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SENTENÇAS TRABALHISTAS SELECIONADAS Abuso de Poder, Assédio Moral, Assédio Sexual e Violência no Trabalho Volume II ORGANIZADORES Candy Florencio Thomé Juíza do Trabalho (TRT da 15ª Região). Doutora em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universidade de São Paulo. Pesquisadora da Fundación Centro Internacional de Educación y Desarrollo Humano (CINDE). Autora/ Organizadora, pela LTr Editora, das obras Curso de Preparação aos Concursos da Magistratura do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho; Direitos de Conciliação entre Trabalho e Família — Licença-maternidade e Licença-paternidade; O Assédio Moral nas Relações de Emprego; e O Princípio da Igualdade de Gênero e a Participação das Mulheres nas Organizações Sindicais de Trabalhadores. Rodrigo Garcia Schwarz Juiz do Trabalho (TRT da 2ª Região). Doutor em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universidad de Castilla-La Mancha, Doutor em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pós-doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pela Universidad de Manizales. Pesquisador da Fundación Centro Internacional de Educación y Desarrollo Humano (CINDE). Autor/Organizador, pela LTr Editora, das obras Curso de Preparação aos Concursos da Magistratura do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho; Dicionário de Direito do Trabalho, de Direito Processual do Trabalho e de Direito Previdenciário Aplicado ao Direito do Trabalho; Os Direitos Sociais e a Sindicabilidade Judicial das Políticas Públicas Sociais no Estado Democrático de Direito; e Trabalho Escravo: a Abolição Necessária. candy florencio thomé Rodrigo Garcia Schwarz Organizadores SENTENÇAS TRABALHISTAS SELECIONADAS Abuso de Poder, Assédio Moral, Assédio Sexual e Violência no Trabalho Volume II EDITORA LTDA. © Todos os direitos reservados Rua Jaguaribe, 571 CEP 01224-001 São Paulo, SP — Brasil Fone (11) 2167-1101 www.ltr.com.br Maio, 2014 Versão impressa - LTr 4944.4 - ISBN 978-85-361-2914-3 Versão digital - LTr 7801.1 - ISBN 978-85-361-3015-6 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Sentenças trabalhistas selecionadas: abuso de poder, assédio moral, assédio sexual e violência no trabalho, volume II / Candy Florencio Thomé, Rodrigo Garcia Schwarz, (organizadores). — São Paulo: LTr, 2014. Vários autores. Bibliografia. 1. Abuso de poder 2. Assédio moral 3. Assédio sexual 4. Direito processual do trabalho 5. Julgamentos 6. Violência no local de trabalho I. Thomé, Candy Florencio. II. Schwarz, Rodrigo Garcia. 13-13185 CDU-347.951.0:331 Índice para catálogo sistemático: 1. Sentenças : Direito processual do trabalho 347.951.0:331 S UMÁRIO dano moral — apelido Jocoso — imagem — indenização Juiz André Eduardo Dorster Araujo (2ª Região — SP) ..................................................................... 9 assédio moral — dano moral — estágio — rigor excessivo Juiz Ben-Hur Silveira Claus (4ª Região — RS) ................................................................................. 11 dano moral — assalto — indenização — depressão Juiz Ben-Hur Silveira Claus (4ª Região — RS) ................................................................................. 26 assédio moral — dano moral — mulher — rigor excessivo Juíza Candy Florencio Thomé (15ª Região — SP) ............................................................................ 32 dano moral — dignidade — indenização — revista Juíza Candy Florencio Thomé (15ª Região — SP) ............................................................................ 35 assédio moral — dano moral — inJúrias — rigor excessivo Juiz Cassio Colombo Filho (9ª Região — PR) ................................................................................... 37 assédio moral — dano moral — indenização — relacionamento amoroso Juiz Felipe Augusto de Magalhães Calvet (9ª Região — PR)............................................................. 45 assédio moral — gestão por inJúria — indenização — rigor excessivo Juiz Guilherme Guimarães Feliciano (15ª Região — SP).................................................................. 48 dano moral — ambiente de trabalho — condições degradantes — indenização Juiz Igor Cardoso Garcia (2ª Região — SP) ...................................................................................... 5 60 assédio moral — dano moral — indenização — ônus da prova Juiz José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva (15ª Região — SP)......................................................... 67 Assédio moral — dano moral — gestante — indenização Juiz José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva (15ª Região — SP)......................................................... 76 Violência — indenização — morte do trabalhador — responsabilidade pós-contratual Juiz Leopoldo Antunes de Oliveira Figueiredo (23ª Região — MT)................................................... 83 Assédio sexual — improcedência — indenização — ônus da prova Juiz Luiz Gustavo Ribeiro Augusto (2ª Região — SP)........................................................................ 87 Dano moral — dispensa no dia do aniversário — indenização — perseguições Juiz Márcio Mendes Granconato (2ª Região — SP)........................................................................... 89 Assédio sexual — assédio moral — prova indiciária — prova testemunhal Juiz Renato da Fonseca Janon (15ª Região — SP)............................................................................. 91 Acumulação de cargos públicos — cargo técnico — dispensa — professor Juiz Rodolfo Mário Veiga Pamplona Filho (5ª Região — BA)........................................................... 107 Assédio moral — dano moral — gestante — isolamento Juiz Rodrigo Garcia Schwarz (2ª Região — SP)................................................................................. 109 Dano moral — indenização — intervalos — limitação do uso do banheiro Juiz Sérgio Cabral dos Reis (13ª Região — PB).................................................................................. 112 Dano moral — indenização — revista — rigor excessivo Juiz Tarcisio Correa de Brito (3ª Região — MG)............................................................................... 116 6 A PRESENTAÇÃO O s últimos anos foram marcados pela expansão, diversificação e sofisticação dos mecanismos através dos quais o Poder Judiciário passou a interferir nas relações sociais. A extensão do controle judicial no campo das relações individuais e coletivas de trabalho, realidade irrefutável e cada vez mais presente na nossa experiência jurídica, vem ao encontro de uma expectativa de maior concretização dos direitos fundamentais, individuais e coletivos, que correspondem a esse ramo do Direito que se denomina ou se categoriza como Direito do Trabalho, expectativa que propõe, permanentemente, novos desafios aos operadores jurídicos trabalhistas em geral e aos juízes do trabalho em particular. Nesse contexto, a exuberante e construtiva produção dos juízes trabalhistas de primeiro grau, no trato direto com as partes, define a própria imagem da Justiça do Trabalho. A matéria-prima da obra dos tribunais advém do labor dos juízes, diretamente empenhados na apreensão dos custosos materiais de construção da tutela jurisdicional justa, célere, efetiva e eficiente. Na presente coletânea, estão reunidas decisões monocráticas de diversos juízes de distintas regiões, relacionadas a temas de expressivo interesse no âmbito da regulamentação das relações de trabalho, organizadas de forma a oferecer ao nosso leitor um repertório de modelos de sentenças e das tendências da jurisprudência trabalhista na contemporaneidade. A presente obra tem, assim, um duplo propósito: oferece-se, por um lado, como importante acervo jurisprudencial para estudantes e profissionais do Direito do Trabalho, sobretudo para advogados, juízes, procuradores do trabalho e para os que se preparam para os concursos públicos para ingresso na magistratura do trabalho (para estes últimos, em especial, este acervo servirá de subsídio na preparação para as provas dissertativas dos concursos); por outro lado, colabora para uma melhor compreensão de alguns temas específicos que dizem respeito ao Direito do Trabalho, colocando-se à disposição do nosso leitor como mais um passo adiante no direito à informação sobre o teor das decisões do Poder Judiciário e sobre os precedentes resultantes dessas decisões. é com essa expectativa que levamos aos estudantes e aos juristas em geral uma amostra preciosa do pensamento e da produção dos juízes trabalhistas. CANDY FLORENCIO THOMÉ RODRIGO GARCIA SCHWARZ 7 S ENTENÇAS ?? dAno?morAl?—?ApElido?jocoso?—? imAgEm?—?indEnizAção Juiz André Eduardo Dorster Araujo (2ª Região — SP) DECIDO Danos morais. A reclamante narra na inicial que foi vítima de tratamento jocoso por colegas de trabalho, notadamente em razão de sua aparência física, o que teria lhe acarretado o apelido de “gislaine” (personagem de programa humorístico televisivo que possui por característica física ser uma mulher obesa). Ressaltou, ainda, que por questões hormonais possuía alguns pelos no rosto, o que acarretou tratamento pejorativo por parte de colegas de trabalho que questionavam se “havia feito a barba” e “quantas meninas pegava”. A defesa admite que “alguns empregados da reclamada a apelidaram de Gislaine, devido a semelhança da reclamante com a atriz que interpreta referido papel, pelos empacotadores e outros caixas da empresa” (fls. 36), fato que somente teria chegado à conhecimento da reclamada quando da distribuição da reclamatória. Ponderou, ainda, que a reclamante jamais se queixou dos acontecimentos e que participava das brincadeiras “incentivando até tal comparação mesmo porque provavelmente, pelo fato de que o bom caráter de tal personagem, conquistou o gosto popular...” (fls. 36). Argumentou tratar-se de brincadeira natural entre colegas de trabalho, incapaz de gerar danos de ordem moral. Por fim, negou a ocorrência de outras adjetivações ou comentários jocosos. Aos vinte e sete dias do mês de julho de 2011, às 17h10min horas, na sala de audiência desta Vara, sob a presidência do Meritíssimo Juiz do Trabalho Substituto André Eduardo Dorster Araujo, foram apregoadas as partes: Roseli Tunico de Souza, reclamante, e Supermercado yamauchi Ltda., reclamada. Ausentes as partes. Prejudicada a renovação da proposta de conciliação. Submetido o processo à apreciação, foi proferida a seguinte SENTENÇA Vistos, etc., os autos da presente reclamação trabalhista movida por Roseli Tunico de Souza, em face de Supermercado yamauchi Ltda., através da qual postulou a reclamante os títulos elencados às fls. 11/12, dando à causa o valor de R$ 70.000,00. Juntou documentos. Em audiência compareceram as partes (fls. 19), sendo deferida a juntada de defesa escrita (fls. 35/40). Dispensado depoimento pessoal da reclamante. Colhido depoimento pessoal da reclamada. Ouvidas testemunhas. Sem mais provas, foi encerrada a instrução processual. As propostas conciliatórias restaram prejudicadas. Razões finais remissivas. é o relatório. é a síntese do essencial. 9 Primeiramente, registro ser incontroverso que a reclamante era habitualmente chamada por apelido jocoso (Gislaine), em clara alusão aos seus dotes físicos, situação que, por si só, evidencia acinte à dignidade da trabalhadora e à sua honra — nos aspectos objetivo (autoestima) e subjetivo (imagem perante os demais). Porém, não é só. As duas testemunhas da autoria deixaram claro que além desse tratamento questionável os colegas de trabalho da autora frequentemente questionavam: “se a reclamante tinha feito a barba, porque a reclamante na época tinha muitos pelos debaixo do queixo” (1ª testemunha) e “você pegou quantas hoje” (2ª testemunha). Tamanho o desrespeito para com a autora que até a 2ª testemunha da autora — mera cliente do local, logo, sem qualquer interesse no deslinde do feito — presenciou este tipo de acontecimento cerca de três vezes, mesmo comparecendo de forma esporádica no estabelecimento empresário. Note-se que, diversamente do ventilado em defesa, as duas testemunhas da autoria deixaram claro que a obreira sentia-se incomodada com a situação — o que é de todo natural, frise-se — logo, não há se ponderar que a autora aceitava as brincadeiras. Ressalto, ainda, que a 1ª testemunha ouvida comprovou que a obreira queixou-se sobre a conduta desrespeitosa à superiora hierárquica que “nada fez a respeito a não ser rir da reclamante”. Assim, evidente a ocorrência de danos de ordem moral, os quais são de responsabilidade do empregador, à luz dos arts. 932 e 933 do Código Civil — que dispensam a comprovação de culpa. Aliás, por falar em culpa certo é que esta, apesar de desnecessária à hipótese, ficou demonstrada pelas queixas da reclamante que não foram atendidas pela superiora hierárquica — culpa por omissão. Nem se diga que as testemunhas defensivas ilidiriam as conclusões ora esposadas. Isto porque, a primeira testemunha nada soube informar, contrariando a própria tese defensiva (que admite ao menos em parte as brincadeiras), ao passo que a segunda possuí nítido interesse no deslinde do feito, afinal, é apontado como um dos agressores e, portanto, pode ser alvo de ação regressiva. Condeno a reclamada no pagamento de indenização por danos morais ora arbitrada em R$ 5.000,00. O arbitramento toma em conta a gravidade da conduta da ré, o potencial econômico da demandada, a lesão sofrida pela autora, o não enriquecimento sem causa da autora e os aspectos punitivo, expiatório e lenitivo da condenação. Honorários advocatícios. Indevidos, pois o reclamante não preencheu os requisitos exigidos pela Lei 5584/70, os quais ainda vigoram por força dos preceitos consolidados, mormente o art. 791, que traz a figura do jus postulandi , não revogada pelo art. 133 da CF/88, nem mesmo pela Lei n. 8.906/94, que apenas regulamentou a profissão de advogado, não impedindo que a parte aja em causa própria. Nesse sentido a posição assente do C. TST, através da Súmula n. 329. Note-se que sequer é o caso de aplicação da IN n. 27 do C. TST, porquanto se trata de lide decorrente de relação de emprego — vide art. 5º da instrução. Justiça Gratuita. Com fulcro nos arts. 790, § 3º, e 790-B, da CLT, defiro à autoria os benefícios da justiça gratuita, isentando-a do pagamento das custas processuais e demais despesas processuais. Compensação/dedução. Não há parcelas à compensar ou deduzir. Correção Monetária. A correção monetária se da data da prolação da presente sentença, à luz da Súmula n. 362 do C. STJ. Juros de mora. Juros de mora na forma da lei, pro rata die, sobre o capital monetariamente corrigido (art. 39, § 1º, da Lei n. 8.177/91) com incidência a partir do arbitramento da condenação, eis que os danos morais somente foram reconhecidos e quantificados quando do arbitramento pelo Juízo. Antes desse arbitramento sequer o devedor teria como quitar a obrigação, de modo que se foge da idéia de mora. Nesse sentido a mais recente jurisprudência do C. STJ no REsp n. 903.258. Natureza da verba. A verba deferida possui caráter indenizatório, não havendo se falar em recolhimentos previdenciários e fiscais. Demais argumentos. Os demais argumentos expendidos pelas partes ficam rechaçados, valendo relembrar que o Juízo não é obrigado a tecer considerações sobre todas as teses e ponderações lançadas, bastando manifestar seu livre convencimento fundamentado. Relembro às partes, ainda, que não há se falar em pré-questionamento em 1ª Instância. Por fim, alerto às partes quanto às disposições do art. 538, parágrafo único do CPC. DISPOSITIVO POSTO ISTO, julgo a presente reclamação PROCEDENTE EM PARTE, para condenar a reclamada Supermercado Yamauchi Ltda., a pagar para a reclamante, Roseli Tunico de Souza, nos termos da fundamentação, os seguintes títulos: — indenização por danos morais ora arbitrada em R$ 5.000,00. 10 Custas processuais pela reclamada, calculadas sobre o valor de R$ 5.000,00, ora arbitrado à condenação, no importe de R$ 100,00. A verba deferida tem caráter indenizatório. Não há recolhimentos previdenciários e fiscais. Correção monetária na forma da fundamentação supra. Juros de mora na forma da lei, pro rata die, sobre o capital monetariamente corrigido (art. 39, § 1º, da Lei n. 8.177/91) com incidência a partir do arbitramento da condenação Defiro para a demandante os benefícios da justiça gratuita. ?? Intimem-se as partes e a União. Nada mais. André Eduardo Dorster Araujo, Juiz do Trabalho Substituto. Assédio moral — Dano moral — Estágio — Rigor excessivo Juiz Ben-Hur Silveira Claus (4ª Região — RS) locamentos da residência ao trabalho; indenização pelo desgaste de veículo; ressarcimento de valores gastos com estacionamento; FGTS sobre os pedidos e acréscimo de 40%; aplicação do artigo 467 da CLT; juros; correção monetária; justiça gratuita e honorários de assistência judiciária ou honorários advocatícios. Atribui à causa o valor de R$300.000,00. O reclamado contesta a ação pelas razões de defesa de fls. 462/512, impugnando as pretensões deduzidas. São juntados documentos. Manifesta-se a reclamante às fls. 666/678. Realiza-se perícia contábil (laudo às fls. 706/716, complementado à fl. 742). Três testemunhas arroladas pela reclamante são ouvidas através da cartas precatórias (fls. 781/783 e 804/805). No prosseguimento da audiência, a reclamante e o preposto do reclamado são interrogados e uma testemunha é ouvida (ata de fls. 809/811). As razões finais são remissivas. A conciliação é rejeitada. É O RELATÓRIO. VARA DO TRABALHO DE CARAZINHO Processo n. 00948-2005-561-04-00-7 — Procedimento Ordinário Aos dezesseis dias do mês de novembro do ano de dois mil e seis, às 11h30min, na sala de audiências da Vara do Trabalho de Carazinho, foi proferida a seguinte sentença da lavra do Exmo. Juiz do Trabalho Ben-Hur Silveira Claus: Vistos etc. Renata Kochenborger, qualificada na inicial, ajuíza ação contra Banco Santander Banespa S.A., postulando declaração de nulidade do contrato de estágio, com reconhecimento do vínculo de emprego a partir de 1.10.2000 e o pagamento de diferenças de férias e terço, de 13º salário, de FGTS e acréscimo de 40%, de gratificações semestrais e de contribuições previdenciárias, relativamente ao período em que não teve a CTPS anotada; horas extras e reflexos; integração das parcelas variáveis recebidas (comissões e prêmios); diferenças salariais por substituição; diferenças salariais por acúmulo de função; adicional de transferência; adicional de risco; ressarcimento do combustível gasto a serviço e nos des- 11 FUNDAMENTOS DA DECISÃO: A verificação das condições da ação — no caso, a legitimidade passiva —, é aferida no plano do direito processual, tendo em conta o afirmado na petição inicial. Dessa forma, a legitimidade estará presente sempre que, em tese e em abstrato, coincidirem os titulares ativo e passivo da relação jurídica de direito material afirmada, mesmo que após a regular instrução do feito tal afirmativa não reste confirmada. Ora, no caso concreto, da análise da petição inicial exsurge a conclusão de que o reclamado é parte legítima para figurar no pólo passivo da demanda. Entretanto, decidir concretamente acerca da procedência das afirmações vertidas na inicial importa a análise do conjunto probatório existente nos autos, com o julgamento do mérito da ação, o que é objeto de análise no item seguinte. Rejeita-se a argüição. II — NO MÉRITO. 1. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO DE ESTÁGIO E DE EXISTÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO DESDE 1.10.2000. RETIFICAÇÃO DA CTPS. DIFERENÇAS DE FÉRIAS E TERÇOS, DE 13os SALÁRIOS, DE GRATIFICAÇÕES SEMESTRAIS, DE FGTS E ACRÉSCIMO DE 40% SOBRE O FGTS APURADO A reclamante postula declaração de nulidade do contrato de estágio e de existência de vínculo de emprego desde 1.10.2000, com a respectiva retificação da CTPS e o pagamento de diferenças de férias e terços, de 13os salários, de gratificações semestrais, de FGTS e acréscimo de 40% sobre o FGTS apurado, alegando que foi contratada em 1.10.2000, mas somente teve a CTPS anotada em 30.7.2001; que houve a celebração de um contrato de estágio, no entanto, era empregada do reclamado, a ele prestando serviços com pessoalidade e subordinação, mediante salário. O reclamado contesta. Sustenta que as partes firmaram contrato de estágio em 1.10.2000, que vigorou até 30.7.2001; que a reclamante foi admitida em 31.7.2000 [2001] para exercer a função de assistente de atendimento. Transcreve dispositivos legais relativos ao estágio e diz que firmou Termo de Compromisso para Estágio de Complementação Educacional com a entidade de ensino da reclamante, no qual constam expressamente as atividades que ela desenvolveria, em razão do que, na sua assinatura, ela ficou ciente de suas atividades. Argumenta que as atribuições da reclamante eram relativas a sua condição de estagiária e que não há, na inicial, maiores especificações a respeito, o que prejudica a ampla defesa e o contraditório. Alega que não existiram os requisitos caracterizadores de relação de emprego entre as partes; que a reclamante não realizou atividades I — PRELIMINARMENTE. 1. ARGUIÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO EM RAZÃO DA MATÉRIA O reclamado argúi incompetência da Justiça do Trabalho em razão da matéria para apreciar o pedido de recolhimento de contribuições previdenciárias do período em que a reclamante foi estagiária. Razão não assiste ao reclamado. Nos termos do art. 114 da Constituição Federal de 1988, na redação dada pela Emenda Constitucional n. 45, de 8.12.2004, “Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: VIII — a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”. Rejeita-se a argüição. 2. ARGUIÇÃO DE INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL O reclamado argúi inépcia da petição inicial, relativamente ao pedido de horas extras excedentes da sexta e da oitava hora diária sem a delimitação dos períodos, alegando que os pedidos cumulativos são incompatíveis. Razão não assiste ao reclamado. A petição inicial atende aos requisitos básicos previstos na legislação consolidada, tendo ensejado adequado e amplo exercício do direito de defesa ao reclamado. Sobreleva, aqui, a norma do art. 794 da CLT, segundo a qual só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes. No caso em exame, o exercício do pleno direito de defesa revela que não ocorreu qualquer prejuízo ao reclamado, não se registrando quaisquer das hipóteses que caracterizam a inépcia da petição inicial. Rejeita-se a arguição. 3. ARGUIÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA O reclamado argúi ilegitimidade passiva, sustentando que a reclamante não foi sua empregada no período de 1.10.2000 a 30.7.2001, uma vez que vigorou, nesse período, contrato de estágio. Razão não assiste ao reclamado. Legitimidade para a causa, segundo preleciona Manoel Antônio Teixeira Filho na obra “As Ações Cautelares no Processo do Trabalho” (2. ed., São Paulo: LTr, 1992, p. 75), “...consiste na individualização daquele a quem pertence o interesse de agir e daquele perante o qual se formula a pretensão.” Não ocorre ilegitimidade passiva. 12