UNIVERSIDADE DE SÃO Paulo
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA SUPERIOR DE AGRICULTURA “LUIZ DE QUEIROZ” PROJETO DE PESQUISA: SOLOS DE RESTINGA DA ILHA DO CARDOSO (SP): GÊNESE DO HORIZONTE ESPÓDICO E CARACTERIZAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS HÚMICAS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO: SOLOS E NUTRIÇÃO DE PLANTAS NÍVEL: DOUTORADO CANDIDATO: FELIPE HAENEL GOMES ORIENTADOR: PABLO VIDAL-TORRADO PIRACICABA Estado de São Paulo – Brasil Dezembro 2002 1. RESUMO Este plano tem como objetivo detalhar o estudo de solos de mangue e de restinga, incluindo a transição entre os dois ecossistemas, situados na Ilha do Cardoso-SP, levantando informações complementares ao projeto: Diversidade, dinâmica e conservação em florestas do estado de São Paulo: 40 ha de parcelas permanentes (BIOTA-FAPESP). São objetivos deste plano: (a) caracterizar o desenvolvimento do horizonte espódico em função do relevo, da presença de lençol freático e da distância em relação ao mar e ao manguezal adjacente; (b) identificar a presença de horizontes e/ou camadas endurecidas em profundidade (até 12 metros); (c) elaborar um mapa ultradetalhado de solos na parcela do projeto BIOTA; (d) Caracterizar espectroscopicamente a matéria orgânica dos solos, procurando relacioná-la com a gênese do horizonte B espódico nos solos sob vegetação de restinga, identificando os grupos funcionais de maior significância no processo. 2. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVAS As restingas, usada aqui no sentido botânico, são ecossistemas costeiros que variam principalmente quanto ao porte da vegetação, que por sua vez depende do aporte de água doce e nutrientes e da estabilização dos sedimentos arenosos em que se situam. Já os manguezais apresentam variações na vegetação relacionadas principalmente ao aporte de água doce e influência da água do mar, que refletindo na salinidade. São ecossistemas “recentes”, considerando sua formação quaternária, já que refletem aspectos relacionados à sedimentação e às variações do nível médio do mar ocorridos neste período. Os manguezais são de maior 1 dinamismo ainda, visto que situam-se no limite da interface entre o continente, o sistema fluvial e os oceanos, sendo ainda altamente dependente do aporte de sedimentos, de água doce e da influência da maré. Os solos formados sob restinga compreendem, em sua grande maioria, Espodossolos Cárbicos, Espodossolos Ferrocárbicos e Neossolos Quartzarênicos, sendo que, este último, muitas vezes é transicional para Espodossolo, apresentando uma formação incipiente de horizonte espódico, ou mesmo apresentando este horizonte abaixo da seção de controle (Espodossolo Cárbico/Ferrocárbico Hiperespesso). Os solos de manguezais correspondem, principalmente, a Gleissolos Tiomórficos, podendo ainda ter quantidade elevada de C orgânico, formando os Organossolos Tiomórficos. Em vista disso, as hipóteses deste estudo serão: -Dentro de uma mesma mata de restinga, quanto mais próximo ao mar, menor será o estágio de desenvolvimento do horizonte espódico, se este ocorrer; -A presença de camadas/horizontes endurecidos influencia diretamente na formação dos Espodossolos, assim como o relevo, através de uma alteração da dinâmica da água no perfil; -O manguezal adjacente exerce grande influência no que diz respeito à destruição do horizonte espódico, sendo provável encontrar resquícios deste na transição restinga-manguezal, já no domínio do segundo; -O processo de iluviação está ligado à materiais orgânicos de composição distinta, sendo possível a identificação destes via métodos espectroscópicos. 2 3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1. Restingas A palavra “restinga” é usada tanto para designar vários tipos de depósitos litorâneos quanto outras feições costeiras. Entre outros usos, o emprego no sentido botânico designaria uma vegetação arbustivo-arbórea características de zonas costeiras. Sua ocorrência está relacionada com variações no nível do mar no holoceno e a conseqüente formação ao longo da costa brasileira, de vastas planícies sedimentares arenosas. Em conseqüência das transgressões e regressões marinhas, elas tomaram a forma de uma sucessão de cordões litorâneos arenosos. que são, em geral, cobertos por comunidades vegetais características e diversas genericamente denominadas de restingas (SUGUIO e TESSLER, 1984). Os diferentes tipos de vegetação ocorrentes nas restingas brasileiras variam desde formações herbáceas, passando por formações arbustivas, abertas ou fechadas, chegando a florestas cujo dossel varia em altura, geralmente não ultrapassando os 20 m. Em muitas áreas de restinga no Brasil, ocorrem períodos mais ou menos prolongados de inundação do solo, fator que tem grande influência na distribuição de algumas formações vegetacionais. A periodicidade com que ocorre o encharcamento e a sua respectiva duração são decorrentes principalmente da topografia do terreno, da profundidade do lençol freático e da proximidade de corpos d’água (rios ou lagoas), produzindo em muitos casos um mosaico de formações inundáveis e não inundáveis, com fisionomias variadas, o que até certo ponto justifica o nome de "complexo" que é empregado para designar as restingas. Assim, caracterizam-se como um conjunto de ecossistemas variados fitofisionomicamente, refletindo assim diferenças geomórficas, pedológicas e climáticas, além de diferentes etapas sucessionais. (SILVA, 2000). 3 3.2. Solos sob restinga Os ecossistemas de restinga se caracterizam pela presença de solos de textura arenosa e, geralmente, pobres em matéria orgânica, tendo baixa capacidade de reter água e nutrientes, essenciais à manutenção dos componentes biológicos do sistema. A vegetação é adaptada, apresentando muitas vezes características xeromórficas. Diferente do que ocorre na maioria dos ecossistemas terrestres, na restinga o solo não constitui a principal fonte de nutrientes. Dada a proximidade do mar, essa fonte é a maresia presente na atmosfera (ARAÚJO e LACERDA, 1987; LEÃO e DOMINGUEZ, 2000). Os solos sob restinga englobam aqueles classificados como Podzóis (Espodossolos) e Areias Quarztosas Marinhas (Neossolos Quartzarênicos) (BRASIL, 1981). Os Espodossolos são solos minerais, com seqüência de horizontes A-E-Bh e/ou Bs ou Bhs-C. São, na grande maioria, arenosos, sendo raras as citações de outras classes texturais. Quimicamente, são ácidos e muito pobres, com a soma de bases raramente ultrapassando 1 cmolc kg-1, mesmo na camada superficial. As Areias Quartzozas Marinhas são solos minerais de seqüência de horizontes A-C, sendo a principal diferença a ausência de horizonte espódico (OLIVEIRA et al., 1992). GOMES (1995) encontrou duas classes de solos em restingas fluminenses, sendo a Areia Quartzoza (atual Neossolo Quartzarênico) intermediária para Podzol, devido ao incipiente processo de podzolização. O mesmo encontrou MOURA FILHO (1998), em solos do litoral sul de Alagoas, porém com predominância Neossolos Quartzarênicos. O autor, porém, não descarta a possibilidade do processo de podzolização estar ocorrendo a maiores profundidades (Espodossolos Cárbicos ou 4 Ferrocárbicos hiperespessos). Segundo OLIVEIRA et al. (1992), a localização dos Neossolos Quartzarênicos em relação aos Espodossolos é de maior proximidade ao mar, imediatamente após as praias, enquanto estes predominam nas baixadas correspondentes às restingas. 3.2.1. Podzolização A podzolização, segundo VAN BREEMEN e BUURMAN (1998), é explicada por diversas teorias, sendo três as principais: a) teoria dos fulvatos (adsorção/precipitação), descrita por Petersen (1976), sugerindo que ácidos fúlvicos no horizonte superficial dissolvem ferro e alumínio de minerais primários e secundários, formando então os complexos organo-metálicos, que precipitam quando ocorre a saturação; b) a teoria da alofana, descrita por Andersen et al. (1982) e Farmer et al. (1980), que considera que o ferro e o alumínio são eluviados ao horizonte B como silicatos positivamente carregados, onde precipitam como alofanas e imogolota, através de um aumento no pH. Após isto, material orgânico pode precipitar na alofana causando um enriquecimento secundário no horizonte B; c) a teoria dos ácidos orgânicos de baixo peso molecular, descrita por Lundström et al (1995), que considera que estes ácidos são os responsáveis pelo transporte de ferro e alumínio para o horizonte subsuperficial, sendo a precipitação do ferro e do alumínio ocasionada por quebra microbiológica do agente transportador. 5 A matéria orgânica do solo é considerada essencial para a formação do horizonte espódico para duas da três principais teorias. Experimentos de laboratório têm mostrado que a taxa de intemperismo pode ser 2 a 3,5 vezes mais alta na presença de COD, principalmente na forma de compostos de baixo peso molecular e de maior acidez (LUNDSTRÖM e ÖHMAN, 1990). Com a descoberta da imogolita e materiais alofânicos como constituintes comuns dos Espodossolos de clima temperado, vários trabalhos postularam que soluções inorgânicas de Fe, Al e Si são suficientemente estáveis para migrarem no perfil do solo, independentes da matéria orgânica, e desempenharem um importante papel no processo de podzolização (MALCOLM & McCRACKEN, 1968; ANDERSON et al., 1982; FARMER, 1982; FARMER, 1984). O exposto foi questionado por BUURMAN e VAN REEUWIJK (1984), ao afirmarem que a presença de imogolita e outros alumino-silicatos pobremente cristalizados nos horizontes B inferiores de Espodossolos pode ser explicada pela neoformação a partir do Si que percolou na solução do solo e de formas de Al liberadas a partir dos complexos orgânicos pela atividade microbiana. Trabalhos recentes confirmaram experimentalmente a importância da migração de Al e Fe em direção ao horizonte B na forma de complexos orgânicos (VAN HEES & LUNDSTRÖM, 2000; LUNDSTRÖM et al., 2000). Na teoria da adsorção/precipitação, os ácidos fúlvicos migrando como complexos com Al e Fe no perfil precipitam pela contínua adição de metais, ao alcançarem uma relação carbono/metal suficiente para tal, criando o horizonte iluvial B (DE CONINK, 1980). Na teoria da biodegradação, os ligantes orgânicos, principalmente os ácidos orgânicos de baixo peso molecular, são decompostos microbiologicamente durante sua migração no perfil, liberando Al e Fe iônicos, os 6 quais precipitam na forma de fases sólidas Al-Si-OH e Fe-OH, um material do tipo imogolita ou ferrihidrita no horizonte B. Os ácidos orgânicos de alto peso molecular podem ser adsorvidos na superfície dos materiais amorfos do horizonte B (LUNDSTRÖM, 1993; LUNDSTRÖM et al., 1995). Os dois processos podem ocorrer conjuntamente (CRONAN e AIKEN, 1985) e a importância de cada um deles pode estar ligada à ocorrência dos materiais tipo imogolita e ferrihidrita no horizonte B de Espodossolos, quando o mecanismo da biodegradação ganharia em importância, como no caso de Espodossolos dos países nórdicos (LUNDSTRÖM et al., 2000). Em Espodossolos com material de origem quartzoso, semelhantes aos das planícies sedimentares arenosas da costa brasileira, a presença de materiais tipo imogolita/alofana é excluída ou colocada em plano secundário (MALCOLM e McCRACKEN, 1968) No caso de Espodossolos Cárbicos Hidromórficos (antigos Podzóis Hidromórficos), estes são descritos como dependentes de um lençol freático permanente aliado ao material de origem empobrecido em minerais intemperizáveis, ou seja, ricos em quartzo (DUCHAUFOR, 1982). Além disso, estes solos apresentariam grandes entradas de material orgânico a partir do topo, elevada acidez, teores de Fe insignificantes, o Al como o principal cátion associado aos materiais húmicos migrantes, os precipitados do horizonte B formados predominantemente por ácidos húmicos e boa parte da matéria orgânica translocando-se, principalmente pelas águas de drenagem escurecidas por ácidos fúlvicos (SKJEMSTAD et al., 1992; GOMES et al., 1998). Estas teorias envolvem essencialmente a formação de Espodossolos em ambientes frios, geralmente do hemisfério Norte, sendo que a junção de condições climáticas ideais, com invernos rigorosos e precipitações generosas, ocorrem em 7 menor extensão no hemisfério Sul (LUNDSTRÖM et al, 2000). No Brasil, os Espodossolos ocorrem associados à materiais de origem quartzosos e drenagem deficiente (RESENDE et al., 1997), ocupando uma área de aproximadamente 142.000 km² (EMBRAPA, 1981). 3.3. Manguezais Os manguezais são ecossistemas costeiros de transição entre os ambientes terrestre e marinho, sujeito ao regime de marés e associado às margens de baías, enseadas, barras, desembocadura de rios, lagunas e reentrâncias costeiras. São de importância fundamental na manutenção e existência de inúmeros ecossistemas localizados fora de seus limites (SCHAEFFER-NOVELLI, 1991). São característicos das regiões tropicais e subtropicais, distribuindo-se entre os trópicos de Capricórnio e Câncer, ocupando uma área aproximada de 20 milhões de hectares (LACERDA,1984). No Brasil, sua ocorrência se dá do Cabo Orange, no Amapá até laguna, no litoral Catarinense, ocupando uma área aproximada de 25 mil hectares (LACERDA, 1984; SCHAEFFER-NOVELLI, 1991) A estrutura e composição de espécies das florestas de mangue variam em função de fatores geofísicos, geográficos, geológicos, hidrográficos, climáticos e edáficos, da história do passado recente do local e das atividades humanas. Funcionam como estabilizadores ambientais, atuando como barreiras naturais contra impactos permanentes de inundações catastróficas além da erosão eólica, por furacões e ciclones, e hídrica, pela ação das ondas (VANUCCI, 1999). Além disso, os manguezais podem funcionar como despoluidores, imobilizando metais 8 pesados nas plantas e no solo, antes que alcancem ecossistemas aquáticos próximos (TAM e WONG,1996; MACFARLANE e BURCHETT, 1999). 3.4.Solos sob manguezal Os processos que ocorrem nos solos sob constante sedimentação podem ser divididos em geogênese e pedogênese. O primeiro diz respeito principalmente à origem e transporte dos sedimentos, e o segundo, a processos que ocorrem após a sedimentação com influência dos fatores de formação de solos. Porém muitas vezes é difícil separar estes processos, que podem ocorrer alternadamente nestes ambientes constantemente inundados (PONS e ZONNEVELD, 1965). Nos levantamentos de solos, têm sido relatados como "solos indiscriminados de mangue". São assim denominados em função do difícil acesso a esses ambientes, sendo poucas as descrições morfológicas e análises físicas, químicas e mineralógicas destes solos, levando à não discriminação das classes de solo às quais pertencem. São freqüentemente incluídos em duas unidades de mapeamento: os complexos de solos, com ocorrência comum nas bacias sedimentares, sendo constituído por solos taxonomicamente distintos e com limites poucos nítidos entre si e de difícil individualização para fins cartográficos; e os grupos indiferenciados de solos, que são constituídos por unidades taxonômicas afins, com morfologia e propriedades muito semelhantes (EMBRAPA, 1995). Encontram-se no litoral, quase sempre junto a desembocaduras de rios, são desenvolvidos a partir de sedimentos recentes e influenciados diretamente pela água do mar, através do efeito das marés. Constituem, provavelmente, uma associação de Gleissolos Sálicos e Tiomórficos, apresentando-se muito mal 9 drenados, com horizontes gleizados, com altos teores de sais e muitas vezes, compostos de enxofre (EMBRAPA, 1975; BRASIL, 1987). Os trabalhos realizados com solos de manguezais indicam que são formados principalmente de Gleissolos Tiomórficos e Organossolos Tiomórficos (PRADAGAMEIRO, 2000; FERREIRA, 2002; GOMES, 2002). 4. OBJETIVOS 1. Caracterizar o desenvolvimento do horizonte espódico de solos de uma restinga do projeto parcelas permanentes do BIOTA na ilha do Cardoso, em função do relevo, da distância em relação ao mar e ao manguezal adjacente. 2. Caracterizar a ocorrência de camadas e/ou horizontes endurecidos em profundidade nos solos de mangue e restinga (até 12 metros). 3. Elaborar um mapa de solos ultradetalhado para a parcela do projeto BIOTA. 4. Caracterizar espectroscopicamente a matéria orgânica de solos de restinga e de mangue, procurando relacioná-la com a gênese dos solos espódico nos solos sob vegetação de restinga, identificando os grupos funcionais de maior significância no processo. 10 5. PLANO DE TRABALHO E CRONOGRAMA CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO: Julho de 2002 a setembro de 2005. ATIVIDADES Revisão de bibliografia 2002 2003 2004 2005 Jul- Out- Jan- Mai- Set- Jan- Mai- Set- Jan- Mai- Set Dez Abr Ago Dez Abr Ago Dez Abr Set X X X X X X X X X X X X X X X X X Visitas preliminares e amostragem sistemática Abertura de trincheiras e descrição de perfis do solo Análise com o GPR (radar penetrante no solo) X Análise granulométrica, química de rotina e sais solúveis X X Analise químicas específicas (ataque sulfúrico e total) X X Extração de Fe e Al com DCB e oxalato X X Difratometria de raios-X X X X Microscopia de varredura X X X Confecção de lâminas delgadas de solo X X X Caracterização da matéria orgânica do solo X X X X Redação de artigos e relatório cientifico X X X X 6. MATERIAIS E MÉTODOS 6.1. Localização A área de estudo está localizada no Parque Estadual da Ilha do Cardoso (Figura 1), na porção mais meridional do litoral sul paulista, e está inserida no complexo lagunar de Iguape - Cananéia. 6.2. Clima O clima, segundo a classificação de Köppen, é do tipo Cfa, ou seja, mesotérmico úmido sem estação seca definida. A pluviosidade varia de 1.700 a 2.000 mm anuais, sendo fevereiro o mês mais chuvoso e julho o mais seco (SÃO PAULO, 1990). 11 Ilha Comprida Cananéia Parcela do BIOTA Oceano Atlântico Ilha do Cardoso São Paulo Ariri Maruja Paraná Figura 1 – Localização da ilha do Cardoso e da parcela do projeto BIOTA. 6.3. Geologia A Ilha do Cardoso (Figura 2) é composta de rochas cristalinas (ígneas ou magmáticas e metamórficas) pré-cambrianas, com sedimentos quaternários localizados junto às suas bordas (SUGUIO e TESSLER, 1992; SUGUIO, 1993). Predominam os sedimentos relativos à transgressão Santos (5.100 A.P.), correspondendo a depósitos marinhos, essencialmente compostos de areia fina e muito fina e bem selecionada, situando-se nas partes externas expostas ao mar 12 Figura 2 – Esboço geológico-geomorfológico da Ilha do Cardoso (SUGUIO, 1993). aberto, enquanto que nas porções internas e protegidas predominam depósitos estuarinos de natureza areno-argilosa, contendo teores variáveis de matéria orgânica (SUGUIO e MARTIN, 1978). Na porção norte da ilha, no entanto, foi preservado um importante testemunho de depósito relacionados à Transgressão Cananéia (120.000 A.P.). Ao lado desta ocorrência da formação Cananéia ocorrem sedimentos colúvio-aluviais em parte contemporâneos à formação Cananéia, de origem continental, provenientes da região montanhosa adjacente (SUGUIO, 1993). 6.4. Geomorfologia A Ilha do Cardoso apresenta, em sua parte central, rochas cristalinas com picos de mais de 900 metros de altitude, relevo este que integra a Serra do Mar. Na metade norte, noroeste e sudoeste da ilha, este relevo acentuado evolui 13 abruptamente para planícies areno-argilosas baixas, dominadas por manguezais. Na metade norte, nordeste e sudeste da ilha, a região montanhosa passa repentinamente para planícies de cristas praiais essencialmente arenosas. Essas planícies, embora algo mais alta que as anteriores, atingem apenas 3 a 4 metros de altitude nas áreas representativas da Transgressão Santos (Holoceno), podendo chegar a 5 a 6 metros nas áreas da Transgressão Cananéia (Pleistoceno) (SUGUIO, 1993). 6.5. Amostragem Duas transeções serão traçadas em uma mata de restinga situada na porção norte da ilha, essencialmente sobre sedimentos relacionados à Transgressão Cananéia, sendo uma em direção ao mar (Sul-Norte) e outra em direção ao manguezal (Leste-Oeste) chegando na extremidades (mar e manguezal) a sedimentos areno-argilosos, de origem mais recente, e possivelmente, ao sul a depósitos areno-agilosos coluvionares (Figura 3). Serão coletadas amostras até a profundidade da seção de controle de 20 em 20 metros em 16 pontos da parcela do biota, mais um ponto em direção ao mar e outro em direção ao centro da ilha para a transeção 1, e dois pontos em direção ao manguezal para a transeção 2, em um total de 360 metros em cada transeção. Serão ainda coletadas amostras para análises morfológicas para elaborar um estudo bidimensional da configuração lateral dos horizontes do solo, aumentando o número de coletas entre os pontos quando necessário, segundo a técnica de BOULET et al. (1982). Após estes procedimentos, serão abertas trincheiras (cerca de 10), para proceder a descrição morfológica e coletar amostras indeformadas para micromorfologia. 14 Mar (Transeção dé) Transeção 1 Direção da Transeção 3 20 m Transeção 2 40 m 320 m (parcela do BIOTA) Sedimentos areno-argilosos continentais Figura 3 – Esquema de amostragem das transeções (negrito) na parcela do BIOTA. Outra transeção será traçada na porção nordeste da Ilha, em direção ao Oceano Atlântico, para a caracterização do processo de podzolização em sedimentos de origem mais recente, relacionados à Transgressão Santos. Serão abertas trincheiras para a descrição morfológica e coleta de amostras indeformadas para micromorfologia, procedendo de forma semelhante às transeções anteriores. 15 Oceano Atlântico 320 m (parcela do BIOTA) Manguezal do rio Ipaneminha 20 m N 6.6. Análises laboratoriais 6.6.1.Granulometria Após agitação horizontal por 16 horas de amostras de 50 gramas, será determinado o teor de argila e silte pelo método do densímetro, utilizando-se como dispersante solução de hidróxido de sódio e hexametafosfato de sódio (CAMARGO et al., 1986). A areia será pesada e peneirada, obtendo-se cinco frações de areia. 6.6.2. Análises químicas de rotina Serão realizadas análises químicas de rotina para fins de levantamento descritas pela EMBRAPA (1997), determinando-se: pH em H2O e em KCl, matéria orgânica, fósforo assimilável, cátions trocáveis (Ca2+, Mg2+, K+, Na+, Al3+) e acidez potencial (H+Al) pelo método do acetato de cálcio. A partir destes resultados serão determinados a soma de bases (SB), a capacidade de troca de cátions efetiva (t) e total (T), a saturação por bases (v%), alumínio (m%) e a percentagem de saturação por sódio (PST) 6.6.3. Determinação de sais solúveis Serão determinados os sais solúveis, a condutividade elétrica, e o pH na solução proveniente da pasta de saturação conforme EMBRAPA (1997). 6.6.4. Análises total dos elementos (ataque triácido total) e ataque sulfúrico O ataque total será realizado na TFSA, utilizando-se HF, HCl e HNO3. Serão determinados Fe, Mn Al, Ti, Zn, Cd, Cr, Ni e Pb por espectrofotometria de plasma 16 segundo a metodologia descrita no manual de métodos de laboratório da comissão de solos do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (ESTADOS UNIDOS, 1996). O ataque sulfúrico será determinado na TFSA dos horizontes subsuperficiais conforme EMBRAPA (1997). 6.6.5. Extração de ferro e alumínio com ditionito e oxalato Será realizada na TFSA em três extrações sucessivas com o ditionito-citratobicarbonato (DCB) de sódio (MEHRA e JACKSON, 1960); e uma extração, na ausência de luz, para o oxalato, determinando-se formas de ferro menos cristalinas (McKEAGUE e DAY, 1966), sendo dosado por espectrofotometria de absorção atômica. Será também realizada a leitura do extrato do oxalato em espectrofotômetro no comprimento de onda de 430 nm, para determinação da densidade ótica conforme método sugerido na Soil Taxonomy para caracterização de material espódico (ESTADOS UNIDOS, 1996). 6.6.6. Análise mineralógica por difração de raios-x (DRX) Serão realizadas nas frações areia, silte e argila. Para as frações areia e silte, serão utilizados porta-amostras com cavidade (não orientada) e irradiadas de 8 a 60º 2θ e, para a fração argila, serão utilizadas lâminas com orientação e irradiação de 5 a 50º 2θ em difratômetro de raios-X com tubo de cobalto. Para a fração argila, será realizado o tratamento com ditionito-citratobicarbonato para eliminação dos óxidos de ferro e tratamentos com potássio às temperaturas ambiente, 350 e 550° C; saturação com magnésio e, quando necessário, magnésio mais glicerol. 17 6.6.7. Identificação visual de minerais por microscopia de varredura (SEM) Na identificação de minerais utilizando o microscópio eletrônico de varredura serão utilizadas amostras analisadas por difração de raios-x, onde serão identificados segundo suas propriedades de espaçamento os minerais de interesse, e logo intentar-se identificar visualmente suas características morfológicas. 6.6.8. Caracterização da matéria orgânica: 6.6.8.1. Fracionamento químico quantitativo de substâncias húmicas Será realizado o fracionamento quantitativo das substâncias húmicas segundo a técnica da solubilidade diferencial, utilizando-se o método baseado nos conceitos de frações húmicas estabelecidos pela Sociedade Internacional de Substâncias Húmicas, descritos por HAYES et al. (1989). 6.6.8.2. Extração e purificação espectroscópicas de ácidos húmicos para análises Os ácidos húmicos (AH) e os ácidos fúlvicos (FAF) serão extraídos segundo a técnica padrão adotada pela Sociedade Internacional de Substâncias Húmicas (IHSS) (SWIFT et al., 1996), sob atmosfera de N2. A purificação dos AH será realizada com solução de HF + HCl 0,5 % (SCHNITZER, 1982), sendo posteriormente lavadas com solução de HCl 0,01 mol L-1, dialisadas em água deionizada, congeladas e liofilizadas. A fração FAF será purificada segundo o método descrito por AIKEN (1985), utilizando coluna cromatográfica carregada com resina Amberlite XAD-8, pré-lavada em Soxhlet, para eliminação das impurezas (MALCOLM, 1991). O percolado será descartado, procedendo-se a lavagem da 18 coluna com solução de HCl (pH 2,0), seguido de água deionizada. O extrato obtido será novamente eluído em coluna cromatográfica, preenchida com resina Amberlite IR 120+ para eliminação de sais. O eluído será transferido para tubos de diálise, e, posteriormente, liofilizados. A caracterização espectroscópica na faixa do UV-visível será realizada em espectrofotômetro de varredura. Os espectros no infravermelho serão lidos na faixa de 4000-400 cm-1, com resolução de 4 cm. Os espectros de ressonância paramagnética eletrônica serão realizados em espectrômetro EPR, na banda X (9 Ghz). 6.6.9. Análise micromorfológica Serão coletadas amostras em blocos indeformados de solos, utilizando caixas de papelão (15 x 7 x 7 cm). Os blocos serão secos em estufa por 2 dias, seguida pela saturação com acetona (imersão total da amostra em bacia plástica). A amostra será então impregnada com resina de poliéster (POLYLITE T-208), com uso de acelerador, diluído com estireno, e adição de pigmento UV fluorescente (UVITEX OB, Ciba-Geigy). A cura será feita em ambiente ventilado, por 7 dias. A partir do bloco impregnado serão obtidas lâminas delgadas de solo (4 mm), para preparação de seções finas de grande dimensão, pelo polimento de uma das faces da fatia montada em lâmina de vidro, até a espessura de 30 micrômetros. As seções finas serão estudadas em microscópio petrográfico com luz plana e polarizada. 6.6.10. Análise com o GPR Para a detecção da topografia do horizonte plácico será feita uma análise complementar à análise estrutural, utilizando-se o GPR (Ground-Penetrating Radar), 19 com o equipamento utilizando-se antena de 80 MHz de freqüência, como proposto por UCHA et al. (2002). O equipamento será tracionado sobre as três transeções. 7. ANÁLISE DOS RESULTADOS A partir da observação das características morfológicas, será feito um esquema da distribuição espacial da configuração lateral dos horizontes dos solos das transeções, de modo a relacionar a formação do horizonte espódico com o relevo (proximidade do lençol freático), presença/ausência de camadas adensadas (que interferem diretamente na dinâmica da água), e sua distância em relação ao mar e ao manguezal. O uso do GPR (Ground-Penetrating Radar) auxiliará a identificação de camadas adensadas e horizontes impeditivos, como o plácico. Foram escolhidas três transeções passando sobre materiais de origem semelhantes quanto à formação (marinha), porém de diferenciadas cronologias para relaciona-los à evolução dos solos, sobretudo o processo de podzolização. As extrações de Fe e Al pelo DCB e oxalato e o cálculo das relações entre as duas extrações, aliados aos dados obtidos nas análises mineralógicas fornecerão subsídios para estabelecer o grau de cristalinidade do óxidos destes elementos, e consequentemente seu papel na podzolização. O ataque total permitirá constatar qual(is) elementos estão presentes nas frações mais grosseiras do solo, enquanto que o ataque sulfúrico constatará, teoricamente, os elementos presentes na fração argila. Assim, poderemos identificar a origem dos elementos envolvidos no processo de iluviação. 20 A caracterização da matéria orgânica do solo permitirá visualizar qual a fração, e dentro de uma mesma fração, quais grupos funcionais estão envolvidos na gênese do horizonte espódico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AIKEN, G.R. Isolation and concentration techniques for aquatic humic substances. In: AIKEN et al. (Eds.). Humic substances in soil, sediment and water: geochemistry, isolation and characterization. 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