Jornal da Casa / Casa do Brasil

Transcrição

Jornal da Casa / Casa do Brasil
# 34 – fevereiro 2014
Boca no trombone
Djavan voltou a Montevidéu
Filho de mãe lavadeira, ainda garoto a
escutava cantarolar os sucessos de Ângela
Maria e Nelson Gonçalves. Mas a música só
veio a se revelar essencial para Djavan
Caetano Viana na adolescência. O violão
aprendeu sozinho, olhando, ouvindo e
acompanhando as cifras nas revistinhas do
jornaleiro. Nesta época, ganhava a vida como
meio-de-campo no CSA.
U
m 8 de março de 1994 no extinto CineTeatro Plaza, Djavan fazia sua primeira
apresentação em Montevidéu para um
público que quase desconhecia seu trabalho.
Hoje, com mais de 20 discos de carreira e
reconhecimento nacional e internacional
como um dos medalhões da música
brasileira, ele retornou –12 de fevereiro na
Sala Adela Reta– com a tournê “Rua dos
Amores” e a mesma banda (Paulo Calasans e
Glauton Campello nos teclados, Carlos Bala
na bateria, Marcelo Mariano no baixo,
Marcelo Martins no sax, Jessé Sadox em
trompete, Torcuato Mariano na guitarra) que
o acompanhou 20 atrás.
Nascido em família pobre, em 27 de janeiro
de 1949, em Maceió (AL), Djavan poderia ter
virado raiz, mas a música mudou seu destino
e de uma flor-de-lis brotou uma carreira cuja
floração já perdura por mais de 37
primaveras. Por sua originalidade e
polinização de suas canções a única coisa
que se pode prever a cada novo trabalho de
Djavan é a sua versatilidade de tons.
Aos 18 anos, formou o conjunto Luz, Som,
Dimensão (LSD), que animava os bailes em
clubes, praias e igrejas de Maceió. No ano
seguinte, Djavan largou o futebol e passou a
dedicar-se apenas à música. Foi dedilhando o
violão que Djavan descobriu que podia
compor. Os companheiros não o entendiam
muito bem, achavam-no estranho, complexo.
Mas Djavan teve logo uma certeza, que
permanece verdadeira até hoje: gosta de
cantar, mas precisa compor. Então, em
1973, decidiu tentar a sorte no Rio de
Janeiro.
O começo, é claro, foi difícil: negro,
nordestino, sem nenhum conhecimento na
grande cidade, o que esperar? Das
desilusões iniciais, aos poucos, desejo e sina
se confundiram e foram lapidando seu
sonho.
Com a ajuda inestimável do radialista e
conterrâneo Edson Mauro, Djavan teve sua
primeira oportunidade: gravar músicas de
outros artistas para as novelas da TV Globo.
São deste período "Alegre Menina" (Jorge
Amado e Dorival Caymmi), da novela
"Gabriela"; e "Calmaria e Vendaval" (Toquinho
e Vinicius de Moraes), incluída na trilha de
"Fogo sobre Terra". Para completar o salário,
Djavan era crooner nas boates Number One
(Ipanema) e 706 (Leblon). Assim, com o
apoio de João Araújo (Presidente da Som
Livre), Djavan pôde trazer sua família (esposa
e filha) para o Rio.
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# 34 – fevereiro 2014
Mas ainda era preciso compor. A chance de
mostrar seu talento como compositor
aconteceu em 1975 com o Festival Abertura.
Conquistando o segundo lugar, sua carreira
se tornou fato consumado, pelo menos a
partir daí que o próprio Djavan considera seu
início. "Fato Consumado" virou compacto e
abriu as portas para uma nova fase em sua
vida com a gravação de seu primeiro LP, em
1976. A Voz, o violão e a arte de Djavan
inscreveu "Flor de Lis" na posteridade.
No ano seguinte, Djavan assinou contrato
com a EMI-Odeon, com quem viria a gravar
três álbuns: Djavan (1978), Alumbramento
(1980) e Seduzir (1981). O primeiro nos deu
"Serrado" e "Álibi"; o segundo, "Meu bem
querer", “Lambada de Serpente” e "A Rosa",
com Chico Buarque; e o terceiro, "Seduzir" e
"Faltando um pedaço".
Artistas, público e crítica começam, então, a
reconhecer o talento de Djavan como
compositor. Nana Caymmi gravou "Dupla
Traição"; Maria Bethânia, "Álibi" e Roberto
Carlos, "A Ilha". Gal Costa soma pontos com
sua interpretação para "Açaí" e "Faltando um
pedaço", que se tornaram as mais
executadas em todo o Brasil. Mas a maior
homenagem veio de Caetano Veloso que, ao
gravar "Sina", retribuiu o verbo "caetanear"
com "djavanear". Suas músicas podiam ser
ouvidas no rádio, em shows e em discos, e
lhe renderam o prêmio de melhor compositor
por dois anos consecutivos (81 e 82) pela
Associação Paulista dos Críticos de Arte.
Em 82, Djavan vai para a CBS (atual Sony
Music) já na categoria de artista consagrado.
Mesmo no hemisfério norte a Luz de Djavan
ganhava intensidade. Gravado nos Estados
Unidos, o álbum teve participação especial de
Stevie Wonder na faixa "Samurai”. Outros
destaques deste disco são "Sina", "Pétala" e
"Açaí". A importância que Djavan assume na
música brasileira pode ser medida através de
seus shows, que passaram de teatros para
ginásios e estúdios e da venda de seus
discos que passaram de 40 para 350 mil
cópias.
Logo após lançar Luz, Djavan dedicou cinco
meses à carreira de ator, vivendo um poeta-
mendigo que se apaixona pela moça rica
(Patrícia Pilar) em "Para viver um grande
amor" (1983), filme de Miguel Faria Jr.
Djavan tem grande interesse no cinema, mas
prefere contribuir com o que faz de melhor:
compor e cantar.
Lilás, faixa-título de seu álbum de 84, foi
executada mais de 1.300 vezes nas rádios
brasileiras, no dia de seu lançamento. Outro
sucesso deste LP foi "Esquinas", composta
em Los Angeles durante a gravação do disco.
A carreira de Djavan está consolidada
também nos EUA, graças aos inúmeros
shows e reverências de artistas do quilate de
Quincy Jones (editor de algumas de suas
músicas do lado de lá do Equador).
Quando todos pensavam saber o que viria a
seguir, o álbum Meu Lado foi gravado
inteiramente no Brasil e refletiu muitas
outras facetas de Djavan. Nele, marcam
presença a balada, o xote, o samba e a valsa,
postos lado-a-lado e mesclados pelo suingue
do cantor e compositor. Em 1987, Djavan
volta aos estúdios americanos em Não é azul
mas é mar, lançado lá fora com o título Bird
of Paradise. No Brasil, América, Europa ou
Japão, todos reconhecem a singularidade da
obra de Djavan.
Se de início achavam que deveria mudar seu
nome e que suas músicas eram muito
complicadas, o nome curto –como o da
maioria de suas músicas, aliás– traduz um
pouco sua arte: simples, sem, entretanto, ser
banal. O popular e o sofisticado se misturam
perfeitamente ao longo da sua carreira.
"Oceano", música que impulsiona o artista de
volta as paradas de sucesso do país, foi
incluída na trilha sonora da novela "Top
Model" trazendo o refinado violão flamenco
de Paco de Lucia. O hit está em mais um
álbum intitulado apenas Djavan, de 1989.
Como curiosidade, este disco apresenta duas
raridades de seu repertório: "Corisco"
(parceria com Gilberto Gil) e "Você bem Sabe"
(com Nelson Motta). Embora o ato de compor
seja mesmo solitário para ele, Djavan soube
concretizar excelentes parcerias, como as de
Aldir Blanc, Chico Buarque, Caetano Veloso,
Orlando
Moraes,
Arthur
Maia
e
Dominguinhos. (Continuará).
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Antenados
(20)14 dicas pra ver
Werneck, lhe faz uma proposta para que se
case com Maria Cecília (Letícia Colin), filha do
patrão. O motivo é que Maria Cecília foi
currada e agora precisa de um noivo, mesmo
que seja comprado. Edgard hesita, mas
aceita a proposta. A partir de então ele entra
em uma grande dúvida: deve depositar o
cheque e se casar com Maria Cecília ou ficar
com Ritinha, seu grande amor?
A
Busca (Direção: Luciano Moura)
Theo Gadelha (Wagner Moura) e Branca
(Mariana Lima) são casados e
trabalham como médicos. O casal tem um
filho, Pedro (Brás Antunes), que desaparece
quando está perto de completar 15 anos.
Para piorar a situação, Theo fica sabendo que
Branca quer se separar dele e que seu
mentor (Germano Haiut) está à beira da
morte. Theo sai em busca do filho sumido e
aproveita a viagem para se redescobrir.
Bonitinha, mas Ordinária (Moacyr Góes)
Nova adaptação da famosa peça (e filmada
três vezes) de Nelson Rodrigues (ver
JornalDaCasa #8), produzida em 2008, mas
lançada cinco anos após as filmagens.
Edgard (João Miguel) trabalha como
subalterno na empresa do milionário
Werneck (Gracindo Junior) e é apaixonado
por Ritinha (Leandra Leal), uma mulher
simples que trabalha como professora para
sustentar a mãe e suas três irmãs. Um dia
Peixoto (Leon Góes), genro e funcionário de
Casa da Mãe Joana 2 (Hugo Carvana)
Após lançar o livro "Casa da Mãe Joana",
Montanha (Antonio Pedro) está levando uma
vida tranquila como escritor de sucesso. Um
dia ele recebe um pedido de ajuda de seu
velho amigo Juca (José Wilker), que está
preso no Cafiristão e precisa urgentemente
de dinheiro para não ser enforcado.
Paralelamente, PR (Paulo Betti) segue dando
seus golpes em viúvas ricas e escolheu a
madame Pedregal (Carmem Verônica) como
seu novo alvo. Não demora muito para que
tanto Juca quanto PR se reencontrem na
mansão de Montanha, que fica muito feliz em
rever os amigos. Entretanto, o que o dono da
casa não esperava era que dona Araci (Betty
Faria), sua governante, estava tramando um
golpe para cima dele e que ele resultaria na
aparição de um fantasma gay, Zazie (Caike
Luna), que foi camareiro de Maria Antonieta
(Fabiana Karla).
Colegas (Marcelo Galvão)
Disposto a quebrar paradigmas e jogar tudo
para o alto, o diretor, produtor, editor e
roteirista Marcelo Galvão apresenta uma
aventura despretensiosa, protagonizada por
um trio de atores portadores da Síndrome de
Down. Stallone (Ariel Goldenberg), Aninha
(Rita Pook) e Márcio (Breno Viola) eram
grandes amigos e viviam juntos em um
instituto para portadores dessa síndrome, ao
lado de vários outros colegas. Um belo dia
surge a ideia de sair dali para realizar o
sonho individual de cada um e inspirados
pelos inúmeros filmes que já tinham assistido
na videoteca local, eles roubam o carro do
jardineiro (Lima Duarte) e fogem de lá. A
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imprensa começa a cobrir o caso e a polícia
não gostou nem um pouco dessa
"brincadeira". Para resolver o problema,
coloca dois policiais trapalhões no encalço
dos jovens, que só querem realizar os seus
sonhos e estão dispostos a viver essa grande
aventura, que vai se revelar repleta de
momentos inesquecíveis.
Disparos (Juliana Reis)
O filme foge do velho clichê do mocinho
contra bandido para trazer a história de um
embate moral. De um lado, o fotógrafo
arrogante (Gustavo Machado) que foi vítima
de assalto. Do outro, o policial (Sílvio
Guindane) que prolonga a investigação ao
máximo como resposta ao nariz empinado do
primeiro. É a partir deste conflito, sem uma
única bala ser disparada –o título é uma
referência ao disparo das máquinas
fotográficas e também uma certa piada em
torno da abordagem do tema principal–, que
o longa-metragem é apresentado.
Elena (Petra Costa)
Ao viajar para Nova York, Elena segue o
sonho de se tornar atriz de cinema e deixa no
Brasil uma infância vivida na clandestinidade,
devido à ditadura militar implantada no país,
e também a irmã mais nova, Petra, de
apenas sete anos. Duas décadas depois,
Petra, já atriz, embarca para Nova York atrás
da irmã. Em sua busca Petra apenas tem
algumas pistas, como cartas, diários e filmes
caseiros. Ela acaba percorrendo os passos da
irmã até encontrá-la em um lugar inesperado.
Flores Raras (Bruno Barreto)
1951, Nova York. Elizabeth Bishop (Miranda
Otto) é uma poetisa insegura e tímida, que
apenas se sente à vontade ao narrar seus
versos para o amigo Robert Lowell (Treat
Williams). Em busca de algo que a motive, ela
resolve partir para o Rio de Janeiro e passar
uns dias na casa de uma colega de
faculdade, Mary (Tracy Middendorf), que vive
com a arquiteta brasileira Lota de Macedo
Soares (Glória Pires). A princípio Elizabeth e
Lota não se dão bem, mas logo se apaixonam
uma pela outra. É o início de um romance
acompanhado bem de perto por Mary, já que
ela aceita a proposta de Lota para que
adotem uma filha.
Mato sem Cachorro (Pedro Amorim)
Deco (Bruno Gagliasso) vive jogado no sofá
de sua casa, apesar de ter bastante talento
com a música. Um dia, ele encontra dois
grandes amores de uma só vez: a radialista
Zoé (Leandra Leal) e o cachorro Guto, que
desmaia toda vez que fica muito animado.
Não demora muito para que o trio viva como
se fosse uma família. Só que, dois anos
depois, Zoé termina o namoro, fica com a
guarda de Guto e ainda por cima arranja um
novo namorado (Enrique Diaz). Motivos mais
do que suficientes para que Deco fique
revoltado e prepare uma vingança,
sequestrar Guto. Para tanto, ele conta com a
ajuda de seu primo Leléo (Danilo Gentili).
Meu Passado me Condena (Julia Rezende)
Quando Fábio (Fábio Porchat) e Miá (Miá
Mello) se encontram, é amor à primeira vista.
Eles se casam um mês depois de se
conhecerem e decidem viajar à Europa em
um cruzeiro em lua de mel. Só que, durante a
viagem, eles encontram seus antigos
namorados, Beto (Alejandro Claveaux) e
Laura (Juliana Didone), que hoje estão juntos
e também passam sua lua de mel.
Meu Pé de Laranja Lima (Marcos Bernstein)
Zezé (João Guilherme de Ávila) tem quase
oito anos e vive com sua família pobre no
interior. Ele é sensível, precoce, um contador
de histórias. Seu esporte favorito é
transformar sua casa e a vizinhança em
cenário para suas traquinagens. E elas não
são poucas. Seu refúgio preferido é um pé de
laranja lima, que fica no quintal de sua casa.
É com ele que desabafa as coisas ruins que
lhe acontecem, que comemora uma boa
novidade ou com quem divide suas
travessuras secretas. Até que, um dia,
conhece Portuga (José de Abreu), um senhor
que passa a ajudá-lo e logo se torna seu
melhor amigo. Uma história de amor e
amizade tão tocante quanto o mais
improvável dos encontros. Baseado no
clássico romance juvenil, escrito por José
Mauro de Vasconcelos e publicado em 1968,
que marcou gerações de crianças. Não
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apenas por retratar o lado imaginativo em
uma vida dura, mas especialmente por
abordar a questão da morte dentro do
imaginário infantil.
O Concurso (Pedro Vasconcelos)
O gaúcho Rogério Carlos (Fábio Porchat), o
paulista Bernardinho (Rodrigo Pandolfo) e o
cearense Freitas (Anderson Di Rizzi)
conseguiram se dar bem em um concurso
público para se tornar juiz, mas ainda falta
uma última etapa, que será realizada no Rio
de Janeiro. Para isso, os três viajam para a
Cidade Maravilhosa e lá encontram o quarto
candidato, Caio (Danton Mello), um carioca
que acaba colocando todos numa tremenda
enrascada por conta da ideia de conseguir o
gabarito faltando menos de 48 horas para o
dia D. Para isso dar certo, todos precisarão
lidar com a bandidagem e um deles acaba
encontrando uma antiga namoradinha
(Sabrina Sato) dos tempos da juventude. Aí, a
confusão só aumenta e o dia da prova está
chegando. Será que eles vão conseguir se
dar bem?
O Tempo e o Vento (Jayme Monjardim)
Rio Grande do Sul, final do século XIX. As
família Amaral e Terra-Cambará são inimigas
históricas na cidade de Santa Fé. Quando o
sobrado dos Terra-Cambará é cercado pelos
Amaral, todos os integrantes da família são
obrigados a defender o local com as armas
que têm à disposição. Esta vigília dura vários
dias, o que faz com que logo a comida
escasseie. Entre eles está Bibiana (Fernanda
Montenegro), matriarca da família que recebe
a visita de seu falecido esposo, o capitão
Rodrigo (Thiago Lacerda). Juntos eles
relembram a história não apenas de seu
amor, mas de como nasceu a própria família
Terra-Cambará. Baseado na série literária do
escritor Érico Veríssimo (ver JornalDaCasa
#9), sob o ponto de vista da luta entre essas
duas famílias, o filme retrata a formação do
Rio Grande do Sul, a povoação do território
brasileiro e a demarcação de suas fronteiras,
forjada a ferro e espada pelas disputadas
entre as coroas portuguesa e espanhola.
Odeio o Dia dos Namorados (Roberto
Santucci)
Débora (Heloísa Périssé) é uma publicitária
que sempre privilegiou a carreira em
detrimento de sua vida amorosa. Entretanto,
ambas se misturam quando ela precisa
trabalhar em uma importante campanha para
o Dia dos Namorados cujo cliente é Heitor
(Daniel Boaventura), seu ex-namorado, que
foi dispensado por ela de forma humilhante.
Diante desta situação, ela ainda precisa lidar
com a inesperada visita do fantasma de seu
amigo Gilberto (Marcelo Saback), que tenta
fazer com que ela repense a vida e descubra
o que as pessoas realmente pensam dela.
Serra Pelada (Heitor Dhalia)
1980. Juliano (Juliano Cazarré) e Joaquim
(Júlio Andrade) são grandes amigos que
ficam empolgados ao tomar conhecimento de
Serra Pelada, o maior garimpo a céu aberto
do mundo, localizado no estado do Pará. A
dupla resolve deixar São Paulo e partir para o
local, sonhando com a riqueza. Só que, pouco
após chegarem, tudo muda na vida deles:
Juliano se torna um gângster, enquanto que
Joaquim deixa para trás os valores que
sempre prezou.
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Ao pé da letra
Sampa
T
ido por muitos paulistanos como o mais
belo hino à sua terra e integrante
obrigatória dos shows que Caetano
Veloso (ver JornalDaCasa #27) faz na cidade
de São Paulo, Sampa foi composta a partir de
um pedido da TV Bandeirantes. Em 1978, o
canal faria um programa sobre a capital
paulista, e o produtor Roberto de Oliveira
pediu um depoimento a Caetano. O
compositor respondeu com uma canção,
posteriormente lançada no disco Muito. Em
Sampa, Caetano relata suas primeiras
impressões ao conhecer a cidade, na década
de 1960. Nascido em 1942, na Bahia,
Caetano instalou-se na década de 1960 em
São Paulo em companhia de seus
companheiros de movimento tropicalista. A
relação com a cidade começava aí.
A letra de Sampa combina diferentes
referências à cidade e à cultura que se
desenvolvia no centro urbano. Revela a
aversão inicial do compositor, que vai se
transformando em afeição: o que primeiro
chama de mau gosto se torna atração pela
dinâmica multiplicidade da metrópole. O
retrato feito por Caetano reúne vilas e
favelas, dinheiro e fumaça, diferentes
correntes artísticas e de pensamento, como o
rock/pop nacional, representado por Rita Lee
e Os Mutantes, ao lado da vanguarda
concretista dos irmãos Augusto e Haroldo de
Campos. A frase de Ronda, de Paulo Vanzolini
(ver JornalDaCasa #27): “Que só quando
cruza a Ipiranga e a avenida São João”, é
citada por Caetano como homenagem, mas
foi entendida por Vanzolini como plágio.
Alguma coisa acontece no meu coração
Que só quando cruza a Ipiranga e a avenida São
João
É que quando eu cheguei por aqui eu nada entendi
Da dura poesia concreta de tuas esquinas
Da deselegância discreta de tuas meninas
Ainda não havia para mim Rita Lee
A tua mais completa tradução
Alguma coisa acontece no meu coração
Que só quando cruza a Ipiranga e a avenida São
João
Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu
rosto
Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau
gosto
É que Narciso acha feio o que não é espelho
E à mente apavora o que ainda não é mesmo velho
Nada do que não era antes quando não somos
Mutantes
E foste um difícil começo
Afasta o que não conheço
E quem vem de outro sonho feliz de cidade
Aprende depressa a chamar-te de realidade
Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso
Do povo oprimido nas filas, nas vilas, favelas
Da força da grana que ergue e destrói coisas belas
Da feia fumaça que sobe, apagando as estrelas
Eu vejo surgir teus poetas de campos, espaços
Tuas oficinas de florestas, teus deuses da chuva
Pan-Américas de Áfricas utópicas, túmulo do samba
Mais possível novo quilombo de Zumbi
E os novos baianos passeiam na tua garoa
E novos baianos te podem curtir numa boa
Discos onde ouvir
Caetano Veloso – Muito (1978)
João Gilberto – João (1991)
Gilberto Gil – Unplugged (1994)
Rildo Hora – Virtuoso (1997)
Nonato Luiz – O Choro da Madeira (1999)
Yamandú Costa – Ao Vivo (2003)
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Telinhas e telonas
Allahalla... salve Jorge!
O
canal 12 começou 2014 estreando
uma nova novela da TV Globo, Salve
Jorge (de segunda a sexta-feira às
19hs), traduzida para o mundo hispanofalante como La Guerrera. Trata-se da
história de Morena (Nanda Costa), uma moça
simples, moradora do Complexo do Alemão,
no Rio de Janeiro, que interrompeu seus
planos de conquistar sucesso em uma
carreira artística por conta de uma gravidez
precoce, consequência de uma decepção
amorosa. Alguns anos depois, ela vê a sua
sorte virar ao receber uma proposta para
trabalhar fora do país. Porém, a decisão de
viajar atrás de uma vida melhor para sua
família a obrigará a se afastar de Theo
(Rodrigo Lombardi), o homem que ama. Theo
é o cara certo na hora errada. Devoto fiel de
São Jorge, ele é cavaleiro do Exército. Morena
mal consegue acreditar que encontrou
alguém como Theo depois de tanta desilusão.
Mas ele vai ter que esperar. Ela não pode
deixar a chance de dar uma guinada na sua
vida, na vida de seu filho e de sua mãe.
Assim que possível, voltará para seus braços.
Mas mal sabe ela os perigos que se
escondem
por
trás
dessa
grande
oportunidade que lhe foi oferecida por Wanda
(Totia Meirelles). Como ela haveria de
desconfiar? Wanda é a pessoa que a faz
enxergar um mundo de novas possibilidades
de vida na Turquia. Na realidade, Wanda
trabalha para a perigosa Lívia Marine
(Cláudia Raia), uma mulher rica, sofisticada,
elegante e acima de qualquer suspeita. Por
trás do convite para uma vida cheia de
possibilidades fora do Brasil está uma
perigosa rede internacional de tráfico de
pessoas. E a determinada delegada Helô
(Giovanna Antonelli) está disposta a
desbaratar esta máfia custe o que custar.
As gravações no exterior se iniciaram na
rústica região da Capadócia, berço do mito de
São Jorge. Famosa por seu céu repleto de
balões coloridos e por suas formações
geológicas únicas, a Capadócia tem como
significado "terra dos belos cavalos". Foram
usados mais de 350 cavalos locais nas cenas
com os atores. Os tradicionais Vale do Amor,
Vale da Rosa e Vale Devrent (da imaginação)
foram algumas das locações escolhidas.
Depois da Capadócia, a produção da novela
se dirigiu para a cosmopolita Istambul. Como
pano de fundo das cenas, alguns dos cartões
postais mais famosos como a Basílica de
Santa Sofia, a Mesquita Azul e o Palácio
Topkapi. "Fomos muito bem recebidos pelo
# 34 – fevereiro 2014
povo turco. É um país de contrastes
maravilhosos", contou em entrevista o diretor
de núcleo Marcos Schechtman, que gravou
cerca de 600 cenas na viagem, que duraram
40 dias em três localidades diferentes.
As equipes de figurino e produção de arte
trabalharam incansavelmente para retratar a
cultura turca. A produção de arte comprou no
país louças de chá e café, narguilés,
instrumentos musicais, tecidos locais,
tapetes e teares. Já a equipe de figurino
incluiu peças turcas como a salwar, calça
larga, que marca o estilo de Sarila (Bety
Gofman), uma mulher do interior da
Capadócia. Oyas (rendas turcas), ikats (peças
de tecelagem artesanal com tingimento
especial nos fios) e suzanis (peças bordadas
em seda) foram comprados durante a viagem
e compunham o guarda-roupa dos
personagens do núcleo turco.
A trilha da novela trouxe uma canção inédita
de Cazuza, Sorte ou Azar, que faria parte do
primeiro disco do Barão Vermelho, há 30
anos. Também duas gravações de Roberto
Carlos: "Esse Cara Sou Eu" e "Furdúncio".
Algumas expressões turcas que viraram
bordões na novela: allahalla (ô, meu Deus!),
babisko (paizinho), bayrun (sejam bemvindos), evet (sim), gule gule (tchau), hádi
(vamos, rápido), lok (não), mashallah (que
deus o proteja), mérabá (oi) e xerefé (saúde para brindar).
A novela de Glória Perez enfrentou a rejeição
do público e críticas por toda parte, seja pela
repetição de temas e elenco, pelo número
excessivo de personagens -quase cem-, ou
pelas dancinhas e bordões estrangeiros que
já não despertavam mais tanto interesse
como na época de O Clone (2001-2002). A
Turquia retratada em Salve Jorge pareceu
uma mistura de Marrocos (de O Clone) com a
Índia (de Caminho das Índias - 2009).
Também vale ressaltar que a novela anterior
no horário, Avenida Brasil, acostumou o
telespectador com uma trama muito mais
ágil, que causou uma verdadeira comoção
entre o público.
Salve Jorge registrou a menor média de
audiência entre as novelas das nove da
Globo até então: 34 pontos (perdendo para
Passione 35, Insensato Coração 36, Fina
Estampa e Avenida Brasil, 39). Mas a
audiência não era um fato isolado. A novela
estreou em uma época ruim, com Horário
Político, Horário de Verão, festas de fim de
ano, feriadões. E não só a novela das nove,
mas todo o horário nobre sofreu uma queda
vertiginosa na audiência no período, em
todas as emissoras. Não por acaso, a trama
das sete (Guerra dos Sexos) e a das seis
(Lado a Lado) também amargaram índices
baixos no Ibope da Grande São Paulo.
Glória Perez apelidou os usuários de mídias
sociais que criticavam sua novela de "bonde
do recalque". Chegou a sugerir que havia
gente recebendo dinheiro para falar mal da
trama. De fato, houve uma campanha contra
Salve Jorge antes de sua estreia: os
evangélicos se movimentaram para boicotar
a novela, acusando de que ela fazia apologia
às religiões afros. Mas também é certo que
Salve Jorge entrou para a história como a que
teve mais furos de roteiro: Thammy Gretchen
dançando a "Conga", travestis traficados, as
surras que a vilã Wanda levou, a seringada
no elevador, o wi-fi na caverna, viagens de
jatinho à Turquia, o "cabelo bipolar" de
Morena, a igreja 24 horas, os personagens
que sumiram, bebês dentro de bolsas,
português falado na Turquia, a repetição de
elenco e estilo, e o próprio bonde do
recalque. Mesmo assim, passada metade da
novela, Glória fisgou seu público com tipos
bem populares e temas de interesse social.
Adoção ilegal, alienação parental e tráfico de
humanos (mulheres, travestis, bebês)
estiveram na pauta durante os sete meses da
novela: o grande mérito de Salve Jorge, levar
ao conhecimento do público assuntos tão
pertinentes. Salve Jorge foi vendida como
uma trama realista, que tratava de um tema
urgente, difícil e alarmante: o tráfico de
humanos. Mas ficou difícil embarcar em uma
proposta tida como realista que acabou
tendo um desenvolvimento muitas vezes
fantasioso, com vilões caricatos, em que a
autora pedia ao seu público que voasse com
ela.