Peixes boi bioacústica e barcos

Transcrição

Peixes boi bioacústica e barcos
Peixes Boi, Bioacústica e Barcos
Testes de audição, medidas ambientais e fenômenos acústicos juntos podem explicar
porque os barcos e animais colidem
Edmund R. Gerstein
São 2 horas da manhã e, adivinhe,
Stormy está "namorando" aquele
grande transdutor da Marinha
novamente. Agora preciso entrar na
água fria e afastá-lo para que
possamos nos preparar para a sessão
do Dundee. Oh, a alegria de
trabalhar com os peixes boi sob o
luar de Tampa! Mesmo estando
cansado, com frio e molhado, antes
do sol nascer teremos medido outro
aspecto crítico das capacidades
auditivas do peixe boi da Flórida.
Durante os próximos sete anos de
longos testes auditivos noturnos –
mais de 30.000 testes de limites no
total – minha esposa Laura e eu
teremos medido a capacidade de
dois peixes boi adolescentes para
ouvir, localizar e discriminar
diferentes sinais subaquáticos em
diversas
condições
acústicas
controladas. No final, teremos
estabelecido o trabalho básico para
uma explicação sensorial porque os
peixes boi sofrem repetidas colisões
com barcos.
Edmund R. Gerstein é diretor de
pesquisa e comportamento de mamíferos
marinhos no Charles E. Schmidt College
of Science na Universidade do Atlântico
na Flórida. Na Universidade do
Atlântico, onde recebeu seu Ph.D. em
psicologia, ele também detém os cargos
de professor assistente de pesquisa de
psicologia e conferencista de biologia.
Seus interesses de pesquisa estão na
biologia sensorial, cognição e ecologia
comportamental dos mamíferos
marinhos. Ele é vice-presidente da
Leviathan Legacy Inc., um grupo de
pesquisa de comportamento animal e
acústica subaquática, atualmente
investigando a acústica ao redor de
colisões de navios com as baleias
francas do Atlântico Norte. As pesquisas
de Gerstein sobre a psicoacústica do
peixe boi e acústica subaquática foi
financiada pelo Programa Legacy da
Marinha. Endereço: Leviathan Legacy
Inc., 1318 SW 14th Street, Boca Raton,
FL 33486. Internet: [email protected].
O peixe boi ameaçado da Flórida,
uma subespécie do peixe boi das
Índias
Ocidentais
(Trichechus
manatus), é um herbívoro gentil, com
bigodes, que pode chegar a 4 metros
de comprimento, pesar até 1.300
quilogramas e viver mais de 60 anos.
Designado como o mamífero marinho
oficial da Flórida, o peixe boi tem
sido o foco de mais controvérsia e
polarização sobre a conservação e
preservação do que talvez, qualquer
outro mamífero. "Vacas marinhas"
como às vezes são chamados
afetuosamente, habitam os habitats
rasos costeiros, de estuário e rios em
toda a península da Flórida, onde se
alimentam de algas marinhas e são
rotineiramente feridos pelos barcos de
lazer, barcaças e navios comerciais.
Estas colisões são tão prevalecentes
que a maioria dos peixes boi
selvagens são identificados por suas
cicatrizes
características
dos
ferimentos devidos aos barcos.
Depois de mais de duas décadas de
políticas de proteção do peixe boi
focalizando a redução da velocidade
dos barcos passando através dos
habitats do peixe boi, o número de
ferimentos e mortes associados com
as colisões tem aumentado e chegado
a recordes históricos durante os
últimos dois anos. Para ajudar a
acompanhar a população, a Flórida e
as agências federais da vida selvagem
mantêm um catálogo crescente de
cicatrizes de indivíduos vivos
reconhecidos que sobreviveram as
colisões. Alguns destes peixes bois
possuem ferimentos de hélices de até
16 colisões diferentes de barcos. Por
quê isto acontece?
Quando surpreendidos ou assustados,
os peixes boi explodem com um surto
de energia e podem chegar a
velocidades de natação de até 6,4
metros por segundo em um instante.
Meus colegas e eu pensamos: já que
os peixes boi possuem a capacidade
cognitiva para reconhecer o perigo,
uma reação de medo-fuga e a
capacidade física para evadir os
barcos, por quê, depois que um
indivíduo sofreu uma, duas ou três
colisões, ele não aprende a evitar os
barcos? Será que eles podem ouvir
os barcos se aproximando, e se
podem, a que distância, em qual
direção e em quais condições
acústicas?
As questões básicas sugeriram
diversas
investigações
interdisciplinares de comportamento
e acústica que eu realizei durante a
última década com Joseph E. Blue,
diretor aposentado do Centro de
Guerra Submarina da Marinha e do
Destacamento de Referência de Som
Subaquático do Laboratório de
Pesquisa Naval e agora presidente da
Leviathan Legacy, Inc.; Steven E.
Forsythe do Centro de Guerra
Submarina da Marinha; e Laura.
Ninguém havia realizado estudos de
psicoacústica
(audiometria)
controlados, rigorosos, subaquáticos,
que são necessários para entender
quais sons os peixes boi podem ouvir
no seu meio ambiente. Em conjunto
com os estudos audiométricos,
realizamos uma série compreensiva
de pesquisas acústicas subaquáticas
de diversos habitats de peixes boi
selvagens, junto com medições de
propagação crítica de propagação de
ruídos de barcos, para entender
melhor porque os animais são tão
vulneráveis às colisões. Definir e
aplicar a física da propagação
acústica perto da superfície também
é necessário se as colisões entre os
barcos e animais devem ser
reduzidas, não somente nas vias
aquáticas da Flórida mas também no
mar aberto, onde as grandes baleias
são feridas regularmente e muitas
vezes mortas pelos grandes navios.
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Figura 1. Barcos e peixes boi: Podem coexistir? Conforme mostrado pelos gráficos, as mortes relatadas dos mamíferos marinhos atribuídas a colisões
de embarcações aumentaram de 1976 até 2001; embora zonas de baixa velocidade tenham estado em vigor durante duas décadas, as colisões, que
provocam uma proporção significativa de todas as mortes relatadas de peixes boi na Flórida durante este período (gráfico de torta) estão aumentado.
A pesquisa do autor sobre a audição do peixe boi, ruído ambiental e a acústica da propagação do ruídos dos barcos perto da superfície da água sugere
que nas águas turvas típicas das vias aquáticas da Flórida, os peixes boi possuem dificuldades para ouvir e localizar os barcos que reduziram a
velocidade em reposta aos regulamentos com a intenção de proteger os animais. Um dispositivo de alerta de alta freqüência projetado para alerta os
peixes boi sobre os barcos que se aproximam está sendo desenvolvido (dados da Comissão de Conservação de Peixes e Vida Selvagem da Flórida).
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sobre o peixe boi. Ademais, os efeitos
da camada limite perto da superfície
podem cancelar ou atenuar severamente
o som dominante de baixa freqüência
produzido pelos hélices. Em muitas
situações, o ruído do navio não é
projetado nos caminhos direcionais
onde ouvir estes sons pode ajudar os
animais a evitar colisões. Os resultados
de nossa pesquisa básica e aplicada
sugerem que pode haver uma solução
tecnológica para tratar da causa básica
dos problemas de colisão e resolver o
conflito entre os interesses humanos e
animais.
Teste de Audição do Peixe Boi
Figura 2. O audiograma de comportamento lota a sensibilidade auditiva dos peixes boi treinados
em condições muito silenciosas. Em testes realizados no Zoológico de Lowry Park em Tampa,
Flórida, cada peixe boi foi treinado para posicionar sua cabeça em um arco subaquático, onde
um hidrofone monitorava todos os níveis de som nos ouvidos do peixe boi. O peixe boi ficava no
arco e ouvia. Depois de piscar uma luz estroboscópica, o peixe boi saía do arco e empurrava a
haste de "tom" (haste listrada à esquerda) se tivesse ouvido um som, ou a haste de "sem tom" à
direita se não tivesse ouvido nenhum som. Um pesquisador operava o equipamento de teste e
registrava os resultados em um laboratório subaquático; o segundo pesquisador servia como o
treinador, orientando o animal para começar cada teste e oferecendo recompensas e
encorajamento para continuar.
Os resultados dos nossos testes
contradizem diversas crenças de longo
tempo que formam a base das
estratégias atuais de proteção. Os
peixes boi possuem boa capacidade
auditiva em altas freqüências,
entretanto, possuem uma sensibilidade
relativamente baixa nas faixas de
baixa freqüência associadas com o
ruído dos barcos.
Ironicamente, os peixes boi podem
ser menos capazes de ouvir os
hélices dos barcos que reduziram a
velocidade
atendendo
aos
regulamentos de velocidade dos
barcos com a intenção de reduzir as
colisões. Tais ruídos muitas vezes
falham em se elevar acima do sons
ambientais do habitat dos peixes boi
antes que o barco fique literalmente
Em 1991, iniciamos experimentos com
dois peixes boi nascidos no cativeiro,
Stormy e Dundee, no Zoológico de
Lowry Park em Tampa. Nosso primeiro
objetivo foi definir um audiograma –
isto é, mapear as capacidades de
audição absolutas destes animais em
condições muito silenciosas. O
audiograma ou curva de audição, é um
gráfico que demonstra a faixa geral de
freqüências que um indivíduo pode
ouvir, bem como a sensibilidade do
sujeito dentro desta faixa. Um
audiograma plota a intensidade de um
sinal no seu limite mínimo de detecção.
O gráfico resultante para a maioria dos
mamíferos tem formato de U, com os
limites
inferiores
mostrando
a
sensibilidade maior. Os limites
superiores
(áreas
de
menos
sensibilidade) são encontrados nas
Figura 3. Os resultados dos testes descritos na Figura 2 foram
consistentes de um peixe boi para outro e produziram a curva de
audiograma apresentada em uma escala logarítmica à esquerda em azul.
Os limites de audição do peixe boi em cada freqüência são medidos em
decibéis contra uma pressão de som de referência de 1 micropascal, o
padrão subaquático. A melhor sensibilidade do animal nas condições de
ambiente silencioso da piscina de teste foi de 16.000 a 18.000 hertz.
Abaixo de 1.000 hertz eles exigiam sons muito mais altos para poder
ouvir. Muitas pessoas assumiram que como as pessoas podem ouvir os
sons de barcos sob a água, certamente os peixes boi também podem.
Entretanto, as pessoas ouvem sons de baixa freqüência muito melhor
que os peixes boi, tanto sob a água como no ar (escala linear, acima).
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Figura 4. Stormy e Dundee (embaixo à esquerda) foram os primeiros peixes boi a serem treinados como sujeitos de um teste psicoacústico: eles
exigiram encorajamento constante do autor, seu treinador (acima à esquerda), mas demonstraram ser sujeitos excelentes. A pesquisa utilizou um
paradigma de duas escolhas onde as hastes podiam ser distinguidas por características visuais e táteis; uma era lisa e com listras brancas e pretas
(acima à direita), a outra era toda branca e com textura áspera com uma seção de tubo cruzado perto do fundo. Os peixes boi normalmente eram
alimentados com alface romana durante todo o dia no zoológico (embaixo à direita), mas recebiam biscoitos de animal e outras delícias como
encorajamento durante suas sessões noturnas de treinamento (Fotografias por Nick Caloyianis).
extremidades inferior e superior da
faixa de freqüência, onde é necessária
uma maior intensidade ou volume para
atingir os limites de detecção.
Antes de começar a testar a audição
dos peixes boi e fazer medições
acústicas dos seus habitats e do ruído
dos barcos, a maioria dos biologistas e
administradores da vida selvagem
encarregados da proteção dos peixes
boi assumiram que os animais
poderiam ouvir facilmente os sons dos
barcos e simplesmente eram muito
lentos ou não eram suficientemente
inteligentes para aprender a evitar as
embarcações.
As
medições
eletrofisiológicas antigas realizadas
por Ted Bullock, Tom O'Shea e John
McClune em 1982 e medições
anatômicas dos peixes boi mortos
reportadas em 1992 por Darlene
Ketten, Dan Odell e Darryl Domning
haviam sugerido que os peixes boi
ouviam melhor em baixas freqüências,
e portanto, podiam detectar os sons
dos barcos imediatamente. Entretanto,
como a audição é um fenômeno de
percepção, a forma mais comum de
descobrir o que um animal realmente
pode ouvir é perguntar. Portanto o
audiograma
comportamental
é
reconhecido com a medição definitiva
da audição.
Estes testes exigiam tremendos
compromissos de tempo, paciência e
recursos. Talvez o maior desafio seja
treinar os peixes boi para entender a
tarefa e depois manter cada um deles
suficientemente motivado durante as
sessões para que eventualmente
possam completar os milhares de
testes necessários para definir sua
audição. Levou aproximadamente um
ano para preparar ambos animais para
o teste – e milhares de biscoitos de
animais, junto com uma grande dose
de imaginação e sorte, para mantê-los
interessados
durante
os
anos
subseqüentes de testes. As demandas
do treinamento durante o dia e os
testes durante a noite exigiram que
Laura e eu literalmente morássemos
no zoológico. Além de novos
descobrimentos
e
descobertas
científicas significativas, o resultado
mais extraordinário de todos foi que
após mais de cinco anos morando em
um reboque de 19 pés, sem um
banheiro em funcionamento, atrás do
zoológico, ainda estamos casados.
Sendo os primeiros a treinar peixes
boi para testes psicoacústicos, não
conhecíamos sua acuidade visual
geral, nem sabíamos em qual
modalidade ou qual combinação
ponderada de modalidades os peixes
bois confiam mais. Portanto, eu
construí o teste de audição usando um
paradigma forçado de duas escolhas
com duas hastes de resposta que eram
diferentes visual e taticamente - uma
era lisa e com um padrão de listras
brancas e pretas, a outra era toda
branca e com textura áspera com uma
ponta de formato diferente feita de
uma seção de tubos cruzados. Ambos
peixes boi foram treinados para se
posicionar dentro de uma estação de
audição (um arco) onde um
microfone subaquático, ou hidrofone,
registrava os sinais enviados para
eles. Deviam ficar no arco, escutar e
esperar uma luz estroboscópica
piscar. Depois que a luz piscava, eles
podiam sair do arco e selecionar a
haste listrada se tivessem ouvido um
som ("sim") ou a haste toda branca se
não tivessem detectado um som
("não"). Estes testes foram repetidos
para muitos tipos diferentes de sons,
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incluindo som de barco, contra
diversos níveis de som típicos das
condições do ambiente selvagem.
Usamos um método de elevação
convencional de apresentações de
sinal duplo cego, começando com
níveis acústicos muito altos (onde o
peixe boi podia escolher a haste de
"tom"), descendo para a amplitude de
sinal onde o animal escolhia a haste
"sem tom" e depois aumentando
novamente para cima. Foram exigidos
centenas de testes para estabelecer o
limite para cada ponto de freqüência
ao longo da curva. Os audiogramas
resultantes para os dois peixes boi
foram muito similares.
Stormy e Dundee demonstraram ser
excelentes sujeitos de teste. Sua
audição também pode ser melhor do
que a maioria dos peixes boi, já que
são animais jovens, nascidos em
cativeiro que passaram suas vidas em
ambiente relativamente silenciosos
com um mínimo de risco de danos
auditivos devido à exposição contínua
a níveis elevados de ruídos. Os níveis
de ruído ambiente no cativeiro são
significativamente mais silenciosos
que os registrados na vida selvagem.
Ademais, estes indivíduos estavam
muito motivados e condicionados para
ouvir as mais leves variações no
campo de som. Não podemos esperar
que os peixes boi selvagens estejam
tão focalizados e atentos a nuances
acústicas tão tênues quanto nosso
sujeitos que foram especificamente
treinados para fazer isto. É provável,
portanto, que as capacidades auditivas
exibidas por Stormy e Dundee sejam
mais apuradas que aquelas da
população em geral.
Conforme ilustrado pelo audiograma
(Figura 3), os peixes boi possuem uma
faixa de audição funcional de 400 a
46.000
hertz.
Seu
pico
de
sensibilidade fica normalmente entre
16.000 e 18.000 hertz, e não entre
1.000 e 5.000 hertz conforme se
pensava anteriormente. Abaixo de
16.000 hertz, a sensibilidade diminui
aproximadamente 10 decibéis por
oitava, e abaixo de 2.000 hertz, cai
subitamente (20 decibéis por oitava)
até que a audição funcional acaba em
400 hertz. Infelizmente, os sons
dominantes produzidos pela maioria
dos barcos e navios são abaixo de
1.000 hertz; estas baixas freqüências
ficam fora ou sobrepõem o limite
inferior da faixa auditiva dos peixes
boi. O audiograma sugere que mesmo
em condições silenciosas, os peixes
boi podem ter dificuldade em detectar
estes sons em níveis acústicos de
menos de 90 ou 100 decibéis (todos os
sons subaquáticos foram fornecidos
contra uma pressão padrão de
referência
subaquática
de
1
micropascal).
Figura 5. Após medir a audição dos peixes boi
em condições de silêncio, o autor e seus
colegas usaram amostras de sons retiradas dos
habitats dos peixes boi para determinar as
relações críticas de sinal para ruído dos peixes
boi. Estes testes mediram o aumento de
volume, ou altura do sinal, necessário para o
peixe boi ouvir sons acima do ruído ambiente.
Conforme indicado pelas amostras de som
acima, os peixes boi vivem em ambientes onde
os sons ambientais são normalmente 70
decibéis ou mais nas freqüências mais baixas e
podem chegar a 90 decibéis através das
freqüências durante uma chuva leve.
Vivendo em um Mundo de Som
Embora o audiograma forneça uma
medida definitiva da audição nas
condições mais silenciosas, os peixes
boi não vivem em ambientes
silenciosos. Na Flórida, o ruído
ambiente nos habitats dos peixes boi
varia tipicamente de 60 a 90 decibéis,
em uma faixa de freqüência de 1 a
20.000 hertz, mas os níveis podem
chegar a 130 decibéis durante chuva
pesada ou em áreas industriais.
Um
fenômeno
de
percepção
conhecido
como
mascaramento
acontece quando a audibilidade de um
som (o “sinal”) é pela presença ou
ocorrência de outro som (o “ruído”).
Quando começamos nosso trabalho,
sabíamos que o ruído ambiente nos
habitats dos peixes boi podia
conceitualmente mascarar a percepção
de muitos tipos de sinais. Os peixes
boi são imersos em uma paisagem
acústica dinâmica cheia com uma
cacofonia de sons, os sons biológicos
mais proeminentes são o estalido
contínuo de milhões de camarões.
Sendo ouvintes passivos – diferente
dos golfinhos eco localizadores que
podem usar o sonar ativo para
navegar e detectar objetos no meio
ambiente – os peixes boi ficam
restritos a ouvir a sua paisagem
auditória. Queríamos entender como
o ruído afeta a capacidade dos peixes
boi para ouvir os sons biologicamente
importantes, os eventos do meio
ambiente e os sons dos barcos se
aproximando. Com esta finalidade
realizamos uma série de investigações
psicoacústicas usando tons puros,
sons complexos e amostras de ruído
típico de barcos e vocalizações de
peixes boi. Estes testes mediram os
limites mascarados e relações críticas
de sinal para ruído ao longo das curva
de audição do peixe boi contra um
ambiente de ruído contínuo.
A relação crítica compara a
intensidade de um sinal no momento
quando começa a ser detectável (o
limite mascarado) com a intensidade
do ruído ambiente. Por exemplo, se
um peixe boi pode ouvir um som em
particular acima de 70 decibéis de
ruído ambiente quando o sinal chega
a 90 decibéis, então a relação crítica é
20 decibéis; como os decibéis são
uma expressão logarítmica, a relação
pode ser derivada subtraindo um nível
de som do outro. Deve ser observado
que as relações críticas são
conservadas para cada freqüência
independente do aumento dos níveis
de som ambiente, assim se o ruído
ambiente aumentar para 100 decibéis,
então o sinal deveria ser pelo menos
120 decibéis antes que o peixe boi
pudesse detectar o mesmo. O
tamanho da relação crítica tem uma
significância ecológica importante, já
que os níveis ambientais elevados
podem notadamente elevar os limites
de detecção acima da energia acústica
absoluta emitida por muitos barcos.
Realizamos testes auditivos que
usaram diversos níveis de ruído
representativos de condições típicas
de
meio
ambiente
selvagem.
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Testamos tons puros pulsantes e
contínuos e ruído de banda larga
como o produzido pelos barcos. Os
estudos
de
mascaramento
mostraram que os peixes boi
possuem relações críticas que
variam de 9 decibéis acima do ruído
ambiente prevalecente para ruído
pulsante de banda larga até 46
decibéis para tons contínuos. Os
peixes
boi
detectaram
sons
pulsantes repetitivos em relações
críticas significativamente mais
baixas que os sons de onda
contínua. Isto não foi um resultado
inesperado, já que os sons
biológicos e, em especial, as
próprias vocalizações dos peixes boi
de 200 a 500 milisegundos, são sons
pulsantes. Os sinais pulsantes
fornecem uma largura adicional de
sinal bem como padrões temporais
que os peixes boi podem detectar
em um ambiente não periódico.
Encontrando a Fonte de Som
Além de simplesmente detectar sons,
os peixes boi devem ser capazes de
localizar os mesmos. Para os peixes
boi, bem como para os outros
animais, a capacidade de localizar
sons é crítica para sua sobrevivência.
Infelizmente, os sons de baixa
freqüência de muitos barcos são
onidirecionais e portanto, por sua
natureza, difíceis de localizar. Antes
dos nossos estudos, as autoridades
de vida selvagem confiavam em
premissas anedóticas que os peixes
boi podiam ver e localizar
imediatamente os sons de barcos se
movimentando lentamente.
Os objetivos das investigações de
localização
foram
medir
as
capacidades de percepção dos peixes
boi para localizar fontes de som
como uma função da freqüência de
sinal, espectro do som, duração,
ângulo de projeção e posição à
esquerda ou direita da cabeça do
animal. Para conseguir isto, foi
usado um paradigma egocêntrico ou
de orientação, que exigia que o
sujeito localizasse a fonte de som
fisicamente
no
espaço.
Os
paradigmas egocêntricos
Figura 6. As vocalizações dos peixes boi são tipicamente sinais curtos, discretos, repetitivos de
banda larga com bandas harmônicas que atravessam diversas bandas críticas diferentes. Os
peixes boi são capazes de ouvir e localizar estas chamadas em níveis de som abaixo do som
ambiente. Infelizmente, não podem ouvir ou localizar o som de banda larga de baixa freqüência
dos barcos em baixa velocidade em distâncias seguras contra o ruído do meio ambiente
selvagem. O autor desenvolveu sons direcionais que os peixes boi podem ouvir e localizar tão
bem quando suas próprias vocalizações.
tradicionalmente têm confiado no
sujeito
realizando
um
simples
movimento da cabeça ou do corpo para
indicar uma orientação. Para este teste,
os peixes boi foram exigidos a nadar até
e tocar a fonte real do som. O teste
exigiu que os sujeitos localizassem a
fonte do som em ambigüidade em
relação a sua própria posição no espaço.
Enquanto um paradigma otocêntrico
(centrado no ouvido) tal como o ângulo
audível mínimo é considerado uma
medida mais precisa da localização do
som, foi projetado para medir a
capacidade de um sujeito para
reconhecer um desvio da localização do
som em relação a uma referência de
amostra arbitrária.
No mundo real os peixes boi devem
reagir se orientando na direção de ou
se afastando do som. Embora existam
diferenças
de
procedimento
significativas entre as abordagens
egocêntrica e otocêntrica, as medidas
de localização de som usando
variações de ambos métodos têm
resultado
em
medidas
extraordinariamente consistentes de
localização de som em animais (Brown
1994).
Para realizar todos os testes
direcionais, revestimos a piscina com
painéis de espuma de célula aberta
absorvente de som para amortecer os
reflexos da superfície, dos lados e do
fundo. Os sujeitos
Figura 7. Na Instalação de Teste de Motores de Popa em Stuart, Flórida, o autor e seus colegas
amostraram o som de diversos barcos pequenos em baixa e alta velocidade, colocando um
hidrofone sob a água para registrar o som de um barco se aproximando em um habitat típico de
peixe boi. Os resultados de uma comparação são mostrados na figura 8 (fotografia cortesia do
autor).
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foram treinados para se posicionar
dentro de um arco estacionário
rodeado
por
alto
falantes
subaquáticos. Foram treinados para
sair
do
arco
estacionário
imediatamente ao ouvir um som a
empurrar o alto falante que projetou
o som. Os alto falantes eram
acionados eletronicamente e girados
periodicamente de modo que os
peixes boi não podiam se orientar
por nenhum artefato de alto falante.
A localização era significativamente
maior nas freqüências mais altas em
todas as condições. Quando os sinais
duravam mais de 200 milisegundos,
as
localizações
melhoravam,
conforme os peixes boi tinham a
oportunidade de fazer um leve
movimento da cabeça para rastrear o
campo de som. Os peixes boi
possuem
vértebras
cervicais
fundidas,
que
restringem
os
movimentos rápidos, agudos e
angulares da cabeça; esta mobilidade
limitada sugere que podem exigir
tempos de reação relativamente mais
longos (comparado com outros
mamíferos marinhos) para rastrear e
amostrar o meio ambiente. Ambos
peixes boi foram testados suando
sons do mundo real – vocalizações
de peixes boi e ruído de barcos, bem
como sinais de banda estreita
derivados de nossas análises de
ondas de vocalizações selecionadas
de peixes boi.
A reprodução destas ondas revelou
características
salientes
das
vocalizações dos peixes boi que são
detectáveis abaixo dos níveis
ambiente. Os sinais de “projeto”
derivados das bandas de freqüência
harmônica mais elevada nas
vocalizações dos peixes boi são
altamente direcionais e facilmente
detectados pelos peixes boi contra a
mais competitiva das condições
acústicas. Quando fica aparente que
os peixes boi podem não ser capazes
de
detectar
ou
localizar
confiavelmente os sons dos barcos,
exploramos os sons que os peixes
boi
podiam
ouvir
melhor.
Esperávamos que estas informações
poderiam ser aplicadas em algum
estágio para ajudar os peixes
boi a detectar e localizar os barcos se
aproximando
(ver
“Procurando
Soluções”, abaixo). Stormy e Dundee
ouviram e localizaram estes sinais
com
a
mesma
precisão
de
sensibilidade como haviam detectado
as vocalizações de peixes boi.
Os
peixes
boi
demonstraram
capacidades de localização simétrica,
significando que sua acuidade
auditiva era equivalente para os lados
esquerdo e direito. As localizações de
som foram relativamente fracas em
freqüências abaixo de 2.000 hertz mas
melhoraram significativamente com
freqüências mais altas. A melhor
sensibilidade direcional foi nas
freqüências acima de 10.000 hertz. As
vocalizações dos peixes boi e os sinais
de onda projetados foram localizados
corretamente 90 por cento do tempo,
enquanto que os sons dos barcos com
baixa velocidade foram localizados
corretamente somente 55 por cento do
tempo. Ironicamente, os sons de
cavitação de freqüência mais alta
produzidos por barcos com maior
velocidade foram localizados 65 a 75
por cento do tempo. Os resultados
demonstram que os peixes boi podem
localizar confiavelmente suas próprias
vocalizações e os sons de freqüência
modulada que criamos com maior
precisão. Também podem localizar
imediatamente os sons de cavitação
dos hélices dos barcos (a formação de
pequenos vácuos ou bolhas, por um
hélice girando rapidamente), mas
possuem dificuldade para detectar
sons de baixa freqüência e os sons dos
barcos em baixa velocidade
Sons Provocados pelos Barcos
O som dos barcos tem caráter
diferente do som biológico. Embaixo
da água possui dois domínios ou
condições de operação: ruído não
cavitante e cavitante, este último
devido à turbulência provocada pelas
rotações dos hélices. A freqüência e
potência do ruído dos barcos são
diretamente relacionadas com a
velocidade da embarcação. Quanto
mais rápida a rotação do hélice, mais
cavitação é criada. Conforme as
pequenas bolhas se formam e
colapsam, produzem uma
ampla faixa de freqüências acima das
condições prevalecentes do ambiente
em freqüências até 20.000 hertz.
Inversamente, quando a rotação do
hélice é reduzida e um barco se
movimenta lentamente, a turbulência
é mínima, e os espectros de
freqüência e potência do ruído são
significativamente reduzidos. Os
espectros do ruído dominante são
abaixo de 1.000 hertz em níveis de
pressão de som que mal chegam aos
limites do audiograma dos peixes
boi.
Em condições ambiente típicas, os
sons de um barco pequeno se
aproximando podem não ser
distinguidos do meio ambiente até
que fiquem suficientemente altos
para
cruzar
os
limites
de
mascaramento. Como a intensidade
de uma determinada fonte de som
diminui com o aumento da distância,
um barco se movendo lentamente
com os hélices girando a 400
rotações por minuto precisa estar
virtualmente encima do peixe boi
antes que o som possa ser detectado.
Infelizmente, os hélices girando a
400 rpm podem cortar um peixe boi
da mesma forma como aqueles
barcos de movimentado rapidamente
a 3.500 rpm.
Gravamos os sons de barcos se
aproximando nas Instalações de
Teste de Motores de Popa em Stuart,
Flórida. Neste local encontramos
condições físicas e ambientais típicas
dos habitats dos peixes boi: água
com profundidade de 5 metros,
condições isotérmicas
e ruído
ambiente biológico proveniente
principalmente dos estalos dos
camarões.
Suspendemos
os
hidrofones de gravação a 1,5 metros
abaixo da superfície e amostramos
sons de barcos representativos
operando em diversas velocidades.
Quando reproduzimos as gravações
destes sons para os peixes boi em
condições
controladas
de
mascaramento, o ruído de cavitação
de banda larga mais alta provocado
pelos barcos mais rápidos foi
detectável a 9 decibéis acima do
nível ambiente – uma relação crítica
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relativamente baixa. Os peixes boi
não podiam detectar o ruído dos
barcos a baixa velocidade nas
condições de ruído ambiente
gravadas no campo. O espectro de
baixa freqüência não chegou ao
limites do patamar do audiograma, e
os sons restantes de freqüência mais
alta eram tão baixos que foram
mascarados
pelas
condições
moderadas de ambiente de apenas
70 e 80 decibéis. Este ruído
precisou ser amplificado 29 decibéis
acima do ruído ambiente antes que
fosse detectável.
Os que sugerem estes resultados?
Primeiro, um barco com um hélice
girando lentamente gera sons de
baixa freqüência impossíveis de
localizar e distinguir do ruído
ambiente até ficar perigosamente
perto do peixe boi.
Uma
estratégia
principal
de
gerenciamento usada na Flórida para
proteger os peixes boi durante os
últimos 20 anos tem sido reduzir a
velocidade dos barcos em águas
freqüentadas pelos peixes boi criando
zonas de parada e baixa velocidade.
Esta estratégia na verdade pode
exacerbar o problema quando é
implementada em condições de águas
turvas (que, junto com a coloração de
tanino, são prevalecentes na Flórida).
Nessas condições, os peixes boi e os
pilotos dos barcos não podem se
evitar ativamente usando sinais
visuais, e os sinais acústicos são os
únicos meios de detecção disponíveis
para os animais.
Considerar os resultados de nossos
estudos de medição dos barcos
simulando um encontro entre um
barco de 8,2 metros e um peixe boi
(Figura 8). Quando o barco se
aproxima a alta velocidade, o nível
de ruído cruza a relação crítica do
peixe boi aproximadamente 16
segundos antes dos hélices chegarem
ao hidrofone – cerca de 198 metros
distante do impacto. O ruído do
mesmo barco se aproximando
lentamente permanece não detectável
e não cruza as relações críticas até os
hélices ficarem somente 0 a 2
segundos de distância, menos de 3,7
metros do impacto. Em condições de
ambiente moderadamente ruidoso, os
sons associados com os barcos se
movendo lentamente podem se
tornar acusticamente transparentes.
Figura 8. Na experiência da Figura 7, o som de um barco viajando a 4,8 quilômetros (3 milhas) por hora (linhas azuis) mal se eleva acima do
ruído ambiente (preto) na faixa de audição dos peixes boi e não é distinguido até o barco passar sobre o hidrofone, nesse ponto ele cruza a relação
crítica do peixe boi. O ruído do mesmo barco se aproximando de 38,6 quilômetros (24 milhas) por hora (linhas vermelhas) cruza a relação crítica
para o ruído de banda larga em aproximadamente 16 segundos (ou cerca de 198 metros) antes de chegar ao hidrofone. É possível que muitas das
cicatrizes de hélices vistas nos peixes boi da Flórida (fotografia) sejam provocadas por barcos cujos sons os animais não são capazes de detectar
(fotografia cortesia do autor).
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Embora os barcos com movimento
lento
possam
conforme
os
argumentos,
provocar
menos
fatalidades que os barcos com
movimento
rápido,
também
apresentam mais probabilidade para
provocar ferimentos repetidos nos
peixes boi que não podem detectar
sua aproximação. O catálogo de
cicatrizes
dos
peixes
boi
sobreviventes vivos é consistente
com, e serve de testemunho para
esta observação.
Som Perto da Superfície da Água
Os peixes boi não são os únicos
animais que colidem com os barcos.
Outros mamíferos marinhos de
escuta passiva, incluindo as grandes
baleias, são vulneráveis a colisões
quando estão perto da superfície ou
em águas rasas. Aqui, a física da
propagação do som perto da
superfície afeta significativamente
sua capacidade para detectar os sons
de baixa freqüência.
Um fenômeno conhecido como
efeito de espelho de Lloyd pode
atenuar ou cancelar a propagação
dos sons de freqüência mais baixa
gerados perto da superfície. O efeito
de espelho de Lloyd faz danos na
superfície, onde o risco de colisões
com navios e barcos é maior. Na
superfície, as reflexões de sons
podem estar 180 graus defasadas
com as ondas incidentes e podem
cancelar os sons de baixa freqüência
dos barcos e navios. A pressão do
som se aproxima de 0, já que a
superfície da água é um limite de
liberação de pressão que está livre
para se movimentar em resposta a
pressão na água. O aumento da
pressão para longe da superfície da
água é proporcional à freqüência,
com a pressão nas profundidades
rasas
sendo
inversamente
proporcional ao comprimento de
onda e assim proporcional à
freqüência (quanto mais baixa a
freqüência, mais baixa será a
pressão
acústica
perto
da
superfície).
Figura 9. A propagação de som de baixa freqüência perto da superfície da água está sujeita a
um fenômeno chamado de efeito de espelho de Lloyd, que complica os problemas dos mamíferos
marinhos ao tentar ouvir os barcos se aproximando. A superfície da água libera a pressão das
longas ondas de som, enfraquecendo ou até mesmo cancelando as mesmas. As gravações de uma
lancha realizadas a 1,5 e 7,5 metros abaixo da superfície antes, durante e após sua passagem
demonstram o efeito. As linhas amarela e azul, representado as medições realizadas na proa nas
duas profundidades, divergem nas freqüências mais baixas, indicando que os comprimentos de
onda mais longos são atenuados na profundidade mais rasa.
Os detalhes destas flutuações em
distâncias curtas dependem de muitos
fatores, os mais importantes dos quais
são a profundidade da água, formato
do fundo e densidade, e aspereza
superficial. Mesmo se os peixes boi
ou baleias pudessem ouvir esses sons
normalmente, o efeito de espelho de
Lloyd pode atenuar os mesmos para
níveis que não são distinguidos do
ruído ambiente. Embora algumas
baleias, diferente dos peixes boi,
possam ter audição aguada para baixa
freqüência, isto não é uma vantagem
na superfície. Os animais não podem
reagir a sons que nunca os alcança,
independente de suas capacidades
auditivas.
Em conjunto com o efeito de espelho
de Lloyd, outro fenômeno acústico
pode ser a causa de muitas colisões
de navios e barcos com os mamíferos
marinhos. O sombreamento acústico
é provocado quando os raios de som
dos hélices de um navio são
bloqueados pelo casco do navio se
projetando para frente.
O
sombreamento
acústico
é
especialmente um problema quando
os hélices são localizados abaixo da
profundidade da quilha dos navios. A
maioria dos navios grandes que
colidem com baleias, bem como os
rebocadores que matam os peixes boi,
possuem esta configuração de hélice.
Os hélices de um rebocador
tradicional são embutidos para
remover a ventilação superficial da
cavitação do hélice, para acionar o
rebocador em linha com seu centro
de massa e para proteger o hélice
contra danos no caso da quilha bater
no fundo. Com o hélice nesta
posição, um raio de som refletido do
fundo raso será refletido novamente
pela estrutura do rebocador antes que
o som possa se propagar para frente.
Isto provoca uma sombra acústica na
frente do rebocador ou uma
combinação de rebocador e barcaça e
severa atenuação de reflexões
múltiplas. A perda de atenuação
somente é 60 a 100 decibéis; assim o
ruído do hélice na frente da
combinação de rebocador e barcaça é
completamente mascarado pelo
ruído ambiente na superfície.
Uma sombra acústica é lançada ao
redor de todo o navio sempre que a
largura do navio for maior que o
comprimento de onda do som. Um
casco com 10 metros de largura deve
lançar uma sombra em freqüências
acima de 150 hertz. A extensão da
sombra depende do número de
comprimentos de onda através do
navio. Deve ocorrer pouca difração
ao redor desta barreira. É claro o
som de freqüência extremamente
baixa (comprimento de onda longo)
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2002 março-abril 162
pode provocar difração ao redor da
maioria dos cascos, mas nestas
freqüências a perda devido ao efeito de
espelho de Lloyd é severa. Os dois efeitos
juntos possuem conseqüências ecológicas
significativas.
Usamos um arranjo vertical de hidrofones
para documentar estes efeitos combinados
dos rebocadores e navios. Os dados
obtidos dos rebocadores com barcaças
mostram uma “zona silenciosa” mais
pronunciada compreendendo um grande
ângulo dos hélices do rebocador. O
mesmo efeito de sombreamento está
presente nos navios grandes que colidem
com as baleias. Um estudo recente por
David Laist e seus colegas indica que os
navios colidindo com as baleias tendem a
ter 80 metros ou mais de comprimento.
Nas vias marinhas costeiras rasas onde as
baleias são mortas com mais freqüência, a
profundidade da água é mais rasa que o
comprimento destas embarcações –
resultando em efeitos de sombreamento
ainda maiores. As mesmas condições
relativas são encontradas nos habitats
rasos dos peixes boi, onde as embarcações
não são tão grandes, mas a água é muito
mais rasa.
Os sons gerados por um rebocador de 18,3
metros empurrando uma barcaça de 76,2
metros
são
significativamente
sombreados.
Uma
amostra
destas
medições ajuda a ilustrar como os sons do
rebocador permanecem não detectáveis
até 45,7 metros da barcaça passarem pelo
arranjo de hidrofones (Figura 10.
gráfico). Um peixe boi ou baleia no
caminho direto da barcaça não seria capaz
de detectar acusticamente a barcaça antes
que o animal fosse atropelado pela mesma
ou ficasse preso pela força hidrodinâmica.
Figura 10. Barcos grandes, por refletirem o ruído dos hélices, provocam uma grande
sombra acústica em todas as direções. A sombra é especialmente profunda na frente de um
navio, enquanto o ruído do hélice pode ser intensificado perto dos lados do navio – o que
podem induzir os animais marinhos a ir para a sombra profunda e portanto para o caminho
de embarcação se movimentado para frente com velocidade. O gráfico mostra as medições
de som realizadas durante a passagem de uma barcaça de 76,2 metros de comprimento
rebocada por um rebocador de 18,3 metros. O som foi mais intenso nos hélices (rosa),
diminuindo um pouco no ponto central da combinação de rebocador e barcaça (verde). Na
proa da barcaça o nível de som (azul) ficou aproximadamente no nível do som ambiente
(preto), marcando o começo de uma sombra que se aprofunda na frente da barcaça.
Os navios grandes e barcaças grandes
diferem na forma como refletem o som.
Uma barcaça na água rasa pode refletir o
som entre o fundo do mar e o fundo chato
do barco diversas vezes. Um navio, com
seu casco em formato de V ou U, deve
refletir o som para o lado ao invés de
direto para frente, criando uma zona de
sombra mais pronunciada com ruído
relativamente alto se irradiando para os
lados.
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Esse ruído pode confundir os
animais e mesmo induzir os mesmos
a nadar para a zona silenciosa para
buscar refúgio – colocando os
mesmos diretamente no caminho da
embarcação que se aproxima.
Procura de Soluções
Assim como os limites de
velocidade para barcos pequenos nas
águas internas podem reduzir o ruído
dos hélices e a freqüência do som,
reduzir a velocidade dos navios
podem certamente aumentar o risco
de colisões devido ao aumento do
tempo de exposição (e assim as
oportunidades de colisão) enquanto
diminui a audibilidade do navio. Os
programas atuais de para vigiar e
evitar não são efetivos durante a
noite ou mau tempo, justamente
quando os animais também devem
confiar na detecção do som para
evitar os navios. Atualmente, os
administradores da vida selvagem
estão enfocando outros métodos de
proteção que ainda não tratam das
causas sensitivas e acústicas das
colisões. Estes métodos incluem o
sonar ativo para detectar os animais
antes dos navios e sensores de escuta
passiva que acendem para indicar
que os peixes boi estão na área.
Interessados em rastrear os peixes
boi nas condições de águas turvas,
investigamos o uso do sonar ativo
para detectar os peixes boi e
realizados as primeiras e únicas
medições de resistência de meta de
sonar nos peixes boi (Gerstein e
Blue 1997). Usando métodos diretos
e de redução do eco, avaliamos o
alcance do eco e as tecnologias de
sombreamento
do
sonar.
Infelizmente,
os
problemas
relacionados com a dispersão do
fundo e do volume e reflexão da
superfície nos ambientes de água
rasa dos peixes boi tornam não
praticável a detecção confiável a
distâncias suficientemente seguras.
Problemas similares de reflexão da
superfície, falsos alarmes e absorção
estão
confundido
os
outros
investigadores tentando detectar as
baleias (alvos muito maiores) perto da
superfície na frente dos navios.
Também está sendo explorado o uso
de bastões de luz ativados pelo som
para alertar os pilotos de barco sobre
os peixes boi na sua vizinhança. O
sistema proposto deve usar a escuta
passiva de vocalizações dos peixes boi
para disparar luzes de alerta nos
postes ao longo das vias aquáticas
freqüentadas pelos peixes boi.
Infelizmente, os peixes boi são
animais relativamente quietos. Esta
característica do comportamento dos
peixes boi não somente reduz a
efetividade de um dispositivo ativado
pelo som, como também pode dar aos
pilotos de barco a falsa impressão que
não há nenhum peixe boi presente,
colocando os animais não detectados
em risco adicional. Temos um
catálogo extensivo de vocalizações
calibradas de peixes boi, e nossas
análises destes sinais mostram que
embora as mães e filhotes se
comunicam mais regularmente, as
chamadas dos peixes boi são sinais de
baixa intensidade na média somente
12 decibéis acima do ruído ambiente.
Temos documentado que os peixes
boi podem detectar e localizar estas
chamadas de baixa intensidade abaixo
do ruído ambiente, mas os
instrumentos acústicos subaquáticos
não podem filtrar estas chamadas
abaixo do ruído ambiente como os
peixes boi podem. Conseqüentemente,
os animais precisam estar muito perto
de uma estação de escuta para serem
detectados acima dos níveis típicos do
ambiente. Outro aspecto que pode ser
não reconhecido é que muitos
componentes de suas chamadas são
direcionais. O arranjo de hidrofones
somente receberia estes impulsos se
estivesse em linha com um peixe boi
vocalizando.
Decidimos que a melhor forma de
proteger os animais seria tratar das
causas sensitivas e acústicas
fundamentais das colisões. Os
peixes boi e baleias podem ser
bem adaptados para ouvir e
detectar os sons biológicos nos
seus ambientes; entretanto, os
barcos, navios e barcaças nunca
foram parte de suas histórias
evolucionárias. Portanto, estes
animais encontram um desafio
ecológico moderno para o qual
estão em desvantagem sensorial.
Considerando
as
medições
psicoacústicas descritas acima, as
características acústicas conhecidas
dos habitats de água rasa, os
espectros de ruídos de barcos e o
problema perigoso e ilusório do
sombreamento
acústico,
fica
aparente que os peixes boi, e talvez
outros mamíferos marinhos de escuta
passiva, podem se beneficiar de um
dispositivo de alerta acústico
projetado para ser adaptado na frente
dos barcos, navios e barcaças.
Considerando isto, desenvolvemos
um dispositivo de alerta acústico
projetado
especificamente
para
explorar as capacidades ótimas de
audição dos peixes boi. Usando
sinais acústicos derivados de ondas
que os peixes boi podem detectar e
localizar imediatamente nos ou perto
dos níveis ambiente, conseguimos
desenvolver
um
dispositivo
ambientalmente
amigável
que
projeta sinais acústicos de muito
baixa intensidade e altamente
direcionais na frente dos barcos. Os
sinais são projetados para vencer os
desafios
apresentado
pelo
sombreamento acústico e pelo efeito
de espelho de Lloyd. Estes sons de
baixa
intensidade,
altamente
direcionais não devem representar
uma ameaça de efeitos de ruídos
cumulativos mesmo com milhares de
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dispositivos
operando
simultaneamente. Comparados com os
descobridores de peixes de 200 watt e
sondadores de profundidade, nosso
dispositivo de 10 watt não apresenta
preocupações de poluição sonora.
Fornece um conjunto de sinais
acústicos
consistentes,
altamente
direcionais
que
os
mamíferos
marinhos, mais especialmente os
peixes
boi,
podem
aprender
rapidamente a associar com barcos,
navios e barcaças.
O dispositivo de alerta de peixes boi
montado na proa que estamos
testando nos habitats dos peixes boi
incorpora um transdutor paramétrico
montado através do casco que cria
um feixe de som estável, direcional
logo abaixo da superfície da água em
distâncias de até 200 metros
(Gerstein e Blue 1996, 1997).
O dispositivo incorpora um projeto
paramétrico para fornecer seu feixe
estreito com um pequeno transdutor.
Projeta duas freqüências de fonte
ultra-sônica que estão além dos
limites medidos de audição dos
animais marinhos. A diferença
resultante,
ou
freqüência
paramétrica das duas fontes de
freqüência oscilante de 230.000 e
250.000 hertz resulta em um onda
paramétrica centrada de 20.000 hertz
que é audível para os peixes boi e
golfinhos, mas fica abaixo do limite
de detecção de peixes e fora da faixa
de audição das tartarugas e pássaros
aquáticos. Como não é projetada
para assustar ou prejudicar os peixes
boi, o dispositivo pode fornecer um
conjunto consistente de sinais
altamente direcionais que os peixes
boi podem aprender a associar com
os
barcos.
Sendo
altamente
direcional, os peixes boi somente
podem ouvir os sinais quando estão
na linha direta de aproximação de
um barco e em risco iminente de
ferimentos. Ignorar os sinais teria
conseqüências negativas; assim o
peixe boi não ficaria habituado aos
mesmos. Os críticos sugeriram que
esta abordagem não é possível
porque os peixes boi precisariam se
ferir antes que pudessem associar os
sinais de alerta com o perigo.
Entretanto, os peixes boi estão sendo
feridos todos os dias, não porque não
sabem que os barcos são perigosos,
mas porque não podem localizar os
mesmos em distância seguras de
tempo e espaço. Se estes dispositivos
fossem instalados nos barcos e
barcaças que
se
movimentam
lentamente, os peixes boi logo
aprenderiam a associar os sons com as
embarcações se aproximando sem
precisar sofrer ferimentos repetidos.
Os animais não podem aprender a
evitar os barcos que não podem
detectar ou localizar.
Apesar de todos os nossos esforços de
cuidados e regulamentos para proteger
os peixes boi, mesmo os pilotos mais
conscienciosos e bem intencionados
ainda podem colidir com os peixes boi
que não podem ver. Quando um
animal não pode ouvir ou localizar um
barco, fica em risco independente se o
barco se movimenta lenta ou
rapidamente. No final, o indivíduo
mais
confiável,
motivado
e
responsável que pode salvar qualquer
peixe boi em qualquer lugar e tempo é
o próprio peixe boi – deste que tenha a
consciência sensorial para fazer isto.
Um dispositivo de alerta acústico
pode fornecer aos animais a
oportunidade para se salvarem.
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“Peixes Boi, Bioacústica e Barcos”
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articles/02articles/Gerstein.htm
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2002 março-abril 165