Volume 17 – número 1 Janeiro – Março 2010
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Volume 17 – número 1 Janeiro – Março 2010
ISSN: 1809-2950 FISIOTERAPIA e PESQUISA REVISTA DE FISIOTERAPIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL Volume 17 – número 1 Janeiro – Março 2010 Fisioterapia e Pesquisa Fisioterapia e Pesquisa em continuação a Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Revista do Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Fofito/FMUSP UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Reitor Prof. Dr. João Grandino Rodas Vice-Reitor Prof. Dr. Hélio Nogueira da Cruz SECRETARIA Sarah Rúbia Ferreira de Meneses INDEXAÇÃO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGÁFICA Serviço de Biblioteca e Documentação da FMUSP e-mail: [email protected] Faculdade de Medicina Diretor Prof. Dr. Marcos Boulos EDIÇÃO DE TEXTO, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Tina Amado, Alba A. G. Cerdeira Rodrigues e Daniel Carvalho Pixeletra ME Depto. Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional IMPRESSÃO Chefe Profa. Dra. Selma Lancman Gráfica UNINOVE Tiragem: 800 exemplares Curso de Fisioterapia Coordenadora Profa. Dra. Carolina Fu FISIOTERAPIA E PESQUISA Fisioterapia e Pesquisa v.17, n.1, jan/mar. 2010 Fisioterapia e Pesquisa / (publicação do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) v.1, n.1 (1994). – São Paulo, 2005. v. : il. Continuação a partir de v.12, n.1, 2005 de Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Semestral: 1994-2004 Quadrimestral: a partir do v.12, n.1, 2005 Trimestral: a partir do v.15, n.1, 2008 Sumários em português e inglês ISSN 1809-2950 Curso de Fisioterapia Fofito/FM/USP R. Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail: [email protected] http://www.mdpesquisa.com.br/RFP Telefone: 55 xx 11 3091 8416 INSTITUIÇÕES COLABORADORAS INSTITUIÇÕES PARCEIRAS FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO / USP ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL APOIO 1. FISIOTERAPIA/periódicos I. Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Filiada à FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ISSN: 1809-2950 FISIOTERAPIA e PESQUISA REVISTA DO CURSO DE FISIOTERAPIA DA FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL Volume 17 – número 1 Janeiro – Março 2010 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 1 Fisioterapia e Pesquisa Publicação trimestral do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da USP Fisioterapia e Pesquisa visa disseminar conhecimento científico rigoroso de modo a subsidiar tanto a docência e pesquisa na área quanto a fisioterapia clínica. Publica, além de artigos de pesquisa originais, revisões de literatura, relatos de caso/s, bem como cartas ao Editor. indexada em: LILACS – Latin American and Caribbean Health Sciences; LATINDEX – Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Cientifícas de Américas; CINAHL – Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature; e SportDiscus. EDITORES ESPECIALISTAS Ana Cláudia Mattiello-Sverzut – RAL / FMRP / USP Amélia Pasqual Marques Isabel de Camargo Neves Sacco – Fofito / FMUSP Fofito / FMUSP – Depto. Fisioterapia, Jefferson Rosa Cardoso – Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, Londrina Faculdade de Medicina / USP Raquel Simoni Pires – Laboratório de Neurociências / Univ. Cidade Rinaldo Roberto de J. Guirro de São Paulo RAL/FMRP/USP – Depto. Biomecânica, Rosângela Corrêa Dias – EEFFTO – Escola Educ. Física, Fisioterapia e Medicina e Reabilitação do Aparelho Terapia Ocupacional / Univ. Federal de Minas Gerais Locomotor, Faculdade de Medicina de Sílvia Maria Amado João – Fofito / FMUSP Ribeirão Preto / USP EDITORES-CHEFES Simone Dal Corso – Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho CORPO EDITORIAL Anamaria Siriani de Oliveira RAL, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil Depto. Engenharia Telecomunicações e Controle Andre Fabio Kohn São Paulo SP Brasil Escola Politécnica / USP Anke Bergmann Curso de Fisioterapia / Centro Univ. Augusto Motta Rio de Janeiro RJ Brasil Armèle Dornelas de Andrade Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de Pernambuco Recife PE Brasil Barbara M. Quaney Medical Center / University of Kansas Kansas City KA EUA Fofito / Faculdade de Medicina / USP Clarice Tanaka São Paulo SP Brasil Cláudia R. Furquim de Andrade Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil School of Allied Health and Life Sciences / New York Chukuka S. Enwemeka Nova Iorque NY EUA Institute of Technology École de Réadaptation et GRIS, Faculté de Médecine / Debbie Feldman Montréal QC Canadá Univ. de Montréal Faculdade Ciências da Saúde/ Univ. Metodista de Piracicaba Piracicaba SP Dirceu Costa Brasil Fofito / Faculdade de Medicina / USP Fátima A. Caromano São Paulo SP Brasil Neurological Science Institute/ Oregon Health & Science Univ. Portland OR Fay B. Horak EUA Laboratoire d’Automatique, de Méchanique et d’Informatique, Franck Barbier Le Mont Houy França Industrielles et Humaines / Univ. de Valenciennes Depto. Fisioterapia / Univ. de Ribeirão Preto Gil Lúcio Almeida Ribeirão Preto SP Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos Helenice Jane C. Gil Coury São Carlos SP Brasil Dept. Public Health and Primary Health Care / Univ. of Bergen Bergen HD Jan Magnus Bjordal Noruega Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho João Carlos Ferrari Corrêa São Paulo SP Brasil Luci Fuscaldi Teixeira-Salmela EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Belo Horizonte MG Brasil Marcelo Bigal Dept. of Neurology, Albert Einstein College of Medicine Bronx NY EUA Escola de Educação Física / Univ. Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre RS Marco Aurélio Vaz Brasil Marcos Duarte Escola de Educação Fisica e Esportes / USP São Paulo SP Brasil Instituto do Coração, Faculdade de Medicina/ USP Maria Ignêz Zanetti Feltrim São Paulo SP Brasil Mariano Rocabado Facultad de Odontología / Univ. Andres Bello Santiago RMS Chile Fofito / Faculdade de Medicina / USP Raquel A. Casarotto São Paulo SP Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal Rio Grande do Norte Natal RN Ricardo Oliveira Guerra Brasil EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Sérgio Teixeira da Fonseca Belo Horizonte MG Brasil Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos Tânia de Fátima Salvini São Carlos SP Brasil Vera Lúcia Israel Curso Fisioterapia / Univ. Federal do Paraná – Litoral Matinhos PR Brasil 2 Fisioter Pesq. 2010;17(1) SUMÁRIO CONTENTS Editorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 Editorial PESQUISA ORIGINAL ORIGINAL RESEARCH Concordância inter-observador em testes de avaliação proprioceptiva do joelho por goniometria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 Inter-rater agreement at knee proprioception tests by goniometry Alberito R. de Carvalho, Márcio Edyr Rahn, Maiara Diedrichs, Andréia C. Lopes, Franciele Gregol, Renata Grochoski, Leonardo M. Pozzer, Maurício A. Machado Eficácia da aromaterapia na redução de níveis de estresse e ansiedade em alunos de graduação da área da saúde: estudo preliminar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 Effectiveness of aromatherapy in reducing stress and anxiety levels in undergraduate health science students: a preliminary study Cassandra Santantonio de Lyra, Larissa Sayuri Nakai, Amélia Pasqual Marques Comparação entre as técnicas de vibrocompressão e de aumento do fluxo expiratório em pacientes traqueostomizados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 Comparison between rib-cage compression and expiratory flow enhancement techniques in tracheostomised patients Antonio A. Matos de Castro, Swiany Rocha, Cléia Reis, José Renato O. Leite, Elias Ferreira Porto Influência do tempo de hospitalização sobre o desenvolvimento neuromotor de recém-nascidos pré-termo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 Influence of length of hospitalization on neuromotor development in premature newborn infants Luciana Giachetta, Carla Marques Nicolau, Anna Paula B. M. Costa, Adriana Della Zuana Comparação entre o uso de bocal e máscara facial na avaliação de volumes pulmonares e capacidade vital em indivíduos saudáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Comparison between the use of mouthpiece and facemask in assessing lung volumes and vital capacity in healthy subjects Patrícia Fregadolli, Ana Beatriz Sasseron, Kelly Cristiane Lanzoni, Luciana Castilho de Figueiredo, Andrea Luciana Cardoso, Núbia M. F. Vieira Lima Efeitos da aplicação do laser de baixa potência na regeneração do nervo isquiático de ratos . . . . . . . . . 34 Effects of low-power laser on injured rat sciatic nerve regeneration Renata Batagini Gonçalves, Jucilene Camilo Marques, Vanessa V. Monte-Raso, Ariane Zamarioli, Leonardo César Carvalho, Valéria P. Sassoli Fazan, Marcelo Rodrigo Tavares Influência do treinamento excêntrico nas razões de torque de flexores/extensores do joelho . . . . . . . 40 Knee torque ratio after eccentric training Fábio Juner Lanferdini, Clarice S. dos Santos Rocha, Viviane Bortoluzzi Frasson, Marco Aurélio Vaz Relação entre cognição (função executiva e percepção espacial) e equilíbrio de idosos de baixa escolaridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 Relationship between cognition (executive function and spatial perception) and balance in low educational status elderly Elaine Bazilio Custódio, Joel Malaquias Júnior, Mariana Callil Voos Fisioter Pesq. 2010;17(1) 3 Influência da força muscular respiratória pré-operatória na evolução clínica após cirurgia de revascularização do miocárdio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Influence of preoperative respiratory muscle strength on clinical evolution after myocardial revascularization surgery Jerusa Schnaider, Marlus Karsten, Tales de Carvalho, Walter Celso de Lima Correlação entre a composição corporal e força, resistência da musculatura respiratória e capacidade de exercício em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica . . . . . . . . . . . . . 58 Correlation between body composition and respiratory muscle strength, endurance, and exercise capacity in patients with chronic obstructive pumonary disease Evanirso da Silva Aquino, Thaís Miranda Peres, Isabel Bernardes de V. Lopes, Fernanda de M. Resgalla e Castro, Cristiane Cenachi Coelho, Inácio T. Cunha Filho Efeito da reeducação postural global no alinhamento corporal e nas condições clínicas de indivíduos com disfunção temporomandibular associada a desvios posturais . . . . . . . . . . . . . . 63 Effect of global postural reeducation on body alignment and on clinical status of individuals with temporomandibular disorder associated to postural deviations Débora Basso, Eliane Corrêa, Ana Maria da Silva Conhecimento de fisioterapeutas sobre a atuação em suporte básico de vida . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 Physical therapists’ knowledge on basic life support Laura M. Tomazi Neves, Márcio S. Vieira da Silva , Saul Rassy Carneiro, Victor da Silva Aquino, Helder J. Lima Reis RELATO DE CASOS CASE REPORT Drenagem linfática manual nos sintomas da síndrome pré-menstrual: estudo piloto . . . . . . . . . . . . . 75 Manual lymphatic drainage for premenstrual syndrome symptoms: a pilot study Juliana de Jesus Ferreira, Aline F. Perez Machado, Rogério Tacani, Maria Elisabete S. Saldanha, Pascale Mutti Tacani, Richard Eloin Liebano REVISÃO REVIEW Reabilitação pulmonar na unidade de terapia intensiva: revisão de literatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 Pulmonary rehabilitation in intensive care unit: a literature review Danielle Corrêa França, Aléssia Quintão Apolinário, Marcelo Velloso, Verônica Franco Parreira Instrumentos clínicos de avaliação funcional do tornozelo: revisão sistemática . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 Clinical measurement tools for ankle functional assessment: a systematic review Tarcísio Santos Moreira, Marcos Antônio de Resende, George Schayer Sabino Instruções para os autores ...................................................................................................................................................... 94 Ficha de assinatura .................................................................................................................................................................. 96 4 Fisioter Pesq. 2010;17(1) EDITORIAL EDITORIAL Revisão sistemática e prática baseada em evidências na tomada de decisão em saúde Há algum tempo o tema revisão sistemática vem sendo a “bola da vez” na área acadêmica da saúde. Há uns 30 anos, o profissional podia ler toda a literatura do seu campo, ao esquadrinhar as coleções de revistas médicas na biblioteca. Hoje, 6.000 artigos são publicados por dia. É aí que emerge a importância da revisão sistemática. O físico, filósofo e matemático francês René Descartes (1596-1650), um dos pioneiros do método científico, em seu Discurso sobre o Método (1637) listou quatro preceitos básicos, um dos quais era: “Realizar periodicamente revisões cuidadosas”. Um século mais tarde, o médico escocês James Lind (1716-1790) foi pioneiro ao publicar um ensaio clínico aleatório, sobre o efeito da vitamina C para o tratamento do escorbuto entre marinheiros a bordo da fragata de guerra Salisbury, em 1747. Os primeiros ensaios clínicos em Fisioterapia foram publicados por Colebrook em 1929, que avaliou os efeitos da irradiação ultravioleta em crianças escolares, e por Doull et al. em 1931, que abordou a mesma irradiação em crianças com problemas respiratórios. A primeira revisão sistemática em Fisioterapia foi publicada em 1975 pelo sueco KolindSorensen, que estabeleceu os efeitos dos tratamentos sobre as lesões ligamentares do tornozelo. Entre o primeiro ensaio clínico e a primeira revisão sistemática em Fisioterapia, porém, há um divisor de águas: o médico e professor escocês Archibald Cochrane (1909-1988). Seu livro Effectiveness and efficiency: random reflections on health services (1972) lançava um desafio à comunidade médica sobre o recurso aos ensaios clínicos aleatórios. Ao mesmo tempo, reconhecia que quem precisa tomar decisões nem sempre tem acesso a revisões confiáveis sobre a evidência disponível, escrevendo mais tarde: “É seguramente uma crítica séria a nossa profissão que não tenhamos organizado um sumário crítico por especialidade e subespecialidade, atualizado periodicamente, de todos os ensaios clínicos aleatórios relevantes”. Foi como uma resposta a seu mestre Archie, que insistentemente o advertia para a atualização das revisões sistemáticas desses ensaios, que Iain Chalmers criou em 1993 a Colaboração Cochrane. Seu objetivo é preparar, manter e promover o acesso a revisões sistemáticas dos efeitos das intervenções em saúde, reunindo informação de qualidade para dar suporte à tomada de decisões nos cuidados em saúde. Fisioter Pesq. 2010;17(1) 5 Mas, o que é mesmo uma revisão sistemática? De forma simples, tenta reunir todos os ensaios que se encaixam em critérios preestabelecidos a fim de responder uma questão clínica específica. Ainda, usa um método sistemático (como o próprio nome indica) e explícito de modo a minimizar erros e apresentar resultados confiáveis, para guiar a tomada de decisões. Para além dessa definição, ratificada pela Colaboração Cochrane, algumas características devem ser observadas: definição extremamente clara dos objetivos com critérios de elegibilidade dos ensaios clínicos, um método reprodutível, livre de vieses; uma busca ampla em bases de dados (nacionais e internacionais, sem restrição de língua) para identificar todos os estudos (significa todos mesmo) que se encaixariam nos critérios de elegibilidade; uma criteriosa avaliação da validade dos achados dos estudos incluídos (avaliação dos riscos de vieses); e uma apresentação minuciosa, uma síntese das características e achados dos estudos analisados. Quando a revisão recorre à análise estatística, dá-se o nome de metanálise: a combinação dos resultados dos desfechos primários e secundários fornece estimativas mais precisas dos efeitos de um determinado tratamento. Urge, portanto, a realização de revisões sistemáticas de tratamento ou prevenção, que sigam os preceitos estabelecidos pela Colaboração Cochrane. Nas instituições de ensino superior, às vezes se incorre em modismo ou banalização; muitos trabalhos de conclusão de curso, ou na própria pós-graduação stricto sensu, não primam pela qualidade da revisão. Tais estudos encontram possibilidade de publicação em nossas revistas. Isso é preocupante, pois o equívoco do trabalho encontra eco nas publicações, havendo disseminação do conhecimento sem qualidade. Nós todos – e começo por mim mesmo – professores, orientadores e fisioterapeutas precisamos urgentemente aumentar nossa vigilância epistêmica por meio da capacitação e instrução de todas as pessoas de nosso convívio acadêmico – e, assim, ao realizar estudos sérios, contribuir de fato para a profissão, para a prática baseada em evidências e para a redução das incertezas durante a tomada de decisão quanto à saúde funcional. Prof. Dr. Jefferson Rosa Cardoso Universidade Estadual de Londrina Programas de Mestrado Associados em Ciências da Reabilitação UEL-Unopar e Educação Física UEL-UEM 6 Fisioter Pesq. 2010;17(1) Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.7-12, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Concordância inter-observador em testes de avaliação proprioceptiva do joelho por goniometria Inter-rater agreement at knee proprioception tests by goniometry Alberito Rodrigo de Carvalho1, Márcio Edyr Rahn2, Maiara Diedrichs3, Andréia Coleto Lopes3, Franciele Gregol3, Renata Grochoski3, Leonardo Mascarello Pozzer3, Maurício Antônio Machado3 Estudo desenvolvido na Clínica Escola de Fisioterapia da Unipar – Universidade Paranaense, Toledo, PR, Brasil 1 Fisioterapeuta; Prof. Esp. do Curso de Fisioterapia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel, PR 2 Fisioterapeuta 3 Graduandos do Curso de Fisioterapia da Unipar ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Alberito R. de Carvalho Colegiado de Fisioterapia / Unioeste R. Universitária 2019 Jardim Universitário 85819-11 Cascavel PR e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO maio 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO dez. 2009 RESUMO: O propósito deste foi determinar o grau de concordância inter-avaliador de dois testes que mensuram a propriocepção do joelho por meio da goniometria, em uma amostra de universitárias (n=13; 23,8±6,4 anos). Mensurou-se a acurácia proprioceptiva pelos testes de percepção do limiar de movimento passivo lento (T1), movendo-se passivamente a perna até o ângulo alvo; e pelo teste de senso de posição articular (T2), solicitando-se movimento ativo até o ângulo alvo, previamente atingido passivamente. Os ângulos alvos foram sorteados e as medições feitas simultaneamente, de forma cega, por dois avaliadores, por meio de dois goniômetros idênticos posicionados nas faces medial e lateral do joelho. As participantes sinalizavam ao atingir o ângulo alvo, registrando-se, por ambos os avaliadores, os valores angulares efetivamente alcançados. A diferença (em números absolutos) entre o ângulo alvo e aquele alcançado foi considerada o “valor de erro”, que reflete a acuidade proprioceptiva. Determinou-se a concordância interavaliador pelo teste de concordância de Kappa; os valores encontrados (T1, Kappa=0,55; T2, Kappa=0,58) mostram concordância moderada. Como a concordância inter-avaliador nos dois testes foi moderada, conclui-se que a goniometria é limitada, na avaliação proprioceptiva de movimento do joelho. DESCRITORES: Articulação do joelho; Artrometria articular; Cinestesia; Propriocepção ABSTRACT: The purpose here was to determine inter-rater agreement in two tests that assess knee proprioception by goniometry, in a sample of 13 female university students (aged 23.8±6.4 years). Proprioceptive accuracy was measured by means of the passive movement threshold detection test (T1), where leg is passively moved to target angle, and the sense of joint position test (T2), in which active movement to (previously passively reached) target angle is required. Target angles were randomly selected; measurements were taken simultaneously by two (blinded) examiners at two identical goniometers placed at knee medial and lateral sides. When participants reported reaching the target angle, both evaluators recorded angle values actually reached. The difference (in absolute numbers) between target and reached angles was considered the “error value", which reflects proprioceptive acuity. Inter-rater agreement was determined by Kappa agreement test; Kappa values found were 0.55 at T1 and 0.58 at T2, pointing to moderate agreement. Since interrate agreement was moderate at both tests, it may be said that goniometry is of limited use for assessing knee proprioception. KEY WORDS: Arthrometry, articular; Kinesthesis; Knee joint; Proprioception Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):7-12 2010;17(1) 7 INTRODUÇÃO Definir o termo propriocepção tem gerado controvérsias na comunidade científica1,2. Contudo, parece haver consenso em considerar a propriocepção como a soma da cinestesia e do senso de posição articular, sendo cinestesia a capacidade de detectar o movimento articular (componente dinâmico), e o senso de posição articular a consciência da posição da articulação no espaço (componente estático)3-8. Défices proprioceptivos predispõem a distúrbios musculoesqueléticos por alterar o controle dos movimentos e impor estresse anormal nos tecidos relacionados9. Grob et al.7 concluem que não pode haver um teste que quantifique abrangentemente a propriocepção, pois cada teste avalia um ou outro componente da capacidade proprioceptiva, e que os termos propriocepção, senso de posição articular e cinestesia não devem ser utilizados como sinônimos. Dois testes têm sido freqüentemente usados para a avaliação da acuidade proprioceptiva do joelho: o teste de percepção do limiar de movimento passivo lento, que mensura a cinestesia, e o teste de reposicionamento, que avalia o senso de posição articular2,10,11. Embora esses testes preservem suas características essenciais em diversos estudos, notamse diferenças no que diz respeito ao instrumento de medição angular, variando desde recursos computadorizados até a goniometria tradicional12,13. Contudo, uma revisão sistemática 14 avaliou a confiabilidade e validade de vários instrumentos (goniometria, eletrogoniômetros, sistemas de análise de movimento bi e tridimensional, entre outros) que quantificam tanto o posicionamento angular quanto o movimento do joelho, mostrando que a goniometria, assim como outros instrumentos, podem ser utilizados com confiança para tais fins. Como em qualquer estudo que envolva medidas, ao avaliar propriocepção as ferramentas de mensuração devem ser confiáveis15. A goniometria tradicional é um método objetivo, simples e barato para avaliar a amplitude de movimento articular16,17 que geralmente apresenta maior reprodutibilidade intra-avaliador, quando comparada à reprodutibilidade 8 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):7-12 inter-avaliador 18,19. É pois relevante avaliar se a goniometria também é uma ferramenta confiável para as mensurações proprioceptivas, já que não há muitos testes clínicos pelos quais os profissionais possam quantificá-la. Para saber se o resultado de um instrumento de avaliação é confiável, faz-se necessário conhecer a concordância entre os resultados de dois ou mais avaliadores. Tal concordância é essencial para a reprodutibilidade de avaliações clínicas e pode ser obtida pelo teste de Kappa, que mede o grau de concordância além do que seria esperado pelo mero acaso20. Assim, o presente trabalho teve como objetivo determinar o grau de concordância inter-avaliador em dois testes que mensuram a acuidade proprioceptiva do joelho por meio da goniometria. METODOLOGIA Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Unipar – Universidade Paranaense. A amostra, de conveniência, compôs-se de 13 universitárias do Curso de Fisioterapia da Unipar (campus de Toledo, PR), com idade entre 18 e 45 anos e média de idade de 23,8±6,4 anos. A seleção foi feita por convite formal em seus locais de estudo, com informações básicas a respeito da pesquisa e a elegibilidade foi determinada após avaliação de triagem para identificação de fatores de exclusão. Antes do início do estudo todas as elegíveis assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. A aplicação dos dois testes durou cerca de 15 minutos e o período de aplicação dos testes, para avaliar todas as voluntárias, foi de duas semanas. O critério de inclusão adotado foi a disponibilidade para participar das avaliações nos dias e horários predeterminados. Não foram incluídas na amostra: a) voluntárias que relataram qualquer acometimento de ordem musculoesquelética nos membros inferiores, crônico ou agudo, ocorrido nos últimos cinco meses; b) as diabéticas, ou portadoras de doenças neurológicas; c) que relatassem uso de drogas que afetam o sistema nervoso central ou o equilíbrio, como sedativos ou ansiolíticos; d) etilistas crônicas ou que tivessem ingerido bebida alcoólica nas 12 horas que antecederam os testes. Procedimentos de avaliação As medições foram feitas simultaneamente por dois avaliadores independentes e previamente treinados para tal, denominados avaliadores A e B, sendo um estudante do último ano de graduação e o outro graduado há menos de um ano e matriculado em programa de pós-graduação em Fisioterapia; aconteceram sempre no período noturno. Ambos os avaliadores já haviam tido contato com os procedimentos de goniometria durante as atividades curriculares. Seu treinamento durou até que se sentissem plenamente seguros e capazes de aplicar os testes de forma ágil, o que levou cerca de um mês. Cada participante foi avaliada duas vezes (primeira e segunda avaliação), sempre a um intervalo de 48 horas. No primeiro dia, antes de cada teste, era feito um teste-demonstração, sem valor para registro, de forma a familiarizar as voluntárias com o procedimento e evitar erros de aprendizagem. Para a mensuração dos valores angulares, eram fixados ao membro inferior de cada avaliada dois goniômetros (aqui chamados goniômetros fixos, GF). O eixo de cada um permaneceu paralelo ao eixo articular do joelho; os dois braços foram fixados por talas de madeira presas a duas faixas de tecido de algodão inelástico e antialérgico com velcro nas duas extremidades para adaptação às distintas circunferências do membro inferior: uma extremidade fixada na parte distal da coxa e a outra, na parte proximal da perna (Figura 1). O membro inferior escolhido para os testes foi o dominante, identificado como a “perna do chute”. Todas as voluntárias identificaram a perna direita como dominante. As voluntárias sentaram-se na extremidade de uma maca de altura regulável, de forma que o membro inferior não-dominante ficou estendido e servindo de apoio para sustentação de peso (fora da maca) e o dominante ficou balançando livremente; os dois GFs idênticos eram ajustados à articulação, Carvalho et al. Avaliação proprioceptiva por goniometria Durante os testes, as voluntárias recebiam estímulos verbais para se concentrar na posição da articulação do joelho e, assim, evitar que o tempo gasto no movimento servisse de estratégia para o reposicionamento. Os avaliadores mantiveram, subjetivamente, uma velocidade média próxima de dois segundos para cada 10º. Todas as movimentações passivas durante os testes foram feitas sempre pelo avaliador A. Os avaliadores se posicionaram, para coleta, voltados perpendicularmente ao eixo do goniômetro, de forma que se mantiveram cegos quanto aos resultados obtidos um pelo outro. Os registros foram feitos por uma equipe de apoio, que mantinha comunicação apenas escrita com os avaliadores, e estes não conversavam entre si. Figura 1 Ilustração: posição da avaliada, posicionamento dos goniômetros e dos avaliadores durante os testes cada qual por um examinador, um na face medial e outro na face lateral do joelho (Figura 1). As participantes tiveram os olhos vendados para remover informações visuais. A coleta simultânea pelos dois avaliadores (Figura 1) foi necessária para assegurar que os dados registrados fossem os mesmos, pois, se os testes fossem executados de forma separada ou subseqüente, não haveria como garantir que as voluntárias reproduzissem exatamente os mesmos ângulos, acarretando um viés metodológico. O protocolo de registro dos dados dos dois testes usando goniometria seguiu metodologia proposta no trabalho de Carvalho et al.13. Para a mensuração da percepção do limiar de movimento passivo lento (T1) estabeleceram-se dois ângulos, de forma aleatória e por sorteio, em um universo de seis ângulos entre 10º e 60º a intervalos de 10º, sendo um ângulo para extensão e o outro para flexão de joelho. Em seqüência, partindo de uma angulação de 90° de flexão, a perna da voluntária foi movida passivamente em movimento de extensão até chegar à angulação pré-determinada pelo sorteio e, nesta, o membro mantido durante 10 segundos e depois retornado à posição neutra. Após cinco segundos, a perna foi movida novamente, e por três vezes consecutivas com intervalos de cinco segundos entre elas, de forma passiva e lenta em direção ao mesmo ângulo, e a voluntária foi previamente instruída a comunicar ao examinador para que parasse o movimento quando sentisse que sua perna atingia a posição alvo. O ângulo alcançado foi observado no goniômetro e registrado pelos examinadores. Posteriormente, o teste repetiuse para o ângulo estabelecido na flexão do joelho. Para aplicar o teste de senso de posição articular (T2), manteve-se o posicionamento anterior e a voluntária permaneceu vendada. Três ângulos foram sorteados de forma idêntica ao T1 e distribuídos, também por sorteio, entre os movimentos de flexão (um ângulo) e extensão (dois ângulos) da articulação do joelho. Em seqüência, uma dessas posições angulares foi reproduzida em movimento passivo. Ao se alcançar o ângulo predeterminado pelo sorteio, mantinha-se a posição por 10 segundos, e o membro era então devolvido à posição neutra. Após cinco segundos a voluntária foi instruída a realizar ativamente o movimento e pará-lo ao atingir a posição alvo, por três vezes consecutivas, com intervalos de cinco segundos entre cada repetição. Os ângulos alcançados foram observados e registrados pelos examinadores. O mesmo foi feito para os dois outros ângulos preestabelecidos. Análise estatística A variável deste estudo foi a diferença, em valores absolutos, entre o ângulo sorteado e o ângulo indicado (T1) ou alcançado (T2) pela voluntária. Definiuse essa diferença como “valor de erro”. Os valores obtidos pelos examinadores em cada uma das avaliações individualmente foram comparados pelo teste T não-pareado, quando os dados apresentaram distribuição normal, ou pelo Mann-Whitney, quando os dados não apresentaram distribuição normal. O grau de concordância foi determinado pelo teste de concordância de Kappa, sendo os cálculos efetuados no site do Laboratório de Epidemiologia e Estatística da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia 21. Para tal, os dados angulares foram agrupados, como exigência do método estatístico, em duas categorias: categoria ß (valor de erro ≤ 6) e categoria γ (valor de erro > 6). Como não se encontraram trabalhos prévios que fornecessem diretrizes para a elaboração dessa categorização, esta se deu de forma empírica. Para interpretar os valores de Kappa, considerou-se a concordância: <0 sem concordância; 0-0,19 concordância pobre; 0,20-0,39 fraca; 0,40-0,59 moderada; 0,60-0,79 substancial; e 0,80-1,00 concordância quase perfeita 21. Para todos os tratamentos estatísticos adotou-se α=0,05. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):7-12 2010;17(1) 9 RESULTADOS Os valores “de erro” médios registrados pelos dois avaliadores, nas duas avaliações, são apresentados na Tabela 1. As comparações foram feitas no intuito de verificar se haveria discrepância significativa entre os avaliadores, o que se verificou apenas na primeira avaliação do T2. Tabela 1 Valores de “erro” (em graus, média ± desvio padrão) obtidos pelos avaliadores A e B nas duas avaliações (1a e 2a) no teste de percepção de movimento passivo lento (T1) e no teste de senso de posição articular (T2), e valor de p da comparação entre os dois avaliadores Avaliação T1 T1 T2 T2 1a 2a 1a 2a Avaliador A B 6,64±4,4 6,38±5,02 5,12±4,9 5,71±4,5 6,91±5,1 6,17±4,3 6,18±4,9 4,94±4,1 p 0,726 0,785 0,03 0,211 T1 = Teste de percepção do limiar de movimento passivo lento; T2 = teste de senso de posição articular Considerando-se conjuntamente as medidas obtidas nas duas avaliações de cada teste, os valores “de erro” médios e o grau de concordância entre os avaliadores podem ser visualizados na Tabela 2. Tabela 2 Teste T1 T2 específicos para determinação da confiabilidade, e não da concordância15,16,18. Talvez essa dificuldade exista porque, diferentemente das avaliações das amplitudes de movimento, cujo limite máximo deveria ser o mesmo para diferentes medidas, avaliadores ou técnicas de mensuração, nos testes proprioceptivos não há como se determinar um ângulo limite que o sujeito vá reproduzir fielmente em todas as mensurações, já que o quanto o sujeito vai se aproximar ou afastar do ângulo alvo depende de sua percepção e não de limitações estruturais, como encurtamento muscular ou bloqueio articular. Assim, não foi possível, no presente estudo, avaliar a concordância intra-observador e os dois avaliadores sempre registraram simultaneamente a mesma medida. Contudo, justifica-se a opção, no presente estudo, pela goniometria como ferramenta de avaliação proprioceptiva, por ser esta um instrumento bastante utilizado no dia-dia clínico dos fisioterapeutas, por ter menor custo e por ser validado cientificamente22-26. Neste estudo, o teste do senso de posição articular (T2) revelou concordância inter-avaliador ligeiramente maior em relação ao teste de percepção do limiar de movimento passivo lento (T1). Um dos motivos que pode ter influenciado os resultados encontrados para as concordâncias inter-avaliadores foi a diferença significativa verificada para os valores de “erro” entre os avaliadores durante a primeira avaliação do T2, o que Valores de “erro” (em graus, média ± desvio padrão) obtidos pelos avaliadores A e B no conjunto das avaliações de cada teste (T1 e T2) e concordância entre os dois avaliadores Avaliador A Avaliador B 6,51±4,7 5,42±4,7 6,54±4,7 5,56±4,5 Kappa 0,55 0,58 Concordância p IC 95% <0,001 <0,001 0,70 / 0,39 0,71 / 0,46 escore moderada moderada T1 = Teste de percepção do limiar de movimento passivo lento; T2 = teste de senso de posição articular; IC 95% = intervalo de confiança de 95% DISCUSSÃO Revisando a literatura, verificou-se que a maior parte dos estudos sobre propriocepção de joelho utilizaram instrumentos que não a goniometria tradicional, além de aplicar testes estatísticos 10 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):7-12 leva a crer que o T2 poderia ter uma concordância ainda maior caso as médias tivessem sido semelhantes estatisticamente. Dois aspectos que podem ter favorecido a melhor concordância interavaliador para o T2 é que, neste teste, solicitou-se mobilização ativa do joelho, o que indiretamente pode ter ajudado tanto na estabilização das tiras de velcro presas à coxa da avaliada e na estabilização do braço cefálico do goniômetro, quanto na maior geração de informações provenientes dos fusos musculares, pela contração ativa. Diferentes formas de posicionar o goniômetro entre os avaliadores também podem conduzir a erros pela dificuldade em identificar o centro de rotação do joelho, já que este muda com o movimento articular23,15. Uma limitação do presente estudo foi não ter adotado como critério de não-inclusão a presença de desalinhamentos nos membros inferiores, que pudesse modificar o centro de rotação do joelho e, com isso, induzir a vieses de medidas; muito embora, por avaliação subjetiva, nenhuma das voluntárias tivesse apresentado desalinhamento articular visualmente notório. Considera-se, ainda, como limitação do estudo a ausência de pontos anatômicos de referência para o posicionamento do goniômetro na face medial do joelho e o fato de apenas um avaliador estar envolvido na movimentação do membro do voluntário durante os testes. A categorização dos dados angulares foi necessária para o tratamento estatístico, já que o teste aplicado para verificar o grau de concordância exigia esse procedimento. Como mencionado, não foi encontrado na literatura parâmetro de referência para tal categorização, utilizando-se um valor angular de erro arbitrário de seis graus. Contudo, podese verificar que esse valor adotado como limite de categorização é muito próximo dos valores de “erro” encontrados em outras pesquisas com sujeitos saudáveis, nesses mesmos testes. No trabalho de Carvalho et al.13, que avaliou o efeito de um programa de treinamento proprioceptivo preventivo sobre a propriocepção de joelho em atletas de futebol, usando os mesmos testes e instrumento de avaliação do presente estudo, tanto o grupo experimental quanto o grupo controle foram compostos por indivíduos saudáveis e os valores angulares médios de erro pré-intervenção foram de 8,89° e 6,89° no T1 e 7,11° e 7,58° no T2 nos respectivos grupos. Entretanto Lobato 27 avaliou a propriocepção do Carvalho et al. joelho em sujeitos saudáveis (grupo controle) e com lesão do ligamento cruzado anterior usando os mesmos testes, porém o instrumento de avaliação foi o dinamômetro isocinético e os ângulos alvos foram pré-estipulados em 60° e 30° (extensão completa = 0°). Os valores médios de erro mínimo e máximo obtidos dentre todas as mensurações nas avaliações iniciais e após três meses, tanto do grupo com lesão (medidas do membro envolvido e do não-envolvido) quanto do grupo controle (medidas dos membros dominante e não-dominante), foram respectivamente 3,8°/6,4° e 3,8°/ 7,4° no T1 e 3,6°/6,8° e 4,7°/8,8° no T2. Assim, embora o valor de categorização no presente estudo continue sendo arbitrário, infere-se que ele reflita um valor médio de normalidade para sujeitos com acuidade proprioceptiva íntegra. Contudo, essa proposição ainda carece Avaliação proprioceptiva por goniometria de ser investigada. Sugere-se, em estudos futuros, que a concordância dos testes aqui utilizados seja estabelecida também por instrumentos de avaliação mais precisos; e esses resultados sejam comparados aos fornecidos pela goniometria, para verificar se a utilização clínica desse recurso simples, prático e barato, para determinação da acuidade proprioceptiva, é pertinente. O uso do eletrogoniômetro para esse fim parece ser uma alternativa, pois o acesso a essa ferramenta é mais acessível do que outros equipamentos, como os isocinéticos; e sua validação e confiabilidade foram reconhecidas, o que pode minimizar erros. A contribuição imediata deste trabalho é que, para uso clínico, como medida norteadora das condutas terapêuticas, a aplicação da goniometria como instru- mento de avaliação proprioceptiva seja aceitável, já que não se exige, nessa situação, exatidão dos resultados. Contudo, como instrumento de pesquisa, deve ser visto com cautela e substituído sempre que possível por outros instrumentos mais precisos, até que cresça o corpo de evidências científicas a seu favor. CONCLUSÃO A concordância inter-avaliador da propriocepção de joelho, avaliada por goniômetro adaptado, revelou-se moderada, tanto no teste de percepção do limiar de movimento passivo lento (T1) quanto no teste de senso de posição articular (T2), sugerindo que a utilização da goniometria como ferramenta para esses testes é limitada. REFERÊNCIAS 1 Lephart SM, Riemann BL, Fu FH. Proprioception and neuromuscular control in joint stability. Champaign, IL: Human Kinetics; 2000. 2 Stillman BC. Making sense of proprioception: the meaning of proprioception, kinaesthesia and related terms. Physiotherapy. 2002;88(11):667-76. 3 Gandevia SC, Burke D. Does the nervous system depend on kinesthetic information to control natural limb movements? Behav Brain Sci. 1992;15:614-32. 4 Pinto RVB, Andrade MAP, Clarete TF, Vieira S, Sampaio TCV, Moraes GFS, et al. Propriocepção após artroplastia do joelho: estudo comparativo entre pacientes com próteses estabilizadas e não-estabilizadas posteriormente. Rev Bras Ortop. 1997;32(2):153-6. 8 Lobato DFM, Santos GM, Coqueiro KRR, MattielloRosa SMG, Terruggi AJ, Bevilaqua DG, et al. Avaliação da propriocepção do joelho em indivíduos portadores de disfunção femoropatelar. Rev Bras Fisioter. 2005;9(1):57-62. 9 Birmingham TB, Kramer JF, Kirkley A, Inglis T, Spaulding SJ. Vandervoort AA. Association among neuromuscular and anatomic measures for patients with knee osteoarthritis. Arch Phys Med Rehabil. 2001;82(8):1115-8. 10 Stillman BC, Tully EA, Mcmeeken JM. Knee joint mobility and position sense in healthy young adults. Physiotherapy. 2002;88(9):553-9. 11 Hopper DM. Functional measurement of knee joint position sense after anterior cruciate ligament reconstruction. Arch Phys Med Rehabil. 2003;84(6):86872. 5 Bouët V, Gahéry Y. Muscular exercise improves knee position sense in humans. Neurosci Lett. 2000;289:143-6. 6 Lönn J, Grenshaw AG, Djupsjobacka M, Johansson H. Reliability of position sense testing assessed with a fully automated system. Clin Physiol. 2000;20(1):30-7. 12 Reider B, Arcand MA, Diehl LH, Mroczek K, Abulencia A, Stroud C, et al. Proprioception of the knee before and after cruciate ligament reconstructions. Arthroscopy. 2003;19(1):2-12. 7 Grob KR, Kuster MS, Higgins SA, Lloyd DG, Yata H. Lack of correlation between different measurements of proprioception in the knee. J Bone Joint Surg. 2002;84B:614-8. 13 Carvalho AR, Piccinin MIW, Bley AS, Faria APG, Iglesias Soler E, Dantas EHM. Evaluación de un protocolo de prevención sobre propriocepción de futbolistas. RED – Rev Entrenam Deport. 2007;21(3):5-9. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):7-12 2010;17(1) 11 Referências (cont.) 14 Piriyaprasarth P, Morris ME. Psychometric properties of measurement tools for quantifying knee joint and movement: a systematic review. Knee. 2007;14:2-8. 15 Ageberg E, Flenhagen J, Ljung J. Test-retest reliability of knee kinesthesia in healthy adults. 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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.13-7, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Eficácia da aromaterapia na redução de níveis de estresse e ansiedade em alunos de graduação da área da saúde: estudo preliminar Effectiveness of aromatherapy in reducing stress and anxiety levels in undergraduate health science students: a preliminary study Cassandra Santantonio de Lyra1, Larissa Sayuri Nakai2, Amélia Pasqual Marques3 Estudo desenvolvido no Fofito/ FM-USP – Depto. de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1 Fisioterapeuta Ms. pósGraduanda em Psicologia Social no Instituto de Psicologia da USP 2 Fisioterapeuta 3 Fisioterapeuta; Profa. LivreDocente do Fofito/FM-USP ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Cassandra Santantonio de Lyra R. Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO maio 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO dez. 2009 RESUMO: Este estudo teve como objetivo verificar a eficácia de aromaterapia na diminuição de níveis de estresse e ansiedade (traço e estado) de alunos de graduação de cursos na área da saúde. Participaram do estudo 36 sujeitos, com idade entre 18 e 29 anos, que foram divididos entre os que receberam tratamento (grupo aroma, n=18) e o grupo controle (n=18). Os sujeitos foram avaliados quanto a níveis de estresse e ansiedade antes e após o período de intervenção, pela Lista de Sintomas de Estresse e pelo Inventário de Ansiedade Traço e Estado. O tratamento de aromaterapia consistiu em sete sessões (duas vezes por semana) de dez minutos de inalação com uma sinergia de óleos essenciais elaborada especificamente. Os escores de estresse e ansiedade antes e depois do tratamento foram comparados estatisticamente, com nível de significância de 5% (p<0,05). O grupo aroma apresentou redução significativa dos níveis de estresse (de 24%) e ansiedade (de 13% e 19%, p<0,05), enquanto no grupo controle houve uma diminuição significante, embora menor (de 11%), apenas no nível de estresse. A aromaterapia mostrou–se eficaz na redução dos níveis de estresse e ansiedade em estudantes da área da saúde. No entanto, ainda são necessários mais estudos para identificar as causas dos níveis medidos e, também, os mecanismos de ação dos óleos essenciais em sua redução. DESCRITORES: Ansiedade/terapia; Aromaterapia; Estresse psicológico; Estudantes de ciências da saúde ABSTRACT: The purpose of this study was to assess the efficacy of aromatherapy in decreasing stress and anxiety levels in undergraduate health science students. Thirtysix students aged 18 to 29 were divided into those who received treatment (aroma group, n=18) and a control group (n=18). All subjects were assessed as to stress and anxiety levels before and after the treatment, by means of the List of Stress Symptoms and the State-Trait Anxiety Inventory. The aromatherapy treatment consisted in twice weekly, 10-minute inhalations of a synergy of essential oils made specifically for this study, for a total of 7 sessions. Stress and anxiety scores measured before and after treatment were statistically compared, with significance level set at 5% (p<0.05). The aroma group showed a significant (p<0,05) decrease in stress (less 24%) and anxitey (less 13% and 19%) levels, while in control group only a significant, though lesser (11%) stress level decrease could be noticed. Aromatherapy thus proved effective in reducing stress and anxiety levels in graduate health students, but there is still great need to further studies to identify causes of the levels assessed, as well as the mechanisms whereby essential oils might have reduced them. KEY WORDS: Anxiety/therapy; Aromatherapy; Stress, psychological; Students, health occupations Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):13-7 2010;17(1) 13 INTRODUÇÃO O estresse é uma reação comum do organismo frente a determinados estímulos externos ou internos (situações reais ou imaginárias de ameaça). As respostas podem variar desde uma reação de emergência, como fantasia e formação reativa, até somatização, retraimento parcial, ruptura transitória do ego, psicose e suicídio1. Quando o estresse se torna crônico, somam-se outros sintomas: aumento do funcionamento da glândula supra-renal (que aumenta o risco de infarto) e redução do funcionamento do timo e de gânglios linfáticos (levando à depressão do sistema imune). Um dos principais presságios do estresse é a ansiedade, uma apreensão deflagrada por algo que o indivíduo considera uma ameaça1. Nos tempos primitivos acredita-se que esse mecanismo levava o ser humano a ter medo e fugir de perigos concretos. No entanto, atualmente, com menos perigos concretos, a ansiedade se refere principalmente a estados psicológicos, como adequação social e êxito competitivo. Alguns estudos indicam que alunos de graduação sofrem de estresse e ansiedade1. Ao longo da vida universitária esses níveis tendem a aumentar e podem ser encontrados tanto em estudantes quanto em profissionais, principalmente da área da saúde. Esses níveis elevados de estresse e ansiedade podem ser um fator negativo para a qualidade de vida e um obstáculo para o desempenho durante e após a graduação, uma vez que o estresse do profissional influi no bem-estar físico dos pacientes2. Fica clara a necessidade de desenvolver programas de atendimento a essa população, visando diminuir esses níveis elevados de estresse e ansiedade e, conseqüentemente, melhorar a qualidade de vida e o desempenho dos estudantes e profissionais. Nesse âmbito, a utilização de terapias complementares é interessante, principalmente pelo baixo custo, menos efeitos colaterais e acessibilidade. Algumas dessas terapias podem ser realmente eficazes, faltando apenas mais estudos e comprovação científica de seus mecanismos de ação, porém outras são apenas crendices e superstições populares3, que não apresentam efeitos 14 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):13-7 consideráveis. Além disso, ao mesmo tempo que podem trazer grandes benefícios sociais e pessoais, quando aplicadas de forma inadequada podem trazer problemas4,5. Por isso são cada vez mais necessárias pesquisas científicas com terapias complementares. Um exemplo importante desse tipo de terapia é a aromaterapia, que consiste na aplicação terapêutica de óleos essenciais. No que se refere a estresse e ansiedade, estudos mostraram a utilidade da aromaterapia, obtendo redução dos níveis de ansiedade e estresse após terapias com óleos essenciais em diversos grupos sociais6-11. No entanto, não há muitos estudos conclusivos sobre a eficácia da aromaterapia em alunos de graduação. Assim, este estudo teve como objetivo verificar a eficácia da aromaterapia na diminuição de níveis de estresse e ansiedade (traço e estado) de alunos de graduação de cursos da área da saúde. METODOLOGIA Este foi um estudo do tipo ensaio clínico. Participaram 36 voluntários de ambos os sexos com idade entre 18 e 29 anos, selecionados de uma amostra de 228 alunos de graduação de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. A todos foram aplicados um questionário de dados gerais, a Lista de Sintomas de Estresse (LSE) e o Inventário de Ansiedade Traço e Estado (Idate). Foram critérios de inclusão ter escore mínimo no LSE de 60 (nível de estresse alto ou altíssimo) e escore mínimo no Idate de 33 (nível de ansiedade médio ou grave) para ansiedade-traço e ansiedadeestado. Os critérios de exclusão foram gravidez, epilepsia, uso de medicamentos psiquiátricos ou de outros tratamentos para estresse ou ansiedade. O tamanho da amostra foi calculado usando 80% de poder estatístico para detectar 30% de diferença no grupo submetido à intervenção. O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética do Hospital das Clínicas e todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. A ansiedade foi avaliada pelo Inventário de Ansiedade Traço e Estado – Idate12. Trata-se de um questionário autoaplicável composto por duas escalas: ansiedade-traço (20 afirmações descrevendo estado geral) e ansiedade-estado (20 afirmações descrevendo estado atual). Cada afirmação recebe escore de 1 a 4 e a pontuação em cada questionário varia de 20 a 80, oferecendo uma classificação do nível de ansiedade em: baixa (20 a 33), média (33 a 49) e alta (49 a 80). O estresse foi avaliado pela Lista de Sintomas de Estresse – LSE13, que arrola 60 sintomas psicofisiológicos e psicossociais de estresse, com escore de 0 a 4 para cada item; a pontuação total varia de 0 a 180, oferecendo as classificações de nível de estresse: nulo (0 a 11), baixo (12 a 29), médio (30 a 59), alto (60 a 120) e altíssimo (acima de 120). Depois que os questionários LSE e Idate foram aplicados aos 228 voluntários, apenas aqueles que apresentaram escore mínimo de 60 no LSE e escore mínimo de 33 nas duas escalas do Idate foram convidados a participar do estudo. Os 36 assim selecionados foram aleatoriamente divididos nos grupos aroma (n=18), submetido a sete sessões de aromaterapia, e controle (n=18), que não receberam tratamento. Os sujeitos do grupo aroma receberam tratamento aromaterapêutico para estresse e ansiedade, que consistiu em 7 sessões de 10 minutos de inalação, num tempo total de terapia de 15 minutos, duas vezes por semana, com 5 ml de soro fisiológico acrescido de 2 gotas da sinergia proposta, descrita a seguir, com inalador elétrico. Os sujeitos eram instruídos a ficarem deitados em decúbito lateral numa maca (numa sala sem distraidores como barulho, movimento ou imagens de televisão), com o inalador bem acoplado ao rosto e respirar pelo nariz. Em aromacologia, chama-se “sinergia” a mistura de óleos essenciais que atuam de forma sinérgica. Para este trabalho foi elaborada uma sinergia aromaterapêutica baseada nos usos tradicionais de alguns óleos essenciais. No tratamento aromaterapêutico para estresse e ansiedade são indicados os seguintes óleos essenciais: lavanda (Lavandula officinalis)14-17, laranja azeda (Citrus aurantium var. amara)14, ilang-ilang Lyra et al. Aromaterapia no estresse e ansiedade (Cananga odorata)14,16,18 e cedro (Cedrus atlantica)16,18. A sinergia elaborada para o estudo consistiu em 10% laranja azeda, 50% lavanda, 20% ilang-ilang e 20% cedro. A sinergia foi preparada de uma única vez, para assegurar homogeneidade no tratamento. Foram respeitadas as diretrizes de formação de sinergia aromaterapêutica e os limites de segurança orientados pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa em Aromaterapia e pela Abraroma – Associação Brasileira de Aromaterapia e Aromacologia19; a sinergia foi armazenada segundo as orientações desta última. Ao final do tratamento (após aproximadamente um mês), os mesmos dois questionários foram aplicados a todos os sujeitos, de ambos os grupos. Os dados demográficos da amostra foram apresentados de forma descritiva (em média, desvio padrão e porcentagem). As variáveis relacionadas aos sintomas foram comparadas antes e após a intervenção usando o teste t de Student. Toda a análise estatística foi realizada com 5% de significância. Tabela 2 Níveis de estresse, ansiedade-traço e ansiedade-estado (média ± desvio padrão) iniciais e finais do grupos aroma e controle, e valor de p da comparação entre iniciais e finais Grupo aroma (n=18) Variável Grupo controle (n=18) Inicial Final p Inicial Final p Estresse 86±22 65±21 0,007 78±15 69±24 0,015 Ansiedade (traço) 54±8 48±8 0,023 54±10 51±8 0,421 Ansiedade (estado) 54±10 44±9 0,006 52±8 52±11 0,960 45% alunas do curso de Fonoaudiologia; no total da amostra, houve maior participação de alunos do terceiro ano. Houve 100% de adesão ao tratamento proposto de aromaterapia e nenhuma desistência. A Tabela 2 mostra os valores médios obtidos nos testes pelos dois grupos, antes e após o tratamento. Foi notada diminuição estatisticamente significante dos níveis de estresse e ansiedade no grupo aroma (p<0,05) após o tratamento e, no grupo controle, apenas no nível de estresse (p=0,015). DISCUSSÃO RESULTADOS Este estudo teve como objetivo verificar a eficácia da aromaterapia em A Tabela 1 mostra os dados demográ- reduzir os níveis de estresse e ansiedade ficos da amostra. No grupo aroma todas (traço e estado) de alunos de graduação eram do sexo feminino e solteiras, sendo de cursos da área da saúde. Houve melhora significativa dos níveis de Tabela 1 Dados demográficos dos grupos aroma estresse e ansiedade no grupo tratado com aromaterapia quando (GA, n=18) e controle (GC, n=18) comparado ao grupo controle. Característica GA GC Idade (anos) média±dp 21±2 22±2 Altura (cm) média±dp 167±6 164±7 Peso (kg) média±dp 62±12,6 58,1±10,7 n % n % Masculino 0 0 1 6 Sexo Feminino 18 100 17 94 Solteiro 18 100 17 94 Estado civil Casado 0 0 1 6 Fono 8 45 4 22 Curso de Fisio 6 33 4 22 graduação TO 4 22 10 56 1° ano 5 28 1 5 2° ano 2 11 5 28 Ano letivo 3° ano 8 44 9 50 4°ano 3 17 3 17 dp = desvio padrão; Fono = Fonoaudiologia; Fisio = Fisioterapia; TO = Terapia Ocupacional Supõe-se que este resultado possa ser atribuído a efeitos descritos na literatura, mas que não foram exaustivamente testados em pesquisas científicas. Alguns exemplos dessas explicações são: • os efeitos tônicos (revigorantes) e calmantes sistêmicos dos óleos essenciais após absorção pelo epitélio pulmonar e no sistema nervoso central6; • efeitos emocionais dos óleos essenciais no sistema límbico via bulbo olfatório5,19; • diminuição de pressão arterial, aumento da temperatura da pele acompanhada de subjetivo aumento de calma e relaxamento9; • efeitos depressores dos óleos essenciais sobre o sistema nervoso central20; • efeito anti-estresse dos óleos essenciais via modulação da atividade de 5-HT e DA10. No grupo aroma, foi observada diminuição dos níveis de ansiedade-estado (no momento de responder ao questionário) mais intensa do que de ansiedadetraço (na vida em geral). A concentração de óleo essencial no sangue diminui gradativamente após cada sessão, pois o organismo metaboliza o óleo essencial e excreta-o aos poucos, como mostrado por Tisserand5 (sobre um estudo de Jäger et al. de 1992). Com isso, os efeitos fisiológicos da concentração do óleo essencial no sangue devem diminuir leve e gradualmente após cada sessão de terapia5. Como os questionários foram aplicados imediatamente após a última sessão de inalação (e portanto a concentração de óleo essencial deveria estar mais alta do que mais tarde), a ansiedade-estado, relativa ao exato momento em que se responde o questionário, mostrou-se menor do que a ansiedadetraço, referente à ansiedade na vida em geral. Embora no grupo aroma não tenha havido alteração na classificação do nível de estresse após o tratamento, houve uma diminuição significativa (de 24%) desse nível. Isso mostra que a eficácia do tratamento não pode ser verificada somente pela classificação sugerida pelos autores, mas também pelo valor numérico dos níveis. O grupo controle teve uma melhora de apenas 11%, su- Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):13-7 2010;17(1) 15 gerindo que o tratamento aqui proposto seja eficaz na redução dos níveis de estresse quando comparado a nenhuma intervenção. Sugere-se ainda que a melhora do grupo controle se deva ao fato de esse grupo ter respondido o questionário final após a última semana de provas do semestre (enquanto o grupo tratado respondeu o questionário final durante a semana de provas do semestre), o que pode ter levado ao menor nível de estresse dos alunos. No grupo aroma, os níveis de ansiedade traço e estado apresentaram redução de 13 e 19%, respectivamente, passando da classificação “alta” a “média”. Pode-se pois inferir que os níveis de ansiedade tendem a diminuir mais intensamente do que os níveis de estresse. Ainda, é possível sugerir que haja uma relação entre estresse e ansiedade, e que a redução de um pode acarretar diminuição do outro, mas esta afirmação só pode ser confirmada por estudos futuros. A duração e o número de sessões na aromaterapia não estão padronizados. Hwang8 aplicou mais sessões de aromaterapia e Bradley7 aplicou terapias mais longas do que no presente estudo. Há ainda estudos sobre tratamento continuado em domicílio21 e os que comparam os efeitos de óleos essenciais diferentes8,22. No entanto, não há estudos que comparem variações desses parâmetros (tempo de terapia, duração de terapia, número de sessões, tratamento continuado em domicílio e óleos essenciais diferentes) a fim de verificar as respectivas influências na eficácia do tratamento. Neste estudo, o tempo de terapia foi fixado (em 10 minutos de inalação); e, em mais da metade das aplicações, sobrou solução de soro fisiológico com a sinergia no frasco do inalador. Pode-se 16 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):13-7 supor que, como sobrou óleo essencial no frasco, os efeitos não atingiram o ponto máximo que poderiam ter atingido, caso todo o conteúdo tivesse sido inalado. Segundo Tisserand5, em média 70% do óleo essencial inalado é efetivamente absorvido pelo organismo; porém, durante o processo de inalação o indivíduo respira, tipicamente, numa proporção de 1:2 de inspiração-expiração, o que faz com que 2/3 do produto que sai pelo inalador nem passe pelos pulmões. Assim, do terço efetivamente inalado, 70% é absorvido, ou seja, no caso deste estudo, das três gotas colocadas no inalador em cada inalação, apenas uma gota passou pelo pulmão e em média 0,7 gota foi absorvida. Segundo o mesmo autor, o mínimo de óleo essencial absorvido pelo organismo de um adulto saudável para que produza efeito é aproximadamente de 10 gotas em uma sessão. No entanto, neste estudo, apesar de provavelmente apenas 0,7 gota de óleo essencial ter sido absorvida, houve diminuição dos níveis de estresse e ansiedade. Neste estudo foi observada a janela terapêutica (entre os limites mínimo eficaz e máximo não-tóxico) da Abraroma19 e do Instituto de Ensino e Pesquisa em Aromaterapia, que indicam aproximadamente 2 gotas de óleo essencial por inalação. Quando se comparam as indicações de Tisserand e da Abraroma, verifica-se que há informações consistentes quanto aos níveis tóxicos5 e máximos terapêuticos para a utilização de óleos essenciais, mas não há conhecimento sobre os mínimos eficazes. Por isso, seria interessante realizarem-se mais estudos para identificar as dosagens mínimas eficazes, a fim de formar uma janela terapêutica melhor definida; também cumpriria verificar os efeitos de cada óleo essencial isoladamente, comparando-se seus efeitos aos de sinergias aromaterapêuticas. Uma limitação deste estudo foi não ter avaliado a qualidade de vida nem o desempenho acadêmico dos alunos de graduação após a diminuição dos níveis de estresse e ansiedade, havendo somente relatos subjetivos de melhora. Dessa forma, ainda são necessários mais estudos para determinar a abrangência dos efeitos da aromaterapia no tratamento de estresse e ansiedade. É importante pesquisar mais profundamente os elementos que podem ter causado a diminuição dos níveis de estresse e ansiedade. Poder-se-ia argumentar que a redução dos níveis de estresse e ansiedade deste estudo se explicariam pelo tempo de relaxamento durante a inalação (embora este tenha sido só de meia hora por semana) e não necessariamente pelo efeito dos óleos essenciais, mostrando a necessidade de futuros estudos comparando inalação sem princípio ativo com inalação com princípio ativo. Além disso, é importante esclarecer o modo pelo qual os óleos essenciais atuam, o que poderia ser pesquisado com análises metabólicas e físicas, por exemplo. CONCLUSÃO O tratamento proposto de aromaterapia foi eficaz na diminuição dos níveis de estresse e ansiedade (traço e estado) dos alunos de graduação da área da saúde, tendo havido redução significante de 24% no nível de estresse, 11% nos níveis de ansiedade traço e 18% de estado no grupo tratado, enquanto no grupo controle houve apenas uma redução menor (de 11%), embora significante, no nível de estresse. Fisioter Pesq. 2010;17(1):12-6 Lyra et al. Aromaterapia no estresse e ansiedade REFERÊNCIAS 1 Baldassin SP, Martins LC, Andrade AG. Traços de ansiedade entre estudantes de medicina. Arq Med ABC. 2006;31(1):27-31. 2 Alesii A, Damiani C, Pernice D. The physical therapistpatient relationship: does physical therapists’ occupational stress affect patients’ quality of life? Funct Neurol. 2005;20(3):121-6. 3 Perry R, Dowrick CF. Complementary medicine and general practice: an urban perspective. Complement Ther Med. 2000;8:71-5. 4 Maddocks-Jennings W. Critical incident: idiosyncratic allergic reactions to essential oils. Complement Ther Nurs Midwifery. 2004;10(1):58-60. 5 6 7 8 9 Tisserand R, Balacs T. Essential oil safety: a guide for health care professionals. London: Churchill Livingstone; 2009. Yamada K, Mimaki Y, Sashida Y. Effects of inhaling the vapour of Lavandula burnatii super-derived essential oil and linalool on plasma adrenocorticotropic hormone (ACTH), catechpolamine and gonadotropin levels in experimental menopausal female rats. Biol Pharm Bull. 2005;28(2):378-9. Bradley BF, Starkey NJ, Brown SL, Lea RW. Anxiolytic effects of Lavandula angustifolia odour on the Mongolian gerbil elevated plus maze. J Ethnopharmacol. 2007;111(3):517-25. Hwang JH. The effects of the inhalation method using essential oils on blood pressure and stress responses of clients with essential hypertension [abstract]. Taehan Kanho Hakhoe Chi. 2006;36(7):1123-34. Hongratanaworakit T, Buchbauer G. 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Int J Neurosci. 2007;117(9):1281-7. 22 Lazarini CA, Uema AH, Brandão GM, Guimarães AP, Bernardi MM. Croton zehntneri essential oil: effects on behavioral models related to depression and anxiety. Phytomedicine. 2000;7(6):477-81. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):13-7 2010;17(1) 17 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.18-23, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Comparação entre as técnicas de vibrocompressão e de aumento do fluxo expiratório em pacientes traqueostomizados Comparison between rib-cage compression and expiratory flow enhancement techniques in tracheostomised patients Antonio Adolfo Matos de Castro1, Swiany Rocha2, Cléia Reis2, José Renato de Oliveira Leite1, Elias Ferreira Porto1 Estudo desenvolvido no Depto. de Fisioterapia do Unasp – Centro Universitário Adventista de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1 Profs. Ms. assistentes do Depto. de Fisioterapia do Unasp 2 Alunas especialistas do Curso de Pós-Graduação em Unidade de Terapia Intensiva do Unasp ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Antonio A. Castro R. Cônego Eugênio Leite 632 apt. 132 05414-000 São Paulo SP e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO nov. 2008 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 18 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):18-23 RESUMO: A fisioterapia respiratória tem papel fundamental nos casos de complicações pelo excesso de secreção broncopulmonar. Manobras de remoção de secreção brônquica como a vibrocompressão e o aumento do fluxo expiratório (AFE) garantem a perviabilidade das vias aéreas. O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito das manobras de AFE e vibrocompressão para remoção de secreção e suas repercussões hemodinâmicas e ventilatórias em pacientes traqueostomizados. Participaram 20 pacientes (com 18 a 73 anos) de ambos os sexos com diagnóstico fisioterapêutico de hipersecreção e/ou retenção de muco brônquico, submetidos à aplicação dessas técnicas e à remoção de secreção, que foram avaliados antes e depois da intervenção quanto a parâmetros hemodinâmicos e respiratórios. Com a aplicação da técnica de vibrocompressão foi verificada queda significativa (p<0,05) nas pressões arteriais (PA) diastólica e média de 82,2±13,4 para 77,4±13,3 mmHg e de 104,3±18,2 para 90,9±9,07 mmHg, respectivamente; o mesmo ocorreu com a PA média (p<0,05) após a aplicação da técnica de AFE, de 103,5±13,2 para 94,1±9,0 mmHg. Não houve diferença entre as técnicas aplicadas quanto ao volume de secreção removida (p=0,60). Pacientes traqueostomizados apresentaram pois redução da pressão arterial após 30 minutos da aplicação das técnicas fisioterapêuticas, mas não houve diferença entre as técnicas utilizadas quanto ao volume de secreção removida. DESCRITORES: Brônquios/secreção; Fisioterapia respiratória; Traqueostomia ABSTRACT: Chest physical therapy plays a key role in respiratory complications due to bronchial hypersecretion. Techniques such as thoracic vibrocompression and expiratory flow enhancement (EFE) are some of the ones used to assure airway clearance. This study aimed at assessing the effects of EFE and vibrocompression on airway-secretion removal and its repercussions on hemodynamic and respiratory parameters of tracheostomised patients. Twenty patients of both sexes aged 18 to 73 with diagnosed pulmonary hypersecretion and/or mucus retention were assessed as to hemodynamic and respiratory parameters before and after application of these techniques. After vibrocompression a significant decrease (p<0.05) was noticed in diastolic and mean blood pressure (BP), respectively from 82.2±13.4 to 77.4±13.3 mmHg and from 104.3±18.2 to 90.9±9.07 mmHg; also, mean BP decreased from 103.5±13.2 to 94.1±9.0 mmHg (p<0.05) with the use of EFE. No difference could be found (p=0.60) between the airway-secretion amounts obtained after both techniques. Tracheostomised patients hence presented BP reduction after the application of both vibrocompression and EFE techniques, but the use of either technique made no difference as to the amount of removed secretion. KEY WORDS: Bronchi/secretion; Physical therapy, respiratory; Tracheostomy Castro et al. Remoção de secreção em traqueostomizados INTRODUÇÃO A unidade de terapia intensiva (UTI) desempenha papel decisivo na chance da sobrevida de pacientes acometidos por doença grave. O objetivo da UTI é proporcionar a melhora de uma doença não-terminal mantendo a função cardiopulmonar estável e obtendo um bom transporte de oxigênio, utilizando para isso tecnologias que estão sendo continuamente aperfeiçoadas1. Para tal, uma das estratégias utilizadas na manutenção e manejo do suporte mecânico ventilatório é a traqueostomia, que vem conquistando importante espaço no suporte ventilatório. Estudos relatam seus efeitos benéficos, como melhor conforto para o paciente, possibilidade de comunicação e até de alimentação oral, facilidade de remoção de secreções da árvore traqueobrônquica e menor incidência de lesões laríngeas2,3. Nos últimos 20 anos o fisioterapeuta que atua na área de terapia intensiva tem se tornado um especialista no cuidado ao paciente crítico. No início sua atuação limitava-se à aplicação de técnicas fisioterapêuticas mas, com o passar do tempo, sua atuação foi estendida para os cuidados com a via aérea artificial e o manuseio de tecnologia de assistência mecânica ventilatória. A fisioterapia respiratória em UTI envolve grande número de procedimentos, em particular as manobras de remoção de secreção brônquica–técnicas que garantem a perviabilidade das vias aéreas, promovendo condições para a adequada ventilação e prevenção de infecções respiratórias4. As técnicas fisioterapêuticas para a remoção de secreção brônquica compreendem três níveis de atuação: (1) descolamento do muco brônquico de vias aéreas de pequenos e médios calibres; (2) deslocamento do muco brônquico das vias aéreas de grande calibre; e (3) eliminação do muco brônquico5,6. Um dos tipos de manobra utilizada para remoção de secreção brônquica é a vibrocompressão, que visa promover a modificação das propriedades físicas do muco, com conseqüente diminuição da viscosidade em razão do tixotropismo7. Outra manobra amplamente utili- zada na remoção de secreção brônquica é o aumento do fluxo expiratório (AFE), que consiste no aumento ativo assistido ou passivo do volume de ar expirado, com o objetivo de mobilizar, deslocar e eliminar as secreções traqueobrônquicas8. Apesar de muito se discutir sobre as técnicas de vibrocompressão manual torácica e aumento do fluxo expiratório em pacientes ambulatoriais, pouco se sabe sobre o efeito dessas técnicas em pacientes traqueostomizados internados em unidade de terapia intensiva. Portanto este estudo tem por objetivo comparar o efeito das manobras de aumento do fluxo expiratório e de vibrocompressão quanto a suas repercussões hemodinâmicas, ventilatórias e quanto à quantidade de secreção pulmonar removida em pacientes traqueostomizados internados em unidade de terapia intensiva. METODOLOGIA Este estudo é do tipo cruzado, cujo projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Adventista de São Paulo. Os familiares dos participantes deram seu consentimento livre e esclarecido, como responsáveis legais dos pacientes. Os pacientes haviam sido encaminhados, por meio do Sistema Único de Saúde, para um hospital da rede pública de saúde do Estado de São Paulo, onde estavam internados em UTI e haviam sido submetidos ao procedimento cirúrgico de traqueostomia. Foram selecionados consecutivamente 20 pacientes de ambos os sexos, com idade entre 18 e 73 anos e com diagnóstico fisioterapêutico de hipersecreção broncopulmonar e/ou retenção de muco. Os critérios de inclusão foram estar traqueostomizado com ventilação mecânica, ar ambiente ou em nebulização contínua, e apresentar hipersecreção brônquica; os de exclusão foram apresentar alterações significativas na hemodinâmica, arritmias, ou saturação de oxigênio a 88%, durante a aplicação das técnicas para remoção de secreção, com uso de 15 l/min de oxigênio. A coleta de dados de cada paciente foi feita na UTI do referido hospital em dois dias consecutivos. Todos os indivíduos foram submetidos aos mesmos procedimentos de anamnese e tratamento fisioterapêutico, distribuídos randomicamente (por sorteio) entre os submetidos aos protocolos de intervenção 1 e 2, e avaliados em dois momentos, antes e logo após a aplicação das intervenções. Aos designados ao protocolo 1 aplicava-se primeiramente este e, após quatro horas, o mesmo indivíduo era submetido ao protocolo 2. No dia seguinte, a ordem da aplicação dos protocolos era invertida. Portanto todos os pacientes receberam as duas intervenções. No protocolo denominado 1, os pacientes foram assistidos com manobras fisioterapêuticas convencionais como tapotagem e vibrocompressão, e submetidos posteriormente à aspiração traqueal de secreção. No protocolo de intervenção 2, os pacientes foram assistidos com a manobra fisioterapêutica que promove o aumento do fluxo expiratório (AFE) e posteriormente submetidos à aspiração traqueal de secreções. Os protocolos de estudo foram aplicados pelo fisioterapeuta responsável pela pesquisa. Caso algum paciente fosse atendido por outro fisioterapeuta em qualquer momento do protocolo, esse paciente era excluído. Dois profissionais da equipe de plantão na UTI (não participantes do estudo) faziam ausculta pulmonar, antes e imediatamente após a aplicação de cada protocolo, para identificar possíveis ruídos pulmonares como roncos, sibilos, estertores crepitantes e subcrepitantes. Cada profissional anotava em um formulário o resultado sem conhecer o laudo do outro avaliador. No mesmo formulário eram registrados os parâmetros hemodinâmicos e ventilatórios como freqüência cardíaca (FC), pressão arterial (PA), freqüência respiratória (f) e saturação de oxigênio (SpO2,) nos momentos pré e imediatamente após a intervenção fisioterapêutica. As freqüências cardíaca e respiratória foram registradas por meio de eletrodos posicionados no tórax do paciente conectados a um monitor de sinais vitais (Monitor Life Scope A, São Paulo, Brasil). A saturação de oxigênio foi medida por um oxímetro de pulso e a pressão arterial sangüínea por um esfignomanômetro, ambos conectados ao mesmo monitor. A aspiração traqueal de secreções foi Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):18-23 2010;17(1) 19 feita mediante sonda de aspiração (números 12 ou 14, conforme a disponibilidade diária de material), sendo a secreção removida colocada em recipiente coletor universal (milimetrado) e mensurado o volume da secreção. Durante a coleta de dados foi também registrado o tempo para realização das manobras de remoção de secreção brônquica em ambos os protocolos. Os parâmetros ventilatórios e hemodinâmicos foram registrados antes e imediatamente após a aplicação do protocolo, bem como aos 10, 20 e 30 minutos depois. Intervenção Como mencionado, dois foram os protocolos do estudo: 1, vibrocompressão e 2, AFE. A vibrocompressão consiste em aplicar vibrações por meio de contração dos músculos agonistas do antebraço do terapeuta, trabalhando em sinergia com a palma da mão aplicada perpendicularmente sobre o tórax do paciente, preferencialmente no final da expiração. Tem como objetivo clínico promover a modificação das propriedades físicas do muco, como diminuição da viscosidade em razão do tixotropismo10. Em certas freqüências, as vibrações são capazes de alterar a viscoelasticidade do muco brônquico e, assim, facilitar sua depuração. No protocolo 2, a técnica de aumento do fluxo expiratório (AFE) consistiu em deprimir o gradil costal do paciente na fase expiratória do seu ciclo respiratório. Essa pressão torácica proporciona um prolongamento da fase expiratória no intuito de gerar maior fluxo expiratório e, conseqüentemente, maior depuração das secreções pulmonares periféricas. A técnica da AFE foi aplicada por um fisioterapeuta experiente, com uma das mãos posicionada na região do esterno, aplicando pressão expiratória no sentido caudal (apêndice xifóide em direção à crista ilíaca). Essa mão permaneceu aberta, dedos aduzidos ao máximo, punhos e cotovelos fixos, e a pressão exercida foi quase toda proveniente dos ombros9. A outra mão do fisioterapeuta comprimia o abdome na fase expiratória para impedir o deslocamento da pressão gerada pela compressão exercida na região torácica. A técnica preconiza que o esforço 20 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):18-23 expiratório atinja o volume residual, portanto a compressão abdominal é importante para posicionar o diafragma à medida que a compressão torácica desinsufla o pulmão até atingir o volume desejado. As manobras de desobstrução brônquica tiveram a duração média de 30 minutos de aplicação no mesmo paciente. A ordem de início das técnicas foi randomizada. O mesmo fisioterapeuta realizava as duas manobras nos pacientes. Para a realização da vibrocompressão e da AFE, os pacientes foram posicionados em decúbito dorsal. Análise estatística Os dados foram apresentados sob a forma de média e desvio padrão. Todos os dados apresentaram distribuição normal. Para a comparação das variáveis ventilatórias e hemodinâmicas ao longo do tempo foi utilizada a Anova com dois fatores. Para comparar as quantidades de secreção pulmonar removida foi utilizado o teste t de Student. Foi considerado como estatisticamente significante p<0,05. RESULTADOS A amostra foi composta de 20 pacientes, 13 homens e sete mulheres, com Tabela 1 média de idade de 45,1±17,9 anos, todos traqueostomizados e internados em unidade de terapia intensiva. Como mencionado, todos os pacientes foram submetidos aos dois protocolos, em dias subseqüentes, mas em ordem inversa; para verificar as características prévias dos pacientes (linha de base), os dados coletados foram agrupados segundo os pacientes fossem ser submetidos primeiro a um, ou primeiro a outro protocolo. Assim, a Tabela 1 mostra os dados clínicos obtidos antes da aplicação das técnicas, não se tendo verificado diferença estatisticamente significante entre os dois grupos de pacientes (p>0,05). A Tabela 2 mostra as medidas das variáveis ventilatórias e hemodinâmicas nos momentos pré- e pós-aplicação (e aos 10, 20 e 30 minutos) da técnica de vibrocompressão. Nota-se redução significativa das pressões arteriais diastólica e média 30 minutos após a aplicação da técnica de vibrocompressão (p<0,05). A Tabela 3 mostra as medidas das variáveis ventilatórias e hemodinâmicas obtidas antes, imediatamente depois, e aos 10, 20 e 30 minutos após a aplicação da técnica de aceleração do fluxo expiratório. Nota-se diminuição significativa (p<0,05) apenas da pressão arterial média após o trigésimo minuto de aplicação da referida técnica. Características clínicas iniciais (média ± desvio padrão) dos pacientes que seriam submetidos às técnicas, segundo tenham recebido primeiro a vibrocompressão (Vibro) ou a de aumento do fluxo expiratório (AFE), e valor de p da comparação entre os dois grupos (n=20) Variáveis Vibro AFE PaCO2 (mmHg) 41,1±8,29 39,1±5,93 PaO2 (mmHg) 81,6±13,0 86±22,5 96,6±1,89 96,0±3,3 SPO2 (%) f (ipm) 16,7±3,5 17,9±1,98 519,0±115,1 598,2±149,5 Vexal (ml) 0,37±0,10 0,37±0,08 FiO2 PA sistólica 135,0±19,9 136,1±30,8 PA diastólica 82,9±12,3 83,9±8,77 PA média 104,3±16,8 103,5±13,2 FC (bpm) 88,9±17,7 85,3±25,7 p 0,10 0,60 0,30 0,30 0,05 0,30 0,80 0,70 0,80 0,60 PaCo2 = pressão parcial arterial de gás carbônico; PaO2 = pressão parcial arterial de oxigênio; SPO2 = saturação periférica de oxigênio; f = freqüência respiratória (incursões por minuto); Vexal = volume exalado; FiO2 = fração inspirada de oxigênio; PA = pressão arterial (em mmHg); FC = freqüência cardíaca (batimentos por minuto) Castro et al. Tabela 2 Remoção de secreção em traqueostomizados Medidas (média ± desvio padrão) ventilatórias e hemodinâmicas obtidas antes (pré), depois (pós), e aos 10, 20 e 30 minutos após a aplicação da vibrocompressão (n=20) Variáveis Pré PA sistólica 133,7±20,0 PA diastólica 82,2±13,4 PA média 104,3±18,2 Pós 136±21,2 81,1±5,98 96,6±11,1 10 130,6±19,2 80,5±10,4 96,1±9,4 20 126,0±21,1 80,3±10,5 95,2±11,1 30 129,1±18,2 77,4±13,3 90,9±9,07 FC (bpm) 89,6±0,7 88,5±14,8 91,3±12,4 91,3±12,3 f (ipm) Vexal (ml) SpO2 (%) 93,2±15,2 18,1±3,3 18,6±3,6 16,4±3,9 17,7±3,8 17,3±3,6 519,0±115,1 547,1±97,7 533,0±93,2 566,1±148,0 541,0±114,7 96,7±1,2 97,0±1,3 97,1±1,4 97,3±1,7 96,9±1,9 PA = pressão arterial (em mmHg); FC = freqüência cardíaca (batimentos por minuto); f = freqüência respiratória (incursões por minuto); Vexal = volume exalado; SPO2 = saturação periférica de oxigênio; * p<0,05 30 vs Pré Tabela 3 Medidas (média ± desvio padrão) ventilatórias e hemodinâmicas obtidas antes (pré), depois (pós), e aos 10, 20 e 30 minutos após a técnica de aumento do fluxo expiratório (n=20) Variáveis Pré PA sistólica 135,7±31,8 PA diastólica 84,0±7,17 PA média 103,5±13,2 87,0±28,3 FC (bpm) f (ipm) Vexal (ml) SpO2 (%) Pós 140,3±17,4 76,9±22,4 102,5±12,1 94,7±2,1 10 141,3±18,2 82,2±17,8 103,8±12,3 88,6±9,0 17,9±1,98 18,8±4,5 18,3±4,4 598,2±149,5 595,6±151,4 590±182,4 97,1±1,52 97,8±0,8 97,9±1,6 20 137,2±17,8 83,2±13,1 105,6±27,7 89,7±11,2 30 131,3±13,0 83,8±11,7 94,1±9,0 87,3±11,0 17±3,9 16,6±3,2 525,9±136,3 556,3±132,0 98,5±1,5 98,6±1,2 PA = pressão arterial (em mmHg); FC = freqüência cardíaca (batimentos por minuto); f = freqüência respiratória (incursões por minuto); Vexal = volume exalado; SPO2 = saturação periférica de oxigênio; * p<0,05 30 vs Pré 18 Secreção removida (ml) 16 14 12 10 8 6 4 2 0 Vibrocompressão AFE Gráfico 1 Volume de secreção removida após aplicação das técnicas de vibrocompressão e aumento do fluxo expiratório (AFE); a diferença foi não-significativa (n=20) A quantidade de secreção removida foi semelhante (p=0,6) com a utilização de ambas as técnicas, de vibrocompres- são (11,7±4 ml) e de aumento do fluxo expiratório (10,7±4,2 ml), como ilustra o Gráfico 1. DISCUSSÃO Neste estudo o objetivo foi comparar o efeito das manobras de aumento do fluxo expiratório e da vibrocompressão em relação à quantidade de secreção pulmonar removida em pacientes traqueostomizados internados em unidade de terapia intensiva. São dois os principais achados: a redução da PA diastólica e média com a utilização da técnica de vibrocompressão e da PA média com a técnica de aceleração do fluxo expiratório; e que não houve diferença significativa entre as técnicas aplicadas quanto ao volume de secreção removido. No presente estudo, ambas as técnicas causaram alterações significantes na pressão arterial diastólica e média, mas as alterações desses valores se mantiveram dentro da normalidade durante todo o período de estudo. Thiesen et al.11 analisaram pacientes com traumatismo cranioencefálico grave (TCE), ao aplicarem um protocolo de fisioterapia que consistia em manobras de vibração manual e pressão manual expiratória semelhantes à vibrocompressão e à AFE aqui utilizadas. Os valores das variáveis foram coletados no primeiro minuto após cada manobra e 30 minutos depois da última manobra. Ao contrário dos presentes resultados, os autores observaram que as manobras não provocaram alterações da PA média. Outro estudo10 em 20 pacientes vítimas de TCE internados em UTI comparou os efeitos da vibrocompressão e da AFE durante os 10 minutos de execução das manobras e, também, não encontrou alteração nas PA médias. No entanto, nesses estudos, com pacientes considerados graves, foi feito controle minucioso das alterações da pressão intracraniana: caso esta aumentasse, o procedimento fisioterapêutico era interrompido. Desse modo, os autores interferiram pouco na hemodinâmica dos pacientes. Neste estudo, acredita-se que a diminuição da pressão diastólica e média ocorreu devido ao efeito da compressão torácica expiratória, que aumenta a pressão intratorácica. Isso leva a um aumento da resistência vascular pulmonar e diminuição do débito cardíaco imediato, obrigando esse fluxo a se redis- Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):18-23 2010;17(1) 21 tribuir, gerando redução das pressões intracavitárias e sistêmicas. Provavelmente, esse efeito redistribuidor e hipotensor se manteve, pois tem em média duração de duas horas após a aplicação da técnica12; daí terem-se encontrado as diferenças até 30 minutos depois da aplicação da técnica13,14. Quanto ao volume de secreção removida, não houve diferença entre a quantidade colhida com a aplicação de ambas as técnicas. Muitos estudos analisaram as propriedades reológicas, o volume expectorado e o índice de purulência do muco. É conhecido na literatura que o volume de muco obtido antes do tratamento é significativamente menor quando comparado ao volume removido após a intervenção fisioterapêutica12. No entanto, poucos estudos se propuseram a comparar as quantidades de secreção removidas entre duas técnicas manuais, das mais utilizadas em nossa prática clínica9. Estudos analisaram amostras de muco brônquico expectorado por 12 indivíduos portadores de bronquiectasia submetidos às manobras de remoção de secreção brônquica. Os autores mostraram que a transportabilidade da secreção, o deslocamento e a velocidade relativa de transporte do muco melhoram após o tratamento, independentemente da técnica empregada15,16. O muco removido pelas manobras aplica- das no presente estudo apresentou-se em maior quantidade após o tratamento, mas a quantidade não diferiu entre as técnicas. Nossos pacientes apresentavam a via aérea mais acessível, uma vez que eram traqueostomizados, mas, por outro lado, apresentavam caixa torácica rígida devido à imobilidade e restrição características de pacientes crônicos em leito de UTI. Isso possivelmente influenciou a mobilidade da secreção para remoção, pois é conhecido que o posicionamento corpóreo influencia diretamente os volumes e fluxos pulmonares – importantes para a remoção da secreção17. Estudos experimentais mostraram os efeitos deletérios da complacência pulmonar e troca gasosa associados a áreas de colapso pulmonar1,9,18. Em modelos experimentais em animais ou pacientes com suporte ventilatório há evidências de que o uso de técnicas de compressão expiratória não geram efeitos adicionais à remoção de secreção pulmonar2,10,19,20. Resultados similares foram obtidos no presente estudo, provavelmente devido à limitação do fluxo expiratório oriundo do colapso dinâmico de pequenas vias aéreas e à menor negativação da pressão pleural durante o uso da técnica de compressão expiratória da caixa torácica7,20. Esses fatores podem ter contribuído para que a compressão torácica de ambas as técnicas não alterasse suficientemente a pressão transpulmonar e o gradiente de fluxo expiratório. Este estudo tem a limitação de não ter analisado as características da mecânica respiratória e das trocas gasosas. No entanto, a intenção foi acrescentar dados à prática clínica do fisioterapeuta em UTI, para a escolha do melhor recurso terapêutico a ser utilizado no leito, mesmo sem a possibilidade do uso de equipamentos sofisticados. Outra possível limitação foi o fato de todos os pacientes receberem as duas intervenções, o que poderia ter influenciado os desfechos principais, especialmente a quantidade de secreção removida. No entanto, para evitar esse viés de delineamento, optou-se por realizar as duas manobras em um dia e repeti-las após 24 horas, porém na seqüência invertida, para que não houvesse influência do efeito da técnica inicial em relação à segunda técnica. CONCLUSÃO Pacientes traqueostomizados apresentaram alterações hemodinâmicas como a diminuição de pressão arterial ao final da aplicação das técnicas fisioterapêuticas de aumento do fluxo expiratório e da vibrocompressão. Não houve alteração ventilatória à aplicação das técnicas. A quantidade de secreção removida desses pacientes foi semelhante, independentemente do tipo de técnica ou manobra utilizada. REFERÊNCIAS 1 Berney S, Denehy L, Pretto J. Head-down tilt and manual hyperinflation enhance sputum clearance in patients who are intubated and ventilated. Aust J Physiother. 2004;50(1):9-14. 5 Nozawa E, Sarmento GJV, Vega JM, Costa D, Silva JEP, Feltrim MI. Perfil de fisioterapeutas brasileiros que atuam em unidades de terapia intensiva. Fisioter Pesq. 2008;15(2)177-82. 2 Choi JS, Jones AY. Effects of manual hyperinflation and suctioning in respiratory mechanics in mechanically ventilated patients with ventilator-associated pneumonia. Aust J Physiother. 2005;51(1):25-30. 6 3 Morgon FH, Guirardello EB. Validação da escala de razão das necessidades de familiares em unidade de terapia intensiva. Rev Latino-am Enfermagem. 2004;12(2):198-203. Lemes DA, Zin WA, Guimarães FS. Hyperinflation using pressure support ventilation improves secretion clearance and respiratory mechanics in ventilated patients with pulmonary infection: a randomised crossover trial. Aust J Physiother. 2009;55(4):249-54. 7 Guimarães FS, Zin WA. Thoracic percussion yields reversible mechanical changes in healthy subjects. Eur J Appl Physiol. 2008;104(4):601-7. 8 Oberwaldner B. Physiotherapy for airway clearance in paediatrics. Eur Resp J. 2000;15(1):196-204. 4 22 Stiller K. Physiotherapy in intensive care: towards an evidence-based practice. Chest. 2000;118(4):1801-13. Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):18-23 Castro et al. Remoção de secreção em traqueostomizados Referências (cont.) 9 Unoki T, Kawasaki Y, Mizutani T, Fujino Y, Yanagisawa Y, Ishimatsu S, et al. Effects of expiratory rib-cage compression on oxygenation, ventilation, and airwaysecretion removal in patients receiving mechanical ventilation. Respir Care. 2005;50(11):1430-7. 10 Neto MLC. Efeitos das manobras fisioterapêuticas respiratórias sobre a hemodinâmica cerebral. Rev Bras Fisioter. 2006;4(1):28-31. 11 Thiesen RA, Dragosavac D, Roquejani AC, Falcão AL, Araujo S, Dantas Filho VP, et al. Influência da fisioterapia respiratória na pressão intracraniana em pacientes com traumatismo craniencefálico grave. Arq Neuropsiquiatr. 2005;63(1):110-3. 12 Naylor JM, Chow CM, McLean AS, Heard RC, Avolio A. Cardiovascular responses to short-term head-down positioning in healthy young and older adults. Physiother Res Int. 2005;10(1):32-47. 13 Antunes LCO, Silva EG, Bocardo P, Daher DR, Faggiotto RD, Rugolo LMSS. Efeitos da fisioterapia respiratória convencional versus aumento do fluxo expiratório na saturação de O2, freqüência cardíaca e freqüência respiratória, em prematuros no período pós-extubação. Rev Bras Fisioter. 2006;10(1):97-103. 14 Verdugo M. Repercussão da fisioterapia respiratória em paciente hipersecretivo sob ventilação mecânica. Arq Med ABC. 2007;32(2):S1-S78. 15 Martins ALP, Jamami M, Costa D. Estudo das propriedades reológicas do muco brônquico de pacientes submetidos a técnicas de fisioterapia respiratória. Rev Bras Fisioter. 2005;9(1):38-44. 16 Ramos EMC, Ramos D, Jardim JRB, Faresin SM, Saldiva PHN, Machione M, et al. Drenagem postural x tapotagem x técnica de expiração forçada: análise da transportabilidade do muco brônquico. Rev Bras Fisioter. 2003;7(3):223-8. 17 Porto EF, Castro AAM, Leite JRO, Miranda SV, Lancauth A, Kumpel C. Análise comparativa da complacência do sistema respiratório em três diferentes posições no leito (lateral, dorsal e sentada) em pacientes submetidos à ventilação mecânica invasiva prolongada. Rev Bras Ter Intensiva. 2008;20(3):213-9. 18 Unoki T, Mizutani T, Toyooka H. Effects of expiratory ribcage compression and/or prone position on oxygenation and ventilation in mechanically ventilated rabbits with induced atelectasis. Respir Care. 2003;48(8):754-62. 19 Ntoumenopoulos G. Mucus on the move: embed it or expel it; the patient, the clinician, and now the ventilator. Respir Care. 2007;53(10):1276-8. 20 Unoki T, Mizutani T, Toyooka H. Effects of expiratory ribcage compression combined with endotracheal suctioning on gas exchange in mechanically ventilated rabbits with induced atelectasis. Respir Care. 2004;49(8):896-901. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):18-23 2010;17(1) 23 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.24-9, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Influência do tempo de hospitalização sobre o desenvolvimento neuromotor de recém-nascidos pré-termo Influence of length of hospitalization on neuromotor development in premature newborn infants Luciana Giachetta1, Carla Marques Nicolau2, Anna Paula Bastos Marques da Costa3, Adriana Della Zuana4 Estudo desenvolvido no Instituto da Criança "Prof. Pedro de Alcântara" do HC/ FMUSP – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1 Fisioterapeuta do Serviço de Fisioterapia do Instituto da Criança, HC/FMUSP 2 Fisioterapeuta Ms. do Instituto da Criança, coordenadora do Berçário Anexo à Maternidade do HC/FMUSP 3 Fisioterapeuta do Instituto da Criança, HC/FMUSP 4 Fisioterapeuta coordenadora do Ambulatório de Fisioterapia do Instituto da Criança, HC/ FMUSP ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Carla M. Nicolau Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar 647 05403-000 São Paulo SP e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO maio 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 24 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):24-9 RESUMO: O objetivo deste estudo foi avaliar a influência do tempo de hospitalização sobre o desenvolvimento neuromotor de recém-nascidos pré-termo (RNPT). Foi feito um estudo prospectivo com 67 RNPT de idade gestacional ≤36 semanas. O desenvolvimento neuromotor foi avaliado pela escala motora infantil de Alberta (Alberta infant motor scale, AIMS), aplicada no ambulatório de seguimento, quando os RN tinham mediana de idade corrigida de 39 a 44 semanas. Para a análise comparativa, os RNPT foram distribuídos em dois grupos segundo o tempo de hospitalização (TH): grupo A (n=35), com TH ≤34 dias, e grupo B (n=32), com TH >34 dias. Na análise estatística considerou-se o nível de significância p<0,05. Os escores medianos na AIMS (numa faixa possível de 0 a 21) foram 7 no grupo A, 5 no grupo B; foram encontradas fracas correlações significativas nos dois grupos (r=0,32; r=0,34) entre o escore na AIMS e o TH. Os resultados indicam que os RNPT que permaneceram por mais de 34 dias hospitalizados mostraram atraso no desenvolvimento neuromotor, sugerindo que, sem excluir outros fatores, quanto maior o tempo de internação do RN, maior seu comprometimento motor. DESCRITORES: Prematuro/crescimento e desenvolvimento; Tempo de internação; Terapia intensiva neonatal ABSTRACT: The purpose of this study was to assess the influence of the length of hospital stay on the neuromotor development of preterm newborns (PTNB). This prospective study was carried out with 67 PTNB (gestational age ≤36 weeks). Neuromotor development was assessed by the Alberta Infant Motor Scale (AIMS) when NB returned to out-patient follow-up, at median 39 to 44 weeks corrected age. For comparative analysis, PTNB were divided into two groups, according to the length of hospitalization period (HP): group A (n=35) with HP ≤34 days, and group B (n=32) with HP >34 days. In statistical analysis significance level was set at p<0.05. Median AIMS scores (possible range 0–21) were 7 in group A, 5 in group B; weak, significant correlations were found at both groups (r=0.32; r=0.34) between AIMS scores and HP. Results show that PTNB who stayed in hospital for more than 34 days showed developmental delay, suggesting that, without excluding other factors, the longer PTNB length of stay, the greater the motor impairment. KEY WORDS: Infant, premature/growth and development; Intensive care, neonatal; Length of stay Giachetta et al. Desenvolvimento neuromotor em prematuros INTRODUÇÃO O aumento na sobrevida de recémnascidos (RN) com idade gestacional inferior a 37 semanas e com peso ao nascimento menor que 2.500 g tem sido atribuído aos avanços médico-científicos e às melhorias nos cuidados intensivos neonatais, o que gera preocupações com a qualidade de vida e desenvolvimento desses RN1-4. Uma das principais características do recém-nascido pré-termo (RNPT) é a instabilidade dos sistemas de controle hormonal e neurogênico. Isso se deve, em parte, ao desenvolvimento imaturo dos diferentes órgãos do corpo e, em parte, ao fato de que os sistemas de controle ainda não se ajustaram ao modo totalmente novo de vida. Dependendo de sua idade gestacional, do seu peso ao nascimento, e dos fatores que atuaram durante sua vida intra-uterina, esses RN podem apresentar maior risco de distúrbios durante o período neonatal e seqüelas que poderão comprometer seu desenvolvimento5,6. Algumas complicações neonatais são apontadas como possíveis fatores de risco para o comprometimento do desenvolvimento neurológico e intelectual normais, como asfixia perinatal, apnéia, infecções, hiperbilirrubinemia, uso de ventilação mecânica, hemorragias intracranianas, entre outras7. Além desses fatores, o impacto do ambiente hospitalar gera preocupação quanto ao desenvolvimento neuropsicomotor. A sobrevida de RN com idade gestacional e peso ao nascer cada vez menores acarreta um período de hospitalização prolongado em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIn) que, em geral, submete o RN ao excesso de manipulação, repouso inadequado, luminosidade e sons intensos, favorecendo o estresse e estimulação sensorial inadequada, podendo afetar a morbidade8,9. A hospitalização em UTIn introduz o RN em um ambiente inóspito, onde a exposição intensa a estímulos nociceptivos como o estresse e a dor são freqüentes10. Ruídos, luz intensa e contínua, bem como procedimentos clínicos invasivos são constantes nessa rotina. O tratamento altamente especializado, do qual depende a sobrevivência do RN, instaura vários desafios à criança e seus pais. Autores observam interferências nos sistemas de autorregulação dos RN, o que pode acarretar desequilíbrio nos mecanismos de homeostase e no desenvolvimento cognitivo e de aprendizagem11-13. Nesses RN também se observa um aumento na incidência de distúrbios neuromotores entre os sobreviventes, o que tem estimulado o surgimento de programas de acompanhamento dessas crianças, consideradas de risco para distúrbios ou atraso no desenvolvimento14,15. Grande parte da literatura sobre o desenvolvimento de RN de risco tem centrado suas investigações na relação entre fatores de risco ao nascimento e componentes neuromotores do desenvolvimento16. Esses estudos revelam que RN de risco diferem dos demais em relação ao tônus muscular, aos reflexos primitivos e reações posturais, principalmente nos primeiros meses de vida. Entretanto, a influência desses componentes neuromotores na aquisição das funções motoras mais complexas ainda não está bem documentada. O diagnóstico precoce de alterações no desenvolvimento motor de lactentes é um desafio constante para fisioterapeutas, clínicos e pesquisadores que trabalham com reabilitação infantil. No Brasil, o desafio do diagnóstico precoce das alterações do desenvolvimento motor é agravado pela escassez de dados normativos e de instrumentos de avaliação padronizados e validados para lactentes17,18. A ultrassonografia craniana, embora seja apontada pela literatura como método diagnóstico de alta especificidade e como método de escolha para o diagnóstico precoce de distúrbio neurológico em RNPT, tem baixa sensibilidade em relação à evolução neurológica e ao desenvolvimento neuromotor. A precariedade do estado clínico do RNPT sob cuidados intensivos, a dificuldade de interpretar as respostas observadas nessas crianças e as disfunções neurológicas transitórias reduzem o valor prognóstico dessa avaliação19,20. O exame neurológico feito no período neonatal também tem pequeno valor preditivo em relação ao surgimento de anormalidades do desenvolvimento no primeiro ano de vida e no prognóstico funcional do desenvolvimento infantil20. Vários estudos21-23 argumentam que os exames neurológicos baseados em componentes e marcos básicos do desenvolvimento neuromotor têm baixo valor preditivo no prognóstico funcional do desenvolvimento infantil. Tradicionalmente, as avaliações de crianças consideradas de risco para apresentar distúrbios neuromotores priorizava a identificação de fatores anormais do desenvolvimento, como as variações de tônus muscular e persistência de reflexos primitivos. Atualmente, a ênfase está na documentação do desempenho funcional da criança, salientando sua movimentação espontânea no ambiente, fazendo com que a observação sistemática da qualidade dos movimentos espontâneos de crianças de risco seja fator essencial na identificação precoce de disfunções do desenvolvimento20. Com base no acima exposto, optouse pela realização de um estudo com RNPT que foram submetidos à internação em UTI neonatal, com o objetivo de avaliar a influência do tempo de hospitalização sobre o desenvolvimento neuromotor de recém-nascidos prétermo. METODOLOGIA O estudo do tipo transversal foi conduzido de forma prospectiva, incluindo recém-nascidos pré-termo (RNPT) após o consentimento por escrito dos pais. Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do HC/FMUSP– Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Foi constituída uma amostra de conveniência não-aleatória, por meio dos critérios adiante indicados de inclusão e exclusão, com recém-nascidos de baixo risco para lesão neurológica, nascidos no Berçário Anexo à Maternidade do HC/FMUSP entre agosto de 2006 e agosto de 2007. Foram incluídos 67 RN (41 do sexo masculino e 26 do sexo feminino) com idade gestacional ao nascimento menor ou igual a 36 semanas e 6 dias, com Apgar de 5o minuto superior a 5 e com idade corrigida de até 60 dias. Foram excluídos os RN por- Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):24-9 2010;17(1) 25 tadores de síndromes genéticas, de malformações congênitas graves, afecções osteomioarticulares e portadores de anormalidades neurológicas (hemorragia peri-intraventricular graus III e IV). Após a alta hospitalar os recém-nascidos incluídos no estudo foram encaminhados ao ambulatório de seguimento fisioterapêutico, onde foi preenchido um formulário para cada um, pela consulta de seus prontuários, sendo coletadas as seguintes informações: data de nascimento, tipo de parto, sexo, idade gestacional (em semanas), peso de nascimento (em gramas), Boletim de Apgar, antecedentes maternos, história pósnatal e morbidades neonatais. Ao final da coleta de dados, mediante a análise da distribuição do tempo de internação, os RN foram divididos em dois grupos, segundo a mediana de dias de internação: um grupo um grupo dos que ficaram internados por até 34 dias, e outro dos que o foram por mais de 34 dias. O desenvolvimento motor foi avaliado na primeira consulta no ambulatório de fisioterapia, quando as crianças apresentavam idade corrigida de 39 a 44 semanas, por meio da escala motora infantil de Alberta AIMS (Alberta infant motor scale)24,25, que avalia a motricidade ampla do RN pela observação de 58 itens agrupados em quatro subescalas que descrevem a movimentação espontânea e as habilidades motoras em posições básicas, incluindo prono, supino, sentado e de pé. A AIMS é um teste predominantemente observacional, desenvolvido para avaliar as aquisições motoras de crianças do nascimento até os 18 meses de idade, servindo para documentar longitudinalmente o desenvolvimento motor de crianças que apresentam risco para o atraso nas aquisições motoras. Para cada um dos 58 itens, o examinador atribui o escore zero quando não foi observado, e um se observado. Os itens observados em cada uma das subescalas são somados, resultando em quatro subtotais (prono, supino, sentado e de pé). O escore total do teste é dado pela soma dos subtotais das subescalas. No caso da faixa de idade da amostra, em que os RN não se sentam nem ficam em pé, o escore máximo seria de 30 pontos, sendo 21 na posição prono e 9 na supino. Entretanto, 26 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):24-9 para a população de RN com idade corrigida entre 39 e 44 semanas, os escores da posição ventral atingem um máximo de 12 pontos, totalizando um escore máximo da AIMS de 21 pontos. O escore total pode ser convertido em percentil de desempenho motor, estabelecido com base na amostra normativa do teste. Um importante aspecto no uso da AIMS é a identificação do ponto de corte, que define o que deve ser considerado desenvolvimento típico ou atraso. Em um estudo com RNPT de 8 e 12 meses de idade24, os autores identificaram o percentil 10 como o ponto de corte mais eficaz (sensibilidade 77%, especificidade 82% e valor preditivo negativo 96%) para identificar crianças com possibilidade de desenvolvimento motor anormal. No presente caso, o ponto de corte indicativo de possível atraso no desenvolvimento correspondeu ao escore de 5 pontos. Durante a avaliação, o examinador deve observar a movimentação da criança em cada uma das posições básicas, levando em consideração aspectos do desempenho motor como descarga de peso, postura e movimentos antigravitacionais. A AIMS foi aplicada e avaliada por um fisioterapeuta habilitado e previamente treinado na aplicação do instrumento, sem o conhecimento prévio dos dados dos lactentes. Para a avaliação do desenvolvimento neuromotor, foram captadas as imagens de cada criança nas posturas de prono, supino, sentado e de pé, por no mínimo 20 minutos e no máximo 50 minutos (permanecendo em média, em cada postura, 5 minutos), com o mínimo de intervenção ou manuseio por parte do fisioterapeuta, podendo, no entanto, serem estimulados com brinquedos para mudança ou aquisição de posturas específicas. O operador da câmera foi o profissional fisioterapeuta responsável pelo ambulatório de seguimento da instituição. Inicialmente, os dados foram submetidos à análise descritiva, avaliando-se a distribuição de cada variável estudada. Os dados nominais foram descritos em termos de porcentagens e proporções. Os resultados foram analisados pelo teste de medidas repetidas Anova unidirecional para a variância de acordo com a classificação do desenvolvimento motor; o teste de correlação de Pearson foi usado para verificar a correlação entre tempo de internação e desenvolvimento motor, considerando-se o nível de significância p<0,05. RESULTADOS Foram estudados 67 RN, distribuídos em dois grupos segundo o tempo de hospitalização. Ao final da coleta de dados, foi calculada a mediana do tempo total de internação e os grupos foram: grupo A, formado por RN (n-35) com período de internação menor ou igual a 34 dias; e grupo B, formado por RN (n32) com período de hospitalização maior que 34 dias. Algumas características dos dois grupos são apresentadas na Tabela 1. Todos os RN incluídos no estudo apresentavam Apgar de 5o minuto acima de 5. A permanência em ventilação mecânica por mais de 72 horas foi observada em 74% dos RN estudados; 35% dos RN evoluíram com hiperbilirrubinemia, 30% com sepse precoce e/ou tardia, e 18% com hemorragia intracraniana. Todos os RN foram avaliados pela AIMS. Considerou-se o ponto de corte de 5 pontos (correspondente ao percentil 10) da AIMS para estabelecer se o lactente estava com o desenvolvimento normal ou atrasado. Os resultados obtidos são apresentados na Tabela 2, que também mostra os valores das correlações encontradas entre os escores da AIMS e o tempo de hospitalização. Os RN do grupo A, tendo permanecido menos tempo internados (média de 20 dias), também apresentaram à segunda avaliação idade corrigida menor (média de 39 semanas) em comparação aos do grupo B (média de 44 semanas). Mesmo assim, apresentaram desenvolvimento típico, comparados aos do grupo B, cujo escore mediano encontra-se abaixo do ponto de corte. A comparação das variáveis idade gestacional, peso ao nascer, dias de hospitalização e idade corrigida no momento da avaliação entre os dois grupos mostra diferenças significativas (Tabela 3): os RN do grupo B precisaram de maior tempo de internação justamente porque Giachetta et al. Tabela 1 Desenvolvimento neuromotor em prematuros Características (média ± desvio padrão) da amostra segundo os grupos por tempo de hospitalização – grupo A, ≤34 dias, grupo B, >34 dias (n=67) Característica Sexo masculino Idade gestacional ao nascimento (semanas) Peso ao nascer (gramas) Tempo de hospitalização (dias) Tabela 2 Grupo A (n=35) 42,8% Grupo B (n=32) 62,5% 33,1±2,7 1750,1±441,1 20,4±7,5 32,1±1,8 1467,5±466,8 50,0±20,8 Idade corrigida no momento da avaliação, escore na AIMS e tempo de hospitalização dos grupos A e B, e valores de r e p da correlação entre escore na AIMS e tempo de hospitalização (n=67) Característica Grupo A (n=35) Idade corrigida (semanas, média ±dp) 39,1±1,3 Escore na AIMS [mediana (máx – mín)] 7 (5 – 9) Tempo de hospitalização (dias, média ±dp) 20,4±7,5 Correlação escore X tempo r=0,32; p=0,09 Grupo B (n=32) 43,8±4,1 5 (3 – 7) 50,0±20,8 r=0,34; p=0,02 dp = desvio padrão; máx = valor máximo; mín = valor mínimo; AIMS = Escala motora infantil de Alberta Tabela 3 Valor de p da comparação de idade gestacional, peso ao nascer, tempo de hospitalização e idade corrigida no momento da avaliação entre os grupos A e B (n=67) Variável Grupo A Grupo B p Idade gestacional (semanas, média±dp) 33,14±2,74 32,06±1,81 <0,001 Peso ao nascer (gramas, m±dp) 1750,06±441,09 1467,50±466,80 <0,001 Tempo de hospitalização (dias, m±dp) 20,44±7,49 50,03±20,76 <0,001 Idade corrigida (semanas, m±dp) 39,06±1,27 43,79±4,06 <0,001 Escore AIMS (mediana) 5 6 <0,04 m±dp = média ± desvio padrão; AIMS = Escala motora infantil de Alberta apresentavam idade gestacional menor ao nascimento, em comparação com os do grupo A, assim como menor peso ao nascer. DISCUSSÃO Além das complicações neonatais atualmente apontadas como fatores de risco para o comprometimento do desenvolvimento neurológico e intelectual normal, o impacto do ambiente hospitalar e o tempo em que os RNPT permanecem internados exercem papel importante no desenvolvimento neuropsicomotor 18,21. Alguns estudos 25-27 mostram que a internação em UTIn deve ser considerada como um dos possíveis fatores de risco para o atraso no desenvolvimento. Isso pode ser explicado pelo fato de RN internados em UTIn serem privados de estímulos sensoriais adequados que facilitem a maturação dos sistemas sensoriais e o desenvolvimento neuromotor, sofrendo hiperestimulação com o excesso de luzes, alarmes, ruídos intermitentes e de alta intensidade, excesso de manuseio, de intervenções dolorosas e contínuas interrupções do ciclo sono/vigília21-26. Algumas pesquisas mostraram que esses RN chegam a ser manipulados 134 vezes em apenas 24 horas, recebendo de 50 a 150 procedimentos potencialmente dolorosos ao longo do dia; e que, apesar da importância das intervenções em uma UTIn, os RN não estariam preparados para responder de maneira organizada a tantos estímulos nociceptivos, podendo vir a ter comprometimento motor25,26 . No presente estudo, os RN que apresentaram escores compatíveis com atraso do desenvolvimento motor, segundo a AIMS, foram os que permaneceram mais tempo (média de 50 dias) internados (grupo B) do que os demais (grupo A), que apresentaram escores compatíveis com o desenvolvimento esperado para a idade gestacional corrigida, não apresentando défices no desenvolvimento motor. No entanto, o fator tempo de hospitalização não pode ser considerado o único fator responsável pelo atraso do desenvolvimento nos recém-nascidos prematuros. Muitos outros fatores se associam, gerando uma questão complexa que deve ser abordada criteriosamente. No presente estudo, os RN com atraso foram os com menor idade gestacional e peso de nascimento, considerados recém-nascidos prematuros extremos, que apresentam idade gestacional inferior a 30 semanas ao nascimento. Dados semelhantes estão presentes na literatura, onde se destaca que o baixo peso ao nascer e idade gestacional menor acarretam maior probabilidade de alterações no desenvolvimento, principalmente nas áreas adaptativa, motora, psiconeurológica, audiológica, oftalmológica e de linguagem. Esses RN geralmente permanecem internados por período prolongado devido à instabilidade dos sistemas de controle hormonal, neurogênico, bem como ao desenvolvimento imaturo dos diferentes órgãos do corpo26-28. O desenvolvimento infantil é um processo que se inicia desde a vida intra-uterina e envolve vários aspectos, como a maturação neurológica, o crescimento físico e a construção de habilidades relacionadas ao comportamento e as esferas cognitiva, afetiva e social do RN29. Os riscos para o atraso no desenvolvimento neuromotor estão associados a diversos fatores classificados como biológicos, sociais e ambientais. Dentre estes, destacam-se a prematuridade, a morbidade neonatal e a desnutrição29,30. É evidente o efeito deletério causado pela desnutrição no sistema nervoso em desenvolvimento e sua influência no prognóstico neurológico desses recémnascidos. Neonatos desnutridos apresen- Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):24-9 2010;17(1) 27 tam maior risco de desenvolver processos infecciosos por diminuição das defesas de seu sistema imunológico, assim como permanecem por períodos prolongados em suporte ventilatório, invasivo ou não, pela incapacidade de manter a respiração espontânea sem auxílio, dada a fadiga muscular30-32. Uma limitação deste estudo refere-se ao instrumento utilizado para a avaliação do desenvolvimento motor, a AIMS. Embora essa escala tenha-se revelado ser de fácil e rápida aplicação, por se tratar de uma escala de observação da motricidade ampla do RN (pelo registro se faz ou não tal postura ou movimento), o refinamento do padrão motor do RN não é analisado. A identificação precoce de alterações no desenvolvimento é uma tarefa complexa para profissionais que atuam na atenção primária. Contudo, por essa identificação pode ser possível estabelecer programas de intervenção que visem a prevenção de distúrbios do desenvolvimento. CON)CLUSÃO Os resultados aqui encontrados mostram, em consonância com a literatura, que os recém-nascidos do grupo que permaneceu menor tempo internado apresentaram desenvolvimento motor adequado para a idade corrigida, enquanto no outro grupo, quanto maior o tempo de internação, maior foi o comprometimento motor. Conclui-se que, na população estudada, o tempo de hospitalização influenciou o desenvolvimento motor dos recém-nascidos prematuros. REFERÊNCIAS 1 Allegretti ALC, Mancini MC, Schwartzman JS. Estudo do desempenho funcional de crianças com paralisia cerebral diparética espástica utilizando o Pediatric Evaluation of Disability Inventory (PEDI). Temas Desenvolv. 2002;11:5-11. 2 Méio MDBB, Melo RR, Morsh DS, Porto MAS. Utilização do método de Gesell na avaliação do desenvolvimento de crianças que necessitaram de terapia intensiva neonatal. J Pediatr (Rio J). 1992;68:1259. 3 4 5 Formiga CKMR, Pedrazzani ES, Tudella E. 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Developmental delay at 12 months in children born extremely preterm. Acta Paediatr. 2005;94:1604-7. 28 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):24-9 10 Moreira MEL, Rodrigues MA, Braga NA, Morsch DS. Conhecendo uma UTI neonatal. In: Moreira MEL, Braga NA, Morsch DS, organizadores. Quando a vida começa diferente; o bebê e sua família na UTI neonatal. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2003. p.29-42. (Coleção Criança, Mulher e Saúde). 11 Whitfield MF, Grunau RE. Behavior, pain perception and the extremely low birth weight survivor. Clin Perinatol. 2000;27:363-79. 12 Lamego DTC, Deslandes SF, Moreira MEL. Desafios para a humanização do cuidado em uma unidade de terapia intensiva neonatal cirúrgica. Cienc Saude Coletiva. 2005;10(3):669-75. 13 Eiser C, Eiser JR, Mayhew AG, Gibson AT. Parenting the premature infant: balancing vulnerability and quality of life. J Child Psychol Psychiatry. 2005;46:1169-77. 14 Mancini MC, Teixeira S, Araújo LG, Paixão ML, Magalhães LC, Coelho ZAC, et al. 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Pesq. 2010;17(1):24-9 2010;17(1) 29 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.30-3, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Comparação entre o uso de bocal e máscara facial na avaliação de volumes pulmonares e capacidade vital em indivíduos saudáveis Comparison between the use of mouthpiece and facemask in assessing lung volumes and vital capacity in healthy subjects Patrícia Fregadolli1, Ana Beatriz Sasseron2, Kelly Cristiane Lanzoni1, Luciana Castilho de Figueiredo4, Andrea Luciana Cardoso5, Núbia Maria Freire Vieira Lima6 Estudo desenvolvido no Setor de Fisioterapia Cardiorrespiratória do Uniararas – Centro Universitário Hermínio Ometto, Araras, SP, Brasil 1 Fisioterapeutas Especialistas em Fisioterapia Respiratória Adulto e Infantil 2 Fisioterapeuta; Profa. Especialista do Curso de Especialização (C.E.) em Fisioterapia Respiratória Adulto e Infantil do Uniararas 3 Fisioterapeuta; Profa. Dra. do C.E. em Fisioterapia Respiratória Adulto e Infantil do Uniararas 4 Fisioterapeuta; Profa. Ms. do C.E. em Fisioterapia Respiratória Adulto e Infantil do Uniararas 5 Profa. Ms. do C.E. em Neurologia Adulto da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Patricia Fregadolli R. 1-B n.412 Cidade Nova 13506-813 Rio Claro SP e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO maio 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 30 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):30-3 RESUMO: Testes de função pulmonar são usados para determinar a gravidade, as conseqüências funcionais e o progresso de disfunções pulmonares e neuromusculares. As variações metodológicas com o bocal e a máscara facial e a cooperação do paciente podem interferir no desempenho das manobras e afetar as medidas. O objetivo deste estudo foi comparar os valores de volumes pulmonares (volume corrente [Vc], volume-minuto [Vm]), freqüência respiratória (FR) e capacidade vital (CV) em indivíduos saudáveis quando avaliados por meio do bocal e da máscara facial. Participaram do estudo 60 voluntários saudáveis, 14 homens e 46 mulheres, com média de idade de 22,9±7,1 anos. Para a avaliação com bocal, utilizou-se uma peça semirrígida descartável e clipe nasal; a máscara usada foi facial plástica com borda pneumática inflável. As medidas obtidas foram comparadas estatisticamente (nível de significância 5%). Os valores obtidos com o bocal e com a máscara facial foram, respectivamente: FR, 15 rpm x 13 rpm (p<0,01); Vm, 14,87 l/min x 10,02 l/min (p<0,01); Vc, 0,93 l x 0,8 l (p<0,01); CV, 3,85 l x 3,52 l (p<0,01). Os valores de volumes pulmonares e capacidade vital mostraramse pois significativamente inferiores quando avaliados com a máscara facial em comparação ao bocal. DESCRITORES: Capacidade vital; Medidas de volume pulmonar; Testes respiratórios/ instrumentação ABSTRACT: Respiratory function tests are used to determinate severity, functional consequences and progress of pulmonary and neuromotor dysfunctions. Methodological variations – by means of a mouthpiece or a facemask – and patient’s cooperation may interfere in manoeuvre performance and affect measures. The aim of this study was to compare lung volume values (tidal volume [VT] and minute volume [Vm]), respiratory rate (RR), and vital capacity (VC) in healthy individuals when assessed by using a mouthpiece and a facemask. A total of 60 healthy subjects (14 men and 46 women), mean aged 22.86±7.14 years, were evaluated. Items used were a disposable, semi-rigid mouthpiece, with a nose clip, and a plastic facemask with pneumatic inflatable sealing. Measures obtained were statistically compared, with significance level set at 5%. Mean values obtained with the mouthpiece and the facemask were, respectively: RR, 15 rpm x 13 rpm (p<0.01); Vm, 14.87 l/min x 10.02 l/min (p<0.01); VT, 0.93 l x 0.8 l (p<0.01); and VC, 3.85 l x 3.52 l (p<0.01). Lung volumes and vital capacity values were thus shown to be significantly lower when assessed by means of a facemask than with a mouthpiece. KEY WORDS: Breath tests/instrumentation; Lung volume measurements; Vital capacity Fregadolli et al. Comparação entre bocal e máscara facial INTRODUÇÃO A monitoração da função respiratória é comumente utilizada para determinar a gravidade, as conseqüências funcionais e o progresso de diversas disfunções pulmonares, neuromusculares e outras condições1-6. Os volumes pulmonares e a capacidade vital são freqüentemente mensurados, e sua redução é uma anormalidade bastante evidente em pacientes com alterações da mecânica respiratória 1. Entretanto, valores abaixo do padrão são comuns e podem refletir, além da própria disfunção respiratória, interferência da técnica de mensuração utilizada7, podendo afetar as medidas8. A avaliação dos volumes pulmonares e da capacidade vital é realizada geralmente com o uso de uma peça bocal rígida achatada, ou circular semirrígida, acoplada entre os lábios do indivíduo9,10. O escape de ar ao redor do bocal foi um problema encontrado em alguns estudos, principalmente quando eram avaliados pacientes com presença de alterações dentárias, que afetavam a oclusão labial 8,10. De acordo com a literatura11-13, além do bocal, a máscara facial pode ser utilizada, para reduzir o risco de escape de ar durante a mensuração, podendo assim tornar as avaliações mais fidedignas. A máscara facial tem como vantagem o melhor controle sobre o vazamento, porém tem um espaço morto maior que o do bocal; este, por sua vez, apresenta maior risco de vazamento, se o indivíduo não comprimir seus lábios contra o mesmo13. Outro problema encontrado nas avaliações de função respiratória que pode levar a baixos valores nas medidas, é que o padrão respiratório pode ser facilmente influenciado pelo próprio ato de mensuração da função pulmonar, podendo causar aumentos no volume corrente, uma vez que afeta o volume-minuto e freqüência respiratória, dependendo do tipo de instrumentação utilizada14,15. Torna-se pois justificável verificar se a máscara facial é um recurso viável quanto à questão metodológica e se existe diferença entre os dados obtidos com esse método em relação ao uso do bocal. O objetivo deste estudo foi comparar os valores de volumes pulmonares (volume corrente e volume-minuto), freqüência respiratória e capacidade vital em indivíduos saudáveis quando avaliados usando o bocal e a máscara facial. METODOLOGIA Participaram deste estudo 60 voluntários saudáveis, de ambos os sexos, com média de idade de 22,86±7,14 anos. Os critérios de inclusão foram: indivíduos de ambos os sexos, saudáveis, com idade superior a 18 anos e inferior a 30 anos, ausência de doença cardiorrespiratória, neuromuscular ou de via aérea alta (gripes ou resfriados) e com capacidade de compreender as instruções dadas para a realização dos testes de avaliação da função pulmonar. Os testes foram realizados no período de novembro a dezembro de 2007, após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido e prévia aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Hermínio Ometto – Uniararas. Procedimentos Previamente à obtenção das medidas de volumes pulmonares, freqüência respiratória e capacidade vital, foi feita uma entrevista com perguntas padronizadas relacionadas aos hábitos de vida (nível de atividade física e hábitos tabagísticos), a fim de caracterizar a amostra, e a doenças prévias e atuais, para assegurar se os indivíduos estavam de acordo com os critérios de inclusão do estudo. Os indivíduos foram submetidos à medição de volumes pulmonares e capacidade vital utilizando-se bocal descartável e máscara facial. Para as avaliações realizadas com o bocal descartável (diâmetro interno de 20,5 mm e externo de 22,2 mm) foi solicitado ao participante que realizasse uma preensão labial suficiente para evitar escape de ar ao redor do bocal. Um clipe nasal evitou o escape de ar pelo nariz 16. Para as avaliações feitas com a máscara facial, foi utilizada uma máscara plástica com borda pneumática inflável e os voluntários foram instruídos a certificar-se de que esta se encontrava bem acoplada a sua anatomia facial, evitando assim o escape aéreo. As variáveis foram medidas com os indivíduos sentados e o avaliador foi responsável por evitar qualquer tipo de vazamento, otimizando o ajuste do bocal nos lábios do indivíduo ou o acoplamento da máscara sobre sua face. A ordem de aplicação do bocal e da máscara facial foi randomizada, assim como a seqüência de avaliação das variáveis estudadas. Os intervalos foram de aproximadamente um minuto entre cada manobra e todas as medidas foram realizadas pelo mesmo avaliador, com comando verbal padronizado. Para obtenção das medidas de volumes pulmonares, freqüência respiratória e capacidade vital, foi utilizado um ventilômetro Wright Mark 8 analógico (Ferraris), com visor de 35 mm, dois mostradores de 0-1 l/min e 0-100 l/min. A CV foi medida com o ventilômetro conectado ao bocal descartável semi-rígido ou à máscara facial, e determinada a partir de uma inspiração até a capacidade pulmonar total (CPT), seguida de expiração até o volume residual (VR). As medidas foram tomadas por três vezes e obtida a média entre elas2. Os volumes pulmonares e a freqüência respiratória foram medidos com o ventilômetro conectado ao bocal descartável semi-rígido ou à máscara facial. O indivíduo foi orientado a respirar tranqüilamente dentro do aparelho por um minuto para a leitura do volume-minuto (Vm). Durante esse tempo, o avaliador contou o número de respirações (freqüência respiratória, FR), para o cálculo do volume corrente (Vc), dado pela fórmula Vc = Vm/FR (litros)2. Análise estatística Foi utilizado o programa estatístico SPSS 15.0. Foi considerado erro amostral de 5%. De acordo com o erro amostral, a amostra ideal seria composta por 67 indivíduos, considerando uma população de 80 estudantes do quarto ano do curso de graduação. Sessenta deles aceitaram participar do estudo. Das varáveis numéricas e categóricas da amostra foi feita análise descritiva. Não foi encontrada distribuição normal das variáveis pelo teste de Kolgomorov-Smirnov. A correlação entre as variáveis foi calculada pelo teste de Wilcoxon. O nível de significância adotado foi de 5%. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):30-3 2010;17(1) 31 RESULTADOS Participaram deste estudo 60 indivíduos saudáveis, sendo 14 do sexo masculino e 46 do feminino, com média de idade de 22,86±7,14 anos. Destes, 12 eram fumantes e 48 não-fumantes; 23 praticavam exercícios físicos e 37 eram sedentários. Na Tabela 1 encontram-se os valores obtidos com a máscara facial e com o bocal da freqüência respiratória (FR), volume-minuto (Vm), volume corrente (Vc) e capacidade vital (CV). Em todas as variáveis, a diferença entre os dois métodos foi significativa. DISCUSSÃO Tabela 1 Variável FR Vm Vc CV Mediana dos valores de freqüência respiratória (FR, em respirações por minuto), volume-minuto (Vm, em litros por minuto), volume corrente (Vc, em litros) e capacidade vital (CV, em litros) obtidos pelos métodos de bocal e máscara, e valor de p da comparação entre os dois métodos (n=60) Bocal 15,00 14,87 0,93 3,85 Máscara 13,00 10,02 0,80 3,52 p <0,01 <0,01 <0,01 <0,01 A literatura é bastante controversa quando se trata de indicar o melhor aparato (bocal ou máscara facial) para a avaliação da função pulmonar, seja pela espirometria ou por ventilometria. Os testes de função respiratória requerem o entendimento e a participação ativa do indivíduo durante as manobras. Segundo Wohlgemuth et al.12, o uso do bocal é adequado apenas para os indivíduos capazes de acoplar bem os lábios ao redor do mesmo. O recrutamento de indivíduos saudáveis no presente estudo teve por finalidade, evitar que algum fator, como grau de cooperação17 ou alterações dentárias8, 32 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):30-3 influenciasse de maneira negativa a mensuração dos parâmetros estudados, tornando-a pouco fidedigna. No presente estudo, em todas as variáveis estudadas (FR, Vm, Vc e CV) os valores obtidos com o bocal foram maiores do que com a máscara facial (p<0,01). Quanto à FR, no estudo de Schneider et al.18, que compararam o uso da máscara facial e do bocal para ventilação mecânica não-invasiva (VMNI), houve um decréscimo na FR, quando comparados aos valores iniciais, somente quando utilizada a máscara facial (p=0,000014): com o bocal não houve esse decréscimo da FR após a sessão de VMNI. Os autores explicam que a nãoredução da FR com o uso do bocal pode ser atribuído à grande ansiedade do paciente. Rameckers et al.19 afirmam que o padrão respiratório pode ser facilmente influenciado pelo próprio ato de mensuração da função respiratória, e depende do tipo de instrumentação utilizada. Para Askanazi et al.11, os aparatos respiratórios são conhecidos por influenciar a respiração, com acréscimos no Vc, mais com a máscara do que com o bocal e o clipe nasal. Machado14 diz que a ansiedade ou claustrofobia durante a utilização da máscara facial pode ser responsável pelo aumento do trabalho respiratório e em virtude do pânico do paciente. Em contrapartida, Gilbert et al.19 mostraram que o uso do bocal com o clipe nasal resultou em aumento no Vc, porém em um decréscimo na FR e mudanças variáveis no Vm. No presente estudo, como se viu, foram verificados maiores Vc, Vm e FR e quando avaliados com o bocal do que com a máscara facial. Quanto aos valores do Vc, pode ser explicado pelo alto valor de FR e do Vm quando avaliados com o bocal, sendo que o Vc é inversamente proporcional à FR e diretamente proporcional ao Vm. Também no estudo de Wohlgemuth et al.12, que avaliaram a capacidade vital forçada por espirometria usando bocal e máscara facial, os valores obtidos com o bocal foram significativamente maiores que aqueles obtidos com a máscara facial (p<0,001), tal como no presente estudo (p<0,01). Em contrapartida, Fiore Jr. et al.10, que também compararam valores obtidos da CV pelo bocal e pela máscara facial, não encontraram diferença estatística significante entre os dois modos de avaliação. Wohlgemuth et al.12 sugerem que, ao realizarem-se as manobras de CVF com a máscara facial, em que era o pesquisador que a segurava contra o rosto dos indivíduos, alguns destes pareciam segurar o fluxo de ar durante as manobras, possivelmente pelo fato de eles próprios quererem evitar o escape de ar, falsificando assim os valores reais da CV do indivíduo. No presente estudo, os próprios indivíduos foram responsáveis por manter a máscara facial bem acoplada à face, não sendo possível observar se seguraram o fluxo de ar ou não, para tentar evitar esse escape aéreo; note-se que, nas medidas de CV, ocorre um aumento da pressão dentro da máscara (positivação da pressão), tendendo a ocorrer um deslocamento da máscara da face do indivíduo. Uma limitação deste estudo foi a utilização de um único tamanho de máscara facial na avaliação das variáveis respiratórias de todos os voluntários. A utilização do bocal e da máscara facial não são métodos questionados apenas em relação à espirometria, mas também como modo de intervenção terapêutica seja a aerossolterapia, oxigenioterapia ou VMNI. Diversos estudos também buscam o melhor método a ser utilizado nessas e outras intervenções terapêuticas18,20-22. A literatura é bastante controversa quando se trata de indicar o melhor aparato (bocal ou máscara facial) para a avaliação da função pulmonar e, apesar da interferência das variações metodológicas nas medidas, muitas vezes a escolha da interface é restrita às limitações de cada indivíduo. CONCLUSÃO Neste estudo, em todas as medidas dos volumes pulmonares, capacidade vital e freqüência respiratória, obtiveramse valores significantemente maiores com o uso do bocal do que com máscara facial. Fregadolli et al. Comparação entre bocal e máscara facial REFERÊNCIAS 1 Gibson J, Whitelaw W, Siafakas N. Tests of overall respiratory function. 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Pesq. 2010;17(1):30-3 2010;17(1) 33 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.34-9, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Efeitos da aplicação do laser de baixa potência na regeneração do nervo isquiático de ratos Effects of low-power laser on injured rat sciatic nerve regeneration Renata Batagini Gonçalves1, Jucilene Camilo Marques1, Vanessa Vilela Monte-Raso2, Ariane Zamarioli3, Leonardo César Carvalho2, Valéria Paula Sassoli Fazan4, Marcelo Rodrigo Tavares2 Estudo desenvolvido no Curso de Fisioterapia da Unifenas – Universidade José do Rosário Velano, Alfenas, MG, Brasil 1 Graduandas em Fisioterapia na Unifenas 2 Profs. Drs. do Curso de Fisioterapia da Unifenas 3 Pós-graduanda do Depto. de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da FMRP/USP – Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP 4 Profa. Dra. do Depto. de Cirurgia e Anatomia da FMRP/ USP ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Vanessa V. Monte-Raso Laboratório de Bioengenharia do RAL/FMRP/USP Av. dos Bandeirantes 3.900 Campus Universitário 14049-900 Ribeirão Preto SP e-mail: [email protected] O estudo contou com bolsa de iniciação científica do Pibic – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Unifenas APRESENTAÇÃO maio 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 34 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):34-9 RESUMO: Os nervos periféricos sofrem constantes lesões de origem traumática, o que resulta em perdas funcionais. A terapia com laser de baixa potência vem sendo utilizada para minimizar os efeitos maléficos da inflamação e acelerar o processo de cicatrização dos tecidos lesados. Este estudo teve como objetivo verificar o efeito da irradiação do laser 830 nm no comportamento do nervo isquiático de ratos submetido a esmagamento. Foram utilizados 20 ratos, todos tendo tido o nervo isquiático esmagado, divididos em 4 grupos (n=5): P7 e P14, tratamento placebo por 7 e 14 dias; L7 e L14, tratamento por laser (dosagem de 4 J/cm²) por 7 e 14 dias. Os animais dos grupos P7 e P14 foram submetidos aos mesmos procedimentos, mas com o laser desligado. Os parâmetros analisados foram presença de infiltrado inflamatório e fibroblastos, destruição da bainha de mielina e degeneração axonal. Na análise estatística foi observada diferença estatística com relação a três parâmetros: os animais do grupo L14 apresentaram maior quantidade de fibroblastos (p=0,0001), menor degeneração da bainha de mielina (p=0,007) e menor quantidade de infiltrado inflamatório (p=0,001). A aplicação do laser de baixa potência contribuiu para a redução do processo inflamatório decorrente da lesão do nervo isquiático de ratos. DESCRITORES: Nervo ciático; Regeneração nervosa; Síndromes de compressão nervosa/reabilitação; Terapia a laser de baixa intensidade ABSTRACT: Peripheral nerves are commonly subject to traumatic injuries, leading to functional loss. Low-power laser therapy has been used in order to minimize harmful effects of inflammation and to accelerate healing of injured tissues. The purpose of this study was to assess the effect of 830 nm-laser irradiation on rat sciatic nerves submitted to crush. Twenty male Wistar rats had their sciatic nerve crushed and were divided into 4 groups (n=5): Sham7 and Sham14, placebo-treated for 7 and 14 days; L7 and L14, laser-treated (at 4 J/cm²) for 7 and 14 days. Sham group animals were submitted to the same procedures, but with the laser turned off. Assessed parameters were inflammatory infiltrates, fibroblasts, myelin sheath destruction, and axonal degeneration. The statistical analysis showed significant differences in three parameters: L14 animals showed more fibroblasts (p=0.0001), lesser myelin sheath degeneration (p=0.007), and lesser inflammatory infiltrates (p=0.001). Low-power laser therapy hence contributed to reduce the inflammatory process due to rat sciatic nerve injury. KEY WORDS: Laser therapy, low level; Nerve compression syndromes/rehabilitation; Nerve regeneration; Sciatic nerve Gonçalves et al. Laserterapia na regeneração nervosa INTRODUÇÃO Os nervos periféricos são alvos de constantes lesões e podem originar deficit motor e sensitivo, gerando seqüelas para os indivíduos, dependentes do grau da lesão1,2. Nervos saudáveis têm a capacidade de estiramento e deslizamento, para permitir aumento do comprimento necessário para o movimento fisiológico dos membros 3,4. Para que ocorra função normal, é preciso que esses movimentos estejam em harmonia. A lesão traumática de um nervo provoca alterações em suas propriedades mecânicas e neuroquímicas 5-7, levando à perda da característica de acomodação dos movimentos, com conseqüente deficit mecânico. Nervos periféricos são extremamente vulneráveis à pressão. O acometimento não depende do nervo específico envolvido, mas sim da magnitude, do tipo de pressão e do tempo da compressão. Se a intensidade e a duração da compressão forem pequenas, os nervos recuperamse imediatamente ou pouco tempo após o trauma, mas se a pressão for intensa e/ ou a duração for longa, a recuperação será prolongada e freqüentemente parcial8. A velocidade de regeneração de um nervo depende de alguns fatores, como tipo, extensão e gravidade da lesão, idade do indivíduo, tipo de intervenção (invasiva por meio de cirurgia, no caso da neurotmese, ou não-invasiva), mielinização do axônio, espessura da bainha de mielina, dentre outros9,10. Inflamação é uma resposta inespecífica do corpo a diferentes lesões e é essencialmente uma resposta de proteção, que inicia o processo de reparo tecidual. Na resposta fisiológica que ocorre imediatamente após um estímulo agressivo, as células inflamatórias ficam acumuladas no sítio da lesão 11,12. No processo inflamatório após esmagamento de nervo, de acordo com George et al.13, os macrófagos, recrutados durante os primeiros dias da degeneração walleriana, bem como as células de Schwann, contribuem para o aumento dos níveis de citocinas pró-inflamatórias locais. Segundo Tavares et al.14, o laser terapêutico na dose de 4 J/cm² influencia diretamente os estágios iniciais da rea- ção inflamatória, minimizando a presença de células inflamatórias, ou seja, o laser atua como moderador da reação inflamatória local nos estágios iniciais da lesão tissular. Para aprofundar o conhecimento do processo de reparo, após lesão nervosa por esmagamento, estudos experimentais produzem lesões do tipo esmagamento em animais. Para produzir tais lesões no nervo isquiático de ratos, Bridge et al.15 utilizaram pinças hemostáticas, ou pinças de relojoeiro, observando que a lesão produzida foi do tipo axoniotmese (para gerar axoniotmese em nervos, a aplicação da pressão deve ser alta). Também validaram o método das pinças, demonstrando sua confiabilidade e reprodutibilidade. Varejão et al.16, que também produziram lesões nervosas em experimentos em animais, usaram pinças estandardizadas para produção de axoniotmese, preconizando a utilização de pinça padronizada para minimizar a variabilidade das lesões produzidas. A aplicação de recursos fisioterapêuticos é realizada com o propósito de melhorar a capacidade funcional de estruturas anatômicas deficitárias 2,14,17. O papel terapêutico do laser em casos envolvendo destruição de tecidos é bem conhecido. A irradiação do laser de baixa potência tem sido utilizada terapeuticamente para cicatrização de lesões, tratamento de artrite reumatóide, dor musculoesquelética, entre outras aplicações clínicas. Efeitos benéficos são atribuídos à fotoestimulação dos tecidos, como melhora de cicatrização de lesões ulcerativas em indivíduos diabéticos e outros tipos de úlceras 18,19, além de efeitos analgésicos 20 e antiinflamatórios 21, estímulo à proliferação de células de diferentes origens 19,22-24 e estimulação do reparo ósseo 18,24. Os benefícios originados pela radiação laser de baixa potência são gerados pelos mecanismos não-térmicos da interação da luz com os tecidos, resultando em efeitos biomodulatórios por meio de interações fotoquímicas8,24. A aplicação do laser em nervos também tem sido muito utilizada na prática clínica e descrita na literatura, sendo a laserterapia reconhecida como um adjuvante efetivo da regeneração ner- vosa8,25-30. A recuperação da função e morfologia após lesão nervosa geralmente é incompleta e imperfeita, justificando o recurso terapêutico. A radiação laser de baixa potência, aplicada direta ou transcutaneamente sobre o nervo periférico esmagado, revelou-se efetiva na recuperação e diminuição da degeneração retrógrada dos neurônios correspondentes nos segmentos espinhais8. Este estudo teve como objetivo analisar os efeitos do laser de baixa-potência na lesão experimental do nervo isquiático de ratos. METODOLOGIA A realização deste estudo foi aprovada pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal da Unifenas – Universidade José do Rosário Velano. Foram utilizados 20 ratos machos adultos da linhagem Wistar, com peso médio de 300 g. Os animais foram divididos em quatro grupos, de cinco animais cada: P7, com tratamento placebo por 7 dias após a lesão; L7, tratado com laser por 7 dias após a lesão; P14, com tratamento placebo por 14 dias após a lesão; e L14, tratado com laser por 14 dias após a lesão. O tratamento começou imediatamente após a cirurgia. Os animais dos grupos P7 e L7 foram submetidos à eutanásia no 7o dia após a lesão e os animais dos grupos P14 e L14, no 14o dia. Todos os animais foram submetidos à lesão nervosa por esmagamento. Para isso, foram anestesiados com associação de ketamina e xilazina a 50% a 0,1 ml/100g e mantidos sob contenção em uma prancha operatória apropriada. Em seguida, foi feita a tricotomia do membro inferior direito do animal e assepsia da região com álcool iodado 700 (2%). Foi efetuada secção do tegumento que recobre o músculo glúteo maior e as fibras musculares foram submetidas à divulsão, com introdução de uma pinça hemostática na região mediana do músculo. A abertura dos ramos da pinça separou as fibras musculares expondo assim a porção proximal do nervo isquiático. Em todos os animais o nervo isquiático direito foi lesionado 3 mm distal à sua emergência Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):34-9 2010;17(1) 35 As lâminas foram analisadas por microscopia de luz e os dados encontrados registrados por análise semiquantitativa da reação inflamatória, de acordo com Tavares et al. 17, sendo definida por presença de infiltrado inflamatório e de fibroblastos, degeneração da bainha de mielina e degeneração axonal. Esses parâmetros foram classificados em graus que variaram de ausente (-), presença leve (+), presença moderada (++) e presença acentuada (+++). Em seguida esses dados foram 36 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):34-9 Os resultados, sintetizados na Figura 1, mostraram que não houve diferença significativa entre os grupos com relação à degeneração axonal (p=0,29). Em relação à degeneração da bainha de mielina, o grupo P7 apresentou degeneração significantemente maior (p=0,007) que o grupo L14. Quanto ao infiltrado inflamatório, que ocorre logo após a lesão, nas lâminas do grupo L14 foi encontrada quantidade significativamente menor do que em todos os demais grupos (p=0,001). E, quanto à presença de fibroblastos, novamente no grupo L14 a quantidade foi significativamente maior do que nos demais (p=0,0001). A análise das lâminas mostrou que, após 7 dias de tratamento, no grupo tratado L7 o perineuro tinha aspecto histológico normal, enquanto no P7 apresentava-se espessado, ainda com intensos sinais inflamatórios ao redor (Figura 2). Após o tratamento por 14 dias, nas lâminas do grupo L14 podiam-se notar axônios regenerados e grande quantidade de colágeno endoneural, produzido por fibroblastos, promovendo a sustentação das estruturas do endoneuro, enquanto no grupo placebo (P14) sinais de reação inflamatória ainda estavam presentes, tanto no perineuro quanto no endoneuro, sem evidências de regeneração axonal (Figura 2). 3,5 3,5 3 Grau de presença 4 3 p<0,05 2,5 2,5 2 2 1,5 1,5 1 1 0,5 0,5 0 P7 P14 L7 Grupos Grupos Degeneração axonal p<0,05 p<0,05 p<0,05 3,5 0 L14 P7 1 P14 2 3 L7 Degeneração da bainha de mielina p<0,05 3,5 p<0,05 3 p<0,05 3 2,5 L14 4 Grupos Grau de presença Após sete aplicações de laser os animais dos grupos P7 e L7 foram submetidos à eutanásia, o mesmo ocorrendo com os dos grupos P14 e L14 após 14 aplicações. Os animais foram submetidos à eutanásia por meio de dose excessiva de anestésico Tiopental 0,5 ml/ 100 g e os nervos foram dissecados e fixados em paraformoldeído tamponado por 24 horas, em seguida incluídos em parafina e então cortados em micrótomo a uma espessura de 5 micrômetros. Na etapa final os cortes foram corados pela técnica do HE (hematoxilina-eosina) e também TG (tricômico de Gomori), para então ser realizada a verificação microscópica de possíveis alterações no tecido. RESULTADOS Grau de presença Para as aplicações de laser, foi utilizado o aparelho Laserpulse (Ibramed) com comprimento de onda de 830 nm, densidade de energia de 4 J/cm², área de feixe 0,62 cm2, potência de emissão de 30 mW, regime de irradiação contínuo e o tempo de aplicação foi calculado pelo aparelho (4 s). Os animais dos grupos L7 e L14 receberam aplicação pontual do laser, sendo disparado apenas uma vez sobre a área do nervo isquiático lesado, ou seja, região posterior do membro inferior direito. Durante as aplicações diárias, os animais não foram sedados. Os grupos P7 e P14 foram submetidos ao mesmo procedimento dos demais grupos, mas com o laser desligado. substituídos por valores numéricos da seguinte maneira: 0 para (-), 1 para (+), 2 para (++) e 3 para (+++); foram também considerados valores intermediários, tais como 0,5 para (-/+), 1,5 para (+/++) e 2,5 para (++/+++). Esses registros foram baseados na observação de dois examinadores, sendo calculada a média dos valores por eles encontrados. Para análise, esses valores foram submetidos ao teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis e ao pós-teste de Dunn, pelo programa estatístico Minitab. Grau de presença com uma pinça regulável31 calibrada com carga de 5 kg/cm2 que foi mantida no nervo isquiático por dez minutos. A pinça foi calibrada por uma máquina universal de ensaios com célula de carga de 500 N (Kratos, modelo IKE-01). Em seguida, os músculos e a pele do animal foram suturados. 2,5 2 1,5 2 1,5 1 0,5 1 0,5 0 0 P7 Figura 1 1 P14 2 L7 3 L144 P7 P7 P14 P14 L7 L7 L14 L14 Grupos Grupos Infiltrado inflamatório Quantidade de fibroblastos Degeneração axonal, degeneração da bainha de mielina, infiltrado inflamatório e proliferação de fibroblastos (média do grau de presença detectada) nas lâminas nos grupos P7, P14, L7, e L14 Gonçalves et al. Laserterapia na regeneração nervosa * L7 P7 L14 L14 Figura 2 Morfologia dos grupos placebo e tratado: perineuro (setas) normal no grupo tratado por 7 dias (L7), espessado no grupo que recebeu placebo por 7 dias (P7), com intensos sinais inflamatórios ao redor (*) (aumento final de 200X); em L14, presença de axônios regenerados (setas) e colágeno endoneural (*); em P14, sinais de reação inflamatória (setas) ainda presentes (aumento final de 400X) DISCUSSÃO O estudo do nervo isquiático de rato é um modelo experimental largamente utilizado para avaliação da função sensitiva e motora de nervos, devido ao baixo custo desse animal, fácil aquisição e manuseio. A capacidade de regeneração de ratos é similar à regeneração nervosa de primatas15 e, apesar de ser mais rápida que a regeneração em humanos, apresenta semelhança com relação à morfologia e processos fisiológicos e biológicos envolvidos. A lesão por esmagamento utilizando uma pinça31 foi selecionada neste estudo por permitir a padronização da intensidade das lesões. Além disso, trata-se de uma técnica simples que preserva a estrutura de sustentação do nervo e não necessita reparo cirúrgico30. O laser terapêutico é empregado para o tratamento fisioterapêutico de muitas doenças do sistema musculoesquelético. Nos últimos anos, a comunidade científica tem se voltado para o estudo da ação do laser de baixa potência na regeneração nervosa periférica 13,25-29, tendo definido aspectos da metodologia de aplicação, como o melhor comprimento de onda, número de aplicações e período de irradiação12. Apesar dos vários estudos, a determinação do tratamento mais eficaz para recuperação de lesão nervosa ainda não está totalmente elucidada25,32,33. De acordo com Anders et al.34, há grande variedade metodológica entre os estudos, desde o comprimento de onda do laser até os tipos de lesões provocadas, além dos parâmetros de avaliação. Apesar dos mecanismos biológicos na interação laser-tecido ainda não estarem totalmente elucidados, é evidente que a laserterapia de baixa potência influencia a regeneração do nervo periférico. Oliveira et al.35 demonstraram, num estudo experimental com nervo isquiático de ratos, que a gravidade da lesão por esmagamento é proporcional à carga aplicada e que a regeneração após o esmagamento está diretamente relacionada à gravidade da lesão inicial. Os autores mostraram também que a função motora retorna ao normal ou próximo disso no prazo de 60 dias, mesmo nas lesões produzidas por carga de 15 kgf aplicada por 10 minutos. No estudo de Endo et al.30 foi utilizado laser de baixa potência As-Ga para verificar sua ação na recuperação de nervo submetido à lesão por esmagamento com carga de 15 kg. Os animais foram tratados com dosagem de 4 J/cm2 durante dez dias consecutivos. Os autores observaram, por meio da análise histológica e morfológica dos nervos, que o laser de baixa potência As-Ga apresenta importante papel no processo regenerativo do nervo. Sotelo et al.36 observaram que a aplicação de laser HeNe proporcionou melhor regeneração do nervo lesado. Embora, no presente estudo, tenha sido utilizado o laser As-Ga, nos parâmetros já mencionados, os resultados aqui encontrados corroboram os achados de Sotelo et al.36, em que foi observada maior degeneração da bainha de mielina no grupo placebo de 7 dias do que no grupo tratado por 14 dias. Esse resultado sugere que a utilização da laserterapia por um período mais longo pode minimizar os efeitos do esmagamento do nervo. No presente estudo também foi observado que o grupo submetido à aplicação do laser por 14 dias apresentou menor quantidade de infiltrado inflamatório que os demais grupos. Esse achado está de acordo com os de outros autores sobre a ação antiinflamatória do laser3,13,17,22. Os resultados de Albertini et al. 13 mostraram que a resposta inflamatória pode ser normalizada ou reduzida pelo efeito fotoquímico da irradiação laser. Tavares et al.16 também demonstraram a ação antiinflamatória da laserterapia. No entanto, os autores avaliaram outra estrutura, o tendão. Assim, o laser mostrou-se um eficiente antiinflamatório para tendões e nervos. Devido ao fato de a lesão de nervos periféricos ser muito comum na prática clínica, a radiação laser de baixa potência é considerada um efetivo coadjuvante no tratamento para melhorar a regeneração neuronal17. Neste estudo não foi observada diferença significante entre os diferentes grupos com relação Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):34-9 2010;17(1) 37 à degeneração axonal. No entanto, a quantidade de fibroblastos foi maior no grupo submetido à irradiação laser por 14 dias. Esse dado sugere que o laser facilita a regeneração nervosa periférica, corroborando estudos prévios9,24,25. Por outro lado, Tavares et al.16 não encontraram diferença significativa quanto à presença de fibroblastos entre grupos submetidos ou não à ação do laser. Assim, os resultados apresentados sugerem que o laser de baixa potência facilita a regeneração nervosa periférica após lesão de nervo periférico de ratos9,17,25, fundamentando a utilização do laser para acelerar processos cicatriciais, em estudos experimentais e na prática clínica16. CONCLUSÃO Os resultados obtidos neste estudo permitem concluir que a terapia com aplicação do laser 830 nm, com dosagem de 4 J/cm², por 14 dias, contribuiu para a diminuição do processo inflamatório decorrente da lesão por esmagamento do nervo isquiático de ratos. REFERÊNCIAS 1 Monte-Raso VV, Barbieri CH, Mazzer N, Fasan VS. Can therapeutic ultrasound influence the regeneration of peripheral nerves? J Neurosci Methods. 2005;142:185-92. 11 Khalil Z, Helme RD. 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Pesq. 2010;17(1):34-9 2010;17(1) 39 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.40-5, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Influência do treinamento excêntrico nas razões de torque de flexores/extensores do joelho Knee torque ratio after eccentric training Fábio Juner Lanferdini1, Clarice Sperotto dos Santos Rocha2, Viviane Bortoluzzi Frasson3, Marco Aurélio Vaz4 Estudo desenvolvido no Setor de Plasticidade Neuromuscular do Laboratório de Pesquisa do Exercício (Lapex) da Esef/ UFRGS – Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil 1 Prof. Especialista do Lapex/ Esef/UFRGS 2 Profa. Ms. do Instituto Portoalegrense do Centro Universitário Metodista, Porto Alegre 3 Profa. Ms. da Faculdade de Enfermagem, Nutrição e Fisioterapia da da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre 4 Prof. Dr. associado da Esef/ UFRGS ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Prof. Fábio J. Lanferdini Setor de Plasticidade Neuromuscular/GPBIC Lapex/Esef/UFRGS R. Felizardo 750 Jardim Botânico 90690-200 Porto Alegre RS e-mail: [email protected] Estudo desenvolvido com apoio financeiro do Curso de Especialização em Cinesiologia da Esef-UFRGS. APRESENTAÇÃO jun. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 40 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):40-5 RESUMO: O treinamento excêntrico (Texc) produz adaptações musculares que minimizam a ocorrência de lesões e é usado em reabilitação e treinamento de força, mas pouco se sabe sobre seus efeitos no equilíbrio entre músculos antagonistas do joelho. As razões de torque permitem determinar esses desequilíbrios musculares. O objetivo do estudo foi avaliar os efeitos de 12 semanas de Texc nas razões de torque excêntrico (Iexc:Qexc) entre os músculos isquiotibiais (I) e quadríceps (Q). Vinte e quatro sujeitos saudáveis do sexo masculino foram distribuídos nos grupos controle (GC, n=13, idade 27,7±4,6 anos) e experimental (GE, n=11, idade 28,5±9,5 anos), submetido ao treinamento. Um dinamômetro isocinético foi utilizado para o Texc (velocidade de -60 º/s) e para as avaliações (uma a cada quatro semanas). As razões de torque medidas foram comparadas estatisticamente entre os grupos e intragrupos entre as avaliações, com nível de significância de 5%. No GE, foi observada redução das razões de torque da avaliação (AV) inicial para as demais: AV1x AV2, p=0,005; AV1x AV3, p=0,001; e AV1x AV4, p<0,001. Na avaliação final, as razões do GE foram menores quando comparadas às do GC (p=0,041). O Texc altera pois o equilíbrio dos músculos flexores e extensores do joelho: doze semanas de Texc levam à redução da razão Iexc:Qexc e ao aumento do torque extensor, sem alteração significativa do torque flexor, podendo ser usado na reabilitação para fortalecimento dos músculos extensores do joelho. DESCRITORES: Articulação do joelho; Músculo quadríceps; Técnicas de exercício e de movimento; Torque ABSTRACT: Eccentric training produces skeletal muscle adaptations that help preventing muscle injuries, being often used in rehabilitation and physical fitness programs, but little is known of the effects of this training in the balance between knee antagonistic muscles. Torque ratios allow determining such balance. The purpose of this study was to assess the effect of a 12-week eccentric training program on the eccentric torque ratio between hamstring and quadriceps muscles (Hecc:Qecc). Twenty-four healthy male subjects were assigned to either a control group (CG, n=13, aged 27.7±4.6 years) or an experimental group (EG, n=11, aged 28.5±9.5 years). An isokinetic dinamometer was used (angular velocity -60º/s) for both the eccentric training and the assessments, performed every four weeks. Torque ratios measured were statistically compared between groups and intragroups between assessments, with (significance level set at p<0.05. In EG a reduction in torque ratios was found from the initial assessment (AS1) to the other three ones: AS1x AS2, p=0.005; AS1x AS3, p=0.001; and AS1x AS4, p<0.001. At the last evaluation, EG torque ratios were lower than those of CG’s (p=0.041). Eccentric training hence changes balance between knee flexor and extensor muscles: a 12-week training program leads to lower Hecc:Qecc ratio and to extensor torque increase, with no significant change in flexor torque, being thus suitable for rehabilitation aimed at strengthening knee extensor muscles. KEY WORDS: Exercise movement techniques; Knee joint; Quadriceps muscle; Torque Lanferdini et al. Treinamento excêntrico e razões de torque INTRODUÇÃO Tanto as atividades da vida diária quanto o treinamento esportivo produzem adaptações estruturais-funcionais no músculo esquelético1. Tais adaptações alteram a capacidade de produção de força muscular e podem estar associadas a adaptações intrínsecas (estrutura muscular) e/ou extrínsecas (ativação) do músculo2. Músculos esqueléticos apresentam diferentes características morfológicas, que podem estar relacionadas à arquitetura muscular e/ou tipos de fibras musculares3. Tais características produzem diferentes adaptações intrínsecas musculares em resposta ao treinamento3,4. Essas adaptações produzidas pelas demandas funcionais impostas ao músculo podem gerar desequilíbrio muscular entre músculos antagonistas em torno de uma articulação. Esses desequilíbrios freqüentemente alteram a sobrecarga mecânica que incide sobre os tecidos e estruturas peri-articulares, o que pode ser um dos mecanismos geradores de lesão e degeneração nas articulações envolvidas5. O exercício excêntrico é um importante recurso na recuperação e prevenção de lesões do sistema musculoesquelético 6 devido ao fortalecimento das estruturas contráteis e não-contráteis (tendão e tecido conectivo) do músculo esquelético 7 , além de adaptações neurais8 que produz. Segundo Butterfield et al.9, o treinamento excêntrico altera as propriedades mecânicas do músculo devido ao aumento do número de sarcômeros em série da fibra muscular. Esse maior número de sarcômeros em série possibilita maior excursão muscular, gerando um efeito protetor da musculatura quando esta é estirada, pois possibilita maior geração de força ativa em maiores comprimentos musculares, onde geralmente ocorrem as lesões. Há evidências na área clínica dos efeitos benéficos de programas de treinamento excêntrico. O tratamento de lesões inflamatórias no tendão de Aquiles com um programa de treinamento excêntrico, por exemplo, possibilita a diminuição dos níveis de dor, auxiliando no retorno às atividades de vida diária10,11. O treinamento excêntrico também promove um aumento da força muscular. Vikne et al.12 encontraram aumento da área de secção transversa (AST) e da força muscular (26%) dos flexores do tornozelo após 12 semanas de treinamento excêntrico. Mjolsnes et al. 13 encontraram aumento (11%) do pico de torque dos músculos isquiotibiais após 10 semanas de treinamento excêntrico. Resultados semelhantes foram encontrados por Seger et al.14 (aumento de 3,5% na AST e de 35% no torque excêntrico) e por Seger e Thorstensson15 (aumento de 43% no pico de torque excêntrico) após 10 semanas de treinamento excêntrico (velocidade angular = -90º/s) dos músculos da coxa. Esses resultados sugerem diferenças na adaptação de diferentes grupos musculares ao treinamento excêntrico, o que tem implicações no delineamento de programas de reabilitação visando o fortalecimento de grupos musculares antagonistas em relação a uma determinada articulação. Apesar da importância do treinamento excêntrico para a melhora da estrutura e função muscular, prevenção e reabilitação de lesões, poucos são os estudos sobre os efeitos do treinamento excêntrico nas razões de torque entre os músculos isquiotibiais e quadríceps (razões I:Q)16-18. A razão de torque possibilita determinar os desequilíbrios musculares entre músculos antagonistas que atuam sobre uma articulação19,20. A razão de torque I:Q identifica possíveis desequilíbrios ou défices musculares que podem levar à instabilidade articular do joelho, e auxilia no diagnóstico, prevenção e tratamento das lesões ocasionadas por esses desequilíbrios 21-23. Segundo a literatura21,24, a razão I:Q do joelho em velocidades angulares baixas (60º/s) deve se situar entre 50% e 80%. Apesar dos benefícios do exercício excêntrico para a musculatura, a maioria dos estudos avaliou as razões I:Q em contrações concêntricas16,17,21-23, e raros são os estudos que avaliaram os efeitos do treinamento sobre as razões de torque excêntrico entre os músculos isquiotibiais e quadríceps (Iexc:Qexc) 17,25. Impellizzeri et al.25 encontraram uma razão Iexc:Qexc de 53% na velocidade angular de -60°/s em indivíduos saudáveis, valores semelhantes aos encontrados para contrações concêntricas. O objetivo do presente estudo foi avaliar os efeitos de 12 semanas de treinamento excêntrico de flexores e extensores do joelho nas razões de torque Iexc:Qexc. METODOLOGIA Os sujeitos assinaram um termo de consentimento livre informado para a participação do estudo, cujos procedimentos foram aprovados pelo Comitê de Ética da universidade. A amostragem foi realizada de forma intencional; a amostra foi constituída por 24 sujeitos do sexo masculino, divididos em um grupo experimental (GE, n=11, massa 70,9±9,4 kg, estatura 176±7,1 cm, idade 28,5±9,5 anos) submetidos a um programa de treinamento excêntrico dos músculos flexores e extensores do joelho, e um grupo controle (GC, n=13, massa 74,8±7,5 kg, estatura 177,0±5,6 cm, idade 27,7±4,6 anos) que não fez treinamento algum. Para participarem do estudo, os sujeitos não deveriam estar realizando nenhum tipo de treinamento de força envolvendo as musculaturas a serem analisadas e poderiam ser sedentários ou fisicamente ativos (caso fossem fisicamente ativos, não deveriam alterar a freqüência e a intensidade da atividade física durante a realização do estudo). Os critérios de exclusão do estudo incluíram: história de lesão nos músculos quadríceps e isquiotibiais ou na articulação do joelho; disfunções no sistema nervoso central e sistema nervoso periférico; doenças cardíacas, pulmonares e desnutrição. Procedimentos As avaliações foram efetuadas somente no membro inferior direito dos sujeitos, antes do início do treinamento e após a 4a, 8a e 12a semanas do treinamento excêntrico. O GC foi submetido às mesmas avaliações que o GE, para poder comparar os resultados entre os dois grupos ao longo do período de 12 semanas. Um dinamômetro isocinético (Cybex, modelo Norm, Lumes & Co., Ronkonkoma, NY, EUA) foi utilizado para a avaliação do torque. Antes do início dos testes os sujeitos foram submetidos a um período de aquecimento e alongamento da musculatura flexora e extensora do joelho; o aquecimento foi realizado em um Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):40-5 2010;17(1) 41 Para o teste o sujeito foi posicionado sentado, com a extremidade distal do membro inferior direito fixada ao braço do equipamento. O eixo de rotação do equipamento foi alinhado com o eixo de rotação aparente da articulação do joelho direito. O pico de torque foi mensurado em três contrações voluntárias máximas excêntricas dos músculos flexores e extensores do joelho na velocidade de -60°/s. Das três contrações foi selecionada aquela de maior valor de pico de torque para cada grupo muscular. Os sujeitos do GE foram submetidos a um programa de 12 semanas de treinamento excêntrico dos músculos flexores e extensores do joelho direito. O protocolo de treinamento consistiu de três sessões semanais, com duas a cinco séries de sete a nove repetições de contrações excêntricas máximas dos músculos flexores e extensores do joelho a uma velocidade angular de -60°/s, com um intervalo de 2 minutos entre as séries. O protocolo foi adaptado do estudo de Hortobágyi et al.26 e está sintetizado no Quadro 1. Note-se que o protocolo prevê aumento progressivo do volume de contrações ao longo do mês e redução do volume no início de cada novo mês, para diminuir a sobrecarga e possibilitar a adaptação muscular. Quadro 1 Protocolo de treinamento excêntrico Mês Sem Sess Séries Rep Vol 1o 1a 2a 3a 4a 2 3 3 3 2 3 3 3 7 7 8 9 14 21 24 27 2o 5a 6a 7a 8a 3 3 3 3 3 4 4 4 7 7 8 9 21 28 32 36 9a 3o 10a 11a 12a 3 3 3 3 4 5 5 5 7 7 8 9 28 35 40 45 Sem = semana; Sess = sessões; Rep = repetições; Vol= volume 42 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):40-5 Existem duas formas de se calcular desequilíbrios musculares de uma articulação. Na razão de torque funcional I:Q relaciona-se o torque concêntrico (con) de um grupo muscular com o torque excêntrico (exc) do grupo antagonista (Icon:Qexc ou Iexc:Qcon). No presente estudo foram calculadas as razões de torque convencionais excêntricas (Iexc:Qexc)15,23. Análise estatística Todos os dados foram descritos por média e desvio padrão das razões Iexc:Qexc. Uma análise de variância de dois fatores (grupo, avaliações) para medidas repetidas (avaliações) foi utilizada na comparação das razões de torque entre os grupos GC e GE. No caso de interação entre os fatores, uma análise de variância de um fator foi utilizada para verificar diferenças em razões de torque dentro de cada grupo. Análise de variância de um fator para medidas repetidas foi utilizada para comparar os dados de torque dos extensores e flexores do joelho no GE entre as diferentes avaliações. O teste post-hoc Holm-Sidak foi utilizado para verificar os efeitos principais nas diferentes avaliações dentro de cada grupo (GC e GE) e dentro de cada grupo muscular (flexor e extensor). O programa SigmaStat 3.5 foi utilizado para todas as análises, com um nível de significância de p<0,05. RESULTADOS O Gráfico 1 permite comparar os resultados entre os grupos GC e GE das razões de torque obtidas nas quatro avaliações. A razão média Iexc:Qexc do GE só foi significativamente menor que a do GC (p=0,041) na avaliação 4. O Gráfico 2 facilita comparar os resultados das quatro avaliações em cada grupo. Não foi observada diferença significativa entre as razões Iexc:Qexc das quatro avaliações do GC. No GE, observa-se uma queda na razão Iexc:Qexc da avaliação 1 para a avaliação 2, mantendo-se a redução na razão até a avaliação 4 (AV1 x AV2, p=0,005; AV1 x AV3, p=0,001; AV1 x AV4, p<0,001). A Tabela 1 mostra os valores de torque absoluto, as razões Iexc:Qexc, a variação absoluta e a variação relativa ou percentual das razões Iexc:Qexc do GE em relação à primeira avaliação. Apesar de os valores das médias de torque dos flexores do joelho aumentarem ao longo das avaliações (9 Nm na segunda avaliação, 14 Nm na terceira e 18 Nm na quarta avaliação), esse aumento não foi significativo. Em termos relativos, o torque flexor aumentou 7% na segunda avaliação, 10% na terceira e 14% na 1,0 Razão de torque Iexc:Qexc cicloergômetro por 5 minutos, a uma potência de 60 Watts; e todos fizeram alongamento ativo dos músculos flexores e extensores do joelho durante 20 segundos antes e após a realização dos testes. GC GE 0,8 * 0,6 * 0,4 0,2 0,0 AV1 AV2 AV3 AV4 Avaliações Gráfico 1 Razão de torque Iexc:Qexc (média e desvio padrão) obtida nos dois grupos, controle (GC) e experimental (GE), nas quatro avaliações, por avaliação (AV) Iexc:Qexc = razão de torque excêntrico isquiotibiais/quadríceps; * = diferença signficativa entre os grupos (p<0,05) Lanferdini et al. Treinamento excêntrico e razões de torque Razão de torque Iexc:Qexc 1,0 0,8 AV1 AV2 AV3 AV4 *†‡ 0,6 * † ‡ 0,4 0,2 0,0 Controle Experimental Grupos Gráfico 2 Razão de torque Iexc:Qexc (média e desvio padrão) obtida nos dois grupos, controle (GC) e experimental (GE), nas quatro avaliações (AV); comparação intragrupo no GE entre as avaliações: * † ‡ = p<0,05 Iexc:Qexc = razão de torque excêntrico isquiotibiais/quadríceps quarta avaliação. Já o torque extensor aumentou na segunda, terceira e quarta (p<0,001 em todas) avaliações quando comparado aos valores da primeira avaliação. Esse aumento (de 59 Nm na segunda avaliação, 69 Nm na terceira e 83 Nm na quarta) foi bem superior ao aumento do torque dos músculos flexores do joelho, representando um aumento em relação à primeira avaliação de 24% na segunda avaliação, de 28% na terceira e de 34% na quarta avaliação. DISCUSSÃO O objetivo do estudo foi verificar o efeito de 12 semanas de treinamento excêntrico no equilíbrio dos músculos flexores e extensores do joelho, por meio do cálculo das razões de torque Iexc:Qexc em sujeitos saudáveis do sexo masculino. A inexistência de diferença nas razões Iexc:Qexc entre os grupos GC e GE antes do início do treinamento excêntrico (Gráfico 1) mostra que os indivíduos dos dois grupos eram semelhantes antes do treinamento. Entretanto, após 12 semanas de treinamento, notouse redução das razões do GE, quando comparada às razões do GC. Essa redução das razões poderia ocorrer por três motivos: (1) aumento do torque extensor, (2) redução do torque flexor ou (3) uma combinação de ambos. Os resultados na Tabela 1 mostram claramente que a opção (1) foi a que ocorreu. A pequena variação do torque flexor (7 a 14%) com o treinamento excêntrico não resultou em aumento, ao passo que houve um aumento no torque extensor (de 24 para 34%) após o treinamento. Isso sugere que o treinamento excêntrico não foi eficaz em produzir ganho de força nos flexores do joelho, enquanto o contrário ocorreu nos extensores do joelho. O motivo para essa diferente resposta ao treinamento excêntrico não é totalmente conhecido, mas pode estar relacionado com a diferente arquitetura dos grupos musculares. Como os isquiotibiais são músculos com fibras longas e as porções do quadríceps apresentam fibras curtas, a sobrecarga mecânica produzida durante o exercício excêntrico (ou seja, de estiramento ativo) pode ter sido bem menor nos isquiotibiais (por apresentarem maior número de sarcômeros em série em suas fibras) comparada à sobrecarga aplicada ao quadríceps (cujas fibras sofreram maior estiramento devido ao menor número de sarcômeros em série). Apesar de ter sido utilizada a mesma sobrecarga de treinamento para ambos os grupos musculares (carga máxima), o aumento dos valores de torque foi significativo apenas para os extensores do joelho, fazendo com que as razões I:Q se afastassem de valores de normalidade21,24. Em função disso, profissionais da área da reabilitação devem escolher a carga adequada para diferentes grupos musculares no momento da elaboração dos protocolos de reabilitação. Além disso, devem levar em consideração a arquitetura muscular no momento da escolha de exercícios, possibilitando uma sobrecarga mecânica adequada aos objetivos desejados no programa de reabilitação. Lieber27 e Lieber e Fridén28 consideram os músculos do quadríceps como músculos penados, com elevados ângulos de penação de suas fibras, grande AST e fibras curtas, classificando-os como músculos de geração de força. Já os músculos isquiotibiais são classificados como fusiformes, apresentando menor ângulo de penação de suas fibras, AST intermediárias, fibras longas, e trabalham em grandes excursões musculares, sendo destinados, portanto, para velocidade. Como a velocidade de treinamento excêntrico foi relativamente baixa (60º/s), é possível que o estímulo mecânico tenha sido mais direcionado para a força e não para a velocidade, o que explicaria o aumento na capacidade de produção de força do músculo quadríceps, sem aumento nos músculos isquiotibiais após o treinamento. A ultrasonografia possibilitaria avaliar os efeitos do treinamento sobre a arquitetura muscular (comprimento dos fascículos musculares, ângulo de penação e espessura muscular29,30). Entretanto, essa tecnologia não estava disponível em nosso laboratório na época de realização do estudo. O aumento significativo dos valores de torque dos extensores do joelho do GE (34%) após o treinamento foi semelhante ao de outros estudos que aplicaram de 10 a 12 semanas de treinamento excêntrico em velocidades angulares médias. Seger et al.14 encontraram um aumento de 35% do torque extensor após treinamento em uma velocidade angular de -90º/s, enquanto Higbie et al.31 encontraram um aumento de 36,2% no pico de torque excêntrico após treinamento dos músculos extensores do joelho em uma velocidade de -60º/s. Entretanto, Blazevich et al.32 encontraram um aumento menor dos valores de torque (14%) para os músculos extensores do joelho, utilizando treinamento na velocidade angular de -30º/s. Como a sobrecarga mecânica (ou a capacidade de produção de força muscular) aumen- Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):40-5 2010;17(1) 43 ta com a diminuição da velocidade angular de movimento33, seria de se esperar que o treinamento excêntrico numa velocidade angular mais baixa produzisse um aumento percentual mais elevado no torque extensor do joelho após o treinamento. Estudos que avaliem os efeitos de programas de treinamento excêntrico com diferentes velocidades angulares sobre a capacidade de produção de força dos músculos do joelho podem esclarecer essa divergência nos resultados. Um reduzido número de estudos que utilizaram o treinamento excêntrico dos músculos flexores do joelho foi encontrado. Mjolsnes et al.13 encontraram um aumento de 11% no pico de torque excêntrico obtido na velocidade de -60º/s após 10 semanas de treinamento excêntrico dos músculos flexores do joelho. Nossos resultados (um aumento de 14% no torque flexor após o treinamento) foram semelhantes aos obtidos neste estudo. Os poucos estudos que avaliaram as razões excêntricas Iexc:Qexc encontraram razões de 0,53 (velocidade de -60º/ s) em sujeitos saudáveis25, de 0,60 em atletas com histórico de lesão nos isquiotibiais e de 0,55 em atletas sem histórico de lesão34. Os resultados aqui encontra- dos são semelhantes aos da literatura, uma vez que foram encontradas uma razão de 0,56 após quatro semanas de treinamento e de 0,47 após 12 semanas de treinamento. Poucos estudos avaliaram os efeitos do treinamento como método para evitar desequilíbrios musculares de uma determinada articulação. Aagaard et al.17 encontraram uma queda na razão Iexc:Qexc de 0,52 pré-treinamento para 0,46 pós-treinamento, na velocidade angular de -30º/s. Apesar de a velocidade utilizada pelos autores ser menor do que a utilizada no presente estudo, os resultados são semelhantes entre os estudos no que diz respeito à redução das razões de torque na avaliação póstreinamento. A comparação das avaliações intragrupo revelou semelhança nas razões Iexc:Qexc no GC (Gráfico 2). O fato de as razões terem sofrido uma redução no GE a partir da segunda avaliação sugere que quatro semanas de treinamento excêntrico são suficientes para aumentar o desequilíbrio natural entre os grupos musculares antagonistas do joelho. Os resultados do presente estudo demonstram que 12 semanas de trei- namento excêntrico determinam um aumento significativo do torque extensor, provavelmente devido à maior sobrecarga mecânica imposta aos extensores do joelho devido a sua arquitetura muscular. O maior aumento da produção de força nos extensores em relação aos flexores do joelho sugere que houve um maior aumento no número de sarcômeros em paralelo do músculo quadríceps. Trabalhos que utilizem a ultra-sonografia permitirão avaliar essa possibilidade e elucidar os mecanismos responsáveis pelas adaptações intrínsecas no sistema musculoesquelético após o treinamento excêntrico. Essas informações permitirão o aprimoramento de programas de reabilitação, tornando-os mais eficazes no tratamento de lesões musculares, assim como no delineamento de programas de treinamento excêntrico com o objetivo de prevenir lesões esportivas. CONCLUSÃO Doze semanas de treinamento excêntrico produzem uma redução das razões Iexc:Qexc e um aumento do torque extensor, sem alteração significativa do torque flexor do joelho. REFERÊNCIAS 1 2 3 4 44 5 Portes ME, Portes LA, Botelho VG, Pinto SS. Isokinetic torque peak and hamstrings/ quadriceps ratios in endurance athletes with anterior cruciate ligament laxity. Clinics. 2007;62(2):127-32. 6 Pull MR, Ranson C. Eccentric muscle actions: implications for injury prevention and rehabilitation. Phys Ther Sport. 2007;8:88-97. 7 Albert M. Treinamento excêntrico em esportes e reabilitação. São Paulo: Manole; 2002. 8 Lieber RL, Fridén J. Functional and clinical significance of skeletal muscle architecture. Muscle Nerve. 2000;23:1647-66. 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Med Sci Sports Exerc. 2006;38:1770-81. 24 Lephart SM, Ferris CM, Riemann BL, Fu FH. Gender differences in strength and lower extremity kinematics during landing. Clin Orthop Rel Res. 2001;401:162-9. 13 Mjolsnes R, Arnason A, Osthagen T, Raastad T, Bahr R. A 10-week randomized trial comparing eccentric vs. concentric hamstring strength training in well-trained soccer players. Scand J Med Sci Sports. 2004;14:311-7. 14 Seger JY, Arvidsson B, Thorstensson A. Specific effects of eccentric and concentric training on muscle strength and morphology in humans. Eur J Appl Physiol. 1998;79:49-57. 15 Seger JY, Thorstensson A. Effects of eccentric versus concentric training on thigh muscle strength and EMG. Int J Sports Med. 2005;26:45-52. 16 Baltzopoulos V, Brodie DA. Isokinetic dynamometry: applications and limitations. Sports Med. 1989;8(2):101-16. 17 Aagaard P, Simonsen EB, Trolle M, Bangsbo J, Klausen K. 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Pesq. 2010;17(1):40-5 2010;17(1) 45 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.46-51, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Relação entre cognição (função executiva e percepção espacial) e equilíbrio de idosos de baixa escolaridade Relationship between cognition (executive function and spatial perception) and balance in low educational status elderly Elaine Bazilio Custódio1, Joel Malaquias Júnior1, Mariana Callil Voos2 Estudo desenvolvido no Curso de Especialização em Fisioterapia Neurofuncional da UGF – Universidade Gama Filho, Unidade São Paulo, São Paulo, SP, Brasil 1 Especialistas em Fisioterapia Neurológica 2 Fisioterapeuta Dra. do Depto. de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Mariana C. Voos R. Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO jun. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 46 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):46-51 RESUMO: O objetivo deste estudo foi investigar se défices na percepção visuoespacial e nas funções executivas apresentariam relação com o equilíbrio em idosos de baixa escolaridade. Participaram deste estudo 38 idosos (com média de idade 69,1±6,8 anos), com um a seis anos de escolaridade formal. Os testes aplicados foram: o teste de seqüência alfa-numérica – partes A, que avalia escaneamento visual e seqüenciamento (TSA-A), B, que avalia flexibilidade mental e memória operacional (TSA-B), considerando-se ainda o delta, que avalia função executiva (TSA-D); teste de cancelamento de estrelas (TCE), que avalia percepção espacial; a escala de equilíbrio de Berg (EEB) e a escala de eficácia de quedas (falls efficacy scale – international, FES-I), que avaliam equilíbrio e risco de quedas. As correlações foram verificadas pelo teste de Spearman, com p<0,05. Foram encontradas fortes correlações significativas entre as escalas de equilíbrio (EEB e FES-I) e o TSA-B (r=0,61 e r=0,60, respectivamente); e correlações moderadas entre a EEB e o TSA-A (r=-0,51) e entre a FES-I e o TSA-D (r=0,55). Também houve correlações significativas entre as escalas de equilíbrio (EEB e FES-I) e o TCE (r=0,45 e r=-0,45, respectivamente). A função executiva e a percepção espacial apresentaram relação com o equilíbrio e com o medo de cair em idosos de baixa escolaridade. Quanto melhores forem a função executiva e a percepção espacial, melhor tenderá a ser o equilíbrio e menor tenderá a ser o medo de cair. DESCRITORES: Cognição; Envelhecimento; Equilíbrio postural; Percepção visual ABSTRACT: The aim of this study was to investigate whether spatial perception and executive function deficits might have a relationship with functional balance in low-educational status elderly. Thirty-eight volunteers (mean aged 69.1±6.8 years), having one to six years of formal education, were assessed by the following tests: part A of the trail making test (TMT-A), for visual scanning ability, and cognitive processing sequencing and speed); part B of the TMT (TMT-B), that assesses mental flexibility and working memory); delta TMT (TMT-D), that assesses executive function; the star cancellation test (SCT), that evaluates spatial perception; Berg balance scale (BBS) and the Falls Efficacy Scale - International (FES-I), both used in the assessment of balance and falls. Correlations were sought for by means of the Spearman test and the significance level was set at 0.05. Significant, strong correlations were found between the balance scales (BBS and FES-I) and TMT-B (r=-0.61 and r=0.65, respectively); and moderate correlations between BBS and TMT-A (r=-0.51), and between FES-I and TMT-D (r=0.55). Significant correlations between the balance scales (BBS and FES-I) and the SCT were also found (r=0.45 and r=-0.45, respectively). Executive function and spatial perception showed relationship with balance and fear of falling in elderly with a low educational level. The better the executive function and spatial perception, the better balance tends to be and the lower the trend to fear of falling. KEY WORDS: Aging; Cognition; Postural balance, Visual perception Custódio et al. Equilíbrio e cognição em idosos INTRODUÇÃO No Brasil, a população de idosos representa um contingente de quase 19 milhões de pessoas1 e a média de anos de estudo formal dos idosos é baixa (cerca de três anos). A baixa escolaridade e o envelhecimento associam-se à diminuição da capacidade cognitiva2. Por outro lado, um maior nível de escolaridade ocasiona maior ativação sináptica, com melhora na percepção, memória e raciocínio, o que retarda o aparecimento de demência2,3. A cognição não deve ser medida apenas por testes que detectam indivíduos com possível demência; percepção, memória, atenção, processamento de informação, raciocínio e capacidade de solucionar problemas também devem ser considerados4. As três últimas habilidades constituem a função executiva5, que é controlada pelo córtex pré-frontal, responsável pela tomada de decisão. Há evidências de que essa região seja mais afetada pelo envelhecimento do que outras áreas encefálicas6. Alguns estudos verificaram piora no desempenho em testes de função executiva com o avançar da idade7-10. A menor capacidade atencional e perceptual foi relatada em indivíduos idosos e em indivíduos de baixa escolaridade. A atenção piora com o envelhecimento e esta piora pode associar-se à perda de independência funcional11. A percepção espacial é afetada pelo nível educacional. Ao executar tarefas de busca visual, indivíduos com baixo nível educacional necessitam de mais tempo, cometem mais erros e alcançam menos alvos do que indivíduos com maior escolaridade12. Uma das maiores preocupações com relação à saúde dos idosos é a elevada taxa de quedas, que são muitas vezes causa de morbimortalidade13,14. Quase metade das internações hospitalares de idosos no Brasil é motivada por quedas15. A capacidade de manter a estabilidade postural pode ser afetada pela associação de tarefas cognitivas, principalmente se estas forem complexas6,16. Quando há maior demanda cognitiva, como ao manter o equilíbrio e executar uma tarefa simultaneamente, o desempenho é prejudicado, especialmente em pessoas com história de quedas. A porcentagem de redução de velocidade ao caminhar e falar ao mesmo tempo, em comparação a caminhar sem realizar outra tarefa, pode prever quedas13,17. Logo, a realização de uma tarefa cognitiva pode perturbar o equilíbrio e aumentar o risco de cair17. Para avaliação completa do equilíbrio é necessário relacioná-lo com a independência funcional18. Embora existam inúmeros estudos na literatura que associem alterações de equilíbrio postural com alterações visuais19, vestibulares14 ou proprioceptivas 20, poucos estudos investigaram a associação dessas alterações com défices cognitivos13,17. Com o envelhecimento, ocorre declínio do controle visuomotor e da capacidade de planejar movimentos durante a locomoção4,17. A alteração da função executiva apresenta relação com o risco de queda, pois altera a resposta à interpretação sensorial no meio ambiente6 e aumenta a exigência para o controle postural6,13,16. Não foi encontrado estudo algum que tenha determinado a relação entre percepção espacial e função executiva no equilíbrio de idosos de baixa escolaridade. A hipótese deste estudo é que tanto o prejuízo da função executiva quanto da percepção espacial, ocasionados pelo envelhecimento e pela baixa escolaridade, poderiam estar associados às alterações do equilíbrio postural. O objetivo deste estudo foi examinar se défices na percepção espacial e/ou na função executiva apresentariam relação com o equilíbrio de idosos de baixa escolaridade. METODOLOGIA Participaram 38 idosos de 60 a 82 anos, residentes na região Leste da cidade de São Paulo, recrutados em um centro de atividades de lazer para idosos. Os critérios de inclusão foram: idade acima de 59 anos, capacidade de ler, escrever, compreender e responder aos questionamentos da pesquisa, escola- ridade entre um e seis anos de estudo (classificação usada por Seo et al.21). Foi permitido o uso de lentes de correção visual. Foram excluídos indivíduos com alterações visuais (testadas com a tabela de Jaeger22), ortopédicas, neurológicas (inquiridas ao voluntário) e cognitivas (testadas pela versão validada em português do mini-exame do estado mental23, considerando <21 a nota de corte para indivíduos com escolaridade entre um e quatro anos e <24 para escolaridade acima de quatro anos). Os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Os testes aplicados foram: o teste de seqüência alfanumérica TSA (trail making test)8; teste de cancelamento de estrelas (TCE)24; a escala de equilíbrio de Berg (EEB)18; e a escala de eficácia de quedas (Falls efficacy scale - International, FES-I)25,26. A aplicação ocorreu em ordem randômica, em uma única sessão, que durou cerca de uma hora. A sala utilizada apresentava boa iluminação. O TSA8,27 foi aplicado utilizando-se ficha de avaliação, mesa, cadeira, cronômetro, fita adesiva e lápis. A folha foi alinhada ao plano sagital do tronco do voluntário e fixada na mesa com fita adesiva, para não se mover. O tempo foi cronometrado e registrado pelo examinador8,9. A parte A do TSA (TSA-A) avalia a habilidade de escaneamento visual, seqüenciamento e velocidade de processamento cognitivo7 e consiste em ligar com um lápis números de 1 a 25 espalhados desordenadamente em uma folha de papel, com cor de fundo branca e os números escritos em preto. A parte B avalia, além dos componentes descritos na parte A, a flexibilidade mental e memória operacional8,9; consiste em ligar números de 1 a 12 alternados com letras de A a M (exemplo: 1, A, 2, B etc.), numa folha semelhante. Segundo Bowie e Tabela 1 Alguns dados demográficos e clínicos dos participantes (n=38) Idade (média ± dp, desvio padrão) 69,1±6,8 anos Sexo – n (%) 28 feminino (73,7%) 10 masculino (26,3%) Escolaridade (média ± dp) 3,9±1,4 anos Mini exame do estado mental (média ± dp) 25,3±2,5 pontos Queda nos últimos dois anos – n (%) 17 sim (44,7%) 21 não (55,3%) Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):46-51 2010;17(1) 47 O TCE foi aplicado segundo recomendações de Nys et al.24 usando-se ficha de avaliação, mesa, cadeira, fita adesiva e lápis. O teste foi realizado numa folha de papel na horizontal, onde constam 52 estrelas grandes, 10 letras, e 10 palavras curtas intercaladas com 54 estrelas pequenas (27 à direita e 27 à esquerda). Assim como no TSA, a folha foi fixada à mesa. A tarefa consiste em riscar as estrelas pequenas o mais rápido possível. Essa tarefa visuomotora exploratória avalia a percepção espacial24. São registrados o tempo total do teste e o número de estrelas canceladas. Indivíduos que deixam de cancelar três ou mais estrelas podem ser considerados portadores de deficit atencional24. A EEB consiste em 14 tarefas de equilíbrio como alcançar, girar, transferir-se, permanecer em pé e levantar-se18. Os materiais usados foram cadeira com descanso de braço, banquinho, régua, cronômetro e chinelo18. Cada item recebe pontuação entre 0 e 4, com máximo de 56, que corresponde a melhor equilíbrio. É uma escala ordinal que avalia a habilidade em manter o equilíbrio estático e dinâmico durante a realização de atividades funcionais18. Pontuações entre 54 e 46 costumam indicar chance de 6 a 8% de ocorrência de quedas e, abaixo de 36, o risco é de quase 100%30. A escala de eficácia de quedas (Falls efficacy scale - international, FES-I) mede o medo de cair durante a realização de atividades diárias25,26. Foi utilizada a versão validada em português26, que consiste em 16 perguntas, cada uma pontuada de 1 (“não estou preocupado”) a 4 (“estou muito preocupado”), feitas ao voluntário, sendo as respostas registradas pelo examinador em formulário 48 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):46-51 próprio. Em um estudo prévio, indivíduos entre 60 e 75 anos apresentaram pontuação média de 29 e indivíduos acima dessa faixa apresentam média de 33 pontos26. Nessa escala, quanto mais alto o escore, maior o medo de cair. Como os dados não apresentaram distribuição normal, foi utilizado o teste nãoparamétrico de correlação de Spearman. Foram utilizados os parâmetros determinados por Mitra e Lankford28, sendo a correlação de 0,20 a 0,39 fraca; de 0,40 a 0,59, moderada; e acima de 0,59, forte. RESULTADOS A pontuação obtida nos testes pelos idosos encontra-se na Tabela 2. Os valores de p e de r das correlações calculadas encontram-se na Tabela 3. Tabela 2 Escores (média ± desvio padrão) dos idosos (n=38) nos testes de seqüência alfanumérica (parte A, TSA-A; parte B, TSA-B; delta, TSA-D, em segundos), de cancelamento de estrelas (TCE), escalas de equilíbrio de Berg (EEB) e de eficácia de quedas (FES-I) Teste TSA-A (segundos) TSA-B (segundos) TSA-D (segundos) TCE (máximo 54) EEB (máximo 56) FES-I (mínimo 16) Escore 85,7±46,1 223,0±84,1 137,3±59,6 51,7±1,9 52,0±2,0 27,5±10,4 Examinando a relação entre função executiva e equilíbrio (Tabela 3), a EEB apresentou correlações negativas moderada com o TSA-A (r=-0,51), forte com o TSA-B (r=-0,61) e fraca com o TSA-D (r=-0,34). Isso significa que, quanto menores os tempos de realização do TSA, melhor tende a ser o equilíbrio (Gráfico 1). Da FES-I, foram encontradas correlações positivas fraca com o TSA-A (r=0,34), forte com o TSA-B (r=0,60) e moderada com o TSA-D (r=0,54). Isso significa que quanto menores os tempos de realização do TSA, menor tende a ser o medo de cair (Gráfico 2). Ao analisar a relação entre percepção espacial e equilíbrio, foi encontrada Tabela 3 Coeficientes de correlação de Spearman (r e p) entre os escores médios obtidos nos testes de seqüência alfanumérica (parte A, TSA-A; parte B, TSA-B; delta, TSA-D), de cancelamento de estrelas (TCE), escalas de equilíbrio de Berg (EEB) e de eficácia de quedas (FES-I) Correlações TSA-A X FES-I TSA-A X EEB TSA-B X FES-I TSA-B X EEB TSA-D X FES-I TSA-D X EEB TCE X FES-I TCE X EEB r 0,34 -0,51 0,60 -0,61 0,54 -0,34 -0,45 0,45 p 0,037 0,001 <0,001 <0,001 <0,001 0,034 0,004 0,004 Pontuação na EEB Harvey8, indivíduos que não conseguem concluir o TSA-B em até 300 segundos recebem a pontuação máxima (300). Tanto o TSA-B quanto o delta (TSA-D, tempo de execução da parte B menos o tempo de execução da parte A) refletem a função executiva. Quanto maiores os tempos de execução do TSA-B e do delta TSA, maior a dificuldade executiva do indivíduo10. No estudo de Seo et al.21, idosos entre 60 e 90 anos, com baixa escolaridade (até seis anos), apresentaram tempo médio de 79 s no TSA-A e 206 s no TSA-B. Escore no TSA-B Gráfico 1 Relação entre o escore na parte B do teste de seqüência alfa-numérica (TSAB) e pontuação na EEB , escala de equilíbrio de Berg (r=-0,61; p<0,001) Custódio et al. Equilíbrio e cognição em idosos Pontuação na FES-I braços, fixar o olhar em um ponto no espaço para manter-se em apoio unipodálico ou com um pé exatamente à frente do outro. Isso explicaria o fato de o TSA-B apresentar correlação forte com a EEB e o TSA-A apresentar correlação moderada. Escore no TSA-B Gráfico 2 Relação entre o escore na parte B do teste de seqüência alfa-numérica (TSAB) e a pontuação na FES-I , escala de eficácia de quedas (r=0,60; p<0,001) correlação positiva moderada entre a EEB e o número de estrelas canceladas (r=0,45). Ou seja, quanto maior o número de estrelas percebidas, melhor tende a ser o equilíbrio. A FES-I apresentou correlação negativa moderada com o número de estrelas canceladas (r=-0,45): quanto maior o número de estrelas percebidas, menor tende a ser o medo de cair. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Na análise da relação entre função executiva e equilíbrio, os idosos que realizaram o TSA-B em menor tempo apresentaram maiores pontuações na EEB. Isso sugere que idosos com maior habilidade de função executiva sejam menos propensos a alterações de equilíbrio. Como a EEB também é um forte preditor de quedas 18, é possível que idosos com melhor desempenho na parte B também apresentem menor risco de quedas. Ble et al.10 constataram que a alteração executiva pode resultar na redução da capacidade de planejar estratégias motoras em idosos, influenciando a velocidade da marcha, sobretudo quando esta é realizada com outra tarefa associada. Além disso, a diminuição da velocidade ao caminhar e falar ao mesmo tempo pode prever quedas 17. A função executiva constitui um compo- nente crítico no desempenho de tarefas motoras com os membros inferiores e, portanto, é parte integrante do sistema de locomoção direcionada a um objetivo10,17. Provavelmente, tal atuação da função executiva não se restringe apenas à locomoção, mas também a outras atividades funcionais realizadas com os membros inferiores, já que, no presente estudo, idosos com alterações na função executiva apresentaram pontuações inferiores em situações que exigiam equilíbrio estático e dinâmico, realizadas com importante atuação dos membros inferiores. Acredita-se que as habilidades de escaneamento visual e de seqüenciamento, detectadas pela TSA-A7-9, também tenham importância na realização de tarefas da EEB, como transferir-se se uma cadeira a outra sem apoio dos braços, alternar as pernas em um degrau ou manter o equilíbrio com pouco apoio. Isso poderia explicar a correlação moderada entre a TSA-A e a EEB. No entanto, talvez a função executiva (medida pela parte B do TSA)8,9 tenha maior importância do que o escaneamento visual e o seqüenciamento (medidos pelo TSA-A e TSA-B) na seleção de estratégias adequadas para a realização das tarefas solicitadas na EEB, como elevar adequadamente o membro inferior para pisar no degrau sem esbarrar nele, aumentar a força no quadríceps e projetar o tronco para frente para levantar-se da cadeira sem o auxílio dos Além disso, o TSA-B pode ter sido mais adequado que o delta-TSA para avaliar a função executiva. Geralmente, quanto maior o tempo no TSA-B, maior o TSA-D e maior a alteração da função executiva10,21. Muitos idosos do presente estudo não conseguiram realizar o TSAB no tempo máximo permitido, sendo atribuída pontuação máxima (300), conforme recomendado por Bowie e Harwey8. Assim, houve efeito-teto para o TSA-B. Por outro lado, os voluntários também obtiveram pontuações altas no TSA-A. Portanto, embora tenham tido grande dificuldade em ambas as partes, A e B, do TSA, o delta-TSA foi baixo e pode não ter refletido a dificuldade de função executiva. Isso pode explicar por que as correlações entre o TSA-D e as escalas de equilíbrio, embora significativas, não tenham sido fortes. Os resultados mostram que os idosos que efetuaram o TSA-B em maior tempo e com maior TSA-D também apresentaram maior pontuação na FES-I. Isso sugere que idosos com maior dificuldade em tarefas que requerem função executiva tenham mais medo de cair. Além da relação descrita anteriormente, entre função executiva e medidas objetivas de equilíbrio como a EEB, pode-se inferir que a função executiva também interfira em medidas de maior subjetividade, como a auto-avaliação do equilíbrio. Um estudo recente de Boffino et al.29 evidenciou a relação entre medo de altura e instabilidade postural. Os autores avaliaram oscilações posturais de indivíduos com medo de altura durante uma tarefa de seguir alvos com um cursor numa tela, usando um joystick. Constataram que indivíduos com medo de altura apresentavam pior desempenho, tanto na tarefa manual quanto na manutenção postural, do que indivíduos sem medo de altura. Assim como o medo de altura, é possível que o medo de cair também esteja associado a alterações fisiológicas que geram maior dificuldade em situações de interação equilíbriocognição. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):46-51 2010;17(1) 49 As habilidades englobadas pela função executiva incluem resolução de problemas e tomada de decisão5,7. É possível que indivíduos que reflitam mais sobre a melhor forma de transpor obstáculos do ambiente com segurança, ou o melhor caminho a ser seguido para evitar quedas, ou ainda a melhor forma de carregar um objeto sem prejudicar a locomoção, utilizem melhor a função executiva para elaborar estratégias seguras para a marcha10 e tenham menos medo de cair. No exame da relação entre percepção espacial e equilíbrio, verificou-se correlação moderada entre ambas as escalas de equilíbrio e o TCE. Não foi encontrado estudo que tivesse investigado correlação utilizando esses dois testes, tampouco essa relação em indivíduos de baixa escolaridade. Porém, isoladamente, Brucki et al.12 verificaram a influência da escolaridade em testes de cancelamento e Leibowitz et al.30 descreveram evidências de que a percepção espacial contribuiria para o equilíbrio em idosos. Outro estudo recente, de Cinelli et al.31, evidenciou que o envelhecimento resul- ta em piora na estabilidade cervical e no direcionamento do olhar para alvos. Além disso, constatou relação entre essas variáveis e o equilíbrio estático e dinâmico. Portanto, idosos com pior equilíbrio apresentariam maior instabilidade cervical e diminuição da precisão de movimentos oculares, o que poderia contribuir com o esquecimento de um maior número de estrelas no teste de cancelamento. O presente estudo complementa e integra achados anteriores, ao constatar uma correlação, mesmo que moderada, entre medidas de caráter objetivo (EEB) e subjetivo (FES-I) do equilíbrio e percepção espacial. Quanto melhor o ambiente é percebido, melhores são as estratégias posturais para manutenção da estabilidade6 (o que explica a correlação positiva com a EEB) e menor é o medo de cair (o que explica a correlação negativa com a FES-I). Uma limitação do presente estudo é que há uma chance de os idosos avaliados, por apresentarem baixa escolaridade, não terem compreendido plenamente as perguntas do questionário da FES-I. A escala também requer boa memória e retenção em longo prazo, que pode estar alterada em indivíduos idosos de baixa escolaridade 21. Além disso, os idosos podem ter omitido dificuldades de locomoção e alegado indevidamente não terem medo de cair em algumas situações. Por outro lado, embora os testes cognitivos tenham apresentado correlações significativas com os testes de equilíbrio, talvez com uma amostra maior os resultados fossem ainda mais expressivos. Por fim, os testes de correlação de Spearman, utilizados no presente estudo, não implicam causa e efeito, ou seja, embora os testes tenham demonstrado uma relação entre aspectos cognitivos (função executiva e percepção espacial) e motores (equilíbrio funcional e medo de cair), não é possível concluir que alterações cognitivas resultem em alterações motoras, ou vice-versa. A função executiva e a percepção espacial parecem ter relação com o equilíbrio e com o medo de cair em idosos de baixa escolaridade. Quanto melhores forem a habilidade executiva e a percepção espacial, melhor tenderá a ser o equilíbrio e menor o medo de cair. REFERÊNCIAS 1 IBGE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais. Rio de Janeiro; 2008. Disponível em: http://www.ibge.gov.br. 2 Ott A, Breteler MMB, Harskamp F, Claus JJ, Cammen TJM, Grobbee DE, et al. Prevalence of Alzheimer’s disease and vascular dementia: association with education. 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Drs. do PPG em Ciências do Movimento Humano da Udesc ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Jerusa Schnaider R. 2500 n.205 ap.101 Centro 88330-394 Balneário Camboriú SC e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO jun. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 52 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):52-7 RESUMO: O objetivo foi avaliar se diferenças na força muscular respiratória préoperatória: a) se relacionam com outros fatores de risco pré-operatórios; e b) influenciam o risco de surgimento de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP), os tempos de permanência em ventilação mecânica (VM) e em unidade de terapia intensiva (UTI) e hospitalar após cirurgia de revascularização do miocárdio. O estudo foi observacional, prospectivo, tipo coorte. Vinte e quatro indivíduos concluíram o estudo e, após análise dos valores da manovacuometria pré-operatória, foram alocados em: G1, com pressão inspiratória máxima (PImáx) >70% do previsto (n=13, 54%); e G2, PImáx <70% do previsto (n=11, 46%). Na análise estatística adotou-se o nível de significância de 5% (p≤0,05); também foi calculado o risco relativo (RR). Os grupos foram homogêneos (p≥0,05) quanto à maioria das variáveis obtidas no pré-operatório (exceto PImáx e PEmáx) e aos dados cirúrgicos. Quase metade dos pacientes do G2, com PImáx inferior, também apresentaram pressão expiratória máxima (PEmáx) inferior à prevista. Os tempos de VM, de internação em UTI e hospitalar pós-operatória, e a presença de CPP não diferiram estatisticamente entre os grupos. Quando comparados aos do G1, os indivíduos do grupo que apresentava fraqueza muscular respiratória (G2) antes da cirurgia revelaram maior risco relativo para o desenvolvimento de complicações pulmonares pós-operatórias. DESCRITORES: Complicações pós-operatórias; Evolução clínica; Fatores de risco; Músculos respiratórios; Revascularização miocárdica/reabilitação ABSTRACT: The aim of this study was to assess whether preoperative respiratory muscle strength: a) is related to other preoperative risk factors and b) represents a higher risk to postoperative pulmonary complications (PPC), higher time under mechanical ventilation (MV), intensive care unit (ICU) and hospitalization, after myocardial revascularization surgery. Twenty-four patients were studied and, after the analysis of preoperative measures taken, divided into two groups: G1, with maximum inspiratory pressure (MIP) over 70% predicted value (n=13, 54%); and G2, with MIP below 70% predicted value (n=11, 46%). At the statistical analysis, significance level was set at 5% (p≤0.05); relative risk (RR) was also estimated. The groups were homogeneous as to most variables measured both in preoperative exams (to the exception of MIP and MEP) and as to surgical data (p≥0.05). Almost half of G2 patients, who had lower MIP, also presented maximum expiratory pressure (MEP) below predicted value. As for time under MV, postoperative ICU and in-hospital times, besides number of PPC, no statistical differences were found between the groups. When compared to G1, G2 patients showed higher relative risk to developing postoperative pulmonary complications. KEY WORDS: Clinical evolution; Miocardial revascularization/rehabilitation; Postoperative complications; Respiratory muscles; Risk factors Schnaider et al. Função respiratória em cirurgia cardíaca INTRODUÇÃO A ocorrência de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP) está vinculada a fatores de risco inerentes à anestesia, ao ato operatório e à condição clínica prévia do paciente1. A anestesia geral e o tempo cirúrgico1, a esternotomia mediana2, o uso de circulação extracorpórea3, da artéria torácica interna como enxerto4,5 e a colocação de drenos intercostais6 levam à redução da função pulmonar no pós-operatório de cirurgia cardíaca, que pode contribuir para o desenvolvimento de CPP. As CPP são as complicações mais freqüentes em cirurgias cardíacas, causando aumento da morbimortalidade e do período de internação hospitalar, com significante impacto nos custos com a saúde7,8. Essas complicações ocorrem freqüentemente entre os pacientes que já têm uma disfunção pulmonar preexistente9. Além de minimizar os riscos cirúrgicos, a avaliação e os cuidados pré-operatórios são importantes para prevenir as complicações pós-operatórias10. Para avaliação da função pulmonar, a espirometria e a manovacuometria são procedimentos de baixo custo aplicáveis antes da cirurgia para estratificação de riscos relacionados a alterações da função pulmonar e da força muscular respiratória, fatores de risco para a doença cardiovascular11. Em um estudo retrospectivo, Borges12 analisou múltiplas variáveis encontradas em prontuários a fim de identificar fatores de risco para pacientes submetidos às cirurgias valvares e de revascularização do miocárdio. Entre outras condições, identificou a fraqueza dos músculos respiratórios como fator de risco para o desenvolvimento de CPP. Fraqueza dos músculos respiratórios foi caracterizada por valores iguais ou menores que 70% do previsto para as pressões inspiratória máxima (PImáx) e expiratória máxima (PEmáx). Nesse contexto, e em função da evidência13 de que fraqueza muscular inspiratória no pré-operatório de cirurgia cardíaca em geral apresenta correlação com a capacidade funcional, justificamse estudos em diferentes condições cirúrgicas e populações. Assim, o objetivo desta pesquisa foi avaliar prospectivamente, em um grupo de pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio: a) a influência da força muscular respiratória (FRM) pré-operatória sobre os desfechos pós-operatórios tempo sob ventilação mecânica, tempo de internação em unidade de terapia intensiva, tempo total de internação pós-operatória e gênese de CPP; e b) a relação entre FMR e outros fatores de risco pré-operatórios. METODOLOGIA Este é um estudo observacional, prospectivo, tipo coorte. A coleta de dados iniciou-se após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Cardiologia de Santa Catarina, sendo realizada no período autorizado, entre os meses de agosto e novembro de 2008. A amostra foi de conveniência, consecutiva, sendo incluídos homens adultos de qualquer idade e mulheres pósmenopausa internados para realização de cirurgia de revascularização do miocárdio eletiva, via esternotomia. Os seguintes critérios de exclusão foram adotados: antecedente de cirurgia pulmonar ou cardíaca, instabilidade cardiovascular ou aneurisma, angina instável recente, dificuldade de compreensão para realização correta dos procedimentos do estudo e pacientes que não assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. No pré-operatório, os dados de identificação, do exame físico e a história clínica foram coletados: sexo, idade, massa corporal, estatura, índice de massa corpórea e presença de fatores de risco para doença arterial coronariana. Hipertensão arterial sistêmica, diabetes melito e dislipidemia tiveram confirmação diagnóstica dos médicos assistentes. O tabagismo foi classificado pelo critério: fumante – paciente que fumou no mínimo um cigarro por dia por mais de um ano, ou mais de 20 maços durante toda a vida; não-fumante – paciente que nunca fumou ou fumou menos de 20 maços durante toda a vida. Considerou-se fisicamente ativo o indivíduo que praticava atividade física moderada por mais de 30 minutos, três vezes por semana, nos últimos 12 meses14. Por fim, foram questionados a respeito da presença de outras doenças prévias, infarto miocárdio prévio e sintomas respiratórios prévios (dispnéia, tosse e/ou expectoração, especialmente nas oito últimas semanas). A avaliação pré-operatória foi complementada com a realização de espirometria e manovacuometria. No pós-operatório (PO), foram registrados os seguintes dados cirúrgicos: duração (tempo) da cirurgia1, utilização de circulação extracorpórea, número e tipo de enxertos utilizados, número de drenos colocados; e os dados clínicos e de evolução pós-operatória: tempo de ventilação mecânica (VM), tempo de internação pós-operatória (em unidade de terapia intensiva – UTI – e total), ocorrência de CPP clinicamente significativas e óbito, decorrente de causa pulmonar ou não. As CPP são classificadas em quatros níveis de gravidade, sendo definidas como “clinicamente significantes” na presença de dois ou mais itens do grau 2 ou um item dos graus 3 ou 415-17. No 7o dia PO, repetiram-se a espirometria e manovacuometria, conforme a rotina de alta hospitalar adotada para pacientes em pós-cirurgia de revascularização do miocárdio. Para a avaliação da função pulmonar foi utilizado um espirômetro digital (One Flow – FVC Kit, Clement Clarke International); as medições seguiram as diretrizes para testes de função pulmonar e os valores previstos foram estabelecidos por tabela de referência18. As medidas das pressões respiratórias máximas (PImáx e PEmáx) foram obtidas com o emprego de manovacuômetro analógico (Comercial Médica) seguindo as orientações das diretrizes para testes de função pulmonar19. Os valores obtidos foram comparados aos previstos para a população brasileira saudável20, sendo expressos em porcentagem do previsto. A avaliação da FMR permitiu alocar os pacientes em dois grupos: G1, com PImáx maior que 70% do previsto (n=13); e G2, com PImáx abaixo de 70% do previsto (n=11), condição associada a maior incidência de CPP12. O cálculo do tamanho amostral considerou valores de α=0,05 e β=0,20 e os valores de proporção de presença de CPP de um estudo21 que apresenta características metodológicas e desfechos concordantes com o presente. Presumindo proporção de presença de CPP semelhante, o tamanho amostral identificado para cada Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):52-7 2010;17(1) 53 grupo (G1 e G2) foi de 16 indivíduos. Os resultados da análise descritiva são expressos em mediana, valores mínimo e máximo ou porcentagem. A distribuição dos dados foi analisada com o teste Shapiro-Wilk. Na análise estatística empregaram-se os testes exato de Fisher (proporções) e Mann-Whitney (variáveis contínuas), com nível de significância de 5% (p=0,05). O risco relativo (RR) foi calculado para verificar a força da associação entre a disfunção muscular respiratória pré-operatória e: a) outros fatores de risco pré-operatórios; e b) os desfechos pós-operatórios – grau de CPP clinicamente significativa, tempo sob VM, tempo de internação em UTI e tempo total de internação pós-operatória. Utilizou-se o programa estatístico GraphPad InStat 3.05. RESULTADOS Durante o período de investigação, 30 pacientes foram submetidos à cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio, dos quais seis foram excluídos do estudo (dois por dificuldade de comTabela 1 Tabela 3 Medidas obtidas (mediana, mínimo e máximo) das pressões inspiratória máxima (PImáx) e expiratória máxima (PEmáx) em cmH2O no pré e pósoperatório, porcentagem (%) do previsto nos dois grupos, variação (Δ) entre o pré e pós-operatório e valor de p da comparação entre os grupos (n=24) Pressão respir. PImáx pré % do previsto PImáx pós % do previsto ' PImáx (%) PEmáx pré % do previsto PEmáx pós % do previsto ' PEmáx (%) G1 (n=13) 80 (60–110) 85,1(71,1–98,2) 60 (35–70) 55,8 (37,8–73,6) 28,2 (15,2–47,3) 90 (80–120) 97,4 (74,0–113,1) 70 (40–80) 64,9 (41,1–87,9) 34,8 (9,3–51,8) preensão dos testes, um por via de acesso cirúrgico diferente de esternotomia, dois por necessitarem de reoperação e um que solicitou exclusão da pesquisa). Assim, 24 pacientes foram avaliados durante o período peri-operatório e monitorados até a alta hospitalar. Suas características antropométricas encontram-se na Tabela 1. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos, o que evidencia que os mes- Características antropométricas (mediana, mínimo e máximo) dos pacientes dos dois grupos e valor de p da comparação entre os grupos (n=24) Característica Sexo (masc/femin) G1 (n=13) G2 (n=11) p 10/3 8/3 1,00 Idade (anos) 62 (52 –71) 61 (43 –77) Estatura (m) 1,68 (1,51 –1,78) 1,63 (1,55 –1,79) Massa corporal (kg) 77 (60 –95) 68 (60 –90) 2 29,8 (24,1 –32,2) 25,9 (22,8 –31,3) IMC (kg/m ) 0,54 0,19 0,08 0,12 IMC = índice de massa corporal Tabela 2 Distribuição (n, %) das características clínicas pré-operatórias dos pacientes dos dois grupos e valor de p da comparação entre os grupos (n=24) Característica G1 (n=13) G2 (n=11) p Tabagismo 8 (61,5) 7 (63,6) 1,00 Sedentarismo HAS 11 (84,6) 12 (92,3) 9 (81,8) 10 (90,9) 1,00 1,00 DM DLP IM prévio 5 (38,5) 12 (92,3) 11 (84,6) 5 (45,4) 11 (100,0) 8 (72,7) 1,00 1,00 0,63 SR prévios 1 (7,7) 3 (27,2) 0,30 HAS = hipertensão arterial; DM = diabetes melito; DLP = dislipidemia; IM = infarto do miocárdio; SR = sintomas respiratórios 54 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):52-7 G (n=11)2 p 60 (40–80) 57,2 (42,7–70,9) <0,001 40 (30–70) 39,2 (31,9–59,5) 0,009 13,1 (8,5–26,6) 0,001 80 (60–120) 78,6 (58,3–96,2) 0,007 50 (30–80) 46,5 (29,1–62,9) 0,004 29,1 (8,6–56,1) 0,543 mos eram homogêneos quanto à idade, massa corporal, estatura, índice de massa corporal e proporção de sexo. Em relação às características clínicas pré-operatórias (Tabela 2), os dados também evidenciam que os grupos se encontravam em condição clínica semelhante, uma vez que não houve diferença estatisticamente significativa entre eles. A manovacuometria pré-operatória mostrou que 11 pacientes (46% do total) apresentavam PImáx menor que 70% do previsto, os quais constituíram o G2. Destes, cinco (45,5% do G2 ou 20,8% do total) também apresentavam PEmáx menor que 70% do previsto. Na espirometria pré-operatória foram identificados cinco pacientes (20,8%) com valores espirométricos compatíveis com distúrbios ventilatórios (DV)18, dois com DV obstrutivo leve, um com DV obstrutivo moderado e outros dois com DV obstrutivo moderado com capacidade vital forçada (CVF) reduzida. Esses pacientes pertenciam ao G2. Este resultado foi estatisticamente significativo (p=0,01) e mostrou que pacientes com menores valores de FMR (G2) apresentam risco maior de apresentar alterações espirométricas (RR=1,83; IC 95% 1,07–3,15), quando comparados aos pacientes do G1. As medidas obtidas das (PImáx e PEmáx) dos dois grupos no pré e pósoperatório, as respectivas porcentagens do previsto e a variação entre o pré e pós-operatório são apresentadas na Tabela 3. Schnaider et al. Tabela 4 Função respiratória em cirurgia cardíaca Características das cirurgias (mediana, mínimo e máximo ou freqüência) dos pacientes dos dois grupos e valor de p da comparação entre os grupos (n=24) Característica G1 (n=13) G2 (n=11) p Tempo cirúrgico (h) 4 (3–5) 3,5 (3–9) 0,64 Tempo cirúrgico > 210’ (%) Emprego de CEC (%) 9 (69,2) 8 (61,5) 5 (45,5) 3 (27,2) 0,41 0,12 No. de enxertos Enxertos de ATI (%) 3 (1–4) 7 (53,8) 2 (1–3) 7 (63,6) 0,11 0,69 No. de drenos 2 (1–3) 2 (1–3) 0,61 CEC = circulação extracorpórea; No. = número; ATI = artéria torácica interna Tabela 5 Características da evolução pós-operatória (mediana, mínimo e máximo ou freqüência) dos pacientes dos dois grupos e valor de p da comparação entre os grupos (n=24) Característica G1 (n=13) G2 (n=11) Tempo de VM (h) 8 (4–16) 6 (4–16) Tempo de VM > 6h (%) 7 (53,8) 4 (36,4) Internação UTI (dias) 2 (2–4) 2 (2–7) Internação UTI > 2 dias (%) 5 (38,5) 5 (45,5) Alta hospitalar (dias) 8 (7–17) 9 (7–18) Alta hospitalar > 7 dias (%) 7 (53,8) 9 (81,8) CPP (graus de 1 a 4) 2 (1–4) 3 (1–4) CPP significantes (> 2+) (%) 3 (23,1) 6 (54,5) p 0,56 0,44 0,32 1,00 0,05 0,21 0,32 0,20 VM = ventilação mecânica; UTI = unidade de terapia intensiva; CPP = complicações pulmonares pós-operatórias A porcentagem do previsto da PImáx, que no pré-operatório foi utilizada como critério de alocação nos grupos, apresentou-se estatisticamente maior no pósoperatório nos dois grupos. No 7o dia PO os valores de PImáx e PEmáx estavam inferiores aos do pré-operatório, tendo a variação da PImáx (ΔPImáx) entre o pré e pós-operatório sido maior no G1 do que no G2. A porcentagem do previsto da PEmáx pré e pós-operatória foi estatisticamente maior no G1, porém a variação da PEmáx (ΔPEmáx) entre o pré e pós-operatório não foi estatisticamente diferente entre os dois grupos. Comparando-se os grupos quanto às variáveis cirúrgicas, os dados obtidos indicam que os grupos apresentaram características semelhantes (Tabela 4). Essa semelhança é considerada importante na avaliação do desenvolvimento de CPP e demais desfechos pós-operatórios. Os dados da evolução no pós operatório encontram-se na Tabela 5. Não houve diferença estatisticamente significativa na comparação entre os grupos quanto aos desfechos tempo de VM, tempo de internação na UTI, tempo de internação hospitalar pós-operatória, proporção de presença de CPP. Embora sem diferença estatística, o tempo de internação maior que sete dias ocorreu em 53,8% do G1 e 81,8% do G2. A incidência de CPP clinicamente significativa (grau >2+) foi de 23,1% no G1 e 54,5% no G2. Esses valores identificam maior risco de desenvolvimento de CPP clinicamente relevante para os indivíduos com fraqueza muscular respiratória, do G2 (RR=2,36; IC 95% 0,77–7,32), ainda que sem diferença estatística significativa. DISCUSSÃO Pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio eletiva foram acompanhados até a alta hospitalar para verificar a influência da FMR préoperatória na evolução pós-operatória. Os principais achados do estudo são a associação da fraqueza muscular respiratória pré-operatória com a presença de disfunções ventilatórias identificadas na espirometria pré-operatória e com maior risco de desenvolvimento de CPP. Em relação ao sexo e às características antropométricas da amostra estudada, não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os grupos. Isso neutraliza a possibilidade de interferência de fatores de risco como a maior mortalidade após cirurgia cardíaca encontrada entre mulheres10, maior risco de CPP associado a diferentes níveis de índice de massa corporal16,22,23 e entre pessoas com mais de 70 anos16,22, especialmente aquelas com importantes alterações fisiopatológicas e pior condição clínica1,24. Os grupos também foram homogêneos quanto às características clínicas, comorbidades e fator de risco para doença arterial coronariana. Embora com distribuição homogênea, foi encontrada alta incidência de tabagismo, sedentarismo, hipertensão arterial e diabetes melito. O tabagismo é um conhecido fator de risco para gênese das CPP, com RR=4,3 entre tabagistas24. Por outro lado, o sedentarismo está associado com maior tempo de internação hospitalar e maior número de complicações trans e pós-operatórias 14, e o diabetes pode levar ao aumento do tempo de VM nos pacientes após revascularizaçãodo miocárdio 25. Além disso, a presença de sintomas respiratórios prévios, como tosse e expectoração, aumenta os riscos de desenvolver CPP16,22. Embora não se tenha observado diferença estatística entre os grupos, o G2 mostrou-se mais exposto (27,2%) do que o G1 (7,7%), provavelmente pela associação existente entre fraqueza dos músculos respiratórios e alterações da função pulmonar. Na amostra estudada, encontrou-se alta incidência de disfunção muscular respiratória na fase pré-operatória. Esses achados são concordantes com os de outros estudos 12,13,21. Saglam et al. 12 estudaram 48 indivíduos no pré-operatório de CC e identificaram alta prevalência de fraqueza muscular inspiratória (50% com PImáx <80cmH2O), a qual apresentou correlação com a capacidade funcional dos pacientes. Destes, cerca de 19% apresentavam também PEmáx baixa. Borges12 encontrou 43,8% dos pacientes com PImáx menor que 70% Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):52-7 2010;17(1) 55 do previsto e 21,3% dos homens com PEmáx menor que 70% do previsto. A proporção de pacientes com PImáx e PEmáx abaixo de 70% do previsto no pré-operatório foi de 23,6%. Além disso, pacientes com ambas, PImáx e PEmáx, abaixo de 70% do previsto no pré-operatório de cirurgia cardíaca tinham maior risco de CPP e óbito. Outro estudo, com pacientes submetidos a toracotomias (não-cardíacas) e laparotomias superiores eletivas21, indicou que isoladamente os valores de PImáx abaixo de 75% do previsto permitem associar a disfunção muscular respiratória pré-operatória às CPP. Um quinto (20,8%) dos pacientes acompanhados no presente estudo, todos do G2, apresentaram espirometria pré-operatória alterada associada à debilidade muscular inspiratória. BorghiSilva et al.26 encontraram 49% dos pacientes candidatos à mesma cirurgia com alteração na prova de função pulmonar pré-operatória, a maioria com DV obstrutivos, tal qual no presente estudo. A associação das doenças pulmonares obstrutivas como fator de risco importante para CPP após revascularização do miocárdio é amplamente descrita1,10,16,22,24. Observou-se, ainda, que no 7o dia PO as pressões respiratórias máximas estavam significativamente inferiores às do pré-operatório, o que permite inferir que a FMR não foi restabelecida nesse período. Outros estudos26,27 confirmam esses achados. Van Belle et al. relataram ainda que a fraqueza muscular respiratória é revertida somente seis semanas após a cirurgia. Além disso, a variação na PImáx entre o pré e pós-operatório (ΔPImáx) foi maior no G1 que no G2, o que mostra que os indivíduos que já tinham debilidade muscular respiratória antes da cirurgia (G2) apresentaram menor perda percentual (18%) do que aqueles do G1 (29,3%). Porém, o mesmo não ocorreu em relação à PEmáx, já que a variação entre o pré e pós-operatório (ΔPEmáx) foi semelhante entre os dois grupos. Borghi-Silva et al.26 também observaram menor perda da força muscular expiratória (21%) do que da inspiratória 56 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):52-7 (29%) em relação aos valores pré-operatórios, no momento da alta hospitalar. Nas variáveis cirúrgicas não se encontraram diferenças estatisticamente significativas entre os grupos quanto ao tempo de cirurgia, uso de circulação extracorpórea (CEC), número e tipos de enxertos e quantidade de drenos utilizados. Embora o uso de CEC possa ser associado ao maior comprometimento pulmonar, há controvérsias quanto a sua relação com CPP e óbito6,28. Por outro lado, o tempo cirúrgico maior que 210 minutos1 representa fator de risco isolado para CPP. Também não foi encontrada diferença estatisticamente significativa quanto aos desfechos pós-operatórios tempo de VM, internação em UTI (prolongada quando superior a dois dias), tempo de internação hospitalar pós-operatória, tempo de internação hospitalar superior à prevista (7 dias), e gênese de CPP. Embora no G2 tenha havido maior incidência de CPP clinicamente significativa e internação pósoperatória superior à prevista, a diferença em relação ao G1 não atingiu significância estatística. A falta de definição consensual sobre CPP dificulta o diagnóstico, assim como a comparação entre pesquisas. Entretanto, em estudo16 que utilizou a mesma escala de graduação de CPP, e estudou o efeito de um treinamento muscular inspiratório pré-operatório em indivíduos candidatos à revascularização do miocárdio, observou-se que entre aqueles com maior FMR (grupo treinamento), apenas 18% desenvolveram CPP clinicamente significante. No grupo controle, que teve maior tempo de hospitalização pós-operatória, CPP clinicamente significante ocorreu em 35% dos pacientes. O risco relativo (RR) para o desenvolvimento de CPP encontrado neste estudo foi de 2,36 para os pacientes do G2 em relação ao G1, mas sem diferença estatística significativa. Isso indica associação entre as condições, ou seja, que a fraqueza dos músculos respiratórios é fator de risco para o desenvolvimento de CPP. Em estudo21 semelhante a este, com 70 pacientes submetidos a cirurgias torácicas não-cardíacas ou laparotomias superiores eletivas, observou-se RR=5,5 para gênese de CPP entre aqueles com PImáx pré-operatória abaixo do valor previsto. Dada a relevância de estudos que aprofundem o conhecimento sobre o papel da musculatura respiratória como contribuinte ou protetor para CPP, sugere-se a realização de estudos com amostra ampliada, em diferentes procedimentos cirúrgicos, e com avaliação dos desfechos em longo prazo, inclusive após a alta hospitalar, a fim de contribuir com a proposição de intervenções para prevenir, minimizar e/ou reverter tais complicações. O presente estudo apresentou como principal limitação o número de pacientes que o completaram. Tal fato deveuse a demandas administrativas inerentes à instituição hospitalar durante o período autorizado para coleta de dados, que levaram à redução do número de procedimentos cirúrgicos realizados e à restrição da amostra. CONCLUSÃO Encontrou-se alta prevalência de disfunção muscular respiratória no pré-operatório de cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio. Os indivíduos com disfunção muscular respiratória pré-operatória também apresentaram maior prevalência de alterações espirométricas pré-operatórias, o que indica associação entre os fatores de risco. Os dados da evolução pósoperatória (tempos de VM, de internação na UTI e de internação pós-operatória, além de CPP) não foram estatisticamente diferentes entre os grupos. Quando comparados aos do G1, os indivíduos do grupo que apresentava fraqueza muscular respiratória (G2) antes da cirurgia revelaram maior risco relativo (embora sem confirmação estatística) para o desenvolvimento de complicações pulmonares pós-operatórias. Schnaider et al. Função respiratória em cirurgia cardíaca REFERÊNCIAS 1 Faresin SM. Avaliação pré-operatória pulmonar. 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Rev Assoc Med Bras. 2007;53(1):8-9. 18 Pereira CAC. Espirometria. In: Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28(Supl 3):S1-82. 19 Souza RB. Pressões respiratórias estáticas máximas. In: Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes para testes de função pulmonar. J Pneumol. 2002;28(Supl 3):S155-65. 20 Neder JA, Andreoni S, Lerario MC, Nery LE. Reference values for lung function tests II: maximal respiratory pressures and voluntary ventilation. Braz J Med Biol Res. 1999;32:719-27. 7 Schuller D, Morrow LE. Pulmonary complications after coronary revascularization. Curr Opin Cardiol. 2000;15(5):309-15. 21 Bellinetti LM, Thomson JC. Avaliação muscular respiratória nas toracotomias e laparotomias superiores eletivas. J Bras Pneumol. 2006;32(2):99-105. 8 Calvin SH, Anthony PC. Pulmonary disfunction after cardiac surgery. Chest. 2002;121:1269-77. 22 Trayner E, Celli BR. Postoperative pulmonary complications. 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Avaliação da musculatura respiratória e dos volumes pulmonares como preditor de complicações respiratórias no pós-operatório de cirurgia cardíaca [dissertação]. Ribeirão Preto: Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP; 2008. 26 Borghi-Silva A, Pires de Lorenzo VA, Oliveira CR, Luzzi S. Comportamento da função pulmonar e da força muscular respiratória em pacientes submetidos a revascularização do miocárdio e a intervenção fisioterapêutica. Rev Bras Ter Intensiva. 2004;16(3):155-9. 13 Saglan M, Arikan H, Savci S, Inal-Ince D, Bosnak-Guclu M, Degirmence B, et al. Relationship between respiratory muscle strength, functional capacity and quality of life in pre-operative cardiac surgery patients. Eur Respir Rev. 2008;17(107):39-40. 27 Van Belle AF, Wesseling GJ, Penn OC, Wouters EF. Postoperative pulmonary function abnormalities after coronary artery bypass surgery. Respir Med. 1992;86(3):195-9. 14 Nery RM, Barbisan JN, Mahmud MI. Influência da prática de atividade física no resultado de cirurgia de revascularização miocárdica. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2007;22(3):297-302. 28 Montes FR, Maldonado JD, Paez S, Ariza F. Off-pump versus on-pump coronary artery bypass surgery and postoperative pulmonary dysfunction. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2004;18(6): 698-703. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):52-7 2010;17(1) 57 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.58-62, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Correlação entre a composição corporal e força, resistência da musculatura respiratória e capacidade de exercício em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica Correlation between body composition and respiratory muscle strength, endurance, and exercise capacity in patients with chronic obstructive pumonary disease Evanirso da Silva Aquino1, Thais Miranda Peres2, Isabel Bernardes de Vasconcellos Lopes2, Fernanda de Moraes Resgalla e Castro2, Cristiane Cenachi Coelho3, Inácio Teixeira Cunha Filho4 Estudo desenvolvido no UNIBH – Centro Universitário de Belo Horizonte, Belo Horizonte, MG, Brasil 1 Fisioterapeuta; Prof. Ms. do DCBAS – Depto. de Ciências Ambientais, Biológicas e da Saúde do UNI-BH 2 Graduandas no Curso de Fisioterapia do UNI-BH 3 Profa. Ms. do Curso de Fisioterapia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, campus de Betim, MG 4 Fisioterapeuta; Prof. Dr. do DCBAS do UNI-BH ENDEREÇO PARA RESUMO: Este estudo buscou correlações entre a composição corporal (aferida por métodos indiretos) e força, resistência da musculatura respiratória e capacidade de exercício em portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Os 30 voluntários, idosos, foram divididos em três grupos, dois de pacientes com DPOC, estáveis e controlados clinicamente, e um grupo controle, com indivíduos sem doenças pulmonares, selecionados na mesma faixa etária e biótipo daqueles com DPOC. Todos foram submetidos a espirometria e medidas das pressões respiratórias máximas para avaliação da força dos músculos respiratórios, teste de resistência dos músculos respiratórios, teste de caminhada de seis minutos (TC6'), medidas de dobras cutâneas e índice de massa corporal (IMC). Os sujeitos (6 mulheres e 24 homens) foram divididos em: grupo A, n=11, com DPOC moderado a grave (idade 69,5±10,5 anos, IMC 24,00±3,66 kg/m2); grupo B, n=10, com DPOC leve (71,1±8,1 anos, IMC 24,41±0,58 kg/m2); e grupo C controle, n=9 (70,1±5,9 anos, IMC 27,44±1,33 kg/m2). Apenas os valores de porcentagem de gordura corporal e distância caminhada (no TC6') apresentaram diferenças significativas entre os grupos. Os resultados não indicaram correlação significativa entre as variáveis analisadas. Embora a literatura aponte o estado nutricional como um dos fatores do comprometimento respiratório na DPOC, não foi encontrada correlação entre a composição corporal e os parâmetros respiratórios nos pacientes estudados. DESCRITORES: Composição corporal; Doença pulmonar obstrutiva crônica; Força muscular; Músculos respiratórios CORRESPONDÊNCIA Evanirso S. Aquino Av. Prof. Mário Werneck 2368 ap.703 Buritis 30575-180 Belo Horizonte MG e-mail: [email protected] Uma versão deste estudo foi apresentada ao congresso Chest 2005 Scientific Highlights, 2005, Montréal, Canada. APRESENTAÇÃO ago. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 58 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):58-62 ABSTRACT: This study searched for correlations between body composition (assessed by indirect methods) and respiratory muscle strength, endurance and exercise capacity in patients with chronic obstructive pulmonary disease (COPD). Thirty elderly subjects were divided into two groups of COPD patients, in clinically stable condition, and a control group, of subjects with no respiratory disease, selected so as to match COPD patients’ age and biotype. All subjects were submitted to spirometry, maximal respiratory pressures for assessing respiratory muscle strength, respiratory muscle endurance test, the six minute walking test (TC6'), and to skin folds and body mass index (BIM) measurements. Subjects (6 women, 24 men) were divided into: group A, with moderate to severe COPD, n=11 (aged 69.5±10.5, BIM 24.00±3.66 kg/m 2); group B with mild COPD, n=10 (aged 71.1±8.1, BIM 24.41±0.58 kg/m2); and control group C, n=9 (aged 70.1±5.9, BMC 27.44±1.33 kg/m2). Significant differences between the groups were found only in body fat percent and distance walked in the TC6'. Results showed no significant correlations between the analysed variables. Though literature consensually points to the nutritional status as a factor for respiratory impairment in COPD patients, no significant correlations could be found between body composition and the analysed respiratory parameters among this study subjects. KEY WORDS: Body composition; Muscle strength; Pulmonary disease, chronic obstructive; Respiratory muscles Aquino et al. Composição corporal na DPOC INTRODUÇÃO A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é considerada um problema de saúde pública, sendo a décima segunda enfermidade mais prevalente no mundo. A Organização Mundial de Saúde fez uma estimativa de que em 2020 essa doença ocupará a quinta posição no ranking mundial1,2. De acordo com as definições da Gold – Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease2, a DPOC é caracterizada por uma limitação progressiva ao fluxo aéreo, que não é totalmente reversível, e está associada a uma resposta inflamatória anormal dos pulmões a partículas ou gases nocivos. Durante a evolução da doença é comum ocorrer um balanço energético negativo, que pode estar associado ao aumento da demanda calórica e à redução da ingestão de alimentos. Isso, por sua vez, pode desencadear um estado de caquexia3,4. O prejuízo no estado nutricional dos pacientes com DPOC está relacionado à perda gradual de peso, resultando em baixo peso corporal e redução de medidas antropométricas4. Os distúrbios nutricionais evidenciados nesses pacientes podem ser responsáveis por anormalidades da musculatura periférica como, por exemplo, atrofia, fraqueza, alterações morfológicas e alterações da capacidade metabólica, com conseqüente diminuição da capacidade funcional e da qualidade de vida3,5,6. Segundo Arora e Rochester7, a má nutrição também afeta a composição e a função dos músculos respiratórios, reduzindo sua força. Ainda segundo esses autores, todo o grupo muscular envolvido na respiração é afetado pela desnutrição. Outros autores8 relatam que a diminuição da massa dos músculos respiratórios reduz a capacidade do sistema ventilatório nas respostas ao aumento das cargas elásticas e resistivas durante os exercícios ou durante exacerbações respiratórias. O quadro de má nutrição associado à limitação crônica ao fluxo aéreo e a hiperinsuflação põem os músculos inspiratórios em desvantagem mecânica, agravando ainda mais a dispnéia9,10. A redução da ventilação voluntária máxima também foi descrita como um reflexo da diminuição da resistência da musculatura respiratória. Em pacientes com aumento do trabalho respiratório, como os pacientes com DPOC, uma resistência diminuída pode predispor à ocorrência de falência respiratória7. Além disso, nesses pacientes, quando uma carga excessiva é imposta à musculatura corporal durante a prática de atividades físicas, observa-se uma limitação devido à sobrecarga nos músculos respiratórios11. As avaliações nutricionais baseadas em medidas antropométricas na DPOC são de grande importância, pois a depleção da massa magra contribui significantemente para o metabolismo anaeróbico precoce e para a diminuição do volume de oxigênio (VO2) durante a prática de exercícios12. Também já foi relatado que a redução do peso corporal e a redução da massa magra nos pacientes é conseqüência primária de um distúrbio no balanço energético13. Na prática clínica comumente são utilizados alguns métodos antropométricos para avaliação da composição corporal, como o índice de massa corporal, a circunferência de braço e as pregas cutâneas, que são vantajosos por não serem invasivos, serem de rápida realização, baixo custo e não requererem colaboração ativa do paciente4. O objetivo deste estudo foi verificar possível correlação entre o estado nutricional e parâmetros respiratórios em pacientes com DPOC, estimando-se o estado nutricional pela avaliação da composição corporal por métodos indiretos, e avaliando a força e a resistência da musculatura respiratória. METODOLOGIA Este foi um estudo transversal. Foi iniciado após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Centro Universitário de Belo Horizonte, tendo-se obtido o consentimento por escrito dos voluntários participantes. Os indivíduos selecionados foram divididos em três grupos, sendo dois grupos de pacientes com diagnóstico de DPOC e um grupo controle. Os pacientes com DPOC, recrutados em unidades básicas de saúde, deveriam estar em acompanhamento médico regular, sem crises ou exacerbações há pelo menos três meses e estáveis clinicamente no que diz respeito aos níveis de pressão arterial e oxigenação sangüínea. O grupo controle foi composto por indivíduos sem doenças pulmonares prévias, selecionados na mesma faixa etária e biotipo dos pacientes com DPOC. Foram incluídos pacientes com DPOC com classificação leve, moderada e grave de acordo com a Gold2. Os pacientes que apresentaram doenças cardiovasculares graves, disfunções neuromusculares e osteoarticulares, disfunções neuropsiquiátricas, desordens endócrinas graves e cirurgia recente foram excluídos14,15. A amostra compôs-se de 30 indivíduos, seis mulheres e 24 homens, divididos em: grupo A (n=11), de pacientes com DPOC grau moderado a grave; grupo B (n=10) de pacientes com DPOC grau leve; e grupo C, controle (n=9). Todos os participantes foram submetidos inicialmente a uma avaliação fisioterapêutica composta de identificação, história clínica e exame físico. Também foi realizada a prova de função pulmonar (espirometria), com o espirógrafo Microlab 3500, que permitiu avaliar parâmetros como a capacidade vital forçada (CVF), o volume expiratório forçado de primeiro segundo (VEF1) e o índice de Tiffeneau (VEF1/CVF). Para calcular dos valores de referência previstos foram utilizadas equações já estabelecidas na literatura16. Como indicador de força dos músculos respiratórios foram avaliadas as pressões inspiratória (PImáx) e expiratória (PEmáx) máximas, de acordo com o método proposto por Black e Hyatt17, por meio de um manovacuômetro Gerar (MV-300/300, Brasil). Para o teste de resistência dos músculos respiratórios foi utilizado um protocolo incremental18,19 com um aparelho de resistência linear pressória Threshold IMT e Threshold PEP. Os testes de resistência dos músculos inspiratórios e expiratórios foram iniciados com uma carga de 15% da PImáx e 10% da PEmáx respectivamente. Essas cargas eram aumentadas em 5 cmH2O a cada dois minutos até que o voluntário não fosse mais capaz de tolerar a carga imposta. A carga máxima considerada foi aquela que o voluntário foi capaz de sustentar por um minuto ou mais. O teste de caminhada de seis minutos (TC6') foi aplicado de acordo com as diretrizes da American Thoracic Society20, em uma pista plana, reta, com superfície rígida e comprimento de 30,6 metros. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):58-62 2010;17(1) 59 Durante todo o teste os voluntários foram monitorados constantemente quanto à freqüência cardíaca (FC) por meio de freqüencímetro portátil (Polar Electro Oy, Model 90440, Kempele, Finlândia) e à saturação de oxigênio (SpO2), por meio da oximetria de dedo (Nonim Medical, INC Model 9500 Finger Pulse Oximeter, USA). Os pacientes que já usavam oxigênio contínuo permaneceram com sua utilização durante o teste e os que apresentaram saturação abaixo de 88% em ar ambiente também usaram oxigênio até que atingissem SpO2 adequada, igual ou maior a 90%, de acordo com Carter et al.21. Os participantes fizeram o teste duas vezes; se a diferença da distância caminhada entre os dois fosse superior a 10%, um terceiro teste era realizado. Foi assegurado um intervalo mínimo de 30 minutos entre os testes. força e resistência da musculatura respiratória e TC6' o voluntário descansou por 30 minutos. Caso os pacientes com DPOC apresentassem queda da saturação de oxigênio durante qualquer um dos procedimentos, era oferecido oxigênio suplementar e, se necessário, os testes eram interrompidos. A avaliação nutricional consistiu em medição antropométrica de dobras cutâneas e circunferência de braço, e cálculo do índice de massa corporal (IMC). Foram mensuradas as seguintes pregas cutâneas: tríceps, subescapular, suprailíaca, abdominal, peitoral, medioaxilar e coxa, por meio de adipômetro (Sanny-medical Clinical do Brasil). O IMC é calculado como o peso em quilogramas dividido pelo quadrado da altura em metros. As medidas de circunferência de braço foram tomadas no membro superior não- dominante, com o braço pendente e relaxado ao lado do corpo, no ponto médio entre o acrômio e o olécrano. Foram feitas três medidas e considerada a média dos dois valores mais próximos 22 . A análise e classificação das medidas antropométricas tiveram como referência as equações propostas pela American College of Sports Medicine23 e foram realizadas pelo mesmo avaliador, após treinamento prévio, a fim de evitar discrepância entre os valores mensurados. Para cada variável foram feitas quatro medições sucessivas e a diferença entre as medidas não poderia ultrapassar 0,1 mm. O valor final foi estimado pela média aritmética das medidas. Todos os indivíduos selecionados (n=30) completaram o estudo. As médias de idade dos voluntários foram: do grupo A (DPOC moderado a grave), 69,5±10,5 anos; do grupo B (DPOC leve), 71,1±8,1 anos; e do grupo C (controle), 70,1±5,9 anos. Quanto ao peso corporal, 96,7% dos voluntários apresentaram peso ideal ou estavam acima do peso. Também foi Os voluntários dos três grupos foram avaliados sempre pelo mesmo fisioterapeuta em ambiente tranqüilo, sem interferências. Todos os procedimentos foram realizados no mesmo dia e sempre na mesma seqüência. Entre os procedimentos de espirometria, avaliação de 60 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):58-62 A análise estatística foi feita por meio do programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences). Na comparação entre os grupos foi aplicada a análise de variância Anova. As correlações foram verificadas pelo teste de correlação de Pearson. Todos os resultados foram considerados significativos ao nível de significância de 5% (p<0,05). RESULTADOS observado que os integrantes do grupo C tinham IMC maior que o grupo B (27,44±1,33 e 24,41±0,58, respectivamente), e o grupo B, por sua vez, apresentou IMC maior que o grupo A (24,00±3,66). Os valores obtidos da força dos músculos inspiratórios e expiratórios, mensurados pela PImáx e PEmáx, do tempo de resistência dos músculos respiratórios na inspiração e na expiração, da distância caminhada no TC6', da circunferência de braço e da porcentagem de gordura corporal são apresentados na Tabela 1. A Tabelas 2 e 3 mostram as comparações múltiplas entre os grupos em relação à força e resistência dos músculos respiratórios, distância caminhada no TC6', circunferência de braço e % de gordura corporal. Como pode ser observado, não foi encontrada diferença significativa entre os grupos quanto à força ou à resistência dos músculos respiratórios. Entretanto, a distância caminhada no TC6' foi significantemente menor no grupo A quando comparada aos grupos B e C. Os grupos A e B apresentaram porcentagem de gordura significantemente menor que o grupo C. Tabela 1 Valores mensurados (média±desvio padrão) das pressões máximas inspiratória (PImáx) e expiratória (PEmáx), da resistência (Res), distância caminhada no TC6’, circunferência (Circ) de braço e porcentagem de gordura dos voluntários dos grupos A, B e C Variáveis PImáx (cmH2O) PEmáx (cmH2O) Res inspiratória (s) Res expiratória (s) Distância TC6' (m) Circ de braço (mm) % de gordura Grupo A (n=11) 72,72±21,49 96,36±31,07 516,36±267,07 596,91±273,47 367,2±126,7 27,5±3,6 17,4±5,1 Grupo B (n=10) 99,00±31,07 134,00±41,95 863,70±449,05 574,70±291,68 533,3±99,6 27,5±2,9 16,9±2,9 Grupo C (n=9) 98,88±21,47 111,11±49,61 632,78±277,93 666,00±267,65 580,5±46,3 30,9±3,6 23,4±6,7 Grupo A – DPOC moderado a grave; grupo B – DPOC leve; grupo C – controle; TC6’ = teste de caminhada de 6 minutos Tabela 2 Grupos Comparação múltipla entre os grupos (média e valor de p) da força (PImáx e PEmáx) e resistência (Res) da musculatura respiratória, e da distância caminhada no TC6' PImáx(cmH2O) PEmáx(cmH2O) Res insp (s) Média p Média p Média p A x B 26,27 A x C 26,16 B x C -0,11 Res exp (s) Média p Dist TC6' (m) Média p 0,07 -37,64 0,13 -347,34 0,83 22,21 1,00 -166,05 0,002 0,08 -14,75 1,00 -116,41 1,00 -69,09 1,00 -213,26 0,001 1,00 22,89 0,70 230,92 0,46 -91,30 1,00 -47,20 0,93 Grupo A – DPOC moderado a grave; grupo B – DPOC leve; grupo C – controle; insp = inspiratória; exp = expiratória; Dist = distância caminhada; TC6’ = teste de caminhada de 6 minutos Aquino et al. Tabela 3 Composição corporal na DPOC Comparação múltipla entre os grupos (média e valor de p) da circunferência (Circ) de braço e porcentagem de gordura Circ braço (mm) % de gordura Grupos Média p Média p AxB AxC BxC 3,73 -3,36 -3,39 1,00 0,10 0,11 0,52 -5,95 -6,48 1,00 0,04 0,03 Grupo A – DPOC moderado a grave; grupo B – DPOC leve; grupo C – controle As correlações calculadas entre as variáveis antropométricas, a força e resistência dos músculos respiratórios e a distância caminhada no TC6' não foram significativas (Tabela 4). DISCUSSÃO A associação entre a doença pulmonar crônica grave e a perda de peso é um fenômeno reconhecido há tempos, mas persiste a incerteza se a perda de peso é conseqüência da doença ou se é fator de risco. Por décadas, pensou-se que a desnutrição era conseqüência inevitável na doença. Mas alguns estudos sugerem que indivíduos susceptíveis à DPOC parecem ser mais magros que os não susceptíveis24,25-27. Neste estudo, os pacientes com DPOC classificada como moderada a grave mostraram uma força da musculatura inspiratória (PImáx) menor que os indivíduos sem alterações respiratórias, entretanto sem diferenças significativas (Tabela 2), assim como foi descrito por Laghi e Tobin27. Sabe-se que a hiperinsuflação, observada nos pacientes com DPOC, provoca uma desvantagem mecânica no desempenho da musculatura respiratória, pois leva à retificação e encurtamento do diafragma, além de causar alterações celulares e moleculares que serão responsáveis por mudanças no comprimento de suas fibras, conseqüentemente reduzindo sua força de produção28,29. Portanto, a caquexia pulmonar gerada pela fraqueza muscular, bem como pela perda da capacidade oxidativa dos músculos, é responsável pela menor capacidade energética e mais estresse oxidativo, o que pode cursar com perda de massa muscular. Um estudo demonstrou que a funcio- Tabela 4 Variáveis PImáx PEmáx Res insp Res exp Dist TC6' Correlação (r e p) entre os métodos indiretos de avaliação nutricional com a força (PImáx e PEmáx) e resistência (Res) da musculatura respiratória e distância caminhada no TC6' % de gordura r p 0,20 0,064 0,69 -0,22 0,11 0,91 0,74 0,71 0,23 0,55 Circ de braço r p -0,02 0,16 0,15 -0,33 0,26 0,92 0,40 0,43 0,78 0,17 IMC r p 0,38 -0,04 0,06 -0,31 0,21 0,84 0,83 0,74 0,08 0,25 Grupo A – DPOC moderado a grave; grupo B – DPOC leve; grupo C – controle; insp = inspiratória; exp = expiratória; Dist = distância caminhada; TC6’ = teste de caminhada de 6 minutos nalidade, a massa muscular e a espessura do diafragma em pacientes estáveis com DPOC sem alteração de peso corporal, são similares quando comparados a indivíduos normais com o mesmo volume pulmonar30. O mesmo estudo também encontrou que, a partir dos 40 anos, o indivíduo apresenta uma redução fisiológica da força e da resistência da musculatura respiratória, independente de doenças pulmonares. Estas podem ser explicações para os resultados de PImáx encontrados entre os grupos (Tabela 1). Os resultados das medidas de PEmáx no presente estudo foram semelhantes aos de alguns estudos27,29, suportando a hipótese de que pacientes com DPOC podem apresentar fraqueza muscular generalizada. Os mecanismos que contribuem para essa fraqueza global são distúrbios eletrolíticos, hipoxemia, hipercapnia, descompensação cardíaca e perda de peso associada à perda muscular. Não houve diferença significativa entre os grupos quanto à força da musculatura respiratória (Tabela 2). Já foi demonstrada menor força da musculatura respiratória em pacientes com DPOC com perda de peso, mas não em pacientes sem perda de peso ou no grupo controle6,30. Esses resultados sugerem que pacientes com DPOC sem perda de peso podem ainda manter a força e massa da musculatura respiratória, em função do menor estresse oxidativo. A resistência dos músculos respiratórios pode estar aumentada em pacientes com DPOC. Segundo Laghi e Tobin27, isso ocorre devido a adaptações como a remodelação da musculatura, em que há um aumento da concentração de mitocôndrias e uma mudança na composição da fibra muscular (aumento da proporção de fibras tipo I, mais resistentes à fadiga). Essa maior resistência também foi observado neste estudo. Em relação ao IMC, um estudo30 observou que apenas três (6,6%) de 45 pacientes com DPOC grave apresentavam IMC menor que 20 kg/m2. Da mesma forma, outro estudo prospectivo amplo, com 3.126 pacientes com DPOC estudados na cidade de Barcelona, também encontrou que apenas 6,6% dos pacientes apresentavam IMC inferior a 20 kg/m2 31. No presente estudo foram observados resultados semelhantes, pois a prevalência de baixo peso corporal foi de apenas 3,3%, embora os grupos de pacientes com DPOC tenham apresentado uma porcentagem de gordura significantemente menor que o grupo controle (Tabela 3). É consenso na literatura que um precário estado nutricional, evidenciado pela perda de peso, pode comprometer os músculos respiratórios e periféricos, levando os pacientes a poder apresentar intolerância ao exercício: cerca de 40% dos pacientes com DPOC apresentam intolerância à realização de atividades físicas em função da fraqueza muscular32. Na literatura, já foram encontradas correlações significativas da função dos músculos respiratórios com alguns parâmetros antropométricos e de função pulmonar6. Entretanto, neste estudo não foi observada correlação significativa entre as variáveis nutricionais, força, resistência dos músculos respiratórios e a distância caminhada no TC6'. A perda muscular está freqüentemente mascarada em pacientes com DPOC: os pacientes podem apresentar peso corporal aumentado que, na verdade, corresponde ao edema e não à gordura. Então, pode-se afirmar que uma das limitações Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):58-62 2010;17(1) 61 do presente estudo foi ter utilizado o IMC para estimativa da composição corporal dos pacientes, já que esse parâmetro não dá indicação precisa dessa composição, embora também tenha sido usada a estimativa de porcentagem de gordura corporal. CONCLUSÃO Embora a literatura aponte o estado nutricional como um dos fatores do comprometimento respiratório na DPOC, neste estudo não foi encontrada correlação entre a composição corporal e os parâmetros respiratórios dos pacientes. REFERÊNCIAS 1 Yaksic MS, Tojo M, Cukier A, Stelmach R. Perfil de uma população brasileira com doença pulmonar obstrutiva crônica grave. J Pneumol. 2003;29(2):64-8. 2 GOLD – Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease. 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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.63-8, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Efeito da reeducação postural global no alinhamento corporal e nas condições clínicas de indivíduos com disfunção temporomandibular associada a desvios posturais Effect of global postural reeducation on body alignment and on clinical status of individuals with temporomandibular disorder associated to postural deviations Débora Basso1, Eliane Corrêa2, Ana Maria da Silva3 Estudo desenvolvido no Laboratório de Motricidade Orofacial do Serviço de Atendimento Fonoaudiológico da UFSM – Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil 1 Fisioterapeuta Ms. da Prefeitura Municipal de Bagé, RS 2 Fisioterapeuta; Profa. Dra. adjunta do Depto. de Fisioterapia e Reabilitação da UFSM 3 Fonoaudióloga; Profa. Dra. adjunta do Depto. de Fonoaudiologia da UFSM ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Débora Basso R. Gomes Carneiro 380 apt.402 Bairro Dores 97050-470 Santa Maria RS e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO ago. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 RESUMO: Este estudo visou verificar o efeito da técnica de reeducação postural global (RPG) nas condições físicas, psicológicas e psicossociais, assim como no alinhamento corporal, de indivíduos com disfunção temporomandibular (DTM) associada a desvio postural. Participaram 20 indivíduos com DTM e com desvio postural confirmado por exame físico, avaliados, antes e depois do tratamento de RPG, pelos critérios diagnósticos de desordens temporomandibulares (RDC/TMD, na sigla em inglês) e quanto às medidas angulares, por fotogrametria digital. O tratamento consistiu em 10 sessões semanais de RPG. Os resultados após o tratamento mostram, na classificação da disfunção, maior predomínio de desordens apenas musculares (em detrimento das articulares e por deslocamento de disco) e redução da intensidade da dor orofacial; o percentual de indivíduos sem depressão aumentou de 10% para 35%; o percentual de indivíduos com classificação normal de sintomas físicos (excluindo itens de dor) passou de 30% para 55%. Foi encontrada melhora estatisticamente significante na maioria das medidas angulares, exceto nos ângulos frontais dos membros inferiores e ângulo perna/retropé direito. O alinhamento horizontal da cabeça e as medidas de lordose cervical e lombar, com valores normais antes da RPG, não se modificaram. Conclui-se que, com o tratamento de RPG, os indivíduos apresentaram importantes melhoras dos sintomas físicos e psicológicos da DTM, assim como melhora do alinhamento e simetria corporais. DESCRITORES: Modalidades de fisioterapia; Postura; Transtornos da articulação temporomandibular/reabilitação ABSTRACT: The purpose of this study was to assess the effects of the technique of global postural re-education (GPR) on body alignment and clinical status of individuals with temporomandibular disorder (TMD) associated to postural deviations. Twenty individuals with both TMD and postural deviations confirmed by physical examination were assessed, before and after treatment, by the research diagnostic criteria for temporomandibular disorders (RDC/TMD) and as to body angle measures, by digital photogrammetry. Treatment consisted of 10 weekly, 45minute GPR sessions. Results after treatment show higher predominance of myogenic dysfunction (rather than joint or disc ones) and significant orofacial pain intensity relief; the percentage of individuals without depression raised from10% to 35%; the percentage of individuals with physical symptoms classified as normal (excluding pain items) raised from 30 to 55%. A statistically significant improvement was found in most body structures angle measures, except at lower limb frontal angles and at the right leg/foot angle. Head alignment and measures of cervical and lumbar lordosis, having normal values before treatment, did not change. Hence the GPR treatment may be said to have brought significant relief of TMD physical and psychological symptoms, as well as improvement in body alignment and symmetry. KEY WORDS: Physical therapy modalities; Posture; Temporomandibular joint disorders/rehabilitation Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):63-8 2010;17(1) 63 INTRODUÇÃO Disfunções temporomandibulares (DTM) são um grupo de condições dolorosas orofaciais que envolvem fatores de predisposição, início e perpetuação1,2. A associação entre desvios posturais dos ombros, coluna cervical, cabeça e outros segmentos corporais podem levar à disfunção craniocervical e, posteriormente, perpetuam os sinais e sintomas de DTM 1,3 . Os músculos mastigatórios têm íntima relação com a postura corporal, por meio de complexas conexões neuromusculares. Assim, alterações na articulação temporomandibular (ATM) podem influenciar o alinhamento postural4,5. Devido à complexidade das DTM, faz-se necessário o diagnóstico correto e precoce, para prevenir danos às funções estomatognáticas 6 . Dentre os métodos de avaliação, destacam-se os critérios de diagnóstico em pesquisa para disfunções temporomandibulares (RDC/ TMD, na sigla em inglês), que possibilitam múltiplos diagnósticos ou diagnósticos diferentes para cada ATM, bem como classificar subtipos de DTM6,7. alongamentos visando o equilíbrio das tensões miofasciais e da postura corporal como um todo18-21. Apesar de ser amplamente utilizada na prática clínica, poucos estudos comprovam os resultados terapêuticos da RPG 19,20,21 . Algumas pesquisas10,14-16 restringem-se a orientações posturais para pacientes com DTM. Assim, este estudo visou verificar o efeito da RPG no alinhamento corporal, bem como em condições físicas, psicológicas e em aspectos psicossociais de indivíduos com DTM associada a desvio postural. METODOLOGIA A coleta dos dados foi iniciada após aprovação do estudo pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Considera-se que uma criteriosa avaliação postural possa determinar os desvios e uma abordagem terapêutica dirigida para sua correção; vários estudos analisaram a relação entre postura corporal e DTM1,3,4,5,8-11. A combinação da fotografia digital a programas de informática permite medir ângulos e distâncias, como pelo software para avaliação postural SAPo12. Esse método de avaliação quantitativo possibilita identificar desvios posturais e suas possíveis complicações, permitindo ainda a comparação de valores obtidos após terapias12,13. Com a divulgação da pesquisa em jornal local, no site da universidade e por contatos com o Serviço de Odontologia da universidade, 68 indivíduos apresentaram-se para participar. Foram considerados os seguintes critérios de inclusão: indivíduos de ambos os sexos, com idade entre 20 e 35 anos; DTM diagnosticada pelo RDC/TMD, associada a desvio postural, verificado por exame físico (protocolo de Kendall22). Foram excluídos indivíduos com comprometimento neuropsicomotor, doença musculoesquelética, traumas ortopédicos, cirurgia prévia ou má formação na região orofacial, e que estivessem ou tivessem estado nos últimos seis meses sob tratamento fisioterapêutico, fonoaudiológico e/ou odontológico. Com base nesses critérios, 20 indivíduos foram selecionados para participar do estudo. Considerando que os desvios posturais desorganizam a harmonia corporal, com possíveis reflexos no sistema crânio-cérvico-mandibular5,10,14, modalidades fisioterapêuticas como exercícios posturais, eletroterapia, reeducação proprioceptiva, entre outras, parecem beneficiar tanto as DTM quanto os desvios posturais14,15. Nessas modalidades inclui-se a reeducação postural global (RPG)16-18 que, com base na noção de integração das cadeias musculares, propõe uma atuação terapêutica de Para o diagnóstico da DTM utilizou-se o questionário RDC/TMD. Desenvolvido por Dworkin e Le Resche6, contempla no eixo I os aspectos físicos, classificandoos em: grupo I, desordem muscular; grupo II, deslocamento de disco; e grupo III, outras condições articulares. O eixo II contempla aspectos psicossociais: gradua a intensidade de dor orofacial crônica em grau 0, sem dor de DTM nos seis meses prévios; grau I, baixa incapacidade e intensidade; grau II, baixa incapacidade e alta intensidade; grau III, 64 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):63-8 alta incapacidade e limitação moderada; e grau IV, alta incapacidade e limitação severa. O eixo II permite ainda classificar como normal, moderados ou severos sintomas de depressão e sintomas físicos não-específicos. A avaliação postural foi feita por fotografias com câmera digital (Sony DSC–S40, resolução de 4.1 megapixels), posicionada paralelamente a um metro do chão, sobre um tripé (Vanguard). Os sujeitos foram posicionados a três metros da câmera fotográfica nas vistas anterior, posterior e perfil esquerdo. Permaneceram na postura habitualmente adotada e, para calibrar a fotografia no programa e como referência para o alinhamento corporal, utilizou-se um fio de prumo fixado ao teto da sala. As referências anatômicas foram manualmente palpadas e demarcadas com bolas de isopor e fita adesiva duplaface, de acordo com o software para avaliação postural SAPo (v0.68)12, bilateralmente, na vista anterior em: tragus, acrômio, espinha ilíaca ântero-superior (EIAS), trocânter maior, projeção lateral da linha articular do joelho, centro da patela, tuberosidade da tíbia, maléolos laterais, maléolos mediais; na vista posterior em: ângulo inferior da escápula, terceira vértebra torácica (T3), ponto medial da perna, linha intermaleolar e tendão do calcâneo. Na vista lateral esquerda, foram marcados: tragus, sétima vértebra cervical (C7), acrômio, EIAS, espinha ilíaca póstero-superior, trocânter maior, projeção lateral da linha articular do joelho, maléolo lateral, região entre o segundo e o terceiro metatarso. A avaliação das curvas da coluna cervical e lombar também foi feita por fotografia digital, com um traçado a partir do plano vertical que tangencia a região mais proeminente da cifose torácica1,4. Reeducação postural global Os participantes submeteram-se a 10 sessões de RPG com duração de 45 minutos, uma vez por semana, adotandose duas posturas por sessão de terapia18. Inicialmente, foram trabalhadas posturas sem carga. Após os pacientes apresentarem redução das compensações, resistências e alcançarem melhor alinhamento dos segmentos corporais, foram realizadas Basso et al. DTM e desvio postural após RPG posturas com carga18,20. Nas sessões, foi enfatizada a postura mais indicada para cada paciente, bem como a função da cadeia inspiratória 18,19,21. Utilizou-se como critério na escolha das posturas de cada participante, em cada sessão, a postura global na qual a correção fosse mais difícil de ser mantida18. As avaliações e o tratamento foram efetuados sempre pela mesma fisioterapeuta. Ao final, foram realizadas reavaliações pelo RDC/TMD e por biofotogrametria. Análise dos dados A análise qualitativa dos resultados do RDC/TMD foi feita por distribuição da freqüência das alterações. As fotografias digitais foram analisadas por meio do SAPo, que fornece automaticamente o cálculo das medidas angulares. Os valores de referência do software são: zero grau para alinhamento vertical e horizontal da cabeça, dos acrômios, das EIAS, das tuberosidades das tíbias, ângulo entre os acrômios e EIAS, assimetria das escápulas em relação à T3, e plano frontal e sagital; 15 graus para os ângulos Q direito e esquerdo; ausência de diferença de comprimento dos membros inferiores (0,0 cm)12. Para o ângulo frontal do membro inferior e ângulo entre a perna e o retropé, o alinhamento vertical do tronco e do corpo, o alinhamento horizontal da pélvis, ângulos do quadril, do joelho e do tornozelo, sem referências estabelecidas pelo programa, compararam-se os valores antes e após a RPG utilizando-se o alinhamento em relação ao fio de prumo. Assim, nas vistas anterior e posterior, o fio de prumo deveria passar por entre os maléolos mediais, estender-se entre os membros inferiores (MMII) passando pela linha média da pelve, coluna e cabeça. Na vista lateral, este deveria passar ligeiramente anterior ao maléolo lateral e à articulação do joelho; levemente posterior à articulação do quadril, próximo ao meio do tronco, no meio do ombro, e pelo conduto auditivo externo22. O alinhamento horizontal da cabeça, em perfil, foi avaliado pelo ângulo formado pela C7, linha horizontal e tragus, conforme o software SAPo. Como valor de referência, uma vez que não se en- contra descrito no software, foi considerado o ângulo de 48,9±6,5°, conforme estudo de Raine e Twomey23. Como parâmetro de normalidade para a curva cervical, considerou-se a distância do plano da cifose torácica de 6 a 8 cm e, para a curva lombar, de 4 a 6 cm. Valores abaixo destes para cada região foram consideradas curvas diminuídas, sendo valores acima destes curvas lordóticas aumentadas1,4. Analisaram-se os dados fotogramétricos por meio do teste de Lilliefors. Como tais dados não seguiram distribuição normal, efetuou-se análise pelo teste nãoparamétrico de Wilcoxon. Foi considerada significância de 5%. RESULTADOS Pelos resultados do eixo I do RDC/ TMD, 100% dos participantes apresentavam DTM; na avaliação inicial, 55% Tabela 1 Distribuição (%) do diagnóstico de DTM nos diferentes subgrupos do eixo I do RDC/TMD, antes (pré) e depois (pós) do programa de RPG – reeducação postural global (n=20) Diagnóstico Pré-RPG (%) Pós-RPG (%) Grupo I 55 75 Grupos I e II 5 5 Grupos I e III 35 15 Grupos I, II e III 5 0 Sem diagnóstico 0 5 RDC/TMD = critérios de diagnóstico em pesquisa para disfunções temporomandibulares; Grupo I = desordem muscular; Grupo II = deslocamento de disco; Grupo III = outras condições articulares Tabela 2 deles foram classificados no grupo I. Ao final do tratamento, em um participante observou-se completa extinção da disfunção; e aumentou bastante o predomínio da classificação no grupo I (75%, Tabela 1). No eixo II, verificou-se redução da intensidade da dor orofacial crônica. Observou-se melhora dos sintomas físicos incluindo itens de dor, sendo que a classificação “normal” passou de 10 para 30% dos pacientes. Nos sintomas físicos excluindo itens de dor, a classificação “normal” passou a abranger 55%; o percentual de indivíduos sem depressão aumentou de 10 para 35% após a RPG (Tabela 2). Quanto à postura corporal, no exame físico realizado pelo protocolo de Kendall22, observaram-se os seguintes desvios: anteriorização e inclinação lateral da cabeça, rotação e elevação dos ombros, retificação da coluna cervical, flexão de cotovelos, hiperlordose lombar, rotação de pélvis, hiperextensão de joelhos e pés pronados. Após a RPG, encontraram-se diferenças significantes, para melhor, em 19 das 25 medidas angulares calculadas. Na vista anterior, houve melhora do alinhamento horizontal da cabeça, dos acrômios, das EIAS, e das tuberosidades das tíbias; dos ângulos entre os acrômios e EIAS, Q direito e esquerdo; da diferença de comprimento dos MMII, e da assimetria do plano frontal (Tabela 3). Na vista posterior, houve melhora da assimetria horizontal das escápulas em relação à T3 e no ângulo entre a perna e o retropé esquerdo (Tabela 4). Na vista lateral esquerda, verificou-se melhora significante do alinhamento vertical da cabeça, do tronco e do corpo; do alinhamento horizontal da pélvis; dos ângulos do quadril, do joelho e do tornozelo, e na assimetria do plano sagital (Tabela 5). Distribuição (%) da classificação dos sintomas diagnosticados pelo eixo II do RDC/TMD, antes (pré) e depois (pós) do programa de RPG – reeducação postural global (n=20) SFID SFED Depressão Pré-RPG(%) Pós-RPG(%) Pré-RPG(%) Pós-RPG(%) Pré-RPG(%) Pós-RPG(%) Normal 10 30 30 55 10 35 Moderado 40 50 35 40 50 40 Severo 50 20 35 5 40 25 Classificação RDC/TMD = critérios de diagnóstico em pesquisa para disfunções temporomandibulares; SFID = sintomas físicos incluindo itens de dor; SFED = sintomas físicos excluindo itens de dor Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):63-8 2010;17(1) 65 Tabela 3 Medidas da avaliação postural (média ± desvio padrão) na vista anterior, antes (pré) e depois (pós) do programa de reeducação postural global (RPG), e valor de p da comparação entre pré e pós (n=20) Item postural da vista anterior Alinh horiz cabeça (°) Alinh horiz acrômios (°) Alinh horiz EIAS (°) Ângulo acrômios/EIAS (°) Ângulo frontal do MID (°) Ângulo frontal do MIE (°) Diferença comprimento MMII (cm) Alinh horiz tuberosidades da tíbia (°) Ângulo Q direito (°) Ângulo Q esquerdo (°) Assimetria no plano frontal (%) Pré-RPG 1,72±1,71 1,35±1,08 1,35±0,70 2,15±1,46 2,43±1,76 3,20±2,46 1,04±0,50 2,08±1,48 21,17±8,24 25,24±7,67 0,10±0,13 Pós-RPG 0,59±0,90 0,68±0,57 0,64±0,71 0,99±0,84 2,35±1,39 3,21±2,67 0,52±0,40 0,89±0,97 18,85±5,94 22,90±7,40 0,06±0,07 p 0,0022 0,0014 0,0006 0,0004 0,9030 0,4781 0,0002 0,0006 0,0130 0,0008 0,0333 Alinh horiz = alinhamento horizontal; EIAS = espinha ilíaca ântero-superior; MID = membro inferior direito; MIE = membro inferior esquerdo; MMII = membros inferiores Tabela 4 Medidas da avaliação postural (média ± desvio padrão) na vista posterior, antes (pré) e depois (pós) do programa de reeducação postural global (RPG), e valor de p da comparação entre pré e pós (n=20) Item postural da vista posterior Assimetria horiz escápulas/T3 (%) Ângulo perna/retropé D (°) Ângulo perna/retropé E (°) Pré-RPG 18,55±12,71 20,80±8.31 22,06±7,40 Pós-RPG 7,08±6,99 17,69±7,04 16,08±7,34 p 0,0000 0,1789 0,0186 Horiz = horizontal; T3 = terceira vértebra torácica; D = direito; E = esquerdo Tabela 5 Medidas da avaliação postural (média ± desvio padrão) na vista lateral esquerda, antes (pré) e depois (pós) do programa de reeducação postural global (RPG), e valor de p da comparação entre pré e pós (n=20) Item postural da vista lateral esquerda Alinh horiz cabeça em relação à C7 (°) Alinh vertical cabeça em relação aos acrômios (°) Alinh vertical do tronco (°) Ângulo do quadril (°) Alinh vertical do corpo (°) Alinh horiz pélvis (°) Ângulo do joelho (°) Ângulo do tornozelo (°) Assimetria no plano sagital (%) Lordose cervical (cm) Lordose lombar (cm) Pré-RPG 52,46±5,86 Pós-RPG 54,15±3,85 p 0,1262 11,14±7,61 9,00±5,66 0,0001* 2,52±2,81 6,78±3,78 1,53±0,79 9,13±8,43 4,89±4,11 88,53±2,52 0,26±0,07 6,15±1,50 4,13±1,23 1,31±1,12 7,74±3,00 0,91±0,56 8,24±9,69 2,52±2,85 86,06±2,94 0,20±0,08 6,64±0,83 4,61±0,57 0,0004* 0,0382* 0,0004 0,0017* 0,0001* 0,0001* 0,0000* 0,0853 0,1031 Alinh = alinhamento; Horiz = horizontal; C7 = sétima vértebra cervical DISCUSSÃO Várias pesquisas mostram associação entre desvios posturais e DTM 1,3,5,8,9. Neste estudo, o exame físico permitiu constatar anteriorização e inclinação lateral da cabeça, rotação e elevação dos ombros, retificação da coluna cervical, 66 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):63-8 flexão de cotovelos, hiperlordose lombar, rotação de pélvis, hiperextensão de joelhos e pés pronados, como os principais desvios posturais apresentados. Os resultados deste estudo mostraram predomínio da desordem muscular antes (55%) e após (75%) a RPG (eixo I do RDC/TMD). O maior número de pacien- tes com DTM miogênica após o tratamento indica redução dos sinais e/ou sintomas de deslocamento de disco e das desordens articulares, pois se observou modificação das disfunções mistas para apenas musculares. Também ocorreu extinção da disfunção em um participante ao final do tratamento. Atribui-se isso ao fato de que o método de RPG aborda a postura global, atuando nos músculos, ligamentos e articulações de forma nãolocalizada, ou seja, sem enfatizar a musculatura mastigatória e cervical. Também se verificou que a intensidade da dor crônica e a incapacidade foram minoradas, em consonância com a pesquisa de Maluf19, que comparou o efeito da RPG e do alongamento estático segmentar em portadoras de DTM. A autora verificou que as técnicas foram igualmente eficazes na redução dos sintomas e no aumento do limiar de dor dos músculos mastigatórios e cervicais. Os sintomas físicos não-específicos e a depressão tiveram importante melhora após a RPG. Examinado a relação entre DTM e depressão, Toledo et al.24 verificaram depressão moderada ou grave nos pacientes com DTM grave e, nos participantes com depressão grave, algum tipo de DTM. Os autores concluem que depressão pode ser fator etiológico de DTM, pois houve associação significante entre esta e o grau de depressão. Após o tratamento, os sinais e sintomas de DTM se atenuaram com tendência à normalidade, nos grupos de DTM mista. Tal resultado pode dever-se à melhora do diagnóstico de artralgia, apesar da disfunção miogênica ainda estar presente. Resultados semelhantes foram encontrados em estudos que utilizaram terapia manual, eletroterapia e correção postural para a redução ou cessação de dor na ATM e coluna cervical, para a melhora da amplitude de abertura da boca e da função mandibular, e correção postural10,14,15. Nesta pesquisa, pela biofotogrametria, observou-se melhora do alinhamento horizontal (Tabela 3) e vertical da cabeça (Tabela 5), o que pode ter sido responsável pela redução dos sintomas detectada pelo RDC/TMD. A relação entre os desvios posturais da cabeça e a DTM também é referida em outros estudos1,3,5,8. Porém, Iunes et al.11, em es- Basso et al. tudo com fotogrametria, radiografias e observação visual, não encontraram diferenças posturais da cabeça e coluna cervical em indivíduos com e sem DTM. Observou-se, na vista anterior, no alinhamento horizontal da cabeça (correção de rotações), dos acrômios, das EIAS e das tuberosidades das tíbias, maior simetria dos pontos anatômicos em relação à referência do SAPo. Esse resultado demonstra que desvios posturais geram tensão nas cadeias musculares e, por seqüência, nos músculos mastigatórios e cervicais, podendo influenciar a DTM. Resultados semelhantes foram encontrados por Yi et al.1, que observaram, por meio de imagens fotográficas, a relação entre a hiperatividade desses músculos e a postura corporal. A melhora significativa na medida do ângulo entre acrômios e EIAS, em relação ao padrão de referência (0°), demonstra redução da inclinação do tronco; e, na diferença de comprimento dos MMII, bem como no ângulo Q direito e esquerdo, indica correção de alinhamento pélvico e do valgismo de joelho, uma vez que o aumento desse ângulo está associado a esse desvio13. Os resultados acima mostram que a correção dos desvios relaciona-se com a adequação da postura da cabeça, indicando benefícios na simetria corporal de forma global. Isso está de acordo com os achados de Tecco et al.25, que estudaram o efeito da lesão do ligamento cruzado anterior na atividade muscular dos músculos da cabeça, pescoço e tronco. Os autores referem que desvios nas extremidades inferiores podem resultar em alterações neuromusculares e articulares superiores, enfatizando a complexa relação entre os músculos da cabeça, pescoço e tronco e as lesões de joelho. DTM e desvio postural após RPG A redução da medida de assimetria do plano frontal e sagital sugere um melhor equilíbrio na distribuição das pressões plantares de contato. Isso concorda com o estudo de Teodori et al.21, sobre a eficácia da RPG na recuperação da simetria corporal, para readequação das pressões de contato e sua interferência positiva na distribuição do centro de força. A diferença significante observada apenas no ângulo entre a perna e o retropé esquerdo pode ser explicada pelo fato de o calcâneo esquerdo ter apresentado maior valgismo antes da RPG. A redução do índice de assimetria entre as escápulas e T3, na vista posterior, com tendência à referência (0%), indica melhor simetria escapular. Pita17 descreve o caso de um paciente com cifose torácica, lombalgia crônica e outros desvios posturais, submetido à RPG, que apresentou melhora dos desvios, inclusive no alinhamento escapular. O alinhamento horizontal da cabeça em relação à C7, quando reduzido, determina a posição anteriorizada da cabeça. Raine e Twomey23 verificaram valores de 48,9° (±6,5°) em indivíduos assintomáticos. Os resultados deste estudo concordam com esses autores, pois os valores angulares encontrados foram similares a estes, antes e após RPG. Isso justifica o fato de que não houve diferença significante após a RPG. Porém, cabe ressaltar que no exame físico a anteriorização da cabeça foi evidenciada. Nos demais alinhamentos e ângulos obteve-se melhora significativa após a RPG. Isso sugere uma repercussão positiva do método nos desvios posturais de portadores de DTM. Ainda, por conseqüência, pode ter contribuído na redu- ção dos sinais e sintomas observados no eixo II do RDC/TMD. Tais achados estão de acordo com Maluf19, que verificou resultados positivos nos sintomas da DTM devido à atuação global da RPG. As medidas no plano torácico, da lordose cervical e lordose lombar, não se modificaram, pois já estavam dentro da normalidade. Esses resultados contrariam o estudo de Yi et al.1, que encontraram associação entre a hiperlordose cervical e tensão da musculatura mastigatória em indivíduos com DTM; no entanto, corroboram sua análise da lordose lombar, em que não encontraram relação com a DTM. Porém, Iunes et al.11, em uma análise visual da postura craniocervical, observaram retificação da coluna cervical, tanto em indivíduos com essa disfunção quanto assintomáticos. CONCLUSÃO Os portadores de DTM associada a desvios posturais se beneficiaram do tratamento proposto pelo método de RPG: boa parte dos que apresentavam desordens articulares e do disco articular passaram a apresentar apenas disfunção muscular; houve redução da incapacidade e intensidade da dor crônica, melhora dos sintomas físicos não-específicos e da depressão, com tendência à normalidade. As medidas do alinhamento horizontal da cabeça em relação à C7 e a lordose cervical e lombar pouco se modificaram, pois os valores já eram fisiológicos antes da RPG; no entanto, houve melhora significante no alinhamento das escápulas, acrômios e EIAS, na simetria e ângulos dos MMII e na posição da cabeça. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):63-8 2010;17(1) 67 REFERÊNCIAS 1 Yi LC, Guedes ZCF, Vieira MM. Relação da postura corporal com a disfunção da articulação temporomandibular: hiperatividade dos músculos da mastigação. Rev Fisioter Bras. 2003;4:341-7. 13 Sacco ICN, Alibert S, Queiroz BWC, Pripas D, Kieling I, Kimura AA, et al. Confiabilidade da fotogrametria em relação à goniometria para avaliação postural de membros inferiores. Rev Bras Fisioter. 2007;11:411-7. 2 Matta MAP, Honorato DC. Uma abordagem fisioterapêutica nas desordens temporomandibulares: estudo retrospectivo. Rev Fisioter Univ São Paulo. 2003;10:77-83. 14 Nicolakis P, Erdogmus B, Kopf A, Djaber-Ansari A, Piehslinger E, Fialka-Moser V. Exercise therapy for cranomandibular disorders. Arch Phys Med Rehabil. 2000;81:1137-42. 3 Bevilaqua-Grossi D, Chaves TC, Oliveira AS. Cervical spine signs and symptoms: perpetuating rather than predisposing factors for temporomandibular disorders in women. J Appl Oral Sci. 2007;15:259-64. 15 Medlicott MS, Harris SR. A systematic review of the effectiveness of exercise, manual therapy, electrotherapy, relaxation training, and biofeedback in the management of temporomandibular disorder. Phys Ther. 2006;86:955-73. 4 Bricot, B. Postura normal e postura patológica: posturologia. São Paulo: Ícone; 2001. 5 Amantéa DV, Novaes AP, Campolongo GD, Barros TP. A importância da avaliação postural no paciente com disfunção da articulação temporomandibular. Acta Ortop Bras. 2004;12:155-9. 6 Dworkin SF, Le Resche L. Research diagnostic criteria for temporomandibular disorders: review, criteria, examinations and specifications, critique. J Craniomandib Disord. 1992;6:301-55. 7 Lucena LBS, Kosminsky M, Costa LJ, Góes PSA. Validation of the portuguese version of the RDC/TMD axis II questionnaire. Braz Oral Res. 2006;20:312-7. 8 9 Munhoz WC, Marques AP, Siqueira JTT. Evaluation of body posture in individuals with internal temporomandibular joint derangement. Cranio. 2005;23:269-77. Munhoz WC, Marques AP. Body posture evaluations in subjects with internal temporomandibular joint derangement. Cranio. 2009;27(4):231-42. 10 Olivo AS, Bravo J, Magee DJ, Thie NMR, Major PW, Flores-Mir C. The association between head and cervical posture and temporomandibular disorders: a systematic review. J Orofac Pain. 2006;20:9-23. 11 Iunes DH, Carvalho LCF, Oliveira AS, Bevilaqua-Grossi D. Análise da postura craniocervical em pacientes com disfunção temporomandibular. Rev Bras Fisioter. 2009;13(1):89-95. 12 SAPO v.0.68: Portal do projeto Software para Avaliação Postural [homepage na Internet]. SãoPaulo: Incubadora Virtual Fapesp; 2007 [citado set 2007]. Disponível em: http://sapo.incubadora.fapesp.br/portal. 68 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):63-8 16 Marques AP. Escoliose tratada com reeducação postural global. Rev Fisioter Univ São Paulo. 1996;3:65-8. 17 Pita MC. Cifose torácica tratada com reeducação postural global. Arq Cienc Saude Unipar. 2000;4:159-63. 18 Souchard P E. Fundamentos da reeducação postural global: princípios e originalidade. São Paulo: É Realizações; 2003. 19 Maluf SA. Efeito da reeducação postural global e do alongamento estático em portadoras de disfunção temporomandibular: um estudo comparativo [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2006. 20 Vanti C, Generali A, Ferrari S, Nava T, Tosarelli D, Pillastrini P. La rieducazione posturale globale nelle patologie musculo-scheletriche: evidenze scientifiche e indicazione cliniche. Rev Reumatol. 2007;59:192-201. 21 Teodori RM, Guirro ECO, Santos RM. Distribuição da pressão plantar e localização do centro de força após intervenção pelo método de reeducação postural global: um estudo de caso. Fisioter Mov. 2005;18:27-35. 22 Kendall FP, McCreary EK, Provance PG, Rodgers MM, Romani WA. Músculos: provas e funções; com postura e dor. 5a ed. São Paulo: Manole; 2007. 23 Raine S, Twomey LT. Head and shoulder posture variations in 160 asymptomatic women and men. Arch Phys Med Rehabil. 1997;78:1215-23. 24 Toledo BAS, Capote TSO, Campos JADB. Associação entre disfunção temporomandibular e depressão. Cienc Odontol Bras. 2008;11:75-9. 25 Tecco S, Vincenzo S, Stefano T, Felice F. Effects of anterior cruciate ligament (ACL) injury on muscle activity of head, neck and trunk muscles: a crosssectional evaluation. Cranio. 2007;25(3):177-85. Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.69-74, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Conhecimento de fisioterapeutas sobre a atuação em suporte básico de vida Physical therapists’ knowledge on basic life support Laura Maria Tomazi Neves1, Márcio Souza Vieira da Silva2 , Saul Rassy Carneiro3, Victor da Silva Aquino4, Helder José Lima Reis5 Estudo desenvolvido no DCMH/Uepa – Depto. de Ciência do Movimento Humano da Universidade do Estado do Pará, Belém, PA, Brasil 1 Fisioterapeuta especialista; mestranda no PPG – Programa de Pós Graduação – em Fisioterapia da UFSCar – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP 2 Fisioterapeuta especialista 3 Fisioterapeuta; Prof. Ms. titular da Universidade da Amazônia, Belém, PA 4 Fisioterapeuta especialista; mestrando no PPG em Fisioterapia da UFSCar 5 Médico; Prof. auxiliar do Depto. de Saúde Integrada da Uepa ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Laura Maria Tomazi Neves Av. Liberdade 225 apto.21 Jardim Nova Santa Paula 13564-331 São Carlos SP e-mail: [email protected] Uma versão deste estudo foi apresentada em forma de banner ao XXX Congresso da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, abril-maio de 2009, São Paulo. RESUMO: O estudo visou avaliar o conhecimento de fisioterapeutas e graduandos em Fisioterapia sobre diagnóstico e atendimento de urgência à parada cardiorrespiratória. A amostra foi composta de 72 estudantes e 108 fisioterapeutas, dos quais 64 atuam no ambiente extra-hospitalar e 44 no ambiente hospitalar. Foi aplicado aos participantes um questionário sobre ressuscitação cardiopulmonar (RCP) baseado nas diretrizes da American Heart Association de 2005. As respostas foram analisadas estatisticamente. Quanto ao diagnóstico da parada cardíaca, os grupos comportaram-se de maneira semelhante, optando pela avaliação da “presença de pulso e respiração”. Quanto à seqüência de atendimento da RCP, a seqüência preconizada foi corretamente indicada por 52,8% do grupo estudante, 65,9% do subgrupo hospitalar e 40,6% do subgrupo extra-hospitalar. Quanto à relação compressão/ventilação, apenas 4,1% do grupo estudante, ninguém do extrahospitalar e 25% do subgrupo hospitalar indicaram a relação preconizada atualmente. Quase todos (94%) os participantes reconheceram a importância do conhecimento em RCP para o fisioterapeuta. Assim, a maioria dos atuais e futuros fisioterapeutas reconhecem a importância da RCP para sua atuação profissional, mas têm conhecimento insuficiente sobre o tema e apenas uma pequena parcela busca atualizar-se. DESCRITORES: Fisioterapia (Especialidade); Parada cardíaca/reabilitação; Prática profissional; Ressuscitação cardiopulmonar/educação ABSTRACT: This study aimed at assessing undergraduates’ and physical therapists’ knowledge on diagnosing and emergency treating cardiopulmonary arrest. Subjects were 72 students and 108 physical therapists – of which 64 were active in nonhospital environment and 44 in hospitals – who answered a questionnaire on cardiopulmonary resuscitation (CPR) based on the American Heart Association 2005 guidelines. Answers were statistically analysed. As to diagnosing cardiopulmonary arrest, groups behaved similarly, having chosen the option “absence of consciousness, pulse and breath”. Concerning the pattern of CPR assistance, the recommended ABCD sequence was recognized by 52.8% of the students, 65.9% of the hospital subgroup, and 40.6% of the non-hospital subgroup; nobody of the latter, only 4.1% of the students, and 25% of hospital professionals indicated the currently recommended compression/ventilation ratio. Almost all (94%) participants acknowledged the importance of CPR knowledge in physical therapy practice. Thus, though most current and future physical therapists recognize the importance of CPR for their professional role, they have insufficient knowledge about the subject and only few of them seek to update their knowledge. KEY WORDS: Cardiopulmonary resuscitation/education; Heart arrest/rehabilitation; Physical therapy (Specialty); Professional practice APRESENTAÇÃO set. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):69-74 2010;17(1) 69 INTRODUÇÃO METODOLOGIA A formação dos profissionais de saúde no atendimento emergencial encontra-se defasada. Somente na última década começaram a surgir disciplinas específicas relacionadas ao atendimento de vítimas de emergências clínico-cardiológicas1. Com isso, a maior parte dos profissionais de saúde, dentre eles o fisioterapeuta, não se sentem capacitados para atuar nessas situações 2,3. A situação emergencial predominante é a parada cardiorrespiratória (PCR), situação em que o débito cardíaco está inadequado para manter a vida4. A conduta de emergência que deve ser adotada nesse caso é a ressuscitação cardiopulmunar (RCP), para manter a circulação de sangue oxigenado para o organismo. Nessa situação, há uma relação direta entre o tempo e a preservação das funções miocárdicas e cerebrais, além da redução do risco de seqüelas com o atendimento precoce5,6. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos do Hospital das Clínicas Gaspar Vianna, Belém, PA. Compuseram a amostra do estudo concluintes do Curso de Fisioterapia em 2007 de três instituições de ensino superior e de fisioterapeutas do município de Belém. Foram excluídos da amostra fisioterapeutas que não atuassem com população adulta ou que atuassem exclusivamente na docência. Estima-se que anualmente 500.000 pacientes sejam submetidos à RCP durante a internação hospitalar, sendo que no ambiente extra-hospitalar esse número é reduzido à metade7. Todo profissional de saúde, independente da área de trabalho, desde sua formação deve saber não só reconhecer os sinais e sintomas da PCR, mas também prestar os primeiros cuidados do suporte básico de vida (SBV) e manter-se atualizado sobre o assunto8,9. No entanto, os instrumentos de avaliação quanto ao conhecimento sobre suporte básico de vida por profissionais de saúde ainda são diversos e não validados para a língua portuguesa2,3,10-12. Como conseqüência, o nível de conhecimento e as atitudes desses profissionais frente à RCP ainda não foram suficiente motivo de estudo em nosso país. Nesse contexto, constata-se a necessidade de avaliar o conhecimento dos profissionais, com o intuito de propor mudanças no processo ensino-aprendizagem e de educação permanente. Assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar o conhecimento dos atuais e futuros profissionais de fisioterapia em diferentes campos de atuação quanto ao reconhecimento, atendimento de emergência e atitudes em face da parada cardiorrespiratória. 70 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):69-74 O cálculo amostral foi feito com auxílio do programa BioEstat 4. Foi adotado erro de 8% para os grupos estudante e profissional, sendo sugeridas amostras de 120 e 63, respectivamente. Por motivo de indisponibilidade de indivíduos, foi obtida uma amostra de 108 profissionais, além de 72 estudantes. Para a análise de algumas situações, o grupo dos profissionais foi submetido a uma subdivisão em dois subgrupos, segundo trabalhassem em ambiente hospitalar ou extra-hospitalar (subgrupo composto exclusivamente por fisioterapeutas que trabalhavam em locais como clínicas, centros de reabilitação e clubes). O instrumento de coleta de dados foi elaborado após leitura e análise da bibliografia revisada que aborda os princípios da aplicação da RCP. O questionário foi dividido em duas partes: identificação do respondente, experiência e atualização em RCP, com questões Quadro 1 fechadas e abertas; e questões fechadas sobre a RCP na prática. Para validação do conteúdo, o instrumento foi apreciado individualmente por juízes (três fisioterapeutas e três estudantes) quanto à presença ou ausência de critérios de abrangência, objetividade e pertinência13. Os juízes de ambos os grupos julgaram o instrumento de maneira geral abrangente, objetivo e pertinente. Foram questionadas a objetividade das perguntas 1 e 4 e a pertinência da pergunta 4 por 23% de ambos os grupos (fisioterapeutas e estudantes), a abrangência da pergunta 4 e a pertinência da pergunta 1 por 23% dos fisioterapeutas e estudantes respectivamente. Após a apreciação, o instrumento foi reestruturado segundo as críticas e sugestões manifestadas, resultando no questionário cuja segunda parte é apresentada no Quadro 1. O questionário foi preenchido individualmente, sem consulta a bibliografia e sob supervisão de um dos pesquisadores. Os participantes foram orientados quanto ao preenchimento do questionário e o pesquisador responsável estava à disposição para o esclarecimento de qualquer dúvida que o participante pudesse apresentar. Para a análise estatística das respostas foram utilizados os programas BioEstat 4, Microsoft Excel e o banco de dados Microsoft Acess. Avaliou-se a concordância das respostas entre os grupos e em relação às diretrizes vigentes de RCP Questionário sobre ressuscitação cardiopulmonar: 2a parte 1 Diagnóstico da PCR Para o diagnóstico inicial de PCR, o que deve ser avaliado? ( ) Presença de pulso e respiração ( ) Traçado do ECG ( ) Ausência de pulso ( ) Inconsciência 2 Atendimento inicial à PCR: Qual a seqüência recomendada? A - Compressão torácica; B - Desfibrilação; C- Abertura de vias aéreas; D - Ventilação Seqüência: ( – – – ) 3 Atualização nas diretrizes AHA (2005-210): Qual a relação compressão/ ventilação atual, se o paciente está em PCR e não foi ainda intubado? ( ) 30/2 ( ) 15/02 ( ) 5/1 ( ) 15/01 4 Vivência em PCR: Qual a modalidade de PCR mais comum no ambiente extra-hospitalar e no hospitalar? ( ) Assistolia e AESP ( ) Sempre assistolia ( ) Sempre FV ( ) FV e assistolia 5 Carga do DEA: Qual carga inicial do choque na desfibrilação (DEA monofásico) você aplicaria? ( ) 100 J ( ) 150 J ( ) 200 J ( ) 360 J Neves et al. Fisioterapeutas e suporte básico de vida da American Heart Association (AHA) de 2005. Foram comparadas as respostas fornecidas pelo grupo de profissionais e de estudantes, bem como entre os subgrupos hospitalar e extra-hospitalar, sendo utilizado o teste do qui-quadrado de aderência. Para todos os testes foi fixado o nível alfa de 0,05 para rejeição da hipótese de nulidade. Tabela 2 Participação Distribuição dos profissionais (n, %) por formação acadêmica, segundo o subgrupo de local de atuação (n=108) Formação / Hosp Extra-hosp especialização (n=44) (n=64) Graduado 2 (4,5) 16 (25,0) Osteomioarticular 8 (18,2) 34 (53,1) Cardiorrespiratória 32 (72,7) 6 (9,3) Neurologia 0 6 (9,3) Os participantes foram inquiridos sobre a participação em RCP, o tipo e o local de treinamento em RCP. Aproximadamente 50% dos estudantes de fisioterapia formam-se sem ter passado por treinamento algum em suporte básico de vida. Além disso, dependendo do ambiente de trabalho, até 65% dos fisioterapeutas permanecem sem qualquer tipo de treinamento. As respostas obtidas na segunda parte do questionário são representadas pelo número de acertos em cada pergunta, em relação às diretrizes do AHA de 2005 (Tabela 3). Na pergunta 1, quanto ao diagnóstico de PCR, foram consideradas duas respostas como corretas “presença de pulso e respiração” e “ausência de 25(23,2) 25(56,8) 0 3 (2,8) 7 (6,5) 5 (4,6) 13 (12,0) 80 (74,1) 3 (6,8) 3 (6,8) * 5 (11,4) * 11 (25,0) * 22 (50,0) 0 4 (6,3) 0 2 (3,1) 58 (90,6) 21 (19,4) 11 (10,2) 19 (17,6) 57 (52,8) 9 (20,5) 6 (13,6) 14 (31,8) 15 (34,1) 12 (18,8) 5 (7,8) 5 (7,8) 42 (65,6) Hosp = hospitalar; RCP = ressuscitação cardiopulmonar; SAVC = Suporte avançado em cardiologia (Advanced cardiac life support); SBV = Suporte básico de vida; FCCS = Suporte fundamental ao paciente crítico (Fundamental critical care support) *p<0,05 Tabela 3 Acertos (%) em cada pergunta da segunda parte do questionário segundo os grupos (n=180) Pergunta 1a 2a 3a 4a 5a Tabela 1 Hosp = hospitalar Profissional Estudante (n=72) Total (n=108) Hosp (n=44) Extra-hosp (n=64) em RCP 1 (1,4) em Curso: SAVC 0 SBV 12 (16,7) FCCS 0 Outros 3 (4,2) Nenhum 57 (79,2) Local Faculdade 26 (36,1) Especialização 0 Outros 12 (16,7) Não indicado 34 (47,2) RESULTADOS A amostra caracterizou-se por indivíduos adultos jovens (28,4±5,3 anos), do sexo feminino (75%). Considerandose apenas o grupo profissional, a média de tempo de atuação como fisioterapeutas foi de 7,2±5,2 anos, sendo que 50% do subgrupo extra-hospitalar e 45,45% do subgrupo hospitalar tinham menos de quatro anos de atuação profissional. Quanto à formação acadêmica, a amostra contemplou um pequeno número de mestres (3,7%) e nenhum doutor (Tabela 1). Distribuição dos respondentes (n, %) segundo a participação em RCP e em curso de treinamento em RCP, segundo os grupos (n=180) Profissional Estudante (n=72) Total (n=108) Hosp (n=44) Extra-hosp (n=64) 51 (70,8) 83 (76,9) 36 (81,8) 47 (73,4) 38 (52,8) 55 (50,9) 29 (65,9) 26 (40,6) 3 (4,2) 11 (10,2) 11 (25,0) 0 19 (26,4) 31 (28,7) 20 (45,5) 11 (17,2) 7 (6,9) 12 (7,4) 10 (13,6) 2 (3,1) Hosp = hospitalar Tabela 4 Opinião (freqüência e %) quanto à importância da RCP, atitude ao presenciar uma PCR e posicionamento quanto à realização de ventilação “boca-a-boca” (n= 180) Profissional Estudante Extra-hosp (n=72) Total (n=108) Hosp (n=44) (n=64) Importância da RCP Sim 69 (95,8) 99 (91,7) 41 (93,2) 58 (90,6) Questão Não 3 (4,2) Ao presenciar PCR A+C 59 (81,9) 9 (8,3) 3 (6,8) 6 (9,4) 77 (71,3) 36 (81,8) 41 (64,1) A+NC 0 1 (0,9) 0 1 (1,6) NA+C 10 (13,9) 26 (24,1) 7 (15,9) 19 (29,7) Não sei 3 (4,2) 4 (3,7) 1 (2,3) 3 (4,7) 19 (43,2) 14 (21,9) Ventilação boca-a-boca NFD 20 (27,8) 33 (30,6) SR 15 (20,8) 21 (19,4) 9 (20,5) 12 (18,8) NR 37 (51,4) 54 (50,0) 16 (36,4) 38 (59,4) Hosp = hospitalar; RCP = ressuscitação cardiopulmonar; PCR = parada cardíaca respiratória A+C= Atenderia e chamaria ajuda; A+NC= Atenderia e não chamaria ajuda; NA+C= Não atenderia e chamaria ajuda; NFD= Não faria em pessoa desconhecida; SR = Sempre se recusaria a fazer; NR = Nunca se recusaria a fazer Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):69-74 2010;17(1) 71 pulso”. Ambas as respostas são aceitáveis, pois dependendo da situação pode-se apenas avaliar o pulso do indivíduo em suspeita de PCR. A pergunta 2 continha a os itens do ABCD da RCP desordenados, sendo a seqüência correta de resposta C-D-A-B. “ABCD” é a sigla em inglês da seqüência airway maintenance (manutenção das vias aéreas livres), breathing rescue (recuperação da respiração, ventilação), chest compression (compressão torácica) e defibrillation (desfibrilização). Na pergunta 3, a resposta correta da razão entre compressão e ventilação preconizada era “30:2”. Na pergunta 4, quanto ao ritmo de parada mais comum nos ambientes extra-hospitalar e hospitalar, respectivamente, a resposta correta estipulada foi “FV (fibrilação ventricular) e Assistolia”. Na pergunta 5, quanto à carga inicial do choque no desfibrilador externo automático (DEA) monofásico, a resposta considerada correta era “360 J”. Outros aspectos abordados foram a opinião dos participantes quanto à importância da RCP, a atitude ao presenciar uma PCR e o posicionamento desses quanto à realização ou não de ventilação “boca-a-boca”. Nessas situações observou-se a concordância dos fisioterapeutas e estudantes quanto à importância da RCP para o profissional da fisioterapia e da iniciativa destes no atendimento de uma PCR. DISCUSSÃO Uma das dificuldades enfrentadas durante a formulação do questionário foi que os estudos que também utilizaram questionários apenas divulgaram os resultados e não o instrumento utilizado. Em virtude disso, não foi possível contrastar as questões do questionário utilizado no presente estudo com outras da literatura, sendo possível apenas comparar os resultados obtidos. É importante avaliar o conhecimento e as atitudes que os atuais e futuros profissionais de fisioterapia detêm sobre a ressuscitação cardiopulmonar, para poder propor mudanças efetivas no processo educacional e garantir a atualização constante desses profissionais. Neste estudo, os participantes reconhecem a importância da RCP para a atuação do 72 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):69-74 fisioterapeuta, porém os conhecimentos ainda são insatisfatórios em relação ao que é preconizado pelas diretrizes do AHA e apenas uma pequena parcela busca atualizar-se. No grupo de estudantes, os baixos níveis de participação são esperados, em virtude de sua pequena inserção em práticas emergenciais e da insegurança no atendimento a situações de emergência2,3 – embora os alunos do último ano atendam pacientes sob supervisão de fisioterapeutas, como parte de seu processo de formação. Por sua vez, no subgrupo hospitalar (7,0±4,3 anos de atuação), mais da metade relatou já ter participado de uma RCP. Apesar de o nível de participação ser significativamente maior nesse grupo, esta ainda é considerada baixa, visto que a RCP faz parte da rotina hospitalar14,15. Nyman e Sihvonen10, em seu estudo com estudantes de enfermagem e enfermeiras, constataram que 96% das enfermeiras e 26% dos estudantes já haviam efetuado RCP na prática, mas não informam o tempo de atuação das profissionais. Quanto à busca de conhecimento em RCP e o local onde esse conhecimento foi obtido, foi observado que a proporção de busca de conhecimentos adicionais à faculdade foi similar entre os grupos (de estudantes e profissionais). Dentre esses últimos, é compreensível que a maior proporção dos que fizeram algum curso seja daqueles que atuam no ãmbito hospitalar: além do fato de quase três quartos deles serem especializados em fisioterapia cardiorrespiratória, sua maior procura por formação complementar, especialmente o curso de Suporte Fundamental ao Paciente Crítico (Fundamental critical care support, FCCS), já era esperada, por sua atuação direta com pacientes críticos. Esses dados são semelhantes aos observados por Moretti et al.4, de que, nas equipes hospitalares, 46% apresentavam treinamento prévio em SBV ou em Suporte avançado de vida. Chama a atenção a proporção de estudantes que fizeram o curso na faculdade, quando comparados aos profissionais já formados. O aparente aumento do compromisso das instituições de ensino é um aspecto positivo da formação na área de emergência, o que se reflete em práticas como a inclusão de disciplinas específicas nos currículos de formação em saúde16,17. A segunda parte do questionário inquiria sobre conhecimentos práticos de RCP. No que se refere à seqüência do atendimento, as proporções de acerto são similares entre os grupos, sendo que aproximadamente metade deles respondeu corretamente. É surpreendente que quase metade não tenha sido capaz de reconhecer a seqüência do ABCD primário: níveis maiores de acertos eram esperados, visto que esta é uma informação disponível inclusive para o público leigo6,18. Contudo, Galinski et al.19 também observaram conhecimento insuficiente da seqüência do ABCD por médicos e enfermeiras: diante de uma PCR, 50% abririam via aérea, 75% iniciariam pela ventilação, 86% começariam massagem cardíaca externa, enquanto apenas 42% chamariam ajuda. Quanto à razão entre compressão e ventilação – isto é, ao intervalo de quantas compressões torácicas deve-se prover ventilação – as taxas de acertos foram quase nulas nos grupos estudante e extra-hospitalar; no subgrupo hospitalar o número de acertos foi baixo, considerando-se a recorrência da situação de PCR. Isso sugere que a amostra do estudo, independente do grupo, está desatualizada ou não sabe a relação correta. Esses dados correlacionam-se à pouca experiência de participação em RCP e às baixas proporções de busca por formação complementar para o atendimento emergencial, mesmo com o reconhecimento da importância da RCP para o dia-a-dia do fisioterapeuta. Nos achados de Rosa e Colenci20 e nos de Bertoglio et al.11, 53,3% e 69,6% das equipes de enfermagem referiram conhecimento adequado da razão compressão/ ventilação atualmente preconizada (contra apenas 25% dos fisioterapeutas que atuam em hospital, neste estudo). Novamente, a pouca experiência de participar de uma RCP, aliada à limitada busca de conhecimento, transparece nos reduzidos percentuais de acerto à questão sobre os mais freqüentes tipos de PCR nos ambientes hospitalar e extrahospitalar. O subgrupo hospitalar mostrou maior percentual de acertos, porém ainda muito baixo quando comparados aos de outros profissionais da área de saúde11,12. No estudo de Zanini Neves et al. et al.12 com enfermeiros/as e auxiliares de enfermagem, houve um percentual de 73,7% de acerto quanto à identificação dos sinais da PCR considerando a ausência de pulsos carotídeos. Em relação ao SBV, no ambiente extrahospitalar o conhecimento do ritmo de parada não é primordial, pois esse reconhecimento só é possível se houver um desfibrilador externo automático ao alcance – que fará o diagnóstico automaticamente. Os baixos níveis de acerto em relação à carga a ser aplicada pelo DEA já eram esperados, visto que este é previamente calibrado e que é possível ensinar profissionais da saúde a utilizá-lo com relativamente pouco treino21. Segundo Timerman et al.1, todos os profissionais de saúde que atuem em ambiente préhospitalar devem ser capazes de prover suporte básico de vida e desfibrilação externa automática, se necessário, a uma vítima de emergência cardiológica. Porém em nosso país, apesar da obrigatoriedade pela legislação, há escassez de DEA principalmente no ambiente extrahospitalar, o que dificulta o treinamento de profissionais de saúde e de leigos22. Quanto à atitude da amostra em face da PCR, os grupos responderam de forma semelhante, concordando em atender e chamar ajuda. No entanto, se considerarmos que a amostra está desatualizada em relação às diretrizes atuais de RCP e não possui experiência em situações de emergência, o atendimento emergencial prestado pode não estar cumprindo sua função ou até agravando o caso. Achados semelhantes em relação à atitude dos profissionais foram encontrados no estudo de Celenza et al.18 com grupos Fisioterapeutas e suporte básico de vida treinados e não-treinados em RCP: no grupo treinado, 61,8% iniciariam a RCP ou chamariam a ambulância e no grupo não-treinado, 58,7% tomariam essa mesma atitude. Ao analisar-se a atitude do participante perante a possibilidade da execução da ventilação “boca-a-boca”, observaram-se altas taxas de recusa em fazê-la em uma pessoa desconhecida. Essa maior rejeição é explicada pela precaução do socorrista quanto à aquisição de infecções6. No estudo de Lester et al.23, mais de 80% dos entrevistados fariam ventilação e compressão apenas caso as vítimas fossem crianças, indivíduos de meia-idade ou idosos desconhecidos. Independente de quem seja a competência para tratar tais situações, os profissionais da área de saúde têm obrigação de reconhecer tais situações, além de também terem obrigação de reciclar-se a respeito do assunto8. Há necessidade de treinamento em condutas de emergência desde os primeiros anos de formação universitária e de sua continuidade na pós-graduação, com intervalo máximo de dois anos entre os treinamentos24. O uso de questionário neste caso é uma forma de avaliação que tem como principal função, por um lado, orientar o processo e as metodologias de ensino e, por outro, possibilitar a melhora do desempenho dos profissionais avaliados. Por esse motivo, vem sendo constantemente usado para avaliação do treinamento em SBV2,3,10-12. Nesse modelo há uma sofisticação no processo avaliativo, pois pode ser reprodutível e acurado para verificar mudanças na aprendizagem. Além disso, é um instrumento frequentemente utilizado em metodologias ativas de ensino12. Uma das limitações do estudo foi a inexistência de um questionário autopreenchível validado para a avaliação do conhecimento do RCP em estudantes e profissionais da área da saúde. A nãovalidação do questionário utilizado pelo estudo ocorreu em virtude da urgência em conhecer a situação do ensino e aprendizagem da RCP por uma das classes de profissionais da saúde que mais cresce nesse país: a Fisioterapia. Outra limitação foi a não-mensuração do nível de recusa da amostra em responder ao questionário. Com isso, pode ter havido um viés de seleção da amostra, superestimando o conhecimento dos entrevistados, pois é provável que tal recusa, se tivesse ocorrido, teria acontecido entre os profissionais e estudantes que se sentiram menos à vontade ao responder sobre o tema. Além dessas limitações, deve-se destacar que o estudo não avaliou o desempenho dos participantes na prática da RCP, apenas seu conhecimento teórico. Este estudo poderá servir como uma proposta para educação permanente dos profissionais de saúde no que concerne à formação e à atualização acerca da RCP. CONCLUSÃO Embora os fisioterapeutas e estudantes reconheçam a importância da ressuscitação cardiopulmonar em seu trabalho, apresentam um conhecimento insuficiente e apenas uma pequena parcela busca formação complementar para atualizar-se sobre o tema. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):69-74 2010;17(1) 73 REFERÊNCIAS 1 Timerman S, Gonzalez MM, Ramires JA. 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Ms. Supervisora do Curso de Graduação em Fisioterapia da Unicid 5 Profa. Ms. do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário São Camilo, São Paulo 6 Prof. Dr. Co-Coordenador da Pós-graduação Lato Sensu em Fisioterapia DermatoFuncional da Unicid ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Juliana J. Ferreira Depto. de Fisioterapia/ Unicid R. Cesário Galeno 448 apt.475 Tatuapé 03071-000 São Paulo SP e-mail: [email protected] RESUMO: A síndrome pré-menstrual é um complexo de sintomas – dentre os quais o edema pré-menstrual – entre o 10o e o 14o dias que antecedem a menstruação e cessam no início do fluxo menstrual. A técnica de drenagem linfática manual (DLM) drena o excesso de líquido acumulado, atua no edema e poderia aliviar esses sintomas. O objetivo deste estudo piloto foi verificar o efeito da DLM no alívio dos sintomas da síndrome pré-menstrual e a qualidade de vida relacionada à saúde em quatro mulheres jovens. O estudo foi realizado ao longo de dois ciclos menstruais, ciclo 1 sem intervenção terapêutica, e o segundo ciclo, com aplicação da técnica de DLM. As participantes foram avaliadas, no início do ciclo 1 e final do ciclo 2, por anamnese, mensuração de estatura e massa, estimativa da composição corporal, diário de sintomas e quanto à qualidade de vida relacionada à saúde, pelo WHOQoL-bref. Os resultados mostraram redução significativa apenas do diâmetro de abdome superior nos níveis xifóide e umbilical; as médias total e individual dos sintomas do diário reduziram-se, porém sem significância, tal como ocorreu no aumento dos escores no WHOQoL-bref. A drenagem linfática manual foi eficaz na diminuição de um sintoma da síndrome pré-menstrual, o edema em região superior abdominal, e não alterou a qualidade de vida dessas jovens. DESCRITORES: Modalidades de fisioterapia; Saúde da mulher; Síndrome prémenstrual; Sistema linfático ABSTRACT: Premenstrual syndrome is a symptomatology – including premenstrual edema – that affects women between the 10th and 14th days prior to menstruation and ends at the onset of menstrual flux. The technique of manual lymphatic drainage (MLD) draws off accumulated fluid excess, acts on edema and might help relieve such symptoms. The purpose of this pilot study was to assess the effect of MLD on premenstrual symptoms and on health-related quality of life of four young women. The study was carried out along two menstrual cycles, the first with no intervention; MLD was applied along the second cycle. Participants were assessed, at the beginning of the first cycle and after treatment, as to height and weight, body composition estimate, daily symptoms by means of a diary, and quality of life by the WHOQoL-bref. After treatment results showed the sole significant decreases in abdomen xyphoid and navel level diameters; mean total and individual symptom scores decreased, but with no significant differences, the same happening to the higher WHOQoL-bref mean scores. Manual lymphatic drainage was thus able to reduce one premenstrual symptom, namely the upper abdomen edema, and didn’t affect these young women’s quality of life. KEY WORDS: Lymphatic system; Physical therapy modalities; Premenstrual syndrome; Women's health APRESENTAÇÃO set. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):75-80 2010;17(1) 75 INTRODUÇÃO mento cirúrgico ou à suspensão da ovulação3-5. A síndrome pré-menstrual (SPM) é um complexo de sintomas que se iniciam entre o 10o e o 14o dias antecedentes à menstruação e cessam no início do fluxo menstrual1. Essa sintomatologia cíclica da fase lútea do período menstrual é idiopática e afeta mulheres em idade reprodutiva2. O edema pré-menstrual é um sintoma freqüente, atingindo 92% das mulheres, predominante na segunda fase do ciclo, quando o hormônio principal é a progesterona, que causa flacidez na parede venosa e assim prejuízo na drenagem e retenção hídrica1. As freqüentes alterações no metabolismo hídrico se manifestam também por dores abdominais, mastalgia e ganho de peso6. Os sintomas mais comuns da SPM se dividem entre somáticos – irritabilidade, alterações de humor, comportamento depressivo, impulsividade e confusão mental – e físicos: fadiga, mastalgia, edema abdominal, lombalgia, insônia, aumento de peso temporário, enxaqueca, aumento do apetite e presença de edema de extremidades3,4. A sintomatologia é provavelmente multifatorial. Alguns fenômenos relacionados à ocorrência da SPM são desequilíbrio entre estrógeno e progesterona; excesso de prolactina; deficiência das vitaminas B6 e E; atividade inapropriada de prostaglandinas; e alterações na ação das endorfinas e serotoninas2,5. Pode-se classificar a SPM em quatro tipos, levando em consideração a caracterização e manifestação dos sintomas: SPM-A, SPM-H, SPM-C e SPM-D. A SPM-A é a sintomatologia emocional, manifestada por ansiedade, irritabilidade, alterando os padrões de comportamento. A SPM-H é caracterizada pelas alterações do metabolismo hídrico, gerando edema, dores abdominais e mastalgia. A SPM-C tem como manifestações cefaléia, aumento do apetite, desejo por doces e fadiga. A SPM-D é caracterizada por depressão intensa, insônia e esquecimento3. As estratégias de tratamento que visam amenizar ou eliminar os sintomas, minimizando o impacto nas atividades de vida diária e nas relações interpessoais femininas, são várias2. Os atuais tratamentos para a SPM são o medicamentoso – sendo utilizados diuréticos, antidepressivos, ansiolíticos e supressores da ovulação – e o não-medicamentoso, que consiste em medidas comportamentais, prática de atividades físicas, atividades relaxantes, repouso, orientações sobre os sintomas e alimentação hipossódica visando a não-retenção hídrica. Em casos graves, recorre-se a trata- 76 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):75-80 A fisioterapia propicia benefícios para pacientes que apresentam diversos tipos de edemas e linfedemas, utilizando freqüentemente a técnica de drenagem linfática manual (DLM), que consiste em um conjunto de manobras específicas que atuam sobre o sistema linfático, visando drenar o excesso de líquido acumulado no interstício7. São porém escassos ensaios clínicos que investiguem a ação das técnicas de fisioterapia, e principalmente da DLM, nos edemas pré-menstruais e em outros sintomas da SPM. Portanto, o objetivo deste estudo foi analisar a evolução dos sintomas da síndrome pré-menstrual e avaliar a qualidade de vida em mulheres jovens submetidas à técnica de drenagem linfática manual. METODOLOGIA Este é um estudo piloto, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo. As voluntárias concordaram com o estudo e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. Para participar do estudo, os critérios de inclusão foram: mulheres durante a menacme, sedentárias, que apresentassem sintomas físicos e/ou somáticos por dois ou mais ciclos menstruais seguidos, interferindo em suas atividades diárias. Os critérios de exclusão foram presença de infecções e inflamações agudas, flebites, tromboses ou tromboflebites, hipertireoidismo, cardiopatias, patologias renais crônicas, metaplasias e distúrbios imunitários, hipersensibilidade do seio carotídeo; uso de medicamentos anticoncepcionais hormonais ou de métodos de supressão da ovulação, de diuréticos, antidepressivos, ansiolíticos ou quaisquer tratamentos, medica- mentosos ou não medicamentosos, que poderiam mascarar e/ou tratar os sintomas. A voluntária seria excluída do estudo caso apresentasse qualquer tipo de desconforto durante o procedimento ou iniciasse qualquer outro tratamento para SPM durante a pesquisa. Foram selecionadas quatro estudantes universitárias, brancas, com 21 e 22 anos, que apresentavam queixas características da SPM dos tipos A, H e C. O estudo foi realizado durante dois ciclos menstruais consecutivos (ciclo 1 e ciclo 2), e dividido em quatro fases: folicular e lútea do ciclo 1, sem qualquer intervenção terapêutica, e folicular e lútea do ciclo 2, com aplicação da técnica de DLM. Durante as quatro fases do estudo foi feito acompanhamento dos sintomas por meio do diário de sintomas. As voluntárias foram submetidas a duas avaliações fisioterapêuticas, uma antes (no início da fase folicular do ciclo 1) e outra após o tratamento, ao final da fase lútea do ciclo 2. A avaliação consistiu em anamnese, avaliação antropométrica, estimativa da composição corporal e aplicação de questionário sobre qualidade de vida relacionada à saúde. As avaliações foram feitas pelo mesmo avaliador. O acompanhamento dos sintomas foi realizado por meio de um diário de sintomas elaborado pelos autores, baseado em Approbato et al.3 e Valadares et al.4, utilizando a pontuação dos sintomas mais recorrentes em uma escala visual numérica (EVN) unidimensional simples, de zero a dez, sensível e reprodutível, que permite análise contínua da dor8. Diariamente, logo ao acordar, as voluntárias pontuavam oito itens propostos – dor ou edema nas mamas, dor pélvica, dor ou edema abdominal, dor ou edema nas pernas, enxaqueca, apetite, cansaço e irritabilidade – nas respectivas escalas, conforme a intensidade dos sintomas; zero representa ausência e dez a intensidade máxima do sintoma. As voluntárias efetuaram a pontuação diariamente, desde o primeiro dia de menstruação até o último dia de tratamento. A avaliação antropométrica consistiu na aferição da estatura e massa corporal. A composição corporal, no intuito de mensurar a retenção hídrica, foi estimada pela coleta de nove perimetrias, na fase expiratória da respiração. Ferreira et al. Drenagem linfática e síndrome pré-menstrual O procedimento terapêutico consistiu na aplicação de 12 sessões, em média, com duração de 40 minutos cada, de drenagem linfática manual, três vezes por semana, durante quatro semanas, ao longo de todo o segundo ciclo ovariano (fase folicular e fase lútea). O método utilizado foi o de Leduc e Leduc10 nas regiões de mamas, abdome superior e abdome inferior, hemicorpo direito e esquerdo. A técnica era iniciada com a execução de dez manobras de drenagem dos nódulos linfáticos da região da base do pescoço, seguindo-se exercícios respiratórios diafragmáticos11,12 (cinco repetições), com o intuito de estimular a atividade dos ductos e troncos linfáticos profundos. Em seguida, eram aplicadas, em cada quadrante ou linfotoma tratado, dez manobras de evacuação dos nódulos linfáticos correspondentes (drenagem de gânglios), seguindo-se até a extremidade destes com manobras em reabsorção, e retornando da extremidade de cada quadrante, com manobras em chamada (ou demanda) até os nódulos linfáticos, finalizando-se com 10 manobras de evacuação (drenagem de gânglios)10. Os dados foram descritos em média e desvio-padrão. A normalidade dos dados foi verificada pelo teste de Shapiro-Wilk. Foi utilizado o teste t de Student para variáveis dependentes, para avaliar a diferença pré e pós-tratamento da massa corporal e das perimetrias. Para avaliar as diferenças pré e pós-tratamento das pontuações dos sintomas da SPM e do WHOQoL-bref, foi utilizado o teste nãoparamétrico de Wilcoxon. Foi assumido valor de p≤0,05 (α=5%) como estatisticamente significante. RESULTADOS As voluntárias apresentavam sintomatologia pré-menstrual por no mínimo dois meses consecutivos. Três voluntárias foram submetidas a 12 sessões de DLM, Irritabilidade Cansaço Apetite Sintomas A qualidade de vida foi mensurada por meio do questionário WHOQoLbref, validado na versão em português9, auto-aplicado. É composto por 26 questões, sendo duas gerais de qualidade de vida e as restantes 24 agrupadas em quatro domínios: físico, psicológico, de relações pessoais e meio ambiente9. Enxaqueca Pré Pós Dor ou edema em MMII Dor ou edema abdominal Dor pélvica Dor ou edema nas mamas 0 0,5 1 1,5 2 Pontuação na EVN 2,5 3 3,5 Gráfico 1 Pontuação média dos sintomas na escala visual numérica (EVN) antes (pré) e após (pós) o tratamento (n=4) MMII = membros inferiores enquanto o procedimento terapêutico de uma delas foi interrompido na décima sessão, em vista de a voluntária apresentar infecção do trato urinário. A duração média do ciclo menstrual foi de 28,5 dias; a média de dias do fluxo menstrual foi de 4,75 dias. O tempo Tabela 1 Perímetros corporais (em cm, média e desvio padrão, dp) medidos antes (pré) e após (pós) o tratamento, e valor de p da comparação entre os dois momentos (n=4) Perímetro Pré Pós Pré Pós Pré Pós Pré Pós Média 81,1 80,6 85,4 85,1 67,6 67,0 95,5 95,3 Pré Pós 74,6 72,8 2,02 0,04* 2,90 Pré Pós Pré Abdome EIAS Pós Coxa Pré proximal Pós Pré Coxa média Pós 75,7 74,9 82,3 82,1 54,9 54,6 49,4 49,0 2,46 2,50 3,43 4,01 4,87 4,64 4,40 3,58 Axilar Mamilar Cintura Quadril Abdome xifóide Abdome umbilical dp 2,66 1,70 3,17 3,40 2,29 2,97 7,43 7,31 p 0,49 0,49 médio de início da sintomatologia prémenstrual foi de 7,75 dias. A média da estatura foi de 159,5±2,12 cm. Na avaliação inicial a média da massa corporal foi de 53,35±4,18 kg e, após o tratamento, de 52,73±3,72 kg não havendo alteração estatisticamente significante (p=0,5). A Tabela 1 mostra as medidas obtidas nos nove perímetros corporais avaliados antes e depois do tratamento; houve redução significativa apenas nas medidas do abdome nos níveis xifóide e umbilical (p=0,04). O Gráfico 1 sintetiza os resultados referentes ao diário de sintomas, que não se alteraram de maneira significante, embora vários tenham se reduzido basTabela 2 0,43 0,49 0,04* 0,71 0,58 0,44 Escores (média e desvio padrão, dp) obtidos nos domínios do WHOQoL-bref antes (pré) e após (pós) o tratamento, e valor de p da comparação entre os dois momentos (n=4) Domínio Aspectos físicos Aspectos psicológicos Relações pessoais Meio ambiente Pré Pós Pré Pós Pré Pós Pré Pós Média 21,5 24,3 21,3 21,8 10,8 10,8 28,5 28,0 dp 5,20 5,56 4,03 5,25 2,99 3,30 5,92 5,35 Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):75-80 2010;17(1) p 1,00 1,00 1,00 1,00 77 tante. Em relação à qualidade de vida mensurada por meio do WHOQoL-bref, não houve alteração significante em domínio algum, como se pode observar na Tabela 2. DISCUSSÃO As características da amostra deste estudo são conformes com o perfil encontrado na literatura: cerca de 79% das mulheres com SPM são brancas13, com escolaridade em nível superior e idade inferior a 30 anos13,14. Quanto ao estado civil, todas as voluntárias eram solteiras e relataram a sintomatologia desde a primeira menstruação; 63,5% das mulheres relatam SPM logo após a menarca e apenas 11,5%, após o casamento 1. Como mencionado, a SPM pode ser classificada em quatro tipos. A amostra aqui foi composta por mulheres com características de SPM dos tipos A, H e C. A SPM tipo D, também conhecida como transtorno disfórico pré-menstrual, é rara, atingindo apenas 5% das mulheres com SPM13. As voluntárias não foram divididas segundo o tipo de SPM por não se observarem casos em que ocorre um tipo de sintomatologia isolado14. Os sintomas do tipo H estavam presentes em toda a amostra, associados aos de outros tipos. Alguns dos sintomas pré-menstruais, como sensibilidade mamária, enxaqueca e dor pélvica, dizem respeito à retenção hídrica5. A técnica de DLM consiste em direcionar o líquido do espaço intersticial para os centros de drenagem mediante manobras especializadas, estimulando a drenagem do local afetado15. Assim, a hipótese inicial era de que a DLM auxiliaria a melhora da sintomatologia física e somática da SPM. Optouse por utilizar a DLM pelo fato de ser mais efetiva do que a drenagem linfática mecânica na redução dos edemas abdominais subcutâneos16. Na literatura são escassos ensaios clínicos que investiguem a ação de técnicas fisioterápicas nos sintomas da SPM e desconhecem-se estudos que abordem a ação da DLM nos edemas pré-menstruais ou em outros sintomas da SPM, o que dificulta a interpretação e a comparação dos resultados aqui obtidos. Por outro lado, justifica-se a realização deste 78 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):75-80 estudo piloto, como incentivo a novas pesquisas. O questionário WHOQoL-bref foi selecionado por ser mais preciso nos domínios comumente afetados pelos sintomas somáticos17. Dependendo do nível de influência dos sintomas, a mulher tende a ter maiores conflitos familiares, menor ênfase a seus valores, menor disposição para atividades recreativas e até perda de autonomia no trabalho, ou crises conjugais. O controle dessas variáveis é essencial para a mensuração da intensidade do impacto da SPM e assim constatar se a terapêutica escolhida está sendo efetiva13. A perimetria foi feita para verificar o comportamento do edema secundário à retenção hídrica, após a aplicação da DLM. Foi possível demonstrar a diminuição estatisticamente significante de dois perímetros mensurados, do abdome xifóide e umbilical, denotando que o protocolo de tratamento utilizado atuou na redução do edema abdominal. Apesar de o edema de membros inferiores (MMII) também ser um sintoma freqüente da SPM, a aplicação da DLM restringiuse às regiões de abdome e mamas devido ao maior acometimento dos sintomas nessas regiões1 e devido à limitação do tempo total de cada sessão neste estudo. Considera-se que a região de abdome inferior, localização uterina, está amplamente vascularizada durante o período lúteo devido à atuação da progesterona18, podendo resultar em maior retenção hídrica em comparação ao abdome superior, com menor redução no diâmetro dessa região. O método diagnóstico de maior importância é a documentação dos sintomas ao longo do ciclo por meio do uso de um diário2,5,13,19. Para que houvesse o controle da intensidade da sintomatologia durante o estudo, na inexistência de um diário validado, foi elaborado um diário baseado nos sintomas mais freqüentes relatados por Approbato et al.3 e Valadares et al.4, pontuados utilizando a EVN. As voluntárias podem ter apresentado dificuldade em diferenciar a dor pélvica do edema abdominal ao pontuar o Diário13, o que pode ter interferido nos resultados obtidos. Dentre as voluntárias que apresentavam SPM dos tipos A e H, verificou-se que a irritabilidade foi o sintoma que mais se reduziu na voluntária 1, seguido de edema de mama e mastalgia, edema abdominal e dor pélvica; e a voluntária 2 apresentou redução da dor pélvica seguida de irritabilidade, apetite e edema abdominal. Dentre as que apresentavam SPM dos tipos A, C e H, verificou-se que a voluntária 3 obteve uma melhora principalmente do edema abdominal, seguida de irritabilidade, edema de mama e mastalgia, dor pélvica junto com o edema de MMII; e a voluntária 4 obteve maior índice de melhora no cansaço, irritabilidade, enxaqueca e apetite. Isso sugere que a DLM reduziu os principais sintomas de cada voluntária, correspondendo à queixa do tipo da SPM apresentada. O sintoma que teve maior melhora foi a irritabilidade, em todas as voluntárias. Segundo Longo et al.20, a DLM pode apresentar efeito analgésico e relaxante muscular, – o que corresponderia, no presente estudo, à redução dos sintomas de mastalgia, dores nos MMII, dor pélvica e enxaqueca. Os autores encontraram um decréscimo não-significativo na freqüência e intensidade da enxaqueca tensiva crônica com DLM de cabeça, além da melhora na qualidade do sono. A cefaléia do período pré-menstrual parece estar relacionada com a queda estrogênica 21. No presente estudo não houve diminuição estatisticamente significante da enxaqueca pré-menstrual. Os sintomas são influenciados pelas alterações hormonais que fazem parte do ciclo ovariano. O mecanismo exato de atuação desses hormônios na SPM ainda é desconhecido, mas sabe-se que principalmente o desequilíbrio entre estrógeno e progesterona tem influência na sintomatologia22. Com a utilização da DLM nas mamas era esperada uma diminuição relevante da mastalgia e do edema na região, o que não foi observado, provavelmente porque as alterações hormonais podem ocasionar importantes distúrbios mamários, inclusive dor23. Em resumo, apenas o edema abdominal pré-menstrual apresentou redução estatisticamente significante, demonstrada pela diminuição do diâmetro de abdome xifóide e umbilical nas comparações pré e pós-tratamento. Ferreira et al. Os tratamentos medicamentosos dos sintomas podem apresentar efeitos adversos a curto e longo prazo. Os diuréticos podem provocar queda da pressão arterial e aumento do débito urinário, podendo levar a uma insuficiência renal, caso seu uso seja abusivo24,25. Os anticoncepcionais orais provocam aumento das pressões sistólica e diastólica, risco de infarto agudo do miocárdio, podem desencadear diabetes, risco de tromboembolismo venoso e embolia pulmonar – esta quatro vezes maior em usuárias do que em não-usuárias26. Os antidepressivos, psicoestimulantes, estabilizadores do humor, antipsicóticos e ansiolíticos podem gerar boca seca, sedação, tontura, náusea, insônia, ganho ou perda de peso, tremores, palpitações, irritabilidade, taquicardia, convulsões, mudança de postura perante as situações cotidianas, anorexia, dores abdominais, inquietação motora, desenvolvimento de manias, labilidade emocional, hiperatividade e agressividade27. A psicoterapia é usada atualmente como coadjuvante Drenagem linfática e síndrome pré-menstrual para o tratamento da sintomatologia somática6. A cirurgia para suspensão da menstruação, sem preservação ovariana, realizada em casos graves de SPM, apresenta riscos de complicações como hemorragia intra e pós-operatória, infecção e deiscência da parede abdominal, infecção urinária e pneumonia pós-cirúrgica, lesões dos órgãos adjacentes como ureter, bexiga e intestino, tromboembolismo, distúrbios sexuais, disfunções do trato urinário inferior e constipação intestinal devido a aderências pélvicas 27. Em contraposição, segundo Wiedemann e Di Pietro 7, a DLM tem baixo risco associado, se executada por profissionais capacitados. Também podem contribuir medidas comportamentais (prática de atividades físicas regulares, atividades relaxantes, repouso adequado, orientações sobre os sintomas e alimentação hipossódica). A DLM poderia ser adotada como medida complementar às comportamentais. O conhecimento e a abordagem da SPM são necessários para atuar da melhor forma nessa desordem utilizando a DLM14; assim o método poderia se tornar uma alternativa para mulheres com contra-indicação medicamentosa e cirúrgica. Neste estudo, o reduzido número constatado de melhoras significantes pode estar ligado à amostra pequena. Sugerem-se estudos com um maior número de voluntárias, colaborando para esclarecer e comparar os resultados obtidos neste estudo piloto, e comprovar a eficácia da técnica isolada ou associada a outros tratamentos. CONCLUSÃO A drenagem linfática manual foi eficaz na diminuição de um sintoma da síndrome pré-menstrual, o edema em região superior abdominal, e não alterou a qualidade de vida dessas mulheres jovens. REFERÊNCIAS 1 Nogueira CWM, Silva JLP. Prevalência dos sintomas da síndrome pré-menstrual. Rev Bras Ginecol Obstet. 2000;22(6):347-51. 8 Pedroso RA, Celich KLS. Dor: quinto sinal vital, um desafio para o cuidar em enfermagem. 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Pesq. 2010;17(1):75-80 2010;17(1) 79 Referências (cont.) 15 Ciucci JL, Krapp JC, Soraccco JE, Ayguavella J, Marcovecchio LD, Salvia C, et al. Clínica e evolução na abordagem terapêutica interdisciplinar de 640 pacientes com linfedema durante 20 anos. J Vasc Bras. 2004;3(1):72-6. 16 Soares LMA, Soares SMB, Soares AKA. Estudo comparativo da eficácia da drenagem linfática manual e mecânica no pós-operatório de dermolipectomia. Rev Bras Promocao Saude. 2005;18(4):199-204. 17 Gordia AP, Quadros TMB, Campos W, Petroski ÉL. Domínio físico da qualidade de vida entre adolescentes: associação com atividade física e sexo. Rev Salud Publica (Colômbia). 2009;11(1):50-61 18 Guyton AC, Hall JE. Tratado de fisiologia médica. 11a ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2006. 19 Demicheli FB, Lüdicke F, Lucas H, Chardonnens D. Premenstrual dysphoric disorder: current status of treatment. Swiss Med Wkly. 2002;132:574-8. 20 Longo C, Rizzo R, Inzitari MT, Scumaci G, Caroleo S, Iocco M. 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Dra. associada do Depto. de Fisioterapia da EEFFTO/UFMG ENDEREÇO PARA RESUMO: O longo período de imobilidade na internação em unidade de terapia intensiva (UTI) desencadeia prejuízos aos sistemas musculoesquelético, cardiovascular, respiratório e neurológico. A reabilitação pulmonar na UTI, em especial o treinamento físico, visa restaurar a funcionalidade anterior ao episódio que determinou a necessidade da ventilação mecânica, reduzindo a dependência, prevenindo novas internações e, conseqüentemente, melhorando a qualidade de vida. Entretanto, é observada resistência na aplicação dessa modalidade de tratamento, devido ao receio das equipes. O objetivo do presente estudo foi efetuar uma revisão da literatura sobre as implicações dos programas de reabilitação pulmonar nas UTI. O levantamento bibliográfico foi feito nas bases de dados PubMed, Cochrane, PEDro e SciELO por meio dos descritores “reabilitação pulmonar” “no cuidado intensivo” e “na unidade de terapia intensiva”, além de estudos sugeridos por especialistas. Sete artigos (ensaios clínicos randomizados, estudos de coorte e retrospectivos) foram avaliados. Todos sugeriram que a reabilitação na UTI é benéfica e não causa efeitos colaterais. Os principais benefícios identificados foram a melhora da deambulação, aumento de força da musculatura respiratória e esquelética, além de melhora funcional ligada às atividades de vida diária. De acordo com os estudos analisados, a reabilitação pulmonar em UTI mostrou-se uma modalidade segura, bem tolerada e que determina efeitos positivos aos pacientes. DESCRITORES: Imobilização; Pneumopatias/reabilitação; Unidades de terapia intensiva CORRESPONDÊNCIA Danielle Corrêa França R. Rui Barbosa 498 35700-412 Sete Lagoas MG e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO fev. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO jan. 2010 ABSTRACT: The long period of immobility in intensive care units (ICU) may be harmful to patients’ musculoskeletal, cardiovascular, respiratory and neurological systems. Pulmonary rehabilitation in ICU, particularly the physical training, aims to restore previous functionality prior to the event that determined the need for mechanical ventilation, thus reducing dependence, preventing new admissions, and improving patients’ quality of life. However, resistance has been noticed among ICU staff to applying physical training. The purpose of this study was to perform a literature review on the implications of pulmonary rehabilitation programs in the ICU. Articles were sought for in PubMed, Cochane, PEDro and SciELO databases, by means of key words “pulmonary rehabilitation”, “intensive care”, and “intensive therapy”, in addition to studies suggested by experts. Seven articles (randomised clinical trials, cohort, and retrospective studies) were assessed. All of them suggested benefits by pulmonary rehabilitation in the ICU, in addition to the absence of side effects. Main benefits were ambulation improvement, increase on strength of respiratory and skeletal muscles, plus improvement in activities of daily living. According to the studies analyzed, pulmonary rehabilitation in the ICU proves to be beneficial to patients, being a safe and well tolerated means of rehabilitation. KEY WORDS: Immobilization; Intensive care units; Lung diseases/rehabilitation Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):81-7 2010;17(1) 81 INTRODUÇÃO O desenvolvimento e os avanços das unidades de terapia intensiva (UTI), aliados aos da ventilação mecânica (VM) e dos cuidados intensivos, propiciam o aumento da sobrevida de pacientes criticamente enfermos. Essa sobrevida é freqüentemente associada à VM prolongada e a período extenso de internação, com conseqüente imobilidade no leito1. A inatividade prolongada pode desencadear limitações e disfunções de órgãos e sistemas2. A restrição da atividade física tem sido associada a diferentes prejuízos aos sistemas corporais. No sistema muscular, a imobilidade prolongada reduz o potencial e a eficácia para realizar exercícios, particularmente os aeróbicos2,3. No sistema esquelético o repouso prolongado leva à desmineralização, diminuição da densidade óssea e fraturas decorrentes de pequenos impactos2. No sistema respiratório, a imobilidade pode diminuir a capacidade residual funcional e a complacência pulmonar, ocasionando atelectasias, retenção de secreções e, em alguns casos, a pneumonia e morte3. As adaptações cardiovasculares à atividade reduzida são consideradas prejudiciais para a saúde do indivíduo e a inatividade crônica é identificada como um fator de risco para doença cardiovascular3. Em relação ao sistema nervoso central, o repouso prolongado induz ao deficit de equilíbrio e redução da capacidade de manutenção em ortostatismo e desempenho em testes da função intelectual4. Os prejuízos determinados pela imobilização durante a hospitalização prolongada podem potencialmente agravar o curso clínico da doença de base5. Entretanto, esse declínio da capacidade funcional pode ser atenuado por um programa de reabilitação pulmonar na UTI, que tem sido associado a um menor deficit funcional após a alta hospitalar6,7. A reabilitação pulmonar é um programa multidisciplinar de cuidado para pacientes com doença respiratória crônica, individualmente planejado para otimizar o desempenho físico, social e autonomia do paciente8-10. A reabilitação pulmonar na UTI objetiva aplicar modalidades terapêuticas que restaurem a funcionalidade anterior ao episódio que 82 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):81-7 determinou a necessidade da VM. Essa modalidade da reabilitação reduz a dependência do paciente em relação às atividades de vida diária, previne novas internações e melhora a qualidade de vida do paciente3. adultos, hospitalizados em UTI, publicados em inglês, espanhol ou português. Não foram incluídas as revisões bibliográficas. A data da publicação não foi limitada devido ao escasso número de estudos sobre o tema. O treinamento físico é um componente essencial do programa de reabilitação na UTI3, associado a incremento da força muscular e otimização do tempo fora da VM. Tais benefícios favorecem a restauração precoce dos sistemas corporais, evitam complicações associadas à imobilidade prolongada e contribuem para a melhora da qualidade de vida após VM prolongada1. Entretanto, observa-se resistência na aplicação do treinamento físico, determinada pelo receio das equipes de UTI diante da gravidade do quadro clínico dos pacientes em VM. Outros fatores que contribuem para a resistência na aplicação desse treinamento são a intensidade de trabalho das UTI e a necessidade de pessoal treinado para efetuar o treinamento físico11. As referências bibliográficas de todos os artigos foram verificadas e foi realizado contato com especialista no assunto, que ofereceu outros estudos. Os estudos foram selecionados mediante leitura criteriosa do título e resumo. Foram excluídos da análise estudos que desviaram do tema proposto. A análise feita foi descritiva. Diante dos défices determinados pela imobilidade e dos benefícios provenientes do treinamento físico dos programas de reabilitação precoce, o objetivo do presente estudo foi realizar uma revisão da literatura sobre os resultados dos programas de reabilitação pulmonar nas UTI. METODOLOGIA Foi realizada uma revisão da literatura. As seguintes etapas foram seguidas: identificação do problema e formulação da pergunta – Quais são as evidências científicas sobre os programas de reabilitação pulmonar nas UTI? –, localização e seleção dos estudos, coleta de dados, análise e interpretação dos dados, avaliação crítica dos estudos. O levantamento bibliográfico foi feito nas bases de dados PubMed, Cochrane, PEDro e SciELO por meio dos descritores, em português e inglês, reabilitação pulmonar no cuidado intensivo e reabilitação pulmonar na unidade de terapia intensiva. Os critérios de inclusão foram: artigos disponíveis na íntegra que abordaram o treinamento físico em um programa de reabilitação pulmonar em pacientes RESULTADOS No levantamento bibliográfico, foram localizadas 16 referências na PubMed, 10 na Cochrane, uma na SciELO e cinco na PEDro. No entanto, a maioria das referências foi encontrada em mais de uma base. Grande parte dos estudos foi excluída por desviar do tema ao abordar reabilitação pulmonar após alta da UTI. Após a análise, de acordo com os critérios de inclusão, dois artigos foram selecionados. Nestes foram encontrados seis artigos listados nas referências bibliográficas, dos quais dois foram incluídos após leitura criteriosa. Também foram incluídos três artigos não disponíveis nas bases de dados, sugeridos pelo especialista, totalizando uma amostra final de sete publicações (Figura 1). O Quadro 1 apresenta uma sinopse dos sete estudos selecionados, destacando suas principais características. De acordo com a literatura pesquisada, Make et al.12 foram os primeiros autores a publicarem um manuscrito sobre a reabilitação pulmonar na UTI. Esses autores estudaram 16 pacientes cronicamente ventilados de forma invasiva, 10 com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) (grupo 1) e 6 com alteração respiratória restritiva devido a doença neuromuscular (grupo 2), referenciados a uma unidade de reabilitação. O programa de reabilitação pulmonar consistiu em: estabilização; avaliação; planejamento da reabilitação com motivação para mobilização; treinamento físico, que incluía exercícios de força e resistência dos membros inferiores França et al. Reabilitação pulmonar na UTI Localização de referências - nas bases de dados PubMed Cochrane SciELO PEDro 16 referências • 10 referências • 1 referência • 5 referências Selecionada: 1 • Selecionada: 1 • Selecionada: 0 • Selecionada: 0 – 15 desviaram – 9 desviaram – 1 repetida – 4 desviaram do tema do tema do tema – 1 repetida Artigos selecionados • • 2 - citadas nas publicações selecionadas 6 referências Selecionadas: 2 – 4 desviaram do tema • • 2 - sugeridas por especialista • 8 referências Selecionadas: 3 – 4 repetidas – 1 revisão • Figura 1 3 Total: 7 artigos Esquema ilustrativo do processo de seleção dos artigos sobre reabilitação pulmonar em unidade de terapia intensiva (MMII), técnicas de conservação de energia, deambulação e treino e encorajamento de atividades de vida diária; e planejamento da alta, com envolvimento de familiares. Os dados foram apresentados de forma descritiva. Segundo os autores, os aspectos chave do programa foram o uso de ventiladores móveis e períodos de desmame superiores a duas horas, que permitiam independência e mobilidade. Ao final do estudo foi observada ampla variação na independência para atividades de vida diária. Quatro pacientes com DPOC e dois com doença neuromuscular eram minimamente independentes ou totalmente dependentes, enquanto 12 pacientes permaneciam de 2 a 24 h/dia fora do ventilador e eram moderada ou totalmente independentes. Os autores sugeriram que o programa de reabilitação para pacientes cronicamente dependentes da VM pode melhorar a funcionalidade e qualidade de vida desses pacientes. Nava et al.6, em 1998, avaliaram 80 pacientes com DPOC em recuperação de episódio de insuficiência respiratória aguda, clinicamente estáveis, internados em UTI, em VM ou espontânea. Dentre os 80, 60 pacientes foram submetidos à terapia padrão – que consistia em tratamento medicamentoso para as doenças de base e possíveis complicações e suporte nutricional – acrescida de um programa de reabilitação (grupo A), enquanto os outros 20 pacientes foram submetidos à terapia padrão associada apenas à deambulação progressiva (grupo B). Na admissão, 78% dos pacientes do grupo A e 70% do gruo B eram ventilados mecanicamente, por ventilação invasiva ou não-invasiva. O programa de reabilitação consistia em duas sessões diárias de 30 a 45 minutos e foi dividido em quatro fases. As duas primeiras foram consideradas treinamento para deambulação progressiva, comum aos dois grupos de pacientes: consistiam em treino com sobrecarga crescente, de manutenção de posturas a deambulação independente. As fases III e IV, realizadas apenas pelos pacientes do grupo A, consistiam em treinamento dos músculos respiratórios, pedalagem em cicloergômetro e caminhada em esteira a 70% da carga atingida no teste incremental realizado. Os principais achados foram: não foi observada diferença significativa na porcentagem de óbitos e de dias de internação entre os grupos; durante a alta, 87% dos pacientes do Grupo A apresentaram autonomia para deambulação, enquanto apenas 70% dos pacientes do grupo B apresentaram esse resultado; pacientes do grupo A apresentaram benefícios não-evidenciados no grupo B, como aumento significativo da distância percorrida no teste de seis minutos (p<0,001) e da força dos músculos inspiratórios (p<0,05), e diminuição significativa da freqüência cardíaca após o teste de caminhada (p<0,01) e da taxa de dispnéia na alta da UTI. Para os autores, os resultados sugerem que pacientes com DPOC admitidos em UTI, após episódio de falência respiratória e que na maior parte eram ventilados mecanicamente, se beneficiaram de um programa de reabilitação pulmonar precoce. Porta et al.13 avaliaram se a adição de treinamento dos membros superiores (MMSS) à fisioterapia global é aplicável e se resulta em benefícios adicionais aos pacientes recentemente desmamados da VM. Foram avaliados 66 pacientes clinicamente estáveis, internados em UTI e desmamados 48 a 96 horas antes do início do treinamento. Os pacientes foram alocados aleatoriamente em dois grupos: 1, intervenção e 2, controle (fisioterapia global). A intervenção consistiu em sessões de 20 minutos de treinamento muscular específico de MMSS em cicloergômetro, além da fisioterapia global. Vinte e cinco pacientes de cada grupo completaram o protocolo. Em relação ao grupo controle, o grupo intervenção apresentou melhora mais notável na capacidade de exercício, evidenciada pela maior tolerância ao teste incremental (p=0,003) e de resistência (p=0,021) dos MMSS, menor taxa de fadiga durante os testes incremental (p=0,001) e de resistência (p=0,005) e menor dispnéia durante o teste de resistência (p=0,01). Ambos os grupos apresentaram melhora na força dos músculos inspiratórios e da taxa de dispnéia durante o teste incremental, sem diferença entre os grupos. Os autores concluem que o treinamento precoce dos MMSS é um programa seguro, aplicável em UTI, que pode melhorar a tolerância ao exercício e reforçar os efeitos de um programa de reabilitação global. Em uma análise retrospectiva de 49 pacientes dependentes crônicos de VM, Martin et al.11 avaliaram a prevalência e Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):81-7 2010;17(1) 83 84 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):81-7 Avaliar se a adição de • NI: freqüência do tratamento, por quem foi aplicado • Sem grupo controle • r 55% dos pcts: aumento de atividades após 24h da transferência • % de pcts que deambulavam passou de r 5% para > 40% após 48 h da transferência • Pcts c/ diferentes diagnósticos e etiologias, amostra relativamente pequena • Sem cegamento Atividades progressivas: sentarse à beira do leito s/ encosto, transferência da cama para cadeira, deambulação c/ ou s/ Não se aplica auxílio, c/ andador e/ou apoio do pessoal duas X ao dia • Grupo intervenção: > força dos músculos esqueléticos e respiratórios (significante) em relação ao grupo controle, além de melhora do estado funcional • Realizadas 1449 atividades Efeitos adversos: 9 pcts (8,7%) em 14 atividades (0,96%): 5 quedas, 4 hipoten- • Ausência de sões, 3 dessaturações, 1 hipertensão, 1 grupo controle remoção de sonda alimentar. • Ausência de extubação e complicações Apoio nutricional + posicionamento adequado, assistência em AVD, encorajamento à mobilização • Aumento significativo da força dos MMSS e MMII, capacidade levantar e deambular após intervenção • Estudo • Força inicial dos MMSS foi retrospectivo inversamente correlacionada com tempo de desmame da VM (r=0,72, p<0,001) • Aumento da PImáx e melhora da sensação de dispnéia em ambos os grupos, sem diferença entre eles. • Sem cegamento Grupo 1 > capacidade de exercício dos MMSS (teste incremental e de resistência) Atividades progressivas, duas X ao dia: sentar-se à beira do leito s/ encosto, transf. da cama para cadeira, e deambulação c/ ou Não se aplica s/ auxílio, usando um andador e/ou apoio do profissional Terapia padrão para a doença subjacente + treinamento 5 X por semana por 6 semanas: exercícios de fortalecimento dos MMSS e MMII, na beira do leito, treino de transf., deambulação e atividades funcionais Exercícios de controle de tronco, manutenção da postura, passivos e de resisNão se aplica tência para MMSS e MMII, deambulação em barras paralelas (sessões 30 a 60 min) Grupo 2: Ft global sem treino específico de MMSS Grupo 1: Ft global (deambulação, controle de tronco e ft respiratória) + sessões diárias de cicloergômetro de braço durante 20 minutos, com aumento da carga de acordo com a dispnéia • Grande distinção entre os grupos • Sem cegamento • Autonomia para deambulação: 87% grupo A e 70% grupo B • Nos dois grupos melhora da função pulmonar, sem diferença entre eles • Grupo A: PImáx significativamente >, melhora significativa da sensação de dispnéia e da tolerância ao exercício Grupo B terapia padrão + treino de deambulação progressiva Ressalvas Grupo A – reabilitação pulmonar: terapia padrão + treino de deambulação progressiva + de músculos respiratórios + pedalagem em cicloergômetro + caminhada em esteira com carga de 70% de teste incremental Resultados Na alta: independência para AVD variou: 4 pcts c/ DPOC e 2 c/ doença neuromus- • Grandes cular minimamente independentes ou diferenças entre totalmente dependentes; 12 pcts de 2 a os pcts 24 h/dia fora do ventilador Controle AVD, deambulação, treinamento de força e Não se aplica resistência dos MMII, técnicas de conservação de energia Intervenção ECR = Ensaio clínico randomizado; Pcts = pacientes; Ft = fisioterapia; VM = ventilação mecânica; DPOC = doença pulmonar obstrutiva crônica; AVD = atividade da vida diária; MMII = membros inferiores; MMSS = membros superiores; transf = transferência; UTI = unidade de terapia intensiva; PImáx = pressão inspiratória máxima; NI = Não indicado Verificar se pcts Thomsen transferidos para UTI em 104 pcts com mais et al., que se prioriza a atividade 4 dias de VM 2008 de precoce apresentam Coorte melhor deambulação 15 Determinar se atividade Bailey et precoce é viável e 103 pcts com mais al., 2007 segura em pcts com de 4 dias de VM Coorte insuficiência respiratória 14 1 Avaliar efeitos de programa de 6 semanas Chiang et de treinamento físico no 39 pcts em VM al., 2006 estado funcional e força por mais de 14 dias muscular em pcts em ECR VM prolongada 11 Avaliar prevalência e Martin et magnitude da fraqueza 49 pcts al., 2005 muscular e o impacto da dependentes Retrosreabilitação em pcts crônicos de VM pectivo cronicamente ventilados al., 2005 à ft global é aplicável e 66 pcts recémse resulta em benefícios desmamados ECR adicionais a pcts recentemente retirados da VM 13Porta et treinamento dos MMSS ECR 1998 6 Nava, 80 pcts c/ DPOC em recuperação de insuficiência respiratória, com VM ou ventilação espontânea Comparar efeitos da reabilitação pulmonar precoce c/ os da deambulação progressiva em pcts c/ DPOC c/ insuficiência respiratória Amostra 16 pcts dependentes de VM, 10 c/ DPOC e 6 c/ alterações restritivas Objetivo 12 Make Reportar métodos e sumarizar resultados da et al. 1984 reabilitação pulmonar Descride 16 pcts cronicamente tivo ventilados tipo Autoria e Quadro 1 Sinopse (principais informações e ressalvas) dos sete estudos incluídos na revisão França et al. a magnitude da fraqueza muscular e o impacto da reabilitação em pacientes cronicamente ventilados, internados em uma unidade de reabilitação multidisciplinar. Na admissão os pacientes apresentaram fraqueza muscular importante e descondicionamento severo. O programa de reabilitação era conduzido por fisioterapeutas, cinco dias por semana em um ginásio construído dentro da unidade de reabilitação. Consistia em sessões de 30 a 60 minutos de duração, com exercícios de controle de tronco, manutenção da postura, exercícios passivos e de resistência para MMSS e MMII, além de deambulação em barras paralelas. O programa foi realizado com pacientes em VM ou ventilação espontânea – quando o paciente conseguia permanecer por mais de quatro horas fora do respirador, em respiração espontânea. Os principais resultados observados foram o aumento significativo da força dos MMSS e MMII (p<0,01), da habilidade de transferir-se de supino para sentado (p<0,01) e de sentado para em pé (p<0,01), e de deambular (p<0,05), além de relação significativa indireta de magnitude moderada entre a força dos MMSS na admissão e o tempo de desmame (r=0,72, p<0,001). Os autores sugerem que pacientes cronicamente ventilados apresentam fraqueza e descondicionamento, mas respondem positivamente à reabilitação, com melhora da força, dos resultados do desmame e da funcionalidade. Chiang et al.1 avaliaram 39 pacientes com o intuito de verificar a hipótese de que um programa de treinamento físico de pacientes em VM prolongada poderia melhorar a força muscular respiratória, aumentar o tempo fora da VM e melhorar o estado funcional. Os pacientes foram divididos em dois grupos, intervenção e controle. Pacientes do grupo intervenção foram submetidos a sessões supervisionadas por fisioterapeutas, cinco vezes por semana por seis semanas. As sessões consistiam em exercícios de fortalecimento na beira do leito para os MMSS e MMII, treinamento de atividades funcionais e deambulação, assim que os pacientes suportassem. A intensidade dos exercícios foi determinada de acordo com a classificação da escala de Borg. O grupo controle recebeu terapia padrão para a doença subjacente, apoio Reabilitação pulmonar na UTI nutricional e cuidados que incluíam posicionamento adequado e assistência nas atividades de vida diária. A mobilização física poderia ser encorajada verbalmente, mas não era rotineiramente realizada pela equipe. Os autores observaram aumento significativo da força dos músculos esqueléticos (p<0,05), da musculatura respiratória (p<0,01), do tempo livre fora do respirador (p<0,01) e do estado funcional (p<0,001) nos pacientes submetidos à reabilitação precoce, enquanto pacientes do grupo controle apresentaram deterioração da força dos músculos esqueléticos e respiratórios e uma diferença não significativa do tempo fora do respirador. Os autores concluíram que os benefícios proporcionados pelo treinamento físico possivelmente acentuaram a melhora funcional desses pacientes. Com o objetivo de verificar se a atividade precoce é segura e viável em pacientes com insuficiência respiratória, Bailey et al.14 avaliaram todos os pacientes admitidos na UTI, no período de junho a dezembro de 2003, e que necessitaram de mais de quatro dias de VM. As atividades foram realizadas duas vezes por semana a partir da estabilização clínica. Foram instituídas, progressivamente, atividades como sentar-se à beira do leito, transferência da cama para cadeira, deambulação com ou sem auxílio, usando um andador e/ou apoio da equipe. Para adequar a ventilação, foram realizados ajustes nos parâmetros ventilatórios, quando necessário. Em relação à viabilidade, a equipe foi treinada e a unidade reorganizada para priorizar as atividades dos pacientes. Foram avaliadas 1449 atividades em 103 pacientes. Efeitos adversos foram observados em 14 atividades (0,96%), em nove pacientes: cinco quedas sem lesões, quatro episódios de hipotensão, três de dessaturação, um de hipertensão e um de remoção de sonda alimentar. Nenhum dos eventos adversos resultou em extubação, complicações que exigiriam terapia adicional, ou longo tempo de hospitalização. Os autores sugeriram que a atividade precoce é segura e viável em pacientes ventilados artificialmente. Recentemente Thomsen et al.15 estudaram 104 pacientes com insuficiência respiratória que foram transferidos de UTI convencionais para uma unidade intensiva respiratória onde a atividade precoce é o ponto chave do tratamento do paciente. A intervenção consistiu de atividades progressivas, iniciadas com o sentar à beira do leito sem encosto e evoluindo para transferência da cama para cadeira, deambulação com ou sem auxílio, de andador e/ou apoio do profissional, duas vezes ao dia. Foram estudados 104 pacientes que requereram VM por período superior a quatro dias. Foi observado que após a transferência houve um aumento substancial da deambulação (p<0,0001) e que, em apenas dois dias na unidade intensiva respiratória, o número de pacientes que deambulava aumentou três vezes em comparação com o período pré-transferência. A transferência para a unidade de treinamento precoce (p<0,0001), o sexo feminino (p=0,019), a ausência de sedativos (0,009) e o menor escore (p=0,017) no questionário Apache, de avaliação do estado fisiológico agudo e crônico (Acute Physiology and Chronic Health Evaluation II), que estima o prognóstico do paciente, foram considerados preditores do aumento da deambulação. Os autores concluem que, em um ambiente que propicia imobilidade, o treinamento físico na UTI pode contribuir para aumentar a deambulação, independente da fisiopatologia subjacente. DISCUSSÃO A presente revisão analisou sete estudos, todos publicados no idioma inglês, que avaliaram os efeitos de diferentes programas de reabilitação pulmonar em pacientes internados em UTI. Destes, três correspondem a ensaios clínicos randomizados, um a estudo descritivo, dois a estudos de coorte e um a estudo retrospectivo. Quanto ao delineamento metodológico, nenhum artigo apresentou cegamento. Quanto ao país de origem, quatro foram feitos nos Estados Unidos, um na China e um na Itália. Em relação à qualidade da evidência dos estudos, de acordo com a escala PEDro16, os ensaios clínicos apresentam baixa pontuação, Nava et al.6 com pontuação (4/10), Porta et al.13 (5/10) e Chiang et al.1 (4/10). Aos quatro estudos restantes não se aplica essa escala. Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):81-7 2010;17(1) 85 Em seis artigos a amostra era composta de pacientes pós-insuficiência respiratória, que apresentavam estabilidade clínica, ausência de comprometimento neuromuscular grave e nível de consciência satisfatório; entretanto a doença de base diferiu entre eles. Houve predomínio de pneumonia como causa de insuficiência respiratória em um estudo11, sepse em dois 14,15, DPOC em três1,6,13 e em um estudo12 não foi identificada a doença de base predominante. Neste último, Make et al.12 avaliaram pacientes cronicamente ventilados, submetidos à VM devido a acidose respiratória progressiva. Em relação à intervenção aplicada, todos os estudos apresentam tratamento a pacientes internados em UTI, mas cada estudo utiliza um protocolo distinto de atividades. A maior parte dos estudos preconiza o treinamento global, baseado em mobilização precoce, fortalecimento de musculatura respiratória de MMSS e MMII, estabilização de tronco, transferências e deambulação. Em um estudo foi realizado treinamento de resistência dos MMII, como nos programas ambulatoriais8-10, e em outro foi priorizado o treinamento de MMSS13. Os autores utilizaram períodos distintos de VM como critério de inclusão nos estudos. Thomsen et al.15 e Bailey et al.14 incluíram pacientes ventilados mecanicamente há mais de quatro dias e Chiang et al.1 e Martin et al.11, há mais de 14 dias. No estudo de Nava et al.6, 78% dos pacientes estavam em VM, mas os autores não utilizaram o período em ventilação como critério de inclusão. Make et al.12 estudaram pacientes dependentes de VM, entretanto não mencionaram o período de ventilação. Já Porta et al.13 estudaram pacientes com mais de 96 horas de extubação. Em três dos sete estudos analisados os autores avaliaram pacientes em grupo controle. Nos de Nava et al.6 e Chiang et al.1, os pacientes do grupo controle foram submetidos a terapia médica padrão para a doença subjacente e apoio nutricional. O primeiro também acrescentou deambulação progressiva e o segundo, posicionamento adequado e mobi- 86 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):81-7 lização encorajada apenas verbalmente. No estudo realizado por Porta et al.13 o grupo controle foi submetido à fisioterapia global sem programa específico de MMSS, esta considerada a intervenção aplicada ao grupo tratado. Vale ressaltar que nos grupos controle desses três estudos os pacientes foram submetidos a programas pouco convencionais na prática clínica e que, apesar de menores em relação aos grupos intervenção estudados, também apresentaram benefícios à funcionalidade e força muscular. Nenhum dos estudos analisados relatou prejuízos determinados pela reabilitação na UTI, demonstrando a viabilidade da atividade precoce. Bailey et al.14, que avaliaram a segurança e viabilidade da reabilitação na UTI, mostraram que menos de 1% das atividades realizadas correlacionaram-se com efeitos adversos simples, sem complicações. Em relação ao custo-benefício, Hopkins et al.5 relataram que a mudança cultural dentro de uma UTI visando a mobilização precoce não exige aumento de gastos, e que é possível desenvolver um programa de reabilitação precoce desde que haja planejamento, preparação da equipe e organização do serviço. Apesar da diversidade de protocolos, características dos participantes e instrumentos, além da ausência de cegamento e da baixa nota na escala PEDro, todos os estudos sugeriram benefícios diante de programas de reabilitação pulmonar na UTI. Os principais benefícios determinados pela reabilitação identificados nos estudos analisados foram aumento da deambulação, aumento da força da musculatura respiratória e esquelética e melhora funcional relacionada às atividades de vida diária. Na busca de evidência científica, foram pesquisadas revisões bibliográficas que analisaram os efeitos da fisioterapia precoce em pacientes internados em UTI. Clini e Ambrosino17, em 2004, avaliaram a efetividade clínica de protocolos de desmame e de intervenções fisioterápicas específicas, dentre as quais destacam-se a mobilização de membros e o treinamento da musculatura esque- lética, consideradas modalidades da reabilitação na UTI. Os autores sugeriram que os exercícios passivos e ativos dos MMSS e MMII podem ser empregados para reduzir os efeitos deletérios da imobilização, e destacaram os benefícios na oxigenação, estimulo gravitacional, restauração da distribuição do fluido corporal, manutenção da amplitude de movimento e prevenção do tromboembolismo. Em relação ao treinamento da musculatura esquelética, os autores analisaram o estudo realizado por Nava6, também incluído na presente revisão. Recentemente, a Sociedade Respiratória Européia 18 publicou recomendações para as ações da fisioterapia na UTI, as quais incluem treinamento dos músculos esqueléticos, mobilização e posicionamento. Os autores enfatizaram a segurança e importância dessas modalidades para a prevenção dos prejuízos causados pela imobilidade no leito e propuseram um fluxograma para início da mobilização na UTI. Também destacaram os níveis de evidência das técnicas e procedimentos realizados pela fisioterapia na UTI. Outro aspecto enfatizado foi a falta de dados e a necessidade de padronização de programas de atendimento, que poderão potencializar os benefícios da prevenção e tratamento da imobilidade e do descondicionamento, freqüentemente observados em pacientes da UTI. CONCLUSÃO Com base nos estudos analisados, conclui-se que a reabilitação pulmonar precoce realizada na UTI tem efeitos positivos na recuperação da falência respiratória dos pacientes, inclusive naqueles em VM. Em adição, esse procedimento mostrou-se seguro e bem tolerado, já que não foram demonstrados efeitos colaterais em nenhum dos estudos analisados. Entretanto, são necessárias novas investigações para determinar a freqüência, tempo de início e técnicas de aplicação mais adequadas a serem utilizadas. França et al. Reabilitação pulmonar na UTI REFERÊNCIAS 1 Chiang LI, Wang LY, Wu CP, Wu HD, Wu YT. Effects of physical training on functional status in patients with prolonged mechanical ventilation. Phys Ther. 2006;86(9):1271-81. 11 Martin UJ, Hincapie L, Nimchuk M, Gaughan J, Criner GJ. Impact of whole-body rehabilitation in patients receiving chronic mechanical ventilation. Crit Care Med. 2005;33(10):2259-65. 2 Topp R, Ditmyer M, King K, Doherty K, Hornyak J 3rd. The effect of bed rest and potential of prehabilitation on patients in the intensive care unit. AACN Clin Issues. 2002;13(2):263-76. 3 Nava S, Piaggig, Mattia E, Carlucci A. Muscle retraining in the ICU patients. Minerva Anestesiol. 2002;68(5):341-5. 12 Make B, Gilmartin M, Brody JS. 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Pesq. 2010;17(1):81-7 2010;17(1) 87 Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.1, p.88-93, jan/mar. 2010 ISSN 1809-2950 Instrumentos clínicos de avaliação funcional do tornozelo: revisão sistemática Clinical measurement tools for ankle functional assessment: a systematic review Tarcísio Santos Moreira1, George Schayer Sabino2, Marcos Antônio de Resende3 Estudo desenvolvido no Depto. de Fisioterapia da EEFFTO da UFMG – Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil 1 Fisioterapeuta especialista em Ortopedia e Esportes; mestrando em Ciências da Reabilitação na UFMG 2 Fisioterapeuta; Prof. Ms. do Centro Universitário Newton Paiva, Belo Horizonte 3 Prof. Dr. associado do Depto. de Fisioterapia da EEFFTO da UFMG ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Tarcísio S. Moreira R. Gávea 50 apt. 303 Jd América 31 3373 4151 30460-400 Belo Horizonte MG e-mail: [email protected] APRESENTAÇÃO out. 2009 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO fev. 2010 88 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):88-93 RESUMO: A entorse lateral do tornozelo é umas das lesões mais comuns em atletas e adultos fisicamente ativos. A utilização de instrumentos de avaliação confiáveis e válidos é fundamental na determinação da intervenção terapêutica adequada e, portanto, do sucesso do tratamento. O objetivo deste trabalho foi fazer um levantamento crítico, por meio de uma análise sistemática da literatura, dos instrumentos de medida adequados (questionários e escalas funcionais) disponíveis para a avaliação dos indivíduos que sofreram entorse lateral do tornozelo. Após busca nos bancos de dados MEDline e Scielo foram incluídos 11 questionários para avaliação funcional do tornozelo. A escala funcional de extremidade inferior LEFS (Lower extremity functional scale) e a medida funcional de pé e tornozelo FAAM (Foot and ankle ability measure) foram as que apresentaram melhor qualidade metodológica, além de mais informações sobre suas propriedades de medida e suas aplicações práticas – mas não foram traduzidas para o português. Foram encontrados dois questionários traduzidos e adaptados para a população brasileira, o instrumento de instabilidade de tornozelo CAIT (Cumberland Ankle Instability Tool) e a escala de tornozelo e retropé AOFAS (American Orthopaedic Foot and Ankle Society – ankle-hindfoot scale). A AOFAS apresentou uma análise mais completa de suas propriedades, sendo portanto o instrumento mais recomendado para avaliação funcional do complexo pé-tornozelo atualmente no Brasil. DESCRITORES: Avaliação/questionários; Literatura de revisão como assunto; Tornozelo/entorses e distensões ABSTRACT: Lateral ankle sprain is the most common injury among athletes and physically active adults. The adoption of valid and reliable clinical assessment instruments is basic for determining the most adequate therapeutic intervention, hence to achieve better rehabilitation. This is a systematic literature review to search for available and reliable outcome measures (questionnaires and functional scales) in the assessment of individuals who suffered lateral ankle sprain. After a search in MEDline and Scielo databases a total of 11 instruments were selected and critically analysed. The Lower Extremity Functional Scale and the Foot and Ankle Ability Measure showed the best methodological properties and provided more information concerning measurement features and clinical application (but have not been translated into Portuguese). Two instruments were found that were translated and culturally adapted for the Brazilian people, the CAIT (Cumberland Ankle Instability Tool) and the AOFAS (American Orthopaedic Foot and Ankle Society – anklehindfoot scale). The AOFAS was found to present a more thorough analysis of its properties and applicability, being thus suggested to be used for functional assessment of ankle and hindfoot in Brazil. KEY WORDS: Ankle/sprains and strains; Evaluation/questionnaires; Review literature as topic Moreira et al. Avaliação funcional do tornozelo INTRODUÇÃO A entorse lateral do tornozelo é umas das lesões mais comuns em atletas e adultos fisicamente ativos1. Mais de 50% de todas as lesões do tornozelo envolvem algum grau de ruptura dos ligamentos laterais dessa articulação2. Acima de 70% dos indivíduos apresentam sintomas persistentes após um episódio de entorse, como dor e instabilidade articular3 Além disso, 5% desses indivíduos podem não ser mais capazes de retornar a alguma atividade esportiva4. Apesar da freqüência de ocorrência da entorse de tornozelo e do potencial de restrição da atividade, ainda não há consenso sobre a melhor abordagem clínica a ser utilizada2. A dificuldade em definir a melhor intervenção no tratamento da entorse do tornozelo decorre, dentre outros fatores, da falta de instrumentos e medidas adequadas para avaliar o efeito terapêutico das intervenções nesse tipo de lesão. Tradicionalmente, a avaliação é baseada em medidas da estrutura e/ou função acometida, por exemplo. na amplitude do movimento articular ou na força muscular1. No entanto, a Classificação Internacional de Funcionalidade propõe que os problemas de saúde devam ser abordados considerando-se a estrutura, função, atividade e participação social dos indivíduos5. A percepção própria sobre a condição de saúde deve ser considerada e quantificada no processo de avaliação. Instrumentos de avaliação baseados no indivíduo, como os questionários, são ferramentas capazes de abranger os domínios de atividade e participação e, portanto, devem ser associadas ao exame físico realizado na clínica de fisioterapia. Os questionários auto-respondidos combinam eficiência, confiabilidade e baixo custo6. Essas ferramentas são adequadas para o uso clínico somente se forem válidas e confiáveis e sensíveis às mudanças no estado de saúde do indivíduo7,8,9. O objetivo deste trabalho foi fazer uma análise sistemática da literatura para verificar quais instrumentos (questionários e escalas funcionais) são os mais adequados na avaliação da condição de saúde de indivíduos que sofreram entorse lateral do tornozelo. Para isso, foi feita uma pesquisa em bancos de dados eletrônicos indexadores de artigos científicos, utilizando-se chave de busca previamente estruturada. METODOLOGIA De março a outubro de 2008 foram feitas buscas nos bancos de dados MEDline e Scielo. Foram incluídos artigos publicados nos últimos 15 anos, escritos nas línguas inglesa ou portuguesa, que apresentavam estudos delineados de modo a testar as propriedades de medida de questionários e escalas funcionais relacionados à funcionalidade do tornozelo. Foram incluídos os estudos que avaliaram: validade, confiabilidade, responsividade e mínima diferença clinicamente significativa. A validade, de uma maneira geral, refere-se ao grau no qual um instrumento mede o que de fato se deseja medir. A confiabilidade relacionase à estabilidade da medida feita em um grupo de indivíduos em que não é esperada mudança ao longo do tempo7. A responsividade diz respeito à capacidade do instrumento de detectar mudanças no estado de saúde de um indivíduo, quando estas ocorrem8. A mínima diferença clinicamente significativa é a correlação entre a mudança em determinada pontuação ligada a um ganho real da funcionalidade e a melhora clínica do paciente. Foram excluídos artigos cujo objetivo primário era avaliar o efeito de uma intervenção e que apenas utilizaram um questionário relacionado à funcionalidade do tornozelo para tanto e/ou que só citavam, mas não mensuravam as características do questionário utilizado. Isso porque o objetivo do presente trabalho não era observar se um questionário foi citado ou utilizado em ensaios clínicos, mas sim se apresenta medidas apropriadas para seu emprego clínico. A chave de busca constituiu-se das seguintes palavras e/ou expressões, incluindo alternativas (“ou”) para cada termo: ankle sprain (ou lateral ligament, ankle, ankle joint; strain etc.); ankle injury; ankle instability; evaluation studies as topic (ou questionnaires, reproducibility of results, treatment outcomes). Termos equivalentes em português, como tornozelo, entorse do tor- nozelo, questionário e tradução foram utilizados na busca na base de dados Scielo. A seleção dos estudos foi feita em três etapas. Inicialmente foi realizada uma triagem com base no título dos estudos, excluindo-se os que não se enquadravam nos objetivos e/ou tema deste trabalho. Em seguida foram lidos os resumos dos artigos restantes, excluindo-se aqueles que não apresentavam o objetivo primário de analisar as propriedades de medida do instrumento de avaliação em questão. Na terceira etapa, os artigos foram lidos na íntegra, excluindo-se os que não apresentavam de modo claro o método de avaliação de pelo menos uma variável em análise; dos restantes foram coletados os dados para o presente estudo. Todas as referências bibliográficas dos artigos incluídos foram analisadas na busca por novos artigos que porventura não tivessem sido encontrados na estratégia de busca proposta. Após a extração e análise dos dados, os instrumentos que eram objeto dos estudos incluídos foram classificados. Cada questionário ou escala foi avaliada quanto a cinco critérios e pontuados de 0 (ausência da informação) ou 1 (presença da informação). Os critérios de pontuação foram validade, confiabilidade, responsividade, mínima diferença clinicamente significativa e o tempo para a aplicação do questionário ou escala. Desse modo, cada instrumento de avaliação foi classificado por uma nota de 0 a 5. Os questionários que alcançaram pelo menos nota 3 (60%) da pontuação proposta foram os considerados mais apropriados para uso clínico. RESULTADOS A busca no MEDline retornou 1.254 estudos, dos quais 39 foram selecionados para a segunda etapa, após a qual 10 artigos foram selecionados para a terceira etapa. Destes, 7 foram incluídos neste estudo3,4,7,10-14. A busca feita na Scielo retornou 87 estudos, dos quais apenas um estava dentro dos critérios propostos e foi incluído neste trabalho6. A análise das referências bibliográficas desses oito artigos selecionados levou a mais três, sendo estes então incluídos nesta revisão1,15,16. Dessa forma, um total de 11 questionários ou escalas de avalia- Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):88-93 2010;17(1) 89 Quadro 1 Propriedades de medida e aplicabilidade dos instrumentos propostos nos estudos selecionados Questionário / Escala Confiabilidade Validade Nota Reprodutibilidade Nota Responsividade Nota MDCS Nota R=0,86 (amostra 9 pts da r=0.80 e completa) escala 1 LEFS 13 1 1 ± 5 pts da escala 1 Curva R=0,94 (condições r=0,64 ROC: 0,76 crônicas) 8 e 9 pts da ±5,7 pts da escala, r=0,64 escala (AVD ICC=0,89 (AVD) FAAM (AVD e (AVD) e 95%IC (AVD) e esporte) 1 1 1 1 r=0,79 esporte) 7 ±12,3 pts da escaICC=0,87 (esporte) Curva ROC: (esporte) la, 95%IC (esporte) 0,80 r=0,67 e Pearson=0,93/0,92 AOFAS (versão Não 0,64 1 1 Não calculada 0 calculada 1 português) 6 ICC=0,96/0,95 r= -0,68 Tempo de Nota aplicação Nota final 2 minutos 1 5 NI 0 4 7,5 minutos 1 4 Análise fatorial: de 0,44 a 0,91 1 ICC= 0,95 1 Não se aplica – Não se aplica – 10 minutos 1 3 CAIT (versão em inglês) 3 ȡ=0,76 e ȡ =0,50 1 ICC=0,96 1 Pontuação na escala t 28/30 1 Não se aplica – NI 0 3 FAOS 12 r =0,58 a 0.67 1 ICC=0,78 a 0,92 Spearman=0,85 a 0,96 1 Não avaliada 0 Não avaliada 0 7 a 10 minutos 1 3 NI 0 ICC=0,95 1 1 NI 0 NI 0 2 Não calculada 0 ICC=0,94 (estudo piloto) 1 1 Não se aplica – NI 0 2 NI 0 ICC=0,89 (FADI); ICC=0,94 (FADI Sport) 1 NI 0 NI 0 2 1 CV<1% (para a maioria dos itens) 1 Não especificada 0 Não avaliada 0 NI 0 2 0 Pearson=0,98 1 Não calculada 0 Não calculada 0 NI 0 1 AAI 16 s CAIT (versão em português)4 AJFAT 13 FADI, FADI Sport 1 Tamanho de efeito = 0,75 (95% IC) Pontuação na escala 26/48 (ROCcurve: 1,0) Tamanho de efeito : 0,52 (FADI) 0,71 1 (FADI Sport) s r =0,62 a 0,87 entre SARS 11 os itens Não KKS (Kaikkonen calculada et al.) 10 MDCS = mínima diferença clinicamente significativa; LEFS = Lower extremity functional scale; FAAM = Functional ankle ability measure; AOFAS = American Orthopaedic Foot and Ankle Society – ankle-hindfoot scale; AAI = Ankle instability instrument; CAIT = Cumberland ankle instability tool; FAOS = Foot and ankle outcome score; AJFAT = Ankle joint functional ability measure; FADI = Functional ankle disability index; SARS = Sports ankle rating system; KKS = Kaikkonen scoring scale of ankle injuries; NI = não informado; IC = intervalo de confiança; ICC = Índice de correlação interclasse; AVD = atividades da vida diária; pts = pontos ção de tornozelo foram analisados. Suas propriedades e a respectiva pontuação atribuída são apresentadas no Quadro 1. Instrumentos de avaliação da função do tornozelo Todos os instrumentos incluídos são de auto-relato, à exceção do protocolo KKS (proposto por Kaikkonen et al.10) e do SARS11, que combinam componentes de auto-relato, desempenho e capacidade funcional – como apoio unipodal e salto lateral – além de testes clínicos de força muscular e estabilidade articular. FADI1 – Índice de incapacidade de pé e tornozelo (Foot and ankle disability index): é um instrumento específico para avaliação da função do tornozelo. É dividido em dois domínios independentes denominados FADI e FADI Sport. Foi testado em população jovem, com idade média de 21 anos, fisicamente ativos, previamente categorizados como saudáveis ou com instabilidade crônica do tornozelo. O FADI é composto de 26 itens, perfazendo um escore máximo de 104 pontos. O FADI Sport é composto de 8 itens, com um escore total de 32 Apenas 6 dos 11 questionários analisados apresentaram pontuação maior ou igual a 3: AAI, AOFAS (versão em português), CAIT (versão em inglês), FAAM, FAOS e LEFS (Quadro 1). Os instrumentos são brevemente apresentados a seguir. 90 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):88-93 pontos. Cada item é pontuado de 0 (incapaz de fazer) a 4 (sem qualquer dificuldade). A pontuação final é dada em porcentagem, sendo que 100% significa sem disfunção. CAIT3 – Instrumento de instabilidade do tornozelo de Cumberland (Cumberland ankle instability tool): na versão em inglês, é um instrumento discriminativo, desenvolvido para determinar se um indivíduo tem instabilidade funcional do tornozelo e sua gravidade. A amostra para o teste foi composta por universitários, sujeitos da comunidade em geral e alunos adolescentes de uma escola de dança local. O questionário original do CAIT é composto por 9 itens, aos quais Moreira et al. Avaliação funcional do tornozelo são atribuídas respostas independentes para cada tornozelo, perfazendo um escore máximo de 30 pontos. A menor pontuação indica maior severidade da instabilidade funcional. sas condições clínicas ortopédicas dos membros inferiores, sendo as mais comuns dores articulares inespecíficas, rupturas ou estiramentos ligamentares e fraturas. O CAIT foi adaptado para o português por Noronha et al.4, mantendo o mesmo sistema de pontuação da versão original. A versão final em português foi testada em 131 indivíduos, dos quais 30 eram pacientes em tratamento fisioterapêutico após entorse de tornozelo. A amostra tinha média de idade de 28 anos, composta em sua maioria por universitários e mulheres. KKS10 – Escala de lesões de tornozelo de Kaikkonen (Kaikkonen scoring scale of ankle injuries): foi um dos primeiros protocolos de avaliação desenvolvido para a abordagem clínica de lesões que acometem a articulação do tornozelo. A escala foi testada em uma ampla população de indivíduos tanto saudáveis quanto previamente submetidos a intervenção cirúrgica para tratamento da entorse lateral do tornozelo grau III. Os autores não deixam explícitas as características da amostra utilizada. O protocolo de avaliação é composto por 9 itens, pontuados de 0 (pior estado) a 15 (melhor estado). É atribuído um escore final de 0 a 100 pontos, dividido em quatro categorias (ruim, razoável, bom e excelente), de acordo com a pontuação obtida; 100 pontos indicam estado funcional normal. A escala de Kaikkonen combina diversos domínios da avaliação clínica, isto é, associa testes clínicos aplicados pelo profissional de saúde, percepção subjetiva do indivíduo e testes de desempenho e capacidade funcional realizados pelo paciente. AOFAS6 – Escala de tornozelo e retropé da Sociedade Ortopédica Americana de Pé e Tornozelo (American Orthopaedic Foot and Ankle Society – Ankle-hindfoot scale) na versão em português: essa escala específica foi proposta pela AOFAS para ser aplicada em indivíduos com diversas lesões dessa região e submetidos a diferentes tratamentos. É composta por 9 itens, distribuídos em 3 categorias, a saber: dor (40 pontos); aspectos funcionais (50 pontos) e alinhamento (10 pontos). O escore total é 100 pontos, indicando funcionalidade normal. Foi traduzida e adaptada para o português por Rodrigues et al.6 em 2008. A versão em português foi testada em indivíduos jovens, com média de idade de 31,5 anos. A lesão mais freqüente foi entorse lateral do tornozelo (72%). O tempo médio de aplicação do questionário foi de 7,5 minutos. FAAM7,14 – Medida funcional de pé e tornozelo (Foot and ankle ability measure): é um instrumento para avaliar o desempenho físico de indivíduos com diversas desordens que acometem os membros inferiores como um todo14. O instrumento é dividido em dois domínios, sendo uma subescala de atividades de vida diária (AVD), composta por 21 itens, e outra de esporte, composta por 8 itens. Cada item é pontuado em uma escala de 0 (incapaz de fazer) a 4 (sem qualquer dificuldade). Logo, a pontuação máxima na subescala de AVD são 84 pontos e na de esporte, 32. Os valores são transformados em porcentagem, em que 100% indica o nível mais alto de funcionalidade7. O instrumento inicialmente foi testado em indivíduos com média de idade de 43,2 anos portadores de diver- O SARS11 – Sistema de avaliação de tornozelo no esporte (Sports ankle rating system): é um sistema de avaliação que conjuga medidas de auto-relato e capacidade funcional. É constituído de três partes, que podem ser aplicadas de modo isolado ou em conjunto, denominadas pelos autores como: medida de qualidade de vida (QoL, quality of life measure), escore clínico (CRS, clinical rating score) e avaliação numérica única (Sane, single assessment numeric evaluation). O instrumento completo consiste em: um questionário para avaliação da qualidade de vida após lesão do tornozelo (QoL); escalas visuais analógicas para medir dor, edema, rigidez, falseio e funcionalidade (CRS subjetivo); medidas clínicas (CRS objetivo) de análise da marcha, movimento e estabilidade articular, força muscular, estabilidade postural em ortostatismo e função (salto lateral unipodal). A terceira parte do SARS é uma questão que solicita ao paciente atribuir uma nota de 0 a 100 para sua função do tornozelo (Sane). O protocolo completo alcança um escore máximo de 100 pontos, sendo que o maior valor indica melhor função. Este instrumento foi desenvolvido para população de atletas e testado em 30 militares com média de 19 anos de idade, em sua maioria homens. A amostra foi divida em dois grupos, sendo um considerado normal em relação à função do tornozelo, e o outro composto por indivíduos que haviam sofrido entorse de tornozelo grau II. FAOS12 – Escala de desfechos de pé e tornozelo (Foot and ankle outcome score): é um questionário auto-administrável, adaptado do KOOS (Knee injury and osteoarthritis outcome score), para conhecer a opinião de pacientes sobre uma série de problemas ligados ao tornozelo e pé. É composto por 42 itens que avaliam 5 dimensões distintas, a saber: dor (9 itens); outros sintomas (7 itens); atividades da vida diária (17 itens); atividades recreativas e esportivas (5 itens); e qualidade de vida relacionada ao pé e tornozelo (4 itens). A cada questão é atribuída pontuação que varia de 0 a 4. A pontuação inicial é transformada em uma escala de 0 a 100, calculada para cada subescala, de modo que valores mais altos indicam melhor funcionalidade. Foi testado por seus elaboradores em pacientes que tinham sido submetidos à reconstrução cirúrgica dos ligamentos laterais do tornozelo, com média de idade de 39,6 anos. O tempo necessário para completar o FAOS varia de 7 a 10 minutos. O guia do usuário pode ser obtido pela internet no site www.koos.nu. LEFS13 – Escala funcional da extremidade inferior (Lower extremity functional scale): foi desenvolvida com base nos conceitos estabelecidos pelo modelo de funcionalidade e incapacidade elaborado pela Organização Mundial de Saúde. Destina-se a ser aplicada a um amplo espectro de indivíduos com alterações ortopédicas nos membros inferiores e, portanto, é considerada um instrumento específico para tal segmento corporal. Foi testada por um estudo multicêntrico em indivíduos com condições clínicas diversas envolvendo os membros inferiores. A média de idade dos sujeitos foi de 44 anos e os locais mais freqüentemente acometidos foram o tornozelo Fisioter Fisioter Pesq. Pesq. 2010;17(1):88-93 2010;17(1) 91 e o joelho, sendo as lesões ligamentares as mais freqüentes. A LEFS é composta por 20 itens, cada um com pontuação máxima de 4 pontos, com um escore máximo de 80 pontos, que significa um estado funcional normal. O questionário pode ser autoaplicado, com tempo aproximado de 2 minutos para completar todos os itens. AJFAT15 – Instrumento de avaliação funcional da articulação do tornozelo (Ankle joint functional assessment tool) é um questionário discriminativo elaborado para diferenciar indivíduos que têm instabilidade funcional do tornozelo daqueles que não apresentam tal disfunção. É composto por 12 questões às quais é atribuída pontuação de 0 a 4, perfazendo um escore máximo de 48 pontos. Escores mais altos indicam maior instabilidade funcional do tornozelo. Este instrumento foi testado em indivíduos jovens, com média de idade de 20,7 anos. AII16 – Instrumento de instabilidade do tornozelo (Ankle instability instrument): é um questionário discriminativo desenvolvido para avaliar se um determinado indivíduo tem ou não instabilidade do tornozelo. Foi testado em população jovem universitária, com média de idade de 20,7 anos, sendo todos fisicamente ativos. Os indivíduos foram divididos em dois grupos, de acordo com a história pregressa positiva para entorse lateral do tornozelo. O AII é composto por 9 itens, aos quais são atribuídas respostas dicotômicas (sim ou não), não sendo contabilizado um escore final. DISCUSSÃO A Fisioterapia encontra-se em processo de mudança, uma vez que condutas tecnicistas estão sendo suplantadas por uma prática sistematizada, que emprega métodos racionais para a tomada de decisão17. Para efetivar essa mudança é preciso recorrer a instrumentos padronizados que permitam uma avaliação de qualidade da condição do paciente. Entre esses instrumentos de medida podemos citar os questionários e escalas funcionais, importantes tanto na prática clínica quanto na pesquisa científica, uma vez que combinam eficiência, confiabilidade e baixo custo13. Entretan- 92 Fisioter Pesq. 2010;17(1) 2010;17(1):88-93 to, o excesso de instrumentos disponíveis pode confundir o profissional, ou mesmo dificultar a comparação de dados em estudos multicêntricos9. Esta revisão coletou dados sobre 11 desses instrumentos, observando que muitos trabalhos não apresentam as informações necessárias para que clínicos e pesquisadores façam uma escolha segura de um determinado instrumento. Algumas informações, como a validade e a confiabilidade, são fundamentais para a tomada de decisão a respeito de um instrumento. A ausência de dados sobre a validade de um instrumento de medida inviabiliza seu uso. Quatro questionários não apresentaram essa informação, o que limita sua utilização na clínica1,4,10,12. Quanto à confiabilidade, os questionários avaliados neste estudo apresentam confiabilidade de boa a excelente. A presença ou ausência dos demais itens avaliados não invalidam a utilidade do questionário, mas é importante informá-los para que a seleção de um instrumento seja apropriada e adequada a uma dada situação. Mesmo que um questionário possua propriedades de medidas adequadas, o contexto em que é testado é preponderante para a determinação de suas propriedades de medida. Cada um dos estudos de desenvolvimento dos instrumentos incluiu amostras distintas, representativas de populações específicas e, eventualmente, restritas a um dado contexto sociocultural. Portanto, a disseminação de um dado protocolo de avaliação deve ser feita de modo criterioso, a fim de garantir que as propriedades de medida se mantenham tal como as mensuradas originalmente. Além disso, é importante salientar que a maioria dos questionários são desenvolvidos em língua inglesa e ainda não foram adaptados para uso em português no Brasil. Dos 11 questionários selecionados no presente estudo, apenas 2 apresentaram tradução e adaptação transcultural para a língua portuguesa (CAIT4 e AOFAS13). Entre os instrumentos aqui analisados, apenas o LEFS e o FAAM apresentaram de modo claro e objetivo todas as propriedades de medida com valores apropriados e, portanto, são os mais recomendados dentre os descritos na literatura. Entretanto, esses questionários não foram traduzidos e adaptados para o Brasil. Pode-se pois observar a necessidade da tradução e adaptação transcultural para o Brasil desses instrumentos de avaliação. Entre os questionários traduzidos para o português, o CAIT foi indicado para ser usado com objetivo discriminativo, ou seja, diferenciar indivíduos com instabilidade crônica do tornozelo daqueles que não a têm. A escala AOFAS, por sua vez, pode ser usada para acompanhar a evolução da capacidade funcional do tornozelo de indivíduos em tratamento. O estudo do CAIT não apresentou uma descrição dos procedimentos de verificação de sua validade e sua pontuação, na escala de classificação proposta no presente estudo, foi inferior a 60%. Dessa forma, para estudos em português do Brasil, com o objetivo de avaliar a capacidade funcional do tornozelo, atualmente, recomenda-se o uso da escala AOFAS (versão em português)13. CONCLUSÃO As escalas LEFS (Lower extremity functional scale) e FAAM (Foot and ankle ability measure) apresentaram melhor qualidade metodológica segundo os critérios propostos no presente estudo, bem como vêm acompanhadas de maiores informações sobre sua aplicabilidade clínica. Entretanto, não foram submetidas à tradução e adaptação para nossa cultura. Foram encontrados dois questionários traduzidos e adaptados para a população brasileira, o CAIT (Cumberland ankle instability tool) e o AOFAS (American Orthopaedic Foot and Ankle Society anklehindfoot scale). Ambos os estudos utilizaram os procedimentos de tradução e adaptação propostos na literatura18 e apresentaram análises importantes de suas propriedades de medida. Porém, a AOFAS apresentou uma análise mais completa, sendo portanto o mais recomendado para a avaliação funcional do complexo pé-tornozelo atualmente no Brasil. Sugere-se a tradução e a adaptação transcultural dos questionários de avaliação funcional do tornozelo que apresentaram melhor descrição de suas propriedades de medida, para que esses instrumentos também possam ser aplicados em futuros estudos no Brasil. Moreira et al. Avaliação funcional do tornozelo REFERÊNCIAS 1 Hale SA, Hertel J. Reliability and sensitivity of the Foot and Ankle Disability Index in subjects with chronic ankle instability. 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Caso uma versão semelhante, em qualquer língua, já tiver sido publicada ou enviada a outro veículo, essa informação deve constar da folha de rosto, para que o Conselho Editorial possa ponderar sobre a pertinência de sua publicação. Processo de julgamento Todo manuscrito enviado para FISIOTERAPIA E PESQUISA é examinado pelo Conselho Editorial, para consideração de sua adequação às normas e à política editorial da Revista. Os manuscritos que não estiverem de acordo com estas normas serão devolvidos aos autores para adequação antes de serem submetidos à apreciação dos pares. Em seguida, o manuscrito é apreciado por dois pareceristas de reconhecida competência na temática abordada, garantindo-se o anonimato de autores e pareceristas. Dependendo dos pareceres recebidos, os autores podem ser solicitados a fazer ajustes (no prazo de um mês), que serão examinados para aceitação. Uma vez aceito, o manuscrito é submetido à edição de texto, podendo ocorrer nova solicitação de ajustes formais – nesse caso, os autores têm o prazo máximo de duas semanas para efetuá-los. O não-cumprimento dos prazos de ajuste será considerado desistência, sendo o artigo retirado da pauta da Revista. Os manuscritos aprovados são publicados de acordo com a ordem cronológica do aceite na secretaria da Revista. Responsabilidade e ética O conteúdo e as opiniões expressas são de inteira responsabilidade de seus autores. Artigos de pesquisa envolvendo sujeitos humanos devem indicar, na seção Metodologia, sua expressa concordância com os padrões éticos e com o devido consentimento livre e esclarecido dos participantes (de acordo com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que trata do Código de Ética para Pesquisa em Seres Humanos). As pesquisas com humanos devem trazer na folha de rosto o número do parecer de aprovação pela respectiva Comissão de Ética em Pesquisa, que deve estar registrada no Conselho Nacional de Saúde. Estudos envolvendo animais devem explicitar o acordo com os princípios éticos internacionais e instruções nacionais (Leis 6638/79, 9605/98, Decreto 24665/34) que regulamentam pesquisas com animais. A menção a instrumentos, materiais ou substâncias de propriedade privada deve ser acompanhada da indicação de seus fabricantes. A reprodução de imagens ou outros elementos de autoria de terceiros, que já tiverem sido publicados, deve 94 Fisioter Pesq. 2010;17(1) vir acompanhada da autorização de reprodução pelos detentores dos direitos autorais; se não acompanhados dessa indicação, tais elementos serão considerados originais do/s autor/es do manuscrito. Autoria Deve ser feita explícita distinção entre autor/es e colaborador/es. O crédito de autoria deve ser atribuído a quem preencher os três requisitos: (1) deu contribuição substantiva à concepção, desenho ou coleta de dados da pesquisa, ou à análise e interpretação dos dados; (2) redigiu ou procedeu à revisão crítica do conteúdo intelectual; e (3) deu sua aprovação final à versão a ser publicada. No caso de trabalho realizado por um grupo ou em vários centros, devem ser identificados os indivíduos que assumem inteira responsabilidade pelo manuscrito (que devem preencher os três critérios acima e serão considerados autores). Os nomes dos demais integrantes do grupo serão listados como colaboradores. A ordem de indicação de autoria é decisão conjunta dos co-autores. Em qualquer caso, deve ser indicado o endereço para correspondência do autor principal. A carta que acompanha o envio dos manuscritos deve ser assinada por todos os autores, tal como acima definidos. Envio dos manuscritos Os manuscritos devem ser submetidos por via eletrônica pelo site www.mdpesquisa.com.br/FP. Ao submeter um manuscrito para publicação os autores devem enviar: Declaração de responsabilidade, de conflitos de interesse e de autoria do conteúdo do artigo. Os autores devem declarar a existência ou não de eventuais conflitos de interesse (profissionais, financeiros e benefícios diretos e indiretos) que possam influenciar os resultados da pesquisa e a responsabilidade do(s) autor(es) pelo conteúdo do manuscrito. Ver modelo no site www.mdpesquisa.com.br/RFP. Declaração de transferência de direitos autorais (copyright) para Fisioterapia e Pesquisa, assinada por todos os autores, com os respectivos números de CPF, caso o artigo venha a ser aceito para publicação (modelo também no site acima). No caso de ensaio clínico, informar o número de registro validado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), cujos endereços estão disponíveis no site do ICMJE: www.icmje.org/faq.pdf. Preparação dos manuscritos 1 Apresentação – O texto deve ser digitado em processador de texto Word ou compatível, em tamanho A4, com espaçamento de linhas e tamanho de letra que permitam plena legibilidade. O texto completo, incluindo páginas de rosto e de referências, tabelas e legendas de figuras, deve conter no máximo 25 mil caracteres com espaços. 2 A página de rosto deve conter: a) título do trabalho (preciso e conciso) e sua versão para o inglês; b) título condensado (máximo de 50 caracteres) c) nome completo dos autores, com números sobrescritos remetendo à afiliação institucional e vínculo; d) instituição que sediou, ou em que foi desenvolvido o estudo (curso, laboratório, departamento, hospital, clínica etc.), faculdade, universidade, cidade, estado e país; e) afiliação institucional dos autores (com respectivos números sobrescritos); no caso de docência, informar título; se em instituição diferente da que sediou o estudo, fornecer informação completa, como em “d)”; no caso de não-inserção institucional atual, indicar área de formação e eventual título (a Revista não indica em quê nem em qual instituição o título foi obtido); d) endereços postal e eletrônico do autor principal; e) indicação de órgão financiador de parte ou todo o estudo, se for o caso; f) indicação de eventual apresentação em evento científico; g) no caso de estudos com seres humanos, indicação do parecer de aprovação pelo comitê de ética; no caso de ensaio clínico, o número de registro internacional. 3 Resumo, abstract, descritores e key words – A segunda página deve conter os resumos do conteúdo em português e inglês. O resumo em português deve ocupar o máximo de 1.500 caracteres com espaços (cerca de 220 a 230 palavras). Resumo e abstract devem ser redigidos em um único parágrafo, buscando-se o máximo de precisão e concisão; seu conteúdo deve seguir a estrutura formal do texto, ou seja, indicar objetivo, procedimentos básicos, resultados mais importantes e principais conclusões. São seguidos, respectivamente, da lista de até cinco descritores e key words (sugerese a consulta aos DeCS – Descritores em Ciências da Saúde da Biblioteca Virtual em Saúde do Lilacs (http://decs.bvs.br) e ao MeSH – Medical Subject Headings do Medline (www.nlm.nih.gov/mesh/MBrowser.html). 4 Estrutura do texto – Sugere-se que os trabalhos sejam organizados mediante a seguinte estrutura formal: a) Introdução, estabelecendo o objetivo do artigo, justificando sua relevância frente ao estado atual em que se encontra o objeto investigado; b) em Metodologia, descrever em detalhe a seleção da amostra, os procedimentos e materiais utilizados, de modo a permitir a reprodução dos resultados, além dos métodos usados na análise estatística – lembrando que apoiar-se unicamente nos testes estatísticos (como no valor de p) pode levar a negligenciar importantes informações quantitativas; c) os Resultados são a sucinta exposição factual da observação, em seqüência lógica, em geral com apoio em tabelas e gráficos –cuidando tanto para não remeter o leitor unicamente a estes quanto para não repetir no texto todos os dados dos elementos gráficos; d) na Discussão, comentar os achados mais importantes, discutindo os resultados alcançados comparando-os com os de estudos anteriores; e) a Conclusão sumariza as deduções lógicas e fundamentadas dos Resultados e Discussão. 5 Tabelas, gráficos, quadros, figuras, diagramas – são considerados elementos gráficos. Só serão apreciados manuscritos contendo no máximo cinco desses elementos. Recomenda-se especial cuidado em sua seleção e pertinência, bem como rigor e precisão nos títulos. Note que os gráficos só se justificam para permitir rápida apreensão do comportamento de variáveis complexas, e não para ilustrar, por exemplo, diferença entre duas variáveis. Todos devem ser fornecidos no final do texto, mantendo-se neste marcas indicando os pontos de sua inserção ideal. As tabelas (títulos na parte superior) devem ser montadas no próprio processador de texto e numeradas (em arábicos) na ordem de menção no texto; decimais são separados por vírgula; eventuais abreviações devem ser explicitadas por extenso, em legenda. Figuras, gráficos, fotografias e diagramas trazem os títulos na parte inferior, devendo ser igualmente numerados (em arábicos) na ordem de inserção. Abreviações e outras informações vêm em legenda, a seguir ao título. 6 Remissões e referências bibliográficas – Para as remissões no texto a obras de outros autores adota-se o sistema de numeração seqüencial, por ordem de menção no texto. Assim, a lista de referências ao final não vem em ordem alfabética. Visando adequar-se a padrões internacionais de indexação, para apresentação das referências a Revista adota a norma conhecida como de Vancouver, elaborada pelo Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (www.icmje.org), também disponível em http://www.icmje.org/index.html#references. Alguns exemplos: Forattini OP. Ecologia, epidemiologia e sociedade. São Paulo: Edusp; 1992. Laurenti R. A medida das doenças. In: Forattini OP, editor. Epidemiologia geral. São Paulo: Artes Médicas; 1996. p.64-85. Simões MJS, Farache Filho A. Consumo de medicamentos em região do Estado de São Paulo (Brasil), 1988. Rev Saude Publica. 1988;32:71-8. Riera HS, Rubio TM, Ruiz FO, Ramos PC, Castillo DD, Hernandez TE, et al. Inspiratory muscle training in patients with COPD: effect on dyspnea and exercise performance. Chest. 2001;120:748–56. [nomear até seis autores antes de “et al”] Rocha JSY, Simões BJG, Guedes GLM. Assistência hospitalar como indicador da desigualdade social. Rev Saude Publica [periódico on-line] 1997 [citado 23 mar 1998];31(5). Disponível em: http://www.fsp.usp.br/ ~rsp. Correia FAS. Prevalência da sintomatologia nas disfunções da articulação temporomandibular e suas relações com idade, sexo e perdas dentais [dissertação]. São Paulo: Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo; 1991. Sacco ICN, Costa PHL, Denadai RC, Amadio AC. Avaliação biomecânica de parâmetros antropométricos e dinâmicos durante a marcha em crianças obesas. In: VII Congresso Brasileiro de Biomecânica, Campinas, 2830 maio 1997. Anais. Campinas: Ed. Unicamp; 1997. p.447-52. Fisioter Pesq. 2010;17(1) 95 7 Agradecimentos – Quando pertinentes, dirigidos a pessoas ou instituições que contribuíram para a elaboração do trabalho, são apresentados ao final das referências. Apresentação eletrônica da versão final Após a comunicação do aceite do artigo, o autor deverá proceder aos eventuais ajustes sugeridos pelos pareceristas, para o quê terá o prazo de quatro semanas (findo esse prazo, se a versão final não tiver sido enviada à Revista, será considerada desistência). A versão final será ainda editada, ocasião em que o editor poderá solicitar novos ajustes e esclarecimentos – e, nesse caso, o prazo para os ajustes será de apenas duas semanas. Solicita-se que, na preparação da versão final, o autor: • use fonte comum, simples; use itálico apenas para títulos de obras e palavras em língua estrangeira; o negrito é reservado a títulos e intertítulos, claramente diferenciados; • não use a barra de espaço para recuos nem a tecla “tab”, apenas recursos de formatação do processador de texto; • não separe parágrafos com sinal de parágrafo adicional; • use o próprio processador de texto (e não planilhas) para elaborar tabelas; • use o próprio processador de texto (recurso “Desenho”) para elaborar diagramas simples, organogramas etc. (não insira figuras ou organogramas do Microsoft PowerPoint®); • inversamente, use programa apropriado (como Microsoft® Excel) para elaborar gráficos, e não o recurso “Gráficos” do processador de texto; • no caso de gráficos ou diagramas elaborados por softwares específicos, devem ser convertidos (exportados) em formatos que possam ser abertos por programas de uso comum (verifique os tipos de arquivos que podem ser aber- tos no Adobe Photoshop®, para figuras em escala de cinza, no CorelDraw®, para desenhos, ou no Excel® ou Origin®, para gráficos), para permitir eventuais ajustes, adequação de fonte etc.; • forneça fotografias ou outras ilustrações com resolução mínima de 300 dpi, e em tamanho compatível; • em qualquer caso, forneça simultaneamente um arquivo em TIFF do elemento gráfico, para permitir visualização e conferência. Envio dos arquivos Os dados de texto (em Word ou compatível) e de ilustrações devem ser enviados em arquivos separados. Os dados devem ser acompanhados da informação precisa de todos os programas utilizados, inclusive de compressão, se for o caso; sugere-se que os nomes dos arquivos sejam curtos e permitam rápida identificação (por exemplo, “sobrenome do autor fig1....”). Exemplares dos autores Serão enviados ao autor principal dois exemplares do número da Revista em que seu artigo for publicado, mais um exemplar para cada co-autor. *** No bojo do processo de aprimoramento de FISIOTERAPIA E PESQUISA, estas normas estão em construção, podendo sofrer alterações. Para informação atualizada, sugere-se a consulta ao site da Revista (http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php) ou às instruções do último número publicado. Para contato com a secretaria da Revista, use [email protected]. O endereço completo da Revista encontra-se na terceira capa, a seguir. Assinatura Para assinar Fisioterapia e Pesquisa, preencha o cupom abaixo e envie-o à revista, junto com um cheque nominal à Fundação Faculdade de Medicina (ver endereço ao lado, na 3a capa) no valor de R$ 64,00 ou recibo de depósito no Banespa (banco 033), agência 0201, cc 13004086-7. A ficha de assinatura está disponível no site da revista: <http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/ revista.php>. Números anteriores solicitar à revista. Valor unitário: R$ 16,00. FICHA DE ASSINATURA Assinatura anual (quatro números) de Fisioterapia e Pesquisa a contar de (data) _________________________ Nome: _______________________________________________________________________________________ Endereço: _____________________________________________________________________________________ CEP: ______________ Cidade: ___________________________________________________ Estado: _______ e-mail: _______________________________________________________________________________________ Instituição (opcional): __________________________________________________________________________ 96 Fisioter Pesq. 2010;17(1) Fisioterapia e Pesquisa Fisioterapia e Pesquisa em continuação a Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Revista do Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Fofito/FMUSP UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Reitor Prof. Dr. João Grandino Rodas Vice-Reitor Prof. Dr. Hélio Nogueira da Cruz SECRETARIA Sarah Rúbia Ferreira de Meneses INDEXAÇÃO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGÁFICA Serviço de Biblioteca e Documentação da FMUSP e-mail: [email protected] Faculdade de Medicina Diretor Prof. Dr. Marcos Boulos EDIÇÃO DE TEXTO, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Tina Amado, Alba A. G. Cerdeira Rodrigues e Daniel Carvalho Pixeletra ME Depto. Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional IMPRESSÃO Chefe Profa. Dra. Selma Lancman Gráfica UNINOVE Tiragem: 800 exemplares Curso de Fisioterapia Coordenadora Profa. Dra. Carolina Fu FISIOTERAPIA E PESQUISA Fisioterapia e Pesquisa v.17, n.1, jan/mar. 2010 Fisioterapia e Pesquisa / (publicação do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) v.1, n.1 (1994). – São Paulo, 2005. v. : il. Continuação a partir de v.12, n.1, 2005 de Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Semestral: 1994-2004 Quadrimestral: a partir do v.12, n.1, 2005 Trimestral: a partir do v.15, n.1, 2008 Sumários em português e inglês ISSN 1809-2950 Curso de Fisioterapia Fofito/FM/USP R. Cipotânea 51 Cidade Universitária 05360-160 São Paulo SP e-mail: [email protected] http://www.mdpesquisa.com.br/RFP Telefone: 55 xx 11 3091 8416 INSTITUIÇÕES COLABORADORAS INSTITUIÇÕES PARCEIRAS FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO / USP ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL APOIO 1. FISIOTERAPIA/periódicos I. Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Filiada à FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ISSN: 1809-2950 FISIOTERAPIA e PESQUISA REVISTA DE FISIOTERAPIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL Volume 17 – número 1 Janeiro – Março 2010
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