Planeamento do Treino das corredoras soviéticas de 800m, 1500, e
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Planeamento do Treino das corredoras soviéticas de 800m, 1500, e
■ Apresentação pelo Prof. JOÃO ABRANTES Dossier Técnico Planeamento do Treino das corredoras soviéticas de 800m, 1500, e 3000m ■ Por M. Litovchenko (Treinador Nacional de Meio-Fundo Feminino da URSS) Comunicação feita no Congresso Mundial da ITFCA (Aix-les-Bains, 1990). Artigo publicado nos “Cuadernos de Atletismo” nº 28 da Federação Espanhola de Atletismo INTRODUÇÃO Para que um treinador possa planificar o treino dos seus atletas, principalmente se esse treino for dirigido a atletas de alto nível, é fundamental que estejam reunidas algumas condições: - O treinador deve ter um conhecimento profundo dos princípios elementares do treino desportivo. - O treinador deve estar familiarizado com as regras da programação e planificação do treino. - O treinador deve ser capaz de elaborar todo o planeamento desde o macrociclo até a cada uma das sessões de treino ao longo da época. - Os atletas devem ter ao seu dispor todas as infra estruturas necessárias para poderem realizar todo o tipo de trabalho programado pelo treinador. - O treinador deve saber e poder utilizar meios de controlo e avaliação do treino ao longo de toda a época. - Por último, mas não menos importante, todo este trabalho deve ser realizado com atletas que tenham uma grande talento para as disciplinas em causa, pois só com atletas de grande qualidade é possível obter resultados do mais alto nível internacional. ASPECTOS FUNDAMENTAIS DO TREINO Baseado numa longa experiência como treinador de atletas de meiofundo (800, 1500 e 3000 metros), cheguei a algumas conclusões sobre quais são os aspectos fundamentais do treino. 1. É fundamental para o treinador conhecer de forma muito objectiva qual o nível físico dos seus atletas (controlo das diferentes capacidades físicas) e qual o seu nível desportivo (recorde pessoal), antes de iniciar qualquer tipo de trabalho, assim como os objectivos que se pretendem alcançar a curto, médio e longo prazo. 2. Outro aspecto fundamental que deve estar sempre presente tanto nos treinos como na competição é a motivação do atleta, sendo o treinador o principal responsável por conseguir motivar os seus atletas. 3. Muitas vezes os treinadores caiem no erro de pensar que o importante para se atingir uma grande marca é que os seus atletas consigam treinar mais do que treinavam, tanto em qualidade como em quantidade, quando o que realmente interessa ao treinador é conhecer a capacidade do organismo de cada um dos seus atletas para se adaptarem aos diferentes estímulos de treino, assim como a capacidade de cada atleta para evoluir graças ao treino. 4. Outro aspecto muito importante está relacionado com a prevenção de lesões. O treinador tem de conseguir prever o aparecimento das lesões, sabendo que algumas são inevitáveis durante o processo de treino, mas as que podem prejudicar seriamente os níveis físicos e psíquicos dos atletas e comprometer a sua evolução, essas devem ser evitadas. 5. Todos os estudos realizados têm mostrado que após um período de seis a oito semanas em que os atletas realizam um determinado microciclo de treino, o organismo começa a adaptar-se, o que provoca uma estagnação em termos de evolução da forma desportiva, o que significa que o treinador deve estar atento e mudar o planeamento do treino da altura certa. 6 – Para cada tipo de prova, assim como para cada tipo de período de preparação, a influência dos diferentes sistemas energéticos, aeróbio e anaeróbio, vai-se alterando. Assim, conforme o atleta vai avançando no seu treino ao longo da época, o treinador deve ir variando as percentagens de treino dedicadas a cada um destes sistemas energéticos, aumentando progressivamente o trabalho em regime anaeróbio. 7. O treino da força deve estar sempre directamente relacionado com o objectivo que se pretende atingir e que deve ser determinado pelo próprio treinador em função das exigências da prova e das características de cada atleta. 8. O mecanismo aeróbio é essencial para a melhoria de rendimento dos atletas, sendo muito fácil tanto o seu desenvolvimento com a manutenção desta capacidade. Pelo contrário, o mecanismo anaeróbio já depende mais das características genéticas de cada atleta. Sabemos que para se atingir um alto rendimento neste tipo de provas os atletas necessitam de ter elevados níveis de potência aeróbia e de capacidade láctica. Isto significa que não se deve efectuar um treino cujo objectivo principal é o desenvolvimento da capacidade aeróbia durante mais de três a três meses e meio, pois a partir desse período de tempo começa a ser difícil a progressão dos atletas. 9. A qualidade do treino no limiar aeróbio – anaeróbio (entre 4 a 8 mmol) não deve ultrapassar nunca os 80% (tanto em ritmo como em volume) da capacidade do atleta, para que este não tenha de recorrer às suas reservas energéticas. Exemplo: Um atleta que consiga correr 6x 2000m num determinado ritmo, deve correr apenas 4x 2000m. 10. O treino anaeróbio deve iniciar-se apenas dois a dois meses e meio antes da data do principal objectivo competitivo da época, pois esse tempo é suficiente para se atingirem os resultados pretendidos. 11. O trabalho de força mais importante deve efectuar-se um mês e meio antes das primeiras competições. 12. É sempre preferível que o atleta atinja a sua forma competitiva de modo gradual, do que demasiado depressa, pois assim pode estag- 35 nar e mesmo começar a perder forma antes das competições mais importantes. 13. Ao longo da época sempre que aumenta o treino aeróbio diminui o anaeróbio e vice versa. MÉTODOS DE TREINO AERÓBIO - Corrida contínua entre 8 a 16 Km (145 a 150 pulsações) – 32% a 36% de lactato. Recuperação deste treino: 3 a 5 horas. - Corrida contínua longa entre 16 a 25 Km (150 pulsações) – 36% de lactato. Recuperação deste treino: 48 a 54 horas. - Corrida contínua rápida entre 4 a 10 Km (170 pulsações) – 65% a 70% de lactato. Recuperação deste treino: mais de 54 horas. - Treino Fraccionado com repetições entre os 2000m a 3000m (170 pulsações) – 50% a 65% de lactato. Recuperação deste treino: 54 horas. - Fartlek de 8 a 14 Km (150 a 180 pulsações) – 55% a 65% de lactato. Recuperação deste treino: 68 horas. tempo de recuperação deve ser entre 5 a 7 minutos. - A intensidade deve ser igual ao ritmo de competição. - Durante uma época só se devem realizar cinco treinos deste tipo, um na época de Inverno (para preparar as competições de pista coberta) e quatro na época de Verão para preparar as competições de ar livre. - Outro exemplo de treino anaeróbio: 3x (300m + 500m + 100m) com 30 segundos de recuperação entre os 300 e os 500 metros e 60 segundos entre os 500 e os 100 metros. PLANEAMENTO DO TREINO O plano de treino que se pode ver na Figura 1, mostra que existem dois picos de forma durante a época, um no Inverno que visa obter resultados nas provas de pista coberta, e o segundo no Verão para preparar as provas de ar livre. O Inverno corresponde ao treino mais ligeiro e no Verão as sessões de treino são muito mais duras com o objectivo de se atingirem grandes resultados. MÉTODOS DE TREINO DA FORÇA - Circuito de Treino, Técnica de Corrida, Multisaltos e Musculação (100 a 180 pulsações) – 36% de lactato. Recuperação deste treino: 3 horas. - Corridas em rampas e na areia: corridas fraccionadas entre 60m a 1000m (170 pulsações). Recuperação deste treino: 48 horas. - Preparação Física Geral: abdominais, dorsais, etc. (150 pulsações). Recuperação deste treino: 3 horas. - Multisaltos em rampas a subir e a descer e corridas com pesos com um volume aproximadamente de 5 Km (170 pulsações) – 30% a 60% de lactato. Recuperação deste treino: 74 horas. MÉTODOS DE TREINO DA VELOCIDADE - Corridas rápidas entre 30m a 150m com uma intensidade entre 90% a 100%. - Corridas In-Out (rápido – lento – rápido) em 50m com um total de 2 a 3 séries de 6 a 20 repetições num volume total de 2 Km. - Corridas intermitentes entre 60m a 200m com 6 a 15 repetições. - Corridas em rampas entre 60m a 800m com 6 a 10 repetições. - Multisaltos rápidos. MÉTODOS DE TREINO DA PREPARAÇÃO ESPECIAL ANAERÓBIA - Competições em distâncias mais curtas ou mais longas que a distância da prova. - Treino Fraccionado – Exemplos: - (4x 200m) + (3x 300m) para corredores de 800m - (2x 400m) + (3x 300m) para corredores de 800m - (4x 400m) + (3x 500m) para corredores de 1500m - (2x 800m) + (3x 500m) para corredores de 1500m - (3x 800m) + (2x 1000m) para corredores de 3000m - (1x 1500m) + (2x 1000m) para corredores de 3000m - O tempo de recuperação é igual ao tempo de esforço. Por exemplo nos 200m, se forem corridos para 30 segundos, o tempo de recuperação entre as repetições será de 30 segundos. No caso das séries o 36 VOLUME TOTAL DO TREINO ANUAL Ao longo de uma época os atletas de alto nível destas disciplinas de meio-fundo realizam entre 540 a 600 sessões de treino com um volume de trabalho que se situa entre os 1600 a 4000 Km de corrida por ano (depende muito da distância que se corre em competição). Esse trabalho está assim distribuído: - Treino aeróbio: 1900 a 2100 Km anuais. - Treino aeróbio – anaeróbio: 260 a 350 Km anuais. - Treino anaeróbio: 120 a 150 Km anuais. - Treino de ritmo competitivo: 15 a 30 Km anuais. - Multisaltos e rampas: 40 a 50 Km anuais. - Competições importantes: 16 a 24 Km anuais. - Treino de Musculação: 200 horas de treino por ano. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O TREINO DE RESISTÊNCIA No trabalho aeróbio os picos em termos de volume situam-se nos meses de Dezembro (época de Inverno) e Abril (época de Verão). Por exemplo, uma atleta que em Outubro corre numa intensidade média de 5,20’/Km, em Abril deverá correr numa intensidade de 3,40’/Km, mas mantendo as 150 pulsações e um lactato entre 32% a 36%. Consegue-se atingir estes resultados porque o atleta melhora consideravelmente a sua capacidade aeróbia. No período pré-competitivo, a carga de treino aeróbio deve diminuir, enquanto que a carga de treino anaeróbio deve aumentar. Durante este período o treino aeróbio – anaeróbio (170 pulsações com 55% a 60% de lactato) mantém-se sem alterações devendo os atletas realizar um total de 7 a 8 sessões deste tipo de treino em três semanas, sendo a quarta semana de recuperação. Durante o período competitivo o volume do treino de corrida diminui. A intensidade da corrida por sua vez aumenta podendo as atletas correr por exemplo a 3,20’/ Km. Isto significa que se trata não de um trabalho para a capacidade aeróbia, mas sim para a potência aeróbia e capacidade láctica. No que respeita ao treino anaeróbio, a sua evolução no ciclo anual atinge os picos máximos de treino em Fevereiro (época de Inverno) e Junho (época de Verão) com volumes de 15 a 20 Km em Fevereiro e de 20 a 25 Km em Junho (Figura 2). Figura 2 CONTROLO E AVALIAÇÃO DO TREINO Durante a época realiza-se um teste de controlo duas vezes por mês. Esse teste consiste em correr 6x 1000m com uma recuperação de 10 a 15 minutos. Os primeiros 1000 metros são corridos em 5 minutos e os seguintes devem ser corridos cada vez de forma mais rápida (menos 20 segundos em cada 1000 metros), 4,40’ para os segundos, 4,20’ para os terceiros, 4,00’ para os quartos, 3,40’ para os quintos e 3,20’ para os sextos. Depois de cada repetição de 1000 metros há uma recolha de sangue para se poder analisar os lactatos referentes a cada ritmo de corrida (Figura 3). Figura 3 37