± 3,4 18,9 ± 4,7 24,3 ± 5,4 b 0,67 a 0,66 a 0,603 16,7 ± 2,7 17,9 ± 4,2 23,0 ± 6,9 0,9 ± 0,9 *1.4 ± 1,3 *1.1 ± 1,0 b 0,047 b 0,05 b 0,047 2,0 ± 0,6 *2.9 ± 2,6 *3.2 ± 2,7 1,7 ± 0,1 1,3 ± 1,2 *0.79 ± 0,4 a 0,19 a 0,16 a 0,67 1,9 ± 3,2 0,8 ± 0,9 *0.9 ± 0,9 50,1 ± 36,3 20,8 ± 28,8 b 0,51 nv a 0,636 28,5 ± 23,2 15,4 ± 28,2 18,6 ± 25,8 nv b 0 nv 55,3 ± 33,6 16,7 ± 21,3 *34.5 ± 34,6 nv b <0.0001 0,027 2,6 ± 3,8 *7.1 ± 9,5 Seco Tabela 1. Comparação de médias (t-student) das variáveis de uso de nitrogênio do período úmido e seco para a Floresta Ombrófila Densa Submontana (A FODSub) e para a Floresta Estacional Semidecídual (B - FESem). Atividade de redutase do nitrato (NRA), concentração de nitrato foliar (NO3-), abundância natural de nitrogênio (δ15N), taxa de nitrogênio total foliar (Ntotal), razão carbono nitrogênio (C:N), conteúdo de nitrato, concentração de aminoácidos e taxa de compostos nitrogenados de baixo peso molecular predominante em cada grupo sucessional: ASN (asparagina), GLN (glutamina) e ARG (arginina). RS = estratégia de regeneração da espécie: PS = pioneira, ESS = secundária inicial, LSS = secundária tardia. nv – não verificado. LSD – diferença mínima significativa. Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais 155 PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M. Figura 2. Modelo progressivo de complexidade metabólica e do continuum de estratégias de uso do nitrogênio dos grupos sucessionais. Pi = pioneira, Si = secundária inicial, St = secundária tardia, Pi-Si = grupo intermediário I (proposta) e Si-St = grupo intermediário II (proposta). Nessas florestas predominam espécies secundárias iniciais e tardias que coexistem com espécies pioneiras. A classificação sucessional de espécies florestais tem sido um ponto muito polêmico nos estudos de florestas tropicais em virtude da carência de conhecimentos de como as espécies reagem aos fatores bióticos e abióticos. Apesar desses obstáculos, esse trabalho permitiu classificar espécies arbóreas de duas importantes formações florestais do Estado de São Paulo. Pelo comportamento ecofisiológico de uso do nitrogênio das espécies arbóreas foi possível separar as espécies em conjuntos e até mesmo propor sub-conjuntos na sucessão ecológica que poderiam ser investigados em futuros trabalhos sobre essa temática. Os grupos de sucessão ecológica utilizam diferentes maneiras para assimilar nitrogênio nas condições de úmido e seco e o que colabora para o desenvolvimento dessas estratégias são os processos de aquisição, de transporte e de assimilação desse elemento, fundamentais para o desenvolvimento das plantas frente às condições edáficas do ambiente estudado. 156 A classificação das espécies em grupos de sucessão em função do uso de nitrogênio foi possível a partir da escolha de atributos relevantes e de métodos apropriados de classificação que consideraram a ecofisiologia das espécies e sua relação com a sazonalidade climática de cada fisionomia florestal, resultando na formação de três grupos de sucessão ecológica em função da utilização do nitrogênio. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A elevação na deposição antropogênica de nitrogênio pode ser condicionante para o aumento de espécies herbáceas invasoras, bem como acelerador da expansão de florestas (Siemann & Rogers 2003), até mesmo naquelas de clima tropical, alterando a composição das comunidades, mudando as interações planta-solo e abrindo o ciclo de nitrogênio (Hendricks et al. 2000). Isso tem significante contribuição na acidificação do solo através da deposição do ácido nítrico, pela oxidação do amônio e pela lixiviação de cátions como o cálcio (Moiser et al. 2001), e seu excesso pode causar o Interciência & Sociedade Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais declínio da diversidade de espécies (Vitousek et al. 1996). Diante dessa problemática ambiental, existem desafios importantes que precisam ser enfrentados em função das circunstâncias de um cenário futuro pouco promissor para a atual biodiversidade de espécies arbóreas da Mata Atlântica. Buscando novas respostas sobre a ecofisiologia e a dinâmica de florestas tropicais, devem ser incentivadas investigações a respeito da deposição de nitrogênio e suas influências qualitativas e quantitativas no comportamento ecofisiológico das espécies vegetais e em suas interações com o meio abiótico em formações florestais tropicais. As estratégias de aquisição, transporte e uso de nitrogênio têm sido caracterizadas em diversos ecossistemas (Schmidt & Stewart 1998, Aidar et al. 2003, Casals et al. 2005, Pereira-Silva 2008) e os resultados têm mostrado que as plantas utilizam estratégias para obter nitrogênio via deposições seca e úmida (Martinelli et al. 2009) e através do solo nas suas formas inorgânica e orgânica. A aplicação do modelo de sucessão ecológica em função do uso de nitrogênio tem se mostrado uma ferramenta importante e fornece informações para o entendimento da dinâmica das formações florestais da Mata Atlântica, além de atender às necessidades de avanços na determinação de categorias sucessionais. Os estudos mostram que espécies pioneiras têm estratégias adaptadas ao uso do nitrato e são mais responsivas nutricionalmente à esse íon, secundárias tardias desempenham estratégias para o uso de amônio ou do solo ou resultante de remobilização, sendo menos responsivas ao nitrato e secundárias iniciais completam o continuum de respostas ecofisiológicas de uso de nitrogênio com espécies mais responsivas às variações sazonais do nitrato, enquanto outras são menos responsivas e se assemelham mais às secundárias tardias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABUZINADAH, R. A.; READ, D. J. 1986. 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Bacharel e Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Carlos (2001), Mestre em Recursos Florestais pela USP/Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (2005) e Doutora em Engenharia Civil pela Universidade Estadual de Campinas (2010). Atualmente é professora da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”. Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Ecologia de Paisagens e Planejamento Ambiental. Carlos Alfredo Joly. Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (1976), mestrado em Biologia Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas (1979), PhD em Ecofisiologia Vegetal pela University of Saint Andrews, Escócia/GB (1982), Pós-Doc pela Universität Bern, Suíça (1994). Atua nas áreas de Ecofisiologia Vegetal e Conservação da Biodiversidade. Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências (2008), Professor Titular em Ecologia Vegetal, Chefe do Departamento de Biologia Vegetal do IB/UNICAMP e membro da Coordenação do Programa de doutorado em Ambiente e Sociedade (NEPAM/UNICAMP). Em janeiro de 2009 reassumiu a Coordenação do Programa BIOTA/FAPESP, atuando também como Editor Chefe da revista eletrônica BIOTA NEOTROPICA e como Coordenador do Projeto Temático Biota Gradiente Funcional. Marcos Pereira Marinho Aidar. Concluiu o doutorado em Biologia Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas (2000). Atualmente é pesquisador do Instituto de Botânica (PqC V), credenciado no Curso de Pós-graduação em Biodiversidade Vegetal e Meio Ambiente do Instituto de Botânica (2004) e no Curso de Pós-graduação em Biologia Vegetal - UNICAMP (2006). Atualmente participa de 5 projetos temáticos de pesquisa. Atua na área de Botânica, com ênfase em Ecofisiologia Vegetal. Em seu currículo Lattes os termos mais freqüentes na contextualização da produção científica, tecnológica e artístico-cultural são: ecofisiologia, nitrogênio, Piptadenia gonoacantha, germinação, jatobá, mata ciliar, sucessão florestal, atmosfera enriquecida CO2, seqüestro de carbono, isotopia de nitrogênio e carbono, Centrolobium tomentosum, Cubatão, estratégia de regeneração, fotossíntese, trocas gasosas, fluorescência da clorofila a, Anadenenthera falcata, interação biosfera - atmosfera e cerrado. Interciência & Sociedade 159 160 Interciência & Sociedade SUBMISSÃO DE TRABALHOS Os artigos deverão ser encaminhados para o Conselho Editorial via mensagem eletrônica para: revista@fmpfm. edu.br (Assunto: Submissão). Os textos deverão ser publicados em português. Além disso, requer-se que os manuscritos submetidos a esta revista não tenham sido publicados anteriormente e não sejam submetidos simultaneamente em outro periódico. O conteúdo dos artigos aqui publicado é de responsabilidade, única e exclusiva, dos respectivos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião ou pensamento do conselho editorial. NORMAS PARA FORMATAÇÃO 1. Formatação Geral Características gerais: Número de páginas: um mínimo de 8 páginas e no máximo 12 páginas, incluindo as dedicadas às referências; Papel: sulfite no formato A4 (297 x 210 mm); Editor de texto: Word 2003 ou superior; Margens: direita e esquerda – 3 cm; superior e inferior – 3 cm; Fonte: Arial, para todo documento; Parágrafo: espaçamento entre parágrafos: 0 cm; espaçamento entre linhas: simples; alinhamento justificado; recuo especial da primeira linha: 1,25 cm. 2. Estrutura do Trabalho Seguem-se as recomendações em relação à estrutura dos trabalhos a serem avaliados e, posteriormente, se for o caso, publicados pelo periódico INTERCIÊNCIA & SOCIEDADE. 2.1. Título O título deve estar na primeira página, centralizado, devendo ocupar no máximo duas linhas, com espaçamento entrelinhas 1,5, letras maiúsculas (caixa alta) em negrito, na fonte Arial, tamanho 14. 2.2. Autoria As autorias constituem-se pelas pessoas físicas responsáveis na criação do conteúdo intelectual de um documento e são indicadas pelos nomes dos autores, IES de origem e pelo e-mail. 2.2.1. Nome Os nomes são referenciados pelo último sobrenome, em letras maiúsculas, seguidos dos prenomes e outros sobrenomes, que podem ser abreviados ou não, no formato que se segue: SOBRENOME do 1º autor, letras maiúsculas (caixa alta), na fonte Arial, tamanho 11; seguido do nome do 1º autor, letras maiúsculas e minúsculas (caixa alta e baixa), normal, na fonte Arial, tamanho 11, alinhados à direita, espaçamento entrelinhas simples. 2.2.2. IES O nome da Instituição de Ensino Superior deve estar em letras maiúsculas e minúsculas (caixa alta e baixa), normal, na fonte Arial, tamanho 10, alinhados à direita, com a sigla da IES, entre parênteses, em letras maiúsculas (caixa alta) normal, na fonte Arial, tamanho 10, alinhados à direita, espaçamento simples. 2.2.2. E-mail O endereço eletrônico deve estar em letras minúsculas (caixa baixa), normal, na fonte Arial, tamanho 10, alinhados à direita, espaçamento simples. 2.3. Resumo O texto deve ser escrito em português, com no máximo 10 linhas, cerca de 500 palavras, na fonte Arial, normal, alinhamento justificado e espaçamento simples. A palavra RESUMO, seguida de dois pontos, deve ser escrita em letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10, o texto do resumo vem logo a seguir. 2.4. Palavras-chave As palavras-chave devem ser escritas em português, em número máximo de cinco palavras-chave, na fonte Arial, normal, alinhamento justificado, espaçamento simples. PALAVRAS-CHAVE seguida de dois pontos devem ser escritas em letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10. 2.5. Abstract O texto do abstract, que vem a ser a tradução para a língua inglesa do resumo, até 10 linhas, na fonte Arial, itálico, alinhamento justificado e espaçamento simples. A palavra ABSTRACT, seguida de dois pontos, deve ser escrita em letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10. 2.6. Keywords São as palavras-chave traduzidas para o inglês, em número máximo de cinco palavras, na fonte Arial, itálico, alinhamento justificado e espaçamento simples. KEYWORDS seguida de dois pontos devem ser escritas em letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10, em itálico, as keywords propriamente ditas vêm logo a seguir. Interciência & Sociedade 161 3.Introdução O texto da Introdução deve ser escrito em português, na fonte Arial, tamanho 11, normal, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples, sem hifenação, com recuo de 1,25 cm na primeira linha. A palavra Introdução deve ser escrita em letras maiúsculas (caixa alta), na fonte Arial, tamanho 11, em negrito, alinhamento justificado, espaçamento 1,5, entre a palavra Introdução e o texto propriamente dito não há espaçamento entrelinhas. 4. Texto 4.1. Tópicos Em quantidade necessária para o desenvolvimento estruturado do trabalho deve estar na fonte Arial, tamanho 11, em negrito, alinhamento justificado, não sendo conveniente ultrapassar-se uma linha e deve obedecer a numeração arábica progressiva crescente. 4.2. Sub-tópicos Se fizerem necessários os sub-tópicos, até no máximo o terceiro nível, devem estar na fonte Arial, tamanho 11, em negrito, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples, não sendo conveniente ultrapassar-se uma linha. E, esses sub-tópicos devem obedecer a numeração arábica progressiva crescente. O texto referente ao conteúdo dos sub-tópicos deve(m) estar na fonte Arial, tamanho 11, normal, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples, obedecendo a um recuo de 1,25 cm para a primeira linha de cada parágrafo. 4.3. Figuras O título da Figura e as legendas devem vir logo abaixo desta, na fonte Arial, tamanho 10, normal, centralizados, com uma entrelinha 1,5 entre a figura e o título da figura, obedecendo a numeração arábica progressiva crescente, e deve haver uma entrelinha 1,5 para a continuação do texto. 4.4. Quadros e Tabelas O título dos quadros e as tabelas devem vir logo acima desta, na fonte Arial, tamanho 10, normal, alinhado à esquerda, com uma entrelinha 1,5 entre o texto e o título dos quadros ou tabelas, obedecendo a numeração arábica progressiva crescente. 4.5. Notas de rodapé As notas de rodapé devem ser inseridas somente se forem extremamente necessárias para a compreensão do texto, em numeração arábica progressiva crescente, na fonte Arial, tamanho 9, normal, alinhamento justificado, com entrelinhas simples. 5. Considerações finais Deve ser escrito em letras maiúsculas (caixa alta), na fonte Arial, tamanho 11, em negrito, alinhamento justificado, espaçamento simples. 6. Referências bibliográficas As referências citadas no corpo do texto, conforme padrão da ABNT (NBR-6023) deverão ser apresentadas em ordem alfabética no final do texto, na fonte Arial, tamanho 9, normal, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples, sem hifenação. Entre as referências deve ser utilizado um espaçamento antes do parágrafo de 6 pontos. Como nota de fim de texto deve ser inserido um minicurrículo do(s) autore(s), até no máximo 10 linhas, na fonte Arial, tamanho 9, normal, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples e espaçamento simples entre os minicurrículos (caso houver mais autores). PROCESSO DE AVALIAÇÃO Os artigos recebidos são submetidos à análise do Conselho Editorial para avaliação da adequação às áreas de interesse da revista e às exigências para submissão. Posteriormente, os artigos são encaminhados para análise por especialistas (pareceristas) nas respectivas áreas temáticas - método conhecido como avaliação por pares, peer review. Os nomes dos pareceristas e dos autores são mantidos em sigilo durante todo o processo. Os autores têm acesso aos pareceres referentes aos seus artigos, porém sem a identificação do parecerista. DIREITOS AUTORAIS Ao submeterem artigos à Revista, os autores declaram serem titulares dos direitos autorais, respondendo exclusivamente por quaisquer reclamações relacionadas a tais direitos. Os autores autorizam a Revista, sem ônus, a publicar os referidos textos em qualquer meio, ficando ainda a Revista também autorizada a adequar os textos a seus formatos. 162 Interciência & Sociedade Interciência & Sociedade 163 EDITORA FMPFM