universidade católica de angola revista académica lucere
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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA CENTRO DE ESTUDOS E INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA REVISTA ACADÉMICA LUCERE OUTUBRO DE 2012 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Índice APRESENTAÇÃO............................................................................................................................. 5 IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR CATÓLICO DE BENGUELA ............................... 12 3. Universidade Católica: natureza e missão .......................................................................... 13 A) Natureza.............................................................................................................................. 13 Renewable Energy in Angola: A New Paradigm .......................................................................... 17 Economic and Sectoral Context .................................................................................................. 17 Meeting the Challenge of an Energy Crisis.................................................................................. 18 Taking Advantage of Solar Resources ......................................................................................... 22 Attracting Private Sector Participation ....................................................................................... 23 Conclusion ................................................................................................................................... 24 References................................................................................................................................... 26 Critical gaps in maternal and newbornhealth services in the provinces of Luanda and Uíge in Angola ......................................................................................................................................... 27 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS ........................................................................... 44 Algumas questões para repensar o futuro de Angola................................................................. 60 Analysis of Interest Rates and Inflation in South Africa .............................................................. 66 Output Estimation ....................................................................................................................... 67 Interest Rate Model ............................................................................................................... 67 The model of interest rate with 2 lags ................................................................................ 69 Regression of residuals of the model number (2) ................................................................ 70 Inflation Model ........................................................................................................................ 72 The model of inflation l with 2 lags ..................................................................................... 74 Regression of residuals of the model number (6) ................................................................ 74 Cointegration Model ............................................................................................................. 76 2 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Regression of residuals of cointegrated model ................................................................... 78 Conclusion ................................................................................................................................... 79 References and Data ................................................................................................................... 80 OS GRANDES DESAFIOS DO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE ANGOLA ATÉ 2017 ...................... 81 Les limites du capitalisme ......................................................................................................... 102 Penser la crise du néolibéralisme et les failles de la pensée économique avec Karl Polanyi - . 102 Autarquias em Angola: Qual o problema do “gradualismo”? ................................................... 114 Introdução: Teorizando o gradualismo no contexto da descentralização ............................ 114 Devolução, desconcentração, gradualismo e a bifurcação do Estado .................................. 118 As autarquias e o gradualismo na Constituição de 2010 ...................................................... 121 Autoridades tradicionais e o gradualismo ............................................................................ 123 Moçambique e a bifurcação do Estado ................................................................................. 125 Gradualismo alternativo: Um modelo para Angola? ............................................................ 130 Eficiência e limites da autoformação profissional e autoemprego No bairro da Sanzala em Viana.......................................................................................................................................... 148 Julien David Zanzala (PhD) ........................................................................................................ 148 Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / UniPiaget ............................................................. 148 Resumo ..................................................................................................................................... 148 1. Introdução......................................................................................................................... 148 O Balcão Único do Empreendedor e o Microempreendedorismo em Angola ......................... 155 Breve historial do ISPOCAB ....................................................................................................... 166 RECENSÃO CRÍTICA.................................................................................................................... 171 KICOLA: ESTUDOS SOBRE A LITERATURA ANGOLANA DO SÉCULO XIX .................................... 171 3 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE ARTIGOS IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR CATÓLICO DE BENGUELA – Eugénio Dal Corso, Bispo de Benguela RENEWABLE ENERGY IN ANGOLA: A NEW PARADIGM – Carlos Leite, Managing Director of Solarize Energy CRITICAL GAPS IN MATERNAL AND NEWBORNHEALTH SERVICES IN THE PROVINCES OF LUANDA AND UÍGE IN ANGOLA – Ingrid Hoem Sjursen, Chr. Michelsen Institute A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS – Alves da Rocha, UCAN/CEIC ALGUMAS QUESTÕES PARA REPENSAR O FUTURO DE ANGOLA – Adelino Torres, Jubilado do ISEG ANALYSIS OF INTEREST RATES AND INFLATION IN SOUTH AFRICA – Albertina Delgado, UCAN OS GRANDES DESAFIOS DO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE ANGOLA ATÉ 2017 – Alves da Rocha, CEIC/UCAN LES LIMITES DU CAPITALISME – PENSER LA CRISE DU NEOLIBERALISME ET LES FAILLES DE LA PENSÉE ECONOMIQUE AVEC KARL POLANYI, - Jérôme Maucourant, Université de Lyon AUTARQUIAS EM ANGOLA: QUAL O PROBLEMA DO GRADUALISMO? – Aslak Orre, Chr. Michelsen Institute CEIC – 10 ANOS DE REALIZAÇÕES, - Regina Santos, CEIC/UCAN EFICIÊNCIA E LIMITES DA AUTOFORMAÇÃO PROFISSIONAL E AUTOEMPREGO NO BAIRRO DA SANZALA EM VIANA – Julien David Zanzala, Universidade Piaget O BALCÃO ÚNICO DO EMPREENDEDOR E O MICROEMPREENDEDORISMO EM ANGOLA – Francisco Miguel Paulo e Precioso Domingos, CEIC/UCAN DOCUMENTOS BREVE HISTORIAL DO INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA – Pe. Amadeu Ngula RECENSÃO CRÍTICA KICOLA: ESTUDOS SOBRE A LITERATURA ANGOLANA DO SÉCULO XIX DE FRANCISCO SOARES – Nelson Pestana, CEIC/UCAN 4 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE APRESENTAÇÃO Os temas tratados neste número da Revista Académica LUCERE, da Universidade Católica de Angola, são variados, embora apresentem como denominador comum a preocupação pela existência de sociedades justas, equilibradas, livres, participativas e democráticas. O ponto de vista político é essencial para o desenvolvimento. Sociedades abertas, democráticas, participativas, liberais e responsáveis são um ingrediente fundamental para a felicidade das pessoas. Cidadãos felizes são trabalhadores, empresários, professores, investigadores, governantes, escritores e artistas mais produtivos. Do ponto de vista político, a situação parece ser crítica em Angola. Como se sabe, as opiniões internas são muitas e divergentes sobre este item e, por isso, para ilustrar um ponto de vista independente utilizou-se o Democracy Index de 2010 e 2011 construído pelo The Economist, a mais prestigiada revista de economia do mundo1. O seu estudo sobre as condições de exercício da democracia no mundo já vai na quarta edição e para os seus autores a situação política no mundo em 2011 apresentou alguns retrocessos. São investigados 167 países, agrupados em “democracias completas”, “democracias incompletas”, “regimes híbridos” e “regimes autoritários”. Cabo Verde, em 2011, conseguiu ser a primeira das democracias incompletas, à frente de alguns países europeus. Ainda dentro desta categoria aparecem, no contexto da SADC, países como a África do Sul, Botsuana, Lesoto, Namíbia, Zâmbia e Malawi. As Maurícias foram consideradas como um país de democracia plena. Angola está classificada em 133º lugar, dentro do grupo dos regimes autoritários. E a situação piorou de 2010 (131º lugar), para 2011. Mas também as condições e os modelos económicos. Igualmente as doutrinas económicas e sociais são relevantes para a construção de sociedades justas. Adelino Torres (ISEG, UTL) e Jérome Muancourant (Universidade de Lyon) apresentam-se como críticos de sistemas em que o excesso de liberalismo económico conduz necessariamente a desigualdades sociais inaceitáveis num mundo onde os progressos científicos e tecnológicos são constantes, sistemáticos e virados para a melhoria das condições de vida das populações. Também nesta perspectiva se coloca a Doutrina Social da Igreja enquanto conjunto de textos definidores duma linha de comportamento cristão baseado em três 1 Democracy Index 2011 – Democracy Under Stress, A Report From The Economist Intelligence Unit, 2011. 5 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE princípios essenciais: solidariedade, caridade e subsidiariedade. Tendo como centro a pessoa de Jesus Cristo, a Doutrina Social da Igreja está expressa nos Evangelhos e nas diferentes Encíclicas Papais que foram sendo escritas ao longo dos tempos. A colecção de vários textos do magistério da Igreja, para alguns representa a Doutrina Social da Igreja, ou seja, a manifestação actual de um esforço milenar de anunciar e viver o Evangelho. A abordagem do cristão aos problemas da economia pode ser resumida num pensamento muito simples: a economia dirige-se para o homem e o homem dirige-se para Deus. Desta ideia simples pode extrair-se que a função utilidade dos cristãos é a de se orientar para todos os homens e o homem todo. São 12 artigos inseridos neste número da LUCERE: 3 em inglês, um em francês e 8 em português. Claramente está-se numa via de internacionalização da Revista Académica da UCAN. D. Eugénio Dal Corso, Bispo de Benguela, colabora neste número da Revista Académica da Universidade Católica de Angola com o texto da sua conferência em Benguela por ocasião da comemoração do reconhecimento oficial da criação do Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela, cuja qualidade suscitou um pedido de cedência do mesmo para publicação na LUCERE. Uma intervenção de enorme relevância, em diferentes vertentes: o pequeno historial das Universidades no mundo e a contribuição da Igreja Católica para o seu aparecimento enquanto centros de saber universal, o papel das Universidades Católicas na sua função de agregar e transmitir conhecimento e de educação ética e moral dos cidadãos, dentro de valores universalmente aceites como enquadradores do comportamento cívico das pessoas, as dificuldades que rodeiam o exercício e a prática do ensino superior no nosso país e outros igualmente aliciantes. O radical comum a todas as Universidades Católicas existentes em todo o mundo foi a Universidade Católica de Bolonha criada em 1088 e à qual se seguiram a de Pádua (1204), de Paris (1215), de Salamanca (1218), de Nápoles (1224), de Oxford (1284) e de Coimbra (1290). O século XIII pode, portanto, ser considerado o das Universidades Católicas na Europa, às quais se foram seguindo outras de natureza não religiosa. Mas a intervenção de D. Eugénio Dal Corso abarca, igualmente, a posição, o papel e a função social das Universidades Católicas. A Grande Federação Internacional das Universidades Católicas, congregando 192 instituições de ensino superior espalhadas por 52 países é uma estrutura que, porventura, mais nenhumas outras Universidades dispõem e que confere às Católicas uma verdadeira vantagem comparativa. É clara a abordagem que D. Eugénio apresenta sobre a natureza e a missão de serviço das Universidades Católicas. É particularmente feliz o pensamento do Bispo de Benguela sobre o trabalho de investigação das Universidades Católicas: diálogo entre a fé e a razão, integração do conhecimento, preocupação ética 6 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE e a perspectiva teológica. Ficaram para trás os tempos em que a religião era a única fonte de conhecimento, reconhecendo-se, agora, a valia da ciência, da razão e da sua interligação com a fé. Carlos Leite – um dos fundadores do Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola – dá-nos uma sinopse, logo no início do seu interessante artigo, sobre as expectativas pós-guerra civil em Angola, referindo as penosas desigualdades na distribuição do rendimento facilitadas e potenciadas pelo actual modelo de exercício da política e pela natureza das políticas económicas, amplamente favoráveis à acumulação de riqueza e à concentração do rendimento. De resto, uma evidência no quotidiano dos angolanos, mas que teima em se manter e ampliar, fazendo de Angola um dos países mais desiguais e injustos do mundo. Mas o foco de Carlos Leite é o das infra-estruturas que continuam em falta no país, com ênfase para o domínio da electricidade. Não se pode industrializar e diversificar a economia – um casamento agricultura/indústria/serviços – com geradores, nem se pode difundir o progresso junto das comunidades rurais sem acesso à electricidade. A análise de Carlos Leite sobre a problemática energética – renovável e não renovável – é serena, mas acutilante, valendo a pena interpretar as suas observações e consequentes propostas. Identifica as mais salientes deficiências do sistema de electricidade de Angola, o que lhe permite, na base desta reflexão inteligente, apresentar uma visão sobre a mais adequada estratégia, que combine renovável e não renovável. Esta rota poderá permitir um crescimento económico de baixo custo energético e de maior difusão da electricidade junto das famílias e das comunidades. São relevantes as sugestões que Carlos Leite apresenta sobre uma estratégia para o sector energético de Angola, ligando-as aos mais recentes desenvolvimentos no mundo sobre esta matéria. Leite sublinha que nas economias mais desenvolvidas as estratégias e as políticas energéticas procuram combinar, por uma questão de redução de custos e maximização de proveitos e utilidades, as fontes renováveis com as fontes não-renováveis, dando como exemplos a Alemanha, o Canadá e os Estados Unidos. Mas informa-nos também das experiências da China e de outros países asiáticos. Para os interessados e estudiosos das matérias energéticas, este artigo é de leitura recomendada. O artigo de Ingrid Hoem Sjursen, investigadora do CMI (Christian Michelsen Institute de Bergen) é baseado nos resultados de um vasto inquérito realizado em Luanda e no Uíge sobre o fornecimento de serviços de saúde à população. Além de se explicar que são de fraca qualidade – e também em reduzida quantidade, ficando uma margem considerável da população sem acesso aos mesmos – em qualquer das províncias, a autora retira ilações importantes sobre as desigualdades existentes entre 7 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE as mesmas. O défice no fornecimento de serviços de saúde tem implicações sobre o estado de saúde das pessoas, agravando-se a sua pobreza e minando-se a sua produtividade. As populações de Luanda estão muito mais bem servidas do que as do Uíge, sendo mais uma das assimetrias na distribuição do rendimento tão características de Angola. Ingrid, neste bem arquitectado artigo, mostra todos os aspectos relacionados com a saúde das populações destas duas regiões do país, apresentando razões para a baixa qualidade dos serviços prestados e para as desigualdades detectadas. Alves da Rocha trata da responsabilidade social das empresas, enquanto tema da actualidade e das novas estratégias de inserção social das unidades económicas. Mas sempre na perspectiva da maximização dos seus lucros e não inteiramente na da inserção das comunidades na partilha dos seus resultados financeiros. Ainda vão ser necessários muitos anos para que as propostas para um novo paradigma do capitalismo de Sua Santidade Bento XVI se concretizar. São algumas, embora tímidas, as tentativas relativamente bem-sucedidas de responsabilidade social das empresas em Angola. Adelino Torres é um pensador de reconhecidos méritos e com contribuições determinantes para o pensamento económico e social em África. É francamente um afro-optimista e um defensor do papel activo do Estado na economia, regulando e regulamentando mercados, criando externalidades, promovendo a justiça social e encarregando-se das infra-estruturas económicas e sociais. Nunca perde oportunidade de defender o continente africano e de mostrar as suas enormes potencialidades. Adelino Torres – e a sua vasta obra – é um autor de leitura obrigatória. Neste artigo, apesar de se basear numa comunicação apresentada num Colóquio da Casa de Angola em Lisboa em 1999, Adelino Torres reflecte sobre muitas questões de actualidade inquestionável, porque ainda não resolvidas: democracia, liberdade, boa governação, transparência, corrupção, melhoria das condições de vida, distribuição do rendimento, modelos de industrialização e de diversificação da produção e assimetrias várias. O artigo da Albertina Delgado é eminentemente econométrico e mostra o domínio que tem sobre estas técnicas matemáticas aplicadas à economia. A sua preferência foi para o estudo econométrico das taxas de inflação na África do Sul que pode perfeitamente ser aplicado ao fenómeno inflacionista em Angola. No segundo artigo que Alves da Rocha apresenta neste número da Revista Académica da UCAN questionam-se os desafios do crescimento económico em Angola 8 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE até 2017, baseados nas projecções do Fundo Monetário Internacional sobre o comportamento futuro da economia nacional. Saúda-se o artigo do Professor Jérôme Maucourant da Universidade de Lyon (Université Jean Monet) que pode indiciar o início de uma colaboração com a UCAN e o CEIC em domínios relacionados com estudos do desenvolvimento económico. O título é sugestivo, num contexto internacional em que as políticas liberais e néoliberais aparentemente entraram em crise ao serem incompetentes para conciliar reformas estruturais e crescimento económico: “les limites du capitalisme – penser la crise du neoliberalisme et les failles de la pensée économique avec Karl Polanyi”. A base do seu artigo é o pensamento de Karl Polanyi um dos maiores historiadores económicos e da sua grande obra “La Grande Transformation”, onde se analisam os efeitos perversos do capitalismo liberal ao longo do tempo e se avança com a eventualidade de se engendrarem regimes fascistas se esta máquina não for contida em limites de racionalidade económica e viabilidade social. Jérôme Maucourant passeia-se com grande à vontade pelas principais crises da sociedade de mercado, suas causas e suas consequências e observa que uma das razões da actual crise económica europeia e norte americana é a deflação salarial: “une des raisons actuelles qui a contraint à l’inflation de la dette, via des inégalités croissantes, est le libré-échange: celui-ci, notammente aux Étas Unis, este porteur de déflation salariale, ce qui va à l’éncontre de l’ opinio communis des vingt derniéres années”. O Aslak Orre é um excelente investigador e co-coordena o programa conjunto CMI/CEIC de pesquisa económica, social e política. É um observador atento e judicioso da realidade angolana, mormente a de pendor político e tem apresentado muitas intervenções, escritas e em forma de palestras e conferências, em Angola, Moçambique, Portugal, Reino Unido, África do Sul, Namíbia, Estados Unidos e Noruega. O tema do artigo relaciona-se com a importante temática das autarquias em Angola e sobre o processo da sua criação, teorizando sobre se o gradualismo é a melhor forma para se criar a regionalização política em Angola. Mesmo o pensamento oficial e dos seus arautos converge no sentido de se constituírem as autarquias no país, para assim se contemplar, política e economicamente, uma realidade complexa, diferenciada e com valores culturais que reclamam ser defendidos e colocar-se mais próximos das comunidades. O ponto de reflexão de Aslak Orre está na dinâmica da criação das autarquias e na sua efectiva autonomia e independência face ao poder central. Aslak defende uma proximidade política genuína com as comunidades locais, por ser a melhor forma de se expressarem anseios, necessidades, expectativas e a participação nos processos decisórios. O artigo de Aslak Orre apresenta uma excelente fundamentação teórica sobre a descentralização – administrativa, política, financeira e 9 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE mesmo económica – e os benefícios da autonomia. Consegue, mesmo, abstrair-se das excelentes experiências dos países desenvolvidos (em especial a Noruega de onde é natural) e concentrar-se nas complexas realidades africanas, onde as tradições têm de ser bem equacionadas para melhor se articularem os níveis da decisão e da governação. Para Aslak Orre, Angola é o país mais centralizado de África, constatação não muito abonatória para o regime político angolano. Não apenas em matérias revertíveis às tomadas de decisão política com incidência sobre as comunidades locais, mas, igualmente, em termos de receitas fiscais do Estado. Por isso, propõe duas vias: a da autarquização – processo de criação e implementação de autarquias de modo imediato, ainda que, naturalmente, assente em estudos específicos – e a da desconcentração, que para Aslak significa “continuar a administrar os municípios através de representantes da Administração Central”. Este artigo é estimulante e vale a pena lê-lo com muita atenção. A Regina Santos subscreve um artigo relacionado com os 10 anos do CEIC e do Relatório Económico comemorados em Junho 2012. Trata-se de uma resenha bem sistematizada e que expressa bem o que se passou durante este período, em que as dificuldades de funcionamento do Centro foram mais do que evidentes e os apoios, sobretudo financeiros, tiveram sempre uma origem externa. A despeito de se tratar duma estrutura funcional e institucional da UCAN o seu funcionamento depende de ajudas estrangeiras. A Regina retrata bem este percurso sinuoso do CEIC e, da mesma forma, destaca a determinação dos seus trabalhadores em continuarem a fazer investigação em condições muito pouco propícias a isso. Seguramente que este apanhado da Regina Santos pode ser considerado como um documento indispensável para se começar a escrever a história do CEIC. O Professor Julien David Zanzala, da Universidade Jean Piaget, é, normalmente, um reincidente na LUCERE, porque os seus artigos são sempre bem esquematizados, escritos e apresentados. Desta vez apresenta-nos um muito interessante estudo de caso sobre a autoformação profissional e o auto-emprego numa comunidade de Viana. Baseado numa amostra de 200 pessoas que foram questionadas sobre a autoformação e as consequências sobre a criação de emprego, o autor retira uma série de conclusões sobre o funcionamento do mercado de trabalho informal. Evidentemente que se trata do sector informal, mas a sua relevância, enquanto “almofada” social e económica para as falhas da economia formal e do Governo (nas suas políticas de inclusão e de disseminação do crescimento) é enorme e por todos confirmada. As dificuldades de criação de emprego são reconhecidas a nível oficial – estima-se entre 25% e 30% a taxa de desemprego em Angola – e a formação profissional pode ser uma via para se ultrapassarem as barreiras à entrada no mercado de trabalho. Mas a formação é, 10 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE sobretudo, um meio para se auferirem melhores salários, respeitando o equilíbrio microeconómico entre valor da produtividade marginal do trabalho e valor das remunerações do trabalho. A concorrência é tremendamente desleal face aos expatriados ocidentais, muitos dos quais, sem experiências profissionais de relevo, auferem salários “pornográficos” face aos trabalhadores angolanos e aos elevados índices de insatisfação de necessidades sociais. Dois jovens promissores investigadores do CEIC – Francisco Miguel Paulo e Precioso Domingos, actualmente em Portugal a fazerem mestrados na Universidade Católica de Lisboa – assinam um artigo sobre o micro-empreendedorismo em Angola. Socorrem-se dos resultados dos inquéritos que a Sociedade Portuguesa de Inovação, com a colaboração do CEIC, realiza periodicamente em Angola sobre a temática do empreendedorismo. Estes resultados passaram a integrar o Global Entrepreneurship Monitor, o Relatório Internacional sobre o estado do empreendedorismo no mundo. Os autores relacionam os resultados para Angola com as iniciativas governamentais de estimular a pequena iniciativa privada, nomeadamente pela via do Balcão Único do Empreendedor e outras iniciativas semelhantes (Angola Investe, Programa de Desenvolvimento das Micros, Pequenas e Médias Empresas, Programa de Apoio ao Pequeno Negócio, etc.), concluindo que, por uma série de razões no seu artigo explicitadas, os resultados têm-se situado bastante aquém do esperado. Luanda, 6 de Janeiro de 2013 O Director do CEIC 11 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR CATÓLICO DE BENGUELA CONFERÊNCIA NO INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA Eugenio Dal Corso Bispo de Benguela 1. Introdução Gostaria, em primeiro lugar, manifestar a minha grande alegria e satisfação pelo momento muito especial que estamos a viver; podemos dizer que é o nascimento oficial e público desta instituição que já está a funcionar na diocese de Benguela como ISUP desde o ano de 2006, e que foi reconhecida pelo governo angolano com decreto presidencial n. 168/12 do 24 de Junho deste ano. Este é o primeiro acto público da instituição, que tem o nome oficial de: INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA. Grande alegria e profunda satisfação minha pessoal, mas estou certo de que estes sentimentos podem ser ainda mais fortes noutras pessoas que trabalharam, lutaram e sofreram para que este nascimento acontecesse; em primeiro lugar o nosso bispo emérito Dom Óscar Braga e os directores que se sucederam no Instituto Superior “João Paulo II”, até os actuais dirigentes, padres e leigos, da instituição. Fui convidado a falar sobre este tema: IDENTIDADE E PERFIL DO INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO CATÓLICO DE BENGUELA. Aceitei com muito agrado; para cumprir esta tarefa baseio-me principalmente nos documentos oficiais da Igreja Católica, em particular da Congregação para a Educação católica. O documento que é como a “magna carta” das universidades católicas no mundo, é a Constituição apostólica EX CORDE ECCLESIAE do papa Beato João Paulo II de 15 de Agosto de 1990. 2. Universidade Para facilitar a exposição e a compreensão, chamarei o nosso Instituto de Universidade Católica; de facto os mesmos documentos da Igreja se referem indistintamente quer às universidades católicas propriamente ditas, como aos Institutos Superiores Católicos. 12 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Gostaria antes de mais recordar que as Universidades, como hoje estão difundidas no mundo ocidental, nasceram na Igreja católica. A primeira foi a de Bolonha fundada no ano de 1088, chamada “Alma mater studiorum”; seguiu a Universidade de Pádua fundada em 1204; com decreto papal nasce em 1215 a Universidade de Paris; em 1218 è fundada na Espanha a Universidade de Salamanca; em 1224 a Universidade de Nápoles; a universidade de Oxford foi fundada pelo rei da Inglaterra em 1284; em 1290 é fundada a Universidade de Coimbra, a primeira do Portugal; no século XIV as universidades difundiram-se na Alemanha (Colónia) e noutras cidades da Europa oriental. A Igreja Católica sempre procurou preservar, difundir e aprofundar a cultura académica em todos os ligares onde ela chegava. Hoje em dia todas as universidades católicas são unidas na FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DAS UNIVERSIDADES CATÓLICAS, que está em 57 países com 192 universidades afilhadas. Penso poder afirmar que a nossa Universidade católica de Benguela é a “kassule” desta grande família de institutos superiores de ensino da Igreja Católica. Hoje com o termo “universidade” designa-se uma entidade de direito público ou privado, que opera no campo do ensino superior, da pesquisa e das actividades culturais em geral. A Universidade Católica, enquanto Universidade, é uma comunidade académica que, dum modo rigoroso e crítico, contribui para a defesa e desenvolvimento da dignidade humana e para o aumento e a transmissão a herança cultural mediante a investigação, o ensino e os diversos serviços prestados às comunidades locais, nacionais e internacionais. Ela goza daquela autonomia institucional que é necessária para cumprir as suas funções com eficácia, e garante aos seus membros a liberdade académica na salvaguarda dos direitos do indivíduo e da comunidade no âmbito das exigências da verdade e do bem comum. 3. Universidade Católica: natureza e missão A) Natureza “A Universidade católica é sem dúvida alguma um dos melhores instrumentos que a Igreja oferece à nossa época, que procura certeza e sabedoria” (Ex corde Ecclesiae,10). A nossa universidade, enquanto católica, deve possuir as seguintes características essenciais: 1. Uma inspiração cristã não só dos indivíduos, mas também da Comunidade universitária enquanto tal; e isto deve aparecer também em sinais exteriores, tais como o crucifixo nas salas de aula e em todos os ligares de direcção, uma capela onde celebrar e orar, etc. 13 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 2. Uma reflexão incessante, à luz da fé católica, sobre o tesouro crescente do conhecimento humano, ao qual procura dar um contributo mediante as próprias investigações; 3. A fidelidade à mensagem cristã tal como é apresentada pela Igreja; 4. O empenho institucional ao serviço do povo de Deus e da família humana no seu itinerário rumo àquele objectivo transcendente que dá significado à vida (Ex corde Eccl. 13). Numa Universidade Católica, além da actividade do ensino, o trabalho de investigação compreende necessariamente estes objectivos: a) perseguir uma integração do conhecimento; b) o diálogo entre a fé e a razão; c) uma preocupação ética; e d) uma perspectiva teológica a)Integração do conhecimento: hoje existe uma tendência acentuada ao fraccionamento do conhecimento; numa universidade católica os estudiosos universitários deverão empenhar-se num esforço constante no sentido de determinar a relativa colocação e o significado de cada uma das diversas disciplinas no quadro duma visão da pessoa humana e do mundo iluminada pelo Evangelho e, portanto, pela fé em Cristo, Logos, como centro da criação e da história humana. b) O diálogo entre a fé e a razão: conservando embora cada disciplina académica a sua integridade e os próprios métodos, este diálogo põe em evidência que a investigação metódica em todo o campo do saber, se conduzida de modo verdadeiramente científico e segundo as leis morais, nunca pode encontrar-se em contraste objectivo com a fé. As coisas terrenas e as realidades da fé têm, com efeito, origem no mesmo Deus. c) Uma preocupação com as implicações éticas e morais: «É essencial convencermonos da prioridade da ética sobre a técnica, do primado da pessoa sobre as coisas, da superioridade do espírito sobre a matéria. A causa do homem só será servida se o conhecimento estiver unido à consciência. Os homens da ciência só ajudarão realmente a humanidade se conservarem o sentido da transcendência do homem sobre o mundo e de Deus sobre o homem» (Ex corde Eccl. N. 18). d) Uma perspectiva teológica: A teologia desempenha um papel particularmente importante na investigação duma síntese do saber, bem como no diálogo entre fé e razão. “Dada a importância específica da teologia entre as disciplinas académicas, cada Universidade deverá ter uma Faculdade ou, ao menos, uma cátedra de teologia” (Ex corde Eccl. 19). A Comunidade universitária de muitas instituições católicas inclui colegas pertencentes a outras Igrejas, a outras Comunidades eclesiais e religiões. Dos membros não católicos 14 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE espera-se o respeito do carácter católico da instituição na qual prestam serviço, enquanto a Universidade, por seu lado, respeitará a sua liberdade religiosa. B) A missão de serviço da universidade católica A missão fundamental de uma Universidade é a procura contínua da verdade, a conservação e a comunicação do saber para o bem da sociedade. A Universidade Católica participa nesta missão com o contributo das características e finalidades específicas. No serviço à sociedade o interlocutor privilegiado será naturalmente o mundo académico, cultural e científico da região em que actua a Universidade católica. São de encorajar formas originais de diálogo e de colaboração entre as Universidades Católicas e as outras Universidades da Nação em favor do desenvolvimento, da compreensão entre as culturas, da defesa da natureza com uma consciência ecológica internacional. Em síntese: § 1. Uma Universidade Católica, como qualquer Universidade, é uma comunidade de estudiosos, representada por vários campos do saber humano. Ela dedica-se à investigação, ao ensino e às várias formas de serviço, compatíveis com a sua missão cultural. § 2. Uma Universidade Católica, enquanto católica, inspira e realiza a sua investigação, o ensino e todas as outras actividades segundo os ideais, os princípios e os comportamentos católicos. Ela está ligada à Igreja ou através dum vínculo formal segundo a constituição e os estatutos, ou em virtude dum compromisso institucional assumido pelos seus responsáveis. § 3. Toda a Universidade Católica deve manifestar a sua identidade católica mediante uma declaração acerca da sua missão ou com outro documento público apropriado a não ser que doutra maneira seja autorizada pela Autoridade eclesiástica competente. Ela deve possuir, particularmente no que se refere à sua estrutura e aos seus regulamentos, meios para garantir a expressão e a conservação de tal identidade. § 4. O ensino católico e a disciplina católica devem influir em todas as actividades da Universidade, respeitando plenamente a liberdade da consciência de cada pessoa. Cada acto oficial da Universidade deve estar de acordo com a sua identidade católica. § 5. Uma Universidade Católica possui a autonomia necessária para realizar a sua identidade específica e cumprir a sua missão. A liberdade de investigação e de ensino é reconhecida e respeitada segundo os princípios e os métodos próprios de cada 15 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE disciplina, sempre que sejam salvaguardados os direitos dos indivíduos e da comunidade, e dentro das exigências da verdade e do bem comum. 4. Em Benguela Falamos de Benguela não só nem principalmente como cidade, mas como território, e se queremos, como diocese. Benguela tem a sua história plurissecular (1617, são quase 400 anos), as suas características religiosas, culturais e sociais; está a ganhar cada dia mais importância também na política e na económica. A nossa universidade de Benguela, pode e deve contribuir para estes objectivos: - a investigação científica da história, da literatura, das artes e artistas desta região; - o crescimento académico e cultural por meio do ensino e da aprendizagem, estendidos também a outras áreas do interior da diocese e da província e com a possibilidade de acesso oferecida também a estudantes dotados de inteligência e boa vontade, mas sem muitos recursos económicos (bolsas de estudo para estudantes pobres); - o progresso social e o crescimento económico por meio da formação de pessoal técnico bem qualificado quer profissionalmente, quer humanamente de nível superior nas diferentes áreas da agricultura, da industria e do comércio; - o desenvolvimento ordenado e sustentável da região no sentido do respeito e do cuidado do ambiente natural; - o desenvolvimento também do turismo, fazendo conhecer e valorizar as belezas naturais do território e a variedade da fauna e da flora desta terra. 5. Conclusão A criatura que hoje é apresentada ao mundo é ainda pequena, mas tem visão, vontade e, cremos, capacidade para crescer e tornar-se um centro propulsivo e meio importante para o bem da sociedade, e a difusão do Evangelho, enfim para uma vida boa presente e futura das pessoas criadas e redimidas por Jesus Cristo. Isto vai acontecer se todos nós nos comprometemos séria e generosamente para atingir estas metas, com a certeza de que a ajuda de Deus Pai não só não nos vai faltar, mas vai iluminar-nos e animar-nos com a sua luz e a sua graça. 16 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Renewable Energy in Angola: A New Paradigm Carlos Leite Managing Director of Solarize Energy (www.solarizeenergy.ca) and formerly Economist at the International Monetary Fund. Economic and Sectoral Context Angola is at a decisive stage in its history. The conflict that restrained development for so many decades has receded and the transition to a new political and economic dispensation is underway. Along the way, Angola needs to address a complex situation: high expectations due to substantial natural riches, a massively unequal distribution of income, and one of the globe’s lowest human development indicators. Choices made over the next few years will decide which model of development Angola will follow for the succeeding decades: the Nigeria model of unequal wealth and arrested development or the Malaysia model of broad-based prosperity and sustained development.2 One of the principal transmission mechanisms to broad-based prosperity for a country like Angola involves the provision of improved infrastructure services. In particular, increased access to modern energy sources ina sustainable manner could help improve livelihoods directly as well as indirectlythrough the promotion of economic development. However, just as in much of sub-Saharan Africa, there is currently a substantial infrastructure deficit in Angola.As discussed in the first textbox below, thisdeficit tends to be particularly acute in the power sector across Africa, and in Angola the average consumption of electricity, at 182kWh per person,is only sufficient to light a 100-Watt light bulb for 5 hours per day (see the first table below)… clearly insufficient to power anything like a vigorous manufacturing sector. Population (2009) Angola Nigeria Namibia Installed Electricity Capacity (2008) 18,497,632 154,728,890 2,171,137 1.16 18.14 0.26 2 Electricity Consumption (2008) Total Per Capita 3.37 5.90 3.93 182.2 38.1 1,810.1 Both Nigeria and Malaysia emerged in the early 1970’s from severe ethnic conflict and into a period of substantial revenues from natural resources. Over the course of the next four decades, Nigeria wasted its wealth on foolish projects and indulged in repeated cycles of corruption and political intrigue. Over the same time period, Malaysia put in place mechanisms for effective sharing of the nation’s wealth, invested in its people, improved the business environment, and became a world-class diversified economy. 17 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Portugal 10,632,069 15.76 48.27 4,540.0 Sources: Population data from World Bank; Installed Electricity Capacity (in GigaWatts) and Electricity Consumption (Total in billion kiloWatt hours, and Per Capita in kWh) from Energy Information Agency. Across sub-Saharan Africa, most of the needs for energy are currently met by the use of traditional biomass, which is principally used for cooking. Meanwhile, access to modern energy sources is estimated to be less than 10% in the rural areas.3 Unfortunately, biomass fuel (either in the form of wood or charcoal), is highly inefficient and when used indoors has adverse emissions that can cause severe health problems; in sub-Saharan Africa alone, it is estimated that 393,000 The Power Sector in Africa people died in 2002 due to inhaling the pollution from biomass fuels Africa’s largest infrastructure deficit is to be found in (Davidson et al, 2006).4 the power sector. Whether measured in terms of Meeting the Challenge of an Energy Crisis In the face of a multiplicity of daunting development challenges and constrained fiscal resources, how can the challenge of increasing access to modern energy services be met in Angola? First, it should be noted that Angola’s prowess in terms of oil production is distinct from (although related to) the issue of electricity generation and consumption. The principal benefits of oil production accrue to Angola in the form of government revenues which ideally should be used strategically to help resolve generation capacity, electricity consumption, or security of supply. Africa’s power infrastructure delivers only a fraction of the service found elsewhere in the developing world. The 48 countries of Sub-Saharan Africa (with a combined population of 800 million) generate roughly the same amount of power as Spain (with a population of 45 million). Power consumption, at 124 kilowatt hours per capita per year and falling, is only a tenth of that found elsewhere in the developing world, barely enough to power one 100-watt light bulb per person for three hours a day. Africa’s firms report losing 5 percent of their sales as a result of frequent power outages; this rises to 20 percent for informal sector firms unable to afford backup generation facilities. 3 Contextually, the lack of reliable statistics on sectoral production and consumption is a significant constraint for effective planning and project promotion in the energy sector (IEA, 2006, p. 22). 4 In addition, the burning of wood for fuel is one of the main sources of deforestation and the main source of greenhouse gas emissions in Africa, and even when used outdoors, this source of energy creates significant air pollution in the form of low-level ozone (a key contributing factor for respiratory illnesses). Source: Foster (2008). 18 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE current development challenges. However, the availability of these revenues for investment in other energy sub-sectors is currently restricted by previous policies (particularly the extent of borrowing against future oil revenues) and the competing demands of other sectors (including health, education, and other sub-sectors of infrastructure). Thus, it is imperative not only to put in place a sound sectoral strategy for the electricity sector but also to attract additional project financing from development and business partners (and the power sector is certainly promising for private sector participation). Second, the sectoral strategy for the energy sector should take into account: (i) the current state of infrastructure assets on the ground, and (ii) recent developments in the energy sector globally. On the ground: a) system outages are chronic in Luanda and even worse elsewhere; b) there are a number of isolated electricity grids which are unlikely to be connected for some years to come;5 c) substantial maintenance and capital investments are needed in the current generating plants as well as on the transmission and distribution networks; d) the capacity of the public sector agencies to finance and manage a significantly larger portfolio of energy assets is limited; e) the current reliance on biomass (including charcoal for the peri-urban areas) is unsustainable, in terms of both its environmental impact and cost to the endusers;6 and f) therefore, current sectoral plans call for electricity production to double and levels of access to electricity services to more than double by 2016 (IEA, 2006, p. 59-61). Globally, recent price developments significantly favour the deployment of solar photovoltaic systems as a key source of power generation (as the price of photovoltaic panels continues to fall steadily), while discouraging reliance on fossil fuels. As a result, there is a widespread transition from centralised, fossil-fuel-based energy systems to systems that combine efficient technologies and renewable sources. Across the globe, new investment in renewable power generation has been greater than investment in fossil-fuelled technologies since 2008 (UNEP, 2009). Third, the need for a quick ramp-up in generation capacity together with the fragmented state of the transmission and distribution network suggest that distributed 5 “Almost all isolated and backup systems run on diesel. Extremely poor conditions on road and rail networks make fuel supply to these isolated systems difficult and costly.” (IEA, 2006, p. 18) 6 “Severe local deforestation has occurred around most large cities, e.g., extending for a radius of 200-300 km around Luanda. Such deforested zones are growing yearly, in turn raising the transport costs of charcoal, which make up the largest part of the price.” (IEA, 2006, p. 19). 19 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE (instead of centralized) generation should be favoured over the medium term in Angola.7 This is primarily due to the combination of: a) the current situation on the ground with regards to the large costs associated with rehabilitating existing generation plants and the difficulty in connecting isolated grids and systems (not just the time and expense but the need for substantial convergence on technical issues such as connecting and safety equipment and interconnection procedures and standards); b) the substantial lead time and upfront capital costs required for new (large) centralized generating plants; c) the advantage of project scalability and quick deployment of renewable energy sources, particularly solar photovoltaic systems(and the imperative to immediately improve quality of life for local populations); and d) more broadly, as Angola is currently planning its future power generation and distribution system, this is the appropriate time to consider a balanced strategy and a mix of energy sources that take account of local conditions and enhances both the security and the stability of supply. Fourth, the technical and financial feasibility of renewable energy technologies are borne out by the wealth of experiences across the world.8In high-income countries, such as Germany and Canada, the promotion of a diversity of energy sources is now a central piece of energy policy, and their incentive programs are helping to drive innovation and to lower costs on existing technologies. In southern European countries and in the southern United States, for example, wind and solar energy is already at or near grid parity,9 and prices of solar photovoltaic panels (which make up approximately 50% of system costs) are falling on a month-to-month basis as manufacturing volumes increase consistently. Across the developing world, the promotion of both wind and solar projects is widespread across Asia, especially in India 7 Distributed generation (DG) refers to a system of generating power from a number of smaller energy sources rather than centralized large production sites. Some of the key advantages of DG include scalability and quick deployment of projects, diversification and security of energy sources, cost savings from reduced distribution losses, and cost savings related to lower investments in expensive high-voltage transmission infrastructure. Thus, DG is applicable not just as a source of energy for the main grid (as commonly used in developed countries) but also as a cost-effective solution for populations with unreliable or no electricity service, including in the case of local grids which are isolated from the main grid (typically due to geographical distances and to cost limitations of extending the main network). 8 Recent initiatives promoting the development of solar projects include inter alia: the European Union’s Strategic EnergyTechnology (SET) Plan and the Solar EuropeIndustry Initiative; the European PV Technology Platform’sImplementation Plan for Strategic ResearchAgenda; the Solar America Initiative (SAI); Japan’s PV roadmap towards 2030 (PV2030) andthe 2009 update PV2030+; China’s solar energy development plans; India’s Solar Initiative; Australia’s Solar Flagship Initiative; Feed-In-Tariff programs in Germany, Italy, Spain, and Canada; and state-level programs in the United States. 9 Grid parity for renewable sources of energy refers to a cost level which is competitive with the power grid retailprices (i.e. without the benefit of incentive programs and subsidies). 20 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE and China; but the adoption of renewables is broad-based, with examples such as: wind-powered water-pumping systems in Namibia and South Africa; programmes providing stoves to burn wood, charcoal, ethanol gel and liquid ethanol in Kenya, Mali, Ethiopia, and Tanzania; and solar water heating systems in South Africa. There has also been notable success in expanding rural electrification using distributed (or decentralised) systems in south and southeast Asia, particularly in India, Cambodia and Vietnam. In addition, countries like Malaysia and Indonesia have managed to successfully develop programmes for the production of biodiesel, thereby creating opportunities for new jobs and income streams.10 Fifth, Africans currently pay more for power than people in other developing countries, contrary to the perception of purchasing power so weak that additional energy supply cannot be supplied at an affordable price. In the power sector, higher costs are exacerbated by an over-reliance on diesel-powered generators (see table below) and high transportation costs for both diesel and kerosene. Thus, whereas tariffs in the range of US$0.50 per kWh are common across Africa, people in North America pay only S$0.12-0.17 per kWh while people in Europe pay only US$0.25-0.30 per kWh. That is, not only do Africans put up with a chronically deficient energy sector, but they tend to pay more for that unreliable service. Table 2 Africa’s high-cost infrastructure SubSaharan Africa Other developing regions 0.02-0.46 0.05-0.1 Water tariffs(US$/m ) 0.86-6.56 0.03-0.6 Road freight tariffs(US$/ton/km) 0.04-0.14 0.01-0.04 Mobile telephony(US$/3 min. call to US) 0.44-12.5 2.0 Internet dial-up service (US$/mo) 6.7-148.0 11 Power Tariffs(US$/kWh) 3 10 Examples for applications in the developing world are adapted from EUEI (2009, p. 8). 21 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Source: Africa Infrastructure Country Diagnostic, 2008. Note: Ranges reflect prices in different countries and various consumption levels. Prices for telephony and Internet represent all developing regions, including Africa. Moreover, unserved customers often end up having to use alternative sources of energy—such kerosene—with relatively higher prices than those that the public utility would need to charge to reach cost recovery, as high as four or five times in many cases.11 Poor households are only able to afford this by cutting back heavily on the quantity consumed, but with enhanced access to the electricity grid, even at cost recovery prices, these households would still be better off than they are today and they would continue to have the option of restricting consumption to keep their overall utility bills affordable.12 Taking Advantage of Solar Resources Solar energy has one key advantage over other renewable options in that this resource is more evenly distributed throughout the world. Furthermore, the amount of solar energy reaching a specific point on the earth over the year — solar irradiation — is known with a greater certainty than are wind or hydropower resources. Therefore, it is not necessary to spend 1-2 years collecting data before committing to a solar system (as happens, for example, with wind and hydropower).In Africa, the availability of excellent solar resources (see table below) and the falling price of solar photovoltaic panels makes solar photovoltaics a particularly attractive part of the solution for the current energy crisis.13 Solar Irradiation 2 (kWh/m /day) 6.21 6.18 6.80 6.34 3.98 3.18 Location Caluquembe, Angola Menongue, Angola Windhoek, Namibia Eldoret, Kenya Toronto, Canada Frankfurt, Germany 11 Across Africa, the stories of villagers having to pedal for hours to the nearest town to be able to plug in their cell phones are common. Typical fees for these services are in the range of $0.25-0.50 per charge, which immediately makes the market for electricity across Africa substantially more profitable than previously thought (there are currently some 125 million cellphone users across the continent). 12 For details, see Foster (2008, p. 14). 13 “Solar photovoltaic power is a commercially available andreliable technology with a significant potentialfor longterm growth in nearly all world regions.” (IEA, 2009). 22 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE In addition, 1. There is little variation in solar irradiation in Africa over the year, which makes solar energy an even better choice for a baseload than in northern countries, such as Canada and Germany. 2. Solar projects have a fast development and deployment cycle (not just in comparison to large centralized power plants but also in comparison with other forms of renewable energy). Thus, solar projects can quickly feed isolated power grids (which makes solar photovoltaics a significant part of a hybrid mini-grid design and deployment). 3. Solar technology is stable and ready for deployment, and with recent moves in developed countries to promote solar projects, the cost of solar equipment is falling quickly as economies of scale in manufacturing take hold. 4. Solar projects are perfectly scalable which ensures adaptation to local needs and even allows step-by-step implementation. 5. Solar projects provide an economic boost to the local economy, including by: local sourcing of installation racking, wiring, and other ancillary materials; using local labour for installation; training local electricians to service equipment; and training local solar engineers to design and manage projects. Attracting Private Sector Participation Given the competing needs for public fiscal resources, solving the current energy crisis in an expeditious manner would be facilitated by a system that attracts private sector participation. In this context, success depends on a number of issues related to project profitability and the regulatory regime.14 Although public utilities in Africa have typically found it difficult to earn sufficient economic returns to properly fund preventive maintenance and recurrent investment, the return on investment becomes a key consideration if private capital is to be mobilized. At a minimum, it is necessary to put in place a tariff regime that offers a reliable return over a time period sufficient to recover the capital invested. Typically, this means offering independent power producers a power purchasing agreement over 15 to 20 years, and it also means a predictable regulatory framework. Of course, the arrangement must be balanced, and it must thereforehave built-in provisions to allow for flexibility in the event of significant market changes or unintended consequences of 14 The discussion in this section is adapted from USAID (2011). 23 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE tariff or incentive schemes (to protect both parties from arrangements that become uneconomic over time).15 In many developing countries, debt financing may not be available due to the perception of risk by lenders (due to political or investment environments). In these cases, investment subsidies and guarantees can help to overcome the barrier of high initial investment costs for projects with longer horizons for investment returns. Such incentive programs can take the form of: a) feed-in-tariffs which reduce the uncertainty over revenue streams (as in the German and Canadian cases); b) subsidies for eligible investment costs (which are often in the range of 30-50% as in the case of Investment Tax Credits in the United States); or c) low interest loans, long-term loans, loan guarantees and partial risk guarantees and grants (also used in the case of Germany and some state-level programs in the United States). On the technical side, integration of distributed energy assets into existing energy systems requires adapting the existing system and creating a supporting framework. A policy that effectively reduces barriers for independent power producers should address inter alia: a) uniform technical standards for interconnecting distributed generation to the grid; b) rules eliminating or reducing barriers for entities to install and interconnect systems; c) publication of reliable data on sector performance and expansion plans; and d) interconnection rules, including related standards and procedures. Conclusion In the face of substantial unmet needs for electricity, the current sectoral strategy in Angola calls for production to nearly double to 5,505 GWh and household access to electricity services to more than double to 46%, by 2016. These ambitious targets are symptomatic of an energy crisis but also warranted based on the positive impact that increased access to electricity can have on quality of life. In the end, of course, a sustainable solution to the energy crisis in Angola requires a combination of approaches (including energy conservation through the use of LED lights, for example) and a diversified set of energy sources on the generation side 15 At the same time, any such change should be circumscribed within defined parameters that include mechanisms to measure progress toward agreed goals, to allow for maximum predictability and minimal investment risk. 24 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE (including taking advantage of significant solar resources over the short-run, and tapping into the significant potential for hydroelectric power over the medium-term). The low levels of electricity access and the lack of transmission infrastructure makes distributed generation a choice which immediately overcomes existing supply bottlenecks and avoids large infrastructure costs associated with high-voltage transmission and distribution (and with a centralized generation model). The development of renewable energy projects allows access to carbon credits as a source of financing; the local deployment of these technologies creates new jobs and business for domestic enterprises; the scalable nature of these technologies allows adaptation to local conditions and mitigates the environmental and financial risks associated with larger projects; and the ability to deploy quickly responds most effectively to the imperative for an immediate ramp-up in production and to the existence of isolated grids. In a nutshell, combining different sources of energy into a sustainable approach for a sustainable energy policy allows the provision of electricity services to underserved populations to take place at a much faster rate, and the appropriate moment to incorporate these alternative technologies into a coherent sectoral policy is precisely at the time that substantial investments in additional capacity are necessary. Renewable energy technologies are commercially available and technologically reliable and the price point is now at grid parity levels for sunnier locations such as most countries in sub-Saharan Africa. 25 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE References Davidson, O.,Chenene, M., Kituyi, E., Nkomo, J., Turner, C., and Sebitosi, B. (2006).Sustainable Energy in Sub-Saharan Africa. Available: http://www.icsuafrica.org/Resource_centre/ICSU%20ROA%20-%20Report%20I%20%20Sustainable%20Energy.pdf. Foster, Vivien (2008). Africa Infrastructure Country Diagnostic. Washington: World Bank. International Energy Agency (2006). ANGOLA: Towards an Energy Strategy. Paris: OECD. International Energy Agency (2009).Technology Roadmap: Solar Photovoltaic Energy. Paris, OECD. European Union Energy Initiative (2009). A Strategy for Introducing Renewable Energy Technologies in Angola. United Nations Environment Program (2010).Global Trends in Sustainable Energy Investment 2009. United States Agency International Development (2011).Encouraging Renewable Energy Development: A Handbook for International Energy Regulators. 26 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Critical gaps in maternal and newbornhealth services in the provinces of Luanda and Uíge in Angola Ingrid Hoem Sjursen (CMI) Abstract Access to, and utilization of, health services during pregnancy and child birth is crucial for the survival of both the mothers and theirnewbornchildren. According to the World Health Organization, most maternal deaths can be avoided if all deliveries are attended by health professionals and emergency obstetric care is available. Similarly, many newborns could be saved by provision of essential newborn care and early check-ups by health professionals or community health workers. Universal access to these services is therefore strongly recommended. Angola has some of the highest estimated maternal and child mortality rates in the world. In the National Health Policy adopted in August 2010, reduction of these rates is pointed out as one of the five main priorities for the country. More specifically, the policy aims to reduce under-five and infant mortality with 60%, and maternal mortality with 85%, by the end of 201316. We have assessed the availability of antenatal, delivery and postpartum services at 40 health facilities and the utilization of these services in 953 households in the Luanda and Uíge provinces. Our objective was to point to critical gaps in maternal and child health service delivery that the Angolan health ministry needs to address if they want to achieve the targeted reductions. The assessment was based on survey data collected in collaboration between Chr. Michelsen Institute (CMI) and Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) in 2010. For nearly all the indicators investigated, availability was found to be substantially poorer in rural than in urban areas. Utilization of services in the antenatal period was generally high, and the fraction of women attending four or more antenatal services is well above the regional average. However, few facilities offer Prevention of Mother To Child Transmission (PMTCT) services to HIV-positive mothers, and malaria services do not seem to be an integrated part of antenatal care in all facilities. We found that coverage of services is lowest at the time when women and newborns face the highest risk of mortality, namely during, and the first few hours after, delivery17. The situation is especially grave in rural areas where as few as 32% of women were attended by a 16 Reduction is measured in comparison to mortality data from 2000 (World Health Organization & European Union, 2010) 17 The Partnership for Maternal Newborn and Child Health (2010) 27 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE skilled health professional during their last delivery, and no facilities qualify as basic emergency obstetric and neonatal care providers. There is a serious shortage of oxytocin and antibiotics at facilities that offer delivery services and only half of the surveyed hospitals provide caesarean section. Availability and utilization of postnatal follow-up of mother and child is low, and not all facilities that offer delivery services are also offering newborn follow-up. Furthermore, coverage is worst for the most vulnerable parts of the population, i.e. those with the highest calculated under-five mortality and the poor. Our findings suggest that the following two interventions should be the main priorities for the Angolan health ministry in their efforts to reduce maternal and child mortality: 1. Increase skilled attendance at birth for women in rural areas 2. Increase availability of emergency obstetric and neonatal care services, especially in rural, but also in urban, areas Introduction In 2011, the worldwide estimate of under-five deaths was 7.2 million. About 40% of these deaths occurred during the first 28 days of life. Furthermore, roughly 270 000 women died from causes related to, or aggravated by, pregnancy(Lozano et al., 2011). Ensuring better access to, and utilization of, health services during pregnancy and child birth is crucial in improving the chances of maternal and newborn survival. Estimates of maternal and child mortality in Angola show some of the highest rates in the World(World Bank, 2011) and reductions are urgently needed. While improvement of social determinants of health such as poverty, sanitation, access to clean water and education are important measures in achieving such progress, the focus in this article is on health services. Reduction of maternal and child mortality is one of five main priorities in the National Health Policy adopted in 2010, and the health ministry is ambitiously aiming for a 60% reduction in under-five and infant, and 85% of maternal, mortality by 2013 (World Health Organization and European Union, 2010).We have chosen a range of antenatal, delivery and postnatal health services that are recommended as essential interventions for obtaining a reduction of maternal and child, especially newborn, deaths. Investigating the availability and utilization of these services and comparing it to recommendations given by the World Health Organization, enables us to point out gaps in Angolan health service delivery that needs urgent attention if the targeted reductions shall be achieved. A particular emphasis is put on urban-rural and wealthgroup differences because mortality is traditionally found to be higher in these subgroups of the population(Houweling and Kunst, 2010, Anyamele, 2011, Ssewanyana and Younger, 2008, Wang, 2003, Pandey, 1998). The data 28 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE We used data collected in collaboration between Chr. Michelsen institute (CMI) in Bergen and Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) in the provinces of Luanda and Uíge in 2010. 40 public health facilities (6 hospitals, 19 health centres and 15 health posts) were surveyed. In addition, onehealth worker was interviewed at each facility. Furthermore, 25 households residing in the catchment area of each of the facilities were queried on health service utilization, socioeconomic background variables and health outcomes. About one half of the chosen households were situated in close vicinity of the facility and the rest at locations of around 5 km removed. We use the term “closest public health facility” to refer to the facility that the households were chosen in the catchment area of, and measure availability of services by provision at this closest facility. While all households interviewed in Luanda are classified as urban, 60% of the Uíge-households in the sample are rural. In each province, three municipalities were chosen for the survey: Cazenga, Kilamba Kiaxi and Ingombota in Luanda, and Uíge, Quitexe and Puri in Uíge. The rest of the article is organized as follows. Firstly, the recommended essential antenatal services are presented and the availability and utilization of these are assessed. The same is done for delivery and postnatal services. We then compare the identified coverage with mortality risk for mothers and children over the continuum of care and poverty and calculated mortality is introduced into the analysis. In the last parts of the article, main findings are underlined and discussed before we make a short conclusion. Availability and use of antenatal services Antenatal care is provided to women during pregnancy and consists of several important components. First of all, women should be screened and treated for conditions like anaemia, sexually transmittable diseases, HIV infection and mental health problems, which are all associated with higher risk of complications during pregnancy. Secondly, complications with the pregnancy itself should be managed, and special attention should be paid to signs of pre-eclampsia. Thirdly, preventive measures including tetanus vaccine, de-worming, iron and folic acid and distribution of insecticide treated bed-nets, should be taken. Fourthly, advice on healthy behaviour at home and education on danger signs of complications should be provided. Furthermore, Prevention of Mother-To-Child Transmission (PMTCT) services should be offered to HIV-positive mothers. These interventions have a potentially large effect on the well-being and survival of mother and child, and the World Health Organization recommends that all women should have at least four antenatal consultations (ANC) containing the abovementioned services during pregnancy (World Health Organization, 2003, The Partnership for Maternal Newborn and Child Health, 2006).Furthermore, a recent study conducted in northern Angola found the prevalence of malaria among pre-school children to be as high as 18.4%(Sousa-Figueiredo et al., 2012). Malaria is closely linked to both maternal and child mortality. On the basis of a malaria survey conducted in Angola in 2006-2007, USAID estimates that malaria accounts for 35% of child, and 25% of maternal, deaths(USAID, 2007).Thus, prevention 29 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE of transmission, and treatment of infections, during pregnancy should receive particular attention in antenatal care in Angola. Based on the available data material and WHO recommendations, five indicators were chosen for important services in the antenatal period, namely whether the facilities offer ANC services, immunization of pregnant women, PMTCT and malaria services plus stock of anti-malarials. A service is regarded as available to the household if it is provided at the closest public health facility. As illustrated in figure 1, the overall availability is relatively high for both ANC and immunization of pregnant women. However, the differences in availability between urban and rural households are huge. While 89% of the urban households reside close to a health facility that offers antenatal services, this fraction is only 23% among rural households. The coverage of immunization services for pregnant women exhibits a similar pattern, but has a somewhat higher coverage with 96% for urban and 38% for rural households. None of the health facilities situated in rural areas offer PMTCT, and the share of facilities offering this service is only 25% in urban areas. More than 90% of facilities offer treatment of malaria, but the recorded share of facilities that had antimalaria drugs in stock is only 70%. The availability of drugs differs substantially between the urban and rural locations. Figure 1: Availability of antenatal services at the closest public health facility Comparing the share of households living close to a facility that offers ANC to the share who report to have attended ANC during the last pregnancy, we find that utilization is higher than availability, especially in rural areas. As many as 74% of the rural women reported to have attended four or more antenatal controls during their last pregnancy, compared to 23% having access at their closest public health facility. Thus, many women living in rural areas where the closest public health facility does not offer antenatal consultations seek these services at other facilities. The proportion of 30 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE women that received a tetanus vaccine during their last pregnancy is high; 93% and 82% in the urban and rural households, respectively. The fractions of women who were offered any treatment to prevent malaria and insecticide treated mosquito nets are smaller than for ANC-attendance and tetanus vaccination, indicating that malaria prevention is not a part of antental controls in all facilities. There is no data on HIVstatus and utilization of PMTCT-services. Figure 2: Utilization of antenatal services Critical gaps in antenatal services The overall picture of antenatal service coverage looks quite good, and the average attendance of four or more antenatal visits of 88% is well above the average in other developing countries (World Health Organization, 2012, Barros et al., 2012). However, fewer women residing in rural than in urban areas attended the four recommended antenatal visits. The availability of antenatal and immunization services for these rural women is very limited. Perhaps the most critical gap found was in the availability of PMTCT-services. None of the facilities in rural areas are offering services to HIVpositive mothers. Though the estimated prevalence of HIV/AIDS in Angola is currently below the sub-Saharan average (World Bank, 2011), the low coverage of PMTCTservices is worrying due to their important role in keeping the incidence rate. Provision of these services does not require advanced equipment and PMTCT should to be offered at all public facilities(The Partnership for Maternal Newborn and Child Health, 2011). We also found indications that malaria prevention is not an integrated part of antenatal controls in all facilities. Knowing that malaria accounts for a large fraction of maternal and child deaths, malaria prevention and treatment should be readily available at all facilities and for all pregnant women. Childbirth care services 31 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Labour, birth and the first few hours after delivery is the period with the highest risk of death for both mothers and their newborns. Availability and utilization of health services around childbirth is therefore of crucial importance to the survival of both. Attendance by skilled health personell is considered the single most important intervention in reducing maternal and neonatal mortality by the United Nations Populations Fund (2012a).About 15% of pregnant women develop obstetric complications, and in many cases these cannot be predicted in advance(World Health Organization, 2005, Women Deliver, 2009).Timely access to essential obstetric services is central for survival and wellbeing of these women. Consequently, UNICEF, WHO and UNFPA have identified a number of vital services, or signal functions, for the treatment of obstetric complications that can be used as a guide for assessing access to them. These are administration of antibiotics, oxytocics18and anticonvulsants, manual removal of placenta, removal of retained products, assisted vaginal birth, neonatal resuscitation, safe blood transfusion and caesarean section. Facilities that offer the first seven essential services are referred to as Basic Emergency Obstetric and Neonatal Care (BEmONC), and those who offer all nine are referred to as Comprehensive Emergency Obstetric and Neonatal Care (CEmONC), providers. We identified seven indicators of availability of childbirth services based on available information in the data, namely: delivery services, manual removal of placenta, removal of retained products, antibiotics in stock, oxytocin in stock, safe 19blood transfusion and caesarean section. Thus, we do not have any indicators of stock of anticonvulsants and neonatal resuscitation. When talking about basic and comprehensive emergency obstetric and neonatal care for the facilities in the sample, we refer to facilities that qualify according to the indicators we do have information about and not the whole set of signal functions as defined by the World Health Organization. The availability of delivery services and emergency obstetric care is far from universal in the sample. Only 45% of the interviewed women have access to delivery services at the closest public health facility, and the urban-rural differences are stark. In fact, availability is twice as high for urban, than for rural, households (54% vs. 25.5%).All facilities that offer delivery services also provide manual removal of placenta, and, with one exception, removal of retained products. However, only 67% of facilities offering these three services had antibiotics, and 39% oxytocin, in stock at the time of the survey. Differences in availability between urban and rural locations are large for all indicators. The data does not contain information about availability of anticonvulsants and neonatal resuscitation at the facilities, but based on the indicators we do have data on, only six (15%) of the facilities in the sample satisfy the requirements for being basic emergency obstetric and neonatal care providers. 18 Oxytocin is a hormone used in late stages of labour to induce contractions, and to prevent and treat postpartum haemorrhage 19 “Safe”: the facility always use blood from a blood bank 32 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Figure 3: Availability of delivery services and emergency obstetric care While health posts and health centres may be basic emergency obstetric and neonatal care providers, caesarean section requires such a level of skills and resources that it should only be performed in hospitals. However, complications that endanger mother and/or child and require delivery by caesarean section are expected to occur in 5 to 15% of all pregnancies. All facilities classified as hospitals should offer comprehensive emergency obstetric and neonatal care services including safe blood transfusion and caesarean section. The fact that only three out of six surveyed hospitals perform caesarean section is thus worrying. Furthermore, only two facilities provide blood transfusion with blood from a blood bank and in the whole sample, one single facility qualifies as a comprehensive provider, i.e. offers caesarean section and safe blood transfusion in addition to the basic emergency obstetric and neonatal care signal functions. In the sample, both skilled20 birth attendance and facility based delivery is recorded. Almost all women who delivered in a facility also reported to have been attended by a skilled health worker. We therefore only graph skilled attendance. 67% of the women interviewed were attended by a skilled health worker the last time they delivered. The difference in use between the urban and rural residence areas is large and much more pronounced than in use of antenatal services. In urban areas, the proportion of women attended by a skilled health worker is more than twice the proportion in rural areas (82% vs. 32%). In the urban households, the utilization of delivery services exhibits a similar pattern to ANC-attendance, in the way that that utilization is higher than the availability measured at the closest public health facility. 20 Here, a “skilled” health worker is a medical doctor, a nurse or a midwife in accordance with the United Nations Population Fund definition (2012). 33 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE For rural households, on the other hand, availability and utilization of delivery services is almost identical. Figure 4: Utilization of delivery services/skilled attendance Critical gaps in childbirth services The availability and utilization of childbirth services is markedly lower than for services in the antenatal category. Most critically, only 32% of women in rural areas reported to have been attended by a skilled health worker the last time they gave birth. The low utilization seems to be linked to availability to a much larger degree than antenatal services. This indicates that improvement of the availability should be part of policies aimed at increasing this fraction. In addition to low utilization and availability of skilled attendance at birth we also find that few facilities offer essential emergency obstetric services. Only one of the surveyed facilities qualifies for comprehensive and only six for basic, emergency obstetric and neonatal care status21. These are all situated in urban residential areas. The poor availability of emergency obstetric care is serious for the estimated 15% of pregnant women who are likely to need these services. However, most of the facilities that offer delivery services only lack oxytocin and/or antibiotics in order to qualify asbasic emergency obstetric and neonatal care providers. Improving access to these drugs in all facilities that offer delivery services will actually will increase the number of basic providers from six to seventeen. While this would be a significant improvement it should be noted that mostly urban households will benefit. Fifteen of seventeen potential new basic providers are situated in urban areas. Postnatal services Availability of health services shortly after child birth is important to discover and treat dangerous conditions, and to promote healthy behaviour. All mothers and newborns 21 Defined according to available indicators 34 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE should be thoroughly checked for warning signals after birth. The timing and number of check-ups is a much debated subject, especially when resources are scarce. PMNCH suggests that women who deliver in facilities should be assessed within one hour after birth and then once more before discharge, and that follow-up visits should be made at 2-3 days, 6-7 days and 6 weeks after delivery. In the case of home-birth, the women should be assessed during the first 24 hours. Follow-ups can take place either at a health facility or at home and be conducted by a skilled professional or community health worker (The Partnership for Maternal Newborn and Child Health, 2006). The overall coverage of follow-up services at the facilities is low, and at approximately the same level as delivery services. 45% and 48% of the women live close to a facility that offers follow-up of mothers and newborns, respectively. Again the geographical inequalities are large. In rural areas, 28%of facilities offer maternal follow-up, versus 53% in urban locations. For newborn follow-ups, the inequality is even larger: while 60% of facilities offer newborn follow-up in urban areas, only 20% of the rural facilities do so. Figure 5: Availability of postnatal services As was the case with antenatal services, we find that a larger fraction of women report to have been checked on within a week after birth, than the fraction of women who reside close to a public health facility that offers follow-up service. 45% of the facilities offer follow-up, whereas 60% of the women received a check-up after their last delivery. The same pattern is observed for newborn check-ups and for both urban and rural areas. 35 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Figure 6: Utilization of postnatal follow-up Critical gaps in postnatal services The availability of postnatal services is poor, particularly in rural areas.Many lives could be saved by postnatal check-ups and they should be seen as a natural continuance of childbirth services. Still, not all facilities that offer delivery services provide follow-up consultations as well. Coverage and mortality risk We have now identified some critical gaps in the availability and utilization of health services during and after pregnancy and delivery. Paradoxically, the coverage in rural areas seems to be at its worst when the mortality risk for mothers and children is at its highest. While this is not uncommon for countries with high maternal and child mortality, (see for example the most recent countdown report by the WHO(World Health Organization, 2012)), it has important implications for health priorities. The risk-coverage disparity is illustrated in the figure below, where rural availability and utilization of ANC, delivery and postpartum services are displayed together with mortality risk for mothers and children over the continuum of care. The graphing of mortality risk is only for illustrative purposes and the main point here is to show that the risk varies over the cause of time, from the antenatal to delivery and the postnatal period22. Risk curves displayed here should therefore not be interpreted as mortality estimates, or as a quantitative size. As illustrated, mortality risk can be described by a curve shaped as an “inverse u” with lower risks before and after birth and a sharp peak around the time of birth. 22 The graphed mortality risks are based on Figure 2 presented in The Global Campaign for the Health Millennium Development Goals report, Innovating for Every Woman, Every Child (2011). 36 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE The columns in the figure show that, while the availability in rural areas is very low for all three categories, the utilization of services displays the almost completely opposite pattern of mortality risk. In the antenatal period when risk is relatively low, the utilization of services is very high. Around delivery, the risk is almost doubled, but the utilization of delivery services is less than one third of the utilization of antenatal services. In the postnatal period where risk (at least maternal) decreases, utilization increases. This pattern is not as strong for urban households. There, availability of services display a pattern converse to the risk, but at higher coverage levels, and utilization is decreasing from antenatal care to delivery services and from delivery services to postnatal services. Figure 7: Mortality risk, availability and utilization over the continuum of care, rural households23 Figure 7 clearly provides a rationale for health authorities to prioritize improvements in the availability and the utilization of skilled and facility based deliveries. Though antenatal care and postnatal services are also important components in a holistic approach towards reducing mortality, delivery services should receive particular attention in this effort. Coverage, wealth and calculated child mortality The coverage of maternal and child services is also poorer in the most vulnerable subgroups of the population. We constructed a wealth index by application of principal component analysis to data on household asset ownership, the building material of the roof, the walls and the floor of the house the family is living in, and land ownership. The index was subsequently used to divide the households into wealth quintiles. The 23 Utilization of delivery services is measured by proportion of women who attended four or more antenatal visits, utilization of delivery services is measured by proportion of women who delivered in a facility and postnatal utilization is measured by the fraction of mothers who were checked upon within a week after delivery. 37 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE figure below depicts distribution of availability of delivery and basic emergency obstetric and neonatal care along with the share of women who delivered in health facilities between the five wealth groups. For all indicators except manual removal of placenta, there is a clear socioeconomic gradient in access to, and utilization of, services. Coverage of services is generally increasing in wealth quintiles. The differences are most striking for utilization; almost three times as many women were attended by skilled personnel among the wealthiest 20% of households compared to the poorest 20%. This finding is in line with other empirical work. In a recent study,Barros et al. (2012) analyse data from 54 developing countries (Angola not included) developing countries and assess inequalities in a number of maternal and child health interventions. They find large variation in coverage between wealth quintiles, and skilled birth attendance shows the highest inequality. While the estimated average coverage of skilled attendance in these countries is almost identical to our estimate for the lowest wealth quintile, the coverage for the other wealth groups is substantially better in our sample. However, the distribution is more uneven than for the average of the other 54 countries. Figure 8: Availability of delivery and emergency obstetric care, and utilization of skilled attendance by wealth quintiles The poor are more likely to be exposed to disease-causing agents such as contaminated water and poor sanitation, hygiene and housing conditions and have deficient knowledge about disease prevention and treatment. Because they are more often malnourished and in worse health, the poor are also more likely to fall ill when exposed to these risk factors. They are thus expected to have a greater need of health services than the better off(Barros et al., 2010). 38 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE That the poor do in fact have worse health outcomes in the sample is illustrated in figure 8 below. Based on information about the number of children born and the number that deceased before reaching the age of one and five, we calculated household mortality rates per thousand children born alive for the households in the sample. As the survey did not follow all children until they reached the age of five, our estimated mortality rates are not comparable with conventional measures such as those presented in the World Development Indicators. They are, however, useful for comparison between subgroups in the sample. The figure depicts under-five and infant mortality rates for the wealth quintiles and shows a clear socio economic gradient in the calculated mortalities in the sample. For both children under-five and infants, mortality is clearly highest in the two poorest quintiles, decreases in the middle quintile, and, somewhat surprisingly, increases for the second richest quintile before decreasing again in the richest quintile. Figure 9: Child mortality by wealth quintiles Having both the worst access and the worst health outcomes, it is obvious that improving health services among the poor should be a priority for the health ministry if they wish to obtain reductions in maternal and child mortality. Summary of findings and discussion We have now pointed out several critical gaps in maternal and newborn health service delivery in the provinces of Luanda and Uíge. While the utilization of antenatal services (four or more visits) is actually well above the regional average for Sub-Saharan Africa, we found availability to be very poor in rural areas. There was also a severe lack in availability of PMTCT services, and despite malaria being endemic in Angola, not all mothers were offered malaria prevention during antenatal controls. Perhaps the most alarming finding is the low share of women who were attended by a skilled health professional during delivery in rural areas. The availability of emergency obstetric and neonatal care is low in both urban and rural locations: only six of the 39 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE forty surveyed facilities qualified as basic, and one as comprehensive, providers defined by available indicators. We also found severe shortage of oxytocin and antibiotics. The availability and utilization of postnatal check-ups for mother and newborns is found to be low, especially in rural areas, and not all facilities that provide delivery services also provide follow-ups. In addition to the identification of services that have particularly low availability and utilization, we also found that the coverage is worse for some subgroups of the population, namely the households residing in rural locations and the poor. These groups also had worse health outcomes in terms of child mortality. When taking a closer look at the distribution of wealth quintiles between urban and rural areas, we find that as many as 93% of the rural households are grouped in the two poorest wealth quintiles. Thus, improving coverage for rural households is almost equivalent to improving coverage for the poor. We also took a closer look at the distribution of the type of the closest public health facility between wealth groups and residential area. Not surprisingly, none of the rural, and thus almost none of the poorest, households had a hospital as their closest public health facility. A health centre was the closest public health facility for 60% of urban, and 18% of rural, households, and a health post was the nearest public health facility for more than 80% of rural households. The low observed coverage of services in rural areas could, at least in part, be explained by this finding because health posts are at the lowest level of care and usually provide a smaller range of services and have less skilled staff than health centres and hospitals. These findings, combined with knowledge about the distribution of mortality risk for mother and child during the continuum of care, suggest that the interventions that are likely to have the largest impact on mortality rates are:1) Increasing the coverage of skilled attendance at birth, and 2) Improve availability of emergency obstetric care among the poor, i.e. at health posts in rural areas. Though our findings might tempt us to conclude that the low utilization of delivery services and skilled attendance at birth is caused by poor availability of services, there are some indications that this is not the whole truth. All women who reported that they did not give birth in a health facility were asked why not. As much as 29% stated reasons that had nothing to do with availability, namely “More comfortable at home” and “Tradition”. In order to get these women to give birth in health facilities, it is probably not enough to improve the availability of services. For instance, health facilities could make better efforts to make women feel comfortable giving birth there and allow families to follow birth traditions at facility premises. Informing women and their local communities about the advantages of facility based deliveries could also be a means to induce higher utilization. That being said, 23% of women state “long travel distance” as the reason for not giving birth at a health facility and this shows that 40 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE availability is also part of the problem. 42% answered “Other” as their reason. Thus a large part of the explanations are exempted from our knowledge. Concluding remarks Our findings show that there is an urgent need for improvement in maternal and newborn health service delivery in the surveyed provinces, espescially among the rural poor where child mortality is highest and the coverage is worst. Skilled attendence is among the interventions with the lowest utilization, and emergency obstetric care is among the ones with the poorest availability. At the same time, these are highlighted by The Partnership for Maternal Newborn and Child Health (2006)as the interventions with the greatest potential for saving lives. As mentioned in the introduction, the Angolan health policy adopted in 2010aims at reducing under-five and infant mortality by 60% and maternal mortality with 85% (baseline year 2000) by the end of year 2013(World Health Organization and European Union, 2010). Based on our findings, increasing the share of women in rural areas that have access to and utilizeskilled delivery and emergency obstetric servicesstands out as the most important task for the Angolan health minstry in this respect. The challenges in acheving this are plentiful: scarsity of human resources, poor infrastructure, shortage of medical equipment and drugs and more. Policymakers and health professionals should work jointly to find out how these challenges can be surmounted. However, even in the case that efficient policiesare made and successfully implemented, the targeted 60% and 85% reductions in child and maternal mortality are not likely to be achieved by 2013. Though our results indicate that health policies should put a particular emphasis on skilled attendance and emergency obstetric care, antenatal and postnatal services remain important components, and should be a part of a holistic approach to the improvement of maternal and neonatal health. How then should the availability and the utilization of services among the worst off groups be improved? Because most of the rural poor have health posts as their closest facility, a possible solution is to expand the range of services offered there. 41 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Literature Anyamele, O. D. 2011. The Role of Wealth in Infant Mortality in Sub-Saharan Africa Within Urban and Between Urban and Rural Areas. International Journal of Economics and Reserach, 2, 73-81. Barros, A. J. D., Ronsmans, C., Axelson, H., Loaiza, E., Bertoldi, A. D., França, G. V. A., Bryce, J., Boerma, J. T. & Victora, C. G. 2012. Equity in maternal, newborn, and child health interventions in Countdown to 2015: a retrospective review of survey data from 54 countries. The Lancet, 379, 1225-1233. Barros, F. C., Victoria, C. G., Scherpbier, R. & Gwatkin, D. 2010. Socioeconomic inequities in the health and nutrition of children in low/middle income countries. . Rev. 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World Health Organization & European Union 2010. Plano Estraregico do Sistema de Informação Sanitária(SIS), Segundo Rascunho. Luanda. 43 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Alves da Rocha Economista e Professor Associado da Universidade Católica de Angola Director do Centro de Estudos e Investigação da UCAN Introdução Começo a minha reflexão sobre o tema em epígrafe com uma afirmação lapidar de Albert J. Dunlap sobre a essência da empresa num regime capitalista de economia de mercado – evidentemente diferente dum outro de capitalismo de Estado, em vigor na China e que quase passou despercebido na ex-União Soviética –: “a empresa pertence às pessoas que nela investem – e não aos empregados, aos fornecedores, nem à comunidade onde está instalada”. Declaração forte e radical do que é o capitalismo – o único sistema económico até hoje implantado e que tem mostrado uma extraordinária capacidade de transformação e regeneração interna e de ajustamento às crises e turbulências várias, políticas e sociais – e a economia de mercado. Na perspectiva de Dunlap, os empregados, os fornecedores, os clientes, o Governo e os representantes da comunidade – esta, provavelmente, um dos vectores de destrinça entre responsabilidade económica e responsabilidade social das empresas: a sua capacidade de inserção nas comunidades e de inter-agir com elas e com os seus elementos24 – não devem interferir nas decisões tomadas pelos verdadeiros decisores, isto é, os que investem na empresa. Os verdadeiros decisores, que são os investidores, têm, não só, o direito de encerrar a empresa e despedir os seus trabalhadores, como declarar inválidos e irrelevantes quaisquer postulados que tais pessoas possam fazer sobre o modo como gerem a mesma25. Como disse, trata-se duma visão restritiva do que deve ser hoje a empresa, em contextos modernos, democraticamente envolventes e participados e competitivos. Seguramente que existem outras formas de governar as empresas a que Peter Drucker tão abundantemente se refere26. Dentre as mesmas avultam as relacionadas com a 24 Como polemizarei mais adiante: as empresas devem ou não agir em favor do combate à pobreza, enquanto situação que diminui o rendimento e o consumo das famílias (perspectiva económica) e indignifica as pessoas e lhes afecta o ego (ponto de vista moral e cristão)? 25 Evidentemente que existem leis que estabelecem os limites do despedimento e encerramento das suas actividades. 26 Os gestores das empresas devem ter um papel e responsabilidade para além da função de maximização do lucro, para incluir reclamações e interesses de grupos não accionistas. 44 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Responsabilidade Social das Empresas e os seus defensores contestam a viabilidade de avaliação económica isolada duma empresa e a curto prazo. Em vez disso, uma avaliação mais ampla, de longo prazo, englobando todas as operações da empresa27. Definição de Responsabilidade Social (Teoria da Responsabilidade Social das Empresas?) Existem pontos de vista defensores duma teoria da Responsabilidade Social das Empresas (RSE). Não irei tão longe. No entanto, ao longo dos tempos, o conceito de RSE (responsabilidade social das empresas) tem sido expandido, esquecido e reintroduzido por um grande número de académicos, activistas e especialistas de economia de empresa. Prefiro, porém, quedar-me por percorrer alguns pontos de vista sob os quais a RSE pode ser polemizada e começar por perguntar: responsabilidade sobre o quê e com quem? E quem exige que as empresas sejam responsáveis para com a sociedade? Não é suficiente a responsabilidade que assumem perante os seus accionistas? Com efeito e para os evangelistas do mercado, a primeira prioridade da empresa é produzir bens e serviços que a sociedade quer e precisa, num quadro estratégico de maximização do lucro individual. Onde meter a responsabilidade social? Na interdependência entre negócios e sociedade na busca duma envolvente estável entre necessidades individuais e necessidades colectivas? Entendi curial reflectir sobre duas dimensões da responsabilidade social das empresas e tentar fazer a ponte entre elas. O ponto de vista moral Aparentemente este ponto de vista pode coincidir com a ética dos negócios, com a lealdade de intenções face a parceiros e a terceiros, o fornecimento de bens e serviços dentro de normas de qualidade e de respeito das preferências dos consumidores, a publicidade não enganosa. Deste ângulo de análise, a responsabilidade social empresarial é a dedicação contínua da empresa a comportamentos éticos, contribuindo para o desenvolvimento económico e melhorando as condições de vida dos trabalhadores e das suas famílias, assim como das comunidades em que estão inseridas. 27 Adivinham-se contornos do que mais tarde Michael Porter veio a denominar “cluster”. 45 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE A componente moral da responsabilidade social exige que os negócios se façam com honestidade, seriedade e sinceridade e no respeito dos compromissos assumidos. Igualmente determina que não se tenham salários em atraso e se paguem as remunerações do trabalho de acordo com os contratos assinados28. Um ponto particular: porque se pede que as empresas se comportem com responsabilidade social e a mesma postura não é exigida às pessoas ricas? Estas classes possidentes afectam somas consideráveis a gastos de extravagância e sumptuosidade privadas29. Estes cidadãos e classes sociais distanciam-se da imensa maioria da população, em vez de a ajudarem na caminhada para uma prosperidade comum. Uma sociedade harmoniosa caracteriza-se pela democracia, pelo imperativo da lei, pela equidade, pela justiça, pela sinceridade, pela amizade e pela vitalidade. O ponto de vista económico (é muito difícil separá-lo do ponto de vista social) Os empresários e as empresas são quem devem operar a melhor combinação produtiva dos factores de produção, com diferentes finalidades: maximizarem os retornos dos investimentos, poupar recursos escassos (e, por isso e em alguns casos, caros) e acautelar uma repartição justa do rendimento gerado no decurso do exercício da actividade produtiva. Percebem-se elementos sociais nesta função económica do empresário. Assim como se adivinham zonas de contradição e conflito entre a função económica das empresas e o que desejavelmente deveria ser a sua função social. E uma delas é quando por razões de eficiência (poupança de recursos) e de maximização de lucros as combinações factoriais favorecem o capital (e as suas diversas componentes) em desfavor do trabalho, optando-se, portanto, por processos de produção intensivos em tecnologia e capital. Observada do ponto de vista da empresa, a RSE pode ser entendida como parte da gestão de risco, isto é, tomando diferentes medidas 28 O caso, tão divulgado, da Empresa Nacional de Pontes – empresa pública – e dos atritos e conflitos entre Direcção e trabalhadores quanto às relações laborais e os salários atrasados de quase um ano é um claro mau exemplo de responsabilidade social das empresas, com a agravante desta empresa ser completamente pública, portanto o Estado não se apresenta como tendo uma postura com responsabilidade social. 29 Ver Revista Sábado de Setembro de 2011 sobre as extravagâncias dos ricos de Angola. 46 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE estratégicas para assegurar a sobrevivência da empresa no futuro previsto. Isto faz parte da responsabilidade dos gestores para com os accionistas e a melhor maneira de o fazer é lutar por um modelo operacional que crie valor para todos os stakeholders, que, de outra maneira, poderiam, no longo prazo, tornar a empresa vulnerável. A criação de emprego pode ser, provavelmente, a mais importante responsabilidade social das empresas e dos empresários, embora seja a consequência económica natural da constituição de actividades produtivas. Não se pode iniciar uma qualquer acção produtiva sem que na combinação dos factores entre o trabalho. Marx dizia que o capital mais não é do que trabalho cristalizado, significando que a origem essencial do processo de produção – capitalista e não capitalista – é o trabalho. Mas que tipo de emprego? Claro que as empresas não são centros empregadores tout court. Não o podem ser, porque também têm a responsabilidade social de acautelar uma racional alocação de outros recursos e factores escassos. Empregando por empregar, as empresas desperdiçam capital, escasso sobretudo em economias em desenvolvimento ou subdesenvolvidas. Então a questão passa a ser: criar bons empregos em que o empregado se sinta útil a si, à sua família e à sociedade em geral. Para isso faz-se mister que a força de trabalho seja bem dotada de educação e de conhecimentos técnicos. De quem é esta responsabilidade económica e social em simultâneo? É evidente que não se pode ilibar o Estado e as suas instituições da responsabilidade de criar as condições para a existência de empregos bons e úteis. Até que ponto a flexibilidade salarial e a livre mobilidade sectorial e territorial da força de trabalho, reclamadas pelas estratégias empresariais em nome de mais racionalidade e lucros privados, prejudica a sua função e responsabilidade social? Liberalizar o mercado de trabalho e promover a flexibilidade dos salários provoca efeitos perversos sobre a sociedade, as comunidades e os cidadãos. O pagamento de impostos é claramente uma responsabilidade económica das empresas, como, de resto, de todos os cidadãos. Todas as Constituições do mundo referem a obrigatoriedade de pagamento de impostos como universal, se bem que sempre ajustada às diferentes 47 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE capacidades tributárias de agentes, empresas e pessoas, em nome da justiça tributária. No entanto, a transferência, a título gratuito, de alguns recursos financeiros empresariais para o Estado pode ser, igualmente, uma responsabilidade social das empresas, embora estas apenas actuem como intermediárias num processo de transformação de dinheiro privado em bens públicos, cuja satisfação compete, por inteiro, ao Estado. Coloca-se, portanto, o Estado como o agente a quem compete a tarefa de gerir bem e com critério, em nome do interesse público, recursos financeiros privados, colocados à sua disposição a título gratuito pelos cidadãos e empresas, para a satisfação de necessidades colectivas. Quase que se pode afirmar que os impostos são uma parceria público-privada, com finalidades muito específicas e concretas. Mas a responsabilidade social, assumindo feições e modalidades materiais, pode ser uma forma de escamotear a fuga e a evasão fiscais da parte das empresas: cumpre-se uma determinada responsabilidade social a troco de pagamento de impostos mais baixos. Ou então, compram-se descontos fiscais com responsabilidade social, o que não deixa de ser um contra-senso, perdendo todo o carácter de responsabilidade social. As Escolas de Pensamento sobre a Empresa e a sua Responsabilidade Social Será que existe diferença entre responsabilidade económica e responsabilidade social? Que escolas de pensamento fazem referência a esta “coligação” e colocam a empresa como um instrumento da realização de certos objectivos sociais? Oskar Lange considera a empresa como a célula básica da actividade económica, com responsabilidade de dinamizar a economia e promover uma adequada utilização de recursos produtivos escassos. Então, deste estrito ponto de vista, a empresa e o empresário devem garantir que essa alocação de factores se faça da forma mais eficiente. A empresa aparece, assim, como uma espécie de guardião dos recursos de cuja utilização tem de prestar contas à sociedade, no sentido de garantir o equilíbrio inter-geracional. Da afirmação anterior adivinha-se, já, o sentido social que as empresas têm de ter quando em causa está lidarse com recursos, factores e outras utilidades que são pertença colectiva. Ou seja, são autênticos bens públicos. Será que esta perspectiva não colide com os princípios de maximização do lucro, expresso por diferentes equações de equilíbrio microeconómico? 48 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Joseph Schumpeter atribui ao empresário uma responsabilidade económica tremenda, ao colocá-lo no centro do processo de crescimento económico capitalista e como actor principal das mudanças estruturais. O núcleo principal destas transformações este economista austríaco, mais tarde naturalizado americano, coloca-o na destruição criadora, uma sucessão de avanços e recuos da e na capacidade criativa durante a qual as inovações acontecem em catadupa, em vários domínios: produtos, processos, mercados, organização, fontes de matérias-primas, etc. Foi Schumpeter quem pela primeira vez falou em empreendedorismo. O grande actor deste processo seria o entrepreneur, empresário inovador que conseguia a maximização dos lucros pela via da busca incessante pela inovação.30 A Escola neo-clássica (Milton Friedman, Thomas Sargeant), como seria de esperar, adopta uma posição muito circunscrita quanto às responsabilidades da empresa, na senda, aliás, das considerações e posições de Albert Dunlap. A escola neo-clássica defende que as únicas responsabilidades sociais das empresas são a criação de emprego e o pagamento de impostos, em nome da defesa da maximização do valor para os accionistas e está reflectida na frase de Milton Friedman: “poucas tendências destruiriam os fundamentos duma sociedade livre como a aceitação, da parte dos gestores, de outras responsabilidades sociais que não sejam as de fazer tanto dinheiro quanto possível para os seus accionistas”31. Este ponto de vista defende, portanto, que os gestores e as empresas são responsáveis somente perante os respectivos donos. A Escola neoliberal ou das expectativas racionais (Robert Lucas, Paul Rommer, Robert Barro e Robert Solow), apesar da carga negativa que, aparentemente, a sua designação comporta, tem uma posição mais moderna e abrangente da função e da responsabilidade social da empresa. Na verdade, os seus defensores apontam que a adopção de políticas de responsabilidade social pelas empresas é racional e lucrativa no longo prazo (em alguns casos no curto prazo), porque estas políticas atraem procura e factores de produção, como o trabalho e o capital. A empresa move-se, em todos os mercados, por incentivos e segurança e os gestores procuram retornos positivos dos empregados, dos 30 Mário Murteira – Os Batoteiros do Grande Casino, Crónica, África 21, Setembro 2011. 31 Friedman, Milton – Capitalism and Freedom, University of Chicago, 1962. 49 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE consumidores e dos investidores, enquanto evitam os riscos duma intervenção governamental, necessariamente perversa e negativa, duma exposição adversa aos media, duma queda nas bolsas de valores e de boicotes. A Escola da Responsabilidade Social Empresarial ou modelo dos stakeholders (R.E. Freeman, J.J. Brummer) defende que as empresas são responsáveis para com todos os intervenientes na sua actividade, quer se localizem dentro das suas instalações e fazendo parte da respectiva configuração orgânica e organizacional, quer estejam no seu exterior como elementos e participantes da comunidade em geral. A responsabilidade social cria externalidades positivas – em termos de segurança dos consumidores, protecção ambiental e satisfação dos empregados – que as empresas individuais podem não ser capazes de apropriar ou internalizar nas suas decisões de investimento. A Escola do Terceiro Sector, ao contrário das iniciativas lideradas pelas empresas ou pelo Governo, elegem o denominado terceiro sector (ONG, associações empresariais e sindicais, igrejas, fundações, universidades, etc.) como o motor da responsabilidade social das empresas. O Terceiro Sector identifica-se com a sociedade civil e as suas instituições procuram influenciar as decisões políticas, sem serem parte do Governo ou estarem fortemente ligados aos empresários e investidores. Preenchem, igualmente, um papel educacional importante, informando os consumidores, as empresas e os políticos, porque são a charneira entre governo, empresas e comunidades. A Condições de Funcionamento das Empresas em Angola para o Asseguramento da sua Função Social O que é que se deve dizer acerca das empresas em Angola neste quadro da responsabilidade social? Não creio existir uma estratégia público-privada de responsabilidade social empresarial em Angola, assumida e declarada. Provavelmente nem teria de haver, atendendo à circunstância de os procedimentos e comportamentos sociais das empresas poder/dever corresponder, afinal, a uma atitude, mais ou menos, natural da sua parte. Como se sabe, coexistem dois universos diferentes: o das empresas angolanas e o das empresas estrangeiras (mesmo que com a capa de empresas de direito angolano e com parceiros locais os seus efeitos sobre a economia nacional são diferentes dos do primeiro grupo). 50 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Não existe uma estatística fiável quanto ao número de empresas estrangeiras a operarem em Angola. Utilizando o ficheiro do CEIC pode estimar-se este conjunto empresarial em 532 empresas estrangeiras, cabendo a Portugal a maior percentagem (37,6%), logo seguido pela China (18,8%). Admitindo que neste universo se encontram as empresas estrangeiras petrolíferas, diamantíferas e de construção, cálculos grosseiros podem apontar para um controlo de perto de 60% do PIB nacional. Uma preocupação a este respeito relaciona-se com as consequências sobre a independência económica do país, quando percentagem tão elevada da riqueza nacional, criada anualmente, é controlada por empresas estrangeiras, cujas estratégias dependem dos centros transnacionais de decisão, podendo, consequentemente, não ser coincidentes com as estratégias de crescimento nacionais. Uma outra preocupação relaciona-se com as linhas de crédito postas à disposição das empresas estrangeiras pelos respectivos países de origem. Mesmo nos casos em que os contratos entre os dois Estados considerem a possibilidade de as empresas angolanas poderem aceder aos envelopes financeiros, a grande fatia é, sempre, reservada às empresas estrangeiras e as empresas angolanas, mesmo que se juntem, em parcerias, às estrangeiras, acabam por deter uma posição sempre minoritária, para não dizer subalterna. A terceira linha de preocupação é do domínio do conhecido spillover effect. Normalmente espera-se que, mesmo nos casos em que não se constituam parcerias, se provoque um efeito-imitação (efeito-demonstração ou efeito de arrastamento ou ainda efeito contágio) sobre as empresas nacionais em diversas áreas, tais como, gestão, inovação, melhoria da qualidade da força de trabalho, visão estratégica, conquista de quotas do mercado externo, etc. Até que ponto as 532 empresas estrangeiras estão contribuindo para a melhoria da qualidade estratégica das empresas angolanas? Que atitude têm as empresas estrangeiras quanto à abertura às empresas angolanas dos seus acervos de gestão e planeamento estratégico, incluindo as inovações? Valem as considerações anteriores para especificar o seguinte: Os dois grupos de empresas não estão em igualdade de circunstâncias, sendo as estrangeiras muito mais competitivas do que as angolanas, devido aos apoios dos respectivos países, de que as linhas de crédito são apenas um deles. 51 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE A responsabilidade social, em situações de desníveis tão acentuados de condições de exercício da actividade privada, tem de se estender para além dos aspectos relacionados com a criação de emprego e outros referidos nos parágrafos anteriores: a partilha de inovação e de estratégias e modelos de gestão acaba por ser uma responsabilidade social das empresas estrangeiras para com as angolanas. E há um outro elemento que reforça esta minha asserção: o ambiente de negócios – a que me vou referir de imediato – acaba por não afectar da mesma maneira as empresas angolanas e as empresas estrangeiras, porque estas são beneficiárias das políticas e estratégias de internacionalização aplicadas pelos governos dos seus países de origem. Em última instância, a responsabilidade social das empresas angolanas e das empresas estrangeiras tem, afinal, de ter contornos diferentes e mover-se em planos distintos. Para o asseguramento da sua função social, a função económica tem de estar garantida, no sentido de que a base material das empresas é o suporte para a sua contribuição para a realização de determinados objectivos sociais gerais. Mas também pode antever-se que sopesando-se a vertente social, as empresas podem tirar proveitos económicos significativos, particularmente em termos de produtividade do trabalho e de visibilidade comunitária, esta com influência no aumento do consumo privado. Qual o quadro de exercício da função económica das empresas em Angola: será que permite às empresas ganhar dinheiro? Ou de outro modo: realizar lucro?32 Os factores macroeconómicos exercem uma grande influência sobre o processo tomada de decisões microeconómicas. Ambientes caracterizados por excesso instabilidade actuam perversamente sobre as motivações empresariais, levando agentes económicos a preferirem o imediato e o especulativo, em detrimento estruturante e mais prospectivo. de de os do Um estudo incidente sobre as principais queixas dos empresários conduziu ao quadro seguinte. A INFLUÊNCIA DOS FACTORES MACROECONÓMICOS NAS DECISÕES EMPRESARIAIS FACTORES MACROECONÓMICOS PONDERAÇÃO 32 Ganhar dinheiro e realizar lucro são duas coisas diferentes, mesmo na estrita óptica do modo de produção capitalista. Os verdadeiros empresários – os entrepreneurs, na perspectiva de Schumpeter – sabem muito bem do que estou a falar. 52 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Acesso ao crédito bancário é complicado e difícil 95 Acesso difícil às divisas 90 Inflação interfere negativamente nas decisões 90 Oscilações do mercado cambial são prejudiciais 87 Direitos de propriedade com efeito negativo nas decisões 95 Restrictividade da política comercial afecta negativamente 57 Leis laborais afectam negativamente as decisões 68 Sistema fiscal tem incidência negativa 85 ÍNDICE AFECTAÇÃO DAS DECISÕES EMPRESARIAIS 83,4 Verifica-se que para os empresários privados os factores macroeconómicos que transmitem maior instabilidade às decisões microeconómicas são o acesso ao crédito, os direitos de propriedade33, a inflação, e o mercado cambial. Os direitos de propriedade são já uma velha questão34 e enquanto permanecer como tal inviabilizará que os activos físicos detidos pelos agentes económicos se possam transformar em capital35. O acesso ao crédito e as elevadas taxas de juro são, semelhantemente, um constrangimento apresentado pelos empresários para o funcionamento normal da actividade privada e que necessita de uma abordagem, pelas autoridades monetárias do país, mais audaz e consequente com as necessidades de reconstrução e desenvolvimento. A inflação e a instabilidade dos preços são apontadas como relevantes pela esmagadora maioria dos empresários privados, enquanto elemento fustigador das decisões empresariais. Um outro factor, igualmente muito reclamado pelas associações empresariais, reportase ao sistema fiscal vigente, considerado excessivamente penalizador da formação das 33 Numa nota endereçada pela AIA ao Ministro das Finanças e datada de 22 de Outubro de 2001 era referenciada a privatização rápida do pequeno sector imobiliário, com as correspondentes escrituras, como um factor importante para que o empresariado nacional pudesse usá-lo como capital no recurso aos financiamentos bancários e institucionais. Até hoje pouco ou nada se fez em conformidade. 34 Que não se esgotam, nem por ela serão integralmente resolvidos, na Lei de Terras vigente. Sublinhe-se que a questão das terras pode vir a ser o próximo grande conflito no país, devido aos constantes atropelos de que as famílias camponesas são vítimas quando pretendem reocupar terrenos ancestrais. 35 Uma correctíssima e interessante abordagem deste tema é feita por Hernando de Souto em “O Mistério do Capital- Porque o capitalismo funciona nos países desenvolvidos e fracassa no resto do mundo”. 53 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE poupanças empresariais necessárias para constituírem e agregarem o seu autofinanciamento. Em síntese, os factores macroeconómicos podem afectar negativamente, em média, 83,4% das decisões empresariais. Mas existem outros factores, comuns a muitos países africanos36: …desta forma, criar um ambiente propício (business friendly) ao desenvolvimento de um sector privado forte e diversificado à atracção de investimento privado é uma tarefa primordial, …a reactivação do sector produtivo nacional é vital para a criação de emprego, redução da pobreza e regresso de deslocados à regiões de origem (rural e urbana) e, consequentemente, para a estabilidade social e económica destes países37, …incentivar o investimento privado com o fito de promover o empowerment dos mais pobres, …as condições em África para o exercício da actividade empresarial são prejudicadas por várias situações: elevado custo de se fazer negócios em África (fragilidades dos sistemas legal, judicial, financeiro e laboral, às regulamentações burocráticas e administrativas e à corrupção associada), reduzida qualidade das infraestruturas e das tecnologias de informação e comunicação, má gestão e instabilidade macroeconómica, risco de recuo das políticas económicas, fraqueza do sector manufactureiro. A estabilidade dos preços costuma ser apontada como um dos factores de maior relevância para o crescimento, o desenvolvimento e, mesmo, a redução da pobreza. Não é, portanto, por acaso que todas as economias do mundo lhe dedicam medidas de política económica muito concretas38. Em Angola, a situação está espelhada no gráfico seguinte. 36 Fátima Roque – A África, a Nepad e o Futuro, Texto Editores, 2007. 37 Em quanto as empresas angolanas e estrangeiras têm colaborado neste desígnio social e também político? Com quanto emprego e investimento colaboraram as empresas para o processo de regresso dos deslocados de guerra às suas origens? 38 Para quem estiver interessado nesta problemática da correlação inflação/crescimento consultar o artigo de Michael Bruno intitulado “A Inflação Desacelera Realmente o Crescimento?”, Finanças e Desenvolvimento (revista do FMI e Banco Mundial), Setembro de 1995. 54 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Algumas Manifestações de Responsabilidade Social das Empresas Conforme referi no parágrafo três, existe uma escola de pensamento que defende claramente a prática da responsabilidade social empresarial, numa concepção completamente abrangente da actividade da empresa, da sua inserção na comunidade e do seu relacionamento com os stakeholders. Algumas manifestações de responsabilidade social das empresas, diferentes – quiçá específicas – das identificadas como fazendo parte da sua função económica: Formação integral das pessoas, desenvolvendo as suas habilidades técnicas, pessoais e sociais, nas áreas económicas mais portadoras de futuro e visando qualificar as pessoas das comunidades para o mercado de trabalho. Preservação da natureza e do ambiente, recorrendo a técnicas e processos de produção respeitadores dos equilíbrios ecológicos e fazendo os investimentos necessários para tornar os detritos produtivos mais consentâneos com a capacidade natural de os regenerar. Contribuições materiais e imateriais para a mitigação de situações sociais de catástrofe ou de desequilíbrios demográficos resultantes de deslocações de população por influência da guerra. Angola já esteve numa situação destas e todo o esforço adjacente para facilitar o regresso dos cidadãos aos seus locais de origem foi acomodado pelo Orçamento Geral do Estado. 55 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Fomento de parcerias com Universidades para o fomento da investigação científica e apoio a projectos que visam estudar e conhecer as realidades económicas, sociais, históricas e culturais do país. Apoio a acções que contribuam para a transparência económica e financeira das instituições públicas e privadas. Actividades relacionadas com o turismo sustentado (respeitador do ambiente e utilizador, em larga escala, dos recursos e factores nacionais e, particularmente, locais): tendo em conta as características intrínsecas ao desenvolvimento da actividade do turismo sustentado, o líder deste tipo de projectos é denominado empreendedor social 39. A Encíclica de Bento XVI: Caridade Na Verdade Um tema e uma reflexão incontornáveis na abordagem da responsabilidade social das empresas: a encíclica Caridade na Verdade de Bento XVI40. O desafio social que se coloca às empresas está muito para além (beyond) duma mera responsabilidade social, no sentido mais estrito do termo, tal como anteriormente descrito. Ou seja: a responsabilidade social empresarial pode não ter como foco essencial e determinante o interesse social, os problemas sociais, a pobreza, afinal. A responsabilidade social empresarial pode ser, finalmente, interesseira: atingir determinados objectivos sociais das comunidades com a finalidade de se melhorar o clima de realização de lucros empresariais, individuais. A provocação de Bento XVI abala os princípios da economia de mercado – sem evidentemente cair em considerações de tipo marxista, socialista ou comunista – e questiona sobre qual deve ser a verdadeira função do lucro empresarial. Trata-se dum repto no sentido de se encontrar um novo paradigma da economia de mercado41 – capitalista na sua essência e, portanto, individualista –, já não assente no lucro individual/empresarial, mas num lucro social: a decisão de investimento e escolha de actividades deixa de se basear na eficiência marginal do capital de Keynes (ou taxa interna de rendibilidade), mas numa taxa social de retorno, que leva em devida boa conta as condições de repartição da renda e de vida das populações. Estão as empresas preparadas para esta nova responsabilidade social? 39 Ricardo Zózimo: O Empreendedor Social em África – Oportunidades para o Desenvolvimento da Comunidade Local através do Turismo Sustentado, Caderno de Estudos Africanos, Centro de Estudos Africanos – ISCTE, nº 11/12, Dezembro 2006/Junho 2007. 40 Frei Luís de França (Professor Universitário na UCAN): Caridade na Verdade – Uma Sinfonia Teológica, Revista Lucere, Ano VI, nº 7, Junho de 2011, UCAN. 41 Se esta inovadora proposta papal, de cunho essencialmente moral, tiver alguns fundamentos científicos, seguramente que os laureados com o Nobel da Economia vão tentar construir uma nova axiomática da economia de mercado e, então, nada será como dantes. 56 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Vale a pena seguir – lendo – o artigo de Frei Luís de França e reter o que de essencial tem em matéria de descrição e interpretação da encíclica papal Caritas in Veritate de Bento XVI: “A caridade na verdade significa que é preciso dar forma e organização àquelas iniciativas económicas que, embora sem negar o lucro, pretendem ir mais além da lógica da troca de equivalentes e do lucro como fim em si mesmo”. “Caritas in Veritate é um princípio à volta do qual gira a Doutrina Social da Igreja, princípio que ganha forma operativa com critérios orientadores da acção moral, como a justiça e o bem comum”. “ O princípio de gratuidade e a lógica do dom como expressão da fraternidade podem e devem encontrar lugar dentro da actividade económica normal. Isto é uma exigência do homem no tempo actual, mas, também, da própria razão económica. Trata-se de uma exigência simultaneamente da caridade e da verdade”. A introdução do princípio da gratuidade na lógica de funcionamento duma economia de mercado é que constitui o grande desafio para a reflexão teórica da Ciência Económica. Não é a obtenção do bem-estar social (ou nacional) enquanto resultado eventualmente secundário do exercício duma actividade empresarial/individual – o exemplo de circuito económico e da realização da função social pela actividade individual dada por Adam Smith na Riqueza das Nações é absolutamente fenomenal –, mas de incorporar na lógica das decisões empresariais de afectação de recursos e factores de produção o princípio (a exigência?) de caridade. Ou seja, a partilha social do lucro empresarial já não se fará apenas ex-post (através da responsabilidade social das empresas ou do pagamento de impostos ao Estado e da correspondente satisfação das necessidades colectivas), mas tem de estar incorporada nos mecanismos e nas regras de funcionamento da economia de mercado, uma economia individualista por essência. O empresário de Joseph Schumpeter – inovador, empreendedor, aceitador do risco e individualista – tem de se transformar, ou pelo menos incorporar elementos novos, num empresário social, onde o principal critério de alocação de recursos escassos (por vezes alheios) é o bem-estar da comunidade e dos seus cidadãos: “… o desenvolvimento económico, social e político precisa, se quiser ser autenticamente humano, de dar espaço ao princípio da gratuidade, como expressão de fraternidade”. 57 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Para os empresários e as empresas que se consideram capazes duma responsabilidade social, a leitura da Encíclica Papal Caritas in Veritate é absolutamente obrigatória (podendo aí encontrar exemplos de actos e actividades de responsabilidade social). No mínimo, a leitura do artigo do Frei Luís de França é fortemente recomendada. 58 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ROQUE, Fátima Moura – África, a Nepad e o Futuro, Texto Editores 2007. FRANÇA, Frei Luís de – Caridade na Verdade: Uma Sinfonia Teológica, Revista LUCERE nº 7, Junho de 2011, Universidade Católica de Angola. ZÓZIMO, Ricardo – O Empreendedor Social em África: Oportunidade para o Desenvolvimento da Comunidade Local através do Turismo Sustentado, Centro de Estudos Africanos, ISCTE, Cadernos de Estudos Africanos nº11/12, Dezembro de 2006/Junho de 2007. TIAGO, Virgínia Tiago – Os Empreendedores Chineses e o Processo de Transformação Económica na China, Centro de Estudos Africanos, ISCTE, Cadernos de Estudos Africanos nº11/12, Dezembro de 2006/Junho de 2007. SANTOS ANTÓNIO, Nelson – Economia e Gestão Chinesas, Aspectos Fundamentais, Editora Sílabo, 2008. FRIEDMAN, Milton – Capitalism and Freedom, University of Chicago, 1962. MURTEIRA, Mário – Os Batoteiros do Grande Casino, Crónica, África 21, Setembro 2011. 59 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Algumas questões para repensar o futuro de Angola42 Adelino Torres Professor Catedrático Jubilado do Instituto Superior de Economia – Universidade Técnica de Lisboa Antigo Secretário-Geral da Sociedade Cultural de Angola e redactor do Jornal ABCDiário de Angola em 1961 e director da revista “Episteme-Revista de Epistemologia e da História das Ciências e das Técnicas da Universidade Técnica de Lisboa”. Repensar o futuro de Angola é porventura a tarefa mais importante e difícil com que os angolanos se deparam na antevisão do pós-guerra. Porém, em termos de acção concreta, a realização de quaisquer projectos só será exequível depois de preenchidas pelo menos duas condições sine qua non: uma paz durável e a consolidação de um Estado de direito garante de um processo democrático efectivo. É igualmente indispensável não esquecer que a reconstrução do país depende (pondo de lado condicionalismos externos) tanto da visão e estratégias dos dirigentes nacionais e dos respectivos partidos políticos, como da capacidade de intervenção da chamada “sociedade civil”. Desde logo, uns e outros terão futuramente que redefinir espaços de convergência e de regulação de tensões tendo em conta direitos e deveres de cidadania à face da lei. É importante observar igualmente que, falando de “democracia” em Angola, não estou de modo algum a sugerir que esta só pode resultar da transposição de organizações e de instituições43 que existem noutras partes do mundo. Se tais modelos podem e devem ser analisados sem preconceitos, nada impedindo que Angola deles recolha o que tem merecimento (não se inventa a roda todos os dias), também nada obsta a que se proceda a adaptações que se revelem adequadas em função da realidade local, coisa que, demasiadas vezes, os países africanos têm negligenciado desde as 42 Texto apresentado oralmente no Colóquio “E Depois da Guerra Que Futuro Para Angola” a propósito das comemorações do 24º aniversário da independência de Angola, realizado pela Casa de Angola (Lisboa) em 11 e 12 de Novembro de 1999. Este artigo foi igualmente publicado na Revista Afroletras. 43 É necessário distinguir “organizações” de “instituições”. A questão da economia institucional é uma das mais actuais na análise do desenvolvimento. Vd. Douglass C. North, Institutions, Institutional Change and Economic Performance, Cambridge University Press, , 1993; Geoffrey M. Hodgson, Economia e Instituições, trad. port., Lisboa, Celta, 1994; John Harriss et al. (Ed. by), The New Institutional Economics and Third World Development, Londres, Routledge, 1995. 60 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE independências. É evidente que a democracia, enquanto tal, é um processo dinâmico que não se restringe aos instrumentos que a servem. A liberdade não é incompatível com a existência de um Estado forte e prestigiado, desde que a sua acção pressuponha uma “good governance” tal como esta é entendida internacionalmente. É certo que a construção do Estado-nação em África é uma tarefa particularmente árdua que se defronta com múltiplas tensões ou disfuncionalidades (étnicas, linguísticas, culturais) onde não é fácil encontrar os pontos de convergência44. Mas não há motivos para pensar que esse obstáculo seja intransponível, e menos ainda para aceitar passivamente um qualquer “afropessimismo” nihilista que nenhuma razão profunda justifica nem, no campo oposto, um igualmente ilusório “afrocentrismo” gerador de frustrações ainda mais perigosas45. Admitindo preenchidas as pré-condições enunciadas pelos dois postulados (paz e democracia), será talvez então possível debater questões prioritárias, nomeadamente as mais imediatas para a reconstituição do tecido económico e social da nação. Não tenho, bem entendido, a pretensão de cobrir no curto espaço deste artigo a globalidade das problemáticas com relevância para essa reflexão, tanto mais que, independentemente da dificuldade própria a cada uma delas, todas se inscrevem numa sistémica feita de complexidade, onde o conjunto não resulta necessariamente da soma das suas partes. Essas limitações, bem como o seu carácter parcelar, cerceiam o alcance analítico destas notas que entendo apenas como pontos sucintos para discussão ulterior. Uma primeira questão condiciona (e é condicionada por) todas as outras: o desenvolvimento. Este está articulado com o conceito de “crescimento”, mas ultrapassa-o na medida em que não se trata apenas de um parâmetro quantitativo (produto nacional bruto per capita, por exemplo) mas de uma noção complexa onde estão presentes elementos de ordem qualitativa nem sempre fáceis de definir46. Para muitos, o motor do desenvolvimento é a industrialização, o que explica o empenho dos governos africanos em enveredarem por estratégias de industrialização ditas de “substituição de importações” que, se fizermos o balanço das últimas décadas, foram, em termos de desenvolvimento, geralmente mal sucedidas. 44 Cf. Jean-François Bayard, L´État en Afrique, Paris, Fayard, 1989; GEMDEV, Les avatars de l´État en Afrique, Paris, Karthala, 1997 45 Stephen Howe, Afrocentrism: Mythical Pasts and Imagined Homes, Londres, Verso, 1999. 46 Vd por exemplo Partha Dasgupta, An Inquiry Into Well-Being and Destitution, Oxford. Clarendon Press, 1993. 61 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Esse fracasso tem várias razões: as estratégias de industrialização por substituição de importações (ISI) foram tomadas como “um fim em si mesmo” em vez de serem encaradas como “um meio”. Essa obstinação foi altamente gravosa para os países africanos, como o tinha sido para a América Latina. Por outro lado as ISI foram acompanhadas por políticas económicas incongruentes, entre as quais taxas de câmbio sobrevalorizadas, políticas aduaneiras desajustadas, recurso constante ao endividamento externo, abandono da agricultura, etc. Por fim faltou-lhes uma integração regional (as comunidades económicas existentes desde 1975 continuam quase letra morta) sem a qual o desenvolvimento da maioria dos países africanos é um empreendimento praticamente inviável47. Em contrapartida, as actuais propostas das instituições de Bretton Woods, relativas ao abandono da ISI, ao estrito cumprimento das regras do comércio internacional e à aplicação da chamada “estratégia de promoção de exportações” (EPE), ou seja a adopção radical de um liberalismo económico, não parece ser, a curto e médio prazo, inteiramente realista no caso angolano. É certo que Angola terá, de qualquer modo, de proceder a uma verdadeira reconstrução do aparelho industrial. O problema consiste em saber a que filosofia esta deve obedecer. Se está obviamente excluído repetir os erros da “velha ISI”48, também não parece haver outra alternativa senão a de voltar a atribuir (mas noutros moldes) um papel activo ao Estado. Com a diferença porém que qualquer nova política económica desse tipo deverá ser considerada como um meio transitório, rigorosamente definido por limites temporais e objectivos que, se possível, recolham o consenso internacional. É inevitável que a metodologia a aplicar deverá recorrer à utilização de investimentos estrangeiros. Mas nada impede que o Estado angolano tenha aí também um papel “regulador” (por exemplo escolhendo os sectores prioritários e zelando pela boa execução desses investimentos). Embora simplificando bastante, poderíamos dizer que o que é importante não é tanto a denominação que se dará à nova estratégia a escolher (se escolha houver!), mas sim a sua filosofia e a maneira como será aplicada para atingir, dentro de um prazo determinado (suponhamos, apenas para fixar ideias, 47 Vd. Robert J. Berg e Jennifer S. Whitaker, Statégies pour un nouveau développement en Afrique, trad. fr., Paris, Economica, 1999; e sobretudo o notável Philippe Hugon, l´Economie de l´Afrique, Paris, La Découverte, 2ª ed. 1999 (uma tradução em português será publicada ainda em 1999). 48 Vd Manuel Ennes Ferreira, Indústria e guerra (Angola, 1975-91), Lisboa, Cosmos, 1999 62 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 5 anos), o objectivo último: a consolidação e diversificação da economia angolana por forma a que a abertura se faça em condições razoáveis de competitividade. Esse compasso de espera entre o fim da guerra e a liberalização permitiria assegurar, de maneira lógica, uma transição minimamente adequada aos desafios colocados pela inserção de Angola na economia dita “global”. O provável desaparecimento da Convenção de Lomé e o estabelecimento de novas regras ditadas pela Organização Mundial de Comércio, mostram bem a urgência do problema e até que ponto estão ultrapassadas as ilusões de autarcia nacionalista. Outro erro a evitar seria de concentrar a orientação desenvolvimentista exclusivamente na ideia de “industrialização”. Num país em que a maioria da população é rural, a agricultura é um vector fundamental desse mesmo desenvolvimento (entendendo o conceito no sentido amplo). Por sua vez os resultados nesses dois sectores dependem em grande medida da formação profissional e, de modo geral, da importância que o Estado atribuir à educação. É indispensável qualificar os trabalhadores, dar uma formação apropriada a futuros empresários, preparar funcionários competentes ao serviço de uma administração eficaz, dispor de quadro técnicos, etc. É claro que todas as acções não podem ser levadas a cabo ao mesmo tempo e com a mesma intensidade. O crescimento é inevitavelmente “desequilibrado”49, havendo que proceder a escolhas de “geometria variável” por assim dizer. Admitindo a hipótese de uma calendarização por períodos de 5 anos (como já disse o prazo indicado é meramente exemplificativo) não parece absurdo consagrar uma fatia importante do orçamento de Estado à educação, e dentro desta, privilegiar fortemente, durante o primeiro quinquénio, o ensino primário e a formação profissional (o que supõe a instalação de uma rede de escolas primárias e de reciclagem profissional em todo o país). Aumentar-se-iam progressivamente, durante os períodos seguintes, as percentagens do orçamento aplicadas ao ensino secundário, ao ensino superior politécnico e finalmente ao ensino universitário. Note-se a esse propósito que a ideia da expansão do ensino primário já foi objecto em 1962 de um plano em grande escala concebido e corajosamente executado pelo antigo Secretário Provincial da Educação de Angola, Amadeu Castilho Soares: “Levar a escola à sanzala”. O plano era tão ousado que deu origem à posterior destituição pura e simples deste 49 Relembram-se as velhas polémicas dos anos 60, nomeadamente os trabalhos de Albert O. Hirschman; Vd. igualmente William K. Tabb, Reconstructing Political Economy, Londres, Routledge, 1999 63 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE alto funcionário e ao seu afastamento da carreira universitária., para além de uma perseguição mesquinha de que foi vítima durante anos50 Com as adaptações naturalmente justificadas pela evolução dos tempos, este plano poderia ainda hoje inspirar uma acção de grande envergadura no ensino primário de Angola. Tal procedimento não significaria o abandono desta ou daquela área: ele ilustra apenas, repito, uma escolha pragmática de prioridades e uma variação de intensidade de investimento ao longo do tempo. A metodologia não se concentra, tão pouco, numa estratégia de satisfação de “necessidades básicas”, embora estas devam merecer, desde o primeiro momento, a maior atenção do governo. No essencial, é necessário não perder de vista que se é imprescindível ocupar o mais rapidamente possível um espaço em todas as vertentes do desenvolvimento, a faixa da “terceira revolução industrial” 51 não deve nem pode de modo algum ser excluída (nem sequer esperar), na medida em que constitui uma condição fundamental da adaptação do país aos desafios da modernidade, sem a qual o retrocesso parece inevitável. Um problema urgente que não pode deixar de preocupar as autoridades é a estrutura das carreiras públicas e a sua dignificação. Neste capítulo, parece aconselhável a maior prudência. Mais vale, talvez, avançar “por pacotes”, aplicados por fases calendarizadas e previamente explicadas à opinião pública angolana. Por exemplo, num primeiro tempo, proceder à elaboração de estatutos de carreira e remuneratórios (método indiciário) na Defesa, Segurança, Magistratura, Educação e Saúde. Os critérios de escolha destes cinco sectores, embora discutíveis e de ordem diferente, procuram colmatar deficiências básicas, atenuando, ao mesmo tempo, tensões corporativistas potencialmente ameaçadoras num tecido social fragilizado. Escusado será dizer que os pontos anteriores dependem de uma reforma em profundidade da moeda e das finanças do país. Sobre este e certos outros aspectos reenvio para a leitura do importante artigo de Jorge Costa Oliveira, - o melhor especialista português em matéria de cooperação económica com África - “A interacção entre a política e a economia (Angola e Guiné-Bissau)”, recentemente publicado52. Poderíamos citar ainda exemplos como: a criação de uma nova moeda, ligada ao euro e com uma taxa de câmbio realista, uma reforma completa do sistema 50 Vd. em: Jornal ABC-Diário de Angola (Luanda) de 17 de Setembro de 1962; Boletim Oficial de Angola-Conselho Legislativo, Acta da sessão, 4 de Novembro de 1963, p. 2345; A Província de Angola (Luanda), 22 de Junho de 1964; A Província de Angola (Luanda), 13 de Abril de 1964; A Província de Angola (Luanda), 19 de Abril de 1964; A Província de Angola (Luanda), 16 de Janeiro de 1969; Diário Popular (Lisboa), 15 de Agosto de 1969; Silva Cunha, O Ultramar, a Nação e o “25 de Abril”, Coimbra, Atlântida, 1977, pág. 103. 51 Vd por exemplo Manuel Castells, L´ère de l´information, 3 vols, trad. fr., Paris, Fayard, 1999. 52 Revista Cadernos de Economia (Lisboa, Ordem dos Economistas), nº de Julho-Setembro 1999, pp. 32-43) 64 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE financeiro em termos de receitas (sistema tributário) e de alocação das despesas, etc. Para ser breve, diria que se impõe a adopção de uma política global de “ajustamento estrutural”, esclarecendo todavia que tal “ajustamento”, diferentemente dos programas do Fundo Monetário Internacional demasiadamente subordinados à óptica financeira dos equilíbrios de curto prazo, terá que acentuar significativamente o esforço consagrado ao sector social sem que isso signifique “aumento de rendimentos” (em numerário) das categorias socioprofissionais mas, tão só, investimentos nos sectores imediatamente mais carentes como os que atrás foram referidos. Com efeito, seria dificilmente suportável, após mais de vinte anos de guerra consecutivos e calamitosos, impor às populações novos sacrifícios sem que elas pudessem usufruir de, pelo menos, contrapartidas imediatamente “visíveis” (apoios ao poder de compra, cuidados de saúde, transportes, escolarização das crianças, etc.). Quanto aos investimentos propriamente ditos, este devem ser direccionados criteriosamente: no apoio prioritário à criação de micro-empresas e PME, o qual está estreitamente ligado à formação e reciclagem de um corpo empresarial nacional e de trabalhadores especializados; no enquadramento do investimento directo estrangeiro, que beneficie não só de um código de investimentos favorável, mas sobretudo de um sistema tão desburocratizado quanto possível onde os procedimentos administrativos sejam reduzidos ao mínimo (se assim não for o código de investimentos de pouco valerá, seja qual for o seu grau de liberalidade teórica). A agricultura também deverá ser objecto de medidas de incentivo especiais, quer na agricultura de exportação, a qual, contrariamente a um preconceito ainda vivaz, não é necessariamente incompatível com a alimentar53, quer na pequena agricultura “doméstica”: criação de cooperativas, encorajamento da livre iniciativa, instalação de uma rede de agências bancárias de fomento de preferência à banca comercial clássica que se tem revelado inoperante em todo o continente como o atesta o desenvolvimento informal das “tontines”54 na África ocidental, etc. Finalmente, a par destas medidas viradas para a economia interna, é imperativo cuidar dos aspectos que, em termos económicos e políticos, favoreçam uma melhor implantação de Angola no âmbito internacional, entre os quais: integração regional na SADC, estreitamento das relações com a União Europeia, preparação para as “ondas 53 Vd. o belo livro de Serge Michaïlof, Les apprentis sorciers du développement, Paris, Economica, 1984. 54 Uma “tontine” é uma associação cujos aderentes colocam em comum as suas cotisações e recebem, cada um por sua vez, por sorteio, empréstimos sobre a poupança assim acumulada. As “tontinas” desenvolveram-se para fazer face à impossibilidade de acesso ao sistema bancário, mas, para lá da sua actividade financeira, contribuem para a socialização e criam solidariedades. Vd. Bruno Lautier, L´économie informelle dans le Tiers Monde, Paris, La Découverte, 1994. 65 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE de choque” geradas pelos acordos da Organização Mundial de Comércio e pelo eventual desaparecimento da Convenção de Lomé, modernização e diversificação do aparelho produtivo. Analysis of Interest Rates and Inflation in South Africa Albertina Delgado Economist Assistant Lecturer at UCAN Master student at CLSBE Introduction In this paper I pretend to explore how interest rates and inflation relate with each other by applying some time series methods of analyses that was given during the course. In this way the paper will do the analyses between the interest rate and inflation rate in South Africa. South African economy is the biggest in Africa and relatively more diversified than the other countries. The interest rate in South Africa was recorded at 8.4% in the last quarter of 2011, historically, during the period of apartheid the interest rate was averaged at 10.2% and from 1994 to 2011(period after the apartheid), it reaching an average of 11.43%. But the inflation behaves in the opposite way, in the last quarter of 2011 was at 6.3%, during the period of apartheid the inflation rate was averaged at 9.09% and after it reaches an average of 6.07%. 66 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE In order to be possible to do the analyses, data have been collect in quarterly from the period of 1958 to 2011 and it was organized in stata. The sample in this case is composed by 216 observations. This assignment will be analysis of the interest rate and inflation behavior by using considerable tests, which the final goal is to check if it is possible to cointegrate these variables as an Autoregressive Distributed Lag (ADL) model type. Output Estimation Firstly, we compute the estimation for the interest rate model and then afterwards we apply the same procedures to estimate an inflation model and see if it acceptable or not to cointegrate these two variables. Interest Rate Model (1) This variables stand for: IR t represents the interest rate in period t; IRt-1 represents the interest rate in period t-1; . reg IR IRlag1 Source SS df MS Model Residual 3218.80373 81.9684976 1 213 3218.80373 .384828627 Total 3300.77223 214 15.4241693 IR Coef. IRlag1 _cons .9833477 .193426 Std. Err. .0107521 .1218232 t 91.46 1.59 Number of obs F( 1, 213) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE P>|t| 0.000 0.114 = 215 = 8364.25 = 0.0000 = 0.9752 = 0.9751 = .62035 [95% Conf. Interval] .9621536 -.0467074 1.004542 .4335593 According to the output, it is possible to verify that IR t-1 is a highly significant variable since we reject the null hypothesis of non-significance for any significance level (pvalue = 0.000 <α=5%). Moreover, the estimation coefficient for IR t-1 (ρ =0,9833477) is approximately to one, which arises suspicion about the presence of unit roots in the model. 67 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE . corrgram IR, lags(20) LAG 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 AC 0.9820 0.9597 0.9404 0.9249 0.9087 0.8929 0.8789 0.8634 0.8508 0.8371 0.8238 0.8133 0.8047 0.7967 0.7840 0.7670 0.7440 0.7206 0.6977 0.6762 PAC 0.9833 -0.1927 0.1432 0.0990 -0.0578 0.0553 0.0518 -0.0971 0.1801 -0.1170 0.0546 0.1668 -0.0512 0.0318 -0.1548 -0.1628 -0.1863 -0.0261 -0.0106 0.0522 Q 211.2 413.84 609.33 799.34 983.63 1162.4 1336.4 1505.2 1669.9 1830.1 1986 2138.6 2288.8 2436.8 2580.8 2719.3 2850.3 2973.8 3090.1 3200 Prob>Q -1 0 1 -1 0 1 [Autocorrelation] [Partial Autocor] 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 In the Auto Correlation (AC) function is important to state that it shows a slow decay in the trend, revealing some persistency behavior, since it takes a while for the values to revert to zero (the AC it is decreasing gradually its values as the number of lags increases). The 1º lag assume values very close to one (ρ =0.9820), which suggests that it may be following a highly persistent AR (1) process with a non-stationary unit root. Moreover, the Partial AC function is also very close to one for the 1º lag and very close to zero for the others lags. This fact reinforces even more our previous suspicion. Another test that is relevant to refer is the Ljung-Box Q-statistic which allows testing if there is presence of a white noise process in the model: H0: H1: All lags are not auto-correlated (independently distributed) not independently distributed Where α stands for the covariance between the error terms ( , automatically the null hypothesis is rejected because P-value (Prob>Qcolumn) is less than any critical level, which indicates that this series show a significant autocorrelation. The rejection of the null means that there is not a white noise process in the model, namely, the condition is not satisfied. In addition, it is also important to understand the best fit for the model, i.e., it should avoid become over fit in order to diminish errors in the forecasts due to the increase number of lags. Therefore, it is possible to conduct several tests that help to define the proper number of lags to include in the model, such as: Akaike’s Information Criterion (AIC), Schwarz’s Bayesian Information Criterion (SBIC) and the Hannan and Quinn 68 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE . varsoc IR, maxlag(4) Selection-order criteria Sample: 1959q1 - 2011q4 lag 0 1 2 3 4 LL LR -588.91 -200.048 -195.989 -193.787 -192.736 Endogenous: Exogenous: Number of obs df p FPE AIC 1 1 1 1 0.000 0.004 0.036 0.147 15.2918 .39386 .382656 .378342 .378161* 5.56519 1.90612 1.87726 1.86592 1.86543* 777.72 8.1182 4.4042* 2.1023 = HQIC 5.57159 1.91891 1.89645 1.89151* 1.89743 212 SBIC 5.58102 1.93778 1.92475* 1.92925 1.9446 IR _cons information criterion (HQIC). The decision is based on the fact that typically models with lower SBIC/AIC/HQIC are preferred. In this hand, it is observed that all the test statistic diverge with each other in terms of a unanimity conclusion. Accordingly with Oscar Torres-Reyna, “in the context of VAR models, that AIC tends to be more accurate with monthly data, HQIC works better for quarterly data on samples over 120 and SBIC works fine with any sample size for quarterly data (on VEC models)”. Thus, the decision was made by choosing the SBIC test that is valid for all types of samples, which suggests an application of a lag 2 in the IR model. The model of interest rate with 2 lags (2) This variables stand for: IR t represents the interest rate in period t; IR t-1 represents the interest rate in period t-1; IR t-2 represents the interest rate in period t-2; . regress IR IRlag1 IRlag2 Source SS df MS Model Residual 3191.77729 78.881372 2 211 1595.88865 .373845365 Total 3270.65867 213 15.355205 IR Coef. IRlag1 IRlag2 _cons 1.174638 -.192673 .2044655 Std. Err. .0675389 .0672608 .1209979 t 17.39 -2.86 1.69 69 Number of obs F( 2, 211) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE P>|t| 0.000 0.005 0.093 = 214 = 4268.85 = 0.0000 = 0.9759 = 0.9757 = .61143 [95% Conf. Interval] 1.0415 -.3252623 -.0340541 1.307775 -.0600838 .4429851 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE The increase number of lags had positive impact over the model specification since the R2 and the Adjust R2have also increased. This means that the proportion of the variation in the dependent variable can be better explained in this regression with second lag than in the first with one. Furthermore, the variables are significant since we reject the null with a significance level of 5% (α =0.05) and the F test indicates that the model is global significant. In order to verify the presence of non stationarity in the parameters it will be perform a unit root test (the Dickey-Fuller test).However, the Dickey-Fuller (DF) test is sensitive to the presence of autocorrelation in the error terms. Consequently, if that situation verifies than the DF test is no longer valid and it needs to perform the Augmented Dickey-Fuller(ADF) test. Thus, it was performed the regression of the errors and computed all of the tests to verify this situation and after that it will be performed the DF test for the parameters. Regression of residuals of the model number (2) (3) This variables stand for: ei represents the error term of model 2 (with 2 lags); represents the error term in period t-1; represents the error term in period t-2; . regress ei eilag1 eilag2 Source SS df MS Model Residual 1.15604907 77.7035022 2 209 .578024533 .371787092 Total 78.8595513 211 .373741949 ei Coef. eilag1 eilag2 _cons .031193 -.1179689 .0010529 Std. Err. .0686957 .0687385 .0418774 t 0.45 -1.72 0.03 Number of obs F( 2, 209) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE P>|t| 0.650 0.088 0.980 = = = = = = 212 1.55 0.2137 0.0147 0.0052 .60974 [95% Conf. Interval] -.1042324 -.2534786 -.0815033 .1666183 .0175409 .0836092 Test of autocorrelation in the residuals To test for autocorrelation in the residuals it is necessary to perform the BreuschGodfrey test. Still, it is only possible to perform this test with presence of conditional Homoskedasticity. Hence, it was computed the Breusch-Pagan test, as it is seen below, which indicates that the null hypothesis of constant variance is rejected, meaning that the model has presence of Heteroskedasticity. So the errors should be corrected by using the robust standard errors for the performance of other tests. 70 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE . estat hettest Breusch-Pagan / Cook-Weisberg test for heteroskedasticity Ho: Constant variance Variables: fitted values of ei chi2(1) Prob > chi2 = = 21.77 0.0000 Since the model has Heteroskedasticity, the Breusch-Godfrey test will no longer be applied. Instead, an alternative test of Durbin-Watson(DW) will be used: H0: Absence of serial correlation H1: Serial correlation . prais ei eilag1 eilag2, vce(robust) Prais-Winsten AR(1) regression -- iterated estimates Linear regression Number of obs F( 2, 209) Prob > F R-squared Root MSE ei Coef. eilag1 eilag2 _cons .4412365 -.3016422 .0011573 rho -.425204 Semirobust Std. Err. t .0893425 .0768281 .0292438 4.94 -3.93 0.04 P>|t| 0.000 0.000 0.968 = = = = = 212 13.88 0.0000 0.1953 .60469 [95% Conf. Interval] .2651086 -.4530995 -.0564934 .6173644 -.1501848 .058808 Durbin-Watson statistic (original) 2.030111 Durbin-Watson statistic (transformed) 1.986936 As a result, the DW statistic is approximately to 2 then it concludes that do not reject the null hypothesis for absence of autocorrelation in error term. In this way, is possible to use the DF test based on first differences in order to analyze the unit roots for the parameters. Test of unit roots in parameters Once is proved there is no autocorrelation in the residuals it is computed the DF test by taking the first differences of the dependent variable. Thus, is used the following equation: (4) H0: Series with unit root (non-stationarity) H1: Series without unit root (stationarity) 71 PAC of Inf 0.50 Partial autocorrelations of Inf 0.50 AC of Inf 0.00 REVISTA ACADÉMICA LUCERE 1.00 1.00 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA 0.00 -0.50 . dfuller IRD, trend regress Dickey-Fuller test for unit root 20 40 Lag Z(t) 60 80 0 -12.129 Bartlett's formula for MA(q) 95% confidence bands = 214 -0.50 -1.00 Test Statistic 0 Number of obs Interpolated Dickey-Fuller 1% Critical 5% Critical 10% Critical Value Value Value 20 -4.002 40 60 -3.435 Lag 80 -3.135 95% Confidence bands [se = 1/sqrt(n)] MacKinnon approximate p-value for Z(t) = 0.0000 D.IRD Coef. IRD L1. _trend _cons -.8219084 -.000819 .1006367 Std. Err. .0677642 .0006826 .0846227 t P>|t| -12.13 -1.20 1.19 0.000 0.232 0.236 [95% Conf. Interval] -.95549 -.0021647 -.0661775 -.6883269 .0005266 .2674509 Since the observed test statistic >critic value (for any level of significance), the null hypothesis is rejected which reveals that there is no presence of a unit root in the series. This leads to the conclusion that after the first differences are taking into account the variable Interest Rate become stationary, and so integrated with order 2. Inflation Model (5) This variables stand for: i. Inft represents the inflation in period t; ii. Inf t-1 represents the inflation in period t-1; . regress Inf Inflag1 Source SS df MS Model Residual 5169.90763 351.208817 1 213 5169.90763 1.64886769 Total 5521.11645 214 25.7996096 Inf Coef. Inflag1 _cons .9664478 .2825113 Std. Err. .0172596 .1649145 t 55.99 1.71 Number of obs F( 1, 213) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE P>|t| 0.000 0.088 = 215 = 3135.43 = 0.0000 = 0.9364 = 0.9361 = 1.2841 [95% Conf. Interval] .9324263 -.0425622 1.000469 .6075849 According to the estimated output, it is possible to verify that Inft-1 is a significant variable since we reject the null hypothesis of non-significance for any significance 72 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE level (p-value <α) and this coefficient (ρ = 0,9664478) is also very close to one, which arises suspicion about the presence of unit roots in the model. . corrgram Inf, lags(20) LAG 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 AC 0.9659 0.9167 0.8633 0.8054 0.7774 0.7591 0.7381 0.7190 0.6916 0.6585 0.6311 0.6156 0.6134 0.6220 0.6323 0.6310 0.6214 0.6077 0.5891 0.5820 PAC Q 0.9664 -0.2537 -0.0196 -0.0858 0.5124 -0.1339 -0.0797 -0.1124 0.1860 -0.0981 0.0813 0.1478 0.1815 -0.0271 -0.0148 -0.0933 0.1515 0.0067 -0.0325 0.1053 Prob>Q 204.32 389.22 553.98 698.05 832.93 962.13 1084.9 1201.9 1310.7 1409.8 1501.3 1588.8 1676.1 1766.2 1859.9 1953.7 2045 2132.9 2215.8 2297.2 -1 0 1 -1 0 1 [Autocorrelation] [Partial Autocor] 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 0.0000 In the AC and the PAC function the Inflation shows a different behavior as the Interest Rate model: reveal a more decline in the trend, no persistency behavior and the values of AC are also decreasing as the number of lags increases but more sharply. The 1º and 2ºlag of the PAC function assumes statistical significance which indicates suspicion of an AR (2) process for the inflation model. By applying the Ljung-Box Q-statistic for the presence of a white noise process in the model is possible to conclude that the null hypothesis is rejected because P-value<critical level, which indicates that this series show a significant autocorrelation. In addition, was also conducted the AIC/SBIC/HQIC tests like it was done previously in the other model, in order to help to decide which is the proper number of lags to include in this model. . varsoc Inf, maxlag(4) Selection-order criteria Sample: 1959q1 - 2011q4 lag 0 1 2 3 4 LL LR -644.971 -353.631 -346.497 -346.453 -345.666 Endogenous: Exogenous: 582.68 14.268* .08833 1.5733 Number of obs df 1 1 1 1 p 0.000 0.000 0.766 0.210 FPE 25.9504 1.67721 1.58291* 1.59725 1.60048 Inf _cons AIC 6.09406 3.35501 3.29714* 3.30616 3.30817 = HQIC 212 SBIC 6.10046 3.36781 3.31634* 3.33176 3.34017 6.1099 3.38667 3.34464* 3.36949 3.38734 this case all tests 73 In UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE have a unanimity decision about the number of lags to include in the model, that follow are previous suspicion, which did not happen before with the IR case. So, it was decided to include lags 2 to perform the tests in the Inflation model. The model of inflation l with 2 lags (6) This variables stand for: Inft represents the inflation in period t; Inf t-1 represents the inflation in period t-1; Inf t-2 represents the inflation in period t-2; . regress Inf Inflag1 Inflag2 Source SS df MS Model Residual 5177.76395 328.562268 2 211 2588.88198 1.55716715 Total 5506.32622 213 25.8512968 Inf Coef. Inflag1 Inflag2 _cons 1.212309 -.2536861 .3433503 Std. Err. .0666338 .0665709 .1616686 Number of obs F( 2, 211) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE t P>|t| 18.19 -3.81 2.12 0.000 0.000 0.035 = 214 = 1662.56 = 0.0000 = 0.9403 = 0.9398 = 1.2479 [95% Conf. Interval] 1.080956 -.3849153 .0246576 1.343662 -.122457 .6620429 As we can see all parameter in the model are highly significant as per t test and p- value, and the R- squared have increase in this model if we compare it to the model (3). Meanwhile, it is required to verify the presence of stationarity in the parameters by performing a unit root test - the Dickey-Fuller test – as well as other test like it was done previously for the IR model. Regression of residuals of the model number (6) (7) This variables stand for: ei represents the error term of model 6 (with 2 lags); represents the error term in period t-1; represents the error term in period t-2; 74 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE . regress ej ejlag1 ejlag2 Source SS df MS Model Residual .017098255 326.205059 2 209 .008549127 1.56078976 Total 326.222157 211 1.54607657 ej Coef. ejlag1 ejlag2 _cons -.0054894 -.0047344 .0083393 Std. Err. Number of obs F( 2, 209) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE t .0691861 .0689693 .0858045 P>|t| -0.08 -0.07 0.10 = 212 = 0.01 = 0.9945 = 0.0001 = -0.0095 = 1.2493 [95% Conf. Interval] 0.937 0.945 0.923 -.1418815 -.140699 -.160814 .1309026 .1312303 .1774926 Test of autocorrelation in the residuals In this case, the null hypothesis of the constant variance is not reject for any level of significance (p-value> α). This means the model has presence of Conditional Homoskedasticity and thus, it is possible to compute the Breusch-Godfrey test normally without assuming its alternative test (Durbin-Watson test). . estat hettest Breusch-Pagan / Cook-Weisberg test for heteroskedasticity Ho: Constant variance Variables: fitted values of ej chi2(1) Prob > chi2 = = 3.69 0.0548 . estat bgodfrey Breusch-Godfrey LM test for autocorrelation lags(p) 1 chi2 df 0.160 Prob > chi2 1 0.6888 H0: no serial correlation As a result the p-value > any critical level, so the null is not rejected, meaning there is no autocorrelation in error term. Thus, the DF test for parameters can be computed. Test of unit roots in parameters The test of unit root is computed by considering the first differences of the dependent variable. Thus, is used the following equation: (8) H0: Series with unit root (non-stationarity) H1: Series without unit root (stationarity) . dfuller InfD, trend regress Dickey-Fuller test for unit root Z(t) Number of obs Test Statistic 1% Critical Value -11.450 -4.002 = 214 Interpolated Dickey-Fuller 5% Critical 10% Critical Value Value -3.435 75 -3.135 MacKinnon approximate p-value for Z(t) = 0.0000 D.InfD Coef. InfD L1. _trend _cons -.7674993 -.0005389 .0656231 Std. Err. .0670283 .001401 .173688 t -11.45 -0.38 0.38 P>|t| 0.000 0.701 0.706 [95% Conf. Interval] -.8996302 -.0033007 -.2767629 -.6353684 .0022229 .4080091 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE This case lead to the same conclusion: test statistic > critic value (for any level of significance), thus the null hypothesis is rejected which means no existence of a unit root in the model. So after taking into account the first differences, it is possible to state that the variable Inflation become stationary and integrated with order 2. Cointegration Model As it was seen before, the variables analyzed where stationary and integrated with the same order 2. This is one of the conditions to verify that these variables can be cointegrated. Although, a second condition must also be verified: absence of unit roots in the residuals of the model cointegrated by applying the Engle Granger test (test for co-integration). This test will be computed below as well with the interpretation of the co-integrated model. Regression of co-integration model (9) . regress IR IRlag1 IRlag2 Inf Inflag1 Inflag2 Source SS df MS Model Residual 3194.74945 75.9092177 5 208 638.949889 .364948162 Total 3270.65867 213 15.355205 IR Coef. IRlag1 IRlag2 Inf Inflag1 Inflag2 _cons 1.133368 -.1721547 .0800135 -.1057017 .0491954 .2346447 Std. Err. .0698564 .0688633 .034292 .0517996 .034015 .1213561 t 16.22 -2.50 2.33 -2.04 1.45 1.93 Number of obs F( 5, 208) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE P>|t| 0.000 0.013 0.021 0.043 0.150 0.055 = 214 = 1750.80 = 0.0000 = 0.9768 = 0.9762 = .60411 [95% Conf. Interval] .9956509 -.3079142 .012409 -.2078213 -.017863 -.004601 1.271085 -.0363951 .147618 -.003582 .1162538 .4738903 The model is global significant (F test) and the R2allows concluding that the variables explain 97.68% of the Interest Rate behavior. If other variables remain constant, an increasing on interest rate of last period by 1%, implies that interest rate of the current period will also increase in 1.13%. If other variables remain constant, an increasing on inflation of last period increase by 1%implies a decreasing of 0.105% of the interest rate. 76 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE The variable Inflag2 is only non-significant variable for a level of 5%. For that reason, it is important to perform the test of joint significance of the variable inflation as following: . test Inf Inflag1 Inflag2 ( 1) ( 2) ( 3) Inf = 0 Inflag1 = 0 Inflag2 = 0 F( 3, 208) = Prob > F = 2.71 0.0459 Thus, the null hypothesis that all coefficients of β are equal to 0 is rejected, meaning that the variable inflation is relevant for the model. So is possible to state that inflation has a causality relation over the interest rate. 0 5 10 15 20 Trend of IR and Inf 1960q1 1970q1 1980q1 1990q1 2000q1 2010q1 Time IR Inf By looking into the graph is possible to observe the trend between the two variables and state its main conclusions: the behavior of the joint variables does not change over time which indicates that maybe they are stationary. Moreover, the variables show a positive trend from 1970 until 1985 and afterwards that they start to oscillate leading to a decrease in the trend almost to the initial values of the sample. After interpreted the co-integrated model it will proceed to the second condition to guarantee the co-integration of the variables. For that an Engle & Granger test must be computed. 77 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Regression of residuals of cointegrated model This output represents the residuals that result from the relation between interest rate and the inflation. Therefore, it is necessary to present the following estimation and tests before applying the Engle & Granger computation. . regress ek eklag1 eklag2 Source SS df MS Model Residual .985384565 74.9011388 2 209 .492692282 .358378654 Total 75.8865233 211 .359651769 ek Coef. eklag1 eklag2 _cons .0014819 -.1140159 .000684 Std. Err. .0687211 .0687639 .0411153 t 0.02 -1.66 0.02 Number of obs F( 2, 209) Prob > F R-squared Adj R-squared Root MSE P>|t| 0.983 0.099 0.987 = = = = = = 212 1.37 0.2552 0.0130 0.0035 .59865 [95% Conf. Interval] -.1339936 -.2495757 -.0803699 .1369573 .0215439 .081738 Prais-Winsten AR(1) regression -- iterated estimates Linear regression Number of obs F( 2, 209) Prob > F R-squared Root MSE ek Coef. eklag1 eklag2 _cons .4300509 -.304822 .0008839 rho -.4440543 Semirobust Std. Err. .0812922 .0727699 .0283156 t 5.29 -4.19 0.03 P>|t| 0.000 0.000 0.975 = = = = = 212 16.89 0.0000 0.1913 .59313 [95% Conf. Interval] .2697931 -.4482791 -.0549368 .5903088 -.1613648 .0567046 Durbin-Watson statistic (original) 2.030822 Durbin-Watson statistic (transformed) 1.992942 Test of autocorrelation in the residuals of the co-integrated model The Breusch-Pagan test was computed, as it is seen below, in order to understand if we are in a presence of conditional Homoskedasticity or not. Thus, the null hypothesis of the constant variance is rejected for any level of significance (p-value<α), meaning it is assumed the alternative (Durbin-Watson test) instead of the Breusch-Godfrey test and the errors should be corrected by using the robust standard errors to performance the tests. . prais ek eklag1 eklag2, vce(robust) 78 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE . dfuller ek, trend regress Dickey-Fuller test for unit root Number of obs Test Statistic 1% Critical Value -14.473 -4.002 Z(t) = 213 Interpolated Dickey-Fuller 5% Critical 10% Critical Value Value -3.435 -3.135 MacKinnon approximate p-value for Z(t) = 0.0000 D.ek Coef. ek L1. _trend _cons -.9988362 .0000897 -.009704 Std. Err. .0690152 .00067 .0826795 t P>|t| -14.47 0.13 -0.12 0.000 0.894 0.907 [95% Conf. Interval] -1.134888 -.001231 -.1726922 -.8627849 .0014105 .1532842 Breusch-Pagan / Cook-Weisberg test for heteroskedasticity Ho: Constant variance Variables: fitted values of ek chi2(1) Prob > chi2 = = 18.10 0.0000 As a result, the DW statistic is approximately to 2, which means that do not reject the null hypothesis for absence of autocorrelation in error term. In this way, is possible to use the DF test in order to analyze the unit roots for the residuals. Test for the co-integration (Engle & Granger) This test is identical to the DF test previously made by the two variables separately, but now it will be computed for the residuals of the co-integrated model to analyze if there is no unit root in the residuals in order to verify the cointegration after all. This test it will also considered the first differences over the residual, such as following: (10) H0: Unit root in cointegrating regression’s residuals (no cointegration) H1: Residuals from cointegrating regression are stationary (cointegration) Accordingly to the Engle & Granger test the test statistic > critical value (for any significant level), which indicates the rejection of the null hypothesis of an existence of unit root in the residuals, meaning that it is possible to cointegrate this model. At the end, the second condition is also verified leading us to an integrated model with a similar behavior as an Autoregressive Distributed Lag (ADL) model. Conclusion 79 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE After performing the econometrics tests and analysis is possible to be driven to the following conclusions: Firstly, the Interest Rate and Inflation are both stationary variables for the estimated period, meaning they are somehow identically distributed and any correlation can be observed throughout the period. Moreover, both variables had a model with 2 lags because R2 was higher in this model than in the model with one lag and it allowed to explaining better the behavior of the parameters. Secondly, a DF test was performed which drive to the conclusion that there is no unit root in the parameters by rejection of null hypothesis, which means that there is no unit roots in the estimated parameters(stationarity). Beside that these variables were cointegrated in a model to explain its behavior and in that model the residuals also showed to have no unit roots, therefore, the variables had all the condition to be cointegrated. This new cointegrated had a similar structure and behavior like an ADL (2, 2) and showed to be global significant with an explanation of 97.68% of South Africa’s interest rate. Finally, the model showed that the variables of Interest Rate and Inflation have a relationship, which in this case it is an inverse one. This relation can allow to state that the results of the estimation coincide and are consistent with the economic theory. References and Data Hamilton, J. (1994). Time Series Analysis. New Jersey: Princeton University Press. Azevedo, J. (2012). Time Series Econometrics classes notes. Lisbon.Portugal: Católica Lisbon School of Business and Economics. Blackwell, Matt.Multiple Hypothesis Testing: The F-test.2008. Available in: http://www.mattblackwell.org/files/teaching/ftests.pdf Organisation for Economic Co-operation and Development. South Africa's Statistics Profile. Available in: http://stats.oecd.org/WBOS/index.aspx Reyna, O. (n.d.). Time Series notes of Princeton University. Available in: http://dss.princeton.edu/training/TS101.pdf 80 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE OS GRANDES DESAFIOS DO CRESCIMENTO ECONÓMICO DE ANGOLA ATÉ 2017 Alves da Rocha Economista e Professor Associado da Universidade Católica de Angola Director do Centro de Estudos e Investigação da UCAN Num recente relatório da prestigiada Economist Intelligence Unit dava-se conta de que a economia angolana poderia ultrapassar a nigeriana e sul-africana até 2016. É inquestionável a dinâmica de crescimento revelada por Angola desde que a guerra civil deixou de atormentar a população e de consumir recursos financeiros do Orçamento de Estado. No entanto, as informações disponíveis parecem não indicar ainda nesse sentido. Na verdade, e tomando 2009 a base de comparação, verificam-se os desníveis seguintes, em termos de valor absoluto do PIB (mil milhões de dólares): Nigéria/Angola – 2,7 e África do Sul/Angola – 4,155. Inverter este hiato em sete anos exige um esforço anual de crescimento do PIB angolano de 22,3% face à economia sulafricana e 15% para se ultrapassar a nigeriana56. Adicionalmente devo referir que o PIB estimado para Angola em 2017 – 153,5 mil milhões de dólares57 - é inferior ao da Nigéria (184,7 mil milhões de dólares) e da África do Sul (284 mil milhões de dólares) em 200958. Portanto, é este o desafio do crescimento: existem condições internas para promover e garantir um crescimento do PIB suficiente para se ultrapassar aqueles dois países? Mas muito mais importante: estar-se-á em circunstância de se financiar um tão elevado crescimento quando o sector petrolífero começa a dar sinais preocupantes de exaustão e o investimento privado estrangeiro a tornar-se negativo?59 A Mini-Idade de Ouro do Crescimento em Angola 55 World Bank - World Development Indicators, 2011. 56 Admitindo-se crescimento zero para África do Sul e Nigéria durante este período. 57 International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring, August 2012. 58 World Bank - World Development Indicators, 2011. 59 CNUCED – World Investment Report 2012. 81 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE O período compreendido entre 2002 e 2008 foi o de mais elevadas taxas reais de crescimento do PIB no país. O clima interno envolvente facilitou-o e o enquadramento externo foi do melhor desde a independência: Resolução do conflito militar depois de 27 anos de guerra (provavelmente a de maior duração em África). Primeiros resultados positivos de um programa de estabilização macroeconómica concebido pela equipa económica do Governo depois de 1999 (a taxa de inflação, no início da nova política de recuperação dos equilíbrios macroeconómicos fundamentais, era de 105,6% e em 2008 estabeleceu-se em 13,2%). Estes sucessos foram estimulados e ajudados pela excelente conjuntura das receitas fiscais (4,5 mil milhões de dólares em 2002 e 42,4 mil milhões de dólares em 2008). A economia mundial encontrava-se numa fase de rápido crescimento, não apenas do lado das economias mais desenvolvidas, como, sobretudo, das economias emergentes, como a China, a Índia, o Brasil, a Coreia, a Rússia e a Índia. FONTE: IMF – World Economic Outlook, April 2012 O preço do petróleo – o regulador dos financiamentos e investimentos internos – apresentou um comportamento sempre ascendente ao longo do período, tendo atingido, em 2008, o valor de 93,7 dólares o barril. O preço médio entre 2002 e 2008 foi de 52,6 dólares o barril. 82 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Ainda que a actuação do Governo tivesse sido consequente com as novas condições políticas e solicitações económico-sociais, dir-se-ia que o crescimento tinha naturalmente de acontecer. A instabilidade militar sempre foi o pior cenário para as economias crescerem, porque aumenta a incerteza e o risco dos investimentos públicos e privados, constrange a livre circulação dos factores de produção e das mercadorias, diminui a performance das empresas e das instituições do Estado e influencia negativamente os índices de produtividade dos factores. Por outro lado, numa economia tão dependente do mercado internacional de petróleo, a sua boa performance, no período em referência, ajudou a alavancar financeiramente os projectos de investimento público e a estimular os investimentos privados. Pondo momentaneamente de lado considerações sobre a efectiva e real capacidade de absorção da economia nacional, a questão está em se saber se todo o potencial financeiro propiciado pelas receitas do petróleo foi, na verdade, usado em benefício do sistema económico e do sistema social60. Neste período, Angola foi identificada como uma das economias de maior crescimento no mundo, passando a ser um dos países mais procurados pelos investimentos privados. FONTE: Balanços dos Programas de Governo e Relatórios Económicos do CEIC. Entre 2002 e 2008 a taxa média anual de cariação do PIB foi de 14,9% e se for excluído 2003 a taxa média anual atingiu a cifra de 17,2%. A taxa de 5,3% registada em 2003 ficou a dever-se, por um lado, ao elevado peso do sector do petróleo na economia 60 Através de que processos se acumularam as extraordinárias fortunas da elite política e quais foram as fontes usadas para tal. 83 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE (50,5%) e, por outro, à quebra do ritmo de crescimento da produção petrolífera em relação ao ano precedente (de 20,8% para -2,2%)61. O extraordinário clima enquadrante da nova economia em Angola propiciou aumentos consideráveis das receitas fiscais, pela via dos impostos petrolíferos, com um aumento de mais de 53% na sua representatividade relativa no PIB. Os recebimentos fiscais não petrolíferos não foram além de 8-9% do PIB. Por outro lado, a percentagem média dos rendimentos governamentais no nível geral da actividade económica foi de quase 43%, numa progressão anual sempre crescente. FONTE: International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring, August 2012. Em 2008 ocorreu um aumento inusitado das despesas públicas, afastando o respectivo rácio dum valor estável abaixo dos 38% registado entre 2003 e 2007. Como consequência, aumentou o rácio do défice fiscal do Estado (-5,6% do PIB), mesmo antes da crise financeira e económica mundial do ano seguinte, quando o saldo negativo das contas públicas se aproximou dos 10% do total da actividade económica. 61 Do que resultou uma contribuição de – 1,7 pontos percentuais para a taxa global de variação do PIB. 84 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE FONTE: International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring, August 2012. Foi graças a estas folgas orçamentais que se deu início ao importante programa de reinfraestruturação do país, com um investimento público acumulado no período de 28,6 mil milhões de dólares. A intensidade do crescimento económico, a relativa consolidação das finanças públicas e a estabilização dos agregados macromonetários – cujo processo, conforme se disse, se iniciou em 1999 – e a evolução positiva do stock de reservas internacionais melhoraram a imagem externa de um país que necessitou de 27 nos para pôr fim ao desperdício de recursos ocasionado pela guerra civil. A consequência, natural e quase imediata, foi o afluxo de investimento estrangeiro directo e o acesso ao financiamento internacional, veiculado pelas linhas de crédito. SALDO (ENTRADA E SAÍDA) DE FLUXOS DE INVESTIMENTO ESTRANGEIRO DIRECTO EM ANGOLA Milhões de dólares 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 1672 3505 1449 -1304 -38 -893 1679 FONTE: World Investment Report 2012. Desafios do futuro e o Crescimento Sustentado (Angola 2012-2017) O crescimento foi desde sempre um dos temas de investigação mais cativantes das ciências económicas. Este fascínio provém das diversas expectativas sociais projectadas neste conceito. Ou seja, sem crescimento aparentemente mais nada pode 85 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE acontecer: nem emprego, nem distribuição de renda, nem melhoria das condições de vida. Seja qual for a perspectiva de abordagem, o crescimento refere-se antes de tudo à evolução da produção62. Até à Revolução Industrial o crescimento era principalmente referenciado à produção agrícola, constituíndo, portanto, um indicador da capacidade de sobrevivência em função de um ciclo natural de boas e más colheitas. O crescimento por habitante ainda serve para comparar os países em termos de nível de vida, jogando o factor demográfico o papel de ponderador da evolução da produção. No entanto, outros indicadores são hoje muito mais expressivos para se entender em que estádio de evolução se encontram os países. E um deles é o desenvolvimento – muito mais vasto que crescimento – ao incluir, não apenas, aspectos relacionados com com a distribuição dos rendimentos e da riqueza, como, igualmente, diferenças culturais e padrões de valores. São conhecidas divergências em relação aos meios e às políticas mais adequadas para alimentar um processo de crescimento. De um lado, insiste-se no investimento em capital, enquanto do outro se salienta a importância da inovação e do progresso tecnológico em geral. Ao estabelecer-se uma relação entre entre capital e trabalho obtém-se um indicador prático para exprimir a intensidade capitalística da produção (K/L). Com o tempo, quanto maior o valor desta relação, mais elevada a quantidade de capital por trabalhador, presumindo-se, em decorrência, que a produção se torna progressivamente intensa em capital. Ou seja, a reserva de capital cresce mais rapidamente do que a de trabalho. Finalmente, estabelece-se uma relação positiva entre a produção por trabalhador (Q/L) e quantidade de capital por trabalhador (K/L), alavancando-se o crescimento. O progresso tecnológico existe quando, com a mesma quantidade de K/L, se consegue aumentar a produção. O crescimento sustentado está relacionado com o crescimento dado na perspectiva anterior (aumento sistemático da quantidade de bens e serviços produzidos anualmente) e com a preservação do ambiente e utilização racional dos recursos naturais (renováveis e não renováveis). Pretende-se, em última análise, deixar às gerações vindouras o que se recebeu das anteriores, retirando-se da sua utilização benefícios individuais e colectivos presentes. Quando um país apresenta uma sequência temporal relativamente longa de taxas de crescimento do PIB de um certo valor, então pode afirmar-se que do ponto de vista estritamente quantitativo a rota da 62 Lewis, Arthur W. – La Théorie de La Croissance Économique, Payot, 1971. 86 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE sustentabilidade pode ter condições de se afirmar63. A China há mais de três décadas que vem crescendo a mais de 10% ao ano (duplicação do PIB a cada ciclo de 7 anos e meio) e o Botswana cresceu entre 1980 e 2008 a uma cadência anual de mais de 8% (duplicação do PIB em cada 9 anos)64. O desenvolvimento e a distribuição dos rendimentos e da riqueza foi primeiramente tratado por Simon Kuznets, na sequência de uma série de observações sobre a evolução das desigualdades sociais nos Estados Unidos65. Estes estudos culminaram com a construção de uma figura geométrica denominada Curva de Kuznets: à medida que o crescimento económico ocorre desenha-se uma tendência para a diminuição das disparidades na distribuição de rendimentos e riqueza. Nas fases iniciais, a curva de Kuznets aponta para um agravamento destas desigualdades (são os mais ricos quem primeiro beneficiam do crescimento), mas à medida que o crescimento se torna mais extensivo (envolvendo mais sectores e regiões) e mais inclusivo (abrangendo mais pessoas, mais emprego e mais factores nacionais), o efeito contágio (também denominado “efeito escoamento” ou “spillover effect”) aparece. Graficamente, esta curva apresenta-se como uma relação entre o coeficiente de Gini e o valor do PIB por habitante. CURVA DE KUZNETS DAS DISPARIDADES SOCIAIS 63 Existem outras condições necessárias para isso, como por exemplo, a quantidade de capital físico por habitante, o capital humano, crescimento e diversificação das exportações (Joseph Stiglitz et all. – Principes d’Économie Moderne, troisiéme édition, Ouvertures Économiques, Groupe De Boeck, 2011). 64 Joseph Stiglitz et all. – Principes d’Économie Moderne, troisiéme édition, Ouvertures Économiques, Groupe De Boeck, 2011. 65 Kuznets, Simon – Economic Growth and Income Inequality, American Economic Review, nº49, 1955. 87 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE No entanto, a relação entre as desigualdades sociais e o crescimento económico continua a ser muito contestada, nomeadamente nos países em desenvolvimento66. As evidências empíricas têm demonstrado existir uma relação estreita e inversa entre democracia e disparidades sociais (mais democracia e menos desigualdades). Nas sociedades politicamente autoritárias, com baixos índices de transparência e altos níveis de corrupção (em particular das elites políticas) as disparidades sociais tendem a agravar-se mesmo com a subida do rendimento por habitante propiciada pelo crescimento económico. Cabo Verde e Botswana são verdadeiros casos de estudo neste domínio da redução das disparidades sociais através de mais crescimento, mais democracia, mais transparência e menos corrupção. O coeficiente de Gini varia entre 0,45 e 0,47 para Cabo Verde e entre 0,39 e 0,42 para o Botswana e o índice de democracia é de 7,92 e 7,63 respectivamente67. As Maurícias, com um índice de Gini de 0,3868, são classificadas no índice de democracia como uma democracia plena, respeitadora dos valores da transparência e da boa governação69. A África do Sul temse aproximado do funcionamento pleno da sua democracia, mas apresenta, por enquanto, valores ainda elevados do Índice de Gini, explicados, em parte, pelas elevadas taxas de desemprego, em todas as faixas etárias. 66 Os Estados Unidos da América são, do ponto de vista histórico, o país-exemplo da curva de Kuznets. No entanto, os mais críticos desta relação entre crescimento económico e redução das desigualdades rejeitam a sua generalização, afirmando a sua especificidade em relação a alguns países e em determinadas condições (Beat Burgenmeir – A Economia do Desenvolvimento Sustentável, Instituto Piaget, 2005). 67 Democracy Index 2011, Economist Intelligence Unit. 68 UNDP – Africa Human Development Report 2012. Angola, numa média para 2000-2010, apresentava um índice de Gini de 0,59. 69 Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca aparecem como democracias plenas, com baixos coeficientes de disparidade social (0,26) e elevados indicadores de transparência e boa governação. 88 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE De que modo se coloca a questão da sustentabilidade do crescimento económico em Angola? Apesar das reservas levantadas sobre a validade universal da curva de Kuznets, tem-se verificado ou não uma atenuação das desigualdades sociais com o crescimento económico? Não existem estudos sobre esta matéria, mas é seguro que a falta de transparência e a generalizada corrupção têm limitado uma maior extensão do efeito contágio do crescimento económico, tal como no início destas reflexões coloquei. A base da análise da economia nacional, deste ponto de vista da sustentabilidade do seu crescimento, tem como suporte estatístico o Relatório do Fundo Monetário Internacional intitulado “Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto de 2012. O período de avaliação é de 18 anos, entre 2000 e 2017. As linhas tendenciais de evolução do PIB entre 2000 e 2017 Quais têm sido as rotas do crescimento económico de longo prazo? Entre 2000 e 2011 a taxa média anual de crescimento do PIB foi de praticamente 10%. Adicionando o período 2012 a 2017 verifica-se que a recta de tendência de longo prazo se estabelece em torno de 8,5%. A perda de dinâmica de crescimento da economia nacional é, assim, evidente. O gráfico seguinte é elucidativo. FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto de 2012. Vale a pena segmentar o período longo 2000-2017 em diferentes subperíodos, para se aquilatar melhor da quebra dos ritmos médios de crescimento do PIB. 89 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto de 2012. A influência da crise financeira e económica internacional 2008/2009 sobre a capacidade de crescimento a longo prazo está bem patente no sub-perído 2009/2011. No entanto, já em 2008 tinha ocorrido uma quebra de 38,8% na taxa de crescimento face a 2007. Desdobrando a economia nos dois sectores correntemente considerados para efeitos de análise, verificam-se dois comportamentos distintos: O PIB petrolífero mostra-se muito atreito às variações internacionais do mercado, em termos de preços e de quantidades. 90 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Um comportamento relativamente caótico, sem uma tendência claramente definida de variação, a atestar a dependência deste sector de actividade e o carácter aleatório das receitas que gera. Uma redução da capacidade de crescimento do sector não petrolífero, denunciando, talvez, que o efeito construção e obras públicas começou a esbater-se (esgotar-se?) depois de 2007 e a crise financeira mundial de 2008/2009 acentuou a tendência regressiva do PIB não petrolífero. Novas folgas e capacidades de crescimento devem ser encontradas na agricultura e na indústria transformadora. 91 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto de 2012. O mercado interno não tem, por enquanto, dimensão suficiente para alavancar a diversificação, donde ser nas exportações transaccionáveis não petrolíferas que devem ser encontradas as bases para a redução desta dependência sectorial. Mas para isso é essencial produtividade, desburocracia, boa governação, transparência, …, numa palavra, a longo prazo a competitividade deve estar na qualidade dos produtos a exportar e numa rede de empresas com real e efectiva capacidade exportadora, significando habilidade e competência para se fidelizarem os clientes externos. É, sobretudo, a partir de 2011 que aparecem as tendências para uma menor capacidade de crescimento da economia nacional. A incerteza quanto à eminência de uma nova crise internacional, a situação de descontrolo financeiro na Europa da moeda única, uma provável retracção nos fluxos de investimento privado estrangeiro, uma redução na produção de petróleo e a prevalência de estrangulamentos a um funcionamento mais eficiente e competitivo da actividade económica podem ajudar a compreender a estabilização da taxa de crescimento do PIB na vizinhança de 5%, do PIB petrolífero abaixo de 3% e a da economia não petrolífera em redor de 6%. FONTE: IMF: Angola – 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring” de Agosto de 2012. 92 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE A redução da taxa de pobreza em 50%, de acordo com os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio para 2015, exige uma taxa de crescimento do PIB de cerca de 7,5% ao ano, para além de políticas de redistribuição da renda mais extensivas, inclusivas e impactantes sobre as condições de vida da população. O comportamento tendencial do PIB por habitante Do ponto de vista das condições de vida da população o indicador utilizado nesta minha reflexão é o PIB por habitante, na ausência do coeficiente de Gini (numa perspectiva temporal) e de outros indicadores relacionados com as disparidades sociais. É evidente que a evolução deste indicador não aponta, necessariamente, para uma melhoria na repartição do rendimento nacional, nem, tão pouco, para um benefício nas condições gerais de vida da população. Para além de políticas adrede direccionadas para a intervenção do Estado nos mecanismos, ex-ante e ex-post, de repartição do rendimento nacional, tem de haver vontade política de actuar sobre os esquemas que favorecem as eleites (políticas e empresariais) no acesso às oportunidades e às fontes de enriquecimento. Distribuir melhor não depende apenas do crescimento económico, pois, como ficou assinalado, desenvolvimento e progresso social têm outros ingredientes que os diferenciam do simples crescimento. FONTE: IMF, op.cit. O valor do PIB por habitante tem subido ao longo do tempo (2000-2008), tendo passado de 635 dólares para 4671 dólares. Se este rendimento fosse igualmente distribuído (coeficiente de Gini igual a zero), caberia a cada angolano um rendimento 93 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE diário de 12,8 dólares, incompatível com a garantia de um conjunto básico de condições dignas de vida. Os incrementos anuais registados na linha tendencial de variação do PIB por habitante apontam para ganhos marginais anuais negativos depois de 2009, explicados, entre 2008 e 2009, pelos choques advenientes da crise internacional e entre 2011 e 2017 pela menor capacidade de crescimento da economia, para uma variação mais ou menos constante do factor demográfico. A melhor distribuição da renda nacional, ainda que possa acontecer – embora as actuais desigualdades sejam de tal maneira profundas que só algumas décadas poderão ajudar a mitigá-las, havendo vontade política para isso – acabará por revelarse através de incrementos marginais quase insignificantes na melhoria das condições de vida da população. Não sendo alterados os canais de acesso à renda petrolífera e diamantífera – enquanto existirem na dimensão presente – dificilmente se poderão tornar mais inclusivos os benefícios do crescimento económico. De resto, até 2017 não se conseguirá reduzir a estrutura de dependência do rendimento médio por habitante da renda petrolífera, dada a débil força muscular do sector não petrolífero, conforme se mostrou anteriormente. Ou seja: as expectativas de crescimento do PIB por habitante entre 2011 e 2017 são fracas e, consequentemente, menor a capacidade da economia distribuir mais. 94 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE O gráfico anterior mostra justamente que depois de 2011 e até 2017 – período durante o qual se esperam variações anuais baixas nos preços do barril do petróleo e na respectiva produção – os incrementos anuais de rendimento médio por habitante rondarão apenas 200 dólares por ano. Mas a questão não está tão-somente na míngua de rendimento para distribuir. O actual sistema de redistribuição da renda nacional está estruturado em redor duma minoria de cidadãos e o seu funcionamento articula-se em torno de regras opacas baseadas numa rede de conhecimentos e de influências difícil de penetrar 70. Não há, portanto, garantias de que a maior fatia do incremento anual de 200 dólares não seja captada pela franja dos mais ricos. A probabilidade do estado estacionário de Solow Foi Robert Solow quem primeiro se debruçou sobre a ocorrência do “estado estacionário” no processo de crescimento económico71. O estado estacionário corresponde ao ponto onde o montante de capital por trabalhador permanece constante. Este ponto corresponde à igualdade sy = (n+d)k, onde s – taxa de poupança/investimento, y – taxa de crescimento do PIB, d – taxa de depreciação do 70 Apesar de não existirem estimativas e estudos sobre a real dimensão do efeito escoamento (“spillover effect”), pode presumir-se pela sua relativa reduzida expressão, justamente devido à natureza do sistema nacional de distribuição e redistribuição do rendimento nacional. 71 Solow, Robert – A Contribution to the Theory of Economic Growth, Quarterly Journal of Economics 70 February, 1956. 95 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE capital físico, n – taxa natural de crescimento demográfico e k – rácio capital por trabalhador. O estado estacionário não significa não crescimento, mas apenas, por razões várias, uma situação em que a taxa de variação real do PIB não consegue cobrir a taxa de variação demográfica e a depreciação do capital físico por trabalhador. À direita desse ponto, o montante de investimento suprido pela economia é menor do que o necessário para manter constante a razão capital-trabalho inicial72. Explicado de outro modo: no estado estacionário ou equilíbrio de longo prazo, produto, capital e população crescem a taxas iguais, donde não ocorrer desenvolvimento económico medido pela taxa de crescimento do rendimento médio por habitante73. Simplificando a equação anterior pela sua redução ao crescimento do PIB e da população – não se dispõem de dados sobre o stock de capital fixo, a taxa de depreciação, a taxa de investimento e a taxa de poupança – a probabilidade do estado estacionário em Angola pode ser vista no gráfico seguinte74. FONTE: IMF, op.cit. Considerando-se uma taxa de depreciação do capital fixo da economia de 5% (vida útil de cerca de 20 anos dos equipamentos e infraestruturas económicas e sociais) concluise pela clara insuficiência de crescimento económico para renovar activos físicos e 72 Jones, Charles I. – Introduction to Economic Growth, W.W. Norton & Company, 1998. 73 Graça, Job – Economia do Desenvolvimento (Sebenta das Lições da UCAN), INIC, 2012. 74 Estranhamente as informações do FMI existentes no documento de base utilizado para esta reflexão referem uma taxa de crescimento da população de 4,4% em 2017. 96 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE população e manter a economia numa rota adequada de melhoria do rendimento médio por habitante. Para além de políticas tendentes a aumentar a capacidade de crescimento da economia – das quais os pólos industriais e regionais e as zonas económicas especiais podem ser um exemplo – surge a necessidade de se reflectir sobre as políticas demográficas. Um cálculo aproximado à rendibilidade dos investimentos públicos Aparentemente, os investimentos públicos têm funcionado como uma das alavancas do crescimento económico do país, tendo-se investido entre 2000 e 2011 a fantástica soma de 56,1 mil milhões de dólares (4,7 mil milhões por ano). Em quanto estas aplicações de capital têm, na realidade, contribuído para os incrementos do PIB ainda está por calcular. No entanto, uma aproximação pode ser tentada através do coeficiente marginal de capital do investimento público. FONTE: IMF, op.cit. A rendibilidade dos investimentos públicos, medida pelo coeficiente marginal de capital75, é baixa, provavelmente devido a: 75 Deficiente programação. Fraca fiscalização. Coeficiente marginal de capital: uma unidade de capital gera x unidades de produto. 97 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Ausência de estudos de viabilidade. Incumprimento dos preceitos legais da contratação pública. Corrupção. Generalizada baixa qualidade das obras públicas (num ciclo infernal de construção/deficiências/reconstrução que eleva os custos das obras, sem contrapartidas económicas). Demora/atrasos substanciais no cumprimento dos prazos de entrega das obras. Adjudicações políticas e por tráfico de influências. Excepção feita aos investimentos petrolíferos (cuja rendibilidade é bem mais elevada, mesmo levando em conta as imobilizações financeiras na prospecção, estudos e desenvolvimento), todos os restantes não devem ser portadores de taxas de rendibilidade muito superiores às dos investimentos do Estado, donde não surpreender o reduzido índice de competitividade da economia angolana. FONTE: IMF, op.cit. Graças ao programa de re-infraestruração levado a cabo pelo Governo, a capitação do investimento público passou de 39 dólares em 2000 para 460 dólares em 2011. Abstraíndo-se da qualidade das obras e respectiva durabilidade – normalmente uma obra pública, respeitando padrões de qualidade normais e ciclos de conservação e manutenção consentâneos, não pode durar menos de 20 anos, de modo a assegurar 98 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE retrono macroeconómico e microeconómico e utilidade social – os valores do gráfico sinalizam uma melhoria das condições gerais de vida da população. Atendendo às projecções do Fundo Monetário Internacional, entre 2012 e 2017 o Estado deverá investir 84,7 mil milhões de dólares, num acumulado 2000-2017 de 140,8 mil milhões de dólares. Ou seja, vai investir-se mais em menos anos (investimento anual médio de 4,7 mil milhões para 2000/2011 e de 14,1 mil milhões para 2012/2017). Haverá capacidade de programação, avaliação, controlo e fiscalização? Notas Finais Depois de um período dourado de crescimento, com taxas médias anuais entre 15% e 17%, o horizonte 2017 pode alterar bastante as expectativas sobre a capacidade de crescimento do país. Entre 2012 e 2017 está projectada uma taxa média anual de crescimento de 5,5%, mais de 3 vezes inferior à do período 2002/2008. Enquanto as primeiras propiciaram uma duplicação do PIB em 5 anos, a última apenas consentirá essa multiplicação em 13,5 anos. Ainda que exista real vontade política em o fazer, a melhoria na distribuição do rendimento pode estar limitada pela menor capacidade de crescimento da economia. Isto não invalida, no entanto, que se possa evitar uma maior concentração da riqueza em poucas pessoas e se opere uma substancial transferência de rendimentos de quem tem para quem não tem. Os incrementos anuais do PIB por habitante entre 2012 e 2017 serão marginalmente pouco expressivos, em média à volta de 200 dólares por ano. Este panorama não é bom para a melhoria dos rendimentos médios da maioria da população, nem para a alteração das suas actuais condições de vida. Pode estar a aproximar-se o estado estacionário da economia nacional, na acepção de Solow. Significa dizer não haverem condições para o aumento do rendimento médio por habitante, com consequências negativas sobre a distribuição do rendimento e a melhoria das condições de vida dos cidadãos. Porém, pode haver tempo para se operacionalizarem políticas de inversão desta tendência e os investimentos públicos podem ser um dos instrumentos. Necessita-se de vontade política para reverter os esquemas actuais de acesso à renda. 99 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Porém, se a rendibilidade das aplicações de capital do Estado nas infraestruturas não melhorar significativamente, os efeitos sobre o aumento da intensidade de crescimento não se verificarão numa dimensão conveniente. A capacidade de crescimento do sector não petrolífero – o alfobre da diversificação da economia – estará reduzida a uma taxa média anual de cerca de 6%. Manifestamente insuficiente face aos desafios da diversificação, melhoria das condições de ida, estruturação mercado interno e da redução do peso do petrolífero. 100 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (listadas à medida da sua indicação no texto) World Bank – World Development Indicators 2011. International Monetary Fund – Angola 2012 Article IV Consultation and Post Program Monitoring, August 2012. CNUCED – World Investment Report 2012. Lewis, Arthur W. – La Théorie de la Croissance Économique, Payot 1971. Stiglitz, Joseph et all. – Principes d’Économie Moderne, 3ª Édition, Ouvertures Économiques, Groupe De Boeck 2011. Kuznets, Simon – Economic Growth and Income Inequality, American Economic Review, 49, 1955. Economist Intelligence Unit – Democracy Index 2011. United Nations Development Program – Africa Human Development Report 2012. Burgenmeir, Beat – A Economia do Desenvolvimento Sustentável, Instituto Piaget 2005. Solow, Robert – A Contribution to the Theory of Economic Growth, Quarterly Journal of Economics 70, February 1956. Jones, Charles I. - Introduction to Economic Growth, W.W. Norton & Company, 1998. Graça, Job – Economia do Desenvolvimento (Sebenta das Lições da UCAN), INIC, 2012. 101 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Les limites du capitalisme Penser la crise du néolibéralisme et les failles de la pensée économique avec Karl Polanyi -76 Jérôme Maucourant Université de Lyon (Université Jean Monnet), UMR 5206 Triangle, France. Il est une notion étrangère au monde construit par le capitalisme, celle de limite. Aristote avait déjà fort bien compris que le principe d’autovalorisation de l’argent impliquait une vie déréglée, asservie à des besoins multiples, antagonique de la vie bonne reposant sur des besoins limités77. Ce que de grands Anciens comprenaient ainsi comme une pathologie sociale est devenu, notamment au XVIIIième siècle, avec des auteurs comme Mandeville ou Smith, la vertu d’un monde nouveau : que chacun s’adonne à sa soif de profit, à son envie de jouissance privée, et il adviendra un univers de marchands pacifiques, qui est le meilleur des mondes possibles et qui bien éloigné des temps jadis, dans lesquels la violence et la politique jouaient un rôle essentiel. Certes, les premiers narrateurs de la fable libérale, celle de l’autorégulation économique de la société, semblent faire bien peu de cas des pauvres dont les corps doivent être exploités sans borne et la dignité bafouée pour que se développe la logique du profit. Mais, ce que nous analysons comme une inhumanité propre à ce processus de prolétarisation est conçu alors comme la moins mauvaise façon de résoudre la question du paupérisme qui hante l’Europe, dès le début des formes agraires du capitalisme. Nous retrouvons ici la manière typique à Polanyi d’interpréter l’histoire économique et sociale. Une thèse majeure de son maître ouvrage, La Grande Transformation, n’est autre que la description des effets pervers tenant à la dynamique même du capitalisme libéral, machine sans limite pouvant engendrer le fascisme. Nous voulons 76 Ce texte est un extrait remanié de la postface du livre suivant : Avez-vous lu Polanyi ?, Flammarion, Paris, 2011. Il existe une traduction en espagnol : Descubrir a Polanyi, Barcelone, traduit par José Miguel González Marcén, Edicions Bellaterra, 2006. 77 Aristote, La Politique, I, 8 et 9. Si l’« appétit de vivre » est certainement « illimité », comme le sont les moyens de le satisfaire, précise Aristote, il convient de ne pas oublier, selon lui, que vivre n’est pas bien vivre. 102 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE maintenant, à la lumière des enseignements de Polanyi, tenter d’éclairer le capitalisme néolibéral comme forme nouvelle de cette machine sociale, qui, depuis trois décennies s’est constitué sur les ruines des compromis sociaux qui avaient fondé le monde d’après la Grande Transformation, c’est-à-dire ce demi-siècle qui commence avec la crise des années 1930. Quel est, en 2011, le trait saillant de ce monde ? C’est dans le pays frappé par l’atome militaire, le Japon, que la soif de profit a permis que l’on construisît des centrales nucléaires sur des failles sismiques. Le drame japonais ouvre ainsi le monde d’après : il n’est plus possible d’occulter la propension du capitalisme à nier la vie. Peut-être que 2011 sera l’équivalent de ce que fut 1986, pour le système soviétique de domination : Tchernobyl a signé le début de sa fin. Ce monde d’après, ce monde de la révélation de notre devenir catastrophique, était pourtant annoncé, entre autres, par la première grande crise du XXI ième siècle : 2008 a signé la démesure de l’esprit capitaliste qui, dans sa forme financière et mondialisée, n’a trouvé de limite que dans l’effondrement. Sans l’intervention massive des Etats, dont les néolibéraux ne cessaient de regretter l’excessive importance, les conséquences humaines et économiques auraient été bien pires qu’en 1929, comme beaucoup s’accordent à le reconnaître. Et, maintenant, l’accroissement des dettes publiques exprime, pour une bonne part, ce qu’il faut payer comme prix des errances de la finance et de la cupidité des intérêts dominants. Néanmoins, il ne manquait pas de consciences critiques pour mettre en garde contre les conséquences désastreuses de la renaissance, il y a trois décennies, d’un projet libéral à hauteur du monde. Les réflexions, qui commençaient à intégrer la problématique de Polanyi, participaient à cette vigilance. À ce moment, l’URSS quittait la scène et la Chine acceptait de s’intégrer dans ce qu’on dénommera « globalisation ». Polanyi, qui fut un critique de la première société de marché, celle qui meurt entre 1918 et 1933, offre une perspective78 toujours féconde pour comprendre la signification de la deuxième, qui naît au début des années 1980. Ainsi, nous discuterons d’abord de la crise actuelle selon un point de vue inspiré par Polanyi ; nous évoquerons, ensuite, une approche institutionnelle concurrente ; nous conclurons à un nécessaire retour à l’historicité dans le monde d’après. La seconde crise de la société de marché Polanyi, dans La Grande Transformation, dénonce, très explicitement le caractère utopique de la « société de marché ». Pas d’économie de marché cohérente sans « société de marché », c’est-à-dire sans des institutions et une idéologie particulières. 78 Il nous semble que l’intérêt du travail de Polanyi soit à chercher d’abord à ce niveau général. Cf. G. Dale, Karl Polanyi – The Limits of the Market, Polity Press, 2010. 103 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE La société de marché contient donc un idéal performatif79 : les mots participent de la construction des choses. C’est là, sans doute, une spécificité de Polanyi par rapport à Marx, voire une différence. Mais, il n’y a rien, ici, des fausses oppositions construites à l’époque de la crise du marxisme80, durant les années 1980, à un moment où Polanyi était utilisé par d’anciens marxistes mélancoliques en quête d’une critique radicalement alternative. L’idée, typiquement polanyienne, du capitalisme comme utopie a une conséquence de taille : nombre de traits du système économique relèvent de la contingence, c’est-à-dire du politique, et non pas d’une pure nécessité, qu’il faudrait chercher dans l’état des techniques ou des exigences économiques. Il ne s’agit pas de nier les déterminations, qui pèsent sur les formes sociales, mais de rejeter le déterminisme techno-économique faisant du capitalisme libéral et mondialisé une nécessité. La politique et la culture ont donc leur place dans l’invention d’autres sociétés. Les néolibéraux sont, d’ailleurs, si persuadés que nous aurions trouvé la clef du meilleur des mondes, dans ces années 1990, qu’ils prétendent que les maux économiques de notre temps seraient le fruit d’un manquement à la pleine logique capitaliste : ils dénoncent l’obsession du plein emploi qui aurait politisé le capitalisme81. Nos néolibéraux raisonnent comme si les politiques d’argent bon marché et la prolifération de la dette ne s’inscrivaient pas dans une nécessité qui s’impose à l’élite : conserver un taux de croissance suffisant, qui est la condition de possibilité de cette mondialisation inégalitaire dont se nourrit sa domination. C’est ce point essentiel que nous voulons démontrer, qui implique que, si les Etats-Unis avaient tranché en faveur d’une protection sociale digne de leur puissance, et renoncer aux facilités de la finance et du « libre-échange », cette folie du crédit n’aurait pas été nécessaire. Une des raisons actuelles qui a contraint à l’inflation de la dette, via des inégalités croissantes, est le libre-échange : celui-ci, notamment aux Etats-Unis, est porteur de déflation salariale, ce qui va à l’encontre de l’opinio communis des vingt dernières années. Les fameux excédents chinois, contrepartie comptable d’une partie du déficit commercial américain, ne font qu’exprimer un mode d’accumulation désindustrialisant et financiarisé. La croissance américaine d’avant crise doit donc beaucoup aux 79 Voir N. Brisset, « Une lecture performativiste de Karl Polanyi », XIIIième Colloque Charles Gide, 2010 et S. Plocinizcak, « Au-delà d’une certaine lecture standard de la Grande Transformation », La Revue du MAUSS, n° 29, 2007. 80 La conception de l’échange comme « forme d’intégration » provient du chapitre premier du Capital : M. Cangiani, « Karl Polanyi : une voix du siècle passé ? », Revue du MAUSS, 2, n° 34, p. 2009, pp. 336-348. 81 Souvenons-nous, d’ailleurs, que les libéraux des années 1930 avait déjà pointé, dans le laxisme monétaire, l’origine de la crise de 1929. 104 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE « progrès » des techniques de la finance, occultant à court terme les conséquences d’un endettement excessif, et à la mondialisation, qui a permis de compenser, par la baisse des prix relatifs de certains biens importés, la tendance à la baisse de la demande, elle-même résultat inéluctable d’une redistribution des gains de productivité à une très mince couche sociale. Les discours orthodoxes, souvent aussi hypocrites que rétrospectifs, fustigeant les mauvaises pratiques financières, masquent que celles-ci sont une composante décisive de cette mondialisation dont ils se font les chantres. Sans disséminer ses dettes dans le monde, sans rendre liquides ses créances, le capitalisme bancaire américain n’aurait pas pu développer son activité de prêt avec l’énergie qu’on sait. Sans ce marché financier si attractif parce qu’inventif, les Etats-Unis n’auraient pas bénéficié de toute l’épargne du monde, et jamais la croissance mondiale n’eût été suffisante, dans ce système-monde polarisé autour de l’étalon-dollar. Comment peut-on dénoncer sérieusement l’« aveuglement » supposé de gouverneurs de banque centrale, alors que ceux-ci ne faisaient que rendre possible la dynamique capitaliste : à un moment critique, celle-ci nécessitait de la monnaie bon marché et des garanties étatiques au crédit hypothécaire qui facilitaient l’endettement. Ces gouverneurs n’ont pas de mandat pour expérimenter une stagnation économique, voire une dépression, assurés qu’ils seraient du bon fonctionnement de la « main invisible » sur le « long terme », car, dans le temps de cette expérience, ce sont les fondements de la société de marché qui auraient été ébranlés, voire détruits. Ce sont donc bien les contraintes globales du capitalisme réellement existant et non les « erreurs » d’un président du Federal Reserve System, jugé trop à l’écoute de la démocratie, qui ont configuré les paramètres de la politique monétaire. Déplorer la montée de la dette privée, comme le font les néolibéraux, en faisant comme si elle ne s’inscrivait pas dans les nécessités du système économique des années 1990-2000, revient à vouloir poursuivie la chimère de la société de marché sans que ne soit jamais payé le coût de sa perpétuation82. De ce point de vue, le schéma d’analyse que propose Polanyi pour comprendre la Grande Crise de 1929 est utile pour saisir certaines dimensions de l’effondrement de 2008 : la société de marché ne peut fonctionner sans des dettes, qui expriment sa 82 Après avoir constaté que « la part des revenus du travail dans la richesse mondiale tend à se réduire », un ancien expert du patronat français écrit, avant la crise de 2008, à propos de la « corporation des économistes médiatisés », si silencieuse à l’égard des politiques monétaires expansionnistes et acharnée à défendre sans relâche la mondialisation : « La beauté idéologique du projet nécessite d’ensevelir la question théorique et pratique de la limite qu’il conviendrait de poser à la capacité d’emprunt croissante des ménages occidentaux, capacité sans laquelle le processus serait voué à s’arrêter ». Cf. J-L Gréau, La trahison des économistes, Gallimard, 2008. Voir aussi l’important travail de l’anthropologue P. Jorion qui annonce, dès 2004, le mécanisme de la crise (La revue du MAUSS publiant un extrait de ce livre en 2005). 105 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE condition sociale de possibilité83, et il n’y a aucune « main invisible » permettant aux antagonismes sociaux de se dissoudre dans l’économie. Seuls des compromis institutionnalisés, qui construisent socialement diverses formes d’action collective et les mécanismes de marché, peuvent stabiliser les conflits de classes et d’autres intérêts sociaux, dans la perspective d’une vie viable. En réalité, les marchés ne fonctionnent pas dans un vide social et culturel, sans des institutions qui sont des legs de l’histoire et expriment des rapports de force. Toutefois, en 1929 comme en 2008, ces institutions ne vivent pas de l’air du temps. La finance de marché contemporaine a ainsi rendu possible une croissance, que l’inégalité de nos temps exige structurellement, mais selon des prises croissantes de risque ; à court terme, celles-ci ont engendré des profits privés considérables qui impliquaient, à moyen terme, toutefois, une crise grave et une importante socialisation des coûts. L’école néoinstitutionnaliste a-t-elle relevé le défi de Polanyi ? Ce constat sévère mais réaliste, que nous suggérons pour le capitalisme en début du XXIième siècle, n’est hélas pas possible dans le cadre de l’économie orthodoxe84, dont la cécité vis-à-vis des mécanismes de la crise est remarquable85. L’analyse d’un courant important de la pensée dominante, le « néo-institutionnalisme », qui aime à croire qu’il peut intégrer et dépasser les analyses de Polanyi, est, en réalité, elle aussi, d’une cécité étonnante vis-à-vis du monde réel : la raison provient, essentiellement, de ses tendances à l’apologie implicite du capitalisme américain. Dès 1977, D. North, a voulu relever le « défi » que constituaient les catégories forgées par Polanyi. Néanmoins, le fonctionnalisme et la perspective téléologique propres à D. North empêchaient que le néoinstitutionnalisme, notamment dans la tendance illustrée par cet auteur, pût constituer une objection de taille à l’analyse de Polanyi86. 83 Voir K. Polanyi, « Le mécanisme de la crise économique mondiale », pp. 337-351, dans M. Cangiani, J. Maucourant dir., Essais de Karl Polanyi, Seuil, 2008. 84 À l’inverse, l’économiste hétérodoxe doute du caractère autorégulateur du marché et de la capacité supposée des forces de celui-ci à promouvoir efficacement et spontanément les institutions nécessaires à la reproduction sociale. Celle-ci s’organise depuis 2009 : http://www.assoeconomiepolitique.org/ 85 Il ne s’agit pas d’affirmer que la fonction de l’économiste soit de prédire la crise : on pourra objecter que l’annonce journalière d’un effondrement a toujours quelque chance d’être confirmé par les faits …Mais, sauf à sombrer dans l’insignifiance, la « science économique », qui se veut la reine des sciences sociales, se doit de mettre en lumière ce à quoi nous expose le mode d’accumulation financière. Il ne s’agit pas, comme peut le soutenir une certaine épistémologie de la physique, d’exiger des expériences ou des conjectures cruciales permettant la réfutation d’une théorie, mais bien de demander, à une science empirique, qu’elle jette de la lumière sur les processus et les structures de son objet, de façon à penser les modes de reproductions et de ruptures. De ce point de vue, l’économie encore dominante est plus un discours normatif qu’une science empirique. 86 J. Maucourant, « Le néoinstitutionnalisme à l'épreuve de quelques faits historiques », Economie Appliquée (56), 3, septembre 2003, pp. 111-131. 106 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Toutefois, il est vrai que l’on opposait souvent, à ce type de critiques, que le néoinstitutionnalisme avait évolué durant ces années 1990 et que le livre de North, paru en 2005, pouvait être considéré comme la preuve d’un « nouveau néoinstitutionnalisme ». Dans le meilleur des cas, ces « évolutions » qui prétendent nous éloigner encore de la théorie néoclassique tombent, finalement, dans d’autres impasses, comme un culturalisme attardé ou la redécouverte stérile de vieux problèmes. Bref, le défi de Polanyi n’est pas près d’être relevé par l’économie orthodoxe, même en ses marches87. Ainsi, North critique la « théorie néoclassique », qui fait l’impasse sur la question essentielle de l’origine des perceptions des individus, car on ne peut supposer que « les gens savent ce qu’ils font ». Dès que des choix complexes sont en jeu : « on ne dispose que d’informations incomplètes, interprétées à l’aide de modèles subjectifs ». La science économique ne devrait plus seulement être une théorie des choix, elle devrait être aussi une théorie des « échafaudages », conçus par l’espèce humaine, qui sont en deçà des choix. Ces échafaudages sont, en fait, assimilés au « contexte culturel » qui « encadre les interactions humaines »88. Ce faisant, il serait possible d’expliquer le « processus du changement économique » et de rendre compte de ce que l’histoire économique est souvent une histoire malheureuse. North a ainsi produit une critique des « économistes néo-classiques », naïvement attachés à un laissez faire intégral, c’est-à-dire s’exerçant en dehors des institutions typiques que l’Occident a développées : les difficultés de la transition vers le capitalisme, dans la Russie des années 1990, le prouverait, selon lui, à l’envi. Des économistes hétérodoxes ont ainsi pu croire que North avait rejoint leurs positions …Pourtant, la critique de cette naïveté néoclassique est de relever, très simplement, que, dans un laps de temps aussi court et compte tenu du poids du passé récent, les bonnes institutions ne s’imposent pas si aisément et si facilement. Il est presque surprenant que ces remarques de North, qui combinent aussi bien le simple bon sens que la croyance discutable en la centralité du marché, aient laissé penser qu’un changement théorique majeur se produise, actuellement, en économie. En réalité, l’« évolution » de North n’est pas une rupture avec son économisme originel. En aucune façon, en effet, ses travaux des années 1970 ne sont niés : il s’agit simplement de comprendre pourquoi les « structures incitatives » à l’origine de 87 Toutefois, dans le cadre de l’approche économique, il y a eu des progrès notables, comme en témoigne cette suggestion d’ajouter une forme d’intégration à la problématique polanyienne : M. Vahabi, « Ordres contradictoires et coordination destructive : le malaise iranien », Revue canadienne d’études du développement (30), n° 3-4, pp. 361-392, 2009. 88 D. North, Le processus du changement économique, Editions d’organisation, 2005, p. 74. 107 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE « l’essor du monde occidental » n’ont pas été adoptées ailleurs. Le privilège occidental de la création de « marchés efficients »89 serait à relier à la nature des croyances religieuses90. Il souligne que les « systèmes de croyances religieux comme le fondamentalisme islamique ont joué et jouent un rôle majeur dans l’orientation du développement social »91 (souligné par nous). Ainsi, le « monde islamique » n’aurait pas élaboré des institutions permettant de favoriser les « échanges impersonnels » qui sont des conditions nécessaires de la croissance. On pourrait, certes, ouvrir un débat sur le rapport des différentes civilisations à leurs structures économiques, mais ce que vise North n’est pas tant l’islam comme civilisation que comme religion. Il assène le fait suivant, qui souligne la singularité, non pas de la différence occidentale, mais bien de la différence chrétienne. À supposer que l’impersonnalité des échanges soit l’ingrédient critique du développement, il n’est nulle part rigoureusement démontré par North que la théologie musulmane eût constitué un obstacle à cet égard. L’efficacité de la rhétorique de North tient sans doute à cette confusion, que peuvent entretenir nos temps actuels, entre l’islam comme politique – ce fait récent qu’il prétend ancien et qu’il qualifie de « fondamentalisme islamique » - et l’islam comme civilisation. On pourrait avoir de bonnes raisons de penser que l’islam politique, en tant qu’idéologie justifiant le pouvoir d’une bourgeoisie militaire, comme c’est le cas en Iran par exemple en ce moment, peut être un facteur de cohésion d’un « capitalisme politique » régressif, dont la logique est essentiellement rentière et dont l’assise est un Etat néopatrimonial. Mais, dans d’autres partie du « monde musulman », l’islam politique joue un rôle différent dans la dynamique sociale : il peut s’agir autant d’un produit d’une crise de la modernisation qu’une raison première de cette crise. Ce signifiant labile - « islam » - dont on ne sait trop s’il décrit une réalité politique, culturelle ou civilisationnelle, est utilisé comme pièce d’une rhétorique confusionniste que North dévoile en conclusion de son ouvrage : « Et l’agitation du monde musulman (à la fois à l’intérieur de ce monde et de ses frontières), jette une ombre épaisse sur les perspectives de l’humanité »92. Pourtant, le rôle des Etats-Unis et de leurs guerres préventives n’aurait-il pas quelque responsabilité décisive dans cette « agitation » qui menacerait l’humanité même ? Et, si l’humanité est menacée, en tant que telle, n’est-ce pas plutôt en raison de l’interaction létale entre l’écosystème et l’économie capitaliste, tant vantée par North 89 Ibid., p. 165. 90 Ibid., p. 15. 91 Ibid., p. 37. North pense que les religions expriment des « contraintes démographiques/et de ressources » propres aux sociétés. Cf. p. 175. 92 Ibid., p. 216. 108 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE et ses épigones, qu’en raison de dérives fascisantes observables dans certaines parties de ce conglomérat problématique, le « monde musulman » ? Les mouvements révolutionnaires, en Iran et dans les nations arabes, qui se développent entre 2009 et 2010 et qui ont surpris autant des dictatures proches de l’Occident que leurs supposés ennemis – les islamistes – montrent par ailleurs que le travail de North, englué dans ses a priori idéologiques, ne nous apprend rien du monde réel. Il eût fallu sans doute prendre au sérieux les mots mêmes adoptés par North pour comprendre que le néoinstitutionnalisme n’est qu’un avatar de l’ « impérialisme de l’économie » à l’égard des autres sciences sociales. Les « économies politiques », qui sont au cœur de son analyse du développement, ne désignent que les logiques de l’organisation politique des sociétés ; l’« économie politique » revendiquée par les néoinstititionnalistes est à comprendre comme l’économie du politique. Quant à l’« efficience », elle renvoie à un état techno-économique où « le marché présente les coûts de productions et de transaction les plus bas possibles »93 : le lien est donc total entre « marché » et « efficience ». On comprend que ces « économistes du politique » aient été incapables de théoriser une protection sociale efficace et peu coûteuse et que naisse, sous leur plume, cet étonnant syntagme : le « marché économique ». Il nous semble ainsi que North qui voulait explicitement relever le défi de Polanyi ne l’a pas relevé : des catégories comme les « coûts de transaction » ou les « échafaudages » n’ont pas de force explicative sérieuse, que l’on considère les problèmes économiques actuels du « monde musulman », les difficultés de la transition postsoviétique ou la question de l’origine du capitalisme. Conclusion : l’empire fragile des marchandises fictives La catastrophe nucléaire japonaise de cette année 2011 accroîtra les contraintes pesant sur ce qui a constitué, longtemps, un facteur crucial de légitimation du capitalisme : la croissance. Il se peut que l’idéologie économique perde de sa capacité à organiser le réel. Dès 2008, dans le sillage de travaux nombreux, F. Neyrat nous avertissait de ce que la notion de « risque », cœur de l’économie contemporaine, était impuissante à appréhender les déterminations catastrophiques de notre monde, où l’interdépendance croissante entre économie et écosystème vide de sens la notion de « risque naturel ». Au minimum, admettons que le risque, qui compte pour l’économie et la société, est absolument non probabilisable : ceci est le cauchemar de la science économique encore dominante. C’est la fin de la logique assurantielle, pivot de l’orthodoxie en économie et de nombres d’institutions économiques, laquelle peut être masquée par une socialisation croissante des coûts privés. 93 Ibid., p. 33, n.3. 109 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Deux évolutions sont possibles. Nous pouvons persévérer dans la logique létale de la société de marché ou de ses fausses alternatives, que sont les « capitalismes politiques » à la chinoise ou à l’iranienne. Nous devons d’ailleurs être conscients que la célébration de l’identité, via une habile mobilisation des mécanismes de réciprocité, peut être un avantage pour assurer la perpétuation de la société de marché. Si la revendication de certains modes de vie constitue parfois un obstacle dressé contre certaines extensions du Capital, il n’en reste pas moins que, faute d’une alternative politique globale, la politique de l’enracinement, la création de communautés, peut se substituer aux interventions de l’Etat pour ce qui est de la stabilité sociale. Le néolibéralisme trouve ainsi un allié aussi inattendu que solide dans ces « formes d’appartenance à des communautés organiques définies à partir de la parenté, de l’ethnicité et de la religion »94. L’idéologie du capitalisme mondial est une foire aux identités aux vertus bien conservatrices, ce que ne comprennent pas certains contestataires médiatiques de la société de marché. Mais, bien loin du projet néolibéral et de ses alliés identitaires ou religieux, voire de ses opposants qui ne font que revisiter les formes du vieux fascisme européen, nous pourrions nous saisir de la réalité des catastrophes pour redonner, comme l’a soutenu justement L. Loty, aux fictions utopiques leurs capacités à susciter une imagination alter-réaliste, contre l’optimisme libéral qui nous fait accroire que le monde actuel est le meilleur des mondes. D’une certaine façon, il serait ainsi possible de quitter nos temps postmodernes pour aller vers une altermodernité. F. Jameson a justement caractérisé notre époque finissante « comme celle du déclin de notre historicité, de notre capacité vécue à faire activement l’apprentissage de l’histoire »95. Le domaine esthétique est sans doute celui qui avait le plus exprimé ce moment historique, « dépression mélancolique » selon N. Bourriaud, liée au travail de deuil de l’idéologie des progrès techniques, politiques et culturels96. Cet auteur soutient également qu’une altermodernité travaillerait déjà le champ esthétique où, après la si postmoderne assignation aux origines, expression de l’idéologie de la fin des idéologies, viendrait le temps d’un « espace déhiérarchisé, celui d’une culture mondialisée et préoccupée par de nouvelles synthèses »97. Ne pas renoncer à l’approfondissement d’une culture commune à l’échelle du globe, ce qui est 94 Nous nous inspirons ici de l’analyse de A. Bugra, « Karl Polanyi et la séparation institutionnelle entre politique et économie », Raisons politiques – études de pensée politique, 20, 2005, pp. 37-55. 95 F. Jameson, Le Postmodernisme ou la logique culturelle du capitalisme tardif, Ecole supérieure nationale des Beaux-Arts de Paris, 2007, p. 62. 96 97 Nicolas Bourriaud, Radicant – pour une esthétique de la globalisation, Denoël, 2009. Ibid., p. 215. La référence botanique aux radicants « qui font pousser leur racine au fur et à mesure de leur avancée » (p. 58) est essentielle : le sujet contemporain est ici « tenaillé entre la nécessité d’un lien à son environnement et les forces du déracinement, entre la globalisation et la singularité ». 110 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE un acquis positif des tendances récentes de la civilisation, tout en refusant les logiques d’assignation, les injonctions à l’authenticité, pourrait être un constituant d’une vie bonne pour ce XXIième siècle. Seule cette conception de la vie, qui pose la question de savoir ce que nous avons envie d’être, pourrait nous permettre de ne pas fuir dans l’avoir, qu’offre l’idéologie économique mortifère. Or, la crise du capitalisme mondialisé et le choc écologique sont justement des faits majeurs susceptibles de réveiller la politique, c’est-à-dire ipso facto de nous rétablir dans l’historicité, de traduire l’exigence de la vie bonne pour aujourd’hui. On l’aura compris : ce rétablissement ne pourra pas être un retour à l’identique, l’altermodernité n’est pas une néomodernité. Polanyi, en son temps, avait déjà mis en question la modernité libérale, d’où était issue l’« impasse fasciste »98. Plus tard, il a opposé la nécessité de l’habitation raisonnée du monde à l’amélioration pourvoyeuse de profit99, intitulant un chapitre de la Grande Transformation, « Le marché et la nature », qui se finissait ainsi : « On ne peut séparer nettement les dangers qui menacent l’homme de ceux qui menacent la nature »100. La crise de la modernité ne mettait donc pas en cause un seul projet humain (la démocratie sociale contre la société de marché) mais, peut-être, le monde lui-même au-delà de l’homme ? La question ici n’était plus de vivre mais de survivre, suite au productivisme impliqué par le Grand Marché. Près de cinquante ans après la mort de Polanyi, ne serait-il pas temps de prendre au sérieux ces questions, même si, en Occident, nous avons cru, un peu vite, que notre vie postmoderne impliquait un mode de vie postindustriel101 ? Malay, le 15 juin 2011 98 K. Polanyi, « L’essence du fascisme », pp. 369-395, dans M. Cangiani, J. Maucourant dir., op. cit. 99 « Habitation contre amélioration » est le sous-titre du chapitre 3 de La Grande Transformation. 100 K. Polanyi, La Grande Transformation, op. cit., p. 253 101 La mondialisation est accumulation du capital à l’échelle mondiale, avec une division du travail telle que se pose avec moins de vigueur la question de la production industrielle en Occident, la baisse de son coût relatif aidant à cette négligence. Mais, la nécessité de la démondialisation, en temps écologiquement difficiles, et d’une réindustrialisation non productiviste peut rebattre les termes de la question industrielle. Il faut noter qu’une démondialisation de l’économie ne signifie pas nécessairement la démondialisation culturelle portée, entre autres, par les flux d’information. 111 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Bibliographie N. BOURRIAUD, Radicant – pour une esthétique de la globalisation, Denoël, 2009. N. BRISSET, « Une lecture performativiste de Karl Polanyi », XIIIième Colloque Charles Gide, Paris, 2010. A.BUGRA, « Karl Polanyi et la séparation institutionnelle entre politique et économie », Raisons politiques – études de pensée politique, 20, 2005, pp. 37-55. M. CANGIANI « Karl Polanyi : une voix du siècle passé ? », Revue du MAUSS, 2, n° 34, p. 2009, pp. 336-348. G. DALE, Karl Polanyi – The Limits of the Market, Polity Press, 2010. J-L GREAU, La trahison des économistes, Gallimard, 2008. 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Michelsen Institute Introdução: Teorizando o gradualismo no contexto da descentralização Na sequência das “eleições gerais” de 2012, Angola está pronto para entrar num período de grandes transformações na área da governação local. A introdução da reforma autárquica – segundo o Ministro da Administração do Território prevista para 2015102 – será de certeza a mudança mais importante na governação local, desde a independência. Quando as autarquias forem criadas, os Angolanos vão pela primeira vez eleger políticos para gerir o governo local. No entanto, a Constituição prevê, nas suas normas transitórias, a introdução gradualista das autarquias e políticos e tecnocratas do governo actual enfatizam, desde há muitos anos, a necessidade do processo de descentralização e desconcentração ser guiado pelo princípio de gradualismo. A expressão “gradualismo” parece algo pacífico, pouco controverso ou até banal – significando apenas que as coisas se farão pouco-a-pouco e não tudo de uma vez – mas implicações, da sua aplicação, no contexto político e constitucional angolano, podem ser diversas, na medida em que a aplicação progressiva das autarquias locais seja em relação ao território ou em relação as matérias de governação. . Urge, por tanto, discutir com algum pormenor qual o significado do “gradualismo” na governação local em Angola. A criação de autarquias em Angola responde à necessidade essencial de qualquer Estado moderno de criar instituições de governação descentralizada. Simplesmente não é possível responder às demandas de milhões de cidadãos, não é possível garantir direitos e serviços públicos para milhões de pessoas e não é possível consolidar uma base tributária universalizada, sem que haja um mínimo de autonomia, capacidade e sofisticação burocrática local para responder às exigências dos cidadãos. A história dos Estados evidencia que os órgãos do Estado central tiveram que fortalecer a sua capacidade burocrática e institucional ao nível descentralizado. Daí, em particular no fim do último século, a descentralização ter recebido muita atenção na teorização do “desenvolvimento”, nomeadamente colocando forte entusiasmo sobre os grandes 102 Ver entrevista de Bornito de Sousa, Ministro da Administração do Território, aa Expansão, 6 de Abril, 2012, e notícia da Angop,25 de Outubro de 2012. 114 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE benefícios que a descentralização iria criar. Um governo descentralizado seria mais próximo dos eleitores; mais responsável (accountable); mais eficaz na satisfação dos interesses dos munícipes, prestando-lhes melhores serviços, sejam pobres ou ricos. Logo levantaram-se dúvidas (Crook and Manor 1999). Em grande parte, o optimismo tomava como ponto de partida que “todos” convergiram no desejo de descentralizar. Recentemente, os estudos dos resultados dos processos de “descentralização” têm sido menos encorajadores, – devido ao facto destes, muitas vezes, não terem passado do nível retórico para a prática –. Houve mesmo um retornar do pêndulo e actualmente bastante literatura visa explicar ou teorizar os desapontamentos através de processos de recentralização – ou mesmo estratégias para enredar a descentralização ou torná-la num instrumento dos executivos que por muito tempo têm dominado os seus Estados (O’Neill 2003; Dickovick 2011; Poteete and Ribot 2011). Neste artigo não se especula sobre as razões explicativas da lentidão do processo de descentralização em Angola e os adiamentos da implementação das autarquias. O que se pretende é analisar a introdução das autarquias, no seu contexto histórico, utilizando a experiência de autarquização de Mozambique como um “espelho” para Angola. Ao contrário dos teóricos da descentralização dos anos 1990 que se inspiraram nas expectativas ideológicas,103 este estudo baseia-se no “realismo histórico” que estuda a governação local no seu contexto histórico e de maneira comparativa. Autores como Mamdani (1996), Herbst (2000) e Boone (2003) olhavam sempre qualquer reforma corrente na governação local nos países Africanos como uma nova volta na dança histórica entre os níveis centrais e locais – em que a capacidade do nível central em impor a sua ordem nos territórios periféricos do Estado é, comparada com os países mais “avançados”, bastante reduzida. A descentralização não é, nessa óptica, uma novidade. A novidade nos anos 1990 era o verniz ideológico (positivo) associada à descentralização. Enquanto todos os países Africanos têm as suas especificidades institucionais e socio-económicas – a comparação revela isto – os países Africanos também se confrontam com desafios que são comuns e especificamente africanos. A experiência colonial era comum, o modo de colonialismo era diferente. A descolonização aconteceu mais ou menos na mesma altura, com variações sim, mas sobre temas recorrentes. 103 De certa forma, houve uma convergência temporária de vários correntes ideológicos que favorecia a “descentralização” como modelo de desenvolvimento. Por um lado, houve o optimismo da esquerda ocidental que via na descentralização uma maneira de fortalecer o “povo” perante os Estado dominado pelos interesses das elites. Por outro lado, o Banco Mundial e outros propagantes da descentralização via nela uma maneira de melhorar os serviços e no mesmo tempo conter o poder central do Estado e limitar a sua intervenção no mercado livre. 115 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Um dos argumentos fundamentais de Mamdanique se debruça sobretudo sobre a experiência dos países anglófonos, é que a governação descentralizada era uma estratégia comum dos regimes coloniais no tempo do “indirect rule” (dominação indirecta). Não lhes importava o “despotismo local” dos chefes tradicionais, e os chefes foram delegados poderes e competências significativas para governar o dia-adia nas suas “comunidades”. Bastava que esses se mantivessem fiéis à supremacia dos oficiais coloniais (Mamdani 1996:37-61). Pois a governação descentralizada não é uma novidade e hoje, como no tempo colonial, a questão é a de saber se levará a “despotismo” ou democracia local, é a de analisar a quem beneficiam as reformas – não pela retórica em que as reformas são embrulhadas, mas na sua prática. No caso de Angola, a preocupação principal a discutir, neste artigo, é se o “gradualismo” vai, eventualmente, significar uma bifurcação do Estado e a contínua divisão entre o meio rural e urbano. A seguir este artigo começa por recordar as principais características da governação local actual e as autarquias, assim como estão visadas na Constituição. Ligaremos logo o significado do gradualismo com o problema da bifurcação do Estado que é um dos problemas historicamente herdados e que é comum em muitos países Africanos. Primeiro far-se-á uma recapitulação teórica do problema e segundo olhs para um exemplo concreto e bastante relevante para Angola, que é o caso de Moçambique. Finalmente, o artigo atreve-se a sugerir uma maneira alternativa de pensar em gradualismo e descentralização democrática. O país Africano mais centralizado Angola é possivelmente o país Africano mais centralizado – quer olhemos para o sistema político, administrativo ou financeiro. É excepcional a centralização financeira, se verificarmos como a receita fiscal angariada localmente é recolhida pelo Ministério das Finanças e depositada na Conta Único do Tesouro (CUT) – tal como é excepcional a maneira como o investimento público é dirigido da capital do país. Uma das consequências, bastante provável mas não inevitável, é a formidável concentração em Luanda das despesas públicas correntes e do investimento público (Rocha 2010). Com a recente ênfase colocado no processo de “desconcentração”, o município alcançou o estatuto de “unidade orçamental” no Orçamento Geral d Estado (OGE). No este novo estatuto não tem resultado na disponibilidade de grandes fundos, pois a grande parte dos investimentos públicos tendem a ser implementados como programas provinciais ou mesmo centrais. Em 2007-2008, aproximadamente 68 municípios foram dotadas de uma verba correspondente a cinco milhões de dólares americanos – abrindo assim um relacionamento directo entre os administradores municipais e o Ministério das Finanças, ultrapassando assim o nível provincial (Orre 2009; Santos 2012a:5). Não foi 116 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE publicado (ao nosso conhecimento) nenhuma avaliação dos resultados desta “experiência” de desconcentração, mas acabou por ser “sol de pouca dura”, pois o programa foi descontinuado e substituído pelo actual Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza(PMIDRCP), que passou a ser gerido a partir da Casa Civil do Presidente da República104 (Santos 2012b:8-9), o que faz que a mão central se mantenha muito forte na gestão desses programas. Angola também se distingue, mesmo comparado com os seus pares Africanos, pelo seu grau de centralização politico-administrativa. A Constituição de 2010 confere ao Presidente da República a prerrogativa de nomear os governadores e os vicegovernadores nas províncias. Actualmente, isto significa que mais que 70 líderes da governação central no território são directamente nomeados pelo PR. Um governador é, segundo, o artigo nº 201, ‘representante da administração central na respectiva Província, a quem incumbe, em geral, conduzir a governação da província’. A Constituição remete por tanto às futuras autarquias criarem instituições que represente os cidadãos locais, já que os governadores respondem política e institucionalmente perante o PR (artigo 201, CRA). Os governadores, sendo assim os “confidés” do PR, nomeiam, por sua vez, todos os administradores municipais e comunais (e ainda os seus adjuntos), embora sob consulta do Ministro da Administração Territorial. A Constituição não prevê o funcionamento da administração municipal ou comunal (já que a administração local do Estado é feita pelo governo provincial). No entanto, segundo a mais recente “Lei sobre os Órgãos da Administração Local do Estado (Lei 17/10), o relacionamento dos administradores municipais e comunais com o governador provincial é assimilável ao deste com o PR, pois estes representam o governador nos seus respectivos territórios e são responsáveis perante quem os nomeiam, isto é, os seus superiores hierárquicos. Não há, por tanto, nenhum dispositivo constitucional ou legal que garanta que os líderes político-administrativos locais prestem contas aos seus munícipes. É importante salientar que neste ponto, a prática político-administrativa não parece fugir muito à legislação vigente. É o que se pode constatar em estudos nos municípios (Orre 2009). Angola é, por isso, um dos países mais centralizados, em termos financeiros e politicoadministrativos, em toda a África.105 104 Ao máximo, esse programa pode financiar obras nos municípios até USD 2,5 milhões. 105 Em Moçambique, o sistema de governação é também muito centralizado zonas rurais, embora os Órgãos Locais do Estado no nível distrital (que corresponde ao município em Angola) devam e podem angariar fundos localmente que se usam no financiamento de planos concebidos localmente. Moçambique também avançou com a autarquização das cidades em 1998. 117 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Devolução, desconcentração, gradualismo e a bifurcação do Estado A descentralização em Angola pode tomar duas vias. Uma delas é a autarquização, que vai ser estudada em baixo e refere-se ao processo de criação e implementação de autarquias. Seria esta a via que representaria mais uma descentralização democrática. A outra via é o que na terminologia Angolana tende a ser referido como desconcentração, o que significa continuar a administrar os municípios através de representantes da administração central mas colocando mais recursos financeiros e humanos ao dispor desses escalões inferiores da administração local do Estado centralista. Os esforços e a prática do governo angolano têm até hoje em dia sidos focados nesta via. Daí que o Ministro da Administração Territorial, Bornito de Sousa, enfatizou a estratégia de fortalecer a administração municipal.106 Associado à via de desconcentração podemos assinalar também a possível transferência ou delegação gradual de poderes às autoridades tradicionais. O que se tem que entender, é que o gradualismo na introdução das autarquias irá levar, no mais provável, a uma combinação das duas vias. O nosso argumento a seguir é que essa combinação pode acabar por entrar em conflito com o objectivo de autarquização e a descentralização democrática. Irá possivelmente contribuir para a contínua bifurcação do Estado ao longo da divisão rural-urbano. O conceito será explicado a seguir, após uma breve recapitulação dos princípios que criam uma autarquia. Deve-se fazer uma tentativa de desembalar os conceitos em questão. Para começar, o processo de descentralização democrática implica por definição que o Estado transfira competências, recursos e poder real para uma autoridade local que representa os cidadãos locais, e que é por eles eleita e que presta contas perante os eleitores locais. É um processo que também tem sido referido como devolução (Crook and Manor 2000; Hadenius 2003; Olowu and Wunsch 2004) em que o Estado renuncia a administração local, ao nível do município. Por seu lado, como alternativa, o Estado pode desconcentrar recursos para escalões inferiores da administração local do Estado, ao nível do município. A diferença entre descentralização democrática e desconcentração é que esta não tem como objectivo criar mais autonomia política local, mas limita-se a criar alguma autonomia administrativa dentro da hierarquia estatal. Não sendo o processo de descentralização político-administrativa realizado em simultâneo, pode-se fazer gradualmente. Mas, sabendo que essa descentralização 106 O Ministro é citado: ‘Consideramos um desafio reduzir o aparelho central e reforçar os municípios...’ e ‘...a visão será priorizar a municipalização, isto é, a criação de quantos municípios se mostrarem necessários para aproximar os serviços aos cidadãos’. Ainda é citado: ‘...é necessário que todos tenham em primeira linha a importância que constitui o município, como elemento da cadeia de governação que permite uma maior proximidade e uma maior participação dos cidadãos na resolução dos seus problemas’. (Expansão, 6 de Abril, 2012) 118 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE pode ser abordada do ponto de vista do seu desdobramento no território nacional ou pelo conjunto de competências que o Estado-central transfere para as colectividades territoriais geridas de forma autónoma, é relevante, ao analisarmos a autarquização, distinguir dois tipos de gradualismo: gradualismo funcional e gradualismo geográfico. O primeiro tipo refere-se ao processo de transferência gradual de funções e competências para órgãos das autarquias locais (ou mesmo para os órgãos desconcentrados do Estado). Quer dizer, por exemplo, que numa primeira fase do processo a responsabilidade para o embelezamento público (parques, ruas e património) é transferida às autarquias, a transferência de tarefas e competências mais “pesadas” (como policiamento ou a educação secundária) é adiada para fases posteriores. O segundo significa um processo em que a autarquização começa apenas em algumas zonas (por exemplo, municípios mais desenvolvidos) do país. Essas são “convertidas” em autarquias, ganham estatuto jurídico como autarquias e devem eleger os órgãos de governação autárquica, Enquanto outras zonas têm que esperar por uma outra oportunidade. Nota aqui que a escolha da palavra “zona”, em vez de por exemplo “município”, não é por acaso. Em Angola, não existe clareza se os municípios vão ser “convertidos” em autarquias, assim que todo o território dum dado município passa a ser a jurisdição da autarquia. Também pode acontecer que apenas certas zonas urbanas vão ser separadas dos municípios e que se criarão novas delimitações geográficas. A Constituição também abre a possibilidade de criação de autarquias que se estendam pelos territórios de vários municípios. A bifurcação do Estado e reforma de governação local Neste artigo seguiremos o conceito do Estado bifurcado, desenvolvido por Mahmood Mamdani na sua obra “Citizen and Subject” (Mamdani 1996). A bifurcação do Estado é um rótulo dado ao cenário bastante típico dum Estado Africano em que uma série de dicotomias caracteriza a situação historicamente herdada. O colonialismo instituiu uma separação rígida entre as cidades onde residiam os brancos/Europeus e zonas periféricas e rurais, onde viviam os nativos/bantus. Os primeiros eram considerados cidadãos, com os devidos direitos e deveres codificados na lei escrita. Em caso de transgressões e litígios, encontravam-se sob jurisdição do sistema judicial baseado no direito Europeu. Os segundos, os “nativos”, consideravam-se sujeitos da sua “comunidade”, “tribo” ou “grupo étnico” e a liderança do seu chefe tradicional (seja esse verdadeiramente “tradicional” ou imposto pelo Estado colonial). A lei que se aplicava nessas jurisdições, era principalmente a “lei consuetudinária”, isto é, os usos e costumes como definido pelo grupo, família, linhagem ou clã dominante numa determinada área. Enquanto os cidadãos das cidades pagavam uma variedade de 119 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE impostos (sob rendimento, renda, venda, etc.) os nativos nas zonas rurais pagavam imposto por cabeça (head tax) ou por agregado familiar (“imposto de palhota”), geralmente cobrado pelo chefe tradicional. Um caso paradigmático dessa separação é o próprio Estatuto dos Indígenas que se aplicava no império Português a partir de 1954 (que veio a confirmar o que já era praticado). Resumido por Feijó (2012:327): ‘... este diploma prescreve que os indígenas se regem, salvo disposição em contrário, por usos e costumes locais’. Isto, evidentemente, colocava os chefes tradicionais reconhecidos pelo governo colonial numa posição de poder perante a população que cabia na “jurisdição” deles, pois os chefes funcionaram como intérpretes ou guardiãs dos “usos e costumes”. Enquanto o caso do colonialismo Português não é um exemplo democrático, mesmo nas colónias Portuguesas as cidades e vilas experimentavam com autarquias cuja liderança gozava de bastante autonomia do poder central – claro, isto era privilégio dos colonos brancos e dos “assimilados”. As autarquias e freguesias administravam muitos serviços urbanos. Nas zonas rurais, o conceito de “serviços públicos” era quase inexistente, e não havia hipótese nenhuma de eleger o administrador local, pois este era nomeado do Estado central e respondia perante o Estado central. Na sua análise, Mamdani conclui que os regimes pós-coloniais enfrentaram a bifurcação do Estado de maneira diferente, mas não a conseguiram eliminar. Seria demais referir todo o argumento aqui, mas por via de conclusão, a solução para os regimes de “nacionalismo radical” (Mamdani 1996:291) – o Estado do MPLA contavase entre estes – visavam eliminar o despotismo descentralizado associado às chefaturas. Mesmo assim, acabaram por substituir o despotismo descentralizado com o centralismo não muito menos autoritário. Tipicamente, tirando a euforia inicial da independência e o “poder popular”, a administração local do Estado acabou por ser uma máquina burocratizada e centralizada e pouco virada a satisfazer as necessidades da população local. Pela incapacidade de prestar serviços públicos e de marcar a sua presença mais que nominalmente (em particular durante tempos de guerra), o Estado, em Angola (tanto como, por exemplo, em Moçambique) acabou por, pouco a pouco, aceitar o papel dos chefes tradicionais na governação local (Orre 2010). Nas cidades, onde o governo teve uma presença forte, os cidadãos respondiam perante o sistema jurídico e judicial do Estado, nas zonas rurais os “usos e costumes” continuavam dominantes. É seguro dizer que é esta a situação que se vive em Angola hoje em dia. Se restar alguma dúvida, a própria Constituição a consagra, nomeadamente nos artigos 223 e 224. Voltaremos já a esse assunto. Constituiu-se por tanto, uma legislação e sistema administrativo para as cidades, e outro para as zonas rurais que é o domínio das 120 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE autoridades tradicionais. A tendência tem sido esta em vários países na África austral recentemente. As autarquias e o gradualismo na Constituição de 2010 Embora a implementação das autarquias já tenha sido prevista a partir da Lei Constitucional de Setembro de1992, houve relativamente pouco debate em Angola sobre a sua realização: Qual o desenho institucional? Qual o sistema eleitoral? Quais atribuições, prerrogativas e competências iriam ter uma autarquia? Quais fontes de rendimento iriam ser concedidas às autarquias? Como iria conviver e dividir tarefas e autoridade com os representantes dos órgãos locais do Estado? Estas e outras perguntas são muito pertinentes a ponderar e discutir para um país como Angola, porque as suas respostas terão, com certeza consequências das mais variadas, até mesmo no dia-a-dia do povo Angolano. Mesmo se a Constituição de 2010, veio dar resposta a uma boa parte das perguntas supra colocadas, e isto com apenas um debate público mínimo sobre o assunto, ela determina um modelo específico, fechando a porta para o que deveria constituir uma discussão pública significativa. Mais problemático ainda é o facto do nível de detalhe constitucional tornar mais difícil fazer ajustes institucionais após a implementação das autarquias. A constituição preludia, por isso, uma flexibilidade institucional que poderse-ia provar valiosa caso a implementação e a prática revelassem dificuldades. Recapitulamos aqui os principais parâmetros ditados pela Constituição. A autarquia Angolana terá uma assembleia composta por representantes dos cidadãos locais. Os representantes são eleitos em eleições locais onde todos cidadãos locais podem votar. Nessa mesma eleição - livre, directa, secreta e periódica – também se vai eleger um presidente da autarquia. O presidente eleger-se-á da mesma maneira (bastante idiosincratica Angolana) que o Presidente da República é eleito, isto é, o cabeça da lista mais votada para a Assembleia torna-se presidente da autarquia. O “executivo” da autarquia é o órgão colegial composto do seu líder, o presidente, e dos secretários por ele nomeados que politicamente responsável perante a assembleia autárquica. A Constituição Angolana de 2010 introduz, no seu artigo 242 nº 1, a seguinte “disposição final”: ‘A institucionalização efectiva das autarquias locais obedece ao princípio do gradualismo.’ Parece uma afirmação que pouco diz, além do óbvio que não se pode fazer tudo de uma vez. Mas continua no nº 2: Os órgãos competentes do Estado determinam por lei a oportunidade da sua criação, o alargamento gradual das suas atribuições, o doseamento da tutela de mérito e a transitoriedade entre a administração local do Estado e as autarquias locais. 121 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Concretizando assim o significado do “gradualismo”, este parágrafo visa duas ambiguidades centrais que são destinadas a causar muita polémica nos anos que vêm. Primeiro, afirma que uma lei (futura) vai determinar quando e, necessariamente, onde se vai introduzir uma autarquia – isto é, grudualismo geográfico. Segundo, o parágrafo dita que num período de transição as tarefas atribuídas às autarquias possam ser transferidas gradualmente, o que chamaremos gradualismo funcional. Abrimos aqui um parêntese para comentar que, de certa forma, a Constituição (como tantos outros) introduz princípios que podem ser mutuamente contraditórios. A Constituição não diz explicitamente que o voto para escolher os representantes do governo local (autárquico) é um direito. A questão que se coloca é a de saber se o gradualismo significa que alguns Angolanos podem votar para eleger o governo local, enquanto outros Angolanos não podem (ou têm que esperar até que o gradualismo eventualmente os faça cidadãos de uma autarquia). Enfim, o gradualismo vai ou não vai chocar com outros princípios constitucionais? Visto no seu conjunto, uma série de artigos constitucionais apontam para o universalismo e não para o gradualismo. O artigo 22º evoca o “princípio da universalidade”, significando que todos os cidadãos têm os mesmos direitos e deveres. O artigo 23º garante a “igualdade” – que todos são iguais perante a lei, e que ninguém pode ser prejudicado ou privilegiado (mesmo se em razão do seu local de nascimento ou condição económica). O artigo 52º cria uma norma particularmente forte: ‘Todo o cidadão tem o direito de participar na vida política e na direcção dos assuntos públicos, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos’. Finalmente, o artigo 54º garante que ‘[T] odo o cidadão, maior de dezoito anos, tem o direito de votar e ser eleito para qualquer órgão electivo do Estado e do poder local e de desempenhar os seus cargos ou mandatos, nos termos da Constituição e da lei.’ A ênfase foi introduzida pelo autor para chamar atenção aos parágrafos que, ao nosso ver, de forma legalo-retórico – indicam o contrário ao princípio de gradualismo geográfico na introdução das autarquias. Isto é, esses parágrafos sugerem que os “direitos autárquicos” devem ser introduzidas ao mesmo tempo para todos os cidadãos. Para já deixaremos para as lutas políticas e jurídicas a interpretação desses parágrafos. Seguiremos, em vez disto, utilizando comparativamente algumas experiências das ciências políticas e para discutir os pontos teóricos relevantes para o caso de Angola. Embora não sendo o foco deste artigo, vale a pena uma nota para chamar atenção para um exemplo, ao nosso ver, de sobredeterminação constitucional em Angola. Ao consagrar que o executivo autárquico provém dos políticos eleitos para a assembleia autárquica existe a possibilidade duma excessiva “politização” da autarquia. Em 122 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE qualquer país, com governos locais funcionais, deve-se encontrar um equilíbrio entre o poder político local e o poder “administrativo” – este último composto pelos oficiais e funcionários que eventualmente trabalharão na prestação de serviços autárquicos (nas áreas de saneamento, educação, saúde, ambiente, etc.). A Constituição Angolana nada diz sobre a composição da administração burocrática da autarquia (o que não constitui em si qualquer problema, pois isto pode ser determinado por lei comum) mas sim garante que a liderança autárquica vai ser alterada com cada ciclo eleitoral, o que pode criar distúrbios e descontinuidade na administração. Uma tarefa que se coloca perante a administração local de Angola é a sua despolitização, senão mesmo despartidarização, e o estabelecimento duma administração local da coisa pública baseado em meritocracia. O “equilíbrio apropriado” “balanço fino” na governação local supramencionado, é o resultado da negociação entre a opinião profissional dos funcionários públicos e a opinião política dos partidos. A preocupação aqui é a ênfase do lado da “politização” das autarquias e a ausência total de discussão da “profissionalização” da mesma autarquia. Autoridades tradicionais e o gradualismo O discurso, e se calhar ainda a prática, de gradualismo também se aplica num outro campo da governação local em Angola, sendo esse o da relação entre o Estado e as “autoridades tradicionais”, vulgo “sobas”.107 A diferença em relação ao gradualismo em relação às autarquias, neste caso, trata-se de transferência de responsabilidades, competências e recursos para figuras que não são democraticamente eleitas.108 Esta problemática também entra pela porta da Constituição. Uma governação democrática local visa criar uma entidade que toma conta de “assuntos públicos locais” que não serão administrados ou geridos directamente pelo Estado central (nem pelos seus órgãos desconcentrados). A autarquia funciona, por tanto, num patamar intermédio entre o Estado e a esfera privada e da sociedade civil. É o que a Constituição Angolana refere como Poder Local. Só que, a autarquia não é o único poder local existente segundo a Constituição, porque o poder local compreende, além das autarquias locais, as ‘instituições do poder tradicional’ (artigo 213). A Constituição 107 A partir de agora deixarei de colocar autoridades tradicionais entre aspas, não porque é um termo absolutamente claro ou que não deixa de ser um eufemismo, mas apenas porque colocá-lo entre aspas em nada ajuda a clarificar a matéria. 108 Isto não é o mesmo que dizer que as autoridades tradicionais não possam gozar de legitimidade, mas é fundamentalmente diferente que a autarquia. Enquanto a legitimidade da autarquia vai ser a eleição democrática, os sobas (como “autoridades tradicionais”) são – segundo a Constituição – poderes tradicionais que tem a sua origem até antes do Estado e a Constituição. Por isso, o Estado reconhece a legitimidade das autoridades tradicionais. Teoricamente, independentemente da legitimidade que um soba goza dentro da comunidade, ele pode evocar a sua linhagem para legitimar-se perante o Estado e obter o seu reconhecimento. 123 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE não clarifica satisfatoriamente o fenómeno do “poder tradicional”, embora possa darnos uma pista: O reconhecimento das instituições do poder tradicional obriga as entidades públicas e privadas a respeitarem, nas suas relações com aquelas instituições, os valores e normas consuetudinários observados no seio das organizações político-comunitárias tradicionais e que não sejam conflituantes com a Constituição nem com a dignidade da pessoa humana. (artigo 223º, CRA) A Constituição reconhece a existência do pluralismo jurídico no país, e aceita a sua aplicação mas é pouco explicita sobre onde e quando se aplica a jurisdição “tradicional”. Suspeitamos que vai ser nas “comunidades rurais” que se venha a aplicar tal jurisdição. O que sabemos é que outorga um papel especial para o que na prática tendem a ser os sobas, cujo autoridade e poder é respeitada principalmente nas zonas rurais: As autoridades tradicionais são entidades que personificam e exercem o poder no seio da respectiva organização político-comunitária tradicional, de acordo com os valores e normas consuetudinários e no respeito pela Constituição e pela lei. (artigo 224º, CRA) A questão das autoridades tradicionais em Angola vai necessariamente sofrer um tratamento superficial neste texto. Para já, apesar de que a grande maioria de Angolanos, no meio rural, sabe quem é o soba, não é nada claro que tipo de autoridade tem ou deve ter aquele indivíduo que é reconhecido pelo Estado como “autoridade tradicional”. E porquê tradicional, já que o soba é normalmente um indivíduo pago e fardado pelo Estado e assim parece manifestamente moderno? Mais relevante para essa nossa discussão: qual é ou deve ser a sua jurisdição e quais as suas competências? Funciona essa autoridade tanto na cidade como no campo, ou será uma autoridade reservada para as zonas rurais? A Constituição simplesmente relega esta importante questão para futura legislação. A prática, no entanto, é que os sobas têm o seu domínio no meio rural, junto às terras de origem dos seus clãs e antepassados. Carlos Feijó, que teve um papel importante na elaboração da presente Constituição Angolana, argumenta na sua tese de doutoramento que se deve transferir – de modo gradual – ‘competências e poderes do Estado para os órgãos do poder tradicional, designadamente para as autoridades tradicionais que o representam’ (Feijó 2012:457). Há de certeza forças significativas no país que se digladiam com os problemas jurídicolegais de institucionalizar o papel das autoridades tradicionais na governação local. Ao nosso ver, o conceito de que o “poder local” é reconhecido como um poder “anterior” ao do Estado e, por isto, merece reconhecimento, não passa de a uma mistificação. Os 124 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE problemas práticos acima mencionados terão que ser atacados porque diariamente levantam dilemas na governação local no interior das províncias. Por exemplo: quem vai abrir um processo contra um réu acusado de furto e de feitiçaria maligna? O Estado ou as cortes do poder local? Quem vai garantir o seu julgamento justo, os tribunais da República ou as autoridades tradicionais? A prática comum que faz com que os sobas e seculos, em muitos lugares de Angola, apareçam como vinculados ao Estado é a segunda razão pela qual devemos prestarlhes atenção na discussão sobre as futuras autarquias. Segundo informações do MAT, há, em 2012, cerca de 41 mil autoridades tradicionais que recebem subsídios do Estado, num dispêndio anual de cerca de 100 milhões de dólares americanos. Em milhares de aldeias e bairros Angolanos (como é o caso em vários outros países Africanos) os chefes tradicionais jogam um papel importante como intermediários em dois sentidos: a) entre o Estado e os que residem na “sua área” – sendo qual for essa – e b) entre os vivos e os antepassados. Como intermediários tem um papel fulcral e decisivo em várias áreas da vida da população local. São bastante influentes em questões como a posse da terra, matrimónio, acusações de crimes e feitiçaria, litígios locais e muito mais. Na sua governação – eles participam efectivamente na governação local na prática, e o governo é completamente dependente deles em muitas zonas rurais – os chefes tradicionais referem às leis codificados do Estado e orientações do “administrador”, tantos como eles referem aos direitos e costumes consuetudinários como fonte da lei.109 Em paralelo com a estratégia de desconcentração – o fortalecimento gradual dos órgãos locais do Estado, principalmente a administração municipal – as autoridades tradicionais foram reconhecidos e integrados, de facto, na governação local do Estado. Um pouco em paralelo com a situação do tempo colonial – o Estado apoia-se na capacidade administrativa dos chefes tradicionais. Voltaram a ficar, nas palavras dum sociólogo, “chefaturas administrativas” (Trotha 1996). Moçambique e a bifurcação do Estado Também em Moçambique, o gradualismo tem sido um dos “princípios” que guia a introdução das autarquias e todo o processo de descentralização e desconcentração (Weimer 2012a). A mesma distinção entre o gradualismo funcional e geográfico é muito relevante para explicar a situação, porque o resultado tem sido a continuação do Estado bifurcado ou uma descentralização em duas vias diferentes. 109 No periurbano, onde existem são na maior parte dos casos vegetativos ou exercem um papel de polícia do regime para controlar cidadãos que não lhes reconhecem papel nenhum. Para além de que é preciso dizer que hoje são sempre tidos como órgãos auxiliares da administração, sendo hierarquicamente inferiores aos administradores respectivos, municipais ou comunais 125 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE O acordo geral de paz entre o governo da Frelimo e a Renamo em 1992 preparou o terreno para um sistema de governação democrática e multipartidária em Moçambique. Um elemento central no acordo era também a promessa de descentralização que visava uma possível partilha de poder. Em 1994 a legislação preparada (Lei 3/94) para a descentralização visava a conversão de todos os 128 distritos (que corresponde, grosso modo, aos municípios em Angola) em autarquias em que o governo local seria eleito. A implementação das autarquias aconteceria simultaneamente em todo o território. A grande parte das funções dos órgãos locais do Estado passariam para as autarquias (ordem pública, postos de saúde, educação primária, etc.). Pelo menos, isto era a expectativa geral até 1996 (Guambe 1996), porque a Frelimo decidiu revogar essa legislação que visava uma descentralização tão radical (Faria and Chichava 1999).110 Subitamente, a Frelimo introduziu uma reforma (Lei 2/97) que consagrava o “gradualismo” como princípio de descentralização, isto é, gradualismo geográfico além de funcional. Argumentava-se no seio do governo que era necessário “criar as condições sócio-económicas”, antes da autarquização. Segundo Weimer (2012a), uma razão importante pela importância do gradualismo na introdução de autarquias foi a hesitação duma boa parte da elite política da Frelimo que, acostumada ao poder a todos os níveis, temia perder “autarquias” para a oposição, e assim “dividir o país”. Como resultado, em 1998, as primeiras autarquias viram a luz do dia, mas apenas em 23 cidades e 10 vilas (uma por província, em regime de “experiência-piloto”). Em 2008, mais 10 vilas foram incluídas, assim o número total de autarquias passou para 43. Os cidadãos das cidades e vilas que foram autarquizadas já gozam da possibilidade de eleger regularmente um presidente para o conselho autárquico e os membros da assembleia municipal.111 Embora com as dificuldades em conseguir um consenso sobre a legitimidade do processo eleitoral, e apesar dos problemas associados à fraca capacidade administrativa e financeira da grande parte delas, as autarquias estão irreversivelmente instaladas no sistema político-administrativo de Moçambique (Weimer 2012b). Utilizando entre outras fontes de financiamento os impostos recolhidos localmente, os políticos que governam as autarquias definem as suas prioridades sempre com um olhar virado para a vontade dos eleitores locais. Constroem postos de saúde e escolas em bairros de carência, pavimentam ruas, embelezam parques e conseguem negociar directamente com instituições públicas e 110 Muitos alegavam que um motivo da Frelimo era o seu assusto com os resultados eleitorais nas eleições gerais em 1994. Esses mostravam que a Renamo era capaz de ganhar a metade ou mais dos municípios – inclusivamente grandes cidades. 111 Para as eleições locais em Moçambique, o eleitor tem de escolher dois boletins de voto: um para a sua preferência de partido, coligação ou lista de cidadãos para a Assembleia Municipal, o outro para a sua preferência de edil (Presidente do Conselho Municipal). 126 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE privadas para resolver problemas de planificação urbana. Até nas vilas pequenas funcionam, embora com as mesmas deficiências que se encontram, pelo menos à mesma escala, em vilas que ainda não foram autarquizadas. No entanto, as autarquias foram dotadas de uma “jurisdição” geográfica pequeníssima à volta das zonas urbanas, enquanto as zonas rurais (com toda a população e os recursos naturais que lá se encontram) ainda continuam administrados directamente pelos órgãos locais do Estado central, com administradores distritais nomeados centralmente e que principalmente são responsáveis perante os seus superiores na hierarquia estatal, e não perante a população local. A maioria da população Moçambicana, se calhar dois terços, continua a viver nas zonas distritais que não são autarquias. Eles continuam a não ter a possibilidade de eleger os seus governantes locais. Sob forte pressão interna e externa (dos doadores), o governo da Frelimo não podia deixar de reformar a governação local também nas zonas distritais. Por isso, durante a última década o governo esforçou-se na aplicação de um processo que denominavam por desconcentração. Este implicava o reforço dos órgãos locais do Estado, dando-lhes gradualmente mais recursos e autonomia administrativa (embora hierarquicamente sempre dependentes das orientações do Estado central). No contexto político de Moçambique muitas ONG e doadores, em particular, estavam comprometidos com a participação popular como ideal para a governação. Por isso seria impossível não criar, pelo menos, os vestígios de uma participação popular institucionalizada. Criou-se, um pouco por todo o país, os chamos “conselhos locais”. Os conselhos locais organizam-se como órgãos de apoio ao governo distrital mas sem terem poderes deliberativos significativos. São compostos por representantes locais, escolhidos por serem bons representantes de categorias de pessoas que são predefinidas – tal como autoridades tradicionais, mulheres, jovens, organizações da sociedade civil e os membros do governo local. Não são, por tanto, eleitos num sufrágio universal e como era de esperar, num regime político completamente dominado pelo partido Frelimo, os representantes nos conselhos locais são, na grande maioria, membros ou gente muito próxima desse partido no poder (Forquilha and Orre 2012). De facto, a composição social e política, e o modo da sua constituição, faz com que os conselhos locais sejam bastante assimiláveis aos Conselhos de Auscultação e Concertação Social (CACS) em Angola (Orre 2010:cap.7). Mas o governo Moçambicano também apostou num outro factor, a reforma das zonas não autarquizadas. O Estado e o partido Frelimo têm feito uma reviravolta de 180 graus na sua relação com os chefes tradicionais. Enquanto no tempo imediatamente depois da independência, por orientação político-ideológica, os chefes tradicionais (os 127 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE régulos) foram perseguidos, em todo o território Moçambicano. Na década dos anos1990, os régulos foram tacitamente aceites, e a partir de 2002 foi-lhes atribuído um papel fulcral no sistema de governação rural. Isto é, os régulos e cabos de terra foram denominados “líderes comunitários” e, tal como em Angola, foram restituídos politicamente e formalmente reconhecidos pelo Estado (Buur and Kyed 2007). Na mesma altura passaram a ter direito de hastear a bandeira nacional, a receber um subsídio do Estado e a vestir um fardamento para ocasiões formais. Hoje em dia, tal como em Angola, os chefes tradicionais em Moçambique actuam em vários domínios: No sistema judicial comunitário; na recolha de impostos e podem, em algumas localidades, reter uma percentagem das receitas; na distribuição de terras; e no regulamento da vida familiar, matrimonial e sexual das pessoas que vivem nas áreas rurais. Funcionam como intermediários em dois sentidos, pelo menos: entre o Estado e a população local e entre a população viva e os antepassados. Por isto são também intérpretes importantes na vida mágico-religiosa dos vivos. Em importantes áreas, o Estado “entregou” ou “delegou” a governação local para chefes locais que não são eleitos, e que – por actuarem com um olhar à lei escrita Moçambicana e outro ao direito consuetudinário local – actuam fora dos trâmites legais do Estado (Kyed 2006; Kyed 2007; Bertelsen 2009). Eles aplicam a sua governação nas suas “comunidades”. O problema fundamental é um jogo de espelhos em relação ao período colonial: A tendência de tratar os residentes rurais como um grupo, ou “membros de comunidades” em vez de cidadãos individuais (Kyed and Buur 2006). Dito a maneira de Mamdani: os residentes rurais são considerados súbditos de uma qualquer “chefatura”, “regulado” e não cidadãos da República. A integração dos régulos também tem sido um êxito político para Frelimo, que por muito tempo sofreu os efeitos políticos negativos da alienação dos régulos no período imediatamente depois da independência. Foi uma situação de que a Renamo se aproveitou e explorou politicamente, conseguindo o apoio dos régulos que viam neste partido uma possibilidade de serem compensados pela humilhação que lhe foi infligida pela Frelimo. Por isto, no novo contexto, é a própria Frelimo que para as dissociar da Renamo que lhes restituiu a dignidade e lhes deu as mordomias que gozavam no tempo colonial (Orre 2010). Olhando para atrás, o esforço do Estado moçambicano na desconcentração (nas áreas distritais) tem sido igual ou maior que o da descentralização democrática. A reforma de governação local de 1996-97, reconfirmado na Constituição de 2005, consagra a bifurcação do Estado em Moçambique. Quanto ao gradualismo, este veio perpetuar, ou mesmo eternizar, a bifurcação do Estado. Não só porque a constituição parece sugerir que apenas cidades, vilas e povoações são autarquizadas enquanto as zonas rurais e os seus residentes ficam sempre fora. Mesmo assim, foram criadas apenas 43 128 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE das 544 autarquias possíveis e o alargamento da reforma a mais autarquias parece estar cada vez mais longínquo porque a criação de mais autarquias depende alegadamente de “condições socio-económicas” ideais. O problema é que quanto menor são os centros populacionais que eventualmente a autarquizar, menos provável é que apresentem as condições sócio-económicas necessárias para se qualificarem como autarquias. O modelo gradualista escolhido por Moçambique já deu um “tiro nos pés” das zonas rurais ainda não autarquizadas. Se os centros urbanos próximos já foram autarquizados, retirou-se ou extraiu-se, como escreveu Weimer (2012c), ‘o “coração” económico, fiscal e administrativo de uma região empobrecida que permanece uma parte do distrito e privada de recursos importantes, tal seja a receita das transacções do mercado...’. Neste texto, inclui-se Moçambique como um espelho para Angola, porque este país é – apesar de tantas diferenças – o que mais se parece com Angola, em termos históricos e político-institucionais. Mais importante, já avançou com a autarquização, pelo menos, 15 anos antes de Angola. As lições que se retiram para Angola são várias: Efectivamente tem-se criado um sistema bifurcado do Estado. Nas cidades e algumas vilas, os cidadãos podem eleger o seu governo local, e os cidadãos são governados pela lei escrita. Nos distritos (as zonas rurais e a as vilas e povoações ainda não autarquizadas) a população depende dos oficiais nomeados centralmente dos governos distritais e ainda das autoridades tradicionais (régulos, mwenes e cabos). Esses garantem uma aplicação dos “usos e costumes” como fonte de direito misturados com o direito “positivo”, abrindo o caminho para bastantes situações de arbitrariedade na aplicação da lei. O processo de autarquização parece estar parado. Quinze anos após a criação das primeiras autarquias, apenas 43 das 544 possíveis foram criadas. A maioria da população Moçambicana parece, por isto, permanentemente desprovida da possibilidade de eleger um governo local. A desconcentração tornou-se um concorrente à autarquização e à descentralização democrática. Em vez de ser visto como um passo gradual para a autarquização, o investimento do governo nos órgãos locais do Estado passou a ter um carácter permanente, uma solução permanente para as zonas rurais. Os órgãos locais do poder são de controlo garantido do partido dominante, a Frelimo, já que este partido controla as rédeas em Maputo, e pode nomear e controlar os distritos, postos administrativos e localidades. O partido Frelimo enfrenta uma forte concorrência dos partidos da oposição nas eleições autárquicas – e dois partidos da oposição já conseguiram ganhar a liderança autárquica em cidades importantes, como Beira e Quelimane. A “despartidarização” dos órgãos de representação local nos distritos (rurais) também tem jogado a favor da Frelimo. 129 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE As autarquias funcionam, mas não englobam o território todo. Isto é uma das razões pelas quais o Estado não investe toda a sua energia em melhorá-las. Em muitas vilas, a administração local do Estado sobrepõe se às autarquias e fica difícil determinar as respectivas funções, competências ou o relacionamento hierárquico (Weimer 2012b). A corrente “aliança” entre a Frelimo e as autoridades tradicionais tem contribuído para forte dominação da Frelimo, e o enfraquecimento constante da oposição partidária nas zonas rurais. Gradualismo alternativo: Um modelo para Angola? O Ministro de Administração do Território em Angola, Bornito de Sousa, foi citado nos media após um discurso que fez no Bailundo, em Outubro de 2012: Uma ideia é de que deveríamos escolher um conjunto de municípios e cidades, começar por aí e avançar progressivamente. Outra ideia diz que uma vez que temos dois anos pela frente, porque não prepararmos tudo e fazermos tudo de uma única vez? A sua resposta parece ir no sentido do gradualismo: ...a própria Constituição aponta para um sentido de alguma prudência, o que não exclui naturalmente a realização de experiências-piloto em 2014 ou eventualmente antes. (Angop, 25 de Outubro, 2012) A introdução duma reforma grande de maneira gradual faz todo o sentido. A ideia de seguir um caminho cauteloso, em que se introduza instituições menos complicadas e que permita a avaliação das primeiras experiências, teria de certeza o mérito de melhor corrigir erros iniciais do que se tudo se fizesse como um “big bang”. Depois de definir a nossa problemática, avançámos uma leitura da Constituição que possa suportar outra conclusão daquela referida pelo Ministro. De facto, há várias passagens na Constituição que se podem evocar para defender a introdução simultânea (“universal”) das autarquias, e não gradualmente. Isto não exclui a possibilidade de avançar gradualmente na transferência de funções. Recentemente, o processo de desconcentração em Angola tem gradualmente fortificado os municípios como órgãos de administração local do Estado (Santos 2012b). Embora a Constituição não fale da administração municipal – esta parece constar nos planos do Ministério da Administração do Território. Até hoje, não foi clarificado se alguns municípios vão ser convertidos em autarquias, com todo o seu território – e assim essa administração municipal é extinta ou, alternativamente, continuam, e assim existem quatro possibilidades: 130 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 1) Coexistência completa: A administração municipal vai continuar a existir, enquanto divide os recursos, património, quadros, funções e competências com a autarquia dentro do mesmo território; 2) Coexistência parcial: a situação de Moçambique, onde a administração municipal cede uma parte do território para a autarquia que toma conta da maioria dos serviços públicos. A administração municipal continua a administrar as zonas rurais e ainda mantém a responsabilidade para certos serviços dentro da área autárquica (por exemplo, as escolas primárias); 3) Separação: o território da autarquia é separado completamente do município e passam a ter uma jurisdição cada; 4) As autarquias constituem-se como entidade governante dos municípios e a administração municipal do Estado desaparece, nos termos da Constituição de 2010, passando este a administrar a província no seu conjunto e dentro das suas competências.112 Seria útil para o debate sobre as autarquias em Angola se o MAT pudesse propor um modelo, ou modelos alternativos para a autarquização. Um debate mais concreto de certeza ajudaria a implementar a reforma e minimizaria as margens de erro. Há toda a razão de chamar atenção para as lições de Moçambique. É que, se a administração municipal vai continuar a existir, vai sobrepor-se às autarquias como em Moçambique? Quem vai mandar na autarquia, o administrador municipal ou o Presidente da Autarquia? Levantam-se uma série de problemas de coexistência que terão de ser resolvidos. Mais grave ainda e o ponto mais importante deste artigo é o facto do gradualismo geográfico na introdução das autarquias parecer levar, na teoria e na prática, para a bifurcação do Estado. Assim como vimos em Moçambique, isto privou uma grande parte dos cidadãos rurais da possibilidade de eleger a sua liderança local através do sufrágio universal – e de ter os mesmos direitos e deveres perante a Constituição e a lei, porque, enfatizamos os residentes nas zonas rurais são igualmente cidadãos. A Constituição de Moçambique introduz a inconsistência de considerar que todos têm os mesmos direitos políticos e civis, enquanto a população rural não pode participar nas eleições locais. Será que a Constituição de Angola permite isto? A Constituição angolana parece incluir outra dúvida, relacionada com o papel dado às autoridades 112 Pode-se dizer que é isto que já acontece, nos termos da nova repartição de competências entre o município e a província, nomeadamente em relação a concessão de terra. Actualmente os administradores municipais somente estão autorizados a conceder terrenos não superiores a mil metros quadrados (tendencialmente para habitação) enquanto compete ao governador autorizar a concessão de terras para exploração económica superior a mil metros quadrados, quando no passado, os administradores municipais tinham competência para autorizar a concessão de terra para exploração produtiva até cinco hectares. 131 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE tradicionais nas zonas rurais, a quem, segundo um dos autores da própria Constituição, vão gradualmente serem transferidos mais poderes e competências. O gradualismo não deve servir como uma “desculpa” para adiar a clareza sobre o modelo a adoptar, respondendo-se se vão ou não as zonas rurais serem incluídos nas autarquias num futuro previsível? Vão andar na direcção da integração e assimilação ou vão se separar administrativamente sob liderança dos sobas – assim emulando o período colonial? Avaliámos em cima os problemas associados às duas formas de gradualismo, assim a sua experiência em Moçambique. É, portanto, possível propor um modelo alternativo, baseado em princípios simples como os descritos a seguir. Para evitar a bifurcação do Estado e a tendência de separação rural/urbano, introduzir-se-ia um modelo de autarquização “gradual” e “universal”. Isto significaria a aplicação dos seguintes princípios: 1. Universalismo geográfico: As autarquias introduzem-se simultaneamente em todo o país, o que significa fazer eleições locais em que todos os angolanos possam votar. Assim, nenhum cidadão vai ser desprovido dum direito fundamental e importante, consagrado na Constituição (direito de sufrágio, artigo 54º, CRA). 2. Gradualismo funcional: Por existir uma grande variação e diversidade em Angola (como em quase todos os países) – capacidade fiscal, actividades económicas, quadros nos serviços públicos, densidade populacional, escolaridade e alfabetização – cada autarquia receberia uma dotação financeira do Estado que corresponde às suas capacidades e às competências a ela transferidas. Certas competências, como por exemplo a embelezamento de espaços públicos, recolha de resíduos sólidos, bibliotecas, construção de escolas primárias (não as despesas correntes), podem certamente ser transferidas imediatamente para todos os Executivos Autárquicos. Outras competências tipicamente de responsabilidade local – como a canalização de água, pavimentação de vias principais, iluminação pública, policiamento local – são possivelmente fora do alcance de muitas autarquias rurais, mas dentro da capacidade de gestão dos governos locais das cidades maiores. 3. Balanço entre o Executivo eleito e a Administração Autárquica. O gradualismo tem sido, em Moçambique, como acima argumentado, deve-se evitar a “politização” completa da administração autárquica. Isto para evitar as descontinuidades que se apliquem se toda a assembleia autárquica e o Executivo são trocados após eleições. É importante manter uma capacidade técnica que sustente a autarquia e os seus serviços, enquanto a direcção geral é dos políticos. Segundo, assim sendo, “perder” uma autarquia não vai constituir um “desastre” para o partido perdedor, pois apenas 132 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE um número pequeno dos seus quadros é dependente de empregos no Executivo. Vai se habituando que a essência da autarquia é um órgão público que serve os cidadãos locais, não “pertence”, de nenhuma forma, ao partido que a governar. Pelo contrário, a autarquia é permanente, enquanto o seu Executivo vai ser temporariamente ocupado por políticos de cores variadas. Certamente, em Moçambique há os que argumentam que uma autarquia (com altos níveis de autosuficiência e autonomia) só se pode organizar onde existir capacidade sócio-económica, administrativa e financeira para suportar a autarquia. Mas mesmo em Moçambique, não há autarquias que sobrevive sem apoio do Estado central de qualquer maneira, e porque é que não deveriam contar com o apoio financeiro e técnico do Estado? E ainda, o que é que sugere que um governo não eleito produz resultados melhores na sua governação que um edil eleito? Embora a bifurcação do Estado, o pluralismo legal e a diversificação governativa entre as zonas urbanas e as zonas rurais provavelmente vai continuar em Angola por muito tempo, uma autarquização universal – embora gradual – teria a vantagem de travar a tendência de bifurcação. As vantagens são ainda a possibilidade de estender o direito de eleger os políticos que governam localmente para toda a população. Os governantes menos populares, incompetentes ou ineficientes poderiam ser removidos através do voto. Ainda cria a possibilidade de que partidos da oposição possam ganhar uma ou outra autarquia e assim ganhar experiência importante para governar. Se a população não gostar de nenhum dos partidos, podem também apostar em listas de cidadãos que se organizam localmente. Bibliografia 133 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Bertelsen, B. E. (2009). Violent becomings. State formation and the traditional field in colonial and postcolonial Mozambique. PhD, University of Bergen. Boone, C. (2003). Political topographies of the African state : territorial authority and institutional choice. Cambridge, Cambridge University Press. Buur, L. and H. M. Kyed (2007). Traditional authority in Mozambique: The legible space between state and community. State recognition and democratisation in SubSaharan Africa: A new dawn for traditional authorities? L. Buur and H. M. Kyed. New York, Palgrave. Crook, R. and J. Manor (2000). Democratic decentralisation. OED Working paper series, nr. 11. Washington D.C, World Bank. Crook, R. C. and J. Manor (1999). Democracy and decentralisation in South Asia and West Africa - participation, accountability and performance. Cambridge, Cambridge University Press. Dickovick, J. T. (2011). Decentralization and recentralization in the developing world: Comparative studies from Africa and Latin America. 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Maputo, IESE. 135 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE CEIC – 10 ANOS DE REALIZAÇÕES Regina Santos Economista Investigadora do CEIC A Universidade Católica de Angola (UCAN) foi constituída, a 22 de Fevereiro de 1999, contando, nesse momento, com quatro licenciaturas, ministradas pelas Faculdades seguintes-- de Economia e Gestão, de Direito, de Ciências Humanas e de Engenharia de Informática. Cedo foi compreendido que a missão académica e científica da UCAN não poderia deixar de ter em conta a existência de um centro de estudos e investigação, voltado para o meio académico e para a prestação de serviços à comunidade, autónomo de qualquer uma das Faculdades existentes, mas em estreita ligação com elas, nomeadamente com a Faculdade de Economia e Gestão, e possuindo autonomia financeira e administrativa. Foi assim que, a 6 de Março de 2002 e por Despacho do Magnífico Reitor Dom Damião Franklin, se criou o Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola. De acordo com os seus Estatutos, o Centro de Estudos e Investigação Científica (abreviadamente CEIC) é um local de investigação e de prestação de serviços, sem fins lucrativos, visando, sobretudo, fomentar a investigação científica fundamental e aplicada. Para além disso, ele pretende incentivar a investigação nos campos económico, social, cultural e histórico, procurando articulá-la com uma visão pluridisciplinar. Assim, ele, apoia a UCAN, não só a desenvolver o seu potencial de investigação e de ensino, mas também a contribuir para o desenvolvimento das capacidades nacionais na área da formulação e da avaliação de políticas públicas e de estratégias de desenvolvimento. Os membros do CEIC podem ser docentes da Universidade Católica de Angola que pretendam participar na sua actividade, bem como docentes e investigadores de 136 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE instituições académicas e/ou de pesquisa, nacionais ou estrangeiras, com trabalho relevante sobre as realidades, angolana, africana e mundial. O CEIC, enquanto instituição vocacionada para a investigação e a promoção de estudos sobre a realidade nacional, assume um carácter independente, aberto à franca discussão na abordagem ampla de temas. Para levar a efeito estes objectivos, o CEIC dispõe de um orçamento próprio, resultante, em simultâneo, de receitas, provenientes da captação de financiamentos obtidos através de parcerias com instituições privadas ou públicas, nacionais e estrangeiras e de vendas das suas publicações, mas ainda de apoios pontuais. O Centro tem instalações próprias no edifício da Universidade Católica, contando com pessoal qualificado e uma infra-estrutura técnica moderna para o suporte das actividades que tem desenvolvido. Apesar de no momento da sua constituição se ter nomeado um corpo directivo, composto por um director executivo e um director académico (que solicitou o seu afastamento menos de um ano após a sua nomeação) não existiam condições para que se estruturasse uma actividade sustentada de investigação e pesquisa. Um novo director académico foi nomeado, mas quer a sua actividade, quer a do director executivo exercia-se em tempo parcial. Nos dois primeiros anos, o CEIC teve portanto de se organizar, de iniciar o seu trabalho, para isso, contou nessa altura com colaboradores interessados na investigação, confiando também na vontade de outros profissionais que durante um tempo não manifestaram essa preocupação, desejada pelo CEIC. Por conseguinte, viveu-se durante esse período uma fase de implantação e de reconhecimento, não só do potencial próprio, como igualmente dos recursos disponíveis e, ainda nesse âmbito, da estratégia seguida pela direcção da UCAN. Mas mesmo assim, em 2003 foi possível lançar o “Projecto Palanca Negra”, que almejava ao tempo demonstrar a sobrevivência deste símbolo nacional após o conflito armado. Esse trabalho, que conseguiu eco internacional, traduziu- se na publicação de um Relatório. As actividades do CEIC foram inicialmente financiadas por subsídios da GTZCooperação Alemã para o Desenvolvimento. Entre 2004 e 2006, o CEIC beneficiou de um importante financiamento da Agência Americana para o Desenvolvimento - USAID, operado através do Fundo de Assistência à Educação para Angola-AEAF que permitiu começar a pensar-se na estruturação do CEIC em termos mais efectivos e duradouros. Foi durante este período, que a Reitoria nomeou uma directora executiva a tempo 137 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE inteiro e se começou a admitir pessoal com alguma experiência no domínio da investigação. De 2004 a 2007, o Centro foi-se estruturando e organizando, deste modo, ele desenvolveu trabalho e ganhou visibilidade, portanto, ganhou solidez e qualidade de trabalho, assegurados por um corpo permanente de investigadores dedicados exclusivamente à sua actividade e apaixonados pelo projecto em si e por aquilo que ele representava – o pioneirismo da cultura da investigação em ciências sociais no nosso país. Desde a sua criação, o CEIC evoluiu em diversos planos, tendo em conta não só a actividade a realizar, de acordo com os objectivos, o espírito de missão, a visão da direcção e dos seus colaboradores e a relação com os doadores ou financiadores, mas também com o contexto económico e social angolano. Como objectivo central, ele deseja manter vivo o projecto e dar-lhe uma dinâmica académica e de pesquisa permanentemente actualizada, através do labor a ser realizado em núcleos de investigação. Um Centro de pesquisa, como qualquer outra instituição académica, além de técnicos especializados, necessita do apoio de um secretariado, da organização da contabilidade e das finanças, para o desenvolvimento da sua actividade e para o desempenho de tarefas administrativas. Para tal, ele elaborou um manual de procedimentos, tendo em conta o regime geral de trabalho em Angola, o quadro legal em vigor sobre a ciência e a tecnologia, a carreira do investigador e o pessoal administrativo. Adquiriu, em Dezembro de 2006, um software de contabilidade para assegurar internamente a elaboração dos balancetes contabilísticos, passando a KPMG, empresa contratada para o efeito desde Janeiro de 2004, apenas a fazer os Relatórios sobre a Contabilidade Revista Trimestralmente e um Relatório Final Anual. O CEIC estabeleceu, também, contratos de prestação de serviços, para a manutenção do equipamento geral do escritório, com empresas especializadas. Em 2005, na intenção de estreitar a relação com a Sociedade Civil e com o corpo docente e discente da UCAN, instituiu-se a realização de um Ciclo Anual de Palestras e de Conferências com temas diversos da actualidade e ainda a publicação e o lançamento do Relatório Económico, da Economia da Energia, do Barómetro de 138 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Conjuntura, assim como outras publicações, livros, brochuras e reflexões. Todo este material, relativo antes do mais a Angola, foi colocado à disposição do público. Assim, de Maio de 2005 a Maio de 2007 foram realizadas 24 Palestras e 9 Conferências, a que assistiram 2.531 pessoas. Em 2005, o Projecto Palanca ganhou grande notoriedade com a obtenção e a publicação das primeiras fotografias da Palanca Preta Gigante em mais de 20 anos, que provaram, desta maneira, a sua existência no Parque Nacional da Cangandala. Após este sucesso, o projecto ganhou novo dinamismo passando a focar-se na conservação e no estudo do animal. Foram realizados dois grandes estudos de consultoria, que tiveram impacto sobre decisões políticas e acções do Governo nos seus programas de desenvolvimento. O RAAAP, Relatório solicitado pelo MINARS e pela UNICEF e, depois, o Diagnóstico sobre as Micro, Pequenas e Médias Empresas em Angola para o Programa Empresarial Angolano (PEA) solicitado pelo PNUD. No ano de 2006, o Projecto de Conservação da Palanca foi reconhecido internacionalmente, com a outorga do prestigiado prémio Whitley Award for Nature, (Prémio concedido a projectos das Ciências da Natureza) recebido pelo coordenador do projecto das mãos da Princesa Anne de Inglaterra em cerimónia realizada no Royal Geographic Society em Londres. Datam de 2007, os primeiros contactos com a Embaixada da Noruega em Angola e os primeiros financiamentos noruegueses ao CEIC começaram a fluir. Este apoio permitiu admitir três investigadores a tempo inteiro e a começar a pensar-se num programa consistente de estudos. E é de 2008, a parceria com o Chr. Michelsen Institute, instituição norueguesa de pesquisa, com quem o CEIC vem desenvolvendo importantes projectos de investigação em Angola. Paralelamente a estas actividades o CEIC promoveu: A publicação da Revista Académica da Universidade Católica de Angola “LUCERE”, com um primeiro número subordinado ao tema do fim do ciclo da guerra e o início duma fase de paz; O estabelecimento duma rede de contactos com Centros de Investigação congéneres na África do Sul, nos Estados Unidos da América, em Portugal, em França e no Reino Unido; 139 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE A instituição duma rede de colaboradores científicos do Centro, constituída por investigadores nacionais e estrangeiros renomados e instituições de pesquisa congéneres; A realização de ciclos de palestras, para docentes, discentes e público em geral, sobre temáticas sociais, culturais e económicas de actualidade; O estabelecimento dum sistema complementar de financiamento das actividades do Centro integrado por algumas organizações nãogovernamentais, estrangeiras e internacionais; O aprofundamento e alargamento do projecto de investigação ambiental sobre a Palanca Preta Gigante; A publicação trimestral do Barómetro de Conjuntura; O lançamento de pesquisas no domínio da interconexão culturadesenvolvimento-modernidade; O lançamento de dossiês, livros e brochuras sobre temas variados. Para o prosseguimento e consolidação das suas actividades, O CEIC tem contado com o apoio financeiro e institucional dos seus parceiros habituais de doadores, nomeadamente, a Embaixada da Noruega. O programa de parceria com o Christian Michelsen Institute foi assinado em Junho de 2008 na Noruega e teve um primeiro período até 2010. No programa estiveram contemplados 17 projectos divididos nos seguintes domínios: Aumento da Capacidade Administrativa e de Investigação do CEIC Paz e Democracia Gestão das Finanças Públicas Sector Privado e Pobreza Uma das vertentes desta parceria incidiu no reforço da capacidade administrativa do CEIC em aspectos relacionados com o manual de procedimentos contabilísticos, no processamento de honorários, no modelo de elaboração das folhas de presença (timesheets) e das folhas de rentabilidade (timerecords) dos investigadores em cada projecto, bem como, mais importante, ainda no modelo de monitorização e de avaliação dos progressos e de resultados das actividades de cada projecto do CEIC. Outros projectos, neste domínio, recaíram no ICT e no WEBSITE, de acesso fácil e rápido à internet e, ademais, na criação da intranet e do website do CEIC. O âmbito de acção alargava-se e, ao mesmo tempo, aumentava a inquietude de fazer corresponder a expectativa dos seus principais contribuidores de fundos e a da sociedade angolana em geral, relativamente às competências e potencialidades do CEIC. 140 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE O CEIC está, neste momento, organizado em Departamentos de Pesquisa e quer ainda expandir Núcleos anteriores, designadamente, o Departamento de Estudos Económicos, o Departamento de Estudos Empresariais, o Departamento de Estudos Sociais, o Departamento de História e Cultura, o Departamento de Conferências e Palestras e o Departamento de Administração e Finanças. Cada um dos Departamentos tem um Coordenador. Como trabalhos mais relevantes de cada Departamento podem destacar-se: Departamento de Estudos Económicos O Relatório Económico de Angola foi o primeiro grande resultado da pesquisa económica e social desta área de pesquisa. Outros resultados: Relatório Económico Anual desde 2002, lançado em Outubro de 2003 e ininterruptamente nestes 10 anos Base de Dados sobre a economia angolana Modelo econométrico sobre a economia angolana Barómetro de Conjuntura que é um indicador que mede o ambiente de fazer negócios no país, particularmente em Luanda. Relatório de Energia em Angola que visa dar resposta à necessidade de uma abordagem económica científica para sustentar o processo de desenvolvimento de um sistema energético integral, seguro e sustentável. Observatório das Relações Angola-China: recolha, sistematização e actualização de informação e apoio a estudantes estrangeiros em acções de mestrado e doutoramento sobre o assunto, publicação de um ensaio específico (workpaper) e a participação no Livro a ser editado em Julho: China&Angola a Marriage of Convenience? Departamento de Estudos Empresariais Espera-se que, cada vez mais, a economia angolana se estruture na base dum sector privado, competente, competitivo, presciente, empreendedor e com responsabilidade social. Principais realizações deste departamento Relatório Anual GEM Angola, projecto em parceria com a SPI (Sociedade Portuguesa de Inovação) e o BFA. Melhor conhecimento sobre o nível de empreendedorismo em Angola e sua comparação com outros países, bem 141 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE como, principais barreiras e limitações das pequenas e das médias empresas em Angola. Acções de Formação em Empreendedorismo Departamento de Estudos Sociais A sua missão é pesquisar as questões sociais relevantes para as condições de vida da população. Actividades: Relatório Social de Angola que pretende apresentar uma análise, a mais detalhada possível, da situação social do país a partir de indicadores estatísticos, dados sistémicos e análise conjuntural. Pobreza no Meio Rural com o relançamento do projecto sobre a pobreza no meio rural, com o estudo de um município da província do Uige. Pobreza, Água e Saneamento, Livro publicado em 2011 Departamento de História e Cultura Grande projecto de pesquisa intitulado “História Económica de Angola no período contemporâneo 1850 -1975” A primeira parte deste projecto propõe-se fazer o levantamento e a classificação das fontes, nos principais arquivos disponíveis em Portugal e em Angola, relativas à História Económica de Angola de meados do século XIX à independência. A segunda parte será a elaboração de dois volumes de História Económica de Angola com estudos sectoriais de maior fôlego ou, quando possível, de cariz macroeconómico. O Primeiro Volume de 1850 a 1930 e o Segundo Volume de 1930 a 1975. Departamento de Ambiente Actualmente e com a entrada em cena de outros parceiros, o Projecto Palanca passou a concentrar-se essencialmente em acções de investigação científica associadas à conservação deste antílope emblemático para Angola. Neste contexto, o coordenador está a desenvolver uma Tese de Doutoramento sobre a biologia da Palanca, ao passo que a assistente do projecto terminou já uma Tese de Mestrado acerca do tema. O Departamento dedica-se à pesquisa científica relativas à ecologia, à genética, à geofagia, à reprodução, às técnicas de inventariação e à detecção remota aplicadas à 142 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE palanca. Para além do trabalho citado, ele possui igualmente um sector consagrado à ornitologia. Departamento de Conferências e Palestras As Conferências e Palestras são realizadas com a finalidade de se debaterem temas relevantes, actuais, oportunos e de conteúdo científico. Elas propõem-se a envolver em debates as mais diferentes personalidades da vida intelectual de Luanda e procuram incentivar os alunos da UCAN a fazerem da pesquisa e a aumentar o seu acervo de conhecimentos científicos e práticos. Aliás, isto tem como alvo, instigar a uma atitude de estudo permanente. Tem-se alargado o leque de temas e de intervenientes, convidando, para esse fim, instituições quer nacionais quer estrangeiras de elevada reputação. Departamento de Administração e Finanças Tem como principais funções a gestão financeira e de projectos dos diversos departamentos, bem como, de administração, logística e de apoio aos diversos membros do CEIC e seus parceiros de investigação. Preparação do Relatório e Contas e produção de informações financeiras que possam influenciar as decisões dos doadores com a máxima eficácia e eficiência. Actualmente o CEIC tem as seguintes Publicações: Relatório Económico, Relatório Social e Relatório da Energia. Revista Académica LUCERE, Barómetros de Conjuntura. Pobreza no Meio Rural (Caderno) Colectânea de Teses de Mestrado Cadernos Literários – Literatura angolana do séc. XIX Pobreza, Água e Saneamento Básico Opiniões e Reflexões Introdução à Economia Internacional e Integração Regional Desigualdades e Assimetrias Regionais em Angola – Os factores de Competitividade Territorial Finanças Públicas “Expedição à Palanca Negra Gigante” 2003 “A Redescoberta da Palanca Negra Gigante” 2006 Tese de Mestrado da Assistente do Departamento de Ambiente Publicações CEIC/CMI MODUCAN – Modelo de Previsão Econométrica Infraestruturas num contexto Regional 143 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Mitos e Percepções Sobre as Empresas Chinesas entre Trabalhadores Angolanos Fortificando as barreiras contra a corrupção na infraestrutura pública em Angola Relatório a publicar Why Collect Local Taxes in Oil Rich Angola? Angola Political Parties. Efeitos das Eleições em Angola Sistema Parlamentar - Presidencial ou Presidencialismo Extremo? Dez Desafios na Construção Pública - Caderno A Dupla Derrota: Como o Financiamento Público dos Partidos Políticos contribui para um Ciclo Vicioso para os Partidos da Oposição em Angola O que Faz um Grupo de Crédito Funcionar? Grandes Desigualdades Regionais nos Serviços de Saúde em Angola Reformas ao Processo Orçamental e Gestão das Finanças Públicas de Angola, A crise foi um sinal de alarme? O CEIC em 2011 foi convidado pela Universidade Lusíada, Pólo de Benguela a apresentar o RE e o RS de Angola. Com a ADRA estabeleceu uma parceria para difundir em Benguela, Huambo e Huíla os Relatórios e outros produtos do CEIC. Neste momento, um importante projecto está a ser levado a cabo entre o CEIC e o CMI sobre a Diversificação da Economia Angolana cujas primeiras abordagens estão já espelhadas no Relatório Económico que aqui se apresenta. Em 2012 irão continuar os esforços tendentes a que o CEIC ultrapasse as estreitas fronteiras do espaço territorial angolano e mesmo lusófono, para se projectar, com mais propriedade, para outras paragens, dando a conhecer a realidade nacional e a sua capacidade de conhecimento da mesma. Os vectores de internacionalização do CEIC são vários, mas para os seus propósitos são seis: a língua inglesa, a melhoria da capacidade de pesquisa, trabalhos conjuntos com instituições congéneres estrangeiras, participação em conferências internacionais, publicação de artigos em revistas/jornais estrangeiros e a publicação de boletins informativos (newsletters). Agora cabe-nos identificar alguma da problemática que nos preocupa Quais as possíveis Ameaças? Falta de Recursos Humanos – Professores, Investigadores qualificados em regime de exclusividade; 144 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Falta de dedicação e de qualidade do Ensino; Existência de outras Universidades a poder oferecer um serviço equivalente; Surgimento de projectos mais bem apetrechados e providos de estratégia, estrutura e sustentação mais sólida. Fim do apoio financeiro E Quais os seus Pontos Fortes? Inovação e Dinâmica; Organização, estrutura, processos de trabalho e RH qualificados, motivados e dedicados ao projecto; Reputação da UCAN As Faculdades, os Cursos, as realizações, a actividade, os produtos, e os resultados; Interesse do mercado e da sociedade em geral pelos produtos do CEIC (publicações, estudos, palestras, conferências); Possibilidade de disseminação de informação actualizada resultante dos artigos de investigação, comunicações, palestras e conferências, através da instauração de um website dinâmico. Parceria com instituições fortes e reputadas; Desenvolvimento da cultura do ensino com qualidade e princípios e centrada na pesquisa; Sustentação do projecto em objectivos bem delineados e delimitados. Agradecimentos São devidos vários agradecimentos: Ao Magnífico Reitor da UCAN, que sempre incentivou e apadrinhou a actividade do CEIC, e o tem considerado uma das bandeiras da qualidade da UCAN. Aos Fundadores do CEIC, Magnifico Reitor, Dr. Carlos Leite, Dr. Emílio Grinõn, Dr. Adão Avelino, Dr. Ennes Ferreira, Dr. Alves da Rocha e Dr. Justino Pinto de Andrade. 145 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Ao Monsenhor José Manuel Cachadinha pelo apoio constante, pelas sugestões pertinentes, pelas referências elogiosas ao trabalho dos seus investigadores, colaboradores e administrativos. Aos financiadores, sem o apoio dos quais a sua actividade permanente não se teria concretizado, nomeadamente USAID/Embaixada dos EUA e Embaixada do Reino da Noruega. Aos financiadores de projectos de pesquisa concretos, como a Fundação Open Society, a Fundação Friedrich Ebert, a GTZ, a World Learning, o FIDA, a Embaixada de Portugal em Angola, o BNA, o BFA, o BNI, a ENI, a Statoil, a ESSO, a Total, a Associação do Bloco 15, a Endiama, o BAI, o Ministério das Finanças e o Ministério do Urbanismo e Ambiente. Aos investigadores colaboradores do Centro de Estudos e Investigação Científica. Aos investigadores permanentes do CEIC e a todos os seus membros. Aos dois primeiros directores executivos – Emílio Griõn e Noelma Viegas D'Abreu e ao primeiro director académico Professor Ennes Ferreira. Aos demais departamentos da UCAN que têm colaborado com o CEIC A Finalizar A preocupação fundamental do CEIC/ UCAN é poder contribuir de algum modo para: O desenvolvimento da cultura de investigação e da pesquisa fundamental; O aumento e actualização da qualificação e da formação de Professores e Investigadores da UCAN; Contribuir para o aumento do saber, da formação e da especialização de profissionais; O Diálogo e a troca de conhecimentos e de cultura, em áreas importantes para a UCAN e para a sociedade angolana. Foram estabelecidas parcerias importantes com Instituições que o reconhecem como um parceiro respeitável e com quem se está a realizar trabalho com visibilidade, são exemplos: O Christian Michelsen Institute (CMI) com protocolos no período 2008-2010 e seguinte período de 2010-2013; O Center For Energy Economics (CEE) da Houston – Texas University com um acordo para a elaboração conjunta do Relatório sobre a Energia; O Centro de Estudos Africanos (CEA) do ISCTE – Portugal –, o IRD – Institute de 146 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Recherche pour le Développment, a Chattam House, a Universidade de Durham, a Open Society Angola e o Codesria. O CEIC recebeu congratulações de pessoas a título individual e em nome de Instituições do Estado Angolano, do corpo diplomático acreditado em Angola, venceu o Whitley Award e é referenciado em vários Relatórios elaborados por Centros congéneres, Universidades, Organizações não-governamentais e foi motivo de artigos elogiosos na imprensa nacional e estrangeira. Até ao momento, o CEIC demonstrou eficiência, interesse e resultados mensuráveis através dos produtos já publicamente apresentados. A UCAN foi pioneira no ensino privado superior e tem a oportunidade de o ser ao nível da investigação académica. Por estas razões, acreditamos na importância e no papel do CEIC e consideramos ser necessária competência e vontade por parte daqueles que estão envolvidos na obra de construção e continuidade do trabalho deste Centro, além naturalmente de uma visão estratégica por parte da Reitoria da UCAN. Ao longo do tempo e do trabalho desenvolvido no Centro, a atracção de Instituições que manifestaram o seu interesse em serem parceiras da UCAN e do CEIC e de académicos que usaram o CEIC como instituição de suporte e de consulta das suas pesquisas, dão-nos a confirmação de que é oportuna a existência do Centro e é possível desenvolver um trabalho sério e útil na sociedade angolana. 147 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Eficiência e limites da autoformação profissional e autoemprego No bairro da Sanzala em Viana Julien David Zanzala (PhD) Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / UniPiaget Resumo Esta pesquisa pretende verificar a relevância, eficiência e limites da autoformação profissional e autoemprego na economia informal no bairro da Sanzala em Viana. No primeiro capítulo define-se e discute-se o conceito de Autoformação profissional sua relação com a autoemprego e apresenta-se um corpus teórico, na perspectiva de fundamentar a pesquisa. Aplicou-se um questionário a 200 pessoas que assinalam as profissões que assumem, a forma como adquiriram a experiência profissional e quais as razões que determinaram a ocupação de muitas profissões. A pesquisa confirma a hipótese científica: A autoformação profissional e autoemprego no bairro da Sanzala em Viana têm bastante relevância no emprego informal. As dificuldades do sector público em promover o pleno emprego, as desigualdades de acesso ao mercado de trabalho, a pobreza e os baixos rendimentos estimulam as pessoas a redimensionarem constantemente as suas qualificações que combinam com a ocupação de muitas profissões. No entanto, essas alternativas não garantem rendimentos seguros, o que convida a reflectir se os esforços públicos ou privados visando combater a pobreza e a desigualdade não deverão ser orientados para o trabalho assalariado. Palavras-chave: Autoformação profissional; Autoemprego; Rendimentos; Desemprego. 1. Introdução O desemprego estrangula hoje todas as economias modernas e tem sido, em grande medida, a discussão quotidiana nos bares, nos lares, nas empresas, na média, na academia nos parlamentos e na sociedade civil como um todo. É uma das realidades contemporâneas presentes em economias desenvolvidas como em vias de desenvolvimento, trazendo argumentos para refutar as teorias clássicas do desemprego voluntário. As suas dramáticas consequências psicológicas, económicas e 148 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE sociais são objecto de análises em vários fóruns. Nas economias em vias de desenvolvimento, tem contribuído muito para a expansão do sector informal que por seu lado permite a formação de rendimentos de remedeios. As estratégias de sua redução encontram-se formuladas tanto a nível das instâncias internacionais como do governo central ou local. Existem ainda estratégias familiares ou individuais de saída. E estas são várias no contexto de baixo nível de escolarização, falta ou fraca formação profissional, pobreza generalizada, restrições orçamentais e políticas sociais selectivas. A autoformação profissional e o autoemprego são algumas que são referenciadas na análise económica. A outra estratégia decorrente das duas primeiras é a ocupação ou exercício de várias profissões cuja emergência tem sido percebida em Angola tanto na economia formal como informal. Sendo a economia informal segmentada, há evidências de no seu seio existirem diferenças de rendimento (Mosca;2010). Quando se pretende aumentar os rendimentos, parece ser necessário combinar as três estratégias. Procura-se de certo modo valorizar um conjunto de saberes práticos nem sempre certificados, adquiridos geralmente em acções de formação de curta duração ou directamente no terreno. Mesmo quando certificados, a sua qualidade não facilita um reconhecimento generalizado. Por fim, convém assinalar que não se regista uma literatura abundante sobre os custos destas estratégias, os seus benefícios e a sua contribuição real na formação do rendimento nacional. Qual a relevância destas estratégias e qual a sua eficiência no contexto informal angolano? Para dar um contributo a este grande debate pretendeu-se desenvolver esta pesquisa que tem como objectivo geral verificar a relevância, eficiência e limites da autoformação profissional e do autoemprego no sector informal no bairro da Sanzala do município de Viana (Luanda). Apostar neste tipo de pesquisa possibilita estabelecer critérios mais consistentes de selecção para programas de apoio ao autoemprego, melhorar a eficiência desses programas e aprimorar o monitoramento dos seus resultados. 2. Breve resenha da literatura sobre autoformação profissional e autoemprego A autoformação é um dos modelos que emerge com grande significado no cenário actual do mercado de trabalho em que “formar-se em” não significava mais “tornar-se profissional em”. Pois, as novas tecnologias hoje facilitam e agilizam determinadas tarefas e os trabalhadores se defrontam-se com exigências de aquisição de habilidades e atitudes, sob risco de obsolescência inexorável. Na perspectiva de Pineau, citado por Couceiro (1992), compreende-se como processo de apropriação completa do seu poder de formação, o processo através do qual a pessoa constrói seus conhecimentos, desenvolvendo habilidades e valores a partir de experiências próprias. É um processo que se desenrola ao longo do tempo e que se traduz numa dupla apropriação do poder 149 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE de se formar. Dupla apropriação porque a pessoa, unidade central neste processo, é simultaneamente chamada a ser agente da sua formação e a ser ela própria sujeito dessa formação. Autoformar-se é formar-se. É "dar-se uma forma" (Couceiro;1992). De acordo com Demaizière (1996), a autoformação é uma nebulosa galáxia, um conceito ou uma prática com perímetro variável. A sua massiva aparição é corolário da introdução das novas tecnologias de informação e comunicação nos processos de aprendizagem ou, mais especificamente, do surgimento, nos anos 70 e 80, das formações assistidas por computadores. Deste modo, toda a inovação propondo uma forma de individualização ou utilizando a informática é qualificada de autoformação. Para Albero (2003), quatro factores socioeconómicos promovem esta modalidade: o aumento e a diversificação dos públicos estudantis, a rápida evolução tecnológica nas diversas tarefas, a pressão internacional sobre o desenvolvimento do espaço numérico e o apoio político aos programas de formação ao longo da vida. Quando aplicada ao mercado de trabalho, ela permite fazer face aos desafios profissionais. Pois, os empregadores esperam que os empregados descubram por si próprios como melhorar e agilizar o seu próprio trabalho, de modo que estes precisam analisar situações, pensar criativamente e solucionar problemas, fazer perguntas e esclarecer o que não compreendem para poder sugerir melhorias de maneira constante e contínua (Lobo da Fonseca; 2005). O que se verifica é uma constante reavaliação do ambiente, autoavaliação pessoal e profissional, estabelecimento de metas e busca ou aproveitamento das oportunidades de melhoria e criação de microempresas. A autoformação contribui para ampliar a visão sobre as oportunidades de trabalho. No contexto da pobreza e do desemprego, ela estimula frequentemente uma atitude empreendedora ou de autoemprego. Quando recebe incentivos dos governos e instituições de diferentes tipos, insere-se numa lógica socioeconómica de criação de emprego e renda. No que diz respeito ao conceito de autoemprego, Pamplona (2002) observa que não se encontra ainda na literatura especializada uma definição precisa e padrão. Pela heterogeneidade da situação de autoemprego, há dificuldades em estabelecer uma distinção consensual entre emprego e autoemprego. Assim, diferentes expressões têm sido usadas como equivalentes do autoemprego: trabalho autónomo, trabalho independente e auto-ocupação. Para alguns autores rigorosos, o conceito de emprego assume o sentido estrito de trabalho assalariado, portanto não seria lógico falar de autoemprego. Porém, de acordo com a concepção apresentada por Marx, o trabalhador independente é uma espécie de “patrão de si mesmo” que “autoempregase como assalariado”. De acordo com Pamplona (idem), o conceito é bem consagrado na literatura e tem algumas características consensuais: independência, autonomia e controlo sobre o processo de trabalho (actividade em si, matérias-primas, meios de 150 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE produção). O autoemprego é visto como situação em que o proprietário dos meios de produção participa directamente da actividade produtiva; com a renda não previamente definida, porque depende do trabalho, do capital e da demanda directa do mercado de bens e serviços; com o objectivo primordial de prover seu próprio emprego (meio de subsistência) e não valorizar seu capital (acumulação de capital). Além disso, Pamplona (idem) assinala as duas abordagens, positiva e crítica, do autoemprego na literatura internacional. A primeira interpreta-o como um fenómeno socioeconómico predominantemente promissor, fonte de crescimento económico e de novos trabalhos. É aquela que acredita que o crescimento do autoemprego resulta de estímulos à oferta, de incentivos que os produtores passaram a ter, como redução de impostos, novas tecnologias, novos nichos de mercado, maior facilidade para contratar e demitir e do espírito empreendedor. É a chamada pull theory. A segunda considera-o como um fenómeno predominantemente adverso, “solução para os males do mercado de trabalho”, “manifestação dos males do mercado de trabalho”, “resultado da crise do assalariamento. Traduziria a queda qualitativa e quantitativa da oferta de empregos assalariados de tempo integral. Mudanças estruturais da economia, recessão e desemprego empurrariam as pessoas para o autoemprego. É a conhecida push theory que vê o crescimento do autoemprego como um indicador da crescente insegurança do mercado de trabalho. Análise empírica Este estudo é essencialmente qualitativo e exploratório. As expressões autoformação profissional e autoemprego foram usadas na perspectiva de investimentos individuais autónomos, através das formas alternativas e flexíveis de preparação profissional que os respondentes julgaram lucrativos empreender para o desenvolvimento de habilidades, capacidades e comportamentos susceptíveis de aumentar a produtividade, por um lado, proporcionar rendimentos, por outro. O autoemprego não corresponde necessariamente a criação de microempresas. As estratégias de autoformação, autoemprego e exercício de várias profissões formuladas pelos respondentes do questionário não são baseadas inteiramente em alguma realidade objectiva de posicionamento competitivo, mas ao contrário, são respostas limitadas às exigências do mercado. A presente pesquisa buscou resposta para a questão: Qual a eficiência e os limites da autoformação profissional e autoemprego na economia informal no bairro da Sanzala em Viana? Os pressupostos são que quanto mais acções autoformativas o trabalhador 151 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE adquirir, mais polivalente se torna, e ao mesmo tempo, mais eficiente para enfrentar o mercado de trabalho; Quando não aparece um emprego ou quando os rendimentos auferidos são insuficientes ou substitutos precários, surge a necessidade de investir em mais uma formação profissional. A amostra, objecto de estudo, foi intencional e constituída por 200 jovens que solicitavam uma formação nos centros do MAPESS de Luanda, no intuito de se qualificar, entrar no mercado de trabalho, auferir bons rendimentos e melhorar o desempenho organizacional. Selecionou-se um conjunto de actividades que possuem um certo potencial para influenciar positivamente o crescimento económico, excluindo aquelas ligadas à mera sobrevivência. Dentre os respondentes, apenas 2 afirmam terem uma única profissão; 117 pretendem possuir capacidades em duas profissões, 70 em três profissões e 11 em quatro profissões. Maioritariamente, são pedreiros (38%) e mecânicos (26%). Os pedreiros, na segunda e terceira profissões são ladrilhadores (21%), pintores (12%) e canalizadores (12%). Os mecânicos, na segunda profissão são motoristas (25%). Verificou-se que Relojoaria, Reparação de aparelhos, Condução, Alfaiataria, Técnica de frio, assim como Carpintaria, Serralharia, Operador de grua e Jardineiro não foram assinaladas como profissões principais. Grande número dos respondentes considera-se mestres qualificados (82%), trabalhadores independentes (87%), polivalentes (75%), com uma elevada capacidade de trabalho (83%), de adaptação a novos empregos (85%) e de inovação (91%). As competências foram adquiridas pela autoformação profissional (65%) ou num centro de formação do MAPESS (55%). Nota-se também que os mestres qualificados, as oficinas, os familiares e amigos ofereceram algumas formações, respectivamente, a 87%, 70%, 44% e 30% de respondentes. No entanto, 96% dos respondentes sentem a necessidade de melhorar a qualificação. A maioria concorda haver facilmente oportunidades para melhorar a qualificação já adquirida. Quanto ao que levou a ter muitas ocupações: 88% apontam o motivo de garantir um bom rendimento familiar, 89% pretendem garantir a empregabilidade e 88% procuram adequar-se às exigências do mercado do trabalho. Assim, observa-se que as estratégias de autoformação profissional e autoemprego no bairro da Sanzala têm muita relevância no emprego informal. A pobreza, o desemprego e a falta de rendimentos levam a recorrer a estas estratégias que combinam com a posse de várias qualificações. No entanto, as mesmas referenciadas como estratégias de saída do desemprego, da pobreza e de formação de rendimentos apresentam limitações. Devem ser usadas permanentemente. Quando se pretende aumentar os rendimentos no contexto informal, parece ser necessário combinar as três estratégias: autoformação, autoemprego e posse de várias qualificações. Procura-se de certo modo valorizar um conjunto de saberes práticos nem sempre certificados, adquiridos geralmente em acções de formações de curta 152 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE duração ou directamente no terreno. Mesmo quando certificados, a sua qualidade não facilita um reconhecimento generalizado. A baixa produtividade, a falta de qualificação e as exigências do mercado de trabalho formal vulnerabilizam estas pessoas. Quando o emprego não aparece ou quando os rendimentos auferidos são substitutos precários, exercitarem-se novos ciclos de formação para aprender outras profissões e aumentar a empregabilidade. Estes ciclos vão aumentando os investimentos e custos de formação cujos proveitos, a curto e médio prazos, não são garantidos (Gulyani e Talukdar 2010, Harris-White 2010). Conhecer os custos e benefícios das referidas estratégias poderá ser objecto de uma futura pesquisa com um tamanho da amostra maior. Conclusão Esta pesquisa pretendia verificar a relevância, eficiência e limites da autoformação profissional e autoemprego na economia informal no Bairro da Sanzala em Viana. No primeiro capítulo definiu-se e discutiu-se o conceito de autoformação profissional e a sua relação com a autoemprego e apresentou-se um corpus teórico, na perspectiva de fundamentar a pesquisa. Aplicou-se um questionário a 200 pessoas que assinalaram as profissões que assumem, a forma como adquiriram a experiência profissional e quais as razões que determinaram a ocupação de muitas profissões. A análise revelou que as estratégias de autoformação, autoemprego e ocupação de muitas profissões no bairro da Sanzala têm muita relevância no emprego informal, mas são dispendiosas. Os respondentes redefinem frequentemente suas acções e experiências profissionais, reavaliando as escolhas, as decisões tomadas e o impacto das mesmas nos rendimentos. Assim, as referidas estratégias não são eficientes para sair verdadeiramente da pobreza, amentar os rendimentos ou promover o desenvolvimento socioeconómico. O facto de os respondentes indicarem uma disponibilidade para melhorar a qualificação, sugere mais reflexões sobre autoformação e autoemprego nos bairros desfavorecidos. Devido da não representatividade da amostra, os resultados postos em evidência nesta pesquisa não devem ser generalizados. No entanto, interpelam a reflectir se os esforços públicos ou privados visando a ajudar as pessoas que nesta situação se encontram não deverão ser orientados para o trabalho assalariado. As futuras pesquisas deverão utilizar outros métodos, verificar a incidência de outras variáveis económicas e sociais assim como os custos e benefícios económicos das referidas estratégias. 153 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Referências bibliográficas Albero, B. Autoformation et enseignement supérieur. Paris, Editions Lavoisier, 2003 Couceiro, M. L. Processos de autoformação: uma produção singular de si-próprio. Tese de Mestrado. Universidade Nova de Lisboa. Faculdade de Ciências e Tecnologia. 1992. Demaizière, F. Autoformation, nouvelles Technologies et didactique. Réflexions et propositions méthodologiques. In Revue Les Sciences de l´Éducation pour l´ère nouvelle. Médiations éducatives et aides à l´autoformation. Volume 29, n´1-2, CERSE – Université de Caen, pp 67-99. 1996. Gasparini, G. et al. Self-employment: Choice or necessity? European Foundation for the improvement of living and working conditions. Office for official publications of the European communities. Luxembourg. 2000. Gulyani, S. Debabrata, T. Inside informality: the links between poverty, microenterprises, and living conditions in Nairobi´s slums. World development vol. 38, nº 12, 1710-1726. Elsevier, 2010. Harris-White, B.. Work and wellbeing in informal economic: the regulative roles of institutions of identity and the state. World development, vol 38, Nº 2, 170-183. Elsevier, 2010. Lobo da Fonseca, F. et al. Ruptura de paradigmas biblioteconómicos, autoformação e mercado de trabalho: Estudo de caso. Rev. ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina, v.10, n.2, p. 207-223, Jan./Dez. 2005. 154 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Mosca, J. Pobreza, economia informal, informalidades e desenvolvimento. In Pobreza, Desigualdade e Vulnerabilidade em Moçambique, eds. De Brito, Luís, Carlos Nuno Castel-Branco, Sérgio Chichava, António Francisco. Maputo: IESE, 83-98. 2010 Pamplona, J.B. O autoemprego e os determinantes de seu sucesso. Rio de Janeiro. Fundação Konrad Adenauer. 2002 O Balcão Único do Empreendedor e o Microempreendedorismo em Angola Francisco Miguel Paulo Investigador CEIC Precioso Domingos Economista, CEIC UCAN Factos sobre o Empreendedorismo em Angola Desde 2008 o Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola e a Sociedade Portuguesa de Inovação, com o apoio do Banco de Fomento de Angola, e desde 2010 com o grupo Media nova, publicam bianualmente O Relatório GEM Angola em parceria com o Global Entrepreneurship Monitor (GEM). O Global Entrepreneurship Monitor é o maior estudo de empreendedorismo realizado em todo o mundo. Tem como objectivo analisar a relação entre o nível de empreendedorismo e o nível de crescimento económico em vários países e, simultaneamente, determinar as condições que fomentam e travam as dinâmicas empreendedoras em cada país113. Este projecto foi iniciado em 1999, com 10 países (numa iniciativa conjunta do Babson College – EUA, e da London Business School – Reino Unido), e tem vindo a expandir-se, contando, em 2008, com 43 países, incluindo Angola, que participava pela primeira vez. Os dados são obtidos por meio de inquéritos efectuados a população com idade compreendida entre os 18 e 64 anos, utilizando um questionário padronizado para 113 Relatorio GEM Angola 2008 pagina vii 155 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE todos os países participantes no GEM. Em 2008 em Angola foram inqueridas 1500 pessoas e em 2010 a amostra foi aumentada para 2000 pessoas. O relatório de 2008 foi publicado em 2009 e o de 2010 foi publicado em Junho de 2011. O índice ou o indicador principal do GEM, ë a taxa de Actividade Empreendedora EarlyStage (TEA), que mede a proporção de indivíduos adultos envolvidos quer num negócio em fase nascente (negócio que proporcionou remuneração salarial por um período não superior a 3 meses), quer na gestão de um negócio existente ou novo (negócio que proporcionou remuneração salarial por um período de 3 a 42 meses). Os principais resultados destes dois relatórios apresentam o quadro geral do empreendedorismo em Angola durante o período entre 2008 e 2010. Quadro Geral do Empreendedorismo em Angola Características da Actividade Empreendedoras em Angola (%) Taxa de Actividade Empreendedora Early-Stage (TEA) Empreendedores de negócios nascentes (até 3 meses) Empreendedores a gerir novos negócios (de 3 meses a 3,5 anos) Empreendedores early-stage do Sexo Masculino Empreendedores early-stage do Sexo Feminino Empreendedores no Sector Terciário Empreendedores no Sector Secundário Empreendedores no Sector Primário Empreendedores movidos por Necessidades de Sobrevivência Empreendedores movidos pela Oportunidade de Aumentarem Rendimento Empreendedores movidos por Outros Motivos Empreendedores que declaram enfrentarem muita concorrência Empreendedores que declaram enfrentarem pouca ou nenhuma concorrência Empreendedores que Desistiram de um negócios nos 12 meses antes Entrevista Empreendedores que Desistiram por Falta de Lucros Empreendedores que Desistiram por Razoes Pessoais Empreendedores que Desistiram por Falta de Financiamento Dados em branco não disponível no primeiro relatório 2008 22,7 19,3 4,1 20,3 25,2 47,0 16,0 25,0 55,3 6,7 19,4 - Fonte: Relatório GEM Angola 2008, 2010 Segundo o quadro, em 2008, a taxa TEA em Angola foi de 22,7%, o que significa que quase 23 adultos em cada 100 estiveram envolvidos em start-ups. A taxa TEA angolana era a quarta mais alta dos 43 países GEM 2008, ficando acima do dobro da média destes países (10,5%) e significativamente acima da taxa registada pelos restantes países africanos participantes neste estudo: Egipto (13,1%) e África do Sul (7,8%). 156 2010 31,9 15,9 16,3 32,9 31,0 85,7 7,1 1,5 42,3 27,1 14,1 53,9 21,8 14,4 32,4 17,6 5,7 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Já em 2010, Angola registou uma Taxa TEA de 31,9%, o que significa que existiam cerca de 32 empreendedores early-stage (indivíduos envolvidos em start-ups ou na gestão de novos negócios), por cada 100 indivíduos em idade adulta. A Taxa TEA de Angola, em 2010, foi a 5ª mais alta do universo GEM 2010 no total de 59 países. No quadro acima nota-se ainda que a necessidade é o factor que motiva cerca de metade da actividade empreendedora em Angola (constituindo 47% da TEA em 2008 e 42% em 2010), a seguir vem a oportunidade de aumentar o rendimento que notavelmente passou de 16% em 2008 para 27,1% em 2010. No que diz respeito à distribuição da actividade empreendedora early-stage angolana por sector em 2010, verifica-se que mais de três quartos da mesma (78,6%) se concentra no sector orientado ao consumidor, que inclui todos os negócios direccionados para o consumidor final, como o retalhista, bares, restauração, alojamento, saúde, educação e lazer, entre outros. Seguem-se, depois, o sector da transformação (12,8%), o sector orientado ao cliente organizacional (7,1%), e, por último, o sector extractivo, com apenas 1,5% Em termos de entraves ao empreendedorismo em Angola os aspectos destacados pelos especialistas entrevistados114 como obstáculos ao fomento da actividade empreendedora no País foram: 1. Dificuldade de acesso ao crédito (na condição estrutural Apoio Financeiro); 2. Dificuldades das empresas novas e em crescimento obterem a maioria das autorizações e licenças no prazo de uma semana, fruto da burocracia (na condição estrutural Políticas Governamentais); 3. O grau em que as infra-estruturas físicas proporcionam um bom apoio às empresas novas e em crescimento (na condição estrutural Acesso a Infraestruturas Físicas); 4. Falta de qualificação da população (na condição estrutural Educação e Formação); 5. E as limitações de eficiência e aplicação da legislação anti trust (na condição estrutural Abertura do Mercado/Barreiras à Entrada). 114 Especialistas ligados ao empreendedorismo em Angola, incluindo líderes do sistema financeiro, funcionários do governo, académicos e empreendedores de renome.- GEM Angola 2008, 2010 157 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA Alguns Programas empreendedorismo desenvolvidos REVISTA ACADÉMICA LUCERE pelo Executivo para o fomento do Nos últimos anos, o mundo tem dado especial atenção a questão do microcrédito com vista a promoção do empreendedorismo. Do ponto de vista do investimento, o microcrédito implica de certo modo a disseminação do risco, evitando naturalmente a concentração de avultadas somas de capital, num grupo reduzido de agentes económicos. Em Angola, o Estado e as instituições financeiras privadas (bancárias e não bancárias), tem desenvolvido programas e produtos financeiros que estão em sintonia com esta tendência. O microcrédito é normalmente entendido como sendo um financiamento com um limite estabelecido e relativamente baixo, direccionado a pessoas de baixo rendimento que realizam uma determinada actividade económica no sector informal (ao que após a concessão do referido microcrédito a passarão a realizar). Este é um mecanismo que torna possível o acesso ao sistema financeiro, por parte daqueles agentes económicos (no fundo, o publico em geral) que não tem fundos para iniciar o seu próprio negócio. Recentemente, a Executivo angolano, deu passos concretos nesse sentido, apoiando os agentes económicos no acesso ao crédito. E importante perceber as inúmeras vantagens que podem resultar deste processo de globalização do acesso ao crédito. De um modo geral, o agente económico informal realiza uma determinada actividade económica para sobreviver e fá-lo a margem da lei, sem estar sujeito as obrigações inerentes a essa mesma actividade (geralmente comercial) e, por outro lado, sem poder beneficiar dos direitos que possui qualquer agente económico formal. O peso enorme da economia informal e uma característica muito vincada da nossa economia. O Executivo angolano, apresentou recentemente o Programa de Desenvolvimento das Micro, Pequenas e Medias Empresas (PDMPMEs), com o objectivo de potenciar este sector empresarial. Tal iniciativa, trouxe ao de cima outras debilidades do sistema, como é o caso da inexistência de um quadro legal que permitisse a execução de programas do género. Tem-se dito que é das contradições que surge o desenvolvimento e como não poderia deixar de ser, foi aprovada a Lei nº 30/11 de 13 de Setembro, das Micro, Pequenas e Medias Empresas possibilitando assim "a formulação da estratégia e estruturação das politicas e programas dirigidas as referidas empresas, bem como a criação ou 158 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE capacitação de organismos e instituições com autoridade publica para coordenação e avaliação permanentes do alcance das politicas a implementar". O referido programa possibilitara ao Poder Executivo gerir mais um instrumento de promoção de desenvolvimento económico e social do país. No entanto, não seria sério e nem suficientemente assertivo, se não se tivesse em conta a necessidade de prestar uma atenção especial a um sector fundamental, o sector informal. Para o efeito, o Executivo apresentou também o Programa de Apoio ao Pequeno Negocio - PROAPEN -, que propicia uma luz ao fundo do túnel aos agentes económicos que realizam actividades económicas de pequena dimensão, facilitando-lhes o acesso ao crédito de acordo com a dimensão e natureza do seu negócio. No âmbito deste programa há ainda a possibilidade de aceder a outras vantagens, nomeadamente um programa de capacitação profissional dos utilizadores no sentido de obterem formação enquanto gestores. O Estado não pode facultar mecanismos de financiamento em condições vantajosas para o sector informal. Portanto a pergunta seria Como e que estes agentes económicas informais poderão aceder a programas do género? Obviamente, tal só será possível se estes agentes económicos procederem a legalização das suas actividades, o que nas condições actuais (há algumas semanas) só será possível no Guiché Único de Empresa. Este serviço, embora necessário, e ainda relativamente oneroso e simplesmente impossível de utilizar para os micro empreendedores. Só o montante necessária para a constituição da empresa, pode em muitos casos superar o montante de investimento que o micro empreendedor necessita, sem falar ainda da própria burocracia que o processo acarreta. Para dar consistência e coerência ao programa, o Executivo criou também o BUE Balcão Único do Empreendedor - que e um serviço publico que concentra num único local diversos serviços administrativos públicos, cuja finalidade e simplificar o processo de constituição, licenciamento de empresas, regulação de empreendedores que se encontram no mercado informal e actos conexos115. O BUE é um serviço tal como definido na lei, mas deve, também, ser entendido como uma ferramenta (muito importante) do já referido PROAPEN. Existem três objectivos principais no programa, a saber: 115 Decreto Presidencial nº 40/12 de 13 de Março 159 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE A formalização da actividade económica realizada ou que pretende realizar o micro empreendedor, a custo zero; A possibilidade de aceder a formação gratuita, através do Instituto de Emprego e Formação Profissional (INEFOP) tutelado pelo MAPESS; A possibilidade de aceder ao financiamento (uma parte em kits de trabalho de acordo com a actividade que realiza ou pretende realizar e/ou 20% do valor do kit em dinheiro para despesas correntes ou fundo de maneio) através dos bancos operadores comerciais, nomeadamente o BPC e o BCI, sem necessidade de dep6sito para abertura de conta. O primeiro destes três objectivos, só é possível através do crédito BUE, avaliado em 679 mil kwanzas por empreendedor, um prazo de carência de 12 meses à uma taxa de juros de 2% ao ano e com um prazo de 60 meses (ou seja, 5 anos). O dinheiro é cedido em forma de material já pago, porém, os utentes recebem entre 5 a 20% do valor em dinheiro para despesas de fundo de maneio. Passos necessários para concessão de crédito, constituição e licenciamento de uma empresa no BUE 1. O Empreendedor que não tenha a sua documentação pessoal em dia deve dirigir-se em primeiro lugar ao Registo Civil do BUE para tratar do seu Registo Civil para efeitos de Bilhete de Identidade. 2. Com a Certidão de Registo Civil deve dirigir-se à Identificação Civil e Criminal do BUE para tratar do Bilhete de Identidade. 3. O Empreendedor deve dirigir-se à U.T.M (Unidade Técnica Municipal) presente no BUE para ”Entrevista de Avaliação”. Caso a entrevista seja positiva a U.T.M deverá apoiar o Empreendedor a preencher a Ficha de Negocio e Documentação, obtendo para o efeitos de concessão de crédito o “ Aval Moral” do Banco. 4. O Empreendedor dirige-se à área de Atendimento da Administração Municipal para obter a declaração para efeitos de pagamento de Imposto Industrial. 160 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 5. O Empreendedor dirige-se à área de Atendimento do Ficheiro de Denominações Sociais para preencher o formulário de pedido de Certificado de Admissibilidade de Denominação Social. Anexar 1 cópia do B.I. do requerente. 6. O Empreendedor dirige-se à área de Atendimento da Direcção Nacional de Impostos para obter o número de Identificação Fiscal, a Declaração de Início de Actividade e o Comprovativo de Isenção de Impostos. O Empreendedor que já possua o Número de Identificação Fiscal deve dirigir-se a Repartição Fiscal de jurisdição para anular o actual número e declarar as actividades a exercer. 7. Após obtenção dos documentos acima referidos, o Empreendedor deverá dirigir-se à área de Atendimento do Registo Comercial, para efeitos de organização do processo e registo do Comerciante em Nome Individual: Entrega de 1 cópia do Bilhete de Identidade; Preencher o formulário para efeitos de pedido de registo comercial. Documentos a Reunir Para a Constituição da Empresa: Declaração da Administração Municipal; Certificado de Admissibilidade; Número de Contribuinte e a Nota de Fixação, do Documento de Arrecadação de Receitas (DAR) Fotocópia do B.I.; Requerimento do Comerciante em Nome Individual preenchido; Requisição do Registo Comercial preenchida. 8. Constituído o Comerciante em Nome Individual, o Empreendedor deverá dirigir-se à área de licenciamento Especial da Administração Municipal ou da Direcção Provincial do Comercio, consoante a actividade a exercer. Certificação das MPME Documentos Necessários Formulário de Certificação MPME devidamente preenchido; Assinatura do Termo de Responsabilidade MPME; Cópia do Estatuto ou Pacto Social, Número de Identificação Fiscal, Cópia do Alvará ou do comprovativo de entrada para o efeito; Declaração da Empresa sobre o número de trabalhadores efectivos, Comprovativo do pagamento do Imposto sobre o Rendimento de Trabalho do mês anterior, com folha de salário 161 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE validada pela Direcção Nacional de Impostos; Comprovativo do pagamento do Imposto Industrial; Certidão Negativa da situação fiscal da MPME. Valores a Pagar As Pessoas Singulares que se dediquem às micro actividades constantes do Anexo I do decreto Presidencial nº 43/12 de 13 de Março, estão isentas do pagamento de taxas emolumentares devidas pela constituição e licenciamento de actividades durante 2 anos. As Micro Empresas estão isentas só do pagamento de taxas devidas pelo procedimento de licenciamento durante 2 anos. Visão crítica do programa O programa BUE esta avaliado num montante global de 21,34 mil milhões de kwanzas (ou seja, 220 milhões de dólares americanos ao câmbio oficial de 2012)116. Tendo em conta que o crédito disponível para cada empreendedor é de 679 mil kwanzas (ou seja 7.000,00 USD), podemos antever a possibilidade de beneficiarem cerca de 31.428 empreendedores. Até que ponto este programa possibilitara diminuir o desemprego? Pode-se esperar geração de emprego ou auto-emprego? Relativamente às questões colocadas, podemos abrir dois cenários: Primeiro cenário: auto-emprego. Vamos assumir que o empreendedor não tenha trabalhadores assalariados, ou seja, emprega membros da sua família que trabalham sem remuneração, visto que o negocio e familiar e o lucro e usufruído por todos (servindo para arcar as despesas com alimentação, saúde, educação, transporte, etc.). Esta assunção leva-nos a uma relação de um emprego por cada crédito concedido, ou seja, espera-se gerar 31.428 postos de trabalho (em auto-emprego). Segundo cenário: Assumindo que o empreendedor, para além de si emprega mais duas pessoas117, espera-se uma geração de 94.284 postos de trabalho. É prematuro medir a eficiência real deste programa por se encontrar numa fase embrionária. Todavia, não podemos deixar de sublinhar alguns elementos associados à forma de funcionamento do programa, nomeadamente, a não concessão, na totalidade dos valores monetários correspondentes a 7.000,00 USD. Isto é, o 116 Comunicado de Imprensa da Casa Civil do Presidente da República, 13 de Março de 2012 117 A evidência empírica sobre o pequeno negócio em Luanda dá conta que em média, cada um destes empreendedores trabalha com duas pessoas. 162 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE empreendedor só recebe até 20% em dinheiro e o restante em forma de materiais e equipamentos. Eventualmente, a lógica do Executivo de conceder até apenas 20% do montante em dinheiro e o restante em materiais e equipamentos é de evitar o Azar Moral118. No entanto, pergunta-se, até que ponto tais materiais e equipamentos são de interesse do empreendedor em termos de qualidade, preço e fornecedor. Não estaria o Executivo a desvirtuar um dos pressupostos fundamentais da economia de mercado ao adjudicar o fornecimento de materiais e equipamentos a certos agentes económicos? O que dizer acerca dos empreendedores que já tiverem materiais e equipamentos? Serão estas empresas as mais eficientes do mercado? Quem são os proprietários das empresas fornecedoras de materiais e equipamentos no âmbito deste programa? Não estaria o executivo a promover o negócio destas empresas à custa do erário público? Não se estaria a resvalar para o sistema de planificação em que o Estado definia as necessidades a serem satisfeitas? Deixamos que os leitores e o tempo esclareçam as questões colocadas. De acordo com a agência noticiosa ANGOP119, o Programa Angola Jovem teve início em 2008 e tem como objectivo proporcionar aos jovens a criação dos seus negócios. Os critérios de selecção são, ter de 18 a 30 anos de idade e estar agrupado em cooperativa de cinco elementos. O Crédito Jovem é um programa nacional inserido no “Angola Jovem”, uma parceria entre o Instituto Nacional de Apoio a Pequenas e Médias Empresas (INAPEM), Banco de Poupança e Crédito (BPC) e o Ministério da Juventude e Desporto. Montantes gastos com o Credito Jovem Ano Valor (milhões de kwanzas) Valor (milhões de USD) 2008 n.d. n.d. 2009 1.447,04 17,43 2010 n.d. n.d. 118 Uma situação em que os 7.000,00 USD são aplicados numa área contrária à aquela que motivou o credor a conceder crédito. 119 http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/economia/2012/8/36/Cem-jovens-beneficiam-creditojovem,a660e9d4-7f26-4e78-af26-d112ef1fab3c.html 163 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 2011 815,74 8,59 2012 481,20 4,91 FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério das Finanças Até agora não existem relatórios sobre a eficiência deste programa no âmbito do fomento ao empreendedorismo, ou seja, quantas pessoas já beneficiaram deste programa? Terão os mutuários criado ou expandido o seu negócio? Como está a questão do reembolso? No que concerne ao BUE, até que ponto os seus beneficiários não são os mesmos que do Crédito Jovem? Que dizer dos beneficiários do microcrédito proporcionado pelo Banco Sol (comparticipado pelo Governo)? É interessante notar que o programa Crédito Jovem foi lançado em 2008 e o crédito BUE em 2012. Será que podemos esperar um outro programa em 2017? Existirá alguma relação entre estes programas e os ciclos eleitorais120? À guisa de conclusão, temos a dizer o seguinte: Apesar das incertezas sobre a eficiência real deste programa no âmbito do fomento do empreendedorismo e apoio aos reais empreendedores, pode-se ver que, o BUE poderá permitir (em certa medida) o registo e legalização dos agentes económicos que operam no mercado informal duma forma rápida e a custos reduzidos. O BUE, até um certo ponto, pode ser considerado uma forma de redistribuição de rendimento a grupos que não têm acesso ao mercado formal de financiamento, pese embora, uma parte considerável do dinheiro e entregue em espécie (pelo menos 80% do total), o que na verdade beneficia os reais proprietários das empresas fornecedoras de materiais e equipamentos. O crédito afigura-se bonificado e competitivo, dada a taxa de juro de 2% ao ano e o prazo de reembolso de 5 anos precedido por um ano de carência. Porém, isto exige uma grande capacidade de monitorização por parte do credor ao longo deste período (praticamente 6 anos), sob pena de haver muito crédito mal parado. Os altos níveis de empreendedorismo que o país apresenta, exigem apoios sérios e sustentados por parte de quem governa, de modo a facilitar a criação 120 Cfr. Teoria do ciclo político de negócios. 164 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE de emprego e a redução da pobreza. Não se deve depender de ciclos eleitorais, caso se queira promover e apoiar o empreendedorismo. Bibliografia SPI; CEIC. Relatório GEM Angola 2008/2010. Decreto Presidencial nº 40/12 de 13 de Março Comunicado de Imprensa da Casa Civil do Presidente da República, 13 de Março de 2012. CEIC. Relatório Económico de Angola, 2011. http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/economia/2012/8/36/Cemjovens-beneficiam-credito-jovem,a660e9d4-7f26-4e78-af26-d112ef1fab3c.html 165 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE DOCUMENTOS Breve historial do ISPOCAB Pe. PhD. Amadeu Ngula Excelência Rvma. D. Eugenio Dal Corso, Bispo da Diocese de Benguela e digníssimo Chanceler deste Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela, Senhor Padre Doutor José Brinco, Director adjunto do Instituto, Distintos chefes de Departamentos, Caros Docentes e Discentes, Abnegados Funcionários, Convidados e amigos! Estou aqui, neste momento não para fazer propriamente a descrição histórica e cronológica do surgimento desta nossa e jovem Instituição, mas apenas para traçar algumas pinceladas sobre um breve historial daquilo que a memória registrou nesses breves anos. Quanto à história como tal, deixaremos o trabalho para os historiadores. Eduardo Galeano, historiador, dizia: “a história é um profeta com o olhar voltado para trás: pelo que foi e contra o que foi, anuncia o que será.” Começo a minha breve abordagem com esta frase, porque acredito que ela encerra a súmula das vicissitudes e peripécias pelas quais passou esta Instituição que hoje temos a honra e o gaudium de inaugurar de modo oficial. Na verdade, debruçando-nos sobre o breve passado desta Instituição, podemos afirmar que o homem é feito de tempo e a história é a interpretação da acção transformadora do homem. O homem se insere no tempo: o presente humano não se esgota na acção que realiza, mas adquire sentido pelo passado e pelo futuro. Espero 166 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE que o nosso recuar no passado não possa ser interpretado como exercício de saudosismo, mera curiosidade ou simples erudição. Os pioneiros desta Instituição acreditam que o passado não está morto, porque nele se fundam as raízes do presente. É compreendendo o passado desta Instituição que podemos dar sentido ao presente que estamos a celebrar e projectar o futuro airoso que nos é dado esperar. Senhoras e Senhores, Vivemos horas maiores, porquanto podemos dizer com veemência «legem habemus». O Instituto Superior Politécnico Católico de Benguela, abre com serena confiança os seus braços ao futuro que há-de assegurar-lhe a desejada continuidade. Não foi fácil chegar aqui onde nós estamos hoje. Que o digam todos aqueles que assistiram desde a primeira hora o raiar deste projecto! Foi por ocasião do encerramento do ano lectivo 2005 do ICRA que o então Bispo D. Óscar Braga anunciava a intenção de criar a exemplo de Luanda o ISUP- JPII. Enviada a carta de pedido à CEAST, obteve-se a resposta a 19 de Março de 2006 que autorizava o Bispo diocesano a avançar com o projecto, já que o decreto de criação o previa. Foi a partir daí que tudo começou… O Titular da Diocese cria a provisão n.4/06 que nomeava a primeira direccão, mais tarde homologada pelo Chanceler do ISUP-JP II, D. Pedro Luís Scarpa. Dia 19 de Março o Chanceler, (D. Pedro Luis Scarpa) do ISUP-JP II presidia à Eucaristia da erecção do Instituto na Paróquia de S. José da Caponte e dava tomada de posse à direcção que era composta pelo sub-escrito e pelo PhD. Paulino Lukamba. Apenas começava aquele ano lectivo uma nuvem de incerteza irrompia sobre o horizonte do projecto e o tornava quase num pesadelo: Éramos aventureiros (como fomos chamados por alguns e malucos e imaturos por outros, mas cheios de esperança) porque sempre acreditamos que o futuro deste projecto se anunciava grandioso. Para agudizar ainda mais este quadro sombrio que se abatia sobre o projecto nascente, no dia 19 de Abril de 2006, a Secretaria de Estado para o Ensino Superior enviava um ofício que inviabiliza o projecto por falta de licenciamento. Consequentemente, outra carta de censura do projecto vem do frei João Domingos, de quem esperávamos apoio dizia que nos tínhamos precipitado ao começar. Tínhamos perdido o chão. O Consenso começou a vir menos dentro e fora da Diocese. 167 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Foi a partir daí que começamos a encetar contactos para contornarmos a situação. Recebidos por Sua Excelência Sr. Arcebispo de Luanda, então Presidente da CEAST e Reitor da UCAN, fora-nos indicado o então Padre Imbamba como seu homem de contacto sobre o “dossier” Benguela. Para cada má notícia, para cada apunhalada houve sempre uma notícia de alento e de esperança. Estávamos assustados mas com a ideia de que se o projecto era de Deus ninguém o faria parar. Na verdade sentíamos a falta de muitos companheiros de caminhada que tinham pensado que havíamos um salto no vazio… Houve dias difíceis como o dia 18 de Fevereiro de 2008 em que recebíamos o segundo aviso do Secretário de Estado para o Ensino Superior que ameaçava tomar medidas apropriadas em conformidade com a lei. Nesse dia, rezámos em umbundu juntos a oração de S. Bernardo à Nossa Senhora: “nunca se ouviu dizer que os que recorreram à vossa protecção fossem por Vós abandonados: «Katchikakulimbe». Agarrámo-nos em Maria como se fosse a última coisa que nos restava em mãos. Nesta esperança retomámos contactos. Sua Eminência Alexandre Cardeal do Nascimento foi um dos que fomos contactar. Guardamos como tesouro em nosso coração os seus conselhos. Suas palavras foram de alento, de conforto mas também de esperança: Deus se encarregará de tomar conta do que é seu, dizia. Ainda acrescentava: “é bom que história seja escrita não pelos caçadores, mas pelos caçados”. Na verdade só hoje compreendemos o alcance destas sábias palavras. Deunos conselhos com base na sua experiência enraizada na fé e na sua visão sobre o futuro do País. Foram palavras de um gigante d´Africa que nos devolveram a força de continuar a lutar por aquilo que acreditamos. Enquanto percorríamos o País, cujas viagens eram pagas com os nossos próprios esforços, para construir um consenso externo sobre o projecto, e percorríamos Luanda a pé entre dicastérios da CEAST e dos ministérios, uma nova situação tornou a assombrar os nossos esforços: As Irmãs Doroteias já não podiam hospedar mais o ensino superior nas suas instalações. Devíamos deixar os espaços que ocupávamos. Teve que intervir o Bispo da Diocese para que nos fosse deixado um tempo até termos um espaço alternativo. Foi nessa altura que começamos com as obras que nos acolhem neste momento. Iniciadas pelo Pe. Castilho, que Deus o tenha, muito cedo Deus o retirava do nosso convívio, para agudizar mais ainda o projecto que já estava ameaçado. A partir daí o Dr. Lukamba passou pessoalmente a fiscalizar os trabalhos porque precisávamos de entrar já. Transportou o material no seu carro pessoal, comia com os operários, como um comandante que come com a tropa, quase que vivia na obra. É uma singela homenagem a este ilustre pioneiro desta obra. Como se não bastasse, mal terminava a 168 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE obra, pesava sobre nós a urgência de deixarmos com urgência o espaço porque não era do agrado de alguns paroquianos… interveio o Bispo e sobreveio a bonança… Outro grande alento nos veio dos contactos com o D. Filomeno Vieira Dias, Bispo de Cabinda, na altura Presidente da Comissão Episcopal para o Ensino Superior. Foi determinado o seu envolvimento e o seu engajamento pessoais. Foi sob a sua orientação que renovámos a esperança de termos retomado o caminho. Os seus contactos com as mais altas esferas do Estado foram decisivos para as nossas relações com o Ministério. D. Filomeno sabia bem quantas frentes (internas e externas) que este projecto enfrentava e soube dar-nos conselhos vitais para a percepção do problema e das formas de o enfrentar. Outros contactos foram encetados com o arcebispo Metropolita do Huambo, D. Alves Queirós, com o arcebispo do Lubango D. Gabriel Mbilingui… Outros contactos de topo dos órgãos de soberania foram efectuados bem como as nossas autoridades locais que não nos retiraram o seu apoio. Mas existiram sempre as linhas de discenso: Dos que nos aconselhavam a abandonar o projecto; Dos que nos ligavam para manifestar o seu total desagrado porque estávamos a pôr mal a Diocese; Dos que pensavam que não estávamos em altura de liderar o processo; Dos que enfim, procuravam minar o projecto desde o princípio e encetar vermes no ventre do projecto. A estas vozes discordantes soubemos sempre respeitar e como estávamos ocupados demais deixámos sempre que o tempo se encarregasse de dizer que estavam do lado errado. Nesse mesmo contexto D. Óscar deixa o governo da Diocese e entra em cena o actual Bispo de Benguela, D. Eugenio. Tomadas as rédeas da Diocese, o novo Bispo não perdeu tempo. Informado sobre o dossier” e conhecedor da realidade do país reuniu esforços e criou consensos. Foram feitas outras diligências junto da CEAST e Junto do Ministério de Ensino Superior e depois de tantos esforços eis-nos aqui hoje coroados de júbilo. Caros discentes e docentes, Esta intervenção, quer ser também uma singela homenagem a todos vós, porque acreditastes neste projecto desde a primeira hora. Vivestes também vós momentos de angústia e de incertezas. Muitos por temor desistiram ou se transferiram para outras 169 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE instituições onde se sentiam mais seguros. Mas vós quisestes aceitar o desafio da incerteza. Aí está a vossa grandeza. É por demais sabido, na fértil experiência da história, que as instituições apenas permanecem quando os homens estão convencidos de que há valores morais que os transcendem. Não acreditem nos arautos da luta permanente contra os valores cristãos e do respeito das tradições seculares dos nossos antepassados. A verdade é que fora de um ideal de amor e de vinculação às formas mentais superiores nenhuma sociedade pode erguer-se sobre alicerces sólidos e espalhar a semente de esperança nos homens que lhe incumbe lançar à vida. Termino agradecendo em nome de todos aqueles que estiveram desde o dealbar deste projecto a oportunidade que nos destes de deixar registado o nosso testemunho sobre o percurso tortuoso, trabalhoso e duro que levou à criação deste Instituto; percurso este que pôs à prova tudo em que acreditamos. Nada me resta senão terminar com as palavras do salmista:” Se o Senhor não estivesse connosco os homens ter-nos-iam devorado vivos no furor da sua ira…! Dado no Lobito, na festa de S. Francisco de Assis, aos 4 dias do mês de Outubro de 2012. By Pe. PhD. Amadeu Ngula 170 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE RECENSÃO CRÍTICA KICOLA: ESTUDOS SOBRE A LITERATURA ANGOLANA DO SÉCULO XIX Nelson Pestana (Ph.D.), Investigador-Coordenador do CEIC “Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX”121 é o livro que Francisco Soares acaba de publicar, pelas edições Mayamba e que teve lançamento na Universidade de Letras, da Universidade Agostinho Neto. O título do livro, “Kicola”, tem um sentido irónico. Como o próprio autor explica numa nota inicial do livro. Kicola é uma expressão kimbundu que quer dizer: “não pode ser”. Ou seja, “é impossível”, sendo a “possibilidade” aqui associada à “transgressão” e “impossibilidade” ao facto de não se querer desrespeitar uma regra social ou cultural estabelecida. Isto é, “não pode ser”, na medida que isso vai contra os valores estabelecidos e que devem ser respeitados, porque estão na ordem natural das coisas. “Kicola” tem pois um sentido transcendental, é uma impossibilidade quase metafísica. A apropriação de “Kicola”, no sentido irónico que lhe é atribuído pelo autor é correlato ao cepticismo exclamativo das pessoas sobre a possibilidade de Angola ter uma literatura, no século XIX. E, ainda mais, uma literatura à altura da exigência estética do seu tempo e ao nível da literatura que se fazia em outras latitudes, nomeadamente no Brasil e em Portugal. Como a primeira reacção das pessoas, quando se falava da literatura angolana do século XIX, era de espanto e de incredulidade, surgia sempre um, “não pode ser”, agora como impossibilidade histórica, já que a noção que se tinha (ou tem) de África é a de que não havia nada de “civilizado”, antes da intervenção do colonialismo moderno (apontado para à ocupação efectiva, decidida na Conferência de Berlim, 1884-1885). Esta noção é muito inculcada pelas ciências de sociais francófona e anglófona que durante muito tempo, determinados pela experiência das suas colónias, apresenta a África como uma realidade homogénea e como terra de literatura, a partir da emergência de escritores africanos, no pós IIª Guerra Mundial. 121 Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX, Francisco Soares, Luanda, Mayamba Editora, 2012. 171 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Ora Angola é um caso específico, historicamente determinado que deve ser compreendido através de um olhar de longa duração. Este permite decantar uma literatura angolana do século XIX que infelizmente continua mal conhecida, apesar do esforço meritório de publicistas e historiadores desta literatura, como Júlio de Castro Lopo, sobretudo através do estudo pioneiro sobre o jornalismo angolano, Mário António Fernandes de Oliveira que se multiplicou em estudos sobre alguns dos mais representativos escritores do século XIX e da sua sociedade (Maia Ferreira, Cordeiro da Matta, Pedro Machado, Pedro da Paixão Franco entre outros) e Gerald Moser, a quem devemos, entre outras coisas, a descoberta do livro "Espontaneidades da Minha Alma", de Joaquim da Silva Maia Ferreira, na Library of Congress, de Washington, dando a oportunidade de recomeçarmos, desde então, a refazer a Historia da literatura angolana. Neste movimento, em que sobressaí Carlos Erverdosa, com o seu "Roteiro da literatura angolana", é justo incluir os nomes de Mário de Andrade e Costa Andrade, pelo seu trabalho de divulgação no estrangeiro, durante o período da ditadura colonial, e, para o período posterior à proclamação da independência, primeiro, Henrique Guerra, pelos vários trabalhos que produziu, depois, a revista Archote, pelo seu trabalho de divulgação e teorização, onde se destacava o esforço de divulgação da literatura angolana do século XIX do indivíduo que vos fala que aí publicou vários trabalhos e, posteriormente resgatou, prefaciou e promoveu a publicação sucessiva, pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda (Lisboa), de dois importantes livros que estava dados como perdidos, Delírios, de Cordeiro da Matta, (2003) e “Cenas de África”, de Pedro Félix Machado (2004). Luis Kandjimbo, com os seus vários artigos no suplemento literário do Jornal de Angola e agora com os seus verbetes no site da ebonet.net e Carlos Pacheco com os seus três livros dedicados ao pioneiro da literatura angolana, Maia Ferreira, dois biográficos e um crítico. E, “last but not least”, há a destacar o trabalho de pesquisa e divulgação de Francisco Soares, que localizou um exemplar dos sonetos, de Pedro Félix Machado, primeiro, numa biblioteca americana, a Library of New York, depois, um outro exemplar, na Biblioteca da Faculdade de Letras do Porto. Este professor de literatura africana de língua portuguesa, também prefaciou e impulsionou, junto da Imprensa Nacional-Casa da Moeda (Lisboa) uma nova publicação desse conjunto de sonetos, "Sorrisos e Desalentos". “Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX” surge neste contexto. Primeiro como um livro de divulgação e agora como um verdadeiro manual de literatura que coloca “as mãos na arqueologia literária do país”, como o próprio Francisco Soares dizia no seu “Notícia da literatura angolana” (edição da IN-CM, Lx, 2001); um livro denso de história e teoria da literatura angolana que está para lá da simples “notícia” e é uma das melhores obras publicadas no género porque reúne as qualidades do rigor factual e teórico. 172 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE Neste livro, “Kicola: estudos sobre a literatura angolana do século XIX”, agora retrabalhado e ampliado, Francisco Soares reafirma o seu mérito, a sua elevada qualidade pela coerência da sua economia de texto e a capacidade produtiva de sentido da sua escrita. A sua intenção é a de fazer um estudo em 2 volumes: o primeiro volume dedicado à análise formal da produção poética dos autores de Angola, no século XIX, e o segundo volume versando sobre as leituras, na Angola do século XIX. Neste livro minuciosamente dedicado à análise formal dessa produção poética, o autor estuda quase meio século de literatura (1856-1900), distribuído por dois períodos: 1ª fase; 1856-1877 e a 2ª fase; 1878-1900. Porém o livro está estruturado, não em termos cronológicos mas em função do seu conteúdo. Aparece pois dividido em duas partes: a primeira parte: “Circunscrições” e a segunda parte: “Análise estilística do corpus escolhido”. Em Circunscrições, depois de uma introdução, em que apresenta a sua problemática, FS apresenta o seu corpus, por uma selecção e exclusão de poemas, determinada pelo critério escolhido e faz alude aos autores e obras de referência, também estrangeiros, já que uma literatura não surge sozinha, isolada mas em interacção com outras. Faz também um apuramento teórico e conceptual tecendo considerações sobre os seus conceitos operatórios (como seja verso, estrofe simples e composta, hierarquização, distribuição rimática e sistema. Na Análise estilística do corpus escolhido, Francisco Soares, primeiro, divide as 119 composições seleccionadas em função do número de versos das estrofes, constituindo diferentes grupos de análise. 1º - o das estrofes com 4 versos, que são os mais comuns, também “na poesia romântica e ultra-romântica portuguesa” e que Olavo Bilac considera serem “as estrofes mais cultivadas”. (verificam-se 64 ocorrências para versos em decassílabos e 5 para dodecassílabos) 2º - o das estrofes com 5 versos (2 tipos: decassílabos (ABBA) e heptassílabos (ABBA) e um mesmo autor: Cândido Furtado). 3º - o das estrofes com 6 versos (12 ocorrências) 4º - o das estrofes com 7 versos 5º - o das estrofes com 8 versos 173 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 6º - o das estrofes com 9 versos 7º - o das estrofes com 9 versos 8º - o das estrofes com 9 versos… A partir daí Francisco Soares centra o seu propósito “na maneira de construir os versos e as estrofes”, nos meios de produção dessa poesia, isto é, na apreciação das formas artesanais que permitiram a construção técnica dos poemas e do corpus poético societal angolense, nessa época. O autor procura, pelo método comparativo transnacional e pela transferência de informação, apreender a filiação literária do grupo de produtores poéticos; rastrear notas fundamentais do tráfego literário angolense; ultrapassar as questões (recorrentes ainda hoje) de classificações ideológicas (positiva ou negativa e de legitimação abrir caminho a hipóteses comparativas abrangentes; Levando em consideração, o caldeamento de cultura em que são formados e alimentados os produtores (recurso já experimentado, para outro corpus, por Mário António de Oliveira, de quem Francisco Soares é discípulo confesso) Conclui que estes artesãos revelam-se frequentadores dos poetas dos poetas ultra-românticos portugueses e brasileiros; do lado português lidera Camilo Castelo Branco, a quem se juntam Casimiro de Abreu e outros do lado brasileiro, Gonçalves Dias e Gonçalves Crespo soa acompanhados por Fagundes Varela, Alvarez de Azevedo entre os angolanos e estrangeiros residentes (ditos “aclimatados”) havia pessoas esclarecidas, actualizadas e pensantes que produziam literatura à altura da Europa e da América daquele tempo; ou seja havia uma comunidade de literatos que demonstravam “uma consciência depurada no trato formal do poema; no entanto, os produtores e a poesia produzida eram conservadores, submetidos à função social ou socializadora que era atribuída à poesia à época; por isto, esta poesia, pela sua função social não podia ser muito erudita, tinha que ficar ao nível da comunidade a que se destinava, restando ao nível dos cânones populares. Por isto a timidez nas inovações não é determinada pela ignorância mas por razões de eficácia social da produção poética 174 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA REVISTA ACADÉMICA LUCERE 175