Donwload da Materia em pdf
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Fotos: Arquivo Pessoal / Divulgação Entrevista José Luiz Ferreira Nelson Cardoso O músico Zé Luiz, como é conhecido, criou com seus irmãos Paulo e Ocimar a fábrica de amplificadores Meteoro. Sua personalidade franca e despojada, por ser ímpar e inconfundível, destaca-se em nosso segmento. Nesta entrevista exclusiva para a Backstage, ele conta como conseguiu aliar a alma de músico à alma de empresário, narra um pouco da história da Meteoro e principalmente da sua trajetória como músico. José Luiz, no início da fábrica Meteoro na década de 80 68 www.backstage.com.br de Músico e Empresário Como e quando você começou a ser músico? J.L. Vim de uma família em que a música sempre esteve presente, meu pai era multiinstrumentista e influenciado por este ambiente, já aos 5 anos de idade, comecei a cantar e dedilhar minhas primeiras notas e acordes no cavaquinho dele, que sempre me incentivou. Portanto, lá pelos 9 anos, mesmo pequeno, já podia me considerar um músico. Como e quando você teve, pela primeira vez, o reconhecimento do seu talento musical? J.L. Sou de uma cidade do interior do Paraná, chamada Cornélio Procópio. Lá havia uma cena musical muito forte, por incrível que pareça. Meu pai tocava em um grande grupo musical e era dono de uma padaria, onde todos nós, eu e meus irmãos trabalhávamos e iniciamos nossas vidas profissionais, paralelas à música. Existiam grandes músicos que também tinham seus trabalhos paralelos e alguns que já estavam até morando fora da cidade. Este celeiro musical era uma realidade, isto você imagina em uma cidade do interior, na década de 60 Por estes motivos, a Prefeitura de lá teve a iniciativa de fazer uma noite de gala para prestigiar e homenagear estes músicos, dos quais eu já fazia parte. Foram convidá-los e localizaram até os que estavam fora da cidade. Você não tem idéia da emoção desta noite, estávamos todos lá e sem receber um centavo, ninguém recebeu cachê e não houve, para mim, um reconhecimento maior que esta homenagem que a nós foi prestada. Este acontecimento foi tão marcante que, mais tarde, já com a Meteoro, decidi criar um evento, no Dia do Músico, onde durante quatro anos homenageamos pessoas que se relacionavam com o cenário musical paulistano: roadies, técnicos, lojistas, bandas, enfim...Tudo isto por que, para mim, o maior reconhecimento de um músico é justamente “Ninguém recebeu cachê e não houve, para mim, um reconhecimento maior que esta homenagem que a nós foi prestada.” quando, no seu meio, ele é homenageado e agraciado com uma premiação, justa, pelo seu trabalho e pelo desempenho do seu talento. Qual foi o seu primeiro instrumento musical e como ele apareceu na sua vida? Zé Luiz (ao centro) com os irmãos Ocimar e Paulo J.L. Como falei, meu pai era um grande músico e em casa tínhamos sempre vários instrumentos. Os meus primeiros instrumentos foram justamente o cavaquinho e o violão dele, embora mais tarde, para minha surpresa, vendo meu interesse pela música, dom e responsabilidade, ele procurou, lá na minha cidade (Cornélio Procópio/PR), um senhor com o nome de Carmona, que hoje poderia ser considerado um luthier, e mandou fazer uma guitarra para mim. Rapaz...Você não tem noção do peso que tinha aquela guitarra, o braço era muito grosso e as cordas muito altas, meus dedos eram pequenos e era um sofrimento para tirar um som, entende? Os acordes com a perfeição que eu queria ficavam difíceis. Mas é aquela coisa, músico é engraçado, era um sonho... O meu pri- www.backstage.com.br 69 Entrevista Aos 9 anos, José Luiz integrava o grupo Black Birds meiro instrumento. E nada importava, o que realmente valia é que era meu e você não faz idéia, eu dormia com a minha guitarra e aquele pedalzinho e gostava de acordar olhando para eles, sabe aquela sensação indescritível e foi meu pai quem me proporcionou tudo isto. É legal porque hoje, aqui na Meteoro, sabendo desta importância e das dificuldades que o músico tem para ter seus instrumentos, temos um departamento que cuida de manter disponível para músicos e bandas, os nossos amplificadores para empréstimo. Bandas e músicos iniciantes podem ter no seu palco os amplificadores que grandes músicos e grandes bandas do cenário nacional utilizam em seus palcos e esta sensação é fantástica, é maravilhosa, para quem ainda não tem a condição de tê-los em definitivo. Fale-me da casa da Rita e de suas andanças musicais neste local? J.L. Êêêê, rapaz... Esta história tem muita importância na minha formação como músico, mas principalmente como homem. Bom... Como falei, comecei muito pequeno e aos 9 anos integrava o grupo musical Black Birds junto com Luquinhas, Sílvio Cunha, Carlos Ferreira - o Carlinhos, meu irmão - e Acir Carvalho, já aos 12 anos integrava profissionalmente este grupo de baile da minha cidade e, naquela época, o que a gente queria era tocar e se contratavam, a gente ia. A casa da Rita, por ser uma casa para encontros amorosos, ficava um pouco afastada do centro e, nos anos 60, as estradas não eram todas asfaltadas, era tudo um barro só. Nós tínhamos as dificuldades comuns para toda banda. Tínhamos problemas para nos deslocar até lá, mas as meninas eram tão legais, era tão bom tocar ali, que fazíamos o seguinte: tocávamos em um restaurante da cidade, para juntar a grana para pagar o táxi do fim de semana. Lembro-me de momentos muito divertidos e como eu era pequeno ainda, as meninas tinham um carinho muito grande comigo. Nós brincávamos muito, mas tinha sempre o lado profissional e, além disto, era complicado, imagine só eu naquela idade estar tocando ali, numa casa como aquela, então, de vez em quando, chegava a polícia no local. Elas me protegiam, me escondiam, isto porque elas Os Diplomatas, grupo musical da cidade de Cornélio Procópio, do qual Zé Luiz participou 70 www.backstage.com.br sabiam o quanto era importante eu tocar. Era a maior correria, mas no final, dava tudo certo, enfim... Pulávamos a janela, uma loucura... Como a cidade era muito pequena e, pelo comércio e musicalidade do meu pai, ele era bastante conhecido e influente, acabou conseguindo uma autorização para tocar profissionalmente, no local, como músico integrante do grupo. “Meu pai era bastante conhecido e influente, acabou conseguindo uma autorização para tocar profissionalmente, no local, como músico” Mais do que isso, a importância deste local foi realmente marcante na minha vida, lembro-me de ter conhecido uma senhora com a qual conversava muito, ela me dava conselhos e me mostrava muita coisa sobre a vida. Chamava-se D. Ivone e foi uma das pessoas mais marcantes da minha vida, e por estas e outras foi muito bom ir tocar naquele local. Quantos anos você tinha e como começou a sua vida de músico profissional? J.L. Como disse, aos 12 anos de idade, da maneira mais divertida, na casa da Rita, nas Rádios Cornélio Procópio e Cruzeiro do Sul, no programa da Jovem Guarda, ao vivo, além dos restaurantes, clubes, formaturas, na minha cidade e por todo estado do Paraná. A profissão torna o músico um pouco andarilho, me fale desta época. J.L. É verdade, esta é uma das vantagens da nossa profissão. Viajávamos muito e foi como músico que pude conhecer o meu país. Esta oportunidade não tem preço, imagi- ne só estar ao lado de grandes músicos, fazendo o que gostávamos, levando diversão e ainda conhecendo os lugares que nos livros estudávamos. É uma escola, uma verdadeira lição, inigualável, é viver a história como ela realmente é. Lembro-me de ter tocado em cidades, como no Mato Grosso do Sul, que inauguramos a luz elétrica, isto porque durante um bom tempo, tocávamos com a energia movida a óleo diesel e era muito engraçado, porque o show e o repertório dependiam de quando o óleo estava chegando ao fim. Como nosso grupo era uma banda de baile, tocávamos de tudo. Então, as viagens eram cada vez mais constantes, não existia asfalto, como disse, na maioria dos locais que íamos, eram caminhos complicados, geralmente de barro, tínhamos uma perua e era nela que viajávamos. Nesta época, aprendi muito e a me disciplinar também. Afinal, não tí- Para chegar aos locais onde faziam os shows,Os Diplomatas enfrentavam estradas precárias nhamos roadies, técnicos, estas coisas, éramos nós mesmos que carregávamos nosso equipamento, instrumentos, montávamos o palco, passávamos o som e tudo isto imediatamente após chegarmos aos locais que faríamos nossas apresentações. Por isto, na maioria das vezes, estávamos cansados pela viagem difícil e suas intempéries - uma vez a nossa perua até capotou - e assim sendo, como havia muita poeira e barro nos caminhos, você imagina como ficávamos sujos. Mas não havia tempo para descanso e tam pouco banho, quando terminávamos de montar tudo, passar o som, era a hora de correr, lavar o rosto, as mãos, os pés e colocar uma roupa limpa, a gravatinha, enfim... A roupa de show e aí meu amigo era paulada, ninguém segurava a gente e www.backstage.com.br 71 Entrevista nós tocávamos muito e o melhor... Felizes, muito felizes. O engraçado é que sempre que chegávamos nos locais dos shows, estávamos realmente sujos e o pessoal que contratava acabava não acreditando no som que fazíamos. Aí sim, era difícil, um tempo muito difícil, mas em compensação muito gratificante e muito maravilhoso de viver, viajar e fazer música, literalmente colocávamos o pé na estrada. Como começou a surgir, na sua cabeça, a Meteoro? J.L. Depois disto tudo, passei ainda por muitas coisas em Cornélio Procópio, toquei na Black Birds, Os Rivais, Diplomatas, onde tínhamos como vocalista um primo nosso, o Márcio Aníbal... Ele tinha a voz do céu, cantava muito, cantava muito mesmo. Ainda na minha cidade, toquei na The Bad Boys Band e aí, como músico, senti necessidade, obviamente, de sair de lá à procura de novos horizontes. Fui para Londrina (PR), toquei na New Sound, e para Presidente Prudente (SP) atrás do sonho que Depois dos Bad Boys, Zé Luiz se mudou para Londrina 72 www.backstage.com.br tinha de tocar numa banda chamada Os Sombras. Este grupo, eu dizia para mim mesmo sempre e para minha mãe, um dia vou tocar com eles e você nem sabe... Cheguei até a pedir a uma estrela para que acontecesse e aconteceu. Passei um tempo em Campinas (SP) e foi só depois que vim para São Paulo tocar com um grupo chamado Super Grupo. Nas horas vagas, comecei a dar aulas em um conservatório, em Guarulhos, do maestro Colacciopo, e isto durou muitos anos, paralelo ao trabalho com o grupo, porque já estava com família, mulher e filhos. Eu tinha muitos alunos, mas o grupo começou a tocar e a viajar muito, por isso constantemente tinha que faltar e aquilo me incomodava, então decidi e achei melhor sair do conservatório. Mesmo assim, o maestro e sua esposa, duas pessoas muito bacanas, ainda me seguraram por mais um ano, até que se tornou impossível conciliar os dois trabalhos. Só que meus alunos já estavam bastante adiantados e acostumados com minha técnica e alguns deles sabendo onde morava, foram pedir-me que continuassem as aulas na minha casa, decidi dar as aulas, mas sabe como é, o boato se espalhou e até vinham alunos de São Paulo. Nos dias que não tinha ensaio ou show, nas horas que sobravam e nas semanas que ficava em casa, tinha alunos o dia inteiro e só parava para me alimentar. Foi aí que minha família começou a ficar louca com aquele som insistente, repetitivo, os mesmos acordes sempre, o que é comum para quem está aprendendo a tocar e como era tudo muito improvisado, lá em casa, o que separava a aula da sala era apenas uma cortina que havíamos colocado para manter a privacidade deles. Por estes motivos, começaram a questionar se não havia um jeito de diminuir aquele som insistente o Primeiro produto lançado pela Meteoro, em 1984, o Meteoro Study Phone tempo todo, foi ai que decidi procurar meu irmão Paulo e falar sobre uma idéia que me veio à cabeça. Paulinho, também músico, baterista, tinha trabalho fixo em uma grande empresa, em eletrônica, na Phillips do Brasil. Pedi que ele desenvolvesse um ampli minúsculo e coloquei-o em um fone de ouvido. Era assim: o músico plugava na guitarra ou no baixo e só ele ouvia o som. A partir daí, todos os alunos, que não eram poucos, começaram a solicitar e todos queriam comprar. E foi aí que, me lembro muito bem, eram umas oito horas da noite, fui à casa do Paulo e disse para ele: "Paulinho, vamos montar uma indústria!". Minha cunhada, Irene, ao ouvir aquilo quase morreu de rir, afinal o Paulinho estava estabilizado, tinha um bom emprego e tudo aquilo só parecia um sonho. Mas fui incisivo e acabei convencendo o Paulinho em montarmos algo pequeno, funcionando na casa dele, na garagem e o mais engraçado é que o primeiro fone foi montado em cima da máquina de costura da minha cunhada. Ele me disse que não poderia deixar o emprego e que eu deveria tomar conta de tudo, durante o dia, à noite, ao largar do serviço, ele iria para produção. Eu fazia as placas e as desenhava a mão uma por uma, colocava no preclorêto de ferro... Uma loucura... Você tinha de ver... E a coi- sa foi crescendo saímos da casa do Paulo para uma salinha de 5m por 5m onde fazíamos tudo, decidimos dar um nome ao equipamento que se chamou Meteoro Study Phone, cada vez mais pedidos chegavam. Lembro-me do nosso primeiro pedido, de fones, foi para as Casas Tommasi, por intermédio do sr. José Roberto, guardo até hoje a cópia do pedido. Mas continuávamos com o grupo e foi quando apareci com isto em um ensaio, os músicos enlouqueceram e falaram: "Ô, Zé, você que mexe com eletrônica, essas coisas, por que não faz uns amplis pra gente tocar? Este incentivo era o que faltava para partirmos para algo ainda maior, aluguei uma casinha em Guarulhos e tudo isto provocou uma conversa ainda mais longa com o Paulo. Na época, tinha acabado de chegar ao Brasil os cubos Roland, que faziam o maior sucesso e nos motivaram a fazer um cubo no estilo, embora o nosso tenha surgido da idéia de um outro ampli, um Yamaha, que era grande. Então nós reduzimos e fizemos o nosso no estilo cubo, daí surgiu o RX 100, o primeiro ampli Meteoro, lembro que era muito legal o som dele. “Ô, Zé, você que mexe com eletrônica, essas coisas, por que não faz uns amplis pra gente tocar?” Decidimos investir em propaganda. Eu já sentia o quanto era importante anunciar, para você ver, eu desistir de fazer Faculdade de Engenharia Cartográfica, e entrei em Desenho Técnico e Publicitário o que sempre me deu esta noção de publicidade para minhas campanhas que até hoje, sempre acompanho e aí mesmo com uma salinha de 5 por 5m, já tínhamos um anúncio de meia página na revista Som 3. Qual foi o primeiro produto que você fez? J.L. Foi justamente o Meteoro Study Phone. Fale-me um pouco das dificuldades no início da Meteoro. J.L. Como nós tocávamos, grana não era problema, tudo que a gente ganhava com as vendas investíamos em peças e fazíamos mais aparelhos. Uma de nossas dificuldades foi com relação aos componentes. Por sermos uma empresa muito pequena e fabricantes de pequeno porte, não tínhamos e não éramos ainda interessantes para os grandes fabricantes, assim sendo, tínhamos que comprar em lojinhas de eletrônica. www.backstage.com.br 73 sa foi crescendo saímos da casa do Paulo para uma salinha de 5m por 5m onde fazíamos tudo, decidimos dar um nome ao equipamento que se chamou Meteoro Study Phone, cada vez mais pedidos chegavam. Lembro-me do nosso primeiro pedido, de fones, foi para as Casas Tommasi, por intermédio do sr. José Roberto, guardo até hoje a cópia do pedido. Mas continuávamos com o grupo e foi quando apareci com isto em um ensaio, os músicos enlouqueceram e falaram: "Ô, Zé, você que mexe com eletrônica, essas coisas, por que não faz uns amplis pra gente tocar? Este incentivo era o que faltava para partirmos para algo ainda maior, aluguei uma casinha em Guarulhos e tudo isto provocou uma conversa ainda mais longa com o Paulo. Na época, tinha acabado de chegar ao Brasil os cubos Roland, que faziam o maior sucesso e nos motivaram a fazer um cubo no estilo, embora o nosso tenha surgido da idéia de um outro ampli, um Yamaha, que era grande. Então nós reduzimos e fizemos o nosso no estilo cubo, daí surgiu o RX 100, o primeiro ampli Meteoro, lembro que era muito legal o som dele. “Ô, Zé, você que mexe com eletrônica, essas coisas, por que não faz uns amplis pra gente tocar?” Decidimos investir em propaganda. Eu já sentia o quanto era importante anunciar, para você ver, eu desistir de fazer Faculdade de Engenharia Cartográfica, e entrei em Desenho Técnico e Publicitário o que sempre me deu esta noção de publicidade para minhas campanhas que até hoje, sempre acompanho e aí mesmo com uma salinha de 5 por 5m, já tínhamos um anúncio de meia página na revista Som 3. Qual foi o primeiro produto que você fez? J.L. Foi justamente o Meteoro Study Phone. Fale-me um pouco das dificuldades no início da Meteoro. J.L. Como nós tocávamos, grana não era problema, tudo que a gente ganhava com as vendas investíamos em peças e fazíamos mais aparelhos. Uma de nossas dificuldades foi com relação aos componentes. Por sermos uma empresa muito pequena e fabricantes de pequeno porte, não tínhamos e não éramos ainda interessantes para os grandes fabricantes, assim sendo, tínhamos que comprar em lojinhas de eletrônica. www.backstage.com.br 73 Entrevista Além do custo ficar altíssimo, não podíamos ter uma condição diferenciada e não havia jeito de adquirir estes componentes com uma margem de erro pequena na fabricação. Isto nos dava muita dor de cabeça e complicava a parte eletrônica dos nossos aparelhos, além dos desperdícios com as peças que não se adequavam, por exemplo, na parte eletroacústica. Além disso, outros problemas foram surgindo, eu não concordava de forma alguma ir até uma loja e comprar 50 falantes para guitarra. Isto não existe. Cada amplificador, cada gabinete é um conjunto e o falante tem que ser desenvolvido para aquele produto específico. Mas tivemos, em nosso caminho grandes parceiros e amigos que acreditaram e acreditam no nosso trabalho e muitos deles continuam conosco e nos ajudaram a vencer estas dificuldades. Por exemplo, nesta história dos falantes, me lembro que por intermédio do sr. Barion, da Bravox, começamos a desenvolver os falantes, mas ainda comprávamos muito pouco e não ficava viável, para empresa, fazer esta parceria conosco, na época, para você ver as dificuldades de fabricação. “Compramos uma fábrica já existente e em duas semanas ela começou a rodar, com antigos funcionários” Aí resolvemos montar uma fábrica de falantes, aconselhados por amigos. Compramos uma fábrica já existente e em duas semanas, ela começou a rodar, com antigos funcionários... Meu amigo... Foi outro problemão, constatamos que não era nada daquilo e que não era tão fácil assim. 74 www.backstage.com.br Paulo Roberto produzindo o RX100 Depois... O que eu gostava mesmo era de pegar meus cubos, colocar no carro e sair para vender. Nunca vou esquecer uma grande venda, talvez o primeiro grande pedido que recebemos, foi para o Torau (loja), ele fez o pedido e na minha total ingenuidade e inexperiência, antes mesmo de entregar todos os aparelhos, precisando do dinheiro, fui lá receber, ele vendo que não havia maldade e sim total desconhecimento do processo, mandou fazer um cheque para me pagar. Com o crescimento da empresa, começamos a fazer bons parceiros, não posso esquecer as dificuldades para colocar um aparelho nacional, de fabricação caseira no mercado. Mas no nosso caminho encontramos tanta gente legal, foram muito amigos e percebiam que, estávamos realmente a fim de fazer algo de músicos para músicos e que durante todos estes anos, foram nossos parceiros e nos ajudam até hoje nos dando o feed back, extremamente necessário para qualquer empresa, do que o nosso consumidor final deseja e principalmente o que acha dos equipamentos. Estas dificuldades nos fizeram ver o quanto os lojistas, são importantes e como é bom tê-los ao nosso lado. A coisa começou a ficar ainda mais louca... Eu ia para o banco, Entrevista comprava peças... montava os aparelhos... contratava gente... cuidava de tudo, sempre com a ajuda do meu irmão Paulo e ainda saía para vender. Começamos a sentir outras grandes dificuldades, não entendíamos nada da parte administrativa, contratação, estas coisas e acontecimentos como o do Torau começavam a nos deixar constrangidos. Era necessário que nos organizássemos com relação a prazo de pagamento, cobrança, gerenciar as vendas, cadastrar nossos clientes e nos planejarmos melhor. Foi aí que nosso irmão caçula, o Ocimar (saxofonista) , entrou na empresa, como funcionário, para cuidar de toda esta parte e você não acredita, em pouquíssimo tempo ele arrumou a casa. Sua garra, força de vontade e determinação eram tantas que chamei o Paulinho e disse: " Irmão vamos colocá-lo como nosso sócio!" Além disso, o Ocimar, não podia ficar sozinho e foi aí que meu cunhado João (Diretor de Fábrica da Meteoro) veio para ajudar a organizar os departamentos. Arrumada a casa começamos a diluir outras dificuldades, a venda para o Brasil, um país demograficamente extenso. Sentíamos a necessidade de Primeiro amplificador da Meteoro, lançado em 1985 76 www.backstage.com.br ter representantes em alguns estados, era complicado e caro para nós, ainda, termos uma boa estrutura, foi aí que veio para nós, outras gratas surpresas e mais pessoas fantásticas que nos ajudaram e ajudam (muitos dos que começaram conosco ainda estão na casa). Eles quebraram barreiras que não foram poucas e “Nossa filosofia foi, e é até hoje, a de fazer equipamentos com os quais os músicos toquem e consigam tirar deles o melhor som” paradigmas. Recordo-me de quantas vezes depois de rodar uma cidade inteira, levando meus amplis no braço e mostrando loja em loja, tivemos que dividir uma única refeição em um quarto de hotel, bem simples, como com meu parceiro "Preto" (Hércules, Representante Interior de São Paulo/Rio) e nunca ouvi destes parceiros uma reclamação ou desânimo, pelo contrário, sempre confiantes, cheios de elogios e com uma vontade danada de ver nossos produtos na vitrine, bem colocados, vendendo bem e sendo assim credibilizados por eles, que já estavam no mercado representando outras marcas. Começamos a pensar que precisávamos associar nossa marca a formadores de opinião, grandes músicos, afinal sentíamos ainda dificuldades em consolidá-la. Mais surpresas, mais parceiros e acima de tudo grandes amigos, também neste meio, encontramos no caminho. Nossa filosofia foi e é até hoje, a de fazer equipamentos com os quais os músicos toquem e consigam tirar deles o melhor som para suas características musicais e que amplifiquem da forma exata o que conseguem, através dos seus talentos, tirar do instrumento que tocam. Com esta filosofia cheguei junto de grandes músicos, os quais respeito e os convidei para ir até a fábrica, tocar nos nossos amplis, dar opiniões e com alguns desenvolvi amplificadores que estão aí no mercado e hoje compõem os back lines de grandes bandas, do nosso riquíssimo cenário nacional e que nos prestigiam usando nossos aparelhos. Tenho como amigos, parceiros e grandes responsáveis por estes trabalhos, músicos como o Mello Júnior (guitarrista) hoje nosso Especialista de Produtos, Celso Pixinga (baixista), conosco há 12 anos, Hélcio Aguirra (guitarrista), que me ajudou muitíssimo quando comecei a desenvolver nossa linha de valvulados, Andreas Kisser (guitarrista), menino tão bom que o coração de músico dele chega a nos emocionar sempre que estamos juntos, Mozart Melo, grande professor e muitos que gostaria de citar, e a todos que fazem esta grande família que é hoje a Meteoro Amplifier. Você sempre apoiou os músicos no início da carreira. Fale um pouco dos Mamonas Assassinas. J.L. É como falei, sou músico, né? Sei a dificuldade de saber que tenho talento, meu som é bom e não ter equipamento para mostrar meu trabalho, para que possam me reconhecer! Já pensou nisto? Vixe, Maria, isto é muito ruim e vai dando um desânimo. Então os meninos eram assim, eles não tinham equipamento e eram uma grande banda, aqui de Guarulhos (SP), eles usavam o nome de Utopia e faziam um rock, na época, muito parecido com o Barão Vermelho, tocavam muito bem, mas no mercado musical já existiam muitas bandas no estilo deles. Estes meninos eram como nós, quando tínhamos o nosso gru- Entrevista po, nunca tiveram ajuda de ninguém e faziam tudo sozinhos. Não tinham roadies, técnicos, tocavam com instrumentos emprestados e pegavam equipamento aqui na fábrica, para fazer seus shows, eles praticamente pagavam para tocar... Quer dizer... Eles pagavam para tocar, mesmo. Mas tinham um grande potencial, o Dinho, era exatamente aquela pessoa do palco, brincalhão, extrovertido, inteligente, e vinha muito aqui, às vezes ficava uma tarde inteira, sentado na recepção, com aquele jeitão, para trocar umas idéias comigo, sempre pedia desculpas por estar ali, imagina. Um dia, ele chegou na fábrica, muito desiludido com as coisas que estavam acontecendo, de ter de tocar cover, de não gostarem quando eles tocavam as músicas deles e de estar na realidade pagando para tocar nos lugares, por que os gastos para ir tocar e mostrar suas músicas ficavam altos. Aí, meu fio... chamei o Dinho na minha sala e falei: "Dinho, você presta atenção, você é um artista, sua banda é legal, mas você tem que ter um pouco mais de paciência!" Não sei por que resolvi contar uma história que havia acontecido comigo, comecei assim... “Chamei o Dinho na minha sala e falei: Dinho você presta atenção, você é um artista, sua banda é legal, mas você tem que ter um pouco mais de paciência!” "Nada nesta vida de músico é fácil. Quando cheguei em São Paulo fiz fazer um trabalho com uma grande banda, antes disto, eu só tocava rock in roll e tinha me desligado um pouco das leituras musicais e este grupo era muito grande, já renomado, tocavam com muitos arranjos e só tocavam pedreiras do tipo: Glen Miller, 78 www.backstage.com.br Frank Sinatra e outros grandes nomes. Era tudo com partitura não dava para ser intuitivo e fazia muito tempo que não lia aí... foi trave... só trave, na certa. Após o primeiro fim de semana, fizeram uma reunião em uma grande mesa e o sr. Erlon José me disse: "Sinto muito, mas você é muito ruim para tocar conosco!" Aquilo me deu um desespero, precisava do emprego, estava com a minha família e o pior, eu sabia e conhecia muito bem meu potencial como músico, olhei para o cara e pedi, por favor, para que ele me desse uma chance para mostrar que eu conseguiria estar ali no meio daqueles grandes músicos que faziam parte do grupo. Por isso, eu agradeço ao Maestro Karan e a todos aqueles músicos que me deram uma nova oportunidade. Mas o melhor você não sabe, Dinho e não vai acreditar, um ano e meio depois eu era o Diretor Musical do grupo e 15 anos depois fui o dono deste grupo, que pertencia à empresa Rearte Traipú, a qual tenho muito carinho!" Não sei por que lhe contei esta história, só sei que olhei para o Dinho e ele estava com os olhos cheios d´água e me pediu para trazer a banda dele aqui na Meteoro, para que eu contasse esta história para eles e aí... É lógico, né?... Concordei, mesmo sem entender muito bem e assim ele o fez. Vieram todos os integrantes da banda aqui e contei a história novamente. Passou um tempo e me chega o Dinho com aquele jeitão dele, com uma fita cassete na mão e umas músicas bem alegres e divertidas numa gravação muito ruim, feita em casa, com muito vazamento e me disse: "Zé... vê aí o que você acha?" Disse que era muito legal porque o país em que vivemos é muito alegre, mas que seria melhor fazer uma demo em um estúdio. Foi quando montamos um equipamento em um barzinho chamado Lua Nua, de um grande amigo, o Valdir aqui em Guarulhos mesmo e eles levantaram uma grana para fazer a demo. Encaminhamos para um pessoal do mercado fonográfico que gostou, mas eles queriam ver ao vivo. Aí, rapaz... Montamos o equipamento novamente, no mesmo bar, desloquei meu técnico de som preocupado com a voz do Dinho, por que nas músicas deles o grande barato do som eram as letras e fui para lá. Sentado, na mesa, com o pessoal, após as primeiras músicas já estava com a certeza do contrato firmado, foi muito legal, legal mesmo. “Um ano e meio depois eu era o Diretor Musical do grupo e 15 anos depois fui o dono deste grupo, que pertencia à empresa Rearte Traipú” Mas gostaria de deixar claro aqui uma coisa, ninguém, mais ninguém mesmo ajudou estes garotos, eles fizeram tudo sozinhos com a força da família e sabe por que tô dizendo isto, por que depois que as coisas acontecem e estouram aparecem sempre os pais da criança. Tiveram muita sorte mesmo assim, um amigo o Rick Bonadio e sua equipe fizeram um trabalho com eles e o pessoal da 89 FM, na época, deu a maior força quando deixaram eles tocarem no show em prol da campanha contra a aids. Veja só, só tinham feras, mas a maioria rock pesado, metal e colocaram os moleques lá no meio com o trecho da música... "Me passaram a mão na bunda e eu não comi ninguém...", inserido na chamada do evento, aquilo foi um estouro, você nem imagina! Por fim, nessa época, nosso estande na Expomusic tinha shows, ao vivo, e o sonho do Dinho sempre foi tocar lá no meu estande, imagine só? No meio de toda a ascensão rápida, estourando nas paradas de sucesso de todas as rádios do Brasil, eles foram até a feira e tocaram no meu estande, aquilo foi uma loucura ain- Entrevista Zé Luiz, em 1987, o começo da Meteoro em feiras da maior, quase derrubaram a cabine e acabou que foram feitas mais de uma apresentação. Eu acredito que o sucesso da Meteoro se deva à soma da alma do músico com a alma do empresário. Como você trabalha estas duas almas? J.L. Na verdade elas são uma coisa só e o músico para mim é como um médico com um paciente para ser operado, quando se sobe no palco e se conta... 3... 4... É assim... Paulada, muito som e uma emoção indescritível. Eu me orgulho muito de ser músico. Hoje quando viajo a negócios, no Brasil ou fora do meu país e vou preencher, minha ficha, nos hotéis, no item profissão, com muito orgulho mesmo, preencho: "músico" e sabe por quê? Escute bem o que eu lhe digo: "Não existe aparelho que meça precisamente o som e qualidade de um equipamento como a sensibilidade de um grande músico". Portanto, as duas almas estão aliadas e somam-se ao gosto sonoro criando uma identidade e é isto que faz a Meteoro ter o som dela, muito próprio, dela, muito dela, entende? Sei que você tem uma imensa admiração pelo sr. Cristalino. Quem é e o que representa para você? J.L. Rapaz, agora você me pegou 80 www.backstage.com.br de jeito. Bom... Um grande homem, um vencedor, amigo, um músico fantástico, a tradução mais verdadeira do dom divino que Deus nos dá. Um filho de índios, mineiro de Teófilo Otoni, que teve em sua companheira a força para aprender o que ela lhe ensinou, que olhava um instrumento perguntava o que era, como “Hoje, quando viajo a negócios e vou preencher minha ficha nos hotéis, no item profissão, com muito orgulho mesmo, preencho: "músico” se tocava e saía tirando notas do mesmo e fazendo música. Eu ficava impressionado em ver a facilidade com que ele tocava quase todos os instrumentos. Com perfeição, ele tocava todos, muito bem. Tocava em regionais, tinha muito carinho pelos seus músicos, para você ter uma idéia um dos maiores saxofonistas da época, o Bucck Pitman, trabalhou na orquestra dele. Cristalino Ferreira era meu pai! Aquele que desde muito cedo me ensinou a respeitar a música e a profissão. Aquele que me incentivou sempre a tocar. Um homem que respeitava acima de tudo sua mulher e seus filhos e mais... Você poderia mexer com quem fosse, mas não mexesse com sua família... Meu fio, o homem virava bicho, Vixe Maria, você nem acredita no que ele seria capaz de fazer. Para você ver, me lembro do quanto a música era importante para ele, porque nunca ouvi minha mãe falar um "aí" que fosse sobre isto, pelo contrário, saíamos para tocar e era como aquela imagem que todo garoto tem quando vai para escola. Da mãe que leva até o portão, para pegar a perua escolar, sabe como é? Com a gente era a mesma coisa, aliás, era ela quem fazia nossas roupas de shows e ela, que é muito linda, uma princesa até hoje, sempre ia nos levar até a perua quando esta chegava. Então... O sr. Cristalino era esse homem que era respeitado em casa e na cidade que morava, mas principalmente como músico, isto porque você imagine só ser músico naquela época, em 60 e em uma cidade do interior, mas ele era muito firme, cresci vendoo tocar e tocando com ele uma das coisas mais importantes que ele me falou foi: "Meu filho, nesta nossa profissão, você vai se deparar com muitas coisas boas e ruins. Nunca caia em nenhum vício, você tem a música no sangue que veio de mim, para você tocar você não precisa disto"! Que mais posso dizer? Só sei que aos 14 anos de idade perdi este amigo, companheiro. Um homem de fibra, músico, que me ensinou também e principalmente a ser honesto e verdadeiro nas minhas atitudes e fazer disto a minha vida, alguém que mostrou e fez entender o verdadeiro valor da família. Por isso, um dos nossos amplificadores mais completos leva seu nome uma homenagem nossa àquele que nos deixou estas lições que nós temos na alma e principalmente no sangue.