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ISSN 2236-0468
Fundação Educacional Guaçuana – FEG
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Tiragem
1.000 exemplares, em 28 de Março de 2011.
I49
Interciência e Sociedade. v.1, n.1 (2011). – Mogi
Guaçu : Faculdade Municipal Professor Franco
FICHA CATALOGRÁFICA
Montoro, 2011.
Semestral
1. Divulgação científica – Periódicos. 2. Ciência. 3.
Cultura. 4. Gestão. 5. Sustentabilidade. 6. Educação.
7. Saúde. 8. Tecnologia. 9. Multidisciplinar
CDD-050
ISSN 2236 - 0548
Ficha Catalográfica: Adriano Madaleno Miossi – CRB 8 / nº 6981
Os textos publicados na revista são de inteira responsabilidade de seus autores.
Permite-se a reprodução desde que citada a fonte e o autor.
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EDITORIAL
A revista Interciência & Sociedade nasce como concretização de um
trabalho de mais de uma década de desenvolvimento e consolida a qualidade de ensino alcançada pela Faculdade Municipal “Professor Franco
Montoro” (FMPFM) nas diversas áreas de atuação de seus cursos.
Visa incentivar e promover o desenvolvimento de uma cultura científica na instituição, abordando temas relacionados à Gestão, Planejamento, Sustentabilidade, Educação, Saúde, Tecnologia e áreas afins.
Com isso, a meta é abranger plenamente um dos principais objetivos da
educação superior: a integração entre ensino, pesquisa e extensão. E
mais: é importante que este objetivo una-se à responsabilidade social da
FMPFM, utilizando o conhecimento científico em apoio às soluções dos
problemas e necessidades da sociedade, auxiliando a formação de profissionais qualificados e com cidadania.
A comissão editorial da Revista Interciência & Sociedade agradece
a toda comunidade acadêmica e demais pessoas que contribuíram para
que esta publicação se tornasse realidade.
Abraços,
Moacyr Rodrigo H. de Almeida
Editor
SUMÁRIO
ANÁLISE DAS DIFICULDADES E VIABILIDADES PARA A
INCLUSÃO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA VISUAL EM AULAS
DE TERMOLOGIA
CAMARGO, Eder Pires
09
AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL DE FUNCIONÁRIAS
DO SERVIÇO DE NUTRIÇÃO DE UM HOSPITAL FILANTRÓPICO
GONÇALVES, Juliana Fermino; PIMENTEL, Gustavo Duarte;
PEREIRA, Elaine Cristina Leite; MOTA, João Felipe
19
CAPITALISMO E TECNOLOGIAS: implicações para o trabalhador
FERREIRA, Simone; SARTORI, Ademilde Silveira
27
CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES ACERCA DO MATERIAL
DIDÁTICO UTILIZADO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
MIRANDA, Nonato Assis de; SILVA, Dirceu da
35
CONCESSÃO DE CRÉDITO E MODELAÇÃO DA TOMADA DE
DECISÃO
SANTADE, Hélio Oliva do Amaral; BIEMBENGUT SANTADE, Maria
Suzett
45
CONSTRUÇÃO
DE UM CONTROLADOR DIGITAL DE
PROCESSOS DINÂMICOS: possibilidades para educação
tecnológica
CAMARGO, José Tarcísio Franco de; BARROS FILHO, Jomar;
BORTOLOTI, João Alexandre; VERASZTO, Estéfano Vizconde;
MAIA, Daltamir Justino
57
DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA (DFC): conceitos e
estrutura
COSTA, Rodrigo Simão da
67
EVOLUÇÃO DO SETOR ELÉTRICO: uma breve reflexão
PAGLIARDI, Odail; SOBREIRO DIAS, José Celso
77
INTERATIVIDADE E EDUCAÇÃO: reflexões acerca do potencial
educativo das TIC
VERASZTO, Estéfano Vizconde; GARCÍA, Francisco García
85
LEITURA, ESCRITA E NOVAS MÍDIAS
SILVA, Fabiano Correa da
97
PARTICIPAÇÃO PÚBLICA E PLANEJAMENTO AMBIENTAL:
proposta de um modelo para organização do diálogo
SCARABELLO FILHO, Sinésio; SANTOS, Rozely F.
103
PLANO DE NEGÓCIOS: o caminho para o sucesso das micro e
pequenas empresas
SILVA, Kátia Elaine
113
RESERVA LEGAL E APP – ÁREAS DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE: áreas de relevante importância ao município.
ACETI JUNIOR, Luiz Carlos
119
REUTILIZAÇÃO DE GARRAFAS PET PARA PRODUÇÃO DE
MÓVEIS E DESENVOLVIMENTO SOCIOAMBIENTAL
CORRÊA, Rony Felipe Marcelino
129
SISTEMA DE REMEDIAÇÃO POR BOMBEAMENTO E
TRATAMENTO EM ÁGUAS SUBTERRÂNEAS CONTAMINADAS
PEREIRA, Paulo Roberto Alves; BARRAZA LARIOS, Mario Roberto;
SARTORI, Marcelo Vanzella; ALMEIDA, Moacyr Rodrigo Hoedmaker;
TOLEDO, Patrícia Caveanha Tavares; COSTA, Ana Caroline
137
SUCESSÃO ECOLÓGICA E O USO DE NITROGÊNIO EM
FLORESTAS TROPICAIS
PEREIRA-SILVA, Erico F. L.; HARDT, Elisa; JOLY, Carlos A.; AIDAR,
Marcos P. M.
149
ANÁLISE DAS DIFICULDADES E VIABILIDADES PARA A INCLUSÃO
DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA VISUAL EM AULAS DE TERMOLOGIA
CAMARGO, Eder Pires
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho (UNESP)”
[email protected]
RESUMO: O presente artigo encontra-se inserido dentro de um estudo que busca compreender quais
são as principais barreiras e alternativas para a inclusão de alunos com deficiência visual no contexto
do ensino de física. Apresenta e discute as dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno cego
de nascimento em aulas de termologia. Por meio de análise de conteúdo, identifica quatro classes funcionais implicadoras de dificuldades e viabilidades. Como conclusão, enfatiza a importância da criação
de ambientes comunicacionais adequados, a função inclusiva do elemento interatividade, bem como, a
necessidade da destituição de ambientes segregativos no interior da sala de aula.
PALAVRAS-CHAVE: ensino de física, inclusão, deficiência visual, termologia.
ABSTRACT: This article is part of a study that seeks to understand what are the main barriers and alternatives for inclusion of students with visual impairments in the context of physics education. Presents
and discusses the difficulties and feasibility to include the blind for birth student in thermology’ classes.
Through content analysis identifies four classes of functioning implies difficulties and feasibility. In conclusion, emphasizes the importance of creating appropriate communication environments, the inclusive
function of element interactivity, as well as the need for dismissal of a segregated environment within
the classroom.
KEYWORDS: physics education, inclusion, visual impairment, thermology.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo relata o panorama das viabilidades e dificuldades para
a inclusão de aluno com deficiência visual
em aulas de termologia. De acordo com
Carvalho e Monte (1995) para incluir os alunos com deficiências no ambiente social da
sala de aula, as práticas educacionais devem ser alteradas no sentido da valorização
da heterogeneidade humana, o que implica
a aceitação individual de todos os alunos
levando-se em conta suas condições pessoais.
A inclusão posiciona-se de forma
contrária aos movimentos de homogeneização e normalização (SASSAKI, 1999).
Defende o direito à diferença, a heterogeneidade e a diversidade (RODRIGUES,
2003). Efetiva-se por meio de três princípios gerais, a presença do aluno com deficiência na escola regular, a adequação da
mencionada escola às necessidades de to-
dos os seus participantes, e a adequação,
mediante o fornecimento de condições, do
aluno com deficiência ao contexto da sala
de aula (SASSAKI, op. cit.). Implica numa
relação bilateral de adequação entre ambiente educacional e aluno com deficiência,
em que o primeiro gera, mobiliza e direciona as condições para a participação efetiva
do segundo (MITTLER, 2003). Na lógica da
inclusão, as diferenças individuais são reconhecidas e aceitas e constituem a base
para a construção de uma inovadora abordagem pedagógica. Nessa nova abordagem, não há mais lugar para exclusões ou
segregações, e todos os alunos, com e sem
deficiências participam efetivamente (RODRIGUES, op. cit.). A participação efetiva é
entendida em razão da constituição de uma
dada atividade escolar que dá ao aluno com
deficiência, plenas condições de atuação. A
participação efetiva, pode, portanto, servir
como parâmetro sobre a ocorrência ou não
de inclusão, além de explicitar as reais neInterciência
& Sociedade
9
CAMARGO, E. P.
cessidades educacionais do aluno com deficiência.
Concluir que, incluir alunos com
deficiências em aulas de física, química,
biologia, matemática, história, língua portuguesa, etc, deve ir além dos princípios gerais indicados, é reconhecer a necessidade
do investimento em pesquisas que revelem
propriedades ativas das variáveis específicas.
A partir do exposto, o presente
texto identifica, classifica e analisa algumas das dificuldades e viabilidades para
a inclusão do aluno com deficiência visual
em aulas de física que enfocaram temas
de termologia. Para tanto, tomou-se como
parâmetro a participação efetiva desse discente nas atividades. A participação efetiva
é avaliada em função da relação: discente
com deficiência visual/conteúdos conceituais e procedimentais de termologia (COLL
apud ZABALA, 1998). Segundo esse autor,
os conteúdos de ensino são compreendidos em termos conceituais, procedimentais
e atitudinais.
Como explica Zabala (op. cit.),
os conteúdos conceituais estão relacionados ao conhecimento de fatos, conceitos
e princípios, os procedimentais ligados às
regras, técnicas, habilidades, e os atitudinais a valores, atitudes, princípios éticos.
Em outras palavras, conteúdos conceituais
relacionam-se ao saber, os procedimentais
ao saber fazer, e os atitudinais ao ser (ZABALA, op. cit.).
Em relação aos conteúdos atitudinais, várias pesquisas indicam que a presença do aluno com deficiência em uma
classe regular contribui positivamente ao
desenvolvimento de valores de caráter colaborativo, de respeito às diferenças, ligados à construção de uma sociedade menos
excludente e para a identificação de uma
natureza humana heterogenia (CARVALHO
E MONTE, 1995). Esse é o motivo pelo
qual, no presente texto, as atenções sobre
o processo de inclusão estão voltadas à
participação efetiva do aluno com deficiência visual naquelas atividades próprias ao
ensino de conteúdos conceituais e procedimentais de termologia. Em outras palavras,
serão discutidos os problemas reais oriundos da relação docente/discente com defici-
10
ência visual, discentes com e sem deficiência visual, discente com deficiência visual/
conhecimento de termologia, discente com
deficiência visual/atividades experimentais,
discente com deficiência visual/operações
matemáticas, etc.
2. O contexto das atividades
Sob a coordenação de um grupo de licenciandos, foram aplicadas quatro atividades de termologia em ambiente
educacional que contou com a presença
de alunos com e sem deficiência visual. As
atividades ocorreram num Colégio Técnico
Industrial (CTI). Elas fizeram parte de um
curso denominado “O Outro Lado da Física” oferecido pela Licenciatura em Física da
UNESP de Bauru em 2005. Inicialmente os
licenciandos organizaram um período de divulgação junto aos alunos do CTI. Estudam
nesse colégio alunos da cidade e da região
de Bauru com idade média de 15 anos. O
número de participantes do CTI foi de 35.
Entrou-se também em contato com uma
Escola Estadual a fim de convidar alunos
com deficiência visual para participarem do
curso. A Escola escolhida possuía uma sala
de recursos pedagógicos. Dois alunos com
deficiência visual interessaram-se em participar do curso. Ambos eram cegos; um possuía 15 anos de idade e cursava a 8ª série
do ensino fundamental, e o outro possuía
34 anos e cursava a oitava série do EJA. O
aluno de 15 anos era cego de nascimento e
o de 34 perdera a visão aos vinte e quatro
anos. Por questão de espaço, os resultados apresentados enfatizam as viabilidades
e dificuldades do aluno que nasceu cego
(identificado como aluno B).
3. Metodologia de análise e técnica para
a coleta dos dados
Adotando os procedimentos: exploração do material; tratamento dos resultados e interpretação (BARDIN, 1977), foram identificadas dificuldades e viabilidades
de inclusão do aluno (B). No processo de
exploração, realizou-se a fragmentação do
material de análise. Para tal, foram selecionados trechos que continham a mesma
viabilidade ou dificuldade. Após a fragmenInterciência
& Sociedade
Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em
aulas de termologia
tação, as dificuldades e viabilidades foram
agrupadas de acordo com a classe que as
caracterizam. Como decorrências foram
identificadas quatro classes de dificuldades
e viabilidades de inclusão. (a) Dificuldades:
comunicação, segregação, operação matemática e experimento. (b) Viabilidades: comunicação, hipótese, experimento e modelos (ver quadro 1).
Quadro 1. Panorama de dificuldades e viabilidades de inclusão para o aluno cego de nascimento.
Classe/dificuldade/
inclusão
Quantid. Porcent.
Classe/viabilidade/inclusão
Quantid. Porcent.
Comunicação
73
83,9%
Comunicação
368
89,7%
Segregação
10
11,5%
Segregação
0
0
Operação matemática
3
3,4%
Operação matemática
0
0
Experimento
1
1,1%
Experimento
12
2,9%
0
0
23
5,6%
0
0
7
1,7%
87
100%
410
100%
Apresentação de hipótese
Apresentação de modelos
Total vertical
Fonte: elaborado pelo autor.
O quadro 1 mostra que as classes:
comunicação e experimento foram comuns
às dificuldades e viabilidades. As classes:
segregação e operação matemática representaram somente dificuldade. As classes:
hipótese e modelo representaram apenas
viabilidade. O entendimento dos fatores determinantes para a condição de dificuldade
e/ou viabilidade será feito em função da
explicitação do perfil lingüístico utilizado pelos licenciandos (categoria linguagem), bem
como, do contexto em que a veiculação de
significados ocorreu (categoria momento).
4. Categorias para a análise dos dados
4.1. Categoria 1: Linguagem
Objetiva compreender se as informações veiculadas pelos licenciandos
foram acessíveis ao aluno com deficiência
visual. A acessibilidade será avaliada em
razão das estruturas empírica e semântico-sensorial das linguagens.
Estrutura Empírica: refere-se ao
suporte material da linguagem (MARTINO,
2005), isto é, a forma por meio da qual uma
determinada informação é materializada,
armazenada, veiculada e percebida. Pode-se organizar em termos fundamentais e
Apresentação de hipótese
Apresentação de modelos
Total vertical
mistos. As estruturas fundamentais são
constituídas pelos códigos visual, auditivo
e tátil articulados de forma autônoma e/ou
independente uns dos outros. As estruturas
mistas surgem quando os códigos fundamentais se combinam de forma interdependente, ou seja, estruturas áudio-visual, tátil-visual, etc.
Estrutura
Semântico-sensorial:
refere-se aos efeitos produzidos pelas percepções sensoriais no significado de fenômenos (DIMBLERY & BURTON, 1990).
Esses efeitos são entendidos por meio de
quatro referenciais associativos entre significado e percepção sensorial: significados
indissociáveis são aqueles cuja representação mental é dependente de determinada percepção sensorial. Nunca poderão
ser representados internamente por meio
de percepções sensoriais distintas da que
os constituem; significados vinculados são
aqueles cuja representação mental não é
exclusivamente dependente da percepção
sensorial utilizada para seu registro. Sempre poderão ser representados por meio de
percepções sensoriais distintas da inicial;
significados sensorialmente não relacionáveis: não possuem vínculo ou associação
com qualquer percepção sensorial. Embora
o aprendiz possa construir representações
Interciência
& Sociedade
11
CAMARGO, E. P.
mentais sensoriais acerca de idéias com a
presente característica, as mesmas nunca
corresponderão de fato aos fenômenos/conceitos que se visam comunicar; significados
de relacionabilidade sensorial secundária:
são aqueles cuja compreensão estabelece
com o elemento sensorial uma relação não
prioritária. Embora ocorram construções de
representações mentais sensoriais por parte do aprendiz, as mesmas não representam pré-requisito à compreensão do fenômeno/conceito abordado.
A idéia de representação utilizada
nesta categoria de análise é aquela contida
em EISENCK & KEANE (1991). Segundo
os autores (op. cit. p. 202) representação
é “qualquer notação, signo ou conjunto de
símbolos capaz de representar, mesmo na
ausência do representado, algum aspecto
do mundo externo ou de nossa imaginação”. De forma mais específica, a presente
categoria fundamenta-se no conceito de “representações internas” ou “representações
mentais”, que ocorrem no nível subjetivo da
cognição, do pensamento. Em outras palavras, tais representações referem-se às
formas em que codificamos características,
propriedades, imagens, sensações, etc, de
um objeto percebido ou imaginado, bem
como, de um conceito abstrato (EISENCK
& KEANE, 1991, p. 202).
A caracterização das linguagens
obedeceu à relação: linguagem = (estrutura
empírica) + (estrutura semântico-sensorial).
A avaliação de uma viabilidade ou dificuldade comunicacional levou em conta o fato
de uma dada linguagem ter ou não tornado
acessível ao aluno cego de nascimento os
significados de termologia por ela veiculados.
4.2. Categoria 2: Contexto
Refere-se a duas características
inerentes à presença do aluno com deficiência visual nas atividades: (a) espaço
instrucional que contemplou a presença
do aluno cego; e (b) nível de interatividade
desse espaço.
Espaço instrucional: episódio e
episódios particulares
Episódios: referem-se a espaços
instrucionais comuns aos alunos com e sem
12
deficiência visual, isto é, momentos em que
todos os discentes envolveram-se nas mesmas tarefas coordenadas pelos licenciandos. Uma característica fundamental dos
episódios é a não diferenciação de conteúdos, estratégia metodológica e recurso instrucional para aluno com e sem deficiência
visual.
Episódios particulares: dizem respeito aos espaços instrucionais que contaram apenas com a participação do aluno
cego, ou seja, ocorreram de forma separada e simultânea à aula dos alunos videntes.
Uma característica central desses episódios
é a diferenciação dos recursos instrucionais
utilizados, das estratégias metodológicas
empregadas e do conteúdo ou de sua abordagem.
Nível de interatividade: discurso interativo e discurso não-interativo: segundo
Mortimer e Scott (2002) a diferenciação entre os discursos interativo e não-interativo
se dá pela identificação do número de “vozes” que participam de uma determinada
relação discursiva.
Discurso interativo: ocorre com a
participação de mais de uma pessoa.
Discurso não-interativo: ocorre
com a participação de única pessoa.
O contexto é definido pela relação:
(espaço instrucional) + (nível de interatividade).
5. Análise dos dados
5.1. Classes que representam dificuldade e
viabilidade à inclusão do aluno com deficiência visual
Dificuldade de comunicação: foram
identificados 73 momentos comuns a todos
os alunos em que ocorreram essas dificuldades. Elas foram agrupadas em função de 8
linguagens: (1) áudio-visual interdependente/significado vinculado às representações
visuais (80,8%), (2) fundamental auditiva/
significado vinculado às representações
visuais (6,8%), (3) fundamental auditiva/
significado indissociável de representações
visuais (4,1%), (4) auditiva e visual independentes/significado vinculado às representações visuais: (2,7%), (5) tátil-auditiva interdependente/significado indissociável de
Interciência
& Sociedade
Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em
aulas de termologia
representações visuais (1,3%), (6) auditiva
e visual independentes/significado indissociável de representações visuais (1,3%),
(7) áudio-visual interdependente/significado
de relacionabilidade sensorial secundária
(1,3%) e (8) áudio-visual interdependente/
significado indissociável de representações
visuais (1,3%).
Exemplos dos significados geradores de dificuldades: (1) vinculados às representações visuais: transformação de escalas termométricas, dilatação térmica nos
líquidos e sólidos, relação matemática entre
trabalho, calor e energia interna, etc; (2) indissociáveis de representações visuais: luz
solar e fumaça, relação entre radiação e luz,
relação entre aquecimento e emissão de
luz, cor das chamas; (3) de relacionabilidade sensorial secundária: nomes de escalas
termométricas, datas de determinado acontecimento histórico, informações gerais.
Características marcantes das linguagens: (a) presença majoritária de dificuldades relacionadas à estrutura empírica
áudio-visual interdependente; (b) presença
majoritária de dificuldades relacionadas
aos significados vinculados às representações visuais; (c) presença majoritária de
dificuldades nos episódios não-interativos;
(d) foram verificadas, de forma majoritária, dificuldades provenientes da relação:
não-interatividade/linguagem de estrutura
empírica áudio-visual interdependente; (e)
significados indissociáveis de representações visuais e de relacionabilidade sensorial secundária participaram de forma minoritária do conjunto de dificuldades; (f) em
episódios particulares não foram verificadas
dificuldades; (g) a interatividade mostrou-se
fator minoritário de dificuldades; (h) foram
verificadas, de forma minoritária, dificuldades provenientes da relação: interatividade/
linguagens de estruturas empíricas fundamental auditiva e auditiva e visual independentes.
Viabilidade de comunicação: foram
identificados 368 momentos em que ocorreram viabilidades de comunicação (entre
episódios e episódios particulares). Elas
foram agrupadas em função de 10 linguagens: (1) fundamental auditiva/significado
indissociável de representações não-visuais
(44,0%), (2) fundamental auditiva/significa-
do vinculado às representações não-visuais
(14,9%), (3) auditiva e visual independentes/significado indissociável de representações não-visuais (9,2%), (4) auditiva e
visual independentes/significado vinculado
às representações não-visuais (7,0%), (5)
tátil-auditiva
interdependente/significado
vinculado às representações não-visuais
(6,2%), (6) fundamental auditiva/significado
de relacionabilidade sensorial secundária
(5,4%), (7) fundamental auditiva/significado
sem relação sensorial (4,6%), (8) auditiva
e visual independentes/significado de relacionabilidade sensorial secundária (3,5%),
(9) tátil-auditiva interdependente/significado
indissociável de representações não-visuais (3,2%) e (10) auditiva e visual independentes/significado sem relação sensorial
(1,6%).
Exemplos dos significados geradores de viabilidades: (1) indissociáveis de representações não-visuais: idéia de quente,
frio, sensação térmica, calor, etc; (2) vinculados às representações não-visuais: idéia
de temperatura como nível de agitação das
moléculas, calor como onda eletromagnética (referente à geometria da onda), etc; (3)
sensorialmente não relacionáveis: idéia de
calor como energia em trânsito entre corpos de diferente temperatura, relação entre temperatura e energia interna, etc; (4)
significados de relacionabilidade sensorial
secundária. Exemplos de tais significados
foram apresentados anteriormente.
Características marcantes das linguagens: (a) predominância de viabilidades
nos contextos comunicacionais comuns a
todos os discentes; (b) predominância de
viabilidades nos contextos comunicacionais
interativos; (c) predominância de viabilidades relacionadas ao emprego de linguagens
de estrutura empírica fundamental auditiva;
(d) linguagens de estruturas empíricas auditiva e visual independentes e tátil-auditiva
interdependentes foram identificadas de
forma minoritária; (e) predominância de viabilidades relacionadas à veiculação de significados indissociáveis de representações
não-visuais; (f) ocorrência significativa da
relação viabilidade/significado vinculado às
representações não-visuais; (g) ocorrência
minoritária de viabilidades relacionadas à
veiculação dos significados de relacionabiInterciência
& Sociedade
13
CAMARGO, E. P.
lidade sensorial secundária e sem relação
sensorial; (h) os episódios comuns a todos
os alunos proporcionaram condições para
a utilização de linguagens de estrutura empírica tátil-auditiva interdependente; (i) não
ocorrência da relação: viabilidade/estrutura
empírica áudio-visual interdependente.
Dificuldade experimento: foi identificada em uma ocasião. Refere-se à não
participação efetiva do aluno cego em atividade experimental. Esse tipo de dificuldade
esteve ligada à realização de experimento
demonstrativo, em episódios não-interativos
e com o emprego de linguagem áudio-visual interdependente/significado vinculado
às representações visuais. O experimento
realizado enfocou o estudo dos gases (experimento 1). Inicialmente, o licenciando
apresentou os equipamentos experimentais
à frente da sala, em seguida, realizou experimento demonstrativo sobre a dilatação
dos gases. Foram utilizados os seguintes
equipamentos experimentais: Erlenmeyer,
borrachas de conexão, bacia, gelo, copo e
detergente.
Viabilidade experimento: foi identificada em 12 ocasiões. Refere-se à participação efetiva do aluno com deficiência visual em atividades experimentais. Esse tipo
de viabilidade esteve ligada à realização de
experimentos participativos, em episódios
interativos e com o emprego de linguagens
de estruturas empíricas tátil-auditiva interdependente e fundamental auditiva. Os experimentos realizados foram os seguintes:
(2) diferença entre calor e temperatura, (3)
relação entre calor, temperatura e massa,
(4)equilíbrio térmico, (5) transferência de
calor por condução, (6 e 7) transferência de
calor por convecção, (8) transferência de
calor por radiação, (9) dilatação linear dos
sólidos, (10) dilatação térmica dos líquidos, (11) dilatação térmica dos gases, (12 e
13) dilatação superficial dos sólidos.
5.2. Classes que representam dificuldade
ou viabilidade à inclusão do aluno com deficiência visual
Dificuldade segregação: foi identificada em 10 ocasiões: diz respeito à criação,
no interior da sala de aula, de ambientes segregativos de ensino. Esses ambientes con-
14
taram com a participação apenas do aluno
com deficiência visual e de um licenciando
colaborador. Os referidos ambientes foram
constituídos devido às dificuldades oriundas da aula principal. Ocorreram prioritariamente durante episódios não-interativos e
com o emprego de linguagem áudio-visual
interdependente. Nos ambientes segregativos, temas discutidos durante a aula principal diferenciaram-se daqueles trabalhados
por todos os alunos. Em tais ambientes, os
diálogos ocorreram em voz baixa, o que explicita sua característica de “incômodo” à
aula principal.
Dificuldade operação matemática:
foi identificada em 3 ocasiões. Refere-se
à não participação efetiva do aluno com
deficiência visual em atividades que envolveram a efetuação de cálculos. Essas atividades foram realizadas em episódios não-interativos e com o emprego de linguagem
áudio-visual
interdependente/significado
vinculado às representações visuais. Fundamenta-se na relação triádica caracterizadora das operações matemáticas, ou seja,
simultaneidade entre raciocínio, registro
do cálculo e sua observação. Os cálculos
que representaram dificuldades foram os
seguintes: equação do trabalho termodinâmico, rendimento de máquinas térmicas e
relação entre calor e temperatura no ciclo
de Carnot.
Viabilidade apresentação de hipótese: foi verificada em 23 ocasiões. Sua
ocorrência esteve relacionada a episódios
interativos e ao emprego de linguagens de
estrutura empírica fundamental auditiva.
Como nesses ambientes os alunos com e
sem deficiência visual alternaram a função
de interlocutor, o discente cego teve condições de expressar-se. Essa viabilidade refere-se a situações em que o discente apresentou relações de causa e efeito para um
determinado fenômeno. Essas hipóteses
foram as seguintes: (1) explicação para
sensação térmica ao sair da piscina, (2) explicação para a variação da temperatura da
água, (3, 4) explicação para a variação de
temperatura em vasilhas cheia e pela metade de água, (5, 6) explicação para a evaporação da água, (7) explicação para o que
ocorrerá com a água aquecida na latinha e
na vasilha plástica, (8) explicação para o
Interciência
& Sociedade
Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em
aulas de termologia
esfriamento da água na latinha e o aquecimento da água na vasilha plástica, (9) explicação do derretimento da parafina no fio
aquecido, (10) explicação para o movimento do cata-vento próximo à chama, (11) explicação para o movimento ascendente da
gota de leite aquecida, (12) explicação para
a diferença de temperatura nas regiões laterais e acima da vela, (13, 14 ) explicação
para a dilatação do prego aquecido, (15)
explicação para a relação dilatação/aquecimento, (16) previsão para o que vai ocorrer
com um prego após sua temperatura diminuir, (17) (explicação para o que ocorrerá
com o prego colocado numa chapa metálica
aquecida, (18) explicação para o que ocorrerá com esfera de metal após ser aquecida, (19) explicação para a dilatação do gás
dentro de uma bexiga, (20) explicação para
a dilatação nos sólidos, (21, 22 ) explicação
sobre pressão atmosférica, (23) explicação
para a relação pressão/profundidade.
Viabilidade apresentação de modelos: foi identificada em 7 ocasiões. Refere-se à apresentação de modelos explicativos de fenômenos de termologia. Ocorreu
em episódios interativos e com o emprego
de linguagens de estrutura empírica fundamental auditiva. Os modelos apresentados
foram os seguintes: (1) modelo para a troca
de calor, (2) modelo para a transferência de
calor por radiação, (3) modelo de dilatação
dos sólidos, (4) modelo de dilatação dos gases, (5, 6, 7) modelo para pressão.
Em síntese, são apresentados os
quadros 2 e 3 . Esses quadros explicitam
as classes de dificuldades e viabilidades,
bem como, suas características intrínsecas
marcantes.
Quadro 2. Classes e características intrínsecas das dificuldades de inclusão.
Classe/dificuldade/
inclusão
Comunicação
Estrutura empírica
predominante
Áudio-visual
interdependente
Estrutura semântico-sensorial pre- Contexto predodominante
minante
Significados vinculados às representações visuais
Episódios não-interativos
Segregação
Áudio-visual
interdependente
Significados vinculados às representações visuais
Episódios não
interativos
Experimento
Áudio-visual
interdependente
Significados vinculados às representações visuais
Episódios não-interativos
Operação mateÁudio-visual
mática
interdependente
Fonte: elaborado pelo autor.
Significados vinculados às representações visuais
Episódios não-interativos
Quadro 3. Classes e características intrínsecas das viabilidades de inclusão.
Natureza/viabilidade/inclusão
Comunicação
Experimento
Apresentação de
hipótese
Apresentação de
modelo
Estrutura empírica
predominante
Fundamental auditiva.
Fundamental auditiva e Tátil-auditiva
interdependente
Fundamental auditiva
Fundamental auditiva
Contexto meEstrutura semântico-sensorial
todológico prepredominante
dominante
Significados indissociáveis de Episódios interepresentações não-visuais.
rativos
Significados indissociáveis de Episódios interepresentações não-visuais
rativos
Significado indissociável de
representações não visuais
Significado indissociável de
representações não-visuais
Episódios interativos
Episódios interativos
Fonte: elaborado pelo autor.
Interciência
& Sociedade
15
CAMARGO, E. P.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com as análises, foram
identificadas 4 classes de dificuldades de
inclusão. A classe “comunicação” (83,9%)
esteve relacionada majoritariamente a episódios não-interativos comuns a todos os
alunos. Centrou-se na veiculação, por meio
de linguagem de estrutura empírica áudio-visual interdependente, dos significados
vinculados às representações visuais. A
dificuldade “segregação” (11,5%) esteve diretamente relacionada à criação, no interior
da sala de aula, de episódios particulares
que contaram apenas com a participação do
discente com deficiência visual. Nesses episódios os temas trabalhados eram distintos
dos abordados na aula principal, que não
previa atendimentos particularizados. Sobre
a dificuldade “operação matemática” (3,4%)
cabem os seguintes comentários. Docentes de física dificilmente sabem como lidar
com esse tipo de situação. O problema envolve a relação triádica raciocínio/registro/
observação dos cálculos. Como o deficiente
visual não observa simultaneamente o que
escreve, a relação é destituída. É preciso o
investimento no desenvolvimento de materiais que proporcionem condições para que
este discente, de forma simultânea, registre, observe aquilo que registra e raciocine.
Já os experimentos que representaram dificuldade à inclusão de (B) (1,1%) foram os
visualmente demonstrativos e observáveis.
Durante a realização de tais experimentos,
não foram verificadas as interações discentes com e sem deficiência visual e discente
com deficiência visual/licenciando.
As viabilidades de inclusão também
se ligaram a 4 classes funcionais. Comunicação (89,7%), apresentação de hipótese
(5,6%), experimento (2,9%) e apresentação de modelo (1,7%). Essas viabilidades
ocorreram majoritariamente em episódios
interativos e com a utilização de linguagem
fundamental auditiva/significado indissociável de representações não-visuais. Em
outras palavras, as condições favoráveis à
inclusão foram verificadas em contextos interativos comuns a todos os discentes e ao
emprego de linguagem auditiva que veiculou significados não-visuais.
A partir dos padrões de viabilida-
16
des e dificuldades expostos, apresentam-se
4 recomendações para a inclusão do aluno
com deficiência visual em aulas de termologia: (1) destituição da estrutura empírica
áudio-visual interdependente caracterizadora de boa parte das linguagens empregadas em sala de aula; (2) criação de material
instrucional de interface visual e não-visual
(registros visuais e não-visuais sobrepostos); (3) interação entre discentes com e
sem deficiência visual, utilizando os materiais de interfaces visuais e não-visuais; (4)
reconhecer e explorar as potencialidades
comunicacionais das linguagens fundamental auditiva, auditiva e visual independentes
e tátil-auditiva interdependente.
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70, 1977.
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ZABALA, A. A prática Educativa: como ensinar. Porto Alegre, Artmed Editora S.A., 1998.
Interciência
& Sociedade
Análise das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em
aulas de termologia
Éder Pires de Camargo é Físico pela Universidade Estadual Paulista, Campus de Bauru/Sp, Doutor em Educação
pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é Professor Doutor do Departamento de Física e Química da Faculdade de Engenharia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho”, campus Ilha Solteira – SP-, e Programa de Pós-graduação em Educação para a Ciência (Área de Concentração: Ensino de Ciências) da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”,
Campus de Bauru/São Paulo/Brasil.
Interciência
& Sociedade
17
18
Interciência
& Sociedade
AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL DE FUNCIONÁRIAS DO
SERVIÇO DE NUTRIÇÃO DE UM HOSPITAL FILANTRÓPICO
GONÇALVES, Juliana Fermino
Universidade São Francisco (USF)
PIMENTEL, Gustavo Duarte
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
PEREIRA, Elaine Cristina Leite
Universidade Paulista (UNIP)
[email protected]
MOTA, João Felipe
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
Universidade São Francisco (USF)
[email protected]
RESUMO: Os objetivos do presente trabalho foram avaliar o consumo alimentar e o estado nutricional
de funcionárias do serviço de nutrição e dietética de um hospital filantrópico de Bragança Paulista/SP.
Metodologia: A amostra foi composta por 31 mulheres (42,8 ± 11,2 anos). A composição corporal foi
determinada por meio da medida de circunferências, peso e estatura. Os dados nutricionais foram coletados através de questionário de freqüência alimentar (QFA). Foi aferida a pressão arterial seguindo
as Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial. Os testes utilizados para determinar diferenças nas
variáveis com o estado nutricional foram ANOVA/MANOVA, seguido por Spearman para analisar as
associações entre a circunferência da cintura e a QFA. Adotando como significância p<0,05. Resultados: As voluntárias mostraram-se com excesso de peso e com circunferência da cintura e do quadril
aumentada. Em relação aos hábitos alimentares, foram observadas baixa ingestão de leite e derivados,
cereais integrais e fibras alimentares. Conclusão: Os resultados do presente estudo sugerem a necessidade de mudança do estilo de vida neste grupo populacional, visando prevenção de doenças crônicas
não transmissíveis e melhora na qualidade de vida.
PALAVRAS-CHAVE: Consumo alimentar, Estado Nutricional, Sobrepeso, Hipertensão, Qualidade de
vida.
ABSTRACT: The aim of this study were to evaluate the dietary intake and nutritional status of employees of nutrition and dietetics service of a philanthropic hospital in Bragança Paulista/SP. Methods: The
sample comprised 31 women (42,8 ± 11,2 years old). Body composition was determined through of measurement of circumference, weight and height. Dietary data were obtained through dietetic frequency
questionnaire (DFQ). Blood pressure measurement was made following the recommendations of Brazilian Guidelines on Hypertension. ANOVA/MANOVA was used to determine differences in variables with
the nutritional status and Spearman was used to analyse the association between waist circumference
and the DFQ. Adopting as significant p<0.05. Results: The volunteers showed up overweight and waist
and hip circumference increased. In relation to dietary habits were observed low intake of dairy products,
whole grains and dietary fiber. Conclusions: The results of this study suggest the need for a change of
lifestyle in this population, aimed at prevention of chronic diseases and improved quality of life.
KEYWORDS: Food Consumption, Nutritional Status, Overweight, Hypertension, Quality of Life.
Interciência
& Sociedade
19
GONÇALVES, J. F.; PIMENTEL, G. D.; PEREIRA, E. C. L.; MOTA, J. F.
1. INTRODUÇÃO
Em decorrência da transição nutricional e tecnológica o número de indivíduos
acima do peso não para de aumentar, sendo que na população adulta brasileira os índices superam 50% (IBGE, 2010), fazendo
com que haja maior preocupação com as
doenças crônicas não transmissíveis, como
hipertensão, obesidade e diabetes.
Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) demonstram que as
doenças crônicas não transmissíveis são
responsáveis por 58,5% dos óbitos e por
45,9% das morbidades em todo o globo
(MONTEIRO, 2005). Outros estudos também mostram que as doenças crônicas não
transmissíveis são caracterizadas por longo
período de latência, com evolução da doença, que podem levar o indivíduo a incapacidades e até ao óbito (MARIATH et al.,
2007).
O elevado número de indivíduos
obesos constitui problema de relevância
para saúde pública por estar associada direta ou indiretamente com o aumento da
incidência das doenças crônicas não transmissíveis e redução da expectativa de vida
(OLIVEIRA et al., 2006).
Paralelo a isto, sabe-se que os
indivíduos obesos apresentam maior relação síntese/oxidação de ácidos graxos intramuscular, o que evidencia ainda mais o
desenvolvimento das doenças crônicas não
transmissíveis (BERGGREN et al., 2004).
Assim, é importante avaliar as reservas corporais especificamente, o acúmulo de gordura na região abdominal, que
é considerado fator de risco grave para o
desenvolvimento de doenças crônicas não
transmissíveis, sendo associados também
à hipertensão arterial, dislipidemias, diabetes melittus tipo 2 e aceleração do processo
de aterosclerose (MARTINS & MARINHO,
2003; OLINTO et al., 2006; MARIATH,
2007).
Outro fator envolvido com o desenvolvimento das doenças crônicas não
transmissíveis e relacionado com o estado
nutricional é a ingestão alimentar inadequada. Segundo VALERO (2004), o método
mais utilizado para avaliação do consumo
alimentar é o questionário de freqüência de
20
consumo alimentar (QFCA).
MONTEIRO (2000), afirma que a
“dieta ocidental”, ou seja, rica em gorduras
(principalmente de origem animal), açúcar
e alimentos refinados, com redução de carboidratos complexos e fibras alimentares
está associada concomitantemente com o
aumento da obesidade.
Assim sendo, o objetivo deste trabalho foi avaliar o consumo alimentar e o
estado nutricional de um grupo de funcionárias do Serviço de Nutrição e Dietética
de um Hospital Filantrópico do Município de
Bragança Paulista/SP.
2. Metodologia
O estudo foi do tipo transversal
descritivo. Participaram do estudo 31 funcionárias do sexo feminino do Serviço de
Nutrição e Dietética de um Hospital filantrópico de Bragança Paulista/SP.
Todas as voluntárias receberam
orientações sobre as avaliações a que foram submetidos e assinaram um termo de
consentimento livre e esclarecido aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco.
2.1. Avaliação antropométrica
Para avaliação do peso corporal e
estatura foi realizada utilizando balança antropométrica tipo plataforma (Filizola®, Brasil, com precisão de 0,1 kg para peso e 0,1
cm para estatura). Para esta avaliação, as
voluntárias foram orientadas a usar roupas
leves e estar sem sapatos. Na avaliação da
estatura os indivíduos foram posicionados
descalços sobre a balança (superfície plana) em ângulo reto com a haste vertical, os
calcanhares deveriam estar juntos, tocando
a haste vertical do estadiomêtro, a cabeça
deve ficar ereta, com os olhos fixos à frente
(HEYWARD & STOLARCZYK, 2000).
Posteriormente, foi calculado o Índice de Massa Corporal (IMC) de acordo
com os critérios da Organização Mundial da
Saúde (OMS/WHO, 2002),
A circunferência da cintura (CC)
foi mensurada com fita milimétrica de metal
inextensível e inelástica, com precisão de
0,5 cm. A medida foi realizada no ponto méInterciência
& Sociedade
Avaliação do estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição de um hospital
filantrópico
dio entre o último arco intercostal e a crista
ilíaca (HEYWARD e STOLARCZYK, 2000).
Como valores de referência para CC, foram
utilizados os propostos pelo Internacional
Diabetes Federation (IDF) (ALBERT, 2005),
sendo considerada elevada a CC maior
igual que 80 cm para mulheres. Outro indicador antropométrico utilizado para classificação foi à relação cintura-quadril (RCQ).
A medida de circunferência de quadril foi
realizada na região de maior perímetro do
quadril entre a cintura e a coxa (CUPPARI,
2005) e foram considerados como alterados
relações acima de 0,85 (OMS, 2002).
não ingestão de bebidas alcoólicas e café
antes da aferição, sentar-se, ficar em repouso por cinco minutos, para então realizar a aferição da pressão arterial. Foram
feitas duas medidas, sendo estabelecida
como valor final a média entre elas.
Foram consideradas anormais
as medidas da pressão arterial acima de
130/85 mmHg, seguindo as normas estabelecidas pelo Terceiro Painel de Tratamento
do Adulto (National Cholesterol Education
Program’s Adult Treatment Panel III, 2001).
2.2. Avaliação do consumo alimentar
2.4. Análise Estatística
O consumo alimentar foi avaliado
por meio da aplicação de Questionário de
Freqüência Alimentar (QFA). Tal questionário já foi aplicado e validado para população
adulta, apresentando similaridades com a
população deste estudo (RIBEIRO et al.,
2006). Após a aplicação da QFA, alguns alimentos foram agrupados em variáveis representativas de uma dieta de boa ou má
qualidade. Além disso, este agrupamento
facilitou a análise dos dados, já que os 56
itens alimentares contidos no QFA ficaram
divididos em 14 grupos a serem analisados:
1) QFA Leite/derivados integrais; 2) QFA/
Leite/derivados desnatados; 3) QFA Ovos;
4) QFA Carnes; 5) QFA Peixes; 6) QFA Embutidos e enlatados; 7) QFA Óleos vegetais;
8) QFA Gordura animal; 9) QFA Petiscos
(pizzas, salgadinhos de pacote, lanches);
10) QFA Cereais integrais (fibras e cereais);
11) QFA Cereais não integrais (pão branco,
cereais refinados, tubérculos e raízes); 12)
QFA Vegetais e leguminosas; 13) QFA Frutas e sucos naturais e 14) QFA Doces em
geral (bolos, sorvetes, chocolates), onde
QFA refere-se à freqüência do consumo em
número de vezes por semana.
Foram empregadas provas estatísticas para análise quanto à simetria. As características gerais dos participantes foram
expressas em valores médios e desvios-padrão, mediana e P25-P75. Foi realizada estatística descritiva básica para o cálculo de
prevalências. ANOVA/MANOVA foi usado
para diferenciação dos grupos, divididos de
acordo com estado nutricional e correlações
de Spearman, com o intervalo de confiança
de 95%, para verificar as associações entre
a CC e freqüência de consumo alimentar.
Valores de p<0,05 foram considerados estatisticamente diferentes. Todas as análises
foram realizadas utilizando o software STATISTICA® for Windows (version 5.1, Statsoft, Tulsa, USA).
2.3. Avaliação da pressão arterial
A pressão arterial foi aferida com
esfignomanômetro digital da marca BD® por
avaliador treinado, seguindo as normas estabelecidas pela IV Diretrizes Brasileiras de
Hipertensão Arterial (2002).
As voluntárias foram orientadas a
3. Resultados
Foram avaliadas 31 funcionárias,
com idade média de 43 anos. Quanto ao
estado nutricional foi verificado que 75%
das participantes apresentavam excesso
de peso, ou seja, 23% sobrepesos e 52%
obesas.
A prevalência de adiposidade abdominal foi observada na maioria das funcionárias avaliadas. De acordo com a CC,
77% das funcionárias apresentavam circunferência alterada. A prevalência de hipertensão arterial na amostra estudada foi de
30%. Das funcionárias que apresentaram
hipertensão, 9% foram classificadas como
eutróficas, 27% sobrepeso e 63% obesidade. Quando associada à CC alterada, 90%
Interciência
& Sociedade
21
GONÇALVES, J. F.; PIMENTEL, G. D.; PEREIRA, E. C. L.; MOTA, J. F.
apresentavam hipertensão. Quando associada às mulheres sobrepeso ou obesas,
91% apresentaram hipertensão. As características gerais da amostra podem ser ob-
servadas na Tabela 1.
Tabela 1. Caracterização geral da amostra (n=31)
*IMC: Índice de Massa Corporal; QFA: Freqüência do consumo em vezes por semana.
Após a divisão de acordo com o
IMC foi verificado que o grupo classificado
como obesas tendeu a relatar menor consumo de leite e derivados integrais (p=0,06),
ovos (p=0,07) e gordura animal (p=0,02),
além de tender a relatar maior consumo de
cereais integrais (p=0,06) e vegetais e leguminosas (p=0,06) (Tabela 2).
Tabela 2. Comparação das variáveis alimentares em relação ao Índice de Massa Corporal, dados
apresentados em média e desvio-padrão (mediana com semi-amplitude interquartílica), (n=31)
22
Interciência
& Sociedade
Avaliação do estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição de um hospital
filantrópico
Tabela 2. Continuação
QFA: Freqüência do consumo em vezes por semana. QFA: Questionário de Freqüência Alimentar
(vezes por semana). †ANOVA, p<0,05.
Na Tabela 3 foram apresentadas
as correlações entre a CC e a freqüência
de consumo alimentar. Houve correlação
negativa entre a CC e QFA gordura animal
(r=-0,38, p=0,03) e positiva com QFA vegetais e leguminosas (r=0,38, p=0,03).
Tabela 3. Correlações entre a circunferência da cintura e a freqüência de consumo alimentar (n=31).
QFA: Questionário de Freqüência Alimentar (vezes por semana); †: correlação linear de Spearman;
ns: não significativo.
4. Discussão
Com base nos dados antropométricos obtidos, podemos observar alta prevalência de sobrepeso e obesidade (75%)
no grupo estudado, refletindo o quadro da
transição nutricional. Estudos mostram que
a prevalência de sobrepeso e obesidade é
cada vez mais preocupante. GIGANTE et
al. (1997) constataram, em seu estudo que
21% da população estudada apresentaram
obesidade, 40% com sobrepeso e que a
prevalência da obesidade mostrou-se mais
elevada em mulheres.
Já em relação à CC, 77% das mulheres apresentaram esse indicador elevado. Segundo OLINTO et al. (2006), o aumento da obesidade abdominal associado
à idade nas mulheres têm sido apontados
em vários estudos com a população brasileira. Outro indicador antropométrico que
apresentou alta prevalência de alteração foi
Interciência
& Sociedade
23
GONÇALVES, J. F.; PIMENTEL, G. D.; PEREIRA, E. C. L.; MOTA, J. F.
a relação cintura-quadril (58%).
A pressão arterial mostrou-se
normal na maioria da população estudada (70%). A hipertensão foi observada em
30% da população estudada estando associada somente aos altos valores de CC e
IMC, apresentando índices de 90% e 91%,
respectivamente. Em estudo realizado por
SARNO & MONTEIRO (2007), com homens e mulheres, foi verificada associação
positiva entre pressão arterial, CC e IMC.
GUS et al. (1998) verificaram que as medidas de CC e RCQ estiveram associadas à
hipertensão arterial.
A OMS afirma que a associação
entre hipertensão e obesidade é bem estudada e documentada. Estudos mostram que
as pressões sistólica e diastólica aumentam
com a elevação do IMC e que os indivíduos
obesos apresentam maior risco de desenvolver a hipertensão quando comparado
aos indivíduos magros (STAMLER et al.,
1980; STAMLER et al., 1978). A duração da
obesidade aumenta o risco de desenvolver
a hipertensão, especialmente em mulheres,
e a conseqüente perda de peso leva a redução da pressão sangüínea (OMS/WHO,
2003).
CARNEIRO et al. (2003), em estudo com predominância de mulheres (432
mulheres e 67 homens), verificou que a
maior prevalência de hipertensão arterial
estava entre os indivíduos com elevado
IMC. Assim, os autores sugeriram que a
obesidade apresentou impacto muito mais
evidente sobre a hipertensão arterial quando comparado a outros fatores de risco
para doenças cardiovasculares, como dislipidemia e intolerância à glicose. Sabe-se
que as doenças crônicas também levam a
inabilidade física, proporcionando maior absenteísmo, prejuízo na qualidade do serviço
prestado e maiores gastos para empresa.
Em estudo longitudinal, os pacientes identificados como moderadamente
hipertensos foram acompanhados por 10
anos, sendo estabelecida mudança dietética positiva associada à interrupção do tabagismo e aumento da atividade física. Os resultados foram redução do peso corporal e
da pressão arterial (STAMLER et al., 1980).
Os resultados obtidos pelo QFA no
presente estudo podem ter sido subestima-
24
dos, devido à população estudada trabalhar
em um Serviço de Nutrição e Dietética e ter
noções de como deve ser uma alimentação
saudável. Segundo SCAGLIUSI & JUNIOR
(2003), subestimações podem ocorrer, se
os indivíduos apresentarem maior consciência sobre alimentação.
Segundo DRUMMOND et al.
(1998), muitos estudos que utilizam diferentes técnicas de inquéritos apresentaram
subestimação nos relatos de consumo, tanto em homens como em mulheres, porém
essa subestimação é encontrada principalmente em indivíduos obesos e do sexo feminino em sua maioria. No presente estudo,
a população é somente do sexo feminino e
a subestimação dos dados fica bem descrita quando analisada as correlações estatísticas. Além disso, a CC apresentou correlação negativa com o consumo de alimentos
ricos em gordura animal e positiva com o
consumo de alimentos como vegetais e leguminosas.
Segundo SCAGLIUSI & JUNIOR
(2003), a dificuldade em se mensurar o
consumo alimentar de forma acurada é uma
das limitações para a detecção de associações entre a ingestão alimentar e o risco de
desenvolvimento de doenças. O autor ainda
afirma que isso acontece devido aos métodos para avaliação da ingestão alimentar
dependerem do relato individual.
Vários indicadores para a subestimação já foram estudados, porém a obesidade é o que melhor se relaciona com a
subestimação alimentar (Taren et al., 1999).
SCAGLIUSI & JUNIOR (2003) afirmam que
o gênero com tendência à subestimação
é em sua maioria do sexo feminino. Ainda
existem poucos estudos nacionais disponíveis sobre a avaliação do consumo alimentar da população brasileira (MARCHIONI et
al., 2003), o que dificulta a comparação entre os dados deste estudo.
Sabemos que o alto consumo de
alimentos ricos em gordura animal, doces
em geral e baixo consumo de cereais integrais, contribuem para o excesso de peso e
de seus indicadores antropométricos como
o IMC, a CC e a RCQ. (MONTEIRO, 2000).
Conclui-se que o excesso de peso
tem alta prevalência no grupo estudado,
superando o número de eutróficas. Fator
Interciência
& Sociedade
Avaliação do estado nutricional de funcionárias do serviço de nutrição de um hospital
filantrópico
preocupante, pois 91% das hipertensas
apresentavam IMC acima de 25kg/m2. Ao
considerar que estas funcionárias trabalham em estabelecimento de nutrição e
dietética, foi observado que os resultados
obtidos com os dados do QFA foram subestimados, pois não apresentaram valores de
significância entre alimentos envolvidos potencialmente com o aumento do sobrepeso
e obesidade.
Ao contrário, os indivíduos obesos
apresentaram maior consumo de vegetais,
leguminosas, cereais integrais e, menor
consumo de gordura animal. Acredita-se
que isso tenha ocorrido devido às funcionárias trabalharem em um serviço de nutrição
e dietética e terem as mínimas noções de
como deve ser uma alimentação saudável.
Assim sendo, incentivos à mudança do estilo de vida devem ser implementados com o intuito de melhora na qualidade
de vida, podendo repercutir em melhor desempenho no trabalho. Sugerimos que esta
área de pesquisa seja explorada para se
determinar o perfil de saúde de funcionários
e traçar estratégias de promoção à saúde
no próprio ambiente de trabalho.
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Juliana Fermino Gonçalves, Nutricionista graduada pela Universidade São Francisco (USF), Bragança Paulista/
SP (2007).
Gustavo Duarte Pimentel, Nutricionista pela UNIMEP (2006), especialista em Cuidados Nutricionais do Paciente
e do Desportista pela UNESP. Mestrando em Fisiologia da Nutrição da UNIFESP/SP.
Elaine Cristina Leite Pereira, Fisioterapeuta pela UFSCar (1997). Doutora em Anatomia pela UNICAMP (2005).
Professor titular da Universidade Paulista-Jundiaí/SP. Coordenadora da Especialização em Fisioterapia Esportiva
(CEFAI-IBRAMED)-Amparo/SP, Coordenadora Pedagógica do Instituto de Nutrição e Ciências da Saúde (INECS)-Campinas/SP.
João Felipe Mota, Nutricionista pela PUC-Campinas (2002), Especialista em Bioquímica Nutricional e Dietética
(UNESP) e em Cuidados Nutricionais ao Paciente Desportista (UNESP), Mestre em Patologia (UNESP). Doutorando em Fisiologia da Nutrição (UNIFESP/EPM). Coordenador do Curso de Nutrição da Universidade São Francisco
(USF)-Bragança Paulista, Diretor do Instituto de Nutrição e Ciências da Saúde (INECS)-Campinas/SP.
26
Interciência
& Sociedade
CAPITALISMO E TECNOLOGIAS:
implicações para o trabalhador
FERREIRA, Simone
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
[email protected]
SARTORI, Ademilde Silveira
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
[email protected]
RESUMO: O presente trabalho apresenta algumas considerações sobre o capitalismo, as tecnologias
e suas implicações para a vida do trabalhador. Discutem-se visões e conceitos sobre o trabalho e sua
organização. Além disso, traça-se um panorama sobre as mudanças ocorridas na sociedade e na
organização do trabalho quando o capitalismo alia-se às tecnologias.
PALAVRAS-CHAVE: Trabalho, Tecnologias, Capitalismo.
ABSTRACT: This paper presents some considerations about capitalism, technology and its implications
for the lives of workers. We discuss visions and concepts about work and your organization. Also, draw
a picture about the changes in society and the organization of work when capitalism joins technologies.
KEYWORDS: Labor; Technologies, Capitalism.
1. INTRODUÇÃO
A acelerada mudança em todos os
níveis da humanidade nos leva a ponderar sobre o fato de que as transformações
econômicas, políticas e sociais são irreversíveis e as exigências do mundo moderno
trazem conseqüências que nem sempre se
pode prever. O trabalho tornou-se central
nas nossas vidas, o capitalismo globalizou-se e as tecnologias trouxeram um avanço
tecnológico sem igual.
Neste sentido, é importante uma
análise (ainda que breve) destas questões,
por isso, as páginas que seguem tratam do
capitalismo, das tecnologias e de suas implicações para a vida do trabalhador na sociedade contemporânea, sem a pretensão
de dar respostas para todas as questões
levantadas.
2. O trabalho e o trabalhador
Nossa vida gira basicamente em
torno das nossas relações afetivo-sociais e
profissionais. Dentre estas, não é novidade
que o trabalho tem grande representatividade, pois nos confere uma identidade social
na medida em que somos aquilo que fazemos. Contudo, isto nem sempre foi assim.
Benjamin citado por Matos (2008) esclarece
que na Grécia antiga o trabalho era reprovado e proscrito; embora fosse executado
essencialmente por mãos escravas, era
condenado principalmente por revelar uma
aspiração vulgar por bens terrenos (riqueza). Tudo o que era artesanal, ou envolvia
o trabalho manual, trazia vergonha e deformava ao mesmo tempo o corpo e a alma.
Ainda hoje para muitos trabalhadores o trabalho é apenas um sacrifício
necessário para garantir a sobrevivência
e não passa de uma atividade degradante
uma vez que ele não é visto somente enquanto condição ontológica do ser humano,
mas também, enquanto condição alienante
e degradante o que tem implicações diretas
na subjetividade do trabalhador e no seu
engajamento com a tarefa que realiza.
Para Dejours (2009) trabalho é
aquilo que implica: gestos, saber-fazer, um
engajamento do corpo, a mobilização da inInterciência
& Sociedade
27
FERREIRA, S.; SARTORI, A. S.
teligência, a capacidade de refletir, de interpretar e de reagir às situações; é o poder
de sentir, de pensar e de inventar etc. Para
ele o trabalho não é em primeira instância a
relação salarial ou o emprego; é o «trabalhar», isto é, um certo modo de engajamento da personalidade para responder a uma
tarefa delimitada por pressões (materiais
e sociais). Em outros termos, é o objetivo
(fazer algo/ação) e o subjetivo (inteligência/
pensamento/reflexão) interligados.
O trabalho gera no trabalhador o
sentimento de ser útil. Diz Minicucci (1982)
que ele dá a sensação de pertencer à sociedade, conduz a pessoa a fazer amigos,
proporciona o sentimento de ter um propósito na vida e, uma das mais fortes necessidades de um homem é sentir-se importante
e que realiza algo de valor.
Para as autoras Navarro e Padilha
(2007) o trabalho é central na vida das pessoas e dá-se não só na esfera econômica,
na medida em que ele é a fonte de renda
da maioria da população mundial, como
também na esfera psíquica por ser uma importante fonte de saúde psíquica e sua ausência, pelo desemprego ou pela aposentadoria, é causa de abalos psíquicos.
Abalos como a insegurança que
o desemprego gera frente às questões objetivas que envolvem a sobrevivência do
trabalhador, suas necessidades básicas
(alimentação/moradia). Abalos na sua subjetividade (auto-estima e necessidade de
pertencimento/reconhecimento), pois ao
cessarem as atividades profissionais em
função da aposentadoria instala-se, para
os indivíduos que não tiveram tempo e nem
a oportunidade de readaptarem-se a esta
nova fase de suas vidas, a falta de sentido,
o isolamento, a tristeza e não raro a depressão. Daí a importância dos programas de
preparação para a aposentadoria que permitem uma reflexão sobre as novas possibilidades de ocupação e convivência social.
Navarro e Padilha (op. cit.) mencionam ainda que é por meio do trabalho que o
homem torna-se um ser social, ele é central
na vida do ser humano e esta centralidade
está apoiada em idéias marxistas. Assim,
o trabalho é compreendido como momento decisivo na relação do homem com a
natureza, pois ele modifica a sua própria
28
natureza ao atuar sobre a natureza externa quando executa o ato de produção e de
reprodução. Nesse sentido, o trabalho é um
ato que pressupõe a consciência e o conhecimento dos meios e dos fins aos quais se
pretende chegar. Pode-se afirmar que não
há trabalho humano sem consciência (enquanto finalidade), na medida em que todo
trabalho busca a satisfação de uma necessidade.
Em outras palavras, seu fazer, sua
ação, tem para o trabalhador um significado
que lhe é particular, seja ele objetivo como
a satisfação de necessidades básicas, seja
subjetivo, como o orgulho pelo reconhecimento de um feito. E quando executa uma
atividade sem conferir-lhe um significado
(finalidade) corre o risco de viver uma vida
profissional sem sentido.
Comparando o trabalho no mundo
contemporâneo ao da Idade Média, Milan
Kundera, citado por Matos (2008, p. 251252) reconhece no presente o tédio, pois
ofícios de outrora, em parte, não poderiam
ser concebidos sem um apego apaixonado:
os camponeses por sua terra; o carpinteiro
era o mágico das belas mesas, os sapateiros conhecendo de cor os pés de todos os
aldeões; os guardas-florestais; os jardineiros. O sentido da vida estava em suas oficinas e campos, cada oficio criara sua própria
maneira de ser.
Esta maneira de ser nada mais era
do que a identificação e a identidade que
o ofício conferia ao trabalhador, mas houve modificações nesta relação no séc. XIX,
pois a Revolução Industrial trouxe como
conseqüência a necessidade de transformar os seres humanos em máquinas e isto,
aos poucos, fez com que se perdesse a visão humana do trabalho. Ele passou a ser
visto não somente como uma condição inerente ao homem, mas também, como uma
condição degradante através de um trabalho alienado.
Neste sentido, Minicucci (op. cit.)
afirma que a subdivisão do trabalho trouxe
vantagens e desvantagens para o trabalhador como, por exemplo, aborrecimentos,
perda do sentimento da importância pessoal, do orgulho de estar fazendo algo importante. Para o autor o trabalho ao longo
do tempo passou por importantes transforInterciência
& Sociedade
Capitalismo e tecnologias: implicações para o trabalhador
mações principalmente com a Revolução
Industrial que tornou a vida mais fácil para
nós, mas com sacrifício das recompensas
(lazer), satisfações (prazer) e relacionamento humano no trabalho (convivência).
De Masi (2000) faz uma crítica à
sociedade industrial quando refere que ela
não só fez com que, para muitos, se tornasse inútil o cérebro como fez com que
somente algumas partes do corpo fossem
utilizadas. Para ele, isto era diferente na
sociedade rural na qual o camponês, para
usar a enxada ou a pá, assim como o pescador para pescar, além de utilizar o corpo
inteiro, usava talvez um pouco mais de cérebro.
Mas não foi afetado apenas o trabalhador operário por processos advindos
da era industrial e do capitalismo. Afirma-nos Matos (op.cit) que na contemporaneidade os indivíduos não são mais sequer engrenagens na máquina de produção, mas
compõem um mercado para o consumo,
de tal forma que a modelação dos comportamentos visando o mercado implica uma
destruição programada do savoir-vivre (saber-viver). E, assim como o operário submetido à máquina perde seu savoir-faire
(saber-fazer), reduzindo-se à condição de
proletário, da mesma forma, o consumidor,
padronizado em seus comportamentos de
consumo pela fabricação artificial de desejos, perde seu savoir-vivre.
É ainda esta autora quem nos diz
que a produção em excesso de mercadorias com respeito à necessidade do mercado e não do consumidor, corresponde a um
estado de exasperação das carências reais
da sociedade e a uma nova modalidade de
exasperação de aturdimento da mente, conseqüência do capitalismo contemporâneo e
da cultura que ele engendra.
Não há duvidas de que o capitalismo, que por definição “significa mudança constante e desenvolvimento” (WOOD,
pág.9), e os seus excessos geram dicotomias.
Navarro e Padilha (op. cit.) dizem
que o capitalismo traz consigo uma série
de contradições. Ao mesmo tempo em que
o trabalho é a fonte de humanização e é o
fundador do ser social, sob a lógica do capital se torna degradado, alienado, estranha-
do. O trabalho perde a dimensão original e
indispensável ao homem de produzir coisas
úteis (que visariam satisfazer as necessidades humanas) para atender as necessidades do capital.
Cafiero (1985, p. 97 e 98) menciona com muita propriedade que:
A lei na sociedade capitalista, segundo
a qual uma massa sempre crescente de
meios de produção mobiliza progressivamente uma quantidade sempre menor de
força de trabalho, quer dizer que quanto
maior a produtividade do trabalho, tanto
maior a pressão dos trabalhadores sobre
os seus empregos e, portanto, tanto mais
precária sua condição de existência, ou
seja, as condições para a venda da própria força para aumentar a riqueza alheia
ou a expansão do capital.
Seria então o capitalismo o grande responsável por produzir um trabalhador
degradado, explorado? O que está posto
na sociedade é que o trabalho juntamente
com o capitalismo são os grandes algozes
do trabalhador, quando, na verdade, sua
degradação está muito mais relacionada às
condições desumanas do trabalho a que se
submeteram e ainda são submetidos muitos trabalhadores e ao modo como o trabalho é organizado.
Sobre a organização do trabalho
Dejours (1992), esclarece que ela é concebida por um serviço especializado da empresa, estranho aos trabalhadores, choca-se frontalmente com a vida mental e, mais
precisamente, com a esfera das aspirações, das motivações e dos desejos. Isso
porque, em muitos casos, essa organização
do trabalho não é deixada a cargo do trabalhador, mas é algo que ele tenha que se
adaptar por ‘imposição’ da empresa e que
acaba confrontando com suas aspirações e
desejos.
Para esse autor, o sofrimento começa quando a relação homem-organização do trabalho está bloqueada, quer dizer,
quando o trabalhador não consegue fazer
modificações neste trabalho. Ele afirma
que não são tanto as exigências mentais
ou psíquicas do trabalho que fazem surgir
o sofrimento, mas sim esse bloqueio na sua
organização.
Ou seja, sua impossibilidade de
Interciência
& Sociedade
29
FERREIRA, S.; SARTORI, A. S.
participar de modo mais ativo e amplo nas
decisões que influenciam diretamente sua
vida profissional implica na frustração de
onde resulta o descontentamento, a desmotivação. Neste sentido, nossa atenção
deve voltar-se também para a organização
do trabalho e não somente para o trabalho
enquanto atividade física/intelectual, pois o
contexto e a sistematização das atividades
também interferem no modo de funcionamento (modus operandi) do trabalhador e
consequentemente em sua subjetividade.
3. Reflexões sobre as tecnologias
Também é preciso refletirmos em
torno da introdução da tecnologia, mais
especificamente da eletrificação que marca mudanças significativas na organização
do trabalho, Benjamim, citado por Matos
(2008, p.255) não hesita em indicar as patologias que surgiram a partir da luz elétrica,
considerando o mundo do capital um asilo
de cegos e loucos: “Vamos aos fatos. A
luz jorrando da eletricidade serviu primeiro
para iluminar as galerias subterrâneas das
minas; no dia seguinte as praças e as ruas;
depois as fábricas, as oficinas, as lojas os
espetáculos, os quartéis; e, finalmente as
casas de família”.
Pode-se perceber aí a mão-dupla
da eletrificação que além de trazer luz e
outras facilidades para a sociedade trouxe
também a produção desmedida e o comprometimento do repouso do trabalhador,
neste sentido, Matos (op. cit., p. 256) menciona:
A economia, em sua forma atual de acumulação (cuja infra-estrutura são as nanotecnologias, a microeletrônica e suas
inovações), exige a extensão e a intensificação da atividade até os últimos limites
físicos e biológicos do indivíduo. Razão
pela qual, com a eletrificação, o dia iluminado terá vinte e quatro horas, estabelecendo-se o estresse como modo de vida,
seja para aqueles ligados a um trabalho,
seja para a massa crescente de trabalhadores precários e desempregados.
Aliando estas questões apontadas
com o modo de organização da vida pessoal do trabalhador percebe-se que raramente
sobrava tempo para que ele pudesse pensar e refletir sobre o que se estava fazendo.
Fato que se repete ainda hoje entre muitos
trabalhadores que se deixam absorver por
tudo isto, anulando uma parte que é somente do próprio homem, sua subjetividade. A
subjetividade aqui não é entendida apenas
como a maneira com que o sujeito, o trabalhador, vive e dá sentido às suas experiências de trabalho, mas num sentido mais
amplo e profundo.
Subjetividade deve ser entendida
como o exercício da escolha daquilo que se
quer ou não para a sua vida. O autor De
Masi (op. cit.) a conceitua como um fenômeno complexo, relacionando-a com autonomia de julgamento, onde o ser humano
pode permitir-se uma escolha baseada em
suas próprias necessidades e recursos, e
não no fato de pertencer a algum grupo.
Resumindo, subjetividade e escolha estão intimamente interligadas e sendo o
homem um ser auto-determinante1, isto significa que ele pode escolher, o que contraria a tese psicanalítica de que ele é apenas
instinto e pulsão. Se ele pode fazer escolhas por que alguns escolhem sentirem-se
vitimas atacadas em sua subjetividade pelo
capitalismo e pelas tecnologias? Isto requer
mais estudos, mas uma saída para que os
trabalhadores não coloquem em risco sua
subjetividade é perceber os instrumentos
de manipulação que estão presentes na
atual sociedade e buscar conhecimento e
criar estratégias para superá-los.
Por falarmos em criar, observamos
que a palavra tecnologia possui sua raiz
no verbo grego tictein que significa criar,
produzir. Há muito o homem cria, produz e
inventa, portanto, há uma ligação histórica
entre homem e tecnologia.
Conta a lenda grega que Prometeu, Deus do Fogo, revoltado com Zeus
pela onipotência deste, confiou o fogo aos
humanos para garantir-lhes o conhecimento, o poder sobre a matéria e o saber técnico. A simbologia prometêica traz à tona a
reflexão sobre a relação dos homens com
Autodeterminação baseia-se na concepção do ser humano como organismo ativo, dirigido para o crescimento. Para saber
mais acesse: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-79722004000200002
1
30
Interciência
& Sociedade
Capitalismo e tecnologias: implicações para o trabalhador
a técnica e seus resultados nos modos de
produção material e simbólica da sociedade ao mostrar que desde os primórdios, as
possibilidades de uso, reinvenção e construção de sentidos na relação ontológica do
homem com o mundo têm se estabelecido
pela mediação tecnológica. (ALVES ; MANCEBO, 2006).
A história da humanidade é permeada por invenções constituindo-se em
diferentes formas de expressão da atividade humana justamente porque o ser humano sente a necessidade de criar a todo
instante. E o século XII d.C foi um período
em que começou uma grande explosão de
invenções tecnológicas similar à ocorrida
na Mesopotâmia quatro mil anos antes. De
acordo com De Masi (op. cit), no referido
século inventou-se a pólvora, redescobriu-se o moinho d’água, difundiu-se a bússola
e os arreios modernos dos cavalos. O cavalo, com o novo arreio, rendia mil vezes mais
do que com o velho tipo de freio. Foram
inventados os óculos, que logo duplicam a
vida intelectual da humanidade.
Uma invenção tecnológica que merece destaque é o relógio e, neste sentido,
Postman (1994) afirma que sem o relógio
teria sido impossível haver capitalismo.
Ele teve sua origem nos mosteiros beneditinos dos séculos XII e XIII. Foi inventado
por homens que queriam se dedicar mais
rigorosamente a Deus, porém, diz o autor,
terminou como a tecnologia de maior uso
para os homens, que desejavam dedicar-se
a acumulação de dinheiro.
Hoje somos escravos desta tecnologia chamada relógio que, embora seja
aparentemente simples, controla tudo e todos e personifica o tempo, o grande regulador das nossas vidas. E por falarmos em
tempo...
Durante muito tempo a tecnologia fez com
que deixassem de existir alguns empregos
para os seres humanos, mas ao mesmo
tempo criou outros e em maior proporção.
Para projetar e construir máquinas eram
necessários, de fato, outros tipos de trabalhadores. Além disto, a riqueza produzida graças às máquinas era reinvestida na
criação de outras fábricas ou usada para
o consumo. Em ambos os casos, direta
ou indiretamente, contribuíam para au-
mentar a oferta de emprego. Porém, com
o advento da eletrônica, sobretudo com a
introdução dos microprocessadores, este
equilíbrio se rompeu e os empregos que
desapareceram com o uso da tecnologia
não são mais compensados por novos
investimentos e novos tipos de emprego
(DE MASI, 2000. pág. 104 - 105).
Será possível afirmar que as tecnologias criam então um novo tempo, um
novo modo de produção, um novo trabalhador e sociedade? Trazemos o seguinte
pensamento para auxiliar na reflexão desta
questão:
O velho fordismo usava a linha de montagem para substituir os altos custos do
trabalho artesanal especializado e para
estreitar o controle sobre o processo do
trabalho pelo capital, com o objetivo óbvio
de extrair mais valor do trabalho. Hoje, as
novas tecnologias são utilizadas para o
mesmo fim: tornar os produtos mais fáceis
e mais baratos para a montagem (...), controlar o processo de trabalho, eliminar ou
combinar várias especialidades tanto no
setor de serviços como no de manufatura,
substituir os altos por baixos salários, promover o “downsizing”(enxugamento) dos
trabalhadores de modo geral – sempre
tendo em vista a extração de mais valor
do trabalho (WOOD, p.10).
Em resumo, Wood diz que as tecnologias permitem que a lógica da velha
economia da produção de massa se diversifique e se estenda ao atingir setores inteiramente novos e trabalhadores que não
afetava antes. Uma vez que todos direta ou
indiretamente são atingidos por este modo
de produção. É o que a autora chama de
universalização, ou seja, é a totalização
do próprio capitalismo, de suas relações
sociais, suas leis de movimento, suas contradições – a lógica da mercantilização, da
acumulação, da maximização dos lucros
penetrando todos os aspectos de nossas
vidas.
Certamente, por isso, Wood afirma
que as novas tecnologias deram origem a
um novo tipo de sistema capitalista, com
linhas de montagem globais com uma burguesia internacional e um capital de alta e livre mobilidade que pode chegar a qualquer
parte do mundo onde o trabalho é barato,
Interciência
& Sociedade
31
FERREIRA, S.; SARTORI, A. S.
cativo e abundante, ultrapassando os estados nacionais e deixando no seu rastro uma
classe operária sem poder, pois quanto
mais há a internacionalização da produção
mais a classe operária torna-se fragmentada e mais poder transfere para uma classe
capitalista transnacional.
Estas considerações chamam a
atenção para o fato de que as tecnologias
estariam então a serviço do capitalismo e
contribuindo para sua globalização. Isto nos
mostra que as tecnologias não são neutras.
Novais e Dagnino (2010) também alertam
para a tecnologia como o meio para se atingir fins, ou seja, ciência aplicada em equipamentos para aumentar a eficácia da produção de bens e serviços. Andrew Feenberg,
citado por estes dois autores, menciona que
a tecnologia que nos é apresentada como
politicamente neutra, eterna, a-histórica, sujeitas valores estritamente técnicos e, portanto, permeada pela luta de classe, é uma
construção histórico-social.
Contudo, há outro aspecto das tecnologias que cabe refletirmos, uma vez que
elas também podem auxiliar no resgate no
humano, do subjetivo. Vejamos:
Nós vivemos construindo para nós mesmos combinações e arranjos pessoais.
Por um motivo objetivo: a tecnologia nos
permite isto. E também por motivo subjetivo: todos nós somos mais viajados, mais
lidos, logo temos melhores condições para
nos orientarmos sozinhos. Talvez seja um
fenômeno oscilante, mas, se o observarmos num intervalo de vinte e trinta anos,
constatamos que certamente está em ascensão. O homem sempre oscilou entre
dois desejos: o de se distinguir e o de homogeneizar. Após duzentos anos de homogeneização forçada, industrial, hoje a
tecnologia nos permite diferenciar-nos. E
é o fazemos ( DE MASI, 2000, p. 116/117).
E podemos acrescentar que permitem proximidade também, uma vez que
os avanços tecnológicos na área da comunicação, por exemplo, criam cada vez mais
possibilidades de diálogo entre as pessoas.
Nesta perspectiva as tecnologias parecem
auxiliar nosso modo de vida, sejam nos
conferindo facilidades ao tornar nossa vida
mais confortável, sejam permitindo um (re)
encontro do ser humano com o outro, com
32
ele próprio e com sua subjetividade.
Seguindo a visão de De Masi (op.
cit.) ele afirma que a tecnologia é uma oportunidade, não é uma obrigação. E diz ainda que quem se perturba diante dela pode
limitar-se a não usá-la, mas não tem o direito de impedir seu uso pelos outros. Por
exemplo, se alguém tem medo de andar de
avião, nem por isso pode proibir a aviação.
Mas isto não significa dizer que as
tecnologias estão livre das influências políticas, culturais e históricas e justamente por
isso, é importante desenvolvermos nossa
capacidade de contextualizarmos e de fazermos a crítica, em termos de meios e fins,
das tecnologias.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao tratarmos do capitalismo, das
tecnologias e suas implicações para a vida
do trabalhador pode-se notar que a produção desenfreada, ancorada pela tecnologia,
visa atender a demanda do consumismo e
do mercado. Isto implica num dilema para
o trabalhador, pois é vital o atendimento de
suas necessidades básicas através do seu
trabalho, mas não com o sacrifício do seu
lazer, das suas satisfações, convivência social e subjetividade.
Dada a centralidade do trabalho
nas nossas vidas, o trabalhador encontra-se, diante de sentimentos ambivalentes,
pois, ao mesmo tempo em que o trabalho
o transforma num ser social, com sentimento de pertença, por outro lado, a lógica do
capitalismo lhe trás aborrecimentos e a perda do sentimento de importância pessoal
(autoestima). Porém são as condições desumanas de trabalho, a que muitos são (e
foram) submetidos, que geram, em alguns,
degradação e alienação.
Constatamos que as tecnologias
também geraram e geram dicotomias no
trabalhador, pois elas não são neutras. Assim como aproximam, facilitam sua vida,
permitem que a lógica da economia e da
produção em massa ganhasse força e se
globalizasse. A tecnologia da eletrificação,
por exemplo, foi um marco significativo para
a sociedade, mas comprometeu a qualidade de vida do trabalhador.
Além disto, a impossibilidade do
Interciência
& Sociedade
Capitalismo e tecnologias: implicações para o trabalhador
trabalhador de participar da organização do
seu próprio trabalho implica no surgimento
do sofrimento, da falta de sentido. Isto não
atinge a todos, mas aqueles que se sentem
parte tão somente de uma engrenagem,
que não pensam, reproduzem, e que abriram mão dos seus próprios desejos para
satisfazer os de outros.
Por tudo isto, o que precisa ser
compreendido e repensado é o atual modo
de vida da sociedade que é orientada pela
sedução e por necessidades nunca satisfeitas. O ser humano atua no mundo para satisfazer seus desejos e necessidades, desta
forma, no capitalismo, os avanços tecnológicos não são algozes cruéis, mas podem
ser considerados instrumentos que auxiliam
na busca incessantes de preenchimento e
sentido.
Deste modo, o desejo humano merece atenção e estudo mais aprofundado,
pois tudo aquilo que criamos para nós, de
que não temos necessidade, pode transformar-se em sofrimento. Em desequilíbrio
o desejo trará problemas: seu excesso resulta em consumismo compensatório e sua
falta em baixa autoestima.
Ao trabalhador é necessário o entendimento do seu papel na construção de
si, a consciência de auto e co-responsabilidade frente ao trabalho e a sociedade, mas
também adaptabilidade e autonomia, pois,
diante de novos paradigmas, as pessoas
precisam aprender a adaptar-se e a intervir.
Assim sendo, cabe ao trabalhador
(que é autodeterminante) fazer a crítica,
aceitando, ou não, o que está posto sem
vitimizar-se, sem ficar, por vezes, ancorado na impotência, mas permitir-se quebrar
o status quo. A questão a ser resolvida é o
quanto a classe trabalhadora se empenhará nisto, sem esquecermos obviamente que
a busca da própria liberdade de dominação
advém de um longo processo político-histórico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Capitalismo. Mimeo, s/d.
POSTMAN, N. Tecnopólio: a rendição da cultura à
tecnologia. São Paulo: Nobel, 1994.
Simone Ferreira é Psicóloga, mestranda em Educação, pelo programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina- UDESC.
Ademilde Silveira Sartori é Licenciada em Física e mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC, doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP, com pós-doutorado em Educação e Comunicação pela Universidade Complutense de Madri, Espanha. Professora do Programa de Pós-Graduação em
Educação - PPGE/UDESC.
Interciência
& Sociedade
33
34
Interciência
& Sociedade
CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES ACERCA DO MATERIAL DIDÁTICO
UTILIZADO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
MIRANDA, Nonato Assis de
Universidade Paulista (UNIP)
[email protected]
SILVA, Dirceu da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
[email protected]
RESUMO: Esse texto apresenta os resultados de uma pesquisa de natureza quantitativa realizada com
alunos de Pós-Graduação Latu Sensu oferecidos pela Universidade Paulista. Os dados, obtidos por
meio de um instrumento tipo escala de likert, foram tratados estatisticamente pela técnica multivariada
conhecida como análise de cluster cujo objetivo foi agrupar os participantes segundo suas características, formando grupos ou conglomerados homogêneos. Para tanto, utilizou-se do método de ward.
A partir do dendrograma, pudemos visualizar dois clusters distintos sendo que o primeiro é formado
por 89 participantes e o segundo por apenas 10. O cluster 1 (89 participantes) prefere trabalhar com
textos impressos e consideram os textos on-line desconfortáveis, principalmente aqueles com mais de
três páginas, pois os considerados cansativos. Enquanto isso, o cluster 2 (10 participantes) prefere ler
textos on-line.
PALAVRAS-CHAVE: Educação à distância; análise de cluster; texto on-line.
ABSTRACT: This text presents the results of a quantitative nature research performed with Post-graduate students offered by the Paulista University in a distance way. The data, obtained through a Likert
scale, were statistically treated by the technique known as multivariate analysis of cluster whose aim
was to group the participants according to their characteristics, forming homogeneous groups or conglomerates. In this research we use the ward method. From the dendrogram, we see two distinct clusters
of which the first is comprised of 89 participants and the second one by just 10. The cluster 1 (89 participants) prefers working with printed texts and consider the on-line texts very uncomfortable, especially
those that have more than three pages because their reading is boring. Meanwhile, the cluster 2 (10
participants) prefers reading on-line texts.
KEYWORDS: Distance education; cluster analysis; on-line text.
1. INTRODUÇÃO
Atualmente, tem-se observado,
em termos globais, que a ampliação das
oportunidades educacionais, com que tanto se sonha, está ligada à institucionalização da modalidade da educação à distância
(NISKIER, 2000). Contudo, acredita-se que
a EAD não pode ser encarada como uma
panacéia para todos os males da educação
brasileira, posto que nessa perspectiva, a
colocaríamos em segundo plano em relação
à modalidade presencial e sabemos que
isso não é prudente. Muito provavelmente
isso aconteça em função dos problemas
que a educação tem enfrentado nos últimos
anos em decorrência de um cenário que
está em constantes mudanças e em função
das dificuldades que a escola de educação
básica, em particular a pública e gratuita,
tem em se adequar a esse novo contexto.
Por outro lado, tem-se observado
que são muitos os esforços realizados por
parte de educadores, gestores e pesquisadores da educação na tentativa de mostrar
que os problemas da educação brasileira
não se concentram somente no interior do
sistema educacional, posto que, antes de
tudo, refletem uma situação de desigualdade e polaridade social, produto de um siste-
Interciência
& Sociedade
35
MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da
ma econômico e político perverso e desequilibrado.
Diante disso,
[...] a educação, nas suas mais diversas modalidades, não tem condições
de sanear nossos múltiplos problemas
nem satisfazer nossas mais variadas
necessidades. Ela não salva a sociedade, porém, ao lado de outras instâncias
sociais, ela tem um papel fundamental
no processo de distanciamento da incultura, da acriticidade e na construção de
um processo civilizatório mais digno do
que este que vivemos (LUCKESI, 1989,
10).
Portanto, é inegável que a busca
de mecanismos que contribuam para que
esse quadro possa se minimizado é uma
necessidade iminente e muito provavelmente a EAD poderá fazer parte dessa forma tarefa.
Não se pode esquecer que a utilização de tecnologias de informação e comunicação nos processos comunicacionais
e educativos na configuração de redes implica, necessariamente, em uma mudanças
de valores e atitudes na sociedade do mundo do trabalho (RODRIGUES, 2006). Mas
quando se analisa que a educação não é
alheia ao que acontece na sociedade como
um todo, percebe-se que, no setor educativo, essas mudanças são acentuadas
pelo comportamento de alguns docentes,
discentes e de gestores frente a novas formas de ensinar e aprender mediadas pelas tecnologias. Portanto, entende-se que
os docentes necessitam aprender a se articularem simultaneamente em diferentes
níveis de ensino por meio de ferramentas
de comunicação antes usadas apenas para
o convívio social, além, é claro, a elaborar
materiais didáticos com linguagens específicas, construídos em redes de saberes significativos (MORAN, 2004; RODRIGUES,
2006).
É nesse contexto que o ensino
presencial se aproxima do ensino à distância no que concerne às atitudes e valores
atribuídos à educação, mas não é só isso,
pois a combinação de tecnologias em rede
e inovações no ensino presencial está modificando as formas de organização da edu-
36
cação a distância (MORAN, 2004).
Mas como será que os cursos oferecidos na modalidade à distância têm se
organizado? Qual tem sido a preocupação
com os materiais didáticos?
De acordo com Moran, até pouco
tempo atrás, o importante era o conteúdo
uma vez que toda a ênfase era dada ao design dos materiais, para que fossem auto-instrucionais, para que o aluno, sozinho,
conseguisse acompanhar e se motivar para
continuar aprendendo.
Não obstante, tem-se observado que esse paradigma, aos poucos, está
sendo repensado, pois se verifica, na atualidade, que muitos cursos de EAD estão
percebendo que o material sozinho não é
suficiente para a maior parte dos alunos.
Portanto, bons materiais auto-explicativos,
mesmo feitos com multimídia, não costumam ser suficientes para que os alunos se
motivem e aprendam, a longo prazo.
Frente ao exposto, esse texto
apresenta os resultados de uma pesquisa
realizada com um grupo de alunos de pós-graduação latu sensu da Universidade
Paulista (UNIP) acerca da leitura de materiais impressos e on-line.
2. Ambiente virtual de aprendizagem
Um ambiente virtual de aprendizagem é um sistema que reúne uma série de
recursos e ferramentas, permitindo e potencializando sua utilização em atividades de
aprendizagem através da Internet em um
curso a distância (VAVASSORI & RAABE,
2003).
Existem inúmeros AVA no mercado, sendo alguns gratuitos tais como o
Moodle e o TelEduc, mas há outros que
são pagos. No caso específico da instituição investigada é utilizado um recurso pago
que o Blackboard. Trata-se de um ambiente
de autoria com interface amigável, de fácil
utilização, desenvolvido para educadores
e profissionais interessados em aplicar as
novas tecnologias interativas via Internet na
educação, contribuindo para a metodologia
de ensino presencial e potencializando o
processo de ensino e aprendizagem à distância.
A área de trabalho é acessível tanto
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Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância
aos alunos como aos professores e, por ela,
os usuários acessam os principais recursos
tais como: avisos, calendário de aulas, tarefas, informações, programa do curso, link
de avaliações, perfis, conteúdo das aulas,
material complementar, fórum, chat, e- mail,
sala de aula virtual e home-pages pessoais.
Os participantes do curso investigado frequentam 50% das disciplinas presencialmente e 50% a distância. No caso
das disciplinas a distância, essas são organizadas em unidades, sendo que cada unidade traz um livro texto que corresponde ao
texto on-line elaborado pelo professor responsável pela disciplina e às vezes textos
complementares, as vídeo-aula que o aluno
pode acessar de qualquer local, desde que
tenha acesso à Internet e atividades que
deverá resolver e que farão parte da avaliação do curso.
3. Percurso metodológico
Essa investigação caracteriza-se
por ser pesquisa quantitativa, cuja vantagem do método consiste em levantar informações com confiabilidade estatística.
Sobre esse assunto, Demo (2000) afirma
que se trata, na realidade, é do emprego da
quantificação da coleta de dados e o tratamento destes por meio de técnicas estatísticas (simples ou complexas).
Neste estudo, os dados foram obtidos por meio de levantamento amostral
(survey), com escala de atitudes de Likert1
realizado em amostra não probabilística
composta por 99 alunos de vários cursos
de Pós-Graduação Latu Sensu da Universidade Paulista e tratados pelo Statistical
Packet for Social Sciences)2.
Partindo-se do pressuposto que
há uma grande probabilidade de alunos de
fazem parte de grupos teoricamente homogêneos apresentarem opiniões divergentes
acerca de um mesmo assunto, os autores
optaram pelo emprego da análise de cluster.
Segundo Hair Jr. et al. (2005), a
análise de cluster, também conhecida como
análise de conglomerados, é um conjunto de técnicas estatísticas cujo objetivo é
agrupar objetos segundo suas características, formando grupos ou conglomerados
homogêneos. Dessa forma, os objetos em
cada conglomerado tendem a serem semelhantes entre si, porém diferentes dos demais objetos dos outros conglomerados. Os
conglomerados obtidos devem apresentar
tanto uma homogeneidade interna (dentro
de cada conglomerado), como uma grande
heterogeneidade externa (entre conglomerados). Portanto, se a aglomeração for bem
sucedida, quando representados em um
gráfico, os objetos dentro dos conglomerados estarão muito próximos, e os conglomerados distintos estarão afastados.
Para Hair Jr. et al. (2005), a análise
de cluster é uma técnica do tipo de interdependência, pois não é possível determinar
antecipadamente as variáveis dependentes e independentes. Ao contrário, examina
relações de interdependência entre todo
o conjunto de variáveis. Neste ponto, esta
técnica é similar à análise fatorial, no entanto, a diferença é que, enquanto a análise de
cluster trata os objetos, a análise fatorial se
preocupa com as variáveis.
Segundo Malhotra (2006), as etapas para a aplicação da análise de cluster
estão descritos na figura 1.
Para Mattar (1997), uma escala Likert, proposta por Rensis Likert em 1932, é um instrumento em que os respondentes são
solicitados não só a concordarem ou discordarem das afirmações, mas também a informarem qual é o seu grau de concordância ou de discordância acerca do assunto indagado.
1
2
SPSS - Statistical Packet for Social Sciences. Base 10.0 User’s Guide. Chicago:SPSS, 1999.
Interciência
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37
MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da
Formular o problema
Escolher uma Medida de distância
Escolher um Processo de Aglomeração
Decidir Quanto ao Número de Conglomerados
Interpretar e Perfilar os Conglomerados
Avaliar a Validade do Processo de Aglomeração
Figura 1. Etapas para aplicação da análise
de clusters.
Fonte: Malhotra (2006, p. 575).
Nestes termos, inicialmente, é necessário definir o problema de aglomeração
e as variáveis a serem tratadas estatisticamente. Feito isso, escolhe-se, uma medida de distância dos conglomerados. Após,
defini-se o processo de aglomeração que
dependerá das variáveis em estudo e do
problema em foco.
Para Malhotra (2006), neste ponto,
a intuição do pesquisador deve ser utilizada
para a escolha do melhor processo e definição do número de conglomerados na pró-
xima etapa. Os conglomerados resultantes
devem ser interpretados em termos das variáveis usadas para constituí-los e de outras
variáveis adicionais importantes. Finalmente, o pesquisador precisa avaliar a validade do processo de aglomeração (ROSES e
LEIS, 2002).
Um passo importante na análise
de cluster é a escolha de uma medida para
avaliar o quão semelhantes ou diferentes
são os casos analisados. Assim, escolhemos como medida de semelhança à distância euclidiana quadrática, por ser uma das
mais utilizadas neste tipo de análise (MALHOTRA, 2006, PESTANA e GAGEIRO,
2000).
Nesta análise não existe nenhum
critério estatístico interno que possa ser
usado para inferir qual o número de clusters
que deve ser retido. Desta forma, a definição dos critérios para a tomada de decisão
fica a cargo do pesquisador. Assim, procuramos clusters que possuam grande homogeneidade entre si.
Como não possuímos, a priori,
um número de cluster que deveria ser retido, precisamos explorar os dados e testar
vários métodos. Assim, testamos sete métodos de aglomeração hierárquicos (apresentados com fundo cinza na figura 2 – Processos de Aglomeração Hierárquicos):
Processo de Aglomeração
Hierárquicos
Aglomerativos
Método de Encadeamento
Não Hierárquicos
Divisivos
Limiar
Limiar
Particionamento
Seqüencial
Paralelo
Otimizador
Métodos de Variância
Métodos de Centróide
Métodos de Ward
Encadeamento Único
Encadeamento Completo
Figura 2. Classificação dos Procedimentos de Aglomeração (Clusters).
Fonte: Malhotra (2006, p. 577)
38
Interciência
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Encadeamento Médio
Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância
O método que mostrou boa separação entre os clusters foi o método Ward.
Desta forma, a seguir, apresentamos os resultados da análise de cluster encontrados
através deste método.
A partir do dendrograma, podemos
visualizar dois clusters distintos sendo que
o primeiro é formado por 89 participantes e
o segundo por apenas 10 (Tabela 1).
4. Descrição da amostra
Foram pesquisados 99 sujeitos
de Cursos de Pós-Graduação Latu Sensu,
sendo 45 do sexo masculino e 58 do sexo
feminino. A média de idade foi de 35 anos
e a distribuição por curso é apresentada na
Tabela 1.
Tabela 1. Distribuição dos participantes Segundo o Curso
Curso
Gestão Financeira Avançada
Estratégia Empresarial
Direito Empresarial
Controladoria Empresas
Formação de Professores Ensino Superior
Total
Freqüência
11
8
8
17
59
99
Fonte: os autores
Conforme se observa, mais da metade dos sujeitos pesquisados são oriundos
do curso de Formação de Professores Ensino Superior, pois é um dos cursos mais
procurados na instituição investigada.
5. Tratamento dos dados
Pelo teste de Kolmogorov-Smirnov,
concluímos que nenhuma das assertivas da
escala de Likert pode ser considerada normal ao nível de significância de 0,05. Desta
forma, utilizamos o teste não paramétrico
de Mann-Whitney para verificar quais são
as variáveis discriminadoras, isto é, em
quais variáveis podemos constatar alguma
diferença de opinião entre os clusters. Este
teste é apresentado na tabela 2.
Tabela 2. Teste de Mann-Whitney
Assertivas
Mann-Whitney
U
Z
Significância
1. Palavras destacadas no texto on-line tiram a atenção do aluno.
197.000
-2.952
.003
2. Quando estudo, prefiro imprimir os textos a lê-los on-line.
121.000
-4.080
.000
3. O texto impresso gera mais interatividade que o texto on-line.
121.500
-3.875
.000
4. Todo material impresso leva o aluno a desenvolver capacidades autônomas.
48.500
-4.692
.000
5. Prefiro ler textos on-line com diferentes fontes (tamanhos e
tipos).
341.500
-1.218
.223
6. O material impresso torna o processo de aprendizagem
mais rico e significativo.
131.000
-3.720
.000
7. Quando leio textos on-line, apenas passo os olhos nas palavras-chave.
206.000
-2.868
.004
8. O tamanho da fonte não interfere na leitura do texto on-line.
162.000
-3.366
.001
Interciência
& Sociedade
39
MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da
Tabela 2. Continuação
9. Todo material impresso permite que o aluno exercite sua
capacidade crítico-reflexiva.
81.000
-4.291
.000
10. A leitura de textos on-line é desconfortável.
151.500
-3.459
.001
11. Material impresso ajudar a desenvolver habilidades.
77.500
-4.334
.000
12. O material impresso mediatiza a relação aluno-tutor ou
orientador da aprendizagem.
48.000
-4.693
.000
13. Prefiro textos on-line que tragam o conteúdo com mais detalhes.
408.000
-.436
.663
14. Todo material impresso permite a flexibilidade necessária
para que o aluno exercite a sua criatividade.
193.000
-2.976
.003
15. Textos escritos em letra maiúscula são mais fáceis de ler.
106.000
-3.987
.000
16. Textos on-line com mais de três páginas tornam-se cansativos.
104.000
-4.021
.000
17. As cores da fonte e fundo nos textos on-line não interferem
na leitura.
200.500
-2.909
.004
443.000
-.024
.981
19. Marcadores de texto quebrando blocos prejudicam a leitura
dos textos on-line.
309.500
-1.594
.111
20. O material impresso tem a função de repassar informações.
79.000
-4.331
.000
Fonte:
SPSS
18. Todo
material instrucional leva o aluno adquirir conhecimentos relevantes.
Pela tabela 2, observamos que
as opiniões dos participantes do cluster 1
se diferenciam das do cluster 2 em quase
todas assertivas, exceto nas de número 5,
13, 18 e 19. Nestas assertivas, as diferenças encontradas não são significantes, ou
seja, podem ser consideradas devido ao
erro amostral.
Contudo, julgamos prudente tecer
alguns comentários sobre esse resultado,
pois a literatura traz algumas orientações
nesse sentido.
Nestes termos, considerando-se
que o instrumento foi composto por uma
escala de 1 a 7, nota-se (Tabela 3) que os
participantes não gostam de ler textos on-line com diferentes fontes.
Para justificar esse resultado, recorremos a Vieira (2006) que realizou uma
pesquisa que analisa a questão da formatação do texto para e-learning e sinaliza que
isso acontece porque as fontes têm muitas
funções para propiciar formas de letras que
podem facilitar a leitura. Portanto, assim
como outros elementos visuais, as fontes
organizam ou criam uma disposição particular (PARIZOTTO, 1997).
No caso da assertiva 5, por exemplo, “Prefiro ler textos on-line com diferentes
fontes” é prudente que haja um certo consenso entre os participantes sobre o assunto, pois as preferências de leituras de textos
40
dessa natureza variam significativamente
entre as pessoas por questões de preferência. Com isso, é importante que os profissionais responsáveis pela produção de
textos veiculados on-line estejam atentos,
pois, Schriver (1997) apud Parizotto (1997),
para fazer as escolhas sobre o tamanho da
fonte para documentos on-line, devem ser
consideradas as características das fontes
propriamente ditas, ou seja, a largura e o
espaçamento das letras e o comprimento
da linha e entrelinhas com vistas a verificar
se o texto está espaçado adequadamente.
Ademais, essas escolhas devem
ser feitas de acordo com o tipo de características de usuário (idade, ponto de vista, nível de motivação ou vontade de ler um texto
contínuo). Nestes termos, na dúvida, é melhor errar para fontes maiores do que para
fontes menores, pois a maior parte dos usuários acha os tipos maiores mais legíveis e
calmantes para os olhos (SCHRIVER, 1997
apud PARIZOTTO, 1997).
Há muito mais a ser dito sobre o
assunto, mas vamos retomar a análise dos
dados obtidos na pesquisa quantitativa que
é o objeto precípuo desse trabalho.
Diante disso, na tabela 3, apresentamos a média e o desvio padrão dos
clusters para cada assertiva sendo que as
médias acima de 4 indicam concordância e
abaixo desse número discordância.
Interciência
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Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância
Tabela 3. Diferenças entre os clusters
Cluster 1
Variáveis
Cluster 2
M
DP
M
DP
1. Palavras destacadas no texto on-line tiram a atenção do aluno.
3.25
1.836
1.40
.516
2. Quando estudo, prefiro imprimir os textos a lê-los on-line.
5.89
1.668
2.90
1.912
3. O texto impresso gera mais interatividade que o texto on-line.
5.51
1.618
2.30
2.058
4. Todo material impresso leva o aluno a desenvolver capacidades autônomas.
5.09
1.571
1.50
1.080
5. Prefiro ler textos on-line com diferentes fontes (tamanhos e tipos).
3.58
1.924
2.90
2.283
6. O material impresso torna o processo de aprendizagem mais rico e significativo.
5.29
1.639
2.20
2.098
7. Quando leio textos on-line, apenas passo os olhos nas palavras-chave.
3.29
2.101
1.50
1.581
8. O tamanho da fonte não interfere na leitura do texto on-line.
3.62
2.177
1.30
.675
9. Todo material impresso permite que o aluno exercite sua capacidade crítico-reflexiva.
4.75
1.805
1.60
.966
10. A leitura de textos on-line é desconfortável.
4.73
1.993
2.20
1.619
11. Material impresso ajudar a desenvolver habilidades.
4.85
1.825
1.60
1.075
12. O material impresso mediatiza a relação aluno-tutor ou orientador da aprendizagem.
4.61
1.542
1.40
.699
13. Prefiro textos on-line que tragam o conteúdo com mais detalhes.
4.55
1.699
4.10
2.470
14. Todo material impresso permite a flexibilidade necessária para que o aluno exercite a sua criatividade.
4.76
1.574
2.80
1.989
15. Textos escritos em letra maiúscula são mais fáceis de ler.
3.98
1.977
1.30
.483
16. Textos on-line com mais de três páginas tornam-se cansativos.
4.94
1.903
2.00
1.155
17. As cores da fonte e fundo nos textos on-line não interferem na leitura.
3.27
2.049
1.40
.699
18. Todo material instrucional leva o aluno adquirir conhecimentos relevantes.
4.84
1.637
4.50
2.593
19. Marcadores de texto quebrando blocos prejudicam a leitura dos textos on-line.
3.69
1.928
2.70
2.058
20. O material impresso tem a função de repassar informações.
5.30
1.503
2.40
1.350
Fonte: SPSS
Analisando a tabela 3, percebemos
que os participantes do cluster 1 tendem a
concordar que, quando estudam, preferem
imprimir os textos a lê-los on-line, pois o
texto impresso gera mais interatividade,
leva o aluno a desenvolver habilidades e
capacidades autônomas e permite o exercício sua capacidade crítico-reflexiva, tornando o processo de aprendizagem mais rico e
significativo.
Ademais, a leitura de textos on-line
é desconfortável e quando têm mais de três
páginas tornam-se cansativos. Já o material
impresso mediatiza a relação aluno-tutor,
permite a flexibilidade necessária para que
o aluno exercite a sua criatividade, mas tem
a função de repassar informações. Por outro lado, o cluster 2 tende a discordar destas
afirmações.
Além disso, observamos também
que os participantes dos dois clusters tendem a concordar que quando lêem textos
on-line, não passam apenas os olhos nas
palavras-chave e que as palavras destaca-
das nesses textos não tiram a atenção do
aluno. Afirmam também que as cores da
fonte e fundo, assim como o tamanho da
fonte de textos on-line interferem na leitura. Por fim, sinalizam que os textos escritos
em letra maiúscula não são mais fáceis de
ler. No entanto, os participantes do cluster
2 tendem a apresentar um grau de concordância mais alto acerca dessas idéias.
Os resultados mostram também
que os participantes dos dois clusters preferem textos on-line que tragam o conteúdo
com mais detalhes e com a mesma fonte
(tamanhos e tipos). Entendem que os marcadores de texto quebrando blocos não
prejudicam a leitura e todo material instrucional leva o aluno adquirir conhecimentos
relevantes.
Para justificar esses resultados,
verificamos que são inúmeros os recursos
aos quais os participantes se referem. Segundo Parizotto (1997), dentre eles, o uso
do negrito, do itálico ou uma mudança na
cor ou no brilho é, provavelmente, a melhor
Interciência
& Sociedade
41
MIRANDA, N. A. de; SILVA, D. da
opção para realçar o texto do que o sublinhado.
Mas não podemos esquecer que
opção por um ou por outro recurso é uma
questão de estilo ou preferência e com isso,
a atenção do usuário pode ser atraída com
a utilização do itálico, por exemplo. Segundo Robertson (1993), este estilo é útil e não
causa quebras severas no ritmo de leitura.
Outra maneira de atrair a atenção do usuário, na concepção desse autor, é usar o
sublinhado, pois este estilo atrai a atenção
sem causar quebras significativas no ritmo
da leitura, mas deve ser usado somente
para textos curtos (ROBERTSON, 1993).
Entretanto, no caso específico de páginas
na Web, o uso do sublinhado deve ser utilizado somente para links (PARIZOTTO,
1997).
Em síntese, podemos constatar
que o cluster 1 (89 participantes) prefere
trabalhar com textos impressos e consideram os textos on-line desconfortáveis, principalmente aqueles com mais de 3 páginas
considerados cansativos. Enquanto isso, o
cluster 2 (10 participantes) prefere ler textos
on-line.
6. CONCLUSÕES
Para apresentarmos algumas considerações acerca do texto ora proposto,
entendemos que seria prudente resgatar
os objetivos que nortearam a pesquisa, ou
seja, o de conhecer as concepções que os
estudantes de Pós-Graduação Latu Sensu
têm acerca dos materiais didáticos, mais
precisamente, textos impressos e on-line.
Pois bem. Conforme pudemos
observar, os resultados mostraram que a
maior parte dos participantes prefere textos
impressos em detrimento do texto on-line.
Portanto, é partir desse quadro que teceremos alguns comentários a guisa de conclusão.
Diante dessa realidade, acreditamos que talvez, algumas pessoas possam
estranhar essa preferência desse grupo de
alunos e até mesmo os taxarem de retrógrados ou algo similar. Todavia, não podemos
esquecer que o ser humano é resistente às
mudanças e o texto on-line ainda é novidade para nós, pois a educação a distância,
42
mais precisamente a ministrada através da
Internet, ou seja, on-line, ainda engatinha
no país.
Outro aspecto a ser destacado é
que, quando nos referimos à educação, não
podemos esquecer as coisas são lentas,
conforme é sinalizado por Pierre Lévy.
Segundo esse pesquisador,
[...] a escola é uma instituição que se baseia, desde há cinco mil anos, no falar/
ditar do mestre, na escrita manuscrita
do aluno e, desde há quatro séculos, no
uso moderado da imprensa,
nestes termos,
uma verdadeira integração da informática (e do audiovisual) implica, portanto,
o abandono de um habitus antropológico mais do que milenário (sic), algo
que não se poder fazer em poucos anos
(LÉVY, 1990, p.11)”.
Frente ao exposto, não poderíamos esperar um posicionamento muito diferente de nossos participantes que estão
iniciando na educação a distância. Mas isso
não significa que esse resultado não represente para nós educadores e demais profissionais da educação a distância um indicador de que estamos no caminho certo e
que o aluno, muito em breve, se adequará a
esse novo contexto e bem como aos novos
materiais.
Não obstante, enquanto profissionais da EAD, concordamos com Parizotto
(1997) que alguns cuidados devem ser tomados por ocasião da elaboração de textos
que serão disponibilizados na Internet.
Segundo essa pesquisadora, para
evitar a poluição visual de uma página na
Web, devemos privar pela simplicidade e
clareza do conjunto de elementos que a
compõem. Não obstante, para alcançar
esse objetivo, é importante que o projetista de páginas na Web não se deixe levar
pelos recursos das ferramentas gráficas,
utilizando-os em excesso, nem use somente tecnologia de ponta, fazendo com que
alguns usuários, por problemas técnicos,
não tenham acesso a esta informação (PARIZOTTO, 1997).
Frente ao exposto, destacamos
Interciência
& Sociedade
Concepções de estudantes acerca do material didático utilizado na educação a distância
que “além dos fatores da compreensão da
leitura derivados do autor e do leitor, há os
derivados do texto que dizem respeito à sua
legibilidade, podendo ser materiais, lingüísticos ou de conteúdo (ALLIENDE & CONDEMARÍN, 2002 apud KOCH & ELIAS, 2007,
p.28)”. Mas podemos acrescentar a esse
conjunto, os fatores técnicos que representam uma forte barreira a muitas pessoas
que não dominam o uso de determinadas
ferramentas tecnológicas, pois “as novas
tecnologias digitais não oferecem aos seus
usuários um novo mundo, sem problemas”.
Afinal “estamos no início de uma nova e
revolucionária era tecnológica e pagamos
um preço alto pelo pioneirismo” (KENSKI,
2007, p.53).
Pioneirismo? Será que somos pioneiros em alguma coisa? De certa forma
sim, pois apesar de nosso atraso tecnológico temos os nossos méritos e não somos
de um todo analfabetos digitais, afinal desde que as tecnologias de comunicação e
informação começaram a se expandir pela
sociedade, aconteceram muitas mudanças
nas maneiras de ensinar e aprender e é
inegável que há um grande esforço por parte das pessoas para se adequarem a esse
novo contexto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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HAIR, J. F.; et al. Análise multivariada de dados.
Porto Alegre: Bookman, 2005.
KENSKI, V. M. Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação. Campinas-SP: Papirus, 2007.
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sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2007.
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2006.
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(2006). Dissertação (Mestrado em Administração de
Organizações) Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeiro Preto da Universidade
de São Paulo, Ribeiro Preto-SP.
Nonato Assis de Miranda é Doutor e professor da Universidade Paulista/São Paulo/Brasil.
Dirceu da Silva é Doutor, professor titular do Programa de Pós-Graduação da Universidade Nove de Julho. Professor e Pesquisador da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas/São Paulo/Brasil.
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Interciência
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CONCESSÃO DE CRÉDITO E MODELAÇÃO
DA TOMADA DE DECISÃO
SANTADE, Hélio Oliva do Amaral
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
Instituição de Ensino São Francisco (IESF)
Empresa Vita Suco – Mogi Guaçu
[email protected]
BIEMBENGUT SANTADE, Maria Suzett
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
Faculdades Integradas Maria Imaculada (FIMI)
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Universidade do Minho (UMINHO-Braga-Portugal)
[email protected]
RESUMO: O texto delimita-se na Tomada de Decisão e apresenta a informação como matéria-prima
para a decisão de crédito. A obtenção de informações confiáveis e o competente tratamento das mesmas constituem uma base sólida para uma decisão de crédito segura. O trabalho parte do princípio de
que é possível construir modelos matemáticos para avaliação de riscos na concessão de empréstimos
para pessoas físicas em cooperativas de crédito, e as questões que surgem nesse sentido são: (i) que
informações necessita-se saber para criar um escoreamento de crédito?; (ii) como avaliar quantitativamente cada informação coletada?; (iii) qual o nível aceitável de risco para liberação de crédito?; (iv)
como classificar os riscos? Assim, diante desses questionamentos, o trabalho objetiva-se em criar,
desenvolver, aplicar e avaliar um modelo de credit scoring para a avaliação de crédito a pessoas físicas
em cooperativas de crédito. Agregam-se ainda ao objetivo central os seguintes objetivos específicos:
desenvolver uma metodologia que leva em consideração particionamentos áureos.
PALAVRAS-CHAVE: tomada de decisão; cooperativas de crédito; número ouro.
ABSTRACT: This work is on Decision Making and presents “Information” as a raw material for Credit
Decision. Getting reliable information and working it adequately constitute a solid basis for a secure
credit decision. This work is based on a principle that it is possible to build-up mathematical models for
evaluating risks on loans for people in credit cooperatives. The questions that arise in this sense are:
(i) what are the information we may need for creating a secure support for credit? (ii) how to evaluate
quantitatively each information that is obtained ? (iii) what is the acceptable risk for liberating a credit
? (iv) how to classify the risks ? So, before these questions, this work is for create, develop, apply and
evaluate a model of “credit scoring” for evaluating credit for people in credit cooperatives. To this main
objective this work aggregates the following specific objectives: to develop a methodology which takes
into consideration the aureate partition.
KEYWORDS: decision making; credit cooperatives; aureate number.
1. INTRODUÇÃO
O trabalho delimita-se na Tomada
de Decisão e apresenta a informação como
matéria-prima para a decisão de crédito.
A obtenção de informações confiáveis e o
competente tratamento das mesmas constituem uma base sólida para uma decisão
de crédito segura. Adicionalmente, nesse
tópico de introdução às informações para
crédito, cabe descrever sobre a tomada de
decisão e seus métodos (SILVA, 1997:1456).
É relevante assinalar que a Tomada de Decisão pode ser entendida como a
escolha entre alternativas. Todas as pessoas, em seu cotidiano, tomam decisões optando entre as alternativas de que dispõem
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SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S.
e conhecem. A análise do processo decisório é algo complexo, envolvendo experiência anterior, conhecimento sobre o que está
sendo decidido, método para tomar decisão
e uso de instrumentos e técnicas que auxiliem o administrador.
Ao se tomar uma decisão, escolhendo entre alternativas, haverá um impacto sobre o objetivo que se pretende atingir.
Ao se tratar dos objetivos da administração
financeira, a decisão de usar uma matéria-prima de baixa qualidade com o objetivo de
maximizar o lucro poderá levar os clientes
a reagirem e, em longo prazo, a empresa
perder mercado. No entanto, há objetivos
concorrentes entre si, pois poderá não ser
possível maximizar as vendas e minimizar
os incobráveis.
A decisão de conceder crédito
numa empresa comercial ou industrial está
relacionada ao volume de vendas que se
quer atingir em determinado produto e em
determinada época. Uma vez tomada a decisão de conceder o crédito, o administrador não encerrou o processo decisório, sendo necessário tomar outras decisões, como
as relativas à cobrança, por exemplo.
Numa instituição financeira, a decisão de crédito está diretamente relacionada
a diversos fatores, tais como: taxas, prazos
e garantias.
A boa capacidade de julgamento
foi considerada durante muito tempo característica de um bom administrador. No
mundo atual, entretanto, apenas uma boa
capacidade de julgamento não é suficiente. Isto porque a evolução da ciência e dos
métodos científicos que vem sendo transmitida de geração para geração com aperfeiçoamento progressivo constitui-se numa
ferramenta de grande utilidade na tomada
de decisão.
Os métodos quantitativos são considerados muito eficientes, pois se baseiam
em registros e cálculos. O uso da estatística,
especificamente a teoria das probabilidades, é um valioso instrumento para a tomada de decisão. Os modelos de previsão de
insolvência e outras técnicas de classificação de risco desenvolvidas são resultados
do tratamento e proces-samento de grande
quantidade de informações, a partir de metodologia estatística (análise discriminante),
46
com o objetivo de auxiliar na decisão de
crédito. Outros recursos, como o teorema
de Bayes, análise fatorial e pesquisa operacional, por exemplo, têm sua aplicabilidade
nas áreas de crédito.
As simulações constituem-se também em valiosos métodos de tomada de decisão, à medida que permitem ao tomador
de decisões simular as situações prováveis
e a obtenção de expectativas de resultados.
Na área de análise e concessão de crédito,
podem-se fazer simulações de diversas alternativas em determinada projeção para se
fazer uma análise de sensibilidade.
A decisão de crédito envolve diversos fatores, alguns objetivos e outros
subjetivos. Dessa forma, a experiência do
analista ou do gestor de crédito constitui-se poderoso instrumento. Para formação
de um analista de empresas, leva-se cerca
de dois anos para obter um profissional com
razoável capacidade de interpretação das
complexas e múltiplas facetas da atividade empresarial. Há casos, evidentemente,
de profissionais com experiência nas áreas
contábil e financeira que conseguem desenvolvimento relativamente rápido, como
profissionais de crédito, em face da sua bagagem técnica acumulada. A visão de um
gestor de crédito deve ser ampla, envolvendo, além da análise econômico-financeira,
conhecimento na área de administração de
empresas, bem como certo grau de domínio acerca dos fatores políticos e macroeconômicos, inclusive em nível internacional.
Mesmo um analista com experiência, ao
mudar de uma instituição para outra, precisa passar por um processo de integração
e adaptação às características da nova empresa e de seu conjunto de clientes.
O chamado feeling é algo que só é
adquirido com o tempo e tal experiência é
o que valoriza o analista. Há uma série de
fatores na análise de crédito que não são
necessariamente quantificáveis e que por
si só podem definir uma decisão de crédito. A chamada experiência anterior é o método mais antigo e mais usado; há apenas
dificuldade de ser transferida para outras
gerações, em face das diferenças de condições ao longo do tempo, pois a experiência
de um gerente de crédito de duas décadas
passadas poderá não ser adequada para
Interciência
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Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
os nossos dias. Assim, a necessidade do
gestor de crédito utilizar também outros métodos como simulações e recursos quantitativos que, adicionados a uma experiência
atualizada.
A tomada de decisão de crédito
fundamenta-se em informações e os métodos para tomada de decisão referem-se
às formas de tratamento e organização das
informações.
1.1. Objetivos do Trabalho
Este texto parte do princípio de
que é possível construir modelos matemáticos para avaliação de riscos para empréstimos para pessoas físicas em cooperativas
de crédito, as questões que surgem nesse
sentido são:
(i) que informações necessitam-se saber para criar um escoreamento
de crédito?
(ii) como quantitativamente avaliar cada informação coletada?
(iii) qual o nível aceitável de risco para liberação de crédito?
(iv) como classificar os riscos?
Diante desse questionamento surge o objetivo principal do texto:
Criar, desenvolver, aplicar e avaliar
um modelo de credit scoring1 para a
avaliação de crédito para pessoas físicas em cooperativas de crédito.
Agregam-se ainda ao objetivo central os seguintes objetivos específicos:
-
Desenvolver uma metodologia que leva em consideração particionamentos áureos2;
- Comparar a metodologia
desenvolvida com algum outro modelo nor-
malmente em uso;
-
Validar a metodologia proposta.
1.2. Importância da Tomada de Decisão
Analisando a tomada de decisão
sob um ponto de vista histórico, encontra-se a ideia de Adam Smith (1982), que
aponta que cada qual deve decidir sempre
em seu próprio favor tomando as decisões
de modo que ele próprio seja o maior beneficiado (SIMONSEN, 1986), sem se importar muito com o que o concorrente decide. Basicamente a ideia torna-se ainda
mais vil quando da teoria dos jogos de Von
Neumann e Morgenstern (VON NEUMANN
e MORGENSTERN, 1944) em que o concorrente é basicamente um “inimigo”, talvez
isto influenciado pelas guerras mundiais.
Com o equilíbrio de Nash3, surge uma nova
perspectiva que se concentra na tomada
de decisão que atenda o grupo e não apenas um ou outro interessado, ideia central
das cooperativas de crédito, ou seja, fazer
o melhor pelos cooperados, sejam eles investidores sejam eles tomadores de recursos. Assim sendo quanto maiores forem os
cuidados na concessão de crédito, mais seguros se sentirão os investidores, por outro
lado há que haver uma metodologia e que
está esteja alicerçada em pontos que ofereçam a possibilidade de crédito para que os
empréstimos realmente ocorram, mas que
também tranquilizem os investidores sobre
o modo de como seu dinheiro está sendo
aplicado; afinal, os dividendos que o investidor recebe são oriundos dos juros pagos
pelos tomadores, e o dinheiro disponibilizado para empréstimos pela cooperativa tem
como fonte o investidor, neste sentido há
que se procurar pelo equilíbrio. Esse estudo
toma este cenário como seu principal argu-
1
Credit Risk ou Risco na Concessão de Crédito.
2
Refere-se ao uso de seções áureas, ou seja, aproximadamente 62% de um total de pontos (BIEMBENGUT, 1999).
O Equilíbrio de Nash representa uma situação em que, em um jogo envolvendo dois ou mais jogadores, nenhum jogador tem a
ganhar mudando sua estratégia unilateralmente. O Equilíbrio de Nash representa uma situação em que, em um jogo envolvendo
dois ou mais jogadores, nenhum jogador tem a ganhar mudando sua estratégia unilateralmente. John Forbes Nash Jr. (Bluefield, 13 de junho de 1928) é um matemático norte-americano que trabalhou na Teoria dos Jogos, na Geometria diferencial e na
Equação de derivadas parciais, servindo como Matemático Sénior de Investigação na Universidade de Princeton. Compartilhou
o Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel de 1994 com Reinhard Selten e John Harsanyi.
3
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SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S.
mento e sobre ele cria a sua metodologia.
1.3. Metodologia do Estudo
O objetivo do credit scoring é classificar solicitantes de crédito de acordo com
seu risco (probabilidade) de inadimplência.
Sua aplicação mais comum é a concessão
ou renovação de crédito a pessoas físicas
ou jurídicas. O credit scoring recebe denominações de alternativas em função dos
objetivos e da estrutura de informações utilizadas para determinar o risco de inadimplência. O termo credit scoring é, em geral,
reservado para a classificação das solicitações de crédito de novos proponentes
(SICSÚ, 2003). Nos casos de renovação
de crédito, usual em créditos rotativos, a
experiência anterior com o cliente pode ser
incluída na elaboração do credit scoring.
Nesse caso, prefere-se a denominação
behavioral scoring, pois as variáveis refletem o comportamento do proponente diante de crédito em transações passadas. Os
ratings de crédito ou risk scores de pessoas jurídicas são, basicamente, modelos de
credit scoring para avaliar o risco-cliente em
determinado mercado.
Neste texto, foi utilizado o termo
credit scoring (CS) para caracterizar o processo de cálculo do risco de inadimplência
de um proponente ou de uma operação. O
termo sistema de credit scoring (SCS) caracteriza um sistema composto pela regra
para o cálculo do escore (credit score), regras de decisão de crédito baseadas nesse
escore e nas políticas de crédito da instituição financeira e um sistema de informações gerenciais que permita acompanhar a
adequação das decisões de crédito e forneça informações adicionais para o aprimoramento do próprio sistema e para outras
áreas envolvidas com a decisão do crédito
(marketing, cobrança etc.).
A metodologia básica para o desenvolvimento do credit scoring não difere
entre aplicações para pessoa física ou jurídica, quer envolvam apenas o risco cliente
ou o risco operação. Por simplicidade, afina-se esse texto ao conceito de credit scoring
stricto sensu, ou seja, a avaliação do risco
de uma solicitação de crédito com o objetivo
de aprová-la ou não. A utilização do credit
48
scoring para outros fins, como precificação
da operação, determinação de garantias ou
processo de cobrança, não será aqui discutida.
Inicialmente, a proposta é avaliada
por meio de critérios qualitativos. Por exemplo, a política de crédito da cooperativa irá
restringir o crédito a pessoas cuja renda
seja inferior a determinado valor, ocupação,
propriedades, idoneidade, local e tempo de
trabalho, moradia, dependentes, etc. para
conceder ou não crédito ao proponente,
sem claro ser preconceituoso em algum
atributo. Se o cliente passa por esses filtros,
seu escore é calculado e comparado com
um valor predeterminado, denominado ponto de corte. Se o escore supera esse valor,
a proposta é “aprovada”. Caso contrário, o
crédito é “negado”.
Esse fluxo, como se observa, é o
mais simples possível. Decisões mais “inteligentes” não se restringem a esse sistema “passa - não passa” (LEWIS, 1992).
Utilizam o valor do escore para precificar a
operação, definir garantias, requerer uma
avaliação mais criteriosa baseada em informações adicionais realizada por analistas
de crédito experientes, entre outras. Nesse
foco é que se encaminha esse texto.
1.4. Estrutura do Estudo
Trata-se de um apanhado do atual
estado da arte em que são tomados diversos autores e deles é extraída a essência
desta ciência. A fundamentação teórica do
credit risk faz a análise de crédito à pessoa
física, e, em seguida, são comentados alguns pontos relevantes sobre cooperativas
de crédito, em especial a que serviu de objeto de estudo. Por último, e não menos importante, fez-se a discussão dos possíveis
avanços desse tema.
2. Sobre a Tomada de Decisão
A expressão ‘tomada de decisão’,
no sentido amplo, significa dar uma ruptura
em determinado momento em quaisquer situações da vida de uma pessoa ou grupo de
pessoa para novas possibilidades de ação.
Sabe-se que uma mesma pessoa toma
Interciência
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Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
decisões múltiplas no cotidiano. Goffman
(2003) afirma que uma pessoa representa
várias máscaras durante um dia, dependendo da fachada, toma decisões várias
em ambiências diferentes. O autor utiliza a
metáfora da ação teatral como estrutura de
sua exposição, dizendo que todo homem,
em qualquer situação social, apresenta-se
diante de seus semelhantes, tenta dirigir
e dominar as impressões que possam ter
dele, empregando certas técnicas para a
sustentação de seu desempenho, tal qual
um ator que representa um personagem
diante do público.
A etimologia do verbo ‘tomar’ pode
migrar por diversos significados e sentidos
segundo o discurso proposto por qualquer
pessoa ou por um gestor administrativo.
Verbo ‘tomar’ significa receber (aquilo que
nos é dado); pegar em; encontrar; achar;
adaptar; segurar; agarrar; comer ou beber;
desejar com veemência; considerar; encher; ocupar; interpretar; julgar; conquistar;
ganhar militarmente; cativar; avaliar; aceitar; reputar; apanhar; alcançar; aguentar;
tolher; extorquir; seguir por; assumir; etc.
Já a palavra ‘decisão’ origina-se do Latim
decisione(m)> ação ou resultado da ação
de decidir; deliberação; resultado; intrepidez; sentença do tribunal; resolução do júri.
Dessa feita, “tomada de decisão”
vem desde os primórdios da vida hominídea. Acredita-se que a partir do momento
em que o ser humano deixou de viver de
modo nômade, somente na luta pela sua
própria sobrevivência, passou a tomar decisões. Maturana (2001) relata que quando os hominídeos começaram a viver em
grupo passaram a praticar coordenações
de condutas consensuais. E é relevante
assinalar nesse contexto que, no viver em
grupo, muitas decisões em acoplamentos
consensuais foram acontecendo para que
as dimensões humanas, em todas as áreas,
com resoluções de problemas e tomadas
de decisões contínuas fortaleceram-se no
cotidiano (BIEMBENGUT SANTADE, 2008;
2002:69-76).
Lazzati (997:5-6) define ‘decisão’
como “escolha de um curso de ação determinado entre vários cursos de ação alternativos. Entende-se que o curso de ação elegido pode compreender uma configuração
de vários cursos de ação”. Lazzati objetiva
em várias definições básicas o processo decisório dizendo que quando surge um problema deve haver uma brecha entre uma
situação atual ou projetada e um objetivo. O
autor conota essa ‘situação projetada’ como
aquela que pode chegar a ocorrer, independente do objetivo. Assim, quando necessita
tomar uma decisão dentro dos problemas
existentes, Lazzati distingue quatro tipos, a
colocar na seguinte ordem:
•
O problema ‘negativo’, quando a situação atual não satisfaz o objetivo prefixado;
•
O
problema
‘potencial’,
quando a situação projetada pode
ser insatisfatória;
•
O problema ‘de implementação’, quando já se há fixado um
objetivo e não necessariamente se
observa um problema negativo ou
potencial, porém é preciso definir
como se vai concretizar o objetivo
estabelecido;
•
O ‘aproveitamento de oportunidades’, quando a partir de um
objetivo geral (explícito ou implícito),
usualmente a raiz de nova informação, se estabelece a possibilidade
de desenvolver novos objetivos.
Neste caso, de todos modos, se gera
uma abertura entre a situação atual ou projetada e o objetivo, o qual
equivale a um problema.
O mesmo autor estabelece uma
sinonímia entre o conceito ‘decisão’ com
‘resolução de problemas’. Define ‘resolução
de problemas’ como “curso de ação que
corrige a lacuna entre a situação atual ou
projetada e o objetivo; aquilo que permite
alcançar o objetivo”. Desse modo, Lazzati
afirma que os conceitos de ‘resolução de
problemas’ (RP) e de ‘tomada de decisões’
(TD) confluem-se, isso porque ambos representam um mesmo processo. Dizendo de
outra forma, a resolução de qualquer problema requer a tomada de decisões; e, toda
decisão implica necessariamente a existência prévia de um problema a resolver. Para
o autor RP/TD significam o mesmo processo. Lazzati afirma que um gerente, dentro
Interciência
& Sociedade
49
SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S.
qualquer nível da organização, dedica a
maior parte de seu tempo à RP/TD, e que
a eficácia e a eficiência gerenciais dependem em grande medida de como o gerente
leva a cabo esse processo. Para o autor,
vale distinguir: a quem, ou seja, as pessoas que participam no processo; o quê ou
conteúdo do processo, que compreende a
informação que se incorpora, as ideias que
se geram, os conceitos que se produzem e
as conclusões que se alcançam; o como ou
desenvolvimento do processo em si, que inclui o clima das relações interpessoais (se
as houver) e o método que se aplica para
administrar o conteúdo (PADOVEZE, 2003:
25-32).
Segundo Stoner e Freeman
(1999:182), a ‘tomada de decisão’ - identificação de um problema específico e escolha
de uma linha de ação para se resolvê-lo ou
aproveitar uma oportunidade - é uma parte
importante do estudo de todo administrador. Afirmam os autores que a tomada de
decisão dá forma aos planos estratégicos e
operacionais de uma empresa e que todo
administrador precisa desenvolver a habilidade de tomar decisões e de resolver
problemas. Para eles um problema surge
quando uma situação existente difere da situação desejada. Ressaltam que em muitos
casos um problema pode ser uma oportunidade disfarçada. Citam, por exemplo, uma
empresa com o problema de empregados
demais que isso passa a ser uma grande
oportunidade de reestruturar a organização,
salvando empregos e aumentando a eficiência ao mesmo tempo.
Para Chiavenato (2000:416-417),
‘decisão’ é o processo de análise e escolha
entre as alternativas disponíveis de cursos
de ação que a pessoa deverá seguir. Para
esse autor, a decisão envolve seis elementos nesta ordem:
• Tomador de decisão: é a pessoa
que faz uma escolha ou opção entre
várias alternativas futuras de ação;
• Objetivos: são os objetivos que o
tomador de decisão pretende alcançar com suas ações;
• Preferências: são os critérios que
o tomador de decisão usa para fazer
sua escolha;
50
• Estratégia: É o curso de ação que
o tomador de decisão escolhe para
atingir seus objetivos. O curso de
ação é o caminho escolhido e depende dos recursos de que pode dispor;
• Situação: são os aspectos do ambiente que envolve o tomador de
decisão, alguns deles fora do seu
controle, conhecimento ou compreensão e que afetam sua escolha;
• Resultado: é a consequência ou resultante de uma estratégia.
Ele constata que, o tomador de
decisão está inserido em uma situação,
pretende alcançar os objetivos, apresenta
preferências pessoais e segue estratégias
(cursos de ação) a fim de alcançar resultados. Desse modo, a decisão envolve uma
opção e o gestor para seguir um curso de
ação, deve muitas vezes abandonar outros
cursos que surjam como alternativas. Para
isso, existe constantemente um processo
de seleção, ou melhor, de escolha de alternativas. O processo de seleção pode ser
uma ação reflexa condicionada (como digitar as teclas do computador) ou produto de
raciocínio, planejamento ou projeção para
o futuro. O autor ressalta que todo curso
de ação é orientado para um objetivo a ser
alcançado e segue uma racionalidade. Se
o tomador de decisão escolhe uma alternativa entre outras e se escolhe os meios
apropriados para alcançar um determinado
objetivo, a sua decisão está embasada na
racionalidade, conforme será abordaredo
mais à frente.
Os tomadores de decisão ou gestores, no exercício de sua função, conduzem suas áreas de responsabilidade e respectivas atividades, de modo formalizado
e estruturado por um processo de gestão.
Assim, as decisões são demarcadas nas
etapas de planejamento (estratégico e
operacional), execução e controle. Essas
decisões são tomadas para solucionar problemas ou aproveitar oportunidades (ALMEIDA, In: CATELLI, 2001:308).
Nas colocações de Pereira da Silva
(1997:145), a tomada de decisão pode ser
entendida como a escolha entre alternativas. Para esse estudioso, todas as pessoas,
em todos os dias, tomam decisões optando
Interciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
entre as alternativas de que dispõem e conhecem. A análise do processo decisório é
algo complexo, e sempre envolve experiência anterior, conhecimento sobre o que está
sendo decidido, método para tomar decisão
e uso de instrumentos e técnicas que auxiliam o gestor e/ou administrador.
É notório que pessoas a todo o momento têm que decidir ante as mais diversas
situações e sobre problemas o mais diferentes possível, utilizando-se, para isso,
de suas experiências passadas, seus
valores e crenças, seus conhecimentos
técnicos, suas habilidades e filosofias,
as quais norteiam a forma pela qual se
tomam decisões. Algumas pessoas são
mais conservadoras; outras possuem
características inovadoras e empreendedoras e estão mais dispostas a assumir riscos em potencial. Essas diversas
maneiras de tomar uma decisão podem
representar tanto o sucesso como o fracasso das pessoas que a tomam e daqueles que dependem desse processo,
bem como da organização na qual estejam insertas, quando são investidas do
poder decisório (SOLINO e EL- AOUAR,
2001:16).
Nessa afirmação acima, os autores
afirmam que a tomada de decisão faz parte
da vida de cada pessoa e que, na evolução
da humanidade perante situações várias, o
ser humano sempre esteve fazendo escolhas na melhoria de seu próprio crescimento e do destino da civilização. No caminhar
do mundo empresarial, “o papel dos administradores torna-se relevante e primordial,
repousando em suas mãos o futuro da civilização moderna, uma vez que tomam decisões que afetam a vida das pessoas e modelam até mesmo o seu destino” (2001:16).
Portanto, na realidade da vida de
um pequeno grupo de pessoas ou na realidade das empresas, o processo de tomada de decisão é bastante complexo. Isso
porque o cotidiano dessas realidades, até
usualmente semelhantes, concretiza-se por
um emaranhado de decisões entre diferentes alternativas dinâmicas e complexas.
Chega-se aqui que as definições etimológicas revelam a diversidade de conceitos na
amostragem das palavras ‘tomada’ e ‘decisão’, conclamando que a expressão sintag-
mática ‘tomada de decisão’ não se define
por um só caminho.
2.1. Decisões programadas e não-programadas
Sabe-se que a tomada de decisão
não pode acontecer no acaso em uma empresa. Isso porque os problemas diferentes
exigem uma diversidade de tomada de decisões. Faz-se necessário destacar, entretanto, que há as decisões programadas e
as não-programadas.
As decisões programadas são soluções para problemas rotineiros, que são
determinadas por regras, procedimentos ou
hábitos. E também, as decisões programadas são tomadas conforme as bases políticas, procedimentos ou regras, as quais
podem ser escritas ou orais. Essas, muitas
vezes, simplificam a tomada de decisão em
situações repetitivas, limitando ou excluindo alternativas. As decisões programadas
servem para enfrentar situações simples ou
complexas. No entanto, elas limitam a liberdade do administrador, pois há as amarras
organizacionais que condensam o tempo
no intuito de economizar a sua atenção
para outras atividades mais excepcionais e
importantes na empresa (STONER e FREEMAN, 1999:184).
As decisões não-programadas
são soluções específicas criadas por meio
de um processo não-estruturado para resolver problemas não-rotineiros. Essas se
destinam a problemas incomuns ou excepcionais que necessitam de atenção mais
acurada do administrador e merecem tratamento especial porque, na verdade, a maioria dos problemas significativos da empresa
perpassa pela hierarquia organizacional.
Isso significa que quanto mais um administrador ascende na estrutura da empresa,
mais suas decisões serão não-programadas, e ainda, essas passam pelo processo
racional. Por isso que o administrador deve
estar capacitado para esse tipo de decisão.
Ressalta-se, nesse contexto, que
os administradores ao tomarem decisões
enfrentam e pesam diferentes alternativas,
que envolvem acontecimentos futuros de
difícil previsão no processo decisório. Tais
procedimentos vão das certezas às incerInterciência
& Sociedade
51
SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S.
tezas e vice-versa. Por um tempo previsto,
as condições de certeza dão-lhes um certo
grau de controle. Nesse sentido, o papel do
administrador torna-se significativo no como
transita entre as situações programadas e
não-programadas por situações em turbulências. O controle do administrador torna-se grande quando se aproxima e/ou chega
à certeza. E o contrário acontece quando da
incerteza à turbulência leva-o ao controle
bastante pequeno.
Os autores definem (1999:184-5)
certeza, risco, probabilidade, incerteza e
turbulência da seguinte forma:
• certeza: condição para tomada
de decisão em que os administradores têm
informações precisas, mensuráveis e confiáveis sobre os resultados das várias alternativas que estão sendo consideradas.
• risco: condição para tomada de
decisão em que os administradores conhecem a probabilidade de que uma determinada alternativa leve a um objetivo ou resultado desejado.
• probabilidade: medida estatística da chance de que um determinado evento ou resultado venha a ocorrer.
• incerteza: condição para tomada
de decisão na qual os administradores enfrentam situações externas imprevisíveis ou
não têm as informações necessárias para
estabelecer a probabilidade de determinados eventos.
• turbulência: condição para tomada de decisão que ocorre quando as metas
não são claras ou quando o meio ambiente
muda muito depressa.
Vale lembrar que, em face da complexidade do mundo moderno e atual, as decisões são plausíveis de mudanças porque
a instabilidade da economia atinge direta
ou indiretamente o cotidiano das pessoas,
e dessa maneira, o controle dos administradores por meio das decisões programadas
permanece-se no intuito de libertar, com
discernimento, suas próprias decisões em
relação a situações diversas. Nas palavras
de Solino e El-Aouar (2001:16), conclama-se “a análise das habilidades gerenciais
requeridas pelas empresas globalizadas”,
assim:
52
Insertas em um contexto de incerteza e
de rápidas mudanças, as empresas estão buscando, cada vez mais, mecanismos que possibilitem maior capacidade
de adaptação e até mesmo de antecipação a essas mudanças, para tornarem-se mais competitivas e, desse modo,
continuarem atuando em um mercado
cada vez mais dinâmico.
Os autores acima destacam que
extensas mudanças estão ocorrendo nas
estruturas organizacionais, processos, sistemas, participação, delegação, liderança,
culturas corporativas e na administração
do talento humano, fazendo do administrador um tomador de decisões sólidas e
dominantes, mostrando sua capacidade de
saber lidar com as novas exigências, que
são feitas às organizações pelos mercados
mais competitivos que buscam maior responsabilidade das pessoas na organização
empresarial.
Para Chiavenato (2000), essa organização é um complexo de sistema de
decisões em que não só o administrador
quem toma as decisões, mas todas as pessoas, nesse contexto, em todas as áreas
de atividades e níveis hierárquicos e em todas as situações estão de modo contínuo
tomando decisão relacionadas ou não com
o trabalho. Segundo esse mesmo autor, o
comportamento humano nas organizações
é visualizado de modo diferente por meio
das diversas teorias de Administração. Para
ele, ressaltam-se três teorias, a saber:
• Teoria Clássica de Administração: Considera os indivíduos participantes
da organização instrumentos passivos cuja
produtividade varia e pode ser elevada mediante incentivos financeiros (remuneração
de acordo com a produção) e condições físicas ambientais de trabalho favoráveis. É
uma posição simplista e mecanicista.
• Teoria das Relações Humanas:
Considera os indivíduos participantes da
organização possuidores de necessidades,
atitudes, valores e objetivos pessoais que
precisam ser identificados, estimulados e
compreendidos para obter sua participação
na organização, condição básica para sua
eficiência. É uma posição limitada.
Interciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
• Teoria Comportamental: Os indivíduos participantes da organização percebem, raciocinam, agem racionalmente e
decidem a sua participação ou a não-participação como tomadores de opinião e decisão e solucionadores de problemas. (CHIAVENATO, 2000:416)
Dentro de uma organização, cada
pessoa participa consciente e racionalmente, traçando sua função nas escolhas
e decisões entre diferentes alternativas de
acordo com sua personalidade, motivações
e atitudes. Cada pessoa influencia e recebe também influências em rede de informações e interpretações porque cada pessoa
em congruência com a outra, no conjunto
sistêmico, são tomadoras de decisões, processadores de informação e criadores de
opinião em constantes mutações estruturais
e organizacionais (CHIAVENATO, Op. cit.).
2.2. Modelo racional de tomada de decisão
O modelo racional torna-se uma
opção mais acertada e útil para as decisões
não-programadas e para auxiliar os administradores a ultrapassarem um raciocínio a
priori, que este mesmo passa a ser uma solução lógica e/ou correta aos procedimentos decisórios.
Nenhuma abordagem do processo decisório pode garantir que o administrador
tome sempre a decisão certa, mas os
administradores que usam uma abordagem racional, inteligente e sistemática têm mais probabilidade de chegar a
soluções de alta qualidade. (STONER e
FREEMAN, 1999:185)
Para efetuar o modelo racional de
tomada de decisão, faz-se necessário passar pelo processo de quatro etapas ou estágios que colaboram aos administradores a
pesar alternativas e selecionar aquela que
houver chance de sucesso. Desse modo,
o processo genérico de tomada de decisão
racional envolve o diagnóstico, a definição e
a determinação das origens do problema, a
coleta e a análise dos fatos significativos ao
problema, o desenvolvimento e a avaliação
de soluções alternativas, a seleção da alternativa mais satisfatória e a conversão des-
sa alternativa em ação, conforme afirmam
Stoner e Freeman (Op. cit.).
Para eles, o processo racional é
composto de quatro estágios:
• Examinar a situação
• Criar alternativas
• Avaliar as alternativas e selecionar a melhor
• Implementar e monitorar a decisão
Ao examinar a situação, a investigação subjacente perpassa por três aspectos: primeiramente, a definição do problema
- quando o administrador deve discernir os
acontecimentos ou questões que descrevem sintomas de dificuldade espraiados
pela organização. Em seguida, a identificação dos objetivos da decisão - quando
o administrador deve decidir o que poderia
ser considerado como uma solução efetiva
e deve determinar que partes do problema
ele tem de resolver e quais deveriam resolver. No terceiro aspecto, deve se fazer um
diagnóstico das causas - o administrador
deve determinar as ações necessárias para
realizar a solução satisfatória. No entanto,
deve antes obter uma compreensão firme
de todas as origens do problema a fim de
formular hipóteses sobre as causas. Essas
causas muitas vezes estão camufladas no
sistema organizacional e, assim, passa a
exigir do administrador a intuição para identificá-las.
Ao criar alternativas, o administrador deve saber discernir as alternativas
relevantes daquelas não viáveis para o problema delimitado. Quando se faz a escolha
pelas alternativas mais viáveis e criadas, o
administrador corre menos risco de cair em
tentação de solucionar problemas, propondo alternativas espontâneas sem o aparato
racional e sem a preocupação com a realidade ou a tradição.
Ao avaliar as alternativas e selecionar a melhor, o administrador, depois
de ter criado um conjunto de alternativas,
e para cada uma delas, deve perpassar por
três perguntas fundamentais: 1. Esta alternativa é exequível? 2. Esta alternativa é
uma solução satisfatória? 3. Quais são as
consequências possíveis para o resto da orInterciência
& Sociedade
53
SANTADE, H. O. do A.; BIEMBENGUT SANTADE, M. S.
ganização? Para cada uma dessas perguntas, surgem outras questões conectadas,
dando caminhos mais claros para se chegar
à seleção da melhor alternativa que apresentará a tomada de decisão racional para
a solução e/ou avaliação mais acertada. A
partir do momento em que uma alternativa
for considerada melhor, ela mesma gera
outra dicotomia “sim” ou “não” na busca de
outra alternativa positiva e assim por diante
até se chegar uma alternativa bem selecionada nesse estágio do modelo racional.
Ao implementar e monitorar a
decisão, o administrador já estará, neste
estágio, com a melhor alternativa para enfrentar as exigências e os problemas que
podem ser suscitados em sua implementação. Isso significa que a implementação
de uma decisão um conjunto de fatores
e recursos que devem ser apontados de
acordo com a necessidade do administrador monitorar a decisão. Nesse contexto,
o administrador estabelece orçamentos e
cronogramas para a operacionalização da
decisão. E esse processo decisório deve
ser medido em termos específicos pelas
tarefas atribuídas com responsabilidade
para haver, em seguida, os procedimentos
na feitura de relatórios sobre o processo e
para, na sequência dele, fazer as correções
caso surjam novos problemas. Conclui-se
que “orçamentos, cronogramas e relatórios
de processo são essenciais para o desempenho das funções dos administradores”
(STONER e FREEMAN, 1999).
Durante todo o processo decisório
nas quatro etapas, identificaram-se os riscos e as incertezas, que jamais podem ser
esquecidas ou descartadas no momento de
avaliação. Muitas vezes, acredita-se que o
que emerge na decisão deve ser lembrado.
No entanto, as incertezas possíveis e os
riscos potenciais dão caminhos para reexaminar sua decisão para, assim, elaborar
planos mais afinados e detalhados a fim de
lidar melhor com riscos e incertezas que podem advir no sistema organizacional. Vale
salientar, nesse momento, que uma decisão pode ser tomada como a melhor pelo
administrador, mas os subordinados, no organograma empresarial, não estarem preparados para realizá-la de maneira eficaz.
Assim, toda a decisão deve ser monitorada
54
em processo contínuo pelo(s) gestor(es).
Ao tomar decisões que precisem da
aceitação por parte dos outros, os administradores eficazes compartilham as
responsabilidades da tomada de decisão
com os subordinados quando as prováveis melhoras da qualidade e do moral
do pessoal ultrapassem os prováveis
custos em tempo e dinheiro, sabendo
que os administradores continuam com
a responsabilidade final pela tomada e
pela aplicação das decisões. (STONER
e FREEMAN, 1999:195)
2.3. Caminhos intuitivos na empresa
No âmbito empresarial, as decisões constituem o núcleo de grande responsabilidade administrativa porque cabe
ao tomador de decisão a ação de decidir
no momento em que surgem os problemas.
Isso implica a ele saber selecionar entre
uma multiplicidade de alternativas aquela
que melhor pareça adequada para o momento. E, muitas vezes, mesmo com um
modelo racional de tomada de decisão, não
se sanam os problemas de modo estabilizante. Embora, no poder decisório, o fracasso ou o sucesso não esteja explícito, há
a necessidade de tirar o endurecimento das
decisões racionais e prontas.
Apesar do modelo racional de tomada de decisão dar suporte para a identificação de problemas, para o estabelecimento de objetivos e metas específicas e
de medida de resultados, para desenvolvimento de alternativas, para escolha de uma
alternativa, para implantação da decisão e
para o controle e avaliação, há constantemente ‘buracos negros’ no processo decisório.
Na verdade, o processo raciocinar
nasce do emocionar, segundo Maturana
(2001). Na travessia entre o emocionar e o
racionar, surge a intuição em qualquer atividade da vida comum ou da organização
empresarial. A intuição é a percepção imediata das coisas e ela é um saber que antecede ao raciocínio lógico.
De nada serve guardar arquivos com conhecimentos que não vão ser compar-
Interciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
tilhados com nossos congêneres. Não
há razão para manter informação que
não vai enriquecer a vida cotidiana da
existência singular. Nenhum sentido tem
acumular verdades que não se transformam em padrões de vida e critérios certos para relacionar-nos com as outras
espécies viventes. Não é possível continuarmos pensando o técnico como sede
do saber, porque o conhecimento não
está aqui nem ali, nem no sujeito nem
no objeto, mas num lugar intermediário,
lugar da interação e da construção conjunta. Um modelo de conhecimento que
não exclua a ternura ingressa necessariamente pela racionalidade ecológica,
considerando fundamental a dependência, a descentralização e a singularidade, aberto à interação e sem fechar-se
em nenhum momento com a arrogância
de um gesto imperial. (RESTREPO,
1998:85)
Conforme esse autor, o texto contempla as formas perceptivas e emocionais,
contrapondo com o profissional que só toma
suas decisões racionais num relacionamento frio e objetivo. Isso porque “a vivência da
rotina é, antes de tudo, um problema perceptual” (1998:98).
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O texto que aqui foi exposto possui
vários pontos que devem ainda serem explorados, a saber: (i) o modelo não é estático, ou seja, a pontuação deve ser ajustada
no tempo e no espaço, ou seja, ele deve ser
dimensionado com a região em que se aplica e também ser revisto de tempos em tempos, pois é certo que pequenas flutuações
irão ocorrer. Além disso, há como mudar
o nível de risco que neste trabalho foi assumido em 50%, ou seja, conforme algum
“termômetro econômico” ou grupo de especialistas, este nível pode variar para mais
ou para menos, conforme os interesses no
instante; (ii) haveria que se fazer uma análise estatística das componentes principais
para determinar vetores que adimplentes e
inadimplentes possuem em comum; (iii) há
como fazer um tratamento difuso das informações e daí criar medidas de “possibilidade”, diferentes das criadas neste estudo.
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Hélio Oliva do Amaral Santade é Mestre em Administração pela Universidade Metodista de Piracicaba-UNIMEP.
Especialista em Controladoria pelo Instituto Paulista de Ensino e Pesquisa - IPEP, Mantenedora da Faculdade de Ciências Empresariais – FACEMC. Graduado em Economia pela Universidade de Marília-UNIMAR-SP.
Atualmente é professor de Contabilidade e Administração Financeira do Curso de Administração da Faculdade
Municipal Professor Franco Montoro-FMPFM e do Curso de Administração da Instituição de Ensino São Francisco-IESF em Mogi Guaçu-SP. Consultor de Empresa e Gerente Administrativo da GS Informática e Gerente Geral da
Empresa Vita Suco de Mogi Guaçu-SP-Brasil. Possui larga experiência na área de Administração, com ênfase
em Administração Empresarial como Gerente de Custos e Vendas, atuando principalmente nos seguintes temas:
produção; qualidade; custos; crm; relacionamento; marketing.
Maria Suzett Biembengut Santade é Pós-Doutora em Letras na Linha de Pesquisa: Ensino da Língua Portuguesa: história, políticas, sentido social, metodologias e pesquisa, no Instituto de Letras da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro-UERJ-Brasil. Pós-Doutora em Educação na área de Metodologia do Ensino do Português, no
Instituto de Educação da Universidade do Minho-UMINHO, Braga-Portugal. Doutora em Educação pela UNIMEP.
Mestre em Educação pela PUC-Campinas. Graduada em Letras Vernáculas - Francês e Inglês em Línguas e Literaturas pela FFCL-UNESP. Graduada em Pedagogia com Habilitação em Administração e Supervisão. Atualmente
é professora colaboradora da UERJ e Pesquisadora do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil / CNPq / Grupos de Pesquisa: Semiótica, leitura e produção de textos e Crítica Textual e Edição de Textos (UERJ-CNPq). Coordenadora e Professora Titular do Curso de Letras na Graduação & Pós-Graduação Lato Sensu das Faculdades
Integradas Maria Imaculada-FIMI e Professora Titular da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro-FMPFM
de Mogi Guaçu-SP-Brasil.
56
Interciência
& Sociedade
CONSTRUÇÃO DE UM CONTROLADOR DIGITAL DE PROCESSOS
DINÂMICOS: possibilidades para educação tecnológica
CAMARGO, José Tarcísio Franco de
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal (CREUPI)
Centro Guaçuano de Educação Profissional “Gov. Mário Covas”
[email protected]
BARROS FILHO, Jomar
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
[email protected]
BORTOLOTI, João Alexandre
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
[email protected]
VERASZTO, Estéfano Vizconde
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
Instituição de Ensino São Francisco (IESF)
[email protected]
MAIA, Daltamir Justino
Faculdade Comunitária de Campinas (FAC)
[email protected]
RESUMO: Este projeto apresenta um controlador programável flexível, eficiente e de baixo custo,
construído com o propósito de fornecer um instrumento alternativo para o controle digital de processos
dinâmicos. Dentro deste escopo, apresentamos a sua concepção eletrônica, sua proposta para programação, alguns módulos de interfaceamento e possíveis aplicações para o mesmo. Particularmente,
esta proposta se direciona ao desenvolvimento de trabalhos de iniciação científica com características
interdiciplinares, envolvendo o curso de Ciência da Computação, permitindo que os alunos de graduação revejam e implementem boa parte dos conceitos teóricos já estudados, ao mesmo tempo em que
proporciona aos alunos uma visão mais ampla das implicações sociais do uso da tecnologia na qual
estão envolvidos.
PALAVRAS-CHAVE: controle, automação, informática, eletrônica.
ABSTRACT: This project presents a flexible programmable controller, efficient and with low cost, built to
provide an alternative instrument to digitally control a dynamical process. Within this scope, we present
the electronic conception, its programming paradigm, some interface modules and possible applications
for the device. In particular, this proposal is driven to the development of scientific works with interdisciplinary characteristics, involving the Course of Computer Science, allowing the under graduation students to review and implement a large range of theoretical concepts already studied, at the same time it
offers to the students a wider view of the social impacts of the use of the technology they are involved.
KEYWORDS: control, automation, informatics, electronics.
Interciência
& Sociedade
57
CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA,
D. J.
1. INTRODUÇÃO
O custo relativamente alto de um
controlador lógico programável (CLP) muitas vezes torna o seu uso proibitivo para
determinadas aplicações, tornando-o basicamente um elemento presente apenas
em empresas de médio ou grande porte
que necessitam do controle automático de
seus processos. Assim, uma grande classe
de potenciais usuários torna-se excluída do
uso desta tecnologia, se levados em consideração os seus custos.
Além disso, os CLPs oferecem aos
alunos dos cursos das áreas ligadas à Ciência da Computação a oportunidade de
desenvolvimento de diversos trabalhos com
características mais interdisicplinares, através de tecnologias capazes de trabalhar na
interface de várias disciplinas dos cursos de
graduação promovendo assim uma primeira oportunidade de integração.
Ressalta-se que os custos não se
encontram, necessariamente, no hardware
do dispositivo, mas inclusive no software
que gerencia o mesmo, o qual muitas vezes
apresenta um custo bastante superior ao do
hardware.
Neste sentido, torna-se bastante
atraente a ideia de se desenvolver um controlador que seja, simultaneamente, acessível em termos de seus custos e flexível
em termos de suas aplicações. Para se alcançar este objetivo, é interessante adotar
como modelo uma estrutura modular, onde
a um bloco fundamental (o controlador em
si) são adicionados módulos com funções
específicas conforme a necessidade do
processo a ser controlado. Por exemplo,
para o controle de um servomotor poderá
ser utilizado um módulo diferente daquele
que seria utilizado para o controle de um
aquecedor. Assim, a necessidade de um
determinado módulo não implica na aquisição compulsória de outros.
A possibilidade de o sistema cole-
58
tar dados e, baseando-se nestas informações, tomar decisões de controle gera um
processo automatizado muito mais sofisticado que um mero sistema mecanizado
cujo objetivo é realizar uma série de ações
por repetidas vezes.
Sob o ponto de vista do software,
pode-se adotar postura semelhante, considerando-se que rotinas específicas podem
ser desenvolvidas para aplicações específicas. Esta postura certamente contribui para
a redução do custo do software, pois:
•
atende apenas às particularidades de uma determinada necessidade de controle;
•
reduz a probabilidade de
ocorrência de bugs no software desenvolvido;
•
reduz o tempo de criação do
software e
•
contribui para a facilitar o
aprendizado do uso do sistema de
controle.
As seções seguintes apresentam detalhes sobre a proposta deste artigo.
2. Definição do modelo para o controlador
Conforme indicado pela Figura 1,
este controlador atua sobre um processo
em regime de malha fechada. De acordo
com esta Figura, o controlador pode atuar
em modo “autônomo”, quando todo o processo de controle é realizado pelo mesmo,
ou em modo “supervisionado”, quando o
controle do processo é dividido entre o controlador e um computador.
Como pode ser observado através
da Figura 1, o controlador é capaz de coletar informações (dados) provenientes das
“variáveis de estado” do processo sob controle e atuar sobre este processo mediante
a análise das instâncias destas variáveis.
Interciência
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Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação
tecnológica
Nesta arquitetura, os módulos auxiliares são os elementos que efetivamente
coletam informações e atuam sobre o sistema. O módulo de controle, por sua vez, é
capaz de receber informações dos módulos
auxiliares de entrada, processá-las internamente e acionar os devidos módulos auxiliares de saída, atuando diretamente sobre
o controle do processo, caso este se encontre em modo “autônomo”. Caso o controlador encontre-se em modo “supervisionado”,
este deverá repassar informações sobre o
estado do processo para um computador
externo, aguardando comandos deste computador para o acionamento dos módulos
auxiliares adequados.
A correta seleção entre os modos de
operação “autônomo” ou “supervisionado”
para o controle do processo é importante
pois, considerando-se a relativa simplicidade do controlador, em determinados casos
o módulo de controle será incapaz de processar em tempo hábil um certo volume de
informações de entrada. Neste caso, torna-se imprescindível a utilização de um computador externo de forma a não ser comprometido o desempenho do processo a ser
controlado.
Figura 1. Representação do modo de atuação
do controlador (elaborado pelos autores).
Tendo por base a proposta de utilização de uma estrutura modular, a arquitetura do controlador pode ser esboçada de
acordo com a Figura 2.
3. Implementação do hardware do controlador
Figura 2. Estrutura modular proposta para o
controlador (elaborado pelos autores).
Seguindo a linha da flexibilidade desejada para o controlador, pode-se propor
ao menos duas soluções simples, eficientes
e de baixo custo para o Módulo de Controle. Caso o processo a ser controlado admita
apenas variáveis digitais, ou caso a atuação
sobre este necessite apenas de um controle
por PWM (Pulse Width Modulation), um microcontrolador apenas com entradas e saídas digitais pode ser suficiente. A Figura 3
apresenta esta versão mais simples para o
Módulo de Controle.
Interciência
& Sociedade
59
CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA,
D. J.
Figura 3. Módulo de controle exclusivamente digital (elaborado pelos autores).
Este circuito tem como elemento
principal um microcontrolador PIC 16F628A
(MICROCHIP TECHNOLOGY, 2009) com
duas portas, sendo que a “Porta A”, de 5
bits, é utilizada como canal de comunicação
entre este microcontrolador e um computador, e a “Porta B”, de 8 bits, é utilizada como
canal (digital) de comunicação entre o microcontrolador e os módulos auxiliares.
A “Porta A” não se comunica diretamente
com um computador externo. Esta comunicação é realizada através de um circuito integrado MAX232 (TEXAS INSTRUMENTS,
2002), o qual se conecta a uma porta serial
padrão RS-232 do computador, tal que a
comunicação microcontrolador / microprocessador possa ser efetivamente realizada.
60
Por sua vez, a “Porta B” do microcontrolador pode ser diretamente conectada
a linhas digitais convencionais, importando
ou exportando dados para os módulos auxiliares. Na implementação apresentada, a
“Porta B” encontra-se preparada para também atuar como geradora de sinais PWM
para o acionamento de servomotores adequados.
Conforme mencionado previamente,
esta implementação não prevê o controle
de sinais analógicos, o que a torna significativamente limitada. De forma a compensar
esta limitação, a Figura 4 apresenta uma
implementação que prevê a utilização de
sinais analógicos e digitais.
Interciência
& Sociedade
Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação
tecnológica
Figura 4. Módulo de controle com capacidade analógica (elaborado pelos autores).
Esta implementação se fundamenta
na utilização de um microcontrolador PIC
16F877A (MICROCHIP TECHNOLOGY,
2002), dotado de cinco portas, com capacidade de tratamento de sinais digitais e
analógicos. Nesta arquitetura, além do microcontrolador em si, há basicamente um
circuito integrado MAX232, responsável
pela comunicação do controlador com um
computador externo, além de dois circuitos
integrados reguladores de tensão.
A “Porta A” do microcontrolador
pode ser utilizada como via de entrada e
saída digital, além de entrada analógica de
dados. A “Porta B” foi concebida para fornecer sinais PWM para servo-motores eventualmente conectados ao controlador. Esta
configuração pode ser revertida para o uso
de sinais digitais ordinários sem necessidade de alteração no hardware da placa. A
“Porta C” concentra o canal de comunicação do controlador com o computador externo, através da interface RS-232. A “Porta D” foi concebida para operar em modo
puramente digital, podendo ser acionada de
forma “bit-a-bit” ou como uma porta paralela de oito bits. Finalmente a “Porta E” pode
operar como entrada/saída digital, entrada
de controle digital ou entrada analógica.
3.1. Módulos auxiliares
Conforme mencionado anteriormente, os módulos auxiliares são constituídos
pelos elementos eletrônicos adicionais necessários para que o módulo de controle possa interagir adequadamente com o
processo sob controle do mesmo. Dada a
proposta de arquitetura flexível, não há um
número fixo e previsível de módulos para
este projeto. Assim, os módulos devem ser
criados em função das necessidades de
controle de cada processo.
A Figura 5 ilustra um possível módulo auxiliar de entrada, que pode ser utilizado como parte do mecanismo de monitoramento da temperatura de um processo, por
exemplo.
Interciência
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CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA,
D. J.
Figura 5. Módulo auxiliar de entrada para
verificação de temperatura (elaborado pelos
autores).
Trata-se de um módulo bastante
simples, baseado em um sensor de temperatura LM35 (NATIONAL SEMICONDUCTOR, 2000), acoplado a um amplificador
operacional que promove um ganho no sinal proveniente deste sensor e o entrega a
uma das entradas analógicas do microcontrolador.
Como exemplo de um módulo auxiliar de saída, podemos ter um driver de
motor de passo, conforme apresentado na
Figura 6.
Este módulo é composto exclusivamente por um circuito integrado ULN2003
(ST MICROELECTRONICS, 2007) que
funciona como um driver para o motor de
passo. O sinal digital proveniente do microcontrolador é amplificado pelo driver, sendo
posteriormente entregue ao motor de passo. O controle da sequência de acionamento do motor (full step / half step) é gerado
previamente pelo microcontrolador.
Alguns dispositivos não necessitam
de interfaces ou módulos auxiliares para serem acionados pelo controlador. É o caso,
por exemplo, de pequenos servomotores,
acionados por PWM, que podem ser conectados diretamente no módulo de controle.
Neste caso, o acionamento de um ou mais
servo motores exigirá que o microcontrolador seja devidamente programado e, também, que o módulo de controle opere em
“modo supervisionado”.
Em várias engenharias como de produção e química estes processos são largamente empregados. O interfaceamento está
presente no controle de reatores, linhas de
alimentação, monitoramento, controladores
de pressão, amostradores e linhas de descarte.
Algumas outras implementações
interessantes para este tipo de controlador
podem ser observadas em (IOVINE, 2004).
A seção seguinte descreve como os elementos de software se encaixam no contexto deste controlador.
4. O software do controlador
O software do controlador pode ser dividido
em duas partes:
Figura 6. Módulo auxiliar de saída para acionamento de um motor de passo (elaborado pelos
autores).
62
1. um firmware, interno ao microcontrolador, que efetivamente
receberá e enviará comandos
aos módulos auxiliares, além de
efetuar o controle do fluxo de informações entre o próprio controlador e um microcomputador e
2. uma “interface com o usuário”,
caso o controlador venha a atuar
em modo “supervisionado”, através da qual um “operador” desta interface poderá efetivamenInterciência
& Sociedade
Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação
tecnológica
te atuar sobre o processo a ser
controlado.
As subseções seguintes apresentam mais detalhes sobre o firmware e sobre
a interface com o usuário.
4.1. O firmware do microcontrolador
O firmware que ficará embutido no
microcontrolador deverá ser implementado
de acordo com o modo de operação em
que se pretende utilizar o controlador. Caso
este deva funcionar em modo “autônomo”,
todas as rotinas de tratamento do processo sob controle deverão ser previstas neste
firmware, tornando o controlador independente de um computador externo. Ao contrário, caso o controlador venha a atuar em
modo “supervisionado”, o firmware deverá
ser implementado de forma a encaminhar
ao computador externo as devidas instâncias das variáveis de controle do processo,
recebendo deste os comandos exatos para
a atuação sobre o processo, acionando os
módulos auxiliares adequados.
Como exemplo ilustrativo, considere o controlador apresentado na Figura 3,
operando em modo supervisionado, sendo
utilizado para controlar simultaneamente a
posição de oito servomotores.
Neste caso, o firmware deverá ser
desenvolvido de forma a receber “comandos” provenientes da interface com o usuário, os quais indicarão as ações a serem
executadas pelos servomotores acoplados
ao controlador. Para tanto, o microcontrolador da interface de controle foi configurado
tal que sua “Porta A” seja utilizada para a
comunicação serial entre este e um microcomputador e sua “Porta B” seja utilizada
para o acionamento dos servos.
As instruções de comando deverão
ser descritas sob a forma de um ou dois
bytes, dependendo da ação a ser realizada. Normalmente, em uma instrução de
dois bytes o primeiro indicará a ação a ser
executada (“byte de comando”) e o segundo será o parâmetro deste comando (por
exemplo, o ângulo de rotação do servomotor). Um “byte de comando” é dividido em
dois nibbles, sendo que os quatro bits mais
significativos indicam o comando propriamente dito e os quatro bits menos signifi-
cativos indicam o “canal” (servomotor) a ser
acionado. O firmware reconhece os seguintes tipos de instrução:
•
Reinicialização do dispositivo:
todas as saídas são desligadas e os servos são desabilitados (um byte).
•
Habilitação de servomotor: torna um determinado servomotor apto a
receber comandos de posicionamento.
O microcontrolador começa a gerar pulsos para um dado servomotor (um byte).
•
Desabilitação de servomotor:
torna um determinado servomotor incapaz de receber comandos de posicionamento. O microcontrolador pára de gerar
pulsos para um dado servomotos (um
byte).
•
Ajuste de centro (offset) de servomotor: determina a posição central
de um determinado servomotor. A partir
desta posição o servomotor poderá se
deslocar de 45o para a direita ou para a
esquerda (dois bytes).
•
Ajuste de posição de servomotor: determina a orientação do eixo do
servomotor a partir do “ponto de offset”
previamente ajustado (dois bytes).
O fluxograma seguinte indica o
funcionamento básico do firmware do controlador nesta situação.
1. Desabilita todas as interrupções do microcontrolador.
2. Configura “Porta A” do microcontrolador como
porta de I/O serial.
3. Configura a “Porta B” do microcontrolador como
porta de saída para os servomotores.
4. Desabilita a recepção de dados mantendo a via
CTS em nível alto.
5. Transmite mensagem de “power on” para a interface com o usuário.
6. Inicializa os servomotores.
7. Habilita a interrupção de “Timer 0” do microcontrolador.
8. Inicializa o “timer” de 20ms (ciclo dos servomotores).
9. Habilita a recepção de dados mantendo a via CTS
em nível baixo.
10. Captura um comando através da porta serial.
11. Desabilita a recepção de dados e mantendo a via
CTS em nível alto.
12. Processa o comando recebido e atualiza o estado dos servomotores se necesário.
13. Aguarda a conclusão do ciclo de 20ms e retorna
a (8.).
Interciência
& Sociedade
63
CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA,
D. J.
Pode ser notado que, além dos parâmetros de configuração do sistema, o firmware consiste em uma rotina que, a cada
20 ms (período de trabalho dos servomotores), faz uma leitura da porta serial em busca de um comando e, com este, efetua, se
necessário, a atualização dos servomotores
conectados ao controlador.
A programação e a verificação do firmware do microcontrolador poderá ser realizada através de um sotware fornecido pelo
próprio fabricante (MICROCHIP TECHNOLOGY, 2009).
4.2. A interface com o usuário
Conforme mencionado, a interface
com o usuário só tem sentido se o controlador atuar em modo “supervisionado”. Neste
caso, de acordo com o exemplo inicialmente apresentado na seção anterior, a interface com o usuário tem por finalidade obter
do “usuário” parâmetros para o devido posicionamento de cada um dos servomotores
conectados ao controlador. Através da inter-
face o usuário pode:
• Configurar a porta de comunicação serial onde está conectado o
controlador.
• Habilitar ou desabilitar cada um
dos servomotores conectados
aos controlador.
• Ajustar a posição central (offset)
de cada servomotor.
• Ajustar a posição de cada servomotor.
• Memorizar as posições do conjunto de servomotores (em arquivo).
• Executar “roteiros” que descrevem um conjunto de “posições-alvo” para cada um dos servos.
• Ajustar a velocidade de transição
de posições dos servomotores
durante a execução de um roteiro.
A Figura 7 apresenta o aspecto da interface
com o usuário.
Figura 7. Aspecto da interface com o usuário (elaborado pelos autores).
64
Interciência
& Sociedade
Construção de um controlador digital de processos dinâmicos: possibilidades para educação
tecnológica
Após carregar a interface o usuário
deve, inicialmente, estabelecer a conexão
da mesma com a placa de controle. Para
tanto, ele deve ajustar os devidos parâmetros da porta serial de conexão: número da
porta, velocidade de transmissão / recepção, paridade, número de bits de dados e
número de bits de parada. Após o ajuste
desta configuração, pode-se iniciar a comunicação entre a interface e o controlador. O
indicador “Connected” mostra que a conexão foi estabelecida com sucesso. Tendo
sido estabelecida a conexão com a placa
de controle, a partir deste ponto o usuário
poderá ajustar e gravar a posição de cada
um dos servomotores, criar um “roteiro” de
movimento dos servos ou mesmo executar
(“play” ou “soft play”) um roteiro previamente armazenado. Como pode ser observado,
o ajuste dos servomotores pode ser realizado individualmente. Previamente à execução de um roteiro de posicionamento dos
servos, o parâmetro “Resolution” deve ser
ajustado para que o movimento dos servos
ocorra da forma desejada.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este texto apresentou uma proposta para implementação de um controlador
programável, flexível e de baixo custo, que
pode ser facilmente adaptado para o controle de diversos tipos de processos. O protótipo mostrado na Figura 8 consiste em uma
implementação de baixíssimo custo (inferior
a U$30.00) do circuito apresentado na Figura 3, sendo capaz de controlar de forma eficiente oito servomotores simultaneamente.
5. O controlador e suas possibilidades
educativas
No âmbito de um curso de graduação em Ciência da Computação, este
controlador permite o desenvolvimento de
trabalhos de iniciação científica com características interdiciplinares. Por exemplo,
a partir dos circuitos apresentados, pode-se projetar uma estação meteorológica de
baixo custo que permita realizar o monitoramento de variáveis ambientais tais como
temperatura, pressão atmosférica, humidade relativa do ar, etc. Ou ainda medidas
de parâmetros indicativos da qualidade da
água em rios como o pH e intensidade da
radiação ultravioleta solar. Tais dados podem ser tomados diariamente ao longo de
um semestre inteiro gerando um banco de
dados que, por exemplo, pode ser usado
nas aulas de estatística do curso de engenharia ambiental e mesmo, disponibilizados
para as escolas que estão na mesma região
geográfica da faculdade.
Figura 8: Foto de uma placa de controle (elaborado pelos autores).
A arquitetura modular permite que
sejam implementados apenas os módulos
realmente necessários para o controle de
determinados sistemas, o que pode vir a
reduzir significativamente os custos e o próprio tempo de desenvolvimento do controlador, tanto no nível do hardware, quanto do
software. Da mesma forma, a possibilidade
de operação nos modos “autônomo” ou “supervisionado” contribui para a simplificação
e flexibilização do seu uso.
Um ponto a ser atacado futuramente, na sequência deste projeto, consiste
na necessidade de tornar este controlador
operável de forma remota, por exemplo,
através de uma conexão por rádio-frequência ou mesmo através do acionamento via
internet.
Interciência
& Sociedade
65
CAMARGO, J. T. F. de; BARROS FILHO, J.; BORTOLOTI, J. A.; VERASZTO, E. V.; MAIA,
D. J.
Tomando como norte estas diretrizes e pensando na utilização deste controlador em atividades práticas de ensino, o
desenvolvimento de um projeto deste tipo,
além de permitir que os alunos de graduação revejam e implementem uma boa parte
dos conceitos teóricos de algumas disciplinas específicas do curso de Ciência da
Computação, também permite que estes
estudantes formem uma visão mais ampla
das implicações sociais a respeito do uso
da tecnologia na qual estão envolvidos.
Vale também notar que com o domínio da tecnologia e sua aplicação naturalmente cria-se a expectativa do aperfeiçoamento dos modelos empregados e a
geração de novas linhas de pesquisa. Esta
conseqüência é importante, pois permite
que empresas da região automatizem seus
processos e que novos canais com o meio
acadêmico sejam gerados para o desenvolvimento de novas tecnologias.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
IOVINE, J. PIC Robotics: A Beginner’s Guide to Robotics Projects Using the PICmicro. Mc-Graw-Hill,
2004. ISBN: 0-07-139455-9.
MICROCHIP TECHNOLOGY INC.; PIC 16F87XA
Data Sheet; 2002.
MICROCHIP TECHNOLOGY INC.; MPLAB IDE Quick Start Guide; 2007.
MICROCHIP
TECHNOLOGY
INC.;
16F627A/628A/648A Data Sheet; 2009.
PIC
NATIONAL SEMICONDUCTOR INC.; Precision Centigrade Temperature Sensors; 2000.
ST MICROELECTRONICS GROUP; Seven Darlington Array; 2007.
TEXAS INSTRUMENTS INC.; Dual EIA-232 Drivers/
Receivers; 2002.
José Tarcísio Franco de Camargo é graduado em Engenharia Elétrica (UNICAMP – 1989), possui mestrado em
Engenharia Elétrica na área de Eletrônica e Telecomunicações (UNICAMP – 1992) e doutorado em Engenharia
Elétrica na área de Computação e Automação (UNICAMP – 1995). Atua como professor universitário desde 1990,
sendo atualmente professor e coordenador de cursos na Faculdade Municipal “Professor Franco Montoro” (Mogi
Guaçu – SP) e no Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal (Espírito Santo do Pinhal – SP). Seus
interesses de pesquisa abrangem as áreas de controle e automação e computação gráfica, aplicados ao ensino
de engenharia.
Jomar Barros Filho é graduado em Física (Unicamp – 1997), mestre em Educação na área de Metodologia de
Ensino (Unicamp – 1999) e doutor em Educação na área de Educação, Ciência e Tecnologia (Unicamp - 2002).
Professor universitário desde 2001, ministra disciplinas das áeras de física e matemática em cursos de engenharia. Como pesquisador publica nas áreas de ensino de engenharia e de tecnologia, avaliação da aprendizagem e
formação de professores.
João Alexandre Bortoloti é graduado em Química (Unicamp – 1998), Mestre em Físico-Química (Unicamp –
2001) e Doutorado em Ciências (Unicamp – 2006). Atua como professor universitário desde 2002 em disciplinas
da área de Química, Estatística e Matemática em cursos de engenharia. Como pesquisador publica nas áreas de
Química Analítica, Quimiometria, ensino de Engenharia e Tecnologia.
Estéfano Vizconde Veraszto possui graduação em Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e
é Mestre e Doutor em Educação, Ciência e Tecnologia pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP). Possui estágio doutoral no exterior na Facultada de Ciencias de la Información da Universidad Complutense de Madrid (UCM). Atualmente é diretor e professor da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”, pesquisador do Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação, da Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de Campinas, pesquisador colaborador da Universidad Nacional de Educación a Distáncia
(UNED/España), pesquisador colaborador da Facultad de Ciencias de la Información da Universidad Complutense
de Madrid e docente da Instituição de Ensino São Francisco (IESF).
Daltamir Justino Maia é graduado em Química (Unicamp – 1991), Mestre em Química Inorgânica (Unicamp –
1993) e Doutorado em Ciências (Unicamp – 1999). Atua como professor Titular na Faculdade Comunitária de
Campinas (FAC III), lecionando as disciplinas Química Geral e de Materiais metálicos para Engenharia. Além disso, é autor de livros didáticos na área de Química: Livro texto aprovado no PNLEM 2008 – Universo da Química.
66
Interciência
& Sociedade
CONCESSÃO DE CRÉDITO E MODELAÇÃO
DA TOMADA DE DECISÃO
COSTA, Rodrigo Simão da
Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos (UNIFEOB)
[email protected]
RESUMO: A Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) se tornou obrigatória no Brasil com a criação
da Lei 11.638/2007 e, desde então, todos os profissionais que fazem parte do ambiente empresarial
precisaram conhecer essa demonstração e saber interpretar os seus resultados. Com o presente estudo, procurou-se através de uma pesquisa bibliográfica abordar os conceitos e a estrutura da DFC e, ao
final, apresentar a resolução passo-a-passo de um exemplo prático para demonstrar as suas técnicas
de elaboração.
PALAVRAS-CHAVE: Fluxo de Caixa, Contabilidade, Finanças, Demonstração.
ABSTRACT: The Statement of Cash Flows (CFD) became mandatory in Brazil with the creation of Law
11638/2007, and since then, all professionals who are part of the business environment needed to go
through this demonstration and to interpret their results. In fact, the control box has always been practiced by companies, but the CFD brought a standardization to that tool. As the present study, we sought
through a literature search addressing the concepts and structure of the CFD and at the final table the
resolution step by step in a practical example to demonstrate their techniques of manufacture.
KEYWORDS: Cash Flow, Accounting, Finance, Demo.
1. INTRODUÇÃO
No atual mundo competitivo e globalizado, cada vez mais se torna necessária
a utilização de ferramentas que garantam a
sobrevivência das empresas no mercado.
Com a criação da Lei 11.638, em 28
de Dezembro de 2007, a Contabilidade brasileira passou a ser convertida nos moldes
do padrão internacional, isto é, das IFRS –
International Financial Reporting Standards
e, somada ao intenso processo de informatização do sistema de fiscalização, tornou
a Contabilidade, mais do que nunca, peça
chave para a sobrevivência das empresas.
Uma das novidades apresentada
por essa lei foi a obrigatoriedade da Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC), em
substituição à antiga DOAR – Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos.
Mesmo antes da aprovação da lei,
o IBRACON (Instituto dos Auditores Independentes do Brasil), pela NPC 20, de abril
de 1999, e a CVM (Comissão de Valores
Mobiliários), já recomendavam a apresentação da DFC como informação complementar. (FIPECAFI, 2010, p.565).
Salotti e Yamamoto (2008, p.48)
elaboraram uma pesquisa onde constataram que as companhias abertas que negociam suas ações na BOVESPA, divulgavam
a DFC de forma voluntária antes da adoção
da Lei 11.638/2007 porque já a divulgavam
em período anterior e também porque dão
mais importância às percepções dos seus
outsiders (usuários externos).
Nem todas as empresas estão
obrigadas a apresentar a DFC, por exemplo, ficam dispensadas as sociedades anônimas de capital fechado com patrimônio
líquido reduzido (inferior a R$ 2.000.000,00
na data do balanço) e as sociedades limitadas de pequeno e médio porte (as que
possuem ativo total igual ou inferior a R$
240.000.000,00 ou receita bruta anual igual
ou inferior a R$ 300.000.000,00).
A utilização da DFC pode proporcionar todo um gerenciamento do caixa,
Interciência
& Sociedade
67
COSTA, R. S. da
onde as empresas podem identificar os períodos de sobra e escassez de recursos.
Sobre esse aspecto, Marion (2009, p.446)
diz que “por meio do planejamento financeiro o gerente saberá o montante certo
em que contrairá empréstimos para cobrir
a falta (insuficiência) de fundos, bem como
quando aplicar no mercado financeiro o excesso de dinheiro, evitando, assim, a corrosão inflacionária e proporcionando maior
rendimento à empresa”.
O objetivo desse artigo é apresentar os conceitos de caixa e a estrutura da
DFC, elaborando-se um exemplo prático no
final. Pretende-se demonstrar uma linha de
raciocínio para acompanhar o passo-a-passo da elaboração de uma DFC.
Como metodologia, foi realizada
uma pesquisa bibliográfica para se identificar os conceitos utilizados na DFC nos mais
recentes materiais publicados sobre o assunto e através de sua conclusão, espera-se contribuir para um melhor entendimento
sobre essa tão importante demonstração
contábil, e que o material sirva para posteriores estudos.
2. A Demonstração dos Fluxos de Caixa
(DFC)
O objetivo da DFC é evidenciar as
variações ocorridas no disponível das empresas entre um determinado período de
tempo. Observe que apesar do nome “fluxos de caixa”, farão parte dessa demonstração todas as contas do grupo do disponível,
isto é, caixa, bancos e aplicações de liquidez imediata (como a caderneta de poupança, por exemplo).
Segundo a FIPECAFI (2010,
p.565) “o objetivo primário da Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) é prover informações relevantes sobre os pagamentos
e recebimentos, em dinheiro, de uma empresa, ocorridos durante um determinado
período”.
O conceito trabalhado na DFC é o
regime de caixa onde se evidencia o que
realmente entrou e o que realmente saiu de
recursos no disponível das empresas.
As informações históricas do fluxo de caixa são extremamente importantes
para o planejamento futuro de qualquer em-
68
presa, onde através de projeções, é possível construir cenários e se antecipar na execução das ações.
Os resultados da DFC também são
importantes para auditar as informações
contábeis na busca por erros e possíveis
fraudes contábeis, conforme comentado
por Lamas e Gregório (2009, p.101) e Marion (2009, p.446).
Serão alvos da DFC todos os recebimentos, ou entradas, e pagamentos, ou
saídas, de caixa (ou disponível). Quando
uma operação representar uma entrada de
caixa, deverá ser somada na demonstração
e, quando representar uma saída, deverá
ser subtraída na demonstração.
No próximo capítulo, serão abordadas a estrutura e as formas de apresentação da DFC.
3. Estrutura e Formas de Apresentação
da DFC
A elaboração de um fluxo de caixa pode ser feita de várias maneiras, pois
cada pessoa ou empresa poderia realizar
o controle dos recebimentos e pagamentos
de caixa conforme seus próprios entendimentos.
Porém, segundo Lamas e Gregório (2009), ao se elaborar uma DFC estruturada em normas, é possível comparar o
desempenho operacional entre diferentes
empresas, uma vez que elimina os efeitos
desiguais dos possíveis tratamentos contábeis.
Em razão dessa necessidade de
uniformização das demonstrações contábeis, torna-se necessário que algumas regras sejam respeitadas na elaboração da
DFC.
A norma contábil responsável por
esta normatização no Brasil é o Pronunciamento Técnico CPC 03 – Demonstração
dos Fluxos de Caixa. Esse pronunciamento
determina a estruturação da DFC em três
atividades: operacionais, de investimentos
e de financiamentos.
As atividades operacionais se referem ao montante dos recursos que a empresa gerou através de sua atividade-fim.
Farão parte dessas atividades os elementos relacionados com a DRE (DemonstraInterciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
ção do Resultado do Exercício). As contas
pertencentes ao Balanço Patrimonial, mas
que foram originadas de transações ligadas
às receitas, custos e despesas, também
deverão ser consideradas, por exemplo:
as contas a receber (relacionadas com as
vendas a prazo), os estoques (relacionados
com os custos), os fornecedores (relacionados com as compras a prazo) e as contas a
pagar (relacionadas com as despesas).
Segundo a FIPECAFI (2010,
p.567), as atividades operacionais “envolvem todas as atividades relacionadas com
a produção e entrega de bens e serviços e
os eventos que não sejam definidos como
atividades de investimento e financiamento”.
Como exemplos de atividades operacionais, poderão ser classificadas como
entradas as vendas à vista, o recebimento
de clientes e o recebimento de juros, e como
saídas, o pagamento de fornecedores, o
pagamento de impostos e o pagamento de
despesas diversas.
As atividades de investimento se
referem às transações onde a empresa utilizou as sobras de caixa e aplicou, investiu
recursos visando um benefício futuro.
Dessa forma, quando há recurso disponível que possa ser investido pela
empresa, ela pode emprestá-lo para terceiros ou investi-lo na compra de ativos fixos
classificados como investimentos, imobilizado ou intangíveis no Balanço Patrimonial.
Quando a empresa adquiri um determinado
ativo fixo, isso representará uma saída de
caixa e, quando vende algum desses ativos, representará uma entrada de caixa.
Na IAS 7, a importância da divulgação separada de fluxos de caixa de atividades de investimentos é destacada, onde diz
ser “importante porque os fluxos de caixa
representam a extensão dos gastos efetuados com recursos destinados a gerar receita e fluxos de caixa futuros” (IASCF, 2008,
p.862).
Farão parte das atividades de investimentos todas as transações relacionadas com o ativo não circulante do Balanço
Patrimonial. Como exemplos de entradas
têm-se as vendas de investimentos, as
vendas de imobilizado e o recebimento de
empréstimos, e como exemplos de saídas,
têm-se as aquisições de investimentos, de
imobilizado e de ativos intangíveis.
Já as atividades de financiamento,
ao contrário das atividades de investimento,
referem-se às transações onde a empresa
toma recursos emprestados, geralmente,
quando há uma escassez de caixa.
Os recursos podem ser captados
tanto de terceiros, quanto dos próprios proprietários ou sócios das empresas.
Farão parte das atividades de
financiamento todos os elementos relacionados com o exigível a longo prazo, o
patrimônio líquido e os financiamentos e
empréstimos de curto prazo, localizados no
passivo circulante, todos localizados no Balanço Patrimonial.
Para as atividades de financiamento, podem-se citar como exemplos
de entradas de recursos, os aumentos de
capital, as emissões de novas ações e os
empréstimos e financiamentos tomados, e
como exemplos de saídas, os pagamentos
de dividendos, as recompras de ações da
empresa e os pagamentos de empréstimos
e financiamentos.
Algumas transações podem não
ser percebidas somente pelas informações
do Balanço Patrimonial e da DRE, necessitando da utilização de uma outra demonstração contábil, como a Demonstração das
Mutações do Patrimônio Líquido.
O resultado final da DFC será a
soma algébrica dos resultados líquidos de
cada uma das atividades, que deverá ser
conciliada com a diferença entre os saldos
respectivos das disponibilidades, isto é, entre o início e o fim do período considerado
(FIPECAFI, 2010, p.573).
Lustosa e Santos (2004) dizem
que essa classificação em três atividades
é muito útil em termos informativos, mas
também existem alguns aspectos polêmicos que devem ser melhor estudados para
algumas transações financeiras, por exemplo, as reservas de capital.
Algumas situações podem apresentar transações onde os fluxos de caixa
serão classificados em mais de uma atividade, por exemplo, quando há um desembolso de caixa para pagamento de empréstimo, onde os juros podem ser classificados
como atividade operacional e o valor do
Interciência
& Sociedade
69
COSTA, R. S. da
principal deve ser classificado como atividade de financiamento (BRASIL2, 2008).
Existem ainda algumas operações
que não deverão fazer parte da DFC, pelo
fato de não afetarem o caixa, por exemplo,
as depreciações, as provisões, os ganhos
e perdas de equivalência patrimonial, entre
outros.
Também podem acontecer transações de investimento e financiamento sem
efeito no caixa, como por exemplo, as dívidas convertidas em aumento de capital,
mas essas, devem ser evidenciadas em
notas explicativas (FIPECAFI, 2010, p.569).
A DFC pode ser elaborada se-
gundo dois métodos, o direito e o indireto.
A diferença entre eles está nas atividades
operacionais.
No método direto as atividades
operacionais são elaboradas utilizando os
reais recebimentos de clientes, pagamentos de fornecedores e pagamentos de despesas.
Segundo a FIPECAFI (2010,
p.573), “o método direto explicita as entradas e saídas brutas de dinheiro dos principais componentes das atividades operacionais, como os recebimentos pelas vendas
de produtos e serviços e os pagamentos a
fornecedores e empregados”.
BALANÇO PATRIMONIAL – EMPRESA ALFA
ATIVO (em R$)
31/12/X1
Circulante
Disponível
Dupl. a receber
Estoques
Total Circulante
Não Circulante
Investimentos
Part.outras cias
Imobilizado
Móveis e utensílios
(-) Depr. acum.
Terrenos
Total Não-Circul.
Total
PASSIVO (em R$)
31/12/X2
1.500
500
1.000
2.300
1.000
1.500
3.000
4.800
500
500
2.640
2.640
1.200
(200)
2.000
3.000
1.500
(320)
3.000
4.180
3.500
6.820
6.500
11.620
Circulante
Fornecedores
Empr. bancários
I.R. a recolher
Total Circulante
Patrimônio Líquido
Capital social
Lucros retidos
Total do P.L.
Total
31/12/X1
31/12/X2
1.000
1.000
-
2.000
1.470
1.050
2.000
4.520
4.500
4.500
6.000
1.100
7.100
6.500
11.620
DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO FINDO EM 31/12/X2 (em R$)
70
Interciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
Receita Bruta
10.000
(-) CMV
(5.500)
Lucro Bruto
4.500
(-)Despesa Operacional
Desp.Vendas
(500)
Desp. Administração
(380)
Desp.c/Depreciação
(120)
Outras Despesas
(500)
1.500
Lucro Antes Impostos
3.000
(-) Provisão p/ I.R.
(1.050)
Lucro Líquido
1.950
Movimentações
Saldo Inicial em 31/12/X1
Aumento de capital
Capital Social
4.500
1.500
L. Retidos
-
Total
4.500
1.500
Lucro Líquido
1.950
1.950
Distribuição Dividendos
Saldo final em 31/12/X2
(850)
1.100
(850)
7.100
6.000
DEMONSTR. DAS MUTAÇÕES DO PATRIM. LÍQUIDO FINDO EM 31/12/X2 (em R$)
O primeiro método a ser elaborado será o método direto. Para se iniciar a
DFC, primeiramente é preciso conhecer a
variação do disponível. O valor encontrado
é de R$ 800,00, obtido pela diferença do
disponível entre os dois períodos, ou seja,
R$ 2.300,00 menos R$ 1.500,00.
Uma vez encontrada a variação do
disponível, o próximo passo é elaborar as
atividades operacionais, as quais possuem,
basicamente, três elementos: recebimento
de clientes, pagamento de fornecedores e
pagamento de despesas.
Para se encontrar o valor que foi
realmente recebido dos clientes é preciso
realizar um pensamento lógico, considerando todas as vendas como sendo a prazo.
Isso porque não é possível identificar de
forma direta qual seriam os valores à vista e a prazo, pelo fato da Contabilidade ser
elaborada por regime de competência, ou
seja, os fatos contábeis são contabilizados
independentemente do seu recebimento ou
pagamento.
No ano de X1, a empresa tinha
para receber R$ 500,00 (duplicatas a re-
ceber – ativo) e vendeu em X2 mais R$
10.000,00 (receitas brutas – DRE), tendo
para receber, portanto, um montante de R$
10.500,00. Como o valor a receber no ano
de X2 é de R$ 1.000,00 (duplicatas a receber – ativo), significa dizer que a empresa
recebeu a diferença, isto é, R$ 9.500.00 de
seus clientes.
Depois de encontrado o valor do
recebimento dos clientes, é preciso calcular o valor do pagamento das compras. O
raciocínio é bem semelhante ao utilizado no
recebimento dos clientes, com a única diferença, que para se encontrar o valor dos pagamentos dos fornecedores, primeiramente
é preciso encontrar o valor das compras,
o qual está embutido no valor do CMV na
DRE.
O procedimento é utilizar a fórmula
do CMV e substituir os valores que podem
ser encontrados nas demonstrações contábeis. A fórmula está descrita abaixo, já com
os valores rastreados do Balanço Patrimonial e da DRE:
Interciência
& Sociedade
71
COSTA, R. S. da
CMV = ESTOQUE INICIAL + COMPRAS – ESTOQUE FINAL
R$ 5.500,00 = R$ 1.000,00 + COMPRAS – R$ 1.500,00
COMPRAS = R$ 6.000,00
Encontrado o valor das compras,
deve-se também considerá-lo como sendo todo a prazo. O raciocínio é o seguinte:
Se a empresa devia ao seu fornecedor R$
1.000,00 (passivo circulante) em X1, e comprou a prazo em X2 mais R$ 6.000,00, teria
que pagar um montante de R$ 7.000,00 a
ele, mas como aparece no saldo da conta de
fornecedores em X2 apenas R$ 2.000,00,
significa dizer que a empresa realmente pagou aos seus fornecedores a diferença, ou
seja, R$ 5.000,00.
Em relação ao pagamento das
despesas, é preciso relacionar as despesas
da DRE com as contas do passivo. Caso
uma determinada despesa conste na DRE
e também conste, no mesmo valor, no passivo, significa que a mesma ainda não foi
paga, não havendo a necessidade de evidenciá-la na DFC e, caso ocorra o contrário,
deverá ser evidenciada.
As despesas constantes na DRE
são as de vendas, administração, com depreciação, outras despesas e provisão p/
I.R.
É possível verificar que além das
despesas operacionais, também foi incluída a provisão para imposto de renda, pois
também se trata de uma despesa, porém
classificada de uma outra forma.
Dentre as despesas elencadas na
DRE, a única conta que não deverá fazer
parte da DRE é a com depreciação, pelo
fato de não afetar o caixa (não representar
um desembolso).
Fazendo a relação com as contas
de passivo, não é possível verificar nenhuma conta intitulada “contas a pagar” ou alguma coisa parecida, o que demonstra que
todas essas contas foram realmente pagas
pela empresa, com exceção da provisão
para imposto de renda, pois aparece a conta
de “I.R. a recolher”, cujo valor é exatamente
o demonstrado na DRE, o que significa que
tal imposto ainda não foi pago.
Dessa forma, somente serão con-
72
sideradas pagas as despesas com vendas,
administração e outras despesas, cujo montante soma R$ 1.380,00.
Utilizando os valores dos recebimentos dos clientes, pagamento dos fornecedores e pagamento das despesas, as
atividades operacionais totalizam, portanto,
R$ 3.120,00.
Encerradas as atividades operacionais, o próximo passo é elaborar as atividades de investimentos, onde serão utilizados os grupos do ativo não circulante, com
exceção do ativo realizável a longo prazo,
onde será utilizado apenas quando tiver valores relacionados com as vendas de mercadorias a longo prazo.
Na empresa ALFA, todas as contas
do ativo não-circulante tiveram uma variação positiva (aumento), devendo ser consideradas como aquisições da empresa e
saídas de caixa na DFC. A única conta que
não será utilizada é a da depreciação acumulada, pois não afeta o caixa. Aliás, pode-se verificar que a diferença entre os saldos
dessa conta é de R$ 120,00, exatamente o
mesmo valor evidenciado na DRE na conta
de despesas com depreciação.
Considerando as variações das
contas do ativo não-circulante, com exceção da depreciação acumulada, as atividades de investimento totalizam um montante
de R$ 3.440,00 que deve ser subtraído na
DFC por representar uma saída de caixa.
As últimas atividades a serem encontradas são as de financiamento, as quais
se referem aos grupos do exigível a longo
prazo, patrimônio líquido e os empréstimos
e financiamentos do passivo circulante.
Observando o grupo do passivo
circulante, percebe-se que existe uma conta de empréstimos bancários, a qual apresenta uma variação positiva de R$ 470,00.
Isso quer dizer que a empresa necessitou
captar recursos e pegou mais essa quantia
dos bancos, representando assim, uma entrada de caixa na DFC.
Interciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
Já no patrimônio líquido, a conta
capital social também sofreu uma variação
positiva de R$ 1.500,00, representando assim, um aumento de capital realizado pelos
sócios e uma entrada de caixa na DFC.
A outra conta é a de lucros retidos que em X1 não possuía saldo e em X2
passou a ficar com R$ 1.100,00. Como não
tinha nada e agora tem um saldo, subentende-se tratar do lucro líquido do exercício
que foi transportado para essa conta, porém, o valor do lucro líquido demonstrado
na DRE é de R$ 1.950,00. A diferença é de
R$ 850,00 e se justifica pela retirada desse
valor da conta lucros retidos para a constituição de dividendos (localizada no passivo
circulante), que está discriminada na Demonstração das Mutações do Patrimônio
Líquido. Como os dividendos não aparecem no passivo circulante, entende-se que
os mesmos foram pagos pela empresa e,
portanto, devem ser evidenciados na DFC
como uma saída de caixa.
As variações na conta de lucros
retidos não devem ser utilizadas na DFC,
pois, na verdade, as transações que afetaram o seu resultado já foram contempladas
pelas atividades quando foram utilizados os
valores relacionados com a DRE.
Considerando as variações dos
empréstimos de curto prazo, do capital social e o valor dos dividendos, as atividades
de financiamento totalizaram R$ 1.120,00,
uma vez que os valores das aquisições de
empréstimos de curto prazo e aumento de
capital foram somados e o pagamento de
dividendos foi subtraído.
Para se elaborar a DFC, basta somar as três atividades e verificar se o resultado é o mesmo identificado pela variação
do disponível, no caso, R$ 800,00. A DFC
pelo método direto fica estruturada da seguinte forma:
DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA
DA EMPRESA ALFA
MÉTODO DIRETO
ATIVIDADES OPERACIONAIS
Recebimento de clientes
Pagamento de fornecedor
Pagamento de despesas
Caixa líquido atividades operacionais
R$
R$
R$
R$
9.500,00
(5.000,00)
(1.380,00)
3.120,00
ATIVIDADES DE INVESTIMENTO
Aquisição de Ações (Part.Outras Cias)
Aquisição de Móveis e Utensílios
Aquisição de Terrenos
Caixa líquido atividades de investimento
R$
R$
R$
R$
(2.140,00)
(300,00)
(1.000,00)
(3.440,00)
ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO
Aquisição empréstimos curto prazo
Aumento de capital
Pagamento de dividendos
Caixa líquido atividades de financiamento
R$
R$
R$
R$
470,00
1.500,00
(850,00)
1.120,00
Variação de Caixa e Equivalentes
Saldo Inicial de Caixa e Equivalentes
Saldo Final de Caixa e Equivalentes
R$
R$
R$
800,00
1.500,00
2.300,00
Interciência
& Sociedade
73
COSTA, R. S. da
Para se elaborar a DFC pelo método indireto, a diferença está nas atividades
operacionais. Ao invés de apresentarem
os reais recebimentos de clientes e pagamentos de fornecedores e despesas, serão
elaboradas ajustando-se o lucro líquido e
considerando as variações das contas patrimoniais relacionadas com a DRE. As atividades de investimento e de financiamento
serão idênticas às do método direto.
A primeira coisa a se fazer no método indireto é verificar o valor do lucro líquido na DRE, no caso, R$ 1.950,00. Nesse
valor, é necessário fazer alguns ajustes referentes às contas que não afetam o caixa.
Na DRE da empresa ALFA, a única conta
que não afeta o caixa é a despesa com depreciação, no valor de R$ 120,00.
Para eliminar o seu efeito sobre o
lucro líquido, é preciso inverter o seu sinal
na DFC, isto é, se na DRE a despesa com
depreciação foi subtraída, na DFC ela será
somada. Caso existam outras contas que
também não afetem o caixa, é preciso que
se faça o mesmo procedimento na DFC.
Feitos os ajustes no lucro líquido,
é preciso verificar as variações nas contas
patrimoniais relacionadas com a DRE. Essas variações serão favoráveis (aumento)
ou desfavoráveis (diminuição) para o caixa,
utilizando-se conta por conta do Balanço
Patrimonial.
No ativo, a primeira conta é a do
disponível e já foi utilizada para verificar a
variação de quanto tem que dar a DFC.
A próxima conta é duplicatas a receber e ela tem relacionamento com a DRE,
pois se origina das vendas a prazo. A variação de X1 para X2 é um aumento de R$
500,00, e é desfavorável para o caixa, ao
passo que a empresa abriu mão de parte de
suas vendas à vista para recebê-las em um
momento futuro, e representará uma saída
de caixa.
Logo após, tem-se a conta dos
estoques que também está relacionada
com a DRE, pois se origina das compras
74
de mercadorias. A variação foi positiva em
R$ 500,00, e também é desfavorável para
o caixa, uma vez que a empresa, para aumentar seus estoques, precisou tirar dinheiro do caixa.
As outras contas do ativo não possuem relação direta com a DRE e não farão
parte das atividades operacionais, pois já
foram utilizadas na atividade de investimento.
No passivo, a primeira conta é
fornecedores que está relacionada com a
DRE, pois é originada pela compras a prazo de mercadorias. Ela traz um aumento de
X1 para X2 no valor de R$ 1.000,00, sendo
favorável para o caixa e representará uma
entrada na DFC, ao passo que a empresa
está, de certa forma, postergando um pagamento.
A próxima conta é a de empréstimos bancários, e essa não tem relação direta com a DRE, pois pertence às atividades de financiamento.
Já a conta de imposto de renda a
recolher possui relacionamento direto com
a DRE, pois recebe os valores da provisão de imposto de renda. A variação de X1
para X2 dessa conta foi um aumento de R$
1.050,00 e também significa uma entrada
na DFC, pois é favorável para o caixa, isto
é, uma postergação de pagamento do seu
imposto de renda.
As outras duas contas do passivo
não se referem às atividades operacionais,
pois a conta capital social pertence às atividades de financiamento e a conta de lucros
retidos já foi computada, pois é composta
pelo lucro da DRE que já foi considerado
na DFC.
O resultado encontrado deve ser
o mesmo do método direto, ou seja, R$
3.120,00, pois se trata do mesmo caixa, da
mesma empresa, só que elaborado de uma
outra forma.
Portanto, a DFC elaborada pelo
método indireto fica representada dessa
forma:
Interciência
& Sociedade
Concessão de crédito e modelação da tomada de decisão
DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA
DA EMPRESA ALFA
MÉTODO INDIRETO
ATIVIDADES OPERACIONAIS
Lucro Líquido
(+/-) Ajustes
Depreciação
Variações nos Ativos e Passivos
Variação em duplicatas a receber
Variação em estoques
Variação em fornecedores
Variação em imposto de renda a recolher
Caixa líquido atividades operacionais
R$
1.950,00
R$
120,00
R$
R$
R$
R$
R$
(500,00)
(500,00)
1.000,00
1.050,00
3.120,00
ATIVIDADES DE INVESTIMENTO
Aquisição de Ações (Part.Outras Cias)
Aquisição de Móveis e Utensílios
Aquisição de Terrenos
Caixa líquido atividades de investimento
R$ (2.140,00)
R$
(300,00)
R$ (1.000,00)
R$ (3.440,00)
ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO
Aquisição empréstimos curto prazo
Aumento de capital
Pagamento de dividendos
Caixa líquido atividades de financiamento
R$
R$
R$
R$
470,00
1.500,00
(850,00)
1.120,00
Variação de Caixa e Equivalentes
Saldo Inicial de Caixa e Equivalentes
Saldo Final de Caixa e Equivalentes
R$
R$
R$
800,00
1.500,00
2.300,00
O método indireto é o mais utilizado pelas empresas, pois sua elaboração é
mais simples, mas, é o método direto o preferido para a tomada de decisão, uma vez
que para os usuários seria muito mais interessante conhecer os reais recebimentos
de clientes e os pagamentos de fornecedores e de despesas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O controle do fluxo de caixa sempre foi e ainda é amplamente utilizado por
qualquer tipo de pessoa ou negócio, pois
o gerenciamento das entradas e saídas de
caixa é a base para todo planejamento e
posterior tomada de decisão.
Para que seja possível a comparação entre a posição financeira dos recursos de caixa das empresas, foi criada a
Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC),
que no Brasil, passou a ser exigida como
demonstração contábil obrigatória com a
criação da Lei 11.638/2007, embora já fosse evidenciada como informação complementar pelas instruções do IBRACON.
Interciência
& Sociedade
75
COSTA, R. S. da
A segregação da DFC em atividades operacionais, de investimento e de
financiamento torna possível uma melhor
análise da composição da variação de caixa.
Para se elaborar a DFC é preciso
seguir algumas técnicas que utilizam as informações de outras demonstrações contábeis, como o Balanço Patrimonial, a Demonstração do Resultado do Exercício e a
Demonstração das Mutações do Patrimônio
Líquido.
Com a realização dessa pesquisa,
procurou-se elaborar uma DFC explicando
cada passo e relacionando cada conta com
sua origem nas demonstrações contábeis.
Esse tipo de estudo torna-se importante não só para os profissionais relacionados com a Contabilidade das empresas,
mas para todas as pessoas que estejam relacionadas com o ambiente de negócios no
qual a empresa esteja inserida.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei n. 11.638, de 27 de dezembro de 2007.
Altera os arts. 176 a 179, 181 a 184, 187, 188, 197,
199, 226 e 248 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro
de 1976. Diário Oficial [da] República Federativa do
Brasil, Brasília, DF, 28 dez.2007.
BRASIL2. Pronunciamento Técnico CPC 03. Demonstração dos Fluxos de Caixa. Ata CPC, Brasília,
DF, 13 jun.2008.
FIPECAFI. Manual de Contabilidade Societária.
São Paulo: Atlas, 2010.
IASCF INTERNATIONAL ACCOUNTING STANDARDS COMMITTEE FOUNDATION. Normas Internacionais de Relatório Financeiro (IFRSs). Incluindo
Normas Internacionais de Contabilidade (IASs) e
Interpretações , aprovadas em 1º de Janeiro de
2008. Volume 1. IASCF – International Accounting
Standards Committee Foundation e IBRACON – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil, 2008
LAMAS, F. R.; GREGÓRIO, A. A. Demonstração dos
Fluxos de Caixa e Contabilidade Criativa. Revista
Universo Contábil, Blumenau, v5, n.3, p.99-115, jul./
set. 2009.
LUSTOSA, P. R. B.; SANTOS, A. Como Classificar
as Reservas de Capital na Demonstração dos Fluxos de Caixa? In: XXVIII EnANPAD. Curitiba-PR,
2004.
MARION, J. C. Contabilidade Empresarial. 14. ed.
São Paulo: Atlas, 2009.
SALOTTI, B. M.; YAMAMOTO, M. M. Divulgação Voluntária da Demonstração dos Fluxos de Caixa no
Mercado de Capitais Brasileiro. Revista de Contabilidade e Finanças USP., São Paulo, v.19, n.48, p.3749, set./dez.2008.
Rodrigo Simão da Costa possui graduação em Ciências Contábeis pelo UNIFEOB - Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos (2001), e também Pós Graduação em Gestão Empresarial (2003). Concluiu seu
Mestrado em Ciências Contábeis e Atuariais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2006). Atualmente é professor titular do UNIFEOB onde atua como coordenador dos cursos de Ciências Contábeis e Administração
e é Gestor da Escola de Negócios. Tem experiência na área Contábil, com ênfase em Contabilidade Ambiental. É
autor de vários artigos científicos e palestrante em diversos assuntos relacionados à Contabilidade, Administração
e Finanças.
76
Interciência
& Sociedade
EVOLUÇÃO DO SETOR ELÉTRICO: uma breve reflexão
PAGLIARDI, Odail
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
SOBREIRO DIAS, José Celso
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
RESUMO: O setor elétrico brasileiro passou por uma reformulação de sua estrutura na década de
1990, marcando a transição para um ambiente mais competitivo nos serviços de eletricidade com participação ativa das empresas privadas. O racionamento de eletricidade em 2001/02 interrompeu esse
processo, originando a segunda reforma do setor, coordenado pelo Estado que concentrou o comércio
de eletricidade em um pool de distribuidores em um sistema de leilões públicos. Este artigo analisa a
evolução do setor e as duas reformas, mostrando que as soluções apresentadas foram frutos de crises
institucionais.
PALAVRAS-CHAVE: Setor elétrico, sistemas de leilões públicos, reformas, estatização.
ABSTRACT: The Brazilian electric sector went through an overhaul of its structure in the 1990s, marking the transition to a more competitive in the electricity services with active participation of private
companies. The rationing of electricity in 2001/02 interrupted this process, resulting in the second sector
reform, coordinated by the State that concentrated trade in electricity in a pool of distributors in a public
auctions system. This paper examines the development of the sector and the two reforms, showing that
the solutions presented were the result of institutional crises.
KEYWORDS: Power sector systems, public auctions systems, reform, nationalization.
1. INTRODUÇÃO
As instituições governamentais
têm resistido às mudanças, devido aos custos políticos e também econômicos que as
envolvem. A história das reformas do setor
elétrico no Brasil ilustra bem esse fato, mostrando que as mudanças institucionais só
ocorreram em face da crise, que exigia uma
profunda reforma setorial. A crise do final da
década de 90 envolveu além da privatização das empresas, uma reforma estrutural
e regulatória. As soluções para a crise no
setor foram de caráter ad hoc, sempre motivado por uma resposta “imediatista” ao problema enfrentado. Uma reflexão desta evolução é o motivo deste trabalho, analisando
os antecedentes do processo de reforma na
indústria de eletricidade brasileira, até chegar à adequação da nova política energética implementada para restaurar o nível de
investimento, em particular o investimento
privado.
No Brasil, em face de seus enormes recursos hídricos, a hidroeletricidade
tem ocupado um papel de destaque na geração de energia. No seu desenvolvimento,
este setor passou por duas fases, uma com
a participação ativa do Estado e outra, após
a reforma que promoveria mudanças institucionais em decorrência da reestruturação
e privatização do setor elétrico.
Enquanto a demanda de eletricidade no Brasil crescia, cada vez mais aumentavam as preocupações sobre a qualidade
da oferta, com o governo controlando o setor da eletricidade. Até início dos anos 1990,
grande parte do setor elétrico estatal foi controlado com limitado investimento privado.
As empresas estatais assumiram a função
de empresas de distribuição, na maioria dos
estados, enquanto a Eletrobrás, gerenciava
Interciência
& Sociedade
77
PAGLIARDI, O.; SOBREIRO DIAS, J. C.
a transmissão, além de assumir também a
maior parte do setor de geração.
Contudo, nesta segunda fase,
podem-se citar duas grandes reformas. A
primeira ocorreu entre 1995 e 2003, com
introdução do modelo clássico de reforma
no mercado atacadista de eletricidade de
curto prazo, tendo como exemplo de países
que o aplicaram, Chile, Inglaterra e País
de Gales, e os países nórdicos. O modelo
consiste, basicamente, na fragmentação da
infraestrutura, na privatização dos serviços
estatais, para favorecer a concorrência, na
criação de entidades reguladoras e, gradualmente, na criação de mercados para serviços de geração e varejo.
A segunda reforma do setor elétrico brasileiro começou durante os anos de
2004 e 2005 com a introdução do mercado de longo prazo, substituindo o mercado
atacadista de curto prazo introduzido na
primeira reforma. Na evolução histórica, o
trabalho lança luz, principalmente, nos períodos em que o setor de eletricidade no
Brasil passou de um modelo clássico para
um modelo de contratos de longo prazo de
reforma.
2. Os primeiros passos da eletrificação
Pouco tempo após ter sido concedido, por Dom Pedro II, a Thomaz Alva
Edson o privilégio de inserir processos destinados à utilização da luz elétrica no Brasil, entra em operação, no ano de 1883, a
primeira usina hidrelétrica do país, localizada no Ribeirão do Inferno, afluente do Rio
Jequitinhonha, na cidade de Diamantina,
Estado de Minas Gerais (ELETROBRÁS,
2010). Contudo, somente a partir de 1897,
deu-se início aos empreendimentos marcantes no desenvolvimento da energia elétrica no país, consolidados pelas concessões em São Paulo e Rio de Janeiro, com a
criação das empresas: São Paulo Railway,
Light and Power (1899) EmpresaCliente Ltd
- SP RAILWAY e Tramway, Light and Power
EmpresaCliente - RJ TRAMWAY (1904),
como mostram CEMIG (2010) e Eletrobrás
(2010), realizando projetos de grande porte
para a época.
O que caracteriza institucionalmente a primeira fase da indústria elétrica
78
brasileira é a ausência de uma legislação
específica, sendo que em 1903 foi aprovado pelo Congresso Nacional o primeiro texto
de lei disciplinando o uso da energia elétrica
no país (ELETROBRÁS, 2010). Nesta primeira fase, o modelo pode ser considerado
privado sendo que o poder concedente era
o Estado e os concessionários os investidores estrangeiros. Não havendo legislação
específica, as relações entre os concessionários e os usuários dos serviços limitavam-se ao poder público, em qualquer uma das
suas três esferas: Federal, Estadual ou
Municipal, atraindo o capital externo e celebrando atos de concessão através de contratos com tarifas corrigidas pela “cláusula
ouro”, a qual preservava os investimentos
em divisas estrangeiras com o objetivo de
compensar os efeitos da desvalorização da
moeda nacional (FARIA, 2003). O marco
do período foi o Decreto 5.407 de dezembro de 1904 que estabelecia regras para os
contratos de concessão sem exclusividade,
cujo prazo máximo da concessão seria de
90 anos, sendo revertido para a União sem
indenização do patrimônio constituído pelo
concessionário. A revisão das tarifas ocorria
a cada cinco anos.
O crescimento da capacidade de
geração foi notável: em 1883, a capacidade instalada era de 52 kW e, em 1920,
ultrapassou 367.000 kW. Surgiram às pequenas usinas geradoras decorrente da
necessidade de fornecimento de energia
para serviços públicos de iluminação e para
atividades econômicas como mineração,
beneficiamento de produtos agrícolas, fábricas de tecido e serrarias. A grande maioria
das unidades era de pequena potência com
cerca de 10 usinas geradoras e ampliou-se
com a construção das primeiras usinas hidrelétricas no país: Marmelos-Zero, Fontes
Velha e Delmiro Gouveia (FARIA, 2003).
A Grande Depressão de 1929 veio
impactar fortemente a economia brasileira
provocando uma profunda recessão e despertando a insatisfação da classe média
com relação ao governo vigente, culminando na instalação de um governo revolucionário com um extremo sentimento nacionalista. Neste contexto, ocorre um crescente
protecionismo do setor industrial brasileiro,
com os nacionalistas defendendo o papel
Interciência
& Sociedade
Evolução do setor elétrico: uma breve reflexão
estratégico da indústria de energia elétrica
e, portanto, não poderia estar sob controle
estrangeiro.
3. Estatização do setor
A Lei da Água, em 1934, atribuindo
ao Governo Federal a propriedade e direitos
sobre os recursos hídricos e a autoridade
de regular os serviços relacionados à energia elétrica, além de introduzir o regime tarifário pelo custo do serviço. Houve muitos
conflitos na interpretação dessa lei. O novo
regime tarifário utilizado foi um fator que desestimulou os investidores estrangeiros enquanto a demanda por energia continuava
a aumentar em função do desenvolvimento
industrial, exigindo racionamento em várias
cidades do país.
A energia sempre teve lugar de
destaque nos programas econômicos de
desenvolvimento do Brasil, que colocava a
produção de energia elétrica como insumo
prioritário nas metas governamentais, diante da impossibilidade do setor empresarial
nacional promover projetos de grande porte. Neste sentido, o Plano SALTE destinava
11% do PIB de 1947, para a área de energia (SILVA, 2010). Além dos recursos externos, o governo cria o Imposto Único sobre a
Energia Elétrica – IUEE e o Fundo Federal
de Eletrificação, destinado a prover e financiar instalações de produção, transmissão e
distribuição de energia elétrica, assim como
o desenvolvimento de materiais elétricos.
Mesmo com o Plano de Metas destinando
9,3% do PIB de 1956, para o setor elétrico,
advindos do IUEE, não se atingiu totalmente
a meta prevista, contudo houve um esforço
considerável para se romper definitivamente seus estrangulamentos quase quadruplicando a capacidade instalada entre 1945 e
1961 (PAGLIARDI, 1990).
A evolução do padrão de financiamento do setor elétrico os anos 80, apresentou-se em duas fases: um fiscal, até 1967,
na qual os recursos provinham de fundos
públicos e pós-67, a fase “empresarial”, em
que a empresa capacitava-se para gerir
recursos próprios. A política traçada para
o setor de energia elétrica para atender a
demanda no pós-64, que até 1967 pode
ser considerada como uma fase de transi-
ção para o setor possibilita sua consolidação graças ao esquema de financiamento
oferecido, tanto em nível fiscal (empréstimo
compulsório, IUEE ad valorem) quanto em
nível de capacidade de autofinanciamento
de empresas (realidade tarifária, correção
monetária do ativo fixo para efeito de tarifa), além da redução de imposto de renda e
isenção do imposto de importação de equipamentos.
A Eletrobrás, criada em 1962, assumiu a coordenação do desenvolvimento da
indústria de energia elétrica, e criou taxas e
buscou recursos nos fundos multilaterais de
investimento para financiar a expansão da
capacidade de geração. O monopólio, sob
controle, federal, e a integração vertical do
setor promoveram a economia de escala,
aumentando a produtividade das empresas e consequentemente reduzindo custos.
Além disso, o governo também criou a Conta de Resultados a Compensar a fim de reduzir os riscos do financiamento de novos
projetos e manter os investimentos na expansão do setor.
O novo regime tarifário para todo
o país a partir de 1977 faz com que as empresas, presentes em áreas de concessão,
econômica e industrialmente desenvolvidas, contando com densidades de carga
elevadas e custos de operação mais baixos,
fossem obrigadas a transferir parte de seus
resultados para as empresas deficitárias.
Esta medida incentivou ao descontrole dos
custos dessas empresas e como resultado
as tarifas aumentaram.
A expansão do setor de infraestrutura no Brasil se dava à custa de endividamento externo e por forte participação do
Estado na solidificação de suas indústrias.
Mesmo com os dois Choques do Petróleo,
a grande oferta de recursos financeiros no
mercado internacional possibilitava que o
país mantivesse elevadas taxas de crescimento através de endividamento externo e
política fiscal expansionista.
Contudo, a crise dos países em
desenvolvimento no início dos anos 80,
fez com que ocorresse uma forte recessão
mundial e a inflação crescesse. Internamente, o governo reajustava as tarifas abaixo da
inflação com o objetivo de frear o processo
inflacionário. Ademais, o desempenho das
Interciência
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79
PAGLIARDI, O.; SOBREIRO DIAS, J. C.
empresas do setor elétrico deteriorou com
os anos em “decorrência do gigantismo, da
falta de flexibilidade e da excessiva interferência política na gestão de seus negócios”
(OLIVEIRA, 2006).
Como consequência, as empresas decidiram suspender os pagamentos
aos geradores elétricos federais sob a alegação de não conseguirem mais suportar
a retenção do repasse de seus custos. A
partir disso, em 1987, o governo identificou
o problema crítico de que as tarifas eram
reajustadas para atender às políticas econômicas e sociais e não atendiam a necessidade crucial da viabilidade financeira das
empresas.
Diante desse quadro, e tendo em
vista a transformação do setor elétrico em
âmbito mundial, os organismos financeiros
internacionais passaram a recomendar a
reformulação do setor, ou seja, além da privatização das empresas, fazer uma reforma
estrutural e regulatória.
A política macroeconômica do Plano Real implementa as privatizações, cruciais para atrair capital externo, fechar o balanço de pagamentos, sustentar a taxa de
câmbio, manter baixa a inflação e, inclusive,
diminuir as interferências políticas nas empresas. No setor elétrico, a estratégia inicial
foi privatizar as empresas distribuidoras, seguidas das empresas geradoras e finalmente as transmissoras. Contudo o BNDES,
não possuía uma estratégia para a reforma
do setor como um todo, sendo necessário
um regime tarifário que representasse baixo
risco regulatório a fim de atrair investidores
privados.
Assim, era necessário criar incentivos para estimular a inserção da iniciativa
privada na indústria principalmente na expansão da oferta, para possibilitar a criação
de um mercado atacadista de energia, que
ocorreriam com duas reformas do setor.
4. Processo de Reforma do Setor
Para que se obtivesse êxito num
mercado atacadista competitivo de energia, algumas mudanças estruturais deveriam ser implementadas, sendo necessário
promover a desverticalização da geração,
com criação empresas de geração ou subsidiárias. Existem duas motivações principais para a primeira reforma implantada em
1995 a 2003. A primeira foi à tentativa de
atrair o capital privado para investir na infraestrutura e, com isso, recuperar financeiramente as empresas debilitadas financeiramente. A outra, era a tendência mundial de
implementação do modelo clássico de reforma como ocorrido na Inglaterra e Gales
(OLIVEIRA, 2006). O arrocho financeiro das
companhias estaduais fez da privatização,
um instrumento importante para aumentar
o capital financeiro. Assim, “a privatização e
a reestruturação foram realizadas independentes umas das outras a qual era sintomático para a natureza ad hoc das reformas
naqueles dias iniciais. O governo estava tão
necessitado de recursos e de se apresentar como um governo reformante, que começou a alienação antes de uma entidade
reguladora de eletricidade ter sido instituída. Antes mesmo de um regulador ser cria-
A reforma do setor elétrico teve
início em 1993 com recuperação tarifária
e criação do Sistema Nacional de Transmissão com o objetivo de assegurar o livre
acesso às linhas do sistema nacional de
transmissão. Essa medida refletia os princípios básicos do livre acesso às redes, de separação das supridoras das distribuidoras,
favorecendo uma competição na geração
de energia elétrica. Foi dada a permissão
para a entrada de investidores autoprodutores de energia permitindo que as empresas pudessem se consorciar na geração
de energia para consumo próprio, e caso
houvesse excedente, poderiam vendê-lo às
concessionárias. Ainda, em 1993, iniciava o
processo de abertura do setor permitindo o
livre acesso ao sistema de transmissão na
esperança de atrair investimento privado
na expansão. Neste contexto, as tarifas de
geração quase dobraram. As medidas não
foram suficientes para alterar profundamente a estrutura da indústria de energia elétrica e, em 1995, o governo aprova emendas
para facilitar a liberalização do mercado e
privatização das empresas de energia.
80
4.1. Mercado atacadista de curto prazo com
base em um modelo clássico
Interciência
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Evolução do setor elétrico: uma breve reflexão
do, cerca de dez empresas de distribuição
foram alienadas” (ALMEIDA e PINTO JÚNIOR, 2005; ARAÚJO et al., 2008).
Em 1997, medidas legais permitiram que as concessionárias, que antes
podiam importar energia somente para
consumo próprio, agora poderiam fazê-lo
para negociar com os consumidores livres.
Outra novidade advinda desta medida era
a possibilidade do autoprodutor vender seu
excedente de energia também aos consumidores livres. Portanto, as principais mudanças já introduzidas na indústria seguiam
as tendências mundiais de reestruturação:
livre acesso às linhas de transmissão, a
introdução de produtores independentes e
consumidores livres. Também, foi adotado
o regime de price cap para melhorar o desempenho do setor, a exemplo do ocorrido
na Inglaterra.
Embora fosse assegurada uma
justa taxa de retorno ao setor, persistia a
falta de confiança dos investidores quanto
à regulação. A fim de solucionar o impasse, e promover as mudanças institucionais
em decorrência da reestruturação e privatização do setor elétrico, novas responsabilidades institucionais seriam atribuídas ao
governo com a criação, em 1996, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL.
Seu principal papel seria o de regulamentar
e fiscalizar a indústria, cabendo proteger o
interesse dos consumidores cativos em relação ao preço, dar continuidade ao fornecimento e qualidade do serviço; assegurar
a viabilidade financeira de longo prazo dos
concessionários. Ainda, promover competição onde possível e prover incentivos para
a eficiência econômica; assegurar o cumprimento de leis e regulamentações; lidar com
as reclamações dos consumidores; garantir
transparência nas transações entre as companhias reguladas; e incentivar a conservação de energia, através de mecanismos
regulatórios criados com essa finalidade.
Em 1998, era criado um Operador
Nacional do Sistema Elétrico – ONS, com a
atribuição de coordenar e controlar a operação das instalações de geração e transmissão de energia elétrica no sistema interligado, instituição de papel crucial no novo
modelo.
Um operador de mercado “a gra-
nel” foi implantado como um organismo de
auto regulação dos agentes de mercado
seguindo o modelo da Califórnia. Além disso, todos os contratos de longo prazo, da
produção à distribuição, foram cancelados
(ARAÚJO, 2006). Esta primeira onda de reformas teve a maioria dos ingredientes de
um modelo clássico: um regulador, um operador independente, um operador de mercado a granel e separação funcional entre
geração, transmissão, distribuição e comercialização. Portanto, a criação do Mercado
Atacadista de Energia – MAE se constituiu
na principal novidade desse novo modelo,
em que deveriam ser realizadas todas as
transações de compra e venda de energia
de cada sistema interligado entre produtores, empresas varejistas e grandes consumidores.
Também eram aplicados o conceito de Energia Assegurada e o Mecanismo
de Realocação de Energia – MRE, com o
intuito de diluir o risco comercial dos investidores em todas as hidrelétricas. Sob o aspecto comercial, foi estabelecido um período de transição através da assinatura dos
Contratos Iniciais - CIs, que permitiu transações bilaterais livremente negociadas entre
distribuidores, geradores e consumidores livres e essas operações liquidadas no MAE,
permitindo inclusive a comercialização de
curto prazo no mercado spot. Quando instituídos, os CIs atendiam plenamente às
necessidades das distribuidoras e esta regra de transição foi considerada necessária devido ao preço da energia das usinas
existentes serem aproximadamente a metade do custo estimado das novas fontes de
suprimento de energia naquele momento.
Desse modo, era preocupante o risco de
um aumento intolerável das tarifas e pressão inflacionária caso fosse imediatamente
introduzida a livre negociação de energia.
Neste contexto, o processo de reestruturação ocorreu rapidamente com a privatização de 16 distribuidoras e quatro geradoras,
as linhas de transmissão passaram a serem
licitadas pela ANEEL e vários investidores
privados solicitavam licença para construir
novas centrais elétricas (OLIVEIRA, 2006).
Para enfrentar a crise de energia
elétrica de 2001-02, devido às severas secas, foram implementadas medidas de naInterciência
& Sociedade
81
PAGLIARDI, O.; SOBREIRO DIAS, J. C.
tureza emergencial para compatibilizar a
demanda e a oferta de energia elétrica. Às
concessionárias, dentre as principais medidas, cabiam suspender o atendimento: às
novas cargas; casas de diversões; realização de eventos esportivos noturnos e para
fins ornamentais; além da redução, em pelo
menos 35% da iluminação pública.
O racionamento havia mudado o
comportamento dos consumidores, alterado os processos industriais e incentivado a
substituição de equipamentos mais eficientes, e, portanto, provocando uma queda
significativa no consumo de energia, cuja
consequência era forte impacto no equilíbrio financeiro das empresas distribuidoras.
4.2. Mercado de Leilões e Contratos de
Longo Prazo.
A produção de energia hidroelétrica diminuiu drasticamente na seca de 2001,
impactando a gestão de energia elétrica no
Brasil, com os operadores sendo obrigados
a racionar a sua oferta por quase um ano.
Apesar do programa de incentivos para
as usinas térmicas, havia poucas iniciativas por parte dos investidores. Isso levou
o novo governo a proceder a uma segunda
reforma durante os anos de 2004 e 2005,
com controle centralizado no setor elétrico,
introduzindo os leilões regulados e os contratos de longo prazo. Os resultados desta reforma são a criação de um pool para
aquisição por parte dos distribuidores, a
criação de dois ambientes de contratação
de longo prazo (regulado e livre) e a criação
das instituições necessárias para apoiar as
tarefas de coordenação e de planejamento
(ALMEIDA e PINTO JÚNIOR, 2005).
As empresas de distribuição, com
seus consumidores cativos, necessitavam
contratar toda a demanda de geradores
existentes feitos por leilões no ambiente de
contrato regulado. No mercado de curto prazo previa-se um sistema de compensação
para as diferenças entre a energia contratada e a energia consumida. Neste contexto,
o governo implementou um complicado processo de leilões regulados de três a cinco
anos para a compra futura de energia nova
e um ano de antecedência para o leilão de
energia existente. Os resultados deste novo
82
modelo de mercado estão ainda a ser visto. Embora bem projetado possa levar à
revelação de preços e custos dos ativos e
há temores de que a falta de informação
adequada entre os licitantes pode levar
à perda potencial de eficiência (DUTRA e
MENEZES, 2005). No entanto, o mecanismo de leilão parece ser um passo positivo
na resolução dos problemas de adequação,
mas existem outras questões que precisam
ser abordadas, como o licenciamento ambiental de novos projetos, a necessidade de
equacionar o setor do gás e da operação
de aumento na contratação livre. Além disso, somente com o amadurecimento e crescimento do mercado de capitais do país,
pode vir à alavancagem necessária para os
ajustes exigidos na atual estrutura de comercialização do mercado da eletricidade.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A história do Brasil mostra que mudanças institucionais são realizadas apenas
quando há um senso de urgência devido a
algum tipo de crise no país ou gerada pela
pressão externa por parte de instituições financeiras internacionais. A primeira reforma
foi motivada pela crise econômica da década de 1990 e quebra de receitas das empresas estatais, levando ao desinvestimento de
seus bens. A reforma da indústria de energia elétrica estava pautada no processo de
privatização caracterizando a saída do Estado do papel de produtor para a entrada do
capital privado. Contudo, a agressividade
da reforma atribuía ao Estado o papel de
regulador, demandando ações no sentido
de criar incentivos e na sinalização correta
para estimular a inserção da iniciativa privada na indústria principalmente na expansão
da oferta.
A recente introdução do mercado
atacadista competitivo foi uma grande mudança institucional na estrutura monopolista verticalmente integrada. Esta mudança
aumenta os custos e exige a fragmentação,
privatização e regulação do setor. A transferência do preço de mercado para os consumidores finais também implica em riscos políticos consideráveis. Apesar destes riscos,
avança-se com esta concepção de mercado, sendo importante destacar a urgência
Interciência
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Evolução do setor elétrico: uma breve reflexão
de sua implantação já que a privatização
das empresas estaduais começou mesmo
antes da introdução de um órgão regulador,
motivada pela crise financeira dos serviços
públicos estatais por volta de 1990.
Outra grande mudança institucional aconteceu com a introdução de um mercado de leilões de longo prazo em substituição ao pré-existente mercado spot de curto
prazo. “Esta mudança na concepção do
mercado atacadista consiste de custos de
transação mais elevados e um aumento da
carga regulamentar, devido à sua complexa
natureza administrativa. Apesar destes custos e desafios, à decisão de avançar com o
novo modelo de mercado mostra novamente um sentido de urgência. Neste momento
a necessidade de mudança foi desencadeada pela crise de eletricidade provocada pelas secas e pelo baixo investimento em outras tecnologias” (KARMACHARYA, 2008).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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DUTRA, J.; MENEZES, F. Lessons from the electricity
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ELETROBRÁS. História do setor de energia elétrica
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da UHE Cana Brava. Rio de Janeiro (RJ). Universidade Federal do Rio de Janeiro (Dissertação de Mestrado). 169 p, 2003.
KARMACHARYA, S. B. The evolution of Brazil’s electricity market from textbook to regulated long term
contracts. Network Industries Quarterly, Lausanne,
v.10, n. 2 p. 9-11, 2008.
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T. C. Ed(s). The Political Economy of Power Sector
Reform: The Experiences of Five Major Developing
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2006, p. 31–75.
PAGLIARDI, O. Uma discussão sobre o futuro das
cooperativas de eletrificação rural do Estado de
São Paulo. 1990. 212f. Dissertação (Mestrado). Universidade Estadual de Campinas: Faculdade de Engenharia Mecânica. Campinas, 1990. Impressa.
SILVA, T. F. Plano Salte. Disponivel em: <http://www.
historiabrasileira.com/brasil-republica/plano-salte/>.
Acesso em: <4 set 2010>.
José Celso Sobreiro Dias possui graduação em Administração pela Faculdade de Ciências Administrativas e
Contábeis Santa Lúcia, especialização em Administração Rural pela UFLA, mestrado e doutorado em Engenharia
de Produção pela UNIMEP. Atualmente é professor titular da UNIFEOB e da Faculdade Municipal Professor Franco
Montoro (FMPFM). É professor de pós-graduação em Latu Sensu e MBA da UNIFEOB e da Sedução - Sistemas
de Educação Continuada, atuando em diversos cursos. Exerce atualmente as funções de Coordenador do Curso
de Administração da FMPFM. É diretor geral da Benedeti & Benedeti Ltda.
Odail Pagliardi é bacharel em Economia e também em Matemática, ambas as graduações realizadas na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e é Mestre em Planejamento de Sistemas Energéticos pela Faculdade
de Mecânica da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Possui doutorado pela Faculdade Agrícola da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com enfoque em mercados futuros de commodities agrícolas.
Atualmente é vice diretor e professor da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” e atua como pesquisador do
Núcleo de Energia da Universidade Estadual de Campinas.
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84
Interciência
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INTERATIVIDADE E EDUCAÇÃO:
reflexões acerca do potencial educativo das TIC
VERASZTO, Estéfano Vizconde
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
Instituição de Ensino São Francisco (IESF)
[email protected]
GARCÍA, Francisco García
Universidad Complutense de Madrid/España (UCM)
[email protected]
RESUMO: Este trabalho apresenta uma abordagem geral das contribuições que as Tecnologias da
Informação e Comunicação (TIC) podem trazer para o contexto educacional ao aliar conteúdo, contexto real e aplicativos interativos de uma forma atrativa e pedagógica. Para atingir essa finalidade, o
artigo apresenta fundamentos históricos e embasamentos teóricos para mostrar a evolução das TIC,
bem como apresentar uma visão própria de interatividade a partir da análise de conteúdo de estudos
desenvolvidos na área. Somente assim, poderá concluir apresentando noções de como os aplicativos
interativos podem ser úteis para a esfera educacional, como também mostrar discussões sobre como
uma Educação Tecnológica efetiva pode ser pensada.
PALAVRAS-CHAVE: interatividade, aplicativos interativos, educação, tecnologia, TIC.
ABSTRACT: This paper presents a general approach of the contributions that the information and communication Technologies (ICT) can bring to the educational context to combine content, real context and
interactive applications in an attractive and pedagogic way. To do this, the article presents historical and
theoretical basis to show the ICT development as well to provide an own vision of interactivity from the
content analysis of studies developed in the area. Only thus it could finish presenting notions of how
the interactive applications may be useful in the educational sphere and also to show discussions about
how an effective technological education can be thought.
KEYWORDS: interactivity, interactive applications, education, technology, ICT.
1. INTRODUÇÃO
O século passado trouxe ao mundo profundas modificações resultantes de
um avanço científico e tecnológico sem precedentes na história da humanidade. Uma
verdadeira revolução tecnológica, presente
em todos os setores da sociedade, se fez
sentir de forma intensa em todo o sistema
de comunicação e de troca de informações,
rompendo barreiras espaciais e temporais e
conectando o mundo inteiro. No conforto do
lar, ao mesmo tempo em que se pode ver
familiares que moram em continentes distantes, também é possível fazer movimentações bancárias e agendar consultas médicas, quase sem precisar deixar de ler as
notícias da última hora. Hoje se está muito
mais informado e se pode adquirir conhecimento de maneira bastante mais prática do
que nossos pais conseguiam (MIRANDA et
al., 2007; VERASZTO; 2004, 2009).
Esta breve introdução aponta que
o conhecimento tecnológico é primordial.
Não apenas para interagir com os novos
aparatos que a cada dia ganham as estantes do comércio, como principalmente para
ser capaz de emitir juízos de valor acerca
de algo que cada vez mais é parte intrínseca do nosso cotidiano. Este é o principal
motivo para apontar que um sistema educacional não pode apenas priorizar conteúdos
transmitidos de forma tradicional, mas que
deve desenvolver novas metodologias que
utilizem em seu proveito as ferramentas
que os alunos e a sociedade já utilizam há
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VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G.
algum tempo (CARDOSO, 2001).
É levando este ponto em consideração que este trabalho se propõe a fazer
uma breve reflexão das contribuições que
as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) podem trazer para o contexto
educacional. Serão dados indícios teóricos
concretos de como se pode aliar conteúdo
curricular e recursos tecnológicos de forma
atrativa, em um processo de ensino-aprendizagem capaz de valorizar a interatividade
e os diferentes recursos textuais e audiovisuais, sem deixar de lado todo o conhecimento conquistado pela humanidade.
2. TIC e Educação: possibilidades de renovação curricular
Com a revolução da microeletrônica na segunda metade da década de 1970,
o desenvolvimento e o aprimoramento das
TIC fez com que a linearidade das tecnologias de informações anteriores fosse
substituída. Algumas tecnologias híbridas,
como computadores, celulares, e os atuais
televisores digitais, trouxeram para o cotidiano uma aproximação com um termo que
passou a se tornar moda: a interatividade.
Isso fez com que uma série de trabalhos e
estudos fosse desenvolvido com o intuito de
mostrar a importância de tecnologias interativas para a sociedade (WALKER, 2009).
Desde o final do século passado,
e ainda crescendo de forma vertiginosa, as
tecnologias interativas ganham cada vez
mais espaço e conquistam o público pelo
fato principal de permitir ver, falar e ouvir
pessoas distantes ou por proporcionar uma
forma de conhecimento e entretenimento
diferenciada, ao aliar, em um só dispositivo, a capacidade de assistir filmes, ouvir
música, bater papo, escolher programas,
fazer pesquisas escolares ou até mesmo jogar sozinho ou em rede (VERASZTO et al.
2008a, 2009b).
E por proporcionarem uma ruptura
no modo de conceber e transmitir informações que as TIC ganham espaço e simpatia
cada vez maior de toda a sociedade, principalmente das novas gerações.
Assim, torna essencial destacar
que essas transformações parecem apenas
não ecoar em parte considerável do sistema
86
educacional, que ainda não compreendeu
os sinais vindos do lado de fora dos muros
da escola.
2.1. O que precisa ser revisto
Há algum tempo a constante perda
de interesse dos alunos pela escola, e pela
forma de ensino tradicional, vem sendo objeto de preocupação e estudo por parte de
muitos educadores em diferentes países.
Estudos que apontam que uma reestruturação curricular e metodológica se faz imprescindível (CALDERARO, 2000).
A falta de habilidade para conseguir perceber a utilidade dos conteúdos que
a escola tenta ensinar é o maior problema
que os estudantes enfrentam hoje em dia.
Em uma sociedade de consumo, os alunos
precisam conseguir ver ou serem convencidos de que os conhecimentos que a escola pretende ensinar são importantes. Não
que o consumo seja mais importante que a
escola, muito pelo contrário, mas sim que
as avançadas técnicas de pesquisas mercadológicas conseguem ser mais eficientes
que o passivo sistema educacional, que em
muitos casos é incapaz de mostrar a utilidade dos conhecimentos que tenta ensinar
(VERASZTO, 2004).
Grande parte do êxito, ou da frustração, dos estudantes está relacionado
com o ambiente produzido em sala de aula.
A preocupação excessiva dos professores
em cumprir o conteúdo curricular e transmitir aos alunos fórmulas e conceitos, regras e
datas, acaba minando a curiosidade intrínseca dos alunos. Isso faz com que a escola, e todo aquilo que ela representa, passe
a não ter nenhum significado para aqueles
que deveria ensinar (SIMON et al. 2004).
Assim, se a escola começar a prestar mais atenção naquilo que a sociedade
e seus alunos estão valorizando, poderá
perceber que as TIC, e todo seu potencial
educativo, podem trazer novos rumos para
o processo educativo.
2.2. As TIC e os desafios para a Educação
Com o advento tecnológico e as
expansões dos multimeios e da internet,
novas formas de se tomar contato com o
Interciência
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Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC
saber foram colocadas à disposição de toda
sociedade. Informações das mais diferentes
áreas são disponibilizadas sob formas dinâmicas, interativas, carregadas de imagens
e sons. Com um vasto campo de pesquisa
para a obtenção de conhecimentos, paulatinamente a escola perde o monopólio da
transmissão do saber. Saber este que hoje
é valorizado como bem máximo da humanidade.
Em nossos dias, as crianças acabam chegando à escola com um capital de
conhecimentos de uma forma nunca antes
possível.
Frente a esta situação, as instituições educacionais enfrentam o desafio de
incorporar essas tecnologias não só como
parte do conteúdo, mas principalmente
como ferramentas de apoio na construção
do saber. Ferramentas que podem contribuir para elaborar, desenvolver e avaliar
práticas educativas, capazes de promover o
desenvolvimento intelectual a formação do
indivíduo como cidadão consciente e participante.
É preciso romper com a postura
tradicional vigente há décadas, pois hoje
não mais nos servem os pacotes de saber
institucionalizados, fragmentados e apostilados. A estática das metodologias tradicionais deve abrir espaço para o dinamismo de
um ensino diferenciado.
Contudo, em momento algum a
intenção é aqui deixar transparecer que o
saber acumulado pela humanidade ao longo da história não seja importante de se ensinar e se aprender, mas sim, que a rigidez
de um sistema escolar que prioriza avaliações objetivas deve ser substituída por uma
metodologia que prioriza idéias e que proporcionem ao aluno relações com o mundo
real.
Porém, é sabido que somente o
discurso não gera mudanças. É preciso
ação. Mas para que estas sejam planejadas
de forma eficiente, também é preciso ter um
norte. E é um caminho para este norte o
que este artigo se propõe a fazer, apontado
a seguir o potencial educativo das tecnologias interativas. Contudo, antes se faz necessário fazer uma rápida apresentação da
evolução histórica do conceito de interatividade para somente então, apontar indícios
de como tecnologias com esta característica podem ser incorporadas e aplicadas na
educação.
3. Classificando a interatividade: aspectos metodológicos
Interação e interatividade. Termos
que muitas vezes são empregados como
sinônimos. Utilizados nas mais diferentes
áreas do saber, foi somente na década de
1960 que a interatividade, relacionada a
tecnologias digitais foi empregada.
Segundo Primo & Cassol (2008)
o termo interação é um conceito bem mais
antigo que interatividade e vem sendo usado utilizado nos mais diversos ramos do
conhecimento científico como as relações e
influências mútuas entre dois ou mais fatores ou entes, etc. Assim, pode-se dizer que
cada fator altera o outro, a si próprio e também a relação entre ambos.
A transformação da palavra interação para interatividade se deu no momento
que a informática reelaborou um termo cuja
gênese vem da Física, que ganhou conotações diferenciadas ao passar pela Sociologia e posteriormente pela Psicologia Social
(FEITOSA, ALVES & NUNES NETO, 2008).
Segundo Bonilla (2002), o termo
surgiu no contexto das críticas aos meios e
tecnologias de comunicação unidirecionais,
que teve início da década de 1970. Todavia,
Fragoso (2001) aponta que o tema surgiu
na década de 1960 quando estudiosos da
Informática procuravam novo significado
para a comunicação entre computador e o
homem, tendo como princípio a agilidade, a
facilidade e maiores possibilidades de comunicação.
A palavra interatividade, derivada do neologismo inglês interactivity, foi cunhada
para denominar uma qualidade específica da chamada computação interativa.
[...] diz-se que a computação interativa
tornou possível estabelecer uma primeira forma de diálogo entre o homem e a
Unidade Central de Processamento [...]
(FRAGOSO, 2001, p. 2).
A então chamada computação interativa não era suficiente para deixar claro
como as relações entre usuário-computador
Interciência
& Sociedade
87
VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G.
iria se modificar pela incorporação de periféricos e pelas trocas de dados em tempo
real. A computação sempre fora interativa,
pois mesmo com cartões perfurados sistema e usuários já interagiam. Não fazia sentido simplesmente empregar o termo pelo
fato do computador ter passado a um conjunto pequeno de CPU-teclado-monitor.
Contudo, ainda é muito comum ver
ambos os termos serem empregados com o
mesmo sentido. Assim, através da análise
de diferentes estudos realizados e de pesquisas sobre o significado dos termos inte-
ração, interativo e interatividade, foi elaborado o Quadro 1 baseado em pressupostos
qualitativos de Análise de Conteúdo para
organização de dados segundo aspectos
da formulação teórica de Bardin (1991), organizando e categorizando os dados, após
a transformação e a diferenciação de informações brutas. Esta estratégia foi adotada
no intuído de, por condensação, obter representações simplificadas dos dados brutos para facilitar a análise.
Quadro 1. Interatividade, interação e interativos: definições e utilizações existentes.
Definição ou utilização dos termos: Interação e inteÁrea de saber
Referência
ratividade
Física
Interação entre a matéria através da atuação de quatro
tipos de forças básicas: gravidade, eletromagnetismo,
a força nuclear forte e a força nuclear fraca. Interação
das ondas eletromagnéticas com a matéria.
Filosofia
O pragmatismo, tomado como um exemplo considera o
homem não como mero espectador separado da natureza, mas como um constante e criativo interagente.
PRIMO &
CASSOL, 2008
Interações entre os homens e sociedade, proporcionando surgimento de relações sociais e culturais.
Sociologia
A relação entre duas ou mais pessoas que, em determinada situação, adaptam seus comportamentos e ações JENSEN, 1998
uns aos outros
A meteorologia se ocupa, por exemplo, das interações entre componentes dos oceanos e a atmosfera
terrestre.
Geografia
Interação das placas tectônicas na formação das montanhas.
PRIMO & CASSOL, 2008
Interação de ventos e ondas provocando pequenos
abalos sísmicos.
Interações entre genótipo e ambiente provocando variações fenotípicas.
Biologia
88
Os conhecimentos não partem, com efeito, nem do sujeito (conhecimento somático ou introspecção) nem do
objeto (porque a própria percepção contém uma parte
considerável de organização), mas das interações entre PIAGET, 1996
sujeito e objeto, e de interações inicialmente provocadas pelas atividades espontâneas do organismo tanto
quanto pelos estímulos externos.
Interciência
& Sociedade
Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC
Química
Interações intramoleculares.
Zoologia
Interações hormonais.
Farmacologia
Interações medicamentosas.
Antropologia
Interações inter culturais entre civilizações.
Interatividade é uma nova forma de interação técnica,
de característica eletrônico-digital, e que se diferencia
da interação analógica que caracteriza a mídia tradicional.
Cibercultura
Interatividade se define como a extensão em que os
usuários podem participar modificando a forma e o
conteúdo do ambiente mediado em tempo real. Interatividade é uma variável direcionada pelo estímulo e
determinada pela estrutura tecnológica do meio.
Interatividade pode ser definida como uma atividade
mútua e simultânea da parte dos dois participantes,
normalmente trabalhando em direção de um mesmo
objetivo.
PRIMO & CASSOL, 2008
Discute a problemática da interatividade na Web: Para
um site ser verdadeiramente interativo – uma necessidade para que a potencialidade do meio seja aproveitada – deve facilitar a comunicação entre os seres humanos. Como a Internet é um meio claramente de dupla
via, os sites plenamente interativos são aqueles que
unem as pessoas, que facilitam a comunicação entre
usuários e entre os usuários e a equipe de produção do
site.
A implementação da interatividade é uma arte pois ela
exige a compreensão da amplitudes de níveis e demandas, incluindo a o entendimento do aluno, uma apreciação das capacidades de engenharia de software, a
importância da produção rigorosa de contextos instrucionais e a aplicação de interfaces gráficas adequadas.
Isto é, interatividade deveria ser mais do que "apontar
e clicar"
Interatividade deve ser descrita como uma atividade
entre dois organismos, e com um aplicativo informático,
SIMS, 1995
envolvendo o aluno em um diálogo verdadeiro. Nesse
caso emerge uma interação de qualidade, desde que
as respostas do computador sejam adequadas com as
necessidades informativas do usuário.
Quanto mais dialógicas forem as interfaces, melhores
serão os níveis de interação em courseware.
Para que uma interface seja plenamente interativa, ela
necessita trabalhar na virtualidade, possibilitando a
ocorrência da problemática e viabilizando atualizações
Interatividade pode ser tida como comunicação bidirecional e imprevisível em seu processo.
GABOCORP/FAInteratividade é como um diálogo homem-máquina, que COM/UFBA, 2008
torna possível a produção de objetos textuais novos,
não completamente previsíveis a priori.
Interciência
& Sociedade
89
VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G.
Interatividade não é somente uma troca de comunicação, mas também geração de conteúdo. Como propriedade, interatividade pode ser abordada como sendo um RICHARDS, 2006;
atributo da tecnologia. “conseqüentemente, o foco do
SUNDAR, 2004
resultado é no design (de interface) e na técnica (usabilidade).
Interatividade é o grau com o qual uma tecnologia de
comunicação pode criar um ambiente mediado no qual
usuários podem se comunicar sincronizada ou assincronamente e participar em trocas de mensagens recíprocas. Interatividade também se refere à habilidade do
usuário de perceber a experiência como uma simulação
da comunicação interpessoal.
Operacionalmente, conclui-se que interatividade é
estabelecida por três fatores: estrutura tecnológica do
meio usado (velocidade, alcance, flexibilidade do sincronismo e complexidade sensorial); característica do
ajuste da comunicação; e percepção dos indivíduos
(proximidade, velocidade percebida, ativação sensorial
e tele-presença).
KIOUSIS, 2002
A interatividade é promovida através de um meio que
permite a interação entre as pessoas.
A interatividade seria um tipo de comunicação possível
graças às potencialidades específicas de umas particulares configurações tecnológicas, cujo objetivo é imitar,
ou simular, a interação entre as pessoas.
A interatividade está na disposição ou predisposição
para mais interação, para uma hiper-interação, para
bidirecionalidade (fusão emissão-recepção), para participação e intervenção, tendo em vista que um indivíduo
pode se predispor a uma relação hipertextual com outro
indivíduo.
FEITOSA; ALVES
& NUNES NETO,
2008
Interatividade mediática geral ultrapassa a situação
concreta de espaço e tempo em que alguém produz; ou
alguém "lê" (usa) um produto; ou alguém reage a um
produto; ou alguém age de tal forma a fazer chegar às
instâncias produtoras suas reações, etc. Deve-se perFRAGOSO, 2001,
ceber a interatividade social em uma sociedade de cop. 4
municação como um conjunto de todas estas (e outras)
ações de tal forma que uma parte significativa das interações em sociedade se desenvolve em conseqüência
e em torno de "mensagens" (proposições, produtos,
textos, discursos, etc.) diferidas no tempo e no espaço.
A interatividade é a extensão de quanto um usuário
pode participar, influenciar ou modificar a forma e o
conteúdo de um ambiente computacional, sendo vista
como uma variável direcionada pelo estímulo e determi- WAISMAN, 2006,
nada pela estrutura tecnológica do meio.
2008
A interatividade é uma atividade mútua e simultânea da
parte de dois participantes normalmente trabalhando
em direção de um mesmo objetivo.
90
Interciência
& Sociedade
Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC
A interação é uma série complexa de mensagens trocadas entre as pessoas. Porém, o entendimento de
comunicação vai além das trocas verbais, sendo assim,
todo comportamento uma comunicação.
PRIMO & CASSOL, 2008
Para ficar mais claro, poderíamos substituir a palavra
‘interação’ pela palavra ‘relação’. O conhecimento é,
portanto fruto de uma relação. E relação nunca tem um
sentido só.
Comunicação e
Semiótica
Interatividade é um conceito que quase sempre está
associado às novas mídias de comunicação.
DEFLEUR &
BALL-ROKEACH,
1989
Interatividade pode ser definida como uma medida do
potencial de habilidade de uma mídia permitir que o
usuário exerça influência sobre o conteúdo ou a forma
da comunicação mediada.
JENSEN, 1998
Interatividade é a disponibilização consciente de um
mais comunicacional de modo expressivamente complexo, ao mesmo tempo atentando para as interações
existentes e promovendo mais e melhores interações –
seja entre usuário e tecnologias digitais ou analógicas,
seja nas relações “presenciais” ou “virtuais” entre seres
humanos.
BONILLA, 2002
Interatividade é uma expressão da extensão que, em
uma determinada série de trocas comunicativas, qualquer terceira (ou posterior) transmissão (ou mensagem) RAFAELI, 1988.
é relacionada ao grau com o qual trocas anteriores se
referem mesmo a uma transmissão mais antiga.
A interatividade, ou seja, o exercício de interação ocorre entre emissor e receptor que devem estar numa
mesma sintonia no processo de comunicação.
A interatividade é uma peculiaridade de alguns sistemas informáticos que permitem ações recíprocas de
modo dialógico com outros usuários ou em tempo real
com artefatos.
A interatividade pode ser entendida como a quantidade
de controle que a audiência tem sobre as ferramentas
(serviços) e o conteúdo; ou a quantidade de opções
que este controle oferece e a habilidade de usar uma
ferramenta ou um conteúdo de forma que seja produtivo ou criativo.
WAISMAN, 2006.
Interatividade é o fenômeno da comunicação que ocorre entre pessoas. Máquinas simulam a interatividade
e precisam ser ensinadas ou munidas de informações
para que possam desempenhar este papel.
Interciência
& Sociedade
91
VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G.
Interativo: 1. Aquilo que procede por interesse; 2. Informática. Diz-se dos programas que permitem uma
interação a modo de diálogo, entre o computador e o
usuário.
Definições de
interação
Educação
Interação é ação que se exerce mutuamente entre duas
ou mais coisas ou pessoas; ação recíproca.
Interação é ação; influência recíproca entre dois elementos.
Interação é ação exercida reciprocamente entre dois
objetos, pessoas etc.
Interação é influência recíproca; fenômeno que permite a um certo número de indivíduos constituir-se em
grupo e que consiste no fato de que o comportamento
de cada indivíduo se torna estímulo para outro.
Interativo é atividade desenvolvida mútua ou reciprocamente. 2. Relação entre dois sistemas comunicativos
(como um telefone, uma TV a cabo ou um computador)
que envolve usuários de outras ordens (seja para troca
de informações, seja para propaganda) ou responsabilidades (como uma enquete)
Interatividade: 1. Uma atividade que envolve interação;
2. Propriedade de ser interativo.
A interatividade é o elemento-chave para a construção
do conhecimento, pois nenhum conhecimento, mesmo
que através da percepção, é cópia do real. O conhecimento não se encontra totalmente determinado pela
mente do indivíduo, mas é produto de uma interação.
Logo o conhecimento é construído interativamente
entre o sujeito e o objeto.
TIMÓN, 1998
GABOCORP/FACOM/UFBA, 2008
RICHARDS, 2006.
PIAGET, 1996
Fonte: elaborado pelos autores.
Analisando os conceitos apresentados para diferentes áreas de concentração, é possível observar que dentre uma
série de citações, a grande maioria pertence à Cibercultura, reforçando os estudos
entre homens e máquinas que têm, nestas,
as coadjuvantes para as relações sociais.
Todavia, o conceito de interatividade pode ir muito além da mera e simples
comunicação entre homem e computador.
4. Afinal, o que é interatividade?
Fazendo uma releitura de todas as
citações postadas anteriormente, e inferin92
do segundo uma visão particular, apoiada
pela formulação teórica, este trabalho entende a interatividade como o nível com o
qual uma tecnologia permite criar um ambiente mediado, no qual diferentes entes,
de diferentes naturezas, podem se comunicar de forma sincronizada ou não, trocando mensagens recíprocas (MURRAY, 1999;
KIOUSIS, 2002).
Complementando, vale ressaltar
que uma tecnologia interativa deve permitir trocas entre máquina, softwares e usuários, através de periféricos ou de menus
e links audiovisuais ou hipertextuais, com a
capacidade de proporcionar aprendizagem,
Interciência
& Sociedade
Interatividade e educação: reflexões acerca do potencial educativo das TIC
entretenimento, aquisição de informações e
comunicação em tempo real ou remota. Assim, pode-se dizer que uma tecnologia interativa interatividade precisa que o sistema
virtual seja dinâmico, forneça possibilidades variadas de escolha e feedbacks, com
auxílio de animações, filmes, músicas, hipertextos, jogos, simulações, holografias e
verossimilhança com o meio real, permitindo ainda que usuário tenha capacidade de
imersão no meio virtual de forma passiva ou
ativa, individual ou coletiva, com opções de
transformar o ambiente de forma livre, em
consonância com sua vontade, suas preferências, crenças e valores (VERASZTO et
al. 2009a, 2009b).
Mesmo sabendo que todos estes
pontos ainda não coexistem em uma única
tecnologia, existem estudos para sua efe-
tivação, dando indícios de todo o seu potencial, que aqui deve-se lembrar, pode ser
empregado no contexto educacional (AMARAL, 2004; BASSO & AMARAL, 2006; BATTAIOLA & ELIAS, 2002; CAMPOS, 2008;
CLUA & BITTENCOURT, 2008; COSTA &
FRANCO, 2005; MISKULIN, 2008; MIT,
2008; MUGNAINI; 2007; PASSERINO,
2010; UFMT, 2008; VERASZTO et al 2009a,
2009b, 2009c).
5. Aplicativos interativos e suas contribuições educacionais
Conforme apontado anteriormente,
é sabido que tecnologias interativas podem
ser desenvolvidas para apoiar intervenções
educacionais. Algumas das possibilidades
podem ser vistas no resumo do Quadro 2.
Quadro 2. Possibilidades educativas das tecnologias interativas
As tecnologias interativas desenvolvidas para o contexto educativo, um aluno é capaz de
•
se beneficiar de simulações para compreender melhor processos reais;
•
tomar decisões;
•
fazer escolhas, a partir de distintas possibilidades, que reflitam suas idéias, código de ética
e valores;
•
selecionar procedimentos e verificar suas funcionalidades;
•
compreender o sentido de mensagens escritas e audiovisuais atribuindo-lhes significado ou
re-significando seus conteúdos;
•
utilizar códigos e símbolos para interagir com a realidade virtual;
•
interagir virtualmente através de diferentes processos interativos;
•
explorar e resolver situações-problema virtuais que envolvam contagens, medidas e códigos numéricos, construindo, a partir deles, os significados das operações fundamentais;
•
identificar relações de posição entre objetos no ambiente virtual;
•
perceber semelhanças e diferenças entre objetos e identificar formas superficiais ou espaciais, em situações que envolvam simulações, construções e representações virtuais e
audiovisuais;
•
confiar na própria capacidade de elaborar estratégias e obter soluções para situações-problema virtuais e audiovisuais, estabelecendo comparações com a realidade e o meio no
qual está inserido;
•
estimar resultados e expressá-los por meio de representações não necessariamente convencionais;
•
valorizar a troca de experiências entre máquinas, sistemas e homens como forma de aprendizagem e aquisição de conhecimentos;
• comparar as formas geométricas encontradas na natureza, nas artes, nas edificações e
fazer associações com as representações dos ambientes virtuais e audiovisuais;
Interciência
& Sociedade
93
VERASZTO, E. V.; GARCÍA, F. G.
• valorizar medidas e estimativas para resolver problemas virtuais e interativos;
• conhecer, interpretar e produzir mensagens, que utilizam formas gráficas e audiovisuais
para apresentar informações;
• organizar e elaborar estratégias para solucionar problemas lógicos;
• utilizar informações obtidas no ambiente virtual para justificar suas idéias ou adquirir conhecimentos novos;
• interpretar as informações estabelecendo regularidades e relações de causa e efeito, semelhanças, diferenças e seqüências de fatos;
• reconhecer, no espaço virtual e no ambiente real, referenciais espaciais de localização e
orientação de modo a estabelecer representações espaciais;
• situar acontecimentos históricos e localizá-los no tempo;
• assumir posições segundo seu próprio juízo de valor, considerando diferentes pontos de
vista e aspectos de cada situação simulada;
• construir objetos virtuais, ou seja, construir imagens, plantas de casas, cidades hipotéticas,
etc.;
• modelar fenômenos, planejando e realizando experiências químicas e físicas, por meio da
simulação de situações, que se modificam em função de diferentes variáveis;
• interagir com uma grande quantidade de informações, que se apresentam de maneira atrativa, por suas diferentes notações simbólicas (gráficas, lingüísticas, sonoras etc.);
• desenvolver processos metacognitivos, na medida em que o instrumento permite pensar
sobre os conteúdos representados e as suas formas de representação, levando o usuário
a “pensar sobre o pensar”;
• formar parcerias de trabalho (duplas ou trios), que servirão também para promover a troca
de informações.
Fonte: elaborado pelos autores.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O vínculo entre tecnologia e educação pode ser estabelecido historicamente
desde o surgimento do primeiro dos nossos
antepassados. O surgimento e o desenvolvimento de atividades próprias do ser humano como a memória, a cognição, o pensamento, a linguagem, a escrita, bem como
o posterior surgimento da impressão e da
informática, são eventos que dão indício da
paralela evolução tecnológica e intelectual
da humanidade.
Dentro do contexto apresentado ao
longo de todo o trabalho, a educação precisa buscar a compreensão e interpretação
da realidade para então situar o educando
na compreensão do mundo que o abriga.
E por termos hoje um mundo plural, e em
constante mudanças, graças ao advento
tecnológicos, a utilização das TIC tem muito
a contribuir. Tecnologias interativas, que se
valem de recursos audiovisuais e textuais
diversificados, podem vir a convergir em
aplicativos, jogos ou softwares com carac-
94
terísticas multidisciplinares assim como o
nosso entorno é constituído.
Assim, o objetivo deste trabalho se
cumpre ao apresentar uma série de contribuições que as tecnologias interativas podem trazer à educação. Contudo, não é o
bastante. As bases da reflexão aqui estão
lançadas e estas, devem deixar como desafio futuro a utilização desta teoria para o
desenvolvimento de atividades educativas
concretas.
Desta forma, é possível ultrapassar a barreira dos discursos bem intencionados colocando em prática aquilo que a
teoria apregoa.
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Estéfano Vizconde Veraszto possui graduação em Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e
é Mestre e Doutor em Educação, Ciência e Tecnologia pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP). Possui estágio doutoral no exterior na Facultada de Ciencias de la Información da Universidad Complutense de Madrid (UCM). Atualmente é diretor e professor da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”, pesquisador do Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas na Educação, da Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de Campinas, pesquisador colaborador da Universidad Nacional de Educación a Distáncia
(UNED/España), pesquisador colaborador da Facultad de Ciencias de la Información da Universidad Complutense
de Madrid e docente da Instituição de Ensino São Francisco (IESF).
Francisco García García é Profesor Doutor, Catedrático de Comunicación Audiovisual y Publicidad de la Facultad
de Ciencias de la Información de la Universidad Complutense de Madrid-España.
96
Interciência
& Sociedade
LEITURA, ESCRITA E NOVAS MÍDIAS
SILVA, Fabiano Correa da
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
Instituição de Ensino São Francisco (IESF)
[email protected]
RESUMO: O presente artigo faz parte de uma pesquisa maior que procurou compreender como acontecem as relações entre leitura e escrita, leitores e escritores com o advento das novas tecnologias da
informação e da comunicação – NTICs. A redefinição destes novos lugares com a valorização da interatividade por meio destes inovadores recursos tecnológicos faz do leitor não mais um simples receptor
de conteúdos, mas também um participante com capacidade de interferir nos rumos da própria escrita
do texto, o chamado escrileitor.
PALAVRAS-CHAVE: Leitura, Escrita, Novas Mídias, Interatividade.
ABSTRACT: This article is part of a larger research project that sought to understand how the relationship between reading and writing, readers and writers with the advent of new information technologies and communication – NICTs. The redefinition of these new places with the enhancement of interactivity through these innovative technological features makes the reader no longer a mere recipient of
content, but also a participant with the capacity to interfere in the course of the actual writing of the text,
called escrileitor.
KEYWORDS: Reading, Writing, New Media, Interactivity.
A escrita metódica me distrai da presente condição dos homens. A certeza de
que tudo está escrito nos anula ou faz de
nós fantasmas (BORGES, 2007).
Questões como a escrita e a leitura
muitas vezes estiveram em pauta nas discussões a respeito das manifestações artísticas e culturais do homem, pois são formas
primordiais de comunicação e inter-relação
entre os seres humanos. Dessa forma, torna-se importante pensarmos a respeito de
como a atual “revolução” das novas mídias,
como diz FURTADO (2002), tem modificado
as maneiras de produzir (escrever) e consumir (ler) textos.
Desde o surgimento da escrita, há
aproximadamente seis mil anos, com os primeiros hieróglifos até o presente das chamadas escritas eletrônicas, o que o homem
busca são maneiras de se comunicar, se
expressar e se fazer presente numa sociedade em mudança.
A escrita tornou-se o aparato pri-
mordial e mais importante de expressão da
humanidade, visto que dá a impressão de
eterno em contrário ao sentimento de efemeridade do oral. Um exemplo marcante
disso foi, segundo diz Horcades (2007), o
apoio que os reis e a Igreja deram à imprensa quando do seu surgimento, visto que os
interesses em manter viva as suas doutrinas e poderio sobre a sociedade medieval.
Por esse motivo, as sociedades letradas
passaram a escrever as suas histórias,
como aconteceu com a Bíblia Sagrada judaico-cristã, ou mesmo o alcorão mulçumano. Todas as histórias ali presentes e carregadas de imagens abstratas e figuras de
linguagem, antes de serem escritas, foram
narradas de geração para geração durante
muitos séculos. Um exemplo concreto disso
é a celebração da Páscoa judaica, à qual foi
cristianizada pelos seguidores de cristo, de
acordo com a sua nova doutrina.
A perpetuação da escrita como
forma principal de manifestação da humanidade fez surgir o que é chamado de sociedades letradas, havendo uma super vaInterciência
& Sociedade
97
SILVA, F. C. da
lorização da escrita, em detrimento do oral.
A palavra dita e acordada já não é mais
válida, sendo necessária a escrita de um
documento legal que legitime tal acordo, o
que demonstra uma mudança social importante, pois a escrita torna-se algo supremo,
só perdendo este status com o surgimento
das mídias eletrônicas já no final do século
XX, relata Mourão em suas análises sobre
o hipertexto.
Com o surgimento da imprensa de
Gutenberg no final da idade média a escrita
inicia o seu apogeu e domínio, pois a facilidade de acesso aos textos impressos vai se
tornando, com o passar do tempo, cada vez
mais fácil. Os romances do século XIX são
exemplos de como a sociedade tem, no suporte escrito, o maior aliado na propagação
de idéias, culturas e conhecimentos.
A supremacia da escrita, portanto,
faz surgir os leitores, consumidores deste tipo de comunicação que, para fazerem
parte desta sociedade, precisam dominar a
decodificação destes sinais gráficos, as letras. Assim, o domínio da leitura e da escrita
torna-se algo de fundamental importância,
pois aqueles que não tiverem o conhecimento letrado são impedidos de ter acesso as mais diversas áreas do saber e da
cultura. Desde então, saber ler e escrever
tornam-se requisitos básicos e primordiais
para pertencer à sociedade e ter acesso
a gama de conhecimentos desenvolvidos
por quem a elas pertencem. Dentre tantos
exemplos dessa supremacia da escrita, os
tratados filosóficos, representações escritas do que antes era oralmente expresso
nas praças públicas, são marcas de como
o acesso ao conhecimento é feito por meio
do código impresso.
O ensino da escrita e o incentivo à
leitura como forma de aquisição de saberes
torna-se algo essencial em muitas culturas,
com o ensino regular de língua e leitura na
maioria das escolas em muitos países. Ser
um bom escritor e um bom leitor são premissas importantes para que a pessoa faça
parte da sociedade e possa gozar de todos
os privilégios.
Vejamos o caso do romance, gênero literário dominante na sociedade burguesa emergente do século XVIII, em contraste
com a poesia, gênero lírico representante
98
da nobreza decadente, que se tornou o estilo literário mais lido, estudado e conhecido a partir de então. Assim, prova-se que o
domínio da escrita e da leitura está vinculado com a aquisição de conhecimento e,
consequentemente, com o acesso aos bens
político-culturais e ao poder.
Nas artes plásticas, na pintura mais
especificamente, muitas obras representavam nas telas essa supremacia da escrita
e da leitura. No teatro, a imagem de pessoas lendo e ou escrevendo simbolizam, por
meio de personagens-tipo, a valorização e
o culto à palavra escrita. Mesmo nas diferentes religiões, por meio da teatralização
das celebrações, existe a “adoração” à
Palavra de Deus, simbolizada pela Bíblia
Sagrada impressa, disponível de manejar
apenas aos sacerdotes, mostrando assim a
sacralização deste objeto. Importante lembrar que, apesar de todas as mudanças culturais, religiosas, políticas e sociais, ainda
hoje existe essa sacralização do livro sagrado impresso.
Fazendo uma pesquisa mais apurada a respeito da valorização da leitura e
da escrita, podemos verificar que em muitas
manifestações artísticas, tais como a pintura, a escultura, a música, e muito marcadamente a literatura (pois é a arte da escrita),
encontramos o culto à escrita e à leitura. Todas essas obras são capazes de demonstrar a valorização de toda uma sociedade
ao culto da palavra escrita, impressa e também da decodificação da mesma.
O pintor flamengo pré-renascentista Robert Campin, um dos grandes pintores
da sua época, demonstra em várias de suas
telas essa admiração, culto e valorização
da escrita e da leitura, por meio de imagens
de pessoas com livros, ou mesmo naquelas
obras em que o livro aparece como objeto
que pertence à cena retratada. Em “A Virgem e o Menino diante de um guarda fogo”
o artista leva ao ápice a valorização da
cultura letrada por meio da imagem de um
livro sobre um móvel, o qual, possivelmente, Maria, a mãe de Jesus, estaria lendo
quando antes de amamentar seu filho. Impressionante é ver que uma santidade leia,
a sacralização da leitura. Já em outra obra
de Robert Campin, intitulada “Retábulo de
Mérode”, no qual retrata a cena da anunciaInterciência
& Sociedade
Leitura, escrita e novas mídias
ção do anjo à Maria, esta, agora sim, está
lendo um livro bem posto em suas mãos, e
ainda em cima da mesa existe outro também aberto, como se a Virgem estivesse a
desfrutar da leitura de ambos. Isso presente
numa cena clássica das histórias evangélicas, visto que este episódio é uma marcante data no calendário católico.
Também em outras tantas obras
de arte, de outros autores e em diferentes
épocas representam a valorização da escrita, tais como as pinturas de Henri Fantin-Latour (1836-1904), “A Leitura”, 1870, Óleo
sobre tela, 95 x 123 cm, já no final do século XIX; ou mesmo a música “Língua” (1972)
do cantor brasileiro Caetano Veloso, a qual
faz diferentes alusões a respeito dos usos
da língua por meio da escrita, referindo-se
a autores brasileiros e portugueses, como
Guimarães Rosa, Camões, Fernando Pessoa, dentre outros.
Na literatura, mais do que em qualquer manifestação artística, a palavra escrita/impressa é super valorizada. Exemplos
de obras que fazem um trabalho de metalinguagem ao homenagear a própria língua
e também a enaltecer o ofício do criar não
faltam na literatura universal. Camões, em
os Lusíadas, por exemplo, pede inspiração às ninfas do Tejo para que a pena em
suas mãos corra pelo papel em branco e
seu canto possa alcançar o objetivo que é a
exaltação aos feitos portugueses.
Isso tudo demonstra, mais uma
vez, que desde que surgiu, a escrita impressa é algo que ganhou muito status e,
por esse motivo, hoje na chamada revolução digital (Santaella) a escrita eletrônica
pode encontrar barreiras por parte de muitas pessoas que acreditam no fim da escrita
impressa/linear, o que não é uma verdade
que venha a ocorrer.
O surgimento das novas mídias,
porém, vem desestabilizar a “cultura livresca” (Furtado), na qual a escrita tradicional
impressa é a guardiã da memória, da ordem
e da lei que mantém as relações hierárquicas e de poder. Por esse motivo é que é
chamado, por muito teóricos da comunicação e das artes, de “Revolução” este momento em que surgem a escrita eletrônica e
seus dispositivos de leitura:
Estamos, sem dúvida, entrando numa
revolução da informação e da comunicação sem precedentes que vem sendo
chamada de revolução digital. O aspecto
mais espetacular da era digital está no
poder dos dígitos para tratar toda informação, som, imagem, vídeo, texto,
programas informáticos, com a mesma
linguagem universal, uma espécie de
esperanto das máquinas. Graças à digitalização e compressão dos dados, todo
e qualquer tipo de signo pode ser recebido, estocado tratado e difundido, via
computador. Aliada à telecomunicação,
a informática permite que esses dados
cruzem oceanos, continentes, hemisférios, conectando potencialmente qualquer ser humano no globo numa mesma
rede gigantesca de transmissão e acesso que vem sendo chamada de ciberespaço (SANTAELLA, 2004: 71).
Esse momento de mudança estabelece temas cruciais, segundo Furtado, da
transição do texto impresso para o suporte
eletrônico, sendo questões que o autor discute em seus estudos procurando entender
como é a natureza do livro no mundo digital
como forma de comunicação; como ocorre
o controle dos livros, da autoria, dos consumidores e mesmo como gerir a herança cultural; e como reestruturar as economias de
autoria e edição. Esses questionamentos
fazem parte de um momento em que são
precisas respostas que justifiquem o aparecimento do eletrônico numa sociedade historicamente marcada pela escrita impressa/
linear.
A palavra Interatividade é um conceito importante quando falamos em Leitura
e Escrita nas Novas Mídias, pois a relação
entre escritores e produtores de informação
com seus leitores e receptores é baseada
na interação entre ambos. Dessa forma,
Interatividade não é algo novo ou que surgiu com o advento das novas mídias, pois
pode haver interação entre um escritor de
obras impressas e seus leitores. O que, no
entanto, é importante saber é em que sentido usamos o termo em questão, como diz
SANTAELLA, 2004 p. 153: diante dessa
proliferação ilimitada de sentidos, é preciso
recuperar uma noção mais estreita, porém
mais significativa do termo ‘interatividade’.
Toda palavra quando muito usada
Interciência
& Sociedade
99
SILVA, F. C. da
por uma grande parcela de pessoas, sendo que a usam de diferentes maneiras possíveis, gera um desconforto e até mesmo
uma grande confusão. A palavra Interatividade está sendo correntemente usada
neste momento que vivemos da chamada
Revolução Digital (SANTAELLA, 2004). Diversas definições foram dadas ao termo, o
que fez com que muitos estudiosos criassem resistência ao seu uso em obras de
pesquisa de caráter científico. Numa pesquisa rápida pelos livros e pela Internet podemos confirmar esta infinidade de usos da
palavra Interatividade:
Como pudemos perceber, é necessário que saibamos em que sentido e para
qual objetivo usamos a palavra em questão.
O que é marcante saber, é que esta pesquisa dos significados da palavra interatividade já demonstra por si só o que é viver
em uma sociedade que tem nos dias atuais
a interação como palavra chave, ou seja,
a relação entre pessoas, entre pessoas e
máquinas são exemplos da necessidade de
compreendermos o uso deste termo que se
tornou fundamental para o entendimento da
sociedade atual. Apesar de sabermos que
faz parte da própria condição humana não
viver isoladamente, o que afirmamos aqui
é que este conceito Interatividade está ainda mais presente nos dias atuais devido ao
avanço tecnológico e suas possibilidades
de interação.
É fácil perceber que ao fazer uma
pesquisa rápida sobre um termo em livros
ou mesmo e mais rapidamente na Internet,
estamos interagindo com um número infinito de pessoas que também, por algum
motivo, tenha procurado saber o significado
desta palavra. Assim sendo, percebemos
que o que parece ser uma simples pesquisa na qual isoladamente eu procuro saber
o sentido de um termo, torna-se, graças às
novas tecnologias, a internet no caso, uma
grande teia de interatividade.
Da mesma forma é importante notar que interagimos constantemente com
os demais seres humanos e máquinas que
fazem parte da sociedade. A interatividade
na sociedade já é algo inerente na vida das
pessoas que o fazem muitas vezes sem
nem sequer notarem que o estão fazendo.
A revolução digital a qual se refere
100
SANTAELLA (2004) é algo que já presenciamos até de forma tranqüila e natural,
visto que nossas crianças já nascem com a
mão no mouse e os olhos nas telas da TV
e do computador, ouvindo nossas músicas
e sonhando com nossas histórias. Dessa
forma, apesar do substantivo revolução, essas mudanças ocorrem de forma um tanto
quanto aparentemente natural, no entanto,
ainda existem realidades bastante distantes
desta revolução e que estão à margem das
novas tecnologias.
A vivência na sociedade em rede
nos proporciona uma reflexão a respeito
das mudanças de paradigmas que enfrentamos neste momento, chamado por muito
teóricos da atualidade, da terceira revolução, afirma CASTELLS (2001) que o que
é caracterizado na atual revolução tecnológica não é a centralidade de conhecimentos e informação, mas a aplicação desses
conhecimentos e dessa informação para a
geração de conhecimentos e de dispositivos de processamento/comunicação da
informação, em um ciclo de realimentação
cumulativo entre a inovação e seu uso.
Portanto, a Interatividade no seu
sentido mais amplo é a interação entre humano-humano por meio do diálogo com uso
ou não de inovações tecnológicas e também a interação entre homem-máquina:
...uma definição mais básica de interatividade nos diz que se trata aí de um
processo pelo qual duas ou mais coisas
produzem um efeito uma sobre a outra
ao trabalharem juntas. Uma definição
menos genérica e mais simplificada diz
que interação é a atividade de conversar
com outras pessoas e entendê-las. Nesta última definição está explícita a inserção da interatividade em um processo
comunicativo, que, na conversação, no
diálogo, encontra sua forma privilegiada
de manifestação (SANTAELLA, 2004:
154).
Dessa forma, a interatividade pode
ocorrer por meio de diferentes tecnologias,
desde as mais simples e conhecidas como
o texto impresso de leitura linear no qual
o autor propõe um diálogo com seu leitor,
quanto àquelas com suporte hipermidiático,
nas quais a máquina oferece muitas ferra-
Interciência
& Sociedade
Leitura, escrita e novas mídias
mentas que colaboram no dialogismo entre
os envolvidos na interação.
A palavra “Mídia” tem sua origem
no Latim e significa “meios” em português.
O acesso a esse conceito ocorreu via língua inglesa (media que pronuncia-se mídia)
e que foi apropriado no português do Brasil todas as vezes que se quer referir aos
meios de comunicação em geral, tais como
os recursos tecnológicos que dispomos em
nossos processos comunicacionais: rádio,
TV, entre outros. O uso destas ferramentas,
isoladamente, corresponde a uma determinada mídia, por exemplo: a TV.
Atualmente muito se fala em novas
mídias, mas o que seria isso? Em seu artigo
intitulado “Novas mídias como tecnologia e
idéia: dez definições”, MANOVICH (2009)
busca compreender o que seriam estas
novas mídias, afirmando que esta pergunta ainda não é fácil de ser respondida, mas
que o autor o tentará fazer elaborando dez
respostas possíveis, desde a diferenciação
entre novas mídias e cibercultura – sendo
a primeira mais uma questão cultural e de
máquina computacional e a segunda mais
redes sociais – passando por questões de
novas mídias atreladas a organização de
dados por softwares até chegar a discussão sobre a relação das novas mídias com
a arte, ao afirmar que os novos criadores de
softwares é quem são os novos artistas.
Outro fator importante na reflexão
de Manovich em seu artigo é o que ele chama de “etapas da nova mídia”, o que pode
ser encontrado em diferentes manifestações de usos destes novos recursos. O que
autor afirma é que existem, como é sabido,
ideologias a permearem os usos destes
novos recursos midiáticos (como o computador, por exemplo), e que todo recurso já
foi um dia uma nova mídia. Por exemplo,
o cinema, o rádio, a televisão já foram assim intitulados e hoje estão em um outro
momento, deixaram de ser uma novidade,
mas já tiveram o seu título de nova mídia.
Sendo assim, o uso do termo Novas Mídias
é, muitas vezes, utilizado como estratégia
para que uma obra, um texto ou mesmo um
recurso tecnológico seja difundido como
algo inovador e ganhe repercussão. Portanto, utilizar este título pode ser algo mais ideológico, com intenções de propagação do
recurso/obra, do que propriamente uma inovação no sentido mais restrito da palavra.
As novas mídias, assim chamadas,
apesar das dificuldades ainda hoje de responder o que sejam, encontram em Manovich uma definição interessante: “as novas
mídias são objetos culturais que usam a
tecnologia computacional digital para distribuição e exposição”. Aqui o autor faz uma
distinção importante entre mídia e novas
mídias: não é o uso ou não dos recursos
computacionais que definem as novas mídias, mas sim a distribuição e exposição.
Sendo assim, os objetos culturais que usam
a computação apenas para produzir e armazenar dados não são classificadas como
novas mídias.
No percurso evolutivo das mídias
às novas mídias (uma constante evolução
como vimos em Manovich), torna-se interessante verificar as diferenças entre a Multímidia e a Hipermídia.
O uso de diferentes mídias para um
mesmo propósito, seja em uma aula, numa
apresentação da empresa, numa apresentação teatral, dentre tantas outras, chama-se de multimídia. Como exemplo, imaginemos uma peça teatral na qual o diretor
faz uso das seguintes mídias: o aparelho de
rádio que executa CD (Compact Disc) para
reproduzir músicas românticas de acordo
com o enredo da obra; um projetor para reproduzir imagens de lugares paradisíacos
e bucólicos, com o intuito de sensibilizar a
platéia; entre outros recursos disponíveis,
demonstram que há nesta dramatização o
uso de um aparato multimidiático.
O próprio aparelho de televisão é
considerado uma multimídia, pois agrupa
som e imagem num mesmo aparato. Portanto, multimídia corresponde à integração
de diferentes modalidades de mídias sendo,
como afirma FERREIRA (1999) uma combinação de diversos formatos de apresentação de informações, como textos, imagens,
sons, vídeos, animações, etc., em um único
sistema.
Com o surgimento do computador
houve um salto na evolução das mídias,
causando a chamada convergência das mídias – as hipermídias:
Interciência
& Sociedade
101
SILVA, F. C. da
A aliança entre computadores e redes
fez surgir o primeiro sistema amplamente disseminado que dá ao usuário
a oportunidade de criar, distribuir, receber e consumir conteúdo audiovisual em
um só equipamento. Uma máquina de
calcular que foi forçada a virar máquina
de escrever há poucas décadas, agora
combina as funções de criação, de distribuição e de recepção de uma vasta variedade de outras mídias dentro de uma
mesma caixa (SANTAELLA, 2004:20).
A diferença entre a multimídia e
a hipermídia é que a segunda pode ter diferentes mídias sendo utilizadas de uma
única vez no mesmo espaço, ou seja, o
computador. Essa miscelânea de aparatos
midiáticos presentes num único aparelho
revolucionou toda a Tecnologia da Informação e da Comunicação, estabelecendo
uma postura ainda mais inovadora em seus
usuários, já que, em tese, qualquer pessoa
que conheça um pouco de cada uma das
mídias, pode usá-las conjuntamente tendo
como suporte o computador.
Todas estas inovações requerem
de nós, leitores/consumidores e escritores/
produtores uma postura diferenciada em relação às definições de leitura e escrita nas
novas mídias. Afinal, diferentes suportes requerem diferentes leitores, sendo que com
as novas mídias os papéis de ambos (escritor e leitor) são redesenhados e redefinidos,
fazendo surgir os chamados escrileitores
(leitor/escritor), mais ativos na construção e
definição da própria noção de texto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BORGES, J. L. O Livro de Areia. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
CASTELLS, M. A Sociedade em Rede. São Paulo:
Paz e Terra, 1999.
FERREIRA, A. (org.) Relatos de Experiência de Ensino e Aprendizagem de Línguas na Internet. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004.
FURTADO, J. A.. Livro e Leitura no Novo Ambiente
Digital. Porto: Porto Editora, 2002.
HORCADES, C. M. A Evolução da Escrita. Rio de
Janeiro: Senac Rio, 2 ed., 2007.
MANOVICH, L. Novas Mídias como Tecnologia e
Ideia: dez definições. In: LEÃO, Lucia (org.) O Chip
e o Caleidoscópio: Reflexões sobre as novas mídias.
São Paulo: Senac São Paulo, 2005.
SANTAELLA, L. Navegar no Ciberespaço: o perfil
cognitivo do leitor imersivo. São Paulo: Paulus,
2004.
Fabiano Correa da Silva é graduado em Letras pela PUC-Campinas. Mestre em Educação Superior pela PUC-Campinas e Doutorando em Ciência da Informação pela UFP - Porto/Portugal. Professor de Ensino Superior há
9 anos . Professor da Instituição de Ensino São Francisco (IESF). Coordenador Geral da Faculdade Municipal
Professor Franco Montoro (FMPFM). Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Educação, Ciência e Tecnologia do
CNPq. Pesquisador do Projeto PO-EX - UFP, financiado pela FCT - Fundação de Ciência e Tecnologia de Portugal.
102
Interciência
& Sociedade
PARTICIPAÇÃO PÚBLICA E PLANEJAMENTO AMBIENTAL: proposta
de um modelo para organização do diálogo
SCARABELLO FILHO, Sinésio
Prefeitura do Município de Jundiaí
[email protected]
SANTOS, Rozely F.
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
[email protected]
RESUMO: As vantagens e a conveniência da participação pública nas atividades de planejamento
têm sido intensamente discutidas. Administradores, empresas e órgãos públicos que fomentam este
debate apontam a participação pública como algo vantajoso, conveniente e necessário. No entanto, as
dificuldades para se incorporar a participação pública nos processos de tomada de decisão são muitas
e igualmente reconhecidas, o que tem mantido o assunto sob discussão. Este trabalho parte do pressuposto de que a participação pública é, de fato, necessária. Tem por objetivos identificar os requisitos
para que ela ocorra de forma positiva e efetiva e, principalmente, investigar a possibilidade de manutenção de uma aliança estável entre os atores sociais. Porém, para obter sucesso é necessário que o
processo de participação tenha uma clara linha metodológica condutora e avaliadora das tomadas de
decisão. Nessa direção, este estudo apresenta a proposta de um instrumento de auxílio ao processo
participativo, designado MOD - Modelo de Organização do Diálogo, que procura reunir os requisitos
considerados indispensáveis para assegurar a participação autêntica dos atores sociais. O modelo foi
construído a partir de considerações e conclusões extraídas da bibliografia e de sua aplicação em um
estudo de caso, desenvolvido na Serra do Japi, em Jundiaí (SP, Brasil).
PALAVRAS-CHAVE: participação, comunidade, oficina
ABSTRACT: The advantages and suitability of citizen participation in the management of protected areas have been discussed intensely. Managers, companies and public agencies that foment this debate
point the citizen participation as something advantageous, convenient and even necessary. However,
the difficulties to incorporate the public participation in the process of making decisions are many and
equally recognized, what has been keeping the subject on intense discussion. This study takes for granted that public participation is, in fact, necessary. But, it tries to identify the requirements so that it happens in positive and efficient way and, mainly, to investigate the possibility of maintenance of a stable
alliance among the citizen participants. For that, this study proposes a model designated MOD – Model
of Organization of the Dialogue, conceived from considerations and conclusions derived of the bibliography and applied in a study case, with the community of Serra do Japi, at Jundiaí (São Paulo, Brazil).
KEYWORDS: participation, community, workshop.
1. INTRODUÇÃO
A participação pública na gestão
local tem sido preconizada e defendida por
pesquisadores, planejadores e administradores, ora como um direito, desejável ou
conveniente, ora como um dever e, muitas
vezes, como uma necessidade. A participação pública não se restringe ao simples
exercício de uma dessas faces, mas diante
desse conjunto, em busca de um processo
de mútuo aprendizado e muita solidariedade. A participação pública tem como finalidade última a busca do consenso, quanto ao
que se deseja e quanto à forma de obtê-lo.
Nessa busca muitas vezes ocorrem conflitos e confrontos, que não devem ser temidos, pois em muitas situações é a partir deles que surgem as condições propícias para
o estabelecimento do diálogo (Connolly &
Richardson 2004). Contudo, reconhecem-se as dificuldades que os planejadores enInterciência
& Sociedade
103
SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F.
frentam em encontros públicos diante da
expectativa de obter solidariedade e consenso. Conforme citam Margerum & Whitall
(2004) “a colaboração tem se tornado rapidamente o paradigma dominante no gerenciamento de recursos naturais, mas existem
muitos dilemas sobre como ela é efetivamente aplicada”. Por um lado trabalham-se
os interesses de cada ator ou grupo social
que comumente não combinam e, por outro, tem-se as agências estatais que planejam sob condições de alta complexidade
e incerteza, mas necessitando conduzir o
processo com transparência, flexibilização
de procedimentos e credibilidade (Pequeno
& Marques 2004). Em síntese, ter entre os
grupos sociais a pré-disposição para dialogar e pactuar um consenso inicial não é
uma tarefa simples.
Para melhor conduzir o processo de participação é necessário estabelecer um forte diálogo entre os participantes
que deve ser cuidadosamente preparado.
Não bastam a simples comunicação entre
os participantes e a explicitação dos seus
interesses. A instalação do diálogo entre
eles pressupõe que eles compartilham de
conhecimentos comuns e, sobretudo, que
eles se compreendem. A compreensão não
“cai do céu”, nem se estabelece com a simples troca de informações (Morin 2000). A
compreensão precisa ser construída, ensinada e aprendida, em um processo lento,
interativo e iterativo. Trata-se de um processo de educação e de aprendizado, no
qual as informações não passam de matéria prima e, desta maneira, não podem ser
confundidos com o resultado. A compreensão está alicerçada no senso comum, nos
preconceitos e no cotidiano dos indivíduos.
Crespo (1998), Reigota (1994), Santos et
al. (2001) e Santos (2004), concordam que
é comum verificar propostas de “consenso”
cujos conceitos que norteiam o seu entendimento e fundamentam-se em diferentes
interpretações sobre o mesmo fato. Desta
forma, o consenso mínimo inicial, em relação aos objetivos do planejamento e as
condições de conservação ambiental definidas no diagnóstico ainda correspondem
à fase de compreensão dentro do processo
de participação.
Estudos sugerem que o senso de
104
comunidade e o senso de poder são fatores capazes de estimular uma população
(Julian et al. 1997), conduzindo a um consenso. O senso de comunidade pode ser
descrito como o senso de pertencer e de
ser parte de uma grande coletividade. Zimmerman & Rappaport (1988) descrevem o
senso de poder, ou de conseguir influenciar,
como a conexão entre o senso de capacidade pessoal e a disposição para atuar. Julian
et al. (op.cit.), concluem que as instituições
responsáveis por planejamento e preocupadas coma a participação devem considerar,
efetivamente, o grau de capacitação dos
partícipes para tomar. Para Scarabello Filho (2005) o senso de poder instala-se entre
os participantes se o processo contar com
credibilidade, se de fato existir uma pré-disposição determinada pelo senso de comunidade e, de se fato existir um certo grau de
distribuição do poder.
Além dessas condições, os partícipes devem ter uma visão clara da variedade
de alternativas e dos efeitos prováveis das
escolhas disponíveis (Taylor 1998). Deve-se considerar que julgamentos de interesses são julgamentos de valores. É importante que as pessoas reconheçam que seus
interesses são problemas de valor, e que as
decisões interferem no coletivo. Assim, uma
vital condição para que os indivíduos se
tornem juizes competentes dos seus interesses é o estabelecimento do diálogo com
outros, o que implica em um processo de
deliberação interpessoal e não individual.
A idéia de que se obtém uma reflexão coletiva mantida pelo diálogo e traduzida em deliberações de consenso a partir de
reuniões ordinárias ou questionários semi-estruturados é altamente suspeita. Quando se trata de identificar interesses sobre
questões complexas que envolvem a qualidade de vida o diálogo direto com as pessoas é demorado e muitas vezes repetido,
para que represente, com riqueza e precisão, os reais interesses da população. Em
outras palavras, é necessário atender a um
conjunto de requisitos fortemente estabelecidos ao longo do processo de participação,
para que ela efetivamente aconteça, com a
manifestação da espontaneidade e dos interesses de todos os envolvidos. Por todas
essas razões, o objetivo deste estudo foi
Interciência
& Sociedade
Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do
diálogo
construir um modelo metodológico que pudesse nortear a participação pública a partir
de seus princípios teóricos primários. Para
averiguar a efetividade dessa proposta,
o modelo foi aplicado e revisado ao longo
de oficinas públicas que tinham como meta
construir um cenário de expectativa para a
preservação das áreas da Serra do Japi, no
Município de Jundiaí. A hipótese é que, se
o modelo for consistente, ele permite a participação de forma positiva e efetiva e, principalmente, conduz a uma aliança estável
entre os grupos sociais.
2. Material e Métodos
Para a construção de um modelo
metodológico de participação pública foi
realizado um levantamento bibliográfico
dentro de um processo de “garimpagem”
(PIMENTEL, 2001). Foram consultados
banco de dados digital de diversas universidades e periódicos eletrônicos. As referências foram organizadas e interpretadas
de acordo com os objetivos da investigação
proposta. Foram também levantados dados
digitais sobre a área foco junto a Prefeitura
de Jundiaí (SP). Foi feito um levantamento
de termos-chave que foram utilizados para
instrumentalizar a análise dos fatos e conceitos fundamentais apresentados nesses
documentos. O resultado foi a obtenção de
um esboço de um modelo para participação
pública, cuja efetividade foi ajustada a partir
de um estudo de caso.
O modelo foi aplicado e ajustado
por meio de quatro ciclos de oficinas desenvolvidos durante dois anos com a comunidade da Serra do Japi, envolvendo em
torno de 20 participantes. O objetivo dos
encontros foi construir, a partir do modelo,
o cenário de expectativas da comunidade
sobre os usos adequados para as áreas da
Serra do Japi, em Jundiaí. Foram convidados representantes das vertentes institucional, técnico-científica e comunitária do município de Jundiaí e áreas vizinhas.
3. Resultados
Os estudos pesquisados permitiram concluir que a participação pública
deve ocorrer estruturada em ciclos de re-
alimentação e que, em cada ciclo completo, devem ser satisfeitos, no mínimo, cinco
princípios básicos para organizar o diálogo:
Pré-compreensão: cada participante do
processo deve, a partir do seu ponto de
vista, assimilar e compreender a natureza
da atividade de planejamento, suas características e os seus objetivos, de longo e de
curto prazos, considerando que o processo
desenvolve-se sempre orientado para a tomada de decisão.
Consenso Mínimo: deve ser obtido a partir da discussão dos conceitos importantes
para o debate e dos seus significados para
os participantes, o que implica no levantamento e interpretação das representações
sociais. O consenso mínimo garante a participação contributiva, tanto na formulação
das propostas como na prática que as sucede.
Senso de poder: corresponde ao senso de
capacidade acrescido da motivação, ou da
disposição para participar. O senso de poder instala-se entre os participantes se o
processo contar com credibilidade; se de
fato existir uma pré-disposição determinada pelo senso de comunidade e se, de fato,
existir certo grau de distribuição de poder.
Deliberação e escolhas racionais: ocorrem
quando todos os participantes têm conhecimento do conjunto de alternativas possíveis
e do conteúdo e dos efeitos de cada alternativa. Além disso, a partir da consciência
da falibilidade individual, cada participante deve estimular a própria capacitação e
abrir-se para o diálogo.
Reflexão coletiva útil: entendida como a
reflexão que produz resultados, isto é, que
identifica e especificam alternativas e soluções. A reflexão coletiva útil instala-se entre participantes aptos, comprometidos com
os resultados do processo, a partir de um
diálogo permanente desenvolvido sob condições racionais de apresentação de argumentos, de identificação e aprimoramento
de alternativas e de deliberação.
Tais condições ou princípios cor
Interciência
& Sociedade
105
SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F.
respondem aos elementos ligados por vínculos causais, em um arranjo circular de
realimentação, conforme representado na
Figura 1. O arranjo circular permite que os
resultados obtidos em cada ciclo de debate
e discussões sejam imediatamente incorporados pelos participantes como novos
conteúdos que ampliam os níveis de conhecimento, compreensão e consciência dos
partícipes do processo naquele momento.
Desta forma, ao se concluir um determinado ciclo, pode ocorrer que os resultados
obtidos permitam avançar na direção de
questões mais complexas ou, simplesmente, realimentem um novo ciclo de debate sobre as mesmas questões tratadas no ciclo
que se encerrou. Neste caso, trata-se de
reavaliar deliberações anteriores a partir de
um novo nível de consciência, mais amplo
e mais profundo. Assim o arranjo circular de
realimentação assegura condições para um
avanço contínuo, regulado pelo próprio processo, na direção de maior complexidade e
maior consciência.
5
6
Reflexão
Coletiva
útil
Resultado
ss
4a
1c
4
MOD
Condições
Racionais de
Deliberação e
Escolha
1
1b
Précompreensão
4b
1a
3a
3
Senso de
Poder
2
Consenso
Mínimo
2b
3c
3b
1 Pré-compreensão
1a Conhecimento da natureza do problema
1b Conhecimento das características do problema
1c Conhecimento dos objetivos
2 Consenso mínimo
2a Identificação e discussão de conceitos específicos
2b Identificação das representações sociais
3 Senso de poder (capacidade e disposição)
3a Credibilidade do processo
3b Senso de comunidade
3c Distribuição do poder
2a
4 Condições racionais de deliberação e
escolha
4a Conhecimento das alternativas
4b Consciência da falibilidade individual
5 Reflexão coletiva útil
Diálogo orientado para a tomada de decisão
6 Resultado
Expressão do nível de consciência alcançado no final
do ciclo, permitindo a tomada a decisão ou a realização
de diálogo.
Figura 1. Modelo de Organização do Diálogo.
106
Interciência
& Sociedade
Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do
diálogo
O primeiro e mais importante requisito para o desenvolvimento de um processo
de participação é a compreensão. De fato, a
necessidade da compreensão impõe-se em
todo o processo de participação e é dela
que derivam os demais requisitos. No processo de planejamento, preliminarmente, a
pré-compreensão envolve o conhecimento
e o entendimento dos conceitos associados à atividade, suas características, objetivos e possibilidades. Trata-se de entender
o que se pretende fazer e alcançar, isto é,
quais são os resultados esperados com o
desenvolvimento do processo de planejamento, com os respectivos riscos e condições. O conhecimento de que os processos
de planejamento desenvolvem-se sempre
orientados para a tomada de decisão deve
ser transmitido e enfatizado, assegurando
o entendimento de que a deliberação e a
escolha constituem a meta final do processo. Além disso, a pré-compreensão deve
incluir o entendimento sobre a situação da
área objeto do processo de planejamento
e sobre a importância dos resultados pretendidos. A compreensão, portanto, precisa
ser construída, ensinada e aprendida, em
um processo lento, interativo e iterativo.
Enfatiza-se que a pré-compreensão é para
o indivíduo o alicerce de todo o processo
de compreensão, tendo por sua vez a influência das suas representações sociais ou
senso comum que se tem sobre um determinado tema, onde se incluem também os
preconceitos e características específicas
das atividades cotidianas, sociais e profissionais dos indivíduos (Reigota 2001). Assim, o consenso mínimo inicial, em relação
aos objetivos, diagnóstico, e conceitos associados às questões em discussão, ainda
corresponde a essa primeira fase do modelo, ou seja, da compreensão.
Desde a década de 1990, estudos
sugerem que o senso de comunidade e o
senso de poder são fatores capazes de estimular a população a considerar-se parte de
uma grande coletividade e de conseguir influenciar uns aos outros (Julian et al. 1997,
Zimmerman & Rappaport 1988). O senso
de poder instala-se entre os participantes
se o processo contar com credibilidade, se
de fato existir uma pré-disposição determinada pelo senso de comunidade e se, de
fato, existir certo grau de distribuição do poder.
Os três requisitos antes descritos,
isto é, a pré-compreensão, o consenso mínimo e o senso de poder parecem a princípio ser suficiente para o estabelecimento da
discussão, ou de um processo completo de
participação pública. Contudo, mesmo sob
tais condições, o processo pode enfrentar
sérias dificuldades e conduzir a equívocos
no momento da deliberação, resultando
em decisões que contrariam os interesses
dos próprios participantes. Segundo Taylor
(1998), as pessoas estão mais preparadas
para fazer julgamentos competentes sob
condições de deliberação e escolha racionais, isto é, sob condições de autonomia
pessoal relativa. Assim, concluída a etapa
de identificação de alternativas e de formulação de propostas, o processo assume um
caráter predominantemente estratégico e
se desenvolve orientado para a implementação das ações correspondentes às escolhas feitas.
A aplicação do MOD com seus
seis ciclos para o estudo de caso obteve
excelentes resultados, com deliberações
fortemente consensuadas, retratadas em
um cenário desejado, além da construção
de uma aliança estável entre os grupos sociais. Porém, deve-se considerar algumas
outras questões que foram limitantes para
sua aplicação. Assim, o modelo proposto
exige que as pessoas envolvidas disponham de tempo, dedicação e capacitação.
Essa condição limita o processo que dificilmente pode ser desenvolvido no contexto
de uma grande participação popular, com a
mobilização de um grande número de pessoas. Por outro lado, a seleção prévia dos
participantes se configura em uma tarefa
complexa, que exige decisões que também
não devem ser tomadas por um ou outro
grupo social. Assim, a identificação dos grupos sociais que são participantes potenciais
constitui-se em um problema que não admite uma resposta única, ou uma fórmula que
pode ser seguramente empregada em qualquer caso. Por essa razão, no encaminhamento do processo aplicado em Jundiaí, os
atores inicialmente convidados participaram
na identificação de outros que, inclusive, tinham eventualmente sido
Interciência
& Sociedade
107
SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F.
excluídos na pré-seleção. Em síntese, coube aos próprios participantes identificar os
representantes mais aptos e interessados,
constituindo uma equipe que participaria de
todas as atividades do processo em um ciclo reiniciado pelos integrantes. Em suma
defende-se que a escolha dos participantes, sua seleção ou exclusão, deve ser realizada dentro do próprio processo, que se
mantém sempre aberto à participação, mas
que se auto-regula pela comunidade diretamente envolvida. Este estudo evidenciou
também que, diante da impossibilidade de
responder às exigências do processo, alguns partícipes que se consideraram prejudicados desistiram ou promoveram discussões no sentido da alteração de critérios e
Identificação Preliminar dos Atores Sociais
↓
Desencadeamento do Processo de Participação
Reuniões Preliminares : ONGs, Associações,
Conselhos Comunitários e interessados em geral
↓
Identificação e Qualificação dos Atores Sociais
↓
Identificação dos Representantes dos Grupos
Sociais e Constituição da Equipe da
Comunidade
↓
Estabelecimento da Reflexão Coletiva
←
↓ →
C
I
C
L
O
C
O
N
T
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U
O
D
E
P
A
R
T
I
C
I
P
A
Ç
Ã
O
P
Ú
B
L
I
C
A
métodos. No entanto, o princípio adotado
durante os encontros foi que, em qualquer
hipótese, as decisões sempre deveriam ser
determinadas e legitimadas pelos participantes. Nessa linha, a formação da equipe
consolidou-se no decorrer do processo e
em conseqüência das dificuldades enfrentadas, ou como já observava Senge (1998)
... “A equipe que se tornou excelente não
começou excelente, ela aprendeu a produzir resultados extraordinários”.
A aplicação do modelo MOD na
Serra do Japi necessitou dois anos para
exercitar todo seu conteúdo e foi aplicado
em quatro ciclos de rotação de oficinas,
com a inserção de vários métodos voltados
à participação, conforme resume a Figura 2.
E
Q
U
I
P
E
D
A
C
O
M
U
N
I
D
A
D
E
Preparação do
Questionário
Estruturado
→
1.º Ciclo de
Participação
Pública
Preparação do 1.°
Relatório
←
↓
Reuniões de Apresentação e Distribuição do
Questionário e do 1. ° Relatório
↓
Assessoramento aos Grupos Sociais e
Recebimento dos Questionários Respondidos
↓
2.º Ciclo de
Participação
Pública
Preparação do 2.° Relatório :Consolidação dos
Resultados em Matrizes de Acertos e Conflitos
↓
Reuniões de Apresentação, Distribuição
E Discussão do 2.° Relatório
↓
Estabelecimento do Processo de Seleção dos
Objetivos ou Usos Consensuados
←
↓ →
Discussão dos
Resultados do
2.° Relatório
→
Discussão dos
Conceitos / Causas
dos Conflitos
←
↓
Deliberação sob Condições Racionais
↓
Cenário das Expectativas da Comunidade e
Elaboração do 3.° Relatório
↓
Reuniões de Apresentação do Cenário das
Expectativas da Comunidade e do 3.° Relatório
e de Divulgação das Propostas
3.º Ciclo de
Participação
Pública
4.º Ciclo de
Participação
Pública
Figura 2. Etapas para a Construção do Cenário das Expectativas da Comunidade.
108
Interciência
& Sociedade
Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do
diálogo
É importante ressaltar que o tempo
de duração do envolvimento dos participantes representa o principal fator para o sucesso do processo. Assim, por exemplo, a fase
de “reflexão coletiva útil”, isto é, da reflexão
que avança produzindo resultados, exige
que as todas as condições articuladas no
arranjo circular que constitui o MOD sejam,
efetivamente atendidas - o que pressupõe
muito tempo para sua efetivação. No início
do processo a pré-compreensão, o consenso mínimo e o senso de poder podem ser
estabelecidos, em níveis satisfatórios, para
o conjunto de questões envolvidas, ou seja,
em relação ao objetivo final de todo o debate. Porém, em relação às questões sobre
as quais há, efetivamente, conflitos entre
os grupos sociais, tais requisitos somente
serão atendidos após uma determinada duração do diálogo direto entre os partícipes
envolvidos. Em conseqüência, é preciso
insistir que os representantes dos grupos
sociais constituam um grupo estável, com a
participação e assiduidade dos mesmos indivíduos. Havendo esta estabilidade e desde que o processo tenha duração suficiente, surge a coesão entre os participantes e
o grupo torna-se efetivamente uma equipe.
Durante os dois anos de aplicação do MOD procurou-se verificar como se
dava a evolução dos elementos envolvidos
na transformação de um grupo em uma
equipe. As conclusões obtidas estão graficamente representadas na Figura 3.
Figura 3. Evolução do Processo Participativo. Dm= duração mínima do processo Dc=duração crítica.
Foi constatado que nas questões
sobre as quais não havia entendimento suficiente entre os participantes, os conflitos
aumentavam no início do processo de discussão até um valor máximo, associados
a uma determinada duração dos debates,
que pode ser chamada de “duração crítica”.
Neste momento foi importante considerar
que o consenso não é possível e se o processo for encerrado restará a impressão
de que os resultados que podem ser obtidos com a participação pública são extre-
mamente limitados. Se houver persistência
e o processo de discussão for conduzido
além da duração crítica, os participantes
passam a se empenhar na busca de alternativas conciliadoras, ocorrendo a redução
das intransigências tanto quanto o aumento da abertura para o diálogo e, finalmente
os conflitos são superados. Sem dúvida,
o instante que determina a duração crítica
certamente varia de uma questão para outra ou entre diferentes locais, não podendo
ser pré-determinado. No entanto, no caso
Interciência
& Sociedade
109
SCARABELLO FILHO, S.; SANTOS, R. F.
Jundiaí ele foi facilmente percebido pelos
participantes. Além disso, a apresentação
de alternativas de input aos participantes
contribuiu para o surgimento de propostas
conciliadoras, reiterando as conclusões de
Taylor (1998) sobre as condições racionais
de deliberação e escolha.
4. CONCLUSÕES
O MOD – Modelo de Organização
do Diálogo procurou estabelecer um processo que reúne as condições consideradas importantes para o desenvolvimento
do diálogo, com minimização dos erros no
momento das deliberações. Ele propiciou
o exercício da dialética, ou da arte de raciocinar com método entre os membros de
uma equipe que pode compartilhar conhecimentos e adquirir habilidade para fazer uso
adequado das ferramentas e dos instrumentos disponíveis. Trata-se, assim, de um
instrumento de auxílio para a organização
da participação pública em processos de
planejamento ambiental e para orientar os
processos de tomada de decisão em grupo,
objetivando o consenso entre os participantes. Ele contribui na obtenção do consenso
na medida em que propõe o diálogo repetitivo diante de cada novo conceito ou alternativa apresentada.
O estudo de caso demonstrou que
foram necessários quatro ciclos de encontros para perfazer as seis fases que compõem um ciclo completo de participação.
Este é, sem dúvida, o principal fator determinante do sucesso do processo e sua
maior limitação, uma vez que exige um longo tempo de duração para o efetivo envolvimento dos partícipes.
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CRESPO, S. (org.) O quanto o brasileiro pensa do
110
Interciência
& Sociedade
Participação pública e planejamento ambiental: proposta de um modelo para organização do
diálogo
Sinésio Scarabello Fiho. Possui graduação em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da USP (1978), Mestrado em Engenharia Civil pela Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da UNICAMP (2003) e
Doutorado em Engenharia Civil pela Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da UNICAMP (2005).
Atualmente é professor e coordenador do curso de gestão ambiental na Instituição Educacional Professor Luiz
Rosa e Secretário de Obras da Prefeitura do Município de Jundiaí. Tem experiência na área de Engenharia Civil,
com ênfase em Planejamento Urbano e Ambiental.
Rozely Ferreira dos Santos. Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (1975),
mestrado em Ciências Biológicas (Botânica) pela Universidade de São Paulo (1981) e doutorado em Ciências
Biológicas (Ecologia Vegetal) pela Universidade de São Paulo (1988). Atualmente é professora associada da Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Planejamento Ambiental
e Ecologia da Paisagem.
Interciência
& Sociedade
111
112
Interciência
& Sociedade
PLANO DE NEGÓCIOS:
o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas
SILVA, Kátia Elaine
Universidad de la Empresa de Montevideo (UDE)
[email protected]
RESUMO: O presente trabalho apresenta algumas considerações que se devem tomar quando o empreendedor deseja abrir seu negócio. O contexto leva em consideração a importância do plano de
negócio para o sucesso das micro e pequenas empresas (MPE). Também é proposto uma pequena
estrutura de plano de negócio como modelo para os iniciantes. A partir da formulação teórica, este trabalho propõem utilizar o plano de negócios para oferecer diretrizes para os micro empresários criarem
metas e disponibilizar aos seus colaboradores o seu objetivo para com estes estabelecimentos.
PALAVRAS-CHAVE: Plano de negócio; Empreendedorismo; Oportunidade; Pequenos Negócios.
ABSTRACT: This paper presents some considerations should be taken when the entrepreneur wants to
open her business. The context takes into account the importance of the business plan for the success
of micro and small enterprises. Also proposed is a small structure of the business plan as a model for
beginners. From the theoretical formulation, this paper proposes to use the business plan to provide
guidelines for the micro and small enterprises create goals and provide its employees with his goal for
these establishments
KEYWORDS: Business plan; Entrepreneurship; Opportunity, Small business.
1. INTRODUÇÃO
Os mais recentes levantamentos
feitos pelo Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas (MPE), apontaram que 22% (vinte e dois porcento), das
pequenas empresas brasileiras encerram
suas atividades todo ano. Busca-se o fator
principal para esse problema crônico brasileiro, já que essas mesmas MPE são reconhecidamente responsáveis pela maior parcela de empregos gerados no país. Diversas
pesquisas e reportagens que veiculam na
mídia focam vários aspectos considerados
como sendo os grandes causadores desses
números (SEBRAE, 1998a).
Pode-se citar a falta de incentivos
e subsídios do governo, altas taxas de juros, acesso restrito ao crédito, exigência
de contrapartidas elevadas ao se pleitear
financiamentos junto a bancos, a crescente
concorrência estrangeira, entre outros que
são diariamente discutidos em vários pontos do país. É constante a preocupação em
se buscar culpados para os próprios erros
e a exagerada preocupação com fatores
intangíveis para o empreendedor (DORNE-
LAS, 2010).
Todos esses exemplos citados são
verídicos, importantes e preocupantes, porém são fatores de ordem macro e de difícil
influência por parte do empreendedor isoladamente. As entidades representativas de
sua classe estão aí para defender seus interesses e buscar melhores condições que
viabilizem um cenário propício à criação e
crescimento de novos empreendimentos.
Não há fórmula mágica para consertar uma empresa que está indo à falência, mas é possível prevenir que ela fracasse prestando atenção em alguns detalhes
durante a abertura. E a pergunta é: Qual a
responsabilidade do empreendedor, o que
ele deve fazer? E a resposta é: planejar,
planejar e planejar.
Entretanto
segundo
Dornelas
(2010), é visível a falta de cultura e de planejamento do brasileiro, que por outro lado
é sempre admirado por sua criatividade e
persistência.
Quantas vezes você já deve ter
falado ou pensado uma dessas frases: Eu
não tenho tempo para planejar. Eu não necessito de um de um plano de negócio, pois
Interciência
& Sociedade
113
SILVA, K. E.
eu tenho um em minha cabeça. Eu não sei
como começar. Eu não sou bom com os números, etc.
Agora chegou a hora de colocar
essas convicções em dúvida: Será que o
planejamento não é importante?
Transformar uma idéia em um
negócio pode parecer assustador em um
primeiro instante, mas depois você terá a
certeza que tudo faz parte de uma aventura, com muitas passagens de suspense e
agonia, mas também de conquistas, a cada
passo do planejamento novos obstáculos
irão aparecer e tentar fazer com que você
volte de onde veio, mas a cada obstáculo
vencido, será um passo a mais para o sucesso. (DORNELLAS, 2010).
Tudo pode ser menos tenebroso, basta para isto você ter conhecimento
suficiente para reduzir constantemente os
riscos, os fatos devem ser encarados de
maneira objetiva, as principais razões para
o falecimento das empresas é a falta de planejamento. (BERGMANN, 2010).
Agora surge a seguinte questão
problematizadora: O Plano de Negócio é
realmente uma ferramenta que pode determinar o sucesso ou o fracasso de uma
empresa?
Levando essa pergunta em consideração, esse artigo vai discutir e propor
estruturas de planos de negócios e ainda
focar a importância da revisão periódica do
plano de negócio, para que essa ferramenta
deixe de ser um empecilho e auxilie o empreendedor alcançar o tão sonhado sucesso.
E o primeiro passo é identificar
condições para melhores oportunidades de
negócio.
2. Identificando a oportunidade de negócio
Para ser bem-sucedido, o empreendedor precisa planejar o seu negócio
improvisar jamais. Saltar no escuro não é
exatamente uma boa pedida.
Segundo Chiavenato (2008),
os empreendeores tendem a negligenciar o
estágio de planejamento seja pela ansiedade de iniciar o novo negócio, seja por falta
114
de confiança no instrumento ou mesmo pela
falta de informação sobre como elaborar um
plano de negócio.
O empreendedor deve começar
seu planejamento identificando a oportunidade de negócio, que pode ser encontradas
em todos os lugares sob as mais diversas
formas, exigindo predisposição e criatividade.
Segundo Degen (2005), a predisposição para identificar a oportunidades é
de fundamental importância para os que
desejam ser empreendedores. Todas as
pessoas estão diariamente expostas a centenas de empreendimentos, mas a grande
maioria vê somente os anúncios e as fachadas. O empreendedor de sucesso é aquele
que não se cansa de observar negócios, na
constante procura por novas oportunidades, analisa cada detalhe, seja no caminho
de casa, nas compras, lendo jornais ou de
férias com a família. Sempre está atento e
curioso.
Degen (2005) ainda coloca que é
pela predisposição que o futuro empreendedor aprende a observar e avaliar o negócio. Mas é através da criatividade que
ele começa a associar as observações dos
mais diversos tipos e formas de empreendimentos.
O mundo empresarial precisa cada
vez mais de empreendedores e trabalhadores de mente aberta e independente, capazes de responder imaginativamente aos
novos desafios.
Mais do que nunca, necessitamos fazer uso de nosso potencial para criar.
Esse potencial ilimitado, que permanece
muitas vezes adormecido ou em estado
latente, é o recurso mais precioso que
indivíduos e organizações dispõem para
lidar com os desafios que acompanham
nossa época, em que a incerteza, o progresso e a mudança são uma constante
(JOSÉ PREDEBON, 1998, p.202).
3. Elaborando o plano de negócio
O plano de negócio não é mais
do que uma descrição detalhada do planejamento de uma empresa. As seções que
compõem um plano de negócios geralmenInterciência
& Sociedade
Plano de negócios: o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas
te são padronizadas para facilitar o entendimento. Cada uma das seções do plano tem
um propósito específico.
Segundo Soler (apud BERGMANN, 2010), existem cinco armadilhas comuns do plano de negócios:
1. Menos é mais. O plano de negócios não deve exceder 30 páginas, pois informação demais pode criar um documento
muito grande que ninguém lê.
2. Simplifique suas projeções financeiras para duas páginas. Focalize em
números-chave para o investidor compreender o negocio: fluxo de caixa projetado
para 5 anos, a TIR Taxa Interna de Retorno, ponto de equilíbrio e período de recuperação. Os investidores olham os números
“grandes” não os detalhes.
3. Incluir os pressupostos além das
previsões. São muito mais importantes e
mais informativos do que as previsões em
se mesmas.
4. Demonstre que conhece as chaves da indústria e por que os clientes irão
comprar o seu produto ou serviço.
5. O plano não é imutável: A pior
coisa que um empresário pode fazer é escrever um plano e, em seguida, seguir à risca só porque é o “plano”. Muitas organizações de sucesso têm mudado seu plano de
negócios durante o lançamento. Uma das
características mais importantes que deve
ter um plano de negócios é a flexibilidade.
Já Dornelas (1999b), entende que
um plano de negócio para pequena empresa pode ser menor que o de uma grande organização, não ultrapassando talvez 10-15
(dez a quinze) páginas. Muitas seções podem ser mais curtas que outras e até menor
que uma única página de papel. Ele ainda
afirmar que para que seja um bom plano de
negócio, antes de chegar ao formato final
deve ser feitas muitas versões e revisões
até que esteja adequado ao público-alvo,
não existindo uma estrutura rígida e específica, porém qualquer plano de negócio deve
possuir entendimento completo do negócio.
Segue abaixo um roteiro considerado como essencial para a confecção de
um plano de negócio, segundo o manual do
empreendedor (IPL, 2010).
3.1. Introdução/Sumário Executivo
O sumário executivo é a parte mais
importante do plano de negócios, visto que
é a primeira coisa a ser lida pelos potenciais
investidores. Desta forma, se não for claro,
poderá desencorajar os analistas a rever o
plano completo.
Não obstante a sua importância,
este não deverá conter mais de 500 palavras, sensivelmente 1 a 2 páginas, pelo
que deverá ser uma radiografia do negócio.
Esta radiografia apenas é possível de fazer,
após a elaboração do plano, pois só nesta
fase a informação se encontra totalmente
organizada e compilada.
3.2. Apresentação da Empresa
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Identificação da Empresa
Nome/denominação social
Logótipo
Direção da Empresa
Contactos e página web (se existir)
CAE – código de atividade econômica
Forma jurídica
Participações sociais e repartição
pelos sócios (montante e percentagem)
Identificação dos Promotores
Dados pessoais (Nome, naturalidade, residência, etc.)
Formação acadêmica
Formação complementar
Atividade profissional atual
Experiência profissional
Tudo o que seja pertinente para em
termos pessoais se demonstrar capacidades empreendedoras.
3.3. Análise do Meio Envolvente
Esta análise permite conhecer o
mercado da empresa, com a finalidade de
identificar os elementos que afetam a generalidade das empresas e a empresa em objeto de estudo. Baseia-se assim no conhecimento dos fatores gerais (conhecimento
dos elementos que afetam todas as empresas, tais como: dimensão, características e
evolução futura do mercado nacional e dos
mercados externos) e específicos (conheciInterciência
& Sociedade
115
SILVA, K. E.
mento dos elementos que afetam o funcionamento da empresa).
3.4. Análise do Mercado
Esta análise consiste na identificação do mercado alvo e tipo de segmentação
de clientes.
Em primeiro lugar, deve-se identificar e caracterizar os concorrentes atuais e
potenciais, os consumidores atuais e potenciais, e uma análise da indústria em geral,
em seguida deve-se explicar em que medida é que o produto ou serviço tem condições de sucesso naquele mercado, apresentando as necessidades de mercado que
satisfaz e como se diferencia da concorrência (qualidade, preço ou outras variáveis
relevantes). Esta análise pressupõe assim
uma análise da procura e uma análise da
oferta.
3.5. Estratégia da Empresa
Na estratégia da empresa deverá
constar a visão, missão, os objetivos da empresa, a diferenciação do negócio, a análise
SWOT e a estratégia adaptada.
3.6. Plano de Marketing
Neste ponto define-se como se
vende o produto e ou serviço que a empresa produz ou comercializa, não é mais do
que definir o modelo de negócios. Trata-se
de definir a estratégia global de marketing
e as diversas políticas do Marketing – Mix
(Produto, Preço, Distribuição e Comunicação)
3.7. Plano de Organização e de Recursos
Humanos
Apresentação da estrutura organizativa e planificação dos recursos humanos
passa por apresentação da equipa de trabalho, número de trabalhadores, funções e
estrutura, organograma, capacidades necessárias e perfil desejado, política de recursos humanos (como recrutar, selecionar
e contratar pessoal) e programa de forma-
116
ção de pessoal.
3.8. Plano de Produção ou de Operações
Descrever como se realiza a fabricação dos produtos ou a prestação de
serviços, isto é, como realiza o lay-out de
produção e explicar cada uma das fases do
processo de produção/prestação de serviços.
3.9. Plano Econômico – Financeiro
Este plano visa avaliar a viabilidade do negócio e a sua probabilidade de
sucesso. Desta forma deve incluir todas as
demonstrações financeiras (balanço, demonstração de resultados, mapas de aplicações e origem de fundos) quer para análise
histórica, quer para a projeção da evolução
do negócio nos próximos anos (em regra,
três a cinco anos).
Deverá incluir também um orçamento de tesouraria (previsão de recebimentos e pagamentos a realizar num determinado período) pelo menos para o primeiro
ano de atividade e, eventualmente, uma
análise do ponto crítico das vendas (volume
de vendas em valor e em quantidade para o
qual a empresa obtém “lucro zero”).
O plano econômico-financeiro engloba o plano de investimentos e o plano de
financiamento.
3.10. Calendário de Execução
Por último deve-se planejar no
tempo o desenvolvimento das principais
atividades necessárias para a atividade da
empresa.
Dornelas (1999b), complementa
que cada seção deve ser elaborada sempre visando a objetividade, sem perder sua
essência e os aspectos mais relevantes a
ela relacionados. Ainda cita que a capa apesar de não parecer é uma das partes mais
importantes do plano de negócios, pois é
a primeira parte que é vista por quem lê o
projeto, devendo portanto ser feita de maneira limpa e com informações necessárias
e pertinentes.
Interciência
& Sociedade
Plano de negócios: o caminho para o sucesso das micro e pequenas empresas
4. A importância do plano de negócio
5. Acompanhe o plano de negócio
Muitas empresas ainda não entendem a necessidade de um planejamento e,
por isso, acabam fechando suas portas.
Segundo Sahlman (apud DORNELAS, 2010), poucas áreas têm atraído tanta
atenção dos homens de negócios nos Estados Unidos como o plano de negócio.
Essa ferramenta de gestão pode e
deve ser usada por todo e qualquer empreendedor que queira transformar seu sonho
em realidade, seguindo o caminho lógico e
racional que se espera de um bom administrador. É evidente que apenas razão e
raciocínio lógico não são suficientes para
determinar o sucesso do negócio.
O cuidado que se deve tomar é o
de se escrever um plano de negócios com
todo conteúdo que se aplica a um plano de
negócio e que não contenha recheados de
entusiasmo ou fora da realidade. Nesse
caso pior do que não planejar é fazê-lo erroneamente. (Dornelas, 2010).
A arte estará no como o empreendedor traduzirá esses passos realizados
racionalmente em um documento que sintetize e explore as potencialidades de seu negócio, bem como os riscos inerentes a esse
mesmo negócio.
O plano de negócios é uma ferramenta que se aplica tanto no lançamento de
novos empreendimentos quanto no planejamento de empresas já existentes.
Outro paradigma que precisa ser
quebrado é o fato de achar-se que o plano
de negócios depois de feito pode ser esquecido. Este é um erro imperdoável e as conseqüências serão mostradas pelo mercado
que está em constante mutação. A concorrência muda, o mercado muda, as pessoas
mudam. E o plano de negócios, sendo uma
ferramenta de planejamento que trata essencialmente de pessoas, oportunidades,
do contexto e mercado, riscos e retornos
também muda. Sahlman,1997 (apud CAVASSOTO, 1999).
O plano de negócios é uma ferramenta dinâmica, um guia que deve ser
atualizado constantemente, pois o ato de
planejar é dinâmico e corresponde a um
processo cíclico.
Depois de finalizar o plano de negócio o empreendedor precisa usá-lo como
um instrumento eficaz de gerenciamento.
Para isso é importante que as informações nele existente sejam divulgadas
para todos os colaboradores da empresa e
isso de uma forma satisfatória. Boas informações trancadas em uma gaveta não são
propriamente utilizadas e acabam fatalmente por cair no esquecimento.
O empreendedor deve divulgar essas informações de forma simples e bastante eficiente, podendo fazer isso com a criação de painéis de metas, disponibilizando
por toda a empresa. Um sistema visível e
de fácil entendimento para guiar no processo de melhoria.
Deve também existir um monitoramento periódico da situação, para acompanhar o desenvolvimento da empresa, guiando e validando os esforços de melhoria,
nunca esquecendo que o plano de negócio
é uma ferramenta flexível e pode ser adaptada de acordo com a situação.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na maioria das vezes sem nenhum
preparado as pessoas têm se aventurado
em montar seu próprio negócio, seja pela
falta de emprego, com o sonho de independência financeira, de liberdade ou de ficar
rico. Mas esses aventureiros, também chamados de empreendedores, encontra decepção e acaba conhecendo uma realidade
cruel quão vil é o mercado com aqueles que
não estão preparado.
Fica claro que utilizar somente o
plano de negócio não é garantia de sucesso
imediato e de uma empresa sólida e lucrativa, contudo, a possibilidade de se cometer
erros é reduzida drasticamente e a chance
de se aproveitar as oportunidades é otimizada. O Plano de Negócios quando bem
elaborado consegue caracterizar a concorrência e o cliente, o produto e a produção,
as estratégias e os investimentos, levando
a uma tomada de decisão mais segura e
racional, com riscos calculados. A palavra
central que resume o Plano de Negócios é
PLANEJAR!
Interciência
& Sociedade
117
SILVA, K. E.
O caminho pode se tornar menos
árduo quando se tem um plano de negócio,
mas não significa que irá dispensar muito
preparo, sabedoria, percepção e acima de
tudo determinação. Um bom negócio é reflexo da competência dos responsáveis por
ele.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BERGMANN, C. Como montar um plano de negócio. Disponível em <http://opinionsur.org.ar/joven/
Como-montar-um-plano-de-negocios,1316> Acesso
03 Set 2010.
CAVASSOTO, C. Qual a importância do plano de
negócio. Disponível em < http://www.clicrbs.com.br/
blog/jsp/default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDat
aServer,getBlog&uf=1&local=1&template=3948.dwt&
section=Blogs&post=233387&blog=793&coldir=1&to
po=3994.dwt > Acesso 07 Set. 2010.
DEGEN, R. J. O empreendedor: fundamentos da iniciativa empresarial. São Paulo: Makron Books, 2005.
DORNELAS, J. C. A. Plano de negócios: Estrutura e
Elaboração. Apostila. São Carlos – SP. Maio. 1999b.
DORNELAS, J. C. A. Plano de negócios: O segredo do sucesso do empreendedor. mito ou realidade?.
Disponível em < http://www.planodenegocios.com.
br/dinamica_artigo.asp?tipo_tabela=artigo&id=20 >
Acesso em 01 Set. 2010.
IPL, Instituto Politécnico de Leira. Manual do Empreendedor. Disponível em < http://www.eo-net.org/pt/
eon_info/documentos/VI_o%20plano%20de%20negocios.pdf> Acesso 01 Set. 2010.
PREDEBON, J. Criatividade: abrindo o lado inovador da mente. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1998
SEBRAE. Indicadores da Mortalidade das MPEs Paulistas. Região Metropolitana de São Paulo. Pesquisas Econômicas, São Paulo-SP, dez. 1998ª. (Relatório Preliminar).
CHIAVENATO, I. Empreendedorismo: dando asas
ao espirito empreendedor. 3. ed. São Paulo: Saraiva,
2008.
Kátia Elaine da Silva é bacharel em Administração pela Instituição de Ensino São Francisco e mestranda em
Administração pela Universidad de la Empresa de Montevideo (UDE). Cursa ainda especialização Lato Sensu em
Planejamento Educacional e Docência do Ensino Superior pela Escola Superior Aberta do Brasil.
118
Interciência
& Sociedade
RESERVA LEGAL E APP – ÁREAS DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE:
áreas de relevante importância ao município.
ACETI JUNIOR, Luiz Carlos
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
RESUMO: Este trabalho apresenta uma abordagem geral da importância das áreas verdes para as
cidades. Para atingir essa finalidade, o artigo apresenta fundamentos históricos e embasamentos teóricos para mostrar a evolução e a importância dessas áreas.
PALAVRAS-CHAVE: áreas verdes, áreas de preservação permanente, reserva legal.
ABSTRACT: This paper presents a general approach to the importance of green areas to the cities. To
this end, the article presents the historical and theoretical grounds to show to show the evolution and
evolution and importance of these areas.
KEYWORDS: green areas, areas of permanent preservation and legal reserve.
Nos termos do Código Florestal
em vigor, Lei 4.771/1965, a RESERVA LEGAL é: “Área localizada no interior de uma
propriedade ou posse rural, excetuada a de
preservação permanente, necessária ao
uso sustentável dos recursos naturais, à
conservação e reabilitação dos processos
ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora
nativas”.
Em princípio, é a área de reserva
legal uma limitação administrativa, onde o
proprietário / possuidor somente poderá utilizá-la sob manejo florestal sustentado, em
tese, mediante projeto próprio confeccionado e prévia autorização de órgão ambiental
competente.
A Lei 4.771/65, com a nova redação dada pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001, no artigo 16 prevê:
“Art. 16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em
área de preservação permanente, assim
como aquelas não sujeitas ao regime de
utilização limitada ou objeto de legislação
específica, são suscetíveis de supressão,
desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo: (Redação dada pela
Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001).
I - oitenta por cento, na propriedade rural
situada em área de floresta localizada na
Amazônia Legal; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001).
II - trinta e cinco por cento, na propriedade
rural situada em área de cerrado localizada
na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte
por cento na propriedade e quinze por cento
na forma de compensação em outra área,
desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do §
7o deste artigo; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
III - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas
de vegetação nativa localizada nas demais
regiões do País; e (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
IV - vinte por cento, na propriedade rural em
área de campos gerais localizada em qualquer região do País. (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 1o O percentual de reserva legal na propriedade situada em área de floresta e cerrado será definido considerando separadamente os índices contidos nos incisos I e
II deste artigo. (Redação dada pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 2o A vegetação da reserva legal não pode
ser suprimida, podendo apenas ser utilizada
sob regime de manejo florestal sustentável,
Interciência
& Sociedade
119
ACETI JUNIOR, L. C.
de acordo com princípios e critérios técnicos
e científicos estabelecidos no regulamento,
ressalvadas as hipóteses previstas no § 3o
deste artigo, sem prejuízo das demais legislações específicas. (Redação dada pela
Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 3o Para cumprimento da manutenção
ou compensação da área de reserva legal
em pequena propriedade ou posse rural
familiar, podem ser computados os plantios de árvores frutíferas ornamentais ou
industriais, compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em
consórcio com espécies nativas. (Redação
dada pela Medida Provisória nº 2.166-67,
de 2001)
§ 4o A localização da reserva legal deve
ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente ou, mediante convênio, pelo
órgão ambiental municipal ou outra instituição devidamente habilitada, devendo ser
considerados, no processo de aprovação, a
função social da propriedade, e os seguintes critérios e instrumentos, quando houver:
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001)
I - o plano de bacia hidrográfica; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de
2001)
II - o plano diretor municipal; (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
III - o zoneamento ecológico-econômico;
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001)
IV - outras categorias de zoneamento ambiental; e (Incluído pela Medida Provisória
nº 2.166-67, de 2001)
§ 8o A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula
do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua
destinação, nos casos de transmissão, a
qualquer título, de desmembramento ou de
retificação da área, com as exceções previstas neste Código. (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 9o A averbação da reserva legal da pequena propriedade ou posse rural familiar
é gratuita, devendo o Poder Público prestar
apoio técnico e jurídico, quando necessário.
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.16667, de 2001)
§ 10. Na posse, a reserva legal é assegu-
120
rada por Termo de Ajustamento de Conduta, firmado pelo possuidor com o órgão
ambiental estadual ou federal competente,
com força de título executivo e contendo, no
mínimo, a localização da reserva legal, as
suas características ecológicas básicas e a
proibição de supressão de sua vegetação,
aplicando-se, no que couber, as mesmas
disposições previstas neste Código para
a propriedade rural. (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 11. Poderá ser instituída reserva legal em
regime de condomínio entre mais de uma
propriedade, respeitado o percentual legal
em relação a cada imóvel, mediante a aprovação do órgão ambiental estadual competente e as devidas averbações referentes a
todos os imóveis envolvidos. (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)”
Importante frisar que os leigos podem entender que a previsão legal – RESERVA LEGAL - como uma restrição administrativa recente; o que não é verdade.
O tema ambiental já era motivo de
preocupação para vários povos da antiguidade! Desde o Código de HAMURABI, a Bíblia e em vários outros ordenamentos jurídicos, inclusive nas Ordenações Filipinas que
previam no Livro Quinto, Título LXXV, pena
gravíssima ao agente que cortasse árvore
ou fruto, sujeitando-o ao açoite e ao degredo para a África por quatro anos, se o dano
fosse mínimo, caso contrário o degredo seria para África em definitivo.
Frise ainda que anterior às Ordenações Filipinas, houve a Ordenações Afonsinas, que tanto uma quanto à outra, estava
em vigor em Portugal na época do descobrimento do Brasil. A Ordenação Afonsina continha determinações proibitivas de que não
se podia atirar aos rios e lagos material que
pudesse matar os peixes ou perturbar seu
desenvolvimento. Sabe-se, também, que
o termo madeira de lei popularizou-se porque uma carta do rei português (carta regia)
considerava determinadas árvores nobres
como de propriedade da corte e proibia o
corte delas.
Além desses ordenamentos supra,
existiram vários outros documentos que
construíram a história do direito ambiental,
como o Código de Hamurabi, o Livro dos
Interciência
& Sociedade
Reserva legal e app – áreas de
mortos do Antigo Egito, o hino persa de Zaratustra, e a Lei Mosaica que determinava
que em caso de guerra que fosse poupado
o arvoredo; ou seja, desde as civilizações
mais antigas existe um respeito imaculado à natureza, porque a água e as florestas
eram vitais para as atividades econômicas
e bélicas daquelas épocas.
As primeiras leis escritas existentes no mundo, foram verdadeiros códigos
que regulavam o uso da água, há 4000 a.
C sobre a regência de Hamurabi; em 1700
a. C., a Mesopotâmia produziu o primeiro
código de leis abrangentes da história que
compreende sem ordenamento rígido, 282
parágrafos para regulamentar a vida social.
No parágrafo 53 diz: “se alguém se exime
de manter seu dique em boas condições, se
este dique se romper e todas as lavouras
forem alagados, então o responsável pelo
dique rompido será vendido como escravo,
e a renda em dinheiro deve repor os cereais
cuja destruição causou”.
Destaque-se ainda a Carta Magna
outorgada por João Sem – Terra em 1215
havia dispositivos que consagravam a proteção em relação as matas e florestas. Tal
documento posteriormente à sua outorga
foi dividido em duas partes, isso é, a Carta das Florestas e a Carta das Liberdades,
que hoje é reverenciada em todos os ordenamentos jurídicos. Na Carta das Florestas era determinada que todas as florestas
pertenciam ao rei, vedando aos súditos de
praticar a caça e a exploração de madeiras
nas mesmas.
Note-se que em toda a história da
humanidade, sempre existe relatos com a
preocupação com o ambiente equilibrado,
para que não existissem riscos de falta de
alimentos, secas, pragas, doenças, etc.
No Brasil a preocupação não diverge. Em 1934 foi editado o primeiro Código Florestal, que criou o limite do direito
de uso da propriedade, a chamada “quarta parte”, ou seja, a reserva obrigatória de
vinte e cinco por cento de vegetação nativa
preservação permanente: áreas de relevante
importância ao município.
de cada propriedade rural. Em 1938 houve
a edição do Código de Águas. Em 1965 o
Código Florestal, que no texto original (art.
16), dizia “nas regiões Leste Meridional, Sul
e Centro Oeste, esta na parte sul, as derrubadas de florestas nativas, primitivas ou regeneradas, só serão permitidas, desde que
seja, em qualquer caso, respeitado o limite
mínimo de 20% da área de cada propriedade com cobertura arbórea localizada, a critério da autoridade competente”. Em 1967
o Código de Pesca e também o Código de
Mineração, e em 1980 o Código Brasileiro
do Ar.
Em 1981 surge a Política Nacional
do Meio Ambiente, sendo a primeira com
exclusiva preocupação ambiental.
Logo depois, em 24 de Julho de
1985 surge a Lei que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos
causados ao meio ambiente, trazendo instrumentos processuais para coibir e reparar
danos à natureza.
Em 05 de outubro de 1988, com a
promulgação da Constituição Federal Brasileira, surge um capitulo exclusive sobre
meio ambiente, tendo o artigo 225 a previsão que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e á coletividade o dever de defende-lo
e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
Importante lembrar as palavras
do Doutor Celso Antonio Pacheco Fiorillo1,
também presente nesse II Congresso Brasileiro da Advocacia Ambiental, ocorrido em
São Luis – MA no ano de 2008, onde considera que:
Assim, temos que o art. 225 estabelece
quatro concepções fundamentais no âmbito do direito ambiental: a) de que todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; b) de que o direito
ao meio ambiente ecologicamente equi-
Agropecuária Sustentável em Face do Direito Ambiental Brasileiro, páginas 99 / 114, in ACETI JR., Luiz Carlos; BRAGA
FILHO, Edson de Oliveira; AHMED, Flávio; GRAU NETO, Werner; MURAD, Samir Jorge (Organizadores); diversos autores.
Advocacia Ambiental: Segurança Jurídica para Empreender. 01ª Edição. 2009. Rio de Janeiro. Editora Lumen Júris.
1
Interciência
& Sociedade
121
ACETI JUNIOR, L. C.
librado diz respeito à existência de um
bem de uso comum do povo e essencial
à qualidade de vida, criando em nosso
ordenamento o bem ambiental; c) de que
a Carta Maior determina tanto ao Poder
Público como à coletividade o dever de
defender o bem ambiental assim como o
dever de preservá-lo; d) de que a defesa
e a preservação do bem ambiental estão
vinculadas não só às presentes como
também às futuras gerações.
Neste estudo o enfoque é apontar
na questão ambiental, a restrição administrativa sobre o direito de propriedade denominada como RESERVA LEGAL.
A Lei 7.803, de 18 de julho de
1989, que alterou o art. 16, entre outros, do
Código Florestal de 1965 é que criou o termo reserva legal, conforme já citado acima.
Em 1991, a Lei Agrícola, de 17 de
janeiro de 1991, assinada por Fernando
Collor de Melo, previa:
Art. 99. A partir do ano seguinte ao de
promulgação desta lei, obriga-se o proprietário rural, quando for o caso, a recompor em sua propriedade a Reserva
Florestal Legal, prevista na Lei n° 4.771,
de 1965, com a nova redação dada pela
Lei n° 7.803, de 1989, mediante o plantio,
em cada ano, de pelo menos um trinta
avos da área total para complementar a
referida Reserva Florestal Legal (RFL).
122
reabilitação dos processos ecológicos, à
conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas;
Agora, não se está mais a falar de
áreas de florestas que devam ser recuperadas ou preservadas; se está, pela nova
redação legal, prevendo que uma parte da
propriedade, ou posse rural, deve, necessariamente ser preservada, mantendo-se
ou recuperando-se as matas originarias ali
existentes. E esta Medida Provisória determina, pela nova redação, conforme acima
já citado, que haverá percentuais diferentes
nos diferentes biomas, sendo no mínimo
20%, descontado as áreas de APPs (áreas
de preservação permanentes).
Assim, todos os proprietários estão
obrigados a demarcar uma área mínima,
de acordo com o bioma onde sua propriedade ou posse rural estiver inserida, para
instituição da Reserva Legal que deverá ser
averbada na matrícula do respectivo imóvel
rural.
Para constituir a Reserva Legal
dentro da propriedade ou posse rural deve-se observar o que determina a citada Medida Provisória:
Conclui-se pelo obvio, que o intuito
do legislador era atingir aquelas propriedades que não tivessem observado a restrição
de 20% prevista no Código Florestal, e não
a toda e a qualquer propriedade, senão o
legislador não teria colocado as expressões
“recompor” e “quando for o caso”.
Posteriormente foi editada a Medida Provisória 2.166-67, de 24.08.2001, que
novamente alterou o Código Florestal e definiu Reserva Legal de forma mais abrangente:
§ 4o A localização da reserva legal deve
ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente ou, mediante convênio,
pelo órgão ambiental municipal ou outra
instituição devidamente habilitada, devendo ser considerados, no processo de
aprovação, a função social da propriedade, e os seguintes critérios e instrumentos, quando houver:
I - o plano de bacia hidrográfica;
II - o plano diretor municipal;
III - o zoneamento ecológico-econômico;
IV - outras categorias de zoneamento
ambiental; e
V - a proximidade com outra Reserva Legal, Área de Preservação Permanente,
unidade de conservação ou outra área
legalmente protegida.
III - Reserva Legal: área localizada no
interior de uma propriedade ou posse
rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável
dos recursos naturais, à conservação e
Já quanto as APPs – Áreas de Preservação Permanente, possui previsão legal
nos arts. 2º e 3º da Lei Federal nº 4.771/65
(alterados pela Lei Federal nº 7.803/89), coberta ou não por vegetação nativa, com a
Interciência
& Sociedade
Reserva legal e app – áreas de
função ambiental de preservar os recursos
hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de
fauna e flora, proteger o solo e assegurar o
bem estar das populações humanas.
Assim, destacam-se para efeito
desse estudo as intervenções humanas e
a conseguinte obrigação de recomposição
das áreas de preservação permanente.
Desta forma a intervenção em
APP, ocorre quando o homem, sem autorização prévia do agente ambiental competente modifica no todo ou em parte as áreas definidas como APP (arts. 2º e 3º da Lei
Federal 4771/65 (alterados pela Lei Federal
nº 7.803/89), sendo tal intervenção crime
ambiental, conforme dispõe a Lei Federal
nº 9.605/98, passível de pena de detenção
de 01 (um) a 03 (três) anos e multa administrativa que em média conforme vemos
no dia a dia, pode chegar até R$ 50.000,00
(cinqüenta mil reais) por hectare danificado.
A intervenção em APP mais comum é a supressão da vegetação nativa,
e o que vem a ser exatamente isso? Qualquer atividade que envolva a supressão de
vegetação nativa depende de autorização,
seja qual for o tipo da vegetação (mata
atlântica, floresta estacional, cerrado, floresta mista de araucária, campos naturais,
vegetação de restinga, manguezais, e outras) em qualquer estágio de desenvolvimento (inicial, médio, avançado ou clímax).
Mesmo um simples bosqueamento (retirada da vegetação do sub-bosque da floresta) ou a exploração florestal sob regime de
manejo sustentável, para retirada seletiva
de exemplares comerciais (palmito, cipós,
xaxim, espécies ornamentais, espécies medicinais, toras de madeira, etc) não podem
ser realizados sem o amparo da licença do
órgão ambiental competente. A pena pelo
crime varia de 3 (três) meses a 1 (um) ano
de detenção; e, multa administrativa, que
na pratica é aplicada de R$1.500,00 (mil e
quinhentos reais) por hectare (existem nos
últimos meses autuações em valores muito
superiores a esse, sendo essa uma tendência).
Os documentos exigidos para o
licenciamento ambiental para intervenção
em APPs em geral são os seguintes: Requerimento; Certidão da Matrícula ou Trans-
preservação permanente: áreas de relevante
importância ao município.
crição do Imóvel; Roteiro de acesso; Planta
de localização; Planta do imóvel; Fotografia
aérea ou imagem de satélite do local do empreendimento; Laudo de caracterização da
vegetação; Laudo de fauna; Projeto de recuperação ambiental; Projeto executivo da
obra; Licença expedida pelos órgãos competentes; Certidão de Diretrizes Municipais;
Comprovante de regularização de infração
florestal; Plano de Manejo Florestal; Especificamente em São Paulo, pagamento do
preço da análise, exceto para os casos previstos no Dec. Est. (SP) nº 48.919/04.
Frise-se que a relação de documentos poderá variar de acordo com a complexidade ou extensão do projeto.
Deve-se observar atentamente as
leis e normas ambientais incidentes para
que o procedimento administrativo para a
intervenção em APPs seja o mais rápido
possível, passamos a citar as mais comuns:
Ajustamento de Conduta; Áreas de Preservação Permanente; Áreas de Proteção
Ambiental – APAs; Árvores Isoladas; Auto
de Infração Ambiental; Atividade Agrícola;
Cerrado; Cobrança de Análise - Cobrança Judicial; Código Florestal; Espécies da
Flora Protegida; ET’s e Divisões Regionais;
Fauna Silvestre; Licenciamento Ambiental;
Rodovias; Saneamento; Unidades de Conservação; Mananciais – Várzea; Manejo
Florestal; Marinas – Pesca; Mata Atlântica;
Microbacias; Mineração; Parcelamento do
Solo / Loteamentos / Condomínios; Políticas de Meio Ambiente; Procedimentos internos dos agentes ambientais; Recursos
Hídricos; Reflorestamento; Reposição Florestal; Reserva Legal; Reserva Particular
do Patrimônio Natural – RPPN; Transporte /
Escoamento de Produtos Florestais; Uso do
Fogo; entre muitas outras.
Frise-se que a Resolução CONAMA 237, de 19 de dezembro de 1997, regulamentou a atuação dos órgãos competentes do SISNAMA (Sistema Nacional do
Meio Ambiente), no exercício do licenciamento previsto no art. 10 da Lei nº 6.938/81.
E essa mesma Resolução, em seu Artigo
2º, §1º, prevê: “Estão sujeitos ao licenciamento ambiental os empreendimentos e as
atividades relacionadas no Anexo 1, parte
integrante desta Resolução.”
Estando descrita assim, nesse
Interciência
& Sociedade
123
ACETI JUNIOR, L. C.
anexo 1 supra, que a “recuperação de áreas contaminadas ou degradadas;”, necessitam de licenciamento ambiental!
Sendo assim, tanto a implantação
de reserva legal, quanto a recuperação de
áreas degradadas, dentro ou fora de APPs,
necessitam de licenciamento prévio do órgão ambiental competente.
Esse licenciamento tem toda uma
sistemática, devendo conter o todo previsto na legislação competente, e ainda, conforme o caso, deverá conter um programa
de recuperação de área degradada, muito
próximo ao formato instituído pelo Decreto
Federal nº 97.632, de 10 de abril de 1989 e
suas atualizações; bem como as previsões
da Lei Federal nº 9.985/00, e da Resolução
CONAMA nº 371/2006, dentre outras não
menos importantes.
Digno de destaque é o teor da Lei
nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, que
dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma
agrária, previstos no Capítulo III, Título VII,
da Constituição Federal.
No artigo 10 dessa Lei supra, estão
previstas o que são áreas não aproveitáveis
á agricultura e pecuária, dizendo: “/.../ Art.
10. Para efeito do que dispõe esta lei, consideram-se não aproveitáveis: /.../ IV - as
áreas de efetiva preservação permanente e
demais áreas protegidas por legislação relativa à conservação dos recursos naturais
e à preservação do meio ambiente. /.../”.
Todas essas áreas descritas como
não aproveitáveis, podem ficar isentas de
ITR – Imposto Territorial Rural, mediante
o preenchimento anual da ADA – Ato Declaratório Ambiental perante o IBAMA e ao
depois protocolado o respectivo documento
junto ao INCRA.
A Instrução Normativa IBAMA Nº.
96 de 30/03/2006, faz a seguinte previsão
em seu artigo 9º: “As pessoas físicas e jurídicas que desenvolvem atividades classificadas como agrícolas ou pecuárias, incluídas na Categoria de Uso de Recursos
Naturais constantes no Anexo II, deverão
apresentar anualmente o Ato Declaratório
Ambiental.”
Muito importante destacar que
para ser realizado todo o procedimento administrativo da ADA junto ao IBAMA para o
124
produtor rural, posteriormente poder ficar
isento do ITR nas respectivas áreas não
aproveitáveis, o produtor rural fará uso de
consultorias especializadas, sendo necessário que o respectivo profissional tenha o
cadastro no CTF / IBAMA – Cadastro Técnico Federal do IBAMA.
Porém, importante lembrar que
o Código Florestal (Lei n.º 4.771, de
15.09.1965) dispõe, no inciso II do §2º do
art. 1º como sendo área de preservação
permanente: área protegida nos termos dos
arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por
vegetação nativa, com a função ambiental
de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas (incluído pela Medida
Provisória n.º 12.166-67 – de 2001).
O art. 2º prescreveu: “Consideram-se de preservação permanente, pelo só
efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) – ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais
alto em faixa marginal cuja largura mínima
será (Lei 7.803/89):
1. de 30ms. para os cursos d’água
de menos de 10 metros de largura;
2. de 50ms. para os cursos d’água
que tenham 50 a 200ms. de largura (Lei
7.803/89);
3. de 100ms. para os cursos
d’água que tenham largura superior a 600
(seiscentos) metros (Lei 7.803/89);
4. de 500ms. para os cursos
d’água que tenham largura superior a 600
(seiscentos) metros (Lei 7.803/89);
b) – ao redor de lagoas, lagos ou
reservatórios naturais ou artificiais;
c) – nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados “olhos d’água”,
qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 metros de largura.
d) – no topo de morros, montes,
montanhas e serras;
e) – nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45%, equivalente a 100% na linha de maior declive;
f) – nas restingas, como fixadoras
Interciência
& Sociedade
Reserva legal e app – áreas de
de dunas ou estabilizadoras de mangues;
g) – nas bodas dos tabuleiros ou
chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100ms. em
projeções horizontais;
h) – em altitude superior a
1.800ms., qualquer que seja a vegetação.
Parágrafo único – No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por
lei municipal, e nas regiões metropolitanas
e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos
respectivos planos diretores e leis de uso
do solo, respeitados os princípios e limites
a que se refere este artigo (Lei 7.803/89).
Art. 3º - Consideram-se, ainda, de
preservação permanente, quando assim
declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural, destinadas:
a) a atenuar a erosão das terras;
b) a fixar as dunas;
c) a formar faixas de proteção ao
longo de rodovias e ferrovias;
d) a auxiliar a defesa do território
nacional a critério das autoridades militares;
e) a proteger um sítio excepcional
beleza ou de valor científico ou histórico;
f) a asilar exemplares da fauna ou
flora ameaçadas de extinção;
g) a manter o ambiente necessário
à vida das populações silvícolas;
h) a assegurar condições de bem-estar público.
O §1º dispõe: A supressão total ou
parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando
for necessária à execução de obras, planos,
atividades ou projetos de utilidade pública
ou interesse social.
O art. 4º, com a redação dada pela
M.P. n.º 2.166-67, de 2001, praticamente repete o §1º acima.
Diz o art. 4º - A supressão de vegetação em área de preservação permanente
somente poderá ser autorizada em caso de
utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em
procedimento administrativo próprio, quan-
preservação permanente: áreas de relevante
importância ao município.
do inexistir alternativa técnica e locacional
ao empreendimento proposto (M.P. 2.16667 de 2001).
§1º - A supressão de que trata o
caput deste artigo dependerá de autorização do órgão estadual ambiental competente, com anuência prévia, quando couber, do
órgão federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o disposto no §2º deste artigo
(incluído pela M.P. 2.166-67).
O §2º aí citado dispõe: A supressão de vegetação em área de preservação
permanente, dependerá do órgão ambiental
competente, desde que o Município possua
conselho de meio ambiente com caráter
deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual
competente fundamentada em parecer técnico (M.P. 2.166-67 – 2001).
O §3º dispõe que o órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo impacto ambiental,
assim definido em regulamento, da vegetação em área de preservação permanente
(incl. M.P. 2.166-67/2001).
O §4º: O órgão municipal competente indicará, previamente à emissão de
autorização para a supressão de vegetação
em área de preservação permanente, as
medidas mitigadoras e compensatórias que
deverão ser adotadas pelo empreendedor
(M.P. 2.166-67/2001).
O § 5º - A supressão da vegetação
nativa protetora de nascentes ou de dunas e
mangues, de que tratam, respectivamente,
as alíneas “c” e “f” do art. 2º deste Código,
somente poderá ser autorizada em caso de
utilidade pública (M.P. 2.166-67 de 2001).
O §6º - Na implantação de reservatório artificial, é obrigatória a desapropriação ou aquisição, pelo empreendedor, das
áreas de preservação permanente criadas
no seu entorno, cujos parâmetros e regime
de uso serão definidos por resolução do
CONAMA.
O §7º - É permitido o acesso de
pessoas e animais às áreas de preservação
permanente, para obtenção de água, desde
que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa (M.P. 2.16667 de 2001).
Sobre o assunto, o CONAMA exInterciência
& Sociedade
125
ACETI JUNIOR, L. C.
pediu a Resolução n.º 369, de 28 de março
de 2006 que “Dispõe sobre os casos excepcionais, de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental”.
O Eminente Professor Dr. Toshio
2
Mukai , também presente no Congresso
Brasileiro da Advocacia Ambiental, realizado em São Luis – MA em 2009, assevera
acertadamente sobre o tema, dizendo: “/.../
várias disposições foi dado ao órgão
ambiental estadual (outra vez, inconstitucionalmente), o poder de autorizar
supressões de vegetação permanente).
Quando se tratar de área urbana, o Município é que dará a autorização, desde que
observado o disposto nos respectivos
planos diretores e leis de uso do solo,
respeitados os princípios e limites a que
se refere este artigo (Lei n.º 7.803/89). O
CONAMA, regulamentando essas disposições do Código Florestal, em primeiro
lugar, baixou a Resolução n.º 303, de 20
de março de 2002, que “Dispõe sobre parâmetros, definições e limites de Áreas
de Preservação Permanente /.../ Todas
as ações, obras, projetos, planos e intervenções em APP, de utilidade pública, de
interesse social ou de baixo impacto ambiental, dependem de autorização do órgão ambiental competente, devidamente
caracterizada e motivada mediante procedimento administrativo autônomo e
prévio, e atendidos os requisitos previstos na Resolução nº 369/2006 e noutras
normas federais, estaduais e municipais
aplicáveis, como o Plano Diretor, Zoneamento econômico-ecológico e Plano de
Manejo das Unidades de Conservação,
se existentes. /.../ Importante salientar
que para a autorização de intervenção
ou supressão de vegetação em APP situada em área urbana possa ser concedida
pelo órgão ambiental municipal a Resolução nº 369/2006 exige que o Município
possua Conselho de Meio Ambiente,
com caráter deliberativo, e Plano Diretor ou Lei de Diretrizes Urbanas, no caso
de municípios com menos de vinte mil
habitantes, mediante anuência prévia do
órgão ambiental estadual competente,
fundamentada em parecer técnico. /.../
Os conteúdos ambientais desta Resolução nº 369/2006 devem ser considerados
na elaboração do Código Municipal de
Meio Ambiente, considerando especialmente sua aplicação em face das peculiaridades e singularidades locais, pois
em matéria de defesa do meio ambiente
os entes federativos devem atuar como
parceiros nos termos estabelecidos pela
Constituição Federal. /.../ Suas principais disposições podem integrar o novo
Código Ambiental como normas legais
municipais a serem aplicadas pelo Município no exercício do poder de polícia
ambiental. De qualquer modo, deve-se
proceder uma avaliação dos conteúdos
ambientais desta Resolução em face
das normas do Plano Diretor Municipal
a fim de, no que couber, ser efetuada a
compatibilização recíproca de ambos os
conjuntos de normas. /.../” (negrito e grifo
nosso).
Assim, fica fácil observar que as
áreas de Reserva Legal e APP – áreas de
preservação permanente possuem relevante importância não apenas para as zonas
rurais, mas também para as zonas urbanas,
devendo não apenas a União e os Estados
e o Distrito Federal legislarem quanto ao
tema, mas também os municípios para que
possam exercem o direito constitucional de
legislarem quanto a temas existentes no interior de seus domínios.
Para tanto basta observar o teor
do artigo 02º da Lei 10.257/2001, que prevê
diretrizes para a política urbana municipal,
senão vejamos:
Art. 2º /.../
VI – Ordenação e controle de uso do
solo, de forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis
urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis
ou inconvenientes;
/.../
A Proteção Ambiental do Meio Ambiente Urbano, página 265 / 271, In ACETI JR., Luiz Carlos; BRAGA FILHO, Edson de
Oliveira; AHMED, Flávio; GRAU NETO, Werner; MURAD, Samir Jorge (Organizadores); diversos autores. Mecanismos Legais
para o Desenvolvimento Sustentável. 01ª Edição. 2010. Belo Horizonte – MG. Editora Fórum.
2
126
Interciência
& Sociedade
Reserva legal e app – áreas de
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
/.../
XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;
XIII – audiência do Poder Publico Municipal e da população interessada nos
processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos
potencialmente negativos sobre o meio
ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população; /.../”
(negrito e grifo nosso).
Assim, é de uma clareza hialina
que a previsão contida no “Estatuto de Cidade”, prevê que essas e as demais diretrizes são obrigatórias não apenas na elaboração do Plano Diretor Municipal (artigo
39 do Estatuto da Cidade), mas também
deverá o município criar leis ambientais e
até um código municipal ambiental, válido
para todo o território municipal, que detalhe
as normas de proteção ambiental.
Desta forma, fica fácil observar que
os munícipes, bem como os poderes executivo e legislativo municipais, têm papel de
relevante importância na sustentabilidade
do município, criando normas de conduta
e proporcionando educação ambiental, fazendo com que as áreas verdes localizadas
nas zonas rurais e nas zonas urbanas sejam locais de proteção e preservação dos
recursos naturais existentes.
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Interciência
& Sociedade
127
ACETI JUNIOR, L. C.
Luiz Carlos Aceti Junior é Advogado. Pós-graduado em Direito de Empresas. Especializado em Direito Empresarial Ambiental. Professor de Legislação Ambiental e Políticas Públicas de Meio Ambiente; de Legislação Social e
Tributária; de Ética e Cidadania da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM). Professor de Direito Ambiental de Cursos de Pós-graduação da METROCAMP de Campinas - SP, ESDC de São Paulo – SP, MEMES de
São Paulo - SP, ESUD de Cuiabá - MT, EXCELLENCE de São Luis - MA, UNIFEOB de São João da Boa Vista - SP,
FAEP de Araras – SP, UNIFEG de Guaxupé - MG, entre outras. Professor e Co-coordenador da Pós-graduação em
Direito Ambiental e Sustentabilidade da EPD - Escola Paulista de Direito de São Paulo. Consultor da Consultoria
ACDP - Ambiental, Comunicação e Desenvolvimento Profissional www.acdp.com.br . Titular da Aceti Consultoria
Jurídico Ambiental www.aceti.com.br .
128
Interciência
& Sociedade
REUTILIZAÇÃO DE GARRAFAS PET PARA PRODUÇÃO DE MÓVEIS
E DESENVOLVIMENTO SOCIOAMBIENTAL
CORRÊA, Rony Felipe Marcelino
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
[email protected]
RESUMO: O presente trabalho teve como um dos objetivos sensibilizar as pessoas para a preservação
ambiental através da reutilização de garrafas Pet dois litros transformando-as em móveis. Outro objetivo foi mostrar para as populações menos favorecidas outra forma de obter lucro a partir dos resíduos,
com a venda desses móveis. A venda de um resíduo, como a garrafa Pet, transformado em um móvel,
pode gerar um lucro até 31 vezes maior que vender a garrafa Pet para empresas de reciclagem. Este
trabalho foi implantado nas escolas municipais do programa de Atendimento Integral à Criança e ao
Adolescente de Mogi Guaçu-SP (AICA). Apesar da dificuldade inicial em obter número desejado de
garrafas, observou-se grande motivação das crianças em participarem do trabalho, colaborando com
a arrecadação de Pet no bairro em que residem e com as atividades práticas para a construção dos
móveis.
PALAVRAS-CHAVE: Material Reciclável, Educação Ambiental, Criança e Adolescente, Sustentabilidade, Reutilizar.
ABSTRACT: This work was one of the aims at raising awareness about environmental conservation
through the reuse of plastic bottles by transforming them into furniture. Another objective was to show
the low-income people another way to earn a profit from waste, with the sale of these piece of furniture.
The sale of a waste, such as plastic bottle, transformed into a piece of furniture, can generate an income
31 times greater than to sell the plastic bottle to recycling companies. This work was implemented in
municipal schools the program of Integral Care of Children and Adolescents of Mogi-SP (AICA). Despite
the initial difficulty in obtaining desired number of plastic bottles, there was great motivation for children
to participate in the work, collaborating with the collection of bottles in the neighborhood where they
reside and with the practical activities to build the furniture.
KEYWORDS: Recyclable Material, Environmental Education, Children and Adolescents, Sustainability,
Reuse.
1. INTRODUÇÃO
Os problemas socioambientais, encarados como ameaçadores à sobrevivência do homem na terra, são relativamente
novos no planeta Terra. Passou a se agravar a partir do momento em que o homem
se distanciou da natureza e tornou a encará-la como uma fonte de recursos disponíveis e ilimitado (PENTEADO, 1999).
O desenvolvimento de um projeto ambiental é apenas um caminho, porém importantíssimo para todo cidadão, multiplicando o
saber e desencadeando ações em conjunto
em busca de um ambiente harmonioso a todos (PADUA & TABANEZ, 1997).
O problema da destinação adequada e produção de lixo é um desafio a ser
abordado na educação ambiental e ser
compreendido por cada individuo por ser
ele parte atuante desse que é um dos mais
preocupantes problemas ambientais (PADUA & TABANEZ, 1997).
Segundo dados da Associação Brasileira da Industria do Pet (ABIPET, 2010),
em 2008 o Brasil consumiu 462.000 toneladas de Pet para a produção de garrafas. De
acordo com Cempre (2010), em 2008 aproximadamente 54,8% das embalagens que
foram consumidas tiveram sua reciclagem
consumada, o que equivale a quantidade
de 253.000 toneladas das 462.000 toneladas produzidas em 2008. As garrafas são
recuperadas principalmente através de catadores.
Apesar de existir muitos catadores
no Brasil, o grande problema é o baixo retorno da atividade de recolhimento e comerInterciência
& Sociedade
129
CORRÊA, R. F. M.
cialização da sucata, fato que leva as cooperativas a tentarem agregar maior valor
aos produtos manufaturando-os (SILVA et.
al., 2003).
Observando os problemas ambientais no Brasil e no mundo, a problemática
do lixo no Brasil, os aterros sanitários cada
vez mais saturados e aumentando do número de catadores com a remuneração injusta pelo esforço, o presente trabalho apresentará uma forma ambientalmente correta
e socialmente justa de recuperar garrafas
Pet. Os resultados deste trabalho servirão
de exemplo para que cooperativas, comunidades carentes, ONGs, empresas, prefeituras e outras escolas encontrem na garrafa
Pet descartada, uma oportunidade de conscientizar, conservar o meio ambiente e obter lucro com isso.
1.1. Garrafa Pet
O Pet (politereftalato de etileno) é
um poliéster, polímero termoplástico, sendo o melhor e mais resistente plástico para
a produção de embalagens, gerando tanto resistência mecânica e química como
formando uma barreira de gases e odores
(ABIPET, 2010).
Os químicos ingleses Whinfield e Dickson
em 1941 foram os que desenvolveram o
Pet, porém só começaram a ser fabricados em grande escala a partir de testes
de segurança e meio ambiente na década
de 70 (CEMPRE, 2010). Chegou ao Brasil
em 1988 primeiramente sendo usado na
industria têxtil e logo depois, em 1993, no
mercado de embalagens para refrigerantes
(ABIPET, 2010).
Analisando a uso do Pet sobre aspectos econômicos é muito interessante
tanto para quem produz como para quem
consome. Porém, em aspectos ambientais
é muito preocupante, sendo 10 milhões de
garrafas fabricadas por dia, havendo poucos dias entre produção, uso e descarte, e
séculos para a degradação (SILVA et. al.,
2007).
O grande problema é sua resistência à biodegradação, sendo resistente à
radiação, calor, ar e água, permanecendo
no meio ambiente durante dezenas de anos
conservando suas propriedades físicas, até
130
irem se degradando após centenas de anos
(NASCIMENTO et. al., 2005).
1.2. Destinação de garrafas Pet utilizadas
no Brasil
No Brasil, após seu uso e reciclagem, sua
maior utilização é na produção de fibra de
poliéster para indústria têxtil, que segundo a
Cempre (2010) gera diversos produtos tais
como, fios de costura, forrações, tapetes e
capacetes, mantas de TNT, entre outras utilidades.
Entretanto, a manufatura da garrafa Pet é uma alternativa muito interessante, tendo diversas vantagens sobre a reciclagem, como por exemplo, não necessita
gastos com equipamentos caros e aumenta
o lucro devido o valor agregado ao produto
final (SILVA et. al., 2003).
Segundo Silva et. al. (2007) além
do aspecto positivo ambiental, o aspecto
social é fortemente afetado positivamente,
gerando empregos as classes menos favorecidas que não tem oportunidade de estudo e encontram dificuldade de colocação
profissional. Estima-se que no Brasil 500
mil pessoas vivam da coleta seletiva e venda do material reciclado.
1.3. Produção de móveis em garrafa Pet
A produção de móveis a partir de
garrafas Pet se tornou realidade graças à
criatividade e dedicação do professor de Ciências, do Rio de Janeiro, Sebastião Feijó.
A produção é possível graças a invenção
desse professor da “célula” que é produzida
através do corte e encaixe entre garrafas.
Segundo Estrada (2003) a invenção foi registrada em 1998, e a tal célula aumenta a
firmeza para construir o que quiser a partir
dela. De acordo com a mesma fonte o professor ministra diversos cursos em comunidades carentes, contribuindo muito com o
meio ambiente e desenvolvimento social de
comunidades.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Tecnologia (INT) do Rio
de Janeiro-RJ apóia cooperativas de catadores em projetos na construção de móveis
feitos em garrafa Pet. De acordo com Silva et. al. (2007) um dos projetos tem três
Interciência
& Sociedade
Reutilização de garrafas pet para produção de móveis e desenvolvimento socioambiental
objetivos comuns básicos: gerar trabalho e
renda para catadores em comunidades carentes com os novos produtos; aumentar o
ciclo de vida da garrafa Pet; melhorar a auto
estima dos catadores através de trabalhos
criativos, quebrando a rotina de seus trabalhos de coleta.
Outro projeto situado em Vigário Geral, Rio
de Janeiro-RJ, recebe financiamento da Fábrica de Catalisadores Carioca, que abrange quatro aspectos básicos dos móveis: o
design, a resistência, avaliação e melhoria
da ergonomia e divulgação na mídia. O projeto também tem parceria com outras cooperativas que comercializam os produtos
(MOVERGS, 2010).
2. Material e métodos
mento das relações pessoais, familiares e
sociais; a valorização das necessidades e
interesses das crianças e dos adolescentes
de acordo com o sexo, faixa etária, condições de vida, grau de desenvolvimento físico e mental, a valorização da escola, evitando assim, a evasão escolar, facilitando a
inserção social das crianças.
Para poder dar atendimento mais
eficiente e ter um trabalho com melhores
resultados, o trabalho selecionou 9 turmas
dentro de 5 núcleos do AICA. Foram envolvidas 9 professoras e uma média de 140
crianças e adolescentes, com uma faixa
etária média de 10 anos. Os bairros selecionados foram os seguintes: Jardim Guaçuano, Jardim Ypê II, Itacolomy II, Itamarati
e Planalto.
2.1. Local de estudo
2.3. Objetos utilizados e forma de trabalho
O presente trabalho foi realizado no
município de Mogi Guaçu-SP, localizado a
latitude 22º22’20’’ e a longitude 46º56’32’’,
estando a uma altitude de 591 metros, tendo uma população de aproximadamente
140.000 habitantes em uma área de 885,00
km2 (WIKIPEDIA, 2010). O trabalho foi desenvolvido no programa de Atendimento
Integral à Criança e ao Adolescente (AICA)
que é coordenado pela Secretaria de Educação de Mogi Guaçu-SP. A Secretaria de
Educação de Mogi Guaçu-SP deu total
apoio ao trabalho, apostando e incentivando para que o trabalho obtivesse êxito.
Os materiais utilizados foram: tesouras, fitas adesivas largas e garrafa Pet. As
tesouras utilizadas foram as dos próprios
alunos e mais algumas adquiridas na Secretaria de Educação. Fita adesiva foi o
único gasto do trabalho. A fita adesiva larga
era necessária para fixar as garrafas Pets
cortadas umas nas outras e dar firmeza aos
móveis produzidos. As garrafas Pet tinham
que ser de dois litros e padronizadas com o
mesmo formato para dar o encaixe correto
quando eram cortadas.
A forma de trabalho utilizou-se da
técnica de agrupamento de garrafas desenvolvida pelo professor Sebastião Feijó da
Escola Municipal Érico Veríssimo do Rio de
Janeiro.
O Trabalho era realizado pelas próprias crianças, com auxílio do coordenador
e dos professores responsáveis (Figuras 1
e 2).
2.2. Programa AICA
O programa atualmente conta com 20 núcleos, 53 turmas e 53 professores, atendendo
uma média de 1.200 alunos da rede municipal de ensino, em horários extra-escolares.
O programa tem como diretriz o fortaleci-
Figuras 1 e 2. Crianças dos AICAs desenvolvendo os trabalhos em equipe. Fonte: do autor.
Interciência
& Sociedade
131
CORRÊA, R. F. M.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Garrafas utilizadas
O trabalho reutilizou, entre maio e
setembro, cerca de 1.200 garrafas Pet dois
litros arrecadada pelas 9 turmas dos 5 núcleos do AICA. O peso total aproximado é
de 68 kg, o que levaria até 400 anos para
degradar no meio ambiente.
3.2. Arrecadação de garrafas
A arrecadação de garrafas foi feita
através de campanhas com as crianças das
escolas do programa AICA, que logo, fizeram campanhas de arrecadação no bairro
onde estudam. O trabalho apresentou dificuldades em arrecadar número suficiente
de garrafas para produção dos móveis por
principalmente três motivos: as garrafas
para a produção dos móveis tem que ser
padronizadas com o mesmo formato (quase
sempre do mesmo fabricante); há formatos
de garrafas Pet que não dão o encaixe correto para a produção dos móveis, limitando
o projeto na região a quase praticamente
marca de dois fabricantes; muitas das crianças integrantes do programa AICA são de
baixa renda, e algumas das famílias delas
utilizam-se da comercialização de garrafa
Pet para a complementação da renda familiar, o que fazia com que os familiares não
as deixassem levar garrafas para o trabalho. Dos três problemas, o mais interessante para o trabalho foi o ultimo, pois, com o
resultado deste trabalho, essas famílias poderão perceber que é mais rentável transformar a garrafa Pet em um produto do que
vendê-la por um preço não muito atrativo.
3.3. Móveis gerados
A princípio o trabalho iniciou-se
ensinando as crianças a construir pufes,
que é a base para a construção de diversos
outros móveis. A partir do momento que as
crianças iriam se aperfeiçoando na técnica
e arrecadando mais garrafas, novos móveis
iriam se transformando, como por exemplo,
cadeiras, mesas, sofás e poltronas (Figuras
3 e 4). De acordo com Silva et. al. (2007)
um projeto semelhante implantado em uma
Cooperativa de catadores no Rio de Janeiro, ministrava o curso em quatro aulas com
aulas teóricas pela manhã e pela tarde aula
prática, sendo que no final do curso o catador teria produzido um pufe.
O trabalho pretende ir inovando e
produzindo móveis maiores à medida que
as crianças forem arrecadando mais garrafas.
Figura 3. Sofá, mesa e pufes de garrafa pet revestidos com retalhos. Fonte: do autor.
132
Interciência
& Sociedade
Reutilização de garrafas pet para produção de móveis e desenvolvimento socioambiental
Figura 4. Sofá em processo de produção. Fonte: do autor.
Os móveis que foram produzidos
em garrafa Pet são tão quanto e até mais
confortável e resistentes que móveis produzidos a partir de outras recursos naturais.
Segundo testes realizados no Instituto Nacional de Tecnologia (INT) apresentou que,
um sofá construído da mesma forma ao do
trabalho, tem resistência semelhante a um
sofá de madeira (SILVA et. al., 2003).
3.4. Retorno e comercialização dos produtos
O resultado esperado no início foi
alcançado, havendo-se a transformação de
um resíduo que uma vez poderia ser descartado de forma irregular na natureza ou
ser reciclado a um preço que não poderia
ser tão atraente aos catadores. O trabalho
promoveu a agregação de valor ao produto,
proporcionando a multiplicação em várias
vezes do valor de venda do produto final.
Há um projeto no Rio de Janeiro chamado
CoopManga que tem a mesma linha de trabalho, que, segundo Silva et. al. (2003) a
expectativa do projeto foi a de gerar novos
trabalhos na comunidade que o projeto esta
localizado e aumentar os lucros dos catadores com a venda dos produtos.
O presente trabalho teve vários
interessados na compra dos produtos, por
valores muito atraentes, mas devido a falta
de demanda no início do trabalho, achou-se
melhor mantê-los, a princípio, para exposição. Para exemplificar o valor agregado ao
produto, um pufe produzido pelas turmas do
AICA do Jardim Guaçuano (Figuras 5 e 6)
teve o valor estimado em R$40,00 depois
de devidamente revestido com retalhos de
um material usado na produção de tapetes
da empresa Rayza da cidade de Inconfidentes-MG, que colaborou com o trabalho.
Comparando a diferença de valores, com a
mesma quantidade de garrafas gastas para
construir um pufe, um catador ganharia uma
média de R$1,26 levando em consideração
o valor de R$0,50/kg de garrafa Pet, consequentemente o catador ganharia 31 vezes a
mais com o produto pufe.
Interciência
& Sociedade
133
CORRÊA, R. F. M.
Figuras 5 e 6. Pufes da Turma do Jardim Guaçuano revestidos com retalhos. Fonte: do autor.
Conforme as crianças forem criando mais móveis durante o ano, os mesmos
serão vendidos e, com o recurso adquirido,
elas poderão comprar materiais necessários para outras atividades, financiar viagens culturais e educativas, etc, aprendendo também o valor do trabalho e dinheiro
e tendo noção de como administrá-lo para
suprir as necessidades.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o trabalho pôde-se apresentar
uma solução ambientalmente correta para a
destinação final das garrafas Pet usadas e,
também uma forma mais rentável para catadores e outras pessoas arrecadarem dinheiro com a manufatura de garrafas Pet. A
transformação das garrafas em móveis não
é tão complicada, visto que até crianças de
faixa etária baixa conseguiram produzir os
móveis trabalhando em equipe.
Levando em consideração
que o coordenador do trabalho incentivou
as crianças a revestir os móveis com tecidos que eram descartados da industria, o
trabalho ficou ainda mais ecológico. Além
de contribuir com a destinação adequada
da garrafa Pet, dava um destino adequado
aos resíduos industriais também, consequentemente agregando mais valor ao produto ainda.
Com a exposição dos móveis e comercializações futuras dos mesmos, mais pessoas serão estimuladas a
separar e dar destino certo as garrafas e,
134
serão conscientizadas sobre a questão do
lixo e seus deveres como cidadãos para
preservar o meio ambiente.
O trabalho despertou o interesse da empresa COARE, que trabalha com produtos recicláveis no município.
A empresa está empenhada em ajudar as
crianças com a disponibilização de garrafas
Pet necessárias para as atividades e em
divulgar os trabalhos desenvolvidos pelas
crianças na cidade para fortalecer a conscientização ambiental.
Espera-se que ações de
cunho socioambiental se multipliquem no
município para inserir e dar dignidade as
classes menos favoráveis.
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pt.wikipedia.org/wiki/Mogi_Guaçu> acesso em 31 de
agosto de 2010.
Rony Felipe Marcelino Corrêa é graduado em Gestão Ambiental pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Sul de Minas Gerais, Inconfidenets/MG. Graduando em Engenharia Ambiental pela Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”, Mogi Guaçu/SP.
Interciência
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136
Interciência
& Sociedade
SISTEMA DE REMEDIAÇÃO POR BOMBEAMENTO E TRATAMENTO
EM ÁGUAS SUBTERRÂNEAS CONTAMINADAS
PEREIRA, Paulo Roberto Alves
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
BARRAZA LARIOS, Mario Roberto
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
SARTORI, Marcelo Vanzella
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
ALMEIDA, Moacyr Rodrigo Hoedmaker
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
TOLEDO, Patrícia Caveanha Tavares
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
COSTA, Ana Caroline
Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM)
[email protected]
RESUMO: O presente trabalho apresenta as etapas que envolveram a determinação das plumas de
contaminação e a implementação de um sistema de remediação por bombeamento e tratamento, para
um site onde a água subterrânea foi contaminada por metais, provenientes das operações industriais
de uma empresa de galvanoplastia localizada na região de Campinas, cujo nome é mantido em sigilo
por questões contratuais. As etapas que compreenderam este trabalho foram fundamentadas no histórico de estudos ambientais realizados no local como a Avaliação Preliminar, a Avaliação Confirmatória
e a Avaliação Detalhada dentre outros estudos, em atendimento aos requisitos legais estabelecidos
pelo “Manual de Gerenciamento de Áreas Contaminadas (CETESB, 1999)”. Conforme preconiza este
manual, foram perfurados poços de monitoramento simples e multiníveis em locais estratégicos no
empreendimento, para a coleta e a análise química quantitativa dos contaminantes presentes no solo
e na água subterrânea, além de poços de extração para o bombeamento da água contaminada. De
posse dos resultados analíticos foram determinadas as plumas de contaminação horizontais e verticais
da fase dissolvida no lençol freático, para os compostos químicos que apresentaram concentração superior aos limites estabelecidos pela legislação vigente. Os resultados obtidos não indicaram a contaminação do solo, confirmaram a contaminação do lençol freático local e permitiram sugerir a estratégia
de bombeamento e tratamento como tecnologia de remediação, em função das condições favoráveis
existentes no local, principalmente em termos das condições favoráveis da estrutura fabril que contribuem para a redução de custos associados ao sistema de remediação.
PALAVRAS-CHAVE: passivo ambiental, remediação por bombeamento e tratamento, plumas de contaminação, poços de monitoramento simples e multinível.
Interciência
& Sociedade
137
PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.;
TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C.
ABSTRACT: The present work is concerned with the determination of contamination plumes and implementation of a remediation system based on pump-and-treat technology for a site where groundwater
was contaminated by metals. This contamination was caused by the activities performed by an electroplating industry located at region of Campinas, which had its name kept in secrecy due to contractual
requirements. The steps taken during this work were based on the historic environmental studies developed in the industrial area and surroundings. These studies denominated preliminary assessment,
confirmatory evaluation and detailed evaluation, were performed in accordance with legal requirements
established by a management manual for contaminated areas (Manual de Gerenciamento de Áreas
Contaminadas) published by CETESB (São Paulo state environment agency) in 1999. In accordance
with this manual, the soil was perforated in strategic points in the contaminated area for the installation
of simple and multilevel monitoring wells, in order to collect samples and determinate quantitatively the
concentration of contaminants present in soil and groundwater, besides extraction wells for pumping
contaminated groundwater. The analytical results showed that there was no contamination in the soil
but in the groundwater, ratifying the conclusion of previous studies realized in the area. Based on these
results, the horizontal and vertical contamination plumes from dissolved phase in groundwater were
determined for the chemical species, which the concentration values were superior to limits established
by the current state legislation. The results indicated no contamination of the soil, confirmed the contamination of local groundwater and allowed to confirm the strategy of pump-and-treat as a remediation
technology, due to the favorable conditions in the property, mainly in terms of suitable conditions of the
industrial structure that contribute to the reduction of costs associated with the remediation system.
KEYWORDS: environmental liability, pump-and-treat cleanup system, contamination plumes, multilevel
and simple monitoring wells.
1. INTRODUÇÃO
Os poluentes ou contaminantes
quando entram em contato com o solo, com
o ar, com a água superficial ou subterrânea,
alteram as características naturais de qualidade destas matrizes e na grande maioria
das vezes, representam riscos e causam
severos impactos sobre os bens a proteger
localizados na área atingida e em suas circunvizinhanças. Segundo a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), são
considerados bens a proteger: i) a saúde e
o bem-estar da população; ii) a fauna e a
flora iii) a qualidade do solo, das águas e
do ar; iv) os interesses de proteção à natureza e à paisagem; v) a ordenação territorial e o planejamento regional e urbano,
e; vi) a segurança e a ordem pública. Para
assegurar que a lei supracitada seja respeitada e cumprida, no Estado de São Paulo,
a Companhia Ambiental do Estado de São
Paulo (CETESB, 2009), publicou o “Procedimento de Gerenciamento de Áreas Contaminadas”, que estabelece as diretrizes
que devem ser rigorosamente seguidas
para a investigação, a remediação e o ge-
138
renciamento de áreas contaminadas. Na
realidade, entende-se que este documento
representa um imenso avanço na prevenção da contaminação e no restabelecimento
gradativo das condições naturais das áreas
contaminadas, possível devido ao grande
avanço tecnológico das metodologias de
remediação reconhecidas pela comunidade científica e pelas agências ambientais,
como a CETESB no Brasil e a EPA (Environmental Protection Agency) nos Estados
Unidos da América. Deste modo, o presente estudo tem como objetivo apresentar as
etapas que envolveram a determinação das
plumas de contaminação, a instalação de
poços multiníveis e de extração, e a instalação do sistema de remediação por bombeamento e tratamento para a água subterrânea contaminada por metais provenientes
das operações industriais de uma empresa
de galvanoplastia localizada na região de
Campinas. As etapas envolvidas neste estudo foram realizadas em conformidade
com o procedimento supramencionado e
são sucintamente apresentadas ao longo
do trabalho.
Interciência
& Sociedade
Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas
contaminadas
2. Gerenciamento de Áreas Contaminadas
O gerenciamento de áreas contaminadas (ACs) visa minimizar os riscos a
que estão sujeitos a população e o meio
ambiente por meio de um conjunto de medidas que assegurem o conhecimento das
características dessas áreas e dos impactos por elas causados. A finalidade é proporcionar os instrumentos necessários à
tomada de decisões quanto às formas de
intervenção mais adequadas, de forma gradativa. As ações do gerenciamento de ACs
adotadas neste trabalho estão fundamentadas nas etapas: 1) definição da região de
interesse; 2) identificação de áreas potencialmente contaminadas; 3) avaliação preliminar; 4) investigação confirmatória; 5) investigação detalhada; 6) análise de risco; 7)
investigação para remediação; 8) projeto de
remediação; 9) Remediação, e; 11) monitoramento.
3. Metodologia de Remediação
Esta seção tem por finalidade apresentar brevemente a tecnologia de bombeamento e tratamento, escolhida dentre diversas tecnologias mundialmente utilizadas
para a remediação de águas subterrâneas
contaminadas, tendo como foco principal a
contaminação por metais.
3.1. Remediação por Bombeamento e Tratamento Convencional
O desempenho de sistemas de
bombeamento e tratamento depende diretamente das condições do site e dos contaminantes químicos presentes. À medida
que aumenta a complexidade dos sites, a
probabilidade de que o sistema seja capaz
de descontaminá-lo até que a água atinja os
padrões estabelecidos diminui. O Quadro 1
mostra a facilidade relativa de descontaminação ou limpeza das águas subterrâneas
como uma função das características químicas dos contaminantes e da hidrogeologia
subterrânea. Os sites são classificados em
4 diferentes categorias: (1) indica os sites
com maior facilidade de limpeza, enquanto
(4) representam o maior desafio técnico. A
seguir é apresentada uma breve explicação
sobre a facilidade de limpeza para as categorias de (1) a (4):
•Limpeza dos sites da categoria 1:
sistemas bem projetados podem ser
capazes de restaurar as condições da
água do lençol freático para a qualidade de água conforme os padrões legais estabelecidos, no entanto, esse
sucesso não é atingido para a maioria
dos sites contaminados.
•Limpeza dos sites da categoria 2:
também é possível promover a limpeza de sites desta categoria por bombeamento e tratamento, mas o alcance dos objetivos de remedição estão
mais sujeitos a uma grande incerteza
do que em sites na categoria 1. É possível que as metas sejam atingidas
após um maior tempo de operação do
site.
•Limpeza dos sites da categoria 3:
também é possível promover a limpeza de sites desta categoria, mas o alcance dos objetivos de remedição estão sujeitos a uma incerteza bastante
significante frente aos da categoria 1.
A limpeza parcial é um cenário mais
realista para os sites desta categoria.
•Limpeza dos sites da categoria 4:
é improvável promover a limpeza de
sites desta categoria de modo que a
qualidade de água atinja os padrões
legais estabelecidos, mas é possível
que a contenção da contaminação
seja alcançada.
O Quadro 1 é um instrumento muito útil para comparar a eficácia relativa de
sistemas de bombeamento e tratamento
para a limpeza de sites com diferentes hidrogeologias subterrâneas e características
dos contaminantes químicos. Segundo a
National Academy Press (1994), é importante perceber que as categorias do Quadro 1 são baseadas na experiência e no
desempenho de sistemas de bombeamento
e tratamento implementados em sites contaminados nos Estados Unidos, na revisão
de dados experimentais preexistentes, e
não em novas análises quantitativas. Ainda
mais importante, é perceber que a viabilidaInterciência
& Sociedade
139
PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.;
TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C.
de da limpeza pode variar em todo o site.
Um simples site pode conter algumas regiões onde é difícil a operação de extração e
os contaminantes continuam a se dissolver
na água subterrânea, enquanto em outras
regiões, os contaminantes estão essencialmente dissolvidos e são fontes insignifican-
tes de contaminação em longo prazo. Deste
modo, a parte do site que contém contaminantes essencialmente dissolvidos poderia
ser enquadrada na categoria 1 ou 2 (Quadro 1), enquanto a parte do site que contém
significantes fontes de contaminação poderia ser categorizada como 3 ou 4.
Quadro 1. Facilidade Relativa de Descontaminação de Aquíferos Contaminados em Função da
Química dos Contaminantes e da Hidrogeologia Subterrânea.
Tipos de Hidrogeologia Subterrânea
Homogêneo,
Simples Camada
Homogêneo,
Múltiplas Camadas
Heterogêneo,
Simples Camada
Heterogêneo,
Múltiplas Camadas
Fraturada
Instável, dissolvido (degrada / volatiliza)
1a
1
2
2
3
Instável, dissolvido
1-2
1-2
2
2
3
2
2
3
3
3
Fortemente adsorvido, dissolvido
2-3
2-3
3
3
3
Fase LNAPL Separada
2-3
2-3
3
3
4
Fase DNAPL Separada
3
3
4
4
4
Química dos Contaminantes
Fortemente adsorvido, dissolvido
(degrada / volatiliza)
Fonte: National Academy Press, 1994. Facilidade relativa de limpeza: (1) mais fácil; (4) mais difícil.
LNAPL – Ligther Non-Aqueous Phase Liquids; DNAPL – Dense Non-Aqueous Phase Liquids.
a
3.2. Poços Multiníveis
A Figura 1 (Einarson, 2006) mostra
dois tipos de concepção de um poço multinível em comparação com um poço de monitoramento simples. Há um desnível entre
os pontos de amostragem de água subterrânea nos poços multiníveis, que fornecem
dados para o delineamento de plumas verticais dos contaminantes. A Figura 2 (Einarson, 2006) apresenta uma pluma vertical
de contaminação típica, obtida através de
poços multiníveis para o monitoramento
vertical da pluma de contaminação (Einarson, 2006). As letras na Figura 15 indicam
respectivamente: L – poço de monitoramento simples com longa zona de amostragem;
M – conjunto de três poços construídos em
diferentes profundidades com curta zona
de amostragem, e; N – tubulação contínua
multicanal com zonas de captação em diferentes níveis.
140
Figura 1. Tipos de Poços (Einarson, 2006)
O poço de monitoramento simples
(L) produz uma amostra que representa
uma mistura de altas concentrações de soluto que adentra na parte superior e de bai-
Interciência
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Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas
contaminadas
xas concentrações que adentram na base
da zona de amostragem do poço.
Figura 2. Pluma Vertical (Einarson, 2006)
O poço de monitoramento simples
(L) produz uma amostra que representa
uma mistura de altas concentrações de soluto que adentra na parte superior e de baixas concentrações que adentram na base
da zona de amostragem do poço.
O conjunto de três poços multiníveis (M) produz amostras que refletem com
maior precisão a real distribuição dos contaminantes na fase dissolvida do aqüífero
do que a amostra de um poço de monitoramento simples. O poço multinível N fornece
amostras que mais se assemelham a distribuição real e efetiva dos contaminantes
na fase dissolvida do aqüífero. Por questões comerciais, optou-se neste trabalho
por instalar na empresa poços multiníveis
do tipo M, compostos por tubos geomecânicos conforme ilustrado na Figura 8. A construção dos poços multiníveis e também de
extração, contou ainda com a inserção de
pré-filtro de areia graduada quartzosa arredondada pré-lavada própria para poços tubulares, com selo de proteção de bentonita
para prevenir o aporte de eventuais contaminações superficiais, com o preenchimento de solo retirado durante a perfuração e
o selamento final com cimento. A Figura 2
mostra a simulação da captura hidráulica de
uma pluma de contaminação vertical, tipicamente obtida a partir de amostragens em
poços de monitoramento multinível.
4. Etapas do Estudo
4.1. Caracterização da Empresa
A empresa objeto de estudo atua
no setor de galvanoplastia voltada ao desenvolvimento de peças de plástico ABS
(Acrilonitrila Butadieno Estireno). Localizada
na região de Campinas, a empresa desenvolve a Cromação em ABS, Estanhagem,
Fosfocromatização e Niquelação Química.
Faz o tratamento superficial, processo chamado de eletrodeposição, que consiste em
recobrir objetos ou peças técnicas, em geral
plásticos ABS e metálicos, com um ou mais
metais. Dentre os tipos de eletrodeposição,
nesta indústria prevalece a atividade principal de galvanoplastia, definida como a deposição eletrolítica de metais sobre a superfície dos objetos. Trata-se de um tratamento
de superfície que consiste em depositar um
metal sobre o outro, através da redução
química ou eletrolítica, e visa a proteção,
a melhoria da condutividade e a captação
para a solda, sobre a superfície tratada. É
ainda aplicada para melhorar a aparência,
a aglutinação de partículas não condutoras
à camada eletrodepositada, e a resistência
ao atrito e à dureza superficial. Em qualquer
tipo de eletrodeposição, a superfície que irá
receber o depósito metálico deve ser convenientemente limpa, removendo-se da superfície, impurezas tais como graxas e óxidos do próprio metal. Dentre os materiais
utilizados neste processo, destacam-se:
solução alcalina (NaOH) para a remoção
de gorduras orgânicas; solventes hexana e
xilol para a remoção de óleos minerais, e;
ácidos H2SO4, HCl e HNO3, para a remoção de óxidos no processo de decapagem.
Após o banho com ácido, as placas são esfregadas com esponja de aço com água e
sabão. Com relação aos banhos, cita-se: a)
a cobreação (com sulfato de cobre e ácido
sulfúrico); b) a niquelação (com sulfato de
níquel, cloreto de níquel e ácido bórico); c)
a cromação (com ácido crômico e ácido sulfúrico), e; d) a zincagem (com sulfato de zinco, cloreto de amônio e acetato de sódio).
Portanto, devido à natureza das atividades
em questão, considera-se que todos os setores industriais representam um potencial
de risco de contaminação do solo e das
Interciência
& Sociedade
141
PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.;
TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C.
águas subterrâneas e merecem um monitoramento contínuo para que não se tornem
fontes de contaminação.
4.2. Histórico da Contaminação
Devido ao potencial poluidor das
atividades desenvolvidas pela empresa,
estudos técnicos recentes foram realizados
para a elaboração de um diagnóstico ambiental das condições do solo e lençol freático na área industrial e em seu entorno.
Inicialmente foi realizada a Avaliação Preliminar por uma empresa especializada, a
qual indicou os pontos de interesse potencialmente poluidores nas áreas produtivas
e operacionais. Com base nos resultados
obtidos, procedeu-se com a Investigação
Confirmatória, também realizada por empresas especializadas, em Setembro de
2006. Neste estudo, foram instalados 5 poços de monitoramento no local e coletadas
20 amostras de solo e água subterrânea.
Os resultados analíticos das amostras de
solo indicaram concentrações superiores
aos limites de intervenção estabelecidos
pela legislação ambiental vigente para o
solo e para a água subterrânea. No solo
foram encontrados os metais Ba, Cd, Cr
total, Fe total, Ni e Zn, enquanto na água
subterrânea os metais Al, Ba, Cd, Pb, Co,
Cr total, Fe total, Mn, Ni e Zn, além de TPH
total. Na etapa seguinte procedeu-se com
a Investigação Detalhada realizada em Abril
de 2007. Neste estudo, foram perfurados e
instalados 5 novos poços de monitoramento e executadas 6 sondagens rasas para a
coleta de amostras de solo. Os resultados
das análises laboratoriais no solo indicaram
a presença dos metais Ba, Cd, Cr, Ni e Zn,
e na água subterrânea Al, Sb, As, Ba, Cd,
Pb, Co, Cu, Cr III, Cr VI, Fe, Mn, Ni, Ag, Zn,
cis-1,2-Dicloroeteno e PCE (Tetracloroeteno), todos em concentrações acima dos
valores orientadores para solo industrial. Na
Investigação Detalhada, foram elaborados
os mapas de isoconcentração com os resultados das análises da água subterrânea. As
plumas de metais foram identificadas como
amplamente distribuídas pela área, muitas
vezes delimitadas fora dos limites dela tanto
a jusante como a montante. Neste estudo
também foram avaliados os riscos à saúde
142
humana em 5 cenários diferentes. Os resultados indicaram risco à saúde humana para
os receptores: trabalhador efetivo, trabalhador temporário, trabalhador efetivo vizinho
e morador residencial criança e adulto, respectivamente. Foram também calculadas
as metas CMEAs (Concentrações Meta
Específicas para a Área) para os cenários
críticos, conforme preconiza a legislação
vigente. Vários compostos apresentaram
concentrações acima desta meta na água
subterrânea e se tornaram o foco principal
da remediação. Uma vez delimitadas as
Plumas de Contaminação dos compostos
de interesse na água subterrânea, foram realizados ensaios pilotos para a remediação
em Fevereiro de 2008, por meio da tecnologia de bombeamento e tratamento associada à técnica de eletrocinese, que promove
a eletrodeposição dos metais em eletrodos.
Esta decisão se baseou na hidrogeologia
subterrânea que é heterogênea com múltiplas camadas e nos contaminantes que são
instáveis e completamente dissolvidos na
água subterrânea (categoria 2 do Quadro
1). Este sistema de remediação operou por
algum tempo com modesta eficiência quando comparado aos custos empreendidos
para a sua montagem e manutenção contínua. Para dar continuidade à investigação
na área contaminada, a Consultoria Geoma
S/S Ltda foi contratada para realizar uma
nova campanha para a atualização das plumas de contaminação, implementar o sistema de remediação por bombeamento e
tratamento e efetuar periodicamente o seu
monitoramento. Neste sistema, a água contaminada é bombeada para a estação de
tratamento de efluentes (ETE) existente na
empresa e tratada com o efluente industrial,
contribuindo para uma redução expressiva
dos custos associados à remediação, com
efetividade significativa na diminuição da
concentração de contaminantes na água
subterrânea.
4.3. Remediação e Poço Multinível
A implementação do sistema de remediação englobou a instalação de poços
de extração de 4 polegadas (Figura 3), que
associados aos poços 4 poços existentes,
perfazem um total de 8 poços de extração
Interciência
& Sociedade
Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas
contaminadas
definitivos. Nesses poços de extração foram
instaladas bombas ANAUGER, adequadas
ao bombeamento da água subterrânea até
a ETE. Para assegurar uma operação adequada das bombas ANAUGER, em alguns
trechos, foi necessária a abertura do solo a
uma profundidade superior a 50 cm, para a
introdução de tubos de PVC de 10 cm ou
5 cm de diâmetro, para a passagem das
mangueiras de sucção e fiação elétrica das
bombas e dos sensores de nível.
Figura 4. Tubo PVC–PE–07 (Geoma, 2009)
Figura 3. Poço de Extração (Geoma, 2009)
Para promover o rompimento do
asfalto e do solo compactado no local pela
passagem de veículos pesados e realizar
as aberturas no solo, foi necessária a utilização de máquinas escavadeiras e pás carregadeiras. A Figura 4 mostra na área externa à empresa, a rua lateral que dá acesso
a sua portaria, com a abertura onde passa
a tubulação que vai em direção ao poço de
extração PE-07, instalado próximo ao ribeirão existente no local. Os tubos de PVC instalados têm a função de isolar da terra as
mangueiras e a fiação, além de assegurar
uma proteção mínima a esses componentes, por estarem sujeitos a movimentação
de veículos pesados na superfície do solo,
acima de onde foram instalados.
A Figura 5 ilustra a instalação das
tubulações e dos sensores no poço de extração PE-06. A Figura 6 demarca todos os
6 poços de extração instalados, além dos 2
poços de extração previamente existentes,
atualmente todos em operação de bombeamento de água subterrânea para a ETE da
empresa. Neste trabalho também foram instalados 7 dos 10 poços multiníveis previstos (Figura 7). Não foi possível a instalação
de 3 deles, devido à existência de material
impenetrável (rocha) detectada durante a
perfuração. Várias referências foram utilizadas como base para a implementação dos
poços multiníveis (Claire Technical Bulletin;
Cadwagan et al., 1993; Lewis, 2001; Einarson &Cherry, 2002; Sterling et al., 2005; Parker et al., 2006; Einarson, 2006).
Figura 5. Instalação PE-06 (Geoma, 2009)
Interciência
& Sociedade
143
PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.;
TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C.
5. Resultados
Esta seção apresenta as plumas
de contaminação obtidas através dos resultados analíticos das campanhas de novembro de 2009 (antes da instalação do sistema
de remediação por bombeamento e tratamento) e maio de 2010 (seis meses após a
instalação do sistema).
5.1. Plumas Horizontais e Verticais
Figura 6. Instalação PE-06 (Geoma, 2009)
Figura 7. Poços Multiníveis (Geoma, 2009)
A etapa de perfuração, inserção de
tubulação, inserção de pré-filtro de areia e
finalização dos poços multiníveis é ilustrada
pela Figura 8.
As plumas de contaminação podem ser caracterizadas como mapas de
isoconcentrações dos compostos objeto
de investigação, cujos valores das análises
químicas das amostras de água subterrânea e/ou solo foram superiores aos limites
de intervenção dos padrões orientadores da
CETESB. As plumas representam a distribuição espacial dos contaminantes na área
objeto de estudo e foram geradas a partir do
georeferenciamento das coordenadas espaciais obtidas no levantamento topográfico e das concentrações dos contaminantes,
ambas tratadas pelo método computacional
conhecido como krigagem. Este método
realiza a interpolação dos dados e calcula
a distribuição das curvas de isoconcentração e delimita as plumas de contaminação.
A sobreposição das plumas de contaminação geradas para cada uma das 3 profundidades dos poços multiníveis, representa
a delimitação total da pluma (vertical e horizontal) das fases dissolvidas identificadas.
Diversas plumas de contaminação horizontal e vertical foram elaboradas, no entanto,
somente algumas delas são exemplificadas
neste artigo. A Figura 9 ilustra a pluma de
contaminação horizontal por cobre para os
resultados analíticos de novembro de 2009
(antes da instalação do sistema de remediação), enquanto a Figura 10 se refere
ao mesmo composto para resultados analíticos de junho de 2010 (seis meses após
a instalação do sistema de remediação).
Observa-se uma drástica redução na concentração de cobre em seis meses de operação de 87000 μg/L (região mais escura da
Figura 9) para uma concentração em torno
de 7000 μg/L (região clara da Figura 10).
Figura 8. Pré-filtro Para o PMN-07
144
Interciência
& Sociedade
Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas
contaminadas
Figura 9. Cobre Nov/2009 (Geoma, 2009)
Figura 12. Níquel Nível 2 (Geoma, 2009)
Figura 10. Cobre Jun/2010 (Geoma, 2010)
As Figuras 11 a 13 mostram as plumas horizontais de concentração do níquel
nos poços multiníveis em três diferentes cotas abaixo da mesa de água (desnível de
1m entre cada profundidade). A maior concentração em torno de 17000 μg/L está localizada no nível 1 (Figura 11), enquanto a
maior concentração do nível 3 está em torno de 3800 μg/L (Figura 13).
Figura 13. Níquel Nível 3 (Geoma, 2009)
A Figura 14 ilustra a superposição das três plumas horizontais supracitadas, para a composição da pluma vertical
de contaminação por níquel (campanha
de junho de 2010). A Figura 15 confirma a
redução na concentração dos contaminantes após a instalação do sistema de remediação, neste caso, ilustrando o composto
Níquel, cuja concentração no nível 1 caiu
aproximadamente de 17000 μg/L (Figura
11), para cerca de 7500 μg/L no mesmo nível 1 (Figura 15).
Figura 11. Níquel Nível 1 (Geoma, 2009)
Interciência
& Sociedade
145
PEREIRA, P. R. A.; BARRAZA LARIOS, M. R.; SARTORI, M. V.; ALMEIDA, M. R. H.;
TOLEDO, P. C. T.; COSTA, A. C.
Figura 14. Pluma Vertical (Geoma, 2009)
plastia. Para tanto, as etapas e os requisitos legais do “Manual de Gerenciamento
de Áreas Contaminadas (CETESB, 1999)”
foram adotados como referência para este
trabalho, concluído com êxito. A despeito de
todas as dificuldades e restrições relatadas
na bibliografia especializada sobre o sistema de bombeamento e tratamento para a
remediação de sites, é evidente que esta
tecnologia tem se mostrado neste caso,
bastante adequada e eficaz para a descontaminação de metais do lençol freático da
área, objeto deste estudo. Assim, recomenda-se, portanto, que a empresa mantenha
o monitoramento semestral nos moldes das
campanhas de novembro de 2009 e dezembro de 2010, com a elaboração das plumas
de contaminação para os compostos de
interesse, como forma de ratificar a verdadeira eficácia do sistema ora instalado no
site em atingir as metas de remediação e
assegurar que as fontes de descontaminação foram realmente estancadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABGE, 1995. Curso de Geologia Aplicada ao Meio
Ambiente. IPT Série Meio Ambiente, 247 p.
Figura 15. Níquel Nível 1 (Geoma, 2010)
Portanto, é notório que o sistema
de remediação ora instalado na empresa
mostra-se adequado ao propósito de promover a limpeza ou descontaminação do
lençol freático e deverá permanecer em
funcionamento até que as metas de remediação sejam atingidas.
CETESB – Companhia de Tecnologia e Saneamento
Ambiental. Decisão de Diretoria Nº 195-2005 – Estabelecimento de Valores Orientadores para Solos
e Água Subterrânea no Estado de São Paulo. São
Paulo, 2005.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
IPT– Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado
de S. Paulo, Divisão de Minas e geologia Aplicada.
Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo, v.
1, 1981.
O presente trabalho teve como
principal objetivo apresentar as etapas que
envolveram a perfuração de poços de extração e multiníveis, a determinação das
plumas de contaminação verticais e horizontais, e a instalação de um sistema de remediação por bombeamento e tratamento,
para um site onde a água subterrânea foi
contaminada por metais, provenientes das
operações industriais oriundas da galvano-
146
BADILLO, E. J.; RODRIGUES, A. R. Mecânica de
Suelos. Editorial Limusa. México.
CETESB – Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental. Manual de Gerenciamento de Áreas
Contaminadas. São Paulo, 1999.
LIBARDI, P. L. Dinâmica da água no solo. 2a edição. Piracicaba, 2000: o autor. 509p.
SILVA, J. X. Geoprocessamento para análise Ambiental. Rio de janeiro. Ed. do autor. 2001. 228p.
U.S. EPA REGION 9. Table Preliminary Remedial Goals (PRG’s) User Guide’s/Technical Background Document – U.S. Environmental Protection
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Interciência
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Sistema de remediação por bombeamento e tratamento em águas subterrâneas
contaminadas
COHEN, R. M.; et al. Design Guidelines for Conventional Pump-and-Treat Systems. EPA, USA,
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EINARSON, M. D. Practical Handbook of Environmental Site Characterization and Ground-water
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STERLING, S. N.; et al. Vertical Cross Contamination of Trichloroethylene in a Borehole in Fractured Sandstone. Vol. 43, No. 4 – GROUND WATER
– July – August 2005 (pages 557–573).
Paulo Roberto Alves Pereira é Doutor em Engenharia pela Universidade de Campinas – UNICAMP, Mestre em
Engenharia Química pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, graduado em Engenharia Química pela
Universidade estadual de Maringá – UEM, e Black Belt Seis Sigmas pela Escola de Extensão da Unicamp - Extecamp. Atualmente é Coordenador do curso de Engenharia Química e professor dos cursos de Engenharia Química
e Ambiental da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM, Professor dos cursos de Engenharia do
Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino – UNIFAE, professor dos cursos de MBA em Gestão
da Qualidade e Perícia Ambiental do Instituto de Aperfeiçoamento Tecnológico – IAT e Responsável Técnico da
Empresa Consultoria Geoma S/S Ltda.
Mario Roberto Barraza Larios é Doutor em Ciências da Engenharia Ambiental pela Universidade de São Paulo
– USP, Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Viçosa – UFV, Graduado em Engenharia Civil
pela Universidade Federal de Viçosa – UFV e Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho pelo Instituto
de Aperfeiçoamento Tecnológico – IAT. Atualmente é Professor do Curso de Engenharia Ambiental da Faculdade
Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM, Professor dos cursos da Escola de Engenharia de Piracicaba
EEP–FUMEP, professor do curso de Engenharia Civil da Universidade Adventista de São Paulo – UNASP e Responsável Técnico da Empresa Gerenciamento Ambiental Ltda.
Marcelo Vanzella Sartori é Mestre em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos – UNISANTOS,
Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Especialista em Gestão
e Práticas Ambientais pelas Faculdades Integradas de São Paulo – FISP, Especialista em Direito Civil e Direito
Processual Civil pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP e Graduado em Direito pelas Faculdades
Metropolitanas Unidas – FMU. Atualmente é Professor do curso de Direito da Faculdade de Direito de Mogi Mirim/
SP, da Associação Educacional e Assistencial Santa Lúcia, professor do curso de Administração da Faculdade
Municipal Professor Franco Montoro – FMPFM e Diretor Jurídico da Consultoria Geoma S/S Ltda.
Moacyr Rodrigo Hoedmaker de Almeida é Doutor em Ciências (Área de concentração: Química Analítica) pelo
Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. Mestre em Química (Área de concentração: Química Analítica) pelo Departamento de Química da UFSCar. Bacharel em Química pela UFSCar. Atualmente é professor dos cursos de Engenharia Ambiental, Engenharia Química e Nutrição da Faculdade Municipal
“Professor Franco Montoro” - FMPFM. Professor e Coordenador dos Cursos de Ciências-Habilitação Química,
Química Industrial e da Comissão Própria de Avaliação (CPA) das Faculdades Integradas Maria Imaculada - FIMI.
Avaliador Institucional e de Cursos INEP/MEC.
Patrícia Caveanha Tavares de Toledo é Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho pelo Instituto
de Aperfeiçoamento Tecnológico – IAT e graduada e Engenharia Ambiental pela Faculdade Municipal Professor
Franco Montoro – FMPFM. Atualmente atua como Engenheira Ambiental Autônoma em parceria com a Consultoria
Geoma S/S Ltda e Gerenciamento Ambiental Ltda.
Ana Caroline Costa é aluna do 8º semestre de Engenharia Ambiental da Faculdade Municipal Professor Franco
Montoro – FMPFM. Atualmente é estagiária de Engenharia Ambiental na Consultoria Geoma S/S Ltda.
Interciência
& Sociedade
147
148
Interciência
& Sociedade
SUCESSÃO ECOLÓGICA E O USO DE NITROGÊNIO EM FLORESTAS
TROPICAIS
PEREIRA-SILVA, Erico F. L.
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
[email protected]
HARDT, Elisa
Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro” (FMPFM)
[email protected]
JOLY, Carlos A.
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
[email protected]
AIDAR, Marcos P. M.
Instituto de Botânica de São Paulo (IBot - SP)
[email protected]
RESUMO: Uma ferramenta que auxilia no entendimento do processo de sucessão ecológica em ambientes florestais, sobretudo da Mata Atlântica do Estado de São Paulo, é o conjunto de estratégias
de aquisição e do transporte de nitrogênio utilizadas pelas espécies arbóreas. As pesquisas realizadas
têm se fundamentado na hipótese de que o metabolismo primário do nitrogênio permite a organização
de espécies em grupos funcionais de sucessão ecológica. Os resultados têm mostrado que espécies pioneiras apresentam níveis relativamente altos de atividade de redutase de nitrato foliar (ARN),
elevada quantidade de nitrato (NO3-) nas folhas e transportam nitrogênio predominantemente através
de NO3- e Asparagina (ASN), enquanto que, em secundárias iniciais, os níveis de atividade enzimática são menores e predominam transportadores de longa distância como Glutamina (GLN) e Arginina
(ARG) e, em secundárias tardias, os níveis de ARN são muito baixos e predominam na seiva aminoácidos como ASN e ARG e um baixo conteúdo de NO3-. Esse tipo de abordagem vem sendo feita em
diversos ecossistemas e se mostra bastante importante quando se verifica que plantas de ambientes
tropicais tendem a depender menos da absorção do nitrato através das raízes. Apesar das evidências
supracitadas, são necessárias mais investigações sobre as principais fontes de nitrogênio utilizadas em
comunidades florestais tropicais, uma vez que a maioria dos estudos tem sido realizada em ecossistemas de clima temperado. São necessários mais estudos sobre a ecofisiologia de uso do nitrogênio de
tal forma a se gerar ferramentas que contribuam futuramente para a recuperação de áreas degradadas
e que complementem as informações sobre a sucessão ecológica em ambientes tropicais.
PALAVRAS-CHAVE: sucessão ecológica, nitrato, amônio, aminoácidos, atividade de redutase do nitrato, espécies arbóreas tropicais.
ABSTRACT: The strategies for acquisition and transport of nitrogen used by tree species, especially in
the Atlantic Forest of São Paulo, that a one way to understanding the process of ecological succession
in forest environments. The researches have been based on the primary metabolism of nitrogen allows
the organization of these functional groups of species in ecological sucession. The relationship between
the observed strategies and the successional categories revealed that pioneer species promoted the
acquisition of nitrate (NO3-) from the soil and transported nitrogen assimilated in the roots as Asparagine (ASN). The early secondary species use Glutamine (GLN) for long distance transport and nitrate
as an alternative form of nitrogen transport. The late secondary species use strategies of storage and
remobilization of nitrogen in the form of Asparagine and Arginine and assimilate ammonium. The results
presented complement the information available relating to ecological succession in tropical forests and
in the future could be useful for the recovery of degraded areas.
KEYWORDS: ecological succession, nitrate, ammonium, amino compounds, nitrate reductase activity,
wood species.
Interciência
& Sociedade
149
PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M.
1. INTRODUÇÃO
O conceito de sucessão ecológica
foi tratado inicialmente como a seqüência
de comunidades de plantas marcadas por
mudanças de formas de vida de simples a
complexas em uma condição de monoclímax (Clements 1916 apud Gandolfi 2007).
Com o passar do tempo, diversos pontos
de vista complementaram esse conceito.
Gleason (1926) propôs que o fator mais
importante para a composição sucessional de uma comunidade seria a interação
entre as espécies, em que a estrutura final
seria policlímax. Witthaker (1953) reconheceu que vários fatores ambientais variavam
espacialmente, refletindo em gradientes na
vegetação. Dentre muitos outros conceitos
formulados, reformulados e complementados, um dos mais recentes foi proposto por
Begon (1996) que discute sucessão como
um padrão de colonização e extinção promovido por populações de espécies em uma
determinada área. Para Gandolfi (2007), a
sucessão em floresta tropical seria um conjunto de transformações que ocorrem na
composição e na estrutura de uma vegetação em escala temporal. Esse panorama
histórico deixa evidente que o entendimento
da sucessão ecológica e dos sistemas de
classificação de grupos sucessionais está
cada vez mais cientificamente fundamentado, ficando de lado o caráter subjetivo das
primeiras classificações, incluindo agora
propostas de investigação de evidências
que influenciam o caráter sucessional e as
estratégias de regeneração das espécies,
procurando melhorar o entendimento desse
processo em comunidades vegetais.
Os estudos sobre sucessão ecológica requerem tempo pelo fato de ser um
processo natural que ocorre de modo ininterrupto durante um longo período até que
a comunidade vegetal atinja uma condição
de equilíbrio (Hartshorn 1980), ou seja, são
processos dinâmicos que dependem de
diversos fatores e que determinam quais
espécies da comunidade terão êxito no estabelecimento (Bazzaz & Picket 1980, Whitmore 1996). As investigações iniciais sobre
a dependência da luz no interior da floresta
(Vázquez-Yanes et al. 1990), a adaptação
de diferentes espécies aos regimes de luz
150
(Chazdon & Pearcy 1991), os processos de
substituição em escala temporal (Brokaw
1985), as respostas ecofisiológicas às condições do meio e diversos outros fatores
têm constituído um arcabouço de informações sobre a sucessão ecológica em diversos ecossistemas.
Na região neotropical tem sido estudada a organização de espécies de plantas em tipos funcionais, famílias botânicas
e caracteres taxonômicos relacionados ao
uso de nitrogênio (Stewart & Schmidt 1998,
Aidar et al. 2003). Além disso, o uso de nitrogênio pelas plantas tem representado
uma forma de entendimento do processo de
sucessão ecológica. Alguns autores (Aidar
et al. 2003, Pereira-Silva 2008 e Campos
2009) têm investigado mais a fundo a caracterização dos compostos nitrogenados
de baixo peso molecular presentes na seiva
do xilema, a atividade de redutase do nitrato (ARN) foliar in vivo e a determinação do
conteúdo de nitrato (NO3-) na seiva do xilema e nas folhas de espécies arbóreas da
Mata Atlântica paulista. Até o momento já
pôde ser caracterizado o metabolismo primário de nitrogênio de mais de cem espécies arbóreas de diferentes fitofisionomias
florestais que responderam ao modelo proposto por Aidar et al. (2003).
A constatação de estratégias quanto ao uso de nitrogênio sob a ótica dos estágios de sucessão em floresta tropical representa um conjunto de informações que
atendem à necessidade de avanços na
determinação de categorias sucessionais.
Trata-se de investigações que devem servir como critérios complementares à classificação em grupos de sucessão ecológica
e oferecer de forma satisfatória subsídio à
recuperação de áreas degradadas. Diante
do exposto, esse trabalho apresenta uma
revisão sobre os estudos a respeito das estratégias das espécies arbóreas tropicais e
apresenta alguns resultados obtidos para
duas fisionomias florestais de Mata Atlântica do Estado de São Paulo.
2. Influência do nitrogênio e as estratégias de uso pelas plantas
A diversidade e a disponibilidade
de nutrientes no ambiente têm sido aponInterciência
& Sociedade
Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais
tadas como fatores importantes que influenciam a interação, a distribuição, a abundância, a diversidade, a composição local e o
desempenho individual das plantas (Bell &
Lechowicz 1994), além de serem algumas
das causas das variações do estado nutricional de espécies vegetais (Glass et al.
2002). Essa heterogeneidade nutricional
ocorre em virtude das modificações estruturais do solo em escalas temporal e espacial
e da influencia dos fatores bióticos e abióticos, de tal forma que a sinergia entre tempo, espaço e fatores institui aspecto chave
para a disponibilidade de nutrientes na solução do solo e direciona a ocupação e o
sucesso das plantas no ambiente (Pereira-Silva 2008).
Em ecossistemas naturais terrestres, o nitrogênio é o elemento que mais limita o desenvolvimento vegetal e, por essa
razão, sua transformação e disponibilidade
no solo e sua aquisição e uso pelas plantas
têm se tornado o ponto comum de muitas
pesquisas. O uso limitado desses recursos
com máxima eficiência mostra que as plantas possuem uma variedade de estratégias
que pode ser resultante das adaptações
dos mecanismos metabólicos em milhares
de anos de evolução (Stewart & Schmidt
1998), em função das formas nitrogenadas
particulares e das quantidades limitadas de
nitrogênio nos ecossistemas. Essas adaptações permitem a aquisição e o uso eficientes e garantem uma estreita economia de
nitrogênio durante o ciclo de vida da planta
(Cánton et al. 2005).
As relações naturais entre nitrogênio e comunidades vegetais têm sido investigadas em diversas regiões e têm sustentado a idéia de que as espécies vegetais
diferem quanto à habilidade de utilizar as
fontes orgânicas e inorgânicas desse elemento (Stewart et al. 1992, Schmidt et al.
1998, Aidar et al. 2003, Pereira-Silva 2008,
Campos 2009). Em ecossistemas áridos e
semi-áridos, por exemplo, onde o nitrogênio
é disponibilizado no ambiente concomitante
aos raros eventos climáticos de precipitação, as plantas desenvolveram habilidades
competitivas para evitar que a escassez
desse recurso afetasse sua sobrevivência
(James & Richards 2006). Da mesma forma, em ecossistemas temperados, embora
a chuva não seja um evento raro e por isso
não influencie diretamente a disponibilidade de nitrogênio, as espécies de estádios
sucessionais inicial e tardio utilizam estratégias para competir entre si pelo nitrogênio
disponível no solo (Tilman & Wedin 1991).
Isso também ocorre nos ecossistemas mediterrânicos em que as plantas utilizam estratégias de uso do nitrogênio na recolonização pós-fogo (Casals et al. 2005, Paula et
al. 2009). A baixa disponibilidade de formas
de nitrogênio inorgânico influencia na diversidade de comunidades vegetais e o uso de
nitrogênio pelas espécies permite organizá-las em tipos funcionais (Cruz et al. 2006).
Em ecossistemas neotropicais
existem algumas semelhanças no metabolismo do nitrogênio das plantas que coincidam com o agrupamento de caracteres
taxonômicos, o que evidencia que famílias
botânicas apresentam padrões quanto à redução do nitrato (Stewart & Schmidt 1998,
Aidar et al. 2003) e, além disso, nesses
ambientes, espécies arbóreas podem ser
organizadas em tipos funcionais (Stewart &
Schinidt 1998) relacionados ao uso de nitrogênio. Como exemplo, diversos trabalhos
mostram que famílias botânicas como Amaranthaceae, Chenopodiaceae, Polygonaceae e Urticaceae apresentam uma taxa de
redução do nitrato bastante elevada quando
comparadas com Ericaceae, Epacridaceae
(Stewart & Schimidt 1998) e Proteaceae
(Aidar et al. 2003, Pereira-Silva et al. 2006).
Em uma breve revisão, Pereira-Silva et al.
(in prep.) verificou que espécies arbóreas
da família Lauraceae, ocorrentes em diversos ecossistemas tropicais, podem ser organizadas como um grupo que apresenta o
comportamento intrínseco de baixa atividade de redução de nitrato nas folhas.
A possibilidade de ordenação de
grupos taxonômicos em função da assimilação de nitrato foliar deixa evidente que as
plantas respondem às variações externas
das concentrações das formas de nitrogênio orgânico e inorgânico, ou seja, utilizam
um eficiente esquema de absorção e transporte do nitrogênio que satisfaz a demanda desse elemento (Raghuram et al. 2006).
São estratégias voltadas à obtenção do nitrogênio do solo, via sistema radicular, nas
formas de nitrato (NO3-), de amônio (NH4+),
Interciência
& Sociedade
151
PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M.
de uréia e de aminoácidos e de dinitrogênio (N2) pela fixação e de amônia (NH3), via
cavidade sub-estomática foliar (Stulen et al.
2006). Além das estratégias de uso do nitrogênio disponibilizado no meio terrestre,
outras formas nitrogenadas ocorrentes na
atmosfera, como o nitrito (NO2-) e o óxido
nítrico (NO), também podem ser capturados
via cavidade sub-estomática e serem transportadas, sob a forma de nitrito ou nitrato,
via apoplasto e absorvidos e assimilados no
citoplasma através de um complexo enzimático (Stulen et al. 2006).
A capacidade de assimilação de
uma forma particular de nitrogênio varia de
espécie para espécie (Crawford & Glass
1998) e existem diversos autores que buscam o entendimento dessas estratégias
(Smirnoff et al. 1984, Abuzinadah & Read
1986, Stewart et al. 1988, Fredeen & Field
1992, Traw & Ackerly 1995, Aidar et al.
2003, James & Richards 2005, 2006, Stulen
et al. 2006, Cruz et al. 2003, Cruz et al.
2006, Pereira-sIlva et al. 2006, Casals et al.
2005 e Paula et al. 2009 ). Dessa forma, são
importantes as investigações da existência
de preferências por uma ou outra forma de
nitrogênio e se isso é decorrente de diferenças genéticas ou se as plantas absorvem
predominantemente a forma nitrogenada
disponível no meio em que melhor se desenvolvem (Rodrigues & Coutinho 2000).
3. Estratégias de uso de nitrogênio e a
sucessão ecológica: estudo de caso em
duas florestas tropicais
Para a Mata Atlântica, Aidar et al
(2003) aprofundaram as investigações sobre as estratégias de regeneração e uso
de nitrogênio e evidenciaram a existência
de estratégias utilizadas por grupos sucessionais de espécies arbóreas para adquirir,
transportar e assimilar o nitrogênio inorgânico disponível no ambiente. Nesse trabalho apresentaram um modelo de sucessão
ecológica de espécies arbóreas que está
152
embasado em estudos ecofisiológicos e
mostra que espécies pioneiras têm preferência ao íon nitrato como fonte de nitrogênio e possuem níveis relativamente altos de
atividade de redutase do nitrato, enquanto
que as espécies secundárias tardias têm
preferência ao amônio como fonte primária
e apresentam níveis relativamente baixos
dessa enzima (Smith & Rice 1983, Smirnoff
& Stewart 1985, Stewart et al. 1990, 1992,
Aidar et al. 2003, Cruz et al. 2006, Pereira-Silva 2008 e Campos 2009).
Com base nesse modelo, em estudos realizados em duas fisionomias florestais de Mata Atlântica, Pereira-Silva (2008)
verificou sua validade e propôs um esquema complementar quanto à complexidade
estrutural do nitrogênio metabolizado pelas
plantas de acordo com cada grupo sucessional (Figura 1).
Na Floresta Ombrófila Densa Submontana (FODSub) do Sul do Estado de
São Paulo (Parque Estadual de Carlos Botelho), os resultados indicaram, além da categorização sucessional das espécies, que
os eventos de chuva são essenciais para
a disponibilização do nitrogênio no solo e
para a aquisição pelas plantas, as quais se
mostram adaptadas à condição sazonal dos
processos de mineralização e de nitrificação no solo.
Nos resultados para a Floresta Estacional Semidecídua (FESem) do interior
do Estado (Reserva Municipal de Santa
Genebra), as espécies arbóreas também
puderam ser organizadas em grupos de
sucessão em função do uso do nitrogênio.
Além disso, pôde ser observado que as características do solo e a estacionalidade da
precipitação são fatores limitantes do processo de nitrificação no solo nessa floresta
e as estratégias de utilização do nitrogênio
pelas espécies estudadas estão condicionadas à forma mais apropriada e eficiente
de nitrogênio inorgânico disponível no solo.
Interciência
& Sociedade
Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais
Figura 1. Complexidade estrutural do nitrogênio inorgânico assimilado e metabolizado pelas plantas
de acordo com o grupo sucessional. ARN foliar (Atividade de Redutase do Nitrato foliar), NO3- (nitrato), ASN (Asparagina), ARG (Arginina) e GLN (Glutamina).
De acordo com Pereira-Silva
(2008), o que foi observado na FESem e
na FODSub está fortemente correlacionado
com o regime de chuvas que condiciona o
caráter intrínseco de limitação de nutrientes
comum nas zonas tropicais (Pimentel 1998).
A distribuição das chuvas tem grande significado ecológico para as formações vegetais e, apesar das diferenças de distribuição
entre as áreas estudadas, foi verificada a
essencialidade da água para a demanda de
nitrogênio das espécies. Em florestas ombrófilas, a precipitação anual aparentemente tem maior importância do que o regime
sazonal de chuvas, já nas florestas semidecíduas, que abrigam um sub-conjunto da
flora das florestas ombrófilas, a estacionalidade marcante das chuvas pode ocasionar
déficit hídrico e atuar na manutenção de
espécies capazes de enfrentar um estado
de seca mais prolongado (Oliveira-Filho &
Fontes 2000).
As investigações realizadas nas
duas fisionomias de Mata Atlântica mostram
que as espécies arbóreas estudadas investem na aquisição e assimilação de nitrogênio através das raízes, transportando esse
elemento predominantemente através de
quatro moléculas, NO3-, ASN, GLN e ARG,
as quais otimizam o uso de nitrogênio que
pode ser destinado ao armazenamento e
posterior remobilização interna. Pode-se dizer que nas duas áreas as espécies utilizam
mecanismos ecofisiológicos semelhantes
para absorver, transportar, assimilar, armazenar e remobilizar esse elemento que
puderam ser organizados em grupos de sucessão ecológica. Além disso, as espécies
também utilizam as folhas para efetuar a
assimilação do nitrato adquirido do solo.
As espécies pioneiras respondem
às variações dos conteúdos de nitrogênio
disponível no solo, sobretudo na forma do
nitrato. Esse grupo teve níveis relativamente altos de atividade de redutase do nitrato foliar, elevada quantidade de nitrato nas
folhas, realiza o transporte de nitrogênio
predominantemente através do nitrato e de
ASN e tem baixa relação carbono-nitogênio
nas folhas (C:N foliar). As secundárias tardias demonstraram ser pouco responsivas
à disponibilidade sazonal de nitrogênio no
solo. Seus níveis de atividade de assimilação do nitrato foram muito baixos em relação ao grupo pioneiro, na seiva do xilema
predominaram aminoácidos como ASN e
Interciência
& Sociedade
153
PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M.
ARG, baixo conteúdo de nitrato e a relação
C:N foliar foi maior em relação às pioneiras.
As secundárias iniciais mostraram níveis
médios de atividade de redutase do nitrato foliar, na seiva do xilema predominaram
transportadores de longa distância como
GLN e ARG. Esse grupo ainda apresentou
características intermediárias na sucessão
ecológica, ou seja, algumas espécies são
próximas às pioneiras e mais responsivas
às variações sazonais de nitrogênio no solo
enquanto outras são menos responsivas e
mais semelhantes às espécies tardias da
sucessão.
A análise do conjunto total das espécies evidenciou dois mecanismos fisiológicos de uso do nitrogênio, a assimilação
de nitrato na folha, especialmente aquelas
do grupo pioneiro, e o processo transpiratório para o transporte do nitrato desde a
raiz até a parte aérea da planta. Nas duas
florestas, as variáveis ecofisiológicas das
espécies selecionadas se condicionam ao
desempenho de estratégias para a utilização do nitrogênio inorgânico disponível no
solo, podendo ser distribuídas em um continuum de respostas ecofisiológicas de uso
do nitrogênio entre pioneiras, secundárias
iniciais e tardias (Tabela 1).
A hipótese do continuum de respostas ecofisiológicas de uso do nitrogênio
mostra que nas duas formações florestais,
nos períodos úmido e seco, o grupo de pioneiras tem maior atividade de redutase do
nitrato que diminui na medida em que se
avança na sucessão até as secundárias tardias. Isso pode ser sustentado pelos conteúdos de nitrato na seiva do xilema que
indicaram o grupo de pioneiras como assimilador preferencial desse íon. O conteúdo
de nitrato foliar por grupo de sucessão foi
significativamente diferente entre as duas
florestas, com maiores concentrações nos
grupos FESem em função da maior fertilidade do solo mesotrófico dessa área. Quanto
ao conteúdo de nitrogênio total foliar, observa-se uma diminuição no decorrer dos
grupos de sucessão em ambas as áreas,
indicando maior investimento no uso desse
elemento pelo grupo pioneiro, refletindo em
uma menor taxa de C:N (Tabela 1). Para o
grupo de secundárias tardias foi verificado
um padrão inverso ao grupo pioneiro, com
154
maior razão C:N por exemplo, o que sugere
a reabsorção de nitrogênio e uma maior longevidade foliar (Eckstein et al., 1999).
Durante o período úmido, não foram
observadas diferenças significativas entre
as duas áreas em relação aos compostos
nitrogenados da seiva do xilema característicos de cada grupo sucessional (Tabela 1).
Contudo, as médias foram diferentes para
ASN no grupo de espécies pioneiras, evidenciando maior taxa desse aminocomposto na seiva das espécies da FODSub. Foi
observada diferença para GLN no grupo de
secundárias iniciais, indicando maior taxa
para as espécies da FESem, o que sugere
o investimento em estratégias relacionadas
ao uso de amônio. Para o grupo de secundárias tardias, a média de ARG foi significativamente diferente, indicando que as espécies da FODSub possuem maiores taxas
desse aminocomposto na seiva. As diferenças significativas observadas nas taxas de
ARG entre as duas formações deixam clara a estratégia de remobilização no grupo
de secundárias tardias do da FODSub nos
dois períodos de amostragem, o que pôde
ser evidenciado pelas elevadas taxas desse
aminoácido na seiva do xilema (Tabela 1).
A organização dos mecanismos
ecofisiológicos de aquisição, transporte e
assimilação do nitrato permitiu identificar
grupos com padrões de uso de nitrogênio
distribuídos em um continuum de sucessão
ecológica e confirmar a hipótese de que,
na FODSub e na FESem, as espécies pioneiras possuem níveis relativamente altos
de atividade de redutase do nitrato foliar,
elevada quantidade de nitrato nas folhas e
transportam nitrogênio predominantemente
através do nitrato e de ASN. Em uma posição intermediária desse continuum, as espécies secundárias iniciais possuem níveis
médios de atividade de assimilação de nitrato nas folhas, com o predomínio de transportadores de longa distância como GLN e
ARG na seiva do xilema. No outro extremo,
estão posicionadas as secundárias tardias,
com níveis de atividade de assimilação do
nitrato muito baixos, com o predomínio de
aminoácidos como ASN e ARG e com baixo conteúdo de nitrato na seiva do xilema
(Figura 2)
Interciência
& Sociedade
Interciência
& Sociedade
ARG
GLN
ASN
NO3- seiva do xilema
aa seiva do xilema
C:N
Ntotal
15
δ N
NO3
-
NRA
Período
Grupo
Variável
Pioneiro
Área
LSD
Média
A 647,5 ± 390,6
b
B 462,2 ± 89,1
A
6,5 ± 1,4
b
B
8,3 ± 0,8
A
2,9 ± 1,4
a
B
2,8 ± 1,5
A
3,0 ± 0,5
a
B
3,1 ± 0,2
A 15,4 ± 2,7
a
B 14,7 ± 0,7
A
0,8 ± 0,2
a
B
0,8 ± 0,5
A
4,7 ± 3,1
b
B
1,8 ± 2,5
A 52,9 ± 6,9
a
B 42,0 ± 18,6
A
nv
B
A
nv
B
0,11
32,4
39,4
12,7
5,8
±
±
±
±
nv
36,5
30,7
19,9
7,9
a
a
0,291
0,568
Secundário Inicial
p-valor
LSD p-valor
Média
89,2 ± 58,2
0,05
b 0,005
183,0 ± 89,1
7,0 ± 2,1
0,41
b 0,438
7,9 ± 3,0
1,5 ± 0,8
0,03
b 0,003
3,1 ± 1,5
2,8 ± 0,7
0,06
a 0,484
3,0 ± 0,7
18,2 ± 5,1
0,487
a 0,546
17,2 ± 4,5
1,2 ± 0,8
0,06
a 0,855
1,2 ± 1,0
1,2 ± 1,1
0,034
a 0,056
0,9 ± 0,6
Úmido
26,7 ± 26,1
9,8 ± 16,7
nv
b
0,046
Secundário Tardio
LSD p-valor
Média
107,8 ± 46,8
a 0,153
151,3 ± 72,5
6,0 ± 1,9
b 0,002
8,8 ± 2,3
1,2 ± 0,9
b <0.0001
2,9 ± 0,9
2,0 ± 0,4
b 0,025
2,5 ± 0,5
23,4 ± 6,1
a 0,127
20,1 ± 4,8
0,7 ± 0,6
b 0,036
1,8 ± 1,8
0,8 ± 0,5
a 0,479
0,9 ± 0,5
13,3 ± 20,2
a 0,119
30,0 ± 30,1
Pioneiro
Secundário Inicial
Secundário Tardio
LSD p-valor
LSD p-valor
Média
Média
Média
LSD p-valor
525,2 ± 201,4
159,8 ± 157,5
56,7 ± 24,1
a
0,21
a
0,99
b 0,024
561,8 ± 68,4
158,9 ± 91,2
68,2 ± 50,1
8,2 ± 6,1
*6.7 ± 3,1
6,7 ± 2,0
a
0,15
a
0,41
b 0,001
7,3 ± 0,4
*7.7 ± 3,2
9,4 ± 1,8
2,2 ± 0,6
1,8 ± 0,7
1,4 ± 0,9
a 0,025
b
0,01
b 0,001
2,3 ± 1,3
2,9 ± 1,7
3,0 ± 1,2
2,3 ± 0,3
2,6 ± 0,6
2,0 ± 0,3
a
0,01
a
0,58
a
0,28
2,7 ± 0,4
2,7 ± 0,6
2,2 ± 0,6
21,2 ± 3,4
18,9 ± 4,7
24,3 ± 5,4
b
0,67
a
0,66
a 0,603
16,7 ± 2,7
17,9 ± 4,2
23,0 ± 6,9
0,9 ± 0,9
*1.4 ± 1,3
*1.1 ± 1,0
b 0,047
b
0,05
b 0,047
2,0 ± 0,6
*2.9 ± 2,6
*3.2 ± 2,7
1,7 ± 0,1
1,3 ± 1,2
*0.79 ± 0,4
a
0,19
a
0,16
a
0,67
1,9 ± 3,2
0,8 ± 0,9
*0.9 ± 0,9
50,1 ± 36,3
20,8 ± 28,8
b
0,51
nv
a 0,636
28,5 ± 23,2
15,4 ± 28,2
18,6 ± 25,8
nv
b
0
nv
55,3 ± 33,6
16,7 ± 21,3
*34.5 ± 34,6
nv
b <0.0001
0,027
2,6 ± 3,8
*7.1 ± 9,5
Seco
Tabela 1. Comparação de médias (t-student) das variáveis de uso de nitrogênio do período úmido e seco para a Floresta Ombrófila Densa Submontana (A FODSub) e para a Floresta Estacional Semidecídual (B - FESem). Atividade de redutase do nitrato (NRA), concentração de nitrato foliar (NO3-), abundância
natural de nitrogênio (δ15N), taxa de nitrogênio total foliar (Ntotal), razão carbono nitrogênio (C:N), conteúdo de nitrato, concentração de aminoácidos e taxa
de compostos nitrogenados de baixo peso molecular predominante em cada grupo sucessional: ASN (asparagina), GLN (glutamina) e ARG (arginina). RS =
estratégia de regeneração da espécie: PS = pioneira, ESS = secundária inicial, LSS = secundária tardia. nv – não verificado. LSD – diferença mínima significativa.
Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais
155
PEREIRA-SILVA, E. F. L.; HARDT, E.; JOLY, C. A.; AIDAR, M. P. M.
Figura 2. Modelo progressivo de complexidade metabólica e do continuum de estratégias de uso do
nitrogênio dos grupos sucessionais. Pi = pioneira, Si = secundária inicial, St = secundária tardia, Pi-Si
= grupo intermediário I (proposta) e Si-St = grupo intermediário II (proposta).
Nessas florestas predominam espécies secundárias iniciais e tardias que
coexistem com espécies pioneiras. A classificação sucessional de espécies florestais tem sido um ponto muito polêmico nos
estudos de florestas tropicais em virtude
da carência de conhecimentos de como as
espécies reagem aos fatores bióticos e abióticos. Apesar desses obstáculos, esse trabalho permitiu classificar espécies arbóreas
de duas importantes formações florestais
do Estado de São Paulo. Pelo comportamento ecofisiológico de uso do nitrogênio
das espécies arbóreas foi possível separar
as espécies em conjuntos e até mesmo propor sub-conjuntos na sucessão ecológica
que poderiam ser investigados em futuros
trabalhos sobre essa temática.
Os grupos de sucessão ecológica
utilizam diferentes maneiras para assimilar
nitrogênio nas condições de úmido e seco
e o que colabora para o desenvolvimento
dessas estratégias são os processos de
aquisição, de transporte e de assimilação
desse elemento, fundamentais para o desenvolvimento das plantas frente às condições edáficas do ambiente estudado.
156
A classificação das espécies em
grupos de sucessão em função do uso de
nitrogênio foi possível a partir da escolha
de atributos relevantes e de métodos apropriados de classificação que consideraram
a ecofisiologia das espécies e sua relação
com a sazonalidade climática de cada fisionomia florestal, resultando na formação de
três grupos de sucessão ecológica em função da utilização do nitrogênio.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A elevação na deposição antropogênica de nitrogênio pode ser condicionante para o aumento de espécies herbáceas
invasoras, bem como acelerador da expansão de florestas (Siemann & Rogers 2003),
até mesmo naquelas de clima tropical, alterando a composição das comunidades, mudando as interações planta-solo e abrindo o
ciclo de nitrogênio (Hendricks et al. 2000).
Isso tem significante contribuição na acidificação do solo através da deposição do ácido nítrico, pela oxidação do amônio e pela
lixiviação de cátions como o cálcio (Moiser
et al. 2001), e seu excesso pode causar o
Interciência
& Sociedade
Sucessão ecológica e o uso de nitrogênio em florestas tropicais
declínio da diversidade de espécies (Vitousek et al. 1996).
Diante dessa problemática ambiental, existem desafios importantes que
precisam ser enfrentados em função das
circunstâncias de um cenário futuro pouco
promissor para a atual biodiversidade de espécies arbóreas da Mata Atlântica. Buscando novas respostas sobre a ecofisiologia e
a dinâmica de florestas tropicais, devem ser
incentivadas investigações a respeito da
deposição de nitrogênio e suas influências
qualitativas e quantitativas no comportamento ecofisiológico das espécies vegetais
e em suas interações com o meio abiótico
em formações florestais tropicais.
As estratégias de aquisição, transporte e uso de nitrogênio têm sido caracterizadas em diversos ecossistemas (Schmidt
& Stewart 1998, Aidar et al. 2003, Casals et
al. 2005, Pereira-Silva 2008) e os resultados têm mostrado que as plantas utilizam
estratégias para obter nitrogênio via deposições seca e úmida (Martinelli et al. 2009) e
através do solo nas suas formas inorgânica
e orgânica.
A aplicação do modelo de sucessão ecológica em função do uso de nitrogênio tem se mostrado uma ferramenta
importante e fornece informações para o
entendimento da dinâmica das formações
florestais da Mata Atlântica, além de atender às necessidades de avanços na determinação de categorias sucessionais. Os
estudos mostram que espécies pioneiras
têm estratégias adaptadas ao uso do nitrato e são mais responsivas nutricionalmente à esse íon, secundárias tardias desempenham estratégias para o uso de amônio
ou do solo ou resultante de remobilização,
sendo menos responsivas ao nitrato e secundárias iniciais completam o continuum
de respostas ecofisiológicas de uso de nitrogênio com espécies mais responsivas às
variações sazonais do nitrato, enquanto outras são menos responsivas e se assemelham mais às secundárias tardias.
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WHITTAKER, R. H. 1953. A consideration of climax
theory: the clímax as a population and pattern. Ecological Monographs 23(1)1: 41-78.
Erico Fernando Lopes Pereira-Silva. Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal
de São Carlos (1999), Mestre em Ecologia e Recursos Naturais pela mesma instituição (2003) e Doutor em Biologia Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas (2008). Foi coordenador e consultor de projetos ambientais de organismos internacionais BID e PNUD. Atualmente é professor do Curso de Graduação em Engenharia
Ambiental da Faculdade Municipal “Prof. Franco Montoro”. Publica trabalhos sobre Ecologia Vegetal: florística,
estrutura de florestas, Cerrado, Mata Atlântica, efeito de borda, relações do sistema solo-planta, uso de nitrogênio
e sucessão ecológica.
Elisa Hardt. Bacharel e Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Carlos (2001),
Mestre em Recursos Florestais pela USP/Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (2005) e Doutora em Engenharia Civil pela Universidade Estadual de Campinas (2010). Atualmente é professora da Faculdade Municipal
“Prof. Franco Montoro”. Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Ecologia de Paisagens e Planejamento Ambiental.
Carlos Alfredo Joly. Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (1976), mestrado
em Biologia Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas (1979), PhD em Ecofisiologia Vegetal pela University
of Saint Andrews, Escócia/GB (1982), Pós-Doc pela Universität Bern, Suíça (1994). Atua nas áreas de Ecofisiologia
Vegetal e Conservação da Biodiversidade. Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências (2008), Professor
Titular em Ecologia Vegetal, Chefe do Departamento de Biologia Vegetal do IB/UNICAMP e membro da Coordenação do Programa de doutorado em Ambiente e Sociedade (NEPAM/UNICAMP). Em janeiro de 2009 reassumiu
a Coordenação do Programa BIOTA/FAPESP, atuando também como Editor Chefe da revista eletrônica BIOTA
NEOTROPICA e como Coordenador do Projeto Temático Biota Gradiente Funcional.
Marcos Pereira Marinho Aidar. Concluiu o doutorado em Biologia Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas (2000). Atualmente é pesquisador do Instituto de Botânica (PqC V), credenciado no Curso de Pós-graduação
em Biodiversidade Vegetal e Meio Ambiente do Instituto de Botânica (2004) e no Curso de Pós-graduação em
Biologia Vegetal - UNICAMP (2006). Atualmente participa de 5 projetos temáticos de pesquisa. Atua na área de Botânica, com ênfase em Ecofisiologia Vegetal. Em seu currículo Lattes os termos mais freqüentes na contextualização da produção científica, tecnológica e artístico-cultural são: ecofisiologia, nitrogênio, Piptadenia gonoacantha,
germinação, jatobá, mata ciliar, sucessão florestal, atmosfera enriquecida CO2, seqüestro de carbono, isotopia de
nitrogênio e carbono, Centrolobium tomentosum, Cubatão, estratégia de regeneração, fotossíntese, trocas gasosas, fluorescência da clorofila a, Anadenenthera falcata, interação biosfera - atmosfera e cerrado.
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SUBMISSÃO DE TRABALHOS
Os artigos deverão ser encaminhados para o Conselho Editorial via mensagem eletrônica para: revista@fmpfm.
edu.br (Assunto: Submissão). Os textos deverão ser publicados em português. Além disso, requer-se que os
manuscritos submetidos a esta revista não tenham sido publicados anteriormente e não sejam submetidos
simultaneamente em outro periódico. O conteúdo dos artigos aqui publicado é de responsabilidade, única e
exclusiva, dos respectivos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião ou pensamento do conselho editorial.
NORMAS PARA FORMATAÇÃO
1.
Formatação Geral
Características gerais:
 Número de páginas: um mínimo de 8 páginas e no máximo 12 páginas, incluindo as dedicadas às referências;
 Papel: sulfite no formato A4 (297 x 210 mm);
 Editor de texto: Word 2003 ou superior;
 Margens: direita e esquerda – 3 cm; superior e inferior – 3 cm;
 Fonte: Arial, para todo documento;
 Parágrafo: espaçamento entre parágrafos: 0 cm; espaçamento entre linhas: simples; alinhamento justificado;
recuo especial da primeira linha: 1,25 cm.
2.
Estrutura do Trabalho
Seguem-se as recomendações em relação à estrutura dos trabalhos a serem avaliados e, posteriormente, se for o
caso, publicados pelo periódico INTERCIÊNCIA & SOCIEDADE.
2.1.
Título
O título deve estar na primeira página, centralizado, devendo ocupar no máximo duas linhas, com espaçamento
entrelinhas 1,5, letras maiúsculas (caixa alta) em negrito, na fonte Arial, tamanho 14.
2.2.
Autoria
As autorias constituem-se pelas pessoas físicas responsáveis na criação do conteúdo intelectual de um documento
e são indicadas pelos nomes dos autores, IES de origem e pelo e-mail.
2.2.1. Nome
Os nomes são referenciados pelo último sobrenome, em letras maiúsculas, seguidos dos prenomes e outros
sobrenomes, que podem ser abreviados ou não, no formato que se segue: SOBRENOME do 1º autor, letras
maiúsculas (caixa alta), na fonte Arial, tamanho 11; seguido do nome do 1º autor, letras maiúsculas e minúsculas
(caixa alta e baixa), normal, na fonte Arial, tamanho 11, alinhados à direita, espaçamento entrelinhas simples.
2.2.2. IES
O nome da Instituição de Ensino Superior deve estar em letras maiúsculas e minúsculas (caixa alta e baixa),
normal, na fonte Arial, tamanho 10, alinhados à direita, com a sigla da IES, entre parênteses, em letras maiúsculas
(caixa alta) normal, na fonte Arial, tamanho 10, alinhados à direita, espaçamento simples.
2.2.2. E-mail
O endereço eletrônico deve estar em letras minúsculas (caixa baixa), normal, na fonte Arial, tamanho 10, alinhados
à direita, espaçamento simples.
2.3.
Resumo
O texto deve ser escrito em português, com no máximo 10 linhas, cerca de 500 palavras, na fonte Arial, normal,
alinhamento justificado e espaçamento simples. A palavra RESUMO, seguida de dois pontos, deve ser escrita em
letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10, o texto do resumo vem logo a seguir.
2.4.
Palavras-chave
As palavras-chave devem ser escritas em português, em número máximo de cinco palavras-chave, na fonte Arial,
normal, alinhamento justificado, espaçamento simples. PALAVRAS-CHAVE seguida de dois pontos devem ser
escritas em letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10.
2.5.
Abstract
O texto do abstract, que vem a ser a tradução para a língua inglesa do resumo, até 10 linhas, na fonte Arial, itálico,
alinhamento justificado e espaçamento simples. A palavra ABSTRACT, seguida de dois pontos, deve ser escrita
em letras maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10.
2.6.
Keywords
São as palavras-chave traduzidas para o inglês, em número máximo de cinco palavras, na fonte Arial, itálico,
alinhamento justificado e espaçamento simples. KEYWORDS seguida de dois pontos devem ser escritas em letras
maiúsculas (caixa alta), em negrito, na fonte Arial, tamanho 10, em itálico, as keywords propriamente ditas vêm
logo a seguir.
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3.Introdução
O texto da Introdução deve ser escrito em português, na fonte Arial, tamanho 11, normal, alinhamento justificado,
espaçamento entrelinhas simples, sem hifenação, com recuo de 1,25 cm na primeira linha. A palavra Introdução
deve ser escrita em letras maiúsculas (caixa alta), na fonte Arial, tamanho 11, em negrito, alinhamento justificado,
espaçamento 1,5, entre a palavra Introdução e o texto propriamente dito não há espaçamento entrelinhas.
4.
Texto
4.1.
Tópicos
Em quantidade necessária para o desenvolvimento estruturado do trabalho deve estar na fonte Arial, tamanho 11,
em negrito, alinhamento justificado, não sendo conveniente ultrapassar-se uma linha e deve obedecer a numeração
arábica progressiva crescente.
4.2.
Sub-tópicos
Se fizerem necessários os sub-tópicos, até no máximo o terceiro nível, devem estar na fonte Arial, tamanho 11,
em negrito, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples, não sendo conveniente ultrapassar-se uma
linha. E, esses sub-tópicos devem obedecer a numeração arábica progressiva crescente. O texto referente ao
conteúdo dos sub-tópicos deve(m) estar na fonte Arial, tamanho 11, normal, alinhamento justificado, espaçamento
entrelinhas simples, obedecendo a um recuo de 1,25 cm para a primeira linha de cada parágrafo.
4.3.
Figuras
O título da Figura e as legendas devem vir logo abaixo desta, na fonte Arial, tamanho 10, normal, centralizados,
com uma entrelinha 1,5 entre a figura e o título da figura, obedecendo a numeração arábica progressiva crescente,
e deve haver uma entrelinha 1,5 para a continuação do texto.
4.4.
Quadros e Tabelas
O título dos quadros e as tabelas devem vir logo acima desta, na fonte Arial, tamanho 10, normal, alinhado à
esquerda, com uma entrelinha 1,5 entre o texto e o título dos quadros ou tabelas, obedecendo a numeração
arábica progressiva crescente.
4.5.
Notas de rodapé
As notas de rodapé devem ser inseridas somente se forem extremamente necessárias para a compreensão do
texto, em numeração arábica progressiva crescente, na fonte Arial, tamanho 9, normal, alinhamento justificado,
com entrelinhas simples.
5.
Considerações finais
Deve ser escrito em letras maiúsculas (caixa alta), na fonte Arial, tamanho 11, em negrito, alinhamento justificado,
espaçamento simples.
6.
Referências bibliográficas
As referências citadas no corpo do texto, conforme padrão da ABNT (NBR-6023) deverão ser apresentadas
em ordem alfabética no final do texto, na fonte Arial, tamanho 9, normal, alinhamento justificado, espaçamento
entrelinhas simples, sem hifenação. Entre as referências deve ser utilizado um espaçamento antes do parágrafo de
6 pontos. Como nota de fim de texto deve ser inserido um minicurrículo do(s) autore(s), até no máximo 10 linhas, na
fonte Arial, tamanho 9, normal, alinhamento justificado, espaçamento entrelinhas simples e espaçamento simples
entre os minicurrículos (caso houver mais autores).
PROCESSO DE AVALIAÇÃO
Os artigos recebidos são submetidos à análise do Conselho Editorial para avaliação da adequação às áreas de
interesse da revista e às exigências para submissão. Posteriormente, os artigos são encaminhados para análise
por especialistas (pareceristas) nas respectivas áreas temáticas - método conhecido como avaliação por pares,
peer review. Os nomes dos pareceristas e dos autores são mantidos em sigilo durante todo o processo. Os autores
têm acesso aos pareceres referentes aos seus artigos, porém sem a identificação do parecerista.
DIREITOS AUTORAIS
Ao submeterem artigos à Revista, os autores declaram serem titulares dos direitos autorais, respondendo
exclusivamente por quaisquer reclamações relacionadas a tais direitos. Os autores autorizam a Revista, sem
ônus, a publicar os referidos textos em qualquer meio, ficando ainda a Revista também autorizada a adequar os
textos a seus formatos.
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