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REALIZAÇÃO APOIO 1 Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) – Biblioteca Profª Elcy Rodrigues Lacerda/ Instituto de Ciências da Educação /UFPA, Belém-PA Seminário Nacional da Rede UNIVERSITAS/Br (23.: 2015 maio. 2023: Belém, PA) Políticas de educação superior no Brasil: [recurso eletrônico] a expansão privado-mercantil em questão: [Anais do] XXIII Seminário Nacional da Rede UNIVERSITAS/Br / Rede UNIVERSITAS/Br; Universidade Federal do Pará. Instituto de Ciências da Educação. – Belém: UNIVERSITAS/Br; ICED/UFPA, 2015. Disponível somente em versão online: www.belemvirtual.com/seminarioUniversitas/ Conteúdo: oitenta trabalhos distribuídos em sete eixos temáticos sobre a expansão da educação superior: 1- Financiamento; 2- Organização Institucional e Acadêmica; 3- Avaliação; 4- Trabalho Docente; 5- Acesso e Permanência; 6- Produção do Conhecimento; 7- Educação Superior do Campo. Inclui bibliografias. ISSN 2446-6123 1. Educação superior – Brasil – Congressos. 2. Política e educação - Brasil. 3. Mercantilismo - Brasil. 4. Universidades e faculdades públicas - Brasil. 5. Privatização - Brasil. I. Rede UNIVERSITAS/Br. II. Universidade Federal do Pará. Instituto de Ciências da Educação. III. Título. CDD - 22. ed.: 378. 0060981 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 2 PREFÁCIO ............................................................................................................................... 8 ORGANIZAÇÃO ..................................................................................................................... 9 EIXO 1 - FINANCIAMENTO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ............ 12 A POLÍTICA DEFINANCIAMENTO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: COMPARAÇÕES ENTRE A CONAE E O PNE. ............................................................... 12 A PROPOSTA DE “REGULAMENTAÇÃO DA AUTONOMIA” E DE VINCULAÇÃO DO FINANCIAMENTO DAS UNIVERSIDADES PARANAENSES À RECEITA TRIBUTÁRIA LÍQUIDA APRESENTADA PELO GOVERNO BETO RICHA EM FEVEREIRO DE 2015 ......................................................................................................... 22 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO DESENVOLVIMENTO DO REUNI E A EXPANSÃO NA UNIVERSIDADE PÚBLICA NO BRASIL .................................................................. 38 DINÂMICAS DE EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR PRIVADA NA ATUALIDADE .................................................................................................................... 56 EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E DESENVOLVIMENTO: UMA ARTICULAÇÃO POSSÍVEL? ............................................................................................ 72 O ENSINO SUPERIOR AMAPAENSE NO CONTEXTO DE EXPANSÃO PRIVADOMERCANTIL ....................................................................................................................... 86 O NOVO MODELO POLÍTICO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO NACIONAL ATRELADO À FINANCEIRIZAÇÃO E À EXPANSÃO DESTE TIPO DE INSTITUIÇÕES PELO PAÍS: O MECANISMO DE COMPRAS E COALISÕES ENTRE INSTITUIÇÕES DE ENSINO QUE FORTALECE AS PRÁTICAS OLIGOPOLISTAS....................................... 102 O PÚBLICO FINANCIANDO A EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO: UMA ANÁLISE DOS INCENTIVOS PÚBLICOS AO GRUPO SER EDUCACIONAL (PERÍODO DE 2010-2014). ............................................................................................... 118 POLÍTICA DE EXPANSÃO E FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS: UM ESTUDO DO CASO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ. ......................................................................................................... 136 POLÍTICAS DE FINANCIAMENTO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO PELA VIA DE RENÚNCIA FISCAL. .................................................................................................. 157 PROGRAMA UNIVERSIDADE PRA TODOS – PROUNI: NOVOS ARRANJOS DA CONTRARREFORMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA ........................... 169 EIXO 2 – ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E ACADÊMICA NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ................................................................................................... 185 A ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E ACADÊMICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES ................................................................................................................. 185 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 3 AS POLÍTICAS DE EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR COMO INDUTORAS DE NOVAS “ARQUITETURAS ACADÊMICAS” NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS FEDERAIS. ........................................................................................................................ 203 EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: TESSITURAS E IDENTIDADES DOS INSTITUTOS FEDERAIS DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NO BRASIL ............................................................................................................................................ 219 EXPANSÃO DOS CURSOS DE LICENCIATURA E ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E ACADÊMICA NOS ESTADOS DO PARÁ E RIO GRANDE DO NORTE. .............................................................................................................................. 236 ORGANISMOS INTERNACIONAIS E AS POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ............................................................................................................................................ 253 OS INSTITUTOS FEDERAIS E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES: UM ESTUDO NO ESTADO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO............................................................... 265 POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE NO PARÁ: O PARFOR EM DESTAQUE . 284 EIXO 3 – AVALIAÇÃO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR .................... 302 (DES) ENCONTROS ENTRE O ÍNDICE GERAL DE CURSOS E A AUTOAVALIAÇÃO INSTITUCIONAL: A REALIDADE DE ALGUMAS IFES ......... 302 AS AGÊNCIAS REGULATÓRIAS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR MEXICANA: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO ............................................................................................. 319 AVALIAÇÃO E REGULAÇÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR DO DISTRITO FEDERAL: OS CURSOS DE LICENCIATURA EM FOCO ........................................... 338 CONCEPÇÃO DE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: O DEBATE NO MERCOSUL E COMUNIDADE EUROPEIA .................................................................. 353 EDUCAÇÃO SUPERIOR ALÉM FRONTEIRAS: IMPLICAÇÕES (NÃO) INTENCIONAIS DO PROCESSO .................................................................................... 373 INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO DE CURSOS: O QUE DEFINE A QUALIDADE DE UM CURSO DE GRADUAÇÃO NA PERSPECTIVA DO SINAES? ....................... 388 PARÂMETROS OFICIAIS DE QUALIDADE NA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR 2003-2013 ....................................................................................................... 402 O PAPEL DA ENQA NO PROCESSO DE GARANTIA DA QUALIDADE NO ESPAÇO EUROPEU DO ENSINO SUPERIOR ............................................................................... 420 REGULAÇÃO EXCESSIVA E AVALIAÇÃO DE EXCEÇÃO: UMA ANÁLISE SOBRE OS FUNDAMENTOS TÉCNICOS E LEGAIS DA EXPANSÃO DOS CURSOS DE ADMINISTRAÇÃO, ENFERMAGEM, PEDAGOGIA E ENGENHARIA CIVIL ENTRE 2004 E 2014 ........................................................................................................................ 436 EIXO 4 – TRABALHO DOCENTE NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR . 452 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 4 “É PRO INTERIOR, VAMOS EXPANDIR DE QUALQUER JEITO”: ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE A INTERIORIZAÇÃO EM UMA UNIVERSIDADE FEDERAL ............................................................................................................................................ 452 A FLEXIBILIZAÇÃO, FRAGMENTAÇÃO E PRECARIZAÇÃO DOS PROCESSOS DE TRABALHO NO EAD: O CASO CEDERJ ...................................................................... 468 A PARTICIPAÇÃO DOS PROFESSORES NA GESTÃO DAS UNIVERSIDADES PORTUGUESAS: ENTRE O COLEGIADO E O GERENCIADO. ................................. 487 A REFLEXIVIDADE DE DONALD SCHÖN E AS POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO BRASIL NA DÉCADA DE 1990.................................................... 503 APONTAMENTOS NARRATIVOS SOBRE O COTIDIANO DOCENTE .................... 519 CONTRADIÇÕES E MEDIAÇÕES NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: O TRABALHO DO PROFESSOR E DO TUTOR ....................................................................................... 536 INDIVIDUALISMO, NORMOPATIA E DEGRADAÇÃO DO COLETIVO: ANÁLISE DE UMA CRISE DE GESTÃO DEPARTAMENTAL NO CONTEXTO DE EXPANSÃO UNIVERSITÁRIA.............................................................................................................. 550 NEM TUDO SÃO FLORES OU CASCALHOS: AS RELAÇÕES ENTRE SOFRIMENTO-PRAZER NAS ATIVIDADES QUE COMPÕEM O OFÍCIO DO PROFESSOR DA PÓS-GRADUAÇÃO DA UNESP........................................................ 565 O TRABALHO DO PROFESSOR PESQUISADOR JOVEM-DOUTOR NA PÓSGRADUAÇÃO ................................................................................................................... 580 A INTENSIFICAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE NA UFPA .................................... 598 TRABALHO DOCENTE PRECARIZADO: UM PANORAMA ATUAL DA SITUAÇÃO DOS CONTRATOS DE PROFESSORES SUBSTITUTOS NA UFF. ............................. 617 UERJ EM TEMPO PRESENTE: TECENDO REFLEXÕES SOBRE O TRABALHO DOCENTE NO CONTEXTO NEOLIBERAL. ................................................................. 637 “OS QUE PERMANECEM SÃO OS GUERREIROS”: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A INTERIORIZAÇÃO DA UFMA ...................................................................... 658 EIXO 5 - ACESSO E PERMANÊNCIA NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ................................................................................................................................................ 674 A EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO ESTADO DE MATO GROSSO: PERÍODO 2000-2013 ......................................................................................................... 674 A PERMANÊNCIA DE ACADÊMICOS NEGROS E INDÍGENAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL: UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL NA UFGD ................................................................................................. 687 A UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS: UMA ANÁLISE DAS AÇÕES DE ACESSO E PERMANÊNCIA ....................................................................... 706 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 5 POLÍTICAS E AÇÕES DE ACESSO E PERMANÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: O CASO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS ...................... 706 ACESSO E PERMANÊNCIA NA GRADUÇÃO A DISTANCIA E PRESENCIAL: ANALISE NO BRASIL E REGIÃO CENTRO OESTE ................................................... 729 ACESSO, PERMANENCIA E AÇÃO AFIRMARTIVA NA UNEMAT: PRESENÇA NEGRA, CÂNONE E “NOVAS” EPISTEMES ................................................................ 740 ALGUNS INDICADORES DE PERMANÊNCIA/ABANDONO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ELEMENTOS PARA O DEBATE ............................................................... 754 DE QUE DISTÂNCIA SE FALA QUANDO SE ANALISA O DESEMPENHO DOS ESTUDANTES DO CEDERJ ............................................................................................ 773 DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR EM DISCUSSÃO: O QUE DIZEM DISSERTAÇÕES E TESES DE PROFESSORES DA UNEMAT.................................... 784 EDUCAÇÃO ESPECIAL NAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS: O PROGRAMA INCLUIR COMO ESTRATÉGIA DE PERMANÊNCIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA ................................................................................................................... 798 ELEMENTOS QUE INTERFEREM NA PERMANÊNCIA DO ESTUDANTE NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PÚBLICA ................................................................................ 815 ESTRATÉGIAS DE PERMANÊNCIA DE ESTUDANTES NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL (UEMS) ..................................................... 831 EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: O PERFIL DOS EVADIDOS DO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DA UAB/UFRN ........................................................................................ 852 EXPANSÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO SUPERIOR: QUALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES?.................................................................................. 872 MOVIMENTO MEANDROSO DE EXPANSÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL A PARTIR DA DÉCADA DE 1990: A EVASÃO COMO UM ENTRAVE PARA A UNIVERSALIZAÇÃO.................................................................... 886 O PERFIL DOS ESTUDANTES INGRESSANTES DO CURSO DE ESTATÍSTICA DA UFMT DE 2010 A 2013. .................................................................................................... 902 O PRESTIGIO SOCIAL DOS CURSOS DA SAÚDE NA UFPB .................................... 917 PAULO FREIRE E A CATEGORIA EMANCIPAÇÃO: UM ENSAIO TEÓRICO PARA ANÁLISE DO ACESSO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR .................................................. 935 PERFIL DOS GRADUADOS EM MEIO A EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR NO ESTADO DE MATO GROSSO: MUDANÇAS OU PERMANÊNCIAS? ....................... 947 PERMANÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: PERSPECTIVA DOS CONCLUINTES DE UM CURSO DE ENFERMAGEM .............................................................................. 967 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 6 PERMANÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: IDEIAS QUE PAUTAM A NORMATIZAÇÃO E A PRODUÇÃO TEXTUAL .......................................................... 983 POLÍTICAS DE ACESSO PARA AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR: DESAFIOS DAS EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS ................................. 1000 POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR E O ACESSO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA................................ 1013 POLÍTICAS DE EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR IMPLANTADAS PELO ESTADO BRASILEIRO: REFLEXÕES SOBRE DEMOCRATIZAÇÃO ..................... 1032 REFLEXOES SOBRE “EXPANSÃO X PERMANÊNCIA” NA UFPB ........................ 1051 EIXO 6 - PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ......................................................................................................................... 1069 A PÓS-GRADUAÇÃO E A PESQUISA NO BRASIL: PROCESSOS DE REGULAÇÃO E DE RECONFIGURAÇÃO DA FORMAÇÃO E DA PRODUÇÃO DO TRABALHO ACADÊMICO .................................................................................................................. 1069 INSTITUCIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA NO BRASIL: EXPANSÃO E ASSIMETRIAS REGIONAIS ................................................................ 1085 AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTISMO E O PROCESSO DE CRIAÇÃO E INTERIORIZAÇÃO DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS DA REGIÃO CENTROOESTE .............................................................................................................................. 1103 INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL: ALGUMAS ANÁLISES DO PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS..................................... 1119 INTERNACIONALIZAÇÃO OU TRANSNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ENTRE A FORMAÇÃO DE UM CAMPO SOCIAL GLOBAL E UM MERCADO DE ENSINO MUNDIALIZADO ................................................................ 1138 INTERNACIONALIZAÇÃO, REGIONALIZAÇÃO, INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO SUPERIOR: REVISANDO CONCEITOS ...................................................................... 1167 NOVO DESENVOLVIMENTISMO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL E PROCESSOS DE EXPANSÃO E INTERIORIZAÇÃO DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS ....................................................................................................................... 1186 POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL: UM PROGRAMA DE PESQUISA A PARTIR DE SOBRE O ESTADO, DE PIERRE BOURDIEU ................. 1203 EIXO 7 – EDUCAÇÃO SUPERIOR DO CAMPO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ......................................................................................................................... 1215 A CONSTRUÇÃO DE SABERES ORIUNDOS DA PRÁTICA PEDAGÓGICA DOS ALUNOS DE PEDAGOGIA DA TERRA ....................................................................... 1215 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA EDUCAÇÃO SUPERIOR E O FECHAMENTO DE ESCOLAS NO CAMPO SERGIPANO ..................................................................... 1234 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 7 EDUCAÇÃO SUPERIOR DO CAMPO: DESAFIOS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS E DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS NA IMPLANTAÇÃO DAS LICENCIATURAS EM EDUCAÇÃO DO CAMPO .............................................................................................. 1247 EDUCAÇÃO SUPERIOR DO CAMPO: CONTRIBUIÇÕES E DESAFIOS DA ALTERNÂNCIA NO CONTEXTO DE FORMAÇÃO DOS EDUCADORES .............. 1265 REFLEXÕES SOBRE A EXPANSÃO DAS LICENCIATURAS EM EDUCAÇÃO DO CAMPO ............................................................................................................................ 1296 TRABALHO DOCENTE NA LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: AMPLIANDO O DEBATE E PROPOSIÇÕES PARA O TRABALHO COLETIVO ENTRE UNIVERSIDADE E EDUCAÇÃO BÁSICA DO CAMPO............................... 1315 UMA ANÁLISE DO P.P.C DO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM AGRICULTURAS AMAZÔNICAS E DESENVOLVIMENTO AGROAMBIENTAL (DAZ) - UFPA....... 1333 INTERDISCIPLINARIDADE E A EDUCAÇÃO DO CAMPO: A LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO PROCAMPO/IFPA CAMPUS DE CASTANHAL ............ 1348 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 8 PREFÁCIO A Rede Universitas/Br consolida uma rede acadêmica, com pesquisadores de universidades públicas de todas as regiões do país, para a pesquisa e a interlocução entre pares que têm em comum a área de conhecimento da educação superior. Congrega pesquisadores do GT Política de Educação Superior/ANPEd e tem como um dos seus objetivos no momento o desenvolvimento da pesquisa “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil” com financiamento do OBEDUC/CAPES. O XXIII Seminário da Rede Universitas/Br tem como temática central a discussão de políticas, programas e ações relativas à expansão da educação superior no Brasil, com ênfase para a nova configuração do setor privado-mercantil, após o ingresso das universidades privado lucrativas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), destacando-se as alterações na organização institucional com as aquisições e fusões de instituições e a formação de grandes conglomerados que representam a maior oferta desse nível de ensino no país e a segunda maior oferta privada da América Latina. Essa nova configuração reconstrói os caminhos da mercantilização, da privatização e empresariamento da educação superior em um novo patamar com repercussão direta financiamento, na formação do trabalhador, no trabalho do docente, na avaliação e produção do conhecimento. São essas e outras questões que os pesquisadores UNIVERSITAS/Br buscaram refletir no evento. do no na do O XXIII Seminário da rede Universitas/Br teve como objetivos: Reunir investigadores, graduandos, pós-graduandos e pesquisadores em estágio pósdoutoral em torno da temática da expansão privado-mercantil da Educação Superior, que vem se constituindo numa preocupação das políticas nacionais e internacionais no contexto da sociedade mundializada; Divulgar e socializar a produção científica dos pesquisadores vinculados ao projeto integrado “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil”; Analisar e programar as novas fases do projeto integrado; Possibilitar intercâmbio entre os diversos Grupos de Pesquisa sobre Educação Superior no Brasil; Refletir e construir novas perspectivas de pesquisa e possibilidades de intercâmbios institucionais. O evento foi realizado com diferentes momentos de discussão sobre a temática da Educação Superior com Conferência de Abertura, Mesas temáticas e apresentação de oitenta trabalhos por eixos temáticos, selecionados pelo Comitê Científico e que integram os Anais. Também foram realizadas reuniões de discussão sobre o Projeto de Pesquisa Integrado em andamento que conta com o financiamento do OBEDUC/CAPES ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 9 ORGANIZAÇÃO Comissão Organizadora Geral: Vera Lúcia Jacob Chaves – Coordenadora do Evento – UFPA Deise Mancebo – Coordenadora do Projeto Integrado – UERJ João dos Reis Silva Júnior - UFSCar João Ferreira de Oliveira – Coordenador da Rede Universitas/Br – UFG José Vieira de Sousa – UnB Arlete Maria Monte de Camargo – UFPA Luciene Miranda Medeiros – UFPA Olgaíses Cabral Maués – UFPA Salomão Mufarrej Hage – UFPA Comitê Científico: Alda Maria Duarte (UFRN) Afrânio Mendes Catani (USP) André Rodrigues Guimarães (UNIFAP) Arlete Maria Monte de Camargo (UFPA) Carina Elizabeth Maciel (UFMS) Carla Vaz dos Santos Ribeiro (UFMA) Deise Mancebo (UERJ) – Coordenadora do OBEDUC Denise Bessa Leda (UFMA) Fabíola Kato (UFPA) João dos Reis Silva Júnior (UFSCAR) João Ferreira de Oliveira (UFG) José Carlos Rothen (UFSCar) José Vieira de Sousa (UNB) – Coordenador do GT-11 Karine Nunes de Moraes (UFG) Luciene Miranda Medeiros (UFPA) Maria das Graças Medeiros Tavares (UFAL/UNIRIO) Maria do Carmo de Lacerda Peixoto (UFMG) Maria Edilene da Silva Ribeiro (UFPA) Mário Azevedo (UEM) Monica Molina (UNB) Nelson Cardoso Amaral (UFG) Olgaíses Cabral Maués (UFPA) Salomão Hage (UFPA) Stella Cecília Duarte Segenreich (UCP) Tereza Christina Mertens Aguiar Veloso (UFMT) Vera Lúcia Jacob Chaves (UFPA) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 10 Comissão Organizadora Local: Secretaria Valéria Silva de Moraes Novais (Coordenadora) Michele Borges de Souza (Coordenadora) Ana Paula Batista da Silva Ana Silvia Ferreira Martins Antonia Vanessa Freitas Silveira Giselle dos Santos Ribeiro Joselene Ferreira Mota Leila Maria Costa Sousa Rosimary Silva dos Santos Infraestrutura Laurimar de Matos Farias (Coordenador) Andréa Cristina Cunha Solimões Antonio Claudio Andrade dos Reis Débora Regina Almeida Eduardo Silva de Morais Iza Cristina Prado da Luz João Paulo Costa Lima João Ribeiro dos Santos Filho Lena Letícia do Nascimento Braga Lenilson Corrêa Pureza Márcia Cristina Lopes e Silva Nemésio Lopes Monteiro Júnior Robson dos Santos Bastos Tarcísio da Silva Cordeiro Zaira Valeska Dantas da Fonseca Logística Luciana Rodrigues Ferreira (Coordenadora) Amanda Caroline Soares Freires Maria Dayse Henriques Camargo Rafael Costa Martins Rhoberta Santana Araújo Divulgação Ivône Rosa Cabral (Coordenadora) Edinilza Magalhães da costa Souza Darinêz da Conceição Lima Helen do Socorro de Araújo Silva ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 11 Karoline Nascimento da Silva Maria Celeste Gomes de Farias Tayanne de Fátima Almeida Tabosa Prestação de Contas Fabíola Bouth Grello Kato (Coordenadora) Luciana Rodrigues Ferreira Cultura Joana Carmen do Nascimento Machado (Coordenadora) Ricardo Augusto Gomes Pereira ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 12 EIXO 1 - FINANCIAMENTO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR A POLÍTICA DEFINANCIAMENTO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: COMPARAÇÕES ENTRE A CONAE E O PNE. Leila Maria Costa Sousa [email protected] Universidade Federal do Pará Valéria Silva de Moraes Novaes [email protected] Universidade Federal do Pará Vera Lúcia Jacob Chaves [email protected] Universidade Federal do Pará RESUMO O trabalho apresenta resultados de pesquisa realizada sobre a política de expansão da educação proposta na Conferência Nacional de Educação (CONAE-2010) e a aprovada no Plano Nacional de Educação (PNE). Os dados foram levantados no Censo da Educação Superior e no documento final da CONAE, no PL Nº 8.035/2010 e no novo PNE. As conclusões apontam que a política de expansão da educação superior prioriza o setor privado em detrimento do público em especial por meio da proposta de financiamento aprovada que ampliará os programas de isenção fiscal. Constatamos, também, que o PNE não exprime todas as deliberações da CONAE. Palavras-chave: Expansão da Educação Superior, PNE, CONAE. Abstract The paper presents results of research carried on the expansion policy of the proposed education at the National Conference on Education (CONAE-2010) and approved the National Education Plan (PNE). The data were collected in the Census of Higher Education and the final document of CONAE, the PL No. 8,035 / 2010 and the new PNE. The findings show that the policy of expanding higher education prioritize the private sector over public especially through the approved financing proposal which will increase the tax exemption programs. We note, too, that the PNE does not express all the deliberations of CONAE. Keywords: Expansion of Higher Education,PNE, CONAE ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 13 INTRODUÇÃO O cenário da educação superior brasileira tem sido marcado por profundas transformações político-econômicas e sociais, que estiveram/estão orientadas por uma conjuntura internacional que influenciou/influencia os delineamentos da politica educacional das últimas décadas. Um fato bastante significativo que vem ocorrendo é a desenfreada expansão desse nível de ensino, especialmente no setor privado. Esse fenômeno suscita algumas indagações fundamentais: Como tem se caracterizado e efetivado o financiamento dessa expansão? Como está a distribuição das matriculas na educação superior do país? Qual o papel do Estado nessa dinâmica? Aliado a isso, é preciso localizar essa discussão na atual politica educacional, tendo o Plano Nacional de Educação (2014-2024) aprovado a partir da lei 13.005/2014 e que orientará as ações educacionais dos próximos dez anos. Nessa direção, precisamos considerar que numa sociedade capitalista, marcada por projetos de sociedade divergentes, e consequentemente com interesses e objetivos diferenciados, urge compreendermos como estes foram construídos e estabelecermos relações com o contexto atual. Diante disso, o presente trabalho tem como objetivo apresentar algumas comparações entre a política de expansão da educação superior proposta na Conferência Nacional de Educação (CONAE-2010) e a aprovada no Plano Nacional de Educação (PNE) e trazer reflexões sobre o financiamento proposto para essa expansão em ambos os documentos. Para desenvolvermos esta pesquisa1 tomamos como base de estudo e análises as informações sistematizadas no Censo da Educação Superior e disponibilizadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira do Ministério da Educação (INEP/MEC). Utilizamos ainda como referenciais teóricos autores como Chaves; Silva Júnior; e Catani (2013) e outros. Além disso, analisamos as deliberações trazidas pela Conferência Nacional da Educação (CONAE, 2010) em seu documento final, bem como as metas e estratégias relativas à Educação Superior contidas no PNEe o que de fato foi aprovado na Lei nº 13.005/2014, o que nos permitiu fazer comparações entre os dois documentos. Pesquisa financiada pelo Observatório da Educação – OBDUC/CAPES e desenvolvido no Grupo de Estudos e Pesquisas Sobre Educação Superior- GEPES/UFPA. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 1 14 Diante dos objetivos deste trabalho, dividimos o texto em duas partes. A primeira contempla uma breve discussão acerca das especificidades das propostas de ações e metas para o PNE, apresentando um comparativo entre as deliberações da sociedade civil que constituíram o documento final da CONAE- Construindo o Sistema Nacional Articulado: O Plano Nacional de Educação, Diretrizes e Estratégias de Ação e o que foi efetivamente aprovado no PNE 2014-2024. Na segunda parte, trazemos alguns dados que nos mostram a configuração da expansão da educação superior no país, estabelecendo paralelos entre as formas de financiamento dessa expansão, bem como o PNE visa incentivar essa dinâmica mediante metas e ações para a próxima década. Nas considerações finais estabelecemos algumas reflexões diante do cenário de fortalecimento do setor privado. BREVE ANÁLISE SOBRE O PNE 2014-2024- AVANÇOS E RECUOS EM RELAÇÃO À PROPOSTA DA CONAE/2010 E ONOVO PNE. A Educação Superior no Brasil tem sofrido um processo de mercantilização, evidenciado principalmente pela comercialização do direito à educação, onde o setor privado tem se sobrepujado ao público, sob diferentes aspectos, seja de estímulo por parte do Governo Federal mediante ações de fortalecimento da lógica mercadológica, seja pela desresponsabilização do Estado em ampliar a educação pública no país. Esse processo se intensificou na década de 1990 e está intrinsecamente ligado à configuração capitalista que em sua nova reordenação necessita formar um perfil de trabalhador para assumir novas competências e habilidades, bem como uma nova mentalidade capaz de atenderem as demandas do mercado. Assim sendo, as Instituições de Educação Superior (IES) seguem também os direcionamentos definidos pelos organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (BM). Segundo Chaves, Silva Júnior e Catani (2013), “o projeto neoliberal de educação desses organismos internacionais para os países periféricos do capital é caracterizado pelo aprofundamento da privatização, pela desnacionalização da educação e consolidação de um novo mercado educativo global” (CHAVES, SILVA JÚNIOR, CATANI, 2013, p. 7). Assim sendo, observa-se no cenário atual ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 15 da educação superior brasileira a adoção de uma política de favorecimento da expansão do setor privado por meio de isenções fiscais, empréstimos subsidiados e outras formas. Nesse contexto de transformação da educação em mercadoria negociável no mercado capitalista e de negação de direitos sociais básicos para atender as recomendações dos organismos internacionais de ajuste fiscal do Estado, o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional o projeto de Lei nº 8.035, com o novo Plano nacional de Educação (PNE), que estabelece metas e diretrizes para a educação nacional a serem implantadas em 10 (dez) anos. (CHAVES, SILVA JÚNIOR, CATANI, 2013, p. 8). No ano de 2010 o Executivo Federal enviou proposta do novo PNE por meio do Projeto de Lei Nº 8.035/2010, cujo anexo compõe-se por 20 metas e 170 estratégias, que envolvem diversas questões relativas à educação nacional. Após quase quatro anos de discussão no Congresso Nacional, em junho de 2014 finalmente o Plano Nacional de Educação – PNE foi aprovado e sancionado pela presidenta Dilma Rousseff, por meio da Lei Ordinária Nº 13005/2014. É importante destacar que antes de ser aprovado o PNE passou por um longo processo de discussão em sua elaboração tendo seu marco a realização da Conferência Nacional de Educação (CONAE), no ano de 2010, que aprovou o documento final no qual apresenta concepções e prioridades que deveriam ser inseridas no novo PNE. E no que diz respeito ao financiamento da educação, o documento da CONAE (2010) afirma que: Tendo em vista a necessidade de efetivação e/ou consolidação de políticas educacionais direcionadas à garantia de padrões de qualidade social e de gestão democrática, destacam-se as seguintes diretrizes a serem consolidadas, com vistas a um novo PNE como política de Estado: [...] h) consolidação das bases da política de financiamento, acompanhamento e controle social da educação, por meio da ampliação dos atuais percentuais do PIB para a educação, de modo que, em 2014, sejam garantidos no mínimo 10% do PIB. (BRASIL; MEC; INEP, 2011). Em relação ao financiamento da educação superior, o documento final da CONAE 2010, evidencia uma posição clara em defesa da utilização de recursos públicos para a manutenção e expansão do ensino superior público, como pode ser observado no extrato a seguir destacado: a) Realizar estudos para estabelecer um Fundo de Manutenção e desenvolvimento da Educação Superior Pública, vinculando, de forma adequada, recursos dos impostos, taxas e contribuições, de modo a efetivar a autonomia universitária prevista na CF/1988; ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 16 b) Estabelecer parâmetros para a distribuição dos recursos entre as instituições públicas que considere, em seu conjunto, as diversas atividades desenvolvidas pelas instituições; c) Definir as condições a serem satisfeitas por estados, distrito federal e municípios para demandarem recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Superior pública; d) Garantir recursos orçamentários para que as universidades públicas possam definir e executar seus próprios projetos de pesquisa, propiciando uma efetiva autonomia de pesquisa; e) Alocar recursos financeiros específicos para a expansão da graduação nas instituições públicas no período noturno, com a condição de que o número de vagas nesse período seja 1/3 (um terço) do número total de vagas; f) Definir parâmetros que expressem a qualidade da instituição de educação superior e estabelecer que o volume mínimo de recursos financeiros seja alocado para que as atividades de ensino (graduação e pós-graduação), pesquisa e extensão reflitam a qualidade estabelecida; g) Estabelecer programas de apoio à permanência dos/das estudantes nas instituições públicas, considerando-se que há a necessidade de provocar uma grande expansão dos cursos de graduação dos cursos presenciais. h) Ampliar a discussão sobre a política do Prouni e do Reuni, para que os recursos públicos destinados a estes programas possam ser revertidos à ampliação, melhoria e reestruturação das instituições públicas de ensino superior, fortalecendo seu caráter público, gratuito e de qualidade. i) Garantir orçamentos às políticas de acesso e permanência na educação superior para inclusão dos negros, povos indígenas, além de outros grupos e extratos sociais historicamente excluídos desses níveis de ensino. j) Garantir financiamento do governo federal ou estadual nos campi universitários públicos para oferta de curso de graduação, pós-graduação, mestrado e doutorado aos/às profissionais da educação. (p. 116-117). Observa-se, no entanto, que no Projeto de Lei Nº 8.035/2010, encaminhado pelo governo federal ao Congresso Nacional, essa proposta não foi incorporada, ao contrário, o texto do PL evidencia uma política de favorecimento do setor privado por meio da ampliação dos programas de isenções fiscais existentes (PROUNI) bem como da extensão do FIES para os cursos de pós-graduação. A seguir estão destacadas quatro das cinco metas que se referem sobre a expansão da oferta na educação superior e as respectivas estratégias que indicam como deveriam ser financiadas, veja: Meta 12: Elevar a taxa bruta de matricula na educação superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos, assegurando a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40 (quarenta por cento) das novas matrículas no segmento público. Meta 13: Elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo 35% (trinta e cinco por cento) doutores. A Meta 14: Elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto senso de modo a atingir a titulação anual de 60 mil mestres e 25 mil doutores. Meta 20- Ampliar o investimento em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do produto interno bruto do país – PIB do ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 17 País no 5º (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio (BRASIL, 2014). Entre as estratégias para atingir essas metas, referentes ao financiamento, destacamos: 12.6 Expandir o financiamento estudantil por meio do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior- FIES, de que trata a Lei Nº 10.260, de 12 de junho de 2001, com a constituição de fundo garantidor do financiamento de forma a dispensar progressivamente a exigência de fiador. 14.1 expandir o financiamento da pós-graduação stricto senso por meio das agências oficiais de fomento e a estratégia 14.3 - Expandir o financiamento estudantil por meio do FIES à pós-graduação stricto senso; 20.3 – destinar à manutenção e desenvolvimento do ensino, em acréscimo aos recursos vinculados nos termos do art. 212 da Constituição Federal, na forma da lei específica, a parcela da participação no resultados ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e gás natural e outros recursos, com a finalidade de cumprimento da meta prevista no inciso VI do caput do art. 214 da Constituição Federal; 20.5 desenvolver, por meio do Instituto Nacional de Estudos Educacionais Anísio Teixeira – INEP, estudos e acompanhamento regular dos investimentos e custos por aluno da educação básica e superior pública, em todas as etapas e modalidades; 20.6 – no prazo de 2 (dois) anos da vigência deste PNE, será implantado o Custo Aluno-Qualidade inicial – CAQi, referenciado no conjunto de padrões mínimos estabelecidos na legislação educacional e cujo financiamento será calculado com base nos respectivos insumos indispensáveis ao processo de ensino-aprendizagem e será progressivamente reajustado até a implementação plena do Custo-Aluno-Qualidade – CAQ. O que observamos é que as metas propostas e destacadas acima tratam da expansão e financiamento da educação superior, contudo, necessitamos de maior clareza quanto ao que deve ser feito para atingir as mesmas, por exemplo, a meta 13 não traz nenhuma estratégia para conseguir o financiamento necessário para o atendimento da mesma. Sobre a meta 20, no que diz respeito às suas estratégias, houve uma alteração bem significativa entre o PL 8.035 e o PNE aprovado, pois aquele trazia a seguinte: “20.1 Garantir fontes de financiamento permanentes e sustentáveis para todas as etapas e modalidades da educação pública” (BRASIL, PL 8035, p.18, 19, grifos nossos) e no novo PNE passou a ter a seguinte redação “garantir fontes de financiamento permanentes e sustentáveis para todos os níveis, etapas e modalidades da educação básica, [...]” (BRASIL, 2014). Fica evidente que enquanto naquele documento (PL) se fazia referência à todas as etapas da educação, neste (PNE) referese apenas à educação básica desfavorecendo então o ensino superior. Percebe-se ainda que existem pontos diferentes entre o PNE aprovado pelo governo e a proposta aprovada pela CONAE 2010, pois o PNE diz que serão destinados recursos, porém, não traz clareza e não especifica o montante desses recursos. E ainda, entre as duas propostas há um diferencial de três por cento do PIB, pois, enquanto a governamental propõe ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 18 sete por cento, a CONAE 2010 propõe dez por cento para a educação. Além disso, o PNE 2014- 2024, não estipula data e nem meios de incrementar anualmente o alcance da meta 20. Outra observação a ser feita é que na “Exposição de Motivos“ do PL Nº 8.035/2010não foi apresentado nenhum diagnóstico da educação brasileira dificultando assim o entendimento da atual situação da educação no país e, em especial o nível superior cujo maior número de matrículas está nas IES privado/mercantis. Certamente que um diagnóstico adequado da educação nos permitiria entender, dentre outros aspectos, como são as condições em que trabalham e estudam jovens e adultos de 18 a 24 anos se pesarmos a distribuição de renda que não é justa em nosso país. Como percebemos ainda nos encontramos diante do desafio de que o Plano Nacional de Educação seja um instrumento político que realmente alcance os anseios e deliberações da sociedade civil trazidos na Conferência Nacional de Educação (CONAE 2010), pois são significativas para que alcancemos uma educação de qualidade como direito público. Foi aprovado o Novo Plano Nacional de Educação (PNE), mas infelizmente continuamos a esperar que o mesmo não seja mais uma “carta de intenções” como aconteceu com o antigo PNE, pois este não trouxe o planejamento orçamentário de forma clara, continha ambiguidades e, além disso, houve os nove vetos determinados pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. A EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: IMPLICAÇÕES NO FINANCIAMENTO DOPÚBLICO E DO PRIVADO. Sabemos que a expansão tem se dado com o crescimento numérico das instituições privadas, especialmente as que se organizam como empresas comerciais, o que gera na maioria das vezes, resultados insatisfatórios com a qualidade da formação, uma vez que elas não estão voltadas para a produção de conhecimento e desenvolvem o ensino em carreiras que exigem baixos investimentos. E sobre o processo de mercantilização da Educação, a CONAE 2010 em seu documento final, nos diz que: [...] sobretudo a partir da segunda metade da década de 1990, fez-se acompanhar de uma diminuição gradativa dos recursos para manutenção e expansão das instituições federais de ensino superior, particularmente das universidades federais. Por essa razão, ocorreu, em certa medida, um processo de intensificação da mercantilização da educação superior, tanto no setor privado como no setor público. No caso das universidades federais, observou-se a ampliação no número de convênios e contratos, visando o aumento de recursos próprios. (CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2010, p. 68). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 19 Os dados trazidos abaixo nos mostram especialmente o crescimento do setor privado em detrimento do público o que enfatiza o grande processo de privatização pelo qual passa o Ensino Superior no país. Gráfico 1- EVOLUÇÃO NOS NÚMEROS DE MATRÍCULA NA GRADUAÇÃO POR SETOR PÚBLICO E PRIVADO- BRASIL -2010-2013. Fonte: Dados Mec/Inep (organização e elaboração nossa). O gráfico acima nos mostra que houve aumento no número de matrículas na graduação tanto no setor público quanto no privado, porém percebemos que o crescimento foi maior no privado, pois enquanto no setor público a porcentagem ficou entre 25,8% em 2010 e 27% em 2012 que foi o máximo atingido; o privado teve a maior parte ficando entre 74,2% e 73,1% em igual período. Nos anos de 2011 e 2013 a mesma categoria registrou um percentual de 73,7% e 73,5% respectivamente contra apenas 26,3% e 26,5%, ou seja, a matrícula no setor privado tem tido um crescimento gigante em relação ao público. O que notamos com os dados acima é que a expansão da educação superior dá-se com o crescimento disparado do setor privado em relação ao público. Com o discurso de democratização e inclusão social o governo federal criou mecanismos para expandir a Educação Superior, exemplos desses mecanismos é o programa Universidade para Todos (Prouni), cuja Lei nº 11.096, de janeiro de 2005 que oferta bolsas de estudos a estudante de baixa renda, e o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) medidas ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 20 essas que concedem isenção fiscal às instituições privadas que ofertam tais bolsas. Obviamente que os programas citados acima- Prouni e Fies são exemplos desse processo de privatização para a expansão do Ensino Superior e percebemos que o novo PNE está de acordo com essas políticas de expansão e financiamento em que a meta 12 traz como uma de suas estratégias a 12.6 citada acima e a 12.20 que diz que se pretende ampliar por meio do FIES e PROUNI “os benefícios destinados à concessão de financiamento a estudantes regularmente matriculados em cursos superiores presenciais ou à distancia [...]” (BRASIL, 2014 p. 12 ). Enquanto o governo concede renúncia fiscal para as instituições privadas, deixa também de investir no setor público e assim as instituições federais de ensino superior, a exemplo, sofre as mazelas com a falta de investimento público. Ou seja, podemos dizer que a educação tem passado por um processo intenso de privatização. Privatização nos moldes empresariais, consubstanciando uma acentuada mercantilização da educação superior por meio do incremento das oportunidades educacionais em instituições e cursos cada vez mais diferenciados em termos de qualidade acadêmica (OLIVEIRA; DOURADO, 2005, P. 58). 4- CONCLUSÃO A pesquisa realizada é de fundamental relevância na medida em que discorre e revela as transformações pelas quais passa a educação superior no Brasil, que nos mostra, dentre outras coisas que o eixo de entendimento da educação como um bem de domínio transformou-se como bem de interesse privado, passível de comercialização, atendendo, até mesmo, aos interesses de organismos internacionais. Assim sendo, o que apreendemos dos referenciais teóricos e das análises de documentos oficiais nacionais, indicam mudanças significativas, de modo a alterar a estrutura organizativa das instituições públicas de educação superior, favorecendo o setor privado e menosprezando o público. Observamos também que o PNE (2014-2024), ao deixar de estabelecer com clareza a implementação de metas relativas ao financiamento contribui para inviabilizar o PNE como política de Estado. As comparações entre os documentos supracitados nos mostraram que há grandes divergências entre o que a sociedade civil esperava (e espera) que se encontra no documento final da CONAE (2010) e o que de fato prevê aquele, e não podemos deixar de observar que há necessidade de maior luta para que futuramente a educação superior possa ser efetivada como um dever do Estado uma vez que a mesma é um direito público e universal. Quanto aos dados estes nos confirmam que o grande crescimento na expansão da educação superior se dá ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 21 por meio do setor privado o que só nos confirma o que outros estudos nos mostram, que a educação superior é alvo de disputa entre interesses públicos e privados uma vez que está inserida dentro das exigências do mercado e da economia, respondendo até aos direcionamentos de organismos internacionais como posto acima. A Educação superior como bem público deve ser papel do Estado e deve objetivar o acesso democrático ao conhecimento para contribuir com a construção da cidadania e o desenvolvimento da sociedade. REFERÊNCIAS: CHAVES, Vera Jacob; SILVA JÚNIOR, João dos Reis; CATANI, Afrânio Mendes (org.). A universidade brasileira e o PNE: Instrumentalização e mercantilização educacionais. São Paulo: Xamã, 2013, p. 9-14. BRASIL. CONAE-2010- Construindo o sistema nacional articulado de educação: o plano nacional de educação, diretrizes e estratégias de ação (Documento Oficial). Disponível em: <http://www.conae.mec.gov.br>. acesso em: 30 set. de 2014. Lein°10.172de09de janeiro de 2001. DispõesobreasmetasparaaEducaçãoBrasileira-o Plano Nacional da Educação. Disponível em: <http://www.mec.gov.br>. Acesso em 20 jun. de 2014. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da Educação Superior 2010: Brasília, DF: Inep 2010. _________.Ministério da Educação. Lei nº 13.005 de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação–PNE. Brasília, DF, 2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm. Acesso em: 25 março de 2015 . _________. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da Educação Superior 2011: Brasília, DF: Inep 2010. _________. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da Educação Superior 2012: Brasília, DF: Inep 2010. _________. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da Educação Superior 2013: Brasília, DF: Inep 2010. Disponível em: http://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/apresentacao/2014/coletiva_ce nso_superior_2013.pdf. Acesso em: 25 fev. 2015. OLIVEIRA, J. F.; DOURADO, L. F. Educação superior: o público e o privado na produção do trabalho e da vida acadêmica. In: ADRIÃO, T.; PERONI, V. (org.). O público e o privado na educação: interfaces entre Estado e Sociedade. São Paulo: xamã, 2005. P. 5780. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 22 A PROPOSTA DE “REGULAMENTAÇÃO DA AUTONOMIA” E DE VINCULAÇÃO DO FINANCIAMENTO DAS UNIVERSIDADES PARANAENSES À RECEITA TRIBUTÁRIA LÍQUIDA APRESENTADA PELO GOVERNO BETO RICHA EM FEVEREIRO DE 2015 Luiz Fernando Reis [email protected] Unioeste/UERJ RESUMO O objetivo deste trabalho é discutir a proposta de “concessão de autonomia financeira às IEES” apresentada, em fevereiro de 2015, pelo governador Beto Richa aos reitores das universidades paranaenses. Tal proposta, dentre outros itens, pretendia vincular o financiamento das universidades estaduais do Paraná a um percentual da Receita Tributária Líquida. Em 2002, o governo Lerner apresentou proposta semelhante e foi derrotado por uma greve de docentes e técnicos que perdurou por 169 dias. Desde o final da década de 1990, o governo e alguns reitores defendem a regulamentação da autonomia universitária e as entidades representativas da comunidade universitária se opõem a tal proposta. O movimento docente, organizado no Andes - Sindicato Nacional, se opôs à proposta apresentada pelo governo Beto Richa argumentando que tal proposta era um ataque a direitos garantidos na legislação vigente, como por exemplo, o direito à revisão anual de salários. O governo, pressionado pela greve de docentes e técnicos que perdurou por mais de trinta dias nas sete universidades paranaenses, desistiu de levar adiante a discussão de tal proposta. Palavras-chave: Financiamento do ensino superior; Autonomia Universitária; Vinculação do Financiamento do Ensino Superior à receita tributária. Introdução Neste texto pretendemos expor e discutir a proposta de “concessão de autonomia financeira às IEES” apresentada, em fevereiro de 2015, pelo governador Beto Richa aos reitores das universidades estaduais do Paraná. Tal proposta, dentre outros itens, vinculava o financiamento das universidades estaduais paranaenses a um percentual da Receita Tributária Líquida2. Inicialmente o governo pretendia que tal projeto integrasse um pacote de medidas3 2 De acordo com o “Glossário de Termos Técnicos Usados na Contabilidade Pública”, da Secretária da Fazenda do Paraná, a Receita Tributária corresponde à arrecadação de Tributos, abrangendo os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. A Receita Tributária Líquida corresponde à arrecadação total de tributos, deduzida a parte da receita tributária destinada ao Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação). 3 O pacote de medidas tinha como objetivo a redução dos gastos do Estado e foi enviado pelo Poder Executivo à Assembleia Legislativa do Paraná por meio do Projeto de Lei Complementar (PLC) nº 6/2015. Tal projeto, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 23 que o governador enviou à Assembleia Legislativa, dia quatro de fevereiro de 2015, com o objetivo de cortar gastos do estado e retirar direitos dos servidores, historicamente conquistados após muitos anos de mobilizações e greves. Tal pacote também propunha uma reforma da previdência que colocaria fim à aposentadoria integral e criaria um Fundo Complementar de Previdência, a PrevcomParaná (Fundação de Previdência Complementar do Estado do Paraná), a exemplo do que fez o governo federal em 2012, com a criação do Funpresp (Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal). Por solicitação dos reitores, o projeto de regulamentação da “autonomia financeira das IEES” não foi enviado à Assembleia, na data inicialmente planejada pelo governo. Os reitores por meio de sua entidade representativa, a Associação Paranaense das Instituições de Ensino Superior Públicas do Paraná (Apiesp), solicitaram também a criação de um Grupo de Trabalho para discutir e formular, no prazo de cento e vinte dias, uma proposta de “autonomia das IEES” a ser enviada à apreciação dos deputados estaduais. Tal Grupo4 foi criado posteriormente por meio do decreto estadual nº 546, de 24 de fevereiro de 2015. Os servidores estaduais do Paraná desencadearam greve para reagir à tentativa do governo estadual em restringir seus direitos. Além disso, a deflagração da greve foi motivada também pelo não pagamento do terço de férias no inicio do ano, conforme determina a legislação. Os servidores estaduais, com o protagonismo dos professores da rede de educação básica, ocuparam a Assembleia Legislativa do estado por três dias (de 10 a 13/2/2015). O governo foi forçado a recuar e retirar o pacote de medidas. Os docentes e funcionários das sete universidades estaduais do Paraná acompanharam a movimentação dos demais servidores do estado e realizaram, pela primeira vez, uma greve unificada com a seguinte pauta de reivindicações: a) Pagamento imediato de 1/3 de férias; b) Rejeição do pacote do governo estadual que suprimia direitos (aposentadoria integral e dentre outras proposições, alterava os Planos de Carreiras, Cargos e Salários dos Professores e Funcionários das Escolas Estaduais de Educação Básica restringindo garantias e direitos conquistados e garantidos no Plano de Carreira de tais categorias. O PLC nº 6/2015 propunha, ainda, a extinção do Adicional Tempo de Serviço (quinquênio) e da aposentadoria integral para todos os servidores do estado e, ainda, a instituição da Previdência Complementar. 4 O Grupo de Trabalho seria composto pelo Secretário de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior; pelos Reitores das Universidades Estaduais; um representante da Secretaria da Fazenda; e dois representantes dos Sindicatos de Servidores das Instituições Estaduais de Ensino Superior (Docentes e Agentes Universitários). Tal Grupo não chegou a ser, de fato, constituído. Por pressão dos professores e funcionários das sete universidades em greve, o decreto 546/2015, foi revogado em 10 de março de 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 24 quinquêno); c) Rejeição do projeto de “autonomia financeira” das universidades. Dada a resistência da comunidade universitária, protagonizada pelos docentes e técnicos em greve, o decreto nº 546/2015 que propunha a criação de um grupo de trabalho para discutir a proposta de regulamentação da “autonomia financeira” das universidades paranaenses foi revogado. Desta forma, tal tema foi retirado da pauta de discussões entre o governo, reitorias e sindicatos representativos de docentes e técnicos das universidades paranaenses. Não foi a primeira vez que o governo estadual do Paraná apresentou proposta de “regulamentação da autonomia” com a vinculação de um percentual da receita orçamentária para o financiamento das IEES. O governo Lerner (1995-2002) apresentou em fevereiro de 2002, o Projeto de Lei nº 32/2002, que propunha a “concessão de autonomia plena” e a vinculação do financiamento das universidades estaduais paranaenses a um percentual da arrecadação do ICMs (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias). Devido à resistência dos três segmentos da comunidade, por meio de suas entidades representativas, tal projeto não logrou êxito (REIS, 2014). Estruturalmente, o trabalho está organizado em duas seções, além da introdução e das considerações finais. Na primeira seção, descreveremos o contexto no qual emergiu a proposta de “concessão de autonomia financeira às IEES” e de vinculação do financiamento das universidades estaduais paranaenses a um percentual da Receita Tributária Líquida, apresentada, em fevereiro de 2015, pelo governador Beto Richa aos reitores das universidades estaduais do Paraná. Na segunda seção faremos a discussão da proposta apresentada pelo governo Beto Richa, apresentando as principais razões que levaram o movimento docente do Paraná, organizado no Andes-Sindicato Nacional, a se opor a tal proposta. Entendemos que a proposição governamental de regulamentação da autonomia das IEES paranaenses tem um eixo estruturante comum que é a tentativa de os governos Lerner (1995-2002) e Beto Richa (2011-2018) de desobrigarem o Estado do financiamento integral das IEES paranaenses. A concepção de autonomia que embasou tais propostas é muito semelhante às proposições do Banco Mundial que defende a “concessão” da autonomia às universidades públicas como instrumento para que tais instituições busquem fontes alternativas (privadas) ao financiamento público. O método empregado pelos governos de Lerner (1995-2002) e Beto Richa (20112018) para abrir o debate sobre a “necessidade” de “concessão da autonomia às IEES” foi o ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 25 mesmo: inicialmente, o governo estadual, via decreto, impõe severas dificuldades para o exercício da autonomia administrativa das universidades por meio de um controle externo, que praticamente inviabiliza o funcionamento de tais instituições. Concomitantemente, o governo estadual passa a argumentar publicamente, por meio dos meios de comunicação, que a manutenção das universidades não é uma obrigação do estado do Paraná e que tais instituições têm um grande custo para os cofres públicos. Por sua vez, a Apiesp, entidade representativa dos reitores, passa a defender a regulamentação da autonomia universitária como solução à restrição da autonomia administrativa das universidades e ao problema do financiamento. O enredo relativo à discussão da regulamentação da autonomia universitária foi muito semelhante nos governos Lerner e Beto Richa. A atuação dos principais sujeitos envolvidos em tal processo também se assemelhou nos dois casos. O governo e a Apiesp defendem a regulamentação da autonomia por meio da vinculação do financiamento das universidades à um percentual da receita orçamentária e os movimentos organizados dos três segmentos da comunidade universitária resistem a tal proposta. 1. Breve contextualização da proposta do Governo Beto Richa de concessão da autonomia e de vinculação do financiamento das IEES à Receita Tributária Líquida Antes de propor a “regulamentação da autonomia das IEES”, a exemplo do que fez o governo Lerner, o governo Beto Richa, estabeleceu um controle externo que dificultou ainda mais o exercício da autonomia administrativa das universidades paranaenses. O governador expediu, em 18 de março de 2013, o decreto nº 7.599 que criou o “Conselho de Gestão Administrativa e Fiscal do Estado, como colegiado de assessoramento direto ao Governador do Estado” (PARANÁ, 2013). Tal decreto, num flagrante desrespeito à autonomia das universidades, submeteu, inicialmente, todas as universidades às deliberações do “Conselho de Gestão Administrativa e Fiscal do Estado”. De acordo com o decreto nº 7.599/2013, os atos dos órgãos da Administração Direta e Autárquica, inclusive das universidades estaduais, que implicassem em despesas de pessoal deveriam, obrigatoriamente, ser autorizados pelo Conselho de Gestão Administrativa e Fiscal do Estado. Tal Conselho poderia “deliberar previamente” sobre a “conveniência e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 26 oportunidade dos atos que impliquem a efetivação de despesas” tais como: a realização de concurso público; admissão ou contratação de pessoal, inclusive temporários; concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, a qualquer título, tais como promoções, progressões, majorações remuneratórias ou acordos de natureza salarial dos servidores; alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa com pessoal. (PARANÁ, 2013, grifo nosso). A comunidade universitária, por meio de suas entidades representativas, protestou e denunciou o decreto do governador como uma afronta à autonomia universitária, prevista no artigo 207 da Constituição Federal. Os reitores, por meio da Apiesp, mais uma vez, a exemplo do que fizeram no governo Lerner, preferiram negociar com o governo do estado. Após tal processo de negociação e a adoção de algumas medidas, por parte das reitorias, de racionalização dos gastos com pessoal, os atos administrativos das universidades deixaram de ser submetidos ao Conselho de Gestão Administrativa e Fiscal do Estado. O governo estadual publicou, em 17 de junho de 2013, o decreto 8.386 que excluiu as IEES das disposições do Decreto Estadual nº 7.599. No processo de negociação, alguns reitores propuseram ao governo estadual a regulamentação da autonomia administrativa e financeira das universidades paranaenses para livrá-las do alcance do Conselho de Gestão Administrativa e Fiscal do Estado. De acordo com a então reitora da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Nádina Moreno, o Conselho Universitário da UEL criou, ainda no mês de maio, uma “Comissão que vai elaborar o próprio Projeto de Autonomia Universitária.” (REITOR..., 2013). O então reitor da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Júlio Santiago Prates Filho, também defensor da regulamentação da autonomia, afirmou: “Temos que estabelecer junto ao governo, por meio do diálogo, a busca de um caminho definitivo para solucionar esta questão. E tenho a certeza e a convicção que esta solução será através da autonomia universitária [...]” (APIESP..., 2013) Em 26 de agosto de 2013, o governador do Paraná, anunciou a criação de um grupo de trabalho para “avaliar a ampliação da autonomia administrativa e financeira nas sete universidades estaduais do Paraná. A proposta foi definida em reunião com os reitores [...]” (ESTADO..., 2013). Porém, tal Grupo foi criado oficialmente somente em fevereiro de 2015. O anúncio do governador Beto Richa que pretendia regulamentar a autonomia das IEES, ocorreu imediatamente após o término de uma reunião do governador e dos reitores das ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 27 universidades paranaenses com o reitor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Julio Durigan. Nessa reunião, de acordo com notícia divulgada pela Agência Estadual de Notícias, o reitor da Unesp, “apresentou o modelo [de autonomia] adotado pelo Governo de São Paulo, que consiste no repasse de um porcentual da arrecadação do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para que a universidade faça toda a gestão dos seus recursos.” (ESTADO..., 2013). Alguns dias após o anúncio do governador, as seções sindicais do Andes - Sindicato Nacional das universidades estaduais do Paraná (Adunicentro, Adunioeste, Sesduem, Sinduepg e Sindunespar), em conjunto com a entidade representativa dos docentes da Universidade Estadual de Londrina e da Universidade Estadual do Norte do Paraná (Sindiprol/Aduel), lançaram uma nota à comunidade universitária, no dia 7 de setembro. Em tal nota as entidades sindicais manifestaram sua discordância em relação à proposta de discutir a “regulamentação da autonomia” e definir um percentual fixo da arrecadação tributária para o financiamento das universidades paranaenses. De acordo com a nota dos sindicatos [...] a autonomia pretendida pelo governo tenderá a congelar [a] situação de precariedade estrutural, insuficiência de professores e técnicos e escassez de recursos financeiros. [...] Esta não é a Autonomia que queremos. (ADUNICENTRO, et al. 2013, grifo nosso). O que teria levado seções sindicais do Andes - Sindicato Nacional a “desconsiderarem” decisões congressuais e se posicionarem contrariamente à definição de percentual específico do orçamento do estado para o financiamento das universidades paranaenses? A resposta a tal questão deve ser buscada na trajetória das lutas protagonizadas pelo movimento docente, em período relativamente recente, no estado do Paraná. Como vimos anteriormente, a proposta de “regulamentação da autonomia das IEES” foi formulada pela primeira vez no governo Jaime Lerner (1995–2002) e foi rejeitada pelos movimentos representativos dos três segmentos da comunidade universitária paranaense, especialmente pelo movimento paredista protagonizado pelos professores e funcionários da UEL, UEM e Unioeste, numa greve que perdurou por 169 dias: de 17 de setembro de 2001 a 4 de março de 2002. Apesar da promessa do governador Beto Richa, feita em agosto de 2013, que iria criar um Grupo de Trabalho para discutir a “ampliação da autonomia administrativa e financeira nas sete universidades estaduais do Paraná” (ESTADO..., 2013), tal Grupo foi criado ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 28 oficialmente por decreto somente em fevereiro de 2015. Entretanto, a Seti constituiu internamente um Grupo de Trabalho5 que discutiu e formulou um estudo e uma minuta de projeto de lei que dispôs “sobre a autonomia financeira das IEES” (SPERANDIO, et. al., 2014). O trabalho de tal grupo foi concluído em maio de 2014. Em reunião realizada com os reitores, no início do mês de fevereiro de 2015, o governador apresentou uma minuta de projeto de lei, formulado pelo grupo instituído internamente pela Seti, que dispunha “sobre o financiamento das universidades públicas do Estado do Paraná” e criava “o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais do Paraná – CRUESPAR” (SPERANDIO, et al., 2014). Tal minuta era precedida por um documento intitulado “Projeto de Autonomia das Universidades do Estado do Paraná – Versão de Estudo”. Tal documento, datado de maio de 2014, procurava justificar a necessidade de regulamentação da “autonomia financeira” das universidades por meio de lei complementar e explicar os indicadores utilizados pelo Grupo de Trabalho para definir o percentual da Receita Tributária Líquida (RTL) a ser destinado ao financiamento das universidades. Do ponto de vista mais geral, destacamos a seguir cinco objeções do movimento docente do Paraná, organizado no Andes-Sindicato Nacional, ao projeto apresentado pelo governador aos reitores. 2. O projeto de regulamentação da autonomia financeira e de vinculação do financiamento das IEES à Receita Tributária Líquida: a posição do movimento docente. Imediatamente após ter conhecimento do conteúdo da minuta de projeto de lei que propunha a regulamentação da “autonomia financeira” das universidades por meio de lei complementar, o movimento docente, organizado no Andes-Sindicato Nacional, passou a argumentar contrariamente ao projeto. Além de argumentar teoricamente, os docentes deflagraram greve, no período de 10 de fevereiro a 12 de março de 2015. Um dos itens da pauta de reivindicações era a rejeição do projeto de “autonomia financeira” das universidades. Apresentamos a seguir as principais objeções do movimento docente à proposta apresentada pelo governador. 5 Tal Grupo foi constituído por quatro pessoas: dois assessores do secretário da Seti e dois professores vinculados às reitorias da UEM e da Unicentro, respectivamente. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 29 1) A autonomia universitária é um princípio constitucional auto-aplicável. Portanto, não é necessária nenhuma legislação infraconstitucional para regulamentá-la. A legislação infraconstitucional, regra geral, tem sido um mecanismo utilizado por governos de diferentes matizes para atacar a autonomia das universidades públicas. A própria minuta de projeto de lei reconhecia que às universidades não se aplicam “os atos normativos do Poder Executivo em matéria de gestão administrativa, financeira e patrimonial, dada a sua autonomia constitucional.” (SPERANDIO, 2014, et al., grifo nosso). Se o governo estadual reconhece que as universidades, por força normativa da Constituição Federal, já gozam de autonomia em matéria de gestão administrativa, financeira e patrimonial por que insiste em regulamentar tal autonomia por meio de legislação infraconstitucional? Qual seria a verdadeira intenção do governo? Como vimos anteriormente, inicialmente o projeto da “autonomia financeira” das universidades estava incluído no pacote que propunha a redução das despesas do estado, incluindo o corte de direitos dos servidores estaduais, e o desmonte do serviço público no Paraná. O projeto de “regulamentação da autonomia das IEES” também visava a redução das despesas do estado com as universidades. 2) A aprovação de tal projeto de lei revogaria o direito à revisão geral anual de salários (data-base) dos docentes e agentes universitários. O governo estadual propunha a criação de um Conselho de Reitores. Uma das atribuições de tal Conselho, seria “definir a política salarial dos servidores das universidades estaduais e os índices de reajuste e reposição” (SPERANDIO, et. al., 2014). Nesse caso, a política salarial e a definição de índices de reajuste e reposição (revisão geral anual de salários) passariam a ser um problema particularizado entre os docentes e técnicos das universidades e o Conselho de Reitores. A atual política de revisão anual de salários do conjunto de servidores estaduais, garantida pela lei estadual 15.512, de 31 de maio de 2007, não se aplicaria para os servidores (docentes e técnicos) das universidades, caso o projeto de lei fosse aprovado. No documento que antecedia a minuta de projeto de lei era apresentada a metodologia adotada pelo Grupo de Trabalho para estabelecer o percentual da RTL a ser destinado ao financiamento das universidades. Ao estimar o aumento dos gastos com pessoal das universidades para o ano de 2016, em relação a 2015, o Grupo de Trabalho considerou apenas o reajuste de 7,14%6 previsto para outubro de 2015. O índice relativo à revisão geral anual de salários, a ser 6 Tal índice diz respeito à quarta e última parcela do reajuste de 31,73%, resultante de greve realizada pelos docentes em agosto de 2012. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 30 implantado em maio de 2015, para todos os servidores públicos estaduais, não foi considerado no cálculo do impacto do aumento das despesas de pessoal (docentes e técnicos) para 2016. Assim, o projeto de autonomia financeira, apresentado pelo governo, ao quebrar o tratamento isonômico entre os servidores das universidades e os demais servidores públicos do estado, punha fim à garantia de revisão geral anual de salários para os servidores docentes e técnicos das universidades paranaenses. 3) A aprovação de tal projeto de lei poderia redundar num ataque à carreira dos docentes e agentes universitários, revogando uma série de direitos garantidos nas leis que normatizam a carreira de tais servidores. A minuta do projeto de lei definia como uma das atribuições do Conselho de Reitores a proposição de plano de cargos, carreiras e salários (art. 9, VIII). No documento que antecedia a minuta de projeto de lei, afirmava-se que dentre as prerrogativas da autonomia administrativa das universidades estaria a possibilidade de cada universidade “implantar carreira própria, fixar vencimentos e conceder vantagem ou aumento de remuneração, dentro dos recursos disponíveis” (SPERANDIO, et. al., 2014, p. 10, grifos nossos). Sendo assim, pairava uma ameaça sobre as carreiras de docentes e técnicos. Cada universidade ao implantar uma carreira própria colocaria fim à isonomia salarial e à carreira única dos docentes, por exemplo, um dos fundamentos estruturantes de um sistema estadual de ensino superior. 4) O projeto de lei, se aprovado, iria impor um arrocho em termos de contratação docente e, consequentemente, intensificar o trabalho docente com o aumento da carga horária em sala de aula e a redução do tempo dedicado à pesquisa e à extensão. O documento que antecedia a minuta de projeto de lei apresentava alguns parâmetros para estimar o percentual da RTL a ser destinada ao financiamento das universidades. O Grupo de Trabalho criou um indicador (“Adicional Professor”) para estabelecer a necessidade de contratação/demissão de docentes. Tal indicador era uma média global da relação entre carga horária de aula/número de docentes. Este índice foi definido em 9,5 e, teoricamente, seria a média da carga horária a ser cumprida por docente. O documento não explicitava como se chegou ao índice de 9,5. Quais foram as atividades docentes consideradas como aulas na graduação e na pós-graduação? Tal índice foi aplicado sobre todas as universidades com o objetivo de estipular “a defasagem existente entre o quadro atual e a necessidade em contratações”. A conclusão do Grupo de Trabalho foi a seguinte: havia um excedente de 737 professores nas universidades: 145 na Unioeste; 364 na UEL; 144 na UEM; 36 na UEPG; 72 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 31 na Unespar. Somente Unicentro e Uenp teriam direito a contratar 24 docentes: 2 e 22 respectivamente. (SPERANDIO, et. al., 2014). O tal “Adicional Professor” era uma fórmula para “subtrair e não adicionar”. Para o governo havia “excedente de docentes” e a solução, do ponto de vista da lógica da redução das despesas do Estado, poderia ser a suspensão dos contratos de colaboradores e a distribuição da carga horária entre os efetivos. Além disso, para estancar a contratação de docentes possivelmente o governo não permitiria a reposição automática de docentes no caso de falecimento, aposentadoria e exonerações. Tal reposição é garantida legalmente pelo decreto estadual nº 5.722/2005. 5) O projeto de lei, se aprovado, a médio e longo prazo poderia impedir a expansão das universidades. O projeto do governo determinava que as universidades receberiam, para o pagamento de pessoal, investimento e custeio, 7,4645% da Receita Tributária Líquida (RTL) em 2015 e 7,7950% a partir de 2016, conforme especificado no quadro abaixo: IEES ÍNDICE DA RECEITA TRIBUTÁRIA LÍQUIDA POR UNIVERSIDADE (Minuta do Projeto de Lei) PERCENTUAL DE CADA UNIVERSIDADE EM RELAÇÃO AO TOTAL DE RECURSOS 2015 a partir de 2016 2015 2016 UEL 1,8533% 1,9391% 24,83% 24,91% UEM 1,9443% 2,0352% 26,05% 26,14% UEPG 0,9183% 0,9595% 12,30% 12,33% UNIOESTE 1,1406% 1,1906% 15,28% 15,29% UNICENTRO 0,7301% 0,7570% 9,78% 9,72% UNESPAR 0,5618% 0,5789% 7,53% 7,44% UENP 0,3161% 0,3247% 4,23% 4,17% TOTAL 7,4645% 7,7850% 100% 100% Fonte: Sperandio; et. al. (2014). Elaboração do autor. Dos percentuais da RTL, a serem destinados ao financiamento das universidades, constantes no quadro acima, seriam excluídos os hospitais universitários que, de acordo com a minuta de projeto de lei (art. 2º §1º), deveriam ser financiados por recursos suplementares especialmente destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde, na forma do art. 198 da Constituição Federal. (SPERANDIO, et. al., 2014). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 32 Qual seria o montante de recursos que as universidades receberiam caso o projeto de autonomia do governo Beto Richa fosse aprovado para vigorar em 2015? Para responder a essa questão construímos a tabela abaixo que nos permite comparar os recursos previstos para 2015 pela Lei Orçamentária Anual e os recursos que cada universidade receberia, de acordo com a sua cota-parte, dos 7,4645% da Receita Tributária Líquida, conforme previsto na minuta de projeto de lei apresentado pelo governador aos reitores. Tabela 1 – Comparação entre os recursos previstos (somente ensino) pela LOA/2015 e os recursos projetados em relação aos 7,4645% da Receita Tributária Líquida para 2015. Previsto (LOA/2015) Projetado 2015 (cota-parte) 7,4645% RTL Diferença nominal entre o previsto e o projetado Diferença percentual entre o previsto e o projetado UEL 340.270.450 493.952.901 153.682.451 45,16% UEM 364.822.510 518.206.780 153.384.270 42,04% UEPG 176.662.180 244.750.957 68.088.777 38,54% UNICENTRO 192.504830 303999.719 111.494.889 57,92% UNIOESTE 131.098.160 194.590.737 63.492.577 48,43% UNESPAR 116.958390 149.734.387 32.775.997 28,02% UENP 63.318.570 84.248.914 20.930.344 33,06% 1.385.635.090 1.989.484.395 603.849.305 43,58% TOTAL Fonte: PARANÁ (2014); Sperandio; et. all. (2014) Considerando que os 7,4645% da Receita Tributária Líquida seriam destinados exclusivamente para a manutenção das atividades de ensino, excluindo os hospitais universitários, numa análise imediata, a proposta do ponto de vista financeiro era vantajosa. Entretanto, tal proposta não se resumia à definição de um percentual da Receita Tributária a ser destinada às universidades. Como vimos anteriormente, tal proposta continha dispositivos que iriam impor um arrocho do ponto de vista da contratação de docentes e revogariam o direito dos docentes e técnicos à revisão geral anual de salários. Além disso, as carreiras de tais servidores poderiam ser revogadas por meio da adoção em cada universidade de um plano de cargos, carreiras e salários específico. No passado recente, em 2002, o governo Lerner (1995-2002) tentou aprovar projeto de lei que propunha a destinação de um percentual da receita do ICMs (parcela estadual) para o ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 33 financiamento das universidades, incluindo os Hospitais Universitários (HUs). O Projeto de Lei (PL) 032/02, enviado à Assembleia Legislativa, em fevereiro de 2002, propunha a destinação de 9% do ICMS (parcela estadual) para o financiamento de todas as IEES, incluindo os hospitais universitários. Na tabela 2 apresentamos uma comparação retrospectiva em relação à proposta apresentada pelo governo Lerner por meio do PL 032/2002. Qual seria o montante de recursos que as universidades em geral receberiam, caso o projeto de autonomia do governo Lerner fosse aprovado em 2002? Seria vantajoso para todas as IEES ou para algumas em particular? Para responder a tais questões, fizemos uma comparação entre os recursos que as universidades efetivamente receberam, no período de 2003 a 2014 e os recursos que tais instituições deveriam receber caso o projeto de lei 032/2002 fosse aprovado em 2002 e a nova matriz de financiamento tivesse sido implantada. Tabela 2 – Comparação entre os recursos previstos pelo PL 032/2002 e os recursos orçamentários empenhados pelo estado do Paraná para o financiamento das IEES (incluindo Hospitais Universitários) no período 2003 – 2014. (Valores em R$, a preços de janeiro de 2015, corrigidos pelo IPCA). UEL UEM UEPG ANO PREVISTO PL 032 (A) ORÇAMENTO EXECUTADO (B) (B)/(A) PREVISTO PL 032 (A) ORÇAMENTO EXECUTADO (B) (B)/(A) PREVISTO PL 032 (A) ORÇAMENTO EXECUTADO (B) (B)/(A) 2003 359.238.304 263.169.559 -26,74% 229.423.935 2004 391.705.945 254.258.514 -35,09% 250.159.068 212.555.151 -7,35% 106.900.381 90.378.384 -15,46% 212.508.443 -15,05% 116.561.943 84.734.235 -27,31% 2005 411.052.248 274.962.391 -33,11% 262.514.390 229.627.881 -12,53% 122.318.921 90.508.036 -26,01% 2006 417.570.164 327.644.610 -21,54% 266.676.992 270.011.086 1,25% 124.258.491 104.725.812 -15,72% 2007 439.719.427 2008 483.891.280 356.486.139 -18,93% 280.822.397 293.218.793 4,41% 130.849.561 112.116.427 -14,32% 401.474.879 -17,03% 309.032.306 337.321.910 9,15% 143.994.005 129.492.714 -10,07% 2009 482.940.122 428.275.969 -11,32% 308.424.859 375.776.700 21,84% 143.710.964 139.130.955 -3,19% 2010 517.944.869 450.347.145 -13,05% 330.780.289 389.737.599 17,82% 154.127.506 153.199.509 -0,60% 2011 556.670.978 452.463.716 -18,72% 355.512.330 406.570.255 14,36% 165.651.432 147.452.099 -10,99% 2012 593.061.520 489.399.642 -17,48% 378.752.784 417.476.464 10,22% 176.480.352 152.678.335 -13,49% 2013 676.819.054 556.619.013 -17,76% 432.243.692 464.914.514 7,56% 201.404.510 183.558.277 -8,86% 2014 760.487.931 365.206.432 -51,98% 485.677.980 381.612.435 -21,43% 226.302.286 181.558.731 -19,77% UNIOESTE UNICENTRO TOTAL IEES PREVISTO PL 032 (A) ORÇAMENTO EXECUTADO (B) (B)/(A) PREVISTO PL 032 (A) ORÇAMENTO EXECUTADO (B) (B)/(A) PREVISTO PL 032 (A) ORÇAMENTO EXECUTADO (B) (B)/(A) 2003 61.356.463 99.802.911 62,66% 34.749.725 45.819.634 31,86% 852.173.098 763.264.013 -10,43% 2004 66.901.806 98.990.768 47,96% 37.890.375 47.177.714 24,51% 929.191.751 751.273.913 -19,15% 2005 70.206.077 112.977.230 60,92% 39.761.775 51.565.335 29,69% 975.084.405 817.637.438 -16,15% 2006 71.319.311 127.132.262 78,26% 40.392.264 58.489.276 44,80% 990.545.987 952.904.833 -3,80% 2007 75.102.317 145.253.282 93,41% 42.534.800 67.563.228 58,84% 1.043.087.729 1.044.231.768 0,11% ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 34 2008 82.646.692 169.646.764 105,27% 46.807.617 84.725.889 81,01% 1.147.870.721 1.218.844.425 6,18% 2009 82.484.238 187.837.061 127,72% 46.715.610 94.980.586 103,32% 1.145.614.416 1.328.843.546 15,99% 2010 88.462.909 207.419.320 134,47% 50.101.678 98.403.269 96,41% 1.228.651.508 1.408.628.265 14,65% 2011 95.077.173 211.672.390 122,63% 53.847.720 105.219.430 95,40% 1.320.516.289 1.444.756.057 9,41% 2012 101.292.532 240.593.802 137,52% 57.367.838 115.754.534 101,78% 1.406.840.717 1.545.773.720 9,88% 2013 115.597.983 301.867.098 161,14% 65.469.845 134.896.455 106,04% 1.605.527.541 1.790.855.643 11,54% 2014 129.888.292 206.065.002 58,65% 73.563.276 147.921.611 101,08% 1.804.004.054 1.441.137.175 -20,11% Fonte: PARANÁ (2015). Nota: Cada universidade receberia uma cota dos 9% do ICMS (parcela estadual). Para projetar o percentual que caberia a cada universidade utilizamos uma proposta de divisão de recursos apresentada pelo governo Lerner em 1996, nas primeiras discussões visando a vinculação do financiamento das IEES à um percentual do ICMs. Cada universidade receberia o seguinte percentual do ICMS (parcela estadual): UEL (3,794%); UEM (2,423%); UEPG (1,129%); Unioeste (0,648%); Unicentro (0,367%); as demais IEES que hoje integram a UENP e Unespar deveriam receber 0,639%. Essas duas instituições não constam da tabela. A análise da tabela acima nos permite concluir que, se o governo Lerner tivesse aprovado o PL 032/2002, que propunha a destinação de 9% para o financiamento global de todas as IEES paranaenses, a médio prazo as universidades enfrentariam o problema do subfinanciamento e, principalmente as IEES não consolidadas em 2002, não conseguiram expandir as suas atividades. A aprovação de tal projeto seria vantajosa para o conjunto das IEES apenas nos anos iniciais da adoção de tal matriz de financiamento (2003-2006). No caso das universidades mais antigas, criadas nos anos 1970, a UEL e a UEPG seriam as únicas beneficiadas, ao longo de todos os anos, pela vinculação do financiamento das IEES ao ICMS. A Unioeste e Unicentro, criadas nos meados dos anos 1990, seriam as instituições mais prejudicadas pela proposta de vinculação apresentada pelo governo Lerner (PL 032/2002). Em todo o período (2003-2014) tais instituições receberiam menos recursos do que os efetivamente empenhados pelo estado. Tais instituições, especialmente a Unioeste, apresentaram uma rápida expansão do número e da titulação do corpo docente, do número de cursos, de vagas e matriculas na graduação e na pós-graduação stricto sensu. No caso da aprovação do PL 032/2002, se não houvesse uma redistribuição da cota do ICMS que caberia a tais instituições, seguramente a Unioeste e a Unicentro não teriam condições de se expandir e, provavelmente, seriam condenadas a “não crescer”. Tal raciocínio se aplica também a UENP e Unespar, criadas em meados dos anos 2000, que seriam prejudicadas pela aprovação do PL 032/2002, do ponto de vista da destinação de recursos orçamentários. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 35 Tais números demonstram que a definição de um percentual fixo da receita tributária poderá ser um entrave à expansão das universidades. Definido um percentual fixo, o aumento do percentual de uma universidade específica dependerá da redução do percentual destinado às demais. Com isso, o governo se isentaria de sua responsabilidade e as comunidades universitárias e reitorias seriam envolvidas num conflito permanente pela partilha dos recursos. Considerações finais Em fevereiro de 2015, o governo Beto Richa apresentou aos reitores das universidades estaduais do Paraná uma proposta de “concessão de autonomia financeira às IEES”. Tal proposta, dentre outros itens, pretendia vincular o financiamento das universidades estaduais paranaenses a um percentual da Receita Tributária Líquida. Não foi a primeira vez que o governo do estado pretendia “regulamentar a autonomia das IEES paranaenses”. Em 2002, o então governo Lerner apresentou proposta semelhante e foi derrotado por uma greve de docentes e técnicos que perdurou por 169 dias. Desde o final da década de 1990, o governo e alguns reitores defendem a regulamentação da autonomia universitária e a vinculação do financiamento de tais instituições a um percentual da receita orçamentária. Por sua vez, entidades representativas da comunidade universitária se opõem à proposta governamental. Tanto no governo Lerner (1995-2002) quanto no governo Beto Richa (2011-2018) a discussão a respeito da vinculação do financiamento das universidades a um percentual da receita orçamentária foi colocada no momento em que o estado passou a reduzir, em termos reais, os recursos destinados às IEES. Em 1997, no governo Lerner, as IEES chegaram a receber 12,88% do ICMS (parcela estadual), a partir de então os recursos foram reduzidos paulatinamente. Em 2002, último ano do mandato de Lerner, tais instituições passaram a receber apenas 8,92%. No governo Beto Richa, observou-se o mesmo procedimento. Em 2010, último ano do governo Requião, as IEES receberam 10,32% do ICMS e em 2014 passaram a receber 7,19%. Tudo indica que tal procedimento é uma forma adotada no Paraná, por diferentes governos, para negociar, em situação vantajosa, com os reitores a vinculação do financiamento das universidades a um percentual da receita orçamentária. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 36 Quanto à proposta apresentada pelo governo Beto Richa, em fevereiro de 2015, o movimento docente, organizado no Andes - Sindicato Nacional, se opôs e argumentou que a aprovação da proposta apresentada iria impor um arrocho quanto à contratação de docentes e um ataque a direitos garantidos na legislação vigente, como por exemplo, o direito à revisão anual de salários e à isonomia salarial entre os docentes. O governo estadual, pressionado pela greve de docentes e técnicos que perdurou por mais de trinta dias, desistiu de levar adiante a discussão de tal proposta. Referências ADUNICENTRO (Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual do Centro Oeste – Seção Sindical do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior - Andes), et al. Sobre a Autonomia Universitária Pretendida pelo Governo Estadual. Nota pública dos sindicatos docentes das universidades estaduais do Paraná. 7 set. 2013. APIESP discute novo conselho de gestão administrativa e fiscal. Universidade Estadual de Maringá (UEM). Maringá 27 mar. 2013. Disponível em: <http://www.uem.br/index.php?option=com_content&task=view&id=6450&itemid=1>. Acesso em: 4 out. 2013. ESTADO vai avaliar novo modelo de autonomia das universidades estaduais. Agência Estadual de Notícias, Curitiba, 26 ago. 2013. Disponível em: <http://www.seti.pr. gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=2911&tit=Estado-vai-avaliar-novo-modelo-deautonomia-das-universidades-estaduais->. Acesso em: 4 out. 2013. PARANÁ. Decreto nº 7.599, de 18 de março de 2013. Institui e define atribuições do Conselho de Gestão Administrativa e Fiscal do Estado, como colegiado de assessoramento direto ao Governador do Estado, estabelece procedimentos e define providências. Disponível em: <http://www.legislacao.pr.gov.br/legislacao/pesquisarAto. do?action=exibir&codAto=90739&indice=1&totalRegistros=1>. Acesso em: 25 mar. 2013. PARANÁ. Decreto nº 546, de 24 de fevereiro de 2015. Institui Grupo de Trabalho para realizar estudos objetivando elaborar proposta para a Autonomia das Universidades Estaduais. Disponível em: http://www.legislacao.pr.gov.br/legislacao/listarAtosAno.do? action=exibir&codAto=136486&indice=1&totalRegistros=210&anoSpan=2015&anoSelecion ado=2015&mesSelecionado=2&isPaginado=true. Acesso em: 25 mar. 2013. PARANÁ. Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Grupo de Planejamento Setorial. Execução das IEES – Recursos do tesouro Empenhados pelas IEES - 2003-2014. (Tabela). Curitiba, 2015 (não publicado). PARANÁ. Assembleia Legislativa. Lei Estadual nº 18.409, de 29 de dezembro de 2014, “Estima a Receita e Fixa a Despesa para o exercício Financeiro 2015”. Disponível em: http://www.legislacao.pr.gov.br/legislacao/pesquisarAto.do?action=exibir&codAto=134973& indice=1&totalRegistros=1. Acesso em 22 mar. 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 37 REIS, Luiz Fernando. A “concessão” governamental de autonomia e financiamento nas universidades estaduais do Paraná. In: Universidade e Sociedade - Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, Brasília – DF, Ano XXIII, n. 53, p. 74-87. 2014. Disponível em: <http://portal. andes.org.br/imprensa/publicacoes/imp-pub2001969914.pdf>. Acesso em: 8 out. 2014. REITOR da UNESP debate autonomia com comunidade universitária do Paraná. Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI). Curitiba, 27 ago. 2013. Disponível em: <http://www.seti.pr.gov.br/modules/noticias/article.php? storyid=2915&tit=Reitor-da-UNESP-debate-autonomia-com-comunidade-universitaria-doParana->. Acesso em 4 out. 2013. SPERANDIO, Décio; et. al. Projeto de Autonomia das Universidades do Estado do Paraná – versão de estudo. Curitiba, maio de 2014. (não publicado). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 38 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO DESENVOLVIMENTO DO REUNI E A EXPANSÃO NA UNIVERSIDADE PÚBLICA NO BRASIL André Moura Blundi Filardi [email protected] PPGE/UFSCar Eixo 1: Financiamento na expansão da educação superior RESUMO Este artigo procura analisar e discutir parte das consequências da implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação das Universidades Federais (Reuni) no Brasil a partir de sua implantação em 2007. Para tanto faz um recorte que busca, por meio de documentos oficiais, números da expansão das universidades, estatísticas, dados da expansão e da reestruturação e a discussão destes, desvelar um viés econômico e administrativo do Reuni que não está escrito em seus artigos e em suas Diretrizes Gerais. Mais que um simples programa o Reuni se mostra como uma peça-chave na recomposição do capital produtivo e na transformação das formas de administração do Estado e das políticas públicas. Palavras-chave: Reuni. Universidades Federais. Expansão O governo brasileiro, no segundo mandato do presidente Lula, em abril de 2007, instituiu o Programa de Expansão e Reestruturação das Universidades Federais no Brasil (Reuni). Este programa que, em vários aspectos, se mostrou mais do que como um simples programa, propôs uma reformulação das universidades públicas federais no que se refere ao seu financiamento, aos seus planos pedagógicos, às suas políticas de inclusão, à mobilidade estudantil, às formas de ingresso na universidade, ao número de docentes por professor por disciplina, à taxa de conclusão de curso, dentre outros fatores. O governo declarou na época como argumento para a necessidade urgente do programa que havia no Brasil uma estrutura universitária atuando abaixo dos níveis de eficiência almejados pela própria administração pública e o uso material e humano e das estruturas das universidades estavam aquém de um ideal considerado pelo próprio governo e pelo Ministério da Educação (MEC). Assim, se promulgou o decreto que estabeleceu o Reuni: DECRETO N° - 6.096, DE 24 DE ABRIL DE 2007. Institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição, que lhe confere o art. 84, inciso VI, alínea "a", da Constituição, e considerando a meta de expansão da oferta de educação superior constante do item 4.3.1 do Plano Nacional de Educação, instituído pela Lei N°10.172, de 9 de janeiro de 2001, DECRETA: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 39 Art. 1º Fica instituído o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), como objetivo de criar condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no nível de graduação, pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais. (Brasil, 2007 a, p. 7). Desta maneira, percebemos de inicio que o governo demonstrou que seus intuitos principais com o referido programa era a otimização dos recursos das universidades, a ampliação do uso de suas estruturas e recursos humanos e ampliação e expansão do sistema de ensino superior federal. Mas, destacamos que estes objetivos foram traçados a partir da lógica da administração gerencial e da eficiência onde a “otimização de recursos” é peça fundamental da proposta. Procuraremos mostrar neste artigo através de dados apresentados e analisados que há um sentido econômico e político nestes objetivos que são interdependentes e interligados à atual conjuntura da economia capitalista e à sua inserção no Brasil. O artigo 2° deste decreto presidencial mostra as diretrizes principais do programa. Em primeiro lugar o Ministério da Educação (MEC) traz ``...a redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período noturno``(Brasil, 2007 a, p. 7). Assim, o governo mostra, novamente, que sua preocupação principal, com o programa, é a melhor utilização dos recursos das universidades. Preocupa-se, também, com o fato de que uma parcela pequena da população brasileira, em idade para cursar o ensino superior, está matriculada neste nível de ensino. Em comparação com países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), grupo de países industrializados, além de outros países emergentes, o Brasil exibia os piores índices de matrícula bruta neste nível de ensino. Assim, o Brasil quando comparado aos níveis de eficiência e qualificação da mão-de-obra era, e ainda é, um dos piores neste ranking, ou seja, temos dificuldades estruturais e humanas (recursos humanos e mão-de-obra qualificada) de inserção na economia mundializada. Segundo o governo em seu Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) de 2007: A educação superior baliza-se pelos seguintes princípios complementares entre si: i) expansão da oferta de vagas, dado ser inaceitável que somente 11% de jovens, entre 18 e 24 anos, tenham acesso a esse nível educacional, ii) garantia de qualidade, pois não basta ampliar, é preciso fazê-lo com qualidade, iii) promoção de inclusão social pela educação, minorando nosso histórico de desperdício de talentos, considerando que dispomos comprovadamente de significativo contingente de jovens competentes e criativos que têm sido sistematicamente excluídos por um filtro de natureza econômica. (Brasil, 2007 b, p. 26). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 40 Observa, também, que pela realidade social brasileira, na qual boa parte dos jovens ingressa cedo no mercado de trabalho, se faz necessária uma maior oferta de cursos de graduação no período noturno, já que, desta maneira, incluiria esta parcela de jovens que iniciam sua vida profissional antes de obterem o curso superior, ou que o fazem concomitantemente. Neste sentido, o diagnóstico que o MEC elaborou da realidade da educação superior brasileira e da própria realidade social, é correto, em primeiro momento, segundo nossa análise. Os meios para a transformação qualitativa e concreta desta realidade é que são discutíveis, mesmo porque o sistema de educação superior demanda investimentos de grande monta para sua manutenção e, ainda mais, para sua transformação, já que, desde a Reforma do Estado (transformação nas esferas de administração pública buscando aumento da eficiência e redução dos custos do Estado, promulgada a partir do governo Fernando Henrique Cardoso e do estabelecimento do Ministério da Administração e Reforma do Estado (Mare) em meados da década de 1990) ocorre uma precarização das condições de financiamento e manutenção destas instituições. Existem a cultura institucional e a organização acadêmica de cada uma destas universidades, as administrações (Reitorias e Pró-reitorias) e, principalmente, os docentes que não estavam dispostos a, simplesmente, cumprir uma demanda governamental sem que fossem discutidas substancialmente quais seriam os meios concretos para estas implantações. Ou seja, o programa sofreu com a resistência da comunidade acadêmica acostumada a perceber e a denunciar a falta de planejamento e concretude dos planos governamentais para as universidades federais. O segundo inciso do artigo 2° do Reuni promulga: A ampliação da mobilidade estudantil, com a implantação de regimes curriculares e sistemas de títulos que possibilitem a construção de itinerários formativos, mediante o aproveitamento de créditos e a circulação de estudantes entre instituições, cursos e programas de educação superior. (Brasil, 2007 a, p. 7). Ou seja, possibilidades de troca de discentes e aproveitamento curricular de uma instituição para outra, no sentido de não se “perder” um trabalho acadêmico que tenha sido iniciado em outra instituição ou mesmo em outro país. As trocas de experiências acadêmicas, o aprendizado de outras línguas e outras culturas seriam algumas “necessidades” da formação profissional completa, ou esperada, no contexto da mundialização do capital que está em operação no atual cenário do sistema econômico mundial. As corporações se beneficiam ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 41 sobremaneira com a formação de uma mão-de-obra, principalmente intelectual, que se ajusta muito bem à realidade econômica do mercado global. Nesse cenário, a mobilidade estudantil emerge como um importante objetivo a ser alcançado pelas instituições participantes do Reuni não só pelo reconhecimento nacional e internacional dessa prática no meio acadêmico, mas fundamentalmente por se constituir em estratégia privilegiada de construção de novos saberes e de vivência de outras culturas, de valorização e de respeito ao diferente: O exercício profissional no mundo atual requer aprendizagens múltiplas e demanda interseção com saberes e atitudes construídos a partir de experiências diversas que passam a ser, cada vez mais, objeto de valorização na formação universitária. (Brasil, 2007 a, p. 5). Faz-se interessante ressaltar como, a partir da necessidade econômica, de formação profissional, o intercâmbio cultural e as possibilidades do aproveitamento dos recursos humanos para a reprodução do capital, perante a economia capitalista atuante em âmbito mundial, se coadunam de maneira justa e própria com um discurso de “construção de novos saberes e de vivência de outras culturas, de valorização e de respeito ao diferente”. Esta mesma realidade se fez presente no que foi denominado “Processo de Bolonha”: O Processo de Bolonha é um movimento que surgiu de fora da universidade, sob o comando dos dirigentes políticos da União Europeia (UE) e está possibilitando um novo desenho de regulação e de reforma na educação superior nesse bloco. A Declaração de Bolonha (1999) estabeleceu as seguintes linhas de ação: adoção de um sistema de graus de acessível leitura e comparáveis no âmbito da UE; implementação de um sistema de ensino baseado em dois ciclos; promoção da maior mobilidade de estudantes, professores e investigadores; estabelecimento de um sistema de acumulação e transferência de créditos; promoção da cooperação europeia para avaliação da qualidade do ensino superior; promoção da atratividade do espaço europeu de ensino superior. A partir de Bolonha, verifica-se: diversificação e hierarquização das IES; aumento do financiamento privado e da parceria com o sistema produtivo; diminuição da durabilidade dos cursos mediante a implantação dos ciclos; modelo gerencial de administração para as IES; sistemas de avaliação da qualidade e credenciamento institucional; criação do Espaço Europeu de Ensino Superior (EEES) e do Espaço Europeu da Investigação (EEI). Esse movimento tem como meta a atratividade internacional de estudantes e pesquisadores tanto interna como externamente, assim como, a adaptação da formação da graduação ao mercado de trabalho visando alavancar e tornar a Europa mais competitiva no mercado global. (Ferreira, 2010, p.5). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 42 Por meio da divulgação de novas “tecnologias de aprendizagem” e “novas possibilidades de formação” se permite que haja uma circulação da formação da mão-de-obra que beneficia sobremaneira os esforços das corporações transnacionais na Europa em sua busca por recursos humanos competentes, baratos e “globalizados”. Além disso, houve uma expansão desta ideologia para as universidades dos países em desenvolvimento no sentido de inseri-las nas perspectivas e nas possibilidades da produção. O conhecimento e a ciência se estão atrelando à esfera da produção e do consumo, conforme análise da professora Suely Ferreira: Nas últimas décadas do século XX e no início dos anos 2000 têm-se observado mudanças substantivas nas concepções e nos papéis sociais das universidades. Esse movimento dialético que envolve tanto os aspectos internos como externos das universidades, remete a situá-la não somente no contexto nacional, mas no cenário da internacionalização da educação superior. Discutir as novas concepções e finalidades sociais que estão sendo reclamadas para as universidades públicas no contexto da reestruturação produtiva do capital em âmbito global faz-se necessário, na medida em que o papel social da universidade vem ganhando significativa centralidade, ao ser exigida uma nova relevância social na e para a sociedade da economia do conhecimento, expressão propalada que assume a perspectiva de que sociedade e economia devem estar assentadas no conhecimento como estratégia de competitividade, tanto no cenário local como no regional e no internacional. (Ferreira, 2010, p.1). Em seguida, o decreto do Reuni trouxe a discussão sobre “...a revisão da estrutura acadêmica, com a reorganização dos cursos de graduação e atualização de metodologias de ensino-aprendizagem, buscando a elevação da qualidade”. (Brasil, 2007 a, p. 7). Aqui, novamente, se visualiza a questão das novas metodologias. A necessidade destas apenas é justificável em um cenário no qual o objetivo da educação superior se transforma. Por exemplo, nas diretrizes do programa, aparece a discussão da necessidade dos cursos de graduação trabalharem a interdisciplinaridade e a flexibilização e que estes cursos devem estar articulados ao que se pesquisa na pós-graduação. Essas exigências serviriam ao aumento da qualidade, mas, é questionável, em termos pedagógicos, a discussão da maior ou menor qualidade da educação a partir de seus métodos. Esta formação “flexibilizada” serviria a necessidade de um profissional mais flexibilizado, segundo nossa análise. A interdisciplinaridade serve ao estabelecimento de cursos com uma grade inicial comum, de modo que a especialização se dá em caráter posterior, e se “otimiza” o “recurso humano” professor. A proclamada “qualidade almejada”, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 43 que flexibiliza a formação e os projetos pedagógicos dos cursos de graduação, no entanto, é compreendida por nós como relacionada aos princípios da educação terciária, tal como se aponta com o discurso oficial: A qualidade almejada para este nível de ensino tende a se concretizar a partir da adesão dessas instituições ao programa e às suas diretrizes, com o consequente redesenho curricular dos seus cursos, valorizando a flexibilização e a interdisciplinaridade, diversificando as modalidades de graduação e articulando-a com a pós-graduação, além do estabelecimento da necessária e inadiável interface da educação superior com a educação básica. (Brasil, 2007 a, p. 5). Assim, questionamos a concretização da melhoria dos cursos de graduação das universidades federais a partir da expansão intensificada de suas vagas. Inclusive, questionamos o “redesenho curricular” dos cursos e a articulação com a educação básica. Como poderíamos trazer transformações substanciais deste porte se não houve tempo hábil para o planejamento do programa? Com isso, o intuito principal concreto do Reuni que é a maior articulação e a maior inserção do ensino superior do Brasil, e de sua economia, na esfera da mundialização do capital, começa a se desvelar. Argumentamos, neste sentido, que certos aspectos da formulação do programa estão carregados de uma ideologia e de um discurso que serve mais à sua própria formulação do que à concretização de fato destas mudanças. A distância entre o que está formulado e os objetivos concretos do programa devem ser analisados a partir destas contradições, discursos e ideologias que ficam evidentes, inclusive pela análise dos dados e documentos disponíveis. Por exemplo, destes artigos extraídos do próprio programa Reuni: Art. 1 § 1o O Programa tem como meta global a elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da relação de alunos de graduação em cursos presenciais por professor para dezoito, ao final de cinco anos, a contar do início de cada plano. Art. 3° O Ministério da Educação destinará ao Programa recursos financeiros, que serão reservados a cada universidade federal, na medida da elaboração e apresentação dos respectivos planos de reestruturação, a fim de suportar as despesas decorrentes das iniciativas propostas (...). § 1º O acréscimo de recursos referido no inciso III será limitado a vinte por cento das despesas de custeio e pessoal da universidade, no período de cinco anos de que trata o art. 1º, § 1º. § 3° O atendimento dos planos é condicionado à capacidade orçamentária e operacional do Ministério da Educação. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 44 Art. 6° A proposta, se aprovada pelo Ministério da Educação, dará origem a instrumentos próprios, que fixarão os recursos financeiros adicionais destinados à universidade, vinculando os repasses ao cumprimento das etapas. (Brasil, 2007a, p. 1). O financiamento da expansão proposta pelo Reuni viria de fontes do MEC na medida em que cada universidade elaborasse um plano de reestruturação e se adaptasse as exigências do governo. Ou seja, há uma necessária submissão das entidades ao Governo quando se trata do plano de expansão e reestruturação. Esse deve ser moldado de acordo com o que o MEC entende como melhor eficiência do uso das instalações e recursos humanos para as universidades. Deveria haver uma “otimização” do trabalho que, segundo nossa análise, poderia levar a precarização das condições de trabalho nas universidades e a intensificação do trabalho docente. Mas, há que se ressaltar que, as universidades federais há tempos trabalhando em um cenário de contenção de despesas e investimento viram no Reuni uma possibilidade de expansão e reestruturação que as poderia beneficiar de algum modo. A previsão do acréscimo orçamentário proposto pelo Reuni é exposto nas tabelas abaixo: Tabela 1 – Previsão de acréscimo orçamentário a partir do reuni Fonte: Brasil Sesu/MEC/Diretrizes Gerais do Reuni, 2007, p. 13. Tabela 2 – Execução orçamentária geral do programa reuni em 2008 Fonte: Brasil MEC/Sesu, 2008, p.12. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 45 O governo vincula as verbas que serão utilizadas no plano de expansão de cada universidade ao cumprimento de metas e a elaboração de um plano para o cumprimento destas metas. É um acordo direto entre o MEC e a reitoria de cada universidade. Mas, que está condicionado à existência de verbas e a um esforço de cada Ifes para que as verbas deem conta da expansão das vagas, da construção de prédios, de estabelecimento de novos cursos, da elaboração e construção de novos campi, da interiorização das universidades federais pelo Brasil. Para cada universidade federal que aderir a este “termo de pactuação de metas”, ou seja, um contrato de gestão com o MEC, o governo “promete” um acréscimo de recursos limitado a vinte por cento das despesas de custeio e pessoal. Entretanto, uma análise cuidadosa do parágrafo terceiro do artigo 3º e do artigo 7º do Decreto de criação do Reuni deixa claro em que termos ocorrerá esta “expansão”, pois “o atendimento aos planos é condicionado à capacidade orçamentária e operacional do MEC” e “as despesas decorrentes deste processo devem estar circunscritas às dotações orçamentárias consignadas anualmente ao MEC”. (Lima, 2009, p. 92). Assim, promulga o governo no PDE de 2007, que mais que um simples programa, ou “abertura de espaço orçamentário”, o Reuni teria a capacidade de incentivar que cada instituição federal encontrasse de maneira autônoma seu caminho, já que, “em plena revolução científica, as fronteiras entre áreas do conhecimento tornam-se tênues e novas possibilidades de formação vão se delineando” (Brasil, 2007c, p. 28). Ou seja, nesta passagem observamos que o Governo incentiva que as áreas de pesquisa e as pós-graduações entrem de vez neste processo, incrementando, se possível, a base de apoio orçamentária e a inserção no processo de “revolução científica”. Na sequência, na citação abaixo, fica claro este intuito já que a “estrutura universitária deve estar à altura dos novos desafios da ciência”. Assim, percebemos que há uma intrínseca ligação entre a reformulação das universidades com o desenvolvimento da área de Ciência & Tecnologia. O novo Ministério da Ciência se chama Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e está cada vez mais interligado ao Ministério da Educação (MEC), de acordo com o sitio do MEC na internet: Uma das formas mais eficazes de incentivar as pesquisas é a partir da redução fiscal das empresas que investirem em projetos desenvolvidos por instituições públicas. O sentido dessa medida é aproximar o setor produtivo e industrial da pesquisa acadêmica aplicada, de acordo com o que está determinado pela Lei nº 11.487, de incentivo à ciência e tecnologia, sancionada em 2007. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 46 (http://portal.mec.gov.br/index.php/?option=com_content&view=article&id=12311.) acessado em 11/11/2013. A exata compreensão dos fins do programa, portanto, exige atenção quanto aos meios a serem empregados: a expansão dos cursos noturnos, a ampliação da mobilidade estudantil, a revisão da estrutura acadêmica e a diversificação das modalidades de graduação. Itinerários rígidos, desperdício de créditos, imobilidade e especialização precoce são incompatíveis com uma estrutura universitária à altura dos novos desafios da ciência. A reestruturação que se espera, portanto, é acadêmica e, como tal, qualitativa. (Brasil, 2007c, p. 28). O programa expõe claramente que se faz necessário à interligação dos programas de ciência à pesquisa universitária, ou seja, a construção de um sistema de apoio entre universidades e setor produtivo. O programa Reuni, neste sentido, é uma plataforma, supostamente, ousada de reestruturação das universidades federais, mas que usa ou vincula, como já dito, o financiamento do programa de cada universidade às metas propostas pelo MEC. Há que se notar que a expansão proposta pelo governo em cada universidade exige um esforço grandioso de cada uma das instituições e há a possibilidade destas não conseguirem cumprir as metas estabelecidas; assim, o MEC poderia suspender investimentos e recursos de maneira unilateral. A autonomia universitária estaria ferida, portanto, quando o MEC se coloca como guardião dos cumprimentos das metas estabelecidas, mas os recursos não estão concretamente disponíveis para as universidades federais. E o discurso oficial, ao mesmo tempo, que propõe suas metas e contratos de gestão heterônomos, oculta este caráter e busca se legitimar na proclamação de noção de uma “expansão democrática”: Em linha com proposta da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), feita em 1997, o Reuni, mediante investimento maciço na educação superior, pretende melhorar os indicadores das instituições federais de educação superior, projetando alcançar um milhão de matrículas de graduação. O Reuni permite uma expansão democrática do acesso ao ensino superior, o que aumentará expressivamente o contingente de estudantes de camadas sociais de menor renda na universidade pública. (Brasil, 2007c, p. 27). Percebemos mais uma vez que o discurso oficial de formulação do programa está na esfera da ideologia quando promulga a “democratização” e o “expressivo aumento de estudantes de camada sociais de menor renda”. Está mais para propaganda do que para o estabelecimento de uma política pública para a educação superior. Como é possível afirmar que o Reuni permite uma expansão democrática antes de implantar o programa e auferir seus ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 47 resultados concretos? Qual o intuito de inserir uma frase como esta na implantação do programa? Esta é a face ideológica praticada pelo governo e pelo MEC. E os documentos oficiais, apesar de se referirem ao qualitativo, primam por apontar dados quantitativos, como se fossem, per si, evidências da democratização. A tabela 3 mostra, por exemplo, que, apesar dos esforços, o número de matrículas de graduandos presenciais com idade de 18 a 24 anos ainda é abaixo do esperado, equivalendo a 14.35% da faixa etária com idade entre 18 e 24 anos. O governo esperava chegar, no início da década dos anos 2010, em 20% de matrículas no ensino superior nesta faixa etária. Além desse dado, se percebe que nitidamente a grande parte destes estudantes está concentrada na região sudeste, onde o percentual de matriculandos entre 18 e 24 anos sobe para 17.05% da população nesta faixa etária. Nesta mesma faixa etária, na região nordeste, apenas 9.49% dos jovens estavam matriculados no ensino superior, evidenciando as desigualdades sociais e econômicas marcantes no território brasileiro, ou o desenvolvimento desigual e combinado da educação superior brasileira, destacando a educação superior no setor privado como preponderante (Cunha, 2004), como observado na tabela 4 abaixo. Tabela 3 – Distribuição de matrículas de graduação presencial (todas as idades e com idades de 18 a 24 anos) e população da faixa etária de 18 a 24 anos – Brasil e regiões geográficas – 2011). Fonte: Brasil/MEC, 2013, p. 50. Mas, os números apresentados podem ser interpretados numa perspectiva distinta da oficial. Em relação ao número de matrículas, relacionadas na tabela 4, se percebe que entre os anos de 2010 e 2011 o sistema público federal atingiu o número de 1.032.936 de matrículas, incluindo nestes números todas as instituições de ensino superior público federal, apenas as ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 48 universidades federais somaram 929.847 matriculas e, portanto, os institutos e escolas federais somam 103.089 alunos. De qualquer maneira, este número representa 15.3% do total de matrículas no ensino superior no Brasil. O sistema público, como um todo, soma 1.773.315 de matrículas, o que representa 26.3% de todo sistema de ensino superior no Brasil. Ou seja, as universidades, centros universitários e faculdades privadas somam 4.966.374 matrículas o que representava 73.7% de todas as matrículas em ensino superior no Brasil. Assim, mesmo com uma expansão acelerada do sistema público federal de ensino superior, haverá uma diferença quantitativa significante do número de matrículas no ensino público em relação ao ensino privado. Tabela 4 – Número e percentual de matriculas, ingressos (todas as formas e processo seletivo) e concluintes de graduação (presenciais e a distancia), segundo a categoria administrativa – Brasil – 2010 - 2011. Fonte: Brasil/MEC, 2013, p. 52. Os números corroboram, portanto, a análise citada abaixo de que apesar de não ser recente o processo de privatização da educação superior no Brasil, nos últimos governos, a partir de 1995 até 2010, segundo nossa análise, este processo se concretiza de forma mais evidente. Observamos que entre 2010 e 2011, 73.7% das matrículas eram em instituições ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 49 privadas, os interesses e a atuação das empresas ligadas à educação superior privada no Brasil, naquele período citado, aumentaram consideravelmente, tanto que o mercado, nesta área, se tornou extremamente competitivo com a atuação de empresas e capitais estrangeiros. Mas, não apenas pelos números, como também pela maneira da administração pública de organizar a educação superior, se percebe uma mudança de enfoque nas universidades públicas da formação e universalidade (ensino, pesquisa e extensão) para a instrução para o mercado e o ensino terciário. O Reuni enfatiza esta mudança, segundo nosso entendimento do programa e conforme análise exposta abaixo que versa sobre parte deste processo: Todavia, é a partir da década de 1990, que se inicia, no Brasil, um consistente processo de redução de gastos públicos federais para o conjunto das instituições federais de ensino superior (Ifes) e se desencadeia a retomada, em grau muito mais aprofundado que na década de 1970, sob a ditadura militar, da privatização desse nível de ensino. Assim, muito embora a privatização da educação superior não se restrinja aos dois últimos governos (o de Fernando Henrique Cardoso de 1995 a 2002 e o de Lula da Silva, a partir de 2003), foi neste período que ganhou um curso extraordinário, já que ambos aplicaram a máxima neoliberal, segundo a qual deve haver deserção do Estado de seu necessário protagonismo na implementação da universidade como um bem público e direito de cidadania. (Mancebo, 2010, p.75). Está se concretizando no Brasil, na área do ensino superior, um processo de mão-dupla de mercantilização: em primeiro momento, a expansão acelerada das instituições privadas e a inserção da lógica da educação superior como uma mercadoria implicam em um processo de privatização; em segundo momento, e mais importante, as relações do Estado com a área da educação, e da educação superior de modo mais específico, passam a ser regidas a partir da lógica da produção e reprodução de capital. O Estado como um todo passa a ser administrado desta maneira, esta é a face mais predatória deste processo. Assim, todos os instrumentos de política pública, excetuando-se os programas com viés assistencialista e emergenciais, ou seja, pontuais e não estruturais, são implantados com foco na “otimização” e “eficiência” do trabalho. O trabalho imaterial e intelectual, como dos professores, está se integrando cada vez mais, junto com a apropriação da produção cientifica pela lógica do mercado, a esta forma de trabalho produtivo (Marx, 2011). Assim, e a partir de uma série de mediações, estamos atingindo um estágio das transformações das relações de trabalho, com o regime de acumulação flexível (Harvey, 1996) que insere o trabalho do professor no processo de produção e reprodução de mais-valia. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 50 Percebemos este processo nas universidades, principalmente, na atuação de professores-pesquisadores, aqueles que estão intrinsicamente ligados na esfera da produção científica e tecnológica, mas que voltam os objetivos de suas atividades à produção para o mercado, e este processo, em última análise, traz alienação frente ao seu próprio trabalho, condição sine qua non para a transformação destas atividades em trabalho produtivo. Não obstante, o estranhamento frente à atividade alienada engendra contradições, assim como a efetivação do trabalho imaterial em trabalho produtivo apenas se dá sob uma série de mediações. De qualquer forma, compreendemos que se efetiva nas mudanças de identidade da universidade e de suas práticas sob os eixos da reforma do Estado e das novas formas de produção e valoração do capital. A compreensão das mudanças da identidade da instituição escolar — lugar da prática da educação básica — da instituição universitária e do trabalho do professor (cujo trabalho é imaterial e superqualificado) deve ocorrer por meio do entendimento de dois grandes eixos, dentre outros: o primeiro consiste na reforma do Estado posta em movimento em 1995 e em curso até os dias atuais; o segundo realiza-se nas mudanças na produção e valoração do capital. O primeiro realiza-se por meio das reformas das instituições republicanas, da reorganização da sociedade civil e da mudança da sociabilidade do ser humano neste momento do capitalismo; o segundo tem como principais orientações, de um lado, a reestruturação produtiva, que teve seu início sistematizado no Brasil na primeira metade da década de 1980, e de outro, a transformação radical no trabalho imaterial superqualificado, ambos no contexto da acumulação flexível. Esta última condensa as formas "pretéritas" e atuais de exploração do trabalho, atualizadas por novas e eficientes formas de controle e valorização do capital. (Silva Junior, 2009, p. 148). Desta maneira, estas transformações do setor público e, portanto, a implantação destes programas, vão atingir também a esfera do trabalho público e, mais especificamente, o trabalho docente nas universidades federais. Estão inseridos no programa Reuni maneiras e exigências diretas para o aumento da produtividade e “otimização” dos recursos humanos nestas instituições e este é outro processo que já se iniciou há algum tempo. O aumento da exploração do trabalho docente, no Brasil, ademais como em todos os países latinos, deu-se em especial pela flexibilidade registrada nos regimes de trabalho e consequente quebra da carreira docente, onde ela existia. Do total de docentes cadastrados pelo censo do Inep (MEC/Inep, 2006b), apenas 16,9% trabalham em regime de dedicação exclusiva e 18,6% em tempo integral. [...] Todavia, a flexibilização não se restringe ao tipo de contrato que é oferecido, pois em nome deste princípio tem-se assistido a um aumento substantivo do trabalho docente, um processo ainda inconcluso e que é objetivado tanto na educação privada, quanto na ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 51 pública. O estratégico dessas alterações é que os novos protocolos destinados aos docentes envolvem mecanismos que têm por alvo a intensificação e extensão do trabalho, relacionando-o às demandas e/ou lógica de mercado. [...] A partir de 2007, por exemplo, com a aprovação do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni, Decreto Presidencial nº 6.096 de 24 de Abril de 2007), até o custeio de atividades básicas dependerá de contratos de gestão com o Estado. Com este Programa – operacionalização, na prática, dos contratos de gestão, ensaiados desde o governo de FHC –, recursos somente serão disponibilizados se a universidade alcançar metas de expansão. (Mancebo, 2010, p. 78-81). Assim esta expansão se dá, também, ao custo de intensificação do trabalho docente que vem acumulando, progressivamente, funções técnico-administrativas, além, de suas funções docentes e de pesquisa, na graduação e na pós-graduação. E a relação professor-aluno que, segundo nossa perspectiva, redunda em intensificação do trabalho e massificação do ensino, é apontada como melhor aproveitamento de recursos pelo discurso oficial. Esta é mais uma consequência do processo de mercantilização das relações de trabalho que se configuram nas transformações do Estado no contexto de mundialização do capital. Os artigos abaixo versam sobre a regulamentação das horas de trabalho docente e o número de discentes por sala: A relação de dezoito estudantes de graduação presencial por professor foi fixada com base nas determinações contidas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), no que se refere à carga horária dos professores (art. 57), estimando-se salas de aulas com 45 alunos de graduação e uma carga horária discente de aproximadamente vinte horas semanais. (BRASIL, 2007, página 4). Art. 57. Nas instituições públicas de educação superior, o professor ficará obrigado ao mínimo de oito horas semanais de aulas. (Brasil, 1996, p.23). Nesta passagem acima das Diretrizes Gerais do Reuni do MEC de 2007 há esta nota de rodapé indicando que na LDB de 1996 se instituiu a carga horária docente mínima, e esta é de 8 horas semanais, e que se estimando uma carga docente de 20 horas e turmas de 45 alunos na graduação se conseguiria atingir uma das metas do programa de “elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da relação de alunos de graduação em cursos presenciais por professor para dezoito, ao final de cinco anos” (Brasil, 2007b, p.4). Neste sentido, o governo não percebe ou não reconhece que o aumento da relação aluno-professor (RAP) e a estimativa da carga horária docente na sala de aula de 20 horas, ou seja, cinco disciplinas de quatro créditos por semestre, em um sistema onde já há uma extensificação (acúmulo de funções e aumento da carga horaria de trabalho) das tarefas a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 52 serem realizadas pelos docentes, onde cada turma teria 45 alunos em média, onde há uma insuficiência de técnicos-administrativos no auxilio da administração dos departamentos, e as exigências da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo aumento da produtividade de pesquisa, seja uma sobrecarga de trabalho além das capacidades físicas e intelectuais do corpo docente das universidades federais. Ademais, a recomendação de uma meta a priori para a carga horária em sala de aula por professor fere o principio da autonomia universitária. O governo promulgou que cada instituição e que cada curso poderiam estabelecer suas próprias diretrizes para a reformulação curricular, mas coloca em suas Diretrizes Gerais do Reuni esta observação acerca da carga horária em sala de aula. Desta maneira, não preserva a possibilidade de cada curso e cada departamento, com suas especificidades, gerirem e promoverem suas próprias transformações. Vejamos como evoluiu entre 2007 e 2011 o número de matrículas em relação à evolução do número de docentes e perceberemos que o Ministério da Educação (MEC) incentiva relativamente a maior expansão do número de alunos em relação à expansão do número de professores. Tabela 5 - Evolução do número de docentes em relação à expansão do número de vagas em instituições federais - Brasil – 2007 a 2011. 2011 Δ% 2007-2011 de 641.094 1.032.936 61,12% Evolução do 59.156 90.388 (total) 52,20% número de 84.408 (em exercício) (considerando 2007 Número matrículas docentes o total de docentes) RAP (relação 10,83 11,42(alunos/professor) 12,92% aluno- 12,23 (em exercício) da relação alunos (alunos/professor) professor) (diferença por professor) Fonte: Elaboração própria, segundo dados do Inep. Considerando o total do número de docentes no sistema federal de educação superior e o número de matrículas no mesmo período 2007-2011, anos em que o Programa Reuni estava sendo implantado em grande parte das universidades federais, se percebe que o governo ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 53 consegue “aumentar/melhorar”, segundo sua lógica, ainda que não tão intensamente, o índice de aluno-professor (RAP). Houve um incremento de 12,92% na relação de alunos por professor de 2007 para 2011, segundo dados do Inep expostos na tabela acima. Mas, no primeiro relatório do Reuni de 2009, produzido pelo MEC, esta instituição, sem apontar números, afirma [...] “No primeiro ano de execução foi possível observar uma média entre as relações das universidades de 17,8 alunos por professor, o que aponta para o cumprimento da meta”. (Brasil/MEC, 2009 p. 7). Conclusão O Reuni em essência é um programa que, apesar de propor a expansão e a reestruturação das universidades federais no Brasil e, de certa forma, consolidar estas metas, é muito mais que um simples programa, pois que como pano de fundo para a consolidação destas metas traz consigo a concretização da inserção do Brasil no contexto da mundialização do capital. Esta concretização se dá por meio de mecanismos que estão subjacentes às propostas de primeiro plano do programa. Ou seja, não é uma meta declarada e assumida do Reuni que as universidades sejam administradas e financiadas com a lógica da administração gerencial, mas esta intenção se materializa. O Governo e o MEC foram bem sucedidos na propaganda política que foi possível de se estabelecer com a implantação do Reuni. Ou seja, a retórica institucional, de forma mais ou menos direta, foi absorvida pelos docentes que fizeram parte desta reestruturação da universidade, mesmo com a efetivação de sobrecarga e intensificação do trabalho. Por esta razão que argumentamos que o programa concretizou parte de sua materialidade, ou seja, há uma real dimensão de mudanças físicas nas universidades, não é apenas discurso. Mas, por meio do discurso o Governo alcançou mais êxito do que o programa obteve na realidade. Em segundo momento, percebemos claramente que a organização micropolítica das universidades, em suas administrações e em seus departamentos, estabelece um jogo dialético na implantação das políticas públicas para a educação superior. Assim, parte das metas do Reuni são renegociadas no momento de sua implantação em cada unidade acadêmica. A situação política e econômica de cada universidade, sua maior ou menor inserção no cenário brasileiro de produção acadêmica e cientifica, seu papel na difusão de tecnologias, sua maior ou menor inserção no setor industrial-produtivo na região em que atua e as demandas da classe docente que administram aquela universidade, aquele centro e aquele curso, são ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 54 características que influenciam diretamente na implantação dos programas para o ensino superior público federal. Há uma cena política efervescente e interessada, ideologicamente direcionada segundo suas pretensões acadêmicas, politicas e econômicas. Esta política de Estado direciona as universidades federais para uma maior ligação e para a interdependência destas com o setor industrial-produtivo brasileiro. São programas como o Reuni que demonstram que o Governo e o Estado brasileiros, independentemente de qual partido esteja no Governo, assumem a necessidade da inserção completa do Brasil no processo de mundialização do capital. Assumem o Brasil como um país que necessita ser atraente ao capital produtivo e financeiro internacionais, um país dependente tecnologicamente, e que pode, a partir de desenvolvimento cientifico e tecnológico direcionados, cumprir um papel emergente, em outras palavras, semiperiférico, na economia mundial. O Reuni auxilia na concretização desta dimensão econômico-social do Brasil: um país com mão-de-obra qualificada para a reprodução de tecnologia, inserido perifericamente na produção de tecnologia de ponta, com capacidade limitada (com a busca para o incremento) para o crescimento de seu setor industrial e com possibilidades modestas, a curto e médio prazos, de transformação da realidade social, ou seja, do quadro de péssima distribuição de renda no qual a sociedade brasileira se encontra. Referências Brasil. Lei nº 9.394. Lei de diretrizes e bases da educação. Brasília, 1996. _______. Decreto nº 6096, de 24 de abril de 2007. Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – REUNI. Brasília, 2007 a. Disponível em: <http://www.mec.gov.br>. Acessado em: 07/09/2011. _______. REUNI – Diretrizes Gerais. Brasília, 2007 b. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/diretrizesreuni.pdf. Acessado em 07/09/2011. _______. 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O predomínio do modelo empresarial com finalidade lucrativa, a concentração e a inserção das instituições de ensino no mercado de capitais têm caracterizado o recente processo de expansão da educação superior. Indagamos neste trabalho sobre os significados do avanço do que vem sendo chamado de internacionalização da educação superior privada nos processos de expansão e democratização da educação superior. Através de pesquisa bibliográfica e documental buscamos identificar quais indivíduos, grupos e/ou associações têm hegemonizado a educação superior no Brasil. Os estudos recentes têm apontado forte concentração das instituições de educação superior e crescente abertura ao capital estrangeiro. Palavras-chave: Educação Superior, Privatização, Expansão, Democratização. Introdução Nos anos recentes alterações significativas vêm ocorrendo nos sistemas de educação superior. Nos mais diversos países as dinâmicas dessas alterações correspondem a diferentes processos, dentre eles, destacamos: os processos de internacionalização, de transnacionalização e de integração dos sistemas educativos (Teichler, 2004; Morosini, 2007; Knight, 2010); de privatização/mercantilização da educação superior (Altbach, 2002; Bertolin, 2011; Serafim, 2011); de interiorização da matrícula (Sampaio, 2011); de criação/difusão de sistemas de avaliação e de redes de agências de avaliação/acreditação de instituições e cursos de educação superior (Dias Sobrinho, 2007; Amaral, 2010). Em contextos como esses, indagamos: a que dinâmicas o movimento recente de democratização da educação superior brasileira está submetido? Que implicações podem ser identificadas no recente processo de transformação da educação superior brasileira em uma commodity, ou seja, em uma mercadoria comercializada internacionalmente? (Altbach, 2002). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 57 O presente trabalho busca problematizar as faces da expansão da educação brasileira superior nos anos recentes. Através de pesquisa documental e revisão da literatura investigamos as dinâmicas da expansão da educação superior e as transformações no setor privado. Buscamos, inicialmente, problematizar e analisar as dinâmicas do crescimento privado da educação superior brasileira, identificando, os principais agentes desse processo. Finalmente, tecer algumas considerações com relação aos rumos da educação superior no Brasil. Dinâmicas da expansão da educação superior no Brasil nos anos recentes O desenvolvimento e a oferta da educação superior no Brasil se caracterizam pelo forte predomínio do setor privado. Tal situação não é recente, o setor se expandiu com o apoio fundamental dos governos civil-militares (1964-1984). Analisando essa trajetória vislumbramos que até meados da década de 1960, o setor privado respondia por menos de 40% das matrículas no ensino superior (Cunha, 2003; Sguissard 2008; Martins, 2009). A preferência do regime pela privatização evidencia-se na transformação radical, em apenas uma década, do perfil da oferta da educação superior. Conforme demonstra Sguissard (2008), no intervalo de 1964 a 1974, a matrícula na educação superior cresceu mais de 500%. Contudo, dos 937.593 alunos matriculados neste nível de ensino em 1974, 341.028 (36,4%) estavam em instituições públicas e 596.565 (63,6%) em instituições de ensino privadas. Nos dez anos seguintes (1974-1984) apesar de se registrar um crescimento bastante inferior ao da década anterior (49,3%) e uma expansão maior das matrículas públicas (67,6%) comparativamente às do setor privado (38,7%), o perfil privatizado da educação superior que emergiu com a ditadura se manteve. Neste intervalo de tempo, 59,1% dos alunos estavam matriculados em instituições privadas enquanto 40,9% se encontravam em instituições públicas de educação superior (Sguissard, 2008). O período posterior (1984-1994) caracteriza-se por uma desaceleração das matrículas, explicada, segundo Martins (2009, p, 24) pela grave crise econômica, altas taxas de inflação e desemprego que assolaram o país no inicio da década de 1980, bem como, pelas duras críticas e descontentamentos quanto à qualidade do ensino privado e que levaram o governo a adotar medidas para controlar a criação de novos cursos nos estabelecimentos já existentes. Nesse intervalo de tempo a taxa anual de crescimento da educação superior foi de aproximadamente 1,5%, totalizando 18,7% ao final do período. Em termos absolutos, estavam ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 58 matriculados em 1994, 1.661.034 alunos, desses, 690.450 (41,6%) em instituições públicas e 970.584 (58,4%) nas IES privadas. Comparativamente, a expansão nas instituições públicas foi maior que nas instituições privadas. As matrículas públicas e privadas cresceram 20,7% e 17,3%, respectivamente. O crescimento do efetivo de alunos nas instituições públicas é explicado pela pressão social sobre os governos da Nova República e pelo fato de que as mesmas passaram a se instalar em áreas geográficas de menor interesse econômico para a rede privada (Sguizzard, 2008; Martins, 2009). Mas, a partir de meados da década de 1990, devido aos estímulos governamentais, o setor privado voltou a crescer muito fortemente (Sampaio, 2000). O Censo Educacional do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, realizado em 1994, contabilizou a existência de 851 instituições de educação superior, dessas, 218 (25,6%) públicas e 633 (74,4%) privadas. Martins (2009) observa que até meados da década de 1970 o modelo organizacional de expansão do setor privado se caracterizava pela forte presença de estabelecimentos isolados de pequeno porte. Este modelo começa a ser alterado ainda nos anos de 1970, com a fusão de alguns estabelecimentos isolados dando origem às federações de faculdades particulares. Já em meados da década de 1980, o movimento consistiu na transformação dessas federações e estabelecimentos isolados em universidades. Segundo este autor, entre 1985 e 1996, o número de universidades passou de 20 a 64 estabelecimentos, e, em 2001, a 85 universidades privadas. Tais mudanças foram orientadas pela “percepção dos proprietários das instituições de que a existência de estabelecimentos maiores, oferecendo cursos mais diversificados, traria vantagens competitivas no interior do mercado do ensino superior” (Martins, 2009, p. 23). Apesar das instituições universitárias concentrarem a maioria das matrículas na educação superior, a presença de estabelecimentos isolados seguiu sendo majoritária. Dados do INEP apontaram uma taxa de crescimento das instituições privadas na ordem de 8,5%, no período de 1990 a 2000. A partir dos anos 2000 observamos o incremento exponencial do número de instituições privadas. Em uma década foram criadas 1.096 novas instituições privadas, um crescimento na ordem de 52,19%. Ressalta-se que dos 2100 estabelecimentos privados registrados em 2010, apenas 89 eram instituições universitárias, 119 centros universitários e 1.892 faculdades isoladas. Também se observou nesse período um movimento de interiorização da oferta privada. O Censo da Educação Superior (INEP/MEC, 2010) registrou que dos 2.100 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 59 estabelecimentos de educação superior privados, 1365 (65,2%) estavam fora das capitais e com mais da metade das matrículas presenciais – 50,75%. Atualmente, quase toda cidade de porte médio tem uma IES ou uma extensão/filial/polo que oferta o ensino a distância (Sampaio, 2000). A desconcentração regional das IES privadas tem se tornado uma excelente alternativa de expansão dos negócios para regiões fora do eixo Sudeste-Sul. Quando do anuncio, em abril de 2013, da fusão entre dois dos maiores grupos de educação superior do país, a Anhanguera Educacional e a Kroton Educacional, o presidente dessa última, Rodrigo Galindo, afirmou em entrevista à Revista Veja (2013) que a nova gigante do setor de ensino superior surgida com essa fusão, pretendia expandir sua atuação principalmente no Norte e Nordeste do país: “Sem dúvida, Norte e Nordeste apresentam um potencial maior de crescimento para a companhia". Tais regiões têm taxas ainda mais baixas de alunos no ensino superior e apresentam grande potencial de crescimento. Dados do INEP (INEP/MEC, 2011) apontavam que as regiões Norte e Nordeste tinham taxas de 11,9% de penetração do ensino superior, ou seja, pessoas entre 18 e 25 anos que já teriam concluído ou ainda estavam cursando o ensino superior, enquanto na região Centro-Oeste, por exemplo, este percentual era de 23,9%, e no Sul e Sudeste de 22,1% e 20,1%, respectivamente. Apesar de mudanças quanto à presença do público e do privado no ensino superior refletida em uma taxa de crescimento menor das instituições e das matrículas privadas ao final do intervalo correspondente aos dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (20032010), estudos como os de Carvalho (2006), Sguissard (2008), Martins (2009), Chaves (2010), dentre outros, enfatizam a continuidade e forte participação do setor privado-mercantil neste nível de ensino. Nos anos recentes o crescimento do setor educacional privado teve como apoio fundamental alguns instrumentos legais, como: o Decreto n. 4.914, de 11/12/2003, que concedeu autonomia aos centros universitários; o Decreto n. 5.622, de 19/12/2005, que regulamentou a educação a distância (EaD); e a Medida Provisória n. 213 de 2004, transformada em Lei n. 11.096/2005 que instituiu o Programa Universidade Para Todos – ProUni. A adesão a este Programa por qualquer instituição privada, com ou sem fins lucrativos, tem propiciado isenção fiscal de importantes tributos. Mesmo com as recentes variações nas taxas de crescimento das matrículas nos setores público e privado, o Brasil segue como o maior mercado de ensino superior privado da ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 60 América Latina e o quinto maior do mundo (BRASIL/Fiocruz, 2013). Dados do Censo da Educação Superior divulgados em setembro de 2013 informaram o crescimento de 4,4% do número de alunos matriculados em cursos de graduação. Esse percentual, no entanto, foi inferior à taxa de crescimento de 5,65% alcançada entre 2010 e 2011. No período de 20112012, apesar de o setor privado registrar taxas de crescimento menores em relação ao setor público, 3,5% e 7%, respectivamente, o setor privado manteve sua hegemonia no quantitativo de alunos matriculados em cursos de graduação. De um total de 7.037.688 matrículas, apenas 1.897.376 (27,0%) estavam em instituições públicas e 5.140.312 (73,0%) em IES privadas (MEC/INEP, 2013). Na última diferenciação entre as IES privadas sem fins lucrativos e as IES mercantis divulgada pelo MEC no Censo de 2010, os dados revelaram que 2.899.763 (77%) dos alunos encontravam-se matriculados em IES privadas-mercantil e 864.965 (23%) em instituições filantrópicas, confessionais e/ou comunitárias. Sendo ainda contabilizadas 1779 IES particulares e apenas 290 IES sem finalidades lucrativas. Concentração e financeirização da educação superior O período recente tem revelado novas facetas na dinâmica de expansão do setor privado de educação superior. Uma delas é a concentração das IES promovida pelo capital financeiro. Segundo Ferreira (2011, p. 47) observou-se um movimento em que as pequenas instituições, bem como as de origem familiar vão “saindo de cena” e cedendo lugar para os grandes conglomerados educacionais “altamente profissionalizados e capitalizados por dinheiro captado na bolsa de valores ou por injeção de recursos de parceiros internacionais e fundos de investimentos”. Trata-se dos “novos provedores” nacionais e internacionais da educação superior, tal como analisa Lópes Segrera (2010). Pesquisadores como Oliveira (2009), Chaves (2010), Carvalho (2011), Santos (2013), dentre outros, têm se dedicado a investigar a recente tendência à fusão, concentração e formação de oligopólios na educação superior privada. Oliveira (2009) e Chaves (2010), por exemplo, apontam que a movimentação pioneira dessa tendência ocorreu em 2001, com a associação da Kroton Educacional, proprietária da Rede Pitágoras de Ensino, com o Apollo Group International, dono da maior universidade privada dos Estados Unidos, a Arizona University. Essa ação, desfeita em 2005, abriu as portas para a associação e/ou aquisição de IES privadas por grupos/instituições educacionais e/ou investidores estrangeiros. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 61 A captação de acionistas no mercado financeiro, por sua vez, teve inicio em 2007 com a realização pela Anhanguera Educacional Participações S.A. de sua primeira oferta pública de ações na Bolsa de Valores de São Paulo – Bovespa. Na sequência, IES como a Estácio Participações S.A., a Sociedade Educacional Brasileira S.A. (SEB) e a Kroton Educacional S.A. também passaram a realizar ofertas públicas de ações na bolsa de valores. Desde então, associações com redes internacionais de ensino, bancos e fundos privados de investimento, como os Private Equity vêm se expandindo rapidamente no Brasil. A possibilidade de investir em IES e cursos privados tornou o mercado educacional atraente e muito lucrativo para grupos nacionais e internacionais que, nos últimos anos, envolveram-se em grandes e milionárias negociações (Oliveira, 2009; Chaves, 2010). Dois movimentos concomitantes têm caracterizado a recente expansão da educação superior privada no Brasil, de um lado, a financeirização do setor privado, com forte presença do capital estrangeiro, de outro, a concentração das empresas educacionais, formando grandes conglomerados educacionais. Exemplo disso, a fusão da Anhanguera Educacional com a Kroton, ocorrida em abril de 2013 e aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) em maio de 2014. Essa associação resultou na formação de uma instituição gigante no setor educacional avaliada em 12 bilhões de reais e com mais de um milhão de estudantes (EXAME, 2013). Em agosto de 2013 foi publicada lista elaborada pela empresa de consultoria em negócios PricewaterhouseCoopers (PwC) mostrando, em ordem alfabética, os principais grupos educacionais no país: Abril Educação; Actis; Advent – Kroton; Anhanguera-Uniban; BR investimentos; DeVry; GP Investments – Estácio; Kinea; Laureate; Pátria-Blackstone (EXAME, 2013a). Dentre essas empresas, as que mais cresceram na bolsa de valores no primeiro semestre de 2014: a Kroton, que ganhou em valor de mercado 6 bilhões de reais; a Estácio, lucrando 2,65 bilhões; e, a Anhanguera Educacional com ganhos de 1,52 bilhão de reais (EXAME, 2014). TABELA 01 - PRINCIPAIS GRUPOS DE ENSINO SUPERIOR PRIVADO NO BRASIL - 2012. Instituição Kroton/Anhanguera - fundo private equity Estácio - fundo private equity UNIP - capital nacional Laureate - EUA Uninove - capital nacional Unicsul - fundo private equity No. de alunos Receita líquida Participação 959 mil 272 mil 238 mil 145 mil 127 mil 47 mil R$ 3 bilhões R$ 1,38 bilhão R$ 1,37 bilhão R$ 956 milhões R$ 562 milhões R$ 487 milhões 16,2% 5,3% 4,6% 2,8% 2,5% 0,9% ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 62 Ânima - BR Educacional - fundo private equity Whitney - EUA Ser Educacional - EUA Grupo Tiradentes - capital nacional Devry - EUA Ibmec - BR Educacional - fundo private equity Outras instituições TOTAL DO SETOR PRIVADO 42 mil R$ 400 milhões 0,8% 37 mil 49 mil 37 mil 27 mil 9 mil R$ 312 milhões R$ 282 milhões R$ 197 milhões R$ 180 milhões R$ 170 milhões 0,7% 0,9% 0,7% 0,5% 0,2% 3,3 milhões 5,16 milhões R$, 18,9 bilhões R$ 28,2 bilhões 63,8% 100,0% Fonte: Hoper Estudos de Mercado (dados de 2012). Para os objetivos desse artigo que consistem em analisar a dinâmica recente da expansão da educação superior privada no Brasil, tomaremos como exemplo para a descrição dos movimentos de concentração, transnacionalização e financeirização apenas uma das três instituições acima mencionadas, a Kroton Educacional S.A. Kroton Educacional Conforme consta no sítio da Kroton (2014), o grupo educacional surgiu em 1966 com a criação, por "cinco jovens amigos", na cidade de Belo Horizonte, do curso pré-vestibular Pitágoras. O curso pré-vestibular começou com 35 alunos e dois anos depois já contava com novas instalações e 600 alunos. Nos anos de 1970 foram criados os primeiros Colégios Pitágoras para alunos de 1º e 2º graus. Na década de 1980, para “driblar a crise econômica” iniciou-se um processo de migração geográfica, com implantação de unidades em outras cidades, regiões e até fora do país. Acompanhando empreendimentos de construtora brasileira no Iraque e na Mauritânia, o Pitágoras foi dirigir unidades escolares para alunos brasileiros que se encontravam nesses países. No inicio da década de 1990 com vistas a consolidar um “modelo diferenciado de expansão do atendimento ao ensino básico” foi criada a Rede Pitágoras, que em menos de um ano passou a contar com 106 escolas associadas. Em 1999, surgiu a Fundação Pitágoras para viabilizar projetos educacionais em instituições públicas e privadas (KROTON, 2014). No ano de 2001, em parceria com Apollo International surge a primeira Faculdade Pitágoras. Sobre o novo empreendimento, Walfrido dos Mares Guia, um dos donos e sócio fundador do Grupo Pitágoras, assim pronunciou: "Vamos dar escala a um modelo pedagógico e empresarial que permitirá levar uma formação cultural forte e ao mesmo tempo profissionalizante para a massa e elevar o faturamento do Pitágoras dos atuais 75 milhões para 400 milhões de reais em 2010” (ROSENBURG, 2002). A parceria com o grupo americano ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 63 durou até 2005 quando a Apollo International decidiu vender sua participação aos fundadores. Em 2007, o grupo Pitágoras, com o nome Kroton Educacional (KROT11) fez sua primeira Oferta Pública de Ações (IOP), tal empreendimento, possibilitou “a consolidação de uma fase de grande expansão e desenvolvimento da Companhia” (KROTON, 2014). A Kroton colocou no mercado 10.675 Certificados de Depósito de Ações – Units, ao preço de R$39,00, perfazendo um montante de R$ 416.325.000,00. A oferta compreendeu a distribuição pública de Units no Brasil e nos Estados Unidos e foi intermediada pelo Banco Morgan Stanley Dean Witter S.A. denominado “Coordenador Líder”, pelo Banco Merrill Lynch de Investimentos S.A., pelo HSBC Corretora de Títulos e Valores Mobiliários S.A. e por diversas instituições integrantes do sistema de distribuição de valores mobiliários, chamadas “Corretoras Consorciadas” (KROTON, 2007, p. 1). A abertura de capital aportou para a companhia R$ 373,3 milhões em recursos líquidos, impactando o seu processo de expansão. O “sucesso da abertura de capital” refletiu no valor de mercado da Kroton Educacional que passou de R$ 1.227 milhões, em agosto de 2007, a R$ 881 milhões, em 31 de dezembro de 2007 (KROTON, 2007a, p. 85). Nesse mesmo ano, a receita bruta total da Kroton Educacional foi de R$ 155,6 milhões, representando, “uma evolução de 52,2% em relação a 2006, sendo composta por 50,9% provenientes da Educação Básica e 48,5% do Ensino Superior” (KROTON, 2007a, p. 37, 63). Já o lucro líquido ajustado da companhia foi 293,9% superior em relação ao ano anterior, passando de R$ 8 milhões para R$ 31,5 milhões. Dois fatores são apontados para esse acréscimo em 2007: “I. o início da maturação de alguns cursos/campi; II. a expansão das operações”. Com relação à expansão da companhia no ensino superior, sua receita bruta cresceu 79,9% em relação ao ano anterior. Em 2006, a companhia contabilizou 7.845 alunos, em 2007, 17.997 alunos, um crescimento de 129,4% (KROTON, 2007a, p. 39). O processo de captação de recursos no mercado financeiro propiciou uma nova fase de crescimento para a Kroton com o foco, principalmente, no ensino superior. Durante o ano de 2007 foram investidos R$ 72,7 milhões, sendo “I. R$ 36,4 milhões na implantação de novas unidades de ensino superior, nos novos cursos nos campi existentes, na educação a distância e tecnologia educacional; II. R$ 36,3 milhões na aquisição de quatro novas faculdades” (KROTON, 2007a, p. 67). Constituído pela Faculdade Pitágoras e pela INED - Faculdade Tecnológica, o grupo possuía, até julho de 2007 oito unidades/e ou campi nas cidades de Belo Horizonte, Nova ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 64 Lima, Betim e Ipatinga. Em dezembro de 2007 este número havia subido para 17, com a abertura de novos campi e aquisições de IES em Divinópolis (MG), Vitória (ES), Londrina (PR), Jundiaí (SP) e São Luís (MA). Em 2008, o crescimento do ensino superior nos negócios da Kroton Educacional já correspondia a 68,1% de sua receita bruta. No ano anterior esse percentual foi de 48,5%. O aumento do número de alunos foi considerado “o grande responsável” pelo crescimento da receita bruta no ensino superior, em valores monetários, foram R$ 209,2 milhões, contra R$ 75,5 milhões de 2007 (KROTON, 2008, p. 7). As aquisições responderam, em grande medida, por esse aumento. Em 2008, foram adquiridas 8 novas empresas educacionais em diferentes localidades do país. A divulgação dos resultados da companhia informou um número médio de 42 mil alunos e 28 campi em operação (KROTON, 2008). Alguns fatores têm tornado o mercado educacional brasileiro bastante atraente ao investimento privado nacional e estrangeiro: o país ainda possui uma das taxas mais baixas de acesso ao ensino superior7 da América Latina, ou seja, considerando a parcela de jovens de 18 a 24 anos, temos uma taxa de escolarização líquida de 14,6% e uma taxa bruta, 27,8% (MEC/INEP, 2011); possui grandes diferenças regionais quanto à oferta e acesso à educação superior; baixa presença de IES públicas, apenas 12% do total de instituições de educação superior no país (MEC/INEP, 2011); e, uma presença importante de recursos públicos no financiamento direto (FIES) e indireto (isenções fiscais/ProUni) ao setor privado, dentro outros. Consideramos que esses fatores têm contribuído para a grande expansão mercantil do setor privado nos últimos anos, com a presença, cada vez maior, de grupos estrangeiros no ensino superior brasileiro. Como parte da estratégia para acelerar o seu processo de expansão, em junho de 2009, a Kroton comunicou aos seus acionistas e ao mercado o recebimento de aportes financeiros no valor de R$ 280.000.000,00 de um dos maiores fundos de private equity do mundo, o Advent International8, que passou a deter 50% do capital social da Pitágoras Administração e Participações S.A (PAP), sociedade que controla diretamente a Kroton. Desse montante, R$ O Plano Nacional de Educação – Lei n. estipula na Meta 12: elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18 (dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento público. 8 A Advent International é o maior fundo de private equity da América Latina, presente no Brasil desde 1997, com mais de US$2 bilhões em fundos já levantados para a América Latina, com escritórios em 15 países e mais de 140 profissionais de investimento, tem investimentos na CETIP - maior depositária de títulos privados de renda fixa -, na rede de varejo Quero-Quero, redes de restaurantes Frango Assado e Viena, Duty Free, entre outras, (EXAME, 2009). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 7 65 220 milhões foram destinados ao aumento de capital da companhia com a colocação privada de 387,9 milhões de ações no mercado (KROTON, 2009; EXAME, 2009). A kroton, conforme divulgado pela Revista Exame (2009) “é a companhia do setor educacional que mais cresce no Brasil”. Para consolidar “um novo ciclo de crescimento” a Kroton Educacional S.A. anunciou no final de 2009 a implantação de um “Plano de Ação” com mudanças em sua estrutura organizacional e de gestão. As mudanças anunciadas incluíam: Incorporação da marca INED à marca Pitágoras, passando com isso a ofertar cursos superiores de tecnologia [...]; aprimoramento da gestão acadêmica, através da criação de um comitê acadêmico, a ser liderado por profissional de prestígio nacional, pela designação de líderes do conhecimento, além de outras medidas; implantação da Diretoria Corporativa de Recursos Humanos; criação da área de fusões e aquisições e PMI (Post Merger Integration); implantação da Auditoria Interna (KROTON, 2009b). O Plano também incluía, além de outras iniciativas, o fortalecimento da área de EAD e uma “clara definição de empresas-alvo para aquisições [...]” (KROTON, 2009a, p. 10). Em março de 2010, a Kroton Educacional concluiu a sua maior aquisição até então, por R$191.753.856,39 adquiriu a totalidade do capital social da IUNI Educacional S.A. Com essa compra, as matrículas no ensino superior chegaram a 85.367, sendo 76.253 alunos em cursos de graduação e 9.114 em cursos de pós-graduação. A Kroton se tornou, em 2010, um dos maiores grupos educacionais do país, com 265 mil alunos na educação básica e 720 escolas associadas. No ensino superior passou a dispor de 40 campi, em 28 cidades de 10 estados brasileiros (KROTON, 2009a). Com uma firme estratégia de expansão, no primeiro semestre de 2011, adquiriu a Faculdade Atenas Maranhense (São Luís e Imperatriz – MA) e a Faculdade Educacional de Ponta Grossa no Paraná. Em setembro, comprou a FAIS – Faculdade de Sorriso no Mato Grosso, em dezembro, realizou "a maior aquisição da história da educação" com a compra da UNOPAR por R$ 1,3 bilhão, tornando-se com essa transação, líder no setor de educação a distancia no Brasil (KROTON, 2011). Com as novas aquisições, a Companhia encerrou o ano de 2011 com 252.864 alunos em cursos de graduação presencial e a distância e 18.139 em cursos de pós-graduação (presencial e a distância), distribuídos em 44 unidades de ensino superior e 399 polos de ensino a distância. Já os resultados financeiros mostraram uma receita líquida de R$ 734,6 milhões, um EBITDA de R$ 111,1 milhões, e um lucro líquido de R$ 37,4 milhões. Quanto à ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 66 movimentação junto ao mercado de capitais, os relatórios demonstraram um aumento de capital e emissão de debêntures de quase R$ 1,5 bilhão (Kroton, 2011). A estratégia de expansão da Kroton englobou, portanto, o seu crescimento no mercado de graduação a distância. No país, de acordo com o Censo da Educação Superior a EAD correspondeu a 19,6% do total de matrículas no ensino superior (MEC/INEP, 2011). Na sequência da aquisição da UNOPAR, em abril de 2012, a companhia adquire o Centro Universitário Cândido Rondon (Unirondon) no Mato Grosso; e, em maio de 2012, compra a Uniasselvi com 73.700 alunos em cursos de graduação e pós-graduação a distância e 12.500 alunos em cursos presenciais de graduação e pós-graduação. Com essas aquisições, a companhia encerrou o ano 2012 com um número total de alunos, considerando as modalidades presenciais e a distancia, de 410.035 alunos, sendo 34,9% no ensino presencial e 65,1% no ensino a distância (KROTON, 2012; 2014). O anuncio em abril de 2013 de um "Acordo de Associação" com outra grande instituição privada de educação superior, a Anhanguera Educacional SA, causou alvoroço no mercado financeiro brasileiro. A fusão das duas companhias criou o maior grupo privado educacional do mundo. Juntas, a kroton e a Anhanguera passaram a deter "mais de 800 unidades de ensino superior e 810 escolas associadas distribuídas por todos os Estados brasileiros, englobando um universo de aproximadamente um milhão de alunos no segmento de educação superior, educação profissional e outras atividades associadas à educação no Brasil". O negócio ocorreu por meio de troca de ações e foi estimado em R$ 5 bilhões, com o valor de mercado das duas companhias estipulado em R$12 bilhões (KROTON, 2013). Esse "Acordo de Associação" foi aprovado em caráter definitivo em 14 de maio de 2014, pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE, mediante celebração de um "Acordo em Controle de Concentrações" - ACC9. Os resultados parciais da fusão das duas companhias foram apresentados em julho de 2014 pela Kroton (2014b). Nos resultados referentes ao segundo trimestre de 2014 (2T14) são informados o número total de alunos das 9 Por meio desse Acordo se comprometeram a alienar a Sociedade Educacional Leonardo da Vinci S/S Ltda., detentora do Centro Universitário Leonardo da Vinci, que oferece cursos de graduação na modalidade EAD sob a bandeira Uniasselvi, bem como duas instituições de ensino superior que oferecem cursos presenciais em Rondonópolis e Cuiabá. Também assumiram o compromisso de limitar o número de alunos que poderão ser captado pelas duas em determinados cursos EAD em 48 municípios específicos, até 2017; se comprometeram a não utilizar concomitantemente suas bandeiras para captar novos alunos em determinados cursos EAD em municípios nos quais ambas venham a atuar. Com relação aos cursos EAD/municípios não afetados por tais compromissos, as atividades da Unopar e Uniderp permaneceriam inalteradas, inclusive no que se refere a seus respectivos planos de expansão. As Companhias também assumiram o compromisso de investir na capacitação de professores e tutores (KROTON, 2014a). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 67 "Companhias combinadas": 1.040,6 mil alunos, sendo 967,6 mil em cursos de graduação e 73 mil em cursos de pós-graduação. Com relação ao desempenho financeiro combinado tem-se que as duas companhias obtiveram, no primeiro semestre de 2014 (1S14), uma receita líquida de R$ 2.446 bi; o EBITDA ajustado de R$ 903 milhões; e, o lucro líquido ajustado de R$ 732 milhões. O informe financeiro também destaca o desempenho das companhias no mercado de capitais: "as ações estiveram presentes em 100% dos pregões no 2T14, atingindo um volume negociado de R$ 7,0 bilhões, em 451.924 negócios, com volume médio diário negociado de R$ 117,5 milhões", sendo o valor de mercado da Kroton fixado em R$ 16,7 bilhões. Ainda, segundo o relatório, no primeiro semestre de 2014, as ações da companhia valorizaram em 61,2%, "o melhor resultado de todo o Ibovespa, cujo índice apresentou valorização de 3,2%", com isso foram distribuídos, em junho e setembro de 2014, R$ 483 milhões de dividendos entre os acionistas da companhia (KROTON, 2014b, p. 29-30). Considerações finais O panorama da educação superior brasileira apresentado neste artigo teve como principal objetivo identificar as alterações nas relações entre o privado e o público na expansão da educação superior. Tratou-se, portanto, de discutir à luz da pesquisa documental as reconfigurações da educação superior no país que se expressam nas distintas dinâmicas de crescimento do setor privado nos anos recentes. A democratização do acesso ao ensino superior no Brasil revela a opção política de ampliação do atendimento pela via do setor privado mercantil. Nos últimos anos o setor vem obtendo apoio substantivo do Estado por meio do Prouni e do FIES. No caso da IES estudada, após a fusão Kroton-Anhanguera, essas companhias passaram a ter 253.196 alunos FIES, representando 59,3% do total de alunos de graduação presencial (KROTON, 2014b). Cabe ainda mencionar o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego - Pronatec, criado pelo Governo Federal, em 2011, com o objetivo de ampliar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica. Assim como ocorre com o Prouni, o segmento público é substituído pelas vagas gratuitas ofertadas nas instituições do Sistema S e por organizações privado-mercantis do setor. O Pronatec foi exaltado pelas IES privadas. No caso da Kroton, em comunicado aos seus "acionistas, investidores e ao mercado em geral", divulga os resultados do processo de matrícula relativo ao segundo semestre de 2014 do Programa: [...] a Kroton (incluindo as instituições da Anhanguera) matriculou 15.420 alunos, sendo 6.968 para o período matutino, 3.899 para o período ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 68 vespertino e 4.553 para o período noturno, as quais serão oferecidas por meio de 40 diferentes cursos e em 59 Instituições de Ensino. Cabe lembrar, também, que essas vagas são referentes à modalidade Bolsa Formação, a qual oferece bolsas de estudos totalmente subsidiadas pelo Governo Federal (KROTON, 2014c). O país tem se apresentado como um mercado com grande potencial a ser explorado e, particularmente, bastante atraente aos “investidores” estrangeiros. A grande expansão do ensino superior privado também se vincula a um intenso processo de “desnacionalização da educação”. A entrada de capitais estrangeiros no mercado educacional tem sido a marca desse processo (Borges & Aquino, 2013). As características da expansão privada do ensino superior apresentadas neste trabalho indicaram mudanças na distribuição socioespacial da oferta de cursos privados com a regionalização e interiorização da oferta; concentração em áreas de baixo custo de investimento; a concentração das IES formando grandes oligopólios. Todas essas características podem revelar uma incapacidade de regulação sistêmica do poder central sobre o mercado educacional privado. Neste sentido, os pesquisadores têm chamado atenção para o fato de que os processos de internacionalização/transnacionalização da educação superior privada por meio da associação e/ou aquisição das IES brasileiras por grupos estrangeiros praticamente não tem encontrado nenhuma restrição legal e movimenta milhões de dólares. Por fim, as transformações recentes na educação superior brasileira não deixam de estar sintonizadas às novas demandas e formas sociais de produção e reprodução do sistema capitalista e que reduzem a educação aos interesses do lucro. Segundo Oliveira (2008, p. 754), em um contexto como esse, as tentativas de limitar a mercantilização, pela via da regulação ou restrições legais, estarão fadadas ao fracasso. Contudo, medidas devem ser implementadas como forma de “preservar condições mínimas de funcionamento que não corrompam e desmoralizem completamente a natureza da atividade educativa na sociedade”, mas, somente partir da “ampliação da oferta pública, de modo a atender a parcelas substantivas da população e criar alternativas de atendimento em massa” será possível por limites à mercantilização da educação. Referências bibliográficas BEZERRA, Paula. 10 grupos de educação que movimentam as aquisições do setor. São Paulo: Exame.Com, 2013a. Disponível em: < http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/10grupos-de-educacao-que-movimentam-as-aquisicoes-do-setor#2>. Acesso em 26 de julho de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 69 BRASIL. Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 72 EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E DESENVOLVIMENTO: UMA ARTICULAÇÃO POSSÍVEL? Rhoberta Santana de Araújo GEPES-UFPA Email: [email protected] Eixo 1: Financiamento da expansão do ensino superior RESUMO O ideário de desenvolvimento econômico propugnado pelo capitalismo dissemina o discurso da educação como um importante fator para competitividade e para o desenvolvimento das economias globais, engendrando um conjunto de ações estatais, materializadas em planos, programas e instrumentos normativos. A conexão entre educação-conhecimentodesenvolvimento institui plena conformação às demandas econômicas. O ensino superior, objeto de análise deste artigo é intensamente impactado pelas mediações da sociabilidade capitalista que incorpora de modo sistemático a ciência, a inovação e a tecnologia, aliada a formação de recursos humanos qualificados enquanto estratégia para ampliação da acumulação e concentração do capital e fator distintos de competitividade das economias globais. O objetivo deste artigo é analisar a atual fase desenvolvimentista encetada pelos grandes empreendimentos de infraestrutura no país, sob o discurso de superação das desigualdades com melhor distribuição de renda e as interrelações com a distribuição do acesso ao ensino superior. A metodologia está assentada nas contribuições do materialismo histórico-dialético e é resultado parcial da pesquisa em desenvolvimento realizada pela autora no doutoramento em educação. Revisão bibliográfica e análises documentais subsidiaram a produção. Os resultados da investigação indicam assimetrias no acesso nas distintas regiões do país, além de uma baixa participação das instituições públicas nas matriculas, demarcando a continuidade do cenário privatista do ensino superior no Brasil. Palavras chaves: Ensino superior. Economia da educação. Desenvolvimentismo. As reformas neoliberais, iniciadas na década de 1990 indicam a readequação do papel do Estado na condução das políticas sociais, com um amplo processo de privatização de empresas prestadoras de serviços de interesse público. A chamada do mercado e da sociedade civil para assumir a oferta desses serviços, serve de pilar político, econômico e ideológico para atendimento das exigências de acumulação do capital, cuja representação está assentada na aliança da burguesia nacional e internacional. Neste sentido, Minto (2007, p.219) reitera que: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 73 Se a gênese do Estado moderno burguês está fundada essencialmente nas contradições e nos antagonismos de classe que caracterizam a sociedade produtora de mercadorias, estranha a admiração – suscitada pelas vicissitudes do capitalismo nos dias atuais – daqueles que julgam imprópria a utilização de recursos do fundo público para os fins da acumulação capitalista. Ora o processo de reconfiguração do capital – a reestruturação produtiva e a recomposição das taxas de lucro – se dá através desse processo histórico em que o capital apropria-se, de forma crescente, de setores ainda não dominados inteiramente por sua lógica reprodutiva, a saber, da esfera estatal de interesses públicos cujo veículo são as políticas sociais. Desse modo, a maciça participação do mercado na promoção de serviços de interesse público, a exemplo da saúde e da educação, é expressão das permanentes metamorfoses da reprodução e da acumulação capitalista. Nessa configuração, o Estado assume um papel decisivo, pois é por meio da transferência dos recursos oriundos do fundo público para iniciativa privada e conseqüente delegação para esta assumir a função de executora desses serviços que é materializada essa conformação, cujo marco regulatório está assentado nas parcerias público-privadas. No cenário macroeconômico de reestruturação produtiva e alterações substantivas nas relações entre capital e trabalho, influenciadas pelos ganhos de produtividade promovidos pela matriz tecnológica nos países avançados e marginalmente nos países periféricos se intensifica o discurso da centralidade da tríade conhecimento-ciência-tecnologia, enquanto estratégia para o crescimento econômico e superação das assimetrias sociais, notadamente de distribuição de renda e desemprego. Dessa forma, os preceitos do capital humano influenciam a adoção de políticas no campo educacional com a funcionalidade de formação de recursos humanos especializados, demarcando o campo de disputa e competitividade nos mercados globais. O ideário de desenvolvimento econômico propugnado pelo capitalismo dissemina o discurso da educação como um importante fator para competitividade e para o desenvolvimento das economias globais. As alterações nas bases técnicas de produção, alicerçada na acumulação flexível, na desregulamentação econômica e na divisão internacional do trabalho difundem um novo perfil do trabalhador, coadunado com os interesses corporativos e empresariais. Nesta perspectiva, um novo modelo de educação deve ser incorporado às políticas educacionais como estratégia para superação dos obstáculos impostos ao crescimento econômico. A expansão do acesso das oportunidades educacionais ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 74 no discurso governamental é sinônimo de competividade, produtividade e melhores condições de inserção do trabalhador no mercado. Educação e conhecimento, nesta perspectiva assumem centralidade, como aponta Oliveira (2009, pp. 239-240): Essa centralidade se dá porque educação e conhecimento passam a ser, do ponto de vista do capitalismo globalizado, força motriz e eixos da transformação produtiva e do desenvolvimento econômico. São, portanto, bens econômicos necessários à transformação da produção, ao aumento do potencial científico-tecnológico e ao aumento do lucro e do poder de competição num mercado concorrencial que ser quer livre e globalizado pelos defensores do neoliberalismo. Torna-se clara a conexão estabelecida entre educação-conhecimento e desenvolvimento-desempenho econômico. A educação é um problema econômico na visão neoliberal, já que ela é elemento central desse novo padrão de desenvolvimento. A partir dos anos 2000 com assunção de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) à presidência da República a pauta do desenvolvimento econômico é reposicionada. Alicerçado no discurso de superação da pobreza o ex-presidente implementou programas de transferência de renda e um conjunto de medidas para a retomada do crescimento econômico. Marcado pelo forte apelo ideológico e midiático por meio de uso de jargões como “nunca na história desse país”, as ações macroeconômicas adotadas nesse período inserem o Brasil no rol de países emergentes. Ressalte-se que nesse cenário o Estado continua assumindo a funcionalidade para ampliação do capital, na medida em que financia as principais ações para subsidiar a nova fase desenvolvimentista. O novo desenvolvimentismo reconhece que a modernização tecnológica e produtiva não engendrou processos mais amplos de inclusão social e a melhoria dos indicadores de distribuição de renda. Em suma, os patamares de crescimento econômico observados na fase nacional desenvolvimentista não se traduziam na melhoria dos indicadores sociais (renda, saúde, educação, habitação). Mota, Amaral, Peruzzo (2012, p.157) em referência a Castelo (2010) caracterizam essa nova fase: Uma estratégia de desenvolvimento alternativo aos modelos em vigência na América do Sul, tanto ao ¨populismo burocrático”, representado por setores arcaicos da esquerda e partidários do socialismo quanto à ortodoxia convencional, representada por elites rentistas e defensores do neoliberalismo [...] cujo principal objetivo é delinear um projeto nacional de crescimento econômico combinado com uma melhoria substancial nos padrões distributivos do país [...] um determinado padrão de intervenção do Estado na economia e na “questão social”. (Grifos do autor) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 75 Frigotto (2006) reitera que as teorias desenvolvimentistas surgem na fase do capitalismo monopolista e servem para ofuscar as reais tensões entre capital-trabalho e a crises decorrentes da acumulação, concentração e centralização do capital. Nesta perspectiva a discussão se direciona para o quadro explicativo do desenvolvimento e da modernização, na qual o capital humano assume papel preponderante. Escamoteiam-se intencionalmente os reais fundamentos da estrutura de organização do capitalismo, expressas na exploração, desigualdade e segregação e notadamente na disputa de classes. A questão das desigualdades sociais, dos antagonismos de classes, o conflito capitaltrabalho seriam superados, por um processo meritocrático. Mascara-se, como vimos, o caráter orgânico da acumulação, concentração e centralização do capital e a própria luta de classes, na medida em que se nivela, sob a categoria de capital, a capacidade de trabalho dos indivíduos “potenciada” com educação ou treinamento, ao capital físico, ou seja a força de trabalho se apresenta como uma mercadoria – um capital do mesmo valor que o capital físico. (FRIGOTTO, 2006, p.126). Nos países periféricos, a exemplo do Brasil, com formação econômica fundada no colonialismo e na dependência, os desafios para alcance de um patamar de competitividade cientifica-tecnológica alicerçado na produção de conhecimento são expressivos. Entretanto, nos últimos anos, especialmente sob o marco dos governos do Partido dos Trabalhadores se observa a retomada do discurso da centralidade da educação, enquanto fator estratégico de superação dos limites para modernização e alcance de patamares de competitividade do país. Nessa esteira uma série de ações políticas, materializadas em planos, programas, projetos, leis, decretos e diretrizes visando ampliação das oportunidades educacionais nos distintos níveis e modalidades de ensino10 são implantadas com amplo apelo midiático. Paralelamente, no plano macroeconômico o Programa de Aceleração do Crescimento11 conforma um conjunto de investimentos em vários setores da economia, pretendo a retomada do crescimento. A estratégia do governo federal, pela primeira vez em muitas décadas, foi apoiar a formação do capital por parte do setor privado, e simultaneamente, aumentar o investimento público em infraestrutura. Além do aumento de investimento 10 FUNDEB, PDE, PROINFANCIA, PRONATEC, PROUNI, REUNI, FIES, UAB, PARFOR, dentre outros. O PAC foi criado no segundo mandato do ex-presidente Lula da Silva (2007-2010) e prevê o planejamento e investimento em obras de infraestrutura social, urbana, logística e energética do Brasil. Segundo o governo federal nessa primeira teria sido o responsável pela criação de 8,2 milhões de postos de trabalho (PAC, 2014) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 11 76 propriamente dito, o PAC também incluiu uma série de desonerações tributárias para incentivar o investimento privado e o desenvolvimento do mercado de consumo de massa no Brasil (BARBOSA, 2013, p.78). Dessa forma, ações governamentais conformam um plano nacional de desenvolvimento social e econômico, garantindo os interesses do capital rentista, articuladas a políticas de estabilidade fiscal e monetária, associado a investimentos em grandes empreendimentos, financiados, predominantemente pelo Estado. Nota-se uma engenhosa aliança entre o capital e o trabalho, considerando que ocorre uma ampliação dos postos de trabalho, com consequente controle das taxas de desemprego e distribuição de renda. Neste cenário, mantém-se uma acomodação de classes, sem alterar a estrutura do sistema. Constitui-se num demiurgo da finalização da modernização do país iniciada por Getúlio Vargas. O que os gramscianos denominariam de “revolução passiva”, pelo alto, conservadora porque pautada pela hipertrofia do Estado, que administra a vida social. Impregna todos os poros da sociedade brasileira e estabelece um pacto social pelo desenvolvimentismo caracterizado pela conciliação de interesses. (RICCI, 2013, p.27). Na tabela a seguir é possível observar o crescimento do PIB na série histórica que coincide com os dois mandatos do ex-presidente Lula da Silva (2003-2010) e os primeiros anos do mandato da presidente Dilma Rousseff: Gráfico 1. Crescimento Produto Interno Bruto (Valor nominal) 2003-2013 Fonte: IPEADATA, 2014 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 77 Diante dos dados é possível observar um crescimento significativo do volume de riquezas produzidas no país. Esses dados articulados a outros indicadores, a exemplo da taxa de desemprego, que em 2014 chegou a 4.9% da população economicamente ativa e em busca de trabalho demonstram um quadro aparentemente favorável no cenário macroeconômico nacional. Entretanto, apesar do governo federal utilizar amplamente esses indicadores para justificar a manutenção da política econômica, alardeando os resultados positivos alcançados, as assimetrias socioeconômicas são latentes nas distintas regiões, no país da 7ª economia do mundo, e que ainda padece de sérias desigualdades. Apesar do reconhecido avanços, o país está no grupo de 12 países mais desiguais do mundo, conforme estudos do IPEA divulgados em 2012, denominado “A década inclusiva12”. Outro dado ilustrativo é o coeficiente de Gini13, utilizado para medir a desigualdade na distribuição de renda entre indivíduos que indica uma forte tendência de manutenção da desigualdade no país. Em 2003 esse coeficiente era de 0,583. No ano de 2012 ficou em 0,530 (IPEA, 2014). Apesar da redução, o país amarga de elevada concentração de renda. O crescimento do PIB, articulado à politica de geração de emprego e distribuição de renda não materializam o atendimento de um conjunto demandas na área social. Outro aspecto importante a ser destacado são assimetrias na produção e distribuição da riqueza nas distintas regiões do país. O modelo de ocupação territorial brasileiro privilegiou cidades localizadas ao longo do litoral, primeiras a serem colonizadas e transformadas em polos de produção agropecuária e mineral. No tardio processo de industrialização nacional alavancado no governo de Getúlio Vargas essas regiões detinham capital econômico e politico, para concentrar a produção de bens de consumo e bens de capital. A integração regional da Amazônia, por exemplo, iniciou-se apenas a partir da década de 1950, com a construção da Rodovia Belém-Brasília. O modelo de desenvolvimento imposto à região está pautado nos grandes projetos de exploração dos recursos naturais (energético, mineral, agroflorestal), destinado ao atendimento das demandas do capital 12 13 O documento está disponível em: www.ipea.gov.br/agencia/.../120925_comunicadodoipea155_v5.pdf. O coeficiente de Gini foi criado pelo estatístico italiano Corrado Gini é utilizado para calcular a desigualdade na distribuição de renda ou distribuição de riqueza e pode ser aplicado a outros área, a exemplo da educação. Numa escala de 0 à 1, onde 0 representa completa igualdade e 1 completa desigualdade. Dessa forma, quanto mais próximo de 1, maior o nível de desigualdade de renda ou riqueza de um determinado país. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 78 nacional e internacional, com intensos impactos socioambientais e forte concentração de riqueza. Esse modelo de colonização deflagrado às regiões periféricas do Brasil, pautadas no mito do desenvolvimento escamoteiam a relação de subordinação e violência promovidas pelo capital em relação às classes subalternas (Loureiro, 2009). Os impasses e contradições sucedem-se e assumem formas agudas desde os anos de 1970, desencadeados pelas políticas desenvolvimentistas – e pela respectiva legislação – para a Amazônia dos governos da ditadura militar. Essas políticas procuravam atrair grandes blocos de capitais privados, multinacionais e nacionais, para realizarem investimentos na Amazônia. Facilitaram – e continuam facilitando – a acumulação de capital e a concentração de terra e renda gerada pelos novos investimentos, em detrimento do resto da população. (idem, p.35). O projeto de desenvolvimento da Amazônia arregimentado pelo poder público atualmente se pauta pela mesma lógica de acumulação e concentração de riqueza, associada à violação dos direitos das populações atingidas pelos grandes empreendimentos. Ensino superior: ampliação do acesso sob o foco da regionalidade Nesta conjuntura a expansão do acesso ao ensino superior aparece enquanto carrochefe das recentes políticas implantadas nos últimos anos nesse nível. Diante da baixa cobertura da oferta para população de 18 a 24 anos, conforme dados do censo do ensino superior de 2011 divulgado pela INEP, a taxa de escolarização líquida da população daquela faixa etária era de 14,6%, se for considerada a mesma população que concluiu o ensino superior o percentual sobe 17,8%. Ressalte-se que a meta prevista no Plano Nacional de Educação, aprovado recentemente no Congresso Nacional é elevar o percentual de matrículas líquidas para 33% e matrículas brutas para 50% no período de vigência do plano. (INEP, 2013). No país se observa a predominância das Instituições de Ensino Superior privadas e intensa concentração na região sudeste como observado na tabela a seguir: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 79 Tabela 1 – Número e Percentual de Instituições de Educação Superior, por categoria Administrativa (Pública e Privada) – Brasil e Regiões Geográficas – 2011. Brasil/regiões Total Geral Total Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste % 2365 152 432 1157 389 235 Elaborado por INEP, 2013 Categoria Administrativa Pública % Privada 100 284 12 2081 100 27 17,8 125 100 63 14,6 369 100 134 11,6 1023 100 42 10,8 347 100 18 7,7 217 % 88 82,2 85,4 88,4 89,2 92,3 Na tabela 1 é possível observar que aproximadamente 48% das IES estão concentradas na região sudeste. Na categoria administrativa referente às instituições públicas o quadro se repete. Àquela região reúne 47% das IES. A territorialidade é um aspecto destacado nas políticas expansionistas, considerando uma intensa concentração nas IES e da oferta de vagas em determinadas regiões geográficas do país. O Plano de Desenvolvido da Educação14 ressalta que: Só é possível garantir o desenvolvimento nacional se a educação for alçada à condição de eixo estruturante da ação do Estado de forma a potencializar seus efeitos. Reduzir as desigualdades sociais e regionais se traduz na equalização das oportunidades de acesso à educação de qualidade. (PDE, 2007, p.05) O plano reconhece que as discrepâncias nas oportunidades educacionais são territorialmente demarcadas entre centro e periferia, campo e cidade, capital e interior (idem), reconhecendo a necessária associação entre educação e ordenação territorial. Conforme dados do censo do INEP de 2011 o universo de alunos matriculados na graduação presencial era 5.746.762 apenas a região sudeste concentrava 48%. A região norte respondia por 6,7% dessas matrículas. Ressalvadas os devidos indicadores demográficos, ocorre uma acentuada assimetria na distribuição de vagas no ensino superior no país. No gráfico apresentado a seguir é possível observar à distribuição das Instituições Federais de Ensino Superior nas regiões geográficas do Brasil. A mesma tendência se repete com forte concentração das IFES na região sudeste, apenas o estado de Minas Gerais concentra 12 dessas instituições. 14 O PDE lançado em 24 de abril 2007 no mandato do ex-presidente Lula da Silva previa um conjunto de princípios, diretrizes, metas para os distintos níveis e modalidades da educação nacional. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 80 GRÁFICO 2. Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil – Distribuição Regional Fonte: MEC, 2014 Na figura a seguir, elaborada pelo INEP e divulgado no último censo se observa o mapa da distribuição das IES no Brasil: Figura 1 – Número de instituições superior, segundo as regiões geográficas do Brasil (públicas, privadas e confessionais) Elaborado por: INEP, MEC 2013. Diante dos dados apresentados é possível observar estreita relação entre os polos dinâmicos de produção econômica e a concentração das IES, incluindo universidades nessas regiões. Depreende-se que o ensino superior no país tem servido à logica de ampliação, reprodução e concentração do capital. O amplo processo de privatização da oferta do ensino ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 81 superior no Brasil, entendida como um bem de capital demonstra um cenário de hegemonia burguesa, impondo importantes desafios para os defensores da universidade pública: [...] os senhores do dinheiro organizam e buscam estratégias para ampliar cada vez mais o controle sobre a escola e a universidade, objetivando definir o que é dado a pensar para a juventude brasileira. O objetivo é a inculcação da moral, da “ética” e dos valores burgueses em seu momento neoliberal, em especial em um contexto de novas configurações da “governança” que requerem a combinação de entes privados (ONG, Terceiro Setor, empresas com “responsabilidade social”) com os aparatos do Estado. (LEHER, 2011, p.163) Os programas e planos de expansão do ensino superior implantados no último decênio, notadamente a partir do governo do ex-presidente Lula da Silva (2003-2010) estabelecem de forma clara a necessidade de ampliação no acesso enquanto estratégia de desenvolvimento econômico do país. As políticas de expansão adotadas são intensamente influenciadas por orientações de organismos multilaterais15 que propugnam a associação entre educação e desenvolvimento econômico. Neste sentido, o ensino superior desempenha papel estratégico na formação de quadros profissionais, com competências e habilidades para atuar no mercado de trabalho. Por isso, há necessidade de superação dos índices de seletividade no acesso, oportunizando ampliação das possibilidades educacionais. Entretanto, na região Norte e no estado do Pará, em particular, persiste o quadro de desigualdade e exclusão em comparação com a média nacional. No ensino superior, por exemplo, enquanto o percentual de jovens com 25 anos ou mais, com formação nesse nível de ensino era de 11,27% em 2010 no país, no Pará esse percentual era de apenas 6,2%. Na tabela apresentada a seguir é possível observar as assimetrias regionais no que se refere às oportunidades educacionais, nas regiões geográficas do país: 15 Banco Mundial, OCDE, CEPAL. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 82 Tabela 8. Taxa de frequência a estabelecimento de ensino da população residente de 6 a 24 anos de idade, por grupos de idade e nível de ensino, segundo as grandes regiões: Grandes regiões, Unidades Taxa de frequência liquida a estabelecimento de ensino da população residente de 6 a 24 anos, por da federação, grupo de idade e nível de ensino 6 a 14 anos 15 a 17 anos 18 a 24 anos Ensino fundamental Ensino médio Ensino superior Brasil 92,5 54,0 15,1 Norte 91,2 42,4 10,8 Nordeste 91,9 44,8 11,2 Sudeste 93,3 62,5 16,6 Sul 92,6 57,1 19,8 Centro-Oeste 92,3 58,5 19,2 Regiões metropolitanas Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios, 2012. A região norte apresenta comparativamente o pior desempenho em todos os níveis educacionais, com destaque para o ensino superior, cuja frequência liquida na faixa etária de 18 a 24 anos é de 10,8%. Nos demais níveis o desempenho da região fica abaixo do registrado em todas as demais regiões brasileiras. Os melhores resultados são observados nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Gráfico 4. Taxa de frequência líquida ao Ensino superior – regiões geográficas Fonte: IBGE/PNAD, 2013. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 83 Os dados disponibilizados do censo do ensino superior de 2011 são reveladores da maciça participação da iniciativa privada na oferta desse nível de ensino no país, abrangendo o percentual de 74,2% das matrículas. Esse percentual corresponde a 4.736.001 do universo de 6.376.299 de alunos matriculados. As demais instituições das esferas federal, estadual e municipal respondem por 25,8% das matrículas (INEP, 2013). As parcerias-público privadas expressam um dos instrumentos que deram materialidade à reconfiguração do ensino superior, dos governos dos presidentes petistas. A diluição das fronteiras entre o público e o privado, em que instituições privadas recebem financiamento público e instituições públicas são induzidas a buscar financiamento na iniciativa privada, consolida a premissa, defendida por esse governo, de que a educação é um bem público, mas não necessariamente estatal; logo, ela não perde sua essência de atendimento ao interesse público se for ofertada pela iniciativa privada. Considerações finais A temática deste artigo cuja temática se relaciona às politicas do ensino superior e economia da educação apresentou um esboço do atual cenário da expansão do ensino superior no Brasil, alicerçada nas recentes acomodações das políticas macroeconômicas ditas desenvolvimentistas. Em que pese os números de crescimento da economia apresentados pelos entes governamentais e a implantação dos programas direcionados a expansão do acesso ao ensino superior, o quadro de assimetrias nas distintas regiões geográficas do Brasil é expressivo. A lógica prevalecente na oferta desse nível de ensino é influenciada pela Teoria do capital humano que compreende a educação como um investimento com retorno futuro, portanto um bem de capital. Nessa conformação os indivíduos devem assumir os custos desse investimento apoiados por políticas de incentivo fiscal e creditício financiadas pelo Estado. Assim, ocorre teoricamente, uma acomodação de interesses da burguesia empresarial do setor educacional e dos trabalhadores que demandam por escolarização. Por seu turno, se esvazia progressivamente o projeto democrático e emancipatório do fortalecimento e expansão da universidade pública, como lócus privilegiado de formação do trabalhador. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 84 REFERÊNCIAS BARBOSA, Nelson. Dez anos de política econômica. SADER, Emir (org.) 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Para tal utilizamos os dados do Censo da Educação Superior referentes ao número de Instituições e matrículas, presenciais e à distância, em cursos de graduação, por categoria administrativa, público e privado. A análise evidencia que no contexto de crise estrutural do capital, com a redefinição do papel do Estado na condução das políticas sociais, amplia-se o espaço/controle privado-mercantil também na oferta do ensino superior amapaense, porém esse movimento apresenta singularidades que devem ser consideradas. Enfim, num país que historicamente negou o direito à educação a maior parte de sua população, particularmente, nas regiões periféricas, como é o caso do estado do Amapá, diante da expansão do ensino superior privado, aprofunda-se a desigualdade sócio-regional. Palavras-chave: Expansão. Público e Privado. Estado do Amapá. Introdução Nas duas últimas décadas o Brasil passa por acelerado processo de expansão da educação superior. Dados oficiais, coletados e divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), evidenciam o extraordinário crescimento das Instituições de Ensino Superior (IES) e matrículas, em todo território nacional. Esse movimento, ainda que ocorra predominantemente no setor privado, também se manifesta na esfera pública. A compreensão desse processo pressupõe considerarmos os condicionantes macroestruturais das políticas sociais no capitalismo contemporâneo. Assim, compreendemos que a atual ampliação do acesso ao ensino superior, registrada em escala global, é ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 87 fundamentalmente decorrente da necessidade de produção e reprodução do capital, ainda que, contraditoriamente, também seja resultado das reivindicações coletivas dos trabalhadores. No âmbito dos interesses do capital, cabe destacar que diante de sua crise estrutural, com o advento do neoliberalismo econômico, também a educação (enquanto política pública e direito social) é alçada à esfera privada em sua oferta, em seus objetivos formativos e na sua condução/gestão. Especialmente para a educação superior esse processo representa veladamente a ampliação de sua oferta pela iniciativa privado-mercantil (SGUISSARDI, 2009). Certamente, no cerne da política educacional em curso no Brasil e em outros países da periferia capitalista estão as orientações do Banco Mundial. Para a educação superior, objeto deste estudo, essas recomendações ressaltam a necessidade de reformas que tenham como princípios a mercantilização desse nível educacional, com a proliferação de matrículas e instituições privadas e ainda a transposição de mecanismos empresariais para a gestão pública. Ao longo das três últimas décadas o Banco Mundial tem apresentado uma série de estudos e recomendações para a reforma da educação superior. Em linhas gerais os documentos publicados por tal organismo enfatizam os seguintes eixos: a) diversificação e diferenciação institucional, com a proliferação de instituições não-universitárias, aos moldes da educação terciária16; b) a instituição de novas formas de financiamento, especialmente nas instituições públicas (como, por exemplo, a cobrança de taxas ou mensalidades dos estudantes); c) a contração do financiamento público, com a otimização dos recursos financeiros e materiais, envolvendo a redefinição do papel do Estado na condução da política e financiamento; d) o incentivo à expansão do mercado, inclusive com recursos públicos para concessão de bolsas e créditos aos estudantes, especialmente aos oriundos de camadas populares. No Brasil, especialmente a partir da aprovação da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), n. 9.394/1996, estudos evidenciam que a política de educação superior tem como fundamento tais orientações. Como destaca Sguissardi (2009) a expansão das IES e matrículas tem se dado, sobretudo, na esfera privada, e tem como eixo a lógica 16 A noção de educação terciária adotada pelo Banco é a mesma formulada pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Em tal formulação educação terciária significa qualquer nível ou etapa de estudos pós-secundários, desenvolvida em instituições públicas e privadas, ou ainda em outros espaços, envolvendo inclusive formações que se efetivam com a utilização de novas tecnologias de informação e comunicação (WORLD BANK, 2003). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 88 privado-mercantil, ou seja, com a proliferação de instituições que objetivam fundamentalmente o lucro na oferta do ensino superior. Cabe destacarmos que a expansão da educação superior brasileira, com seu viés privado-mercantil, também apresenta diferenciações em função da diversidade regional. Na análise sobre essa questão é “desnecessário repetir e enfatizar que apenas o Estado e seu pólo público têm condições de enfrentar os problemas da diversidade regional, que se traduzem em disparidades, assimetrias e exclusão social” (SGUISSARDI, 2008, p. 42). Considerando essas questões estamos desenvolvendo uma pesquisa para analisar a evolução do orçamento público para as IES públicas localizadas no Amapá, diante da expansão das matrículas, no período 2006-2013. Como parte desse estudo, procuramos identificar o processo de expansão do ensino superior nessa Unidade da Federação, em articulação com o cenário regional e nacional. No presente artigo expomos essa análise considerando os dados do Censo da Educação Superior (MEC/INEP) referentes ao número de IES e matrículas em cursos de graduação, presencial e via EaD (Educação à Distância), por categoria administrativa, público e privado. O texto está dividido em duas partes: inicialmente abordamos a gênese do ensino superior no território amapaense e em seguida analisamos as implicações do processo de expansão privado-mercantil nesse estado. Ao final fazemos nossas considerações conclusivas. Breve histórico do ensino superior no Amapá A oferta de educação superior no Estado do Amapá tem história recente. Segundo informações do INEP foi somente a partir de 1970 que se instituíram as primeiras turmas desse nível educacional no então Território Federal do Amapá (TFA), sob a égide do regime militar-burguês. Essa oferta surgiu por meio de convênio entre o Centro de Educação (CE) da Universidade Federal do Pará (UFPA) e o Ministério da Educação e Cultura para criação de cursos de nível superior para a formação de professores que atuavam no interior do estado do Pará, o qual foi estendido ao então Território Federal do Amapá (TFA). Assim, a UFPA expandiu-se para além das fronteiras territoriais paraenses, instalando o Núcleo de Educação de Macapá (NEM), com o formato de Campus Avançado. Por meio do parecer nº 663 de 1970 o Conselho Federal de Educação regulamentou e autorizou a UFPA a atuar no então Território Federal do Amapá oferecendo cursos de Licenciatura Polivalente de 1º Ciclo nas áreas de Letras, Estudos Sociais, Ciências Naturais, numa primeira fase. Esses ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 89 cursos eram ministrados em etapas letivas, durante o recesso escolar, isto é, nos meses de julho, janeiro e fevereiro. (MAUÉS, OLIVEIRA e COSTA, 2006, p. 24). Como vemos a origem do ensino superior em terras amapaenses foi tardio. O estado do Pará desde 1902, com a criação da Faculdade Livre de Direito, já possuía cursos superiores. Em que pese o fato do TFA ter sido criado em 1943, por desmembramento do próprio estado do Pará, é somente a partir da UFPA, que foi criada em 1957 por meio da junção de faculdades e escolas superiores existentes (CHAVES, GUIMARÃES, 2011), que surgiu a oferta de cursos superiores nesse espaço geográfico. Esse caráter tardio torna-se mais evidente quando observamos o desenvolvimento do ensino superior no Brasil e na América Latina. Conforme demonstra Oliven (2002) a partir de 1808, com a vinda da família real portuguesa para a então Colônia, surgiram os primeiros cursos superiores em Salvador e no Rio de Janeiro. Isso ocorreu quase três séculos após a criação das primeiras universidades na região latino-americana (visto que os espanhóis já tinham universidades em suas Colônias desde o século XVI), e sob a forma de cursos específicos e não com a criação de universidades. Como evidencia Fávero (2006) as tentativas de criação de universidades no período colonial/monárquico não obtiveram êxito no Brasil. Isso se deu especialmente em função do controle exercido pela Metrópole, que procurou impedir qualquer forma de independência política e cultural da Colônia. Por outro lado, cabe ressaltarmos que a introdução do ensino superior no TFA ocorreu no contexto ditatorial-militar. Assim, deve também ser analisada como parte do projeto educacional implantado, vinculado ao ideário de segurança nacional e de desenvolvimento econômico, conforme os interesses do capital nacional e internacional. Conforme destaca Fonseca (2012) uma das finalidades desse projeto educacional, presente nos planos, nas diretrizes e na legislação constituída, foi o processo de desqualificação e controle dos profissionais da educação. Para a autora, isso se materializou, por exemplo, por meio da instituição de licenciaturas curtas, para atender a carência de professores com formação superior no mercado de trabalho. A partir da Lei 5.692/1971 o NEM passou também a oferecer outros cursos, ainda voltados à formação de professores, para atuação específica no 1º grau (atual ensino fundamental). Foram instituídos em Macapá os cursos de Licenciatura em Educação Física, Licenciatura Monovalente em Artes Práticas e Licenciatura em Pedagogia, com habilitação em Administração, Supervisão e Inspeção Escolar, conforme apontam Maués, Oliveira e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 90 Costa (2006). Esses mesmo autores indicam que na década de 1980 o Núcleo passou a oferecer cursos de complementação com o intuito de transformar as Licenciaturas Curtas em Licenciaturas Plenas, passando também a ofertar cursos de formação de professores para o 2º grau (atual ensino médio). Durante a década de 1980 o NEM continuou sendo a única forma de atendimento de nível superior no território amapaense. Ainda que limitado à oferta de cursos de licenciaturas a criação do Núcleo atendeu às aspirações do setor educacional do TFA. Essas ações representaram um progresso relativo na qualificação docente e deram aos amapaenses a possibilidade, mesmo que restrita, de cursar a educação superior sem precisar sair do território (MELO; CORDEIRO, 2008). É necessário considerar a instituição dos cursos de licenciatura por intermédio do NEM/UFPA no bojo no projeto nacional de modernização da economia brasileira, ou seja, como parte da estratégia militar-burguesa de integração da região amapaense à economia de mercado. Essas primeiras iniciativas, ainda que decorrentes das demandas do setor educacional do TFA, encontravam-se vinculadas às pressões impostas pelo processo de reestruturação da economia em curso no Brasil naquele contexto (MELO; CORDEIRO, 2008). Assim, esse atendimento afinava-se à reforma universitária ditatorial-militar, a qual, segundo Morosini (2005), enfatizou a constituição da universidade centrada em conteúdos técnicos, em detrimento de uma formação acadêmica crítico-política. Como destacamos todas as ações do Núcleo foram focalizadas na formação de professores para o 1º e 2 graus. Certamente essa limitação também decorreu da ausência de um projeto de desenvolvimento econômico-social para a região. Seguindo a lógica de racionalização dos recursos públicos, os investimentos na área educacional, estavam diretamente relacionados aos interesses de retorno econômicos vigentes. Nesse contexto, a oferta de cursos de licenciatura demandava, na lógica em curso, menos investimento público, com a desobrigação do Estado para com a ampliação do financiamento do ensino superior público na região amapaense. Essa desobrigação fica evidenciada pela ausência até mesmo de estrutura física para funcionamento do NEM, pois como destacam Maués, Oliveira e Costa (2006) o Núcleo funcionou em diversos ambientes até a construção de seu prédio definitivo (no qual seria posteriormente construída a Universidade Federal do Amapá). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 91 Em 1990, no recém constituído Estado do Amapá17, foi criada a Fundação Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Ainda que autorizada pela Lei n. 7.530, de 29 de agosto de 1986, essa Universidade foi criada somente quatro anos depois pelo Decreto n. 98.997, de 2 de março de 1990. Como expressam Maués, Oliveira e Costa (2006), a UNIFAP representou um marco na consolidação do ensino superior no Amapá, mas manteve inicialmente a oferta de cursos do seu embrião, o NEM/UFPA (o qual funcionou concomitantemente até 1992). Também em 1990 foi criado o Centro de Ensino Superior do Amapá (CEAP), no setor privado. Instituído por meio do decreto n. 98.842 de janeiro de 1990. Vinculada inicialmente à Universidade da Amazônia (UNAMA), com sede em Belém (PA), o CEAP diversificou a oferta de cursos no estado, instituindo dois cursos Ciências Contábeis e Ciências Jurídicas. Durante a década de 1990, o CEAP foi a única IES (Instituição de Ensino Superior) privada no estado. Porém, sua participação no atendimento educacional em seus anos iniciais foi sempre inferior aos números da UNIFAP, conforme verificamos na Tabela 1. Tabela 1: Evolução das matrículas presenciais em cursos de graduação no Amapá, por setor, público e privado, 1992-1996 Ano Total 1992 1994 1996 Público Privado Número % Número % 917 817 89,1 100 10,9 1.861 1.559 83,8 302 16,2 456 17,6 ... 2.593 2.137 82,4 ... ∆% 182,8 161,6 Fonte: Maués, Oliveira e Costa (2006) – Adaptada. 356,0 Os dados demonstram o extraordinário crescimento, 182,8%, nas matrículas no estado do Amapá, entre os anos 1992 e 1996. Ainda que o crescimento das matrículas públicas tenha sido considerável, 160,2%, o setor privado foi o que obteve maior crescimento percentual, com 356%. Também observamos que ao longo desse período o setor público sempre deteve a grande maioria das matrículas, ainda que esse predomínio tenha reduzido de 89,1% para 82,4%. Cabe destacar que a evolução das matrículas no setor privado, que passou a ser responsável em 1996, por mais de 17% do total do estado, foi intensificado a partir de 1997, no contexto de expansão privado-mercantil do ensino superior brasileiro, conforme veremos a seguir. 17 A Constituição Federal de 1988 transformou o então Território Federal do Amapá em Estado do Amapá. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 92 A expansão do ensino superior no estado do Amapá no contexto neoliberal Conforme evidenciamos anteriormente a origem do ensino superior no estado do Amapá se deu via setor público, com o NEM/UFPA. Também destacamos que no mesmo ano de criação da UNIFAP, 1990, surgiu também uma IES privada, as únicas existentes no estado até o ano 2000. Nesse sentido, observamos que o atendimento privado ocorreu tardiamente no Amapá e foi inicialmente sempre menor que a oferta pública. Assim, percebemos uma diferença em relação ao que ocorria nacionalmente, visto que a partir do regime ditatorialmilitar a maioria das matrículas já estava no setor privado. Ainda que o predomínio do setor privado na oferta do ensino superior brasileiro tenha origem no período militar, a partir de 1996, com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, esse processo adquire outras características. A partir de então, institui-se “políticas governamentais privatizantes com proliferação das IES, de cunho essencialmente lucrativo, que transformam a educação num ‘produto’ que os ‘clientes’ podem adquirir no mercado universitário” (CHAVES, GUIMARÃES, 2011, p. 3). Conforme destaca Sguissardi (2009) adentramos num contexto de expansão privado-mercantil, com a redução do ensino superior à mercadoria. Para compreendermos a manifestação desse processo no estado do Amapá, vamos analisar os dados oficiais, do Censo da Educação Superior (MEC/INEP) referentes às instituições e matrículas, presencial e à distância. As instituições de ensino superior no Amapá Em 2013, o Brasil possuía 2.391 IES, tendo crescimento de 165,7% em relação ao ano de 1997. Do total de instituições existentes 146 estava no Norte e 16 no Amapá, ampliandose, no período em questão, respectivamente, 329,4% e 700%. Percentualmente o número de IES no Norte e no Amapá foi ampliado em relação ao ano inicial, visto que passou, respectivamente, de 3,8% e 0,2% para 6,1% e 0,6%. Essa evolução está detalhada na Tabela 2. Tabela 2: Evolução do Número das IES por setor, público e privado – Brasil, Região Norte e Amapá, 1997-2013 Ano Brasil (A) Norte (B) Total Publico Privado Total Publico Privado B/A Amapá (C) Total Publico Privado C/A 1997 900 211 689 34 12 22 3,8 2 1 1 0,2 1999 1.097 192 905 42 11 31 3,8 2 1 1 0,1 2001 1.391 183 1.208 61 12 49 4,4 3 1 2 0,2 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 93 2003 1.859 207 1.652 101 15 86 5,4 8 1 7 0,4 2005 2.165 231 1.934 122 16 106 5,6 11 1 10 0,5 2007 2.281 249 2.032 140 18 122 6,1 12 1 11 0,5 2009 2.314 245 2.069 147 19 128 6,3 14 2 12 0,6 2011 2.365 284 2.081 152 27 125 6,4 16 3 13 0,6 2013 2.391 301 2.090 146 26 120 16 3 13 42,7 203,3 329,4 116,7 445,5 6,1 ... 700,0 200,0 1.200 0,6 ... ∆% 165,7 Fonte: MEC/INEP Ao considerarmos a expansão por categoria administrativa, percebemos que ainda que seja registrado crescimento do setor público seus índices são inferiores aos registrados no setor privado. Cabe destacar que os maiores percentuais de evolução ocorreram no Norte e, particularmente, no Amapá que ampliou 200% o número de IES públicas e 1.200% nas privadas. Certamente a expansão apresentada no ensino superior amapaense foi também conseqüência do caráter tardio da oferta desse nível de ensino, conforme analisado anteriormente. Também vale ressaltar que diferentemente do aconteceu na evolução das IES no Brasil e no Norte, que no período analisado sempre tiveram a maioria de instituições no setor privado, no Amapá esse predomínio ocorreu somente a partir de 2001, sendo acelerado a partir de 2003. Essa relação percentual, entre o setor público e privado, é explicitada na Tabela a seguir: Tabela 3: Distribuição percentual das IES por setor, público e privado – Brasil, Região Norte e Amapá, 1997-2013 Brasil Norte Amapá Ano Publico Privado Publico Privado Publico Privado 1997 23,4 76,6 35,3 64,7 50,0 50,0 1999 17,5 82,5 26,2 73,8 50,0 50,0 2001 13,2 86,8 19,7 80,3 33,3 66,7 2003 11,1 88,9 14,9 85,1 12,5 87,5 2005 10,7 89,3 13,1 86,9 9,1 90,9 2007 10,9 89,1 12,9 87,1 8,3 91,7 2009 10,6 89,4 12,9 87,1 14,3 85,7 2011 12,0 88,0 17,8 82,2 18,8 81,3 2013 12,6 Fonte: MEC/INEP 87,4 17,8 82,2 18,8 81,3 Na Tabela 3 percebemos que no Amapá ocorreu um equilíbrio entre as categorias administrativas, público e privado, no primeiro período (1997 a 1999). A partir de 2001 os ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 94 percentuais passaram a apontar a prevalência do setor privado, o que já ocorria no cenário nacional e regional. Em 2007 foi registrada no Amapá a menor participação percentual de toda a série histórica, incluindo os dados do Brasil e do Norte. A Tabela demonstra ainda que nos anos finais do período em questão observamos uma recuperação da participação do setor público. No Brasil e no Norte isso ocorreu a partir de 2009 e no Amapá dois anos antes. Considerando os dados da Tabela 2, já analisada, perceberemos que esse movimento se deu em função da redução do ritmo de crescimento no número de IES privadas (chegando até mesmo a diminuir o número instituições no caso da região Norte) e ainda pela ampliação significativa no quantitativo das IES públicas. No caso do Estado do Amapá, ressaltamos que a recuperação da participação do setor público se deu em função do surgimento da Universidade Estadual do Amapá (UEAP), criada por meio da Lei n. 0969, de 31 de março de 2006 e instituída pela Lei nº. 0996, de 31 de maio de 2006, mas que somente passou a ser inserida no Censo da Educação Superior a partir de 2009. Nesse período final também foi instituída a Escola Técnica Federal do Amapá, Lei n. 11.892, de 29 de dezembro de 2008, atual Instituto Federal do Amapá (IFAP). Entretanto, mesmo com esse crescimento do setor público, em 2013, a grande maioria das IES estava no setor privado, movimento que também foi registrado, como veremos, nas matrículas em cursos de graduação. Evolução das matrículas em cursos de graduação no Amapá O processo expansão do ensino superior brasileiro é mais bem percebido ao analisarmos a evolução nas matrículas em cursos de graduação. Em 2013 o Brasil, em cursos presenciais, registrou 6.152.405 matrículas na graduação, crescimento de 216,2% em relação a 1997. O setor privado, com 4.374.431 estudantes, apresentou maior expansão, 268,7%, enquanto o público aumentou 134,2%, atingindo 1.777.974 matrículas. Essa evolução é apresentada na Tabela 4. Tabela 4: Evolução das matrículas presenciais em cursos de graduação, por setor, público e privado – Brasil, Região Norte e Amapá, 1997-2013 Ano Brasil (A) Norte (B) 1997 Total 1.945.615 Publico 759.182 Privado 1.186.433 Total Publico Privado 77.735 52.667 25.068 1999 2.369.945 832.022 1.537.923 94.411 61.110 2001 3.030.754 939.225 2.091.529 141.892 86.100 B/A Amapá (C) Publico Privado 1.836 467 C/A 4,0 Total 2.303 33.301 4,0 3.358 2.588 770 0,1 55.792 4,7 7.179 5.741 1.438 0,2 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 0,1 95 2003 3.887.022 1.136.370 2.750.652 230.227 129.759 100.468 5,9 14.469 7.548 6.921 0,3 2005 4.453.156 1.192.189 3.260.967 261.147 124.763 136.384 5,8 18.011 6.856 11.155 0,4 2007 4.880.381 1.240.968 3.639.413 303.984 136.754 167.230 6,2 19.828 7.610 12.218 0,4 2009 5.115.896 1.351.168 3.764.728 313.959 128.689 185.270 6,1 18.363 6.249 12.114 0,3 2011 5.746.742 1.595.391 4.151.371 385.717 168.327 217.390 6,7 21.896 8.296 13.600 0,3 2013 6.152.405 1.777.974 4.374.431 423.565 185.753 237.812 6,8 ... 26.027 8.574 17.453 1.030,1 367,0 3.637,3 0,4 ... ∆% 216,2 134,2 Fonte: MEC/INEP 268,7 444,9 252,7 848,7 No período analisado, a expansão das matrículas presenciais registradas na Região Norte e, especialmente, no Amapá, foi consideravelmente superior aos índices nacionais. No Norte o aumento foi de 444,9%, sendo o setor privado principal responsável por esse crescimento, com 848,7%, ainda que na esfera pública o percentual de expansão também tenha sido bastante elevado, 252,7%. Já no Amapá, o processo de expansão foi mais intenso, elevando-se 1.030,1%. Esse crescimento deu-se também no setor público e, extraordinariamente, no privado, que, respectivamente, ampliou-se em 367,0% e 3.637,3%. No setor público, particularmente na rede federal, a ampliação das matrículas e das IES, nos anos finais do período analisado, é conseqüencia do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), instituído pelo Decreto n. 6.096, de 24 de abril de 2007. O objetivo central do Programa consistiu em “criar condições para ampliação do acesso e permanência”, por meio do “melhor aproveitamento da estrutura física e dos recursos humanos”, ou seja, amplia-se o número de vagas em cursos de graduação, para atingir a relação entre alunos e professores de 18x1, sem a correspondente elevação orçamentária. Neste sentido, o REUNI, sendo um contrato de gestão firmado entre o MEC e as universidades públicas federais, encerra essas características em relação à expansão da educação superior constituindo-se numa regulação, sobretudo política, cujas metas pré-definidas contemplam demandas das próprias universidades e de setores da população que vivem no interior do Brasil, historicamente excluídos do acesso ao ensino superior. (MEDEIROS, 2012, p. 287-8). Conforme demonstram Guimarães, Chaves e Ribeiro Filho (2014) outra política fundamental para expandir a educação superior pública federal foi o Decreto Federal 6.095/2007, que transformou os Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFET), criados pelo Decreto 5.224/2004 a partir da transformação das Escolas Técnicas Federais, em Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IF). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 96 Já no âmbito do setor privado as ações governamentais principais para a manutenção de sua expansão são o PROUNI e o FIES. O Programa Universidade para Todos (PROUNI), criado em 2004, por meio de renúncia fiscal, abre vagas parciais e integrais nas IES privadas. Por sua vez, o Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior (FIES), consiste na utilização de recursos públicos para financiar estudantes dessa rede de ensino. Sustentados no discurso da “democratização” do acesso ao ensino superior, essas ações estão voltadas, essencialmente, para o atendimento do mercado. Em suma, o desenvolvimento das políticas afirmativas PROUNI/FIES constituem ações para ampliar a relação Estado/Mercado e impulsionar a expansão do setor privado na educação superior. Não se visualiza ampliação expressiva do quantitativo de matrículas com vistas à “Democratização do Ensino Superior”, como propalado pelo Governo Lula da Silva, ao representar parcela insignificante diante da população que almeja acesso no ensino superior. (GUIMARÃES; MONTE; MORAES, 2012, p. 12). Cabe destacarmos que para entendermos esse acelerado crescimento no Norte e no Amapá devemos considerar dois aspectos, interligados. O primeiro diz respeito ao fato de que mesmo com o predomínio das matrículas públicas no período anterior ao neoliberalismo no Brasil, o atendimento em ensino superior nesses espaços geográficos foi bastante limitado, conforme demonstra os índices percentuais, em relação aos números nacionais, das matrículas no Norte (4,0%) e no Amapá (0,1%). Em decorrência disso, há, como segundo aspecto, uma grande lacuna de atendimento educacional a ser ocupada pelo mercado. Assim, ainda que de forma tardia, em relação ao cenário nacional, a expansão privado-mercantil passou a ter o predomínio da oferta do ensino superior também no Norte e no Amapá. Esse movimento está exposto na Tabela a seguir. Tabela 5: Distribuição percentual das matrículas presenciais em cursos de graduação, por setor, público e privado – Brasil, Região Norte e Amapá, 1997-2013 Brasil Norte Amapá Ano Publico Privado Publico Privado Publico Privado 1997 39,0 61,0 67,8 32,2 79,7 20,3 1999 35,1 64,9 64,7 35,3 77,1 22,9 2001 31,0 69,0 60,7 39,3 80,0 20,0 2003 29,2 70,8 56,4 43,6 52,2 47,8 2005 26,8 73,2 47,8 52,2 38,1 61,9 2007 25,4 74,6 45,0 55,0 38,4 61,6 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 97 2009 26,4 73,6 41,0 59,0 34,0 66,0 2011 27,8 72,2 43,6 56,4 37,9 62,1 2013 28,9 Fonte: MEC/INEP 71,1 43,9 56,1 32,9 67,1 A Tabela 5 mostra que no período analisado ampliou-se o controle do setor privado na oferta do ensino superior, considerando as matrículas presenciais. No Brasil, ainda que tenha sido registrada uma recuperação do setor público, a partir de 2007, o índice percentual dessa categoria administrativa em 2013 (28,9%) é inferior ao apresentado em 1997 (39%). O processo de privatização no período é mais intenso no Norte e no Amapá, visto que até o ano de 2003, a maioria das suas respectivas matrículas era pública. Registramos que no caso do Amapá até o ano 2001 as IES públicas atendiam cerca de 80% dos estudantes matriculados em cursos de graduação presencial no estado. Porém, nos anos subseqüentes a ampliação do setor privado aproximou os índices amapaenses aos apresentados pelo Brasil, chegando em 2013 com cerca de 70% de matrículas na esfera privada. Nesse ano, em termos percentuais, a região Norte foi quem apresentou o maior número de matrícula pública (43,9%). Ainda que a evolução das matrículas presenciais evidencie o processo de expansão privado-mercantil, a análise desse movimento será mais bem explicitada se considerarmos a participação dos cursos de graduação via EaD. Para o setor público a utilização de cursos via tal modalidade de ensino afina-se aos interesses de contenção dos gastos com as políticas sociais. Já para as IES privadas a expansão via EaD se apresenta como fundamental para a ampliação do mercado educacional (CASTRO; CABRAL NETO, 2009). No Brasil esse processo tem início em 2003, ocorrendo posteriormente no Norte (2004) e no Amapá (2009). Na Tabela 6 evidenciamos o processo de expansão das matrículas nessa modalidade de ensino. Tabela 6: Evolução das matrículas à distância em cursos de graduação, por setor, público e privado – Brasil, Região Norte e Amapá, 2003-2013 Ano Brasil (A) Norte (B) Total Publico Privado 2003 49.911 39.804 2005 114.642 2007 2009 2011 B/A Amapá (C) Total Publico Privado C/A Total Publico Privado 10.107 0 0 0 0 0 0 0 0 53.117 61.525 16.406 16.327 79 14,3 0 0 0 0 369.766 92.873 276.893 54.005 53.681 324 14,6 0 0 0 0 838.125 172.696 665.429 82.972 29.432 53.029 9,9 1.384 517 867 0,1 992.927 177.924 815.003 134.557 54.043 80.514 13,5 2.778 320 2.458 0,2 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 98 2013 ∆% 2003-2013 ∆% 2005-2013 ∆% 2009-2013 1.153.572 154.553 999.019 144.772 24.212 120.560 12,5 7.054 381 6.673 0,6 2.211,3 288,3 9.784,4 ... ... ... ... ... ... ... ... 906,2 191,0 1.523,8 782,4 48,3 152.507,6 ... ... ... ... ... 37,6 -10,5 50,1 74,5 -17,7 127,3 ... 409,7 -26,3 669,7 ... Fonte: MEC/INEP De 2003 a 2013 verifica-se o crescimento acentuado no número de matrículas em cursos de graduação à distância em todo país (2.211,3%). Essa expansão também ocorreu predominantemente no setor privado, que passou de pouco mais de 10 mil para quase 1 milhão de matrículas, ou seja crescimento de 9.784,4%, número bastante superior ao apresentado pelo setor público (283,3%). No Norte os primeiros registros de matrículas à distância ocorreram em 2004. Na Tabela 5, considerando os dados 2005-2013, vemos que também nessa região a expansão das matrículas via EaD são elevadas, atingido 782,4% no total, abaixo do índice nacional (906,2%). Assim como no caso nacional, percebemos que nos anos iniciais a maior parte das matrículas nessa modalidade era pública, sendo que o crescimento privado é extraordinário, evoluindo, na região, no período em questão, 152.507,6% (enquanto o setor público cresceu 48,3%). Esse fenômeno foi ainda mais tardio no Amapá, o qual somente vai registrar matrículas tal modalidade em 2009. Cabe destacar que desde então, até 2013, no Amapá, assim como no Norte e no Brasil, reduz-se o número dessas matrículas no setor público. Em contrapartida as matrículas no setor privado foram crescentes, registrando no território amapaense evolução de 669,7%. A regressão na participação do setor público e o crescimento do setor privado estão expostos na Tabela 7. Tabela 7: Distribuição percentual das matrículas à distância em cursos de graduação, por setor, público e privado – Brasil, Região Norte e Amapá, 2003-2013 Brasil Norte Ano Publico Privado 2003 79,7 2005 Amapá 20,3 Publico ... Privado ... Publico ... Privado ... 46,3 53,7 99,5 0,5 ... ... 2007 25,1 74,9 99,4 0,6 ... ... 2009 20,6 79,4 35,7 64,3 37,4 62,6 2011 17,9 82,1 40,2 59,8 11,5 88,5 2013 13,4 86,6 16,7 83,3 5,4 94,6 Fonte: MEC/INEP ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 99 Como já apontamos, no Brasil e no Norte, as matrículas via EaD surgiram principalmente no setor público. No Brasil, a partir de 2005, e na região Norte a partir de 2009, o predomínio dessas matrículas passa para o setor privado. Diferentemente, no Amapá, desde o surgimento das matrículas à distância, em 2009, a maior parte do atendimento é privada. Seja como for, o processo de expansão privado-mercantil é mais intenso em tais cursos, em função disso, e da retração das matrículas públicas na modalidade registradas nos últimos anos, o setor privado era responsável, em 2013, por 86,6%, 83,3% e 94,6%, respectivamente, no Brasil, no Norte e no Amapá. Considerações finais No contexto de crise estrutural do capital, com a redefinição do papel do Estado na condução das políticas sociais, amplia-se o espaço/controle privado-mercantil. Para a educação superior, conforme preconiza os organismos internacionais, isso tem implica na sua negação enquanto direto social e na sua efetivação enquanto serviço não-exclusivo do Estado. No Brasil esse processo ganha efetividade a partir da década de 1990, particularmente com a aprovação da LDB 9.394/1996. Desde então, conforme demonstramos no presente artigo vivenciamos um processo de expansão, no número de IES e matrículas, no setor privadomercantil. Assim, como vimos, reduz-se a participação percentual das IES públicas no atendimento desse nível educacional. Particularmente no estado do Amapá esse movimento ocorrerá a partir de 2001, acentuando-se nos anos subseqüentes. Com isso, ainda que de 2009 a 2013 tenhamos registrado um crescimento no número de IES públicas, no Brasil, no Norte e no Amapá, ainda está no setor privado mais de 80% das instituições então existentes. Da mesma forma, o período analisado demonstrou o crescimento das matrículas em cursos de graduação também foi hegemonizado pela iniciativa privada. Nacionalmente ampliou-se o domínio já existente, iniciado no regime militar, fazendo com que a participação do setor público fosse reduzida de 39%, em 1997, para 28,9% (registra-se que esse índice atingiu, em 2007, 25,4%). Para a região Norte e o estado do Amapá esse processo foi mais intenso, visto que antes do processo de expansão privado-mercantil, as matrículas nesses espaços geográficos, eram majoritariamente públicas. Em 1997, as IES públicas atendiam, respectivamente, no Norte e no Amapá, 67,8% e 79,7%, já em 2013 esses números caíram para 43,9% e 32,9%. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 100 Também como vimos o processo de expansão privado-mercantil tem se manifestado, nos últimos anos, particularmente via EaD. Os números apresentados evidenciam como essa modalidade de ensino, com menores custos, apresenta-se como lócus privilegiado de venda do serviço educacional, diante da “exaustão da oferta de cursos presenciais (que tinham expandido de forma extraordinária nos últimos anos do século XX) e, essencialmente, pela busca de ocupar novos espaços no mercado educacional” (CASTRO; CABRAL NETO, 2009, p. 103). Enfim, diante desse cenário, num país que historicamente negou o direito à educação a maior parte de sua população, particularmente, nas regiões periféricas, como é o caso do estado do Amapá, aprofunda-se a desigualdade sócio-regional. Ao invés de estabelecer políticas que combatam a dívida histórico-social brasileira, no contexto neoliberal, o Estado brasileiro implementa ações restritas aos interesses privado-mercantis. Referências CASTRO, Alda Maria D. A.; CABRAL NETO, Antônio. Educação a distância como estratégia de expansão do ensino superior no Brasil. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 102 O NOVO MODELO POLÍTICO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO NACIONAL ATRELADO À FINANCEIRIZAÇÃO E À EXPANSÃO DESTE TIPO DE INSTITUIÇÕES PELO PAÍS: O MECANISMO DE COMPRAS E COALISÕES ENTRE INSTITUIÇÕES DE ENSINO QUE FORTALECE AS PRÁTICAS OLIGOPOLISTAS João Paulo Costa Lima E-mail: [email protected] Universidade Federal do Pará – UFPA RESUMO O artigo pretende analisar o advento da financeirização e expansão de Instituições Privadas de Ensino Superior (IPES) no país, o qual passou a reordenar o mercado da educação superior nacional e precarizar suas atividades em geral. Este reordenamento proposto passou a englobar itens como: ampliação e abertura e transnacionalização do capital das IPES por meio de Bolsa de Valores; a ampliação do volume de capital e a expansão de suas operações por mecanismos de financiamento governamental; as sobreimplicações ao trabalho docente; e a prática de reinvestimentos de capital baseados em remuneração de capital fictício. O foco do estudo centrou-se na análise das novas formas de composição e oferta de ensino superior, dentro do mercado educacional privado brasileiro, que atualmente engloba a maioria dos docentes de ensino superior existente no país; quase 75% do total de discentes; e quase 90% do total de Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras. Números que mostram um grande deslocamento das atividades de ensino superior à iniciativa privada, intensificado em meados dos anos 2000. Este segmento econômico vem gestando o mercado de serviços educacionais no país, com serviço e infraestrutura de excelência, porém financiados pelo aparelho estatal, fato que restringe o avanço das Universidades Públicas, e só reforça a ótica do máximo lucro e da satisfação de investidores internacionais. Palavras-chave: Ensino Superior Privado, Expansão, Financeirização, Sobreimplicações. 1. Introdução A financeirização e a expansão das IPES no país surgiu não coercitivamente, mas ideologicamente pensada, para virar o “novo apelo” das relações sócio educacionais do país. É uma nova forma de fazer "política educacional", que legitima e institucionaliza a prática de interesses deletérios, que visam, única e exclusivamente, a obtenção de lucro, além de legalmente, acabarem conduzindo o contexto da educação superior privada brasileira, a uma interpretação Maquiavélica, que se traduz basicamente em perfis de gestão, baseados em mecanismos permanentes de redução de gastos e de otimização na geração de receita. Para Marx (1978) há três fatos importantes do capitalismo: 1) Propensão à acumulação máxima; 2) Mercado de trocas de mercadorias e serviços com utilização de moeda; e 3) Alteração dos meios de produção, e transformação da força de trabalho em mercadoria. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 103 Karl Marx definiu o capitalismo, comoo novo modelo de mercado, que alterou o modo de produção, não o avanço das forças produtivas, mas tornou o trabalho e a propriedade coisas separadas: os capitalistas (donos dos meios de produção e mercadorias). Onde o produto do trabalho não era mais ao trabalhador, tendo sido a força de trabalho alienada pelo capitalismo. O modelo de alienação do trabalho, é reforçado pela ideia seminal de Adam Smith de Liberalismo Econômico, que séculos mais tarde, no inicio da década de 1980, acabou potencializada, mundialmente, pela criação e espraiamento do modelo Neoliberal18. A partir daí, considera-se que a reestruturação financeira, laboral e legal das IES no país, é derivativa de um modelo concebido há cerca de três décadas, internacionalmente, chamado de Política Neoliberal ou “Neofordista”, preconizada pelo Consenso de Washington19 e, educacionalmente, pela Conferência de Jomtiem20, que admite um novo plano econômico-político e ideológico para vários setores produtivos, inclusive para o educacional. Segundo Gramsci (2004), no período denominado de “Era do Mercado”, a ideologia de uma nova concepção de mundo hegemônica, baseada na apropriação do público pelo privado, por um mecanismo perverso de financiamento e expansão da propriedade privada, por recursos governamentais, considera a premissa de que o mercado é o legítimo fundamento econômico, e a Educação teria um contexto de relações socioeconômicas igual a todas às demais, devendo ser ofertada como “serviço-mercadoria”, e regida pelo modelo atual de produção e circulação preconizado pelo grande capital mundial. A situação disposta nas IPES de todo o país dispõe elementos como: mercantilização da educação, transnacionalização do capital das IPES em Bolsa de Valores, e Concentração de capital nas mãos de Grandes Grupos Investidores Nacionais e Internacionais (encabeçados no país pelos grupos: Kroton Educacional S/A, Anhanguera Educacional S/A, Estácio Participações S/A e Abril Educacional S/A), que gerou mudanças curriculares, que para Saviani (2008), são forjadas em: neoprodutivismo (extrema ênfase nas capacidades e competências humanas), neotecnicismo 18 Neoliberalismo pode ser entendido por um conjunto de ideias políticas e econômicas capitalistas, que defende a não participação do estado na economia. De acordo com esta doutrina, deve haver total liberdade de comércio (livre mercado), pois este princípio garante o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país. Surgido na década de 1970, através da Escola Monetarista, do economista Milton Friedman, foi pensado como solução à crise econômica mundial em 1973, provocada por aumentos excessivos no preço do barril de petróleo. 19 Foi um conjunto de medidas - que se compõe de dez regras básicas - formulado em novembro de 1989 por economistas de instituições financeiras situadas em Washington D.C., como o FMI, o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, fundamentadas num texto do economista John Williamson, do International Institute for Economy, e que se tornou a política oficial do Fundo Monetário Internacional em 1990, quando passou a ser "receitado" para promover o "ajustamento macroeconômico" dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades. 20 Conferência realizada no ano de 1990, que versava sobre a Declaração Mundial sobre Educação para Todos. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 104 (extrema racionalização dos sistemas produtivos) e o neofuncionalismo (teoria para se pensar internacionalmente o contexto de processos regionais). De acordo com Lukács (2004), esta situação que gerou vários danos aos colaboradores do setor, além de alto clima de instabilidade, fragilização das relações de trabalho, intensa competição, parcos períodos de tempo livre, alterações no sentido do trabalho e na qualidade de vida dos trabalhadores, e outros. O que alterou o papel inicialmente concebido para as IES, centrado na produção de ciência e conhecimento, e ainda na geração de consciência crítica à sociedade. Para Santos (2008), nasceria assim um processo acelerado de mutação do magistério dentro das IPES do país, que originou a padronização das aulas no mercado, o empobrecimento curricular docente e a desqualificação na formação profissional discente, maquiadas pela proposta enganosa de elevação cultural das massas. No final da década de 1990, os EUA, resolveram incluir a educação global no rol de serviços mercadológicos, por meio do acordo da OMC/GATS21, que passou a ver a Educação como mercadoria, e desejava submetê-la às mesmas regras do mercado de comercialização de outras mercadorias, passando a extrair mais-valia de suas relações laborais, gerando danos à sua estrutura. A “nova educação global”, intencionava: a) Internacionalizar a “carteira” de discentes e o corpo docente das IPES; b) Padronizações curriculares e didáticas; c) Eliminação da burocracia formal no exercício pleno da docência em qualquer país; e d) Reduções salariais ao menor valor praticado internacionalmente. O Brasil ainda não ofereceu, até o presente momento, seu mercado educacional a este supracitado modelo, mas empresários do setor têm perseguido acordos e lacunas na legislação, que permitam a quebra dos limites legais e pedagógicos dispostos pelos países. 2. O Novo Projeto do Capital Financeiro Internacional à Educação dos Países Subdesenvolvidos Apesar dessa aparente resistência legal por parte dos países, diz-se que no Brasil passou-se a experimentar, bem recentemente, a vultosa entrada de capital transnacional, injetado por Grandes Grupos de Investimento Estrangeiros em determinadas IPES, fato este que acabou desdobrando-se, 21 O Acordo Geral sobre Serviços (GATS) segue a mesma estrutura de funcionamento que o GATT de 1994, respaldando-se nos mesmos princípios de não discriminação interfronteiras. Seu fim último é estabelecer um quadro de princípios e regras para o comércio de serviços, com vistas à expansão do mesmo sob condições de transparência e liberalização progressiva e como forma de promover o crescimento de todos os parceiros comerciais e o desenvolvimento dos países em desenvolvimento, conforme exposto em seu preâmbulo. O GATS passa a ser administrado pelo Conselho para o Comércio de Serviços, que opera dentro da OMC. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 105 na montagem de um novo modelo organizativo e regulatório, supranacional, para as políticas educacionais, que, ideologicamente, passou a articular suas ações através do desenvolvimento, espraiamento e consolidação de oligopólios no âmbito da educação superior privada brasileira. Para Dias Sobrinho (2010), a investigação preliminar dá conta, que tais conglomerados empresariais educacionais, se ergueram por obra deste maciço capital, oriundo de um novo perfil de burguesia, que passou a perceber na expansão do conjunto de serviços educacionais, a mola propulsora potencial para seus investimentos, daí passarem a dispersá-los por este setor de forma massificada, terminando assim por criar um conjunto de oligopólios de ensino, que passaram a ser formatados, disfarçadamente, por mecanismos de ampliações, fusões, e aquisições de pequenas IPES, por grandes grupos educacionais, geralmente com o falso discurso, de que as primeiras passavam por crises financeiras, litígios societários ou problemas de gestão. Ainda segundo Dias Sobrinho (2010), estes mega conglomerados empresariais educacionais, abriram seus capitais em Bolsas de Valores, potencializando a atração de investidores de diversos portes, do mundo inteiro, com interesses diversos de multiplicar seu capital no país. Nitidamente, estes oligopólios educacionais se mostram como degeneradores das bases da formação educacional superior do país, por partilharem de interesses capitalistas deletérios, que visam só o lucro, em detrimento à formação profissional de qualidade nas IPES no país. Estes grupos especuladores financeiros determinaram a educação superior brasileira como “mercadoria”, e os estudantes como “consumidores”, de um produto final mal acabado, e vendido a altos valores de comercialização, fora da realidade econômica da população brasileira, visando apenas maximizar os investimentos iniciais realizados. Para Dias Sobrinho (2010), o grande dilema pelo qual passariam as universidades públicas, nos dias atuais, em países desenvolvidos e países em desenvolvimento, adviria de uma nova concepção econômica, que pretenderia reordenar o Estado, os direitos de sociais e o conjunto dos serviços públicos essenciais, dentro de uma ideologia que preconiza, a colocação dos bens públicos em segundo plano, reforçando mesmo no setor educacional, a ideia de que “pagar caro” para adquirir conhecimento e formação profissional, seria o modelo atual universalizado de fazer as coisas, caracterizando como démodé, a multissecular identidade universitária, destinada ao ensino de qualidade gratuito a todos. Deste modo, passou a ocorrer desde os meados dos anos 2000, uma acelerada e extraordinária expansão do modelo de administração educacional privado mercantil, na educação do país, o que elevou o número de unidades de ensino privadas nacionais, em cerca de 90%, do total ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 106 verificado ainda ao final da década de 1990, com a consequente subvaloração e redução dos investimentos estatais nas universidades públicas. Para Barboza (2012), o Governo Federal deixou brechas para uma conjuntura perversa, com predominância da iniciativa privada mercantil, se instaurasse no âmago da educação superior nacional, devido à apatia e omissão do governo o tema “educação”, por todo o país. E principalmente, pela não geração de um conjunto robusto de políticas públicas, de caráter social, direcionadas à contenção da propagação deste tipo de prática empresarial, que só corruptela o modelo pedagógico tradicional pensado outrora. Tornou-se assim muito difícil definir o futuro do setor educacional no país, principalmente, o do subsetor do “ensino superior”, pois atualmente, este se liga intensamente com o aspecto econômico, esquecendo-se de outros como: o laboral, o de saúde ocupacional, o político pedagógico e o social. Houve uma mudança na trajetória que vinha sendo percorrida anteriormente, deixando a temática da “educação” no país, seriamente comprometidas, ou reféns de um novo conjunto de articulações políticas governamentais, com certos grupos de interesse, caracterizadas por uma correlação de poder, que de forma lenta, mas firme, passou a boicotar o volume de investimentos estatais nas universidades públicas. Para Martins (1994), a Política Educacional do país não cabe num conceito fechado, voltado apenas à obtenção de lucro, pois faria parte de um mecanismo maior que englobaria: o aperfeiçoamento intelectual humano; o desenvolvimento de pesquisas de diversas naturezas e em várias áreas do conhecimento; além de contribuir na resolução de diferentes problemáticas surgidas no contexto socioeconômico e ambiental das populações. Para Martins (1994), na ideologia do lucro máximo, é que se deu o avanço, o crescimento e a proliferação desordenada (sem critérios e regulação legal), das IPES, consolidada através de vultosos investimentos, que se multiplicaram com mais intensidade após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) ou Lei nº 9.394, de 20/12/1996. Dados recentes emitidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP, 2012), dentro do Censo da Educação 2010, diagnosticaram que o número de instituições de ensino privadas no país aumentou percentualmente em 195,4%, somente no período compreendido entre o ano de 1996 a 2010, passando de apenas 711 unidades, para cerca de 2.100, número este que se somado ao número de IES de caráter público, acaba totalizando um montante de 2.377 instituições, explicitando a velocidade e voracidade da iniciativa privada de dominar o mercado de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 107 ensino superior do país, além de criando instabilidade e desequilíbrio à formação profissional discente no Brasil, como demonstrado na Tabela 01 na sequência. Tabela (2010) – 01 Estatísticas Básicas Instituições Estatísticas Total Geral Básicas Educacionais - Categoria Administrativa Pública Total Federal Estadual Municipal Graduação Brasil Privada 2.377 278 99 108 71 2.099 29.507 9.245 5.326 3.286 633 20.262 Matrículas de Graduação 6.379.299 1.643.298 938.656 601.112 103.530 4.736.001 Ingressos (todas as formas) 2.182.229 475.884 302.359 141.413 32.112 1.706.345 Concluintes 973.839 190.597 99.945 72.530 18.122 783.242 Funções Docentes em Exercício¹ 345.335 130.789 78.608 45.069 7.112 214.546 Cursos Alunos e Docentes Alunos (matrículas) Docentes (em exercício) 6.218.620 1.588.800 922.457 579.640 103.097 4.671.145 300.078 128.153 77.788 44.775 6.929 183.640 95.113 48.950 848 28.497 Pós - Graduação Matrículas de Pós-Graduação 173.408 144.911 Graduação e Pós-Graduação Matrículas Total 6.552.707 1.788.209 1.033.769 650.062 104.378 4.764.498 18,97 13,67 13,15 14,42 14,68 22,21 2 Razão Matrículas Total /Funções Docentes em Exercício Nota¹: Corresponde ao número de vínculos de docentes a instituições que oferecem cursos de graduação. A atuação docente não se restringe, necessariamente, aos cursos de graduação. Fonte: INEP, 2010 (Censo da Educação Superior Brasileira). Acerca da problemática exposta, vários autores renomados têm travado discussões aprofundadas, e de grande relevância socioeconômica, no decorrer do processo histórico, dentre os quais pode-se citar: Saviani (1980), Tramontin (1985), Mendes (1986), Rosemberg (2000), Sader (2003), Cunha (2004), Fávero (2004), Mancebo (2004), Sguissardi (2004), Bittar (2005), Ristoff 2006, Rosa (2006), Chaves (2005, 2013), e outros. Percebe-se diante destes fatos, que o tema é extremamente controverso, polêmico e complexo, pois envolve os contornos globais do capital investidor monetarista, aperfeiçoado ao longo dos anos, para rapidamente e articuladamente propagar seus domínios a outros países, o que passou a se dar a partir da abertura econômica e mercadológica criada pelo contexto globalizante, e com astutos intentos, que pretendem reorganizar a área social, o que acabou por traduzir-se numa grande avidez de grandes investidores, em realizar vultosos investimentos em vários setores ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 108 produtivos considerados de alta rentabilidade, como o setor educacional, onde pensaram em levar às últimas consequências, a maximização do lucro e a restrição ampla dos direitos sociais. Para Frigotto (2009, pág. 155), a massificada entrada de capitais transnacionais no país, criou um modelo de negócio, bastante conhecido no mundo empresarial como joint venture, ou seja, uma nova designação e uma nova roupagem para uma prática mercadológica antiga, denominada de oligopólio, ainda que de forma velada, só fazendo acentuar o fenômeno de mercantilização da educação, o que é considerado desastroso para o setor educacional brasileiro, uma vez que sua privatização maciça passou a gerar grandes prejuízos aos direitos legais da coletividade, e grandes vantagens individuais, subjetivando a prestação de serviços educacionais, direito de todo cidadão, em mercadoria altamente dispendiosa e cada vez mais excludente. De acordo com Pacievitch (2009), até o momento atual, juridicamente falando, a legislação lacunar do país, continua fornecendo precedentes para que grandes grupos de investimento nacionais e internacionais acabem buscando obter com a Educação Superior no país, um novo grande filão para a expansão de seus investimentos e multiplicação de seus dividendos. Sua nova política de atuação, acabou mesclando dois aspectos conceituais: o de Joint Ventures (fusão ou associação entre empresas envolvendo capital, trabalho e recursos estratégicos), com a prática oligopolista22, que induz a uma extraordinária expansão do setor privado mercantil, e termina reduzindo o volume de investimentos estatais no aparato público, através da pregação enganosa da alta eficiência e da excelência dos processos e conteúdos dispensados, o que na verdade não ocorre, primando por sucatear e minimizar o sistema de acesso popular em várias frentes, como é o caso do setor educacional universitário nacional, que tem transitado da “autonomia” para a “heteronomia”. Complementarmente para aumentar a compreensão do conceito de Joint Ventures, e assim poder diferenciá-lo do conceito de Oligopólio, colocou-se a definição apropriada de Pacievitch (2009, pág. 01), que delineia a prática mercadológica da junção de firmas: “Uma Joint Venture é algo que pode ser traduzido como uma “aventura em conjunto”, ou melhor, uma aliança estratégica que supõem um acordo comercial de inversão conjunta de longo prazo entre duas ou mais corporações de quaisquer portes, com o objeto de casar benefícios econômicos”. 22 Na economia, Oligopólio (expressão idiomática advinda do Grego: oligos = poucos + polens = vender), seria uma forma conceitual evoluída da prática do Monopólio, na qual não mais uma empresa, mas um conjunto delas, com ou sem auxílio dos governos, acaba promovendo o domínio de determinada oferta de produtos e/ou serviços numa economia quaisquer. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Oligop%C3%B3lio. Acesso em: 15 de Agosto de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 109 Por outro lado, o Oligopólio aparentemente despontaria como uma nova forma de arranjo empresarial de mercado, que pouco diferiria da prática da Joi Venture, onde se destaca aqui as considerações de Nunes, (2012, pág. 01), que assim o define bem claramente: “Oligopólio é uma estrutura de mercado de concorrência imperfeita, que se caracteriza pela dominação mercadológica, por um número reduzido de empresas produtoras, de um determinado setor, onde juntas possuem poder de influenciar os preços dos bens. (NUNES, 2012, pág. 01)”. 3. A Ideologia Contemporânea, o Relativismo e o Modelo de Acumulação Flexível Neofordista Para Chaves (2010, pág. 481), o país há muito, desde a redefinição do papel estatal (tentativa de criação do Estado Mínimo), ocorrida ainda em meados da década de 1990, pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, com diretrizes primárias focadas em itens como: privatização, terceirização e publicização, passou a ser induzido a um intuito maior, o de reduzir a presença do Estado na área produtiva e social. O recente discurso da diversificação no Ensino Superior Brasileiro acabou por revelar um novo plano de flexibilizar a expansão dos grupos empresariais, através da concessão de incentivos fiscais governamentais, o que abriu precedentes para estes grupos montarem variados tipos de cursos, respaldados por meios normativos criados às pressas, com intuito de aumentar a oferta da educação superior a outras faixas populacionais, ditas de alta vulnerabilidade socioeconômica, mas que estavam dispostas a pagar para demandar um serviço pensado como de “qualidade”, mas que na verdade não o era. Fenômeno este que passou a ocorrer mais intensamente a partir de meados dos anos 2000, período em que os grupos empresariais da educação também começaram a se inserir no Mercado de Capitais. Ainda de acordo com Chaves (2010), desde esta época, as fusões empresariais no setor educacional vêm ocorrendo rapidamente, tanto motivadas pela aquisição de ações dos grupos nas bolsas, como pela vultosa entrada de capital transnacional no país. A grande maioria destes grandes grupos empresariais (Holdings23) já foi mapeada pela Receita Federal do Brasil, dentre os quais se 23 Holding é uma empresa que possui como atividade principal, a participação acionária majoritária em uma ou mais empresas, ou seja, é uma empresa que possui a maioria das ações de outras empresas e que detém o controle de sua administração e políticas empresariais. Holding seria uma sociedade gestora de participações sociais que administra conglomerados de um determinado grupo. Essa forma de sociedade é muito utilizada por médias e grandes empresas, com o objetivo de melhorar a estrutura de capital, ou de criar e manter parceria com outras empresas. Disponível em: http://www.significados.com.br/holding/. Acesso em: 20 de Agosto de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 110 destacam: UNIP; Estácio de Sá Participações; Anhanguera Educacional S.A; Kroton Educacional S.A; Sistema COC; Rede Pitágoras de Ensino e outros de menor capital investidor. Para Harvey (2008), é neste contexto que acaba nascendo a precarização do trabalho, onde as Instituições Educacionais acabam gerando uma conotação de fábrica, passando a utilizar seus docentes como “ferramentas” de baixo custo, e oferecendo um produto (ensino) de baixa qualidade final aos seus demandantes (estudantes), mas a preços bem elevados. Para o autor, estes grupos empresariais passariam a construir novas relações deletérias entre capital e trabalho, dotadas de um maior controle sobre o trabalho pelos capitalistas, além de uma maior pressão sobre a classe trabalhadora (docentes) já enfraquecida pelo processo de sujeição ao novo modelo, onde há o fortalecimento dos mecanismos de exploração da força de trabalho, como condição sine qua non ao espraiamento deste novo padrão produtivo. Essa nova forma de acumulação máxima, implica em níveis relativamente altos de “desemprego estrutural” (substituição do trabalhador por máquinas e processos produtivos tecnológicos), além da ocorrência da precarização do trabalho (pagamento de baixos salários), o terminaria por arruinar assim as habilidades dos trabalhadores, reduzindo seus ganhos a pífios salários reais, além de solapar as bases do movimento sindical da categoria. É importante destacar, que as grandes redes investidoras escamoteiam suas reais intenções através de slogans bem elaborados e credibilizados, como o Joi Venture, tentando a todo o momento avançar em novos espaços, o que acaba alienando o direito de escolha dos jovens a uma formação de qualidade, e nivelam por baixo, o conhecimento que lhes asseguraria a possibilidade de melhor colocação futura nos mercados de trabalho. Para piorar, o Governo Federal há muito vem se furtando a dar os devidos esclarecimentos à população, sobre o avanço desmedido destes interesses capitalistas privados, que estão acabando por construir impérios, de forma silenciosa, inclusive violando os direitos dos cidadãos brasileiros e impossibilitando que estes tenham a garantia de uma vida melhor para si e para suas famílias. Os estudos e debates nacionais que vêm sendo realizados sobre esta problemática, nos últimos anos, acabaram por clarificar todo o processo, mas acabaram se perdendo no vazio, pois na maioria dos casos, terminaram sendo amainados por políticas públicas, que não passam de letra morta, e se prestam tão somente a justificar a inércia daqueles que têm o dever político legitimado, para garantir a integridade mental da nação, mas que preferem seguir o discurso da regulação das ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 111 atividades produtivas, pela lógica da auto regulação de mercado Smithiana24, a qual defende que o Estado deveria sair do “controle direto” para um “controle indireto mínimo”, ou seja, um modelo híbrido, preconizador da regulação feita dominantemente pelo mercado e por seus interesses privados (BERTOLIN, 2009, pág. 168). Para Bertolin (2009), a tríade, Estado, Instituições Privadas e Sociedade, foi contaminada em seu âmago, por certas distinções criadas por uma das componentes (por conta de seus interesses deletérios e egoístas), pervertendo assim a pura essência de prestar e servir o povo, “republica et privata populus”, isto é, do latim, “a serventia do povo pelo público e privado”, e com excelência, pois foi para isso que foram originados, para servir ao povo, não a seus mais vis interesses de enriquecimento individual, comprometendo todo um processo histórico de lutas sociais que o ser humano teve de passar, e muito sangue ter sido derramado, para que a sociedade conseguisse um pouco de dignidade. Entre o Estado e as Instituições Privadas repousa a “Educação”, a ponte pênsil da sociedade, a estrutura que conduz os famintos e sedentos por conhecimento, ao refrigério e melhor qualidade de vida, algo que não pode ser jamais corrompido. O desmedido avanço das Holdings Educacionais no país, e a apatia do poder público diante disso, tem gerado muita “inquietação” em diversos setores sociais do país, que ainda buscam consolidar à Nação, um modelo de formação superior de excelência, onde todos possam ter acesso a uma qualidade de vida melhor, e não somente aqueles mais abastados, que dispõe de recursos para pagar caro por isso. É fácil perceber que há uma atuação dissonante do Estado neste caso, através do Ministério da Educação (MEC), pois se por um lado, normatiza e oferece bolsas de capacitação continuada através das Pós-Graduações Stricto Sensu (Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado), com o fim de qualificar os profissionais da Educação, por outro degenera, ao realizar a aprovação de 24 Adam Smith é considerado o pai da economia moderna, tido como o mais importante teórico do liberalismo econômico. Autor de "Uma investigação sobre a natureza e a causa da riqueza das nações", sua obra mais conhecida, que continua sendo usada como referência para gerações de economistas, na qual procurou demonstrar que a riqueza das nações resultava da atuação de indivíduos movidos fortemente (não exclusivamente) por seus próprios interesses (selfinterest), que assim promoviam o crescimento econômico e a inovação tecnológica. Smith ilustrou bem seu pensamento ao afirmar que: "não é da benevolência do padeiro, do açougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu "auto interesse". Acreditando que a iniciativa privada deveria agir livremente, com pouca ou nenhuma intervenção governamental, pois a livre competição dos diversos fornecedores no mercado levaria não só à queda do preço das mercadorias, mas também a constantes inovações tecnológicas, no intuito de baratear o custo de produção e vencer os competidores. Analisou ainda a divisão do trabalho como um fator evolucionário poderoso e propulsionador da economia. Uma frase de Adam Smith que se tornou famosa foi: "Assim, o mercador ou comerciante, movido grandemente por seu próprio interesse egoísta (self-interest), é levado por uma mão invisível, a promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da sociedade." Como resultado da atuação desta "mão invisível", o preço das mercadorias decrescerá e os salários deverão subir. As doutrinas de Smith exerceram uma rápida e intensa influência na burguesia (comerciantes, industriais e financistas), que queriam acabar com os direitos feudais e com o mercantilismo. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Adam_Smith. Acesso em 15 de Setembro de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 112 “IES” e credenciar Universidades Privadas, que desvalorizam docentes de alta titulação, através dos seguintes lobbys: “... mais importa o conhecimento da prática do que o proveniente de titulações”, que representa a ideologia de se expurgar aqueles, que a duras penas conseguiram seus títulos, e para assim reduzirem seus quadros funcionais, a Graduados e Especialistas, de modo espúrio, o que lhes asseguraria a redução de seus custos com folhas de pagamento, e preconizaria a adoção de práticas ilegais, que assim aviltariam a formação profissional de qualidade no país. De acordo com Schugurensky (2002), dentro deste complexo processo de usurpação do poder das universidades públicas e do povo, por uma elite dominante atual, que percebe como único caminho, o rápido e expressivo retorno de seus investimentos, tem-se que esta jactanciosa minoria vem ganhando bastante com a “educação” no país, estando sempre respaldados pela própria Lei, que já assegura grandes regalias à iniciativa privada, desde a publicação da Carta Magna do país em 1988, mais precisamente em seu Art. 170, caput, da CF, o qual caracteriza a economia do país, como de livre mercado para a produção capitalista, fundamentada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, onde o Estado, em regra, não interviria nas atividades econômicas do mercado, a qual se adiantou em garantir sua forma própria de conduzir a Educação no país. Quem perde é o próprio Estado, pois se torna conivente com a expropriação que se dá dentro da “Fábrica” (Instituição Educacional), no “Processo Educacional” (Mercadoria), pelos dois lados da moeda: de um lado a “Ferramenta” (Educadores) que está sendo desgastada e desvalorizada na sua profissão, e do outro, o “Demandante” (Alunos), vítima, que na busca de uma formação profissional de qualidade, acaba comprando um “produto” reduzido (fracas grades curriculares) e a um “preço” dispendioso (constantes reajustes no preço dos cursos), o que aumenta o lucro dos “Donos da Fábrica” (Capitalistas), sem que haja a devida contrapartida para sua formação. De um tempo pra cá, o ensino público mundial passou a ser tripudiado, não só no Brasil, como em vários países, um nítido reflexo do jogo de interesses do grande capital mercantil. A realidade deflagrada da conjuntura do ensino superior no país, submete o entendimento, de que estão sendo rapidamente consolidados, verdadeiros oligopólios neste setor de produção do conhecimento, pela articulação entre alguns grandes grupos privados educacionais, uma prática lesiva à educação do país, pois estas instituições privadas acabam por restringir o acesso das classes menos abastadas ao ensino superior, ou no mínimo, comprometem a formação profissional de milhares de jovens por todo o país. A formação de oligopólios no ensino superior brasileiro, paulatinamente, está transformando a “educação” em “negócio”, impactando não só a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 113 qualidade do ensino, como a qualidade de vida docente, além de tirar o foco das instituições públicas, que ainda são responsáveis pela democratização do ensino superior. Para Tiradentes (2011), dentro deste escopo, percebe-se que a “educação” transformou-se num dos negócios mais rentáveis do mundo, e encontra-se profundamente alinhado às diretrizes neoliberais, visto que promove a redução do investimento público no sistema de educação superior brasileiro, e ao longo dos anos, vem fomentando uma crescente expansão em suas atividades pelo processo de aquisições, de forma a moldar uma face extremamente mercantil ao setor. De acordo com Tiradentes (2011), a última coisa a preocupar estes grandes conglomerados educacionais seria a qualidade da educação, pois estariam cegos com a obtenção de lucro, ou seja, se instaurou no país um novo modelo perverso de governança educacional, privilegiador dos interesses mercantis individualistas, o que compromete seriamente a formação humana e a emancipação social da geração atual e das futuras. Só pra se ter uma ideia, através da fusão já anunciada para 2014, entre o grupo Kroton Educacional S.A e a rede de ensino Anhanguera Educacional S.A, estima-se que seja formado o maior grupo educacional do mundo, com mais de R$ 12 bilhões de capital aberto, e um faturamento projetado até o final de 2014 de R$ 760 milhões, além de passar a contar com mais de 800 unidades de ensino superior em todo país, que terão a cifra superior a 1 milhão de alunos, ou 20% do total de alunos do país, sendo que destes, 486 mil farão parte do modelo de ensino presencial e 516 mil estarão vinculados ao modelo de ensino à distância (EaD) (EXAME, 2014). Para Lima (2011), grande tem sido a voracidade dos grupos educacionais, pela aquisição de fatias do mercado da educação superior nacional, além de seu gigantismo econômicofinanceiro, pela entrada de capital transnacional no país, pois desde o ano de 2007, abriram seu capital na Bolsa de Valores. Para piorar, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (CONTEE) repudiou o que está sendo feito com a educação no país, onde informa ser contrária a série de fusões ocorridas entre grupos educacionais de todo o país, e também à abertura de capitais destes grupos em Bolsas de Valores, pois o próprio mecanismo que desconstrói a importância das Universidades Públicas no país, acaba se valendo do aparato governamental, para financiar seu crescimento e expansão, pois a maioria das matrículas existentes nestas IPES estaria sendo mantida, por investimentos públicos, advindos de programas criados pelo Governo Federal, como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Universidade Para Todos (PROUNI). Programas que injetariam dinheiro às IPES, sem quaisquer tipos de contrapartidas à coletividade, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 114 pois estas entidades não são obrigadas a destinar parte destes fundos recebidos a projetos socioambientais. Além do excesso de ensino à distância oferecido pelas IPES, disfarçar a venda de “facilidades”, para economizar nas folhas de pagamento (CONTEE, 2013). A CONTEE ofereceu denúncia da exploração e sobrepressão nos ambientes laborais, que está produzindo docentes, com alto nível de estresse, desgaste e doença. A ótica do alto lucro por estes grupos, faz com que os relatórios de trabalho atinjam outro nível, onde os docentes têm de prestar satisfações à diretoria ou donos das IPES, e ainda ao conjunto de acionistas nacionais e internacionais. Houve a reestruturação com redução de pessoal, adoção de baixos salários, demissões de docentes qualificados e precarização das relações de trabalho. (CONTEE, 2013). A CONTEE diz que desde 2003, tramita no Congresso Nacional, propostas de emendas parlamentares que limitam a participação do capital estrangeiro nas IPES do país, apesar de nenhum projeto deste ter sido aprovado. A entidade diz que nenhum fundo de investimento questiona de que modo pode melhorar a educação do país, pois só está preocupado em aumentar os lucros de seus acionistas (CONTEE, 2013). 4. Considerações Finais Admiti-se que as relações político-econômicas e ideológico-pedagógicas desenvolvidas no contexto da educação superior nacional, vem sendo delineadas a gosto do grande capital transnacional, onde o processo de mercantilização das IPES por todo o país, que vem sendo empreendido nas últimas décadas, dentro do quadro político-econômico neoliberal concebido para o país e mundialmente, tem reordenado os paradigmas da produção e da gestão do trabalho, além de gerar o empobrecimento dos conteúdos docentes e a perda de sentido nas atividades desenvolvidas, somadas à descaracterização do processo pedagógico e das relações educacionais. Conformando um modelo bastante individualista a este mercado. A ação hegemônica do capital na educação está terminando por perverter, toda a lógica inserida nos projetos de formação discente de qualidade, outrora pretendidos no país. Vive-se o desafio e o compromisso histórico de retomar o trabalho em educação como prática transformadora da realidade que permeia a vida do homem, ainda que o exacerbado economicismo e o determinismo tecnológico ainda continuem a tentar esterilizar tais ações. 5. Referências Bibliográficas ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 115 BARBOZA, M. Q. Um negócio nota 10. Publicado em: 14 de Setembro de 2012. Disponível em: <http://www.istoe.com.br/reportagens/237975_UM+NEGOCIO+NOTA+10?pathImagens=&path= &actualArea=internalPage>. Acesso em: 20 de Agosto de 2014. BERTOLIN, Júlio Cesar Godoy. A Mercantilização da Educação Superior: uma trajetória do bem público ao serviço comercial. Educação & Realidade. Nº. 34 Vol.3. Set /Dez. 2009. Pág. 191-211. CAVALCANTI, J. C. Educação superior: bem público ou privado? 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 118 O PÚBLICO FINANCIANDO A EXPANSÃO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO: UMA ANÁLISE DOS INCENTIVOS PÚBLICOS AO GRUPO SER EDUCACIONAL (PERÍODO DE 2010-2014). João Ribeiro dos Santos Filho UFPA E-mail: [email protected] Vera Lúcia Jacob Chaves UFPA E-mail: [email protected] EIXO 1: FINANCIAMENTO NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR. RESUMO Aborda-se o financiamento da expansão do setor educacional privado-mercantil, mediante incentivos públicos (programas e financiamentos assegurados pelo Governo Federal), tendo como elemento de análise o financiamento da expansão do grupo Ser Educacional (2010 a 2014).Na metodologia, fez-se uso de pesquisa documental, por meio das demonstrações contábeis e financeiras do grupo Ser Educacional no período em análise, com ênfase nos dados de incentivos fiscais do Prouni e de Financiamento Estudantil (Fies). Os resultados demonstram que os incentivos públicos (como as isenções fiscais do Prouni e o financiamento estudantil – Fies) têm relevância no processo de expansão do setor privado-mercantil, com redução de carga tributária (em face do Prouni), com a integralização de reservas de incentivos fiscais para aumento de capital social (com potencial para a aquisição de novas unidades), bem como em face da redução de riscos com inadimplência e do incremento de créditos a receber do governo federal (compensáveis com dívidas da previdência social), em decorrência do Fies. PALAVRAS-CHAVE: Financiamento. Expansão. Ensino Superior Privado. Incentivos públicos. 1. INTRODUÇÃO A inserção de grupos educacionais no mercado financeiro, com oferta de ações na bolsa de valores, é um fenômeno que tem se intensificado nos últimos anos. Trata-se de uma reorientação do capital, no âmbito educacional, fortemente marcada por atuação governamental, com políticas de acesso à educação superior que favorecem este arranjo do capital especulativo, na área educacional (VALE, 2013). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 119 Tendo por tema este processo de expansão do ensino superior privado, atualmente centrado na concentração de empresas (instituições educacionais) pela formação de oligopólios por meio de aquisições (compras) e/ou fusões/incorporações, objetiva-se neste artigo abordar o financiamento da expansão do setor educacional privado-mercantil, mediante incentivos públicos(programas e financiamentos assegurados pelo Governo Federal), tendo como elemento de análise o financiamento da expansão do grupo Ser Educacional, no período de 2010 a 2014. Trata-se de pesquisa documental, tendo como principal elemento de análise as informações contábeis e financeiras (constantes de demonstrações financeiras padronizadas) prestadas pela própria instituição objeto de estudo, mediante dados disponibilizados aos investidores (acionistas/proprietários de ações da Companhia Ser Educacional). A análise centrou-se nas informações constantes da demonstração de resultado25 e da demonstração das mutações do patrimônio líquido26, com utilização de dados envolvendo os incentivos fiscais relativos ao Prouni27e os créditos a receber (incluindo os dados de financiamento estudantil). Para fins de delimitação do interstício temporal de análise (2010 a 2014), considerou-se a inserção do grupo Ser Educacional no mercado de ações (oferta de ações em Bolsa de Valores), que ocorreu em 2013, bem como a existência de demonstrações contábeis e financeiras padronizadas publicadas no período considerado, de modo a permitir uma análise da expansão a partir do desempenho e das informações prestadas pela referida “corporação” (companhia) educacional. Os dados foram obtidos no site do grupo Ser Educacional (http://www.sereducacional.com/ri/) e no site da Bolsa de Mercadorias e Futuros & Bovespa (http://www.bmfbovespa.com.br). O texto está estruturado em três partes (sessões), além desta introdução e das considerações finais. Na primeira sessão, discorre-se, em breve síntese, acerca do processo de 25 A demonstração do resultado do exercício (DRE) é a demonstração contábil destinada a evidenciar a composição do resultado (lucro ou prejuízo) formado num determinado período (exercício financeiro) de operações da entidade. A demonstração do resultado do exercício, observado o princípio de competência, evidenciará a formação dos vários níveis de resultados mediante confronto entre as receitas, e os correspondentes custos e despesas (FERRARI, 2010; IUDÍCIBUS et al., 2010). 26 A demonstração das mutações do patrimônio líquido é aquela destinada a evidenciar as mudanças, em natureza e valor, ocorridas no patrimônio líquido da entidade, num determinado período de tempo (exercício financeiro ou exercício social) (FERRARI, 2010; IUDÍCIBUS et al., 2010). 27 Programa Universidade Para Todos, instituído por meio da Lei 11. 096, de 13 de janeiro de 2005, por meio do qual as instituições que ofertarem bolsas de estudo no referido programa terão isenção dos seguintes tributos: Imposto de renda das pessoas jurídicas; contribuição social sobre o lucro líquido; contribuição social para o financiamento da seguridade social; e contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 120 financeirização do ensino superior, com base em literatura já produzida sobre o processo de inserção dos grupos educacionais no mercado financeiro (oferta de ações em bolsa de valores). Na segunda sessão do texto, caracteriza-se o grupo Ser Educacional, em seu processo de expansão, e na terceira parte, discutem-se possíveis impactos dos incentivos governamentais no processo de expansão do grupo educacional em análise. Por fim, nas considerações finais reforçam-se as conclusões decorrentes do texto. 2. ASPECTOS GERAIS DO PROCESSO DE FINANCEIRIZAÇÃO DE GRUPOS EDUCACIONAIS NO BRASIL. Como argumenta Sguissardi (2008), o predomínio do segmento privado na expansão da educação superior brasileira não reflete nenhuma novidade, mas este predomínio teve significativas alterações no curso das reformas neoliberais implementadas no Brasil a partir da década de 1990, que favoreceram a lógica privado-mercantil. Há alguns autores, entretanto, que ressaltam o crescimento do setor privado como sendo fortalecido no período da ditadura militar (Vale, 2013; Carvalho, 2005). Para Martins e Velloso (2002), a trajetória do ensino superior privado no Brasil, iniciada na Primeira República, foi marcada por um processo inicial de expansão de pequenas instituições de ensino, em geral vinculadas à formação de elites locais e por iniciativas confessionais da Igreja Católica, e a partir do período da ditadura militar a expansão do setor privado se insere em um novo momento, marcado pela “hegemonia privada nas mãos de um setor empresarial” (VALE, 2013, p. 115). Corroborando as ideias de Carvalho (2005), Vale (2013) argumenta que este processo de expansão do setor privado sempre foi marcado por forte incentivo estatal, com utilização de recursos públicos, mediante renúncias fiscais às instituições privadas e, mais recentemente, por programas e financiamentos com aval do Governo Federal. Com base em Chesnais (2005), argumenta-se que há conexões entre “a emergência de um regime de acumulação com predominância financeira”, a crise do período denominado de milagre econômico no Brasil, que coincide com o período do sistema de dominação política da ditadura civil-militar, e a “ação dos organismos internacionais na reconfiguração econômica e política dos países da periferia, que se manifestaria também ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 121 como reforma dos sistemas educacionais", sendo esta reforma encetada pelos “governos de cunho neoliberal que assumem o poder na esteira da redemocratização” (VALE, 2013, p. 123). De acordo com Chesnais (2005) o regime de acumulação com predominância financeira não pode existir sem que haja o apoio de um imenso processo de mudanças tecnológicas e organizacionais. Desta forma, a produção de conhecimento e o desenvolvimento de tecnologias é permeada por demandas que exigem reformas nos sistemas educacionais, em especial no nível de educação superior. Vale (2013, p. 124) acresce que estes processos de mudanças e de reformas não “se realizam apenas no sentido de empresariar, mercadorizar e privatizar a própria condução do conhecimento, mas expressam o movimento do capital que se realiza contraditoriamente”. Neste sentido, este processo é inserido como parte da totalidade, e observa-se “a transformação do próprio espaço de educação superior em lócus da acumulação do capital e campo cuja tônica atual é dada pela financeirização”. Trata-se de um processo oriundo de reformas no setor educacional, ou como afirmam Netto e Braz (2012, p. 239) “um gigantesco processo de contrarreforma (s), destinado à supressão ou à redução de direitos e garantias sociais” (grifos no original), sob a égide da ideologia neoliberal que sustenta “a necessidade de diminuir o Estado e de cortar as suas gorduras”, entretanto, os representantes de monopólios (e de oligopólios) têm ciência que a economia capitalista “não pode funcionar sem intervenção estatal”, ou seja, o grande capital continua demandando intervenção estatal, de outras formas, por meio de incentivos fiscais, por meio da garantia de proteção aos mercados consumidores. Netto e Braz (2012, p. 239) expõem ainda que “o objetivo real do capital monopolista não é a diminuição do Estado, mas a diminuição das funções estatais coesivas, precisamente aquelas que respondem à satisfação de direitos sociais”. E arremata que, ao apregoar a necessidade de um “Estado mínimo”, o que objetivam os monopólios e seus representantes “nada mais é do que um Estado mínimo para o trabalho e máximo para o capital” (negritos no texto original). Estes argumentos dos autores servem de suporte à análise das transformações ocorridas no ensino superior, com atuação marcante do setor privado-mercantil, por meio de incentivos estatais. Estas transformações no ensino superior têm favorecido a expansão do setor privado-mercantil, sob a forma de grandes oligopólios educacionais (CHAVES, 2010), ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 122 aliando-se a um processo de financeirização do setor educacional, com inserção destes grupos educacionais em mercado de ações e com controle acionário, em parte, realizado por grandes bancos privados. O grupo Ser Educacional, objeto de nossa análise neste texto, é exemplo de um destes oligopólios educacionais com inserção no mercado financeiro. 3. CARACTERIZAÇÃO DO GRUPO SER EDUCACIONAL E DE SEU PROCESSO DE EXPANSÃO. Conforme informações constantes do site institucional (www.sereducacional.com), o Grupo Ser Educacional é agente controlador das seguintes instituições: Faculdades Maurício de Nassau, UNINASSAU – Centro Universitário Maurício de Nassau, Faculdades Joaquim Nabuco, Escolas Técnicas Joaquim Nabuco e Maurício de Nassau, Instituto de Pesquisa Maurício de Nassau e Instituto Ser Educacional. Por meio destas instituições oferece mais de 250 cursos entre graduações, pós-graduações e cursos técnicos (SER EDUCACIONAL, 2014). Fundado em 2003, por José Janguiê Bezerra Diniz, que atualmente é presidente do conselho do Grupo, o Ser Educacional tem mostrado um crescimento expressivo nos últimos anos, realizando aquisições em diversas cidades das regiões Norte e Nordeste e, de acordo com sua autodescrição, vem “aperfeiçoando sua estrutura gerencial para dar suporte a seu crescimento futuro”. Em 2013, a holding converteu-se em uma instituição de Capital Aberto e deu início às atividades na Bolsa de Valores. Atualmente o grupo atua no ensino superior por meio de 24 (vinte e quatro) unidades, estando presente em 11 (onze) estados e 18 (dezoito) cidades das regiões Norte e Nordeste. De acordo com as demonstrações contábeis, a Ser Educacional S.A. (denominada “Companhia”) e suas controladas (conjuntamente denominados de “Grupo”) tem como atividades preponderantes o desenvolvimento e administração de atividades nas áreas de educação de graduação, pós-graduação, educação profissional e outras áreas associadas à educação, bem como a participação, como sócio ou acionista, em outras sociedades empresárias, no Brasil (SER EDUCACIONAL, 2014; 2015). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 123 Já na definição de atividades, está marcantemente delineada a atuação no mercado de capitais, mediante a participação como sócio ou acionista em outras sociedades empresárias. Cabe ressaltar que desde de sua origem o grupo Ser Educacional teve uma vertente para a atividade lucrativa, tendo em vista que o embrião do grupo começou em 1994, “quando foi criado o Bureau Jurídico com o objetivo de preparar candidatos para os concorridos concursos públicos”. De acordo com a Companhia, os recursos obtidos com as ofertas de ações têm como finalidade principal o crescimento orgânico, a aquisição de novas empresas, ativos e marcas, e a abertura de novas unidades. Desde o início de suas operações, a Companhia realizou diversas transações societárias alinhadas com sua estratégia de ampliação e investimento em um portfólio de marcas, produtos e unidades operacionais. As aquisições representam foco estratégico na busca de oportunidades relacionadas a obtenção de sinergias na estrutura acadêmica, operacional e administrativa, bem como no aproveitamento do potencial de expansão não explorado. O quadro acionário do grupo Ser Educacional, em virtude de ainda ser recente a inserção no mercado de ações, é composto por poucos acionistas majoritários, conforme abaixo. Tabela 1 - Quadro societário – Grupo Ser Educacional, 2014 Sócio Percentual de ações (%) José Janguiê Bezerra Diniz 87,68 JânyoJanguiê Bezerra Diniz 1,00 Poah One Acquisition Holdings VII LLC 11,32 Fonte: Demonstrações contábeis padronizadas – exercício financeiro de 2014 Acrescente-se que o acionista PoahOneAcquisition Holdings VII LLC, proprietário de parte das ações preferenciais do grupo Ser Educacional, está sediado no Departamento de Estado de Delaware (nos EUA), reforçando o pensamento de Chesnais (2005) de financeirização do capital em âmbito mundial, que está ocorrendo na área educacional, sobretudo do ensino superior. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 124 Cabe destacar que a inserção do grupo Ser Educacional no mercado de ações, a partir de 2013, com base em registro deferido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em 18 de outubro de 2013, trouxe forte apelo para o processo de expansão do grupo mediante aquisições. Estas aquisições são operacionalizadas com suporte no crescimento do grupo, que decorre também de incentivos governamentais, com recursos do fundo público, cuja análise será desenvolvida na sessão seguinte. 4. INCENTIVOS PÚBLICOS À EXPANSÃO DO GRUPO SER EDUCACIONAL. O processo de expansão do grupo Ser Educacional é marcado pelo apoio e pelo incentivo governamental. A própria Companhia admite a relevância dos programas federais de acesso ao ensino superior, com os dados constantes de suas demonstrações contábeis, em especial as demonstrações de resultados e de mutações do patrimônio líquido, relativas aos exercícios financeiros de 2010 a 2014, cuja análise será desenvolvida nesta sessão. Ao discorrer sobre o desempenho operacional, por exemplo nas demonstrações financeiras dos exercícios de 2013 e 2014, o grupo Ser Educacional afirma que encerrou o exercício de 2013 com aproximadamente 70,3 mil alunos de graduação (que corresponde a um crescimento de 44,3% em relação a dezembro de 2012) e em torno de 7,7 mil alunos de pós-graduação (incremento de 5,5% em relação a 2012). Já em 2014, o total de alunos no encerramento do exercício foi de aproximadamente 128,5 mil alunos (crescimento de 30,0% em relação a 2013), sendo que 101,2 mil correspondiam a cursos de graduação presencial (incremento de 44,0% em relação a dezembro de 2013). O ano de 2014 foi o primeiro ano de implantação de cursos de graduação na modalidade Ensino a Distância (EAD), em sua forma 100% online, resultando em 2,0 mil alunos matriculados em 6 (seis) diferentes estados. Também no segmento de pós-graduação, o grupo encerrou o ano de 2014 com 8,3 mil alunos. O grupo Ser Educacional teve em 2014 a primeira turma de alunos concluintes do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego)28, com um total de 2,7 mil formados e encerrou o ano com 16,9 mil alunos frequentando os cursos técnicos. 28 O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) foi criado pelo Governo Federal, em 2011, por meio da Lei 11.513/2011, com o objetivo de expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica no país, além de contribuir para a melhoria da qualidade do ensino médio público.A partir de 2013, as instituições privadas, devidamente habilitadas pelo Ministério da Educação, também passaram a ser ofertantes dos cursos do Programa. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 125 Ainda acrescenta, nas demonstrações financeiras de 2013, que o número de vagas anuais autorizadas na graduação presencial e a distância naquele ano alcançou 116 mil, um incremento de 54 mil em relação a 2012, com autorizações de 113 (cento e treze) novos cursos aprovados, totalizando 365 (trezentos e sessenta e cinco) cursos autorizados, o que garantiu a expansão de captação de alunos. A importância governamental no processo de expansão é ressaltada ao declarar que Outro fator importante que tem contribuído para o incremento e retenção de estudantes é o uso da ferramenta do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil), que já é utilizado por 44,7% de nossa base de alunos (SER EDUCACIONAL, 2014, p. 75). Além do Fies, a Companhia se utiliza de outros incentivos e programas governamentais que fortemente contribuem para a expansão, como o Pronatec, cuja primeira oferta ocorreu no exercício financeiro de 2013. Neste sentido, o grupo informa em suas demonstrações financeiras, quanto ao Pronatec: Pronatec: em 2013 ocorreu a primeira oferta de cursos relacionados a este programa. A Companhia utilizou sua estrutura existente em 5 unidades (Recife, Maceió, Vitória da Conquista, Salvador e Teresina). Ao final de 2013, a Companhia possuía aproximadamente 20,9 mil alunos presentes em seus cursos técnicos (SER EDUCACIONAL, 2014, p. 75) Embora afirme que o crescimento no número de alunos no exercício financeiro de 2013 deveu-se principalmente ao “crescimento orgânico”, em decorrência da aquisição de unidades educacional menores, observa-se, dos excertos acima transcritos que houve forte incentivo governamental para a expansão em número de alunos, com o Fies financiando aproximadamente 45% do total de alunos matriculados no exercício financeiro de 2013. Além disso, cabe ressaltar que da base de alunos do Fies, a própria Companhia declara em suas demonstrações financeiras de 2013 que um total de 80% destes estudantes já utilizava o instrumento do Fundo Garantidor de Crédito Educativo, reduzindo os riscos de inadimplência no pagamento das mensalidades e também permitindo ao grupo registrar em suas demonstrações contábeis um menor valor para provisão de créditos de liquidação duvidosa (uma espécie de conta contábil de despesa que reduz o patrimônio da entidade). Como declara o grupo Ser Educacional, “a política de vendas da Companhia e de suas controladas está intimamente associada ao nível de risco de crédito a que estão dispostas ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 126 a se sujeitar no curso de seus negócios”, ou seja, há forte orientação quanto à redução de riscos. Alguns procedimentos como o controle de matrículas de inadimplentes, por meio de bloqueio sempre que o aluno fica inadimplente com a instituição, a diversificação de valores recebíveis e a seletividade de alunos, bem como o acompanhamento dos prazos, são procedimentos adotados a fim de minimizar eventuais problemas de inadimplência em suas contas a receber. Como o próprio grupo educacional admite em suas demonstrações, no“segmento de ensino superior presencial para os alunos contemplados pelo Programa de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior - Fies, a Companhia tem parte substancial dos créditos garantidos pelo Programa”. Desta forma, a Companhia mantém registrada a provisão para créditos de liquidação duvidosa para fazer face ao risco de crédito, incluindo os potenciais riscos de inadimplência da parcela não garantida dos alunos beneficiados pelo Fies. Para fins de apontar a importância do Fies, sob o aspecto quantitativo, no contexto dos créditos a receber do grupo Ser Educacional, elaborou-se a tabela 2, abaixo descrita, no qual constam as modalidades de créditos a receber no período de 2010 a 2014. Assim, são modalidades de créditos a receber do grupo Ser Educacional os valores de mensalidades em atrasos, os créditos do Fies, os acordos celebrados para pagamentos, créditos educativos privados (créditos educacionais do Fundaplub - Fundação Aplub de Crédito Educativo e Educred, cujos financiamentos foram contratados pelos alunose aprovados pela Companhia), os valores relativos ao Pronatec e outros créditos não especificados. Ressalte-se que os créditos a receber constituem direitos recebíveis de curto prazo do grupo educacional, identificados no encerramento do exercício, ou seja, não incluem os valores recebidos no curso do exercício financeiro. Tabela 2 - Créditos a receber (2010-2014), Ser Educacional, valores em R$, em milhares Modalidade de crédito a receber Ano Mensalidades Fies Acordos Créd.Educ. Pronatec Outros Total 2010 2011 2012 2013 2014 30.414 44.904 59.610 39.670 449 6.178 14.227 48.389 15.287 19.029 24.205 15.647 1.607 11.066 16.299 12.131 7.267 1.619 2.611 4.023 3.102 62.573 83.788 118.363 125.874 76.859 111.604 18.441 9.077 20.389 6.134 242.504 Fonte: Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFP), notas explicativas – Ser Educacional (20102014). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 127 Observações: a) ( - ) sem dado numérico. b) Valores atualizados a preços de Jan/2015, pela média do IPCA/IBGE Analisando os dados dos créditos a receber do grupo Ser Educacional, no período de 2010 a 2014, observa-se que a expansão do grupo decorre fortemente de incentivos governamentais, com destaque neste caso para o Fies, que nos exercícios financeiros de 2013 e 2014 corresponde, respectivamente a 38,44% e a 46,02% do total de créditos a receber do grupo nos respectivos exercícios financeiros. Estes dados, sobretudo do crescimento dos créditos do Fies no exercício financeiro de 2014, revelam a importância do processo de aquisição de instituições que são inscritas no Fies, como a Universidade da Amazônia (Unama) e a Faculdades Integradas do Tapajós (FIT), adquiridas em 2014. Ressalte-se que os créditos do Fies, de acordo com as notas explicativas às demonstrações contábeis do grupo Ser Educacional, podem ser utilizados “para pagamento das contribuições previdenciárias retidas (INSS sobre salários) dos funcionários da Companhia, bem como convertidos em caixa por meio de leilões dos títulos do Tesouro Nacional”. Novamente se destacam, com estes dados, as contradições deste processo de financiamento do setor privado com recursos públicos, pois com o Fies tem-se a garantia governamental, mediante fundo garantidor de crédito, que provoca implicações no endividamento público, quando o neoliberalismo defende controle de endividamento por parte do Estado. Além disso, há a manutenção de uma estrutura estatal (sobretudo no Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação-FNDE29) para operacionalização do Fies, em contraponto aos argumentos neoliberais de redução do Estado. Ressalte-se que os custos do Fies são compartilhados entre o governo federal (juros subsidiados, custos de administração e operacionalização do Fundo, formação de fundo garantidor de crédito) e a sociedade (alunos e pais de alunos), que pagarão, durante anos, o financiamento obtido junto ao governo federal. Para as instituições privadas de ensino superior, ficam os bônusdo programa governamental de crédito estudantil (que no discurso governamental apregoa como principal característica a expansão do acesso ao ensino superior) a seguir relacionados: garantia de 29 O FNDE é uma autarquia federal criada pela Lei 5.537, de 21 de novembro de 1968, e alterada pelo DecretoLei 872, de 15 de setembro de 1969. O órgão tem como missão prestar assistência técnica e financeira e executar ações para o desenvolvimento de políticas educacionais do Ministério da Educação (MEC). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 128 crédito pelo governo federal, que serve para o controle de inadimplência e de atrasos nos pagamentos das mensalidades, reduzindo os riscos de crédito e garantindo solidez no mercado de ações (incremento nos valores das ações em bolsa de valores, por exemplo); compensação de créditos no pagamento de contribuições previdenciárias retidas (INSS sobre salários) dos funcionários; controle do preço das mensalidades pelas próprias instituições privadas de ensino. Acrescente, em relação ao controle do preço das mensalidades pelas instituições de ensino, que no final de 2014, o governo federal editou normativo vinculando o reajuste das mensalidades, no âmbito do Fies, à inflação no período (reajuste máximo das mensalidades em 6,4% no ano de 2015). Este fato tem provocado outro agravante à estrutura estatal: o recurso das instituições ao Poder Judiciário, mediante ações judiciais contra a vinculação do reajuste de mensalidades à inflação, sob o argumento de que esta decisão do governo federal fere a “liberdade de iniciativa” (vide informações sobre mandados de segurança interpostos pelas instituições privadas de ensino, em sites dos Tribunais Regionais Federais da 1ª e da 3ª Regiões, por exemplo). Também a alteração nos critérios para que o aluno pleiteie o financiamento estudantil, constantes do art. 19 da Portaria 24, de 24 de dezembro de 2014, de que o estudante deve ter obtido média aritmética das notas nas provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) igual ou superior a quatrocentos e cinquenta pontos e não pode ter nota zero na redação, é outra questão fortemente discutida pelos grupos educacionais, que tiveram o seu “mercado consumidor” reduzido em face da limitação imposta pelo Ministério da Educação nos critérios de acesso ao financiamento estudantil. Observa-se, assim, que após as medidas do governo federal estabelecendo um mínimo de controle no aumento de mensalidades, os grupos educacionais, que até então reajustavam livremente as mensalidades no Fies, sentiram-se incomodados com a postura do governo, uma vez que estavam acostumados com a atuação do Estado voltada a atender seus interesses corporativos de expansão com incentivos e recursos públicos, sem nenhuma forma de controle estatal sobre os preços cobrados dos estudantes inseridos no Fies. Outro incentivo governamental de grande relevância para as instituições privadas diz respeito aos benefícios fiscais (isenções fiscais) relativos ao Prouni.O Prouni estabelece, por meio da Lei 11.096, de 13 de janeiro de 2005, isenção de determinados impostos federais ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 129 a instituições de ensino superior que concedam bolsas de estudo integrais e parciais a alunos de baixa renda, matriculados em cursos de graduação tradicional e graduação tecnológica. As empresas de ensino superior controladas do grupo Ser Educacional estão inseridas nesse programa. Segundo a Instrução Normativa 456, de 5 de outubro de 2004, da Secretaria da Receita Federal, uma instituição de ensino superior privada que aderiu ao Prouni fica isenta, total ou parcialmente, dos seguintes impostos, durante o período em que o termo de adesão estiver em vigor: Imposto de renda e contribuição social com relação à parcela do lucro líquido proporcional às receitas provenientes de cursos de graduação tradicional e graduação tecnológica; Cofins e PIS referentes às receitas provenientes dos cursos de graduação tradicional e graduação tecnológica. Devido à adesão ao Prouni, os valores do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucrolíquido, não pagos em razão do incentivo fiscal concedido, são contabilizados no resultado do período, reduzindo as despesas dos referidos tributos. Para evitar a distribuição dedividendos com recursos oriundos das renúncias fiscais (que é proibido pela Receita Federal), o montante dos incentivos fiscais é destinado, após transitar pela conta de resultado (após apurado o resultado do exercício financeiro), para a conta contábil de reserva de incentivos fiscais no patrimônio líquido. Esta reserva de lucro somente poderá ser utilizada para aumento de capital ou absorção de prejuízos. Ademais, tais valores não poderão ser distribuídos aos acionistas, mediante restituição ou redução do capital, por até cinco anos após a data em que ocorrer referida capitalização. Para fins de mensurar a importância dos incentivos fiscais relativos ao Prouni para o grupo Ser Educacional, elaborou-se a tabela 3, com os dados consolidados de incentivos fiscais, de reserva de incentivos fiscais e de integralização de capital oriunda desta reserva de lucros, com base nas demonstrações de apuração de resultado da Companhia. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 130 Tabela 3 – Prouni (incentivo fiscal, reservas e integralização de capital) – Ser Educacional 2010-2014, valores em R$, milhares Ano Incentivo fiscal Prouni Reserva de Integralização no capital incentivos fiscais social 2010 17.530 17.530 2011 14.424 14.424 2012 25.939 13.384 2013 45.925 20.604 68.155 2014 67.680 35.688 Fonte: Demonstrações de resultado (2010-2014) e demonstrações de mutações do Patrimônio Líquido (2010-2014), do grupo Ser Educacional. Observações: a) Valores a preços de Jan/2015, atualizados pela média do IPCA/IBGE. b) ( - ) sem dado numérico. Considerando somente os dados de incentivos fiscais do Prouni, no período de 2010-2014, sem a análise das receitas financeiras decorrentes da constituição de reserva de incentivos fiscais, observa-se que o grupo Ser Educacional teve um acréscimo em seu capital social de mais de 68 (sessenta e oito) milhões de reais (o valor de 61,65 milhões de reais, corrigidos a preços de janeiro de 2015, pela média do IPCA), em decorrência da conversão das reservas de lucros decorrentes destes incentivos em integralização de capital social, no exercício financeiro de 2013. Ressalte-se que a integralização de capital social ocorrida em 2013 (conforme tabela 3) é decorrente da constituição de reservas de incentivos fiscais no período de 2010 a 2013. Trata-se de valores, oriundos de incentivos governamentais, que podem, dentre outras destinações, ser utilizados no amplo processo de expansão do grupo que, sobretudo a partir de 2013, foi fortemente acentuado com a aquisição de instituições de ensino como a Universidade da Amazônia (Unama) e das Faculdades Integradas do Tapajós (FIT), ambas localizadas no Estado do Pará. O processo de aquisição destas unidades começou em 23 de dezembro de 2013, quando o grupo Ser Educacional celebrou memorando de entendimentos com o propósito de negociar, com exclusividade, a aquisição das quotas representativas do capital social da União de Ensino Superior do Pará (Unespa), mantenedora da Unama, com sede em Belém-PA, e do Instituto Santareno de Ensino Superior - ISES ("Sociedades"), mantenedor da FIT Faculdades Integradas do Tapajós, com sede em Santarém-PA. O valor total da aquisição das quotas foi de aproximadamente R$ 151,2 milhões (informações do próprio grupo educacional). Como se observa, o processo de aquisição iniciou-se em 2013, mesmo ano em ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 131 que houve aumento de integralização do capital social, com aporte em reserva de lucros oriunda de incentivos fiscais do Prouni, conforme demonstrado na tabela 3. Continuando o processo de aquisição, em 02 de julho de 2014, o grupo Ser Educacional, por meio de sua subsidiária ICES – Instituto Campinense de Ensino Superior Ltda., efetuou um adiantamento para investimento no montante de R$ 24 milhões referente à aquisição da totalidade do capital social das sociedades União de Ensino Superior do Pará – Unespa, mantenedora da Unama, e Instituto Santareno de Educação Superior – ISES, mantenedor das Faculdades Integradas do Tapajós –FIT, bem como os direitos associados na Associação de Educação Superior do Médio Amazonas (AESMA) e na Fundação Instituto para Desenvolvimento da Amazônia (Fidesa). O processo de aquisição foi concluído em 24 de outubro de 2014, com a assinatura do termo de encerramento da transação. A partir de 28 de outubro de 2014 o grupo Ser Educacional assumiu a gestão das empresas e dos direitos de associado adquiridos. Por certo, os incentivos fiscais de redução de isenção de tributos, decorrentes do Prouni, que além de redução da carga tributária, podem ser integralizados ao capital social do grupo Ser Educacional, têm grande importância neste processo de expansão, por meio de aquisições de universidades e faculdades já em atuação, como a Unama e a FIT. Além disso, o fato de as instituições em processo de aquisição serem contempladas com o Prouni é elemento motivador do processo de compra intentado pelo grupo Ser Educacional. Todos estes dados do Prouni (isenção de tributos, formação de reservas de lucros, com consequente integralização de capital social) contribuem para o processo de expansão do setor privado, em especial para o processo de aquisições e fusões de instituições educacionais, pois permitem redução da carga tributária (dos tributos mais onerosos, por exemplo, imposto de renda pessoa jurídica e contribuição social sobre o lucro líquido) e ainda corroboram para o aumento de capital do grupo educacional, com a utilização dos valores de renúncia fiscal na integralização e no aumento de capital social, como se evidencia nas demonstrações de mutação patrimonial e de apuração do resultado do exercício financeiro de 2013, do grupo Ser Educacional, publicadas em março de 2014 (SER EDUCACIONAL, 2014). Apenas para destacar a evolução patrimonial do grupo Ser Educacional no período em análise, elaborou-se a tabela 4, abaixo, com dados do Patrimônio Líquido, constantes do Balanço Patrimonial da “Companhia” (corrigidos a preços de jan/2015, pela média do ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 132 IPCA/IBGE). Os números de crescimento do patrimônio líquido, per si, apontam o exponencial crescimento financeiro do grupo Ser Educacional no período em análise. Tabela 4 – Evolução do Patrimônio Líquido – Ser Educacional, 2010-2014, em R$ (milhares) Ano 2010 2011 2012 2013 2014 Variação, 2010-2014 (%) Patrimônio Líquido 152.851 174.410 226.811 498.999 651.547 426,26 Fonte: Balanço Patrimonial (2010-2014), do grupo Ser Educacional. Observações: a) Valores a preços de Jan/2015, atualizados pela média do IPCA/IBGE. Os dados evidenciam que o patrimônio líquido do grupo Ser Educacional ampliou 426,26% em apenas quatro anos (2010-2014) demonstrando que a abertura do capital no mercado de ações dessa empresa, aliada aos incentivos fiscais do governo federal, tem possibilitado o aumento de seu capital, a compra de outras instituições e, com isso, a transformação num grande conglomerado ou empresa holding. Essa nova lógica das IES mercantis centradas no capital fictício (mercado de ações) é incompatível com as finalidades da educação. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Como argumenta Oliveira (1998, p. 44), as concepções defendidas pelo neoliberalismo revelam que o fundo público deve ser mantido apenas como pressuposto para acumulação do capital, isto é, não se trata “de reduzir o Estado em todas as arenas, mas apenas naquelas onde a institucionalização da alteridade se opõe a uma progressão do tipo ‘mal infinito’ do capital”. Este argumento do autor corrobora a ideia de que os incentivos governamentais, com recursos do fundo público, no processo de expansão do ensino superior privado, são formas de apropriação e de acumulação por parte de grandes corporações educacionais, como o grupo Ser Educacional, em estudo neste texto. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 133 Com relação aos incentivos fiscais, decorrentes do Prouni, observa-se que podem ser destinados ao aumento do patrimônio líquido, por meio de formação de reservas de lucros e de integralização do capital social, pode-se afirmar que esta forma de estímulo favorece o aumento de capital dos grupos educacionais beneficiados com estes incentivos fiscais, como é o caso do grupo Ser Educacional, objeto desta análise. O aumento de capital decorrente de incentivos fiscais oriundos do Prouni tem potencial para alimentar o processo de expansão do ensino superior privado, mediante a aquisição de novas unidades educacionais pelos oligopólios já existentes. Em relação ao incentivo governamental do financiamento estudantil (Fies), observa-se nas demonstrações contábeis do grupo Ser Educacional que os créditos a receber, oriundos deste programa federal de expansão do acesso ao ensino superior, representam significativo montante, sobretudo nos exercícios financeiros em que o grupo educacional expandiu seu processo de aquisição de unidades menores (2013 e 2014). Ademais, os créditos a receber decorrentes do Fies, que podem ser convertidos em títulos do Tesouro Nacional ou utilizados para compensar/pagar dívidas com a previdência social, corroboram os argumentos de que esta forma de incentivo governamental tem importante relevância no processo de expansão do setor privado-mercantil no ensino superior, tendo em vista o potencial de redução de índices de inadimplência e de atrasos nas mensalidades, bem como o preenchimento de vagas ociosas com o apoio do financiamento estudantil. O próprio grupo Ser Educacional admite a importância do Fies no aumento de sua base de alunos, sobretudo nos exercícios financeiros de 2013 e 2014. Embora a análise neste texto desenvolvida, por força dos limites impostos na extensão textual, careça de outros elementos como informações por parte do governo federal sobre os repasses de Fies ao grupo Ser Educacional ou do efetivo montante de incentivos fiscais concedidos, não se pode descartar os aspectos que apontam para uma expansão do grupo privado-mercantil Ser Educacional, no período de 2010 a 2014, tendo como forma de financiamento deste processo de expansão os incentivos públicos (Prouni, Fies, Pronatec). REFERÊNCIAS CARVALHO, C. H. A. de.Política de ensino superior e renúncia fiscal: da reforma universitária de 1968 ao Prouni. Associação Nacional de Pós-Graduação. Grupo de Trabalho: Política de Educação Superior/GT 11. 28ª Reunião Anual, 2005. Disponível em <http://www.anped.org.br/reunioes/28/textos/gt11/gt11532int.rtf>. Acesso em 22 fev 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 134 CHAVES, Vera Lúcia Jacob. Expansão da privatização/mercantilização do ensino superior Brasileiro: a formação dos oligopólios. Educação & Sociedade, Campinas, SP, v. 31, n. 111, abr-jun/2010. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/es/v31n111/v31n111a10.pdf>. Acesso em 10 fev 2015. CHESNAIS, François (Org.). A finança mundializada: raízes sociais, configuração, consequências. São Paulo: Boitempo, 2005. FERRARI, Ed Luiz. Contabilidade geral. 26 ed. rev. Niterói/RJ: Impetus, 2010. IUDÍCIBUS, Sérgio de. et al. Manual de contabilidade societária. São Paulo: Atlas, 2010. MARTINS, Carlos Benedito; VELLOSO, Jacques. Balanço: as universidades privadas no contexto do ensino superior contemporâneo. In: HEYMANN, Luciana; ALBERTI, Verena (orgs.). Trajetórias da universidade privada no Brasil: depoimentos ao CPDOC-FGV. Brasília, DF: Capes; Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas/CPDOC, 2002, p. 797-827. II, 2v. NETTO, José Paulo: BRAZ, Marcelo. 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Disponível em <www.sereducacional.com/ri/ >. Acesso em 12abr 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 135 SGUISSARDI, Valdemar. Modelo de expansão da educação superior no Brasil: predomínio privado-mercantil e desafios para a regulação e a formação universitária. Educação & Sociedade, Campinas, SP, v. 29, n. 105, dez/2008. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/es/v29n105/v29n105a04.pdf>. Acesso em 10 mar 2015. VALE, Andréa Araújo do. A expansão do segmento privado-mercantil na educação superior brasileira: o caso da Estácio de Sá. In: CHAVES, Vera Jacob; SILVA JÚNIOR, João dos Reis; CATANI, Afrânio Mendes (orgs.). A universidade brasileira e o PNE: instrumentalização e mercantilização educacionais. São Paulo: Xamã, 2013. p. 113-130. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 136 POLÍTICA DE EXPANSÃO E FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS: UM ESTUDO DO CASO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ. Tayanne de Fátima Almeida Tabosa dos Reis Universidade Federal do Pará. [email protected] Valéria Silva de Moraes Novais Universidade Federal do Pará. [email protected] Vera Lúcia Jacob Chaves Universidade Federal do Pará. [email protected] RESUMO O texto apresenta uma análise do financiamento da educação superior brasileira sob a lógica da atual politica expansionista tendo como foco o caso da Universidade do Estado do Pará-UEPA. Discute-se de que forma a educação superior foi afetada nas últimas décadas pelas novas demandas da economia global, enfocando principalmente nas instituições estaduais de ensino superior e seu atual desafio: expandir matrícula, mas sem ampliação de recursos financeiros para esse fim. Para tanto, adotamos uma abordagem quanti-qualitativa e realizamos levantamentos de dados orçamentários em sites oficiais, revisão bibliográfica e levantamento de documentos oficiais, a fim de identificar no orçamento do Estado do Pará o que é gasto com a universidade e o que isso representa para o PIB estadual. Os resultados apontam que a educação superior foi afetada nas últimas décadas pelas demandas globais, e que principalmente as universidades estaduais vêm sofrendo para se expandirem sem contar com ampliação de recursos financeiros e sob constante política de contenção de gastos, como é o caso da UEPA. Nas considerações finais fazemos algumas reflexões acerca dos desafios enfrentados pelas universidades estaduais no contexto da atual sociabilidade capitalista. Palavras-chave: Financiamento na expansão da Educação Superior; Universidade Estadual. UEPA 1- INTRODUÇÃO Este texto é parte integrante do trabalho que estamos desenvolvendo a partir da pesquisa “Política de expansão e financiamento da educação superior nas universidades estaduais: um estudo do caso da Universidade do Estado do Pará”30, vinculada ao projeto de 30 Orientado pela Profª. Drª. Vera Lúcia Jacob Chaves e vinculado ao Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Superior (GEPES), do Instituto de Ciências da Educação/UFPA. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 137 pesquisa “Política de Financiamento da Educação Superior no Brasil – uma análise dos Planos Nacionais de Educação”, que tem por objetivo analisar a política de financiamento da educação superior existente no Brasil e investigar como esta se relaciona com as metas de expansão previstas nos Planos Nacionais de Educação (2001-2010 e 2011-2020), buscando apreender as contradições e questionamentos das politicas públicas na ótica de crise mundial do capitalismo. O objetivo deste trabalho é o de analisar a Reforma do Estado brasileiro e suas implicações na política educacional com ênfase para o financiamento das Universidades estaduais e identificar no orçamento do Estado do Pará os recursos destinados ao financiamento da Universidade do Estado do Pará e o que representam em relação ao conjunto dos gastos com políticas sociais e em relação ao PIB. Para o desenvolvimento da pesquisa utilizamos dados levantados na literatura existente e em documentos oficiais. Foram consultados os dados orçamentários do estado do Pará, da Universidade do Estado do Pará e do PIB. O texto foi desenvolvido em duas partes. Na primeira, apresentamos uma reflexão sobre a Reforma do Estado e suas implicações na política da educação superior. Tal análise com recorte na década de 1990, década que o Brasil aderiu a políticas neoliberais com forte incidência na educação superior, sendo esta a peça fundamental para o entendimento da educação brasileira e para o financiamento das universidades estaduais. Na segunda parte, apresentamos uma breve caracterização acerca do financiamento das instituições estaduais de ensino superior – IEES brasileiras, em seguida discutimos os delineamentos do financiamento da UEPA, bem como tratamos dos dados financeiros relacionados com o PIB do estado do Pará e as despesas destinadas para esta instituição. 2- Reforma do Estado e suas implicações no ensino superior e Universidades Estaduais. O estudo das políticas educacionais brasileiras nas ultimas três décadas envolve análises conjunturais que são reflexos das alterações de ordem política e econômica demandados pela atual etapa de desenvolvimento capitalista. Com base em Anderson (1995) o cenário mundial dos anos 1980 é demarcado por diversas mudanças nos campos políticos, econômicos e sociais. Na Europa, por exemplo, de acordo com Anderson (1995) pode-se destacar no pós-guerra a quebra das bases idearias do que se intitulou de Estado de bem estar ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 138 social, que pode ser entendido como uma estratégia do capitalismo a fim de reduzir os efeitos da crise econômica (em especial o crescente desemprego) e principalmente eliminar as doutrinas contrárias à vigente. Desse modo, para a garantia de tal estabilidade investiu-se em políticas públicas e assistenciais para garantir o “bem estar social”. Porém, esse fenômeno histórico causou um extremo fortalecimento dos sindicatos trabalhistas, que reivindicavam por melhores salários e políticas públicas mais abrangentes. Por conseguinte, a economia europeia passou por grande período de instabilidade, o que culminou com a grande crise do capitalismo, fato este que veio a fomentar e propiciar os meios para a disseminação da sua atual etapa de expansão do capital, o neoliberalismo. O remédio, então, era claro: manter um Estado forte, sim, em sua capacidade de romper o poder dos sindicatos e no controle do dinheiro, mas parco em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas. A estabilidade monetária deveria ser a meta suprema de qualquer governo. Para isso seria necessária uma disciplina orçamentária, com a contenção dos gastos com bem-estar, e a restauração da taxa “natural” de desemprego, ou seja, a criação de um exército de reserva de trabalho para quebrar os sindicatos. (ANDERSON, 1995, p.2) No Brasil, a partir das décadas 1980/90 intensificou-se a crise do modelo econômico de substituição de importações vigente no país, que trouxe como consequência altas taxas de inflação, crise fiscal e o aumento das desigualdades. Diante desse cenário, e sob influências neoliberais que ganhavam abertura no país, fazia-se necessário e urgente a formulação de mudanças para solucionar a crise econômica, e é nessa lógica que perpassa o novo funcionamento do Estado brasileiro. [...] Vem se produzindo no Brasil um novo pacto social consensuado politicamente por nossas elites para a adaptabilidade do país ao que se convencionou chamar, no plano político, de Neoliberalismo. Esta adaptabilidade está vinculada às mutações no sistema capitalista em escala mundial com mudanças nas esferas comercial, produtiva, tecnológica e financeira, exigindo dos países novo pacto social com alterações expressivas na sua sociabilidade, nas suas políticas econômicas, nas políticas de desenvolvimento produtivo, nas suas Constituições e ainda nas políticas educacionais. (KATO, 2013, p.106). Nesse contexto de mutações do sistema do capital e da necessidade de superação da crise iniciada nos anos 1970 e que alcançam seu ápice no Brasil a partir dos anos 1990, são exigidas a implantação de reformas pelos países hegemônicos do capital por meio dos organismos internacionais, na tentativa de garantir a manutenção da concentração do capital e da lucratividade dos capitalistas, como destaca Kato: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 139 [...] E do momento histórico vivido pelo Brasil em meados da década de 1989 é possível compreender as reformas econômicas e políticas que o país vem realizando nos últimos vinte anos: O Plano Real, as diversas reformas jurídicas, com destaque para as reformas na previdência pública e privada, a dilapidação do patrimônio público pela venda das principais empresas estatais que produziam lucros em setores estratégicos sob o argumento da necessidade de sanear as contas públicas, seguindo a risca o receituário imposto pelo Consenso de Washington. (KATO, 2013, p.110). A reforma do Estado nos anos 1990, portanto, de acordo com Kato (2013), teve sua principal expressão na publicação do seu manifesto político, o Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado. A publicação desse documento vem produzindo severas mudanças na política e na economia brasileira, com destaque para a redefinição do papel do Estado, sobretudo, com a criação do setor público- não estatal. Residiria neste setor, portanto, a racionalidade das mudanças no padrão de financiamento público das universidades. É neste chamado terceiro setor que estão incluídas as atividades de pesquisas e as universidades públicas. Tal inclusão passou a operar significativa mudança cultural, pois faculta a esta instituição nova relação com o Estado e com o setor produtivo. (KATO, 2013) Nesse contexto, o Estado passou a aderir ressignificações e ações impostas pelas organizações internacionais, como o Banco Mundial e FMI -representantes do interesse do capital- que traduziam seus interesses sociopolíticos nas mudanças determinadas para o Estado nacional, como a minimização do Estado e a forte crítica ao intervencionismo estatal, a abertura do mercado e a privatização da esfera pública; o que resulta em profundas mudanças para o campo das políticas públicas, e principalmente, para as politicas sociais. “[...] Ou seja, o processo resultante de uma nova fase de reestruturação capitalista é marcado por políticas de centralização, de diferenciação e de diversificação institucional e, especialmente, de privatização da esfera pública”. (DOURADO, 2002 p. 235). As politicas educacionais e sociais fundadas a partir de então também estão em consonância com as diretrizes de ordem internacional com o intuito de retomar a capacidade de crescimento do capital brasileiro. O reflexo de tal reforma na educação superior, se torna evidente à medida que a sua sinuosa competitividade, e modelo de gerenciamento acadêmico, pautado na organização e gestão da educação pública passam a exibir perfil de empresas privadas. Como explicita Amaral e Pinto (2010, p.2): ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 140 Na ES [educação superior], como consequência dessa linha de pensamento o que se viu foi uma pregação em favor do eficientismo, da competição entre as instituições, da implementação de um gerenciamento acadêmico que segue padrões de empresas privadas, e da procura por fontes alternativas de financiamento, em especial a partir da proliferação das fundações. Dourado (2002) faz uma profunda análise a cerca das recomendações do Banco Mundial à Educação Superior brasileira, fazendo referencia ao documento La enseñanza superior: las lecciones derivadas de la experiência (1995), cuja intencionalidade se torna clara no sentido de privatização desse nível de ensino, da eliminação de gastos com políticas compensatórias, aplicação de recursos públicos nas instituições privadas, busca de novas fontes de recurso através da iniciativa privada, expansão do numero de instituições não universitárias objetivando a diversificação do ensino superior, entre outras demandas. Assim, a educação brasileira perde a essência democrática, passa a assumir um modelo mercadológico, baseado em custos e benefícios, uma mercadoria de livre negociação no mercado. Como afirma Chaves (2008) a educação é um direito público e dever do Estado garantida na Constituição Federal de 1988, mas a partir da Reforma de 1990, se transforma em uma mercadoria atraente a ser negociada na lógica capitalista de mercado nacional e internacional, e nessa perspectiva, a educação superior, sem garantia de financiamento público para seu sustento integral adere a gestão empresarial, o que consequentemente ocasiona a perda de sua autonomia e sua funcionalidade passa a ser definida a partir do interesses das empresas privadas. 3- O Financiamento das Universidades Estaduais: o caso da Universidade do Estado do Pará - UEPA. Percebemos que a Reforma do aparelho do Estado trouxe novos entendimentos para a concepção de esfera pública e privada, visto que após esta, o que era exclusivamente oferecido pelo Estado e entendido como de ordem pública, passa a ser definido pelo conceito de público não-estatal, caracterizado pela parceria entre o Estado e a sociedade, que atua na forma de organizações sociais, essencialmente entre instituições privadas. De acordo com SOUSA JÚNIOR (2002, p.4): Os serviços não-exclusivos, nos quais se incluem os serviços educacionais, devem primar pela eficiência e eficácia e o seu financiamento deve ser assumido, em grandes proporções, ainda pelo Estado. Entretanto, a sua ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 141 execução deve ser transferida da gestão para o setor público não-estatal. Nas atividades não exclusivas, a exemplo de escolas, hospitais, universidades, centros de pesquisa, museus, etc, deverá imperar a forma de Organizações Sociais, isto é, instituições públicas não-estatais que adotarão o modelo de administração gerencial, de direito privado, e irão prestar contas de suas atividades à sociedade e a governo. É fundamental compreender que tais mudanças tiveram influência dos organismos internacionais - a exemplo do Banco Mundial (BM), e promoveram significativas reformas na educação brasileira, em todos os níveis educacionais, seja em relação ao currículo (parâmetros e diretrizes curriculares); avaliação (Provinha Brasil; Prova Brasil, IDEB, ENEM, ENADE, SINAES), financiamento (FUNDEF, FUNDEB, PROUNI, FIES, parcerias público-privadas) como no modelo de gestão (gestão gerencial), seguindo as premissas neoliberais. O texto de Sousa Junior (2002) mostra que o BM ainda propõe que a educação secundária e superior estão sujeitas ao pagamento de taxas. No caso específico da educação superior, faz-se necessário que se amplie as taxas de impostos locais e centrais e há um forte incentivo para a maior participação da comunidade, bem como variadas formas de financiamento privado. Fatos esses que explicitam as bases neoliberais na educação e a forma como a identidade das universidades foi mudada a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso, sobremaneira, no seu financiamento, que passa a ser baseado no incentivo à mercantilização, como destacam as autoras a seguir. O movimento de privatização desse nível de ensino tem sido intenso e se evidencia tanto pela expansão do setor privado como pela privatização das IES públicas. Esse movimento vem transformando a universidade pública num modelo educacional que privilegia a mercantilização do ensino como a principal forma de superação da crise institucional que ela vivencia. Assim, a privatização interna das instituições públicas ocorre por meio da utilização de diferentes mecanismos, dentre os quais destacamos: criação de fundações de direito privado; cobranças de taxas de mensalidades de cursos de pósgraduação lato sensu; convênios e contratos de prestação de serviço com empresas privadas para o desenvolvimento das atividades de ensino, pesquisa e extensão; dentre outros, com a finalidade de captar recursos no mercado. (CHAVES, MEDEIROS E LIMA, 2006, p. 12). Os estudos realizados, baseados em Chaves, Medeiros e Lima (2006) e Catani e Oliveira (2002), demonstram que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), aprovada em 20 de dezembro de 1996, Lei n° 9.394/96, constitui-se como um agente para o inicio da reestruturação da educação, principalmente no nível superior. No mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998) houve a aprovação de um arcabouço que deu subsídios para possíveis alterações nas diretrizes e bases educacionais, o que possibilitou mais diretamente a inserção da reforma neoliberal no seio educacional, todavia há uma totalidade ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 142 de mecanismos de mudanças nesse nível de ensino, que contam com reforços de leis e outros instrumentos legais. Então, constata-se que a LDB, traz implícita ou explicitamente uma nova relação entre o Estado e as Instituições de Ensino Superior (IES), em especial as públicas, haja vista que aquele se coloca no controle e na gestão das políticas voltadas para esse setor, com destaque para o financiamento. É importante destacar que a Constituição Federal de 1988 define o regime de colaboração reciproca entre os entes federativos, ou seja, Estado, Município e União, que devem trabalhar de forma conjunta para o oferecimento da educação, de forma compartilhada e descentralizada, de acordo com seus artigos de n° 1°, 18,23,30 e 211. O Estado e o Distrito Federal devem atuar prioritariamente no ensino fundamental e médio, os Municípios, prioritariamente no ensino fundamental e médio, a União, Distrito Federal e Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas educacionais em níveis de ensino obrigatório. (CURY, 2010). O financiamento da educação está claramente definido na Constituição de 1988, no art. 212, que aponta: A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino. § 1°- A parcela da arrecadação de impostos transferida pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios, ou pelos Estados aos respectivos municípios, não é considerada, para efeito do calculo previsto neste artigo, receita do governo que transferir (Brasil, 1988, art.212). Embora a Constituição Brasileira de 1988 nos mostre que os entes federados devem trabalhar em regime de colaboração, de forma descentralizada, no que diz respeito ao financiamento da educação, ainda percebemos que as marcas do processo de Reforma do Estado trouxeram modificações para IES, principalmente para as universidades estaduais. Torna-se notória a maior participação do Estado e dos municípios no financiamento da educação, e este fato influencia diretamente no financiamento das instituições estaduais, pois os Estados e municípios precisarão despender muito mais do que o previsto pela Constituição Federal de 1988 para custear o financiamento da educação, e a União, que tem maior capacidade de arrecadação, passa a despender menos recursos. [...] Os Estados que arcam com quase metade dos recursos para a educação no Brasil, 47,2% seguidos dos municípios com cerca de 30% e ficando em ultimo a União com cerca de 23%. Esses dados mostram de forma clara que ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 143 a União tem despendido menos recursos para a educação do que sua capacidade de arrecadação permite a despeito do processo de centralização fiscal que promoveu nos últimos anos. São os Estados que, historicamente, têm arcado com o grosso do financiamento da educação. A participação dos municípios tem sido crescente nos últimos anos e a partir de 1998 [...] (SOUSA JUNIOR, 2002, p.9). Este fato influencia no financiamento das universidades estaduais, por que os governos estaduais precisam despender maiores gastos para a educação básica e, a universidade estadual, acaba tendo seu financiamento limitado. Dessa forma, as parcerias público- privadas, ensejadas com a reforma do Estado, passam a ser essenciais para o desenvolvimento dessas instituições “[...] posto que não encontram formas de melhorar as condições de trabalho e a própria qualidade de ensino, a não ser que busquem recursos adicionais para enfrentar essa situação de penúria da maioria das universidades estaduais.” (SOUSA JUNIOR, 2002, p. 11). No cenário brasileiro é possível identificar diferentes formas de vinculação para a manutenção e desenvolvimento do ensino - MDE. De acordo com Carvalho (2014), alguns poucos estados vinculam mais de 25% dos recursos para MDE, como demonstra o mapa abaixo: Mapa 1 – Vinculação de impostos à Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE) por Estado da Federação Fonte: Constituições Estaduais brasileiras. In: CARVALHO, 2014. Verificamos que a grande maioria dos estados brasileiros vinculam 25% dos recursos para MDE (17 estados e o distrito federal), ou seja, o mínimo estabelecido pela CF/1988. Os estados do Acre, Paraná, São Paulo e Piauí são os estados que vinculam 30% dos impostos para MDE. Já o ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 144 Amapá destina 28% dos recursos de impostos e Goiás 28,25%. O Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro são os estados que mais destinam impostos, com 35%. Na aparência dos fatos, parece que esses estados que destinam mais de 25% dos recursos de impostos apresentam um percentual maior de recursos para a educação superior, entretanto, sabemos que o principal desafio enfrentado pelas universidades públicas brasileiras é expandir seu número de matriculas, sem haver expansão suficiente de recursos públicos que garantam a qualidade e manutenção destas. No caso das IEES, esse desafio torna-se mais árduo, dado a pouca participação federal (que se dá principalmente para financiar ações e programas determinados pelo MEC ou que esteja relacionado com ações da politica educacional nacional) e os parcos recursos transferidos pelos estados, somado ainda a orientação internacional dos organismos multilaterais de destinação à educação básica, onde os governantes estaduais destinam 20% dos recursos para o Fundo Nacional de Desenvolvimento e Valorização da Educação Básica - FUNDEB. Em âmbito nacional, a subvinculação de percentual específico para a educação superior pública também é bastante variante. De acordo com Carvalho (2014), das 27 unidades federativas, apenas nove subvinculam um percentual mínimo para a educação superior, são os estados do Amazonas, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Piauí, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os percentuais variam entre 0,5% a 5% das receitas de impostos. A ausência de uma vinculação definida para o financiamento das IEES na sua grande maioria tem suscitado ampla discussão no país, principalmente no espaço dos movimentos docentes, os quais vêm imprimindo esforços mediante debates em seminários e mobilização conjunta de associações31, para que se efetivem recursos específicos que garantam a manutenção destas. A busca por mudanças no cenário das IEES culminou na recente criação da Frente Parlamentar em Defesa das Universidades Estaduais e Municipais32, visando ampliar e aprimorar as legislações referentes ao tema. É importante destacar que as universidades estaduais paulistas contam com a destinação 33 de 9,57% dos recursos arrecadados pelo Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, conquista essa efetivada desde 1995. O regime de vinculação orçamentária dessas IEES 31 É realizado anualmente reuniões, encontros e marchas de protestos com a participação de mais de 40 associações docentes do país para discussões acerca do financiamento das instituições estaduais e municipais de educação superior (ADUSP, 2013). 32 A Frente Parlamentar em Defesa das Universidades Estaduais e Municipais é formada por membros do Senado e da Câmara dos Deputados Federais, e conta com o apoio da Associação dos Reitores de Universidades Estaduais e Municipais – ABRUEM. 33 Em 1989 as universidades estaduais: USP - Universidade de São Paulo. UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas e UNESP – Universidade Estadual Paulista contavam com 8,4% da arrecadação do ICMS, em 1992 passou para 9% e a partir de 1995, 9,57%. Por essa razão, as universidades estaduais paulistas tornaram-se referencia em vinculação orçamentaria para as IEES. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 145 possibilitou a autonomia para gerir seus recursos sem necessitar ser dependente de orçamento do governo estadual, como acontece com a grande maioria das universidades estaduais. Ao aproximarmos tal realidade com o estado do Pará, identificamos que de 1903 a 1957, a Educação Superior era oferecida em faculdades isoladas, que atendiam as demandas do cenário social e econômico da região. A ideia de criar uma Universidade no Pará como forma de divulgação científico e cultural se proliferou a partir de 1924, porém, só se consolidou em 1957, após o processo de federalização das Faculdades já existentes no Estado - fato esse que tornou possível o advento da Universidade-. (INEP, 2006. p. 33) Somente em 2 de julho de 1957, o então Presidente da República, Juscelino Kubitschek de Oliveira, sancionou a Lei nº. 3.191 que criou a Universidade do Pará. Essa universidade foi a 8ª instituição do gênero no Brasil. Seguiu, também, o modelo de organização das demais universidades brasileiras, sendo formada pela congregação de sete escolas superiores já existentes que adquiriram novas designações, passando a ser: Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará; Faculdade de Direito; Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras; Faculdade de Farmácia; Faculdade de Odontologia; Faculdade de ciências Econômicas, Contábeis e Atuariais e Escola de Engenharia. Posteriormente, em 20 de agosto de 1965, a Lei 4.795 foi sancionada, e determinava que a então Universidade e todas as Escolas Técnicas da União, vinculadas ao MEC, seriam qualificadas de federais, a partir de então a Universidade do Pará, passou a ser chamada de Universidade Federal do Pará. (INEP, 2006, p. 34). Em 1993, foi criada a UEPA, nascida pela fusão de faculdades estaduais, com a missão de somar com o desenvolvimento e modernização do Estado. A Universidade do Estado do Pará (UEPA) foi criada em 1993, por meio da Lei Estadual n° 5.747, de 18 de maio de 1993 como resultado da transformação da Fundação Educacional do Estado do Pará (FEP) que congregava a Escola de Enfermagem do Estado do Pará, Faculdade de Medicina do Estado do Pará, Escola Superior de Educação Física, a Faculdade de Educação e o instituto Superior de Educação do Pará (ISEP). A UEPA é uma instituição pública estadual organizada como autarquia de regime especial e estrutura multi-campi, gozando de autonomia didáticocientífica, administrativa, disciplinar e de gestão financeira e patrimonial. (INEP, 2006, p.37) Muitas universidades estaduais brasileiras, como forma de ampliação de seus programas e sua forma de atuação, iniciam o processo de interiorização, que funcionam através da criação de campi universitários nos interiores. Especialmente no Pará, a UEPA utiliza esse processo a fim de expandir a esfera educacional e a diminuição das desigualdades ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 146 na lógica da oferta deste nível de ensino, cuja oferta se concentra na capital. (PICANÇO E FROTA, 2002). Atualmente os campi universitários da UEPA estão espalhados por 15 municípios do Pará, quais sejam: Paragominas, Conceição do Araguaia, Marabá, Altamira, Igarapé-Açu, São Miguel do Guamá, Santarém, Tucuruí, Moju, Redenção, Barcarena, Vigia de Nazaré, Cametá, Salvaterra e Castanhal. A universidade tem a sua estrutura fundamentada em três áreas do conhecimento: Saúde, Educação e Tecnologia, para tanto, dispõe de três centros acadêmicos: Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), Centro de Ciências Sociais e Educação (CCSE) e o Centro de Ciências Naturais e Tecnologia (CCNT), que totalizam na oferta de 24 cursos de graduação. Quadro 1: Relação de cursos ofertados na UEPA. CURSOS OFERTADOS NA UEPA LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA. MEDICINA. ENFERMAGEM. CCBS FISIOTERAPIA. TERAPIA OCUPACIONAL. BIOMEDICINA. PEDAGOGIA LICENCIATURA PLENA EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO. LICENCIATURA PLENA EM CIÊNCIAS NATURAIS COM HABILITAÇÃO EM QUÍMICA, FÍSICA E BIOLOGIA. SECRETARIADO EXECUTIVO TRILINGUE. LICENCIATURA PLENA EM LETRAS- LIBRAS. CCSE LICENCIATURA PLENA EM MATEMÁTICA. LICENCIATURA PLENA EM MÚSICA. LICENCIATURA PLENA EM LETRAS- LINGUA PORTUGUESA. LICENCIATURA PLENA EM GEOGRAFIA. LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA. LICENCIATURA PLENA EM LETRAS- LINGUA INGLESA. CURSO DE BACHARELADO EM DESIGN. ENGENHARIA DE PRODUÇÃO. CCNT TECNOLOGIA DE ALIMENTOS. TECNOLOGIA EM ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS. ENGENHARIA AMBIENTAL. ENGENHARIA FLORESTAL. Fonte: Site da UEPA (2015) A instituição vem tentando cumprir o papel a que ela se compromete, o tripé da pesquisa, ensino e extensão, para tanto, a gestão investiu no crescimento da universidade, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 147 ampliou o quadro de docentes, adquiriu novos acervos, implantou novos cursos em núcleos do interior, viabilizou novos recursos, ampliou a estrutura física, promoveu ações para o incentivo da pesquisa, da valorização docente, dados estes levantados no “Relatório Acadêmico e Social de Gestão – Passos de gigante no rumo certo para desenvolver o Pará” publicado pela UEPA em 2013, que tem como objetivo demonstrar os avanços da universidade durante a gestão de Marilia Brasil Xavier (2008 à 2013). Em 2012, após negociações com o governo do Estado, a instituição conseguiu firmar novos concursos e regulação de vínculos não estáveis, elevando o número total de servidores técnicos administrativos para 2.330, quadros de melhora, visto que em 2008 o aponte de servidores era de 1.088. Para o quadro docente, foram realizados concursos públicos, os quais elegeram 803 efetivos e mais 315 temporários, somados aos já pertencentes anteriormente. No que diz respeito aos avanços existentes na graduação, o relatório de gestão aponta que a UEPA vem ampliando a oferta de cursos e de vagas na graduação, segundo expressa o planejamento estratégico, com recursos do tesouro e também com recursos de captação de programas federais, a exemplo o PARFOR e UAB. A diminuição na oferta de vagas com recursos do tesouro de 2009 para 2010 foi compensada pela oferta de vagas com recursos captados de programas federais. Com este remanejamento de vagas e otimização de recursos, foi possível retomar o crescimento na oferta nos anos seguintes em áreas de conhecimento estratégicas para o desenvolvimento do Estado. (RELATÓRIO DE GESTÃO, 2013). As tabelas a seguir, demonstram um crescimento substancial da universidade comparando os anos de 2007 e 2012, em um recorte que nos possibilita analisar o balanço da nova gestão. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 148 Tabela 1: Evolução do ensino de graduação na Universidade do Estado do Pará de 2007-2012 ENSINO GRADUAÇÃO 2007 2012 VAGAS OFERTADAS 2.468 3.646 INSCRITOS NOS PROCESSOS SELETIVOS 98.620 ISENÇÕES DAS INSCRIÇÕES NOS PROCESSOS SELETIVOS 30.52 4 4.000 BOLSAS PIBID 0 188 20 114 BOLSAS DE PROJETOS RECURSOS PRÓPRIOS). BOLSAS MONITORIA DE GRADUAÇÃO (PET-SAÚDE, 10.500 305 527 ALUNOS MATRICULADOS NOS CAMPI DA CAPITAL 4.799 5.293 ALUNOS MATRICULADOS NOS CAMPI INTERIORIZAÇÃO 4.840 PROJETOS ESPECIAIS DE GRADUAÇÃO (PTP, PARFOR, UAB E CONVENIOS). TOTAL DE ALUNOS MATRICULADOS 313 6.11 1 3.317 9.952 14.721 FONTE: Site UEPA (2015) Os dados acima mostram o crescimento da UEPA em relação aos cursos de graduação apresentando uma expansão de 47,9% das matrículas de 2007 a 2012, sendo os projetos especiais de graduação (PTP, PARFOR, UAB E CONVENIOS) foram os que mais expandiram (960%). A Tabela 2 a seguir apresenta os dados relativos à pesquisa, pós-graduação e extensão universitária da UEPA no período de 2007 a 2012. Tabela 2: Evolução da pesquisa, pós-graduação e extensão universitária na Universidade do Estado do Pará de 2007 a 2012. PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSUMESTRADO VAGAS ANUAIS EM PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU ALUNOS MATRICULADOS EM PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU BOLSAS PIBIC (NNPQ, FAPESPA, CHAMADA INTERNA DE PESQUISA). BOLSAS PIBIC JR. - FAPESPA- CNPQ GRUPOS DE PESQUISA CERTIFICADOS NO DIRETÓRIO NACIONAL DO CNPQ PROJETOS DE EXTENSÃO EM EXECUÇÃO PROGRAMAS DE EXTENSÃO EM EXECUÇÃO 2007 2012 21 1 28 6 20 40 89 222 166 223 0 24 156 69 42 7 96 12 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 149 BOLSAS DE EXTENSÃO BOLSAS DE ASSISTENCIAL ESTUDANTIL PROGRAMA DE INTERCAMBIO (CIENCIA SEM FRONTEIRAS) INVESTIMENTO ANUAL EM AUXILIO ESTUDANTIL Fonte: Site da UEPA (2015) 100 0 0,00 189 320 16 728.038 1.554.300 Os dados expostos na Tabela 2 mostram a UEPA tem investido na expansão também da pesquisa, da pós-graduação e da extensão o que demonstra que a Universidade caminha no sentido de sua expansão, dentro e fora da capital, trabalhando fortemente no ensino graduação, da pesquisa e extensão, e, na pós-graduação. Os dados mostram que em 2007 a UEPA possuía apenas um curso de Mestrado e que em 2012 passam a ser seis (6) cursos. Tal crescimento tem se dado mesmo diante da pouca destinação de recursos públicos vinda do governo estadual como pode ser visualizado na Tabela 3, que apresenta as despesas vinculadas para o financiamento da UEPA e o que representam em relação ao PIB do estado. Tabela 3: Produto Interno Bruto (PIB) e despesas do Estado do Pará com o financiamento da UEPA. ANO PIB (1) UEPA (2) UEPA/PIB 2007 44.369.675 49.507.144 78.535 90.859 0,17% 0,19% 2008 58.518.557 116.867 0,19% 2009 58.401.830 120.742 0,20% 2010 77.847.597 136.487 0,17% 2011 88.370.610 163.250 0.18% 2012 91.009.014 179.907 0,19% 2013 - 204.268. - 2006 Fonte (1): IBGE; (2): SEPOF. Os dados da Tabela 3 revelam que houve um incremento significativo, em termos de valores absolutos tanto nos valores do PIB do Estado quanto nos valores repassados para a UEPA, onde estes recursos quase triplicaram entre o início e o fim do período analisado. No entanto, a evolução dos valores repassados à UEPA mantém uma trajetória quase constante (Figura 1). Note-se que enquanto os valores do PIB possuem uma trajetória ascendente ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 150 positiva (representada pela linha azul), os valores dos repasses (linha em vermelho) destinados à UEPA se mantêm praticamente constantes. Figura 1: Evolução dos valores repassados à UEPA em relação ao PIB. Dessa forma, pode-se afirmar que, proporcionalmente, os valores destinados à instituição em questão, não acompanharam o ritmo de crescimento da arrecadação do Estado. Este fato é corroborado quando se avaliam a proporção desses recursos em relação ao PIB. Note-se que os valores destinados à UEPA variam entre 0,17% a 0,2% do PIB. Figura 2: Participação da UEPA no PIB do Estado do Pará, 2006/2012. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 151 Podemos a partir desses dados levantar uma discussão acerca das instituições estaduais pós reforma do Estado, e seu principal desafio: expandir o seu desenvolvimento como universidade multicampi, mas sem ampliação de recursos financeiros para este fim. Conforme observamos nas informações supracitadas no Relatório de Gestão da UEPA, lançado em 2013, houve um alto desenvolvimento na Universidade, expansão de matriculas, ofertas de novos cursos na graduação e pós graduação, estrutura física renovada, e vários outros quesitos de desenvolvimento foram citados, fato este que se torna incoerente quando analisamos os gastos do Estado do Pará com a UEPA. Nota-se que o crescimento do Estado é bem relativo e que os gastos com a educação se mantém constante com o passar dos anos, sem crescimento. Fato este que explicita as raízes neoliberais, as recomendações dos organismos internacionais fixados de forma inegável no seio da educação superior. Tais investimentos nem sempre são sanados com parcerias entre público-privado, com a privatização de áreas educacionais, bem como a cobrança de taxas e mensalidades em cursos de pós-graduação lato sensu, convênios com empresas, entre outros serviços destinados para a captação de receitas próprias. Uma das soluções mais utilizada para manter suas ações é a contenção dos gastos, materializada na redução de consumo de energia, pagamento de hora-extra aos professores, redução em 20% do valor originário dos contratos de aquisição, redução dos serviços de reprografia, redução do quantitativo de funcionários de vigilância e limpeza, entre tantas outras medidas de contingenciamento, como destacado em reportagem veiculada pelo Portal ORM (2009) e também na Portaria/UEPA n° 491/11, de 23 de fevereiro de 2011, que visou atender ao Decreto nº 05 de 19/01/2011, publicado no Diário Oficial do Estado do Pará nº 31.837. As ações de contenção dos gastos é uma recomendação do governo estadual, que de acordo com o então Pró-reitor de Gestão e Planejamento da UEPA, Do primeiro para o segundo quadrimestre deste ano fizemos um contingenciamento e a recomendação expressa do governo é a redução de gastos por conta da queda da arrecadação do estado. Hoje (em 2009), 98% de recursos são do Tesouro do Estado. A Uepa tem uma capacidade de captar verbas muito baixa, em torno de 2% (PORTAL ORM, 2009, grifo nosso). No discurso institucional, o contingenciamento se dá pela queda na arrecadação estadual. Entretanto, vimos na Tabela 3, que houve uma queda pouco expressiva, uma vez que em 2008 a arrecadação foi de R$ 58.518.557,00 e em 2009 (ano destacado na fala acima) foi de R$ 58.401.830,00. Aliado a isso, vale destacar que a diversificação na forma de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 152 financiamento tem sido irrisórios para manter uma instituição pública multicampi, já que representam apenas 2%. De fato, as ações de redução de despesas se tornaram recorrentes na UEPA e comumente são reveladas no jornal local de Belém, e vem contribuindo diretamente para a precarização das atividades desenvolvidas nessa universidade. Tal fato se agrava se considerarmos as pressões vinculadas pelo projeto neoliberal de sociabilidade, as quais visam adequar os órgãos públicos aos critérios de eficácia, eficiência, qualidade e produtividade, haja vista que divergem desses critérios se não há as condições necessárias para efetivá-los. O cenário que se evidencia para as universidades públicas é de crise institucional, que de acordo com Santos (2010, p. 15-16): [...] A crise institucional era e é, desde há pelo menos dois séculos, o elo mais fraco da universidade pública porque a autonomia cientifica e pedagógica da universidade assenta na dependência financeira do Estado. Enquanto a universidade e os seus serviços foram um inequívoco bem público que competia ao Estado assegurar, esta dependência não foi problemática, à semelhança do que se passa, por exemplo, com o sistema judicial, em que a independência dos tribunas não é beliscada pelo fato de serem financiados pelo Estado. No entanto, ao contrário, do que se passou com a justiça, decidiu reduzir o seu compromisso político com as universidades e com a educação em geral, convertendo esta num bem que, sendo público, não tem de ser exclusivamente assegurado pelo Estado, a universidade pública entrou automaticamente em crise institucional. Se esta existia antes, aprofundou-se. Pode-se dizer que nos últimos trinta anos a crise institucional da universidade na grande maioria dos países foi provocada ou induzida pela perda da prioridade do bem público universitário nas políticas públicas e pela consequente secagem financeira e descapitalização das universidades públicas. Portanto, há uma clara estratégia focada em expandir a educação superior através das universidades estaduais com um caráter economicista, com a contenção de despesas, estimulando a abertura para parcerias público-privadas, captação de recursos próprios, bem como qualquer estratégia que fortaleça a lógica mercantil no interior das universidades públicas estaduais, que permita o mínimo de utilização do produto interno bruto - PIB estadual, enfraquecendo assim a adoção de subvinculações de recursos públicos captados para a educação superior. 4- ALGUMAS APROXIMAÇÕES. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 153 Atendendo aos objetivos e demonstrando os resultados parciais da pesquisa em andamento, percebemos que a Reforma no Aparelho do Estado foi a grande motivadora das transformações sociais, politicas e econômicas no Brasil. Essa reforma fez eclodir um novo cenário no país, visto que as bases neoliberais as quais era fundamentada findavam mudanças que vinham a reorganizar as estruturas antes firmadas no estado brasileiro. Nesse contexto, a educação passa a atender os interesses neoliberais recomendados por organismos internacionais de grande influência, como FMI e Banco Mundial. Com isso todos os níveis educacionais são afetados, inclusive o nível superior, nosso objeto de pesquisa, que passa a ser vista como mercadoria, e assume um papel cada vez mais enraizado às recomendações destes organismos internacionais, e estes acarretam diretamente na perda da identidade da educação superior, principalmente, da Universidade, trazendo perdas irreparáveis para a história da educação no Brasil. No que toca ao financiamento das universidades estaduais pós Reforma do Estado, depreende-se que essas instituições são também afetadas por estas mudanças estabelecidas neste recorte temporal, haja vista que os recursos para seu sustento são angariados prioritariamente pelo Estado, e por suas parcerias com empresas privadas, ficando a União com participação indireta no financiamento das IES estaduais, uma vez eu se dá mediante programas federais. O cenário apresentado até aqui demonstra a fragilidade na captação de recursos para manutenção das IEES, que se agrava com a falta de destinação legalmente estabelecida na maioria das instituições estaduais de ensino superior. Somado a isso, sabemos da orientação internacional de priorização das ações governamentais para o ensino fundamental, que no caso dos governos estaduais, representa uma grande parcela dos recursos destinados para o FUNDEB. Nessa direção, o ensino superior estadual fica secundarizado e a resultante é a contenção de despesas para manutenção das atividades básicas das IEES. Aliado a isso, é possível perceber que as IEES vem sofrendo com a ausência de uma concepção que destaque a importância da educação superior dada pelos governos estaduais principalmente, e também pelo governo federal, este último essencialmente ao não fortalecer e apoiar a vinculação constitucional dos recursos em âmbito estadual ou mesmo complementar com recursos da União. A falta de concepção e importância das universidades estaduais é reforçada inclusive pela persistente crise institucional em que se encontram, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 154 mesmo estando alinhadas as orientações neoliberais, evidenciada fundamentalmente pela diversificação das fontes de financiamento. Para a UEPA, a adoção de práticas mercantis como a cobrança de taxas e mensalidades em cursos de pós-graduação lato sensu, convênios com empresas, entre outros serviços destinados para a captação de receitas próprias, mesmo assim não puderam/podem dar conta de garantir o financiamento das atividades fins que uma universidade multicampi necessita, e como consequência, o sucateamento dessa instituição social é inevitável e inegável. A estratégia propalada da lógica neoliberal é de expandir a educação superior via universidades estaduais sob o advento economicista, com a contenção de despesas, mas estimular a maior abertura para parcerias público-privadas, captação de receitas próprias, bem como qualquer estratégia que fortaleça a lógica mercantil no interior das universidades públicas estaduais, que permita o mínimo de utilização do produto interno bruto - PIB estadual. Portanto, é necessário romper com a lógica de priorização da educação básica e que emerja uma concepção de educação superior com vistas a dar continuidade ao processo de formação emancipadora aos sujeitos, para além de um nível básico de educação. É indispensável pensar na educação em todos os seus níveis, com destinação de recursos públicos exclusivos para a educação pública. 5- REFERÊNCIAS. BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Brasília: Ministério da Educação e Cultura. CARDOSO, Nelson Amaral. MARCELINO, José de Rezende P. 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No texto, desenvolve-se uma análise do montante de recursos financeiros relativos à renúncia fiscal por meio do Prouni (período de 2006 a 2014), apontando contradições neste processo de financiamento do ensino superior, que se utiliza de recursos do fundo público (mediante renúncia na arrecadação de tributos) e favorece a apropriação privada de recursos públicos. PALAVRAS-CHAVE: Financiamento, Renúncia fiscal, Ensino Superior Privado. 1. INTRODUÇÃO Trata-se de texto em que se propõe uma discussão sobre o financiamento público do ensino superior em instituições privadas, por meio do mecanismo de renúncia fiscal, com ênfase no Programa Universidade Para Todos (Prouni)34, do governo federal, indicando as 34 Programa Universidade para Todos. Instituído por meio da Lei 11. 096, de 13 de janeiro de 2005. As instituições que ofertarem bolsas de estudo no referido programa terão isenção dos seguintes tributos: Imposto de renda das pessoas jurídicas; contribuição social sobre o lucro líquido; contribuição social para o financiamento da seguridade social; e contribuição para o Programa de Integração Social (PIS). Além do Prouni, atualmente há também o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies), que permite a concessão de moratória e parcelamento de dívidas ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 158 possíveis contradições existentes neste processo de financiamento do ensino superior privado. Estruturalmente, o texto apresenta inicialmente alguns estudos já desenvolvidos acerca do tema renúncia fiscal e do Prouni. Em seguida, discorre-se sobre o papel do Estado no financiamento do ensino superior e os aspectos relativos à lógica neoliberal de financiamento das políticas sociais, como a educação superior. Também se desenvolve uma análise do montante financeiro de renúncia fiscal, na área educacional, enfatizando os valores destinados às instituições privadas no âmbito do Prouni e discorre-se acerca das contradições evidenciadas neste processo de financiamento de expansão do ensino superior privado, por meio de renúncia fiscal. O financiamento da educação superior, conforme se extrai de leitura do art. 205 da Constituição Federal, pode se efetivar pelos recursos da arrecadação de tributos, de origem estatal (que constituem o fundo público, na concepção de Amaral, 2009), pelo pagamento de mensalidades (recursos das famílias) e pela interação das instituições de ensino superior com diversos setores da sociedade, em que são firmados contratos e convênios para que as instituições de ensino superior recebam recursos financeiros. No caso das instituições privadas de ensino superior, o financiamento ocorre por meio de recebimento de recursos de mensalidades (recursos das famílias) e pelos recursos decorrentes da não arrecadação de tributos, por meio de renúncia fiscal. Este tipo de financiamento (renúncia fiscal), que constitui benefícios destinados ao setor privado, também pertence ao fundo público (pois são recursos que deixam de ser arrecadados para a composição do fundo público). Assim, neste texto, propõe-se uma discussão acerca desta forma de financiamento do ensino superior em instituições privadas com utilização de recursos públicos, mediante o mecanismo de renúncia fiscal. 2. FINANCIAMENTO DO ENSINO SUPERIOR E RENÚNCIA FISCAL. tributárias federais de entidades privadas de ensino superior em troca da concessão de bolsas de estudos em cursos de graduação. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 159 Cabe inicialmente destacar alguns textos que já abordam a relação entre o financiamento do ensino superior e o mecanismo de renúncia fiscal. Gemaque e Santos Filho (2011, p. 195-214) em estudo realizado com o objetivo de analisar “a concessão de benefícios tributários a instituições privadas de ensino, na perspectiva de verificar o peso desses benefícios nos gastos da União com o ensino superior público”, por meio do cotejamento dos valores dos gastos tributários indiretos com as instituições privadas (as denominadas renúncias tributárias), registrados em demonstrativos da Secretaria da Receita Federal do Brasil - SRFB (valores previstos e gastos tributários) e os valores orçamentários destinados à Subfunção “Ensino Superior” da Função “Educação”, apontaram elementos de discussão acerca do favorecimento do ensino superior privado na política de financiamento do Governo Federal, mediante concessão de benefícios fiscais, em detrimento de investimentos nas instituições públicas de ensino superior. No estudo, os autores chegaram à conclusão de “que as renúncias tributárias na área de educação têm beneficiado muito mais a mercantilização do ensino e a ampliação do capital privado do que a redução de desigualdades sociais” (Op. cit., p. 212). Ademais, observaram que ocorre uma transferência de responsabilidades relativas à educação superior para instituições privadas, por meio de incentivos fiscais (renúncia fiscal), que revela uma lógica de privatização do ensino superior, com incentivo à atuação do setor privado na área educacional. Carvalho (2005), afirma que a renúncia fiscal se refere à isenção e/ou à imunidade tributária, funcionando como um mecanismo de financiamento público indireto para os estabelecimentos de ensino superior privados. Destaca a mesma autora que há outros mecanismos de renúncia fiscal, os quais são direcionados a pessoas físicas (como, por exemplo, o abatimento na declaração do Imposto de Renda, em decorrência de gastos educacionais pessoais ou com dependentes econômicos). É possível que a própria Constituição Federal contenha previsões acerca de limitações ao poder de tributar, firmando mandamento constitucional negativo de competência para a tributação (trata-se de imunidade tributária), ou ainda a possibilidade de o próprio ente fiscal (União, Estados e Municípios) renunciar à tributação de determinado ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 160 contribuinte ou de situações específicas, por meio de legislação infraconstitucional, o que caracteriza a isenção35 fiscal (SILVA, 2009, p.712). Nesta esteira, os incentivos fiscais prestam exatamente à concessão de benefícios para o fomento, ao desenvolvimento de certas atividades da iniciativa privada, principalmente as associadas à utilidade pública, ou mesmo à própria vedação de tributar imposta ao ente fiscal. Neste texto, optou-se pela utilização da expressão renúncia fiscal (uma renúncia específica de receitas de origem tributária - impostos, taxas, contribuições sociais – em benefício de instituições privadas de ensino), por ser a mais adotada dentre pesquisadores da área educacional (CARVALHO, 2005). A renúncia fiscal é incluída dentre os denominados “gastos tributários”, que são objeto de demonstrativos específicos da Secretaria da Receita Federal do Brasil - SRFB. Os critérios de classificação dos gastos tributários pela SRFB apontam para a manutenção do sistema capitalista, pois podem ter objetivos sociais e econômicos (de incentivo a determinados setores da economia), ou seja, como se observa dos critérios de classificação, os gastos tributários têm caráter incentivador, quando o governo deseja desenvolver determinado setor econômico. Entretanto, nem sempre há uma prévia definição dos critérios de escolha dos setores econômicos a serem beneficiados com os gastos tributários e, desta forma, não se pode de antemão afirmar que os incentivos a estes setores econômicos são benéficos à coletividade. Após estas considerações iniciais acerca da renúncia fiscal (assimilada neste texto como os gastos tributários de natureza fiscal concedidos em proveito de instituições privadas), cabe ressaltar que a discussão sobre o financiamento da educação superior implica, necessariamente, numa análise acerca da atuação do Estado, no aporte de recursos financeiros para atendimento às necessidades coletivas, mediante políticas públicas sociais, como a política educacional, cuja discussão se propõe na sessão seguinte. 3. O PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR, POR MEIO DE FINANCIAMENTO COM RECURSOS PÚBLICOS. Isenção fiscal “significa a dispensa do pagamento do tributo devido”, embora ocorra o fato gerador de incidência do tributo, os entes tributantes (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) não constituem o crédito tributário para a cobrança do tributo (BORBA, 2005, p. 383-384). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 35 161 O financiamento do ensino superior é marcado por ampla contraposição de ideias entre teóricos que argumentam em favor do intervencionismo, os quais defendem um Estado do bem-estar social (ou uma forma aproximada de bem-estar social, no caso do Brasil), com uma intervenção do Estado no financiamento das políticas sociais, por meio de um fundo público) e teóricos não intervencionistas (que defendem um Estado liberal, com intervenção estatal mínima, ou mesmo inexistente e regulação pelo mercado). Na perspectiva liberal, Smith (1993) argumenta que para o financiamento da educação deve-se avaliar acerca do benefício gerado, ou seja, caso a educação de um indivíduo, por um lado, beneficie somente a ele, este custo deve ser bancado pelo próprio beneficiário; mas se, por outro lado, o fato de o indivíduo ser educado gera benefício para toda a sociedade, então é justo e correto que parte de sua educação seja financiada com dinheiro público [do fundo público]. Assim, na concepção de Smith, existem tipos de educação, como a educação superior, que beneficiam mais o próprio indivíduo que a sociedade, e tipos de educação cujo resultado, além do benefício individual, é muito grande para a sociedade (educação básica, por exemplo). Neste sentido, Pires (2005, p. 64), corroborando as ideias de Smith, argumenta que “deve haver diferentes formas de financiamento, combinando a utilização de recursos privados e públicos”. Em relação ao financiamento da educação superior, seguindo-se esta lógica alinhada ao pensamento liberal, o financiamento tende a ser voltado para a iniciativa privada, como ocorre com a concessão de benefícios fiscais, por meio de renúncia fiscal. Esta concepção privatista do ensino superior é endossada pelo Banco Mundial ao declarar que “a criação de instituições não universitárias e o aumento das instituições privadas podem contribuir para satisfazer a demanda cada vez maior de educação superior e faz com que os sistemas de ensino melhor se adéquem às necessidades do mercado de trabalho” (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 31). Adam Smith, em sua obra “A riqueza das nações”, demonstra que o Estado capitalista, além de atuar como representante do capital por meio de uma autonomia política relativa, sempre teve uma importante atuação econômica, em defesa da reprodução plena da ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 162 propriedade privada, ou seja, permitindo que o capital se reproduza de forma privada pela “mão invisível do mercado”. Além de demonstrar o papel político do Estado, Smith também demonstra os papeis econômico e belicoso do Estado moderno. Para Smith (1993), as principais funções do Estado são relacionadas a despesas com a defesa e com a justiça, como forma de garantir a propriedade privada, o que exige um ordenamento jurídico de sustentação, impondo uma forma burocrática à política e à dimensão ideológica do capitalismo. Em um terceiro grupo de despesas, Smith relaciona aquelas despesas do Estado para com serviços ou instituições que possam atender aos interesses do capitalismo, como por exemplo, “a criação e a manutenção dos serviços públicos que facilitam o comércio de qualquer país, [...], boas estradas, pontes, canais navegáveis, etc., exigirão variadíssimos níveis de despesas nos diferentes períodos da sociedade” (SMITH, 1993, p. 335). Smith considera a educação também como um destes serviços públicos, ou seja, “submete a dimensão pública à esfera privada em benefício desta última, no âmbito do próprio Estado Republicano” (SILVA JÚNIOR, 2008, p. 61), colocando a educação a serviço do capital. Com esta concepção, como argumenta Silva Júnior (2008, p. 61-62), Smith revela no âmbito da economia “o fetiche do Estado liberal e torna clara a contradição entre o público e o privado presente nas relações econômicas e sociais”. E mais, demonstra “a tendência histórica de intensificação da dimensão estatal mercantil que faz com que o Estado dirija suas políticas públicas para o polo privado da contradição”, em decorrência da materialidade da economia. As renúncias fiscais no contexto do ensino superior, em favor de entidades privadas de ensino, demonstram esta dimensão privado-mercantil do Estado. O capitalismo, em seu processo de crise do denominado Estado do bem-estar social (Welfare State), mas mantendo mecanismos de utilização do fundo público, “desatou uma capacidade de inovações que não podem ser postas a serviço da produção e financiadas apenas pelo lucro”, ou seja, “exigem e puncionam parcelas crescentes do fundo público” (OLIVEIRA, 1998, p. 46-47), As concepções defendidas pelo neoliberalismo, neste contexto, revelam-nos que o fundo público deve ser mantido apenas como pressuposto para o capital, isto é, não se trata “de reduzir o Estado em todas as arenas, mas apenas naquelas onde a institucionalização da alteridade se opõe a uma progressão do tipo ‘mal infinito’ do capital” (OLIVEIRA, 1998, p. 44). Tipifica este tipo de raciocínio, o ataque aos gastos sociais públicos que intervenham “na ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 163 nova determinação das relações sociais de produção”, e em contrapartida aprofunda-se o fundo público como pressuposto do capital (para pagamento da dívida pública, por exemplo). A renúncia fiscal em favor de entidades privadas de ensino superior também se insere neste contexto de utilização de recursos públicos em benefício do privado (privatização com destinação de recursos públicos). Além disso, com a concessão de renúncia fiscal, como ocorre no âmbito do Prouni, a concentração da propriedade privada passa a não envolver somente os meios produtivos, mas também os meios de formação do trabalho, em decorrência de um aumento constante do número de vagas nos cursos superiores ofertados pelas entidades privadas de ensino, por meio de incentivos do Estado, com a utilização do fundo público. Sguissardi (2008) argumenta que, no processo de expansão do ensino superior no Brasil, há predomínio do setor privado/mercantil. Para justificar esta afirmação o autor apresenta dados em que o número de matrículas nas instituições públicas (mantidas pelos governos federal, estaduais e municipais) de ensino superior, no período de 1999 a 2006, cresceu 45%, enquanto nas instituições privadas (sem fins lucrativos) o crescimento, no mesmo período, foi de 74%, e nas particulares (privadas em sentido estrito, com fins lucrativos), cresceu 195%. A partir de 2006, este processo de expansão é favorecido por meio do Prouni, com significativo montante financeiro de renúncias fiscais em favor de instituições privadas de ensino superior. Esta expansão do ensino superior privado também tem relevância no que diz respeito ao financiamento público, por meio da concessão de benefícios (gastos) tributários, via renúncia fiscal. Implica dizer que o crescimento do número de matrículas em instituições privadas é também incentivado pelo governo federal, mediante a concessão de benefícios tributários em contrapartida ao oferecimento de bolsas de estudo a estudantes no ensino superior, como ocorre com o Prouni. Na sessão seguinte, discutem-se as contradições que decorrem do mecanismo de renúncia fiscal, no âmbito do Prouni e demonstram-se a relevância do montante financeiro de renúncias fiscais. 4. AS CONTRADIÇÕES NO MECANISMO DE RENÚNCIA FISCAL ÀS INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO SUPERIOR. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 164 Os incentivos à expansão do ensino superior pela via da privatização, como ocorre com as renúncias fiscais em favor de entidades privadas, reforçam os antagonismos sociais e favorecem a propriedade privada, pela acumulação capitalista. Com isto, a educação superior que deveria ser instrumento contrário à alienação, pela possibilidade de discussão crítica e de desenvolvimento da autonomia, converte-se em um produto mercantil voltado aos interesses do mercado. A concessão de benefícios fiscais a entidades privadas de ensino superior revela um processo contraditório, pois se por um lado se exige redução da intervenção estatal, com desregulamentação do controle sobre os rendimentos financeiros do capital, por outro se buscam recursos do fundo público (OLIVEIRA, 1998), vez que a renúncia fiscal é uma das formas de utilização do fundo público (por meio de benefícios tributários indiretos), para o financiamento da iniciativa privada. Outra contradição relevante quanto à concessão de renúncia de receitas em benefícios de instituições privadas de ensino é quanto à crise fiscal. Se por um lado exige-se maior arrecadação tributária para garantir superávits primários (diferença positiva no contraponto entre receitas e despesas não financeiras), com redução de gastos correntes (despesas de custeio) e de investimento (despesas de capital), como se justifica a concessão de benefícios tributários (isenções, renúncia fiscal, anistia) a instituições privadas? Se a lógica defendida por Carvalho (2005) é a de “sustentabilidade da dívida”, com elevação de superávits primários dos países devedores de recursos financeiros a credores internacionais, há uma expressa contradição com o mecanismo de renúncia fiscal, em face da redução da arrecadação, decorrentes da concessão de isenções (renúncias fiscais) a instituições privadas de ensino superior. Para corroborar estes aspectos contraditórios, elaborou-se a tabela 1, abaixo transcrita, em que se apontam os dados financeiros de renúncias fiscais no âmbito do Prouni, em favor de instituições privadas de ensino superior, no período de 2006 a 2014. Os dados foram obtidos no site da Secretaria da Receita Federal do Brasil – SRFB, por meio dos demonstrativos de gastos tributários (disponíveis em <https://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/gastos-tributarios/previsoes-ploa/arqui vos-e-imagens/demonstrativos-dos-gastos-tributarios-dgt>). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 165 Tabela 1 - Renúncias Fiscais por tributo – Prouni – 2006-2014, em R$, milhões * ANO IRPJ Contr.PIS-PASEP CSLL COFINS TOTAL 2006 75 230 32 87 423 2007 47 36 19 92 194 2008 149 45 77 203 474 2009 207 66 119 305 697 2010 250 75 157 344 825 2011 272 47 97 216 632 2012 321 70 148 322 862 2013 349 64 121 296 830 2014 218 61 65 281 625 Fonte: Relatórios de renúncia- Projetos de Lei Orçamentária Anual/Secretaria da Receita Federal do Brasil. *Valores atualizados a preços de Jan/2015, pelo IPCA/IBGE. Como se observa da tabela 1, as renúncias fiscais relativas ao Prouni abrangem os seguintes tributos: Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) do trabalhador e/ou para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS). Extrai-se da tabela 1, que nos exercícios financeiros de 2008 a 2014, houve uma significativa renúncia fiscal envolvendo recursos destinados à seguridade social (renúncia fiscal da COFINS e da CSLL), fato que se revela contraditório, tendo em vista que o governo federal alega a existência de constantes déficits na seguridade social, sobretudo na previdência social, entretanto renuncia a arrecadação anual de valores, em muitos casos, superiores a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais). Neste sentido, a renúncia fiscal em favor de entidades privadas de ensino superior, de recursos que seriam destinados à seguridade social (que atende áreas sociais relevantes como a saúde, a assistência e a previdência social) não favorece a população mais carente (aquela que mais necessita de recursos nas áreas de saúde, assistência e previdência social, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 166 por meio de atendimento estatal, e que, em sua maioria, ainda não está inserida no ensino superior). Também a renúncia fiscal de valores referentes à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a renúncia fiscal da Contribuição para o PIS/PASEP retiram do potencial de arrecadação de tributos recursos que integrariam o fundo público e que poderiam ser aplicados no atendimento de políticas sociais por parte do Estado, em favor do trabalhador (no caso do CSLL e do PIS) e do servidor público (no caso do PASEP). Considerando os significativos valores de recursos de renúncia fiscal no âmbito do Prouni, relativos ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica, cabe mencionar que esta forma de renúncia afeta o ensino público, tendo em vista que com base no art. 212 da Constituição Federal de 1988, a União deve aplicar anualmente pelo menos 18% (dezoito por cento) dos recursos oriundos da arrecadação de impostos. Ao conceder renúncia do Imposto de Renda Pessoa Jurídica, a União deixa de arrecadar valores sobre os quais incidiria um percentual de 18% destinado ao ensino público. Tendo em vista a atuação prioritária da União no atendimento ao ensino superior, implica dizer que parte significativa de recursos oriundos de arrecadação de impostos deixa de ser aplicada no ensino superior público. Apenas para exemplificar, uma renúncia fiscal anual de aproximadamente R$ 320.000.000,00 (trezentos e vinte milhões de reais) no IRPJ, como se observa no exercício financeiro de 2012, equivale a aproximadamente R$ 57.600.000,00 (cinquenta e sete milhões e seiscentos mil reais) que deveriam ser investidos anualmente em ensino público, em decorrência da vinculação constitucional do art. 212. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A política de financiamento do ensino superior por meio de renúncia fiscal em benefício de instituições privadas é defendida com base no argumento de que com a expansão do número de vagas nas instituições privadas, por meio da concessão de bolsas a estudantes, ocorre uma ampliação no acesso ao ensino superior, gerando oportunidades aos jovens oriundos de famílias de menor poder aquisitivo. Embora não se possa desconsiderar que exista uma ampliação no número de vagas com esta forma de financiamento do ensino superior, não se pode desconsiderar que a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 167 concessão de renúncia fiscal por meio do Prouni é realizada com base em tributos cuja receita de arrecadação atenderia áreas sociais como saúde, assistência e previdência social, como as renúncias de contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) do trabalhador e/ou para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), que são vinculadas às demandas da seguridade social, uma efetiva contradição com os argumentos do próprio governo federal de que a seguridade social apresenta déficits de arrecadação. Além disso, trata-se de uma forma de financiamento que favorece a iniciativa privada (as instituições privadas de ensino superior), com uma redução significativa da carga tributária e também com o preenchimento de vagas ociosas nos cursos superiores destas instituições. Em decorrência da renúncia do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), também ocorre redução no montante de recursos vinculados constitucionalmente à educação pública, em virtude da ausência de arrecadação do IPRJ, gerando perdas no montante de recursos destinados às instituições públicas de ensino superior, o que revela uma preferência do governo federal pela privatização, pelo favorecimento da iniciativa privada. REFERÊNCIAS: AMARAL, Nelson C. Avaliação e Financiamento de Instituições de Educação Superior: uma comparação dos governos FHC e LULA. Atos de pesquisa em educação (FURB), v. 4, p. 321-336, 2009. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. BANCO MUNDIAL. La ensañanza superior: las lecciones derivadas de la experiencia. (El desarrollo en la práctica). Washington, D.C: Banco Mundial, 1995. BORBA, Cláudio. Direito tributário. 18 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. BRASIL. 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Constatamos os novos arranjos da contrarreforma da educação superior brasileira vêm respondendo às demandas do setor privatista de várias formas de financiamento criadas e/ou alteradas contando com a participação do fundo público. PALAVRAS-CHAVE: Educação Superior; Expansão; Financiamento; PROUNI. Apresentação Esse artigo tem como objetivo é analisar a expansão da Educação Superior, no setor privado por meio das diversas modalidades de parcerias público-privadas, durante os governos do Partido dos Trabalhadores – PT – Luiz Inácio Lula da Silva (2003 - 2010) e governo Dilma Rousseff (2011 - em andamento)36. Nesse sentido, a hipótese construída é que ocorrem, neste período, uma intensificação do empresariamento, privatização e mercadorização37 da Educação Superior brasileira, especificamente, a partir primeira década do século XXI. 36 Esse estudo é resultado da minha dissertação de mestrado, apresentada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal Fluminense em setembro de 2014, intitulada: As parcerias público-privadas na educação superior brasileira: FIES, PROUNI e BNDES. 37 Segundo (Avila, Léda e Vale, 2012), há três conceitos presentes no espaço educacional: mercadorização, privatização e empresariamento. As autoras apresentam a distinção entre esses conceitos e denominam a “mercadorização ao processo que transforma a educação superior em um bem comercializável, ou seja, um objeto de lucro ou acumulação, segundo Sguissardi (2008). Privatização é o processo que se refere à predominância de interesses particulares sobre interesses públicos em suas inúmeras facetas e não se reduz, de modo algum, à simples extensão do setor privado, embora essa seja uma de suas muitas manifestações. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 170 O interesse pela temática se constitui a partir dos estudos desenvolvidos coletivamente no Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Superior (GEPES), vinculado à Escola de Serviço Social e ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social e Desenvolvimento Regional, ambos da Universidade Federal Fluminense – UFF. A pesquisa apresentada refere-se à expansão da Educação Superior brasileira pós promulgação da LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96). A análise inicial dos dados sobre as matrículas nas Instituições de Educação Superior (IES) revela que essas matrículas estão concentradas no ensino superior privado. Dados do Censo da Educação Superior de 2012 demonstram que dos 7.037.688 estudantes matriculados nos cursos de graduação presencial e a distância no Brasil, 5.140.312 (73,04%) dos estudantes brasileiros estão matriculados em IES privadas, enquanto 1.897.376 (26,96%) estão nas IES públicas (MEC/INEP, 2012). É apresentado um panorama de quanto o Estado deixa de arrecadar, por meio das isenções fiscais, com o PROUNI – Programa Universidade para todos (Lei nº 11.096/2005). É demonstrado como o Estado brasileiro está conduzindo as suas ações para a Educação Superior privada nesse período onde essas políticas materializam a contrarreforma38 do Estado e da Educação Superior. Programa Universidade pra Todos – PROUNI: democratização ou mercadorização? Com o objetivo de responder a crise estrutural do capital instaura-se no Brasil, na década de 1990, um conjunto de reformas neoliberais, nas quais estão inseridas as reformulações na política educacional e, especificamente, as reformulações na educação superior brasileira. O sistema capitalista é sustentado e reproduzido através da propagação da concepção burguesa de mundo. Para Lima (2005), essas reformulações serão norteadas a partir do caráter atribuído à educação escolar pelos organismos internacionais. Tais organismos entendem a educação escolar como: i) “alívio da pobreza” nos países periféricos; ii) uma política Empresariamento corresponde à concepção de Neves (2002) do processo pelo qual se espraia uma concepção empresarial de instituição educacional” (Avila, Léda e Vale, 2012, p. 148, grifos nossos). Segundo Netto e Braz (2007, p. 227), os neoliberais apresentaram o Estado como “um trambolho anacrônico que deveria ser reformado – e, pela primeira vez na história do capitalismo, a palavra reforma perdeu o seu sentido tradicional de conjunto de mudanças para ampliar direitos; a partir dos anos oitenta do século XX, sob o rótulo de reforma(s) o que vem sendo conduzido pelo grande capital é um gigantesco processo de contrarreforma(s), destinado à supressão ou redução de direitos e garantias sociais”. 38 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 171 internacional de segurança do capital; iii) uma nova e promissora área de investimento do capital em crise; e iv) uma forma de difusão da concepção de mundo burguesa. Nas orientações do Banco Mundial, há uma intensa sinalização para o processo de mercantilização da educação superior, esse setor é concebido como um serviço e não como um direito. O modelo de IES indicado para a periferia do capital são as instituições voltadas apenas para o ensino e que atendam os interesses do mercado. O Banco indica que: (...) as instituições privadas constituem um elemento importante de alguns dos sistemas de ensino superior mais eficaz que existem atualmente nos países em desenvolvimento (...). Os governos podem fomentar o desenvolvimento do ensino superior privado para complementar as instituições estatais como meio de controlar os custos do aumento de matrícula nesse nível, incrementar a diversidade dos programas de capacitação e ampliar a participação social deste setor (BM, 1994, p. 37, tradução nossa). A essência desse discurso é o controle privado, aliado, sobretudo ao emprego de recursos públicos diretos e indiretos para o financiamento das IES privadas, como se materializa na realidade da educação superior brasileira, através do FIES e PROUNI. Assim como, ao não aumento do gasto público nas IES estatais, priorizando o pagamento da dívida pública. Conforme os dados da Auditoria Cidadã da Dívida (2010), no governo Luiz Inácio, a dívida pública consumiu 45% dos recursos da união. De acordo com esse estudo, o total do Orçamento Geral da União em 2010 foi R$ 1,414 Trilhão, sendo destinados R$ 635 bilhões para juros e amortizações da dívida pública (44,93%), enquanto as áreas sociais fundamentais receberam do orçamento federal: Educação (2,89%), Saúde (3,91%), Segurança (0,56%), e Reforma Agrária (0,16%). Propõe que o Estado se reconfigure e que, para ser eficiente precisa realizar “reformas” para que possa se adaptar ao “mundo em transformação”. Segundo Ugá (2004), isso significa, para o Banco Mundial, que o Estado não deve ser mais promotor direto do desenvolvimento, deixando essa tarefa para os setores privados, porém, criando um arcabouço jurídico, econômico e político que garanta a movimentação lucrativa desses setores. Segundo Netto e Braz (2007, p. 227) com base em Dreifuss (1996) o grande capital ao proclamar um Estado mínimo continua demandando a intervenção estatal, na verdade defende um Estado mínimo para o trabalho e máximo para o capital. Os autores desmentem o discurso neoliberal, quando destaca que as demandas do capital ao Estado ainda ocorre intensamente no campo da pesquisa e da investigação (ligados à indústria bélica), citando como exemplo os ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 172 de 1990, nos EUA “mais de 80% da pesquisa em engenharia elétrica, 70% em materiais e metalurgia e 55% em ciência da computação são sustentados por programas de pesquisa militar aplicada do governo”. Ugá (2004) afirma que, para o Banco Mundial o Estado é tido como um facilitador e parceiro dos mercados: (...) os Estados devem voltar sua ação para a implementação e adaptação de instituições que estimulem um melhor desempenho dos mercados. Assim, o Estado deve, por um lado, facilitar e garantir o bom funcionamento dos mercados; seu papel seria delineado pela necessidade de construírem-se novas instituições, modificar as existentes e eliminar as que não servem mais para tal objetivo (...) (Ugá, 2004, p. 57, grifos nossos). É nesse sentido que se configura a reforma neoliberal da política educacional, especificamente, a contrarreforma da educação superior, como uma importante estratégia de ampliação do campo de exploração lucrativa do capital em crise e de difusão do projeto de sociabilidade burguesa. O estímulo ao empresariamento, privatização e mercandorização da educação brasileira, que se dá ao longo da história desse país, tem se concretizado, nas últimas décadas, a partir de novos arranjos que aprofundam um padrão de financiamento público direto e indireto destinados a esse setor de ensino. Em relação às fontes indiretas de recursos públicos, Almeida (2006, p. 78-79) afirma que as isenções fiscais e previdenciárias39 são evidenciadas como as principais para as IES privadas. Segundo o autor, a Constituição Federal - CF de 1988, comparada as anteriores, acrescentou que somente as instituições de educação sem fins lucrativos seriam isentas: “esta exigência, entretanto, fez com que algumas instituições que se autodenominavam sem fins lucrativos, encobrissem lucros como ‘contribuição a entidades mantenedoras’”, mas as IES privadas são privilegiadas com a imunidade fiscal desde a criação do Código Tributário Nacional em 1966. As entidades de ensino superior consideradas sem fins lucrativos são imunes ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU e ao Imposto sobre Serviços Renda e Proventos de Qualquer Natureza – ISS, 39 As isenções fiscais para o setor privado de ensino já era previstas na Constituição Federal de 1934, segundo Almeida (2006, p. 78): no art. 154 da CF de 1934 “estimulava que ‘os estabelecimentos particulares de educação gratuita primária ou profissional, oficialmente considerados idôneos, serão isentos de qualquer tributo’. As Constituições Federais de 1946, 1967 e 1988 ampliaram esse alcance para as instituições de educação de todos os níveis de ensino”. A contribuição previdenciária patronal é outra importante forma de destinar indiretamente recursos públicos para as IES privadas. “Durante longo tempo, as entidades filantrópicas de modo geral estiveram isentas da sua contribuição (a chamada cota patronal) para a previdência social, por força de legislação ordinária específica (p. 81)”. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 173 ambos de competência do poder municipal, além do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza – IRPJ e do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR, no caso dos imóveis localizados em zonas rurais, ambos de competência da União (Almeida, 2006, p. 80). O autor destaca que, nos anos seguintes, outros tributos federais apresentaram isenções e cobranças diferenciadas entre instituições com fins lucrativos, sem fins lucrativos e filantrópicas: o Programa de Integração Social – PIS (Lei complementar nº 7, de 7 de setembro de 1970); a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL (Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988), voltada ao financiamento da Seguridade Social; e a Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS (Lei complementar nº 70 de dezembro de 1991) destinada às áreas da Saúde, Previdência e Assistência Social. No início do novo século, observamos continuidades do projeto neoliberal de educação que trazem algumas novidades para a educação superior brasileira. O governo Luiz Inácio Lula da Silva remodelou projetos anteriores e apresentou, no começo do seu mandato, a “Reforma da Educação Superior” que, segundo Otranto (2006, p. 43), inicia seu curso em caráter oficial com o Decreto de 20 de outubro de 2003, que “institui o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) encarregado de analisar a situação da educação superior brasileira e apresentar um plano de ação visando à reestruturação, desenvolvimento e democratização das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES)”. O GTI, em dezembro de 2003, apresentou o relatório final que foi divido em quatro partes, com destaque: as ações emergenciais; autonomia universitária; complementação de recursos (financiamento) e as etapas para a implementação da “reforma” universitária neoliberal. O texto inicia reconhecendo a situação de crise da educação superior brasileira, em especial das universidades federais, mas atribui o problema à crise fiscal do Estado, sem maiores aprofundamentos de sua origem. Em seguida, procura demonstrar que a crise já está atingindo também as instituições privadas, que viveram uma expansão recorde nos últimos anos e agora se encontram ameaçadas pelo risco da inadimplência generalizada do alunado e de uma crescente desconfiança em relação aos seus diplomas (Otranto, 2006, p. 43). A base dessa afirmação, as vagas ociosas e o risco de inadimplência para os empresários da educação são as duas maiores preocupações, compartilhadas pelo governo federal que, para fortalecer o empresariamento da educação superior, cria o Programa Universidade para Todos – PROUNI em 2004. O Ministro da Educação, Tarso Genro, em ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 174 abril de 2004, encaminhou ao Congresso o Projeto de Lei – PL nº 3.582/2004 sobre a criação do PROUNI, e adiantou parte da contrarreforma da educação superior brasileira. Mesmo quando o governo financia bolsas do tipo Prouni para estudantes frequentarem IES privadas de ensino, não há, a rigor, gratuidade. Isto porque, em primeiro lugar, são utilizados recursos públicos para financiar uma “gratuidade” que é mediada pela lógica do capital (setor privado de ensino), e que, portanto, difere da gratuidade do ensino estatal, já que parte significativa desse “ensino” tem de ser materializada na forma de lucros ao setor. Dito de outra maneira: o “valor de usos” desses ensino tende a ser inferior ao do estatal, uma vez que parte dele deve ser transformado em lucro, estabelecendo uma espécie de “pagamento indireto” cujo prejudicado imediato é o estudante, mas seus resultados se apresentam ao conjunto da sociedade (Minto, 2011, p. 246). Em 13 de janeiro de 2005, o programa transformou-se na Lei nº 11.096/2005, que inicialmente tramitou da seguinte forma: Medida Provisória - MP nº 213, em 10 de setembro de 2004, o Decreto nº 5.245, de 18 de outubro de 2004, que regulamenta a MP, a Portaria nº 3.268, de outubro de 2004, que estabelece os procedimentos para adesão das IES privadas ao PROUNI. Otranto (2006, p. 49 e 50) destaca o discurso falacioso de justificativa da MP, que “toda a atuação política relativa ao marco regulatório do ensino superior foi orientada a buscar a formação de um amplo consenso”. A autora nos faz questionar: que consenso é esse? Será que uma MP editada de forma autoritária, desrespeitando o Parlamento que analisava, em Comissão Especial, o projeto de lei do próprio executivo, e ainda, desconhecendo todas as críticas advindas dos defensores das escolas públicas ou privadas, pode-se autodenominar como uma medida de consenso? Que falso consenso é esse que desconsidera os encaminhamentos do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, integrado por várias entidades representativas da Educação, dentre as quais ampla maioria se posicionou contra o PROUNI? Mais uma vez, é uma afirmação inverídica, um jogo de palavras que atinge os incautos. Até hoje existem resistências a esse Programa impostas por sujeitos políticos coletivos que lutam em defesa da educação pública e para que os recursos públicos sejam destinados a esse setor de ensino. Porém, o governo federal sob a aparência de ampliação das vagas na educação superior em IES privadas, deixa de arrecadar tributos, dando isenção de impostos aos empresários da educação superior, e faz propaganda de que está democratizando o acesso aos trabalhadores e filhos dos trabalhadores que ocupam vagas ociosas dessas instituições. Como, pelo perfil social, esses estudantes não terão como custear seus cursos, a solução encontrada pelo MEC foi repassar verbas públicas para o pagamento de mensalidades. Se esses recursos (oriundos da isenção fiscal e pagamento das mensalidades) fossem direcionados para as universidades ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 175 federais, novos professores poderiam ser contratados e todos os cursos de graduação poderiam ser oferecidos no horário noturno. A tendência seria de chegar, em três ou quatro anos, a um milhão de novas matrículas nas universidades públicas e não 120.000 bolsas como pressupõem o PROUNI (...) (OTRANTO, 2006, p. 50) No Projeto de Lei, a bolsa de estudo integral seria destinada somente aos alunos que tivessem cursado o ensino médio em escola da rede pública ou professores da rede pública de educação básica. Segundo Almeida (2006, p. 86), na justificativa da Medida Provisória (MP nº 213/04) apresentada pelo ministro da Educação, Tarso Genro, e pelo então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, “mencionam que a MP em questão incorporar ‘as reivindicações das mantenedoras de instituições de ensino superior’”. Dentre as modificações realizadas nesse trâmite, está a ampliação do perfil do bolsista, que incluiu estudantes que tenha cursado o ensino médio completo em instituições privadas na condição de bolsistas integrais e estudantes portadores de necessidades especiais. O senador Expedito Junior (PR-RO), criou a PL 2.943/2008 que permite que bolsas remanescentes do PROUNI sejam destinadas a estudantes que tenham cursado parte do ensino médio em escolas particulares, que continua em tramitação. E o deputado Wilson Picler (PDT-PR) criou o PL 5.568/09 que inclui os cursos de pós-graduação, e o PL 5.569/09 que propõe incluir os polos de apoio à educação à distância nos beneficiários do PROUNI, porém ambos estão arquivados. Mais uma vez o Legislativo, assim como o Executivo, buscam atender as demandas dos empresários da educação superior brasileira. O Programa recebeu algumas mudanças durante esses dez anos de existência, e atualmente concede bolsas de estudo integrais e parciais (50%) em IES privadas, em cursos de graduação e sequenciais de formação específica, presencial ou à distancia, a estudantes brasileiros sem diploma de nível superior. Segundo o MEC, o candidato tem que atender algumas condições: Podem participar: - Estudantes egressos do ensino médio da rede pública ou da rede particular na condição de bolsistas integrais da própria escola; - Estudantes com deficiência; - Professores da rede pública de ensino do quadro permanente que concorrerem a cursos de licenciatura, nesse caso não é necessário comprovar renda. Para concorrer às bolsas integrais, o candidato deve comprovar renda familiar bruta mensal, por pessoa, de até um salário mínimo e meio. Para as bolsas parciais (50%), a renda familiar bruta mensal deve ser de até três salários mínimos por pessoa. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 176 O bolsista parcial de 50% poderá utilizar o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para custear os outros 50% da mensalidade, sem a necessidade de apresentação de fiador na contratação do financiamento. Para isso, é necessário que a instituição para a qual o candidato foi selecionado tenha firmado Termo de Adesão ao Fies e ao Fundo de Garantia de Operações de Crédito Educativo (FGEDUC). Fonte: MEC (2014) http://siteprouni.mec.gov.br/ O candidato deve realizar o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), obter no mínimo 400 pontos na média e não zerar na redação. O Programa também reserva bolsas aos estudantes que autodeclarem pretos, pardos e indígenas, incluindo os critérios destaca acima. O único caso de exceção a comprovar renda são os de professores da rede pública de educação básica, em exercício. A renúncia fiscal aos empresários da educação superior significa a redução da receita tributária, a imunidade e a isenção de tributos, instrumentos financeiros destinados à iniciativa privada. Segundo Carvalho (2009, p. 2), essa fonte de financiamento indireto “foi denominado pela Secretaria da Receita Federal (SRF), até 2003, de benefício tributário, mas, a partir de 2004, foi substituindo pelo termo ‘gasto tributário’”. A autora destaca a definição desse termo para a SRF, apresentado no relatório de 2005: “gasto tributário” é entendido como “gastos indiretos do governo realizados por intermédio do sistema tributário visando atender objetivos econômicos e sociais”. Nesse sentido, entendemos que a isenção dos tributos destinados às IES privadas que aderirem o PROUNI não são benefícios tributários, e sim, gastos públicos indiretos. Almeida (2006) destaca que no projeto original, as entidades beneficentes de assistência social que atuem no ensino superior, as IES consideradas filantrópicas, que adotarem as regras do PROUNI deverão converter 20% de “gratuidade” em vagas com bolsa integral para estudantes cuja renda familiar mensal per capita não exceda o valor de até 1 (um) salário mínimo. E as IES privadas com fins lucrativos ou sem fins lucrativos não beneficentes que aderirem ao PROUNI deverão destinar 10% das vagas em bolsas integrais e, no caso das IES com fins lucrativos, em contrapartida, ficarão isenta dos seguintes impostos e contribuições: Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ); Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social (COFINS); e Contribuição para o Programa de Integração Social (PÌS). Segundo Almeida (2006, p. 84), a justificativa do MEC, em 2004, para a implantação do Programa era meramente econômica: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 177 (...) seria supostamente mais barato criar vagas nas instituições privadas que nas IES públicas. Uma outra justificativa também presente na exposição de motivos do PL, seria a existência de um grande número de vagas ociosas nas IES privadas, estimada em 37,5%. Uma terceira justificativa seria “separa o joio do trigo” entre as filantrópicas, as quais, para continuarem gozando do título de filantropia e, pois, da isenção da contribuição previdenciária patronal, teriam de atender aos novos requisitos. No plano da aparência desse fenômeno, o governo federal apresenta o PROUNI como uma proposta de democratização do acesso e regulamentação da contrapartida das IES filantrópicas ao governo, mas, na essência, parece atender aos interesses dos empresários do ensino, fração da “nova burguesia de serviços”40 e em plena sintonia com a orientação dos organismos internacional, especialmente, com o Banco Mundial. Os empresários da educação superior reduzem significativamente seus custos com isenção tributária, aumentando, assim, sua lucratividade. A tabela abaixo demonstra os gastos tributários por tipo de tributo de 2006 a 2013, disponibilizados nos relatórios da Receita Federal, intitulado “Demonstrativo dos Gastos Governamentais Indiretos de Natureza Tributária” que apresenta os valores não arrecadados em decorrência da renúncia fiscal. Somente a partir de 2006 que os gastos tributários com a educação superior passaram a fazer parte do relatório. Tabela 14 Gastos tributários com PROUNI - 2006 A 2013, por tipo de tributo (R$ mil) IRPJ PIS-PASEP CSLL COFINS TOTAL 2006 110.133.536 12.231.350 37.072.960 56.452.384 215.890.230 2007 157.349.448 24.655.476 52.966.699 113.794.503 348.766.126 2008 176.851.366 35.043.071 60.541.965 161.737.253 434.173.655 2009 197.828.356 42.983.008 91.404.602 198.383.113 530.599.079 2010 243.317.748 44.646.068 84.093.306 206.058.777 578.115.899 2011 226.045.170 46.971.297 74.738.598 216.790.600 564.545.664 2012 308.856.898 62.647.019 97.779.242 289.140.088 758.423.247 2013 335.512.671 68.053.745 106.218.041 314.094.209 823.878.666 40 % 281,61 Rodrigues (2007, p. 18) define a nova burguesia de serviços com base na análise de Boito Jr. (1999), e afirma que, com “a retirada do Estado brasileiro da ação direta nos chamados serviços sociais tem propiciado a emergência agressiva de uma nova burguesia de serviços. O referido autor entende que a nova burguesia de serviços, ligada principalmente a educação e à saúde, é consequência da política neoliberal que acabou por desmontar os serviços públicos nessas áreas. (...) As IES privadas apresentam-nos casos bem sucessivos do crescimento dessa nova burguesia de serviços”. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 178 Fonte: MF (2013), (2008) Conforme demonstra a tabela, houve um aumento de 281,61% entre 2006 – 2013 no montante que a União deixou de arrecadar com a isenção dos tributos e contribuições das IES privadas que aderiram o PROUNI. Segundo Carvalho (2009, p.13), os valores do IRPJ e CSLL têm peso no caso das IES lucrativas, o COFINS é o tributo com o custo mais expressivo, tanto as empresas educacionais quanto as instituições sem fins lucrativos são isentas. O PIS, que “[...] atinge indistintamente os três modelos institucionais era aquele que mobilizava a maior quantidade de previsão de receita, mas perdeu força de modo progressivo e tornou-se o de menor importância em termos relativos”. Para Almeida (2006), as IES com fins lucrativos são as mais beneficiadas com o PROUNI, já que ficam isentas “a partir da adesão ao programa, de praticamente todos os tributos que recolhiam. Além disso, a contrapartida em número de bolsas é muito baixa, elas permanecem com o mesmo status institucional e continuam não se submetendo a fiscalização e regulamentação governamental”. O governo federal, em sua propaganda justifica os Programas que compõem a parceria público-privada, como o PROUNI e o FIES, por também expandir a educação superior no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Porém, os dados demonstram a concentração dos recursos públicos e expansão das matrículas na região Sudeste. Tabela 15 Gastos tributários com o PROUNI – 2006 a 2013, por região geográfica (R$ mil) Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul 2006 23.858.368 37.404.952 23.708.002 96.891.969 34.026.939 2007 25.965.632 77.274.361 19.066.121 164.173.560 62.286.453 2008 22.289.499 98.434.481 52.677.680 170.335.694 90.436.301 2009 31.436.163 107.296.002 79.649.984 228.922.769 83.294.161 2010 52.258.465 106.873.959 124.350.605 215.689.761 78.943.109 2011 37.066.762 120.343.170 45.964.095 256.807.374 104.364.263 2012 36.538.329 186.631.911 41.288.389 371.697.804 122.266.813 2013 39.691.756 202.739.105 44.851.767 403.777.036 132.819.002 TOTAL 269.104.974 936.997.941 431.556.643 1.908.295.967 708.437.041 % 6,33 22,03 10,14 44,85 16,65 Fonte: MF (2013), (2008). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 179 Almeida (2006, p. 87) destaca que a Lei nº 11.096/2005 é bastante generosa com os estabelecimentos com ou sem fins lucrativos não beneficentes: aponta que, a partir de 2006, “amplia a relação de estudantes pagantes por bolsas concedidas e reduz o comprometimento da receita bruta com os benefícios”. Essas IES teriam a alternativa de substituir a relação de estudantes pagantes de 10,7 para cada bolsa integral disponível, e conceder uma bolsa integral para cada 22 estudantes pagantes, e bolsas parciais, que atinjam 8,5% da receita bruta. Percebemos a partir dos dados da tabela abaixo um crescimento do número de bolsas do PROUNI no governo Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Tabela 16 Bolsas ofertadas por ano e por região Bolsas ofertadas por ano Ano Integral Parcial Total 2005 71.905 40.370 112.275 2006 98.698 39.970 138.668 2007 97.631 66.223 163.854 2008 99.495 125.510 225.005 2009 153.126 94.517 247.643 2010 125.922 115.351 241.273 2011 129.672 124.926 254.598 2012 150.870 133.752 284.622 2013 164.379 87.995 252.374 % 124,78 Bolsas ofertadas por região (presenciais e a distância) Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Total 70.334 191.899 122.507 649.286 239.639 % 6% 15% 10% 51% 19% Fonte: MEC, 2013. http://prouniportal.mec.gov.br Seguindo a mesma lógica dos gastos tributários expressivos para o Sudeste, consequentemente o montante do número de bolsas do PROUNI também está concentrado nesta região, chegando a 51% do total de bolsas ofertadas. O número de bolsas do Norte, Nordeste e Centro-Oeste é claramente inferior ao Sul e ao Sudeste. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 180 Além das bolsas de estudo e do financiamento indireto às IES privada, a partir de 2006, o PROUNI passou a conceder bolsa permanência no valor de R$ 300,00 para alunos com bolsa integral e que estejam matriculados em cursos presenciais com, no mínimo, seis semestres de duração, com carga horária a igual ou superior a seis horas. “Se as bolsas convencionais são custeadas pelas IES em troca de desoneração fiscal, a bolsa permanência envolve pagamento pecuniário por meio de transferências orçamentárias do MEC aos beneficiários” (Carvalho, 2009, p. 15). O prefeito do município do Rio de Janeiro, por meio da Lei nº 5.266, de 5 de maio de 2011, institui o benefício do desconto de cinquenta por cento nas tarifas de transportes coletivos, por ônibus, tipo regular, operados por concessão do Poder Público Municipal, à estudantes matriculados nos cursos de graduação de instituições de educação superior no Município do Rio de Janeiro, desde que sejam alunos bolsistas do Programa Universidade para Todos – ProUni, do Ministério da Educação, ou alunos Cotistas - que se beneficiam das políticas afirmativas. A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro criou uma INDICAÇÃO LEGISLATIVA nº 124/2011, de 09 de novembro de 2011, que institui o mesmo desconto e perfil de estudantes, para ônibus intermunicipal e inseridos em IES no Estado do Rio de Janeiro, mas que ainda não está em vigor. A partir do Decreto41 Municipal 38.280 de 29 de Janeiro de 2014, o cartão do benefício do Passe Livre Universitário substitui o cartão Bilhete Único Universitário, e os bolsistas do PROUNI terão passe livre no município do Rio de Janeiro. Esse decreto institui o “PASSE LIVRE UNIVERSITÁRIO e amplia benefícios aos estudantes da Rede Pública de Ensino, alterando o Decreto nº 32.842, de 1º de outubro de 2010, que institui o Bilhete Único Carioca. Art.11. Para atendimento ao disposto no art. 401, inciso II da Lei Orgânica e no art. 12 da Lei Municipal n° 3.167/00, os alunos da rede pública de ensino fundamental, ensino médio, Universitários beneficiados pelos programas do Governo Federal de cotas ou Programa Universidade para Todos e alunos universitários com renda familiar per capta de até 01 (um) salário mínimo, receberão, a cada ano letivo, cartões eletrônicos contendo créditos de viagens de Bilhete Único” (grifos nossos). Nesse sentido, são concedidos vários incentivo aos estudantes inseridos no PROUNI, e não nas IES públicas – os alunos das IFES e IEES que não se incluem no campo das cotas não 41 http://www.riocard.com/passelivre/arquivos/DECRETO%20N%C2%BA%2038.280%20DE%2029%20DE%2 0JANEIRO%20DE%202014.pdf (acesso em 16 de junho de 2014). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 181 gozam do mesmo benefício. O Ministério da Educação, por meio da Portaria-MEC nº 381, de 29 de março de 2010, institui o Módulo Internacional no âmbito do PROUNI e “dispõe sobre o procedimento de adesão de instituições educacionais estrangeiras ao Programa”. Essas instituições poderiam receber os estudantes brasileiros contemplados pelo PROUNI, mas não receberiam benefícios que dispõem as IES brasileiras. Em contrapartida, as instituições educacionais do Brasil poderão receber estudantes estrangeiros das instituições que aderiram ao Módulo Internacional do PROUNI42. O desempenho acadêmico do estudante beneficiado será avaliado exclusivamente pela instituição estrangeira, que decidirá, a cada período letivo, sobre a renovação da bolsa de estudos e a permanência do brasileiro na instituição. Lembre-se que está em curso a internacionalização da educação superior: (...) Internacionalizar, seja na vertente que for, tem um sentido muito específico no Brasil hoje: significa ajustar as IES, assim como o que nelas se produz, às regras, valores e diretrizes difundidas no espaço da acumulação de capital em escala mundial, nada tendo a ver com uma “inclusão” de todos e de tudo na sua esfera de realização. Daí o sentido ideológico deturpador oculto na sua autopromoção como “internacional”. Essa difusão não é aleatória e a menção à língua inglesa como vernáculo da ciência é mais do que esclarecedora: trata-se da “ciência” produzida para atender aos interesses de classe hegemônicos do capitalismo global. Um dos recursos usados pelas elites mundiais para “estimular” os países periféricos a se adequar a tais regras, valores e diretrizes, é o de pressionar por mudanças na organização de seus sistemas de ensino e pesquisa (Minto, 2011, p. 264 e 265). Reforçando essa lógica, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES – também será responsável pelo custeio de bolsas de estudos, passagens aéreas, auxílio instalação, seguro saúde e cursos de línguas dos estudantes brasileiros. Segundo a notícia apresentada no site da Universia: “atualmente, já existe o Programa Prouni Salamanca de Bolsas de Graduação Plena, que concede auxílios para que estudantes cursem a universidade na Espanha”43. Está tramitando, no Senado, o Projeto de Lei nº 324, de 2011, de autoria do senador Marcelo Crivella, que inclui os estudantes estrangeiros entre os beneficiários do PROUNI, dá prioridade aos de nacionalidade de países africanos e latino-americanos. O PL foi aprovado pela CRE - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, e está aguardando aprovação 42 As bolsas destinadas aos estudantes estrangeiros pelas IES brasileiras não serão considerados no cálculo dos benefícios fiscais. 43 Fonte: http://noticias.universia.com.br/destaque/noticia/2010/03/30/644705/prouni-oferecera-vagas-eminstituies-estrangeiras.html Acesso em 13 de agosto de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 182 da Comissão de Educação. O governo cria novas modalidades de internacionalização, por meio da operação de concretização do público não-estatal. O estímulo ao empresariamento, privatização e mercantilização da educação superior brasileira foi aprofundado no governo Lula (2003 – 2010), com a importante estratégia de diluição das fronteiras entre público e privado. O processo da contrarreforma da Educação Superior em curso no Brasil que vem se consolidando por meio de leis, decretos, medidas provisórias e portarias, implementados pelo governo federal, tomando como um de seus eixos a expansão do ensino superior por intermédio do PROUNI. Considerações Finais O crescimento do setor privado na educação superior brasileira corresponde, historicamente, à participação do Estado burguês que compartilha as demandas apresentadas pelos empresários da educação superior por meio de suas entidades representativas, sujeitos coletivos do capital, legitimadas e defendidas pelos governos brasileiros, que incorporam as políticas educacionais do Banco Mundial à educação superior brasileira em plena consonância com o projeto neoliberal. Ao analisar o PROUNI, percebemos o movimento da mercadorização, articulando as demandas dos empresários da educação superior e as políticas materializadas na legislação federal, tanto do Legislativo (Senado e Câmara dos Deputados) com os projetos de lei e as propostas de emendas, quanto do Executivo, por meio de leis, decretos, medidas provisórias e portarias. Constatamos que as ações do governo federal vêm respondendo às demandas do setor privatista de várias formas de financiamento criadas e/ou alteradas contando com a participação do fundo público. O PROUNI, em resposta as demandas do setor privado, também obteve algumas mudanças desde o início do programa. Esse programa é apresentado pelo governo federal como uma proposta de democratização do acesso da classe trabalhadora, porém atende aos interesses dos empresários do ensino – que aumentam sua lucratividade com a redução de seus custos com isenção tributária. Os dados dos gastos tributários apresentados no “Demonstrativo dos Gastos Governamentais Indiretos de Natureza Tributária” (2006 a 2013) disponibilizados nos relatórios da Receita Federal expõem os valores não arrecadados em decorrência da renúncia fiscal. Constatamos que houve um aumento de 281,61% entre 2006 – ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 183 2013 no montante que a União deixou de arrecadar com a isenção dos tributos e contribuições das IES privadas que aderiram o PROUNI. Procuramos contribuir com as análises e as ações políticas dos estudantes e dos trabalhadores da educação comprometidos com a luta em defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, buscando dar maior visilibilidade ao processo de expansão do acesso à Educação Superior em curso no Brasil. Continuaremos na luta pela defensa do recurso público exclusivamente para as instituições públicas. Referências bibliográficas: ALMEIDA, Sergio Campos de. O AVANÇO DA PRIVATIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA: O ProUni como uma nova estrategia para a transferencia de recursos públicos para o setor privado. Dissertação apresentada ao Programa de Pósgraduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2006; AUDITORIA CIDADà DA DÍVIDA. A dívida pública consumiu 45% dos recursos da união em 2010, subtraindo direitos sociais. Informativo: 2011. Disponível em http://www.auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2012/08/Informativo-agosto-2011.pdf Acesso em 14 de julo de 2014; AVILA, S. F. O; LÉDA, D. B; VALE, A. A. Configurações do setor privado-mercantil na expansão da educação superior privada: notas para a análise do trabalho docente. Mancebo, Deise e Silva Júnior, João dos Reis (org) – Trabalho docente e expansão da educação superior brasileira. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 185 EIXO 2 – ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E ACADÊMICA NA EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR A ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E ACADÊMICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES Antonia Vanessa Freitas Silveira [email protected] UFPA Michele Borges de Souza [email protected] UFPA Andrea Cristina Cunha Solimões [email protected] UFPA Eixo 2 - Organização institucional e acadêmica na expansão da educação superior RESUMO Este texto analisa a conjuntura na qual se desenvolveu a atual organização institucional e acadêmica no Brasil e algumas de suas repercussões para a formação de professores no Brasil. Analisa, ainda, no período pós-Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional – LDB/96 a relação entre o processo de expansão da educação superior e a adoção de políticas públicas de formação de professores. Questionamos qual a relação entre a expansão da educação superior e a formação de professores. A atual organização institucional e acadêmica no Brasil A organização institucional e acadêmica das Instituições de Ensino Superior resulta de um processo de (re)organização do Estado, a partir das relações de produção estabelecidas em cada momento histórico e de acordo com o estágio de desenvolvimento em que se encontra a sociedade. Desse modo, para responder às demandas a favor dos interesses da classe dominante, é necessário que o Estado desenvolva ações de modo que se mantenha o controle por meio de educação, a partir do desenvolvimento de políticas voltadas à área e, neste caso específico, às políticas de formação de professores. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 186 No Brasil, durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso – FHC44, as mudanças na educação brasileira apresentam desdobramentos que podem ser notados até os dias atuais, principalmente a partir da reforma do Estado brasileiro, que teve como referência os indicadores das instituições internacionais como o Banco Mundial – BM e a Organização das Nações Unidas para a educação, à ciência e a cultura (UNESCO). Esses organismos, visando garantir a estabilidade econômica dos países em desenvolvimento (ALTMANN, 2002), passam a fixar alguns indicadores em serviços básicos prestados à sociedade como a saúde e a educação, a fim de legitimar, em última instância a redefinição do papel do Estado. Pautado pelos ideais internacionais é criado, no Brasil, o Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), dirigido por Luís Carlos Bresser Pereira. O Ministério nasce para realizar a Reforma Administrativa do Estado, com o argumento de que uma das causas da crise que então o país vivia (inflação alta, desemprego, crescimento pequeno do Produto Interno Bruto – PIB) era o fato do Estado estar “inchado”, isso é, com muito funcionários, desempenhando funções que não lhe competiam, como despesas com serviços à população. Para dar apoio a essa reforma foi elaborado o documento denominado Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRE), documento que apresenta novas orientações para a nova forma de gerenciamento (neoliberal) nos diferentes setores da máquina pública, inclusive no educacional. Segundo Mancebo (2010) foi nesse período que se efetivaram, no Brasil, tanto a “abertura democrática” quanto os ajustes da economia no contexto da mundialização do capital. Sobre essa reconfiguração, Mancebo ressalta que: A expansão do sistema de educação superior para atender e “calar” a elevada demanda social por esse nível de ensino, deu-se, no período, como aval do então Conselho Federal de Educação (CFE), pela multiplicação de estabelecimentos isolados, federações de escolas e faculdades mantidas pelas iniciativas privadas, confessional ou comunitária, sem qualquer pretensão ou mesmo qualificação para pesquisa (MANCEBO, 2010, p.40). Essas mudanças desenvolvidas a partir da reforma do Estado brasileiro encontra-se em sintonia com a legislação educacional vigente. Foi com a Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional – LDB), que se pode afirmar, que houve uma espécie de “início” legal da expansão da educação superior, o que tem sido uma tendência mundial. 44 FHC foi presidente do Brasil por dois mandatos seguidos, de 1995 a 1998 e 1999 a 2002. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 187 Durante o governo FHC houve uma expansão significativa do setor privado perante o setor público, evidenciando assim o caráter privatista do governo em questão. A partir do governo FHC foram operadas mudanças que permitiram a criação de novas instituições, dotadas de autonomia acadêmica, favorecidas que foram pela diminuição dos ritos burocráticos da política governamental do período. Em razão da demanda represada por vagas na universidade, o resultado não poderia ser outro. O número de instituições privadas cresceu, e o de estudantes universitários matriculados no Brasil, em poucos anos dobrou [...]. (BAUER, 2006.p. 455). Por meio do decreto 2.207 de 5 de abril de 1997, alterado pelo Decreto 2.306/1997, seguido do Decreto 3.860 de 9 de julho de 2001, é instituída, de forma legal, a diversificação das Instituições de Ensino Superior, que passam a ter uma nova configuração. O quadro da educação superior no Brasil passa a ser composto de: Universidades; Centros Universitários; Faculdades, Institutos ou Escolas Superiores. Para cada uma das instituições, agora definidas de acordo com a organização acadêmica45, há exigências diferenciadas e de acordo com os objetivos de cada um dos novos formatos institucionais. Quanto às universidades, a LDB/96 em seu artigo 52 aponta que: [...]são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por: I - produção intelectual institucionalizada mediante o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural, quanto regional e nacional; II - um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado; III - um terço do corpo docente em regime de tempo integral. Parágrafo único. É facultada a criação de universidades especializadas por campo do saber. (BRASIL, 1996.) Os Centros Universitários (responsáveis pelo ensino e extensão) e as Faculdades (responsáveis apenas pelo ensino) não têm a mesma exigência das universidades, principalmente estas últimas. Um grande exemplo que pode seu utilizado para diferenciar Universidades e faculdades, é a questão da titulação dos professores, já que nas faculdades o docente não necessita de formação para além da graduação para ministrar aula. Essa diversificação facilitou a implantação de Faculdades privadas, pois as exigências são muito menores do que aquelas para a criação de Universidades ou mesmo Centros Universitários. Essa talvez esta seja uma das razões para que o aumento das instituições privadas se desse por esse tipo de organização acadêmica. 45 A organização acadêmica refere-se ao que está posto no Decreto 5.773 de 09 de maio de 2005 artigo 12, agrupadas em Universidades, Centros Universitários e Faculdades. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 188 Sobre o aumento do número das faculdades no Brasil, Sguissardi (2008), ressalta que existe um fenômeno relativamente recente no modelo de expansão da educação superior no Brasil, que seria a sua acelerada mercadorização, passando a educação, a ser tratada como uma mercadoria, que pode ser vendida e comprada. Reafirmando essa abertura comercial da educação superior já mencionada por Sguissardi, Mancebo (2010) ressalta que: A educação pode, com vários graus de abrangência e especialização, ser ministrada em instituições públicas ou privadas. As primeiras, mantidas pelo poder público, são federais, estaduais ou municipais, e as segundas, privadas, particulares, comunitárias, confessionais ou filantrópicas (MANCEBO, 2010 p.41). É desta forma que novas formas de organização acadêmica de instituições de ensino superior começam a se estruturar para suprir a demanda apresentada por este nível de ensino. Também surgem mudanças na questão administrativa e pedagógica das instituições e os alunos passam a ser vistos pela grande maioria das IES 46 como clientes, e a instituição como prestadora de serviço. Na sociedade capitalista em que vivemos, a busca pelo melhor status social vê na educação o caminho mais certo e seguro, para que se alcance o objetivo de uma melhor forma de vida. E é neste contexto que os novos formatos de instituições de educação superior se enquadram e ganham força, já que as universidades públicas não tem capacidade de oferecer vagas a todos, pela falta de políticas públicas que estimulem essa expansão com as devidas condições. É importante destacar que essa desproporção de instituições quanto à categoria administrativa (que diferencia as instituições entre públicas e privadas) e, consequentemente, reflete no número de alunos que a educação superior passa a atender, acontece a partir da LDB/96, e tem o governo como principal fator de apoio. A proposta do governo para a educação, segundo CUNHA (2003), tinha como característica mais marcante o destaque para o papel econômico da educação, como “base do novo estilo de desenvolvimento”, cujo dinamismo e sustentação provêm de fora dela mesma – do progresso científico e tecnológico. Organização institucional e acadêmica e a formação de professores 46 É importante destacar que a grande maioria das instituições de educação superior no Brasil são instituições privadas e por isso aponto essa relação, prestador de serviço/cliente como predominante. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 189 A partir desta redefinição e ampliação da educação superior, nosso país passa a aumentar significativamente a oferta neste nível de ensino. Neste tópico buscamos apresentar os dados referentes à expansão da educação superior no Brasil a partir dos documentos disponibilizados no site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, responsável por pesquisas, estudos e avaliações sobre o sistema educacional brasileiro. Por meio dessa coleta de dados, elaboramos gráficos que possibilitam a análise do quadro de formação inicial de professores no Brasil. Foram elaborados gráficos que tratam da expansão das organizações acadêmicas assim como a quantidade de matrículas nos cursos de formação docente. O período analisado está situado entre os anos de 2001 a 2012, e busca um quadro geral de como está se dando esta discussão na prática, quais os “principais protagonistas” deste momento educacional em que vivemos e quais os possíveis rumos podem ser traçados. A educação, a partir do processo de globalização é entendida como um bem comum, que deve ser oferecida a todos, equitativamente. No Brasil a partir da Constituição Federal de 1988, em seu artigo 205 essa ideia é reafirmada assim como passa a ser entendida também como dever do Estado e da família. A partir da LDB/96, mais especificamente em seu artigo 62, a formação de professores para a atuação na educação básica se dá preferencialmente a partir da educação superior, em cursos de licenciatura, nas universidades ou em institutos superiores de educação. Como já analisado anteriormente, o decreto 2.306/97 diversifica as IES no Brasil, possibilitando também a expansão destas instituições para além do setor público. Com relação às instituições de educação superior no Brasil e a formação de professores, o Gráfico 01 permite que analisemos no período de 2001 a 2012 a partir de sua organização acadêmica. É possível destacar que o maior percentual de crescimento é na universidade, com 62,62% das instituições, seguida das faculdades, com 26,33% instituições, e os centros universitários com 9,02% e 2,03% das Instituições Federais e Centros Federais de Ensino Tecnológico, dentro do total das instituições. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 190 Gráfico 1 – Curso de formação de professores presencial por organização acadêmica, Brasil 20012012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Esse crescimento das universidades, como campo de formação de professores, pode estar ancorado nas iniciativas governamentais dos últimos anos que, de acordo com o documento “Análise sobre a Expansão das Universidades Federais 2003 a 2012" do Ministério da Educação- MEC (2012), afirma: : Em 2001, para dar cumprimento ao disposto na Constituição, foi elaborado o Plano Nacional de Educação – PNE (2001- 2010), fixando metas que exigiam um aumento considerável dos investimentos nessa área, além de metas que buscavam a ampliação do número de estudantes atendidos em todos os níveis da educação superior. Nesse contexto foram estabelecidos, nos últimos 10 anos, os programas de expansão do ensino superior federal, cuja primeira fase, denominada de Expansão I, compreendeu o período de 2003 a 2007 e teve como principal meta interiorizar o ensino superior público federal, o qual contava até o ano de 2002 com 45 universidades federais e 148 câmpus/unidades. Ao definir como um dos seus objetivos prover as universidades das condições necessárias para ampliação do acesso e permanência na educação superior, o Reuni congregou esforços para a consolidação de uma política nacional de expansão da educação superior pública, em atendimento ao disposto pelo Plano Nacional de Educação (Lei nº 10.172/2001), que estabeleceu o provimento da oferta da educação superior para pelo menos 30% dos jovens na faixa etária de 18 a 24 anos, até o final da década. (BRASIL. 2012. p. 09) Neste processo de expansão, surge o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) por meio do Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007, com o objetivo de ampliar o acesso e a permanência na educação superior. Este programa tem como objetivo dar condições físicas, pedagógicas e acadêmicas de expansão às ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 191 universidades federais. O REUNI tem ainda a ampliação de vagas nos cursos noturnos e o combate à evasão, como metas. [...] somada ao segundo momento, por meio do Reuni, trouxe um expressivo crescimento não somente das universidades federais, mas também de campus no interior do país. De 2003 a 2010, houve um salto de 45 para 59 universidades federais, o que representa a ampliação de 31%; e de 148 campus para 274 campus/unidades, crescimento de 85%. A interiorização também proporcionou uma expansão no país quando se elevou o número de municípios atendidos por universidades federais de 114 para 272, com um crescimento de 138%%. (BRASIL. 2012, p.11) Evolução dos cursos de formação de professores na modalidade presencial No que tange à formação de professores nas universidades, o Gráfico 02, aponta que a formação de professores nestas instituições, no período analisado, teve seu auge entre os anos de 2009 e 2010, logo, podemos inferir que o fator responsável por tal crescimento é a implantação do Plano Nacional de Formação de Professores – PARFOR, também implementado nesse período. Como política, o PARFOR tem como objetivo fomentar a oferta de educação superior, gratuita e de qualidade para os professores que estão em exercício na rede pública de educação básica, para que estes profissionais possam ter a formação exigida a partir da LDB/96. Ainda sobre a formação de professores nas universidades entre os anos de 2001 a 2012, podemos notar que anteriormente ao ano de 2006 a formação de professores se encontrava em um decréscimo constante e, posteriormente ao ano de 2009, ano de seu auge, o número de cursos de formação de professores nas universidades volta a cair. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 192 Gráfico 2 – Evolução dos cursos de formação presencial por Organização Acadêmica (Universidade), Brasil 2001 – 2012 Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Com relação à expansão dos cursos de formação de professores na organização acadêmica dos centros universitários pode-se notar que os cursos de formação de professores nos centros universitários possuem uma evolução irregular e que no período atual encontra-se abaixo de zero. O auge da expansão dos cursos de formação no período analisado encontra-se entre os anos de 2003 a 2004 e o período com menor evolução nos cursos de formação de professores nos centros universitários foi no período de 2010 a 2011, conforme indica o Gráfico 3. Gráfico 3 – Evolução dos cursos de formação presencial por Organização Acadêmica (Centros universitário), Brasil 2001 – 2012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 193 Quanto à evolução dos cursos de formação de professores nas faculdades, pode-se perceber que o pico encontra-se no período de 2010 a 2011 e o decréscimo mais visível no período de 2009 a 2010. Se compararmos as universidades e faculdades neste mesmo período, 2009 a 2010, notaremos que o crescimento mais acentuado das universidades se dá ao mesmo tempo que a diminuição do número de formação de professores nas faculdades. Um dos fatores que podem ter contribuído com a instabilidade entre tais organizações acadêmicas pode também ter se dado por ocasião, como já dito anteriormente, da implantação do PARFOR. É possível que neste período a formação de professores pode ter se concentrado na rede pública e dentro das universidades e consequentemente diminuído nas faculdades, principais representantes da rede privada. Gráfico 4 – Evolução dos cursos de formação presencial por Organização Acadêmica (Faculdades), Brasil 2001 – 2012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Com a implantação da lei 11.892 de 29 de Dezembro de 2008 surge uma nova organização acadêmica também responsável pela formação de professores, os Institutos Federais de Educação (IFE). Em seu artigo 2º, a Lei 11.892/2008 define que os institutos federais: [...] são instituições de educação superior, básica e profissional, pluricurriculares e multicampi, especializados na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, com base na conjugação de conhecimentos técnicos e tecnológicos com as suas práticas pedagógicas, nos termos desta Lei (BRASIL, 2008). Os Institutos Federais, criados a partir da rede tecnológica de ensino no Brasil, mesmo anteriormente à criação dos IFE, já possuíam uma trajetória importante para o Brasil no que ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 194 tange à educação profissional, com a publicação da Lei, somam-se às atribuições desta instituição a formação de professores. No que se refere à oferta, a lei 11.892/2008 afirma que, entre outros objetivos, as instituições de ensino superior devem oferecer: b) cursos de licenciatura, bem como programas especiais de formação pedagógica, com vistas na formação de professores para a educação básica, sobretudo nas áreas de ciências e matemática, e para a educação profissional (BRASIL, 2008). Em relação aos IFE e CEFET e a formação de professores, a evolução principalmente entre os anos de 2002 e 2009 foi praticamente linear, dando um salto considerável no período de 2009 a 2010, ano de implementação dos IFE. É importante ressaltar que esta instituição não possui uma trajetória na formação de professores, logo, o acompanhamento e avaliação dos cursos de formação de professores destas instituições torna-se imprescindível. Evolução de matrícula nas licenciaturas presencial A compreensão de como vem se dando a evolução das matrículas nos cursos de formação, em um contexto de necessidade de captação de mais professores para o Brasil, também se torna um fator de importante análise. Com relação às matrículas nas Universidades, a formação de professores tem seu ápice também no período de 2009 – 2010 e, em seguida, no período de 2011 – 2012, um decréscimo bastante considerável de 5,21% negativos, a questão da docência não ser uma carreira atrativa, pode ser um dos fatores que tem contribuído para a queda na taxa de matrícula que se observa no Gráfico 5. Gráfico 5 – Evolução das matrículas curso de formação de professores presencial por Organização acadêmica (Universidades), Brasil 2001 a 2012. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 195 Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Com relação às matrículas nos centros universitários, é possível observar que a matrícula nos cursos de formação de professores tem um decréscimo acentuado no ano de 2007 e possui como seu maior índice no período de 2004-2005. Gráfico 6 – Evolução das matrículas no curso de formação de professores presencial por Organização acadêmica (Centro universitário), Brasil 2001 a 2012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Com relação às matrículas nas faculdades, nota-se que o ano de 2002 apresenta o menor número de matrículas, e a maior concentração destas está no ano de 2008. Não possuindo um crescimento muito significativo no período analisado. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 196 Gráfico 7 – Evolução das matrículas no curso de formação de professores presencial por Organização acadêmica (Faculdades), Brasil 2001 a 2012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Em relação aos IFE e CEFETs, as matrículas nos cursos de formação de professores começam a crescer principalmente a partir da possibilidade de tais instituições formarem professores. Mesmo sem a rede profissional de educação no Brasil possuir anteriormente a criação dos institutos, uma experiência na formação de professores. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 197 Gráfico 8 – Evolução das matrículas no curso de formação de professores presencial por Organização acadêmica (IF e CEFET), Brasil 2001 a 2012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Evolução das licenciaturas presencial por categoria administrativa, público e privado Sobre a categoria administrativa, podemos destacar o atual quadro de desenvolvimento do setor privado, visto que parte das políticas nacionais de formação de professores, como o Programa Universidade para Todos – PROUNI e o Programa de Financiamento Estudantil – FIES, assim como a abertura comercial da educação reforçam ainda mais a ideia de educação como mercadoria, buscando terceirizar cada vez mais o ensino. No período de 2001 a 2012 podemos notar que há uma instabilidade durante todo o período. Com a menor diferença quanto aos cursos de formação de professores entre os anos de 2007 e 2008, e com maior diferença no período de 2009 e 2010, ressaltamos novamente o PARFOR como fator que pode ter contribuído significativamente para o crescimento da rede pública no ano de 2010. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 198 Gráfico 5 Evolução dos cursos de Formação presencial por categoria Administrativa, Brasil 2001 – 2012 Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Em relação à evolução da categoria administrativa pública no Brasil, o período em questão apresenta uma evolução praticamente linear na formação de professores. Tendo um crescimento significativo apenas entre os anos de 2009 e 2010, ano de implantação do PARFOR, e em seguida, a segunda média mais baixa na formação de docentes no período analisado. Ressaltamos novamente a questão da profissão docente não vir apresentando atrativos financeiros, e muitas vezes nem sociais. Além da remuneração inadequada, o professor muitas vezes não possui nem um local de trabalho adequado para atuar, havendo um grande número de unidades com estrutura física e pedagógica precárias, além de tantos outros fatores que aprofundam o quadro de e desvalorização docente. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 199 Gráfico 10 – Evolução das matriculas de formação de professores presencial por categoria Administrativa (Rede pública), Brasil 2001 a 2012. Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado Quanto à rede privada de educação superior no Brasil, nota-se uma instabilidade no número de matrículas, apresentando grandes diferenças a partir do ano de 2006, e tendo o seu menor percentual no ano de 2007 e auge no ano de 2008. É importante ressaltar que no último ano de análise da pesquisa, 2012, o número na taxa de matrículas encontra-se negativo. Gráfico 11 – Evolução das matrículas de formação de professores presencial por categoria Administrativa (Rede Privada), Brasil 2001 a 2012 Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Adaptado ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 200 Com a análise realizada a partir dos dados disponíveis no site do INEP, podemos constatar que a formação inicial de professores no Brasil, vem apresentando um crescimento tímido com relação às politicas de acesso vigentes. Levando-se em consideração a abertura legal a partir do decreto 3.860 que expande a possibilidade de instituições para a atuação na educação superior e consequentemente na formação de professores assim como as políticas de formação de professores como o PARFOR, a Universidade Aberta do Brasil – UAB, as relacionadas à valorização como o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID, podemos constatar que a mudança tão necessária ao atual quadro de formação docente está para além do acesso. A permanência dos novos professores nos cursos de formação assim como a possibilidade de uma carreira atrativa financeiramente e boas condições de trabalho são essenciais. Considerações finais Com relação aos resultados quantitativos dessas politicas, a coleta de dados realizada a partir das informações disponíveis no site do INEP pode-se constatar que no período de 2001 a 2012 a instituição com maior representatividade com relação à formação de professores foi a universidade. Mesmo com o crescimento acelerado do setor privado em relação ao público, a formação de professores ainda se dá em grande parte nas universidades. Inferimos assim que essa instituição é a categoria administrativa pública como maior representatividade também, visto que as universidades são as maiores representantes do setor público em nosso país. Dentre as instituições de ensino superior podemos destacar ainda os Institutos Federais e Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET) no que tange a expansão da formação de professores principalmente a partir do ano de 2008. Visto que esses apresentam o crescimento de 7,08 % em matrícula na média dos cinco últimos. Levando-se em consideração o fato dos IFE não possuírem tradição da formação de professores e neste espaço de tempo apresentarem esse salto na matrícula, tornando-se um dos maiores representantes da formação de professores no Brasil nos últimos anos também deve ser um fator a ser analisado mais de perto por parte dos nossos governantes. É importante destacar também o atual quadro das faculdades no que se refere à formação de professores, as quais diminuíram consideravelmente seu campo de atuação sobre ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 201 a formação de professores. Encontrando-se no ano final da análise desta pesquisa com um dos seus menores valores no período analisado. É importante destacar que, mesmo com a diminuição da atuação das faculdades, ao somarmos tanto o número de matrículas quanto de cursos das faculdades e centros universitários, principais representantes da rede privada, iremos constatar que a participação desta categoria administrativa ainda é grande com relação à expansão da formação de professores no Brasil. Ainda sobre a categoria administrativa, no que se refere ao período de 2001 a 2012, podemos notar que há uma instabilidade entre os setores público e privado. Nota-se uma oscilação permanente, que se pode visualizar especialmente entre os anos de 2009 e 2010, quando o setor público aumenta e o privado diminui consideravelmente, relacionamos a isso a implantação do PARFOR no ano de 2009. Há a necessidade de que, juntamente com a ampliação deste nível de ensino e qualificação do mesmo, se amplie também as políticas de permanência em todas as áreas da educação superior, mas especialmente. No caso das licenciaturas, destaca-se a necessidade da boa formação dos alunos nas mesmas, diante da carência de profissionais para atuarem na área, e a importância da própria profissão que tanto se reforça no campo da retórica pelo Estado. Formar professores exige compromisso com o futuro da sociedade, logo, tais cursos não devem se dar de qualquer maneira, ou possuírem uma legalização oficial como único (ou mais importante) requisito para funcionamento. O planejamento curricular, estrutural e acadêmico deve ser levado em consideração, assim como a avaliação dos cursos e valorização dos futuros profissionais. Principalmente no que se refere à formação de professores e a valorização destes profissionais, que atualmente, passa por sérios problemas dos mais variados fins em nosso país, seja na formação inicial, continuada, no que se refere ao salário e às condições de trabalho. Também é de extrema importância que todos os requisitos citados neste trabalho para uma boa formação e principalmente aquelas na área das licenciaturas estejam em consonância com políticas de valorização destes profissionais. Isso implica a existência de Planos de Carreira e Salário, políticas de formação inicial, além de formação continuada, avaliação docente e boas condições de trabalho. Essas são algumas das políticas que podem contribuir tanto para que estes profissionais se mantenham na área, quanto para a verdadeira formação ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 202 de cidadãos capazes de contribuir com sua própria formação e de seus semelhantes como para a sociedade. REFERÊNCIAS ALTMANN, Helena. Influências do Banco Mundial no Projeto Educacional Brasileiro. Educação e Pesquisa, São Paulo. Vol.28, nº. 01, p.77-89, jan./Jun.2002. 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Modelo de expansão da educação superior no Brasil: Predomínio privado/mercantil e desafios para a regulação e a formulação universitária Educ. Soc., Campinas, vol. 29, n. 105, p. 991-1022, set./dez. 2008. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 203 AS POLÍTICAS DE EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR COMO INDUTORAS DE NOVAS “ARQUITETURAS ACADÊMICAS” NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS FEDERAIS. 47 Luciene Medeiros [email protected] Universidade Federal do Pará Eixo 2 RESUMO Este trabalho se insere no campo da educação. Tem como objetivo discutir as políticas de expansão da educação superior, nas universidades federais brasileiras, tendo como referência a reforma do aparelho administrativo do Estado, em 1995, que engendrou uma série de marcos regulatórios: Leis, Decretos, Portarias, Medidas Provisórias, e Regulações dentre as quais se destaca o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI, criado pelo Decreto 6.096/2007, que se constituiu como regulação da política de expansão da educação superior e como indutor de mudanças estruturais com novos formatos institucionais e acadêmicos nas instituições de ensino superior, gerando novas arquiteturas acadêmicas, sobretudo, nas universidades públicas federais, no sentido de ajustá-las à racionalidade pragmática, de caráter utilitário. Palavras-chave: políticas de expansão da educação superior; REUNI; arquiteturas acadêmicas. Este trabalho tem como objetivo discutir as políticas de expansão da educação superior, no Brasil, tendo como referência a reforma do aparelho administrativo do Estado, em 1995, que engendrou uma série de marcos regulatórios: Leis, Decretos, Portarias, Medidas Provisórias, além de novas Regulações48. Entre as mais recentes destaca-se o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI, criado pelo Decreto 6.096/2007, cujos desdobramentos tem sido indutores de novas arquiteturas acadêmicas, sobretudo, nas universidades públicas federais. 48 A regulação é entendida como o processo de produção de regras e de orientação de condutas. É um conceito importado das ciências biológicas para as sociais constituindo-se na maneira pela qual a relação social se reproduz, apesar da conflituosidade e contradição que encerra. Maroy (2006) e Barroso (2005) utilizam o conceito regulação para descrever dois tipos de fenômenos diferenciados, mas interdependentes, concebendo-os como os modos pelos quais são produzidas e aplicadas as regras que orientam as ações dos atores no seu campo de atuação e os modos como esses mesmos atores se apropriam delas e as transformam. No primeiro caso, é uma regulação institucional, normativa e de controle. No segundo caso, na opinião de Maroy (2006), é uma regulação situacional, ativa e autônoma que é vista como um processo ativo de produção de “regras de jogo”. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 204 Segundo Segenreich, Morosini e Franco (2012), a categoria arquitetura acadêmica “subentende mudanças estruturais ou de processo; explicita formatos de Educação Superior institucionalizados; encerra a noção de projeto que antecipa o futuro em que o resultado pode ser alterado” (p.76).Podem ainda ser compreendidas como “modalidades organizacionais associativas de orientação formativo-científica, concebidas e implantadas como potencialmente indutoras de qualidade da educação superior, tendo a pressuposição de um processo de aferição de resultados implícito e ou explicito” (DAL PAI FRANCO; RIBEIRO, 2012, p.5) Buscando compreender e desvelar esses novos formatos das organizações institucionais e acadêmicas no contexto das políticas de expansão da educação superior, a rede UNIVERSITAS Br desenvolve o projeto de pesquisa Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil que se subdivide em sete (07) subprojetos, entre os quais o subprojeto 02 que investiga a organização acadêmico-institucional e expansão da educação superior no Brasil, com especial ênfase nas políticas de formação de professores e tem como objetivos específicos analisar a configuração das políticas de formação docente nas diferentes modalidades de ensino e arquiteturas acadêmicas e suas relações com as políticas de expansão. Para tanto, o subprojeto 02, tem centralizado seus estudos na formação docente e nas arquiteturas acadêmicas e suas relações com as políticas de expansão da educação superior. Nesse sentido, faz-se necessário avançar na discussão sobre a ressignificação das arquiteturas acadêmicas nas universidades públicas federais, sobretudo, a partir do REUNI, que guarda estreitas relações com o Processo de Bolonha que se ancora na declaração de Sorbone, de 1988, que “reforça a pretensão de harmonizar a ‘arquitetura’ do sistema europeu do Ensino Superior, marcando o processo de Bolonha, mesmo quando questionado” (SEGENREICH; MOROSINI; FRANCO, 2012, p.79) e com a Universidade Nova49, Proposta defendida, em 2006, pelo então reitor da Universidade Federal da Bahia, professor Naomar de Almeida Filho, que prevê uma radical reestruturação na arquitetura curricular dos cursos de graduação que deveria ter como objetivo o fim da profissionalização precoce. Essas mudanças operariam, segundo a proposta da Universidade Nova, 49 Universidade Nova - Proposta defendida, em 2006, pelo então reitor da Universidade Federal da Bahia, professor Naomar de Almeida Filho, prevê uma radical reestruturação na arquitetura curricular dos cursos de graduação que deveria ter como objetivo o fim da profissionalização precoce. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 205 [...] uma transformação radical da arquitetura acadêmica da universidade pública brasileira, visando a superar os desafios. A principal alteração na estrutura curricular da universidade é a implantação de Bacharelados Interdisciplinares (BI), propiciando formação universitária geral, como uma pré-graduação que antecederá a formação profissional de graduação e a formação científica ou artística da pósgraduação. (Grifos nossos), (UFBA, 1996) Esses movimentos defendem uma concepção de educação superior voltada para os interesses do capital, em que a universidade é pautada por uma gestão gerencialista, afinada e submissa aos ditames do mercado e assumindo cada vez mais um caráter mercantil e privatizante bem representado atualmente pelas parcerias público-privadas defendidas pelo governo federal como “modelos públicos de gestão” mas que, na prática são modelos que permitem, a criação de empresas públicas de direito privado. Como exemplos mais recentes temos a Fundação de Previdência Complementar dos Servidores Públicos FederaisFUNPRESP e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH, que têm sido duramente criticadas pelo movimentos de docentes, servidores e estudantes das universidades federais por materializarem modelos de privatização no interior das Instituições Federais de Ensino Superior – IFE. Tais modelos vão contribuindo com a reconfiguração da arquitetura acadêmica das instituições públicas federais e alterando seu modus operandi. O conceito arquitetura acadêmica volta aos documentos das universidades federais a partir de 2008, com o REUNI, despertando o interesse dos pesquisadores do campo da expansão da educação superior. Segenreich, Morosini e Franco (2012), entendem que o termo arquitetura acadêmica [...] pode assumir distintas conotações: arquitetura institucional, arquitetura organizacional, arquitetura pedagógica para designar tipos de estruturação da educação, seja institucional e/ou modalidade de ensino, como a sala de aula presencial e/ou virtual. (SEGENREICH, MOROSINI e FRANCO 2012, p. 76). Nesse sentido, a arquitetura acadêmica assume um sentido bem amplo envolvendo tanto a organização institucional como acadêmica e a natureza jurídica das instituições públicas e privadas. Estudos de CATANI; LIMA; AZEVEDO (2008); MEDEIROS (2012) também concordam que há uma profunda relação entre o que se está chamando de arquiteturas acadêmicas nas universidades federais e o REUNI e com regulações transnacionais, particularmente, as emanadas do Processo de Bolonha (1999) e, assumidas, no Brasil, pela ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 206 proposta da Universidade Nova (2006), inseridas em propostas de reforma da educação superior. Quando usado, o conceito arquitetura acadêmica se refere mais especificamente à diversificação de instituições e suas propostas curriculares para a formação de profissionais nas universidades. De acordo com Houaiss (2009) apud Segenreich; Morosini; Franco (2012), o termo “num sentido figurado, expressa desde o conjunto de regras que são a base de uma instituição, até os elementos que perfazem o todo” com imensas possibilidades de sentidos e significados, já que a raiz do termo tem origem latina, Architectura “arte de edificar” enquanto que o termo academia é usado no sentido de “circunscrever o corpo arquitetural” delimitando-o a “um sentido pedagógico, de espaço onde a pedagogia pode ocorrer” (Idem, p.77). Medeiros (2012) ao analisar as versões sobre a origem do REUNI, em sua tese de doutorado50, afirma ter encontrado suas raízes nas propostas do Grupo de Trabalho Interministerial de 200351 em articulação com as propostas neoliberais que circulavam na América Latina e, particularmente, com a proposta da Universidade Nova, que enfatiza a reestruturação da arquitetura acadêmica dos cursos superiores, referenciada no Processo de Bolonha. As ideias sobre educação superior e sua expansão na configuração que vem acontecendo no Brasil são fruto do processo de internacionalização da educação superior que submetem as políticas para essa etapa do ensino a um conjunto de regulações formuladas e divulgadas na década de 1990, entre as quais, se destacam as produzidas pela Declaração de Bolonha, com os seguintes objetivos: Adoção de um sistema com graus acadêmicos de fácil equivalência, também através da implementação, do Suplemento ao Diploma, para promover a empregabilidade dos cidadãos europeus e a competitividade do Sistema Europeu do Ensino Superior. 50 Disponível em www.ppged.belémvirtual.com.br Grupo de Trabalho Interministerial - GTI, foi composto por membros da Casa Civil e da Secretaria Geral da Presidência da República, dos Ministérios da Ciência e Tecnologia, do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Fazenda e da Educação que recomendou ao governo brasileiro elaborar propostas ou um plano para orientar o processo de reforma da universidade brasileira e enfrentar a crise das universidades federais, a partir de dois eixos estruturantes: a autonomia e o financiamento. Teve como membros, inicialmente, o Ministro da Educação Cristóvão Buarque, Kátia dos Santos Pereira, Carlos Antunes, Hélio Barros, Luiz Soares Dulci, Marcelo Feitosa de Castro, Jairo Celso Correia Marçal, Luiz Tadeu Rigo, Gustavo Sampaio, Edílson Collares, Wanderley Guilherme dos Santos e Luiz Eduardo Alves (MARTINS; NEVES, 2004). 51 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 207 Adoção de um sistema baseado essencialmente em duas fases principais, a prélicenciatura e a pós-licenciatura. O acesso à segunda fase deverá requerer a finalização com sucesso dos estudos da primeira, com a duração mínima de 3 anos. O grau atribuído após terminado a primeira fase deverá também ser considerado como sendo um nível de habilitações apropriado para ingressar no mercado de trabalho Europeu. A segunda fase deverá conduzir ao grau de mestre e/ou doutor, como em muitos países Europeus. Criação de um sistema de créditos - tal como no sistema ECTS - como uma forma adequada de incentivar a mobilidade de estudantes da forma mais livre possível. Os créditos poderão também ser obtidos em contextos de ensino não-superior, incluindo aprendizagem feita ao longo da vida, contando que sejam reconhecidos pelas Universidades participantes. Incentivo à mobilidade por etapas no exercício útil que é a livre circulação, com particular atenção: - aos estudantes, o acesso a oportunidades de estudo e de estágio e o acesso aos serviços relacionados; - aos professores, investigadores e pessoal administrativo, o reconhecimento e valorização dos períodos dispendidos em ações Europeias de investigação, letivas e de formação, sem prejudicar os seus direitos estatutários. Incentivo à cooperação Europeia na garantia da qualidade com o intuito de desenvolver critérios e metodologias comparáveis; Promoção das necessárias dimensões a nível Europeu no campo do ensino superior, nomeadamente no que diz respeito ao desenvolvimento curricular; cooperação interinstitucional, projectos de circulação de pessoas e programas integrados de estudo, de estágio e de investigação. (BOLONHA, 1999) Esses objetivos apontam uma mudança estrutural na organização curricular dos cursos superiores a serem oferecidos pelos países signatários da Declaração de Bolonha, com vistas a adquirir maior competitividade, sobretudo, com os Estados Unidos. De acordo com Catani; Lima; Azevedo (2008), a construção do sistema europeu de educação superior é considerada [...] “a chave para promover a mobilidade e a empregabilidade dos cidadãos” e para a “obtenção de maior compatibilidade e de maior comparabilidade”. Embora se recuse a ideia de simples homogeneização ou padronização, eventualmente menos aceitável face à grande diversidade da educação superior dos países aderentes, insiste-se na harmonização e na necessidade da coordenação de políticas, na promoção da dimensão europeia dos currículos, na cooperação internacional, na mobilidade e no intercâmbio, bem como na cooperação no “setor da avaliação da qualidade, tendo em vista vir a desenvolver critérios e metodologias que sejam passíveis de comparação (DECLARAÇÃO DE BOLONHA, 1999, apud CATANI; LIMA; AZEVEDO, 2008, p. 10) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 208 Essa concepção de educação superior, orientada e movida pela lógica mercantil, opta pelo princípio da competitividade face à concorrência internacional, sobretudo, nos Estados Unidos. Com vistas a ampliar seus lucros e investimentos no campo da educação superior, [...] os países europeus atuam no sentido de ampliar a internacionalização de suas instituições de ensino e pesquisa estendendo e aprofundando as relações entre suas universidades e as instituições e sistemas de ensino superior latino-americanos” (MEDEIROS, 2012, p.149) E, com perspectivas de servir de modelo, não só no Espaço Europeu, propõe alterações na arquiteura acadêmica da educação superior: nos curriculos e organização curricular; na estrutura dos ciclos (percurso formativo); nos processos de ensino (centrados nas competências) e de avaliação dos alunos e nos sistemas de financiamento do ensino superior. O modelo curricular estaria mais próximo ao que é praticado, em alguns casos, nos Estados Unidos, no Reino Unido e no Canadá. A centralidade da pós-graduação é a titulação que deverá ser obtida o mais rápido possível, através de um bacharelado de três anos (em alguns casos, quatro), em que se terá uma formação geral, interdisciplinar e básica, a que pode seguir-se um período de dois anos de mestrado, de formação especializada, mais três anos de doutorado, totalizando oito anos para a obtenção dos três títulos. O encurtamento dos cursos para a obtenção mais rápida dos títulos está intimamente ligado à visão pragmática da educação e ao atendimento, em curto espaço de tempo, das demandas do mercado. Veiculado no Brasil, primeiro em 1996 pela Nova Universidade e, depois, resgatado pelo REUNI, em 2008, o novo paradigma da educação superior pragmática, traz como centralidade a reorganização dos currículos dos cursos de graduação e pós-graduação, portanto, da arquitetura acadêmica dos cursos do ensino superior, encurtando o tempo para a obtenção da titulação. Esse paradigma, contou com imediata reação do movimento organizado de docentes e estudantes, nas universidades públicas federais que, apesar de todas as dificuldades e ataques, continuam defendendo e não abrem mão do princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, que mantém as características de uma universidade nos moldes humboldtianos. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 209 Na maioria das universidades federais, no momento em que seus Conselhos Superiores discutiam a adesão ao REUNI, houve reação contrária a esse programa e particularmente os estudantes, levantaram a polêmica sobre o que significaria a reestruturação acadêmico-curricular no seu âmbito. Na Universidade Federal do Pará - UFPA, os estudantes se posicionaram dizendo que “gostariam de opinar sobre o tipo de reestruturação e concepção de ensino de graduação”; requereram “o direito de participar do debate e da reestruturação acadêmico-curricular” (MEDEIROS, 2012, p.172), ou seja, queriam entender qual a nova ‘arquitetura acadêmica’ que estava sendo proposta para a UFPA, por seus dirigentes. Das seis diretrizes do REUNI, a terceira e a quarta tratam da reestruturação da arquitetura acadêmica dos cursos de graduação: [...] I-Redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período noturno; II - Ampliação da mobilidade estudantil, com a implantação de regimes curriculares e sistemas de títulos que possibilitem a construção de itinerários formativos, mediante o aproveitamento de créditos e a circulação de estudantes entre instituições, cursos e programas de educação superior; III - Revisão da estrutura acadêmica, com reorganização dos cursos de graduação e atualização de metodologias de ensino-aprendizagem, buscando a constante elevação da qualidade; IV - Diversificação das modalidades de graduação, preferencialmente não voltadas à profissionalização precoce e especializada; V - Ampliação de políticas de inclusão e assistência estudantil; e VI - Articulação da graduação com a pós-graduação e da educação superior com a educação básica. (Decreto Nº 6.096/2006, Art. 2º)(Grifos nossos) Essas diretrizes caracterizam o REUNI como um contrato de gestão que teve sua origem na Associação Nacional de Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior ANDIFES, com apoio do poder executivo, no âmbito do Estado brasileiro, para regular a política de expansão da educação superior nas universidades públicas federais, impondo condicionalidades que foram questionadas por segmentos universitários contrários ao programa. Um dos docentes da UFPA ao se posicionar, em entrevista, sobre o REUNI, observa: [...] A concepção do programa, no meu ponto de vista, é extremamente complicada, porque quando a gente estuda a gestão e, lógicamente, é o recorte do que eu venho estudando, fui verificar que esse plano de reestruturação e expansão da universidade, ele se faz tendo em vista o que nós chamamos de contrato de gestão e o contrato de gestão ao mesmo tempo em que ele apresenta as propostas de melhorias, ele tem em contrapartida umas cobranças para as pessoas que estão implementando, principalmente dos gestores. Esse programa de reestruturação da universidade pública, ele é uma faca de dois gumes: assim como ele faz, aliás, ele faz exigências ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 210 para uma universidade, ele não faz pra outras. Para as universidades que já estão bem consolidadas, como as que já têm programas de pós-graduação fortalecidos, não têm a mesma exigência que uma universidade que está começando. (DE-10)52 O REUNI como uma “regulação nacional” articulada à “regulações transnacionais”, se constitui num programa que tem como fim imediato “o aumento das vagas de ingresso e a redução das taxas de evasão nos cursos presenciais de graduação” (BRASIL, 2007a, p. 27), produzir uma reorganização curricular inovadora e alcançar uma taxa de conclusão de 90% na graduação (BRASIL, 2007b, p. 4). Fomenta os cursos de graduação a reorientarem seus currículos, contribuindo com a mudança na ‘arquitetura acadêmica’, ou seja, um currículo que prepare mais rapidamente os estudantes para o mundo do trabalho, em menor espaço de tempo e com um custo per capita menor, com efetiva e eficiente gerência do trabalho institucional e docente (SGUISSARDI, 2009, p.156). Ainda, segundo as Diretrizes do REUNI, a graduação [...] é fundamental para que os diferentes percursos acadêmicos oferecidos possam levar à formação de pessoas aptas a enfrentar os desafios do mundo contemporâneo, em que a aceleração do processo de conhecimento exige profissionais com formação ampla e sólida. A qualidade almejada para este nível de ensino tende a se concretizar a partir da adesão dessas instituições ao programa e às suas diretrizes, com o conseqüente redesenho curricular dos seus cursos, valorizando a flexibilização e a interdisciplinaridade, diversificando as modalidades de graduação e articulando-a com a pós-graduação, além do estabelecimento da necessária e inadiável interface da educação superior com a educação básica - orientações já consagradas na LDB/96 e referendadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, definidas pelo CNE. (BRASIL, 2007b, p. 5, Grifos nosso) As consequências dessa nova arquitetura acadêmica são currículos flexíveis, organizados sob um sistema uniforme de créditos, nos moldes do Processo de Bolonha em que, cada universidade federal brasileira “com base em sua autonomia”, deve buscar “seu caminho de desenvolvimento”, pois o REUNI é um instrumento “que oferece às instituições condições para repensar sua estrutura acadêmica e seu desenho institucional” (BRASIL, 2007a, p. 27). As Diretrizes do REUNI apontam os eixos orientadores da mudança na arquitetura 52 acadêmica dos cursos de graduação: flexibilização, diversificação Entrevista que faz parte da tese de doutorado de Medeiros (2012), p. 253. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 e 211 interdisciplinaridade, para formar profissionais concatenados com as exigências do mercado. Essas alterações pretendidas são estruturais, com reorientação dos processos formativos nos quais as “novas possibilidades de formação vão se delineando” e uma visão utilitarista da educação superior vai se evidenciando à medida que os currículos dos cursos são criticados por seus “itinerários rígidos, desperdício de créditos, imobilidade e especialização precoce que são incompatíveis com uma estrutura universitária à altura dos desafios da ciência.” (BRASIL, 2007a, p. 28). Sob a égide do REUNI, particularmente, as novas universidades federais que foram criadas no governo Lula, já introduziram nos cursos de graduação os Bacharelados Interdisciplinares (BIs). “Uma proposta de regime de ciclos, na área de ciência e tecnologia, foi pioneiramente iniciada na Universidade Federal do ABC, seguida por outras universidades federais, como a UFBA, a UFJF, UFRN, UFOPA, UFRB, UNIFAL-MG, UFVJM” (MEDEIROS, 2012) ampliando o escopo da inovação curricular a outras áreas do conhecimento. Além disso, muitas outras “inovações” curriculares estão sendo experimentadas, alterando a arquitetura acadêmica do ensino de graduação nas universidades federais e que precisam ser estudadas. Para Medeiros (2012), [...] O REUNI é portador de uma concepção de educação superior que se conecta direta ou indiretamente com concepções presentes no cenário mundial, que tem sido veiculadas em importantes fóruns. Um deles foi a Conferência Mundial sobre a Educação Superior realizada em 2009, em Paris, de 5 a 8 de julho, que em seu documento final intitulado La nueva dinâmica de la educación superior y la investigación para el cambio social y el desarrollo, reafirma o valor da educação para o desenvolvimento do planeta. Essa Conferência ratificou os resultos da Declaração da Conferência Mundial sobre Educação Superior de 1998, bem como as conclusões e recomendações das seis conferências regionais (Cartagena-Colômbia, Macau, Dakar, Nova Delhi, Bucarest e Cairo), assim como os debates e os resultados produzidos no seu próprio âmbito. No documento final, a educação superior é tratada a partir dos eixos: responsabilidade social da educação superior; acesso, equidade e qualidade; internacionalização, regionalização e mundialização; aprendizagem, pesquisa e inovação. (MEDEIROS, 2012, p. 104) Os estudos numa vertente crítica sobre a expansão da educação superior no Brasil, após 1995, ano em que a Reforma do Aparelho Administrativo do Estado no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995- 2002) alcançou maior nível de refinamento com ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 212 regulações mais precisas, concordam quanto à produção de um paradigma de caráter neoliberal que esvaziou o papel do Estado, retirando-lhe maior responsabilidade pelas políticas sociais, entre as quais as voltadas à educação superior, o que resultou na abertura de um maior espaço para o mercado e, consequentemente, para maior expansão da educação superior via o setor privado, [...] num duplo movimento: expansão da rede privada e abertura de espaço para a entrada do capital na rede pública, onde possível e necessário, objetivando o que vem sendo definido como mercantilização da educação superior” (OBEDUC, 2012, p 12). Tais mudanças não aconteceram por mero acaso. Inscreveram - se numa dinâmica mais ampla de reconfiguração do Estado moderno, em face das sucessivas crises e da ‘mundialização do capital’, resultado da ascensão do capital financeiro numa nova etapa de acumulação do capital em que se evidenciaram “novas formas de centralização de gigantescos capitais financeiros, os fundos mútuos e fundos de pensão, cuja função é frutificar, principalmente no interior da esfera financeira” (CHENAIS, 1996, p. 14-15), ou seja, “um processo de internacionalização do capital e de sua valorização, à escala do conjunto das regiões do mundo” (CHENAIS, 1996, p. 32). Esse novo momento de ajuste do capital, exigiu novas regulações que passaram a ser difundidas pelo Banco Mundial, através de “regulações transnacionais” exaradas nos anos de 1990 para os países em desenvolvimento, que prescreveram controle dos gastos do Estado, fim da regulação estatal e liberdade máxima para o capital no sentido de proporcionar o cumprimento de sua mais importante meta que foi a de [...] redefinir o papel do Estado frente às políticas sociais, desobrigando-o de suas funções específicas, de garantir as políticas públicas veiculadoras de direitos básicos dos cidadãos, transferindo-os para o mercado, numa opção clara pelo Estado mínimo que desconcentra suas responsabilidades com as políticas sociais, mas mantém-se firme no controle e avaliação dessas mesmas políticas” (MEDEIROS, 2012, p.137) Assim, o fenômeno da deserção do Estado vai permitindo que o mercado, no que tange às políticas de expansão da educação superior, vá ocupando maior espaço, ancorado em marcos regulatórios provenientes do próprio Estado objetivado em suas instituições como o Ministério de Educação – MEC. Dentre esses marcos regulatórios, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (Lei Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996) foi estratégica para a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 213 expansão da educação superior brasileira, sobretudo, do setor privado ao permitir a diversificação das instituições de ensino superior e as mudanças na organização acadêmica para responder às pressões pelo acesso ao ensino universitário. O artigo 45 da LDB define que “a educação superior será ministrada em instituições de ensino superior públicas ou privadas, com variados graus de abrangências ou especialização”, Apenas as universidades são definidas no Art.52, como “instituições pluridisciplinaares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano...” Assim, criaram-se prerrogativas para romper, em etapas, com o modelo humboldtiano, criticado por ser centrado na pesquisa, “unificado, rígido e oneroso ao Estado” fomentando-se a expansão de instituições privadas. De 1995 para cá, as políticas educacionais, tendo como base ideológica o neoliberalismo, aprofundaram os compromissos com a lógica capitalista na medida em que deslocaram a educação do sentido de “direito público” para o sentido de “bem público” e fosse tratada como qualquer outra mercadoria. A universidade vai se reconfigurando, afastando-se do paradigma humboldtiano, que se assenta no tripé da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, aproximando-se e assumindo, em forma e conteúdo, um paradigma ditado pelo modelo econômico capitalista que está a exigir uma universidade pragmática, focada no ensino e pautada por uma gestão empresarial. Uma universidade que vai perdendo a sua frágil autonomia, conquistada na Constituição Federal de 1988, (Art. 207), para se tornar cada vez mais heterônoma. Como consequência, “no período de 1995 a 2011, houve o crescimento de 283% de matrículas” (OBEDUC, 2012, p.12) no ensino superior, com 74,2% das matrículas no setor privado. No entanto, a taxa líquida de matrícula da população de 18 a 24 anos que, teoricamente, deveria estar na educação superior foi de 14,8% em 2011, mesmo com o REUNI. Segundo dados do IBGE/PNAD, em 2013, a taxa líquida de matrículas atingiu 16,5%, revelando crescimento e a necessidade, urgente, de investimento na educação superior sem esperar que o PNE (2014-2024) chegue no seu último ano de vigência para alcançar os 10% de recursos previstos para a educação Numa curva crescente, a educação superior vai adquirindo um “valor de troca”, abrindo espaço para que empresários nacionais e internacionais, a explorem com retorno de lucro certo, pois contam com subsídios governamentais para alavancar seus negócios, por meio de políticas que se materializam em programas como o Programa Universidade para ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 214 Todos – PROUNI (Lei Nº 11.096 de 13 de janeiro de 2005) e o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior - FIES (Lei Nº 10.260 de 12 de julho de 2001, e modificada pela Lei Nº 12.202, de 14 de janeiro de 2010) que ensejam a consolidação das parcerias público-privadas, no campo educacional, regadas com recursos do fundo público. A partir de 2006, o governo brasileiro, em nível federal, elaborou uma agenda para a educação e o Ministro da Educação, à época, Fernando Haddad, lançou por meio do site do MEC, em 2007, o chamado Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) envolvendo mais de 40 programas, com metas e objetivos para a política educacional brasileira. O PDE, forjado num movimento de empresários, o “Todos pela Educação”53, lançado no Museu Ipiranga, em São Paulo, em 6 de setembro de 2006 (SAVIANI, 2007, p.1.239) fez suas as metas desse movimento, transformando a agenda do “Todos pela Educação” nas principais medidas educacionais dos governos de Lula (2003-2010) e depois o de Dilma Rousseff (2011-2014). Na retórica governamental o PDE apontou a preocupação com a qualidade da educação básica brasileira. No entanto, sua origem foi marcada por uma visão mercantil da educação e, na prática, buscou materializar a concepção do “Todos pela Educação” que defende uma concepção estreita de qualidade “traduzindo-a sob a forma de subordinação à formação para o trabalho explorado, requerido pelo capitalismo dependente”, (LEHER; EVANGELISTA, 2012, P.9) a partir de três programas lançados em 24 de abril: o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), a Avaliação da Alfabetização, a “Provinha Brasil” (Portaria Normativa Nº 10 de 24 de abril de 2007) e o Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério Público da Educação Básica que, naquele ano, foi fixado no valor de R$ 850,00 (oitocentos e cinquenta reais). Neste ano de 2015 o valor é R$1.917,78 (mil novecentos e dezessete reais e setenta e oito centavos). Lamentavelmente, as políticas que traziam algum benefício aos professores não foram implementadas, imediatamente, como o O Movimento “Todos pela Educação” constitui uma ONG financiada exclusivamente pela iniciativa privada através de fortes grupos e instituições empresariais como: Grupo Pão de Açúcar, Fundação Itaú-Social, Fundação Bradesco, Instituto Gerdau, Grupo Gerdau, Fundação Roberto Marinho, Fundação Educar- Dpaschoal, Instituto Itaú – Cultural, faça Parte – Instituto Brasil Voluntário, Instituto Ayrton Senna, Cia. Suzano, Banco ABN-Real, Banco Santander, Instituto Ethos (SAVIANI, 2007, p. 1.243). Congrega a sociedade civil organizada, educadores e gestores públicos. Tem como objetivo contribuir para que o Brasil garanta a todas as crianças e jovens, educação básica de qualidade. (Portal Todos pela Educação, 2010). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 53 215 Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério Público da Educação Básica, ainda não garantido pela maioria dos governos estaduais 54 O PDE fixou para as universidades federais a meta de duplicar as vagas até 2010 e o REUNI, se constituiu numa nova regulação da política de expansão da educação superior, com objetivo de reestruturar e expandir as universidades públicas federais, sobretudo o ensino de graduação. Tinha como metas globais: “a elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para 90% e a relação de 18 alunos da graduação em cursos presenciais para 01 professor, ao final de cinco anos a contar do início de cada plano”. (Art. 1º§ 1º do Decreto 6.096/2007). Foi implantado nas universidades públicas federais brasileiras, com vigência até o ano de 2012. Para o governo federal, o REUNI e o PROUNI seriam a estratégia mais adequada para incrementar a política de expansão do acesso à educação superior. Investindo recursos públicos por meio do PROUNI e do Financiamento Estudantil-FIES, os governos de Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2014) optaram pela expansão do acesso ao ensino superior via o setor privado, que amargava uma inadimplência de 40% em suas anuidades. Opção corroborada por Gabriel Mario Rodrigues55 reeleito presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) e indicado para comandar o Conselho Administrativo do maior grupo educacional privado do mundo, oriundo da fusão dos grupos Anhanguera e Kroton. À época, afirmou: “Financiamento Estudantil (FIES) era o que grandes instituições precisavam” (Último Segundo, 2013). O repasse de recursos do fundo público via o FIES representaram 40% da renda desse grupo que conta, atualmente, com mais de 800 unidades de ensino superior e 810 escolas privadas, cujo valor de mercado se aproxima dos 12 bilhões de reais. Segundo Rodrigues (2013), o objetivo principal de sua gestão, no grupo Anhanguera - Kroton, seria implantar testes padronizados para treinar os alunos para as avaliações do governo federal como o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes ENADE, em que a lógica orientadora da educação, tem como base a avaliação de resultados, estreitamento curricular e uma qualidade ditada pelas necessidades do mercado. 54 No momento em que terminava esse texto, abril de 20015, os professores da educação básica, da rede pública estadual de São Paulo e do Pará estavam em greve, lutando por direitos não garantidos. Entre as reivindicações dos professores do Pará estava, justamente, a exigência do pagamento do Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério Público da Educação Básica pelo governo Simão Jatene, do PSDB. 55 Entrevista de 15 de maio de 2013, disponível em www.ultimosegundo.ig.com.br ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 216 A integração ou fusão de IES privadas tem sido uma estratégia do setor para manter seu patamar de expansão, favorecendo grupos brasileiros a se articularem a grupos internacionais, especialmente bancos de investimentos norte-americanos, de onde vem grande parte do capital a ser aplicado no ensino superior privado, que vem se consolidando como um lucrativo negócio. Chaves (2009), demarcava em seus estudos, que [...] As “empresas de ensino” agora abrem o capital na Bolsa de Valores com promessa de expansão ainda mais intensa e incontrolável. São quatro as empresas educacionais que mais se destacam nesse mercado de capitais: a Anhanguera Educacional S.A com sede em São Paulo; a Estácio Participações, controladora da Universidade Estácio de Sá, do Rio de Janeiro; a Kroton Educacional da Rede Pitágoras, com sede em Minas Gerais e a empresa SEB SB, também conhecido como “Sistema COC de Educação e Comunicação” com sede em São Paulo. (CHAVES, 2009, p. 10). Essas empresas do ensino vem se espalhando pelo Brasil, expandindo sua atuação no ensino superior, provocando alterações que têm reflexo direto na vida universitária e no trabalho docente, em que os professores, contratados como horistas, vivem um trabalho cada vez mais precarizado. Dados do INEP/ MEC de 2013 mostram que enquanto na rede pública havia mais de 120 mil professores em tempo integral, na rede privada eram, aproximadamente, 50 mil. Quando se trata de professores horistas, a rede privada contava com mais de 80 mil professores enquanto na rede pública havia, aproximadamente, 15 mil. Enquanto os professores horistas da rede privada vivenciam a precarização e a intensificação do seu trabalho, por uma jornada que não inclui tempo para estudos, planejamento, orientação e correção de trabalhos, nas universidades públicas federais, o professor vive a precarização e intensificação do seu trabalho, acossado pela avaliação de desempenho, nos padrões CAPES, orientada pela lógica produtivista, numa racionalidade técnica e pragmática que produz um vínculo entre quem produz conhecimento (a universidade) com quem consome a partir das suas demandas (o mercado), gerando uma “espécie de privatização do conhecimento” (MEDEIROS, 2012, p. 106) , que [...] significa principalmente que o conhecimento gerado no âmbito do público com financiamento pelo setor privado carrega cláusulas de confidenciabilidade que limitam o livre fluxo do conhecimento, assim como, também se estimulam temas de investigação (pesquisa) que sejam rentáveis com avaliação do trabalho acadêmico segundo critérios empresariais. (SCHUGURENSKY; NAIDORF, 2004, apud MEDEIROS, 2012, p.106) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 217 Essa relação público-privado que encolhe a esfera pública exige a continuidade das investigações sobre as políticas de educação superior que cada vez mais assumem um caráter mercantil e privatizante que vai alterando, no fundo e na forma, a arquitetura acadêmica das universidades públicas federais. Referências Bibliográficas BRASIL. Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007. Institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25 abr. 2007c. p. 7. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais: Reuni 2008: Relatório de Primeiro Ano. Brasília, 2009. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Brasília, 2007a. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. REUNI Reestruturação e expansão das universidades federais: diretrizes gerais. Brasília, 2007. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. Referenciais orientadores para os bacharelados interdisciplinares e similares. Brasília, 2010b. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil, Brasília, DF, 24 dez. 1996. BRASIL- CAPES. Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil. OBEDUC, 2012 BARROSO, J. O Estado, a educação e a regulação das políticas públicas. Educação e Sociedade, v. 26, n. 92, 725-751, out. 2005. Número especial. CATANI, Mendes Afrânio; AZEVEDO, Mário Luiz Neves de; LIMA C. Licínio. O Processo de Bolonha, a Avaliação da Educação Superior e algumas considerações sobre a Universidade Nova. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, v. 13, n. 1, p. 7-36, mar. 2008. 31 CHAVES, V. L. J.; MENDES, O. C. REUNI: o contrato de gestão na reforma da educação superior pública. In: CHAVES, V. M.; CABRAL NETO, A.; NASCIMENTO, I. V. (Org.). Políticas da educação superior no Brasil: velhos temas, novos desafios. São Paulo: Xamã, 2009. CHESNAIS, F. A mundialização do capital, São Paulo: Xamã, 1996. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 218 DAL PAI FRANCO, Maria Estela; MOROSINI Marília Costa. Marcos Regulatórios e arquiteturas acadêmicas na expansão da educação superior brasileira: movimentos indutores.IN:Revista Educação em Questão, Natal, v.42, n. 28, p. 175-198, janqabr.2012 LEHER, Roberto; EVANGELISTA, Olinda. Todos pela Educação e o Episódio Costin no MEC: a pedagogia do capital em ação na política educacional brasileira. Trabalho Necessário – Ano 10, Nº 15/2012 MAROY, C. École, régulation et marché: une comparaison de six espaces scolaires locaux en Europe. Paris: Presses Universitaires de France, 2006. MEDEIROS, Luciene. O REUNI - uma nova regulação da política de expansão da educação superior: o caso da UFPA. Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Pará, Belém, 2012. SAVIANI, Dermeval. PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação: análise crítica da política do MEC. Campinas: Autores Associados, 2009. SEGENREICH, Stella Cecília Duarte; MOROSINI Costa Marília; FRANCO Dal Pai Maria Estela. Questões Transversais na Expansão da Educação Superior Brasileira Pós-LDB. IN: MANCEBO Deise; BITTAR Mariluce; CHAVES Jacob Vera Lúcia (Orgs) Educação Superior: expansão e reformas educativas. Maringá:Eduem, 2012. SGUISSARDI, Valdemar; SILVA JR, João dos Reis. Novas Faces da Educação Superior no Brasil – reformas do Estado e mudanças na produção. Bragança Paulista: EDUSF, 1999. Universidade Nova: Reestruturação da Arquitetura Acadêmica da UFBA. Disponível em www.fis.ufba.br Acesso em 20 de maio de 2013. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 219 EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: TESSITURAS E IDENTIDADES DOS INSTITUTOS FEDERAIS DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NO BRASIL Celia Regina Otranto [email protected] Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ Liz Denize Carvalho Paiva [email protected] Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ Eixo temático: Organização institucional e acadêmica na expansão da educação superior. RESUMO Este artigo apresenta parte da pesquisa em andamento cujo foco é o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – IF. A pesquisa integra o Eixo temático: Organização Institucional e Acadêmica na Expansão da Educação Superior, tendo como preocupações investigar a criação e expansão dos IFs, considerando suas identidades e trajetórias educacionais e institucionais. As realizações de pesquisas bibliográficas e documentais nos levaram a classificar os IFs como exemplos de novas arquiteturas acadêmicas, em virtude das suas especificidades estruturais e organizacionais. Ao observar as formas e as relações de trabalho que foram construídas e desconstruídas, segundo a dinâmica das estruturas econômicas, percebemos a interferência explícita no surgimento de instituições de ensino de diversas naturezas. O estudo em suas considerações finais identificou a complexidade da expansão e a hibridez na composição das instituições de ensino envolvidas na criação dos IFs. Palavras-chave: Instituto Federal, Expansão, Identidade, Educação Superior. Introdução Este estudo compõe a pesquisa em curso pertinente ao Eixo temático: Organização Institucional e Acadêmica na Expansão da Educação Superior, tendo como foco os Institutos Federais em sua constituição e propagação no sistema de ensino brasileiro. A pesquisa central do eixo se projeta para a criação e expansão dos cursos de licenciatura nos IFs, no âmbito brasileiro, bem como as articulações realizadas em suas diferentes fases ao longo da existência das instituições. Deste modo, o presente artigo tem o objetivo de abordar o recorte acerca da criação dos IFs, considerando a legislação que os ampara, os critérios para o seu surgimento, e as ações de fortalecimento destas instituições no cenário brasileiro, a exemplo ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 220 do Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica, considerando sua projeção e alcance. Identifica-se neste cenário a disputa pelo território e o empoderamento de bens provenientes dos diversos usos da terra, como elementos a serem observados neste cenário de composições institucionais. O universo do poder ganhou diferentes sentidos, marcadamente aqueles gerados com o advento do sistema capitalista, em que a desigualdade de relações na sociedade desloca determinados extratos de indivíduos a espaços territoriais de acordo com os interesses hegemônicos. Para realizar este estudo foram feitas pesquisas bibliográficas e documentais de modo a constituir o referencial teórico como aporte para a análise e reflexões dos processos identitários pelos quais passaram os IFs, de modo a fundamentar o prosseguimento da pesquisa central em questão concernente à expansão dos cursos de licenciatura no bojo da Política de Expansão da Educação Superior. Assim, ao constituir um entendimento sobre tais aspectos relacionais que os IFs se propõem a estabelecer, pretende-se identificar e clarificar as ações das políticas públicas instituídas nessa nova arquitetura acadêmica e as possíveis tensões implicações neste contexto. Cenário da Rede Federal: Identidades institucionais em foco Na busca da compreensão acerca da essência dos Institutos Federais, se faz necessário aclarar as identidades56 culturais na fluidez das instituições de ensino que compuseram os IFs no Brasil, conforme nos aponta Hall (2008). As relações de interesses estabelecidas no espaço ocupado ou não pela população provocam discussões que têm permeado estudos acerca do rural e do urbano e suas relações . “Ao ver a identidade como uma questão de ‘tornar-se’, aqueles que reivindicam a identidade não se limitariam a ser posicionados pela identidade: eles seriam capazes de posicionar a si próprios e de reconstruir e transformar as identidades históricas, herdadas de um suposto passado comum.” (HALL, 2008, p.28). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 56 221 com o território57, gerando uma determinada identidade social, tanto para o indivíduo quanto para a coletividade. Deste modo, Compreendendo a identidade social como contendo uma “essência socialnatural” não positivista, a abordagem procura se aproximar desta essência social-natural a partir das dimensões da realidade que dão o sentido (significado) de pertencimento comum. Esses sentidos e significados de comum expressam coesões de grupos, comunidades, habitantes e do território que habitam. Procura- se elucidar as múltiplas ordens internas e externas em relações codeterminadas de poderes assimétricos, reconhecendo assim um mundo complexo e relacional no qual se expressam identidades e alteridades em relações de cooperação e competição, hegemônicas, contrahegemônicas e subalternas. (MOREIRA, 2012, p.22). Franco, Morosini e Zanettini-Ribeiro (2014, p.180) apontam em seus estudos categorias de marcos regulatório da expansão da educação superior em relação às arquiteturas acadêmicas, os quais nos instigam a refletir como o Estado tem agido ao longo dos tempos, por meio da regulação para alcançar seus interesses mediados e conduzidos pelo sistema capitalista. a) o estado aparece inúmeras vezes como um ator ligado a educação superior, tendo papéis ambíguos que transitam entre o benéfico e o prejudicial aos sistemas de educação superior; [...] c) a organização local (grandes centros e cidades interioranas) onde se encontra a instituição influencia diretamente em suas organizações externas e internas; [...]. (FRANCO; MOROSINI; ZANETTINI-RIBEIRO, 2014, p.180). Além disso, outro aspecto é referenciado pelas autoras que nos chama a atenção ao mencionar a organização local como um elemento interventor na constituição e ação da instituição de ensino. Estes dois marcadores parecem estar presentes no contexto histórico de criação das instituições de ensino relacionadas à educação profissional desde os idos da De acordo com Haesbaert (2007, p.78-79) “O território, de qualquer forma, define-se antes de tudo com referência às relações sociais (ou culturais, em sentido amplo) e ao contexto histórico em que está inserido [...]. o território pode ser concebido a partir da imbricação de múltiplas relações de poder, do poder mais material das relações econômico-políticas ao poder mais simbólico das relações de ordem mais estritamente cultural”. 57 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 222 colonização do país até, mais recentemente, com a criação da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, como vermos a seguir. Diante do cenário mundial e do desenvolvimento que primariamente se deu no Brasil, com a economia agrícola, outras formas da dinâmica econômica surgiram, dentre elas a era industrial trazendo novas demandas à sociedade vigente. O ensino técnico no Brasil tem referências no início do século XX por meio Decreto nº. 7.566/1909 (BRASIL, 1909), quando da criação de 19 Escolas de Aprendizes e Artífices. Anos mais tarde, com Decreto nº. 12.893/1918 (BRASIL, 1918), do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, foram criados os Patronatos Agrícolas, organizados em postos zootécnicos, fazendas-modelo de criação, núcleos coloniais e outros estabelecimentos, sob a responsabilidade do órgão federal. Os objetivos principais destas escolas, ainda segundo a lei que as criou eram, além de proporcionar a instrução primária e cívica, introduzir noções práticas de agricultura, zootecnia e veterinária aos menores desafortunados. (BRASIL, 1918). Os Patronatos Agrícolas deram origem às Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais, voltadas para a área agrária. Azeredo e Carvalho (2010, p. 208-215), nos oferecem uma singular amostra da diversidade cultural das Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais – ETVs. Os autores classificam as ETVs em quatro segmentos de acordo com as especificidades e abrangências: ETVs da área agrária; ETVs da área comercial; ETVs da área industrial e ETVs na área de saúde. As ETVs relacionadas à área agrícola inicialmente receberam a denominação de Patronatos Agrícolas tendo a missão de acolher os desvalidos da sorte na sociedade e capacitá-los para ocuparem a posição de mão de obra na produção agrícola. Dentre aqueles que deram origem às ETVs, destacamos, primeiramente, o Patronato Visconde da Graça criado em 1923, localizado na cidade de Pelotas no Rio Grande do Sul, que após algumas mudanças estruturais recebeu a denominação de Escola Agrotécnica Visconde da Graça vinculada à Universidade Federal de Pelotas (UFPel) em 1969. Já o Patronato Vital de Negreiros criado em 1924 situado na cidade de Bananeiras no Estado da Paraíba, obteve também ao longo de sua existência algumas denominações até se tornar Colégio Agrícola Vidal de Negreiros vinculado à Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em 1968. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 223 No ano de 1937 surgiu na cidade de Pinheiral no Rio de Janeiro, o Patronato Nilo Peçanha e assim como ocorrido em outras instituições de ensino sofreu variadas mudanças estruturais e em sua nomenclatura até vincular-se à Universidade Federal Fluminense em 1968, processo este seguido por outras ETVs distribuídas no país, totalizando 32 instituições. Em relação ao território brasileiro, outros cenários no âmbito educacional foram estabelecidos, considerando o universo produtivo campo-cidade. Dentre eles destacam-se as décadas de 1920 e 1930, período de efervescência industrial, em que se fazia necessária a formação de mão de obra especializada para atender às demandas do país. Deste modo, houve uma série de alterações nas instituições dedicadas ao ensino técnico, impulsionadas pelas leis em vigor à época. Assim, surgem os Liceus Industriais por volta na década de 1940, sendo renomeados em 1942 para Escolas Industriais e Técnicas. Estas por sua vez existiram com tal denominação até 1959 até serem reconhecidas como Escolas Técnicas Federais (ETFs), por meio da Lei nº 3.552/1959 (BRASIL, 1959). As ETFs passaram a ter personalidade jurídica própria, além de autonomia didática, administrativa, técnica e financeira. As Escolas Técnicas que mais se destacavam à época foram as dos Estados de Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro devido à abertura proporcionada pelo Decreto-lei nº. 547/69, art 1º. (BRASIL, 1969) permitindo-lhes a oferta de cursos de curta duração denominados Engenharia de Operações. Quase dez anos mais tarde a Lei nº 6.545/1978 (BRASIL, 1978) transformou estas três escolas em Centros Federais de Educação Tecnológica, garantindo-lhes autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didática e disciplinar, regulando-se por seus Estatutos e Regimentos internos. A Lei nº 8.711/1993 (BRASIL, 1993) em seu Art. 2º. atribuiu aos CEFETs o direito de oferecer educação tecnológica, com os seguintes objetivos: I - ministrar em grau superior: a) de graduação e pós-graduação lato sensu e stricto sensu, visando à formação de profissionais e especialistas na área tecnológica; b) de licenciatura com vistas à formação de professores especializados para as disciplinas específicas do ensino técnico e tecnológico; II - ministrar cursos técnicos, em nível de 2° grau, visando à formação de técnicos, instrutores e auxiliares de nível médio; ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 224 III - ministrar cursos de educação continuada visando à atualização e ao aperfeiçoamento de profissionais na área tecnológica; IV - realizar pesquisas aplicadas na área tecnológica, estimulando atividades criadoras e estendendo seus benefícios à comunidade mediante cursos e serviços. Percebe-se então conforme nos aponta Cunha (2000, p.51, apud WILSON s/d), uma articulação dos organismos internacionais, principalmente o Banco Mundial para a prática da “diferenciação para cima” da educação técnico-profissional na América Latina, desde o nível secundário até o pós-secundário para técnicos e tecnólogos. Ele aponta, ainda, que essas mudanças todas teriam sido determinadas pela globalização da economia, com o consequente abandono das políticas protecionistas e a abertura dos mercados nacionais a uma competição internacional cada vez mais acirrada. Para enfrentar a competição num mercado progressivamente mais globalizado, os governos dos países latino-americanos decidiram, entre outras providências, modificar os modos como qualificam sua força de trabalho, em especial para a indústria e os serviços, que, por sua vez, passam a utilizar tecnologias mais sofisticadas, exigentes de trabalhadores dotados de diferentes qualificações e/ou competências. (CUNHA, 2000, p.51, apud WILSON s/d). O surgimento das Escolas Agrotécnicas Federais - EAFs difere da história da formação técnica industrial, pois segundo Koller e Sobral (2010, p. 222-225) as intervenções provocadas pelo ideário da teoria do capital humano principalmente a partir da década de 1960 interferiram na elaboração das políticas educacionais circunscrita na modernização tecnológica da agricultura. Neste período, eclode a “Revolução Verde”58 e com ela as exigências de mão de obra qualificada devido à mecanização do campo. [...] podemos apontar o processo de transformação tecnológica no campo, ocorrido a partir das décadas de 1950-1960, como responsável pela criação da maioria das escolas agrotécnicas federais no país. [...] A partir da diretriz condizente com a “Revolução Verde”, ou seja, da substituição de insumos “tradicionais” por insumos ditos “modernos ou de síntese industrial”, é que a Rede Federal de Ensino Agrícola 58 Caracteriza-se pelo uso químico na produção agrícola de modo redimensionado em maiores escalas, a fim de atender à demanda de mercado (ASSIS, 2002). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 225 articulou sua proposta de formação técnica. (KOLLER; SOBRAL, 2010, p. 223). As Escolas Agrotécnicas criadas no bojo da expansão do sistema capitalista no campo ganharam relevância, contudo sofreram as nuances de investimento por parte das instâncias governamentais ocasionadas por interesses políticos e de mercado, deixando as escolas por vezes à margem deste processo. Conforme observado, diversos tipos de instituições de ensino foram criadas em todas as regiões do Brasil, buscado atender aos interesses dos ciclos econômicos macros do país. É possível perceber, nestas instituições, múltiplas ideias de educação e de qualidade, mediadas pela territoriedade do campo e da cidade e dos propósitos expansionistas. Termos legais. Como lhes dar sentido? A letra da lei Com as transformações hegemônicas do campo para a cidade, houve reflexos nos processos pedagógicos. As discussões acerca do rural e do urbano têm se mostrado presentes nas agendas dos governantes do país desde os idos do Império. De tais questões emergem também as problematizações das identidades das Instituições de Ensino no país. Dentre elas, algumas ações do governo, tendo como exemplo, a Chamada Pública MEC /SETEC n.º 002 em 12 de dezembro de 2007, que oferecia aos CEFETs, às ETFs, às EAFs e às ETVs às Universidades Federais, a oportunidade de transformarem-se em Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. - os IFs ou ainda os IFETs como inicialmente eram denominados. Nas reflexões a respeito da reforma da educação profissional, técnica e tecnológica é necessário não perder de vista que a Lei nº 11.892/08, que institui os IFETs, integra um conjunto de medidas normativas que visa à concretização do Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE – do atual governo, que o tem como um dos mais importantes componentes educacionais do Plano de Aceleração do Crescimento – PAC. Os Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia representam parte fundamental da reengenharia da rede federal de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 226 educação profissional, científica e tecnológica, já que foi formada a partir deles. (OTRANTO, 2010, p. 104). Cabe ressaltar, no entanto, que esta convocação do governo federal não inibiu algumas instituições de recusarem tal processo de transformação, mantendo-se com suas características e vocações instituídas até então. Deste modo, a Lei nº 11.892/ 2008 (BRASIL, 2008), além de criar os IFs, instituiu a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, dando novos contornos a este segmento educacional em todo território brasileiro, conforme exposto em seu Art. 1º. I - Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia - Institutos Federais; II - Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR; III - Centros Federais de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca CEFET-RJ e de Minas Gerais - CEFET-MG; IV - Escolas Técnicas Vinculadas às Universidades Federais. Parágrafo único. As instituições mencionadas nos incisos I, II e III do caput deste artigo possuem natureza jurídica de autarquia, detentoras de autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e disciplinar. V – Colégio Pedro II59. Esta composição organizacional compreendida como uma nova arquitetura acadêmica60 apresenta diferentes origens institucionais que no caso do IFs foram aglutinadas mediante interesses políticos e territoriais. Nesta condição os CEFETs por já possuírem experiências no espectro da Educação Superior provavelmente devem ter encontrado menos dificuldades em adaptar-se aos direcionamentos da lei. Diferentemente, pode-se inferir que as ETFs, assim como as EAFs e as ETVs às Universidades Federais encontraram estranhamentos na gestão e na proposta pedagógica dada a verticalização dos IFs. Franco e Morosini (2012, p. 175) chamam a atenção para a compreensão das arquiteturas educacionais de âmbito formativo-científico como forças indutoras que se veem submetidas aos marcos regulatórios, mas que podem de algum modo redirecioná-los para caminhos que convirjam para a qualidade da Educação Superior - ES, considerando o contexto em questão. As autoras afirmam ainda que 59 Incorporado à Rede Federal por meio da Lei nº 12.677, de 25/6/2012, em seu art 5º. “Essas são aqui entendidas como uma expressão neologista, em parte emprestada do mundo estéticoconstrucional para designar formatos e modalidades organizativas”. (FRANCO; MOROSINI, 2012, p. 176). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 60 227 Sob tal perspectiva, arquitetura acadêmica tem como elementos constituintes: a) a indicação de possibilidades de formatação da educação superior, em uma ou mais de suas instâncias e níveis; b) a formalização de possibilidades em documento com princípios subsumidos e com força política; c) a antecipação projetiva de melhoria na consecução do concebido; d) a vinculação, explicitada ou não, a critérios de qualidade subsumidos em seus vínculos com valores, contexto e trajetória histórico-institucional da ES; e) a pressuposição de um processo de aferição de resultados implícito e/ou explicito. (FRANCO; MOROSINI, 2012, p. 176-177). Todos estes elementos constituintes da arquitetura acadêmica parecem fazer parte da constituição dos IFs, pois com o novo desenho estas instituições ganharam projeção, sendo estimulados pelas forças políticas a crescerem em suas estruturas físicas, pedagógicas e de gestão, de modo a pôr em prática a verticalização de ensino. O Brasil sendo um país de dimensões continentais contempla singularidades margeadas pela tratativa entre o rural e o urbano, que na contemporaneidade sucinta um esclarecimento, principalmente ao ter como círculo de ação a cultura e a identidade como meios de buscar compreender os fenômenos sociais de transformação e integração das instituições de ensino que compuseram os IFs. De acordo com Carneiro (1998), há de se ter atenção ao mencionar as características do rural e do urbano, tendo em vista que as representações sociais construídas ao longo do tempo se modificam, não sendo capazes de definir com precisão suas propriedades. Ainda segundo a autora, os movimentos nas relações sociais e de trabalho no campo, advindos dos processos de modernização da agricultura, sobremaneira atingem com uniformidade e intensidade a comunidade rural. “Nesse sentido não se pode falar de ruralidade em geral; ela se expressa de formas diferentes em universos culturais, sociais e econômicos heterogêneos” (CARNEIRO, 1998, p. 53). Tomando-se como base esta abordagem, pode-se atentar para os diferentes sentidos e significados que o rural possui, a exemplo de um vasto espaço onde se cultivava eminentemente a agricultura. Diante do capitalismo61 e do avanço industrial e de serviços, tem-se observado uma “pluriatividade” no meio rural, com a atuação da população local O capitalismo entendido como “uma fórmula mínima que enfatiza a exigência de acumulação ilimitada do capital por meios formalmente pacíficos. Trata-se de repor perpetuamente em jogo o capital no circuito econômico com o objetivo de extrair lucro, ou seja, aumentar o capital que será, novamente, reinvestido, sendo esta a principal marca do capitalismo, aquilo que lhe confere a dinâmica e a força de transformação que fascinaram seus observadores, mesmo os mais hostis”. (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 2009, p.35, grifo do autor). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 61 228 adaptando-se e buscando dar conta das demandas econômicas advindas principalmente das cidades, do urbano. Assim posto, são neste cenário de múltiplos entendimentos que se configuram as tessituras das instituições que deram origem aos IFs, provenientes de diversas identidades institucionais em meio ao rural e o urbano, onde as diferenças e a busca pelas identidades pessoais, locais, sociais se instauram na comunidade acadêmica em questão. Na busca da compreensão acerca do modo com que as instituições de ensino se reorganizaram para dar vida aos IFs, identificou-se na Lei nº 11.892/2008 (BRASIL, 2008) em seu art. 5º algumas pistas. A lei apresenta a diferenciação de criação dos IFs classificandoos como “mediante transformação” nas ocorrências em que a criação do IF se realizou por meio de uma única instituição de ensino. Já para os casos em que a criação se efetivou com mais de uma instituição de ensino, a classificação utilizada menciona o termo “mediante integração”. Implica destacar ainda, que a lei utiliza também o termo integração quando efetua a composição dos IFs com as ETVs às Universidades Federais, tanto nos processos de transformação quanto de integração, conforme consta no anexo II da lei. Na tabela 1 pode-se identificar por região do país, o número de instituições que compuseram os IFs, seja por transformação, seja por integração. Tabela 1- Quantitativo de Institutos Federais por região do Brasil e processos legais de criação. Região IFs Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Total 7 11 5 9 6 38 Criação mediante Transformação Integração 3 4 4 7 2 3 3 6 3 3 15 23 Fonte: Elaboração própria a partir da Lei nº 11.892/2008. Considerando a natureza de cada Instituição de Ensino que foi incorporada aos IFs, podem-se apreender alguns pontos críticos na busca da comunhão de fatores culturais, institucionais, sociais e políticos impostos com o advento da Lei 11.892/2008. Fávero e Sguissard (2012, p. 62) chamam a atenção para o caráter “mutualmente inclusivo” que as categorias qualidade e quantidade possuem, pois uma não exclui a outra, ao contrário, fazem parte do processo que compõe o todo. Afirmam ser impossível relacionar as categorias quantidade/qualidade e educação superior sem ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 229 um projeto político acadêmico-científico articulado eficazmente para as instituições universitárias; sem se estabelecer criteriosamente o tipo de universidade e de instituições de ensino superior que se pretende e de que a realidade brasileira necessita, verificando-se depois em que medida essas instituições poderão ser ampliadas. (FÁVERO; SGUISSARD, 2012, p. 62). Além destas preocupações, acrescenta-se a existência de diferentes concepções de qualidade, referenciadas em visões de mundo particulares que atuaram no cômputo da criação dos IFs. No caso do Brasil, identificam-se também influências provenientes dos organismos multilaterais que representam o sistema capitalista, interferindo diretamente na expansão da educação superior. Deste modo, observa-se a hibridez institucional que se configura na criação dos IFs, considerando que as instituições que foram transformadas ou integradas umas com as outras em uma fusão multidimensional tiveram que incorporar novos direcionamentos dos marcos legal e regulatório. A tabela 2 exibe a quantidade e os tipos de Instituições de Ensino por região do país que foram incorporadas aos IFs no momento de sua criação. Tabela 2 – Quantitativo e tipos de Instituições de Ensino envolvidas na criação dos IFs. Região Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Total Instituições de Ensino envolvidas na criação dos IFs em 2008* CEFET ETF EAF ET Vinculada 3 10 5 9 4 31 4 0 2 0 1 7 6 15 3 10 5 39 0 0 0 3 5 8 Total de instituições envolvidas na criação dos IFS 13 25 10 22 15 85 IFs criados 7 11 5 9 6 38 Fonte: Elaboração própria a partir da Lei nº 11.892/2008. Otranto (2010, 2012) menciona o contexto tenso vivenciado pelas instituições envolvidas na criação dos IFs. Os CEFETs possuíam o interesse direto em transformarem-se em Universidade Tecnológica a exemplo da Universidade Tecnológica do Paraná, contudo após alguns impasses e ajustes, os 31 CEFETs com exceção do CEFET RJ e do CEFET MG aderiram à Chamada Pública. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 230 Já as EAFs após intensos debates, entendimentos e dúvidas, inclusive com a intervenção do Conselho das Escolas Agrotécnicas Federais (CONEAF), obteve a adesão de todas, sem exceção, se integraram aos IFETs, transformando-se em um dos seus campi. No entanto, as dúvidas permaneceram em muitos docentes, técnicos e discentes, mas por outro lado, eles não vislumbraram outro jeito da instituição sobreviver [...] (OTRANTO, 2010, p.95). Ainda em relação à adesão, foram sete as ETFs que compuseram os IFs, além de oito ETVs às Universidades Federais, restando ainda 24 ETVs que não acenaram para a adesão, segundo o anexo III da Lei 11.892/2008. Tal cenário nos remete às origens destas instituições, bem como aos espaços territoriais que ocupavam nas dimensões rural e urbana, formando suas raízes identitárias. Somam-se também os seus propósitos de crescimentos institucionais aspirados até então, como prosseguimento de suas trajetórias educacionais, e que em função dos marcos legais e regulatórios foram suprimidos. Condições para a expansão dos IFs: a força da Lei A lei de criação dos IFs possui amplo espectro, já que ao criar a nova instituição calcada na verticalização do ensino a define como “instituições de educação superior, básica e profissional, pluricurriculares e multicampi, especializados na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino [...]” (BRASIL, 2008). Deste modo, sua diversidade estrutural física e administrativa, bem como pedagógica, de avaliação e gestão se mostra desafiadora, tendo em vista também a territoriedade estendida a todo país. Não obstante, a natureza jurídica autárquica, estabelecendo autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e disciplinar asseveram as dimensões desta instituição de ensino. Destaca-se, ainda, o fato dos IFs serem equiparados às universidades federais no tocante à regulação, avaliação e supervisão das instituições e dos cursos de educação superior, conforme registrado no Art. 2 º, § 1º da lei de sua criação. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 231 Diante desta amplitude institucional amparada e estimulada pela legalidade os IFs se encontram em plena expansão de seus campi, conforme demostrado na tabela 3, onde foram consideradas as cinco regiões do país no período que contempla desde a sua criação até dezembro de 2014. Tabela 3 – Quantitativo de expansão de campi por região do Brasil. Região IFS criados Nº de campi em 2009** Nº de campi em 2014*** Expansão dos campi Norte Nordeste CentroOeste Sudeste Sul Total da Expansão 7 11 40 114 68 169 28 55 % de expansão de cada região 70% 48,24% 5 35 54 19 54,28% 9 6 74 49 110 98 36 49 48,64% 100% 38 312 499 187 59,93% Fonte: Elaboração própria a partir da Lei nº 11.892/2008; **Portaria nº 4/2009 e ***PDI e Relatório de Gestão dos IFS. A expansão dos IFs se pauta também no Art. 2º. § 3º. que explicita a sua autonomia para criar e extinguir cursos, em seu campo de ação territorial, sendo responsável pelo registro de diplomas de seus cursos, resguardando as esferas legais do Conselho Superior. Toda esta independência institucional se reflete na tabela 3, ao se explicitar a expansão dos IFs, dando prosseguimento à aglutinação de identidades e culturas institucionais. Tais características de um tipo de organização acadêmica apresentada pelos IFs e por sua forma de expansão podem integrá-los à categoria expansão via alternativas (BRASIL), conforme estudos de Franco, Morosini e Zanettini-Ribeiro (2014, p.182). Na tabela 3 pode-se identificar a região sul como a que mais se expandiu no período. Esta região alcançou a totalidade de 100% de aumento de seus campi, seguida pela região norte com 70% de expansão. Já a região centro-oeste cresceu em número de campi pouco mais de 50%, enquanto a região sudeste apresentou a marca de 48,64%, e por fim, observa-se a região nordeste com 48,24% de crescimento de suas unidades. O apoio aos IFs tem se materializado em ações governamentais de incentivo à expansão não só pelos ritos legais, mas também por meio de eventos como, para citar o ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 232 exemplo mais recente, o Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica62, consolidando as experiências da expansão. Compõem as Comissões Organizadoras do encontro cerca de 50 instituições internacionais e 129 instituições nacionais, contando ainda com a participação de 30 IFs, diversas Escolas Técnicas Estaduais, Faculdades e Universidades. Cabe, no entanto, a reflexão acerca dos critérios para essa expansão, bem como do impacto sócio-educacional, político, econômico e cultural de tais ações, tendo em vista as características das instituições de ensino que deram origem aos IFs, bem como as suas adaptações para cumprirem um novo direcionamento institucional. É certo que já se passaram pouco mais de cinco anos da criação dos IFs, no entanto, os impactos educativos e culturais precisam ser observados e pautados de modo que se possa compreender e seguir na construção de um sistema de ensino capaz de formar sujeitos críticos, competentes e participativos, de modo a assumir a cidadania plena. Reflexões em ação: algumas considerações A proposta de estudo se insere no Eixo temático: Organização institucional e acadêmica na expansão da educação superior. Integra a pesquisa central que investiga a criação e expansão dos cursos de licenciatura nos IFs no âmbito brasileiro, contemplando as ações realizadas nas distintas fases ao longo da existência da instituição. Este artigo teve como foco principal a criação e a expansão dos IFs, considerando o cenário da Rede Federal de Educação Profissional e as implicações legais. O referencial teórico foi composto por pesquisas bibliográficas e documentais com o propósito de subsidiar as reflexões dos processos identitários pelos quais passam os IFs, na expansão de seus campi. 62 "O Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica (FMEPT) nasceu do Fórum Mundial de Educação e do Fórum Social Mundial. O evento faz parte de um movimento pela cidadania e pelo direito universal à educação, reunindo instituições, entidades e associações de todo o planeta.”. Disponível em: <http://www.fmept.org/pt/?page_id=68>.Acesso em 04 abr. 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 233 A partir desse estudo foi possível perceber o entrelaçamento das temáticas rural e urbana, bem como da cultura e da identidade, ao tratar os elementos que caracterizam as instituições de ensino que deram origem aos IFs. Tais instituições possuíam raízes identitárias institucionais e educacionais nos mundos rurais e urbanos das quais extraíram/extraem em suas particularidades, considerando o território continental brasileiro. Tal composição provoca novos questionamentos e acrescenta mais uma gama de variáveis no nosso lócus de investigação: os Institutos Federais. Somou-se ao estudo, a identificação das identidades das instituições envolvidas no contexto político que se instaurou com a Chamada Pública nº 002/ 2007, realizada pelo MEC/SETEC com objetivo de apresentar as propostas para constituição dos IFs. Estes, por sua vez, apresentam características que podem integrá-los às categorias de: a) expansão pela via numérica, e b) expansão via alternativas (BRASIL), apresentadas nos estudos sobre as organizações acadêmicas brasileiras, desenvolvidos por Franco, Morosini e Zanettini-Ribeiro (2014). A relevância da investigação se evidenciou ao buscar melhor compreender os fenômenos sociais que emergem das transformações da sociedade margeadas pelas esferas e interferências legais, políticas, educacionais e culturais do país. A continuidade deste estudo se pautará na investigação da expansão dos IFs, assim como das ações legais e promocionais do Estado, a exemplo, de instrumentos normativos para criação de novos institutos e novos campi e de ações de apoio a eventos de amplo espectro como o citado Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica. Referências ALVES-MAZZOTTI, A, J.; GEWANDSZNAJDER, F. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira, 1999. ASSIS, Renato L. de. Agroecologia no Brasil: análise do processo de difusão e perspectivas. 2002. 150p. Tese (Doutorado em Economia Aplicada), Universidade Estadual de Campinas, Campinas. AZEREDO, G.A de; CARVALHO, I.H. S. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 236 EXPANSÃO DOS CURSOS DE LICENCIATURA E ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E ACADÊMICA NOS ESTADOS DO PARÁ E RIO GRANDE DO NORTE. 63 Arlete Maria Monte de Camargo [email protected] Universidade Federal do Pará Alda Maria Duarte Araújo Castro64 [email protected] Universidade Federal do Rio Grande do Norte Eixo 2: Organização institucional e acadêmica na expansão da educação superior RESUMO O trabalho analisa a expansão da educação superior em cursos de licenciatura segundo a organização acadêmica no Pará e Rio Grande do Norte no período de 2003 a 2010. Tem como referência de análise, as mudanças ocorridas nas últimas décadas que culminaram no regime de acumulação com dominância da valorização financeira, as quais contribuíram para desencadear um conjunto de reformas na realidade brasileira, em especial, a reforma do aparelho do estado, com repercussões para a configuração da educação superior. Procurou-se desenvolver uma abordagem comparada dos dados da expansão dos cursos licenciaturas, nos Estados do Pará e do Rio Grande do Norte, com base nos dados do Inep e os resultados apontam para a prevalência da participação das universidades na expansão da educação superior nas licenciaturas, apesar das taxas de crescimento negativas observadas quanto ao número de matrículas e vagas nesses estados. Palavras-chave: Expansão da educação superior – Políticas de educação superior – Organização acadêmica - Licenciaturas 1. Situando a questão A comunicação ora apresentada resulta de estágio pós-doutoral realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e tem como referência, o projeto “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil” em curso pela Rede Universitas/Br. Procurou investigar as políticas de educação superior ocorridas entre os anos de 2003 a 2010, com foco nos cursos de licenciatura e considera, em suas análises, as mudanças ocorridas a partir das 63 Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação do Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do Pará. 64 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora do Programa de PósGraduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 237 quatro últimas décadas, que culminaram no “regime de acumulação com dominância de valorização financeira”. (CHESNAIS, 1996). Tais mudanças exigiram reformas institucionais também no Brasil, cuja matriz teórica, política e ideológica foi incorporada pela reforma do aparelho de Estado, iniciado em 1995, que sugeria um ambiente institucional que implicava o controle dos gastos do Estado, fim da regulação estatal e liberdade máxima para o capital. No que tange à educação superior, verificou-se a expansão da rede privada e abertura de espaço para a entrada do capital na rede pública, onde fosse possível e necessário, objetivando o que vem sendo definido como mercantilização da educação superior (PAULANI, 2008). A investigação foi orientada com base em três grandes hipóteses: (1) a existência de um novo paradigma que tem conduzido a um processo de mercantilização da produção do conhecimento; (2) a implementação de uma certificação em massa dos estudantes de graduação, nas redes privada e pública, e de pós-graduação, cada um desses níveis qualificando mão de obra destinada a diferentes patamares da economia e (3) mudanças nas relações entre universidade e sociedade, e dos padrões clássicos de ensino, pesquisa e extensão, de interesse mais imediato da sociedade. No campo da educação superior, as diretrizes formuladas pelos organismos internacionais constituem-se em referenciais importantes para os países da América Latina, entre eles, o Brasil. Segundo Moraes e Pacheco (2003, p. 15), esses organismos tem apresentado recomendações gerais para as políticas educacionais, voltadas para mudanças qualitativas nos sistemas educativos de vários países e que acabam por encontrar eco entre os dirigentes e policy makers nacionais, em face da necessidade de acesso aos fundos financeiros de que os países necessitam. Desde então vem se observando uma mudança no padrão de ensino superior para um novo modelo, em que as instituições isoladas passam a ser a regra, em substituição ao padrão de instituições universitárias tradicionais, referido anteriormente. Novos protagonistas passam a concorrer com as universidades tradicionais, podendo, também podem atuar de forma complementar ou em parceria. É o caso das universidades corporativas, empresas instrucionais, e entidades de intermediação, responsáveis pelo estabelecimento de elos entre os provedores da educação superior e os consumidores. Ademais, verificaram-se mudanças igualmente nas relações entre universidade e sociedade, para além dos padrões clássicos de ensino, pesquisa e extensão, com a assunção de funções de interesse mais imediato da sociedade. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 238 Sem dúvida, essas mudanças modificam o padrão usual de oferta da educação superior, realizado, predominantemente em universidades tradicionais, de natureza pública, voltadas para a formação de elites, produção do conhecimento e desenvolvimento da cultura em geral (CABRAL NETO, CASTRO, 2011, P. 16). A predominância das orientações dos organismos internacionais que se constituem em referenciais comuns para o continente latino-americano não impede que, nas políticas implementadas, outras influências também possam valer. Segundo Cabral Neto e Castro (Idem, p. 21), “as decisões não ocorrem de forma unilateral; pelo contrário, são compartilhadas com as autoridades nacionais, havendo uma confluência de interesses e objetivos no campo político e econômico, assumindo características e peculiaridades locais”. Concomitantemente à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB nº 9.394/1996 foram implantadas diferentes políticas educacionais voltadas ao atendimento às demandas nacionais por qualificação de professores na realidade brasileira, bem como aos compromissos internacionais firmados com o objetivo de ampliar a qualificação dos professores da educação básica. Pela importância que tais mudanças assumem no quadro da educação superior brasileira, é que se destaca para a análise o eixo referente à organização acadêmicoinstitucional no que diz respeito à formação de professores. Dessa forma, procurou-se responder a questões voltadas para a compreensão de como a expansão da educação superior se configura no país no tocante à atuação das diferentes formas de organização acadêmica. Por organização acadêmico-institucional, tomou-se o conceito explicitado por Morosini et al. (2010) as quais entendem “os tipos de Instituições de Educação Superior - IES mantidos e/ou criados pelos documentos normativos surgido no período pós-LDB/1996, incluídos as universidades, centros universitários, faculdades tecnológicas e universidades tecnológicas, que servem de referência, dentre outros. (BRASIL, 1996). Um primeiro movimento no sentido de compreender o processo de expansão na educação superior ocorreu em 2006 pela Rede Universitas/Br, a qual realizou análise nos 27 estados brasileiros acerca desse processo de expansão. As principais constatações foram as seguintes: 1) o crescimento do sistema; 2) o crescimento do sistema pela via das IES privadas; 3) a perda de espaço das universidades quando comparadas com outras organizações acadêmicas de Educação Superior; 4) a centralização progressiva do Sistema de Educação Superior - SES; 5) a concentração geográfica do SES; 6) a inserção social através da ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 239 incorporação de outras formas desenvolvidas pelo setor privado; 7) o desequilíbrio de ofertas de formação profissional; 8) a ociosidade de vagas; 9) a qualificação das funções docentes (RISTOFF & GIOLO, 2006). Dessa forma, os resultados sinalizaram para o crescimento do sistema de Ensino Superior, sobretudo das IES privadas, redução da participação da oferta pelas universidades em relação a outras formas de organização acadêmica, bem como desequilíbrio na oferta de formação profissional. Com a aprovação da LDB, em 1996, há uma redefinição das exigências quanto à formação docente em nível superior, inclusive dos professores em atuação na educação básica, sendo estimulada a formação em serviço, fenômeno observado em âmbito mundial. Dessa forma, procurou-se responder em que medida as tendências observadas na expansão da educação superior irão repercutir na formação de professores? A investigação aqui relatada procurou investigar a natureza dessa expansão, quais suas principais características no que diz respeito às matrículas, vagas ofertadas e concluintes. Dado os limites deste trabalho, procurou-se explorar as variáveis matrículas e vagas ofertadas. Para isso, foi realizado um estudo de caso (LAVILLE e DIONE, 1999, p. 155), já que se refere à análise do fenômeno da expansão do ensino superior na formação de professores nos estados do Pará e Rio Grande do Norte, tidos como significativos. Considera-se, assim, esses casos como representativos de um conjunto de casos análogos possibilitando o aprofundamento da questão estudada. Adotou-se uma metodologia comparada buscando identificar aspectos semelhantes e mudanças convergentes no fenômeno estudado. O confronto entre essas duas realidades ocorreu com base em estatísticas oficiais, dados, portanto, secundários padronizados a partir de dados primários pelo Inep/MEC. (MORAES e PACHECO, 2003, P. 12). Segundo esses autores, na busca de uma compreensão significativa, no processo de comparação que envolve essa metodologia, é necessário levar a efeito tanto a justaposição de realidades quanto a descrição e interpretação de factos e contextos. (IDEM, p. 13). Foi definida uma série histórica de oito anos – 2003 a 2010 - que expressa a evolução do fenômeno, tomando, como referência o início e término do governo Lula da Silva (20032006) e (2007-2010) que se deu no período pós- LDB, período no qual observou-se convergências e divergências no fenômeno estudado nos estados do Pará e do Rio Grande do Norte em relação à taxa de crescimento de matrículas, vagas ofertadas e concluintes. Nesta comunicação será abordado aspectos relativos à matrículas e vagas ofertadas. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 240 2. A formação de professores e a expansão do ensino superior na literatura correlata Em artigo que aborda, especificamente, o papel das universidades em relação à formação docente, Charlot e Silva (2010) procuram analisar os desafios enfrentados pelas universidades contemporâneas em âmbito mundial. Um desses desafios é o de questionar a pertinência na atualidade da tarefa de formar professores. Esses autores mostram que a formação dos professores foi o principal objetivo das universidades do século XX e, segundo os mesmos esse objetivo pode ser conflitante com a ênfase cada vez maior na pesquisa. Questionam: qual será o seu destino em universidades incitadas a focalizar a pesquisa? A formação de professores continuará a ser central nas universidades? Uma das contribuições adicionais dos autores é a de problematizar a já tradicional diferença existente nas universidades, a formação de professores para o ensino secundário e para o chamado ensino primário, já que a formação do professor de ensino primário foi suprimida das missões das universidades, até há pouco tempo. Diferentemente, a formação do professor de ensino secundário foi o projeto central das universidades nos tempos modernos. Por que essa diferença ocorreu? Por fim, analisam-se as principais evoluções contemporâneas do ensino superior: internacionalização, mercantilização e diferenciação. Avançam-se algumas hipóteses sobre o que será a formação dos docentes naquelas universidades do século XXI. Uma das produções relevantes para a compreensão do processo de expansão da educação superior no Brasil é a de Fávero e Sguissardi (2012). Nesse artigo, os autores desenvolvem argumentação de que, para se pensar a relação quantidade/qualidade e educação superior, faz-se necessário um projeto político-acadêmico articulado, em que se estabeleça o tipo de universidade e de instituições de ensino superior de que o país necessita. Observam, ainda, os autores que a expansão da educação superior deve ser entendida como um processo, no qual a quantidade se transforma em qualidade e vice-versa e, para que isso se efetive, é necessário, antes de tudo, estabelecer tipos e modelos de instituições e, depois como devem ser ampliados. Os referidos autores mostram ainda, que, no período de 1999 a 2010, a expansão da educação superior tem sido marcada pela influência de interesses das instituições privadas e com ações pautadas pelo cunho mercantil, os quais em geral dificultam a existência de instituições universitárias requeridas pelo desenvolvimento democrático e soberano do país. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 241 Concernente à identificação dos marcos regulatórios norteadores das políticas de expansão do ensino superior e à formação de professores nas universidades, identificam-se três artigos publicados em 2012 na Revista Educação em Questão. O primeiro deles é o de Franco e Morosini (2012) em que procuram identificar as principais categorias expressas em marcos regulatórios da expansão da Educação Superior brasileira pós-LDB/1996. O artigo abrange a organização institucional e acadêmica (formatos e modalidades) e suas aproximações com a internacionalização. Em uma perspectiva histórica, as autoras observam que há uma relação significativa entre marcos regulatórios e a emergência de formatos organizacionais institucionais em geral. No contexto pós-LDB, isso não é diferente; os marcos regulatórios da expansão da educação superior acompanham os movimentos expansionistas observados mais recentemente. Para isso, são decisivas as circunstâncias socioeconômicas, os movimentos temporais, como é o caso de uma das tendências na educação superior como a da internacionalização. Segundo essas autoras, o movimento expansionista nesse contexto Veio em resposta a demandas pelo acesso à educação superior; por outro, deixou o sistema mais complexo na medida em que as leituras e análises sobre as novas modalidades, gestaram interpretações e críticas de sua força privatizadora do público e também da publicização do particular. Foram mudanças significativas na base organizativa − princípio da diversificação (formatos, cursos, modalidades terminais, diplomas e certificados), proliferação de ofertas de cursos e programas nas diferentes modalidades a distância, semipresenciais, bem como de cursos superiores tecnológicos; também não se pode omitir que houve um incremento da diversificação e da diferenciação (formatos e modalidades na organização institucional e acadêmica, articulação às tendências internacionais). (FRANCO E MOROSINI, 2012). Entre as possibilidades abordadas pelas autoras, destaca-se o estabelecimento da Universidade Aberta do Brasil (UAB), um dos marcos regulatórios65 pela sua importância como indutor da expansão, seja pela via de formatos organizativos inovadores e de modalidades de oferecimento diversificadas, como os polos educacionais nos municípios e o sistema de tutoria a distância. Essas características abrem e ampliam a possibilidade de acesso ao ensino superior, nas regiões e municípios distantes. Isso pode ser observado com base em mecanismos favorecedores de benefícios para as universidades federais que aderissem ao sistema da UAB, do caráter regulatório que advém da Decreto nº 5.800, de 08 de junho de 2006. Dispõe sobre o Sistema Universidade Aberta do Brasil − UAB. Disponível em: <http://uab.capes.gov.br/images/stories/downloads/legislacao/decreto5800.pdf> ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 65 242 política expansionista da UAB, sob a direção da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)66. Dentre outros indutores das políticas expansionistas, as autoras destacam o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), instituído pela Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), as políticas de cotas e o Programa Universidade para Todos (ProUni). Outros exemplos são destacados por Franco e Morosini (2012, p. 183) como é o caso do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), surgido ao final da década de 1990, mas que só passou a ser considerado para o ingresso na Educação Superior, em meados dos anos 2000, o que, para as autoras, contribui para fortalecer a expansão qualificada do sistema. Adicionalmente, com a instituição do ProUni, vinculando as bolsas oferecidas em IES privadas às notas obtidas no exame foi dado mais um passo na direção de indução das políticas de expansão. As autoras concluem sua argumentação ressaltando a importância de se entender as forças indutoras que subjazem a esses marcos regulatórios, suas marcas e sentidos, o que pode significar possibilidade de redirecioná-los. Adicionalmente, Maués e Camargo (2012) procuram identificar e analisar os marcos regulatórios no que tange às políticas de formação e valorização docente pós-LDB após a aprovação da LDB nº 9.394/1996. Essa lei ensejou a edição de novos marcos regulatórios manifestados mediante orientações que definem políticas e recomendações sobre o trabalho e formação docente. Segundo as autoras, sinalizam para a adoção de medidas que requalifiquem os cursos de formação de professores, além de soluções que coloquem o sistema educacional em sintonia com as mudanças econômicas e sociais na atualidade. O foco dessas medidas pode ser constatado na agenda educacional direcionada para a gestão, financiamento e avaliação da educação, visto que essas orientações interferem, diretamente, na formação e no trabalho docente. Silva e Castro (2007) procuram discutir as diretrizes da política de formação inicial de professores implantada no Brasil na década de 1990, que, conforme já mencionado, trouxeram novos direcionamentos e exigências, tanto para as instituições formadoras quanto para o próprio processo de formação docente. Esse foi o caso dos centros federais de educação tecnológica, que, foram introduzidos como lócus de formação, em que são valorizados Sobre o assunto ler Sousa (2012) “Universidade Aberta do Brasil como política de formação de professores’. Disponível em: <http://www.revistaeduquestao.educ.ufrn.br/pdfs/v42n28.pdf> ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 66 243 aspectos quantitativos, otimização dos recursos e a instrumentalização da formação, não obstante o discurso da qualidade do processo educacional (Op. cit). Zainko (2010) analisa a política de expansão da educação superior colocada em prática no Governo Lula da Silva, além de apresentar as ações estratégicas que vêm sendo desenvolvidas para minimizar os déficits na escolarização e debater os desafios apresentados por estudiosos e dirigentes na Conferência Mundial de Educação Superior com especial ênfase no papel que a formação dos professores assume no momento atual. Procura situar aspectos das políticas de formação em desenvolvimento nas universidades, bem como a influência significativa no fazer acadêmico, trazidas pelas tendências internacionais no século XXI, quando foi acentuada a influência da "mundialização" sobre os processos de formação na educação superior, os quais não podem mais ser pensados nos limites das fronteiras nacionais. 3. Cenário da expansão da educação superior brasileira no período 2003 a 2010: o foco no Pará e no Rio Grande do Norte O período estudado abrange os mandatos dos governos de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2006) e (2007-2010), em que apesar de manter um discurso progressista e democrático deu continuidade à política neoliberal de seu antecessor Fernando Henrique Cardoso. Para ampliação das vagas no setor privado, o governo manteve as diretrizes de diferenciação e diversificação da oferta nesse nível de ensino, ampliação da isenção fiscal em instituições privadas de ensino superior mediante a criação do PROUNI em 2005, além da continuidade do Fundo de Financiamento Estudantil - FIES. Em relação ao setor público, verificou-se uma retração da oferta, tendo em vista as políticas vigentes que secundarizaram do ponto de vista financeiro as chamadas políticas sociais. Em relação às Universidades Públicas Federais o governo criou o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni67) – com o objetivo de ampliar o acesso e permanência na educação superior. Essas medidas de indução da expansão do ensino superior, sem dúvida contribuíram de forma significativa para ampliar o número de alunos matriculados nesse nível de ensino, melhorando os índices de atendimento do País. Sobre o assunto, ver Medeiros, Luciene M. “O Reuni – uma nova regulação da política de expansão da educação superior: o caso da UFPA” (2012). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 67 244 Dessa forma, o período estudado é marcado pelo crescimento do sistema de educação superior, sobretudo pela via das IES privadas; além disso, observou-se uma perda de espaço das instituições universitárias se comparadas com outras organizações acadêmicas de Educação Superior (RISTOFF e GIOLO, 2006). Ainda sobre o fenômeno da expansão da educação superior, Mancebo (2013, p. 22), em análise sobre o crescimento desse nível de ensino, observa que, no início do mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, a situação assim se apresentava: 39,8% das matrículas se davam em IES públicas e 60,2% nas privadas. Ao final do seu governo, houve uma redução da participação do setor público (30,8%) e aumento no setor privado (69,2%). Em comparação com esse governo, ao final do governo Lula da Silva, essa tendência privatizante foi ampliada com 25,8% de matrículas nas IES públicas e 74,2% nas IES privadas. Ressalte-se que, de 1995 a 2010, houve um aumento de matrículas na ordem de 262,52%, com o predomínio do crescimento do setor privado, como já visto. O fortalecimento da iniciativa privada tem sido incentivado pela formação de grandes conglomerados, da participação internacional por meio de ações na Bolsa de Valores, além das parcerias público-privadas, como é o caso do Programa Universidade para Todos (Prouni) e do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Segundo Mancebo (2013, p. 25), os principais traços da expansão no âmbito do setor privado são a concentração institucional, a financeirização e a internacionalização da educação superior. Essa autora destaca ainda que no caso das políticas de expansão voltadas para o setor público, o Reuni é direcionado para pactuação de metas (ampliação do número de estudantes, da relação professor-aluno, diversificação das modalidades dos cursos de graduação, elevação da taxa de conclusão dos cursos de graduação, dentre outros) pelas IES públicas, com a ampliação de recursos limitados a 20% das despesas de custeio e pessoal, vinculados à capacidade orçamentária e operacional do MEC. 3.1 A expansão do ensino superior e a diversificação da oferta em cursos de licenciatura no Pará e Rio Grande do Norte Os estados do Pará e do Rio Grande do Norte, já se constituíram em objeto de estudo sobre a expansão da educação superior, cujos resultados foram publicados em livro que analisa as políticas de expansão da educação superior no Brasil. (CABRAL NETO, NASCIMENTO e CHAVES, 2011). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 245 No período estudado, 1996 a 2008, o número de cursos de graduação no estado do Pará quase que quintuplicou, havendo um aumento de 213,2% predominando o setor privado; a predominância do setor privado se dá também pelo aumento substancial do número de matrículas atingindo 348% no período estudado, enquanto no setor público o percentual foi de 85,7%. (CHAVES et al., 2011, p. 53). Segundo Cabral Neto e Castro (2011, p. 21), nesse período a situação no estado do Rio Grande do Norte não foi diferente do que ocorreu no restante do Brasil, com a expansão do ensino superior privado. Os autores constatam que o crescimento das instituições de ensino superior se deu, predominantemente, no setor privado, 800% no período estudado, e no setor público, foi de 66,7%; esse elevado crescimento do número de instituições ocorreu em Faculdades, escolas e institutos superiores, formato organizacional estimulado no processo de expansão da educação superior brasileira, menos oneroso e de fácil manutenção. Em relação aos cursos de licenciatura, o período estudado é marcado por mudanças nas políticas educacionais no que diz respeito à formação de professores, já que as políticas até então adotadas não conseguiam ainda alterar de forma significativa os índices na formação de professores em nível superior. No período, destacam-se inúmeros programas voltados para a melhoria da formação docente no Brasil entre eles o Programa de Formação de Professores da Educação Básica – Parfor - na modalidade presencial e a distância (Brasil, 2009) Segundo dados fornecidos pela Capes (2013), havia 1565 cursos de licenciatura ofertados a partir do Parfor. No Pará, havia 538 cursos ofertados e no Rio Grande do Norte, 46 cursos. No estado do Pará, cinco instituições de ensino superior estavam envolvidas com a oferta de cursos (1ª licenciatura): quatro universidades públicas e um instituto federal; o estado que apresentava maior número de turmas em andamento. No estado do Rio Grande do Norte, também havia cinco instituições de ensino superior envolvidas, sendo três universidades públicas e dois institutos, localizados nas cidades de Angicos, Açu, Apodi, Mossoró, Natal e Pau dos Ferros. Os cursos no total de 52 ofertados abrangiam a 1ª licenciatura e a 2ª licenciatura. É válido destacar a participação dos institutos de educação tecnológica nos programas de formação, IES sem tradição na formação de professores, mas que vem sendo estimuladas pelo Governo Federal a ingressar no campo da formação. Além disso, atuam no programa universidades públicas federais e estaduais. Entre as federais, outra novidade é a participação ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 246 das universidades rurais; no caso do Pará, a instituição envolvida, Universidade Federal Rural da Amazônia, não tem tradição no campo da formação de professores. Importante lembrar que, quando da aprovação da LDB em 1996, houve um aumento da procura pelos cursos de licenciatura, já que foi ampliada a exigência de qualificação dos professores para atuar na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, movimento que não teve continuidade posteriormente. É provável que a redução na matrícula tenha ocorrido em decorrência da baixa procura por esses cursos, sobretudo pela população na faixa de 18 a 24 anos, que não vêm na profissão docente uma carreira promissora em termos de remuneração. Por outro lado, a rentabilidade comercial desses cursos é muito baixa, não sendo atrativos para o setor privado. Outra possibilidade é a de que essa redução possa ser explicada em função da ampliação dos cursos de licenciatura na modalidade a distância, comercialmente mais lucrativos e que têm sido priorizados na atual política do MEC para a formação de professores. Adicionalmente, importa lembrar que com a aprovação das Resoluções CNE/CP nº 01, de 18 de fevereiro de 200268, e a Resolução CNE/CP nº 0269, de 19 de fevereiro de 2002, os cursos de licenciatura iniciaram o processo de separação dos cursos de bacharelado, com suas propostas pedagógicas desvinculadas desses cursos, o que, historicamente, sempre ocorreu de forma integrada. Assim, com a extinção dos formatos anteriormente existentes, o ingresso dos estudantes em cursos de licenciatura (Biologia, Física, Geografia, História, Letras, Matemática, Química, etc.) passou a ocorrer desvinculado dos cursos de bacharelados, o que deve ter refletido nas estatísticas referentes à oferta desses cursos como as que envolvem número de cursos, vagas, matrículas, concluintes, etc. A tabela abaixo expressa a evolução no período de 2003 a 2010 no que diz respeito à matrícula nos estados analisados tendo, como referência a organização institucional. 68 Instituiu Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena 69 Institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da Educação básica em nível superior. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 247 Tabela 1 – Crescimento de matrículas nas licenciaturas, por organização acadêmica no Pará e Rio Grande do Norte – 2003 a 2010 CENTRO/ INSTITUTO FEDERAL UNIVERSIDADE CENTROS UNIVERSITÁRIOS FACULDADE Pará RN Pará RN Pará RN Pará RN 2003 45.957 21.252 2.212 - 810 692 2070 127 2004 49.904 19.271 3.279 47 1.310 744 1.726 211 2005 51.092 19.083 2.150 83 2.150 563 538 374 2006 50.462 19.684 2.245 133 2.245 819 920 494 2007 45.959 19.740 1.406 92 2.480 1.077 1.229 640 2008 44.298 16.721 1.525 - 5.822 1.674 1.493 772 2009 18.564 12.828 783 - 3.215 1.020 1.362 722 ANO 2010 25.740 12.685 658 3.182 1.057 653 1.007 2003-44 -40,3 -70,6 292,8 52,7 -68.5 693 2010 ∆% Fonte: Mec/Inep/Deed – Anos de 2003 a 2008 (Microdados). Anos 2009 e 2010 (Inepdata). Em relação ao estado do Pará, constata-se que a maior oferta se dá a partir das universidades, seguida pelas faculdades, instituições privadas. Apesar disso, verifica-se uma taxa de crescimento negativa nas universidades no período analisado (- 44), o que é igualmente observado nos centros universitários. Assim é que, há uma gradual diminuição das matrículas pelas universidades no estado, cuja centralidade havia sido priorizada no século anterior. Essa constatação, que decorre do incentivo à diversificação institucional no âmbito do ensino superior, terá implicações do ponto de vista da oferta dos cursos de licenciatura. Isso significa dizer que outras instituições passaram a se responsabilizar pela tarefa de formar professores, como é o caso das faculdades e centros/institutos federais, como se verá a seguir. A única taxa de crescimento positiva observada foi nas faculdades (292,8%), o que reflete uma ampliação da participação desse tipo de organização institucional na educação superior como um todo, tendência já indicada na expansão da educação superior no Brasil. É importante lembrar que as faculdades se constituem na opção preferencial do setor privado, e que ganharam força com a viabilização de políticas como o Prouni e Fies; além disso, o investimento na infraestrutura desses cursos costuma ser de baixo custo, o que, de certa forma, viabiliza a sua oferta. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 248 Assim como no estado do Pará, o crescimento na matrícula em cursos de licenciatura no Rio Grande do Norte apresenta a seguinte situação: a maior oferta ocorre nas universidades, mas essa oferta vem sendo reduzida no período estudado, já que a taxa de crescimento percentual é negativa (-40,3%). Desde 2008, não há registro de matrículas em centros universitários, o que pode indicar uma tendência em relação aos centros universitários existentes, os quais deixaram de priorizar a oferta dessa modalidade de curso presencialmente. As matrículas em faculdades no período tiveram uma taxa de crescimento na ordem de 52,7%, sinalizando, assim, um crescimento positivo nesse tipo de organização acadêmica. A maior taxa de crescimento de matrículas no período estudado ocorreu em Centros e Institutos Federais (693%), o que revela a centralidade na oferta dos cursos de licenciatura por essas instituições mencionadas anteriormente. Apesar disso, a taxa de crescimento no Pará, nessa forma de organização acadêmica foi negativa. Em relação à oferta de vagas, a situação poderá ser melhor percebida a partir da tabela abaixo ficando evidenciada a taxa de crescimento nesse período. Tabela nº 2 – Número de vagas em cursos de licenciatura segundo a organização acadêmica nos estados do Pará e Rio Grande do Norte – 2003 a 2010. UNIVERSIDADE CENTRO FACULDADE UNIVERSITÁRIO PA RN PA RN PA RN CENTRO/INSTITUT O FEDERAL PA RN 2003 2.730 1.344 600 - 557 370 400 60 2004 4.917 1.675 1.280 80 661 370 280 60 2005 3.570 1.496 840 40 1.495 300 - - 2006 3.469 1.724 1.440 140 1.160 590 - 42 2007 2.075 1.454 500 - 1.729 490 282 177 2008 3.892 1.429 619 - 3.121 840 320 185 2009 4.902 4.485 760 - 3.125 925 1.220 485 2010 4.717 4.450 440 - 3.195 980 280 560 231 -26,7 473,6 164,9 -30 833,3 ANO 2003-2010∆% 72,8 Fonte: Mec/Inep/Deed – Anos de 2003 a 2008 (Microdados). Anos 2009 e 2010 (Inepdata). No que se refere às universidades, a taxa de crescimento se apresenta positivamente nos dois estados estudados; no estado do Pará a taxa é de 72,8% e no estado do Rio Grande do ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 249 Norte é de 231%, o que indica uma ampliação na oferta de vagas nessa modalidade organizacional nesses estados, em especial no Rio Grande do Norte. Entre as prováveis explicações para essa ampliação está a criação de novas instituições universitárias localizadas em cidades do interior desses estados; além disso, a criação do Parfor em 2009 pode ter contribuído para a ampliação das vagas observadas no ano de 2010, bem como as vagas surgidas com o Reuni. Os centros universitários apresentam crescimento negativo no estado do Pará, com uma taxa de crescimento de (-26,7%), o que indica, uma tendência de decréscimo na oferta desses cursos. No estado do Rio Grande do Norte esses dados são quase inexistentes. Nos anos de 2003 a 2006, registra-se um número insignificantes de vagas, (140 vagas no ano de 2006), não tendo sido possível identificar nos microdados do Inep, dados referentes os anos de 2007 a 2010, o que pode indicar a não existência de vagas em cursos de licenciatura nesse tipo de organização acadêmica nesse Estado. Em relação ao número de vagas, pode-se inferir, considerando as taxas negativas de vagas no Pará e a inexistência de informações no RN, é que os cursos de licenciatura não são uma prioridade nesse tipo de organização institucional. Os dados da Tabela 2 evidenciam que o crescimento das vagas para os cursos de licenciatura vão ocorrer nas faculdades. Instituições que priorizam o ensino em detrimento da extensão e da pesquisa, com sérias repercussões para a formação. As matrículas nas Faculdades, tiveram um crescimento significativo nos dois estados. No Pará cresceram 473,6% e no Rio Grande do Norte cresceram 164,9%. Quanto ao crescimento das vagas em centro/instituto federal ele só vai ocorrer positivamente no Rio Grande do Norte, com um percentual de 833,3%, essa tendência não é registrada no Pará, que tem uma redução no número de vagas de (- 30%). Esse grande crescimento no RN pode indicar que naquele estado a tarefa de formar professores, antes prioridade nas instituições universitárias, passa a ser assumida por essas recentes instituições de ensino superior, sem tradição nessa tarefa. De modo geral, observou-se uma desaceleração da expansão do ensino superior nos estados do Pará e Rio Grande do Norte em universidades no que diz respeito aos cursos de licenciatura, considerando a variável matrículas. A taxa de crescimento positiva, nos dois estados, ocorreu em relação às vagas ofertadas nos dois estados. O cenário acima exposto acerca das matrículas, vagas e concluintes sugere uma redefinição nas prioridades na expansão da educação superior no âmbito das diversas formas de organização acadêmica no que tange aos cursos de licenciatura; novos formatos ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 250 organizacionais passam a priorizar a oferta desses cursos como é o caso dos centros/institutos federais e das faculdades. Considerando que o período estudado vai do ano de 2003 a 2010, não será possível observar os efeitos da ampliação constatada no ano de 2010 (vagas ofertadas) no que diz respeito à variável concluintes. CONSIDERAÇÕES FINAIS As novas demandas por qualificação dos profissionais da educação, intensificadas ao final do século passado alargaram as possibilidades de desenvolvimento de cursos em nível superior; essa situação foi particularmente observada em cursos de licenciatura tendo em vista a necessidade de qualificar os profissionais que atuam na educação infantil e nos anos iniciais da escolarização Dessa forma, com o crescimento do sistema de educação superior e consequente diversificação institucional, o processo de formação docente passou a ser assumido por outras instituições do ponto de vista da organização acadêmica, como é o caso das Faculdades e dos Centros e Institutos Federais. Isso vem constatar uma perda de espaço das universidades nessa tarefa formativa, inclusive no âmbito das instituições de ensino federais, já que essa tarefa passa a ser dividida com os Centros/Institutos Federais, que passaram a atuar como lócus de formação docente, com a utilização de parâmetros quantitativos, otimização dos recursos e a instrumentalização da formação (SILVA E CASTRO, 2007), já que tem se verificado resistência por parte das universidades públicas a iniciativas ocorridas no campo de formação de professores, como a rejeição da criação dos cursos normais superiores no âmbito universitário. Em relação ao número de matrículas ainda prevalece a maior parte da oferta pelas universidades, apesar de se constatar taxa de crescimento negativa nas matrículas no período de 2003 a 2010, tanto no estado do Pará (-44%), como no estado do Rio Grande do Norte (40%), diferentemente da taxa de crescimento em faculdades e centros e institutos federais. Isso vem corroborar o entendimento de que a centralidade na formação de professores deixa de ser prioridade das instituições universitárias, sendo assumida por outras formas de organização acadêmica. Outra constatação é de que a taxa de crescimento das vagas em cursos de licenciatura ofertados pelas universidades se apresenta positivamente nos dois estados estudados; no estado do Pará, a taxa é de 72,8% enquanto, no estado do Rio Grande do Norte é de 231%. Entre as prováveis explicações para essa ampliação, está a criação de novas instituições ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 251 universitárias localizadas em cidades do interior desses estados; além disso, a criação do Parfor em 2009, pode haver contribuído para a ampliação das vagas observadas no ano de 2010. Essa ampliação também será significativa nas faculdades e centros/institutos federais, sendo inclusive superior às das Universidades; com exceção do estado do Pará como já referido. REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, pela União Federal, em regime de colaboração com Municípios, Distrito Federal e Estados, e a participação das famílias e da comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira, visando a mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 25 abr. 2007. Seção 1, p. 5-6. _____ Decreto nº 6.755, de 29 de Janeiro de 2009. Institui a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, disciplina a atuação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior- Capes no fomento a programas de formação inicial e continuada, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.adurrj.org.br/4poli/gruposadur/gtpe/decreto_6755_29_1_09.htm>. Acesso em: 10 maio de 2009. CABRAL NETO, Antonio; CASTRO, Alda Maria Araújo. A supremacia da iniciativa privada na expansão do ensino superior: realidade brasileira e repercussões no RN. In CABRAL NETO; NASCIMENTO e CHAVES. Política de expansão da educação superior no Brasil: democratização às avessas. São Paulo: Xamã, 2011, p. 15-38. CHAVES; CAMARGO; MONTE e MORAES. A expansão da educação superior no Pará: cenário atual e tendências. CABRAL NETO; NASCIMENTO e CHAVES. Política de expansão da educação superior no Brasil: democratização às avessas. São Paulo: Xamã, 2011, p. 39-64. CHESNAIS, François. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 253 ORGANISMOS INTERNACIONAIS E AS POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR Edinilza Magalhães da Costa Souza E-mail: [email protected] Instituição: Universidade Federal do Pará/UFPA Eixo Temático 2- Organização institucional e acadêmica na expansão da educação superior RESUMO: Trata este artigo da política da educação superior e a intervenção dos organismos financeiros internacionais como o Banco Interamericano de desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial (BM), na condução das políticas de ensino superior. Este estudo é parte da pesquisa que realizamos no curso de Mestrado em Educação sobre formação e profissionalização docente. Considerando que as políticas orientadas para a educação superior nos países da América Latina são decorrência dos ajustes estruturais, reestruturação produtiva na atual fase de crise do capitalismo mundial, os mecanismos propostos pelo BM e BID deixam evidentes o processo de mercantilização da educação superior, em que a diversificação de instituições de ensino, fontes de financiamento e mudanças nas funções do Estado, abrem prerrogativas para a iniciativa privada. Assim, assiste-se a grande expansão de instituições privadas de ensino superior e mudanças operadas nas instituições públicas de ensino, uma vez que passam a inserir-se no setor de serviços não-exclusivos do Estado, permitindo que sejam transferidas a responsabilidade por sua execução às entidades não estatais e à iniciativa privada, como forma de reduzir custos. PALAVRAS-CHAVES: Mercantilização; Educação superior; Organismos Internacionais; Este artigo discute sobre a reestruturação da educação superior a partir das orientações propostas pelos organismos financeiros internacionais, dentre os quais destacamos as proposições do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco Mundial (BM). O processo de reformas estruturais que se desencadeia a partir dos anos de 1990, no Brasil, é parte do movimento de crise do capitalismo mundial e dos ajustes estruturais, que afetam os diferentes países. Portanto, tais mudanças acompanham as transformações de base econômica em nível global, com repercussões diretas nas esferas políticas, econômicas, sociais e culturais. O objetivo deste estudo foi analisar o processo de intervenção dos organismos ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 254 internacionais (BID e BM) na condução das reformas da educação superior no contexto das reformas de Estado brasileiro. Esta análise é parte da pesquisa desenvolvida sobre Formação e profissionalização docente, no Mestrado em políticas publicas educacionais, cuja metodologia tomou por base a pesquisa bibliográfica e documental e análise de conteúdo. A análise, que aqui se desenvolve, volta-se, pois, às estratégias do Banco Mundial (BM) e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), bem como suas influências nas reformas da educação e nas reformas na educação superior , que, apesar da peculiar forma de materialização de tais políticas no Brasil, guarda ressonância das influências externas. Convém relembrar que as orientações postuladas pelos organismos internacionais para a reforma do sistema de ensino, no Brasil, apresentam como causa a crise do Estado Brasileiro, repercutindo, consequentemente, em uma crise do sistema educacional. Os princípios orientadores da reforma se embasam na lógica de eficiência e qualidade do ensino, cujos índices educacionais revelam que o ensino nos países da América Latina é bastante deficiente, haja vista suas condições históricas, políticas e sociais. A partir dos anos 1960/70, de acordo com Silva (2002), com a acelerada expansão da educação e o aumento dos índices de matrículas nos países economicamente dependentes dos investimentos externos, ocorreu o processo de intervenção do Banco Mundial nas políticas educacionais, cuja estratégia vinculava-se ao desenvolvimento de políticas que contivessem a grande demanda pelo ensino público. Na década de 1980, o Banco Mundial assume a liderança “da condução das políticas e das estratégias sociais e educacionais, sistematizandoas nos documentos oficias” (SILVA, 2002, p 67). Nos anos 80/90, a educação, enquanto política social, adquire grande relevância para os objetivos do capital, visto que as ideias de livre-mercado e o modelo de gestão empresarial ganham destaque. Com o acelerado desenvolvimento econômico e tecnológico, postula-se que, mediante a valorização da educação, novas gerações serão formadas para atuar no processo de produção capitalista, que, agora, se torna mais exigente, com o processo de reestruturação produtiva que requer um novo perfil de trabalhador, que atenda as demandas mercadológicas. O Banco Mundial, desde sua criação, exerce influência e desempenha papel fundamental no que concerne ao desenvolvimento econômico em âmbito internacional. Sua importância não se refere, entretanto, apenas ao fornecimento de investimentos aos países, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 255 mas, sobretudo, no processo de ajuste estrutural e na configuração de políticas neoliberais, que concorrem para a consolidação da globalização do capital (SOARES, 1996). Avaliando a educação nas regiões da América Latina e Caribe, o Banco, nos anos de 1990, lançou um documento, que partia da perspectiva do desenvolvimento econômico e social para a região, concebendo a educação como estratégia de diminuição da pobreza, reforçando a necessidade de privatização do ensino superior, por entender que a iniciativa privada seria mais eficiente na condução desse nível de ensino. Coraggio (1990) fazendo referência aos organismos financeiros ressalta a centralidade da educação, discutida como um instrumento importante para a formação e desenvolvimento dos indivíduos e das sociedades, além de contribuir para o crescimento econômico e a redução da pobreza nos países em desenvolvimento. Os incentivos financeiros a serem aplicados pelos agenciadores da educação, indicam a potencialização dos resultados educacionais nesses países, sendo que, para isto, é necessário racionalizar gastos, realocar recursos, objetivando, por intermédio da educação, o crescimento econômico e o desenvolvimento social. A concepção de que níveis mais elevados de educação seriam fundamentais à qualidade da educação, bem como ao processo de desenvolvimento e competitividade das nações no mundo globalizado, enfoca o ensino superior como prioridade nos discursos do Banco Mundial. Nesse sentido, a concepção emergente tem por finalidade: [...] o incentivo à expansão do setor privado; busca de fontes alternativas de recursos no setor público (mensalidades, cursos pagos, consultorias, contribuição de ex-alunos) apresentada sob o manto de autonomia financeira; defesa da “eficiência” interna; criação de sistemas de avaliação, pautado em critério de produtividade, que permitissem comparação e ranqueamento, e subsidiassem a distribuição de recursos para instituições e prestadores de serviços; diversificação das instituições de ensino superior, o que veio acompanhado de uma crítica incisiva ao modelo de ensino superior baseado na universidade de pesquisa, bem como na defesa da criação de instituições de ensino superior não-universitária; e ainda a crítica ao vínculo empregatício dos professores e funcionários como servidores públicos, assim como as eleições para escolha de reitor e a existência de muitos órgãos coletivos de decisão (SIQUEIRA, 2004, p. 49). Ainda segundo esta autora, o ensino superior difundido pelo Banco Mundial, não se apresenta como oferta do setor público, mas, sim, como uma “área de negócios do setor privado internacional e das grandes firmas nacionais a ele associados, que estariam prontos ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 256 para vender seus pacotes educacionais, consultorias, equipamentos etc.”. A ênfase reside não só na necessidade de diversificar as instituições, como, também, na defesa da estratificação do sistema, podendo haver universidades que desenvolvam pesquisa, universidades de formação profissional de quatro anos, institutos isolados e centros vocacionais e/ou de formação técnica, com dois anos de duração. O documento do Banco Mundial, intitulado La enseñanza superior: las lecciones derivadas de la experiência, segundo LIMA (2002), apresenta quatro estratégias para a Reforma da Educação Superior na América Latina. (1) A diversificação das instituições de ensino superior, objetivando o desenvolvimento de universidades públicas, privadas e nãouniversitárias, envolvendo cursos politécnicos de curta duração e educação à distância, que, segundo o Banco, poderiam contribuir para satisfazer demandas de educação pós-secundária e atender às necessidades do mercado; (2) a diversificação das fontes de financiamento seria a segunda estratégia proposta, havendo necessidade de mobilizar mais fundos privados para o ensino superior; visando apoiar estudantes que tenham boa qualificação, mas que, por falta de recursos financeiros, não possam prosseguir em estudos superiores e, por fim, melhorar o destino e a utilização dos recursos fiscais no interior das instituições de ensino; (3) a redefinição das funções do Estado seria a terceira estratégia difundida pelo Banco, que atribui ao Estado a execução da política do ensino superior, tornando-o um agente facilitador da consolidação de um novo marco político e jurídico, que viabilize a implantação das diretrizes privatizantes da educação; (4) a última estratégia proposta é a implantação de uma política de qualificação do ensino superior, cuja concepção se dá a partir de sua vinculação às demandas por profissionais dos setores privados. A diversificação de instituições e o crescente processo de privatização do ensino superior são considerados como “democratização” desse nível de ensino, em que a equidade substitui o discurso da universalidade do acesso à educação. O documento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), intitulado Educação Superior na América Latina e no Caribe (1998), apresenta o diagnóstico do ensino superior nesses países, bem como as proposições para intervenção nas políticas de financiamento e aprimoramento das políticas de ensino superior. O BID é bastante enfático ao vincular a importância do ensino superior ao desenvolvimento produtivo, conforme expressa o referido documento: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 257 [...] a política de ensino superior é importante também pelo fato de que deve estar vinculada ao desenvolvimento, à formação de sociedades mais produtivas, informadas, prósperas, justas, satisfatórias e democráticas [...] a própria modernização e integração da América Latina numa economia e numa sociedade cada vez mais global, depende significativamente do ensino superior. (BID, 1998, p. 2) Segundo o documento, o ensino superior desenvolvido nos países latino-americanos apresenta desempenhos pouco satisfatórios. Desse modo, suas proposições acerca de uma política para o ensino superior sinalizam para uma maior vinculação com o desenvolvimento econômico, social e político dos países. No entanto, considera que o ensino superior deva voltar-se para o mercado, defendendo, também, que os recursos a serem aplicados não sejam apenas oriundos do Estado, propondo outras formas de financiamento, como a busca de parcerias com o setor empresarial, dentre outros (BID, 1998). São, então, estabelecidas quatro funções para o ensino superior, considerando o diagnóstico e a reforma proposta pelo BID, quais sejam: a liderança acadêmica; a educação profissional; a formação técnica e o ensino superior geral. De acordo com o documento, a educação profissional – inserida nesta função a formação de professores – deve ter como principal mecanismo de controle o mercado. Este será o definidor de competências a serem desenvolvidas nos cursos de formação, pois a “[...] formação do profissional deve ser usualmente impulsionada mais pela demanda econômica do que pela social” (BID, 1998, p. 14). Os mecanismos propostos pelo Banco deixam evidente o processo de mercantilização da educação superior, em que a diversificação de instituições de ensino e suas funções abre prerrogativas para a iniciativa privada, sob o discurso da democratização do acesso ao ensino. O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PDRE, 1995) menciona a transferência dos serviços não-exclusivos do Estado, para o setor privado, referindo-se àquelas atividades que podem ser controladas pelo mercado, que, no discurso neoliberal, tem exacerbada sua capacidade de geri-los com eficiência, ficando o Estado no papel de regulador e promotor de tais serviços. Assim, fica estabelecido que os serviços não-exclusivos do Estado ou mais relevantes são as universidades, as escolas técnicas, os centros de pesquisa, os hospitais e os museus. A década de 1990 no Brasil, na análise de Siqueira (2004, p. 1), presencia uma ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 258 ampliação do setor privado “[...] não somente nas atividades ligadas diretamente à produção econômica, mas, também, no campo dos direitos sociais conquistados pela luta da classe trabalhadora, o que gera um aprofundamento no processo de mercantilização da educação”. Esse processo reflete, igualmente, na educação superior, visto que os organismos internacionais enfatizam que os recursos destinados ao ensino superior são maiores do que para a educação básica, evidenciando que tais recursos deveriam ser priorizados para a educação básica, sobretudo para o ensino fundamental, cabendo ao ensino superior diversificar fontes de financiamento. Nessa perspectiva, o ensino superior – retirado das prioridades governamentais70 em relação ao financiamento – é orientado a buscar fontes diversificadas de recursos. Esse fator abre a possibilidade de que o ensino superior seja oferecido pela iniciativa privada. Siqueira (2004) enfatiza que o processo de privatização envolve dois movimentos: (a) a expansão de instituições privadas, por meio da liberalização dos serviços educacionais e (b) o direcionamento das instituições públicas de ensino para a esfera privada, mediante a instituição das fundações de direito privado, das cobranças de taxas e mensalidades, do corte de vagas para contratação de trabalhadores em educação e do corte de verbas para a infraestrutura das instituições de ensino. A educação superior passa a inserir-se no setor de serviços não-exclusivos do Estado, permitindo que sejam transferidas a responsabilidade por sua execução às entidades nãoestatais e à iniciativa privada, como forma a reduzir custos – ou “gastos” – com educação, por meio do estabelecimento de parcerias, tal como propugnam as agências financiadoras, e reitera a reforma educacional. O intervencionismo do BID nas políticas públicas educacionais se apresenta como forma de disseminação ideológica, cujos mecanismos difundidos objetivam conduzir o Estado para uma nova ordem mundial instaurada. O BM apresenta como exigência à condução do país rumo ao desenvolvimento socioeconômico, de um lado, uma política de redução da pobreza, através de medidas compensatórias71 e, de outro, uma política de modernização do 70 O ensino superior, ainda no governo militar no primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), foi considerado prioritário entre os investimentos governamentais, enquanto que nas atuais políticas, é considerado não prioritário nas ações governamentais, pois situa-se no núcleo de serviços não-exclusivos do Estado, cabendo-lhe apenas subsidiar e controlar resultados, por meio de mecanismos de avaliação aplicados ao ensino superior. Nesse sentido, a iniciativa privada passa a ser privilegiada como locus prioritário para esse nível de ensino. 71 Conforme expõe Simionatto (2003), as políticas compensatórias assumem uma perspectiva focalista, na medida em que buscam atender os segmentos populacionais mais vulneráveis. No interior de tais políticas, os ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 259 Estado brasileiro, políticas essas que, aliadas à reformulação do sistema de ensino, permitirão alcançar o tão esperado desenvolvimento e crescimento econômico. Segundo Maués (2003, p. 96), as reformas educacionais têm sido orientadas dentro do processo de regulação social e ajustes estruturais, pois, por se encontrar no núcleo de serviços não-exclusivos do Estado, segundo a concepção neoliberal, estaria produzindo gastos abusivos ao Estado “[...] desequilibrando o orçamento, provocando déficits públicos, que produzem inflação e desemprego, criando a crise”. A disseminação da informação mediada pelos avanços tecnológicos introduz novas necessidades e mudanças no âmbito da educação. Os níveis mais elevados de educação, assim como a renovação de aprendizagens, têm se constituído em necessidades absolutas para todos os indivíduos, possibilitando-lhes estar em sintonia com as novas exigências da sociedade contemporânea. Os educadores são vistos como agentes de mudança nesse contexto, visto que a eles são atribuídas responsabilidades pela formação de atitudes, pela concretização de aspirações por parte dos alunos, visando prepará-los para o futuro, pelo desenvolvimento de autonomia entre os educandos, bem como pelo despertar da curiosidade, estimulando o rigor intelectual e criando as condições necessárias para o desenvolvimento da educação formal e da educação permanente. Estes são aspectos imprescindíveis para o desenvolvimento das novas gerações, segundo a ótica dos organismos internacionais, repercutindo, consequentemente, em uma crise do sistema educacional. Os princípios orientadores da reforma se embasam na lógica de eficiência e qualidade do ensino, cujos índices educacionais revelam que o ensino nos países da América Latina é bastante deficiente, haja vista suas condições históricas, políticas e sociais. Segundo os estudos realizados por Torres, embora o Banco Mundial, em que pese sua visibilidade, no campo educacional ser recente, vem atuando indiretamente neste setor há mais de 30 anos, ampliando sua atuação e influência para as atividades de pesquisa, assistência técnica, assessoria aos governos – em matéria de políticas educativas –, bem como prestando ajuda para a mobilização e coordenação de recursos externos para a educação. O BM não apresenta idéias isoladas mas uma proposta articulada – uma ideologia e uma pacote de medidas – para melhorar o acesso, a gastos e os investimentos em serviços públicos devem concentrar-se nos setores de extrema pobreza, como salienta o Banco Mundial. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 260 qualidade e a equidade dos sistemas escolares, particularmente do ensino de primeiro grau, nos paises em desenvolvimento. Embora se reconheça que cada país e cada situação concreta requerem especificidades, trata-se de fato de um “pacote” de reforma proposto aos países em desenvolvimento que abrange um amplo conjunto e aspectos vinculados a educação (TORRES, 1996, p. 126) A ênfase sobre a educação básica72, mencionada pelo Banco Mundial, foi reforçada a partir da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em 1990, em Jomtien, Tailândia, promovida pela UNESCO, UNICEF, PNUD e o próprio Banco Mundial. Essa Conferência estabeleceu que a educação básica seria prioritária na década de 1990 (TORRES, op.cit., p.129). A reforma do sistema escolar é apresentada pelo Banco Mundial como forma de propor saídas para os problemas que afetam a educação nos países em desenvolvimento, enfatizando que quatro desafios fundamentais se colocam para tais países, que são: o acesso, a equidade, a qualidade e a redução da distância entre as reformas educativas e a reforma das estruturas econômicas. Justificando a prioridade sobre a educação básica dos países, assim o Banco se manifesta: A educação básica proporciona o conhecimento, as habilidades e as atitudes essenciais para funcionar de maneira efetiva na sociedade sendo portanto uma prioridade em todo lugar. Esses atributos constituem um nível básico de competências em áreas gerais tais como as habilidades verbais, computacionais, comunicacionais e a resolução de problemas. Essas competências podem ser aplicadas à uma grande variedade de empregos e permitir ás pessoas adquirir habilidades e conhecimentos específicos orientados para o trabalho. (apud. TORRES, 1996, p. 131). Segundo o Banco Mundial, os custos com a educação básica são bem menores se comparados ao que é investido no ensino superior. Assim, sua posição é de que a educação básica seja priorizada entre os investimentos públicos, conforme menciona o documento de 1995: 72 No Brasil, esse nível de ensino refere-se aos anos iniciais do ensino fundamental, conforme estabelece a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394/96. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 261 Já que as taxas de retorno de investimentos em educação básica são geralmente maiores que as da educação superior nos países de baixa e média renda, a educação básica (primária e secundária inferior) deveria ser prioritária dentre as despesas públicas em educação naqueles países que ainda não conseguiram uma matrícula quase universal (Banco Mundial apud. TORRES, 1996, p.132). Os programas de ajuste estrutural realizam-se, no Brasil, por meio das reformas empreendidas no âmbito do Estado, que, para consecução de seus objetivos, implementam políticas públicas que convergem para a inserção do país na nova estrutura produtiva. De acordo com Peroni (2003), as políticas públicas não são apenas decorrências das Reformas do Estado, sendo, antes, partes constitutivas do projeto de tais reformas. As políticas educacionais elaboradas buscam materializar o projeto de reformas do Estado, que, tendo como causa fundamental a crise fiscal, estabelecem mecanismos que visam alinhar o Estado à política macroeconômica. Do mesmo modo, Silva (2002) afirma que, como decorrência das alterações econômicas e políticas de ordem internacional, a política ditada aos Estados nacionais têm sido a da intervenção e da regulamentação, visando promover mudanças na política interna de desenvolvimento econômico dos países, desenvolvimento esse que deve ser alicerçado em bases consistentes, alinhados ao processo de acumulação crescente do capital, engendrando, no interior dos Estados nacionais, uma articulação entre os agentes administrativos do Estado a fim de que a nova ordem seja instaurada. Maués (2000, p. 3) afirma que: [...] a lógica dessas políticas tem sido a institucionalização das determinações de organismos internacionais que vêem na educação um dos meios para a adequação social às novas configurações do desenvolvimento do capital [...]. A ampla reforma educacional realizada no Brasil, mediante o diagnóstico e as orientações apresentados pelo Banco Mundial, convergem para mecanismos de controle e de regulação da educação, cujas estratégias avaliam o custo-benefício e a taxa de retorno dos ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 262 investimentos que são aplicados em educação. Essas categorias definem as prioridades das aplicações e dos investimentos e a qualidade que se pretende alcançar. A ênfase na qualidade da educação, uma das metas a serem alcançadas, é proposta mediante avaliações institucionais, cuja prioridade se volta mais para os resultados do que para com o processo de ensino. De acordo com Afonso (2000), esta é uma tendência que se apresenta, atualmente, não só na educação, mas, também, nos diversos setores em que o Estado atua. A educação superior pública, nessa perspectiva, é pensada a partir dos princípios do mercado, uma vez que a defesa do público não-estatal evidencia o processo de mercantilização da educação, uma vez que sendo difundida em nome da autonomia financeira, matrículas, mensalidades, cursos pagos, consultorias e outros, ocorre o aprofundamento do processo de privatização da educação superior. Vale ressaltar que as estratégias que visam conformar ideologicamente o processo de privatização da educação superior, são disseminadas em nome da humanização do capital, no entanto, torna-se imperioso enfrentar e resistir a estas investidas e fortalecer a luta em prol de uma educação pública, gratuita e de qualidade. Aproximações conclusivas Vimos que as mudanças no ensino superior no contexto da década de 90 no Brasil são orientadas pelas agencias financeiras internacionais, dentre as quais destacamos o BID e BM. O papel do estado em relação às políticas educacionais nesse contexto reforça o processo de mercantilização da educação, uma vez que este nível de ensino é lançado para a esfera do mercado. A lógica aferida ao ensino superior enfoca a gestão racional de recursos, eficiência e produtividade. Nesse sentido, é possível perceber que as orientações referentes a diversificação de fontes de financiamentos, a diversificação das instituições de ensino superior, a redefinição do papel do Estado, através da retomada do conceito de público não-estatal, enfatizam que a redefinição das políticas de educação superior encontram sintonia com o processo de ajustes fiscais e reformas estruturais com o acirramento das políticas neoliberais no contexto brasileiro. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 263 Vale ressaltar que nesse contexto, a diversificação de instituições e o crescente processo de privatização do ensino superior são considerados como “democratização” desse nível de ensino, em que a equidade substitui o discurso da universalidade do acesso à educação. Diante desse contexto, assiste-se a um retrocesso em relação às conquistas alcançadas pela classe trabalhadora, uma vez que o capital avança sem precedentes, cujas estratégias se voltam para a perda de direitos e conquistas sociais. Assim a expansão acentuada da educação superior privada em detrimento da educação pública, por meios de mecanismos diversos concedidos pelo Estado à iniciativa privada, contribui para a exclusão cada vez maior da classe trabalhadora a uma educação superior de qualidade acirrando-se as desigualdades sociais. Diante destas investidas contra a universidade pública brasileira, torna-se imperioso fortalecer a luta em prol da educação pública e de qualidade socialmente referenciada. REFERÊNCIA BANCO MUNDIAL. Relatório sobre o desenvolvimento mundial. Washington, 1990. BID. Educação Superior na América Latina e no Caribe. Documento de Estratégia Washington, D. C., julho de 1998. BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 23 dez. 1996. _______. Presidência da República. Câmara da Reforma do Estado. Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília (DF), 1995. 83p (Documento da Presidência da República). CORAGGIO, J. L. Proposta do Banco mundial para a educação: sentido oculto ou problemas de concepção? In: TOMMASI, L. de WARD, M.J., HADDAD, S. (org). O Banco Mundial e as Políticas Educacionais. São Paulo: Cortez, 1996. p. 75-121. 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RESUMO O trabalho apresenta por parte das autoras, resultados parciais da pesquisa “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil”, subprojeto 2 “Organização acadêmicoinstitucional e expansão da educação superior no Brasil”. Para tal realizamos análise de conteúdos a partir de pesquisas extraídas da bibliografia anotada e aos relatórios de gestão dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro, objetivando caracterizar a implantação desses cursos nos Institutos Federais. O estudo conclui que: os cursos de licenciatura foram implantados nos campi originários dos CEFETs que deram origem aos IFs; que há um alto índice de evasão; que os programas da CAPES estão sendo utilizados como forma de consolidar as Licenciaturas; e que os Institutos Federais estão encontrando dificuldades para preencher as vagas destinadas para o PARFOR. Palavras-chave: Institutos federais de Educação, Ciência e Tecnologia; Formação de professores; Ensino superior. 1. Introdução Com o objetivo de estudar as modificações na Educação Superior, a Rede Universitas/Br, articulada em sete subprojetos, está desenvolvendo a pesquisa “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil”. O presente trabalho integra o subprojeto 2 “Organização acadêmico-institucional e expansão da educação superior no Brasil”, que tem como tema transversal a Formação de Professores. A formação de professores no Brasil também passa por modificações, nem sempre devidamente sublinhadas. Podemos observar ao ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 266 longo de estudos que essas modificações estão privilegiando como formas de expansão do acesso a esse tipo de formação, a educação a distância; a privatização da educação superior; e a diversificação do lócus de formação. A expansão da educação superior a partir da diversificação do lócus de formação já foi apontada por Otranto (2010), que registrou o processo de criação e implantação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. A Lei nº 11.892 de 2008, não apenas instituiu esses institutos, mas redesenhou a Rede Federal de Educação Profissional, elevando instituições que antes atuavam apenas na Educação Básica à condição de instituições de educação superior. Essa reforma, a nosso ver, criou uma rede de educação superior paralela às universidades, com as mesmas prerrogativas dessas, porém sem o arcabouço da tríade ensino, pesquisa e extensão. Afirmamos isso, pois os Institutos Federais são formados a partir da transformação/agregação de antigos CEFETs, Escolas Agrotécnicas, Escolas Vinculadas às Universidades Federais e Escolas Técnicas Federais. Das instituições que compõem atualmente os Institutos Federais apenas os CEFETs se destacavam no oferecimento de cursos de educação superior, ofertando inclusive licenciaturas. Essa reforma também introduziu de maneira efetiva a formação de professores na Rede Federal de Educação Profissional, uma vez que os Institutos Federais são obrigados a oferecer 20% de suas vagas para a formação de professores (BRASIL, 2011). A partir dessa exigência legal, os IFs passaram a constituir um novo lócus para a formação de professores, sendo que esta é uma nova tarefa para a maioria desses institutos, constituindo-se, então, em grande desafio para a implantação. Vale ressaltar que os IFs devem, ainda, promover educação em todos os níveis (educação básica e educação superior) e em diferentes modalidades (educação de jovens adultos, educação Profissional, educação especial). A presente pesquisa estuda a implementação da formação de professores nos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro e analisa todos os campi que já ofertam licenciaturas. A análise leva em consideração a bibliografia anotada pelos membros do grupo de pesquisa sobre o assunto e os relatórios de gestão das instituições pesquisadas. 2. A formação de professores nos Institutos Federais ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 267 Acreditamos que a formação de professores nos Ifs se configura como uma diversificação das instituições formadoras de professores, consubstanciando assim essa formação fora da universidade. Esse processo no Brasil se iniciou após a homologação da LDB 9.394/96, que passou a exigir a formação em nível superior de todos os professores da Educação Básica. Segundo Macedo (2011) [...] a marca do governo Lula da Silva foi tornar essa exigência possível via cursos superiores fragmentados e aligeirados por meio da contrarreforma da educação superior (MACEDO, 2011, p. 307-308). A diversificação possibilitada pela LDB 9.394/96 permitiu, segundo Mancebo (2009), a materialização de novos formatos para a educação superior, uma vez que alterou significativamente os até então existentes. Como exemplos, podemos citar o Decreto nº 2.306/97, que previa cinco classificações para organização do ensino superior, sendo elas: I universidades; II - centros universitários; III - faculdades integradas; IV - faculdades; V institutos superiores ou escolas superiores (BRASIL, 1997). O citado Decreto foi revogado pelo de nº 3.860/2001, que por sua vez foi revogado pelo Decreto nº 5.773/2006 (BRASIL, 2006). Esse último previa três classificações para organização do ensino superior, sendo elas: I - faculdades; II - centros universitários; e III – universidades (BRASIL, 2006). Na atual LDB, temos dois artigos que se reportam diretamente à questão. O primeiro é o artigo 45, que abre o oferecimento a todas as “instituições de ensino superior, públicas ou privadas, com variados graus de abrangência ou especialização”. O segundo é o artigo 62, que trata especificamente da formação de professores, e assumiu nova redação a partir da Lei 12.796, de 2013. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal. (BRASIL, 1996, art. 62, com nova redação dada em 2013 ). Vale ressaltar que os Institutos Superiores de Educação, citados no artigo acima transcrito, não se referem aos Institutos Federais de Educação, da Rede Federal de Educação Profissional, aos quais estamos nos reportando neste texto. As Instituições citadas surgiram da proposta de transformação das antigas Escolas Normais em instituições de educação superior e se constituíram, também, em nova opção para a formação de professores, principalmente ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 268 para o ensino fundamental, com a oferta do Curso Normal Superior. No entanto, tanto o Instituto Superior de Educação quanto o Instituto Federal se constituem em novas formas de organização da educação superior, que abriram caminho para que a formação de professores pudesse ser oferecida em diferentes instituições e formatos, impossibilitando a unidade na política de formação de professores no Brasil. Dessa maneira, a formação de professores acabou ganhando força para ser realizada fora da universidade que, segundo Maués (2003, p. 100), à primeira vista, parece um contra-senso. Isso quer dizer que a formação é oferecida em nível pós secundário, ou seja, superior, mas sem obedecer necessariamente aos princípios básicos que caracterizam a instituição universitária desde o seu surgimento, pelo menos como universidade moderna, no início do século XIX, ou seja, o ensino ligado à pesquisa, à autonomia em relação a ensino e pesquisa e à socialização dos conhecimentos. A ideia de que o locus da formação de professores era a universidade, sempre foi uma das bandeiras de luta da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação. No seu 14º Encontro Nacional, que ocorreu em novembro de 2008, essa Associação anunciou sua preocupação com os desenhos atuais dos mais diversos programas e ações propostos pelo MEC no que concerne a formação de professores (BRZEZINSKI, 2011). A Anfope identificou 38 programas oferecidos pelo Ministério da Educação aos Estados e Municípios com o objetivo de propiciar formação inicial e continuada para professores. Esses programas envolvem desde cursos voltados para a formação de professores para a escola básica até cursos voltados para a formação continuada na área da Tecnologia da Informação e Comunicação. Tais programas, ainda segundo Brzezinski (2011), apresentam indícios de desarticulação interna setorial no ministério. Observamos que a exigência de ensino superior para a formação de professores está sendo cumprida através: a) do incentivo às Instituições de Ensino Superior (IES) privadas, como, por exemplo, o investimento no Programa Universidade Para Todos - PROUNI; b) a implementação da Educação a distância, com a criação da UAB e; c) pela diversificação das instituições (MAUÉS, 2003, MACEDO, 2011). É especificamente nesse último item que se encaixa nosso objeto de estudo: os Institutos Federais. São instituições de educação superior ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 269 feredais, paralelas às universidades que têm a obrigatoriedade de ofertar cursos superiores, dentre os quais se encontram os cursos de licenciatura. 3. Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro Nesse item caracterizamos, sucintamente, os Institutos Federais do Estado do Rio de Janeiro e suas respectivas licenciaturas, a fim de assinalar algumas tendências na implementação e manutenção desses institutos. O Estado do Rio de Janeiro conta com dois Institutos Federais: o Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) e o Instituto Federal Fluminense (IFF). As informações aqui apresentadas foram extraídas dos Relatórios de Gestão do IFRJ e do IFF dos anos de 2009 até 2013. Esses Relatórios estão disponíveis no site oficial dos respectivos Institutos e são apresentados anualmente ao Tribunal de Contas da União para prestação de contas das unidades. Têm como objetivo “disponibilizar informações que possibilitem a avaliação das ações realizadas” (IFRJ, 2009, p. 50). Esclarecemos que a regra para apresentação de dados nos Relatórios de Gestão foi determinada pelos Acordos nº. 480/2005 e o nº 2267/2005, estabelecidos entre a Secretaria de Educação Técnica e Tecnológica SETEC e os IFs, que juntos definiram um conjunto de dados e indicadores que deveriam integrar os Relatórios de Gestão dos Institutos Federais. Esses indicadores são: a) relação candidato/vaga; b) relação ingressos/aluno; c) relação concluintes/aluno; d) índice de eficiência acadêmica de concluintes; e) índice de retenção do fluxo escolar; f) relação de alunos/docente em tempo integral; g) índice de titulação do corpo docente; h) gastos correntes por aluno; i) percentual de gastos com pessoal; j) percentual de gastos com outros custeios; e k) percentual de gastos com investimentos (SETEC, 2015, p. 64-65). Nesses relatórios de Gestão não há a obrigatoriedade de apresentação de dados específicos, ou seja, os indicadores são referentes aos cursos de: Ensino Médio, Graduação e Pós Graduação de maneira geral. Até o ano de 2011, porém, o IFRJ disponibilizou os dados de maneira específica, ou seja, quanto aos cursos de graduação esse Instituto apresentou dados das Licenciaturas separadamente, assim como dos cursos de bacharelado e dos Cursos Superior em Tecnologia CTS. No entanto, nos anos seguintes, os dados foram apresentados de maneira geral, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 270 englobando as Licenciaturas e os demais cursos de graduação. Já o IFF nunca apresentou os dados especificando os cursos. Na leitura dos relatórios encontramos alguns dados em separado, mas isso constitui uma exceção. 3.1 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro – IFRJ O IFRJ foi criado mediante a transformação do Centro Federal de Educação Tecnológica de Química de Nilópolis (CEFET Química de Nilópolis/RJ) e a integração com o Colégio Agrícola Nilo Peçanha, até então vinculado à Universidade Federal Fluminense (IFRJ, 2014, p. 05). Silva (2011), que registrou um histórico do Instituto, afirma que o “IFRJ teve início, em 1945, com a criação do Curso Técnico de Química Industrial (CTQI) pela Escola Nacional de Química da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro” (SILVA, 2011, p. 112). Já o Colégio Agrícola Nilo Peçanha, era, na época da criação do IFRJ, uma Escola Técnica vinculada à Universidade Federal Fluminense. O Colégio Agrícola Nilo Peçanha é uma instituição centenária, criada em 1909, pelo Ministério da Agricultura, como Escola Técnica anexa ao Posto Zootécnico de Pinheiro. Em 1910, foi transformada em Escola Média de Agricultura e Veterinária de Pinheiro e, em 1947, assumiu a denominação de Colégio Agrícola Nilo Peçanha. A Instituição permaneceu como escola vinculada à Universidade Federal Fluminense de 1968 até 2008. Ao longo da sua história, sempre esteve voltada para cursos agropecuários. Outra característica importante é que desde sua vinculação à Universidade Federal Fluminense nunca ofertou cursos superiores. Cabe destacar que, antes mesmo da transformação em Instituto Federal, o CEFET de Química de Nilópolis já oferecia as licenciaturas em Química, Física (criadas em 2004) e Matemática (criada em 2006). Todas eram oferecidas na sede do CEFET, em Nilópolis (IFRJ, 2014). Essas licenciaturas foram criadas após o momento da primeira expansão ocorrida em 2003, que abriu caminho para a transformação dos CEFETs em Instituições de Educação Superior, ocorrida no ano de 2004, por força do Decreto 5.224/2004 (BRASIL, 2004). No ano de 2008 a Instituição foi transformada em Instituto Federal e, em 2009, após a transformação, foram criados os seguintes cursos: Licenciatura em Química, no Campus Duque de Caxias e Licenciatura em Matemática e em Física ofertadas no Campus Volta ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 271 Redonda. No ano de 2011 passou a funcionar o curso de Licenciatura em Matemática no Campus de Paracambi. Atualmente o IFRJ conta com sete cursos de licenciatura distribuídos em quatro campi: Nilópolis (3), Duque de Caxias (1), Volta Redonda (2) e Paracambi (1). É relevante para o nosso estudo a constatação de que as sete licenciaturas são oferecidas nos campi originários das antigas Unidades Descentralizadas do CEFET e nenhuma licenciatura ou outro curso de graduação foi criado em Pinheiral, onde está localizado o Campus Nilo Peçanha, que, conforme informado anteriormente, antes de se integrar ao IFRJ era uma Escola Vinculada à Universidade Federal Fluminense. Quanto à criação das licenciaturas no ano de 2009, é válido salientar o registro feito no relatório de gestão daquele ano: No tocante ao andamento dos cursos iniciados em 2009, destacam-se os esforços dos Campi para a aquisição dos equipamentos e insumos de laboratórios, bem como de móveis e demais materiais necessários ao alcance das condições de oferta previstos nos projetos pedagógicos dos cursos ofertados pelo IFRJ (IFRJ, 2010, p 54.). Esse mesmo esforço é relatado no relatório de 2010, ano em que a Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) realizou visitas técnicas nos campi que abriram novos cursos de graduação e registrou que: Tais visitas consistiram no reconhecimento das instalações específicas e na identificação das necessidades relativas ao andamento e implantação de cada curso ofertado, tendo como base as condições de oferta previstas em seus projetos pedagógicos Os esforços dos Campi para a aquisição dos equipamentos e insumos de laboratórios são notórios, apesar das dificuldades relatadas (IFRJ, 2011, p 67.). Os registros encontrados nos documentos internos do IFRJ nos mostram que os cursos de graduação de maneira geral, uma vez que os relatórios não especificam quais cursos relataram essas dificuldades, foram criados, porém não contavam ainda com a infraestrutura completa para seu funcionamento. Tais afirmativas também corroboram com a hipótese de que a lei de criação dos Institutos e a obrigatoriedade de oferta de ensino superior é a grande incentivadora para criação de tais cursos e que os Institutos não possuíam, naquele momento, a infraestrutura necessária para a abertura de tais cursos. Porém, mesmo registrando essas dificuldades, ainda no ano de 2010, havia o incentivo para que cada Campus do IFRJ “[...] avaliasse a possibilidade de ampliação da oferta de cursos de graduação, com base no estabelecido pela Lei de criação dos Institutos Federais, dando ê nfase à criação de cursos de licenciatura” [...] (IFRJ, 2011, p.67.) (Grifos nossos). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 272 Quanto às vagas oferecidas para os cursos de Licenciatura, constatamos que o total de vagas oferecidas para os cursos de graduação no IFRJ no ano de 2009 foi de 1010, sendo que 410 vagas foram destinadas para as licenciaturas. Assim, no primeiro ano da nova configuração dessa instituição, 40% do total de vagas destinadas aos cursos de graduação foram direcionadas para os cursos de licenciatura. No ano de 2010 foram disponibilizadas 1040 vagas, sendo que 440 delas foram ofertadas para os cursos de Licenciatura, perfazendo um percentual de 42%. No ano de 2011, esse percentual chegou a 48%. Nos anos de 2012 e 2013 esse percentual caiu para 46%. Podemos inferir, então, que os cursos de licenciatura ocupam lugar de destaque no ensino de graduação do IFRJ, uma vez que quase 50% das vagas são a eles destinadas. No ano de 2010, das 440 vagas para os Cursos de Licenciatura, 20% foram destinadas para ao Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR), como demonstramos a tabela 01. No ano de 2011 também foram ofertadas 20% das vagas para a PARFOR. O IFRJ aderiu ao PARFOR em 2009, tendo como objetivo [...] “contribuir para a formação de professores em exercício na rede pública da educação básica, por meio da reserva de 20% das vagas nos cursos regulares de licenciatura” (IFRJ, 2010, p. 51). A Tabela 01 demonstra a distribuição dessas vagas, nos anos de 2009 a 2013. Tabela 01: Oferta de vagas para as Licenciaturas do IFRJ Curso de Licenciaturas Vagas Vagas em 2010 Vagas em 2011 Vagas Vagas 2009 ENEM + PARFOR ENEM + PARFOR 2012 2013 Licenciatura em Física 80 64 + 16 = 80 80 + 08 = 88 80 80 Licenciatura em Química 80 64 + 16 = 80 80 + 08 = 88 80 80 Licenciatura em Matemática 80 64 + 16 = 80 80 + 08 = 88 80 80 80 64 + 16 = 80 80 + 08 = 88 80 80 Campus Nilópolis Campus Duque de Caxias Licenciatura em Química Campus Volta Redonda ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 273 Licenciatura em Física 30 48 + 12 = 60 60 + 06 = 66 60 60 Licenciatura em Matemática 60 48 + 12 = 60 60 + 06 = 66 60 60 Licenciatura em Matemática -----* -----* 40 + 04 = 44 80 80 Total de Licenciaturas 410 440 528 520 520 1.040 1.088 1.120 1.120 Campus Paracambi Total de cursos de graduação 1.010 Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Relatório de Gestão em vigor dos IFs. * Curso criado no ano de 2011 e que passou a disponibilizar vagas a partir do 2º semestre de mesmo ano (IFRJ, 2012, p. 60). Conforme explicitado na Tabela acima, no ano de 2010, foram ofertadas 44 vagas para o Programa, nesse ano, apenas 9 vagas foram preenchidas. No ano de 2011, das 48 vagas ofertadas pelo PARFOR, apenas 15 vagas foram preenchidas. Segundo o relatório de 2011 esse fato “demonstra uma dificuldade de ocupação das vagas destinadas a professores da educação básica que atuam sem formação” (IFRJ, 2012, p.70). De acordo com o mesmo relatório essa questão foi levada para o Fórum Estadual Permanente de Apoio à Formação Docente do Rio de Janeiro, sendo decidido então que no primeiro semestre de 2012 não seriam ofertadas vagas pelo PARFOR no IFRJ. No ano de 2012 a determinação foi cumprida não foram ofertadas vagas para o PARFOR uma vez que o e o Programa sofreu alterações em “função das decisões tomadas no âmbito do Fórum Estadual de Apoio à Formação Docente, com base na demanda de formação de professores apresentada pelos municípios e pelo Estado” (IFRJ, 2013, p.52). No âmbito desse fórum ficou definido então que a reserva de vagas deveria se dar apenas “em cursos de Pedagogia, Filosofia e Ciências Sociais, não incluindo as licenciaturas ofertadas pelo IFRJ” (IFRJ, 2013, p.52). Destacamos aqui que a Pedagogia não é vista na Instituição como um curso de licenciatura. Além disso, havia a prioridade de constituição de turmas especiais. No ano de 2013 o IFRJ também não ofereceu vagas para o PARFOR, pois, a oferta de vagas para o programa deveria se dar na forma de turmas especiais, o que impediu a participação do IFRJ, que somente disponibiliza vagas para o programa nos cursos de Licenciaturas em turmas regulares (IFRJ, 2014). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 274 No caso do indicador alunos ingressantes/ alunos matriculados esse índice situa-se entre 16% a 25%, considerando os dados do ano letivo de 2009, com exceção dos cursos em fase de implantação, especificados na tabela 02. Tabela 02: Relação Ingressos/ total de alunos matriculados no curso em 2009, por semestre. Curso de Licenciaturas Campus Nilópolis 1º Semestre 2009 Ingressos Total de Alunos Matriculados* 2º Semestre 2009 Ingressos/ Ingressos Alunos % Total de Alunos Matriculados* Ingressos/ Alunos % Licenciatura em Física 40 219 18,26 43 220 19,54 Licenciatura em Química 40 249 16,06 42 260 16,15 Licenciatura em Matemática ** 40 158 25,31 42 182 23,07 41 41 100 45 74 60,8 6 6 100 25 32 78,12 Licenciatura em Matemática** 16 16 100 23 35 65,71 Total 689 * 220 * 803 * Campus Duque de Caxias Licenciatura em Química ** Campus Volta Redonda Licenciatura em Física ** 183 * Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Relatório de Gestão em vigor dos IFs * Total de matrículas ingressos por meio de processo seletivo discente (Processo seletivo da própria instituição em 2009 e ENEM em 2010), por transferência externa e reingresso. ** Cursos em fase de implementação. Em 2010, no 2º semestre, esse índice ficou entre 16% e 40%, especificados na tabela 03. Segundo o relatório de 2010 “a realidade de evasão enfrentada nos cursos superiores de tecnologia e nas licenciaturas não permitiu, ainda, o alcance dos índices considerados ideais” (IFRJ, 2011, p. 82). O mesmo relatório afirma que “É necessário aperfeiçoar os mecanismos de permanência, o que tem sido buscado por meio dos programas de fomento à graduação” (IFRJ, 2011, p. 82). Tabela 03: Relação Ingressos/ total de alunos matriculados no curso no 2º semestre de 2010***. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 275 Curso de Licenciaturas Campus Nilópolis 2º Semestre 2010 Ingressos Total de Alunos Matriculados* Ingressos/Alunos % Licenciatura em Física 43 240 17,9 Licenciatura em Química 45 279 16,1 Licenciatura em Matemática ** 49 220 22,3 38 111 34,2 Licenciatura em Física ** 25 62 40,3 Licenciatura em Matemática** 28 72 38,8 Total 228 984 Campus Duque de Caxias Licenciatura em Química ** Campus Volta Redonda Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Relatório de Gestão em vigor dos IFs. * Total de matrículas de ingressos por meio de processo seletivo discente (Processo seletivo da própria instituição em 2009 e ENEM em 2010) e por transferência externa e reingresso. ** Cursos em fase de implementação. *** Os dados do 1º semestre de 2010 não foram disponibilizados O número de concluintes nos cursos de Licenciatura de 2009 e 2010 é outra dificuldade enfrentada pelos institutos. Na tabela 04 encontra-se a relação concluintes/total de alunos matriculados do ano de 2009 e, na tabela 05, essa mesma relação referente ao ano de 2010. Os cursos ofertados nos campi de Duque de Caxias e Volta Redonda, assim como a Licenciatura em Matemática ofertada no Campus de Nilópolis, não tinham alunos concluintes nos anos de 2009 e 2010. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 276 Tabela 04: Relação concluintes/total de alunos matriculados por curso por semestre em 2009 Concluintes em 2009 Curso de Licenciaturas Campus Nilópolis Licenciatura 1º Semestre Concluintes 2º Semestre Total de Alunos no Total de Concluintes/ Concluintes curso Alunos (%) em 06 219 2,32 em 01 249 2,73 Concluintes/ Alunos no curso Alunos (%) 08 220 3,63 05 260 1,92 Física Licenciatura Química Total 7 13 Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Relatório de Gestão em vigor dos IFs. Nos anos de 2009 e 2010 esses cursos apresentam índices muito abaixo do esperado, conforme é mostrado nas tabelas 04 e 05, variando de 1 a 3 no ano de 2009 e de 2 a 6 no segundo semestre de 2010. Os dados referentes aos anos de 2011 até 2013 não foram disponibilizados. Tabela 05: Relação concluintes/total de alunos matriculados por curso em 2010 Concluintes em 2010 Campus Nilópolis Concluintes Total de Alunos no curso Concluintes/Alunos Concluintes (%) Licenciatura em Física 15 240 6,3 Licenciatura em Química 13 279 2,73 Total 28 Fonte: Elaboração própria a partir de dados extraídos do Relatório de Gestão em vigor dos IFs Destacamos que os demais cursos ainda não apresentavam alunos concluintes. No relatório de 2009 o IFRJ destaca que há muitos problemas internos e externos à instituição a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 277 serem sanados relativos à porcentagem de alunos concluintes. Para o IFRJ no que concerne às licenciaturas, [...] “o problema da valorização do professor, em termos de condições de trabalho e de remuneração da carreira, é um dos fatores que afeta a decisão do estudante” em terminar o curso ou não. Para reverte esse problema o IFRJ busca ofertar “ao aluno experiências enriquecedoras, que o colocam em contato com a realidade vivenciada no interior da escola, como ocorre nos programas de fomento à graduação do tipo Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID e Programa de Consolidação das Licenciaturas - PRODOCÊNCIA, com a oferta de bolsas” (IFRJ, 2010, p.63). Segundo o relatório de gestão de 2009 Tais programas, voltados aos Cursos de Licenciatura, constituem-se em importantes políticas de permanência e êxito acadêmico, não apenas pelo expressivo número de bolsas de auxílio direcionadas aos licenciandos e docentes envolvidos, como também por propiciar a aplicação prática dos conceitos desenvolvidos durante os anos de formação à realidade das escolas públicas participantes. (IFRJ, 2010, p.57). Podemos observar que esses programas estão sendo utilizados como política de permanência para os cursos de Licenciatura. 3.2 O Instituto de Educação Ciência e Tecnologia Fluminense - IFF O IFF foi criado a partir da transformação do antigo CEFET Campos e da integração do Colégio Técnico Ildefonso Bastos Borges, na época, vinculado à UFF. Apesar de constar na Lei 11892/2008 a integração desta Escola Vinculada, ela somente se efetivou no ano de 2010. Os primeiros cursos ofertados pelo Colégio Técnico Ildefonso Bastos Borges foram: Técnico em Agropecuária e o Técnico em Economia Doméstica Rural. Já na qualidade de Campus Ildefonso Bastos Borges ofereceu, em 2014, os cursos técnicos em: Agropecuária, Agroindústria e Informática, além do curso superior em Ciência e Tecnologia dos alimentos. Já o CEFET Campos, em seus primórdios como Escola Técnica, oferecia os cursos: técnicos de Edificações, Eletrotécnica e Mecânica de Máquinas e, posteriormente, o curso de Estradas e o curso técnico de Química. Em 2014 o IFF se mostra composto por nove campi, a saber: Campus Cabo Frio; Campus Campos Centro e Campus Campos Guarus localizados ambos em Campos dos Goytacazes; Campus Ildefonso Bastos Borges, localizado em Bom Jesus do Itabapoana; Campus Itaperuna; Campus Macaé; Campus Quissamã; Campus Rio Paraíba do Sul, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 278 localizado em Martins Laje. Dois campi ainda estão em construção, o Campus Itaboraí e o Campus Santo Antônio de Pádua. De todos esses campi, apenas um é originário de uma escola vinculada, o de Ildefonso Bastos Borges. Estudando os Relatórios de Gestão desse Instituto, encontramos a afirmação de que a estrutura multicampi e pluricurricular causa dificuldades para a instituição. A respeito dessa afirmação, destacamos o seguinte excerto As dificuldades enfrentadas pelo IF Fluminense envolvem, em sua essência, essa nova institucionalidade, que se caracteriza por uma estrutura multicampi e pluricurricular. Esse desenho não só representa a riqueza da diversidade e da abrangência regional, como também o desafio na busca do fortalecimento da participação coletiva e representativa no processo construtivo de desenvolvimento institucional numa comunidade quantitativamente maior e detentora de especificidades. (IFF, 2012 p. 14) Como percebemos as próprias características da estrutura dessa nova institucionalidade representam o desafio de organização para a instituição em tela. Além disso, é necessário considerar a identidade das instituições incorporadas, algumas centenárias. Como já assinalado o IFF é oriundo do antigo Cefet Campos, por isso, no momento de sua criação já possui graduações e entre elas as licenciaturas. As primeiras licenciaturas do Cefet Campos foram implantadas em 2000, com a publicação do Decreto nº 3.462/2000, revogado pelo Decreto 5.224 de 2004, que dispõe: Art. 8o Os Centros Federais de Educação Tecnológica, transformados na forma do disposto no art. 3o da Lei no 8.948, de 1994, gozarão de autonomia para a criação de cursos e ampliação de vagas nos níveis básico, técnico e tecnológico da Educação Profissional, bem como para implantação de cursos de formação de professores para as disciplinas científicas e tecnológicas do Ensino Médio e da Educação Profissional (BRASIL, 2000). Naquela época a instituição optou pela implantação do curso licenciatura em Ciências da Natureza, nas modalidades Biologia, Física e Química, com a justificativa de que a região era carente de profissionais formados nestas áreas (CEFET, 2007). Esse curso foi aberto no Campus Campos Centro. No ano seguinte, em 2001, foram criadas as licenciaturas em Matemática e Geografia (CEFET, 2007). A instituição alegou novamente que a região na qual está inserida [...] “apresenta um déficit enorme de profissionais nessas áreas” (CEFET, 2007, p.38), outro fator ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 279 que levou a escolha da implantação desses cursos foi “a infra-estrutura de laboratórios e ambientes de aprendizagem já existentes, bastante favorável à contextualização da Ciência e da Tecnologia” (CEFET, 2007, p. 39) No projeto de criação do IFF havia a previsão de implantação de cinco novos cursos de licenciatura, que abrangeriam as áreas de linguagens e códigos, ciências humanas e ciências da natureza. Seriam três novas licenciaturas para o Campus Campos Centro: História, Filosofia, Linguagem e Literatura. Também seria criada a Licenciatura em História para o Campus Macaé e a Licenciatura em Ciências da Natureza, para o Campus Cabo Frio. Ainda estava prevista a abertura de um curso de formação docente, que a instituição especificou como “capacitação pedagógica para os alunos dos cursos de tecnologia”, que seria implantado também no Campus de Campos Centro. (CEFET, 2007). Das licenciaturas citadas acima, somente o curso de Letras foi implantado no Campus de Campos dos Goytacazes e o curso de Ciências da Natureza no Campus Cabo Frio. Os demais não foram criados e não há nenhuma informação nos relatórios de gestão a respeito desse fato. O IFF ofertou em 2014 cinco licenciaturas, a saber: no Campus Campos dos Goytacazes, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Matemática, Geografia e Letras, (criado no ano de 2012). No Campus Cabo Frio é oferecida a Licenciatura em Ciências da Natureza e suas Tecnologias. Diferentemente do que ocorreu com o IFRJ, somente dois cursos foram criados após a Lei nº 11.892/2008. Contudo, 100% dos cursos de licenciatura estão implementados em campi originários do antigo CEFET-Campos. Diferentemente do acontece no IFRJ, existe no IFF um curso de graduação no Campus originário de uma antiga escola vinculada, porém, não se constitui em uma licenciatura. Em 2010 ocorreu o processo de reestruturação dos Projetos Político-Pedagógicos e das matrizes dos Cursos de Licenciatura, essa demanda, segundo o relatório partiu das próprias Coordenações das Licenciaturas (IFF, 2011, p. 38). No ano de 2011 foram destinadas 240 vagas para os cursos de licenciaturas de um total de 710 vagas ofertadas para os cursos de graduação (IFF, 2012, p. 98), logo as vagas para as licenciaturas representaram 33% do total de vagas oferecidas. No ano de 2012, foram designadas 248 vagas para os cursos de licenciatura de um total de vagas 925 vagas ofertadas ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 280 para os cursos de graduação (IFF, 2013, p.181) perfazendo um total de 26% das vagas oferecidas. Como já assinalado anteriormente uma das formas de entrada nos cursos de Licenciatura é via PARFOR, mas não encontramos nenhuma especificação de como essa entrada se dá, qual é o percentual de vagas ofertadas, em quais licenciaturas estão disponíveis vagas e qual é a modalidade das vagas ofertadas (se em turmas especiais ou nas classes regulares). Nenhuma dessas informações está disponível nos relatórios de gestão. Assim como não encontramos informações a respeito de alunos ingressantes, matriculados e alunos concluintes. Isso ocorre, em virtude de os relatórios não especificarem essas informações, ou seja, as informações disponíveis são referentes aos cursos de graduação incluindo os bacharelados, as licenciaturas e os Cursos Superiores em Tecnologia sem especificações. Os únicos dados específicos encontrados foram apresentados acima. O IFF, assim como o IFRJ, buscou nos programas ofertados pelas CAPES fomento para as licenciaturas. A participação em diversos programas seria uma forma de consolidação da oferta de licenciaturas nesses institutos (IFF, 2014). O IFF atualmente desenvolve projetos junto ao PRODOCÊNCIA; ao PIBID e ao Programa de Apoio a Laboratórios Interdisciplinares de Formação de Educadores, LIFE. Além disso, o Programa de Educação Tutorial, PET, também envolve alunos das licenciaturas. 4. Novos encaminhamentos e algumas conclusões parciais Com o caminhar da pesquisa, novos dados irão surgir e novas interpretações poderão ser realizadas. Além disso, ainda não aplicamos os instrumentos de coleta de dados, apenas analisamos os relatórios de gestão com o intuito de conhecer o caminhar dessas instituições e o que elas declaram a respeito dessa caminhada em seus relatórios. Pelos motivos acima expostos, os resultados aqui apresentados não podem ser considerados ainda conclusivos. Contudo, a partir da análise dos Relatórios de Gestão das instituições, algumas constatações já podem ser registradas: a) a implantação dos cursos de licenciatura se deu prioritariamente em campus oriundos dos antigos CEFETs; b) os programas de fomento da CAPES são usados para equacionar as dificuldades encontradas durante a manutenção desses cursos; c) o índice de evasão desses cursos se mostra elevado, mesmo em cursos implementados antes da criação ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 281 dos Institutos Federais; d) existe a dificuldade de preenchimento de vagas oferecidas pelo PARFOR. As primeiras análises indicam que nos campi originários dos antigos CEFETs não houve problemas para manter as licenciaturas já existentes e/ou criar novos cursos de formação docente. No entanto, nos campi criados a partir das Escolas Técnicas Vinculadas não foram abertos cursos de licenciatura. O fato pode evidenciar que estes campi podem estar encontrando dificuldades na abertura de tais cursos, uma vez que sua tradição é na oferta de cursos médios e técnicos. Outra observação que podemos destacar é que, mesmo os campi que já tinham experiência com a formação de professores estão tendo dificuldades em diminuir a evasão nos cursos de licenciatura. Tal dificuldade pode indicar que a formação de professores não requer apenas experiência na oferta de cursos, para cumprir seu papel na sociedade, precisa estar alicerçada em pesquisas na área e contar com corpo docente qualificado, para atuar na formação pedagógica. Para equalizar a evasão a solução parcial encontrada foi a inserção desses institutos em programas da CAPES. Inserir as licenciaturas em tais programas também foi uma forma de estabelecer um contato mais estreito com a escola básica. Este pode ser um indicativo de que existe um déficit em relação à formação pedagógica e que tais programas poderiam estar ajudando a resolver tal questão. Novas pesquisas devem ser desenvolvidas para avaliar o real alcance dos programas da CAPES na formação docente. Também sinalizamos a dificuldade dos Institutos Federais em consolidar sua participação no PARFOR e constatamos, ainda, que algumas das dificuldades aqui listadas não se constituem em problemas exclusivos do IFs, e sim dos cursos de licenciatura, de modo geral, no Brasil. Nesse sentido, os IFs poderiam estar, em alguns casos, somente refletindo a realidade nacional. REFERÊNCIAS BRASIL. Congresso Nacional. Decreto nº 2.306, de 19 de Agosto De 1997. Regulamenta, para o Sistema Federal de Ensino, as disposições contidas no art. 10 da Medida Provisória nº 1.47739, de 8 de agosto de 1997, e nos arts. 16, 19, 20, 45, 46 e § 1º, 52, parágrafo único, 54 e 88 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e dá outras providências. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 284 POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE NO PARÁ: O PARFOR EM DESTAQUE Lena Leticia do Nascimento Braga [email protected] UFPA Arlete Maria Monte de Camargo [email protected] UFPA Eixo: Organização Institucional e Acadêmica na Expansão da Educação Superior RESUMO O presente trabalho volta-se para a análise das políticas de formação docente no Estado do Pará, focalizando o Plano Nacional de Formação de Professores (PARFOR) no período de 2009 a 2013 e procurando inferir possíveis implicações dessa formação na qualidade do ensino na educação básica do estado. Utilizou-se como referência a base de dados do MEC/INEP, Capes/Parfor, documentos oficiais sobre as políticas de formação docente, além da literatura correlata e de marcos regulatórios que regem as políticas educacionais de formação de professores. Os resultados do estudo apontam para a expansão da formação docente em nível superior a partir dos programas oficiais de formação, como o PARFOR e de cursos a distância. Apesar dos avanços no que tange a ampliação da formação inicial de professores, o quadro da educação no estado ainda é precário, o que indica a necessidade de regulamentar políticas educacionais para os professores da educação básica que envolva além da formação em nível superior, a valorização do magistério, as condições de trabalho, o cumprimento do piso salarial nacional, dentre outros. PALAVRAS CHAVE: Políticas de formação de professores. Expansão do ensino superior. Plano Nacional de Formação de Professores. 1- Situando as mudanças ocorridas na formação de professores no Brasil As políticas de formação docente para o ensino básico vêm sendo discutidas e avaliadas no Brasil há muito tempo, seja por autores que se dedicam a esse estudo, quanto por associações científicas e acadêmicas, como é o caso da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação – ANFOPE, que durante pelo menos três décadas trouxe contribuições significativas para a constituição das diretrizes nacionais para a formação dos profissionais da educação. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 285 Dentre os autores que contribuem para a compreensão desse tema destacam-se Saviani (2009) e Tanuri (2000), que fazem uma reconstituição da história da formação de professores no Brasil, além de Freitas (1999) a qual recupera a trajetória do movimento dos educadores na luta pela sua formação e pela profissionalização do magistério, representada na atualidade pela Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope). Destacam-se ainda as contribuições de Gatti, Barreto e André(2011), as quais apresentam um estudo do estado da arte sobre as políticas docentes no Brasil e a análise do processo de mudança nas concepções curriculares nos cursos de formação de professores nos últimos anos, respectivamente. , Camargo (2012) cujo o estudo volta-se para a análise das políticas de formação inicial de professores e a expansão dos cursos de formação de professores em nível superior no estado do Pará, e por fim, Mota Junior e Tavares (2012) cujo o objetivo do estudo é socializar análises e inferências produzidas a partir dos dados coletados na pesquisa Trabalho docente na educação básica no Brasil sobre os aspectos “condições de trabalho” e “formação docente” no âmbito do estado do Pará, em cinco municípios (Belém, Marituba, Altamira, Concordia do Pará e Curralinho. Esses autores mostram que os embates se colocam entre diferentes organizações acadêmicas e sindicais sendo são ainda pertinentes na atualidade e procuram investigar em que medida as políticas de formação docente de fato sinalizam para a melhoria da qualificação desses profissionais a partir da implementação dessas políticas. Um marco nas políticas de formação docente foi a Lei nº 9394/1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – a qual em seu artigo 62 faz referência à formação dos profissionais da educação, sinalizando a obrigatoriedade do preparo em nível superior em cursos de licenciatura plena aos professores destinados a atuar tanto na Educação Infantil quanto nos quatro primeiras series do ensino fundamental (BRASIL, 1996). Desde então, essa orientação tem repercutido de forma decisiva nas políticas educacionais voltadas para a qualificação de professores. A promulgação dessa lei trouxe inúmeras regulamentações acerca da formação inicial de professores, como: a regulamentação dos Institutos Superiores de Educação (IES) e de cursos emergências, para professores que já atuavam nas redes de ensino; a criação dos Cursos Normais Superiores, cujo o objetivo se assemelha com os cursos de licenciatura em Pedagogia, formar professores para os anos iniciais da escolarização e educação infantil; a constituição da diretrizes curriculares direcionadas à “prática educativa”. A LDB também ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 286 trouxe no art. 62, §2º que a formação continuada e a capacitação dos profissionais do magistério far-se-á também com o auxílio de recursos e tecnologias de Educação a Distância EAD. Diante do exposto observa-se que a formação de professores em sua trajetória histórica, conquistou reconhecimento de forma legal, por meio de leis, Decretos, enfim, sendo que durante décadas a profissão de professor poderia ser exercida por leigos sem nenhuma formação na área da educação. Nota-se que com as novas exigências da Lei 9.394/96 a respeito da formação de professores da Educação Básica os cursos de formação docente expandiram-se incluindo tanto a formação inicial quanto a formação continuada desses profissionais. Do ponto de vista legal, nota-se que a preocupação predominante das regulamentações que se seguiram volta-se mais à expansão da oferta dos cursos de formação de professores em nível superior sejam eles a distância, presenciais ou semipresenciais. Entretanto, acredita-se que não basta apenas titular professores em nível superior, é necessário que essa titulação corresponda para o bom desempenho de seu trabalho e uma educação de qualidade. Tendo em vista as diretrizes curriculares disponíveis sobre esses cursos, percebe-se que estamos ainda distantes de uma política de melhor qualificação no que tange à formação inicial. (GATTI et al, 2011). Em relação à formação docente em exercício no estado do Pará, passados mais de dez anos após a aprovação da LDB “apenas cerca de 10% dos docentes que atuam na educação básica no estado do Pará possuem formação inicial adequada às suas funções. Os demais carecem de formação inicial em nível de graduação ou apesar de possuir formação em nível de graduação atuam em área diferente de sua formação inicial” (Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará, 2009, p. 5). Esse resultado contribuiu para explicar parcialmente os baixos índices da educação no Estado no período de 2007. Para resolver esse problema, tornou-se necessário intensificar as políticas de formação de professores, já que as ações desenvolvidas não haviam surtido o efeito necessário, tendo em vista a necessidade de profissionalizar os professores em exercício da profissão docente. Dessa forma, foi necessária a articulação das Instituições Públicas de Ensino Superior (IES) com a Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC-PA) para qualificar professores que atuavam na educação básica. Sendo assim, por meio de integração, foi criado o Protocolo SEDUC-IES, o qual tem o objetivo de “formular proposições e procedimentos a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 287 serem implementados no Ensino Médio e no Ensino Superior visando a melhoria da educação pública no Estado do Pará” (SEDUC-IES, 2009). Esse Protocolo teve por base o Decreto n° 6.755, de 29 de janeiro de 2009, o qual instituiu a Política Nacional de Profissionais do Magistério da Educação Básica com o intuito de organizar, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, a formação inicial e continuada dos profissionais do magistério para as redes públicas da educação básica. O referido Decreto também regulamentou a alteração da estrutura da Capes, através da Lei n° 11.502, de 11 de julho de 2007, autorizando essa instituição a se voltar para a capacitação dos docentes da educação básica, impulsionando tanto a formação inicial, quanto a formação continuada desses docentes. O Ministério da Educação (MEC) passou a adotar estratégias diferenciadas sob a ótica de formação docente, dentre elas destaca-se o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação básica, documento este, resultado da ação conjunta do MEC, e instituições públicas de educação superior e das Secretarias de Educação dos Estados e Municípios visando a assegurar a formação exigida na LDB para todos os professores que atuam na educação básica. A partir desse contexto em que se intensificam as ações no campo da formação docente é que se objetivou analisar as políticas de formação docente no Estado do Pará, verificando as principais mudanças nos índices da formação docente, regulamentações apresentadas anteriormente, comparando o documento SEDUC-IES com os dados da Universidade Federal do Pará, sendo esta a maior universidade do Norte, e uma referência em cursos de formação de professores. A pesquisa aqui apresentada de forma parcial resulta de plano de trabalho desenvolvido intitulado Formação e valorização do magistério no Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica – Parfor e que orientou a elaboração de Trabalho de Conclusão de Curso defendido em 2015. Está traduzida na busca de respostas para as seguintes questões: As políticas de formação de professores que estão sendo desenvolvidas pelas IES, especificamente o PARFOR, têm contribuído para a melhoria da qualidade da educação básica no estado do Pará? Quais os principais resultados alcançados a partir do protocolo SEDUC-IES no que diz respeito à atuação da Universidade Federal do Pará? ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 288 A abordagem da pesquisa desenvolvida é de natureza quanti-qualitativa e considera o que entende Minayo e Sanches (1993:247) de “que a relação entre quantitativo e qualitativo, entre objetividade e subjetividade não se reduz a um continuum, ela não pode ser pensada como oposição, como uma relação contraditória. Pelo contrário, é de se desejar que as relações sociais possam ser analisadas em seus aspectos mais “ecológicos” e “concretos” e aprofundadas em seus significados mais essenciais. Assim, o estudo quantitativo pode gerar questões para serem aprofundadas qualitativamente, e vice-versa”. Não é de hoje a preocupação com a preparação de professores no Brasil. Durante décadas a formação docente vem sofrendo frequentes mudanças e reformas no que constam às regulamentações e legislações a respeito dessa temática. A seguir, será feito um exame da política de formação de professores no Brasil a partir da Lei nº 9.394/96. 2. Plano Nacional de Formação de Educação Básica (PARFOR) e a formação em exercício no estado do Pará. A partir da promulgação da LDB inúmeros programas de formação de professores foram criados com o objetivo de capacitar professores que atuavam na rede de ensino sem a qualificação adequada em nível superior, bem como, diretrizes curriculares voltadas para instituir como deveria ser esta formação. Para a análise de um desses programas, o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica – PARFOR e sua implementação no Estado do Pará, além da literatura sobre esse programa, utilizou-se os dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira – INEP, pelo Ministério de Educação – MEC, pelo Plano Decenal de Formação de Professores do Estado do Pará, pela Universidade Federal do Pará – UFPA e pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, os quais dispõem em sua base de dados elementos importantes para entendimento da temática em questão. De acordo com Camargo (2012) as primeiras ações a serem desenvolvidas para constituição de uma política de formação de professores no estado do Pará surgiram nas décadas de 1970 e 1980 com a criação dos núcleos de educação e dos campi universitários. Naquele período houve a necessidade de qualificar professores para lecionar as disciplinas conseguintes da legislação então vigente – Lei nº 5692/1971, a qual estabeleceu alterações no sistema de ensino brasileiro, com a estruturação da educação brasileira de 1º e 2º Graus, de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 289 caráter profissionalizante. Essas mudanças no sistema educacional de ensino no Brasil surtiram efeitos significativos no tal sistema, constituindo dessa forma a formulação de programas de formação de professores concebidos pelo governo federal, objetivando qualificar professores nas capitais e interiores dos estados. (CAMARGO, 2012) Destaca-se ainda a realização de cursos de licenciatura a partir de convênios entre as Instituições de Ensino Superior e prefeituras municipais do Brasil direcionados apenas aos professores que já atuavam nas redes de ensino desses municípios e foram mantidos com recursos oriundos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério - FUNDEF73 constituindo-se em um dos principais impulsionadores da formação de professores sem formação adequada. Essa lei previu a aplicação dos recursos da parcela de 60% na capacitação de professores leigos em exercício no ensino fundamental durante os primeiros cinco anos de vigência da lei. Em substituição a esse Fundo, em 2007 foi criado do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB74, o qual previa que até 60% do Fundo poderia ser utilizado na remuneração dos profissionais do magistério da educação básica (CAMARGO; ALMEIDA; BRAGA, 2014). Entre as iniciativas públicas direcionadas a formação de professores da educação básica em nível superior, foram criados inúmeros programas de formação emergencial docente cujo objetivo dirige-se para a habilitação desses profissionais em nível superior, especialmente para aqueles professores que atuavam nas redes de ensino e que ainda não apresentavam a titulação exigida pela LDB. Dentre os programas destaca-se o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica – PARFOR, cujo referido trabalho se propõem a investigar. De acordo com o documento Relatório de Gestão da Capes (2013)75, criado em 28 de maio de 2009, o PARFOR apresenta-se na modalidade presencial e a distância, sendo que, a modalidade presencial é implementada pela Diretoria de formação dos professores da Educação Básica (DEB) e modalidade a distância é de responsabilidade da Diretoria de 73 Aprovado pela Lei nº 9.424/1996. Aprovado pela Lei nº 11.947/ 75 Disponível em: http://www.capes.gov.br/. Caracteriza-se como um Resumo Executivo e tem o propósito de dar uma visão sucinta do Relatório de Gestão 2009-2013, da Diretoria de Formação de Professores da Educação Básica – DEB, órgão da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes. Acesso em 10 de dez. de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 74 290 Educação a Distância (DED), órgão pertencente a Capes. O presente trabalho volta-se para a primeira modalidade. Segundo o site de MEC76 o PARFOR é um Programa emergencial baseando-se nas orientações do disposto no artigo 11, inciso III do Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009, tais quais as diretrizes estão ancoradas no Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação77, criado com programas estratégicos no de Plano de Desenvolvimento da Educação, em 2007. O Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009 instituiu a oferta emergencial de cursos de licenciatura e de cursos ou programas especiais dirigidos aos docentes em exercício na rede pública de educação básica, os quais se destinam a: graduados não licenciados, licenciados em áreas diversas da atuação docente e professores com nível médio, na modalidade Normal (BRASIL; 2009). O Plano foi implantado em regime de colaboração entre a Capes, os estados, municípios o Distrito Federal e as Instituições de Educação Superior – IES para ministrar cursos superiores a professores em exercícios em escolas públicas que não possuem formação adequada prevista pela LBD, os cursos são: Cursos de 1ª licenciatura, para os que não possuem formação em nível superior e estão em exercício na educação básica; Cursos de 2ª licenciatura, para os licenciados que estejam em exercício a pelo menos três anos na rede pública de educação básica e que atuam em área distinta a sua área formação inicial; Cursos de formação-pedagógica para bacharéis sem licenciatura. Segundo o documento Relatório de Gestão da Capes (2013) a participação dos Estados foi viabilizada por meio de acordos firmados entre a Capes e as Secretarias Estaduais de Educação, a participação das IES é efetivada por meio de assinatura de Termo de Adesão ao Acordo de Cooperação Técnica (ACT). Os chamados Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação docente exercem o papel de analisar, planejar, organizar a demanda das redes estadual e municipal, além de acompanhar o desenvolvimento da formação em cada unidade federada. (CAPES, 2013). 76 77 Disponível em: portal.mec.gov.br. Acesso em 25 de ago. de 2014 Instituído pelo Decreto 6.094/2007 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 291 Segundo o sítio da Capes78, essa coordenação atua como gerenciadora do processo de proposição, inscrição e execução dos planos estratégicos dos estados em parcerias com as IESs participantes por meio da Plataforma Freire, pelo qual os professores das redes públicas se candidatam aos cursos de formação inicial e continuada, mediante pré-inscrição, as inscrições são validadas pelas secretarias de educação as quais os docentes pertencem e são submetidas às IESs, para fins de seleção e matrícula. O PARFOR tem como principal objetivo induzir e fomentar a oferta de educação básica, para que os professores em exercício na educação básica possam obter a formação exigida pela LDB e contribuam para a melhoria da qualidade da educação básica do Brasil. Em âmbito Nacional79 estão em desenvolvimento no PARFOR estão em desenvolvimento 194 cursos presenciais de licenciatura, sendo: 138 de Primeira Licenciatura e 56 de Segunda Licenciatura, beneficiando um total aproximadamente 40 mil professores em exercício na rede pública de educação básica, abrangendo 25 unidades federais. Com relação aos dados colhidos pela Capes, segundo o documento Relatório de Gestão da Capes (2013) o PARFOR na modalidade presencial, apresenta evolução no processo de institucionalização e crescimento na efetivação de matricula. No ano de 2009, o número de matriculados era de 4.273 professores distribuídos em 140 turmas. Encerrando o ano de 2013 70.220 professores matriculados em 2.145 turmas ofertados por 96 IES. Tomando como referencia a organização academica, a Tabela 1 indica que o numero de Universidades que ofertam o PARFOR sobrepõe-se ao numero das outras organizações que também disponibilizam o mesmo Programa, tal diferenciação ocorre em todas as regiões brasileiras, sendo ainda maior na Região Sul, onde observa-se que do número total de IES (25), 22 são universidades e as outras 3 restantes dividem-se em CentroUniversitário (1) e Institutos (2). 78 79 Disponível em: www.capes.gov.br. Acesso em 15 de dez. de 2014. Disponível em: portal.mec.gov.br no ano de 2014. Acesso em 18 de set. de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 292 Tabela 1. Oferta no PARFOR em 2012 segundo o número de IES, por organização acadêmica em todo o Brasil. BRASIL Nº DE IES UNIVERSI DADE CENTRO UNIVERSITÁ RIO INSTITUTO FACULDADE 90 68 6 14 3 14 10 0 4 0 25 22 1 2 0 25 20 0 5 0 22 12 5 2 3 4 3 0 1 0 NORTE SUL NORDESTE SUDESTE CENTROOESTE Fonte: Capes/Inep, 2012. 3 - A implementação do PARFOR no Estado do Pará. Com relação ao estado do Pará, onde o estudo foi desenvolvido, o Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará foi criado exatamente em 14/11/2009, como bem explicita o sitio da SEDUC-PA80. De acordo com esse Plano, os dados do Educasenso 2007 revelaram que havia cerca de 125.000 funções docentes exercidas sem a qualificação adequada no Estado. Sabe-se que inúmeros fatores contribuem para explicar os baixos índices da educação no Estado no período de 2007; a formação docente é um desses fatores, o que sem dúvida contribuiu para intensificar as políticas de formação de professores, já que as ações desenvolvidas nesse campo não haviam surtido o efeito necessário, tendo em vista a necessidade de profissionalizar os professores em exercício da profissão docente. Dessa forma foi necessária a articulação das Instituições Públicas de Ensino Superior (IES) com a Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC-PA) para qualificar professores que atuam na educação básica. Sendo assim, por meio de integração, foi criado o Protocolo SEDUC-IES, o qual constitui um instrumento interinstitucional com o objetivo de “formular proposições e procedimentos a serem implementados no Ensino Médio e no Ensino 80 Disponível em http://www6.seduc.pa.gov.br. Acesso em 05 de jun. de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 293 Superior visando a melhoria da educação pública no Estado do Pará” (PLANO DECENAL DE FORMAÇÃO DOCENTE NO ESTADO DO PARÁ, 2009). Criado em 18 de dezembro de 2006, o Protocolo SEDUC-IES trouxe contribuições significativas na construção do Plano Estadual de Educação em 2009, além do mais, vem construindo junto com a União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME-PA) a proposta de Plano de Formação Docente do Estado do Pará. De fato, a elaboração do Plano partiu da análise de dados para implantar o diagnóstico da qualificação dos profissionais que atuam na Educação Básica do Pará prevendo a formação inicial e continuada de professores. Dessa forma, foi solicitado ao MEC acesso a dados sobre a demanda por qualificação docente no Pará. (PROTOCOLO SEDUC-IES, 2006) A SEDUC-PA gerencia as ações educativas no estado, por meio de domínios de gestão chamadas de Unidades Regionais de Educação – URE. Cada URE reúne os municípios próximos geograficamente semelhantes. Cada URE tem como polo um dos municípios que a compõem. Ver a Tabela 01 em anexo. Segundo o Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará (2009) a descrição das necessidades de qualificação docente far-se-á a partir do detalhamento da situação de cada uma das Unidades Regionais apresentada no respectivo Plano. Para esta analise seriam considerados o número de docentes com os seguintes perfis: Licenciados atuando no ensino de disciplinas de acordo com sua formação inicial; Licenciados atuando em disciplina diferente da sua formação inicial; Bacharéis sem formação em licenciatura e professores não graduados. De acordo com o Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará (2009) verificou-se uma maior demanda de professor sem a qualificação em nível superior nas URE de Marabá e Belém, respectivamente foram 4.430 e 4.342. A URE de Belém também apresentou maior demanda de licenciado atuando em disciplinas diferentes da sua formação, exatamente 4.690. Dessa forma, nota-se a necessidade de desenvolver programas de qualificação docente, tanto em nível de graduação como de pós-graduação. Ainda segundo esse plano as ações paralelas de graduação e pós-graduação oportunizarão a criação de um ambiente à discussão de métodos de ensino, elaboração de projetos de pesquisa e de extensão nas escolas e nas comunidades. Dessa forma se caracteriza como objetivo geral do referido Plano “oferecer licenciaturas em nível de graduação, considerando as peculiaridades dos sujeitos a serem formados, propiciar especialização e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 294 incentivar docentes para ingressar em programas de mestrado e doutorado em todo o estado do Pará, nas redes estadual e municipal de ensino” (PARÁ, 2009, p. 31) Para tanto, dois eixos norteadores constituem o Plano Decenal, objetivando a melhoria da Educação Básica no Estado do Pará. São estes: a graduação de professores que já atuam como docente e não possuem formação adequada e a formação continuada de professores graduados. De acordo com o Plano para cada eixo haverá um conjunto de estratégia diferenciada. Entretanto, as ações do Plano serão coordenadas por um Comitê Interinstitucional sediado pela SEDUC-PA seja qual for o eixo. (PARÁ, 2009). Tendo em vista os dados apresentados no Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará, observa-se que o cenário educacional no estado do Pará no ano 2007, especialmente no que tange à demanda pela Formação de Professores, era assustador, pois havia cerca de 60.000 docentes com qualificação inadequada, sendo que destes, quase 40.000 não possuem formação em nível superior, sendo apenas 12.300 os que possuem licenciatura adequada à função que exercem. Esses dados ilustram o baixo nível acadêmico nas escolas, podendo contribuir para explica a qualidade educacional na educacional do Estado do Pará (PARÁ, 2009). Outro documento que trata sobre a formação dos professores é o Plano Nacional de Educação, que segundo o sítio81, uma lei ordinária que terá vigência de dez anos a partir de 26/06/2014, estabelecendo diretrizes, metas e estratégias de concretização no campo da Educação. A meta 15 desse documento volta-se para a formação dos professores, assegurando-lhes que todos esses profissionais possuam formação especifica em nível superior, obtidas em cursos de licenciatura na área de conhecimento em que atuam. Os indicadores referentes a cada uma das metas do PNE e de suas respectivas estratégias são monitorados no Observatório do PNE82, uma plataforma online que oferece análise sobre as políticas públicas do Plano. A Tabela 2 sintetiza as informações disponibilizadas no Observatório do PNE, apresentando a porcentagem de professores da educação básica com curso de licenciatura em municípios do estado do Pará no período de 2009 a 2013. 81 82 Disponível em: www.observatoriodopne.org.br. Acesso em 15 de dez. de 2014. Disponível em: www.observatoriodopne.org.br. Acesso em 15 de dez. de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 295 Tabela 2 – Professores da Educação Básica com curso de licenciatura em municípios do estado do Pará no período de 2009 a 2013 Municípios do 2009 2010 2011 2012 2013 estado do Pará 20092013 % Abaetetuba 34,9% 37,6% 47,1% 49,2% 50,7% 15,8 Altamira 42,1% 44,8% 48,5% 55,1% 55,8% 13,7 Belém 65% 68,2% 66,6% 65,2% 73,1% 8,1 Bragança 49,9% 55,8% 62,5% 67% 16,5 Breves 27,2% 27,1% 31,6% 30,2% 33,6% 6,4 Cametá 20,4% 27,6% 27% 36,7% 40,4% 20 Capanema 42,6% 46,9% 58,7% 66,7% 70,6% 28 Castanhal 50% 51,8% 57,2% 59,9% 64,9% 14,9 do 41,1% 49,2% 60,8% 65,8% 68,6% 27,5 Capitão Poço 25,2% 27,1% 39,1% 41,5% 36,9% 11,7 Itaituba 45,6% 43,6% 40,5% 53,1% 46,8% 1,2 Mãe do Rio 67% 67% 71,7% 77,8% 81,5% 14,5 Marabá 39,5% 42,2% 41,9% 50,7% 56,3% 16,8 Maracanã 8,4% 11,9% 19,6% 22% 21,7% 13,3 Monte Alegre 36,6% 44,8% 53,6% 60,2% 61,5% 24,9 Óbidos 23,9% 25,5% 27,7% 31,3% 29,9% 6 Santa Izabel 46% 51,1% 51,7% 60,3% 60,8% 14,8 Santarém 42,9% 43,9% 51,2% 51% 10,1 Tucuruí 66,8% 69,3% 67,4% 64,4% 62,5% Conceição 66,4% Araguaia 53% -4,3 Fonte: MEC/INEP/DEED/Censo Escolar/Preparação: Todos Pela Educação. No período analisado verifica-se que houve uma ampliação da formação de professores em cursos de licenciatura. Acredita-se que o PARFOR deve ter contribuído para a modificação dessa situação. Em relação aos municípios de Marabá e Belém, onde se observou anteriormente a maior demanda de professores sem formação em nível superior, constata-se a partir dos dados acima que houve um acréscimo considerável nos municípios de Cametá, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 296 Conceição do Araguaia e Monte Alegre. Já em Tucuruí houve um decréscimo percentual em relação a formação de professores com licenciatura. Em Itaituba e Óbidos o crescimento observado foi na ordem de 1,2% e 6% respectivamente o que significa ter havido uma redução do número de professores com essa formação. Uma das possíveis explicações para tal é a ampliação do número de professores contratados sem licenciatura, estratégia que vem sendo desenvolvida pelas prefeituras para reduzir a folha de pagamento, já que são obrigados a cumprir o piso salarial para professores com licenciatura. Dessa forma, pode-se dizer que foram cumpridos parcialmente os objetivos do Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará, considerando que das quatro IES que integram o PARFOR, o total de 30.911 de alunos ingressos no Programa a partir de 2009, foram dados registrados apenas na Universidade Federal do Pará (UFPA), não considerando as demais instituições. Além do mais, considerando os dados disponibilizados pelo Observatório do PNE, verifica-se que cresceu o numero de professores com licenciatura no Estado do Pará a partir de 2009, ano que o PARFOR foi implementado no Estado. Outro indicador a ser considerado é o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb)83, criado como condutor de política pública na esfera nacional, nos estados e municípios e escolas. É um indicador que possibilita não apenas o diagnóstico atualizado da situação educacional em todas as esferas, mas também a projeção de metas individuais intermediaria rumo ao incremento da qualidade do ensino. Criado em 2007 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - Ideb é um indicador que reúne dois conceitos igualmente importantes para a qualidade da educação, são estes: fluxo escolar e médias de desempenho nas avaliações. Agregando ao enfoque pedagógico dos resultados das avaliações em larga escala do Inep a possibilidade de resultados sintéticos, facilmente assimiláveis, e que permitem traçar metas de qualidade educacional para os sistemas. O indicador é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar e médias de desempenho nas avaliações do Inep, o Saeb – para as unidades da Federação e para o país, e a Prova Brasil – para os municípios. 83 Disponível em: http://portal.inep.gov.br/. Acesso em 20 de dez. de 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 297 Em contrapartida, deve-se considerar que o IDEB84 é um indicador que analisa o cenário educacional do ponto de vista do estudante, ou seja, seu rendimento escolar diagnosticado por meio de sistemas de avaliações. Esse indicador, pelas limitações que apresenta, não dá conta de compreender a dimensão da situação educacional em cada um dos municípios, pois para que se pudesse avaliar e analisar o quadro da formação de professores da educação básica, seria preciso levar em consideração um conjunto de fatores como: estrutura física das escolas, condições de trabalho dos profissionais que atuam no campo educacional, a condição social e cultural dos alunos, o que possibilita uma maior ou menor aproximação com os processos de escolarização, entre outros fatores a se considerar. Mesmo com essas limitações, a partir desse índice é possível, ainda que de forma limitada, estabelecer possíveis implicações da ampliação da formação docente no Sistema Educacional no Estado do Pará. Levando em consideração apenas as escolas estaduais de ensino fundamental (4ª serie/5º ano), os resultados foram os seguintes nos municípios de Belém, Benevides, Bragança, Cachoeira do Arari, Castanhal e Marabá, os quais integram o Protocolo SEDUC-IES (Pará, 2006). De acordo com a tabela 3, dos municípios que compõem o estado do Pará, seis, dentre outros, destacaram-se por não conseguir ultrapassar as metas projetadas para 2013. Considerando o município de Belém, o qual, segundo o Plano Decenal de Formação Docente do Estado do Pará, no ano de 2007, apresentou maior demanda de professor sem a qualificação em nível superior, exatamente 4.342, observa-se que o IDEB do município caiu de 4.1 no ano de 2011, para 3.9 em 2013, não conseguindo atingir a meta projetada em 2013 de 4.2. Apenas o município de Marabá apresentou uma evolução se comparamos os anos de 2005 a 2013, bem como atingiu a meta projetada em 2013. Tabela 3 – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) na 4ª série/5º escolas públicas estaduais: metas projetadas e resultados alcançados. Resultados Alcançados Metas Projetadas Município 2005 2007 2009 2011 2013 2007 2009 2011 Belém 3.1 3.0 3.8 4.1 3.9 3.2 3.5 3.9 Benevides 3.0 2.9 3.5 4.1 3.9 3.1 3.4 3.8 Bragança 3.0 3.0 3.6 3.7 3.4 3.0 3.4 3.8 Cachoeira do Arari 2.6 2.1 1.7 3.1 3.3 2.0 3.0 3.4 84 ano das 2013 4.2 4.1 4.0 3.7 Sobre o IDEB ver Almeida, Dalben e Freitas (2013): O IDEB. Limites e ilusões de uma política educacional. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010173302013000400008&lng=pt&nrm=iso. Acesso em 20 de março de 2015; ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 298 Castanhal 2.6 Marabá 2.7 Fonte: IDEB/INEP, 2014. 2.7 3.3 3.5 4.0 -85 4.4 3.0 4.3 2.7 2.8 3.1 3.1 3.5 3.5 3.8 3.8 Assim, é possível afirmar que apesar dos avanços observados na formação docente no estado do Pará, a melhoria na qualidade da educação do estado do Pará não depende apenas da formação adequada a professores em exercício na educação básica, pois mesmo com a oferta do PARFOR desde 2009, o quadro da educação no estado ainda é precário. Certamente outros fatores contribuem para esse cenário, como: condições de trabalho, infraestrutura das escolas, nível salarial, dentre outros, o que precisa ser devidamente observado no desenvolvimento das políticas educacionais. 4 - Considerações Finais Vale retomar aqui os pontos primordiais que resultaram na pesquisa aqui apresentada de forma parcial. Primeiro ponto em pauta são as conquistas históricas na formação de professores no Brasil que ao longo de sua trajetória conquistou reconhecimento legal. Todavia é fundamental a mobilização dos educadores para a missão de construir um sistema educacional que efetivamente prepare e certifique efetivamente os professores que atuarão na educação básica. Uma segunda questão a ser pontuada, diz respeito às políticas de formação de professores pós-LDB, implementadas no âmbito Federal, as quais trouxeram resultados importantes para o desenvolvimento educacional. Entretanto é importante ressaltar que as políticas tanto as da formação inicial quanto da formação continuada de professores devem estar norteadas para a valorização desse profissional, o que nem sempre ocorre, uma vez que ainda existem municípios que não adotaram políticas como planos de cargos e salários, concursos públicos, além de outros aspectos igualmente importantes. Com relação ao PARFOR, ponto chave desse trabalho, a partir dos dados disponibilizados no Plano Decenal de Formação de Formação Docente do Estado do Pará, no documento da Universidade Federal do Pará PARFOR/UFPA e no Observatório PNE, foi possível observar a significativa contribuição desse programa na formação de professores no 85 Não houve registro da inexistência do IDEB no município de castanhal no ano de 2011. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 299 Estado do Pará, os quais atuavam na educação básica sem a formação exigida pela Lei 9.394/96 (LDB). Assim acredita-se ter sido cumprindo parcialmente os objetivos do Plano. A partir dos principais achados da pesquisa é possível ainda afirmar que mesmo com os avanços na formação docente do estado a melhoria na qualidade da educação do estado do Pará não depende apenas da formação adequada a professores em exercício na educação básica, pois mesmo com a oferta do PARFOR e sua demanda de cursos desde 2009, o quadro da educação no estado ainda é precário. É necessário o desenvolvimento de políticas públicas educacionais voltadas aos docentes que atuam na educação básica, políticas que envolvam as condições de trabalho, a questão salarial, dentre outros. Dessa forma constata-se que as ações desenvolvidas pelo PARFOR concorrem para a universalização da formação em nível superior do magistério, todavia ainda não foi possível superar a dicotomia da profissionalização, e das condições econômicas, sociais, políticas que afetam a problemática. REFERÊNCIAS ANFOPE. Documento para subsidiar discussão na audiência pública regional. 2001. 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Modifica as competências e a estrutura organizacional da fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes, de que trata a Lei nº 8.405, de 9 de janeiro de 1992; e altera as Leis nº 8.405, de 9 de janeiro de 1992, e 11.273, de 6 de fevereiro de 2006, que autoriza a concessão de bolsas de estudo e de pesquisa e participantes de programas de formação inicial e continuada de professores para a educação básica. Diário Oficial da União. Brasília: Casa Civil da Presidência da República, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 300 2007f. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2007/Lei/L11502.htm. Acesso em: 17 nov. 2014. BRASIL. Ministério da Educação. Plano Nacional de Educação. Observatório do PNE. 2014 a 2024. 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O artigo traz breve análise sobre o contexto teórico e legal da autoavaliação tomando por base o Sinaes e, em seguida, apresenta o percurso metodológico e os casos analisados, destacando os critérios de escolha para a seleção do universo da pesquisa. Por último, focaliza as análises de cinco relatórios selecionados, subdividindo-os em políticas acadêmicas, políticas de gestão e infraestrutura, correspondente a três dimensões sugeridas pelo Sinaes, a partir da Portaria 92/2014 (INEP). O resultado mostra convergências entre os relatórios e o IGC, bem como aspectos de difícil compreensão para esta relação, diante dos resultados obtidos pelas universidades. Palavras-chave: IGC, CPC, relatórios de autoavaliação Considerações iniciais O objetivo deste artigo é discutir a relação entre o Índice Geral de Curso (IGC) atribuído a cinco universidades federais, uma de cada região brasileira, e os relatórios de autoavaliação institucional elaborados pelas suas respectivas Comissões Próprias de Avaliação (CPA), tendo por referência o ano de 2012. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 303 A reflexão empreendida no artigo considera que a autoavaliação assume uma função diagnóstica, identificando as causas dos problemas e deficiências encontradas em relação ao trabalho da instituição de educação superior (IES), de maneira a contribuir para aumentar a consciência pedagógica e a capacidade profissional do corpo docente e técnicoadministrativo. Nesta perspectiva, seu propósito maior é fazer com que as informações coletadas e analisadas sejam capazes de, em um primeiro momento, subsidiar a tomada de decisões na gestão e, em um segundo momento, apresentar elementos que atendem a elaboração de um relatório abrangente e detalhado. Partindo desta tese e visando alcançar o objetivo anunciado, estruturalmente, o texto está organizado em três partes. A primeira parte situa a autoavaliação como componente avaliativo do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). A segunda apresenta o percurso metodológico adotado no estudo e as universidades selecionadas. A última parte discute os resultados da pesquisa, em relação às políticas acadêmicas, políticas de gestão e infraestrutura, tomando como referência os relatórios de autoavaliação das instituições pesquisadas e o IGC obtido pelas mesmas. 1. A autoavaliação no contexto do Sinaes Como política pública de avaliação, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), instituído pela Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004 (BRASIL, 2004), foi estruturado tomando como referência uma tríade de componentes: (i) avaliação das instituições (interna e externa); (ii) avaliação dos cursos; (iii) avaliação do desempenho dos estudantes, buscando a articulação e integração dos seus focos. Considerando que existe farta literatura sobre esses três componentes e das relações que se estabelecem entre eles, primando pela objetividade, este trabalho focalizará especificamente a avaliação institucional afeta diretamente à discussão nela proposta – autoavaliação. Levando em conta a importância e validade para o aperfeiçoamento do trabalho da Instituição de Educação Superior (IES) em suas várias dimensões, a autoavaliação amplia a visão da comunidade interna sobre suas potencialidades e fragilidades para uma tomada de decisão (DIAS SOBRINHO, 2000; BELLONI, 1999; LEITE, 2005, 2008). Ela oportuniza à IES construir conhecimentos sobre sua própria realidade, visando compreender os sentidos e significados do conjunto de suas atividades, bem como de melhorar a qualidade educativa e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 304 alcançar a relevância social. Sua finalidade é fornecer elementos que provoquem um olhar da instituição para dentro de si, na perspectiva de encontrar alternativas que contribuam para melhorar a qualidade da educação que oferta. A autoavaliação pode levar a IES a se analisar interna e autonomamente, de maneira que as informações coletadas, sob a ótica de diferentes segmentos, possam ajudá-la a compreender sua missão, organização, gestão, seu projeto pedagógico, bem como sua responsabilidade social. Para sua realização, é preciso que cada IES crie uma comissão para conduzir esse processo no universo institucional, como o definido no artigo 11 da lei nº 10.861/04, a Comissão Própria de Avaliação – CPA: Art. 11. Cada instituição de ensino superior, pública ou privada, constituirá Comissão Própria de Avaliação - CPA, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da publicação desta Lei, com as atribuições de condução dos processos de avaliação internos da instituição, de sistematização e de prestação das informações solicitadas pelo INEP, obedecidas as seguintes diretrizes: I – constituição por ato do dirigente máximo da instituição de ensino superior, ou por previsão no seu próprio estatuto ou regimento, assegurada a participação de todos os segmentos da comunidade universitária e da sociedade civil organizada, e vedada a composição que privilegie a maioria absoluta de um dos segmentos; II – atuação autônoma em relação a conselhos e demais órgãos colegiados existentes na instituição de educação superior. (BRASIL, 2004) De forma geral, a academia tem produzido críticas diversas no que concerne à política educacional definida para a avaliação da educação superior nas últimas duas décadas, no país. No âmbito da política implementada nos dois mandatos do governo Fernando Henrique Cardoso/FHC (1995-1998 e 1999-2002), tais críticas voltaram-se para a centralidade que o Exame Nacional de Cursos (ENC), mais conhecido como “Provão”, ganhou ao se propor avaliar os cursos mediante prova feita pelo aluno. No tocante à última década, é sustentada a ideia de que, a partir do que propõe o Sinaes, a visão formativa desse sistema estaria sendo comprometida pela inclusão de diversos índices na proposta original (BARREYRO, 2008; ROTHEN, 2006). Subjaz a essa crítica a ideia de que a avaliação estaria sendo orientada pelo paradigma dos índices construídos pelo Estado e não pelo paradigma de visão formativa e emancipatória. Os críticos desse sistema avaliativo assumem tal posição, ainda que admitam que a discussão e construção de variados índices venham contando com a participação de representantes da academia. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 305 Críticas variadas também são apresentadas em relação ao Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) que, como componente do Sinaes, visa aferir o rendimento dos alunos dos cursos de graduação quanto aos conteúdos programáticos e as habilidades e competências apontadas nas diretrizes curriculares de cada curso. Nesse caso, a crítica é apresentada no sentido de que, de instrumento secundário no sistema, o Enade ganhou destaque e força política bem mais expressiva do que, por exemplo, a própria autoavaliação. Cabe reiterar que, devido à sua natureza, importância para o autoconhecimento da instituição e necessário diálogo com a avaliação externa86,a autoavaliação permite “a troca de experiências, o intercâmbio de materiais úteis à avaliação e as atitudes de ajudas mútuas” (DIAS SOBRINHO, 2002, p. 100). Leite (2008) sustenta a tese de que o Sinaes sofreu uma “reforma por dentro” ao instituir índices diversos, apresentando dois exemplos: (i) regulamentação da aplicação do Conceito Preliminar de Cursos (CPC), em 2007, para fins dos processos de renovação de reconhecimento respectivos, no âmbito do ciclo avaliativo do Sinaes instaurado pela Portaria Normativa nº 1; (ii) instituição do Índice Geral de Cursos da Instituição de Educação Superior (IGC), em 2008, que confere autonomia às IES para fins de autorização de cursos (INEP, 2011), objeto de discussão deste trabalho. Ao que tudo indica, a proposição desses e outros índices têm apresentado dificuldades adicionais à produção de “práticas avaliativas com finalidade de melhoria institucional e pedagógica [sejam] protagonizadas pelos atores institucionais” (DIAS SOBRINHO, 2010, p. 25). 2. Percurso metodológico e casos analisados Como o próprio nome indica, o Índice Geral de Cursos é um indicador que envolve todos os cursos de cada instituição, levando em conta critérios estruturantes da educação superior, com vistas à busca da qualidade. Tem-se no conjunto de aportes para se estabelecer esse índice: (i) CPC da IES; (ii) avaliação dos programas de pós-graduação stricto sensu realizada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes); (iii) 86 Na proposta do Sinaes, com base na avaliação feita sobre a globalidade da instituição, as comissões externas emitem um relatório cujas conclusões têm como finalidade a apresentação de subsídios para a IES avaliada, visando contribuir para sua melhoria. Posteriormente, esse relatório é encaminhado à Conaes que, após analisálo, o disponibilizará à população, ao MEC, à IES, à comunidade acadêmica e científica (SINAES, 2007). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 306 distribuição dos estudantes entre os diferentes níveis de ensino, graduação e pós-graduação stricto sensu, quando for o caso. De acordo com os critérios estabelecidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o CPC utiliza os resultados do Enade, no ano seguinte à sua realização que, por sua vez, leva em conta, além da avaliação de desempenho discente, o corpo docente, infraestrutura, recursos didático-pedagógicos e outros insumos conforme orientação técnica da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior/Conaes (DIREG/SERES/MEC, 2013). Em relação ao Enade, cabe ressaltar que, caso não existam, pelo menos, dois alunos ingressantes e dois concluintes nele inscritos, não será atribuído o CPC para aqueles cursos que venham a se encontrar nesta situação. Consequentemente, tais cursos terão a menção Sem Conceito (S/C). Para o estabelecimento dos índices CPC e IGC considera-se, ainda, o ciclo avaliativo composto por período de três anos, o que levou ao recorte do estudo discutido neste trabalho para o ciclo 2010/2012 das universidades federais. No Brasil, esse grupo totaliza 56 IFES com maior concentração na Região Sudeste, seguida da Região Nordeste (INEP, 2014). Na Tabela 1, apresentada a seguir, constam dados a respeito das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e seus respectivos IGC referentes ao ano de 2012. Os dados revelam que o conceito 5 foi obtido somente nas instituições localizadas nas Regiões Sul e Sudeste, enquanto o conceito 4 esteve presente em universidade federais de todas as regiões do país. Tabela 1. Demonstrativo da quantidade de IFES, conforme IGC obtido, por região REGIÕES CO NO NE SUL SE TOTAIS IGC 5 2 6 8 IGC 4 4 1 10 6 13 34 IGC 3 7 5 12 S/C 2 2 TOTAL DE IFES 4 8 15 10 19 56 Fonte: Tabela IGC 2012 – MEC/INEP/2013. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/educacaosuperior/indicadores/indice-geral-de-cursos-igc>. Acesso em 16 mar. 2015. A tabela disponibilizada pelo INEP evidencia sete critérios para se chegar ao IGC final, sendo eles: (i) número de cursos avaliados; (ii) número de cursos com CPC no triênio; (iii) proporção de graduandos; (iv) conceito médio da graduação; (v) proporção de mestrandos – equivalente; (vi) conceito médio do mestrado; (vii) conceito médio do doutorado, se ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 307 estabelecendo o IGC contínuo, que por sua vez, arredondado gera o IGC (faixa). Esses parâmetros demonstram o conceito médio obtido, levando em conta os níveis de ensino ofertados pelas instituições, conforme apresentado na próxima tabela. Tabela 2. Demonstrativo dos intervalos identificados em cada nível, que constituíram o IGC obtido IGC NÍVEL Graduação Mestrado Doutorado Graduação Mestrado Doutorado Graduação Mestrado Doutorado Graduação Mestrado Doutorado 3 4 5 S/C AVALIAÇÃO MENOR 1,4611 3,0000 0,0000 2,5275 3,0000 0,0000 3,4423 3,4935 2,1239 0,0000 0,0000 Fonte: Tabela IGC 2012 - MEC/INEP. Disponível em: superior/indicadores/indice-geral-de-cursos-igc. Acesso em 16 mar. 2015. MAIOR 2,8618 3,5945 2,5563 3,6088 4,6456 3,7777 4,1651 4,7284 3,6808 3,0000 0,0000 http://portal.inep.gov.br/educacao- Ao analisar os conceitos médios que definem o IGC de cada instituição, confirma-se o que está estabelecido na Nota Técnica 786/2013 (DIREG/SERES-MEC. 2013) em relação à falta de participação de, pelo menos, 2 graduandos ingressantes e 2 concluintes no Enade. Uma vez não cumprido esse critério, a instituição ficará S/C. Nesse quesito foram identificadas duas IFES na Região Sul (Tabela1). Outra observação que se faz em relação aos conceitos médios emitidos, que são baseados no terceiro parâmetro, diz respeito à distribuição dos estudantes: quanto maior os conceitos médios entre os diferentes níveis de ensino, maior será o IGC. Realizada esta análise prévia, partiu-se para o segundo passo, que foi a seleção da amostra para o estudo, ora apresentado. Do grupo das 56 instituições identificadas, estabeleceram-se os seguintes critérios para a escolha daquelas que seriam objeto de análise: (i) representatividade de todas as regiões; (ii) ter obtido o IGC 4; (iii) ter o maior conceito médio por ordem de nível de ensino; (iv) ter disponibilizado em sua página institucional o relatório de autoavaliação referente ao ciclo de 2012, elaborado pela CPA. Diante da dificuldade de se ter acesso a relatórios de IFES cujo IGC fosse o mesmo para todas, optou-se pela alteração do segundo critério, admitindo o IGC 5 ou 3. Na Região ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 308 Sul duas IFES obtiveram o conceito 5, duas ficaram sem conceito (S/C) e as demais com IGC 4, porém, nenhuma delas apresentou o relatório de autoavaliação elaborado pelas CPA, de forma a contemplar os objetivos do estudo. Situação semelhante ocorreu com as IFES da Região Norte, levando à inclusão de uma que tivesse obtido o IGC 3. Nessa região nenhuma universidade federal obteve o conceito 5. Logo, definiram-se os relatórios de autoavaliação institucional referentes ao ano de 2012, que revelassem IGC 5, 4 e 3. Tabela 3. Demonstrativo das IFES selecionadas por região e IGC IES Universidade Federal de Goiás (UFG) Universidade Federal do Amazonas (UFAM) Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) REGIÃO CO NO NE SE SUL IGC 4 3 4 4 5 Fonte: Tabela IGC 2012– MEC/INEP. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/educacaosuperior/indicadores/indice-geral-de-cursos-igc>. Acesso em 16 mar. 2015. A Tabela 4, apresentada a seguir, demonstra o quantitativo de cursos avaliados no triênio que garantiram os conceitos estruturantes do IGC final entre as IFES selecionadas. Ao buscar os relatórios emitidos pelo INEP, referentes ao CPC resultantes de cada período avaliativo, o número de cursos avaliados confere com os divulgados, à exceção da UFG. Já na relação IGC x número de cursos com CPC no triênio, nenhum dos totais apresentados confere com o somatório das tabelas analisadas. Os relatórios divulgados não permitiram encontrar explicações para tal divergência. Ao observar os conceitos médios obtidos nos diversos níveis de ensino percebe-se coerência para se chegar ao IGC contínuo. No entanto, a variação entre os conceitos médios atribuídos por nível de ensino torna-se intrigante nas tentativas de análises. Tabela 4. Demonstrativo os conceitos obtidos por nível de avaliação das IFES selecionadas IES Região Número Número de Conceito Conceito Conceito de Cursos IGC IGC Cursos com médio da Médio do Médio do avaliados (Contínuo) (faixa) CPC no triênio Graduação Mestrado Doutorado no triênio UFG UFAM UFPE UFRJ UFRGS CO NO NE SE SUL 84 70 59 64 55 71 62 57 53 52 3,2946 2,5352 2,9238 2,7935 3,6987 3,6347 3,4170 4,2027 4,6456 4,7284 2,2389 1,8810 2,6550 3,7777 3,5109 3,5896 2,7195 3,5345 3,8365 4,2775 4 3 4 4 5 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 309 Fonte: Tabela IGC 2012 MEC/INEP. Disponível em: superior/indicadores/indice-geral-de-cursos-igc. Acesso em 16 mar. 2015. http://portal.inep.gov.br/educacao- Analisando as IFES que alcançaram o IGC 4, a UFRJ obteve o menor conceito da graduação, porém o maior conceito do mestrado e doutorado. Consequentemente, essa IES obteve o maior IGC contínuo. Em contrapartida, a UFG obteve o maior conceito da graduação e os menores do mestrado e do doutorado, porém obteve o IGC contínuo mediano entre as três. A UFPE, que obteve o IGC contínuo mediano entre as três, conseguiu também os conceitos medianos da graduação, mestrado e doutorado. Não se trata, portanto, da média ponderada entre os níveis da graduação, mestrado e doutorado. Isto leva a crer que, embora somente estes três elementos apareçam na tabela emitida pelo INEP, além do quantitativo de cursos avaliados e com CPC, outros elementos entram na definição do IGC contínuo, que arredondado, forma o IGC final das instituições. Fica, então, o seguinte questionamento: o quantitativo de cursos avaliados e o número de cursos com CPC no triênio se tornam indutores para o estabelecimento do indicador IGC ou, caso contrário, que outros elementos interferem nesse indicador? Uma vez conhecido o IGC de cada uma das IFES selecionadas e levando em conta as dimensões pertinentes ao CPC, buscamos analisar como as CPA interpretam os resultados das autoavaliações que sistematizam, nos tópicos que diretamente interferem na formação do conceito em questão. Para tanto, foram levados em conta, nesse estudo: (i) Dimensão 2– políticas para o ensino, a pesquisa, a extensão e a pós-graduação, inseridas no Eixo 3 como políticas acadêmicas; (ii) Dimensão 5– políticas de pessoalque se insere no Eixo 4 como políticas de gestão; (iii) Dimensão 7– infraestrutura física, constituída por todos os seus componentes no Eixo 5. 3. Os achados da pesquisa A reorganização das dimensões da autoavaliação do Sinaes em eixos está regulamentada pela Portaria nº 92, de 31 de janeiro de 2014 (BRASIL/MEC, 2014), a qual foi considerada na leitura dos relatórios das cinco IFES selecionadas. Também adotamos como referência na análise as orientações reiteradas pela Nota Técnica Nº 14/2014 (INEP, 2014b), sobre o Instrumento de Avaliação Institucional Externa do Sinaes, que organiza os indicadores de avaliação nos seguintes termos: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 310 Eixo 1 – Planejamento e Avaliação Institucional: considera a dimensão 8 do SINAES (Planejamento e Avaliação). Inclui também um Relato Institucional, que descreve e evidencia os principais elementos do seu processo avaliativo (interno e externo) em relação ao Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), incluindo os relatórios emanados pela Comissão Própria de Avaliação (CPA), do período que constituiu o objeto de avaliação. Eixo 2 – Desenvolvimento Institucional: contempla as dimensões 1 (Missão e o Plano de Desenvolvimento Institucional) e 3 (Responsabilidade Social da Instituição) do SINAES. Eixo 3– Políticas Acadêmicas: abrange as dimensões 2 (Políticas para o Ensino, Pesquisa e Extensão), 4 (Comunicação com a Sociedade) e 9 (Políticas de Atendimento aos Discentes) do SINAES. Eixo 4 – Políticas de Gestão: compreende as dimensões 5 (Políticas de Pessoal), 6 (Organização e Gestão da Instituição) e 10 (Sustentabilidade Financeira) do SINAES. Eixo 5 – Infraestrutura Física: contempla a dimensão 7 (Infraestrutura Física) do SINAES. (BRASIL/MEC/INEP, 2014b, p. 3) A análise apresentada a seguir considera a necessidade do esforço para compreender a autoavaliação das IFES, respeitando as relações e o contexto mais amplo no qual esse processo ganha vida e forma. Decorreu desta ideia a opção por tentar apreender os elementos que concorrem para a compreensão da autoavaliação dessas IES, cuja realização tem como referência primeira as dez dimensões do Sinaes. Todavia, lembramos que no estudo aqui relatado foram eleitas para análise as três dimensões já citadas. Desse ponto de vista, procuramos compreender o sentido da política de autoavaliação proposta pelo Sinaes e a criação dos significados pelas IFES, pelos seus atores, para essa mesma política. O sentido da palavra é totalmente determinado por seu contexto. De fato, há tantas significações possíveis quantos contextos possíveis [a] concretização da palavra só é possível com a inclusão dessa palavra no contexto histórico real de sua realização primitiva (BAKHTIN, 2004, p.103) Considerando a importância de apreender o significado atribuído pelas IES em seus relatórios de CPA sobre a autoavaliação no Sinaes, a análise está estruturada em: políticas acadêmicas, políticas de gestão e infraestrutura, correspondendo às três dimensões selecionadas. No caso da última, acrescentamos informações sobre o item expansão, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 311 considerando que esta é uma política fortemente desenvolvida no âmbito das universidades federais, por meio do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). a) Políticas acadêmicas O primeiro aspecto a ser observado em relação às políticas acadêmicas é a integração entre o ensino a pesquisa e a extensão. As IFES selecionadas demonstram estarem atentas aos aspectos que induzem a formação do IGC, ao sinalizarem preocupação com os currículos, o incentivo à pesquisa, e revelam o aumento significativo das atividades de extensão. Neste sentido, destacamos o exemplo da UFPE que registra em seu relatório de autoavaliação institucional “o aumento do público atendido por projetos e do público participante de cursos e eventos atingidos” (p. 51). No caso da UFRGS, seu relatório revela a criação da PróReitoria de Coordenação Acadêmica, com o objetivo de buscar maior integração e qualificação das atividades de ensino, pesquisa e extensão. Tal iniciativa visa permitir a articulação da graduação com a educação básica e profissional e com a pós-graduação, e estas com a pesquisa e a extensão. Em razão de três cursos apresentarem menores avaliações no CPC, a UFPE dá destaque ao Núcleo de Desenvolvimento Estruturante (NDE), ressaltando a necessidade de ações para a melhoria do acompanhamento e desenvolvimento das práticas pedagógicas e ainda a oferta de Cursos de Atualização Didático-Pedagógica. A UFRJ faz referência ao Reuni, considerando o esforço despendido para a grande meta prevista, alcançada, segundo seu relatório, quase na totalidade. Entretanto, os esforços empreendidos ainda são insuficientes para dar conta de toda a diversidade e necessidade da graduação ali ofertada. Dentre as dificuldades a serem vencidas nos próximos anos, a CPA/UFRJ destaca a necessidade da adoção de maior flexibilidade acadêmica nos cursos de graduação. Considera que, no período correspondente ao relatório, uma maior mobilidade e integração entre cursos e, até mesmo, áreas de conhecimento, era muito dificultada pela falta de integração física que se refletia nos projetos pedagógicos. Ademais, as propostas curriculares consideradas estanques e rígidas, dificultando a desejada flexibilidade curricular. Porém, o mesmo relatório declara que “a elevada qualidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão desenvolvidas pela UFRJ não oculta as dificuldades e problemas que a instituição enfrenta para cumprir sua missão institucional e tornar-se uma verdadeira construtora de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 312 futuros” (UFRJ, 2012, p. 174). Por sua vez, a UFRGS propõe desenvolver estudos sobre as possibilidades de adequar o Sistema de Graduação aos novos formatos curriculares decorrentes das inovações pedagógicas emergentes. Em relação à pesquisa, a UFAM declara que obteve avanços significativos com projetos aprovados nos diversos editais de agências nacionais, enquanto as demais relatam o incentivo à formação de pesquisadores. No caso da UFRGS, esse quesito tem como prioridade a ação formativa da pós-graduação, apresentando no cenário de 2012, quase 83% de professores doutores. Em relação à avaliação dos programas de pós-graduação stricto sensu realizada pela Capes, todas as cinco IFES demonstram grande preocupação com este quesito, considerado de grande importância na formação do IGC. Entretanto, isso é revelado de maneira diferente ou com intensidades variadas, quando se examinam os vários relatórios de autoavaliação. A UFRJ, embora se destaque pela excelência na pesquisa, conforme afirma em seu relatório da CPA, ao fazer referência ao volume e qualidade da produção científica, reconhece que precisa cuidar, fazer crescer e progredir os programas de pós-graduação com menor conceituação na avaliação da Capes. Seu relatório constata, ainda, a pouca participação da área das Humanidades, entendendo que este fato pode acarretar um avanço desordenado em relação à sua infraestrutura, como universidade. Por outro lado, a mesma instituição tem uma quantidade significativa de mestrados profissionais, sendo a maioria deles criada com a Nota 3 e revela preocupação, seguindo orientações da política da pós-graduação para situações como esta. Outro fator levado em conta no IGC é a distribuição dos estudantes entre os diferentes níveis de ensino, graduação e pós-graduação stricto sensu. Essa preocupação é citada em quatro dos cinco relatórios analisados. Nas palavras da CPA da UFG, “o indicador de envolvimento de alunos com a pós-graduação fornece uma medida do número de alunos da pós-graduação em comparação com o universo de alunos da UFG. [...] a UFG possui um grande potencial de crescimento no nível de pós-graduação, que deve ser mais bem explorado nos próximos anos”. (UFG, 2012, p. 207). O mestrado profissional é um segmento que tem destaque na expansão desse nível de ensino. Além disso, a referida universidade revela atenção às necessidades de equilíbrio de matrículas entre a graduação e a pós-graduação com a abertura de novas linhas de pesquisa, bem como a criação de novos cursos e ampliação das vagas. A UFRJ é a única instituição cujo relatório de autoavaliação registra algumas ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 313 dificuldades, como, por exemplo, a limitação do número de bolsas de pós-graduação que restringe, em grande parte, o número de vagas por curso. Alguns cursos ainda carecem de maiores investimentos em infraestrutura para atender suas necessidades laboratoriais e didáticas, embora seja registrado o esforço constante para o aumento no número de alunos na pós-graduação. Neste quesito, a UFAM declara que, em 2012, manteve a política de fortalecimento de sua pós-graduação para formar novos doutores da instituição. O relatório da UFRGS registra que ocorreram avanços significativos no sistema de pós-graduação com a liberação de recursos financeiros, o que possibilitou a aprovação 1.805 bolsas no mestrado e doutorado no triênio. Com recursos do Reuni, foram 349 bolsas de mestrado e doutorado e 35 de pós-doutorado. Assim, registra que desenvolve política de expansão da pós-graduação, além de fazer referência à qualidade dos cursos por ela ofertados. b) Políticas de gestão A política de gestão, definida pelo Sinaes para a Dimensão 5 é outro fator de peso para a formação do IGC, não passando portanto, despercebido pelas IFES selecionadas. O desenvolvimento de ações com o objetivo de consolidar as políticas de pessoal, no que diz respeito à qualificação dos quadros, está presente em todos os relatórios, o que se faz notar, por exemplo, por meio da criação de Programa Institucional de Bolsas de Pós-graduação, em nível de mestrado e doutorado. Sob este ângulo, enquanto a UFRGS declara que possui um quadro de servidores altamente qualificado, com destaque para um corpo docente que apresenta qualificação acima do percentual médio das IFES, a UFAM declara que ainda possui no seu quadro, muitos professores com apenas graduação (315 do total de 1.699), correspondendo a 18,5% do total de docentes. Essa realidade existe embora a referida IES tenha criado o Plano Institucional de Capacitação dos Servidores (PIC) que, de acordo com o seu relatório, vem permitindo melhorias viabilizando o processo de afastamento dos servidores para qualificação. A UFAM declara, ainda, que encerrou o ano de 2012 com 65 (sessenta e cinco) servidores afastados para qualificação em cursos stricto sensu. A política de afastamento para participação em programa de pós-graduação stricto sensu (mestrado, doutorado e pós-doutorado) é destacada também pela UFG. Todavia, também são relatadas pelos servidores, algumas dificuldades enfrentadas nas unidades acadêmicas e órgãos, no que se refere à liberação para participação nas atividades formativas. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 314 A UFRJ sinaliza a intenção de atender a demanda pela expansão da educação superior no país, com investimentos orçamentários e de pessoal. Todavia, admite ainda lidar com o grave problema da “falta de política de organização de carreira e remuneração que venha fixar e permitir o desenvolvimento ao longo da vida profissional dos seus docentes e técnicos administrativos”. (UFRJ, 2012, p. 89) c) Infraestrutura A Dimensão 7 do Sinaes diz respeito à infraestrutura que, aliada à qualificação do corpo docente e as políticas acadêmicas tem grande peso na formação do CPC. Ao analisar a avaliação dessa dimensão nos relatórios selecionados, constatamos que todos registram as fragilidades existentes nas IFES em termos estruturais, embora isso seja assumido e expresso com níveis variados de ênfase. Neste quesito, percebe-se que o Reuni foi o grande responsável pelas melhorias realizadas em relação à infraestrutura, tendo em vista o incremento de recursos para revitalização de estrutura física. A infraestrutura física da UFRJ, de acordo com o relato de sua CPA, é coerente com a necessidade de consolidar e ampliar seus cursos. O relatório afirma, também, que as quantidades e qualidades continuam em permanente evolução, uma vez que diversas instalações vêm sendo construídas ou adaptadas para atender à crescente demanda decorrente da oferta de novas vagas na graduação. No entanto, a UFAM apresenta uma situação oposta, ao relatar que os seus vários segmentos expressam uma insatisfação generalizada com a infraestrutura existente. Em geral, reivindicam uma necessária e adequada condição para o funcionamento dos cursos e espaço físico voltado para convivência e lazer, visto que os existentes, à época da produção do relatório de 2012, mostravam-se inadequados. A IFES em questão reconhece a importância e necessidade da elaboração de estratégias e metas de melhoria da qualidade nos seus respectivos cursos. Ao analisar o relatório da UFRGS, constatamos nele o reconhecimento da insuficiência da infraestrutura disponível, em seus vários campi, para a prática de esportes, bem como para lazer e convivência considerando, sobretudo, sua dimensão. Admite, ainda, a necessidade da redefinição dos espaços, por meio de uma política de planejamento e controle integrado do espaço acadêmico. O relatório explicita também que, no contexto do Reuni, está prevista considerável expansão da infraestrutura predial, bem como reformas em espaços já utilizados. Acrescenta, enfim, que nos últimos três anos a instituição tem investido em ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 315 infraestrutura para as atividades de ensino, pesquisa e extensão, no que tange à construção, ampliação e reformas de prédios. Em relação às bibliotecas, a UFPE declara que foram identificados problemas quanto à qualidade, quantidade e falta de documentação comprobatória do acervo e a atualização adequada aos cursos, bem como inadequação das instalações de maneira geral. Os laboratórios estão mal cuidados, as instalações não estão de todo adequadas, considerando a qualidade dos equipamentos e as normas de segurança. No quesito infraestrutura, as outras quatro IFES fazem breves referências, sinalizando a necessidade de investimentos na área. Vale ressaltar que as inadequações das IES quanto à infraestrutura constituiu-se no principal item apontado pelas avaliações externas realizadas pelo INEP. Por último, ressaltamos que, uma vez que as cinco universidades selecionadas são federais, em seus relatórios de autoavaliação ganhou destaque o aspecto da expansão. Na prática, o projeto de expansão das IFES – previsto por programa específico (Reuni) – tem garantido recursos que abrangem as três dimensões, antes analisadas. Todavia, percebe-se, pelos relatórios, que algumas IFES têm muito mais carências que outras, fato este que denota políticas diferenciadas, ainda que todas tenham os mesmos objetivos e sejam da mesma natureza administrativa. O processo de expansão se faz presente nos relatórios mediante a sinalização dos investimentos realizados para atendimento a novos cursos, bem como com ampliação de vagas naqueles ora existentes, possibilitando a interiorização, como é o caso da UFPE e UFAM. Entretanto, em geral, as IFES reconhecem que um dos grandes desafios a serem enfrentados por elas é a insuficiência de pessoal ainda existente, sobretudo, especializado. A UFRJ é a que mais faz referência à expansão, afirmando que desde 2004, mesmo antes da implantação do Reuni, pelo Ministério da Educação, já vinha se expandindo, de forma bastante significativa. Isso se reflete, sobretudo, no número e na diversidade dos seus cursos de graduação e pós-graduação. Em consequência, há a ampliação do número de vagas ofertadas em seus concursos de acesso. Nesse sentido, afirma que a sua política de expansão não se desenvolve, estritamente, em termos quantitativos, mas em consonância com a realidade e necessidades regionais, privilegiando aspectos estratégicos para o desenvolvimento do país. Para tanto, abriu vários cursos novos, alguns deles de caráter ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 316 multidisciplinar, superando a fragmentação histórica tida como uma característica interna da própria universidade como instituição. Considerações finais A análise feita ao longo deste trabalho confirmou aspectos relevantes no que diz respeito aos indicadores que conduzem um processo de avaliação aos seus resultados finais, bem como demonstrou pontos que induzem a novas pesquisas para esclarecimentos que não se fazem presentes em determinados momentos. É nítida a necessidade das IES pensarem as dimensões propostas pelo Sinaes, que de certa forma atingem a totalidade de sua constituição. Assim, percebe-se a importância do processo de autoavaliação coordenado pelas CPA, e principalmente, a necessidade dos gestores darem a devida atenção aos resultados obtidos nesse componente do Sinaes que, interagindo às avaliações externas permite amplas condições para o autoconhecimento da instituição e a busca pela condução das IES à qualidade da educação. Em relação às dimensões abordadas nos processos de autoavaliação, se bem definidas e analisadas durante a operacionalização, seus indicativos são capazes de sinalizar os resultados que serão alcançados pelas IES, por meio dos indicadores de qualidade da educação superior apontados pelo INEP. REFERÊNCIAS BAKHTIN, Mikhail. O problema do texto. Estética da criação verbal. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. BARREYRO, Gladys Beatriz. De exames, rankings e mídia. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, v. 13, n. 3, p. 863-868, nov. 2008. BELLONI, Isaura. Autoavaliação institucional: um instrumento de democratização da educação. 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Aprova, em extrato, os indicadores do Instrumento de Avaliação Institucional Externa para os atos de credenciamento, recredenciamento e transformação de organização acadêmica, modalidade presencial, do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 04 fev. 2014, seção 1, p. 5. ________. ________. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. Diretoria de Avaliação de Educação Superior. Coordenação-Geral de Avaliação de Cursos de Graduação e Instituições de Ensino Superior. Nota técnica: nº 14 de 07 de fevereiro de 2014. CGACGIES/DAES/INEP/MEC, 2014. ________. ________. Diretoria de Regulação da Educação superior. Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior. Nota Técnica nº 786 de 5 de dezembro de 2013. DIREG/SERES/MEC, 2013. DIAS SOBRINHO, José. Avaliação da educação superior. São Paulo: Cortez, 2000. _________. Universidade e avaliação: entre a ética e o mercado. Florianópolis: Insular, 2002. _________. 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ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 319 AS AGÊNCIAS REGULATÓRIAS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR MEXICANA: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO José Vieira de Sousa UnB [email protected] Lukelly Fernanda Amaral Gonçalves UnB [email protected] Eixo temático: Avaliação na expansão da educação superior RESUMO: Com o objetivo de promover a qualidade da educação superior e a regulação, diversos países elaboraram, na década de 1980, políticas de avaliação. Este artigo se configura em um estudo do tipo exploratório e buscou compor uma visão geral sobre como se deu a regulação da educação superior no contexto mexicano. O levantamento bibliográfico foi realizado nos reportórios de pesquisa Google-México, Google Acadêmico-México e Red de Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugal (Redalyc) e fundamentou as considerações levantadas no artigo. As agencias reguladoras mexicanas foram caracterizadas minimamente e situadas no contexto histórico do país. Ademais, os programas avaliativos em vigência foram discutidos de forma mais específica, ressaltando-se, especialmente, os critérios de qualidade por eles adotados. Palavras-chave: Avaliação da educação superior. Agencias reguladoras. Expansão da educação superior. Considerações iniciais O objetivo deste trabalho, o qual é fruto de demanda do Subgrupo 03, do grupo de pesquisa UNIVERSITAS/Br, é discutir as políticas regulatórias da educação superior no México, tendo como referência uma visão mais geral a respeito das agências regulatórias desse nível educacional no referido país. Consoante a esse objetivo, adota-se uma abordagem qualitativa do tipo exploratória, partindo-se da premissa que o trabalho corresponde a uma primeira incursão na temática. O recorte do estudo situa-se em um panorama dotado de grande complexidade, que tem recebido, cada vez mais, a atenção de pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento. Com efeito, as investigações do modus vivendi das instituições de educação superior no mundo têm convergido estudos interdisciplinares que se, por um lado, contribuem com interpretações que resultam de olhares diversos, por outro concorrem para que o campo da ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 320 educação superior se configure como um objeto de disputas, dificultando dados consensuais a respeito (SOUSA, 2013). Nessa perspectiva, o autor esclarece que, notadamente nas últimas décadas, os pesquisadores têm procurado em várias Ciências Sociais e Humanas – Sociologia, Ciência Política, História, Pedagogia, Economia e Administração – referenciais e categorias para orientar suas análises a respeito das questões geradas no interior desse campo. Nesse cenário interdisciplinar a relação avaliação/regulação tem ganhado grande expressão nos estudos propostos em nível mundial e nacional, como no caso do nosso país. Para atender ao objetivo antes mencionado e situar a discussão do tema no campo mais amplo da educação superior e dos processos regulatórios que nela têm ganhado crescente expressão, o texto está estruturado em cinco partes, além das considerações iniciais e finais. Na primeira parte, desenham-se, ainda que brevemente, alguns cenários da educação superior na região latino-americana, como a finalidade de apontar elementos que concorram, mais adiante, para situar esse nível educacional na realidade mexicana. A segunda trata dos procedimentos metodológicos do estudo, enquanto a seguinte discute o que motivou o Estado mexicano a regular a educação superior por meio de avaliações. A quarta parte faz uma retrospectiva cronológica da institucionalização de agências reguladoras no México. A última parte mostra os critérios de qualidade adotados pelas políticas regulatórias vigentes no nível da graduação. 1. Cenários da educação superior na América Latina, com ênfase no México O campo da educação superior apresenta-se como um espaço social relevante para pesquisas sob os mais variados enfoques e recortes. Este fato suscita nos estudiosos desse nível educacional a preocupação com o seu estado, evolução, reconfiguração constante das esferas pública e privada, além da definição de políticas de avaliação que procurem alcançá-lo em sua heterogeneidade e complexidade. De acordo com Sousa (2006), é preciso assumir a convicção de que o campo da educação superior necessita de constantes e vigorosas “investigações que explicitem o quadro complexo e heterogêneo que envolve as instituições que o configuram.” (p.154). O autor assevera, ainda, que tais investigações precisam considerar, dentre outros aspectos, a relação público/privado e o papel que o Estado tem assumido no processo de expansão da educação superior em nível mundial, nacional e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 321 regional. Nesse nível de compreensão, compartilhamos com Bourdieu (1989) a tese segundo a qual [...] a análise sociológica das formas escolares de classificação, tais como podem ser observadas em uma conjuntura particular, permitem o desenvolvimento de questões que toda pesquisa pode e deve se colocar, sobre agentes e situações profundamente diferentes. (p. 21). Com efeito, nas duas últimas décadas os estudos sobre o campo da educação superior têm sido estimulados por vários fatores. Do ponto de vista do governo, esses estudos são relevantes porque podem subsidiar o planejamento das políticas públicas norteadoras do processo de expansão e avaliação da educação superior nas esferas pública e privada. Situando o debate no contexto da América Latina, percebe-se que os sistemas de educação superior dos seus países continuam a enfrentar diversos dilemas. Este cenário tem contribuído para que, preservando suas singularidades, esses sistemas venham sendo objeto de pesquisa a seu respeito, o que ocorre tanto por parte de estudiosos do tema, ligados à academia, quanto pelo próprio Estado, que revela especial interesse pela dinâmica e evolução dos mesmos sistemas. De maneira geral, o esforço dos pesquisadores tem sido dirigido para a discussão da vastidão, diversidade e as muitas transformações sofridas pelo setor. A compreensão do atual estado das análises a respeito da educação superior latinoamericana pressupõe identificar das principais temáticas privilegiadas pelos pesquisadores, bem como pelos próprios órgãos governamentais. Nessa lógica, Sousa (2005) esclarece que [...] na segunda metade do século XX, muitos dos estudos produzidos sobre a realidade latino-americana revelaram a preocupação com a coleta de dados e a formulação de estratégias visando contribuir para que as universidades superassem o subdesenvolvimento nesses países. Particularmente [na década de 1960], conceitos e categorias como, por exemplo, desenvolvimento versus subdesenvolvimento, progresso, transformação social, modernização, reforma e gestão de recursos humanos ganharam força nas pesquisas realizadas. (p.24) Na década seguinte, verificou-se determinado nível de ceticismo sobre alguns desses sistemas, decorrente de análises críticas a respeito dos problemas evidenciados em relação ao baixo nível de acesso e à elitização desse nível educacional, em vários países, nos quais se incluía o Brasil. Na perspectiva de Guadilla (1997), nos anos 1970, configuraram-se como tendências predominantes nas investigações a respeito da educação superior latino-americana ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 322 os seguintes temas: (i) conceitos-chave como “universidade necessária” e “consciência crítica”; (ii) combinação da abordagem da dependência “centro-periferia” com outras teorias populares da época em que conceitos como “reprodução” e “aparelhos ideológicos do Estado” se fundiram com a teoria da dependência; (iii) oposição às várias atividades sobre a relação desenvolvimento e educação, propalada por organizações internacionais diversas; análise teórica da educação superior incluindo a metodologia ativa e/ou participativa da pesquisa, baseada nas ideias de Paulo Freire e no trabalho analítico de Fals Borda. Nas duas décadas seguintes, intensificam-se as investigações sobre a educação superior nos países latino-americanos. De maneira geral, nos anos 1980, os estudos mostramse diversificados, porém com predominância para a ênfase em temas como financiamentos públicos e privados e qualidade nos sistemas universitários. (SOUSA, 2003). De acordo com o autor, ainda que alguns desses temas tenham continuado no centro das preocupações dos pesquisadores, outros começam a despontar. Dessa forma, ainda na primeira metade da década de 1990, há uma diversificação do debate na educação superior na América Latina, [...] destacando-se questões como, por exemplo, modernização, redes de pesquisa e informação, formas não tradicionais de ensino superior, avaliação, cooperação (internacional, regional e institucional), universidades e institutos de ensino superior, estudos de graduação e novas tecnologias educacionais. Por outro lado, verifica-se pouco interesse dos pesquisadores em investigarem, no período 1990-1995, a heterogeneidade das instituições e a relação ensino superior público versus privado. (p. 9) Na década de 2000, essa diversificação temática permaneceu, porém com destaque para a avaliação da educação superior, levando vários países latino-americanos, como, por exemplo, o Brasil a propor políticas de avaliação para o setor, sendo algumas delas alvo de polêmicas por parte da academia. No que tange às pesquisas a respeito da educação superior, diversos desses países têm se destacado nessa atividade. Dentre eles, ganham maior visibilidade no cenário em questão o Brasil, Chile, Colômbia, México e Venezuela, por revelarem nas duas últimas décadas um considerável número de pesquisas. Já na primeira metade da década de 1990, esses cinco países produziam, juntos, cerca de 86% dos estudos desenvolvidos e relatados ao Centro Regional para o Ensino Superior na América Latina/CRESALC (GUADILLA, 1997). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 323 Para Sousa (2003), nessa época, particularmente no México, já havia uma grande quantidade de instituições que desenvolviam pesquisas a respeito da organização da educação superior, merecendo destaque a Universidade Azcapotzalco, fundada em 1987. Considerando o alcance e nível de estabilidade, é possível classificar os sistemas de ensino superior na América Latina em quatro blocos, que são demonstrados no quadro a seguir. Quadro 1 – Sistemas de ensino superior da América Latina e Caribe, por países PAÍSES PORTE DOS SISTEMAS DE ENSINO SUPERIOR Brasil, Colômbia, México e Venezuela Costa Rica, Cuba e Porto Rico Argentina, Chile, Equador, Peru e Uruguai Bolívia, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Panamá e República Dominicana De proporções significativas em nível regional e estáveis institucionalmente. Pequeno ou médio em âmbito regional, porém com estabilidade institucional considerável. Significativos, mas com instituições acadêmicas que sofrem diferentes tipos de instabilidade. Pequeno e com pouca estabilidade institucional. Fonte: Classificação feita por Sousa (2011) com base nos estudos de Guadilla (1997, p. 121–125). De acordo com Guadilla (1997), já na primeira metade da década de 1990, alguns países latino-americanos aderiam às propostas econômicas neoliberais, o que trouxe implicações para a política de educação superior, com destaque para o campo da avaliação. A agenda liberal para transformação econômica foi abraçada por poucos países na região – aqueles onde a globalização ocorreu primeiro e os que estão entrando num processo de integração econômica com uma “assimetria educacional” significativa que se reflete em diferenças no sistema de ensino superior. Não obstante, mesmo entre os países comprometidos com a nova agenda (Chile, México, Colômbia, Brasil) e onde há uma aceitação desta forma de ensino superior que mostraria maior eficiência e corresponderia às necessidades dos setores produtivos, demandas pela atualização de currículo, e modernização de informações e sistemas de comunicação, este “vago consenso” é muito menos evidente quando opções políticas concretas são discutidas com relação a tais pontos como, fontes alternativas de financiamento, barreiras ao estudo, contração da pesquisa, financiamento baseado nos resultados tributação externa, e envolvimento de agentes externos na avaliação das instituições de ensino superior e programas acadêmicos. (p. 118) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 324 No México, desde a década passada, duas instituições que funcionam dentro da Universidad Nacional Autonoma de México (UNAM), realizam várias pesquisas sobre a educação superior: (i) Centro para Estudos Sobre Universidades (CESU), criado em 1976, e que vem desenvolvendo projetos de pesquisa sobre temas diversos, como universidades, educação e sociedades; agentes e processos institucionais; processos e práticas educacionais; (ii) Centro de Pesquisas Educacionais e Serviço (CISE), fundado no mesmo ano, mas que se dedica tanto à educação superior quanto demais níveis educacionais mexicanos. A difusão dos estudos sobre a educação superior mexicana acontece por diferentes meios, como, por exemplo, jornais: Universidade Futura, Docência Post-Secundária, Revista de Educación Superior, Docente Universitário, Foro Universitário, Reforma y Utopia: Reflexiones sobre Educación Superior. (GUADILLA, 1997) Em 1994, a União de Universidades Latina Americanas (UDUAL) realizou um encontro intitulado “As Universidades no Novo Cenário da América Latina e Região,” na Universidad Iberoamericana no México. Nesse encontro, as instituições mexicanas de educação superior já expressavam preocupam com a avaliação de suas atividades. Na ocasião, três temas receberam especial atenção: (i) educação e formação de professores nas universidades; (ii) estabelecimento de um sistema de avaliação aplicável a instituições de educação superior na América Latina; (iii) o futuro do estudo das ciências humanas nas Universidades LatinoAmericanas. Esta breve caracterização dos estudos sobre educação superior latino-americana, com destaque para a situação do México, teve como objetivo situar a temática das agências reguladoras, nesse país, em um contexto mais amplo. Ao fazermos isso, partimos da ideia de que a regulação não pode ser compreendida sem o seu outro par – avaliação. Defendemos essa ideia à medida que compartilhamos da tese proposta por Kells (1999) de que o conceito de regulação “inclui o ato de avaliar e, portanto, a medição do desempenho relativo em comparação com as expectativas ou com o comportamento normativo” (p. 8). 2. Procedimentos metodológicos Pesquisas exploratórias, segundo Gil, (2008, p. 27), “são desenvolvidas com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. Esse tipo de pesquisa é realizado especialmente quando o tema escolhido é pouco explorado e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 325 torna-se difícil sobre ele formular hipóteses precisas e operacionalizáveis.” Sendo assim, este trabalho adota uma abordagem qualitativa e tem caráter exploratório, visto que buscou conhecer como se dá a regulação da educação superior no contexto mexicano, tema pouco estudado no Brasil, mas que pode ajudar em reflexões futuras sobre nossas próprias políticas regulatórias. De acordo com o referido autor, em caso de adoção deste tipo de pesquisa, em vista da temática genérica, exige-se fazer revisão da literatura, discussão com especialistas ou outros procedimentos. No curso da nossa pesquisa, houve em um momento inicial conversas via Skype com um professor da Universidade de Guadalajara (UdeG) e com uma funcionária do Sistema Educativo Estatal (SEE), do Estado de Baja California, a fim de que direcionássemos a busca a partir de termos corretos e mais usuais para o contexto mexicano. Em um segundo momento se realizou o levantamento bibliográfico nos reportórios de busca Google-México, Google Acadêmico-México e Red de Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugal (Redalyc). A escolha deste último reportório como fonte de busca, o qual é mantido pela Universidad Autónoma del Estado de México (UNAM), se justificou por este ser considerado pelo Webometrics o portal em espanhol mais importante na difusão da ciência e o segundo melhor do mundo. Assim, usando as expressões “agencias de regulación en México”, “agencias de regulación de la educación en México”, “órganos de regulación en México”, “organismos de regulación en México” e “expansión de la educación superior y evaluación” chegou-se a uma gama de trabalhos dos quais foram separados aqueles produzidos nos dez últimos anos. Destes, leu-se primeiramente o resumo, descartando os que exploravam somente questões referentes à educação escolar, chegando-se, por fim, a um corpus de artigos e teses que nos ajudaram a conhecer o contexto mexicano de regulação. O produto final do processo de exploração dos trabalhos encontrados seria o que Gil (2008) considera um problema mais esclarecido e passível de investigação mediante procedimentos mais sistematizados. 3. A expansão da educação superior no México e a necessidade da garantia da qualidade Em recente estudo, Yingfeng (2012, p. 4) apresenta a seguinte conclusão: En México, la población total de estudiantes de licenciatura y postgrado pasó de 29,892 en 1950, a 1, 833,330 en 1998, en la actualidad en el ciclo 2010ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 326 2011, de acuerdo con estimaciones preliminares, la matrícula ya está por encima de los 3 millones. La cobertura total de la educación superior (sin el postgrado) alcanzó más del 30 por ciento de los jóvenes de 19 a 23 años. Assim como na história recente da educação escolar brasileira, na do México também se percebe a influência neoliberal na expansão da educação superior. A partir de 1982, no mandato de Miguel de la Madrid (1982-1988) como presidente da república, e sobretudo nos mandatos subsequentes, de Carlos Salinas de Gortari (1988-1994) e Ernesto Zedillo (1994-2000) verificou-se, no México, uma considerável redução do papel do Estado em políticas públicas sociais, entre as quais, as relacionadas à educação superior. (GARAY, 2013). As políticas para a educação superior desse país podem ser divididas, segundo o autor, em três períodos que coincidem, em parte, com os mandatos dos presidentes citados. O primeiro período (1982-1989) caracteriza-se pela profunda crise econômica que levou a investimentos restritos na educação pública, facilitando o crescimento das instituições privadas. O segundo período (1989-2000) é caracterizado pela recuperação econômica e criação de diversas instituições de educação superior públicas no país. Além disso, nesse período, se instituem no México os cursos superiores de tecnologia, que pretendiam formar os estudantes em uma média de dois anos. O terceiro período (2001-2012), por fim, caracteriza-se por uma expansão maior de instituições privadas, bem como por maior ampliação da cobertura das instituições públicas federais, estatais e de institutos tecnológicos públicos. Observa-se na tabela a seguir, que compara o número de instituições de educação superior públicas e privadas no período de 2000 a 2010, a considerável expansão das últimas. Tabela 1: Instituições de Educação Superior no México (2000-2010) Categoria Quantidade Porcentagem Quantidade Porcentagem administrativa (2000) (2000) (2010) (2010) Públicas 258 25,9% 539 28,7% Privadas 739 74,1% 1339 71,3% Total 997 100% 1878 100% Fonte: Elaboração própria com base no estudo de Garay (2013). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 327 Percebe-se na tabela 1 uma expansão considerável no número de instituições, tanto públicas como privadas, caracterizando um aumento percentual de quase 50% em ambos as esferas. Este fato mostra que, apesar da abertura ao setor privado, o setor público não foi negligenciado nesse país. Não obstante, percebe-se na próxima tabela, a seguir, que apesar da expansão do setor privado e do maior número de instituições que esse comporta, as matriculas concentram-se mais nas instituições públicas. Tabela 2: Matrículas na Educação Superior no México (2000-2010) Tipo de Quantidade Porcentagem Quantidade Porcentagem instituição (2000) (2000) (2010) (2010) Públicas 1.118.696 70,6% 1.635.800 67,6% Privadas 466.855 29,4% 782.344 32,4% Total 1.585.551 100% 2.418.144 100% Fonte: Elaboração própria com base no estudo de Garay (2013). Observa-se na última tabela uma pequena diminuição do percentual de matrículas nas instituições públicas entre os anos de 2000 a 2010, embora seja setor que abarca cerca de 70% das matrículas na educação superior no México. Dessa forma, as matrículas nas instituições mexicanas concentram-se mais nas instituições públicas. Como salienta Tuirán (2011), p. 3: Casi 70 por ciento del aumento de la matrícula en el periodo reciente se originó en el esfuerzo de las instituciones públicas de educación superior. Mientras que otros países, como Brasil y Chile, han hecho descansar el crecimiento reciente de la matrícula de este nivel educativo principalmente en el sector privado, en México la apuesta ha sido la de fortalecer el sistema público. De acordo com o autor, isso se deve, em parte, ao perfil das famílias mexicanas, que não têm, em geral, condição econômica suficiente para manter seus filhos em instituições privadas. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 328 Vale salientar ainda, que a expansão tanto do setor público como do privado, não caminhou junto com a qualidade e, como mostram Leal e Ocegueda (2013), no final da década de 1980 a opinião pública chegou a generalizar a ideia de que as instituições de educação superior privadas conseguiam oferecer uma educação melhor que a das IES públicas e que era especialmente a falta de qualidade destas que estaria provocando a crise fiscal da época. Essa falta de qualidade, por sua vez, se explicaria, de acordo com os autores, por um crescimento exacerbado do setor com desigual distribuição de recursos e com falta de diálogo com o mercado laboral, constatações reafirmadas pelo próprio Consejo Internacional para el Desarrollo de la Educación e pela Organización para la cooperación y desarrollo económico (OCDE). Assim, como iniciativa para o oferecimento de uma educação superior equanimemente de qualidade, intensificou-se a intervenção estatal na educação, mas por meio da criação, pela Secretaria de Educación Pública (SEP) do México, de organismos de regulación. Esses, proporcionariam ao governo regular a qualidade educacional à distância e sem ter que ampliar o aparato burocrático, ampliação impossível naquele contexto de crise econômica da década de 1980. (LEAL; OCEGUEDA, 2013). A respeito disso, Tuirán (2011, p. 10) assevera: Este giro hacia una cultura de la calidad en México ha sido respaldado por la labor que realizan, entre otras instancias, los Comités Interinstitucionales para la Evaluación de la Educación Superior (CIEES), los organismos reconocidos por el Consejo para la Acreditación de la Educación Superior (COPAES) y el Centro Nacional para la Evaluación de la Educación Superior (CENEVAL), los cuales constituyen uno de los más importantes pilares de la modernización de la educación superior en el país. Caracterizada a expansão da educação superior do México e sua falta de qualidade como motivação para a construção de políticas de regulação para o setor, passa-se no subitem a seguir à reconstituição histórica das instituições reguladoras já existentes nesse país. 4. As agências reguladoras da educação superior no México A proliferação de agências reguladoras da educação superior no México se deu e em outros países no contexto de expansão do neoliberalismo, o qual gerou uma tendência de diminuição da intervenção do Estado e da liberação das forças do mercado. Assim, sobretudo nas décadas de 1980 e 1990, no contexto dos governos de Carlos Salinas e Ernesto Zedillo, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 329 respectivamente, houve muita privatização e liberalização de empresas de serviços públicos e, logo, a criação de “instituciones específicas para regular tanto a las nuevas compañías privadas como la prestación de servicios públicos en un entorno competitivo. Es decir, se establecieron reguladores sectoriales y autoridades para la competencia en general.” (ARROYO, 2007, p. 62). Uma das primeiras políticas educacionais em prol da melhoria da qualidade da educação superior foi a publicação, em 1978, da Ley para la Coordinación de la Educación Superior, a qual corroborou a criação do Sistema Nacional para la Planeación Permanente de la Educación Superior (SINAPPES). Dentro deste, por sua vez, criou-se uma instância nacional de gestão – Coordinación Nacional para la Planeación de la Educación Superior (CONPES) –, uma instância estatal – Comisiones Estatales para la Planeación de la Educación Superior (COEPES) – e uma regional – Coordinaciones Regionales para la Planeación de la Educación Superior (CORPES) –, que em diálogo uma com a outra, geraram diretrizes para avaliação dos planos e programas de estudo de IES públicas e privadas. (VIDAÑA, 2014). Já em 1984 foi aprovado o documento “La evaluación de la educación superior en México” pela já criada Asociación Nacional de Universidades e Instituciones de Educación Superior (ANUIES), instituindo indicadores e metodologias de análise para a avaliação sistêmica e de IES. (VIDAÑA, 2014). Essas diretrizes foram postas em prática por essa Associação em 1989 quando se criou a Comision Nacional para la Evaluacion de la Educacion Superior (CONAEVA), a qual criou e operacionalizou o Sistema Nacional de Evaluación de la Educación Superior, com avaliação institucional (autoavaliação), avaliação sistêmica e avaliação interinstitucional de programas acadêmicos e funções institucionais. A COMPES, por sua vez, em 1992, complementando a proposta da ANUIES e visando a institucionalização de uma avaliação externa, criou os Comités Interistitucionales para la Evaluación de la Educación Superior (CIEES), “como organismos de carácter no gubernamental que tienen como principales funciones: la evaluación diagnóstica de programas académicos y funciones institucionales y la acreditación de programas y unidades académicas.” (ROJAS, 2009, p. 13). A metodologia utilizada pelo CIEES se assemelha à do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior do Brasil (Sinaes) cuja avaliação externa é feita por pares de acadêmicos provenientes de IES distintas do país. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 330 Já em 1994, funda-se o Centro Nacional para la Evaluación de la Educación Superior (CENEVAL) que passa então a certificar os estudantes que ingressam e que saem do nível médio e do superior por meio de exámenes de ingresso (EXANI) e de egreso (EGEL). O EGEL, especificamente, tem caráter obrigatório e é aplicado a estudantes de IES públicas e privadas de várias áreas do conhecimento de acordo com os programas de seus cursos. Os estudantes das 33 áreas já contempladas pelo exame o fazem mediante pagamento de taxa de 500 pesos (mais ou menos 100 reais). (LEAL; OCEGUEDA, 2013). Por fim, a partir de 1995 começa-se a criação de organismos acreditadores para IES públicas e privadas, impulsionados pela fundação do primeiro organismo, a saber: o Consejo de Acreditación para la Enseñanza de la Ingeniería (CACEI). Tal proliferação de organismos particulares culminou na instituição no mesmo ano do Consejo para la Acreditación de la Educación Superior, A.C. (COPAES), que veio para reconhecer e fiscalizar esses organismos em concordâncias com as legislações educacionais do país. Atualmente, há 33 grupos acreditadores reconhecidos, os quais recebem um auxílio financeiro da Secretaria de Educación Superior (SES), mas também recebem das próprias IES que visitam. O atestado de acreditação realizado por esses grupos tem validade de cinco anos e é passível de renovação caso o programa educativo continue satisfazendo os estandartes de qualidade préestabelecidos. (RUBIO OCA, 2007). Não obstante, relacionado à pós graduação foi instituído a partir de 1992 o Padrón de Posgrados de Excelencia (PPE) e o Programa de Fomento al Posgrado Nacional (PFPN) dentro do Consejo Nacional de Ciencia y Tecnología (CONACYT). As IES públicas que apresentam bons resultados recebem incentivos financeiros, enquanto as privadas de bons resultados não recebem dinheiro, mas simplesmente prestígio. (SILAS CASILLAS, 2013). No quadro a seguir pode-se visualizar de uma maneira mais sintética o nome das instâncias antes citadas, bem como o ano de fundação de cada uma delas: Organismos, mecanismos e instâncias regulatórias Ano Sistema Nacional para la Planeación Permanente de la Educación Superior (SINAPPES) 1978 Comision Nacional para la Evaluacion de la Educacion Superior (CONAEVA) 1984 os Comités Interistitucionales para la Evaluación de la Educación Superior (CIEES) 1992 Centro Nacional para la Evaluación de la Educación Superior (CENEVAL) 1994 Consejo para la Acreditación de la Educación Superior, A.C. (COPAES) 1995 Padrón de Posgrados de Excelencia (PPE) e o Programa de Fomento al Posgrado Nacional 1992 (PFPN) dentro do Consejo Nacional de Ciencia y Tecnología (CONACYT) ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 331 Fonte: Elaboração própria com base no estudo de Romo (2007). Entre todos esses organismos, mecanismos e instâncias regulatórias citadas no quadro, estão em vigência para o nível de graduação os seguintes: Comités Interistitucionales para la Evaluación de la Educación Superior (CIEES), Centro Nacional para la Evaluación de la Educación Superior (CENEVAL) e Consejo para la Acreditación de la Educación Superior, A.C. (COPAES), cujos critérios de qualidade serão comentados a seguir. 5. Os critérios de qualidade das políticas regulatórias em vigência para a educação superior em nível de graduação Os Comités Interistitucionales para la Evaluación de la Educación Superior (CIEES) são formados por nove equipes dividas por área do saber, conforme o organograma a seguir. Fonte: < http://www.ciees.edu.mx/index.php/acerca/organigrama> ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 332 Essas equipes comportam avaliadores externos que por meio de visita às IES públicas e privadas deverão avaliar seus programas educacionais nos seguintes eixos e categorias, os quais também devem ser observados no momento de autoavaliação institucional: Eixo 1 – Intencionalidad: (i) Normativa y políticas generales; (ii) Planeación-evaluación Eixo 2 - Contexto y procesos: (i) Modelo educativo y plan de estudios; (ii) Alumnos; (iii) Personal académico; (iv) Servicios de apoyo a los estudiantes; Eixo 3 – Infraestructura: (i) Instalaciones, equipo y servicios; Eixo 4 - Resultados e impacto: (i) Productividad académica (docencia e investigación); (ii) Vinculación con los sectores de la sociedad; (iii) Trayectoria, perspectivas e impacto social del programa. Aos programas que contemplam de acordo com a avaliação em questão todos os eixos e categorias acima é outorgado um reconhecimento de Nivel 1 e aos que não contemplam todos os requisitos é outorgado reconhecimento de Nivel 2. Ambos os reconhecimentos têm validade de cinco anos, sendo que os programas alocados no nível 2 têm até dois anos para se reformularem em prol do cumprimento de todos os requisitos. Vale ressaltar que apesar de eixos e categorias fixos, a filosofia de trabalho do CIEES, de acordo com documento de mesmo nome, […] entiende por un programa educativo de buena calidad aquel que tiene propósitos pertinentes y adecuados, y logra cumplirlos. Esto quiere decir que, en principio, cualquier programa educativo podría ser considerado de calidad sin importar su tamaño, su ubicación geográfica, la institución de educación superior (IES) que lo alberga o la población estudiantil a la que atiende, siempre y cuando el propósito del programa sea un propósito claro, deseable, pertinente y plausible, y que las condiciones de operación del programa sean suficientes para lograr ese propósito. (CIEES). O Centro Nacional para la Evaluación de la Educación Superior (CENEVAL), por sua vez, é uma associação civil sem fins lucrativos que promove uma série de avaliações externas por meio de exames. Os exámenes de ingresso (EXANI) servem tanto para reconhecer o perfil do alunado de cada carreira como também para selecionar os que ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 333 começarão seus estudos em determinada instituição. Já os exámenes de egreso (EGEL) servem para identificar se os alunos, ao fim da carreira, contam com os conhecimentos e habilidades necessários para entrarem no mercado de trabalho. O conteúdo do EGEL é dividido por áreas e subáreas. As áreas correspondem aos amplos âmbitos profissionais do profissional de determinado curso; enquanto as subáreas correspondem às principais atividades profissionais de cada área. Apesar de ser um exame de cunho diagnóstico, as instituições têm a permissão de usa-lo como pré-requisito para a formação do alunado. Como debilidade de ambos os exames considera-se o fato de serem provas homogêneas, estandardizadas e de múltipla escolha, que podem não serem capazes de captar a complexidade da aprendizagem do alunado. (LEAL; OCEGUEDA, 2013). Finalmente, o Consejo para la Acreditación de la Educación Superior, A.C. (COPAES) é a única instancia autorizada a supervisionar os organismos acreditadores da educação superior. Esse conselho atribui reconhecimento e permissão de funcionamento aos organismos acreditadores em uma vigência de cinco anos e esses devem promover o processo de acreditação por meio de cinco etapas: solicitação, autoavaliação, avaliação, ditames e continuação para a melhoria continuada, conforme a figura abaixo: Fonte: <http://www.copaes.org/> As categorias avaliadas por meio desse processo, por sua vez, são dez: “1. Personal Académico 2. Estudiantes 3. Plan de Estudios 4. Evaluación del Aprendizaje 5. Formación ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 334 Integral 6. Servicios de Apoyo para el Aprendizaje 7. Vinculación – Extensión 8. Investigación 9. Infraestructura y Equipamiento 10. Gestión Administrativa y Financiamiento.” (COPAES, 2012). Quando contemplado esses requisitos a instituição é acreditada e considerada uma instituição de qualidade internacional. Para Silas Casillas (2013, p. 24-25), no entanto, é [...] preocupante que la valía de una institución de educación superior o de un programa formativo, que busca desarrollar a los jóvenes de un país, se mida a través de un concepto eficientista y mercadizado de lo que significa la calidad y más aún, que este concepto se refuerce en la práctica a través de una acreditación. Considerações finais O objeto deste trabalho foi compor uma visão geral e aproximativa das agências reguladoras da educação superior no México. Para tanto, em um primeiro momento, buscamos caracterizar minimamente as agências reguladoras mexicanas já existentes. Em seguida, buscamos aprofundar o debate nas características específicas dos programas vigentes na educação superior em nível de graduação e seus respectivos critérios de qualidade, nesse país. Nos últimos anos, um considerável número de estudos teóricos e empíricos vem indicando uma expansão quantitativa dos sistemas de educação superior no mundo e o aumento de sua relevância na sociedade contemporânea. Dentre outros aspectos, um tem sido ressaltado com grande ênfase por esses estudos: a necessidade de se compreender as relações que estruturam o campo das instituições da educação superior, a ação dos sujeitos que as dinamizam e as políticas de avaliação da qualidade de sua oferta por estabelecimentos públicos e privados e a avaliação da qualidade dos serviços prestados por essas instituições. Considerando a existência das diversas agências regulatórias já existentes no território mexicano e que os programas existentes atualmente para o nível de graduação fazem parte de agências distintas, diversas dificuldades mostram-se presentes em seu sistema de educação superior. Diante disso, concordamos com Viñada (2014), para quem falta estabelecer no México um projeto educativo que seja capaz de responder coerentemente à pergunta: ¿para qué educamos en las IES mexicanas? Caso o contrário, segundo o referido autor, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 335 […] la evaluación y acreditación serán sólo mecanismos burocráticos y mercadológicos y no una función educativa sustancial e inescapable para la consolidación del proceso formativo de los mexicanos a fin de que sean profesionistas comprometidos con la transformación del país. (p. 11). Por último, ressaltamos que, apesar da finalidade anunciada pelo COPAES e CENEVAL ser promover a qualidade da educação e apontar à sociedade quais são as instituições de qualidade, ambos não se pronunciam sobre o que acreditam ser uma educação superior de qualidade e privam-se, como visto, a mencionar os critérios avaliados. Referências ALTBACH, Philip G. A pesquisa sobre o ensino superior - perspectivas globais. Cf. In: SADLAK, Jan; ALTBACK, Philip G. (Eds.). Higher education research at the turn of the new century: structures, issues, and trends. Paris: UNESCO; New York: Garland, 1997. p. 12-39. ARROYO, Federico Hernandez. La independencia de las agencias reguladoras en México. Gestión y Política Pública, volumen XVI, núm. 1, I semestre de 2007, 2007, p. 61-100. BOURDIEU, Pierre. La noblesse d’état: grandes écoles et esprit de corps. Paris: Minuit, 1989. p. 21. CIEES. Misión. Disponível em: <http://www.ciees.edu.mx/>. _______. Organograma. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 338 AVALIAÇÃO E REGULAÇÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR DO DISTRITO FEDERAL: OS CURSOS DE LICENCIATURA EM FOCO José Vieira de Sousa Universidade de Brasília [email protected] Paola Matos da Hora Universidade de Brasília [email protected] Avaliação na expansão da educação superior RESUMO A Lei n° 10.861 de 14 de abril de 2004, que instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), tem por objetivo garantir a avaliação das instituições de educação superior (IES), dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus estudantes. Tendo em vista os índices que compõem o Sinaes, para fins de regulação considera-se que um resultado satisfatório é igual ou superior a 3, em uma escala que varia de 1 a 5. Apesar da existência da regulação observa-se que, seguindo uma tendência nacional, há uma expansão da educação superior no Distrito Federal (DF) a partir da década de 1990, sobretudo no setor privado. De acordo com dados do Censo da Educação Superior (INEP, 2013) as matrículas nos cursos de Licenciatura aumentaram mais de 50% nos últimos dez anos, um crescimento médio de 4,5% ao ano. O artigo investiga em que medida o Estado tem acompanhado, por meio da regulação, realizada pelos índices existentes no Sinaes, o movimento de expansão da educação superior dos cursos de Licenciatura no DF. Palavras chave: Avaliação, Expansão, Cursos de Licenciatura, Regulação. Considerações iniciais A Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) e tem como objetivo assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior (IES), dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus estudantes. As avaliações presentes no Sinaes permitem que se faça uma análise mais global da real situação das IES no Brasil, ofertando subsídios para que se possa investir na qualidade educacional. Todavia, segundo Barreyro e Rothen (2011), com o passar dos anos, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 339 esse sistema foi sofrendo alterações que iam contra os seus princípios iniciais, como a criação de índices, de forma unilateral. Essas mudanças trouxeram à tona uma série de debates no meio acadêmico, como por exemplo, a discussão sobre as funções que a avaliação assume na educação superior. Dentre as discussões relacionadas às funções que a avaliação assume, ganha destaque o papel da regulação. Partindo desta ideia mais geral, o presente trabalho tem como objetivo analisar em que medida o Estado tem acompanhado, por meio da regulação, a expansão dos cursos de Licenciatura no Distrito Federal (DF). Assim, o intuito é verificar em que medida a relação existente entre avaliação e regulação é responsável por orientar a expansão dos cursos de Licenciatura do DF. É importante ressaltar que a relação existente entre a avaliação e a regulação cria focos de tensão, uma vez que os índices passam a assumir inúmeras funções, como aquelas relacionadas à qualidade, e também as de ranking. De acordo com Barreyro (2008), os índices presentes no Sinaes criam várias discussões, pois possibilitam às instituições e à mídia a formação de rankings a partir das notas obtidas pelos alunos, pelos cursos e pela instituição. Em virtude desta forma de utilização dos índices, observa-se que a preocupação com a aferição da qualidade é mero acessório, uma vez que a ideia mercadológica se sobressai. De acordo com Hora (2013), os índices são utilizados pela mídia, como forma de colocar em destaque as melhores e as piores instituições. Já as IES divulgam seus resultados como forma de se promoverem perante a sociedade, quando o seu resultado é satisfatório. Todavia, nem a mídia e nem as IES têm se aprofundado nas questões que a composição destes índices envolve Em relação à escolha, neste trabalho, pelos cursos de Licenciatura, observa-se que de acordo com a Sinopse Estatística da Educação Superior de 2013 existem no Brasil 7.920 cursos de Licenciatura ofertados nas modalidades presencial e à distância. Já em relação à quantidade de matrículas nesses cursos, de um total de 1.374.174 dessas matrículas 29.440 concentram-se no DF, sendo 6.367 em instituições públicas e 23.073 em instituições privadas. Ainda conforme a mesma fonte, há um número considerável de matrículas em cursos de Licenciatura no DF, propondo-se a formar docentes para atuar na Educação Básica. Assim, a escolha do DF como Unidade Federativa para discussão do tema aqui proposto se dá pelo fato de, ao longo das últimas décadas nele ter havido um crescimento acentuado do setor privado com a anuência do Estado, tendência que manteve sintonia com o cenário nacional (SOUSA, 2013). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 340 Do ponto de vista de sua estrutura, o artigo é composto por três partes. A primeira parte trata da relação avaliação, regulação e expansão da educação superior brasileira, destacando aspectos conceituais dessa relação, tendo em vista a política do Sinaes. A segunda problematiza a utilização dos índices no âmbito desse sistema avaliativo, ressaltando o papel que eles assumiram frente à regulação da educação superior brasileira. A terceira parte discute a expansão da educação superior no DF, dando ênfase às licenciaturas nesse processo, de maneira articulada ao par avaliação/regulação. 1. Avaliação, regulação e expansão da educação superior brasileira No contexto recente da educação superior brasileira, mais do que nunca, a relação existente entre avaliação, regulação e expansão merece ser investigada. De acordo com a Lei nº 10.861 de 14 de abril de 2004, o Sinaes deve assegurar processo nacional de avaliação das IES, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus estudantes. De acordo com o seu artigo 1º, parágrafo 1º, uma das finalidades do sistema é orientar a expansão da oferta da educação superior. Assim, a expansão desse nível educacional, segundo a lei, deve ser orientada pelas avaliações contidas no Sinaes. Já em relação à regulação, a lei garante que os resultados da avaliação constituirão referencial básico dos processos de regulação e supervisão da educação superior, compreendidos o credenciamento e a renovação de credenciamento de IES, a autorização, o reconhecimento e a renovação de reconhecimento de cursos de graduação. Diante do exposto é possível afirmar que a referida lei estabelece uma relação entre avaliação, regulação e expansão, razão pela qual é necessário investigar em que medida a articulação dessas três dimensões ocorre. 1.1 Concepção e diretrizes gerais do Sinaes De acordo com Höfling (2001), a política pública se remete a quando o Estado implanta um projeto de governo por meio de programas que são destinados a setores da sociedade. As políticas públicas são de responsabilidade do Estado, porém devem contar com a participação de agentes públicos e da sociedade no processo de tomada de decisão. Nesta perspectiva, as continuidades e rupturas do processo de formulação de uma política de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 341 avaliação da educação superior fazem parte de um cenário que se delineia de acordo com o momento histórico e político no qual é gestada. Dessa forma, os objetivos da política nem sempre são unânimes, pois podem se contrapor em virtude dos atores que dela se beneficiam. Para Belloni e Belloni (2003), as tentativas mais significativas de se implantar a avaliação de modo sistemático, no Brasil, nas IES, tiveram início na década de 1980. As tentativas de sistematização de uma avaliação da educação superior se deram por meio de políticas como: i) Programa de Avaliação da Reforma Universitária (Paru); ii) Grupo Executivo para a Reformulação do Ensino Superior (Geres); iii) Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (Paiub); iv) Exame Nacional de Cursos (ENC); e v) Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior. Todavia, apenas os dois últimos mencionados entraram para a agenda governamental como políticas públicas de avaliação da educação superior. Para este estudo destacaremos apenas o Sinaes. O Sinaes começou a ser criado a partir da Comissão Especial de Avaliação da Educação Superior (CEA). Essa proposta, em 2004, transformou-se em Lei (10.861), e instituiu o Sinaes, que se configura a partir de três componentes de avaliação: avaliação institucional, que compreende a avaliação externa e a autoavaliação, avaliação dos cursos e a avaliação dos estudantes, feita por meio do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). Como sistema de avaliação, ele visa fazer uma análise global da realidade da educação superior brasileira, tendo em vista a melhoria da qualidade. Sua estrutura administrativa envolve a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), responsável pela coordenação e supervisão do sistema, sendo sua operacionalização feita pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em conjunto com a Secretaria de Educação Superior (SESu). Com base nos resultados do Enade e dos demais insumos constantes das bases de dados do Ministério da Educação são calculados os Indicadores de Qualidade da Educação Superior87: i) de desempenho de estudantes: o Conceito Enade; ii) de cursos superiores: o Conceito Preliminar de Curso (CPC), instituído pela Portaria Normativa nº 4, de 05 de agosto de 2008; e iii) de Instituições de Educação Superior: o Índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição (IGC), instituído primeiramente pela Portaria Normativa n º 12, de 05 de setembro de 2008. 87 Nota metodológica (INEP, 2013). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 342 Observa-se que os indicadores de qualidade da educação superior são representados por meio de índices e conceitos que se propõe a medir os componentes avaliativos que constituem o Sinaes. As avaliações presentes no sistema permitem que se faça uma análise mais global da real situação das IES no Brasil, oferecendo subsídios para que se invista na qualidade educacional. Assim, é possível observar que a lei que institui o Sinaes não previa que o desempenho de alunos, cursos e instituições fossem mensurados desta maneira, por meio de indicadores. As portarias publicadas posteriormente à referida lei é que garantiram a incorporação dos índices. Todavia, para Belloni e Belloni (2003), a avaliação da educação superior brasileira, de responsabilidade do governo e das instituições, tem a finalidade de cumprir objetivos que não se restringem ao cumprimento de requisitos legais. A partir dos resultados fornecidos pela avaliação, é possível exigir que tanto instituições quanto o próprio sistema de avaliação se reavaliem no que diz respeito ao seu funcionamento, cumprimento de normas e objetivos, bem como à sua missão institucional, e, assim, busquem uma redefinição dos caminhos a serem trilhados. Os resultados dos índices provenientes de cálculos que utilizam diversos componentes são usados não só como instrumento da regulação, mas também para que a sociedade civil tenha conhecimento da qualidade dos cursos e das IES. Desta forma, a preocupação com os resultados por parte dessas instituições, leva em consideração uma gama de fatores, como, por exemplo, a credibilidade que a sociedade civil pode atribuir às instituições, tendo como referência os índices. 1.2 Regulação na educação superior A primeira etapa de participação da sociedade civil no processo de regulação e controle social é na compreensão da política, principalmente no que se refere ao seu funcionamento. Esse ponto merece destaque, pois a sociedade não tem a devida clareza da complexidade que há no sistema de avaliação da educação superior brasileira. Esse sistema, no entendimento popular, acaba sendo reduzido ao Enade; logo o Conceito Enade toma grandes proporções, principalmente por conta dos rankings. O maior desafio é fazer com que a política de avaliação seja vista como instrumento de regulação e também capaz de prover subsídios que ajudem a alterar o cenário em que a ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 343 educação superior se encontra. Mas isso só é possível quando todos os envolvidos têm um sentimento de pertencimento à IES e podem colaborar para a transformação do local. Barroso (2004) levanta o debate sobre uma polissemia de conceitos acerca da regulação na educação. Um deles está atrelado à noção de o Estado ser o responsável por intervir na condução das políticas públicas. O outro conceito está ligado a um novo modelo, que pretende romper com o estilo tradicional de manter o Estado como único responsável em interferir na coordenação do processo político. Observa-se que, ao longo da história de avaliação da educação superior, há a predominância alternada de ambos os conceitos em virtude dos objetivos almejados em cada período. O autor analisa a existência de quatro níveis de regulação: i) a regulação transnacional, que é originária dos países centrais, e compõe um sistema de dependências do qual fazem parte os países semiperiféricos e periféricos, que estão sob diferentes tipos de constrangimentos estruturais, como os econômicos, oriundos do processo de globalização; ii) a regulação nacional, resultante da sobreposição de diferentes lógicas durante a definição de políticas, reforçando o caráter ambíguo desse tipo de regulação; iii) a microrregulação local, na qual há uma série de negociações entre vários atores com o objetivo de fazer ajustes locais nas normas da regulação nacional; e iv) metarregulação em que a regulação do sistema educativo é resultado de um complexo sistema de coordenações, com diferentes níveis, finalidades, processos e autores, que interagem de modo imprevisível e de acordo com racionalidades lógicas, interesses e estratégias distintos. Ao analisar os três níveis de regulação, percebe-se que eles estão presentes na avaliação da educação superior brasileira, cuja origem deu-se em um contexto permeado por interesses econômicos e políticos da década de 1980, sob influência direta de organismos internacionais. Dessa forma, foi se configurando um “Estado avaliador”, que começava a interferir cada vez mais na organização das IES, como subsídio para a avaliação. No que se refere à microrregulação local, é possível afirmar que esta sofreu uma ação dos demais níveis de regulação, pois as IES têm procurado meios de se adequarem às normas estabelecidas pela política de avaliação. 1.2 Avaliação e expansão da educação superior Ao tentar estabelecer uma relação entre a avaliação da educação superior e a sua expansão, Barreyro e Rothen (2010) destacam que a avaliação desse nível educacional, no ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 344 contexto da Reforma do Estado, tornou-se um instrumento de controle da qualidade da educação via mercado. Os autores afirmam que no início do governo Luís Inácio Lula da Silva, especialmente no que tange ao seu primeiro mandato (2003-2006), houve a tentativa de criação de uma nova sistemática de avaliação que continuaria vinculada ao controle da qualidade da educação superior em expansão, mas não tendo mais como pressuposto a “mão invisível do mercado” como reguladora do sistema. Todavia, o projeto não se realizou e, em 2008, com a instituição do “Conceito Preliminar de Cursos” e o “Índice Geral de Cursos”, consolidou-se a prática de avaliação estabelecida com a Reforma do Estado. Estudo realizado por Tavares et al. (2014) aponta que a expansão da educação superior brasileira, capitaneada pelo setor privado mercantil, seguiu lógica e dinâmica próprias, sem significativa interferência dos processos avaliativos, ainda que submetida à ânsia legiferante do Estado. Assim, a avaliação mostrou-se desvinculada da expansão: o vínculo, se existe, é entre regulação e expansão. Os referidos autores sinalizam que [...] a partir da implantação do Sinaes há um visível movimento em torno da avaliação, podendo sinalizar o reconhecimento deste processo ou até a necessidade de participação devido às exigências da regulação do sistema de educação superior, no que se referem à vinculação da avaliação aos programas de financiamento estudantil (PROUNI, FIES) e à autorização para a abertura de novos cursos e manutenção de vagas autorizadas (p. 103). Pode-se afirmar que, conforme mencionam os autores, a avaliação não estabelece uma relação estreita com a expansão da educação superior. A regulação acaba exercendo uma maior influência na questão da expansão em virtude de critérios que devem ser atendidos para a concessão de maior número de vagas nas IES. O Estado, por meio da criação de índices, que visou dar uma solução para a avaliação de um sistema amplo complexo, acabou por se eximir de acompanhar o crescimento e surgimento de novos cursos nas IES. Essa isenção da responsabilidade do Estado está de acordo com o que discutem Tavares et al. (2014), pois as universidades e centros universitários têm autonomia para a abertura de cursos. Logo, essa autonomia atua como um elemento facilitador, dado que essas IES ficam dispensada da avaliação in loco para fins de autorização do funcionamento. Torna-se obrigatória apenas para o ato de reconhecimento, fazendo que esta seja apenas aporte do ato regulatório. Percebe-se que a relação existente entre avaliação e regulação é praticamente inexistente, o que faz com que a regulação ganhe um espaço considerável no Sinaes. Deste modo, a expansão continua ocorrendo, com a anuência do Estado, porém de forma ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 345 desvinculada da avaliação. Do ponto de vista prático, a regulação ganha destaque neste processo, e pouco interfere na ampliação de IES e cursos. 2. A regulação no Sinaes Como ressaltando anteriormente, ao longo dos anos, a proposta do Sinaes foi sendo modificada. Uma das alterações diz respeito à inserção de índices por meio de portarias, como por exemplo: (i) Indicador de Diferença de Desempenho (IDD); (ii) Conceito Preliminar de Curso (CPC); e (iii) Índice Geral de Curso (IGC). Para Barreyro (2008), os índices foram agregados ao Sinaes de forma unilateral, ferindo, assim, a proposta inicial do sistema, elaborada em 2003, que tinha como centro a autoavaliação institucional. De acordo com Barreyro e Rothen (2006) a proposta da CEA tinha a avaliação institucional como o seu centro. A ênfase da concepção avaliativa exposta estava na preocupação com a tomada de consciência sobre a instituição, conseguida pela participação coletiva em todo o processo, o que lhe dá caráter formativo e de aperfeiçoamento individual e institucional. Dessa forma, a incorporação dos índices traz uma série de questionamentos sobre sua utilização, bem como acerca de quais os seus objetivos em relação àquilo a que se propõem. 2.1 A discussão dos índices De acordo com a Nota Metodológica (INEP, 2013) as avaliações do ciclo avaliativo do Sinaes são orientadas pelos indicadores de qualidade da educação superior. Estes são expressos em uma escala de cinco níveis, em que os níveis iguais ou superiores a 3 (três) indicam que a qualidade é satisfatória. Já aqueles cursos que obtiveram desempenho inferior a três são passíveis de sanções por terem ficado abaixo do que se considera um bom resultado. ´Neste contexto, é importante destacar que o Conceito Enade, o CPC e o IGC fornecem subsídios para a regulação da educação superior. Barreyro e Rothen (2014) discutem que o Conceito Preliminar de Curso (CPC) mudou a implementação do Sinaes, limitando as visitas in loco aos cursos que obtiveram um conceito preliminar menor que 3. Tal ação gerou a diminuição de 3.000 visitas previstas por ano para 1.800. Para eles, a atitude é benéfica apenas do ponto de vista administrativo, pois ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 346 não contribui para a qualidade da educação superior uma vez que se ao “aligeirar os processos de avaliação de cursos, perdeu-se o caráter formativo da avaliação”. (p.70). Os mesmos autores concluem que na educação superior os índices são usados para regular o sistema. Na prática, apesar de as instituições federais estarem submetidas a esse sistema de regulação, ele exerce pouca influência, pois o desempenho dos alunos costuma ser maior que o mínimo exigido. Já para as IES privadas, resultados menores aos exigidos significam não apenas monitoramento via visitas de especialistas e eventuais compromissos de melhoria, mas também impedimentos para participação no Programa Universidade para Todos (PROUNI) e em solicitação de créditos junto ao BNDES. Ainda, os resultados acabam se tornando um selo de qualidade e são utilizados para marketing institucional. (p. 73) Os índices são alvos de várias críticas, pois vêm sendo usados como ferramentas para diminuir o número de visitas in loco, bem como para que as IES pudessem se promover e para a mídia criar rankings. Nesta perspectiva, eles pouco contribuíram para aprofundar algumas discussões sobre a educação superior, dentre elas a da qualidade. Situando o debate no âmbito das universidade, para Garcia et al (2011), essas instituições vivenciam as contradições resultantes do embate entre a regulação e a emancipação. Assim, é necessário que se pense uma prestação de contas que vá além do simples propósito de punir ou conferir méritos, mas que signifique grandes passos em direção a compromissos com a melhoria da oferta da educação superior. 3. Expansão da educação superior no Distrito Federal e a relação avaliação e regulação Para Sousa (2013) o campo da educação superior no DF, apesar de ter crescido e se diversificado nas últimas décadas, sobretudo no setor privado, não tem sido alvo de muitos estudos que aprofundem a discussão sobre a sua dinâmica e evolução. Por isso, faz-se necessário compreender o movimento de expansão da educação superior local, para que assim seja possível analisar a sua relação com a avaliação e a regulação. Ao analisar a configuração do campo da educação superior do DF, Sousa (2011) afirma que as ações do Estado destinadas à educação superior no período de 1995 a 1998 contribuíram para que houvesse, no setor privado, a consolidação de um grupo complexo de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 347 estabelecimentos que se distinguem em função de seus objetivos e valores. Pode-se afirmar que há um grupo bastante diversificado de instituições nesse segmento, de acordo com a tabela 1. Tabela 1: Instituições de Educação Superior no Distrito Federal - 2013 Instituições Categoria Administrativa Universidades Centros Universitários Faculdades IF e CEFET Total Capital Total Capital Total Capital Total Capital Total Capital 62 62 2 2 5 5 54 54 1 1 3 3 1 1 . . 1 1 1 1 2 2 1 1 . . . . 1 1 Estadual 1 Municipa l . 1 . . . . 1 1 . . . . . . . . . . . 59 1 1 5 5 53 53 . . Distrito Federal Pública Federal Privada Total Geral 59 Fonte: Inep, 2014 Observa-se que há 62 IES no DF, destas 03 são públicas e 59 são privadas. Das IES públicas 01 é universidade, 01 é faculdade e 01 é Instituto Federal. Em relação às privadas 01 é universidade, 05 são centros universitários e 53 são faculdades. Essa heterogeneidade exige que a avaliação da educação superior consiga abranger as IES, de modo a analisar as especificidades nela contidas. Isso faz com que o processo de avaliação da educação superior assuma grandes proporções, tendo em vista não apenas o quantitativo de IES, mas também sua diversidade. A análise do período que compreende os anos de 1995 a 2001, no que se refere à expansão da educação superior, no DF, é possível perceber que o crescimento do número de IES e de matrículas mostra-se bastante acentuado, evoluindo a cada ano. Para Sousa (2013) no DF, em função desse processo de expansão da educação superior, a partir da segunda metade da década de 1990, este nível educacional evidenciou-se bastante heterogênea e com um número considerável de instituições. Para o autor a expansão do setor privado local foi expressiva e superou os índices de crescimento desta esfera, quando contrastada com a realidade no país, no referido período. Em 1995 havia, no Brasil, 684 IES privadas passando para 1.442 no ano de 2002, o que ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 348 aponta um aumento de 110,8%. Porém no DF, no mesmo período o aumento de IES privadas mostrou-se bem mais acentuado, pois a quantidade de instituições passou de 12 para 63, registrando um crescimento de 425%. Todavia, o autor afirma que esse processo de expansão deve ser investigado, buscando entender de que forma as instituições organizaram os seus trabalhos frente à concorrência deste setor. Afirmar, ainda, que o estímulo ofertado pelo governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), na segunda metade da década de 1990, contribuiu para a expansão do segmento privado no DF, tendo em vista a lógica orientadora do crescimento do setor, bem como a diversificação do sistema, realidade que mostrou semelhança com o cenário nacional, à época. É possível analisar que a expansão da educação superior no DF se dá majoritariamente no setor privado, com a permissão do Estado. Todavia, não se pode afirmar que esse crescimento de IES e número de matrículas deu-se com padrões de qualidade mínimos, uma vez que a expansão se deu de forma rápida e questiona-se se o Estado, de fato, pode acompanhar esse movimento. 3.1 Os cursos de Licenciatura no Distrito Federal De acordo com Gatti (2010), as licenciaturas são cursos que, pela legislação, têm por objetivo formar professores para a educação básica. A institucionalização e currículo desses cursos vêm sendo questionados, uma vez que estudos já apontavam vários problemas na consecução de seus propósitos formativos. A autora afirma que em função dos graves problemas enfrentados no que se refere às aprendizagens escolares, avoluma-se a preocupação com as licenciaturas, tanto no que se refere às estruturas institucionais, quanto ao currículo e conteúdos formativos. Porém, mesmo levando em consideração um conjunto de fatores que influenciam o desempenho dos cursos de licenciatura, é preciso chamar atenção para a formação inicial dos professores, que envolve diretamente as IES, sobretudo as universidades. Para Gatti e Barreto (2009), em um período muito curto de tempo, o locus de formação docente no país se deslocou inteiramente para a educação superior. Essa mudança evidencia questionamentos relacionados à possibilidade de os novos cursos superiores cobrirem as vastas áreas do território nacional onde, há bem pouco tempo, mal chegavam os ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 349 cursos de nível médio. Segundo as autoras, questionam-se também as condições de financiamento e funcionamento dos cursos, e a qualidade da formação ofertada, sendo esse um dos aspectos mais difíceis de serem aferidos. Ainda no que diz respeito à qualidade Brito (2007), analisa que os cursos de formação de professores não têm recebido a merecida atenção. Ao longo dos anos, essa profissão foi gradativamente sendo sucateada, particularmente em função da ideia amplamente disseminada de que formar bacharéis, futuros pesquisadores, se reveste de uma importância maior que formar professores. Para a autora, a década de 1990 foi aquela onde o número de estudantes era bastante reduzido, porém em 2004 o número de estudantes ultrapassa a barreira dos 100.000. Como mencionado anteriormente, a Sinopse Estatística da Educação Superior de 2013 aponta que no Brasil são ofertados 7.920 cursos de licenciatura nas modalidades presencial e à distância. Já em relação à quantidade de matrículas nesses cursos foi registrado um total de 1.374.174, das quais 29.440 concentram-se no Distrito Federal, sendo distribuídas 6.367 em instituições públicas e 23.073 em instituições privadas. Assim, o DF possui um número considerável de matrículas em cursos de licenciatura e essas se concentram, sobretudo, no setor privado. É preciso investigar a relação existente entre avaliação e regulação e de que forma elas orientaram a expansão da educação superior no DF, que se deu de forma vertiginosa a partir de meados da década de 1990. Considerações finais A relação entre avaliação, regulação e expansão está explicitada na Lei nº 10.861 de 2004, que institui o Sinaes. Partindo dessa premissa, um dos objetivos do sistema de avaliação é orientar a expansão da oferta da educação superior. Logo, o Estado é responsável por regular não apenas a qualidade dos cursos e instituições, mas também tem o papel de intermediar a expansão da educação superior, por meio das avaliações. O Sinaes foi sofrendo transformações ao longo dos anos, à medida que índices foram implementados em suas políticas por meio de portarias. Tal ação causou uma série de discussões entre os pesquisadores da área, sob o principal argumento de que a concepção inicial do Sinaes estava sendo deturpada. A inclusão dos índices nesse sistema avaliativo teve o intuito de regular a educação superior, no que tange à qualidade das IES e cursos. Todavia, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 350 há evidências de que os índices são utilizados para inúmeras finalidades. Dependendo do público, o índice assume um determinado papel. Para o Estado, diminuiu o número de visitas in loco; para as IES contribui com a sua autopromoção e para a mídia serviu como subsídio para a elaboração de rankings. Portanto, pode-se inferir que, assim como a avaliação assume vários papéis, os índices também têm acompanhado esse movimento. Muito tem se falado sobre os índices, mas pouco se aprofunda nessa discussão. Além do mais, como mecanismos de regulação, os índices devem orientar a expansão da educação superior. De acordo com os dados apresentados, percebe-se que a educação superior brasileira obteve um significativo crescimento no setor privado, fenômeno que se mostra igualmente intenso no Distrito Federal, nas últimas décadas, em termos do número de instituições e de matrículas. Sousa (2013) destaca que a esfera pública também evidenciou uma expansão, mas tímida quando comparada àquela que se deu na esfera privada. Todavia, de acordo com o autor, o crescimento do número de vagas na educação superior é um ponto contraditório, porque o Brasil ainda apresenta uma das menores taxas de inserção de indivíduos na educação superior, quando comparado aos países da América Latina. Em relação à necessidade de o estudo elencar o DF como locus da pesquisa, tal ação faz-se necessária pelo fato de o DF ter apresentado, ainda na década de 1990, uma expressiva expansão do número de IES. O crescimento se deu principalmente no setor privado, assim é importante saber de que forma os cursos de licenciatura se relacionaram com a expansão. Diante do exposto é preciso analisar em que medida o Estado vem acompanhado a expansão da educação superior. Os índices não podem ser vistos como mecanismos de ajuste ao sistema ou coerção, eles devem possibilitar a análise desse processo de expansão, permitindo discutir como a qualidade tem acompanhado esse crescimento. REFERÊNCIAS BARREYRO, G. B. De exames, rankings e mídia. Avaliação, Campinas, v. 13, n. 3, p. 863868, nov. 2008. BARREYRO, G. B.; ROTHEN, J. C.“SINAES” contraditórios: considerações sobre a elaboração e implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, p. 955-977, out. 2006. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 351 ______. 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SEIFFERT, Otilia RUIZ-MORENO, Lidia ABENSUR, Patricia LIMEIRA, Polyana Universidade Federal de São Paulo [email protected] Eixo temático 3 – Avaliação na expansão da educação superior Resumo O texto é produto da pesquisa “Avaliação, expansão e qualidade da educação superior no século XXI” realizada pelo “Observatório e pesquisa das políticas de avaliação da educação superior” (POW1). Foi analisada no contexto do MERCOSUL e da Comunidade Europeia – ENQA –, a concepção de qualidade do ensino superior e os atributos de qualidade que agências internacionais referenciam a este nível de ensino. Percebe-se que no âmbito do MERCOSUL o conceito de qualidade é construído através de consensos e negociações. A qualidade da educação superior é avaliada por sistema de acreditação, coordenado pelas Agências Nacionais de Acreditação (ANAs); é feita pelo ARCO-SUL, o qual estabelece critérios regionais de qualidade. Na comunidade europeia a qualidade da educação superior é chancelada pela ENQA que afirma que a excelência do ensino superior europeu é que garante a qualidade deste ensino. Para a ENQA a excelência pode ser avaliada de acordo com normas acordadas que se aplicam em toda a gama de diferentes disciplinas acadêmicas e tipos de instituições. É um conceito relativo e pode ser aplicado para refletir a variabilidade entre instituições e o contexto do estudante. Palavras-Chave: educação superior, avaliação, qualidade, ARCO-SUL, ENQA Introdução Este texto é um dos produtos da pesquisa “Avaliação, expansão e qualidade da educação superior no século XXI” em realização pelo “Observatório e pesquisa das políticas de avaliação da educação superior” (POW1)88 com apoio do CNPq e do Programa 88 Pesquisadores do POW1: José Carlos Rothen, Maria das Graças Medeiros Tavares, Adenize Costa Acioli, Ana Lucia Calbaiser da Silva, Ana Lydia Vasco de Albuquerque Peixoto, Andréia da Cunha Malheiros Santana, Andreliza Cristina de Souza, Arlete de Freitas Botelho, Camila Yuri Santana Ikuta Claudia Maffini Griboski , Dávilla Camila da Silva Correia, Fabiane Robl, Flávio Reis dos Santos Gladys Beatriz Barreyro, Ivanildo Ramos Fernandes, Ively Guimarães Abdalla, Jaime Farias, Jandernaide Resende Lemos, Joelma dos Santos Bernardes, José Vieira de Sousa, Lauro Victor Nunes, Letícia Bortolin, Lidia Ruiz Moreno Brisola, Lukelly Fernanda Amaral Gonçalves, Maria Antonieta Albuquerque de Oliveira, Maria do Carmo de Lacerda Peixoto, Otília Maria Lúcia Barbosa Seiffert, Pamela Cristina Botiglieri, Patrícia Lima Dubeux Abensur, Polyana de Castro Limeira, Regilson Maciel Borges, Sheyla Aparecida Tavares Pedrucci, Simone Fabrini Paulino ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 354 Observatório da Educação - OBEDUC nº 20346. Que é desenvolvida por pesquisadores vinculados ao Grupo de Trabalho de Políticas de Educação Superior da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (GT 11/ANPEd) e a Rede Universitas/BR. Constitui um dos sete subprojetos do “Projeto Integrado Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil a partir de 1995”, desenvolvido com o financiamento do Programa Observatório da Educação - OBEDUC nº 20346 - CAPES (2012-2016). O trabalho tem como objetivo analisar, no contexto do MERCOSUL e da Comunidade Europeia – ENQA –, a concepção de qualidade da educação superior e os atributos de qualidade preconizados por agências internacionais, ou seja, os elementos que conferem a uma instituição a qualidade educativa. O desenvolvimento do texto foi baseado em levantamento bibliográfico feito em trabalhos apresentados no XXII SEMINÁRIO NACIONAL UNIVERSITAS/Br, artigos de periódicos e publicações do ENQA disponíveis online. O conceito de qualidade no MERCOSUL No contexto da América Latina, a crescente internacionalização da educação superior, as mudanças ocorridas ao redor do chamado Pacto de Bolonha (1999) e a integração regional latino-americana, especialmente no cone sul, com o desenvolvimento do MERCOSUL Educacional têm incentivado a preocupação com a qualidade e comparabilidade de cursos e instituições de educação superior. O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) foi criado em 1991, com o Tratado de Assunção entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai e incluiu, desde o início, a educação como um aspecto de sua intenção de integração regional, com a criação de um Plano Trienal do Setor Educacional, em 1992 (BARREYRO, LAGORIA, HIZUME, 2015). Na educação superior foi criado, em 1998, O Mecanismo Experimental de Acreditação de Cursos para o reconhecimento de diplomas universitários — MEXA – que derivou nos processos de Acreditação Regional de Cursos Universitários — Arcu-SUR e na criação da Rede de Agências Nacionais de Acreditação — RANA (MERCOSUR EDUCATIVO, 2009). Stela Maria Meneghel, Suzana Funghetto, Maria do Carmo Lacerda Peixoto. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 355 O MEXA postula o reconhecimento dos diplomas de Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai, Bolívia e Chile, e estabelece parâmetros que aplicariam as agências nacionais de acreditação com a finalidade de garantir uma educação superior de qualidade (BARREYRO, LAGORIA, 2010). O MEXA insere-se no Plano Operacional do Setor Educacional do Mercosul (SEM) como política pública regional de certificação da qualidade de cursos superiores e excelência acadêmica. A partir da experiência do MEXA foi proposta a elaboração de um sistema permanente em 2006, o que dimanou na criação do Sistema de Acreditação de Cursos Universitários do Mercosul (Sistema ARCU-SUL), aprovado pela Decisão n. 17 de 2008 do Conselho Mercado Comum (MERCOSUL, 2009), nos mesmos moldes do MEXA, mas de caráter permanente. Além dos três cursos que participaram do MEXA, foram também eleitos Arquitetura, Enfermagem, Odontologia e Veterinária para o 1° Ciclo de acreditação do Sistema ARCU-SUL, iniciado em 2008 (BARREYRO, LAGORIA, HIZUME, p. 53, 2015). Não existe consenso na literatura sobre a noção de qualidade, o conceito é construído através de consensos e de negociações. Como afirma Dias Sobrinho (2003), ele é uma construção social, que varia segundo os interesses dos grupos de dentro e de fora da instituição educativa, e que reflete as características da sociedade desejada para hoje, e projetada para o futuro. Lamarra (2007), recorrendo às reflexões de Dilvo Ristoff, entende que se deve avaliar para planejar e para evoluir, visto que avaliar é uma forma de restabelecer compromissos com a sociedade; de repensarem objetivos, modos de atuação e resultados; de estudar, propor e implementar mudanças nas instituições e em seus programas. A Rede Ibero-americana para a Acreditação da Qualidade na Educação Superior (RIACES) indica o conceito de qualidade vigente nos sistemas de avaliação da educação superior da região: Grado en el que un conjunto de rasgos diferenciadores inherentes a la educación superior cumplen con una necesidad o expectativa establecida. En una definición laxa se refiere al funcionamiento ejemplar de una institución de educación superior. Propiedad de una institución o programa ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 356 que cumple los estándares previamente establecidos por una agencia u organismo de acreditación (RIACES, 2008, p.21). A qualidade da educação superior no MERCOSUL é avaliada pelo sistema de acreditação, que é coordenado pelas Agências Nacionais de Acreditação (ANAs) dos países membros originários: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Todo o processo de acreditação é coordenado internamente pelas ANAs de cada país e em âmbito regional pela organização das ANAs em uma Rede de Agências Nacionais de Acreditação (RANA). A RANA elabora suas próprias regras e adota decisões consensuais. Assim, as ANAs são a força motriz do Sistema, responsáveis desde o lançamento da convocatória para participação no processo até a emissão final de Resolução que concede ou nega a acreditação (BARREYRO, LAGORIA, HIZUME, p. 53, 2015). A maioria dos processos de avaliação da qualidade da educação superior no MERCOSUL foi motivada por normas governamentais como demonstrado no quadro a seguir, que especifica a situação na Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Quadro1 – Marcos regulatório do sistema de ensino superior e organismos nacionais criados para assegurar a qualidade. Países Marco Regulatório Do Sistema De Ensino Organismo Nacional Criado Para Superior Assegurar A Qualidade Geral Específico Denominação Funções 1-Constituição Nacional/1994 (consagra autonomia universitária). 1-Lei de Educação Superior Nº. 24.521/1995: regulamenta a educação superior universitária e não universitária; faculta ao Estado exercer as funções de controle da qualidade da educação universitária. 1-CONEAU (Comissão Nacional de Avaliação Acreditação Universitária). 1-Avaliação institucional. a ARGENTINA 2-Lei Federal de Educação Nº. 24.195/1994. 3-Lei de Educação Superior Nº. 24.521/1995 2-Resolução Ministerial Nº.1717/2004. 2-Acreditação das carreiras de graduação. 3-Acreditação das 2-Critérios de carreiras de pósavaliação da graduação. educação à 4-Autorização de distância. funcionamento das instituições universitárias privadas, nacionais e provinciais. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 357 1-Constituição Federal/1988. 1-Lei Federal Nº. 10.861/ 2004: institui o Sinaes e 2-Lei Nº. 9394/ 1996 (estabelece as cria a Conaes diretrizes e bases da Comissão Nacional Educação nacional). de Avaliação da Educação Superior, com função de coordenar e monitorar o Sinaes. SINAES (Sistema Nacional Avaliação Educação Superior). 1-Avaliação institucional. 2de Credenciamento da das carreiras de graduação. 3-Exame do ingresso à educação superior BRASIL 2-Resolução Nº. 1263/64/65 de 2004: regulamenta os processos de regulação, supervisão, credenciamento, autorização de funcionamento e reconhecimento da educação superior). 3-Portaria Ministerial Nº.1.027/2006, cria a CTAA – Comissão Técnica de Acompanhamento da Avaliação. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 358 Lei 136 Universidades 1993 de Lei 2.072 de 13 de ANEAES de fevereiro de 2003. Agência Nacional Avaliação Acreditação Ensino Superior – 1Realizar avaliações de externas de e qualidade do acadêmica das instituições de ensino superior; PARAGUAI É vinculada ao Ministério da Educação e Cultura, mas com autonomia técnica e acadêmica para desempenhar as suas funções. 2-Servir como órgão consultivo em matéria de avaliação e acreditação da Educação Superior; 3-Acreditar a qualidade acadêmica dos cursos e programas de pós-graduação que tenham sido objeto de avaliações externas da Agência; 4-Vincular-se a organismos nacionais ou estrangeiros em matéria de cooperação financeira e técnica. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 359 - Constituição da República 1-Lei Orgânica da 1-CCETP Universidad de La (Conselho República/ 1958. Consultivo de de 2-Lei 15.661 e Ensino Terceiro Grau Decreto Nº. 308/1995: criam o Privado) Avaliação acreditação instituições privadas. e de sistema 2-ANEP funcionamento de (Administração autorização e Nacional da regulação das Educação universidades e Pública) instituições universitárias privadas e o reconhecimento de seus títulos. 3-Lei 15.739: cria a ANEP. 4-Decreto Nº. 308/1995: ordena o Sistema de Ensino de Terceiro Grau Privado e cria o CCETP. URUGUAI 5-Leis 14.101 e 15.739: estabelecem o funcionamento da Comissão Coordenadora da Educação, presidida pelo Ministro da Educação e Cultura. *Adaptado de: Fernández Lamarra. Educación Superior y Calidad en América Latina y Argentina [Los Processos de Evaluación y Acreditación]. Caseros: Universidad Nacional de Tres de Febrero, 2007; Barreyro, Lagoria e Hizume. As Agências Nacionais de Acreditação no Sistema ARCU-SUL: primeiras considerações. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, v. 20, n. 1, p. 49-72, mar 2015. Segundo Barreyro, Lagoria e Hixume (2015) a acreditação de cursos tem sido um dos aspectos mais desenvolvidos desde 1996 quando começaram os trabalhos e dez anos depois, o ARCU-SUR assume essa função. Essa continuidade mostra uma firme tendência de política regional. O ARCU-SUL tem a potencialidade de estabelecer critérios regionais de qualidade e uma possível convergência dos sistemas nacionais ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 360 de avaliação da educação superior no Mercosul, apesar da diversidade dos sistemas nacionais e seus sistemas de avaliação, embora não seja prevista no ARCU-SUL a substituição das avaliações nacionais pelas regionais (BARREYRO, LAGORIA, HIZUME, 2015, p: 65). O conceito de qualidade na Comunidade Europeia No contexto da comunidade europeia, a Associação Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior – ENQA – é uma agência com administração localizada em Bruxelas, na Bélgica, e é a sucessora legal da Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior. A história desta agência retoma ao final dos anos 1990 quando procedimentos formais de garantia de qualidade começaram a se estabilizar em nível nacional. Em 19 de junho de 1999, os ministros de educação de vinte e nove estados europeus comprometeram-se com a criação e promoção da Área Europeia de Educação Superior (European Higher Education Area) – EHEA até 2010. Para isso, assinam em Bolonha (Itália) o que ficou conhecido como a Declaração de Bolonha (BOLOGNA DECLARATION, 1999); tentativa de criação de um espaço europeu de educação superior (EHEA), iniciado em 1999. Lima, Azevedo e Catani (2008, p.15) destacam que o Processo de Bolonha “tem atribuído grande protagonismo às questões relativas à ‘garantia da qualidade’”: Quanto à “garantia da qualidade” da educação superior, ela tem estado na base do lançamento de múltiplos sistemas de avaliação, conselhos e agências nacionais (dos cursos ou programas, da pesquisa, das instituições ou mesmo dos sistemas nacionais ou regionais). A regulação transnacional de tais iniciativas, até recentemente dependentes de legislação nacional corresponde, agora, a uma exigência do Processo de Bolonha e, nesse sentido, a ENQA produziu já standards e “orientações” com vista à integração dos processos de avaliação em nível europeu (LIMA; AZEVEDO; CATANI, 2008, p.16). A ideia da criação de uma associação se origina do Projeto Piloto Europeu para Avaliação da Qualidade no Ensino Superior (1994-95), que demonstrou o valor da partilha e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 361 experiência na área de garantia de qualidade em desenvolvimento. Seguindo a recomendação do Conselho (98/561/CE, de 24 de Setembro de 1998) sobre a cooperação europeia na garantia da qualidade do ensino superior e da Declaração de Bolonha de 1999, a ENQA foi criada em 2000 como a “European Network for Quality Assurance in Higher Education” (Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior) para promover a cooperação europeia em matéria de qualidade. Em 2004, a rede se transformou na Associação Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior (ENQA). A missão da ENQA é contribuir de forma significativa para a manutenção e melhoria da qualidade do ensino superior europeu em um nível elevado e para atuar como uma importante força motriz para o desenvolvimento da garantia da qualidade em todos os países signatários do pacto de Bolonha. Como uma associação das agências europeias, a ENQA contribui para esse objetivo, especialmente por meio de promoção de cooperação em matéria de garantia de qualidade (QA – quality assurance) na educação superior, a fim de desenvolver e compartilhar boas práticas de controle de qualidade e promover a dimensão europeia de QA . A integração proposta pela ENQA se faz, em grande parte, por meio de declarações que previam a promoção da cooperação europeia, por meio do desenvolvimento de critérios e metodologias comparáveis de avaliação. Mais que uma agência europeia de avaliação e acreditação, a ENQA cumpre um papel relevante na construção de uma plataforma europeia da qualidade da educação superior. A ENQA tem como principais objetivos ser reconhecida como a principal fonte de conhecimento e informação no campo da qualidade a nível europeu; desenvolver processos com instrumentos fundamentais para o aprimoramento e prestação de contas; compor as agências de garantia de qualidade em todos os países da EHEA (European Higher Education Area) para ser o mais abrangente possível, e também com a participação ativa de todos os membros. ENQA reconhece que a responsabilidade primária pela qualidade recai sobre as instituições de educação superior. A garantia de qualidade externa, para a qual as agências de controle são responsáveis, preenche uma necessidade diferente: no seu melhor combina tanto a responsabilidade para a tranquilidade do público e um objetivo quanto o papel de desenvolvimento para melhorar a qualidade nas instituições. O papel das autoridades ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 362 nacionais é definir a configuração nacional da qualidade e garantir que o sistema nacional de controle de qualidade atue em harmonia com a área de Educação Superior Europeia. Essa associação está empenhada em respeitar a aptidão para o princípio da finalidade (alinhamento, propósito, processo) que está no cerne da concepção europeia de garantia de qualidade. Considera a autonomia das instituições e a independência das agências no âmbito dos sistemas nacionais de educação superior como uma condição necessária para garantir o pleno exercício de suas responsabilidades, nomeadamente no que respeita ao fornecimento de informações precisas e consistentes para o público em geral. A ENQA também está firmemente comprometida com uma cooperação contínua com outras redes de garantia de qualidade; respeita a diversidade da educação superior europeu, de abordagens e medidas e a da definição de sistemas de garantia de qualidade nacional. Na declaração enviada para a conferência de ministros da educação europeus, reunidos em Praga em 2001, a ENQA detalha as iniciativas desenvolvidas concomitantes ao Processo de Bolonha. O grupo de acompanhamento da ENQA declara estar convencido de que a premissa básica para uma garantia da qualidade europeia é a existência de sistemas nacionais bem estabelecidos e eficazes, e relaciona fortemente a necessidade de mudança com a internacionalização. O texto apresenta ainda algumas questões e problemas para um sistema de garantia da qualidade europeia, incluindo algumas orientações de direção que uma abordagem europeia poderia tomar. São também apresentadas algumas recomendações para o próximo debate (ENQA, 2001). Em outra declaração para a conferência de ministros da educação europeia, realizada em Berlim em 2003, a Agênciaapresenta as atividades desenvolvidas desde a reunião de Praga; o reforço de sua organização, estrutura e funções; o papel futuro da associação; reforça abertura para todos os países signatários do Processo de Bolonha; o desenvolvimento de um Registro Europeu das Agências; o reforço dos critérios para a adesão a ENQA; e o lançamento de um Código de Princípios para os membros das agências da ENQA. O documento encerra reforçando o objetivo de uma cooperação europeia eficaz na perspectiva do Processo de Bolonha (ENQA, 2003). No ano de 2005, por ocasião da reunião ministerial em Bergen, a ENQA, juntamente com a EUA, EURASHE e ESIB, elabora documento contendo as Normas e Diretrizes para a Garantia da Qualidade no EHEA, solicitação dos ministros signatários do Processo de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 363 Bolonha reunidos em Berlim, no ano de 2003. É nesa reunião que este relatório será aprovado. O relatório é composto por quatro capítulos. O primeiro capítulo introdutório trata do contexto, objetivos e princípios. O segundo apresenta as normas e orientações para a garantia da qualidade interna dentro das instituições de ensino superior. O terceiro apresenta os padrões europeus para o controle externo de qualidade do ensino superior. O quarto apresenta as normas europeias para as agências externas (ENQA, 2009b). Em 2007 a ENQA envia relatório à reunião ministerial realizada em Londres, a fim de apresentar os desenvolvimentos desde a reunião ministerial de Bergen. Inicialmente trata da participação ativa da associação no Grupo E4. Em seguida relata a mudança organizacional e opiniões externas das agências membros da associação. E por fim, trata das atividades relacionadas com o Processo de Bolonha, por meio de suas oficinas e seminários. Encerra com recomendações para um futuro sistema, concentrando-se na terminologia e epistemologia da garantia de qualidade (ENQA, 2007). Em vista a conferência ministerial de Leuven/Louvain-la-Neuve, realizada em 2009, a ENQA elabora um documento de posição sobre a garantia da qualidade no EHEA. Nele concorda que a busca da excelência, transparência e prestação de contas, estão diretamente relacionadas a este processo. Reconhece o progresso que tem sido feito no desenvolvimento interno e externo de procedimentos no nível nacional. Mantém sua responsabilidade de contribuir para atingir a meta de manutenção da qualidade do ensino superior europeu a um nível elevado e está convencida que as metas fixadas no interior do âmbito do Processo de Bolonha apenas podem ser alcançadas por meio da cooperação internacional (ENQA, 2009a). Em 2010 a ENQA elabora uma declaração sobre o Relatório da Comissão Europeia para o progresso na Garantia da Qualidade. Neste texto a associação apresenta a noção desse termo na Europa e no EHEA; as normas e diretrizes no EHEA, a dimensão europeia; e a infraestrutura de garantia da qualidade (ENQA, 2010b). Em outro documento de 2010, a ENQA envia relatório para a reunião ministerial de aniversário de dez anos do Processo de Bolonha. Neste relatório são apresentados os principais resultados da linha de ação do Processo de Bolonha, as conquistas da ENQA, e os desafios para o futuro (ENQA, 2010a). Em março de 2011, a ENQA elabora documento de posição sobre a garantia da qualidade e ferramentas de transparência. O objetivo é examinar a natureza e a finalidade destas ferramentas, entre os quais se mencionam: os instrumentos de transparência Bolonha; ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 364 os rankings e os procedimentos de garantia da qualidade. São ferramentas que servem a propósitos diferentes, mas que se apoiam mutuamente, caso dos rankings, que são restritos à função de prestação de contas, e a garantia da qualidade, que servirá sempre. Ambas as abordagens se sobrepõem na função de prestação de contas e, assim, podem ser complementares (ENQA, 2011). Como resultado dos trabalhos desenvolvidos até então foram definidos critérios e diretrizes para garantir a qualidade interna e externa das instituições, bem como a das agências de acreditação. Os critérios e diretrizes para garantia da qualidade interna foram definidos como: política interna e procedimentos desse processo; aprovação, acompanhamento e revisão periódica dos programas; avaliação dos alunos; garantia da qualidade do pessoal docente (qualificação); recursos de aprendizagem e apoio ao estudante; sistemas de informação; informação pública atualizada e imparcial. Os critérios e diretrizes para garantia da qualidade externa foram definidos como: utilização de procedimentos de garantia da qualidade interna eexterna; critérios para a decisão; processos adaptados às finalidades; relatórios acessíveis; processos de monitoramento; avaliações periódicas; análise de todo o sistema. Os critérios e diretrizes das agências foram definidos como: utilização de procedimentos de garantia externa da qualidade na educação superior; classificação oficial; atividades de garantia da qualidade; recursos utilizados; missão da agência; independência e autonomia; critérios e processos de controle externos utilizados pelas agências; procedimentos de prestação de contas. Em 2012, por ocasião da conferência ministerial de Bucareste, a ENQA produz relatório em que sublinha a sua mais recente contribuição para o desenvolvimento da garantia da qualidade no EHEA, bem como suas respostas aos desafios que ainda estão pela frente. Em face disso, a associação indica sua vontade de continuar a contribuir para o desenvolvimento do EHEA e para o desenvolvimento em todos os países do EHEA. A fim de alcançar isso, a ENQA reforça a sua colaboração com os países que ainda não criaram agências, ou que estão em fase de criação (ENQA, 2012); forma um Grupo de trabalho para trabalhar com o conceito de excelência para o ensino superior europeu, o qual que se reuniu pela primeira vez em junho de 2012. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 365 Nesta reunião, o grupo definiu um programa de trabalho para identificar sobre a excelência na literatura existente e avaliar a prática atual (ENQA, 2014). Segundo a ENQA (2014) o conceito de "excelência" é bem estabelecido em muitos campos da atividade e o termo é usado frequentemente para se referir a um desempenho muito bom ou excelente. No ensino superior, o conceito significa coisas diferentes em contextos diferentes. Excelência pode ser equiparada à reputação e posição das instituições, mas depende muito da percepção da experiência do aluno e das missões de instituições que variam. Existem inúmeras definições ideais, diferentes propósitos e diferentes áreas de garantia de qualidade e participação dos interessados. O conceito é vago o suficiente para oferecer razões abundantes, tanto para pesquisa teórica e prática. Na opinião do grupo de trabalho, é importante considerar a excelência como um fenômeno social, com base em considerações teóricas e culturais, mas é o grupo também reconhece que o conceito tem aplicações práticas no contexto da gestão e do desenvolvimento tecnológico (ENQA, 2014, p. 9). O grupo chegou a um acordo sobre uma série de questões-chave para enquadrar o debate sobre excelência e fornecer alguma estrutura para um documento de trabalho. Os questionamentos acordados foram: • O que é a excelência? • Como é reconhecida atualmente? • Quais os critérios que podem ser usados para avaliar a aplicação da excelência? • Pode ser alcançado através de excelência de garantia de qualidade? • Que exemplos atuais estão lá de excelência na prática? Concluiu-se que as diferentes abordagens para a excelência servem para ilustrar os aspectos multidimensionais do conceito. Excelência pode ser identificada ao nível da instituição, o corpo docente, departamento ou membros individuais do pessoal e pode ser aplicada no contexto dos muitos papéis e funções das instituições de educacão superior. Aplica-se tanto na gestão e prestação ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 366 de serviços, bem como na experiência de funcionários e alunos em programas de intercâmbio de estudo e pesquisa. O que está claro é que a excelência é uma expectativa e um objetivo. Há um entendimento geral de que o objetivo é central para a cultura e os valores de ensino superior e impulsiona a motivação para a melhoria contínua. Os governos e as agências são um foco na excelência como um meio para melhorar a qualidade do ensino universitário e de investigação, e para a divulgação de boas práticas. Esta abordagem também incentiva a concorrência entre as instituições para o reconhecimento como centros de excelência, o que pode melhorar o seu perfil. Há uma mudança perceptível no pensamento longe de noções utilitárias da equidade e da percepção da educação superior como um "bem social" no sentido da promoção de um mercado mais competitivo para as instituições, na crença de que a competição irá melhorar os padrões e qualidade. A categorização das instituições é uma alternativa para tabelas de classificação e para o estabelecimento do status e reputação das mesmas. Isto evita o posicionamento relativo das instituições em ordem de classificação e estabelece metas para que se esforcem a se tornarem excelentes. Instituições consideradas excelentes também podem ganhar reconhecimento em um contexto internacional e demonstrar a capacidade de competir com outros países. ENQA afirma que existem diferentes elementos que constituem a definição de excelência na educação superior conforme figura 1. Figura 189. Elementos que constituem a definição de excelência na educação superior 89 Quadro referenciado na publicação ENQA, 2014, p. 21 ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 367 Segundo publicação da ENQA em 2014, o ser excelente no ensino superior pode ser interpretado como "Muito bom" ou "excepcional”. Excelência é parte de um processo, cuja competência é o ponto de partida. Por este motivo, não pode ser definida como um resultado simples. Apreende-se que o conceito de excelência consagra um aspecto de qualidade, e, de acordo com a visão tradicional, ele se vincula com a qualidade excepcional. A partir deste ponto de vista, pode ser compreendido como uma medida de qualidade de algo especial que nem sempre é alcançada. Qualidade refere-se a algo distinto e, em termos educacionais, está ligada às noções de excelência, com um padrão tão alto, que raramente é atingida; representa algo que as instituições ou estudiosos podem aspirar a atingir. Excelência é geralmente definida como uma qualidade que supera um limite em um determinado campo em particular. A noção de qualidade excepcional é vista como algo especial. De acordo com Harvey e Green (1993), existem três variações90 (ENQA, 2014, P:22): 1. Noção tradicional de qualidade: o conceito de qualidade associado à noção de distinção, de algo especial ou 'alta classe'. 2. Superação de padrões de qualidade elevados: a excelência é muitas vezes usada como sinônimo de qualidade e percebida como normas elevadas. É semelhante à visão tradicional, mas identifica o que os componentes de excelência são ao mesmo tempo em que garante que estes são quase inatingíveis. É uma abordagem elitista em que o sentido da qualidade é apenas atingido possivelmente somente em circunstâncias limitadas. 3. Analisando se os critérios de qualidade foram atingidos: Um produto de "qualidade" é aquele que passou por um conjunto de critérios de qualidade. Os critérios são baseados em indicadores de desempenho atingíveis que são projetados para rejeitar itens ‘defeituosos’. Portanto, "qualidade" é atribuída a todos os itens que satisfazem os padrões mínimos estabelecidos pelo órgão de monitoramento o que implica que a qualidade pode ser considerada como o resultado de "controle de qualidade científico". A principal conclusão a que o grupo de trabalho do ENQA chega sobre excelência é que o conceito tem a maior relevância e valor se for aplicado em um contexto com critérios 90 TRADUÇÃO DOS AUTORES ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 368 definidos. Desta forma a Excelência pode ser avaliada de acordo com normas acordadas que se aplicam em toda a gama de diferentes disciplinas acadêmicas e diferentes tipos de instituições. É um conceito relativo e pode ser aplicado para refletir a variabilidade entre instituições e o contexto do estudante. Considerações finais Este texto pretendeu descrever como o conceito de qualidade é entendido e trabalhado no âmbito do MERCOSUL e no da Comunidade Europeia. Percebe-se que na América do Sul, no contexto do MERCOSUL, a garantia da qualidade do ensino superior é dada pelo sistema de acreditação, o qual é coordenado pelas Agências Nacionais de Acreditação (ANAs) dos países membros originários: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Apesar de não haver ainda um consenso sobre a noção de qualidade, a Rede Iberoamericana para a Acreditação da Qualidade na Educação Superior (RIACES) indica o conceito de qualidade vigente nos sistemas de avaliação da educação superior da região. Este é compreendido como o grau em que um conjunto de características diferenciadoras inerentes à educação superior atende a uma necessidade ou expectativa, refere-se ainda à operação exemplar de uma instituição que atende aos padrões previamente estabelecidos por um órgão ou agência de acreditação (RIACES, 2008, p.21). A maioria dos processos de avaliação da qualidade da educação superior no MERCOSUL é derivada de normas governamentais e o ARCU-SUL é o sistema responsável pela acreditação dos cursos no âmbito do MERCOSUL. Este tem a potencialidade de estabelecer critérios regionais de qualidade e uma possível convergência dos sistemas nacionais de avaliação da educação superior desses países. Já no contexto da comunidade europeia, a qualidade da educação superior é chancelada pela Associação Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior – ENQA, criada em 1999 com o objetivo de ser reconhecida como a principal fonte de conhecimento e informação no campo da garantia da qualidade a nível europeu. Esta agência ao contrário do que ocorre no MERCOSUL já trabalha com o conceito de excelência para a educação superior europeu, o qual deve garantir a sua qualidade. Para a ENQA as diferentes abordagens para a excelência servem para ilustrar os aspectos multidimensionais do conceito. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 369 Neste sentido, a excelência pode ser identificada nos diferentes níveis da comunidade acadêmica como: instituição, corpo docente, departamento ou membros individuais do pessoal; e pode ser aplicada no contexto dos muitos papéis e funções das instituições de ensino superior. Aplica-se tanto na gestão e prestação de serviços, bem como na experiência de funcionários e alunos em programas de intercâmbio de estudo e pesquisa. Desta maneira, conclui-se que a excelência é uma expectativa e um objetivo central para a cultura e os valores de ensino superior e impulsiona a motivação para a melhoria contínua. Segundo a ENQA, os governos e as agências de controle de qualidade são um foco na excelência como um meio para melhorar a qualidade do ensino universitário e de investigação, e para a divulgação de boas práticas. Esta abordagem também incentiva a concorrência entre as instituições para o reconhecimento como centros de excelência, o que pode melhorar o seu perfil. Ao trabalhar com o conceito de excelência das instituições as tabelas de categorização e o posicionamento relativo das mesmas em ordem de classificação perde o sentido e possibilita que se estabeleçam metas para que estas se esforcem para se tornarem excelentes. Assim, o conceito de excelência consagra um aspecto de qualidade, e, de acordo com a visão tradicional, ele se vincula com a qualidade excepcional. A partir deste ponto de vista, pode ser compreendido como uma medida de qualidade de algo especial que nem sempre é alcançada. Qualidade, então, refere-se a algo distinto e, em termos educacionais, está ligada às noções de excelência, com um padrão tão alto, que raramente é atingida; representa algo que as instituições ou estudiosos podem aspirar a atingir. A excelência é geralmente definida como uma qualidade que supera um limite em um determinado campo em particular. A noção de qualidade excepcional é vista como algo especial. Podemos concluir então que o conceito de excelência tem a maior relevância e valor se for aplicado em um contexto com critérios definidos. Desta forma a excelência pode ser avaliada de acordo com normas acordadas que se aplicam em toda a gama de diferentes disciplinas acadêmicas e diferentes tipos de instituições. É um conceito relativo e pode ser aplicado para refletir a variabilidade entre instituições e o contexto do estudante. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 370 REFERÊNCIAS BARREYRO, G. B.; LAGORIA, S. L.; HIZUME, G. C. As Agências Nacionais de Acreditação no Sistema ARCU-SUL: primeiras considerações. 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ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 372 MERCOSUL EDUCATIVO. Sistema de acreditación de carreras universitarias para el reconocimiento regional de la calidad academica de sus respectivas titulaciones en el Mercosur y Estados Asociados Sistema Arcu-Sur. Manual de procedimientos. 2008. Disponível em: http://edu.mercosur.int/pt-BR/component/content/article/25-mercosul- educacional/126-premio-paulo-freire.html . Acesso em: 25/03/2015. RIACES – Rede Iberoamericana para la Acreditación de la Calidad de la Educación Superior – Glosario Internacional RIACES de Evaluación de la Calidad y Acreditación. Documento Madrid 2004. Disponível http://www.aneca.es/var/media/21717/publi_riaces_glosario_oct04.pdf. em: Acesso 25/04/2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 em: 373 EDUCAÇÃO SUPERIOR ALÉM FRONTEIRAS: IMPLICAÇÕES (NÃO) INTENCIONAIS DO PROCESSO Adriana de Lurdes Trentin Alvares [email protected] Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD Giselle Cristina Martins Real [email protected] Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD Eixo temático 3: Avaliação na expansão da educação superior RESUMO: Para acompanhar as transformações que têm ocorrido no cenário mundial, os países latinoamericanos passaram a investir significativamente no setor educacional, sobretudo, investimentos em educação superior com vistas à competitividade internacional. A expansão desse segmento educacional e o aumento da demanda tem gerado enorme preocupação com a qualidade da formação acadêmica e tornado essencial maiores investimentos em credenciamento e controle da melhoria da qualidade. Dessa forma, o surgimento de novos tipos de prestadores públicos e privados de educação tem levado os governos a implementarem políticas voltadas para assegurar o reconhecimento dos títulos e diplomas oriundos dessas IES. Assim, a partir de uma pesquisa bibliográfica e documental, o presente trabalho tem como objetivo compreender as mudanças que vêm ocorrendo no sistema educacional superior latino-americano e contribuir para as análises acerca da temática, em virtude dos incipientes estudos. Conclui-se que o aumento do número de prestadores educacionais, nos últimos anos tem gerado inquietações, em níveis nacional e internacional, já que há graves problemas relacionados com a integridade desses fornecedores, associada à qualidade da oferta acadêmica, e, sobretudo, ao reconhecimento posterior desses títulos. PALAVRAS-CHAVE: Educação superior. Expansão e demanda. Prestadores educacionais. Qualidade. Reconhecimento de títulos. INTRODUÇÃO Este trabalho analisa o movimento expansionista que vem ocorrendo na educação superior nas últimas décadas e, em especial no contexto latino-americano. Tem-se como hipótese que a necessidade dos países de se ajustarem às novas demandas da economia mundial, em decorrência da mundialização financeira (CHESNAIS, 1996), proporcionado a definição de políticas indutoras de expansão para a mesma. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 tem 374 Essas diretrizes vêm estabelecendo um novo modelo de governo educacional sujeito “as prescrições e assunções normativas do economicismo” (BALL, 2001, p. 100), que procura instaurar uma ideologia educativa em nível mundial através das políticas educacionais, vinculando educação e desenvolvimento e considerando-os vital para a inserção/permanência no contexto global. À luz destas transformações, a educação superior no espaço latino-americano, enquanto elemento essencial para integração e desenvolvimento da região (PILETTI; PRAXEDES, 1998; AZEVEDO, 2008), tem passado pela assunção de novos formatos, discursos e (re)novas práticas educativas, objetivando integrar suas funções as necessidades da sociedade, tendo como pano de fundo a produção de conhecimento que prepare/forme o capital humano para entrada no circuito da globalização (MIRANDA, 2008; LANDINELLI, 2008; DIDRIKSSON, 2008). Nesse sentido, as reformas educacionais, passaram a responder por uma maior eficiência e produtividade dos trabalhadores, a fim de que eles se adaptassem mais facilmente às exigências do mercado. Desse modo, nota-se a diminuição do investimento público na educação superior que, aliada à crescente procura por profissionais capacitados têm possibilitado uma grande expansão do sistema educacional superior privado para suprir esta lacuna (MELO; ANGELO, 2005; OLIVEIRA, 2009; SOUSA, 2010). Observa-se ainda, que à medida que os países vêm buscando seu desenvolvimento, passou-se a se requerer níveis mais elevados de educação para poder atuar nesse cenário globalizado (CASTRO; NETO, 2012). Diante disso, uma mudança percebida praticamente em todas as profissões é a movimentação e o deslocamento de pessoas de um país para outro em busca de melhores condições de vida e oportunidades de crescimento profissional. Essas necessidades formativas têm estimulado, de acordo com Knight (2009, 2012), a proliferação de novos tipos de prestadores públicos e privados de programas educacionais e provocado um crescimento da mobilidade estudantil através das fronteiras. Para Carneiro e Novaes (2009) isso representa dizer que, do ponto de vista econômico, as exigências de competitividade e produtividade passaram a imprimir um novo patamar de qualificação profissional. Diante desse fenômeno, observa-se a existência de um movimento migratório de estudantes brasileiros para instituições de educação superior estrangeiras, em especial para ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 375 países que fazem fronteira com o Brasil, como o Paraguai e a Bolívia, na busca por uma titulação (REAL, 2009, 2011; CONCEIÇÃO, 2013). Este cenário tem trazido novos desafios aos estudiosos do assunto e suscitado debates e inquietações em relação a qualidade dos cursos que tem sido oferecido nessas instituições, como também levado os governos a implementar medidas políticas para fins de reconhecimentos desses títulos. Diante disso, o presente trabalho busca compreender as mudanças que vêm ocorrendo no sistema educacional superior latino-americano e que tem apresentado um crescimento acentuado de matrículas na região nos últimos anos, como também contribuir para as análises acerca da temática, diante dos incipientes estudos. Para facilitar a exposição dos fatos, este estudo está dividido em três seções, sendo que a primeira contextualiza o processo de expansão da educação superior no contexto latinoamericano e algumas de suas causas. A segunda parte analisa a proliferação dos novos tipos de fornecedores educacionais e a instituição de políticas com enfoque nos mecanismos de avaliação e acreditação. Por fim, a título de considerações finais explicitam-se as estratégias e as dificuldades na construção do espaço latino-americano de educação superior. Educação superior no contexto latino-americano: expansão e suas causas A educação superior, no espaço latino-americano, tem passado por transformações, a partir dos anos de 1990, para enfrentar os desafios decorrentes das mudanças produtivas e dos avanços tecnológicos. Esta tendência, tem gerado alterações nas políticas educacionais, pois segundo Piletti e Praxedes (1998, p. 223), o modelo atual de educação da região tornou-se “incompatível com qualquer pretensão a competir em iguais condições num mercado mundial altamente dependente de ciência e tecnologia de ponta”. Os autores observam ainda que os países têm buscado também a adoção de indicadores educacionais “confiáveis internacionalmente” (225), que evidenciem a qualificação da mão de obra para os padrões internacionais. Desse modo, a expansão e a avaliação da educação superior passaram a constituir-se elementos centrais na política educacional dos países que compõe o Mercosul. Segundo Real (2009, p. 88), “a avaliação educacional, no contexto contemporâneo, passa a se constituir em um pressuposto de qualidade, na medida em que é capaz de mensurá-la [...]”. Para Almeida ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 376 Júnior e Catani (2009) a implementação dos processos de avaliação foram justificados como indutores da melhoria da qualidade educativa. Observa-se assim, que a avaliação vem tomando formas de centralidade na medida em que é implementada e testada. Assim sendo, uma cultura de avaliação torna-se vital para os países frente à expansão dos níveis de escolaridade e as exigências ocasionadas com o decorrer das transformações globais. Visão essa corroborada por Dias Sobrinho (2004), ao destacar que a avaliação tem assumido papel de destaque no contexto das reformas educacionais, particularmente da educação superior. Nesse sentido, destaca-se que a avaliação e o credenciamento de programas e instituições são um fenômeno recente nas universidades latino-americanas, desse modo, a preocupação com a qualidade dos serviços em educação tem se constituído num desafio para os países latino-americanos. Assim, segundo Guadilla (2010), foi a partir da década de 1990 que a América Latina passou a estabelecer de forma mais dinâmica a avaliação nos seus sistemas educacionais e este “[...] establecimiento de sistemas de evaluación y acreditación, fue la política pública más frecuente en la mayoria de los países latinoamericanos” (GUADILLA, 2010, p. 29). Pode-se observar que desde a constituição do Setor Educacional do Mercosul (SEM), na medida em que se implementam planos, ações e metas, tem havido uma convergência para implementação de políticas de regionalização com enfoque nos mecanismos de avaliação e acreditação, a fim de subsidiar a construção de um padrão de qualidade comum à educação superior dos países membros e associados ao Mercosul91. Da Luz, Melo e Angelo (2005) ressaltam que apesar das diferenças com o contexto europeu, os sistemas de educação superior da América Latina e, em especial, no âmbito do Mercosul já se defrontam com alguns temas emergentes como a mobilidade de estudantes, professores e egressos, a necessidade de um sistema compatível de créditos, a equivalência entre currículos e tempo de duração dos cursos, a 91 Para além da centralidade que os processos de avaliação da educação superior ganharam na agenda governamental das nações, a avaliação da educação superior ganha importância também na política supranacional ou regionalizada. O MEXA foi implementado em todos os países membros do MERCOSUL, inclusive junto às instituições de educação superior brasileiras, no período de 2003 a 2006, com o propósito de promover o reconhecimento recíproco de títulos de graduação universitária nos países participantes. De acordo com o MEC, o objetivo da avaliação é o de “estabelecer padrão de qualidade, com critérios acordados entre os países” (MEC, 2011). Atualmente, está em vigor o Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Caráter Universitário do MERCOSUL (ARCU-SUL), visando estabelecer e assegurar critérios regionais de qualidade de cursos de graduação para a melhoria permanente da formação em nível superior (MEC, 2011). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 377 “legibilidade” dos títulos e diplomas, a avaliação da qualidade e o credenciamento de instituições. São questões agravadas pela grande heterogeneidade dos sistemas de educação superior latino-americanos, em geral com grande rigidez curricular e submetidos à pressão do aumento crescente da demanda (DA LUZ, MELO, ANGELO, 2005, p. 08). Do mesmo modo, Krawczyk e Sandoval (2012, p. 649) destacam que diferentemente da Europa, nos países do Mercosul o debate em torno do processo de integração regional “é bastante incipiente porém já existem políticas supranacionais, governamentais e universitárias de regionalização que merecem reflexão”. Os autores acrescentam ainda, que a definição das políticas passa pela dificuldade de se obter consenso entre todos os países membros, o que atrapalha a aprovação de novas ações e o desenvolvimento de estruturas jurídicas de gestão que possibilitem a constituição de instancias regionais para acreditação. Dessa maneira, os fatores que impulsionam a instituição de políticas para avaliar e acreditar cursos para a área da educação superior perpassam pela busca de garantir as “melhores condições de empregabilidade e de competitividade regional no âmbito internacional” (KRAWCZYK; SANDOVAL, 2012, p. 652). Assim, em paralelo aos movimentos identificados no contexto mundial, a procura por um curso de educação superior no contexto dos países latino-americanos tem apresentado um crescimento acentuado nos últimos anos. Segundo relatório da UNESC0 de 2011, o número de estudantes na região, aumentou 10 vezes desde a década de 1970, elevando-se para 17,8 milhões no ano de 2007. O relatório destaca ainda que existe um crescimento acelerado de matrículas na região para esse nível de ensino. Os dados estatísticos disponibilizados pela UNESCO, informam também, que entre os anos de 1999 a 2009 houve um aumento no número das matrículas nos países que fazem parte do Mercosul, entre eles, o Paraguai e a Bolívia, e que tem se mostrado superiores aos padrões de atendimento no Brasil, a partir de 2005. Corroborando esses dados, Conceição (2013) destaca que no ano de 2004, a Bolívia atendeu 3.965,43 estudantes por cem mil habitantes, enquanto que o Paraguai, durante o ano de 2009, chegou perto desse patamar atendendo 3.813,54 alunos. Já o Brasil apresentou a menor taxa de atendimento, totalizando 3.158,47 alunos para cada cem mil habitantes no ano de 2008. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 378 Além disso, Rodriguez (2007, p. 67) ressalta que a Bolívia tem apresentado um crescimento superior aos demais países da América Latina, pois “em 1982 registrava uma matrícula de sessenta mil estudantes e no final da década chegava a aproximadamente cem mil inscritos”. Esse fenômeno também pode ser observado pelos estudos feitos por Rivarola no ano de 2008, diante da expansão paraguaia e por Ostria e Vargas no ano de 2006, perante a expansão boliviana. No que tange a expansão paraguaia, Rivarola (2008)92 apresenta dados que ratificam esse aumento diante do seu estudo sobre as instituições universitárias nesse país e o crescimento da educação superior nos últimos anos De hecho, a partir de 1990, la matricula, tanto en las instituciones públicas como privadas experimentan un ritmo de crecimiento nunca antes registrado a nivel universitario. En el ano de 2000, la matrícula de las universidades públicas ascendía a 27.374 estudiantes (45.7%), en tanto que la cantidad inscripta en las universidades privadas alcanzó un total de 32.503 alumnos que representan el 54.3%. [...], esta tendencia de crecimiento no solamente se mantiene, sino que se acelera marcadamente en la medida en que crece el número de universidades, se extiende su espacio de cobertura y a la vez se expande la enseñanza media. Por otra parte, aun cuando las universidades públicas experimentan una aceleración del crecimiento de su matrícula, es evidente que la expansión se realiza fundamentalmente por vía de las universidades privadas (RIVALORA, 2008, p. 559-560). Em relação à expansão boliviana isso não foi diferente, conforme estudo publicado por Ostrias e Vargas93, no ano de 2006, a Bolívia vem apresentando um aumento no número de matrículas a cada ano, “[...] han passado de algo más de 3.000 alumnos en 1972 a casi 7.000 en 1981, a 14.600 en 1995 y a 30.000 en 2000” (OSTRIA; VARGAS, 2006, p. 27). Os autores destacam que esse crescimento de matrículas se deve ao aumento de instituições privadas nos últimos anos, favorecidas por uma regulação estatal fraca e também pela crise no ensino superior público e a adoção de um modelo de mercado livre. En el campo de la Educación Superior, se vive una explosión de la matrícula pública, el surgimiento, crecimiento desmedido del sistema universitario 92 Segundo o autor, o Paraguai passou por uma reforma educacional na década de 1990, favorecendo dessa forma a expansão privatista para atendimento da educação superior, contudo sem um acompanhamento de processos avaliativos dessas instituições. 93 Este estudo foi desenvolvido junto ao Instituto Internacional de Educación Superior para a América Latina y Caribe (IESALC) no ano de 2006. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 379 privado, complejizando el espacio de la Educación Superior, anteriormente monopolizado por la Universidad Pública; con políticas muy débiles y con un Estado sin capacidad de interactuar efectivamente en este campo (OSTRIA; VARGAS, 2006, p. 34). Em face do exposto até aqui, observa-se que o Brasil apresenta um processo de expansão menor que os processos bolivianos e paraguaios, no entanto, a expansão da educação superior brasileira veio atrelada à preocupação com a qualidade dos cursos ofertados, o que não ocorreu com a Bolívia94 e o Paraguai95. Estes países começam a se preocupar com a qualidade dos cursos oferecidos somente a partir dos anos 2000, quando iniciam as primeiras ações para se implementar políticas de avaliação para os cursos superiores. O Brasil, no entanto, já tinha iniciado esse processo na década de 1990, quando instituiu as primeiras políticas de avaliação para cursos superiores, como o Exame Nacional de Cursos (ENC), em 1996 e em 2004, estabeleceu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) para aferir os cursos de graduação e o desempenho dos alunos. Frente a crescente expansão da educação superior nesse contexto, Real (2013, p. 06) destaca que essa superioridade das taxas de expansão paraguaia e boliviana em relação às taxas brasileiras trouxeram efeitos, especialmente, nos espaços fronteiriços entre esses países e que “incidem principalmente sobre as questões de ordem mercadológica, uma vez que a educação superior está caracterizada pela iniciativa privada nesses contextos”. Desse modo, um dos efeitos ocasionados está relacionado à crescente busca de estudantes brasileiros por instituições de educação superior nos países de fronteira, como o Paraguai e a Bolívia. Destacando-se que esse movimento não se caracteriza por mobilidade estudantil, uma vez que não é fruto de políticas indutoras por internacionalização e/ou de cooperação, como são exemplos o Programa de Mobilidade Acadêmica Regional para Cursos Acreditados96 (MARCA) e o Programa Mobilidade Mercosul97 (PMM) (REAL, 2011; CONCEIÇÃO, 2013; OLIVEIRA, 2014). No ano de 2010, ocorreu na Bolívia a sanção da Ley n° 070/2010 que instituiu a Ley de la educación “Avelino Siñani – Elizardo Pérez”, onde no Art. 68 encontra-se a menção sobre a Agencia Plurinacional de Evaluación y Acreditación de la Educación Superior Univeristaria (APEAESU). 94 95 Foi só a partir da constituição do Mercosul Educacional que o Paraguai iniciou o processo de avaliação dos cursos superiores, criando em 2003, a Agência Nacional de Evaluación y Acreditación de la Educación Superior (ANEAES) para institucionalizar a avaliação de cursos de graduação e pós-graduação no país (RIVAROLA, 2008). 96 Programa MARCA. Disponível em: www.programamarca.siu.edu.ar. Acesso em: 22 de novembro de 2013. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 380 Esse movimento, de acordo com Real (2009), pode ser explicado pela proximidade fronteiriça entre esses países e o Brasil e pelas maiores possibilidades de acesso a essas instituições, uma vez que não há processo seletivo (vestibular) e a moeda brasileira, o real, é mais valorizada em relação às demais moedas, contribuindo para que a educação privada se torne mais barata para os brasileiros nesses espaços. Nesse sentido, Real (2011) explicita que “existe um movimento de estudantes para outros países, realizado por ações próprias decorrentes da oferta de instituições privadas estrangeiras, facilitando o acesso à educação superior nesses países [...]” (p.135). Diante dessa realidade e em busca de uma inserção mais qualificada no cenário econômico e educacional, os cursos mais procurados tem sido os de pós-graduação stricto sensu e de graduação, especialmente para a carreira de medicina. Knight (2009, p. 189) observa que esse crescimento da demanda por educação superior resultou em uma diversidade de fornecedores de educação além das fronteiras nacionais, quando os mesmos são classificados em “IES tradicionais e fornecedores novos ou alternativos, os quais enfocam basicamente ensino e prestação de serviços educacionais, em geral com fins lucrativos”. Desse modo, a autora argumenta que existe uma série falta de dados sólidos sobre o volume e o tipo de programas além fronteiras e fornecedores. As instituições e os sistemas nacionais de educação têm feito grande esforço para reunir dados confiáveis sobre mobilidade estudantil, mas foi apenas nos últimos cinco anos que os países e as organizações internacionais começaram a rastrear mobilidade de programas e fornecedores. A escassez de informação sobre esses programas cria um ambiente negativo de especulação, confusão e frequentes desinformações. Isso pode ter consequências negativas em relação à confiança que as pessoas colocam na qualidade e segurança do ensino além fronteiras, e impede a necessária análise para sustentar uma política sólida e estruturas reguladoras, especialmente com fins a credenciamento (KNIGHT, 2009, p. 189). Cumpre destacar que o acesso à educação superior no Brasil ainda não foi viabilizado a todos, embora tenha ocorrido aumento no número de vagas, o mesmo foi insuficiente e mal distribuído (MCCOWAN, 2012), o que implica ainda em demanda não atendida pela educação superior, especialmente para as carreiras mais atrativas. 97 Programa de Mobilidade MERCOSUL, instituído a partir da Resolução do MERCOSUL/Grupo Mercado Comum (GMC) nº 04, de 16 de abril de 2008. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 381 Isso tem levado estudantes brasileiros a buscar esses cursos nos países vizinhos, com ênfase na carreira de medicina, o que tem produzido efeitos na política brasileira, particularmente, no que se refere ao processo de revalidação dos títulos obtidos junto às instituições de educação superior desses países. Implicações da mobilidade estudantil além fronteiras As transformações impostas pelo processo de globalização passaram a exigir pessoas extremamente capacitadas, assim, o nível de conhecimento e experiências, bem como o desenvolvimento de habilidades e competências tornaram-se condição básica para que um profissional possa se inserir, nos dias atuais, competitivamente no mercado de trabalho (CASTRO; NETO, 2012). Nesse contexto, de crescente processo de integração cultural, a internacionalização da educação se apresenta como fenômeno bastante presente no mundo contemporâneo. Desse modo, estudar no exterior passou a representar importante fator de aperfeiçoamento na formação acadêmica. Assim, diante da internacionalização da educação superior e da intensa mobilidade de docentes, pesquisadores e estudantes nos blocos regionais, na busca por uma melhor qualificação ou posição no mercado de trabalho, o reconhecimento de títulos e estudos tem se tornado uma prática comum. A questão central diante desse movimento migratório além fronteiras é o crescimento de programas educacionais e fornecedores públicos e privados de baixa qualidade. Nesses casos, Knight (2009, p. 127) alerta para os riscos potenciais desses títulos, ou seja, “não há garantias de que esses títulos terão qualidade aceitável [...]”, e que o “fornecimento sem planejamento ou monitoração desses serviços pode trazer riscos ao sistema educacional nacional”. Knight (2004) aponta, ainda, que o fenômeno da educação além fronteiras está relacionado a motivações comerciais, que se constitui, inclusive como um dos aspectos negativos desse fenômeno. Para a autora, [...] no sólo se están movilizando más personas, sino que además los programas académicos y sus provedores también están traspasando fronteras. Por oro lado, hay razones econômicas que están impulsando cada vez más ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 382 gran parte de las ofertas educativas; y esta motivación comercial es uma realidad, que se aplica tanto a provedores privados, como a algunos de los públicos (KNIGHT, 2004, p. 27). Para Küller (2010, p. 51), com a crescente oferta de produtos fronteiriços, cresce a necessidade “de se estabelecer marcos regulatórios supranacionais e comuns, tanto visando a garantia de qualidade, quanto para permitir/facilitar a circulação de pessoas e programas”. Assim, desde a criação do SEM, o qual reconhece a importância da educação como estratégia para o desenvolvimento da integração econômica e cultural da região, tem ocorrido a instituição de medidas e a implementação de reformas dos sistemas nacionais de educação superior “com vistas à comparabilidade, reconhecimento de créditos e mobilidade acadêmica entre os distintos sistemas nacionais de educação superior” (AZEVEDO, 2008, p. 875). Desse modo, pode-se observar que com a constituição do SEM, na medida em que se implementam planos, ações e metas, tem havido uma convergência para implementação de políticas de regionalização com enfoque nos mecanismos de avaliação e acreditação, a fim de subsidiar a construção de um padrão de qualidade comum à educação superior dos países membros e associados ao Mercosul. Assim, destaca-se o Mecanismo Experimental de Credenciamento (MEXA), que foi implementado de 2003 a 2006, com o propósito de promover o reconhecimento recíproco de títulos de graduação universitária nos países participantes para cursos de graduação do SEM e substituído mais tarde pelo Sistema de Acreditação Regional de Cursos de Caráter Universitário do Mercosul (ARCU-SUL), instituído pela Decisão n.17/2008, do Conselho Mercado Comum. Outra medida política decorrente dos acordos firmados no âmbito do Mercosul, é o Decreto n. 5.518/2005, que promulga o acordo de admissão de títulos e graus universitários para o exercício de atividades acadêmicas nos Estados Partes do bloco, com estruturação do processo de revalidação de títulos obtidos por brasileiros no exterior, especialmente considerando o espaço do Mercosul. Destaca-se também a criação do Espaço de Encontro Latino-americano e Caribenho de Educação Superior (ENLACES), cujo intuito é aumentar os processos de integração econômica e de competitividade no cenário global (FERREIRA; OLIVEIRA, 2010, CONCEIÇÃO, 2013), para promover a integração regional e a cooperação acadêmica. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 383 Nesse sentido, a existência de migração de estudantes brasileiros para cursos de graduação, em instituições de países fronteiriços, tem pressionado as instituições brasileiras a revalidar os títulos obtidos no âmbito dos países do Mercosul. Contudo, essa demanda pode ser considerada um efeito não esperado da política de expansão da educação superior, especialmente por haver entraves para se atestar a equivalência desses títulos e que de acordo com Lamarra (2004) seriam decorrentes de pontos incongruentes como: currículo diferenciado, políticas de avaliações distintas, normas jurídicolegais particularizadas, entre outros fatores. Com isso, alguns reveses têm sido observados nos processos de revalidação dos diplomas de educação superior, principalmente nos de medicina, devido à crescente expansão do mercado nesse setor e as políticas educacionais no âmbito dos acordos entre os países do Mercosul, e que levou o governo brasileiro a instituir um programa especifico para essa área, tendo em vista o crescente aumento no número de pedidos de revalidação nos últimos anos, no Brasil98. Nesse sentido, constata-se um crescimento dos pedidos de revalidação de títulos das instituições da Bolívia e do Paraguai, por parte dos estudantes brasileiros, e que chegou a 60,3% para o ano de 2014, ou seja, são estudantes brasileiros que fizeram o curso em instituições bolivianas e paraguaias e que depois retornam ao Brasil a fim de revalidarem seus títulos99. Ante do exposto, observam-se incongruências diante desse processo, uma vez que o crescimento da procura de candidatos para revalidação de seus títulos não atinge os resultados esperados, observado pelos baixos índices de aprovação diante do Programa REVALIDA. Desse modo, as questões envolvendo mobilidade estudantil e equivalência de títulos e estudos acabam ressaltando que as políticas implementadas para acreditação e reconhecimento das instituições de educação superior tem sido incipiente para assegurar a qualidade da educação superior, como também os esforços de cooperação e acordos comuns para a construção do espaço mercosulino de educação frente aos processos de massificação e mercantilização da educação superior. 98 Em 2011, o governo brasileiro instituiu o Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos expedidos por Instituição de Educação Superior Estrangeira (REVALIDA), por meio da Portaria Interministerial nº 278, onde “disponibiliza exame de avaliação com base em matriz referencial de correspondência curricular, com a finalidade de subsidiar os procedimentos de revalidação conduzidos por universidades públicas” (BRASIL, 2011). 99 Dados do REVALIDA de 2014. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/revalida. Acesso em: 20 de janeiro de 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 384 Considerações finais Diante da atual conjuntura, caracterizada por um mercado cada dia mais exigente com a qualificação profissional, a educação tem sido levada, especialmente a superior, a passar por um intenso processo de adequação. Esses processos de crescimento, expansão, diversificação, especialização e diferenciação dos sistemas, estimulados pela tendência da modernização produtiva e a globalização dos mercados, fizeram surgir novos cenários e modalidades de ensino. Desse modo, a globalização das economias e a propagação de um ideário mercadológico tem conduzido cada vez mais a educação e a sociedade a uma inevitável dependência, onde o objetivo maior é gerar um trabalhador competitivo, com novas habilidades e competências num aprendizado contínuo. Estamos diante de um mercado globalizado e transnacionalizado e de um novo paradigma de governo, um governo transnacional com uma concepção única de políticas diante da competitividade econômica. Desse modo, a unificação dos países em blocos foi vista como uma forma de fortalecimento diante dessas mudanças e como justificativa a necessidade de adequação das estruturas nacionais a um modelo único supranacional. Assim, a institucionalidade dos blocos, além de constituir um projeto de integração dos países, legitimou a ideia de que a educação é pressuposto para o desenvolvimento econômico. Nesse sentido, a constituição do Mercosul tem procurado estabelecer uma aliança política entre as nações baseado principalmente na integração econômica e na conformação dos seus sistemas educacionais para enfrentar os desafios decorrentes da transformação produtiva e dos avanços tecnológicos. Observa-se contudo que o Mercosul apresenta algumas limitações quanto a integração educativa, o qual aponta para pouca efetivação das políticas instituídas, e apesar dos avanços na harmonização das legislações e elaboração de planos, que tem facilitado o reconhecimento de títulos e processos de acreditação regional, estas mesmas se reduzem a poucos programas, que frente a heterogeneidade das instituições educativas tem se mostrado incipientes. Por fim, cumpre destacar que esse processo de expansão e diversificação institucional entre Brasil e os países fronteiriços tem gerado embates no sentido de se engendrar um processo convergente para a construção de um espaço latino-americano de educação, haja vista os inconvenientes que surgem dos diferentes tipos de educação pelo que passam os ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 385 estudantes que circulam por esses territórios, como as incompatibilidades no reconhecimento dos certificados, títulos e estudos de níveis de ensino diferentes. Nesse sentido, a avaliação e a acreditação têm pautado a agenda das políticas latino-americanas e se mostrado como um desafio para a garantia da qualidade nos processos de revalidação. Referências ALMEIDA JÚNIOR, V. P.; CATANI, A. M. Algumas características das políticas de acreditação e avaliação da educação superior da Colômbia: interfaces com o Brasil. Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 561-582, nov. 2009. AZEVEDO, M. L.N. A formação de espaços regionais de educação superior: um olhar meridional – para o MERCOSUL. Avaliação, Campinas, SP, v. 13, n. 3, p. 875-879, nov. 2008. BALL, S. J. Diretrizes políticas globais e relações políticas locais em educação. Currículo Sem Fronteiras, v. 1, n. 2, p. 99-116, jul./dez. 2001. BRASIL. 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RESUMO O artigo se propõe à análise crítica dos instrumentos de avaliação externa de cursos de graduação, do sistema federal de ensino superior, produzidos sob a ótica da política de avaliação determinada pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES - na intenção de extrair os atributos que identificam um curso como sendo de qualidade, na perspectiva dos indicadores oficiais determinados pelos referenciais mínimos, definidos pela Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação – SESu/MEC. Foi realizado estudo analítico dos instrumentos de avaliação de curso editados entre 2004 e 2012, para fins de reconhecimento e/ou renovação de reconhecimento. Os resultados obtidos mostram que os critérios adotados para caracterizar um curso de qualidade seriam aqueles que conseguissem satisfazer plenamente a todos os atributos das três dimensões e ainda atendessem aos requisitos legais oriundos das determinações impostas ao sistema federal de ensino. Contudo, a qualidade avaliada pelos instrumentos permite estabelecer um retrato da instituição a partir dos documentos e dos atores sociais envolvidos, para assegurar consolidação de políticas institucionais para o exercício da educação superior de qualidade acadêmica e da responsabilidade social. Palavras-chave: instrumentos de avaliação de cursos de graduação – indicadores de qualidade – ensino superior. INTRODUÇÃO A proposta de trabalho foi a de analisar criticamente os instrumentos de avaliação externa de cursos de graduação, do sistema federal de ensino superior, editados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, entre 2004 e 2012, e elaborados em colaboração entre a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior – CONAES – e a Diretoria de Estatísticas e Avaliação da Educação Superior – DEAES. As Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN -, os referenciaismínimos de qualidade definidos 100 101 Centro Universitário de Maceió – CESMAC. Endereço eletrônico: [email protected] Universidade Federal de Alagoas – UFAL. Endereço eletrônico: [email protected] ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 389 pela Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação – SESu/MEC - e os princípios e diretrizes do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES - serviram de referência para sua formulação. O objetivo foi o de extrair dos documentos os indícios que classificam um curso de graduação em relação à qualidade. Ou seja, o que identifica que um determinado curso de graduação possa ser considerado como tendo qualidade em referência aos padrões oficiais? O foco da análise foram os indicadores e/ou grupo de indicadores de cada dimensão e/ou categoria considerando apenas os conceitos que classificam cada um deles em relação à qualidade – 3 (três), 4 (quatro) e 5 (cinco). O primeiro, definido como o referencial mínimo e o último como o referencial máximo em termos de qualidade. Os conceitos 1(um) e 2 (dois), neste entendimento, foram excluídos do estudo por não serem considerados como sinalizadores de qualidade e, uma vez atribuídos aos indicadores/grupos de indicadores e dimensões/categorias, podem comprometer o conceito final do curso, rebaixando-o para um patamar inferior ao aceitável como mínimo para aprovação para fins de autorização e reconhecimento ou sua renovação. Nesta perspectiva, foram identificados os seguintes instrumentos de avaliação de curso: 06 (seis) de autorização; 07 (sete) de reconhecimento; 01 (um) de reconhecimento e renovação de reconhecimento; 02 (dois) de renovação de reconhecimento e 04 (quatro) de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento, e as respectivas portarias que lhes dão respaldo legal, editados no período de tempo 2004-2012, considerado pelo estudo. Do total de 18 instrumentos, há aqueles específicos (Quadros 1 e 2): Quadro 1- Instrumentos específicos CURSOS NATUREZA Autorização Reconhecimento Direito 2008 2009 Medicina 2010 2010 Pedagogia - 2010 Superior de 2010 2009 e 2010 Tecnologia Fonte: Elaborado pelas autoras. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 390 Desses observa-se, uma variação em relação à nomenclatura adotada nos mesmos que não apontam para cursos em especial: Quadro 2 – Instrumentos que não apontam para cursos em especial. CURSOS NATUREZA Autorização Bacharelado 2007, 2010 Reconheci Renovação de Reconhecimento e mento reconhecimen renovação to reconhecimento - - 2011 2008, 2010 2006 2012 2008, de 102 e 2009 , licenciatura 2010 Graduação Único - - Fonte: Elaborado pelas autoras. As edições de 2011 e 2012 –“cursos de bacharelado, licenciatura e superiores de tecnologia” e “cursos de graduação”, são instrumentos únicos não se distinguindo quanto à natureza ou à especificidade.No primeiro caso, tratando-se de autorização avalia-se a previsão de implementação dos aspectos referidos no Projeto Pedagógico de Curso – PPC - e demais documentos apresentados pela instituição de ensino - IES. No tocante ao reconhecimento e/ou sua renovação, considera-se se os mesmos aspectos estão devidamente institucionalizados, regulamentados e implantados. Para atender às especificidades, recorre-se ao NSA (“não se aplica”) quando o curso não se encontra em conformidade para ser pontuado na área de conhecimento e/ou modalidade em processo de avaliação. Considerando o universo acima referido, foram submetidos à análise crítica apenas os instrumentos de avaliação de curso para fins de reconhecimento e/ou renovação de reconhecimento, nomeados como “cursos de bacharelado e licenciatura” e “cursos de graduação”, por se entender serem nestas situações que se conceituam os cursos em termos de qualidade efetivada, enquanto a autorização pontuaria tão somente a potencialidade e a expectativa de qualidade a ser alcançada pela concretização das condições de implantação de um projeto pedagógico a ser desenvolvido por um corpo social, dada as condições de infraestrutura e os recursos previstos. 102 A Portaria Ministerial n.02 de 5 de janeiro de 2009 dispõe sobre o reconhecimento de cursos de bacharelado e licenciatura na modalidade presencial e traz em anexo um extrato do instrumento de avaliação. No entanto, não foi localizada cópia impressa desta edição. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 391 Não importando o regime acadêmico da IES (universidade, centro universitário ou faculdade) os cursos devem obrigatoriamente solicitar o reconhecimento por uma comissão de avaliação externa, quando cumprida entre 50 e 75% da carga horária total prevista em seu Projeto Pedagógico. Uma vez concedido, o mesmo é automaticamente renovado a cada ciclo avaliativo, caso o curso mantenha Conceito Preliminar de Curso (CPC) igual ou superior a 3 (três). A exigência de renovação de reconhecimento, por processo de avaliação externa, ocorre, caso o mesmo seja igual ou inferior a 2 (dois). Importante observar que este resulta de cálculo aritmético complexo envolvendo, entre outros indicadores, o conceito obtido pelos alunos no Exame Nacional de Desempenho do Estudante – ENADE. Infere-se, portanto, que a qualidade atestada em um determinado curso poderá ser contestada a cada ciclo avaliativo e não está na dependência apenas dos indicadores das dimensões avaliativas definidas pela CONAES e pontuadas nos instrumentos de avaliação externa de curso. Um primeiro olhar permitiu extrair dos instrumentos selecionados seus elementos estruturantes -dimensões, categorias e indicadores - e identificar os termos de escalaaplicados aos aspectos a serem avaliados. Consideraram-se, também, nas dimensões, os atributos valorizados em cada indicador. Desta feita, foi possível compor um quadro que facilitasse a análise comparativa e crítica do material, sempre em referência aos instrumentos editados em 2006. DESENVOLVIMENTO O art. 4º da Lei 10.861/2004 – Lei do SINAES dispõe que a avaliação dos cursos de graduação tem por objetivo “identificar as condições de ensino oferecidas aos estudantes, em especial as relativas ao perfil do corpo docente, as instalações físicas e a organização didático-pedagógica”. Em consonância com o dispositivo legal, as Portarias MEC – 300, de 30 de janeiro, e 563, de 21 de fevereiro de 2006, instituíram os Instrumentos de Avaliação Externa e o de Avaliação de Cursos de Graduação do SINAES, respectivamente, que passariam a disciplinar a concretização das ações propostas pela política de avaliação, conforme já expresso no documento “Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes): bases para uma nova proposta da educação superior”, e reproduzido como “Apresentação da 1ª. Edição,” na 4ª edição ampliada do livro “SINAES: da concepção à regulamentação”: ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 392 [...] Desse processo avaliativo, articulado com mecanismos regulatórios do Estado decorrem ações de fomento e medidas de natureza corretiva e planos de expansão qualificada que assegurem o desenvolvimento da Educação Superior em patamares compatíveis com metas de curto e longo prazos, de acordo com diagnósticos de necessidades nacionais e regionais, de avanço do conhecimento e de atuação acadêmico profissional (2007, p. 15). Em sua decorrência foram identificados três documentos similares103 editados em março, maio e junho do mesmo ano, com “Apresentação” do, então, Ministro da Educação, Fernando Hadad, que os definem enquanto instrumentos únicos a ser..., [...] utilizado para o reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos de Bacharelado, Licenciatura e Tecnológicos, nas modalidades presencial e a distância. Neste sentido, tem como características a abrangência e a flexibilização necessárias para assegurar avaliação fidedigna destes cursos, respeitando suas peculiaridades contempladas nas DCN de cada curso, a diversidade regional e a identidade institucional. (MEC, 2006) No mesmo texto há a preocupação em conceituar os termos: categorias, grupo de indicadores, indicadores e critérios, com a finalidade de orientar os avaliadores e as próprias IES. Neste sentido, categorias “são agrupamentos de grandes traços ou características referentes aos aspectos do curso sobre as quais se emite juízo de valor e em seu conjunto, expressam sua totalidade”. (MEC, 2006). Grupo de indicadores é “o conjunto de características comuns usadas para agrupar, com coerência e lógica, evidências da dinâmica acadêmica dos cursos”. (ibem.). Indicadores são “os aspectos (quantitativos e qualitativos) que possibilitam obterem evidências concretas que, de forma simples ou complexa, caracterizam a realidade dos múltiplos elementos institucionais que retratam”. (ibdem.). Critérios “são os padrões que servem de base para comparação, julgamento ou apreciação de um indicador”. (ibem.). A leitura atenta dos referidos instrumentos, que não se diferenciam em termos de conteúdo, permite observar que estão subsidiados por concepções e princípios de avaliação de curso no âmbito do SINAES, em relação ao Projeto Pedagógico de Curso – PPC -, ao Projeto de Desenvolvimento Institucional – PDI - e às Diretrizes Curriculares- DCN - específicas de cada área de formação profissional, bem como suas articulações. As edições de 2006 são as únicas que apresentam o esquema de uma matriz orientadora do processo avaliativo e suas categorias, expressão adotada, então, em relação às dimensões. Estruturam-se a partir de três categorias/dimensões: Organização didático pedagógica; Corpo docente, corpo discente e 103 Apenas a edição de maio apresenta um sistema de numeração de seus itens diferenciado dos demais. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 393 corpo técnico administrativo e Instalações físicas, que se organizam em grupos de indicadores (apenas em 2006), a serem avaliados através de critérios para atribuição de conceitos. As categorias/dimensões, por sua vez, possuem pesos diferenciados: 40, 35 e 25, respectivamente, enquanto que dentro da uma mesma categoria, os grupos de indicadores possuem pesos iguais.Nas edições de 2011 e 2012, a nomenclatura das dimensões foi revista passando a segunda a se denominar Corpo docente e tutorial e a terceira, Infraestrutura, assim como os pesos atribuídos: 40, 30, 30 para autorização e 30, 30, 40 para reconhecimento e sua renovação. Uma quarta dimensão - Requisitos Legais - de caráter estritamente regulatório, portanto não pontuada para a conceituação do curso, mas com indicadores de caráter obrigatório por força de leis e/ou resoluções cuja presença, no âmbito do curso, devem ser constatadas pelos avaliadores externos, foram integrados aos instrumentos de avaliação na edição de 2008. A partir de então, novas exigências legais foram sendo incorporadas em função das políticas adotadas pelo MEC. Indicadores imprescindíveis são os definidos por legislação em vigor, portanto, de caráter obrigatório. Há, outros aos quais pode ser atribuída a situação de NSA quando remetem às especificidades de determinados cursos ou modalidades. Nestes, destacam-se: a não exigência de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) para os cursos superiores de tecnologia e a da pesquisa para as faculdades e centros universitários; a comprovação da experiência de trabalho na educação básica para as licenciaturas e a formação e experiência em tutoria para os da modalidade a distância. O curso de Medicina é o que se apresenta com maiores exigências específicas em termos de aspectos a serem avaliados. Faz-se importante observar que o nível de exigências para todos os cursos é sempre crescente em relação aos aspectos descritos para serem avaliados em cada indicador. Consta, ainda, ao final de cada categoria espaço para uma análise qualitativa, presente em todas as edições, embora nem sempre com a mesma orientação. O sentido, entretanto, aponta para a sinalização de forças/potencialidades; fragilidades/pontos que requerem melhorias e recomendações. Cabe, também, apresentar os argumentos que justifiquem os conceitos atribuídos aos indicadores pelos avaliadores, ou como consta das edições de 2006, abre-se espaço para um “parecer analítico final da Comissão de Avaliação Externa” (p.89) ou para um “relato global da dimensão”, nas edições 2011 e 2012. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 394 A descrição dos instrumentos de 2006 se faz pertinente por terem servido de modelo para os demais, muito embora se evidencie a preocupação com a revisão dos mesmos no sentido de minimizar a subjetividade do olhar dos avaliadores externos. Assim, na “Apresentação” da Portaria Ministerial 1.081, de 29 de agosto de 2008, Fernando Hadad se refere à: [...] compreensão da avaliação como um processo dinâmico, que exige mediação pedagógica permanente, impõe ao Ministério da Educação a responsabilidade de rever periodicamente os seus instrumentos e procedimentos de avaliação, de modo a ajustá-los aos diferentes contextos e situação que se apresentam no cenário da educação superior e torná-los elementos balizadores da qualidade que se deseja para a graduação. (MEC, 2008, p. 7) E conclui afirmando que: Com o novo instrumento de Avaliação de Cursos de graduação o INEP está apto a implementar esta etapa do processo avaliativo integrado do SINAES, assegurando a oferta de cursos de educação superior com qualidade acadêmica e o compromisso social com o desenvolvimento do Pais. (MEC, 2008, p.7). O documento anexo à Portaria acima referida, editado em setembro de 2008, preserva as dimensões até então contempladas nos instrumentos de avaliação anteriores e explicita, apenas, o referencial mínimo de qualidade (conceito 3) a ser observado em cada um dos indicadores, sempre expresso em referência a sua adequação ao aspecto em análise. Ao final de cada dimensão abre-se o espaço para a apreciação qualitativa em termos de “Considerações sobre a dimensão”. A partir de 2009, por determinação da Portaria Ministerial 02, de 05 de janeiro, os instrumentos passam a ser disponibilizados na versão on-line no sistema e-MEC. Desta forma, os editados em dezembro de 2008, foram revisados em 2010, conservando a estrutura dos anteriores em termos de dimensões, indicadores e critérios, agora nomeados como de análise. Em 2011, foi postada, no site do INEP, uma edição dos “Instrumentos de Avaliação de Cursos de Bacharelado, Licenciatura, e Superiores de Tecnologia”, com a característica de se tratar de um documento único para atendimento às situações de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento para cursos presenciais e na modalidade à distância. Nesta perspectiva, um novo instrumento de avaliação substituiu os anteriores incorporando os cursos em suas diversas modalidades e áreas de conhecimento, resguardando as especificidades quando necessário. Mantiveram-se as mesmas dimensões, porém, com pesos diferenciados em se tratando de autorização ou reconhecimento esua renovação. Assim, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 395 para a primeira situação, a Infraestrutura passou a ter peso 40 e as demais, peso 30; para reconhecimento e renovação de reconhecimento o maior peso recai sobre a Organização didático pedagógica. Há um maior quantitativo de indicadores a serem pontuados segundo critérios de análise e o espaço para o relato global de cada dimensão. As fontes de consulta para os avaliadores externos foram acrescidas das informações prestadas pela IES no formulário eletrônico disponibilizado no sistema e-MEC. Observe-se que, por se tratar de um único instrumento servindo para todas as situações de avaliação de curso, os critérios de análise são pontuados em função de uma análise sistêmica e global da previsão (caso de autorização) ou da constatação de sua implantação e regulamentação (caso de reconhecimento/renovação de reconhecimento). Na intenção de se revisar constantemente os instrumentos, a Portaria 1.741, de 21 de dezembro de 2011 em seu Art 1º resolve: “Aprovar em extrato os indicadores do Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação nos graus de tecnólogo, de licenciatura e de bacharelado para as modalidades: presencial e a distância, anexo a esta Portaria”,dando oportunidade a que, a partir de maio de 2012, fosse inserido no site do INEP uma nova edição, mantendo as características da anterior em termos de estrutura e termos de escala. Os indicadores, entretanto,são mais explícitos em função dos aspectos a serem comprovados pelos avaliadores. Crescem, também, as exigências em relação ao curso de Medicina. Atenção especial deve ser dada na análise dos instrumentos de avaliação de curso são os termos de escala, pinçados à cada edição, que servem à comprovação da presença dos indicadores, exprimindo ideias de quantidade: não existente, insuficiente e suficiente a serem atribuídos ao conceitos 1, 2 e 3, respectivamente. Já para os conceitos 4 e 5, há sempre um viés mais tendente ao qualitativo: bom/bem e muito bom/muito bem, até o emprego dos termos “plenamente” e “excelente”, presentesa partir de 2008, esse último, de conotação claramente qualitativa. Faz-se importante, então, introduzir a discussão sobre os termos “qualidade” ou, melhor ainda, “qualidade acadêmica” em referência direta ao discurso oficial aplicado aos cursos de graduação. Em evento congregando universidades espanholas da Andaluzia, realizado em março de 2001, na Universidade de Sevilha, tal debate já pontuava que “qualidade” era condição inerente ao reconhecimento de uma instituição de ensino superior universitária e o que se almejava, então, se colocava em termos do alcance da excelência, expressa, no caso, de forma ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 396 reducionista, ao centrar atenção no nível de desenvolvimento tecnológico que a instituição apresentasse. Aceita-se como pertinente a posição acima referida em relação ao que se pontua como “qualidade”, mas seria necessário ampliar o olhar para outras dimensões, a exemplo das adotadas pela política de avaliação dos SINAES: Organização didático pedagógica, Corpo docente, corpo discente e corpo técnico administrativo/Docente e tutorial e Instalações físicas/Infraestrutura, paraa aferição da qualidade acadêmica. Seria, então, o caso de se questionar que atributos, em cada indicador das diferentes dimensões que compõem os instrumentos de avaliação, poderiam, uma vez satisfeitos os referenciais mínimos, serem pontuados em nível de qualidade acadêmica? Revisita-se, mais uma vez, os documentos oficiais para tentar identificar o que aos olhos da política educacional seriam atributos de qualidade e, em última instância, sua manifestação em grau de excelência, uma vez introduzido este termo de escala nos instrumentos de avaliação. O alcance da qualidade das ações acadêmico-administrativas dos cursos depende, portanto, do quadro docente, do corpo técnico-administrativo, dos projetos pedagógicos de cursos, além da infra-estrutura física e logística e do ambiente educacional. A exigência da qualidade comporta múltiplos aspectos e o objetivo primordial das medidas adotadas no momento da avaliação deve induzir à melhora no desempenho dos cursos. (SINAES, 2007; 96) A leitura atenta dos instrumentos facilita identificar que constatações de natureza acadêmico-administrativas poderiam permitir aferir a qualidade intrínseca a cada curso, expressas nas relações a serem estabelecidas face aos indicadores das dimensões avaliativas. Em relação à dimensão Organização didático pedagógica valoriza-se: a adequação da proposta do curso às demandas de ordem política, econômica e social considerando o contexto local e regional; a inserção e a implantação das políticas institucionais de ensino, pesquisa e extensão no âmbito do curso; a coerência entre as competências eo perfil de egresso definidos nas diretrizes curriculares da área de formação profissional do curso com os objetivos, os conteúdos curriculares e a bibliografia sugerida nas ementas das disciplinas. Atribui-se importância ainda à coerência entre a concepção metodológica expressa no PPC e as práticas de ensino e de avaliação da aprendizagem e do curso que deve prover um currículo flexível, oferecendo condições de interdisciplinaridade e enriquecido com a presença da relação teoria/prática, do estágio supervisionado, do trabalho de conclusão de curso (TCC) e ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 397 as atividades complementares, todas estas atividades acadêmicas devidamente regulamentadas e institucionalizadas. Importante observar, entretanto,em relação ao perfil do egresso, que o valor atribuído à formação para a cidadania, indicador presente nas edições de 2006, foi omitido nas demais, não sendo substituído por outro com teor semelhante ou no mesmo sentido. A dimensão Corpo docente, discente e técnico administrativo/Corpo docente e tutorial enfatiza, enquanto aspectos a serem valorizados, a atuação, participação, qualificação, compromisso e experiência profissional dos sujeitos na gestão e na docência do curso, tais como: coordenador, docentes e,a partir de 2010, os membros dos Núcleos Docentes Estruturantes – NDEs. A experiência é computada em relação à atuação docente no ensino superior, mas exigida, também, na área de formação profissional, na intenção de aferir o domínio do conhecimento do professor para além do plano meramente teórico. Neste sentido, por exemplo, nos cursos de licenciatura é cobrada aos docentes a comprovação de experiência na Educação Básica. Infere-se, pois, que a competência do professor deve ser mensurada, entre outros atributos, em um discurso qualificado, alimentado pela prática. O mesmo critério se aplica aos docentes de todas as áreas de conhecimento e modalidades de curso. Ainda, na mesma dimensão, para além destes atributos a serem avaliados, de caráter mais qualitativo, há que se observar a presença de um percentual otimizado de docentes titulados em cursos de pós-graduação stricto senso, bem como a articulação entre estes, o regime de trabalho e o quantitativo de vagas autorizadas para a oferta do curso. Quanto às Instalações físicas/Infraestrutura os requisitos são no sentido da disponibilidade aos docentes, discentes e técnicos administrativos de ambientes de estudo, de práticas e de trabalho dotadas decondições de conforto, conservação e higiene e recursos tecnológicos compatíveis com as atividades acadêmicas neles desenvolvidas, além de equipamentos específicos suficientes para a realização das atividades de práticas e pesquisa em laboratórios especializados, em conformidade com a natureza dos cursos.A intenção é comprovar se os objetivos propostos e as competências enunciadas no PPC são possíveis de se concretizar com as condições físicas presentes e disponibilizadas para viabilidade do curso. Um indicador observado com muito cuidado em relação a esta dimensão se refere ao acervo bibliográfico, a ser mensurado em perspectiva qualitativa e quantitativa. É nesta perspectiva que se retoma as palavras de Hadad ao apresentar os instrumentos de avaliação de curso no ensejo de“[...] torná-los elementos balizadores da qualidade que se ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 398 deseja para a graduação”e analisando a série histórica iniciada em 2006, elucida-se a intenção de se promover a indução de aspectos considerados importantes para o alcance da qualidade acadêmica que se almeja, pois a revisão periódica dos indicadores traduz-se na intenção de provocar o afunilamento do olhar investigativo dos avaliadores para a comprovação mais efetiva dos atributos desejáveis de serem alcançáveis. Infere-se, pois, que uma vez os cursos avaliados demonstrem ter, em sua maior parte, alcançado tais aspectos, há que se elevar o nível de exigências de forma a garantir que a qualidade seja sempre um desafio proposto pela SESu/MEC e uma meta a ser cumprida pelas IES. O emprego do termo de escala “excelência” encontra assim sua razão de ser para aplicação aos indicadores que tenham respondido para além do satisfatório às exigências requeridas em cada dimensão. A partir do momento que os termos de escala utilizados nos instrumentos de avaliação de curso do INEP se propõem a pontuar a excelência em relação aos cursos de graduação seria interessante observar o que distingue “qualidade” de “excelência” em nosso sistema de ensino superior. A adoção do termo de escala “excelência” (conceito 5) para a pontuação máxima de um indicador, pressupõe que o mesmo seja considerado não apenas como plenamente atendido em todos os aspectos exigidos pelo referencial de qualidade oficial (conceito 4), mas que se revista de efetividade e eficácia, portanto, exceda a qualidade acadêmica desejada, para situar-se em patamar mais elevado. Então, não basta satisfazer a exigência de se comprovar a presença dos aspectos referidos nos indicadores, mas de apresentá-los dotados de atributos que ultrapassem o que seria desejável em termos de qualidade acadêmica. Na mesma perspectiva, faz-se importante observar o caráter fortemente indutivo da dimensão 4 – Requisitos Legais -, determinando a adoção e a implantação das políticas educacionais uma vez devidamente regulamentadas. A exemplo, convém citar a criação do NDE, a princípio de existência restrita aos cursos de Direito e de Medicina, por força da Portaria 147, de 2007, mas informalmente cobrado aos demais cursos, até sua implantação em caráter universal pelo Parecer CONAES 01/10. O que se observa é que a exigência de se alcançar o mais elevado grau de qualidade, qual seja o de excelência, atentando às prerrogativas da indução faz com que as IES passem a compor, frente à iminência da presença de uma comissão de avaliação externa, um cenário maquiado que, em muitas das vezes, não encontra correspondência em seu fazer cotidiano, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 399 mas confirma o desejável. Assim sendo, sugere-se uma pseudoqualidade frente às diferentes realidades avaliadas. Isto é, considerar que um dado curso possui qualidade em relação aos aspectos solicitados, não significa que realmente a tenha efetivamente ainda que responda adequadamente ao desafio posto. O que se avalia, nesta circunstância, é a capacidade do curso se adequar ao modelo ideal desenhado pelo atendimento quantitativo e qualitativo aos indicadores das dimensões aos quais deve se regular. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apreender o discurso da qualidade tendo como pano de fundo a educação superior se traduz em tarefa árdua da qual já tínhamos conhecimento ao iniciarmos este trabalho. No entanto, direcionamos nosso olhar para os instrumentos de avaliação externa de cursos de graduação, editados pelo INEP, entre 2006 e 2012, para tentar extrair os atributos que conceituam um curso superior de graduação como sendo de qualidade na perspectiva do discurso oficial. O atendimento às exigências dos referenciais de qualidade oficiais em grau de plenitude ou de excelência conforme os termos de escala constantes dos instrumentos de avaliação seria se compor à imagem de um modelo ideal, abstração que não passa de um constructor referencial de atributos altamente desejáveis a serem demonstrados pelos cursos de graduação das diferentes categorias e instituições de ensino superior. Neste sentido, um curso de qualidade seria aquele que conseguisse satisfazer plenamente a todos os atributos das três dimensões e ainda atendesse aos requisitos legais oriundos das determinações impostas ao sistema federal de ensino. Vale destacar que, a qualidade também passa pela comprovação das condições de viabilizar um Projeto Pedagógico a ser implantado sob a responsabilidade de um corpo social apto a conduzir uma dinâmica acadêmica coerente e lógica dada às condições de infraestrutura e recursos disponíveis. Assim, considerando a possibilidade do alcance da qualidade que se almeja, percebese que o atendimento a este patamar se caracteriza como uma situação de exceção no cômputo geral dos conceitos atribuídos aos cursos superiores. Portanto, um curso em nível de excelência, ainda se configura como um curso oferecido por poucas IES e para poucos alunos, a confirmação desta condição revela um andar na contramão da democratização da educação ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 400 superior, política educacional tão prezada pela sociedade e tão imprescindível para o desenvolvimento político, econômico e sócio cultural do país. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004. Institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES e dá outras providências. Diário Oficial [da]República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 15 abr. 2004. Disponível em:<http://www.presidencia.gov.br>. Acesso em: 12 jan. 2015. _______. Ministério da Educação. Portaria n. 300, de 30 de janeiro de 2006.Aprova o Instrumento de Avaliação Externa de Instituições de Educação Superior do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES.Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 31 jan. 2006. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/download//superior/2006/avaliacao_institicional/Portaria_n300_ 30_01_06.pdf>. Acesso em: 12 jan. 2015. _______. Ministério da Educação. Portaria n. 563, de 21 de fevereiro de 2006.Aprova, em extrato, o Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 22 fev. 2006. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/download//superior/2006/avaliacao_institicional/portaria_MEC _563_21_2_2006.pdf>. Acesso em: 12 jan. 2015. _______. Ministério da Educação. Portaria n. 1.081, de 29 de agosto de 2008. Aprova, em extrato, o Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil , Brasília, DF, 01 set. 2008. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/download//superior/institucional/2008/Portaria_1081_29.08.200 8_inst_renovacao_rec.pdf>. Acesso em 12 jan. 2015. _______. Ministério da Educação. Portaria n. 02 de 05 de janeiro de 2009. Aprova, em extrato, o instrumento de avaliação para reconhecimento de cursos de graduação bacharelados e licenciaturas do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil , Brasília, DF, 06 jan. 2009. Disponível em:<http://www.jusbrasil.com.br/diarios/412348/pg-8-secao-1-diario-oficial-dauniao-dou-de-06-01-2009/pdfView>. Acesso em 12 jan. 2015. _______. Ministério da Educação. Portaria n.1.741, de 12 de dezembro de 2011.Aprova, em extrato, os indicadores do Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação nos graus de tecnólogo, de licenciatura e de bacharelado para as modalidades: presencial e a distância, do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES.Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 dez. 2011. Disponível em: <http://www.semesp.org.br/portal/pdfs/juridico2011/Portarias/Dez/por_1.741(12_12).pdf>. Acesso em 12 jan. 2015. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 401 BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira(INEP).Instrumento de Avaliação deCursos de Graduação, Brasília, DF, mar. 2006. Disponível em: <http://www.prograd.ufscar.br/arquivos/instrumento_avaliacao_cursos%5B1%5D.pdf>. Acesso em 12 jan. 2015. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação, Brasília, DF, maio 2006. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação, Brasília, DF, junho 2006. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação, Brasília, DF, ago. de 2008. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação presencial e a distância, maio de 2012. Disponível em:<http://download.inep.gov.br/educacao_superior/avaliacao_cursos_graduacao/instrumento s/2012/instrumento_com_alteracoes_maio_12.pdf>. Acesso em 12 jan. 2015. SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior: da concepção à regulamentação / [Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira]. – 4. ed., ampl. – Brasília : Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 402 PARÂMETROS OFICIAIS DE QUALIDADE NA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR 2003-2013104 José Carlos Rothen [email protected] UFSCar. Andreliza Cristina de Souza [email protected] UFSCar. Joelma dos Santos Bernardes [email protected]) UFSCar. Pamela Cristina Botiglieri [email protected]) UFSCar. Regilson Maciel Borges [email protected] UFSCar. Eixo temático 3: Avaliação na Expansão da Educação Superior. RESUMO Este artigo é fruto de uma pesquisa documental que buscou identificar o conceito de qualidade presente nos documentos oficiais brasileiros no período de 2003 a 2013. Foram analisados os seguintes tipos de documentos: Anais de Eventos, Decretos, Diretrizes, Estudos Técnicos, Manuais, Medidas Provisórias, Notas Técnicas, Ofícios, Portarias, Relatórios de Gestão, Resoluções e Resumos Técnicos. Para análise os usos do conceito qualidade foram organizados em cinco categorias temáticas: Qualidade como base para a fundamentação legal; Qualidade tendo como referência o projeto governamental e/ou projeto institucional; Qualidade como relevância social; Qualidade baseada em índices e indicadores; Quando a qualidade é excelência. Como resultados do estudo realizado observa-se que não existe uma definição única do que seria qualidade, mas sim uma flutuação no uso do termo. Palavras-chave: Qualidade; Avaliação da Educação Superior; SINAES. 104 O artigo é uma parte da pesquisa em desenvolvimento intitulado” Avaliação, Expansão e Qualidade da Educação Superior no século XXI”, integra o projeto “OBEDUC: Políticas de Expansão da Educação Superior no Brasil” da Rede Universitas/Br, e conta com o apoio do CNPq (Projeto Universal). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 403 INTRODUÇÃO Vemos surgindo, nas duas últimas décadas 1990 e 2000, sistemas de avaliação educacional, cujo objetivo expresso é o de garantir a qualidade da educação para uma sociedade que exige, a cada dia, maior adaptabilidade dos envolvidos para as mudanças mundiais e locais. Avaliar a educação, em particular o ensino superior, não é uma novidade que se inicia com o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), pois, ao longo das décadas de 1980, 1990 e 2000 ocorreram processos e programas de avaliação que apresentaram perspectivas, durações e implicações sociopolíticas diferentes (BARREYRO; ROTHEN, 2006; 2008). Neste contexto, o SINAES tem se configurado como uma política de Estado devido a vários fatores, em especial, ao fato de que em dias atuais é difícil prever a ausência de um sistema nacional de avaliação. Como política de Estado, o SINAES deveria ter âmbito nacional e envolver todas as IES, públicas ou privadas, grandes ou pequenas, respeitando o pacto federativo (o regime de colaboração entre o sistema federal e os estaduais), bem como a identidade e as especificidades de cada Instituição. O fato de que parte das IES estaduais e municipais não se submeterem ao regime do SINAES não anula seu caráter nacional. Com efeito, o SINAES é praticado em todos os Estados da Federação, estende-se a todo o território brasileiro, operando no sentido de consolidar a Educação Superior nacional (DIAS SOBRINHO, 2010, p.208). No decorrer do desenvolvimento do SINAES, houve instrumentos que foram modificados, aperfeiçoados e outros deixaram de existir. Isso ocorreu porque, à medida que aconteciam os processos avaliativos do Sistema, surgiam demandas de adequação à realidade das IES, de inquietações da comunidade acadêmica e de entidades representativas da sociedade civil que tinham ligação com o ensino superior. Dias Sobrinho (2010) observa que grande parte dessas mudanças favoreceram o descarte ou descumprimento de alguns dos princípios e propósitos do SINAES. Diante deste panorama procuramos, neste artigo, apresentar as transformações pelas quais passou o conceito de qualidade à luz dos documentos oficiais que tratam da avaliação da educação superior brasileira, questionando-se principalmente o significado que o termo adquiriu ao longo da vigência do SINAES. Para obtenção dos dados foi realizado um levantamento das fontes em dois bancos de dados disponíveis em suporte online: o Portal Domínio Público da Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação (MEC) e o site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Buscou-se pelos títulos dos documentos, com os seguintes descritores: “Educação Superior”, “Avaliação”, “Qualidade” e “Ensino ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 404 Superior”; prosseguida com busca que focalizou o conteúdo dos documentos disponíveis no acervo, a partir dos descritores: “Educação Superior”, “Avaliação da Educação”, “Qualidade da Educação”, “Avaliação Educacional”, “Qualidade do Ensino” e “Ensino Superior” (BOTIGLIERI; BORGES; ROTHEN, 2014). Nesse levantamento encontrou-se um total de 122 documentos, sendo que 45 tratavam sobre a temática e foram selecionados para o estudo e 27 destes foram citados neste trabalho. Por meio deste processo, emergiram cinco categorias temáticas que são: Qualidade como base para a fundamentação legal; Qualidade tendo como referência o projeto governamental e/ou projeto institucional; Qualidade como relevância social; Qualidade baseada em índices e indicadores; Quando a qualidade é excelência. Estas temáticas serão tratadas nas seções seguintes. Qualidade como base para a fundamentação legal A organização e a implantação de um novo sistema de avaliação, no início da década 2000, é fruto da mudança de governo, que se deu com a eleição, em outubro de 2002, de Luiz Inácio Lula da Silva para a presidência do Brasil. Em seu Programa de Governo é previsto a recuperação da rede pública do ensino com a valorização da qualidade, entendendo que “a educação de qualidade é fator de emancipação e cidadania, contribui para que os jovens se integrem ao mercado de trabalho e evita a fragmentação social que alimenta a violência e o crime organizado” (COLIGAÇÃO LULA PRESIDENTE, 2002, p.15). Nessa perspectiva será formulado um novo sistema de avaliação para as instituições de ensino superior. Em 2003, é criada a Comissão Especial de Avaliação (CEA), “com o objetivo de elaborar uma proposta de avaliação da educação superior em vista das críticas feitas no programa de governo de Lula ao modelo adotado pelo governo anterior” (BARREYRO; ROTHEN, 2014, p.65). No documento elaborado pela Comissão que propões o SINAES, intitulado “Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior SINAES: Bases para uma Nova Proposta da Educação Superior” (BRASIL, 2003b, p.17), reconhece-se, por exemplo, que “da Constituição de 1988 às sucessivas Medidas Provisórias, passando pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), pelo Plano Nacional de Educação (PNE) e por vários Decretos houve indiscutivelmente um progressivo reconhecimento legal da importância da Avaliação associada à ideia de melhoria da qualidade”. Destaca que a lei que cria o Conselho Nacional de Educação propõe como uma das atribuições do MEC “zelar pela qualidade do ensino”. Este mesmo documento (BRASIL, 2003) junto com o Relatório de Gestão 2003 do ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 405 INEP (INEP, 2004a) menciona que na nova LDB a necessidade dos processos de avaliação aparece direcionado à qualidade, especificamente seu artigo 9º, inciso VI, diz que é tarefa da União assegurar processo nacional de avaliação com objetivo de definir prioridades e a melhoria da qualidade do ensino. O documento Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior SINAES: Bases para uma Nova proposta da Educação Superior (BRASIL, 2003b, p.63) considera que são dois os “mais importantes critérios da qualidade da educação superior”, trata-se da “relevância da formação e da produção de conhecimentos para o desenvolvimento do conjunto da população e para o avanço da ciência, e na sua eficácia para fortalecer as preferências éticas e políticas dominantes em um determinado momento histórico”. São critérios que combinam desenvolvimento do país com a formação de cidadãos em determinada sociedade, que de certo modo corresponde com aquilo que prevê o artigo 205 da Constituição Federal ao entender a educação como “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988). O documento que apresenta a proposta do SINAES salienta ainda que cabe ao Estado supervisionar e regular a educação superior “para efeitos de planejamento e garantia de qualidade do sistema” (BRASIL, 2003, p.64). Menciona também algumas diretrizes que se apoiam em pressupostos acadêmicos e políticos, dentre as quais destaca a “valorização da missão pública no âmbito local, regional e nacional através de um sistema de avaliação que tenha como principal objetivo a melhoria da qualidade acadêmica e da gestão institucional” (BRASIL, 2003, p.8), prevendo-se, portanto, a criação de um novo sistema de avaliação da Educação Superior, que veio a se configurar com a implantação do SINAES em 2004. O Relatório de Gestão 2003 do INEP (INEP, 2004a) menciona que a Constituição Federal apresenta a educação de qualidade como um direito fundamental para todos os brasileiros. O relatório-síntese “O desafio de uma educação de qualidade para todos: educação no Brasil – 1990-2000” (INEP, 2004b) enfatiza o artigo 206, inciso VII da referida Constituição, onde a qualidade aparece como um dos princípios do ensino. Nos documentos publicados no início do SINAES, o termo qualidade está associado à ordem legal que embasa a necessidade da avaliação no contexto educacional. Em outras palavras, a qualidade é um termo sem um significado específico que justifica a realização da avaliação. No Manual do Enade (BRASIL, 2009) está expresso que o objetivo do SINAES é a melhoria da qualidade da educação e não realiza nenhuma conceituação do que vem a ser essa ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 406 melhoria da qualidade. Nessa perspectiva, a avaliação se justifica pela busca da qualidade da educação cada vez maior, em que, muitas vezes o uso da terminologia qualidade vem para sustentar a realização de avaliações em larga escala. Qualidade tendo como referência o projeto governamental e/ou projeto institucional O relatório-síntese “O desafio de uma educação de qualidade para todos: educação no Brasil – 1990-2000” (INEP, 2004b) realiza um diagnóstico sobre o quadro educacional brasileiro para a participação brasileira na 5ª Reunião Ministerial de Revisão do Programa Educação para Todos, realizada na cidade do Cairo no Egito, de 19 e 21 de dezembro de 2003. No final do documento são apresentados “os desafios para uma educação de qualidade”, sendo a qualidade definida a partir das principais metas estabelecidas no Plano Nacional de Educação – PNE (2001-2010) e dos programas do Plano Plurianual (PPA) do MEC (20042007). Com ênfase na qualidade no ensino superior são listados, por exemplo, a ampliação da oferta da educação profissional, tecnológica e da educação superior; o acesso ao ensino de graduação e pós-graduação, à pesquisa e a extensão; e a oferta de práticas pedagógicas modernas, materiais didáticos atualizados, inovação tecnológica e infraestrutura física e instrumental necessários à aprendizagem. No processo de “implantação” do sistema a CONAES irá publicar as Diretrizes para a Avaliação das Instituições de Educação Superior (BRASIL, 2004b) e o Roteiro de Autoavaliação Institucional (BRASIL, 2004c). Nas Diretrizes para a Avaliação das Instituições de Educação Superior (BRASIL, 2004b, p.10, grifo nosso) a CONAES aponta algumas diretrizes para a avaliação das instituições, sendo uma delas “comparar o projeto da IES e a sua realidade institucional, ou seja, melhorar a qualidade acadêmica significa, no contexto de cada instituição, diminuir a distância entre ambos”. Compreendendo que a qualidade acadêmica necessariamente passa por um processo avaliativo que procura garantir principalmente a qualidade acadêmica (ensino, pesquisa e extensão). O Roteiro de Autoavaliação Institucional (BRASIL, 2004c) oferece orientações e sugestões para a avaliação interna do processo de autoavaliação institucional, neste documento o termo qualidade aparece distribuído nos três núcleos (básico e comum; temas optativos; e documentação, dados e indicadores) que compõem o roteiro de autoavaliação, porém, sem maiores aprofundamentos. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 407 O Simpósio Educação Superior em Debate I, apresenta o Estudo Avaliação participativa: perspectivas e desafios (2005), no qual, há estudos que tratam da educação superior, da CPA e do SINAES, a organização é feita Dilvo Ristoff e Vicente de Paula Almeida Junior e sua editoração é realizada pelo MEC/INEP. Nesse documento é explicitado que uma das formas de atingir a qualidade educativa na instituição de ensino é por meio da avaliação interna (autoavaliação institucional), em muitos momentos é desenvolvida pela CPA. A autoavaliação possibilita conhecer com maior profundida a realidade institucional e a relevância social da avaliação, isso porque, permite que a IES se reconheça e seja reconhecida por meio da divulgação dos resultados alcançados. A partir da autoavaliação institucional desenvolvida pela CPA, é possível apontar os problemas e as deficiências para a melhoria da qualidade pedagógica e para a capacitação profissional, além de verificar e acompanhar se os objetivos propostos, as metas e o planejamento estão de acordo com o pretendido pela gestão institucional. Já na Portaria INEP nº 31, de 17 de fevereiro de 2005 (BRASIL, 2005a) ao tratar da qualidade da educação superior, está expresso que compete a Coordenação Geral de Avaliação Institucional do MEC e às Coordenações de Cursos de Graduação manter as informações de alunos, de cursos, de infraestrutura, de corpo docente, de técnicoadministrativos e entre outros atualizados para que possam ter uma série histórica de ações de melhoria da qualidade da educação superior. Cabe ainda à Coordenação Geral de Avaliação Institucional e às Coordenações de Cursos de Graduação implantar e implementar ações e procedimentos no âmbito das suas competências com o objetivo de obter a melhoria da qualidade dos processos e dos produtos relacionado à avaliação. O documento Avaliação de cursos de graduação: instrumento (BRASIL, 2006) é fruto de um trabalho coletivo entre a CONAES, a Diretoria de Estatísticas e Avaliação da Educação Superior (Deaes) do INEP. Nesse documento, está exposto que para alcançar a qualidade na educação superior necessita ter dentro da instituição ações acadêmico-administrativas, quadro docente, corpo técnico-administrativo, projeto pedagógico de curso, infraestrutura física, logística e ambiente educacional. No que tange a ação acadêmico-administrativa exige que tenha múltiplos aspectos para serem contemplados (organização didático-pedagógica, atividade de prática profissional, entre outros) e também, objetivos a serem alcançados para melhoria do desempenho do curso, conseguintemente melhoria da sua qualidade.. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 408 Qualidade como relevância social No documento Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES): Bases para uma Nova Proposta de Avaliação da Educação Superior (BRASIL, 2003b) é apresentado que a avaliação da educação superior gera a melhoria da qualidade e a responsabilidade social. Os resultados obtidos das avaliações podem promover a qualidade gerencialista ou formativa, bem como as duas concomitantemente, visto que, apesar de haver diferenças entre elas, possuem uma proximidade que é apresentar ao final do processo a melhoria daquilo que foi avaliado. A qualidade gerencialista está na perspectiva da eficiência e da produtividade. Por sua vez, a qualidade formativa está na perspectiva da produção de valores e sentido para os envolvidos. Ainda no documento é mencionado que é importante direcionar a avaliação para a produção da qualidade formativa e da produção de conhecimento. O relatório nacional O desenvolvimento da educação. Educação de qualidade para todos os jovens: desafios, tendências e prioridades (BRASIL, 2004d), preparado para a 47ª Sessão da Conferência Internacional de Educação, em Genebra na Suíça, de 8 a 11 de setembro de 2004, menciona que “a reorganização do sistema de educação superior brasileiro vai exigir a formulação de um novo sistema de avaliação”, com objetivo de “identificar as qualidades e os pontos fracos das universidades, a fim de capacitá-las a desempenhar o papel que a sociedade delas espera” (BRASIL, 2004d, p.77). O texto compreende que “a qualidade acadêmica necessita ser conjugada com relevância social e equidade” (BRASIL, 2004d, p.76). Enfatiza ainda algumas iniciativas do Governo Federal para elevar a qualidade do ensino, dentre as quais se encontram o desenvolvimento de programas nacionais de formação inicial e continuada de professores, elaboração de um novo fundo para financiar a educação básica e a utilização de tecnologias de informação e de comunicação aplicadas à educação presencial e a distância. Ainda na perspectiva social podemos atribuir à qualidade outra dimensão que se mostra presente nos documentos: a dimensão da equidade Dourado, Oliveira e Santos (2007). A qualidade entendida nesse contexto é considerada fato de promoção da equidade, com destaque para a contribuição das experiências educativas para a promoção da igualdade de oportunidades. Corroborando com essa compreensão Moacir Gadotti no documento O Mercosul Educacional e os Desafios do Século 21, apresentado no Seminário promovido pelo Setor ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 409 Educacional do Mercosul (SEM) “O Mercosul e a Educação do Século 21” e posteriormente publicado na Série documental: textos para discussão pelo INEP, o autor assegura que é missão da SEM promover um espaço educacional onde políticas educacionais promovam a integração do Mercosul, estimulem a mobilidade, intercâmbio e formação, com o objetivo de alcançar uma educação de qualidade para todos, com foco especial nos setores mais vulneráveis da sociedade, buscando a justiça social. O autor afirma que a grande oportunidade dos pobres está no acesso a uma educação de qualidade e reitera a questão da qualidade aliada à igualdade a responsabilidade social da instituição diz muito sobre sua qualidade. Qualidade baseada em índices e indicadores O documento Sistema Nacional de Avaliação e Progresso da Educação Superior: Uma nova sistemática de avaliação do Ensino Superior brasileiro (BRASIL, 2003a, p. 7) prevê a criação do Índice do Desenvolvimento do Ensino Superior (IDES), que se trata de um “salto de qualidade na avaliação realizada até aqui, e por isso será utilizado pelo MEC em suas análises, classificações e medidas regulatórias, que incluem o credenciamento e o descredenciamento de cursos e instituições”. Para aferir a contribuição dos cursos das IES à sociedade, por meio de seu desenvolvimento social, o documento indica a instituição de um indicador específico a fim de verificar “os padrões de eficiência e eficácia do modelo de gestão dessas atividades, assim como a democratização e efetiva participação da comunidade acadêmica na definição de propósitos e na administração da instituição” (BRASIL, 2003a, p. 6). Para a implantação do SINAES ocorreram embates e impasses entre diversos atores sociais, entidades representativas da sociedade civil e Estado, dentre eles, cabe destacar a atuação da CEA. Após a Comissão ter divulgado o documento Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior SINAES: Bases para uma Nova proposta da Educação Superior (BRASIL, 2003b) os veículos de comunicação reagiram com fortes embates, e mesmo dentro do próprio MEC, contra as alterações no Provão (ROTHEN; DAVID; LOPES, 2008; BARREYRO; ROTHEN, 2014). O Ministro Cristovam Buarque elaborará então uma proposta intermediária que se utiliza de instrumentos produzidos nos governos Fernando Henrique Cardoso e nas ideias propostas pelo documento do SINAES. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 410 As ideias do Ministro Cristovam Buarque encontram-se no documento Sistema Nacional de Avaliação e Progresso da Educação Superior: Uma nova sistemática de avaliação do Ensino Superior brasileiro (BRASIL, 2003a), trata-se de um documento que o ministro envia para a Câmara como proposta de nova sistemática para a avaliação da educação superior. O texto trata da criação de um sistema apoiado em quatro pilares: o processo de ensino, o processo de aprendizagem, a capacidade institucional e a responsabilidade do curso com a sociedade em geral (BRASIL, 2003a, p.2). A avaliação se encerraria com a apresentação de um Relatório de Avaliação e Progresso, cuja principal consequência seria a “indução da melhoria da qualidade dos cursos superiores, em função do conhecimento do Índice, dos indicadores parciais, da classificação dos cursos e do Protocolo de Compromissos” (BRASIL, 2003a, p.11, grifo do autor). Em dezembro de 2003, é editada a Medida Provisória nº 147 que Institui o Sistema Nacional de Avaliação e Progresso do Ensino Superior e dispõe sobre a avaliação do ensino superior (BRASIL, 2003c). A medida menciona em seu artigo 11 que cabe ao Ministério da Educação tornar público e disponível o resultado a avaliação dos cursos, e que esse resultado deveria ser reunido nos seguintes níveis: I - qualidade institucional satisfatória, II - qualidade institucional regular e III - qualidade institucional insatisfatória. Em 2004 é sancionada a Lei 10.861/04 que Institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES e dá outras providências (BRASIL, 2004a). O primeiro parágrafo do artigo 1º da lei, que apresenta as finalidades do sistema, coloca “a melhoria da qualidade da educação superior” como uma das primeiras finalidades do novo sistema de avaliação. A lei estabelecia ainda como instrumentos do sistema a avaliação institucional (autoavaliação e avaliação externa), a avaliação de cursos (in loco) e a avaliação dos estudantes (ENADE). Criava também a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (CONAES), órgão colegiado de coordenação e supervisão do SINAES. No documento As diretrizes para Avaliação das Instituições de Educação (BRASIL, 2004) é assinalado à importância da autoavaliação institucional como um indicador de melhoria da qualidade, em que, na maioria das vezes é conduzida e sistematizada pela Comissão Própria de Avaliação (CPA). A autoavaliação institucional propicia a melhoria da qualidade na educação superior, que deve estar em consonância com a responsabilidade social, pois é um juízo de valor que expressa à identidade e a diversidade institucional por meio do SINAES. A partir dos resultados da autoavaliação, são gerados indicadores de ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 411 qualidade e, em decorrência disso, acontece à prestação de contas à sociedade civil do investimento recebido e, ademais, é verificável o nível de qualidade do ensino que é ofertado pelas IES. Para que a IES obtenha uma melhora da qualidade acadêmica é importante o comprometimento dos gestores, da CPA e da comunidade com o desenvolvimento da avaliação institucional. No documento Avaliação Externa de Instituições de Educação Superior: diretrizes e instrumento (BRASIL, 2005b) ao mencionar à avaliação externa do SINAES há uma busca em extrair indicadores de qualidade de cada IES e do sistema num todo (BRASIL, 2005b). Com base nesses indicadores há uma tentativa do Estado em instituir a cultura da qualidade para que, nos processos avaliativos, haja confiança na divulgação dos resultados, como forma da prestação de contas. Cabe ressaltar que a condição valorativa da qualidade varia de organização acadêmica para outra, isso porque, cada IES tem autonomia para promover a sua qualidade acadêmica e como ela se manifestará nos resultados da avaliação do SINAES. Entretanto, há referências universais para verificar a qualidade nas diferentes organizações acadêmicas que são: “a adequação e a pertinência dos processos de formação, o rigor acadêmico e científico, a condição social, científica e cultural da produção acadêmica, a construção da cidadania e o exercício da democracia” (BRASIL, 2005b, p. 11). Fernandes et. al. (2009), no artigo publicado pelo INEP na Série Documental: textos para discussão, buscam analisar a contribuição do Conceito Preliminar de Curso (CPC) como indicador que compõe o SINAES. Para os autores, com os olhos voltados para a responsabilidade social, podemos entender que a avaliação dos cursos de graduação no Brasil tem objetivo de aferir a contribuição do curso de graduação em sua formação profissional e no mercado de trabalho (FERNANDES et al., 2009). Segundo os autores este seria um importante contributo do SINAES para garantia da qualidade, uma vez que a média obtida pelos egressos auxiliaria tanto empregadores quanto novos candidatos ao curso, pois uma boa qualidade de ensino daria prestígio ao curso. Os autores alertam que a simples comparação entre cursos e instituições não é suficiente, pois embora os critérios de qualidade emanem da sociedade, é o seu caráter regulador que define a qualidade mínima para o funcionamento de um curso. Fernandes et al. (2009) dizem que uma metodologia para se combinar diversos indicadores de resultados, insumos e processos foi desenvolvida e aplicada para avaliar a qualidade dos cursos de educação superior, uma vez que dentro do SINAES há outra medida ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 412 que pode orientar a qualidade do ensino oferecido aos estudantes, o Conceito Preliminar de Curso (CPC). “É nessa perspectiva que surge o Conceito Preliminar de Cursos (CPC). Obtido pela combinação de indicadores de qualidade já existentes, o CPC tem a função de orientar e racionalizar as avaliações in loco” (FERNANDES et al., 2009, p. 8). Os autores asseveram que o CPC tem fundamental para o SINAES: se maior que 2, o curso pode dispensar a visita e, assim, o CPC torna-se automaticamente o Conceito de Curso. Para os cursos visitados (por solicitação ou por ter o CPC inferior a 3), o Conceito de Curso é dado pelos avaliadores, mas, caso divirja do CPC, é necessário uma justificação sólida dos motivos. Com isso esperase eliminar a aparente contradição entre indicadores objetivos e os da avaliação in loco. Assim, o CPC é um indicador intermediário que viabiliza e dá consistência ao Conceito de Curso (FERNANDES et al., 2009, p.8). Sendo assim, o CPC incita maior coerência entre as avaliações in loco e os indicadores de qualidade e que “os resultados mostram que o CPC se aproxima muito do que denominamos indicador ‘ideal’” (FERNANDES et al., 2009, p. 17). O Manual dos Indicadores de Qualidade (2011d) entende que os indicadores “são medidas da qualidade dos cursos e das instituições do país” (d, p.5). Neste manual, o CPC é apontado como um dos indicadores de qualidade, sendo contemplado por meio de “notas”, que indicam “medidas relativas à qualidade do curso”. Esses componentes englobam informações a respeito da infraestrutura (Nota referente à Infraestrutura), recursos didáticopedagógicos (Nota referente à Organização Didático-Pedagógica), corpo docente (Nota de professores doutores; Nota de Professores Mestres; Nota de Professores com Regime de Dedicação Integral ou Parcial), o desempenho obtido pelos estudantes concluintes no ENADE (Nota dos Concluintes no Enade) e os resultados do Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado (IDD) (Nota do IDD) (BRASIL, 2011). Outros documentos publicados posteriormente retomarão discussões do Manual de Indicadores de Qualidade (BRASIL, 2011), caso da Nota Técnica nº 029 que define o cálculo do CPC referente ao ano de 2011 (BRASIL, 2012a), da Portaria nº 386 que reafirma o Enade, o CPC e o Índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição (IGC) como indicadores da educação superior e aponta as fontes para cálculo do ano de 2011 (BRASIL, 2012b) e do Despacho da Secretária da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres)(BRASIL, 2012c) que também trata do CPC como indicador de qualidade para os cursos. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 413 Em outro Despacho do Secretário da Seres (BRASIL, 2013) é tornado público os critérios para a revisão da medida imposta pelo despacho anterior da Seres (BRASIL, 2012c) relativo aos cursos que obtiveram resultados insatisfatórios nos CPC referentes aos anos 2008 e 2011, mas que por outro lado apresentaram tendência de melhora em seu indicadores contínuos. Neste caso, define-se que “não poderão ser revistas às medidas cautelares impostas às IES cujos cursos estejam submetidos a processos de supervisão ativos, nos quais existe penalidade ou medida cautelar já aplicada” e “também não poderão ser revistas às medidas cautelares impostas às IES cujos cursos tenham obtido resultado insatisfatório, em qualquer das dimensões, no último CC - Conceito de Curso calculado pelo INEP” (BRASIL, 2013, p.122). Quando a qualidade é excelência O Estudo Internacionalização, Gestão Democrática e Autonomia Universitária em Questão (2005), organizado por Valdemar Sguissardi, Maria Estela Dal Pai Franco e Marília Costa Morosini e editado pelo MEC/INEP apresenta uma série de textos que debatem os temas internacionalização, gestão democrática e autonomia universitária. Nesta obra mencionada, os pesquisadores Sguissard, Franco e Morosini (2005) apontam que nos principais documentos dos organismos multilaterais (Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial, Centro de Informação Bancária, Organização Mundial do Comércio) que financiam programas e projetos educacionais em países em desenvolvimento, o que realmente tem valor é que “a excelência acadêmica seja medida por critérios de qualidade nos moldes administrativo-empresariais (produto, custo/benefício)” (SGUISSARD; FRANCO; MOROSINI, 2005, p. 15). Os pesquisadores entendem que o padrão de qualidade está aos moldes de uma perspectiva gerencialista da educação, nos quais são elencados indicadores a serem seguidos pelas instituições. Em outro momento do estudo Internacionalização, gestão democrática e autonomia universitária em questão o termo excelência é posto em discussão concernente à reforma da educação superior brasileira sendo que, para que as redes de pesquisa do ensino superior alcancem nível de excelência é preciso estabelecer parceria: com instituições/grupos nacionais e internacionais, fortalecendo as bases científicas e tecnológicas do País, o que poderia aumentar a participação na comunidade científica nacional e internacional, incrementar o potencial de negociação nos fóruns internacionais e ampliar a participação no mercado internacional, preservando os ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 414 interesses nacionais, mediante a revitalização do Mercosul (SGUISSARD; FRANCO; MOROSINI, 2005, p.48). Ao tratar de mercado na educação superior, é discutida a autonomia institucional das IES, de maneira que está ligada à capacidade empreendedora de estabelecer critério de eficiência mais específico e flexível. Uma das lógicas econômicas está na eficiência dos mecanismos de avaliação do sistema universitário, para alcançar um mercado competitivo por resultados (SGUISSARD; FRANCO; MOROSINI, 2005). Por sua vez, no documento Avaliação externa de instituições de educação superior: diretrizes e instrumento (2005b) o termo excelência é indicador de qualidade ligado à infraestrutura, à instalação, ao material didático-pedagógico, à biblioteca e ao laboratório. No documento Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior SINAES: Bases para uma Nova proposta da Educação Superior (BRASIL, 2003b) ao tratar de excelência, refere-se às IES que obtiveram padrões internacionais ou se constituíram como centros de excelência. É expresso no documento que os cursos de pós-graduação avaliados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) são atribuídos notas que variam de 1 a 7, sendo que os cursos que possuem as notas 6 e 7 são considerados nível de excelência, “segundo os padrões internacionais da área” (BRASIL, 2003b, p. 49). O Manual do Enade (2005) faz menção do termo excelência referindo-se ao §10 do artigo 5º da Lei n. 10.861, que ao tratar dos estudantes que obtiveram os melhores desempenhos no ENADE, receberam como “estímulo, na forma de bolsa de estudos, ou auxílio específico, ou ainda alguma outra forma de distinção com objetivo similar, destinado a favorecer a excelência e a continuidade dos estudos, em nível de graduação ou de pósgraduação” (BRASIL, 2005c, p.51). Poderíamos inclusive afirmar que as avaliações se justificam pela busca da melhoria da qualidade rumo a excelência da educação, contudo essa é uma interpretação particular. Nos documentos analisados não encontramos essa afirmação, inclusive, um dos únicos momentos em que encontramos o termo excelência esse veio referenciar a grande dificuldade em um curso conseguir a excelência, visto que um pequeno detalhe em que a instituição não atinja a nota máxima nas avaliações pode comprometer esse diagnóstico. CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho teve por objetivo identificar o conceito de qualidade presente nos documentos oficiais elaborados no Brasil no período de 2003 a 2013. Ao findar a análise, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 415 concluímos que no discurso oficial a ênfase se encontra na melhoria da qualidade e na responsabilidade social. Cabe destacar que os parâmetros oficiais de qualidade variaram ao longo do tempo, pois houve a adoção de qualidade gerencialista voltada para eficiência, eficácia e produtividade, com também a qualidade formativa-educativa que possibilita desvelar a realidade institucional por meio da produção de valores e de sentidos para os envolvidos além da relevância social. A abrangência da qualidade perpassa, portanto, desde questões políticosociais como a expansão de oportunidades educacionais até a aferição da aprendizagem dos alunos, sua formação para a cidadania e para o mundo do trabalho. Os resultados da análise foram organizados em cinco categorias temáticas que procuraram unificar os conteúdos mais representativos. Na primeira categoria, Qualidade como base para a fundamentação legal, o termo qualidade está associado à ordem legal que embasa a necessidade da avaliação no contexto educacional, contudo não apresenta, inicialmente, uma significação específica, apenas legítima a promoção das avaliações. Nos textos que tratam da formulação e implantação de um novo sistema de avaliação para a educação superior brasileira, que se viu materializado na implantação do SINAES, isso possibilitaria ao Estado a garantia de padrões de qualidade do ensino como prevê a Constituição Federal (art. 3º, inciso IX) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (art. 3º, inciso IX). Na segunda categoria, Qualidade tendo como referência o projeto governamental e/ou projeto institucional, o termo ao longo dos anos de implantação e de desenvolvimento do SINAES houve instrumentos, roteiros e diretrizes que visaram à melhoria da qualidade. A autoavaliação institucional, conduzida pela CPA, permite conhecer a realidade institucional e a relevância social da avaliação. No que confere ao desenvolvimento de projeto governamental, tem que considerar elementos intra e extra-institucionais para analisar a situação da qualidade e então melhorá-la. Na terceira categoria, Qualidade como relevância social, o termo aparece associado à responsabilidade social das IES e equidade no âmbito da avaliação promovida pelo SINAES. A relevância social está na divulgação dos resultados, por meios dos indicadores de qualidade, para a sociedade civil, ao Estado e a comunidade acadêmica como forma de prestação de contas. Cabe destacar que os resultados da autoavaliação institucional, ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 416 desenvolvida pela CPA, é uma das formas de conhecer a realidade e a relevância social da avaliação dentro da IES, o que conduz a instituição se reconheça e seja reconhecida. Na quarta categoria, Qualidade baseada em índices e indicadores, o termo associa-se a criação dos indicadores de qualidade surgidos ao longo do período de implantação do SINAES. Isso pode ser evidenciado na criação de indicadores como o IDES que tem a finalidade de classificar, analisar e regular o credenciamento e o recredenciamento de cursos e de IES; o CPC, que na sua formulação são utilizados dados da infraestrutura, recursos didático-pedagógicos, corpo docente, além do desempenho dos estudantes que prestaram o ENADE e os resultados do IDD; e o IGC, que avalia as IES considerando a média dos CPCs, a média dos conceitos de avaliação atribuídos pela CAPES e a distribuição dos estudantes entre os níveis de ensino. Na quinta categoria, Quando a qualidade é excelência, é tida, num primeiro instante, na perspectiva gerencialista da educação, em que, são elencados indicadores a serem seguidos pelas IES. Em outro momento, a excelência é indicador de qualidade ligado à infraestrutura, à instalação, ao material didático-pedagógico, à biblioteca, aos padrões internacionais de instituição e à continuidade dos estudos para o bom resultado de desempenho de estudante. Acreditamos que a discussão sobre qualidade da educação não deve ficar restrita aos documentos e pesquisadores, mas deve transpor os limites teóricos e chegar às instituições, aos professores e envolvidos com a educação, pois, a qualidade da educação possui diversas faces que merecem ser compreendidas e exploradas para os benefícios a todos. Referências BARREYRO, Gladys Beatriz; ROTHEN, José Carlos. “SINAES” contraditórios: considerações sobre a elaboração e implantação do sistema nacional de avaliação da educação superior. Educação e Sociedade, Campinas, v. 27, n. 96 - Especial, p. 955-977, out. 2006. BARREYRO, Gladys Beatriz; ROTHEN, José Carlos. Para uma história da avaliação educação da superior brasileira: análise dos documentos do PARU, CNRES, GERES e PAIUB. Avaliação da Educação Superior, Campinas, v.13, n.1, p.131-152, mar. 2008. BARREYRO, Gladys Beatriz; ROTHEN, José Carlos. Percurso da avaliação da educação superior nos Governos Lula. Educ. Pesqui., São Paulo, v.40, n.1, p.61-76, jan./mar. 2014. ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 417 BOTIGLIERI, Pamela Cristina; BORGES, Regilson Maciel; ROTHEN, José Carlos. Documentos oficiais de avaliação: um levantamento bibliográfico (1960-2014). In: CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 22, 2014, São Carlos, SP. Anais de Eventos da UFSCar, v.10, p.1, 2014. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. BRASIL. Sistema Nacional de Avaliação e Progresso da Educação Superior: Uma nova sistemática de avaliação do Ensino Superior brasileiro. Brasília, DF: MEC, 2003a. BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior: bases para uma nova proposta de avaliação da educação superior brasileira. 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Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 420 O PAPEL DA ENQA NO PROCESSO DE GARANTIA DA QUALIDADE NO ESPAÇO EUROPEU DO ENSINO SUPERIOR105 José Carlos Rothen [email protected] UFSCar Regilson Maciel Borges [email protected] UFSCar Andreliza Cristina de Souza [email protected] UFSCar Jaime Farias [email protected] UFSCar Joelma dos Santos Bernardes [email protected] UFSCar Ana Lúcia Calbaiser da Silva [email protected] UFSCar Andréia Cunha [email protected] UEL Ana Sofía Aparicio [email protected] Maria Cristina da Silveira Galan Fernandes [email protected] UFSCar Pamela Cristina Botiglieri [email protected] UFSCar Eixo temático 3: Avaliação na expansão da educação superior O artigo é uma parte da pesquisa em desenvolvimento intitulado “Avaliação, Expansão e Qualidade da Educação Superior no século XXI”, integra o projeto “OBEDUC: Políticas de Expansão da Educação Superior no Brasil” da Rede Universitas/Br, e conta com o apoio do CNPq (Projeto Universal). ANAIS XXIII Seminário da rede Universitas/Br Políticas de Educação Superior no Brasil: a expansão privado-mercantil em questão. Belém/PA, 20 a 23 de maio de 2015 ISSN 2446-6123 105 421 RESUMO A presente investigação busca contribuir com o debate atual em torno da qualidade e seu papel na melhoria da educação. Para tanto, este texto apresent