Revista 67 Nº 1 sem anúncios

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Revista 67 Nº 1 sem anúncios
Trabalhos da
Sociedade Portuguesa
Dermatologia
e Venereologia
de
Volume 67 - Número 1 - Janeiro / Março de 2009
TRABALHOS DA SOCIEDADE
PORTUGUESA DE
DERMATOLOGIA E VENEREOLOGIA
EDITOR
Gabriela Marques Pinto
EDITORES ANTERIORES
Juvenal Esteves (†)
Menéres Sampaio (†)
F. Cruz Sobral (†)
Artur Leitão (†)
António Poiares Baptista
António Cabral Ascensão (†)
Manuel Marques Gomes
Augusto Mayer-da-Silva
CONSULTORES CIENTÍFICOS
Américo Figueiredo
António Massa
António Picoto
António Pinto Soares
António Poiares Bapstista
Armando Roseira
Artur Sousa Basto
Carlos Resende
Clarisse Rebelo
Fernando Guerra Rodrigo
Filomena Azevedo
Francisco Brandão
João Amaro
Jorge Cardoso
José Mesquita Guimarães
Helena Lacerda e Costa
Luis Camacho de Freitas
Manuela Capitão-Mor
Margarida Gonçalo
Oscar Tellechea
Osvaldo Correia
SECRETARIADO E CORRESPONDÊNCIA
Gabriela Marques Pinto
Serviço de Dermatologia
Hospital de Curry Cabral
Rua da Beneficência
1069-166 Lisboa
Propriedade
Sociedade Portuguesa de
Dermatologia e Venereologia
ISSN: 0304-4777
Registo imprensa nº 111449
Depósito legal 24892/88
Telef: 21 792 42 74 / 21 792 43 42
FAX: 21 792 42 74
Editora
PUBLICAÇÕES
E
PUBLICIDADE
Publicações e Publicidade Unipessoal
Rua Virgínia Vitorino nº9 B - 1600-782 LISBOA
Telf.: 21 757 81 35
Periodicidade
Trimestral
1
SOCIEDADE PORTUGUESA DE
DERMATOLOGIA E VENEREOLOGIA
PRESIDENTES HONORÁRIOS
Aureliano da Fonseca
A. Poiares Baptista
CORPOS GERENTES - BIÉNIO 2009-2010
DIRECÇÃO
Presidente
Manuel António de Azevedo Marques Gomes
Vice-Presidente
Carlos Manuel Soares de Rezende e Sousa
Secretária Geral
Maria Margarida Martins Gonçalo
Tesoureira
Maria Raquel Mendes Pereira Vieira Macedo
Vogal
Sofia Beatriz Loureiro Marques Vasconcelos Magina
MESA DA ASSEMBLEIA GERAL
Presidente
Esmeralda Maria Seco do Vale
Secretária
Glória Maria Cardoso da Cunha Velho
Secretário
Jorge Luís Furtado de Mendonça Olim Marote
CONSELHO FISCAL
Presidente
João Abel Amaro
Vogal
Bárbara Cristina Guerreiro Fernandes
Vogal
José Carlos Faria Fernandes
Capa: Calcinosis Universalis em Criança de 8 Anos.
Proveniência: Dr.ª Catarina Vilarinho e Cols. Serviços de Dermatologia e Pediatria, Hospital São Marcos, Braga.
2
Informações aos Autores
A revista "Trabalhos da Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia " é o órgão oficial da Sociedade
Portuguesa de Dermatologia e Venereologia (SPDV) e aceita para publicação trabalhos elaborados no âmbito da
Dermatologia e da Venereologia.
Publicará também notícias, informações, actas e/ ou relatórios, bem como os resumos dos trabalhos apresentados em
reuniões, cursos ou congressos.
INFORMAÇÕES AOS AUTORES
1. Três conjuntos completos de cada manuscrito, incluindo gráficos e figuras, deverão ser
manuscritos, para apreciação por um ou mais
consultores ("referees"), para o editor:
Gabriela Marques Pinto
Serviço de Dermatologia
Hospital Curry Cabral
Rua da Beneficência
1069-166 Lisboa
2. Os autores, ao submeterem o material para publicação, aceitam que o artigo é original e não
está proposto para publicação em qualquer outra
revista ou livro, excepto sob a forma de resumo.
O consentimento escrito de cada um dos autores
é obrigatório.
3. Preparação do manuscrito:
Os trabalhos podem ser submetidos em Português ou Inglês. O manuscrito deverá ser dactilografado a 2 espaços, letra tipo arial ou outra sem
"serif, tamanho l 2, em folhas A4 de um só lado,
com amplas margens. Todas as páginas, são
numeradas. Cada secção (ver "organização do
manuscrito") inicia-se em nova página.
4. Organização do Manuscrito
ou **) colocados a pós os nomes e antes das
instituições).
Nome, morada, telefone e fax do autor responsável pela publicação.
Referência a bolsas, suportes financeiros ou
outros (quando aplicável).
b - Resumo (2ªe 3ª páginas)
É obrigatório o envio de resumos em Português e
em Inglês, dactilografados em folhas separadas,
com um máximo de 250 palavras.
Os resumos deverão ser concisos e indicar os
objectivos / âmbito, resultados e conclusões, ou
descrição sumária dos casos clínicos.
c - Palavras Chave (4ª página)
Cada artigo far-se-á acompanhar de l página 5
palavras chave ("Key-words") dactilografadas em
português e em inglês.
d - Texto
O texto deverá ser estruturado da forma tradicional:
i) artigo original: introdução; doentes / material
e métodos; resultados; comentários ou discussão.
ii) caso clínico: introdução; descrição do(s) caso(s);
comentário ou discussão.
a - Na primeira página indicar:
e - Referências / Bibliografia
Título em Português
Título completo em Inglês
Nome(s) do(s) autor(es)
Serviço, Departamento instituição de filiação de
cada um dos autores
(indicar a filiação dos autores por símbolos (p.ex.*
Todas as referências as referências (e só estas) são
numeradas e listadas por ordem de aparecimento
no texto.
Identificar as referências no texto, quadros e gráficos por numeração árabe (entre parênteses).
3
Informações aos Autores
Modelos:
(1) Artigo:
23.Autor NN, Autor NN: Título do artigo. Nome
da revista abreviada vol n°: página inicial página final (ano).
23.Breathnach SM: The skin immune system and psoriasis. Clin Exp immunol
91:343-345(1993).
(2) Capítulo do livro:
24.Autor NN, Autor NN: Título do Capítulo. In
Editor NN, Editor NN (eds), n° edição, Cidade,
Editora, ano, pág. inicial - página final.
24.Norris PG, Gange RW Hawk LM: Acute
efects of ultraviolet radiation on the skyn.
In Fitzpatrick TB, Elsen AZ, Wolff
K, Freedberg IM, Austen KF (eds), Dermatology in General Medecine, 4a ed, New
York, McGraw-Hi 11,1993, pp 1651-1658.
NOTA: Os Títulos das revistas deverão ser abreviados de acordo com o estilo usado no
índex Medicus. Dados não publicados e
"comunicações pessoais" não podem ser
citadas na bibliografia mas podem ser
referidas no texto (entre parênteses).
f - Quadros
Apresentados individualmente em páginas separadas com numeração romana pela ordem de
localização no texto.
Cada quadro deve ser acompanhado de
pequeno título e pode conter notas de rodapé,
desde que referidas a elementos apresentados
nos quadros.
Não se aceitam legendas nos quadros.
g - Figuras e legendas
As figuras deverão ser enviadas sob a forma de:
(i) desenhos ou gráficos nítidos, com qualidade para
4
publicação, sem legenda incorporada;
(ii) fotografias a preto e branco ou a cores, em papel
brilhante. A fim de evitar reduções, as fotografias
deverão ter de largura 6,5 cm (1 coluna) ou 14 cm
(2 colunas);
(iii) diapositivos de 35mm. Recomenda-se o envio de
1 conjunto de diapositivos para melhor qualidade
de reprodução na impressão;
(iv) cd-r com fotografias digitalizadas, correctamente e com a máxima definição possível; sem
legenda incorporada e acompanhado por
reprodução a cores, em papel, indicando nº das
figuras.
No dorso de cada fotografia, ou no caixilho de
cada diapositivo, indicar (1) o numero da figura
conforme referenciado no texto, (2) o nome do l °
autor e (3) uma seta referindo o topo da fotografia.
As legendas deverão ser enviadas em tolha separada, dactilografada a 2 espaços, indicando sem
pre o n° da figura.
5. EDIÇÃO ELECTRÓNICA
A fim de facilitar e melhorar o trabalho
de impressão, recomenda-se que, acompanhando os conjuntos impressos, seja
enviado um CD-R, contendo o manuscrito
em forma final de publicação e utilizando
como processador de texto o microsoft
word (IBM-compatível). Os gráficos deverão ser enviados em ficheiro separado
(Microsoft Power Point, ou similar). E as
imagens deverão ser enviadas no seu
ficheiro original (jpeg. ou tiff.) e não
inseridas em qualquer outro programa.
O texto deverá ser dactilografado em
contínuo, sem introdução de separadores
de página e sem justificação à direita.
Aceitam-se também ficheiros ASCII.
Índice
EDITORIAL
Gabriela Marques Pinto .................................................................................................................................... 9
EDUCAÇÃO MÉDICA CONTÍNUA
Anestesia Local em Cirurgia Dermatológica
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo ............................................................................................... 11
Anestésicos Locais em Dermatologia – Da Molécula à Técnica
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo ............................................................................................... 25
ARTIGO ORIGINAL
A Dermatologia sob o Microscópio
Bernard Cribier (Traduzido por Luís Soares de Almeida)..................................................................................... 41
ARTIGOS DE REVISÃO
Fibromixoma Acral Superficial – Caracterização Clinicopatológica e Imunohistoquímica
de um Tumor Recentemente Descrito
Ricardo Coelho, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo e Sá .................................................................. 51
Neurofibromatose Tipo 1 na Consulta de Dermatologia Pediátrica do Hospital de
São Marcos – Revisão de 16 Casos
Filipa Ventura, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Ricardo Maré, Jaime Rocha, Raquel Pinheiro,
Laura Brito, Celeste Brito ................................................................................................................................. 59
Cirurgia Micrográfica de Mohs no Dermatofibrosarcoma Protuberans – Experiência
do Centro de Dermatologia Médico-Cirúgica de Lisboa
Ricardo Coelho, Goreti Catorze, João Sousa, José Labareda, Isabel Viana, Esmeralda Vale,
António Picoto, Olívia Bordalo e Sá ................................................................................................................. 69
ARTIGOS DE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Novidades em Dermatopatologia – 2008
Luís Soares de Almeida .................................................................................................................................. 77
O Papel do Pulse Dye Laser na Dermatologia
Nuno Menezes, Gioconda Mota, Armando Baptista ........................................................................................ 89
GRUPO PARA O ESTUDO E INVESTIGAÇÃO DAS DOENÇAS SEXUALMENTE
TRANSMISSÍVEIS (GEIDST)
Exsudado Vaginal Exuberante como Primeira Manifestação de Doença Inflamatória
Intestinal
Nuno Menezes, Natividade Rocha, Sónia Fernandes, David Tente, Gioconda Mota, Armando Baptista ............... 97
5
Índice
“PÉROLAS” CIRÚRGICAS
Reconstrução de Defeitos da Face Lateral do Nariz com Retalhos Nasogenianos
Ricardo Coelho, Vítor Neto ........................................................................................................................... 103
Sinus Pilonidalis Sacrococcígeo – Tratamento Cirúrgico com Retalho Rombóide
de Limberg
João Goulão, Constança Furtado ................................................................................................................ 107
CASOS CLÍNICOS
Calcinosis Universalis em Criança de 8 Anos
Catarina Vilarinho, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Henedina Antunes, Celeste Brito ....................................... 115
Manchas de Bier Múltiplas
Felicidade Santiago, Hugo S. Oliveira, Américo Figueiredo ............................................................................. 121
Síndrome de Laugier-Hunziker
Ricardo Coelho, Manuel Martins, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo ............................................... 127
Hiperidrose e Bromidrosofobia
Rui Tavares-Bello .......................................................................................................................................... 133
Rosácea Fulminante
Daniela Cunha, Raquel Vieira, Alexandra Chaveiro, Ana Afonso, Jorge Cardoso ............................................. 139
Pênfigo Vulgar Refractário – Tratamento com Rituximab
Catarina Vilarinho, Filipa Ventura, José Carlos Fernandes, Celeste Brito ......................................................... 145
BOLSAS E PRÉMIOS
Bolsas e Prémios atribuídos (2008) .................................................................................................... 151
ARQUIVO DA SPDV
Notícias – “Desafios Éticos Regulamentares e Jurídicos para a Dermatologia”
Rui Tavares-Bello
........................................................................................................................................ 155
Actas das Assembleias Gerais (Actas n.º 270 e n.º 271) ........................................................... 156
REUNIÕES DA SPDV
X Congresso Nacional de Dermatologia e Venereologia
Lisboa, 14 a 16 de Novembro de 2008 (Programa e Resumos) .......................................................................... 161
6
Contents
EDITORIAL
Gabriela Marques Pinto .................................................................................................................................... 9
CONTINUOUS MEDICAL EDUCATION
Local Anesthesia in Dermatologic Surgery
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo ............................................................................................... 11
Local Anesthetics in Dermatology – From the Molecule to the Technique
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo ............................................................................................... 25
ORIGINAL ARTICLE
Dermatology under the Microscope
Bernard Cribier (Traduzido por Luís Soares de Almeida)..................................................................................... 41
REVIEW ARTICLES
Superficial Acral Fibromyxoma – A Clinicopathological and Immunohistochemical
Analysis of a Recently Recognized Tumor
Ricardo Coelho, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo e Sá .................................................................. 51
Neurofibromatosis Type 1 in the Pediatric Dermatology Consultation of the Hospital
de São Marcos – Review of 16 Cases
Filipa Ventura, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Ricardo Maré, Jaime Rocha, Raquel Pinheiro,
Laura Brito, Celeste Brito ................................................................................................................................. 59
Mohs Micrographic Surgery for Dermatofibrosarcoma Protuberans – Centro de
Dermatologia Médico-Cirúrgica Experience
Ricardo Coelho, Goreti Catorze, João Sousa, José Labareda, Isabel Viana, Esmeralda Vale,
António Picoto, Olívia Bordalo e Sá ................................................................................................................. 69
BIBLIOGRAPHIC REVIEW ARTICLES
News in Dermatopathology – 2008
Luís Soares de Almeida .................................................................................................................................. 77
Pulse Dye Laser in Dermatology
Nuno Menezes, Gioconda Mota, Armando Baptista ........................................................................................ 89
GROUP FOR THE STUDY AND INVESTIGATION OF SEXUALLY TRANSMITTED
DISEASES (GEIDST)
Exuberante Vaginal Discharge as the First Manifestation of Inflammatory
Bowel Disease
Nuno Menezes, Natividade Rocha, Sónia Fernandes, David Tente, Gioconda Mota, Armando Baptista ............... 97
7
Contents
SURGICAL PEARLS
Nasal Reconstruction of Defects of the Nose with Nasolabial Flaps
Ricardo Coelho, Vítor Neto ........................................................................................................................... 103
Pilonidalis Sinus – Surgical Treatment with Limberg Rhomboid Flap
João Goulão, Constança Furtado ................................................................................................................ 107
CASE REPORTS
Calcinosis Universalis in an 8 Year Old Child
Catarina Vilarinho, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Henedina Antunes, Celeste Brito ....................................... 115
Multiple Bier Spots
Felicidade Santiago, Hugo S. Oliveira, Américo Figueiredo ............................................................................. 121
Laugier-Hunziker Syndrome
Ricardo Coelho, Manuel Martins, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo ............................................... 127
Hyperhydrosis and Bromidrosophobia
Rui Tavares-Bello .......................................................................................................................................... 133
Rosacea Fulminans
Daniela Cunha, Raquel Vieira, Alexandra Chaveiro, Ana Afonso, Jorge Cardoso ............................................. 139
Recalcitrant Pemphigus Vulgaris Successfully Treated with Rituximab
Catarina Vilarinho, Filipa Ventura, José Carlos Fernandes, Celeste Brito ......................................................... 145
SCHOLARSHIPS AND PRIZES
Scholarships and Prizes Granted (2008) ......................................................................................... 151
ARCHIVE OF SPDV
Announcements – “Ethical Challenges of Rules and Juridic Conceptions in Dermatology”
Rui Tavares-Bello
........................................................................................................................................ 155
SPDV General Meeting Reports ......................................................................................................... 156
REUNIÕES DA SPDV
10th National Congress of the SPDV
Lisbon, November 14-16, 2008 (Program and Abstracts) .................................................................................... 161
8
Editorial
Neste primeiro número de 2009 dos “Trabalhos da SPDV”, queria começar por desejar a todos os colegas, em geral,
um auspicioso ano – apesar dos condicionalismos decorrentes da conjuntura nacional e internacional… – e, em
particular, aos colegas que integram a nova Direcção da SPDV para o biénio 2009/2010 desejo que continuem a
desenvolver o excelente trabalho, a que já nos habituaram, em prol desta nossa especialidade.
Como devem ter notado, este número dos “Trabalhos” tem 2 artigos de Educação Médica Contínua subordinados ao
mesmo tema: “Anestesia Local em Dermatologia”, facto que julgo merecer uma explicação da minha parte.
De facto, o que se verificou é que aceitei os 2 trabalhos para publicação neste capítulo de Educação Médica
Contínua, sem me ter dado conta, de início, que se tratava de artigos diferentes e de autores diversos. Passo a explicar:
num curto intervalo de tempo recebi 2 trabalhos, um por email e outro por correio tradicional, dedicados ao mesmo
tema e elaborados no âmbito da formação pós-graduada na área da dermatologia, que considerei de todo o interesse
para publicar nesta rubrica da revista, pelo que dei de imediato resposta positiva à sua publicação. Convenci-me, na
altura, que se tratava do mesmo artigo enviado por 2 meios diferentes, o que se tornou usual nesta era das novas
tecnologias; actualmente, é frequente os colegas enviarem-me emails (para 2 caixas de correio diferentes…)
questionando-me acerca do meu interesse em publicar determinado trabalho e, simultaneamente ou mesmo em data
prévia, enviarem-me o referido trabalho por correio normal ou electrónico. Contribuiu para esta minha “confusão” o
facto dos 2 trabalhos abordarem o mesmo tema, terem títulos semelhantes, serem provenientes de 2 serviços de
dermatologia do centro/norte do país e a primeira autora de ambos os trabalhos ser uma jovem interna com nome
“parecido”: Ana Moreira e Ana Nogueira e que eu, na altura, não reconheci pessoalmente.
Apesar de todas estas coincidências – e ainda dizem que não há coincidências!........ – a responsabilidade pela
aceitação dos 2 trabalhos para publicação no mesmo número da revista é obviamente minha e, como tal, decidi, após
obter a concordância dos autores dos referidos trabalhos, publicar ambos os artigos neste número dos “Trabalhos”.
O mérito e interesse científicos dos referidos trabalhos não são, de modo nenhum, diminuídos por esta infeliz
coincidência e, na minha opinião, apesar de alguns trechos dos artigos serem, como seria de esperar, semelhantes, não
abordam o tema da “Anestesia Local em Dermatologia” exactamente na mesma perspectiva, pelo que considero que
cada um deles constitui uma mais valia formativa em relação ao outro.
Na verdade, mesmo que tivesse desde o início notado que se tratavam de 2 trabalhos diferentes julgo que não seria
justo excluir nenhum deles, dada a qualidade científica, o interesse e oportunidade do tema, bem como o tempo e
esforço dispendidos na elaboração de ambos.
Aqui ficam, mais uma vez, as minhas desculpas em relação aos autores dos artigos em causa e julgo que a decisão
de publicar os 2 artigos nesta revista foi a mais correcta e menos lesiva para todos.
Por último, chamava a atenção para o facto de no presente número dos “Trabalhos da SPDV” serem publicados
apenas os resumos dos trabalhos apresentados oralmente no 10º Congresso Nacional de Dermatologia e Venereologia,
que decorreu em Lisboa em Novembro de 2008; dado o elevado número de trabalhos apresentados neste Congresso e
a limitação do espaço gráfico da revista, os resumos referentes aos trabalhos apresentados sob a forma de poster serão
publicados no próximo número da revista.
Cordiais saudações,
Gabriela Marques Pinto
9
Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 11-23 (2009)
Educação Médica Contínua
ANESTESIA LOCAL EM CIRURGIA DERMATOLÓGICA
Ana Moreira1, Ricardo Vieira2, Américo Figueiredo2
1
Serviço de Dermatologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho
2
Serviço de Dermatologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra
RESUMO - A anestesia local é bastante mais utilizada que a anestesia geral no contexto da cirurgia dermatológica. É
uma técnica anestésica que induz perda de sensibilidade reversível numa área cutânea limitada, permitindo a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos com desconforto e risco mínimos para o doente.
Estudos recentes comprovam que a anestesia local é geralmente bem tolerada em doentes com risco elevado para
anestesia geral, resultando em menor morbilidade. O procedimento local vem igualmente ao encontro das tendências
actuais de cirurgia ambulatória, aliando a contenção de custos à segurança e eficácia.
O conhecimento básico das propriedades farmacológicas dos agentes anestésicos, os efeitos adversos potenciais e as
diferentes aplicações e técnicas de administração são fundamentais para o cirurgião dermatológico que pretende
aumentar a segurança e conforto do doente.
PALAVRAS-CHAVE - Anestesia local; Cirurgia dermatológica; Anestésicos locais.
LOCAL ANESTHESIA IN DERMATOLOGIC SURGERY
ABSTRACT - Most cutaneous surgical procedures are performed under local anesthesia. Its effects provide a reversible
loss of sensation in a limited area of skin, allowing dermatologists to perform diagnostic and therapeutic procedures
safely, with minimal discomfort to the patient.
Recent studies have shown that patients at high risk for complications from general anesthetics tolerate local anesthesia
with less morbidity. The use of local anesthesia for cutaneous procedures also conforms to recent trends toward cost
containment, safety and a greater emphasis on outpatient surgery.
Thus a basic understanding of the pharmacologic properties of these agents, the potential adverse effects and the
different applications and techniques of administration is vitally important to the practicing dermatologic surgeon in order
to maximize patient safety and comfort.
KEY-WORDS - Local anesthesia; Dermatologic surgery; Local anesthetics.
Correspondência:
Dr.ª Ana Isabel Duarte Moreira
Serviço de Dermatologia e Venereologia
Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia / Espinho
Rua Conceição Fernandes – Vilar de Andorinho
4430-502 Vila Nova de Gaia
Telefone: 227865100
Fax: 227830209
E-mail: [email protected]
11
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo
Educação Médica Contínua
PERSPECTIVA HISTÓRICA
Para além de agentes físicos (frio e calor), usados ancestralmente como anestésicos, os primeiros fármacos
com propriedades anestésicas locais remontam à civilização Inca, que utilizava folhas de coca (Erythroxylon
coca). Quando mastigadas produziam uma insensibilidade da cavidade oral e da faringe, assim como um
efeito estimulante, sendo utilizadas para pequenas
intervenções nessa zona. Foi Albert Niemann, em 1860,
que começou a utilizar o seu alcalóide activo (cocaína).
Em 1880, Von Annep foi o primeiro a descrever a
administração de cocaína por infiltração subcutânea,
com fins anestésicos2. Em 1884, Koller e Freud demonstraram que a instilação ocular desta substância produzia
anestesia oftálmica tópica. Finalmente, Halsted, em
1885, realizou o primeiro bloqueio nervoso periférico
com cocaína.
Até 1904, altura em que surgiu a procaína, não existia alternativa satisfatória à cocaína. Este novo fármaco,
um éster do ácido para-aminobenzóico (PABA), adquiriu
Quadro I
CLASSIFICAÇÃO DOS ANESTÉSICOS LOCAIS
Ésteres
Amidas
Cocaína
Lidocaína
Procaína
Bupivacaína
Mepivacaína
Cloroprocaína
Prilocaína
Tetracaína
Benzocaína
Etidocaína
Ropivacaína
de imediato popularidade apesar da tendência para
produzir reacções alérgicas. Em 1930 foi introduzida a
tetracaína que, apesar de ter a vantagem de se tratar de
um éster do PABA mais potente, partilhava também uma
elevada taxa de reacções alérgicas. O maior progresso
ocorreu com a síntese do derivado amídico do ácido
dietilaminoacético, a lidocaína, em 19431,4. A lidocaína
é o protótipo do grupo amino-amídico, com características de penetração tecidular elevada, escassa toxicidade e efeito anestésico potente2, sendo praticamente
desprovida de propriedades sensibilizantes1. Nas últimas três décadas desenvolveram-se novos anestésicos
locais, como a prilocaína, a mepivacaína, a etidocaína e
a bupivacaína2 (Quadro I).
MECANISMO DE CONDUÇÃO NERVOSA
1. Fundamentos anatómicos
As fibras nervosas transmitem impulsos a diversas
zonas do corpo por um complexo mecanismo electroquímico, sendo iniciados por diversos estímulos químicos, mecânicos ou eléctricos. A estrutura anatómica
chave do impulso nervoso é a membrana celular que
rodeia os axónios, o axolema, uma vez que a transmissão nervosa é condicionada pelas suas propriedades
químicas. Trata-se de uma estrutura lipoproteica, com
uma zona fosfolipídica bimolecular que apresenta um
pólo externo hidrofílico e um pólo interno hidrofóbico,
rodeada e intercalada por complexas proteínas. As
células de Schwann não estão envolvidas na transmissão
nervosa apesar da sua importante função de síntese da
bainha de mielina.
Os nervos periféricos classificam-se em três categorias: fibras A, B e C (Quadro II). A dor é transmitida
sobretudo por fibras amielínicas do tipo C. Estas fibras
Quadro II
CLASSIFICAÇÃO DAS FIBRAS NERVOSAS
12
Tipo de fibra
Diâmetro
Velocidade de condução
Função
A-alfa
10-20 ìm
70-120 mseg
Motora/proprioceptiva
A-beta
5-12 ìm
30-70 mseg
Pressão/tacto
A-gama
4-8 ìm
15-30 mseg
Proprioceptiva
A-delta
1-4 ìm
12-30 mseg
Temperatura
B
1-3 ìm
3-15 mseg
Vasoconstrição
C
0,5-1 ìm
0,5-2,5 mseg
Dor/temperatura
Anestesia Local em Cirurgia Dermatológica
Educação Médica Contínua
são bloqueadas mais facilmente e de forma mais rápida
do que as fibras intermédias, que veiculam a temperatura. As fibras mielínicas do tipo A e as fibras motoras
são as últimas a ser bloqueadas2-4.
2. Fundamentos fisiológicos
Um estímulo externo provoca um impulso nervoso
que é conhecido como potencial de acção. O fenómeno
do impulso eléctrico na membrana nervosa depende do
gradiente de concentração dos iões sódio e potássio no
axoplasma e no líquido extracelular, assim como da
permeabilidade da membrana nervosa a estes iões. O
potencial de membrana em repouso, medido mediante
eléctrodos intracelulares, é de -60 a -90mV. A estimulação nervosa altera a permeabilidade aos iões sódio e
potássio, originando saída de potássio e entrada de
sódio na célula nervosa. Quando o potencial de
membrana se eleva, fecha-se a porta de entrada do
sódio. Neste momento, o potencial de membrana é de
+40mV. A membrana inicia a repolarização com a
ajuda da bomba de sódio, restaurando-se assim o
equilíbrio de membrana. Este transporte activo de sódio
requer energia da fosforilação oxidativa. Durante o
processo de despolarização e repolarização, a membrana permanece refractária a estímulos adicionais.
O impulso nervoso gerado propaga-se pelas fibras
nervosas. A condução avança de um nódulo de Ranvier
para o seguinte sob a forma de “saltos de rã”, adquirindo grande velocidade nos nervos mielínicos2,3.
3. Fundamentos bioquímicos
A acção anestésica dos diferentes anestésicos locais
depende de diversos factores, nomeadamente da sua
lipossolubilidade, da ligação a proteínas, do pKa, da
difusão através dos tecidos não nervosos e da actividade
vasodilatadora intrínseca.
A solubilidade de um anestésico local é extremamente importante, uma vez que a composição da membrana nervosa é maioritariamente lipídica. Assim, os
anestésicos locais lipofílicos apresentam difusão rápida
e maior potência.
A união a proteínas também é um factor limitante,
uma vez que 10% da composição restante do axolema é
proteica. A duração do efeito anestésico relaciona-se
com a ligação a proteínas da membrana neuronal.
O pKa é a constante dissociativa do anestésico local e
determina a proporção da base e do seu catião num
determinado pH. A maioria dos anestésicos locais é
pouco solúvel em água e o pH tecidular influencia de
forma notável a sua eficácia. Por exemplo, em tecidos
infectados, que possuem uma elevada concentração de
ácido láctico e portanto um pH inferior ao normal, têm
menor eficácia.
À excepção da cocaína, todos os anestésicos locais
têm uma capacidade vasodilatadora intrínseca.
A zona a anestesiar também é importante, uma vez
que determina a absorção do anestésico. Áreas muito
irrigadas, como a face e o couro cabeludo, absorvem
rapidamente o anestésico local, prejudicando a eficácia
da anestesia, enquanto que nas extremidades, com
menor vascularização, o efeito é potenciado2-4.
MECANISMO DE ACÇÃO
Qualquer procedimento que atinja a derme ou a
hipoderme despertará dor. Utilizam-se anestésicos
locais com o intuito de facilitar o procedimento cirúrgico,
evitando a sensação dolorosa3.
Todos os anestésicos locais existentes actuam por
bloqueio da função do nervo periférico. O mecanismo
de acção mais provável é a ligação da forma catiónica a
um receptor no canal de sódio, inibindo-o. Desse modo,
estabilizam a membrana no seu potencial de repouso,
aumentando o limiar da excitação eléctrica e reduzindo
a propagação de um impulso excitatório. Assim, a despolarização não ocorre e os potenciais de acção não se
propagam3-5.
A cocaína tem, ainda, acrescida a propriedade vasoconstritora, que resulta da inibição da recaptação da
noradrenalina1,3.
ESTRUTURA DOS ANESTÉSICOS LOCAIS
Todos os fármacos anestésicos locais são estruturalmente semelhantes, tendo em comum três componentes: uma porção aromática, uma cadeia intermédia e
uma porção amina. A alteração em qualquer um destes
componentes modifica a sua potência, tempo de início e
duração de acção (Quadros III e IV). São bases orgânicas fracas que requerem a adição de um sal de hidrocloreto para serem solúveis em água e injectáveis1,3-5.
A porção aromática é responsável pela solubilidade
em lípidos, uma propriedade importante que favorece a
difusão dos anestésicos através da membrana nervosa
altamente lipofílica. A porção amina é hidrofílica e responsável pela hidrossolubilidade. A cadeia intermédia
contém a ligação éster ou amida, pela qual os anestésicos são classificados1,3,5.
13
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo
Educação Médica Contínua
CLASSIFICAÇÃO DOS ANESTÉSICOS LOCAIS
DOSE, INÍCIO E DURAÇÃO DE ACÇÃO
Os anestésicos locais podem ser classificados em
dois grupos de acordo com o tipo de ligação na cadeia
intermédia (ésteres ou amidas). Para além desta diferença estrutural, os dois tipos de anestésicos diferem ainda
no seu metabolismo e potencial de sensibilização.
Os ésteres são hidrolisados por uma enzima plasmática, a pseudocolinesterase, e indivíduos com formas
atípicas desta enzima podem sofrer sobredosagem
quando anestésicos ésteres lhes forem administrados1,3-5.
Os metabolitos são excretados pelo rim. Um dos metabolitos é o ácido para-aminobenzóico (PABA) que é o
principal responsável pelas reacções alérgicas que ocorrem com os anestésicos deste grupo4.
As amidas são metabolizadas no fígado e excretadas
pelo rim. Indivíduos com insuficiência hepática são mais
susceptíveis á sobredosagem1,3-5.
A dose máxima para os anestésicos locais está bem
estabelecida e é de cerca de 4,3 a 5mg/kg para a lidocaína sem adrenalina e de 7,0mg/kg para a lidocaína
com adrenalina (Quadros III e IV)1,5. Para procedimentos
simples e rápidos preconiza-se a utilização de anestésicos com início de acção rápido, enquanto que para
cirurgias mais complexas e longas, a duração de acção
é mais importante que o tempo de início da anestesia3.
De um modo geral, os anestésicos de longa duração são
mais tóxicos, comportando doses de segurança mais
baixas e um início de acção mais lento. Os níveis plasmáticos dependem da concentração do anestésico
infiltrado, da duração da infiltração, da vascularização
do local injectado e da capacidade do organismo para
metabolizar o fármaco.
Quadro III
FISIOLOGIA DOS ANESTÉSICOS LOCAIS (ÉSTERES)
Duração (min)
Fármaco
Metabolismo
DMR (mg) (Adulto de 70 Kg)
Início acção
Sem adrenalina
Com adrenalina
Sem adrenalina
Com adrenalina
Cocaína
Plasmático
Rápido
45
N/A
200
N/A
Procaína
Plasmático
Rápido
15-30
30-90
500
600
Cloroprocaína
Plasmático
Rápido
30-60
N/A
800
1000
Tetracaína
Plasmático
Lento
120-240
240-480
100
N/A
DMR – Dose Máxima Recomendada; N/A – não aplicável
Quadro IV
FISIOLOGIA DOS ANESTÉSICOS LOCAIS (AMIDAS)
Duração (min)
Fármaco
Metabolismo
DMR (mg) (Adulto de 70 Kg)
Início acção
Sem adrenalina
Com adrenalina
Sem adrenalina
Com adrenalina
Lidocaína
Hepático
Rápido
30-120
60-400
300
500
Bupivacaína
Hepático
Lento
120-240
240-480
175
225
Mepivacaína
Hepático
Lento
30-120
60-400
300
500
Prilocaína
Hepático
Lento
30-120
60-400
400
600
Etidocaína
Hepático
Lento
200
240-360
300
400
DMR – Dose Máxima Recomendada; N/A – não aplicável
14
Anestesia Local em Cirurgia Dermatológica
Educação Médica Contínua
ADITIVOS NOS ANESTÉSICOS LOCAIS
Diversas substâncias são frequentemente adicionadas aos anestésicos locais para modificar o seu efeito
(Quadro V). É importante compreender o seu uso apropriado e estar atento aos riscos das várias substância
adicionadas.
1. Vasoconstritores
Há diversas razões para adicionar agentes vasoconstritores às soluções anestésicas. Em primeiro lugar,
a maior parte dos anestésicos, à excepção da cocaína,
causa vasodilatação por relaxamento directo do músculo liso vascular. Sendo assim, os vasoconstritores são
adicionados no intuito de contrariar esta vasodilatação e
minimizar a hemorragia. Em segundo lugar, diminuem
a absorção do agente anestésico, permitindo a utilização de menores quantidades do fármaco enquanto
prolongam a duração de acção.
A adrenalina (Fig. 1) é o vasoconstritor mais frequentemente adicionado, apesar da fenilefrina ou da solução de
vasopressina-8-ornitina a 2% terem menos efeitos cardíacos. A adrenalina existe comercialmente pré-misturada
com anestésicos numa concentração de 1:100.000 ou
1:200.000. Diversos estudos demonstraram que a adrenalina mantém algum efeito vasoconstritor em diluições
tão baixas quanto 1:500.000 e que concentrações superiores a 1:200.000 não são provavelmente necessárias.
Concentrações superiores a 1:100.000 estão associadas a
um aumento do risco de efeitos secundários.
É importante relembrar que o tempo necessário para a
adrenalina produzir a vasoconstrição máxima é de 7 a 15
minutos e que o branqueamento cutâneo que origina
geralmente consegue delinear a área anestesiada. Porém,
no pós-operatório imediato, produz-se uma paralisia vas-
Fig. 1 - Solução comercial de adrenalina.
cular reflexa que pode ser responsável por hematomas
extensos se não se tiver realizado uma coagulação cuidadosa no período intra-operatório.
Quadro V
ADITIVOS NOS ANESTÉSICOS LOCAIS
Aditivo
Dosagem
Acção
Adrenalina
1:100.000 ou menos
Reduz sangramento
Prolonga anestesia
Reduz toxicidade anestésica
Hialuronidase
150 UI em cada 30 ml de anestésico
Promove difusão
Reduz distorção tecidular
Bicarbonato de sódio
1ml (1mEq/ml) em cada 10 ml de lidocaína
a 1% com ou sem adrenalina
Reduz a dor da infiltração
15
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo
Educação Médica Contínua
A absorção de adrenalina pode provocar sintomas
de estimulação adrenérgica, tais como palpitações,
taquicardia, aumento da tensão arterial e dor pré-cordial, particularmente em doentes hipertiroideus.
Deve evitar-se a sua utilização em zonas acrais, nomeadamente nas pontas dos dedos, pelo risco de necrose
sobretudo em doentes com alterações vasculares
periféricas e nos diabéticos. Como regra geral, deve-se
utilizar com precaução no pavilhão auricular e extremidade nasal apesar de alguns autores não contra-indicarem o seu uso nessas localizações devido à ampla
vascularização sanguínea. A administração de adrenalina na área periorbitária dos doentes com glaucoma de
ângulo estreito deve ser evitada, uma vez que pode
agravar a situação clínica de base2,4,5.
Conservantes ácidos, nomeadamente o ácido cítrico
e o metabissulfito de sódio, são adicionados às soluções
anestésicas comerciais que contêm adrenalina. Com o
decorrer do tempo, o pH alcalino pode degradar a
adrenalina, pelo que as soluções de lidocaína com
adrenalina são ajustadas a um pH inferior (3,3 a 5,5)
que as soluções de lidocaína sem adrenalina (5,0 a 7,0).
Isto tem relevância clínica, uma vez que soluções
acídicas originam mais dor durante a injecção do que
soluções neutras ou alcalinas.
Soluções de lidocaína com adrenalina preparadas
pelo cirurgião são menos dolorosas, uma vez que
possuem um pH mais elevado. A adrenalina pode ser
misturada diariamente com o anestésico local, utilizando ampolas com concentração de 1:1.000. Assim,
0,1ml de adrenalina a 1:1.000 adicionados a 20ml de
lidocaína originam uma solução com concentração de
1:200.000, com pH superior ás preparações comercialmente disponíveis.
As contra-indicações absolutas ao uso de adrenalina
são o hipertiroidismo e o feocromocitoma1,4.
2. Hialuronidade
A hialuronidase, enzima que despolimeriza o ácido
hialurónico, é por vezes adicionada às soluções
anestésicas locais para facilitar a difusão do fármaco no
tecido e minimizar a distorção anatómica. É muito útil
nos procedimentos palpebrais, onde a distorção tecidular é muito frequente. Pode também ser útil nos
bloqueios nervosos, onde a difusão do anestésico é
desejável, ou nos enxertos totais de pele. Utiliza-se a
dose de 150 UI em 30 ml de anestésico. A hialuronidase
contém uma pequena quantidade do conservante
timerosal, um alergeno bem conhecido. Deve estar presente que esta enzima acelera a absorção da lidocaína,
16
aumentando desta forma o seu pico plasmático e
encurtando a duração do efeito anestésico.
Apesar de rara, a alergia à hialuronidase é possível.
Um teste simples consiste na injecção intradérmica de
pequena quantidade 10 a 15 minutos antes da intervenção. Se se desenvolver uma pápula urticariforme com
pseudópodes, o uso de hialuronidase está contra-indicado1,4.
3. Bicarbonato de sódio
O pH das soluções de lidocaína com adrenalina
pode ser neutralizado pela adição de 1 ml de bicarbonato de sódio a 8,4% a cada 10 ml de solução anestésica, levando a menor dor na infiltração (Fig. 2). A
adrenalina nas soluções neutralizadas declina a uma
taxa de 25% por semana, sugerindo-se a rejeição destas
soluções ao fim de 1 semana1,3,4.
Fig. 2 - Solução comercial de bicarbonato de sódio a 8,4%.
Anestesia Local em Cirurgia Dermatológica
Educação Médica Contínua
MÉTODOS DE ANESTESIA LOCAL
1. Anestesia tópica
A camada córnea representa uma barreira limitativa
à absorção transcutânea de fármacos, incluindo os
anestésicos locais. A utilização de agentes que facilitam
a penetração, como o dimetilssulfóxido, foi previamente
tentada, mas o prurido e a hiperestesia que provocava
limitou muito a sua utilização.
Para além da crioanestesia, um método físico de produzir anestesia tópica, os fármacos mais utilizados por
esta via são a cocaína, a benzocaína e a tetracaína (do
grupo dos ésteres), bem como a lidocaína e a prilocaína
(do grupo das amidas). Estes agentes só são eficazes se
forem capazes de penetrar até à derme papilar.
A cocaína é um potente vasoconstritor que reduz o
sangramento durante a cirurgia. É geralmente preparada em solução com concentração de 2 a 4% e aplicada
com a ajuda de um cotonete. O efeito anestésico
máximo ocorre após 3 a 5 minutos e dura cerca de 30
minutos. A dose máxima para um adulto de 70 Kg é de
200mg, apesar de reacções tóxicas graves poderem
ocorrer apenas com 20mg (estimulação do sistema
nervoso central, bradicardia, taquicardia e hipertensão
arterial). A possibilidade de utilização para fins ilícitos e
os efeitos secundários sistémicos fazem dela uma opção
pouco conveniente.
A benzocaína, outro anestésico do grupo dos ésteres,
é pouco solúvel em água e como tal não é utilizado de
forma injectável. Porém, é frequentemente usado por via
tópica, particularmente nas membranas mucosas.
Demora cerca de 15 a 30 segundos a actuar e apresenta
uma duração de acção de 12 a 15 minutos. A sensibilização de contacto á benzocaína é relativamente frequente.
A tetracaína foi introduzida como um anestésico éster
de longa duração de acção e tem sido muito utilizada
topicamente em procedimentos oftálmicos.
Misturas de lidocaína a 2 e 4% nos veículos convencionais têm sido utilizados para anestesia tópica de
membranas mucosas, mas estas misturas não são úteis
para a anestesia de pele intacta.
O EMLA (Eutetic Mixture of Local Anesthetics), com
2,5% de lidocaína combinada com 2,5% de prilocaína,
apresenta bastante utilidade em cirurgia cutânea superficial (Fig. 3). A aplicação tópica durante 45 a 90 minutos
sob oclusão origina anestesia suficiente para a realização de diversos procedimentos superficiais. Pode ser
aplicado na pele de doentes ansiosos antes da infiltração de outros anestésicos1,3,5.
Fig. 3 - EMLA: Eutetic Mixture of Local Anesthetics.
2. Anestesia infiltrativa
A anestesia infiltrativa consiste na aplicação directa
do anestésico no local cirúrgico por via intradérmica ou
subcutânea. É a técnica anestésica local mais utilizada.
A injecção intradérmica é semelhante ao teste da
tuberculina e resulta num início rápido e mais duradouro
do efeito anestésico que as injecções profundas, tendo
as desvantagens de aumentar a dor durante a injecção e
de distorcer os tecidos.
A aplicação subcutânea tem início de acção mais
lento e duração mais curta, mas é menos dolorosa. É
aconselhável para procedimentos extensos e para doentes muito ansiosos.
Nestas técnicas utiliza-se sobretudo a lidocaína a 1%
(Fig. 4), mas em anestesia de áreas extensas ou em
crianças sugere-se uma concentração de 0,5%. Em
cirurgias de longa duração, a bupivacaína a 0,25% (Fig.
5) ou a etidocaína podem ser infiltradas em áreas
17
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo
Educação Médica Contínua
Fig. 4 - Diferentes apresentações de lidocaína comercialmente disponíveis.
Fig. 5 - Solução comercial de bupivacaína a 0,25%.
18
previamente anestesiadas com lidocaína. Procaína e
cloroprocaína são anestésicos ésteres de acção rápida
que raramente são utilizados pelo risco de reacções alérgicas.
A injecção de quaisquer anestésicos locais origina
sempre alguma dor. O planeamento cuidadoso e utilização da técnica adequada podem reduzir essa dor e
deixar o doente mais confortável. Os doentes sentem
geralmente uma “picada” que representa a entrada da
agulha e um “ardor” que representa a infiltração do
anestésico. A colocação rápida e decidida da agulha na
pele magoa menos que a colocação lenta e hesitante. O
ardor é menor se o anestésico for injectado lentamente e
por via subcutânea. Injecções adicionais devem sempre
ocorrer em áreas previamente anestesiadas e o procedimento deverá começar no lado de origem do nervo
sensorial. Existe controvérsia em relação ao efeito que o
aquecimento do anestésico tem na quantidade de dor
sentida. Um estudo demonstrou redução marcada da
dor na altura da injecção quando a solução anestésica
foi previamente aquecida até á temperatura corporal.
A utilização de soluções anestésicas com adrenalina
preparadas pelo cirurgião ou o tamponamento com
bicarbonato de sódio conseguem reduzir a dor associada á infiltração de um modo muito eficaz1,3-5.
A eleição do diâmetro e do volume de carga da seringa também é muito importante, uma vez que seringas
com pouco diâmetro (1 a 3ml) induzem menos dor, pois
permitem pressões de injecção mais baixas. Pelo contrá-
Anestesia Local em Cirurgia Dermatológica
Educação Médica Contínua
rio, seringas de grande diâmetro (por exemplo, 10ml)
obrigam a efectuar uma forte pressão de saída no ponto
de injecção, originando mais dor.
O diâmetro da agulha também contribui para a dor
sentida na infiltração, sendo as agulhas de calibre 30G e
25G as melhores para este fim. Por último, apesar de
dever utilizar-se agulhas com o menor comprimento
possível, a utilização de agulhas mais compridas é mais
apropriada quando se pretende infiltrar grandes áreas,
uma vez que diminui o número de picadas na pele.
O simples costume de aspirar antes de infiltrar evita a
introdução directa do anestésico na corrente sanguínea,
reduzindo-se significativamente os acidentes anestésicos2,3-5.
3. Anestesia tumescente
Esta técnica foi descrita inicialmente em cirurgias de
lipossucção (Fig. 6). Grandes volumes de lidocaína
(0,05 a 0,1%) e adrenalina (1:1.000.000) muito diluídos
são infiltrados na gordura hipodérmica (Quadro VI e
Fig. 7). Inicialmente é realizada a infiltração do plano
hipodérmico profundo seguido do compartimento de
Quadro VI
FÓRMULA DA ANESTESIA TUMESCENTE
Ingrediente
Quantidade (ml)
Lidocaína a 1%
50-100
Adrenalina a 1:1000
1
Bicarbonato de sódio a 8,4%
10
Cloreto de sódio a 0,9%
900 - 950
Hialuronidase a 150 UI/ml
6 (opcional)
Acetonido de triancinolona a 40 mg/ml
0,25 (opcional)
gordura mais superficial. O limite superior de segurança
estimado para a lidocaína utilizando esta técnica é de 35
a 50mg/kg e o início de acção demora cerca de 20
minutos. Parece que a absorção retardada do anestésico, motivada pelo uso concomitante de adrenalina,
pela sua injecção mais profunda e pela lentidão do
próprio procedimento, origina níveis plasmáticos mais
baixos do que os esperados para doses equivalentes
Fig. 6 - Material utilizado na anestesia tumescente.
19
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo
Educação Médica Contínua
Fig. 7 - Solução de Klein para a anestesia tumescente.
com a técnica infiltrativa. A anestesia tumescente tem
como vantagens adicionais, a reposição dos fluidos perdidos durante o procedimento, assim como o prolongamento da duração da anestesia, reduzindo desta
forma a necessidade de analgesia pós-operatória1,3,4,6.
4. Anestesia por bloqueio de nervo periférico
(bloqueio nervoso ou anestesia troncular)
A injecção de pequenas quantidades de anestésico
próximo de um tronco nervoso cuja distribuição anatómica é conhecida origina anestesia da pele que esse
tronco inerva. Este método anestésico é conhecido como
bloqueio nervoso. É particularmente útil quando é
necessário anestesiar grandes áreas anatómicas, uma
vez que requer pequena quantidade de anestésico,
reduzindo assim o risco de toxicidade. Outra vantagem
do bloqueio nervoso é que não origina distorção do
20
local operatório e causa habitualmente menor desconforto do que a infiltração na total distribuição do nervo.
Existem, contudo, algumas desvantagens. Primeiro,
a técnica exige maior perícia e maior conhecimento
anatómico. Segundo, o bloqueio nervoso não produz
vasoconstrição do local operatório, dado que habitualmente se localiza distante do sítio da injecção. Uma
vez que o anestésico é colocado muito próximo do
nervo, existe o risco de laceração inadvertida do mesmo.
Embora geralmente ocorra regeneração nervosa,
podem resultar disestesias de longa duração. Uma vez
que nervos e vasos sanguíneos estão por vezes associados em feixes neurovasculares, existe risco de
laceração de vasos, resultando em hematomas ou equimoses1,3,4.
Para que a insensibilidade da zona seja satisfatória,
deve-se bloquear pelo menos 3 nódulos de Ranvier, o
que corresponde na prática a 1,5-6mm do comprimento
Anestesia Local em Cirurgia Dermatológica
Educação Médica Contínua
do nervo. É interessante realçar como este tipo de
anestesia permite comprovar a cronologia do bloqueio
em cada uma das diferentes fibras nervosas que
compõem o tronco nervoso. Assim, as fibras da dor
ficam bloqueadas antes das da temperatura e estas
antes das da pressão. Por este motivo alguns doentes
sentem manipulação (pressão e vibração) e não dor
durante alguns minutos após o início da intervenção.
Outro efeito curioso denomina-se “efeito Wedensky” e
resulta do nervo ficar bloqueado a estímulos intermitentes e não a estímulos contínuos. Isto significa que, nos
minutos imediatamente após a infiltração, a sensação
de dor à picada de agulha pode estar abolida mas não
em relação ao corte de bisturi. Quando este fenómeno
se verifica não é necessário injectar mais anestésico,
apenas esperar uns minutos para que o bloqueio se
torne completo2-4.
Os anestésicos do grupo das amidas são os mais
utilizados nesta técnica. Raramente se associam vasoconstritores, pelo maior risco de compromisso vascular e
porque não são úteis em reduzir a hemorragia, uma vez
que a anestesia não é aplicada no local operatório. É útil
utilizar maior concentração de anestésico, como lidocaína a 2%, porque causa um gradiente de concentração
superior que promove a difusão. Apesar da dose tóxica
poder ser atingida mais rapidamente com concentrações superiores, são necessárias quantidades menores
de anestesia.
A agulha avança até próximo do nervo ou dentro do
mesmo plano fascial, permitindo a difusão do anestésico à volta do nervo. Para promover esta difusão, podese adicionar hialuronidase.
O início de acção é mais lento e deve-se esperar
cerca de 8 a 10 minutos antes de iniciar o procedimento.
O bloqueio digital é talvez o mais simples e mais
frequentemente utilizado (Fig. 8). O bloqueio dos nervos
supraorbitário e supratroclear permite anestesiar a
porção medial da fronte, desde o supracílio até ao vertex
do couro cabeludo. A pálpebra inferior, o lábio superior,
a região malar medial e as asas do nariz podem ser
anestesiados bloqueando o nervo infraorbitário. Consegue-se anestesia do mento e do lábio inferior por bloqueio do nervo mentoniano1,3,4.
REACÇÕES ADVERSAS
O efeito secundário mais comum após injecção de
anestésico é a reacção vasovagal, na qual ocorre activação do nervo vago com aumento do tónus parassim-
Fig. 8 - Bloqueio nervoso digital.
pático por excessiva ansiedade do doente. Os sintomas
resolvem quando se coloca o doente em posição de
Trendelenburg, não sendo habitualmente necessário
outras intervenções.
As verdadeiras reacções adversas às soluções anestésicas podem ser causadas pelo próprio anestésico ou,
mais frequentemente, pelos aditivos, tais como a
adrena-lina. Reacções locais à adrenalina são raras,
mas há relatos de necrose tecidular devido à vasoconstrição. A maior parte dos casos envolveu os dedos,
sobretudo em doentes com diabetes e insuficiência
vascular periférica. Outras reacções locais incluem dor,
equimose, hematoma, infecção e lesão nervosa.
Reacções sistémicas à adrenalina são comuns e incluem
tremor, taquicardia, diaforese, palpitações, cefaleias,
aumento da tensão arterial, dor torácica e resultam da
estimulação beta-adrenérgica. Uma interacção pouco
frequente mas potencialmente perigosa é a que ocorre
entre a adrenalina e o propranolol (bem como com
outros bloqueadores â), devido à possível vasoconstrição mediada pelos receptores á1. Clinicamente pode
ocorrer hipertensão, bradicardia e até paragem cardíaca1,5. Deve-se também prestar especial atenção às
fenotiazinas, antidepressivos tricíclicos, bloqueadores á
e hormonas tiroideias2-4.
Reacções sistémicas aos anestésicos locais podem
ocorrer quando se atingem níveis tóxicos que resultam
da infiltração de grandes quantidades, injecção vascular
directa inadvertida ou alteração no metabolismo (por
exemplo, insuficiência hepática ou deficiência da pseudocolinesterase). A toxicidade às amidas caracteriza-se
inicialmente por inibição do sistema nervoso central,
seguida de excitação à medida que os níveis sanguíneos
aumentam. A lidocaína em doses tóxicas baixas (3 a 6
21
Ana Moreira, Ricardo Vieira, Américo Figueiredo
Educação Médica Contínua
ìg/ml) origina parestesias digitais, sonolência, discurso
arrastado e agitação psicomotora. À medida que os
níveis sanguíneos aumentam (5 a 9 ìg/ml) pode ocorrer
irritabilidade, visão turva, contractura muscular e nistagmo. Aumentos superiores podem originar convulsões, paragem respiratória ou morte (Quadro VII). Em
caso de reacção tóxica, oxigénio e diazepam endovenoso podem reverter a reacção.
Quadro VII
NÍVEIS SANGUÍNEOS
DE LIDOCAÍNA E TOXICIDADE
3-6 ìg/ml
Toxicidade subjectiva
Euforia, parestesias digitais, sonolência, agitação
5-9 ìg/ml
Toxicidade objectiva
Náuseas, vómitos, tremores, visão turva, tinitos,
confusão, psicose, fasciculações musculares
8-12 ìg/ml
Convulsões, depressão cardiorrespiratória
12-20 ìg/ml
Coma, paragem respiratória e cardíaca
Reacções alérgicas aos anestésicos são pouco habituais e ocorrem mais frequentemente com as preparações éster. A procaína é raramente utilizada hoje em dia,
uma vez que possui enorme capacidade sensibilizante
originando reacções quer do tipo I, imediata ou anafiláctica, quer do tipo IV com hipersensibilidade retardada. Os anestésicos ésteres podem ter reacções cruzadas
com diversos alergenos de contacto, nomeadamente
com o PABA e com a parafenilenodiamina. Não se verifica reactividade cruzada entre os ésteres e as amidas.
Casos de alergia ás amidas são raros e pouco documentados. A maior parte das reacções são causadas
pelos aditivos, nomeadamente os parabenos. A abordagem do doente com história de alergia ao anestésico é
difícil. Verdadeiras reacções alérgicas do tipo I, com
prurido, rinorreia, broncoespasmo, urticária, angioedema ou anafilaxia devem ser diferenciadas de reacções
psicogénicas que cursam com hiperventilação, hipersudorese, síncope, náusea ou outros sintomas vasovagais.
Frequentemente a história clínica é pouco esclarecedora
e são necessários outros testes diagnósticos.
Quando existe de facto alergia ao anestésico local, a
solução mais prática será utilizar anestésicos alternativos ou outros meios de anestesia. A difenidramina é
provavelmente o anestésico alternativo mais utilizado
quando existe alergia às amidas. A solução a 1% é reco22
mendada e pode ser usada em curetagens ou biopsias
com biótomo. Pode causar alguma sedação, pelo que o
doente deve regressar a casa acompanhado. Nos procedimentos maiores recomenda-se anestesia geral.
O anestésico de escolha na grávida é a lidocaína,
que está classificada na categoria B (não se documentaram efeitos teratogénicos em estudos realizados
em animais). A sua administração durante o primeiro
trimestre de gravidez parece não aumentar o risco de
malformações anatómicas no feto. Contudo, deve-se
evitar o seu uso nos 4 primeiros meses de gravidez. A
lidocaína atravessa a placenta e pode ser excretada no
leite materno. Ainda assim, a sua utilização durante a
amamentação não está contra-indicada.
A lidocaína pode ser utilizada com segurança na
criança, mas a dose máxima recomendada deve ser
ajustada ao peso e idade. Os parabenos, utilizados
como conservantes, ligam-se á albumina. Nos recémnascidos com icterícia podem competir com a bilirrubina
pela ligação à albumina, agravando desse modo a
hiperbilirrubinemia. Por isso, nos recém-nascidos só se
deve utilizar anestésicos sem parabenos1,3,4.
Em suma, para prevenir reacções tóxicas é importante não esquecer:
Efectuar uma avaliação pré-operatória cuidadosa, inquirindo especificamente sobre história
de alergia ou resposta idiossincrásica;
A adrenalina só pode ser utilizada com os anestésicos locais após exclusão das suas contra-indicações;
Deve-se utilizar o menor volume e a mais baixa
concentração eficaz de anestésico local;
Deve-se aguardar os minutos necessários pelo
início de acção dos anestésicos antes de fazer
novas infiltrações, sobretudo nos anestésicos de
início de acção lento;
Sempre que possível, realizar bloqueios nervosos;
Escolher os anestésicos cuidadosamente, aspirar
em primeiro lugar e injectar lentamente3.
BIBLIOGRAFIA
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Anestesia local. In Camacho F, Dulanto F, Cirugía
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Educação Médica Contínua
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6. Namias A, Kaplan B: Tumescent anesthesia for dermatologic surgery. Cosmetic and noncosmetic procedures. Dermatol Surg 24 (7): 755-8 (1998).
VERIFIQUE O QUE APRENDEU
Qual é o mecanismo de acção mais provável dos anestésicos locais?
O que distingue os anestésicos do grupo éster dos do grupo amida?
Quais são as vantagens e desvantagens da adição de adrenalina ao anestésico local?
Quais são as vantagens da anestesia tumescente?
Como é composta a solução de Klein?
Quais são as contra-indicações absolutas á utilização de adrenalina?
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
1. Auletta MJ: Local anesthesia for dermatologic surgery. Semin Dermatol 13:35-42 (1994).
2. Do DV, Kelley LC: Tumescent anesthesia: evolution
and current uses. Adv Dermatol 23:33-46 (2007).
3. Amin SP, Goldberg DJ: Topical anesthetics for cos-
metic and laser dermatology. J Drugs Dermatol 4(4):
455-61 (2005).
4. Namias A, Kaplan B: Tumescent anesthesia for dermatologic surgery. Cosmetic and noncosmetic procedures. Dermatol Surg 24(7): 755-8 (1998).
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Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 25-39 (2009)
Educação Médica Contínua
ANESTÉSICOS LOCAIS EM DERMATOLOGIA –
DA MOLÉCULA À TÉCNICA
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo
Serviço de Dermatologia e Venereologia do Hospital de S. João, EPE, Porto
RESUMO - A anestesia local é uma parte integrante da cirurgia dermatológica, sendo o seu conhecimento importante
para a escolha do fármaco e técnica mais adequados para cada paciente. Este artigo discute os anestésicos locais mais
frequentemente utilizados em Dermatologia, desde a sua forma de actuação, classificação e efeitos adversos. São
também apresentadas as diferentes técnicas de administração, bem como as particularidades da anestesia local na
infância e na gravidez. Adicionalmente, é revista a segurança da utilização concomitante de adrenalina, sobretudo nas
extremidades.
PALAVRAS-CHAVE - Anestesia local; Lidocaína; Adrenalina; Bupivacaína; EMLA®; Toxicidade.
LOCAL ANESTHETICS IN DERMATOLOGY –
FROM THE MOLECULE TO THE TECHNIQUE
ABSTRACT - As local anesthesia is an integral part of dermatologic surgery, its knowledge is very important to choose the
proper drug and technique for each patient. This article discusses the local anesthetics most commonly used in skin surgery,
focusing on the mechanism of activity, classification and adverse effects. The different techniques of administration and
the particularities of local anesthesia in children and pregnancy are also presented. Furthermore, the safety and usefulness
of concomitant adrenaline in the extremities is reviewed.
KEY-WORDS - Local anesthesia; Lidocaine; Adrenaline; Bupivacaine; EMLA®; Toxicity.
Correspondência:
Dr.ª Ana Nogueira
Serviço de Dermatologia e Venereologia
Hospital de S. João, EPE
Alameda Prof. Hernâni Monteiro
4200-319 Porto
Fax: 225096320
Telefone: 965321904
E-mail: [email protected]
25
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo
Educação Médica Contínua
INTRODUÇÃO
A necessidade frequente de actos cirúrgicos diagnósticos e terapêuticos na Dermatologia torna imperiosa
uma anestesia eficaz. Aplicada localmente de uma
forma adequada, é um procedimento simples e rápido
que elimina o desconforto do paciente aquando da
realização de uma pequena cirurgia. O uso dos primeiros anestésicos locais (AL) remonta a 1884, com a
aplicação ocular de cocaína pelo oftalmologista Carl
Köller, que tomou conhecimento deste fármaco pelo seu
célebre amigo Sigmund Freud. Devido aos seus efeitos
psicoactivos, o uso clínico de cocaína veio rapidamente
a tornar-se muito restrito, desenvolvendo-se um longo
caminho na síntese dos AL1.
O dermatologista tem ao seu dispor uma miríade de
AL, com várias formas de administração e diferentes
efeitos adversos. O adequado conhecimento destes fármacos, bem como das diferentes técnicas de aplicação,
são essenciais para optimizar a sua acção terapêutica e
aumentar o conforto do doente.
FISIOLOGIA DA TRANSMISSÃO DO IMPULSO
NERVOSO
Em repouso, as fibras nervosas têm um potencial de
membrana negativo, mantido por uma bomba electrogénica, a adenosina trifosfatase sódio-potássio (Na+/
K+ATPase) que está continuamente a remover 3 iões
sódio (Na+) e a colocar 2 iões potássio (K+) dentro da
célula, contribuindo para o interior da célula estar
carregado negativamente. É também esta Na+/K+
ATPase a responsável pelo diferencial de concentrações
destes iões entre o meio intracelular e extracelular (altas
concentrações de K+ e baixas de Na+ no meio intracelular e o inverso no meio extracelular). Quando ocorre
a despolarização, aumenta a permeabilidade da
membrana para o Na+, fazendo com que este ião se
difunda para o interior da fibra nervosa de acordo com o
seu gradiente de concentração através dos canais Na+
voltagem-dependentes, ficando o interior da célula
carregado positivamente. A este fenómeno chama-se
potencial de acção. Uma vez terminado, devido à
abertura mais tardia dos canais K+ voltagem-dependentes e à inactivação dos canais Na+ voltagem-dependentes, dá-se um efluxo de K+ da célula e uma cessação
da entrada de Na+, restaurando o potencial de repouso
da membrana, para o qual contribui também a actividade da Na+/K+ ATPase1-4.
A dor depende da propagação de um potencial de
26
acção ao longo das fibras nervosas tipo Aä (mielínicas) e
C (amielínicas, mais finas e com condução nervosa mais
lenta)2-4.
FORMA DE ACTUAÇÃO DOS AL
Os estudos têm demonstrado que os AL inibem a
despolarização nervosa ao interferir com o influxo de
sódio. Apesar de não se conhecer ao certo o mecanismo
exacto de acção, acredita-se que actuam intracelularmente, alterando a actividade dos canais Na+1-3,5.
Para atravessarem as membranas celulares, estes fármacos têm de ser lipossolúveis, mas devem também ser
hidrofílicos, para uma melhor ligação às proteínas intracelulares. A potência de um AL depende da sua lipossolubilidade, mas a duração de acção depende sobretudo
da sua capacidade hidrofílica1.
Os AL são bases fracas, pouco hidrossolúveis, no
entanto a maioria das soluções comerciais são acidificadas para prolongar o seu prazo de validade. Quando
se infunde um AL, este apresenta-se no meio extracelular
como uma mistura entre moléculas catiónicas e bases
neutras (não ionizadas). São as bases neutras que vão
permear as células e bloquear os canais Na+. Cada AL
difere no pH em que se encontra em equilíbrio entre
estas duas formas (pKa), sendo que quanto mais próximo este for do pH tecidular, mais rápido será o início de
acção do AL. Isto também explica a diminuição da
eficácia da anestesia quando o meio extracelular se encontra inflamado, dado que a baixa de pH origina uma
maior ionização do fármaco1,6.
Uma vez dentro da célula, o pH baixo regenera a
forma catiónica, que bloqueia o receptor dos canais de
sódio. Assim, o potencial de membrana será estabilizado, aumentando o limiar para a excitação eléctrica.
À medida que mais canais de sódio vão sendo bloqueados, vai diminuindo a capacidade de condução dos
impulsos nervosos, o que leva ao bloqueio da transmissão nervosa1,6. As fibras mais sensíveis a este fenómeno
serão as fibras mais finas (fibras C), que como referimos
são as responsáveis pela transmissão das sensações
dolorosas. Já as fibras de maior calibre, responsáveis
pela propriocepção, são mais resistentes a este fenómeno, o que justifica que o doente diga frequentemente
“não tenho dor, mas sinto a mexer…”. À medida que se
infunde mais anestésico e o bloqueio da transmissão
nervosa aumenta, as vias de sensibilidade são afectadas
pela seguinte ordem: dor, temperatura, tacto e pressão
profunda. Em seguida, a função motora é inibida1.
Para além da capacidade de bloqueio dos canais Na+,
Anestésicos Locais em Dermatologia – Da Molécula à Técnica
Educação Médica Contínua
têm vindo a ser investigadas outras propriedades dos AL,
nomeadamente a acção anti-inflamatória por interacção
com receptores das proteínas G. Para além disso, a
maioria dos AL possuem actividade antimicrobiana, que se
pensa que está relacionada com a interacção com a
parede bacteriana ou com macro-moléculas na superfície
das bactérias. Curiosamente, já foi inclusive reportado que
a maioria dos AL potenciam in vitro a actividade dos
antibióticos, estando relatados aumentos de 10 vezes na
concentração inibitória mínima7.
cepto nos doentes com deficiência de colinesterases. No
entanto, há o reverso da medalha: o ácido para-aminobenzóico (PABA), um alergéneo sobejamente conhecido,
é o principal metabolito desta reacção, o que justifica
que os ésteres estejam associados a mais reacções alérgicas que as amidas. Estas são metabolizadas pelo
fígado e devem ser utilizadas com precaução nos doentes com doença hepática8.
COMO ESCOLHER UM AL?
CLASSIFICAÇÃO DOS AL
A escolha do anestésico deve ser feita individualmente, tendo em conta não só as características do
doente, como também o tipo de procedimento. Dado o
maior risco de alergia com os ésteres, as amidas
acabam por ser preferidas. Caso o doente apresente
história de alergia aos ésteres e amidas, a difenidramina
poderá ser uma alternativa, devendo no entanto avisarse o doente para evitar conduzir nesse dia devido aos
seus efeitos sedativos8. Uma outra hipótese é a administração intradérmica de cloreto de sódio 0.9%, que
fornece anestesia suficiente para efectuar uma biópsia
cutânea por punção. Pensa-se que o mecanismo subjacente é a pressão gerada nas terminações nervosas10.
Há vários AL disponíveis para cirurgia dermatológica
em Portugal. Cada anestésico tem as suas propriedades
farmacocinéticas, variando no tempo e duração de acção, bem como na dose máxima e concentrações disponíveis (Quadro I).
Os AL são classificados com base na sua fórmula
química. De uma forma geral, todos estes fármacos são
compostos por três porções: uma extremidade lipofílica
(aromática), uma extremidade hidrofílica (aminada) e
uma ligação entre elas. Esta tanto pode conter um
radical aminoéster ou aminoamida. É esta cadeia intermédia que confere a divisão em dois grandes grupos de
AL: ésteres ou amidas (Quadro I)8. Como mnemónica,
pode reter-se que as amidas têm dois “ii” (tal como a
designação aminoamida), ao passo que os ésteres apenas têm um9.
A metabolização e potencial de alergia são partilhados pelos anestésicos da mesma classe. Os ésteres são
hidrolisados pelas esterases plasmáticas, com eliminação dos metabolitos por via renal. Isto significa que
são fármacos com baixo potencial de toxicidade, ex-
Quadro I
CARACTERÍSTICAS DOS AL MAIS FREQUENTEMENTE UTILIZADOS EM PORTUGAL
(elaborada a partir de 8 e 49)
Duração (min)
Dose máxima (mg)
a
Potência
Ligação às
Início da
relativa
proteínas (%)
anestesia
Lidocaína
4
64
Rápido
30-120
60-400
500
300
1.0, 2.0, 5.0
Mepivacaína
2
77
Rápido
30-120
60-400
500
400
2.0, 3.0
Bupivacaína
16
95
Lento
120-240
240-480
225
175
0.25, 0.5
1
5,8
Rápido
15-30
30-90
1000
ND
16
76
Lento
120-240
240-480
Anestésico
S/ adrenalina C/ adrenalina C/ adrenalina S/ adrenalina
Concentrações
disponíveis (%)
AMIDAS
ÉSTERES
Procaína
b
Tetracaína
a
b
c
c
0.75
adulto standard
uso limitado a anestesia tópica
em Portugal apenas disponível em formulações tópicas para uso em otorrinolaringologia
27
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo
Educação Médica Contínua
Dado o seu início célere de acção, a lidocaína é o
anestésico mais frequentemente utilizado para procedimentos rápidos, estando disponível em concentrações
de 1 e 2%. A 2%, poderá ser uma opção interessante
quando se pretende a injecção de um pequeno volume.
Para uma anestesia mais prolongada, a bupivacaína e a
ropivacaína são escolhas adequadas8-12. A ropivacaína é
estruturalmente derivada da bupivacaína, apresentando
um início de acção mais precoce e um perfil de efeitos
laterais mais aceitável, que no entanto acaba por ser
contrabalançado pelo facto de ser menos potente1,13,14.
ANESTESIA COM ADRENALINA – QUANDO
UTILIZAR?
Os AL, com excepção da cocaína, são vasodilatadores, favorecendo a hemorragia local15. A adrenalina,
em concentrações entre 1:100.000 e 1:500.000, é
frequentemente adicionada aos AL devido à sua acção
vasoconstritora mediada pelos receptores vasculares
alfa adrenérgicos. A analgesia é potenciada, a absorção
do anestésico é mais lenta, com consequente menor
toxicidade, e o sangramento diminui16. Estima-se que
assim a duração e eficácia do AL aumentem em 100 a
150%. Após a injecção, deve aguardar-se cerca de cinco
minutos para beneficiar do efeito vasoconstritor, que é
máximo aos quinze minutos12,17.
Não obstante as vantagens da adrenalina, a sua
utilização é temida por muitos médicos, sobretudo nas
extremidades, dado que o ensinamento corrente na
maioria dos tratados é que esta acção vasoconstritora
numa circulação terminal leva a isquemia e gangrena.
Contudo, as revisões bibliográficas mais recentes têm
vindo a desmistificar este receio, estando actualmente
até recomendado o seu uso na anestesia digital, desde
que os doentes sejam correctamente seleccionados
(ausência de patologia trombótica ou vasoespástica,
hipertensão arterial não controlada)18. De facto, não
existem relatos de necrose digital com as soluções
correntemente comercializadas de lidocaína-adrenalina. Os casos em que tal sucedeu foram atribuíveis a
outras causas, nomeadamente uso de concentrações
não estandardizadas de adrenalina, uso de anestésicos
mais antigos (cocaína, eucaína, procaína), uso inadequado de garrotes, infiltração de quantidades excessivas
de anestésico e má técnica cirúrgica19. Indo mais longe,
a administração digital da solução comercial lidocaínaadrenalina acaba por ser vantajosa ao induzir uma
anestesia mais rápida, maior duração da analgesia no
pós-operatório, diminuição do uso de garrotes e redu28
ção da quantidade de anestésico infiltrada. É também
seguro o seu uso no pénis e na ponta do nariz, desde que
não estejam presentes contra-indicações18,19.
Os efeitos sistémicos da adrenalina incluem palpitações, ansiedade, medo, diaforese, tremor, sensação de
fraqueza, taquicardia e aumento da pressão arterial.
Estas alterações podem surgir mesmo com as doses
utilizadas na prática dermatológica, sobretudo em
locais muito vascularizados, mas são auto-limitadas,
resolvendo ao fim de poucos minutos. Os efeitos mais
graves podem incluir arritmias, taquicardia ventricular,
fibrilhação ventricular, paragem cardíaca e hemorragia
cerebral. É excepcional estas reacções surgirem com as
doses utilizadas rotineiramente. A presença de feocromocitoma e hipertiroidismo são contra-indicações absolutas para a utilização de adrenalina. Quando os
doentes estão sob terapêutica com â-bloqueadores,
inibidores da monoamino-oxidase ou fenotiazinas, a
acção da adrenalina é potenciada, devendo a sua dose
ser reduzida. O mesmo se deve fazer nos doentes com
hipertensão ou doença coronária graves17.
QUAL A DOSE MÁXIMA DE AL A ADMINISTRAR?
Conhecer a dose máxima recomendada de cada
anestésico é necessário, mas importa salientar que na
maioria dos casos estes valores são recomendações do
fabricante para protecção pessoal e foram estabelecidas
de forma empírica, quase sempre sem tomar em linha
de conta a vascularização e o local a anestesiar. Isto
significa que os valores aconselhados não devem ser
considerados inflexíveis, mas antes ajustados conforme
o doente e o procedimento.
Para exemplificar, na União Europeia, a dose máxima total de lidocaína recomendada para um adulto é de
200mg, ao passo que nos Estados Unidos é de 300mg.
Caso se utilize lidocaína com adrenalina, a dose
máxima recomendada é de 500mg. No Quadro I estão
identificadas as doses máximas dos anestésicos mais
frequentemente utilizados e no Quadro II apresenta-se
um guia de consulta rápido para os volumes máximos
aconselhados.
Nas idades avançadas e nos lactentes, na doença
hepática grave, bem como na insuficiência renal com
uremia e na cardiopatia isquémica grave, devem administrar-se os AL com precaução, com doses mais pequenas, apesar de não existirem recomendações nesse
sentido com um nível de evidência elevado (apenas
disponíveis evidências com grau C ou inferior)20,21.
Anestésicos Locais em Dermatologia – Da Molécula à Técnica
Educação Médica Contínua
Quadro II
GUIA PRÁTICO DE VOLUMES MÁXIMOS (Vmax)
DOS ANESTÉSICOS LOCAIS MAIS FREQUENTEMENTE UTILIZADOS (Adulto standard)
Anestésico
Volume máximo (Vmax, mL)
Com adrenalina (Vmax, mL)
1%
30
50
2%
15
25
0,25%
70
90
0,5%
35
45
Lidocaína
Bupivacaína
Quadro III
EFEITOS LATERAIS DOS AL
De uma forma geral, os AL são considerados fármacos seguros, desde que deles seja feito uso adequado.
Não obstante, o médico deve estar familiarizado com os
potenciais efeitos adversos, que podem ser decorrentes
do anestésico em si ou da inserção da agulha.
O anestésico pode provocar toxicidade local ou
sistémica (Quadro III)22. A própria inserção da agulha
pode acarretar várias acções desfavoráveis, nomeadamente desmaio, dor, equimose, edema, infecção,
hematoma, hiperalgesia e trismo muscular8. Não é raro
o doente que afirma ser alérgico aos AL mas que em
história clínica mais cuidada se desvenda que desmaiou
na cadeira do dentista por uma reacção vagal. Quando
tal sucede, deve colocar-se o doente em posição de
Trendelenburg, aplicar compressas frescas na fronte e
refrescá-lo. Idealmente, a administração de anestesia
deve ser feita com o doente em decúbito ou em posição
de Trendelenburg15.
As reacções locais são comummente secundárias a
uma técnica de injecção deficiente. As mais frequentes,
para além da dor, são a formação de uma equimose ou
hematoma (sobretudo se os doentes estão sob terapêutica
anticoagulante ou se os procedimentos envolverem áreas
altamente vascularizadas, como a periorbitária), infecção
(mas mais frequentemente por pouco cuidado com a
assepsia), laceração nervosa pela agulha ou neurotoxicidade. Muito raramente pode ocorrer necrose tecidular8.
As reacções sistémicas podem surgir independentemente dos níveis séricos de anestésico. Mesmo infundindo uma pequena quantidade do fármaco, as
reacções anafilactóides, anafilácticas e idiossincrásicas
podem instalar-se8,22. Felizmente, a grande maioria das
reacções adversas não são imunologicamente mediadas, pois o baixo peso molecular dos AL faz com que não
sejam alergénios, comportando-se antes como hapte-
CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE REACÇÕES
ADVERSAS AOS AL (elaborada a partir de 6 e 22)
Reacções locais
Efeitos tóxicos locais
Traumatismo
Dermatite de contacto
Reacções sistémicas
Psicossomáticas (ansiedade, vasovagal)
Reacções tóxicas (sistema nervoso central, cardiovascular)
Idiossincrásicas (metahemoglobinemia; risco maior com prilocaína)
Anafilactóides (risco superior com ésteres)
Anafilácticas (risco superior com ésteres)
nos. As reacções anafilácticas (hipersensibilidade tipo I),
são IgE mediadas e levam à desgranulação dos
mastócitos, com libertação de histamina, leucotrienos,
citocinas e proteases. O culminar deste processo leva a
prurido, urticária, broncoespasmo, hipotensão e/ou angioedema, em poucos minutos. Caso a desgranulação
dos mastócitos ocorra por mecanismos não dependentes da IgE, é considerada uma reacção anafilactóide,
apesar de os sintomas serem os mesmos22. Quando
acontece uma destas reacções, deve ser imediatamente
instituído tratamento com adrenalina, corticosteróides e
anti-histaminicos, bem como oxigenoterapia8. As reacções de hipersensibilidade retardada (tipo IV) ocorrem
através da interacção entre as células de Langerhans
apresentadoras de antigénios e os linfócitos T, originando sintomas de dermatite de contacto entre 12 a 48
horas após a exposição nos doentes previamente
sensibilizados. A grande maioria das reacções alérgicas
tipo I descritas na literatura foram causadas pelos éste29
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo
Educação Médica Contínua
res devido ao PABA. As reacções adversas às amidas são
excepcionais; de uma forma geral não existe sensibilidade cruzada e a maioria deve-se à presença do
conservante parabeno. Quando se suspeita de alergia
aos AL, o doente deve ser referenciado a um imuno-alergologista para realizar testes intradérmicos aos ésteres,
amidas, metabissulfito de sódio e metilparabenos15,22.
Já os efeitos tóxicos sobre o sistema cardiovascular e
o sistema nervoso central surgem com concentrações
mais elevadas, que podem ser atingidas por injecção
endovenosa acidental, por não se respeitar a dose
máxima, ou quando o doente não metaboliza adequadamente o fármaco.
Com doses mais baixas, os efeitos sobre o sistema
nervoso central são inicialmente excitatórios, e manifestam-se por sensação de cabeça oca, verborreia, agitação, tremores, ou convulsões. As acções depressoras
ocorrem à medida que os níveis séricos continuam a
aumentar, afectando sobretudo o tronco cerebral e centro
nervosos superiores, levando a sonolência, coma, ou
paragem respiratória. Os efeitos cardiovasculares tipicamente surgem com concentrações bastante mais elevadas
do AL, originando diminuição da contractilidade
miocárdica (efeito inotrópico negativo) e alterações da
condução, com alargamento do complexo QRS, bloqueio
auriculoventricular e assistolia22. A bupivacaína tem um
risco de toxicidade cardíaca superior à lidocaína6,12. Na
maioria das vezes, parar a administração do anestésico e
iniciar oxigenoterapia é suficiente para travar estes processos; caso a deterioração clínica aparente ser progressiva, o doente deve ser imediatamente referenciado para
um departamento de emergência1.
Para prevenir a toxicidade, há uma série de passos
úteis, nomeadamente: questionar o doente acerca da
história de reacções adversas, utilizar concomitantemente adrenalina desde que não contra-indicada,
instilar o menor volume e a menor concentração eficazes
do anestésico, esperar o tempo suficiente para o anestésico actuar (sobretudo no caso de agentes com acção
mais lenta), preferir bloqueios nervosos sempre que
possível, seleccionar o anestésico adequado, aspirar
inicialmente e injectar lentamente6,8.
Há poucas contra-indicações absolutas ao uso de AL,
sendo a mais importante a história de alergia. A gravidez e o aleitamento são contra-indicações relativas8,23.
ANESTESIA TÓPICA – INDICAÇÕES E PRECAUÇÕES
O uso de anestesia tópica torna-se bastante vantajo30
so quando vão realizar procedimentos pouco profundos
(curetagem de moluscos contagiosos, tratamento com
laser, criocirurgia, injecção intralesional) ou, sobretudo
no caso das crianças, se pretende minimizar a dor da
inserção da agulha24,25.
O primeiro anestésico tópico no mercado foi a mistura de tetracaína, adrenalina e cocaína (TAC), que foi
entretanto abandonado devido à sua toxicidade, ao
preço elevado e às questões ético-legais envolvendo a
utilização de cocaína26.
Actualmente, em Portugal, estão disponíveis para
anestesia tópica dermatológica a mistura de lidocaína
com prilocaína (EMLA®), um emplastro de lidocaína e
tetracaína (Rapydan®), assim como a lidocaína tópica.
O spray de cloreto de etilo, que anestesia pelo arrefecimento, é também uma opção. Pode ainda utilizar-se a
iontoforese, aplicando topicamente o anestésico com
uma corrente eléctrica suave.
O EMLA® (mistura eutéctica de AL) foi o primeiro
anestésico tópico com eficácia satisfatória e consiste
numa emulsão óleo-em-água, com 2,5% de lidocaína e
2,5% de prilocaína. As misturas eutécticas, ao contrário
dos AL puros, têm um ponto de fusão a uma temperatura
mais baixa do que qualquer um dos componentes
isolados (18ºC), permitindo concentrações mais elevadas do anestésico, e formando uma mistura estável em
creme à temperatura ambiente, que se liquefaz
ligeiramente em contacto com a pele1,24,27. O EMLA®,
desde que correctamente utilizado, tem uma eficácia
superior às preparações de lidocaína tópica disponíveis
em Portugal28.
O EMLA® deve ser aplicado no local a anestesiar em
camada espessa (1 a 2g por 10cm2, dose máxima de
10g) em oclusão, o que facilita a sua absorção adequada. Os pensos de EMLA® têm uma eficácia semelhante à
da emulsão28,29. A utilização de papel celofane ou película aderente é adequada em grandes superfícies
corporais. Quando se aplica nos dedos, pode utilizar-se
para oclusão uma luva cirúrgica de tamanho adequado.
Deve aguardar-se no mínimo 45 minutos até se iniciar o
procedimento cirúrgico, sendo uma hora o ideal; a
eficácia mantém-se por mais meia a duas horas27. A sua
profundidade de penetração é variável e aumenta com o
tempo de aplicação: cerca de 2 a 3mm depois de uma a
duas horas e 6mm depois de 3 a 4 horas30. Nas mucosas, nos genitais e em pele não íntegra, não é necessário
aguardar tanto tempo dada a maior rapidez de absorção. Já nas palmas e plantas a absorção é imprevisível,
pelo que aí não se recomenda a sua utilização27.
O uso incorrecto do EMLA® é frequentemente a causa da sua ineficácia. Alguns erros comuns são a substi-
Anestésicos Locais em Dermatologia – Da Molécula à Técnica
Educação Médica Contínua
tuição dos pensos oclusivos por compressas ou pensos
permeáveis, esfregar vigorosamente o creme na pele na
ausência de oclusão, aplicação de pouca quantidade ou
durante um período de tempo insuficiente, ou a extrusão
do EMLA® por um eventual rasgo não identificado no
penso transparente31.
Apesar de normalmente ser bem tolerado e seguro,
estão relatados efeitos adversos locais e hematológicos.
Os efeitos locais incluem eritema transitório, empalidecimento, irritação ocular, edema e dermatite de contacto
alérgica. Na maioria dos estudos, a dermatite de contacto
alérgica foi imputada à prilocaína. O empalidecimento da
pele pode dificultar a delimitação de lesões vasculares
mais ténues, pelo que se recomenda marcar a área a
tratar. Este empalidecimento poderá interferir com a
absorção da energia dos lasers17,32. Podem surgir lesões
purpúricas ou petequiais imediatamente após a aplicação
de quantidades tão pequenas como 1 g durante 30 minutos, que resolvem espontaneamente ao fim de alguns dias.
Aparentemente, esta reacção será mais comum nos prematuros e em doentes com dermite atópica, apesar de não
se tratar propriamente de um eczema de contacto. Pensa-se que talvez corresponda a um efeito tóxico sobre o
endotélio capilar31.
Em lactentes com menos de três meses pode surgir
metahemoglobinemia sintomática, com pele marmoreada e pálida, cianose perioral e acral e má perfusão
periférica, com um pico 8 horas após ter sido removido o
creme da pele. Nesta faixa etária o nível de nicotinamida
adenina nucleótido (NAD) citocromo b 5 reductase é
baixo, estando as hemácias mais susceptíveis ao stress
oxidativo que resulta na conversão do ião ferroso da
hemoglobina em férrico, provocando metahemoglobinemia1,30. Os metabolitos da prilocaína hidroxi-2metilanilina e ó-toluidina são os responsáveis pela
indução deste quadro. A toma concomitante de sulfonamidas, paracetamol, benzocaína, dapsona, fenobarbital e fenitoína aumenta este risco. Para prevenir esta
ocorrência, deve evitar-se a utilização de EMLA®, ou
pelo menos diminuir o tempo, a quantidade e a área de
administração nos lactentes mais jovens. Uma vez
instalada a metahemoglobinemia, deve tratar-se com
oxigenoterapia, suporte de fluidos e eventualmente com
azul-de-metileno31.
Há pouco tempo ficou disponível em Portugal um
novo anestésico tópico (Rapydan®). Trata-se de um emplastro de lidocaína (70mg) e tetracaína (70mg) (Fig. 1),
com um componente de aquecimento activado pelo
oxigénio para aumentar a penetração na pele, podendo
atingir-se uma temperatura cutânea de 40ºC. É obtido
um grau adequado de anestesia em 30 minutos. Os
Fig. 1 - Aplicação do emplastro de lidocaína / tetracaína.
efeitos locais mais comuns são, por ordem decrescente,
eritema, edema e empalidecimento. Não está aprovado
para uso em crianças com menos de três anos. Aliás, nos
recém nascidos a sua utilização é formalmente desaconselhada dado o tamanho relativamente grande do
emplastro, a possibilidade de induzir elevadas concentrações séricas de AL e o potencial de lesar a pele com o
adesivo30,33,34.
Há outros anestésicos tópicos por enquanto não
disponíveis em Portugal, que apresentam algumas
vantagens relativamente ao EMLA®, nomeadamente os
com veículo lipossómico. Os lipossomas são partículas
microscópicas, esféricas, à base de fosfolípidos, que
facilitam a penetração percutânea do fármaco. Estudos
in vitro demonstraram que os anestésicos com veículo
lipossómico atingem concentrações mais elevadas nas
terminações nervosas sensoriais periféricas. Um destes
anestésicos é a lidocaína lipossómica a 4% e a 5% (LMX4® e LMX-5®). A formulação a 4% permite obter
analgesia equivalente ao EMLA® com menor tempo de
aplicação (cerca de 30 minutos), e sem os efeitos
adversos decorrentes da prilocaína28,35. A formulação a
5% está comercializada para uso ano-rectal mas tem
vindo a ser usada na pele. A tetracaína e a tetracaína
lipossómica têm uma eficácia pelo menos equivalente
ao EMLA®, devendo ser preferidas, assim como a
lidocaína lipossómica, nos lactentes com menos de três
meses30.
Mais recentemente surgiu o “peel” lidocaína/tetracaína. Trata-se de uma mistura eutéctica de 7% lidocaína
e 7% tetracaína, que é aplicada como creme e seca ao
ar, formando uma membrana flexível que é removida da
pele. Oferece alguns pontos favoráveis relativamente ao
EMLA®, dado que é fácil de aplicar e remover (está
31
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo
Educação Médica Contínua
recomendado um tempo de aplicação de 30 minutos).
Uma vez seco e formando a membrana, não sai acidentalmente. Este produto não causa edema, empalidecimento ou eritema local significativos e pode ser usado
em grandes áreas corporais nos adultos com um risco
mínimo de efeitos sistémicos32,36.
A crioanestesia é utilizada com frequência nos procedimentos a laser não ablativos. Pode também ser útil na
terapêutica fotodinâmica, assim como na dermoabrasão,
em injecções dérmicas de ácido hialurónico ou de
corticóides intralesionais. Há várias formas de o conseguir, seja com uma pequena aplicação de azoto líquido
na superfície cutânea, com a colocação de uma superfície
fria no local, com a utilização de um gel gelado, ou com a
insuflação de ar refrigerado acoplada à aplicação de gel.
Quando se usa ar frio, a temperatura cutânea ideal a
atingir é de 20ºC. Todos estes métodos diminuem a dor
do tratamento e protegem a pele das lesões induzidas
pelo calor do laser. O spray de cloreto de etilo, devido ao
arrefecimento pela evaporação, induz uma anestesia
fugaz que é suficiente para a inserção da agulha do
anestésico. A aplicação de um cubo de gelo pode também servir este propósito, e tem uma grande utilidade na
redução da dor da injecção de toxina botulínica nas
palmas e dedos para o tratamento da hiperhidrose17,37.
A iontoforese com lidocaína também pode ser útil ao
aliviar o desconforto de procedimentos ablativos superficiais como laser, electrocirurgia, dermoabrasão ou
curetagem. Ao obviar a necessidade de infiltração do
anestésico, o campo cirúrgico não é distorcido e diminui a
apreensão nos doentes com fobia de agulhas. A absorção
sistémica da lidocaína é muito reduzida com esta técnica,
mais ainda porque devido à sua acção vasodilatadora
intrínseca, a sua remoção do tecido é acelerada, sendo
necessária a adição rotineira de adrenalina. A anestesia
mais eficaz é obtida usando soluções de lidocaína 1-4%,
com adrenalina 1/10.000 a 1/50.000. Aplicando uma
corrente de 1mA, consegue-se anestesia equiparável ou
superior ao EMLA® em poucos minutos. No entanto, esta
técnica é mais adequada para pequenas superfícies e
requer um aparelho específico. Como efeitos adversos,
pode registar-se prurido, queimor, bem como urticária,
eritema transitório ou petéquias; muito raramente podem
surgir queimaduras17,38,39.
QUAIS AS TÉCNICAS DE INJECÇÃO DE ANESTÉSICO?
A anestesia infiltrativa envolve a inibição directa das
terminações nervosas da área a operar e é a que o Der32
matologista usa mais frequentemente no seu quotidiano
(Fig. 2). A sua principal desvantagem é a distorção local
pelo aumento da tensão causado pelo AL, recomendando-se a marcação prévia e a massagem após a
infiltração8,11,17.
Fig. 2 - Anestesia infiltrativa. Note-se a preensão da pele
circundante para diminuir a dor da infiltração.
No bloqueio circunferencial, injecta-se o AL no tecido
celular subcutâneo e na derme, num anel imaginário à
volta do local da cirurgia. É útil para anestesiar áreas
grandes com pouco anestésico e nos quistos evita a sua
perfuração. Esta técnica é mais eficaz nos locais onde a
enervação cutânea chega de forma horizontal. Apesar
de este bloqueio fornecer anestesia, não oferece hemostase no local cirúrgico em si, pelo que aí se recomenda a
injecção intradérmica de AL com adrenalina. O bloqueio circunferencial utiliza-se com frequência no couro
cabeludo, no nariz, no lobo da orelha, no tronco e extremidades8,11,17.
A anestesia troncular consiste na infiltração do
anestésico junto do tronco nervoso (não directamente no
nervo), ao invés de ser nas terminações. Com este
método, é necessária uma menor quantidade de anestésico, o local da cirurgia não é distorcido e de uma
forma geral é menos doloroso do que a infiltração
periférica de uma grande quantidade de anestésico.
Dado que a anestesia é subcutânea, o início é mais
tardio e a duração é diminuída. Deve anestesiar-se
primeiro a derme com uma agulha 30G para diminuir a
dor da injecção, sendo que para o bloqueio nervoso
devem ser usadas agulhas de calibre 25-27 para
diminuir o risco de injecção intravascular (não deve
esquecer-se que junto a um nervo costuma passar uma
Anestésicos Locais em Dermatologia – Da Molécula à Técnica
Educação Médica Contínua
artéria…). Estas técnicas são mais complexas do que a
infiltração rotineira, sendo necessário o conhecimento
detalhado da anatomia local, bem como treino na sua
administração, para minimizar os riscos potenciais de
hematoma, laceração e paralisia nervosa. Na prática
dermatológica, os bloqueios nervosos mais frequentemente utilizados são o digital (Fig. 3), supraorbitário/
supratroclear (anestesia da fronte e vértex), infra-orbitário (anestesia da asa do nariz, zigoma medial, pálpebras
inferiores, lábio superior) e alveolar inferior (anestesia
da língua e lábio inferior). Para a maioria dos bloqueios
nervosos, é adequada a utilização de lidocaína 1% com
adrenalina, eventualmente adicionando bicarbonato.
Para os procedimentos mais demorados, pode utilizar-se bupivacaína 0,25% com adrenalina8,17.
Quadro IV
FÓRMULA DA ANESTESIA TUMESCENTE
(elaborada a partir de 17 e 40)
Composto
Quantidade (mL)
Cloreto sódio 0,9%
900-950
Lidocaína 1%
50-100
Adrenalina 1:1000
1
Bicarbonato de sódio 8,4%
10
Hialuronidase 150 U/mL
Acetonido de triamcinolona
40 mg/mL
6 (opcional: aumenta difusão)
0,25 (opcional: diminui inflamação
e eventualmente fibrose)
COMO DIMINUIR A DOR ASSOCIADA À ADMINISTRAÇÃO DO ANESTÉSICO?
Fig. 3 - Anestesia troncular digital.
A técnica da anestesia tumescente é semelhante à da
anestesia infiltrativa, com a diferença residindo no facto
de serem utilizadas maiores quantidades de uma solução
mais diluída (Quadro IV). Aqui, o anestésico é directamente infiltrado no local do procedimento, inicialmente
no tecido celular subcutâneo profundo e posteriormente
na gordura. Inicia-se a administração com um agulhas
mais pequenas e vai-se aumentando o calibre à medida
que os tecidos ficam infiltrados. A administração está
terminada quando o local em questão fica firme e túmido.
O anestésico em baixas concentrações na gordura
subcutânea é absorvido a uma velocidade muito lenta,
podendo ser infiltradas doses bastante superiores ao
habitual com um baixo risco de efeitos adversos. Esta
técnica é usada frequentemente para lipoaspiração,
dermoabrasão e transplante capilar8,17, 40.
Apesar de os AL visarem a ausência de dor, a inserção da agulha com a infiltração do fármaco é um
momento doloroso ao qual se associa frequentemente
uma grande ansiedade do paciente41.
Há várias técnicas úteis para diminuir o desconforto
do doente durante esta fase. Para começar, deve tentar
estabelecer-se uma atitude empática com o doente,
conversando com ele, explicando-lhe o que vai sentir e
distraindo-o. Isto é importante também para a detecção
precoce de toxicidade. Para pacientes muito ansiosos,
uma sedação ligeira com uma benzodiazepina pode ser
útil. Nas crianças, a aplicação prévia de anestesia tópica
é recomendada8,11.
Está demonstrado que o aquecimento do anestésico
para uma temperatura próximo da corporal não diminui
a sua eficácia e reduz a dor da infiltração42,43. A sensação
de ardor que se segue à picada é devida sobretudo à
acidez da solução do anestésico. A lidocaína simples
tem um pH de 6.5-6.8, a lidocaína com adrenalina tem
um pH de 3.5-4.5; já o fluido tecidular tem um pH de
7.3-7.4. O tamponamento com bicarbonato de sódio a
8.4% aproxima o pH da solução do pH corporal e
aumenta a proporção das moléculas do anestésico não
carregadas, que se difundem com maior facilidade para
os nervos, permitindo um início de acção mais precoce e
uma diminuição da dor com a infiltração1,8,43. Na prática,
pode misturar-se um 1mL de bicarbonato de sódio a
8.4% com 10mL de lidocaína43. Esta solução pode ser
armazenada a 0-4ºC durante quatro semanas sem
perda significativa de eficácia. Outras alternativas de
tamponamento incluem misturar lidocaína simples com
35
Ana Nogueira, Paulo Santos, Filomena Azevedo
Educação Médica Contínua
lidocaína com adrenalina 1:1, bem como misturar 10mL
de lidocaína simples com 0.1mL de adrenalina, obtendo
lidocaína com adrenalina mas com um pH semelhante
ao da lidocaína simples. A acção do tamponamento é
sinérgica com o aquecimento44,45. Podem também tamponar-se a mepivacaína e a bupivacaína, na proporção
1:10 e 1:150, respectivamente8,31.
O calibre da agulha utilizada deve ser o mais fino
possível, recomendando-se agulhas de 30G, de preferência longas para serem movidas de forma rotativa e
minimizar o número de picadas. Quando é necessário
picar mais do que uma vez, deve-se fazê-lo nas áreas
previamente anestesiadas. A inserção da agulha deve
ser lenta mas precisa. Se simultaneamente a pele for
massajada ou pinçada, ou se se utilizar instrumentos
vibratórios, a dor é diminuída por “distracção” das fibras
nervosas46-48. A injecção do anestésico deve ser feita
paulatinamente, para a distensão dos tecidos ser mais
lenta. É também importante não usar mais anestésico
que o necessário, pois leva a um estiramento excessivo
dos tecidos que acaba por ser contraproducente ao
induzir mais dor. De facto, para a maioria dos procedimentos dermatológicos não são precisos mais do que
2mL de lidocaína. O uso de seringas mais pequenas é
útil para melhor controlar o volume infundido e evitar
desperdício. Dado que a anestesia do tecido celular
subcutâneo é menos dolorosa, embora com início mais
tardio e com duração mais fugaz que a intradérmica,
sugere-se a infiltração inicial do tecido celular subcutâneo seguido da infiltração da derme. Por último, se
estivermos na presença de uma laceração, devem infiltrar-se primeiro os bordos8,11,43.
CONSIDERAÇÕES ESPECIAIS
Na infância, a concentração recomendada de lidocaína a utilizar é de 1%, não se devendo exceder a dose
de 5mg/Kg na lidocaína simples e de 7mg/Kg na
lidocaína com adrenalina31. Quando se pretende uma
anestesia mais demorada, devem preferir-se a
levobupuvacaína e a ropivacaína dado apresentarem
um espectro terapêutico semelhante à bupivacaína e um
menor perfil de efeitos laterais. Relembra-se ainda que
nesta faixa etária os AL têm um pico plasmático mais
precoce devido ao débito cardíaco aumentado, bem
como um aumento da semi-vida devido ao maior
volume de distribuição e imaturidade hepática. Considera-se que o limiar para a toxicidade nas crianças
com menos de 5 anos é metade do dos adultos12. Nos
lactentes com menos de 4 meses de idade, a concen36
tração da á1 glicoproteína ácida, responsável pela
ligação à maioria dos AL, é mais baixa, aumentando a
sua fracção livre e consequentemente o seu potencial de
toxicidade. É assim recomendável ajustar as doses de
anestésico para cerca de 15% menos do que nas
crianças mais velhas20.
Idealmente, na gravidez devem adiar-se os procedimentos cirúrgicos electivos para após o parto. Quando
tal não é possível, podem usar-se como AL a lidocaína e
prilocaína (categoria B); a bupivacaína e a mepivacaína
correspondem à categoria C por provocarem bradicardia fetal, não devendo ser empregues. A adrenalina
não é contra-indicada23. Em todos os estadios da
gravidez está recomendado a redução da dose de
anestésico dado que a progesterona aumenta a sensibilidade nervosa ao bloqueio dos canais de sódio20. Os
anestésicos tópicos disponíveis em Portugal (EMLA® e
preparações de lidocaína) são categoria B, pensando-se
que têm potencial mínimo de riscos para a mãe e para o
feto. Dado que os AL podem ser excretados no leite
materno, tem vindo a ser sugerido evitar a sua utilização
durante a amamentação ou em alternativa usar ésteres,
que têm uma metabolização mais rápida23.
NOTA FINAL
O conhecimento do estado da arte da anestesia local
é essencial ao Dermatologista. Novos caminhos se vão
entretanto traçando, com o investimento na síntese de
veículos lipossómicos e de novas moléculas mais
eficazes e inócuas. Em particular, a anestesia tópica tem
vindo a ser crescentemente investigada paralelamente à
explosão de métodos cirúrgicos cada vez menos
invasivos, sobretudo no campo da dermocosmética.
Assim, os anestésicos recomendados hoje podem não
ser os mais eficazes de amanhã…
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Anestésicos Locais em Dermatologia – Da Molécula à Técnica
Educação Médica Contínua
VERIFIQUE O QUE APRENDEU
Qual o grupo de anestésicos locais que mais frequentemente causa reacções anafilácticas?
Quais as alternativas nos doentes com hipersensibilidade aos anestésicos locais?
Quais os anestésicos locais preferidos para procedimentos mais demorados?
Que anestésicos tópicos deveriam ser preferidos nos lactentes mais jovens?
Quais as contra-indicações para o uso de adrenalina na anestesia local?
Indique técnicas para diminuir a dor da administração do anestésico.
Quais os anestésicos locais preferidos na grávida?
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Artigo Original
A DERMATOLOGIA SOB O MICROSCÓPIO*
DERMATOLOGY UNDER THE MICROSCOPE
Bernard Cribier (Secretário da ESDP)
Laboratório de Histopatologia Cutânea, Hospital Universitário de Strasbourg, France
*Tradução para Português de Conferência Plenária (apresentada durante a reunião da EADV, em 2008, Paris)
realizada por Luís Soares de Almeida, Clínica Universitária Dermatológica de Lisboa
1. A dermatopatologia: um conceito particular?
Em caso de dificuldade diagnóstica, a atitude geral
da maioria dos dermatologistas é a de efectuar uma
biopsia, e de a enviar ao patologista que lhe vai dar a
resposta esperada. É exactamente o mesmo que fazem
os nossos colegas da maior parte das outras especialidades, que apenas estão interessados na conclusão da
resposta do exame histopatológico, sem ter verdadeiramente em conta nem o texto descritivo, nem a correlação
anatomo-patológica.
Esta ideia de correlação é aliás muito específica da
dermatologia, pois, aqui mais do que em qualquer outra
especialidade, a conclusão do exame histológico deve
ser interpretada à luz dos sinais clínicos, os quais podem
mudar de acordo com o ponto de vista microscópico.
Para um certo número de dermatologistas todavia,
há uma solução alternativa, que se chama em francês
histopathologie cutanée ou dermatopatologia, termo
derivado do inglês dermatopathology. Neste conceito
unificador, é um dermatologista ou um patologista com
formação e conhecimentos em dermatologia que vão
interpretar as lâminas.
O argumento principal da conferência era argumentar por um lado a necessidade vital do microscópio
para o dermatologista e por outro lado de demonstrar
que a dermatopatologia se assemelha em grande parte
à dermatologia clínica (ou se confunde com ela?).
2. Um pouco de história para melhor compreensão
É certo que a dermatologia clínica nasceu antes da
utilização do microscópio, pois as bases do raciocínio
datam do fim do século XVIII com Jacob Plenk em Viena,
depois Willan e Bateman em Londres, antes do Barão
Alibert em França inventar a sua árvore das dermatoses
(Fig. 1), monstro vegetal cuja complexidade se opõe
Fig. 1 - Árvore das dermatoses, de Alibert.
totalmente à análise semiológica dos precedentes. Estes
grandes pioneiros descreveram e classificaram as lesões
cutâneas, contribuindo para o nascimento da nosologia
dermatológica sem ter à sua disposição uma imagem
microscópica.
Devemos também recordar-nos que a anatomia patológica nasceu antes do microscópio, o que parece todavia
paradoxal aos nossos ouvidos modernos. No entanto, foi
a análise dos órgãos e dos tecidos realizada na autópsia
que constituiu a base desta disciplina. O microscópio só
apareceu bem mais tarde.
41
Bernard Cribier (Traduzido por Luís Soares de Almeida)
Artigo Original
Pensa-se que a dermatopathology foi utilizada pela
primeira vez no fim do século XVIII por um cirurgião
britânico, Henry Jackson, para designar um conceito de
micro-anatomia cutânea baseado num estudo de
vascularização cutânea, sem que esteja em causa aqui a
análise microscópica.
O verdadeiro fundador da ideia de “micro-anatomia”
é Pierre Rayer (1793-1861), que não é considerado como
um dos nossos antecessores dermatologistas, porque ele
dedicava-se a interesses muito diversos. Ele é mesmo
considerado um dos fundadores da uro-nefrologia. Rayer
publicou em 1835 um Traité des maladies de la peau
acompanhado dum magnífico atlas no qual se viam
lesões tecidulares e dos órgãos em corte, segundo os
princípios anatomo-patológicos. Tratam-se das primeiras
representações verticais de lesões cutâneas, por vezes
muito pequenas. A mais célebre é a que representa a
“marche des pustules” na varíola onde existe uma correlação anatomoclínica perfeita entre a evolução das lesões
elementares e o seu aspecto em corte vertical, observado
sem microscópio. Pode dizer-se que com esta planche
nasceu a correlação anatomo-clínica à francesa. Encontram-se também numerosos exemplos de cortes verticais
de fragmentos cutâneos mostrando tumores benignos
(Fig. 2), quistos, metástases, ou até mesmo uma púrpura.
segunda metade do século XIX que os progressos na
óptica, o aparecimento do micrótomo, o aperfeiçoamento das técnicas de fixação e de coloração vão
permitir observar os cortes em condições bem melhores.
Os pioneiros da dermatopatologia são assim como uma
espécie de heróis, como Simon e Von Bärensprung, que
publicaram os dois, pequenos tratados de microscopia
cutânea em 1848. Foi em 1879 que Ernest Besnier (Fig.
3) inventou em Paris o termo biopsia, para designar o
exame de tecidos colhidos no vivo.
Fig. 2 - “Tumeur folliculeuse” de Rayer.
Fig. 3 - Retrato de Besnier que inventou a biopsia.
Globalmente, pode dizer-se que a utilização do microscópio antes dos anos 1850 foi um fenómeno todavia
pontual, totalmente separado da medicina clínica; a
microscopia era realizada apenas por alguns excêntricos animados por uma curiosidade que não era de
diagnóstico mas apenas de conhecimento puro. É
necessário referir que a tarefa não era fácil, pois os
instrumentos eram muito rudimentares. É apenas na
42
As primeiras imagens microscópicas publicadas nos
jornais de dermatologia eram muito rudimentares, não
permitindo chegar a um diagnóstico a maioria das
vezes. A partir de 1880, assiste-se ao aparecimento das
planches a cores, algumas muito semelhantes ao real e
as primeiras microfotografias foram publicadas no final
do século XIX.
A Dermatologia sob o Microscópio
Artigo Original
Além das limitações técnicas, é necessário levar em
conta as importantes reticências colocadas pelo corpo
médico em relação ao microscópio. A teoria celular de
Schwann, datada dos anos 1840, teve o seu ensino
interdito em França até aos anos 1870. Em 1854, os
debates na Academia de medicina mostravam a feroz
oposição ao conceito da célula. Mais tarde, quando esta
foi aceite, a ideia que se poder analisar a histologia da
pele e sobretudo a das doenças da pele parece inatingível devido à extrema complexidade deste exercício.
É a partir dos anos 1880 que os dois pais fundadores
da dermatopatologia moderna vão estar activos. Trata-se de Jean Darier em Paris e de Paul Gerson Unna em
Hamburgo (Fig. 4). Unna (1850-1929) fundou uma
clínica privada em Hamburgo, centro modelo do ensino
da dermatologia e da microscopia cutânea. Foi o
primeiro a escrever um verdadeiro tratado de histopatologia cutânea. Em Paris, Darier (1856-1938) foi o
primeiro a fazer descrições histológicas para complementar as apresentações clínicas nas reuniões de 5ª
feira, da Sociedade. Teve a ideia de introduzir as imagens microscópicas em paralelo com as fotografias
clínicas em todas as suas obras, apesar de ele não ter
escrito um verdadeiro tratado de dermatopatologia.
Todavia, no início do século XX, a biopsia mantém-se um
acto excepcional que ninguém usa como método de
rotina no exame dermatológico. A ideia de se efectuar o
diagnóstico de um cancro cutâneo pela histopatologia é
por vezes ainda considerada uma loucura (Fig. 5).
Fig. 5 - Um microscópio histórico em Estrasburgo (pertenceu
a Woringer, o que descreveu a doença de Woringer-Kolopp).
Graça a estes dois pioneiros, a biopsia torna-se uma
ferramenta importante no diagnóstico dermatológico. A
correlação anatomo-clínica é fundamental no raciocínio
diagnóstico, mas torna-se também a base do ensino da
dermatologia. Finalmente, em França, Darier impõe o
diagnóstico microscópico dos cancros cutâneos.
Fig. 4 - Unna e Darier.
3. Os tempos modernos
A partir dos seus pais fundadores, a dermatopatologia conheceu um desenvolvimento considerável,
mantendo-se nas mãos dos dermatologistas até aos
anos 1950-60. Todavia, pode constatar-se hoje que esta
disciplina não é muito popular entre os estudantes de
dermatologia e que destes os que a ela se dedicam
constituem uma pequena minoria dos internos, habitualmente mais interessados na cirurgia, no laser ou
mesmo na cosmética. Sem dúvida que uma das razões é
a dificuldade de praticar a dermatopatologia em medicina privada quando se é dermatologista. Isto é possível
nalguns países, mas não em todos.
43
Bernard Cribier (Traduzido por Luís Soares de Almeida)
Artigo Original
Por outro lado, os dermatologistas, eles mesmo,
consideram por vezes a histopatologia cutânea como
pouco “científica”, preferindo a imunologia ou a genética. Na realidade, a histopatologia como outras disciplinas morfológicas é uma verdadeira ciência: sim,
existe a dermatopatologia investigativa. Contrariamente
ao que alguns possam crer, os critérios de diagnóstico
microscópico mudam com o tempo, novos conceitos
microscópicos surgem permanentemente e novas doenças são descritas com base nos seus sinais histológicos.
Deve aqui render-se homenagem ao enorme trabalho e à grande influência que teve Bernard Ackerman
durante os últimos quarenta anos do século XX. Além de
todas as novas doenças por si descritas, foi sobretudo
um modo de pensar diferente que ele introduziu. Ele
também inventou o diagnóstico pela silhueta, demonstrando a importância da arquitectura, antes da citologia.
Entre os novos conceitos que ele impôs, o mais marcante
foi sem dúvida a utilização dos “patterns” nas doenças
inflamatórias cutâneas. Finalmente, o seu entusiasmo
inabalável inspirou numerosos jovens dermatologistas
de todo o mundo, que lhe devem a sua vocação. Aprendemos com ele que a dermatopatologia pertence à
dermatologia, que a dermatologia clínica não pode
viver sem a dermatopatologia e por fim, que a dermatologia é more beautiful ao microscópio (Figs. 6 e 7).
4. Uma grande necessidade de microscópio
O dermatologista não pode evidentemente passar sem
a análise microscópica dos tumores cutâneos. Como
exemplo, um tumor de grande tamanho, de crescimento
rápido, ulcerado que surja em zona foto-exposta de um
idoso, pode corresponder a três tumores absolutamente
idênticos clinicamente: um carcinoma sebáceo, um carci-
Fig. 6 - Dermatopatologia é arte – uma cartilagem auricular.
44
Fig. 7 - Dermatopatologia é arte – leiomioma em forma de
coração.
noma triquilémico ou um fibroxantoma atípico. É evidente
que sem o microscópio, ninguém poderia classificar estes
tumores. Esta situação é evidente, e ninguém poderá
negar a importância da dermatopatologia. Mas no fundo,
será preciso ser-se dermatologista para efectuar estes
diagnósticos microscópicos? Claro que não.
Os exemplos seguintes mostram alterações mais
subtis, em particular as pequenas pápulas faciais
ligeiramente queratósicas, que podem passar por lesões
não específicas, podendo ser respondidas por um
microscopista peu averti como “tumores benignos
epidérmicos ou foliculares”. O tumor é evidentemente
benigno. Todavia, ele é perfeitamente específico e tem
um nome preciso: o tricolemoma. A simples identificação precisa deste tumor anexial permite efectuar um
diagnóstico de doença de Cowden, na qual existe um
risco acrescido de cancro mamário. A chave do diagnóstico para o dermatologista é aqui a identificação correcta desta lesão totalmente banal e benigna para o
microscopista.
Os outros exemplos referidos por B. Cribier foram a
síndrome de Gardner (ou polipose cólica familiar adenomatosa), a síndrome de Birt-Hogg-Dubé, e a
síndrome de Muir-Torre, nos quais a identificação
precisa dum tumor benigno permite o diagnóstico duma
doença genética predisponente ao cancro (Fig. 8). A
dermatologia com certeza que precisa de microscopia
mas ela necessita sobretudo de uma dermatopatologia
de alto nível.
Assim os internos de dermatologia formados com a
microscopia são melhores dermatologistas. Eles conhecem melhor as doenças, podem discutir melhor o
diagnóstico diferencial, sabem integrar melhor a informação histológica (!) e podem sobretudo discutir a
correlação anatomo-clínica. Com efeito, esta correlação não se limita apenas à comparação da lesão
clínica com a conclusão do exame anatomo-patológico.
A Dermatologia sob o Microscópio
Artigo Original
Fig. 8 - Imagem característica de queratinização epidérmica e
matrical num quisto, que é sugestiva da síndrome de Gardner.
Apenas a comparação entre o aspecto clínico e a visualização da lesão ao microscópio, permite compreender
as lesões elementares, ou por vezes mesmo o mecanismo das lesões.
É necessário ter colocado o seu próprio nariz num microscópio para compreender a extrema dificuldade na
interpretação dos tumores “spitzóides” que, para um
olho pouco experiente, são assustadores, apesar de
benignos (Fig. 9). Assim, o diálogo entre um clínico non
averti e um patologista pode tornar-se muito complicado. O clínico quer, em geral, apenas saber se a
lesão é benigna ou maligna. Em dermatologia, por
vezes, as coisas não são assim tão simples, particularmente no diagnóstico das lesões melanocíticas.
5. A dermatopatologia: um acesso à verticalidade
Se parece estabelecido que todos os dermatologistas
precisam dum microscópio, eles necessitam de deitar
uma espreitadela para melhor compreenderem a sua
disciplina. Isto os fará penetrar num novo mundo,
abandonando assim o tédio da horizontalidade do
exame clínico, para aceder ao mundo fascinante da
verticalidade, um mundo colorido e rico em imagens
infinitamente mais subtis (Fig. 10). Assim, o verdadeiro
histopatologista é como o deus Janus, com uma face
voltada para as lesões clínicas e a outra voltada para o
microscópio.
Nesta terceira dimensão, a verticalidade, o dermatologista pode aprender a compreender os processos
patológicos, com o exemplo dado pelas dermites de
interface. Nesta afecção da junção dermo-epidérmica,
Fig. 9 - Caso difícil de nevo de Spitz atípico.
o dermatologista poderá apreender os elementos comuns ao lúpus, à dermatomiosite, à doença de enxerto
contra hospedeiro ou mesmo de lesões mais afastadas
como o pênfigo paraneoplásico ou o líquen aureus.
Assim, o conhecimento da microscopia permite ter
uma visão mais global da dermatologia. Atinge-se
então o sonho de todos os morfologistas, que consiste
em explicar o funcionamento do mundo através das
formas.
6. Mas o que é um especialista?
Se temos a certeza que a dermatopatologia nasceu
da dermatologia, este monopólio tem sido contestado,
cada vez com mais intensidade, pelos patologistas a
partir dos anos 1970. Existiu e ainda existe uma certa
rivalidade entre os patologistas e os dermatologistas,
quanto à paternidade ou por vezes quanto à propriedade desta disciplina e dos exames que dela resultam.
45
Bernard Cribier (Traduzido por Luís Soares de Almeida)
Artigo Original
lugar porque o número de doenças, sobretudo as
inflamatórias, é enorme. Os seus aspectos clínicos são
muitas vezes indistinguíveis para um olho não treinado e
elas têm nomes difíceis. Há também exemplos de
doenças como o líquen ou a psoriase que podem manifestar-se com aspectos clinico-patológicos totalmente
diversos. Assim, sem um conhecimento mínimo da
clínica, o diagnóstico histopatológico das lesões inflamatórias mantém-se muito rudimentar e pouco eficaz.
Este é também o caso dos tumores anexiais, duma
grande dificuldade não só para o clínico como também
para o histologista. Para se penetrar neste campo é
necessário ter uma grande experiência destas lesões,
sendo o microscópio o seu único veículo para as
conhecer verdadeiramente. Elas são consideradas um
pesadelo para os clínicos e para os patologistas, sendo
no entanto consideradas uma sobremesa para os
dermatopatologistas.
As qualidades requeridas para a dermatopatologia
são a honestidade, a curiosidade, o gosta pelas imagens
– como é óbvio –, mas também a independência de
espírito e o interesse pela discussão clinico-patológica,
sem a qual não se pode evoluir. Por isto, é necessário serse dermatologista, ou no mínimo ter uma boa formação
em dermatologia clínica.
Fig. 10 - Um microscópio no cimo do telhado do Instituto de
Bacteriologia em Estrasburgo, onde Luís Pasteur trabalhou alguns anos.
Pode fazer-se tudo ao microscópio, sem se ser clínico
nem se conhecer a dermatologia clínica? Alguns exemplos mostram os perigos desta concepção redutora da
histopatologia cutânea.
Três casos histologicamente típicos de micose fungóide mostram ser sucessivamente o bordo inflamatório
dum vitíligo, um eczema de contacto linfomatóide e
mesmo uma zona após a realização de cortes seriados.
Todos conhecemos também o caso das dermatoses
invisibles nas quais o clínico vê uma lesão evidente e o
patologista não vê qualquer alteração histológica. Por
certo, muitos destes erros estão ligados a uma má
colaboração entre clínico e patologista, mas alguns são
com certeza devidos a uma ausência de conhecimentos
de dermatologia clínica.
Porque é a dermatopatologia tão difícil? Em primeiro
46
7. Razões para esperar?
A Sociedade Europeia de Dermatopatologia (ESDP European Society of Dermatopathology) foi fundada em
1995 por Helmut Kerl e alguns colegas europeus, com a
finalidade de definir os níveis de qualidade para a
prática e o ensino da dermatopatologia. Estes esforços
levaram à organização dum exame europeu de dermatopatologia, organizado presentemente de forma
conjunta e amigável por patologistas e dermatologistas.
Este exame tem lugar todos os anos em Frankfurt (Alemanha), no mês de Dezembro. Esperamos que ele se
torne rapidamente uma referência nesta disciplina.
Por outro lado, a EADV organiza desde 2005 um
curso de Verão de dermatopatologia destinado a internos motivados vindos de toda a Europa. Dois cursos já
foram realizados em 2005/2006 em Gant (Bélgica) e
em 2007/2008 em Graz (Áustria).
Em jeito de conclusão o motto da EADV em Paris foi
“Beyond fashion” (para além da moda). Bernard Cribier
propõe um novo mote para o dermatologista: “Not
without my microscope”.
Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 51-56 (2009)
Artigo de Revisão
FIBROMIXOMA ACRAL SUPERFICIAL – CARACTERIZAÇÃO
CLINICOPATOLÓGICA E IMUNOHISTOQUÍMICA DE UM TUMOR
RECENTEMENTE DESCRITO
Ricardo Coelho1, Isabel Viana2, Esmeralda Vale2, Olívia Bordalo e Sá2
Serviço de Dermatologia, Hospital Distrital de Faro; 2Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa
1
RESUMO - Introdução: O Fibromixoma acral superficial (FMAS) é um tumor benigno das partes moles, mixóide, raro,
recentemente descrito na literatura. Objectivos: Analisar as características clínicas, histopatológicas e imunohistoquímicas do FMAS. Métodos: Foram revistos os tumores arquivados entre 2001 e 2007 no Laboratório de
Histopatologia do Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa com localização acral e diagnosticados como
mixomas, fibromas ou dermatofibromas. Resultados: Foram identificados 3 casos de FMAS, todos do sexo feminino e
com idades compreendidas entre os 45 e 48 anos (idade média 46). Clinicamente, observava-se uma massa ou nódulo
nos dedos dos pés (n=2) ou das mãos (n=1). Após um ano de seguimento, não foi evidenciada recidiva das lesões em
nenhum doente. Histopatologicamente, todos os tumores eram constituídos por células fusiformes e/ou estreladas com
um padrão estoriforme e fasciculado num estroma mixoide/mixocolagénico/colagénico com aumento do número de
mastocitos e aumento da vascularização. Não se observaram mitoses ou atipias celulares. Um padrão imunofenotípico
característico incluiu CD34+ (n=3), AML+ (n=1), Factor XIII + focalmente (n=1), desmina–, EMA– e Proteína S100–.
Conclusões: Descrevem-se 3 casos de FMAS, documentando-se uma entidade distinta com características clínicas,
histopatológicas e imunihistoquímicas próprias. É importante o diagnóstico diferencial do FMAS de outros tumores
mixóides, uma vez que a sua natureza benigna torna desnecessários tratamentos agressivos.
PALAVRAS-CHAVE - Fibromixoma acral superficial; Tumor dos tecidos moles; Fibroqueratoma acral adquirido; Mixoma.
SUPERFICIAL ACRAL FIBROMYXOMA – A CLINICOPATHOLOGICAL
AND IMMUNOHISTOCHEMICAL ANALYSIS OF A RECENTLY
RECOGNIZED TUMOR
ABSTRACT - Background: Superficial acral fibromyxoma (SAFM) is a rare myxoid benign soft tissue tumor that has
recently been recognized in the literature. Objectives: To describe the clinical, histopathologic and immunohistochemical
features of SAFM. Methods: We reviewed the tumors reported between 2001 and 2007 in the Laboratório de
Histopatologia do Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa with acral localization and coded as myxoma,
fibroma or dermatofibroma. Results: Three cases of SAFM were identified, all female and with an age range 45-48 (mean
46). They presenting with a mass or nodule in the toes (n=2) and the fingers (n=1). 1-year follow up showed no evidence
of recurrence. Histologically, all tumors presented with spindle and/or spindle-shaped cells with a storiform and fascicular
pattern embedded in a myxoid/fibromyxoid/collagenous stroma with conspicuous mast cells and increased
vascularization. No mitosis or cytological atypia were seen. A characteristic immunophenotype included CD34+ (n=3),
AML + (n=1), Factor XIII + focally (n=1), Desmin–, EMA– and S100–. Conclusions: We describe 3 cases of SAF showing
that it is a distinct entity with typical clinical, histological and immunohistochemical features. The distinction of SAFM from
other myxoid tumors is of importance in regard to its benign course to avoid unnecessary aggressive treatment.
KEY-WORDS - Superficial acral fibromyxoma; Soft tissue tumor; Acquired digital fibrokeratoma; Myxoma.
51
Ricardo Coelho, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo e Sá
Artigo Revisão
Correspondência:
Dr. Ricardo Coelho
Rua dos Remédios à Lapa, 9
1200-782 Lisboa
E-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
O Fibromixoma Acral Superficial (FMAS) é um tumor
mesenquimatoso reconhecido como entidade clinico-patológica própria desde 20011 por Fetsch e cols. Estes
autores identificaram 37 casos desta nova entidade e
descreveram-na como uma lesão solitária com localização acral, mais precisamente no leito ou prega
ungueal proximal, de natureza benigna e que se admite
ser pouco frequente.
OBJECTIVOS
Pretendeu-se neste trabalho determinar as características clínicas, histopatológicas e imunohistoquímicas
deste tumor.
MATERIAL E MÉTODOS
Com base no sistema informático do Laboratório de
Histopatolgia do Centro de Dermatologia MédicoCirúrgica de Lisboa, foi feita uma revisão de todas as
lâminas arquivadas entre 2001 e 2007 cujo diagnóstico
de saída tenha sido compatível com um FMAS. Foram
pesquisados os diagnósticos de fibroma acral, mixoma
das mãos e pés ou neurofibroma. Em todos os casos foi
feita colocação com Hematoxilina-Eosina e Azul de
Alcião. Nas amostras com critérios histológicos de
FMAS, foi feita imunomarcação com CD34, Desmina,
EMA, AML, Factor XIII e Proteína S100. Foram colhidos
dados clínicos através da consulta do processo clínico do
doente: idade e sexo do doente, localização da lesão,
diagnóstico clínico, terapêutica e follow-up.
RESULTADOS
Entre 2001 e 2007 foram identificados três doentes
com FMAS por critérios histológicos e imunohistoquímicos. Os três doentes eram do sexo feminino, com
idade entre os 45 e os 48 anos (Quadro I). Clinicamente,
caracterizaram-se por nódulo solitário periungueal (dois
doentes no dedo do pé, um doente no dedo da mão),
diagnosticados inicialmente como fibroma ou fibroqueratoma acral.
O exame histopatológico revelou em todos os casos
a presença de tumor moderadamente circunscrito, não
encapsulado, que ocupava toda a derme e coberto por
epiderme hiperqueratósica (Fig. 1). Era constituído por
células fusiformes e/ou células estreladas distribuídas
com padrão estoriforme (em dois casos) ou fasciculado
(num caso), envolvidas numa matriz mixóide abundante
(Figs. 2 e 3). Em dois casos, a vascularização estava
aumentada e estavam presentes mastocitos em número
elevado. Não se observaram atipias nucleares, mitoses
ou infiltrado linfocitário. A coloração com Azul de Alcião
confirmou o abundante material mucinoso presente no
estroma do tumor (Fig. 4).
O estudo imunohistoquímico revelou positividade
nos 3 tumores para o CD34 (Fig. 5), um dos tumores
marcava para a AML e outro focalmente para o Factor
Quadro I
CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DOS DOENTES
52
Parâmetro
Doente 1
Doente 2
Doente 3
Sexo
Feminino
Feminino
Feminino
Idade
46
45
48
Localização
5? Dedo do pé esquerdo
1º Dedo do pé direito
1º Dedo da mão direita
Diagnóstico clínico
Fibroma acral
Fibroqueratoma
Fibroma acral
Fibromixoma Acral Superficial – Caracterização Clinicopatológica e Imunohistoquímica de um Tumor Recentemente Descrito
Artigo Revisão
Fig. 1 - Pequena ampliação de FMAS onde se observa tumor
dérmico, não encapsulado, coberto por epiderme hiperqueratósica (H&E).
Fig. 3 - Observam-se células fusiformes agrupadas em padrão fascicular e estoriforme (H&E).
Fig. 4 - Coloração com Azul de Alcião evidencia matriz
mixóide.
Fig. 2 - Observa-se em maior ampliação células fusiformes
distribuídas com padrão estoriforme numa matriz mixóide. De
realçar aumento da vascularização e do número de mastocitos
(H&E).
XIII. Os restantes marcadores (Desmina, EMA, AML e
Proteína S100) foram negativos. (Quadro II).
No que respeita à terapêutica da lesão, foi feita em
todos os casos, uma excisão em cunha com encerramento directo, sem evidência de recidiva tumoral após 1
ano de seguimento.
DISCUSSÃO
Em 2001, foi pela primeira vez descrito por Fetch et
al.1 um tumor mesenquimatoso com localização acral de
crescimento lento denominado Fibromixoma Acral Su-
Fig. 5 - Positividade para o CD34.
53
Ricardo Coelho, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo e Sá
Artigo Revisão
Quadro II
ESTUDO IMUNOHISTOQUÍMICO DOS TUMORES MOSTROU POSITIVIDADE
AO CD34 EM TODAS AS LESÕES
Uma das lesões mostrou positividade à AML e outro ao factor XIII
Imunohistoquímica
Doente 1
Doente 2
Doente 3
CD34
1+1
1+1
1+1
Desmina
1-1
1-1
1-1
EMA
1-1
1-1
1-1
AML
1-1
1-1
1+1
Factor XIII
1+1
1-1
1-1
Proteína S100
1-1
1-1
1-1
perficial. Os referidos autores reviram o material de
arquivo do Instituto de Patologia das Forças Armadas de
Washington DC entre 1970 e 2000 com a indicação de
tumor dos tecidos moles afectando as extremidades
distais e identificaram 37 casos com características clínicas, histológicas e imunofenotípicas semelhantes.
Desde a descrição inicial, têm sido publicados casos
clínicos isolados e outras séries de doentes (Quadro III).
Dos casos publicados na literatura até ao momento, tem-se assistido a um predomínio do sexo masculino e de
doentes na quarta década de vida, tendo-se diagnosticado
esta lesão em doentes com idades compreendidas entre os
14 e os 76 anos. A lesão – invariavelmente única –
localiza-se nos dedos das mãos ou dos pés na maioria das
vezes em localização periungueal ou subungueal, estando
mais raramente descritas lesões nas palmas2. O tempo de
evolução médio da lesão é de 3 anos variando entre os 3
meses e os 30 anos, havendo referência por parte dos
doentes a um traumatismo prévio em 7 casos. São lesões
geralmente indolores, de crescimento lento, causando
apenas um desconforto ligeiro aos doentes. Na série
publicada por Fetsch e cols. houve recidiva num caso e
Quadro III
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA DOS CASOS DE FMAS ENCONTRADOS NA LITERATURA
Autores
Nº de doentes
Idade média
Sexo
Localização
Fetsch et al1 (2001)
37
43
25/M
12/F
20 – Mão
17 – Pé
Prescott et al2 (2008)
41
50
27/M
14/F
Pés – 29
Mãos – 11
Palma- 1
Quaba et al3 (2005)
1
71
M
Mão
Andre et al (2004)
1
50
F
Pé
Misago et al6 (2008)
1
53
M
Pé
Meyerle et al (2004)
1
53
M
Mão
Kasakov et al8 (2002)
2
63
1/M
1/F
2 – Pé
Presente trabalho
3
46
3/F
2 – Pé
1 – Mão
5
7
54
Fibromixoma Acral Superficial – Caracterização Clinicopatológica e Imunohistoquímica de um Tumor Recentemente Descrito
Artigo Revisão
exérese incompleta em dois doentes, sem que se tenha
constatado a presença de metástases ou invasão em
profundidade. Á excepção do sexo (na nossa série todos os
doentes são do sexo feminino) as restantes características
demográficas e clínicas são similares às anteriormente
descritas na literatura. A inespecificidade macroscópica
das lesões leva a que habitualmente os doentes não sejam
fotografados, pelo que são raras as fotografias clínicas
disponíveis na literatura3,4.
O exame histopatológico e imunohistoquímico são
característicos e fazem o diagnóstico desta entidade.
Estas lesões fazem diagnóstico diferencial com outros
tumores benignos mixóides ou de natureza acral como o
neurofibroma mixóide, perineurioma esclerosante,
fibroqueratoma acral adquirido, histiocitoma fibroso,
angiomixoma superficial e malignos como o dermafibrosarcoma protuberans variante mixóide ou o sarcoma
fibroblástico mixoinflamatório acral.
A positividade para o CD34, poderá levantar problemas de diagnóstico diferencial com o dermatofibrosarcoma protuberans mixóide ou outros sarcomas mixóides
de baixo grau de malignidade e daí a importância do
reconhecimento desta entidade para evitar terapêuticas
desajustadas8,9. O FMAS tem no entanto características
clínicas e histopatológicas diferentes, como a localização, história natural e ausência de padrão histológico
em “favo de mel” que se observa no dermatofibrosarcoma protuberans (Quadro IV).
Da revisão retrospectiva descrita por Fetsch e cols.,
salienta-se que dos 37 casos descritos, 4 doentes tinham
sofrido amputação como método terapêutico, o que
poderia ter sido evitado caso esta entidade tivesse sido
reconhecida antecipadamente.
Estes tumores persistem se não for feita a sua exérese
cirúrgica e admite-se que possam recidivar se incompletamente excisados3. Não existem relatos de transformação maligna na literatura. Devido à deformidade
associada do leito ungueal e à necessidade de excluir
uma lesão de natureza maligna, está recomendada a
sua excisão completa e seguimento posterior do doente4.
BIBLIOGRAFIA
1. Fetsch JF, Laskin WB, Miettinen M: Superficial acral
fibromyxoma: a clinicopathologic and immunohistochemical analysis of 37 cases of a distinctive soft
tissue tumor with a predilection for the fingers and
toes. Hum Pathol 32: 704-14 (2001).
2. Prescott RJ, Husain EA, Abdellaoui A, Al-Mahmoud
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B, Al-Daraji WI: Superficial acral fibromyxoma: a
clinicopathological study of new 41 cases from the
U.K.: should myxoma (NOS) and fibroma (NOS)
continue as part of 21st-century reporting? Br J
Dermatol 2008, Sep 1.
3. Quaba O, Evans A, Al-Nafussi AA, Nassan A: Superficial acral fibromyxoma. Br J Plast Surg 58: 561-4
(2005).
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(2004).
Quadro IV
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DO FMAS – CARACTERIZAÇÃO IMUNOHISTOQUÍMICA
Diagnóstico diferencial
FMAS
Neurofibroma mixoide
CD34
1+1
1+/1
EMA
1+/1
1-1
AML
S100
1-1
1-1
1-1
1+1
Perineurioma esclerosante
1-1
1+1
Fibroqueratoma acral adquirido
1-1
1-1
1-1
1-1
Histiocitoma fibroso
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
1-1
Angiomixoma superficial
DFSP mixoide
Sarcoma fibroblástico
mixoinflamatório acral
1+/1
1+1
1+/1
1+/1
1-1
55
Ricardo Coelho, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo e Sá
Artigo Revisão
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Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 59-66 (2009)
Artigo Revisão
NEUROFIBROMATOSE TIPO 1 NA CONSULTA DE
DERMATOLOGIA PEDIÁTRICA DO HOSPITAL DE SÃO MARCOS –
REVISÃO DE 16 CASOS
Filipa Ventura1, Joana Rocha1, Ana Paula Vieira1, Ricardo Maré2, Jaime Rocha3, Raquel Pinheiro4,
Laura Brito4, Celeste Brito1
Serviços de 1Dermatologia, 2Neurologia, 3Neurorradiologia e 4Departamento de Psicologia
da Universidade do Minho, Hospital de São Marcos, Braga
RESUMO - Introdução: A Neurofibromatose tipo 1 (NF1) é a doença neurocutânea mais frequente, com uma
incidência aproximada de 1:3500. Tem uma transmissão autossómica dominante, porém 50% dos casos devem-se a
mutações de novo. As manifestações clínicas são extremamente variáveis entre indivíduos e ao longo da vida do próprio
indivíduo. Determinadas complicações surgem mais frequentemente em idades específicas, sendo este aspecto muito
relevante na idade pediátrica. Objectivos: Análise dos aspectos demográficos e clínicos da população em causa.
Elaboração de um protocolo para o seguimento destes doentes. Métodos: Estudo descritivo e retrospectivo baseado na
revisão dos processos clínicos dos doentes com o diagnóstico de NF1 seguidos na consulta de Dermatologia Pediátrica
do Hospital de São Marcos (HSM), entre Janeiro de 2000 e Dezembro de 2007. O diagnóstico foi estabelecido pelos
critérios estipulados pelo National Institutes of Health Consensus Development Conference. Todos os doentes foram
avaliados pelas especialidades de Neurologia e Oftalmologia e realizaram ressonância magnética nuclear (RMN)
cerebral. À data do estudo, foram submetidos a uma avaliação neuropsicológica. Resultados: Dos 16 doentes
avaliados, 8 (50%) eram do sexo masculino. A média de idades foi de 11 anos. O tempo médio entre a primeira
manifestação clínica e o preenchimento dos critérios de diagnóstico foi de 4 anos. As manchas café com leite foram o
motivo de referenciação à consulta em 15 doentes. Os critérios de diagnóstico clínico apresentavam as seguintes
frequências: manchas café com leite (16 doentes – 100%), efélides axilares ou inguinais (8–50%), antecedentes
familiares (5–31%), neurofibromas cutâneos (5–31%), neurofibroma plexiforme (1–6%) e displasia da grande asa do
esfenóide (1–6%). Não foram identificadas crianças com nódulos de Lisch ou glioma óptico. A avaliação cognitiva e
psicológica foi efectuada em 12 doentes. O QI médio foi de 89. No estudo imagiológico por RMN cerebral foram
identificadas áreas de hiperintensidade em T2, denominadas unidentified bright objects (UBO's) em 9 casos (56%).
Discussão: Os autores pretendem documentar os diferentes aspectos a considerar no acompanhamento de crianças
com NF1, nomeadamente na vigilância das múltiplas manifestações clínicas da doença ao longo da idade pediátrica.
PALAVRAS-CHAVE - Neurofibromatose tipo 1; Criança; Diagnóstico; Ressonância magnética nuclear cerebral; Vigilância.
NEUROFIBROMATOSIS TYPE 1 IN THE PEDIATRIC DERMATOLOGY
CONSULTATION OF THE HOSPITAL DE SÃO MARCOS –
REVIEW OF 16 CASES
ABSTRACT - Introduction: Neurofibromatosis type 1 (NF1) is the most common neurocutaneous disorder with a
prevalence of approximately 1 in 3500. It has an autosomal dominant hereditary condition although 50% of the cases are
related with spontaneous mutations. NF1 is a variable condition concerning its clinical manifestations. It may also present
different complications through life, a capital issue to pediatric management. Objectives: Epidemiologic analysis and
clinical characteristics of the population in question. Implementation of a protocol for the patients follow up. Methods:
Descriptive and retrospective study based on clinical notes of patients with NF1 referred to Dermatology Department
59
Filipa Ventura, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Ricardo Maré, Jaime Rocha, Raquel Pinheiro, Laura Brito, Celeste Brito
Artigo Revisão
between January of 2000 and December of 2007. Diagnostic criteria were those of National Institutes of Health
Consensus Development Conference. All the patients were evaluated by the specialties of Neurology and Ophthalmology
and underwent brain magnetic resonance imaging (MRI). At the time of the study, they were submitted to a
neuropsychological assessment. Results: We studied 16 patients, 8 (50%) males. The medium age was 11 years. The
average time between the first clinical manifestation and the fulfillment of the criteria for diagnosis was 4 years. Fifteen
patients were referred for assessment for “café-au-lait” spots. Diagnostic criteria included: “café-au-lait” spots (16
patients – 100%), axillary or inguinal freckling (8 – 50%), first degree relative with NF1 (5 – 31%), cutaneous neurofibroma
(5 – 31%), plexiform neurofibroma (1 – 6%) and sphenoid wing dysplasia (1 – 6%). No children were identified with íris
Lisch nodules or optic glioma. Cognitive and psychological evaluation was performed in 12 cases. Mean QI was 89. MRI
revealed unidentified bright objects (UBOs) in 9 cases (56%). Discussion: The authors wish to document the different
aspects to consider in the monitoring of children with NF1, particularly in monitoring the multiple symptoms of the disease
over the children.
KEY-WORDS - Neurofibromatosis type 1; Children; Diagnosis; Magnetic resonance imaging; Follow up.
Correspondência:
Dr.ª Filipa Ventura
Hospital de São Marcos
Apartado 2242
4701-965 Braga
Tel: 253209022
Fax: 253613334
E-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
A NF1 é a doença neurocutânea mais frequente, com
uma incidência aproximada de 1:35001-3. Foi descrita
pela primeira vez por Frederich von Recklinhausen em
18812. Tem um padrão de transmissão autossómico
dominante, porém cerca de 50% dos casos devem-se a
mutações de novo4. Esta doença resulta da perda de
expressão do gene NF1 (cromossoma 17q11.2) responsável pela síntese de neurofibromina, proteína
composta por 2818 aminoácidos, que intervém nos mecanismos reguladores da proliferação celular através da
regulação negativa do proto-oncogene Ras1,5-7.
O diagnóstico de NF1 exige a presença de pelo menos 2 dos 8 critérios estipulados pelo National Institutes
of Health Consensus Development Conference1,8,9:
- Seis ou mais manchas café com leite com dimensões superiores a 0,5 cm em crianças pré-púberes
ou superiores a 1,5 cm após o período da puberdade;
- Efélides axilares ou inguinais;
- Dois ou mais neurofibromas cutâneos;
60
-
Um neurofibroma plexiforme;
Dois ou mais nódulos de Lisch;
Glioma óptico;
Lesão óssea: displasia do esfenóide, estreitamento da cortical dos ossos longos com ou sem pseudoartrose;
- Antecedentes familiares de NF1 (primeiro grau).
As manifestações clínicas são extremamente variáveis entre indivíduos, mesmo entre familiares, e ao longo
da vida do próprio indivíduo. Geralmente surgem mais
frequentemente em idades específicas, sendo este
aspecto muito relevante na idade pediátrica2.
MATERIAL E MÉTODOS
Estudo descritivo e retrospectivo baseado na consulta
dos processos clínicos dos doentes com o diagnóstico de
NF1 seguidos na consulta de Dermatologia Pediátrica
do Hospital de São Marcos, entre Janeiro de 2000 e
Neurofibromatose Tipo 1 na Consulta de Dermatologia Pediátrica do Hospital de São Marcos – Revisão de 16 Casos
Artigo Revisão
Dezembro de 2007. Todos os doentes foram avaliados
pelas especialidades de Neurologia e Oftalmologia e
realizaram RMN cerebral. À data do estudo, foram
submetidos a uma avaliação neuropsicológica. O
diagnóstico foi estabelecido pelos critérios estipulados
pelo National Institutes of Health Consensus Development Conference.
Analisaram-se os dados referentes à caracterização
da população, idades na altura da primeira manifestação clínica e em que foi estabelecido o diagnóstico,
motivo de referência à consulta, critérios de diagnóstico,
outras manifestações clínicas, avaliação neuropsicológica e cognitiva e realização de RMN cerebral.
Nº de doentes
16
16
14
12
10
8
8
6
4
2
0
0
1
1
Ante
ce
Fam dentes
i
Disp liares
lasia
do e da asa
sfen
óide
Glio
ma ó
ptico
Nód
ulos
de L
isch
Neu
rofib
plex roma
ifo
Neu rme
rofib
ro
cu mas
Eféli tâneos
des
ou in axilare
guin s
ais
Man
café chas
-aulait
0
RESULTADOS
Foram avaliados 16 doentes, 8 do sexo feminino e 8
do sexo masculino. A idade média à data do estudo foi
de 11 anos. Foram incluídos doentes entre os 4 e os 20
anos de idade mas em todos eles o diagnóstico tinha
sido estabelecido antes dos 16 anos. A idade média na
altura da primeira manifestação clínica foi de 2 anos e a
idade média de diagnóstico foi de 6 anos. O motivo de
referência à consulta mais frequente foi a presença de
manchas café com leite (15 doentes – 94%). Uma criança foi enviada à consulta por dismorfia craniofacial.
Os critérios de diagnóstico estavam presentes nas
seguintes frequências (Fig. 1): manchas café com leite
(16 doentes – 100%), efélides axilares ou inguinais
(8–50%), antecedentes familiares (5–31%), neurofibromas cutâneos (5–31%), neurofibroma plexiforme
(1–6%) e displasia da grande asa do esfenóide (1–6%).
Não foram identificadas crianças com nódulos de Lisch
ou glioma óptico. Salientar que com base em apenas
manifestações cutâneas foi possível a realização do
diagnóstico em 13 doentes (81%). Outras manifestações
clínicas incluíram: cefaleias, tonturas, macrocefalia,
baixa estatura, linfangioma da língua e tumores (astrocitoma do corpo caloso e ganglioneuroma do mediastino)
(Fig. 2).
Nenhum doente apresentou alterações no exame
neurológico sumário.
O estudo genético foi realizado em 6 casos tendo
confirmado o diagnóstico.
A avaliação cognitiva e psicológica foi realizada em
12 casos. O QI médio foi de 89 (máximo 141, mínimo
51) (Fig. 3).
O estudo imagiológico por RMN cerebral foi realizado em todos os doentes. A idade média em que
realizaram a primeira RMN foi de 8 anos. Foi descrita a
5
5
Fig. 1 - Critérios de diagnóstico.
7
46%
1
7%
2
13%
3
20%
1
7%
1
7%
Cefaleias
Tonturas
Baixa Estatura
Macrocefalia
Linfagioma da Língua
Tumores
Fig. 2 - Outras manifestações clínicas.
61
Filipa Ventura, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Ricardo Maré, Jaime Rocha, Raquel Pinheiro, Laura Brito, Celeste Brito
Artigo Revisão
órbita com extensão intracraneana. Sete doentes realizaram mais do que uma RMN cerebral, cinco dos quais
apresentaram alterações relativamente à anterior (4 casos de UBO´s e o diagnóstico do astrocitoma do corpo
caloso).
Nº de doentes
5
QI
Classif.
≥130
Muito
Superior
120-129
Superior
110-119
Médio
superior
90-109
Médio
80-89
Médio
Inferior
70-79
Inferior
≤69
Muito
Inferior
4
DISCUSSÃO
3
5
2
1
2
0
1
2
1
1
r
erio
r
rior
o Inf
Muit
Infe
io
ferio
Méd
io In
Méd
or
rior
peri
io Su
Méd
Supe
Muit
o Su
peri
or
0
Fig. 3 - Avaliação cognitiva e psicológica.
presença de UBO´s em 9 casos, 2 casos de espessamento do nervo óptico, 1 caso de hidrocefalia externa
e, como anteriormente mencionado, um astrocitoma de
baixo grau do corpo caloso, uma displasia da grande
asa do esfenóide e um neurofibroma plexiforme da
Tendo em conta a sua heterogenicidade, a NF1
permanece uma doença enigmática e complexa. Embora com um padrão de transmissão autossómico dominante com penetrância completa tem uma expressão
extremamente variável3,10. Assim, a herança de uma
mutação específica não é preditiva de determinado
fenótipo7.
A análise do ADN do gene NF1 é complexa, não só
pelo grande tamanho do gene, como também pela
presença de pseudogenes e grande variedade de
anomalias possíveis1. Actualmente foram identificadas
cerca de 500 mutações diferentes no gene NF1,
nenhuma delas predominante10. Não está indicada a
sua realização por rotina, sendo o diagnóstico da NF1
baseado na clínica. Por vezes é difícil estabelecer um
diagnóstico clínico em idade precoce, na medida em
que são exigidos 2 dos critérios já referidos na Introdução e as manifestações clínicas surgem em idades
muito específicas (Quadro I).
Quadro I
FREQUÊNCIA E IDADE DE INÍCIO DAS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS MAJOR DA NF13
Manifestações clínicas
Frequência (%)
Idade de início
≥ 95
nascimento – 12 anos
85
3 anos – adolescência
≥ 95
> 7 anos
30 – 50
nascimento – 18 anos
15
nascimento – 7 anos
90 – 95
> 3 anos
2
nascimento – 3 anos
Displasia da asa do esfenóide
<1
congénita
T. maligno da bainha do n. periférico
3–5
5 – 75
Glioma cerebral
2–3
toda a vida
30 – 60
nascimento
4–8
nascimento
Manchas café com leite
Efélides
Neurofibroma
Neurofibromas plexiformes
Glioma óptico
Nódulos de Lisch
Pseudoartrose da tíbia
Dificuldades de aprendizagem
QI < 70
62
Neurofibromatose Tipo 1 na Consulta de Dermatologia Pediátrica do Hospital de São Marcos – Revisão de 16 Casos
Artigo Revisão
As manchas café com leite são geralmente a manifestação clínica inicial e mais frequente da doença,
presentes em 95% dos indivíduos. Muitas vezes presentes à nascença, vão aumentando em tamanho e número
nos primeiros 5 – 7 anos, podendo surgir em qualquer
parte do corpo com excepção das regiões palmares e
plantares2. Crianças com 6 ou mais manchas café com
leite, sem nenhum outro critério de diagnóstico, devem
ser seguidas como se tivessem NF1, uma vez que em
95% dos casos se vai confirmar a doença3,11. Por outro
lado, enfatizar que 1 ou 2 manchas café com leite estão
presentes em 10% da população geral3. Todos os doentes da nossa consulta tinham 6 ou mais manchas café
com leite, que foram o motivo de referência à consulta
em 15 deles.
Outras manifestações cutâneas são as efélides axilares ou inguinais, que surgem entre os 3 e os 5 anos, e os
neurofibromas cutâneos. Os neurofibromas cutâneos
são tumores benignos focais da bainha dos nervos
periféricos que geralmente surgem a partir dos 7 anos
de idade e, embora não estejam descritos casos de
degenerescência maligna, são causa de problemas
estéticos graves, dor e alteração da função sensitiva e
motora. Na nossa revisão, a frequência de efélides e
neurofibromas cutâneos está de acordo com o esperado
para uma população cuja idade média, à data do
estudo, é de 11 anos12.
Hemangiomas, manchas acrómicas e xantogranulomas juvenis são mais frequentemente observados em
doentes com NF1 do que na população em geral. Tem
sido sugerido que crianças com NF1 e xantogranuloma
juvenil têm um risco aumentado de leucemia mielóide crónica, associação não confirmada em estudos recentes13.
Os neurofibromas plexiformes são tumores difusos,
que podem envolver múltiplos ramos e plexos nervosos.
Por vezes infiltram os tecidos moles adjacentes e provo-
cam hipertrofia óssea. Embora possam surgir em
qualquer idade, existem dois períodos preferenciais – os
primeiros anos de vida e mais tarde, a puberdade; na
mulher acresce ainda os períodos de gravidez2. Uma das
crianças da nossa série, de 8 anos, tem um neurofibroma plexiforme da órbita com extensão intracraneana,
diagnosticado ao nascimento (Figs. 4 e 5). Em 3 a 5%
dos doentes com NF1, mais frequentemente entre os 20
e os 35 anos, a evolução dos neurofibromas plexiformes
é para o tumor maligno da bainha do nervo periférico,
muitas vezes multicêntricos e com metastização rápida
por via hematogénea12,14.
Fig. 4 - Neurofibroma plexiforme da órbita direita.
Fig. 5 - RMN cerebral: Neurofibroma plexiforme da órbita direita.
63
Filipa Ventura, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Ricardo Maré, Jaime Rocha, Raquel Pinheiro, Laura Brito, Celeste Brito
Artigo Revisão
Os tumores em geral, e particularmente os cerebrais,
são mais frequentes neste contexto. Identificaram-se 3
crianças com tumores: um neurofibroma plexiforme da
órbita (aos 6 meses), um astrocitoma do corpo caloso
(aos 5 anos) e um ganglioneuroma do mediastino (aos 2
anos).
O glioma do nervo óptico é o tumor do sistema
nervoso central mais frequente na NF1, ocorrendo em
cerca de 15% dos casos14,15. Curiosamente tem uma
evolução mais indolente do que quando surge na
população geral. Em 5% dos casos resultam em perda
da visão, proptose severa e/ou hidrocefalia, exigindo
tratamento cirúrgico14-16. Tratamento com vincristina e
carboplatina tem mostrado bons resultados1,14,17.
Os nódulos de Lisch ou hamartomas da íris geralmente surgem no início da adolescência e não têm
significado clínico.
Não foram diagnosticados casos de glioma óptico
nem nódulos de Lisch, o que está provavelmente relacionado com o número total de casos.
O envolvimento ósseo engloba um conjunto de
patologias que podem ter grande expressão e ser causa
de morbilidade importante. As lesões displásicas do
osso incluem anomalias vertebrais, displasia da mandíbula e do esfenóide e pseudoartrose ou displasia
congénita do osso, mais frequentemente da tíbia.
UBO's são focos de mielina vacuolizada que surgem
na RMN cerebral como áreas de hiperintensidade na
ponderação T219. Estas alterações são muito frequentes
nas crianças com NF1, variando numa frequência entre
43 e 93%2,19,20. Alguns autores propõem mesmo que a
presença de UBO's deveria ser considerada um critério
de diagnóstico adicional21. A sua natureza e benignidade são ainda controversos e parecem apresentar uma
evolução temporal na idade pediátrica, com um
desenvolvimento rápido em número e volume entre os 4
e os 10 anos de idade e regressão ulterior, sendo raros
após os 20 anos2. Foram detectados UBO's em 9 casos
(56%). Assim como o citado na literatura, não se constatou nenhuma associação entre a presença dos UBO's e
défices cognitivos19.
Outras alterações características da NF1 incluem a
macrocefalia e baixa estatura (comprimento/altura < 2
desvios padrão). Esta última parece mais pronunciada
nos casos hereditários e dentro destes, nos de herança
paterna2. Tem por vezes associada má progressão
ponderal22. A escoliose está presente em cerca de 10%
dos casos de NF11. A hipertensão afecta cerca de 4%
destes doentes e embora a hipertensão essencial seja a
causa mais frequente, também pode resultar de doença
renovascular, coarctação da aorta e tumores secretores
64
de substâncias vasoactivas2,23. A puberdade precoce é
também descrita como complicação da doença, de
forma isolada ou associada a outra patologia como os
tumores das vias ópticas e hipotalâmicos18. Quando o
doente tem convulsões, que ocorrem em cerca de 6%
dos casos, deve ser realizada RMN cerebral para excluir
um tumor intracraneano, embora a maioria das vezes
não se encontre nenhuma causa. Apesar das anomalias
electroencefalográficas serem frequentes, não está
indicada a realização de electroencefalograma por
rotina1,12. A epilepsia surge associada à NF1 em
percentagens muito inferiores às citadas para outras
síndromes neurocutâneas, como a Esclerose Tuberosa
ou a Hipomelanose de Ito.
Nestas crianças constatam-se, com maior frequência, a existência de atraso do desenvolvimento,
dificuldades de linguagem e de aprendizagem, défice de
atenção e hiperactividade, alterações na percepção
visuo-espacial, dificuldades na motricidade fina, na
planificação e execução de tarefas2. Não está contudo
ainda estabelecido um perfil neurocognitivo específico2,24. O QI médio encontrado de 89 encontra-se no
intervalo citado na literatura (entre 68-100)2.
Como conclusão, relevante parece o facto da idade
média da primeira manifestação clínica e do diagnóstico
ser inferior à idade escolar, permitindo uma avaliação
precoce destas crianças bem como a sua preparação,
dos pais e professores. Contribui-se assim para a
prevenção das dificuldades escolares e para a criação
de uma rede que facilite a promoção da auto-estima,
fácil relação interpares e integração social.
Salientar, ainda, o papel da Dermatologia no
diagnóstico da NF1. De facto, as manchas café com leite
estão presentes em todos os doentes e são o principal
motivo de referência à consulta, dado recorrente na
literatura. Em 81% dos doentes, pelo menos dois dos
critérios exigidos para a realização do diagnóstico são
manifestações cutâneas.
Propõe-se um protocolo para o seguimento das
crianças com o diagnóstico de NF1 (Fig. 6)3,19,25. A
realização da história clínica, história familiar e exame
objectivo pormenorizado são fundamentais. Este último
deve ser repetido anualmente. O exame oftalmológico
também deve ser repetido anualmente até aos 8 anos, e
de 2 em 2 anos, entre os 8 e os 18 anos de idade. A
realização de RMN cerebral parece-nos muito importante
não só pela detecção precoce de tumores cerebrais, sua
caracterização e follow-up, bem como, pelo diagnóstico
dos UBO's, tão característicos desta doença, e pela
Neurofibromatose Tipo 1 na Consulta de Dermatologia Pediátrica do Hospital de São Marcos – Revisão de 16 Casos
Artigo Revisão
Hx clínica
Hx familiar
Diagnóstico NF1
Aconselhamento genético
(ou suspeita)
(13 - 21 anos)
Exame físico
Desenvolvimento
estaturoponderal
Desenvolvimento
cognitivo e psicológico
Exame cutâneo
Exame do esqueleto
Exame neurológico
TA
…
Exame oftalmológico
Anual até 8 anos
2 - 2 anos
RMN cerebral
2 – 2 anos
se alterações
(UBOs, glioma óptico,
glioma cerebral,
neurofibroma plexiforme,…)
Variável
Anual
Fig. 6 - Protocolo proposto para o seguimento das crianças com o diagnóstico de NF1.
elevada prevalência de achados neurorradiológicos em
doentes assintomáticos. No caso de não se detectarem
alterações, deverá ser repetida de 2 em 2 anos. Quando
surgem alterações, a periodicidade é muito variável. Todos
os doentes com NF1 devem ser orientados para uma
consulta de Genética na adolescência. A avaliação e
seguimento de crianças com NF1 são complexos, devendo
ser multidisciplinares e dinâmicos.
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Artigo Revisão
CIRURGIA MICROGRÁFICA DE MOHS NO
DERMATOFIBROSARCOMA PROTUBERANS – EXPERIÊNCIA DO
CENTRO DE DERMATOLOGIA MÉDICO-CIRÚGICA DE LISBOA
Ricardo Coelho1, Goreti Catorze2, João Sousa2, José Labareda2, Isabel Viana2, Esmeralda Vale2, António Picoto2,
Olívia Bordalo e Sá2
1
Serviço de Dermatologia, Hospital Central de Faro; 2Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa,
ARS Lisboa e Vale do Tejo
RESUMO - Introdução: O Dermatofibrosarcoma protuberans (DFSP) é um tumor maligno raro, com importante
agressividade local e morbilidade associada. Os trabalhos publicados na literatura evidenciam o benefício da Cirurgia
Micrográfica de Mohs (CMM) como tratamento de primeira linha neste tipo de tumor. Objectivos: Pretende-se avaliar os
doentes submetidos a CMM para o tratamento do DFSP analisando dados epidemiológicos, clínicos e taxas de recidiva.
Material e Métodos: Foram revistos os registos clínicos dos 18 doentes submetidos a CMM como tratamento do DFSP no
Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa. Resultados: Dos 18 doentes tratados, 13 eram do sexo feminino e
5 do sexo masculino, com idade média de 45,4 anos (25 a 69 anos). O tronco era a localização mais frequente (9 casos)
seguido dos membros inferiores (5 casos). Metade dos doentes operados tinham sido submetidos a cirurgia
convencional prévia, tendo feito CMM por exérese incompleta ou recidiva tumoral após a primeira intervenção. Foi
necessário efectuar retalho cutâneo em 3 dos casos e enxerto em 4 casos. Dos 18 doentes operados, observaram-se 2
recidivas locais (24 e 41 meses depois) sem nova evidência de recidiva após reintervenção por CMM. Consideraram-se
tempos de follow-up mínimos de 8 meses, 13 doentes estão em follow-up há mais de 3 anos. Conclusão: Os resultados
obtidos neste estudo retrospectivo são similares aos de outros trabalhos equivalentes publicados na literatura que
evidenciam a CMM como tratamento de eleição do DFSP. Quando comparado com a exérese cirúrgica clássica, a CMM
permite uma elevada taxa de cura cirúrgica associada à conservação máxima de tecido não afectado.
PALAVRAS-CHAVE - Dermatofibrosarcoma protuberans; Cirurgia micrográfica de Mohs.
MOHS MICROGRAPHIC SURGERY FOR
DERMATOFIBROSARCOMA PROTUBERANS:
CENTRO DE DERMATOLOGIA MÉDICO-CIRÚRGICA EXPERIENCE
ABSTRACT - Background: Dermatofibrosarcoma protuberans (DFSP) is a relatively rare cutaneous malignancy with the
potential for significant local destruction and morbidity. There is growing evidence that Mohs Micrographic Surgery (MMS)
is the treatment of choice for DFSP. Objective: Our purpose is to determine epidemiologic and clinical data and local
recurrence rate of primary and recurrent DFSP after treatment with MMS. Methods: The records of 18 patients with primary
and recurrent DSFP treated with MMS at Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa were reviewed. Results: Of
the 18 patients with DFSP treated with MMS, 13 were female and 5 were male. The age at the time of definitive therapy
ranged from 25 to 69 years (mean, 45,4 years). The most common sites were the trunk (9 patients) and lower extremities (5
patients). Of the 18 patients in the study, 9 were referred to our department because of a recurrence after prior excision.
The average recurrence rate for DFSP after MMS in this series was 11,1% (2 patients), developed 24 and 41 months after
the initial Mohs procedure. These patients underwent a second Mohs excision and remained disease-free. Conclusions:
On the basis of our results and data compiled from the literature, MMS may be the treatment of choice for DFSP because of
its high cure rate and maximal conservation of tissue.
KEY-WORDS - Dermatofibrosarcoma protuberans; Mohs micrographic surgery.
69
Ricardo Coelho, Goreti Catorze, João Sousa, José Labareda, Isabel Viana, Esmeralda Vale, António Picoto, Olívia Bordalo e Sá
Artigo Revisão
Correspondência:
Dr. Ricardo Coelho
Rua dos Remédios à Lapa, 9
1200-782 Lisboa
E-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
O Dermatofibrosarcoma Protuberans (DFSP) é um
tumor raro (com incidência anual de 0,8 casos/milhão
habitantes) e de crescimento lento descrito inicialmente
em 1924 por Darier e Ferrand1, referindo-se a esta nova
entidade como “dermatofibroma progressivo e recorrente”. Existindo na época alguns casos isolados
descritos sob diferentes nomes, o termo DFSP foi pela
primeira vez designado por Hoffman2 em 1925. Trata-se
de um tumor fibrohistiocitário de malignidade intermédia com potencial para destruição local significativa,
impotência funcional e em casos raros metastização à
distância. Predomina no adulto jovem entre a segunda e
a quinta década de vida, sendo raro na infância. Localiza-se mais frequentemente no tronco ou extremidades
e caracteriza-se por uma placa ou nódulo infiltrado,
eritemato-acastanhado ou cor de pele, de crescimento
lento, assintomático e de consistência dura. A lesão sofre
posteriormente infiltração dos tecidos adjacentes
formando nódulos protuberantes. O tumor é localmente
agressivo mas raramente metastiza, estando descrita
uma taxa de metastização inferior a 0,3%, sendo o local
de metastização mais frequente o pulmão. Como
características histopatológicas, trata-se de um tumor
localizado na derme, com envolvimento frequente e
característico da hipoderme, em “favo-de-mel”,
caracterizado por uma proliferação mal delimitada e
monomorfa de células fusiformes com padrão
estoriforme. Estão descritas diversas variantes, alguma
com significado prognóstico: Pigmentada (tumor de
Bednar), Mixóide, Mióide, Esclerosante, Atrófica, com
células granulosas, com células gigantes multinucleadas
e Fibrosarcomatosa. Esta última variante, está associada
a pior prognóstico e considerável taxa de metastização à
distância (cerca de 20%). Um aspecto característico
desta entidade é a sua tendência para recorrência local
após a exérese cirúrgica. Tal, deve-se provavelmente a
um padrão de crescimento infiltrativo difuso e irregular
em profundidade. As recomendações recentes para o
tratamento cirúrgico do DFSP compreendem margens
de segurança não inferiores a 3 cm3-5. No entanto, tais
70
margens de segurança implicam defeitos cirúrgicos de
grande dimensão com consequentes sequelas de
carácter funcional e cosmético. Mesmo utilizando uma
grande margem de segurança, a taxa de recidiva é
caracteristicamente elevada, estando descritas taxas de
recidiva de 44 % para uma excisão conservadora e de
20% para excisões com margens superiores a 2cm4,5. O
tratamento convencional deste tumor é assim claramente insatisfatório e a Cirurgia Micrográfica de Mohs
(CMM) que permite um controlo preciso das margens
cirúrgicas impôs-se como método terapêutico de eleição
em muitas unidades a nível internacional. É o caso do
Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa,
onde esta técnica é utilizada desde 1980, sendo o único
centro a nível nacional onde esta técnica cirúrgica é
efectuada rotineiramente.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi elaborado um estudo retrospectivo com o objectivo de avaliar os doentes com DFSP tratados por CMM no
Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa
entre 1989-2006. Como método de trabalho, foram
revistos todos os processos clínicos com vista a avaliar
parâmetros demográficos (sexo e idade), clínicos (localização, diâmetro, tempo de evolução e diagnóstico
clínico estabelecido), cirúrgicos (número de estádios de
Mohs e forma de encerramento) e seguimento (tempo de
seguimento, existência de recidiva ou metastização).
Foram incluídos no estudo, doentes com períodos de
seguimento mínimo de 12 meses.
RESULTADOS
Entre 1989 e 2006 foram tratados por Cirurgia Micrográfica de Mohs 18 doentes com Dermatofibrosarcoma
protuberans, 13 do sexo feminino e 5 do sexo masculino
(Fig. 1). A idade dos doentes estava compreendida entre os
25 e os 69 anos, com uma idade média de 45,4 anos. O
tumor localizava-se mais frequentemente no tronco (9
Cirurgia Micrográfica de Mohs no Dermatofibrosarcoma Protuberans – Experiência do Centro de Dermatologia Médico-Cirúgica de Lisboa
Artigo Revisão
Tempo de evolução (meses)
13
72%
160
140
120
100
80
60
40
20
0
5
28%
Sexo Masculino
Sexo Feminino
Fig. 1 - Sexo dos doentes da amostra.
doentes), seguindo-se o membro inferior (5 doentes), o
membro superior (3 doentes) e a cabeça (1 doente). O
diâmetro variava entre 1x1cm e os 10x7cm com um
diâmetro médio de 3,8x2,9cm. O Quadro I ilustra os
diagnósticos clínicos colocados na altura da primeira
observação do doente. O tempo de evolução da lesão variou entre os 4 meses e os 15 anos (Fig. 2), para um tempo
de evolução médio de 38 meses. Em metade dos casos, a
Cirurgia Micrográfica de Mohs constituiu o tratamento
primário da lesão, na outra metade, constituiu o tratamento de recidiva após cirurgia convencional. Foram
necessários entre 1 e 6 estadios de Mohs (média de 3). Foi
possível o encerramento directo do defeito operatório em
Fig. 2 - Tempo de evolução do tumor (meses).
11 doentes, foi utilizado um enxerto cutâneo em 4 e um
retalho em 3 doentes (Fig. 3). Quanto ao follow-up dos
doentes incluídos neste estudo, refere-se que 5 doentes
estão em seguimento há menos de 36 meses; durante este
período de seguimento, foram observados dois doentes
com recidiva da lesão, um dos quais aos 24 meses e outro
aos 41 meses. Dos 18 doentes tratados, foi constatada
metastização à distância em apenas um doente.
11
61%
3
17%
Quadro I
DIAGNÓSTICOS CLÍNICOS ESTABELECIDOS
Dermatofibrosarcoma protuberans
6
Histiocitofibroma
4
Quisto epidermóide
3
Linfoma
2
Morfeia
1
Sem diagnóstico clínico
2
4
22%
directo
retalho
enxerto
Fig. 3 - Forma de encerramento do defeito cirúrgico.
71
Ricardo Coelho, Goreti Catorze, João Sousa, José Labareda, Isabel Viana, Esmeralda Vale, António Picoto, Olívia Bordalo e Sá
Artigo Revisão
DISCUSSÃO
O DFSP é um tumor maligno raro que afecta caracteristicamente doentes entre a 2ª e a 5ª décadas de vida. A
idade média na nossa série foi de 45 anos, consistente
com as outras séries publicadas na literatura. Ao
contrário da maioria das séries que reportam um
predomínio masculino, 72% dos nossos doentes eram
do sexo feminino. O facto de ter sido possível efectuar
encerramento directo em 61% dos casos poderá ser
indicador de um menor defeito resultante da CMM
comparativamente à cirurgia clássica. Ficou constatado
um elevado tempo de evolução do tumor: entre 4 meses
e 15 anos, para um tempo de evolução médio superior a
3 anos, dados consistentes com outros trabalhos publicados6,7. Este facto evidencia alguma tendência por
parte dos doentes para negligenciar este tumor, provavelmente por serem lesões indolentes e de crescimento
lento o que explica as dimensões consideráveis que
podem atingir.
O tratamento do DFSP é cirúrgico, existindo escassa
experiência com a utilização da radioterapia3,10,11. A
quimioterapia deve ser reservada apenas para doença
metastática12,13. O DFSP tem potencial para causar
significativa destruição tecidular se não tratado
precocemente e taxas de recidivas muito elevadas foram
citadas frequentemente quando são utilizadas margens
mais estreitas. O Quadro II ilustra os trabalhos publicados
na literatura em que foram utilizadas margens
conservadoras. Taylor e Helwig8 reportaram uma taxa de
recidiva de 49% em 98 casos, Hadju9 53% após excisão
de 119 casos, Pack e Tabah6 obtiveram 24% de recidiva. A
taxa de recidiva total foi de 46,8%, para um período de
seguimento entre 9 meses e 34 anos. De forma a permitir
maiores taxas de cura oncológica, vários autores têm
recomendado excisões alargadas de pelo menos 2cm. O
Quadro III ilustra os vários trabalhos publicados em que o
DFSP foi tratado com margens cirúrgicas alargados. Do
conjunto das várias séries, a taxa de recidiva foi de 20%
(100 doentes com recidiva local para um total de 489
doentes). Sendo a taxa de recidiva para margens
conservadoras consideravelmente mais elevada do que a
exérese com margens alargadas, em termos práticos, tal
nem sempre é possível, particularmente quando o tumor
envolve a face ou extremidades. Por outro lado, o DFSP
tem muitas vezes áreas de extensão microscópicas
assimétricas em profundidade, e desta forma torna-se
necessária a excisão de grande quantidade de tecido
normal existindo ainda assim uma probabilidade elevada
de obter uma exérese incompleta.
O impacto cosmético e funcional de defeitos
cirúrgicos de grandes dimensões levou a que a Cirurgia
Micrográfica de Mohs fosse utilizada como método
terapêutico neste tipo de tumor. O Quadro IV esquematiza os trabalhos publicados respeitantes à CMM no
tratamento do DFSP. Nos vários estudos publicados,
foram assim detectados 4 doentes com recidiva local,
correspondendo a uma taxa de recidiva de 2,6%. Neste
estudo, foram documentados dois doentes com recidiva,
um correspondendo a uma variante histológica rara:
DFSP fibrosarcomatoso, que está associado a uma taxa
de recidiva de 75% e de metastização de 20%. Neste
caso, o tumor recidivou aos 41 meses, tendo-se detectado metástases pulmonares aos 6 anos de seguimento,
tendo o doente sido transferido para o Instituto Português de Oncologia. O outro caso de recidiva foi
referente a uma CMM de uma lesão já previamente
tratada com cirurgia convencional. A recidiva foi objecti-
Quadro II
TRABALHOS PUBLICADOS RELATIVOS A DFSP TRATADOS COM EXCISÕES CONSERVADORAS
Autor
Ano
Nº doentes
Follow-up (anos)
Nº doentes c/ recidiva
Taxa recidiva (%)
1979
119
ND
64
53%
1984
15
9 M-23
8
53%
Roses et al
1986
48
>3
16
33%
Rutgers et al13
1992
19
7-34
8
42%
Mark et al
1993
15
3-16
9
60%
Koh et al19
1995
19
>3
5
26%
-
235
-
110
46,8%
9
Hadju
Barnes, Coleman,
7
Johnson17
5
18
Total
ND: não disponível.
72
Cirurgia Micrográfica de Mohs no Dermatofibrosarcoma Protuberans – Experiência do Centro de Dermatologia Médico-Cirúgica de Lisboa
Artigo Revisão
Quadro III
TRABALHOS PUBLICADOS RELATIVOS A DFSP TRATADOS
COM EXCISÕES ALARGADAS (SUPERIORES A 2 CM)
Autor
Ano
Nº doentes
Follow-up (anos)
Nº doentes c/ recidiva
Taxa recidiva (%)
1962
98
1 – 17
48
49%
1966
21
>5
7
33%
1983
15
4 – 13
0
0%
1985
13
1–7
3
23%
1985
96
1 – 15
6
6%
Roses et al5
1986
21
>3
5
24%
Chattopadhyay,
21
C
Singh,Arunabh
1986
10
5–7
6
60%
Rutgers et al13
1992
14
2 – 28
0
0%
1993
14
1–5
0
0%
Mark et al18
1993
8
4 – 13
1
13%
Gloster, Harris,
Roenigk23
1995
39
1M – 14
5
13%
-
349
-
81
23,2%
8
Taylor and Helwig
Burkhardt et al10
Bendix-Hansen et al
Waldermann and
W
Hagedorn12
Petoin et al
20
Brabant et al
22
Total
3
Quadro IV
TRABALHOS PUBLICADOS RELATIVOS A DFSP TRATADOS COM CMM
Autor
Ano
Nº doentes
Follow-up (anos)
Nº doentes c/ recidiva
Taxa recidiva (%)
Mikhail and Lynn24
1978
2
> 60
0
0%
1978
7
> 60
0
0%
1985
4
> 60
0
0%
1988
10
15 - 91
0
0%
Parker and Zitelli28
1995
20
3 - 105
0
0%
Gloster, Harris,
23
G
Roenigk
1995
15
5 - 96
1
7%
Dawes and Hanke7
1996
24
ND
2
8%
1997
50
3 - 160
1
2%
2002
20
4 - 216
0
0%
-
152
-
4
2,6%
18
9 - 144
2
11%
25
Mohs
Robinson26
Hobbs et al
27
Ratner et al
29
Nouri et al30
Total
Presente estudo
ND: não disponível.
vada 24 meses após a cirurgia tendo-se optado por
nova excisão com CMM sem evidência de recorrência
aos 3 anos de seguimento. Destacou-se nesta série de
doentes a elevada percen-tagem (50%) de doentes em
que a CMM constituiu o tratamento da recidiva após
cirúrgica convencional. Tal poderá dever-se ao facto do
73
Ricardo Coelho, Goreti Catorze, João Sousa, José Labareda, Isabel Viana, Esmeralda Vale, António Picoto, Olívia Bordalo e Sá
Artigo Revisão
Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa ser
o único centro a nível nacional a fazer CMM, recebendo
portanto doentes oriundos de outros Hospitais já
previamente tratados por cirurgia convencional. A
presença de fibrose secundária a cirurgias prévias
dificulta a apreciação das margens cirúrgicas na CMM,
o que explica que grande parte das lesões recidivadas
após CMM seja recidiva após cirurgia convencional.
Também a avaliação das margens pode ser particularmente difícil nos casos em que as células malignas
são escassas e assemelham-se a fibroblastos normais. A
imunomarcação rápida com CD34 (que é selectivamente expresso pelo DFSP) optimiza o controlo das margens
da CMM permitindo detectar células neoplásicas que
poderiam não ser detectadas.
O espaço de tempo entre a cirurgia e a objectivação da
recidiva está de acordo com as outras séries publicadas,
estando descrita que a maioria das recidivas ocorre nos
primeiros 3 anos. Taylor e Helwig8 reportam que 75% dos
tumores recidivam nos primeiros 3 anos, McPeak et al4
relataram que 80% das suas recidivas ocorreram nos
primeiros 2 anos. Existem na literatura casos em que a
recidiva ocorreu entre os 19 e os 23 anos mais tarde6,8,14.
Este facto leva a que se considere com muita prudência a
análise de recidivas dos doentes em que os tempos de
follow-up são inferiores a 3 anos. No que respeita à
presença de metástases, assistiu-se a apenas um doente
com DFSP de variante fibrosarcomatosa com metástases
pulmonares 6 anos após a cirurgia, o que está de acordo
com a literatura que reporta uma taxa de metastização e
mortalidade muito baixa, à excepção desta variante
histológica bastante mais agressiva.
Como conclusão, nesta série de doentes, o DFSP
tratado por CMM foi mais frequente no sexo feminino
(13:5) e no adulto / adulto jovem, teve localização preferencial no tronco e membros inferiores, elevado tempo
de evolução (em média de 38 meses) e elevada proporção de tratamento de tumores recidivados. No que
respeita ao seguimento, foi objectivada recidiva tumoral
em 2 doentes (11%), um dos doentes com variante
fibrosarcomatosa que sofreu metastização pulmonar
posterior. Como limitações deste trabalho, considera-se
a dimensão reduzida da amostra (consequência de se
tratar de um tumor raro) e em 5 doentes existirem tempos de seguimento inferiores a 3 anos e é nestes casos
difícil avaliar a existência de uma real cura cirúrgica. Os
autores consideram que este trabalho vem de encontro a
outros já publicados e que demonstram que a CMM
permite uma elevada taxa de cura cirúrgica associada à
conservação máxima de tecido não afectado e desta
forma a CMM é o tratamento de eleição do DFSP.
74
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75
Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 77-87 (2009)
Artigo de Revisão Bibliográfica
NOVIDADES EM DERMATOPATOLOGIA 2008
Luís Soares de Almeida
Clínica Dermatológica Universitária de Lisboa, Hospital de Santa Maria
RESUMO - Foi efectuada uma pesquisa bibliográfica dos artigos mais importantes de Dermatopatologia, publicados
nos anos 2007 e 2008. As principais revistas de Dermatopatologia são o Journal Cuthaneous Pathology e o The
American Journal of Dermatopathology.
Os artigos foram agrupados em grandes temas: lesões melanocíticas, linfomas e pseudolinfomas, tatuagens e
carcinomas, carcinoma de Merkel e vírus, tumores vasculares, sarcomas, psoríase, doenças auto-imunes, toxidermias,
reacções pós-transplante, curiosidades, novas técnicas em dermatopatologia, novidades em Portugal e futuro.
Termina-se sugerindo a consulta da revista Dermatopathology: practical and conceptual, editada por B. Ackerman e A.
Böer, de acesso exclusivo on-line através do site www.derm101.com.
PALAVRAS-CHAVE - Histopatologia cutânea; Dermatopatologia.
NEWS IN DERMATOPATHOLOGY 2008
ABSTRACT - A bibliographic research in Dermatopathology was conducted, the selected papers were published during
2007 and 2008. The two most important journals in this field are the Journal Cuthaneous Pathology and The American
Journal of Dermatopathology.
The selected main topics are: melanocytic lesions, lymphomas and pseudo-lymphomas, tattoos and carcinomas, Merkel
carcinoma and virus, vascular tumors, sarcomas, psoriasis, auto-immune diseases, drug reactions, graft versus host
reactions, curiosities, new techniques in dermatopathology, news from Portugal and finally the future.
At the end a proposal to read the on-line Dermatopathology: practical and conceptual, edited by B. Ackerman and A. Böer,
on the site www.derm101.com
KEY-WORDS - Skin Pathology; Dermatopathology.
Correspondência:
Dr. Luís Soares de Almeida
Serviço de Dermatologia
Hospital de Santa Maria
Avenida Professor Egas Moniz
1649-035 Lisboa
Tel.: 217805197
Fax: 217954447
E-mail: [email protected]
77
Luís Soares de Almeida
Artigo de Revisão Bibliográfica
NOVIDADES EM DERMATOPATOLOGIA 2008
A pesquisa dos artigos mais recentes publicados no
campo da Dermatopatologia incidiu nos anos 2007 e
2008 e foi realizada com especial ênfase em artigos de
correlação anátomo-clínica. As revistas mais importantes de Histopatologia cutânea são o Journal Cuthaneous
Pathology que é o órgão oficial da American Society of
Dermatopathology e o The American Journal of Dermatopathology que é a publicação oficial da International
Society of Dermatopathology, grupo a que pertencem a
maior parte dos dermatopatologistas Portugueses.
Os artigos foram agrupados em grandes temas, tais
como: lesões melanocíticas, linfomas e pseudolinfomas,
tatuagens e carcinomas, carcinoma de Merkel e vírus,
tumores vasculares, sarcomas, psoríase, doenças autoimunes, toxidermias, reacções pós-transplante, curiosidades, novas técnicas em dermatopatologia, novidades
em Portugal e futuro.
LESÕES MELANOCÍTICAS
As lesões melanocíticas benignas têm características
histológicas atípicas quando ocorrem em localizações
anatómicas especiais. G. Hosler1 faz uma revisão dos
nevos que ocorrem nessas localizações, conforme o
Quadro I.
Quadro I
LOCALIZAÇÕES ANATÓMICAS ESPECIAIS
PARA NEVOS
Couro cabeludo
Conjuntiva
Pavilhão auricular
Axila
Mama
Umbigo
Virilhas
Genitais
Região acral
A extensão anatómica subclínica das lesões melanocíticas obriga a que se dê uma margem de segurança na
sua excisão cirúrgica. Este assunto é de particular
importância quando os tumores se localizam na cabeça
ou no pescoço, pela necessidade de se poupar tecido. C.
Hazan2 fez uma análise retrospectiva de 117 casos e
observou que a margem de segurança média no lêntigo
maligno foi de 7,1mm e no caso de lêntigo maligno
melanoma foi de 10,3mm.
R. Scolyer, da Sidney Melanoma Unit, estudou um
grupo de 124 melanomas subungueais3. Concluiu que a
78
idade média dos doentes no momento do diagnóstico
foi de 59 anos, o melanoma ocorreu 24% das vezes no
dedo grande do pé e estava ulcerado em 33% dos casos.
Pela classificação do American Joint Committee on
Cancer (AJCC) os doentes foram separados 9% no grau
0, 14% no grau I, 41% no grau II, 32% no grau III e 4% no
grau IV. Dos subtipos observados destaca-se o melanoma acral em 66%, o melanoma nodular em 25% e o
melanoma desmoplásico em 7% dos doentes. 79%
tinham nível de Clark IV ou V, a espessura média observada foi de 3,2mm e o número de mitoses foi de 3 por
mm². Foi efectuada biopsia do gânglio sentinela (SLNB)
em 29 doentes, tendo sido positiva em 7 destes.
C. Bastian, da Universidade da Califórnia, estudou
as mutações BRAF e NRAS em 302 melanomas.
Observou que as mutações BRAF ocorrem mais frequentemente nos doentes com idade inferior a 55 anos,
estão associadas com aspectos morfológicos especiais
em H&E e metastizam habitualmente para os gânglios
linfáticos regionais. Esta informação poderá ser útil na
separação de doentes com melanoma, em subgrupos
com padrões diferentes de metastização, com prognósticos diferentes e também na possível utilização de novas
terapêuticas geneticamente orientadas4.
A biópsia do gânglio sentinela tem sido realizada por
rotina em melanomas com espessuras entre 1 e 4mm. O
seu maior interesse parece residir no estadiamento de
melanomas, apesar de se discutir qual o seu interesse
terapêutico. J. Meirion Thomas, cirurgião do Royal
Marsden Hospital em Londres, afirma que a realização
de SLNB em melanomas é desnecessária pois as micrometástases ganglionares com valor clínico e prognóstico
5,6
podem ser identificadas por ecografia .
Eun Kwon e A. Rosenberg, dermatologistas em
Cleveland, nos USA, fizeram uma revisão da literatura
sobre a utilidade da realização de biópsia de gânglio
sentinela, para o diagnóstico diferencial de lesões
melanocíticas de difícil interpretação, nomeadamente
entre nevos de Spitz atípicos e melanoma maligno7. Já
em 2003 Phil LeBoit se interrogava sobre qual o
significado de se observarem melanócitos na cápsula de
um gânglio, pois não existe experiência de biopsias
ganglionares seriadas em doentes com nevos de Spitz8.
Nesse mesmo ano Biddle questionava-se sobre o
significado diagnóstico da observação de ninhos de
células névicas no parênquima do gânglio9. Em 2008
Busam volta a questionar-se sobre a validade e utilidade
da realização de SLNB no diagnóstico diferencial de
lesões melanocíticas de potencial biológico indeterminado10,11 e Brennick chama a atenção para a ocorrência de falsos positivos12. Não resistimos a citar M. Wick
Novidades em Dermatopatologia – 2008
Artigo de Revisão Bibliográfica
quando afirma em relação a este tema que “…compound incertainty with more uncertainty is never a good
idea…”13.
LINFOMAS E PSEUDOLINFOMAS
Luís Requena e Omar Sangueza descreveram uma
nova variante clínico-patológica de micose fungóide
denominada micose fungóide anetodérmica14.
K. Reddy faz uma revisão dos possíveis imitadores
histológicos de micose fungóide15 representados no
Qua-dro II.
Quadro II
IMITADORES HISTOLÓGICOS
DE MICOSE FUNGÓIDE
Pseudolinfoma a anti-epilépticos
Reacção a picada de artrópodes
Sífilis secundária
Dermite de contacto linfomatóide
Nódulos escabióticos
Reticulóide actínico
Tinhas superficiais (PAS)
Líquen escleroso
Líquen estriado
Queratose liquenóide benigna
Dermite purpúrica pigmentada
Lúpus eritematoso discóide
Fase inflamatória de vitíligo
Regressão de melanoma
Por definição uma neoplasia é causada pela proliferação de um clone particular de células. Cynthia Magro
efectuou um estudo de monoclonalidade do receptor
beta de células T, num grupo variado de infiltrados
linfocitários T16. Observou monoclonalidade em variadas dermatoses benignas conforme o Quadro III.
Quadro III
MONOCLONALIDADE PARA RECEPTOR
DE CÉLULAS T
Papulose linfomatóide 1/1
Parapsoríase em grandes placas 5/5
Dermites purpuricas 3/11
Pitíriase liquenóide 4/13
DCA por fármacos: 5/16
Lúpus eritematoso: 1/2
C. Massone e L. Cerroni de Graz, detectaram clonalidade T em 36 de 67 biopsias (54%) de micose fungóide,
em estádios iniciais, e concluíram que nem o fenotipo
citotóxico, nem a presença de rearranjo monoclonal
para receptor gama de células T, têm qualquer valor
prognóstico neste subgrupo de doentes com micose fungóide17.
A presença de um infiltrado pleomórfico de grandes
linfócitos CD30+ pode ocorrer num largo espectro de
patologias que vão desde a papulose linfomatóide
passando pelo Linfoma primário cutâneo de grandes
células até à infiltração cutânea secundária a um
Linfoma sistémico de grandes células CD30, sendo
necessário efectuar correlação clínico-patológica para
se obter um diagnóstico definitivo. Cerroni estudou o
espectro morfológico do Linfoma cutâneo primário
anaplásico de grandes células CD30+18, em 66 biopsias
realizadas em 47 doentes. A variante comum foi observada em 40% dos casos, a variante inflamatória (com
eosinófilos e/ou neutrófilos) em 26%, que corresponderam a 15 casos e, por fim, a variante linfohistiocitica
em 11 casos. A morfologia celular de grandes células
anaplásicas ocorreu em 33% dos casos, quase tantas
vezes como o tipo celular de grandes células pleomórficas observado em 36% dos casos e por fim as células
de pequeno e médio tamanho observadas em 26% dos
casos. Descreveram também dois casos de linfoma
CD30+ com células em anel de sinete.
Betina Werner, brasileira de Curitiba, a estagiar em
Graz com L. Cerroni, estudou 28 casos de infiltrados
densos de grandes linfócitos CD30+ que simulavam
linfomas19, mas estavam presentes em dermatoses
benignas (ver Quadro IV).
Quadro IV
PSEUDOLINFOMAS CD30
Nódulos do mugidor: 8
Infecção herpética: 7
Toxidermia linfomatóide: 3
Molusco contagioso: 3
Nódulo escabiótico: 2
Outras dermatoses: 5
Na tentativa de se uniformizar os critérios diagnósticos, de estadiamento e de tratamento das 3 variedades
mais comuns de linfoma B cutâneo primário, que
representam cerca de 20 a 25% do total de linfomas
cutâneos primários, reuniram-se a European Organization for Research and Treatment for Cutaneous
Lymphoma (EORTC) e a International Society for
Cutaneous Lymphoma (ISCL). Concluíram que o linfoma
da zona marginal, o linfoma centro-folicular e o linfoma
de grandes células da perna do idoso têm especificidades clínicas, histológicas, de imunohistoquímica
e até prognósticas20. A sobrevida aos 5 anos, dos 2
primeiros grupos é igual ou superior a 95% enquanto
que no linfoma B de grandes células do idoso, tipo
perna, essa sobrevida é apenas de 50%. É de salientar
que do painel de autores desta reunião muitos já profe79
Luís Soares de Almeida
Artigo de Revisão Bibliográfica
riram conferências em Portugal como Lorenzo Cerroni,
Nicola Pimpinelli, Sean Whitaker e Rein Willenze.
Num exemplar de Janeiro de 2008, da revista Nature, foi publicado um artigo de R. Chiarle21, sobre o papel
do ALK (Anaplastic Lymphoma Kinase) na patogénese de
cancros, principalmente em linfomas CD30, com o seu
possível interesse no estudo de terapêuticas que o utilizem como alvo assim como pelo seu poder antigénico
para o fabrico de vacinas.
F. Rongioletti, de Génova, publicou uma exaustiva
revisão do espectro histológico e patológico das dermatoses associadas com as gamapatias monoclonais22.
Quadro V
TUMORES VASCULARES
DESCRITOS RECENTEMENTE
Hemangioma elastótico adquirido33
Hemangioma simplástico34
35
CEAN: Nódulo angiomatoso epitelióide cutâneo
Angiomatose cutaneo-visceral com trombocitopénia
36
(Linfangioendotelioma multifocal)
Lesão vascular atípica pós-radioterapia37-40
RICH: Hemangiomas congénitos de rápida involução41 (GLUT1-, Perl's+)
NICH: Hemangiomas congénitos não involutivos42 (GLUT1-, WT1-) =
43,44
Malformação vascular [(DD com Hemangioma infantil (GLUT1+, WT1+)]
TATUAGENS E CARCINOMAS
SARCOMAS
Vários artigos descrevem a ocorrência de queratoacantomas, em tatuagens, na área do corante encarnado23
assim como de carcinomas espinocelulares eruptivos
sobre tatuagem24.
CARCINOMA DE MERKEL E VÍRUS
Desde 1971 que a infecção urinária causada por
poliomavírus humanos BK e JC foi reconhecida como
causa de nefropatia em transplantados renais e de
leucoencefalopatia multifocal progressiva em doentes
imunosuprimidos, respectivamente.
Num exemplar de Fevereiro de 2008, da revista
Science, foi publicado por R. Viscidi um editorial25,
baseado na descrição de Feng da associação entre um
poliomavirus humano e o carcinoma de Merkel26.
TUMORES VASCULARES
Eduardo Calonje publica um fenómeno até hoje nunca descrito de um Sarcoma de Kaposi intravascular27.
Demonstra este fenómeno com imagens da marcação
por actina de músculo liso da parede vascular, rodeando
um nódulo de células, com marcação nuclear positiva
para Herpes vírus humano tipo 8, que sabemos ser
especifica de Sarcoma de Kaposi. Esta marcação já é
usada por rotina na maioria dos Laboratórios de
Dermatopatologia pela sua grande fiabilidade, tendo
sido descrita em 1996 por Kemény28 e Cathomas29-31.
E. Calonje publicou na Histopathology, uma revisão
sobre tumores vasculares cutâneos32. No Quadro V podemos ver algumas das entidades vasculares recentemente
descritas.
80
As mutações genéticas podem ser muito úteis como
ferramentas diagnósticas no caso de sarcomas da pele e
de tecidos moles.
O. Sanmartin do I.P.O. de Valência fez uma revisão de
Dermatofibrosarcoma protuberans45 explicando que a
região de rotura da translocação t (17;22) afecta
normalmente o exon 2 do gene do factor de crescimento
derivado de plaquetas beta (PDGFB), localizado no
cromossoma 22, que se funde com o gene da cadeia
alfa 1 do colagéneo I (COL1A1) localizado no cromosoma 17. A proteína de fusão daqui resultante induz a
activação do receptor PDGFBR. Esta poderá ser a
explicação para a acção terapêutica dos inibidores deste
receptor como o Imatinib (inibidor da tirosinase).
No caso do diagnóstico do Sarcoma de células claras
a característica translocação t (12;22)(q13;q12) é
confirmada pela demonstração do rearranjo genético
EWSE1 por fluorescência por hibridização in situ (FISH) e
detecção da fusão EWS/ATF1 por PCR-transcriptase
reversa (RT-PCR)46.
PSORÍASE
A dificuldade do diagnóstico diferencial histológico
entre psoríase palmo-plantar e eczema, localizado às
palmas e plantas, é demonstrado numa publicação de
Aydin47 que comparou biopsias de 17 doentes com
psoríase e de 25 com eczema. De todas as variáveis
histológicas estudadas apenas a presença de múltiplos
focos de paraqueratose dispostos verticalmente, alternando com ortohiperqueratose, teve valor estatístico
significativo, no sentido da psoríase.
Betina Werner estudou as variações histológicas e imu-
Novidades em Dermatopatologia – 2008
Artigo de Revisão Bibliográfica
nohistoquímicas das placas de 17 doentes com psoríase
vulgar, antes do início da terapêutica com acitretina e 4
meses depois do início da terapêutica48. Observou uma
diminuição acentuada da acantose, mas sem redução da
espessura da epiderme suprapapilar. Também observou
uma grande diminuição do número de mitoses dos
queratinócitos, evidenciada pela marcação com Ki-67, assim como uma acentuada redução no número de células
de Langerhans intraepiteliais, por marcação com CD1a.
DOENÇAS AUTO-IMUNES
D. Lipsker e JH Saurat publicaram na Dermatology, um
artigo sobre os infiltrados neutrofílicos em doentes com
Lúpus eritematoso49. Separam 2 grupos de doenças, um
em que predominam os auto-anticorpos e o infiltrado é
linfocitário que denominam de auto-imunes, como o
Lúpus, a artrite reumatóide e o Síndrome de Sjogren e
outro grupo em que predominam os factores inflamatórios locais e o infiltrado inflamatório é predominantemente neutrofílico, como a doença de Still do adulto, a
doença de Crohn e a doença de Behçet, com vários
quadros de sobreposição e em que de comum têm
fenómenos de vasculite.
G. Mendese fez um estudo das características histológicas das pápulas de Gottron50, raramente biopsadas,
mas que podem ser úteis na ajuda ao diagnóstico de
dermatomiosite.
TOXIDERMIAS
O Síndrome de Sweet histiocitóide tem um infiltrado
de células neutrofílicas imaturas, CD68+ e MPO+
(Mieloperoxidase) e foi descrito recentemente por L.
Requena51. Angela Wu publica um caso desta variante de
Sweet surgido após toma de Co-Trimoxazol52.
São conhecidas as dermatoses mais associadas com
a toma de inibidores da tirosinase como sejam a
erupção folicular pustulosa aguda (70%), a dermatose
xerótica generalizada (30%) e as lesões do sulco ungueal
(15%). J. Lübbe publica imagens de espongiose neutrofílica em doente com dermatose xerótica generalizada,
após toma de Erlotinib (Tarceva®)53.
Hashimoto descreve mais dois casos de paniculite
lobular secundária a injecções de Copaxone®, usado
por neurologistas no tratamento da esclerose múltipla54.
P. Puri descreve-nos a localização da hidroxicloroquina em melanófagos, na derme papilar, em dois
doentes com hiperpigmentação secundária à toma des-
te anti-malárico55.
O uso de substâncias exógenas injectadas com
finalidades cosméticas e reconstrutivas tem aumentado
o número de reacções cutâneas a estes produtos. O
desconhecimento pelos doentes de qual o produto que
lhe foi injectado, o aparecimento de lesões cutâneas à
distância do local das infiltrações e o intervalo de tempo
entre o procedimento e as reacções faz com que por
vezes o doente não relacione a causa com o efeito.
Ophelia Dadzie faz uma descrição detalhada de todas
as reacções histológicas causadas pelos novos fillers56.
EMLA é um anestésico local em creme, que pode
provocar alterações histológicas, como por exemplo
clivagem dermo-epidérmica. Sylvie Fraitag57 estudou
essas alterações em 13 doentes e concluiu que a sua
utilização deve ser evitada na realização de biopsias em
algumas dermatoses (Quadro VI).
Quadro VI
DERMATOSES EM QUE DEVE SER EVITADO O
USO DE EMLA, NA REALIZAÇÃO DE BIOPSIAS
Doenças bolhosas
Dermites de interface
Colagenoses
Doenças por depósitos
REACÇÕES POS-TRANSPLANTES
O transplante alogénico de tecidos (CTA) é efectuado
recentemente na substituição de membros e na reconstrução de defeitos teciduais, podendo desencadear
reacção imunológica de rejeição. Foi realizada na
Corunha uma reunião de consenso e proposta uma
classificação de trabalho, intitulada Banff CTA-07, que
separa a rejeição cutânea em 5 grupos, de acordo com
a intensidade do infiltrado inflamatório presente, o
envolvimento da epiderme e dos anexos em relação com
a apoptose de queratinócitos, a disqueratose e a
necrose. Foi publicada por Cendales, Kanitakis e al no
American Journal of Transplantation58.
Andrew Carlson publicou o caso de um doente de 47
anos, transplantado ao rim e pâncreas, 6 anos antes do
aparecimento de múltiplos nódulos nas mãos e punhos,
cujas biopsias revelaram tratar-se de granulomas sarcóides59.
CURIOSIDADES
Jane Manonukul estudou uma tailandesa de 14 anos,
83
Luís Soares de Almeida
Artigo de Revisão Bibliográfica
que sangrava esporadicamente do couro cabeludo e
das palmas. Num dos episódios de hemorragia efectuou
biopsias tendo descoberto a presença de eritrócitos em
fendas intradérmicas, não tapetadas por células endoteliais60. Notou que o sangue drenava directamente para
a superfície da epiderme ou para os folículos pilosos e
não através dos conductos sudoríparos, como o seu
nome, hematidrose, parece erradamente descrever.
Lauria e Lombardi, demonstram a utilidade da realização de biopsias cutâneas no estudo de neuropatias
periféricas, nomeadamente em doentes diabéticos61. As
biopsias são efectuadas com um punção de 3mm, 20cm
acima do maléolo externo. Após imunomarcação com
um marcador neuronal, PGP 9.5, contam-se o número de
fibras nervosas intradérmicas que atravessam a membrana basal, atingindo assim a epiderme. A diminuição
do número destas fibras nervosas, está directamente
correlacionado com o agravamento da neuropatia.
NOVAS TÉCNICAS EM DERMATOPATOLOGIA
Um laboratório moderno de Dermatopatologia tem
necessidade de recorrer a novas técnicas usadas como
ferramentas de ajuda à realização de diagnósticos.
Cada vez mais numerosas, complexas e dispendiosas
obrigam à existência de critérios rigorosos na sua
selecção.
Braun-Falco, W. Schempp e W. Wyers publicaram
num dos últimos números de 2008 da Experimental Dermatology62 uma explicação detalhada de todas as
técnicas modernas ao dispor dos histopatologistas. Sem
a pretensão de sermos exaustivos mostramos as siglas
de algumas das técnicas descritas no artigo: IHQ, IFD,
PCR, RT-PCR, Real-time PCR, LOH, G-banding, FISH,
CISH, CGH, Array CGH e DNA-microarray.
E EM PORTUGAL?
Na revista dos trabalhos da SPDV seleccionámos três
trabalhos de revisão publicados nos últimos dois anos.
Márcia Ferreira e al, do Hospital de Santo António, do
Porto, efectuaram uma revisão de 126 doentes com
melanoma maligno, entre os anos de 1996 e 200663. Em
percentagem os vários subtipos observados foram MM
de extensão superficial (52%), MM nodular (22%),
Lêntigo maligno (16%) e MM acral (10%). A espessura
média dos melanomas estudados foi de 1.46mm.
As Dr.as Gilda Luciano, Esmeralda Vale e Isabel Viana
estudaram 36 tumores glómicos, de 34 doentes do Centro
84
de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa, observados
entre 2001 e 200564. Nos homens predominou a lesão
única, enquanto nas mulheres ocorreram predominantemente lesões múltiplas. Histologicamente predominou o
padrão sólido (70%), seguido do glomangioma (22%) e
menos frequente o glomangiomioma (8%).
José Carlos Cardoso, Óscar Tellechea, José Pedro Reis
e al, estudaram 80 doentes com Síndrome de Sweet que
comparam com 20 doentes com outras dermatoses neutrofílicas não classificáveis65. As alterações vasculares
(1/80 vs 3/20) e o atingimento da epiderme (31% vs
53%) foi mais raro no primeiro grupo de doentes. Além
disso concluíram que além dos neutrófilos, presentes em
99% dos casos de Síndrome de Sweet, estes estavam
acompanhados por mastócitos (11%) e eosinófilos (9%).
FUTURO
As revistas científicas são publicadas em papel e cada
vez em maior número podem ser consultadas na sua
versão on-line.
B. Ackerman e A. Böer66 editam a revista bimensal
Dermatopathology: practical and conceptual, disponível
apenas on-line. No site que nos permite a sua leitura
www.derm101.com podem também ser consultadas
todas as obras escritas por B. Ackerman, incluindo os
seus livros de Dermatopatologia.
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Artigo de Revisão Bibliográfica
O PAPEL DO PULSE DYE LASER NA DERMATOLOGIA
Nuno Menezes, Gioconda Mota, Armando Baptista
Serviço de Dermatologia e Venereologia do Centro Hospitalar de V.N. de Gaia
RESUMO - O laser pulsado de contraste (PDL), que usa como meio excitatório um dye de rodamina, existe desde 1989 e
é considerado o tratamento padrão para hemangiomas e manchas cor do vinho do Porto. Emite luz num comprimento
de onda próximo do último pico de absorção da oxihemoglobina (577nm) a 585/595nm o que lhe permite um aumento
da penetração do feixe de luz sem perder selectividade. Os novos aparelhos com pulsos mais longos (até 40ms),
atingem maior profundidade e induzem menor púrpura, são também úteis no tratamento da rosácea, telangiectasias e
poiquilodermias. Neste artigo revê-se o papel do LASER PDL em Dermatologia e a sua acção e eficácia nas diversas
dermatoses em que foi usado.
PALAVRAS-CHAVE - Laser PDL; Hemangiomas; Manchas cor do vinho do Porto; Rosácea; Verrugas.
PULSE DYE LASER IN DERMATOLOGY
ABSTRACT - Pulsed dye laser (PDL) uses a rodamin dye and is considered gold standard treatment for port-wine-stains
and haemagiomas. This device selectively targets oxyhemoglobin emitting light with a wavelength of 585/595nm. Newer
devices with increased pulse width have the ability to go deeper with less purpura are being used for treatment of rosace,
telangiectatic vessels and warts In this article PDL use in Dermatology is revised regarding indications and efficacy.
KEY-WORDS - PDL; Haemangiomas; Port-wine-stains; Rosácea; Warts.
Correspondência:
Dr. Nuno Menezes
Serviço de Dermatologia e Venereologia do CHVNG/E
Rua Conceição Fernandes
4434-592 VN Gaia
E-mail:[email protected]
89
Nuno Menezes, Gioconda Mota, Armando Baptista
Artigo de Revisão Bibliográfica
Nos últimos 10 anos tem-se verificado um aumento
da utilização de LASERS em Dermatologia. A diversificação deste tipo de equipamento, associada ao seu
elevado custo, faz com que seja difícil possuir todo o
arsenal terapêutico desta área nos diversos serviços de
Dermatologia.
Neste artigo os autores vão tentar ser o mais elucidativos possível sobre a utilização do Pulse Dye Laser
(PDL) e as suas indicações terapêuticas. LASER (Light
Amplification by the Stimulated Emission of Radiation), é
um acrómino criado em 1957 por Gordon Gould,
derivado do conceito de luz estimulada (criado em 1917
por Einstein) tendo por base o conceito de que os átomos
são compostos por um núcleo rodeado por electrões em
órbita, que normalmente estão em repouso, isto é, no
nível mais baixo de energia.
Quando há uma absorção de energia, o electrão
passa para uma órbita de maior energia (mais distante
do núcleo). Este estadio é instável, dada a tendência
natural de regresso ao estadio de repouso do electrão
com libertação de um fotão, processo a que se chama
emissão espontânea de radiação. Ocorre emissão
estimulada quando um electrão, já excitado, absorve um
fotão de igual energia e depois regressa ao estadio de
repouso, com libertação de fotões com o mesmo
comprimento de onda, fase e direcção do fotão
absorvido. A energia necessária a este conjunto de
acções é, normalmente, fornecida por uma fonte de
energia artificial1,2. Num LASER, este conjunto de acções
ocorre numa cavidade óptica com dois espelhos
paralelos nos topos e um meio excitatório. Os fotões
viajam para a frente e para trás, estimulando continuamente mais electrões e produzindo mais fotões a
cada passagem. O espelho da região frontal é, só
parcialmente, refractivo o que implica que alguma
fracção de luz seja transmitida. Essa luz é extremamente
brilhante, monocromática, altamente colimada,
coerente e controlável, podendo ainda ser emitida de
forma contínua ou em pulsos2,3.
A acção de um LASER na pele depende também das
características próprias das estruturas do tegumento
cutâneo, nomeadamente, no que diz respeito a reflexão,
absorção, dispersão e transmissão. Baseando-se nos
cromóferos existentes na pele (melanina, hemoglobina,
água e colagénio) e seus picos de absorção, é possível
atingir selectivamente as estruturas cutâneas. Um LASER
é tanto mais efectivo quanto maior for a sua
selectividade de absorção, maior a transmissão de luz e
menor a reflexão e a dispersão2. O objectivo principal
dos tratamentos com laser é, tal como na medicina,
“primu non nocere”, ou seja, atingir o alvo com o menor
90
número de dano para as estruturas adjacentes, teoria
esta postulada em 1983 por Anderson e Parish, à qual se
deu o nome de Fototermólise Selectiva. São permissas
necessárias ao cumprimento desta teoria uma correcta
escolha do comprimento de onda, por parte do executante, de forma a haver absorção selectiva pelo tecido
alvo; do tempo de exposição, que deve ser inferior ao
Tempo de Relaxação Térmica (TRT) do alvo, e da fluência
necessária para produzir o efeito.
Define-se TRT como o tempo que um determinado
alvo demora a dissipar 50% da energia absorvida para
os tecidos vizinhos. Uma forma rudimentar de o calcular
é através da fórmula TRT=d2 (sendo d igual ao diâmetro
do alvo)3. O primeiro LASER a seguir esta teoria foi o
PDL, emitindo luz a 577nm, coincidente com o último
pico de absorção da oxihemoglobina (420, 542,
577nm) ou, como se verificou mais tarde, aumentando o
comprimento de onda para 585/595nm, sem perda de
selectividade e aumento da penetração4. Este LASER que
usa como meio excitatório um corante de rodamina, foi
introduzido em 1989 e rapidamente revolucionou o
tratamento das lesões vasculares, tornando-se o tratamento de primeira escolha para hemangiomas, manchas cor de vinho do Porto (PWS) e telangiectasias5.
As principais indicações terapêuticas deste laser são
lesões tipo PWS, hemangiomas, telangiectasias, pequenos angiomas e lagos venosos6. No Departamento de
LASERs de Universidade de Regensburg, na Alemanha,
verificou-se que as lesões vasculares (hemangiomas,
port-wine stains e telangiectasias) correspondiam a mais
de 70% dos tratamentos realizados6. É consensual que,
para se ter sucesso terapêutico com o uso do PDL, é necessário obter púrpura após o tratamento. Geralmente,
cada aparelho traz uma tabela onde é possível consultar
o intervalo padrão de fluências para o tratamento de
determinada lesão, fazendo-se depois eventuais ajustes
consoante a prática, o doente e a área corporal a tratar.
Na primeira sessão devem tratar-se várias áreas, com
fluências dentro do intervalo fornecido, para se determinar a que provoca púrpura em menor grau. Nos
tratamentos subsequentes, a fluência deve ser ajustada
consoante a resposta obtida. Deve ter-se a noção, que o
maior índice de resposta se obtém nas primeiras
sessões, havendo áreas cutâneas que respondem mais
rápido que outras: por exemplo, nas regiões cervical,
frontal, mentoniana e malar obtém-se uma resposta
mais rápida que na centrofacial2,3. A cada disparo do
LASER deve observar-se o aparecimento de púrpura, o
que para além do já referido maior efeito terapêutico,
permite também ao operador evitar a sobreposição dos
disparos e assim diminuir o risco de efeitos laterais5. O
O Papel do Pulse Dye Laser na Dermatologia
Artigo de Revisão Bibliográfica
tratamento com PDL causa normalmente dor, parestesias ou uma sensação de adormecimento no local
tratado, podendo ser aliviado pelo uso de um dispositivo
de arrefecimento, placas de hidro-gel (Laser Aid®) ou
anestésicos tópicos (EMLA®).
Em crianças, se a área a tratar é de grandes dimensões, pode mesmo optar-se por anestesia geral. O uso
de um dispositivo de arrefecimento que liberte ar frio
durante todo o tratamento (caso do utilizado pelos
autores), quando projectado na direcção da pirâmide
nasal pode provocar uma sensação falsa de dispneia ao
doente. Esta situação pode ser contornável pelo posicionamento da mão livre do operador entre o jacto de ar e o
nariz do doente. As lesões a ser tratadas devem ser
sempre fotografadas antes do início dos tratamentos,
durante e no fim para comparação e avaliação do efeito
obtido.
De entre os efeitos laterais associados ao tratamento
com o PDL, a hiperpigmentação é o mais frequente.
Pode ocorrer, também, o aparecimento de zonas de
hipopigmentação, bem como de cicatrizes atróficas e
hipertróficas, alterações que desaparecem ao fim de
alguns meses, na grande maioria dos casos5. O uso do
PDL é diversificado, não se limitando a lesões vasculares, podendo ser utilizado em:
MANCHAS COR DO VINHO DO PORTO (PWS)
São malformações capilares comuns que afectam
0,3% da população. Manifestam-se por máculas de cor
rosa, vermelha ou púrpura, localizadas na face ou extremidades, normalmente unilaterais e podendo envolver
grandes áreas7. O uso do PDL é o tratamento de escolha
na maioria das situações, existindo, porém, casos em
que o uso de outro tipo de LASERs possa ser melhor
opção5,7. Deve ter-se a noção de que nem todas as PWS
vão desaparecer com o uso do PDL e que o uso de
fluências cada vez maiores aumenta o risco de aparecimento de efeitos laterais. Nos primeiros 4 a 10
tratamentos verifica-se, normalmente, uma resposta
satisfatória. Casos há em que a melhoria só se verifica
para além do 20º tratamento. Apesar de haver inúmeros
trabalhos a relatarem a eficácia do LASER PDL no
tratamento das PWS, os resultados incidem mais na
capacidade de se obter um clarear da lesão, do que de
uma completa regressão5. No intuito de obter uma
melhor previsão da resposta ao tratamento, vários
factores prognósticos foram testados, tendo-se concluído que a localização e o tamanho da lesão influenciam a
resposta, sendo de esperar uma resposta mais rápida
Fig. 1 - Púrpura após tratamento.
em lesões da face e pescoço do que em lesões dos
membros inferiores. Lesões do tronco, membros superiores e ombros, de uma forma geral, respondem bem
ao tratamento. Áreas menores que 20cm2 têm uma
resposta mais rápida que áreas de maiores dimensões810
. Apesar de se considerar que idades mais jovens
necessitam menor número de tratamentos que as mais
velhas, há autores que afirmam ser precisamente o
contrário, dada a maior rapidez de crescimento dos
vasos sanguíneos residuais entre os tratamentos nas
primeiras11. A cor inicial das lesões não parece ser um
factor prognóstico12.
HEMANGIOMAS
São os tumores benignos mais observados na infância, com uma incidência de 1 a 2,6%. São mais
frequentes em prematuros e no sexo feminino. Surgem
entre a 1ª e a 4ª semana de vida sob a forma de uma
mácula hipopigmentada, com ou sem telangiectasias,
ou como placas eritemato-violáceas e caracterizam-se
por uma fase inicial proliferativa, que dura cerca de 9
meses, com aumento marcado do volume da lesão.
Segue-se uma fase de gradual involução espontânea
que normalmente fica completa entre os 5 e os 10 anos.
Por vezes esta regressão pode ser incompleta, surgindo
uma área telangiectásica macular residual5,13. Apesar de
na maioria dos casos se optar pela não instituição de
terapêutica, em certos casos, sobretudo se há risco de
interferência com alguma função vital (p.ex: hemangioma da região periorbital que pode interferir com a
91
Nuno Menezes, Gioconda Mota, Armando Baptista
Artigo de Revisão Bibliográfica
TELANGIECTASIAS FACIAIS
Estas lesões respondem rapidamente aos LASERs
capazes de emitir luz absorvida pela hemoglobina. O
PDL, apesar de ser o menos frequentemente associado
ao aparecimento de cicatrizes e o mais eficaz, induz o
aparecimento de púrpura após o tratamento tornandose para alguns doentes traumatizante, pelo que é
frequente a preferência pelo uso de outro tipo de laser
não purpurogénico, apesar da menor eficácia16. Em
doentes com rosácea verifica-se, por vezes, o aparecimento de grandes áreas de eritema malar telangiectásico para o qual o PDL é uma excelente escolha
terapêutica, apesar da púrpura que produz17.
Fig. 2 - Melhoria após 3 sessões de hemangioma da face e
pescoço.
TELANGIECTASIAS DA PERNA
visão) ou casos em que há aparecimento de complicações (ulceração ou hemorragia), pode ser necessário
tratamento3. O uso de LASER nestas lesões visa sobretudo diminuir ou parar a fase proliferativa, quando
realizado precocemente, corrigir ou minimizar as
complicações e quando realizado mais tardiamente,
atingir uma melhoria estética das telangiectasias
residuais5. O PDL é o LASER de 1ª escolha, devendo, no
entanto, o tratamento iniciar-se o mais cedo possível,
dado o pequeno poder de penetração deste LASER
(cerca de 1mm). Quando o objectivo é o tratamento das
complicações, podem apenas ser necessários 1 a 2
tratamentos. Neste caso deve tratar-se todo o hemangioma e não só as áreas que estão ulceradas ou a
sangrar14. O uso em hemangiomas não complicados
não parece ter melhores resultados que a ausência de
atitudes15.
São actualmente, um problema cosmético comum e
para o qual a escleroterapia se mantém como a terapia de
escolha. Porém, em certos casos, em que os vasos são tão
pequenos que é difícil a execução desta técnica o uso deste
LASER ganha interesse. Devem-se usar pulsos maiores que
o convencional (0,5ms), conseguindo obter-se taxas de
50% de desaparecimento das telan-giectasias das pernas
quando com diâmetro inferior a 1mm18.
POIQUILODERMIA DE CIVATTE
Esta dermatose pode ser tratada com o PDL devendo,
no entanto, usar-se baixas fluências (4-6J/cm2) dada a
grande frequência de aparecimento de hipopigmentação e cicatrizes quando se usam LASERs na região
cervical e torácica13,19.
Fig. 3 - Eritema telangiectásio antes e após 7 sessões com laser PDL.
92
O Papel do Pulse Dye Laser na Dermatologia
Artigo de Revisão Bibliográfica
OUTRAS LESÕES VASCULARES
Há relatos de resposta de lesões, como aranhas
vasculares, lagos venoso, angioqueratomas, angiomas
tipo cereja, lesões de sarcoma de Kaposi e granulomas
piogénicos, com tratamento com o LASER PDL ressalvando-se, porém, os casos em que o laser não tem
penetração suficiente para provocar uma completa ressolução da lesão, havendo apenas resposta parcial (ex:
granuloma piogénico e sarcoma de Kaposi)5,20-25.
CICATRIZES ERITEMATOSAS, HIPERTRÓFICAS E
26-33
QUELÓIDES
Sabe-se que o tratamento de cicatrizes com o LASER
PDL altera não só a aparência clínica da lesão como a sua
textura, flexibilidade e sensação de prurido associado26.
Apesar de ainda não se saber o mecanismo porque tal
acontece, pensa-se que o dano provocado à microvasculatura da cicatriz vá, de alguma, forma influenciar o
colagénio, sobretudo o tipo V que está aumentado nas
cicatrizes hipertróficas27. De forma genérica, quanto menor
é o tempo de evolução da cicatriz, maior a probabilidade
de resposta, sendo esta na ordem dos 77% de melhoria,
em algumas séries com dois tratamentos28. Em cicatrizes da
face com menos de 1 ano de evolução conseguiu-se em
20% dos casos uma resolução completa após uma média
de 4,4 tratamentos29. Usualmente, cicatrizes tipo quelóide
necessitam de múltiplos tratamentos e a resposta é impre-
visível, facto que deve ser explicado ao doente antes de se
iniciar o tratamento. Actualmente avalia-se a hipótese de o
comprimento de onda de 595nm ser mais benéfico que o
de 585nm, o que até à data não foi confirmado30.
ESTRIAS
Habitualmente manifestam-se por bandas lineares
de pele atrófica ou enrugada que, com o tempo tende a
ficar hipopigmentada ou prateada. Ocorrem em locais
onde ocorreu uma hiperextensão da pele com ruptura
das fibras elásticas (p.ex. na gravidez). O papel do Laser
no tratamento destas lesões ainda não está suficientemente estudado, porém há relatos de uma melhoria
na aparência clínica e profilometria óptica após uso do
Laser PDL34.
PSORÍASE
Nas placas de psoríase verifica-se uma dilatação e
aumento da tortuosidade dos capilares da derme papilar subjacente, pelo que, em teoria, o uso do LASER PDL
nestas lesões deverá ter um efeito terapêutico. Múltiplos
estudos confirmaram esta hipótese35-38, tendo-se porém
verificado serem necessários múltiplos tratamentos. Dado o elevado custo destes tratamentos, parece lógico
limitar o uso a lesões crónicas, resistentes ao tratamento
e localizadas5.
Fig. 4 - Verrugas vulgares - resposta completa com 13 sessões de PDL.
93
Nuno Menezes, Gioconda Mota, Armando Baptista
Artigo de Revisão Bibliográfica
VERRUGAS
Apesar de não se tratarem de lesões vasculares, existem relatos de sucesso do seu tratamento com o laser
PDL. Refere-se ser necessário, normalmente, a realização de curetagem pré-tratamento39,40. Segundo a experiência dos autores, o uso deste LASER tem maior eficácia
em verrugas vulgares isoladas, do que quando em
mosaico.
CONCLUSÃO
A utilização do LASER PDL na prática dermatológica
apesar de ainda não estar totalmente definida, está já
padronizada em múltiplas situações clínicas, devendo,
no entanto, ser enquadrada pelo médico dermatologista
consoante o seu treino e a eficácia conhecida deste
tratamento, relativamente a outras opções terapêuticas
existentes.
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95
Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 97-100 (2009)
GEIDST
EXSUDADO VAGINAL EXUBERANTE COMO PRIMEIRA
MANIFESTAÇÃO DE DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL
Nuno Menezes1, Natividade Rocha1, Sónia Fernandes2, David Tente3, Gioconda Mota1, Armando Baptista1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia, 2Gastrenterologia e 3Anatomia Patológica do Centro Hospitalar
de VN Gaia/Espinho (CHVNG/E)
RESUMO - Descrevemos o caso clínico de uma doente do sexo feminino enviada à nossa consulta com o diagnóstico de
cervicite, vaginite e eritema vulvar marcado resistente à terapêutica oral instituída. Ao exame objectivo apresentava
exuberante exsudado vaginal amarelo-esverdeado, não fétido, espesso acompanhado de eritema, edema, fissurações
dos pequenos e grandes lábios. Os exames complementares realizados permitiram excluir as hipóteses diagnosticas de
cervicite/vaginite bacteriana e/ou herpética e dermatite de contacto alérgica. Apesar dos tratamentos empíricos
instituídos a doente mantinha exsudação vaginal exuberante com eritema, edema marcado de todo o períneo com
extensão à região perianal. Referia também ocasionalmente fezes com sangue, motivo pelo qual foi pedida
colonoscopia que revelou, múltiplas erosões de tipo aftóide, algumas com halo eritematoso, intercaladas com mucosa
normal. e a biopsia do cólon foi compatível com o diagnóstico de doença inflamatória intestinal. Foi instituída
terapêutica com Pentasa® 1gr/dia PO com melhoria progressiva até resolução completa do quadro clínico em 30 dias e
actualmente com 12 meses de seguimento mantém-se assintomática mesmo após paragem da medicação.
PALAVRAS-CHAVE - Corrimento vaginal; Doença inflamatória intestinal; Doença de Crohn.
EXUBERANTE VAGINAL DISCHARGE AS THE FIRST
MANIFESTATION OF INFLAMMATORY BOWEL DISEASE
ABSTRACT - We present the case of a woman referred to us by cervicitis, vaginitis and vulvitis that didn't respond to
treatment. Clinically an exuberant greenish vaginal discharge was observed with associated well delimitated eczema
(erythema and fissures) involving the vulvae and perianal region. Lab work done that excluded the diagnosis of a bacterial
or herpetic cervicitis/vaginitis or an allergic contact dermatitis. Despite all empiric treatment patient kept all complaints. As
she started to notice some bleeding with defecation a colonoscopy was asked that revealed colonic erosions intermingled
by normal mucosa and the biopsy was suggestive of bowel inflammatory disease. After 30 days of treatment with
mesalanine she became asymptomatic. Nowadays, with a 12 month follow up, she still is symptom free even after
treatment withdrawal.
KEY-WORDS - Vaginal discharge; Inflammatory bowel disease; Crohn disease.
Correspondência:
Dr. Nuno Menezes
Serviço de Dermatologia e Venereologia do CHVNG/E
Rua Conceição Fernandes
4434-592 VN Gaia
E-mail:[email protected]
97
Nuno Menezes, Natividade Rocha, Sónia Fernandes, David Tente, Gioconda Mota, Armando Baptista
GEIDST
INTRODUÇÃO
A presença de um exsudado vaginal é um motivo
frequente de consulta médica. Este pode ser fisiológico ou
patológico. Em condições normais o ph vaginal situa-se
entre os 3,8 e 4,4 devido à colonização bacteriana normal
da vagina. Assim toda a mulher apresenta um certo grau
de corrimento vaginal que varia ao longo do ciclo menstrual, designado fisiológico. Um exsudado patológico está
frequentemente relacionado com infecções, nomeadamente infecções oportunistas por Candida mas também,
infecções sexualmente transmissíveis, ou pode dever-se a
causas não infecciosas (Quadro I).
Quadro I
CAUSAS DE EXSUDADO VAGINAL
Infecciosas
Candida albicans
Não infecciosas
Objecto estranho retido
(ex: tampão ou preservativo)
Irritação química
Trichomonas vaginalis
Chlamydia trachomatis
Neisseria gonorrhoeae
Eczema alérgico
Ectropion
Pólipo endocervical
Dispositivo intra-uterino
Vírus papiloma humano
Sífilis primária
Alterações atróficas
Traumatismo
Fístula vesicovaginal
Mycoplasma genitalium
Fístula rectovaginal
Ureaplasma urealyticum
Neoplasia
Escherichia coli
Doenças inflamatórias
(doença de Behçet, doença
inflamatória intestinal, etc.)
Adaptado de Mitchell et al1
CASO CLÍNICO
Descrevemos o caso clínico de uma doente do sexo
feminino, de 45 anos, casada, doméstica, natural e
residente em VN Gaia, com antecedentes de sífilis
tratada e hemorróides. Foi enviada por Ginecologia à
nossa consulta com o diagnóstico de cervicite, vaginite e
eritema vulvar marcado. A doente queixava-se de prurido, ardência vulvar e corrimento vaginal com 2 anos
de evolução, sem resposta à terapêutica oral e tópica
com: hidroxizina, fluconazol (dose desconhecida), itraconazol 400mg/dia, durante 7 dias, metronidazol oral
98
(1gr/dia, 7 dias), imidazóis e clindamicina tópica. Referia discreta melhoria inicial com dexametasona e
metilprednisolona tópica com agravamento posterior.
Referia agravamento da sintomatologia com o período
menstrual e negava agravamento com o uso de preservativo.
Negava hábitos medicamentosos para além dos já
referidos.
Ao exame objectivo apresentava exuberante exsudado vaginal amarelo-esverdeado, não fétido, espesso
(com necessidade de uso de vários pensos higiénicos
diários) acompanhado de eritema, edema e fissuração
dos pequenos e grandes lábios.
No sentido de despistar as hipóteses de cervicite/
vaginite bacteriana e/ou herpética e dermatite de contacto alérgica, realizaram-se os seguintes exames
complementares de diagnóstico: 1) colheita de exsudado
vaginal para pesquisa de herpes por imunofluorescência
directa (resultado negativo); 2) colheita de exsudado
vaginal para coloração por Gram e cultura em meio
próprio para Neisseria (pesquisa de diplococus negativa e
não foram identificadas tricomonas, pseudo-hifas ou
clue-cells; a cultura foi negativa); 3) colheita de exsudado
vaginal para pesquisa de Clamídea por imunofluorescência directa (negativa); 4) reacções serológicas da sífilis
(VDRL negativo e TPHA positivo) de acordo com sífilis
tratada; 5) marcadores víricos do VHB, VHC e HIV1,2
negativos; 6) testes epicutâneos com a série padrão do
GPEDC (negativos); 7) Biopsia vulvar: processo inflamatório crónico com sinais de actividade (vênulas revestidas
por células endoteliais tumefactas com espessamento da
parede dos vasos), infiltrado inflamatório constituído por
histiócitos, linfócitos, plasmócitos e polimorfonucleares
(Fig. 1). A coloração com o PAS foi negativa. A determinação do ph vaginal não foi realizada.
Dado o nosso hospital não dispor nessa altura de
técnicas de amplificação de ácidos nucleicos para
pesquisa de VHS, Clamídea e Neisseria e apesar dos
resultados negativos dos exames laboratoriais, a doente
realizou tratamento empírico com ceftriaxone 250mg IM
(dose única) + azitromicina 1gr (dose única) + clindamicina em creme. O marido recusou comparecer na
consulta.
Apesar dos tratamentos realizados a doente mantinha exsudação vaginal exuberante com eritema,
edema e fissuração marcada de todo o períneo com
extensão à região perianal. Referia também, recentemente e esporadicamente, fezes com sangue, motivo
pelo qual foi pedida colonoscopia que revelou, múltiplas
erosões de tipo aftóide, algumas com halo eritematoso,
intercaladas com mucosa normal (Fig. 2) e a biopsia do
Exsudado Vaginal Exuberante como Primeira Manifestação de Doença Inflamatória Intestinal
GEIDST
cólon revelou espessamento inflamatório polimorfo de
intensidade moderada a grave, com constituição de
folículos linfóides com centros germinativos proeminentes. Migração transepitelial de polimorfonucleares
neutrófilos com constituição de abcessos crípticos e
esboço de granulomas epitelióides, quadro compatível
com doença inflamatória intestinal. (Figs. 3 e 4). Foi
instituída terapêutica com Pentasa® 1gr/dia via oral
com resolução completa das queixas genitais em 30
dias. Após 1ano a doente mantém-se assintomática.
Fig. 1 - Infiltrado linfo-plasmocitario e de histiócitos, perivascular dérmico, sem lesões de vasculite. Ocasionais polimorfonucleares neutrófilos. Ligeira tumefacção da parede vascular.
Fig. 3 - Mucosa de intestino grosso com infiltrado inflamatório polimorfo moderado do córion, com constituição de folículos linfóides.
Fig. 2 - Presença de múltiplas erosões de tipo aftóide, algumas com halo eritematoso, intercaladas com mucosa normal
(imagem de colonoscopia).
Fig. 4 - Esboço de granuloma epitelióide, à mistura com
infiltrado polimorfo e alterações regenerativas do epitélio.
99
Nuno Menezes, Natividade Rocha, Sónia Fernandes, David Tente, Gioconda Mota, Armando Baptista
GEIDST
De acordo com a clínica, o exame histológico do
cólon e a excelente reposta à terapêutica concluímos
tratar-se de uma manifestação extra-intestinal de doença de Crohn, com apresentação genital.
DISCUSSÃO
Corrimento vaginal é uma queixa frequentemente
subestimada (razão pela qual não foi fotografado) e
incorrectamente abordada pelos médicos. O diagnóstico empírico baseado na história clínica e características
do exsudado é inadequado e resulta muitas vezes em
tratamentos inapropriados e sem sucesso terapêutico.
Na doença de Chron, 46% dos doentes apresentam pelo
menos uma manifestação extra-intestinal, sabendo-se
que o envolvimento muco-cutâneo é mais frequente em
doentes com envolvimento cólico. Entre as manifestações genitais desta entidade podemos encontrar
(Quadro II)3-5: a) Complicações relacionadas directamente com a doença: fístulas entéricovaginais ou
rectovaginais, inflamação vulvar, abcessos, ulcerações,
leucorreia ou granulomas vaginais; b) Complicações
relacionadas indirectamente com a doença: anemia,
dismenorreia e amenorreia; c) Complicações iatrogénicas: ulcerações e fístulas após episiotomia ou efeitos
laterais do uso de corticóides tópicos; d) Alterações
psicossociais: má imagem corporal e alteração da sexualidade.
Apesar de algumas manifestações extragenitais poderem constituir a primeira manifestação da doença3,4;
após pesquisa bibliográfica, não encontramos qualquer
descrição de exsudado vaginal como primeira manifestação de doença inflamatória intestinal.
100
Quadro II
COMPLICAÇÕES GENITAIS
DA DOENÇA DE CROHN
Complicações relacionadas directamente com a doença:
fístulas entérico-vaginais ou rectovaginais, inflamação vulvar,
abcessos, ulcerações, leucorreia ou granulomas vaginais
Complicações relacionadas indirectamente com a doença:
anemia, dismenorreia e amenorreia
Complicações iatrogénicas: ulcerações e fístulas após episiotomia
ou efeitos laterais do uso de corticóides tópicos
Alterações psicossociais: má imagem corporal e alteração
da sexualidade
Adaptado de Feller et al3
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"Pérolas" Cirúrgicas
RECONSTRUÇÃO DE DEFEITOS DA FACE LATERAL DO NARIZ
COM RETALHOS NASOGENIANOS
Ricardo Coelho, Vítor Neto
Serviço de Dermatologia, Hospital de Faro
RESUMO - A reconstrução de defeitos da área nasal permanece uma das áreas mais complexas da cirurgia cutânea
devido aos seus contornos complexos, múltiplas subunidades estéticas e diferentes tecidos (pele, cartilagem e mucosa).
Os retalhos nasogenianos são retalhos locais úteis e versáteis com vascularização robusta e que permitem encerrar
defeitos nasais de pequena e média dimensão.
Os autores apresentam 3 doentes com defeitos nasais resultantes de exéreses oncológicas em que foram utilizados
retalhos nasogenianos.
PALAVRAS-CHAVE - Reconstrução nasal; Retalhos naso-genianos.
NASAL RECONSTRUCTION OF DEFECTS OF THE NOSE WITH
NASOLABIAL FLAPS
ABSTRACT - Nasal reconstruction remains one of the most challenging areas of cutaneous surgery with complex skin
contours, multiple nasal subunits and different tissues (skin, cartilage and mucosa).
The nasolabial flaps are very useful and versatile local flaps with robust vascularity suitable for covering small and
moderate sized nasal defects.
The authors present three patients with nasal defects resulting from oncologic resection in whom nasolabial flap
reconstruction was performed.
KEY-WORDS - Nasal reconstruction; Nasolabial flaps.
Correspondência:
Dr. Ricardo Coelho
Rua dos Remédios à Lapa, 9
1200-782 Lisboa
E-mail: [email protected]
103
Ricardo Coelho, Vítor Neto
"Pérolas" Cirúrgicas
INTRODUÇÃO
A região nasal constitui uma área de difícil abordagem
cirúrgica pela sua morfologia complexa e diferentes
estruturas anatómicas - pele, cartilagem e mucosa. A
utilização de retalhos nasogenianos (também denominados retalhos melolabiais) para encerramento de
defeitos cirúrgicos tem-se revelado uma técnica de fácil
execução e com resultados cosméticos globalmente satisfatórios.
CASOS CLÍNICOS
Exemplificam-se três exemplos de reconstrução nasal
em doentes idosos com basaliomas envolvendo a face
lateral e asa do nariz.
No primeiro doente (Fig. 1), efectuaram-se um enxerto de cartilagem auricular e retalho transposição
nasogeniano em dois estadios, obtendo-se um bom
resultado cosmético aos 6 meses de seguimento.
No segundo doente (Fig. 2), executou-se um retalho
de deslizamento da mucosa vestibular, enxerto de
cartilagem auricular e retalho de transposição nasogeniano. Observa-se também aos 6 meses de seguimento
um resultado cosmético satisfatório.
No terceiro doente (Fig. 3), para a reconstrução de
um defeito transmural, optou-se por fazer um enxerto
composto de pele e cartilagem auricular associado com
retalho ilhado da região nosogeniana. Ocorreu alguma
retracção do bordo inferior da asa nasal, no entanto o
resultado final é cosmeticamente aceitável.
De salientar a ausência de complicações operatórias
imediatas em todos os doentes.
Fig. 1 - Enxerto de cartilagem auricular e retalho nasogeniano em dois estádios.
Fig. 2 - Executou-se um retalho de deslizamento da mucosa vestibular, enxerto de cartilagem auricular e retalho de transposição
nasogeniano.
104
Reconstrução de Defeitos da Face Lateral do Nariz com Retalhos Nasogenianos
"Pérolas" Cirúrgicas
Fig. 3 - Para a reconstrução de um defeito transmural, optou-se por fazer um enxerto composto de pele e cartilagem auricular associado
com retalho ilhado da região nosogeniana.
COMENTÁRIOS
A reconstrução de defeitos da asa e face lateral do
nariz pode ser conseguida através de enxertos ou
retalhos de transposição frontal, bilobulados ou nasogenianos1. Os retalhos nasogenianos são retalhos cuja
região dadora é a área anatómica adjacente ao sulco
nasogeniano, podendo ser retalhos superiores ou inferiores. É uma técnica frequentemente utilizada para a
reconstrução de defeitos da face lateral do nariz por
tratar-se de uma região anatómica com abundante
tecido redundante e com boa vascularização, sendo o
seu encerramento feito facilmente ao longo do sulco
nasogeniano2. Dentro dos retalhos nasogenianos, existem várias opções possíveis como sejam os retalhos de
transposição simples, em ilha ou executados em dois
estadios; os autores exemplificaram neste artigo cada
uma destas técnicas.
Este retalho está especialmente indicado nos defeitos
profundos com necessidade de enxerto de cartilagem, já
que a sua delicada reconstrução poderia colapsar se
fossem utilizados retalhos locais com maior tensão3. O
uso de retalhos nasogenianos em dois estadios é útil
quando o defeito ocupa uma grande área como aconteceu no primeiro doente.
A reconstrução com retalhos nasogenianos tem no
entanto várias limitações, não devendo ser utilizado
para defeitos com diâmetro superior a 2,5cm, uma vez
que defeitos maiores poderiam levantar dificuldades no
encerramento do defeito nasogeniano4 nem para defeitos medianos, caso em que a utilização desta técnica
implicaria um retalho excessivamente longo com consequente risco de uma deformidade “trapdoor” e necrose
distal5.
É uma técnica de fácil planeamento e execução rápida, sendo a sua complicação mais frequente a formação
de protuberâncias (efeito “trapdoor”) causado por uma
excessiva espessura da prega nasogeniana obliterando
a sua concavidade natural, defeito que pode exigir uma
ou mais revisões posteriores6-8. Têm sido propostas
algumas variações da técnica para minimizar esta complicação3. Também o tecido celular subcutâneo da pele
destes retalhos tem tendência para retrair com sucedeu
no terceiro doente.
Em conclusão, o retalho nasogeniano é uma técnica
versátil, simples, de fácil e rápida execução que permite
encerrar defeitos de pequena e média dimensão da asa
e face lateral do nariz. Os três casos que se apresentam
ilustram a versatilidade da técnica e os resultados
globalmente satisfatórios que podem ser conseguidos.
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"Pérolas" Cirúrgicas
SINUS PILONIDALIS SACROCOCCÍGEO – TRATAMENTO
CIRÚRGICO COM RETALHO ROMBÓIDE DE LIMBERG
João Goulão, Constança Furtado
Serviço de Dermatologia, Hospital Garcia de Orta, Almada
RESUMO - A região sacrococcígea corresponde à localização mais frequente do sinus pilonidalis, doença frequente e
que afecta sobretudo jovens do sexo masculino. Estes indivíduos recorrem frequentemente aos Serviços de Urgência
hospitalares por complicações dessa afecção, sendo a mais frequente o abcesso. O tratamento cirúrgico necessita, na
maioria dos casos, de bloco operatório com apoio anestésico, o que resulta num aumento da lista de espera cirúrgica.
Na procura de diminuir o sofrimento e tempo de espera destes doentes, os autores descrevem um tratamento cirúrgico
com anestesia local, sem necessidade de internamento, recorrendo ao uso de um retalho rombóide de Limberg para
encerramento do defeito, o qual por sua vez está associado a menores taxas de recorrência e a mais rápida cicatrização
e regresso à vida quotidiana normal.
PALAVRAS-CHAVE - Sinus pilonidalis; Sulco interglúteo; Retalho de Limberg.
PILONIDALIS SINUS - SURGICAL TREATMENT WITH LIMBERG
RHOMBOID FLAP
ABSTRACT - Pilonidal disease is a common clinical entity and the sacrococcygeal area is the most frequent localization. It
mainly affects young men. When it complicates with abcess formation, patients often recur to the emergency room.
Surgical treatment usually needs an operating room with anesthesia support, which leads to an increase in the waiting list
for this surgery.
The authors describe a surgical technique with a local rhomboid Limberg flap performed under local anesthesia, not
requiring hospitalisation, with a quicker healing and returning of the patient to his normal life.
KEY-WORDS - Pilonidal disease; Natal cleft; Limberg flap.
Correspondência:
Dr. João Goulão
Serviço de Dermatologia
Hospital Garcia de Orta
Av. Torrado da Silva
2801-951, Almada
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107
João Goulão, Constança Furtado
"Pérolas" Cirúrgicas
INTRODUÇÃO
A designação “sinus pilonidalis” foi descrita pela 1ª
vez por Hodges e provém da palavra latina “pilus”=pêlos e “nidus”=ninho1. Durante muitos anos
pensou-se que esta afecção se localizava, exclusivamente, na região sacrococcígea. Actualmente existem
descrições noutras localizações, como é o caso das
pregas interdigitais das mãos (barbeiros), couro cabeludo, pálpebra, supracílio, pavilhão auricular, axila, coto
de amputação, parede torácica anterior, mamilo, planta
do pé, umbigo, região suprapúbica, perineo e pénis.
Afecta 0,7% da população, é mais frequente no sexo
masculino (2:1-3:1) e tem um pico de incidência entre os
16 e 25 anos de idade2,3.
É uma doença adquirida4, cuja etiologia não está
bem esclarecida. Há autores que defendem que o sinus
pilonodal resulta da invaginação de pêlos através da
pele, como resultado de uma fricção crónica da região
interglútea5, provocando reacção de corpo estranho
com subsequente desenvolvimento de abcesso4,6.
Karydakis1,7 atribui o processo de inserção dos pêlos
a 3 factores principais: o invasor - “pêlos soltos”; a força
que provoca a inserção e a vulnerabilidade da pele à
inserção dos pêlos na profundidade do sulco interglúteo.
No século XIX, defendia-se que a doença era congénita, mas esta teoria foi contraposta com os seguintes argumentos1: é uma doença mais frequente no sexo
masculino, pelo que se fosse congénita, a incidência
devia ser igual em ambos os sexos; está associada a
algumas profissões: p.ex. condutores de jeep – “jeep
driver´s bottom”; e podem existir lesões semelhantes
noutras partes do corpo.
O quadro clínico é variável podendo manifestar-se
por drenagem crónica, dor, abcesso, prurido ou hemorragia. A transformação maligna é rara, mas há casos
descritos de carcinoma espinocelular e de carcinoma
verrucoso1.
Não está estabelecido o tipo de tratamento ideal,
mas este tem como principais objectivos a cura com o
mínimo de desconforto, baixas taxas de complicações e
de recorrência e, ao mesmo tempo, possibilitar o menor
tempo de internamento e incapacidade para recomeçar
a trabalhar8,9. As técnicas cirúrgicas mais frequentemente usadas são a excisão simples com encerramento
directo e a excisão com marsupilização. A primeira,
associa-se a grande morbilidade e taxa de recorrência,
podendo atingir 7-42%8. Ayede et al10 e Al-Jaberi11
publicaram uma taxa de infecção de 7% associada ao
encerramento primário. A segunda, excisão com sutura
dos bordos cutâneos à parede lateral do sinus (marsupilização), está associada a uma baixa taxa de recorrência, de 6 a 8%6. Tem no entanto a grande desvantagem de ter uma cicatrização muito demorada,
podendo chegar aos 2 meses, o que implica um grande
desperdício de tempo por parte do doente ao ter que
fazer diariamente ou em dias alternados a mudança do
penso.
Os autores descrevem a sua experiência, com um
“follow-up” de mais de 1 ano, de 4 doentes com sinus
pilonidal sacrococcígeo, tratados cirurgicamente com
retalho rombóide de Limberg.
DOENTES E DESCRIÇÃO DA TÉCNICA
Foram revistos os quatro primeiros casos em que o
retalho rombóide foi usado no Serviço de Dermatologia
do Hospital Garcia de Orta, para tratamento do sinus
pilonidal sacrococcigeo, em 3 homens e 1 mulher saudáveis, com idades compreendidas entre os 19 e 30
anos (Quadro I).
Nos quatro casos, havia história de recorrência da
doença e/ou drenagem no serviço de urgência, pelo que
estes doentes se mostravam muito motivados para verem solucionada a sua doença.
O tratamento cirúrgico foi executado de acordo com
os seguinte protocolo:
Quadro I
Remoção
da totalidade
dos pontos
Tempo
de follow-up /
recidiva
2º dia P.O.
14º dia P.O.
1 A + 8M
Sem recidiva
25 cc
1º dia P.O.
15º dia P.O.
1,5 A
Sem recidiva
40cc
(2 frascos=400mg de lidocaína)
175 cc
2º dia P.O.
20º dia P.O.
1 A + 3M
Sem recidiva
40cc
(2 frascos=400mg de lidocaína)
60 cc
2º dia P.O.
12º dia P.O.
1 A + 2M
Sem recidiva
Sexo /
Volume total de anestésico
Volume
Remoção
idade
(lidocaína 1% + adrenalina)
drenado
do dreno
Caso 1 (AD)
M/30 A
40cc
(2 frascos=400mg de lidocaína)
45 cc
Caso 2 (BJP)
M/25 A
40cc
(2 frascos=400mg de lidocaína)
Caso 3 (LMF)
M/22 A
Caso 4 (ILS)
F/19 A
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Sinus Pilonidalis Sacrococcígeo – Tratamento Cirúrgico com Retalho Rombóide de Limberg
"Pérolas" Cirúrgicas
Doente colocado em decúbito ventral, na marquesa operatória;
Afastamento do sulco interglúteo com fita adesiva
(Fig. 1);
Tricotomia, pré-cirúrgica, da região sagrada;
Antissepsia com iodopovidona;
Injecção de azul de metileno pelo orifício do sinus,
para visualização de todos os trajectos;
Anestesia local com lidocaína 1% com epinefrina,
não ultrapassando a dose tóxica (6mg/Kg);
Excisão do sinus e trajectos corados pelo azul de
metileno até à fascia pré-sagrada (Fig. 3);
Desenho do retalho rombóide de Limberg (Fig. 4);
Dissecções executadas com electrocautério para
minimizar perdas sanguíneas;
Antes de se encerrar a ferida operatória, as fitas
adesivas deverão ser retiradas, para permitir a
aproximação dos tecidos;
Revisão da hemostase;
Transposição do retalho (Fig. 5);
Fig. 2 - Pós injecção de azul de metileno.
Fig. 3 - Excisão do sinus e trajectos corados pelo azul de metileno até à fascia pré-sagrada.
Fig. 1 - Afastamento do sulco interglúteo com fita adesiva.
Fig. 4 - Desenho do retalho rombóide de Limberg.
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João Goulão, Constança Furtado
"Pérolas" Cirúrgicas
RESULTADOS
Fig. 5 - Transposição do retalho.
Sutura da gordura subcutânea do retalho à fascia
pré sagrada com Vicryl 3.0., para evitar a formação de espaços mortos e de hematomas;
Dreno aspirativo por baixo do retalho, ao nível da
fascia pré-sagrada;
Sutura dos bordos cutâneos com nylon 4.0 e/ou
agrafes (Fig. 6).
Profilaxia antibiótica com amoxicilina e ácido clâvulanico e analgesia com metamizol e/ou paracetamol.
Nas primeiras 24h, os doentes estão proibidos de se
deitarem em decúbito dorsal. O 1º penso é feito no 2º
dia P.O. e o dreno é retirado (se drenar menos de
30ml/dia). Os pontos são removidos ao fim de 10-15
dias. No período pós alta os doentes deverão fazer a
tricotomia da região sagrada e uma cuidada higiene.
Os 4 casos de doença do sinus pilonidal sacrococcígeo corrigidos cirurgicamente com retalho rombóide,
foram realizados sem complicações intra-operatórias,
nem sinais de isquémia que pudessem comprometer a
viabilidade do retalho. Em todos os casos a anestesia
local foi sendo administrada, segundo a necessidade de
cada doente, acabando por se atingir em todos eles, o
limite da dose tóxica de 6mg/Kg de lidocaina 1% com
adrenalina. É importante não esquecer que grande
parte do tecido infiltrado pelo anestésico local é
rapidamente excisado, diminuindo a absorção sistémica
do anestésico. Após a cirurgia todos os doentes foram
para casa, instruídos para contabilizarem o volume
drenado e esvaziarem o conteúdo do reservatório do
dreno, consoante a necessidade. Em todos os doentes a
cicatrização pós operatória decorreu por primeira
intenção sem dificuldades, não foram registados áreas
de necrose cutânea nem outras complicações a curto ou
a longo prazo, como hematoma ou infecção. Houve
apenas um caso em que se verificou uma pequena
deiscência da sutura, a qual foi corrigida com nova
sutura. O dreno foi retirado ao 2º dia pós operatório,
excepto num caso em que foi retirado no dia a seguir à
cirurgia. Os pontos foram removidos na sua totalidade
entre o 12º e 20º dia pós operatório (Fig. 7), e nos quatro
doentes a sua vida foi retornando à normalidade a partir
da 3ª semana pós operatória.
Fig. 7 - Aspecto da cicatriz operatória na 3ª sem. P.O (caso 1).
Fig. 6 - Sutura dos bordos cutâneos com nylon 4.0 e/ou
agrafes.
110
Actualmente o tempo de follow-up destes doentes vai
desde 1 ano e 2 meses a 1 ano e 8 meses, não tendo
havido nenhum caso de recorrência.
O resultado estético final também é satisfatório,
como se pode observar na Fig. 8, correspondente ao
caso nº4 no 1º mês P.O.
Sinus Pilonidalis Sacrococcígeo – Tratamento Cirúrgico com Retalho Rombóide de Limberg
"Pérolas" Cirúrgicas
Fig. 8 - Aspecto da cicatriz operatória no 1º mês P.O. (caso 4).
oblíqua. A outra opção seria aplanar a região sacrococcígea, diminuindo a profundidade do sulco, através de
retalhos: retalho de Limberg; retalho de Dufourmentel;
retalho de avanço V-Y; plastia em Z, entre outros9.
O retalho rombóide de Limberg, foi usado para
tratar a doença do sinus pilonidal sacrococcígeo, pela
primeira vez, por Azab et al, em 198413. Vários estudos
apontam uma taxa de recorrência à volta de 0-3%, para
o retalho de Limberg8.
Segundo Mentes et al2, a única desvantagem do
retalho de Limberg é que o polo inferior do retalho fica
localizado no sulco interglúteo, ocorrendo uma inversão
da parte inferior da cicatriz para dentro do sulco interglúteo, o que por vezes se associa a uma taxa de recorrência na linha média inferior.
Os mesmos autores2, descreveram um retalho de
Limberg modificado (Figs. 9 e 10), o qual para além de
aplanar a região sacrococcígea, lateraliza o sulco interglúteo, diminuindo assim a recorrência.
DISCUSSÃO
Existem inúmeras técnicas cirúrgicas descritas para o
tratamento do sinus pilonidal sacrococcígeo. A recorrência é o principal problema após o tratamento, ocorre
sobretudo nos 3 primeiros anos8 e é variável consoante a
técnica cirúrgica utilizada (Quadro II).
Quadro II
Técnica Cirúrgica
Taxa de Recorrência
Excisão + encerramento primário
Excisão oblíqua + encerramento primário
Excisão + marsupilização
Retalho de Karydakis
Retalho Rombóide de Limberg
Retalho de avanço V-Y
Plastia em Z
Plastia em W
16 a 25%6
9,4 a 11%7
6,8 a 8%3
1%10
0 a 3%8
0,9 a 5%2
1,6 a 10%2
0 a 16,7%2
A utilização de retalhos locais proporciona menor
taxa de infecção e de recorrência, menor tempo de internamento hospitalar e melhores resultados estéticos6.
Como factores de risco de recorrência destaca-se a
profundidade do sulco interglúteo; segundo alguns autores, outro mecanismo patogénico implicado na recorrência seria a entrada de pêlos pelos orifícios dos pontos
de sutura colocados na linha média12.
Das várias opções teóricas para diminuir a recorrência, uma seria lateralizar o sulco interglúteo (para evitar
recorrências na linha média) e como exemplos temos o 1)
retalho de Karydakis; 2) técnica de Bascom; 3) incisão
Fig. 9
Fig. 10
111
João Goulão, Constança Furtado
"Pérolas" Cirúrgicas
Nos quatro doentes por nós operados, foi efectuado
o retalho rombóide de Limberg clássico e apesar de
parte da sutura ficar localizada no sulco interglúteo, não
se registaram, até há data, recorrências com um “followup” superior a um ano em todos os casos.
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Caso Clínico
CALCINOSIS UNIVERSALIS EM CRIANÇA DE 8 ANOS
Catarina Vilarinho, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Henedina Antunes1, Celeste Brito
Serviços de Dermatologia e 1Pediatria, Hospital de São Marcos, Braga
RESUMO - Descreve-se o caso clínico de uma criança de 8 anos, sexo masculino, observada na nossa consulta, com
múltiplos nódulos duros, eritematosos, de variadas dimensões, com extrusão de material branco-amarelado, dispersos
pelo tegumento cutâneo. Eram dolorosos e incapacitantes para as actividades da vida diária. O Rx do esqueleto revelou
calcinose extensa, com envolvimento tendinoso e muscular. A biopsia cutânea confirmou o diagnóstico de Calcinosis
Universalis. Nos antecedentes é de referir diagnóstico de dermatomiosite aos 3 anos de idade. O desenvolvimento de
calcinose cutânea é muito frequente na dermatomiosite juvenil. Depois de instalada, esta condição tem uma
morbilidade muito significativa e o seu tratamento é insatisfatório e decepcionante. Como tal, é importante o tratamento
precoce e efectivo de todas as formas de dermatomiosite na tentativa de impedir o desenvolvimento desta grave
complicação.
PALAVRAS-CHAVE - Calcinosis universalis; Dermatomiosite.
GENITAL POROKERATOSIS
ABSTRACT - An 8 year old boy, was referred to us with multiple hard, eritematous, painful nodules of different sizes, all
over the skin, with great consequences on everyday activities. X-rays revealed extensive calcinosis, affecting the muscles
and ligaments. Skin biopsy confirmed clinical diagnosis of Calcinosis Universalis. At 3 years old he was diagnosed with
dermatomyositis. Calcinosis is a common and debilitating complication of juvenile dermatomyositis. It causes a significant
morbidity and its treatment is difficult and unsatisfactory. Herein, early and aggressive treatment of dermatomyositis is
mandatory in order to prevent the complications associated with this condition.
KEY-WORDS - Calcinosis universalis; Dermatomyositis.
Correspondência:
Dr.ª Catarina Vilarinho
Serviço de Dermatologia
Hospital de São Marcos
Apartado 2242
4701-965 Braga
E-mail: [email protected]
115
Catarina Vilarinho, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Henedina Antunes, Celeste Brito
Caso Clínico
INTRODUÇÃO
A Calcinosis Universalis consiste na deposição massiva
de cálcio na pele, tecido celular subcutâneo e até mesmo
tendões e músculos1. Trata-se de uma condição dermatológica muito rara mas que pode surgir como complicação de dermatomiosite. A dermatomiosite juvenil, ao
contrário da adulta, tem como complicação frequente o
aparecimento de calcinose cutânea, que se estima
ocorrer em 40-70% dos casos2,3. O impacto desta complicação na qualidade de vida dos doentes pode ser
muito significativo mas, infelizmente, depois de estabelecida a calcinose, o seu tratamento é insatisfatório e
decepcionante.
CASO CLÍNICO
Descreve-se o caso clínico de uma criança do sexo
masculino, 8 anos, natural e residente em Lisboa que,
com esta idade, em Janeiro de 2006, recorre pela
primeira vez à nossa consulta de Dermatologia
Pediátrica por apresentar múltiplos nódulos cutâneos
dolorosos dispersos pelo tegumento. Na anamnese,
colhida com a mãe, é de realçar o estabelecimento de
diagnóstico de dermatomiosite aos 3 anos de idade,
com uma biopsia muscular compatível. Apresentava
astenia e fraqueza muscular muito discretas, pelo que
não foi iniciado qualquer tratamento nessa altura.
Passado meio ano, surgem pela primeira vez nódulos
cutâneos ao nível dos cotovelos, joelhos e nádegas e é
tratado em diferentes instituições com prednisolona e
posteriormente também com metotrexato e ciclosporina.
Aos 5 anos, continuando a surgir novos nódulos, foi
observado num hospital em Londres onde efectua
tratamento com metilprednisolona em bólus e infliximab
e.v. durante 3 meses. Aos 7 anos, sem melhoria, é
observado num hospital em Boston, onde é proposto
tratamento com diltiazem, que não chega a iniciar. É
então, aos 8 anos, que é observado no nosso hospital,
fazendo antibioterapia de forma quase constante devido
às infecções frequentes e recorrentes dos referidos
nódulos. Para além da antibioterapia, não efectuava
qualquer outra medicação desde há cerca de 1 ano. Ao
exame objectivo, observavam-se vários nódulos eritemato-violáceos, de diferentes dimensões, consistência
dura e dolorosos ao toque, superfície irregular, alguns
recobertos por substância branco-amarelada (Fig.1).
Alguns destes nódulos estavam infectados. Distribuíam-se por todo o tegumento mas com predomínio nos
cotovelos, joelhos e nádegas (Figs. 2, 3 e 4). As lesões
116
Fig. 1 - Nódulos de superfície irregular, recoberta por
substância branco-amarelada.
Fig. 2 - Pormenor das lesões dos cotovelos.
Fig. 3 - Lesões localizadas nos joelhos.
Calcinosis Universalis em Criança de 8 Anos
Caso Clínico
Fig. 4 - Nódulos das nádegas.
Fig. 6 - Calcinose extensa, envolvendo tendões e músculos
(membros inferiores).
acarretavam grande compromisso funcional, que condicionava má qualidade de vida, tendo de ser transportado ao colo para a escola.
Foi efectuado estudo analítico completo e exaustivo,
focando o metabolismo do cálcio e fósforo, que foi
normal ou negativo. O estudo imunológico foi também
negativo. O Rx do esqueleto revelou imagens de calcinose extensa (Figs. 5 e 6) interessando não só o tecido
celular subcutâneo como também os músculos e os
tendões. A biópsia cutânea confirmou a presença de
cálcio na derme e hipoderme (Fig. 7). Assim, foi estabelecido o diagnóstico de Calcinosis Universalis, muito
provavelmente sequelar, após dermatomiosite.
Fig. 7 - Calcinose cutânea (H&E, 40x).
Fig. 5 - Calcinose extensa, envolvendo tendões e músculos
(membros superiores).
Após consulta bibliográfica e revisão da literatura, foi
iniciado tratamento em Janeiro de 2006 com diltiazem
60mg 2x/dia e hidróxido de alumínio 10ml 3x/dia. Em
Junho de 2007 foi associado a este esquema alendronato, na dose de 10mg/dia. Durante o ano de 2006,
registaram-se 3 internamentos para antibioterapia e.v. e
remoção cirúrgica de nódulos maiores e libertação
articular pela Ortopedia. A RMN pré-operatória revelou
os achados intra-operatórios de envolvimento tendinoso
e muscular pelo cálcio. Em 2007, a densitometria óssea
revelou presença de osteoporose.
Actualmente, encontra-se no percentil 5 de peso e
percentil 10 de altura. Apesar da doença, o percurso
escolar não foi afectado, frequentando como seria de
117
Catarina Vilarinho, Joana Rocha, Ana Paula Vieira, Henedina Antunes, Celeste Brito
Caso Clínico
esperar o 4º ano de escolaridade. Desde o início do
tratamento, não têm surgido novas lesões e pode-se
dizer que houve uma melhoria global da qualidade de
vida da criança, conseguindo já ir a pé para a escola e
até andar de bicicleta.
DISCUSSÃO
A calcinose cutânea representa uma condição
dermatológica relativamente rara, cujos mecanismos
fisiopatológicos continuam mal compreedidos1-15. Classicamente, consideram-se 4 subtipos: distrófica,
metastática, iatrogénica e idiopática4. A hipervitaminose
D, nefropatia e hiperparatiroidismo devem ser excluídas
através de estudo analítico5. A forma distrófica ocorre
em locais de prévio dano fisiológico dos tecidos mas não
está presente qualquer alteração sistémica do metabolismo do cálcio1. Pensa-se que o dano nos tecidos possa
permitir um influxo de iões de cálcio com consequente
aumento dos níveis intracelulares e precipitação dos
cristais de cálcio. O dano tecidual também leva à
existência de proteínas desnaturadas que se ligam
preferencialmente a iões de fosfato. O cálcio então
reagiria com o fosfato levando à precipitação de cristais
de fosfato de cálcio. A calcinose cutânea de mecanismo
distrófico ocorre geralmente associada a conectivites
auto-imunes e, dentro destas, destaca-se a associação
com a dermatomiosite3,6. Os locais de atingimento mais
comuns são os cotovelos, os joelhos, as nádegas e os
ombros, com o aparecimento de nódulos duros inflamados, de superfície irregular e esbranquiçada3. Na sua
forma mais grave, designada por Calcinosis Universalis6, verifica-se uma deposição uniforme de cálcio em
camadas, desde a pele e tecido celular subcutâneo aos
tendões e músculos. Esta condição tem uma morbilidade
muito elevada, relacionada com a dor que provoca,
fistulização e drenagem devido a infecções secundárias
recorrentes e ainda limitações funcionais importantes1,4.
Não existe nenhum tratamento eficaz1,2,4,6 nem clinicamente aprovado para esta patologia pois, dada a sua
raridade, as propostas terapêuticas baseiam-se no
relato de casos clínicos ou pequenas séries de doentes.
Dentro dos tratamentos descritos na literatura1-14, incluem-se o hidróxido de alumínio7, o diltiazem5,8,9, os
bifosfonatos2,10, a colchicina9, o probenecide9 e a varfarina9. Optamos pelas 3 primeiras pois pareceram-nos as
mais interessantes, tendo em consideração os seus
mecanismos de acção. O hidróxido de alumínio, pelo
seu perfil relativamente seguro de efeitos laterais, é um
dos tratamentos de primeira linha. Um dos mecanismos
118
possíveis para o seu eventual benefício será a redução
da absorção intestinal de fosfatos, conduzindo também
à diminuição do nível sérico do produto fosfo-cálcico.
Quanto ao diltiazem, especula-se que este bloqueador
dos canais de cálcio possa reduzir o influxo de iões de
cálcio para dentro das células. Partindo do princípio que
existe um dano na homeostasia do metabolismo do
cálcio nas células do tecido conjuntivo, com acumulação
intracelular de cálcio e depois a sua extrusão e
deposição nos tecidos, a redução do influxo intracelular
de cálcio poderia corrigir até certo ponto esta anomalia.
No entanto, esta explicação é apenas uma teoria, uma
tentativa de compreender o papel do diltiazem no
tratamento desta afecção. O uso de diltiazem em
adultos é frequente mas em crianças a experiência é
reduzida e baseada nos relatos de casos clínicos da
literatura, nos quais o seu uso se tem revelado seguro9.
Os bifosfonatos e o seu mecanismo de acção nesta
patologia continuam mal compreendidos. Sabe-se que
os bifosfonatos são potentes inibidores da actividade
osteoclástica e daí o seu benefício e utilização no
tratamento da osteoporose. No caso da calcinose
cutânea, ao reduzirem o turnover do cálcio, este estaria
menos disponível para a deposição ectópica nos
tecidos10. Além de tratamentos médicos, a cirurgia é uma
opção em casos seleccionados e existem 2 casos publicados na literatura11,12 do uso da litotrícia extracorporal
para o tratamento de calcinose cutânea, com fracos
resultados.
Em conclusão, pode-se dizer que a variedade de
tratamentos propostos ilustra bem a dificuldade terapêutica que esta condição acarreta14. Nos casos de
dermatomiosite juvenil, ao contrário da adulta, cerca de
40-70 % dos doentes desenvolvem calcinose cutânea2,
mais ou menos expressiva. O atraso entre o diagnóstico
e o tratamento assim como a corticoterapia em dosagens infraterapêuticas são conhecidos factores de risco
para o desenvolvimento da calcinose2,14. Como tal,
torna-se mandatório o tratamento precoce e efectivo de
todas as formas de dermatomiosite na tentativa de
impedir o aparecimento desta grave complicação.
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Caso Clínico
MANCHAS DE BIER MÚLTIPLAS
Felicidade Santiago, Hugo S. Oliveira, Américo Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
RESUMO - Apresenta-se o caso clínico de uma doente de 20 anos com máculas hipocrómicas, irregulares, múltiplas e
assintomáticas, com cerca de 3-10mm de diâmetro, nos membros superiores e inferiores. Evoluíam há 5 anos e surgiam
espontaneamente com os membros em posição pendente, desaparecendo com a elevação dos mesmos.
Cosmeticamente preocupavam a doente, e por isso foi instituída terapêutica com nifedipina que se revelou ineficaz.
As lesões descritas denominam-se manchas de Bier e são a expressão de uma anomalia vascular benigna, devendo ser
diferenciadas de outras alterações da pigmentação e vascularização.
PALAVRAS-CHAVE - Manchas de Bier; Máculas anémicas fisiológicas; Fenómeno benigno.
MULTIPLE BIER SPOTS
ABSTRACT - A 20-year-old woman presented with a 5-year history of multiple, irregular, asymptomatic and hypochromic
spots, with 3-10 mm of diameter, located on the limbs. The spots appeared spontaneously when the limbs were in a
dependent position and vanished with limb elevation. Cosmetically the spots were a distress and a therapeutic trial with
oral nifedipin was attempted without success.
The described lesions are named Bier's spots and are the expression of a benign vascular anomaly that should be
differentiated from hypopigmentation and other vascular disorders.
KEY-WORDS - Bier's spots; Physiologic anemic maculae; Benign phenomenon.
Correspondência:
Dr.ª Felicidade Santiago
Serviço de Dermatologia e Venereologia
Hospitais da Universidade de Coimbra
Praceta Mota Pinto
3000-075 Coimbra
Tel.: 239400420
Fax: 239400490
E-mail: [email protected]
121
Felicidade Santiago, Hugo S. Oliveira, Américo Figueiredo
Caso Clínico
INTRODUÇÃO
Em 1898, um cirurgião alemão, August Bier, descreveu um conjunto de experiências sobre a fisiologia
vascular periférica1. Numa dessas experiências observou que após compressão externa da artéria braquial o
antebraço ficava uniformemente cianótico e, subsequentemente, manchas brancas apareciam. Tais manchas que ocorriam após a oclusão do fluxo sanguíneo
ficaram conhecidas sob o epónimo de manchas de Bier
(MB). Bier postulou que resultavam de um shunt vascular
intra-ósseo. Estudos foram sendo elaborados2, e só mais
tarde em 1986, Wilkin e Martin3 atribuíram as diferenças
de coloração a um fenómeno de capitância com venodilatação nas áreas mais eritematosas e venoconstrição
nas áreas mais pálidas.
CASO CLÍNICO
Os autores descrevem o caso de uma doente de 20
anos, sexo feminino, que recorreu à Consulta de Dermatologia por lesões maculosas hipocrómicas. Eram vagamente circulares ou ovaladas, irregulares, oscilando
entre 3 a 10mm de diâmetro e assintomáticas. As lesões
estavam rodeadas por uma pele eritemato-cianótica
que clareava após pressão digital, atenuando-as.
Desapareciam ao fim de alguns segundos quando os
membros afectados se elevavam, agravando com a
posição de declive. Não sofriam alteração com a exposição solar, nem com variações da temperatura ambiente.
Evoluíam desde os 15 anos de idade; inicialmente
localizadas aos membros inferiores progrediram para
os superiores, sobretudo antebraços. (Figs. 1, 2 e 3) As
palmas e plantas, bem como face e mucosas estavam
poupadas. Não havia alterações da temperatura cutânea nem da sudação nas regiões afectadas. O restante
exame objectivo era normal.
A doente não tinha hábitos medicamentosos. Não
referia antecedentes patológicos pessoais ou história
familiar de patologia cutânea semelhante.
Não foi realizada biopsia dado o curso benigno da
dermatose. Efectuou-se um estudo analítico com hemograma completo, coagulação, provas hepáticas, função
renal e ionograma, ficha lipídica, anticorpos antinucleares e antifosfolipídicos, velocidade de sedimentação,
factor reumatóide, complemento, imunoglobulinas com
IEF e proteinograma, crioglobulinas, imunocomplexos,
serologias da hepatite B e C, e sumária de urina tipo II.
Todo o estudo foi normal ou negativo.
Pelo incómodo estético que as máculas provocavam
122
Fig. 1 e 2 - Múltiplas máculas hipocrómicas assintomáticas
nos membros inferiores.
Manchas de Bier Múltiplas
Caso Clínico
Fig. 3 - Máculas hipocrómicas no antebraço.
à doente foi prescrita nifedipina 10mg 1 id com aviso
para a monitorização dos níveis de tensão arterial e
possíveis efeitos secundários. Ao fim de 4 semanas a
doente não notou alterações cutâneas, e embora não
tivesse efeitos secundários, suspendeu a medicação.
DISCUSSÃO
As MB são máculas hipocrómicas, irregulares e de
dimensões reduzidas. Geralmente localizam-se nos braços e pernas de adultos jovens. Apresentam um carácter
transitório e são induzidas ou agravadas pela posição
pendente dos membros, desaparecendo com a sua
elevação. A sua incidência apesar de desconhecida, é
mais comum do que se julga, pois são assintomáticas e
subdiagnosticadas.
As MB traduzem uma resposta fisiológica, embora
exagerada, de vasoconstrição provocada pela hipóxia
associada à estase venosa ou hipertensão venosa3. Por
outro lado podem reflectir uma falha do reflexo venoarteriolar das arteríolas ascendentes dérmicas em resposta
ao enchimento venoso4.
Recentemente foi proposto que estas máculas
hipocrómicas em fundo eritemato-cianótico que sofrem
alterações pela temperatura e posição se designassem
máculas anémicas fisiológicas, melhor reproduzindo a
natureza das lesões experimentalmente produzidas por
Bier5.
Perante um doente com máculas brancas o diagnóstico diferencial inclui hipopigmentações melânicas
(pitiríase versicolor, vitiligo, nevo acrómico, hipopigmentação pós-inflamatória) e alterações vasculares (nevo
anémico e livedo reticular)1,2. Tais dermatoses são facilmente excluídas com base em características clínicas e
histológicas, exceptuando-se o nevo anémico que destacamos.
O nevo anémico é uma lesão que surge ao nascimento ou na infância precoce, permanente, circunscrita,
geralmente no tronco. Expressa uma anomalia mais
funcional que anatómica, com aumento da reactividade
dos receptores a catecolaminas levando a uma vasoconstrição permanente6,7. A aplicação de fricção, calor
ou frio acentua a lesão já que os bordos ficam hiperémicos e a lesão permanece pálida. Tal como ocorre nas
MB, o nevo anémico torna-se imperceptível após pressão suficiente para branquear a pele envolvente.
Na literatura existem casos esporádicos que retratam
a associação de MB a gravidez ou determinadas patologias.
Foram descritas numa grávida de 32 semanas no
tronco e membros, com resolução gradual e total no
período pós-parto. Os autores relacionaram o seu
aparecimento com a hipertensão venosa acrescida na
mulher grávida8.
A associação de MB a crioglobulinémia mista tipo II
foi relatada numa doente de 75 anos. Os autores
especularam acerca do papel patogénico da hiperviscosidade9, o que foi reforçado quando se descreveram
MB nos antebraços de um doente com policitemia vera10.
Mais recentemente foi reportada a presença de MB
numa doente com crise renal esclerodérmica. Iniciaram-se com a crise e desapareceram após optimização da
terapêutica e melhoria da função renal11.
Finalmente foram descritos dois casos associados a
12
13
malformações da aorta: hipoplasia e coarctação .
Em todas as situações anteriormente referidas as
lesões eram fixas e subjacentes a patologias diversas, e
portanto, não devem ser consideradas sob o termo de
máculas anémicas fisiológicas.
O caso clínico apresentado está de acordo com o
diagnóstico de MB numa localização típica. O exame
histopatológico quando realizado não revela alterações
vasculares morfológicas nem melanocíticas. Relativamente á terapêutica, noutros doentes já se tinha recorrido á nifedipina, embora em doses mais elevadas (num
deles com dose 60 mg 1id) com alterações mínimas ou
nulas notadas9,14.
Em conclusão perante um doente com máculas hipocrómicas transitórias e assintomáticas o diagnóstico de
MB deve ser equacionado. A tranquilização do doente
quanto à etiologia benigna destas lesões, que não
carecem de tratamento, deverá constituir o principal
objectivo.
123
Felicidade Santiago, Hugo S. Oliveira, Américo Figueiredo
Caso Clínico
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Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 127-131 (2009)
Caso Clínico
SÍNDROME DE LAUGIER-HUNZIKER
Ricardo Coelho1, Manuel Martins2, Isabel Viana2, Esmeralda Vale2, Olívia Bordalo2
Serviço de Dermatologia, Hospital Distrital de Faro; 2Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa
1
RESUMO - O síndrome de Laugier-Hunziker é uma doença esporádica rara, de etiologia desconhecida que se
caracteriza por máculas hiperpigmentadas assintomáticas que atingem frequentemente os lábios, a cavidade oral e
mais raramente os dedos, palmas e área genital, com algumas características comuns ao síndrome de Peutz-Jeghers
mas sem alterações sistémicas nem predisposição para doenças malignas. Os autores descrevem o caso clínico de uma
mulher caucasiana de 75 anos com quadro clínico sugestivo de síndrome de Laugier-Hunziker.
PALAVRAS-CHAVE - Síndrome de Laugier-Hunziker; Hiperpigmentação; Síndrome de Peutz-Jeghers.
LAUGIER-HUNZIKER SYNDROME
ABSTRACT - Laugier-Hunziker syndrome (LHS) is a rare sporadic disorder; of unknown aetiology, consisting of
asymptomatic areas of hyperpigmentation affecting the lips, buccal mucosa and fingernails, witch shares some clinical
features with Peutz-Jeghers syndrome. However, no underlying systemic abnormalities are associated with LHS and no
malignant predisposition exists. We report a 75-year-old Caucasian woman presented with clinical features of LaugierHunziker syndrome.
KEY-WORDS - Laugier-Hunziker syndrome; Hyperpigmentation; Peutz-Jeghers syndrome.
Correspondência:
Dr. Ricardo Coelho
Rua dos Remédios à Lapa, 9
1200-782 Lisboa
E-mail: [email protected]
127
Ricardo Coelho, Manuel Martins, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo
Caso Clínico
INTRODUÇÃO
O Síndrome de Laugier-Hunziker (SLH) é uma entidade benigna, rara e adquirida que consiste na
pigmentação dos lábios, mucosas (oral e genital) e
regiões acrais. O SLH levanta problemas de diagnóstico
diferencial com outras entidades associadas a hiperpigmentação mucocutânea, sendo este um diagnóstico
de exclusão.
CASO CLÍNICO
Os autores apresentam o caso clínico de uma doente
do sexo feminino de 75 anos, caucasiana, observada na
Consulta Externa por manchas hiperpigmentadas monomorfas, ovais/circulares, de limites bem definidos,
isoladas, com cerca de 4 a 10mm de diâmetro, com
distribuição simétrica localizadas nas polpas dos dedos
das mãos, lábios, língua, região perianal e mucosas oral
e vaginal (Figs. 1 e 2). Estas lesões eram assintomáticas,
tinham 10 anos de evolução e agravamento progressivo
com carácter aditivo. Os antecedentes pessoais e familiares eram irrelevantes e a doente negava qualquer
medicação habitual. O restante exame físico era normal.
Com base nos dados anamnésicos e exame dermatológico, foram colocadas várias hipóteses de diagnóstico:
S. Peutz-Jeghers, SLH, e Insuficiência supra-renal. Foram
pedidos exames laboratoriais (hemograma, função renal
e hepática, ACTH e cortisol sérico e urinário) que não
revelaram alterações. O exame histopatológico de biópsia da mucosa oral mostrou acantose com discreta
hiperpigmentação da basal e presença de melanocitos
dendríticos além de melanófagos na derme papilar (Fig.
3). Para exclusão de envolvimento sistémico, foi feita
endoscopia digestiva alta e colonoscopia que não documentaram alterações. A conjugação dos dados clínicos e
a)
b)
c)
d)
Fig. 1 - a) Múltiplas máculas hiperpigmentadas na língua; b) polpas dos dedos das mãos; c) Mucosa oral e d) Lábio inferior.
128
Síndrome de Laugier-Hunziker
Caso Clínico
a)
a)
b)
Fig. 3 - Acantose e hiperpigmentação da camada basal, com
numerosos melanófagos na derme papilar e melanócitos
dendríticos basais: a) H&E, X100; b) H&E, X400.
histopatológicos e a exclusão de envolvimento sistémico
pela avaliação laboratorial e endoscópica permitiram
chegar ao diagnóstico de S. Laugier-Hunziker. Tratando-se de uma dermatose benigna sem envolvimento sistémico associado, foi feita apenas a tranquilização da
doente estando as lesões sobreponíveis após 3 anos de
seguimento.
DISCUSSÃO
b)
Fig. 2 - a) Lesões com as mesmas características com localização na mucosa vaginal e b) perianal.
Em 1970, Laugier e Hunziker publicaram 5 casos de
hiperpigmentação macular adquirida dos lábios e mucosa oral1. Dois dos doentes tinham também bandas
longitudinais pigmentadas nas unhas das mãos e não
havia evidência de qualquer envolvimento sistémico em
129
Ricardo Coelho, Manuel Martins, Isabel Viana, Esmeralda Vale, Olívia Bordalo
Caso Clínico
nenhum dos doentes. Existe um predomínio do sexo
feminino (2:1) e a dermatose tem início mais frequentemente entre a segunda e a quarta década de vida2,3. A
etiologia da hiperpigmentação no SLH é desconhecida e
não é característica uma história familiar positiva para
esta entidade. Estão no entanto publicados na literatura
três casos de SLH ocorridos na mesma família4.
A hiperpigmentação consiste em máculas assintomáticas, isoladas ou confluentes, circulares ou ovais,
ocasionalmente lineares, com cor variável entre o
castanho e o preto. Classicamente, as áreas afectadas
incluem os lábios (predominantemente o lábio inferior
como se observou na nossa doente) e a cavidade oral
(incluindo a mucosa jugal, palato, gengiva e língua). As
unhas estão afectadas em cerca de 60% dos casos e
estão descritas várias variantes, desde uma a duas
bandas hiperpigmentadas lineares longitudinais, hiperpigmentação afectando metade da unha ou a unha
completa5,6. Existe uma grande variabilidade topográfica e outras localizações têm sido descritas na
literatura7-9. É o caso de lesões do dorso ou face lateral
dos dedos das mãos, órgãos genitais, períneo, região
perianal e mucosa anal (que também se observava na
nossa doente). O atingimento das conjuntivas, escleróticas, mucosa esofágica, pescoço, tórax e abdómen está
igualmente descrito10.
Histologicamente, é característico um reforço da
melanina dos queratinócitos da camada basal e
incontinência pigmentar com melanófagos na derme
papilar, sem que se observe um aumento do número de
melanócitos. No entanto, trabalhos recentes referem
também a presença de melanócitos dendríticos na
basal, como ocorreu no nosso caso.3 Acantose ligeira a
moderada pode igualmente ser observada1-3. A microscopia electrónica revela um aumento do número de
melanossomas maduros, isolados ou agrupados, de
diferentes dimensões, localizados no citoplasma de
queratinócitos e melanófagos2. Os aspectos histopatológicos observáveis no SLH são inespecíficos e isoladamente não permitem afirmar o diagnóstico.
Existem várias entidades que cursam com hiperpigmentação mucocutânea e/ou melanoníquia fazendo
diagnóstico diferencial com o SLH. É o caso da pigmentação racial, iatrogénica, doença de Addison e síndrome
de Peutz-Jeghers.
A hiperpigmentação mucocutânea fisiológica observada em indivíduos não caucasóides é muito frequente e
pode ser observada em cerca de 38% de indivíduos de
raça negra11. Da mesma forma, a melanoníquia longitudinal pode estar presente em cerca de 96% dos
indivíduos de raça negra12.
130
A doença de Addison pode determinar a presença de
hiperpigmentação mucocutânea difusa devida ao
aumento da ACTH e da MSH, que resulta numa
hiperfunção dos melanócitos condicionando a pigmentação da pele e mucosas característica desta entidade.
Outros sinais e sintomas da doença de Addison, incluem
fadiga, perda de peso, hipotensão e distúrbios gastrointestinais. Estes sinais e sintomas estão tipicamente
ausentes no SLH e os doseamentos hormonais são
também normais13,14.
Os fármacos são outra causa bem estabelecida de
hiperpigmentação mucocutânea (é o caso das tetraciclinas, dos contraceptivos orais ou de agentes de
quimioterapia), no entanto, nenhum fármaco relevante
tinha sido consumido pela nossa doente13,14.
A síndrome de Peutz-Jeghers é uma doença autossómica dominante caracterizada por polipose gastrointestinal com malignização potencial e hiperpigmentação
da pele e mucosas podendo observar-se a presença de
máculas irregularmente distribuídas nos lábios e mucosa
oral, bem como na região perioral, nasal e ocular. O
exame histopatológico mostra igualmente um aumento
da pigmentação da camada basal, sem que se observe
um aumento no número de melanocitos. A hiperpigmentação mucocutânea na síndrome de Peutz-Jeghers tem
início na infância com agravamento máximo na
puberdade15. A nossa doente não tinha polipos intestinais
na colonoscopia, nem história familiar de doença cutânea
e as lesões surgiram durante a idade adulta, factores que
permitiram excluir a síndrome de Peutz-Jeghers.
Excluídas as principais causas de hiperpigmentação
mucocutânea, foi feito o diagnóstico de SLH. Sendo esta
uma entidade benigna, não existe indicação para
qualquer terapêutica dirigida. Existem no entanto relatos
na literatura de métodos terapêuticos com bom
resultado cosmético, que incluem o LASER Q-switched
alexandrite, Q-switched Nd:YAG e a criocirurgia16-18.
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Caso Clínico
HIPERIDROSE E BROMIDROSOFOBIA
Rui Tavares-Bello
Serviço de Dermatologia, Hospital Militar de Belém
RESUMO - Acredita-se que entre 20 e 40% dos doentes que procuram cuidados dermatológicos diferenciados tenham
algum tipo de problema psicológico ou psiquiátrico subjazendo ou complicando as queixas. Assim, concebe-se a
doença psico-cutânea como toda e qualquer doença da pele e dos seus anexos, nos quais factores de índole psicológica
são operativos na génese, apresentação, gravidade e evolução.
A Hiperhidrose Idiopática pertence ao grupo das psicodermatoses relacionadas com o stresse enquanto a
Bromidrosofobia ou Bromidrose Delirante, caracterizada por falsas crenças de um mau odor corporal, está incluída no
grupo das psicodermatoses psicogénicas.
Caso clínico de EC, de 30 A, com hiperhidrose axilar crónica, agravada pelo stresse e com 14 A de evolução, surgida no
contexto de graves conflitos familiares. Após exploração clínica e complementar, foi prescrita iontoforese em esquema
diário, o qual se revelou eficaz com remissão obtida – objectiva e subjectiva – do sintoma. Três meses depois, passa a
queixar-se de um odor axilar intolerável, que se repercutia fortemente na sua vida pessoal e profissional. O exame
clínico não revelou hiperhidrose nem qualquer odor particular. O tratamento encetado, para o controlo sintomático de
um quadro ansioso e depressivo, permitiu uma melhoria da qualidade do sono e dos sentimentos de autodesvalorização sem, no entanto, interferir na sua crença, que entretanto assumira o carácter de um verdadeiro delírio
intrusivo, partilhado pela sua mãe, com quem coabitava. Tendo sempre recusado ajuda psicológica ou psiquiátrica, o
doente faltou ao seguimento.
O caso presente ilustra por um lado a dificuldade em lidar com estes doentes, em particular a compliance aos
tratamentos e, por outro, enfatiza a fragilidade das classificações das psicodermatoses. De facto, o que se iniciou por
uma queixa objectiva relacionada com o stresse, veio a evoluir para um quadro primariamente subjectivo, psicogénico,
de delírio de referência olfactiva. Discute-se o caso à luz da literatura relevante.
PALAVRAS-CHAVE - Hiperidrose; Bromidrosofobia; Delírio de referência olfactiva; Doenças psico-cutâneas.
HYPERHYDROSIS AND BROMIDROSOPHOBIA
ABSTRACT - It is widely believed that 20 to 40% of dermatological patients have some kind of psychological/psychiatric
problem underlying their skin complaints. So, the concept of psychocutaneous disease applies to all and every skin
ailment, in which psychological factors are determinant in their genesis, presentation, severity and evolution.
Idiopathic Hyperhidrosis is usually included in the category of stress related psychodermatoses while Bromidrosophobia,
characterized by tenacious and false beliefs of a foul body odour, is normally described as a primary psychogenic
psychocutaneous disease.
The case of a 30 YO Caucasian male that for the last 14 years had complaints of hyperhidrosis is reported. After clinical
and lab evaluation, he was submitted to a daily and then weekly tap water iontophoresis schedule, which was fully
successful. However, 3 months later, the patient started complaining of severe axillary bromhydrosis, which, allegedly,
strongly compromised his personal and professional life. Clinical examination disclosed neither hyperhidrosis nor
bromhydrosis. Treatment that was prescribed – for the symptomatic control of a mild depressive and anxious status – did
allow to obtain some improvement both in the sleep quality and in the low self-esteem without however interfering in his
foul odour belief. In fact, this delusion turned out to assume the character of a truly intrusive delusion, which was otherwise
shared by his mother with whom he lived. The patient failed the proposed follow up visits.
The case is discussed at the light of the relevant literature.
KEY-WORDS - Hyperhidrosis; Bromosis delusions; Olfactory reference syndrome; Psychocutaneous disorders.
133
Rui Tavares-Bello
Caso Clínico
Correspondência:
Dr. Rui Tavares-Bello
Rua D. Francisco de Almeida, 23
2750-163 Cascais
INTRODUÇÃO
Acredita-se que entre 20 e 40% dos doentes que procuram cuidados dermatológicos diferenciados tenham
algum tipo de problema psicológico ou psiquiátrico
subjazendo ou complicando as queixas1,2. Não estranha
que assim seja: a Pele desempenha um papel absolutamente ímpar na cognição sensorial e imunológica, na
individualização precoce, na comunicação, na atracção
sexual... O sofrimento dermatológico, globalmente
menorizado e trivializado, tem de facto um forte impacto
no indivíduo doente, fortemente afectado no seu estado
psicológico, relações sociais e actividades quotidianas.
Por outro lado, a acessibilidade imediata do orgão
propicia igualmente uma interacção directa com a
própria doença, facilitando condutas que afectam a
doença e o doente (coceira, negligência, agravamento).
Assim, no contexto da inevitável reciprocidade na
relação dermatose / alteração psicológica / psiquiátrica,
no quadro de uma conjuntura social determinada pela
visibilidade e pela relevância enorme da pele, concebese a doença psico-cutânea3 ou síndrome psicodermatológica4 como toda e qualquer doença da pele e dos
seus anexos, nos quais factores de índole psicológica
são operativos na sua génese, apresentação, gravidade
e evolução.
Nesta complexa área pode ser encarada uma classificação que valorize o tipo e o grau de relacionamento
causal entre os factores psicológicos e a dermatose. De
acordo com a classificação etiopatogénica original de
Caroline Koblenzer3 as doenças psico-cutâneas classificam-se em primariamente psiquiátricas (delírios
centrados na pele, Pert Dismórfica Corporal, Tricotilomania, dermite artefacta e excoriações neuróticas...) e
em primariamente dermatológicas, eventualmente desencadeadas ou amplificadas por factores situacionais
que determinam sofrimento psicológico ou perturbação
psiquiátrica reactivas (Quadro I). Uma outra classificação4 propõe: 1. Dermatoses primariamente psicogénicas, 2. Dermatoses psicossomáticas causadas pelo
stresse e 3. Dermatoses biologicamente determinadas,
cuja evolução é condicionada por factores emocionais
(Quadro II). Outras classificações foram propostas
(Quadros III e IV)5,6 e, independentemente dos méritos
134
Quadro I
CLASSIFICAÇÃO DAS
DOENÇAS PSICO-CUTÂNEAS
Caroline Koblenzer, 19833
1. Doenças primariamente psiquiátricas
2. Doenças primariamente dermatológicas
Quadro II
CLASSIFICAÇÃO QUE VALORIZA
O RELACIONAMENTO CAUSAL ENTRE OS
FACTORES PSICOLÓGICOS E A DERMATOSE
Van Moffaert M, 19924
Dermatoses estritamente psicogénicas (dermatoses psico-cutâneas
strictu senso)
Dermatoses psicossomáticas basicamente provocadas pelo stresse
Dermatoses biologicamente determinadas,
cuja evolução é condicionada por factores emocionais
Quadro III
CLASSIFICAÇÃO PRAGMÁTICA,
PARA USO CLÍNICO
PELOS DERMATOLOGISTAS
Millard e Cotterill, 20046
1. Condições primariamente psiquiátricas mas que se apresentam
1. frequentemente a dermatologistas (Delírios centrados na pele,
1. alt da imagem corporal, estados fóbicos, perturbações obsessivo1. -compulsivas envolvendo a pele)
2. Reacções de grupo e de massas (sick building syndrome...)
3. Dermatoses primariamente factícias:
Dermatoses agravadas por hábitos e compulsões prejudiciais
Dermatoses causadas por respostas fisiológicas exacerbadas
(hiperidrose e blushing)
Dermatoses nas quais factores emocionais precipitantes
ou perpetuantes podem ser importantes
relativos, o seu interesse não é de todo despiciendo já
que permite implementar uma abordagem sistematizada ao doente, integrando de forma adequada a
panóplia de opções terapêuticas disponíveis incluindo a
dermatológica, a psicológica e a psiquiátrica.
Hiperidrose e Bromidrosofobia
Caso Clínico
Quadro IV
CLASSIFICAÇÃO DAS
MANIFESTAÇÕES PSICOCUTÂNEAS
Saurat, JH et al, 20045
Expressão cutânea de doenças psiquiátricas
Ilusões/delírios patológicos
Indução/simulação de sinais
Fobias
Dermatoses cujo desencadeamento e evolução implicam
factores emocionais
Dermite Atópica, herpes, hiperidrose...
A Hiperidrose Focal Idiopática é na generalidade
dos casos incluída no grupo das dermatoses primárias
ou respostas fisiológicas acentuadas da pele relacionadas com o stresse7 enquanto a Bromidrosofobia ou
Bromidrose Delirante, caracterizada por delírios ou
falsas crenças relativas à presença de um mau odor
corpo-ral8,9, está incluída no grupo das psicodermatoses
primariamente psiquiátricas.
cerca de 14 anos de evolução, surgida no contexto de
graves conflitos familiares. O quadro também se
manifestava, embora de forma mais errática, nas mãos
e pés, dorso e região peitoral e assumia por vezes,
alegadamente, um carácter “paroxístico” em situações
de tensão emocional ou mesmo durante o sono.
Tratava-se de um doente claramente ansioso, com um
discurso loquaz e atabalhoado, porém com um léxico
rico e variado concordante com o estatuto de trabalhador-estudante, trabalhando durante o dia numa
unidade hoteleira de Lisboa e frequentando à noite com
sucesso o Curso de Filosofia. Trazia inúmeros artigos
retirados da Internet referentes à sua “Hyperhidrosis”,
como fazia questão em dizer. Após exploração clínica e
complementar (Quadro V), foi prescrita iontoforese com
água corrente em esquema diário para as axilas e para
as palmas e plantas, o qual se revelou eficaz com
remissão obtida – objectiva e subjectiva – do sintoma ao
fim de cerca de 10 dias, a qual se manteve mediante
esquema de manutenção com 2 sessões semanais de
iontoforese.
Quadro V
CASO CLÍNICO
Apresento caso clínico de EC masculino, de 30 A de
idade, que recorre à consulta por quadro de hiperhidrose axilar crónica (Fig. 1), agravada pelo stresse e com
Fig. 1
EX COMPLEMENTARES
(NORMAIS OU NEGATIVOS)
Hemograma completo, Urina II, ionograma, Bioquímica incluindo
PFHepática e PFRenal
Avaliação endocrinológica incluindo TSH, T3 e T4, Prolactinémia
basal, Cortisolémia, metanefrinas, catecolaminas e AVM urinários,
PTH e Ác 5 OH Indol acético urinário
Cerca de 3 meses depois, o doente regressa à consulta, agora queixando-se de um odor corporal intolerável, que se repercutia de forma grave na sua vida
pessoal e profissional. O exame clínico não revelou nem
hiperidrose nem qualquer odor particular. Trazia com ele
novos artigos com referências à relação entre a “má
alimentação e a bromidrose” e uma carta que pretendia
ultrapassar a “vergonha e o acanhamento” que sentia
aquando do contacto directo na consulta (Quadro VI).
Na carta, para além de definir que o âmbito do
problema tinha passado de um nível dermatológico
para um neurológico, envolvendo o sistema nervoso
central, afirmava a propósito do alegado mau odor
“...situação essa que tem vindo a piorar substancialmente derivado ao facto de, eu não possuir olfacto,
como a minha mãe, o que ainda torna pior a situação...”.
Adiante, salientando o impacto negativo da alegada
anosmia e do mau odor afirma “...pelo facto de, a
135
Rui Tavares-Bello
Caso Clínico
Quadro VI
CARTA PARA O MÉDICO DERMATOLOGISTA
APRESENTADA NA 2ª CONSULTA
“...Eu, MJFAA, seu doente recente de dermatologia,
venho por este meio informá-lo de acontecimentos...por
vergonha e acanhamento...Na minha perspectiva
pessoal, os diversos tratamentos que me recomendou,
nomeadamente o método da iontoforese, juntamente
com todas as medidas que o Senhor me tem vindo a
recomendar... teve resultados quase imediatos com
uma quase cessação de manifestações de suor a nível
cutâneo, inclusive nos dias mais quentes do Verão, e
que até à data me causavam sempre muito embaraço e
retraimento.”
“...Mas todavia, pelo que me tenho apercebido desde á
um mês a esta parte,... noto uma variação da minha
doença, que no meu entender, e o Senhor Doutor o
confirmará ou não, deixou de ter um contexto dermatológico...e passou a ter uma evolução diferente,
limitando-se a um nível estritamente neurológico,
com um mau odor corporal derivando daí uma
constante insegurança que sinto em lugares públicos
com pessoas conhecidas ou mesmo desconhecidas...”
natureza não ter dado meios de me defender a mim próprio e com isso proteger o meu corpo de uma situação
humilhante e desagradável socialmente, situação essa,
como disse, começou a tomar proporções alarmantes...”. Terminava a carta afirmando não pretender
“...ser submetido a tratamentos com ansiolíticos” os
quais lhe comprometeriam o desempenho intelectual e
lhe poderiam provocar “Hyperhidrosis”(sic) e suscitando a possibilidade de um tratamento mais definitivo,
com “...toxina botulínica o/ou simpaticectomia torácica
por Videotoracoscopia” .
O tratamento encetado – resultado de uma negociação persistente – associando tópicos e agentes psicofarmacológicos para o controlo sintomático de um
quadro ansioso e depressivo, permitiu uma melhoria da
qualidade do sono e dos sentimentos de auto-desvalorização do doente sem, no entanto, interferir na sua
crença de mau odor corporal, a qual veio a assumir o
carácter de um verdadeiro delírio intrusivo, de resto
partilhado pela sua mãe, com quem coabitava. Tendo
sempre recusado ajuda psicológica ou psiquiátrica, o
doente faltou ao seguimento.
136
DISCUSSÃO
O caso presente é ilustrativo da problemática das
patologias psicocutâneas. Uma queixa frequente – a
hiperidrose – constatada aquando da 1ª consulta, justificou uma exploração clínica e complementar laboratorial
que atestou a sua natureza funcional, eventualmente
relacionada com o stresse. O tratamento efectuado – a
iontoforese – revelou a sua eficácia, verificada objectivamente pelo médico e “aclamada” pelo próprio
doente. No entanto, essa queixa viria a ser substituída
rapidamente por uma outra queixa –a bromidrose – não
objectivável nem pelo médico nem pelo doente e sua
mãe, por diferentes razões. De facto, a bromidrose
assumia neste contexto o carácter de um verdadeiro
delírio uma vez que, por um lado, não podia ser contrariado por terceiros e, por outro, não podia ser avaliado
nem pelo próprio nem sua mãe dada a anosmia de que
ambos alegadamente padeciam. De facto, o mau odor
corporal é inferido pelo doente e sua mãe não no plano
da sensorialidade, mas pelo resultado social – incapacidade em estabelecer relações sociais de proximidade.
De resto, também a hiperidrose – essa sim verificada
objectivamente – se constituía como um entrave social
de monta.
A problemática social parece pois ser fulcral na economia da doença: causa objectiva (a hiperidrose), uma
vez controlada, converte-se em sintoma imaginado (a
bromidrose), ambas justificativas de deficiente inserção
social.
Estamos consequentemente perante uma situação
patológica caracterizada por um delírio bem circunscrito
que, não afectando o funcionamento profissional ou
escolar do doente, é no entanto gerador de franca
ansiedade social. O delírio é igualmente assumido pela
mãe – “folie a deux” –, único componente de uma
unidade familiar residual, frágil e marcada por uma
história traumática e conflitual.
O caso apresentado é revelador das dificuldades
sentidas pelos dermatologistas com número significativo
de doentes psicodermatológicos. Em 1º lugar, a não
observância da referenciação a profissional de saúde
mental, a relutância em cumprir a prescrição de psicofármacos e, finalmente, da comparência a consultas de
seguimento contrasta com a pressão exercida para ser
submetido a tratamentos mais invasivos. Em 2º lugar, a
variação/vicariação das queixas ao longo do tempo, ao
sabor da economia da doença (1º hiperidrose e, depois,
bromidrose). Em 3º lugar, a dimensão social do
problema: num plano mais restrito com o delírio familiar
(“folie a deux”) e, num plano mais geral, com as queixas
Hiperidrose e Bromidrosofobia
Caso Clínico
de hiperidrose e o delírio funcionando como verdadeiros
“alibis” para as dificuldades sociais óbvias do doente.
Uma palavra final para a não aplicabilidade prática
neste caso das várias classificações das síndromes psico-cutâneas. De uma queixa relativamente prevalente,
relacionada habitualmente com o stresse, para um
quadro delirante de referência olfactiva, a variação
registada em curto intervalo pelo doente ilustra sem
dúvida a complexidade e a multidimensionalidade inerentes ao diagnóstico e sofrimento psiquiátricos.
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137
Trab Soc Port Dermatol Venereol 67 (1): 139-142 (2009)
Caso Clínico
ROSÁCEA FULMINANTE
Daniela Cunha1, Raquel Vieira1, Alexandra Chaveiro1, Ana Afonso2, Jorge Cardoso1
Serviços de 1Dermatovenereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital de Curry Cabral, Lisboa
RESUMO - A rosácea fulminante é uma patologia rara que afecta predominantemente mulheres em idade adulta, em
muitos casos sem diagnóstico prévio de rosácea.
Os autores descrevem o caso de uma doente do sexo feminino, de 53 anos, admitida por dermatose circunscrita à face,
de início abrupto e evolução rápida em duas semanas, caracterizada por nódulos inflamatórios coalescentes em placas,
pústulas e lagos de pus. Analiticamente salientava-se elevação dos valores séricos da Proteína C reactiva e ligeira
macrocitose. No exame histopatológico observava-se um processo inflamatório misto na derme superficial, com
destruição do epitélio folicular.
O quadro clínico foi inicialmente controlado com corticoterapia oral associada a amoxicilina e ácido clavulânico e
posteriormente em associação com doxiciclina oral, metronidazol 7.5mg/g tópico e pimecrolimus a 1% creme. Por
persistência de nódulos inflamatórios a terapêutica oral foi substituída por isotretinoina (10mg/dia), com melhoria
significativa ao 4º mês de terapêutica.
Ao 16º mês de follow-up a doente permanece bem, sem terapêutica sistémica.
PALAVRAS-CHAVE - Rosácea fulminante; Acne fulminante; Terapêutica.
ROSACEA FULMINANS
ABSTRACT - Rosacea fuminans is a rare disease mainly affecting post-adolescent women generally without a previous
diagnosis of rosacea.
The authors describe the clinical case of a 53 year-old caucasian woman, who had a sudden spring up of multiple and
coalescent nodular and pustular lesions on the face with a rapid evolution through the next two weeks. Laboratory work
revealed elevated C reactive protein blood levels and slight macrocitosis. Histopathology showed an intense inflammatory
infiltrate through the upper dermis with follicular epithelium destruction.
Patient's condition was successfully managed with the association of oral prednisolone and amoxicillin and clavulanic acid
and latter combined with oral doxicicline, topical metronidazole 7.5 mg/g and topical pimecrolimus 1%.
As inflammatory nodules didn't subside systemic treatment was replaced by Isotretinoin, leading to a significant clinical
improvement at the 4th month of treatment.
At the 16th month of follow-up the patient remains well with no need of systemic treatments.
KEY-WORDS - Rosacea fulminans; Acne fulminans; Treatment.
Correspondência:
Dr.ª Daniela Cunha
Serviço de Dermatologia
Hospital Curry Cabral
Rua da Beneficência, nº8
1069-166 Lisboa
Tel/Fax: 217924274
139
Daniela Cunha, Raquel Vieira, Alexandra Chaveiro, Ana Afonso, Jorge Cardoso
Caso Clínico
INTRODUÇÃO
A rosácea fulminante é uma patologia pouco frequente que parece consistir numa forma grave e súbita
de rosácea conglobata1.
Habitualmente manifesta-se em mulheres adultas,
com ou sem história pregressa sugestiva do diagnóstico
de rosácea.
De início abrupto e evolução rápida, a doença tende a
limitar-se à face, em particular à região central. Apenas
ocasionalmente se observam manifestações sistémicas.
CASO CLÍNICO
Descreve-se o caso de uma mulher de 53 anos, caucasiana, aparentemente saudável, admitida por dermatose
limitada à face, com cerca de duas semanas de evolução.
As lesões tinham surgido subitamente, nas regiões malares, caracterizando-se por pápulas, pústulas e nódulos
eritematosos, acompanhados de prurido e sensação de
ardor local. Registou rápida progressão da dermatose a
toda a face, com franco aumento do número de lesões e
coalescência das mesmas.
A doente referia agravamento das queixas após a
exposição a ambientes aquecidos ou a ingestão de
bebidas alcoólicas e descrevia sintomatologia sugestiva
de “flushing” no decurso dos últimos 2 anos.
Negava aplicação de tópicos ou introdução de novos
fármacos previamente ou no decurso da evolução da
dermatose.
Nos antecedentes pessoais havia a salientar hábitos
etanólicos de 20g/dia no decurso dos útimos 6 a 12
meses. Negava história de patologia cutânea prévia,
designadamente acne ou rosácea, bem como de patologia de foro ginecológico.
Na admissão observava-se dermatose circunscrita à
face, com predomínio centro-facial, cujas lesões consistiam em múltiplas pápulas eritematosas, nódulos
eritematovioláceos coalescentes em placa e pústulas
coalescentes em lagos de pús (Fig. 1). Não se observavam lesões das mucosas oral ou ocular.
A doente encontrava-se apirética (36,7ºC) e hemodinamicamente estável (tensão arterial sistólica=
120mmHg, diastólica=76mmHg, frequência cardíaca
de 80 bpm). O restante exame objectivo encontrava-se
dentro da normalidade.
Do ponto de vista analítico, havia a salientar macrocitose (100,5fl), sem anemia e elevação da gama glutamil transpeptidase (53U/L, valor de referência 12 a 43
U/L). No exame histopatológico de biópsia cutânea
140
Fig. 1 - Pápulas, nódulos inflamatórios e pústulas coalescentes em lagos de pús, com predomínio centro-facial.
observava-se um processo inflamatório intenso na metade superficial da derme, com destruição do epitélio folicular, compatível com o diagnóstico de rosácea (Fig. 2).
Neste contexto, assumiu-se o diagnóstico de rosácea
fulminante. Foi instituída terapêutica com prednisolona
oral na dose de 10mg/dia associada a terapêutica
antibiótica com amoxicilina e ácido clavulânico (2,2g
12/12 horas, ev), cianocobalamina (1mg/dia p.os),
ácido fólico (5mg/dia p.os) e omeprazol (20mg/dia
p.os). Durante os 8 dias de internamento verificou-se
estabilização clínica, regressão das pústulas e persistência de pápulas e nódulos coalescentes em placa. Na
alta hospitalar foi mantida a corticoterapia oral, bem
como o ácido fólico e a cianocobalamina, tendo-se
associado doxiciclina na dose de 200mg/dia durante 10
dias com posterior diminuição para 100mg/dia. A tera-
Rosácea Fulminante
Caso Clínico
a)
b)
Fig. 2 - Exame histopatológico de biópsia cutânea onde observa um processo inflamatório intenso na metade superficial da derme, com
destruição do epitélio folicular (a) H&E, 40x; b) H&E, 100x.
pêutica tópica consistiu em metronidazol 7,5mg/g
(creme) e pimecrolimus 1% (pomada). A corticoterapia
oral foi progressivamente diminuida e descontinuada no
final do primeiro mês. A restante terapêutica foi mantida
durante os primeiros dois meses de seguimento ambulatório. Nessa altura a melhoria clínica era apenas
moderada, persistindo ainda múltiplos nódulos
inflamatórios coalescentes na região frontal, regiões
malares e mento. A doxiciclina foi então suspensa e
introduzida isotretinoína oral na dose de 10mg/dia,
mantendo-se a restante terapêutica tópica. Esta associação terapêutica foi mantida durante os quatro meses
seguintes, assistindo-se a franca melhoria sintomática,
com regressão das pápulas e nódulos inflamatórios. A
terapêutica com isotretinoina foi, nesta altura, descontinuada, mantendo-se apenas a terapêutica tópica.
Ao 16º mês de seguimento, 10º mês sem necessidade de terapêutica sistémica, a doente encontra-se
bem, não tendo sofrido recorrência da dermatose. Do
ponto de vista analítico verificou-se normalização volume globular médio e da gama glutamil transpeptidase.
DISCUSSÃO
A rosácea fulminante é uma patologia rara originalmente descrita por O'Leary e Kierland sob a designação
de pioderma faciale2. Plewing e col. descreveram, em
1992, 20 novos casos e reviram sistematicamente 51
casos previamente reportados1. Na sequência destes
estudos propuseram a designação de rosácea fulmi-
nante por analogia com a acne fulminante, rejeitando
classificação de piodermite1,3.
Trata-se uma doença habitualmente observada em
mulheres pós-adolescentes, embora Firooz e col. tenham
descrito em 2001, um caso de rosácea fulminante numa
criança de 3 anos de idade4.
A fisiopatologia não é completamente conhecida,
admitindo-se o stress como potencial factor precipitante3. Do ponto de vista clínico são conhecidas as
associações de rosácea fulminante com a gravidez5,6 e
com a doeça inflamatória intestinal7,8, muito embora
não seja claramente estabelecido o mecanismo subjacente a estas associações.
Clinicamente a rosácea fulminante é uma doença de
início súbito, limitada à face, com predomínio da região
centro-facial. A dermatose é constituída por pápulas,
pústulas e nódulos coalescentes, ocasionalmente com
trajectos fistulosos, não se acompanhando geralmente
de manifestações sistémicas1,3.
O reduzido número de casos justifica a ausência de
uma abordagem terapêutica uniformizada. Massa e
col.9 em 1982 descreveram resultados satisfatórios combinando a associação de antibioterapia sistémica
(tetraciclina, minociclina ou eritromicina) e tópicos contendo enxofre e sulfatos de cálcio. A utilização de
isotretinoina oral em combinação com corticoterapia
tópica ou sistémica, revelou resultados favoráveis,
apresentados nos trabalhos de Veraldi e col. (1996)10 e
de Plewig e col. (1992 e 1994)11,12. Mais recentemente,
em 2001, Bormann e col.13 descreveram a utilização de
dapsona com boa resposta clínica, numa doente de 56
141
Daniela Cunha, Raquel Vieira, Alexandra Chaveiro, Ana Afonso, Jorge Cardoso
Caso Clínico
anos de idade, resistente às terapêuticas previamente
referidas.
A resolução clínica é lenta, podendo prolongar-se ao
longo de um ano, embora habitualmente curse sem
recidivas1,3.
Este caso clínico consiste num quadro clínico característico de uma patologia rara. À semelhança das outras
formas de rosácea, o papel desempenhado pela ingestão etanólica pode ter sido determinante na precipitação
da dermatose, embora esta relação não seja comprovável.
Destaca-se também a complexidade das associações
terapêuticas que conduziram à resolução da dermatose
e a resposta mantida, sem recorrência aos 16 meses de
seguimento.
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Caso Clínico
PÊNFIGO VULGAR REFRACTÁRIO –
TRATAMENTO COM RITUXIMAB
Catarina Vilarinho, Filipa Ventura, José Carlos Fernandes, Celeste Brito
Serviço de Dermatologia, Hospital de São Marcos, Braga
RESUMO - Descreve-se o caso clínico de doente do sexo masculino com pênfigo vulgar tratado com várias associações
que incluíram: prednisolona, azatioprina, ciclosporina, ciclofosfamida, imunoglobulina humana intravenosa (IGIV) e
micofenolato de mofetilo. Durante a fase de doença activa, houve sobreposição de infecção herpética por HSV-1, que
cedeu à terapêutica com aciclovir. No entanto, o doente continuava a apresentar lesões extensas na face, couro
cabeludo e dorso pelo que se decidiu introduzir rituximab endovenoso na dose semanal de 375 mg/m2, durante 4
semanas consecutivas. Verificou-se melhoria clínica a partir da segunda infusão, com re-epitelização completa após 2
meses do início do tratamento. Decorridos 3 anos, o doente mantém-se em remissão clínica, sem qualquer medicação.
PALAVRAS-CHAVE - Pênfigo vulgar; Rituximab.
RECALCITRANT PEMPHIGUS VULGARIS SUCCESSFULLY
TREATED WITH RITUXIMAB
ABSTRACT - We report a case of recalcitrant pemphigus vulgaris (PV) successfully treated with rituximab. Besides prednisolone, several other immnosuppressive agents were gradually added: azathioprine, cyclosporine, cyclophosphamide
and intravenous immunoglobulin (IGIV). A overlapped herpetic (HSV-1) cutaneous infection was treated with intravenous
acyclovir and a new immunossupressive regimen was adopted: introduction of mycophenolate mofetil and suspension of
cyclosporin, cyclophosphamide and IGIV. However, the patient presented with persistent and severe PV lesions involving
face, scalp and trunk and intravenous rituximab was started at a dosage of 375 mg/m2 once weekly for 4 consecutive
weeks. After the second infusion, lesions began to heal, with complete re-epithelization 2 months after treatment. After 3
years follow-up, clinical remission was obtained and the patient is doing well, without any medications.
KEY-WORDS - Pemphigus vulgaris; Rituximab.
Correspondência:
Dr.ª Catarina Vilarinho
Serviço de Dermatologia
Hospital de São Marcos
Apartado 2242
4701-965 Braga
E-mail: [email protected]
145
Catarina Vilarinho, Filipa Ventura, José Carlos Fernandes, Celeste Brito
Caso Clínico
INTRODUÇÃO
CASO CLÍNICO
O Pênfigo Vulgar (PV) é uma dermatose bolhosa
auto-imune, mediada por auto-anticorpos patogénicos
anti-caderinas, de prognóstico reservado na ausência
de tratamento. Nem sempre os tratamentos convencionais são suficientes para obter o controlo eficaz e a
remissão clínica sustentada.
O rituximab é um anticorpo monoclonal anti-CD20
que induz deplecção das células B in vivo e daí ser usado
no tratamento de vários distúrbios auto-imunes mediados por auto-anticorpos1. A sua aplicação no tratamento
do PV tem vindo a ser descrita na literatura nos últimos
anos, através de casos clínicos ou pequenas séries de
doentes. Os resultados parecem promissores e capazes
de induzir remissão clínica por períodos prolongados,
como se verificou no caso clínico que descrevemos.
Descreve-se o caso clínico de doente do sexo masculino, 42 anos, agente da GNR. O doente foi-nos
referenciado pela especialidade de Estomatologia, por
lesões ulcerativas da cavidade oral, cuja biópsia tinha
revelado o diagnóstico de PV. A doença manteve-se
estável durante mais de 1 ano, controlada com baixas
doses de corticoterapia oral (5-20mg/dia prednisolona).
A partir de Março de 2005, verifica-se aparecimento
de bolhas superficiais, exulcerações e crostas envolvendo a face e couro cabeludo (Figs. 1 e 2). Além de
prednisolona até 120mg/dia, outros imunossupressores
foram adicionados sucessivamente e por esta ordem:
azatioprina, ciclosporina, ciclofosfamida, imunoglobulina humana intravenosa (IGIV).
Em Setembro de 2005, e na ausência de quaisquer
Fig. 1 - Bolhas, exulcerações e crostas.
Fig. 2 - Bolhas, exulcerações e crostas.
146
Pênfigo Vulgar Refractário – Tratamento com Rituximab
Caso Clínico
melhorias, repete-se biopsia de pele que revela infecção
herpética sobreposta a lesões de PV (Figs. 3 e 4). Por PCR
identificou-se o vírus herpes simplex tipo 1 (HSV-1). Nesta altura, o doente é internado para tratamento com
aciclovir endovenoso e ajustamento de novo regime
terapêutico para o PV. Reduziu-se a dose de prednisolona de 80mg/dia para 40mg/dia e de azatioprina de
150mg/dia para 100mg/dia. A ciclosporina, ciclofosfamida e os ciclos de IGIV foram suspensos. Foi adicionado micofenolato de mofetil, na dose de 2gr/dia.
face e tronco (Fig. 5). Perante este quadro clínico decidiu-se introduzir rituximab endovenoso na dose semanal de
375 mg/m2, durante 4 semanas consecutivas. Verificou-se melhoria clínica a partir da segunda infusão, com
re-epitelizacão completa após 2 meses do início do
tratamento. Não foram observados quaisquer efeitos
adversos relacionados com o uso do rituximab. O doente manteve tratamento com prednisolona, azatioprina e
micofenolato de mofetil, com redução gradual e progressiva dos fármacos até à sua suspensão. Passado um
período de follow-up de cerca de 3 anos, o doente
mantém-se em remissão clínica, sem qualquer medicação (Fig. 6).
Fig. 3 - Bolhas suprabasais sobrepostas a infecção herpética.
Fig. 5 - Manutenção das lesões de PV.
Fig. 4 - Bolhas suprabasais sobrepostas a infecção herpética.
Em Novembro de 2005, após resolução da infecção
herpética, documentada em nova biopsia e PCR, o
doente mantinha extensas áreas exulceradas e crostosas, facilmente sangrantes, envolvendo couro cabeludo,
Fig. 6 - Reepitelização após tratamento com rituximab.
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Catarina Vilarinho, Filipa Ventura, José Carlos Fernandes, Celeste Brito
Caso Clínico
DISCUSSÃO
O PV é uma doença autoimune caracterizada pela
presença de bolhas flácidas e exulcerações, envolvendo
a pele e as mucosas. A doença é mediada por autoanticorpos, dirigidos contra as caderinas, moléculas de
adesão celular entre os queratinócitos, nomeadamente
as desmogleinas (Dsg) 1 e 3. A ligação destes anticorpos
a nível desmossómico leva à perda de coesão entre os
queratinócitos com a consequente acantólise e
formação de vesículas e bolhas. Apesar dos mecanismos
implicados na doença não estarem ainda totalmente
esclarecidos, sabe-se que os linfócitos B e T estão
envolvidos na patogénese do PV. O curso da doença é
tipicamente severo e, para além da morbilidade elevada
que acarreta, ainda está associado a taxas de mortalidade que rondam os 5 a 10%1-3. As causas são
sobretudo devidas às altas doses de corticóide utilizadas,
resultando em sepsis e outras complicações4,5. No
entanto, o tratamento de primeira linha continua a ser a
corticoterapia sistémica, mas os seus efeitos adversos,
conforme referido, sobretudo no uso prolongado, conduzem à necessidade de procura de agentes poupadores de corticóide8. Os fármacos imunossupressores
que têm sido amplamente utilizados incluem a azatioprina, metotrexato, ciclosporina, micofenolato de
mofetil, ciclofosfamida, IGIV, plasmaférese e fotoférese2.
Por vezes, surgem casos refractários que colocam desafios terapêuticos complexos, como no caso clínico que
descrevemos.
O rituximab é um anticorpo monoclonal dirigido
contra o antigénio CD20 presente na superfície dos
linfócitos B, induzindo deplecção in vivo destas células1,6.
Este efeito tem sido a base racional para o uso do
rituximab no tratamento com sucesso de Linfomas B Não
Hodgkin (LNH)1-3. Foi aprovado pela primeira vez em
1997 para o tratamento de cancro e desde então mais
de 300.000 doentes com LNH foram tratados1. Apesar
de ainda não estar aprovado oficialmente, o rituximab
tem sido utilizado com sucesso no tratamento de várias
doenças autoimunes refractárias mediadas por
autoanticorpos. A Púrpura Trombocitopénica Idiopática
(PTI) foi das primeiras a ser tratada com rituximab e
também existe evidência de claro benefício no
tratamento de anemias hemolíticas autoimunes.
Subsequentemente, outras indicações têm surgido como
a artrite reumatóide, lúpus eritematoso sistémico,
miastenia gravis, granulomatose de Wegener, síndrome
de Sjögren e dermatomiosite9-11. Têm-se obtido
remissões prolongadas destas doenças após a infusão
de rituximab, sugerindo que a tolerância imune pode ser
148
re-estabelecida. No caso concreto do PV, a produção de
anticorpos anti-desmogleinas por clones de células B é
crucial para o desenvolvimento da doença. Além disso,
os linfócitos B estimulam os linfócitos T CD4+ Dsg-3
específicos para a produção de citoquinas como a IL-4,
IL-6 e IL-101, necessárias para a proliferação de células
B de memória assim como para a diferenciação em
plasmócitos produtores dos autoanticorpos. Assim, a
deplecção de linfócitos B conduziria não só à diminuição
da produção de autoanticorpos como também actuaria
na função de memória imunológica, com controlo a
longo prazo da doença. Já existem vários relatos de
casos clínicos e séries de doentes tratados com sucesso,
com remissões sustentadas1,12-15. O rituximab é
administrado em perfusão intravenosa lenta durante
algumas horas. O regime standard consiste em 4
infusões (1 ciclo), na dose de 375mg/cm2, em intervalos
semanais. Nos doentes com PV, o tratamento em geral
tem sido bem tolerado e a maioria de reacções adversas
consiste em discretos sintomas como naúseas, febre,
hipotensão e dispneia. Nas administrações seguintes, a
tendência é para o desaparecimento destes sintomas.
No entanto, o risco de infecções aumenta, estando
relatado um caso clínico fatal por pneumonia por
pneumocystis carinii4. Infecções activas ou história de
doenças bacterianas ou virícas recorrentes são contraindicação para o uso de rituximab. O rastreio infeccioso
incluindo HBV, HCV, HIV deve ser feito por rotina antes
do início da terapêutica. Outras contraindicações1
incluem doenças hepáticas ou renais, distúrbios neurológicos ou psiquiátricos, osteoporose grave, gravidez e
amamentação. Doentes com imunodeficiências primárias ou secundárias e doentes com antecedentes de
neoplasias malignas não são candidatos a tratamento
com rituximab. Uma vez que estão descritos episódios de
angina pectoris e arritmias cardíacas durante a infusão,
doentes com doença cardíaca devem ser rigorosamente
monitorizados.
No nosso doente, as infusões semanais de rituximab
foram muito bem toleradas, sem efeitos adversos
associados a registrar. A re-epitelização das lesões foi
conseguida 2 meses após o início do tratamento. É de
referir que a introdução de micofenolato de mofetil
ocorreu poucas semanas antes do rituximab, inserindo
aqui um viés na interpretação dos resultados. No
entanto, baseados na literatura publicada, parece lógico
concluir que a boa resposta terapêutica, após a falência
dos outros esquemas imunossupressores, terá sido
devida ao rituximab. Outro ponto positivo a referir
prende-se com o facto de existir um follow-up prolongado (3 anos), sem doença e actualmente sem qualquer
Pênfigo Vulgar Refractário – Tratamento com Rituximab
Caso Clínico
medicação, reforçando a noção de que o rituximab
induz remissões sustentadas.
Hoje, já existem vários trabalhos publicados sobre o
uso do rituximab no tratamento de PV refractários e o
nosso caso clínico vem confirmar e sublinhar a sua
utilidade nos casos mais graves desta doença.
BIBLIOGRAFIA
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treatment of recalcitrant, life-threatening pemphigus
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(anti-CD20 monoclonal antibody) for recalcitrant
pemphigus vulgaris. Int J Dermatol 47(3): 292-4
(2008).
149
Bolsas e Prémios
Bolsas e Prémios Atribuídos
BOLSA SÁ PENELLA (2008)
Deslocação para apresentação de trabalhos em reuniões científicas no estrangeiro – membros da SPDV
(Patrocínio: Laboratórios Pierre Fabre)
“McGregor's groin flap: case report” (Poster); “Paramedian forehead flap for reconstruction of nasal
defects- experience of 4 cases” (Poster); “Primary cutaneous NK/T-cell lymphoma, nasal type - case
report” (Poster); “Infundibulomatosis – case report” (Poster)
José Carlos Cardoso
17th EADV Congress
Paris, 17 a 21 de Setembro de 2008
“Vitiligo – a Good prognostic factor melanoma?” (Poster); “Verrucous Tumours in an Immunodepressed patient”(Poster); “Cutaneous Adverse reaction to Pseudoephedrine” (Poster)
Daniela Cunha
17th EADV Congress
Paris, 17 a 21 de Setembro de 2008
“Morfeia – Formas clínicas atípicas; A propósito de 3 casos clínicos“ (Comunicação oral)
Rita Guedes
XVII Congreso del CILAD
Quito, Equador, 8 a 11 de Outubro de 2008
151
Bolsas e Prémios
PRÉMIOS REUNIÃO SPDV (2008)
Atribuídos à melhor comunicação e ao melhor caso clínico apresentados em cada Reunião da SPDV
(Patrocínio: Laboratório La Roche-Posay)
10º CONGRESSO NACIONAL DE DERMATOLOGIA E VENEREOLOGIA
Melhor comunicação
“Úlceras de perna reveladoras de leucemia aguda: apresentação clínica de 4 casos de leucemia cútis”
Ana Filipa Duarte2, T. Baudrier1, M. J.Cruz1, F. Azevedo1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de São João, Porto, 2Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de
São João e Faculdade de Medicina, Porto
Melhor caso clínico (ex-aequo)
“Erupção zosteriforme como manifestação de doença sistémica”
Joana Antunes1, M. André1, A. Fraga1, P.L. Filipe1, L.S. de Almeida1, H. Kutzner2, M. Marques Gomes1
1
Clínica Universitária de Dermatologia, Hospital de Santa Maria, Lisboa; 2Dermatopathologische Gemeinschaftspraxis,
Germany
“Acropatia ulcero-mutilante associada a Linfoma-B da zona marginal”
Sandra Medeiros1, R. Vieira1, A. Afonso2, F. Carvalho3, F. Costa4, R. Delgado5, F. A.Pacheco1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia; 2Anatomia Patológica; 3Nefrologia e 5Ortopedia do Hospital Curry Cabral,Lisboa;
4
Serviço de Hematologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa – Central
“Osteodistrofia Hereditária de Albright e Pseudohipoparatiroidismo: a propósito de um caso clínico”
Joana Rocha1, F. Ventura1, T. Pereira1, A. P. Vieira1, L. Macedo2, F. Pardal3, R. Cerqueira4, C.Brito1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 3Anatomia Patológica, Hospital S. Marcos, Braga, 2Serviço de Pediatria, Hospital
de Nossa Senhora da Oliveira, 4Centro de Genética Clínica, Porto
PRÉMIO EDOL (2008)
Atribuído ao melhor poster apresentado no 10º Congresso Nacional de Dermatologia e Venereologia
(Patrocínio: Oftalder/EDOL Produtos Farmacêuticos, SA)
Poster Premiado
“Morfeia generalizada associada a instilação intravesical de mitomicina C”
Ana Maria Calistru1, T. Baudrier1, A. Mota2, A. L. Cunha3, J. Silva4, F. Azevedo1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia, 3Anatomia Patológica e 4Urologia do Hospital de São João, Porto; 2Faculdade de
Medicina do Porto
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Bolsas e Prémios
BOLSA DE INVESTIGAÇÃO DA
SOCIEDADE PORTUGUESA DE DERMATOLOGIA E VENEREOLOGIA (2008)
Subsídio para projecto de investigação científica – membros da SPDV
(Patrocínio: Schering-Plough Farma)
(Júri: A. Sousa Basto, M. Marques Gomes, Óscar Tellechea)
Projecto Premiado
“Análise de mutações de genes relacionados com a via de sinalização Wnt em células de melanoma e
determinação do seu papel na oncogénese e progressão tumoral”
Américo Figueiredo, Ricardo Vieira, Carlos Faro
Hospitais da Universidade de Coimbra
PRÉMIO “AUGUST C. STIEFEL”
Atribuído ao melhor trabalho escrito sobre qualquer tema de Dermatologia ou Venereologia, publicado em
qualquer revista nacional ou estrangeira, nos 2 anos anteriores à sua atribuição
(Patrocínio: Laboratórios Stiefel)
(Júri: Filomena Azevedo, Gabriela Marques Pinto, Margarida Gonçalo)
Trabalho Premiado
“Desmoplastic Malignant Melanoma: A Clinicopathologic Analysis of 113 Cases”
Luís Soares de Almeida1, L. Requena2, A. Rütten3, H. Kutzner3, C. Garbe4, D. Pestana5, M. Marques Gomes1
1
Clínica Universitária de Dermatologia, Hospital de Santa Maria, Lisboa; 2Department of Dermatology, Fundación Jiménez,
Universidad Autónoma, Madrid; 3Dermatopathologie Bodensee, Friedrichshafen, Alemanha; 4University Department of
Dermatology, Tübingen, Alemanha; 5Departamento de Estatística e Investigação, Universidade de Lisboa, Faculdade de
Ciências e CEAUL
Publicado em: American Journal of Dermatopathology, 2008 Jun, Vol. 30, Nº3: 207-215.
153
Arquivo da SPDV
NOTÍCIAS
Do nosso colega Rui Tavares Bello recebemos para divulgação o seguinte resumo, referente à sua participação no “II Fórum
de Dermatologia” realizado em Aveiro a 4 de Outubro de 2008.
“DESAFIOS ÉTICOS,REGULAMENTARES E JURÍDICOS PARA A DERMATOLOGIA”
Rui Tavares-Bello
Serviço de Dermatologia do Hospital Militar de Belém
Uma das mais antigas especialidades médicas, a Dermatologia vem testemunhando os avanços extraordinários registados
nas ciências médicas, quer no domínio dos conhecimentos básicos, quer no das tecnologias aplicadas. A descoberta dos
mecanismos patogénicos de múltiplas velhas e novas dermatoses, bem como a aquisição de novos agentes e técnicas
terapêuticas permitiram de facto expandir a Especialidade nos planos qualitativo e quantitativo. Na realidade, verificou-se uma
verdadeira mudança de paradigma do seu exercício, de uma disciplina eminentemente clínica e contemplativa para uma
especialidade mais interventiva, “médico-cirúrgica” de pleno direito. Neste processo, à luz e em função das normas
socioculturais vigentes, fortemente impulsionada pela sociedade em geral e pelos mass media, a Dermatologia Cosmética
vem crescendo rapidamente, atraindo novos profissionais, criando novas oportunidades mas também suscitando novos
problemas éticos e jurídicos.
Paradoxalmente, de forma paralela com estas conquistas científicas e tecnológicas, vem-se verificando uma erosão
progressiva do prestígio da profissão médica, tal como testemunham os inquéritos e sondagens de que os mass media dão
ampla cobertura. Neste domínio e de acordo com a literatura disponível, a Dermatologia não é (ainda) das especialidades
médicas mais fustigadas, se bem que as áreas da Dermatologia Cosmética e da Oncologia Cutânea venham conhecendo um
aumento significativo de litigiosidade médico-legal.
Igualmente sintomático é o “apurado sentido de risco” desenvolvido pelo público em geral em relação às novas conquistas
médicas o que conduz por um lado à inobservância terapêutica e, por outro, à opção por formas de medicina ditas alternativas
e complementares, uma e outras conduzindo em regra a situações dramaticamente irreversíveis.
A realidade sócioprofissional da praxis médica vem sofrendo por outro lado uma considerável transformação: Dos laços
profissionais sólidos a um hospital público complementados por um exercício privado personalizado e autónomo de outrora
aos actuais vínculos temporários a unidades multidisciplinares, propriedade ou subsidiárias de entidades bancárias ou
seguradoras (third parties), vai uma grande mudança! Nestas estruturas, o Médico tende a perder a independência e
autonomia proverbiais, correndo o risco de se integrar numa nova rede de lealdades e dependências hierárquicas que podem
excluir o interesse do próprio doente. À inevitável menorização do papel (leading role) de liderança institucional, técnica,
científica e moral por parte do Médico corresponde em regra uma subalternização salarial e inerentes riscos potenciais...
Por outro lado, o astronómico encarecimento dos custos dos serviços, tecnologia e receituário médicos que se vem
registando retira adicionalmente poder aos clínicos, os quais se vêm condicionados na sua prática diária, ao ponto mesmo de
verem limitada a sua capacidade de prescrição de novos fármacos (!).
Vivemos pois tempos de mudança!
Saibamos fazer face ao que se avizinha reforçando os traços identitários da nossa Especialidade; integrando de modo
formal competências e sub-especialidades que são essenciais para o método dermatológico; desenvolvendo as aptidões
comunicacionais e de negociação face aos doentes, ao público, às instituições e poderes relevantes; aprofundando o prestígio
da especialidade entre as várias disciplinas médicas e, last but not least , promovendo, mediante uma melhor atenção em sede
de formação core e contínua pós-graduada, o ensino e o debate da ética médica na Especialidade.
Vejamos a situação actual não como uma ameaça, mas como uma nova oportunidade.
155
Arquivo da SPDV
ACTAS DAS ASSEMBLEIAS GERAIS DA SPDV
Acta Nº 270
Ao Décimo Sexto dia do mês de Novembro de 2007,
reuniu no Hotel Solverde em Espinho, a AssembleiaGeral Ordinária da SPDV com a seguinte Ordem de
Trabalhos:
1. Leitura da Acta da Reunião anterior.
2. Informações relativas à actividade da SPDV durante o ano de 2007.
3. Discussão e aprovação do novo regulamento de
Bolsas e Trabalhos SPDV.
4. Apresentação e Discussão da proposta de adesão
à EADV.
5. Admissão de novos sócios.
A Dr.ª Gabriela Marques Pinto deu início ao 1º ponto
– leitura da acta da reunião anterior, que foi aprovada
por unanimidade.
Passou-se ao 2º ponto – Informações relativas à
actividade da SPDV durante o ano de 2007.
O Professor Marques Gomes informou que no
decurso do ano de 2007 foram realizadas as seguintes
reuniões: Fórum do Interno, Reunião do Centro em
Tomar, Reunião Norte no Hotel Solverde em Espinho.
Todas as reuniões tiveram participação elevada dos
membros da SPDV. Quanto a futuras reuniões, a sua
comunicação passará a ser online, representando o não
envio de programa uma poupança de 2000 euros.
Ainda no que concerne a futuras reuniões da SPDV, o
Professor Marques Gomes pediu colaboração activa dos
membros, nomeadamente que a entrega dos trabalhos
fosse dentro dos prazos limite, e auxílio na criação do
novo site da SPDV.
De seguida, o Professor Marques Gomes esclareceu
o que foi efectuado durante o ano de 2007 para
divulgação da Dermatologia. Na comunicação escrita
foram publicados artigos em jornais destinados ao
Grande Público como o Expresso e Diário de Notícias, e
em publicações mais específicas na área da Saúde como
o Jornal do Centro de Saúde, e a Semana Médica.
Referiu-se ainda, a manutenção dos Trabalhos da SPDV,
graças ao grande empenho da Dr.ª Gabriela Marques
Pinto, acrescentando-se que os Trabalhos da SPDV, além
de enviados aos sócios, passaram a ser enviados para
Bibliotecas Médicas e outras Sociedades.
A Dr.ª Gabriela Marques Pinto esclareceu, que a
razão do não envio da revista a Bibliotecas, se prendia
com divergências com a anterior gráfica.
Prosseguiu-se com a divulgação das formas de
156
comunicação oral, que decorreram durante o ano 2007
em meios de comunicação como a RTP1, RTP2, SIC, TVI,
SIC Mulher, RC, e das iniciativas do dia da Psoríase.
De seguida enumeraram-se exemplos do que atrás
foi apresentado:
Diário de Notícias – Separata Saúde sobre Eczema de 27 Outubro 2007;
No Expresso a 27 de Outubro 2007 entrevista a A.
Figueiredo sobre Psoríase;
Em 3 de Novembro 2007 Caderno de Saúde
Pública – artigo de 1ª página sobre Psoríase da
autoria de M. Marques Gomes.
Para o Jornal do Centro de Saúde:
Fevereiro: Frieiras, João Goes Pignatelli – HSM
Março: Acne, Isabel Correia – HSM
Abril: Lúpus Eritematoso, João Pedro Freitas –
HSM
Maio: Euromelanoma, João Abel Amaro – IPO
Lisboa
Junho: Pé de Atleta, José Carlos Cardoso –
HUC
Julho: Eczema, Mariana Cravo – HUC
Agosto: Infecções Sexualmente Transmissíveis,
Sérgio S. Alves – HSJ
Setembro: Alergias Medicamentosas, Maria
Miguel Canelas – HUC
Outubro: Psoríase, Elisabete Moreira – HSJ
Novembro: Dermatite das Fraldas, Márcia Ferreira – HSA
Dezembro: Piolhos, Tiago Torres – HSA
No Expresso a 27 de Outubro 2007 entrevista a A.
Figueiredo sobre Psoríase. Colaboração do Dr. Fernando Guerra com casos clínicos na Semana Médica (publicação mensal).
Igualmente, publicados na Semana Médica:
Julho: Cancro Cutâneo, Ricardo Vieira – HUC
Setembro: As peles Atópicas, Margarida Gonçalo – HUC
Outubro: Psoríase, Sofia Magina – HSJ
Novembro: A Acne, Hugo Oliveira – HUC
Dezembro: Dermatomicose, Glória Velho –
HSA
Completando as informações sobre a divulgação da
Dermatologia o Professor Marques Gomes divulgou a
contratualização de profissional para efectuar ligação aos
Media.
Prosseguiu-se com a apresentação das bolsas atribuídas durante o ano de 2007, que totalizaram 38, sendo
9 EADV/Saninter, 20 Sá Penella com 9 publicações (Europa
Arquivo da SPDV
13/Fora 7), Cabral Ascensão 7 com 9 publicações e 2
Estágios Formativos no país, totalizando um dispêndio de
47.462,19 euros, contemplando 28 médicos.
De seguida, informou-se a Assembleia-geral da existência das seguintes bolsas e prémios:
Bolsa EADV – John Stratigos
Bolsa Praga – Maio 2009, International Congress of Dermatology
Prémio Hermal no valor de 10.000 euros para
trabalho de investigação
Passou-se à divulgação do novo plano de protocolo
com a Indústria Farmacêutica com 3 níveis de sponsorização (sponsor de platina, sponsor de ouro, sponsor
de prata); do projecto da página da SPDV, passando as
revistas online a estar disponíveis a partir 2008.
Terminou-se o ponto de Informações esclarecendo
que os sócios com quotizações em atraso há mais de 2
anos perdem direitos (receber trabalhos SPDV, receber
bolsas e prémios e participação paga nas reuniões) e
foram indicadas as datas das próximas reuniões.
3º Ponto – Discussão e aprovação dos novos regulamentos sobre bolsas e trabalhos SPDV.
Foi iniciada pelo Professor Marques Gomes que
salientou os pontos mais importantes da proposta da
direcção da SPDV. Foi proposto que cada sócio apenas
receberia duas bolsas por ano, ficando obrigado a
apresentar comprovativos das despesas. Seria dada
preferência na atribuição de bolsas a palestras convidadas e a comunicações orais. Os estágios formativos
no país teriam de ser específicos. Situações excepcionais
de palestra por convite seriam submetidas a avaliação
particular.
O novo regulamento passou a votação sendo aprovado por unanimidade.
4º Ponto – Apresentação e discussão da proposta de
adesão à EADV.
O Professor Marques Gomes fez um pequeno historial da relação da SPDV e EADV, explanou a proposta de
que os sócios da SPDV passariam a sócios da EADV,
mediante pagamento de quantia inferior a quota anual,
mas sem direito de voto.
Perante a indefinição da proposta da EADV, e da
indecisão dos participantes na Assembleia-geral, foi
sugerida a continuação da discussão noutra Assembleia-geral o que foi aprovado.
5º Ponto – Admissão de novos sócios.
Foi aprovado por unanimidade como sócio agregado a Dr.ª Maria João Banha Alves da Mata Nunes proposta pela Dr.ª Margarida Anes e Dr.ª Carla Rodrigues.
Foi aprovado por unanimidade como sócio efectivo a
Dr.ª Maria Victoria Guiote Domingues proposta pela
Dr.ª Martinha Henriques e Dr.ª Rosa Mascarenhas.
Foi aprovado por unanimidade como sócio efectivo a
Dr.ª Maria Calistru proposta pela Dr.ª Filomena Azevedo
e Dr.ª Cármen Lisboa.
Foi aprovado por unanimidade como sócio efectivo a
Dr.ª Guida Maria Mendes dos Santos proposta pela Dr.
Pinto Soares e Dr.ª Ana Barata Feio Terrahe.
Foi aprovado por unanimidade como sócio efectivo a
Dr.ª Olga Cristina Soares Ferreira proposta pela Dr.ª
Filomena Azevedo e Dr. Alberto Mota.
Foi aprovado por unanimidade como sócio efectivo a
Dr.ª Rita Venina de Amaral Pereira Guedes proposta
pela Dr. Paulo Varela e Dr.ª Natividade Rocha.
Foi aprovado por unanimidade como sócio efectivo a
Dr.ª Inita Ramoska proposta pelo Prof. Marques Gomes
e Dr. Carlos Garcia.
Terminada a ordem de trabalhos deu-se por encerrada a Assembleia.
João Goes Pignatelli
Acta Nº 271
Aos 11 dias do mês de Abril de 2008, reuniu no Hotel
Montebelo em Viseu a Assembleia-geral Ordinária da
SPDV, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
Votação da alteração da Ordem de Trabalhos;
1. Discussão e votação do relatório de actividades da SPDV de 2007;
2. Discussão e votação do relatório de contas de
2007;
3. Discussão e votação do plano de acção de
2008;
4. Informações gerais;
5. Admissão de novos membros.
Por ausência do Presidente e de um Secretário, Esmeralda Vale presidiu à mesa da Assembleia-geral tendo
sido apoiada por Gabriela Marques Pinto e Mª Raquel
Vieira.
Ponto prévio á ordem de trabalhos - Votação da
alteração da ordem de trabalhos.
Foi colocado à votação e aprovado por unanimidade
o adiamento da leitura da acta nº 270 para a próxima
reunião da SPDV.
Primeiro ponto - Discussão e votação do relatório de
actividades da SPDV de 2007, lido pela Dr.ª Margarida
Gonçalo.
157
Arquivo da SPDV
Realizaram-se duas reuniões científicas ordinárias,
em Tomar, de 27 a 28 de Abril e em Espinho, nos dias 16
e 17 de Novembro e o Fórum do Interno, em Coimbra
em 30 de Junho.
Bolsas: Foram atribuídas 7 bolsas Cabral de Ascensão, no valor total de 20 951,31 euros, 23 bolsas Sá
Penella, no valor total de 27 200,00 euros e 9 bolsas
SPDV/EADV.
Prémios: Foram atribuídos Prémios Reunião da SPDV
no valor total de 2 400,00 euros e Prémio Bernardino
António Gomes, no total de 2 400,00 euros.
Trabalhos da SPDV: Foram publicados os 4 números
anuais da revista, mantendo a Dr.ª Gabriela Marques
Pinto como Editora e publicados como suplementos os
Boletim Informativo das Dermatites de Contacto do Grupo
Português de Estudo da Dermatites de Contacto e Acta
Fotobiológica, do Grupo Português de Fotobiologia.
Manteve-se o contrato com a empresa gráfica "Sublinhado" e a facturação da publicidade da Revista foi feita
directamente pela SPDV junto da Indústria, tendo
constituído uma boa fonte de receita para a SPDV.
A Dr.ª Gabriela Marques Pinto, na qualidade de Editora
da Revista da SPDV, apelou ao fornecimento de trabalhos
científicos, nomeadamente da parte dos dermatologistas
séniores na área da formação médica contínua.
O Prof. Dr Poiares Baptista salientou a necessidade
de referenciar e divulgar a literatura dermatológica portuguesa.
O Dr António Massa sugeriu a edição de um CD e a
Dr.ª Gabriela Marques Pinto, que o conteúdo de tal CD
fosse disponibilizado na página da Internet da SPDV.
Durante o ano 2007 realizaram-se 2 Assembleias
Gerais Ordinárias, em Tomar e Espinho, respectivamente a 27 de Abril e 16 de Novembro.
Relacionamento com as secções especializadas da
SPDV: Tem sido mantida uma colaboração mútua e
regular com as diversas Secções Especializadas nas
áreas legal, administrativa, financeira e científica.
Página da SPDV na internet: manteve-se o contrato
com a empresa "Trace – Soluções Informáticas e Internet,
Lda", estando a manutenção da página da SPDV
integralmente a cargo da SPDV. O site manteve-se funcional, dinâmico e actualizado com informação sobre
eventos científicos, revistas da SPDV, acesso online a
revistas da especialidade, nomeadamente o British Journal of Dermatology, Acta Dermato-Venereologica e
Photodermatology, Photoimmunology & Photomedicine,
além de outras funcionalidades.
Divulgação da especialidade - empresa de comunicação: manteve-se o contracto com a empresa de
comunicação, responsável pela divulgação das reuniões
158
da SPDV e de outros eventos considerados de interesse
para a divulgação da Especialidade (Dia Mundial da
Psoríase, Euromelanoma Day, posição da Direcção da
SPDV face a situações do foro da especialidade surgidas
na comunicação social). A Direcção da SPDV promoveu
também a divulgação da Especialidade na imprensa
escrita, através da publicação de temas dermatológicos,
quer na imprensa dirigida ao público em geral, quer na
imprensa médica geral.
Situação contabilística e fiscal da SPDV: Manteve-se o
contrato com o contabilista já anteriormente contratado
pela SPDV, desde Janeiro de 2004, estando a contabilidade organizada de modo adequado e atempado.
Posto à votação o relatório de actividades de 2007,
foi aprovado por unanimidade.
Segundo ponto - Discussão e votação do relatório de
contas de 2007.
Do orçamento do ano de 2006 transitou para 2007
um saldo de + 26 700,00 €.
Durante o ano de 2007 salienta-se:
Das Reuniões da SPDV obteve-se um saldo de
+ 52 029,57 €
A Revista "Trabalhos da SPDV" obteve um saldo de
+ 62 642,58 €
Despendeu-se em Bolsas e Prémios da SPDV56 801,31 €, com uma receita de + 39 800,00 €,
resultando um saldo de - 17 001,31 €
Os Cursos e Formações ministrados obtiveram
um saldo de + 15 345,31 €
Do Balanço Global de 2007 resulta um saldo de
+ 64 791,37 €
Posto à votação o relatório de contas de 2007, foi
aprovado por unanimidade.
Terceiro ponto - Discussão e votação do plano de
acção de 2008.
O Prof. Marques Gomes apresentou o plano de
acção de 2008, salientando-se:
A importância de uma "newsletter", definindo-a
como meio de comunicação entre os sócios;
Em relação ao site da SPDV, foram assinadas
novas revistas da EBSCO, tendo como mais valia
a possibilidade de 200 pessoas terem acesso;
Referindo-se aos Trabalhos da SPDV considerou a
importância de alargar a sua distribuição, nomeadamente a Serviços de Medicina Interna;
Continuou, referindo-se á importância da divulgação ao grande público, nomeadamente através de um suplemento integrado na revista Semana Médica;
Em relação à actividade científica, referiu a
importância do Congresso Nacional e do Fórum
Arquivo da SPDV
do Interno, como meios de formação e divulgação da prática clínica. Salientou também a
importância de motivar os colegas que trabalham
exclusivamente em medicina privada, funcionando a SPDV como elo de ligação entre todos os
sócios, através do estabelecimento de protocolos
em comum;
Em relação ao novo regime de Bolsas, salientou
que um estágio interno deve ser para o interno um
complemento da sua formação; referiu também a
criação de uma nova Bolsa de Investigação Científica, com o patrocínio da SPDV, a ser apresentada na entrega de Prémios.
O Dr. António Massa referiu o próximo patrocínio de
uma Bolsa a um Interno, destinado a contemplar a
melhor “Comentário” publicado nos Trabalhos da
Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia
referente à: Descrição dos aspectos da vivência do
Dermatologista num Serviço fora do País, ou resumo
comentado das novidades num Congresso Internacional em que participou.
A Dr.ª Margarida Gonçalo, referindo-se aos critérios
usados na ordem de selecção para atribuição de Bolsas,
disse serem considerados prioritários os convites pessoais para prelectores e as comunicações orais.
O Dr. Manuel Sereijo referiu a importância de um
Estudo epidemiológico sobre o cancro cutâneo, dado não
se saber até hoje qual o número de casos de Melanoma
diagnosticados em Portugal. O Prof. Marques Gomes
referiu a importância de existir em Portugal um Protocolo
específico para os Melanomas, ao que o Prof. Américo
Figueiredo respondeu que o número de registos por parte
dos dermatologistas Portugueses ser muito escasso, sendo
do desconhecimento geral que existe um impresso
próprio para esse efeito. Referiu também o baixo número
de presenças nas Assembleias da APCC (Associação
Portuguesa do Cancro Cutâneo). A Dr.ª Margarida
Gonçalo referiu que a Bolsa de Investigação Científica,
não foi criada para investigação básica.
A relação a ser mantida com a Indústria Farmacêutica / Sponsors, deve ser protocolada com antecedência.
Portugal candidatou-se á Organização em Lisboa do
Congresso da EADV em 2011, sendo Presidente o Dr.
António Picoto, Secretário-geral o Professor Marques
Gomes e Vice-Presidente o Dr. António Massa. O Comité
Cientifico teria como Presidente o Professor Américo
Figueiredo e como Secretário a Dr.ª Margarida Gonçalo.
Realizar-se-á uma "Site Visit" em Abril de 2008, para
apreciação desta candidatura, sendo a escolha da
responsabilidade do Board de Istambul. Salientou-se a
importância destes eventos e a participação dos sócios
da SPVD na EADV.
Terminou referindo-se ao Orçamento para 2008,
sendo o objectivo principal, considerando o saldo positivo actual as despesas não ultrapassarem as receitas.
Posto á votação o Plano de acção para 2008, foi
aprovado por unanimidade.
Quarto ponto - Informações gerais.
A Dr.ª Margarida Gonçalo sugeriu a divulgação de
informações através da Newsletter referida no ponto
anterior.
O Professor Marques Gomes salientou a importância
do registo das actividades das Secções Especializadas
da SPDV.
A Dr.ª Gabriela Marques Pinto referiu que as actividades dos Grupos especializados eram publicadas
inicialmente, contudo, há vários anos, não têm sido
recebidos os boletins informativos respectivos, tendo
sugerido a colocação dessas actividades no site da SPDV.
Quinto ponto - Admissão de novos membros.
Foram propostos como sócios efectivos:
Aristóteles David Neiva Rosmaninho, do Hospital
Geral de Sto. António, tendo como proponentes as Dr.as
Manuela Selores e Glória Velho;
André Jacinto Garcêz de Lencastre, do Hospital de Sto.
António dos Capuchos - Centro Hospitalar de Lisboa
Central, tendo como proponentes as Dr.as Margarida
Apetato e Ana Fidalgo;
Filipa Alexandra Ribeiro Osório, do Hospital S. João,
tendo como proponentes as Dr.as Filomena Azevedo e
Sofia Magina;
Vasco Manuel Coelho Macias, do Hospital de Curry
Cabral, tendo como proponentes os Drs. Jorge Cardoso
e Ana Rodrigues;
Joana da Veiga Ferro Jerónimo Antunes, do Hospital
de Santa Maria, tendo como proponentes os Drs. João
Pignatelli e Carolina Gouveia;
Pedro Filipe Sousa Andrade, dos Hospitais da Universidade de Coimbra, tendo como proponentes o Prof. Dr.
Américo Figueiredo e Dr.ª Margarida Gonçalo;
Ana Maria Carvalho Brinca, dos Hospitais da Universidade de Coimbra, tendo como proponentes o Prof. Dr.
Américo Figueiredo e Dr.ª Margarida Gonçalo;
Joana Alexandra Devesa Parente, do Hospital de
Santarém-EPE, tendo como proponentes as Dr.as Maria
de São José Marques e Maria João Filipe da Silva.
Não havendo outros assuntos a tratar deu-se por
encerrada a Assembleia.
Maria Raquel Vieira
159
Reuniões da SPDV
10º CONGRESSO NACIONAL DE
DERMATOLOGIA E VENEREOLOGIA
14 a 16 de Novembro de 2008
HOTEL SANA LISBOA
PROGRAMA
Dia 14 de Novembro (6ª Feira)
08h30m CASOS CLÍNICOS
Moderadores: Manuel Sereijo, Bárbara Fernandes (Sala Alfama)
Moderadores: Paulo Varela, Anabela Faria (Sala Castelo VIII)
09h30m Cerimónia de Abertura e Entrega de Prémios
Moderadores: Manuel Marques Gomes, Américo Figueiredo, F. Guerra Rodrigo
10h00m CONFERÊNCIAS PLENÁRIAS
Moderadores: Américo Figueiredo, Carlos Resende
Aspectos Funcionais da pele em perspectiva antropológica
F. Guerra Rodrigo, Lisboa
Dermatology in the 21st century
Harald Gollnick, Berlim
11h30m SIMPÓSIO – DERMATOLOGIA E DOENÇAS INFECCIOSAS
Coordenador: Óscar Tellechea
Mecanismos de defesa da pele – Óscar Tellechea, Coimbra
Terapêutica actual da SIDA – João Machado, Lisboa
Infecções emergentes em Dermatologia – Narciso Pérez , Oviedo
14h30m SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE PSORÍASE (Sala Alfama)
Coordenadora: Martinha Henrique
Factores desencadeantes. Endógenos ou exógenos – Paulo Filipe, Lisboa
Psoríase – doença sistémica ou co-morbilidades – Hugo S. Oliveira, Coimbra
O paradoxo da Psoríase na SIDA – Gabriela Marques Pinto, Lisboa
O que a terapêutica sistémica nos ensina – Luís Puig, Barcelona
14h30m SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE DERMATOLOGIA PEDIÁTRICA (Sala Castelo VIII)
Coordenadora: Manuela Selores
Imunopatogénese – Sofia Magina, Porto
Clínica – Susana Machado, Porto
Estudo complementar – Margarida Guedes, Porto
Terapêutica – Alberto Mota, Porto
16h30m SIMPÓSIO SATÉLITE – Galderma Portugal (Sala Castelo VIII)
Introdução
Algoritmo de Tratamento do Acne
Experiência Clínica com a combinação fixa de adapaleno e Peróxido de Benzoílo
Harald Gollnick, Berlim
16h30m SIMPÓSIO SATÉLITE – Schering Plough (Sala Alfama)
Revolução na psoríase
Moderador: Américo Figueiredo; Coordenadora: Gabriela Marques Pinto
Infliximab: a revolução no tratamento da psoríase
Marina Papoutsaki
161
Reuniões da SPDV
Infliximab na psoríase: A experiência portuguesa
Sofia Magina – Hospital S. João, Porto
Raquel Alpalhão – Hospital Santa Maria, Lisboa
Ana Ferreira – Hospital Capuchos, Lisboa
17h30m Assembleia Geral da SPDV
Dia 15 de Novembro (Sábado)
08h30m CASOS CLÍNICOS
Moderadores: António Massa, Mª São José Marques (Sala Alfama)
COMUNICAÇÕES
Moderadores: João Amaro, Osvaldo Correia (Sala Castelo VIII)
10h00m CONFERÊNCIAS PLENÁRIAS
Moderadores: M. Marques Gomes, F. Menezes Brandão
Update on autoimmune bullous diseases
Giovanna Zambruno
Da importância estratégica da Dermatologia Cirúrgica
João Duarte Freitas
11h30m SIMPÓSIO – INTERFACES DA DERMATOLOGIA
Coordenador: Américo Figueiredo
Oftalmologia e pele – Rui Proença, Coimbra
Psiquiatria e pele – Manuel Quartilho, Coimbra
14h30m SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE DERMATOPATOLOGIA
(Simpósio Interactivo - Sala Alfama)
Coordenadora: Isabel Viana
14h30m SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE DERMATITES DE CONTACTO (Sala Castelo VIII)
Coordenadora: Olívia Bordalo
Tintas Capilares. Problemas cutâneos e soluções
Christophe Le Coz, Strasbourg
Highlights do 9º Congresso da ESCD
Imunologia da Dermatite de Contacto – Margarida Gonçalo, Coimbra
Medicamentos – Raquel Santos, Lisboa
Cosméticos – Olívia Bordalo, Lisboa
Unhas artificiais – Olívia Bordalo, Lisboa
Profissionais – Raquel Silva, Lisboa
“Sofa dermatitis” – Christophe Le Coz, Strasbourg
16h30m SIMPÓSIO SATÉLITE – Wyeth (Sala Alfama)
Introdução
Moderador: F. Menezes Brandão
Psoríase e Psoríase Artropática: Diagnóstico e Objectivos Terapêuticos
Rui Tavares Bello – Serviço Dermatologia, Hospital Militar Belém, Lisboa
Psoríase: Tratamento a Longo-Prazo
Miquel Ribera Pibernat – Hospital Universidade Germans Trias i Pujol de Badalona
Sub-temas: Etanercept: Eficácia e Segurança a Longo-Prazo; Tratamento da Psoríase em Crianças e Adolescentes
16h30m SIMPÓSIO SATÉLITE – Alliance Healthcare (Sala Castelo VIII)
Repair of photoaged dermal matrix
Rachel Watson – The University of Manchester, Manchester
18h00m Assembleia da APCC (Associação Portuguesa de Cancro Cutâneo)
20h30m Jantar de Confraternização – Cortesia: La Roche Posay; Restaurante Virgula, Lisboa
162
Reuniões da SPDV
Dia 16 de Novembro (Domingo)
08h30m COMUNICAÇÕES
Moderadores: Manuel Sacramento Marques, Margarida Apetato (Sala Alfama)
CASOS CLÍNICOS
Moderadores: Paulo Lamarão, Raquel Vieira (Sala Castelo VIII)
10h15m Sessão de Apresentação e Discussão de 5 Posters Seleccionados
Coordenadores: Jorge Cardoso e Filomena Azevedo
11h30m O que há de novo?
Coordenador: Margarida Gonçalo
Em IST – Cândida Fernandes, Lisboa
Em Dermatopatologia – Soares de Almeida, Lisboa
Em Terapêutica – Ricardo Vieira, Coimbra
Que mais há de novo – Clarisse Rebelo, Faro
13h30m Encerramento do Congresso
163
Reuniões da SPDV
CONFERÊNCIAS PLENÁRIAS
DERMATOLOGY IN THE 21ST CENTURY
Harald Gollnick
Department of Dermatology and Venereology, Otto-von-Guericke University Magdeburg, Germany
Dermatology and Venereology as a broad spectrum and interdisciplinary medical speciality covers a large field of diagnoses which reach from the classical spectrum of core diseases such as genodermatoses, psoriasis, acne and atopic dermatitis
and STI´s as well to immune mediated diseases, allergology, dermato-oncology and medical cosmetology. It is in particular the
last which in recent times led us to consider in depth the role of “superficial skin corrective medicine” in contrast to the classical
role as physicians educated in sciences and practical skills. Dermatology derived from internal medicine as well as from surgery.
We care for patients starting from already at birth until the very aged ones. It is therefore our first duty to serve for the diseases
and not to dedicate our daily practice for cosmetic problems and to provide preferentially procedures which of course have a
high reimbursement aspect. Switching to a cosmetics oriented dermatology only could with no doubt bring harm and danger to
our discipline. However, to care for the scientific aspects of pharmacological and surgical cosmetology, of course should be
part of research and training programs. In several countries dermatology has lost in patient facilities which means training of
residents in severe courses of dermatologic diseases can not anymore provided in an appropriate manner. Dermatooncology
does not mean to diagnose a disease only but to be able to provide surgical techniques incl. daily dermatosurgery and
conservative oncological procedures incl.chemotherapy as well as follow-up and cancer management as a whole. A similar
situation can be drawn from allergology which if not fully provided will not enable us to make good patient related diagnoses
and treatment. It is therefore an important workload of our network of European Dermatological Associations to further provide
help in stabilizing our discipline and to support the process of harmonization of medical training in dermatology according to
the UEMS charters of the european curriculum teaching program and continuous professional development and CME quality
as well.
UPDATE ON AUTOIMMUNE BULLOUS DISEASES
Giovanna Zambruno
Laboratory of Molecular and Cell biology, Istituto Dermopatico dell'Immacolata, IDI-IRCCS, Rome, Italy
The two major subgroups of autoimmune bullous skin diseases, pemphigoids and pemphigus, are characterized by
pathogenetic autoantibodies targeting specific proteins of the skin. The major pemphigoid autoantigens are BP180 (collagen XVII)
and BP230, two components of the hemidesmosome. The mucosal and epidermal epithelial cells detachment (acantholysis)
distinctive of pemphigus is induced by autoantibodies directed against the desmogleins 3 and 1 (Dsg3 and 1), desmosomal
cadherins playing a major role in cell-to-cell adhesion. In the last years, there has been considerable progress in the understanding
of the pathophysiology of autoimmune blistering disorders. The recent development of humanized mouse models for bullous
pemphigoid (BP) has enabled the study of disease mechanisms mediated by BP autoantibodies, and represents an in vivo system to
test novel therapeutic strategies for disease management. In parallel, the characterization of the dynamics of the humoral immune
response in BP patients has allowed delineation of disease severity and activity markers. For pemphigus, an active disease mouse
model, generated by the adoptive transfer of Dsg3-/- lymphocytes into immunodeficient mice expressing Dsg3, has been used to
investigate the roles of T and B cells in perpetuating autoantibody production. Pathogenetic and non-pathogenetic monoclonal
antibodies have also been generated from pemphigus model mice. In parallel, human monoclonal antibodies have been isolated
from pemphigus patients, using antibody phage display technologies or efficient memory B cell immortalization methods. The
availability of pathogenic human monoclonal antibodies allows to circumvent limits linked to the use of polyclonal IgG purified
from patient sera and has important implications for the understanding of disease pathogenesis and towards improved disease
diagnosis and treatment. In the therapeutic field, rituximab, a potent B-cell depleting chimeric anti-CD20 monoclonal antibody, is
being increasingly used off-label in cases of severe pemphigus resistant to conventional immunosuppressive therapies. At least
four independent non-randomized prospective studies have reported that rituximab, in most cases administered in an adjuvant
setting, leads to complete remission in the large majority of pemphigus patients with refractory disease, with frequently sustained
clinical benefit. These results support the need for a controlled trial to assess the role for rituximab in pemphigus management and
the best modalities of administration.
164
Reuniões da SPDV
DA IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DA CIRURGIA DERMATOLÓGICA
João Duarte Freitas
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
A Dermatologia autonomiza-se muito cedo. Em 1776, na segunda metade do séc. XVIII, Joseph Plenck, em Viena, publica
um livro intitulado Doctrina de Morbis Cutaneis, que inicia um método dermatológico para a observação dos doentes com
afecções na pele.
Este, livro é a origem remota de uma confrontação mais tardia (séc. XIX) entre Robert Willan que defendia a classificação
morfológica (por lesões elementares) e Jean-Louis Alibert reputado dermatologista francês que defendia a classificação
nosológica, tendo mandado desenhar a “árvore das dermatoses”. Este confronto, envolveu toda a dermatologia europeia e
foi muito proveitoso – consolidou a dermatologia enquanto especialidade autónoma.
Entretanto, a ciência na Europa está em ebulição e surge, no início do séc. XX, afamadas e prestigiadas Escolas
Dermatológicas (Londres, Paris, Viena, etc.) que forneceram abundante investigação científica, material que foi engrossando
o conteúdo desta disciplina.
A Escola de Viena, sob a direcção de Ferdinand von Hebra é considerada uma instituição modelo. É aqui que vão receber
formação os futuros dermatologistas americanos.
A II Grande Guerra foi um dramático evento que mudou o mundo e pôs fim a vários ciclos, inclusive na Ciência.
Começa aqui – na segunda metade do séc. XX - a hegemonia americana que abrange, também, a Dermatologia e
condiciona a sua evolução. Louis Duhring (que estagiou em Viena com Hebra e Kaposi) e depois Sulzberger, Lever, Rees,
Lerner, Weeller, etc. constituem o núcleo duro da Dermatologia americana que acaba por, de certo modo, subalternizar a
europeia.
Depois da guerra, aparecem as primeiras derivas cirúrgicas. As primeiras vêm de fora para dentro, como a Cirurgia de
Mohs. Mais tarde esta cirurgia é adoptada pela Dermatologia, com o contributo de dermatologistas como Theodore
Tromovitch.
Em 1956, Ervin Epstein, um dermatologista, publica um 1º livro de Cirurgia dermatológica – “Skin Surgery”. Esta publicação é o corolário, e não o estímulo, de “muita” cirurgia convencional (com bisturi) que se efectuava por todos os EUA.
Na Europa, começam as dificuldades em acompanhar a evolução tecnológica americana aplicada e não “arranca” em
relação à Cirurgia, que continua prisioneira de técnicas rudimentares e simples (electro, crio, cureta, etc.). A Europa é uma
sociedade mais segmentada, compartimentada e a Cirurgia Geral e Plástica, travaram o desenvolvimento da Cirurgia
Dermatológica. Excepção feita à “Escola de Granada”, sob a direcção do Prof. Felipe Dulanto, que contagiou a Espanha,
Portugal e a América Latina.
Esta disseminação, deu origem à formação de diversas sociedades de dermatologia cirúrgica e trouxe importantes
alterações na formação e no treino operatório. E, mais importante, permitiu uma mudança qualitativa na especialidade.
Transformar uma especialidade médica em médico-cirúrgica.
Em 1978, em Marraquesh (Marrocos) criou-se sob a égide do Dr. Perry Robins e do Prof. Luigi Ruscianni a INTERNATIONAL SOCIETY FOR DERMATOLOGIC SURGERY, que congregará no seu seio a maioria dos Hospitais e Serviços que
praticam Cirurgia Dermatológica. Foi um passo estratégico importante no âmbito euro-americano.
SIMPÓSIO DERMATOLOGIA E DOENÇAS INFECCIOSAS
INFECÇÕES EMERGENTES EM DERMATOLOGIA
Narciso Pérez
Hospital Universitario Central de Astúrias, Oviedo
O conceito das doenças infecciosas emergentes, segundo o Instituto de Medicina dos E.U.A., define-se como uma das
doenças de origen infecciosa cuja incidência nos humanos cresceu nas passadas duas décadas e ameaça com continuar no
futuro. No presente trabalho analisamos as principais doenças emergentes na actualidade, bem como os factores
favorecedores da sua emergencia e as estratégias para a prevenção e o controlo.
165
Reuniões da SPDV
SIMPÓSIO INTERFACES DA DERMATOLOGIA
OFTALMOLOGIA E PELE
Rui Proença
Imunopatologia e Oncologia Ocular
Serviço de Oftalmologia – Hospitais da Universidade de Coimbra
A ciência oftalmológica sempre soube associar-se, ao longo dos tempos, a outros ramos da ciência médica. Mas é, sem
dúvida, a ciência dermatológica a que estuda um maior número de entidades clínicas que apresentam uma relação directa ou
indirecta com a oftalmologia. Os diversos aspectos e complexidade do diagnóstico, manifestações clínicas e terapêutica das
doenças que afectam simultaneamente o olho e a pele justificam, por si só, a existência de uma área individualizada da
ciência médica: as Doenças Óculo-Cutâneas.
A mera enumeração destas entidades clínicas constituiria tarefa que ultrapassaria em muito o âmbito temporal previsto
para esta lição temática. Assim, e resultante de uma experiência profícua de colaboração entre ambas as especialidades,
foram seleccionados alguns temas que parecem oportunos pela sua importância clínica e actualidade.
Neste contexto seleccionámos em conjunto as manifestações óculo-cutâneas de doenças multissistémicas em particular e
pela sua prevalência na comunidade e na consulta de oftalmologia: a doença de Behçet, a sarcoidose e a Síndroma de VogtKoyanagi-Harada. Serão, ainda, enfatizados os efeitos oculares de medicações tópicas e sistémicas, como os
corticosteróides, os retinóides e os anti-palúdicos de síntese, utilizados com frequência em dermatologia.
Por último, constituirão matéria de reflexão alguns aspectos clínicos e terapêuticos de tumores oculares não melanocíticos
e melanocíticos, com destaque para algumas similaridades e diferenças de comportamento dos correspondentes tumores
cutâneos, nomeadamente do melanoma maligno.
PSIQUIATRIA E PELE
Manuel Quartilho
Unidade de Doenças Psicosomáticas
Serviço de Psiquiatria dos Hospitais da Universidade e Faculdade de Medicina de Coimbra
De entre as doenças psicosomáticas mais comuns destacam-se sem dúvida as cutâneas e não é por acaso que em
literatura dermatológica se identifique frequentemente uma área de Psicodermatologia. Por outro lado o clínico de dermatologia é cada vez mais confrontado com situações deste foro, também designadas entre os dermatologistas como situações
“difíceis de diagnosticar ou difíceis de tratar”. As formas como a mente e a pele podem interagir podem ir desde doentes que
agravam a sua situação cutânea em períodos de stress tal como acontece na psoríase e no eczema atópico até aqueles que
têm principalmente um problema psiquiátrico com repercussão cutânea, como na ilusão de parasitose e nas excoriações
neuróticas.
Nesta nossa lição vamos essencialmente enquadrar a questão abordando as seguintes áreas temáticas:
Classificação e Avaliação das Perturbações Psicocutâneas:
1) Factores Psicológicos influenciando a Condição Médica;
2) Perturbações Somatoformes;
3) Perturbação Delirante, Tipo Somático;
4) Perturbações do Controlo do Impulso;
5) Perturbações Factícias.
A Importância da Avaliação Psiquiátrica em Dermatologia.
166
Reuniões da SPDV
SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE PSORÍASE
O PARADOXO DA PSORÍASE NA SIDA
Gabriela Marques Pinto
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de Curry Cabral, Lisboa
Parece paradoxal a ocorrência de psoríase, uma doença mediada por células T, nos doentes infectados pelo VIH, situação
associada a franca diminuição dos linfócitos T.
De facto, a prevalência de psoríase nestes doentes é idêntica, ou mesmo superior, à da população em geral. Existe uma
relação clara entre a psoríase e a imunossupressão que ocorre nos doentes infectados pelo VIH. De facto, A psoríase, que
pode ser a 1ª manifestação da SIDA, traduz habitualmente a presença de infecção avançada, tende a agravar-se com a
progressão da infecção pelo VIH e correlaciona-se com a descida do nº total de células CD4+, embora, também
paradoxalmente, possa melhorar ou mesmo regredir espontaneamente nos estadios terminais da imunodeficiência.
As lesões de psoríase podem surgir antes ou após a infecção pelo VIH, mas esta dermatose tem características particulares
no doente com SIDA, em que as formas graves e extensas de psoríase, refractárias à terapêutica, e a eritrodermia psoriásica
parecem ser mais frequentes que nos doentes imunocompetentes; são habituais as lesões eritemato-descamativas e a
pustulose palmoplantar, a artrite e quadros Reiter-like, bem como lesões de face e couro cabeludo, com padrão seborreico, e
envolvimento das grandes pregas (psoríase inversa).
O tratamento da psoríase cutânea extensa e da artrite é particularmente difícil nos doentes com SIDA, dada a contraindicação para as terapêuticas sistémicas com potencial imunossupressor e risco de reactivação do VIH. A acitretina pode ser
uma boa escolha nalguns doentes com quadros Reiter-like ou eritrodermia, mas a resposta habitual da psoríase à terapêutica
antiretroviral torna-a numa melhor opção e é mais um factor a favor da relação imunopatogenica entre estas duas entidades.
A psoríase nos doentes com SIDA suscita, entre outros, 2 paradoxos essenciais:
1º Apesar da psoríase nos doentes HIV se agravar à medida que a contagem de células T CD4 diminui, melhora
com várias terapêuticas que diminuem a contagem de CD4 (paradoxo imunoterapêutico);
2º A SIDA caracteriza-se por um perfil secretório de citoquinas Th2 (IL4, IL5, Il6, IL10), enquanto a psoríase está
associada a um padrão Th1 (IL2, TNFa, IFNg) (paradoxo secretório).
Na verdade, quer a psoríase, quer a SIDA, caracterizam-se por um status de imunodesregulação, em que a avaliação
detalhada do tipo de células T envolvidas, perfil das citocinas, papel das células apresentadores de Ag, presença de
superantigenes (bacterianos e virais) e susceptibilidade genética podem esclarecer a relação entre estas 2 patologias e
clarificar estes aparentes paradoxos. Os mecanismos imunopatogénicos subjacentes, em ambas as situações, são complexos
e qualquer explicação simplista dos intervenientes imunológicos envolvidos conduz, facilmente, a uma visão “paradoxal” da
associação entre estas duas entidades.
Nos doentes com SIDA o desequilíbrio na relação CD4/CD8 e, em particular, o aumento relativo e absoluto das células T
memória CD8+, conduz ao aumento da secreção de IFNg e consequente expressão aberrante de HLA-DR pelos
queratinócitos, que facilita a sua activação policlonal por superantigenes, em particular pelas toxinas estreptococicas e
estafilocócicas que sabemos serem frequentemente responsáveis pelos surtos de agravamento da psoríase; esta activação
dos queratinócitos resulta na produção de TNFa e, possivelmente, outras citocinas que perpetuam o fenotipo psoriásico.
Também não podemos ignorar outros potenciais mecanismos imunopatogénicos envolvidos na associação destas duas
patologias, como a diminuição na SIDA de linfócitos CD4 específicos (com acção supressora da via imunológica que conduz
ao desenvolvimento de psoríase), a acção directa do vírus HIV na estimulação dos queratinócitos, o papel da substância P, a
particular susceptibilidade para a psoríase nos doentes com SIDA e portadores de HLA-Cw*0602, etc.
A futura compreensão de todos os mecanismos patogénicos envolvidos nos doentes com SIDA e psoríase é essencial, não
só para esclarecer e desmistificar o aparente paradoxo desta associação, mas, sobretudo, para melhor delinear a
imunopatogenese da psoríase nos doentes imunocompetentes e, consequentemente, estabelecer novos alvos terapêuticos
para a psoríase, área que como sabemos sofreu um avanço notável nos últimos anos.
167
Reuniões da SPDV
WHAT BIOLOGICAL TREATMENTS CAN TELL US
Luis Puig
Department of Dermatology, Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Autonomous University of Barcelona, Barcelona, Spain
The introduction of biologics has not only broadened the therapeutic armamentarium for psoriasis but also stimulated
discussion about the treatment of this common skin condition. Patients should carefully be monitored for the presence of
psoriatic arthritis and comorbidities because these may need to be integrated in the planning of treatment goals on an
interdisciplinary basis. Patient surveys and recent studies in the Iberian Peninsula indicate a relatively high mean severity of skin
symptoms and low quality of life, as well as frequent undertreatment among severely affected patients. One possible
explanation is that the conventional traditional and new treatment options are not being used consistently.
Biologic agents, due to their favorable benefit/risk profile, provide a unique opportunity to achieve complete or nearly
complete blanching that can be maintained continuously, to a level that used to be hampered by the organ-targeted toxicities of
traditional systemic agents. In general, the best evidence of efficacy is becoming the percentage of patients who achieve the
result of “clear or almost clear” (PASI>90%) on treatment. In studies enrolling severe patients, patients who achieve the result of
“mild” (PASI>75%) may also be considered as responders if defined prospectively". If, after a defined period of time, a PASI50
response or a Dermatology Life Quality Index of not less than 5 is not reached, patients should be switched to another therapy.
Whenever necessary, a continuous maintenance therapy should be instituted with special attention to these goals.
Clinical experience is increasing and will contribute to the establishment of individualized treatment protocols that take into
account the continuous versus intermittent character of the disease, the rate of worsening, the association with arthritis and
other comorbities, as well as transitioning and combined treatment schemes. Eventual loss of response in a subset of patients
under treatment with TNF-blocking agents provides another challenge, to which new additions to our therapeutic
armamentarium might contribute to provide a solution. Taking into account the ever increasing hurdles that new treatments are
overcoming as regards both efficacy and safety, new therapeutic goals are being developed, aiming towards maintained
clearance or nearly blanching, thus improving significatively our patients' health-related quality of life.
SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE
DERMATOLOGIA PEDIÁTRICA
CONECTIVITES NA CRIANÇA – CLÍNICA
Susana Machado
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Geral Sto António
O lúpus eritematoso na criança pode ser dividido em 2 tipos distintos: o lúpus eritematoso exclusivo da infância – lúpus
neonatal (LEN), e o lúpus eritematoso comum às outras faixas etárias. Cinquenta por cento dos recém-nascidos com LEN têm
manifestações cutâneas. Caracterizam-se por um eritema periocular em máscara e pelo aparecimento de máculas ou placas
anulares, com ou sem descamação fina. Podem também ter lesões urticariformes, purpúricas, cutis marmorata
telangiectásica congénita, pápulas angiomatosas e icterícia. Na raça negra é frequente o aparecimento de áreas de
despigmentação simétrica. As alterações cardíacas surgem em 60% dos recém-nascidos, sendo a mais comum o bloqueio
cardíaco congénito. Podem também cursar com alterações hepáticas, hematológicas, pulmonares, gastrointestinais e do
sistema nervoso central (SNC), entre outras. O lúpus eritematoso sistémico na criança é semelhante ao do adulto, tendo em
conta que o diagnóstico é por vezes muito difícil pelo facto dos critérios não serem concomitantes. As manifestações iniciais
são essencialmente as artralgias e/ou artrite, o eritema malar, febre e/ou um mal-estar generalizado. Na infância é mais
comum o envolvimento renal e do SNC e o aparecimento de adenomegalias e hepatoesplenomegalia. O LE discóide e o LE
subagudo são raros nesta faixa etária.
Tal como no adulto, a dermatomiosite na criança é uma doença inflamatória caracterizada por lesões cutâneas e
alterações musculares características, podendo afectar outros órgãos. Em 50% dos casos o início é insidioso, com fraqueza
ligeira, anorexia, mal-estar, dor abdominal e aparecimento gradual do rash. Em 30% dos casos o início é fulminante, com
febre, fraqueza muscular grave e envolvimento multisistémico. São mais frequentes nas crianças as lesões de vasculopatia e
de calcificação distrófica. É comum nesta faixa etária haver dor à palpação muscular, bem como contracturas e atrofias
168
Reuniões da SPDV
musculares, que resultam em grande morbilidade e limitação. Para além das outras lesões cutâneas características, aparecem
também muitas vezes telangiectasias gengivais, lipodistrofia e, em alguns casos, hipertricose. No entanto, são menos
frequentes os fenómenos de Raynaud e raras as associações a neoplasias.
Na criança é muito mais frequente a esclerodermia localizada (morfeia) do que a sistémica, com maior variedade clínica:
morfeia linear, em golpe de sabre, em placa, gutata, subcutânea, generalizada e panesclerótica. Caracteristicamente, a
morfeia mais comum nesta faixa etária, a linear, pode levar ao encurtamento do osso subjacente e resultante assimetria. A
esclerodermia sistémica é uma doença generalizada e rara na criança, com atingimento multiorgânico e com diferentes fases
de envolvimento cutâneo.
CONECTIVITES NA CRIANÇA – ABORDAGEM TERAPÊUTICA
Alberto Mota
Faculda de Medicona do Porto
O tratamento de primeira linha do lúpus eritematoso sistémico pediátrico (LESP) é idêntico ao do adulto, sendo de
realçar uma significativa incidência de deslipidemia. Contudo, dada a maior prevalência de casos mais graves no LESP, alguns
dos quais refractários ao tratamento clássico, o rituximab tem emergido como um fármaco promissor. No entanto, a
toxicidade deste fármaco na criança permanece por caracterizar. Apesar de alguma evidência sugerir que a dermatomiosite
juvenil (DMJ) possui uma etiopatogénese distinta da do adulto, a abordagem terapêutica nestes grupos etários é, em linhas
gerais, sobreponível e o tratamento de primeira linha assenta na corticoterapia sistémica. Na variante amiopática, de melhor
prognóstico, o tratamento pode circunscrever-se à fotoprotecção, com ou sem corticoterapia tópica associada, embora
alguns casos necessitem da introdução de antimaláricos de síntese. O fármaco de segunda linha mais utilizado na
apresentação clássica da DMJ parece ser o metrotrexato. Contudo, vários casos de DMJ refractária responderam ao
tratamento com imunoglobulina endovenosa, ciclofosfamida, ciclosporina A ou micofenolato de mofetil. Tal como no LESP, o
rituximab prefigura-se como um fármaco promissor, mas o seu uso limita-se a alguns casos clínicos. Os inibidores do TNFalfa, como o etanercept e o infliximab, produziram resultados muito variáveis, pelo que o seu papel terapêutico permanece
por definir. Dada a elevada prevalência de calcinose cutânea na DMJ, é muitas vezes necessária a exérese cirúrgica destes
tumores que avultam nas proeminências ósseas. Nenhum tratamento é satisfatoriamente eficaz na reversão da fibrose que
caracteriza a esclerodermia localizada juvenil (ELJ), muito mais frequente do que a sistémica nesta faixa etária de doentes.
Contudo, os casos de resolução espontânea ao fim de alguns anos, sobretudo nas formas de morfeia em placa, não são
desprezíveis. Os corticosteróides tópicos afiguram-se mais eficazes in vitro do que in vivo na inibição da fibrose devido, talvez,
à dificuldade de absorção percutânea destes agentes num contexto esclerodérmico. É possível que a associação com
derivados da vitamina D3, como o calcipotriol, exerça um efeito terapêutico sinérgico. A fototerapia, em particular com baixa
dose de UVA1, é recomendada por muitos autores como abordagem de primeira linha, mas a segurança a longo prazo na
criança é uma limitação. O imiquimod produziu resultados interessantes nalguns casos clínicos de morfeia em placas. O
metrotrexato associado à metilprednisolona endovenosa, com ou sem prednisolona oral consoante a resposta, foi
introduzido com sucesso no tratamento de variantes de ELJ desfigurantes, com marcada impotência funcional ou com
manifestações extracutâneas.
SIMPÓSIO DO GRUPO PORTUGUÊS DE
DERMATITES DE CONTACTO
DERMATOLOGICAL PROBLEMS DUE TO HAIR DYING: PROBLEMS AND SOLUTIONS
Christophe Le Coz
Strasbourg, France
Hair dyes are a cultural necessity. Natural hair dyes (metallic, vegetal or animal substances) have been, henna excepted,
replaced by chemical “modern” dyes at the end of the 19th century. Transient hair dyes can be considered as hair paints, are can
be removed by a single shampoo. Semi-permanent hair dyes are present in “one component” preparations, applied for
169
Reuniões da SPDV
minutes and persist some weeks. Permanent hair dyes are present in “two components” coloring preparations; a generally no
colored dye monomer will be polymerized into a colored polymer within the hair, requiring a coupling agent, a basic medium
and a source of oxygen. Irritant dermatitis is mainly due to a misuse of the dye. Immediate type reactions, including anaphylactic
shock, are exceptional. Nevertheless, the prevalence of allergic contact dermatitis from hair dyes increases and can be very
severe. Allergies are mainly due to permanent dyes, that comprise numerous highly allergenic substances: diaminobenzenes
(para-phenylenediamine and derivatives), diaminotoluenes (toluene-2,5-diamine), and aminophenols (o-, m-, and paminophenols and derivatives). Sensitization is sometimes induced by transient “black henna” tattoos. Patch tests are the gold
standard for the diagnosis. The attitude of the dermatologist for the patient's advice depends on the result of the tests, and will be
discussed.
IMUNOLOGIA DA DERMATITE DE CONTACTO
Margarida Gonçalo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
A Dermatite de contacto alérgica (DCA) é considerada por excelência uma reacção de hipersensibilidade retardada
mediada por linfócitos T específicos do alergeno, mas dados recentes apontam a importante participação da resposta
imunitária inata tanto na sensibilização como na resposta efectora.
São muito diversas as células efectoras da DCA, sendo a grande novidade a infiltração predominante do local da DCA
com células Natural Killer (NK) ou NKTcells que, se reconhecem o alergeno, o fazem de forma independente da complexação
com as moléculas HLA, e que promovem a destruição (apoptose) de ceratinócitos que fixaram o alergeno. Das células T
específicas do alergeno (CD4 e CD8, Th1,Th2 e Th17), está comprovado o contributo pró-inflammatório das células Th17 e o
papel anti-inflamatório das células T reguladoras, e das células efectoras cutâneas que migram para a pele e outros locais de
inflamação (CLA+ e CCR7-) e outras que recirculam pelo gânglio linfático (CLA-e CCR7+) e são responsáveis pela memória
central de longa duração, ou seja a resposta específica ao alergeno passados longos anos.
Na iniciação da DCA, a resposta inata dos ceratinócitos e das células dendríticas (CD) ao alergeno é o verdadeiro “alerta”
para iniciar todo o processo. Apenas substâncias capazes de alterar ceratinócitos e as CD têm capacidade antigénica.
Induzem receptores que permitem à CD abandonar a sua ligação ao ceratinócito, atravessar a membrana basal e migrar pela
derme até à zona T do gânglio linfático que a atrai pelo seu recém induzido CCR7. A maturação da CD induzida pelo
alergeno confere-lhe o equipamento capaz de activar o linfócito T naive e induzir a sua sensibilização e polarização para
célula Th1/2 ou Th17, tornando-o numa célula T efectora ou de memória. O ceratinócito estimulado numa fase muito
precoce pelo alergeno liberta citocinas e quimiocinas (IL-1,6,8,TNF-alfa, CCL17 e CCL27) que estimulam as CD locais e
atraem outras mais eficientes na apresentação Ag e recrutam as células T efectoras.
COSMÉTICOS
Olívia Bordalo
Centro de Dermatologia Médico Cirúrgico, Lisboa
A dermatite de contacto alérgica a cosméticos é provocada principalmente por perfumes, conservantes, tintas capilares e a
resina do verniz das unhas.
Os perfumes são os alergenos mais frequentes nos cosméticos. São usados não só na perfumaria fina como também em
aromaterapia, nos produtos de uso diário como desodorizantes, cosméticos para a pele, produtos domésticos e profissionais,
cosméticos e brinquedos para crianças, medicamentos tópicos e até nos sistemas para perfumar o ambiente de hotéis e
edifícios variados.
Para detectar a alergia a perfumes são aplicados na série standard as misturas de perfumes I e II.
A mistura de perfumes I contém oito essências, sete sintéticas e uma natural, o oak moss absoluto, sendo esta a que
provoca maior número de reacções positivas. Estima-se que a mistura detecte 70 a 80% de alergias a perfumes.
A mistura de perfumes II, mais recente, contém seis essências sintéticas sendo o Lyral® (hidroxiisohexil 3-ciclohexeno
carboxaldeído) o principal responsável pelas reacções positivas.
Actualmente, é obrigatório rotular todos os cosméticos comercializados na Europa que contenham na sua composição
170
Reuniões da SPDV
qualquer uma de 26 fragrâncias indicadas numa lista emanada pela Directiva Cosmética Europeia (7th Amendment of the
European Cosmetic Directive) – nos produtos “leave-on”, se a sua concentração exceder 0,001%, e nos produtos “rinse-off”,
se a sua concentração exceder 0,01%. Desta lista constam todas as essências que compõem ambas as misturas de perfumes.
Relativamente aos conservantes, um dos alergenos que mais nos preocupavam era o metildibromoglutaronitrilo
(MDBGN) que foi definitivamente retirado do mercado em Junho deste ano.
A clorometilisotiazolinona (MCI / MI, Kathon CG) mantém-se como um dos principais alergenos mas têm surgidos novos,
como o iodopropinil butilcarbamato (IPBC), usado, por exemplo, em toalhetes para bebés.
As tintas capilares serão o tema de palestra deste Simpósio.
A resina tosilamida formaldeído (tolueno-sulfonamida-formaldeído) continua a provocar dermatite de contacto ectópica
nos seus utilizadores e dermatite das mãos nas manicuras. Estão comercializados vernizes isentos desta resina.
Destacam-se ainda alguns alergenos emergentes como a benzofenona 4, nos filtros solares, a hidroxidecil ubiquinona
(idebenona), usada como anti-oxidante em cosméticos e o hidrolisado de proteínas de trigo, entre outros.
É essencial testar sempre os produtos utilizados pelos pacientes, pois só assim ser-nos-á possível descobrir novos alergenos num mercado em activa expansão.
Salienta-se a importância da rotulagem dos cosméticos que permite evitar o contacto dos doentes com os produtos a que
são alérgicos.
UNHAS ARTIFICIAIS
Olívia Bordalo
Centro de Dermatologia Médico Cirúrgico, Lisboa
As unhas artificiais tornaram-se muito populares nas últimas décadas e são principalmente usadas com finalidades estéticas. Servem ainda para camuflar as unhas distróficas ou com dificuldades de crescimento.
Existem três tipos principais de unhas artificiais:
- As unhas pré-formadas são geralmente de plástico e não provocam alergias. São aplicadas no prato ungueal com o
auxílio de uma cola acrílica, habitualmente o etilcianoacrilato. Este pode provocar onicólise, perioníquia, perda de cutícula,
dermite de contacto irritativa ou alérgica.
Nas extensões as pontas são plásticas ou acrílicas, encaixam-se e colam-se à porção distal do prato ungueal. Na porção
proximal coloca-se uma unha esculpida ou fotopolimerizada. Uma onicólise traumática devido ao aumento desmesurado do
comprimento da unha é uma possibilidade não negligenciável.
- As unhas esculpidas (vulgo, unhas de porcelana) são aplicadas com o auxílio de um pacote (“kit”) constituído por um pó e
um líquido. O pó contém um polímero de metacrilato, o catalizador (peróxido de benzoílo) e outros aditivos. O líquido é um
éster ou uma mistura de ésteres de metacrilato. A polimerização inicia-se à temperatura ambiente, quando se juntam o líquido
e o pó e o produto é moldado no prato ungueal. Esta reacção pode ser inibida pela hidroquinona. A unha resultante será
esculpida conforme o formato pretendido.
- As unhas fotopolimerizadas (vulgo, unhas de gel) são aplicadas com um pincel embebido em gel constituído por metacrilatos. A polimerização é efectuada sob o efeito da radiação ultravioleta e não por exposição ao ar.
Estão descritos casos de dermatite de contacto irritativa, alérgica, perioníquia, anoníquia, onicólise e parestesias devido
aos acrilatos usados nestes processos.
As lesões de dermatite de contacto alérgica podem observar-se na região periungueal, nos dedos, no dorso da mão ou a
distância. Por vezes pode ocorrer uma dermatite com o padrão “airborne” ou, mais raramente, uma generalização do eczema.
Os alergenos mais frequentes são o 2-hidroxietil metacrilato (2-HEMA), o 2-hidroxipropil metacrilato (2-HPMA), o etilenoglicol dimetacrilato (EGDMA), o trietilenoglicol dimetacrilato (TREGDMA) e com menor frequência, o etilcianoacrilato (ECA).
As unhas pré-formadas são de curta duração, pois devem ser substituídas ao fim de 48 horas. As unhas esculpidas ou as
fotopolimerizadas podem ser mantidas durante um longo período de tempo, embora a porção proximal tenha que ser
regularmente preenchida à medida que a unha natural vai crescendo. Destacam-se com o auxílio de uma broca eléctrica,
complementada por um solvente, de preferência a acetona. Durante a utilização da broca, tanto o profissional como a cliente
deverão estar protegidos com máscara e óculos.
Em caso de sensibilização a unhas esculpidas ou fotopolimerizadas pode optar-se pelas unhas pré-formadas uma vez que
171
Reuniões da SPDV
os cianoacrilatos raramente dão reacção cruzada com os acrilatos / metacrilatos.
As unhas artificiais têm maior risco de colonização por microorganismos patogénicos, frequentemente bactérias gramnegativas e leveduras, pelo que o seu uso é desaconselhado em determinadas profissões. A lavagem das unhas torna-se difícil
e demorada e as luvas rompem-se mais facilmente.
A NEW PATTERN OF TEXTILE DERMATITIS: THE POISONED SOFA INDUCING THE “SOFA DERMATITIS”
Christophe Le Coz
Strasbourg, France
Since 2007, an epidemic of contact dermatitis is reported in Great-Britain and Finland and since June 2008 in France by the
way of the network Revidal-GERDA. The characteristic presentation is a severe, long lasting, corticosteroid resistant, and
relapsing dermatitis occurring in posterior body areas. All patients have bought a low cost microfiber or leather covered sofas
or armchair (sold for 299 €), manufactured in China by the firm Linkwise. The allergen is dimethylfumarate, a white powder with
a wide spectrum biocide activity. It is contained in little paper bags, progressively evaporates and contaminates the sofa. Patch
tests, negative to standard series, have to be cautious with dimethylfumarate. Dimethylfumarate is an extremely irritant and
sensitizing substance, experimented or used in Asia as a preservative for textiles, leather, foods, cosmetics, flours… and remains
generally unknown by the European instances. This fantastic substance is also used to preserve leather of shoes made in China,
and may be responsible for acute bullous dermatitis of the feet.
COMUNICAÇÔES
ÚLCERAS DE PERNA REVELADORAS DE LEUCEMIA AGUDA: APRESENTAÇÃO CLÍNICA DE 4 CASOS DE
LEUCEMIA CUTIS
Ana Filipa Duarte2, T. Baudrier1, M. J.Cruz1, F. Azevedo1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de São João, Porto, 2Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de
São João e Faculdade de Medicina, Porto
Nos doentes hemato-oncológicos, as úlceras cutâneas podem ser consequência das alterações hemorreológicas associadas, de infecções ou de processos inflamatórios ou degenerativos das paredes vasculares. Mais raramente devem-se à
infiltração dérmica específica por leucócitos neoplásicos. Esta forma, designada por leucemia cutis, é um factor de mau
prognóstico.
Quatro doentes hematológicos foram enviados à consulta Dermatologia por úlceras de perna recentes. Em três, as lesões
acompanharam a transformação aguda da doença, nomeadamente de uma leucemia de grandes linfócitos granulares e de
dois síndromes mielodisplásicos para leucemias mielóides agudas. Na quarta doente, a úlcera de perna revelou uma leucemia de grandes linfócitos granulares de tipo NK aguda.
A biopsia cutânea efectuada demonstrou a infiltração neoplásica nos quatro casos.
Todos os doentes relacionavam o aparecimento da úlcera com traumatismo ocorrido algumas semanas antes. Localizavam-se na metade infero-lateral da perna e eram muito dolorosas. Tinham forma arredondada, bordos regulares, eram
pouco profundas. Não se associavam estigmas de insuficiência venosa ou arterial periférica relevantes.
A leucemia cutis é clinicamente indistinguível de outras lesões cutâneas e a rara apresentação ulcerada, quando presente
nos membros inferiores mimetiza as úlceras vasculares. É portanto fundamental para o diagnóstico precoce, a suspeição
clínica, alicerçada pela anamnese e exame objectivo.
Salienta-se ainda que a opção pela terapêutica quimioterápica agressiva, depende nalgumas neoplasias hematológicas
crónicas de sinais de transformação aguda. Estes, podem ser detectáveis no sangue periférico mas, por vezes só se evidenciam nos tecidos (medula óssea, pele - leucemia cutis, outros órgãos). O envolvimento cutâneo pela população tumoral pode
ser demonstrado por histopatologistas experientes na área dermatológica e decisivo para a instituição rápida do tratamento .
172
Reuniões da SPDV
TRATAMENTO CIRÚRGICO DO SINUS PILONIDALIS SACROCOCCÍGEO COM RETALHO ROMBÓIDE
João Goulão, C. Furtado
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Garcia de Orta, Lisboa
A região sacrococcígea, corresponde à localização mais frequente do sinus pilonidalis, que é uma doença frequente e que
afecta sobretudo jovens do sexo masculino. A excisão do sinus com encerramento directo ou a excisão com marsupilização,
constituem as técnicas cirúrgicas, mais frequentemente usadas. A primeira tem a grande desvantagem de associar-se a uma
elevada taxa de recorrência, a segunda por causar um grande incómodo ao doente por necessitar de fazer pensos ao longo
de 1 a 2 meses. A utilização de retalhos locais proporciona: menor taxa de infecção e de recorrência, menor tempo de
internamento hospitalar e melhores resultados estéticos.
Os autores descrevem o tratamento cirúrgico com retalho rombóide, em três doentes: dois do sexo masculino e outro do
sexo feminino. Estes doentes foram operados sob anestesia local, em todos eles foi deixado dreno cirúrgico que foi retirado ao
fim de 48h, e os pontos ao fim de 15 dias. Na 3ª semana pós operatória já faziam a sua actividade diária normal. Neste
momento têm mais de 1 ano de follow-up e não houve registo de recorrência da doença.
ANESTESIA TUMESCENTE EM CIRURGIA DERMATOLÓGICA
Felicidade Santiago, M. M. Canelas, R. Vieira, A. Figueiredo
Serviço e Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
A primeira descrição de anestesia tumescente surgiu em 1986 por Jeffery Klein, aplicada à lipoaspiração. O seu uso rapidamente se expandiu a outras áreas da cirurgia dermatológica como a dermoabrasão, enxertos, correcção de rinofima,
abdominoplastias, mamoplastias, transplante capilar, entre outras.
A anestesia tumescente baseia-se na infiltração subcutânea de grandes volumes de uma solução diluída de lidocaína
(0,05%-0,1%), adrenalina (1:1.000.000) e bicarbonato de sódio. Permite optimizar a eficácia do anestésico maximizando a
sua concentração no local (doses de lidocaína entre 35 a 50 mg/kg podem ser usadas), atrasando a absorção e diminuindo a
toxicidade sistémica. Proporciona ainda uma anestesia completa regional sem bloqueios nervosos; pode persistir até 24 horas
reduzindo a necessidade de analgesia pós-operatória; e, origina uma perda mínima de sangue com uma recuperação
rápida.
Apresentam-se 5 casos clínicos (uma volumosa metástase subcutânea de melanoma, um lipoma interescapular de grandes dimensões e três casos de dermatofibrossarcoma protuberans do tronco) em que a referida técnica foi usada como
método anestésico em preferência à anestesia geral. Em todos os casos, a infiltração anestésica foi bem tolerada, permitindo
uma anestesia eficaz e duradoura de todo o campo operatório. O principal inconveniente detectado foi o consumo de tempo
requerido pela própria infiltração e necessário à instalação da anestesia que foi, em todos os casos, superior a 20 minutos.
A técnica tumescente assume-se como uma opção segura e vantajosa na anestesia local, por oposição à técnica
convencional, nomeadamente em lesões volumosas ou que exijam amplas margens de ressecção cirúrgica.
TUMORES DO PAVILHÃO AURICULAR E CIRURGIA MICROGRÁFICA DE MOHS – REVISÃO DE 25 ANOS
(1980-2003)
Rubina Alves1, J. O. Wilhelmi2, G. Catorze2, J.M. Labareda2, A. Picoto2, O. Bordalo2
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Central Funchal, 2Serviço de Dermatologia, Centro Médico-Cirúrgico de
Lisboa, Lisboa
Introdução: Os tumores cutâneos não-melanoma (TCNM) englobam essencialmente 2 tipos de tumores: o Carcinoma
Basocelular (CBC) e, menos frequente, o Carcinoma Espinocelular (CEC). Cerca de 85 % dos TCNM localizam-se na cabeça
e pescoço, dos quais 5 a 10% representam tumores do pavilhão auricular. Estes são de difícil tratamento e com elevadas taxas
de recidiva. A Cirurgia Micrográfica de Mohs (CMM) é o método cirúrgico de eleição de tumores ocorrendo em locais onde a
recidiva é mais provável, como é o caso do pavilhão auricular.
Objectivo: Revisão e caracterização de tumores malignos do pavilhão auricular (CBC e CEC) tratados por CMM, no
Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgica de Lisboa, no período entre 1980 e 2003.
173
Reuniões da SPDV
Material e Métodos: Foi efectuada uma análise retrospectiva de todos os doentes com tumores do pavilhão auricular
operados por CMM, durante 25 anos (1980 e 2003). Os dados foram obtidos através da consulta e revisão dos processos
clínicos. Os parâmetros analisados foram: idade, sexo, tipo e localização do tumor, tempo de evolução, técnica de reconstrução e recidiva.
Resultados: Foram encontrados 107 doentes com correspondente número de tumores operados. Houve um predomínio
do sexo masculino (84%) relativamente ao sexo feminino (16%). A idade média foi de 68 anos (41-89 anos). O tumor mais
frequente foi CBC (85%), seguido do CEC (13%). Na nossa amostra, 87% dos casos correspondiam a tumores primitivos e
13% a tumores recidivados. A localização mais atingida foi o hélix, com 42 tumores operados. As técnicas de reconstrução
mais utilizadas foram a sutura directa e o retalho de avanço (ambas em 21 % dos casos). O total de recidivas após CMM foi de
5%.
Conclusão: A CMM é o método de eleição para os tumores do pavilhão auricular, uma vez que representa uma menor
taxa de recidivas e uma maior poupança de tecido.
RETALHO EM PORTA GIRATÓRIA NA RECONSTRUÇÃO DA CONCHA AURICULAR: REVISÃO DE 3 CASOS
Maria Miguel Canelas, F. Santiago, R. Vieira, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
O retalho em porta giratória foi descrito por Masson em 1972 para a reconstrução de defeitos da concha auricular.
Corresponde a um retalho em ilha com pedículo subcutâneo procedente da superfície posterior da orelha, sulco aurículo-cefálico e região mastoideia.
São apresentados 3 doentes com carcinomas basocelulares da concha auricular, submetidos a excisão tumoral e reconstrução com retalho em porta giratória.
Entre as várias técnicas descritas para a reconstrução da concha auricular, o retalho de pedículo subcutâneo em porta
giratória é ideal para defeitos que incluam a cartilagem subjacente, como aconteceu nos doentes descritos. A sua realização é
possível num só tempo operatório sob anestesia local, apesar de um dos doentes ter sido operado sob anestesia geral, em
virtude da grande dimensão do tumor. Nenhum dos retalhos sofreu complicações descritas na literatura como necrose ou
infecção. O resultado estético foi bastante aceitável, dada a textura e cor da pele transportada serem semelhantes às
esperadas para esta região anatómica. Num dos doentes observou-se aderência da face posterior do pavilhão auricular à
região mastoideia, motivada pela necessidade de confeccionar um retalho de grandes dimensões, adaptável ao tamanho do
defeito cirúrgico. Ainda assim, este inconveniente não prejudicou significativamente o resultado cosmético global.
MITOMICINA C: UMA PROMISSORA OPÇÃO NO TRATAMENTO DE QUELÓIDES?
Pedro Ponte, A. Fidalgo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa-Central
Introdução: Os quelóides são cicatrizes formadas por produção exagerada de colagénio pelos fibroblastos, que se
expandem para além dos limites da lesão original. Para além do problema estético, os quelóides são frequentemente
sintomáticos e podem determinar compromisso psicossocial. Apesar de serem muito prevalentes na população em geral,
continuam a ser um desafio dermatológico. Os tratamentos presentemente disponíveis incluem corticóides tópicos ou
intralesionais, crioterapia, aplicação de gel de silicone, excisão cirúrgica seguida de radioterapia, laserterapia, braquiterapia,
bleomicina e 5-fluouracilo intralesionais, e imiquimod tópico. Os resultados destas terapêuticas são inconsistentes, mesmo
quando utilizadas em esquemas combinados.
A mitomicina C é um agente anti-neoplásico com um efeito anti-proliferativo nos fibroblastos sem interferência na
epitelização. Tem sido usada com eficácia para prevenir a formação de tecido cicatricial em procedimentos invasivos do foro
da Oftalmologia e da Otorrinolaringologia. Foram recentemente publicados alguns estudos que demonstraram resultados
promissores deste agente na prevenção de quelóides.
Objectivos: Procurámos determinar a eficácia da mitomicina C tópica na prevenção de quelóides tratados por shaving.
Métodos: Neste estudo prospectivo participaram doentes com quelóides resistentes a múltiplas terapêuticas prévias.
Fizemos shaving das lesões seleccionadas sob anestesia local e, após hemostase, aplicámos mitomicina C a 1mg/ml durante
174
Reuniões da SPDV
3 minutos; repetimos a aplicação 4 semanas depois. Os quelóides foram fotografados antes e depois do tratamento e os
doentes revistos aos 2 e 6 meses. O resultado da intervenção foi classificado por doentes e médicos numa escala qualitativa.
Resultados: Foram introduzidos neste estudo 9 doentes (7 do sexo feminino), com idades compreendidas entre os 30 e os
69 anos, com quelóides localizados no tronco (2), ombro (4), região púbica (1), braço (1) e região retro-auricular (1), com
dimensões variáveis entre 1cm a 4cm de maior diâmetro. Cinco dos 9 doentes ficaram Muito Satisfeitos com o resultado e
nenhum ficou Insatisfeito. Registaram-se efeitos irritativos transitórios na globalidade dos doentes e alterações de pigmentação local ligeiras a moderadas em 6.
Conclusões: A utilização de mitomicina C foi muito eficaz no tratamento de quelóides dos doentes analisados, mas são
necessários estudos mais amplos que confirmem estes resultados.
MELANOMA DE “TIPO ANIMAL”: UMA VARIANTE RARA NO HUMANO
Pedro Ponte1, R. Alves2, I. Viana3, E. Vale3
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa Central, 2Serviço de
Dermatologia e Venereologia, Centro Hospitalar do Funchal, 3Centro de Dermatologia Médico-Cirúrgico de Lisboa
O melanoma de “tipo animal” (MTA), ou melanoma com síntese proeminente de pigmento, é uma variante muito rara de
melanoma. O seu nome deriva dos aspectos histológicos que são semelhantes aos descritos em melanomas que ocorrem em
determinadas espécies de cavalos. Clinicamente manifesta-se como placa de cor negra a azulada ou nódulo com diâmetro
superior a 1cm, habitualmente em adultos jovens. Histopatologicamente é uma lesão dérmica, constituída por proliferação
de células epitelióides, poligonais e fusiformes com abundante melanina no seu citoplasma, com arranjo nodular, fascicular
ou em toalha, sem atipia celular marcada e escasso número de mitoses. Dado que é uma entidade rara e o número de casos
publicados é muito limitado, ainda não foi estabelecido um comportamento biológico padrão para este tumor.
Fez-se uma revisão de 7 casos de MTA diagnosticados no Centro Dermatologia Médico Cirúrgica onde foram avaliados
parâmetros clínicos, histológicos e imunohistoquímicos. Encontrámos 5 doentes do sexo masculino e 2 do sexo feminino, com
idades compreendidas entre os 65 e os 97 anos (mediana 72). As lesões localizaram-se predominantemente na face e uma no
ombro e foram interpretadas clinicamente como nevo azul, corno cutâneo, carcinoma basocelular ou melanoma maligno.
Histologicamente as características observadas foram sobreponíveis às acima descritas. Dois doentes faleceram por motivos
relacionados com a doença, 1 faleceu por causa não esclarecida, 1 foi perdido no follow-up e 3 estão presentemente bem,
sem progressão da doença (follow-up médio de 2 anos).
Ainda que na literatura este tipo de melanoma seja descrito como tendo um comportamento indolente, os nossos
resultados não sustentam essa afirmação. O MTA permanece uma variante distinta de melanoma, sendo importante fazer o
diagnóstico diferencial com outras lesões melanocíticas, nomeadamente com nevo azul celular, nevo azul epitelióide, nevo
azul maligno e regressão de melanoma maligno. Os planos diagnóstico e terapêutico deverão manter-se os mesmos que os
usados para os restantes melanomas, com excisão alargada e pesquisa de gânglio sentinela sempre que indicado.
TUMORES FOLICULARES: ESTUDO HISTOPATOLÓGICO
José Carlos Cardoso, José P. Reis, Óscar Tellechea
Serviço de Dermatologia e Venereologia, dos Hospitais da Universidade de Coimbra
Introdução e Objectivo: os tumores foliculares benignos compreendem um grande número de entidades relativamente
raras, definidas pelo tipo e grau de diferenciação pilosa observado no exame histológico. De relevância essencialmente
dermatológica, parte da sua importância prende-se com o facto de poderem constituir marcador de neoplasia extracutânea
no contexto de síndromes específicos. O presente trabalho tem por objectivo o estudo da frequência relativa destes tumores e
avaliação das suas principais características histopatológicas.
Material e Métodos: seleccionaram-se do arquivo histopatológico do Serviço de Dermatologia dos HUC os casos
correspondentes aos diagnósticos dos diferentes tumores foliculares benignos, observados num período de 12 anos; foi
efectuada a observação das lâminas, com revisão dos diagnósticos e avaliação das principais características histopatólogicas; outras variáveis registadas foram a idade, sexo, localização das lesões e diagnóstico clínico.
Resultados: foram incluídos no estudo um total de 207 tumores foliculares (117 casos do sexo feminino, 90 do sexo
175
Reuniões da SPDV
masculino; média de idades de 50,2 anos, com mínimo de 5 e máximo de 89 anos), com a seguinte distribuição: 2
tricofoliculomas; 40 tricoblastomas; 15 tricoepiteliomas (um dos quais da variante desmoplásica); 2 linfadenomas cutâneos
(tricoblastomas adamantinóides); 1 tricogerminoma; 7 poros dilatados de Winer; 1 acantoma das bainhas pilosas; 7 infundibulomas; 48 triquilemomas (15 dos quais da variante desmoplásica); 5 quistos triquilémicos proliferativos; 11 fibromas
perifoliculares; 4 fibrofoliculomas; 2 tricodiscomas; 63 pilomatrixomas. Não se observou nenhum caso de panfoliculoma
nem de tricoadenoma.
Discussão: embora escasseiem estudos sobre a frequência relativa destes diferentes tipos de tumores, os dados que
obtivemos parecem ser concordantes com o que está descrito na literatura. Salientam-se dois casos de tricodiscomas/fibrofoliculomas em síndrome de Birt-Hogg-Dubé, bem como um caso de infundibulomas múltiplos. O presente trabalho
aborda estes tumores de uma forma relativamente global, mas pode constituir ponto de partida para o seu posterior estudo
mais aprofundado.
TUMORES CUTÂNEOS EM DOENTES TRANSPLANTADOS RENAIS SEGUIDOS NAS CONSULTAS DE
DERMATOLOGIA E TRANSPLANTE RENAL
Daniela Cunha1, R. Carvalho1, A. Chaveiro1, A. L. Papoila2, F. A. Pacheco1, P. Lamarão1, J. R. Pinto3, M. Possante3, J. Sousa3,
A. Ferreira3, F. Nolasco3, J. Cardoso1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 3Nefrologia, Hospital Curry Cabral, Lisboa, 2Departamento de Bioestatística e
Informática da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, CEAUL
Introdução: Os doentes transplantados renais têm risco acrescido de neoplasia maligna cutânea, condicionando morbilidade significativa.
Objectivos: Avaliação do efeito da exposição à terapêutica imunossupressora no aparecimento de tumor cutâneo em
transplantados renais, ajustada por sexo e idade.
Metodologia: Análise dos processos clínicos dos doentes seguidos nas consultas de Dermatovenereologia e Transplante
Renal do Hospital Curry Cabral entre 1989 e 2007. Estudo comparativo entre os doentes transplantados renais com e sem
tumor cutâneo.
Resultados: Foram incluídos 677 doentes com o mínimo de 1 mês de imunossupressão e follow-up superior a 6 meses.
Em 61 doentes (9%) foi diagnosticado tumor cutâneo, 78.7% dos quais do sexo masculino. A idade mediana foi de 51 anos.
Os tumores mais frequentes foram o carcinoma espinocelular (47.5%), o carcinoma basocelular (34.4%) e o sarcoma de
Kaposi (SK) (18%). A maioria (60.7%) teve apenas um tumor e em 65.6% dos casos as lesões limitavam-se às áreas
fotoexpostas. A mediana do tempo até ao diagnóstico foi de 4 anos, destacando-se o SK com intervalo de tempo de 1 ano.
Todos os doentes realizaram terapêutica com inibidores da calcineurina associados a outros imunossupressores. Na análise multivariável verificou-se que, comparativamente com a associação com azatioprina, o risco de tumor foi 70% menor nos
medicados com micofenolato de mofetil (MMF) (p=0,001) e 60% menor nos medicados com sirolimus (p=0.068).
A idade à data do transplante constituiu um risco acrescido de 28% (p<0.001), assim como o sexo masculino (risco
relativo=1.8, p=0.098).
Discussão: A incidência e a distribuição por tipo histológico observadas enquadram-se nos dados da literatura
internacional. Destacamos porém, o curto intervalo de tempo decorrido entre o transplante e o diagnóstico de SK.
É relevante a diminuição do risco relativo da terapêutica com MMF e com sirolimus relativamente à azatioprina, o que no
caso do MMF, está ainda escassamente descrito na literatura.
NEUROFIBROMATOSE TIPO 1 NA CONSULTA DE DERMATOLOGIA PEDIÁTRICA – REVISÃO DE 16 CASOS
Filipa Ventura1, J. Rocha1, A. P. Vieira1, R. Maré2, L. Brito3, C. Brito1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Neurologia, Hospital de São Marcos, Braga; 3Departamento de Psicologia,
Universidade do Minho
Introdução: A Neurofibromatose tipo 1 (NF1) é a doença neurocutânea mais frequente, com uma incidência aproximada de
1:3500. Tem uma transmissão autossómica dominante, porém 50% dos casos devem-se a mutações de novo. Determinadas
complicações surgem mais frequentemente em idades específicas, sendo este aspecto muito relevante na idade pediátrica.
176
Reuniões da SPDV
Métodos: Estudo descritivo e retrospectivo baseado na revisão dos processos clínicos dos doentes com o diagnóstico de
NF1 seguidos na consulta de Dermatologia Pediátrica do HSM, entre Janeiro de 2000 e Dezembro de 2007. Todos os doentes
foram avaliados pelas especialidades de Neurologia e Oftalmologia e realizaram RMN cerebral. Foram também submetidos
a avaliação neuropsicológica.
Resultados: Dos 16 doentes avaliados, 8 (50%) eram do sexo masculino. A média de idades foi de 11 anos (intervalo de 4
a 20 anos). As manchas café-au-lait foram o motivo de referenciação em 15 doentes. O tempo médio entre o 1º sinal e o
preenchimento dos critérios de diagnóstico foi de 4 anos. A idade média de diagnóstico foi de 6 anos. Os critérios de
diagnóstico clínico apresentavam as seguintes frequências: manchas café-au-lait (16 doentes – 100%), efélides axilares ou
inguinais (8 – 50%), antecedentes familiares (5 – 31%), neurofibromas cutâneos (5 – 31%), neurofibroma plexiforme (1 – 6%) e
displasia da asa do esfenóide (1 – 6%). Não foram identificadas crianças com nódulos de Lisch ou glioma óptico. Três doentes
(19%) apresentavam baixa estatura e apenas um (6%) tinha macrocefalia. Quatro doentes (25%) tinham queixas de cefaleias.
o estudo imagiológico por RMN cerebral foram identificadas áreas de hiperintensidade em T2 (UBO's) em 9 casos (56%). Em
2 crianças foram identificados tumores: um astrocitoma do corpo caloso e um ganglioneuroma do mediastino.
Discussão: Neste estudo pretendemos documentar os diferentes aspectos a considerar no acompanhamento de crianças
com NF1, nomeadamente na vigilância das múltiplas manifestações clínicas da doença ao longo da idade pediátrica.
PUVA NO TRATAMENTO DA ALOPÉCIA AREATA - ESTUDO RETROSPECTIVO DE 12 ANOS
Sara Lestre, P. Ponte, F. Guerra, M. Apetato
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa-Central
Introdução: A Alopécia Areata (AA) é uma alopécia não cicatricial recorrente, de etiologia não totalmente esclarecida,
que atinge o couro cabeludo e/ou outras áreas pilosas.O impacto psicossocial nos indivíduos afectados é importante,
particularmente nos doentes jovens e no sexo feminino. O tratamento é sintomático, não interferindo na história natural da
doença. A fotoquimioterapia (PUVA) é uma das alternativas terapêuticas a considerar na abordagem da AA, no entanto, sem
eficácia comprovada.
Objectivo: Avaliação da eficácia do PUVA no tratamento da alopécia areata.
Métodos: Foi efectuado um estudo retrospectivo dos doentes com AA tratados com PUVA tópico e/ou sistémico no Serviço
de Dermatologia do Hospital Santo António dos Capuchos, no período compreendido entre 1996 e 2008. Foram avaliadas
as características epidemiológicas e clínicas da população estudada, assim como a resposta ao tratamento, recorrências e
efeitos adversos.
Resultados: Durante um período de 12 anos, 77 doentes (52 do sexo masculino e 25 do sexo feminino) com AA foram
tratados com PUVA tópico e/ou sistémico. A idade média foi de 27,7 anos (2-68 anos). Do total de doentes, 29 (37,7%)
tinham AA parcial, 12 (15,6%) AA total, 30 (39%) AA universal e 6 (7,8%) AA ofiásica. Na maioria dos casos (76,6%) foi
utilizado 8-Metoxipsoraleno tópico (8-MOP) associado a radiação UVA. O número médio de tratamentos foi de 32,3 (9-89
tratamentos) com doses de UVA cumulativas médias variando entre 5,75 a 706 j/cm2 (dose UVA média 142,3 J/cm2).
Em 63,7% dos doentes (n=49) observou-se uma resposta boa a excelente (25 e 24 doentes com mais de 90% e 75% de
reponte, respectivamente). Houve falência terapêutica em 36,4% (n=28). Entre os doentes respondedores, ocorreram
recidivas em 21 (42,9%), com um tempo médio sem doença de 17,8 meses. A presença de história familiar, atopia, idade de
diagnóstico, sexo, duração da doença e tipo de alopécia não influenciaram de forma significativa os resultados obtidos. O
tempo médio de follow-up foi de 12,1 meses, após o término do tratamento.
Conclusão: Na nossa experiência, o PUVA continua a ser uma alternativa terapêutica em casos de AA refractários às
terapêuticas convencionais, apesar de se ter observado um número significativo de recidivas.
VINTE ANOS DE TOXIDERMIAS AO PIROXICAM
David Serra, M. Gonçalo, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
Introdução: O piroxicam é um anti-inflamatório não esteróide (AINE) capaz de provocar diferentes tipos de toxidermias,
como a fotossensibilidade (FTS) ou o eritema pigmentado fixo (EPF).
177
Reuniões da SPDV
Neste trabalho, revemos os casos de FTS e EPF induzidos pelo piroxicam, estudados no Serviço de Dermatologia dos
Hospitais da Universidade de Coimbra, desde 1984.
Métodos: Estudámos 92 doentes, 85 com FTS (51 homens/34 mulheres; idade média 50.4 anos) e 7 com EPF (2
homens/5 mulheres; idade média 51.9 anos). Todos realizaram testes epicutâneos com uma série padrão e ainda com
timerosal e ácido tiosalicílico; 82 doentes com FTS realizaram provas foto-epicutâneas com fotoalergenos e vários oxicans.
Nos casos de EPF, realizaram-se testes epicutâneos com oxicans e outros AINEs, em pele normal e em lesões residuais
hiperpigmentadas.
Resultados: Todos os doentes com FTS tiveram testes positivos com timerosal e ácido tiosalicílico. Obtivemos resultados
positivos com piroxicam em 75 doentes (91.4% de 82 doentes testados) e em apenas 1 com meloxicam. Nos doentes com EPF,
os testes em pele normal foram negativos. Obtivemos os seguintes resultados positivos nos testes aplicados em lesões
residuais: piroxicam – positivo em todos os doentes; tenoxicam – positivo em 6 doentes (86%); meloxicam – positivo em 1
doente (17% de 6 doentes testados). Observámos a reactivação das lesões de EPF aquando da toma acidental de tenoxicam,
enquanto que vários doentes com FTS toleraram este oxicam.
Conclusões: Os testes epicutâneos e foto-epicutâneos são úteis na confirmação da imputabilidade nestas toxidermias. A
reactividade cruzada entre oxicans, excepcional em doentes com FTS, parece ser norma nos casos do EPF.
A participação de diferentes radicais químicos nestes 2 tipos de erupção permite explicar as diferenças observadas no
estudo, por um lado, quanto à presença de sensibilização ao timerosal e ao ácido tiosalicílico e por outro, quanto à
ocorrência de reactividade cruzada entre oxicans.
TESTES FOTO-EPICUTÂNEOS COM UMA SÉRIE ALARGADA DE ALERGENOS: ESTUDO DE 5 ANOS
José Carlos Cardoso, M.M. Canelas, M. Gonçalo, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
A incidência das dermatites de contacto fotoalérgicas tem diminuído e recomendações recentes sugerem que a série de
fotoalergenos deve incluir apenas alguns filtros solares e anti-inflamatórios não-esteróides (AINEs). No sentido de conhecer os
principais fotossensibilizantes no nosso serviço, foi conduzido um estudo retrospectivo dos testes foto-epicutâneos realizados
em doentes com fotodermatoses nos últimos 5 anos.
Durante este período, 83 doentes (58 do sexo feminino/25 do sexo masculino, média de idades de 54,8 anos) foram
testados com uma série alargada de fotoalergenos, incluindo 11 filtros solares, salicilanilidas e outros antissépticos, e
fenotiazinas. Trinta doentes foram também testados com uma série de AINEs. Os testes foram irradiados em D2 com UVA
5J/cm2, e as leituras efectuadas em D2 e D4. Os doentes foram igualmente testados com a série padrão do Grupo Português
de Estudo das Dermatites de Contacto.
Vinte e um doentes (25,3%) apresentaram positividade para um ou mais fotoalergenos, prometazina (7), clorpromazina
(2), 6-metilcumarina (2) e 11 filtros solares (9), principalmente a oxibenzona e a benzofenona-4. Relativamente à série de
AINEs, vinte e um dos 30 doentes testados (70%) tiveram reacções positivas, 9 ao piroxicam por fotossensibilidade sistémica,
8 à benzidamina em gel ou solução oral, e 2 ao ketoprofeno (um dos quais com reacção cruzada ao fenofibrato).
Conclusões: os nossos resultados são discordantes da maioria dos estudos publicados recentemente, com uma menor
reactividade aos filtros solares, elevada reactividade ao piroxicam e à benzidamina e baixa reactividade ao ketoprofeno,
mantendo-se ainda uma elevada reactividade às fenotiazinas. Estes resultados provavelmente reflectem o uso particular de
fármacos na nossa região, e como tal uma série mais restrita de fotoalergenos não detectaria a causa da maior parte dos
nossos casos de fotoalergia.
DERMATITE DE CONTACTO ALÉRGICA EM CRIANÇA E ADOLESCENTES – ESTUDO RETROSPECTIVO DE 11
ANOS
Tiago Torres, S. Machado, M. Selores
Serviço de Dermatologia e Venereologia do Centro Hospitalar do Porto-HGSA
A dermatite de contacto alérgica em crianças e adolescentes tem vindo a aumentar nos últimos anos.
O objectivo deste estudo retrospectivo é descrever e comparar os resultados dos testes epicutâneos efectuados a crianças
178
Reuniões da SPDV
(0-12 anos) e a adolescentes (13-18 anos) na consulta de Alergologia Cutânea e Dermatoses Profissionais do Serviço de
Dermatologia do Hospital Geral de Santo António, entre 1997 e 2007.
Durante este período foram estudados 4180 doentes, dos quais 105 (2,5%) tinham idades compreendidas entre os 0 e 12
anos (idade média 8.8 anos) e 173 (4,1%) eram adolescentes (idade média 15.3 anos). Foi encontrada positividade para os
testes epicutâneos em 49 crianças e em 83 adolescentes, com relevância clínica em 67,1% das provas efectuadas até aos 12
anos e em 80,7% no restante grupo.
Os alergénios mais comuns foram, por ordem decrescente, no grupo das crianças o sulfato de níquel, cloreto de cobalto,
timerosal, dicromato de potássio e neomicina, e no restante grupo o sulfato de níquel, timerosal, cloreto de cobalto,
dicromato de potássio e parafenilenodiamina. As principais origens de sensibilização foram os adornos, o calçado e os
medicamentos. De referir que no grupo dos 13 aos 18 anos surge já a actividade profissional como origem de sensibilização.
O número de doentes testados aumentou com a idade. A percentagem de testes positivos não foi significativamente
diferente mas a relevância clínica foi superior no grupo dos adolescentes. O predomínio das localizações da dermatite de
contacto e dos alergéneos mais frequentes (à excepção do sulfato de níquel) variaram nos 2 grupos etários.
A prevenção das dermatites de contacto nas crianças e adolescentes, principalmente em relação ao sulfato de níquel e aos
adornos, têm de ser mais persuasivas sobre as crianças, os pais e a indústria.
CONSULTA DE DERMATOLOGIA PEDIÁTRICA DO CENTRO HOSPITALAR V. N. GAIA: REVISÃO DE 10 ANOS
Inês Leite, A. Moreira, N. Menezes, A. Baptista, E. O. Ferreira
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho EPE
Introdução: Em Março de 1998 teve início a Consulta de Dermatologia Pediátrica (DP) do Centro Hospitalar Vila Nova de
Gaia (CHVNG), centralizando a observação de todas as crianças e jovens dos 0 aos 15 anos (inclusivé) que recorrem ao
Serviço de Dermatologia do CHVNG.
Métodos: Realizámos a análise estatística das consultas realizadas desde 1 de Março de 1998 até 29 de Fevereiro de
2008.
Resultados: Foram realizadas 8394 consultas, das quais 3325 (39,6%) foram primeiras consultas e 5069 (60,4%)
segundas consultas. Procedemos à análise estatística dos dados relativos às primeiras consultas no que concerne a: sexo,
idade, raça, proveniência do pedido de consulta e diagnósticos. Das 3325 crianças observadas, 1770 (53,2%) eram do sexo
feminino e 1555 (46,8%) do sexo masculino e as idades compreendidas entre 0 meses e 15 anos, com média de 8 anos; a
maioria dos doentes observados pertencia ao grupo etário dos 6 aos 15 anos de idade (70,4%). Relativamente à proveniência
dos pedidos de consulta, 66,6% destes foram realizados pelo médico de família, 30,1% por pediatra e os restantes por outras
especialidades. As principais patologias observadas foram, por ordem decrescente de frequência: doenças infecciosas
(22,2%), nevos (20,4%), eczemas (16,1%), doenças dos anexos (10,6%) e alterações da pigmentação (5,5%). Analisámos
ainda, entre outras, a frequência das entidades nosológicas mais comuns assim como as suas frequências relativas por sexo e
idade.
Conclusão: A realização de estatísticas nosológicas é importante na medida em que podem contribuir para a prática de
medicina preventiva e subsequente diminuição da prevalência de doença cutânea nas crianças.
LINFOMAS CUTÂNEOS PRIMÁRIOS DE CÉLULAS T EM ESTÁDIO AVANÇADO – APRESENTAÇÃO DE
QUATRO CASOS CLÍNICOS
Ana Maria Calistru1, A. M. Barros1, C. Lisboa1, P.Guimarães2, O. Ferreira1, F. Azevedo1
Serviços de 1Dermatovenereologia e 2Hematologia Clínica do Hospital S. João, Porto
Os linfomas cutâneos primários de celulas T (LCCT) em estádios iniciais têm um percurso indolente com sobrevida
semelhante à da população geral, mas nos estádios avançados o prognóstico é desfavorável, sendo poucas as terapêuticas
que aumentam a sobrevida ou que induzam remissões duráveis.
Apresentamos quatro doentes com formas avançadas de LCCT que constituíram um desafio de diagnóstico e tratamento.
Caso 1: Mulher de 60 anos com eritrodermia cuja histologia foi inespecífica, um ano depois revelando-se o diagnóstico
de LCCT CD4+, com epidermotropismo e células atípicas no sangue periférico (< 5% e sem características de células Sézary).
179
Reuniões da SPDV
Sem resposta ao tratamento com Re-PUVA e CHOP e resposta parcial ao tratamento sequencial com metotrexato, interferão
alfa e bexaroteno. Por agravamento com desenvolvimento de lesões tumorais encontra-se a fazer radioterapia localizada e
fludarabina oral.
Caso 2: Homem de 60 anos com placas eritematosas no tronco, edema duro generalizado, tendo sido feito o diagnóstico
de LCCT CD4+ de pequenas-médias células. Teve resposta transitória ao CHOP, e, dadas as comorbilidades do doente
optou-se por ciclofosfamida.
Caso 3: Homem de 56 anos com Síndrome Sézary. Sem resposta à terapêutica sequencial com Re-PUVA, interferão alfa,
fotoquimioterapia extracorporal e CHOP. Por agravamento da eritrodermia e do estado geral, efectuou um ciclo de CVP.
Iniciou vorinostat, tendo falecido dois dias depois por sépsis.
Caso 4: Mulher de 37 anos com história de psoríase em placas confirmada em histologias repetidas, desenvolveu
eritrodermia, cuja biopsia mostrou LCCT CD4+ de pequenas-medias células. Efectuou um ciclo de CHEOP e faleceu por
sépsis.
O diagnóstico preciso de LCCT e seu subtipo nem sempre é possível de modo rápido e inequívoco. As formas avançadas
representam um desafio terapêutico por não existirem tratamentos padronizados e requerem uma abordagem multidisciplinar.
DOENÇA DE BEHCET: REVISÃO DE 10 ANOS
Paula Maio1, S. Medeiros1, R. Vieira1, C. Rodrigues2 , J. Cardoso1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Curry Cabral, Lisboa; 2Instituto Oftalmológico Dr. Gama Pinto, Lisboa
Introdução e Objectivos: A Doença de Behcet é uma doença de carácter inflamatório, multissistémica, de etiologia
ainda indeterminada.
O sexo masculino, uma idade precoce de manifestação da doença e a positividade para o antigénio HLA-B51, têm sido
relacionados em alguns estudos com um curso natural mais agressivo. Pretendemos verificar se existe correlação entre estes
factores e uma maior morbilidade da doença.
Material e Métodos: Realizamos um estudo retrospectivo dos doentes com Doença de Behcet seguidos na Consulta de
Dermatologia entre 1996 e 2006.
Resultados: Foram estudados 14 doentes (57,1% do sexo feminino). A média de idades à data do diagnóstico foi de
38,7±4,0 anos, variando entre 16 e 55 anos. Em 4 doentes verificava-se história familiar positiva. As úlceras orais (100%) e
genitais (85%) em conjunto com a artropatia (85%) foram as manifestações mais frequentemente observadas. Não encontrámos correlação estatisticamente significativa entre o teste de patergia positivo e a presença de manifestações muco-cutâneas. Identificaram-se 6 doentes (42,9%) com positividade para o antigénio HLA-B51. Estes tinham um maior número de
manifestações neurológicas (70,0%), oftalmológicas (63,6%), gastrointestinais (77,8%) e articulares (68,8%) enquanto que o
grupo sem positividade para o antigénio HLA-B51 tinha predominantemente manifestações vasculares (66,7%) e mucocutâneas (57,7%). Os doentes do sexo masculino tiveram um maior envolvimento neurológico (70%) e gastrointestinal
(66,7%) enquanto que no sexo feminino se verificou um maior número de manifestações vasculares (71,4%). Um início mais
precoce da doença esteve associado com maior morbilidade oftalmológica (degenerescência retiniana e descolamento da
retina) e com manifestações de neuro-Behcet.
Conclusões: Tal como descrito na literatura, parece haver uma associação entre a positividade para o antigénio HLAB51, o sexo masculino e uma idade mais precoce de manifestação da doença com um curso clínico mais agressivo.
SÍNDROME DE SWEET: ESTUDO RETROSPECTIVO DAS VARIÁVEIS CLÍNICAS E LABORATORIAIS DE 42
DOENTES INTERNADOS
João Borges da Costa, L.S. de Almeida, R. Silva, P. Filipe, M.M. Gomes
Clínica Universitária de Dermatologia de Lisboa, Hospital de Santa Maria, Lisboa
Introdução: A síndrome de Sweet é a dermatose neutrofílica mais frequente, com diferentes subgrupos com características
cliníco-laboratoriais distintas.
Objectivos/Métodos: 1. Caracterizar retrospectivamente algumas variáveis clínicas/laboratoriais dos doentes interna180
Reuniões da SPDV
dos por síndrome de Sweet na nossa enfermaria (1977-2007). 2. Pesquisar a ocorrência de associações entre as variáveis
estudadas e os diferentes subgrupos, nomeadamente a ocorrência prévia de infecção na orofaringe. 3. Todos os doentes
incluídos neste estudo cumpriram os critérios clássicos para o diagnóstico desta síndrome, corroborado pela realização de
biopsia cutânea. 4. Os dados foram analisados com o apoio do programa SPSS, com 5% de significância.
Resultados/Discussão: 42 doentes cumpriram os critérios de inclusão, com uma média de idades de 50 anos e o sexo
feminino a representar 88% desta população. Previamente ao início das lesões, foi possível identificar na anamnese destes
doentes: infecção prévia da orofaringe em 38%; neoplasias malignas em 10% e introdução prévia recente de novos fármacos
em 5%.
A comparação entre os subgrupos de doentes com e sem infecção prévia da orofaringe demonstrou que o S. de Sweet
ocorreu, no primeiro subgrupo de doentes, com significativa maior frequência no Outono, o valor da temperatura axilar foi
inferior no momento da admissão, menor duração do seu internamento e também menos artralgias.
Em contraste com o descrito na literatura, as artralgias foram a manifestação extracutânea mais frequente e o
envolvimento dos membros inferiores foi frequente. Os resultados observados no subgrupo de doentes, com infecção prévia
da orofaringe, estão de acordo com algumas séries recentemente publicadas que indicam que a divisão da S. de Sweet por
subgrupos, deve incluir não só os doentes com síndrome de Sweet associado a fármacos ou a neoplasias malignas, mas
também um subgrupo de doentes com infecções prévias, nomeadamente da orofaringe.
ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO DOS DOENTES COM INFECÇÃO CLÍNICA DE HPV GENITAL (CONDILOMAS) DA
CONSULTA DE DST DO HOSPITAL CURRY CABRAL NUM PERÍODO DE 3 ANOS.
TiagoEsteves1, D. Cunha2, R. Santos2, C. Fernandes2, A. Rodrigues2, J. Cardoso2
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital Central do Funchal; 2Serviço de Dermatologia Venereologia, Hospital Curry
Cabral, Lisboa
Introdução: A infecção causada pelo papilomavírus humano (HPV), emergiu como uma das mais frequentes e
importantes infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Colectivamente, o HPV pode causar mais ISTs do que qualquer outro
agente patogénico.
Objectivos: Pretendeu-se caracterizar a população de doentes com condilomas, observada no Serviço de Dermatologia
do Hospital Curry Cabral.
Material e Métodos: Revisão retrospectiva dos registos clínicos de todos os doentes com infecção clínica de HPV genital
(condilomas), observados na consulta de DST do Hospital Curry Cabral, entre Janeiro de 2005 e Dezembro de 2007 (3 anos).
Estudaram-se variáveis como sexo, idade, localização, manifestações clínicas, co-infecção com o VIH, outras ISTs concomitantes, tratamento e recidiva.
Resultados: O estudo incluiu 145 doentes, dos quais 68 % (99/145) eram do sexo masculino e 32 (46/145) do sexo
feminino. A média de idades foi de 34 anos. As localizações mais frequentes de condilomas no homem foram o pénis e a
região perianal, enquanto que nas mulheres foram a vulva seguido da região perianal. A co-infecção com o VIH verificou-se
em 26 % dos casos (38/145). A Crioterapia com azoto líquido foi o método de tratamento mais utilizado (73%), seguido da
Resina de Podofilino a 20% (52%), Ácido Tricloroacético a 80% (28%), creme de Imiquimod (6%) e finalmente a curetagem
(2%). O total de recidivas foi de 9,8% (13 doentes).
Conclusão: Os dados epidemiológicos e clínicos encontrados estão em consonância com os descritos em estudos
similares em países ocidentais. A prevalência de condilomas mantém-se elevada, não só em consultas de IST mas também na
população geral. A sua multifocalidade implica uma avaliação periódica exaustiva de todo o tracto genital e um apertado
follow-up, salientando-se a importância, em muitos casos, de uma abordagem multidisciplinar desta população.
CHLAMYDIA PNEUMONIAE E SYNDROME DE STEVENS-JONHSON
Ana Filipa Duarte2, E. Moreira1, O. Ferreira1, M. J. Cruz1, A.Mota2, T. Baudrier1, F. Azevedo1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de S. João, Porto; 2Serviço de Dermatologia e Venereologia Hospital de S.
João e Faculdade de Medicina do Porto
O Síndrome de Stevens-Jonhson é uma reacção mucocutânea aguda, potencialmente grave, caracterizado por início
181
Reuniões da SPDV
abrupto de pápulas eritematosas, por vezes em alvo atípico e com evolução para necrose epidérmica. É predominantemente
observado em crianças e adultos jovens, e neste contexto é, frequentemente, desencadeado por infecções e fármacos.
Descrevemos 4 casos clínicos de SSJ associado a infecção por Chlamydia pneumoniae. Uma doente do sexo feminino, de
3 anos de idade e um homem de 29 anos, com exantema maculopapular confluente, esboçando lesões em alvo, localizados
à face, tórax e membros, e associado a febre e hiperemia conjuntival, cujas serologias para Mycoplasma e Chlamydia
penumoniae foram sugestivas de infecção recente. Uma mulher de 20 anos com erupção cutânea em alvo atípico, queilite e
febre, cujas serologia para HSV tipo 2 e Chlamydia pneumoniae sugeriram infecção recente. E, ainda, um rapaz de 6 anos,
com <10% de descolamento epidérmico e erosões das mucosas oral e genital, cujas serologias mostraram infecção por
Chlamydia pneumoniae isoladamente. Em todos os casos a biópsia cutânea confirmou o diagnóstico clínico de SSJ.
A Chlamydia pneumoniae é frequentemente responsável por infecções respiratórias. Apesar do seu papel em casos de SSJ
ter sido raramente reportado, estes casos sugerem que poderá ter um papel importante, actuando em sinergia para o
agravamento da reacção cutânea. O último caso sugere, ainda, que a Chlamydia pneumoniae possa, isoladamente,
associar-se ao SSJ. A infecção por Chlamydia pneumoniae associada ao SSJ parece sub-diagnosticada, pelo que deverá ser
pesquisada em todos os doente com SSJ, não apenas por motivos epidemiológicos, mas sobretudo pelas suas implicações
terapêuticas.
CASOS CLÍNICOS
ERUPÇÃO ZOSTERIFORME COMO MANIFESTAÇÃO DE DOENÇA SISTÉMICA
Joana Antunes1, M. André1, A. Fraga1, P.L. Filipe1, L.S. de Almeida1, H. Kutzner2, M. Marques Gomes1
1
Clínica Universitária de Dermatologia, Hospital de Santa Maria, Lisboa; 2Dermatopathologische Gemeinschaftspraxis,
Germany
Introdução: As manifestações cutâneas de leucemia linfocítica crónica são raras, e podem estar associadas a
agravamento do prognóstico. O termo zosteriforme refere-se a lesões cutâneas com distribuição ao longo de um dermátomo,
sem se ter registado reactivação prévia de Herpes Zóster nessa localização.
Caso Clínico: Os autores apresentam o caso de uma doente do sexo feminino, de 77 anos, observada no Serviço de
Urgência do Hospital de Santa Maria por pápulas eritematosas, de cor vermelho vivo, pruriginosas, de aparecimento súbito
no hemitórax esquerdo, ao longo do dermátomo C6, com cerca de 1 mês de evolução. Tinha já sido avaliada pelo médico
assistente tendo-lhe sido diagnosticado Herpes Zóster, e feito 1 mês de terapêutica antiviral com Valaciclovir e Aciclovir, sem
resolução da dermatose. Como antecedentes pessoais destacava-se diabetes mellitus tipo 2, bócio multinodular e leucemia
linfocítica crónica de células B (LLC-B) em vigilância. Fez-se esfregaço para citodiagnóstico de Tzanck que não demonstrou
presença de células gigantes multinucleadas, bem como pesquisa de VZV e HSV 1 e 2 por PCR na biopsia cutânea, que foi
negativa. O exame histopatológico revelou infiltrado típico de LLC-B (CD3+, CD20+) e a análise citogenética mostrou
alterações semelhantes às observadas no aspirado medular, confirmando o diagnóstico de infiltração cutânea por LLC-B. A
doente iniciou quimioterapia com Clorambucilo e ainda Imunoglobulina humana endovenosa, que resultou na regressão
praticamente total das lesões e do prurido.
Discussão: Apesar de estar bem documentada infiltração cutânea linfocítica em cicatrizes de Herpes Simples ou Herpes
Zóster, infiltração cutânea com distribuição zosteriforme sem episódio prévio de Herpes é muito rara. Após intensa pesquisa
bibliográfica, encontrou-se apenas um caso descrito deste fenómeno em doente com LLC-B. A terapêutica deve ser dirigida à
patologia de base, e o prognóstico parece não ser tão agravado como nas outras manifestações de leucemia cutânea.
ESCLEREDEMA DE BUSCHKE APÓS INFECÇÃO RESPIRATÓRIA POR MYCOPLASMA PNEUMONIAE
Paulo Morais1,2, M. A. Pereira1, P. Santos1, F. Azevedo1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de S. João, 2Faculdade de Medicina do Porto
Introdução: O escleredema de Buschke (EB) é uma dermatose rara e de etiologia desconhecida, pertencente ao grupo
das mucinoses. Caracteriza-se pelo endurecimento difuso e não depressível da pele, com predilecção pela cabeça, pescoço e
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Reuniões da SPDV
dorso superior. Pode associar-se a infecção respiratória superior estreptocócica, diabetes mellitus (DM), paraproteinemias,
hiperparatiroidismo, conectivites ou insulinoma maligno.
Caso clínico: Doente do sexo feminino, de 28 anos, previamente saudável, internada por pneumonia atípica, após
tratamento ineficaz com azitromicina. Ao 4º dia de internamento iniciou conjuntivite, enantema e, gradualmente, a pele
tornou-se indurada, brilhante e não pinçavel, com consequente restrição dos movimentos. A doente foi admitida em Unidade
de Cuidados Intensivos em choque, febril e hipóxica. Analiticamente apresentava leucopenia, trombocitopenia, insuficiência
hepática e elevação da proteína C reactiva, com glicemia em jejum, hemoglobina glicosilada, perfil imunológico,
doseamento de imunoglobulinas e electroforese das proteínas séricas sem alterações. O título de antiestreptolisina O e as
serologias víricas e bacterianas foram negativos, excepto para Mycoplasma pneumoniae. Os exames imagiológicos
evidenciaram uma pneumonia bilateral, derrame pleural e pericárdico, ascite, hepatomegalia ligeira e edema subcutâneo
extenso. A análise do líquor, a TAC cerebral e o electrocardiograma foram normais. A biópsia cutânea mostrou aumento da
espessura dérmica e fibras de colagéneo espessadas separadas por espaços não corados correspondentes a depósitos de
mucina na coloração Azul de Alcian. A doente foi tratada com doxiciclina e prednisolona orais, evidenciando-se melhoria
clínica imediata e resolução completa das alterações cutâneas e laboratoriais. Após 7 meses de follow-up, a doente encontrase assintomática e sem recidiva da dermatose.
Discussão: O diagnóstico de EB deve ser considerado num doente com espessamento e endurecimento cutâneo difuso
poupando as mãos e os pés, particularmente na presença de DM ou episódio febril prévio. Segundo é do nosso
conhecimento, o presente caso constitui o primeiro ocorrendo na sequência de infecção por Mycoplasma pneumoniae.
POROQUERATOSE SUPERFICIAL DISSEMINADA NUM DOENTE COM COLANGIOCARCINOMA
Tiago Torres, G. Velho, M. Selores
Serviço de Dermatologia do Centro Hospitalar do Porto - HGSA
As poroqueratoses representam um grupo de doenças caracterizadas por alteração da queratinização epidérmica,
caracterizando-se clinicamente por lesões de bordo hiperqueratósico com centro atrófico e histologicamente pela presença
de lamela cornóide. A variante clínica designada por poroqueratose superficial disseminada tem sido descrita na literatura
associada a estados de imunossupressão, incluído transplante de órgãos, infecções e algumas neoplasias, especialmente
hematológicas. O aparecimento súbito de lesões de poroqueratose superficial disseminada em doentes com neoplasias
sólidas é raro, embora estejam descritas na literatura casos associados a hepatocarcinoma, colangiocarcinoma a adenocarcinoma ovárico.
Descrevemos o caso clínico de um doente do sexo masculino, de 80 anos, que desenvolveu subitamente múltiplas pápulas
e placas eritemato-róseas, circulares, de bordo elevado e hiperqueratósico e centro atrófico dispersas pelo tronco e membros,
cerca de um mês antes de ser diagnosticado um colangiocarcinoma avançado, aquando do desenvolvimento de icterícia
clínica. O exame histopatológico de uma das lesões cutâneas foi compatível com o diagnóstico de poroqueratose. Dado o
estado avançado do tumor, apenas tratamento paliativo foi efectuado (drenagem biliar percutânea), tendo o doente falecido
2 meses após o diagnóstico da neoplasia.
A existência de relação temporal entre o aparecimento das lesões cutâneas de poroqueratose superficial disseminada e o
desenvolvimento de sintomas e sinais que conduziram ao diagnóstico de colangiocarcinoma e o facto da expressão aumentada do gene p53 ter sido implicada na patogénese do colangiocarcinoma e ter sido demonstrada em lesões de
poroqueratose sugerem uma natureza paraneoplásica à doença cutânea. Assim, a expressão aumentada de p53 pelo tumor
poderá promover o desenvolvimento de lesões de poroqueratose em indivíduos geneticamente susceptíveis.
SÍNDROME DE SAPHO
Joana Parente¹, M.S.J. Marques¹, T. Magalhães², R. Faustino²
Serviços de ¹Dermatologia e Venereologia e ²Ortopedia, Hospital Distrital de Santarém EPE
A síndrome de SAPHO (sinovite, acne, pustulose palmo-plantar, hiperostose e osteíte) é uma doença inflamatória crónica,
recidivante com manifestações cutâneas e osteoarticulares.
Apresentamos o caso de uma doente do sexo feminino, de 42 anos de idade, seguida em consulta de Dermatologia desde
1996 por acne quístico e posteriormente (desde Setembro de 2000) por pustulose palmo-plantar, submetida a diversas
183
Reuniões da SPDV
terapêuticas, nomeadamente corticoterapia tópica, retinóides, PUVA e colchicina. Em Outubro de 2001 foi internada no
Serviço de Ortopedia por osteomielite do fémur esquerdo com necessidade de intervenção cirúrgica. Foi estabelecido o
diagnóstico de síndrome de SAPHO.
Esta é uma doença rara com prevalência desconhecida. Em doentes com algumas dermatoses inflamatórias associadas a
sintomas musculo-esqueléticos deve ser considerada a hipótese diagnóstica de síndrome de SAPHO.
O seu conhecimento pode evitar numerosos procedimentos invasivos, como biopsias repetidas e intervenções cirúrgicas
desnecessárias, não existindo ensaios clínicos controlados em relação à terapêutica.
INCONTINÊNCIA PIGMENTAR: MANIFESTAÇÕES INICIAS E A LONGO PRAZO
Filipa Diamantino1, V. Rodrigues2, A. Pinheiro3, H. Carreiro2, M. João Lopes1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa Central, 2Serviço de Pediatria,
Hospital Fernando da Fonseca, Amadora – Sintra; 3Serviço de Pediatria, Hospital do Espírito Santo, Évora
A incontinência pigmentar (IP), também conhecida por síndrome de Bloch-Sulzberger, é uma genodermatose pouco
frequente que afecta os tecidos derivados da neuroectoderme. Cursa com lesões cutâneas características, classicamente
subdivididas em quatro estádios: vesicular, verrucoso, pigmentado e atrófico. Está associada em 50-80% dos casos a
malformações oculares, do sistema nervoso central, cabelo, dentes ou sistema musculoesquelético.
Descreve-se o caso de recém-nascida de termo, caucasiana, segunda filha de casal não consanguíneo, 6 dias de vida,
sem antecedentes obstétricos relevantes e com somatometria adequada para a idade gestacional. Observada em consulta de
Dermatologia por lesões vesiculares sobre base eritematosa, com crostas melicéricas, com distribuição linear nos membros,
presentes desde o nascimento. Por suspeita de herpes neonatal estava internada na unidade de cuidados neonatais e
medicada com aciclovir. A avaliação analítica inicial revelou discreta leucocitose e eosinofilia. Os exames culturais de sangue
e urina foram negativos, assim como exames citoquímico, bacteriológico e PCR para HSV 1 e 2 do LCR.
Dada a distribuição característica das lesões e ausência de alterações analíticas, foi colocada hipótese diagnóstica de IP,
que se confirmou mediante biópsia cutânea.
Foram realizados estudo neurológico e oftalmológico que não revelaram alterações.
Efectuado o diagnóstico de IP, constatou-se que a mãe e irmã também apresentavam manifestações clínicas da doença.
Ao exame dermatológico da irmã, 15 meses de idade, objectivaram-se manchas hiperpigmentadas, contorno serpiginoso, na
face posterior dos membros inferiores e tronco. Hipopigmentação macular linear na face posterior dos membros inferiores foi
evidente no exame objectivo da mãe, 22 anos de idade, com antecedentes pessoais de diminuição da acuidade visual e
alterações da morfologia dentária.
O prognóstico da doença depende das alterações neurológicas e oftalmológicas eventualmente associadas, sendo, por
isto, importante um diagnóstico precoce e um acompanhamento multidisciplinar.
ESCLEROSE SISTÉMICA: RELATO DE UM CASO TRATADO COM CICLOFOSFAMIDA
Filipa Diamantino, A. Fidalgo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa - Central
A esclerose sistémica é uma doença relativamente rara, caracterizada por diferentes graus de fibrose da pele e dos órgãos
internos. A sua etiologia e patogénese continuam a ser desconhecidas, não existindo até à data um tratamento específico e,
portanto, curativo.
Os autores descrevem o caso de um doente, 49 anos, seguido em Consulta de Dermatologia desde Outubro de 2006,
por quadro clínico com 10 meses de evolução caracterizado por edema e endurecimento cutâneo das mãos e rigidez dos
dedos, bilateral e simétrico, com posterior extensão aos antebraços. A biopsia cutânea realizada demonstrou aspectos
compatíveis com o diagnóstico de esclerodermia. A avaliação do atingimento sistémico (TAC Tóraco-pulmonar, EDA e
avaliação laboratorial com marcadores imunológicos) foi negativa. Foi iniciada terapêutica com Penicilamina 300 mg/dia e
corticoterapia, mas dada a ausência de resposta, o esquema terapêutico foi alterado para metotrexato, deflazacort e PUVA
associado a Losartan, Nifedipina e Pentoxifilina, que manteve durante 9 meses. A doença manteve um progressivo
agravamento do componente de esclerose cutânea com extensão às porções proximais dos membros superiores, tronco e
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Reuniões da SPDV
face. Foi decidida a introdução de Etanercept que, porém, suspendeu após 6 semanas por um episódio intercorrente de
infecção respiratória. Após um ano de acompanhamento do doente os sucessivos regimes terapêuticos tinham-se verificado
incapazes de deter o curso rapidamente evolutivo da doença. Por isto, e pela evidência de desenvolvimento de atingimento
sistémico (fibrose pulmonar na TAC torácica, alterações nas provas de função respiratória compatíveis com um padrão
restritivo, hipomotilidade do esófago com EEI hipotensivo e alterações da condução cardíaca e disfunção disatólica do VE)
iniciou Ciclofosfamida em administração endovenosa mensal associada a corticoterapia, vasodilatadores e atorvastatina.
Após 1 ano de manutenção desta terapêutica verificou-se melhoria gradual da esclerose cutânea, dos parâmetros de função
pulmonar e da capacidade de tolerância ao esforço.
FITOFOTODERMATITE: INFUSÃO DE FOLHA DE FIGUEIRA
Catarina Vilarinho, J. Gomes, J. C. Fernandes, C. Brito
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital São Marcos, Braga
Introdução: O termo fitofotodermatite foi introduzido por Klaber, em 1942, para descrever reacções cutâneas causadas
pelo contacto com determinadas plantas, seguido de exposição solar. Estas reacções inflamatórias, com formação de vésicobolhas e até queimaduras, iniciam-se em geral 24 horas após exposição, atingindo o seu pico às 48-72 horas. Existem várias
famílias de plantas com potencial fototóxico. A figueira é o mais conhecido membro da família das Moráceas. A infusão das
suas folhas é popularmente utilizada no Brasil desde há várias décadas como agente bronzeador. As substâncias fotoactivas
são o psoraleno e o bergapteno que estão concentradas nas folhas mas não no fruto em si.
Caso clínico: Descreve-se o caso clínico de uma adolescente de 16 anos que recorreu à Internet para encontrar formas de
obter bronzeado rápido. Dessa pesquisa, resultou a ideia de utilizar a infusão de folha de figueira (fervura de 4 folhas em 1,5
litros de água), que aplicou no corpo seguida de exposição solar durante 30 minutos. No dia seguinte de manhã,
aparecimento de eritema difuso e à noite, decorridas mais de 24 horas após exposição solar, aparecimento de vesículas e
bolhas tensas, confluentes e desenhando trajectos lineares, sobretudo no dorso, nádegas e membros inferiores (atingimento
de cerca de 45% da superfície corporal). Foi observada na nossa consulta já medicada pelo médico de família com
flucloxacilina + ibuprofeno + levocetirizina + vaselina e foi decidido internamento dada a extensão das lesões e para manter
cuidados de assépsia adequados. Iniciou corticoterapia com prednisolona na dose de 60 mg/dia que reduziu para 40mg/dia
à data de alta, passados 8 dias de internamento. Foi re-observada em consulta decorrido 1 mês, apresentando hipopigmentação residual em toda a extensão das áreas afectadas. Esta hipopigmentação foi atenuando com o tempo e passados 2 anos
estava bem, sem vestígios na pele deste episódio.
ONICODISTROFIA GRAVE CAUSADA POR DERMATITE DE CONTACTO AOS ACRILATOS APÓS APLICAÇÃO
DE UNHAS ATRIFICIAIS
Maria João Cruz, O. Ferreira, T. Baudrier, A. P. Cunha, F. Azevedo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de S. João, Porto
Introdução: As unhas artificiais têm ganho grande popularidade nos últimos anos, enquanto acessórios de moda,
principalmente em países desenvolvidos. Existem diversos tipos disponíveis no mercado e os compostos de acrilato estão
presentes na maioria deles. O principal risco das unhas artificiais é a alergia de contacto a estes compostos, que se tem
verificado um acontecimento relativamente comum, podendo ocorrer num contexto ocupacional ou não-ocupacional. A
reacção adversa mais frequente é a dermatite das mãos. O contacto das unhas com outras partes do corpo é por vezes
responsável por lesões de eczema noutros locais. Têm sido também descritas na literatura outras reacções menos frequentes
que incluem onicodistrofia, onicólise, paroniquia, hiperqueratose do leito ungueal e parestesias. A maioria destas é rara e
geralmente ocorre num contexto ocupacional.
Caso clínico: Os autores descrevem o caso clínico de uma mulher de 39 anos, secretaria, que recorreu à Consulta de
Dermatologia por paroniquia, fissuração das polpas, distrofia ungueal, onicólise e hiperqueratose do leito ungueal de todos
os dedos das mãos, uma semana após a aplicação de unhas artificiais. Foram realizados testes epicutâneos com as series
Standard e Acrilatos cujas leituras às 48h e 72h foram positivas para acrilonitrilo 0,1%, acrilato de etilo 1%, metilmetacrilato
monómero 10% e dibromodicianobutano 0,3%, todos em vaselina. Foi realizado tratamento com betametasona tópica
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Reuniões da SPDV
(1mg/g) com melhoria clínica significativa ao fim de uma semana. Ao fim de 2 meses verificou-se recuperação praticamente
completa.
Conclusão: Os compostos de acrilato habitualmente utilizados nas unhas artificiais são importantes alergénios de contacto que podem despoletar múltiplas reacções alérgicas. No entanto, quadros tão exuberantes como o descrito são muito
raramente observados, em especial em contexto não ocupacional.
ERUPÇÃO LIQUENOIDE INDUZIDA PELO MISOPROSTOL
Maria João Cruz1, A. F. Duarte1, T. Baudrier1, A. P. Cunha1, F. Barreto2, F. Azevedo1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital de S. João, Porto
Introdução: As erupções liquenoides secundárias a fármacos, são dermatoses relativamente comuns que frequentemente
imitam o líquen plano idiopático. Estas erupções podem ocorrer após inalação, contacto ou ingestão de vários compostos. A
lista de fármacos responsáveis por estas dermatoses é extensa e aumenta de dia para dia.
Caso clínico: Uma mulher de 16 anos recebeu Cytotec® (misoprostol) administrado vaginalmente para indução de
aborto. Dois meses após apresentava pápulas violáceas, descamativas, pruriginosas, dispersas de forma simétrica,
inicialmente pelos membros inferiores que progrediram para os membros superiores e abdómen. Não havia atingimento das
mucosas. Não existia história de doença alérgica, nem uso de outros fármacos. O estudo laboratorial não revelou alterações.
O exame histológico das lesões confirmou a suspeita clínica de dermatite liquenoide. Foi prescrito corticosteroide tópico
(Betametasona 0,1%) tendo-se verificado melhoria clínica significativa após um mês de tratamento. Foram realizados testes
epicutâneos com a serie Standard e misoprostol na forma comercial diluído a 0,01% em vaselina. A leitura às 48h revelou
reacção fracamente positiva (+) ao misoprostol. Seis meses depois foram repetidos testes epicutâneos com misoprostol na
forma pura, diluído a 1% em vaselina tendo-se observado reacção positiva (++) após 48h. Não foi realizado rechallenge.
Nessa altura todas as lesões tinham regredido, deixando apenas hiperpigmentação cutânea pós-inflamatória.
Conclusão: Quando a história clínica sugere erupção liquenóide induzida por fármacos, os testes epicutâneos podem
revelar grande utilidade na identificação do agente causal, podendo por vezes dispensar o rechallenge. Os autores
apresentam este caso porque, apesar do grande número de fármacos implicados no desenvolvimento de erupções
liquenóides, a associação destas dermatoses com o misoprostol nunca antes tinha sido descrita.
UMA CAUSA RARA DE QUERATODERMIA PALMOPLANTAR ADQUIRIDA
Sara Lestre1, E. Lozano2, C. Meireles2, A. B. Feio1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Medicina 3, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa-Central
Introdução: As Queratodermias palmo-plantares são um grupo heterogéneo de doenças hereditárias e adquiridas
caracterizadas pela presença de hiperqueratose das palmas e plantas. São múltiplas as causas associadas às formas
adquiridas, sendo essencial a realização de uma anamnese e de um exame físico completos na abordagem diagnóstica inicial
deste grupo de doentes. O hipotiroidismo está associado a um amplo espectro de alterações dermatológicas, no entanto, é
uma causa extremamente rara de queratodermia palmo-plantar adquirida, com um escasso número de casos descritos na
Literatura.
Caso clínico: Doente do sexo feminino, de 43 anos de idade, observada por hiperqueratose palmo-plantar difusa com 3
meses de evolução, refractária às terapêuticas tópicas instituídas (queratolíticos, corticóides, análogos da vitamina D e
antifúngicos). Sem antecedentes pessoais ou familiares relevantes. Referia queixas recentes de astenia, alterações do humor e
obstipação. A avaliação laboratorial revelou um hipotiroidismo associado a tiroidite auto-imune, tendo sido excluídas outras
causas de queratodermia palmoplantar adquirida. Após o início de terapêutica de substituição hormonal, observou-se uma
melhoria lenta e gradual das alterações cutâneas.
Conclusão: O hipotiroidismo é uma doença endocrinológica causada pela produção insuficiente de hormonas
tiroideias, cuja apresentação clínica é frequentemente inespecífica. O diagnóstico das causas subjacentes às queratodermias
palmo-plantares adquiridas é frequentemente difícil, sendo no entanto, o seu reconhecimento essencial na obtenção de bons
resultados terapêuticos. Embora seja uma associação muito rara, o hipotiroidismo deve ser excluído, particularmente quando
a hiperqueratose das palmas e plantas surge associada a queixas sistémicas sugestivas de disfunção tiroideia.
186
Reuniões da SPDV
ACROPATIA ULCERO-MUTILANTE ASSOCIADA A LINFOMA-B DA ZONA MARGINAL
Sandra Medeiros1, R. Vieira1, A. Afonso2, F. Carvalho3, F. Costa4, R. Delgado5, F. A.Pacheco1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia; 2Anatomia Patológica; 3Nefrologia e 5Ortopedia do Hospital Curry Cabral,Lisboa;
4
Serviço de Hematologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa – Central
Doente do sexo masculino, com 81 anos de idade, observado na Consulta de Dermatologia em 1994 por acropatia
ulcero-mutilante, polineuropatia sensitivo-motora e madarose, com cerca de 10 anos de evolução. A hipótese de Doença de
Hansen foi excluída pela ausência de lesões cutâneas sugestivas, pelas baciloscopias persistentemente negativas no exsudado
nasal e cutâneo, e pela negatividade dos marcadores histológicos da doença.
Em 2006 o doente regressa à consulta por agravamento do quadro com múltiplos nódulos subcutâneos e equimoses
dispersas.
Dos exames complementares realizados destacava-se a presença de paraproteinémia sérica IgM-K. O exame histológico
de nódulo subcutâneo revelava depósitos de substância amilóide na hipoderme.
Em biopsias subsequentes de pele, nervo e gordura abdominal identificou-se também amilóide, cuja caracterização
imunohistoquímica revelou tratar-se de cadeias leves K. Após se terem excluído as outras possíveis etiologias de
osteoartropatia ulcero-mutilante (hereditárias, esporádicas e a Lepra) efectuamos biopsia de tecido sinovial de uma
articulação interfalângica que demonstrou igualmente a presença de amilóide, o que permitiu efectuar o diagnóstico de
acropatia secundária a amiloidose primária.
A investigação ulterior com o objectivo de explicar a origem da amiloidose identificou conglomerado adenopático
supraclavicular cujo diagnóstico microscópico foi de Linfoma B da zona marginal. Posteriormente a pesquisa positiva do
anticorpo-anti-glicoproteína associada à mielina permitiu também estabelecer a relação entre a neuropatia desmielinizante e
o linfoma.
Iniciamos terapêutica com Ciclofosfamida e Metilprednisolona e verificamos, após 1 ano de follow-up, melhoria não só da
neoplasia, como também dos quadros neurológico e osteo-articular.
Salientamos a importância deste caso pela sua extrema raridade. A amiloidose primária decorre habitualmente no
contexto de mieloma múltiplo e excepcionalmente no contexto de um linfoma B. Em alguns destes pacientes a gamapatia
monoclonal precedeu em muitos anos o diagnóstico da neoplasia, e o envolvimento articular ou neuropático ocorreram
como manifestação inaugural da amiloidose.
POLINEUROPATIA AMILOIDÓTICA FAMILIAR EM DERMATOLOGIA
David Serra1, F. Matias2, J. C.Cardoso1, M.M.Brites1, A. Figueiredo1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Neurologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
Caso clínico: Descrevemos o caso de um doente de sexo masculino com 34 anos de idade, enviado à Consulta de
Dermatologia por lesões bolhosas, com cerca de 2 anos de evolução. Dos antecedentes pessoais, a realçar sequelas
neurológicas resultantes de traumatismo crânio-encefálico aos 17 anos, complicado por fístula de líquor e meningites de
repetição, que resolveram após tratamento neurocirúrgico. Sem história familiar relevante. Observámos ao exame objectivo,
lesões de morfologia variada localizadas às mãos, pernas e pés. Apresentava bolhas, erosões, úlceras e cicatrizes. O exame
histológico de uma biopsia cutânea revelou vasculite leucocitoclásica, achado posteriormente interpretado como incidental,
mas que numa fase inicial, levantou a suspeita de doença do tecido conjuntivo. A imunofluorescência directa foi negativa e o
estudo laboratorial sistémico também. Pela topografia acral das lesões e presença de défice sensitivo periférico, realizou
electromiograma que documentou neuropatia periférica sensitiva e autonómica. A detecção de TTR met 30 veio confirmar a
suspeita de polineuropatia amiloidótica familiar (PAF). O doente foi proposto para transplantação hepática.
Discussão: Apresentamos um caso de PAF diagnosticado a partir do estudo das manifestações cutâneas. A apresentação
clínica, apesar de poder parecer paradigmática aquando da revisão retrospectiva, não é típica. Embora rara, a PAF reveste-se
de particular interesse em Portugal, nomeadamente pela sua gravidade, pela dimensão social que assume nos focos onde é
endémica e pelo notável contributo de um português, Corino de Andrade, para a sua caracterização. Trata-se de uma doença
hereditária, provocada por uma mutação no gene TTR. A proteína aberrante resultante origina neuropatia periférica, com
repercussões graves a nível sistémico.
Assim, pretende-se divulgar e relembrar uma entidade particularmente relevante entre nós. Apesar de continuar incurável,
187
Reuniões da SPDV
o diagnóstico em fase inicial permite melhorar o prognóstico, pela implementação precoce das medidas preventivas e
terapêuticas actualmente disponíveis.
HIPERQUERATOSE EPIDERMOLÍTICA – CASO CLÍNICO
Paulo Morais1,3, A. Mota1,3, T. Baudrier1, A. P. Cunha1,3, J. M. Lopes2,3,4, R. Cerqueira5, F.Azevedo1
Serviços de 1Dermatovenereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital de S. João, 3Faculdade de Medicina, Porto, 4Instituto de
Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto, 5Centro de Genética Clínica, Porto
Introdução: A hiperqueratose epidermolítica (HE), ou eritrodermia ictiosiforme congénita bolhosa, é uma genodermatose
autossómica dominante rara, causada por mutações nos genes codificantes da queratina (KRT) 1 ou da queratina 10. Foram
descritos seis fenótipos clínicos, incluídos em duas categorias principais: HE com ou sem envolvimento palmoplantar,
associadas a mutações nos genes KRT1 ou KRT10, respectivamente. Aparentemente, os doentes com mutações no gene
KRT10 apresentam melhor resposta aos retinóides.
Caso clínico: Uma doente do sexo feminino, de 12 anos de idade, institucionalizada e com antecedentes familiares
desconhecidos apresentava, ao nascimento, eritrodermia, erosões e bolhas dispersas pelo tegumento, que desapareceram
nos dias seguintes, dando lugar a escamas secas e espessas. Aos 3 anos de idade eram evidentes placas hiperqueratósicas
generalizadas, com padrão em “pedra de calçada” e odor pungente, mais proeminentes nas áreas flexurais, palmoplantares
e couro cabeludo. O exame histológico da pele mostrou marcada hiperqueratose e degeneração vacuolar dos queratinócitos
suprabasais e da epiderme superior. A microscopia electrónica revelou agregação dos tonofilamentos em redor do núcleo
queratinocitário, além das alterações evidentes na microscopia óptica. Os achados clínicos, histológicos e ultraestruturais
eram sugestivos de HE. A análise genética molecular permitiu a identificação de uma mutação em heterozigotia no gene
KRT10 (p.Leu452Pro). Foi tentado tratamento com acitretina, no entanto, o desenvolvimento de descamação marcada,
bolhas e disfunção hepática, motivou a suspensão do fármaco. Actualmente, a doente encontra-se medicada com
antissépticos, emolientes e queratolíticos.
Comentários: Embora a queratodermia palmoplantar seja característica dos doentes com mutação no gene KRT1, a
nossa doente apresenta HE com envolvimento palmoplantar e mutação do gene KRT10. Além disso, não se verificou resposta
favorável aos retinóides sistémicos, contrariamente ao esperado num doente com mutação no gene KRT10. Apesar da
abordagem difícil e por vezes insatisfatória desta dermatose, alguns doentes apresentam melhoria com a idade.
PÊNFIGO VEGETANTE
Ana Brinca, M. M. Canelas, M. Cravo, M. M. Brites, M. R. Cordeiro, O. Tellechea, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra
Descrevemos o caso de um homem de 76 anos com antecedentes de neoplasia prostática e insuficiência renal crónica,
que recorreu ao Serviço de Urgência por dermatose com 3 semanas de evolução caracterizada por lesões erosivobolhosas e
outras crostosas dispersas pelo tronco, outras verrucosas localizadas às regiões inguinais e axila esquerda. Apresentava
também lesões erosivas nas mucosas conjuntival e jugal.
A histologia e a imunofluorescência directa permitiram o diagnóstico de Pênfigo Vulgar.
Instituiu-se corticoterapia e posteriormente associou-se um imunossupressor, com melhoria progressiva das lesões.
Manteve o tratamento por um ano e meio, altura em que suspendeu o corticóide mantendo apenas o imunossupressor.
Três meses após a suspensão do corticóide verificou-se agravamento clínico, com prurido generalizado, odinofagia,
disfagia e emagrecimento. Apresentava lesões localizadas às áreas intertriginosas: pregas inguinais, axila esquerda, fossas
antecubitais e sulco nadegueiro, vegetantes, exsudativas, de contornos bem definidos, com bordos erosivos circinados, de
superfície irregular. Apresentava também lesões erosivocrostosas nos lábios e pequenas lesões erosivas na cavidade oral.
A histologia revelou tratar-se de um Pênfigo Vegetante.
Reintroduziu-se corticoterapia sistémica juntamente com o imunossupressor, com progressiva melhoria clínica.
O Pênfigo Vegetante é uma dermatose bolhosa autoimune, rara, categorizada como uma variante do Pênfigo Vulgar, com
lesões vegetantes localizadas às áreas intertriginosas, sendo muitas vezes refractária ao tratamento.
188
Reuniões da SPDV
ÚLCERA FRONTAL ÚNICA – SÍFILIS TERCIÁRIA
Pedro Andrade, A. Mariano, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
Relata-se o caso de doente do sexo feminino, de 30 anos de idade, solteira, com o 7º ano de escolaridade, observada no
Serviço de Dermatologia dos H.U.C. por lesão ulcerada grosseiramente circular com 3 cm de diâmetro, profunda, com
bordos eritematosos infiltrados, indolor, de localização frontal, com 2 meses de evolução e agravamento progressivo, sem
factor traumático desencadeante.
A doente apresentava-se com óptimo estado geral e assintomática, sem outros achados relevantes ao exame físico, não
sendo identificáveis antecedentes pessoais patológicos significativos.
Os estudos laboratoriais realizados não revelaram alterações à excepção de título elevado de RPR (1:32), confirmado por
TPHA positivo. As serologias para despiste de infecção HIV, HBV e HCV foram negativas. O estudo histopatológico de biópsia
do bordo da lesão revelou infiltrado dérmico granulomatoso rico em plasmócitos com área de necrose incompleta, raras
células multinucleadas e discretas áreas de endotelite, compatível com goma sifilítica. As colorações tecidulares de WarthinStarry e Levaditi não detectaram espiroquetas.
Após confrontação com o diagnóstico, foi relatada relação sexual desprotegida há cerca de 13 anos, e erupção cutânea
eritematosa não pruriginosa autolimitada algumas semanas depois, envolvendo face e tronco, não sujeita a avaliação
médica.
À data da observação não eram evidentes outras lesões cutâneas e as avaliações ginecológica, anal e orofaríngea não
detectaram lesões de sífilis primária ou secundária. Foi realizada punção lombar, com exclusão de neurossífilis.
A doente cumpriu antibioterapia semanal com benzilpenicilina benzatínica 2.400.000 (3 tomas) sem efeitos adversos e
com regressão total da lesão em 1 mês, deixando cicatriz atrófica.
Trata-se de um caso particular de sífilis terciária, apresentando-se exclusivamente como lesão ulcerada única assintomática – goma sifilítica – em doente sem patologia associada, situação outrora frequente mas presentemente rara em indivíduos
imunocompetentes.
INFECÇÃO CUTÂNEA MISTA DE CAUSA PROFISSIONAL. IMPORTÂNCIA DE TÉCNICAS DE BIOLOGIA
MOLECULAR NO DIAGNÓSTICO DESTAS INFECÇÕES
João Borges da Costa1, R. Silva1, I. Correia1, G. Pessoa2, H. de Sequeira1, M. Viveiros3, M.M.Gomes1
1
Clínica Universitária de Dermatologia de Lisboa, Hospital de Santa Maria, Lisboa, 2Serviço de Dermatologia do Hospital
Distrital de Faro, 3Unidade de Micobactérias do IHMT
Descreve-se o caso de um homem de 27 anos, trabalhador numa loja de animais, sem antecedentes pessoais relevantes.
Cerca de 4 meses antes, e na sequência de ter descarregado grande quantidade de peixes exóticos, sem qualquer protecção,
surgiu com edema e endurecimento acentuados do 3º dedo da mão esquerda e múltiplos pontos de drenagem de substância
“purulenta” não acompanhados de sintomas gerais. Surgiram entretanto, nódulos ao longo do trajecto linfático do membro
superior esquerdo, que regrediram. Foi submetido a terapêutica tópica que não sabe especificar, e, oral com doxiciclina, sem
melhoria.
Foi então referenciado à consulta de Dermatologia do HSM onde se efectuaram biopsias cutâneas para exame
histológico, micológico e bacteriológico com pesquisa de Micobacterias.
No exame bacteriológico foi isolada Pseudomona aeruginosa sensível à Ciprofloxacina, pelo que lhe foi prescrita durante
2 semanas, sem melhoria significativa. O exame histológico foi novamente inespecífico.
Cerca de um mês depois repetiram-se todas as colheitas.
No exame micologico observou-se crescimento fúngico em cultura, que se enviou para identificação em centro de
referência. No estudo por biologia molecular, identificou-se Hormographiella sp.
No Instituto de Medicina Tropical foi identificada uma infecção por micobactérias, provavelmente M. marinum,
aguardando-se ainda a confirmação da espécie por biologia molecular.
O doente iniciou tratamento com claritromicina, com resolução parcial da lesão e, posteriormente, com terbinafina, com
boa resposta. No entanto, teve que interromper este fármaco após 3 semanas por toxidermia. O tratamento foi continuado
com itraconazol.
189
Reuniões da SPDV
As infecções cutâneas mistas levantam vários problemas no diagnóstico por microbiologia clássica, pelo que mesmo após
culturas negativas, as colheitas devem ser repetidas se a clínica assim o justificar. As técnicas de biologia molecular poderão
ser especialmente úteis nestas infecções, sobretudo quando já foram efectuadas várias terapêuticas antes das colheitas.
ERITEMA ACRAL E ONICÓLISE ASSOCIADOS AO USO DE DOCETAXEL
Olga Ferreira1, T. Baudrier1, A. Mota2, A. F. Duarte1, F. Azevedo1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia do Hospital S. João, Porto; 2Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
Introdução: O docetaxel é um taxano semi-sintético usado no tratamento de diversas neoplasias malignas. As alterações
cutâneas associadas ocorrem em 50 a 70% dos casos e incluem exantema maculo-papular pruriginoso, descamação das
extremidades, xerose, placas eritematosas, alopécia, hiperpigmentação e eritema acral (eritrodisestesia palmo-plantar). As
lesões ungueais surgem em 35% dos doentes e incluem discromia do leito ungueal, onicodistrofia, onicólise, linhas de Beau
vermelhas ou laranjas, com ou sem paroníquia e hemorragias ou abcessos subungueais.
Caso clínico: Doente de 60 anos, recorreu ao Serviço de Urgência por lesões em placa, eritematosas, infiltradas e
descamativas, acompanhadas de dor e sensação de queimor localizadas ao dorso das mãos e face, com 10 dias de
evolução. O doente padecia de carcinoma do pulmão de não pequenas células, com metastização óssea e em tratamento
com docetaxel. Realizou bióspsia cutânea que revelou edema da derme papilar, presença de algum infiltrado
linfohistiocitário, espongiose e frequentes corpos colóides. Foi medicado com corticóide tópico, analgésico e compressas de
soro fisiológico frio. Um mês depois apresentava onicólise e melanoníquia das unhas das mãos. Realizou dermatoscopia.
Apesar das alterações cutâneas e ungueais, o doente não interrompeu a quimioterapia.
Discussão: O eritema acral envolve, habitualmente, palmas e plantas. Contudo, pode ocorrer em áreas mais atípicas
como dorso das mãos e pés, cotovelos e joelhos, e até mesmo pavilhões auriculares, face e área genital. O tratamento inclui
compressas frias, emolientes e corticoterapia tópica. As alterações ungueais ocorrem geralmente após vários ciclos de
docetaxel. Manifestam tendência para resolverem gradualmente ao longo de várias semanas, apesar da continuação do
tratamento e devem-se a lesões da matriz e alterações neurogénicas e vasculares do leito ungueal. O reconhecimento
precoce das alterações cutâneas e ungueais em doentes a fazer quimioterapia é fundamental não só para uma correcta
orientação do doente, como também para evitar suspensões desnecessárias da mesma.
FOLICULITE EOSINOFÍLICA PUSTULOSA EM CAUCASIANA IMUNOCOMPETENTE
Ana Nogueira1, S. Magina1,2, Á. Canelhas3, C. Resende1, F. Azevedo1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 3Anatomia Patológica do Hospital S. João, EPE, Porto; 2Faculdade de Medicina da
Universidade do Porto
Introdução: A foliculite eosinofílica pustulosa (FEP), ou doença de Ofuji, é uma dermatose rara que cursa com pápulopústulas que se expandem centrifugamente, formando lesões anulares. Atinge preferencialmente as áreas seborreicas e está
descrita sobretudo em asiáticos de meia-idade. Histologicamente caracteriza-se por um infiltrado de eosinófilos e linfócitos
envolvendo a unidade pilo-sebácea. A etiopatogenia não é conhecida e a resposta ao tratamento é muito variável. A história
natural é de lesões recorrentes. Os autores descrevem uma doente caucasiana imunocompetente com FEP generalizada.
Caso clínico: Uma doente de 18 anos previamente saudável, caucasiana, foi referenciada ao nosso serviço por uma
dermatose pruriginosa caracterizada por pápulo-pustulas de predomíneo centro-facial, evocando uma configuração anular
no ângulo da mandíbula, com 6 meses de evolução. Apresentava também, desde há 4 meses, placas anulares generalizadas
com predilecção pelo tronco, de coloração violácea e bordo infiltrado, pseudovesiculoso. Já tinha sido tratada com
corticosteróides tópicos e sistémicos com pouco benefício. Posteriormente a dermatose foi interpretada como tinha incógnita,
mas não se observou melhoria após um mês de terbinafina oral. Analiticamente apresentava eosinofilia relativa (23%) sem
leucocitose. A bioquímica, incluindo a enzima conversora da angiotensina, era normal, bem como o estudo imunológico. Os
marcadores víricos e o exame parasitológico de fezes foram negativos. A biópsia cutânea revelou um infiltrado rico em
eosinófilos em relação com as unidades pilosebáceas e com parcial destruição das mesmas. O raspado para exame
micológico foi negativo. Foi colocado o diagnóstico de FEP e iniciado tratamento com indometacina 50 mg/dia, com
melhoria franca da dermatose ao fim de duas semanas e normalização paralela da eosinofilia. Registou-se no entanto
190
Reuniões da SPDV
recidiva após suspensão do fármaco aos três meses de terapêutica.
Comentário: Este caso destaca-se pela raridade desta patologia e pela exuberância da apresentação. Salienta-se
também a boa resposta ao tratamento inicial com indometacina, embora sem cura.
SARCOIDOSE CUTÂNEA ASSOCIADA A TRATAMENTO COM ALFA-INTERFERÃO E RIBAVIRINA EM DOENTE
COM HEPATITE C CRÓNICA.
Sónia Fernandes1, R.Tavares-Bello1, A. Afonso2, S.Nobre3, C.Espírito Santo3, T. Silva3
1
Serviço de Dermatologia; Hospital Militar de Belém, Lisboa, 2Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Curry Cabral,
Lisboa, 3Serviço de Gastrenterologia, Centro Hospitalar de Cascais
A Hepatite C Crónica é patologia infecciosa de elevada prevalência à escala global. Para além do risco inerente de
contágio, a Hepatite C crónica é fonte de importante morbi-mortalidade, quer de origem hepática, quer extra-hepática, onde
patologias do foro auto-imune, metabólico são frequentemente descritas em associação.
A Sarcoidose é uma doença granulomatosa multissistémica de etiologia imprecisa, caracterizada pela presença a nível
tecidular de granulomas de células epitelióides não caseosos. Vem sendo relatado, nos dois últimos decénios, a sua
associação à Hepatite C Crónica nos contextos do início da terapia com Interferão alfa, no de doença não tratada e enquanto
reactivação de doença previamente tratada.
A Sarcoidose desencadeada pela terapêutica antiviral tem habitualmente expressão cutânea e/ou pulmonar e uma
evolução benigna, não requerendo em regra a instituição de terapêutica imunossupressora, a qual poderia de resto agravar o
quadro viral.
Caso clínico: É apresentado o caso clínico de EC, sexo masculino, de 61 A de idade, que desenvolveu, 8 M após iniciar
tratamento com Interferão alfa peguilado e Ribavirina, quadro de sarcoidose cutânea exuberante dos tipos cicatricial (“scar
sarcoidosis”), pseudo-tumoral e paniculítico. A avaliação complementar confirmou o diagnóstico de sarcoidose com
envolvimento exclusivo da pele, que remitiu completamente ao fim de 2,5 meses após a suspensão da terapêutica.
O caso é ilustrado e discutido à luz da literatura pertinente.
PUSTULOSE PALMO-PLANTAR E DO COURO CABELUDO APÓS TERAPÊUTICA BIOLÓGICA COM ANTI-TNF
EM DOENTE COM ARTRITE REUMATÓIDE: UM CASO CLÍNICO
João Borges da Costa, L.S. de Almeida, M. M. Gomes
Clínica Universitária de Dermatologia de Lisboa, Hospital de Santa Maria, Lisboa
As terapêuticas biológicas dirigidas contra o Factor de necrose tumoral alfa (TNF-alfa) têm demonstrado eficácia clínica
em patologias como a doença de Crohn, a artrite reumatóide, a artrite psoriática e recentemente em outras formas de
psoríase.
Alguns destes fármacos biológicos utilizados no tratamento da psoríase, como o etanercept, o infliximab e o adalimumab,
podem também ser causa de lesões cutâneas de psoríase, em doentes com outras patologias. Este efeito paradoxal foi
recentemente descrito, sobretudo em séries de doentes com artrite reumatóide, onde pode atingir uma incidência de até 5%.
Os autores descrevem o caso clínico de uma doente de 37 anos de idade, com Artrite Reumatóide, com envolvimento
simétrico das articulações dos punhos, joelhos e tibiotársicas, com queixas articulares progressivas de difícil controlo. Nesta
doente surgiram pústulas no couro cabeludo, nas palmas e nas plantas após infusão de adalimumab. A doente não tinha
história pessoal, nem familiar de psoríase e objectivamente não tinha envolvimento ungueal, nem das articulações
interfalângicas distais. As biópsias cutâneas realizadas numa das palmas e no couro cabeludo foram compatíveis com
psoríase. As lesões cutâneas foram controladas com administração oral de metotrexato, a aplicação tópica de Daivobet ®
creme e com a paragem do fármaco biológico. Ao fim de um ano, a doente mantém-se sem lesões cutâneas, mas com
progressão da doença articular.
O conhecimento actual do papel do TNF-alfa na fisiopatologia destas doenças inflamatórias não nos permite
compreender a ocorrência deste efeito paradoxal. Nos casos já descritos na literatura, as lesões cutâneas são pustulosas em
aproximadamente metade dos doentes. A ocorrência destas lesões com um dos fármacos anti-TNF, não permite prever se a
mesma reacção ocorrerá com outros fármacos do mesmo grupo.
191
Reuniões da SPDV
DOENÇA DE BEHÇET- INFLIXIMAB NO TRATAMENTO DAS ÚLCERAS OROGENITAIS
Sara Lestre1, F. Trindade1, R.Tavares-Bello2, Mª J. P. Lopes1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa-Central, 2Serviço de Dermatologia, Hospital Militar de Belém, Lisboa
Introdução: A Doença de Behçet é uma doença multisistémica, de curso clínico crónico e/ou recidivante, cujo
diagnóstico é essencialmente clínico. A gravidade das manifestações clínicas e o envolvimento de outros órgãos ou sistemas é
determinante na escolha do tratamento. Em estudos recentes, os antagonistas do factor de necrose tumoral á (anti–TNFá) têm
mostrado bons resultados no tratamento das manifestações mucocutâneas da doença de Behçet.
Caso Clínico: Doente do sexo feminino, com 16 anos de idade, referenciada à Consulta de Dermatologia do Hospital
dos Capuchos por úlceras orais dolorosas e recorrentes com cerca de 8 anos de evolução e atingimento da mucosa genital
desde os 12 anos de idade. No restante exame físico e oftalmológico não tinha quaisquer alterações. O diagnóstico de
doença de Behçet foi apoiado pela positividade do teste de patergia e do HLA B51. Foram excluídas outras causas de
ulcerações orogenitais recorrentes.
Tratando-se de uma doente jovem com aftose bipolar grave refractária aos tratamentos tópicos e sistémicos convencionais, optou-se pelo início de tratamento com Infliximab.
Verificou-se uma rápida resposta clínica à terapêutica biológica instituída, com resolução parcial e total das úlceras à 2 ª e
6ª semana de tratamento, respectivamente.
Conclusão: As manifestações mucocutâneas da doença de Behçet têm uma morbilidade elevada, com grande impacto
psicossocial nos doentes afectados. O Infliximab é uma alternativa terapêutica eficaz a considerar na presença ulceração
orogenital grave e resistente às terapêuticas sistémicas tradicionais, particularmente quando a doença se inicia em idades
jovens.
OSTEODISTROFIA HEREDITÁRIA DE ALBRIGHT E PSEUDOHIPOPARATIROIDISMO: A PROPÓSITO DE UM
CASO CLÍNICO
Joana Rocha1, F. Ventura1, T. Pereira1, A. P. Vieira1, L. Macedo2, F. Pardal3, R. Cerqueira4, C.Brito1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 3Anatomia Patológica, Hospital S. Marcos, Braga, 2Serviço de Pediatria, Hospital
de Nossa Senhora da Oliveira, 4Centro de Genética Clínica, Porto
Introdução: Pseudohipoparatiroidismo (PHP) e Osteodistrofia Hereditária de Albright (OHA) são patologias indissociáveis. A expressão OHA descreve um conjunto de características fenotípicas e o PHP caracteriza-se pela resistênca do
orgão-alvo à acção da paratormona (PTH), podendo ser classificado em vários tipos (Ia, Ib, Ic e II) de acordo com diferenças
patogénicas e fenotípicas. Pseudopseudohipoparatiroidismo (PPHP) corresponde à presença do fenótipo de Albright na
ausência de resistência periférica à acção da PTH. Diferentes mutações do gene GNAS1, que codifica a proteína Gá, têm sido
associadas a diferentes apresentações clínicas.
Caso clínico: Descreve-se o caso de uma criança de sexo feminino, 2 anos de idade, obesa, com baixa estatura, face
redonda, braquidactilia e atraso de desenvolvimento psicomotor, observada no Serviço de Dermatologia por pequenas
pápulas cobertas por pele aparentemente normal, de consistência dura, agrupadas na região abominal inferior e raiz das
coxas, conferindo à superfície cutânea um aspecto irregular (“em grão de arroz”). Analiticamente, constatou-se aumento da
PTH sérica associada a hipocalcemia e hiperfosfatemia; a tireotropina sérica estava aumentada com valores de tiroxina e triiodotironina plasmáticas variando entre o normal e ligeiramente diminuídos. O estudo histopatológico de uma das lesões
mostrou os achados típicos de ossificação primária. O diagnóstico de PHP tipo I foi confirmado pelo estudo molecular, tendo
sido detectada a mutação c.565_568delGACT em heterozigotia no exão 7 do gene GNAS1. Esta delecção de 4 pares de
base introduz um codão STOP prematuro na síntese da proteína (p.Asp189fsX14).
Discussão: Em idade pediátrica, na presença de ossificações subcutâneas e de um conjunto de alterações fenotípicas e de
desenvolvimento características de OHA, a possibilidade de PHP tipo I deve ser excluída através da avaliação da resposta
periférica à PTH. No tratamento destes doentes é fundamental a correcção do metabolismo fosfocálcico, função tiroideia e
outros eixos hormonais envolvidos, para prevenir complicações e reduzir a morbilidade.
192
Reuniões da SPDV
PSORÍASE PUSTULOSA OU PUSTULOSE EXANTEMÁTICA AGUDA GENERALIZADA?
David Serra, A. Mariano, M. Gonçalo, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
Caso clínico: Apresentamos o caso de uma doente de sexo feminino com 65 anos de idade, seguida no nosso Serviço
desde 1991 por psoríase vulgar, em placas, com vários surtos de psoríase pustulosa.
Sob tratamento com ciprofloxacina por úlcera de perna, desenvolveu surto de lesões pustulosas em base eritematosa, com
atingimento sistémico (mal-estar geral, febre, leucocitose e neutrofilia). Cerca de duas semanas após a resolução deste
episódio, teve um novo surto, mais grave, com início horas após a reintrodução de ciprofloxacina. Observámos um quadro
sugestivo de pustulose exantemática aguda generalizada (PEAG), com febre elevada e lesões pustulosas em base
eritematosa, sobretudo a nível das grandes pregas numa fase inicial, mas com posterior extensão ao restante tegumento.
Desenvolveu em poucos dias descolamento epidérmico interessando praticamente toda a superfície corporal.
O exame histológico revelou imagem de pústula espongiforme subcórnea com infiltrado linfomononuclear perivascular
na derme. Realizámos posteriormente testes epicutâneos que demonstraram hipersensibilidade a várias fluorquinolonas, com
eritema e pústulas às 48 e 72 horas e cujo exame histopatológico revelou também pústula espongiforme subcórnea.
A revisão dos antecedentes revelou a ocorrência de um surto de lesões pustulosas possivelmente precipitado pela
norfloxacina.
Discussão: O caso evoca a problemática do diagnóstico diferencial entre psoríase pustulosa e PEAG. Neste contexto,
analisamos argumentos a favor de um ou outro diagnóstico. A imputabilidade da ciprofloxacina no desencadeamento destes
surtos é solidamente estabelecida com base em critérios cronológicos e semiológicos e entre estes, os testes epicutâneos
positivos que reproduziram o aspecto clínico e histológico.
Finalmente, este caso abre perspectivas relativamente aos mecanismos fisiopatológicos subjacentes, nomeadamente: a
participação de mecanismos de hipersensibilidade nestas duas entidades (psoríase/PEAG); o conceito de pustulose
exantemática como padrão de reacção cutânea; e o papel dos fármacos, entre outros factores extrínsecos, na história natural
da psoríase.
DERMATOFITOSE PROFUNDA POR TRICHOPHYTON RUBRUM EM DOENTE HEMODIALISADO
Ana Filipa Duarte1, P. Morais1, A. Mota1, M. D. Pinheiro2, F.Azevedo1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de S. João e Faculdade de Medicina do Porto, 2Laboratório de Microbiologia, Serviço de Patologia Clínica, Hospital de S. João, Porto
Os dermatófitos são agentes patogénicos comuns, que frequentemente produzem infecções superficiais da pele, unhas e
cabelo, provocando raramente infecções mais agressivas e profundas.
Apresenta-se um doente do sexo masculino, de 35 anos, com insuficiência renal crónica em hemodiálise e espondilite
anquilosante. Recorreu à consulta de Dermatologia por pápulas arredondadas, da cor da pele, com depressão central,
localizadas aos membros superiores. Efectuou-se biopsia cutânea para despiste de dermatose perfurante, que foi
inconclusiva. Por agravamento do quadro repetiu-se a biópsia cutânea que revelou a presença de hifas. O estudo
microbiológico da peça confirmou a presença de Trichophyton rubrum. Ao exame objectivo observou-se, ainda, a presença
de onicomicose das mãos e pés. Institui-se terapêutica com fluconazol, oral, 100 mg/dia, durante 8 meses, até à resolução
completa do quadro clínico.
O granuloma de Majocchi, ou perifoliculite granulomatosa nodular, ocorre por extravasamento dos dermatófitos para a
derme, devido à destruição traumática do folículo piloso, a qual provoca uma inflamação granulomatosa localizada à derme
e à hipoderme. Neste caso parece ter ocorrido invasão directa da derme por inoculação dos dermatófitos através do
traumatismo da epiderme pelas unhas infectadas. A derme é mais alcalina do que a epiderme e é desprovida do substrato
ideal para o crescimento dos dermatofitos, a queratina. No entanto, estes microrganismos podem adaptar-se e crescer no
tecido mesenquimatoso, sobretudo se ocorrer introdução traumática de queratina na derme e diminuição do pH pela
presença de ácido mucopolissacárico. É possível que a hemodiálise contribua para as alterções físico-químicas da derme,
que propiciam uma proliferação dos dermatófitos.
193
Reuniões da SPDV
EPIDERMÓLISE BOLHOSA ACQUISITA – A PROPÓSITO DE UM CASO CLÍNICO
Sandra Medeiros1, C. Fernandes1, A. Afonso2, F. A.Pacheco1, J. Cardoso1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital Curry Cabral, Lisboa
Doente do sexo masculino, 24 anos de idade, raça negra, observado por dermatose arrastada caracterizada por bolhas
tensas de conteúdo sero-hemático que evoluíam para erosões cobertas por crosta acastanhada e pele apergaminhada
cicatricial, com abundantes quistos de mília na sua superfície, localizadas à superfície de extensão das mãos e pés, cotovelos,
joelhos e região maleolar. Ocorria ainda envolvimento das mucosas oral, genital e peri-anal, com erosões superficiais
dolorosas, cobertas por tecido fibrinoso.
A biopsia de lesão cutânea revelou “vesícula sub-epidérmica” e a IFD pelo método de “salt-split-skin” demonstrou
marcação positiva com IgG no lado da derme e formando o pavimento da vesícula, achado consistente com o diagnóstico de
Epidermólise Bolhosa Acquisita.
A remissão parcial do quadro cutâneo verificou-se durante a terapêutica com Ciclosporina (150 mg/dia). Em Março de
2007, verificamos recorrência da dermatose acompanhada por quadro de artrite migratória das grandes articulações,
diarréia e emagrecimento acentuado. A subsequente colonoscopia, e respectivo exame histopatológico, permitiram
confirmar o diagnóstico de Colite Ulcerosa. Actualmente o doente encontra-se medicado com ciclosporina e sulfassalazina
com melhoria dos quadros cutâneo e intestinal.
A Epidermólise Bolhosa Acquisita é uma rara dermatose bolhosa adquirida e subepidérmica, associada a autoimunidade
para o colagéneo do tipo VII. É mais frequente nos indivíduos asiáticos e africanos, apresentando habitualmente um curso
crónico e refractário às várias terapêuticas. Associa-se em cerca de 30% dos casos a doença inflamatória do intestino, mais
frequentemente à doença de Crohn (25 casos descritos), sendo que apenas 5 casos foram reportados na literatura em relação
com a Colite Ulcerosa. Admite-se que o elo etiopatogénico entre esta dermatose e a doença intestinal se deva também à
autoreactividade para o colagéneo do tipo VII presente no cólon. No nosso doente o quadro intestinal manifestou-se
posteriormente à dermatose, contrariamente à sequência classicamente descrita.
PARACOCCIDIOIDOMICOSE: CASO CLÍNICO
Rubina Alves1, J.Marote1, C. Freitas1, L.S. Almeida2, H. Sequeira3, M.M. Gomes3, C. Veríssimo4, L. Rosado4, A.Faria1
1
Serviço Dermatologia e Venereologia, Hospital Central Funchal, 2Laboratório de Histopatologia, Serviço de Dermatologia e
Venereologia, Hospital Santa Maria, Lisboa 3Laboratório de Micologia, Serviço de Dermatologia, Hospital Santa Maria, Lisboa,
4
Laboratório de Micologia, Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge de Lisboa
Os autores reportam o caso clínico de um homem, 43 anos de idade, natural e residente na ilha da Madeira, emigrado na
Venezuela até 2001.
Em Março 2007, observado por aparecimento de lesão pápulo-crostosa de bordos regulares eritematosos, indolor,
pruriginosa, com dimensões de 4,5 x 3,0 cm, localizada no dorso, com 2 meses de evolução. Sem outras alterações. Em Março
1999, refere história de lesão da mucosa oral, com exame histopatológico compatível com Paracoccidioidomicose (PCM).
Foram efectuadas duas biópsias da lesão cutânea para avaliação histopatológica e micológica. O exame histopatológico
revelou a presença de múltiplas células circulares, sugerindo distribuição característica de “ roda de leme”. O estudo
micológicos revelou, no exame directo, leveduras de tamanhos variados – algumas em gemulação. As culturas em Mycobiotic
agar, Sabaroud's dextrose agar e Brain heart Infusion agar, 24º e 37º C, permitiram isolar o Paracoccidioides brasiliensis. A
radiografia pulmonar apresentava infiltrado bilateral e simétrico, nos lobos centrais e basais. A TAC torácica demonstrou
múltiplos nódulos espiculados, áreas de opacidade e bronquiectasias. Foi efectuada broncofibroscopia (sem alterações) e
simultaneamente obtido o Lavado Broncoalveolar (LBA). A cultura, a 25º C, revelou a presença de hifas e clamidósporos
(forma filamentosa). Na cultura, a 37º C, não se obteve a forma leveduriforme.
O tratamento efectuado foi o itraconazol 200 mg/dia, durante 6 meses. Actualmente com lesão residual.
A PCM é uma micose sistémica granulomatosa, crónica e progressiva. O agente etiológico é um fungo dimórfico, o
Paracoccidioides brasiliensis, geográficamente restrito à América Central e do Sul. A PCM tem um amplo espectro de
manifestações clínicas e prognóstico reservado se não for efectuado tratamento adequado. Até à actualidade, nenhum caso
de PCM foi reportado na ilha da Madeira. Embora não seja frequente fora das áreas endémicas, os dermatologistas devem
ser capazes de reconhecer e diagnosticar micoses sistémicas, como a PCM.
194
Reuniões da SPDV
PÊNFIGO FOLIÁCEO (FOGO SELVAGEM)
Martinha Henrique1, V. Guiote1, R. Mascarenhas1, J. P. Reis2, F. Cunha2
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital de Santo André, EPE, Leiria
O Pênfigo Foliáceo Endémico ou Fogo Selvagem é uma doença auto-imune caracterizada pela presença de bolhas
superficiais subcórneas e anticorpos da classe IgG4 contra a glicoprotéina desmossómica, Desmogleína 1.
Apresentamos o caso clínico de uma doente, sexo feminino, 36 anos, brasileira, natural de Goias e residente em Portugal
desde Outubro de 2005.
A doente refere em 2004 o aparecimento de lesões eritemato-crostosas na face que desapareceram após seis meses. Em
2006 aparecimento novamente de lesões na face, bem como placas verrucosas no couro cabeludo. A dermatose foi
agravando com o aparecimento de vesículas, erosões e crostas, no tronco e posteriormente nos membros; era acompanhada
de intenso prurido e não havia envolvimento das mucosas. A biópsia cutânea, a imunofluorescência directa e a
imunofluorescência indirecta foram compatíveis com o diagnóstico de Pênfigo Foliáceo.
Iniciou corticoterapia na dose de 1mg/Kg/dia e azatioprina na dose de 1,5mg/kg/dia. Houve boa resposta clínica,
estando sem lesões desde há 6 meses. Mantém ainda terapêutica com 5mg de prednisolona/dia e 150mg de azatioprina.
O diagnóstico de Pênfigo Foliáceo/ Fogo Selvagem é suportado pela existência de uma dermatose bolhosa superficial,
crostosa com envolvimento muito marcado das áreas seborreicas, com biópsia cutânea, IMD, IMI compatíveis, bem como o
início da dermatose numa zona endémica.
ICTIOSE EM FATO DE BANHO – UM FENÓTIPO SENSÍVEL À TEMPERATURA
Felicidade Trindade1, T. Fiadeiro2, A. Torrelo3, I. Hausser4, H. Hennies5, H. Traupe6
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa-Central, 2Hospital da Luz,
Lisboa, 3Hospital Niño Jesus, Spain, 4Universidade de Heidelberg, Germany, 5Universidade de Colonia, Germany, 6Universidade de Muenster, Germany
Introdução: A ictiose em fato de banho é um tipo raro de ictiose congénita de transmissão autossómica recessiva. É
caracterizada pela presença de escamas grandes, castanhas ou cinzentas, localizadas na área do fato de banho. A região
central da face e os membros habitualmente estão poupados na sua totalidade. Foi sugerido recentemente que este fenótipo é
sensível à temperatura e é causado por uma deficiência da tranglutaminase-1.
Caso clínico: Criança de 2 anos, sexo feminino, raça nega, com escamas grandes localizadas no tronco, pescoço e
região frontal. Nos antecedentes pessoais havia história de bebé colóide ao nascimento, com posterior formação de escamas
na área do fato de banho. As extremidades e região central da face não tinham lesões. O exame histológico demonstrou a
presença de hiperqueratose e camada granulosa normal. Os estudos genéticos, ultra-estruturais e bioquímicos revelaram a
deficiência de transglutaminase-1 na pele com lesão, e normal expressão da transglutaminase-1 na pele sem lesão.
Discussão: A ictiose em fato de banho é uma variante rara de ictiose lamelar. Traupe e col. estudaram recentemente 10
doentes com ictiose em fato de banho. Verificaram que é uma doença causada por uma deficiência na tranglutaminase-1,
atendendo ao facto de que esta enzima está ausente na pele afectada e presente na pele normal. Propuseram que se tratava
de um fenótipo causado por uma inactivação da transglutaminase-1 devido ao aumento da temperatura. A termografia
digital corporal demonstra a estreita correlação entre as áreas mais quentes do corpo e a presença de escamas. Os doentes
têm lesões nas áreas com maior temperatura (tronco, pescoço e região frontal) e outras áreas, como os membros e região
central da face estão poupadas.
DOENÇA DE COWDEN
Martinha Henrique1, R. Mascarenhas1, V. Guiote1, C. Gonçalves2, C. Amado3, F. Cunha3
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, 2Serviço de Gastroentologia e 3Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Santo
André, Leiria, EPE
A Doença de Cowden é um sindroma autossómico dominante, caracterizado por hamartomas mucocutâneos e predisposição para vários tumores extracutâneos benignos e malignos. Estão estabelecidos critérios para o diagnóstico da doença e
195
Reuniões da SPDV
follow-up dos doentes. Dos critérios patognomónicos fazem parte lesões mucocutâneas e a doença de Lhermitte-Duclos do
adulto (hamartoma do cerebelo). Esta doença encontra-se associada a alterações no gene PTEN do cromossoma 10q23.
Apresentamos 2 casos clínicos, pai e filho com doença de Cowden.
Ao 1º doente de 58 anos, é excisada uma lesão do couro cabeludo cujo diagnóstico histológico é de fibroma esclerótico.
Posteriormente excisa-se uma pápula da face cujo diagnóstico histológico é também de fibroma esclerótico, pelo que se inicia
a investigação do doente, para o despiste de doença de Cowden. Este doente de 58 anos tem antecedentes de nefrectomia
por tumor renal, neoplasia da próstata e o aparecimento recente de múltiplas lesões cutâneas como lipomas e hemangiomas
cavernosos. Na investigação detectou-se a existência de polipose intestinal e a ressonância cerebral revelou cavernomas e
meningiomas.
O filho apresenta múltiplos nevos melanociticos, hemangiomas e tem antecedentes de cirurgia da tiróide, com o
diagnóstico de adenoma. A investigação revelou polipose intestinal e a ressonância cerebral mostrou uma lesão vascular.
O estudo cromossómico de ambos identificou a mutação genética compatível com a doença.
CARCINOMA ESPINOCELULAR DE GRANDES DIMENSÕES DO COURO CABELUDO
Ana Fraga, M. André, C. Garcia, J. Pignatelli, R. O. Soares, M. M. Gomes
Clínica Universitária de Dermatologia, Hospital de Santa Maria, Lisboa
O encerramento de defeitos cirúrgicos devido a tumores no couro cabeludo de grandes dimensões constitui sempre um
desafio. A opção mais comum é o enxerto, com a inerente alteração da textura da pele como consequência. A alternativa
consiste em retalhos múltiplos de grandes dimensões que implicam o “undermining” da pele em área que abarca quase todo
o couro cabeludo.
Os autores propõem como alternativa o recurso a incisões de relaxamento efectuadas a mais de 6 cm da ferida
operatória, permitindo o “undermining” a montante e jusante, conseguindo a disponibilidade de tecido em falta. É, de certa
forma, um duplo retalho de avanço em que cada retalho tem dois pedículos, um em cada extremidade. Esta técnica permite
poupar quer em incisões (e consequentemente em sutura), em área de descolamento e em tempo de cirurgia, mantendo
textura de pele original.
Descreve-se o caso clínico de homem de 91 anos com tumor 3.5x4 cm, ulcero-vegetante, na ½ anterior da região parietal
direita. O estudo histológico revelou tratar-se de carcinoma espinocelular. TAC de crânio, pescoço e tórax não revelaram
alterações.
Efectuou-se excisão da lesão por cirurgia convencional, e duas incisões de relaxamento paralelas ao grande eixo de cada
retalho, efectuando-se através desta “undermining” a montante e a jusante, conseguindo-se a disponibilidade de tecido,
aliviando a tensão sobre a sutura. A ferida operatória teve boa evolução cicatricial e resultado estético favorável.
RETALHO PEDICULADO EM ILHA EM FORMA DE BARBATANA DE TUBARÃO PARA RECONSTRUÇÃO DE
DEFEITO POR TUMOR LOCALIZADO NA ASA DO NARIZ
Marisa C. André, A. Fraga, J. Pignatelli, R. O. Soares, M. M. Gomes
Clínica Universitária de Dermatologia, Hospital de Santa Maria, Lisboa
O aparecimento de neoplasia cutânea, sobretudo carcinoma basocelular, na asa do nariz não é infrequente.
Na reconstrução da asa do nariz o enxerto constitui a principal opção, pois esta região constitui, por si só, uma unidade
cosmética.
A reparação, por retalho, do defeito nasal na área alar constitui um desafio para a cirurgia reconstrutiva dado o
envolvimento de várias unidades cosméticas cuja intersecção leva à perda de definição do sulco que limita exteriormente a
ala, condicionando um resultado estético indesejável.
Descrevemos a utilização do retalho em barbatana de tubarão (RBT), procedimento cirúrgico de reparação num único
tempo operatório, após excisão de carcinoma basocelular alar. Este tipo de reconstrução restaura a anatomia natural,
mantendo o sulco nasal, sem necessidade de recorrer a enxerto, mantendo pele cuja cor e textura se assemelha muito à da
pele do nariz.
O RBT é um retalho pediculado em ilha cujo braço superior sofre rotação de 90º relativamente ao defeito cirúrgico,
196
Reuniões da SPDV
reparando a área alar; esta rotação do braço superior do retalho força a porção nasal do retalho a dobrar 90º sobre o
restante, formando um cone invertido de redundância que resulta na recriação da asa externa e do sulco nasal, sem
necessidade de suturas de ancoragem.
A realização planeada de um RBT constitui técnica útil e em um único tempo cirúrgico para reparação funcional e estética
da asa nasal, com vantagem, relativamente a outros retalhos, na preservação do sulco que define a unidade cosmética.
DERMATOFIBROSSARCOMA PROTUBERANS GIGANTE DO COURO CABELUDO: A PROPÓSITO DE UM
CASO
Victoria Guiote1, R. Mascarenhas1, R. Vieira2, M. Henrique1, C. Amado1, F. Cunha1
1
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Hospital de Santo André, Leiria, EPE, 2Serviço de Dermatologia e Venereologia,
Hospitais da Universidade de Coimbra
O dermatofibrossarcoma protuberans (DFS) é um tumor fibro-histiocitário de baixo grau de malignidade e com escasso
potencial metastático, mas localmente invasivo e com um elevado risco de recidiva local. Predomina no tronco e raiz dos
membros, sendo menos frequente a localização no couro cabeludo. A cirurgia de Mohs ou, em alternativa, a excisão cirúrgica
convencional com margens amplas (3 cm), representam o tratamento de escolha.
Um homem de 41 anos com antecedentes de esquizofrenia e atraso mental moderado, internado compulsivamente em
psiquiatria, foi observado por um tumor de grandes dimensões e de evolução indeterminada localizado no couro cabeludo.
Tratava-se de uma massa tumoral de aproximadamente 20 cm, bastante exofítica, multinodular, dura, perfurada por diversos
orifícios por onde drenava material purulento fétido. A base da lesão apresentava aderências aos planos subjacentes. Não se
palpavam adenopatias regionais.
O estudo histopatológico foi típico de dermatofibrossarcoma protuberans e o estudo de extensão excluiu doença metastática.
Realizou-se excisão cirúrgica com margem de 3 cm sob anestesia geral, encontrando-se aderência do tumor na sua
porção mais central ao periósteo epicraniano, requerendo remoção do mesmo. Num segundo tempo operatório, após
granulação abundante do defeito, suficiente para cobrir o plano ósseo exposto, procedeu-se à reconstrução mediante
colocação de um enxerto laminar.
A evolução decorreu favoravelmente, encontrando-se o doente sem evidência de recidiva loco-regional ou à distância aos
12 meses de seguimento.
RETALHO BILATERAL V-Y PARA RECONSTRUÇÃO DE DEFEITO DA POLPA DIGITAL
Felicidade Santiago, M.M. Canelas, R. Vieira, A. Figueiredo
Serviço de Dermatologia e Venereologia Hospitais da Universidade de Coimbra
Vários procedimentos reconstrutivos estão descritos para o tratamento de defeitos da polpa digital com exposição da
falange. São exemplos o retalho volar V-Y; o retalho bilateral V-Y; o “cross-finger flap” e o retalho tenar, entre outros. A
indicação cirúrgica dependerá do tipo e extensão da lesão e dedo envolvido.
O retalho bilateral V-Y descrito por Kutler em 1947 é um dos mais populares na reconstrução de amputações transversais e
oblíquas quando há preservação das porções laterais da polpa digital. Consiste na execução de dois retalhos laterais e
simétricos de pedículo subcutâneo que avançam distalmente sendo suturados na linha média, e o defeito secundário fechado
bilateralmente em forma de “Y”.
Descreve-se o caso de um jovem submetido a excisão de exostose sub-ungueal do V dedo da mão direita, que
condicionava elevação do prato ungueal. Foi realizada uma amputação transversal com exposição óssea e procedeu-se à
reconstrução com um retalho bilateral V-Y. A evolução do doente foi favorável do ponto de vista estético e funcional, não
apresentando dores ou alterações sensitivas.
Algumas desvantagens têm sido apontadas a este retalho, como o risco de necrose parcial ou total, hipersensibilidade nas
linhas de sutura e insensibilidade no retalho, o que pode contribuir para o seu pouco uso. Comparando com o “cross-finger
flap” ou o retalho tenar que requerem 2 tempos cirúrgicos e prolongada imobilização, o retalho bilateral V-Y é um
procedimento relativamente simples e eficaz com resultados satisfatórios do ponto de vista cosmético e funcional.
197
Reuniões da SPDV
HEMANGIOMA RETICULAR ULCERADO DO MEMBRO INFERIOR ASSOCIADO A ANOMALIAS VENTROCAUDAIS
Paulo Morais1,4, S. Magina1,4, H. Pinto2, A. Reis2, J. Amil2, R. Vaz2, G. Rocha3, H. Guimarães3,4, J. Mulliken5, F. Azevedo1
Serviços de 1Dermatovenereologia, 2Pediatria e 3Neonatologia do Hospital de S. João; 4Faculdade de Medicina do Porto,
5
Department of Plastic Surgery, Vascular Anomalies Center, Children's Hospital, Harvard Medical School, Boston, Massachusetts, EUA
Introdução: O hemangioma infantil reticular (HIR) é uma variante rara de hemangioma recentemente descrita na
literatura. Ocorre geralmente nos membros inferiores, associando-se a um espectro clínico variável. Na sua forma mais
grave, envolve todo o membro inferior e períneo com úlceras refractárias, anomalias anorrectais, urogenitais e espinhais, e
sobrecarga cardíaca.
Caso clínico: Apresentamos o caso de uma recém-nascida resultante de gestação de 34 semanas, complicada por préeclâmpsia e sem alterações ecográficas pré-natais. Ao nascimento observou-se mancha reticulada de coloração vinosa
envolvendo o membro inferior esquerdo, períneo e nádegas, dismorfia genital externa e imperfuração anal. A RMN revelou
imperfuração anal, fístula recto-vestibular e hipoplasia do cóccix. O quadro clínico era compatível com o diagnóstico de HIR
com anomalias estruturais subjacentes. Ao 5º dia de vida surgiram úlceras perineais com auto-amputação dos grandes
lábios, pelo que iniciou prednisolona endovenosa (2-mg/Kg/dia). Para permitir a realização de pensos, a doente foi
submetida a colostomia, algaliação permanente e analgesia com morfina endovenosa durante todo o internamento. Apesar
da corticoterapia, entretanto aumentada para 3-mg/Kg/dia, surgiram novas úlceras na coxa e pé esquerdos, profundas,
confluentes e com infecção recorrente. Atendendo à sua extensão e gravidade e aos insuficientes resultados com os pensos
convencionais optou-se por, após limpeza hidrocirúrgica do leito das úlceras, utilizar o sistema VAC (vacuum-assisted closure)
para preparação das mesmas para futura correcção cirúrgica. Gradualmente, observamos cicatrização das úlceras, com o
seu encerramento directo após 16 semanas de tratamento com VAC e 30 semanas de corticoterapia. A doente teve alta aos 8
meses de vida.
Comentários: A presença de hemangiomas perineais pode ser invocativa de anomalias estruturais subjacentes, as quais
devem ser excluídas através de RMN. Tal como nos restantes hemangiomas complicados, no HIR, os glicocorticóides
sistémicos são o tratamento farmacológico de 1ª linha. Como tratamento complementar, o VAC revelou-se útil nas úlceras
recalcitrantes.
APRESENTAÇÃO CUTÂNEA DE LINFOMA ANAPLÁSICO DE CÉLULAS GRANDES CD30+ SISTÉMICO
Maria Miguel Canelas1, R. Vieira1, D.Ferreira2, R. Afonso3, Ó. Tellechea1, A.Figueiredo1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia, 2Imunohemoterapia e 3Hematologia, Hospitais da Universidade de Coimbra
Doente de 53 anos, observado com uma lesão tumoral arredondada, exofítica, séssil, de superfície ulcerada e
hemorrágica, com 5 cm de diâmetro, localizada na região poplítea esquerda, com evolução de 6 semanas. No intervalo de
um mês, aparecimento de outras lesões tumorais, cupuliformes, ulceradas com dimensões variáveis, dispersas pelo tronco e
membros, bem como de uma massa dura, aderente e dolorosa na região parotídea direita. Associadamente apresentava
dores intensas, anorexia, astenia e emagrecimento. A biopsia da lesão poplítea revelou infiltração maciça por linfócitos de
células grandes, com formas bizarras e núcleos polilobados, com expressão de CD30 intensa, compatível com linfoma
anaplásico T CD30 +. A citologia aspirativa da massa parotídea revelou invasão por células de linfoma. A tomografia
computorizada toraco-abdominopélvica demonstrou conglomerado adenopático parotídeo direito, massa do seio maxilar
direito com extensão às células etmoidais e destruição óssea do seio frontal, nódulos pulmonares bilaterais e lesão nodular
hepática. Não se detectaram células estranhas na biopsia óssea. Colocado o diagnóstico de linfoma anaplásico de células
grandes CD30+ (LACG CD30+) sistémico, foi transferido para o serviço de Hematologia e efectuou 3 ciclos de quimioterapia com CHOP. Verificou-se agravamento progressivo do estado geral e morte ao fim de 5 meses após o diagnóstico.
Dado que a pele é a primeira das localizações extraganglionares do LACG CD30+ sistémico, é fundamental distinguir
este linfoma do LACG CD30+ primário cutâneo, visto que o tratamento e o prognóstico são muito diferentes. Contrariamente
ao excelente prognóstico dos LACG CD30+ cutâneos primários, os sistémicos associam-se a doença avançada, rápida
deterioração geral e escassa resposta à poliquimioterapia.
198
Reuniões da SPDV
LENTIGO MALIGNO – TRATAMENTO COM IMIQUIMOD
Filipa Ventura1, J.Rocha1, J. C. Fernandes1, F. Pardal2, C. Brito1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital de São Marcos, Braga
O lentigo maligno surge, geralmente, em doentes idosos, nas áreas fotoexpostas podendo progredir para melanoma
invasivo se não for tratado. As lesões podem ter grandes dimensões, o que torna difícil ou inviabiliza a realização do
tratamento cirúrgico, particularmente quando localizadas na face. O imiquimod é um fármaco imunomodulador com
actividade antiviral e antitumoral. Várias publicações referem que o imiquimod 5% creme é eficaz no tratamento do lentigo
maligno, constituindo uma alternativa a considerar nos casos em que a cirurgia não é exequível.
Descreve-se o caso de uma doente de 80 anos que, há cerca de 10 anos, foi referenciada ao serviço de Dermatologia por
mancha heterogénea localizada na região malar esquerda. O exame histopatológico de biopsia incisional mostrou lentigo
maligno. Foi proposto tratamento cirúrgico que a doente recusou, tendo abandonado a consulta. Há 10 meses, recorreu
novamente ao nosso serviço pela mesma lesão. Ao exame objectivo observava-se mancha pigmentada heterogénea, do
acastanhado ao negro, de bordos irregulares e limites bem definidos, ocupando praticamente toda a hemiface esquerda.
Observavam-se, ainda, 2 lesões nodulares, uma das quais ulcerada, localizadas na região malar esquerda, com 6 meses de
evolução. Foi realizada biopsia excisional das lesões nodulares cujo exame histopatológico mostrou melanoma Clarck IV
Breslow 7 e biopsia de 3 fragmentos da mancha que revelou lentigo maligno. Não tinha adenopatias ou organomegalias
palpáveis. Realizou estudo analítico, TAC cerebral e toraco-abdomino-pélvica que não mostraram alterações relevantes.
Iniciou tratamento com imiquimod 5% creme, 1 aplicação diária, durante 4 meses. Um mês após o término do tratamento não
havia evidência, clínica e histológica, de doença. Presentemente, com 6 meses de follow-up, não há sinais de recidiva.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÉMICO BOLHOSO
Filipa Ventura1, J.Rocha1, J.C. Fernandes1, F. Pardal2, C. Brito1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital de São Marcos, Braga
O lúpus eritematoso sistémico (LES) bolhoso é uma entidade clínica rara que se caracteriza pela co-existência de LES e de
uma erupção vésico-bolhosa generalizada, com boa resposta à terapêutica com dapsona. Histologicamente, trata-se de uma
doença bolhosa subepidérmica com infiltrado predominantemente neutrofílico e formação de microabcessos na derme
papilar, indistinguível da dermatite herpetiforme. A característica imunopatológica mais específica é a deposição granular
e/ou linear de IgG, IgA, IgM e C3 ao longo da membrana basal.
Descreve-se o caso de um doente do sexo masculino, de 24 anos, referenciado ao serviço de Dermatologia por lesões
vésico-bolhosas sobre manchas eritematosas de bordos circinados, discretamente pruriginosas, dispersas pelo terço superior
do tronco e superfícies extensoras dos membros. Do restante exame objectivo destacavam-se manchas eritematosas
localizadas nas regiões malares e dorso do nariz, em “borboleta”, manchas violáceas ao longo da superfície palmar dos
dedos e pequenas hemorragias cuticulares nas mãos. O doente referia astenia e mal-estar geral. A biopsia cutânea mostrou
bolha dermo-epidérmica e intenso infiltrado neutrofílico, com formação de microabcessos na derme papilar. A
imunofluorescência directa da pele perilesional revelou deposição linear de IgG, IgA, IgM e C3 ao longo da membrana basal.
Do estudo analítico salientava-se leucopenia (2,7x109/L) com neutropenia e linfopenia, trombocitopenia (93x109/L). O
título de ANA era 1/160, com padrão mosqueado, os anticorpos anti-DNAds, anti-Sm, anti-SSa e anti-RNP eram positivos.
Foi feito o diagnóstico de LES bolhoso. O doente iniciou tratamento com dapsona (50mg/dia), que suspendeu após 4 dias por
aparecimento súbito de febre, odinofagia e cefaleias. Instituiu-se, então, terapêutica com prednisolona (30mg/dia),
azatioprina (100mg/dia) e hidroxicloroquina (400mg/dia), com rápido desaparecimento dos sintomas gerais e resolução
progressiva das lesões cutâneas.
ERITEMA MULTIFORME EM EPISÓDIO INICIAL DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÉMICO
Rita Guedes, N. Rocha, P. Varela, P. Gil, A. Baptista
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia-Espinho
O eritema multiforme (EM) foi descrito pela primeira vez por Ferdinand von Hebra em 1860. Caracteriza-se pelo apare199
Reuniões da SPDV
cimento súbito e auto-limitado de pápulas eritematosas, algumas das quais com progressão para lesão em alvo e que
assumem uma distribuição simétrica e preferencialmente acral. Em 50 % dos casos está relacionado com infecção herpética
(primoinfecção ou latente), mas o papel de outros agentes infecciosos e de certos fármacos, embora controverso, continua a
ser defendido por alguns autores.
A associação de lesões compatíveis com EM e lúpus eritematoso é uma entidade clínica distinta e rara, descrita como
síndrome de Rowell. Os seus critérios diagnósticos estão definidos, embora modificados desde a descrição inicial de Rowell.
Descrevemos o caso clínico de uma doente do sexo feminino de 16 anos, com história de polimedicação recente, que
durante o episódio inicial de lúpus eritematoso sistémico (LES), desenvolveu lesões cutâneas compatíveis com EM. Durante o
internamento foi excluída uma etiologia infecciosa como causa do EM.
Nesta apresentação discutimos diferentes hipóteses diagnósticas:
- Quadro clínico auto-imune idiopático puro – Síndrome de Rowell;
- Doença auto-imune desencadeada por medicamentos – LES medicamentoso e EM medicamentoso;
- Intercorrência medicamentosa na forma de eritema multiforme durante um episódio inicial de LES.
TERAPÊUTICA ANTI-TNF-ALFA NO PIODERMA GANGRENOSO: TALIDOMIDA VS. ETANERCEPT
Rita Guedes, A. Moreira, I. Leite, P. Varela, A. Baptista
Serviço de Dermatologia e Venereologia, Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia-Espinho
Os autores apresentam um caso clínico de um homem de 54 anos com o diagnóstico de pioderma gangrenoso. Fez
tratamento com prednisolona oral com boa resposta clínica, mas com recidiva após suspensão da corticoterapia. Não
apresentou resposta clínica com a ciclosporina. Iniciou terapêutica com talidomida e aos 2 meses de tratamento apresentava
cicatrização total das lesões. Aos 11 meses iniciou queixas de parestesia e hipostesia em luva e peúga, pelo que suspendeu
esta terapêutica.
A talidomida actua como agente anti-inflamatório, imunomodelador e anti-angiogénico. O seu papel exacto no
pioderma gangrenoso continua por esclarecer, mas pensa-se que actue preferencialmente através da inibição do TNF-á.
Tendo em conta a resposta favorável do doente à terapêutica com talidomida e à necessidade de suspensão da mesma,
optou-se por introduzir uma terapêutica com efeitos sobreponíveis na cascata de inflamação.
O bloqueio do TNF-á pode ser efectuado através do uso de inibidores desta citocina. O etanercept é um receptor solúvel
do TNF-á, que através da sua ligação ao TNF-á bloqueia a sua acção, interrompendo a cascata da inflamação. Neste
momento o etanercept encontra-se aprovado no tratamento da artrite reumatóide, artrite psoriática, espondilite anquilosante
e psoríase, mas tem sido utilizado noutras dermatoses com boa resposta clínica.
O doente iniciou etanercept 25mg 2 vezes por semana e suspensão gradual da corticoterapia. À 7ª semana de tratamento
apresentou melhoria franca na cicatrização das lesões, mantendo, no entanto, o aparecimento de pápulas e pústulas, que
não evoluíram para ulceração. À 20ª semana de tratamento encontava-se sem lesões activas e sem aparecimento de novas
lesões. Manteve terapêutica sem recidiva ou qualquer efeito lateral.
Pretende-se com esta apresentação divulgar uma alternativa no tratamento do pioderma gangrenoso refractário. Até à
data estão descritos 15 casos de pioderma gangrenoso tratados com etanercept.
PIODERMA GANGRENOSO EM CONTEXTO DE DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL
Pedro Andrade1, H. Alexandrino2, M.M. Xavier1, A. Figueiredo1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Cirurgia II, Hospitais da Universidade de Coimbra
Relata-se o caso de doente do sexo feminino, de 67 anos de idade, apresentando diarreia mucopiossanguinolenta, lesões
orais e síndrome febril recorrente com 3 meses de evolução, referenciada para o Serviço de Dermatologia dos HUC para
esclarecimento de dermatose dos membros inferiores com início no último mês.
Apresentava várias placas de tonalidade violácea com bolha flácida central, com rápida evolução para lesões ulceradas
extensas, muito dolorosas, com bordos infiltrados, com pústulas em algumas áreas e progressão centrífuga, clinicamente
sugestivas de pioderma gangrenoso. A biópsia do bordo de uma das úlceras revelou pústula intraepidérmica e infiltrado
neutrofílico dérmico com carioclasia, sem vasculopatia, compatível com hipótese diagnóstica colocada. Do estudo
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Reuniões da SPDV
laboratorial realizado destaca-se apenas a presença de autoanticorpos x-ANCA. A colonoscopia subtotal foi sugestiva de
doença inflamatória intestinal (DII) com envolvimento contínuo de toda a mucosa visualizada.
Cumpriu tratamento com mesalamina, antibioterapia oral e metilprednisolona 48mg/dia, sem modificação significativa
dos quadros cutâneo ou intestinal. Ao 10º dia de internamento foi submetida a colectomia esquerda na sequência de
perfuração cólica, e posteriormente a colectomia total por complicação pós-operatória. O estudo histológico da peça
operatória confirmou DII sem critérios definitivos de colite ulcerosa ou doença de Crohn. Foi suspensa corticoterapia oral em
pós-operatório, mantendo-se apenas tratamento tópico (propionato de clobetasol), com rápida cicatrização das lesões e
restituição da integridade cutânea no prazo de 3 meses após a cirurgia, sem recidiva após follow-up de 2 meses.
O pioderma gangrenoso é uma entidade clínica rara de etiologia pouco clara com associação frequente a patologia
sistémica, nomeadamente a DII; salienta-se neste caso a evolução sinérgica das doenças intestinal e cutânea, e em particular
a rápida resolução do quadro cutâneo após colectomia total.
VASCULOPATIA LIVEDÓIDE – TRATAMENTO COM IMUNOGLOBULINA ENDOVENOSA
Joana Rocha1, F. Ventura1, A. P. Vieira1, F. Pardal2, C. Brito1
Serviços de 1Dermatologia e Venereologia e 2Anatomia Patológica, Hospital S. Marcos, Braga
Introdução: Vasculopatia livedóide (VL) é uma patologia rara, crónica, que se caracteriza pelo aparecimento recorrente
de úlceras dolorosas nas pernas e pés. A cicatrização destas lesões é lenta, deixando áreas de atrofia branca rodeadas de
manchas hiperpigmentadas e telangiectasias.
Caso clínico: Doente de raça caucasiana, sexo masculino, 36 anos de idade, observado no Serviço de Dermatologia
pelo aparecimento recorrente, desde há cerca de 5 anos, de úlceras dolorosas, de cicatrização lenta, localizadas no terço
inferior de ambas as pernas. Apresentava úlceras de tamanho variando entre 1 e 2 cm, de limites irregulares e eritematosos,
algumas confluentes, cobertas por exsudado purulento, sobre pele eritemato-purpúrica e com lesões de atrofia branca. A
biopsia de pele revelou proliferação vascular no plexo capilar superficial, com frequente trombose luminal constituída por
coágulos de fibrina, sem lesões de vasculite, aspectos característicos de VL. A avaliação analítica, que incluiu serologias
infecciosas e os estudos imunológico, da coagulação e pró-trombótico foi normal ou negativa.
Após tratamento com prednisolona, colchicina, AINEs e analgésicos potentes, com benefício precário, foi iniciada
terapêutica com imunoglobulina endovenosa (IGev), na dose de 0,5g/Kg/dia durante 3 dias consecutivos/mês, ácido
acetilsalicílico 100mg/dia e pentoxifilina 400mg 3 vezes/dia. Logo após o 2º ciclo de IG ev, o doente referia franca melhoria
da dor, com cicatrização das lesões activas, e, ao fim de 6 ciclos de tratamento, verificou-se cicatrização completa das lesões
sem aparecimento de novas úlceras.
Discussão: Embora a etiopatogenia da VL não esteja inteiramente esclarecida, parecem estar envolvidas alterações locais
e/ou sistémicas dos mecanismos de controlo da coagulação.
O tratamento habitual inclui fármacos antiplaquetários, antitrombóticos, antiinflamatórios e agentes imunossupressores
que têm sido instituídos com respostas muito variáveis. Recentemente foram relatados na literatura sucessos terapêuticos com
a utilização da IG ev, sugerindo a sua utilização como opção terapêutica promissora nos doentes com vasculopatia livedóide.
VASCULITE ANTICORPO ANTICITOPLASMA DOS NEUTRÓFILOS (ANCA) POSITIVA ASSOCIADA AO
PROPILTIOURACILO – CASO CLÍNICO
Paulo Morais1,3, A. Calistru1, T.Baudrier1, A. Mota1,3, A.P. Cunha1,3, M. Alves2, C.Neves2,3, F.Azevedo1
Serviços de 1Dermatovenereologia e 2Endocrinologia, Hospital de S. João, Porto; 3Faculdade de Medicina do Porto
Introdução: Os fármacos antitiroideus utilizados no tratamento da doença de Graves (DG) podem associar-se a reacções
adversas potencialmente graves. O propiltiouracilo (PTU) pode produzir uma vasculite ANCA positiva, mais frequentemente
do tipo MPO-ANCA, com repercussões sistémicas variáveis e possível desfecho fatal. O tratamento de eleição é a
descontinuação do fármaco.
Caso clínico: Apresentamos o caso de uma doente de 43 anos, com história de síndrome antifosfolipídico e DG com 4
anos de evolução. Após um curso inicial de iodo radioactivo sem sucesso, a doente foi medicada com PTU. No terceiro ano de
tratamento desenvolveu lesões cutâneas violáceas e bolhosas nos membros inferior e superior direitos que evoluíram para
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Reuniões da SPDV
úlceras dolorosas. Analiticamente apresentava hipertiroidismo, elevação dos parâmetros inflamatórios e dos imunocomplexos circulantes, e anticorpos anticardiolipina, antitiroideus e ANCAs (MPO e PR3-ANCA) positivos. A imunofluorescência
directa mostrou depósito de IgG e C3 na parede dos vasos da derme superior, enquanto a imunofluorescência indirecta
revelou um padrão misto de ANCA. A biópsia lesional mostrou uma vasculite leucocitoclásica. As lesões cutâneas resolveram
progressivamente com a suspensão do fármaco e o tratamento com corticóides orais. Nesta altura foi possível submeter a
doente a uma tiroidectomia total, a qual foi seguida por normalização dos títulos de ANCA e anticorpos anticardiolipina e
redução marcada dos antitiroideus. Os testes epicutâneos foram positivos para o PTU. Após 12 meses de follow-up, a doente
mantém-se assintomática, sem novas lesões cutâneas ou queixas relacionadas, embora os títulos de ANCA tenham
aumentado, mantendo-se em valores estáveis.
Comentários: Este caso enfatiza a necessidade de maior alerta para este efeito adverso relativamente raro do PTU. O
reconhecimento das características cutâneas clássicas permite o diagnóstico precoce e o tratamento apropriado atempado,
com consequente redução da morbilidade. O seguimento a longo prazo deve ser preconizado, devido ao risco de recidiva do
quadro clínico.
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