Direitos Humanos 2015
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Direitos Humanos 2015
POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO TOCANTINS QUARTEL DO COMANDO GERAL DIRETORIA DE ENSINO, INSTRUÇÃO E PESQUISA CURSO ESPECIAL APERFEIÇOAMENTO DE SARGENTO CEAS/2015 - 2ª ETAPA Direitos Humanos INSTRUTOR: Marcelo Falcão Soares - Ten Cel QOPM E-mail: [email protected] 2015 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO...................................................................................................................03 1.UNIDADE DIDÁTICA I: CONCEITOS BÁSICOS DE DIREITOS HUMANOS ............. 04 1.1. Conceitos ........................................................................................................................... 04 1.2. Principais características dos Direitos Humanos ............................................................... 06 3. ASPECTOS HISTÓRICOS DOS DIREITOS HUMANOS ................................................ 07 3.1. Primeira Geração de Direitos Humanos ............................................................................ 08 3.2. Segunda Geração de Direitos Humanos ............................................................................ 09 3.3. Terceira Geração de Diretos Humanos .............................................................................. 09 UNIDADE DIDÁTICA II: Atuação policial frente a Grupos Vulneráveis ............................. 10 1. Contextualização Social ....................................................................................................... 10 1.1. Conceito de grupos vulneráveis ......................................................................................... 14 1.1.1. Classificação dos grupos vulneráveis ............................................................................. 15 ABORDAGEM JURÍDICA PROTETIVA DOS GRUPOS VULNERÁVEIS ....................... 23 1. Legislação Nacional e Internacional .................................................................................... 23 1.2. Nacionais ........................................................................................................................... 23 1.3. Internacionais..................................................................................................................... 23 ATUAÇÃO POLICIAL NO ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIAS ENVOLVENDO GRUPOS VULNERÁVEIS. ................................................................................................... 25 1.2. Crianças e adolescentes ..................................................................................................... 25 1.3. Mulheres ............................................................................................................................ 26 1.4. Pessoas com deficiência .................................................................................................... 27 1.5. Idosos ................................................................................................................................. 30 1.6. Comunidade LGBTT ......................................................................................................... 31 1.7. Pessoas em situação de rua ............................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 32 2 APRESENTAÇÃO Prezado aluno do Curso de Especial de Aperfeiçoamento de Sargento da Polícia Militar do Tocantins. É com grande satisfação que organizamos este material de pesquisa que reúne informações atualizadas e indispensáveis para o enriquecimento intelectual de todos nós. Objetiva-se que você, Sargento ou Subtenente da PMTO, ao pesquisar este material encontre informações referentes ao tema Direitos Humanos que possam ser úteis para o desempenho de suas missões profissionais, considerando ser o Encarregado de Aplicação da Lei um autêntico representante do Estado e, consequentemente, deve agir como um promotor de direitos humanos e garantidor destes direitos. É importante lembrarmos que vivemos em uma sociedade cada vez mais conhecedora de seus direitos e cada vez mais apta a exercer sua cidadania. Esta realidade reflete importantes avanços democráticos que nosso País conquista a cada dia. Todo este contexto deve provocar nos profissionais de segurança pública um sentimento de busca acirrada de constante melhora dos conhecimentos inerentes ao desempenho de sua profissão uma vez que qualquer erro técnico inerente ao nosso trabalho pode resultar em situações catastróficas para a sociedade, culminando na total falta de confiança em uma instituição pública formada por profissionais que devem estar preparados para servir e proteger com total qualidade. E é fundamentado nestas premissas que convidamos você a se dedicar com muita determinação no estudo dos conhecimentos que formam esta apostila de Direitos Humanos que traz abordagens importantes sobre o tema Direitos Humanos e atuação policial frente a grupos vulneráveis. Temos certeza que com sua dedicação e comprometimento em construir cada vez mais seus conhecimentos profissionais teremos uma Polícia Militar cada dia mais preparada para o desempenho de suas missões. Bom estudo. Marcelo Falcão Soares – Ten Cel QOPM Organizador da apostila 3 UNIDADE I – CONCEITOS BÁSICOS DE DIREITOS HUMANOS 1 CONCEITOS O estudo dos Direitos Humanos é o estudo integrado dos direitos individuais, sociais, econômicos e políticos fundamentais. Os termos direitos humanos e direitos fundamentais são utilizados como sinônimos. Ainda se complementam como sinônimos dos direitos humanos os termos “Direitos dos povos”, “Direitos das Gentes”, “Direitos de todos” entre outros termos. Conforme abordagem que consta no Manual Servir e Proteger (CICV/98), um direito é um título. É uma reivindicação amparada legalmente que uma pessoa pode fazer para com outra. Destaca ainda que os direitos humanos são títulos legais que toda pessoa possui como ser humano. Considerando que direito é um título, todos somos titulares diretos desses valores frente ao Estado Direitos humanos são os direitos de todos os povos e de todos os indivíduos, independentemente de cor, raça, sexo, religião ou nacionalidade. Cada um de nós é responsável para tornar esses direitos plena realidade, seja respeitando-os, seja ajudando a promovê-los e divulgando-os. Por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir. Encontramos na doutrina vários conceitos de direitos humanos. É importante ressaltar que todos estes conceitos trazem como núcleo o respeito a dignidade humana. Destacamos alguns conceitos de renomados doutrinadores, conforme segue: “Direito humanos são aqueles direitos inerentes à personalidade humana, é a ausência de constrangimento para toda atividade que não destrua, nem embarace a conservação do homem e da sociedade.” (Sampaio Dória): “É o conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito à sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.” (Alexandre de Moraes) “os direitos em função da natureza humana, reconhecidos universalmente pelos quais os indivíduos e humanidade em geral, possam sobreviver e alcançar suas próprias realizações” (Selma Regina Aragão). “um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, buscam concretizar as exigências da dignidade, da liberdade, da igualdade, 4 da fraternidade e da solidariedade humanas, as quais devem ser reconhecidas positivamente, em todos os níveis. (Alci Marcus Ribeiro Borges) Ao observarmos atentamente os conceitos em destaques podemos emitir as seguintes interpretações: O núcleo central dos direitos humanos é a proteção a dignidade humana. Por dignidade humana entende-se ser um atributo da pessoa humana: pelo simples fato de "ser" humana, a pessoa merece todo o respeito, independentemente de sua origem, raça, sexo, idade, estado civil ou condição social e econômica. A pessoa humana, enquanto tal, não perde sua dignidade quer por suas deficiências físicas, quer mesmo por seus desvios morais. Neste contexto, a ideia de dignidade da pessoa humana está na base do reconhecimento dos direitos humanos fundamentais. Os Direitos Humanos resultam de lutas contra o arbítrio do poder estatal. Não nascem de uma concessão e sim de reivindicações legítimas contra o excesso de poder do Estado. Cabe ao Estado, portanto a total responsabilidade de garantir e efetivas todos os direitos inerentes ao ser humano. Em sua amplitude os Direitos humanos alcançam varias áreas do direito que deve ser viabilizado pelo Estado a todos os indivíduos, como por exemplo: direito a saúde, direito a educação, direito a habitação, direito a liberdade, direito ao lazer, direito ao trabalho, direitos culturais, direito a segurança, direitos da intimidade, direito ao esporte, entre outros. Com estas interpretações, deve-se evitar um erro muito comum entre os profissionais de segurança pública que é interpretar que direitos humanos existem somente para proteção de bandidos e outras falácias que infelizmente permeiam o imaginário policial. O que deve ser interpretado é justamente o contrário, ou seja, direitos humanos existem para garantia e proteção da dignidade humana e exercício total da cidadania. Isto porque, como dito, não temos somente direito à segurança, à vida e a liberdade como preceitua o artigo terceiro da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Muito além destes direitos temos que ver garantidos e efetivados pelo Estado vários outros que citamos no parágrafo anterior. Desta forma, podemos afirmar que como policiais militares e funcionários do poder público exercemos uma dupla função em relação a direitos humanos. Primeiro, somos portadores destes direitos, por sermos humanos. Segundo, por sermos representantes do Estado, obrigatoriamente temos que focar nossas ações no respeito à dignidade humana e na promoção destes direitos. 2 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS 5 Dentro da amplitude de especificidades dos direitos humanos, destacados doutrinadores elencam como suas principais características as seguintes: 2.1 IMPRESCRITIBILIDADE Os direitos humanos fundamentais não se perdem pelo decurso de prazo. Eles são permanentes; Inalienabilidade: não se transferem de uma para outra pessoa os direitos fundamentais, seja gratuitamente, seja mediante pagamento; 2.2 RENUNCIABILIDADE Os direitos humanos fundamentais não são renunciáveis. Não se pode exigir de ninguém que renuncie à vida (não se pode pedir a um doente terminal que aceite a eutanásia, por exemplo) ou à liberdade (não se pode pedir a alguém que vá para a prisão no lugar de outro) em favor de outra pessoa. 2.3 INVIOLABILIDADE Nenhuma lei infraconstitucional nem nenhuma autoridade pode desrespeitar os direitos fundamentais de outrem, sob pena de responsabilização civil, administrativa e criminal; 2.4 UNIVERSALIDADE Os direitos fundamentais aplicam-se a todos os indivíduos, independentemente de sua nacionalidade, sexo, raça, credo ou convicção políticofilosófica; 2.5 EFETIVIDADE O Poder Público deve atuar de modo a garantir a efetivação dos direitos e garantias fundamentais, usando inclusive mecanismos coercitivos quando necessários, porque esses direitos não se satisfazem com o simples reconhecimento abstrato; 2.6 INTERDEPENDÊNCIA As várias previsões constitucionais e infraconstitucionais não podem se chocar com os direitos fundamentais; antes, devem se relacionar de modo a atingirem suas finalidades; Complementaridade: os direitos humanos fundamentais não devem ser interpretados isoladamente, mas sim de forma conjunta, com a finalidade da sua plena realização. 2.7 INDIVISIBILIDADE Porque não devem ser analisados isoladamente. Por exemplo: o direito à vida exige a segurança social (satisfação dos direitos econômicos). A declaração 6 universal coloca no mesmo patamar de igualdade os direitos civis e políticos com os direitos econômicos e culturais. Todas estas características visam reforçar o entendimento da importância dos direitos humanos para os seres humanos independente de naturalidade, de raça, de cor ou mesmo de classe social. A partir do momento em que conseguimos interpretá-las o entendimento do que seja direitos humanos fica claramente facilitado. Desta forma podemos afirmar que direitos humanos existem para proteção da pessoa humana cabendo ao Estado viabilizar todos os meios necessários para sua total efetividade. Sobre a necessidade de efetivação destes direitos, ressalta-se a seguinte reflexão: “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-lo, mas o de protegê-los” (BOBBIO, 1992, A era dos direitos p. 24). Ainda, mais O problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é a sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados” (BOBBIO, 1992, p. 25). Neste contexto o autor indica que o problema dos direitos humanos hodiernamente não é de previsão e sim de efetivação. Realmente, podemos perceber no arcabouço jurídico mundial existem inúmeros instrumentos jurídicos inerentes à obrigação estatal de garantir e aplicar os direitos humanos. O grande problema que presenciamos, especialmente em países pouco desenvolvidos ou em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, é a real efetivação destes direitos. Isto porque temos uma das constituições mais democráticas do mundo. Ao lermos o artigo 5º da Constituição Federal do Brasil de 1988, podemos perceber a amplitude da previsão de garantia de direitos humanos fundamentais apesar de não os vermos aplicados na sua totalidade na vida cotidiana. 3 ASPECTOS HISTÓRICOS DOS DIREITOS HUMANOS A historicidade dos direitos humanos é permeada de interpretações doutrinárias divergentes, ou seja, não encontramos uma vertente única para explicar a evolução histórica destes direitos. É certo que a evolução histórica predominante pelos doutrinadores parte de concepções políticas, filosóficas, idealistas, entre outras. Neste contexto, é correto afirmar que direitos humanos não surgiram apenas de resultados de reivindicações de uma pessoa ou grupo isolado. Resultam sim de lutas históricas em determinados momentos da existência humana. 7 A conquista dos Direitos Humanos reflete ações quase sempre pautadas em reivindicações legítimas de pessoas que corajosamente buscavam uma mudança de atitudes na forma do exercício do poder daqueles que eram responsáveis pelo destino dos povos, em detrimento do sofrimento e do descaso com os demais indivíduos que eram considerados simples cumpridores de ordens inescrupulosas e nefastas que se originavam destes mesmos responsáveis. Sempre vai refletir uma luta entre civilização e barbárie, que, quando resultaram em êxitos, conduziram à emergência de uma cultura democrática que vai além da ideia de Estado, política e ideologias. Em diferentes ordenamentos jurídicos, como as leis hebraicas, encontra-se, através de uma leitura religiosa, a proteção para esses direitos, sempre direcionados para a proteção dos valores humanos. No cristianismo o homem é visto como o templo do espírito divino, e, assim sendo, não pode ser torturado, ter fome ou não ter uma moradia, uma vez que, para o Deus Eterno, não existe acepção de pessoas em virtude de raça, cor, ou posição social. Tudo isso devidamente fundamentado no livro sagrado, a Bíblia. Por sua vez, no judaísmo, estão sempre presente os valores de igualdade, preconizando ainda que todos os homens têm direito ao salário e ao alimento e é sempre visto como semelhança de Deus. Já o islamismo traz valores como a fraternidade e universalidade do homem quanto à sua origem. Tem como lema indiscutível a liberdade, ao passo em que o budismo apregoa a plena realização humana e, em consequência disso, a existência de uma sociedade pacífica e perfeita, enquanto o taoísmo afirma a liberdade e reprova a coação, pregando que os Governos devem governar pela persuasão dos corações e não pelo uso da força. Assim, é importante ressaltar que mesmo com divergência e aceitação da doutrina, uma melhor forma de entendermos a evolução histórica dos direitos humanos é a interpretação do surgimento destes direitos através de momentos históricos classificados como “gerações de direitos humanos”. Destacamos exemplos históricos inerentes a cada geração abordada. 1ª Geração: Direitos civis e políticos. Conhecida também como geração de direitos individuais. São os direitos inerentes à individualidade humana, como: liberdade, igualdade, liberdade de pensamento e manifestação, direitos políticos, liberdade de ir e vir, entre outros. Nascem da luta contra o Estado absolutista. Nesse primeiro momento, os direitos humanos se materializaram como direitos civis e políticos ou como direitos individuais atribuídos à condição natural do indivíduo. É a expressão de necessidades individuais que requerem a abstenção do Estado para o seu pleno exercício. 8 Exemplos históricos: Revolução francesa (1789); Revolução americana de 1776. 2ª Geração: Direitos sociais e coletivos Mais da metade do século XIX foi marcada pela consolidação do Estado liberal e ainda pelo desenvolvimento da economia industrial, tendo agora a classe burguesa, já instalada no poder do Estado, pautado sua atuação por características não revolucionárias, que marcou de maneira efetiva sua atuação nos séculos passados. Houve também, nesse período, a ocorrência de muitos confrontos sociais permeados por contradições políticas marcantes, tendo como protagonista as classes operárias que não eram incomodadas pelo Estado dito Liberal e não intervencionista. Esse período recebe a classificação histórica de segunda geração dos direitos humanos. Era uma histórica progressão do conteúdo dos Direitos Humanos que ganham um novo enfoque no seu entendimento, ou seja, deixam de ser entendidos apenas como direitos individuais e passam a ter uma nova roupagem no sentido de serem entendidos como direitos coletivos de natureza social. Para exemplificarmos: direito ao trabalho, direito à organização sindical, direito à previdência social, direito à greve, direito à saúde, à educação gratuita, férias remuneradas, entre muitos outros. Exemplos históricos: Revolução russa de 1917; Criação da Organização Internacional do Trabalho em 1919. 3ª Geração: Direitos da solidariedade humano ou direitos de autodeterminação dos povos: Foi durante o século XX, especialmente logo após a primeira grande guerra mundial, que o mundo começou a demonstrar publicamente sua preocupação com o respeito aos direitos de autodeterminação dos povos, ou, como preferem alguns autores, os direitos de solidariedade humana. O espetáculo de carnificina propiciado pelos horrores da primeira guerra mundial (1914/1919) despertou em todos os cantos do mundo sentimentos de solidariedade entre perdedores e vencedores daquele período sangrento que marcou a história da humanidade. 9 Com o fim da segunda guerra mundial, abriu-se uma nova realidade inerente à luta pelos direitos humanos. De todas as partes do mundo ouviam-se clamores pela formação de um organismo internacional que coordenasse ações que conclamassem a participação dos Estados no exercício concreto do respeito aos direitos humanos como única condição do alcance da tão sonhada paz mundial. Estava lançada internacionalmente a ideia da criação da ONU (Organização das Nações Unidas), marco histórico no contexto dos direitos humanos. Todos esses anseios mundiais propiciaram também o que os historiadores denominaram de “direitos humanos de terceira geração”, consubstanciados no surgimento de novas classes de direitos tais como: o direito à paz, o direito ao desenvolvimento, o direito à autodeterminação dos povos, o direito a um meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, tutela das minorias e ainda à utilização do patrimônio comum da humanidade. Exemplos Históricos: Criação da Organização das Nações Unidas (1945). Promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. É importante destacar que a classificação histórica dos direitos humanos visa apenas facilitar o entendimento da evolução destes direitos. Ressalta-se que tais direitos são universais, indivisíveis e interdependentes. UNIDADE DIDÁTICA II – ATUAÇÃO POLICIAL FRENTE A GRUPOS VULNERÁVEIS 1 CONTEXTUALIZAÇÃO SOCIAL Na busca de uma sociedade mais justa e fraterna, a sociedade assume papel decisivo, especialmente pela contribuição a desempenhar para o estabelecimento da democracia estruturada e praticada com a participação da sociedade como um todo. A sociedade brasileira possui, atualmente, cerca de 170 milhões de brasileiros distribuídos em um território de dimensões continentais. A cultura brasileira é o resultado de um grande sincretismo que uniu costumes de diversos 10 povos e os caracteres genéticos que compõem as nossas raízes são frutos de uma secular miscigenação de etnias, gerando uma diversidade que proporciona ao Brasil, uma imensurável riqueza cultural e social. Neste contexto temos uma grande variedade de grupos ou pessoas que formam a nossa sociedade mundial. Há grupos na nossa sociedade e no mundo, que para muitos são invisíveis. Alguns desses grupos, devido a questões ligadas a gênero, idade, condição social, deficiência e orientação sexual, tornam-se mais suscetíveis à violação de seus direitos, por isso são denominados grupos vulneráveis. As diferenças relacionadas à etnia, gênero, deficiência, idade, dentre outros, também constituem essa diversidade tornando-a ainda mais bela. Porém, quando as diferenças se convertem em desigualdade, criam um ambiente propício para a violação de direitos, tanto no espaço público quanto no privado, tornando vulneráveis as pessoas que estão na condição de diferentes. É possível citar como exemplo: as pessoas com necessidades especiais, os idosos, as mulheres, crianças e adolescentes e a população de rua. Esses grupos são chamados de grupos vulneráveis. A busca dessas pessoas pelo reconhecimento de seus direitos é hoje um fator democrático preponderante, pois, somente através da igualdade é que se percebe a plena democracia. Foram muitos os movimentos sociais e conquistas no século XX, dos setores mais vitimados pelo preconceito e a discriminação, mas, ainda hoje, a sociedade não está preparada para lidar com essas diferenças, o que gera o preconceito e a indiferença tornando a vida dessas pessoas, ainda mais difícil. A falta de políticas públicas direcionadas a esses grupos e a desinformação da sociedade são fatores que contribuem para a vitimação. Atualmente existe um grande esforço nacional para dar mais visibilidade a esses grupos e mais informação a sociedade, estimulando, assim, uma coresponsabilidade na formulação de leis e políticas garantidoras dos direitos dos grupos vulneráveis, como a criação de conselhos temáticos – o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, dentre outros. Os direitos humanos foram construídos através da história, na luta dos oprimidos pelo reconhecimento como cidadãos e pela liberdade. A defesa dos direitos humanos proporciona a sociedade e, notadamente, a esses grupos vulneráveis, o reconhecimento e a abertura de espaço político, para além do meramente formal, ou seja, traz a realização concreta de seus anseios e faz cumprir efetivamente o que está escrito nas leis e nos estatutos. Dentro desse contexto, o policial na sua atividade cidadã e de proteção social deve conhecer a dinâmica dos grupos humanos, ou seja, descobrir seus anseios, dificuldades, necessidades e se engajar, no que for relativo à segurança pública, 11 para a defesa e promoção dos direitos desses grupos. É como afirma Balestreri (2004, p.49): Dada a grave realidade nacional e internacional, onde o crime e a violência ameaçam, a cada dia mais, as liberdades individuais e coletivas e as instituições democráticas, é preciso que a segurança pública seja resolutamente percebida como inclusa no mais fundamental rol dos direitos humanos. É por isso que seus operadores de direitos (policiais, bombeiros, agentes penitenciários e guardas municipais) devem considerar-se e ser considerados, cada vez mais, como promotores de direitos. Por vezes, é necessário repensar as atitudes e valores que temos confrontando-as com a nova ordem social e política de nossa sociedade. Por exemplo, reflita sobre: Como você agiria caso uma pessoa que usa cadeira de rodas lhe solicitasse ajuda para descer uma escada ou sair de seu carro? Como agiria se uma pessoa surda e muda tivesse sido vítima de agressão? Qual seria sua atitude caso um cidadão cego lhe solicitasse ajuda ou você se deparasse com uma ocorrência de violência doméstica contra uma mulher ou abuso sexual de crianças e adolescentes? Com certeza, essas seriam situações embaraçosas, por fugirem da rotina de seu trabalho, pois você está habituado a lidar com pessoas que podem se locomover normalmente, entender o que lhes é solicitado, enfim, que não possuem características que dificultará suas vidas em sociedade. No entanto, quando se depara com casos como os citados, surge a dúvida de como atuar nessas ocasiões. Por outro lado, essas pessoas esperam ser tratadas com respeito e dignidade, como cidadãos sujeitos de direito, como todos os demais. A atividade de segurança pública exige profissionais que saibam lidar com as pessoas sem discriminá-las, garantindo seus direitos e resolvendo conflitos de forma serena e igualitária. É imprescindível que o profissional de segurança pública conheça melhor as dificuldades de cada grupo e como ele pode auxiliá-las, protegendo e promovendo seus direitos, além de se habituar aos procedimentos que fogem aos padrões, que contemplam questões sobre minorias e grupos vulneráveis, de forma a nortear a sua atuação no trato adequado com essas pessoas. A Constituição Federal de 1988 dá a todos a promoção dos direitos coletivos sem nenhuma discriminação, senão vejamos: Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – (...); II – (...); III – (...); e IV - Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (CF, 1988) 12 O Plano Nacional de Direitos Humanos II também é claro, com relação às políticas públicas para o enfrentamento relativo aos grupos vulneráveis. Plano Nacional de Direitos Humanos II 13. Apoiar programas e ações que tenham como objetivo prevenir a violência contra grupos vulneráveis e em situação de risco. Também é possível encontrar respaldo no artigo 5º da Constituição Federal. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se a todos a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” (Art. 5º CF 1988). Além dos dispositivos já citados, no ordenamento jurídico há outros garantidores de direitos dos grupos vulneráveis mais específicos, como o Estatuto do Idoso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, a Lei nº 11.340, Maria da Penha, dentre outros. Entretanto, a efetividade desses dispositivos depende da participação da sociedade civil organizada e de políticas públicas de atendimento em diversas áreas, inclusive na segurança pública. Nesse contexto, o profissional de segurança pública não pode de forma alguma ser mais um a vitimar e desrespeitar os direitos dessas pessoas. Ele também não deve ser alguém somente disposto a ajudar, precisa ter conhecimentos básicos sobre cada um dos dispositivos legais referentes a cada segmento, para prestar um atendimento de qualidade e dar os devidos encaminhamentos a cada caso em específico. Outro procedimento necessário é a criação de redes, onde os vários órgãos ligados à proteção e promoção de direitos, como conselhos temáticos, polícias, Ministério Público e Judiciário estejam integrados e formulando estratégias de atendimento em conjunto. 1.1 CONCEITO DE GRUPOS VULNERÁVEIS É comum a ocorrência de erros na interpretação dos conceitos de grupos vulneráveis e minorias. Ocorre que muitas pessoas imaginam que se trata de grupos semelhantes. Desta forma é interessante que o profissional de segurança pública saiba distinguir, sob a ótica dos direitos humanos, estes dois grupos sociais. Por grupo vulnerável se entende um conjunto de pessoas que por questões ligadas a gênero, idade, condição social, deficiência e orientação sexual, tornam-se mais suscetíveis à violação de seus direitos. 13 Deve-se destacar deste conceito as questões que diferenciam estes grupos. São questões referentes a gênero, idade, condição social, deficiência e orientação sexual. Assim, Para efeito didático esses grupos são classificados em seis categorias: Mulheres; Crianças e adolescentes; Idosos; População de rua; Pessoas com deficiência física ou sofrimento mental; e Comunidade LGBTT. Existem outros grupos na sociedade em situação de risco, porém, a vulnerabilidade neste caso é a sujeição constante ao preconceito e à discriminação, independente de outros fatores. Por minorias, entende-se: “Um grupo de cidadãos de um Estado, constituindo minoria numérica e em posição não dominante no Estado, dotada de características étnicas, religiosas ou linguísticas que diferem daquelas da maioria da população, tendo um senso de solidariedade um para com o outro, motivado, senão apenas implicitamente, por vontade coletiva de sobreviver e cujo objetivo é conquistar igualdade com a maioria, nos fatos e na lei.” (Sabóia (2001, p. 19 e 20 apud DESCHÊNES, 1985, p. 31). A identificação de uma minoria envolve a apreciação de critérios objetivos e subjetivos. Em outras palavras, caberá ao Estado reconhecer determinados grupos como índios e demarcar terras para eles, ou remanescentes de quilombos, e reconhecer aquele sítio como histórico dando-lhes titularização coletiva das terras; ou como ciganos, por exemplo. Para a SENASP, minorias são: um grupo de cidadãos de um Estado, constituindo minoria numérica e em posição não dominante no Estado, dotada de características étnicas, religiosas ou linguísticas, que os diferenciam da maioria da população, tendo um senso de solidariedade um para com o outro, motivado, senão apenas implicitamente, por vontade coletiva de sobreviver e cujo objetivo é conquistar igualdade com a maioria, nos fatos e na lei. A partir destes conceitos, é possível distinguir: Minorias étnicas: “São grupos que apresentam fatores distinguíveis em termos de experiências históricas compartilhadas e sua adesão a certas tradições e significantes tratos culturais, que são diferentes dos apresentados pela maioria”. 14 Minorias linguísticas: São grupos que usam uma língua, quer entre os membros do grupo, quer em público, que claramente se diferencia daquela utilizada pela maioria, bem como da adotada oficialmente pelo Estado. Não há necessidade de ser uma língua escrita. (...) Língua é utilizada como sinônimo de linguagem, querendo significar ‘método humano e não instintivo de comunicar ideias, sentimentos e desejos, por meio de um sistema de sons e símbolos sonoros. Minorias religiosas: São grupos que professam e praticam uma religião (não simplesmente outra crença, como o ateísmo, e.g.) que se diferencia daquela praticada pela maioria da população. (SABOIA 2001, p. 23 apud Dienstein,1992, p.156). No Brasil existem as seguintes minorias: budistas, muçulmanos, espíritas, praticantes de candomblé (religião jeje-nagô ou ioruba), dentre outras. 1.1.1 Classificação dos Grupos Vulneráveis Para melhor entendimento e estudos, é importante destacarmos as diversas classificações dos grupos vulneráveis. Após a diferenciação entre grupos vulneráveis e minorias, muitos questionamentos surgem, como por exemplo se um grupo pode estar incluso em outro. É uma questão de aplicabilidade de conceitos. Se possuo um grupo de islâmicos, mas dentro deste grupo possuo um deficiente físico, certamente encontraremos um caso de grupo vulnerável (deficientes) e minorias (islâmicos). Tal diferenciação é interessante para efeitos de estudos, mas todas possuem o interesse em conceituar, a fim de que a aplicação dos direitos não seja de forma fracionada. IDOSOS O Estatuto do Idoso (Lei 10.741-2003) define como pessoa idosa aquela com idade igual ou superior a 60 anos. A situação da terceira idade no Brasil mostra um aumento desta parcela da população, motivo este que coloca a segurança pública como órgão diretamente responsável pela manutenção dos direitos desta camada social. Consoante o que preconiza a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, “O envelhecimento populacional representa a maior conquista da humanidade e acredita-se que, em um futuro próximo, todos os países o experimentarão, ainda que em diferentes níveis de intensidade e de estrutura temporal. 15 O Brasil assiste a uma redução proporcional da população jovem e a um aumento na proporção e no número absoluto de idosos. Essa dupla demanda – com a chegada de novos e a persistência de antigos problemas – em termos de políticas públicas, traduz-se em dilemas para os gestores e em dificuldades para quem envelhece. Segundo as projeções das Nações Unidas, entre 2000 e 2050, a população idosa brasileira ampliará a sua importância relativa, passando de 7,8% para 23,6%, enquanto a jovem reduzirá de 28,6% para 17,2%, e a adulta de 66,0% para 64,4%. Todo o aumento se concentra na população idosa, intensificando sobremaneira o envelhecimento demográfico brasileiro, com taxas médias de crescimento de 3,2% entre idosos e de 4% ao ano dos muito idosos (de 80 anos e mais). Até 2030/2040, a população idosa deve ampliar, momento a partir do qual as novas gerações nascidas sob os baixos níveis de fecundidade começam a se incorporar ao grupo e a determinar a trajetória do mesmo. Ainda assim, em 2050 a população de 65 anos e mais ascenderia a 38 milhões de pessoas, superando a de jovens. Em 2025, na população brasileira haverá mais de 50 adultos com 65 anos ou mais, por cada conjunto de 100 jovens menores de 15 anos. Em 2045, o número de pessoas idosas ultrapassará o de crianças. Esse número poderá incluir você, encarregado pela aplicação da lei. Este é o motivo de se garantir hoje os direitos dos idosos. Amanhã a sociedade estará mais preparada para receber esta crescente parcela da população. Entre as causas mais comuns de violência contra o idoso, estão: abuso físico, psicológico, sexual, abandono e negligência. Some-se a essas formas de violência, o abuso financeiro e a autonegligência. Veja as conceituações, disponíveis também no Portal saúde, do Governo Federal: 16 Abandono – ausência ou deserção, por parte do responsável, dos cuidados necessários às vítimas, ao qual caberia prover custódia física ou cuidado. Abuso financeiro aos idosos: exploração imprópria ou ilegal e ou uso não consentido de recursos financeiros de um idoso. Abuso físico ou maus-tratos físicos – uso de força física que pode produzir uma injúria, ferida, dor ou incapacidade. Abuso psicológico ou maus-tratos psicológicos – agressões verbais ou gestuais com o objetivo de aterrorizar, rejeitar, humilhar a vítima, restringir a liberdade ou ainda isolá-la do convívio social. Autonegligência – conduta de pessoa idosa que ameaça sua própria saúde ou Segurança, com a recusa ou o fracasso de prover a si mesmo um cuidado adequado. Negligência – recusa omissão ou fracasso por parte do responsável no cuidado com a vítima. CRIANÇAS E ADOLESCENTES Crianças e adolescentes têm direitos próprios que estão previstos em diversos instrumentos internacionais e na legislação brasileira. A Constituição Federal relaciona em seu art. 227 direitos destinados a garantir às crianças e adolescentes absoluta prioridade no atendimento ao direito à vida, saúde, educação, convivência familiar e comunitária, lazer, profissionalização, liberdade e integridade. Além disso, é dever de todos (Estado, família e sociedade) livrar a criança e adolescente de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Crianças e adolescentes têm primazia em receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, precedência no atendimento por serviços públicos ou de relevância pública, destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e juventude, programas de prevenção e atendimento especializado aos jovens dependentes de entorpecentes e drogas afins. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece um rol de direitos exclusivos dessas pessoas, bem como regras especiais para o adolescente infrator. Considera-se criança a pessoa de até doze anos de idade, e adolescente aquela de entre doze e dezoito anos. O ECA também regula casos excepcionais de jovens que 17 receberam medidas que se esgotarão até depois dos dezoito anos, como no caso do prolongamento da medida de internação e no caso de assistência judicial. Ato infracional: Ato infracional é a ação tipificada como contrária à lei que tenha sido praticada pela criança ou adolescente. São inimputáveis todos os menores de dezoito anos e não poderão ser condenados a nenhuma pena. Recebem, portanto, tratamento legal diferente dos réus imputáveis (maiores de dezoito anos) a quem cabe a penalização. A criança acusada de crime deverá ser encaminhada à presença do Conselho Tutelar ou Juiz da Infância e da Juventude. Se efetivamente praticou ato infracional, serlhe-á aplicada medida especial de proteção como orientação, apoio e acompanhamento temporário, freqüência obrigatória a ensino fundamental, requisição de tratamento médico e psicológico, entre outras medidas. Adolescente em caso de flagrância de ato infracional será levado à autoridade policial especializada. Os adolescentes não são igualados a réus ou indiciados nem são condenados a nenhuma pena (reclusão e detenção), como ocorre com os maiores de dezoito anos. Recebem medidas socioeducativas, sem caráter de apenação. É ilegal a apreensão do adolescente para averiguação. Fica apreendido, e não preso. A apreensão somente ocorrerá, quando for em flagrância ou por ordem judicial, e, em qualquer das hipóteses, esta apreensão será comunicada, de imediato, ao juiz competente, bem como à família do adolescente. DEFICIENTES FÍSICOS Também incluso no rol de grupos vulneráveis, este segmento da sociedade sem sempre é percebido pela segurança pública, até mesmo por se tratar de uma parcela menor, com relação aos idosos, crianças ou mesmo mulheres. Com rupturas de seus direitos constantes, este grupo possui mecanismos de proteção e defesa dos seus direitos, mas demanda atenção especial por parte dos órgãos encarregados pela aplicação da lei, visto seu descaso ser quotidiano, bem como suas reclamações pouco ou nada atendidas. Segundo a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, o Governo Federal lançou recentemente o Plano Viver sem Limite - Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, como resultado do firme compromisso político com a plena cidadania das pessoas com deficiência no Brasil. Oportunidades, direitos, cidadania para todas as pessoas são objetivos aos quais o Plano está dedicado. 18 Conforme o site oficial do governo, segundo resultados divulgados pelo IBGE, do Censo 2010, o País possui 45,6 milhões de pessoas com alguma deficiência, o que representa 23,91% da população. Mas, ao lançarmos esse conjunto de iniciativas, estamos pensando numa sociedade mais justa e plural para todos os 190 milhões de brasileiros, afinal de contas quando as pessoas com deficiência estão incluídas, toda a sociedade ganha. O Viver sem Limite foi construído com inspiração na força e no exemplo das próprias pessoas com deficiência, que historicamente estiveram condenadas à segregação. Trata-se de um conjunto de políticas públicas estruturadas em quatro eixos: Acesso à Educação; Inclusão social; Atenção à Saúde e Acessibilidade. Cada ação presente nesses eixos é interdependente e articulada com as demais, construindo redes de serviços e políticas públicas capazes de assegurar um contexto de garantia de diretos para as pessoas com deficiência, considerando suas múltiplas necessidades nos diferentes momentos de suas vidas. O produto desse trabalho é um Plano de Ação que articula e organiza iniciativas inovadoras em diferentes áreas, possibilitando aperfeiçoar resultados e assegurar cada vez mais uma vida melhor, com dignidade e direitos para as pessoas com deficiência. Ao lançar o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, o Estado brasileiro reafirma o compromisso irrenunciável de assegurar a todos e todas, sem qualquer discriminação, o direito ao desenvolvimento e à autonomia. A base dessa responsabilidade está na Constituição Federal de 1988 e foi ampliada com a ratificação pelo Brasil da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em 2008. Entretanto, a partir dos documentos legais expostos, a aplicabilidade ainda se torna fragilizada. Basta observar nas cidades brasileiras, por exemplo, quais calçadas estão realmente adaptadas aos portadores de necessidades especiais, ou quantas calçadas possuem guias-mestre para deficientes visuais, ou mesmo quantos restaurantes estão adaptados com menus em braile? Mesmo na segurança pública, quantos profissionais estão habilitados a atender portadores de necessidades especiais, como mudez ou surdez? COMUNIDADE LGBTT 19 Outro grupo vulnerável, carente de recursos estatais para a garantia de seus direitos, são os grupos intitulados LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais). Por se tratar de um país ainda arraigado em condições religiosas, este grupo possui grandes histórias de resistência, por parte da população em geral. Conforme o Programa de Combate à violência e à discriminação contra GLTB (assim aparece no site oficial da SEDH), desde o início da década de 1980, assistimos, no Brasil, a um fortalecimento da luta pelos direitos humanos de gays, lésbicas, travestis, e bissexuais (LGBTT). Associações e grupos ativistas se multiplicam pelo País. Atualmente, há cerca de 140 grupos espalhados por todo o território nacional. A força do ativismo vem se expressando em diferentes momentos e eventos comemorativos, como é o caso do Dia Mundial do Orgulho LGBTT, na qual se destaca a realização das Paradas do Orgulho LGBTT que mobilizam milhões de pessoas em todo o País. Esses eventos, especialmente, devem, com justiça, ser considerados como as mais extraordinárias manifestações políticas de massa desse início de milênio no Brasil. Atuando em áreas como a saúde, a educação e a justiça, os homossexuais brasileiros organizados têm enfrentado a histórica situação de discriminação e marginalização em que foram colocados no seio da sociedade brasileira. E, para além da luta pelo reconhecimento de seus legítimos direitos civis, sociais e políticos, sua atuação tem se desdobrado em um notável engajamento no enfrentamento de graves problemas de interesse público, sendo casos exemplares de sua mobilização em torno da luta contra o HIV/AIDS no País e do combate à violência urbana. Não há dúvida quanto ao fato dessa luta pela cidadania estar produzindo importantes frutos. A homossexualidade foi retirada da relação de doenças pelo Conselho Federal de Medicina em 1985 (vários anos antes de a OMS fazer o mesmo) e o Conselho Federal de Psicologia, por sua vez, determinou, em 1999, que nenhum profissional pode exercer “ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas. Em que pese a Constituição Federal de 1988 não contemplar a orientação sexual entre as formas de discriminação, diferentes constituições estaduais e legislações municipais vêm contemplando explicitamente esse tipo de discriminação. Atualmente, a proibição de discriminação por orientação sexual consta de três Constituições Estaduais (Mato Grosso, Sergipe e Pará), há legislação específica nesse sentido em mais cinco estados (RJ, SC, MG, SP, RS) e no Distrito Federal e mais de oitenta municípios brasileiros têm algum tipo de lei que contempla a 20 proteção dos direitos humanos de homossexuais e o combate à discriminação por orientação sexual. O poder judiciário brasileiro apresenta-se, nos últimos anos, como um outro setor em que se percebem avanços na defesa dos direitos sexuais no País. Em certos casos, como o da extensão dos benefícios de pensão por morte e auxílioreclusão aos casais homossexuais, determinado pelo INSS, em 2001, foram ações judiciais movidas por grupos de ativistas homossexuais que abriram caminho para mudanças legislativas. Em outros, foram abertos diversos precedentes jurisprudenciais importantes no sentido do reconhecimento do direito que os (as) homossexuais têm sobre a guarda dos filhos que criam em comum com seus companheiros ou companheiras. A violência letal contra homossexuais é, sem dúvida, uma das faces mais trágicas da discriminação por orientação sexual ou homofobia no Brasil. Com base em uma série de levantamentos feitos a partir de notícias sobre a violência contra homossexuais publicadas em jornais brasileiros, os dados divulgados pelo movimento homossexual são alarmantes, revelando que nos últimos anos centenas de gays, travestis e lésbicas foram assassinados no País. Muitos deles morreram exclusivamente pelo fato de ousarem manifestar publicamente sua orientação sexual e afetiva. Pesquisas publicadas por órgãos oficiais de defesa dos direitos destes grupos destaca-se grandes deficiências do aparato estatal para a investigação dos crimes ou proteção e defesa dos direitos deste grupo. Em muitos casos, agentes de segurança da justiça e de outros órgãos do Estado, a exemplo de grande parte de nossa sociedade, se mostram despreparados para lidar com a violência letal que atinge os homossexuais, o preconceito segue “vitimando” de diferentes formas, aqueles que se encontram nas prisões. PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA Comumente chamados de moradores de ruas, este grupo também pode ser considerado grupo vulnerável, uma vez que seus direitos estão em difícil garantia, bem como são fragilizados e hostilizados no quotidiano. Os cidadãos em situação de rua formam um grupo populacional heterogêneo constituído por pessoas que possuem em comum a garantia da sobrevivência por meio de atividades produtivas desenvolvidas nas ruas, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a não referência de moradia regular. 21 A população em situação de rua constitui um grupo caracterizado pela diversidade. São quatro os grupos de fatores que podem levar um individuo ou mesmo uma família a se encontrar numa “situação de rua”: Violência: casos, em grande parte, relativos à violência doméstica, em suas várias formas - psicológica, física, preconceitos. Drogas: casos de dependentes químicos ou dependentes de álcool que culminam na desagregação familiar. Desemprego: casos de incapacidade de gerar renda suficiente para garantir moradia. Problemas de Saúde: casos de sofrimento mental ou doenças socialmente discriminadas (deficiências físicas AIDS e a hanseníase). Já a ONU - Organização das Nações Unidas define dois conceitos relativos à pessoa em situação de rua: o desabrigado e o sem-teto. O desabrigado é um indivíduo que vive nas ruas por lhe faltar residência, devido a tragédias naturais, guerras, desemprego em massa, falta de renda, dentre outros. O sem-teto seria a pessoa - ou família - sem abrigo que sobrevêm à vida nas ruas. Eles carregam suas posses consigo, pernoitando nas ruas, nas entradas ou cais, ou em qualquer outro local, a partir de uma trajetória mais ou menos aleatória. Ao administrar conflitos envolvendo cidadãos em situação de rua, saiba que morar na rua não é crime, habitar uma rua, uma praça ou demais espaços públicos não constitui, por si só, um delito ou infração penal. A “mendicância” deixou de ser tipificada como contravenção penal a partir da Lei n° 11.983, de 16 de julho de 2009. Mas, se o cidadão estiver em local privado e lhe for solicitado que saia, o policial deve garantir o direito do proprietário. ABORDAGEM JURÍDICA PROTETIVA DOS GRUPOS VULNERÁVEIS SOB A ÓTICA DOS DIREITOS HUMANOS E DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS 1. LEGISLAÇÃO NACIONAL E INTERNACIONAL PROTETIVA DOS GRUPOS VULNERÁVEIS Atualmente a legislação nacional cresceu muito com relação à proteção e defesa dos direitos dos grupos vulneráveis. Por se tratar de constante evolução, o sistema de proteção destes direitos tem encontrado inúmeros reforços para a sua consolidação. Como exemplo temos: 1.2 NACIONAIS 22 Constituição Federal Plano Nacional de Direitos Humanos Estatuto da Criança e do adolescente Estatuto do Idoso Lei Maria da Penha Programa Brasil sem Homofobia Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDEC e Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil Legislações estaduais e municipais, ancoradas pela Constituição Federal. 1.3 INTERNACIONAIS Internacionalmente, podemos contar com os documentos assinados em tratados ou convenções dos quais o Brasil é signatário. Pelo artigo 5º da Constituição Federal, parágrafo 1º, no intuito de reforçar o vínculo impositivo das normas que traduzem direitos e garantias fundamentais, institui o princípio da aplicabilidade imediata dessas normas. E “este princípio ressalta a força normativa de todos os preceitos constitucionais referentes a direitos, liberdades e garantias fundamentais, prevendo um regime jurídico específico endereçado a esses direitos”. O princípio da aplicabilidade imediata objetiva assegurar a força dirigente e impositiva dos direitos e garantias fundamentais, prevê tornar tais direitos prerrogativas automaticamente aplicáveis pelos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo, ou seja, é de responsabilidade destes Poderes conferir eficácia máxima e imediata a todo preceito definidor de direitos e garantias fundamentais. Aqui os exemplos de alguns tratados e convenções que contemplam os direitos a serem garantidos aos grupos vulneráveis. A Carta das Nações Unidas Convenção sobre os Direitos da Criança Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher e a Comitê para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres Convenção sobre os Direitos das Crianças (CDC); Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras de Beijing) Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riad) Regras das Nações Unidas para a Proteção das Crianças e Adolescentes privados de sua Liberdade (RNUPCA Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio). DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos PIDESC – Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais PIDCP – Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. 23 Mesmo com a riqueza de documentos norteadores dos direitos dos grupos vulneráveis, percebe-se que a sua efetiva aplicação ainda encontra entraves. Percebe-se também que os documentos ainda abarcam, de forma superficial e subjetiva, os direitos dos idosos, da comunidade GLBTTT ou moradores de rua. A inclusão destes grupos aos considerados vulneráveis é recente, pelo fato tanto de os organismos nacionais quanto internacionais englobarem em seus tratados e convenções a necessidade de se contemplar os direitos e garantias a todos os seres humanos. ATUAÇÃO POLICIAL NO ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIAS ENVOLVENDO GRUPOS VULNERÁVEIS; 1. ATUAÇÃO POLICIAL NO ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIAS ENVOLVENDO GRUPOS VULNERÁVEIS Na atuação policial, é comum o profissional deparar com situações as quais sejam necessários alguns cuidados, tanto na abordagem, quanto identificação e eventual prisão. Com relação aos grupos vulneráveis, sejam em situações de crime ou de ruptura de seus direitos, algumas peculiaridades devem fazer parte da atuação policial, a fim de que os direitos destes grupos, sejam em qual lado do crime estiverem, estejam resguardados. Assim, o profissional poderá se deparar com inúmeras situações envolvendo grupos vulneráveis. Seja na condição de denunciante ou de suspeito, o interessante é sempre oferecer um tratamento diferenciado. Cita-se alguns tópicos extraídos da DPSSP 08 (Diretriz para a Produção de Serviços em Segurança Pública), em consonância com a Apostila do CTSP 2002 (Curso Técnico em Segurança Pública), da Polícia Militar de Minas Gerais, algumas orientações são importantíssimas para a garantia destes direitos. 1.2. CRIANÇAS E ADOLESCENTES O policial militar, em sua maioria de atendimentos, se depara com a situação de crianças e adolescentes vítimas da criminalidade ou da ruptura de seus direitos. É interessante ressaltar que a garantia dos direitos deste grupo está preconizada não somente no Estatuto da criança e do adolescente, como na Constituição Federal. Cuidados que o policial deve ter ao abordar ou auxiliar uma criança ou adolescente: 24 Pergunte ao menor se ele possui responsável legal, onde estes estão e quais as formas de contatá-los; Demonstre interesse em ajudar a vítima. Em muitos casos, a vítima não aceita sequer a ajuda policial, por estar muito fragilizada; Avalie o risco da vítima no ambiente da ocorrência, com vistas a priorizar seu atendimento; Tenha sempre em mãos os telefones dos órgãos de proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente, a fim de que sejam resguardados; Assegure-se de que o seu atendimento será priorizado, nos casos de vitimização, com atenção aos responsáveis pela secção destes direitos; Nos casos de cometimento de ato infracional Informar à autoridade judiciária e à família do infrator, ou a pessoa por ele indicada; Atenção à exposição da imagem do menor, pois sua imagem deve ser preservada; Não conduza o menor em compartimento destinado ao transporte de presos, salvo se esta situação for indispensável para a garantia da segurança da equipe policial; O uso de algemas também deve ser evitado. Não se pode, entretanto, deixar de atentar para a segurança da equipe; Assegure de que seus responsáveis serão acionados. Isso poderá garantir uma confiança estabelecida entre você e o infrator apreendido; Separe o infrator menor dos adultos, mesmo que tenham praticado os mesmos delitos; 1.3. MULHERES A mulher possui garantias adicionais durante a prisão: A sua prisão deve ser feita, sempre que possível, por uma policial ou pessoa do sexo feminino, devidamente orientada. As mulheres e suas vestimentas devem ser revistadas por uma policial (em todas as circunstâncias), exceto se retardar execução da ação policial ou houver prejuízos e riscos aos policiais presentes. Neste caso, é interessante contar ao menos com duas testemunhas, a fim de resguardar o serviço policial, devendo ainda constar em relatório os dados dos envolvidos e testemunhas. Ainda há a necessidade de que sejam mantidas separadas dos homens presos, sempre que possível. Também, à mulher detida asseguram-se procedimentos destinados a proteger seus direitos e sua condição especial (particularmente os de grávida e de lactante). Entre tais medidas, incluem-se instalações médicas especializadas e alojamento/cela separada. Na busca minuciosa, a policial feminina observará atentamente cabelos, seios e órgãos genitais, devido à possibilidade de conterem drogas e/ou outros objetos ilícitos, 25 1.4. PESSOAS COM DEFICIÊNCIA Cuidados que o policial deve ter ao abordar ou auxiliar uma pessoa deficiente: Pessoa que usa cadeira de rodas Não segure nem toque na cadeira de rodas. Ela é considerada como se fosse parte do corpo da pessoa. Apoiar-se ou encostar-se na cadeira é o mesmo que se apoiar-se ou encostar-se na pessoa Se desejar, ofereça ajuda, mas não insista. Se precisar de ajuda, ele (a) aceitará seu oferecimento e lhe dirá o que fazer. Não tenha receio de usar palavras como "caminho" ou "correr". As pessoas com deficiência também as usam; Se a conversa durar mais do que alguns minutos, sente-se, se possível, de modo que fique no mesmo nível do olhar do interlocutor. Para uma pessoa sentada, não é confortável ficar olhando para cima, durante um período relativamente longo; Ao ajudar uma pessoa com deficiência física a descer uma rampa inclinada ou degraus altos, é preferível usar a marcha à ré para evitar que, pela excessiva inclinação, a pessoa perca o equilíbrio e caia para frente; Nos casos de busca pessoal, certamente a busca deverá primar pela segurança da equipe. Não faça a busca pessoal se perceber que somente dois policiais poderão se tornar alvos fáceis de uma eventual ação criminosa; Caso o abordado esteja escondendo algo na cadeira de rodas, solicite ao mesmo que fique em posição de levantar, a fim de que um dos policiais, ou mesmo dois, o segure pelos braços até que a revista seja efetuada. Em nenhum momento o profissional deve zombar da situação ou expor o deficiente. Pessoa que usa muletas: Acompanhe o ritmo de sua marcha; Tome cuidados necessários para que ele (a) não tropece; Deixe as muletas sempre ao alcance das suas mãos; Pessoa com deficiência visual Ofereça sua ajuda, sempre que um (a) cego (a) parecer necessitar. Mas não ajude, sem que ele (a) concorde. Sempre pergunte, antes de agir. Se 26 você não souber em que e como ajudar, peça explicações de como fazêlo; Para guiar uma pessoa cega, segure-a pelo braço, de preferência no cotovelo ou no ombro. Não a pegue pelo braço. Além de perigoso, isso pode assustá-la. À medida que encontrar degraus, meios-fios e outros obstáculos, vá orientando-a. Em lugares muito estreitos para duas pessoas caminharem lado a lado, ponha seu braço para trás, de modo que a pessoa cega possa segui-lo. Ao sair de uma sala, informe-o ao cego (a), pois é desagradável para qualquer pessoa falar para o vazio. Não se preocupe ao usar palavras como "cego", "olhar" ou "ver": os (as) cegos (as) também as usam; Ao explicitar direções a uma pessoa cega, seja o mais claro e específico possível. Não se esqueça de indicar os obstáculos que existem no caminho que ela vai seguir. Como algumas pessoas cegas não têm memória visual, não se esqueça de indicar as distâncias em metros (p.ex.: "uns vinte metros para frente"). Ao guiar um (a) cego (a) para uma cadeira, guie sua mão para o encosto da cadeira e verifique se a cadeira tem braços ou não. Trate-a com o mesmo respeito com que trata uma pessoa que enxerga; Quando estiver em contato social ou trabalhando com pessoas com deficiência visual, não pense que a cegueira possa vir a ser problema. Por isso, nunca as exclua de participar plenamente nem procure minimizar tal participação. Quando se tratar de pessoa suspeita, deverão ser seguidos todos os procedimentos acima, e efetuada a busca pessoal, tomando-se cuidado de avisar ao suspeito que será procedida uma busca por outro policial, e que ele fique calmo. Pessoa com deficiência auditiva Fale claramente, distinguindo palavra por palavra, mas não exagere. Fale com velocidade normal, salvo quando lhe for pedido para falar mais devagar; Cuide para que o (a) surdo (a) enxergue sua boca. A leitura dos lábios fica impossível, se você gesticula segura alguma coisa na frente de seus próprios lábios, ou fica contra a luz; Fale com tom normal de voz, a não ser que lhe peçam para levantar a voz. Gritar nunca adianta; Seja expressivo. Como os surdos não podem ouvir as mudanças sutis do tom de sua voz, indicando sarcasmo ou seriedade, a maioria deles (as) lerá suas expressões faciais, seus gestos ou os movimentos de corpo, para entender o que você quer comunicar; Se você quer falar com uma pessoa surda, chame a atenção dela, sinalizando com a mão ou tocando em seu braço. Enquanto estiverem conversando, mantenha contato visual. Se você olhar para outro lado, enquanto está conversando, o (a) surdo (a) pode pensar que a conversa terminou; 27 Se você tiver dificuldades para entender o que uma pessoa surda está falando, sinta-se à vontade para pedir que ela repita o que falou. Se você ainda não entender, peça-lhe para escrever. O que interessa é comunicar-se com a pessoa surda. O método não é o que importa; Se o (a) surdo (a) está acompanhado (a) por um intérprete, fale diretamente à pessoa surda, não ao intérprete; Quando se tratar de pessoa suspeita, deverão ser seguidos todos os procedimentos padronizonados e efetuada a busca pessoal. Neste caso, a pessoa abordada deverá ser mantida em calma, para que a ação policial não seja entendida de forma errada, seja para mais ou para menos. Pessoa com paralisia cerebral A pessoa com paralisia cerebral anda com dificuldade ou não anda, podendo ter problemas de fala. Seus movimentos podem ser estranhos ou descontrolados. Ela pode, involuntariamente, apresentar gestos faciais incomuns, sob a forma de caretas. Geralmente, porém, trata-se de pessoa inteligente e sempre muito sensível – ela sabe e compreende que não é como os outros; Para ajudá-la, não a trate bruscamente. Adapte-se a seu ritmo. Se não compreende o que ela diz, peça-lhe que repita: ELA O COMPREENDERÁ. Não se deixe impressionar por seu aspecto. Aja de forma natural e sorria. Ela é uma pessoa como você, porém, com necessidades especiais. 1.5. IDOSOS Na atuação do policial em relação à pessoa idosa, ele, sempre que possível, tomará os seguintes cuidados: Em uma delegacia, deverá ser convidado a assentar-se. Também será ótimo oferecer-lhe um cafezinho e água. Com isso, o policial estabelecerá clima de confiança e respeito; Se o idoso for suspeito, o policial deve respeitar sua idade e condições de saúde, e manter com ele prévia conversa sobre o ato cometido, para que ele comece a refletir sobre as consequências e esteja preparado para assumi-las, resguardados os aspectos de segurança do policial; Será esclarecida ao idoso a ajuda jurídica que ele receberá do Estado, com outras informações acerca do trâmite da investigação ou processo; O idoso, sempre que possível, será acompanhado por algum membro familiar; O policial deverá evitar agressão verbal ou física aos familiares do idoso, vítima de crime, para não causar-lhe problemas sérios ou até complicações à saúde. 1.6. COMUNIDADE LGBTT 28 O cidadão homossexual ordeiro deve ser tratado de forma respeitosa, sem gracejos nem críticas, pelos policiais que o abordam ou são acionados por ele, em situação de vítima da criminalidade e abuso de poder. Algumas orientações são importantes, como: Se o cidadão homossexual teve um direito seu desrespeitado como vítima de crimes diversos, o policial que por ele for procurado deve tratá-lo com respeito, sem constrangê-lo, ainda mais, com gracejos ou descrédito de seus apelos; Ao suspeitar de homossexual masculino, o policial deverá, da maneira menos constrangedora possível, proceder à revista evitando apertar-lhe os “seios”, se este os tiver, podendo realizar uma vistoria entre os mamilos como é procedida em mulher; no restante do corpo a busca se procede normalmente; Ao detectar homossexual feminino (lésbica), travesti ou transexual, evitar o constrangedor preconceito social, exemplo: ao ler o nome de registro na Carteira de Identidade, não o fazer em voz alta a outros policiais nem ao público presente, com zombaria; É interessante perguntar ao abordado, já que os documentos estão em mãos, por qual nome se deseja ser chamado. Não é demérito ao policial militar chamar o abordado pelo nome que quiser. Não cabe ao policial externar o que pensa, com posições pessoais, religiosas e morais sobre a homossexualidade, e sim advertir, orientar e cumprir aquilo que por lei lhe for exigido, aplicando assim os devidos procedimentos; O policial não deve coibir manifestações de afeto entre homossexuais (mãos dadas, beijo na boca, abraços, entre outros), em logradouro público, estabelecimento público ou estabelecimento aberto ao público (se solicitado a coibir, deve orientar o solicitante que a manifestação de afeto não é crime, mas sua coibição, sim; sexo explícito é diferente de manifestação de afeto; no primeiro caso, é necessária a providência policial). 1.7. PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA Aborde com segurança: Fique atento à segurança da equipe, calcule a quantidade de abordados para uma atuação segura. Na vistoria do local, primeiramente, afaste o abordado dos materiais ali existentes (papelões, colchões, cobertores e etc). Preserve sua saúde! Na busca pessoal, aconselha-se o uso de luvas descartáveis para o contato com o abordado, visando preservar a saúde do policial. Seja cauteloso com os pertences do abordado. Quando fizer a verificação nos pertences, seja cuidadoso, lembre-se que estes objetos têm grande importância para aquela pessoa. Oriente o abordado sobre abrigos. Informe ao cidadão sobre a existência de abrigos ou albergues que podem acolhê-lo de forma segura. Esclareça que ele não é obrigado a aceitar o convite, mas que as instituições estão abertas para acolhê-lo. 29 Considerações Finais Quando o assunto é Direitos Humanos, toda a classe de policiais inicia um debate em torno, principalmente, da proteção ao criminoso, ao marginal, ao meliante, ao “bandido”. Muitas vezes esquecem-se da formação dos Direitos Humanos e seu real sentido. E a deturpação deste conceito implica nas cenas comumente estampadas nos jornais e mídia televisiva, colocando o profissional encarregado pela aplicação da lei em destaque como o primeiro a extirpar esse direito. É evidente que o desrespeito aos Direitos Humanos implica, necessariamente, em quebra do que está escrito na Constituição Federal. Entretanto, muitos profissionais ligados à Segurança Pública insistem em banalizar, esquecer ou mesmo deixar em segundo plano o tema Direitos Humanos. Mas por outro lado, é interessante salientar que a promoção dos Direitos Humanos, por parte dos policiais, não é somente uma questão legal, mas cidadã. E atender aos grupos vulneráveis está diretamente ligado ao atendimento dos que mais comumente possuem seus direitos negados. Assim, é interessante ter, o policial militar, uma série de recursos disponíveis para a execução de medidas que visem a minimizar os efeitos lesivos da prática recorrente do desrespeito aos direitos destes grupos. E como cidadão, o policial militar deve procurar desempenhar um papel junto á comunidade que vive, como forma de se integrar á sociedade, contribuindo para a promulgação dos direitos inerentes à condição humana. 30 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALESTRERI, Ricardo Brisolla. Direitos Humanos: coisa de polícia. Passo Fundo: CAPEC, 1998. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 27.ed. São Paulo: Saraiva, 2001. BOBBIO. Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. BRETAS Marcos Luiz. Observações sobre a falência dos modelos policiais. São Paulo: Tempo Social, Rev. Social. USP. 9 (l) 79-94, 1997. CARDIA Nancy. O medo da polícia e as graves violações dos direitos humanos. São Paulo: Tempo Social, Rev. Social, USP, 9 (l) 249-265, 1997. COMPARATO Fábio K. Fundamentos dos Direitos Humanos: NET, seção Direitos Humanos – Textos e reflexões. Disponível em http://www.dhnet.org.br acesso em Nov2003. DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. 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Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/politica_promocao.pdf 31 Programa Viver sem limite. Acessado pelo site da SDH/PR. Disponível em http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/viver-sem-limite-0 Apostilas e materiais diversos: Apostila de Direitos Humanos – Curso de Formação de Oficiais/CFO 3. Organização: Gleidison Antônio de Carvalho – 1º Ten QOPM. Palmas-TO 2003. Apostilas do II Curso Avançado de Direitos Humanos – Ministério da Justiça. Brasília-DF:2009 Apostila de Direitos Humanos do Curso Técnico de Segurança Pública – CTSP 2002, ministrado pela Polícia Militar de Minas Gerais. Cartilha de Atuação policial na proteção dos direitos humanos de pessoas em situação de vulnerabilidade, oferecida pela SENASP/Ministério da Justiça, disponível em: http://portal.mj.gov.br/services/DocumentManagement/FileDownload.EZTSvc.asp?D ocumentID={040118A8-0A42-4273-A190DD5ED66A2DFC}&ServiceInstUID={B78EA6CB-3FB8-4814-AEF6-31787003C745} 32