Faça o dos Anais do VII Conere clicando aqui!
Transcrição
Faça o dos Anais do VII Conere clicando aqui!
ISSN 2359-1773 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso 7ª Edição FONAPER Florianópolis/SC 2014 VII Congresso de Ensino Religioso, realizado entre os dias 03 a 05 de outubro de 2013, na Universidade Federal de Juiz de Fora, em Juiz de Fora/MG. © 2014 FONAPER – Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso Caixa Postal 90 - Florianópolis/SC - CEP 88.010-970 http://www.fonaper.com.br | e-mail: [email protected] Copyright da Compilação: FONAPER Copyright dos textos: dos autores Proponentes Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER) Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Coordenação Geral Adecir Pozzer (FONAPER) Rodrigo Portella (UFJF) Comissão Organizadora Arnaldo Érico Huff Junior (UFJF); Elcio Cecchetti (UFSC); Francisco Sales Palheta (FONAPER); Frederico Pieper Pires (UFJF); Gracileide Alves da Silva (FONAPER); Henri Luiz Fuchs (FONAPER); Maria José da Silva Lopes (FONAPER); Maria José Torres Holmes (FONAPER); Simone Riske Koch (FONAPER); Josiane Cruzaro (ASPERSC). Comissão Científica Dr. Alberto da Silva Moreira (PUC-GO); Dr. Antônio Sidekum (UCA/El Salvador); Dr. Artur César Isaia (UFSC); Dr. Carlos André Cavalcanti (UFPB); Dr. Douglas Rodrigues da Conceição (UEPA); Drando Élcio Cecchetti (UFSC); Dra. Elisa Rodrigues (UFJF); Dr. Evaldo Luís Pauly (UNILASALLE); Dr. Flávio Augusto Senra Ribeiro (PUC-MG); Dr. Gilbraz de Souza Aragão (UNICAP); Me. Henri Luiz Fuchs (IFRS); Me. Romi Márcia Bencke (UFJF); Dr. Iuri Andréas Reblin (Faculdades EST); Dr. José Luiz Izidoro (CES-JF); Dr. Leomar Brustolin (PUC-RS) ; Dra. Lílian Blanck de Oliveira (FURB/RELER); Dr. Luiz José Dietrich (PUCPR e GPEAD/FURB); Dr. Luzival Barcellos (UFPB); Dr. Marcos Rodrigues da Silva (PUC/SP); Dra. Marga Janete Ströher (SDH/PR); Dra. Maria Clara Lucchetti Bingemer (PUC-RJ); Me. Maria José Holmes Torres (SEMED João Pessoa/PB); Dra Kathlen Luana de Oliveira (FACOS e IMT/URI); Dr. Wellington Teodoro da Silva (PUC-MG); Me. Obertal Xavier Ribeiro (UNIGRANRIO); Dr. Oneide Bobsin (Faculdades EST); Dr. Remí Klein (Faculdades EST); Dra. Sílvia Regina Alves Fernandes (UFRRJ); Ma. Simone Riske-Koch (FURB/FONAPER); Dr. Zwinglio Mota Dias (UFJF). Organização dos Anais: Janaina Hübner; Iuri Andréas Reblin; Francisco Sales Palheta. Produção dos Anais do VII Congresso Nacional do Ensino Religioso Dados Técnicos: Título: Anais do VII Congresso Nacional do Ensino Religioso Organização: Janaina Hübner; Iuri Andréas Reblin e Francisco Sales Palheta Editora/Autor corporativo: FONAPER Cidade: Florianópolis Ano: 2014 Volume: 7 Páginas: 1004 ISSN: 2359-1773 Revisão: Esther do Amaral Editoração Eletrônica: Iuri Andréas Reblin Como citar um texto nos Anais do VII CONERE: SOBRENOME, Nome. Título da Comunicação. In: Congresso Nacional do Ensino Religioso, 7., 2013, Juiz de Fora/MG. Anais do Congresso Nacional do Ensino Religioso. Organizado por Janaina Hübner, Iuri Andréas Reblin e Francisco Sales Palheta. Florianópolis: FONAPER, v. 7, 2014. página inicial - página final. (Online) ISSN: 2359-1773 A correta menção às fontes, em termos de honestidade intelectual, e a coerência às normas da ABNT são de de responsabilidade dos autores e das autoras dos textos. SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ...................................................................................................13 PROGRAMAÇÃO ....................................................................................................17 COMUNICAÇÕES ...................................................................................................19 GT1: FORMAÇÃO DOCENTE PARA O ENSINO RELIGIOSO ..............................21 A PRÁTICA REFLEXIVA NO CONTEXTO DE AÇÃO DO PROFESSOR PESQUISADOR ...................................................................................... 23 Gleyds Silva Domingues .................................................................................23 FORMAÇÃO DOCENTE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA: LICENCIATURA EM ENSINO RELIGIOSO DA FURB ................................. 33 Vanderlei Kulkamp ..........................................................................................33 Gysselly Buzzi Puff ..........................................................................................33 Adecir Pozzer ..................................................................................................33 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO ENSINO RELIGIOSO NUMA PERSPECTIVA INCLUSIVA ..................................................................... 49 Ana Cristina de Almeida Cavalcante Bastos ...................................................49 A MEMÓRIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO CONTRIBUIÇÕES PARA AS PRÁTICAS COM O ENSINO RELIGIOSO PLURALISTA .......................................................................................... 63 Araceli Sobreira Benevides .............................................................................63 O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL: A POSTURA DO EDUCADOR ENTRE O CUIDAR E O EDUCAR NA DIVERSIDADE DE PERTENÇA ................................................................ 81 Celeide Agapito Valadares Nogueira ..............................................................81 FORMAÇÃO ACADÊMICA/PROFISSIONAL PARA A DOCÊNCIA DO ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS BRASILEIRAS ............................. 93 Edalza Helena Bosetti Santiago ......................................................................93 FONAPER OS (DES)PROPÓSITOS DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL ........................................................................................................... 109 Renata de Souza Leão ................................................................................. 109 A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DO DOCENTE DE ENSINO RELIGIOSO .......................................................................................... 125 José Carlos do Nascimento Santos ............................................................. 125 NO JARDIM DAS ERVAS – SUBPROJETO INTERCULTURAL INDÍGENA FURB/SC ............................................................................................. 137 Eldrita Hausmann de Paula .......................................................................... 137 Sandra Andréia Müller Schroeder ................................................................ 137 O CAMINHO E OS DESAFIOS NA FORMAÇÃO DOCENTE DO ENSINO RELIGIOSO EM PERNAMBUCO ............................................................ 151 Wellcherline Miranda Lima ........................................................................... 151 Rosalia Soares de Sousa ............................................................................. 151 ENSINO RELIGIOSO ESCOLAR NO CONTEXTO DA DIVERSIDADE RELIGIOSA: UMA EXPERIÊNCIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES ... 163 Iolanda Rodrigues da Costa ......................................................................... 163 Maria de Lourdes Santos Melo ..................................................................... 163 Rosilene Pacheco Quaresma ....................................................................... 163 QUE PESQUISADORES/EDUCADORES DE ENSINO RELIGIOSO BUSCAMOS? UM DEBATE A PARTIR DA DISCIPLINA PESQUISA EM ENSINO RELIGIOSO – PARFOR BLUMENAU E RIO DO SUL/SC ............. 177 Josué de Souza ............................................................................................ 177 O ENSINO RELIGIOSO EM GOIÁS: O PROBLEMA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES ................................................................................... 189 Raimundo Márcio Mota de Castro ................................................................ 189 José Maria Baldino ....................................................................................... 189 A ABORDAGEM DA FINITUDE NO CURRÍCULO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO/PA: CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................................................................... 203 Rodrigo Oliveira dos Santos ......................................................................... 203 4 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso A IMPORTÂNCIA DO PROFISSIONAL HABILITADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO PARA ATUAR COMO DOCENTE DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO BÁSICA ............................................................................ 221 Ediana Maria Mascarello Finatto ...................................................................221 Leonel Piovezana ..........................................................................................221 FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO RELIGIOSO NO MUNICÍPIO DE CARIACICA - ES ............................................................................. 235 Eliane Maura Littig Milhomem de Freitas ......................................................235 O ENSINO RELIGIOSO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL, EM MINAS GERAIS: A FORMAÇÃO E A PRÁTICA DOCENTE .................. 251 Felippe Nunes Werneck ................................................................................251 GT2: CURRÍCULO DO ENSINO RELIGIOSO ......................................................269 ENSINO RELIGIOSO PARA ALUNOS/AS DO ENSINO FUNDAMENTAL I: ESTUDO SOBRE PROPOSTA CURRICULAR UNIFICADA ....................... 271 Aldenir Teotonio Claudio ...............................................................................271 Marinilson Barbosa da Silva ..........................................................................271 LIMITES E AVANÇOS DA ESTRUTURA CURRICULAR DO ENSINO RELIGIOSO NO COLÉGIO MARISTA DE BELÉM .................................... 291 Alex Coimbra Sales .......................................................................................291 O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS BRASILEIRAS: UMA ANÁLISE A PARTIR DAS LEGISLAÇÕES EDUCACIONAIS ...................... 309 Claudia Berdague ..........................................................................................309 O ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO ESCOLAR ............................... 319 Elisângela Madeira Coelho............................................................................319 O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO ADVENTISTA ....................................................................................... 331 Francisco Luiz Gomes de Carvalho ..............................................................331 5 FONAPER O ENSINO RELIGIOSO TRANSVERSALIZANDO OUTRAS ÁREAS DE CONHECIMENTO ................................................................................. 343 Iêda de Oliveira Caminha ............................................................................. 343 Maria José Torres Holmes............................................................................ 343 DANÇAS CIRCULARES SAGRADAS: UM RELATO DE UMA PROPOSTA METODOLÓGICA NO CURSO DE LICENCIATURA NO ER- PARFOR/ BLUMENAU.......................................................................................... 357 Laudicéia Lene de Freitas Barbosa .............................................................. 357 O ENSINO RELIGIOSO NA REDE MUNICIPAL DE CURITIBA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ............................................................................... 369 Luís Fernando Lopes .................................................................................... 369 Renata Adriana Garbossa ........................................................................... 369 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO RELIGIOSO: EXPERIÊNCIAS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS ............................................................... 385 Josiane Crusaro ............................................................................................ 385 Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro ............................................................ 385 Adecir Pozzer................................................................................................ 385 GT3: CONCEPÇÕES METODOLÓGICAS DO ENSINO RELIGIOSO ................ 397 O FENÔMENO RELIGIOSO NO ENSINO RELIGIOSO: DESAFIOS EPISTEMOLÓGICOS PARA DOCENTES NO ENSINO FUNDAMENTAL .... 399 Anderson Ferreira Costa ............................................................................. 399 Edile Maria Fracaro Rodrigues ..................................................................... 399 ENSINO DO FATO RELIGIOSO: CONHECIMENTO PARA A ACEITAÇÃO DO DIFERENTE ......................................................................................... 417 José Antonio Lages ...................................................................................... 417 POR UM ENSINO RELIGIOSO NÃO RELIGIOSO: DESAFIOS NO CONTEXTO ESCOLAR ............................................................................................ 433 Daniela Crusaro ............................................................................................ 433 Josiane Crusaro ............................................................................................ 433 Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro ............................................................ 433 6 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso ALTERIDADE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA: REFLEXÕES SOBRE O SER HUMANO ...................................................................... 447 Marcely Carnieletto Gazoni ...........................................................................447 Leonel Piovezana ..........................................................................................447 A QUESTÃO ATUAL DO ENSINO RELIGIOSO COMO CAMPO DISCIPLINAR: UMA PROPOSTA DE CONSCIENTIZAÇÃO PARA A COMUNIDADE ESCOLAR ........................................................................................................... 465 Terezinha de Souza Pacheco .......................................................................465 Neusa Maria de Souza Trindade ...................................................................465 O ATEÍSMO NAS AULAS DO ENSINO RELIGIOSO ................................. 471 Narjara Lins de Araújo ...................................................................................471 POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS PARA O ENSINO RELIGIOSO NO ENSINO MÉDIO EM SANTA CATARINA ................................................. 489 Eliston Terci Panzenhagen............................................................................489 MORTE E VIDA: DIFERENTES CONCEPÇÕES....................................... 503 Janete Ulrich Bachendorf ..............................................................................503 Marléte Arens ................................................................................................503 O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO ESCOLAR: UM DESAFIO DIÁRIO ........................................................................................................... 515 Janete Ulrich Bachendorf ..............................................................................515 GT4: IMAGINÁRIO SIMBÓLICO E ENSINO RELIGIOSO ....................................531 A DIALÉTICA DO SAGRADO NA RESOLUÇÃO DA TENSÃO DE CONHECIMENTO ................................................................................. 533 Marco Antônio Teles da Costa ......................................................................533 PROJETO CORPO SINCRÉTICO: INSTALAÇÃO PERFORMATIVA COMO PERCURSO EDUCATIVO EM AMBIENTES NÃO ESCOLARES ................ 549 Wallace Wagner Rodrigues Pantoja .............................................................549 7 FONAPER SAMHAIN, HERANÇAS DE UM IMAGINÁRIO SIMBÓLICO APLICADO AO ENSINO RELIGIOSO............................................................................. 565 Silas Roberto Rocha Lima ............................................................................ 565 GT5: DIVERSIDADE RELIGIOSA E DIREITOS HUMANOS ............................... 577 ENSINO RELIGIOSO: DIREITO RECONHECIDO OU DIREITO NEGADO .. 579 Maria Lina Rodrigues de Jesus .................................................................... 579 DISCURSOS E PRÁTICAS: A (IN)TOLERÂNCIA RELIGIOSA NO AMBIENTE ESCOLAR ............................................................................................ 597 Sueli Martins ................................................................................................. 597 DIVERSIDADE RELIGIOSA E INTERCULTURALIDADE: APORTES PARA UMA DECOLONIZAÇÃO RELIGIOSA NA EDUCAÇÃO ............................. 615 Georgia Carneiro da Fontoura ...................................................................... 615 Lilian Blanck de Oliveira ............................................................................... 615 MEMÓRIA, TOLERÂNCIA E RESISTÊNCIAS: DISCUSSÕES SOBRE RELIGIÃO E DIREITOS HUMANOS NO BRASIL ...................................... 635 Kathlen Luana de Oliveira ............................................................................ 635 GT6: EDUCAÇÃO E INTERCULTURALIDADE ................................................... 655 O ENSINO RELIGIOSO E A DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA NA EDUCAÇÃO ......................................................................................... 657 Edina Fialho Machado .................................................................................. 657 Rodrigo Oliveira dos Santos ......................................................................... 657 EDUCAÇÃO INTERCULTURAL: A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE E DA DIFERENÇA NO AMBIENTE ESCOLAR .................................................. 673 Eliel Ribeiro da Silva .................................................................................... 673 ETNOJOGO UMA PROPOSTA CRIATIVA ............................................... 689 Claudilene Christina de Oliveira ................................................................... 689 Rosana Castro de Luna Rezende ................................................................ 689 8 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso GT7: A RELIGIÃO E O ETHOS CONTEMPORÂNEO NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO E DO ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL ........................................709 ORA PRO NOBIS: MEMÓRIA E RELIGIOSIDADE DOS CANTADORES DE LADAINHA EM MOCAJUBA PARÁ ........................................................ 711 Guilherme Luís Mendes Martins ...................................................................711 DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS E LAICIDADE DO ESTADO ...... 725 Myriam Aldana ...............................................................................................725 Leonel Piovezana ..........................................................................................725 A CONTRIBUIÇÃO DE JOHN LOCKE PARA A TOLERÂNCIA ................... 739 Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek ................................................................739 GT8: ENSINO RELIGIOSO E VALORES DO DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO ...753 RELIGIÃO E ESTADO SECULAR EM DIÁLOGO: UMA NOVA PROPOSTA DE ENSINO E APRENDIZAGEM PARA O ENSINO RELIGIOSO ..................... 755 Elenilson Delmiro dos Santos .......................................................................755 ENSINO RELIGIOSO E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS: UM DESAFIO A SER ENFRENTADO .................................... 767 Elivaldo Serrão Custódio ...............................................................................767 A PLURALIDADE EM DIÁLOGO E O ENSINO RELIGIOSO NO SÉCULO XXI ........................................................................................................... 785 Suely Ribeiro Barra .......................................................................................785 GT9: A ESPIRITUALIDADE E A FORMAÇÃO DO EDUCADOR .........................801 A IMPORTÂNCIA DA ESPIRITUALIDADE DO EDUCADOR NA CONSTRUÇÃO DA ESPIRITUALIDADE NO PROCESSO EDUCATIVO .... 803 Ana D‘arc Vieira Cândido ..............................................................................803 Sidney Allessandro da Cunha Damasceno ...................................................803 ESPIRITUALIDADE: UM CAMINHO DE BUSCA E DESCOBERTAS PARA O EDUCADOR ......................................................................................... 821 Daiane da Silva Barbosa ...............................................................................821 Laugrinei P. B. da Anunciação - UCB ...........................................................821 9 FONAPER A ESPIRITUALIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO DOCENTE ....................... 833 Monica Pinz Alves ........................................................................................ 833 PROFESSOR COMO MEDIADOR DE APRENDIZAGEM NO ENSINO RELIGIOSO .......................................................................................... 847 Nancy Pereira da Silva ................................................................................. 847 GT10: CONHECIMENTOS E RELIGIOSIDADES INDÍGENAS E O ENSINO RELIGIOSO .......................................................................................................... 861 RITUAL DO KIKI: UMA CELEBRAÇÃO DE VIDAS .................................... 863 Avalcir Rita Ferrari ........................................................................................ 863 Rosinei Pedrotti Ferrari ................................................................................. 863 Leonel Piovezana ......................................................................................... 863 INOVAÇÃO PEDAGÓGICA PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR EM CULTURAS INDÍGENAS: DESAFIOS E POSSIBILIDADES ......................................... 877 Leonel Piovezana ......................................................................................... 877 Luciano Jaeger ............................................................................................. 877 Ediana M. M. Finatto ..................................................................................... 877 RELIGIOSIDADE INDÍGENA: REFLEXÕES SOBRE OS POVOS KAINGANG ........................................................................................................... 893 Gilberto Oliari ................................................................................................ 893 RELIGIOSIDADES MACUXI E A PERSPECTIVA PARA O ENSINO RELIGIOSO .......................................................................................... 905 Manoel Gomes Rabelo Filho ........................................................................ 905 GT 11: CONHECIMENTOS E RELIGIOSIDADES AFRICANAS E AFROBRASILEIRAS E O ENSINO RELIGIOSO ........................................................... 923 ESTÁGIO DE DOCÊNCIA: UMA EXPERIÊNCIA INOVADORA ENVOLVENDO ELEMENTOS ESSENCIAIS E INDIVIDUAIS DA UMBANDA ...................... 925 Adenize Vieira de Jesus ............................................................................... 925 Daiane Waltrick ............................................................................................. 925 Ediana M. M. Finatto ..................................................................................... 925 10 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso BEBÊS ABAYOMIS: UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA PARA O ENSINO RELIGIOSO NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ........... 947 Dina Carla da Costa Bandeira .......................................................................947 Elane Queiroz Carneiro Ribeiro ....................................................................947 ENSINO RELIGIOSO E RELIGIÕES DE MATRIZES AFRICANAS: CONFLITOS E DESAFIOS NA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO AMAPÁ ............................... 959 Elivaldo Serrão Custódio ...............................................................................959 Eugenia da Luz Silva Foster .........................................................................959 DESAFIOS DO ENSINO DAS RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS ............... 977 Fabiano Aparecido Costa Leite .....................................................................977 RELIGIOSIDADE AFROBRASILEIRA E O TRATO PEDAGÓGICO NO ENSINO RELIGIOSO .......................................................................................... 989 Alysson Brabo Antero ....................................................................................989 11 APRESENTAÇÃO Em âmbito nacional, a educação básica tem ocupado lugar de destaque nos últimos anos, principalmente após a promulgação da Resolução CNE/CEB n° 4/2010, que institui novas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica (DCNGEB)1 e da Resolução CNE/CEB nº 7/2010, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos2 (DCNEF). As diretrizes apresentam a organização curricular por áreas de conhecimento. O art. 13, explica que os conteúdos escolares são constituídos por componentes curriculares que, por sua vez, se articulam com as áreas de conhecimento, as quais favorecem a comunicação entre diferentes conhecimentos sistematizados entre estes e outros saberes, mas permitem que os referenciais próprios de cada componente curricular sejam preservados. No art. 15, os componentes curriculares obrigatórios do ensino fundamental são assim organizados em relação às áreas de conhecimento: I – Linguagens: a) Língua Portuguesa; b) Língua Materna, para populações indígenas; c) Língua Estrangeira moderna; d) Arte; e e) Educação Física; II – Matemática; III – Ciências da Natureza; IV – Ciências Humanas: a) História; b) Geografia; V – Ensino Religioso. Neste contexto de consolidação da educação básica, do processo de reorganização curricular, de redefinição da base nacional comum e da 1 2 BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB nº 4/2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília, DF, 2010. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB nº 7/2010. Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de Nove (9) Anos. Brasília, DF, 2010. FONAPER parte diversificada, da nova relação entre área de conhecimento e componente curricular, que se insere o Ensino Religioso. Atentos às mudanças da sociedade brasileira e frente aos desafios contemporâneos surgidos após a Constituição Federal de 1988, diferentes sujeitos vêm propondo e construindo novos paradigmas para o ensino religioso. Legitimado pelo Art. 33 da LDB nº. 9.394/96 (redação alterada pela Lei nº. 9.475/1997)3, é considerado disciplina escolar, parte integrante da formação básica do cidadão, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Desde então, o Ensino Religioso objetiva disponibilizar conhecimentos construídos historicamente pelas culturas e tradições religiosas, a fim de possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença, valorizando a diversidade cultural religiosa presente na sociedade, como uma das formas de promover e exercitar a liberdade de concepções e a construção da autonomia e da cidadania, prerrogativas de um Estado laico e democrático. Todo conhecimento humano, inclusive o religioso, independente da forma como foi construído, quando elaborado, torna-se patrimônio da humanidade. Sendo patrimônio da humanidade, deve estar disponível à escola a fim de possibilitar ao educando uma compreensão mais acurada da realidade em que está inserido, possibilitando o desenvolvimento de ações conscientes e seguras no mundo imediato, além de ampliar o seu universo cultural. (MOREIRA; CANDAU, 2008)4. A fim de atender as necessidades e garantir os direitos de aprendizagem dos educandos, o conhecimento que transita o cotidiano escolar apresenta certas características próprias para serem tratados na escola, por isso denominados de conhecimentos escolares. [...] Concebemos o conhecimento escolar como uma construção específica da esfera educativa, não como uma mera simplificação de conhecimentos produzidos fora da escola. Consideramos, ainda, que o conhecimento escolar tem características próprias que o distinguem 3 4 14 O Art. 33, o primeiro a ser modificado da LDBEN nº. 9.394/1996, procede de uma grande mobilização da sociedade brasileira, envolvendo educadores, representantes de entidades civis, religiosas, educacionais, governamentais e não governamentais, de diferentes setores de atuação, sensibilizados e comprometidos com a causa do Ensino Religioso na escola pública, em nível da Educação Básica. MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa; CANDAU, Vera Maria. Currículo, conhecimento e cultura. In: BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Indagações sobre o currículo. Brasília, 2008. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso de outras formas de conhecimento. (MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 22). Essas características se tornam evidentes em diferentes momentos, sendo um deles o tratamento dado aos conhecimentos no processo de ensino-aprendizagem. Quando ensinados na escola, não podem ser tratados como ―cópias exatas de conhecimentos socialmente construídos‖ (MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 23). Significa dizer que não se trata de uma simples mudança de posição ou de lugar. Se assim fosse, a função da escola e do professor estariam comprometidas, pois não podem ser reduzidos a simples receptores de conhecimentos elaborados pelas instituições produtoras do conhecimento científico e das demais áreas da atividade humana, como o mundo do trabalho, das tecnologias, dos movimentos sociais, da produção artística, do campo da saúde, das atividades desportivas e corporais e outras. A escola também pode ser um espaço de produção de conhecimentos no processo de ensinoaprendizagem. Neste sentido, é de fundamental importância compreender que: Para se tornarem conhecimentos escolares, os conhecimentos de referência sofrem uma descontextualização e, a seguir, um processo de recontextualização. A atividade escolar, portanto, supõe uma certa ruptura com as atividades próprias dos campos de referência. (MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 23). É nesta perspectiva que a formação específica para cada área do conhecimento da educação básica tem seu fundamento. É o professor licenciado para determinado componente curricular que poderá reunir as condições necessárias para ler, interpretar e realizar o processo de descontextualização e a posterior recontextualização com seus educandos em um determinado contexto histórico-cultural, tornando assim os conhecimentos significativos para aqueles sujeitos. Isso posto e, diante das DCNGEB, das DCNEF e do art. 33 da LDB, cabe perguntar: como os conhecimentos são construídos nas culturas e tradições religiosas? Como esses conhecimentos elaborados e sistematizados pelas ciências chegam até a escola? Quais são os desafios e possibilidades inerentes ao processo de descontextualização e recontextualização dos conhecimentos no Ensino Religioso? Quais são os 15 FONAPER desafios e perspectivas para a formação de professores na área do ensino religioso? Discutir e socializar estudos e pesquisas relacionadas aos processos de construção de conhecimentos nas culturas e tradições religiosas e suas interfaces com o Ensino Religioso enquanto área de conhecimento da educação básica, bem como oportunizar a comunicação de pesquisas e práticas pedagógicas que dizem respeito a essa temática, foram as intenções do VII CONERE. Ao todo, 64 trabalhos foram aprovados pela Comissão Científica para a publicação, os quais integram o presente volume dos Anais do VII CONERE. O FONAPER agradece as instituições copromotoras e apoiadoras do evento, os membros da Comissão Organizadora e da Comissão Científica, acadêmicos, pesquisadores e docentes de Educação Básica que gentilmente submeteram seus trabalhos, bem como a todos os participantes do VII CONERE, os quais, em conjunto, contribuíram para a realização de mais um evento científico em prol da consolidação do Ensino Religioso como área de conhecimento na Educação Básica. Coordenação FONAPER (Gestão 2012-2014) 16 PROGRAMAÇÃO DATA 03/10 5ª feira 04/10 6ª feira HORA ATIVIDADE C-H 16h00 Credenciamento 18h30 Solenidade de Abertura 19h00 às 21h30 Mesa I: A construção dos conhecimentos nas culturas - tradições religiosas e não-religiosas 4h/a 8h00 às 12h00 Comunicações de trabalhos – GTs 5h/a 14h00 às 16h00 Minicursos 17h00 às 19h30 Mesa II – Os conhecimentos religiosos e nãoreligiosos na produção do conhecimento científico. 6h/a Plenária 05/10 Sábado 19h30 Assembleia Ordinária do FONAPER 20h30 Noite Cultural 08h30 Mesa III: A (re)construção dos conhecimentos religiosos e não- religiosos no Ensino Religioso. Plenária 12h30 Solenidade Encerramento 5h/a COMUNICAÇÕES GT1: FORMAÇÃO DOCENTE PARA O ENSINO RELIGIOSO Coordenação: Dra. Lílian Blank de Oliveira (RELER/FURB); Me. Simone Riske-Koch (FURB/FONAPER) Dra. Elisa Rodrigues (UFJF) Ementa: Ao longo da história da educação brasileira, diferentes ações foram implementadas visando garantir a oferta de formação inicial e continuada aos professores de Ensino Religioso. Entretanto, a partir da promulgação da Lei n. 9.475/97, a formação de docentes para esta área do conhecimento tem sido alvo de crescente interesse, discussão e pesquisa em âmbito nacional, envolvendo a comunidade acadêmica, sistemas de ensino e organizações da sociedade civil, tendo em vista a necessidade de assegurar o respeito à diversidade culturalreligiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Este GT busca problematizar, discutir e socializar referenciais, políticas e práticas relativas à formação inicial e continuada na área de conhecimento de Ensino Religioso na atualidade brasileira. Palavras-chave: Formação Docente; Ensino Religioso; Diversidade Cultural Religiosa; Brasil. A PRÁTICA REFLEXIVA NO CONTEXTO DE AÇÃO DO PROFESSOR PESQUISADOR Gleyds Silva Domingues1 - FACULDADES EST Resumo: A prática reflexiva torna-se o ponto chave para que o docente repense a sua ação pedagógica, a qual não deve estar limitada ao ato de transmissão de um conhecimento sistematizado. Antes, faz-se necessário revisitar a sua forma de pensar, agir e decidir diante de uma situação ou processo educativo. Sendo assim, questiona-se: como a prática reflexiva pode contribuir de forma significativa com a ação do professor-pesquisador? E ainda, como formar o professor para o exercício de uma prática reflexiva? Diante da questão levantada, esta pesquisa visa apontar a relevância da prática reflexiva na formação do professor pesquisador situado no campo do ensino religioso. A intenção volta-se para tecer uma discussão sobre a formação profissional, uma vez que tanto o processo de ensino como de aprendizagem são demarcados por diferentes significações. A proposta, então, apresenta como direção o desenvolvimento da formação profissional reflexiva e como esta deve ser considerada pelo docente, no que se refere a sua ação educativa. Esse é o desafio ou a trama a ser construída nesta investigação. Palavras-chave: prática reflexiva; professor pesquisador; formação profissional. Introdução O contexto do trabalho docente torna-se referente de uma prática profissional, a qual é revestida de códigos e linguagens que lhe dão sentido e significação, isso porque no seu interior ocorrem representações que são parte do fazer docente, as quais revelam concepções e saberes oriundos, quer da experiência, quer da sistematização de conhecimentos de natureza teórico-prática. O fazer docente, então, é marcado por saberes que tem sua origem nos conhecimentos tácitos e científicos, os quais foram e continuam sendo adquiridos no processo de formação quer seja inicial ou continuada, sendo alvos diretos da ação reflexiva, e por isso são fundamentais no ato de repensar e ressignificar a prática educativa. 1 Doutoranda em Teologia (Faculdades EST); Bolsista da CAPES, Mestre em Educação. Integrante do Grupo de Pesquisa Currículo, identidade religiosa e práxis educativa e pesquisadora do Núcleo Paranaense de Pesquisas em Religião (NUPER). E-mail: [email protected] FONAPER Esses saberes, ainda, são expressos no trabalho educativo e possibilitam ao professor tecer diálogos com a realidade em que está inserido. Isso se torna mais evidente quando os saberes são percebidos no interior de uma prática reflexiva, a qual se apresenta na tríade relacional ação-reflexão-tomada de decisão. A prática reflexiva torna-se, então, o objeto eleito neste trabalho, cujo objetivo volta-se para compreender o seu sentido no contexto do trabalho docente, uma vez que a mesma requer do profissional professor(a) o desenvolvimento de uma escuta atenta capaz de perceber os detalhes envolvidos na trama relacional, em que este profissional encontra-se inserido: a práxis educativa. Diante disto, surge a questão problematizadora a ser investigada: como a prática reflexiva pode contribuir de forma significativa com a ação do professor pesquisador? E ainda, como formar o professor para o exercício de uma prática reflexiva? A finalidade do trabalho não é apresentar respostas pontuais sobre a problemática levantada, antes objetiva-se discutir a questão, a fim de contribuir com o campo de pesquisa sobre formação de professores, no sentido de pontuar possibilidades a serem consideradas, no que diz respeito ao fazer docente em relação à prática reflexiva. Eis um caminho a ser trilhado. A busca começou. Saberes, formação e identidade docente Ao falar em formação docente faz-se necessário tecer relações entre os saberes e a prática profissional a ser exercida, isso porque não há prática esvaziada de sentidos, antes ela partilha de certos saberes que dão forma e representatividade à ação educativa. Entende-se que os sentidos incorporados ao fazer docente são construídos numa trajetória de formação e profissionalização, visto que envolve um processo marcado por experiências, significações e conhecimentos que comporão a identidade profissional docente. ―A identidade não é um dado adquirido, não é uma propriedade, não é um produto. A identidade é um lugar de lutas e conflitos, é um espaço de construção de maneiras de ser e estar na profissão‖. (NÓVOA, 1995, p. 34). A identidade, ainda: 24 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso [...] nos permite aprender a ser o que somos, nos distanciando do que não somos, ajuda a compreender a complexidade do nosso trabalho e a importância do mesmo, imprime em nós um caráter, uma marca, uma especificidade que distingue pessoas e produz conhecimento (CUNHA, 2005, p.167). A identidade docente, então, constitui-se de digitais que são atinentes ao exercício de uma profissionalidade, a qual é revestida de saberes que se tornam próprios de uma profissão. Isso porque, a profissionalidade é ―caracterizada por um conjunto de competências, habilidades e valores instituídos pela sociedade‖. (DOMINGUES, 2007, p. 22). No caso brasileiro da formação profissional de professores, este conjunto - de competências, habilidades e valores - pode ser encontrado nas Diretrizes Curriculares de Formação de Professores, as quais são utilizadas pelas diferentes instituições de ensino superior na organização e construção de seus projetos pedagógicos voltados à formação docente. Para Nóvoa (1992, p. 26): Os professores têm de afirmar a sua profissionalidade em um universo complexo de poderes e relações sociais, não abdicando de uma definição ética – e, num certo sentido, militante – da sai profissão, mas não alimentando utopias excessivas, que se viram contra eles, obrigando-os a carregar aos ombros o peso das injustiças sociais. A causa do mal estar dos professores prende-se, sem dúvida, à defasagem que existe nos dias de hoje entre uma imagem idílica da profissão docente e as realidades concretas com que os professores se deparam no seu dia a dia. Ainda sobre a profissionalidade docente é perceptível que a mesma expresse de fato uma identidade real, ou seja, aquela que está consubstanciada na realidade e não distanciada da mesma, o que torna um grande desafio no processo de formação e profissionalização, pois parte-se da ideia de uma prática fundamentada numa teoria e de uma teoria fundamentada numa prática. Afinal, ―os professores e as professoras também têm teorias que embasam a sua prática e práticas que embasam suas teorias, e esses conhecimentos podem ser sistematizados‖. (GERALDI et al., 1998, p. 264) A relação teoria e prática torna-se o ponto de equilíbrio a ser buscado no processo de formação docente, visto que é nesta busca que os saberes serão situados e constituídos. Os saberes, então, podem ser considerados como a expressão fundante do trabalho docente, pois 25 FONAPER revelam posicionamentos, concepções e fazeres que foram se consolidando no decorrer de um tempo histórico. ―A apropriação desses saberes pelo educador pode contribuir para que sua prática seja reflexiva, consciente e politizada‖ (BENASSULY, 2002, p. 185). Não é à toa que os saberes são apresentados pelos estudiosos da formação docente em categorias. Essas categorias expressam, de fato, as significações que são representadas no fazer docente e que influenciam, sobremaneira, a forma como este docente pensa, age e sente sobre o exercício de sua profissão. Weisser (1998, p. 95) sinaliza que os saberes da prática ―não são fruto de uma transmissão, mas de uma apropriação e de uma produção; eles estão ligados ao ator profissional, mas também à sua pessoa‖. Os saberes imprimem o jeito de ser do docente, ou seja, eles refletem a forma com que cada docente se afirma diante do conteúdo do seu trabalho e também da vida. Ainda sobre os saberes, Tardif (2002) afirma que são eles plurais, pois compreendem os conhecimentos ligados à disciplina, ao currículo, à experiência e à formação profissional. Na visão, ainda, de Tardif o saber tem natureza social e por isso revela a presença de uma intencionalidade na ação do professor, requerendo dele uma postura profissional política e ética. Isto porque, ―O professor é alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência‖ (TARDIF, 2002, p. 39). Para Gauthier (1998, p.27), a prática educativa é pautada na ―mobilização de vários saberes que formam uma espécie de reservatório no qual o professor se abastece para responder a exigências de sua situação concreta de ensino‖. Assim, na tentativa de encontrar respostas para as questões enfrentadas no cotidiano de sua ação educativa, surge a necessidade de os professores autorrefletirem sobre suas práticas. Essa reflexão requer posicionamento crítico diante da realidade, como também bases teóricas, epistemológicas e práticas que substanciam seu trabalho docente. A prática reflexiva A reflexão é um ato que envolve escuta sensível dos sujeitos quanto à leitura da realidade presente. Esta realidade é marcada por significações 26 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso que dão vida ao trabalho efetivado, principalmente quando este envolve o processo de ensinar e aprender. Afinal, ―o ensino não é um meio para conseguir certos objetivos fixos, previamente estabelecidos, mas o espaço no qual se realizam os valores que orientam a intencionalidade educativa (SACRISTÁN e PÉREZ GÓMEZ, 2007, p.86)‖. O ato do ensinar e do aprender constitui um processo relacional a ser mediado, o que retira dele o caráter puramente técnico e transmissivo, pois à medida que há interação o ato educativo se apresenta como uma possibilidade aberta para o diálogo e para o enfrentamento da realidade social, pois a partir das questões levantadas, os sujeitos autorrefletem e se posicionam criticamente diante das problemáticas advindas de um contexto, no sentido de buscar sentidos para o seu pensar e agir no mundo. A condição basilar do ensino é ―transformar a informação numa ponte luminosa entre a realidade do aluno e a realidade da cultura, entre o mundo do aluno e o mundo da gramática, entre a vida do aluno e a vida das palavras (PERISSÉ, 2012, p. 14)‖. Frente a esta realidade interacional, entende-se que o agir reflexivo torna-se uma prática emancipatória que requer do professor uma visão comprometida com a reconstrução social. Isso porque, ele se torna um protagonista de sua ação, pois assume o processo de autoria que permite a construção de novos saberes, os quais se farão presentes no processo ensino e aprendizagem. Desta forma, ao transpor a concepção do professor reflexivo para o Ensino Religioso percebe-se que seu papel requer abertura para o diálogo e, acima de tudo, a aceitação do outro. Esse outro é percebido e sentido com toda a gama de discursos construídos, aceitos e representados na esfera social. A ação reflexiva do professor frente ao seu trabalho docente, ainda, remete à prática da autonomia legitimada e consolidada, que busca nos discursos produzidos a representação dos papeis que entram em jogo no ato de fazer e acontecer a educação. A ação reflexiva é um processo que implica mais do que a busca de soluções lógicas e racionais para os problemas; envolve intuição, emoção; não é um conjunto de técnicas que possa ser empacotado e ensinado aos professores. A busca do professor reflexivo é a busca do 27 FONAPER equilíbrio entre a reflexão e a rotina, entre o ato e o pensamento. (GERALDI et al, 1998, p.248) A reflexividade, então, não é um ato simples da prática docente, isso porque o próprio ato revela o modo como o pensamento é projetado e concretizado no trabalho educativo. Quando se pensa em ação reflexiva, deve-se fazer a correlação possível entre os sujeitos em cena, a partir de suas leituras e percepções sobre a vida e, principalmente, como esses apreendem os objetos e os sentidos atribuídos no ato de significação e desvelamento do desconhecido. A reflexão não é apenas um processo psicológico individual, passível de ser estudado a partir de esquemas formais, independentes do conteúdo, do contexto e das interações. A reflexão implica a imersão consciente do homem no mundo da sua experiência, um mundo carregado de conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afetivas, interesses sociais e cenários políticos. O conhecimento acadêmico, teórico, científico ou técnico só pode ser considerado instrumento dos processos de reflexão se for integrado significativamente, não em parcelas isoladas da memória semântica, mas em esquemas de pensamento mais genéricos ativados pelo indivíduo quando interpreta a realidade concreta em que vive e quando organiza a sua própria experiência (PÉREZ GÓMEZ, 1992, p.103). Ao se posicionar política e historicamente, o professor reflexivo confere novos jeitos de trabalhar o Ensino Religioso, à medida que permite o ato de se descobrir diante do inusitado, do inesperado, do impensável e do não crido. Nesse gesto de abertura para o diferente há a proposição da autonomia, que confere voz e vez aos sujeitos que estão diretamente envolvidos nas práticas cotidianas, pois o que se fala é de vida e não de outra coisa. A prática reflexiva no fazer docente torna-se o ponto de partida para o exercício da alteridade, capaz de posicionamento e enfrentamento, cuja finalidade não é o distanciamento, mas a busca pelo outro. Mais uma vez este outro que desequilibra e torna a vida um grande desafio, assim como o trabalho educativo a ser construído num tempo e num espaço demarcado na história. Ao praticar a reflexão no Ensino Religioso o que se tem em mente é a diversidade de ideias, de ações e leituras sobre a vida. Vida significada, experimentada e compartilhada, quer seja por um conjunto de crenças, 28 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso tradições e visões de mundo. A prática reflexiva coloca em confronto as certezas que fundamentam o sentido de ser, estar e viver neste mundo. A reflexão na e sobre a ação evidencia o momento entre o ato pensado, concretizado e o que poderá ser reelaborado, que requer registro do professor e suas ações. Esse registro não se limita a práticas, mas são formulações e reformulações de possíveis ações, como respostas às reflexões sobre o problema encontrado na realidade escolar (DOMINGUES, 2007, p. 29). Tem-se na prática reflexiva uma visão que projeta para o desconhecido. É um ato de desvelamento, de descoberta e de aventura, pois de fato não se busca por respostas prontas, mas por perguntas que desafiam as certezas, o que torna esta prática um ato do sujeito, envolto em suas percepções e subjetividades. À guisa de conclusão Falar da prática reflexiva na formação e prática docente requer um olhar atento para o processo educativo em que estão imersos os professores e as professoras, isso porque este processo não pode ser limitado apenas ao momento de sistematização do conhecimento, pois sua amplitude abarca as experiências e os saberes teórico-práticos que são construídos ao longo de uma trajetória profissional. Os saberes delineiam a identidade docente e o modo como cada professor e professora orientam seu trabalho educativo, o que requer do profissional uma postura comprometida com as questões éticas, políticas e sociais em que se encontram imersos. Pensar a reflexividade na prática docente é assumir que a mesma possibilita tecer leituras sobre o vivido, o experenciado e o construído, quer seja de forma subjetiva ou em conjunto com seus pares. O desafio a ser perseguido é que o ato da reflexão se faça presente no contexto do trabalho docente, a fim de significar o seu trabalho educativo. Nesta direção, a reflexividade no contexto do Ensino Religioso tornase referente de uma prática que busca tecer linhas de confronto com o estabelecido na realidade social. Assim, não há que se falar numa prática religiosa, mas de uma multiplicidade de cosmovisões que significam a vida. A busca pelo sentido da reflexão começa quando se toma consciência das possibilidades a serem construídas no âmbito da prática 29 FONAPER docente, a qual demanda novas leituras e interpretações daquele que observa, sente, age e vive a educação. Essa é a grande diferença. Referências BENASSULY, J. S. A formação do professor reflexivo e inventivo. In: LINHARES, C.; LEAL, M.C. (Orgs.). Formação de Professores: uma crítica à razão e à política hegemônicas. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. CUNHA, Kátia Silva. A Formação Continuada Stricto Sensu: sentidos construídos pelos docentes do ensino superior privado face às exigências legais. Dissertação (Mestrado em Educação). Recife: CE/UFPE, 2005. DOMINGUES, G. S. Concepções de investigação-ação na formação inicial deprofessores. 2007, 135 p. (Dissertação de Mestrado). Programa de Pós Graduação (strictosensu) em Educação, Universidade Metodista de Piracicaba - SP, 2007. GAUTHIER, C. et al.Por uma teoria da pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente - Coleção Fronteiras da Educação. Ijui: Ed.UNIJUÍ, 1998. GERALDI, C. M. G.; FIORENTINI, D. e PEREIRA, E. M. DE. A. (orgs).Cartografia do trabalho docente: professor(a) pesquisador(a). SP: Mercado das Letras, 1998. NÓVOA, A. (org). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. ______. Diz-me como ensinas, dir-te-ei quem és e vice-versa. In: FAZENDA, I. (org.) A Pesquisa em Educação e as transformações do conhecimento. Campinas: Papirus,1995, p.29-41. PÉREZ GOMÉZ, A. O pensamento prático do professor – a formação do professor como profissional reflexivo. In: NÓVOA, A. (org). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. PERISSÉ, Gabriel. A arte de ensinar. Brasília: Editora UNB, 2008. SACRISTÁN, Juan Gimeno; PÈREZ GÓMEZ, A. I. Compreender e transformar o ensino. Porto Alegre: Artmed, 2007. 30 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 2a edição. Petrópolis: Vozes, 2002. WEISSER, M.Lesavoir de la pratique: I‟Existence precede I‟Essence. Recherceetformation, Lessavoirs de la pratique: um enjeupourlarecherche et laformation.INRP, n.27, p. 93-102, 1998. 31 FORMAÇÃO DOCENTE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA: LICENCIATURA EM ENSINO RELIGIOSO DA FURB Vanderlei Kulkamp (PARFOR/FURB)1 Gysselly Buzzi Puff (PARFOR/FURB)2 Adecir Pozzer (GPEAD/FURB)3 Resumo: O presente artigo trata da formação docente do profissional de Ensino Religioso na Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB) que, com base no artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), visa assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa brasileira, em uma perspectiva de direitos humanos. Ao se constatar grande carência de profissionais habilitados em Ensino Religioso para atuarem nesta área do conhecimento da educação básica que, acaba sendo suprida por profissionais com formação em pedagogia, filosofia, história e/ou outras áreas, verificamos a relevância da licenciatura em Ensino Religioso para o estudo das diferentes manifestações do fenômeno religioso presentes no cotidiano escolar e na sociedade de modo a contextualizá-lo, a partir de pressupostos científicos e em perspectivas de direitos humanos. Consideramos o Ensino Religioso, enquanto área de conhecimento e componente curricular, um espaço privilegiado para o acesso aos conhecimentos produzidos pelas culturas – tradições religiosas e não-religiosas, contribuindo significativamente na construção de relações alteritárias na diversidade cultural religiosa. Palavras-chave: Formação docente; Licenciatura em Ensino Religioso na FURB; Diversidade Cultural Religiosa; Direitos Humanos. 1 2 3 Acadêmico da 8ª fase do Curso de Ciências da Religião: Licenciatura em Ensino Religioso (PARFOR – Rio do Sul), da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Licenciado em Filosofia pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). Professor de Ensino Religioso na Rede Municipal de Agronômica/SC e de Filosofia na Rede Estadual de Educação de Santa Catarina, Ensino Médio, na cidade de Rio do Sul/SC. E-mail: [email protected] Acadêmica da 8ª fase do Curso de Ciências da Religião: Licenciatura em Ensino Religioso (PARFOR – Rio do Sul), da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Licenciada em Química pela FURB. Professora de Química e Ensino Religioso na Rede Estadual de Educação de Santa Catarina, Ensino Fundamental e Médio, na cidade de Lontras/SC. E-mail: [email protected] Mestrado em Educação pela UFSC; Graduação em Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso pela FURB (2010); Especialização em Formação de Professores para o Ensino Religioso pela PUCPR (2006). Bacharel em Ciências Religiosas pela PUCPR (2002). Membro dos grupos de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento (GPEAD/FURB) e Arte e Educação da linha Filosofia da Educação (GRAFIA/UFSC). Coordenador do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER 20122014). Professor de Ensino Religioso Rede Pública do Estado Santa Catarina, da Associação Franciscana Senhor Bom Jesus e no Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso na FURB/PARFOR. Atua na área da Educação, com ênfase nos seguintes temas: diversidade cultural religiosa, ensino religioso, formação de professores e direitos humanos. E-mail: [email protected] FONAPER Introdução Pensar a formação docente no Brasil requer uma ampliação de olhares para além dos momentos formais pelos quais os formandos são submetidos nos inúmeros processos formativos. Significa dizer que é necessário compreender o conceito de formação no intuito de identificar os pressupostos, princípios e valores que orientaram e orientam os processos de formação presentes na atualidade. Não nos deteremos na realização de uma análise histórica do conceito e dos processos de formação de modo geral, apenas nos propomos puxar um ―fio‖ da grande ―teia‖ que, de certa forma, incide diretamente com a formação docente para o Ensino Religioso. Este ―fio‖ que nos dispomos refletir se refere à relação entre a diversidade cultural religiosa e a formação docente para o Ensino Religioso no Brasil, com especial atenção a licenciatura de Ensino Religioso da FURB. É sabido, pois, que uma das marcas da sociedade brasileira é a presença de inúmeras identidades culturais que, cada qual, trouxe crenças e formas diversificadas de manifestá-las. Esta marca estava/está presente nos diferentes grupos indígenas, ampliada e ao mesmo tempo negada com a vinda dos colonizadores, seguida com o tráfico de africanos tornados escravos, com os processos de imigração e mais recentemente com o processo de mundianização. Estes encontros entre culturas e crenças religiosas e não-religiosas geraram sincretismos e despertaram a consciência de muitos para a importância do respeito à diferença e a dignidade4 do outro5, porém, 4 5 34 Todo ser humano é portador de dignidade por ser diferente. O outro interpela o eu por reconhecimento. O eu não poderá anular o outro ou simplesmente reduzi-lo ao mesmo. Emerge daí a diferença que constitui cada pessoa, sob a qual se constroem as identidades humanas. ―[...] A dignidade humana não provém do Estado e nem é criada pela ordem jurídica ou simplesmente atribuída ao ser humano. A dignidade humana fundamenta-se no ser sujeito e pessoa, do ―ser humano‖ como tal. Ela implica numa existência anterior ao princípio da ordem jurídica do Estado. Ela interpela eticamente pelo reconhecimento da alteridade absoluta. Ela é conquista, afirma uma nova consciência histórica para ser humanamente no mundo social e político. É anterior a qualquer direito estabelecido pelo Estado‖ (SIDEKUM, 2011, p. 40). Para Levinas, o ―Outro‖ existe independentemente da intencionalidade do ―eu‖. É totalmente diferente do ―eu‖. Totalmente livre diante do ―eu‖. ―O Outro metafísico é outro de uma alteridade que não é formal, de uma alteridade que não é simples inverso da identidade nem de uma alteridade feita de resistência ao Mesmo, mas de uma alteridade anterior a toda a iniciativa, a todo imperialismo do mesmo; outro de uma alteridade que constitui o próprio conteúdo do Outro; outro de uma alteridade que não limita o mesmo, porque nesse caso o Outro não seria rigorosamente Outro: pela Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso possibilitou também a construção de preconceitos em relação à diferença cultural e religiosa, gerando discriminação, invisibilização e estigmatização do outro, sendo colonizado e não reconhecido em sua alteridade. Na esteira deste contexto marcado pela diversidade cultural religiosa é que diferentes conceitos e encaminhamentos na área da formação foram se construindo e, em grande parte da história, reforçando certos preconceitos referentes às crenças religiosas. No tocante ao Ensino Religioso, a formação docente para as conhecidas ‗aulas de religião‘, de ‗educação religiosa‘ até na década de 1990 estava centrada nas instituições religiosas cristãs. Segundo Caron (1997), esses professores tinham formação em cursos de Teologia, Ciências Religiosas, Catequese, Educação Cristã ou outras formações similares. Deste modo, o Ensino Religioso tinha caráter confessional cristão. Neste período ainda não existiam cursos de graduação com o objetivo de formar profissionais habilitados para o Ensino Religioso, sendo capazes de compreender o fenômeno religioso em suas diferentes manifestações culturais religiosas, bem como as inúmeras linguagens religiosas ou não, a partir de pressupostos científicos. De acordo com Figueiredo (1994), as primeiras iniciativas para a formação docente em Ensino Religioso de caráter não confessional, surgiram no Sul do Brasil, especificamente no Estado de Santa Catarina. Essas iniciativas são decorrentes das amplas discussões e estudos iniciados nos anos 1970, principalmente a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 5.692/1971, mas, surgem também para atender ao art. 33, da Lei nº 9.394/1996, cuja redação fora alterada pela Lei nº 9.475/19976. Após algumas tentativas sem êxito de criar cursos de licenciatura em Ensino Religioso no Estado de Santa Catarina7, a FURB, tendo recebido a coordenação do Conselho Interconfessional para a Educação Religiosa 6 7 comunidade da fronteira, seria, dentro do sistema, ainda o Mesmo‖ (LEVINAS, 1980, p. 26). ―O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo‖ (BRASIL, 1997). De acordo com Oliveira (2003), já em 1972 foi elaborado o primeiro projeto de curso de licenciatura de Ensino Religioso. Outros dois projetos foram elaborados em 1973 e entre 1985 a 1990, de forma articulada com a Secretaria Estadual da Educação. Porém, nenhum obteve êxito na sua implementação. 35 FONAPER (CIER) e de representantes da Secretaria da Educação e do Desporto de Santa Catarina (SED), em outubro de 1995, avaliou e acolheu a proposta de ofertar licenciatura em Ensino Religioso. Para esta área do conhecimento da educação básica, criava-se aí a primeira licenciatura do país, exigindo e desafiando para uma nova perspectiva de formação docente. Neste sentido, pretendemos refletir alguns aspectos que, com base na experiência de estarmos envolvidos com esta formação, reconhecemos como diferenciais para o exercício da docência na atualidade, no intuito de afirmar o quanto é relevante uma formação fundamentada em uma perspectiva interreligiosa e intercultural em vista de uma educação emancipadora. Diversidade cultural religiosa brasileira: invisibilizações e reconhecimento Tratar da diversidade religiosa presente na sociedade brasileira implica compreender como a pluralidade de culturas está imbricada aos processos históricos, políticos e sociais que, de uma forma ou de outra, perpassam os processos formativos, tanto acadêmicos quanto escolares. Antes de qualquer coisa, é preciso lembrar que a diversidade religiosa foi (e continua) se constituindo nos encontros e/ou desencontros entre as culturas, em que a dimensão transcendental foi sendo representada e tomando forma de crenças fundadas em mitos, vivenciada e representada em rituais e símbolos específicos. Por cultura, concordamos que é o arcabouço para a sobrevivência e o desenvolvimento do ser humano, por possibilitar aprendizagens, sentidos e significados (SIDEKUM, 2009). O mesmo autor complementa tal definição afirmando que ela é: [...] todo o ato de aprender a viver e o processo de humanizar-se. Cultura passa a ser o processo de humanização. Assim, podemos definir a cultura como o modo de viver do ser humano. Pela cultura o homem supera o que lhe é dado pela natureza. Portanto, a cultura é todo o processo com o qual ele se transforma: a sociedade e o mundo material. [...] A cultura compreende-se a partir da criatividade humana. Essa criatividade é sua característica fundamental. O caráter antropológico é a divisa que se estabelece com um mundo dado. [...] A cultura expressa o desenvolvimento das habilidades cognitivas e espirituais do ser humano. Além da ideação do mundo, o ser humano é impulsionado para a transformação do mundo (SIDEKUM, 2009, p. 58-60). 36 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Todas as culturas produziram crenças religiosas frente aos processos de compreensão e explicação dos fenômenos naturais e humanos que incidiam sobre os corpos humanos e influenciavam o ambiente que viviam. De acordo com Martini (1995), na raiz de toda criação cultural reside uma possibilidade de transcendência. A capacidade de transcender é uma dimensão inerente ao ser humano e esta integra tudo o que está em seu envolto. Por isso, o ser humano foi deixando marcas ao longo da história que o caracteriza como homo religiosu que, de acordo com Eliade (2001), é a abertura às manifestações inteiramente diferentes das realidades consideradas ―naturais‖. O religioso, expresso em diferentes religiosidades e tradições religiosas, passa a ser entendido como parte de uma totalidade, corresponsável pela vida. Para Eliade, buscar conhecer o universo transcendental e as situações assumidas pelo ser humano religioso é fazer avançar seu conhecimento como um todo, embora se saiba que, [...] a maior parte das situações assumidas pelo homem religioso das sociedades primitivas e das civilizações arcaicas há muito tempo foram ultrapassadas pela história. Mas não desapareceram sem deixar vestígios: contribuíram para que nos tornássemos aquilo que somos hoje; fazem parte, portanto, da nossa própria história (ELIADE, 2001, p. 164). No Brasil, as crenças religiosas dos povos ancestrais indígenas e africanos foram relegadas, negadas e invisibilizadas pelos colonizadores, os quais impuseram outra crença, a cristã. Aos que se negavam à conversão, à perseguição e ao não reconhecimento social e político. Além dos povos ancestrais indígenas, passaram pelas mesmas restrições e perseguições integrantes das religiões afro-brasileiras, judaicas e protestantes, até a Proclamação da República. A diversidade cultural religiosa era tida como uma ameaça ao fundamento em que a sociedade brasileira estava organizada (FONAPER, 2000). A concepção etnocêntrica, monocultural e colonialista não permitia/permite ver/aceitar/acolher a diversidade cultural e religiosa que constitui a sociedade brasileira. Com o processo de imigração iniciado no século XIX e intensificado no século seguinte, juntamente com as lutas de movimentos étnicos, sociais e religiosos ocorreu um processo de ampliação e percepção da diversidade cultural religiosa. Mesmo assim, tal 37 FONAPER processo se mostrou insuficiente e lento enquanto reconhecimento social e político de inúmeras identidades culturais/religiosas. É perceptível que, mesmo após as reformas educacionais, o modelo etnocêntrico e monocultural permanece em propostas pedagógicas, em currículos de formação docente, produções de materiais didáticos, paradidáticos e outros, manifestando que, em certa medida, a própria educação e demais processos formativos têm se mostrado corresponsáveis na reprodução do pensamento monocultural. Pode-se dizer que, ora ela assume oficialmente, ora oficiosamente valores da cultura religiosa eurocêntrica, judaico-cristã, masculina, branca, negando e/ou desconsiderando o religioso presente no substrato das diferentes culturas. Na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, da UNESCO, publicada em 2002, a diversidade cultural é reconhecida como um patrimônio da humanidade. Do conjunto de elementos que constituem as culturas, não é possível excluir a dimensão das crenças religiosas, pois são parte da cultura e, de uma forma ou de outra, exercem influência na formação das identidades dos sujeitos. Mesmo que, aparentemente, as diferenças culturais e religiosas ―convivam bem‖ no Brasil, é preciso afirmar que o contexto é complexo e (re)produtor de exclusões, desafiando fundamentalmente os processos formativos para que ampliem suas reflexões, estudos e práticas a fim de superar processos que invisibilizam, discriminam e colonizam o outro em sua alteridade. Neste sentido, cabe destacar que a perspectiva intercultural e interreligiosa tem despertado o interesse de educadores que, comprometidos em assegurar o respeito e o (re)conhecimento da diversidade religiosa no campo educacional, têm procurado refletir e encaminhar práticas de caráter intercultural. A formação da identidade do docente em ensino religioso O reconhecimento do perfil do profissional de Ensino Religioso possibilita o exercício da cidadania e a construção de uma relação respeitosa com o diferente. O fato de acolher e aceitar o diferente e suas diferenças permite conhecer o outro em mim mesmo. A partir desta atitude 38 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso compreendemos que cada pessoa é única e irrepetível, digna de reconhecimento e respeito. Deste modo, não é possível tornar o outro igual ao mesmo, pois, acarretaria anulação total do outro, mas o que pode ocorrer são tentativas de redução, causadas pela pouca liberdade e responsabilidade em assumir a própria vida diante daquele/daquilo que a ameaça e, principalmente diante de processos subalternos e colonizantes que discretamente se desenvolvem na sociedade. No decorrer da história, o professor da Educação Básica conviveu com a desvalorização profissional. A desvalorização do professor de educação básica (antigo primário e ginásio e, depois, Ensino Fundamental; ensino secundário e, hoje, Ensino Médio) é continuação do longo processo histórico da educação no Brasil desde os tempos dos jesuítas, passando pela era pombalina, que a República não conseguiu superar (CORDEIRO, 2010, p. 128). Nas relações que o ser humano desenvolve, o uso das linguagens tem de favorecer a construção de uma ética da comunicação capaz de proporcionar transformações no convívio entre educandos e educadores. Mas, a alteridade do outro não pode ser compreendida na sua totalidade, pois acessamos o outro por meio da linguagem, e esta tem se demonstrado limitada e falível, especialmente quando se trata do entendimento do outro na sua infinitude. A linguagem é a maneira mais complexa que o ser humano criou para se relacionar com o mundo; ele faz a humanidade ser. Desde a fecundação, a fala do grupo familiar já integra o indivíduo no nível sociocultural da existência, transmitindo expectativas, escolhendo nomes, relatando a experiência e progressos no seu crescimento. A linguagem é a possibilidade concreta de os dados brutos da realidade tornem objeto de conhecimento. A fala permite às gerações transmitir o processo de interação com a natureza e elaborar a compreensão sobre elas (ANDRADE,1993, p.22). O ser humano nunca está pronto e, por ser inacabado, sempre permanece buscando o conhecimento de si mesmo e do outro que, de uma forma ou de outra, dá sentido a sua existência. Por isso, o espaço escolar tem maior relevância quando compreendido como espaço de construção de identidades individuais e coletivas, sendo a identidade e alteridade do outro o imperativo ético para continuar pensando e agindo 39 FONAPER não a partir de uma ―egologia‖, mas sim, a partir do outro, proposta filosófica de Emmanuel Levinas8. O reconhecimento da identidade e da alteridade do outro e do outro em mim nos processos de formação docente encontra-se desafiada pela globalização, o que tem trazido sérias consequências à educação. Os elementos norteadores desta ideologia tentam inculturar nos formandos a prática do consumismo, do individualismo, em que o ‗ter‘ tem muito mais importância que o ‗ser‘. Assim sendo, pode-se cair no risco de formar analfabetos funcionais. Formação docente e a licenciatura em Ensino Religioso na FURB Na atualidade, a formação do professor de Ensino Religioso apresenta-se cercada por inúmeros desafios. De um modo geral, no Brasil, é possível encontrar correntes que defendem a exclusão deste componente curricular. Outras correntes defendem a permanência do Ensino Religioso, mas de caráter confessional. Outra corrente defende a permanência do Ensino Religioso laico, independente de qualquer confissão religiosa e sem qualquer tipo de proselitismo. Mas, se há uma legislação (Art. 210 da Constituição Federal; Art. 33 da LDB) e esta indica uma concepção (assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa, sem proselitismo), por que tantas dificuldades para efetivamente pensar a oferta de formação docente, bem como sua oferta por parte dos sistemas de ensino, nesta perspectiva? Com a promulgação da Lei nº 9.475/1997, que alterou a redação do art. 339 da Lei nº 9.394/1996, inaugurou-se uma nova identidade deste componente. O Ensino Religioso perde seu caráter confessional e/ou interconfessional e adquire status de estudo do fenômeno religioso na diversidade cultural religiosa do Brasil. A partir disso, surgem novas demandas, especialmente voltadas à formação docente para esta área do 8 9 40 Para aprofundamentos, ver Tese de Doutoramento de Marcos Alexandre Alves, UFPEL, 2011, intitulada ―Pedagogia da Alteridade: O Ensino como Acolhimento Ético do Outro e condição crítica do saber em Levinas‖. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas do ensino fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo (BRASIL, 1997). Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso conhecimento (Cf. Resolução CNE/CEB nº 2 e Resolução CNE/CEB nº 4/2010). O Ensino Religioso, enquanto área de conhecimento e componente curricular tem de proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso partindo das experiências religiosas e não religiosas percebidas e vivenciadas no contexto dos educandos. Os conteúdos do Ensino Religioso presentes no currículo visam garantir o direito à diferença, promovendo a construção de relações interpessoais, interculturais e interreligiosas, efetivando assim os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Para alcançar estes objetivos, faz-se mister formar docentes que sejam capazes de desempenhar este papel na educação básica, confrontando processos que reduzem o ser humano a lógica instrumental e monocultural. Os docentes precisam ter consciência da complexidade sociocultural da questão religiosa no ambiente escolar, estando abertos e sensíveis à diversidade cultural religiosa, mediando diálogos, conflitos a fim de garantir aprendizagens e o direito à expressão do pensar, crer, ser e viver. Como em todas as áreas de conhecimento, exige-se também do profissional de Ensino Religioso, sensibilidade e responsabilidade frente às pessoas que são parte dos processos formativos. Justifica-se com isso a necessidade de profissionais que estejam devidamente preparados para o exercício da docência no ambiente escolar. Configuram algumas exigências para o profissional de Ensino Religioso: Compreenda o fenômeno religioso, contextualizando-o espacial e temporalmente; Configure o fenômeno religioso através das ciências da religião; Conheça a sistematização do fenômeno religioso pelas tradições religiosas e suas teologias; Analise o papel das Tradições religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações sócio-culturais; Faça a exegese dos Textos Sagrados orais e escritos das diferentes matrizes religiosas (africanas, indígenas, ocidentais e orientais); Relacione o sentido da atitude moral, como consequência do fenômeno religioso sistematizado pelas Tradições Religiosas e como expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária das pessoas (FONAPER, 1998, p. 11). A formação acadêmica deste profissional deve auxiliar no estudo e desenvolvimento de suas habilidades e competências. Uma das dificuldades encontradas na atualidade é o número de profissionais 41 FONAPER devidamente preparados e qualificados para a prática docente deste componente. Por isso, encontramos situações onde professores habilitados em outras áreas de conhecimento estão assumindo aulas de Ensino Religioso com o intuito de complementar sua carga horária, sem formação alguma. As habilidades e competências que o profissional de Ensino Religioso precisa adquirir durante a sua formação acadêmica são múltiplas. Entre elas convém destacar a relação entre teoria e prática através de uma formação sólida na área das ciências humanas, onde conhecimentos religiosos de matriz indígena, africana, oriental e semita se articulam em diferentes áreas como a Antropologia, Sociologia, Filosofia, História, Geografia, Psicologia, Teologia, Ética e outras. Com base no histórico de 18 anos - desde a instalação do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER, ele propõe que a formação específica para o professor de Ensino Religioso em nível superior, deve se dar por meio de licenciatura, precisa estar alicerçada em dois pressupostos curriculares: o epistemológico, que tem suas bases nas Ciências Sociais, especificamente nas Ciências da Religião e o pedagógico, que se fundamenta nas Ciências da Educação. Estes pressupostos necessitam estar articulados, sem que um se sobreponha ao outro, mas que se complementem visando à formação docente (FONAPER, 2008). Na proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso, elaborada a partir dos debates realizados no X Seminário Nacional de Formação de Professores para o Ensino Religioso pelo FONAPER e, encaminhado à presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Professora Clélia Brandão Alvarenga Craveiro, em 4 de dezembro de 2008, assim propôs a contemplação dos dois pressupostos acima citados no art. 7º: O curso de Graduação em Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso terá a carga máxima de 2.800 horas de efetivo trabalho acadêmico, assim distribuído: I – 1.800 horas de conteúdos curriculares de natureza científicoculturais específicos no campo das Ciências da Religião e da Educação, incluindo atividades formativas como assistências às aulas, realização de seminários e participação na realização de pesquisas; 42 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso II – 400 horas de prática como componente curricular, realizadas articuladamente às questões metodológicas dos conteúdos curriculares de natureza científico-cultural; III – 400 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado em todos os níveis da Educação Básica, caracterizadas por um trabalho práticoreflexivo devidamente acompanhado pelos docentes do curso, no qual os graduandos desenvolverão atividades pedagógicas rigorosamente planejadas; IV – 200 horas de atividades complementares de cunho acadêmicocientífico-cultural em áreas específicas de interesse dos licenciados, articulados ao campo das Ciências da Religião e da Educação (FONAPER, 2008). Outros aspectos fundamentais à formação docente para o Ensino Religioso devem ser considerados, como: ter consciência crítica com espírito investigativo, visão ampla da realidade/mundo/cosmo, conhecimento do ser humano como um ser inacabado em contínuo desenvolvimento, capacidade de discernimento e maturidade no exercício de sua profissão, domínio dos conteúdos a serem estudados neste componente, abertura à diversidade cultural e religiosa, senso de responsabilidade perante o Outro, estímulo à pesquisa de campo. Um professor de Ensino Religioso não pode reduzir sua formação ao domínio dos saberes de diferentes culturas e tradições religiosas, mas, para além destes conhecimentos necessários, precisa ter sensibilidade e responsabilidade referente às questões que dizem respeito ao ser humano em sua dignidade e alteridade, identificando e erradicando práticas prosélitas na escola e na sociedade que depõem contra os direitos humanos. Nesta perspectiva e atendendo os imperativos legais no que se refere à formação docente e às necessidades regionais, o Curso Ciências da Religião: Licenciatura em Ensino Religioso da FURB reelaborou sua proposta curricular no ano de 2011. O objetivo do curso consiste em: Auxiliar o acadêmico na construção de um referencial teóricometodológico que viabilize uma leitura e compreensão crítica dos fenômenos religiosos na diversidade cultural, permitindo a construção de uma sociedade justa, solidária e livre, capaz de reconhecer na alteridade a dignidade de todas as formas e expressões de vida (OLIVEIRA; RISKE-KOCH, 2012, p. 473). 43 FONAPER De acordo com as mesmas autoras, espera-se que com essa proposta curricular se atinja os seguintes objetivos enquanto curso de graduação: a) Habilitar o acadêmico para o exercício pedagógico em Ensino Religioso na Educação Básica; b) Investigar e compreender a dimensão educativa da escola e sua interação com a família, comunidade e sociedade em suas diversidades; c) Situar o estudo dos fenômenos religiosos no âmbito das ciências humanas; d) Sistematizar categorias, conceitos e práticas que expressem diferentes ideologias e relações com o que transcende as vivências humanas; e) Estudar os fenômenos religiosos na complexidade das relações sociais, culturais, políticas e pedagógicas, compreendendoos a partir de perspectivas inter e transdisciplinares; f) Analisar o papel das tradições religiosas e não religiosas na organização e estruturação das realidades sociais, históricas, políticas e culturais; g) Reconhecer e respeitar as diversidades e complexidades das diferentes manifestações e experiências religiosas nas sociedades e culturas, combatendo a discriminação e quaisquer formas de proselitismo no contexto escolar e social; h) Atuar com sensibilidade ética, responsabilidade e compromisso, na perspectiva da constituição de uma sociedade justa, solidária e humana, que indaga e busca intervir nas fontes geradoras do sofrimento, da ignorância e da injustiça; i) Conhecer as disposições previstas nas legislações do magistério e específicas para os profissionais de Ensino Religioso (OLIVEIRA; RISKE KOCH, 2012, p. 473-474). Atingir estes objetivos significa formar professores para o Ensino Religioso conscientes do compromisso enquanto gestores do conhecimento, prática que deve ter como pano de fundo a criticidade. Princípios éticos devem orientar a construção e/ou contextualização dos saberes que transitam o cotidiano escolar, a fim de conviver com as diversidades em uma perspectiva democrática e emancipatória, superando práticas de invisibilização, discriminação e colonização do Outro. Nesta perspectiva que o Curso Ciências da Religião com licenciatura em Ensino Religioso da FURB reorganizou sua proposta curricular, definindo em sua matriz curricular um total de 3.474 horas. Estas estão distribuídas em 2.322 horas para componentes de caráter científicoculturais e pedagógicas; 414 horas eixo articulador das licenciaturas; 486 horas destinadas à realização de estágios curriculares supervisionados na educação básica e 252 horas para atividades acadêmicas científicoculturais de cunho extracurricular (FURB, 2011). 44 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso A organização curricular se distribui em áreas temáticas que, se desdobram em um Eixo Geral que inclui componentes de outras áreas, e um Eixo Específico que caracteriza a identidade de cada curso. No Eixo Geral das licenciaturas, encontram-se os seguintes componentes: Currículo e Didática; Psicologia da Educação; Humanidade, Educação e Cidadania; Libras; Pesquisa em Educação; Políticas Públicas e História e Legislação de Ensino e Produção de Texto I e II; Disciplina Optativa I (FURB, 2011). Já no Eixo Específico do Curso Ciências da Religião com licenciatura em Ensino Religioso, os componentes são: Arte, Cultura e Religião; Cosmovisão das Religiões e dos Movimentos Religiosos; Culturas e Fenômenos Religiosos; Desenvolvimento Humano e Religiosidade; Diálogos Interculturais e Diversidade Religiosa; Direitos Humanos e Educação; Educação e Interculturalidade; Educação Inclusiva; Ensino Religioso no Brasil I, II; Epistemologias e Fenômenos Religiosos; Estágio em Ensino Religioso I, II, II, IV, V; Estética, Ética e Formação Docente; Éticas; Fenômenos Religiosos e Desafios Contemporâneos; Filosofia e Humanidade, Gestão, Planejamento e Avaliação Educacional; Histórias Religiosas da América Latina; Introdução aos Textos e Narrativas Sagradas; Linguagens e Fenômenos Religiosos; Meio Ambiente, Sociedades e Tradições Religiosas; Metodologia do Ensino Religioso I, II; Movimentos Sociais e Espiritualidades; Pesquisa em Ensino Religioso; Religião, Ciência e Tecnologia; Sociedades, Religiões e Territórios; Planejamento e Avaliação Educacional; Textos e Narrativas Sagradas Indígenas; Textos e Narrativas Sagradas Africanas; Textos e Narrativas Sagradas Orientais e Textos e Narrativas Sagradas Semitas (FURB, 2011). Enquanto egresso e acadêmicos do Curso, ressaltamos a significativa contribuição desta licenciatura na formação docente, pois, por meio de sua proposta inovadora busca articular o ensino, a pesquisa e a extensão, levando a um comprometimento acadêmico e social do formando com as realidades que requerem outras práticas educacionais e sociais, a fim de superar e combater situações desumanas de desigualdades, invisibilizações e discriminações, que impedem o (re)conhecimento da alteridade dos diferentes sujeitos históricos que estão ou não em processos formativos. 45 FONAPER Considerações finais Se o Ensino Religioso é uma possibilidade real para o estudo das diferenças culturais e religiosas na educação básica assegurando o direito a ter uma ou outra religião, ou inclusive de não ter nenhuma; se, enquanto área de conhecimento e componente curricular, o Ensino Religioso deve disponibilizar e proporcionar o acesso ao conjunto de conhecimentos religiosos produzidos pela humanidade e; se legalmente o Ensino Religioso deve ser ofertado pela escola, em que medida uma formação docente nesta perspectiva que tratamos, poderá contribuir para novos e outros encaminhamentos relativos a oferta do Ensino Religioso nas escolas, bem como a ampliação da formação para atender as demandas educacionais e sociais? A formação docente para o Ensino Religioso é fundamental que se dê por meio de licenciatura em uma perspectiva interreligiosa e intercultural, identificando e estudando as diferentes linguagens religiosas e outras que o ser humano utiliza na construção e manutenção de respostas e significados para sua existência. Formar para a sensibilidade e responsabilidade em relação ao Outro, enquanto um sujeito histórico constituído por subjetividade e singularidades, requer outros olhares, encaminhamentos e práticas, capazes de subsidiar os docentes para o desenvolvimento de processos democráticos e emancipatórios. Neste sentido, ressaltamos a contribuição desta licenciatura à formação humana e acadêmica para a prática docente do Ensino Religioso. Não reduz a formação a aplicabilidade de uma dada ciência. Forma para um olhar crítico do conhecimento seja religioso ou não, tendo em vista uma docência que de fato garanta o direito à aprendizagem e ao desenvolvimento dos formandos, necessários para construir mundos possíveis, sustentáveis e justos. Referências ANDRADE, R. Metodologia do Ensino Religioso, novas perspectivas. Revista de Educação da AEC. São Paulo, AEC, 22/88, 1993. BRASIL. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Dá nova redação ao art. 33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília: Diário Oficial da União, 1997. 46 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso ______. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Diário Oficial da União, 1996. ______. Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus. Brasília: Diário Oficial da União, 1971. ______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. ______. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 4/2010. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília, 13 de julho de 2010. Disponível em: <www.mec.gov.br/cne> Acesso em 24 jul. 2010. ______. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 2/1998. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília, 02 de abril de 1998. CARON, Lurdes. Entre Conquistas e Concessões: uma experiência ecumênica em educação religiosa escolar. São Leopoldo, Sinodal, 1997. CORDEIRO, Darcy. A Formação Inicial de Professores para a Educação Básica: Desafios e perspectivas para o Ensino Religioso. In: POZZER, Adecir; et. al. (Orgs.) Diversidade Religiosa e Ensino Religioso no Brasil: Memórias, Propostas e Desafios. Petrópolis: Nova Harmonia, 2010, p. 127-136. ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano. Trad. Rogério Fernandes. São Paulo: Martins Fontes, 2001. FIGUEIREDO, Anísia de Paulo. Ensino Religioso: perspectivas pedagógicas. Petrópolis: Vozes, 1994. FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DE ENSINO RELIGIOS - FONAPER. Caderno Temático 1: Referencial Curricular para a Proposta Pedagógica da Escola, 2000. ______. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. São Paulo, Mundo Mirim, 2009. ______. Parâmetros curriculares nacionais para o Ensino Religioso. 3. ed. São Paulo: Ave Maria, 1998. 47 FONAPER ______. Propostas de diretrizes curriculares nacionais para o curso de graduação em ciências da religião - Licenciatura em ensino religioso. Florianópolis, 2008. Disponível em: <http://www.fonaper.com.br/documentos_propostas.php> Acesso em 09 de agosto de 2013. FURB. Projeto Pedagógico do Curso de Ciências da Religião Licenciatura em Ensino Religioso. Blumenau, 2011. LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e Infinito. Trad. José Pinto Ribeito. Lisboa: Edições 70, 1980. MARTINI, Antonio; et al. O humano, lugar do sagrado. 2 ed. São Paulo, SP: Editora Olho d‘Água, 1995. OLIVEIRA, Lílian Blanck de; RISKE-KOCH, Simone. Diversidade cultural religiosa e formação de docentes de ensino religioso na FURB/SC: tecendo cartografias. Revista Numen, Juiz de Fora, 2012, v.15, n. 2, p. 457-481. OLIVEIRA, Lílian Blanck de. Formação de docentes para o ensino religioso: perspectivas e impulsos a partir da ética social de Martinho Lutero. São Leopoldo, 2003. Tese de Doutorado em Teologia. Instituto Superior de Teologia (EST). SIDEKUM, Antonio. Direitos Fundamentais: a dignidade humana. Nova Petrópolis: Nova Harmonia, 2011. SIDEKUM, Antônio. Identidade Cultural e Desenvolvimento. In: OLIVEIRA, Lilian Blanck de; et. al. (org.). Culturas e Diversidade Religiosa na América Latina: Pesquisas e Perspectivas Pedagógicas. Blumenau: Edifurb & São Leopoldo: Nova Harmonia, 2009, p. 58-63. UNESCO. Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Paris: 2002. 48 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO ENSINO RELIGIOSO NUMA PERSPECTIVA INCLUSIVA Ana Cristina de Almeida Cavalcante Bastos1 – UFPB Resumo: O Ensino Religioso, numa visão epistemológica e pedagógica, é o lócus privilegiado para promoção do reconhecimento e assunção cultural (FREIRE, 1996) das pessoas pertencentes às minorias, dentre elas, as pessoas com deficiência. Essa pesquisa busca analisar a formação continuada dos professores de Ensino Religioso nas escolas da Rede Municipal de João Pessoa em educação especial/inclusiva. Pretende-se perceber como os conceitos de inclusão/exclusão e diversidade se aplicam no resultado, responder a indagação sobre a contribuição do Ensino Religioso para a inclusão do aluno com deficiência no ambiente escolar, de forma a perceber se os professores se sentem subsidiados com conhecimentos teóricos e práticos nesta área específica, para promover a formação integral de seus alunos. Palavras-Chave: Formação continuada; Pessoa com deficiência; Educação inclusiva; Ensino religioso; Introdução O Ensino Religioso (ER), normatizado pela Lei 9.475 de 22/07/97, caminha na transformação de uma hegemonia monocultural, resquício de um ensino religioso confessional e interconfessional para uma concepção focada no reconhecimento das diferenças, no respeito à diversidade cultural/religiosa e no combate ao preconceito e intolerância. O ER tem seus Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNERs alicerçados nos princípios de cidadania, respeito à diversidade, tolerância no entendimento do outro e na relação do ser humano em sua busca pelo transcendente. No texto ―Concepção de ensino religioso no FONAPER: Trajetórias de um conceito em construção‖, o autor faz uma análise da importância do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER em seus 15 anos de existência, para a busca da ―ampliação, aprofundamento e 1 Professora da Rede Estadual à disposição da Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência – FUNAD/Paraíba, atuando como reabilitadora na Assessoria de Educação Especial – Professora da Educação de Jovens e Adultos da Rede Municipal de João Pessoa – PMJP/PB – Graduada em Estudos Sociais – UEPB/PB e Pedagogia – UVA/CE – Especialista em Psicopedagogia Institucional – CINTEP/PB – Mestranda em Ciências da Religiões UFPB. E-mail: [email protected] FONAPER efetivação de uma concepção de ER enquanto parte integrante da formação básica do cidadão‖ (POZZER, 2010, p. 84). O mesmo autor afirma que: Esse entendimento levou o FONAPER a propor um objeto de estudo, objetivos, encaminhamentos didáticos e metodológicos, eixos de conteúdos e pressupostos para avaliação, buscando sustentação epistemológica e pedagógica para o ER, o qual constantemente é desafiado a mostrar sua importância na superação de preconceitos, no tratamento adequado às culturas e grupos religiosos silenciados, invisibilizados, negados e/ou exotizados, ao propor o (re)conhecimento do diferente e suas diferenças a partir de, com e em relações alteritárias. Dessa forma, o ER torna-se um componente curricular apropriado para trazer à tona as questões pertinentes à busca da construção de uma educação inclusiva, voltada para garantir não somente o acesso de todos os alunos, mas sua permanência com sucesso num ambiente escolar acolhedor. Desenvolvimento A educação inclusiva, entendida como um processo em construção de cunho mundial2, que implica no acesso e permanência de todos os alunos na escola, conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis (Brasil, 2008). Para tanto, requer adoção de práticas pedagógicas que valorizem as potencialidades e a produção de conhecimentos, segundo o ritmo e possibilidades de cada aluno, independente de sua condição social, etnia ou deficiência que possua. Uma série de documentos filosóficos e normativos de âmbito internacional e nacional oferece subsídios e diretrizes para cada vez mais erradicar a exclusão e favorecer o fortalecimento da Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva em todo o território brasileiro. A própria Constituição Brasileira, nossa Carta Magna em seu Art. 3, diz que se deve ―promover o bem de todos, sem 2 50 O compromisso com a construção de sistemas educacionais inclusivos possui a orientação de documentos de âmbito internacional, a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), seguido da Declaração de Jontiem (1990), Declaração de Salamanca (1994), Declaração de Guatemala (1998) e Convenção da ONU (2008), que em seu artigo 24, garante, que nenhuma pessoa com deficiência seja excluída do sistema educacional geral sob alegação de deficiência‖. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação‖; Já o Art. 5º diz que ―Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza‖ e o Art. 206. Diz que um dos princípios para ministrar o ensino é ―Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola‖ O conjunto de Decretos, Leis, Portarias e Resoluções existentes, além de Notas técnicas emanadas do Ministério da Educação e Cultura – MEC através da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), normatizam a garantia não somente a oferta, mas a permanência com sucesso dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, público-alvo da educação especial em ambiente escolar em iguais condições que os demais alunos. Apesar de todo o cabedal de marcos normativos que o Brasil dispõe, observa-se que ainda existe um distanciamento entre a Lei e sua aplicabilidade efetiva. Um exemplo disso é a Lei 7.853/89 que em seu Artigo 8º diz o seguinte: Constitui crime punível com reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa: I - recusar, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar, sem justa causa, a inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, por motivos derivados da deficiência que porta. Porém existe um longo caminho ainda a se percorrer para que essa lei seja cumprida em sua totalidade e dessa forma, ainda acontecem situações de preconceito e discriminação sofridas pelas pessoas públicoalvo da educação especial, que são as pessoas com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Muitas destas situações são oriundas do desconhecimento sobre os direitos dessas pessoas em participar em situação de igualdade de todo e qualquer espaço social, principalmente o espaço escolar, elemento meio entre família e sociedade, que tem função vital para o desenvolvimento da formação básica do cidadão. A luta pela educação inclusiva vai muito além da garantia da matrícula, pois o que se almeja é uma escola que não somente matricule, mas ofereça oportunidades de desenvolvimento das potencialidades das pessoas com deficiência, numa igualdade de oportunidades. É o que 51 FONAPER Santos (2002, p.75) afirma em sua pauta transidentitária e transcultural: ―temos o direito de sermos iguais quando a diferença nos inferioriza e a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza‖. A educação inclusiva é um fenômeno muito complexo e de grande envergadura e como tal, para que realmente se efetive depende de muitos fatores, sendo a formação de professores, de capital importância para a implantação/implementação dessa política pública. O Decreto nº 5626 de 22 de dezembro de 2005, que trata da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e que também regulamentou o art. 18 da Lei nº 10.098 de 19 de dezembro de 2000, determinou em seu artigo 3º: Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. § 1º Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o curso normal de nível médio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são considerados cursos de formação de professores e profissionais da educação para o exercício do magistério. § 2º A Libras constituir-se-á em disciplina curricular optativa nos demais cursos de educação superior e na educação profissional, a partir de um ano da publicação deste Decreto. No corpo do referido Decreto estão estabelecidos os prazos máximos para a sua execução: o Art. 9 A partir da publicação deste Decreto, as instituições de ensino médio que oferecem cursos de formação para o magistério na modalidade normal e as instituições de educação superior que oferecem cursos de Fonoaudiologia ou de formação de professores devem incluir Libras como disciplina curricular, nos seguintes prazos e percentuais mínimos: I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da instituição; II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da instituição; III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da instituição; e IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da instituição. Isso significa dizer que até o ano de 2015, todos os cursos de Licenciatura, inclusive a graduação em Ciências das Religiões, têm de se moldar à lei e ofertar a Libras como disciplina curricular obrigatória. Espera-se, portanto, que o Decreto seja cumprido, muito embora que alguns dos prazos nele existentes já foram exauridos e não se sabe se o 52 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso percentual estipulado para o seu cumprimento foi concretizado. Mas o importante é que esta é uma grande vitória para a pessoa surda que cada vez mais conquista o direito de ser entendido em sua língua materna que já esta é oficializada no Brasil pela Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Considerando que na Resolução nº 1/2012, do Conselho Nacional de Educação, que trata da Educação em Direitos Humanos, ao evidenciar a formação inicial e continuada dos profissionais da educação em seus Artigos 8º e 9º, e tendo em seu Art. 3º, III, o ―reconhecimento e valorização das diferenças e das diversidades‖, justifica-se trazer para a escola, enquanto lócus dessa investigação, os conceitos de inclusão, exclusão e diversidade, para que esta possa sair de uma cultura heterogênea e assuma a condição de ser o melhor espaço de formação de valores voltados à construção de um ser ético, solidário, fraterno e sensível aos seus pares. Como afirma Freire (1996, p. 17): A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifestação discriminatória de raça, de gênero, de classe. É por esta ética inseparável da prática educativa, não importa se trabalhamos com crianças, jovens ou com adultos, que devemos lutar. E a melhor maneira de por ela lutar, é vivê-la em nossa prática, é testemunhá-la, vivaz, aos educandos em nossas relações com eles. Para tanto, torna-se importante uma formação voltada à complexidade e à transdisciplinaridade em educação, que se baseia segundo Moraes e Navas (2010, p.15) ―no desenvolvimento integral da pessoa humana e na realização plena de todas as suas capacidades e possibilidades‖. Segundo Caetano (2007, p. 228) esta é uma visão holística de perceber o ser humano enquanto ―sujeito epistêmico, éticosocial, afetivo, psicológico e sexual‖ que dá ao Ensino Religioso as condições necessárias para trazer o foco da Educação Inclusiva para dentro do contexto da escola. O estudo do fenômeno religioso e suas manifestações em todos os tempos, lugares e povos, alicerçados nos princípios de cidadania e na busca pelo respeito à diversidade, deve favorecer a construção de uma cultura de paz, com a abolição do preconceito e da discriminação. Daí a relevância dessa pesquisa, que permitirá uma análise crítica e reflexiva sobre o que o professor do ensino religioso entende por inclusão, exclusão e diversidade; e de como esses conceitos são aplicados em sua prática pedagógica, mais especificamente, na educação inclusiva enquanto 53 FONAPER construção de um ambiente acolhedor para o recebimento e manutenção dos alunos público-alvo da educação especial no ambiente escolar. No decorrer da História, a pessoa com deficiência vem sofrendo um processo de exclusão em seus aspectos sócio-econômicos, religiosos e educacionais desde os primórdios das civilizações antigas até agora na contemporaneidade (SANTIAGO, 2011). De um lado, a exclusão e por outro, a luta por uma inclusão que vem ao longo do tempo, também mostrando avanços capazes de fazer com que a história se modifique e surjam políticas públicas voltadas para esse segmento populacional3. A inclusão e a exclusão estão ao longo do tempo, lado a lado como faces de uma mesma moeda, uma vez que só existe uma porque a outra se evidencia. Tomando como exemplo o período da Antiguidade nas sociedades Greco-romanas, muitas vezes quando nascia uma criança com deficiência esta era sacrificada. Entretanto, nestas mesmas civilizações alguns de seus cidadãos já pensavam de forma diferente, tanto é que essas situações que já haviam se incorporado à sociedade vigente, enquanto regra social, foram ao longo do tempo modificadas por um pensamento de preservação da vida. E isso foi acontecendo em toda uma cronologia sócio-histórica até chegar a nossa atualidade, na qual, apesar dos avanços tecnológicos e de todas as conquistas legais, situações de inclusão e exclusão ainda são vivenciadas. A sociedade inclusiva passa necessariamente por uma escola inclusiva que tem no perfil mediador do professor, o diferencial capaz de suscitar a construção desse processo. (TEBAR, 2011, p. 19) afirma que ―o papel dos docentes é fundamental no que se refere à qualidade e a pertinência da educação e ainda diz que: Mediar também é transmitir valores, é conectar vivências e elementos culturais, é superar a ignorância e a privação cultural, abrindo ao outro um mundo novo de significados. Ao mediar vamos além das necessidades imediatas, transcendemos o presente, buscamos um mundo de relações que antecipam o futuro ou apresentam outras situações inesperadas. A mediação é um fenômeno vital; não acontece somente na escola, é uma realidade em toda a vida (TEBAR, 2011. p, 115). 3 54 Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Marcos PolíticoLegais da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva/Secrearia da Educação Especial. – Brasília: Secretaria de Educação Especial, - 2010. 72 p. Este guia contém uma série de Decretos, leis, resoluções e outros marcos normativos que referendam a educação especial/inclusiva. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Se o professor do ER busca mediar a formação de uma cultura de paz, de respeito à diversidade cultural e religiosa, então nada mais viável do que este profissional trabalhar com seus educandos o respeito à condição de diferença de ―ser gente‖. Portanto, esta pesquisa busca analisar o processo de formação continuada dos professores de Ensino Religioso nas escolas da Rede Municipal de João Pessoa, objetivando identificar se estes docentes possuem formação continuada em educação especial/ inclusiva. Pretende também analisar como o conhecimento teórico sobre educação inclusiva se aplica na prática pedagógica do professor do ensino religioso. Segundo Holmes (2010) o Ensino Religioso foi normatizado na Paraíba através da Resolução 119/94 do Conselho Estadual de Educação – CEE e ficou sob a responsabilidade da Secretaria Estadual da Educação e Arquidiocese da Paraíba. Em 1986, foi implantado em todas as escolas estaduais, da 5ª a 6ª série (atualmente, do 6º ao 9º ano). Também em 1996, aconteceu a ―I Capacitação de Professores do ER‖, com carga horária de 80h. Em 2000, houve o Curso à Distância Capacitação para a Formação Docente Novo Milênio FONAPER, no qual dos 100 (cem) educadores escritos, cinquenta e seis concluíram o curso (ibidem, p.93). Em 2005, foi implantada através da Universidade Federal da Paraíba, a primeira turma de especialização em Ciências das Religiões. Em 2007, foi implantado o Mestrado e em 2008, o curso de Licenciatura/Bacharelado nesta mesma área de ensino. Isso nos leva a crer que os professores do ER do estado da Paraíba têm possibilidades cada vez mais emergentes de formação inicial e continuada na área específica em Ciências das Religiões, a exemplo do Mestrado (ibidem, p.94), que é o primeiro Mestrado em Ciências das Religiões no Nordeste e o 2º em uma Universidade Federal no Brasil. Por isso, mais uma vez professamos a importância de contemplar nestes espaços de formação, conteúdos inerentes ao contexto da inclusão dos alunos público-alvo da educação especial em ambiente escolar, para que a partir do momento em que os professores absorvam conhecimentos teóricos e práticos, possam se sentir subsidiados a fazer com que essa concepção sobre educação inclusiva, chegue à sua prática pedagógica na escola, sendo um interlocutor da busca da formação integral de todos os alunos na escola. 55 FONAPER Metodologia Segundo Damasceno e Sales (2005), a pesquisa qualitativa é um tipo de abordagem que permite a aferição de aspectos qualitativos de questões relevantes no campo socioeducacional, como por exemplo, atitudes, expressões culturais, motivações, percepção, representações sociais e saberes gerados nas práticas socioeducativas. A análise dos dados ocorre de forma indutiva; sem a preocupação primeira, portanto, de confirmar hipóteses, as quais não são constituídas previamente, mas vão constituindo-se na medida em que os dados são descobertos e se interrelacionam. Tendo em vista a complexidade e abrangência do tema, utilizaremos a observação direta - nas análises que faremos do ambiente escolar dos professores que fazem parte do universo pesquisado, e a observação indireta, na pesquisa bibliográfica tendo como fonte de pesquisa, livros, artigos de periódicos e materiais disponibilizados na Internet. Na pesquisa documental, faremos uma análise dos documentos filosóficos e normativos em âmbito internacional e nacional que ratificam a Educação Inclusiva e o Ensino Religioso. Utilizaremos também a aplicação de questionários, a elaboração de quadros e tabelas e a análise de todas as informações para traçar um perfil do professor do ensino religioso numa perspectiva inclusiva. Por fim, além de oferecermos propostas de ressignificação desse componente curricular, ainda faremos a análise, interpretação e cruzamento de todos os dados obtidos na pesquisa, junto às fontes teóricas estudadas, objetivando auferir subsídios que possam comprovar a importância do Ensino Religioso para uma educação de qualidade, inclusiva. Resultados O Ensino Religioso, enquanto componente curricular que trabalha para a formação de um ser crítico e pensante no exercício de sua cidadania precisa fomentar a Educação Inclusiva, como forma de promover a visibilidade de uma minoria que não é tão minoria assim, já que segundo 56 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso os dados do Censo 2010,4 24% da população brasileira, disse ter algum tipo de deficiência, o que corresponde a cifra de 45 milhões de pessoas. A Paraíba é o 3ª Estado5 brasileiro com o maior número de pessoas com deficiência num total de 1.045.962, totalizando um percentual de 27,7% de sua população. Almejamos como resultado dessa pesquisa responder às seguintes indagações: Em sua formação inicial o professor é preparado com conhecimentos teóricos para trabalhar com a diversidade dos alunos com deficiência em suas necessidades? O professor do Ensino Religioso participa de cursos de formação continuada que contemple esse conhecimento específico? Nas escolas onde esses professores exercem sua docência, conseguem trazer à tona as discussões sobre inclusão, exclusão, preconceito, limites e possibilidades frente às diferenças? Até que ponto o professor do ER é o interlocutor das minorias na escola? É o professor um mediador da aprendizagem e da formação de valores de aceitação e respeito às diferenças? O professor organiza os conteúdos a serem trabalhados em sala com esse fim? Ao se deparar com um aluno com deficiência em sua sala de aula, o professor se preocupa em criar estratégias metodológicas para ensinar a turma toda, incluindo-o na mesma proporção que os demais? Existe algum material didático de suporte que possa fazer com que a aprendizagem aconteça de forma mais significativa? E os recursos de tecnologia e mídias digitais são utilizados? Qual o papel concreto que o professor pode desempenhar para disseminar a educação inclusiva e a inclusão de alunos com deficiência nas escolas? Como lidar com situações de preconceito rótulos e estigmas diante dos alunos com deficiência? Quais as propostas de se minimizar ou solucionar essa questão? O professor se sente parte integrante da escola em que trabalha ou ele próprio se sente vítima de alguma situação de exclusão e preconceito? 4 5 GLOBO.COM. 23,9% DOS BRASILEIROS DECLARAM TER ALGUMA DEFICIÊNCIA, DIZ IBGE. DISPONÍVEL EM < HTTP://G1.GLOBO.COM/BRASIL/NOTICIA/2012/04/239-DOSBRASILEIROS-DECLARAM-TER-ALGUMA-DEFICIENCIA-DIZ-IBGE.HTML> ACESSO EM 20/05/2012 REDE SACI. 27,7% da população paraibana tem algum tipo de deficiência, diz IBGE. Disponível em <http://saci.org.br/index.php?modulo=akemi¶metro=34235 > Acesso em 20/05/2012 57 FONAPER Por fim, além de oferecermos propostas de ressignificação desse componente curricular, ainda faremos a análise, interpretação e cruzamento de todos os dados obtidos na pesquisa, junto às fontes teóricas estudadas, objetivando auferir subsídios que possam comprovar a importância do Ensino Religioso para uma educação de qualidade, inclusiva. Concluímos que se faz necessário repensar a formação inicial e continuada do Ensino Religioso com vistas a contemplar essa temática a fim de que o exercício da cidadania desse segmento populacional possa se tornar cada vez mais concreto. Conclusão Segundo Machado (2008, p. 77), A formação do professor supõe a mobilização de práticas pedagógicas solidárias, democráticas e reflexivas sobre a realidade social, capazes de gerar inovação completando a diversidade presente no contexto brasileiro, entre elas, a diversidade religiosa. Criando uma nova cultura a partir do entendimento de que todo e qualquer indivíduo é portador de direitos e deveres, e que estes devem tornar-se algo á ser buscado e conquistado de forma coletiva e não interpretado como uma mera concessão, pois, o exercício da cidadania é ser cidadão no gozo seus direitos e deveres, sendo capaz de interferir na ordem social em que vive, constituindo-se em uma luta pela inclusão. É importante que o professor conheça seu alunado e tente construir uma cultura de paz em sala de aula. Assim o respeito á diversidade humana precede qualquer outra forma de diversidade. A partir do momento em que as pessoas se aceitam como são, reconhecendo as diferenças e a diversidade humana, fica mais fácil se aceitar a diversidade social, econômica e religiosa que o outro possa ter. O Professor do Ensino Religioso deve possuir saberes que favoreçam a promoção da autonomia do educando (FREIRE, 1996). Assim, saindo de uma curiosidade ingênua para uma curiosidade epistemológica e rejeitando todo o tipo de discriminação, com bom senso, criatividade, estética e ética, este profissional, pautará sua prática pedagógica na assunção cultural de cada um de seus alunos, independente que tenham ou não deficiência, já que o ser humano é inconcluso, condicionado, mas não determinado. 58 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Por isso, mais uma vez professamos a importância de contemplar nestes espaços de formação, conteúdos inerentes ao contexto da inclusão dos alunos com deficiência em ambiente escolar, para que a partir do momento em que os professores apreendam conhecimentos teóricos e práticos, possam se sentir subsidiados a fazer com que essa concepção sobre educação inclusiva, chegue à prática pedagógica na escola, sendo um interlocutor da busca da formação integral de todos os alunos no ambiente escolar. Referências BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. 292 p. BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Estabelece Diretrizes Nacionais para a em Direitos Humanos. Resolução nº 1, de 30 de maio de 2012. Website <:http://www.sedh.gov.br/promocaodh/edh/Resolucao%20%20Diretrizes%20Nacionais%20EDH.pdf> Acesso em 13/05/2013 BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Disponível em< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2005/decreto/d5626.htm> Acesso em 15/07/2013 BRASIL. Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L10098.htm> Acesso em 15/07/2013 BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências.- Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10436.htm> Acesso em 15/07/2013 BRASIL. Lei nº 7.853 de 24 de outubro de 1989. Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - Corde, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou 59 FONAPER difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências. Disponível em< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7853.htm> Acesso em 18/07/2013 BRASIL. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997 - Dá nova redação ao art. 33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9475.htm> Acesso em 13/05/2013 BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Marcos Político-Legais da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Secretaria da Educação Especial. Brasília: Secretaria de Educação Especial, - 2010. 72 p. CAETANO, M. C. O Ensino Religioso e a formação de seus professores: dificuldades e perspectivas. 2007. 115 f..Dissertação (Mestrado em Educação). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007. Disponível em <www.gper.com.br/biblioteca_download.php?arquivoId=406>Acesso em 0805/2013 DAMASCENO, Maria Nobre; SALES, Celina de Maria Veras (orgs). O caminho se faz ao caminhar: elementos teóricos e práticos na pesquisa qualitativa. Fortaleza: Editora UFC, 2005 FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. 6. Ed. São Paulo; editora Ave Maria, 1997. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo – Paz e terra, 1996 Globo.com. 23,9% dos brasileiros declaram ter alguma deficiência, diz IBGE. Disponível em< http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/04/239-dosbrasileiros-declaram-ter-alguma-deficiencia-diz-ibge.html> Acesso em 03/08/2013 HOLMES, M. J. T. Ensino religioso: problemas e desafios. 2010.186 f, Dissertação (Mestrado) Universidade Federal da Paraíba – UFPB. João Pessoa 60 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso MACHADO, L,M,P, 2006. A cidadania na formação de professores para o ensino religioso. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Educação. Curitiba. Paraná. Brasil MANTOAN, M. T. Inclusão escolar: o que é? Por que? Como fazer? 1ª edição. São Paulo: Moderna, 2003. 95 p MORAES, M. C. M & NAVAS, J.M.B. (orgs) Complexidade e transdiciplinaridade em educação: teoria e prática docente. Rio de Jáneiro: Wak Ed, 2010, 264 p. POZZER, Adecir. Concepção de ensino religioso no FONAPER: Trajetórias de um conceito em construção, 2010 Disponível em < http://www.fonaper.com.br/documentos_concepcao.php> Acesso em 01/08/2013 POZZER, Adecir. et al. Diversidade religiosa e ensino religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios – Obra comemorativa aos 15 anos do FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010, 192p. RAPOLI, E. A A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: a escola comum inclusiva. Edilene Aparecida Rapoli {et. Al.} Brasília: Ministério da Educação. Secretaria da Educação Especial. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2010. v. 1. REDE SACI. 27,7% da população paraibana tem algum tipo de deficiência, diz IBGE. Disponível em <http://saci.org.br/index.php?modulo=akemi¶metro=34235 > Acesso em 07/05/2013 SANTIAGO, S.A.S. A história da exclusão das pessoas com deficiência: aspectos sócio-econômicos, religiosos e educacionais. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2011.284 p. SANTOS, B. S. A globalização e as ciências sociais. Boaventura de Sousa Santos (org.). 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2002. TÉBAR, Lorenzo. O perfil do professor mediador: pedagogia da mediação. Tradução de Prisicla Pereira Mota. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2011. 61 A MEMÓRIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO - CONTRIBUIÇÕES PARA AS PRÁTICAS COM O ENSINO RELIGIOSO PLURALISTA Araceli Sobreira Benevides - UERN1 Resumo: Este trabalho discute a constituição das identidades de docentes de Ensino Religioso de Natal/RN, compreendendo como as trajetórias de professores contribuíram para uma teoria da formação na área, assim, destacamos as transformações mais significativas que aconteceram nas práticas com o ER. As análises indicam caminhos que professores/as percorrem para compreender o significado da memória da docência de professores que vivenciaram a prática com o ensino de Religião (denominação do passado) e o Ensino Religioso Pluralista (denominação atual). Consideramos que os resultados apresentam reflexões para a realidade da formação e da atuação docente, além de estabelecer um diálogo com as teorias que compreendem as imagens e os processos embutidos ao longo das experiências pedagógicas modificadas pelas transformações sociais das duas últimas décadas. Palavras-chave: Memórias de Docentes de Ensino Religioso; Identidades de Docentes de Ensino Religioso; Ensino Religioso Pluralista. Introdução Ao varrer o sagrado desvão Denominado Memória, Escolhe uma vassoura reverente E faz em silêncio o teu trabalho. Será um labor de surpresas – além da própria identidade, outros interlocutores são uma possibilidade. Nesses domínios é nobre a poeira, Deixa que repouse intocada – Não tens como removê-la, Mas ela pode silenciar-te. Emily Dickinson No domínio das pesquisas interdisciplinares em Linguística Aplicada, os estudos da constituição de processos identitários dos/as professores/as 1 Doutora em Educação. Professora do Curso de Ciências da Religião e do Programa de Pós-Graduação em Educação – POSEDUC/UERN. Pesquisadora da Linha de Pesquisa Formação e Atuação do Docente das Ciências da Religião e da Educação. Líder do Grupo de Pesquisa Educação, Cultura e Fenômeno Religioso/UERN. E-mail: [email protected] FONAPER têm sido motivo de permanente investigação nos últimos anos. Paralelamente, pesquisas sobre os saberes docentes também mostram a necessidade de se olhar atentamente para a formação de professores/as na área das Ciências da Educação. Discutindo sobre essas duas questões, interpretamos o que professores e professoras de Ensino Religioso da região metropolitana de Natal/RN enunciam sobre seus saberes e experiências formativas. Com o intuito de observar as vivências e os saberes dos docentes que atuam desde antes da legislação de 1997 (BRASIL, 9.475/97), em comparação com os daqueles que estão desempenhando esse papel a partir da nova modalidade de Ensino Religioso: pluralista, não catequista, não dogmático, não evangelizador. Esse modelo2 contemporâneo está sendo estabelecido desde as transformações da última década quando se firmaram que para se lecionar, em salas de aula dessa disciplina, era necessária a formação específica, isso ocasionou a criação de cursos de Graduação e PósGraduação, no Brasil, que garantissem os conhecimentos/saberes da docência de professores de ER. Assim, para quem escolhe essa área para atuar no Ensino Fundamental, o curso a ser feito é a Licenciatura em Ciências da Religião, área de conhecimento das Ciências Humanas e Sociais que tem se expandido (CORTELLA, 2007) e se fortalecido nesses anos iniciais do novo milênio. Dessa forma, neste trabalho, trazemos reflexões construídas em relação à memória das práticas docentes retiradas do corpus discursivo da pesquisa coordenada por nós – Saberes das práticas docentes no contexto do Ensino Religioso – diálogo multidisciplinar entre as práticas de leitura, memórias docentes, experiências e a construção de identidades (FASE II – UERN- 2013-2014) que revelam quem são e o que sabem os professores de ER da capital potiguar. Neste estudo, interpretamos o quanto as imagens construídas pelos professores/as sobre si próprios revelam as experiências, as relações, as dificuldades com a prática desde o início da atuação e os saberes mobilizados na prática com a disciplina. Analisaremos dados de uma entrevista coletiva realizada com dois professores que vivenciaram momentos diferentes com o ER no RN que 2 64 Esse novo modelo apresenta-se legalizado pelo artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96, modificada, posteriormente, pela lei nº 9475/97, que estabelece o Ensino Religioso como área de conhecimento do Ensino Fundamental. Em decorrência, a religiosidade deixa de ser o ponto central da docência que passa a ter o fenômeno religioso como objeto de estudo. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso discutem exatamente a questão da formação específica para a atuação docente na disciplina e como esses/as profissionais se inserem no contexto de atuação ao narrar sobre suas experiências pessoais ou sua trajetória como professor/a de ER. Para analisarmos o que os/as professores dizem sobre suas identidades e sobre seus saberes, tomamos como base o modelo sóciohistórico de linguagem, compreendendo linguagem como uma prática discursiva, que constitui identidades e subjetividades, relacionada a todas as esferas da atividade humana (BAKHTIN, 2003). Quando o/a graduando/a do curso de Ciências da Religião passa para a fase de estágio e precisa desenvolver as atividades inerentes dessa fase, percebemos a discrepância entre o conhecimento construído em relação às práticas passadas e às práticas atuais que indicam um preconceito muito grande em relação aos modelos de Ensino Religioso existentes em cada fase. Para traçarmos um caminho historiográfico para as mudanças acontecidas no plano epistemológico e no plano metodológico dessa disciplina, iniciamos, no contexto da pesquisa em formação docente, o resgate de narrativas biográficas de professores de diferentes épocas e modelos de ensino. Acreditamos que essas informações pudessem indicar aos estudantes da Licenciatura em Ciências da Religião que as transformações com o ER não foram aleatórias nem desconectadas das discussões maiores realizadas no âmbito da formação de professores. Além disso, também quisemos mostrar que, inclusive, no âmbito da prática em modelos anteriores à LDB (1996), os próprios professores iniciaram as alterações de um ensino de/da Religião para um ensino com base na compreensão do fenômeno religioso e na apropriação de um método didático apropriado para a mediação pedagógica desse componente do Ensino Fundamental. Os caminhos para um labor de surpresas Em pesquisas anteriores, quando discutimos as identidades e os saberes de professores de Ensino Religioso (BENEVIDES, 2011), construímos um olhar para as diferenças de saberes existentes nas práticas de professores dessa disciplina ainda entendida como ensino confessional para muitos dos sujeitos participantes pelo fato de, na construção do percurso profissional, não haver a obrigatoriedade de 65 FONAPER formação específica em nível de licenciatura. Em nossos estudos iniciais, indicamos que os docentes, os quais não possuem formação específica na área, utilizam-se de metodologias variadas (BENEVIDES, 2011), sem um escopo teórico que fundamente suas práticas, levando em conta o fenômeno religioso, enquanto objeto de estudo dessa disciplina. No entanto, o Estado do Rio Grande do Norte registra a presença de docentes que contribuíram significativamente com a mudança de paradigma que conduz ao Ensino Religioso atual. Esses docentes elaboraram documentos importantes, como a Cartilha de Deus (década de 70) e as Propostas Curriculares do Ensino Religioso (década de 80 e 90), além de organizarem encontros de planejamento e organização curricular da disciplina, mesmo em uma época em que o ensino baseava-se na proposta confessional, entendemos que essa fase pode ser compreendida como introdutória das ações pedagógicas que criam a Licenciatura em Ciências da Religião no Estado as quais ainda são desconhecidas pelos estudantes que ingressam nesse curso na UERN. Com isso, registramos a necessidade de se ampliar as ações da formação docente, recuperando uma memória da docência de professores de um passado recente. Assim, a linha de pesquisa Formação e Atuação do Docente da Educação e das Ciências da Religião começa a se fortalecer, através dessas investigações, ao conseguir mapear ações de docentes do Ensino Religioso na região da Grande Natal (BENEVIDES, 2011) e, ao indicar novas compreensões para o longo percurso que se instaurou em termos de organização dos saberes curriculares do Ensino Religioso (ER), conforme as transformações sóciohistóricas que estabelecem um ensino plural, não-proselitista nem confessional, diferente do que havia, desde o período colonial brasileiro, até fins do século XX, quando existia a predominância do ensino católico nas práticas escolares. Essa mudança significativa não foi aleatória nem ocorreu de repente. Seguiu as transformações ocorridas no espaço escolar e no campo das discussões sobre modernidade, pós-modernidade, ideologias, discursos, poder e diversidade cultural, entre outras, postas pelas Ciências Humanas e Sociais nos últimos anos. Entretanto, pela falta de conhecimento de docentes e de gestores, pela distância ou ausência de curso específico, ou pela tradição já estabelecida, o ER ainda necessita de ampliação dos conceitos (que, na sua nova versão, ainda estão em processo de construção, segundo os discursos de seus agentes) e da 66 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso inserção de ações pedagógicas sob a orientação do multiculturalismo e do respeito à diversidade religiosa. Por essas razões, percebemos a necessidade de ampliação das questões postas em nossas investigações que têm gerado algumas produções acadêmicas em congressos, no âmbito dos trabalhos de conclusão de curso de graduação e interesse por parte daqueles que ingressam na Especialização em Ciências da Religião, além dos grupos que estão envolvidos com a formação continuada tanto das Secretarias de Educação do Estado do RN quanto do município de Natal. Estes têm buscado alterar essa realidade que demonstra ser também uma posição política de gestão escolar, já que os discursos dos sujeitos revelam que só assumem a disciplina, sem a devida formação, porque diretores e outros gestores assim o permitem. Tudo isso retira o caráter disciplinar e pedagógico (CORDEIRO, 2004) envolvidos nas práticas educativas e impede um trabalho planejado na perspectiva pluralista, não-proselitista e multicultural. Dessa forma, pretendemos nos deter mais precisamente em dois aspectos gerados pelas inquietações que as pesquisas provocaram: o resgate das experiências vivenciadas pelos sujeitos que construíram práticas transformadoras do ER, a partir da análise do discurso das narrativas pessoais e do registro do cotidiano escolar, relacionando a construção identitária à construção das novas práticas construídas nas vivências de professores recém-formados pela Licenciatura em Ciências da Religião/UERN e que tenham sido aprovados em concursos públicos para atuar na escola pública. Ao debruçarmos sobre essas questões, acreditando que merecem tratamento científico, dada a relevância de pesquisas que acompanham as transformações/reflexões que ocorrem no espaço escolar, buscamos, a partir das construções discursivas, uma relação interdisciplinar (MOITA LOPES, 2006), trazendo as vozes das teorias sobre práticas de ensino, entre outros encaminhamentos pedagógicos apreendidos naquele curso, nas/pelas disciplinas, que estarão presentes no campo de atuação dos sujeitos participantes cuja construção identitária indica a posição de educadores/as e não de agentes religiosos/as. 67 FONAPER A identidade pela narrativa biográfica Justapondo a essa compreensão de construção de identidades ao trabalho de compor narrativas sobre as trajetórias pessoais de professores, apoiamo-nos, neste artigo, na perspectiva das pesquisas sobre as biografias educativas para discutir sobre quem são/foram os/as professores/as de Ensino Religioso. Nessa perspectiva, o trabalho de autonarrar-se evoca uma dimensão de compreensão do Eu e do Outro. Isso significa o desenvolvimento de uma atitude reflexiva diante do olhar para nós mesmos, da compreensão (parcial) de nós mesmos, ao mesmo tempo em que esse olhar se dirige para o outro, no sentido de compreendê-lo, ―[...] de olhar para fora, contrastar com outros pontos de vista e com outras sensibilidades, como forma de compreender, de captar nossas dimensões não-exploradas‖ (CONTRERAS, 2002, p. 211). Com isso, as subjetividades, as complexidades, as diferenças e as novas percepções dos sujeitos emergem através das práticas discursivas, ou seja, de seus enunciados (tanto orais quanto escritos), que, no dizer bakhtiniano (BAKHTIN, 2003), significam unidades da interação verbal e que partem daquilo que um sujeito disse (ou escreveu) em um momento dado e em condições precisas. Nóvoa (1995) propõe a compreensão da realidade do professor a partir do que é dito pelo próprio professor. De acordo com esse autor, os/as professores ―possuem um conhecimento vivido (prático), que cada um é capaz de transferir de uma situação para outra, mas que é dificilmente transmissível a outrem‖ (NÓVOA, 1995, p.36). Dessa forma, é necessário que seja dada a palavra ao professor, no intuito inclusive de se valorizar os conhecimentos dos quais os professores são portadores, do ponto de vista social e científico. Além desses autores, Ferrarotti (1988) aponta para a necessidade de uma renovação metodológica no campo da formação docente, apostando no método biográfico no âmbito da pesquisa em educação. Nesse método, tanto a subjetividade dos sujeitos que se manifestam através de sua historicidade, quanto a compreensão desse sujeito a respeito do mundo ao seu redor são explicitadas a partir de sua autobiografia educativa. Mais: olhando-o como o outro, o que está no outro lugar – o lugar da prática – por parte de quem o vê – do lugar da formação – elaboramos novos conhecimentos. Conhecimentos estes produzidos pela reflexão sobre os dois lugares – o da prática e da teoria. 68 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Assim, diante dessas colocações, começamos a debater no curso de Ciências da Religião qual o papel da memória para a construção das identidades docentes. A seguir, estabelecemos o percurso metodológico para a instauração de possibilidades de interlocução com os conhecimentos da formação e os da prática, pela experiência vivida em diferentes épocas do Ensino Religioso em Natal e no Brasil. A abordagem metodológica Adotamos como direcionamento metodológico de nosso estudo o enfoque qualitativo, com ênfase na abordagem interpretativista (MOITA LOPES, 1994) relacionada ao contexto sócio-histórico (FREITAS, 2002) dos sujeitos participantes. Essa perspectiva permite a (re) interpretação do mundo, tendo em vista as significações das diferentes vozes do mundo social pela linguagem, entendida como sistema aberto. A segunda abordagem corrobora no entendimento das perspectivas sociais e históricas que se constroem e são construídas pela linguagem e que permitem uma compreensão dos processos mediante os quais os próprios sujeitos investigados foram constituindo modos de ser e de fazer específicos de sua pessoa/profissional. Desse modo, o corpus discursivo foi construído a partir de uma entrevista realizada com uma professora que representa as várias gerações com a prática pedagógica do Ensino Religioso no RN. Optamos por trabalhar com a entrevista coletiva, porque, conforme Kramer (2004), a proposta desse instrumento de pesquisa é que os participantes dela dialoguem e o que é dito, transforme-se em situações dialógicas (BAKHTIN, 2003). A entrevista foi realizada em uma seção, no final do ano de 2012, e procuramos dar voz aos participantes, observando as informações pessoais e profissionais, com características biográficas. No momento da entrevista, estavam presentes duas estudantes do curso de Ciências da Religião e um bolsista de iniciação científica, cada um participou de algum modo, perguntando ou comentando. Porém, o objetivo maior voltou-se para a trajetória pessoal da professora, aqui denominada P1. Essa professora foi convidada a participar como sujeito de pesquisa porque possui quarenta anos de experiência com o ER no Estado do RN, já foi Coordenadora Pedagógica do Curso de Ciências da Religião da 69 FONAPER Universidade de Estado do Rio Grande do Norte (UERN), além de ter trabalhado como coordenadora da formação continuada em Ensino Religioso na Secretaria de Educação, Cultura e Desportos do RN de onde se aposentou como professora de Ensino Religioso. Ainda possui uma trajetória pessoal bastante envolvida com a evolução do ER no estado do RN e no Brasil, por ter participado de situações históricas definidoras das transformações mais recentes com as práticas formativas do ER e a criação do Fórum Nacional do Ensino Religioso, representando o RN. A transcrição da entrevista foi feita de modo que os trechos selecionados também não sofressem qualquer modificação no que é dito. Existem alguns trechos destacados entre chaves com informações explicitadas por nós, para melhor compreensão do leitor. Interpretamos que a professora traz inúmeras contribuições sobre a evolução que acontece nas práticas pedagógicas do ER. Dessa maneira, interpretamos as posições assumidas pela informante do ponto de vista daquilo que é ex-posto (LARROSA, 2002), enquanto experiências formativas, no contexto da entrevista coletiva. Em outras palavras, essa escolha oportuniza o pesquisador a entender os enunciados a partir dos posicionamentos dos entrevistados que refletem o contexto social e histórico que vivenciaram, mostram as marcas do seu tempo, trazem as dimensões em que estavam/estão inseridas, privilegiando os fragmentos de vida trazem diferentes situações, sentidos e vozes que se articulam como possibilidade de interlocução. Freitas (2002, p.29) destaca ainda que, ―[...] na entrevista é o sujeito que se expressa, mas sua voz carrega o tom de outras vozes, refletindo a realidade de seu grupo, gênero, etnia, classe, momento histórico e social‖. Assim, as narrativas proporcionam um gama de contextos investigativos, que, na análise, demonstram como as identidades são produtos históricos e sociais. Considerando essas ideias, analisamos as rememorações, com base na significação das vivências de uma professora de Ensino Religioso que revela suas experiências com a atuação na área desde o antigo modelo de Ensino Religioso – o modelo de ensino da Religião – ao modelo mais atual – o das práticas pluralistas. Inserida no campo da subjetividade, as entrevistas implicam dimensões do sujeito e o modo como os seres humanos entendem suas histórias pessoais, sociais, coletivas. Além disso, observamos e tentamos compreender como a professora participante 70 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso pensa e sente as diferentes situações de seu processo formativo, principalmente ao destacar essa ou aquela situação em detrimento de outras. Seguindo essa lógica, a entrevista torna-se um espaço para o diálogo e para o destaque dos papeis subjetivos que são produzidos no momento da rememoração. Desse modo, salientamos que para a construção dos dados, participamos desse momento juntamente com mais três alunos do curso de Ciências da Religião que fazem parte do grupo de estudos organizados pela linha de Pesquisa da qual todos participam. Em alguns momentos, cada participante teve voz e fez perguntas e/ou comentários. Neste artigo, porém, destacaremos apenas os enunciados selecionados da transcrição que indicam a escolha de professores de Ensino Religioso nas décadas de 70 e 80 e o modelo que orientava a prática dos professores desse período. Os dados contidos nas filmagens foram transcritos e estão organizados da seguinte maneira: [...] Corte pelo analista, ( ) Pausas, hesitações no fluxo das enunciações, [ Falas sobrepostas, / Interrupção na fala em curso. Na análise e construção dos dados, procuramos interpretar os discursos da participante com o intento de entender os valores tomados como fundamentais para uma melhor educação da época, ou seja, priorizamos o conhecimento que essa profissional construiu ao invés de julgarmos suas atitudes de proselitistas ou não. A experiência como professora-formadora – além da própria identidade Formada em Letras e com especialização e Mestrado em Ciências da Religião, desde a formação inicial leciona ou trabalha diretamente com a formação de professores de Ensino Religioso. A seguir, transcrevemos um trecho da entrevista no qual a pesquisadora (identificada na transcrição3 como E1 – Entrevistadora 1) indaga à participante sobre as experiências profissionais durante os anos de 1970. 3 Elementos que estão na transcrição: Pq pesquisador; ( ) algo inaudível; ... algo foi editado; / pausa curta; // pausa longa; [ fala sobreposta; [...] Trecho retirado. Trabalhamos com modelo existente em Moita Lopes (2002). 71 FONAPER E1: [...] E a gente quer ver mais ou menos as práticas. / Como eram as práticas? / então, a gente vai fazer dois blocos. Hoje a gente vai ver um pouquinho sobre a formação. O que você puder contar pra gente quem eram, quem é que dava o Ensino Religioso? Como você começou sua carreira? Como você entrou na carreira docente? E como era a formação naquele tempo, né?! / P1: É! / Então! / em 1973, com a LDB 5.692/71, é, / é a exigência através do artigo / já na reformulação de 1969, através do artigo que eu num tô lembrada agora, mas vocês pesquisem que acham... E1: Hum...hum... P1: O Ensino Religioso começou a fazer parte / porque na LDB, ela sai, ele, na CNBB, ele sai sem ônus, e sem ônus num funciona, em canto nenhum, nem com ônus funciona, imagine sem ônus! / Mas logo, na Emenda Constitucional de 1969, que é fruto do regime militar, entra o Ensino Religioso, nas escolas de primeiro e segundo grau, / obrigatório para o aluno. / Obrigatório para a escola oferecer, e facultativo para o aluno, que isso é História que.. que... tá na história do Ensino Religioso desde 1931, né?! / então / aí va, vamos, vamos nos organizar para esse ensino, pra, pra, sistematizar este ensino. / O Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Norte, através do parecer 03/76, / [lembrando-se]... isso antes a gente se reúne, a gente vai a NUREB‘s, nessa época era a NUREB‘s. / Acho que era Núcleo de Educação e Supletivo, que só havia três no Rio Grande do Norte! Era um Natal, um Mossoró e outra em Caicó. / E a chefe do, da 4 NUREB‘s na época era XX , chama Monsenhor WW, para trabalhar com o Ensino Religioso / como eu não sabia / nessa época eu trabalhava no Manoel Dantas, que era uma experiência da, da / em 1972 / uma experiência inovadora, exitosa que era um colégio, eram três colégios chamados Complexos Escolar de Natal. Era o Sebastião Dantas, // o Sebastião Fernandes, o Manoel Dantas e o Jerônimo Gueiros. Eram escolas de primeiríssima... / E1: [Jerônimo o que? / P1: Jerônimos, Jerônimo Gueiros, que hoje praticamente não funcionam. São escolas... / Sebastião Dantas tá até com problemas num tem mais aula à noite por causa disso. Mas era uma experiência inovadora! // E aí começa / a gente vai convidar a chefe do NUREBS pra trabalhar o Ensino Religioso aqui no Rio Grande do Norte. / Na / No primeiro NURE, no primeiro NUREB, e no Rio Grande do Norte, posteriormente o NUREB passa a ser NURE, que é Núcleo Regional de Ensino, de, ensino... de ensino! / E1: Hum..hum! 4 72 Alguns nomes foram substituídos por XX, YY, WW, para se preservas as identidades de pessoas citadas. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso P1: Então, quando ele chega no NUREB é muito interessante. Elas entregam três, sete professoras, todas velhas e a gente perguntou: ―e por que essas professoras?‖. ―Por que elas não prestam mais‖. O termo usado foi esse! ―elas não prestam mais para a sala de aula. / Mas elas têm afinidade com o Ensino Religioso‖. E elas faziam catequese de sobra. Mas essas criaturas foram maravilhosas! / Eram sete pessoas idosas que começamos um trabalho excelente com essas criaturas...que... acho que a última morreu há pouco tempo, que era Irmã WW. Que era uma memória viva, que a gente num registrou nada. Então, que que elas faziam? / Elas faziam catequeses nas escolas, e elas estavam liberadas pelo Estado, para isso. Pra fazer isso! Porque nós fazíamos preparação para a eucaristia, preparação para crisma, faziam catequese, preparação de missa. / E, chegamos nós, né?! Também com esta, / esta preocupação, a gente começou esse trabalho fazendo catequese mesmo. / Que era um / a gente fazia catequese, mas a gente tinha uma preocupação, já na época, de respeitar a religiosidade presente na sala de aula. Aí, a gente já tinha essa preocupação. / Aí a gente começou a perceber que havia muito boa vontade, mas não havia preparação adequada. Então, a gente começou a fazer viagem. / Aqui, a gente fazia reunião com os professores e, e, e fazia viagens pelo interior/ do Rio Grande do Norte, para trabalhar o Ensino Religioso. / Nessa época existia um método, / chamado.. é, realizado na igreja, é, chamado Ver, Julgar e Agir. O que era esse método? / Esse método a gente analisava a realidade presente na sala de aula, que, na mesma época, que era usada na catequese, depois essa realidade era iluminada por um texto bíblico, ou outro texto, que pudesse iluminar, dar respostas a essa realidade. Depois esses / a gente trabalhava com os alunos, / é, / ações transformadoras daquela realidade. / E celebrávamos também. Celebrávamos aquela realidade. / Foi uma experiência riquíssima. E nessa época 5.692 [referindo à lei], / a gente trabalhava exatamente isso: a religiosidade. / Respeitando os credos, só que, que, nas escolas, a lei dizia / posteriormente em 1996, quando o Conselho Estadual de Educação regulamenta o Ensino Religioso, / que os professores são indicados pela autoridade religiosa, / então, a gente tinha o poder de indicar o professor para a sala de aula. / A narrativa produzida pela professora, mediada por nossas intervenções, deixa marcas de cada uma de nós, pois revela historicamente o que acontecia em uma época não tão distante de hoje, indicando uma prática muito comum em tempos passados: as pessoas que lidavam com o Ensino Religioso não precisavam de nenhuma formação especial a não ser possuir uma fé. Esta última informação confere com o que Passos (2007 p. 32) explica sobre o ensino religioso dessa época: ―[...] há um vínculo direto entre as confissões religiosas e o ER [...]‖. Para completar a imagem construída pela participante, se as/os professoras/es fossem mais velhas/os ou perto de se aposentar, enquadravam-se na representação mais comum de quem lidava com essa disciplina, caso não fosse freira ou padre. São elementos constitutivos da 73 FONAPER identidade de docente do Ensino Religioso e que, por total desconhecimento das agências de formação, dos gestores da educação (diretores, coordenadores e professores, além dos próprios estudantes e familiares) sobre as mudanças legais e epistemológicas do atual modelo de ER, ainda hoje continuam a se perpetuar. A professora ainda considera normal o fato de as professoras indicadas para a prática com o Ensino Religioso da época serem enquadradas no modelo confessional. Tanto é que percebemos a naturalidade como ela se expressa durante a filmagem, olhando para cada interlocutor e achando graça da situação rememorada. No entanto, notamos uma pequena fissura na avaliação que a professora introduz no diálogo: ela marca o momento em que o grupo que trabalhava com o ER no Estado do RN começa a perceber que há algo mais a ser feito no contexto da prática educativa. A primeira reação que motiva um olhar diferenciado para as novas práticas a serem introduzidas ao longo dos próximos vinte anos, começa a ser construída da percepção de que se necessitava respeitar a religiosidade dos estudantes e professores e, em seguida, de que não poderia haver qualquer conhecimento no contexto da sala de aula. Na condição de formadora, a professora evoca o período em que começa a viajar pelo estado e o período em que usa a mesma metodologia da catequese com o material intitulado Ver, Julgar e Agir que orientava as práticas de ensino na época. Mesmo sem a possibilidade de uma mudança radical, a professora destaca a importância de se analisar a realidade da sala de aula, de se ter um tema norteador e de se ler um texto. Essa prática fica condizente aos momentos históricos pelos quais a educação brasileira atravessa, quando vislumbramos uma rotina muito parecida com o ensino em geral: o trabalho com os temas geradores, a leitura que inspira e ilumina o conhecimento e a compreensão que é feita pela reflexão e discussão. Esse modelo, muito comum à época, decorre do sistema didático adotado no país. O respeito à religiosidade não era desvinculado das práticas celebrativas, como a realização da primeira eucaristia e da crisma, porém, o olhar do/a professor/a daquela época é atravessado pelo respeito à diversidade, ainda que de modo não muito organizado nem sistemático, em termos pedagógicos, como podemos ver, no trecho selecionado. 74 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Percebemos ainda que P1 ainda revela conhecer profundamente a legislação que altera o status de disciplina sem ônus, ou seja, de disciplina que não precisa de agentes externos ou agentes religiosos, vindos de uma instituição religiosa quem mantinha o ensino de catequese para o status de disciplina com ônus, significando que os estados e municípios assumiriam a seleção e manutenção dos docentes de Ensino Religioso, ficando responsáveis pelos salários desses docentes. Essa alteração aconteceu, de fato, a partir dos anos finais do século passado, a partir de uma grande mobilização no Brasil, conforme relembra a própria professora: P1: [...] e isso foi muito bom, porque na calada da noite, a LDB é apro... apro...(titubeando) aprovado em 20 de dezembro, onde escola não funciona mais, onde tinha com ônus para os cofres públicos, Sarney, tirou com ônus e botou sem ônus! / foi Sarney que fez isso! [...] é quando // a gente se movimenta! / há um movimento, o Fórum toma a frente, a CNBB toma a frente, aí a gente foi buscar ajuda de todas as entidades! / as superiores, as... tudo! / os institutos formados, as universidades, a AEC, e aí vamos juntar! / vamos juntar! / era, era a confecção do MEC dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso! / nós não fomos contemplados com os Parâmetros Curriculares,[...]. Uma transformação radical nesse tipo de prática de ensino foi a superação do ER catequético para o respeito às práticas religiosas tanto de alunos/as quanto de professores/as. Ainda há contradições na construção das transformações no contexto escolar. Nem sempre os agentes religiosos conseguem interferir na escolha/seleção dos docentes do Ensino Religioso, porque também, nem sempre, os professores da disciplina são agentes religiosos, ao contrário, são professores que trabalham numa linha pedagógica e que assumem a disciplina por vários fatores. A entrada de professores que não atuavam como agentes religiosos introduz as pequenas alterações que ainda levarão quase uma década para alterar o modelo de Ensino Religioso predominantes. Essa contradição reforça os embates que irão acontecer tanto na área da atuação quanto na formação docente. Percebemos, em nossos estudos iniciados em 2007, que esse embate ficará registrado até a criação do curso de Ciências da Religião da UERN. Nessa linha de pensamento, a resistência acontece porque Tal ensino estaria, portanto, fundado na factualidade e na relevância do preceito religioso para a vida social, fazendo parte de um projeto mais amplo que não coloca a priori a religiosidade dos sujeitos como 75 FONAPER algo a ser educado, mas, antes, os próprios sujeitos, independentemente de suas adesões de fé. (PASSOS, 2007, p.33). Para que houvesse a percepção indicada nas palavras de Passos, muito foi realizado em termos de discussões e posicionamentos. As referências indicam que para na história recente, o Ensino Religioso passou a ser entendido mais como ―[...] parte integrante da formação do cidadão‖ (GIUMBELLI; CARNEIRO, 2004a, 2004b). No entanto, a partir dessa concepção, várias mudanças começam a se destacar na rotina das práticas com o ER. Quem assume que qualquer professor/a pode lecionar a disciplina Ensino Religioso, sem o devido preparo inicial, está se posicionando como alguém que desconhece as leis e parâmetros orientadores das ações com essa disciplina e, mais ainda, demonstra desconhecer totalmente que Ensino Religioso não é mais sinônimo de ensino de uma religião, como podemos registrar ao longo da História da Educação Brasileira. P1 revela que durante a sua trajetória pessoal, o Ensino Religioso funcionava em detrimento da religião católica e mostra que hoje, isso não é mais concebido. Para ela: P1: Ele [o professor] não pode fazer proselitismo nem da sua [religião] nem de nenhuma. Ele tem de trabalhar as Ciências da Religião oportunizando a esse aluno a se encontrar com ele mesmo, a se encontrar com os outros, numa atitude de respeito à natureza, de cuidado com a natureza, de cuidado com as pessoas, como todos, com velhos, com crianças, com adultos, com todo mundo. (Trecho da entrevista) Como professora formadora, P1 mostra o que tem feito em sua prática. Como podemos ver, a trajetória pessoal da professora-formadora resgata particularidades de um período marcado por transformações diversificadas no campo do Ensino Religioso. Essas transformações, para ela, que estava totalmente envolvida com a prática nessa área de atuação em diversas áreas, como a de elaboração de materiais didáticos; cursos que hoje são compreendidos como formação continuada (há poucos anos, esses cursos eram chamados de treinamentos, cursos de reciclagem, capacitação profissional); além de participar de ações que traziam para a realidade do Ensino Religioso a compreensão de área de conhecimento constituída historicamente e que possui saberes epistemológicos, não dissociados de um conhecimento sobre didática, filosofia, antropologia, 76 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso sociologia, teologia e outras áreas afins. Assim, quando P1 rememora diferentes fases de sua experiência profissional, também traz consigo, através de suas palavras, sua compreensão própria sobre os reflexos das últimas mudanças sobre as práticas de ensino nessa área de conhecimento. Para o/a aluno/a de um curso de Formação de Professores, como o é a Licenciatura em Ciências da Religião, essas palavras se tornam conhecimentos que reconstroem o percurso pessoal e coletivo do fazer docente de uma época muito significativa para os que se envolveram com as Ciências da Religião. Observações finais Podemos perceber como o conhecimento da trajetória pessoal de professores/as que fazem a memória do Ensino Religioso no RN, mais especificamente na capital potiguar, conforme sublinhamos neste artigo, serve para que estudantes em formação possam ter conhecimentos sobre o que acontece e acontecia em períodos variados da história da educação mais recente. Além disso, podemos entender a percepção do sujeito que conta os conhecimentos, as mudanças, as ações, as perspectivas da educação pelo seu ponto de vista, pela sua compreensão, ou seja, pelos desdobramentos de sua subjetividade. No dizer de Bueno (2002, p.24): [...] aqueles que visam unicamente favorecer o processo de formação do professor utilizando- se do recurso às histórias de vida como instrumento de educação continuada; aqueles que se exprimem por uma preocupação essencialmente investigativa, quer seja como forma de obter conhecimento sobre aspectos da formação dos docentes, quer seja sobre as práticas pedagógicas; e aqueles que visam simultaneamente favorecer práticas de formação contínua e a investigação de processos aí envolvidos. Na interface entre a individualidade que rememora e as questões relativas às transformações das práticas de professores é necessário considerar a natureza social das práticas educativas, percebendo que as transformações ocorrem em contextos situados e se configuram como complexos e dinâmicos, quando olhamos – do ponto de vista do sujeito que atua no campo educacional. As reflexões que ora realizamos, neste trabalho, não são determinantes nem acabadas, pois que ainda estão em fase de apropriação pelos sujeitos pesquisadores. Entretanto, podemos afirmar que a memória – como produto social – pode ter um significado 77 FONAPER formativo para aqueles que buscam construir e reconstruir os caminhos percorridos para a instalação no novo modelo de Ensino Religioso. Referências BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. Tradução Paulo Bezerra. 4ª ed. São Paulo, Martins Fontes, 2003. BENEVIDES, A.S. Saberes da Prática Docente do Ensino Religioso. Referências para a Formação sobre a construção/constituição da identidade do/a professor/a de ER. Relatório Final de Projeto de Pesquisa. Natal: FAPERN, 2011. BRASIL. Presidência da República. Lei n. 9.475/97, de 22 julho de 1997. Alteração, normas, correlação, facultatividade, disciplina escolar, religião, estabelecimento de ensino, ensino fundamental, território nacional, competência, sistema de ensino, fixação, conteúdo, disciplina escolar, religião. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, Congresso Nacional, 23 jul. 1997. Coluna 2, p. 15824. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaNormas. BUENO, B. O método autobiográfico e os estudos com histórias de vida de professores: a questão da subjetividade. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.28, n.1, p. 11-30, jan./jun. 2002. CONTRERAS, José. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002. CORDEIRO, Darcy. A Evolução dos Paradigmas e o Ensino Religioso. In: SILVA, Valmor da (org.). Ensino Religioso: educação centrada na vida: subsídio para a formação de professores. São Paulo: Paulus, 2004. CORTELLA, M. S. Educação, Ensino Religioso e formação docente. In: SENA, Luzia (org.). Ensino religioso e formação docente: Ciências da Religião e Ensino Religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2007. FERRAROTTI, F. Sobre a autonomia do método biográfico. In: NÓVOA, A.; FINGER, Matthias (org.) O método (auto) biográfico e a formação. Lisboa: Ministério da Saúde, Departamento de Recursos Humanos da Saúde, 1988. p.17-34). FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO. (FONAPER). Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Religioso. 9ª ed. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. 78 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso FREITAS, Maria Teresa de Assunção. A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa qualitativa. Cadernos de Pesquisa, n. 116, p. 2139, julho/2002. GILZ, Claudino; JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; OLIVEIRA, Lilian Blanck; PEROBELLI, Rachel de M. Borge; RODRIGUES, Edile M. Fracaro. Curso de formação de professores. In: SENA, Luzia (org.) Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2007, p. 91-103. GIUMBELLI, Emerson; CARNEIRO, Sandra de Sá (orgs.). Ensino Religioso no Estado do Rio de Janeiro – registros e controvérsias. Comunicações do ISER, 60, 2004a. GIUMBELLI, Emerson; CARNEIRO, Sandra de Sá. Introdução. In: Ensino Religioso no Estado do Rio de Janeiro – registros e controvérsias. Comunicações do ISER, 60, 2004b: 11- 19. KRAMER, Sônia. Professoras de educação infantil e mudança: Reflexões a partir de Bakhtin. Cadernos de Pesquisa, V. 34, nº 122, mai/ago. 2004, p. 497-515. LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência. Revista Brasileira de Educação. Jan/Fev/Mar/Abr 2002 Nº 19. MOITA LOPES, Luiz Paulo da. Uma linguística aplicada mestiça e ideológica: interrogando o campo como linguista aplicado. MOITA LOPES, Luiz Paulo da. (org.). Por uma Linguística Aplicada INdisciplinar. Parábola Editorial: São Paulo, 2006. MOITA LOPES, Luiz Paulo da. Pesquisa Interpretativista em Linguística Aplicada: a linguagem como condição e solução. D.E.L.T.A., Vol. 10, Nº 2, 1994, p. 329-328. NÓVOA, A Os professores e as histórias de vida. In: NÓVOA, A. (org.) Vidas de professores. Portugal, Porto Editora, 1995. PASSOS, João Décio. Ensino Religioso: Construção de uma proposta / João Décio Passos – São Paulo: Paulinas, 2007 – (coleção temas do ensino religioso). SANTOS, Boaventura Souza. Um discurso sobre as ciências. São Paulo: Cortez, 2003. 79 O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL: A POSTURA DO EDUCADOR ENTRE O CUIDAR E O EDUCAR NA DIVERSIDADE DE PERTENÇA Celeide Agapito Valadares Nogueira (UFJF)1 Resumo: O intuito desta comunicação é discorrer sobre a educação infantil e o lugar do ensino religioso entre o Educar e o Cuidar na diversidade religiosa de um país laico. A delicada tarefa no processo de desenvolvimento da criança abrange diversas dimensões e requer uma postura multilateral de múltiplas perspectivas do que é o ser humano e suas potencialidades evolutivas de forma global: a antropológica, a fisiológica, a sociológica, a epistemológica, a lúdica, a artística, a afetiva, a religiosa, a espiritual, etc. Lançar-se-á mão como aporte teórico-metodológico autores como Jean Piaget (2009); Luiz Antônio Cunha (2013); Jordanna, Castelo Branco e Patrícia Corsino. Palavras-chaves: Ensino Religioso; Educação Infantil; Diversidade. Introdução A educação infantil requer e necessita de um olhar para o ser a qual se destina o processo educativo em suas múltiplas dimensões: antropológica, a fisiológica, a sociológica, a epistemológica, a lúdica, a artística, a afetiva, a religiosa e a espiritual. Não é tarefa fácil englobar tantas dimensões necessárias ao desenvolvimento cognitivo e afetivoespiritual do ser que são o arcabouço e sustentáculo da criança para um equilíbrio deste ser humano em pleno desabrochar das suas multifacetadas necessidades intrínsecas. No entanto, existem pontos básicos ao qual o feito educativo não pode negligenciar o cuidado e, por lado, o cuidado não pode abster da esfera educativa do ser humano em evolução com suas potencialidades. De maneira que, historicamente, vemos uma ênfase em determinado aspecto do processo global educativo em detrimento do outro. Houve, em princípio, um ideário assistencialista preconizando a fase da educação infantil como um momento apenas de cuidados que se 1 Mestrado em Ciência da Religião PPCIR-UFJF (2012). Licenciada em Filosofia pela UFJF (2007) com Especialização em Filosofia Moderna e Contemporânea pela UFJF (2008) e Especialização em Ciência da Religião PPCIR-UFJF (2010). Atualmente cursando Especialização em Religiões e Religiosidades Afro-brasileiras NEAB-UFJF e Licenciatura em Pedagogia pela UFJF. FONAPER restringiam aos cuidados elementares e básicos para o desenvolvimento físico-biológico. Esta visão da educação infantil no percurso da história da educação brasileira foi se ampliando, de maneira que na realidade da educação infantil atual é inconcebível não abarcar as duas dimensões, a do cuidar e do educar. O educar e o cuidar É polissêmica a semântica das palavras educar e cuidar, por isto merece a nossa delicada atenção para compreendermos seus vários significados, e assim apontarmos sobre o quê se está falando quando nos referirmos a estas. Cuidar segundo o Dicionário Analógico da Língua Portuguesa é ―velar; zelar, ter os olhos sobre alguém‖ e cuidado é ―solicitude, pensamento, desvelo, zelo, atenção, empenho, interesse‖.2 Educação de acordo com o Dicionário de Filosofia: ―Daí o imperativo a que pode ser reduzida a E. contemporânea: o de ‗aprender a ser‘, ‗aprender a aprender‘: tarefa que dura toda a vida e envolve indivíduos e instituições.‖ 3 Os indivíduos são objeto a qual se dirige a educação, as instituições têm que garantir os direitos e a base logística para o desenvolvimento destes indivíduos para viverem a plena cidadania. Indivíduo que se torna um cidadão do mundo, comprometido com a casa comum, que é o planeta. E, ainda, segundo a concepção de Educação de Abbagnano: A exigência da universalização do direito à E. traz à luz o nexo entre E. e democracia que não poucos pensadores do século XX evidenciaram ( tais como J. Dewey, J. Maritain, S. Hessen, e R. Dottrens), e que constitui outra peculiaridade do discurso contemporâneo sobre a E., que se configura, assim, em termos decididamente pessoais e idiográficos: na base da E. atual existe a preocupação de respeitar o homem em sua dignidade (universal) e em sua especificidade (individual), e a E. configura-se essencialmente como um processo de remoção dos obstáculos que impedem o 2 3 82 AZEVEDO, Francisco Ferreira Dos Santos. Dicionário Analógico da Língua Portuguesa. 2ª Ed. Atual. E revista. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010, p.459. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5 ed. SãoPaulo, Martins Fontes, 2007, p. 358. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso desenvolvimento, bem como de promoção das potencialidades 4 próprias de cada pessoa. Se a educação é promover o desenvolvimento das potencialidades de cada ser em si, não se pode excluir da educação infantil o apanágio da dimensão da religiosidade ou espiritualidade do ser humano. Não desconsiderando que as crianças trazem de suas famílias socializações primárias referenciais de religião que irão se imiscuir com uma diversidade na sala de aula. Desde a infância o ser humano vai desenvolver suas potencialidades, sobressaltando que o conceito de infância é um construto social que cada tempo histórico tende a colocar em uma estrutura específica de cada contexto social. Num primeiro momento, elencaremos algumas concepções de Piaget sobre uma proposta educativa que leva em conta as necessidades do ser humano para se desenvolver intelectualmente e afetivamente. E, num segundo momento far-se-á a explanação com o arcabouço teórico escolhido para abordar a temática a educação infantil e o lugar do ensino religioso entre o Educar o Cuidar na diversidade religiosa de um país laico. Piaget: O desenvolvimento do pensamento não é indissociável do afetivo-emocional. Segundo Piaget (2009) o pensamento da criança não é uma mentalidade pré-lógica no sentido que não há uma lógica, mas no sentido que há uma lógica diferente da fase adulta: Comecemos pelas diferenças entre a criança e o adulto. Sustentei em meus primeiros livros que a criança começava sendo ‗pré-lógica‘, não no sentido de uma diferenciação fundamental entre a criança e o adulto, e, sim, no da necessidade de uma construção progressiva das 5 estruturas lógicas. Partindo desse pressuposto, inferimos que esta construção progressiva do pensamento inicia-se antes mesmo das etapas sucessivas: ―concreto‖ entre 7 e 11 anos, e ―formal‖ ou proposicional após os 11-12 anos. O que queremos chamar a atenção aqui sobre a construção 4 5 ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5 ed. SãoPaulo, Martins Fontes, 2007, p. 358. PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães D‘Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 24ª Ed. Rio de janeiro: Forense, 2009, p.69-70. 83 FONAPER progressiva do pensamento é a respeito da mentalidade lógica da criança como preponderante para o desenvolvimento da criança não somente ao que tange a uma epistemologia genética. Entre e para além está todo o dimensionamento do que é este ser humano que se quer progredir. Ainda na etapa da primeira infância como já supracitado, há inúmeras nuances da criança e do humano como tal que precisam ser consideradas. Englobando a criança num ser físico, que pensa, mas também num ser afetivo que sente antes de tudo. Este sentimento se revela no corpo físico na ação como primeira linguagem, por isto, no jogo e no brincar ludicamente revela sua face mais genuína. Assim também, a posteriori no desenho livre, na linguagem escrita vai progressivamente construindo sua visão de mundo a partir da sua própria descoberta. De acordo com Piaget esta construção da realidade centrada nos dois primeiros anos no eu, dá lugar a um eu em relação com o mundo, as pessoas, os objetos. A evolução da afetividade durante os dois primeiros anos dá lugar a um quadro que, no conjunto, corresponde, exatamente, àquele estabelecido através do estudo das funções motoras e cognitivas. Existe, com efeito, um paralelo constante entre a vida afetiva e a intelectual. Temos aí apenas um exemplo, mas veremos que esse paralelismo se seguirá no curso de todo desenvolvimento da infância e adolescência. Tal constatação só surpreende quando se reparte, de acordo com o senso comum, a vida do espírito em dois compartimentos estanques: o dos sentimentos e dos pensamentos. 6 Mas, nada é mais falso e superficial. No veio da reflexão de Piaget entrevemos ser indissociável o sentimento do pensamento e vice-versa. O desenvolvimento do pensamento não é indissociável do afetivo-emocional. Isto nos leva a pensar que a criança é um todo complexo, um misto de sentimento e pensamento dialéticos em eterno devir, pois que nunca pronta e acabada. Mas, um ser em construção, e isto não é próprio da criança, mas da existencialidade humana. Diante de tais conjecturas, como são levados em conta estas premissas pelas políticas públicas para agraciarem este ser em construção, tanto na sua necessidade fisiológica, afetiva e intelectual e 6 84 PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães D‘Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 24ª Ed. Rio de janeiro: Forense, 2009, p. 22. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso religiosa? Será que estas políticas no Brasil consideram esta criança em construção em suas diversas dimensões em progressão? A legislação do Ensino Religioso e as politicas públicas para a educação infantil no Brasil Em um artigo intitulado O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL DE DUAS ESCOLAS PÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: o que as práticas revelam? As autoras Jordanna Castelo Branco (Licenciada em Pedagogia pela UFRJ) e Patrícia Corsino (Professora adjunta da Faculdade de Educação da UFRJ) fazem uma reflexão sobre o Ensino Religioso no Rio de Janeiro no ensino fundamental e relatam que nas duas escolas pesquisadas encontraram práticas de um ensino confessional. Em suas palavras: Colocando o foco no município do Rio de Janeiro, temos cerca de 18% das crianças de zero a três anos de idade atendidas em creches e 95% 3, das de quatro a seis anos, freqüentando escolas. As crianças de seis anos, desde 2000, já foram incluídas no Ensino Fundamental, e as de quatro e cinco anos freqüentam pré-escolas públicas e privadas. Quanto ao ensino religioso, antes da lei municipal no 3.228, de 26 de abril de 2001, que estabelece o Ensino Religioso Confessional nas escolas da rede pública de ensino do Município do Rio de Janeiro, em algumas escolas municipais, já havia aulas de religião lecionadas por voluntários, fora da grade curricular, sob a justificativa de ensinar valores éticos e morais às crianças. O ensino religioso, como parte integrante do currículo do Ensino Fundamental e da Educação Infantil das escolas da redemunicipal de ensino, está contemplado no Núcleo Curricular Básico - Multi-educação, de 1996, como ―enfoque religioso na pluralidade cultural sob a justificativa de que a potencialidade transformadora do sagrado se manifesta e mostra o quanto é importante, hoje, a busca de uma ética para o ser 7 humano‖ (p.188). Adiante acrescenta: Cabe a ressalva de que, com a lei no 9.475, de 22 de julho de 1997, o ensino religioso nas escolas públicas passou a ser ―de matrícula facultativa, parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino 7 CASTELO BRANCO, Jordanna e CORSINO,Patrícia. O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL DE DUAS ESCOLASPÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: o que as práticas revelam?, In: http://www.revistacontemporanea.fe.ufrj.br/index.php/contemporanea/article/download/2 1/15 Acessado em 18/06/2013. 85 FONAPER fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa 8 do Brasil, vedadas de qualquer forma deproselitismo‖ (artigo 33). Nesse veio sobre o ensino religioso como facultativo (Cordeiro, 2010, p.133) aponta que a formação básica do cidadão não se completa no ensino fundamental. Ressalva sobre a formação de professores a importância da postura de um professor que transmita o Ensino Religioso de maneira científica, como fazem a Ciência da Religião, e não como Teologia advogando qualquer causa confessional. Sem proselitismo o Ensino Religioso há que respeitar a diversidade multicultural, multirracial e a pluralidade religiosa na qual se configura o cenário da realidade contextual brasileira. O cenário no qual estamos inseridos no Brasil desde a Constituição de 1988 Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, segundo Barreto (2003): Nota-se que grandes avanços no âmbito jurídico-legal vêm ocorrendo, especialmente após a Constituição de 1988, no que tange aos direitos da criança. O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, a Lei Orgânica da Assistência Social, de 1993, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, consagram tais avanços. Destacamse, entre estes, o direito à educação da criança de 0 a 6 anos de idade, em creches e pré-escolas. Essas instituições passam a 9 constituir a educação infantil, primeira etapa da educação básica. E, Kramer (2006) assinala que: Do debate sobre a educação de crianças de 0 a 6 anos nasceu à necessidade de formular políticas de formação de profissionais e de estabelecer alternativas curriculares para a educação infantil. Diferentes concepções de infância, currículo e atendimento; diversas alternativas práticas, diferentes matizes da educação infantil. Direitos de crianças consideradas cidadãs foram conquistados legalmente sem que exista, no entanto, dotação orçamentária que viabilize a consolidação desses direitos na prática; exigências de formação de 8 9 86 CASTELOBRANCO,Jordanna e CORSINO,Patrícia. O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL DE DUAS ESCOLASPÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: o que as práticas revelam?, In:http://www.revistacontemporanea.fe.ufrj.br/index.php/contemporanea/article/download /21/15 Acessado em 18/06/2013. A educação infantil no contexto das políticas públicas Angela Maria Rabelo Ferreira Barreto, p.58. In: http://www.scielo.br/pdf/%0D/rbedu/n24/n24a05.pdf Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso profissionais da educação infantil e reconhecimento de sua condição 10 de professores. Os direitos estão garantidos legalmente, no entanto, faltam, na prática, verbas orçamentárias para efetuarem eficazmente a aplicação da lei. O reconhecimento não garante efetivamente a contemplação dos direitos que em debates são levados à tona na realidade de um cenário multiforme com diferenças que emergem da diversidade do país. Tanto no que se refere às diferentes concepções de infância, quanto da elaboração de currículos diferenciados para atenderem a demanda de um país geograficamente e culturalmente diverso. Para além do pano de fundo que é circunscrever numa esfera conceitual a qual ser se quer educar, há novas implicações de cunho social, curricular, orçamentário, etc. Com as quais o desenvolvimento dos dois aspectos educar e cuidar são uma problemática. O lugar das políticas públicas para as crianças menores de sete anos no Brasil até as pesquisas do ano de 2003 ainda é tímido, como assinala Barreto (2003): Observa-se que ainda é tímido o lugar ocupado pela criança menor de sete anos nas políticas públicas, apesar de ser esse o segmento populacional mais afetado pelas condições de pobreza e desigualdade. O percentual de crianças dessa faixa etária em famílias com renda inferior a 1/2 salário mínimo per capita chega a 42,2%, bem superior àquele da população em geral. (Dados da PNAD/IBGE de 11 1999). Percebe-se que são escassas pesquisas da área de pedagogia recentes que abordem a evolução dos programas e metas traçando um paralelo a partir de 2006 para cá. Nas buscas e mapeamentos de levantamento bibliográfico pela Internet não conseguimos dissertações ou teses recentes sobre esta temática. Ainda que haja muitos referenciais de análises quantitativas. Há uma sobrepujança de dados numéricos sobre a Educação infantil em detrimento de pesquisas que retratem com zelo em termos qualitativos o encaminhamento progressivo das crianças de 0 a 6 anos. O campo das pesquisas também requer uma atenção e um olhar 10 11 KRAMER, Sônia. AS CRIANÇAS DE 0 A 6 ANOS NAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL: EDUCAÇÃO INFANTIL E/É FUNDAMENTAL In: http://www.scielo.br/pdf/%0D/es/v27n96/a09v2796.pdf Acessado em 13/10/2012. A educação infantil no contexto das políticas públicas - Angela Maria Rabelo Ferreira Barreto In: http://www.scielo.br/pdf/%0D/rbedu/n24/n24a05.pdf 87 FONAPER voltado para este público alvo investigando em termos qualitativos o perfil das crianças de 0 a 6 anos em seu aspecto global. Nas observações de Rosemberg (2001), Dentro desta ótica, o design dos projetos de diagnóstico/avaliação são orientados para avaliar cobertura, custo e impacto, este último geralmente medidos através de aferição do estado nutricional, da inteligência, de habilidades cognitivas, mas, raramente, do desenvolvimento social (Myers, 1992). O indicador chave deste modelo é a avaliação custo–benefício, incluindo nos benefícios principalmente as taxas de retorno. Este é o modelo particularmente presente nos estudos realizados, encomendados ou publicados pelo 12 Banco Mundial (CORAGGIO, 1996; LAUGLO, 1997). A ótica da política de resultados é o imperativo como nos diz Rosemberg, em face desta realidade pouco se conhece sobre os efeitos sociais e os reflexos na individualidade do sujeito a qual se destina os programas que visam geralmente resultados na ordem da aprendizagem no âmbito do mérito conceitual e intelectual. Não abordando as outras possibilidades de evolução como no campo afetivo, social, familiar, estético, e por que não para avaliar se estas crianças que recebem tais programas estão felizes. Afinal, os programas são elaborados para quê? Para desenvolver o país em termos de taxas numa educação que zela por resultados técnicos, ou para permitir a educação de crianças e adultos felizes e plenos no desenvolvimento das suas potencialidades globais, dentre elas a espiritual? A educação brasileira face ao princípio da laicidade A laicidade é um dos princípios do Estado Moderno que promove a igualdade de todos perante a lei e a liberdade de crença de cada indivíduo como um direito individual desde que não fira a liberdade de outrem. Sendo o conceito de Laicidade com semânticas diferenciadas: ora designa a separação dos poderes da Igreja e do Estado, ora designa uma profícua liberdade individual (privada) com respeito à pluralidade no âmbito do coletivo (pública). Neste trabalho buscar-se-á, por vezes, nas entrelinhas nas referências bibliográficas fazer um exercício hermenêutico buscando 12 88 ROSEMBERG, Fúlvia. Avaliação de programas, indicadores e projetos em educação infantil. Revista Brasileira de Educação. Jan/Fev/Mar/Abr 2001 Nº 16, p.23. In: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n16/n16a02.pdf Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso os dois sentidos explicitados, e suas inter-relações na configuração do processo de laicidade desencadeando políticas públicas em prol de um feito educativo laico. Pensando o conceito de laicidade entendido filosoficamente como princípio de abertura ao acolhimento das múltiplas pertenças religiosas em um mesmo espaço – no caso aqui a ambiência escolar – é a condição de possibilidade de um convívio pacífico com respeito às diferentes pertenças religiosas. Segundo Botto (2010) a secularização foi a propulsora da laicidade fundamentada nas ideias iluministas contrapondo-se ao modelo absolutista da supremacia da aristocracia e do clero: ―Fenômeno europeu no século XVIII, a secularização integra o movimento que separa a moralidade da religião, que marca os limites entre Estado e Igreja;‖(BOTTO, 2010, p.111112). Adiante BOTTO (2010) faz referência a compreensão sobre o estatuto do homem secularizado ―[...] que determinará o mundo e o modode-ser-no-mundo moderno. Por isso, uma interpretação do iluminismo é, por essência, uma leitura da secularização‖ (PEREIRA apud BOTTO, 2010, p.112). Tal constatação traz em seu bojo uma nova cosmovisão humana, e na diferenciação de status desse homem não mais cavalheiro (súdito da vontade do Rei) representante de Deus, mas um homem com o uso da razão que conduz a sua vontade e os ditames de sua liberdade com seus direitos civis salvaguardados em igualdade de direitos. Uma liberdade ancorada na subjetividade humana com o direito natural, agora o detentor das suas escolhas sociais, morais, intelectuais, espirituais, etc. O livre-arbítrio doravante é o condutor das ações humanas, desde que, em consonância com o bem geral de toda a sociedade civil. Fundamentado nos imperativos kantianos a ética humana doravante com uso da liberdade dá condições de discernir e escolher com o uso da razão uma lei interna, e não mais uma lei coercitiva externa. A justiça depende da capacidade humana de discernimento, o homem como projeto humano consciente da sua liberdade então, passa a ser sujeito da história. Luiz Antônio Cunha em sua mais recente obra Educação e Religiões: A descolonização religiosa da Escola Pública faz uma análise da laicidade no Brasil dividindo o eixo temporal histórico em dois momentos: uma ―primeira onda laica‖ no Período Imperial (1870-1870) seus protagonistas são homens da elite; na ―segunda onda laica‖ que Cunha refere-se aos últimos anos, que tem como fundamento mudanças profundas no campo religioso brasileiro e os protagonistas além da parte intelectual da elite ―tem 89 FONAPER um componente antes inexistente: os movimentos de massa, especialmente os que lutam pelos direitos sexuais e reprodutivos, tão marcados por proibições de caráter religioso‖ (CUNHA, 2013, p. 99). O ensino religioso na escola pública, na sua compreensão trata-se de colonização. Aponta que o Ensino Religioso no Brasil deveria ser banido da Constituição Brasileira: Deverá ser expurgado da Constituição Brasileira o dispositivo que inseriu o Ensino Religioso nas escolas públicas, de modo que o currículo seja efetivamente secularizado, sem prejuízo algum para as 13 crenças dos alunos e suas famílias. Tal compreensão não leva em conta a perspectiva de Piaget com relação à educação do ser de forma global, bem como a Constituição Federal de 1988 em seu art. 205: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da 14 cidadania e sua qualificação para o trabalho. E mais, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96: A educação dever do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais da solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da 15 cidadania e sua qualificação para o trabalho. A educação infantil está mais voltada para política de resultados conforme as exigências do Banco Mundial, ou seja, elevação em termos de qualificação tecno-científica para o trabalho e rendimentos que contemplem as avaliações de verificação de aprendizagem conceitual, 13 14 15 90 CUNHA, Luiz Antônio Cunha. Educação e Religiões: A descolonização religiosa Escola Pública. Belo Horizonte, Mazza, 2013, p.102. POZZER, Adecir; et al (Organizador). Diversidade religiosa e ensino religioso Brasil: memórias, propostas e desafios – Obra comemorativa aos 15 anos FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010, p. 70. POZZER, Adecir; et al (Organizador). Diversidade religiosa e ensino religioso Brasil: memórias, propostas e desafios – Obra comemorativa aos 15 anos FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010, p.70. da no do no do Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso renegando para o segundo plano a felicidade deste sujeito em construção pelo feito educativo. Considerações finais O que revelam os dados aqui analisados? Ainda no momento atual a Educação Infantil no Brasil e as políticas públicas não conseguem agraciar de forma satisfatória as necessidades da pessoa em evolução com as suas potencialidades de forma global. Há uma lacuna entre o ideal e o real a ser preenchida no que tange a concretização da legislação. A legislação existe de forma a contemplar o campo da Educação Infantil, no entanto na práxis não se efetiva ou concretiza-se às projeções das leis. As políticas públicas ficam mais no âmbito das ideais e utopias, posto que concretamente não tenham tanta demonstrabilidade de eficácia tal quais os discursos políticos anunciam. Há muito que caminhar e avançar para conseguirmos no Brasil uma efetivação das propostas que vislumbram um Ensino Religioso laico sem proselitismo e consequentemente que consiga abranger as necessidades globais do educando de 0 a 6 anos eficazmente, segundo os dados em análise por este trabalho. Prenuncia-se uma esperança em andamento pelos meios pedagógicos, mas os recursos oriundos dos poderes púbicos são escassos. Apesar da dedicação do magistério em lutar por ensino de qualidade para a Educação Infantil faltam os recursos numéricos para tal feito. Além, da falta de qualificação dos professores da Educação Infantil, as verbas para as escolas públicas também são ínfimas. Em decorrência de tal realidade ainda deixa a desejar o ensino do Ensino Religioso no Brasil com professores com uma visão do que seja o feito da educação religiosa vislumbrando uma perspectiva científica como é feito pela Ciência da Religião. Ainda que se perceba conquistas e avanços desde 1990 para cá, há muito o que se realizar para nos orgulharmos da qualidade da Educação e do Cuidado com as crianças de 0 a 6 anos no nosso país de forma a agraciar e de maneira a contemplar as necessidades globais da criança, dentre elas a espiritualidade da pessoa em evolução nas suas potencialidades. 91 FONAPER Referências ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5 ed. São Paulo, Martins Fontes, 2007. AZEVEDO, Francisco Ferreira Dos Santos. Dicionário Analógico da Língua Portuguesa. 2ª Ed. Atual. E revista. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010. BARRETO, Angela Maria Rabelo Ferreira. A educação infantil no contexto das políticas públicas Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/%0D/rbedu/n24/n24a05.pdf CASTELO BRANCO, Jordanna e CORSINO,Patrícia. O ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL DE DUAS ESCOLASPÚBLICAS DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: o que as práticas revelam?, In:http://www.revistacontemporanea.fe.ufrj.br/index.php/contemporan ea/article/download/21/15 CUNHA, Luiz Antônio. Educação e Religiões: A descolonização religiosa da Escola Pública. Belo Horizonte, Mazza, 2013 KRAMER, Sonia. AS CRIANÇAS DE 0 A 6 ANOS NAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL: EDUCAÇÃO INFANTIL E/É FUNDAMENTALEduc. Soc., Campinas, vol. 27, n. 96 - Especial, p. 797818, out. 2006 797 Disponível em http://www.cedes.unicamp.br PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães D‘Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 24ª Ed. Rio de janeiro: Forense, 2009. POZZER, Adecir; et al (Organizador). Diversidade religiosa e ensino religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios – Obra comemorativa aos 15 anos do FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010. ROSEMBERG, Fúlvia. Avaliação de programas, indicadores e projetos em educação infantil. Revista Brasileira de Educação. Jan/Fev/Mar/Abr 2001 Nº 16, p.23. In: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n16/n16a02.pdf ROSEMBERG, Fúlvia. ORGANIZAÇÕES MULTILATERAIS, ESTADO E POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/%0D/cp/n115/a02n115.pdf 92 FORMAÇÃO ACADÊMICA/PROFISSIONAL PARA A DOCÊNCIA DO ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS BRASILEIRAS Edalza Helena Bosetti Santiago1 Resumo: O presente artigo traz uma discussão acerca da formação docente para o profissional da disciplina Ensino Religioso do Ensino Fundamental das Escolas da rede pública. Conforme LDB 9394/1996 esta disciplina é parte do núcleo comum da estrutura curricular das escolas públicas do país. No entanto, a mesma legislação educacional deixa claro que a formação dos docentes deve ser em curso de licenciatura para as séries finais do ensino fundamental. Como não ficou definido em lei nacional qual seria a formação docente para tal disciplina, o Conselho Nacional de Educação – CNE - através do Parecer 97/99 dá autonomia aos Sistemas de Ensino para deliberarem e definirem sobre o tema. Portanto, o objetivo desta comunicação é trazer à tona, algumas Resoluções já estabelecidas por alguns Conselhos Estaduais de Educação do país. Palavras-chave: Ensino Religioso. Formação Docente. Introdução A disciplina Ensino Religioso é componente curricular da Educação básica, mais especificamente, do Ensino Fundamental, cujo objetivo é entender a natureza da religiosidade nas culturas presentes no dia a dia dos discentes, bem como o respeito às diferentes formas de conceber os credos, evitando quaisquer formas de proselitismo. Assim, a Lei de Diretrizes e Bases nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 (LDB nº 9394/96) ao versar sobre a oferta desta disciplina nas escolas públicas de ensino fundamental do Brasil, delegou autonomia aos sistemas de ensino, seja através dos Conselhos Estaduais de Educação (CEE) ou Conselhos Municipais de Educação (CME), para decidirem juntamente com a entidade civil, constituída pelas diferentes 1 Especialista em Docência do Ensino Superior, Literatura Brasileira e Gestão Escolar. Mestranda do Curso de Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória (ES). Docente da rede pública em Eunápolis e Porto Seguro (BA). E-mail: [email protected] FONAPER denominações religiosas a regulamentação acerca dos conteúdos e normas para a habilitação e admissão dos professores para a disciplina. Portanto esta pesquisa cujo objetivo é trazer à tona as deliberações sobre a formação acadêmica/profissional para a docência da disciplina Ensino religioso nas escolas públicas do país, se justifica mediante a importância do legado cultural de crenças que permeiam os espaços escolares e que deve ser mediados por um profissional capacitado para tal, com imparcialidade, para tratar dos diversos credos e costumes que constituem o homem. Um breve relato sobre como foi introduzido o Ensino Religioso no Brasil A condição humana, antropológica2, torna-o acessível às questões transcendentais e religiosas, com aptidões a reproduzir suas crenças e valores através do seu convívio em sociedade. Portanto, estas questões sempre estarão permeadas no convívio escolar, por não ser possível dissociar o ser humano de suas crenças e valores neste espaço. A escola por sua vez, através da disciplina Ensino Religioso3, deve estar preparada para lidar com a diversidade de credos ou religiões4, como explicita Sérgio Junqueira (2008, p. 133): [...] o Ensino Religioso deverá ser concebido a partir do contexto escolar, com o objetivo de conhecimento próprio e com objetivos específicos, enfatizando a formação cidadã a partir das contribuições que as tradições religiosas oferecem para o processo de civilização e humanização do homem. 2 3 4 94 Adj. Relativo à antropologia.De antropo- + -log(o) - + ia. S. f. Ciência que reúne várias disciplinas cujas finalidades comuns são descrever o homem e analisá-lo com base nas características biológicas (antropologia física) e culturais (antropologia cultural) dos grupos em que se distribui, dando ênfase, através das épocas, às diferenças e variações entre esses grupos. Antropologia cultural. Ramo da antropologia que trata das características culturais do homem (costumes, crenças, comportamentos, organização social) e que se relaciona, portanto com várias outras ciências, tais como etnologia, arqueologia, linguística, sociologia, economia, história, geografia humana (...). Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 1986, p. 134. Art. 33. O ensino religioso, (...) constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas do ensino fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997). p. 26 Grifo nosso. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Para entendermos a inserção desta disciplina como componente curricular nas escolas públicas de ensino fundamental faz-se necessário retornarmos ao período colonial. Porque naquele momento da história a disciplina foi formalizada com a aquiescência do Estado e da Igreja Católica. Cujo objetivo era catequizar os povos indígenas e colonizar os africanos, sem considerar suas culturas, com o fim específico de tirar proveito dos tesouros deste país e ao mesmo tempo impor aos habitantes aqui encontrados o seu credo, o catolicismo, como também, explorar sua força para o trabalho. E, em 1549, os jesuítas, foram os primeiros professores do Brasil, que tinham função evangelizadora. Em 1550 são criadas as primeiras escolas jesuítas, e assim se dá o marco inicial da introdução do ensino religioso na educação brasileira. Severino (1986, p.71) ressalta que: [...] os princípios de uma ética individualista e social fundada na suprema prioridade da pessoa sobre a sociedade. A qualidade moral dos indivíduos repercutirá necessariamente sobre a qualidade moral da sociedade. Todo o investimento da evangelização, em sentido estrito, como da educação, sob inspiração cristã, se deu historicamente nesta linha. Foi por isso mesmo que o Cristianismo e a Igreja conviveram pacificamente com situações sociais de extrema opressão, com a escravidão, a exploração no trabalho etc. É como se estas situações independessem da vontade do homem, bastando que as consciências individuais se sentissem em paz, nada se podendo fazer contra estas situações objetivas. Neste contexto de passividade e submissão do evangelizado, sua condição antropológica foi negligenciada por muitos anos. Ou seja, toda a diversidade de riqueza cultural destes colonizados foram sufocadas. Só após 488 anos, após a promulgação várias Constituições que tratavam o ensino religioso com proselitismo, o povo brasileiro, teve promulgada em 1988 a Constituição da República Federativa do Brasil (CF/88). Carta Magna que garante os direitos e deveres do cidadão desta nação. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. 95 FONAPER Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta Constituição. Na CF/88, em seu Capítulo III, nos artigos 205 e 210 versão que a educação é um direito de todos e dever do Estado e da família e que, o ensino religioso, constitui disciplina das escolas públicas de Ensino Fundamental. Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. § 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas do ensino fundamental. BRASIL, 1988, grifo nosso). Porém na contemporaneidade, o professor de Ensino Religioso, talvez por falta de habilitação específica para tratar da diversidade religiosa poderá agir com proselitismo e preconceitos com seus alunos. Fatos que poderão desencadear controvérsias e desentendimentos não só com seus alunos, mas também com toda a comunidade escolar, que se sentir ferida nos direitos adquiridos através da Carta Magna e Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96 de 20 de dezembro de 1996 (LDB nº 9394/96). Portanto, faz-se necessário refletir sobre a formação docente desta área. Qual a formação específica para a docência do Ensino Religioso? Ao questionarmos qual a formação específica para a docência do Ensino Religioso, fomos buscar respostas nas Resoluções de alguns CEE‘s através de suas publicações na internet e solicitações via e-mail aos Conselhos de Educação. Visto que a LDB (9394/96) devido às várias vertentes religiosas existentes no Brasil, associada aos direitos do cidadão que constam na Carta Magna (CF/88) aprovou o seguinte sobre o tema: 96 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Art. 33 O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997) § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. (LDB nº 9394/96, grifo nosso) Tais decisões acerca de dar autonomia aos sistemas de ensino para deliberarem e decidirem quanto à habilitação do docente para a tal disciplina estão discutidas no Parecer do Conselho Pleno (CP) nº CP 97/995. Este Parecer teve como relatora, a conselheira, Sra. Eunice R. Durham. Ela se refere ao art. 33 da Lei nº 9.475/97 da seguinte forma: ―(...) A Lei nos parece clara, reafirmando o caráter leigo do Estado e a necessidade de formação religiosa aos cuidados dos representantes reconhecidos pelas próprias igrejas (...)‖. Mais adiante declara que como a lei deixa a cargo dos sistemas decidirem sobre o § 1º e § 2º do Art. 33, para o CP ―(...) é impossível prever a diversidade das orientações estaduais e municipais e, assim, estabelecer uma diretriz curricular uniforme para uma licenciatura em ensino religioso que cubra as diferentes opções (...)‖. Enfatizando que a Lei nº 9475/97 não se refere a cursos de licenciatura específica para esta docência, mas, que os sistemas de ensino estabeleçam normas para habilitação e admissão de professores. (...) é preciso evitar que o Estado interfira na vida religiosa da população e na autonomia dos sistemas de ensino. Devemos considerar que, se o Governo Federal determinar o tipo de formação que devem receber os futuros professores responsáveis pelo ensino religioso, ou estabelecer diretrizes curriculares para curso específico de licenciatura em ensino religioso, estará determinando, em grande 5 Parecer CP da Câmara de Educação Superior nº CP 97/99, que tem como interessado o Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre o assunto ―Formação de professores para o Ensino Religioso nas escolas públicas de ensino fundamental‖, através do processo nº 23001.000110/99-06. 97 FONAPER parte, o conteúdo do ensino religioso a ser ministrado. (PARECER Nº: CP 097/99) Portanto, o CP se coloca da seguinte forma quanto à licenciatura para ministrar aulas de ensino religioso: (...) - Não cabendo a União, determinar, direta ou indiretamente, conteúdos curriculares que orientam a formação religiosa dos professores, o que interferiria tanto na liberdade de crença como nas decisões de Estados e municípios referentes à organização dos cursos em seus sistemas de ensino, não lhe compete autorizar, nem reconhecer, nem avaliar cursos de licenciatura em ensino religioso, cujos diplomas tenham validade nacional; (idem, PARECER Nº: CP 097/99) Então, além do que está posto na Lei nº 9.475/97, o CP com este pronunciamento deixa clara a autonomia dos Conselhos Estaduais e Municipais de Educação para deliberarem e resolverem sobre o tema em questão. A partir de então, discorremos sobre a questão a ser analisada a luz dos Sistemas de ensino quanto à formação acadêmica para o ensino religioso. Ora, se a Constituição da República declara o princípio da laicidade do Estado (Art. 19, Inciso I) no que concerne ao ensino religioso. Não cabe a escola pública o ensino confessional ou interconfessional como foi colocado por Debora Diniz e Tatiana Lionço6 que ressaltam: Há, entretanto uma ambigüidade conceitual na fronteira entre essas duas modalidades de ensino religioso, pois todo ensino interconfessional é também confessional em seus fundamentos. A diferença entre os dois tipos de ensino estaria na abrangência da confessionalidade: o ensino confessional estaria circunscrito a uma 6 98 Débora Diniz e Tatiana Lionço. ―Educação e Laicidade‖. In: Debora Diniz, Tatiana Linço e Vanessa Carrião. Laicidade e ensino religioso no Brasil. Brasília: Unesco/Letras Livres/Unb, 2010, p. 14/15. a) Ensino confessional: objetivo do ensino religioso é a promoção de uma ou mais confissões religiosas. O ensino religioso é clerical e, de preferência, ministrado por um representante de comunidades religiosas. É o caso do Acre, Bahia, Ceará e Rio de Janeiro; b) ensino interconfessional: o objetivo do ensino religioso é a promoção de valores e práticas religiosas em um consenso sobreposto em torno de algumas religiões hegemônicas à sociedade brasileira. É passível de ser ministrado por representantes de comunidades religiosas ou por professores sem filiação religiosa declarada. É o caso de Alagoas, Amapá, Amazonas, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins. Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso comunidade religiosa específica, ao passo que o interconfessional partiria de consensos entre as religiões, uma estratégia educacional mais facilmente posta em prática pelas religiões cristãs por exemplo. (DINIZ e LIONÇO, 2010, p. 14/15) Portanto se for usado um modelo confessional nas escolas, estará descaracterizado o caráter laico. Acredita-se que o modelo não confessional poderá trabalhar com conteúdos diversos como: fazer um estudo das doutrinas existentes no Brasil e sua dimensão social, considerando também as posições ateístas e agnósticas procurando evitar o preconceito, enfatizando o respeito à diversidade. E, para ministrar tal disciplina, e evitar quaisquer formas de proselitismo, deve-se considerar o professor da própria rede pública, visto que existem os critérios para admissão de professores (através de concurso público) e que estes profissionais sejam habilitados à prática pedagógica desta ciência com imparcialidade. No entanto, é necessária muita habilidade no trato das políticas para a formação de professores, porque de acordo com Caron: É urgente repensar políticas para a formação de professores, pois a transformação da escola frente às exigências impostas pela globalização, pela reestruturação produtiva, pelas políticas educacionais a sociedade depende em grande parte da habilitação, qualificação e competência dos professores. Para que os profissionais da educação sejam dotados de competência mínima ao exercício da profissão, o preparo se dá com a formação inicial, continua, com a 7 licenciatura ou cursos de magistério. (CARON, 2007, p. 62) E alguns Estados da Federação, como o Paraná, por exemplo, definiu o seguinte sobre a disciplina Ensino Religioso, mesmo sem ter a graduação específica: (...) 4. nos anos iniciais será ministrada pelo professor regente conforme encaminhamentos específicos pedagógicos para esta fase de escolarização. (...) 10.1. Para o exercício da docência no ensino religioso, exigir-se-á, em ordem de prioridade: 7 CARON, Lurdes. Políticas e Práticas Curriculares: Formação de Professores do Ensino Religioso. Tese (Doutorado em Educação: Currículo). Pontifícia Universidade Católica de são Paulo – PUC-SP, 2007. 99 FONAPER 10.1.1 nos anos iniciais . graduação em Curso de Pedagogia, com habilitação para o magistério dos anos iniciais; . graduação em Curso Normal superior; . habilitação em curso de nível médio – modalidade Normal, ou equivalente. 10.1.2 nos anos finais . QPM, nomeados em Ensino religioso, para a rede pública estadual de ensino; . formação em cursos de licenciatura na área das Ciências Humanas, preferencialmente em Filosofia, História, Ciências Sociais e Pedagogia, com especialização em Ensino Religioso;(...) (Instrução nº 8 013/2006 SUED/SEEB) Já o CEE e Secretaria de Estado da Educação de Alagoas através da Res. Nº 003/20029 definiram o seguinte no Art. 9º quanto à habilitação de professores para a docência do ensino religioso: ―(...) Consideram-se habilitados para o exercício do magistério do Ensino Religioso em quaisquer séries dos anos do Ensino Fundamental: Os portadores de diploma de licenciatura plena em História, Filosofia, Ciências Sociais, Psicologia; Os portadores de diplomas em cursos de licenciatura plena para formação de Professores para o Ensino Religioso; Os docentes licenciados portadores de Curso de Especialização latosensu em Ensino religioso ou pós-graduação stricto-sensu na área. § 1º - Os portadores de diploma de bacharel em História, filosofia, Ciências sociais, Psicologia e Teologia poderão também ser considerados habilitados ao exercício do magistério do Ensino religioso desde que venham a concluir curso de preparação pedagógica em instituição devidamente credenciada, nos termos da Resolução 02/97, do plenário do CNE.( Res. Nº 003/2002) E, nas nossas pesquisas foi constatado que existem cursos de Licenciatura e Pós-graduação (lato e stricto sensu) em várias Universidades e Faculdades do Brasil. Destacamos algumas e evidenciamos a proposta dos cursos ofertados: Na Universidade Regional de Blumenau (FURB), o Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino (CR-ER): 8 9 Secretaria de Estado da Educação – Superintendência da Educação - Instrução nº 013/2006 SUED/SEED. Assunto: Orienta a oferta do ensino religioso na rede estadual de ensino do Paraná. Curitiba, 07/11/2006. Secretaria de Estado da Educação e do Esporte – Conselho de Estadual de Educação de Alagoas – Resolução nº 003/2002 – CEE/AL. 21/05/2002 100 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Criado há quinze anos, o Curso CR-ER da FURB é pioneiro no Brasil com Licenciatura em Ensino Religioso, habilita profissionais para o exercício docente em Ensino Religioso na Educação Básica. No decorrer destes anos o curso tem integrado de forma significativa a luta pelos Direitos Humanos em relação à Diversidade Cultural Religiosa, que transita no cotidiano social, acadêmico e escolar, buscando contribuir na formação de docentes e pesquisadores e comunidades comprometidas com a erradicação de discriminações e violências de caráter religioso. O curso de Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso (CR-ER) da FURB tem como foco desenvolver atividades de ensino, pesquisa e extensão, que possibilite uma leitura e compreensão críticas dos fenômenos religiosos na diversidade cultural, contribuindo para a construção de uma sociedade justa, solidária e livre, que reconheça na alteridade a dignidade de todas as formas e expressões de vida. É um curso voltado ao estudo das ciências da religião que são disciplinas empíricas que investigam sistematicamente a religião em todas as suas manifestações. Um elemento chave é o compromisso de seus representantes com o ideal da neutralidade frente aos objetos de estudo (FURB, 2011. Disponível em: http:/www.furb. br/web/1771/cursos/.../cursos/ciencias-da-religiao/apresentaca.) A Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes-MG) Não se questiona a "verdade" ou a "qualidade" de uma religião. Do ponto de vista metodológico, religiões são "sistemas de sentido formalmente idênticos". É especificamente este princípio metateórico que distingue a Ciência da Religião da Teologia. O licenciado em Ciências da Religião estará apto a atuar como docente em Ensino Religioso na Educação básica, Fundamental e Médio. Conforme a legislação vigente poderá avançar seus estudos em cursos de PósGraduação em Ciências da Religião ou áreas afins e atuar na Educação Superior. (http://www.unimontes.br/index.php/.../4761ciencias-da-religiao-montes-claros) A Faculdade de Educação Tecnológica do Pará (FACET) – Oferta a Licenciatura Plena em Ciências da Religião. (...) é o estudo e a análise das religiões num contexto histórico específico e sua influência sobre os processos antropológicos e sociológicos. O curso tem por objetivo formar profissionais com Habilitação em Licenciatura Plena em Ciências da Religião para exercerem a docência e a pesquisa em face da realidade do fenômeno religioso e suas múltiplas relações econômicas, políticas sociais e culturais. (www.facet.com.br) 101 FONAPER Na Faculdade Teológica de Ciências Humanas e Sociais Logos – Unidade Passo Fundo – RS. O curso de Licenciatura em Ciências da Religião (Formação de Professores em Educação Religiosa – Parecer 296/99 CNE) proporciona conhecimento e treinamento às pessoas vocacionadas para o ensino religioso. No seu conteúdo o curso debruça-se sobre amplos fundamentos bíblicos, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento sobre a educação religiosa. Ênfases são dadas aos ensinos de Moisés, dos profetas, de Jesus Cristo e dos apóstolos, especialmente Paulo. Além dos fundamentos bíblicos, o curso valoriza ainda os fundamentos teológicos e históricos da educação religiosa, sempre numa abordagem cristã. (www.faetelpassofundo. com/2011/05/licenciatura-plena-em-teologia.html) A Universidade do Contestado (UnC) oferece no Campus Universitário Canoinhas – Marcílio Dias e Campus Universitário Curitibanos em Santa Catarina o curso Licenciatura em Ciências da Religião através da Plataforma Freire (PARFOR). O Curso de Licenciatura em Ciência da Religião tem como finalidade proporcionar aos docentes conhecimentos necessários para trabalhar com o Ensino Religioso para o ensino fundamental e médio com uma sólida fundamentação teológica, tradições orais/simbólicas e pedagógicas, com ênfase para os estudos do fenômeno religioso, valorizando o pluralismo e a diversidade cultural, proporcionando a vivência dos valores éticos, morais e espirituais na perspectiva do exercício pleno da cidadania. No Campus Universitário Canoinhas Marcílio Dias e Campus Universitário Curitibanos em santa Catarina. (http://www.unc.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10 87&Itemid=28) O Centro Universitário Municipal de São José (USJ) oferece o Curso de Licenciatura em Ciências da Religião reconhecido pelo CEE de Santa Catarina através do Parecer 171 e Resolução 050/CEE/SC de 14/09/2010. O Curso de Licenciatura em Ciências da Religião tem a finalidade de formar docentes qualificados para atuarem no ensino religioso entendido como componente curricular, bem como, formar profissionais qualificados para atuarem na pesquisa e na produção científica no campo religioso. Visa ainda, propiciar estudos do campo religioso, numa perspectiva científica, com uma abordagem crítica, dialógica, criativa e respeitosa. Abordar os estudos das práticas religiosas dos povos ao longo da história da humanidade por um conjunto de disciplinas das Ciências Humanas e Sociais, tendo como foco principal o campo religioso com vistas a habilitar o acadêmico para trabalhar pedagogicamente as questões religiosas. O egresso do curso de Ciências da Religião está habilitado para atuar 102 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso na educação básica e nos espaços educacionais onde a temática da religião e/ou Ensino Religioso se faz presente para assessorar grupos religiosos de caráter inter-religioso; em projetos e movimentos sociais, visando à leitura e à interação crítica do fenômeno religioso na pluralidade cultural.(www.usj.edu.br/templates/.../conteudo_visualizar_ dinamico.jsp?...) A Universidade Metodista de São Paulo oferece através do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião está autorizada pelo MEC e foi muito bem avaliada pela CAPES/MEC 2007-2009, a sua ementa contempla: O Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião estuda as religiões em suas formas de expressão e articulação próprias e nas relações com seus contextos histórico, social e cultural. Desenvolve a interdisciplinaridade no campo extenso das ciências da religião, recorrendo ao instrumental teórico fornecido sobretudo pelas ciências humanas: teorias literárias e da linguagem, da cultura, de gênero, historiográficas, das ciências sociais, da teologia, da exegese, da filosofia, da psicologia e da pedagogia. (http://www.metodista.br/posreligiao) A Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP) A Ciência da Religião é um campo do saber que tem como realidade o fenômeno religioso investigando-o sistematicamente em todas as suas manifestações sem que se questione sua validade teológica, ou seja, nesta área do conhecimento não se questiona a "verdade" ou a "qualidade" de uma religião, pois todas se apresentam igualmente como objeto de estudo e investigação. Seu princípio metodológico é o vislumbramento das religiões como sistemas de sentido formalmente idênticos apresentando, portanto, pontos comuns que as tornam passíveis de serem investigadas. Universos culturais, as religiões representam os sentidos e os significados criados pelo homem nas relações que estabelece com o mundo, com os outros e com si mesmo. Sua compreensão, portanto, do universo cultural religioso torna possível a compreensão do homem nele inserido. (www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e.../ciencias-da-religiao) A Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro (FSBRJ) O curso de pós-graduação lato sensu em Ciências da Religião busca dar sustentação ao campo da pesquisa e da docência. A partir de uma pluralidade metodológica este estudo investiga as distintas áreas do saber possibilitando uma visão atualizada, diversa e ao mesmo tempo profunda sobre o tema em questão. O fenômeno religioso não é abordado a partir de uma tradição em especial. Os fundamentos e as manifestações do religioso serão analisados em distintas culturas, numa reflexão sobre a essência do religioso e sua presença na 103 FONAPER história.(www.faculdadesaobento.org.br/pos-graduacao/cincias-dareligio) A Universidade Presbiteriana Mackenzie Criado em 2002, o Programa de Pós Graduação em Ciências da Religião (PPG/CR) da Universidade Presbiteriana Mackenzie busca contribuir para: compreender a religião em suas relações com a sociedade na interface das ciências sociais e humanas; formar pesquisadores e capacitar lideranças sociais, culturais, educacionais e políticas em sintonia com as demandas científico-culturais e históricosociais contemporâneas de compreensão do campo religioso; desenvolver a pesquisa e a produção científica na área das Ciências da Religião e nas áreas relacionadas ao fenômeno do campo religioso em geral; formar docentes altamente qualificados para atuar no campo do estudo do fenômeno religioso em suas relações com a sociedade brasileira. O público alvo do programa consiste em profissionais de todas as áreas que pretendam aprofundar seus conhecimentos quanto à influência da religião na sociedade e trabalhar com o ensino e a pesquisa. (http://www .mackenzie.br/stricto_ciencias_religiao.html) Na Faculdade Unida de Vitória-ES é ofertado Mestrado Profissional em Ciências das religiões. O Programa do Mestrado Profissional em Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória tem como objetos principais de suas pesquisas: (a) a compreensão das relações entre religiões e a sociedade democrática nas suas diversas dimensões, com ênfase no incremento crítico da participação religiosa na vida social; e (b) a análise dos discursos religiosos canônicos e não-canônicos, com vistas à compreensão crítica dos modos de produção, interpretação, circulação e difusão do discurso religioso no âmbito sócio-cultural. Nosso Programa é o único de natureza ―profissional‖ na área de Teologia e Ciências da Religião e desenvolve suas atividades em sintonia com a história e desafios do campo, sendo membro da ANPTECRE desde seu credenciamento pela CAPES. A Área de Concentração do programa é Religião e sociedade e suas linhas de Pesquisa são: Religião e Esfera pública: cujo foco recai sobre o lugar da religião na sociedade em geral e na esfera público-política em particular, incluindo pesquisa e discussão sobre temas tais como: Ensino Religioso escolar, crenças religiosas e legislação; a participação política das religiões; pluralismo e diálogo inter-religioso etc. Análise do Discurso Religioso: cujo foco recai sobre a análise crítica dos vários tipos de discurso religioso, tais como: discurso em textos canônicos das religiões; testemunho pessoal dos adeptos; religião na mídia; hermenêutica e filosofia da linguagem etc. 104 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso (http://www.faculdadeunida.com.br/site/cursos/mestrado/) A Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO) também oferece o curso de Pós-graduação em Ciências da Religião. Vimos então, que em diversos Estados brasileiros, podemos encontrar Universidades ou Faculdades que estão ofertando cursos em níveis de graduação e/ou pós-graduação em Ciência(s) da(s) Religião(ões) com vistas ao Ensino Religioso, objetivando habilitar o profissional para a docência deste componente curricular da Educação Básica. Portanto, fica evidenciada a importância da formação docente para o exercício da função nesta área específica. Considerações Através deste estudo conclui-se que, existem ainda várias divergências entre o CNE e os CEE e CME do país quanto à formação específica para o docente da disciplina Ensino Religioso. Alguns estados ou municípios já estabeleceram uma licenciatura específica: Licenciatura ou Bacharelado em Ensino Religioso, em Ciências da Religião, Especialização na área para esta docência, e no caso de não haver demanda de professores da área específica, abrem vagas para a docência da disciplina, para os professores portadores de diplomas de licenciatura plena em História, Filosofia, Ciências Sociais, Psicologia. Porém, foi diagnosticado que existem municípios no estado da Bahia que não deliberaram sobre a questão, e, nem mesmo ofertam a disciplina aos alunos do ensino fundamental. Por outro lado, percebemos que os centros de pesquisa e extensão ―As Universidades e Faculdades‖ já estão se preparando para tal demanda que possivelmente está por vir. Mas, se faz mister ressaltar que os diálogos continuam acerca do assunto, e, que eles não se encerram em si mesmo. Porque, já que estamos em um estado democrático de direitos, o ser humano em sua condição antropológica deve ser respeitado e respeitar a condição do outro, e, o ensino religioso, na fase escolar do ensino fundamental poderá através do estudo das crenças e costumes religiosos observados dentro e fora do contexto escolar, promover a autonomia do educando, evitando o 105 FONAPER preconceito e a discriminação, preparando-o para o respeito mútuo, garantindo a todos os seus direitos fundamentais. Referências BRASIL, Constituição Federal de 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 17 de ago. 2013. ______. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 4024 de 1961. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4024.htm. Acesso em: 17 de ago. 2013. ______. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 5692 de 1971. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm. Acesso em: 20 de mai. 2011. ______. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases – LDB - nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 – Parecer CNE/CEB nº 17/2001. Brasília, 2007. ______. Ministério da Educação e Cultura. Lei Nº 9475 de 1997. Disponível em: http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/lindice.htm. Acesso em: 20 de mai. 2011. ______. Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº 97, de 06 de abril de 1999. Formação de professores para o Ensino religioso nas escolas públicas de ensino fundamental. Disponível em: www.pen.uem.br/diretrizes/Parecer_CNE-CP_1999_97.doc Acesso em: 19 ago. 2013. FERREIRA. Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2. Ed. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1986. JUNQUEIRA, Sérgio. História, legislação e fundamentos do Ensino religioso. Curitiba: Ed. IBPEX, 2008. PARAMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO RELIGIOSO. Fórum Nacional permanente do Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. 106 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso SEVERINO, Antônio Joaquim. Educação, Ideologia e Contra-ideologia. São Paulo: EPU, 1986. 107 OS (DES)PROPÓSITOS DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO INFANTIL Renata de Souza Leão1 Resumo: Este artigo objetiva defender a necessidade de formação para professores de Educação Infantil nas práticas pedagógicas de ensino religioso nas escolas públicas. As instituições de ensino provocam induções partidárias de conhecimento de mundo, ou seja, professores seguidores de uma determinada religião fazem divulgação de suas crenças religiosas, no entanto, este proselitismo na infância ascende à desigualdade, apontando a supremacia de catequização de um conceito sobre o outro. Utiliza-se como metodologia o estudo teórico subsidiado por referência bibliográfica relevantes ao tema. Considerando que a discussão se faz necessária para a educação, pois conduzirá a práticas pedagógicas de respeito às diferenças religiosas e culturais, o que caracteriza a constituição de um povo pertencente a um Estado Laico, e detentores de direitos nas escolas públicas de qualidade com a possibilidade de saber pensar e produzir intervenções por meio de interações de conhecimento. Palavras-Chave: Formação. Educação Infantil. Intervir. Introdução A proposta deste artigo é aprofundar a temática da formação do professor de educação infantil direcionada ao ensino religioso no processo de desenvolvimento e no acesso a direitos fundamentais como igualdade e liberdade. O problema do texto se situa na prática realizada pelo professor de educação infantil em pregar sua religiosidade promovendo proselitismo dentro da escola, provocando preconceitos e discriminações sem a ampliação de direitos humanos e constitucionais. Este texto provoca um pensar autônomo, numa discussão eticamente direcionada por uma prática educacional, como fazer valer direitos sociais básicos num momento de descoberta, de prazer e de conhecimento na educação infantil. O objetivo é garantir na formação do professor de educação infantil a essencial prática pedagógica igualitária e 1 Graduada em Filosofia pela UFAL e Especialista em Gestão Escolar pela UNOPAR. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Educação pela UNASUR. Professora efetiva da rede pública, Estadual e Municipal, de Maceió/AL. FONAPER justa, mediante a aliança do ensino religioso como práxis de desenvolvimento humano na educação infantil. O Trabalho provoca uma reflexão baseado em estudos, publicações, textos acadêmicos e documentação do MEC, relativas à educação infantil, primeiramente o texto discutirá os pontos do ensino religioso e da educação infantil e em seguida debatendo sobre práticas pedagógicas e formação continuada do professor de educação infantil em ensino religioso. Ao acompanharmos o histórico da educação no Brasil, podemos destacar a evolução da Educação Infantil que revigorou suas reais funções em relação às crianças ganhando um novo horizonte, valorizando-se cada vez mais a educação das crianças entre 0 e 5 anos de idade. Contudo, observa-se também que este trajeto foi estabelecido com o incentivo e empenho de educadores, através de discussões e movimentos sociais em prol da qualidade na educação infantil. A visão em relação às crianças também foi valorizada, visto que estas passaram a ser consideradas como sujeitos de direitos que se encontram em processo de desenvolvimento, necessitando assim de investimentos especiais para uma educação de qualidade que atenda as peculiaridades de sua faixa etária. Os (des)propósitos do Ensino Religioso A legislação brasileira, Constituição Federal (1988) garante educação básica de qualidade para todos, que possibilita ao cidadão o seu desenvolvimento pleno. A LDB (1996) apresenta uma estrutura curricular de aprendizagem, organizando a educação por etapas e modalidades, utilizando como parâmetro a faixa etária, ou seja, períodos determinados para aprender um conhecimento fixado. Pois bem, a compreensão da legislação possibilita o entendimento de uma série de atividades que aparecem como conteúdo social, incluindo a organização humana como uma conexão histórica, política e social fortalecido, nos propósitos da constituição educacional. A divisão do saber como propostas de aprendizagem apresentam unicamente o ensino religioso como facultativo e laico, na etapa de ensino fundamental. O conhecimento fatiado abre espaço para aberrações educacionais que acometem as outras modalidades, no qual o ensino 110 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso religioso passa pelo processo de mutação de conceitos para o proselitismo escolar visto assim, a discussão em prol do conhecimento, sofre metamorfose religiosa dilaceradoras do ser humano, promovendo desigualdade, movida de preconceitos e ignorância, coisa que não pode ser permitida dentro dos muros de uma escola pública, abrindo o descredenciamento do Estado em discutir educação de qualidade (JUNIOR, 2012). No entanto, quando discorremos sobre determinações curriculares sabemos que a escola é sujeito de um objeto específico de contexto personificado socialmente. Mészáros (2008), afirma que a crescente preocupação de resolver a ―crise de valores‖, mostra que o Estado caminha a passos largos e definidos para uma sociedade delinqüente, projetada pelo Ministério da Educação e assegurada pelos professores. Entretanto, parece radical a discussão de que o poder público é o maior e único culpado do fracasso social, mas quando estamos falando em direcionamento educacional, de teorias pedagógicas, de estruturas de aprendizagem, não existe outro a culpar, ou pelo menos não existem outros para começar a debater, quais são as intenções sociais proferidas de uma década até agora? No qual a criança hoje de 10 anos, que se encontra no ensino fundamental, é a mesma criança que pratica roubos, mata e passa pela educação infantil, possuidora da bolsa-escola e numerada no Brasil carinhoso, viés que tenta apaziguar os desníveis sociais, mas que ainda é o maior detector de negligência do Estado para com o seu povo. Entenda melhor, o ensino religioso não é o salvador social, não é isto que está sendo defendido, o que está sendo questionado é: por qual motivo o ensino religioso é preso a uma etapa de ensino, transformando uma área de conhecimento em um contexto limitado e aprisionado, como se na educação infantil as crianças não conseguissem refletir e no ensino médio são tão avançados intelectualmente que outras disciplinas supririam as competências necessárias do conhecimento como a filosofia e/ou a sociologia? A escola influi e forma pensamentos proferido pelo professor, desencadeado pelo conhecimento, como proposta de aprendizagem entre pares pensantes e dispostos a significar ou reinventar os conceitos propostos. Isto demonstra que o ensino religioso deve ser contemplado em todas as áreas e modalidades para discutir a cultura dentro da sociedade, 111 FONAPER Morin (2000), coloca que a condição humana está ligada com o cosmo, como ser único no posicionamento do individuo no mundo, não determinando idade e momento para aprender. Então, o que se entende por ensino religioso não é um simples levantamento histórico de culturas religiosas passadas pelo mundo, mas de uma aprendizagem significativa voltada para o interesse de aprender e transcender a metafísica, que necessita de ser repensados quais são os objetivos da exclusividade no Ensino Fundamental como proposta de aprendizagem e quais são suas competências vinculadas as suas habilidades. Como apresenta a LDB 9304/96 art.33: Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997) § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso." Cury (2004) afirma que a multiculturalidade do Brasil é o primeiro processo polêmico de debate, entretanto o que se compreende são a limitação e o direcionamento que incorpora a legislação relacionada ao ensino religioso. Posto que, a exclusividade do ensino fundamental relacionada ao ensino religioso tem deixado aberto o que vem sendo feito como prática pedagógica nas salas de educação infantil e nas salas do ensino médio, não esquecendo que o ser humano é o mesmo que passa por todas as etapas escolares, então, quais as discussões e os encaminhamentos quando temas e atitudes relacionados ao ensino religioso é abordado nestas salas, qual é o norteador que compreende que a resposta dada anos depois, não responde a pergunta de hoje, ou que já passou a pergunta e a resposta não é satisfatória, nisto a angústia do saber 112 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso determinado deve ou não ser apreciado e tratado como proposta de aprendizagem, ou como elaborar respostas para estes itens se a própria legislação atribui áreas a serem abordadas no tempo e no espaço determinado. O problema não é o período da aprendizagem, o problema é limitarem o pensamento humano e negligenciarem a astúcia humana que direciona, influencia e até determina o caminho da salvação da humanidade. Nessa situação o ensino religioso necessita de uma elaboração epistemológica de intenções, e uma proposta de diálogo derivado do pensar, visto que a credibilidade do aprender é fundamentada no empirismo da razão. A educação infantil e o ensino religioso Desde a LDB de 1996, a educação infantil é uma etapa da educação básica que profere características próprias e legislação específica. O CNE através da Resolução das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil 20/2009 apresenta eixos determinados e teorias detalhadas de aprendizagem com a publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Assim, a Lei define que a criança é um sujeito de direito e de acesso irrestrito a educação, com progressão contínua através de uma rotina que possibilita a interação e a brincadeira, pelo menos são estes os eixos determinados no currículo e que o cuidar e educar são propostas elementares do ensino na educação infantil. Valendo lembrar inicialmente que o preâmbulo da constituição afirmam direitos irrevogáveis do cidadão: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir em Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceito, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte constituição da república federativa do brasil.(BRASIL, 2004) Não é necessário agora discutir o proselitismo encontrado no preâmbulo da Magna Carta, pois é um ponto extenso a ser estudado; o 113 FONAPER importante é compreender que promover o pleno desenvolvimento do cidadão depende do ‗exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça‘ em uma sociedade ‗pluralista e sem preconceito‘ com contexto social e educacional. Entendendo que o ensino religioso como área, abrange todo o contexto, modalidades e etapas da educação básica como acontece com a matemática, e a linguagem, entre outros, estando presente na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino médio, rompendo a barreira da etapa e ampliando o desenvolvimento pleno como proposta de aprendizagem na educação, política e cidadã, lembrando que a educação infantil erroneamente está vulnerável a teorias eurocêntrica, criacionista e classista, por entender que a criança não reflete e é um ser propenso a modelagem, contribuindo para a desigualdade e fomentando e discriminação. A problemática sobre as concepções de currículo tem sido discutida dentro da sociedade, pois os movimentos tecnológicos têm ultrapassado a estrutura da grade curricular, e credenciado pela humanidade no caráter atualizador de conhecimento pela mídia, a criança vive neste cenário e é protagonista desta história de tecnologia, Warschauer (2002). Então, a criança não espera mais a informação vinda do professor, ela dialoga mediante o panorama discutido na atualidade dentro do espaço educativo, Barbosa e Richter (2012) afirmam que os bebês já organizam seus pensamentos mediantes as propostas de atividades oferecidas pelos estímulos. A criança é incentivada o tempo todo e interage entre muitas linguagens no decorrer do dia. Na educação infantil, o professor é o elo entre o estímulo e a aprendizagem; visto que, é através desta relação que a criança participa das atividades propostas, e muitas vezes este professor é o formador de opinião e possuidor de uma credibilidade inabalável diante do olhar curioso e perceptivo da criança, Warschauer (2002). Podendo sujeitá-la ao domínio negligente da educação pública que não discute o ensino religioso na Educação Infantil e permite a religiosidade, transmissora da omissão em teorias provocadoras de aberrações sociais. Então, qual é a conseqüência do não cumprimento de vários direitos relacionados à educação infantil que prejudica o desenvolvimento da sociedade? A resposta é simples: o não cumprimento gera um povo 114 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso omisso, ignorante e que não sabem que o Estado é o maior vilão da história social ou a maior vítima já que a sociedade é composta por cidadãos criados pelo Estado. A radicalização das ações educacionais é o suporte de mudanças, talvez pelo menos seja o início de alguma mudança, visto que a sociedade é reflexo dos seus direitos e deveres cumpridos pelo Estado. No entanto, é do Estado que fomenta uma sociedade refletida em um povo, como relata Marx e Engels (2009, p. 43): Todas as sociedades anteriores, como vimos repousaram no antagonismo entre classes opressoras e classes oprimidas. Mas para oprimir uma classe, é necessário pelo menos lhe garantir condições de existência que lhe permitam viver na servidão. Visto que, a educação brasileira é fruto de um Estado opressor e do não diálogo dentro da educação, na existência de um processo melhor ou da ideia de um campo conceitual superior provocando e garantindo as ‗condições de existência que lhe permitam viver na servidão‘. Então, esbarramos num contexto histórico desastroso como a colonização, escravidão, o capitalismo (usineira, cafezais e outros) e o neoliberalismo refletido ainda hoje num Estado afogado em desvios, subornos, roubos e cobranças alarmantes de impostos, qual seria a versão contrária nesta peça democrática, a consciência de um povo baseado na educação, isto é fato, mas como se dá esta consciência, já que Marx e Engels (2009, p. 56) afirmam: Será necessária uma grande perspicácia para compreender que as idéias, os conceitos, e as noções dos homens, numa palavra, sua consciência, se modificam com toda modificação sobrevinda em suas condições de vida, em suas relações sociais em sua existência social? Em uma palavra a mudança entrelaça-se na ‗consciência‘, sendo a porta fundamental da radicalização dita em parágrafos anteriores, mas como gerar um povo consciente, como retirar da história a inércia de uma nação, como solicitar a soberania da igualdade e justiça, como mobilizar a massa? As inquietações são rebatidas mediante o óbvio que proporciona a outra palavra, talvez salvadora da pátria que é a educação, ou seja, é o cumprimento legal, é garante a um povo a possibilidade da mudança. 115 FONAPER O que nos parece indiscutível é que, se pretendemos a libertação dos homens não podemos começar por aliená-los ou mantê-los alienados. A libertação autêntica, que é a humanização em processo, não é uma coisa que se deposita nos homens. Não é uma palavra a mais, oca, mitificante. É práxis, que implica a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo (FREIRE, 2005, p. 132). Separados por etapas e diferenciado por área a educação infantil não consegue dialogar com o ensino religioso, andam lado a lado sorrateiramente, permitindo que as crianças sejam sujeitadas a pregações e catequizações que diabolizam o saber com seus proselitismos causais, distintos e discriminatórios com contexto étnico, racial e cultural. É necessário a ‗libertação do homem‘, na práxis de transformação. Os momentos ingênuos da roda na educação infantil É dito que dentro da educação infantil os momentos inocentes podem acontecer, mas estes momentos utilizados pelo adulto nunca são inocentes, sempre tem intencionalidades, sempre estão cobertos de interesses, sempre estão sujeitos ao poder burocrático da salvação. Discutir o ensino religioso como proposta de ciência na educação pública laica e de qualidade é debater porque a aceitação calada de proselitismo dentro das rotinas de atividades apresentadas para as crianças. A organização do trabalho pedagógico é dividida no cuidar e educar dito como associado, atividades contínuas e inseparáveis, pelo CNE 20/2009. Na palavra educar, estão as atividades cotidianas, sendo divididas em roda de conversa, lanche, atividade direcionada, brincadeiras, pinturas, contação de história até a espera do responsável para o regresso a casa. O que acontece na roda da conversa ou hora de atividade é o momento de sucessivo abuso de direitos humanos infringidos; explicando melhor, e sabendo que este momento pode ter a nomenclatura regional de diferentes formas, cabe detalhamento do que seja a roda da conversa, é o instante da primeira atividade proposta, as crianças são colocadas em roda, ou seja, cadeiras alinhadas em círculo, no qual as crianças fazem a chamada diária e cantam como forma de iniciar os preparativos da aprendizagem. Nisto temos músicas repetidas como comandos ditatoriais diariamente, Fonterrada (2005), é neste momento de abertura do dia, que 116 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso as professoras cometem a arbitrariedade de orarem, rezarem e proferem sua fé. É neste instante de tempo na educação infantil que o professor deixa de ser professor e passa a agir como doutrinador de dogmas, proferidores de verdades absolutistas, e de singularidades preconceituosas e discriminatórias. Junior (2012) aborda que a negligência política educacional provoca a desigualdade e é sujeito à penalidade judicial ou pelo menos é necessário estar atento aos conceitos culturais abordados com valores negativos apreendidos socialmente iniciando com a criança entrando na creche, violando os direitos do cidadão. Esta discussão é pertinente e muito necessária mediante a consequência que provoca dentro da qualidade educacional, levando a discriminação étnico-racial criando num vínculo cultural de superioridade em determinadas crenças, subjugando culturas milenares praticadas por nossas crianças em suas comunidades. Para garantir igualdade de direito e para efetivar uma sociedade justa é necessário abrir espaço para discutir o ensino religioso como forma de assegurar o espaço de aprender dentro da instituição educacional, não prevalecendo a religiosidade do professor, mas abrindo temas para aprendizagem na educação infantil sobre o ensino religioso. Provocando no professor o diálogo no momento que inicia as atividades com as crianças na roda de conversa e não propondo proselitismo, e sim, um espaço de diálogo, interação e respeito à diversidade humana, e isto, estão suas crenças, seus rituais, suas oferendas e seus deuses e demônios. É importantíssimo salientar que o conhecimento é fundamental para mudança, pois, só através dele iremos conseguir uma transformação, tendo o poder de pensar e agir com consciência. Vigotski (2002) afirma que a construção do conhecimento é entendida como resultado de adaptações da criança ao meio, envolvendo dois mecanismos reguladores: a assimilação, através da qual a criança exercita os esquemas já construídos e a acomodação pela qual se apropria desses dados. Valorizar o conhecimento, ouvir atentamente as opiniões, estimular as participações, possibilitar as escolhas e divertir-se na aprendizagem, são os objetivos de uma proposta de educação infantil. Trabalhar às diferentes necessidades educacionais, aos interesses e estilos de aprendizagem da cada criança, 117 FONAPER exigem uma avaliação contínua do profissional diante suas ações e deliberações nas estratégias ao ensino e a aprendizagem. A formação como proposta de ampliação do Ensino Religioso na educação infantil O que requer muita atenção é quando acontece proselitismo nas escolas públicas e este detalhe está passando despercebido por nossos conceitos, mas vivenciado pelas crianças da educação infantil como práticas discriminatórias, a religiosidade de matriz africana ou a indígena demonstrada como crença não cristã e isto provoca a supremacia de uma colonização determinante de classes. Goes, Barbosa e Junior (2012) discutem que na matriz africana a religiosidade concebe ao humano com um ser integrado ao meio, parte importante da harmonização do humano com seu habitat, com respeito aos mais velhos, com transmissão de conhecimento pela oralidade e que todos estão detidos em uma roda de dança, bailando para o engrandecimento individual e coletivo, as escolas precisam oferecer uma aprendizagem que produza liberdade, igualdade e conhecimento. A formação do professor é essencial para discutir que os espaços educativos não são lugares de pregação ou direcionamentos religiosos, que a roda de conversa é exclusivamente o espaço voltado para o diálogo aberto e discursivo. Promover a formação do profissional de educação infantil é importantíssimo, pois o intercâmbio intencional de conhecimento através de diálogos nos encontros promovidos pela formação é estimulador no que se refere a planejar a rotina, o tempo e o espaço das práticas pedagógicas da educação infantil. Kramer (2008) propõe uma ação contínua de formação atendendo ao aspecto cultural e social das crianças, compreendendo a infância como conectivos de ações únicas e sujeitas de propriedades singulares de aprendizagem. A qualidade é inerente à educação ou deveria ser, pois é financiada para proporcionar o pleno ‗desenvolvimento do cidadão‘, retomando uma relação indivíduo e educação na proporção qualitativa, ou seja, a qualidade da educação é dever do Estado, e passa pela formação do professor, pois 118 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso o povo sendo o fornecedor de subsídios por meio de imposto à devolução de um serviço de qualidade é o mínimo esperado. A divulgação de resultados de avaliações (SAEB, IDEB, PISA, ENEM, ENADE) tem trazido dados preocupantes sobre a qualidade do ensino no país. Comumente, quando são divulgados estes índices, há algumas reações, mais ou menos inflamadas, mas são apenas espasmos: logo depois, tudo parece voltar ao ―normal‖. Aos poucos, no entanto, parcelas cada vez maiores da sociedade vão tomando consciência de que não deve ser assim: a preocupação com a qualidade da educação deve ser uma constante (VASCONCELLOS, 2013, p.02). Então a gratuidade e a qualidade é exigência inerente da educação, nisto por ser um investimento que é retirado do povo para o povo, e pelo povo, num governo democrático, não discutindo aqui o sentido de valor e de custo, só esboçando uma estrutura da efetivação do direito social. Visto que, a propriedade da discussão volta ao teor educacional de propor inicialmente o conhecimento dos fatos como evidência de proselitismo e ao mesmo tempo como proposta de formação direcionada para aprendizagem do professor, no qual utiliza o ambiente laico para uma prática pluralista e democrática. Considerações finais A efetivação dos direitos sociais depende de sua capacidade de autorreconstrução teórica e, ao mesmo tempo, da atividade da educação como o trabalho crítico do conceito que buscar a elaboração de teorias com intenções práticas construindo hipóteses plausíveis orientadoras do sujeito autônomo – de vontade livre, capaz do exercício constante da auto – reflexão. É essa capacidade de auto-reconstrução o que torna a educação eficaz, dando-lhe condições de pemanecer fiel à praxis que a idealiza. A formação do professor é uma proposta relevante quando aponta uma discussão entre a teoria e prática, buscando uma educação de qualidade e aliando a educação infantil com o ensino religioso desde os primeiros passos linguísticos do ser humano. A lógica desse exercício de liberdade e de prática é o diálogo. O diálogo é peculiar ao indivíduo, pois a prática individual é essencialmente 119 FONAPER dialética e a dialética é a lógica da ação, tanto quanto a ação é processo inteligível da educação. Essa conversão só é possível no diálogo entre o ensino religioso e suas ações na educação infantil como propulsora de equidade equivalente a proliferação dos direitos sociais num contexto justo de direitos, e para isso é necessário garantir estes direitos de forma clara e acessível. Isto é claro quando no decorrer do artigo faz um levante da formação do professor mediante as atitudes que estão sendo vistas dentro da educação infantil e ao mesmo tempo propõe um debate esclarecedor que as práticas sejam ações includentes e possibilitadoras do exercício da cidadania. Referências BARBOSA, Maria Carmen Silveira; RICHTER, Sandra Regina Simonis. Desenvolvimento de crianças de 0 a 3 anos: qual currículo para bebês e crianças bem pequenas? 2012. Disponível em http://crechecuidareeducar.blogspot.com.br/2012/05/educacao-decriancas-em-creches.html. Acessada em 06/08/2013. BARBOSA, Maria Carmen Silveira; RICHTER, Sandra Regina Simonis Os bebês interrogam o currículo: as múltiplas linguagens na creche. 2010. Disponível em http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs2.2.2/index.php/reveducacao/article/view/1605/900. acessado em 06/08/2013 BRASIL. Constituição Federal. Editora Rideel. Edição 2004. ______. (MEC). Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente d dá outras providências. Brasília: MEC, 1990. ______. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO INTERESSADO: Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica UF: DF. Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil.RELATOR: Raimundo Moacir Mendes Feitosa. PARECER CNE/CEB Nº: 20/2009.COLEGIADO:CEB.APROVADO EM:11/11/2009 120 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso ______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação infantil– Versão Preliminar V1. Brasília, MEC/SEF, 1998. ______. Ministério da Educação e do Desporto. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Ministério da Educação e Desporto. 2012. ______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Orientação sobre convênios entre secretarias municipais de educação e instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos para a oferta de educação infantil. Brasília : MEC, SEB, 2009. ______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros nacionais de qualidade para a educação infantil; Volume 1 e 2. Brasília. DF : MEC, SEB, 2008. ______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil: conhecimento de mundo. Brasília: MEC/SEF, 1998. v. 3. ______. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de diretrizes e bases da educação – LDB. Disponível em: <http://www.mec.gov.br>. Acesso em: 14 jul. 2011. ______. Ministério da Educação e Cultura. Parâmetros Curriculares Nacionais; Primeiro e Segundo Ciclos do Ensino Fundamental: Língua Portuguesa. V. 2. Brasília: MEC/SEF, 1997. ______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação infantil – Versão Preliminar. Brasília, MEC/SEF, 1998. CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao silêncio escolar: Racismo, preconceito e discriminação na educação infantil. São Paulo.1998. disponível em http://xa.yimg.com/kq/groups/19003918/1691636777/name/TESE. acessado em 06/08/2013. CURY, Carlos Roberto Jamil – Ensino religioso na escola pública: o retorno de uma polêmica recorrente; Rev. Bras. Educ. nº. 27 Rio de Janeiro Sept./Oct./Nov./Dec. 2004. Disponível em 121 FONAPER http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141324782004000300013&script=sci_arttext. Acessado em 06/08/2013. Educação infantil, igualdade racial e diversidade: aspectos políticos, jurídicos, conceituais / Maria Aparecida Silva Bento, organizadora- São Paulo : Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades CEERT, 2012. FONTERRADA, MarisaTrech de Oliveira. De tramas e fios: um ensaio entre música e educação. São Paulo : Editora UNESP, 2005. GOES; Tiago Brasileiro, BARBOSA. Pedro e JUNIOR; Henrique Antunes Cunha – Do racismo ambiental à multiterritorialidade dos membros das religiões de matriz africana em Prata-MGFILHO, Guimes Rodrigues; BERNARDES, Vânia Aparecida Martins; NASCIMENTO, João Gabriel do. Educação para as relações étnico-raciais: outras perspectivas para o Brasil / -- 1. ed. -- Uberlândia, MG : Editora Gráfica Lops, 2012. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 2005. JUNIOR. Hédio Silva; BENTO. Maria Aparecida Silva; CARVALHO. Silvia Pereira de; Coordenação geral. Educação infantil e práticas promotoras de igualdade racial. São Paulo: Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade – CEERT : Instituto Avisa Lá – Formação Continuada de Educadores, 2012. KRAMER, Sônia; Formação de profissionais de educação infantil: questões e tensões. Encontros e desencontros em educação infantil/ Maria Lucia A. Machado, organizadora. 3 ed. São Paulo : Cortez, 2008. MARX, Karl. O Capital: Crítica da economia política. São Paulo, Abril Cultural, 1984, t. I, v. 2. MÉSZÁROS, István; A educação para além do capital. 2 ed. São Paulo : Boitempo, 2008. MORAN, Edgar. Os setes saberes necessários à educação do futuro. 2.ed. São Paulo : CORTEZ : Brasília, DF :UNESCO, 2000. Disponível http://www.slideshare.net/Hemeter/edgar-morin-os-sete-saberesnecessrios-educao-no-futuro-115-pags. acessado em 07/08/2013. VASCONCELLOS; Celso dos S. Texto Preparatório para a CONAE 122 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso O Desafio da Qualidade da Educação. DISPONÍVEL http://www.celsovasconcellos.com.br/Download/CSVDesafio_da_Qualidade.pdf VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991. WARSCHAUER, Cecília; A roda e o registro, uma parceria entre professor, alunos e conhecimento. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 2002. 123 A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DO DOCENTE DE ENSINO RELIGIOSO José Carlos do Nascimento Santos1 Resumo: Este artigo objetiva apresentar a importância da formação inicial e continuada do docente de Ensino Religioso, uma vez que se faz necessário uma formação de caráter inicial como também de forma continuada para que o docente possa transmitir de forma eficaz e coesa o objeto de estudo que é o fenômeno religioso. O artigo objetiva ainda à práxis pedagógica utilizadas pelos docentes, proporcionando uma ação-reflexão-ação. Pretende-se com esta reflexão contribuir para com um Ensino Religioso voltado ao respeito à diversidade religiosa presente nas escolas públicas, como também fazer um resgate do perfil do docente para atuar nesta área de conhecimento que é o Ensino Religioso. Para a conceituação teórica utilizarei autores que abordam a temática da formação docente em Ensino Religioso. Palavras-chave: Formação docente; Ensino Religioso; Práxis pedagógica; Fenômeno religioso. Introdução A formação docente para o Ensino Religioso – ER sempre foi um grande desafio na realidade brasileira. Esta problemática remete ao período da colonização e se arrasta até os dias atuais. O professor tem muito pra contribuir na formação do alunado, no tocante as questões relacionadas à religiosidade de cada um para que assim sejam orientados nas expressões religiosas. É fundamental que o profissional tenha no mínimo uma formação específica nesta área de conhecimento. O mediador da construção do conhecimento deve preparar-se para assim saber dialogar com as múltiplas religiões. O educador deve levar em consideração a metodologia que melhor possibilite o desenvolvimento da aprendizagem, sem excluir nenhum dos alunos e seus saberes. É bom ressaltar o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso FONAPER como um espaço específico de formação continuada para todos aqueles que atuam ou buscam informações no tocante o fenômeno religioso como também as práticas pedagógicas do Ensino Religioso. O 1 Graduado em Licenciatura plena em Letras (UEPB), Pós-graduado em Língua, linguagem e Ensino (CINTEP), Bacharel em Teologia (FJC), Mestrando em Filosofia da Docência Teológica (CAEEC), Professor dos municípios: Cuitegi e Pilões. E-mail: [email protected] FONAPER mesmo busca informar, formar e capacitar o docente para atuar de forma segura sobre o Ensino Religioso na sala de aula. Para que tenhamos uma formação docente significativa faz-se necessário uma formação de caráter sequencial aonde venha atender todos os anseios do profissional de Ensino Religioso. A relação entre professor e aluno deve haver uma liberdade. É o que afirma Freire (1999), ―No fundo, o essencial nas relações entre educador e educando, entre autoridade e liberdade, entre pais, mães, filhos e filhas é reinvenção do ser humano no aprendizado de sua autonomia‖. Aspectos teóricos I - Formação do docente de Ensino Religioso A formação do docente em Ensino Religioso é um grande desafio, pois a demanda é muito grande para atender aos profissionais desta área de conhecimento. Faz-se necessário uma formação inicial de forma sistemática dos conteúdos que são abordados nas aulas de Ensino Religioso. O profissional deve estar apto para ministrar os conteúdos, pois os mesmos requerem conhecimento na área, dentre eles podemos elencar como: Culturas e Tradições Religiosas; Escrituras Sagradas; Teologias Comparadas; Ritos e Ethos, garantindo-lhe a formação adequada ao desempenho de sua ação educativa. O docente de Ensino Religioso deve estar disponível ao diálogo como também a compreensão do fenômeno religioso enquanto objeto de estudo do ensino religioso. É bom salientar a importância de despertar em sala de aula a alteridade entre o alunado para que assim entendam a importância da transcendência na sua vida pessoal e social. Os cursos de Licenciatura em Ensino religioso e Ciências da Religião têm um papel importante na formação dos profissionais de Ensino Religioso para que aprofundem o conhecimento sobre o fenômeno religioso. A partir daí o professor terá a capacidade de analisar e realizar pesquisas no campo religioso. Já os cursos de teologia, são confessionais, desencontrando com a religião como afirma Oliveira et al. (2006, p.92): 126 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso É preciso considerar que não há teologia a-confessional ou supra confessional, isto porque a teologia sistematiza experiências religiosas e afirma que os adeptos de uma denominação religiosa devem crer e como devem agir na organização de sua vida para então, serem considerados membros daquele grupo religioso. A sistematização da fé normaliza o odo de vida de um grupo religioso. Para alcançar os objetivos propostos ao Ensino Religioso, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso (PCNERs) apresentam cinco (5) eixos organizadores, que indicam os conteúdos programáticos de cada ciclo ou série do Ensino Fundamental: 1.Culturas e Tradições Religiosas (filosofia da tradição religiosa; história e tradição religiosa; sociologia e tradição religiosa; psicologia e tradição religiosa); 2. Escrituras Sagradas e/ou Tradições Orais (revelação; história das narrativas sagradas; contexto cultural; exegese); 3. Teologias (divindades; verdades de fé; vida além da morte); 4. Ritos (rituais; símbolos; espiritualidades); 5. Ethos (alteridade; valores; limites) (FONAPER, 1997, p. 33-39). O professor de ER tem os seus lugares e no tempo decorrido desde a promulgação da LDB 9.394/96 tem sido desafiado a pensar e repensar a sua práxis como sujeita do conhecimento religioso. Nesse sentido, no que refere ao professor, Tardif (2002, p.238) alerta que: Se pare de ver os professores de profissão como objetos de pesquisa e que eles passem a ser considerados como sujeitos de conhecimento. Isso significa, noutras palavras, que a produção dos saberes sobre o ensino não pode ser mais privilégio exclusivo dos pesquisadores, os quais devem reconhecer que os professores também possuem saberes esses que são diferentes dos conhecimentos universitários e obedecem a outras lógicas de ação. Um órgão que não podemos deixar de enfatizar é o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso - FONAPER, pois o mesmo tem contribuído significativamente na formação continuada do docente de Ensino Religioso, realizando seminários (anos pares) como também congressos (anos impares). Nesses espaços o professor tem a oportunidade de apresentar suas pesquisas como também aprofundar seus conhecimentos. O fórum é dinâmico, uma vez que o mesmo realiza sessões, congressos e seminários de forma itinerantes em todo o recanto do nosso país. 127 FONAPER Com a presença do FONAPER no meio educacional o professor/educador do Ensino Religioso passou a ter um lugar ideal e específico para buscar informações pertinentes sobre a práxis do ER em sala de aula, como também o acesso ao conhecimento sobre o fenômeno religioso. O papel do Fórum é muito pertinente e merece todo reconhecimento e valorização dos professores, educadores, pesquisadores, enfim, de todos que buscam diretamente ou indiretamente formação. II - Perfil do docente de ensino religioso O mediador do conhecimento, no caso o professore, deve se preparar para melhor dialogar com as diversas culturas e religiões. O educador deve levar em consideração a metodologia ideal para ser aplicada, sem que não exclua nenhum dos alunos, pois é importante que haja uma sintonia entre o transmissor e o receptor. Freire (1999, p.94) nos afirma no tocante a relação professor e aluno. ―No fundo, o essencial nas relações entre educador e educando, entre autoridade e liberdade, entre pais, mães, filhos e filhas é reinvenção do ser humano no aprendizado de sua autonomia.‖ A comunidade escolar deve caminhar sempre em sintonia com a sociedade, pois duas realidades se completam. Um desafio é não realizarmos proselitismo, pois vivemos em um contexto marcado pela diversidade. E, portanto, o respeito às diferenças deve ser o diferencial do Ensino Religioso no campo educacional. É importante que todos educadores independente de ser professor de ER ou não, despertem no alunado a importância da disciplina ER no currículo escolar e na vida de cada aluno, pois o ser humano é um ser que sente a necessidade de relacionar com o transcendente. No ER como diz Roque Zimmermann (1998, p. 09), não se trata de transmissão de normas de conduta e sim: Trata-se de proporcionar, na educação escolar, oportunidade para que o educando descubra o sentido mais profundo da existência; encontre caminhos e objetos adequados para sua realização e valores que lhe norteiam o sentido pleno da própria vida. O professor de Ensino Religioso precisa colocar seu conhecimento e sua experiência pessoal a serviço da liberdade do educando, subsidiando128 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso o no entendimento do fenômeno religioso. Portanto, a competência deste profissional exige que: 1. Compreenda o fenômeno religioso, contextualizando-o no espaço e no tempo; 2. Configure o fenômeno religioso através das ciências da religião; 3. Conheça a sistematização do fenômeno religioso pelas Tradições Religiosas e suas teologias; 4. Analise o papel das Tradições Religiosas na estruturação, manutenção das diferentes culturas e manifestações socioculturais; 5. Compreenda os fundamentos éticos, políticos e culturais dos Textos Sagrados orais e escritos das diferentes matrizes religiosas; 6. Relacione o sentido da atitude moral, como consequência do fenômeno religioso sistematizado pelas Tradições Religiosas e como expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária das pessoas. O profissional do Ensino Religioso faz sua síntese do fenômeno religioso a partir da experiência pessoal, mas necessita, continuamente, apropriar-se da sistematização de outros saberes e experiências que permeiam a diversidade cultural. III - Características do professor de Ensino Religioso Considerando a Escola como lugar de saber (conhecimento), lugar de saber fazer (habilidade), lugar de ser (ética), o Professor de Ensino Religioso deverá apresentar as seguintes características. Sólida formação no campo das ciências, com ênfase nas ciências humanas; Fundamentação teórica voltada à reflexão e ação no campo pedagógico; Consciência crítica; Visão e ação criativa, contextualizada com vistas à totalidade na perspectiva interdisciplinar; Conhecimento do ser humano na sua integralidade e contexto no qual está situado; 129 FONAPER Sensibilidade, discernimento e equilíbrio nas relações com o fato religioso e suas diversas manifestações. IV - A práxis pedagógica do Ensino Religioso A prática pedagógica é de suma importância no desenvolvimento educacional no campo religioso, uma vez que é um tema que merece muita atenção e valorização, pois é algo de muita importância na formação integral do cidadão (ã). O objetivo do componente, hoje, é de levar ao educando como proposta de cunho interreligioso e intercultural, não fundada no proselitismo. Vivemos num mundo plural onde cabe a cada um de nós respeitas as diversidades. Os conteúdos programáticos são conteúdos voltados à interação entre o homem e o sagrado nas diversas expressões religiosas. Os conteúdos não são temas transversais e sim temas vinculados ao sagrado de cada um de forma particular. A metodologia que os educadores utilizam de formas diversas. O método por sua vez deve proporcionar: PARTICIPAÇÃO, INTERAÇÃO E CAPACIDADE DE PENSAR. Cabe ao educador proporcionar uma aula dinâmica e de participação ativa nas aulas de ER, deixando assim a flexibilidade para o educando expor as suas percepções sobre os temas abordados em sala de aula e não o educador impor o seu pensamento de ver o mundo e o sagrado. A Lei que dá suporte e respalda ao ER é muito ampla e flexível, uma vez que, deixa a critérios das Secretarias Estaduais de Educação e os Conselhos de Educação sua regulamentação. Deixa também a possibilidade do projeto Político Pedagógico de que cada unidade escolar adapte tal legislação à sua realidade universal. Houve um grande avanço quanto ao direcionamento pedagógico no ER desde as reflexões e lutas garantidas na Constituição Federal, em 1987/1988. O Ensino Religioso Ocupava-se com a educação integral do ser humano, com os valores e suas aspirações mais profundas quer cultivar no ser humano as razões mais íntimas e transcendentes fortalecendo nele o caráter de cidadão, desenvolvendo seu espírito de participação, oferecendo critérios para a segurança de seus juízos e aprofundando as motivações para a autêntica cidadania. 130 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Não se pretende na sala de aula fazer uma comunidade de fé, mas um espaço de reflexões sobre limites e superações. Diante disto necessitase construir uma pedagogia que atende a estas reflexões. Entretanto, fazse necessário interferir a teoria e a prática pedagógica. Na escola, diante da diversidade cultural religiosa em que os educandos estão inseridos, segundo o FONAPER (2000, p. 18), o Ensino Religioso: Pelo estudo do fenômeno religioso desencadeia o diálogo e a reverência. Pode - se dizer que estas são as grandes finalidades dessa disciplina na escola: diálogo e reverência. Diálogo a partir do entendimento da palavra: diálogo. Dia: prefixo grego= diferentes, opostos Logos: sufixo grego = palavra, discurso articulado. Portanto, diálogo e a realidade que se estabelece a partir de palavra de diferentes de opostos. Na homogeneidade não há diálogo, somente repetição. O diálogo como meta do ER é possível pela diversidade cultural-religiosa do Brasil, presente no convívio social. Diálogo como processo de construção do conhecimento, de modo que possa contribuir para a formação de indenidades afirmativas, persistentes e capazes de protagonizar ações solidárias e autônomas de constituição de valores indispensáveis à vida cidadã. (Cf. parecer nº 04/98 da CEB/Conselho Nacional de Educação). Reverência - significa acatamento às coisas sagradas, ao que é digno de respeito veneração, mesura, cortesia, genuflexão. Quando se usa o termo reverência (ao Transcendente no outro) no Ensino Religioso quer-se ir mais longe, além do simples entendimento encontrado no senso comum, vai do respeito à tolerância para com o diferente. Tanto o diálogo como a reverência são de uma importância ímpar para o ER. Como afirma Freire (1998, p. 134) em Pedagogia do Oprimido: O diálogo com as massas não é concessão, nem presente, nem muito menos uma tática a ser usada, como a sloganização o é, para dominar. O diálogo, como encontro dos homens para a ―pronúncia― do mundo é uma condição fundamental para a sua real humanização. O fenômeno religioso é algo que está presente muito antes de vivenciado em sala de aula. Humanamente falando, temos a necessidade de transcender e ao mesmo tempo esperamos que algo ou alguém preencha as nossas vidas. Nós educadores temos uma tarefa de levar ao alunado a importância do ser na sociedade plural e global que estamos inserindo. Estamos vivendo uma cultura de contra valores muito fortes, uma vez que o ser 131 FONAPER enquanto personalidade está adormecido na grande maioria; enquanto que o ter, poder aquisitivo, está muito em evidência. Em outras palavras estamos cultivando uma frase muito pronunciada ―só vale quem tem‖. Devemos como mediadores de conhecimento despertar nos nossos ambientes educacionais meios através dos quais o aluno se sinta amado e acolhido pelo ser superior, independente da tradição, movimento religioso ou não religioso ao qual pertença, ou da terminologia da palavra: Deus, Jeová, Alorum, Tupã... que utilize. O ER deve despertar no alunado, por meio do acesso ao conhecimento, o querer relacionar-se e reconhecer a transcendência. É o que o afirma Zimmermann (1998): tem como objeto a compreensão da busca do transcendente e do sentido da vida, que dão critérios e segurança ao exercício responsável de valores universais base da cidadania. Desta forma, o Ensino Religioso assim previsto, se torna possível e necessário para: estrutura a partir da Escola, lugar privilegiado para o exercício de construção das bases da cidadania. desenvolve-se na perspectiva de construção do conhecimento religioso e não mais na do modelo ultrapassado de repasse de conteúdos. alicerça-se na certeza de que as tradições Religiosas (Religiões) conferem critérios de segurança para o exercício da cidadania. Segundo Delors (1999, p. 90-99) a educação durante toda a vida baseia - se em quatro pilares: 1. Aprender a conhecer 2. Aprender a fazer 3. Aprender a viver junto, conviver. 4. Aprender a ser É importante desenvolver no ER possíveis relações com as diferenças espirituais e culturais, como afirma: Devemos cultivar, com utopia orientadora, o propósito de encaminhar o mundo para uma maior compreensão mútua, mais sentido de responsabilidade e mais solidariedade, na aceitação das nossas diferenças espirituais e culturais. A educação permitindo o acesso de todos ao conhecimento tem um papel bem concreto a desempenhar o 132 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso mundo e o outro a fim de melhor se compreender. (DELORS, 1999, p. 50). De acordo com a citação acima se faz necessário um Ensino Religioso onde deve cativar a todos sem distinção de cor, raça e religião, pois o objeto de estudo é justamente o fenômeno religioso e não religião. O difícil está sendo trabalhar com o diferente, o outro. Alteridade é algo que deveríamos resgatar, pois a partir do momento que há uma aceitação um respeito para com o meu próximo. Deve-se levar em consideração na prática de ensino religioso, um ensino que não desenvolva práticas prosélitas e sim ecumênica que contemple todas as religiões, conforme rege o artigo 33 da LDB. Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso." (BRASIL,1997). Considerações finais Faz-se necessário uma reflexão diante de tudo que foi apresentado anteriormente sobre a formação específica da profissional de ensino religioso área de conhecimento que requer um olhar todo especial, uma vez que se trata da relação do ser humano com o transcendente. A formação do docente nesta área de conhecimento perpassa por inúmeras dificuldades, pois o mesmo trabalha com diversos credos na rede pública de ensino. Mediante a tudo o que foi apresentado como fundamentação teórica e prática o profissional deve receber uma atenção diferencial, um olhar com atenção, articulação e respeito à diversidade religiosa presente nas escolas que lecionam. O professor de Ensino Religioso deve ser aquele profissional que na sua comunidade e na sala de aula desempenhe o papel de mediador do conhecimento das diversas religiosidades e espiritualidades, sem perder a sua missão de promotor do diálogo inter-religioso e intercultural como 133 FONAPER também da busca constante da ética e da promoção da paz entre todos os credos, crenças e religiões presentes no contexto social e escolar. Nota-se a grande importância que tem o professor de Ensino Religioso, uma vez que o mesmo torna-se um grande elo entre a realidade social e a realidade pedagógica da escola e da comunidade na qual está inserido. Percebe-se ainda que a formação docente diante de pesquisas e sistematizações são mais complexas. Diante desta complexidade o docente de ER deve ter domínio dos conteúdos e conhecimentos que perpassam os eixos que constam dos PCNER, a saber: ethos, ritos, textos orais e sagrados e teologias. Não podemos esquecer-nos da importância do FONAPER na formação dos docentes de Ensino Religioso, pois o mesmo é um ―espaçopolítico-pedagógico‖. Nesse sentido, continua exercendo o papel de acompanhar as discussões relevantes sobre o Ensino Religioso de todo o Brasil, como também estabeleceu como prioridade a formação do docente para este componente curricular, sempre atualizado para os desafios decorrentes. Referências BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. _____. Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LEI No. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. D.O. U. de 23 de dezembro de 1996. DELORS, Jacques. Educação um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre educação para o século XXI. 2 Ed. São Paulo: Cortez; Brasília: MEC: UNESCO, 1999. FONAPER, Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros Curriculares do Ensino religioso. São Paulo: Ave Maria, 1997. _____. Caderno Temático N. 1: Ensino Religioso - Referencial Curricular para a proposta pedagógica da escola. 2000. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática pedagógica. São Paulo: Paz e Terra. 1996 (Coleção Leitura). 134 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido 38ª Edição, PAZ E TERRA. HTTP://www.pime.org.br/missaojovem/mjeducensino.htmacessado em: 11 ago. 2013 OLIVEIRA et al. Curso de formação de professores in: SENA, Luzia. (Org.) Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006, p. 91-109. TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. 6. Ed. Petrópolis: vozes. 2006. ZIMMERMAM, Pe. Roque. Ensino Religioso: uma grande mudança. Brasília: Câmara dos Deputados. Nº 46, 1998. 135 NO JARDIM DAS ERVAS– SUBPROJETO INTERCULTURAL INDÍGENA FURB/SC Eldrita Hausmann de Paula – FURB/PIBID1 Sandra Andréia Müller Schroeder – FURB/PIBID2 Resumo: O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID criado pela CAPES (2007) objetiva incentivar licenciandos a aproximação da realidade escolar, valorização, aperfeiçoamento, capacitação e prática formadora via construção de reflexão e qualificação docente. Desde agosto de 2012 o Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em ER integra o PIBID da FURB/SC com o Subprojeto Intercultural Indígena. Radicado na EEB Hercílio Deeke (Blumenau/SC) busca contribuir com a prática formadora dos licenciandos em consonância com a Lei nº 11.645/08. Conhecimentos, práticas pedagógicas e produção de materiais didáticos pedagógicos envolvendo o saber tradicional sobre ervas e árvores medicinais relacionados a historia e cultura do Povo Indígena Xokleng Laklanõ (Vale do Itajaí) são alguns dos resultados se articularam na construção coletiva do Jardim das Ervas. Palavras-chave: História; Cultura; Povo Xokleng Laklanõ; Ervas; Árvores. Introdução O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência é um Programa –(PIBID) do Ministério da Educação (MEC), gerenciado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, que desempenha papel fundamental na expansão e consolidação da pósgraduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados do Brasil. Em 2007, passou também a atuar na formação de professores da educação básica ampliando o alcance de suas ações na formação de professores qualificados no Brasil e no exterior, como objetivo maior. 1 2 Acadêmica da IV Fase do Curso Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso, da Fundação Universidade Regional de Blumenau – FURB/SC, Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID, Subprojeto Intercultural Indígena. E-mail: [email protected] Acadêmica da IV Fase do Curso Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso, da Fundação Universidade Regional de Blumenau – FURB/SC, Bolsista do Programa Institucional de Bolsa a Iniciação à Docência – PIBID, Subprojeto Intercultural Indígena. E-mail: [email protected] FONAPER É um programa de Iniciação à docência, os bolsistas são acadêmicos dos cursos de Licenciatura que, inseridos no cotidiano de escolas da rede pública, planejam e participam de experiências metodológicas e práticas docentes de caráter inovador, disciplinar e interdisciplinar, e que buscam a superação de problemas identificados no processo de ensino aprendizagem. O objetivo do programa é incentivar licenciandos a aproximação da realidade escolar, valorização, aperfeiçoamento, capacitação e prática formadora via construção de reflexão e qualificação docente. O PIBID se organiza com projetos Institucionais inserindo vários subprojetos nas diferentes áreas de conhecimento da Educação Básica e são formados por: acadêmicos de graduação (licenciandos), professores das escolas públicas conveniadas (supervisoras) e coordenadores de área (professores da IES). A participação no programa garante a cada bolsista uma bolsa mensal. Atualmente, no Brasil, o PIBID é aplicado em 196 Instituições de Ensino Superior - IES e oferece 49.321 bolsas. Em Santa Catarina, sexto lugar no ranking brasileiro, é oferecido 2.460 bolsas. No contexto de SC, a FURB integra o PIBID com dois projetos institucionais. Em 2012, o Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso passou a integrar o PIBID da FURB/SC com o Subprojeto Intercultural Indígena. O Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso (CR-ER), uma das iniciativas de formação pioneira nesta área do conhecimento no Brasil. Busca habilitar profissionais para o exercício docente em Ensino Religioso abordando a diversidade cultural religiosa em sua relação direta com os Direitos Humanos, que contempla em sua matriz curricular o estudo dos fenômenos religiosos de matriz oriental, semita, africana e indígena. Nesse sentido, tem contribuído com a construção de reflexão e ações comprometidas com a erradicação de discriminações e violências de caráter religioso no cotidiano escolar, acadêmico e social. O Curso CR-ER busca constantemente ampliar e subsidiar sua prática formadora, e um dos espaços/lugares é no Subprojeto Intercultural Indígena, iniciado em agosto de 2012, na Escola de Educação Básica Hercílio Deeke, Blumenau, SC. Objetiva desenvolver uma parceria entre a Universidade e a Educação Básica, colaborar com os estudantes, professores em exercício e a escola na promoção de uma aprendizagem significativa nos diferentes processos de reflexão, discussão, 138 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso conhecimento, construção de outros olhares acerca do povo indígena Laklanõ Xokleng que são correspondentes à História e Cultura Indígena no Vale do Itajaí, na execução da Lei nº 11.645/08.Vale que historicamente foi habitado por este povo e hoje se restringe apenas às cidades de Doutor Pedrinho, José Boiteux, Vitor Meireles e Itaiópolis (SC). O referencial teórico que sustenta esta iniciação à docência são pesquisas, estudos e leituras do povo indígena Laklanõ Xokleng sob os títulos: História e cultura indígena e educação básica no Alto Vale do Itajaí: desafios e perspectivas a partir da Lei n. 11.645/08; A semana dos povos indígenas de 2005: um exercício de interlocução e O povo indígena Laklanõ Xokleng: aproximações sobre cultura e religiosidade, Botocudo: uma história de contacto,respectivamente, foi possível realizar um trabalho minucioso sobre o povo indígena Laklanõ Xokleng registrou-se o conhecimento parcial sobre este povo. Outras leituras feitas e não menos importante foram realizadas. O povo Laklanõ Xokleng com seus saberes tradicionais sobre ervas medicinais e através das experiências, conhecimentos e olhares na Mata Atlântica, desenvolveu práticas e formas de utilizar essas ervas medicinais, árvores nativas, frutos e raízes silvestres. O recorte que realizamos no desenvolvimento das atividades de aprendizagem na EEB Hercílio Deeke, com estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental, foi justamente a partir dos saberes sobre as ervas. Na primeira fase do subprojeto desenvolvemos atividades com estudantes dos sétimos e oitavos anos. Onde realizamos a elaboração e a confecção de material didático pedagógico acerca dos conhecimentos do povo indígena e da sociedade atual para tratamento, cura e prevenção de doenças. Com estes saberes, foram realizadas pesquisas e coletas das ervas. Além é claro, do Jardim das Ervas, atividade desenvolvida com estudantes dos sétimos anos realizada no contra turno da escola. Este texto está organizado em algumas partes, à primeira faz uma introdução ao subprojeto, à segunda traz um recorte do nosso aporte teórico, a terceira relata uma prática pedagógica e seus desdobramentos com o Jardim das Ervas. Jardim das ervas: relatando as práticas Pesquisar e sistematizar a história do povo Laklanõ Xokleng é um desafio, pois esse povo foi violentado em seus direitos e sua cultura sofreu 139 FONAPER perdas significativas a partir do contato com a sociedade não indígena em especial, no que tange o aspecto religioso. Desse modo, buscamos na primeira parte deste capítulo trazer um pouco desta história de contacto até os dias atuais. Na segunda parte relatamos a utilização de plantas com fins medicinais, para tratamento, cura e prevenção de doenças, que são uma das mais antigas formas de prática medicinal da humanidade e dos povos indígenas. Por fim, relatamos algumas práticas didáticas pedagógicas desenvolvidas na escola, e que são resultados de estudos, pesquisas e confecção de materiais pedagógicos que contemplam e integram a História e Cultura do povo indígena Laklanõ Xokleng, com seus possíveis resultados. Conhecendo um pouco da cultura e história do povo Laklanõ Xokleng A religiosidade é uma forma de expressar seus específicos sentimentos pela vida, o ser humano e a natureza (FLORES, 2003). Segundo Lopes (apud FLORES, 2003, p. 14) ―[...] é sumamente concreta [...] gosta de contemplar a vida, saboreá-la, banhar-se nos seus mistérios...‖. Os povos indígenas respeitam, valorizam e acima de tudo amam a terra que é sagrada e estes povos pretendem conviver em harmonia. Flores (2003, p. 14) complementa afirmando: ―religiosidade indígena é portanto a experiência do mergulho sagrado sem estar sobrecarregado de culpas ou enfrentando o olhar ameaçador de Deus‖. A ideia de religioso está estritamente vinculada a tudo que dá vida e a sustenta, constituindo outras maneiras de compreender a própria transcendência. No povo indígena Laklanõ Xokleng não há divindade ocupando a centralidade na vida da comunidade. A dimensão religiosa representa parte constitutiva e está interrelacionada com o todo de sua cultura. Esta visão é perceptível nas diversas concepções, nos mitos, nos ritos, nos símbolos, nas práticas cotidianas, na organização do tempo, do espaço e das atividades, nas relações e interações (MARKUS; OLIVEIRA, 2005, p.376). O cotidiano, o nascimento, a morte os acontecimentos na vida e a cosmovisão com o sagrado, a terra, a natureza, os seres vivos e humanos, estão repletos de sentimentos específicos com a cultura e a religião. Sendo assim, a religiosidade está presente em todos os momentos da 140 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso história e da vida da comunidade indígena. Os rituais, as práticas e a crença religiosa na natureza estão nos valores e normas do povo indígena. O respeito, a cultura, as práticas e modos de conviver com a natureza são a principal fonte da religiosidade do povo indígena Laklanõ Xokleng. Portanto, não há uma divindade com nome específico e sim, a veneração e o respeito à natureza, os animais, os seres humanos, isto é divino. A língua materna também é um dos elementos da cultura que mantém a família e o grupo unidos, segundo Markus e Oliveira (2005). Vocês adoram a lua, o sol? Que Deus vocês adoram: as pedras, os animais, os rios, a floresta? É verdade que os índios não entendem o cristianismo? Então eu me dou conta do tamanho da desinformação, da distorção e das dificuldades de diálogo e compreensão entre índios e não índios em pleno século XXI. (FLORES, 2003, p.11). Os indígenas não entendem o cristianismo, mas amam as pedras, os animais, os rios, as florestas, adoram a lua, o sol e as estrelas. Então, o que é o cristianismo? Estamos desinformados, somos distorcidos e temos dificuldade de diálogo. Amor e respeito por todos e tudo é o que o indígena prega. São com lutas e através da identidade de um grupo, que se forma a denominação de um povo, com medidas de reviver sua língua, seus artefatos, os seus mitos, os seus símbolos, enfim, sua cultura. O povo Laklanõ Xokleng vem conquistando espaço e território político em terras que lhes foram tomadas, inclusive com o nome de seu povo. A denominação Laklanõ Xokleng traz significados importantes para o povo. O termo Xokleng, na língua do grupo designa ―a aranha que vive nas taipas de pedra‖ e foi popularizado pelo trabalho do antropólogo Silvio Coelho dos Santos (1987). O nome foi incorporado pelo grupo enquanto denominador de uma identidade externa e usada em suas lutas públicas. No entanto, o grupo se autodenomina ―Laklanõ‖, isto é, ―o Povo do Sol‖ (PEREIRA, 1998). Este termo vem ganhando espaço político através de um forte movimento de afirmação da identidade do grupo, com estudos e revitalização de sua língua, mitos, artefatos, medicina e território tradicional. A língua é um dos elementos fortes da cultura deste povo e tem tido zelo e a persistência em sua transmissão. (MARKUS; OLIVEIRA, 2005, p.376) O povo Laklanõ Xokleng habitava boa parte do estado de SC. Mas, o contato com os colonizadores deflagrou uma verdadeira guerra os habitantes que aqui viviam e os colonizadores que recém chegaram. Segundo Namem (1994), visando proteger esse povo da violência dos 141 FONAPER bugreiros3, foi criado pelo chefe do governo catarinense, Adolfo Konder, em 1926a Terra Indígena (TI) inicialmente denominada Posto Indígena Duque de Caxias, para aldear os indígenas. Ao povo Laklanõ Xokleng, que era nômade, foi destinado uma área de 14.156,58 hectares. Em 1965 foi oficialmente demarcada e em 1975 recebeu o nome de TI Ibirama, situada ao longo dos rios Hercílio e Plate, que moldam a bacia do rio Itajaí-açu. Localizada em quatro municípios cerca de 70% da área está dentro dos limites dos municípios José Boiteux, Doutor Pedrinho, Vitor Meireles e Itaiópolis. Com o plano de colonização do alto Vale do Itajaí em conjunto com representantes do governo, o povo Laklanõ Xokleng, sofreu ataques com violência para o seu extermínio e foram impedidos de conviver na estrutura cultural, territorial e social do grupo e desta forma o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) deveria garantir a não exploração e a integridade física, transformando indígenas em agricultores sofridos. Antes de 1914, os Botocudos viram suas terras serem ocupados pelos brancos, ao tempo em que foram violentamente caçados pelos bugreiros [...] Segundo RIBEIRO (1979:127-48), contrariando interesses dos governantes locais e estaduais, a criação do SPI visava garantir aos índios a posse de suas terras, controlar as relações desses com a sociedade nacional, não permitindo que fossem oprimidos e explorados, e promover a punição de crimes cometidos contra os índios. Entretanto, além desse protecionismo declarado, conforme LIMA (IN OLIVEIRA FILHO, 1989), os objetivos eram, também, de sedentarizar índios, transformando-os em reserva de mão-de-obra. [...] praticassem a agricultura, a fim de manterem a sobrevivência e o Posto Indígena, e procurava evitar um contacto mais direto entre esses e os brancos (SANTOS, 1973) [...] (NAMEM, 1994, p. 28). Ao serem confinados em uma área restrita e com precárias condições de desenvolvimento. Esse grupo viu seu povo sendo reduzido, além de sua cultura e religião. Afinal para o povo indígena cultura e religião não se separam. A ancestralidade está presente, é para manter viva a memória dos seus ancestrais através de orações, refeições e oferendas especiais; os indígenas estão convictos de que os ancestrais estão incumbidos de cuidar da vida de seus descendentes, crença de que 3 Bugreiros nomenclatura designada aos contratados pelos colonizadores imigrantes e muitas vezes pelo governo provincial de Santa Catarina, para capturar e exterminar os indígenas. O termo deriva da palavra bugre, como era conhecido o povo indígena desta região. 142 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso os mortos, especialmente os espíritos, continuam vivos e influenciam o destino dos vivos, dando proteção. Nas décadas de 50 a 70, a atuação de igrejas na TI logrou a adesão de indígenas à Igreja Católica; quanto à Igreja Evangélica Assembleia de Deus e a incidência de adesão do grupo ao pentecostalismo estão muito presente na representação do Botocudo. Na adesão à religião católica e ao pentecostalismo que o povo indígena se prende a outros grupos sociais. Quanto à assistência religiosa na área indígena, SANTOS (1973:270: 6) relatou as constantes mudanças de orientação ao longo dos anos 1950, 60 e 70. Entre 1935 e 1968, a orientação foi dada pela Igreja Assembleia de Deus, de orientação protestante. [...], para preservar a integridade da sociedade e da cultura dos pioneiros, que veem nos cultos religiosos um substituto das suas cerimônias tradicionais (NAMEM, 1994, p.96). Atualmente, constata-se que a Igreja Assembleia de Deus consolidada entre grande parte da população da área indígena se identifica como crentes e cristãos, a igreja Pentecostal tem introduzido novos valores, servindo para preservar a integridade da sociedade e da cultura. As plantas e ervas na cultura do Povo Laklanõ Xokleng A utilização de plantas com fins medicinais, para tratamento, cura e prevenção de doenças, é uma das mais antigas formas de prática medicinal da humanidade e dos povos indígenas. A Organização Mundial de Saúde (OMS) , responsável por desempenhar um papel de liderança em questões de saúde globais, a definição da agenda de pesquisa em saúde, estabelecendo padrões, articulando opções políticas baseadas em evidências, fornecendo apoio técnico aos países e monitorar e avaliar as tendências da saúde - define planta medicinal como sendo ―todo e qualquer vegetal que possui, em um ou mais órgãos, substâncias que podem ser utilizadas com fins terapêuticos ou que sejam precursores de fármacos semissintéticos‖. A humanidade utiliza plantas, primeiro numa relação de consumidor e mais tarde para a cura de suas enfermidades. Iniciada antes da medicina moderna, a medicina tradicional definida pela OMS como sendo: A soma de todos os conhecimentos teóricos e práticos, explicáveis ou não, utilizados para diagnóstico, prevenção e tratamentos físicos, mentais ou sociais, baseados exclusivamente na experiência e 143 FONAPER observação e transmitidos oralmente ou por escrito de geração em geração. (MORODIN; BAPTISTA, 2001). Essa medicina tradicional permanece até os dias de hoje, com base e práticas mantidas há milhares de anos, vem oferecendo contribuição ao desenvolvimento da ciência, a partir de conhecimentos e práticas de saúde. Considerando que a medicina tradicional representa um importante papel social, por meio de seus elementos compartilhados por toda a sociedade, é importante avaliar se o uso de plantas medicinais decorre de um conhecimento tradicional, embasado na experiência direta dos membros das comunidades ou resulta de contatos com fontes externas à cultura local, como migrantes ou veículos de comunicação (livros, rádio, televisão) e caráter empírico, influenciadas pelo contexto sociocultural, econômico e físico, no qual se encontram inseridos. Segundo Neves (2001), observa-se a predominância da utilização de folhas, frequentemente a partir da combinação de plantas bem como a utilização de outros componentes no preparo, como mel e leite. A maioria da sociedade atual faz uso das ervas medicinais por indicação dos parentes e amigos, um número reduzido busca informações em livros ou através da televisão e rádio. Mais da metade desta sociedade recomendam o uso de alguma erva medicinal para outras pessoas. Grande parte da sociedade cultiva espécies de ervas consumidas, em hortas ou pequenos vasos. Embora seu potencial nem sempre seja bem explorado. É possível reduzir o consumo de medicamentos fazendo uso correto das ervas medicinais. O mais importante é que por um custo muito baixo pode-se manter um bom número de ervas em residências, mesmo dispondo de pouco espaço para o cultivo. O uso de ervas requer cuidados, em se tratando de preparações caseiras e tais cuidados permitem segurança e eficácia na utilização, garantindo que seus efeitos sejam aqueles desejados, para tanto, devem ser levados em conta a parte e tipo da erva, o grupo de princípio ativo e a finalidade. Foram os povos indígenas que descobriram a capacidade medicinal das ervas. Os europeus, quando chegaram ao Brasil, aprenderam muito com os indígenas e recorreram às ervas para tratar doenças e amenizar dores e incômodos e esta mesma erva empregada pelos povos indígenas continuaram a ser valorizados através dos tempos. Os pajés ou xamãs dos povos indígenas são os grandes conhecedores das ervas e plantas medicinais. 144 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso O uso de ervas entre o povo Laklanõ Xokleng era basicamente restrito a dois vegetais: ―o ―uiôlo-nhãtâi‖ e o ―tutôlo‖, espécies até hoje nunca identificadas (SENS, 2002)‖, sendo indicadas para os mais variados distúrbios. No entanto, ―o emprego mais significativo destes vegetais era profilático e ritualístico uma vez que a etiologia das doenças tinha um caráter essencialmente espiritual (Henry, 1941; Mussolini, 1946, apud SENS, 2002)‖. Porém, quando as grandes epidemias se alastraram após o contato com os brancos, as práticas tradicionais de cura deixaram de ter efeito e foram abandonados, os Laklanõ Xokleng passaram a fazer uso de muitas plantas indicadas e ou introduzidas pelos brancos, para tratar doenças infecciosas. As duas principais plantas originais perderam o seu valor profilático e ritualístico e passaram a ser utilizadas de acordo com as regras da medicina popular brasileira. É provável que o próprio Eduardo de Lima e Silva Hoerhan, o ―pacificador‖, tenha sido um dos importantes agentes na introdução de tantas espécies vegetais, uma vez que dispunha de pouquíssimos recursos para o tratamento dos indígenas e a utilização de plantas se convertia em uma modalidade de terapia de baixo custo e razoável eficácia (SENS, 2002). Diante dessa nova realidade os indígenas passaram a fazer uso de muitas plantas indicadas e ou introduzidas para tratar doenças infecciosas e outras até então, desconhecidas e para as quais eles não tinham tratamento. O jardim das ervas na escola: exercícios de iniciação a docência De posse dos referenciais teóricos, realizamos observação participante, acompanhando a professora supervisora em suas aulas de Ensino Religioso, com os anos finais do Ensino Fundamental. Esse período nos permitiu conhecer o chão da escola com suas rotinas, suas dificuldades, necessidades, avanços e desafios. Também realizamos uma visita à Aldeia Bugio, na terra indígena Laklanõ Xokleng situada em Dr. Pedrinho, SC - para aproximação com o modo de vida; seus hábitos, cultura, religiosidade e vida social. Na Terra Indígena de Ibirama, vivem alguns povos indígenas: Laklanõ Xokleng, Guarani e Kaingang. Estão organizados em oito aldeias, a saber - Bugio, Palmeira, Barragem, Figueira, Sede, Coqueiro, Toldo e 145 FONAPER Pavão. Nossos estudos focam-se no povo Laklanõ Xokleng, por dois motivos: é o único logo, o último grupo existente no planeta; segundo pelas atrocidades feitas com sua cultura e religião, ao longo da história do estado de SC. Na Aldeia Bugio, participamos de uma Trilha da Sapopema e identificamos uma quantidade significativa de ervas medicinais como: tanchagem, erva cidreira, camomila, etc. Na etapa das ervas, nos auxiliou teoricamente artigo Alternativas para a auto sustentabilidade dos Kokleng da terra indígena Ibirama - publicado por Sávio Luiz Sens, em 2002. Elaboramos e aplicamos um instrumento de diagnóstico para mapeamento de saberes dos educandos e dos professores em exercício sobre saberes das ervas medicinais, conhecimentos e práticas pedagógicas. Realizamos o registro, sistematização e análise dos dados recolhidos após encontro dos/as bolsistas que subsidiaram a elaboração das práticas pedagógicas. A escolha pela temática das ervas "Jardim das Ervas" se deu primeiro pela observação realizada na Aldeia Bugio; segundo porque a Escola cedeu um canteiro para o plantio das ervas coletadas, que se articularam na construção coletiva do livro ―Jardim das Ervas". E a partir do Jardim das Ervas, foram desenvolvidas atividades de aprendizagem envolvendo a produção de material didático pedagógico relacionado à História e Cultura dos Povos Indígenas no Vale do Itajaí, em consonância com a Lei nº 11.645/08. Dentre as diferentes atividades desenvolvidas no decorrer do primeiro semestre de 2013 no Subprojeto, socializaremos somente a experiência do Jardim das Ervas. Esta atividade era realizada com estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental, através de encontros sistematizadosdas15h50mim até 17h20mim, no contra turno da escola com os estudantes dos 7º. Utilizamos aulas dialogadas e vídeos, a partir de uma atividade diagnóstica e de uma apresentação em Power point que abordou a história do povo indígena Laklanõ Xokleng, apresentamos a definição de ervas, conhecendo as ervas Alecrim, Alfavaca, Amargosa, Canela de Sassafrás, Marcela do Campo, Picão, Quebra Pedras, Tanchagem e Urtiga Miúda, ensinando e aprendendo como preparar um canteiro para posteriormente plantá-las. 146 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso No canteiro das ervas, espaço disponibilizado dentro da área escolar, foi desenvolvida a prática do plantio das ervas, o cultivo e conhecimento dos métodos de utilização, a conservação e os benefícios das ervas; foram realizadas visitas periódicas ao jardim das ervas, na sala de informática desenvolvemos pesquisas; na prática explicativa das ervas medicinais estudamos os nomes científicos e famílias, a indicação terapêutica, a conservação, parte utilizada da erva, posologia, contra indicação e modo de usar, tanto da cultura indígena quanto na cultura não indígena, conhecendo as diversas formas de manipular as ervas e as plantas medicinais; preparamos alguns chás com auxílio de água, chaleira e o modo correto da infusão destas ervas, degustando-os, percebendo os gostos, os cheiros, fotografando as plantas no jardim das ervas e por último iniciando a produção de um livro das ervas estudadas, com imagens, nome científico, indicação terapêutica, modo de preparo e o modo de uso na cultura indígena e não indígena.Nele é possível encontrar fotos e ilustrações criadas pelos educandos e informações sobre os usos de cada erva em particular.Não se trata de uma obra completa. Aprendizados e desafios: um convite (ainda tímido) a outras leituras e olhares para as relações e práticas No Subprojeto Intercultural Indígena do PIBID/FURB, destacamos sua contribuição na nossa formação como futuros professores, porque é a oportunidade de experimentar e realizar, na prática, o conhecimento teórico adquirido no decorrer da formação acadêmica dentro do Curso Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso, em especial aqui sobre a História e Cultura Indígena no Vale do Itajaí, em consonância com a Lei nº 11.645/08. Muitos foram os aprendizados e os desafios identificados pelo Subprojeto Intercultural Indígena, somou-se a reflexão, através de debates e diálogos sobre a temática analisando de forma coletiva e crítica, desafiando a construção de outros olhares e leituras dos educandos acerca do povo indígena Laklanõ Xokleng, em pesquisas, estudos, socialização e discussões com o grupo sobre a importância, a utilização das ervas e árvores medicinais para tratamento, cura e prevenção de 147 FONAPER doenças, sendo uma das mais antigas formas de prática medicinal da humanidade, e deste povo. Como resultado final a confecção do livro, sistematizado em forma de produção textual coletiva com os conhecimentos adquiridos sobre as ervas medicinais do saber tradicional indígena e os conhecimentos da sociedade atual. O subprojeto como experiência foi uma oportunidade de aprofundar os conhecimentos e a capacidade criativa na resolução dos impasses encontrados durante esse período. Reflexão de que educadores da sociedade escolar têm a tarefa importante de pesquisar, estudar, conhecer e principalmente respeitar e valorizar a diversidade cultural dos povos indígenas. Que toda a sociedade escolar deverá passar pelo exercício do diálogo, criar lastro e competências para a superação de diferenças discriminatórias e preconceituosas, conhecer para respeitar e conviver para a construção de diálogos na busca pela erradicação de violências de caráter religioso e cultural, é no desarmamento de leituras e olhares que se tornam possíveis percepções diferenciadas movidas pelo respeito em alteridade no cotidiano social, cultural e escolar através do ensino e da docência. Considerações finais A Interculturalidade realizada entre o povo indígena Laklanõ Xokleng e a Escola de Educação Básica Hercílio Deeke mostrou a importância do reconhecimento da diversidade cultural, onde não se considera uma cultura superior à outra. Nesse sentido, se incentiva o respeito e o entendimento entre os seres humanos de diferentes etnias e culturas, ainda que se saiba que relações de desigualdades existem. Sabemos que perante a humanidade somos todos iguais pertencentes à espécie humana e, diferentes quanto à cultura. Sabemos que geralmente é nas diferentes culturas que os grupos se dividem, achando a sua própria cultura como predominante e a mais correta. Mas reconhecer que o outro pode utilizar a sua língua materna e o seu processo de aprendizagem na educação escolar instituindo-se como parte de um processo de afirmação étnica e cultural é um desafio e um caminho árduo a se concretizar. 148 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Neste sentido, um pequeno passo foi dado pelos bolsistas, coordenadores e supervisores do Projeto PIBID, para uma aproximação entre o povo indígena Laklanõ Xokleng com um grupo de estudantes de uma escola, mas que muitas outras possam seguir o mesmo caminho. Diminuindo assim, a distância entre os povos indígenas e não indígenas. E quem sabe, com isso o reconhecimento e respeito às diversidades de culturas e religiosidades ultrapassem os muros das escolas. Referências CASTRO, Luiz Osorio de. Plantas medicinais, condimentos e aromáticas: descrição e cultivo. Guaíba: Agropecuária, 1995. CORRÊA JÚNIOR, Cirino. Cultivo de plantas medicinais, condimentos e aromáticas.2.ed. Jaboticabal, FUNEP, 1994. JUNQUEIRA, Sergio Rogerio Azevedo, OLIVEIRA, Lilian Blanck de; O ensino religioso: memória e perspectivas; MARKUS, Cledes; OLIVEIRA, Lilian Blanck de, A semana dos povos indígenas de 2005: um exercício de interlocução; Curitiba: Champagnat, 2005, p.375-384. KINAS Rafaela Catarina; OLIVEIRA, Lilian Blanck de História e cultura indígena e educação básica no Alto Vale do Itajaí: desafios e perspectivas a partir da Lei nº 11.645/08, Blumenau: FURB (mimeo). MARODIN, S. M. e BAPTISTA, L. R. M. Plantas utilizadas como medicinais no município de Dom Pedro de Alcântara, Rio Grande do Sul, Brasil. 1. Origem e aspectos ecológicos. Iheringia, Série Botânica, Porto Alegre, n. 56, p. 131-146, 2001. NAMEM, Alexandro Machado; Botocudo: uma história de contato; Florianópolis: Editora da UFSC; Blumenau: Editora da FURB, 1994, p. 112. NEVES, M. C. M. Plantas medicinais: diagnóstico e gestão. Brasília. Editora Ibama, 2001 (Série Meio Ambiente em Debate nº 35). 52p. 2001. SENS, Sávio Luiz. Alternativas para a auto sustentabilidade dos Kokleng da terra indígena Ibirama. Florianópolis, 2002. 149 FONAPER SILVA, Franciele da et al.; Folhas de chá: remédios caseiros e comercialização de plantas medicinais, aromáticas e condimentos. Viçosa, MG: UFV, 2008. SIMON D. O guia Decepar Chora de ervas: 40 receitas naturais para uma saúde perfeita. Rio de Janeiro (RJ): Campus; 2001. WOLFRAM, Helen Elfride; OLIVEIRA, Lilian Blanck de;O povo indígena Laklanõ Xokleng: Aproximações sobre cultura e religiosidade, Blumenau: FURB, 2007(mimeo). Referencias eletrônicas: http://www.cotianet.com.br/eco/HERB/fichas.htm http://www.jardineiro.net/classe/arvores http://www.plantamed.com.br/ http://www.plantasquecuram.com.br/ www.proxy.furb/tede/tde_busca/arquivo?...150 - Entre o Sol e a Sombra. Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB. 150 O CAMINHO E OS DESAFIOS NA FORMAÇÃO DOCENTE DO ENSINO RELIGIOSO EM PERNAMBUCO Wellcherline Miranda Lima SEE/PE 1 Rosalia Soares de Sousa SEE/PE 2 Resumo: Neste artigo mostram-se dados da pesquisa em desenvolvimento sobre a formação docente de Ensino Religioso da Rede Estadual de Pernambuco cujo objetivo é buscar reflexão da função social do Ensino Religioso (ER), considerado como elemento de formação cidadã, na educação brasileira, em especial na sociedade pernambucana; e também, apresentar dados da investigação sobre a formação docente ER na qual ainda continua o desafio para os Sistemas de Ensino. A metodologia da pesquisa qualitativa foi revisão bibliográfica com os estudos de Junqueira (2001; 2007) sobre o Ensino Religioso na educação brasileira; a formação docente do ER com Sena (2007) e Oliveira; Junqueira; Alves; Keim (2007). Dessa forma, teremos um olhar mais ampliado sobre o docente do ER para a promoção ao diálogo interreligioso. Palavras-chave: Ensino Religioso; Formação de Docente; Pernambuco; Escola Pública. Os Princípios Básicos do Ensino Religioso para a função social O Ensino Religioso é componente curricular de oferta obrigatória para o Ensino Infantil e Fundamental como os demais componentes. A matrícula só é efetivada se o responsável legal do estudante fizer a opção. Essa condição é determinada pela Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo 210. Apesar de não ser obrigatório, esse componente procura atender à função social da escola de conformidade com a legislação vigente. Por outro lado, o Ensino remete à instrução, à educação, enquanto o religioso deve ser entendido como religiosidade, ou seja, a dimensão humana de abertura ao transcendente que se almeja educar no ambiente escolar com base no respeito à diversidade dos sujeitos existentes nesse espaço educacional. 1 2 Mestre em Ciências da Religião (UNICAP). Secretaria de Educação de Pernambuco (SEE/PE). Email: [email protected] Mestranda em Ciências da Religião (UNICAP). Secretaria de Educação de Pernambuco (SEE/PE). Email: [email protected] FONAPER O ordenamento jurídico do Brasil está baseado em princípios que expressam a conduta e os valores do povo brasileiro. De acordo com Sundfeld (1995, p. 18) os princípios devem ser entendidos como as "ideias centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico, harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de se organizar". Assim, os princípios do Ensino Religioso (e demais componentes curriculares) deverão estar fundamentados nos princípios constitucionais e a partir dele na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9394/96, incluindo a Lei 9475/97 que dá nova redação ao art. 33. São considerados princípios do Ensino Religioso: A igualdade de condições para o acesso ao conhecimento das tradições culturais religiosas em todas as escolas da rede pública do ensino fundamental. Esse princípio não pode ser efetivado para todos os estudantes pelo fato óbvio de a matrícula para esse componente curricular ser opcional. Outro princípio constitucional é o pluralismo religioso. Reconhecer a diversidade religiosa dos sujeitos que fazem parte do universo escolar é dever de todos. Esse princípio faz jus à condição de país de riquíssima diversidade cultural como o Brasil, notável em vários povos que deram sua contribuição no processo de formação desse espaço geográfico. Os povos indígenas, Tapuias, Jês, Fulni-ô e tantos outros, já ocupavam esse território quando da chegada dos portugueses. A migração forçada dos negros africanos, além de outros povos europeus e asiáticos que vieram para cá contribuindo com o processo de miscigenação fez surgir essa diversidade cultural que precisa ser considerada na escola, valorizando a experiência que os estudantes trazem sobre sua religiosidade, mas abordar também a religiosidade regional e brasileira. As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 09 (nove) anos3 apresentam em seus fundamentos que as escolas devem: Assegurar a cada um e a todos o acesso ao conhecimento e aos elementos da cultura imprescindíveis para o seu desenvolvimento pessoal e para a vida em sociedade, assim como os benefícios de uma formação comum, independentemente da grande diversidade da população escolar e das demandas sociais. (BRASIL, 2010, p.01) Para que o Ensino Religioso Escolar cumpra sua função social é importante considerar os princípios éticos, políticos e estéticos 3 Em seu artigo 5º afirma que o direito à educação é inalienável, ou seja, aqueles pertencentes à pessoa pela sua condição humana. 152 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso determinados pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 09 (nove) anos. No primeiro, espera-se que esse componente possa contribuir para a eliminação dos preconceitos religiosos combatendo a discriminação expressas nas abordagens orientadas pelo professor, pelas opções dos estudantes em professar religiões consideradas minorias em relação àquelas predominantes. Liberdade, autonomia, justiça e solidariedade, portanto, são expressas nesse princípio ético. Considerando o segundo princípio (políticos), espera-se que o Ensino Religioso possa contribuir para o reconhecimento dos direitos dos estudantes em expressar sua religiosidade e deveres quanto ao respeito do outro também poder expressar-se livremente a sua opção religiosa, à preservação dos templos religiosos evitando depredações nos símbolos de outras religiões. O reconhecimento da igualdade de direitos entre os sujeitos escolares que apresentam diferentes necessidades também fazem parte desse segundo princípio. Quanto ao terceiro princípio (Estéticos), faz-se necessário o estímulo e desenvolvimento da sensibilidade, da racionalidade, da criatividade e valorização das diferentes expressões da cultura (local, regional e nacional) do reconhecimento do pluralismo religioso, característico da sociedade brasileira. Portanto, o Ensino Religioso é direito de todos os estudantes, sem exceções, pois desenvolverá o potencial da transcendência humana, além de oportunizar o pleno exercício dos mais variados direitos cumprindo, assim, a função social da escola. O Estado de Pernambuco através do Conselho Estadual de Educação publicou no ano de 2006 a Resolução nº 05 cujo dispõe sobre o Ensino Religioso (ER) nas escolas da rede pública de ensino constando na formação básica dos estudantes do ensino fundamental. O fenômeno religioso é o seu objeto de estudo sendo expresso nas manifestações religiosas. O proselitismo também está presente nessa resolução e assim como na Lei nº 9.394/1997 fica expressamente proibido, bem como os conteúdos direcionados para esse ou aquele credo religioso. Os mesmos deverão constar no projeto-político-pedagógico de cada unidade de ensino desde que estejam em consonância com os pressupostos das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. 153 FONAPER Os pressupostos referem-se à interdisciplinaridade e contextualização como estruturadores da organização do currículo; o reconhecimento ―do transcendente e do sagrado através de fontes escritas e orais, ritos, símbolos e outras formas de expressão, identificadas e organizadas pelas tradições religiosas‖. Reconhece também os valores (éticos/morais) que cada tradição religiosa traz e a garantia da dignidade do ser humano; a cultura de paz; justiça e solidariedade entre os diversos povos; o reconhecimento do pluralismo religioso presente na escolas que deverá ser respeitado como direito inerente a cada indivíduo; a busca pelo diálogo entre as diversas religiões. O objetivo das Orientações Curriculares de Educação em Direitos Humanos (PERNAMBUCO, 2012, p.16), ―é contribuir para a qualidade da educação de Pernambuco, proporcionando a todos os pernambucanos uma formação de qualidade, pautada na Educação em Direitos Humanos em prol da valorização da diversidade4 e do respeito pelo diferente, que garanta a sistematização dos conhecimentos desenvolvidos na sociedade e o desenvolvimento integral do ser humano.‖ Portanto, para a função social da escola. Formação dos docentes do Ensino Religioso A formação dos docentes esteve e continua com desafios inerentes à história da educação brasileira, visto que a partir da década de 1990, devido às exigências estabelecidas pelos órgãos internacionais,5 como também o processo da globalização que envolveu o Brasil, várias ações políticas e reformas educacionais que se propagaram nas esferas federal, estadual e municipal, juntaram esforços no sentido de buscar definir e concretizar políticas públicas para a formação técnica e tecnológica de docentes (CARON, 2008, p. 62-66). Caron diz que ―[...] há necessidade de efetivas políticas públicas. E para que novas políticas públicas sejam implementadas é preciso que o professor no exercício de sua função política, de sua cidadania, participe das discussões e atividades de formação [...]‖ (CARON, 2005, p.12). 4 5 Entende-se também sobre a inclusão da cultura religiosa. FMI - Fundo Monetário Internacional e a UNESCO - Organização das Nações Unidas para a educação, à ciência e a cultura. 154 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Com isso, percebemos a necessidade de políticas públicas que envolvam os participantes, incluindo integralmente as suas vivências culturais e religiosas também. Fazendo uma análise do artigo 62 da LDBEN, fica clara a necessidade de atenção à política de formação docente para atendimento na educação básica das áreas de conhecimento previstas na Lei nº 9.394/1996 que: A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidade e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal (BRASIL, 1996, grifo nosso). Está previsto na lei federal que a formação inicial e continuada docente do Ensino Religioso deve ser realizada nos espaços das Instituições Superiores. Segundo os comentários de Meneghetti (2007), essa formação deve acontecer em Instituições Superiores, por elas existirem em função dos saberes universais, ou melhor, no ensino, pesquisa e extensão sobre as diversas ciências e tradições de sabedoria, tendo assim o melhor ―domínio da área do conhecimento e das metodologias de trabalho apropriadas a esse saber‖. (MENEGHETTI, 2007, p. 141) Em Pernambuco, a Região Metropolitana do Recife dispõe de faculdades particulares e as três grandes Instituições Superiores com cursos voltados para a docência, tais como: as públicas - Universidade Federal de Pernambuco, Universidade Federal Rural de Pernambuco ambas não dispõem de curso de Ciências da Religião e Teologia; e de natureza comunitária a Universidade Católica de Pernambuco, a qual dispõe do curso de Teologia e o mestrado em Ciências da Religião.6 Outro ponto levantado sobre a formação docente do Ensino Religioso, em Pernambuco, é a Resolução nº 05 do Conselho Estadual de Educação que orienta no artigo 5º que a ―formação dos docentes para o magistério de ER dar-se-á em curso superior de licenciatura em Ciências da Religião ou correspondente‖ (CEE/PE, 2006, p.02). A palavra ―corresponde‖ inserida no texto informa mais adiante que é o curso de 6 O panorama apresentado mostra-se a deficiência na formação inicial do docente para o Ensino Religioso 155 FONAPER Teologia que melhor atende e, na ausência desses, deve-se ao curso de Pedagogia ou outro na área de Humanas. Nota-se que há urgência da formação de maneira adequada dos docentes do Ensino Religioso, que deve ser inserida no plano de formação de licenciados e, no caso da Resolução pernambucana, especificando o curso de Ciências da Religião. Logo, esse curso fornecerá a capacidade para o docente saber como desenvolver e enfocar, na pluralidade do fenômeno religioso, o olhar para a diversidade cultural para a formação cidadã em valores humanizantes (MENEGHETTI, 2007, p.141). Diante disso, pode-se afirmar que a formação do docente de Ensino Religioso requer a compreensão do docente como mediador do saber no conjunto de saberes/ciências de que se compõe o currículo escolar, lembrando que a disciplina ainda conta com obstáculos de ordem política, legal e epistemológica, relativos à laicidade do Estado e à presença do religioso em espaço público no Brasil. Parte-se do princípio de que a formação docente se articula com o contexto social em que está inserida e que o Ensino Religioso tem diante de si a perspectiva da diversidade cultural e religiosa verificada na sociedade brasileira atual. A esse respeito, cabe citar a obrigatoriedade, dada pela redação do artigo nº 33 da LDBEN 9.394/1996, de que os sistemas de ensino ouçam entidades civis com representação religiosa. Pois existem também dificuldades dos docentes quanto à demora da efetivação das mudanças do sistema de ensino nessa direção. Verifica-se que muitos docentes ainda não conseguem estabelecer necessária distância entre sua formação inicial e familiar de base religiosa-confessional e a elaboração de uma visão plural e inclusiva do componente curricular de Ensino Religioso. Caron nos conduz para a reflexão de Perround a esse respeito: [...] Para o professor adquirir competências profissionais, um conjunto de conhecimentos é necessário. Essas competências são, ao mesmo tempo, de ordem cognitiva, afetiva, conotativa e prática. Entende-se como um conjunto diversificado de conhecimentos da profissão, de esquemas de ação e de posturas que são mobilizados no exercício do ofício (PERROUND apud CARON, 1999, p.12) Nesse estudo, objetiva-se, a partir da apresentação de dados coletados, por amostragem, através da aplicação de 06 (seis) questionários e 02 (duas) entrevistas semi-estruturadas com o universo de 156 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso 06 (seis) docentes para ilustrar os desafios referentes à formação docente, discutidos neste tópico. A pesquisa de campo foi realizada entre maio a junho de 2013 na capital pernambucana, a partir de vivências de 06 (seis) escolas da Rede Estadual relativas ao Ensino Religioso, que essas detêm de uma diversidade cultural e religiosa notável, é que se colocaram as provocações e o desejo de aprofundamento, que se traduzem no esforço realizado desta pesquisa. Observamos nos gráficos 01 e 02 que uma boa parte das participantes7 ainda continua no patamar da Graduação, sendo concentrada na área das Ciências Humanas, por razões inerentes ao contexto docente tradicional. Gráfico 01- FORMAÇÃO ACADÊMICA Graduação 17% Especialização 83% A maior parte das docentes que responderam ao questionário tem Especialização, em área normalmente correspondente à da sua graduação em licenciatura plena, distribuída como mostra o gráfico 02. 7 As pessoas que responderam o questionário estruturado foram do sexo feminino. 157 FONAPER Gráfico 02 - HABILITAÇÃO EM LICENCIATURA Ciências da Religião 0% Biologia 20% Filosofia 10% Geografia 10% História 10% Teologia 10% Letras 20% Pedagogia 20% A rede estadual de ensino dispõe, na prática, de critérios de lotação8 dos docentes para assumir a disciplina do Ensino Religioso, dando prioridade aos cursos de Pedagogia, Letras e Teologia. A escolha desse primeiro curso vem pelo motivo do Sistema de Ensino aproveitar os docentes de Pedagogia que perderam carga-horária ao longo dos anos, desde o fim do Magistério (hoje chamado Normal Médio), atendendo às exigências da LDBEN Lei nº 9.394/1996; como também o docente de Letras, que contém uma carga-horária superior às demais, exceto Matemática, sendo como complemento de carga horária9. As aparições dos formados em cursos de História e Geografia ocorrem no caso da vacância na unidade escolar e da disponibilidade de carga-horária do docente. Percebemos a ausência nas respostas dos questionários das docentes da habilitação no curso de Ciências da Religião: na entrevista semi-estruturada apenas duas professoras conheciam a existência do curso oferecido na capital em nível de mestrado conforme a disposição do gráfico 03. Para a formação específica do Ensino Religioso houve ainda, na pesquisa, a posição de duas docentes que responderam ter cursado uma 8 9 Informações cedidas pelas Gerências Regionais de Educação. Essas situações eram muito comuns até o ano de 2010. 158 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Extensão em Ensino Religioso, mas não informaram à instituição que ofertou. Gráfico 03 - FORMAÇÃO ESPECÍFICA NA ÁREA DO ENSINO RELIGIOSO Sim 33% Não 67% Para Meneghetti, a disponibilidade dos cursos apresentados nos registros das entrevistas mostra os entraves para a garantia do respeito à diversidade cultural religiosa presente no contexto sociocultural da sociedade. Logo, a política pública de formação, no caso, em Pernambuco, onde não há cursos destinados para essa modalidade e nem à disposição do Estado, precisa ser incrementada com vistas, inicialmente, à oferta de curso de especialização e/ou extensão na linha das Ciências da Religião10. Outro ponto em destaque é a formação continuada sendo promovida pelo Sistema de Ensino estabelecido pelo 1º parágrafo do artigo 62 da LDBEN que, em se tratando da rede estadual, ―em regime de colaboração, deverão promover a formação inicial, a continuada e a capacitação dos profissionais de magistério‖ (BRASIL, 1996). 10 Nas Instituições do Ensino Superior em Pernambuco não dispõe do curso em Licenciatura em Ciências da Religião. No campo da pós-graduação existe desde 2005 o curso em nível de mestrado pela Universidade Católica de Pernambuco que ainda ofereceu em 2012 o curso de Especialização em Ciências da Religião. Em 2008 foi aberto o Edital no Diário Oficial de Pernambuco, publicado em 17 jun. 2008 de cursos de Especialização e Atualização patrocinados pelo Governo do Estado que nesta área de conhecimento não foi contemplada. 159 FONAPER A formação continuada promovida na rede estadual de ensino e em suas respectivas Gerências Regionais de Educação - GRE, localizadas no Recife (Norte e Sul), aproxima-se do proposto pelas Ciências da Religião. O primeiro entendimento é a ação vinculada com as Ciências da Religião, a qual se dá pela formação das técnicas das GRE, que possuem cursos de Especialização e Mestrado em Ciências da Religião. O segundo é a interação promovida pela GRE com a sociedade civil, sendo convidados variados segmentos religiosos em vários momentos das formações de docentes, para conhecimento das suas cosmovisões11. Para Caron a formação adequada para o docente ―terá condições de análise e crescimento, assim como para inovar em seu fazer pedagógico‖ (CARON, 2008, p.67). Ao docente de Ensino Religioso, que se insere no espaço escolar com pluralidade religiosa, espera-se uma constante busca de conhecimento do fenômeno religioso contextualizado no espaço sociocultural e de formações permanentes que possibilitem o aprimoramento de sua interação pedagógica. Portanto, Junqueira (2002, p. 112) reforça que a formação do docente de ER não se deve: [...] limitar ao estudo acadêmico dos conteúdos específicos. Após esta apropriação do ‗discurso religioso‘, é preciso fazer a ‗tradução pedagógica‘ da linguagem religiosa, adaptando-a ao nível do desenvolvimento dos alunos, em seus aspectos psicogenéticos e socioculturais. Considerações Finais O contexto histórico do docente do ER nos remente ao longo percurso de desafios entre elas à formação para o exercício do cargo e na dinâmica pedagógica para promover o respeito e a valorização das diversidades cultural e religiosa presentes no espaço social. O Ensino Religioso apresenta diversos vértices e elementos de enorme perspectiva de interação social, como também a sua função social mediante a totalidade de inserir estudos no campo do sagrado. 11 Esses momentos foram registrados em vídeos e fotografias realizadas pelas duas técnicas das GRE e apresentados durante a entrevista. Nas entrevistas semiestruturadas com as docentes foi levantado esse último ponto, que as formações promoveram a oportunidade de conhecer outros saberes e a minimização do preconceito dessas religiões. 160 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso A Secretaria de Educação de Pernambuco publicou em 2012 os Parâmetros Curriculares do Estado, com cadernos12 específicos para cada componente curricular (alguns em processo de construção e outros já publicados). O caderno de Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso, em Pernambuco, não foi elaborado e acreditamos que não deverá ser pelo menos em curto prazo. Referências BRASIL. Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/1996. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf> Acesso em: 27. abr 2012. BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9(nove) anos Disponível em: <portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/noveanorienger.pdf> Acesso em: 23 jun. 2013. CARON, Lurdes (Org.). O ensino religioso na nova LDB. 2. ed. Petrópolis: Vozes,1999. JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. O Processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil. Petrópolis: Vozes, 2002. _____ ; WAGNER, Raul (org.). O Ensino Religioso no Brasil. Porto Alegre: Champagnat, 2007. OLIVEIRA, Lilian Blanck; RISKE-KOCH, Simone; WICKERT, Tarcísio Alfonso (orgs.). Formação de docentes e Ensino Religioso no Brasil: tempos, espaços, lugares. Blumenau: Edifurb, 2008. PERNAMBUCO. Conselho Estadual de Educação. Resolução nº 05, de 09 de maio de 2006. SENA, Luiza (Org.). Ensino Religioso e a formação docente: Ciências da Religião em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2007. 12 A elaboração desses cadernos teve a participação de professores da rede estadual e de universidades públicas. As diretrizes e princípios educacionais estão presentes nesses parâmetros bem como a organização curricular. 161 FONAPER SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e Contrato Administrativo. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. 162 ENSINO RELIGIOSO ESCOLAR NO CONTEXTO DA DIVERSIDADE RELIGIOSA: UMA EXPERIÊNCIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES Iolanda Rodrigues da Costa (UEPA)1 Maria de Lourdes Santos Melo (UEPA)2 Rosilene Pacheco Quaresma (UEPA)3 Resumo: O artigo aborda a experiência desenvolvida no processo de formação de professores no Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará, objetivando socializar práticas significativas realizadas junto aos alunos do PARFOR (Plano Nacional de Formação de Professores). O texto apresenta reflexões acerca dos paradigmas educacionais contemporâneos, onde a questão do multiculturalismo emerge como um desafio para o currículo escolar e para a formação de professores. Discute ainda a questão do Ensino Religioso como área de conhecimentos no currículo da Educação Básica e seus desafios para a formação de professores para essa disciplina. Em seguida, relata a experiência que vem sendo desenvolvida na disciplina Prática de Ensino, do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade Estadual do Pará, onde os alunos são levados a elaborar propostas de conteúdos programáticos para o Ensino Fundamental, tendo em vista a diversidade cultural religiosa da sociedade e a importância do cultivo do diálogo inter-religioso e do respeito às diferenças de crenças, bem como, realizam palestras sobre a Identidade do Ensino Religioso na Escola, envolvendo os educadores e gestores escolares dos municípios do interior do Estado. Palavras-chave: Paradigmas educacionais; Multiculturalismo; Diversidade Religiosa; Ensino Religioso; Formação de Professores. 1 2 3 Pedagoga, Mestre em Educação (UNIMEP/SP), professora do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará- UEPA, Membro da Equipe Técnica de Pesquisa da Secretaria Municipal de Educação de Belém/PA. E-mail: [email protected] Pedagoga, Doutora em Educação (UFRJ/RJ), coordenadora do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará-UEPA, Membro do grupo de pesquisa internacional sobre avaliaçãoBrasil/Portugal. E-mail: [email protected] Pedagoga, Especialista em Educação, professora do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará-UEPA. Sub-Coordenadora de Extensão da COAD/CCSE/UEPA. E-mail: [email protected] FONAPER Introdução A sociedade contemporânea vivencia um processo de mudanças paradigmáticas em todos os campos: sociopolítico, cultural, econômico, epistemológico, científico, tecnológico, enfim, em todos os setores. Tais mudanças se intensificaram a partir da década de 90, com os avanços científicos e tecnológicos que marcaram esse período, expandindo as telecomunicações e os sistemas de informação, favorecendo o intercâmbio entre os povos do mundo inteiro, onde as distâncias físicas e espaciais não são mais empecilho para o contato humano e o aprendizado mútuo. Ao mesmo tempo em que a globalização rompe as fronteiras entre pessoas e países, traz consigo a intensificação do processo de exclusão social, acirrada pela competitividade internacional, como alerta Moreira (2001, p. 66): Há que se atentar para as desigualdades econômicas e se distribuir os frutos da globalização com mais justiça. Há também que se reconhecer a pluralidade cultural que cada vez mais se expressa no mundo de riscos globais em que vivemos, tanto nos setores beneficiados pela globalização como nos que ela tem ajudado a marginalizar. Nesse contexto, emergem inúmeros desafios para a educação, no sentido de repensar o currículo escolar e a formação de professores, de modo a responder às novas exigências da sociedade. Um desses desafios se refere à educação multicultural, uma vez que esta é a marca fundamental das sociedades contemporâneas, cujas diferenças se expressam em várias dimensões da vida social: gênero, etnia, orientação sexual, cultura e religião. Nesse sentido, o multiculturalismo representa uma condição inescapável do mundo ocidental, à qual se pode responder de diferentes formas, mas não se pode ignorar. (MOREIRA, 2011, p. 66). A educação multicultural representa uma resposta dada pela escola às diferenças existentes na sociedade, enquanto um desafio que envolve a garantia dos direitos humanos, uma vez que as pessoas têm direito a ser iguais sempre que a diferença as tornar inferiores; contudo, têm também direito a ser diferentes sempre que a igualdade colocar em risco suas identidades. (SANTOS, 1997, apud MOREIRA, 2001, p. 67). Dentre as diferenças a serem trabalhadas pela educação multicultural, situamos a diversidade religiosa. Sendo o ser humano 164 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso possuidor de uma religiosidade intrínseca, este sente necessidade de transcender à realidade imanente, em direção ao transcendente, em busca de respostas para o sentido da vida. A religiosidade se expressa de diversas formas em diferentes culturas humanas, por meio de símbolos, gestos, ritos, mitos, festividades, textos sagrados, monumentos, edificações, ethos, religiões e outras formas de expressão. A esse respeito, Oliveira et al. (2007, p. 65) assim se reporta: Quando o ser humano se pôs a perguntar sobre a origem da vida, seu sentido e finalidade, ativou um movimento extremamente dinâmico, responsável por seu afastamento dos limites biológicos e pelo início do processo de humanização, entendido como a busca de algo mais, que extrapole as necessidades básicas de sobrevivência. Por se constituírem em saberes e práticas sociais, as expressões religiosas fazem parte da cultura humana em sua diversidade, sendo, portanto conhecimentos a serem incorporados pelo currículo escolar, no contexto de uma educação multicultural. Ao perceber a religião como uma forma de expressão do fenômeno religioso que ocorre em uma cultura ou culturas, compreende-se também o ambiente social como um agente que contribui e interfere na avaliação do mundo e das pessoas na dimensão da expressão religiosa. Essa diversidade se faz reconhecer pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, por meio da criação e instalação do Comitê Nacional de Diversidade Religiosa, em cooperação com a Secretaria de Direitos Humanos no dia 30 de novembro de 2011, tendo como um de seus objetivos a elaboração de políticas de afirmação do direito à diversidade religiosa e a implementação das ações programáticas previstas no PNDH-3. Mais do que nunca se ampliam os horizontes da Educação Básica, no sentido de promover uma ampla revisão tanto no currículo quanto nas práticas pedagógicas dos professores, de forma a incorporar a diversidade religiosa como área de conhecimentos, como forma de desenvolver uma formação cidadã, onde os alunos possam aprender a conviver com as diferenças de credo de forma respeitosa e dialógica. Nesse sentido, os novos paradigmas da disciplina Ensino Religioso Escolar, apontam para o respeito à diversidade cultural religiosa, quando a lei nº 9.475/97 (Art. 33) estabelece: 165 FONAPER O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de Educação Básica assegurada o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Como se pode observar, a referida lei integra essa disciplina no conjunto da formação básica do cidadão e garante o tratamento igualitário de sua oferta no horário escolar, bem como, a liberta das amarras do proselitismo, afirmando a sua identidade como área de conhecimentos, tal como as demais disciplinas que compõem o currículo da educação básica. Nesta nova abordagem, o Ensino Religioso assume como objeto de estudos o fenômeno religioso em suas diversas formas de expressão entre os diferentes povos do planeta, de acordo com a sua história e cultura. Esta abordagem representa um avanço significativo em relação ao caráter e à abordagem dessa disciplina no currículo escolar, uma vez que rompe com o modelo tradicional pautado numa perspectiva catequética, que se confunde com o papel da igreja. É nessa perspectiva que a formação de professores para o Ensino Religioso Escolar se coloca enquanto um importante desafio para os formadores no âmbito do Ensino Superior, uma vez que exige o estabelecimento de um referencial teórico-metodológico fundamentado numa práxis inovadora, aberta à pluralidade de concepções de mundo e de crenças, apoiada no espírito crítico e investigativo, bem como no senso de alteridade e respeito às diferenças. Até a década de 90 a formação de professores nessa área estava restrita às denominações religiosas cristãs, algumas poucas experiências eram realizadas em parceria com as Secretarias de Educação. No caso do Estado do Pará, houve uma experiência na década de 80 de parceria, por meio de um convênio entre a Arquidiocese de Belém e a Universidade Federal do Pará, quando foi ofertado um curso Livre de Educação Religiosa, voltado para a formação de professores de Ensino Religioso Escolar. O referido curso apresentava um desenho curricular amplo, contemplando matérias pedagógicas, teológicas, sociológica, filosóficas, psicológicas e científicas, totalizando 2.700 horas. A abordagem curricular estava centrada numa proposta de formação ecumênica para o Ensino Religioso Escolar. Este curso foi extinto ainda na década de 80. Segundo Oliveira (2007, p. 121-122): 166 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso É preciso mencionar que esse tipo de formação, apesar de envolver empenho e qualidade, não graduava os professores, diferentemente do que ocorria com os profissionais da educação de outras disciplinas, o que gerava impasses e dificuldades em sua vida funcional. [...] Os professores das outras disciplinas tinham as graduações reconhecidas pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), fator que lhes dava direito de prestar concurso público e, consequentemente, seguir plano de carreira funcional. Os professores de ensino religioso, embora muitas vezes formados por cursos de caráter teológico, não eram reconhecidos pelo MEC. Por imperativos da legislação, eram-lhes negados os acessos funcionais na área do magistério, sendo permitida a contratação de seus serviços apenas em caráter temporário. O cenário apresentado exige o desenvolvimento de iniciativas no sentido de atender às demandas para a formação inicial de professores nessa área de conhecimentos. Conforme determina a Lei 9.475/97, os sistemas de ensino devem regulamentar os procedimentos para a definição dos conteúdos do Ensino religioso e as normas para a habilitação e admissão de professores, atendendo à prerrogativa da LDB (Lei nº 9.394/96), que exige habilitação específica do professor em nível de Licenciatura na área que leciona. Dessa forma, em 1999 a Universidade do Estado do Pará cria o Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, tendo como referência o curso da Arquidiocese, porém ofertado em nível de Licenciatura Plena e com um desenho curricular mais abrangente, focado em 4 eixos básicos: Dialogo Inter-religioso, Diálogo Inter saberes, Produção de Conhecimentos e Práxis Pedagógica, totalizando 3.200 horas. De acordo com o Projeto Político-Pedagógico do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião (UEPA, 2003, p. 25), as diretrizes filosóficas que permeiam a formação docente no Curso consideram: a) a compreensão do ser humano como reflexivo, crítico, dialógico, investigador, problematizador, aberto ao transcendente e sujeito do conhecimento e da história; b) a compreensão da práxis educativa como formadora integral do ser humano, uma produção cultural humana, ética e política; c) a compreensão do fenômeno religioso como processo de formação existencial do ser humano. O curso assume uma perspectiva multiculturalista e científica das religiões, tomando o fenômeno religioso que se expressa nas diversas culturas e tradições religiosas como objeto de estudos. É o primeiro curso 167 FONAPER de graduação, em universidade pública, no Brasil voltado especialmente para a formação de professores para a disciplina Ensino Religioso Escolar, dentro de uma concepção pluralista das religiões, de modo a fomentar o diálogo inter-religioso e o respeito à diversidade religiosa na Educação Básica. Pode-se dizer que a proposta curricular do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião da UEPA articula-se com os critérios definidos pelo Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso - FONAPER (2000) para a avaliação da formação do professor de Ensino Religioso, quais sejam: a) Honestidade científica do profissional, que exige a constante busca do conhecimento religioso, o entendimento da complexidade do conhecimento do fenômeno religioso, a capacidade de viver a reverência à alteridade; o reconhecimento da família e da comunidade religiosa como espaços privilegiados para a vivência religiosa e para a opção de fé; o propósito de estar a serviço da liberdade do estudante; o aperfeiçoamento nas cinco áreas temáticas do estudo do fenômeno religioso (fundamentos epistemológicos do Ensino Religioso, Culturas e Tradições Religiosas, Textos Sagrados, Teologias e Ethos). b) Competência profissional, que exige do professor: a compreensão do fenômeno Religioso, contextualizando- espacial e temporalmente; a configuração do fenômeno religioso por meio das ciências da tradição religiosa (religião); o conhecimento da sistematização do fenômeno religioso pelas tradições religiosas e suas teologias; a análise do papel das tradições religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações socioculturais; a exegese dos textos sagrados orais e escritos das diferentes matrizes religiosas (africanas, indígenas, ocidental e oriental); a compreensão do sentido da atitude moral como consequência do fenômeno religioso sistematizado pelas tradições religiosas e como expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária das pessoas. Pelo exposto, percebe-se que são muitos os desafios para a formação de professores de Ensino Religioso, o que requer o empenho e o compromisso da Universidade e dos docentes do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, no sentido de aproximar-se cada vez mais desse ideário formativo proposto pelo FONAPER, bem como, pelas orientações emanadas do Conselho Nacional de Educação- CNE, no que se refere ao parecer sobre a formação de professores para o Ensino Religioso nas Escolas Públicas de Ensino Fundamental (1999). Nesse sentido, há que se louvar o esforço empreendido por algumas universidades, por educadores, pelo FONAPER e por alguns grupos religiosos e entidades não governamentais, comprometidos com uma 168 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso educação democrática e de qualidade, que têm lutado pela efetivação das condições necessárias para a garantia da qualidade do ensino em todos os níveis, e no caso do Ensino Religioso escolar, que este seja oferecido de forma laica, respeitando a diversidade cultural religiosa e que conte com professores devidamente capacitados para oferecer um ensino isento de proselitismo. O Estágio Supervisionado na Formação de Professores para o Ensino Religioso O estágio supervisionado, como componente curricular, constitui-se disciplina fundamental na formação de professores, na medida em que se efetiva espaço de reflexão-ação, como possibilidade de campo de pesquisa onde emerge questões norteadoras que possibilitam a construção da práxis. Nesse sentido, a prática docente exige do profissional uma concepção educacional que determine a compreensão dos papéis de professor e estudante, da metodologia, da função social da escola e dos conteúdos a serem trabalhados. A discussão dessas questões é importante, para que se explicitem os pressupostos pedagógicos subjacentes à atividade de ensino, na busca de coerência entre o que se pensa estar fazendo e o que realmente se faz (OLIVEIRA et al., 2007). Como professoras da disciplina Prática de Ensino (Estágio Supervisionado) no Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, temos clareza de que o estágio deve proporcionar aos futuros profissionais experiências significativas, onde possam materializar os conhecimentos adquiridos ao longo do curso, bem como, produzir novos conhecimentos a partir do enfrentamento da realidade educacional. Nesse contexto, nossas preocupações voltaram-se para a compreensão dessa realidade, bem como, para a elaboração de propostas curriculares que pudessem contribuir para o avanço das práticas educativas no âmbito do Ensino Religioso escolar, tanto na rede pública quanto da rede privada de ensino. Desta forma, queremos compartilhar com o leitor a experiência que vem sendo desenvolvida com discentes do Estágio Supervisionado no Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, especificando aqui atividades junto aos acadêmicos do PARFOR – Plano Nacional de 169 FONAPER Formação de Professores da Educação Básica, experiência que reúne o tripé de sustentação das Universidades, ou seja, Ensino, Pesquisa e Extensão. Este estágio supervisionado compreende uma carga horária de 400 horas, sendo 200 horas no 3º ano do curso e200 horas no 4º ano do curso, sendo dividido didaticamente em 3 etapas, a saber: Observação, Participação e Regência. Etapa de Observação: Essa etapa caracteriza-se como um momento fundamental de investigação acerca da realidade escolar. Nela, o estagiário tem a oportunidade de compreender os desafios postos para a área, a partir de um olhar crítico e ao mesmo tempo solidário em relação ao contexto de trabalho docente, observando as condições de ensino, as práticas pedagógicas, a cultura organizacional da escola, as percepções/importância da disciplina, enfim, uma série de aspectos que envolvem a realidade educacional/escolar do professor. Nessa etapa é realizada uma observação participante, eles/elas atuam como monitores, auxiliando professores em suas tarefas em sala de aula. Foi com base nas observações realizadas, que os estudantes descobriram que a maioria dos professores que ministram a disciplina Ensino Religioso não possuem habilitação específica na área, como exige a LDB (Lei 9394/96), sendo oriundos da área da Pedagogia (majoritariamente), além de profissionais da Matemática, Letras, História, alguns possuem somente o Magistério de nível Médio, dentre outras formações estranhas à licenciatura, como podemos observar no gráfico 1. 170 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Fonte: Secretaria Estadual de Educação do Pará, Setor de Lotação, 2011. A falta de formação específica desses professores, considerando a observação dos acadêmicos, resulta em práticas pedagógicas ultrapassadas, dentro do modelo catequético, acreditando que esse modelo de Ensino Religioso é o que ainda corresponde aos propósitos da educação escolar. Em suas observações, os estagiários perceberam que muitos professores foram lotados sem critérios profissionais, obedecendo apenas à necessidade de complementação de carga horária ou preenchimento de horário na jornada escolar. Apesar de haverem profissionais já habilitados na área, formados pelo Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, a partir de 2009é que iniciou concursos públicos para a referida disciplina nas escolas públicas municipais e em quantidade insuficiente, o que exigiu uma ação do Ministério Público do Estado do Pará, para que o Estado regularizasse essa situação, efetuando concurso no ano de 2012. Outra realidade observada pelos estagiários foi a total desvalorização da disciplina e do profissional de Ensino Religioso no contexto escolar, sendo colocada sempre nos horários que ninguém quer. Isso sem falar nas 171 FONAPER ―piadinhas‖ às quais professores são submetidos, fruto da imagem equivocada e que os demais professores possuem em relação a essa disciplina na escola. Essas e outras questões são foco de reflexões em sala de aula, incentivo para criação de atividades e produção de artigos pelos acadêmicos durante a fase inicial do estágio. Por outro lado, nessa etapa os estagiários têm ainda oportunidade de conhecer experiências pedagógicas significativas no âmbito do Ensino Religioso Escolar, por meio da realização do Painel de Relatos de Experiências no Ensino Religioso escolar, promovido pela Coordenação de Estágio e Coordenação do Curso de Licenciatura em Ciências da Religião, evento em que participam professores com larga experiência de atuação na disciplina, docentes que possuem práticas pedagógicas inovadoras, levando-se em consideração a abordagem da diversidade cultural religiosa. O referido painel permite um intercâmbio entre as escolas de Educação Básica e a Universidade, viabilizando a relação teoria e prática na formação de professores. Outro aspecto importante nessa atividade é a possibilidade de obtermos um feedback dos egressos do curso, no sentido de avaliarmos o êxito da formação adquirida no curso. 2- Etapa de Participação: Essa etapa do Estágio Supervisionado caracteriza-se como um momento em que o estagiário tem a oportunidade de analisar o plano de ensino elaborado pelo professor de Ensino Religioso, bem como o livro didático utilizado em sala de aula, tendo como referência os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso Escolar, elaborado pelo FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso). Tais parâmetros situam-se no contexto da pluralidade cultural religiosa da sociedade, fomentando o respeito à diversidade e o diálogo inter-religioso. Com base nas observações e nas análises, os estudantes são desafiados a elaborar uma proposta de planejamento de ensino para as séries/ciclos finais do Ensino Fundamental, bem como, um projeto didático para as séries/ciclos iniciais, tendo em vista as observações feitas no planejamento docente e suas concepções acerca da identidade do Ensino Religioso na escola. 172 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Tal elaboração constitui-se num exercício crítico-reflexivo fundamental de produção de conhecimentos pedagógicos, buscando contribuir para o desenvolvimento do currículo escolar. Essa elaboração exige dos estagiários a sistematização dos conhecimentos específicos e pedagógicos adquiridos ao longo do curso. 3 - Etapa de Regência Esta etapa está dividida em dois momentos importantes. No primeiro momento os acadêmicos são orientados a realizar palestras nas Secretarias de Educação tanto da capital quanto do interior do Estado do Pará, voltadas para os educadores que atuam na Educação Básica, bem como, para a equipe gestora das escolas e das Secretarias de Educação, com o tema: ―A identidade do Ensino Religioso na Escola e a Formação de Professores‖. O objetivo desta atividade é discutir acerca dos novos paradigmas do Ensino Religioso Escolar, bem como, esclarecer acerca da legislação concernente à disciplina e os critérios de lotação docente. Os discentes são organizados em equipes e distribuídos pelos municípios para a realização das palestras, sendo acompanhados pelas professoras responsáveis pela disciplina. É uma atividade que tem contado com a parceria das Prefeituras Municipais, sendo elogiado, pela maioria dos professores participantes como a primeira formação continuada na área. Durante a programação os estagiários apresentam a proposta de planejamento para a disciplina, elaborada na etapa de participação, constituindo-se como uma contribuição ao trabalho dos professores na disciplina. Além dessa atividade, os estagiários ministram aulas, nas turmas de Ensino Religioso onde realizam o estágio, tendo em vista o respeito à diversidade cultural religiosa da sociedade, participam de seminários e atividades na UEPA e elaboram um relatório, ao final do período de estágio, contendo as reflexões e o registro de todas as etapas aqui mencionadas. Considerações Finais A experiência na formação de professores, no contexto da diversidade cultural religiosa da sociedade, tem representado um grande 173 FONAPER desafio para nós educadores, no sentido de empreendermos uma luta pela construção de um projeto de formação que articule o Ensino, a Pesquisa e a Extensão, ao mesmo tempo em que possibilita o intercâmbio entre a universidade e as escolas de educação básica, numa dinâmica de trocas significativas. O resultado deste trabalho tem sido bastante gratificante e produtivo, tanto para nós docentes da Universidade, como para os acadêmicos estagiários, bem como para os professores da rede municipal e, em consequência, para o trabalho desenvolvido com os estudantes do Ensino Fundamental, que têm a chance de ampliar o seu olhar sobre a diversidade religiosa e experimentar uma verdadeira formação para a cidadania. Há que se considerar nesse processo o que afirma Oliveira (2007, p. 128): Os professores e a disciplina de Ensino Religioso vivem na atualidade, numa constante encruzilhada entre o velho e o novo, o estabelecido e o desafiador. A sabedoria talvez resida em retirar tanto do velho quanto do novo o que permanece válido: princípios que, no encontro dos tempos, desnudos de suas roupagens contextuais e históricas, detêm o poder de denunciar, enunciar e desafiar outras perspectivas; ir ao encontro e promover vivências pedagógico-didáticas inovadoras; valorizar e respeitar o diferente e as diferenças. Acreditamos que experiências como esta são cada vez mais urgentes na formação de professores no âmbito do Ensino Superior, pela inovação curricular que proporciona tanto para os cursos de Licenciatura, mas principalmente, pelo retorno positivo que apresenta para o currículo da educação básica e formação continuada dos educadores. Referências BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Parecer sobre a formação de professores para o Ensino religioso nas Escolas Públicas de Ensino Fundamental. Brasília: CNE, 1999. _____. Lei nº 9394/96. Brasília/DF, 1996. ______.Lei nº 9.475/97. Brasília/DF, 1997. 174 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso FONAPER, Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. São Paulo/SP: Ave Maria, 1997. MOREIRA, AntonioFlávio. A recente produção científica sobre currículo e multiculturalismo no Brasil (1995-2000): avanços, desafios e tensões. Revista Brasileira de Educação- Set/Out/Nov/Dez 2001 Nº 18. OLIVEIRA, Lilian Blank de. etal. O Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo /SP: Cortez, 2007. (Coleção docência em Formação. Série Ensino Fundamental). SOUSA SANTOS, Boaventura, (1997). Toward a multicultural conception of human rights.ZeitschriftfürRechtssoziologie,nº 18, p.1-14. UEPA, UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ, Projeto Político Pedagógico do Curso de licenciatura em Ciências da Religião. Belém/Pa, 2003. 175 QUE PESQUISADORES/EDUCADORES DE ENSINO RELIGIOSO BUSCAMOS? UM DEBATE A PARTIR DA DISCIPLINA PESQUISA EM ENSINO RELIGIOSO – PARFOR BLUMENAU E RIO DO SUL/SC Josué de Souza1(PARFOR/FURB) Resumo: A presença do Ensino Religioso no currículo escolar é motivo de debate e controvérsia. Muito desta resistência é por conta da prática de proselitismo religioso. Prática legalmente superada pela Lei nº 9.475/97. Resta a discussão do perfil de pesquisadores/educadores da área. Com base em Weber e Bourdieu pretendemos debater particularidades do campo de pesquisa das Ciências da Religião, bem como o perfil dos pesquisadores/educadores. Weber defende que a produção científica deve buscar os significados atribuídos pelos atores sociais para a realidade, que por sua vez, é construída por múltiplas individualidades, possibilitando diversas leituras. Isso não quer dizer que a produção científica deva buscar subjetividade, pelo contrário, busca características singulares do objeto. Já Bourdieu defende que a característica do campo é a presença de pesquisadores pertencentes ao próprio campo social. Palavras-chaves: Formação docente; Ciências da Religião; Diversidade Cultural Religiosa; Brasil Introdução A história da disciplina de Ensino Religioso nas escolas de ensino fundamental está diretamente ligada ao processo de construção nacional, que tem como base a forte presença da fé católica através do processo de homogeneização cultural religiosa promovido por ela ao longo da história do Brasil. O Ensino Religioso, como forma de catequização, foi utilizado por muitos atores sociais como forma de domínio e construção de docilidades pelo colonizador europeu. Assim, a presença de uma disciplina, que tenha como objeto de estudo o saber religioso no currículo escolar é motivo de debates e controvérsias. Muito desta resistência, dá-se 1 Cientista Social e Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional – PPGDR da FURB. Docente no Curso de Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso da FURB – Programa PARFOR. Docente efetivo da disciplina de Sociologia na Rede Estadual de Educação de SC, atuando na Escola de Educação Básica Alexandre Guilherme Figueiredo no Município de Picarras/SC; Integra o Grupo de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento (GPEAD) do PPGDR – FURB. FONAPER por conta da prática do proselitismo religioso e pelo papel histórico, que historicamente esta disciplina serviu ao longo do tempo. Porém, a partir da Constituição Federal de 1988, em seu art. 210, a disciplina de Ensino Religioso passa a ser garantida em todo o território nacional. Isto se dá na forma facultativa e na Lei nº 9.475/97, que reconhece que o Ensino Religioso, enquanto disciplina do currículo escolar. Traz em seu art. 1º que: ―é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa, vedadas quaisquer formas de proselitismo‖. O novo ordenamento jurídico coloca novas luzes sobre a disciplina e segundo Riske-Koch (2007), a partir de agora, busca resolver questões como a promoção e a integração sociocultural. Dito de outra forma, se historicamente a disciplina buscava construir homogeneização cultural/religiosa, agora busca gerar alteridade e valorização de convivência dos educandos com o outro e com a diferença, proporcionando o diálogo das diferenças cultural, social e religiosa. Neste cenário o perfil do educador/pesquisador de Ensino Religioso deve ser problematizado, para assim, sua postura romper com históricas práticas de catequização e privilégios à apenas determinadas formas de expressão de religiosidades. Sobretudo, em um cenário sociorreligioso como o brasileiro marcado pela diversidade religiosa, étnica e cultural (MARKUS; OLIVEIRA, 2010). Neste sentido, pretendemos neste artigo problematizar do campo de pesquisa da ciência da religião, o perfil para um docente na disciplina em Ensino Religioso. Defendemos que a prática docente deve unir não só a transmissão de conhecimento, mas a prática docente com a base em um conhecimento construído na prática de cultura de pesquisa na educação. Como base de reflexão vamos utilizar os ensinamentos do sociólogo alemão Max Weber, especificamente em sua obra: ―Ciência e política: duas vocações‖ e do sociólogo Francês Pierre Bourdieu no texto: ―Sociólogos da crença e crença de sociólogo‖. Max Weber, a ciência e a docência Dos autores clássicos do pensamento social, Max Weber talvez seja o mais lembrado pelo tratamento do fenômeno religioso em sua obra. A 178 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso mais conhecida delas é ―A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo‖ (2005), onde busca mostrar a relação existente entre as ideias religiosas e as suas consequências sobre o processo de mudança social. Porém, ele inicia seus estudos sobre religião em um artigo anterior chamado ―Rejeições religiosas do mundo e suas direções‖ onde apresenta as tensões existentes entre as religiões e outras esferas sociais. No texto, o autor mostra como se deu o percurso histórico na construção das racionalidades religiosas, sejam elas de caráter místico, ascese ou mesmo as universalistas. Todas estas correntes surgiram segundo Weber, de pressupostos mágicos que a partir de atuação de um profeta ou salvador, se legitimaram a partir da construção de um carisma. Nas palavras do autor: Em geral, o profeta e salvador legitimaram-se através de um carisma mágico. Para eles, porém isso foi apenas um meio de garantir o reconhecimento e conseguir adeptos para a significação exemplar, a missão, da qualidade de salvador de suas personalidades (WEBER, 1997, p. 161). Assim, segundo Weber, o objetivo das religiões é garantir ao fiel um estado sagrado, livre do sofrimento terreno. Para isso prega a ele um comportamento que garante a salvação. O status de salvo é dado ao fiel de forma transitória através de rituais, orgias, ascetismo ou contemplação. Na busca da salvação o religioso age com regularidade, tendo agora sua conduta controlada pelos sucessores do profeta, ou seja, a hierarquia do grupo religioso (WEBER, 1997). Porém será na obra ―Ciência e valores: duas vocações‖, que o autor irá trabalhar a relação entre ciências sociais e valores do pesquisador, especificamente a relação existente entre conhecimento e valores. Debaterá sobre a distinção entre conhecer e valorar. Para compreendermos o autor alemão é preciso partir da premissa que a sociologia weberiana ―filia-se‖ na escola neokantiana, defendendo que o método das ciências sociais deveria ser ―singularizante‖. Portanto, é necessário compreender o significado cultural do objeto. Weber nasceu e viveu durante a sua formação intelectual no período em que as primeiras disputas e discussões sobre metodologia das ciências sociais estava sendo travado, o que torna os escritos de Max Weber importantes para a compreensão de como se dá o processo de construção do conhecimento científico nas Ciências Sociais (TRAGTENBER, 1980). 179 FONAPER I - A esfera da ciência Em ―Ciência e Política: Duas vocações‖, o sociólogo alemão aponta as características da comunidade científica. A primeira afirmativa de Weber é que o cientista só consegue sucesso na carreira quando se coloca pura e simplesmente a serviço de sua causa. Assim, ele se põe a desvelar o interior da esfera da ciência, comparando a organização da ciência nos Estados Unidos e na Alemanha. Mostra que as relações de poder no interior desta esfera, em nada se diferem das relações capitalistas existentes em outras áreas de atuação profissional. O autor alemão valoriza a intuição dos pesquisadores neófitos e afirma que a intuição deste pode ter um significado e resultado maior que de um especialista. Isto não significa afirmar que Weber despreze o método e a dedicação do pesquisador ao seu objeto de estudo, pelo contrário, o autor afirma que ―a inspiração não substitui o trabalho, mas este por seu turno não pode substituir nem forçar o nascimento de uma intuição‖ (WEBER, 2009, p. 34). Assim, o autor dês-romantiza o papel social do cientista mostrando que na ciência a intuição tem a mesma função que qualquer outro campo da vida sendo a sua importância, tanto quanto a intuição de um empreendedor ou de um artista. Porém, diferente deste último, em que a produção artística fixa-se em seu tempo, na ciência a produção é concebida para ser ultrapassada. O sentido do conhecimento científico não é outro do que fazer surgir novas indagações. Neste sentido a vocação científica pressupõe paixão, rigor, e, sobretudo, aceitação da precondição fundamental de que o conhecimento científico existe para ser superado. Weber aceita a ideia que a pesquisa científica sempre é parcial e provisória, pois opera uma seleção da realidade diretamente influenciada pelo momento histórico e cultural vivido pelo cientista. Assim, na sociologia weberiana não é possível conhecer toda a realidade e a ciência não possui a palavra final na compreensão da realidade. Segundo Mattedi (2006), esta afirmação não se dá apenas às ciências sociais, mas em toda modalidade de ciência empírica (MATTEDI, 2006 p. 54). Sobre os cientistas veteranos ou professores, Weber os compara aos artesões, pois estes são o seu próprio patrão, possuem a liberdade de produzirem sua própria agenda de pesquisa. São proprietários da sua biblioteca que é seu meio de trabalho. Reconhece, porém, que as transformações capitalistas se processavam na sociedade e então, que em 180 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso breve atingiriam também esta esfera social. Assim a atuação na ciência depende muito mais de dedicação do que vocação profissional. Weber chama a atenção que o sucesso na carreira passa também pela inspiração; Sempre que se objetiva atingir um resultado, não se pode impunemente fazer com que o trabalho seja executado por meios mecânicos – ainda que esse resultado seja, muitas vezes, de reduzida significação. No entanto, se não vier ao espírito uma ‗idéia‘ precisa que a oriente a formulação de hipótese, e se, no tempo em que nos entregamos a nossas conjecturas, não nos ocorra uma ―idéia‖ relativa ao alcance dos resultados parciais obtidos, não lograremos a alcançar nem mesmo aquele mínimo (WEBER, 2006 p. 33). Outra característica do pensamento Weberiano é a impossibilidade de apresentar uma visão da totalidade ou uma ―cosmovisão‖, sobretudo porque esta linha de pensamento, diferente de Comte, Durkheim e Marx, não é normativa, pois não possui uma visão finalista do desenvolvimento da sociedade. Dito de outra forma, a sociologia de Weber não serve de ―caminho para a felicidade‖, pois para ele, os valores supremos que dão sentido a vida humana não são construídos ou escolhidos de forma racional, mas movidos por convicções de superioridade (MATTEDI, 2006; LAZARTE, 1996). Rolando Lazarte, no livro ―Max Weber: ciência e valores‖, propõe que interpretamos o sociólogo alemão a partir de uma perspectiva humanista e que possibilite a interpretação da sociedade contemporânea. Sobretudo quando em um período que segundo ele, vivenciamos uma crise civilizacional e por consequência, uma crise na ciência que nasceu assentada na modernidade. O autor procura ―domesticar‖ o pensamento de Max Weber, afirmando que para o sociólogo alemão era impossível fundamentar qualquer norma moral, ou valor supremo. Qualquer caminho escolhido, mesmo que seja uma escolha racional, não nos inocentaríamos como seres de cultura. O importante aqui é observar que toda ação humana é realizada de forma ―racional‖, ou seja, com algum sentido, mesmo que para o observador isso não fique aparente. Um exemplo disto é o principal tema de estudo de Weber, a Religião. O mecanismo que a religião puritana opera na economia, é na verdade, instrumentalizar o trabalho a fim de conhecer a vontade positiva de Deus. 181 FONAPER No texto ―Religião e Racionalidade Econômica‖ o autor aponta como funciona o mecanismo operado pela fé calvinista: Os homens eram por natureza todos igualmente pecaminosos, mas as chances religiosas eram desiguais no mais alto grau, não só temporariamente mas de modo definitivo [...] Mas sempre reinava nessas diferenças a providencia e a graça injustificada e imerecida, ―livre‖ de um Deus supramundano. Por isso a crença na predestinação, ainda que não a única, era de longe a formulação dogmática, mas consequente dessa religiosidade de virtuosos [...] tudo se orientava, portanto, para a livre graça de Deus e para o destino do além, e a vida terrena era apenas um vale de lagrimas ou então somente uma passagem. Por isso mesmo uma ênfase extraordinária era posta sobre o esse diminuto lapso de tempo. Não porque fosse possível conquistar a salvação eterna pelo puro desempenho próprio. Isso era impossível. Mas porque a própria vocação para a salvação só era concedida ao individuo e, sobretudo, só podia ser conhecida através da consciência de uma ralação nuclear unitária dessa sua curta vida com Deus ultramundano e sua vontade: na ―santificação‖. Esta, por sua vez como em toda a ascese ativa, apenas podia ser comprovada na atividade cara a Deus, portanto numa ação ética sobre a qual repousava a benção divina, dando assim ao indivíduo a certeza da salvação na segurança de que era instrumento de Deus. Com isso ficava reservado o prêmio íntimo mais forte de que pudesse conceber para uma vida moral metodicamente racional. [...] O empenho ―na obra daquele que me mandou enquanto é dia‖ tornava-se aqui um dever, e essa tarefa não eram de natureza ritual mas ético-racional (WEBER 1999, p. 155). Mesmo aceitando a impossibilidade de que o conhecimento científico é portador do conhecimento da totalidade dos fatos, Weber defende que na prática da docência, assim como na pesquisa, a objetividade e neutralidade devem ser buscadas. Assim, a função do professor reduz-se a de apresentar os dados científicos a seus estudantes. O autor reprova que o professor busque reproduzir nos estudantes suas próprias concepções ideológicas ou políticas, afirmando que ao fazer isto, o professor perde a compreensão real dos fatos. O papel do professor é mostrar fatos científicos, que produzam desconforto nas opiniões dos estudantes, encorajando-os a reflexão. Nas palavras do autor: A tarefa primeira de um competente professor é a de levar seus discípulos a reconhecerem que há fatos que geram desconforto, assim entendidos aqueles que desagradam a opinião pessoal de um indivíduo. Positivamente existem fatos extremamente desagradáveis para cada opinião, inclusive a minha (WEBER, 2009 p. 48). 182 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Weber afirma que o professor que possui o desejo de participar de lutas políticas e de concepções de mundo, nas palavras do autor, ―conselheiro da juventude‖, deve fazer fora de sala de aula, em lugar público através da imprensa, em reuniões ou associações. Por sua vez, a visão de mundo produzida pela ciência, sobretudo na sociologia, é de desencantamento e de desconstrução de qualquer tipo de ―significação‖. Neste sentido, Weber não crê que o conhecimento científico em algum momento pode ser ferramenta de construção de verdades ou de produção de felicidades. Neste ponto, afirma que, na tentativa de diferenciar o discurso científico do religioso, apontando que as respostas produzidas pela ciência dizem respeito apenas a questionamentos feitos por quem o faz, mediante a sua própria especialização. Assim, o sociólogo alemão prega que a função do professor é o de ensinar um método de pensamento que possa servir de instrumento para a compreensão da realidade, capacitando o estudante de compreender diante de um problema ou valor qual prática ou opção possível e as consequências de suas ações. Nas palavras do autor: O professor pode mostrar apenas a necessidade da escolha, mas não pode ir além, caso se limite a seu papel de professor e não queira transformar-se em demagogo... os cientistas podem e – devem – mostrar que tal ou qual posição adotada deriva, logicamente e com toda certeza, quanto ao ―significado‖ de tal ou qual visão última e básica do mundo. Uma tomada de posição pode derivar de uma visão única do mundo ou de varias (WEBER, 2009, p. 52). Assim, para Weber, o papel da ciência é o de mostrar que dependendo da posição que adotar, a pessoa estará a serviço de um deus e ofendendo o outro. Ou seja, a tarefa do pesquisador é compreender o porquê das ações humanas, seu desenvolvimento e suas consequências. Neste sentido, o texto científico não é e nem deve pretender ser uma cópia do real, mas é a reprodução da realidade que deve ser entendida como parcial, e provisória que irá sucumbir diante de um conhecimento novo. 183 FONAPER Bourdieu, o sociólogo da crença e os campos Em uma conferência apresentada no congresso da associação francesa de sociologia da religião em 19822, o sociólogo francês apresentou algumas observações sobre o campo da sociologia da crença, que julgamos ser importante para utilizarmos na análise e debate do tema em tela. O autor francês inicia seu texto perguntando se a sociologia da religião tal como é praticada hoje é de fato científica. A pergunta se dá pelo fato de que segundo Bourdieu, boa parte dos pesquisadores faz parte do mesmo campo social que pesquisam. Assim, para compreensão do tratamento ao fenômeno religioso, neste texto e na obra de Pierre Bourdieu, partimos da compreensão de um dos principais conceitos da sua obra que é o conceito de campo social. O campo social pode ser compreendido como um microcosmo no espaço social com regras específicas. Sua atuação dá-se como um ―sistema‖ ou um ―espaço‖ estruturado de posições entre os diferentes agentes que ocupam as diversas posições dentro dos microssomos. Estes agentes atuam em disputas (lutas) em torno da apropriação de um capital específico, do que por sua vez, é desigualmente distribuído dentro do campo. Esta disputa desigual faz coexistir no seu interior duas classes de indivíduos, os dominantes e os dominados. Será esta distribuição desigual do capital que irá determinar as estrutura do campo. As estratégias dos (agentes, instituições) são compreendidas a partir de suas posições no campo. Cada agente do campo é caracterizado por sua trajetória social, seu habitus3 e sua posição no campo. Um campo possui uma autonomia relativa: as lutas que nele ocorrem têm uma lógica interna, mas o seu resultado nas lutas (econômicas, sociais, políticas...) externa ao campo, pesa fortemente sobre a questão das relações de força internas. Por sua vez, este campo encontra-se em disputa com outros campos constitutivos da sociedade (OLIVEIRA, 2003). 2 3 Texto publicado no Brasil com o título ―Sociólogos da crença e crença de sociólogo‖ no livro: BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990. P. 108-113. Em Bourdieu, Habitus é o produtor de ações e produto do condicionamento histórico e social, configura um universo de classificações e possibilidades que o agente internalizou como aprisionamento prático e mental. Embora o autor recuse a aceitar que seja um determinismo social rígido, uma vez que aceita uma margem de manobra para a ação do indivíduo. (PINTO, 2000) 184 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso No que se refere ao fenômeno religioso, as disputas se concentram em um campo próprio, o campo religioso e foi analisado pelo sociólogo francês em um texto intitulado: ―A gênese e estrutura do campo religioso‖. Bourdieu (2005) propõe uma teoria do fenômeno religioso que engloba as contribuições das principais correntes da teoria sociológica e procura sistematizar a distribuição do poder, ou ocupação dos espaços dentro do campo religioso, que para ele, divide-se entre especialistas e leigos. No campo da sociologia da crença4 os pesquisadores se dividem em dois grupos: os que fazem parte do campo religioso, (religiosos, ou exreligiosos que praticam ciência) e os cientistas que não fazem parte do campo (chamados pelo autor de pesquisadores não autocnes). A diferença dos dois grupos, segundo o autor, não será pelo fato de o pesquisador ter fé ou não, mas pelo grau de comprometimento que este mantém com as estruturas do campo pesquisado. E nisto, segundo Bourdieu, reside à dificuldade de transposição, ou rompimento, de um campo para outro. O autor problematiza se este rompimento, não pode influenciar na produção da pesquisa: Ele se preocupa demais, e o leigo não se deixa enganar: a raiva, a indignação e a revolta são sinais de interesse. Por sua própria luta, ele testemunha que continua fazendo parte dela. Esse interesse negativo, critico, pode orientar toda a pesquisa e ser vivido como interesse científico puro, graças à confusão entre atitude científica e a atitude critica (de esquerda) afirmada no próprio campo religioso (BOURDIEU, 1990 p. 109). Porém o pesquisador, religioso, ou ex-religioso possui a vantagem de possuir um conhecimento prático sobre o campo, característica e vantagem que o pesquisador não-autocne possui dificuldade. Por outro lado, este saber de detalhes, pode confundir o pesquisador religioso sobre o que é o saber científico em relação à objetividade do seu conhecimento. Neste sentido, o corte etimológico, consiste no corte social, das vinculações com as estruturas do campo, que segundo ele, é uma ameaça aos especialistas das grandes religiões universais, pois, correm o risco de produzir uma ciência de edificação. Bourdieu chama a atenção para raridade de pesquisa na área da ciência e da religião que sejam produzidos cientistas que fazem parte de outra tradição religiosa, ou ate mesmo, estudos comparativo (BOURDIEU, 1990). 4 Termo utilizado pelo autor. 185 FONAPER Ensaiando uma (in)conclusão: desafio à prática do educador/pesquisador em ensino religioso A dificuldade de produção de pesquisas, que sejam produzidas por autores de formação pessoal em outras tradições religiosas está diretamente ligada às dificuldades e desafios da formação do docente em Ensino Religioso. Segundo Markus e Oliveira (2010), o processo de formação docente é herdeiro não somente do processo de homogeneização cultural-religioso, como também, deve enfrentar o desafio de produzir um educador/pesquisador, que possua capacidade de compreensão, intervenção e construção de novas realidades. Neste sentido, cremos que a sociologia weberiana possibilita ao pesquisador o olhar para si, na tentativa de compreender e explicar os caminhos da construção do discurso científico. Porém, é da natureza desta corrente sociológica não pretender ser o discurso final ou a verdade sobre a matéria, mas apenas ser a compreensão possível a partir de uma determinada metodologia de uma determinada disciplina científica, a sociologia. Outra característica desta corrente é aceitar que a ciência é uma produção cultural, que por sua vez é fruto de um determinado tempo histórico, a modernidade e sendo assim, carrega no seu interior, valores, características culturais e ideológicas deste tempo histórico. Pelo seu caráter universal, a ciência e o cientista como seu operador, devem buscar despirem-se destes valores para ser aceito e possuir legitimidade. Porém a principal característica da contribuição de Weber para a formação de um educador/pesquisador de Ensino Religioso é conceber uma teoria que não seja finalista ou que seja detentora de uma cosmovisão, ou uma ―mensagem escatológica‖, apesar de não abrir mão de elementos históricos na análise sociológica. Características que em nosso juízo de valor, estão na gênese da disciplina de Ensino Religioso, que tem como um dos seus objetivos compreender que ―o ser humano é multifacetado, e possui capacidade de intervir, criar e recriar as suas relações e os saberes inerentes a elas‖ (FONAPER, 1997; MARKUS;OLIVEIRA). Da mesma forma que a construção de uma prática docente esteja comprometida com uma produção científica esta deve desafiar o educador/pesquisador a fazer de sua prática docente um constante exercício de pesquisa/docência. Assim, conforme Bourdieu, buscar 186 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso construir um campo de pesquisa, que rompa com práticas de catequização e proselitismo, esteja comprometido com práticas de e em alteridades na construção de um saber que não se reduza a uma ciência edificante, mas conforme o autor francês, rompa com o jogo duplo. Referências BRASIL, Constituição Federal. Brasília: 1988. BOURDIEU, Pierre. Sociólogos da crença e crença de sociólogo, in: Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990. p.108-113. ______. A gênese e estrutura do campo religioso. A economia das trocas simbólicas. Org. Sergio Micelli. Editora Perspectiva – São Paulo, 2005. ______ As estruturas sociais da economia. Lisboa: Instituto Piaget, 2001. CARVALHO, Jose Sergio F. de. A teoria da ciência em Weber e as pesquisas em educação. Cadernos de pesquisa. N. 90, p. 25 35, ago. 1994. MATTEDI, Marcos Antônio. Sociologia e conhecimento: introdução à abordagem sociológica do problema do conhecimento Chapecó: Argos, 2006. FONAPER. Parâmetros curriculares nacionais para o ensino religioso. São Paulo. Ave Maria, 1997. MARKUS, Cleide. OLIVEIRA, Lilian Blank de. Diversidade cultural religiosa no Brasil: entre desafios e perspectivas para uma formação docente. In: Culturas e diversidade religiosa na America Latina: pesquisas e perspectivas. Org: OLIVEIRA Lilian Blank de. 2° Ed. – Blumenau: Edifurb: São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010. SELL, Carlos Eduardo, Sociologia clássica: Durkheim, Weber e Marx -Itajaí : Ed. da UNIVALI ; 2001. - 214 p ______. História ou Sociologia? Max Weber o debate sobre ‗A ética protestante e o ‗espírito‘ do capitalismo‘. Revista Brasileira de História das Religiões, v.III, p.173-197, 2011. 187 FONAPER ______. Racionalidade e racionalização em Max Weber. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 2012, vol.27, n.79, pp. 153-172 LAZARTE, Rolando. Max Weber: ciência e valores. -São Paulo: Cortez, 1996. OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro. A teoria do trabalho religioso em Pierre Bourdieu. In: TEIXEIRA, Faustino (org.). Sociologia da religião: enfoques teóricos. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 177-197. PINTO, Louis. Pierre Bourdieu e a teoria do mundo social. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2000. WEBER, Max; COHN, Gabriel. Max Weber: sociologia. 7. ed. São Paulo: Atica, 1999. RISTE KOCK. Simone, Discurso e ensino religioso: Um olhar da diferença. Dissertação de Mestrado em Educação, Centro de Ciências da Educação, da Universidade Regional de Blumenau. 2007. WEBER, Max, Ciência e política: duas vocações São Paulo: Editora Martin Claret, 2006. 124 p. ______, Texto Selecionados; Tradução de Mauricio Tratenberg – 2 ed. – São Paulo: Abril Cultural, 1980. 268 p. ______. Rejeições religiosas do mundo e suas direções. Os Economistas. Org. Mauricio Tragtenberg. Editora Nova Cultural: São Paulo, 1997. ______. Teoria do los estádios y direcciones del rechazo religioso del mundo. Ensayos de sociologia de la religion. Madrid: Taurus, 1998, p.534535. ______. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. 3. ed. Brasília: UnB, 1994, vol.1. ______. A ética protestante e o espírito do capitalismo. Editora Martin Claret. 2005. 188 O ENSINO RELIGIOSO EM GOIÁS: O PROBLEMA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES Raimundo Márcio Mota de Castro – UEG1 José Maria Baldino – PUC/Goiás2 Resumo: Com a promulgação da Lei nº. 9.475/97 que modificou o art. 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a formação (habilitação) para o professor de Ensino Religioso tornou-se responsabilidade dos sistemas de ensino. O objetivo deste trabalho é analisar os desdobramentos da ausência de políticas de formação de professores em Goiás. O aporte teórico-metodológico sustenta-se em Castro (2009); Cury (1993); Dallabrida (2005); Souza (2006) entre outros. Por meio da pesquisa narrativa, professoras/es de escolas públicas relatam a ausência de sua formação e os dedobramentos em suas práticas educativas. Percebe-se a prática do proselitismo religioso na escola pública o que fere o principio básico da laicidade do estado e tem possibilitado certa aversão a esse componente curriicular, inclusive por parte dos alunos. Palavras-chave: Ensino religioso; Narrativas; Formação de professores. Introdução Com a redemocratização do Brasil na década de 1980, inicia-se amplo debate em torno das questões educacionais. Quase 10 anos após a promulgação da Carta Constitucional de 1988, a educação era reformada em toda sua estrutura e organização, pela Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que definiu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. No que se refere à formação de professores, a nova lei determinava que o professor, para atuar na docência, mesmo da educação básica, deveria ter formação obtida em instituições de ensino superior. Apesar de Oliveira (2005, p. 247) atestar que, ―as discussões desenvolvidas assim como a emissão do dispositivo legal atingiram de modo substancial o processo de formação de docentes para todas as áreas do conhecimento na educação 1 2 Mestre em Educação. Doutorando em Educação. Professor efetivo da Universidade Estadual de Goiás. E-mail: [email protected] Doutor em Educação. Professor Titular de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail: [email protected] FONAPER brasileira‖, nada foi feito em relação à formação de professores para o ensino religioso. Não somente a formação dos professores para o ensino religioso, como também a forma de se pensar essa disciplina na escola (estrutura, conteúdo, organização etc.), demandou da sociedade civil a exigência da alteração do art. 33 da LDB, que passou a vigorar com nova redação por meio da Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Apesar de uma nova configuração legal, o novo dispositivo também não apresentou solução para inúmeras questões que permeiam essa disciplina e permanecem abertas, tornado-se ―foco de interesse, discussão e pesquisa em âmbito nacional; envolvendo lideranças de diferentes denominações religiosas, a comunidade acadêmica e os sistemas de ensino, todos diretamente atingidos pelo dispositivo legal‖ (OLIVEIRA, 2005, p. 247). O texto apresentado é parte dos resultados da pesquisa ―FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO: textos legais e contextos vividos‖, desenvolvido na Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Itaberaí, realizada no biênio 2011-2012, e tem por objetivo analisar a formação dos professores para o ensino religioso no Estado de Goiás a partir do dispositivo presente na LDB de 1996, tendo por referência o relato de professoras que atuam nessa disciplina em diversos municípios de Estado. Para o alcance do objetivo, privilegiou-se a pesquisa qualitativa que possibilitou uma maior aproximação e aprofundamento do tema em evidência. Por meio da pesquisa narrativa, coletou-se os relatos de professoras/es que atuam em escolas públicas em municípios da região noroeste do estado de Goiás (Itaberaí, Goiás, Itapuranga, Itauçu e Inhumas). A escolha dos sujeitos e locais da pesquisa deu-se por três motivações: a primeira por ser necessário compreender a complexidade vivida na docência dessa disciplina visto que não há uma formação específica para atuar na área; a segunda por se observar, em visitas feitas a priori, que há uma prática, na maioria das escolas públicas dessas cidades de uma oração (de cunho cristão) no início das atividades escolares, situação que fere o princípio da laicidade do estado; e por fim, por ser nessa região que se localiza a cidade de Itaberaí que sedia uma unidade universitária da Universidade Estadual de Goiás, possuindo como um de seus encargos a formação dos professores por meio do curso de pedagogia. 190 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Assim, busca-se entender a prática desses docentes situando-os no contexto da legislação educacional vigente, que preconiza o ensino religioso como parte integrante da formação do cidadão, apresentando-o como obrigatório na escola, mas de caráter facultativo ao aluno. Neste sentido, o texto apresenta-se dividido em duas partes: na primeira se traça todo o aspecto metodológico da pesquisa e em seguida, discute-se a temática partindo de uma breve trajetória da inclusão do ensino religioso na escola brasileira; depois, reflete-se sobre as ambiguidades legais presentes na legislação em vigor; e por fim, analisa a fala das/os professoras/es numa tentativa de desvelar os problemas causados no espaço da escola pública pela ausência de formação desses professores. A construção da pesquisa A pesquisa nasce da necessidade de se buscar uma resposta a uma indagação, mas a forma de atingir tal resposta, longe de possuir um padrão único, está de certa forma condicionada a ―crença‖ do pesquisador, ou melhor, ao entendimento teórico e metodológico apreendido no percurso da pesquisa. Pesquisar tem muito de desafio e aventura. É uma luta por saber e para demonstrar o que se sabe. É sempre uma decisão árdua desentranhar o conhecimento para, com a discrição e o equilíbrio devidos, pô-lo em circulação e torná-lo acessível aos demais. São esses, pelo menos esses, que devem ser, de um ponto de vista deontológico, a meta, o destino e a finalidade: contribuir com nosso esforço e nossa vontade perscrutadora par ampliar os limites do conhecimento racionalizado (PERUJO SERRANO, 2011, p. 13). Se durante muitos anos a pesquisa debruçou-se apenas sobre o modelo positivista, que primava pela exatidão e, em muitos casos, a dogmatização dos resultados, contempla-se nas últimas décadas inúmeros debates sobre a permanência de outros modelos como o método histórico dialético e o método fenomenológico. A utilização desses métodos produziu alterações substanciais, na forma de se pensar pesquisa em Ciências Sociais, haja vista a complexidade do homem enquanto Ser produtor de si e de história. Enquanto Ser, o homem busca estabelecer-se no mundo mediante a apreensão do mesmo. Essa apreensão vai acontecendo por meio das indagações que o ser humano faz de si e do mundo que o cerca. Nem 191 FONAPER sempre as indagações são respondidas no todo ou no tempo em que se destinou a buscar soluções para tal problemática. Assim também ocorre com a pesquisa. Inicialmente pensava-se que no prazo de um ano daríamos conta de responder a questão norteadora dessa pesquisa, mas logo percebemos que o primeiro ano seria apenas para efetuarmos o levantamento bibliográfico sobre a temática, assim a pesquisa prolongou-se por dois anos (2011-2012). Dada a complexidade de nosso objeto, optamos por realizar uma pesquisa de natureza qualitativa. De acordo com Lüdke; André (1986, p. 11-13), as características básicas de uma pesquisa qualitativa são: 1. A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural com sua fonte direta de dados e o pesquisador com seu principal instrumento. [...] 2. Os dados coletados são descritivos [...]. 3. A preocupação com o processo é muito maior do que com o produto [...]. 4. O significado que as pessoas dão as coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo pesquisador [...] 5. A análise dos dados tende a seguir um processo indutivo. Os pesquisadores não se preocupam em buscar evidências que comprovem hipóteses definidas antes do início dos estudos. As abstrações se formam ou se consolidam basicamente a partir da inspeção dos dados num processo de baixo para cima. Bicudo (2011, p. 17) amplia essa caracterização afirmando que a pesquisa qualitativa, como o nome já indica, trabalha com a qualidade. Tendo presente a necessidade de ouvir os relatos e deste modo dar voz aos professores/as, optou-se pela pesquisa narrativa, por entender que se trata de uma perspectiva que permite não somente a investigação, mas também a formação. Para esclarecer a dupla dimensão da pesquisa narrativa, Souza (2006, p. 26) infere que essa perspectiva de trabalho, [...] configura-se como investigação porque se vincula à produção de conhecimentos experienciais dos sujeitos adultos em formação. Por outro lado, é formação porque parte do princípio de que o sujeito toma consciência de si e de suas aprendizagens experienciais quando vive, simultaneamente, os papéis de ator e investigador da sua própria história. 192 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Para Catani et al (1997, p. 20), [...] o que se convencionou chamar de pesquisa narrativa, no campo educacional, enfatiza a variedade de práticas de investigação e formação assim agrupadas, como iniciativas que vêm se firmando no campo desde a década de 80, principalmente na Europa, e que deve muito às tentativas de recolocação do sujeito no centro das interpretações das ciências humanas. Pela pesquisa narrativa é possível compreender as experiências vividas, lembradas pelos/as narradores/as, tornado-se forma de comunicação e troca de experiências, haja vista que não se tem apenas uma informação repassada do narrador ao ouvinte, mas principalmente uma troca, onde narrador e ouvinte unem-se em uma simbiose de trocas mutuas. A escolha de narrativas como instrumento de coleta de dados deu-se ao fato de que entender que as mesmas constituem-se de acordo com Chizzotti (2003, p.17). ―testemunho oral das pessoas presentes em eventos, suas percepções e análises‖ e isso pode ―esclarecer muitos aspectos ignorados e indicar fatos inexplorados do problema‖. Ainda sobre as narrativas, Bosi (1994, p. 88) afirma que ―a narração é uma forma artesanal de comunicação. Ela não visa a transmitir o ‗em si‘ do acontecido, ela o tece até atingir uma forma boa. Investe sobre o objeto e o transforma‖. As narrativas foram produzidas de próprio punho por professores da rede municipal e estadual de ensino que ministram aulas de Ensino Religioso, depois digitalizadas e arquivadas em mídia eletrônica. Para a produção dos mesmas, os/as sujeitos receberam um roteiro com 4 (quatro) itens que deveriam se fazer presente em seus relatos. Tais narrativas ao serem escritas e digitalizadas, passaram a compor como fonte e documento da pesquisa. A participação dos sujeitos foi voluntária, e a utilização de suas falas foi possível graças à autorização dos mesmos sujeitos que, por meio de termo de consentimento livre e esclarecido, tomaram conhecimento dos objetivos da pesquisa e decidiram contribuir com a pesquisa. Delineado o percurso da pesquisa, apresenta-se a seguir, breve apontamentos sobre a trajetória do ensino religioso no Brasil. 193 FONAPER Ensino religioso no Brasil: apontamentos de uma trajetória Durante o período colonial, visto que a formação educacional no país fora majoritariamente feita pelos jesuítas e por outros religiosos, sempre vigorou na escola o ensino da religião. No entanto, as reformas de cunho iluminista empreendidas por Sebastião José de Carvalho e Melo – o Marquês de Pombal, influente ministro do rei de Portugal, Dom José I, que possibilitou a expulsão dos padres jesuítas do Brasil em 1759 e a posterior extinção da Companhia de Jesus em 1760, não conseguiu quebrar a ideia de permanência da religião cristã no ensino ministrado nas escolas. Durante o período imperial, a religião católica continuou sendo oficialmente a fé professada pelo imperador Dom Pedro I e pela maioria da corte, apesar do reconhecimento de que outras denominações religiosas já tivessem se instalado nas terras brasileiras. Fato evidente ao se ler o art. 5º, do Título I, da Constituição Política do Império do Brasil. O texto menciona: ―A Religião Catholica Apostólica Romana continuará a ser a religião do Império. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo‖ (BRASIL, 1824). Mas se por um lado há o reconhecimento de outras crenças, percebe-se fortemente a ―confirmação e a legitimidade do poder da Igreja Católica‖ (CASTRO, 2009, p. 39). Com a proclamação da república, em 15 de novembro de 1889, religião e estado deixam de ser sinônimos e se inicia um processo complexo e lento de separação entre o poder religioso e o poder temporal, ou seja, entre a igreja e o estado. A educação deixa de ser dever apenas da família e da Igreja, tornando-se uma das prerrogativas do estado. Comentando esse período Castro (2009, p. 44) afirma: Com a latente separação, a educação passa a ser de responsabilidade do Estado, assim, surge a tendência de eliminar o ensino da religião das escolas públicas, uma vez que este era gerador de grande polêmica. Em 22 de fevereiro de 1890, o governo provisório decidiu suprimir o ensino de religião dos estabelecimentos públicos do Distrito Federal, por proposta de Benjamim Constant, então ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, alegando que ser de responsabilidade do Estado incentivar qualquer sentimento religioso, bastando, para isso, no lar, a ação da mãe de família, e nos templos de cada religião a ação do sacerdote. Notamos que, mesmo com a decisão de suprimir o ensino de religião da escola pública, alguns professores fiéis aos princípios da fé e dos bons 194 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso costumes permaneceram com a prática das orações ao início das aulas e tomando ainda por base um ou outro texto da doutrina cristã para o ensino. A Igreja não tardou em reagir. Nesse período abriram-se inúmeras escolas católicas onde o ensino da religião era amplamente divulgado. [...] A entrada de ordens e congregações religiosas intensificou-se após a promulgação da Constituição de 1891, que contornou o anticlericalismo radical dos primeiros meses do regime republicano, permitindo maior liberdade à Igreja Católica. Os membros destas ordens e congregações que imigravam para o Brasil vinham imbuídos de forte ardor missionário e acreditavam que eram enviados com o dever de ensinar a verdadeira doutrina cristã, contribuindo para reconstruir o colonialismo cultural europeu. Algumas congregações imigraram com o intuito de atender espiritualmente colônias de imigrantes europeus, como os salesianos e lazaristas entre italianos; outras visavam à catequização dos indígenas e a maioria delas atuou na reconversão dos brasileiros à fé católica romanizada (DALLABRIDA, 2005, p. 79). No entanto, a primeira Constituição Republicana, de 1891, garantiu a liberdade de culto público e com isso possibilitou que outros credos gozassem dos mesmos privilégios que os católicos e logo essas novas denominações também abriram escolas confessionais, possibilitando uma abertura a novas tendências, a novas formas de pensar o ensino, diferentemente daquele ministrado unicamente pelos cristãos católicos. Segundo Cury (1993), a crise sócio-econômico-político ocorrida no final dos anos de 1920, possibilitou o retorno da Igreja ao cenário nacional. As reformas empreendidas a partir da década de 1930, entre as quais a ascensão de Vargas ao poder, a criação do Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública, sendo empossado no cargo Francisco Campos e a elaboração da Constituição de 1934, consolidou no campo educacional, o retorno da Igreja para dentro da escola. Aliada e apoiando o Governo Vargas, como guardiã da ordem e dos bons costumes, a Igreja consegue que o ensino de religião volte para a escola, agora, porém com um diferencial: a nomenclatura passa a denominar-se de ensino religioso, apesar da prática continuar proselitista e catequética. Analisando a conjuntura desse período, Cury (1993, p. 28), infere: E apesar da pressão dos deputados defensores da laicidade no ensino público, a redação final ficou assim: ―Art. 153 – O ensino religioso será de frequência facultativa e ministrado de acordo com os 195 FONAPER princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais‖. Daí em diante o ensino religioso perpassou todos os textos constitucionais, inclusive estando presente na Constituição Federal de 1988, e posteriormente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, sendo que esta lei sofreu, alguns meses depois, sua primeira alteração por meio da Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997, justamente no dispositivo referente ao ensino religioso. Ambiguidades na legislação A polêmica recorrente que envolve o ensino religioso na escola e ao pequeno interesse pela produção de uma reflexão sistematizada por parte da academia, tem tornado o espaço desse ensino um lugar de todos e de qualquer um, se apresentado até mesmo de forma irresponsável quanto à formação do cidadão. Quando os debates tem se instalado no meio acadêmico, aparecem duas categorias que ocupam posições antagônicas em extremos – os defensores e os contrários a esse ensino. Muitos debates não saem disso e longe de se ter uma solução impossibilitam uma reflexão amadurecida que proponha formação para os professores, modelo a ser seguido e base epistemológica dessa disciplina. A nova redação dada ao Art. 33 da LDB, pela Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997, em nada contribuiu para dirimir os conflitos presentes em torno dessa questão. Pelo contrário, tem permitido que a efetivação do que fora pensado não se concretize devido às ambiguidades presentes na própria redação legal. Basta uma leitura atenta de tal artigo para que as indagações pululem a mente e instiguem a busca de respostas. Uma primeira ambiguidade está no caput do artigo 33, da LDB, ao mencionar que: O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo (BRASIL, 1996). 196 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Como se pode observar, ao mesmo tempo em que esse ensino é entendido como ―parte integrante da formação básica do cidadão‖ o mesmo é de ―matrícula facultativa‖ cabendo ao aluno optar por participar do mesmo ou não. Cabe perguntarmos de que maneira um ensino reconhecidamente fundamental para a promoção da cidadania do sujeito pode ser facultativo? Outro problema advém em seguida, pois se esse ensino deve assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, sendo vedada qualquer forma de proselitismo, não se teria aqui um ensino de doutrinação de um determinado credo, mas sim, um espaço para que o aluno entendesse as diferenças que culturalmente são construídas e que constitui os diversos credos. Reconhecer o ensino religioso como facultativo é reconhecer a dimensão proselitista, catequética e doutrinal de um ensino que não é capaz de educar para as diferenças, mas reproduz modelos oriundos de práticas culturais religiosas majoritárias. Como se já não bastasse à polêmica ambiguidade na redação do caput do artigo, os parágrafos que o compõem prolongam tal situação. Vejamos a redação: § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso (BRASIL, 1996). Referente ao texto do parágrafo primeiro atribui-se aos sistemas de ensino (estadual e municipal) a responsabilidade de legislar sobre os conteúdos e as normas para habilitação e admissão dos professores para ministrarem tal ensino, devido à ausência de uma sistematização por parte desses sistemas; e tendo presente que na maioria dos casos há uma omissão na organização e definição do lugar dessa disciplina no currículo, verifica-se que este espaço torna-se apropriação de qualquer um, pois encontramos professores, inclusive de química, matemática e física ministrando tal aula, simplesmente para complementar carga horária de suas modulações. No que diz respeito ao parágrafo segundo, quando da elaboração dos parâmetros curriculares nacionais e tendo em vista que não havia um para o ensino religioso, o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER) – instituição civil desvinculada de credos religiosos e formada 197 FONAPER por diversos professores de ensino religioso; articulou-se no sentido de enviar ao Ministério da Educação e Cultura (MEC) um parâmetro curricular que contemplasse tal ensino. Tal documento fora rejeitado pela comissão responsável pela elaboração dos PCNs, pois segundo parecer da relatora, não cabia ao estado legislar sobre questões religiosas como amplamente propagado na Constituição Federal. Ao tratar o ensino religioso como ―coisa de religião‖ e não ―tema de responsabilidade do Estado‖ (laico, como é o Brasil) significa dizer que esse ensino serve para que as denominações utilizem do espaço público como adendo ou complemento de suas fronteiras catequéticas e doutrinais. Ainda no parágrafo segundo da lei, ao dizer que ―os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso‖ isso não significa dizer que será dessas denominações à palavra final sobre o tema. Para isso, se faz necessário que tenhamos no interior do estado, como seus representantes, pessoas preparadas e entendidas de que ensino religioso não é o mesmo que ensino de religião. Posto os diversos problemas apresentados por conta de uma lei ambígua e às vezes pela omissão das reflexões acadêmicas sobre o tema, tem-se o espaço do ensino religioso existe na escola, tomando as mais diversas conotações e tons que acinzentam o chão da escola, permitindo que, em vez de formar pessoas para o entendimento do fenômeno religioso esse ensino sirva para reproduzir modelos dogmáticos que reforçam o preconceito e a demonização da religião das minorias. Como o Estado até o presente momento não cumpriu o parágrafo segundo, inúmeros livros didáticos de ensino religioso circulam no mercado, servindo de subsídio, inclusive para o MEC, que os adquire e os coloca no ensino público. Tais livros, no entanto, muitas vezes de autoria de pessoas vinculadas a alguns seguimentos religiosos (na maioria cristã) têm reforçado as ideias de preconceito e intolerância como comprovado na pesquisa realizada, em 2010, pelo Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero da Universidade de Brasília, sob a responsabilidade das professoras Débora Diniz, Tatiana Lionço e Vanessa Carrião; e, publicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Toda essa problemática, longe de ser resolvida, tem seus reflexos ampliados no espaço escolar, como veremos a seguir. 198 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso A formação de professores de ensino religioso: relatos Como relatado anteriormente, as narrativas foram desmembradas em unidades de significado constituindo recortes que desvelam e descortinam uma realidade vivida, experienciada pelo narrador. Tal realidade precisa ser descortinada e trazida à tona. Neste trabalho, apresentaremos a unidade relativa à problemática da formação do professor de ensino religioso. Observando a preservação da identidade das respondentes, tendo em vista o princípio ético da pesquisa, utilizamos a identificação das letras do alfabeto de nossa língua, haja vista que o número de participantes é exatamente proporcional ao número de letras que o compõe. A primeira unidade de significado diz respeito à formação desses professores: Vejamos os relatos: Professora A: Como já disse minha formação é História, na área do ensino religioso eu não tenho nenhuma formação. Professora B: Sou licenciada em pedagogia pela Universidade Estadual de Goiás, pós-graduada em psicopedagogia clinica [...] Com relação ao ensino religioso eu nunca fiz nenhum curso na área, mas ministro a disciplina há quatro anos. Professora C: Fiz pedagogia. Antes de começar a dar aula de ensino religioso fiz um curso em Goiânia [...] um curso de missões mesmo, que tem tudo a ver com essa área. Professora X: Sou geógrafa e advogada, especialista em direito agrário [...] Na área de ensino religioso não fiz nenhum curso específico, estudei no curso de direito a disciplina teologia que estuda as questões pertinentes ao conhecimento da divindade, suas atribuições e relações com os homens e o mundo que os cerca, ela, porém, toma partido a favor de revindicações e verdade de determinada religião. Professora V: Sou formada em matemática. Eu já trabalho ensino religioso há bastante tempo [...] Como se pode notar no relato das narradoras, nenhuma possui uma formação específica para o ensino religioso, em todos os casos no seguimento da narrativa percebe-se que as mesmas são colocadas em 199 FONAPER sala de aula com o intuito de complementar carga horária de atividade docente. A exceção é a professor V que apesar de ter formação em matemática, hoje só leciona ensino religioso por ter tido um problema de saúde e ter solicitado que gostaria de trabalhar apenas essa disciplina. A ausência de uma formação específica influirá direto na prática desses/as docentes em sala de aula. Em seus relatos fica patente a utilização de um único seguimento religioso como referencial de tal ensino: o cristão. Tal prática tem produzido proselitismo cristão uma vez que todos/as participantes da pesquisa declaram-se cristãos católicos ou evangélicos e na unidade de significado referente ao como trabalha a disciplina em sala temos: Professora V: [...] às vezes os alunos não tem conhecimento do painosso, que tem família [...] tem família que não senta, não abre a bíblia, não discute uma palavra de Deus [...] o primeiro texto que trabalhei com eles esse ano foi ―a família, presente de Deus‖. Professora M: Mas eu gosto muito aprofundar dentro da palavra de Deus que é muito importante. Professor J: Eu sou pastor [...] trabalhar o ensino religioso é aproximar as crianças de Deus. Como se pode observar nas narrativas o ensino é proselitista uma vez que o conteúdo volta-se à única possibilidade de entendimento do sagrado (perspectiva cristã – ainda que entendamos o multifacetamento do cristianismo). Há como se pode notar a tomada do espaço público como prolongamento do espaço privado, e podemos atribuir tal situação a dois motivos que se desvelam no decorrer da pesquisa: o primeiro refere-se à ausência de formação que forme e habilite o professor a ministrar tal conteúdo, o segundo diz respeito ao entendimento reinante que ensino religioso é espaço de ensino de catequese doutrinal e das verdades relativas à fé. Considerações finais Os desafios postos para o entendimento do ensino religioso como disciplina presente na escola pública são inúmeros e complexos. A discussão sobre a laicidade do estado tem sentido à medida que não 200 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso houve, dada a omissão do poder público, a formulação que um modelo que rompesse com a catequese e a doutrina do credo que toma posse desse espaço, transformando o público numa extensão do privado. Nas pesquisas mencionadas nesse texto tem-se evidenciado que o espaço escolar tem sido usurpado pela confissão religiosa de professores despreparados para lecionarem a disciplina de ensino religioso, isso por ausência de uma política educacional que garanta o pleno cumprimento do que se encontra previsto no ordenamento jurídico constitucional e da Lei de Diretrizes e Bases. No entanto, não podemos culpabilizar os professores que tem se empenhado em atender e ministrar tal ensino, pois ao chegarem em sala, não levam consigo nenhum preparo como vimos nas narrativas analisadas. Fazem o que entendem ser o mais correto. E como são resultado de um processo educativo, também, confessional (ainda que no espaço público) replicam e reproduzem o que receberam; fato que fica evidente, quando a professora menciona na análise anterior diz que utiliza dos conhecimentos recebidos na disciplina de teologia, cursada na universidade, durante sua formação. Para longe de ser um espaço para a propagação da fé, nossos estudos tem-nos conduzido a pensar o ensino religioso como espaço de formação cidadã para a diversidade num país de cultura multifacetada como o nosso. Assim, entende-se que haja lugar para o ensino religioso na escola desde que por religioso entenda-se o fenômeno social e cultural de todas e de cada religião, que possui seus ritos próprios, suas crenças, seus costumes, sua cultura de re-ligação ao seu criador, ou que seja inclusive capaz de negar tal possibilidade como é o caso dos ateus. Temos entendido que a única possibilidade de aceitar o ensino religioso na escola seja na perspectiva entendida por Oliveira et al (2007) que ao falar dos objetivos desse componente infere que deve ser impresso nesse ensino o religioso não como religação do sujeito ao transcendente, mas como releitura do fenômeno religioso. Diante dessas inúmeras provocações, fica o alerta para que os programas e os diversos cursos de formação de professores possam levantar esse debate, também despido de preconceitos, e que busquem solicitar do poder público uma resolução sobre o tema no intuito de amenizar o dano que tem sido produzido na vida e na formação social e cidadã dos principais sujeitos da educação que são os alunos. 201 FONAPER Referências BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. BRASIL. Constituição Política do Império do Brazil. 28 de março de 1824. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7a o24.htm>. Acesso em 20 Out. 2012. CASTRO, Raimundo Márcio Mota de. Tocar em frente as ensinhanças da dúvida: a busca da identidade do Ensino Religioso 2009.134 f. Dissertação (Mestrado em Educação) -- Universidade de Uberaba, Uberaba, 2009. CATANI, D. B. et al. Docência, memória e gênero. São Paulo: Escrituras, 1997. CHIZOTTI, Antônio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 2003. CURY, Carlos Roberto Jamil. Ensino Religioso e a escola pública: o curso histórico de uma polêmica entre Igreja e Estado no Brasil. Educação em revista, Belo Horizonte, n. 17, p. 20-37, jun. 1993. DALLABRIDA, Norberto. Das escolas paroquiais às PUCs: república, recatolicização e escolarização. In: STEPHANOU, Maria, BASTOS, Maria Helena Câmara. Histórias e memórias da Educação no Brasil: século XX. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005. v. III. p. 77-86. OLIVEIRA, Lilian Blank. A formação de docentes para o ensino religioso no Brasil: leituras e tessitura. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 5, n.16, p. 247-267, set./dez. 2005. OLIVEIRA, Lilian Blank et al. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo: Cortez, 2007. SOUZA, E.C.de (Org.). Autobiografias, História de Vida e Formação: pesquisa e ensino. Salvador/Bahia: EDUNEB - EDIPUCRS, 2006. 202 A ABORDAGEM DA FINITUDE NO CURRÍCULO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO/PA: CONSIDERAÇÕES INICIAIS Rodrigo Oliveira dos Santos (UFPA)1 Resumo: Este estudo pretende destacar, por meio da pesquisa qualitativa e do paradigma hermenêutico-fenomenológico, algumas considerações acerca da abordagem da finitude no currículo de formação de professores para o Ensino Religioso no Pará, haja vista que, para esse componente curricular, a temática em torno desta se apresenta como central, a ponto de nortear toda a sua prática educativa na Educação Básica, conforme orienta os PCNER. A partir do diálogo metodológico com o currículo do curso de formação desses professores, percebe-se certo distanciamento e articulação entre a área tomada para essa formação, no caso, as Ciências da Religião, assim como a sua prática, o Ensino Religioso, implicando, de certa forma, na formação desses professores. Palavras-chave: Finitude. Currículo. Hermenêutica. Formação de Professores. Ensino Religioso. Introdução Desde a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 9.394/1996, busca-se desenvolver uma política para Formação de Professores de Ensino Religioso (ER) no Brasil nos mesmos moldes das demais formações para as áreas do conhecimento que compõem o currículo da Educação Básica (EB). O cerne da questão é política e aponta para a responsabilidade do Ministério da Educação (MEC) que até hoje não emitiu Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação desses professores, muito menos Parâmetros Curriculares Nacionais para a disciplina, deixando a critério dos Sistemas de Ensino Básico (SEB) e Instituições de Ensino Superior (IES) tal responsabilidade. Os Conselhos de Educação Municipais, Estaduais e Federais que autorizam/reconhecem essa formação no país apontam para as Ciências 1 Mestrando em Educação (PPGED/UFPA) na Linha de Pesquisa Educação: Currículo, Epistemologia e História. Bolsista da CAPES. Líder do Grupo de Pesquisa em Educação e Religião na Amazônia (GPERA). Bolsista da CAPES. Membro do grupo de pesquisa em Filosofia, Ética e Educação (GPFEE/UFPA) e Hermenêutica, Antropologia e Educação (GPHAE/UFPA). Professor de Ensino Religioso da rede estadual do Pará e municipal de Belém. E-mail: [email protected] FONAPER da Religião (CR) como área do conhecimento capaz de assegurar o caráter epistemológico e pedagógico do ER, também defendida entre vários pesquisadores que se dedicam a referida área e sua relação com a educação (PASSOS, 2007; SOARES, 2010, JUNQUEIRA, 2008, 2010, 2011). Nesse contexto, destaca-se o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER), criado em 1995, com a finalidade de assumir essa pasta, acabando por ficar responsável pela leitura pedagógico-didática e metodológica do ER, congregando, formando e apoiando os profissionais que ministram esse componente curricular em todo território nacional. Após a sua criação, o FONAPER logo organizou os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER) em 1996 e publicados em 1997 e, posteriormente as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião/Ensino Religioso, encaminhados ao MEC, por duas vezes, em 1998 e 2009 (JUNQUEIRA, 2010, 2011), mas sem nenhum avanço nessas questões fundamentais para operacionalização da disciplina, restando a operacionalização e sua implementação por meio dos SEB e IES, a saber, dos procedimentos para a definição dos conteúdos, assim como as normas para a habilitação e admissão dos professores, em conformidade com a Lei 9.475/1997 e o Parecer CNE/CP 097/1999. Nesse sentido, várias instituições de ensino organizaram seus cursos para habilitação de professores de ER, desde 1996, sob as mais diferentes concepções e aporte teórico-metodológicos, a luz da legislação educacional, estando presentes em quase todas as regiões do país. A trajetória de implantação, organização e funcionamento desses cursos de graduação é um percurso motivador que nos surpreende a cada parada, seja esta no âmbito das instituições privadas, públicas municipais, estaduais e federais, são objetos de conhecimentos e análises de vários pesquisadores da área, com destaque para OLIVEIRA (2003), CARON (2007), PASSOS (2007), JUNQUEIRA (2010, 2011) e SOARES (2010). O currículo de formação de professores de ensino religioso no contexto brasileiro: pós-graduação e graduação As Ciências da Religião, nomenclatura mais utilizada para nomear a área de conhecimento adotada para a formação de professores de ER no 204 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso país, localiza-se na Grande Área Ciências Humanas – Área Teologia – Subárea Filosofia/Teologia, segundo tabela de áreas do conhecimento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Atualmente, existem com recomendação e/ou reconhecimento da CAPES vários programas de pós-graduação em Ciência da Religião, Ciências da Religião ou ainda Ciências das Religiões e Teologia, sendo esses presentes em todas as regiões do país (Ciências da Religião), como discriminados na tabela abaixo: Tabela 01: Relação de cursos Recomendados e Reconhecidos de Ciência da Religião, Ciências da Religião ou Ciências das Religiões e Teologia constante na web página 2 Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) . Ord. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Grande Área: Ciências Humanas Área: Teologia Nomenclatura/ Programa IES Programas Ciência da Religião Ciência da Religião: 01 UFJF Ciências da Religião PUC/GO Ciências da Religião PUC/MG Ciências da Religião UEPA Ciências da Religião Ciências da Religião: 07 UNICAP Ciências da Religião PUC/SP Ciências da Religião UMESP Ciências da Religião UPM Ciências das Religiões Ciências das Religiões: 02 FUV Ciências das Religiões UFPB Teologia FAJE Teologia PUC/PR Teologia FTBP Teologia PUC/RJ Teologia: 08 Teologia PUC/RS Teologia EST Teologia EST Teologia PUC/SP UF MG GO MG PA PE SP SP SP ES PB MG PR PR RJ RS RS RS SP M 5 4 3 3 3 5 5 3 3 6 3 3 5 4 6 3 NOTA D F 5 4 5 5 3 6 5 6 - 4 - Legenda: M (mestrado acadêmico); D (doutorado acadêmico); F (mestrado profissional). Considerando os dados tabulados acima, percebemos que, três dos programas em CR estão presentes em instituições públicas (mestrado: 2 Disponível em: <http://conteudoweb.capes.gov.br/conteudoweb/ProjetoRelacaoCursosServlet?acao=pe squisarIes&codigoArea=71000003&descricaoArea=CI%CANCIAS+HUMANAS+&descric aoAreaConhecimento=TEOLOGIA&descricaoAreaAvaliacao=FILOSOFIA%2FTEOLOGI A%3ASUBCOMISS%C3O+TEOLOGIA, acesso em 30/05/2013. 205 FONAPER Universidade do Estado do Pará (UEPA) – Ciências da Religião; mestrado: Universidade Federal da Paraíba (UFPB) – Ciências das Religiões; mestrado e doutorado: Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) – Ciência da Religião) e seis confessionais, sendo quatro católicas (mestrado: Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO) – Ciências da Religião; mestrado: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG) – Ciências da Religião; mestrado: Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) – Ciências da Religião; mestrado e doutorado: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) – Ciências da Religião), uma metodista (mestrado e doutorado: Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) – Ciências da Religião) e duas presbiteriana (mestrado: Universidade Mackenzie (UPM); mestrado profissional: Faculdade Unida de Vitória (FUV) – Ciências das Religiões). Dos dez cursos apresentados e/ou recomendados pela CAPES, a maioria não apresenta em suas áreas de concentração ocupação com o ER, muito menos com a formação desses professores a partir das CR, a não ser no programa da PUC/SP que, na área Fundamentos das Ciências da Religião, possui a linha de pesquisa Fundamentos do ER, como consta no site do programa3: Busca-se recolher diferentes experiências de Ensino Religioso, em nível de primeiro e segundo grau, em vários estados brasileiros. Aplicam-se recortes históricos e geográficos para a configuração das propostas aí contidas, que são confrontadas com teorias consagradas na ciência da religião, assim como estudos no campo de ensino em vários países. Objetiva-se prestar uma contribuição a um tema atual no campo educacional brasileiro, especialmente na escola pública, oferecendo reflexos de fundo que possam subsidiar práticas específicas, de profissionais diretamente vinculados a esta atividade. Outro programa que merece destaque, embora com singularidades, é o Programa de Pós-Graduação em Teologia, com mestrado e doutorado acadêmico da Escola Superior de Teologia (EST/RS), das Faculdades EST, que possui, entre as suas áreas de concentrações, a área Religião e Educação, sendo nesta uma das linhas de pesquisa Fenômeno Religioso e Práxis Educativa na América Latina, como consta no site do programa4: 3 4 Disponível em: http://pos.pucsp.br/cienciasreligiao, acesso em 20/06/2012. Disponível em: http://www.est.edu.br/pos-graduacao/, acesso em 20/06/2012. 206 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Área de Concentração: Religião e Educação A área desenvolve a pesquisa interdisciplinar sobre a relação entre religião e educação no contexto latino-americano com ênfase na formação continuada de educadores e na formação de pesquisadores. Focaliza a relação entre as diferentes manifestações do fenômeno religioso e a práxis educativa escolar, eclesial e dos movimentos sociais. Linha de Pesquisa Fenômeno Religioso e Práxis Educativa na América Latina Nesta linha realizam-se pesquisas sobre a relação entre o fenômeno religioso e a educação em suas múltiplas formas e interfaces, compreendendo a análise das políticas, processos e práticas educativas, num enfoque interdisciplinar, na perspectiva da Teologia e da Educação com atenção para a práxis educativa das denominações religiosas, das instituições escolares e dos movimentos sociais na América Latina. Esses programas têm contribuído com o ER em diversos aspectos, principalmente nos últimos citados, com a produção de pesquisas essências no campo epistemológico e pedagógico da disciplina e na formação desses professores, mais que ainda são escassos, diante da necessidade, adequação e defesa como área referencial para esse componente curricular. Dos programas em Ciência da Religião, Ciências da Religião ou Ciências das Religiões listadas, apenas três deles convivem com a graduação: os da UEPA, UFPB e UFJF, ampliando, dessa forma, a integração e a área que forma e a sua aplicação na EB. Nesse sentido, a formação de professores para o ER vai se constituindo em quase todas as regiões do país, a partir do modelo teóricometodológico e pedagógico das Ciências da Religião, no espaço acadêmico-científico, em paridade com as demais áreas do conhecimento, ampliando e conquistando seu espaço, seja na pós-graduação ou na graduação, como abaixo especificado, listamos os cursos de graduação, nos graus de licenciados, bacharelados; na modalidade presencial ou à distância; com os cursos ativos ou extintos, assim como as três nomenclaturas possíveis, enfatizando a perspectiva da singularidade e multiplicidade desse campo de estudos que vem se configurando no Brasil a partir da década de 70, do século passado. 207 FONAPER Tabela 02: Cursos de graduação em Ciência da Religião ou Ciências da Religião ou 5 Ciências das Religiões que constam no site do MEC em 2013 Ord. 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Curso Ciências da Religião Instituição UFS UEPA USJ UERN UEL FURB UNOESC UNIMONTES UNISUL UNOCHAPECÓ UNEC UEMA IESPES IESMA FSB/RJ CEUCLAR Ciência da Religião UFJF Ciências das Religiões UFPB Grau Modalidade Situação Total Licenciatura Presencial Ativo 11 Licenciatura Distância Extinto Ativo 01 01 Bacharelado Presencial Ativo Distância Licenciatura Bacharelado Licenciatura Bacharelado 03 01 Presencial Ativo 02 Presencial Ativo 02 Fonte: MEC: disponível em: http://emec.mec.gov.br/, acesso em 15/02/2013. Como podemos observar na tabela acima, dos vinte cursos listados no site do MEC, dezoito estão ativos e presentes em todas as regiões do país (dois no norte, seis no nordeste, quatro no sudeste, seis no sul), onde treze são licenciaturas, sendo um extinto (UNEC), logo onze são presenciais e um a distância; e seis bacharelados onde, um deles está com suas atividades encerradas (CEUCLAR), apesar de ter sido o primeiro curso de bacharelado a ser reconhecido no país. Entre os dezoito cursos em atividades, onze estão em instituições públicas (cinco federais, cinco estaduais e uma municipal) e o restante em instituições privadas. Esses dados disponíveis no site do MEC demonstram que, em quase todas as regiões do país a formação docente para o ER já é uma realidade que vem ocorrendo desde a segunda metade da década de 90, sendo 5 Dados disponíveis no e-MEC que informa as Instituições de Ensino Superior e Cursos Cadastrados no país. O e-MEC foi criado para fazer a tramitação eletrônica dos processos de regulamentação. Pela internet, as instituições de educação superior fazem o credenciamento e o recredenciamento, buscam autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos. Em funcionamento desde janeiro de 2007, o sistema permite a abertura e o acompanhamento dos processos pelas instituições de forma simplificada e transparente. 208 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso predominante, segundo a tabela, a nomenclatura Ciências da Religião, defendido como área do conhecimento referencial para formação de professores de ER, e a sua aplicação didática, os conteúdos ministrados nesse componente curricular (PASSOS, 2007; SOARES, 2010). Nesse sentido, As Ciências da Religião podem oferecer base teórica e metodológica para a abordagem da dimensão religiosa em seus diversos aspectos e manifestações, articulando-a de forma integrada com a discussão sobre a educação. A educação geral, fundada em conhecimentos científicos e em valores, assume o preceito religioso como um elemento comum às demais áreas que fazem parte do currículo e como um dado histórico-cultural fundamental para as finalidades éticas inerentes à ação educacional. Portanto, nesse modelo não se afirma o ensino da religião como uma atividade cientificamente neutra, mas com clara intencionalidade educativa, postula-se a importância do conhecimento da religião para a vida ética e social do educandos [...]. Nesse sentido, trata-se de uma visão transreligiosa que pode sintonizar-se com a visão epistemológica atual, sendo que busca superar a fragmentação do conhecimento posta pelas diversas ciências com suas especializações e alcançar horizontes de visão mais amplos sobre o ser humano. (PASSOS, 2007, p. 65-66). Considerando os pressupostos teórico-metodológicos e legais apresentados, percebemos o quanto as Ciências da Religião tem muito a contribuir para leitura e decodificação do fenômeno religioso na sociedade brasileira e na escola em atendimento aos pressupostos do Estado laico com a formação educacional e humana do cidadão. O lugar da finitude no currículo e no ensino religioso Dando continuidade a discussão e apontando para os aspectos pertinentes a legislação educacional que se restringe a formação cidadã e o mundo do trabalho, destaca-se o ER, no currículo da escola da EB como espaço de diálogo e interseção entre Educação e Tanatologia. Segundo a legislação educacional, o ER está assegurado no art. 210, § 1°, da Constituição Federal (1988) e na LDB/1996, no art. 33, alterado pela Lei nº 9.475/1997, como parte integrante da formação básica do cidadão, constituindo-se disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do país e vedadas quaisquer formas de proselitismo. 209 FONAPER O ER assume a compreensão de área do conhecimento, de acordo com as Diretrizes Nacionais para o Ensino Fundamental (RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 02/1998). De acordo com as Diretrizes Nacionais para Educação Básica, esse componente curricular integra à base nacional comum, segundo o art. 14 da Resolução CNE/CEB nº 04/2010, assegurando, nesses termos já citados, o currículo para a formação comum. Embora exista diversos dispositivos legais que assegurem seu espaço no currículo e sua natureza pedagógica, esse componente curricular tem ainda sido alvo de polêmicas: Estamos diante de um tema polêmico. Não por acaso, esta foi a primeira emenda à LDB. A república Federativa do Brasil é laica, significa dizer que, de um lado, inexiste religião oficial face a separação total entre Estado e Igreja; de outro, não pode haver relações de dependência, ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público. É preciso compreender que a previsão constitucional de algumas vedações dirigidas aos entes federativos objetiva garantir o equilíbrio federativo, a harmonia e a coesão sociais e, evidentemente, no caso da opção religiosa, o respeito à escolha de cada um. Mas é preciso compreender, também que, ao ser formalmente constituído como uma federação leiga, o Brasil não é um Estado ateu. Tanto é assim que, no preâmbulo da Constituição, os representantes do povo brasileiro proclamam: ―[...] promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil‖ (CARNEIRO, 2011, p. 39). A não compreensão do ER como área de conhecimento e como componente curricular é assistida por muitas questões de natureza pedagógica, epistemológica e política, envolvendo diretamente o Estado e os SEB e IES na regulamentação dos procedimentos para a definição dos conteúdos e estabelecimento das normas para habilitação e admissão dos professores, uma vez que as igrejas saem de cena, como segue abaixo: De fato, desde a nova LDB, o Ministério da Educação não conseguiu implantar uma política de ER que superasse a clássica questão da separação Igreja-Estado, o que significou não conseguir sustentar uma proposta consistente desse ensino: do ponto de vista antropológico, como uma dimensão humana a ser educada; do ponto de vista epistemológico, como uma área de conhecimento com estatuto próprio, conforme indica a Resolução n. 2/98, da Câmara da Educação Básica; e, do ponto de vista político, como uma tarefa 210 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso primordial dos sistemas de ensino e não das confissões religiosas (PASSOS, 2007, p.14). Essa responsabilidade, até então deixada de lado pelo MEC, mesmo estando prevista na legislação educacional, implicou na organização do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER), em 1995, congregando pesquisadores desse componente curricular que posteriormente se debruçaram na elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER), em 1996, haja vista que na elaboração/publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) pelo MEC, o ER não foi contemplado. Para o MEC, os PCN publicados por ele representam O conjunto das proposições aqui expressas responde à necessidade de referenciais a partir dos quais o sistema educacional do País se organize, a fim de garantir que, respeitadas as diversidades culturais, regionais, étnicas, religiosas e políticas que atravessam uma sociedade múltipla, estratificada e complexa, a educação possa atuar, decisivamente, no processo de construção da cidadania, tendo como meta o ideal de uma crescente igualdade de direitos entre os cidadãos, baseado nos princípios democráticos. Essa igualdade implica necessariamente o acesso à totalidade dos bens públicos, entre os quais o conjunto dos conhecimentos socialmente relevantes. (PCN, 1997, p. 13). Nesses termos, os PCNER (2009) têm sido até então, o principal documento na orientação acadêmico-científica do ER e da sua prática educativa no país, respaldado no modelo das Ciências da Religião, mesmo que esse modelo não seja o mais praticado, coexistindo com outros, que a nosso ver, contrariam os pressupostos da legislação educacional. É por meio da orientação desse documento que fazemos a leitura pedagógico-didática e metodológica do ER, e que por onde podemos estabelecer relações diretas com a Tanatologia6, pois, O Ensino Religioso, valorizando o pluralismo e a diversidade cultural presente na sociedade brasileira, facilita a compreensão das formas que exprimem o Transcendente na superação da finitude humana e 6 A Tanatologia poderia ser definida como a ciência que estuda a morte e o processo de morrer em todos os seus aspectos: forense, antropológico, social, psicológico, biológico, educacional, filosófico, religioso e estético. Seu nome deriva do no nome do deus grego Tânatos. Na mitologia grega, Tânatos era irmão de Hipnos, o Sono e filho de Nix, a Noite e Érebro, as trevas. Era representado como uma nuvem prateada ou um homem de olhos e cabelos prateados (SANTOS, 2009, p. 292). 211 FONAPER que determinam, subjacentemente, o processo histórico da humanidade. Por isso necessita: proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas, o contexto do educando; subsidiar o educando na formulação do questionamento existencial, em profundidade, para dar sua resposta devidamente informado; analisar o papel das tradições religiosas em estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações socioculturais; facilitar a compreensão do significado das afirmações e verdades de fé das tradições religiosas; refletir o sentido da atitude moral, como consequência do fenômeno religioso e expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária do ser humano; possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença na construção de estruturas religiosas que tem na liberdade o seu valor inalienável (PCNER, 2009, p 46-47). Ao propor a leitura e decodificação do fenômeno religioso como uma construção sociocultural, apontando para o estudo do sagrado transcendente/imanente na superação da finitude humana e na busca do sentido existencial, reconhecemos nossa individualidade e nossa dificuldade em nos compreender como sujeitos do conhecimento que estamos sempre a nos perguntar: Quem sou? De onde vim? Para onde vou? Essas questões não eliminam e nem colocam determinados conhecimentos sobre outros, uma vez que todos os conhecimentos são produções humanas que buscam fundamentar, (re)significar e melhorar nossas condições, logo todos precisam estar disponíveis e isso não exclui o conhecimento religioso. Essa compreensão não consiste mais na codificação desse conhecimento (conhecimento adquirido como produto por meio de doutrinas, leis, ensinamentos, ritos, história etc.), algo próprio das tradições culturais religiosas e já superado na legislação educacional, mas o educando é desafiado a (re)leitura, ou seja, a decodificação (interpretar, analisar, entender como, por que, para que em que se deu esta codificação) do fenômeno religioso na diversidade cultural religiosa da sociedade, tendo em vista a compreensão da finitude humana, na formulação do questionamento existencial, em profundidade. Esse questionamento vem sendo trabalhado de diversas formas nos diferentes tempos e espaços, unificando-se a vida coletiva e prática, em 212 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso sua orientação frente a essa dimensão do ser, como podemos observar nos critérios para organização e seleção dos conteúdos e seus pressupostos didáticos de caracterização geral do ER: Hoje, o fenômeno religioso é a busca do Ser frente à ameaça do Não Ser. Basicamente, a humanidade ensaiou quatro respostas possíveis como norteadoras do sentido da vida além da morte: a Ressurreição; a Reencarnação; o Ancestral; o Nada. Cada uma dessas respostas organiza-se num sistema de pensamento próprio, obedecendo uma estrutura comum. E é desta estrutura comum que são retirados os critérios para organização e seleção dos conteúdos e objetivos do Ensino Religioso. Assim, na pluralidade da Escola brasileira esses critérios para os blocos de conteúdos são: Culturas e Tradições Religiosas; Escrituras Sagradas; Teologias; Ritos; Ethos (PCNER, 2009, p. 49-50). A busca do ser frente à ameaça do não ser evidencia o conhecimento de que o ser humano tem acerca da sua finitude, ou seja, que ele é um ser-para-a-morte, tão presente na codificação do conhecimento racional e inerente ao conhecimento religioso. Esse conhecimento, inerente ao ser humano, desde sempre, é marcado pelo mistério, fazendo com que este recorresse, na maioria das vezes, a Transcendência, não muito diferente dos dias atuais, embora o tratamento dado a finitude a partir do final do século XIX seja outro. Nesses termos, a humanidade vem ensaiando diversas respostas, sendo as mais recorrentes a ressurreição, a reencarnação e a ancestralidade. Sendo que, essas concepções defendem a continuidade da vida, dotando-a de sentido e significação variados, na busca da tão sonhada felicidade. A concepção do nada, ou seja, da morte física como cessação da existência que atribuí à vida, na maioria das vezes, a sua dimensão imanente e material, tem sido objeto de estudo do fazer filosófico e de certa forma, o científico, há mais de dois milênios, mesmo coexistindo divergência entre alguns filósofos que se atém a transcendência. Essa concepção passa a ser bem mais difundida a partir do século XVIII até os dias atuais. 213 FONAPER Nesses termos, cada uma dessas respostas, segundo os PCNER, organiza-se num sistema de pensamento próprio, obedecendo a uma estrutura comum, de onde são retirados os critérios para organização, seleção dos conteúdos e objetivos do ER, outrora já citados, na diversidade cultural religiosa da sociedade e escola, em cinco eixos temáticos: cultura e tradições religiosas, escrituras sagradas escritas e orais, teologias, ritos e ethos. O curso da UEPA/PA e a finitude Dentre os cursos de formação específica para o ER no Brasil, para atender os anos finais do ensino fundamental e médio, conforme o art. 33, § 1º (Lei 9.475/1997) e o art. 62 da LDBEN/1996, o Projeto Político do Curso de Licenciatura Plena em Ciências da Religião (PPCLPCR) da Universidade do Estado do Pará (UEPA) foi o primeiro a ocupar o espaço de uma (IES) pública. Esse processo teve sua origem no curso livre de Educação Religiosa (PALHETA, 2007; NASCIMENTO, 2009), ministrado pela Arquidiocese de Belém em parceria com a Universidade do Federal do Pará (UFPA) entre as décadas de 80 e 90 do século passado, sendo o curso reconhecido pelas Resoluções nº 1.351/1986, 1.954/1991 e 2.127/1993 do Conselho Superior de Ensino e Pesquisa (CONSEP), da UFPA. A base metodológica do curso livre de Educação Religiosa encontrava na proposta da interconfessionalidade os pressupostos para seu desenvolvimento no espaço escolar, conforme a Lei nº 5.692/1971. O PPCLPCR/UEPA foi criado pela Resolução nº 361/1999, do Conselho Universitário (CONSUN/UEPA), tendo seu funcionamento autorizado pelo Parecer nº 372/2001 e a Resolução nº 403/2001, do Conselho Estadual de Educação do Pará (CEE/PA), de acordo o PPCLPCR/UEPA (2003). As atividades do referido curso iniciaram em 2000, na modalidade regular anual e atualmente conta com mais seis turmas do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR) em atividade. Diante do exposto, e da documentação analisada, pudemos perceber a evolução na mudança de paradigma e na concepção para a formação 214 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso desses professores que vai se constituindo no país, assim como do próprio ER, uma vez que isso não exclui o Pará. Dessa forma, o estudo da religião, bem mais coerente do que seu ensino nas escolas, nas suas mais diversas manifestações, experiências e complexidade tem sido algo localizado no PPCLPCR/UEPA, a partir dos aportes teórico-metodológicos das Ciências da Religião, traduzidos para sua aplicação na EB. Esse aspecto, no que consiste a tradução para sua aplicação na escola, tem sido algo que vem nos chamando atenção e aponta para uma problemática pertinente a toda e qualquer formação profissional, em nosso caso, a formação de professores. O estudo das diversas ciências e as suas aplicações nas escolas, tem posto em evidência a preocupação de caráter pedagógico-didático e metodológico na efetivação das aprendizagens, uma espécie de adaptação/tradução para se tornar acessível aos alunos e aos seus limites cognitivos. Com os estudos da religião, traduzidos para o ER, não tem sido diferente e o que temos percebido, a partir da análise do PPCLPCR/UEPA, evidencia certo distanciamento e articulação na sua organização curricular para o ER, refletindo na integração entre as disciplinas específicas e pedagógicas, assim como uma reflexão mais apurada do seu caráter nuclear assentado na finitude, de onde se pensa a sua organização e desenvolvimento no currículo da escola. Mas essas reflexões, embora sejam iniciais, nos fazem pensar na maior proximidade que deveria ocorrer entre as IES e a EB, algo também que deveria ser pensado no momento de organização dos currículos dos cursos de formação de professores. A finitude humana, segundo os PCNER (2009), pode ser algo que aponte para a reflexão da nossa própria morte e morrer, a partir do momento em que localizamos nas diversas culturas e tradições religiosas vários elementos que as compõem, como os mitos, ritos, valores, textos escritos e orais que, às vezes, remetem-nos a continuidade da vida, apontando limites, maneiras de ser e fazer no cosmo; assim são ensaiadas as respostas elaboradas pela humanidade: ressurreição, reencarnação e a ancestralidade. Também, nos abre espaço para reflexão de que a morte delimita nossa finitude, como a perspectiva do nada, permitindo outras analíticas 215 FONAPER existenciais, advindas da perspectiva filosófico-científica, como nesse caso, na maioria das vezes. Para encerrar, sabemos que na organização do PPCLPCR/UEPA, não somente, vários fatores estão envolvidos e que neste texto e em outros não teremos como encerrar. Por isso, trata-se de considerações iniciais, apreendidas in loco, assim como da análise do referido documento. Considerações finais A morte, o morrer e a finitude, nesses termos, é algo nuclear e pertinente para a organização e seleção dos conteúdos e objetivos do ER, como previsto nos PCNER (2009). Nessa perspectiva, a partir do estudo da religião, na diversidade cultural religiosa do país e nas respostas elaboradas pela humanidade, o ER pode ―[...] subsidiar o educando na formulação do questionamento existencial, em profundidade, para dar sua resposta, devidamente informado‖ (PCNER, 2009, p. 47). Esse compromisso desenvolve-se na sua prática pedagógicodidática, a partir dos pressupostos traduzidos das Ciências da Religião para o ER, para a formação humana do cidadão, de forma integral e solidária. Nesse processo, devem-se abordar todas as respostas possíveis, no que se refere aos conhecimentos socioculturais e filosófico-científicos, construídos nos variados tempos e espaços, onde nem sempre a interdição da reflexão e discussão da nossa mortalidade fosse uma constante. Nesse sentido, o ER é um componente curricular que situa numa perspectiva de uma educação para vida e para a morte, quando se assenta na perspectiva da finitude humana. Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas emendas constitucionais nº 1/92 a 53/2006 e pelas emendas constitucionais de revisão nº 1 a 6/94. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2007. 216 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso ________. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Brasília, 1997. ________. Lei nº 9.394. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Sancionada em 20 de dezembro de 1996. Publicada no Diário Oficial da União, em 23 de dezembro de 1996. ________. Parâmetros curriculares nacionais: Introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1997. ________. Parecer nº 097, de 06 de abril de 1999. Conselho Pleno. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Brasília, 2008. ________. Resolução nº 02, de 07 de abril de 1998. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília, 2008. Publicada no D.O.U., de 15/04/1998, Seção I, p. 31. ________. Resolução nº 04, de 13 de julho de 2010. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais a Educação Básica. Brasília, 2010. Diário Oficial da União, Brasília, 14 de julho de 2010, Seção 1, p. 824. ________. Resolução nº 07, de 14 de dezembro de 2010. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de Nove Anos. Brasília, 2010. Diário Oficial da União, Brasília, 15 de dezembro de 2010, Seção 1, p. 34. CARNEIRO, Moacir Alves. LDB fácil: leitura crítico-compreensiva artigo a artigo. São Paulo: Vozes, 2011. CARON, Lourdes. Políticas e práticas curriculares: formação de professores de ensino religioso. Tese (Doutorado em Educação: Currículo). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, 2007, 354 p. FONAPER. Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros curriculares nacionais ensino religioso. São Paulo: Mundo Mirim, 2009, p. 47. GAMBOA, Silvio Sánchez. Pesquisa em epistemologias. 2 ed. Chapecó: Argos, 2012. educação: métodos e 217 FONAPER JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. Formação docente no ensino religioso: espaço da profissionalização. Tese pós-doutoral em Ciências da Religião (Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). São Paulo: PUC/SP, 2011. ________. Formação de professores para o ensino religioso: construção de uma identidade. Tese de livre docência em Ciências da Religião (Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). São Paulo: PUC/SP, 2011. NASCIMENTO, D. A. Prática docente na educação superior: um estudo sobre a formação do professor de ensino religioso no curso de ciências da religião da UEPA. 2009. 40 f. Monografia de Conclusão de Curso – Universidade do Estado do Pará, Belém, 2009. OLIVEIRA, Lilian Blanck. Formação de docentes para o Ensino Religioso: perspectivas e impulsos a partir da ética social de Martinho Lutero. São Leopoldo: EST/IEPG, 2003. PALHETA, A. A. A trajetória curricular do curso de licenciatura plena em ciências da religião da UEPA: Avanços e Desafios. TCC. UEPA. Belém: 2007. PASSOS, João Décio. Ensino religioso: construção de uma proposta. São Paulo: Paulinas, 2007. PARÁ. Projeto Pedagógico de Licenciatura Plena em Educação Religiosa. Belém: UEPA, 1998. PARÁ. Projeto Pedagógico de Licenciatura Plena em Educação Religiosa. Belém: UEPA, 1999. ________. Curso Licenciatura Plena em Ciências da Religião. Belém: UEPA, 2001. ________. Projeto Pedagógico de Licenciatura Plena em Ciências da Religião. Belém: UEPA, 2003. ________. Relatório de evolução do curso de licenciatura plena em ciências da religião para fins de renovação de reconhecimento (2008). Belém: CCSE/UEPA, 2008. 218 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso SANTOS, Franklin Santana. A tanatologia e a universidade. In: INCONTRI, Dora; SANTOS, Franklin Santana (org.). A arte de morrer – visões plurais: volume 1. Bragança Paulista, SP: Comenius, 2009, p. 289-303. SENA, Luzia (org.). Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006. SOARES, Afonso M. L. Religião & educação: da ciência da religião ao ensino religioso. São Paulo: Paulinas, 2010. UFPA. Universidade Federal do Pará. Resolução nº 1.351, de 02 de janeiro de 1986. Conselho Superior de Ensino e Pesquisa. Universidade Federal do Pará, 1986. ________. Resolução nº 1.954, de 19 de novembro de 1991. Conselho Superior de Ensino e Pesquisa. Universidade Federal do Pará, 1991. ________. Resolução nº 2.127, de 18 de outubro de 1993. Conselho Superior de Ensino e Pesquisa. Universidade Federal do Pará, 1993. 219 A IMPORTÂNCIA DO PROFISSIONAL HABILITADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO PARA ATUAR COMO DOCENTE DO ENSINO RELIGIOSO NA EDUCAÇÃO BÁSICA Ediana Maria Mascarello Finatto Leonel Piovezana** Resumo Este trabalho busca caracterizar e questionar a realidade do ensino mediante as novas discussões que emergem na sociedade. Procura demonstrar a importância do profissional habilitado em Ciências da Religião para atuar como docente do Ensino Religioso na Educação Básica. A formação de profissionais em Ciências da Religião, com estudos da implantação desse curso no estado de Santa Catarina e mais especificamente no oeste catarinense, tem possibilitado discussões e alternativas metodológicas e pedagógicas que incluem todas as pessoas no processo ensino-aprendizagem, gerando mais inclusão e humanização. Contribui-se assim para a introdução de novos paradigmas nos debates relacionados a essa área do conhecimento e a superação de teorias padronizadas e ou teologia específica. Palavras-chave: Ensino; Ciência; Religião. Introdução Como habitantes do planeta Terra, acompanhamos nessa primeira e segunda décadas do século XXI mudanças rápidas, principalmente no campo econômico, e consequentemente no social. Essas mudanças implicam transformações, atitudes e posições; acreditamos que seja o conhecimento o carro-chefe para filtrar o que é bom ou pode ser bom para as pessoas. Nesse vai e vem de mudanças e discussões, contempla-se ** Mestranda em Educação pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó – Unochapecó (SC). Graduada em História pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó – Unochapecó (SC). Acadêmica do sétimo período do Curso de Ciências da Religião da Universidade Comunitária da Região de Chapecó – Unochapecó (SC), Professora de Teoria e Metodologia de História III na Unochapecó e professora efetiva da rede estadual de Santa Catarina. E-mail: [email protected] Doutor em Desenvolvimento Regional – Área Interdisciplinar – pela UNISC. Coordenador dos cursos de Ciências da Religião e das Licenciaturas Interculturais Indígena e Professor dos Programas de Mestrado em Educação e Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais da Unochapecó. E-mail: [email protected] FONAPER em âmbito escolar e social uma ebulição de ideias, que trazem no seu bojo o desejo de problematizar e/ou desconstruir visões dominantes. Essa desconstrução vem atrelada aos desafios que a sociedade impõe: convivência entre diferentes grupos étnicos em um mesmo espaço, presença de diversos grupos religiosos em uma mesma localidade e encontro das diferenças no espaço escolar. Nesse terreno de desafios, faz-se necessário estarmos receptivos às reivindicações feitas pelos diversos grupos étnicos; cabe também buscarmos constantemente conhecimentos que possibilitem ampliar novas discussões. Essas reivindicações que no iniciar do século XXI ganham corpo têm o intuito de favorecer novas reflexões, as quais consolidam discussões que até o findar do século XX não se fizeram tão presentes, principalmente na comunidade escolar. Nas representações desses grupos, percebe-se que o interesse está na reformulação de valores instituídos, que durante muitos anos naturalizaram-se como verdadeiros. Diante deste cenário, intensifica-se o desejo de oportunizar aos diversos grupos étnicos reflexões significativas, as quais propiciem a deslegitimação de paradigmas hegemônicos enraizados na mente das pessoas. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) é um elemento de grande visibilidade no amparo às emergências desses movimentos, que buscam constantemente introduzir nas discussões marcas identitárias como meio de viabilizar a convivência de diferentes elementos culturais. No conjunto de artigos que compõem a Declaração Universal dos Direitos Humanos, encontramos, no artigo I, princípios que garantem uma convivência pautada no respeito à diversidade, justamente o que os grupos minoritários reivindicam para assegurar sua identidade e sobrevivência. ―Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.‖ (UNESCO, 2008, p. 202). Por essa razão, é imprescindível suscitar nos indivíduos um olhar aguçado para as especificidades no tratamento aos mais diversos grupos sociais, o que perpassa os valores culturais. Esses valores, quando incorporados, fornecem subsídios que possibilitam um reconhecimento da identidade e da alteridade, elementos presentes em cada grupo étnico, que propiciam a identificação do outro como contribuinte das relações sociais. 222 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Esses movimentos se mesclam na intencionalidade de ampliar os espaços de debates e introduzir uma visão que contribua para uma nova estruturação do conhecimento, que seja capaz de reconhecer o diferente e permitir a adesão às constantes transformações sociais e culturais, em que a coexistência se intensifique e garanta novos sentidos ao viver. O que se propaga na educação, principalmente no ambiente escolar, na grande maioria das vezes, é a reprodução de conhecimentos já elaborados. Esta reprodução torna-se evidente quando, nas metodologias teórico-pedagógicas, contemplamos uma fragmentação de determinados temas e a imposição de padrões homogeneizantes que ao longo da história da educação legitimaram-se como meios de atingir os objetivos traçados para o desenvolvimento social e do ensino. Envolvendo essa linha de raciocínio, salienta-se como exemplo de conhecimento instituído por interesses a teoria geocêntrica, segundo a qual se acreditava que a Terra era o centro do universo. Transmitiu-se e defendeu-se essa teoria por muitos séculos. Porém, quando Galileu Galilei, através de estudos realizados anteriormente e ampliados por ele, contestou essa teoria afirmando que não era a Terra o centro do universo, mas sim o Sol, muitos se revoltaram contra o seu discurso e passaram a persegui-lo – isto, porque essa nova teoria estabelecia um rompimento entre o pensamento dogmático religioso e o pensamento científico, o que se evidencia nas palavras de Lopes (2010, p. 49): ―A teologia cristã estava intrinsecamente ligada à concepção de universo fechado, estático, geocêntrico, ao modelo aristotélicoptolomaico‖. Devido à formulação de uma nova teoria, a qual viria a desestruturar um conhecimento instituído pela igreja, Galileu Galilei foi condenado pela inquisição. Apesar de todo o constrangimento, ele manteve-se firme em seu discurso, e neste iniciar do século XXI o que vigora como teoria é de fato aquilo que, com ousadia, ele defendeu. A implementação de um novo modelo considerava a superação de uma teoria basicamente religiosa, transmitida como verdadeira durante muitos séculos, por outra que estabelecia o contrário, baseada em transformações decorrentes de inúmeras pesquisas e estudos. Essa nova teoria possibilitou avanços na compreensão da formação do universo, estabelecendo assim uma dinâmica de substituição de conhecimentos incutidos na mente e no pensamento humano. 223 FONAPER Nesta perspectiva, buscamos historicizar como o processo educativo pode contribuir para desconstruir ideias naturalizadas que dificultam a entrada de novos olhares compostos por diferentes reflexões. Encontrar no terreno da educação o favorecimento de novas reflexões tem sido um processo lento, mas fundamental para lançar novas perguntas e desconstruir modelos clássicos, estandardizados na educação. Meio a essa multiplicidade de fatores que podem exercer influências no processo de introdução de novos objetivos na educação, deparamo-nos com o que Cortella (2012, p. 11) compreende como limite durante o desenvolvimento de novos conhecimentos: ―[...] a condição humana perde substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão, rendendo-se à sedução do repouso e mobilizando-se na acomodação‖. Ao nos enquadrarmos numa determinada zona de conforto, ficamos impossibilitados de estranhar o objeto, o novo, de problematizá-lo e avançar na compreensão de novos conhecimentos. Agindo assim, assumimos um entendimento generalizado dos fatos. Nesse sentido, quando internalizamos um conhecimento difundido há muito tempo, acabamos propagando-o, dificultando assim o desvencilhamento dele de nossa estrutura intelectual. Sob essa ótica, acabamos moldando seres condicionados a aceitar apenas uma verdade, desconsiderando a existência de outras possibilidades de construir novos conhecimentos. Diante disso, constatase que há [...] a necessidade de descobrirmos, respeitarmos e orientarmos nossa prática pedagógica pela ―diferença‖, ―categoria essencial para compreender a função da escola‖, e, por fim, a necessidade de se tratar a questão étnica na sala de aula, retrabalhando nosso imaginário social [...] (DAYRELL, 1996, p.18). Esse imaginário é inundado por estereótipos que impossibilitam a manifestação da sensibilidade em perceber o outro, dificultando a convivência cultural e religiosa e a atuação profissional no espaço escolar como meio de introduzir novas maneiras de articular as relações humanas. Nesse sentido, é de fundamental importância compreender que as mudanças necessárias não ocorrem sem turbulências no ambiente escolar. No entanto, emerge um desafio aos educadores, principalmente aos licenciados em Ciências da Religião, que durante a formação 224 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso continuada têm possibilitada a apropriação de conhecimentos e discussões que contribuem para a desconstrução e desestruturação de conhecimentos padronizados e incorporados, os quais ocasionam ocultamento de muitos outros que o mundo rejeitou por inúmeros motivos. O conhecimento se faz num processo de vida da humanidade e vai se somando aos feitos culturais e mesmo às necessidades para a sobrevivência ou para sanar as dúvidas, as curiosidades, que juntos resultam nas práticas e ações socioculturais, econômicas, ambientais e religiosas das pessoas. Ele não se constrói sozinho, depende do outro, de olhares múltiplos. Smolka (1996, p. 9) refere: Isto significa dizer que é através de outros que o sujeito estabelece relações com objetos de conhecimento, ou seja, que a elaboração cognitiva se funda na relação com o outro. Assim, a constituição do sujeito, com seus conhecimentos e formas de ação, deve ser entendida na sua relação com outros, no espaço da intersubjetividade. Com a interação estabelecida entre sujeitos, as trocas de conhecimentos vão acontecendo naturalmente. Através disso, há a possibilidade de construção de novos conhecimentos como também a efetivação de conhecimentos já elaborados e estigmatizados pela sociedade, como aponta Smolka (1996, p. 37): [...] os modos sociais de interação, incluindo a função comunicativa da fala e a coordenação das relações sociais, são internalizadas pelo indivíduo que passa a usar esses mesmos modos para organizar e atuar sobre a sua própria atividade. Nesse processo de interação de signos e práticas sociais, os seres humanos desenvolvem a fala interior, o pensamento verbalizado, preservando a função social das interações na sua atividade individual. Essa reflexão está pautada no objetivo deste artigo, que consiste em compreender o seguinte: como, através de uma formação acadêmica, pode-se apreender novos conhecimentos e reelaborá-los de acordo com a realidade em que o profissional da educação vai atuar, sem que fique alienado ao que está dado como conhecimento pronto e acabado? Nesta perspectiva, referimo-nos especificamente ao Ensino Religioso, componente curricular que tem permanecido com estruturas sólidas emergidas de conhecimentos fundamentados e difundidos pela visão dominante de políticos religiosos. Não é nossa intenção buscar uma compreensão que justifique tal permanência, mas, diante da 225 FONAPER reconfiguração dessas estruturas, vale ressaltar que a falta de profissionais habilitados nesta área do conhecimento impossibilita introduzir novos olhares nos espaços escolares. Assim, em muitos ambientes escolares, percebe-se que o Ensino Religioso continua bebendo da fonte dominadora que se instituiu desde a chegada dos Portugueses ao Brasil. A diferença proporcionada pelo novo olhar sobre a Religião na Europa, difundido através da Reforma Protestante, fez com que a Religião Católica, forte e dominadora até então, aos poucos fosse perdendo fiéis. No intuito de buscar saídas para tal situação instalada nos reinos, Católicos Ibéricos (Portugal e Espanha) são motivados pela Igreja para a busca e conquista de novas terras, novas colônias e, juntamente a essas conquistas, a efetivação do convencimento de novos adeptos, catequizando-os nos seus princípios religiosos. O modelo de pensamento ligado à religião como única e universal ainda é muito forte e resistente em muitas regiões do Brasil. Uma atenção mais minuciosa sobre essa dimensão leva-nos a perceber a dificuldade da atuação dos profissionais do Ensino Religioso nas comunidades escolares, onde, ao lançar perguntas para descontextualizar dilemas que advêm dessa situação, encontram grande resistência na discussão e desconstrução de ideias normatizadas. Essa situação se agrava mais quando da atuação de docentes proselitista que apregoam a teologia de suas religiões e de seus interesses, para o que propomos: todo educador do componente de Ensino Religioso deve ser um profissional habilitado em Ciências da Religião, contemplando as pessoas sem distinção de credo, etnia e função social, com respeito à diferença, cultura e posição social, cujo objetivo seja humanizar o humano e ver nas pessoas ‗alteridade‘ e, na vida da terra, a vida sendo respeitada, sem exceção. O conhecimento humaniza o humano à vida No âmbito escolar, é comum ouvirmos e vermos a prática e o discurso de teorias alienantes. Para muitos profissionais da educação, elas continuam vivas pelo fato de não incorporarem, em seu dia a dia, novos elementos que destituam padrões e normas estabelecidas por interesses econômicos, políticos e religiosos. Diante dessa realidade, percebe-se como os elos dessas teorias permanecem resistentes e perpetuam-se 226 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso através da educação, dificultando aos profissionais da educação perceberem novos conhecimentos, como aborda Adorno (1995, p. 34): Apagar a memória seria mais um resultado da consciência vigilante do que resultado da fraqueza da consciência frente à superioridade de processos inconscientes. Junto ao esquecimento do que mal acabou de acontecer ressoa a raiva pelo fato de que, como todos sabem, antes de convencer os outros é preciso convencer a si próprio. No processo da educação, evidencia-se essa afirmação ao efetivarse a instituição do Ensino Religioso com um novo viés, sem as bases de uma doutrina religiosa, evidenciado nos PCNER (FONAPER, 2009, p. 5): ―[...] o ano de 1997 foi um marco na história do Ensino Religioso no Brasil, o ano em que, pela Lei nº 9475/97, foi dada nova redação ao artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 9394/96 [...]‖, ficando assim contemplada a nova redação: ―[...] assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.‖ (POZZER, 2010, p. 51). Mesmo com essa nova abordagem acerca do Ensino Religioso, percebe-se que a prática de efetivação da aula de Ensino Religioso continua na mesma linha do século XX, com mudanças quase que insignificativas, tanto no discurso como na prática. Nesse sentido, compreende-se que, para ocorrer uma mudança no discurso, é necessário, como diz Adorno (1995, p. 34), ―convencer-se a si próprio‖ de que a mudança ocorreu. Assim como convencer-se de que a mudança ocorreu é importante, talvez seja mais importante contar com um profissional habilitado para atuar nessa área de conhecimento. Teixeira (2011, p. 910) discorre: [...] estudos em ciências da religião hoje no Brasil vem [...] favorecer uma importante ampliação de visada do fenômeno religioso, de capacitação de profissionais instrumentados para essa reflexão específica e de contribuição efetiva para o enriquecimento pedagógico nesta delicada e fundamental área. Porém, passadas duas décadas e meia da elaboração da última Constituição, na qual o Ensino Religioso também é tratado em trâmite legal, encontramos muitos profissionais da área da educação despreparados para ministrar as aulas de Ensino Religioso. Percebemos no dia a dia que nos discursos da maioria de docentes evidenciam-se falas de um ensino proselitista. 227 FONAPER Cabe aqui justificar a importância da atuação do profissional habilitado em Ciências da Religião, que, após frequentar esse curso, tem como sustentação nas discussões relacionadas ao Ensino Religioso abordar os conhecimentos específicos para essa área, retirando dos PCNER (FONAPER, 2009, p. 49) ―[...] os critérios para organização e seleção dos conteúdos e objetivos do Ensino Religioso. [...] Culturas e Tradições Religiosas; Escrituras Sagradas; Teologias; Ritos e Ethos [...]‖ e, ainda, dialogar com pessoas que não têm nenhuma religião ou crença. De posse desses conhecimentos, o profissional habilitado contará também com uma multiplicidade de fatores que exercerão influências em seu discurso, utilizando-se assim de uma linguagem apropriada para abordar os conteúdos específicos desta área do conhecimento, a qual, segundo Oleniki e Daldegan (2003, p. 10-11), ―[...] torna-se responsável em proporcionar o conhecimento do patrimônio cultural de diferentes tradições religiosas para que o educando compreenda o pluralismo e a diversidade cultural presentes na dinâmica social‖. Com a atuação desse profissional, é possível fomentar a mudança que a educação deste novo milênio aspira principalmente no que tange ao Ensino Religioso Escolar. A permanência do discurso proselitista é percebida no espaço escolar nas conversas paralelas do dia a dia dos profissionais. É percebida também nas reuniões pedagógicas quando gestores e demais profissionais ainda se referem ao Ensino Religioso como ―aula de Religião‖ ou direcionam-se a ele utilizando-se da sigla ERE (Educação Religiosa Escolar), evidenciando que as mudanças no tratamento desse componente curricular ainda não foram absorvidas, tampouco a mudança nos próprios conteúdos. Pudemos constatar em nossos estudos que a manutenção desse discurso enquadra-se nos moldes de três características perceptíveis. Porém, em adiantamento a essas três características, é preciso clarificar que tal situação não é presenciada em todas as escolas das redes de ensino, não estamos generalizando, mas enfatizando a ocorrência dessa prática em alguns espaços com os quais temos tido contato, como estagiária, profissional da educação ou através de cadernos de alunos de outras instituições escolares. Primeira característica: a forma de gestão escolar. Tanto no nível micro como no macro, ministrar as aulas de Ensino Religioso, na maioria das vezes, é tarefa atribuída a alguém que está na escola e não possui 228 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso carga horária suficiente em sua habilitação; não se abrem vagas, dificultando a outros profissionais, no caso, os que estão cursando ou que são licenciados na área, ministrarem essas aulas. Dito de outro modo possibilita-se a regência das aulas a quem interessa à gestão. Segunda característica: a formação para essa área. Como professora da rede estadual há mais de dez anos e, especificamente de Ensino Religioso há seis anos, durante os cursos de formação continuada que foram oferecidos pela Secretaria Estadual da Educação, não me lembro de ter recebido formação específica para esta área. O que ocorre quando da oferta dos cursos é uma junção de áreas afins. Provavelmente isso tem ocorrido pela falta de profissionais habilitados e disponíveis para atender tal demanda, ou talvez pelo descrédito que se tem em relação a esse componente curricular. Essas características ficam mais evidentes quando se propaga que qualquer profissional de outras áreas pode ministrar essas aulas de ensino religioso, demonstrando que ainda não foram incorporadas as mudanças garantidas legalmente para o Ensino Religioso. Em razão dessas tendências, percebe-se no início de cada ano letivo as divergências em relação à distribuição das aulas. Como graduandos ou habilitados em Ensino Religioso, precisamos no ato da escolha das aulas nos impor para conseguirmos a garantia de ministrar as aulas desse componente curricular, pois em muitas escolas as aulas são distribuídas a profissionais de outras áreas antes mesmo do momento oficial de escolha. A terceira característica mais limitante e que traz à tona discursos arcaicos: a dificuldade encontrada pelo profissional habilitado para modificar estruturas cimentadas, petrificadas no intelecto de cada profissional integrante das unidades escolares. Essa característica tem traços marcantes, pois dificulta a instituição de novos debates e a construção de novos conhecimentos. A resistência para a desconstrução desses conhecimentos legitimados evidencia-se na gestão escolar, assim como em outros segmentos da sociedade. A maior dificuldade perceptível é justamente a que acontece em datas comemorativas, quando, nas paredes da escola, encontra-se nitidamente estampada a preferência pela mesma religião que outrora era tida como única, ou, muito mais grave, quando são expostos modelos de ―Mães‖ com gravuras de profissionais de passarela ou de ―Mãe Maria‖ em 229 FONAPER comemoração ao dia das mães, jogando-se por terra os Direitos Humanos, os quais referem que temos por direito sermos humanos. Diante dessas práticas comuns em muitas escolas, percebe-se a tendência pela manutenção dos mesmos discursos. Portanto, através do Ensino Religioso, faz-se [...] necessário subsidiar práticas educativas que eduquem para o acolhimento da diversidade, que modifiquem estereótipos e preconceitos por meio do conhecimento de todas as culturas, em mesmo grau e valor, promovendo atitudes e relações sociais que evitem a discriminação e favoreçam interações positivas, possibilitando o desenvolvimento das culturas, em especial, a dos grupos em desvantagem social. (POZZER, 2010, p. 275). A partir dessa abordagem e possuídos por esses conhecimentos que afloram socialmente, o que mais tem nos inquietado é a falta de criatividade de alguns segmentos escolares para substituir essas práticas por outras. As críticas que sofremos como profissionais habilitados em Ciências da Religião ao tentar incluir novos olhares no âmbito escolar são tão frequentes que muitas vezes acabamos compactuando com esses olhares, contribuindo assim para a permanência da visão dominante. Novamente, reporto-me a aquilo que Adorno (1995, p. 34) cita: ―Apagar a memória seria mais um resultado da consciência vigilante do que resultado da fraqueza da consciência frente à superioridade de processos inconscientes [...]‖. Apesar da urgência em absorvermos essas novas tendências, ainda paira a dúvida acerca de como podemos nos desvencilhar desses conhecimentos arcaicos e substituí-los por novos conhecimentos se a comunidade escolar, assim como a sociedade, ainda resiste ao que propomos nos moldes desse novo viés? Cabe, então, formar profissionais capazes de dialogar com as pessoas, com a vida envolta às questões sociais colocadas por interesses individuais ou de grupos que desqualificam qualquer ação humanitária, fraterna, mais igual e de liberdade, que dignificam e fortalecem a alteridade. A sobrevivência desses elementos em nosso conhecimento deve-se à persistência dos pressupostos sociais de alimentar e manter vivas em nosso dia a dia, mesmo que por meio do ocultamento, ideias e afirmações instituídas com o objetivo de manutenção do poder. 230 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Possibilitar novos olhares no âmbito escolar através da efetivação de um profissional habilitado em Ensino Religioso só será possível quando conseguirmos compreender aquilo que Adorno (1995, p. 45) defende: Nem nós somos meros espectadores da história do mundo transitando mais ou menos imunes em seu âmbito, e nem a própria história do mundo, cujo ritmo frequentemente assemelha-se ao catastrófico, parece possibilitar aos seus sujeitos o tempo necessário para que tudo melhore por si mesmo. Percebemos, nessa abordagem, uma multiplicidade de fatores que nos levam a refletir sobre a importância de mudarmos e definirmos os rumos de nossa história. Não é concebível continuarmos difundindo um ensino estruturado em torno dos conhecimentos selecionados. Precisamos, como profissionais habilitados em Ciências da Religião, possibilitar ao Ensino Religioso efetivar as PCNER (FONAPER, 2009, p. 8): ―[...] o conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso‖, isto é, precisamos dar voz a esse componente curricular que, durante toda a História do Brasil, vem lutando para se efetivar como área do conhecimento. O conhecimento das coisas e de como elas realmente acontecem ou aconteceram, principalmente quando nos referirmos às religiões ou crenças, é a saída e entrada para um novo mundo, que já iniciamos. Saberes e Interculturalidade Nenhum saber, por mais puro e estruturado que seja, está isento de ser refutado. Numa cadeia de significações, os saberes ao propor discussões possibilitam a formulação de perguntas que contextualizem as informações e direcionem para outras áreas de conhecimento. Como consequência, outros saberes colocam-se no campo das discussões e vão tomando consistência, contribuindo para a estruturação de novos elementos, os quais emergem para dar sentido e presença à pluralidade de saberes. Nas Ciências da Religião, incontestavelmente, presenciam-se grandes discussões. Essas discussões surgem relacionadas a uma infinidade de saberes que por muito tempo estiveram sob o controle de grupos hegemônicos, dificultando o debate em espaços coletivos. Entre os saberes que na atualidade passam por uma aguçada observação e 231 FONAPER estimulam a reflexão sobre a coexistência, encontramos a pluralidade cultural. Desfrutando das reflexões proporcionadas por essa temática, percebe-se que através das questões que dela emergem há a possibilidade de uma convivência mais harmoniosa entre todos, superando-se assim o modo linear e causal de entendimento da constituição da sociedade. Sem dúvida, se através das aulas de Ensino Religioso conseguirmos deslocar o ângulo estratificado social e superar conhecimentos arcaicos, reformulando-os de acordo com uma nova consciência recheada de olhares destituídos de preconceitos, a partir da qual o ser humano possa compreender que tudo o que vive tem sua sensibilidade, estaremos rompendo com os enquadramentos impostos há séculos e possibilitando novas maneiras de articular relações, refutando assim a ideia de um homem ideal. São muitos e complexos os caminhos para a efetivação desse pensamento. Mas, nesse arcabouço de possibilidades emergentes, compreendemos o que diz Pozzer et. al. (2010, p. 9) quando salienta que [...] o Ensino Religioso constitui-se um direito de todo cidadão, uma vez que o conhecimento religioso é parte dos conhecimentos historicamente produzidos e elaborados por inúmeros povos/culturas e, como tal, necessita estar disponível e acessível a educandos e educandas na escola. Compreendendo a importância que esse componente representa no exercício de absorver ideias de pluralidade, afirmamos que o Ensino Religioso, presente nas escolas públicas e com profissionais licenciados em Ciências da Religião atuando, conseguirá ressignificar essa realidade permeada por ideologias que contêm os germes da dominação e projetar novas interpretações capazes de degenerar a história da individualidade. O Ensino Religioso foi até recentemente uma área pulverizada por outros campos de saberes, começando a ser garantidos nos PCNER (FONAPER, 2009, p. 7) os ―[...] fundamentos históricos, epistemológicos e didáticos desse componente curricular‖. Esses fundamentos direcionam para um aprofundamento de novos saberes e uma aplicação daquilo que está garantido legalmente pelos PCNER (FONAPER, 2009, p. 49): os ―critérios para a organização e seleção de conteúdos e seus pressupostos didáticos‖. Diante dessa argumentação, constatamos que devemos dar 232 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso novos sentidos e direções para o trabalho escolar, adequando-o aos princípios que se apresentam neste século XXI como pressuposto de uma educação que promova a diversidade cultural. Para isso, devemos, como educadores que somos, especialmente como habilitados em Ciências da Religião, proporcionar no âmbito escolar reflexões acerca das mudanças ocorridas na ―concepção da abordagem pedagógica do Ensino Religioso‖ (FONAPER, 2009, p. 7). Devemos introduzir nas discussões do dia a dia, mesmo encontrando muitas resistências, os saberes adquiridos durante a graduação e através das constantes leituras, os quais contribuirão para uma nova compreensão da realidade e possibilitarão, também, ampliar os horizontes da humanização das pessoas, ainda na contemporaneidade. Referências ADORNO, Theodor W. Educação e Emancipação. Tradução Wolfgang Leo Maar. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. CORTELLA, Mario Sergio. Não nascemos prontos!: Provocações filosóficas. 14. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. DAYRELL, Juarez (Org.). Múltiplos olhares sobre a educação e cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1996. FONAPER, Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros Curriculares Nacionais - Ensino Religioso. 9ª. edição. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. LOPES, Ideusa Celestino. Giordano Bruno: crítica ao geocentrismo e defesa do universo infinito. Saberes, Natal, RN, v. 3, n. especial, dez. 2010. Disponível em: <http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/saberes>. Acesso em: 9 abr. 2013. OLENIKI, Marilca Loraine R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: uma prática pedagógica no ensino religioso. 2ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2003. POZZER, Adecir et al. (Org.). Diversidade religiosa e ensino religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios. Obra comemorativa aos 15 anos do FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010. 233 FONAPER POZZER, Adecir; CECHETTI, Elcio; RISKE-KOCH, Simone. Ensino Religioso em Santa Catarina: exercícios na perspectiva de uma educação intercultural. In: OLIVEIRA, Lilian Blank (Org.). Culturas e diversidade religiosa na América Latina: pesquisa e perspectivas. 2. ed. Blumenau: Edifurb; São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010. SMOLKA, Ana Luiza; GÓES, Maria Cecília Rafael de. A linguagem e o outro no espaço escolar: Vygotsky e a construção do conhecimento. 5. ed. Campinas, SP: Papirus, 1996. TEIXEIRA, Faustino. O ―ensino religioso‖ e as Ciências da Religião. Horizonte, Belo Horizonte, v. 9. n. 23, p. 909-931, out./dez. 2011. UNESCO. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Psic. Clin, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 201-207, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pc/v20n2/a15v20n2.pdf>. Acesso em: 9 abr. 2013. 234 FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO RELIGIOSO NO MUNICÍPIO DE CARIACICA - ES Eliane Maura Littig Milhomem de Freitas1 – PMC/FSG Resumo: A presente comunicação objetiva apresentar o processo de formação continuada dos professores do Ensino Religioso do município de Cariacica – ES: como esse sistema de ensino tem pensado e organizado tal formação e como se tem privilegiado a metodologia das sequências didáticas. O texto esclarece sobre a legislação estadual que ampara e normatiza a oferta dessa área do conhecimento e também aborda as formações iniciais oferecidas na grande Vitória – ES. Destaca as tensões que podem ocorrer na prática de sala de aula por falta do estabelecimento de critérios claros para formação dessa área do conhecimento. Tem como intenção discutir sobre a importância da formação continuada, uma vez que os Sistemas de Ensino precisam compreender a dinâmica da disciplina do ensino religioso escolar, seus pressupostos epistemológicos, objetivos, tratamento didático, avaliação da disciplina entre outros, que especifica um trabalho didático diferenciado e que atenda ao prescritivo legal do oferecimento da mesma. Palavras-chaves: Ensino Religioso; Formação Continuada; Sequências Didáticas. Introdução A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) orienta que sistemas de ensino organizem suas Diretrizes Curriculares, e estas devem representar no seu documento as peculiaridades do município. Este texto tem a pretensão de apresentar como tem se dado o processo de formação continuada dos professores do Ensino Religioso do município de Cariacica – ES. Relata sobre a legislação estadual que ampara e normatiza a oferta dessa área do conhecimento e também aborda sobre as formações iniciais oferecidas para essa disciplina na grande Vitória – ES. Em se tratando da disciplina em questão, é necessário considerar sobre a fragilidade da formação do professor de Ensino Religioso, uma vez que paira sobre essa disciplina um entendimento de que ela tenha pouca contribuição específica para a formação dos alunos, além é claro da 1 Mestre em Educação. Universidade São Marcos/SP. Coordenadora da formação de professores do Ensino Religioso no município de Cariacica – ES. Professora do Curso de Pedagogia da FSG. E-mail: [email protected] FONAPER argumentação de que em um Estado laico, o Ensino Religioso foge a esse prescritivo legal. Cabe então a escola, aos professores e a comunidade em geral compreenderem que, embora o país seja laico a nova legislação, a partir da Lei nº 9.475/97 garante um direito humano primordial conforme o artigo 5º inciso VI da Constituição: ―É inviolável a liberdade de consciência e de crença sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias‖. A liberdade religiosa é um dos direitos fundamentais da humanidade, como afirma a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), da qual somos signatários. Assim, as escolas devem organizar seus currículos considerando os princípios norteadores da disciplina como prescreve a legislação tomando como base o diálogo e a tolerância religiosa conforme a cartilha sobre ―Diversidade Religiosa e Direitos Humanos‖ (2004), produzida pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Formação Continuada dos Professores do Município de CariacicaES: Privilegiando as Sequências Didáticas No ano de 2013, em virtude das eleições, o município de Cariacica – ES recebeu uma nova gestão política. A Secretaria Municipal de Educação deixou como herança para a nova administração, um currículo que fora produzido no final da gestão anterior. Tal currículo fora produzido a muitas mãos contando com assessores, especialistas e professores dessa rede de ensino. Dentre as ações da política educacional vigente dessa nova gestão, considera-se como relevante a execução das Diretrizes Curriculares produzidas anteriormente. Assim, para garantir a implantação e materialização do currículo em âmbito escolar, tem se agregado muitos esforços; pois além de um movimento político da secretaria municipal de educação para que o currículo se processe no seio da escola, é importante considerar que os teóricos praticantes do mesmo, ou seja, os professores, participem, compreendam e acreditem na importância do currículo para que este se materialize no dia a dia da escola e para tanto esse movimento deve contar incondicionalmente com os professores atuantes no sistema de ensino. 236 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Esse movimento de formação tem ocorrido periodicamente e a cada encontro a formação vem tomando corpo e aperfeiçoando a metodologia de trabalho que tem permeado tal formação isto é, As Sequências Didáticas. De acordo com as Diretrizes Curriculares do Município de Cariacica para o Ensino Religioso (2012, p. 158): [...] enfatiza-se a importância de uma metodologia que busque a utilização dos eixos apresentados e o desenvolvimento do conteúdo a partir das sequências didáticas. Essas, por sua vez, se constituem num conjunto de atividades ligadas entre si e planejadas para trabalhar um determinado conhecimento, etapa por etapa, numa perspectiva dinâmica, intencional, contextualizada visando atingir os aspectos da aprendizagem de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais. As sequências devem na sua estrutura metodológica privilegiar a problematização inicial, que consiste em motivar e coordenar as discussões, a organização no qual diferentes atividades poderão ser empregadas para auxiliar no desenvolvimento dos conceitos em que se articula o conhecimento com as atividades cotidianas. Observa-se que o trabalho desenvolvido a partir das Sequências Didáticas mobiliza o aluno, pois o torna um sujeito mais participativo nas aulas e os conteúdos tanto mais significativos. Assim a aprendizagem se torna também significativa. De acordo com Pelizzari (2002) a teoria da aprendizagem de Ausubel propõe que os conhecimentos prévios dos alunos sejam valorizados, para que possam construir estruturas mentais utilizando, como meio, mapas conceituais que permitem descobrir outros conhecimentos, caracterizando, assim, uma aprendizagem prazerosa e eficaz. Delizoivov, Angotti e Pernanbuco apud Mendes (2010) sugerem uma nova abordagem de conteúdos, visando a superar as concepções, muito presentes em sala de aula. Essa metodologia tem início com a problematização inicial, na qual se faz a introdução do conteúdo, valorizando a participação dos alunos. Nesse momento devem colocar seus conhecimentos e experiências em relação ao tema. Num segundo momento segue a organização do conhecimento, sistematizando e estudando o tema visando à sua compreensão, com a orientação do professor. A metodologia é finalizada com a aplicação do conhecimento, na qual o aluno deverá articular o conhecimento com situações cotidianas e significativas. 237 FONAPER Ausubel apud Pelizzari (2002, p. 38) assim se expressa: Para haver aprendizagem significativa são necessárias duas condições. Em primeiro lugar, o aluno precisa ter uma disposição para aprender: se o indivíduo quiser memorizar o conteúdo arbitrária e literalmente, então a aprendizagem será mecânica. Em segundo, o conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente significativo, ou seja, ele tem que ser lógica e psicologicamente significativo: o significado lógico depende somente da natureza do conteúdo, e o significado psicológico é uma experiência que cada indivíduo tem. Cada aprendiz faz uma filtragem dos conteúdos que têm significado ou não para si próprio. Se esta metodologia for amplamente trabalhada por nossos professores, então teremos um aprendizado potente, pois o que a escola pode oferecer de melhor é um ensino que faça sentido para o alunado; pois infelizmente muitos deles enxergam o conhecimento como algo muito fora da sua realidade. Na docência do Ensino Religioso é necessário considerar que os conteúdos se tornam interessantes ao conhecimento do/a aluno/a se ele/a compreender que os temas ali problematizados e discutidos em sala de aula fazem parte de um contexto que abrange uma complexidade, mas que essa complexidade precisa ser identificada e reconhecida pelo/a próprio aluno/a. Toma-se como referência Figueiredo (1995) quando diz que a busca da identidade pessoal é fundamental no processo que visa a tal realização. Assim, no dizer da autora a escola por ser uma instituição qualificada de educação, abre perspectivas para a evolução diferencial do eu, isto é, possibilita ao aluno reconhecer-se como ser humano que é, colabora no sentido de ampliar os horizontes, identificar outras concepções de valores e de sua determinação subjetiva na relação interativa global do nós, compreender-se como ser integrante de algo muito maior. ―A pessoa não é ainda uma plenitude experimentada, é um ―vir-a-ser‖; a única maneira de alcançá-la é fazê-la ser‖ (RICOUER apud FIGUEIREDO, 1995, p. 34). A Legislação Estadual e os cursos de Formação de professores do Ensino Religioso na Grande Vitória – ES No Estado do Espírito Santo temos como legislação que rege a disciplina do Ensino Religioso os decretos do governador nº 1735 – R que 238 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso dispõe sobre o reconhecimento e credenciamento do CONERES (Conselho do Ensino Religioso no Estado do ES), o Decreto nº 1736 – R que dispõe sobre a oferta da disciplina do Ensino Religioso nas escolas públicas estaduais do ES e a Resolução nº 1900/2009, que explica e normatiza sobre a oferta da disciplina Ensino Religioso no Ensino Fundamental das escolas públicas do Estado do Espírito Santo. Esses textos apresentam como perfil docente para o Ensino Religioso preferencialmente professores do quadro efetivo do magistério com curso de licenciatura e com pós-graduação em Ensino Religioso; ou com licenciatura, acrescida de curso de formação específica em Ensino Religioso, com carga horária mínima de 180 (cento e oitenta) horas; para atuação nas séries iniciais do Ensino Fundamental ou ainda com formação em Ciências da Religião acrescida de complementação pedagógica. Para suprir eventual falta de professores do quadro efetivo, a Resolução nº 1900/2009 diz que será permitida uma concessão de autorização temporária para o exercício do magistério da disciplina Ensino Religioso, considerando os mesmos prescritivos anteriormente colocados. O Art. 7º da Resolução citada afirma que nos dois primeiros anos contados a partir de sua publicação, as secretarias de educação deveriam promover em caráter emergencial, curso de formação específica em Ensino Religioso, com carga horária mínima de 180 horas, elaborado por comissão designada para esse fim, com a participação do CONERES, destinada a docentes da respectiva rede pública, com licenciatura em qualquer área do conhecimento ou habilitados em curso de nível médio, modalidade Normal que tenham interesse em ministrar Ensino Religioso. O Art. 9º afirma que as secretarias de educação promoveriam para os professores com formação em nível superiora oferta de cursos de pósgraduação lato sensu em Ensino Religioso, elaborado com a assessoria do CONERES. Embora já tenhamos por parte das secretarias de educação um esforço no sentido de garantir pelo menos a oferta do Ensino Religioso nas escolas e da formação continuada, não temos, por outro lado, atingido a meta da formação de professores com a participação e envolvimento dos sistemas de ensino, como prescreve a resolução, salvo raríssimas exceções. Assim cabe a iniciativa privada ofertar o curso de formação de professores em Ensino Religioso para sua atuação em escolas públicas municipais e estaduais. 239 FONAPER Infelizmente, no Estado do Espírito Santo, não temos ainda um curso de formação de professores em nível de graduação que possa atender a todas as demandas colocadas para o desenvolvimento da disciplina em âmbito escolar. Na grande Vitória, são oferecidos cursos da iniciativa privada em nível de pós-graduação e aqueles que têm seus projetos de curso em concordância com a lei, têm obtido o referendo do CONERES conforme adverte a Resolução citada anteriormente. No entanto consideram-se tais cursos incipientes no sentido de oferecer maior aprofundamento para atender à dinâmica que envolve a disciplina tanto no que diz respeito aos conhecimentos de aprofundamento teórico como de aprofundamento prático. Observa-se que nesses cursos de formação muitos dos formandos são pessoas que fizeram o bacharelado em Teologia e então buscam uma complementação pedagógica e um curso de pós em Ensino Religioso para que possam adquirir a formação requerida para a docência nessa disciplina. Resulta daí alguns percalços que contribuem para uma docência que às vezes se torna problemática, pois, na maioria das vezes, falta a esse docente uma maior compreensão metodológica e didática para o desenvolvimento do processo educativo, pois é preciso compreender que mesmo o/a professor/a de Ensino Religioso deve desenvolver saberes necessários à prática educativa, segundo Freire (2002). Tomando por base o autor citado considera-se como marco fundamental para a formação do professor a máxima de Freire que afirma que ―ensinar exige reflexão crítica sobre a prática. [...] É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática‖ (FREIRE, 2002 p. 44). Para esse autor, a prática educativa-crítica pauta-se numa ética pedagógica e numa visão de mundo alicerçadas em rigorosidade, pesquisa, criticidade, risco, humildade, bom senso, tolerância, alegria, curiosidade, esperança, competência, generosidade, disponibilidade dentre outros que transforma um/a professor/anum docente crítico e comprometido com uma educação que prima pela aprendizagem dos alunos. Placco e Silva, citadas por Freitas (2013), alertam que é preciso considerar que a formação se dá em diferentes dimensões. Assim temos: a 240 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso dimensão técnica científica – esta dimensão consiste na formação de uma área específica e na busca de um conhecimento técnico-científico inter e transdisciplinar; a dimensão da formação continuada – a qual motiva, estimula a busca de outros saberes, possibilitando a dialética como o novo; a dimensão do trabalho coletivo e da construção coletiva do trabalho pedagógico – essa dimensão possibilita a construção do grupo, trabalhando em cooperação com vistas à melhoria da aprendizagem dos alunos; a dimensão dos saberes para ensinar – essa dimensão abrange os aspectos afetivo-emocionais, proporciona o conhecimento sobre os objetivos educacionais e seus compromissos como cidadão e profissional (visão de educação, objetivos da educação, formação de determinado tipo de homem que se pretende formar); a dimensão crítico reflexiva – tal dimensão exige compromisso e disponibilidade para reflexão e avaliação da própria prática; e finaliza com a dimensão avaliativa – tal dimensão colabora no sentido de informar sobre as especificidades de uma avaliação mais justa e destituída de autoritarismo. Tais dimensões podem e devem ser desenvolvidas simultaneamente a fim de melhorar a prática dos professores e para que estas sejam assimiladas pelos/as professore/as é necessário que haja uma boa formação inicial complementada pela formação continuada. Apontamos ainda Tardif (2002) que em seu livro ―Saberes Docentes e Formação Profissional‖ apresenta aos professores dois pontos de convergência; ele diz que a formação deve considerar o saber dos professores em seu trabalho e o saber dos professores em sua formação. No texto o autor procura discutir sobre os saberes que servem de base para desenvolver um bom trabalho, sobre os fundamentos sociocognitivos do ensino entre outros que darão suporte teórico para entendimento do trabalho docente no contexto escolar, colaborando assim com os textos sobre formação discutidos anteriormente. Tensões Pedagógicas e os Desafios da Compreensão da Disciplina do Ensino Religioso para a Formação do Professor De conformidade com Oliveira (2007) a prática docente pressupõe uma concepção educacional que determine a compreensão dos papéis do professor e do estudante, da metodologia, da função social da escola e dos conteúdos a serem trabalhados. 241 FONAPER Educar não é tarefa fácil e a cada dia as tensões pedagógicas se confundem no seio da escola. Para além dessa normativa a disciplina do Ensino Religioso sempre esteve ―marcada por conflitos políticos e ideológicos em decorrência da dificuldade de definir com clareza a identidade pedagógica da disciplina‖ (OLIVEIRA, 2007, p. 120). A religiosidade se faz presente na modernidade em que vivemos e nesse contexto Sandrini (2009) nos esclarece que estamos vivendo uma mudança de época. Novos paradigmas estão surgindo e trazendo consigo novos valores. Para o autor o grande desafio que se coloca é odo diálogo com todas as culturas, todas as religiões e etnias. Assim o autor destaca três realidades que se entrecruzam. São elas: a religiosidade, a educação e a pós-modernidade. Ele alerta que se a modernidade não soube dialogar com a religião, por outro lado a religião não soube dialogar com a modernidade. No contexto atual em que vivemos não há espaço para exclusões e muito menos para anátemas. Todos querem ser incluídos e de maneira geral recebem por parte dos seus constitutivos políticos e jurídicos tais condições. O próprio autor reconhece que a cultura ocidental sempre teve grande dificuldade em incluir o outro e o diferente em sua reflexão e em sua ação. Infelizmente os conhecimentos que adquirimos em nossa vida acadêmica foi pensado a partir da cultura eurocêntrica, mesmo que os povos em que se manifestassem esses sentidos fossem das mais diversas etnias. No Brasil em particular vivemos muitas tensões políticas que perpassam pelo viés religioso. Não são poucas as tentativas de também por conta disso suprimir o Ensino Religioso da escola, desconhece, no entanto tais predicativos que quanto maior for o entendimento do conhecimento religioso tanto mais se abreviará as tensões pelo imperativo da tolerância e do respeito ao outro. Sandrini (2009) propõe uma análise que no seu entender se constitui na revitalização da religiosidade. No dizer do autor, se por um lado houve um adormecimento da espiritualidade, por outro ele destaca cinco pontos fundamentais pelas quais apresentam os motivos de tal revitalização. Em primeiro lugar, destaca a queda do colonialismo, determinando também o fim do eurocentrismo, ou pelo menos seu enfraquecimento, podemos constatar que nossa legislação educacional já determina a inserção das 242 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Leis nº 10.639/03 e da Lei 11.645/08 que torna obrigatória o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana, e indígena nas redes públicas e particulares da educação, pela qual, anteriormente, nem se pensava em estudar tais conhecimentos e quando apareciam eram destacados como inferiores, primitivos e folclóricos e tantos outros adjetivos que o livro didático procurou apresentar; assim como outras culturas que receberam valor e consideração a partir de um olhar plural; em segundo lugar, o consequente desenvolvimento de uma sociedade multiétnica, que se mostra e se empodera como sujeitos de direitos e culturas diferenciadas; e em terceiro, as culturas que tomaram a palavra nas sociedades ocidentais e trouxeram consigo suas próprias teologias e crenças religiosas com o consequente retorno à tradição religiosa local nas sociedades industriais; como ponto quarto, a gravidade dos novos problemas que advém da modernidade com o desenvolvimento das ciências da vida e que simplesmente a razão é incapaz de solucionar; e ainda um quinto ponto que o autor coloca como a popularidade que um personagem como o papa romano adquiriu ao contribuir poderosamente para a queda das ditaduras comunistas. Diante de todo esse contexto depreende-se que ―mesmo com suas contradições e acusações de alienação, manipulação, distorções, regressões, a religião continua sendo potencial de esperança para o mundo‖ (SANDRINI, 2009, p. 133). Há que se entender, no entanto que todo esse conhecimento não é incorporado imediatamente pelo universo escolar ou mesmo pela sociedade. Fazem-se necessárias políticas públicas que fomentem tal entendimento criando possibilidades de formação e de compreensão por parte dos indivíduos. Continuando com o autor citado ele adverte que a religião são tesouros éticos e que tem muito a ensinar a modernidade; assim como a modernidade tem a ensinar a religiosidade. Boff citado por Sandrini (2009), destaca que as grandes ameaças da humanidade são o desequilíbrio ecológico e as injustiças sociais. Para o autor a solução para esses males não se encontra na técnica e nem na economia isoladas e sozinhas. Para ele o encaminhamento pode ser dado a partir da confluência de três grandes realidades: a ética, a educação e a espiritualidade. Fazendo um recorte de todas as questões aqui colocadas, compreende-se a escola como uma agente também de responsabilidade 243 FONAPER social e nesse sentido não somente a disciplina do Ensino Religioso deve imbuir-se desse papel como todas as demais disciplinas. Para tanto cabe aos sistemas de ensino e as escolas reconhecerem qual de fato é a roupagem para essa disciplina tão rica para promover conexões e interações com o vasto e globalizado mundo em que vivemos. Dinâmica da disciplina do ensino religioso escolar: seus pressupostos epistemológicos, objetivos, tratamento didático e avaliação. A Resolução nº 4 de 13 de julho de 2010 que define as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica no capítulo II, artigo 14 relaciona as disciplinas da Educação Básica e dentre elas cita o Ensino Religioso como parte integrante da base nacional comum e como área do conhecimento de acordo com o parágrafo 2º. Assim a mesma enquadra-se no padrão comum das demais disciplinas, pois apresenta: objeto de estudo – o fenômeno religioso; conteúdo próprio – conhecimento religioso; tratamento didático – didática do fenômeno religioso; e ainda, objetivos definidos, metodologia própria, sistema de avaliação e inserção no sistema de ensino prescrito nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso - PCNER (FONAPER, 2006). Para Oliveira et al. (2007) o desafio de discutir a identidade pedagógica do Ensino Religioso encontra-se no fato de que, no decurso de sua história, ele não foi concebido como integrante de uma área maior com a educação. Propor e discutir características pedagógicas para esse componente curricular significa analisá-lo e compreendê-lo segundo o conjunto de teorias e doutrinas da educação. A mesma autora relata que historicamente em grande parte das investigações efetuadas pelos estudiosos do Ensino Religioso brasileiro, a fonte mais utilizada era a legislação, e não as linhas educacionais. A autora adverte sobre dois enfoques significativos na articulação da formatação dos componentes curriculares; o primeiro é o enfoque social sobre os processos de ensino e aprendizagem. Entende-se desse sentido as relações entre desenvolvimento e aprendizagem, a importância da relação interpessoal e a relação entre a cultura e educação e o papel da ação educativa ajustada às situações de aprendizagem e às 244 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso características da atividade mental construtiva do aluno em cada momento da escolaridade; o segundo é a compreensão do processo de desenvolvimento na construção do conhecimento. Compreender os mecanismos pelos quais o indivíduo constrói suas representações. De conformidade com a autora citada, o componente curricular do Ensino Religioso, articulado com as demais disciplinas, contribui para a construção de outra visão de mundo, de ser humano e de sociedade. Depreende-se que o objeto do Ensino Religioso é o fenômeno religioso, assumindo a conceituação de religião que tem o significado de ―reler‖, ―religar‖ o ser humano a Deus. Figueiredo (1995) adverte que o termo ―religioso‖ deriva do latim ―religio‖, que designa, de certa forma, a relação da pessoa humana com o sagrado; e a paIavra ―Religião‖, segundo Lactâncio, vem de ―religare‖, no sentido de relação com a entidade divina. No entanto é importante considerar de acordo com a autora citada que o Ensino Religioso não está a serviço dessa ou daquela religião, mas sim identificar o substrato religioso presente na formação do povo brasileiro e ainda o fenômeno religioso, que adentra as nossas vidas, sejam pelos símbolos, costumes, feriados, movimentos sociais, mídia e etc. Segundo os PCNER (FONAPER, 2006), o tratamento didático do Ensino Religioso deve considerar, como em outras áreas, os conhecimentos anteriores do educando, interesses e possibilidades, a garantia de participação dos alunos numa perspectiva de gerar respeito à diferença, vivência da própria cultura e tradição religiosa, abertura para a aprendizagem e autonomia, recursos adequados, estabelecimento de relações, interações, conexões entre os conhecimentos do universo religioso pessoal e com os conhecimentos religiosos dos colegas e os apresentados no ambiente escolar. Oliveira et al. (2007) apresenta alguns aspectos estruturais da disciplina, já regulamentadas em nível nacional. São elas: é parte integrante da formação básica do cidadão; é disciplina dos horários normais, assegurando o respeito à diversidade cultural religiosa sem proselitismo; é componente curricular; veicula um conjunto de conhecimentos e conteúdos que subsidiam o entendimento do fenômeno religioso à luz da relação entre culturas e tradições religiosas; orienta para a sensibilidade ao mistério; encaminha processos de aprendizagem 245 FONAPER processual, progressista e permanente; desenvolve práticas pedagógicodidáticas contextualizadas e organizadas, que se concretizam nas relações de ensino-aprendizagem; percebe a avaliação como um processo não servindo para fins de promoção e retenção, mas para aferir se os objetivos foram atingidos e as metas alcançadas. O Ensino Religioso utiliza-se da avaliação como um elemento integrador da aprendizagem dos estudantes à atuação dos professores na construção coletiva dos conhecimentos. Na forma de avaliação processual, o objetivo maior será sempre desenvolver o diálogo, oferecendo a uns e outros, oportunidades para que cresçam mediante percepções diferenciadas sobre um mesmo dado social, num constante processo de construção e reconstrução dos conhecimentos (OLIVEIRA et al., 2007, p. 116). Em relação aos conteúdos e metodologia compreende-se que o Ensino Religioso constitui um dos elementos para a formação integral do ser humano. Assim como as outras disciplinas tal componente assume o compromisso de pensar, discutir, analisar e proporcionar os elementos que transitam numa ética, alteridade e respeito à diferença. É importante levar em conta a vivência do alunado, observando os elementos dos contextos, a singularidade, situações e sentimentos que permeiam suas vidas e como estas mobilizam seu desenvolvimento humano. Além desse imperativo, Oliveira et al. (2007) considera proposital a perspectiva cultural para que estas possam também ser privilegiadas na elaboração das propostas curriculares. Assim também é importante apreciar as condições positivas, a cooperação ativa; as relações interpessoais e outros elementos que no contexto das escolas são consideradas de fundamental relevância. Como parte da orientação dos PCNER (FONAPER, 2006), Oliveira et al. (2007) destaca cinco invariantes propostas para o conhecimento religioso. São eles: Cultura e Tradições Religiosas, que analisa questões como função e valores da tradição religiosa, relação entre ética e outros; Textos Sagrados (orais e escritos) apresentam os textos que transmitem, conforme a fé dos seguidores, uma mensagem do transcendente, mediante a qual, pela revelação, cada forma de afirmá-lo faz conhecer aos seres humanos seus mistérios e sua vontade, dando origem às tradições. De acordo com a autora, estão presentes neste eixo a pregação, a exortação e os estudos eruditos; Teologias, esse eixo contempla o conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados pela religião sobre o 246 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso transcendente e repassados aos fiéis de um modo organizado ou sistematizado; os Ritos identificam uma série de práticas celebrativas das tradições religiosas, formando um conjunto de rituais, símbolos e espiritualidades; e o Ethos, que apresenta a forma interior da moral humana em que se realiza o próprio sentido do ser. A autora considera a importância de exercícios que favoreçam a sensibilidade diante de qualquer discriminação religiosa no trato do cotidiano. Assim professores/as e alunos/as precisam embrenhar-se nos mistérios da fé. Devem formar o senso crítico, a fim de possibilitar aos estudantes leitura e interpretação das narrações e dos fatos históricos religiosos relacionados como fenômeno religioso de caráter plural. Conclusões A formação de professores permeada pelas Sequências Didáticas está em andamento. Embora tenhamos muito que avançar, o município de Cariacica já deu conta de oferecer aos seus professores um documento escrito, como também tem mobilizado e possibilitado a formação. No desenvolvimento dessa formação contamos com atentos novos olhares, curiosos, mas interessados em oferecer um Ensino Religioso com qualidade e comprometimento. A metodologia ora pensada é uma novidade na formação. É preciso acreditar que tem consistência e que pode mobilizar o educando para a aprendizagem. Os conteúdos apresentados pelos professores devem chegar para os alunos com efeitos de sentidos e significados. A modernidade se expressa de forma a tomar o seu lugar também no contexto da religiosidade e o diálogo é fundamental para possibilitar a aproximação dos sujeitos, diferentes em concepções, mas iguais em direitos. Assim, cabe também ao docente o entendimento da revitalização do ser humano que tem modos de vida diferentes, porém que precisa ser respeitado e acolhido pelos agentes educativos. Se tivermos bons professores de Ensino Religioso teremos em boa medida bons alunos e bons cidadãos também cientes não só dos seus deveres, como também dos seus direitos. Para dar conta da docência do Ensino Religioso é preciso levar em conta seus pressupostos epistemológicos, objetivos, tratamento didático e avaliação; pois assim cada vez mais se produzirá novos conceitos. E 247 FONAPER assim, os/as alunos/as, professores/as e quem sabe os cidadãos/ãs brasileiros/as poderão conhecer a dinâmica dessa disciplina que envolve o ser humano naquilo que ele tem de mais precioso que é a sua espiritualidade. Cabe então à escola ofertar com responsabilidade e zelo o Ensino Religioso compreendendo que a educação para a religiosidade fará a diferença na vida do alunado trazendo-lhes mais segurança, conhecimento e respeito. Referências BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil – Brasil, DF: Senado Federal, 1998. BRASIL. Resolução CNE/CEB nº 4, de 13 de julho de 201. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Disponível em http//portal.mec.gov.br. Acesso em 04 de agosto de 2013. BRASIL. Resolução do CEE/ ES nº 1900/2009. Vitória: ES. Diário Oficial dos Poderes do Estado, de 26 de novembro de 2009. DECRETO nº 1735-R de 26 de Setembro de 2006. Dispõe sobre o reconhecimento e credenciamento do CONERES (Conselho do Ensino Religioso no Estado do ES). DECRETO nº 1736-R de 26 de Setembro de 2006. Dispõe sobre a oferta da disciplina do Ensino Religioso nas escolas públicas Estaduais do ES. Diretrizes Curriculares do Município de Cariacica (Ensino Fundamental de 6º ao 9º ano)/ Prefeitura Municipal de Cariacica, ES: Secretaria Municipal de Educação: ES, 2012. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários a Prática Educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. FREITAS, Eliane Maura Littig Milhomem de. O Ensino Religioso no município de Cariacica – ES: O processo de construção das diretrizes curriculares e o desafio de sua implementação em âmbito escolar. Comunicação apresentada no I Simpósio Internacional de Teologia e Ciências das Religiões no período de 10 a13 de junho de 2013 em Vitória/ES. 248 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso FIGUEIREDO, Anísia de Paulo. Ensino religioso: perspectivas pedagógicas. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. (Colégio Ensino religioso escolar. Série fundamentos). MENDES, Francisco Carlos Pierin. Fundamentos e Metodologia de Ciências. Curitiba: Editora Fael, 2010. OLIVEIRA, Lilian Blanck (et al). Ensino Religioso: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2007. (Coleção docência em formação. Série Ensino Fundamental). Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. Editora Ave Maria: São Paulo, 2006. PELIZZARE, Adriana (et al). Teoria da aprendizagem significativa segundo Ausubel. Rev. PEC, Curitiba, v.2, n. 1, p. 37, jul. 2001 – jul. 2002 SANDRINI, Marcos. Religiosidade no contexto da pós-modernidade. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. Petrópolis. RJ: Vozes, 2002. 249 O ENSINO RELIGIOSO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL, EM MINAS GERAIS: A FORMAÇÃO E A PRÁTICA DOCENTE Felippe Nunes Werneck1 (PUC Minas) Resumo: Ao se pensar sobre o Ensino Religioso (ER) nas escolas públicas estaduais, em Minas Gerais, depara-se com o aspecto legal, no que se refere à docência: a Resolução SEE nº 2.253/2013, estabelece, no art. 4º, que as disciplinas ER e Educação Física (EF) devem ser ministradas pelo professor regente, nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Esta comunicação, considerando o currículo do curso de Pedagogia de três universidades mineiras e a proposta, defendida por Cortella (2006), Passos (2006), Caron (2011) e Junqueira (2011), de formatação dos cursos de Ciências da Religião para a formação de professores de ER, objetiva discutir o seguinte: É necessário o docente especialista para o ER, nos anos iniciais do Ensino Fundamental? O curso de Pedagogia prepara o professor regente para abordar, sistematizada e cientificamente, o conteúdo do ER? Palavras-chave: Ensino Religioso. Ensino Fundamental. Anos Iniciais. Formação Docente. Prática Docente. Introdução No Estado de Minas Gerais, foi publicada, pela Secretaria de Estado de Educação, a Resolução nº 2.253, de 09 de janeiro de 2013, estabelecendo, no artigo 4º, que as disciplinas Educação Religiosa e Educação Física (EF) devem ser ministradas pelo professor regente da turma, nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Art.4º Nos anos iniciais do Ensino Fundamental os componentes curriculares de Educação Física e Educação Religiosa serão ministrados pelo próprio regente da turma, exceto quando na escola já houver professor efetivo ou efetivado pela Lei Complementar nº 100, de 2007, nesses componentes curriculares. (MINAS GERAIS, 2013). Esse ato normativo causou um desconforto muito grande entre os professores de Educação Religiosa e EF. No início do ano de 2013, 1 Mestrando em Ciências da Religião, sob orientação do Prof. Dr. Amauri Carlos Ferreira, no Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião – PUC Minas, Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e integrante dos Grupos de Pesquisa (CNPQ): Educação, Ética e Religião e Rede Ibero-Americana de Estudos sobre Educação Profissional e Evasão Escolar (RIMEPES). E-mail: [email protected] FONAPER seguindo as determinações da Resolução SEE nº 2.253/2013, os professores designados que tinham assumido uma das duas disciplinas, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, foram desligados das escolas estaduais e, de acordo com relatos de alguns docentes, os profissionais efetivos ou efetivados, que lecionavam a Educação Religiosa ou a Educação Física, no referido nível de ensino, foram lotados em outras séries e, até, em outras disciplinas diferentes daquelas para as quais fizeram concurso e se formaram. Diante disso, o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG) e o Conselho Regional de Educação Física – 6ª Região, através de seus representantes, organizou-se e solicitou ajuda aos representantes políticos para intermediar o diálogo entre os professores, as organizações civis de representação e a Secretaria de Estado de Educação, para discutirem o conteúdo da Resolução SEE nº 2.253/2013. No dia 30 de abril de 2013, a partir do requerimento assinado pelos deputados estaduais Ulysses Gomes de Oliveira Neto, Rogério Correia de Moura Baptista e Luiz Tadeu Martins Leite, ocorreu uma Audiência Pública, promovida pelas Comissões de Educação, Ciência e Tecnologia e de Esporte, Lazer e Juventude, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), com o objetivo de debater o artigo 4º, da Resolução SEE nº 2.253/2013. Em todas as declarações dos trabalhadores em educação, dos representantes sindicais, dos licenciandos e de alguns deputados, pronunciadas na Audiência, afirmou-se a reivindicação da revogação do referido artigo, assegurando, assim, que as disciplinas Ensino Religioso (ER)2 e Educação Física fossem lecionadas, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, por profissionais com habilitação específica. No que tange ao ER, para demonstrar a especificidade do conteúdo e, consequentemente, do trabalho da referida disciplina, que acaba requerendo um professor habilitado nessa área, os docentes e demais debatedores, ao longo da Audiência Pública, explicitaram, através de cartazes e de seus pronunciamentos, algumas expressões referentes aos 2 Neste trabalho, a nomenclatura utilizada é Ensino Religioso para se referir à disciplina que se configura no tema deste texto. Dessa forma, apesar desse trecho se referir ao artigo 4º, da Resolução SEE nº 2.253/2013, que faz o uso da designação Educação Religiosa, utiliza-se o termo Ensino Religioso, recorrendo àquela nomenclatura, apenas, quando se referir ao texto do instrumento normativo, em questão. 252 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso assuntos abordados nas aulas de ER, no intuito de defender a importância da matéria na formação dos alunos. A seguir, evidenciam-se as palavras e expressões expostas em cartazes afixados no auditório, onde ocorreu a Audiência: 1. Relacionamentos Saudáveis, Harmoniosos e Equilibrados; 2. Cultura de Paz, Compreensão, Diálogo, Respeito e Tolerância; 3. O Ser Humano como Projeto Infinito; 4. Valores em Primeiro Lugar; 5. Propiciando Escolhas Saudáveis. Com base nas palavras e expressões expostas nos cartazes, como Relacionamentos, Ser humano, Valores, Escolhas, Cultura de Paz, Compreensão, Diálogo, Respeito e Tolerância, pode-se demarcar a base epistemológica do Ensino Religioso, do currículo das escolas estaduais, a partir da visão e da prática dos professores. No entanto, ressalta-se que, neste trabalho, não se fará a análise do conteúdo dos cartazes apresentados acima, assim como, da epistemologia do ER, focando na discussão sobre o docente, que leciona nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a sua formação e a sua habilitação para trabalhar com os conteúdos do Ensino Religioso, no referido nível de ensino. Na Audiência Pública, vários expositores puderam manifestar as suas opiniões acerca da Resolução SEE nº 2.253/2013 ou o posicionamento dos órgãos que se fizeram presentes, e, a partir de algumas falas, pôde se chegar à questão sobre a formação e a atuação do professor de Ensino Religioso, ou seja, do docente especialista da área, e do profissional generalista que leciona nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. A coordenadora-geral do Sind-UTE/MG, prof.ª Beatriz da Silva Cerqueira, defendendo a presença, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, dos professores habilitados ou especialistas para lecionarem as disciplinas Ensino Religioso e Educação Física, afirmou que ―[...] é um desrespeito ao direito das crianças de ter um profissional habilitado nas áreas de Educação Física e Ensino Religioso nos Anos Iniciais.‖ (IMPASSES..., 2013). No sentido contrário à requisição da prof.ª Beatriz Cerqueira, a subsecretária de Educação Básica, da Secretaria de Estado de Educação, prof.ª Raquel Elizabeth de Souza Santos, reiterou que o professor, 253 FONAPER licenciado em Pedagogia ou em Normal Superior, é o profissional habilitado, legalmente, para atuar nos Anos Iniciais, devendo, assim, lecionar todos os conteúdos que compõem a matriz curricular, do referido nível de ensino. O profissional, para trabalhar nos Anos Iniciais, não é o especialista de conteúdo, é o habilitado pelo curso Normal, de nível superior, ou o habilitado pelo curso de Pedagogia. Em todas as estruturas destes cursos, lá dá plena autonomia a ele, que esses profissionais vão lecionar: Português, Matemática, Geografia, História, Ciências, Educação Física, Artes e Ensino Religioso. (IMPASSES..., 2013). Ressalta-se que o argumento, apresentado acima, valida a decisão do Estado mineiro em reafirmar que os componentes curriculares de Educação Física e de Ensino Religioso devem ser ministrados pelo próprio regente da turma, ou seja, o professor, cuja formação obrigatória se consubstancia na posse do título de graduado em Pedagogia ou em Normal Superior. Uma aluna do curso de Pedagogia, de uma Instituição de Ensino Superior (IES) particular, localizada em Belo Horizonte, e que estava presente na Audiência Pública, realizada na ALMG, manifestou a sua preocupação em lecionar os conteúdos de Educação Física e de Ensino Religioso, pois ela não se sentia capacitada, por meio de sua graduação, para ministrar os componentes citados, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental (SIND-UTE., 2013). Ainda, ao encontro da fala dessa expositora, um aluno do curso de Ciências da Religião, de uma IES pública, situada na cidade de Montes Claros, indagou a prof.ª Raquel Santos sobre o porquê das escolas estaduais não continuar seguindo a orientação já praticada quanto à disponibilização dos professores de ER para os Anos Iniciais, visto que, no próprio Estado, é ofertada, na modalidade licenciatura, a graduação em Ciências da Religião, responsável pela formação do docente em ER, o qual poderá atuar na Educação Básica, ou seja, nos Ensinos Fundamental e Médio. Diante desses argumentos e opiniões, questiona-se, especificamente sobre a disciplina Ensino Religioso, o seguinte: o curso de Pedagogia prepara o professor regente para abordar, sistematizada e cientificamente, o conteúdo do ER? É necessário o docente especialista para o ER, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental? 254 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Na tentativa de se encontrar alguma resposta aos questionamentos acima, recorrer-se-á à legislação que normatiza, atualmente, a formação dos professores para o Ensino Fundamental, especificamente, para os seus cinco primeiros anos, às matrizes curriculares de três cursos de Pedagogia, de diferentes IES, localizadas em Belo Horizonte, e, também, às proposições de Cortella (2006), Passos (2006), Caron (2011) e Junqueira (2011), as quais se referem à habilitação dos cursos de licenciaturas em Ciências da Religião para a formação de professores de ER. Formação Docente para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental: alguns aspectos das legislações nacional e estadual Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBen), a de nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, é previsto, após a alteração do artigo 62 através da Lei nº 12.796, de 04 de abril de 2013, que a formação de professores, para a Educação Básica, deve ser realizada em cursos de licenciatura, de nível superior, admitindo-se, para o exercício da docência na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a formação mínima oferecida em cursos normais de nível médio. Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica farse-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal. (BRASIL, 1996). Ainda sobre isso, tem-se o Parecer CNE/CP nº 5, de 13 de dezembro de 20053, que, ao tratar sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia, defini o exercício profissional daqueles que se formarem na referida graduação, enfatizando, como base da formação ofertada, a docência, cuja atuação professoral se efetiva na Educação Infantil, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e em disciplinas pedagógicas dos cursos de nível médio, na modalidade Normal, e de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar. 3 Ressalta-se que este Parecer foi reexaminado pelo o de nº 3, de 21 de fevereiro de 2006, entretanto as mudanças propostas não alteraram os trechos utilizados neste trabalho. 255 FONAPER Diante disso, a Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006, estabelece, em seu artigo 5º, inciso VI, que o egresso da graduação em Pedagogia, na modalidade licenciatura, deve estar apto a: ―VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano;‖ (BRASIL, 2006). É possível destacar, neste instante, que, de acordo com o instrumento normativo acima, não é determinado o Ensino Religioso como um conteúdo obrigatório a ser lecionado pelo professor habilitado no curso de Pedagogia, demonstrando, assim, o avocamento de uma postura de indefinição quanto ao componente curricular em questão. Essa posição já tinha sido adotada, anteriormente, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), que, ao versar, por exemplo, sobre a formação de professores para o Ensino Religioso nas escolas públicas de Ensino Fundamental, reforçou, através de o Parecer CNE/CP nº 97, de 06 de abril de 1999, a postura de que à União não cabe legislar sobre os conteúdos curriculares dos cursos de ―formação religiosa‖ dos professores, ficando o assunto sob a competência dos Estados e dos Municípios, os quais devem respeitar ―as determinações legais para o exercício do magistério, a saber: diploma de habilitação para o magistério em nível médio, como condição mínima para a docência nas séries iniciais do ensino fundamental;‖ (BRASIL, 1999). Mediante a essa deliberação de definição da situação do ER aos Estados, em Minas Gerais, foi promulgada a Lei nº 15.434, de 05 de janeiro de 2005, que dispôs sobre o Ensino Religioso na rede pública estadual de ensino. Em cinco artigos, a referida legislação determinou o seguinte: a) o ER, de caráter facultativo, é definido como componente curricular no Ensino Fundamental e deve respeitar a diversidade cultural e religiosa; b) o ER deve seguir o modelo fenomenológico, buscando incluir aspectos da religiosidade, da antropologia cultural e filosófica e da formação ética; c) o ER deve ser ofertado no horário normal das escolas e, caso o aluno opte por não cursar a referida disciplina, o estabelecimento oferecerá outros conteúdos e atividades de formação para a cidadania; d) seguindo a orientação dada na LDBen, o Estado normatizou, no artigo 5º, a habilitação e a admissão dos professores de ER: 256 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Art. 5º O exercício da docência do ensino religioso na rede pública estadual de ensino fica reservado a profissional que atenda a um dos seguintes requisitos: I -conclusão de curso superior de licenciatura plena em ensino religioso, ciências da religião ou educação religiosa; II -conclusão de curso superior de licenciatura plena ou de licenciatura curta autorizado e reconhecido pelo órgão competente, em qualquer área do conhecimento, cuja grade curricular inclua conteúdo relativo a ciências da religião, metodologia e filosofia do ensino religioso ou educação religiosa, com carga horária mínima de quinhentas horas; III -conclusão de curso superior de licenciatura plena ou de licenciatura curta, em qualquer área de conhecimento, acrescido de curso de pós-graduação lato sensu em ensino religioso ou ciências da religião, com carga horária mínima de trezentas e sessenta horas, oferecido até a data de publicação desta Lei; IV -conclusão de curso superior de licenciatura plena ou de licenciatura curta, em qualquer área de conhecimento, acrescido de curso de metodologia e filosofia do ensino religioso oferecido até a data de publicação desta Lei por entidade credenciada e reconhecida pela Secretaria de Estado da Educação. § 1ºFica assegurada isonomia de tratamento entre os professores de ensino religioso e os demais professores da rede pública estadual de ensino. § 2ºÉ garantido ao profissional que satisfizer requisito definido em inciso do caput deste artigo o direito de participar de concurso público para docência de ensino religioso na rede pública estadual de ensino. (MINAS GERAIS, 2005). Ao analisar a lei estadual, citada anteriormente, é importante destacar a exigência posta para que um profissional possa lecionar o Ensino Religioso, em uma escola da rede pública estadual. Para isso, é necessário que o docente possua um curso superior de licenciatura plena em Ensino Religioso, Ciências da Religião ou Educação Religiosa, ou qualquer curso superior de licenciatura plena ou de licenciatura curta, que tenha, em seu currículo, o conteúdo, com no mínimo 500 horas, relativo às Ciências da Religião, à metodologia e filosofia do Ensino Religioso ou Educação Religiosa, ou, ainda, um curso superior de licenciatura plena ou curta, em qualquer área de conhecimento, acrescido de curso, com no mínimo 360 horas, de Pós-graduação Lato Sensu em Ensino Religioso ou em Ciências da Religião, ou de curso de metodologia e filosofia do Ensino Religioso. 257 FONAPER Ressalta-se, também, que, na Lei nº 15.434/2005, não há uma delimitação explícita sobre a partir de qual nível de ensino é necessária a presença do docente de Ensino Religioso com uma formação específica, o que pode gerar a interpretação de que as orientações dadas, no artigo 5º, podem ser adotadas para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, indicando, assim, a possibilidade da atuação, no referido nível, do professor especialista para o conteúdo de ER. Ensino Religioso e as Ciências da Religião: a formação docente Ao tratar sobre a questão da formação do professor de Ensino Religioso, Cortella (2006) reitera, primeiramente, que o ER deve ser visto como um componente curricular obrigatório, revestido de seriedade, de valor acadêmico e de rigor científico quanto qualquer outro componente pedagógico, necessitando, assim, da ordenação intencional do seu conteúdo no ambiente escolar, em instituições privadas ou públicas, pois ―[...] o estudo científico das religiões é tão laico quanto qualquer outro inscrito na esfera das ciências que são ensinadas nas escolas, [...].‖ (PASSOS, 2006, p. 23). Após a identificação dos três modelos que norteiam as tendências predominantes nas práticas de Ensino Religioso, Passos (2006) afirma que o modelo das Ciências da Religião, ao conferir à disciplina escolar a autonomia epistemológica e pedagógica, permite a superação dos outros dois modelos, a saber: o Catequético e o Teológico, os quais possuem um caráter confessional que fere o princípio da laicidade dos currículos escolares. Dessa forma, para se buscar a afirmação do Ensino Religioso como área de conhecimento, é importante fundamentar a sua competência em ser um componente regular, nos currículos do Ensino Fundamental, objetivando o ensino da religião com o pressuposto pedagógico. E, para isso, há a requisição de uma formação específica que recorra ―[...] aos fundamentos das Ciências da Religião, com todo o aporte que nos oferece ao investigar as manifestações do religioso na história e nas sociedades (de antes e de agora), seus campos simbólicos, as relações com o poder político, sempre com a colaboração multidisciplinar de vários ramos do saber.‖ (CORTELLA, 2006, p. 20). 258 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Essa formação específica fundamentada nas Ciências da Religião, as quais concedem ao ER a base teórica e metodológica para a abordagem da dimensão religiosa em seus diversos aspectos e manifestações, objetivam, mediante as propostas de licenciatura das Ciências das Religiões, ―[...] capacitar o profissional a exercer a docência na disciplina atualmente denominada ER na rede pública e privada, tratando o fenômeno religioso como característica cultural dos povos e patrimônio da humanidade, passível de ser estudado e pesquisado.‖ (JUNQUEIRA, 2011, p. 185). No intuito de defender a formação de professores de ER como o meio fundamental para garantir a continuidade da disciplina escolar que busca respeitar a liberdade religiosa, favorecer o exercício da cidadania e contribuir no processo de formação integral dos estudantes, Caron (2011) apresenta a matriz curricular do curso de Ciências da Religião – Licenciatura Plena em Ensino Religioso, ofertado em três IES, no Estado de Santa Catarina. Para elucidar a estrutura da referida matriz, relacionar-se-ão todas as disciplinas ofertadas no curso ofertado nas instituições citadas, que são: Ações Comunitárias; Ações Comunitárias I e II; Atividades AcadêmicoCientíficas; Antropologia Religiosa; Cosmovisão das Religiões e dos Movimentos Religiosos I e II; Cosmovisão das Religiões e Movimentos Religiosos; Cultura e Tradições Religiosas; Didática; Didática Geral; Ecumenismo e Diálogo Interreligioso; Educação Física I e II; Educação Física – Prática Desportiva; Ensino Religioso no Brasil; Escrituras Sagradas e Reencarnação; Escrituras Sagradas e Ressurreição I, II e III; Estágio Curricular Supervisionado (Prática de Ensino); Estrutura e Funcionamento de Ensino de 1º e 2º Graus; Estrutura e Funcionamento do Ensino; Exegese I e II; Ética em Ciência da Religião; Ética em Ciências da Religião I e II; Filosofia I e Filosofia da Educação; Filosofia da Religião; Filosofia Geral; Filosofia Religiosa; História da Educação; História Religiosa na América Latina; Informática Básica; Introdução aos Textos Sagrados; Introdução às Escrituras Sagradas; Língua Portuguesa; Metodologia de Ensino de 1º e 2º Graus; Metodologia de Pesquisa; Metodologia do Ensino Religioso; Metodologia do Ensino Religioso I e II; Metodologia do Trabalho Acadêmico; Mística e Fé; Prática de Ensino em Ensino Religioso I - II Prática de Ensino – Estágio; Projetos de Pesquisa em Ciências da Religião; Psicologia Geral; Psicologia da Aprendizagem; 259 FONAPER Psicologia da Educação; Psicologia do Desenvolvimento; Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem; Psicologia Religiosa; Psicopedagogia Religiosa; Religiosidade Popular na América Latina; Religiosidade Popular; Seminário de Formação Humanística; Sociologia; Sociologia da Educação; Sociologia Geral; Sociologia Religiosa; Técnica de Redação; Teologia nas Tradições Religiosas; Textos Sagrados I e II; Textos Sagrados I, II e III; Tópicos Especiais em Ensino Religioso; Trabalhos de Conclusão de Curso – TCC. O nível da Educação Básica, em que o licenciado em Ciências da Religião deve atuar, é o Ensino Fundamental. Contudo, apesar da tradição, em alguns estabelecimentos públicos e em quase todos os particulares, de se ter, nos Anos Iniciais, a presença do professor especialista para lecionar o Ensino Religioso, a normatização brasileira não exige a presença do referido profissional nos cinco primeiros anos, pois, como já dito anteriormente neste estudo, o professor regente é o responsável por lecionar todos os componentes curriculares integrantes dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Professor Regente e o Ensino Religioso: a matriz curricular dos cursos de graduação em Pedagogia Retornando à LDBen e à Resolução CNE/CP nº 1/2006, reitera-se que a graduação em Pedagogia é o curso de nível superior responsável pela formação dos professores que devem lecionar nos Anos Iniciais, do Ensino Fundamental. E, com o objetivo de verificar se os egressos da referida graduação estão habilitados para lecionarem o componente curricular Ensino Religioso, nos primeiros cinco anos do nível em questão, apresentar-se-á, abaixo, a matriz curricular de três licenciaturas em Pedagogia, ofertadas em três distintas IES, localizadas em Belo Horizonte, sem, contudo, entrar no mérito de análise das matrizes, focando, assim, na identificação de alguma disciplina que, notadamente, busque abordar o conteúdo do Ensino Religioso. A matriz curricular da primeira instituição, aqui designada como IES A, possui a seguinte estrutura: 260 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso TABELA 1 - Matriz Curricular do curso de Pedagogia, da IES A DISCIPLINA 1º Período 2º Período 3º Período 4º Período 5º Período 6º Período Alfabetização e Letramento I Política Educacional Metodologia de Pesquisa em Educação I Sociologia da Educação I Filosofia da Educação I Alfabetização e Letramento II Arte no Ensino Fundamental Psicologia da Educação I Filosofia da Educação II Sociologia da Educação II Atividades Teórico-Práticas I História da Educação I Política e Administração dos Sistemas Educacionais Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática I Antropologia e Educação Psicologia da Educação II História da Educação II Estágio Curricular de Introdução ao Campo Educacional Atividades Teórico-Práticas II Fundamentos e Metodologia do Ensino da Matemática II Corpo e Educação Estudos sobre a Infância Teorias de Currículo Processos Educativos nas Ações Coletivas Escola e Diversidade: Interfaces Políticas e Sociais Atividades Teórico-Práticas III (continua) CARGA HORÁRIA 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 30h 30h 30h 30h 30h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 30h 30h 120h Fundamentos e Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa Fundamentos e Metodologia do Ensino da Geografia Didática Fundamentos da Educação Inclusiva Organização da Educação Infantil Organização do Ensino Fundamental Formação Livre 60h Dificuldades no Ensino-Aprendizagem da Leitura e da Escrita Fundamentos e Metodologia do Ensino da História Fundamentos e Metodologia do Ensino de Ciências Físicas Fundamentos e Metodologia do Ensino de Ciências Biológicas Estágio Curricular em docência no Ensino Fundamental 60h 60h 60h 60h 30h 30h 60h 60h 60h 60h 60h 261 FONAPER (conclusão) 7º Período Sistemas de Avaliação Educacional Libras Arte na Educação Infantil Didática da Educação Infantil Estágio Curricular em Educação Infantil Políticas Públicas, Movimentos Sociais e Cidadania Metodologia de Pesquisa em Educação II 8º Período Economia e Política de Financiamento da Educação Básica Observatório de Currículo: Educação Infantil Observatório de Currículo: Ensino Fundamental Optativa (3) Estágio Curricular em Gestão da Escola e Coordenação Pedagógica Fundamentos Teórico-Metodológicos da Educação Popular 9º Período Trabalho Docente e Relações de Trabalho nos Sistemas de Ensino Educação Social Tópicos em Educação Social ou Tópicos Especiais em Sociologia da Educação Prática em Educação Social Organização da Educação de Jovens e Adultos Metodologia da Alfabetização de Jovens e Adultos Prática em Educação de Jovens e Adultos Monografia na área de Ciências da Educação Optativa (4) Formação Livre Fonte: Elaborada pelo autor 60h Não definido 60h 60h 120h 60h 60h 60h 30h 30h 60h 120h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h 60h A matriz curricular da segunda instituição, aqui designada como IES B, possui a seguinte estrutura: TABELA 2 - Matriz Curricular do curso de Pedagogia, da IES B (continua) DISCIPLINA 1º Período 262 Pedagogia e sua Multidimensionalidade História da Educação: Educação na Formação Social Moderna Estudos Filosóficos: Sociedade e Educação Psicologia da Educação: Teorias Psicológicas e Práticas Educativas Sociologia: Sociedade e Educação Didática: Pensamento Educacional e Processo de EnsinoAprendizagem na Educação CARGA HORÁRIA 54h 54h 54h 54h 54h 72h Língua Portuguesa 36h Pesquisa em Educação 36h Prática Pedagógica de Formação: - Atividade de Integração Pedagógica 36h Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso 2º Período 3º Período 4º Período 5º Período História da Educação: Educação na Formação Social Moderna e na Sociedade Brasileira Estudos Filosóficos: Epistemologias da Educação Sociologia: Sociedade e Educação Psicologia da Educação para a Educação Infantil Antropologia: Cultura, Sociedade e Educação Didática: Processos de Aprendizagem na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Educação e Tecnologia: Sociedade da Informação e do Conhecimento Pesquisa em Educação Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado e Práticas Pedagógicas História da Educação: Bases Sociais, Políticas do Pensamento Educacional Brasileiro Antropologia: Cultura Brasileira Psicologia da Educação para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental Estudos do Conteúdos – Ciências da Natureza: Desenvolvimento da Criança na Educação infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental Didática: Planejamento e Avaliação no Processo Pedagógico Organização Curricular da Educação Básica Estudos sobre Estatística Aplicada à Educação Pesquisa em Educação Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado e Práticas Pedagógicas Psicologia da Educação para a Educação de Jovens e Adultos Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Geografia e História: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Ciências da Natureza: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Educação Física: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Pesquisa em Educação Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado e Práticas Pedagógicas Pedagogia e sua Multidimensionalidade Organização Curricular da Educação Básica Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Organização e Funcionamento do Sistema Educacional – Educação Básica (continua) 72h 72h 54h 72h 54h 54h 36h 36h 81h 54h 54h 54h 54h 72h 72h 54h 36 92h 54h 72h 72h 72h 72h 72h 36h 92h 54h 72h 72h 72h 54h Gestão da Escola na Educação Básica 72h Pesquisa em Educação 54h Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas e Práticas de Pesquisa 117h 263 FONAPER 6º Período 7º Período 8º Período Estudos Sobre Necessidades Educacionais Especiais Arte na Educação: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Geografia e História: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Ciências da Natureza: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Educação e Tecnologia: Mediação Tecnológica Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas, Práticas de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso: Elaboração de Monografia Estudos Filosóficos: Ética na Formação do Educador Organização Social e Técnica do Trabalho Capitalista: Profissão Docente Arte: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Matemática: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Sala de aula: Espaço Social, Cultural e Histórico Educação Física: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Introdução à Língua Brasileira de Sinais Educação e Tecnologia: Mídias e Educação Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas, Práticas de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso: Elaboração de Monografia Organização e Funcionamento do Sistema Educacional: Educação Básica Geografia e História: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental Gestão da escola na Educação Básica Língua Portuguesa: Conteúdos e Metodologias na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental Avaliação Educacional – Sistemas e Instituições Políticas Públicas para Educação Básica Educação e Tecnologia: Informática Educativa Práticas Pedagógicas de Formação: Atividade de Integração Pedagógica, Estágio Supervisionado, Práticas Pedagógicas, Práticas de Pesquisa e Trabalho de Conclusão de Curso: Elaboração de Monografia (conclusão) 72h 54h 72h 72h 54h 54h 36h 196h 54h 54h 54h 54h 54h 54h 54h 36h 196h 72h 54h 72h 54h 54h 72h 36h 166h Fonte: Elaborada pelo autor Ao comparar as matrizes curriculares da licenciatura em Ciências da Religião e dos dois cursos de Pedagogia, percebe-se que, nas duas últimas matrizes não há nenhuma disciplina que faz referência aos conteúdos e às disciplinas que compõem as bases e os fundamentos das Ciências da Religião, assim como, nenhuma matriz contempla a especificidade do trabalho do professor com os conteúdos do Ensino 264 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Religioso, evidenciando, assim, a negligência quanto ao ensino desse componente curricular, que, por meio do artigo 210, parágrafo 1º, da Constituição Federal de 1988, e do artigo 33, da Lei nº 9.394/1996, se faz obrigatória a sua oferta, em todo o Ensino Fundamental. Segue, abaixo, a matriz curricular da terceira instituição, aqui designada como IES C. Ela possui a seguinte estrutura: TABELA 3 - Matriz Curricular do curso de Pedagogia, da IES C (continua) DISCIPLINA 1º Período 2º Período 3º Período 4º Período 5º Período 6º Período Pedagogia: Identidade, Teorias e Práticas Sociologia Filosofia I Laboratório de Pesquisa e Prática Educacionais I Metodologia do Trabalho Científico Leitura e Escrita Sociologia da Educação Didática I Filosofia II Fundamentos e História da Educação Filosofia da Educação Seminário de Integração I Pedagogia da Educação Não Escolar Metodologia da Alfabetização e Letramento I Metodologia do Ensino da Matemática I Pesquisa Pedagógica I Antropologia Cultural e Educação Cultura Religiosa I Psicologia da Educação Laboratório de Pesquisa e Práticas Educacionais II Língua Brasileira de Sinais Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem Cultura Religiosa II Seminário de Integração II Didática II Metodologia do Ensino da Matemática II Metodologia do Ensino da Geografia Metodologia do Ensino da História Políticas Públicas de Educação Educação de Jovens e Adultos Metodologia do Ensino das Ciências Naturais Avaliação Escolar Laboratório de Pesquisa e Práticas Educacionais III Teorias do Currículo Estágio Curricular Supervisionado I Seminário de Integração III Princípios Epistemológicos da Educação Infantil Metodologia da Escrita e Letramento na Educação Infantil A Criança, a Natureza e a Sociedade: Aspectos Metodológicos Metodologia do ensino da Matemática na Educação Infantil Estágio Curricular Supervisionado II: Docência nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Pesquisa Pedagógica II CARGA HORÁRIA 64h 64h 64h 64h 64h 64h 64h 64h 64h 64h 64h 34h 32h 64h 64h 104h 64h 64h 64h 68h 64h 64h 32h 34h 64h 32h 64h 64h 64h 64h 64h 64h 68h 64h 140h 34h 64h 64h 64h 64h 140h 104h 265 FONAPER 7º Período 8º Período A Família e a Escola na Educação Infantil Literatura na Educação Infantil Gestão e Trabalho Docente Trabalho de Conclusão de Curso I Estágio Curricular Supervisionado III: Docência na Educação Infantil Arte e Educação Tecnologias e Práticas Educativas Seminário de Integração IV Fundamentos Legais e Organização da Educação Infantil Corporeidade e Movimento Estágio Curricular Supervisionado IV: Gestão Pedagógica Trabalho de Conclusão de Curso II Informática Aplicada à Educação Infantil (conclusão) 32h 64h 64h 104h 116h 32h 68h 34h 64h 32h 116h 140h 64h Fonte: Elaborada pelo autor Diferentemente das instituições A e B, a IES C, através da oferta das disciplinas Cultura Religiosa I e Cultura Religiosa II, demarca, em sua matriz curricular do curso de Pedagogia, a presença de algum conteúdo que se relaciona com o objeto do Ensino Religioso, ou seja, o fenômeno religioso. Entretanto, ressalte-se que não há referência quanto às especificidades do trabalho docente, no ER, especificamente, no que diz respeito à questão didático-metodológica. Considerações Finais Quanto à formação do professor para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a legislação brasileira deixa claro que ela se dá por meio dos cursos de graduação em Pedagogia, na modalidade licenciatura, admitindo-se, para o exercício da docência na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do citado nível de ensino, a formação mínima oferecida em cursos Normais de nível médio. Diante disso, há o respaldo legal para a decisão da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, disposta na Resolução nº 2.253, de 09 de janeiro de 2013, em restringir a docência, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, e, especificamente, dos componentes de Ensino Religioso e de Educação Física, ao regente da turma, considerando o fato do referido profissional ser habilitado, pelos cursos de graduação em Pedagogia ou Normal, de nível médio ou superior, para lecionar todos os conteúdos dos cinco primeiros anos. Entretanto, através das matrizes curriculares dos cursos de Pedagogia, de três Instituições de Ensino Superior, localizadas em Belo 266 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Horizonte, pode-se constatar, em duas IES, a ausência de disciplinas que abordem os conteúdos básicos do Ensino Religioso, e, nas três instituições, a falta de abordagem das especificidades do trabalho docente, no ER, especificamente, quanto à questão didático-metodológica, evidenciando, assim, o despreparo dos licenciados, formados nos referidos cursos, para lecionar, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, de forma científica e sistematizada, os conteúdos da disciplina ER. Dessa forma, sugere-se a reflexão mais aprofundada sobre a necessidade de inclusão da discussão sobre os conteúdos e os aspectos didático-metodológicos do Ensino Religioso, no âmbito da formação dos licenciados em Pedagogia. Referências BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, 20 dez. 1996. Disponível em: < http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1996/lei-9394-20-dezembro-1996362578-normaatualizada-pl.html>. Acesso em: 12 ago. 2013. BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP nº 97, de 06 de abril de 1999. Formação de professores para o Ensino Religioso nas escolas públicas de ensino fundamental. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PNCP097.pdf>. Acesso em: 12 maio 2011. BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. Diário Oficial da União, Brasília, 16 maio 2006. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf>. Acesso em: 12 ago. 2013. CORTELLA, Mário Sérgio. Educação, ensino religioso e formação docente. In: SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006. p. 1120. CARON, Lurdes. Cursos de ciências da religião – licenciatura plena – e a formação de professores de ensino religioso. In: OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro; MORI, Geraldo de (Orgs.). Religião e educação para a cidadania. São Paulo: Paulinas, 2011. p. 189-228. 267 FONAPER IMPASSE marca audiência sobre aulas de educação física: professores pedem revogação de artigo e SEE defende proposição, em reunião conjunta de comissões da ALMG. 30 abr. 2013. Disponível em: <http://www.almg.gov.br/acompanhe/noticias/arquivos/2013/04/30_comissa o_aula_educacao_fisica.html>. Acesso em: 15 maio 2013. JUNQUEIRA, Sérgio. A construção histórica entre o ensino religioso e as ciências da religião no cenário brasileiro. In: OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro; MORI, Geraldo de (Orgs.). Religião e educação para a cidadania. São Paulo: Paulinas, 2011. p. 169-188. MINAS GERAIS. Lei nº 15.434, de 05 de janeiro de 2005. Dispõe sobre o Ensino Religioso na rede pública estadual de ensino. Minas Gerais Diário do Executivo, 06 jan. 2005. Disponível em: <http://crv.educacao.mg.gov.br/sistema_crv/banco_objetos_crv/%7B6F9E0 65A-E628-41FE-8AD6-B43642CFA204%7D_Lei15434_2005.pdf>. Acesso em: 17 maio 2013. MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Educação. Resolução nº 2.253, de 09 de janeiro de 2013. Estabelece normas para a organização do Quadro de Pessoal das Escolas Estaduais e a designação para o exercício de função pública na rede estadual de educação básica. Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, jan. 2013. Disponível em: <http://crv.educacao.mg.gov.br/SISTEMA_CRV/banco_objetos_crv/8AF44 F7006BE4E7FBB4E35C2F0CAE7402412013165242_RESOLU%C3%87% C3%83O%20SEE%20N%C2%BA%202253,%20DE%209%20DE%20JAN EIRO%20DE%202013..pdf>. Acesso em: 13 fev. 2013. PASSOS, João Décio. Ensino religioso: mediações epistemológicas e finalidades pedagógicas. In: SENA, Luzia (Org.). Ensino religioso e formação docente: ciências da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006. p. 21-45. SIND-UTE/MG cobra revogação do artigo 4º da Resolução 2.553/13. Disponível em: < http://www.sindutemg.org.br/novosite/conteudo.php?MENU=1&LISTA=deta lhe&ID=4743>. Acesso em: 15 maio 2013. 268 GT2: CURRÍCULO DO ENSINO RELIGIOSO Coordenação: Drando. Elcio Cecchetti (UFSC) Me. Maria José Holmes Torres (SEMED João Pessoa/PB) Ementa: Reconhecendo o Ensino Religioso como área do conhecimento este GT objetiva aprofundar as discussões relacionadas às concepções, objetivos, conteúdos, metodologias e procedimentos avaliativos concernentes aos processos de ensino-aprendizagem em Ensino Religioso na Educação Básica; socializar atividades de aprendizagem e práticas pedagógicas em Ensino Religioso e; estabelecer relações entre currículo, conhecimento religioso e diversidade cultural religiosa. Palavras-chave: Currículo; Ensino Religioso; Conhecimento Religioso; Diversidade Cultural Religiosa. ENSINO RELIGIOSO PARA ALUNOS/AS DO ENSINO FUNDAMENTAL I: ESTUDO SOBRE PROPOSTA CURRICULAR UNIFICADA Aldenir Teotonio Claudio (UFPB)1 Marinilson Barbosa da Silva (UFPB)2 Resumo: O objetivo central desse estudo consistiu na discussão e aprofundamento sobre a proposta de currículo unificado para o Ensino Religioso, a partir dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER). Desenvolveu-se assim uma pesquisa de cunho bibliográfico, utilizando-se de livros, artigos científicos, revistas e LDB realizando assim um recorte do currículo trabalhado atualmente. Percebemos que Ensino Religioso é um marco estruturado de leitura e interpretação da realidade, essencial para garantir a possibilidade de participação do cidadão na sociedade de forma autônoma, para tal possui uma linguagem própria, favorecendo a compreensão do fenômeno religioso, valorizando o pluralismo e a diversidade cultural e religiosa, no cotidiano, e na sociedade, possibilitando a compreensão do Sagrado no âmbito geral das diferentes culturas e manifestações socioculturais. Palavras-chave: Ensino Religioso; Diversidade Religiosa; Sagrado; PCNER. Introdução Ao longo dos anos, o Ensino Religioso vem sofrendo várias modificações de acordo com a forma de conceber dos legisladores no decorrer da história. Essas mudanças de concepção estão pautadas nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: na Lei 4024/ 61, o Ensino Religioso era concebido como ―aula de religião‖, em que a doutrinação, a catequese tinha um lugar privilegiado na sala de aula, cuja finalidade era "fazer seguidores‖; na Lei 5692/71 era "resgate de valores", "aula de ética‖, tendo como propósito ―tornar as pessoas mais religiosas". Com o advento da Lei 9394/96, aconteceu uma grande movimentação nacional por parte dos profissionais da educação, Igrejas e vários 1 2 Professora de Ensino Religioso na Prefeitura Municipal de João Pessoa-PB. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões - UFPB. E-mail: [email protected] Pesquisador do quadro permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões. Professor Adjunto e Vice-chefe do Departamento de Habilitações Pedagógicas (DHP - CE - UFPB). E-mail: [email protected]. FONAPER organismos da sociedade no que concerne da mudança na redação do Art. 33, onde constava a expressão: ―sem ônus para os cofres públicos‖. Essa mobilização possibilitou uma grande manifestação que motivou a proposição de vários projetos para mudança na referida redação. Desenvolveremos neste trabalho pesquisa bibliográfica, com uma abordagem qualitativa que dará respaldo e amparo indispensáveis para seu desenvolvimento, pois o homem está sempre a procura de respostas das perguntas ―de onde vim?‖ e ―para onde vou?‖. E a busca para essas inquietações se dá na busca do transcendente. Essas questões são bem presentes no universo dos educandos, com isso uma proposta de um currículo unificado proporcionará a todos os educandos a possibilidade de ter o mesmo currículo sem quaisquer adaptações ou improvisações respeitando os que têm alguma confissão de fé ou aqueles que não têm; a discussão em sala de aula não é acreditar ou não acreditar em um ―Deus ou em deuses‖, mais sim ter o respeito, pois estamos em um País Laico e esse respeito deve ser independe de religião. Como em qualquer área, o Ensino Religioso veicula um conhecimento específico e um objetivo a ser perseguido. E esse conhecimento, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso, não é uma mera informação de conteúdos religiosos, um saber em si. É um conhecimento que, numa nova visão pedagógica, oportuniza o saber de si: ―o educando conhecerá ao longo do Ensino Fundamental, os elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, para que possa entender melhor a busca do transcendente‖ (PCNER, 2010, p.47). Procedimentos Metodológicos Um dos fundamentos para a realização deste trabalho surgiu a partir de alguns questionamentos levantados no grupo de pesquisa Formação, Identidade, Desenvolvimento e Liderança de Professores de Ensino Religioso (FIDELID) ao qual faço parte, no debate constante com meu orientador e em minha pratica docente, devido há não existência de uma grade curricular unificada para o Ensino Religioso, uma vez que, quando recebo alunos transferidos de escolas do mesmo município, vejo que os conteúdos ministrados diferem do que estou trabalhando naquele momento, estes muitas vezes distorcendo totalmente do currículo trabalhado segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino 272 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Religioso (PCNER), cuja orientação se fundamenta na proposta dos cinco eixos temáticos: Culturas e Tradições Religiosas; Escrituras sagradas e/ ou Tradições Orais; Teologias; Ritos e Ethos. Realizaremos uma pesquisa exploratória, com base na análise bibliográfica e qualitativa. Mesmo os PCNER não sendo um documento oficial elaborado pelo Ministério da Educação (MEC), contribuem efetivamente na ação educativa e no processo de ensino e aprendizagem em sala de aula. O ensino religioso de matrícula facultativa é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas, quaisquer formas de proselitismo (art. 33 da Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996). Assim o currículo do ensino Religioso deve ser fundamentado na diversidade cultural e no diálogo e comunicação entre grupos sociais diversos, inclusive das culturas minoritárias do país, atuando de forma Multicultural. Diante disto, pretendemos adentrar na questão curricular com o intuito de provocar reflexões e inquietações nos educadores para a estruturação da unificação do currículo de Ensino Religioso, proporcionando ao educando a possibilidade de estudar o mesmo conteúdo referente à sua série independente da escola que esteja inserido no mesmo município. Esperamos que esse artigo contribua para as discussões sobre o Ensino Religioso, sua estruturação enquanto disciplina, seu currículo, seus conteúdos, independente de sua nomenclatura e que os futuros cientistas das religiões sintam-se provocados a pensar nessa temática. Educação e Religião A dimensão teórico-prática da Educação e Religião é um processo altamente complexo, e, portanto, uma necessidade que se impõe, tendo em vista que a religiosidade está arraigada na tradição cultural e profundamente incorporada na experiência pessoal do ser humano, repercutindo diretamente no espaço escolar. Muitas vezes esta relação é elaborada de forma conformista, burocrática e confessional pelos docentes do ensino religioso. No sentido mais amplo, educação é um processo de atuação de uma comunidade sobre o desenvolvimento do indivíduo a fim de que ele possa 273 FONAPER atuar em uma sociedade pronta para a busca da aceitação dos objetivos coletivos, à medida que o homem se educa não passa somente a aceitarse, mas busca uma transformação dele e do mundo onde está inserido, pois a função social da educação hoje não é só transmitir conhecimento formal, mas educar para a vida, para o respeito e para a coletividade. Para tal educação, devemos considerar o homem no plano sociocultural, intelectual e espiritual consciente das possibilidades e limitações, capaz de compreender e refletir sobre a realidade do mundo que o cerca. Segundo Aurélio (2002), educação é o processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando a sua melhor integração individual e social. Consideramos que a educação tem caráter permanente. Não há seres educados e não educados, estamos todos nos educando. Existem graus de educação, mas estes não são absolutos. Esta afirmação tão coerente nos faz refletir sobre o processo educativo contínuo, como base de uma constante busca pela melhoria da qualidade da formação docente e discente. A ação educativa, portanto, implica um conceito de homem e de mundo concomitantes, é preciso não apenas estar no mundo e sim estar aberto ao mundo (FREIRE, 1996). Esta perspectiva nos faz entender a educação enquanto desenvolvimento integral do indivíduo: corpo mente espírito, saúde, emoções, pensamentos, conhecimento, expressão, etc. Tudo em benefício da própria pessoa, e a serviço de seu protagonismo, autonomia, bem como, sua integração construtiva com toda a sociedade. Neste sentido, compreendemos que a educação do cidadão é um processo complexo que inclui múltiplos aspectos, inclusive o religioso enquanto dado antropológico e sócio cultural presente na história da humanidade. O conhecimento é assimilação crítica e responsável de conteúdos e métodos acumulados pelas ciências no decorrer da história, e a universidade apresenta-se como facilitadora dessa, ao ensinar a aprender, ao oferecer aos educandos posturas e estratégias cognitivas e éticas (PASSOS, 2007). Este pensamento nos leva a interpretar que o Curso de Ciências das Religiões participa desse processo complexo de ensinar a conhecer com autonomia e responsabilidade que é creditado à universidade, pois, a Religião compõe o conjunto dos demais conhecimentos, tanto como fonte de informação sobre o ser humano, a sociedade e a história, quanto como fonte de valor para a vida dos educandos. 274 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso De acordo com Alves (2003), a religião está mais próxima de nossa experiência pessoal do que desejamos admitir, é como um espelho no qual nos vemos, ela não se liquida com a abstinência dos atos lamentais e a ausência dos lugares sagrados, ela permanece e frequentemente exibe uma vitalidade que se julgava extinta. Basta depararmos com uma situação de dor, na qual todos os recursos técnicos tenham se esgotado para acordarmos um pouco videntes, profetas, benzedores, mágicos, curadores, etc., aquele que reza e suplica sem saber ao certo a quem deve pedir ou entregar-se. É fácil, portanto, identificar, isolar e estudar a religião como comportamento exótico de grupos sociais restritos e distantes, sendo necessário reconhecê-la como presença invisível, sutil e disfarçada, pois, ela se constitui em um dos fios que se tece o acontecer do nosso cotidiano (ALVES, 2003). Então, por mais que determinados grupos pareçam exóticos estes devem ser visto, com respeito, como os demais grupos religiosos. A cada dia cresce fervorosamente o numero de religiões, comunidades, seitas, ou grupos alternativos que não querem fazer parte de grupos que tenham ritos, dogmas ou praticas religiosas, então o desafio de ser professor de ensino religioso cresce, pois esse componente curricular deve ser estruturado dentro de uma base epistemológica pautada no fenômeno religioso e não ensinar o que surge rapidamente ou o que se ouvi falar, levar para sala de aula apresentar como verdade absoluta, e pronta, é um risco, isso, porque o artigo 33 (PCNER) em sua redação, mais atual deixa a cargo dos estados e municípios decidirem o que ensinar com isso enfrenta-se esquemas políticos, tudo vai depender de quem está ―assinando‖ que esse tenha uma conduta ética e não tendenciosa. Sabemos que o Ensino Religioso vem de uma discussão histórica em nosso país com mais, de 500 anos sem alcançar a legalidade efetiva, única disciplina inserida na Constituição Federal Brasileira, mais a coisa não anda, historicamente falando, houve avanços e retrocessos, quando falamos em uma unificação curricular, não pretendemos, alçar voo tão altos e dizer agora será assim, até porque, quando se implanta no currículo, uma disciplina obrigatória para a escola e facultativa para o aluno, por si só a disciplina fica com viés de ―coisa fácil‖, com isso permite a não eficácia da sua efetivação, pensando no que temos hoje veremos que a sociedade civil, o Fonaper, os professores, os leigos trabalham em 275 FONAPER função desse componente, mais quem de fato e de direito deveria organizar e estruturar a disciplina como qualquer outro componente. Acreditamos que com a possibilidade dos municípios ou estados, estruturarem um currículo de Ensino Religioso Unificado, iniciariam uma só linguagem, dentro da não confessionalidade, e independente do gestor, do diretor, do partido politico, da religião, esse ensino não seria da conveniência de um grupo, mais sim de culturas diversas contidas no mesmo País. Ensino Religioso Não há como falar de Ensino Religioso sem falar do FONAPER, que é a própria vivência do Ensino Religioso, e é o instrumento responsável por toda a evolução desse componente nas escolas do Brasil. Então na assembleia dos 25 anos do CIER - Conselho das Igrejas para o Ensino Religioso, realizada em Florianópolis nos dias 25 e 26 de setembro de 1995, aconteceu à organização do Fórum Nacional do Ensino Religioso, onde foi instalado em 26 de setembro de 1995 e depois transformado em FONAPER - Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso, sendo formado por educadores, organismos e entidades interessadas e/ou envolvidas com o Ensino Religioso. O FONAPER tem como objetivos consultar, refletir, propor, deliberar e encaminhar assuntos relacionados ao Ensino Religioso cujas finalidades são: exigir que a escola, de qualquer natureza, ofereça esta disciplina em todos os níveis de escolaridade, respeitando a diversidade e as diferentes opções religiosas; contribuir para que o espaço pedagógico atenda o entendimento a busca do Transcendente; subsidiar o Estado na definição do conteúdo programático; pessoas jurídicas e físicas podem se filiar ao Fórum desde que sejam identificadas com o Ensino Religioso (www.fonaper.com.br). O Ensino religioso é um componente curricular que visa discutir a diversidade e a complexidade do ser humano como pessoa aberta às diversas perspectivas do sagrado presentes nos tempos e espaços histórico-culturais. Esse ensino deve estar atento para essa questão, pelo fato de haver, nas escolas, diferentes opções e dimensões de fé. Saber respeitar o diferente e as diferenças e com eles interagir, para esse componente é um marco referencial. Em um mundo culturalmente 276 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso diversificado nos aspectos educacionais, culturais, religiosos, sociais, étnicos, tecnológicos, nos vemos frente a um grande desafio que é repensar a educação, a prática pedagógica, o processo de ensinoaprendizagem e o currículo, que começou a ser pensado a partir da industrialização. Deparamo-nos com um desafio maior ainda, que ocorreu com a implantação do Ensino Religioso nas Escolas públicas como componente curricular de matrícula facultativa para os educandos e obrigatória para escola. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) aponta para o respeito à diversidade religiosa brasileira, daí a importância da abordagem do fenômeno Religioso, mesmo sabendo que esse ensino não aborda apenas a dimensão religiosa do ser humano, consideramos que há uma confusão, com a disciplina ensino religioso por parte de alguns educadores, mesmo nos reunindo sistematicamente, há não existência de uma grade curricular que seja comum para professores da disciplina, deixa os professores autônomos e sem direcionamento, lembrando que o documento (PCNER- FONAPER) que orienta a disciplina ainda não é oficial, ele sugere uma gama de conteúdos, mas o que percebemos é que o conteúdo é aplicado de maneira individual, por mais que o grupo de professores planeje junto, na prática no dia-dia depende do comprometimento do profissional. Esse componente curricular, não está estruturado como as demais disciplinas do currículo, como os conteúdos definidos e selecionados para os quatros bimestres, ainda falta formação e capacitação para professores, uma epistemologia específica respeitando a imparcialidade da disciplina, a ética na não propagação de um proselitismo para determinado confissão de fé, a formação acadêmica para os profissionais que atuam na disciplina. O Ensino Religioso, como as demais disciplinas do currículo escolar, prevê também a organização social das atividades, a organização do tempo e do espaço, assim como a seleção e os critérios de uso dos materiais e recursos, sendo por isso, necessário assumir um referencial metodológico na perspectiva de totalidade. A disciplina do Ensino Religioso insere-se na escola como um exercício de ciência a ser feito com os alunos sobre a religião em suas expressões simbólicas e valorativas. Participa do processo complexo de ensinar a conhecer com autonomia e responsabilidade o que é creditada a escola, lembrando que a religião compõe o conjunto dos demais conhecimentos. 277 FONAPER De acordo com Gilz (2009), é preciso zelar pelo respeito às diversidades culturais e religiosas dos alunos ao lidar com o Ensino Religioso, ou seja, chama a atenção para o tratamento que deve ser dado na pluralidade e diversidade em sala de aula. Nesta concepção o Ensino Religioso, valorizando a diversidade cultural-religiosa em sala de aula e consciente da função social da educação no atual contexto históricocultural busca auxiliar na compreensão das diferentes formas de exprimir o transcendente, inclusive, contribuir para o respeito àqueles que não pertencem a nenhuma religião e os que dizem não professar crença alguma. O Ensino Religioso na escola propõe analisar o fenômeno religioso com base na convivência social dos alunos, configurando-o objeto de estudo e conhecimento na diversidade cultural-religiosa. Favorece na construção de respostas aos questionamentos existenciais dos estudantes, no entendimento da identidade religiosa e no convívio com as diferenças (OLIVEIRA et. al, 2007). Com relação aos conteúdos curriculares do ER estes são orientados pelos eixos temáticos das culturas e tradições religiosas; teologias; textos sagrados e tradições orais; ritos e ethos. O currículo é o instrumento que aciona as possibilidades de aprendizagem e a educação integral latentes na sala de aula não só no que se refere aos conteúdos, como também ao planejamento de atividades. O FONAPER, ao organizar a primeira Capacitação para o novo milênio, preparando os professores de Ensino Religioso à distância, na introdução aos Cadernos de Estudo, fez um verdadeiro manifesto a favor de um novo Ensino Religioso. Segundo as orientações de Carniato (2010), é possível de forma pedagógica, organizar a diversidade de informações e de possíveis abordagens do conteúdo em cinco eixos temáticos, partindo-se do visível, isto é, do conhecimento o qual os estudantes têm acesso fora da escola, por meio da cultura, da comunicação, da observação do meio ambiente ou da experiência familiar, conforme abaixo: • Ritos, festas, locais sagrados, símbolos - Centros religiosos, templos, igrejas, sinagogas, mesquitas, terreiros, casas de reza; cerimônias, oferendas, cultos, liturgias, rituais etc.; • Tradições Religiosas – Indígenas, Africanas e Afro-brasileiras, Judaísmo, Xintoísmo, Hinduísmo, Budismo, Islamismo Fé Bahá‘i, 278 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Protestantismo, Catolicismo, Pentecostalismo, novos movimentos religiosos ecléticos e sincréticos, religião cigana e outras; • Teologias das Tradições Religiosas - Diferentes nomes e atributo do ser transcendente, diferenças e semelhanças doutrinas entre as tradições religiosas; mitos de origem; crenças na imortalidade: ancestralidade, reencarnação, ressurreição; • Textos Sagrados – Orais: mitos e cosmo visões das tradições indígenas, ciganas, africanas; Escritos: livros sagrados das antigas civilizações e das tradições religiosas atuais; • Ethos dos Povos e das Culturas – Costumes e valores dos povos e de suas religiões. Considerando os eixos temáticos acima relacionados sob os moldes do FONAPER, consideramos que o Ensino Religioso é essencialmente interdisciplinar, com isso, ele requer atividades interativas que proporcionem não só a pesquisa rigorosa, a reelaboração de dados, mas também a produção de formas literárias e artísticas do conhecimento adquirido e reflexão. Juntamente com experiências significativas na educação integral, pois, nenhuma disciplina como o Ensino Religioso lida com as questões humanas universais. Assim, torna-se imprescindível o uso de debate em classe, diálogo em grupo, mutirão de ideias, entre outros. Sobre Currículo Em um mundo culturalmente diversificado nos aspectos educacionais, culturais, religiosos, sociais, étnicos, tecnológicos, nos vemos frente a um grande desafio que é repensar a educação: a prática pedagógica, o processo de ensino- aprendizagem e o currículo. É importante situarmos que os estudos sobre currículo nasceram a partir das teorias tradicionais nos Estados Unidos como um campo profissional especializado, as quais se organizavam em: ensino, aprendizagem, avaliação, metodologia, didática, organização, planejamento, eficiência e objetivos. Já as Teorias Críticas de Currículo possuem como palavras-chave ideologia, reprodução cultural e social, poder, classe social, capitalismo, relações sociais de produção, conscientização, emancipação e libertação, currículo oculto e resistência e, as Teorias Pós-Críticas: identidade, alteridade, diferença, subjetividade, 279 FONAPER significação e discurso, saber-poder, representação, cultura, gênero, raça, etnia, sexualidade e multiculturalismo. A década de 60 foi marcada por grandes agitações e transformações, as teorias críticas do currículo efetuam uma completa inversão nos fundamentos das teorias tradicionais, onde o currículo estava baseado na cultura dominante. Na perspectiva fenomenológica o currículo era visto como experiência e como local de interrogação e questionamento da experiência, não podendo ser compreendido e transformado se não fizermos questionamentos fundamentais com as relações de poder. Henry Giroux foi um dos grandes amigos de Paulo Freire, inclusive, escreveram alguns textos a quatro mãos. O teórico crítico da cultura e da educação, Henry Giroux, foi um dos fundadores da pedagogia crítica nos Estados Unidos, além disso, foi pioneiro nos estudos voltados para a cultura, os jovens, o ensino superior e público, os meios de comunicação e teoria crítica. Como crítico, propôs reflexões sobre as teorias educacionais, escola e mais ainda, sobre os professores e seu papel no processo ensinoaprendizagem, bem como a influência dos mesmos nos alunos. Segundo Giroux (1997) a escola é um local onde a cultura da sociedade dominante é aprendida e inculcada nos alunos, à mesma prepara os estudantes, não somente para ingressarem no mercado de trabalho, mas no meio social. Contudo a escola para Giroux (1997) pode se tornar um veículo para ajudar cada estudante a desenvolver todo o seu potencial como pensador crítico e participante responsável no processo democrático simplesmente alterando-se a metodologia e o currículo oficial nos estudos sociais. O currículo oculto é constituído por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem, de forma implícita para aprendizagens sociais relevantes (...) o que se aprende no currículo oculto são fundamentalmente atitudes, comportamentos, valores e orientações... (SILVA, 2001, p. 78). É notório que todos os profissionais comprometidos com a educação se angustiam em: ―o que ensinar?‖ e ―como ensinar?‖, em princípio as teorias do currículo tentaram responder as perspectivas tradicionais como uma questão simplesmente técnica, ela se tornaria mais complexa na medida em que as teorias críticas e pós-críticas passavam a conceber o 280 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso currículo como um campo ético e moral, ―teorizar‖ o currículo resumia-se em discutir as melhores e mais eficientes formas de organizá-lo. A primeira vez que se utilizou a palavra currículo foi em 1918 (Bobbitt – The curriculum - Currículo é organização, é mecânica, é economia). A sua inspiração teórica foi à administração científica de Taylor. Especificação precisa de objetivos, procedimentos e métodos para a obtenção de resultados passíveis de serem mensurados. A necessidade de pensar no currículo surge devido à industrialização. Nessa altura o modelo institucional da concepção de um currículo era a fábrica. O currículo seria sempre o resultado de uma seleção, parar, observar o público, selecionar o que é pertinente para aquele grupo. Para elaborar um currículo deve-se selecionar o que pretendemos com base nas seguintes questões: que tipo de ser humano se quer? (uma vez que o currículo pretende alterar pessoas). O que queremos que ele saiba? O currículo é sempre o resultado de uma seleção, então nos perguntamos o que queremos que nossos alunos saibam. Para Giroux (1997), o currículo está ligado diretamente às relações sociais de poder e a desigualdade, pois ele envolve as construções dos significados e valores culturais, não estando simplesmente envolvido com a transmissão de ―fatos‖ e conhecimentos ―objetivos‖. Deparamo-nos com um desafio maior ainda, que ocorreu com a implantação do Ensino Religioso nas Escolas Públicas como componente curricular de matrícula facultativa para os alunos e obrigatório para escola, pois inicialmente o pensamento era que o grande desafio seria quebrar preconceitos em relação às religiões e trabalhar o respeito, o resgate de valores, à etnia, gênero e sexualidade, mas à medida que, fomos nos apropriando do conhecimento vimos que teríamos que focar nosso trabalho no respeito e conhecimento à diversidade cultural e religiosa e não na religião A, B, ou C. O conhecimento não é exterior ao poder, o conhecimento não se opõe ao poder. O conhecimento não é aquilo que põe em xeque o poder: o conhecimento é parte inerente do poder (...), o mapa do poder é ampliado para incluir os processos de dominação centrados na raça, na etnia, no gênero e na sexualidade (SILVA, 2001, p.148-1149). 281 FONAPER A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) aponta para o respeito à diversidade religiosa brasileira, daí a importância da abordagem do Fenômeno Religioso, mesmo sabendo que esse ensino não aborda apenas a dimensão religiosa do ser humano, pois muitas das vezes é na aula do Ensino Religioso que o educando tem a oportunidade de expressar-se, não só sobre sua religião, a religião do outro, mais o que a sociedade apresenta como o fenômeno religioso. O currículo aparece, assim, como o conjunto de objetivos de aprendizagem selecionados que devem dar lugar à criação de experiências apropriadas que tenham efeitos cumulativos avaliáveis, de modo que se possa manter o sistema numa revisão constante, para que nele se operem as oportunas reacomodações (SACRISTÁN, 2000, p. 46). Um currículo escolar é primeiramente, no vocabulário pedagógico, um percurso educacional, um conjunto contínuo de situações de aprendizagem às quais um indivíduo vê-se exposto ao longo de um dado período, no contexto de uma instituição de educação formal. O currículo está irremediavelmente envolvido nos processos de formação pelos quais nós nos tornamos o que somos e é uma questão de identidade e poder. O currículo é lugar, espaço, território, é relação de poder, é trajetória, viagem, percurso, é autobiografia, nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade, é texto, discurso, documento, é documento de identidade (SILVA, 2003). Contribuições para unificação do Currículo A mudança do enfoque da disciplina de Ensino Religioso, para as escolas brasileiras, a partir da Lei 9475/97 e os atuais Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso são os eixos norteadores da nova proposta curricular para o Ensino Religioso. Tal proposta considera a disciplina como: • Uma disciplina escolar concebida na diversidade cultural religiosa do Brasil. • Uma disciplina centrada na antropologia religiosa e não na catequese ou exposição de doutrina. 282 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso • Uma disciplina organizada para possibilitar o acesso ao conhecimento religioso - patrimônio da humanidade, a partir da pluralidade cultural religiosa da sala de aula. • Uma disciplina curricular do Ensino Fundamental, que a partir de sua especificidade, o religioso, contribui de forma significativa, juntamente com as demais disciplinas escolares, na formação básica do cidadão, conforme o disposto no artigo 33 da Lei e Diretrizes Básicas da Educação, n. 9394 de 20 de dezembro de 1996. Os PCNER ao centrarem a disciplina de Ensino Religioso na antropologia religiosa pressupõem que o ser humano é um ser dotado de múltiplas capacidades: que pensa, sente, se relaciona e age. Estas capacidades possibilitam o homem ―ser humano‖ a viver no seu cotidiano, em seu mundo impregnado de diferentes nuanças, compostos pela sua própria essência, e pelo outro, pelo mundo e pela sociedade na qual está inserido, o homem é produto do meio, porem ele é capaz de fazer suas próprias escolhas a partir do conhecimento adquirido. Na tentativa de expressar e nomear o vivenciado o homem e a mulher utilizam de metáforas, imagens, nomes e títulos inscritos em uma cultura. Os PCNER, procurando respeitar de forma igual às diversas tradições religiosas, usam para refletir e dialogar sobre a temática em questão, a expressão "o Transcendente", que significa "muito elevado, superior, sublime, excelso; que transcende os limites da experiência possível, metafísico". (PCNER, p.4) O Transcendente nos PCNER é estudado através do fenômeno religioso. Fenômeno este, que surge da relação ou experiência entre o ser humano e o Transcendente. Dessa forma, o objeto de estudo, na disciplina de Ensino Religioso, não é a causa e sim, o efeito ou consequência. O objeto de estudo não é o Transcendente em si mesmo, centra-se no produto humano que se dá do encontro da pessoa com essa realidade, o fenômeno religioso. Produto que ao ser organizado, dá origem aos sistemas religiosos que alimentam cada cultura e as diversas tradições religiosas. Não se propõe desinteresse frente ao Transcendente, mas, a busca por uma maior compreensão, que transparece nas diversas tradições religiosas e que, na sociedade brasileira, tem suas raízes: africanas, indígenas, ocidentais e orientais. 283 FONAPER O objetivo central da disciplina é facilitar a compreensão das formas que exprimem o Transcendente na superação da finitude humana e que determinam subjacentemente, o processo histórico da humanidade, valorizando o pluralismo e a diversidade cultural presentes na sociedade brasileira. Dentre todos os objetivos destacamos: proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas no contexto do educando. Subsidiar o educando na formulação do questionamento existencial, em profundidade, para dar sua resposta, devidamente informado. Analisar o papel das tradições religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações socioculturais. Facilitar a compreensão do significado das afirmações e verdades de fé das tradições religiosas. Refletir o sentido da atitude moral, como consequência do fenômeno religioso, expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária do ser humano. Possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença na construção de estruturas religiosas que têm na liberdade o ser valor inalienável. Promover o diálogo como um dos elementos construtores da cidadania, reverência e alteridade. Favorecer ao aluno o conhecimento sobre os elementos básicos que compõem os fenômenos religiosos, a partir do seu contexto sociocultural. Conceder ao educando a oportunidade de refletir sobre a história e origem dos textos sagrados, relacionando-os com as práticas religiosas nos diferentes grupos (PCNER, 1997). Compreender que a ideia do Transcendente em cada tradição religiosa se constitui no valor supremo de uma cultura, e que é de suma importância que o educando exteriorize suas ideias religiosas, reverenciando as diferenças do outro. Compreender que em quase toda estrutura religiosa o objeto de estudo é o Transcendente. Analisar a estrutura religiosa como um todo se colocando como parte integrante dela, se posicionando de forma lógica diante dos questionamentos, relacionando o conhecimento religioso adquirido com o seu próprio contexto. Destacar os valores morais como subsídios importantes para o crescimento pessoal e social de cada indivíduo. Analisar as mudanças e permanências na religião, articulando as perspectivas que contemplem a singularidade das diferentes tradições religiosas. Conhecer as possíveis respostas dadas perante o fato morte, orientadoras das verdades de fé, da valorização em 284 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso atitudes éticas e expressas em diferentes métodos de relacionar-se com o Transcendente, consigo mesmo, com o outro e com o mundo. Considerações Finais A Transcendência é a companheira da ação humana em todas as etapas da aventura da pessoa e origem de seus projetos enquanto desejo e utopia. O senso religioso é o substrato da cultura e, portanto, buscar os fundamentos para o Ensino Religioso remete à questão do fundamento da vida humana. Entende-se, dessa forma, a religiosidade como parte fundamental integrante do conhecimento humano, nessa compreensão de ser humano como finito se fundamenta o fenômeno religioso, que lhe possibilita construir-se na liberdade e plenitude humana. No Transcendente a pessoa procura respostas para as situações-limites: o nascimento, a morte, a doença, as catástrofes, o amor, o altruísmo e as grandes opções. A pessoa defronta-se com essas situações, questiona-se quanto ao por que delas, buscando o real sentido da vida. Ela indaga-se, procurando respostas às perguntas clássicas: Quem sou? De onde vim? O que acontece depois da morte? Por que isto acontece comigo? Ao questionar-se, a pessoa estabelece tensões entre a realidade vivida e a realidade do inexplicável, que transcende o tempo, a consciência e o mundo palpável. Conhecer as tradições religiosas significa entrar em contato com um mundo pluricultural no qual estamos inseridos. As sociedades e os indivíduos, apesar dos níveis variados, todos, entram em relação com o mundo religioso que é inerente ao homem. Assim esse Transcendente, o sagrado e o luminoso, permanecem atraindo e fascinando o homem no contexto pós-moderno. Apesar do avanço da ciência, da tecnologia, da robótica e da informática, desse mundo globalizado continuamos a nos questionar, e esses questionamentos nos levam a questionar que no ser humano há algo misterioso, indecifrável e insondável que o faz sentir-se criatura, limitado, dependente, e, paradoxalmente aberto ao infinito, com desejo de imortalidade e isso desperta, temor e veneração provoca alegrias, esperanças e faz nascerem angústias e tristezas. Com isso o Ensino Religioso como área do conhecimento visa todos os aspectos do desenvolvimento do ser humano, conduzido pela sua dimensão de Transcendência, aberto aos outros, sem discriminação a 285 FONAPER nenhum credo religioso, etnia, cultura, condição social, ou mesmo aqueles que si dizem não ter nenhum tipo de religião. A essa disciplina se confia, um ensino leigo e pluralista e com caráter de disciplina curricular. Concluímos ressaltando a importância de um estudo integrado por parte de todos que fazem o Ensino Religioso para dá o real significado há esse fenômeno, assim organizando um currículo que seja único para todas as escolas, a linguagem será a mesma, os recursos pedagógicos, a metodologia, o plano de trabalho a dinâmica em sala de aula, fica a critério do educador, mas ele deve ter um norte do que ensinar? Como ensinar? E em qual bimestre ensinar? Referências ALMEIDA, Cleide Rita S. O humano, lugar do sagrado. São Paulo: Olho D'Água, 1995. ALONSO, Luisa G. e outros. A Construção do Currículo na Escola: Uma Proposta de Desenvolvimento Curricular para o 1o. Ciclo Básico. Porto, Porto Editora, 1994. ALVES, Rubens. O que é religião. São Paulo: Loyola, 2003. ALVES, Luís Alberto Sousa; JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo (org.). Educação Religiosa. Construção da identidade do Ensino. AURELIO, O minidicionário da língua portuguesa. 4ª edição revista e ampliada do Mini dicionário Aurélio. 7ª impressão. Rio de Janeiro: Ed. Abril, 2002. BRASIL. Ministério da Educação. Portal Educação. História do MEC. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id= 2&Itemid=171> CAMURÇA, Marcelo. Ciências sociais e ciências da religião: polêmicas e interlocuções. São Paulo: Paulinas, 2008. CÂNDIDO, Viviane Cristina. O Ensino Religioso em suas fontes: uma contribuição para a epistemologia do ER, 2004. Dissertação (Mestrado em Educação). Centro Universitário Nove de Julho. São Paulo, SP, 2004. 286 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso ______. Há lugar para o Ensino Religioso na Escola? Revista Diálogo Educacional. N. (16, v. 05, p. 185-208). CARNIATO, Maria Inês. Religião no Mundo. Edição revista conforme o referencial curricular nacional para o ensino religioso. São Paulo: Paulinas, 2010. ______. Paradigmas do Ensino Religioso. In: JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo e OLIVEIRA, Lílian Blanck (org). Ensino Religioso: Memórias e Perspectivas. Curitiba: Champagnat, 2005. CARON, Lurdes (org.) e Equipe do GRERE. O Ensino Religioso na nova LDB. Histórico, exigências, documentário. Petrópolis: Vozes, 1998 [Coleção ensino religioso escolar – Série fundamentos/ 06], 85 pp. FIGUEIREDO, Anísia. Ensino Religioso: perspectivas pedagógicas. Petrópolis: Vozes, 1994. FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO. Capacitação Docente: ENSINO RELIGIOSO - Capacitação Para Um Novo Milênio pág. 03. ______. Capacitação Docente: Licenciatura – Lato Sensu – Extensão para o Ensino Religioso. Brasília: DF: UCB, 1998, 66 pp. ______. Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Religioso. São Paulo, SP: Ave Maria, 1997. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessário à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996 / 2003. ______. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem [Trad. Daniel Bueno]. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. GPER – Grupo de Pesquisa Educação e Religião. O Ensino Religioso como componente do currículo da Escola Básica [Sérgio Rogério Azevedo Junqueira]. Disponível em: < http://www.gper.com.br/gper_news/anexos/news56.pdf> HOLMES, Maria José Torres. Ensino Religioso: problemas e desafios. João Pessoa: 2010. 287 FONAPER JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; MENEGHETTI, Rosa Gitana Krob; WASCHOWICZ, Lilian Anna. Ensino Religioso e sua relação pedagógica. Petrópolis: Vozes, 2002. LAZÁRI, Marli Raquel Assunção de Oliveira. Currículo e Diversidade Cultural. Disponível em < http://meuartigo.brasilescola.com/educacao/curriculo-diversidadecultural.htm.> LIBANIO, João Batista. A Religião no início do milênio. São Paulo: Loyola, 2002. OLIVEIRA, Lilian Blanck de; JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo; ALVES, Luiz Alberto Sousa; KEIM, Ernesto Jacob. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo: Cortez, 2007. PASSOS, João Décio. Ensino religioso: construção de uma proposta. São Paulo: Paulinas, 2007. PORTAL EDUCAÇÃO. Cursos Online: Mais de 900 cursos online com certificado. Disponível no endereço: < http://www.portaleducacao.com.br/pedagogia/artigos/14465/henry-giroux-eos-professores-como-intelectuais-transformadores#ixzz2RNxilrHC > REVISTA NOVA ESCOLA. Tudo Sobre Educação. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/legislacao/leis-brasileirasensino-religioso-escola-publica-religiao-legislacao-educacionalconstituicao-brasileira-508948.shtml. SACRISTÁN, J. Gimeno e Gómez, A. I. Perez. O currículo: os conteúdos do ensino ou uma análise prática? Compreender e Transformar o Ensino. Porto Alegre, Armed, 2000:119-148. SILVA, Tomaz Tadeu da. Quem escondeu o currículo oculto. In Documento de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte, Autêntica, 1999: 77-152. TEIXEIRA, Faustino (Org.). A(s) ciência(s) da religião no Brasil: afirmação de uma área acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2001. UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA. Portal Reuni. Ciências das Religiões/CE – Campus I (João Pessoa). Disponível em: <http://www.ufpb.br/reuni/index.php?option=com_content&view=article&id= 288 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso 11%3Aciencias-das-religioes--ce-campus-i-joaopessoa&catid=6&Itemid=19> VIESSER, Lizete Carmem. Um paradigma didático para o Ensino Religioso: Vozes, 1994 (ISBN 85-326-1323-3) - [Coleção ensino religioso escolar. Série fundamentos/ 03], 69 pp. WASCHOWICZ, Lilian Anna. Ensino Religioso e sua relação pedagógica. Petrópolis: Vozes, 2002 (ISBN 85-326-2752-8) - [Coleção Subsídios pedagógicos/ 04], 77 pp. 289 LIMITES E AVANÇOS DA ESTRUTURA CURRICULAR DO ENSINO RELIGIOSO NO COLÉGIO MARISTA DE BELÉM Alex Coimbra Sales1 Resumo: Esta pesquisa pretende fazer uma reflexão acerca dos limites e avanços da estrutura curricular do Ensino Religioso no Colégio Marista de Belém a partir do seu Plano Trienal de Evangelização (2009), seguindo as atribuições da rede de ensino Marista. Palavras-chave: Educação. Ensino Religioso. Currículo. Colégio Marista de Belém. Rede de Ensino. Introdução Nos últimos anos, o Ensino Religioso no Brasil tem sido alvo de debates na busca de compreender sua natureza e o seu lugar na escola como disciplina regular do currículo. Se por muitas décadas o Ensino Religioso foi considerado um elemento eclesial na escola, hoje o esforço tem sido envidado no sentido de assegurá-lo como área de conhecimento visando à produção do conhecimento religioso (CNBB, 2000). A partir de 1997, com a revisão do artigo 33 da LDB, estabeleceu-se uma nova concepção para o Ensino Religioso. Seu foco deixou de ser catequético para assumir um perfil pedagógico e, Como componente curricular, seu foco é a educação da dimensão religiosa dos estudantes, incluindo a produção do conhecimento religioso, a abertura às diferenças e o reconhecimento e respeito à pluralidade religiosa, a partir do confronto com diferentes modelos de pensamento, prática social e construção de sentidos (PLANO CURRICULAR DE ENSINO RELIGIOSO PARA O BRASIL MARISTA, 2007, p.35). Nessa perspectiva o Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré em conformidade com o Plano Curricular de Ensino Religioso para o Brasil Marista, apresenta sua matriz curricular, assumindo o Ensino Religioso como área do conhecimento, cujo objeto de estudo é o Fenômeno Religioso/Religiosidade. A disciplina é um componente curricular de todas 1 Especialista em Ciências da Religião pelo Instituto Esperança de Ensino Superior de Santarém. Graduado em Ciências da Religião – UEPA. Email:[email protected]. FONAPER as séries da Educação Básica, tendo uma hora/aula por semana na primeira fase do Ensino Fundamental, duas horas/aulas por semana na segunda fase do Ensino Fundamental e uma hora/aula por semana no Ensino Médio. O Ensino Religioso no Currículo da Rede Marista de Ensino O objetivo do Ensino Religioso é promover a compreensão, interpretação e (re)significação da Religiosidade e do Fenômeno Religioso em suas diferentes manifestações, linguagens e paisagens religiosas presentes nas culturas e nas sociedades. O objeto de estudo é delimitação de um saber a ser desvendado, descoberto, pesquisado, apreendido, desconstruído e construído no universo das aprendizagens. Estabeleceu-se o objeto de Ensino Religioso a partir de uma perspectiva contemporânea e das experiências de outras áreas de conhecimento que historicamente se constituíram como ciência. O Ensino Religioso é uma área de conhecimento incipiente no conjunto que compõe o quadro das ciências humanas na educação básica. Tal fato exige uma postura investigativa que não se encerra com a produção de um plano curricular. As possibilidades de buscas continuam abertas. Contudo não é possível que o ER se constitua como componente curricular sem a definição de um objeto de estudo que direcione a seleção de objetivos e conteúdos significativos que contemplem a especificidade dessa área. Dessa forma, dentre as tantas possibilidades de abordagens e recortes no campo das ciências, constitui-se como objeto de estudo do ER: o Fenômeno Religioso/Religiosidade. A opção por esse objeto quer garantir o tratamento do fato religioso que advém das experiências humanas com o ser Transcendente e da dimensão religiosa considerada inerente ao ser humano. O ser humano é essencialmente um ser religioso. Todas as culturas humanas registram práticas religiosas, mesmo que estas não estejam ligadas a uma instituição religiosa. Esta disposição primeira do ser humano para se relacionar com o Transcendente é chamada de religiosidade. A religiosidade é uma atitude dinâmica de abertura efetiva da pessoa em relação ao mundo que ela integra e, nesse sentido, apresenta-se como a 292 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso dimensão mais profunda da vida, inter-relacionada com todas as dimensões humanas. A religiosidade muitas vezes é exteriorizada dentro de sistemas formais: ritos, mitos, doutrinas, mistérios, celebrações, reuniões, comunidades, tradições etc. Estes sistemas se inserem em um espaço cultural próprio, que define as maneiras de se viver a religiosidade. O fenômeno religioso é a manifestação cultural das opções religiosas individuais e coletivas e, por isso, é antes de tudo um fenômeno humano. Todo ser humano, considerado em sua totalidade ou tomado em cada uma de suas dimensões, só se desenvolve quando se expressa e relaciona com outros entes. Da mesma forma, a religiosidade torna-se efetiva e se desenvolve pela expressividade, comunicabilidade e linguagem. O dinamismo religioso ganha forma, ritmo e intensidade no fenômeno religioso. Compreender o Fenômeno Religioso/Religiosidade como objeto de estudo pressupõe alguns elementos de disposição e abertura epistemológica. Torna-se necessário estudar o sentido das experiências religiosas no seu contexto específico e na sua estruturação e coerência, o que exige também a investigação e compreensão da diversidade religiosa, da significação do processo religioso, das atitudes, do campo simbólico e dos textos sagrados, entre outros. O fenômeno é gerado também nas diferentes maneiras pelas quais o ser humano busca compreender as questões existenciais (de onde vim? Para onde vou?); tem, portanto, uma origem pessoal e individual, que se manifesta na vivência grupal. É no processo comunitário que as respostas são sistematizadas e produzem formas de relações com o outro e com o Transcendente, novas narrativas e manifestações religiosas. Esta pluralidade constituída desafia o processo ensino-aprendizagem e, ao mesmo tempo, traz grandes possibilidades de construção do conhecimento a partir da ressignificação da dimensão religiosa na contemporaneidade. Sendo o Ensino Religioso um componente curricular, fundamentar-se-á nos seguintes princípios (Plano Curricular de Ensino Religioso para o Brasil Marista, 2010): a) Abordagem metodológica que favoreça interpretação, significação e ressignificação; a compreensão, 293 FONAPER b) Abertura a todas as situações de aprendizagem que favorecem a produção do conhecimento religioso; c) Leitura crítica e contextualizada da realidade na busca e na construção do sentido da vida; d) Respeito às diferenças culturais e religiosas; e) Flexibilidade curricular frente à alteridade sociocultural; f) Investigação e problematização do fato religioso para qualificar conceitos, valores e atitudes; e g) Prática pedagógica baseada na interdisciplinaridade. A partir das definições contidas no Plano Curricular de Ensino Religioso para o Brasil Marista quanto às competências e aprendizagens fundamentais do Ensino Religioso e quanto às competências a partir dos eixos estruturantes, demarcamos treze competências básicas para a disciplina de Ensino Religioso no Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré. Dessa forma, ao final da educação básica, no que diz respeito à disciplina de Ensino Religioso, o aluno deverá ter adquirido a capacidade de: 1) Reler e interpretar o fenômeno religioso; 2) Ler e interpretar textos e símbolos sagrados; 3) Compreender o conhecimento religioso para a busca de respostas às questões existenciais do ser humano e para a busca do sentido da vida; 4) Compreender-se como corresponsável pelo equilíbrio dinâmico na relação consigo mesmo, com o outro, com o meio e com o Transcendente; 5) Compreender as tradições e culturas religiosas como construção sócio-histórica; 6) Reconhecer e valorizar o papel das comunidades humanas como lugar de manifestações interculturais e de ampliação dos pertencimentos; 7) Decodificar a linguagem religiosa e os elementos que a constituem; 8) Ter domínio da linguagem religiosa para compreender os fenômenos, as manifestações religiosas e os textos sagrados; 9) Compreender as linguagens religiosas como instância de poder; 10) Compreender e problematizar as situações sócio-religiosas contemporâneas, abrindo-se ao diálogo inter-religioso; 294 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso 11) Compreender as relações religiosas nos processos sociais, políticos, éticos e culturais; 12) Estabelecer uma relação de alteridade nos grupos religiosos, sociais e culturais; 13) Conviver com as diferenças, dialogando de maneira respeitosa com as múltiplas expressões de espiritualidade. A disciplina de Ensino Religioso se estrutura a partir dos seguintes eixos: fundamentos, linguagem religiosa e relações religiosas. Estes eixos estruturantes devem perpassar os conteúdos da disciplina garantindo a unidade desse componente curricular ―que visa discutir a diversidade e a complexidade do ser humano como pessoa aberta às diversas perspectivas do sagrado presentes nos tempos e espaços históricoculturais‖ (OLIVEIRA et al, 2007, p. 33). Os fundamentos referem-se aos elementos teórico-práticos que compõem o Fenômeno Religioso/Religiosidade. Neste eixo são contemplados as teologias, as culturas, as tradições religiosas e os textos sagrados. O eixo linguagem religiosa circunscreve-se no contexto da interpretação, compreensão e decodificação do fato religioso não apenas para decifrar as mensagens presentes na sociedade, mas também para rever posicionamentos, posturas e condutas frente a esses fatos. A compreensão da linguagem religiosa está intimamente ligada à experiência do sagrado que a própria linguagem quer comunicar. Compreender a linguagem religiosa a partir da experiência do sagrado é condição para ir-se além do conceito e se aproximar da vida real, do contexto histórico e cultural onde a experiência é vivida e partilhada. O ser humano delineia as suas características históricas e culturais nas relações sociais e interpessoais que estabelece e que geram novos tipos de relação: compromisso social e transformação da realidade; apelo à solidariedade; testemunho de vida religiosa, pessoal e social; apreensão de uma ética a partir de valores religiosos, e, também, a alteridade e os limites éticos que sustentam as relações. A análise e observação dos procedimentos e das várias formas de manifestação ajudarão a compreender e reconhecer processos que incluem o cuidado e a solidariedade como jeito de ser-estar no mundo. O acolhimento e a inclusão das diferenças enriquecem e evidenciam uma postura ética e crítica, necessária frente às relações de poder presentes 295 FONAPER também no campo religioso, visto que, essas relações de poder podem ser geradoras de lutas infindáveis em nome de um ser transcendental. A moral, os costumes e até mesmo os princípios éticos são delineados a partir de uma caracterização social, histórica e cultural. Nesse sentido as relações religiosas evidenciam a diversidade e as possibilidades de respostas religiosas para os tempos atuais. Essa visão ampliada auxilia na busca de novas significações para a própria existência, desenvolvendo as mais variadas formas de relacionamento com a diferença religiosa, na tentativa de superação dos preconceitos e a favor da alteridade, da ampliação dos pertencimentos e da consciência planetária. A metodologia e a didática do Ensino Religioso se direcionam a duas vertentes que se inter-relacionam. A primeira diz respeito aos aspectos filosóficos, culturais e sociais na abordagem do saber religioso. A segunda refere-se aos aspectos de ordem didático-pedagógica que envolvem as relações professor/ estudante. É importante que se tenha presente que a metodologia que assegura ao ER à validade de componente curricular, está ancorada nas ciências humanas. É o ser humano o sujeito desse processo com todas as suas circunstâncias e em todos os seus contextos. Para dar conta desse objeto no ER pode-se lançar mão de uma metodologia interdisciplinar que permita a interpretação, a compreensão e ressignificação do fenômeno religioso. Desde a fenomenologia e a hermenêutica até a semiologia e a genealogia, há uma gama enorme de possibilidades de olhares. Esse tratamento plural do objeto é uma demanda que advém do próprio objeto de estudo (Fenômeno Religioso/Religiosidade) e também dos eixos estruturantes (Fundamentos, Linguagem Religiosa, Relações Religiosas), pois abrem um leque de possibilidades metodológicas no sentido da aproximação dos aspectos tangíveis do fenômeno e daqueles que o precedem. Em Ciências Humanas é fundamental que se tenha essa variedade de olhares, de perspectivas, de óticas e de explicações para atender da melhor forma possível a complexidade do objeto. Por isso, ao se propor uma análise multirreferencial do Fenômeno Religioso, propõe-se multiplicidade de leituras, sob diferentes ângulos e a partir de muitas referências que ajudarão na produção de novos conceitos, dispositivos, metodologias, terminologias, etc. 296 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Esse procedimento amplia o tratamento do fato religioso, da manifestação religiosa, da experiência religiosa a partir de uma abordagem sociológica e antropológica. Nesse sentido, pode-se levar em conta não só as narrativas e as experiências coletivas e individuais, mas também outros aprofundamentos como o da interioridade, da espiritualidade, da mística, do mistério, do sagrado, de tudo que está à raiz dos questionamentos da existência humana, da busca de sentido, assim como, atentar-se para a dimensão dos significados, da interpretação e da compreensão da linguagem, dos signos e símbolos religiosos. Dessa forma o ER se ocupará não somente em estudar o fenômeno religioso, mas a sua essência, buscando seus significados e sua compreensão. Procura-se, então, não somente garantir o estudo do objeto, assim como ele se apresenta à experiência humana, mas deixam-se espaços para a descrição das experiências, compreendendo-as a partir das inter-relações. O descrever as próprias experiências, fazendo emergir as memórias, acoplando essas memórias aos conhecimentos religiosos, facilitará a produção de uma genealogia das experiências e vivências religiosas. Além de tudo o que foi dito acima, há o aspecto didático-pedagógico que exige igual atenção e aprofundamento. A especificidade e a natureza pedagógica do ER requerem clareza e objetividade na escolha dos instrumentos que favorecerão a relação entre as variáveis da relação didática – professor, estudante e conhecimento. Considera-se, para tanto, os princípios definidos e a natureza do objeto de estudo. A prática pedagógica do Ensino Religioso deve estar imbuída pela disposição metodológica de contribuir com o processo de busca pelo sentido da vida. No mundo contemporâneo, encontram-se possibilidades de diálogo, de socialização, de análise das diferentes relações entre sujeitos que favorecem a construção do conhecimento religioso. Essa construção solicita do sujeito aprendente, disposição para a interação sociocultural para a interpretação, a compreensão num processo de significação. O processo de significação é aquele que visa à busca do sentido da linguagem, e a relação entre significante e significado geradora de signos, enunciados e discursos. O signo é composto de um significante (corresponde ao conceito ou à noção plana da expressão) e de um significado (corresponde à forma, é o plano do conteúdo). A significação 297 FONAPER não é o objeto em si, mas a relação entre o objeto e sua representação psíquica (conceito), por exemplo, a relação entre o som cruz e o objeto cruz produz uma associação que é a significação. Neste contexto do ER, entretanto, partir-se-á da semiologia para compreender os sistemas de signos que dizem respeito ao campo religioso. A semiologia acrescenta outro elemento na relação significado/significantes, que é o ‗dizível‘, isto é, o significado será não a representação psíquica e nem a coisa real, mas o que se pode dizer da coisa real, das imagens e dos gestos. Voltando ao exemplo da cruz, o cristão ao ouvir o som cruz, imediatamente remete-se à imagem de Jesus morto que é o ‗dizível‘ de sua experiência. A semiologia ocupa-se da significação do objeto (seja gestos, imagens, símbolos, sons, ritos, etc.) e os interroga sob a relação de sentido que detêm, pois seu lugar está situado no sistema de sentido. A semiologia pode se constituir em análise religiosa, no caso do ER, dos diferentes sistemas de signos religiosos, colocando-os em relação, por exemplo, os sistemas simbólicos das diversas tradições religiosas. Pode-se dizer ainda que a significação é também caracterizada por alguns conceitos-síntese: poeticidade, reflexividade, alteridade e reciprocidade. A poeticidade diz respeito ao valor criativo da linguagem, às formas de expressão da atividade subjetiva que forma um objeto no pensamento; a reflexividade trata da capacidade específica da linguagem de voltar-se sobre si mesma e para outros sistemas de signos não-verbais; a alteridade, que está voltada para a presença do outro, e a reciprocidade, que diz respeito ao diálogo. Nesse sentido, quando se fala em significação, tenta-se responder à pergunta: por quais meios ou processos um enunciado é produzido como possuidor de sentido? No ER os processos de significação e ressignificação são permeados de desconstrução e construção de novos sentidos. Nesse campo, a compreensão e a interpretação, ajudam a extrair todas as possibilidades de sentido do objeto, e a interpretação, principalmente, ajuda a projetar para mais longe a significação. Outro aspecto, que vale salientar, no que diz respeito aos elementos didático-pedagógicos, é a relação dos princípios contextualização e interdisciplinaridade e a relevância da problematização. Nesse processo a problematização dá abertura para novas narrativas, respeitando as diferenças individuais, permitindo um distanciamento do problema e ajudando a questionar as várias maneiras 298 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso de agir e de reagir, assim como, o sentido das coisas, das vicissitudes, dos objetivos em relação ao próprio problema. Só é capaz de problematizar aquele que se dispõe a pensar. Dessa forma, o Ensino Religioso, além de assumir o papel de problematizador, amplia as capacidades de diálogo, debate, pesquisa, qualificando a síntese pessoal e coletiva. Para o Ensino Religioso é fundamental que a contextualização ultrapasse os exemplos encontrados nos livros ou narrados pelos professores e alcance também a vivência extramuros, ampliando e diversificando o currículo. O ER é uma área de conhecimento interdisciplinar por natureza, por isso é importante compreender bem a interdisciplinaridade como uma metodologia, e não como uma forma de atividade. Interdisciplinaridade vem do latim da junção de inter, que quer dizer em relação, reciprocidade ou interação, e disciplina, que significa a forma de organizar e de concentrar as pesquisas e as experiências dentro de uma perspectiva. Cada disciplina oferece uma imagem particular da realidade, pois delimita um aspecto da mesma. Desde o início do século XIX, vê-se surgir o conceito de disciplina como a se entende hoje, isto é, possuidora de objeto de estudo, marcos conceituais, métodos e procedimentos específicos. Tais características acabaram produzindo uma visão rígida na compreensão das diferentes disciplinas. A interdisciplinaridade surge para quebrar esta rigidez, trazendo flexibilidade aos estudos e pesquisas. A interdisciplinaridade, portanto, permite a reciprocidade e a aproximação de diferentes áreas na busca de algo novo. Para melhor compreender a interdisciplinaridade é preciso diferenciála de seus correlatos: multidisciplinaridade e transdisciplinaridade. A multidisciplinaridade é o nível mais restrito de integração. Ela se dá quando se busca ajuda em diversas disciplinas para solucionar algum tipo de problema, sem que esta ação contribua para a transformação ou enriquecimento das disciplinas envolvidas. Nesse nível não há tanta cooperação, pelo fato de haver apenas justaposição de disciplinas. A multidisciplinaridade é essencialmente aditiva, e não integrativa. Uma característica marcante da multidisciplinaridade é que cada área de conhecimento se preocupa em manter e proteger seus próprios modelos. A transdisciplinaridade é o nível de interação em que a rede está estabelecida de forma que não haja mais fronteiras entre as disciplinas. 299 FONAPER Este é o nível ideal para o qual concorre toda ação interdisciplinar, ou seja, quando realmente se trabalhará sem os limites impostos pelas disciplinas. No nível da interdisciplinaridade, a interação enriquece, e o intercâmbio é de verdadeira reciprocidade. A interdisciplinaridade reúne estudos de diversas disciplinas num contexto mais coletivo no tratamento dos fenômenos a serem estudados ou das situações-problema em destaque. Tal procedimento exige um compromisso maior ao elaborar, de modo mais geral, os projetos de pesquisa que resultarão em intercomunicação e enriquecimento, e, também, em transformação de metodologias de pesquisa, modificação de conceitos e de terminologias. A definição original de interdisciplinaridade é comunicar ideias para integrar e organizar conceitos, metodologia, procedimentos, epistemologia, terminologia, informações. Nesse sentido, a interdisciplinaridade surge para corrigir o equívoco da compartimentação e da não comunicação entre as disciplinas. Ela é ao mesmo tempo processo, uma filosofia de trabalho que facilita ações para resolução de problemas. Embora não haja apenas um processo, e nem mesmo um conjunto rígido de ações, existem alguns passos que podem estar presentes na intervenção interdisciplinar, desde que se respeite o princípio da flexibilidade: delimitar os problemas de acordo com os questionamentos iniciais; determinar os conhecimentos necessários; desenvolver um marco integrador e as questões a serem pesquisadas, etc. Nas ciências humanas é frequente a integração entre disciplinas próximas, como história, sociologia, filosofia, Ensino Religioso, entre outras. A pesquisa interdisciplinar nesse campo parte dessa integração com o objetivo de organizar conceitos, metodologias, dispositivos, epistemologias para se chegar a uma nova abordagem como consequência da construção de seus próprios objetos de investigação, conceitos fundantes, premissas e paradigmas. A avaliação é um instrumento de aprendizagem, que envolve pressupostos epistemológicos (construção do conhecimento), ontológicos (o ser) e axiológicos (valores) que não são separados. A ação transformadora implica pensar, planejar, replanejar, agir, avaliar o que se conhece, o que se está conhecendo e o que se necessita conhecer. A avaliação é um exercício de reflexão, única e exclusiva do ser humano, de pensar os seus atos, de analisá-los, de interagir com o mundo e com os 300 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso seres, de influenciar na tomada de decisões e transformação da realidade. Avaliar exige a definição de onde se quer chegar. Precisam-se estabelecer critérios e escolher procedimentos adequados. Na avaliação está implícita a concepção de homem que se quer formar, o modelo de sociedade que se quer construir. Essa avaliação não se refere apenas ao domínio de conteúdos específicos, mas também, ao desenvolvimento das competências, habilidades e atitudes. Significa avaliar o estudante como um todo, nas diversas situações que envolvem a aprendizagem. A avaliação processual promove o crescimento, a análise da situação, a busca de alternativas e momento privilegiado de aprendizagem, promovendo um conjunto de ações com o objetivo de aprofundar os conhecimentos, esclarecer, opinar, discernir, participar e decidir. É ação de acompanhamento, de conhecimento de onde se encontra o estudante e das aprendizagens que se deseja construir. Uma avaliação significativa no Ensino Religioso torna-se excelente instrumento de aprendizagem, e exige que o educador saiba trabalhar com objetivos; exige que saiba, ainda, identificar elementos que determinem o aprimoramento do saber e da postura cidadã; e que saiba, também, reconhecer o estudante em sua totalidade. A avaliação no ER contempla o conhecimento, a participação, a atitude de vida e as inter-relações, como também implica na abertura e na criação de espaços para a análise das experiências religiosas. A avaliação nestes termos decorre da postura do educador em relação ao estudante e dos instrumentos utilizados durante o desenvolvimento das aulas para obtenção da aprendizagem destes. Portanto, a dimensão vivencial do Ensino Religioso não pode ser medida, mas pode ser avaliada na perspectiva do crescimento pessoal, e pode ser observada, para ser retomada e redimensionada pelos envolvidos no processo. É um espaço para crescer no conhecimento, na consciência e na religiosidade. Torna-se necessário buscar critérios que correspondam a esta proposta e às expectativas que daí são geradas, colocando a avaliação a serviço da promoção e da melhoria da aprendizagem, buscando estratégias que possam concretizar a qualidade educacional. A avaliação é uma parte do processo ensino-aprendizagem. É por meio dela que o professor consegue verificar aquilo que foi apreendido 301 FONAPER pelos alunos. No ensino formal, geralmente ela é feita de forma escrita, mas não deve ser a única forma de verificação de aprendizagem. O acompanhamento dos alunos, através da observação e dos registros do professor é importante para verificar a participação e a produtividade dos alunos ao longo do ano. Neste sentido, as provas escritas não devem ter um caráter apenas classificatório dos educandos, mas questões que estejam de acordo com o objetivo do conteúdo trabalhado e a faixa etária dos alunos. Devem ter uma linguagem clara, que não induza a erros, nem contenham caráter de dubiedade, e não devem ter um fim em si mesmo, mas orientar a tomada de decisões por parte da equipe docente sobre aqueles conteúdos que precisam ser revistos e /ou aprofundados. A realização de atividades em grupos e a execução de exercícios permitem a socialização dos educandos, a tomada de decisões e favorecem também a capacidade de interpretação e análise do grupo, ao ter que contrastar suas informações com as de outras pessoas que compõem o coletivo. As pesquisas que visam ampliar o conhecimento sobre determinado tema, precisam ser conduzidas de forma a propor a solução de problemas e a investigação do meio, permitindo uma visão crítica da realidade em diferentes escalas: seja ela local, regional, nacional ou internacional. Resultados Através da pesquisa realizada pode-se perceber que a escola citada, apesar de pertencer a um carisma e uma filosofia confessional católica, há uma distinção organizada e sistematizada, acerca do Ensino Religioso como disciplina da área do conhecimento das ciências humanas, contrapondo os tipos de Ensino Religioso do passado, tendo os modelos catequéticos e teológicos segundo (PASSOS, 2007). Os resultados dessa sessão serão realizados através das análises documentais, tendo como maior referência o Plano Trienal de Evangelização 2007-2009. Serão observados os métodos, modelos, aspectos avaliativos neste estudo. a) Quanto à concepção de Ensino Religioso A Província Marista nos seus constantes estudos em busca de uma educação de qualidade, não esqueceu o componente curricular Ensino 302 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Religioso. De uma disciplina pautada a partir de um currículo catequético, a Província Marista acompanhou o percurso histórico-político por que passou o Ensino Religioso. As novas abordagens pedagógicas e consequentemente uma nova concepção de educação, com vistas à construção de um ser humano pensante e crítico, foi acompanhada pela elaboração de leis voltadas à educação brasileira. Os Maristas deram um passo significativo, quando em 2007, atenderam as exigências da Lei de Diretrizes e Bases (LDB – 9394/96), sobretudo, a partir da Lei 9.475/97. A Província, através do seu Plano Trienal de Evangelização, 20072009 (UMBEC. PNE.) organizou seu setor de evangelização, orientando que, entre as mudanças, o Ensino Religioso passasse a ter sua Matriz Curricular própria, seguindo as exigências da LDB. Com as mudanças ocorridas não menos, em princípio, confusas e resistentes por parte de alguns, a primeira ação foi separar o Ensino Religioso da gerência do Serviço de Orientação Religiosa - SOR. Essa gerência ficou a cargo do Núcleo de Apoio Pedagógico - NAP, das séries de Maternal ao Ensino Médio. Essa mudança fez com que, o ER passasse a ter um tratamento pedagógico semelhante aos das outras disciplinas, como por exemplo, instrumentos avaliativos, plano de aula, livro didático, material didático, entre outros. É verdade que muito já se avançou nesse processo, contudo, nem toda a comunidade escolar, ainda absorveu o novo paradigma do Ensino Religioso. Porém, à medida que novas dúvidas e discussões vão surgindo, é preciso mergulhar em novos estudos, reformulações e formulações de outras respostas a fim de amadurecer cada vez mais a concepção da disciplina. b) Quanto ao processo de avaliação da aprendizagem no Ensino Religioso Na pesquisa, até 2008, não foi encontrado nenhum registro de documentos e textos relacionados à avaliações quantitativas (provas e testes); de forma informal, foi perguntado a professores que trabalhavam nesse período, e as respostas foram as mesmas, que até o ano mencionado, as avaliações eram realizadas através da participação e frequência dos alunos; ressaltaram que nesse período, a disciplina não tinha obrigatoriedade na aplicação de testes avaliativos. A partir de 2009, 303 FONAPER pode-se verificar a presença de alguns registros de provas, aplicadas pelos educadores de ER. Dentro da nova proposta do ER como área do conhecimento, esse mecanismo passa a ser uma ferramenta indispensável na rotina educacional da rede Marista, podendo se verificar que muito já evoluiu nesse sentido, mas ainda existem muitos percalços nessa trajetória, um deles é escassez de materiais didáticos específicos, baseados no modelo das Ciências da Religião; outro a falta de banco de questões para os conteúdos da disciplina. c) Quanto à metodologia de ensino do Ensino Religioso Segundo Passos (2007) percebeu-se que os planos de Curso de Ensino Religioso de 2002 a 2005 utilizaram uma metodologia voltada para o modelo teológico reforçando os aspectos ético-valorativos, tendo como ferramentas as dinâmicas de grupos, assim como, a presença do aspecto catequético através do momento reservado à oração. Com um modelo de plano mais estruturado, em 2006, os métodos ainda acompanham os modelos teológicos, trabalhando temas geradores como: a pessoa, a família, o mundo e a religião, percebe-se que os aspectos da religiosidade são trabalhados de maneira segmentada e com pouca proximidade do modelo das Ciências da Religião. No ano de 2008, com a reestruturação da Catequese e do Ensino Religioso (UMBEC. PNE), em passos pequenos foi se construindo novos métodos, se aproximando cada vez mais do modelo das Ciências da Religião. Ainda em 2010, sem ter um referencial estruturado e fundamentado no Fenômeno Religioso, percebeu-se que conteúdos metodologias e avaliações acabavam-se repetindo em alguns momentos. A equipe de professores de Ensino Religioso foi convidada, pela gestão da escola, para suprir, principalmente, os desnivelamentos de conteúdos das séries. No início de 2011, foi construído um documento, do Maternal II ao 2º ano do Ensino Médio, verticalizando os conteúdos da disciplina ER que serviria de base para a construção do Plano de Curso do ano referido. Sem imaginar que um ano depois a mantenedora, através de um grupo de educadores da rede, iria construir uma Matriz Curricular do Ensino Religioso fundamentada nas leis, PCNs de ER. 304 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso d) O Ensino Religioso na escola Marista de Belém em 2013 Quanto à organização nos níveis de ensino, existe uma peculiaridade quanto à nomenclatura da disciplina, como a escola tem dentro de sua grade curricular a partir da Educação Infantil – Maternal II – esse segmento recebe um nome próprio Sentido Religioso, estabelecido pela rede. A nomenclatura é Ensino Religioso, e a outra novidade, é a presença da disciplina no Ensino Médio com o nome de Culturas Religiosas. Hoje, no seu quadro de professores a escola conta com cinco profissionais para ministrar as aulas de Ensino Religioso, distribuídos nos segmentos de ensino sinalizados, todos com a habilitação legal para exercer a função. É importante ressaltar que o critério seletivo para o cargo é realizado da mesma forma que qualquer outra disciplina e com requisito essencial, a graduação em Ciências da Religião ou Licenciatura em Ensino Religioso. A carga horária da disciplina, do 6º ao 3º Ano do Ensino Médio obedece-se uma hora/aula por turma semanalmente, enquanto as turmas da Educação Infantil ao 5º Ano/09 tem o acréscimo de mais uma hora/aula, sendo 2 horas aulas semanais para cada turma. Sabe-se da dificuldade e escassez de materiais didáticos compatíveis a nova realidade do Ensino Religioso. A escola desde 2012 adotou livros didáticos de duas editoras diferentes, a primeira coleção da Editora Vozes, Redescobrindo o Universo Religioso, para as turmas do 2º Ano/09 até o 5º Ano/09; já a segunda da Editora Moderna, reservada para o Ensino Fundamental II. O livro didático, mais que uma ferramenta no auxílio do ensinoaprendizagem tem contribuído bastante para o desenvolvimento da disciplina dentro da instituição, suprindo possíveis lacunas encontradas nessa ferramenta pedagógica os educadores do ER, produzem seus próprios materiais didáticos para poder complementar as necessidades acadêmicas de cada série. As avaliações são realizadas de acordo com a proposta pedagógica da escola atual; a cada trimestre os alunos a partir do 3º ano /09 fazem as seguintes aplicações avaliativas: 1. Avaliação Trimestral - AVT; 2. Avaliação de Área - AVA. Dentro da proposta Marista, a formação é continuada; é visto e trabalhado como prioridade para todos os educadores da rede, e não é diferente para os profissionais do ER, no ano de 2012. Foram realizadas 305 FONAPER pelas mantenedoras dos cursos EAD, Fenômeno Religioso e O Ensino Religioso e o Currículo com carga horária de 80h, além da Quarta de formação, que são formações em conjuntos com os outros profissionais da escola, reservados à discussão dos diversos assuntos guiados pela proposta educacional Marista. O ano de 2013, no mês de maio, teve um grande encontro do Ensino Religioso em Brasília, onde foi um momento ímpar para os estudos do Fenômeno Religioso, troca de experiências entre as unidades da rede Marista, assim como, fazer um levantamento de quais avanços foram obtidos pelo ER enquanto rede Marista e quais são os desafios e dificuldades encontradas pela disciplina nesse percurso. A escola Marista de Belém foi bem representada por três profissionais da área, como também, uma coordenadora pedagógica, uma agente pastoral e a coordenadora de área das ciências humanas. No retorno do grupo, no momento da socialização, foi detectado que pela nova estrutura da matriz curricular, o livro didático utilizado na educação fundamental I pouco atende os anseios da matriz atual e que provavelmente não será adotado no ano de 2014, já o livro do ensino Fundamental II, ainda está sendo feito uma analise pela equipe. Considerações Finais Ao longo da história do Ensino Religioso neste país, é notória a influência cristã nas práxis desenvolvidas em sala o que dificulta o processo de mudança a um novo e moderno conceito acerca da disciplina. Ainda é muito comum o conflito entre ensino laico versus o confessional, onde se visualiza um enfraquecimento do Ensino Religioso, principalmente pelo descaso de alguns gestores e comodismo de muitos educadores. Já não se vive mais no período colonial, onde os métodos educacionais eram devocionais. Vive-se em um mundo onde o respeito e a reverência devem ser buscados a todo o momento, individualmente ou em grupos, e a escola não pode ficar de fora desse processo e o Ensino religioso precisa e deve mostrar a sua ―cara‖ ou a ―nova cara‖ que é representada pelo estudo do fenômeno religioso, dando ênfase na diversidade e da pluralidade cultural religiosa, porque lhe cabe esta função. Ao término da pesquisa, fica minha convicção de que a Escola Marista de Belém mesmo pertencendo a uma confessionalidade religiosa, vem alcançando diversos avanços na busca de um ensino-aprendizagem 306 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso coerente para disciplina estudada fundamentada na pluralidade cultural e religiosa. Acredito também, que para aprimorar e crescer ainda mais é necessário que a instituição invista em profissionais especializados da área da Ciência das Religiões no intuito de gerenciar o Ensino Religioso da Rede Marista. Este trabalho não esgota a discussão, mas constitui-se em um elemento que provoca a reflexão crítica e um olhar atualizado sobre nova ótica da disciplina Ensino Religioso nas escolas públicas e privadas do Brasil e tem a pretensão de mostrar, ao leitor, em especial, aos acadêmicos das Ciências da Religião e aos professores de Ensino Religiosos, que uma escola de carisma e filosofia confessional pode trabalhar o Ensino Religioso de forma a obedecer à laicidade legalizada no Brasil. Referências ARROYO, Miguel G. Ofício de Mestre. Petrópolis: Vozes, 2000. BRASIL. LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9394/96. Disponível em <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2013. CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Setor de Ensino Religioso. Ensino Religioso, Situação e Perspectivas. Subsídio divulgado a 36ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Itaici, Indaiatuba – São Paulo, abril de 1998. FERNANDES, Maria Madalena S. Afinal o que é o Ensino Religioso? São Paulo: Paulus, 2000. FIGUEIREDO, Anísia de Paulo. Ensino Religioso. Perspectivas pedagógicas. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. FONAPER. Parâmetros curriculares Nacionais. Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. FREIRE, Paulo, Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. OLIVEIRA, Lilian Blanck de. et al. Ensino Religioso: fundamentos e métodos. São Paulo: Paulinas, 2007. 307 FONAPER PASSOS, João Décio. Ensino Religioso: construção de uma proposta. Coleção Temas do Ensino Religioso. São Paulo: Paulinas, 2007. UMBRASIL - União Marista do Brasil. Projeto Educativo Brasil Marista: Nosso jeito de conceber a Educação Básica. Brasília: UMBRASIL, 2010. ______. Plano Trienal de Evangelização 2007-2009. UMBRASIL, Brasília, 2007. ______. Matriz Curricular Marista. Área das ciências humanas e suas tecnologias. Brasília: UMBRASIL, 2012. 308 O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS BRASILEIRAS: UMA ANÁLISE A PARTIR DAS LEGISLAÇÕES EDUCACIONAIS Claudia Berdague1 Resumo: Este artigo trata da permanência do Ensino Religioso no currículo das escolas públicas brasileiras. A disciplina foi inserida nas escolas no período colonial quando o Estado assumia a Igreja Católica como sua religião oficial. No período republicano acontece a separação entre Estado e Igreja, entretanto as Constituições e leis da educação normatizam sobre o tema, mantendo a disciplina no currículo. O objetivo desta discussão é analisar as legislações emanadas pelo Conselho Nacional de Educação, após a promulgação da LDB 9394/1996, objetivando compreender como a disciplina vem se mantendo nos currículos escolares. Palavras-chave: Ensino Religioso. Legislação Educacional. Currículo Escolar. Introdução A religiosidade nas suas diversas formas de expressão é uma das dimensões constitutivas do ser humano. Na escola, o estudo do tema tem a função de embasar o entendimento do fenômeno religioso, através do conhecimento das culturas e tradições religiosas presentes no convívio social dos educandos, buscando educar para o diálogo e a reverência ao transcendente. Entretanto, os sistemas de ensino demonstram certa dificuldade em trabalhar com este componente curricular, necessitando que os órgãos regulamentadores da educação brasileira, os conselhos de educação, deliberem sobre sua aplicabilidade nas escolas públicas. A lei torna a disciplina facultativa para o aluno, mas obrigatória para a escola. E, no entendimento de algumas redes de ensino, o ―facultativo‖ desobriga a oferta da disciplina, visto que não há um entendimento da contribuição da mesma para a formação dos sujeitos. Além disso, muitos não sabem como se fará a formação de professores para a disciplina. 1 Pedagoga Especialista em Planejamento e Gestão Escolar. Mestranda do Curso de Ciências das Religiões na Faculdade Unida de Vitória. Docente das Faculdades Integradas do Extremo Sul da Bahia. E-mail: [email protected] FONAPER Desta forma, o estudo deste tema se justifica pela busca de um novo paradigma para a disciplina Ensino Religioso, capaz de sustentar uma prática pedagógica significativa para a formação das novas gerações inseridas nas escolas públicas e, à luz das legislações emanadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), compreender os conflitos que interferem no tratamento dado à disciplina nos dias atuais, visto que o Ensino Religioso tem sido alvo de debate quanto à compreensão de sua natureza e papel na escola. O Ensino Religioso nas leis brasileiras: da colonização à década de 1980 O Ensino religioso, enquanto uma área de conhecimento, sempre esteve presente nos currículos escolares. A disciplina insere-se na trajetória da educação brasileira, desde o período da colonização (1500 a 1800), quando Estado e Igreja apresentavam-se integrados numa relação de interdependência. Neste período, por delegação pontifícia e reafirmando o poder exercido sobre o Estado, a Igreja Católica desenvolveu um modelo de ensino voltado para a evangelização dos gentios e catequese para os índios e negros. Num segundo momento, de 1800 a 1964, a educação passa a ser referendada pelo Estado, tendo como objetivo a escola pública, gratuita e laica para todos. Nesse contexto, o Estado assume seu papel e a burguesia toma o lugar da hierarquia religiosa na gestão das escolas. Este período, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso2 (FONAPER, 2009), compreende épocas distintas, a saber: Monarquia Constitucional (1823 a 1889): O ensino Religioso é submetido ao esquema de protecionismo da Metrópole. O fio condutor é o texto da Carta Magna de 1824, que mantém a Religião Católica Apostólica Romana, a Religião oficial do Império em seu artigo 5º. A religião passa a ser um dos principais aparelhos ideológicos do Estado. O que se faz na Escola é o Ensino da Religião Católica, Regime Republicano (1890 – 1930): Acontece a separação entre Estado e Igreja pelo viés dos ideais positivistas. Na primeira Constituição Republicana aparece a expressão ―Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos de ensino‖. Mesmo havendo a laicidade o Ensino da Religião nesse período esteve presente pelo 2 Embora tenham sido publicados pelo FONAPER desde 1997, os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso ainda não foram aprovados pelo CNE. 310 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso zelo de fidelidade dos princípios estabelecidos sob a orientação da Igreja Católica. Período de transição (1930 – 1937): O Ensino Religioso é inicialmente admitido em caráter facultativo, através do Decreto de 30 de abril de 1931. Assim diz a constituição de 1934 no artigo 153: ―O Ensino Religioso será de matrícula facultativa ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno (...) e constituirá matéria dos horários das Escolas Públicas primárias, secundárias, profissionais e normais‖. Estado Novo (1937 – 1945): O Ensino Religioso perde o seu caráter de obrigatoriedade. Terceiro período republicano (1946 – 1964): O Ensino Religioso é contemplado como dever do Estado para com a liberdade religiosa do cidadão que frequenta a Escola. Quarto período republicano (1964 – 1984): Os avanços democráticos alcançados pela sociedade brasileira são interrompidos. Nesse contexto o Ensino Religioso é obrigatório para a Escola, concedendo ao aluno o direito de optar pela frequência ou não no ato da matricula. No sentido de regulamentar o tratamento da disciplina no âmbito escolar, no período republicano foram homologadas duas Leis de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). A primeira LDB, de Nº 4.024, publicada em 1961, após amplo debate iniciado em 1948, estabelece, através de seu Artigo 97, que: Art. 97 O Ensino Religioso constitui disciplina dos horários normais das escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado sem ônus para os cofres públicos, de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável. 1º parágrafo – A formação de classe para o ensino religioso independe de número mínimo de alunos. 2º parágrafo – O registro dos professores de ensino religioso será realizado perante a autoridade religiosa respectiva. A segunda LDB, de Nº 5.692, homologada em 1971, fundamentada na necessidade de uma escola tecnicista e voltada para a preparação para o trabalho, disciplinou o tratamento a ser dado ao tema, da seguinte forma: Art. 7º Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programa de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de 1º e 2º graus, observado quanto à primeira o disposto no Decreto-lei no 869, de 12 de setembro de 1969. 311 FONAPER Parágrafo único. O ensino religioso, de matrícula facultativa constituirá disciplina dos horários normais dos estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus. Por influência da Igreja Católica e compreendendo a religião como parte integrante da formação do sujeito, ambas as leis mantiveram em seu texto a disciplina, embora não se apresentasse uma proposta coerente e que atendesse à Constituição quanto à laicidade da escola. Na prática cotidiana das escolas, predominava o ensino da religião, em detrimento da discussão acerca da religiosidade. Tal fato se deu, primeiro, em função do Estado não assumir o ônus com os docentes, permitindo que outros agentes assumissem a função dentro das escolas. Segundo, quando o Estado passa a assumir o ônus, permite que a disciplina seja ministrada por docentes do quadro efetivo do magistério que precisavam de complemento da carga horária, os quais nem sempre estavam preparados para ministrá-la, passando doutrinas da religião por eles escolhida. Na década de 1980, foi promulgada a Constituição Federal (CF) de 1988, que em seu Artigo 210 estabelece que ―O Ensino Religioso de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental‖ (Art. 210, parágrafo 1º do capítulo II). No contexto da CF, o Ensino Religioso garante seu espaço no currículo básico do Ensino Fundamental, garantindo, posteriormente, espaço real nas leis da educação. Desta forma, com a promulgação da terceira LDB, Lei Nº 9394 de 1996, a disciplina é inserida no contexto global da educação, preconizando o respeito à diversidade cultural religiosa existente no Brasil. O Ensino Religioso na LDB Nº 9.394/1996 Analisando o texto original da LDB Nº 9.394/1996, constatou-se que esta cometia o mesmo equívoco da primeira (4.024/1961), pois defendia a posição de que a disciplina não deveria ter ônus para o Estado. Tal fato provocou protestos no setor educacional, e assim, em 1997, foi publicada a Lei 9.475, que altera o artigo 33 da referida LDB, retirando de seu texto o termo ―sendo oferecido sem ônus para os cofres públicos‖ e dando outros dispositivos, conforme abaixo: 312 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Art. 33 O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentam os procedimentos para a definição do conteúdo do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. Com esta lei, o Ensino Religioso passa a garantir o direito à diversidade cultural e religiosa do Brasil, sem quaisquer formas de proselitismo. Porém, a forma como a disciplina está posta na lei ainda não atende às necessidades do setor educacional, visto que, sendo uma disciplina facultativa para o aluno, não deve constar no cômputo das 800 horas anuais, devendo cada sistema de ensino deliberar sobre a melhor forma de atender a esta prescrição da lei. Para os sistemas de ensino esse tema ainda apresenta dúvidas quanto à aplicação das leis educacionais. Percebe-se uma falta de clareza nos textos legais, pois não definem como a disciplina deve ser tratada, se como uma área de conhecimento, ou como um tema. Entre os anos de 1997 a 1999 foram feitas várias consultas ao Conselho Nacional de Educação no sentido de compreender os dispositivos da LDB Nº 9.394/1996, quanto às diretrizes para inserir a disciplina no Ensino Fundamental, sua carga horária e a formação de professores. No mês de março de 1997, o CNE publica o Parecer Nº 05/97, aprovado pelo Conselho Pleno em 11/03/1997. Os relatores, Conselheiros João Antonio Cabral de Monlevade e José Arthur Giannotti, apresentam duas formas de entendimento para o Ensino Religioso: a primeira é o ensino da matéria ―religião‖ o que, neste caso, permite que qualquer profissional que tenha a formação acadêmica adequada, seja concursado ou contratado para a docência pode ministrar a disciplina; a segunda, defendida pelos conselheiros, compreende por Ensino Religioso ―o espaço que a escola pública abre para que estudantes facultativamente, se iniciem 313 FONAPER ou se aperfeiçoem numa determinada religião‖. Neste caso, somente os representantes das igrejas poderiam ministrar a disciplina, preservando o caráter leigo do Estado, uma vez que o Art. 19 da CF veda a subvenção a cultos religiosos e as igrejas. Neste contexto, a escola apenas deve garantir a matrícula facultativa dos alunos e disponibilizar horário e espaço físico para os encontros/aulas da disciplina Ensino Religioso, conforme a opção dos discentes e/ou responsáveis pelos mesmos. Os conselheiros finalizam o parecer afirmando que: [...] para a oferta do ensino religioso nas escolas públicas de ensino fundamental, da parte do Estado, e, portanto dos sistemas de ensino e das escolas, cabe-lhes, antes do período letivo, oferecer horário apropriado e acolher as propostas confessionais e interconfessionais das diversas religiões para, respeitado o prazo do artigo 88 da lei 9394/96, ser incluída no Projeto Pedagógico da escola e transmitida aos alunos e pais, de forma a assegurar a matricula facultativa no ensino religioso e optativa segundo a consciência dos alunos ou responsáveis, sem nenhuma forma de indução de obrigatoriedade ou de preferência por uma ou outra religião. Este parecer esclarece alguns pontos acerca do tratamento a ser dado à disciplina. Porém, com a publicação da Lei 9.475, em julho de 1997, o artigo 33 é alterado, e na nova redação assegura o ―respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo‖. Em seu artigo primeiro, delega aos sistemas de ensino a tarefa de regulamentar os conteúdos, habilitação e admissão dos professores. Entende-se que o Estado deve arcar com o pagamento desse profissional, visto que, na nova redação, o termo ―sem ônus para os cofres públicos‖ foi retirado do texto. Outra questão posta por essa Lei, em seu artigo segundo, é que os conteúdos devem ser definidos pelos sistemas de ensino, com a participação da sociedade civil constituída pelas diferentes denominações religiosas. Desta forma, não há compatibilidade de acolhimento às propostas confessionais ou interconfessionais, conforme estabelecia o texto original da LDB Nº 9.394/96. Desta forma, com a alteração do Artigo 33 tornou-se necessário novo pronunciamento do CNE. Assim, em janeiro de 1998, foi publicado o Parecer Nº 04/98, que define diretrizes nacionais para o Ensino Fundamental. Em sua introdução, a relatora, Conselheira Regina Alcântara 314 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso de Assis, afirma que: ―A magnitude da importância da Educação é assim reconhecida por envolver todas as dimensões do ser humano: o singulus, o civis, o socius, ou seja, a pessoa em suas relações individuais, civis e sociais‖. A conselheira não menciona o aspecto religioso como dimensão constituinte do ser, apenas reafirma que a ―Educação Religiosa, nos termos da lei, é uma disciplina obrigatória de matrícula facultativa no sistema público‖. Em junho de 1998, o CNE publica novo parecer sobre o Ensino Religioso. Trata-se de resposta à consulta feita pela Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina. O referido Parecer, de Nº 16/98, vem esclarecer o prescrito na lei 9.475/97, e teve como relator o Conselheiro Kuno Paulo Rhoden, que inicia seu texto enfatizando a função social do Ensino religioso e sua oferta na escola, em seguida faz uma ―exegese‖ da Lei 9.475/1997, explicitando que a disciplina deve fazer parte dos horários normais do Ensino Fundamental, e que cabe a cada sistema de ensino a elaboração da Proposta Pedagógica que irá determinar as normas e procedimentos para o cumprimento das disposições legais e operacionais das escolas. Quanto à formação de professores para a disciplina Ensino Religioso, ainda não se tem uma orientação concreta de como os sistemas de ensino devem proceder para a contratação de docentes. Numa tentativa de nortear os sistemas de ensino, em 06/04/1999 o CNE publica o Parecer Nº CP 97/99, que trata da formação de professores para o Ensino Religioso nas escolas públicas de Ensino Fundamental. Este parecer teve como relatora a Conselheira Eunice R. Durham, que aborda as demais legislações que tratam do tema e dá uma resposta às solicitações de autorização de cursos de licenciatura em Ensino Religioso. De acordo com a conselheira, em virtude da diversidade de manifestações religiosas existentes no Brasil, não é possível que o Estado autorize um curso desta natureza sem ferir a autonomia dos sistemas de ensino tão enfatizada nas demais legislações. Assim, de acordo com a referida conselheira, não cabe à União, [...] determinar, direta ou indiretamente, conteúdos curriculares que orientam a formação religiosa dos professores, o que interferira tanto na liberdade de crença como nas decisões de Estados e municípios referentes à organização dos cursos em seus sistemas de ensino, não lhe compete autorizar, nem reconhecer, nem avaliar cursos de 315 FONAPER licenciatura em ensino religioso, cujos diplomas tenham validade nacional. Ainda sobre a formação de professores, em 19/04/1999 é publicada a Resolução do CNE Nº 02/1999, que estabelece diretrizes para a formação de docentes para a Educação Básica. Apenas o Artigo 2º, Inciso III, faz menção à questão, ao estabelecer que os sistemas de ensino devam preparar professores capazes de: III – desenvolver práticas educativas que contemplem o modo singular de inserção dos alunos futuros professores e dos estudantes da escola campo de estudo no mundo social, considerando abordagens condizentes com as suas identidades e o exercício da cidadania plena, ou seja, as especificidades do progresso de pensamento, da 3 realidade socioeconômica, da diversidade cultural, ética, de religião e de gênero, nas situações de aprendizagem; Desta forma, espera-se que cada sistema de ensino elabore sua proposta pedagógica, determinada por um projeto de educação que atenda aos anseios da comunidade para a qual se destina. Uma vez definida a proposta, deve-se priorizar a formação de docentes capazes de dar vida ao proposto, imprimindo em suas práticas pedagógicas ações capazes de transformar a realidade, ora esvaziada de valores próprios à boa convivência social. Considerações Finais O estudo aqui apresentado mostra que as normas regulamentadoras do setor educacional definem que a disciplina Ensino Religioso deve fazer parte do currículo normal do sistema escolar. O tema não deve ser entendido como ensino de uma religião ou das religiões na escola, mas sim uma disciplina centrada em pressupostos antropológicos, teológicos e pedagógicos. Alguns setores ainda a consideram como elemento eclesiástico e não como disciplina regular integrante do currículo escolar. Assim, ainda se faz presente nas salas de aula práticas confessionais, ou então, diante da carência de docentes para a disciplina, a mesma é tratada de forma superficial e às vezes como tema transversal, usando a metodologia da pedagogia de projetos. 3 Grifo nosso. 316 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso As diversas legislações que tratam do tema demonstram as incertezas quanto a sua oferta. Isto faz com que os sistemas de ensino não a valorizem, não invistam na formação de professores ou elaborem uma proposta pedagógica que responda aos anseios da sociedade para a formação das novas gerações que vêm demonstrando comportamentos caracterizados pela violência e intolerância. No contexto atual, a disciplina Ensino Religioso deve se constituir num espaço para a discussão e debate de questões como cultura, tradições, valores, ética e fé. Faz-se urgente repensar a disciplina Ensino Religioso nas escolas públicas, visto que a mesma é um dos caminhos para combater os preconceitos e discriminações ligados à raça, ao gênero, às diferenças, à religião e à cultura, proporcionando a construção de uma nova ideologia para uma sociedade como a nossa, que é composta por diversas etnias, caracterizada por marcas identitárias, que precisam ser educadas para a justiça e a paz. Referências BRASIL. Constituição Federal de 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 de mai 2011. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº 4.024 de 1961. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4024.htm>. Acesso em 20 de mai. 2011. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 5.692 de 1971. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm>. Acesso em: 20 de mai. 2011. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 9.394 de 1996. Disponível em: <http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/ldb_5ed.pdf? sequence=1>. Acesso em: 20 de mai. 2011. _____. Lei Nº 9475 de 1997. Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/lindice.htm>. Acesso em: 20 de mai. 2011. 317 FONAPER ______. Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº 05, de 11 de março de 1997. Interpretação do artigo 33 da Lei nº 9.394/96. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PNCP0597.pdf>. Acesso em 25 jun. 2012. ______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº 04, de 29 de janeiro de 1998. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Disponível em <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PCB04_1998.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2012. ______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº 16, de 01 de junho de 1998. Consulta a carga horária do ensino religioso no Ensino Fundamental. Disponível em <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/pceb 16_98.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2012. ______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Resolução Nº 02 de 1998. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/20483294/Resolucao-CEB-02-98-Institui-asDiretrizes-Curriculares-Nacionais-para-o-Ensino-Fundamental>. Acesso em: 20 de mai. 2011. ______. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 02 de 19 de abril de 1999. Institui diretrizes curriculares nacionais para a formação de docentes da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental, em nível médio na modalidade normal. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/doc/rceb02_99.doc>. Acesso em 02 mai.2006 ______. Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. Parecer nº 97, de 06 de abril de 1999. Formação de professores para o Ensino Fundamental nas escolas públicas de ensino fundamental. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PNCP0597.pdf>. Acesso em 25 jun. 2012. FONAPER. Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros curriculares nacionais - Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. 318 O ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO ESCOLAR1 Elisângela Madeira Coelho2 Resumo: O artigo aborda a necessidade de discutir e socializar estudos relacionadas aos processos de construção de conhecimentos nas culturas – tradições religiosas e não-religiosas e suas interfaces com o Ensino Religioso enquanto área de conhecimento da educação básica. A partir dessa perspectiva, destacamos que um dos grandes desafios para a educação é promover o respeito pelo outro como legítimo outro, sem o intento de homogeneizar as culturas. Outro aspecto relevante é levar em consideração o perfil docente que possa atender a proposta do Ensino Religioso. Espera-se desse profissional, uma metodologia dialógica e contextual e o grande desafio, porém, é efetivar um Ensino Religioso voltado para a superação do preconceito religioso, alicerçado no conhecimento e respeito à diversidade cultural e religiosa. Palavras-chave: Ensino Religioso. Currículo. Formação de professores. Introdução A esfera da religiosidade é uma dimensão constitutiva da realidade humana. Desde que o ser humano começou a ter consciência das coisas, ele já percebeu a existência de algo superior a ele, que foge da sua compreensão. Esta interpretação foi feita por vários povos e culturas diferentes, do qual resultaram distintas crenças em seres ou espíritos divinos, também chamados de transcendentes. Segundo o dicionário Aurélio (2002), o sentido da palavra transcendente possui muitos significados como: algo muito elevado, superior, sublime, excelso, que transcende aos limites da experiência possível, que supõe a intervenção de um princípio que lhe é superior. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (FONAPER, 2009), o transcendente é uma das manifestações do fenômeno religioso, entendido como o processo de busca que o ser humano realiza na procura pela transcendência, o que perpassa desde sua experiência pessoal até a sua experiência religiosa em grupo, comunidade ou tradições religiosa. 1 2 Este artigo é resultado parcial da dissertação do Mestrado em Ciências da Religião. Elisângela Madeira Coelho, Pedagoga-Supervisora Escolar no Instituto Federal do Espírito Santo – Campus Itapina, Mestranda em Ciências da Religião na Faculdade Unida de Vitória - ES, e-mail: [email protected] FONAPER Como a sociedade brasileira é caracterizada pela diversidade cultural, coexistem inúmeras expressões religiosas no contexto social, bem como nas escolas e salas de aula, o que implica diretamente nas relações estabelecidas entre os diversos personagens que constituem o ambiente escolar. Pensar estas relações na escola supõe desafios e possibilidades. Desafios enquanto as dificuldades de aceitar o diferente e as diferenças e possibilidades enquanto espaço de contato com o diferente e as diferenças para então (re)significá-las na perspectiva da alteridade. Por isso, evidencia-se a importância de oportunizar acesso ao conhecimento das diferentes tradições e movimentos religiosos que se apresentam na atualidade, considerando que a intolerância religiosa promove diversos tipos de discriminação, que em muitas ocasiões podem levar a graves conflitos. Para viver democraticamente em uma sociedade multicultural é preciso conhecer e respeitar as diferentes culturas que a constituem. E o ambiente escolar é o espaço privilegiado para promover o conhecimento e a valorização da trajetória dos diferentes grupos sociais, pois só assim será possível superar atitudes de intolerância em relação às diferenças culturais. A fim de promovermos significativas mudanças na vida das pessoas, com o intuito de elas repensarem a forma de agir e interagir em sociedade, devemos utilizar meios para que sejam impulsionadas a desfazer posturas avarentas e coercivas. Nesse contexto, evidenciamos a grande contribuição do Ensino Religioso no processo formativo e educacional. O grande desafio, porém, é efetivar um Ensino Religioso voltado para a superação do preconceito religioso, alicerçado no conhecimento e respeito à diversidade cultural e religiosa. Tal componente deve oferecer subsídios para que os estudantes entendam como os grupos sociais se constituem culturalmente e como se relacionam com o sagrado. Estudar o fenômeno religioso requer, por sua própria natureza, uma metodologia dialógica e contextual. Neste trabalho, propomos trazer elementos teóricos que auxiliem na reflexão e compreensão dessas implicações na disciplina do Ensino Religioso, apontando para alguns aspectos práticos que propiciem a construção de espaços democráticos onde as diversas culturas e religiões possam estar representadas e principalmente a formação do profissional de Ensino Religioso que necessita de uma leitura crítica das realidades 320 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso sociais para organização e direcionamento do seu trabalho em sala de aula. Por fim, reiteramos a importância do Ensino Religioso em abordar o conhecimento das diferentes culturas e religiões presentes na sociedade, uma vez que o ambiente escolar é o espaço privilegiado para promover o reconhecimento e a valorização da trajetória dos diferentes grupos sociais. Consideramos que os saberes abordados pela disciplina precisam ser pesquisados e contextualizados histórica e socialmente. A partir dessa perspectiva, destacamos que um dos grandes desafios para a educação é promover o respeito pelo outro como legítimo outro, sem o intento de homogeneizar as culturas. Diversidade Religiosa e Ensino Religioso A nova redação do art. 33 da Lei n° 9394, de 20 de dezembro de 1996, determina que o Ensino Religioso, de matrícula facultativa, seja parte integrante da formação básica do cidadão, constituindo disciplina nos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. Neste sentido, para Junqueira (1995, p.14) não é ―função do Ensino Religioso escolar promover conversões, mas oportunizar ambiente favorável para a experiência do Transcendente, em vista de uma educação integral, atingindo as diversas dimensões da pessoa‖. Tornar essa concepção possível no currículo escolar implica considerar professores e alunos sujeitos produtores e disseminadores de conhecimento, conscientes de sua cidadania, em formação permanente. Assim, o Ensino Religioso nos permite andar pelos caminhos da cultura e da diversidade, resgatando valores que podem influenciar na construção de uma sociedade mais justa e humana. Na escola, diante da diversidade cultural e das tradições religiosas em que o educando se insere, o Ensino Religioso, por meio do estudo do fenômeno religioso, desencadeia o respeito à tolerância para com o diferente, implicando ao professor compreender os movimentos específicos das diversas culturas, cujo substantivo religioso colabora com a constituição de cidadãos multiculturalistas, e também valorizar a diversidade daquilo que distingue os diferentes componentes culturais, 321 FONAPER com a finalidade de adotar na sua prática, políticas educacionais e sociais de valorização da diversidade. A literatura sobre o Ensino Religioso disponível não tem nenhuma dúvida sobre as possibilidades concretas deste apresentar alguma contribuição para a formação do cidadão. Citamos trechos paradigmáticos de duas autoras: Esta disciplina, trabalhada de forma interdisciplinar, colabora para que educandos e educadores estejam comprometidos com a qualidade de vida, em que a justiça, a fraternidade, o diálogo e o respeito pelo diferente, pela história, pelas tradições e culturas favoreçam a paz, a unidade, a esperança e a solidariedade. Admitido como parte integrante da formação global o educando, favorece a humanização e a personalização de educandos e educadores, como sujeitos de seu desenvolvimento e protagonistas na construção de um mundo novo, humano e solidário (CARON, 1998, p. 286-287). Muitas vezes é pelo vazio desta disciplina que no relacionamento humano o direito se tornou a lei do mais forte e a vida social termina no egoísmo que semeia as injustiças mais gritantes. Eis a finalidade da religião na vida da pessoa: tentar orientá-la para o sobrenatural; ligá-la novamente com o sobrenatural... No entanto, esta ligação deve ser orientada numa dimensão libertadora e não alienante, pois já vimos que a religião pode ser usada para libertar o homem e levá-lo a uma ação transformadora, condizente com o projeto de Deus, ou pode levá-lo a uma atitude totalmente contrária como é o caso da opressão, da exploração, da dominação e da discriminação, tão presentes em nosso continente Latino-americano (FERNANDES, 2000, p. 30-31). Uma das funções sociocultural-histórico da educação básica é desenvolver fundamentos para a formação do cidadão e que o currículo deste ensino contribua para uma aprendizagem significativa de releitura e interpretação da realidade, possibilitando assim a participação do cidadão na sociedade de forma autônoma, livre e feliz. O Ensino Religioso, área de conhecimento, tem um referencial próprio de leitura e de interpretação da realidade e o objetivo de contribuir com a formação integral do indivíduo, inserindo-o no processo de participação cidadã na sociedade, de forma autônoma e solidária. Enquanto campo de conhecimento, o Ensino Religioso se fundamenta na matriz teórica das ciências das religiões e metodologicamente trabalha com eixos estruturantes, que tem por objetivo desenvolver a compreensão do fenômeno religioso e a compreensão das experiências e expressões da religiosidade no ser humano. Os eixos que sustentam o componente curricular se organizam em torno da leitura e 322 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso compreensão das Tradições e Culturas, Teologias, Textos Sagrados Orais e Escritos, Ritos e Ethos (FONAPER, 2009). É a ação pedagógica realizada a partir de conteúdos programáticos que possibilita ao educando apropriar-se de uma metodologia de leitura e compreensão da realidade, quando se desenvolvida numa ação de: • Observação: ou seja, de olhar e perceber o fenômeno religioso em suas múltiplas dimensões e de fazer a análise do contexto para apropriar-se de conceitos básicos do componente curricular Ensino Religioso. • Informação: ou seja, da aproximação do conhecimento, na perspectiva de que o educando amplie seus conhecimentos, para construir instrumentos e referenciais de interpretação e análise, possibilitando recolocar e ressignificar conceitos. • Reflexão: ou seja, oportunizar o confronto pedagógico do conhecimento teórico com a prática, exercitando e organizando observações, e gerenciando informações necessárias à construção do conhecimento. • Ação: ou seja, mobilizar o educando para apropriar-se de linguagens, compreender fenômenos, construir argumentações e elaborar propostas para a convivência fraterna, respeitosa e de dignidade. Assim se constitui a área de conhecimento Ensino Religioso, na compreensão do seu objeto de estudo e possibilidade de a abertura de um campo de leitura e de relações multi e transdisciplinar, integrando diversos saberes e dialogando com outras ciências com a finalidade de contribuir para a construção de novas práticas, que auxilie para a formação integral do educando e que tenha uma perspectiva sempre aberta para o novo. Que se expande para novos e desconhecidos horizontes do saber. A Formação do Professor de Ensino Religioso Freire (1996) nos ensina que o diálogo não é mero bate-papo, não é tática para fazer amigos, não é um vaivém de informações, não é um método, não é uma técnica para obter resultados ―não existe num vácuo político. Não é um espaço livre onde se possa fazer o que se quiser.‖ O diálogo implica uma troca de saberes, mas não se esgota nela. É condição para a construção de conhecimento, porque na situação dialógica a 323 FONAPER comunicação entre os sujeitos que estão dialogando problematiza o objeto de conhecimento, questionando, criticando, avaliando, trazendo novos aportes de informação, enfim, ampliando as dimensões do que é possível saber sobre o objeto a ser conhecido/reconhecido. Nas palavras de Paulo Freire (1986, p.123), O diálogo é uma espécie de postura necessária, na medida em que os seres humanos se transformam cada vez mais em seres criticamente comunicativos. O diálogo é o momento em que os seres humanos se encontram para refletir sobre sua realidade tal como a fazem e a refazem. A relação é presença e construção. Portanto, a educação é construída na base de uma compreensão pluridimensional da pessoa e vai acontecer nos espaços de aprendizagem como exercício de reflexão e ação críticas. A educação no Ensino Religioso deve apresentar-se como uma pedagogia que promova a construção de uma participação, incentive a compreensão dos dissensos e conflitos, leve a uma abertura para o mundo como compromisso concreto com os contextos nos quais se dão os processos educativos. A investigação sobre o currículo e a formação do professor de Ensino Religioso encontra-se intimamente atrelada ao processo histórico e social da educação brasileira. A promulgação da LDB/96 se deu em meio a uma época marcada por significativos avanços científicos tecnológicos, reestruturações no mundo do trabalho, ampliação dos meios de acesso à informação e instauração de políticas públicas voltadas às demandas das classes menos favorecidas. Crescia, porém, a consciência da necessidade de um fortalecimento de iniciativas em prol da valorização das diferentes culturas, preservação ecológica, respeito à ética e à dignidade humana, entre outros. O Ensino Religioso na sua articulação prescinde de alguns aspectos fundamentais para a sua concretização, como por exemplo: as contribuições das áreas afins, a busca permanente pelo sentido da vida, a superação da fragmentação das experiências e da realidade, o pluralismo religioso, a compreensão do campo simbólico e a necessidade de evitar o proselitismo. Através dos eixos temáticos e da concepção de que a atuação do ser humano não se limita às relações com o meio ambiente e às relações sociais, mas sim está sempre em busca de algo que transcende essas realidades. 324 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Nesse sentido, como os professores de Ensino Religioso estariam trabalhando /vivenciando sua prática no dia-a-dia escolar? Não se faz Ensino Religioso sem pensar em organização da educação como um todo, em projeto de escola e em concepções que se têm do conhecimento religioso. As ideias de Morin (2003) em suas produções individuais ou como relator da UNESCO, têm se mostrado significativas para a pesquisa na área do Ensino Religioso. Suas contribuições estão centralizadas no conceito de multidimensionalidade do ser humano e da sociedade. Entre essas dimensões encontra-se a religiosa. Ao mesmo tempo em que Morin (2003, p. 116) ressalta as partes, as diferentes dimensões, para mostrar que elas existem, também destaca que há ―uma interretroação‖ entre elas para que se gere o ―conhecimento pertinente‖. O conhecimento religioso torna-se, a partir desse argumento, um conhecimento pertinente porque faz parte da multidimensionalidade do ser humano e da sociedade, ou seja, proporcionará o entendimento das ideias em contribuir para o incremento do estudo das concepções epistemológicas do Ensino Religioso, conhecer as concepções epistemológicas que norteiam a intencionalidade e a prática dessa área de conhecimento. As religiões fazem parte da cultura humana, e, portanto, cada religião é peculiar, por expressar diferentes linguagens, diferentes formas de acreditar, de celebrar, de rezar, e de relacionarem-se com alteridade e de simbolizar de formas diferentes esses fenômenos religiosos vivenciados pelos membros de cada cultura. A educação precisa ajudar a interpretar a nossa história, a refletir sobre atitudes, a perceber como se constrói uma vida melhor. Os professores de Ensino Religioso tem grande dificuldade em manter um clima agradável em sala de aula, uma vez que os alunos e a comunidade escolar de um modo geral ―ainda não estão conscientizados‖ da importância da disciplina, causando tumulto no ambiente escolar. Desta forma os professores de Ensino Religioso precisam de instrumentos que os façam interessarem e com isso possam transmitir seu conteúdo de forma dinâmica e prazerosa. Lurdes Caron e equipe do GRERE, no livro O Ensino Religioso na nova LDB, relatam que a escola, ao introduzir o Ensino Religioso na sua matriz curricular, busca refletir e integrar o fenômeno religioso como um 325 FONAPER saber fundamental para a formação integral do ser humano. Mas, a partir disso, emerge uma questão: quem educará os educadores? Morin (2005) remete-nos a uma resposta quase que imediata: precisamos adequar a nossa formação para que ela possa atender a este ―Novo Mundo‖ no qual vivemos hoje, onde a cada dia, novas ferramentas tecnológicas estão à nossa porta. É preciso pensar que muito mais do que a própria ideologia neoliberal que aponta a exigência da formação para que se tiverem títulos – necessitamos de uma formação e auto-formação que possam avançar na ciência, no estudo do objeto e de suas relações. Surge então a ideia de perfil docente que possa atender a proposta de Ensino Religioso. Espera-se do professor um envolvimento que inicia e culmina no projeto político-pedagógico da escola, referindo-se à competência pedagógica de trabalhar com situações novas em que a pessoa docente demonstre coerência entre preceitos teóricos e sua prática. Freire (2005, p. 90) enfatiza que ―não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão‖. A capacidade de interagir com pessoas de diferentes etnias, gêneros, situação sociocultural, confissões religiosas supõe conhecimento das características da identidade nacional, regional e local. Colocar-se em diálogo com diferentes pensamentos e formas de ser requer humildade e sabedoria ao mesmo tempo. Para Freire (1980, p. 83), ―o diálogo não pode existir sem um profundo amor pelo mundo e pelos homens. Designar o mundo, que é ato de criação e de recriação, não é possível sem estar impregnado de amor. O amor é ao mesmo tempo o fundamento do diálogo e o próprio diálogo‖. Dada tal importância ao diálogo, é possível dizer que, no prisma educacional, dialogar não é ―catequizar‖, mas socializar para uma reflexãoação. Dialogar vai além de intercambiar ideias, mas é uma conversa que gera uma reflexão coletiva visando criar ou aprimorar ações emancipadoras dos oprimidos. Ao assumir o Ensino Religioso na perspectiva da formação, da busca de um significado de vida, do desenvolvimento da personalidade com critérios seguros, do compromisso com a plena realização, tem implicações com os conteúdos e as metodologias veiculadas, isto é, Junqueira (2004, p.35) relata que se exige a coerência e a consistência entre teoria e prática, intenções e ações, o que perpassa pela transformação de seu articulador, de seu interlocutor, de seu mediador que 326 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso é a pessoa do educador, o professor de Ensino Religioso como catalisador pela sua sensibilidade, perspicácia e criatividade. Ao docente se faz necessário que transite com segurança e equilíbrio entre o saber religioso e a adesão religiosa do corpo discente e a sua própria. O perfil docente se constrói de modo contextualizado. A figura professoral se faz em consonância com o seu espaço de atuação, em conjunto com outras pessoas docentes, em conjunto com seu corpo discente e em sintonia com a sua formação. Nesta perspectiva, percebemos que a identidade do Ensino Religioso pretende contribuir para que os educandos tenham: esperança e utopia, para buscar uma sociedade justa, humana e solidária; capacidade de dialogar com os diferentes num contexto de uma sociedade ao mesmo tempo plural e desigual; condições de buscar o Transcendente sem perder de vista o compromisso ético com o ser humano; senso crítico e discernimento tanto para fazerem a leitura do mundo à sua volta quanto para fazer a distinção entre o certo e o errado com base em valores religiosos e humanistas; engajamento e militância nas causas que envolvem o enfrentamento de toda forma de opressão, exploração, exclusão, dominação e discriminação. Considerações Finais Com este trabalho verificamos a necessidade dos profissionais de Ensino Religioso terem formação para colocar em prática os objetivos da disciplina, a qual tem suas especificidades e os professores precisam buscar referenciais para a organização e o redirecionamento do seu trabalho em sala de aula, ampliando-se as vivências no trato com o outro, para aprender a ser e conviver. Morin (2003) salienta a necessidade da formação do professor para ajudar a contextualizar, a ampliar o universo alcançado pelos estudantes, a problematizar, a descobrir novos significados no conjunto das informações trazidas, ou seja, de conhecimentos prévios. Para Pedro Demo (2002), a pesquisa deve ser compreendida como atividade cotidiana onde o educando é desafiado e estimulado a buscar ajuda na literatura e, com os professores, a acessar recursos tecnológicos, a montar um mosaico das informações, a discuti-las e criticá-las, e com isso, a construir seu próprio conhecimento. 327 FONAPER Dessa forma há uma interação entre educando (sujeito), fenômeno religioso (objeto) e conhecimento (objetivo); o fenômeno religioso se estrutura na bipolarização: cultura e tradição religiosa, visto que toda cultura tem em seu substrato a presença do religioso e que toda tradição religiosa constitui-se no bojo de uma cultura, num processo simultâneo, interativo. As possibilidades de uso de novos recursos são imensas. O mais importante, porém, seria abrir os olhos dos nossos adolescentes para analisar tudo o que acontece à sua volta, tornando-os capazes de entender a vida para ter liberdade de escolher, construir e modificar sua prática. Referências BRASIL. Lei n. 9.394 - Diretrizes e bases da educação nacional: promulgada em 20/12/1996. Brasília, Editora do Brasil, 1996. CARON, Lurdes. O Ensino Religioso na nova LDB. Petrópolis: Vozes, 1999. DEMO, Pedro. Educar pela pesquisa. Campinas, SP: Autores Associados, 2002. FERNANDES, Maria Madalena S. Afinal, o que é o Ensino Religioso? Sua identidade própria em contraste com a Catequese. São Paulo: Paulus, 2000. FONAPER. Ensino religioso: referencial curricular para a proposta pedagógica da escola. 2000. ________. Parâmetros curriculares nacionais: ensino religioso. São Paulo: Ave Maria, 1997. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996, p. 152 a 159. GADOTTI, Moacir. Paulo Freire: uma biobibliografia. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire; Brasília, DF: UNESCO, 1996. JUNQUEIRA. Sérgio Rogério Azevedo. O processo de escolarização do ensino religioso no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. 328 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso _______________________________. O ensino religioso no contexto da educação. Curitiba: Champagnat, 2004, p. 35 MORIN, Edgard. A cabeça bem-feita. 8 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. 329 O LUGAR DO ENSINO RELIGIOSO NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO ADVENTISTA Francisco Luiz Gomes de Carvalho (PPCIR/UFJF)1 Resumo: Assim como caracterizar o modelo de Ensino Religioso (ER) ofertado no sistema educacional adventista é fundamental para compreender a lógica inerente aplicada pela denominação em sua missão veiculada na efetividade do projeto educacional, de igual importância é entender a estruturação e operacionalização curricular no nível escolar para observamos o lugar reservado ao ER. Os dados aqui apresentados advêm de análise documental balizada por uma abordagem crítica que se afirma como crivo reflexivo. É conveniente indicar que este texto apresenta uma fundamentação teórica devedora à área de estudos curriculares e da sociologia da educação, especialmente das teorias analíticas de Apple (2006), Bourdieu (1989), Foucault (1979), Goodson (2008) e Silva (2004). Palavras-chave: Ensino Religioso; Currículo; Educação Adventista; Introdução A história da Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD) apresenta em seus primórdios um desinteresse pela educação, porque a membresia aguardava o segundo advento de Jesus em sua geração. Assim ―[...] para muitos pais adventistas a iminência do advento tornava uma educação comum e básica até mesmo relativamente sem importância‖ (SCHWARZ; GREENLEAF, 2009, p. 116). Por isso, o sistema educacional adventista foi o último empreendimento denominacional. Nesta direção, Knight (1982, p. 1) afirma que: A educação formal foi o último segmento institucional a ser estabelecido dentro da denominação. Ela foi precedida pelo estabelecimento da obra de publicações em 1849, da organização eclesiástica centralizada em 1863 e da obra médica em 1866. Em contraste, a Igreja Adventista estabeleceu sua primeira escola em 1872 e não chegou a possuir um amplo sistema de escolas fundamentais até cerca de 1900. 1 Doutorando em Ciência da Religião (UFJF / Bolsista FAPEMIG). Mestre em Ciência da Religião (PUC-SP/ Bolsista CNPq), graduado em Teologia (UNASP-SP) e graduando em Pedagogia (UNIP). Participante do NEPROTES – Núcleo de Estudos em Protestantismos e Teologias. E-mail: [email protected]. FONAPER Desta forma, a primeira escola patrocinada pela denominação surgiu em Battle Creek (EUA), em 1872. Dois anos após, a Sociedade Educacional Adventista do Sétimo Dia torna-se entidade legal nos Estados Unidos da América. Por ocasião da inauguração da primeira escola oficial da denominação, Uriah Smith apresenta o propósito que a educação adventista deveria representar: ―[...] Como a semente de mostarda entre as plantas, esperamos que esta escola ocupe um lugar importante entre as instituições em funcionamento para o avanço da verdade‖ (SMITH, 1872, p. 204). É fato que o início da história da educação brasileira deu-se no berço da confessionalidade, tendo ao longo de seu percurso recebido influências significativas do catolicismo e protestantismo. Certamente que as missões norte-americanas ligadas ao protestantismo prestaram importante contribuição à educação brasileira ao ampliar a oferta educacional para a população não contemplada pelo sistema de ensino vigorante, bem como ―[...] pela inovação do sistema pedagógico, que veio preencher as lacunas existentes‖ (HACK, 2000, p.12). Nesta direção, Silva (2002) aponta possíveis contribuições do sistema educacional adventista para a educação brasileira, são elas: a) a instalação de escolas em áreas rurais favoreceu a difusão da educação no Brasil; b) a oferta de bolsas de estudos para estudantes oriundos das camadas mais pobres contribuiu para que a educação proporcione a mobilidade social ascendente. Queremos, neste trabalho, apresentar o lugar que o Ensino Religioso (ER) ocupa na educação adventista, analisando-o a partir da perspectiva da sociologia da educação e dos estudos de currículo. Tal análise funda-se numa apropriação tópica (CATANI; CATANI; PEREIRA, 2001) das teorias analíticas de Apple (2006), Bourdieu (1989), Foucault (1979), Goodson (2008) e Silva (2004). É imprescindível neste texto apresentar que os delineamentos a serem expostos acerca do ER na educação adventista tem a compreensão maximizada à luz de dois documentos que são balizadores para tal sistema educacional confessional, a saber: Pedagogia Adventista (DSAIASD, 2009) e Declaração da Filosofia Educacional Adventista do Sétimo Dia (RASI, 2001). 332 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso A educação adventista A educação adventista é um empreendimento denominacional que foi precedido pela organização denominacional da obra de publicações em 1849, e pelo vigoroso programa de saúde de 1866 (KNIGHT, 1982). Este empreendimento encontrou nos escritos advindos de Ellen G. White2 as diretrizes a serem seguidas na implantação e desenvolvimento de uma educação cristã, centrada na preocupação com o currículo, tendo a Bíblia como referencial para todos os níveis de educação (CADAWALLADER, 1949). De algum modo, Ellen G. White apenas refletiu as mudanças que estavam acontecendo na sociedade de sua época (GREENLEAF, 2010), pois o ânimo e interesse denominacional pela educação deve ser entendido numa dialética que considere o espírito de reforma que reanimava a sociedade norte-americana pelo progresso da educação. Nesta conjuntura maior entende-se que no meio adventista [...] os princípios educacionais foram desenvolvidos, por um lado, dentro do contexto das tentativas do século dezenove de reformar a educação e, por outro lado, dentro do contexto denominacional de comparativa indiferença para com a reforma educacional (DOUGLAS, 2001, p. 344). Certamente que o desenvolvimento do sistema educacional adventista caminhou concomitantemente às orientações da profetisa, todavia, seus princípios, alvos e objetivos educacionais encontram-se pulverizados em uma ampla e variada coleção de cartas, panfletos e artigos publicados ao longo de sua vida, e posteriormente sistematizados pela liderança eclesiástica. É perceptível nos escritos denominacionais de White, que a educação deve ser vista a partir da perspectiva da cosmovisão bíblicocristã, a fim de que a Bíblia tenha centralidade no processo educativo, para que o aluno seja desenvolvido nas múltiplas dimensões, tornando-se uma pessoa preparada para atuar como obreiro ou como alguém que, mesmo não estando nas fileiras dos servidores denominacionais ao escolher sua profissão apoie a missão da igreja. Para tanto, o ideário educacional que 2 Ellen G. White recebeu em janeiro de 1872 sua primeira visão sobre princípios educacionais e escreveu 30 páginas sobre o que havia visto, por título a Devida Educação. 333 FONAPER permeia o sistema educacional adventista, bem como compõe o imaginário denominacional refere-se a uma proposta educacional de ―restauração‖ do indivíduo. Segundo Suárez (2010), desde que se criou um consenso acerca da missão educacional da IASD, a partir daí buscou-se a formulação de um currículo educacional que fosse condizente com os ideais propostos. Em sua obra, Hilde (1980) dentre as reflexões realizadas acerca da presentividade da educação adventista, ressalta que a preocupação com o currículo deve estar permeada pelos apontamentos da mensagem da IASD. A questão curricular na educação adventista tem sempre ocupado a pauta das preocupações institucionais da IASD, pois é neste campo onde se assentam as bases para a integração fé e ensino pretendida por este sistema educacional. Com a prerrogativa de que um currículo equilibrado é aquele que fomenta o desenvolvimento integral da vida espiritual, intelectual, física, social, emocional e vocacional, na educação adventista o currículo além de promover a excelência acadêmica, deve contar com ―[...] cursos de formação espiritual que guiarão o viver cristão [...] A formação do cidadão inclui apreço por sua herança cristã [...]‖ (RASI, 2001, p. 08). É notória a preocupação com a implantação de um currículo ―plenamente adventista‖, no qual a Bíblia constitua a base de todo o currículo e os escritos de Ellen G. White sejam permanente fonte de leitura e orientação, de modo que o ―modo de vida adventista‖ seja ensinado (AZEVEDO, 2003). É imprescindível apresentar as bases para a oferta da disciplina de ER na educação adventista de nível básico, fundamentado no pressuposto de que o ser humano é marcadamente caracterizado pela necessidade humana pelo transcendente, de modo que a religião e a religiosidade são componentes fundamentais da identidade humana. O lugar do Ensino Religioso na Educação Adventista Como ponto de partida convém aqui explicitar que a concepção de integração fé e ensino é o espectro que permeia a educação adventista nos mais diversos níveis escolares. Em suma, entende-se que é [...] um processo contínuo e sistemático mediante o qual se enfocam todas as atividades educativas de uma perspectiva bíblico-cristã, a fim 334 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso de que os alunos, ao completarem seus estudos, tenham internalizado voluntariamente uma visão de vida, do conhecimento e seu destino. Essa visão se centraliza em Cristo, orienta-se para o serviço e projetase até o reino do Céu (STENCEL, 2005, p. 27). Na declaração de missão3 da educação adventista diz que o alvo primordial é prover ―[...] oportunidade para os estudantes aceitarem a Cristo como seu Salvador pessoal, permitir ao Espírito Santo transformar suas vidas e cumprir a missão de pregar o Evangelho ao mundo‖ (AZEVEDO, 1997, p. 61). Por sua vez, a justificativa e objetivo das aulas de ER, a disposição da disciplina no currículo, como também o propósito e a intencionalidade última de tal projeto revelam-se pautado pelo binômio educação/evangelização. Neste sistema educacional confessional, o professor é entendido como ―[...] astro de primeira grandeza no firmamento educacional [...]‖ (DSAIASD, 2009, p. 63). Assim, o professor adquire a função de catalisar o processo de integração fé e ensino na sua prática pedagógica em seu ambiente privilegiado, a sala de aula. Isto se dá porque quando o ―professor entra na sala e fecha a porta, ele é o currículo, por que o aprendizado é grandemente comunicado através da sua visão de mundo e da vida‖ (STENCEL, 2004, p. 31). Como exposto até aqui, percebe-se que o professor é peça chave na integração fé e ensino, pois é o docente que no ambiente escolar e na relação com os estudantes operacionalizará na prática o que a teoria rege. Orientado pela perspectiva educacional cristã, balizado pela filosofia educacional adventista, o educador para alcançar os propósitos da educação adventista deve manifestar e buscar continuamente algumas posturas. Destacam-se, as seguintes: ―a) ser um imitador de Jesus; b) ter senso da presença divina; c) conhecer e estar sintonizado com a filosofia e a proposta da educação adventista [...]‖ (DSAIASD, 2009, p. 63-64). Neste sentido, no magistério, o docente pode incrementar o cotidiano da sala de aula com algumas atividades de cunho espiritual, tais como: [...] realizar oração intercessória por alunos, familiares, professores e funcionários; planejar e executar semanas especiais com temas espirituais; compartilhar textos bíblicos com as famílias e pessoas da comunidade que estejam necessitando de auxílio especial; dar estudos bíblicos e distribuir folhetos com mensagens bíblicas de 3 Para maiores informações o texto está disponível em <http://educacao.adventistas.org.pt/paginas/missao.php>. Acesso em: 11 ago. 2011. 335 FONAPER saúde que promovam a qualidade de vida; promover campanhas de cunho social e espiritual; fazer uma maratona de leitura da Bíblia com a turma; estimular a criação de uma agenda pessoal e coletiva de oração (DSAIASD, 2009, p. 74). A disposição e sequência da disciplina de ER apontam para um ordenamento prévio, no qual prevalece uma intencionalidade para a construção do currículo, visto que na educação adventista o currículo tem ―[...] caráter contextual no qual se considera a inter-relação entre as agencias educativas: família, igreja e escola, tendo como alvo o cumprimento da missão e visão‖ (DSAIASD, 2009, p. 52). Evidentemente que não nos propusemos inventariar a gênese dos conteúdos programáticos, nem mesmo assinalar o seu progressivo desenvolvimento, todavia, é indispensável mencionar que os mesmos apresentam-se intrinsecamente relacionados e embasados com as doutrinas da mantenedora. De maneira que: Doutrinas, fatos bíblicos, descobertas arqueológicas, correlações do pensamento bíblico com a filosofia grega, as implicações dos distintos pontos de linguagem, e assim por diante, certamente fazem parte da ―substância‖ do ensino religioso (KNIGHT, 2010, p. 174). Os conteúdos programáticos selecionados devem enfatizar os objetivos específicos de cada área de conhecimento, mas sem perder de vista os ―[...] valores e ideologias, [...] conceitos, procedimentos e atitudes que se deseja ver no desenvolvimento integral do educando‖ (DSAIASD, 2009, p. 68). Assim, fica nítido o comprometimento da seleção dos conteúdos com a cosmovisão pregada e defendida pela instituição educacional. A nomenclatura que abarca a disciplina confessional apresenta-se de forma confusa nos documentos que balizam a educação adventista, de modo que em alguns momentos é tida por ―aula de Bíblia‖, ―aula de religião‖, ―ensino da Bíblia‖ ou mesmo ―ensino religioso‖. Todavia, o que se espera mesmo é a integração de outros tópicos do currículo com a cosmovisão cristã com contornos de marcas denominacionais pregadas e defendidas pela mantenedora, de maneira que especialmente a disciplina confessional possa ―[...] preparar o caminho para essa integração na mente dos estudantes enfatizando a cosmovisão cristã e o que esta perspectiva significa para o restante de sua educação‖ (KNIGHT, 2010, p. 176). 336 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Sendo que a Bíblia, a natureza e a racionalidade humana constituem as principais fontes de conhecimento consideradas pela filosofia educacional adventista é preciso compreender que alguns conhecimentos são privilegiados na organização e seleção do programa de estudos da educação adventista, o que implica em saber que também neste nível educacional o ―[...] currículo escolar está relacionado diretamente às questões do conhecimento, provocando desse modo a seleção, organização, institucionalização e dinamização das atividades, valores, competências [...]‖ (DSAIASD, 2009, p. 67). É adequado indicar que neste sistema de ensino confessional, as orientações referentes ao currículo das instituições educacionais buscam incluir uma perspectiva teórica de abordagem e tratamento da realidade, entretanto, é importante [...] lembrar que no currículo integral-restaurador o estudo das ciências, dos problemas contemporâneos e dos contextos culturais globais e locais tem espaço e é tratado à luz da cosmovisão bíblica (DSAIASD, 2009, p. 69). Considerações Finais As atividades proselitistas que atravessam o cotidiano das instituições educacionais protestantes podem ser percebidas principalmente nas práticas educativas, pois é sempre difícil a delimitação clara entre a prática educativa e a prática religiosa. Basta relembrar que ―[...] o programa educativo é uma das primeiras e mais importantes expressões da obra missionária‖ (RAMALHO, 1976, p. 69). De certa forma, o que subjaz nestas práticas catequéticas é uma elaborada estratégia proselitista que, além compor o núcleo evangelizador intenciona difundir por meio dos conteúdos a serem transmitidos os elementos distintivos da identidade confessional da instituição. Assim, a concepção de ER colocada em prática é baseada primordialmente nos princípios eclesiásticos, mesmo que contenha princípios educacionais. Desse modo, ―a intencionalidade proselitista, ainda que disfarçada sob os princípios humanistas, é que de fato efetiva essas práticas [...]‖ (PASSOS, 2007, p. 57). A compreensão das relações de poder no contexto educacional é cada vez mais importante na composição dos sistemas interpretativos, 337 FONAPER devido à enorme contribuição para a leitura da realidade, pois ao mesmo tempo em que se apresentam de forma oculta demarcam e fornecem os padrões de conduta dos educadores, os princípios seletivos dos conteúdos, além de patentear as próprias matrizes paradigmáticas educacionais. Estar atento à detecção das relações de poder na escola é considerar [...] o poder em suas extremidades, em suas últimas ramificações, lá onde ele se torna capilar; captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto em que, ultrapassando as regras do direito que o organizam e delimitam, ele se prolonga, penetra em instituições, corporifica-se em técnicas e se mune de instrumentos de intervenção material [...] (FOUCAULT, 1979, p. 182). Ficou evidenciado neste texto o fato de que o currículo não é componente neutro e desinteressado no amplo processo educacional, pois no processo de organização e seleção de conteúdos programáticos recorre-se às fontes da filosofia institucional, a fim de que os valores, crenças e ideologia sejam difundidos de forma consensuais. Sobre esta realidade, Silva (2004, p. 46) afirma que ―a seleção que constitui o currículo é resultado de um processo que reflete os interesses particulares das classes e grupos‖. As relações de poder não se apresentam como protagonistas no enfrentamento da resistência e oposição advinda de algum movimento discente, mas certamente elas se subterfugiam nos bastidores da confecção curricular. Todavia, não podemos deixar de indicar que no currículo estão envolvidas as questões de poder, pois: Selecionar é uma operação de poder. Privilegiar um tipo de conhecimento é uma operação de poder. Destacar, entre as múltiplas possibilidades, uma identidade ou subjetividade como sendo a ideal é uma operação de poder (SILVA, 2004, p. 16). Os caracteres da operacionalização do ER na educação adventista possibilita-nos entender que este modelo educacional confessional contém uma propriedade simbólica, de maneira que suas instituições educacionais de uma forma ou outra preservam e distribuem o seu próprio capital cultural contribuindo assim para a criação e recriação de formas de consciência que vinculadas aos princípios da filosofia educacional 338 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso adventista pretendem atuar de maneira subjacente na vida dos estudantes (APPLE, 2006). Compreendemos que, especialmente no sistema escolar confessional, por meio da disciplina de ER, a ideologia e experiência escolar são regularidades básicas de comprometimentos subjacentemente assumidos no currículo explícito. Desta maneira, é seguro afirmar que também ―a escola atua ideologicamente através de seu currículo, [...] de uma forma mais direta, através das matérias mais suscetíveis ao transporte de crenças explicitas [...]‖ (SILVA, 2004, p. 31). Muitas pesquisas curriculares consideram o currículo como uma construção social, e o fazem por meio do apontamento de padrões de mudança, desvelamento dos processos de seleção de conteúdos, além de indicar que muitos saberes são considerados legítimos em detrimento de outros. Nesta esteira interpretativa, Goodson (2008) faz-nos entender que a criação de um currículo possibilita visualizar as metas e estruturas prévias como mapas ilustrativos que condicionam as práticas educacionais, especialmente no contexto institucionalizado. Assim que, para este autor, a confecção curricular acontece balizada pelo nível préativo, que por sua vez oferece elementos para a execução interativa efetivada por meio das práticas escolares. Este entendimento nos possibilita afirmar que os parâmetros que orientam as ações pedagógicas em sala de aula e sua consequente negociação interativa são permeados por valores e objetivos patenteados na escolarização (GOODSON, 2008). Tendo entendido as conjunturas institucionais nas quais se efetiva o ER confessional no currículo escolar, percebe-se cada vez mais transparente a instauração de relações de domínio subjacente de poder simbólico. O poder simbólico apresenta-se como pedra fundamental na construção de uma dominação simbólica, pois transporta violência de forma dissimulada e transfigurada (BOURDIEU, 1989). Diante disso, é importante manifestar a preocupação sobre os conhecimentos que compõem o ER na educação adventista, tendo em vista o grande número de estudantes não-adventistas. Tal preocupação, [...] não é com a validade epistemológica do conhecimento corporificado no currículo. A questão não é saber qual conhecimento é verdadeiro, mas qual conhecimento é considerado verdadeiro. A preocupação é com as formas pelas quais certos conhecimentos são considerados como legítimos, em detrimento de outros, visto como ilegítimos (SILVA, 2004, p. 46). 339 FONAPER Em um sistema de ensino confessional, cuja racionalidade se apresenta como meio de efetivação das demandas identitárias da mantenedora, o ER na educação básica adventista além de explicitar uma hierarquização dos conhecimentos em um contexto de assimetria nas relações pedagógicas, concede aos estudantes apenas a possibilidade de uma contestação puramente simbólica, que por sua vez não debate os princípios fundamentais, nem mesmo as relações de poder. Foi somente por meio de uma abordagem crítica fundamentada nas análises teóricas de Apple (2006), Goodson (2008) e Silva (2004) que, ao analisarmos o lugar do ER no currículo da educação adventista, foi possível indicar que a seleção dos conteúdos, a hierarquização dos saberes e a uniformização do conhecimento contribuem para a caracterização de um poder simbólico (BOURDIEU, 1989) dissimulado e transfigurado em relações pedagógicas assimétricas. Referências APPLE, Michael W. Ideologia e currículo. 3ª ed. Porto Alegre: ArtMed, 2006. AZEVEDO, Paulo C. Missão das escolas de Igreja. In: GROSS, Renato (Org). Cristo nas salas de aula: uma abordagem adventista sobre integração fé e ensino. v. 1. Engenheiro Coelho: Imprensa Universitária Adventista, 1997. AZEVEDO. Roberto C. Plano Brasil 2010: plano decenal de educação da Divisão Sul Americana. Engenheiro Coelho: Imprensa Universitária, 2003. BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 1989. CADWALLADER, E. M. Educational principles in the writings of Ellen G. White. Tese de PhD em Educação. The University of Nebraska, Lincoln, United States, 1949. DSAIASD. Divisão Sul-Americana da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Pedagogia adventista. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2009. 340 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso DOUGLAS, H. E. Mensageira do Senhor. O ministério profético de Ellen G. White. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2001. FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979. GOODSON, Ivor. F. Currículo: teoria e história. 10ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. GREENLEAF, Floyd. Historia de la educación adventista: una visión global. Florida: Associación Casa Editora Sudamericana, Adventus: Editorial Universitaria Iberoamericana, 2010. HACK, Osvaldo H. Protestantismo e educação brasileira. 2ª ed. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2000. HILDE, Rubem. Showdown: can Seventh-day Adventist education past the test? Washington, DC: Review and Herald Publishing Association, 1980. KNIGHT, G. R. Early adventists educators. Washington, DC: Review and Herald, 1982. ______. Mitos na educação adventista: um estudo interpretativo da educação nos escritos de Ellen G. White. Engenheiro Coelho, SP: UNASPRESS, 2010. PASSOS, João Décio. Ensino Religioso: construção de uma proposta, São Paulo: Paulinas, 2007. RAMALHO, Jether P. Prática educativa e sociedade: um estudo de sociologia da educação. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1976. RASI, Humberto. Declaração da filosofia educacional adventista do sétimo dia. EUA: Andrews University, 2001. 341 FONAPER SCHWARZ, Richard W.; GREENLEAF, Floyd. Portadores de Luz: história da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Engenheiro Coelho, SP: UNASPRESS, 2009. SILVA, M. Aspectos da contribuição adventista para a educação brasileira. Revista Impulso, n. 30, v. 13, p. 125-132, 2002. Disponível em: <http://www.unimep.br/phpg/editora/mostrasumario.php>. Acesso em: 09 fev. 2011. SILVA, Tomaz. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. SMITH, Uriah. The Seventh-day Adventist School. Advent review and sabbath herald. Battle Creek, Michigan, 11 June, 1872. STENCEL, Renato. A educação adventista de nível superior no Brasil. In: TIMM, Albert. R. (Org.). A educação adventista no Brasil: uma história de aventuras e milagres. Engenheiro Coelho: UNASPRES, 2004. _______________. Fazendo a integração fé e ensino. In: UNGLAUB, Eliel. A prática da pedagogia adventista em sala de aula: tornando a teoria uma realidade eficaz no ambiente escolar. Engenheiro Coelho: Editora Paradigma, 2005. SUÁREZ, Adolfo S. Redenção, liberdade e serviço: os fundamentos da pedagogia de Ellen G. White. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2010. 342 O ENSINO RELIGIOSO TRANSVERSALIZANDO OUTRAS ÁREAS DE CONHECIMENTO Iêda de Oliveira Caminha (SEDEC)1 Maria José Torres Holmes (SEDEC)2 Resumo: Apresentamos neste artigo a relação do Ensino religioso com outras áreas de conhecimento, no decorrer de um processo de formação continuada envolvendo os cinco eixos organizadores dos conteúdos propostos pelos PCNER (FONAPER, 2009), no qual construímos com os educadores uma dinâmica metodológica que focaliza o processo de ensino e aprendizagem do fenômeno religioso. Palavras chave: Currículo; Ensino Religioso; formação continuada; Introdução Pensar o Ensino Religioso (ER) no contexto escolar é um desafio muito grande quando se pretende articulá-lo com outras disciplinas do currículo escolar. Durante séculos, esse componente curricular foi visto nas escolas como um elemento com características religiosas de propósito proselitista. Entretanto graças às mudanças na legislação de ensino, atualmente há um novo olhar sobre o ER que proporcionou grandes discussões focalizando a parte pedagógica no processo de ensino e aprendizagem dentro do contexto escolar. Por isso, nesse momento, a grande preocupação do FONAPER3 é sistematizar um currículo que venha oferecer ao educador(a) mais segurança quanto à transmissão dos conteúdos no processo de ensino e aprendizagem. Segundo (ANDRADE 2003, p. 11): [...] o currículo escolar é o elo entre a teoria educacional e a prática escolar (o que realmente ocorre nas salas de aula), o instrumento que articula possibilidades, necessidades, interesses, pretensões e 1 2 3 Pedagoga (UFPB). Especialista em Gestão Educacional (FIP). Teológa (IBBB) e Mestre em Ciências das Religiões (UFPB). Profª. Secretaria de Educação e Cultura de João Pessoa-PB. E-mail [email protected] Pedagoga. Especialização e Mestrado em Ciências das Religiões (UFPB). Secretaria de Educação e Cultura de João Pessoa-PB. E-mail: [email protected]. Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso. Fundado em 26 de setembro de 1995, é um espaço de discussão e ponto aglutinador de ideias, propostas e ideais na construção de propostas concretas para a operacionalização do Ensino Religioso na escola. FONAPER perspectivas da escola, em um conjunto de escolhas, ações, ênfases e omissões. Para isso, vale salientar que a formação docente é uma necessidade básica para o(a) docente de todas as áreas de conhecimento, principalmente para os de Ensino Religioso, tendo em vista existir uma rotatividade muito grande no quadro desses(as) professores(as). Essa é uma questão a ser enfrentada por esse(a) profissional o que reforça a necessidade da sistematização desse processo, principalmente diante da demanda de qualificação para assumir as classes e ministrar essas aulas, mesmo porque, muitos ainda não possuem habilitação nessa área de conhecimento. Para isso é preciso um estudo aberto e criativo, com muito diálogo sobre o fenômeno religioso das diversas culturas religiosas e suas manifestações na nossa sociedade, já que este é considerado o objeto de estudo desse componente curricular. A proposta intenta promover um espaço onde o diálogo, o respeito e a aceitação dos educandos, sejam quais forem suas convicções, se deem no sentido de um amadurecimento sobre o conhecimento religioso das tradições religiosas, os quais possam minimizar ou até mesmo eliminar as diversas formas de preconceitos existentes no espaço escolar e na sociedade. Com isto esta se educando as novas gerações, apresentando-lhes alternativas e precavendo-os contra fundamentalismos e manipulações ideológicas de discursos religiosos. Tais considerações são importantes para os educadores do Ensino Religioso, já que precisam se fundamentar a esse respeito para que possam desenvolver na escola, de forma organizada em sua ―linguagem específica‖, a releitura do fenômeno religioso, conforme preconiza a Lei 9475/97. Neste sentido, de acordo com Holmes (2010, p. 53), Todas as culturas religiosas têm o seu modo especial de expressar o seu encontro com o sagrado. Por isso a religião para cada ser humano se expressa com uma dimensão existencial de grande profundidade, marcando assim os seus elementos culturais dentro de uma realidade histórica, onde a religiosidade torna-se efetiva para o ser humano, denominada em cada cultura como fenômeno religioso. O currículo do ER articulado com as demais áreas de conhecimento Compreendendo a importância da linguagem específica do Ensino Religioso, enquanto componente curricular entre as demais áreas de 344 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso conhecimento, propusemos o uso simbólico da imagem da árvore em um processo de formação continuada para professores deste componente curricular. Atrelamos o saber que o símbolo transmite e desperta com os saberes dos cinco eixos organizadores dos conteúdos proposto pelos PCNER (FONAPER, 2009). Ao nosso redor, no mundo que vivemos a televisão, o vídeo e outras tecnologias constantemente nos envolvem com enxurradas de imagens que permeiam o nosso pensamento. As imagens nos chamam atenção. Ficamos perplexos com a fotografia de momentos especiais, além da internet que nos proporciona o contato com inúmeras imagens. Entretanto, qual é o papel das imagens para a educação? E, especificamente, como usar a imagem a favor da aprendizagem? Tendo em vista o fato de ser tão usada na construção de novos conhecimentos, pensamos em utilizar a imagem como recurso para nossa proposta formativa: A imagem torna-se, portanto, um objeto a ser analisado, investigado e debatido, sobretudo quando se entende que ela é um texto portador de valores, de atitudes, de comportamentos e de saberes que produzem efeitos significativos sobre a formação da consciência e a conduta dos indivíduos em suas diferentes fases da infância, adolescência, juventude e adulta (SILVA, 2008, p. 8). Portanto, a imagem possui seu papel no processo didático pedagógico imprescindível nesse momento que buscamos novas técnicas e metodologias para o momento de ensino aprendizagem. Todavia, a imagem que apresentamos é a ‗imagem viva‘, imagem de um elemento presente na humanidade desde seus primórdios. A árvore é um dos símbolos que merece atenção por sua presença em todos os cantos da terra, além de apresentar semelhança com o ser humano, pois nas locuções metafóricas, a madeira muitas vezes representa o próprio homem (GIRARD, 1988, p.436). Desde os seus elementos constitutivos como a raiz, o tronco, galhos, folhas, flores e frutos, bem como suas necessidades para manter-se firme, em pé, a árvore simboliza vida: As árvores se contextualizam. Espalhadas por todas as partes em diversas culturas sabem como viver e crescer; independentemente do mundo ao seu redor, elas cumprem seu papel. Assim percebemos que apontam caminhos essenciais para a vida, e sua simbologia de mestre nos ensina. Quem deseja aprender com elas pela sua ontologia pode 345 FONAPER tirar lições, é só sentar a sombra de uma delas [...] (SILVA, 2010, p.19). A árvore é um símbolo cuja semântica abrange diversos sentidos. A imagem da árvore nas narrativas míticas representa a ―árvore cósmica que se encontra no meio do universo e que sustenta como um eixo os três mundos‖ (ELIADE, 1991, p. 40). A árvore cósmica é um simbolismo do centro e é também um dos mais propagados que existe. A árvore cósmica é encontrada nas mitologias hindus, mesopotâmica e entre os maias e astecas. Para fazer uso dessa imagem viva é necessário exercer sensibilidade. ―Que nos deem o jardim e o prado, a campina e a floresta, e nós reviveremos nossas primeiras felicidades‖ (GIRARD, 1988, p.437). A árvore é uma ‗imagem viva‘, um símbolo4, um arquétipo para a humanidade, podendo ser utilizada para facilitar a aprendizagem em todas as áreas do conhecimento. A árvore é um símbolo de linguagem universal, ele quebra as barreiras da incompreensão de um indivíduo ou de uma cultura, pois o homem é simbólico em todo viver, criando e recriando sentidos. Os símbolos podem passar anos, décadas, séculos ou milênios e eles estarão lá; impregnados a cultura e para conhecê-las corramos atrás do seu sentido, pois o símbolo é um código que revela e desvela uma cultura [...] (SILVA; GOMES, 2010, p. 217). No percurso da nossa caminhada de formação continuada, tivemos a ideia de trabalhar com os eixos temáticos numa dinâmica de transversalizar o ER fazendo pontes com a área de Ciências e Língua Portuguesa, comparando as cinco partes de uma árvore com os cinco organizadores dos conteúdos do ER e, por meio disso, produzir um texto para melhor compreensão da proposta formativa. Como recursos metodológicos, apresentamos um estudo sobre os cinco eixos organizadores dos conteúdos através de slides com discussões e debates. Em seguida elaboramos uma oficina com cinco grupos, cada qual representado uma parte de uma árvore. Isto aconteceu em dois turnos de trabalho, tendo em vista a formação estar dividida em dois grandes grupos. Esta dinâmica proporcionou um estudo reflexivo 4 No dizer de Girard (1997, p.26), ―Símbolo‘ provém do termo grego symbolon, derivado do verbo sym-ballein, que em seu sentido primeiro significa ‗lançar com, pôr junto com, juntar‖. 346 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso envolvendo todos os educadores. Foi uma forma que encontramos para aperfeiçoar a formação continuada e logicamente facilitar o processo de ensino e aprendizagem do fenômeno religioso. De acordo com os PCNER (FONAPER, 2009, p. 57), O tratamento didático subsidia o conhecimento. Assim, o Ensino Religioso, pelos eixos de conteúdos de Culturas e Tradições Religiosas, Escrituras Sagradas, Teologias, Ritos e Ethos, vão sensibilizando para o mistério, capacitando para a leitura da linguagem mítico-simbólica e diagnosticando a passagem do psicossocial para a metafísica/Transcendente. Assim, relacionamos os cinco eixos organizadores dos conteúdos do ER com as cinco partes de uma árvore, destacando cada uma através da interpretação do texto proposto, onde cada grupo trabalhou com questões específicas, conforme apresentado abaixo: a) Raiz: parte responsável pela sustentação da planta ao solo, alimentando-a e nutrindo-a com seus sais minerais. Compreendemos que essa parte representa o eixo Culturas e Tradições Religiosas, o que remete ―a árvore que é o eixo do mundo, a Axis mundi, um arquétipo do Universo que recebe seu alimento do transcendente‖ (PONTES, 1998, p. 203). Também foi possível vincular o papel das tradições religiosas na sustentabilidade do Planeta Terra: a) Como o grupo se vê diante do preconceito religioso de uma cultura em relação à outra? b) Em suas escolas isso acontece? De que maneira você enfrentaria essa situação? Aqui temos um caminho para trabalhar a diversidade religiosa do mundo e do povo brasileiro. ―Compreendemos que as raízes podem indicar uma comunicação com outras árvores pela terra que a todas alimenta e de onde as árvores tiram seu sustento. Isso repercute na necessidade do ser humano relacionar-se com o outro‖ (SILVA, 2011, p.34). Ou seja: mesmo que eu faça parte de um grupo religioso isso não significa que eu não possa me relacionar com o outro diferente enquanto pertencente à outra tradição religiosa. b) Caule: parte que sustenta a planta transportando a seiva retirada da raiz levando até seus galhos, folhas e frutos. Esta pode ser comparada com os textos sagrados orais e escritos, pois estes são responsáveis pela transmissão da comunicação através do tempo-história, as verdades de fé de uma cultura religiosa, o mistério do transcendente. 347 FONAPER Podemos observar que o tronco das árvores está no espaço humano, aquele que é mais visível, que faz a ligação com o céu e embaixo da terra. A humanidade na procura por sentido de vida e também por querer respostas para as perguntas ante as faces do tempo e da morte busca o transcendente. As árvores convivem, mesmo com sua diversidade, com as raízes na terra, os troncos entre nós [...] (SILVA, 2011, p.61). Entendemos que a busca pelo transcendente é uma ação da humanidade dentro da diversidade religiosa que existe. Desta forma podemos trabalhar as diferenças no que se refere às tradições escritas e orais. Assim levantamos as seguintes perguntas: a) qual a importância dos textos sagrados orais e escritos? b) Qual a diferença entre um texto sagrado oral e um texto sagrado escrito? c) Folhas: são as responsáveis pela fotossíntese, respiração e transpiração, funções primordiais de um ser vivo do reino vegetal. Essa parte da planta simboliza o eixo temático Teologias, que representa o oxigênio das culturas religiosas que sistematiza as afirmações, os conhecimentos das religiões sobre o sagrado, suas crenças e doutrinas sobre o tempo, a vida e a morte. Com essa perspectiva perguntamos: quais são as possíveis respostas para a vida além da morte nas tradições religiosas? d) Flores: quando uma flor desabrocha significa que está pronta para reproduzir-se. Quando uma planta "dá flor", está em sua fase mais crítica, pois direciona toda a energia a esta atividade. Compreendemos que as flores são os saberes que ensinamos e mediamos aos alunos, utilizando nossa criatividade e metodologia, através do diálogo. Assim são os Ritos religiosos na vida das pessoas. Existe uma infinidade de ritos, práticas celebrativas, símbolos e espiritualidades nas culturas e tradições religiosas. São ações que fortalecem o mundo mítico da tradição em que o rito é celebrado. O rito, portanto, é uma vivência que tem fundamentalmente duas faces correlacionadas: por um lado, é uma ação não instrumental com caráter expressivo, e isso liga-se bem com o seu movimento para um mundo ‗místico‘, tendendo a levar para uma compreensão ‗mística‘ de toda a existência; por outro lado, é um fato concreto que vive na opacidade como qualquer outro fato comunicativo social (TERRIN, 2004, p.30). A vivência do rito leva a uma compreensão de uma existência mística, ou seja, ―o rito parece um elemento de estruturação e organização 348 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso do mundo‖ (TERRIN, 2004, p.192). Logo, no rito vivido, podemos ver a tradição religiosa ser estabelecida em que a busca pelo sagrado faz-nos perceber a grandeza da transcendência da humanidade. A busca pelo sagrado compreende o fenômeno religioso e na religião procura-se tanto o encontro, como a capacidade para transcender nas relações, o ser humano necessita aprender a conviver como humano, observando no humano as singularidades, bem como as diferenças e estabelecer diálogo (SILVA, 2011, p. 95). As relações entre as tradições e as relações pessoais da humanidade entre os seus iguais ou diferentes nos permitem perguntar: a) Qual a importância dos ritos nas tradições religiosas? b) Como você vê essa questão em relação ao preconceito religioso? É possível um diálogo? e) Frutos: é o ovário fecundado que se incumbe de proteger a maior riqueza de uma planta, a semente, guardando-a em seu interior para dar origem a outro vegetal da mesma espécie. Tanto os frutos, como a árvore em si são arquétipos da imagem feminina: A árvore é um símbolo feminino por excelência, e representam os instintos da maternidade, da gestação, da fecundidade, pois cria a vida, alimenta e protege. Portanto, é um símbolo que conta com as emoções mais profundas do ser humano. A associação da natureza com a mulher é imediata, a copa da árvore, por exemplo, lembra a cabeleira da mulher, e de dentro da árvore sai à seiva que tira o alimento da terra, faz a ligação com o céu; mediando os dois reinos, da terra e o celeste, além de servir de abrigo. De forma geral encontramos nas religiões mais tradicionais ritos, mitos e cultos consagrados à árvore, pois são tidas como sagradas (SILVA, 2011, p.34). Assim também o eixo Ethos representa o próprio sentido do ser, é formado na percepção de valores de que nasce o dever como expressão da consciência como resposta do próprio ―eu‖ pessoal. Ética e religião são temas centrais no processo de humanização das pessoas. É do Ethos que os educadores devem tirar os frutos do seu trabalho. A religião é experiência do encontro com o sagrado. Quando estamos ante um texto sagrado no sentido re-liga (re-ligare) o texto revela o que está em nossas entranhas e movimenta nossas lembranças mais ancestrais, memória humana (FERREIRA–SANTOS, 2010). Portanto, o Ethos não pode ficar de fora do processo educacional, pois é um valor essencial no exercício da cidadania, onde se situa o 349 FONAPER princípio de alteridade. É por isso que o Ensino Religioso nas escolas se torna um espaço importante. Nesse sentido, elaboramos a seguinte questão: quais princípios integram a ética educacional do Ensino Religioso? A escola é o espaço aberto, amplo e muito rico para se trabalhar com as culturas e tradições religiosas. Não só no aspecto de construção do conhecimento, mas, pela riqueza de sua diversidade. Faz parte de uma de suas tarefas o desenvolvimento do ser humano nos aspectos: sensorial, intuitivo, afetivo, racional e religioso-antropológico, porém, não é função da escola mostrar a vivência desses valores, enquanto conduta religiosa de fé, mas possibilitar esse conhecimento através do componente curricular do Ensino Religioso que não privilegia esta ou aquela religião. Esta é uma questão de respeito às diferenças existentes no contexto escolar. Com embasamento nestes cinco eixos é que os conteúdos do Ensino Religioso, segundo o FONAPER, devem ser dialogados com os educadores. Para que estes levem para sala de aula essa mesma relação estabelecendo vínculos de uma aprendizagem prazerosa e humanizada com afetividade. Estudar as culturas de outros povos com suas crenças e valores deve ser aplicado e refletido no cotidiano escolar e isto tem muita importância para estabelecer a construção do currículo do Ensino religioso. Segundo SACRISTÁN (2008, p. 94), Na escola, normalmente, não se pode aprender qualquer coisa em qualquer momento, embora tenha relevância e interesse indubitável para os alunos. Inclusive, a partir de determinados esquemas pedagógicos e modelos ou formatos de aprendizagem, se define uma alta estruturação de processos e conteúdos didáticos para desenvolver o currículo. [...] Em se tratando deste componente curricular, também precisamos estabelecer seus conteúdos. Ensino Religioso não é qualquer coisa! Não é trabalhar religião! Não é também imaginar que este professor é bonzinho. Nem tão pouco, uma oportunidade do professor complementar a sua carga horária. Então, ensinar o quê? Foram-se os tempos em que o ER era visto como um ensino confessional. Hoje a LDB já não permite mais que isto aconteça. Por outro lado não é ensinar somente valores, como se passa no imaginário popular, mesmo porque valores é um tema transversal inserido em qualquer 350 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso componente curricular. E nem tão pouco esta área de conhecimento serve para complementação de carga horária, como se apresenta nas escolas. Para Oliveira et al. (2007, p. 110) A presença de diversas culturas, com suas diferentes expressões de ordem linguística, artística, religiosa, etc., num sistema educacional requer indubitavelmente uma tomada de consciência, uma reflexão sobre os encaminhamentos e a elaboração de suas propostas curriculares. Esta é uma das grandes preocupações do FONAPER em construir uma proposta curricular para o Ensino religioso, sistematizando seus conteúdos para todo o território nacional, além da luta pelos cursos de licenciatura nesta área de conhecimento. Da Teoria à Práxis Segundo Olenik e Daldegan (2003, p.14), No processo de ensino-aprendizagem do Ensino Religioso o encantamento será a mola motivadora que favorece o educador e educando, a reconhecer, pelo prisma do conhecimento e do respeito, o seu universo religioso e o do outro. Este aprendizado pode se tornar o ponto-chave para construir uma cultura de paz em diferentes ambientes e consequentemente entre povos. Assim, podemos dizer que nesse processo ambos, professor e educando, podem ocupar o lugar da borboleta, que em seu voo descobre a diversidade, no entanto sem deixar de ser borboleta. De acordo com essas autoras, percebemos que estes são exemplos para os docentes de Ensino Religioso seguirem. É onde podem alçar os voos das borboletas a quem elas se referem, onde se confundem entre o ensinar e o aprender, isto é, uma troca de saberes, em que a partir daí poderão alçar voos mais distantes sem perderem de vista que são educadores compromissados cujos desafios, fazem parte do seu cotidiano, não só na condição de ensinar, mas de aprender. Uma troca de saberes. O processo de formação ora descrito possibilitou aos educadores um estudo reflexivo a respeito dos eixos que conduzem aos conteúdos do Ensino Religioso. Veremos a seguir os relatos do que os professores vivenciaram com a metodologia das partes da árvore e a oficina da produção do texto para trabalhar em sala de aula. 351 FONAPER A oficina de produção de texto foi um momento significativo da formação, pois não só despertou o interesse pelo trabalho, mas motivou para outras experiências. Vejamos os resultados dos trabalhos das equipes: Equipes Raízes: Preconceito/Respeito; Imposição/Compreensão; Diversidade Religiosa/Diálogo Inter-religioso; Intermediar com naturalidade; Globalização/Pós Modernidade. Esses são temas para serem debatidos em sala de aula. Segundo os relatos das duas equipes que trabalharam Culturas Religiosas nos encontramos em meio a um grande desafio, [...] uma vez que o etnocentrismo religioso suplanta os valores religiosos de outras culturas. É necessário um preparo sócio antropológico por parte dos docentes para tratar em sala de aula essas questões, de maneira que não ignore os valores e as particularidades de cada tradição cultural, como também uma consciência pautada pela ética religiosa capaz de nos levar a enxergar cada cultura como igual. O preconceito religioso existe dentro das escolas e se apresenta fortemente nas aulas do ER visto ser um espaço de construção e reflexão do conhecimento. É comum a imposição por parte dos adeptos de várias tradições religiosas, todavia cada professor de ER deve nesse momento, mediar o conhecimento da diversidade cultural religiosa, levando o aluno a perceber a necessidade de compreensão e diálogo interreligioso para convivência pacífica entre os alunos e entre as pessoas. Equipes Caules: A tradição oral tem sua grande importância por ter o compromisso em passar de geração em geração todo o seu conhecimento cultural religioso. Portanto seus rituais são vivenciados e rememorados constantemente. Na tradição escrita todos os conhecimentos religiosos são registrados para contribuir para a reflexão e prática de sua religiosidade. Embora que dependendo das tradições feitas, podem correr o risco de interpretações do texto sagrado, assim como a tradição oral depende da influência de outras tradições religiosas podem trazer outros elementos agregadores para seus rituais. Ambas as tradições possuem importância fundamental para a compreensão da prática, conhecimento, experiência, visão de mundo, de fé e religiosidade, de conhecimento cultural religioso e o fenômeno religioso presente em diversas culturas religiosas. 352 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso A diferença de um texto sagrado oral e de um texto sagrado escrito é pelo fato de que o texto oral passa o conhecimento cultural e religioso envolvendo os mitos, lendas, rituais a história de pais para filhos de geração em geração (ancestralidade). E o texto escrito é a forma fundamentada da crença religiosa onde esses registros sagrados tornam-se leis e estatutos para serem cumpridos. Todos os textos sagrados (orais e escritos) são relevantes, cada um com sua importância sagrada. Ambos representam as cores do arco-íris, são lindos exuberantes, participantes e fundamentais na natureza. Para o conhecimento dessas tradições por outros segmentos religiosos ou estudiosos na área a tradição escrita torna-se mais fácil o entendimento porque a palavra escrita comprova, fundamentaliza e consegue ultrapassar o tempo. Equipes Folhas: O mundo transcendente do ser humano, o que há além da morte, tanto as tradições religiosas orais e escritas interpretam de várias formas o mundo além morte. Na tradição cristã se ensina a ideia de um céu como premiação por uma vida obediente a Deus. E uma ideia de inferno como punição por desobediência e acreditam na ressurreição. Na tradição budista existe a ideia de vidas sucessivas assim como no espiritismo (reencarnação) como forma de evolução espiritual. Ancestralidade para outras culturas e o nada, porque existem aqueles que acreditam que após a morte tudo se acaba. Na condição de professor acreditamos que devemos transmitir informações sobre essa temática de forma que contemple a visão das várias crenças, através do debate, diálogo, vídeos, pesquisas entre outros. Equipes Flores: A tradição e o conhecimento, a criatividade e a interatividade para vencer preconceitos. Os ritos são essenciais nas tradições religiosas. Tudo começa e termina com um ritual no percurso das celebrações. É uma forma de perpetuar o conhecimento, transmitir a comunicação entre as tradições, responder perguntas, interagir e celebrar a história e a memória. A cultura religiosa por si só traz consigo preconceitos e obstáculos. E cabe a nós educadores utilizar da criatividade na metodologia para desmistificar essas barreiras do preconceito. É possível sim o diálogo! Se as pessoas tomarem consciência da importância do respeito e do diálogo religioso, essas barreiras do preconceito serão amenizadas. 353 FONAPER Equipes Frutos: pensar uma ética educacional para trabalhar as culturas religiosas é "praticar o não proselitismo em sala de aula, saber respeitar as escolhas de cada um, demonstrando para os alunos o quanto é importante respeitar as religiões dos colegas". O respeito a tudo e a todos que fazem parte desse mundo é fundamental. A diversidade cultural religiosa, diferença de raças, gênero limitações e deficiências, nos fazem repensar que poderemos trabalhar em nossas aulas através da conscientização, da informação, do não preconceito junto às demais culturas diferentes das suas. Os frutos é o que deixaremos para as gerações que virão, para que delas possam se alimentar e se fortalecer para a vida. Enquanto princípios para uma ética educacional para o Ensino Religioso, os professores indicaram: o não proselitismo; o diálogo interreligioso; respeitar a tolerância e a laicidade do nosso País; entender o direito que todas as culturas religiosas têm; respeitar as pessoas que dizem não professar nenhuma crença religiosa; respeitar a individualidade de cada um; cumprir o que preconiza o Artigo 33 da LDB; participar da formação continuada; e do planejamento da escola; seguir os preceitos das diretrizes que regem o Ensino Religioso; ter compromisso e responsabilidade não só com as escolas, mas com os alunos e toda comunidade escolar; não ser complemento de carga horária; elaborar um currículo próprio para ser seguido. Com bases nesses princípios as pessoas poderão vivenciar a humildade, caridade e demais virtudes; afeto, amor, respeito e fé; prudência, tolerância e atitudes responsáveis. Considerações Finais Neste processo formativo tivemos a oportunidade de interagir com dois grandes grupos e seus subgrupos e verificamos que foram momentos de muita riqueza e dinamismo segundo depoimentos e avaliação dos(as) educadores. Dessa forma percebermos que esta é uma grande oportunidade de conhecermos a importância do trabalho interdisciplinar no cotidiano escolar. Isto faz a grande diferença. As árvores são como escolas que nos remetem a aprendizagem através da ontologia própria da imagem que se uni a ontologia do humano. 354 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Dessa forma pensamos a escola que de forma bela trata o Rubem Alves (2011)5: Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de serem pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado. Na contemplação do símbolo podemos aprender com ele, onde os pássaros podem ir e vir; fazerem os ninhos, buscando proteção e aconchego na natureza. Que façam suas escolhas de forma livre nossos pássaros, nossos alunos. Que nas nossas escolas os professores intermedeiem o conhecimento de forma que os alunos sejam como pássaros livres para ir e vir, que façam seus ninhos com liberdade, onde encontrem símbolos de proteção e aconchego, e através destes possam construir conhecimentos e a sua história, através do diálogo e da afetividade. E com isto, aos poucos vão eliminando formas prosélitas de preconceitos e logicamente, transformar a convivência, não só no espaço escolar, mas para fora dos muros da escola e serem mediadores de conflitos, na construção de uma sociedade mais humana e mais justa, para um mundo melhor, além de ser também um construtor de pontes, para uma cultura de paz. Referências ELIADE, Mircea. Imagens e Símbolos: ensaio sobre o simbolismo mágico-religioso. São Paulo: Martins Fontes, 1991. FONAPER. Parâmetros curriculares nacionais do ensino religioso. 9 ed. São Paulo-SP: Mundo Mirim, 2009. GIRARD, Marc. Os símbolos na Bíblia: ensaio de teologia bíblica enraizada na experiência humana universal. São Paulo: Paulus, 1997. 5 Disponível em http://bibliotecapaulozappi.blogspot.com.br/2011/07/projeto-virandopaginas.html. Acesso em 16 agos 2013. 355 FONAPER HOLMES, Maria José Torres. Ensino Religioso: problemas e desafios. Dissertação de (Mestrado em Ciências das Religiões). João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2010. OLENIK, Marilac Loraine R., DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar: uma prática pedagógica no ensino religioso. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 2004. OLIVEIRA, Lilian Blanck de. et al. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo, SP: Cortez, 2007. (Coleção docência em formação. Série Ensino Fundamental). SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo uma reflexão sobre a prática. 3. ed. Porto Alegre RS: Artmed, 2000. SILVA, Maria Lúcia Gomes da. A cultura midiática e suas implicações na educação de jovens e adultos. In: ERENILDO, João Carlos (Org). Educação e visualidade. João Pessoa: Editora Universitária UFPB, 2008. SILVA, Iêda de Oliveira Caminha; GOMES, Eunice Simões Lins. Simbologia da árvore: uma análise das imagens míticas. Revista Religiosidades Populares - diálogos e interpretações. Universidade Católica de Pernambuco, 2010, p. 205-218. ______. A árvore na torá: uma análise simbólica e mítica. Dissertação de Mestrado. João Pessoa: UFPB. 2011. TERRIN, Aldo Natali. O rito: antropologia e fenomenologia da ritualidade. São Paulo: Paulus, 2004. 356 DANÇAS CIRCULARES SAGRADAS: UM RELATO DE UMA PROPOSTA METODOLÓGICA NO CURSO DE LICENCIATURA NO ER- PARFOR/ BLUMENAU Laudicéia Lene de Freitas Barbosa (PARFOR/FURB)1 Resumo: Toda prática educativa necessita de um nível de reflexão, pois qualquer proposta de atividades possui uma história que a precede e a justifica, sendo decorrente de escolhas. Porém, os educadores escolhem sempre ideias, finalidades e alternativas concretas em que seus atos de escolhas estão relacionados com a sua atitude valorativa geral. Decisões que dependem da intencionalidade, e o objetivo aqui a ser destacado é a aprendizagem, a interação cognitiva e a construção de conhecimentos. Neste intuito há que se reconhecer na prática a Dança Circular Sagrada na importância dos indivíduos como parte de um todo, objetivando desenvolver nos alunos a capacidade de convivência em sociedade de maneira harmoniosa. O trabalho ora apresentado é parte da atividade realizada nas aulas de Ensino Religioso com uma proposta de renovação nas práticas educativas. Uma vez que, é de mãos dadas e em círculo, que os alunos colocam-se em contato com seu corpo em movimento, seu ser em expressão com o outro, estabelecendo e transformando suas relações. A educação na perspectiva libertadora tem como ponto de partida para a formação, a construção das identidades e a percepção do ambiente escolar como forma de interação e compartilhamento de experiências. Palavras chave: Ensino Religioso; Danças Circulares Sagradas; Diversidade Cultura. Introdução Este trabalho foi desenvolvido dentro de um procedimento metodológico inserido no currículo escolar e que proporcionou maior conhecimento para a elaboração do planejamento de aulas para a docência despertando cada vez mais o encantamento pelo Ensino Religioso. Refere-se às descobertas ou redescobertas no processo da própria espiritualidade, da diversidade religiosa, assim concebida: O Ensino Religioso, como disciplina, trata do conhecimento dos elementos essenciais que compõem o fenômeno religioso [...] [e o professor] necessita ter presente na aprendizagem os conhecimentos anteriores do educando e possibilitar uma continuidade progressiva no entendimento do fenômeno religioso, sem comparações, confrontos ou preconceitos de qualquer espécie (SED/SC, 2001, p. 21). 1 Possui Graduação em Matemática pela UFPE; Graduanda na Ciências da Religião pelo PARFOR/FURB; Trabalha na EEB Santos Dumont/Blumenau-SC; Coordenadora do Programa COOPER JOVEM/SISCCOP na escola que atua. [email protected]. FONAPER Acreditamos que, conhecemos e construímos cultura, também resgatamos os valores, mas não apenas via educação formal, do que é trabalhado nas escolas, mas em tantos momentos e processos vivenciados informalmente. Podemos citar: família, amigos, ou seja, a educação compreendida como um processo de vida podendo contribuir para a reflexão das culturas de outros povos. Neste sentido refletimos o que nos afirma Santos (1983, p. 19), [...] é importante considerar a diversidade cultural interna à nossa sociedade, isso é de fato essencial para compreendermos melhor o país em que vivemos. Essa diversidade não é feita só de ideias, ela está também relacionada com as maneiras de atuar na vida social, é um elemento que faz parte das relações sociais do país. A diversidade também se constitui de maneira diferente de viver, cujas razões podem ser estudadas, contribuindo dessa forma para eliminar preconceitos e perseguições de que são vítimas grupos e categorias de pessoas (SANTOS,1983, p.19). Pensamos dessa forma, a aprendizagem escolar como uma prática pedagógica fundamentada no equilíbrio entre a teoria e a prática. Nesse sentido, a disciplina de Estágio em Ensino Religioso busca proporcionar e promover atividades pedagógicas integradas para a contribuição da formação docente. Conhecer o ambiente escolar, bem como o contexto em que a escola e seus atores estão inseridos é fundamental para pensar e repensar o fazer pedagógico. De modo especial, nesse estudo, destaca-se com ênfase a prática docente do(a) professor(a) de Ensino Religioso. Em suma, foi possível perceber, que o Estágio permitiu analisar e compreender o ensino e a aprendizagem escolar como um processo múltiplo, onde cada criança aprende com diversas estratégias e de acordo com a etapa do seu desenvolvimento, sem desconsiderar o contexto e a trajetória de vida da qual o educando está inserido. É o contato com o ambiente escolar, que proporciona ainda mais ao estagiário assimilar tudo que vem aprendendo e que ainda vai aprender teoricamente na formação docente no estágio curricular. Ou seja, é no momento da formação, que concretamente colocamos em prática a busca de uma possível ponte que une o discurso e a prática docente, proporcionando uma melhor compreensão das práticas institucionais e das ações praticadas pelos profissionais, como maneira de prepará-los, uma vez que a teoria, ao longo do curso, proporciona vários pontos de vista 358 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso para uma ação contextualizada, bem como, mecanismos para análise histórica, social, cultural e organizacional de si mesmo e demais profissionais da educação. As Danças na metodologia escolar no ER O professor é o grande responsável, em tantos momentos, para guiar e mediar o processo na construção do conhecimento do aluno. Com responsabilidade de sua ação e aproveitando suas expectativas em torno de sua atuação, como docente deflagra o processo de questionamentos com os alunos, a didática para o ensino-aprendizagem, ou seja, os recursos didáticos precisam ir além do quadro e giz. Portanto, é preciso usar dinâmicas que incentivem o aluno a aprender com prazer e não por mera obrigação. Desta forma, fica estabelecido um canal aberto entre docente e discente, tornando assim, uma ação motivada por atividades participativas exigindo planejamento para as respectivas realizações. Para isso, a construção teórica Piagetiana nos propõe uma escola voltada para o pensamento, uma vez que o propósito da docência é o de preparar o educando(a) para o desenvolvimento do seu completo potencial. Como seres humanos dotados de racionalidade, isto é, como indivíduos únicos que pensam e desejam continuar a pensar eternamente devido a sua natureza. Lê-se em Cellerier (1980, p. 43) que, A pedagogia que se desprende da teoria de Piaget gera uma aprendizagem libertadora, participante, vivenciada, com os olhos escancarados para a realidade e para a vida prática: orientadas, as crianças discutem entre si e com os professores, para assessorar-se de valores que serão os seus futuramente. É preciso limpar a velha escola das atividades que não contribuem para a saúde mental, social e afetiva do educando. Importante é fortalecer o pensamento e a criança poderá expressar-se inteligentemente por meio da linguagem. Essa inteligência cresce concomitantemente com o desenvolvimento da afetividade (CELLERIER, 1980, p. 43). Desta forma, o discurso da prática com todos seus erros e acertos são características peculiares da ação do homem, devendo ser preocupação constante da ação pedagógica. E, agindo assim, estaremos vivenciando a ação escolar e a interação entre os alunos para a construção dos saberes, abrindo espaço para a vida na sala de aula. 359 FONAPER Percebemos que a educação é mais que ensino, não se constituindo em instrumento solucionador de problemas, mas altamente revelador de valores implícitos na relação entre professor e aluno remetendo-nos às reflexões e inferências no processo de construção do conhecimento. Essa construção democrática envolve ensino e pesquisa em que os envolvidos precisam ser mediadores e transformadores trabalhando com a concepção de um currículo que estimule todos os envolvidos na aprendizagem, pois ela se funda num processo que necessita da relação dialógica entre professor e aluno, e como tal, na sua prática, tem início as derrubadas de diversos paradigmas. Contudo, isto só será efetivamente compreendido quando o docente ajudar os alunos no seu processo educativo via diálogo, onde exista no processo de aprendizagem, espaço para a inteligência e afetividade. Para isto, temos que romper com qualquer tipo de relação imposta, sendo assim, se faz necessário romper paradigmas, que ao longo do processo educacional os alunos possam construir conceitos sobre os conteúdos do Ensino religioso, que em sua maior parte são, de fato, criações culturais a diversidade. Neste sentido, a Resolução a seguir é altamente elucidadora: I - o ensino visando à aprendizagem do aluno; II - o acolhimento e o trato da diversidade; III - o exercício de atividades de enriquecimento cultural; IV - o aprimoramento em práticas investigativas; V - a elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento dos conteúdos curriculares; VI - o uso de tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias, estratégias e materiais de apoio inovadores; VII - o desenvolvimento de hábitos de colaboração e de trabalho em equipe (Art. 2º da Resolução CNE/CP 01/2002). Desta forma, a escolha do roteiro de aprendizagem elaborada foi as ―Danças Circulares Sagradas‖. Com a finalidade de trabalhar conhecimentos de valores éticos, de cooperação, diversidade social diante do cotidiano escolar, conduzindo a um processo de reflexão e possibilidades do educando criar sua autonomia para eleger seus valores, tomar suas decisões e ampliar seus conhecimentos epistêmicos. Segundo Garaudy "a dança é um modo total de viver o mundo: é, a um só tempo, conhecimento, arte e religião" (GARAUDY, 1998, p. 15). O principal intuito foi reconhecer na ―Dança Circular Sagrada‖ a importância dos indivíduos como parte de um todo, a fim de desenvolver nos alunos a capacidade de convivência em sociedade, de maneira harmoniosa e civilizada. É de mãos dadas e em círculo, que os alunos se 360 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso colocam em contato com seu corpo em movimento, seu ser em expressão e com o outro, estabelecendo e transformando suas relações. ―A dança possibilita o conhecimento para despertar e leva ao encantamento pelo Ensino Religioso no que se refere à descoberta ou redescoberta da sua espiritualidade, da sua dimensão religiosa.‖ (OLENIKI; DALDEGAN, 2003, p. 41). Oleniki e Daldegan (2003, p.42), afirmam sobre o futuro professor de Ensino Religioso: Deverá estar sempre atento à linguagem, pois o proselitismo é vetado. [...] Para favorecer de linguagem adequada é significativo que o professor de Ensino Religioso organize um quadro ou pesquisa das tradições religiosas, em sua classe, para evitar a exclusão de algumas delas e possibilitar aos educandos manifestarem-se (OLENIKI; DALDEGAN, 2003, p.42). E trazendo a nossa discussão para o campo da pesquisa, apoiamonos em Dyniewicz (2007), para destacá-la no aspecto quantitativo, que prevê a mensuração de variáveis preestabelecidas para verificar e explicar sua influência, mediante análise de frequência de incidência, correlações e estatísticas. O método quantitativo é baseado na medida, geralmente numérica, de um grande conjunto de dados, dando ênfase à comparação de resultados e ao uso intensivo de técnicas estatísticas. Todo este processo também requer dimensões acerca da efetivação de uma metodologia participativa. Minayo (1992, p. 10) assim a conceitua, A metodologia qualitativa é aquela que incorpora a questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações e às estruturas sociais. O estudo qualitativo pretende aprender a totalidade coletada visando, em última instância, atingir o conhecimento de um do fenômeno histórico que é significativo em sua singularidade (MINAYO, 1992, p. 10). Considerando o exposto, percebemos que a necessidade de trabalhar a dança circular na sua dimensão avaliativa do próprio ensino, na forma quanti-qualitativa, por ser considerada a mais adequada para dimensionamento e compreensão do aprendizado. 361 FONAPER A Dança Circular Sagrada no Ensino Religioso A prática das danças no meio educacional traz uma proposta pedagógica a fim de que, o trabalho em conjunto possibilite ao educando a sua adaptação, integração com ele e o outro. Ocorrendo desta forma o equilíbrio e a libertação e oferecendo um plano com o intuito de possibilitar o acesso à multiplicidade da educação. Tal formação harmônica, também traz para a comunidade uma ação positiva. Ou seja, a dança oferece um meio pedagógico que busca a idealidade para trabalhar às pré-condições do jovem educando tornar-se potencialmente capaz de viver em harmonia com a comunidade ou grupo a qual pertencem. Baseado nos Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso, em que o ambiente escolar é responsável pela socialização de conhecimentos, à medida que os conteúdos estão inseridos na disciplina do Ensino Religioso. Isto possibilita melhor compreensão do fenômeno religioso, do transcendente, da diversidade cultural. A dança, bem aplicada pedagogicamente, desenvolve nos educandos um movimento de execução de ritmo, ordem, da referência espacial, a aceitação do seu eu com o outro e com a comunidade, a atenção e a concentração, favorecendo a autoestima e exercitando o respeito às diversidades. No ambiente escolar, a presença da criança é uma experiência social, na qual o cuidar e o educar desenvolvem-se de forma programada, planejada, pensada previamente dentro de um sistema que atende, na coletividade, à individualidade e à diversidade de realidades dos educandos (OLENIKI; DALDEGAN. 2003, p. 58). Tornando assim, as pessoas criativas e participativas, com a aceitação de errar, acertar e aprender ―a dança é uma oferta desta ordem. Onde pessoas dançam umas com as outras, elas se educam e se formam a si mesmas‖ (WOSIEN, 2000, p 66). Dançar em círculo significa delimitar um centro; e este é a ―manifestação do divino que existe em cada um. Representa a força maior, pela qual somos guiados‖ (BISCONSIN; MIZUMOTO, 2008, p.9), algo que favorece o ser humano a entrar em contato com a linguagem simbólica, metafórica e transcendental. Neste contexto, as danças possibilitam a integração das diversas áreas do conhecimento e em qualquer nível de aprendizagem da educação 362 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso seja infantil, juvenil e adulta, em que a dança proporciona os sete saberes, que: 1-Cegueiras do conhecimento: considerar os vários pontos de vista e que cada um traz em si múltiplas realidades. 2- Princípios do conhecimento pertinente: dançando no círculo, símbolo da totalidade, é possível experienciar ser Todo em Si e Parte de Algo Maior: qualquer ação local reverbera no todo e o todo nas partes – complexidade/interdependência. 3- ensinar a condição humana - As danças nos conectam com a teia cósmica da Vida. Os gestos, carregados de significados, abrem portais de acesso arquivo energético da humanidade. Do infinitamente pequeno, ao infinitamente grande, tudo dança. O universo está em permanente movimento. Nós, seres humanos, somos dançantes. Renascemos e reinterpretamos cotidianamente a dança cósmica da criação. 4- Ensinar a identidade terrena; 5- Ensinar a compreensão – Dançar/ corpar outros povos é espelhá-los, é aprender com o que há na memória da matéria profunda e permite reconhecer, legitimar, respeitar, e harmonizar as diferenças. 6 - Enfrentar as incertezas – experimentar a construção/desconstrução de gestos. A cada dança, uma aventura ao desconhecido mundo das culturas, das ideias, dos movimentos, das crenças. Novas formas corporais surgem e trazem novos conceitos sobre as possibilidades de si mesmo. 7- Certeza-risco-incertezas. Ética do gênero humano – as danças, por todos os pontos descritos até então, contribuem para a humanização da humanidade, alcançar a unidade planetária na diversidade, desenvolver a ética da solidariedade, da compreensão, da cooperação (RAMOS, 2008, p.12). O que faz a diferença são as pessoas de mãos dadas e unidas a colocarem-se em movimentos. Existindo o encontro de aceitação do eu com o outro e a entrega de todos na roda, temos como resultado a essência do transcendental no encontro com o sagrado. ―No momento desse contato temos a união de espírito e matéria e a possibilidade da criação. O ser humano se torna um ser íntegro quando se torna criativo. A partir daí ele tem a trindade dentro de si‖ (RAMOS, 2008, p.3). No entanto, dançar em círculo é um processo de transformação e um princípio de mudança, símbolo universal da unidade e da totalidade. Ela é sagrada não por ser religiosa, mas por expressar em si a espiritualidade. A mão direita é, neste caso, a que recebe, com a palma da mão voltada para cima, e a esquerda, a mão doada, com as costas voltadas para cima. Ela dá a luz adiante, garantindo ao mesmo tempo a retro-ligação [...]. Desta forma o presente e o passado estão misteriosamente interligados. Só nós humanos separamos o hoje e o amanhã. O eterno, sub spezia e aeternitatis, está além do tempo. Acorrente circular, uma imagem sensorial da eternidade (WOSIEN, 2000, p.43). 363 FONAPER Com a finalidade de promover uma organização de tempo e espaço no ensino aprendizagem e a relação do ser humano. Entretanto, faz-se interessante destacar a necessidade de conhecer e valorizar cada grupo na sua aprendizagem, a fim de levar o diálogo para o educando de forma que o mesmo possa vivenciar sua própria cultura e a construção do seu convívio social respeitando as diversidades culturais. Conhecendo as Danças Circulares Sagradas As Danças Circulares Sagradas têm início na década de 60, com Alemão bailarino e coreógrafo Bernhard Wosien. A descoberta dessas danças teve como ponto de partida as danças folclóricas tradicionais e com o principal objetivo o de analisar como evoluíam as formas, símbolos e o que iria além dos passos desta dança. Muitas foram pesquisadas em aldeias e campos daquela época, a fim de que, com tais danças, fosse possível buscar em pessoas simples da comunidade, a alegria e a comunhão entre o grupo cultural a qual cada grupo pertencia. Em todas as culturas o conhecimento está subordinado à um contexto natural, social e de valores. Indivíduos e povos criam, ao longo da história, instrumentos teóricos de reflexão e observação. Associados a estes, desenvolvem técnicas e habilidades para explicar, entender, conhecer e aprender, visando saber e fazer. Assim, teorias e práticas são respostas a questões e situações diversas geradas pela necessidade de sobrevivência e transcendência. A transdisciplinariedade é uma postura transcultural de respeito pelas diferenças, de solidariedade na satisfação das necessidades fundamentais, e de busca de uma convivência harmoniosa com a natureza (D‘AMBRÓSIO, 1997, p.10). Em 1977, Wosien com todo o conhecimento que havia tido através das diversas comunidades que passou conhecendo as danças, transformou a ―Dança Circular‖ em diversas coreografias, levando-a posteriormente para a comunidade escocesa, Findhorn. Lá ensinou a um grupo de pessoas e se tornou, desde então, responsável pela divulgação das ―Danças Circulares Sagradas‖ espalhadas por todo o mundo. No Brasil, ela chegou por volta de 1980, no Estado de São Paulo, na cidade de Nazaré Paulista. Todo esse processo de efetiva pesquisa, no entanto, transformou-se para o bailarino num encantamento e, com a necessidade de manter viva a raiz desta dança, que não havia excluídos, porque todos participavam 364 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso percebendo nela a força da comunhão ali contida, em gestos simples, muito mais que apenas uma coreografia ou danças em círculo, ―a ideia da dança como caminhada para dentro do silêncio e de uma meditação em movimento‖ (WOSIEN, apud BICONSIN; MIZUMATO, 2008, p. 6). A ‗Dança Circular Sagrada‘ envolve o ritualístico em conexão com o divino, proporcionando a interação humana. Porém, nem todas as danças são realizadas em círculos podendo ser em labirintos ou espiral, mas sem perder as ―metáforas perfeitas da circulação da vida na terra e da totalidade do ser humano, inspirando nos dançarinos o desejo de transformação e evolução‖ (RODRIGUES, 2008, p. 2). O homem e a mulher antigos, na medida em que desvendavam as leis e os princípios de organização da realidade circundante, registrava-os no corpo através de movimentos rítmicos e significativos [...] A dança é uma das raras atividades humanas em que o ser humano está totalmente engajado: corpo, espírito e coração. Por isso, a arte de imitar a natureza através de movimentos rítmicos e repetitivos é uma virtude que torna o conhecimento definitivo, inesquecível (RODRIGUES, 2008 p.3). Sendo assim, a dança poderá levar a um conhecimento para formação da linguagem e da manifestação cultural, de forma que, as ―Danças Circulares Sagradas‖ estão relacionadas às danças populares de todas as regiões do mundo; assim, como os cantos tradicionais e junto com eles, elas têm o poder dos costumes, que se transmitem de geração para geração. Neste sentido, todos somos dançarinos. Considera-se que o verbo dançar em grego orce-omai (orque-omai) é derivado de or-numi (ornumi), cujo significado é fazer levantar, despertar, fazer nascer (LORTHIOIS, 1998). Considerações Finais O trabalho desenvolvido para o presente artigo teve como objetivo o envolvimento com a prática e o estudo das ―Danças Circulares Sagradas‖ e foi então que, entramos na roda para dançar! O desafio não foi dar aulas de dança, mas criar um espaço no qual a dança se tornasse uma experiência em círculo para um reencontro com o eu e o outro, ou seja, não era apenas falar sobre ou se tornar uma mera apresentação, mas de fato, falar de si mesmo e o que a dança poderia mobilizar. Que todos de mão dadas, voltados para um centro comum em passos ritmados na 365 FONAPER crescente harmonia, aceitando as diferenças, poderiam afirmar ao mesmo tempo a individualidade. Gerando através das ―Danças Circulares Sagradas‖ uma conexão com o todo e a integração com os envolvidos, dentro do currículo da disciplina de Ensino Religioso, as reflexões teóricas e próprias experiências obtidas como uma forma metodológica um grande aprendizado. Referências BISCONSIN, Adriana; MIZUMOTO, Lili. De Semente á Flor ―tosa semente tem dentro de si uma flor‖. Curitiba: Etapa Semente-II Edição, 2008. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Conselho Pleno. Resolução CNE/CP 1, de 18 de Fevereiro de 2002. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, graduação plena. Disponível em <<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_02.pdf>> acessado em 17/02/2012. CELLERIER, G. Piaget. Rio de Janeiro: Edições 70, 1980. D‘AMBRÓSIO, Ubiratan. Transdisciplinariedade. São Paulo: Palas Athenas, 1997. GABINI, Roberto. Sonhos na Escola. In: SCOZ, Beatriz (Org). (Por) uma educação com Danças circulares sagradas alma: a objetividade e a subjetividade nos processos ensino/aprendizagem. 2..ed.Petrópoilis. Rio de Janeiro: Vozes, 2001. P. i-f. GARAUDY, R. Dançar a vida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. LIMA, D. B. Linguagem e pensamento em Piaget. Petrópolis (RJ): Vozes, 1976. 366 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso LORTHIOIS, Celine. As danças circulares na roda da vida. In: RAMOS, R.C.L. (Org.).: uma proposta de educação e cura. São Paulo: TRIOM/ Faculdade Anhembi Morumbi, 1998. p.27-41. (ISBN 85-85464-16-X). MORIN, E. Os Sete Saberes necessários a Educação do Futuro. Brasília: Cortez, 2000. MINAYO, M. C. S. O Desafio do Conhecimento: Pesquisa Qualitativa em saúde. São Paulo: Hucitec, Rio de Janeiro: ABRASCO, 1992. ______. Quantitativo-qualitativo: Oposição ou complementaridade? Cadernos Saúde pública. 1993; 9 (3). 239 a 262. OLENIKI, M. L. R.; DALDEGAN, V. M. Encantar: uma prática pedagógica no ensino religioso. Rio de Janeiro: Vozes, 2003. PIMENTA, S.G.; LIMA, M. L. Estágio e docência. São Paulo: Cortez, 2004. ______. O estágio na formação de professores:unidade, teoria e prática? 4.ed., São Paulo: Cortez, 2001. RAMOS, R. C. L. Danças circulares sagradas: uma proposta de educação e cura. São Paulo: Ed. Triom, 2002. ______. et al. Danças circulares sagradas. São Paulo:TRIOM: Faculdade Anhembi Morumbi, 1998. RAMOS, Marcia Maristela. Danças circulares e sagradas: Uma experiência transdisciplinar Disponível em < http://www.uece.br/setesaberes/anais/pdfs/trabalhos/51603082010-164028.pdf >acesso em: 22 jul. 2013 RODRIGUES,Nina. Danças Circulares Sagradas. Disponível em Disponível em <http://www.rodasdalua.org.br/danças_circulares.htm> acesso em: 22 jul. 2013. 367 FONAPER SANTA Catarina. Secretaria de Estado da Educaçãodo Desporto. Proposta curricular de Santa Catarina: implementação do ensino religioso, ensino fundamental. Florianópolis: SED, 2001. SANTOS, José Luis dos. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense. 1983. WOSIEN, B. Dança um caminho para a totalidade. São Paulo: Ed. Triom, 2000. WOSIEN, M. G. Danças sagradas: deuses, mitos e ciclos. São Paulo: Ed. Triom, 2002. VALLE, William. Meu caminho no circulo das danças. Texto escrito para a revista ‗Tecendo Idéias‟, produzida pelo CENAP - Centro Nordestino de Animação Popular, 2001. ZIMMER, Heinrich Robert. Mitos e símbolos na arte e civilização da Índia. São Paulo: Palas Athena, 1989. 368 O ENSINO RELIGIOSO NA REDE MUNICIPAL DE CURITIBA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Luís Fernando Lopes1 Renata Adriana Garbossa 2 Resumo: Esta comunicação é um estudo bibliográfico que tem como objetivo demonstrar como historicamente a disciplina de Ensino Religioso (ER) vem sendo trabalhada na Rede Municipal de Ensino de Curitiba/PR. Os referenciais bibliográficos apoiam-se principalmente nas considerações de Junqueira (2008), Oliveira e Koch (2008), Paraná (2008), Fonaper (2001) e Assintec (2010). Incialmente faz-se um histórico sobre o Ensino Religioso no mundo e especificamente no contexto brasileiro e paranaense. Em seguida, focaliza-se a atenção em descrever como o ER é trabalhado no estado do Paraná e mais especificamente na rede municipal de ensino de Curitiba. O processo histórico de ingresso e consolidação dessa disciplina na Rede Municipal Ensino de Curitiba, resguardadas as suas singularidades, acompanhou o processo nacional que é marcado por contradições, avanços e retrocessos. Com este estudo objetiva-se oferecer elementos para uma reflexão mais aprofundada sobre o ER no Brasil e o seu reconhecimento como disciplina integrante do currículo da educação básica. Palavras-chave: Ensino Religioso. Curitiba. História. Introdução A análise e, consequentemente, a busca pela compreensão do fenômeno religioso em um diálogo inter-religioso constitui uma tarefa importante na sociedade contemporânea. O conteúdo dos programas que assistimos na televisão, ouvimos no rádio, acessamos na internet estão repletos de conteúdo religioso, embora na maioria das vezes isso passe despercebido. Contudo, o voltar-se para o universo religioso e procurar analisá-lo e compreendê-lo não pode ser considerado uma aventura que se faz sem nenhum critério ou fundamentação histórica e epistemológica. A falta de tais critérios conduz a posições extremistas de desprezo ou fundamentalismo em relação ao fenômeno religioso. Nesta perspectiva o 1 2 Mestre e Doutorando em Educação pela Universidade Tuiuti do Paraná. Coordenador do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Religioso do Centro Universitário Internacional UNINTER. Mestre em Geologia ambiental pela UFPR. Tutora do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Religioso do Centro Universitário Internacional UNINTER. FONAPER trabalho com a disciplina de Ensino Religioso requer uma formação coerente dos professores, com as implicações que dele decorrem. A compreensão do Ensino Religioso e sua presença no currículo da educação básica requer atenção ao processo histórico de sua constituição e desenvolvimento no decorrer dos tempos. Assim o intuito desse trabalho é analisar como a disciplina de Ensino Religioso (ER) vem sendo trabalhada na Rede Municipal de Ensino de Curitiba/PR. Conforme a legislação vigente no Brasil, o Ensino Religioso, ainda que de matrícula facultativa, é considerado uma disciplina que integra os saberes necessários para a formação do cidadão. Nesse sentido, é fundamental aprofundar a pesquisa no que diz respeito ao seu reconhecimento como um campo do conhecimento, o que implica necessariamente uma fundamentação epistemológica e pedagógica. Não se trata de impor mais um elemento para o currículo das escolas, mas de fato reconhecer a importância de um elemento que é essencial para proporcionar uma formação integral, com vistas à superação de todo tipo de preconceito e formas de proselitismo. O processo histórico do Ensino Religioso no Mundo e no Brasil Abrolhadas na Alemanha por inspiração da Reforma, as escolas tinham como escopo universalizar o ensino elementar com vistas à divulgação religiosa. Lutero (1483-1546) reivindicava que o Estado assumisse essa tarefa, já que por meio da alfabetização e o estudo de outros elementos seria possível ler a Bíblia e interpretá-la. Assim, a motivação religiosa implica uma organização no processo educacional. Apesar da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) e todas as consequências que ela acarretou, os alemães obtiveram melhores resultados no que diz respeito à educação na Europa (JUNQUEIRA, 2009). No século XVIII, temos o Movimento Iluminista representando o poder da razão humana de interpretar e reorganizar o mundo. Assistimos, também, ao desenvolvimento das ciências experimentais com Bacon, Galileu e Newton, o empirismo com Locke e o racionalismo cartesiano. Com a introdução da máquina a vapor em 1750 e o início da Revolução Industrial o panorama socioeconômico altera-se definitivamente. Conforme Junqueira (2008, p. 147), ―o marco histórico da origem do Ensino Religioso no Ocidente é o estabelecimento do Império Austro370 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Húngaro no século XIX‖. Nesse sentido é importante destacar a atuação da imperatriz Maria Teresa da Áustria que criou uma comissão da corte para os Estados, a qual ressaltava que a instrução é e sempre foi em cada época um fato político. O abade Felbiger foi chamado pela rainha e, sob sua influência, a educação na Áustria tomou um novo rumo. Esse pedagogo ensaiou, com a melhor sorte, interessantes ideias educativas. (...). Todo esse processo foi importante para que, na criação das escolas do império austro-húngaro, fosse finalmente criada, pela primeira vez na história da educação ocidental, a disciplina Ensino da Religião que originaria o Ensino Religioso (JUNQUEIRA, 2009, p. 149-150). Dessa maneira, para compreensão atual do Ensino Religioso é importante retomar as influências pedagógicas, que também sofrem interferências políticas na concepção e divulgação de propostas de ensino aprendizagem (JUNQUEIRA, 2008). Em 1794, o imperador Frederico, o Grande, mesmo sofrendo oposição do clero e do povo, publicou no império austro-húngaro uma lei declarando que todas as instituições educativas, públicas ou não, eram instituições do Estado e deviam estar sob seu controle. Percebe-se assim que progressivamente a compreensão de educação e a forma de organizá-la vão se modificando. Com Kant a pedagogia toma contornos de ciência teórico-prática que une arte e saber para promover a moralidade e a felicidade dos sujeitos. Racionalizar e laicizar constitui-se como estratégias da escola para promover uma educação para a formação do cidadão honesto, paciente, equilibrado e generoso, fiel a Deus e ao Imperador. Também a religião é ensinada como forma de educar. O catecismo era o instrumento que ao mesmo tempo era utilizado como meio para a instrução religiosa e cartilha para alfabetizar. Nesse contexto histórico, as aulas de religião, assim como a alfabetização em língua materna, dava-se por meio do ensino do catecismo e das histórias bíblicas, o que colaborou para a unidade desse império. Tal experiência influenciou outros países nos quais a relação entre Igreja e Estado era muito próxima, inclusive no Brasil, como verificamos anteriormente. Este pressuposto é importante para compreendermos o Ensino Religioso no contexto internacional e verificarmos os caminhos construídos com a criatividade e sensibilidade dos professores e pesquisadores brasileiros (JUNQUEIRA, 2008, p. 147). 371 FONAPER Como é possível notar, o Ensino Religioso é uma disciplina que tem suas raízes em um contexto no qual o Estado se responsabiliza pela educação no século XVI, quando se desencadeia o processo da Reforma Protestante. Trata-se de um momento muito importante na história, pois: Era a primeira vez que se falava de educação universal e ao mesmo tempo, Lutero solicitava às autoridades oficiais que assumissem essa tarefa, considerando que a educação para todos devia ser de competência do Estado, pois, por meio da alfabetização e do estudo de outros elementos, haveria a possibilidade de ler a Bíblia e sua interpretação; portanto, a motivação religiosa demandaria uma organização no processo de ensino-aprendizagem (BRAIDO, 1991 apud JUNQUEIRA, 2008, p. 148). Convêm salientar que esta preocupação com a formação elementar para todos está também relacionada com as necessidades da época, as mudanças no processo produtivo. Além de dar instrução religiosa, tratavase preparar trabalhadores para o comércio e para a indústria. O Estado progressivamente descobre o papel da escola como instrumento de domínio político e social e cada vez mais toma medidas para organizar e controlar a educação. Entre outras consequências, isso provoca desencontros com a Igreja, que percebe sua perda de domínio do sistema educacional. Conforme Junqueira (2008), assistimos progressivamente uma pedagogização da sociedade, que com o nascimento do Estado moderno e da sociedade burguesa, articula-se, de fato, a instituição escolar e um projeto social em torno de uma preocupação com a cultura e com as ciências. Ao longo desse processo, assistimos as resistências da Igreja Católica, progressivamente excluída de seus tradicionais domínios geográficos e ideais. Tal caminho histórico interfere na discussão atual da questão religiosa no continente europeu. Evidencia-se que todas as pessoas têm direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, o que acarreta implicações fundamentais no horizonte educacional. Como se pode notar o Ensino Religioso paulatinamente passou a fazer parte do espaço da escola, articulando-se a partir da estrutura escolarizada da sociedade. O Ensino Religioso, criado no século XVIII, entra no contexto da escola que passa a ser orientada pelo Estado. Inicialmente essa disciplina possui um perfil relacionado à religião hegemônica do país. 372 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Mas ao longo dos séculos, e como as conquistas do povo e os novos direitos alcançados, a questão religiosa nas escolas assumiu um caráter polêmico. Nos países da comunidade europeia as fortes tradições ainda se fazem presentes nas decisões que orientam essa área. Na América Latina, a força da Igreja Católica ainda persiste na influência de uma confessionalidade determinante, enquanto no Canadá existe uma discussão que busca a leitura de uma cultura religiosa como a proposta brasileira, mas ainda será um tema de longas reflexões a presença dos temas religiosos no espaço escolar (JUNQUEIRA, 2008, p. 170). Com relação ao contexto latino-americano convém ressaltar o projeto político-religioso implantado pelos colonizadores ibéricos, que fará da confessionalidade a marca dominante do Ensino Religioso proporcionado. Tal consideração é fundamental para a compreensão do processo histórico do ER no contexto brasileiro, onde a disciplina de Ensino Religioso integra os currículos escolares há muito tempo, assumindo diferentes características pedagógicas e legais em cada período histórico. Muito embora no contexto do Brasil Colônia não seja possível falar em políticas públicas para a educação e também numa disciplina denominada de Ensino Religioso, a primeira forma de inclusão dos temas religiosos na educação brasileira, que se perpetuou até a Constituição da República em 1891, pode ser identificada nas atividades de evangelização promovidas pela Companhia de Jesus e outras instituições religiosas de confissão católica (PARANÁ, 2008, p. 38). No Brasil Império a religião oficial era a Católica Apostólica Romana conforme determinava a Constituição de 1824. Uma nova concepção da educação escolar de caráter laico foi manifestada com os princípios estabelecidos pelos republicanos e explicitados desde o início do regime com a criação, em 1889, do Ministério de Instrução, Correios e Telégrafos. Porém, temos um contexto de disputas, em que estão presentes demandas republicanas e confessionais, no qual a Igreja Católica tenta recuperar seu domínio. Entre os pontos polêmicos no campo da educação estava o Ensino Religioso. Nesse sentido as pesquisas realizadas por Romanelli (2000, p.14) levaram-na a certas constatações, tais como: A primeira delas é a de que a forma como evolui a economia interfere na evolução da organização do ensino, já que o sistema econômico pode ou não criar a demanda de recursos humanos que devem ser preparados pela escola. A segunda constatação relaciona-se com a 373 FONAPER evolução da cultura, sobretudo da cultura letrada. [...] A terceira constatação tem implicações com o sistema político a forma como se organiza o poder também se relaciona diretamente com a organização do ensino, em princípio porque o legislador é sempre o representante dos interesses políticos da camada ou facção responsável por sua eleição ou nomeação e atua, naquela organização, segundo esses interesses ou segundo os valores da camada que ele representa. Uma intensa campanha foi desenvolvida ao longo da Primeira República com o objetivo de minorar os efeitos práticos da laicidade do Estado exarado na constituição. Na década de 1930 colocam-se em defesa da Igreja Augusto de Lima e depois Leonel Franca que, em Minas Gerais, teve seu texto sobre o Ensino Religioso incorporado à Constituição de 1934, sendo facultativo para o aluno e obrigatório para Escola. Tratavase de uma tentativa de colocar fim as disputas atendendo tanto às demandas confessionais quanto republicanas. Em 1937, ele passa a ser facultativo para ambos (PARANÁ, 2008). As incoerências dessa introdução do Ensino Religioso na Constituição de 1934 são questões que ainda demandam muitas pesquisas para possibilitar uma compreensão adequada, o que não é o foco desse artigo. Desde os anos de 1930 se tornaram constantes as disputas sobre a manutenção ou retirada o Ensino Religioso do currículo do ensino brasileiro. Na constituinte da década de 1980 os argumentos contrários e a favor do Ensino Religioso foram discutidos e a polêmica continuou mesmo depois da aprovação da LDBEN 9.394.96, que no tocante ao Ensino Religioso exigiu uma nova formulação aprovada no ano seguinte com Lei nº 9.475/19973: O art. 33 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os 3 Ao então deputado Pe. Roque Zimermann (PT-PR), como membro da Comissão de Educação, Cultura e Desporto, coube assumir a relatoria do processo de revisão do art. 33 da LDBEN. A proposta apresentada pelo deputado foi na realidade, uma colaboração do FONAPER, resultado de diversos estudos, em um retorno aos projetos anteriores, sobretudo porque aproveitava o viés conceitual que dificultou a discussão anterior em relação ao que seria, de fato, o inter-religioso, já que tal termo estava mal colocado. Sem utilizar novas terminologias, o substitutivo respeitava o espírito de todas as discussões, ou seja, o pluralismo religioso (JUNQUEIRA, 2008, p. 37). 374 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso‖. O Art. 33 foi o primeiro da LDBEN 9.394/96 a ser alterado. Em 1998 com a Resolução nº 02/1998 o Conselho Nacional de Educação (CNE) reconheceu o Ensino Religioso como área de conhecimento a ser organizado não a partir de religiões, mas da escola (JUNQUEIRA, 2008). O Ensino Religioso no Estado do Paraná A altercação sobre o Ensino Religioso no Estado do Paraná não é recente. Documentos apontam que uma das fases mais marcantes sobre o mesmo ocorreu entre 1922 até 1930, em meio às ações e os discursos dos intelectuais católicos em defesa do ensino religioso, privilegiando suas intervenções na imprensa católica e no Congresso Legislativo Paranaense (CAMPOS, 2011). Nos pressupostos de Campos (2011) em 1922, foi apresentado pelo deputado Padre Alcidino Pereira o Projeto n. 40, que visava estabelecer o ensino religioso facultativo nas escolas públicas e nas instituições de ensino privadas subvencionadas pelo poder estatal paranaense. A proposição desse projeto provocou forte debate entre os parlamentares. O mesmo autor pondera que em 1926, o grupo católico estabeleceu a revista A Cruzada, com circulação até 1931. Neste mesmo ano (1931), através do decreto n. 19.941 Francisco Campos, Ministro da Educação, instituiu o ensino religioso como disciplina facultativa para compor o currículo das escolas públicas brasileiras. A imprensa católica paranaense divulgou um conjunto de artigos em tom comemorativo pelo alcance dessa matéria no ordenamento jurídico brasileiro. Conforme apresentado pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná com o objetivo de viabilizar a proposta de Ensino Religioso no Estado, a Assintec4, formada por um grupo de caráter ecumênico, cuidou da elaboração de material pedagógico e também, com cursos de formação continuada. Como resultado desse trabalho foi elaborado em 1972 o 4 Associação Interconfessional de Curitiba 375 FONAPER (Prontel)5, que propôs a instituição do Ensino Religioso radiofonizado nas escolas municipais, com parecer favorável do Conselho Estadual de Educação. Havendo o consentimento de abrigar o Prontel da SEED juntamente com a Prefeitura Municipal de Curitiba. Como relata a Secretaria de Educação do Estado do Paraná em suas diretrizes curriculares: O conteúdo veiculado pelo sistema radiofônico teve como foco curricular as aulas de ensino moral-religioso nas escolas oficiais de primeiro grau. Em 1973, foi firmado um convênio entre a SEED e a Assintec, com a proposta de implementar um Ensino Religioso interconfessional nas escolas públicas de Curitiba. No mesmo ano, a SEED designou a entidade como intermediária entre a Secretaria e os Núcleos Regionais de Educação, nos quais foi instituído o Serviço de Ensino Religioso para orientar a proposta curricular da disciplina (PARANÁ, 2008 p. 41). Em 1976, pela Resolução n. 754/76, foram autorizados cursos de atualização religiosa em quatorze municípios do Estado, com o apoio da Associação das Escolas Católicas (AEC). Em 1981, nasceu um novo programa de rádio dirigido aos professores, como meio para ampliar as possibilidades de uma formação continuada, bem como favorecer a preparação dos temas a serem tratados nas aulas de Ensino Religioso. Além disso, realizou-se o Primeiro Simpósio de Educação Religiosa. Seis anos depois (1987) teve inicio o curso de Especialização em Pedagogia Religiosa, numa parceria da SEED, Assintec e PUC/PR, voltado à formação de professores interessados em ministrar aulas de Ensino Religioso. Nos pressupostos da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (2008) durante o transcorrer do curso, ficou demonstrada a inquietação com a formação do professor para a pluralidade religiosa, ainda que, por conta da concepção de Ensino Religioso que vigorava na época, prevalecessem atividades marcadas por celebrações e vivências de valores. Durante o período da Constituinte as discussões iniciadas foram intensificadas com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, por meio da organização de um movimento nacional, que buscou garantir o Ensino Religioso como disciplina escolar. Inicialmente, o entendimento das orientações oriundas dos textos legais, do Congresso Nacional (art. 210, § 1º da Constituição Federal de 5 Programa Nacional de Tele-educação 376 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso 1988 e art. 33 da LDBEN 9.394/96) e dos pareceres do Conselho Nacional de Educação (CNE), foi fundamental para o posicionamento de cada um dos Estados da Federação em relação ao Ensino Religioso (JUNQUEIRA, 2007). Na mesma década (1980), com o processo de redemocratização do país, as tradições religiosas asseguraram o direito à liberdade de culto e de expressão religiosa. Nessa conjuntura, no ano de 1990, o Estado do Paraná elaborou o Currículo Básico para a Escola Pública do Paraná. O Ensino Religioso não foi apresentado como as demais disciplinas na primeira edição do documento. Sob a responsabilidade da Assintec com a SEED dois anos mais tarde, foi publicado um caderno para o Ensino Religioso, conforme os moldes do Currículo Básico. Houve um esvaziamento do papel do Estado em relação ao Ensino Religioso, retomando-se na prática, a compreensão de que a definição do currículo da disciplina é responsabilidade das tradições religiosas. Diante do exposto evidenciou-se, ainda, o distanciamento do Ensino Religioso das demais disciplinas escolares. Conforme explicitado pela SEED No âmbito legal, o Ensino Religioso ofertado na Rede Pública Estadual atendia às orientações da Resolução SEED n. 6.856/93, que, além de reiterar o estabelecido anteriormente entre a SEED e a Assintec, definia orientações para oferta do Ensino Religioso nas escolas. No entanto, esse documento perdeu validade nas gestões que se sucederam, especialmente a partir da promulgação da nova LDBEN 9.394/96 (PARANÁ, 2008, p.43). O Ensino Religioso passou a ser compreendido como disciplina escolar, com a discussão da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ― LDBEN 9.394/96, incentivadas pela sociedade civil organizada. Em decorrência desse processo, sua instituição nas escolas públicas do país foi regulamentada. O enfraquecimento da disciplina de Ensino Religioso na Rede Pública Estadual do Paraná ocorreu no período entre 1995 a 2002, acentuando-se a partir de 1998, uma vez que nesse período não havia sido regulamentado pelo Conselho Estadual de Educação, ficando restrito somente às escolas onde havia professor efetivo na disciplina. Na reorganização das matrizes curriculares do Ensino Fundamental, realizada nesse período, o Ensino Religioso foi praticamente extinto, mesmo diante da exigência legal de sua oferta pela LDBEN 9.394/96. 377 FONAPER O Ensino Religioso não foi contemplado na elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) coordenado pelo Ministério da Educação (MEC). Tornou-se então tema de debate pelo FONAPER. Nesse contexto é que se elaborou uma proposta educacional com educadores de diversas tradições religiosas. No ano de 1997 foi publicado o PCN de Ensino Religioso. O Conselho Estadual de Educação do Paraná, em 2002, aprovou a Deliberação 03/02, que regulamentou o Ensino Religioso nas Escolas Públicas do Sistema Estadual de Ensino do Paraná. Com a aprovação dessa deliberação, a SEED elaborou a Instrução Conjunta n. 001/02 do DEF/SEED, que estabeleceu as normas para esta disciplina na Rede Pública Estadual. No inicio da gestão 2003-2006, o Estado retomou a responsabilidade sobre a oferta e organização curricular da disciplina no que se refere à composição do corpo docente dos conteúdos da metodologia, da avaliação e da formação continuada de professores (PARANÁ, 2008, p. 41). Dessa forma os professores que ministravam aulas de Ensino Religioso foram abarcados em um processo de formação continuada que tinha como objetivo a legitimação da Rede Pública Estadual. Tal processo ocorreu entre os anos de 2004 a 2008 por meio de Simpósios, grupos de Estudos, e resultou na fundamentação das Diretrizes Curriculares do Ensino Religioso. Como explicita a SEED: No final de 2005, a SEED encaminhou os questionamentos oriundos desse processo de discussão com os Núcleos Regionais de Educação e com os professores ao Conselho Estadual de Educação (CEE). Em 10 de fevereiro de 2006, o mesmo Conselho aprovou a Deliberação n. 01/06, que instituiu novas normas para o Ensino Religioso no Sistema Estadual de Ensino do Paraná (PARANÁ, 2008, p.44). Portanto, no ano de 2006, após um longo processo de discussão, a SEED lançou a primeira versão para das Diretrizes Curriculares do Ensino Religioso para a Educação Básica. Após inúmeras discussões entre os diversos setores envolvidos o resultado final, mas não conclusivo, deste processo surgiu a proposta de implementação de um Ensino Religioso laico e de forte caráter escolar. 378 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso O Ensino Religioso na Rede Municipal de Curitiba Como vimos, a discussão acerca da presença do Ensino Religioso nos espaços escolares oficiais do Paraná remonta longa data. Conforme Campos (2011), em 1922, o parlamentar Pe. Alcídio Pereira apresentou ao Congresso Legislativo Paranaense, o Projeto nº 406 que objetivava instituir o ensino religioso facultativo nas escolas públicas e subvencionadas pelo estado do Paraná. Tal proposição provocou um forte debate entre os parlamentares. ―A imprensa curitibana, particularmente aquela alinhada aos anticlericais (Comércio do Paraná, Diário da Tarde, Gazeta do Povo), endereçou muitas críticas à iniciativa do representante do clero‖ (CAMPOS, 2011, p. 66-67). De acordo com Hernandes, Nizer e Correa (2012) a Secretaria Municipal da Educação de Curitiba conta, atualmente, com 181 unidades educacionais que ofertam Ensino Fundamental. Elas estão distribuídas em nove Núcleos Regionais da Educação. Em todas as escolas da Rede Municipal de Ensino de Curitiba o ER é ofertado. Do total de 144 escolas, 141 contam com um professor específico para esta disciplina. Nas outras escolas o professor regente assume esse componente curricular. Nas escolas em que se ofertam os anos finais do Ensino Fundamental a responsabilidade pelas aulas de ER na maioria das vezes fica com os professores de História. Ao todo são onze escolas que possuem essa oferta (HERNANDES; NIZER; CORREA, 2012). No que diz respeito à formação continuada dos professores de Ensino Religioso, eles participam anualmente, na área de vários encontros e eventos. São oferecidos também cursos7 de introdução e de aprofundamento de conteúdos em parceria com a equipe pedagógica da Associação Inter-religiosa de Educação (ASSINTEC). 6 7 No contexto dessa discussão convém mencionar o Decreto nº. 119a de 7 de janeiro de 1890, cuja vigência foi reestabelecida pelo Decreto nº 4.496 de 2002: É proibido à autoridade federal, como a dos Estados federados, expedir leis, regulamentos ou atos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a a criar diferenças entre os habitantes do país ou nos serviços sustentados a custa do orçamento, por motivo de crença ou opiniões filosóficas ou religiosas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d119-a.htm>. Acesso em: 01 Ago. 2013. Entre os já ofertados pode-se citar: Textos Sagrados (2010), Respostas norteadoras para o sentido da vida além-morte (2011) e Espaços Sagrados (2012) (HERNANDES; NIZER; CORREA, 2012). 379 FONAPER Conforme argumenta Valdir Cândido de Deus (2010), a constituição da ASSINTEC remonta ao Movimento Ecumênico de Curitiba. A origem oficial da entidade ocorreu no ano de 1973, quando se realizou um convênio com Secretaria Estadual de Educação, sob a condição de que dentro de seis meses fosse criada uma associação responsável pelo projeto de implementação do Ensino Religioso nas escolas públicas do Paraná. Além da Secretaria Estadual de Educação, firmou-se um convênio com a Secretaria Municipal de Curitiba. Se considerarmos estas três últimas décadas, a Assintec passou por diferentes fases. Primeiramente surgiu como entidade ecumênica, que tinha como objetivo fomentar o Ensino Religioso que superasse a catequese cristã na escola pública. Em seguida, a ênfase era o ensino de valores humanos. Contudo, com a LDBEN 9.394/96, sob novos alicerces, a Asssintec passou a trabalhar com o conhecimento religioso historicamente acumulado e vivido no contexto das tradições religiosas, místicas e filosóficas. A presença do Ensino Religioso na escola tem gerado inúmeros debates. Isso se deve, por um lado devido a crescentes resistências, e por outro lado, aceitações, sendo levantadas diferentes concepções com relação a sua metodologia, sua importância e também para que fins a sua contribuição no ambiente escolar. Nos pressupostos de Valdir Cândido de Deus (2010), alguns autores, e até mesmo organismos, estão aventando e conjeturando sobre este assunto, de modo que se desenvolva um currículo multicultural, que propicie ao aluno o pleno exercício da cidadania. O mesmo esforço tem partido do FONAPER8 para contemplar um currículo que seja também multicultural. Sob essa perspectiva, o conhecimento religioso é: Um patrimônio da humanidade e necessita estar à disposição da escola, contribuindo para que os educandos se tornem capazes de entender os movimentos no âmbito das diversas culturas, colaborando para que o autêntico cidadão multiculturalista se aprofunde (DEUS, 2010, p. 49). No município de Curitiba, com base na Lei 9.475/97, que dá uma nova redação ao Art. 33 da Lei da LDB n. 9.394/96, redimensionando o Ensino Religioso no contexto escolar, lançou-se um Caderno Pedagógico 8 Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. 380 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso com o título ―Caderno Pedagógico: Ensino Religioso‖, onde estabelece e determina como deverá ser o Ensino Religioso nas escolas públicas de Curitiba. Neste, como área de conhecimento, o Ensino Religioso deve trabalhar os seus conteúdos buscando fazer a articulação com as demais áreas. Uma parceria entre a Rede Municipal de Educação de Curitiba e a ASSINTEC gerou a proposta de Ensino Religioso no município. Em 2005, ambas as entidades citadas coordenaram um processo de revisão das diretrizes curriculares municipais. Ocasionando também mesma data a discussão da proposta com os profissionais da Educação de Ensino Fundamental, onde se apontou possibilidades de trabalho efetivo com os alunos. A discussão da proposta foi pensada na atual legislação, a partir do Art. 33 da LDBEN n. 9394/96, sendo alterado pela Lei n. 9.475/97, contando com a Resolução n. 2/1998, da Câmara de Educação Básica do CNE: O Ensino Religioso, mediante isto, passa a ser considerado área do conhecimento e parte integrante da Base Nacional Comum, sendo trabalhado de modo sistemático, em articulação com as demais áreas, em horário normal das escolas. A legislação determina o respeito à diversidade cultural religiosa existente na realidade brasileira. Considerando que o trabalho com o Ensino Religioso na escola não é uma doutrinação, evangelização, catequese ou imposição de quaisquer práticas religiosas, fica proibido o proselitismo (DEUS, 2010 p. 50). A ASSINTEC, juntamente com a RME, desenvolve planos anuais de formação continuada dos professores, visando conhecer e analisar as diversas tradições religiosas, místicas e filosóficas, ao lado de condutas que reforçam os valores em comum. A realidade do estudante deve ser o ponto de partida e o ponto de chegada no processo ensino-aprendizagem. Nessa concepção, consideram-se as peculiaridades ou particularidades da comunidade na qual se insere a escola, para que o estudante chegue ao entendimento da diversidade das manifestações do sagrado e construa um referencial de respeito às diferenças (RIBEIRO HOLANDA, apud DAUDT DA COSTA; SCHLÖGEL, 2006, p. 24). Com alusão ao desenvolvimento em seu trabalho pedagógico, de caráter especial o Ensino Religioso, os professores precisam de modo 381 FONAPER constante de instrumentos de apoio que lhes permitam uma fundamentação segura. Com o objetivo de dar apoio para os professores das escolas municipais, dois cadernos de Ensino Religioso foram construídos nos anos 2003 e 2004. O primeiro Caderno teorizava sobre os aspectos legais a que área estava ligado. Já o segundo Caderno tinha como base uma complementação do anterior, trazendo exemplos de planejamentos de aulas para os ciclos I e II. Outros materiais foram produzidos três anos mais tarde (no ano de 2006) para os professores dos Ciclos I e II (do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental), categorizados como Cadernos Pedagógicos. Nos demais encontros que foram realizados, pedagogos, professores e outros interessados realizaram avaliações sobre a importância do objeto de estudo, aos conteúdos e à metodologia que o Ensino Religioso se propôs. Considerações Finais Neste estudo procurou-se apresentar uma abordagem histórica sobre a disciplina de Ensino Religioso no contexto nacional, estadual e particularmente no contexto da rede municipal de ensino de Curitiba/PR. Considerou-se como pressuposto que a realidade singular ― o Ensino Religioso na Rede municipal de Curitiba ― é um elemento do universal ― o Ensino Religioso no contexto histórico nacional e mesmo internacional. No entanto, tal realidade particular não pode ser vista apenas como um reflexo da realidade geral, pois, ela possui características próprias que lhe conferem uma identidade particular. Pela exposição do processo histórico de introdução e desenvolvimento do Ensino Religioso na realidade mundial e brasileira nota-se uma situação constante de disputas pelo controle do sistema educacional como um dos meios para alcançar e garantir o controle político, econômico e social. Com relação aos esforços para a promoção de um Ensino Religioso, enquanto área de conhecimento e a consequente valorização dos professores que com ele trabalham, na realidade brasileira desde 1995, é preciso destacar o trabalho do FONAPER, que em sua carta de princípios estabelece, entre outros, ―A garantia que a Escola, seja qual for sua natureza, ofereça Ensino Religioso ao educando, em todos os níveis de 382 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso escolaridade, respeitando as diversidades de pensamento e opção religiosa e cultural do educando‖.9 Também no contexto paranaense esse cenário se reproduz à sua maneira, bem como na capital do Estado. Uma das particularidades a serem destacadas dessa realidade singular é o trabalho da Associação Inter-religiosa de Educação (Assintec), que procura também atuar no sentido de superar disputas e promover um Ensino Religioso que realmente colabore para formação integral do ser humano. Na capital paranaense como em todo território nacional está presente o desafio de superar visões sectárias para a promoção de um Ensino Religioso, enquanto área de conhecimento pautado no respeito à diversidade religiosa com vistas à formação integral do ser humano frente aos desafios da sociedade hodierna. Referências BRASIL. Decreto nº 119-a, de 7 de janeiro de 1890. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 7 de janeiro de 1890. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d119-a.htm>. Acesso em: 01 / Ago./ 2013. ______. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Diário oficial da União. Poder legislativo, Brasília, DF, 23 jul.. 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l9475.htm>. Acesso em: 01 / Ago./ 2013. CAMPOS, N. Debate sobre o Ensino Religioso na capital paranaense: entre a tribuna e a imprensa (1922-1931). Educação em Revista. vol. 27 nº. 01 Belo Horizonte jan./abr. 2011. Disponível em: <http://educa.fcc.org.br/scielo.php?pid=S010246982011000100004&script=sci_arttext>. Acesso em: 30 jul. 2013 9 Disponível em: <http://www.fonaper.com.br/carta-principios.php>. Acesso em: 01 Ago. 2013. 383 FONAPER DEUS, V. C. de. Ensino religioso nas escolas municipais da Zona Norte de Curitiba. Dissertação (mestrado) – Escola Superior de Teologia. Programa de Pós-Graduação. Mestrado em Teologia. São Leopoldo, 2010. FONAPER. Forum Nacional Permanete do Ensino Religioso. Carta de Princípios. Disponível em: <http://www.fonaper.com.br/cartaprincipios.php>. Acesso em: 01 Ago. 2013. HERNANDES, E. C. C.; NIZER, C. do R.; CORRÊA, E. S. Espaços sagrados: formação continuada dos Professores da rede estadual do Paraná e Municipal de ensino de Curitiba. Caderno de estudos e pesquisa do turismo. Curitiba, v. 1, p. 144-155, jan./dez. 2012. Disponível em: http://www2.pucpr.br/reol/index.php/TURISMO?dd99=view&dd98=&dd1=70 39&idioma=2 Acesso em: 01 Ago. 2013. JUNQUEIRA, S. R. A.; CORRÊA, R. L. T.; HOLANDA, A. M. R. Ensino Religioso: aspecto legal e curricular. São Paulo: Paulinas, 2007. JUNQUEIRA, S. R. A. História, legislação e fundamentos do Ensino Religioso. Curitiba: Ibpex, 2008. ______. O processo de escolarização do ensino religioso no Brasil. Petrópolis: Vozes, 2002. PARANÁ. Diretrizes Curriculares da Educação Básica Ensino Religioso. Curitiba: SEED, 2008. Disponível em: <http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/dce_er.pd f>. Acesso em: 30 jul. 2013. ROMANELLI, O. de O. História da Educação no Brasil (1930/1973). 24 ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2000. 384 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO RELIGIOSO: EXPERIÊNCIAS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS Josiane Crusaro (ASPERSC)1 Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro (UNIGRAN)2 Adecir Pozzer (GPEAD/FURB)3 Resumo: O espaço escolar é lócus de acolhida, integração, mediações, socializações, aprendizagens e reconhecimento do(s) outro(s) e, ao mesmo tempo, palco de exclusões, conflitos, intolerância e desentendimentos gerados pela incapacidade de um diálogo autêntico e vivencial, legitimado pela escuta ativa e pelo respeito às diferenças na convivência entre as diversidades. Repensar o currículo de forma contextualizada perpassando as concepções, planejamentos, metodologias e avaliações, atendendo aos anseios de uma educação significativa para o educando, capaz de promover, além do conhecimento, uma formação cidadã pautada em princípios éticos de convivência e práticas alteritárias é tarefa constante que perpassa as diferentes áreas do conhecimento da Educação Básica. Por isso, objetivamos socializar atividades de aprendizagem desenvolvidas no componente curricular Ensino Religioso que, enquanto área do conhecimento da Educação Básica tem por meta assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil. Palavras-chave: Ensino Religioso; espaço escolar; diversidade cultural religiosa. Palavras iniciais A escola possui diversos significados e compreensões. Pode ser entendida como espaço de acolhida, encontros, reencontros, amizades, 1 2 3 Graduação no Curso Ciências da Religião - licenciatura em Ensino Religioso pela Unochapecó (2012) e História pela UNOESC - ;Xanxerê. Professora de Ensino Religioso da Rede Pública Estadual de Santa Catarina e vice-secretária da Associação dos Professores de Ensino Religioso do Estado de Santa Catarina - ASPERSC, Gestão 2011/2013. E-mail: [email protected] Acadêmica do Curso de Pedagogia - UNIGRAN. Professora do Ensino Fundamental/Séries Iniciais da Rede Municipal de Ensino de Faxinal dos Guedes/SC. Email: [email protected]. Mestrado em Educação pela UFSC; Graduação em Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso pela FURB (2010); Especialização em Formação de Professores para o Ensino Religioso pela PUCPR (2006). Bacharel em Ciências Religiosas pela PUCPR (2002). Membro dos grupos de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento (GPEAD/FURB) e Arte e Educação da linha Filosofia da Educação (GRAFIA/UFSC). Coordenador do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER 20122014). Professor de Ensino Religioso da Rede Pública do Estado Santa Catarina, da Associação Franciscana Senhor Bom Jesus na região da Grande Florianópolis e da FURB/PARFOR. Atua na área da Educação, com ênfase nos seguintes temas: diversidade cultural religiosa, ensino religioso, formação de formadores e direitos humanos. E-mail: [email protected] FONAPER diálogos, construção de saberes e aprendizados, que contribuirão na formação da identidade, ou também como espaço de legitimação, opressão, regras, imposições, exclusão e intolerância. Estando incumbida, enquanto instituição social, de ser espaço/local/ambiente de aprendizagens e, ao mesmo tempo, de convivência entre as diversidades, sabe-se que o cuidado para com o outro, não raras as vezes, tem estado em segundo plano porque ainda há uma formação visando atender as demandas do sistema capitalista, ou seja, para um mercado de trabalho centrada na geração de capital e no incentivo ao consumismo exacerbado, cujo fundamento é uma racionalidade reduzida à instrumentalização. Avaliações servem como indicativos ou métodos para averiguar e classificar os níveis de aprendizagens que, socializados em gráficos, não passam de meros resultados para verificar se atenderam ou não às metas estabelecidas. São importantes para quem detém o controle e que precisa demonstrar os índices dos quais depende inclusive a sua sobrevivência. Com o objetivo de refletir este contexto em que a escola está fortemente envolvida, faz-se necessário recuperar o desejo e o sabor do aprender e do ensinar, para além de uma capacitação técnica para o exercício de uma profissão. E, na construção do saber aliado ao sabor do aprender, do compreender e do ensinar, o diálogo é base/fator preponderante, porque estudantes e professores precisam discutir, refletir e trabalhar conjuntamente atuando como protagonistas no processo ensino/aprendizagem, utilizando constantemente do encontro, para ouvir, dialogar e interagir no espaço escolar. Diante dessa perspectiva, Silva (2007, p. 250) afirma que: um dos grandes desafios da escola hoje é contribuir para a construção da alteridade e do conhecimento do eu e o outro, oportunizando espaços de diálogo para o pleno desenvolvimento dos educandos, a partir de processo de ressignificação da linguagem utilizada por eles. Acrescenta a autora (2007, p. 251) que há uma ―[...] necessidade de criar um ambiente de diálogo na sala de aula, de troca de experiências, oportunizando assim a valorização de todos‖ implementando outras lógicas onde todos/as se sintam integrados, acolhidos e ao mesmo tempo tenham 386 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso assegurado o reconhecimento da alteridade, agindo assim com responsabilidade diante do outro. Fontanive, Daneliczen e Kravice (2009) afirmam que uma educação capaz de atender aos pressupostos da alteridade é tarefa desafiadora, pois rompe com a postura tradicional a qual estamos habituados e nos provoca a (re)flexão sobre a necessidade do respeito perante às diferenças que estão presentes nos diversos espaços. Para Pozzer, Cecchetti e Riske-Koch (2009, p. 271) ―a alteridade é negada, esquecida [...]‖ forjando-se identidades, moldando, marcando e etiquetando estudantes de acordo com os ideais de um sistema que oprime o ser humano e nega a beleza e riqueza da diversidade, principalmente, nos ambientes escolares. Diante dessa perspectiva, concordamos que ―[...] na sociedade excludente, o diferente é visto como alguém inferior e não digno do círculo das nossas relações sociais‖ (WITT; PONICK, 2008, p. 09), possibilitando o surgimento de tipificações, exclusões, (pré)conceitos, discriminações, intolerâncias em relação ao outro, enquanto sujeito histórico singular, diferente e único. Daí a necessidade constante da escola refletir seu papel no contexto atual, atuando como promotora de uma conscientização que parta do outro, de caráter alteritário, humano e respeitoso para com os diferentes indivíduos que constituem a sociedade, contribuindo com uma formação de sujeitos de direitos, emancipados e críticos frente às injustiças e a negação do direito de aprender e se desenvolver. As flores e o jardineiro: aprendendo e convivendo com a diversidade Vamos imaginar uma sala de aula? Um espaço da diversidade, constituído por diferentes corpos, saberes, experiências, etnias, cores, crenças religiosas ou não, gêneros, gostos, desejos, ideias, entendimentos, significados e sentidos. A sala de aula comparada a um jardim demonstra que cada qual na sua maneira de ser, ver, agir e viver, é especial e requer atenção, compreensão, cuidado, acolhimento e responsabilidade. Recordamos com isso, que ―[...] o homem se constitui como ser humano na relação com o outro, ou seja, por meio de sua inserção sócia histórica‖ (MARTINS FILHO, 2011, p.60), por isso, é preciso a inter-relação com o outro/diferente, o convívio e respeito ao que não existimos sozinhos. 387 FONAPER O ―jardineiro‖ necessita cuidar, cultivar suas ―flores‖ para que cresçam e juntas constituam o jardim. Da mesma forma, o professor tem de cuidar, ensinar e educar os educandos para que reconheçam e aprendam a conviver respeitosamente na diversidade, pois ―[...] conhecer o que é do outro permite a construção do respeito mútuo [...]‖ (OLENIKI; DALDEGAN, 2003, p. 21). Geralmente, os (pré)conceitos são originários da falta de (re)conhecimento e entendimento. De acordo com Rubem Alves (1994, p. 6) ―a alegria está no jardim que se planta, na criança que ensina, no livrinho que se escreve‖. Por isso, o professor assume uma tarefa primordial no processo de ensino/aprendizagem, pois, tem de assegurar as possibilidades para que aconteça aprendizagem e (con)vivência. Para Giroux (1997), o professor precisa criar oportunidades para que os estudantes tornem-se cidadãos e que a partir do conhecimento adquirido e/ou produzido sejam críticos e autônomos, o que de fato, pode corroborar na importância do educador ser mediador. Nesta perspectiva, ―a docência é uma profissão que exige muito mais do que a transmissão dos conteúdos teórico-práticos, aprendidos nos cursos de formação inicial e continuada‖ (SOUZA, 2008, p.92), porque exige comprometimento e qualificação constante do profissional, sensibilidade e responsabilidade ética frente às interpelações expressas no rosto do outro. Reafirmando a relevância do professor enquanto educador, exige-se que este, [...] prepare o aluno para enfrentar as contradições sociais da conjuntura atual, que, por meio de práticas inovadoras e atraentes, ofereça e provoque no aluno o desejo de adquirir e construir o conhecimento para responder aos desafios da sociedade (VEIGA; VIANA, 2010, p. 32). Para Delors (2001, p. 54) ―o respeito pela diversidade e pela especificidade dos indivíduos constitui, de fato, um princípio fundamental [...]‖, o que implica em ensinar aos sujeitos/estudantes desde cedo à necessidade de respeitar o outro como ele é considerando suas escolhas e diferenças, principalmente, no que se refere às questões religiosas que são de foro individual ou familiar. Por isso, é preciso que a escola como um todo esteja comprometida com a oferta: 388 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso [...] de uma educação de qualidade, que, ao mesmo tempo, seja universal na garantia de acesso e atenda também as necessidades educativas de crianças, adolescentes e jovens [...] que nela estão inseridos (KUENH, 2007, p.196). É preciso demonstrar aos estudantes que enquanto pessoas, eles são únicos, diferentes e especiais, porém, iguais em direitos, dignidade e deveres. Ensinar e aprender esta perspectiva não são responsabilidade somente do componente Ensino Religioso, mas dos demais componentes e áreas do conhecimento que compõem o currículo escolar e possuem por incumbência contribuir na formação cidadã de cada estudante. Ensino Religioso: concepções e compreensões acerca do componente em Santa Catarina O componente Ensino Religioso no decorrer do processo histórico brasileiro foi marcado por diversos entendimentos, ideias, compreensões e análises. Aceito, ignorado, com avanços e retrocessos, foi trabalhado, ensinado e/ou abordado em diferentes perspectivas. Destacamos que a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB nº 4024/61 - abordava o termo Ensino Religioso, mas na prática pedagógica o mesmo era concebido como ensino catequético e/ou doutrinal de caráter confessional, através do qual eram ensinados os princípios do cristianismo católico. Para Santos (2011), a concepção exposta na Lei nº 5.692/71 é marcada por um discurso pluriteológico e embasado nos aspectos morais da tradição cristã, em que o componente recebeu caráter interconfessional/ecumênico, continuando a privilegiar/priorizar uma pequena parcela da população. Para o FONAPER4 (2000, p. 7) ―o novo para o Ensino Religioso começa a ser vislumbrado a partir dos anos 90 [...]‖ quando passou a ser concebido como parte integrante da formação básica do cidadão, ao assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa, sendo vedadas quaisquer formas de proselitismo, conforme art. 33 da LDB de 1996. De acordo com FONAPER (2000, p. 16), ―o Ensino Religioso pluralista deve apresentar uma visão positiva da diversidade religiosa, situando-a como parte de um contexto democrático, no qual a liberdade de pensamento e de credo pode se expressar‖. Por isso, a escola tem de 4 Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. 389 FONAPER promover o acolhimento de todos/as e tratar a diversidade religiosa envolvendo e integrando as diferenças existentes, em uma perspectiva inter-religiosa e intercultural. Destacamos que o Ensino Religioso no contexto atual, concebido como área do conhecimento e componente a integrar a educação básica (Cf. Resolução CNE/CEB nº 4/2010 e Parecer CNE/CEB nº 7/2010), tem por objeto estudar o fenômeno religioso, isto é, aquilo que se mostra, revela ou manifesta na existência humana. Desta forma, o Ensino Religioso contribui na vivência pessoal do estudante. Daí a necessidade das unidades escolares se constituírem enquanto espaços de construção, produção e socialização de conhecimentos, pois, a escola tem ―a função de ajudar o educando a se libertar de estruturas opressoras que o impedem de progredir e avançar‖ (FONAPER, 2009, p. 41). No Estado de Santa Catarina, o Ensino Religioso: [...] apresenta um histórico construído pela participação de inúmeros homens, mulheres, jovens e crianças, que edificaram nesta disciplina um dos espaços no currículo escolar a contribuir significativamente com reflexões e encaminhamentos pedagógicos na construção de cidadãos catarinenses comprometidos com um mundo melhor e possível (CECCHETTI; THOMÉ, 2007, p. 150). Dentre os avanços significativos, é preciso destacar que em muitos Municípios, por meio de suas redes de ensino, o componente Ensino Religioso faz parte da matriz curricular, sendo que alguns oportunizam profissional específico nos nove anos do Ensino Fundamental o que vem corroborar com o debate referente ao Ensino Religioso estar ou não inserido nos currículos escolares, com professor específico. Destacamos que as discussões do Ensino Religioso, enquanto área do conhecimento, estão presentes em diferentes espaços, tanto nas unidades escolares, como nas instituições formadoras. Verificamos também que houve um número maior de universidades que ofertaram/ofertam cursos de licenciatura na área, bem como o constante apoio na organização de eventos, congressos, seminários e cursos de formação continuada que buscam ter em pauta o tema Ensino Religioso na perspectiva da diversidade cultural religiosa. 390 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Semeando esperança, despertando para a responsabilidade – relato de práticas pedagógicas A Escola de Educação Básica Romildo Czepanhik, da qual relataremos a prática pedagógica, foi fundada no ano de 1985 e está situada no Bairro Veneza, na cidade de Xanxerê/Santa Catarina. Conta com aproximadamente 900 estudantes matriculados no Ensino Fundamental e Médio. A grande maioria dos estudantes reside naquele bairro, porém, há um número expressivo oriundos de bairros vizinhos e também provenientes do campo. Em comum, possuem o desejo de aprender. É significativa a diversidade nos aspectos físicos, cognitivos, econômicos, culturais, religiosos e sociais. Referente ao componente Ensino Religioso identificamos que os estudantes gostam muito da disciplina e apresentam um bom relacionamento com a professora desta área. É de se destacar que em anos anteriores, havia na unidade escolar um profissional habilitado, fato que contribui com a concepção de Ensino Religioso que os estudantes possuem. Diante disso, Krieck e Pacheco (2007, p. 295) afirmam que: não se aprende a participar teorizando sobre os processos participativos, aprende-se a participar participando. Ensina-se a participar abrindo espaços para que os educandos participem. Uma prática social participativa ensina a cidadania e amplia os limites da qualidade de vida e proporciona o exercício dos princípios definidos para o ser humano no que se pretende formar. E é nessa perspectiva que analisamos o desenvolvimento desta unidade escolar no decorrer de sua história em relação ao Ensino Religioso, pois é perceptível que os estudantes se sentem protagonistas do processo de ensino-aprendizagem atuando como integrantes e participantes nas aulas de Ensino Religioso. De acordo com o FONAPER (2009, p. 34-35), a escola é local onde se constroem conhecimentos, se socializam os saberes historicamente produzidos e acumulados pela humanidade, sendo um deles o conhecimento religioso que também precisa ser disponibilizado aos estudantes. Daí decorre a necessidade do diálogo entre todos enquanto promotores e mediadores de aprendizagens. 391 FONAPER Neste sentido, ―precisamos compartilhar uma visão de escola como ambiente que pode ser de felicidade, de satisfação, de diálogo, onde possamos de fato desejar estar‖ (ROCHA; TRINDADE, 2006, p. 55), onde saber e sabor, diálogo e silêncio, fala e escuta, ensino-aprendizagem e convivência estejam integrados num processo contínuo. Assim, no início do semestre letivo, procuramos desenvolver um projeto voltado à convivência e respeito à diversidade cultural religiosa para ser socializado em diferentes momentos que a escola proporcionasse, como eventos ou feiras interdisciplinares. O objetivo foi demonstrar à comunidade as atividades de aprendizagem desenvolvidas pelos estudantes. Primeiramente buscamos compreender/conhecer a composição das famílias dos estudantes; para isso, todos foram convidados a fazer a dobradura de uma casa, ilustrar as pessoas que compunham sua família e registrar qual tradição ou denominação religiosa seus familiares frequentavam, ou se não tinham nenhuma. Na sequência, propomos uma socialização onde todos puderam expor a sua realidade familiar. Posterior a isso, realizamos uma pesquisa na unidade escolar envolvendo todas as pessoas - estudantes, professores, orientação pedagógica, merendeiras e agentes de serviços gerais – com o objetivo de conhecer a diversidade religiosa presente na escola. Os estudantes estiveram na cozinha, nas salas de orientação pedagógica, nos corredores para realizar as entrevistas. Outra atividade proposta levou a reflexões em torno da vida enquanto presente e/ou dádiva, pois ninguém pagou para nascer e ser o que é. Simplesmente nascemos e o mundo nos acolheu, as pessoas nos cuidaram. Fomos e estamos nos constituindo enquanto sujeitos históricos, sempre nos transformando, melhorando ou não. Para chegar a esta reflexão, cada estudante registrou numa tarja de papel o que para ele significava viver; posteriormente confeccionamos um mural no qual expomos as tarjas sobre um círculo representando o sol, que significa o nascer do dia, uma nova oportunidade para viver. Dialogando sobre o sentido da vida identificamos que há em nós um desejo de ser eterno, por isso buscamos a todo o momento prolongar a vida. Assim, pensamos em práticas que podem contribuir para uma vida saudável (a alimentação, o exercício físico, etc.) evitando atitudes que 392 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso conduzem a morte – seja ela lenta ou rápida - (uso de bebidas alcoólicas, drogas, dirigir embriagado, etc.). Destacamos que em cada tarefa objetivamos dialogar e ao mesmo tempo ouvir, pois precisamos aprender ―[...] a olhar o outro com um olhar de compreensão, aceitação, respeito e interesse de aprender com este outro [...]‖ (KRIECH; PACHECO 2007, p. 299). Para isso, os estudantes foram convidados a contornar sua mão em uma folha de ofício e registrar os sonhos, desejos e perspectivas para o futuro. As atividades visaram propiciar aos estudantes o entendimento da importância do eu e o outro, do sentido da vida, da necessidade da convivência numa lógica de acolhimento, integração, responsabilidade e ajuda para com as pessoas que habitam este mundo. Neste sentido, não se pode esquecer que: o grande líder da não-violência, Mahatma Gandhi, nos deixou grande exemplo [...], pois não demorou em perceber que só nos construímos no encontro com o diferente, e que todo ser torna-se humano na medida em que se confronta e dialoga com aquilo que é desconhecido (CECCHETTI; THOMÉ, 2007, p. 141). Também no decorrer desse semestre letivo destacamos as inúmeras atividades de integração, acolhimento, conhecimento e desenvolvimento de aprendizagens envolvendo todos que fazem parte da comunidade escolar, pois ―[...] sentimos que ressurge forte em nosso intimo e na sociedade em geral um anseio de comunhão, de comunicação e de relacionamento fraterno‖ (Idem, p. 297). Percebemos assim, que diante da construção de aprendizados e aproximação das pessoas, avanços significativos foram sendo alcançados no decorrer do processo, pois, é impossível aprender e conviver sozinho; sempre precisaremos do outro, do diferente, da coletividade para podermos (sobre)viver e nos educar. Este é um dos grandes legados da pedagogia freiriana: ―Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo‖ (FREIRE, 1987, p. 68). Para concluir o trabalho desenvolvido, realizamos uma feira multidisciplinar apresentando à comunidade a perspectiva que o FONAPER propõe e defende em relação ao componente Ensino Religioso, conforme prevê o art. 33 da LDB, pois, ao mesmo tempo em que assegura o respeito à diversidade cultural religiosa no contexto escolar, (re) ensina a 393 FONAPER convivência com as diferenças enquanto processo de formação em e para a alteridade. (In)concluindo Quantos passos precisam ser dados em direção a uma educação diferenciada, capaz de possibilitar diferentes olhares, concepções, entendimentos e compreensões em torno de um ensino e uma aprendizagem que humanize o homem para a convivência com os demais. Adentrar na sala de aula, poder dialogar, interagir, ouvir e crescer em sabedoria com as pessoas que constituem aquele ambiente; tantos desejos que são possíveis quando desafiamos a nós mesmos e acreditamos que a mudança se inicia nos pequenos gestos e ações. Essas atitudes e práticas não são tarefa apenas do professores/educadores do Ensino Religioso, porque a escola enquanto espaço/ambiente/local de conhecimentos e aprendizagens deve proporcionar e exigir que cada área ou componente curricular atente para a prática da acolhida do outro, desenvolvendo processos centrados nos direitos de aprendizagem e desenvolvimento dos estudantes. Por isso, seguimos guerreiros, aprendizes, educadores porque a cada dia que passa continuamos lutando pela possibilidade de dias e mundos melhores para todos/as. Assim, juntos, diferentes, unidos... continuamos nessa caminhada entendendo que enquanto professores/educadores/amigos do Ensino Religioso uma significativa história estamos tecendo. Referências ALVES, Rubem. A Alegria de Ensinar. São Paulo: Ars Poética, 1994. BRASIL. Lei nº 9.475, de 22 julho de 1997. Dá nova redação ao art. 33 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jul.1997. ______. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. 394 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso CECCHETTI, Elcio; THOMÉ, Ione Fiorini. Ensino Religioso em Santa Catarina: memórias e desafios de um percurso em constante construção. In: CAMARGO, César Camargo; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA Lilian Blanck de. (Orgs) Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap. 11, p. 141-157). DELORS, Jacques. EDUCAÇÃO: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 6 ed, São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2001. FONAPER. ENSINO RELIGIOSO: capacitação para um novo milênio. Caderno temático nº 01 Ensino Religioso é parte integrante da formação básica do cidadão. Florianópolis, 2010. ________. ENSINO RELIGIOSO: capacitação para um novo milênio. Caderno temático nº 02 Ensino Religioso na Diversidade Cultural Religiosa do Brasil. Florianópolis, 2010. _______. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirin, 2009. FONTANIVE, Dolores Henn; DANELICZEN, Francisca Helena Cunha; KRAVICE, Mariane do Rocio Peters. Diversidade Cultural e Religiosa no Contexto Escolar: um Convite a Práticas Pedagógicas Interculturais. In: OLIVEIRA, et al (Org.). Culturas e Diversidade Religiosa na América Latina. Blumenau: Edifurb; São Leopoldo: Nova Harmonia, 2009 (Parte III, p. 286-299). FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. KUEHN, Almir. Humanização dos espaços escolares: uma experiência das escolas de Indaial. In: CAMARGO, César Camargo; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA Lilian Blanck de. (Orgs) Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap. 12, p.194-204). KRIECK, Maike Graciela; PACHECO, Maria Aparecida dos Santos. Dinâmicas de grupo: agentes de interação social no cotidiano escolar. In: CAMARGO, César Camargo; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA Lilian Blanck 395 FONAPER de. (Orgs) Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap. 13, p. 295300). MARTINS Filho, Lourival José. Tem azeite na botija? A Docência e o Componente Curricular Ensino Religioso nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Florianópolis: UDESC, 2011. OLENIK, Marilac L. R.; DALDEGAN, Viviane M. Daldegan. Encantar: uma prática pedagógica no Ensino Religioso. Vozes, 2003. POZZER, Adecir; CECCHETTI, Elcio; RISKE-KOCH, Simone. Ensino Religioso em Santa Catarina: exercícios na perspectiva de uma educação intercultural. In: OLIVEIRA, et al (Org.). Culturas e Diversidade Religiosa na América Latina. Blumenau: Edifurb; São Leopoldo: Nova Harmonia, 2009 (Parte III, p. 271-285). ROCHA, Rosa Margarida de Carvalho; TRINDADE, Azoilda Loretto da. Ensino fundamental. In: MEC, SECAD. Orientações e ações para a educação das relações étnico-culturais. Brasília: SECAD, 2006. SANTOS, Alinor dos. Os discursos do ensino religioso escolar: uma análise a partir dos dizeres dos alunos. Disponível em: <http://www.fonaper.com.br/noticia.php?id=1250>. Acesso em 20 de Ago. 2013. SILVA, Rute Patrícia da. Escola: um dos lugares/espaços para a construção da alteridade – relato de uma experiência. In: CAMARGO, César da Silva; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA, Lilian Blanck de (Orgs.). Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap.13, p.249-257). SOUZA, Ana Maria Borges, CARDOSO, Teresinha Maria. Organização Escolar. Florianópolis: UFSC/EAD/CED/CFM, 2008. VEIGA, Ilma Passos Alencastro; VIANA, Cleide Maria Quevedo Quixadá. Formação de professores: um campo de possibilidades inovadoras. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro; SILVA, Edileuza Fernandes (Orgs) A escola mudou. Que mude a formação de professores! Campinas, SP: Papirus, 2010. (cap I. p.13-34) WITT, Maria Dirlane; PONICK, Edson (Coords.) Dinâmicas para o Ensino Religioso. São Paulo: Sinodal, 2008. 396 GT3: CONCEPÇÕES METODOLÓGICAS DO ENSINO RELIGIOSO Coordenação: Me. Henri Luiz Fuchs (UNILASALLE) Dr. Remí Klein (Faculdades EST) Ementa: Toda concepção metodológica reflete um determinado entendimento de Ensino Religioso. Ao longo da história desta área de conhecimento diferentes encaminhamentos metodológicos reafirmaram suas respectivas concepções. Com a promulgação da Lei nº 9.475/1997, o Ensino Religioso visa assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa presente no Brasil. Neste sentido, este GT acolherá pesquisas e relatos de práticas pedagógicas relacionadas às concepções e encaminhamentos metodológicos do Ensino Religioso; procedimentos e processos de ensino e aprendizagem em Ensino Religioso e, seleção e uso de recursos didáticos e paradidáticos para esta área do conhecimento na diversidade cultural religiosa. Palavras-chave: Ensino Religioso; Concepções Metodológicas; Diversidade Cultural Religiosa. O FENÔMENO RELIGIOSO NO ENSINO RELIGIOSO: DESAFIOS EPISTEMOLÓGICOS PARA DOCENTES NO ENSINO FUNDAMENTAL Anderson Ferreira Costa 1 Edile Maria Fracaro Rodrigues2 Resumo: Este artigo tem a proposta de mostrar as dificuldades epistemológicas que o ensino religioso apresenta aos profissionais que se aventuram em uma área de conhecimento tão esquecida pelo poder público e desvalorizada no campo educacional. Torna-se, portanto, necessário verificarmos e analisarmos a causa de tantos problemas para podermos então refletir em que estrada percorrer rumo a valorização de uma disciplina que integra a formação humana, e não meramente capitalista e liberal no sentido do mercado. Palavras-chave: educação, ensino religioso, cultura, fenômeno religioso. Introdução O objetivo deste artigo é refletir sobre o fenômeno religioso como conhecimento a ser estudado na disciplina de ensino religioso. Este tema é necessário para a formação do cidadão, levando em consideração que a dimensão religiosa do ser humano é algo de extrema complexidade, que causa impactos significativos na sociedade brasileira e especificamente no cenário religioso paraense. Para este estudo, é necessário pensarmos os aspectos que compõem o fenômeno religioso, neste caso aspectos que causam dificuldades na implementação da disciplina na escola como por exemplo os fundamentalismos, a falta de formação dos professores, questões como doutrina, ritos, ethos e tradições religiosas que acabam sendo vistas a partir de conceituações de fé e não culturais. É exatamente essa falta de conceituação que transforma o ensino religioso em espaço de 1 2 Aluno do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Religioso — Artigo apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso — Faculdade Internacional de Curitiba – FACINTER, 2011. Professora orientadora TCC do Curso de Especialização em Metodologia do Ensino Religioso da Facinter. Mestre em Educação pela Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Curitiba (PR), Brasil e-mail: [email protected]. FONAPER proselitismo e a geografia que será observada o fenômeno, que no caso será na região de Marapanim. Como é visto o Ensino Religioso em uma Escola Municipal de Marapanim Marapanim fica a 200 quilômetros de distância da capital do estado do Pará, Belém. Tem cerca de 30 mil habitantes e pouco mais de 50 escolas contando as da zona rural e zona urbana. Existe apenas um professor formado em Ciências da Religião que ministra a disciplina, outros professores que ministram a disciplina não são formados na área e estão ministrando as aulas por questão de carência. Marapanim é conhecida por ser a terra do carimbo, ritmo musical que canta o cotidiano do pescador ribeirinho, da amazônica. Essa dança possui claras influências africanas e mistura com cultura de tradição cristã. Em um primeiro momento imaginase que, por conta de uma cultura ribeirinha diversificada, os professores residentes na região tenham um pensamento mais contemporâneo sobre o ensino religioso, entretanto, através de entrevistas esta hipótese cai por terra e vimos que a tradição cristã é preponderante à tradição religiosa africana, e que raízes culturais são esquecidas. Esse esquecimento é percebido através dos comentários acerca do ensino religioso. Sobre a escola, a atual diretora não permitiu que fosse divulgado nenhum dado sobre a instituição e sobre os professores, apenas que fosse exposto o pensamento sobre o tema em questão. Nessa pesquisa qualitativa serão apresentadas ideias e autores que vão subsidiar as reflexões para a análise de dados levantados por meio de entrevistas sobre quais os conteúdos que o ensino religioso deve conter. Para começarmos, vamos ver algumas entrevistas feitas com alguns professores sobre o ensino religioso. A entrevista foi feita com dois diretores, cinco professores. As perguntas foram: 1. Você acha o ensino religioso uma disciplina importante na escola? 2. Quais conteúdos devem ser abordados nas aulas? 3. Qual a qualificação mais adequada dos professores para esta disciplina? 4. Voce acha correto a disciplina ser facultativa ao aluno? 5. Você já ministrou a disciplina durante a sua carreira? 400 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Vamos ver as respostas: Diretora 1: 1. A disciplina é importante na escola para que os alunos possam se sensibilizar com o que está acontecendo no mundo, violência, o homem cada vez mais afastado de deus, marginalidade, drogas, tudo isso é importante ser trabalhado, e o ensino religioso é peça fundamental para se combater estes males. 2. Acredito que conteúdos referentes a deus, a todas as religiões, à paz, amor ao próximo que está tão devassado hoje em dia, e principalmente à família que está tão desestruturada. 3. Teologia ou filosofia 4. É complicado, por que o ensino religioso não é uma disciplina difícil, e por isso, de repente o aluno não passa, mas passa em matemática? Fica complicado, por isso acho melhor deixar o ensino religioso como está, que mal nenhum ele está fazendo. 5. Sim, quando era professora, ensinava pra quinta à oitava, passava conteúdos relacionados a valores, como paz, amor, família, solidariedade, meio ambiente. Nunca usei a disciplina para doutrinar meus alunos na minha crença. A diretora 1 tem 45 anos, e 20 de docência, é formada em pedagogia e a cinco anos atua como diretora. Mora na região metropolitana de Belém e tem cinco filhos, sua religião é cristã de denominação protestante (pentecostal da Assembleia de Deus) Vamos analisar agora o entrevistado 2. Diretor 2: 1. Acho sim, acredito que a violência, as drogas e a prostituição possam ser combatidas nos momentos das aulas, já que as outras disciplinas estão mais preocupadas com seus conteúdos específicos. 2. Deve ensinar sobre deus, que na verdade é um valor universal, e se fugirmos disso, estaremos fugindo da própria realidade do aluno. Pode ser o mais bandido da escola, mas se você falar de deus pra turma você percebe que ele se comporta. Por isso não 401 FONAPER há assunto mais pertinente. Se não for isso é melhor mudar de nome. 3. Teologia, né? 4. Acho que deus não deveria ser uma opção de conhecimento e sim uma obrigação, desde quando falar sobre a verdade é uma questão de escolha? 5. Sim, sim, eu levava a bíblia pra sala de aula e lá lia um trecho e explicava historicamente o que aquilo significava, os alunos adoravam e realmente prestavam atenção. O diretor 2 é católico, tem 32 anos e sete anos de docência, há dois anos atua como diretor, tem um filho e é divorciado, sua formação é em matemática. A próxima entrevistada é uma professora que atua com a disciplina na escola. Professora 1 1. A disciplina é importante, mas acho que ela deveria falar somente de deus, por que é a verdade máxima, esse negócio de falar sobre outras religiões não leva a nada, pois, não é a realidade do aluno. 2. Principalmente valores, que hoje em dia estão sendo perdidos, ética e moral. Se formos perceber, no cristianismo todos estes valores estão presentes, por isso, ensinar sobre Cristo é ensinar sobre tudo isso que é importante. 3. Eu estudei teologia, sempre foi teologia. 4. Mesmo que não fosse, a gente teria a obrigação de passar os alunos de ano por que não é uma disciplina difícil de se entender. 5. Atuo até hoje, e adoro o que faço, os alunos gostam a meu ver e nunca tive problema com a disciplina. Acredito que o que estou fazendo é um serviço para mim e para eles também, que muitas vezes não conseguem ouvir uma palavra de conforto. A professora tem 26 anos e é formada em teologia em curso de nível médio certificado pela Assembleia de Deus. É formada em nível médio pelo magistério e atua há cinco anos na docência. 402 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Professor 2 1. Eu acho que ela deveria sair da grade curricular e entrar no lugar a educação ambiental, porque a religião é algo que não pode partir da escola mas sim das igrejas, educação ambiental é algo importante, os geógrafos são muito bons em trabalhar esse assunto, mas não podemos trabalha-lo com maior dedicação por conta dos assuntos que são muitos. 2. Deveria ensinar algum assunto que fosse geral pra todos, não apenas para uma religião, como por exemplo, educação ambiental, educação para o trânsito, enfim, algo que servisse para a pessoa valorizar sua cidade. 3. Qualquer pessoa pode ensinar religião porque todos nós temos religião. 4. Tem que continuar, por que ninguém pode ser reprovado por não acreditar em determinada religião. 5. Não! O professor em questão tem 35 anos, atua a dez anos como docente, é formado em geografia pela FINOM, Faculdade do Norte de Minas Gerais, não tem filhos e nem esposa, possui uma crença independente de religiões. Professor 3 1. Acho que é importante sim; os alunos precisam ouvir mais sobre determinados valores como amor, paz e solidariedade. 2. Valores universais, pode até usar o exemplo de Jesus, é religião mesmo, como amor, paz, união, família, deve falar sobre o perigo das drogas e sobre moral e ética. 3. Teologia. 4. Acho que tanto faz, o que importa é o aluno aprender, se ele não aprender não vai mudar muita coisa na vida dele. 5. Não. O professor tem 29 anos, é docente de língua portuguesa, formado pela Universidade Vale do Acaraú, UVA, ministra aulas há 4 anos. Católico e catequista da igreja local. 403 FONAPER Professor 4 1. É sim, até mesmo porque a religião é algo do ser humano, não existe a possibilidade de não haver religião no mundo e se ela está no mundo faz parte da realidade do aluno e deve ser ensinada, não apenas uma, mas todas. 2. Deve ensinar sobre a história das religiões e sobre os valores universais como paz, amor, família, solidariedade. 3. É ciências da religião, né? 4. Não vejo problema nisso, por que o ensino religioso não é uma matéria que o aluno tem dificuldade em aprender. 5. Não. Professor de 31 anos, formado em história pela Universidade Federal do Pará e que ministra aulas há 6 anos, possui uma crença independente de religiões. Professor 5 1. É importante sim, existem muitas coisas que a escola fecha os olhos, e o ensino religioso deve abrir, como as drogas, a prostituição, a violência. Acho importante a gente falar mais de Jesus, não pra converter, mas por que ele é um símbolo de paz, amor, os ensinamentos dele tem tudo a ver com o que a gente precisa pra nossa vida. 2. A vida de Jesus interessa a todos, assim como a páscoa, o natal, a bíblia que é o livro mais lido no mundo, isso não pode passar despercebido na escola. 3. Teologia, pastores e padres. 4. Acho que deus não deveria ser opcional, deveria ser obrigatório para todos. 5. Sim. Professora de Inglês, 43 anos, casada, dois filhos, é da Assembleia de Deus e leciona há 15 anos. Todas estas entrevistas nos levam a crer o quão devassado está o conceito de ensino religioso dentro da cabeça dos próprios diretores, professores e da comunidade escolar em geral, ao menos na escola em que atuo. Podemos perceber que a maior parte dos pensamentos é de que o ensino religioso é uma espécie de disciplina transversal, que ela não possui uma epistemologia própria e nem uma referencial nacional, e 404 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso sabemos que isso não condiz com a verdade. Os parâmetros curriculares nacionais do Ensino Religioso foi formulado pelo FONAPER em 1998 após uma reunião com o Conselho Nacional de Educação que deliberou a responsabilidade do Fórum de legislar sobre o ensino religioso, e embora não tenha uma dimensão legal sobre a disciplina, o Fórum Permanente de Ensino Religioso tem sido até hoje o subsídio para milhares de professores compromissados com um Ensino Religioso sem proselitismo na escola pública e privada. Todas as respostas apresentaram desafios epistemológicos à disciplina, incorporados à prática de sala de aula e ao objeto próprio, mais importante em saber sobre o que pensam da disciplina, é encontrar maneiras de superar os erros. Estes desafios encontram-se na comunidade escolar e na formação do professor. Religião como Cultura e os problemas para o Ensino Religioso Segundo Frank Usarski (2002), religião constitui ―sistemas simbólicos com plausibilidades próprias‖, podemos pensar religião como um fenômeno universal, sem reducionismos teológicos, que é o que caracteriza a teologia. Mas para estudarmos a religião e suas ―plausibilidades‖ precisamos entender o fenômeno religioso, que é o que define a religião como uma produção simbólica universal e diversamente manifesta no mundo. Para isso, a fenomenologia da religião é de fundamental importância, pois, segundo Luiz Alves (2009, p. 49): a fenomenologia das religiões...pretende construir um sistema de análises das religiões que não perca de vista as complexidades presentes nestas. Essa tarefa foi facilitada com a criação da ciência da religião. A ciência da religião procura estudar seu objeto de forma acadêmica, científica e principalmente neutra, não a neutralidade que imaginamos que possa existir, mas uma neutralidade exposta por Usarski (2002 p. 12): Se um cientista for um ateu ou um indivíduo religioso será uma opção particular, feita na sua vida privada. Mas quando exercer sua tarefa profissional deve controlar e disciplinar as próprias preferências ideológicas o tanto quanto possível. Nunca se consegue isso totalmente. Mas isso não invalida a importância do ideal da neutralidade, da objetividade. 405 FONAPER A neutralidade também não é total em outras áreas de conhecimento, pois, as ideias, sejam políticas e religiosas do pesquisador, sempre podem influenciar, entretanto, isso não nega o fato da responsabilidade de ser o máximo possível imparcial. Para estudar o fenômeno religioso é necessário que se pense na gama de religiões que fazem parte da nossa sociedade, nos impactos de influências que elas causam nos diversos setores, políticos, de saúde pública e de sociedade em geral. Para esquematizar o estudo deste fenômeno é necessário que haja observação de determinadas tradições religiosas e que seja construído um discurso racional sobre elas para que possa ser transportado para a sala de aula com a devida linguagem. O fenômeno religioso é assim a base para uma nova epistemologia do ensino religioso, criando conceitos universais e um pensamento mais abrangente sobre as diversas religiões no mundo. As religiões criam discursos, doutrinas, rituais e criam símbolos, tudo isso faz parte do objeto da disciplina, mas para que essa nova epistemologia no ensino fundamental possa acontecer, o ensino religioso precisa passar por uma revolução, começando pela formação dos professores. A formação dos professores é um grande problema educacional brasileiro e que está longe de ser resolvido, principalmente dentro do ensino religioso que não possui uma lei nacional específica que legitime uma formação adequada para este profissional. Dentro desta nova concepção a formação adequada está dentro das licenciaturas de Ciências da Religião. Para o estudo do fenômeno religioso é necessário estudar os esquemas que compõe a religião como o mito, o rito doutrina, dogmas e a história das tradições religiosas. À luz da fenomenologia de Hurssel, pensador que ―proporcionou condições de realizar um estudo ordenado e sistemático do fenômeno‖ (OLIVEIRA, et al. 2007) o conhecimento religioso das tradições religiosas e das suas nuances faz que a religião seja vista como um fator cultural como os autores Lilian Oliveira, Sérgio Junqueira, Luiz Alves e Ernesto Keim em sua obra Ensino Religioso no Ensino Fundamental afirmam: Atualmente, considera-se como marco referencial a concepção de que o fenômeno religioso se manifesta em uma cultura. É a cultura que 406 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso marca profundamente a maneira de ser e viver do ser humano. É ela o leitmotiv de sua maneira de perceber-se, estar e agir no mundo. Sobre cultura podemos citar o antropólogo Roger Keesing (1998) que elaborou um conceito de cultura a partir de duas divisões. A primeira o autor considerava a cultura como sistema adaptativo e a segunda divisão chamada idealista que está subdividida em três aspectos, a cultura como sistema cognitivo, como sistema estrutural e como sistema simbólico. Dentre estas três abordagens o sistema estrutural tem em seu destaque o antropólogo Claude Lévi-Strauss (2003), que acredita que a cultura seja uma teia de interações e de relacionamentos, os teóricos da corrente estruturalista defendem a idéia que a sociedade na verdade possui um mesmo padrão cultural, apenas a manifestação é diferente. Sobre religião e cultura podemos dizer que uma influencia a outra como afirmam nossos autores já citados (Oliveira; Junqueira; Alves; Keim, 2007), ―a religião manifestou-se e manifesta-se em um universo cultural, ora influenciando a cultura, ora sendo influenciada por ela. É impossível, pois, querer entender a religião sem remeter-se à cultura em que ela está inserida.‖. Eis o eixo do estudo do fenômeno religioso a partir de uma formação adequada, no caso as Ciências da Religião. O estudo da cultura nos faz entender o quão importante é a interação social do ser humano na construção de religiosidades e de doutrinas, ética e na construção do sagrado. Mas o que ensinar em ensino religioso? A criação de doutrinas, crenças, dogmas rituais símbolos e o próprio ethos fazem parte do fenômeno religioso, entretanto estudar esse objeto de estudo com neutralidade é um desafio, a luz das várias áreas de conhecimento juntas em uma só. O estudo no ensino fundamental deste objeto deve ser através de uma linguagem acessível à realidade do educando. A teologia, as ciências da religião, outras áreas de conhecimento das ciências humanas estudam o fenômeno religioso. O estudo teológico deste fenômeno é um estudo das características da religião a partir de uma outra religião, isso quando não se estuda a idéia de deus, ou a própria divindade pois, existem muitas teologias, e suas diferenças são tantas quantas o numero de religiões espalhadas no mundo, por isso falar em teologia como um subsídio para o estudo de fenômeno religioso seria mais adequado em uma atividade doutrinal e não educacional. 407 FONAPER Outras áreas de conhecimento como a filosofia ou a sociologia podem estudar o fenômeno religioso, entretanto farão uma análise a partir de suas bases, ou seja, será apenas um estudo filosófico ou sociológico. Em ciências da religião, o pesquisador poderá estudar o fenômeno religioso através de uma série de visões de conhecimento, que partem deste a história até a psicologia da religião, e por isso terá uma análise maior sobre o fenômeno porque terá o discurso de várias áreas de conhecimento ao seu favor. O fenômeno religioso analisa o discurso, tanto escrito quanto oral, e reconhece a importância desses discursos como preponderantes para as tradições religiosas. Estes discursos regulamentam a vida religiosa do fiel e servem de apoio para as dificuldades da vida. Como exemplo, temos a bíblia, alcorão, tanak, a tradição oral nas religiões afro-brasileiras e religiosidade indígena dentre outras. A invenção da escrita proporcionou a latência do fenômeno religioso na antiguidade criando-se os textos sagrados. Essa latência pode ser comprovada através dos primeiros escritos, que se referia à religiosidade dos grupos. a primeira codificação foi a dos livros sagrados, que se constituem num primeiro esforço de organização da experiência de fé, para que as gerações futuras tivessem acesso a esse saber e, mais importante de tudo, para que o conhecimento fosse preservado, não se perdesse no tempo histórico e que o seu conteúdo não sofresse grandes alterações. (ALVES, 2009, p.133) Os textos sagrados vão definir as tradições religiosas como instituição, ―o texto escrito passa a ser a base dos diversos saberes que serão produzidos no interior da tradição religiosa, tais como: a doutrina, os ritos, a moral, a simbologia etc. (ALVES, 2009) Por isso, conhecer os textos sagrados das tradições religiosas é importante para o estudo do fenômeno religioso levando em consideração que muitos fenômenos desta natureza são justificados por conta da literatura sagrada. O professor deve conhecer as diferentes literaturas para basear o conhecimento de outros componentes do fenômeno como a doutrina, a transcendência e o sagrado. O que regulamenta a doutrina religiosa é o livro sagrado, mas como analisar esse aspecto do fenômeno religioso no ensino fundamental? Segundo ALVES (2009), doutrina é ―o conjunto de conhecimentos que fundamentam a tradição religiosa‖. O desenvolvimento intelectual da 408 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso humanidade caminhou junto com o desenvolvimento institucional das religiões e com a criação da escrita as interpretações destes textos gerou a criação das doutrinas religiosas que vão regulamentar as normas e regras do grupo religioso, dando nascimento a mais um fenômeno religioso, o da normatização do sagrado. A vivência religiosa fica então condicionada à doutrina religiosa. Apesar dos textos sagrados, da doutrina religiosa existe outro aspecto do fenômeno que dá vida à vivência religiosa, é o rito. ―O rito é uma linguagem em gestos, por meio do qual o homem procura expressar a sua total entrega a deus, como ser não só espiritual, mas também corporal‖ (ALVES, 2009). Os ritos são importantes para ver o invisível e entrar em contato com a divindade de determinada tradição religiosa, um contato não apenas teórico, e sim mais vívido, mais eficaz com o que a doutrina diz. Os ritos podem ser divididos de acordo com a função. Ritos repetitivos são os ―estão ligados aos mitos primordiais‖ (ALVES, 2009), procuram explicar a origem de alguma coisa, chamam-se assim por repetirem os gestos e ações em ciclos durante o ano em datas determinadas. Os ritos de passagem são os ritos que definem a situação do ser humano dentro da sociedade e sua mudança dentro da mesma através de gestos e ações simbólicas. Ainda existem os ritos religiosos que possuem a função de ligar o ser humano à divindade de determinado grupo religioso. Os ritos agrários fazem uma ponte entre a fertilidade da terra e a fertilidade humana, as tradições celtas possuem esses ritos com mais afinco, e finalmente os ritos de coroação que são os gestos, cerimônias que legitimam o poder temporal constituído a alguém. O rito depende muito de seu significado simbólico e por isso, muitas vezes há muita dramaticidade e outras vezes poucos gestos simbólicos. Algumas vezes o rito está ligado ao mito, para manter a memória de estórias passadas sempre viva no sentimento de fé dos fiéis. Não existe rito sem símbolo, este último ―é uma apresentação ritual da crença, posto que sintetiza no ritual religioso uma explicação da realidade e as regras que irão normatizar o comportamento das pessoas no grupo.‖(ALVES, 2009 pp 39) De acordo com o autor, os símbolos podem ser classificados: 409 FONAPER Emblema: É uma figura visual que representa uma ideia, um ser ou elemento moral. Ex: bandeira para pátria. Atributo: é uma imagem que representa o todo de alguma coisa, essa imagem deve ser uma parte do que se quer representar. Ex: asa para companhia aérea. Alegoria: é o figurino, ou fantasia em forma humana ou animal ou vegetal que representa heroísmo, qualidades e defeitos. Ex: a mulher alada que representa a vitória. Metáfora: é um elemento simbólico que compara dois seres ou duas situações para medir intensidade. Ex: que doce de menina. Analogia: é uma relação entre uma coisa e um fato, ou um ser e um fato ou entre dois fenômenos, como por exemplo, a cólera de deus, faz relação com a cólera do homem, uma doença devastadora, ou outro exemplo o câncer cristão, relacionando o fenômeno cristão a uma doença que mata a humanidade transformando essa tradição, portanto em uma doença. Síndrome: uma prévia do que pode ser mais perturbador ou conflitante. Ex: o movimento pentecostal cresce agora, para dominar depois. Parábola: uma estória com fundo de lição moral. Ex: o sermão da figueira de Buda. Apólogo: é uma fábula com fundo de moral com a função a passar determinado conhecimento por meio de situações imaginárias. Estes recursos em que o símbolo se divide são usados pelas religiões onde denotam diversas interpretações. Elas geram eficácia nos ritos, que consequentemente geram a eficácia da religião e sua legitimação junto ao fiél. Diante de todo este contexto que cerca o fenômeno religioso, existe a criação da ética, normas e condutas que orientam uma civilização. Segundo Alves, a ética pode ser dividida em normativa, ―que indica os princípios da conduta correta‖, e a metaética ―que norteia a fundamentação e a aplicação de conceitos como certo e errado, bem e mal‖ (ALVES, 2009, p. 67). A metaética está baseada nos pensamentos de Platão e Sócrates que pesquisaram a natureza da bondade chegando ao resultado da virtude para orientar uma boa vida. A maior parte das sociedades vêem a ética como sendo um conjunto de regras que possuem o intuito de viverem em harmonia. Dentro das comunidades religiosas a ética está atrelada ao 410 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso sentimento de sagrado e a transcendência e na maioria das vezes entra em contradição de viver em harmonia com outros grupos sociais. ALVES, (2009), comentando Usarski diz: as instituições religiosas racionalizadas, devido à sua força e influencia na sociedade, tendem a produzir um discurso ético que favoreça o equilíbrio e a estabilidade de todos... A influencia delas reside na sua força moral e política e no acúmulo das experiências de que são portadoras. Esse é o aspecto positivo da tradição. O aspecto negativo é o risco do conservadorismo que afeta a tradição, tornandoa resistente às mudanças históricas. Dentro do fenômeno religioso existe uma infinidade de códigos de conduta ética que devem ser seguidos pelos fiéis. Entre os judeus a ética prega a unidade humana; no cristianismo a ética leva em consideração a bondade e o cuidado com o mundo como criação de deus; entre os hindus a ética varia de acordo com as castas e, por isso, não existe uma igualdade natural entre os seres humanos, cada ser evolui a partir de seu próprio estado encarnatório; na religião afro-brasileira a ética se preocupa com a vivência em grupo e por isso o mais importante é a relação entre as pessoas da comunidade e sendo assim o fiel deve pensar sempre no bem da comunidade e a ele mesmo; a ética budista se baseia nas quatro nobres verdades para a construção da paz e justiça, e por fim a ética islâmica está associada ao alcorão sendo este livro a orientação ética dos fiéis para o controle dos impulsos. Dependendo das denominações religiosas entre as tradições, a ética de uma pode ser também a ética de outra, e sendo assim este fenômeno religioso acaba se tornando um trânsito entre as condutas éticas com discrepâncias doutrinais que nem sempre ajudam a promover o diálogo entre as crenças. O fenômeno religioso aborda todas as características analisadas e por isso é necessário que o professor tenha o conhecimento profundo sobre estes fenômenos e tanto outros que permeiam a religião. A complexidade deste fenômeno vai mais além da configuração religiosa, passa por setores da sociedade afetados por doutrinas, ritos, símbolos, mitos e éticas religiosas, como bem podemos observar na política e até mesmo no futebol. Entretanto, a coisa se complica quando este fenômeno atinge os limites do público e do privado. Pelo discurso forte, incentivador e esperançoso a religião acaba expandindo-se para setores públicos com a 411 FONAPER missão de crescer em numero de fiéis. Entretanto esse fenômeno é mais observado nas religiões de salvação que possuem a ideia de expansão como vitória transcendental, e o limiar para o fundamentalismo fica muito tênue. O fundamentalismo não deixa de ser um fenômeno também, provocado por interpretações da literatura sagrada, por êxtase religioso que acabam produzindo uma visão da realidade escatológica que emergência uma solução divina de imediato. Pedro Lima Vasconcelos, em sua obra Fundamentalismos (2008), faz uma análise do início deste fenômeno que também pode ser religioso dentro dos Estados Unidos no século XIX e início do século XX. Para o autor, o fundamentalismo protestante é um claro exemplo do que ele chama de militância. Essa relação de fundamentalismo com a militância se dá pela verdade absoluta e também pela dimensão escatológica como diz Vasconcelos (2008, p. 138): Esse quadro ilustra outro componente básico dos grupos fundamentalistas em geral: a densidade escatológica que conferem a seus atos e a percepção do caráter dramaticamente decisivo dos eventos presentes e do que entendem serem desvios ou corrupções da ordem estabelecida divinamente desde sempre. O fundamentalismo se faz ouvir e ver e utiliza de diversas formas para que isso aconteça travando luta política e religiosa para conseguir impor doutrinas e a própria ética, prova disso, são as bancadas evangélicas que travam batalha contra direitos de grupos considerados oposição do sistema religioso protestante. O fundamentalismo como um empecilho para tratar de questões tabus dentro da religião é também um problema para o professor em sala de aula, pois, o que fazer com alunos que não admitem conhecimentos considerados tabus. Há que se pensar a relação entre conhecimento e absorção deste conhecimento como verdade, liberdade de se questionar e aceitar, mas o importante é que se deve ter o conhecimento para que se possa criar um pensamento sobre. Negar o conhecimento a isso é negar a diversidade religiosa, entretanto, o professor deve saber como passar essas informações como não sendo verdades absolutas, mas possibilidade de reflexão e aceitação das diferenças, esse é um desafio ao professor de ensino religioso, não demonstrar doutrinação científica, mas incentivar o pensamento racional no educando como habilidade de superar 412 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso questionamentos de diferença religiosa evitando juízos de valores e discriminações. Seja na política, seja na educação o fundamentalismo é um dos grandes desafios para se ensinar sobre o fenômeno religioso. É necessário que o professor entenda sobre este fenômeno para lidar com ele em sala de aula, pois, educandos, pais e muitas vezes a própria direção da escola podem agir tal como. O problema do que ensinar sem doutrinar no ensino religioso está ligado também ao currículo. É necessário pensar no que ensinar sem causar proselitismo e abordar o fenômeno religioso em seus aspectos históricos, psicológicos, filosóficos, sociológicos, antropológicos, geográficos e fenomenológicos. Estes aspectos refletem um fenômeno religioso com bases nas ciências humanas, transformando a disciplina em uma área de conhecimento tão importante quanto qualquer outra. Apesar de analisarmos o fenômeno religioso como sendo um campo a ser estudado pelas ciências da religião, ele se difere do fenômeno científico pelo fato de ele ser bem mais subjetivo do que os fatos observáveis e mensuráveis. Assim como o fenômeno artístico, o fenômeno religioso é algo que surge intimamente nos delírios e sonhos humanos e externa-se na institucionalização religiosa, criando fatos que em essência são religiosos. O estudo de fenômeno religioso requer uma identificação própria, linguagem própria algo que o defina como diferente de outras áreas. O docente de ensino religioso deve se ater de sua própria tradição religiosa e abrir sua mente para outras tradições, aprender a observar os fatos religiosos a partir de mensurações racionais e não amadoras e confessionais, caso o contrário ele estará ensinando a sua própria doutrina para os educandos. A produção de conceitos é muito importante para se definir o fenômeno religioso como uma área própria, sobre isso Oliveira (2009, p. 91) afirma: em primeiro lugar, os conceitos fazem parte da nossa linguagem, a qual está inserida em nossa vida concreta. Nesse sentido a linguagem religiosa é contextualizada, de modo que não age com seriedade quem emprega as palavras de outras ciências no ensino religioso sem preparar os alunos e sem alertá-los para o feto de que existe uma diferença entre a compreensão das outras ciências e a compreensão do ensino religioso. É de fundamental importância compreender que diverge o sentido do verbo acontecer quando empregado em uma aula de química e em uma aula de ensino religioso. Não se trata de ir contra a ciência, mas de admitir que há diferenças entre o 413 FONAPER conhecimento empírico-científico e o conhecimento religioso, as quais podem ser evidenciadas quando há referência a linguagem religiosa. Esta pode utilizar as mesmas palavras e as mesmas estruturas gramaticais que a linguagem científica, todavia, a compreensão e a significação são completamente diferentes. Utilizar o fenômeno para conceituar características do próprio fenômeno é dar identidade e estrutura independente para o docente de ensino religioso possa abordar com mais propriedade os temas trabalhados em sala de aula. Não significa dizer que o método científico não seja usado no estudo do fenômeno religioso, na verdade ele é base para este estudo, mas difere na compreensão e significado dos resultados, sobre isso podemos interpretar o que Mondin, citado por Oliveira, nos diz (2008, p. 140): a experiência religiosa se diferencia de todas as outras experiências humanas, sobretudo pelo objeto ao qual se refere; e a diferença está essencialmente no fato de que o objeto pertence a ordem transcendente, ultraterrena. Para pesquisar é necessário fazer a investigação como se acreditasse que a experiência religiosa fosse verdadeira, é vestir a pele do fato e observá-los com olhos fieis, é sentir para descrever e analisar com a metodologia empírico-científica. Como apreciar uma canção sem deixar-se levar? Como contemplar uma pintura sem antes fixar a mente em suas cores e formas? Como esculpir sem algo a se sentir? Na religião acontece a mesma coisa, como investigar a aparição de imagens de santos sem procurar sentir a emoção de se acreditar na imagem? É necessário que o cientista da religião saiba separar sua fé, de sua investigação, ou então, o resultado de sua pesquisa não estará mais pautada no método científico, mas sim no campo teologal. Podemos resumir com o que Oliveira (2008, p. 84) preconiza: o primeiro passo para obter uma melhor compreensão do que a religião pode ser, é deixar de pensar que a crença religiosa é principalmente uma questão de sustentar que certas proposições das tradições religiosas devam ser demonstráveis e, em vez disso começar a encará-las como modo de vida. Sendo assim o conhecimento científico serve como a arma, mas a forma como se a usa é diferente quando se faz a investigação, não se corta o fenômeno com essa arma, entra-se com ela no fenômeno, ela 414 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso passa então a servir como lanterna, iluminando o fenômeno por dentro e destrinchando-se a vivência do fenômeno, sem o destruir. Existem muitos desafios no campo da disciplina que precisam ser superados, a formação dos professores, a criação de currículo baseados nas ciências da religião, o proselitismo em sala de aula do professor, a pesquisa do fenômeno religioso em um novo paradigma e a própria construção do conhecimento sobre a religião como fenômeno. Todos estes desafios podem ser superados através de uma política de valorização dos profissionais de sua formação e da tomada do governo pela disciplina, pois, e podemos dizer que isso também é um desafio, as igrejas cristãs sentem-se responsáveis pela disciplina, promovendo encontros, criando currículos e formando professores, o que é pior. Considerações Finais Não se pode culpar a disciplina, mas sim os responsáveis pela educação pública que se ausentam da responsabilidade sobre a justificativa de não intervir na formação religiosa de professores e educandos na sociedade. Eis um dos maiores desafios dentro da disciplina, deixar de ser vista como formação religiosa. O modelo das ciências da religião propõe uma formação que adeque o pensamento do cidadão para viver a diversidade religiosa e que mudanças de atitudes discriminatórias aconteçam em todas as modalidades da sociedade, o ensino religioso possui esta força de mudança, entretanto, diante de tantos desafios, é necessário que haja vontade de transformação, e que todos estes desafios sejam superados. Os problemas do ensino religioso não se resolvem com sua exclusão, mas sim com uma nova forma de pensar esta área de conhecimento, a exclusão da disciplina do currículo brasileiro significa que a educação brasileira não considera a diversidade religiosa significativa na sociedade, quando sabemos que a religião é fator determinante na política, nos temas tabus, em todas as esferas da sociedade, na exclusão de pessoas, ou em alguns casos na liberdade de expressão e de culto, na mudança de costumes de uma sociedade, na própria esperança de cidadãos que vivem na linha da pobreza (fenômeno neopentecostal da prosperidade) e que muitas vezes resultam em fundamentalismos e acaba acontecendo o inverso de paz entre os seres humanos. O ensino religioso 415 FONAPER é necessário na escola pública e laica, exatamente para aprendermos a ser laicos em determinados lugares, nos momentos certos e em outras circunstancias expressarmos nossa religiosidade sem interferir no pensamento religioso de outras pessoas. Referências USARSKI, Frank. Constituintes da Ciência da Religião. São Paulo: Paulinas, 2006. ALVES, Luiz. OLIVEIRA, Lilian; JUNQUEIRA, Sérgio; ALVES, Luiz; KEIM, Ernest. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. Curitiba: IBPEX, 2009. KEESING, Roger M. Teorias da Cultura, Revista Anual de Antropologia. São Paulo: p. 45 - 56, 16 mar 1998 (Artigo). STRAUSS. L. Claude. Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. VASCONCELOS. L. Pedro. Fundamentalismos. São Paulo:Paulinas, 2008. 416 ENSINO DO FATO RELIGIOSO: CONHECIMENTO PARA A ACEITAÇÃO DO DIFERENTE José Antonio Lages1, UMESP Resumo Esta comunicação apresenta os resultados parciais de uma pesquisa de doutorado sobre o Ensino Religioso na Escola Pública, com um estudo de caso do projeto do Paraná. Dentre os diversos modelos de ensino religioso nas escolas públicas adotados no Brasil, destacaremos aquele que se aproxima muito do que Régis Debray chamou de ―ensino do fato religioso‖. Que papel pedagógico exerce este modelo, tornando esta área de conhecimento epistemologicamente possível, necessária e até indispensável no currículo escolar? Essa parece ser a questão que deve ser enfrentada. Nossa hipótese é de que este modelo de ensino religioso assume um papel fundamental para o reconhecimento da diversidade e da afirmação do respeito para com o outro, principalmente frente ao crescimento dos mais diversos fundamentalismos, contribuindo para a aceitação do diferente, no contexto de uma educação focada na solidariedade. Palavras-chave: Ensino do fato religioso; alteridade; aceitação do diferente; solidariedade. Introdução Propomo-nos nesta comunicação apresentar os resultados parciais de uma pesquisa de doutorado sobre o ensino religioso na escola pública, com um estudo de caso do projeto do Paraná. Iniciaremos fazendo uma rápida resenha das vertentes ou modelos de ensino religioso adotados nas escolas públicas do Brasil. Esta diversidade se explica pela própria legislação, no caso a LDBEN (Lei 9394/96), que liberou aos sistemas de ensino decisões sobre questões cruciais como objetivos, conteúdos, avaliação e formação de professores. Focaremos mais aquele modelo que procura ser aconfessional e não proselitista, como transposição didática da(s) Ciência(s) da Religião para os currículos escolares, muito próximo do que Règis Debray sugeriu para a França, o ―ensino do fato religioso‖ em vez do ensino religioso. Entendendo ser esta uma possibilidade ainda bastante complexa e 1 José Antonio Lages é mestre em História pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) e doutorando em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). É membro do grupo de pesquisa Memória religiosa e vida cotidiana: interpretações historiográficas e teológico-literárias coordenado pelo Prof. Dr. Lauri Emilio Wirth. E-mail para contato: [email protected] FONAPER incipiente, no entanto, mais condizente com uma visão de Estado laico e mediador e com uma sociedade secularizada como a nossa. Veremos que este modelo poderá assumir um papel fundamental para o reconhecimento da diversidade e da afirmação do respeito para com o outro, principalmente frente ao crescimento dos mais diversos fundamentalismos. Além disso, pretendemos demonstrar que o estudo da religião nos ambientes escolares é necessário, não só porque a religião pode ser o mais despercebido instrumento de sustentação das mais diversas formas de dominação do passado, mas, principalmente, porque ela é uma referência para as resistências a diversas formas de dominação do presente. O que está em jogo é o lugar do ensino religioso no âmbito público. Qual é a utilidade dos saberes religiosos para uma sociedade secularizada? Essa parece ser a questão que deve ser enfrentada. Buscaremos como referenciais teóricos nesta discussão autores como Faustino Teixeira, Cristel Hasselmann, Danilo R. Streck, Jorg Rieger, Edgar Morin e Jung Mo Sung. A controvérsia do Estado laico e do ensino religioso na escola pública O ensino religioso na escola pública tem suscitado amplo debate em toda a sociedade brasileira, desde a Constituição de 1988, que tornou a oferta deste componente curricular obrigatória com sua matrícula facultativa, e sua regulamentação pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, Lei 9394/96 modificada posteriormente pela Lei n.º 9.475/97). Podemos sintetizar este debate que envolve organismos do Estado, mas particularmente gestores e órgãos da área de educação, confissões religiosas e setores acadêmicos, estabelecendo três grandes modelos para este debate: 1º) os que não admitem, em hipótese alguma, o ensino religioso na escola pública, escudados na defesa absoluta da laicidade do Estado; 2º) os que admitem o ensino religioso na escola pública como área de conhecimento, privilegiando a escolarização e não os interesses das confissões religiosas, como uma transposição didática da(s) Ciência(s) da Religião para os currículos escolares; 3º) os que defendem o ensino religioso confessional, utilizando as contradições da própria lei, quando a LDBEN prevê, por exemplo, o respeito à diversidade cultural e religiosa da sociedade brasileira com o veto a quaisquer formas 418 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso de proselitismo, mas, ao mesmo tempo, prevê também um órgão colegiado integrado pelas confissões religiosas que deverá estabelecer os conteúdos a serem ministrados em cada sistema de ensino. Percebe-se que não existe hoje no Brasil um consenso em torno da questão do ensino religioso nas escolas públicas. É um tema de extrema complexidade, que envolve uma série de variáveis. Mas também não há como trabalhar esta questão sem levar em conta as conquistas republicanas do Estado laico, sobretudo a liberdade religiosa, bem como o reconhecimento de uma afirmação cada vez mais decisiva da pluralidade e diversidade religiosas no país. Nestas últimas décadas, o Brasil vem passando por importantes deslocamentos no campo religioso e isso recondiciona a visão da laicidade e, por consequência, o próprio tratamento da questão do ensino religioso entre nós. O debate do ensino religioso na escola pública frente à laicidade do Estado permanece no Brasil preso a um forte viés político-jurídico. Aqueles que são contrários a qualquer forma de ensino religioso na escola pública justificam a sua posição na defesa radical do caráter laico do Estado previsto na Constituição (art. 19) e em vários de seus dispositivos relacionados à dignidade da pessoa humana (art. 1º, 3º e 4º), à igualdade de todos perante a lei (art. 5º) e ao dever da família, da sociedade e do Estado em relação às crianças e adolescentes (art. 227). A preocupação é com a liberdade de consciência, de crença e de culto. (FISCHMANN, 2008 & DINIZ, 2010). Assim, a discussão permanece no âmbito da lei e da ordem jurídica, envolvendo interesses do Estado e das confessionalidades, e não abrange a contextualização do ensino religioso na escola pública no âmbito propriamente educacional e pedagógico, dentro de um processo de escolarização voltado para os estudos de cultura e de uma formação para a cidadania. Ressalte-se que a proposta do ensino religioso como transposição didática da (s) Ciência (s) da Religião é apenas uma possibilidade colocada, que precisa de uma ampla discussão que propomos aqui apenas iniciar. Nossa hipótese é que é possível o ensino religioso na escola pública, como área de conhecimento curricular comprometido com a formação geral do educando, inclusive com a construção de valores para a sua cidadania, sem caráter confessional e sem objetivos proselitistas, com 419 FONAPER respeito à laicidade do Estado, à diversidade cultural e à pluralidade religiosa da sociedade brasileira. Admitimos que é possível o estudo das tradições religiosas, e mais que isso, o estudo do que se baseiam todas elas – ou seja a dimensão transcendental da vida humana - como um área de conhecimento configurada em um componente curricular no contexto do Estado laico. Os que se colocam contra esta alternativa partem de um conceito fechado de laicidade, entendida apenas como separação entre Estado e Igreja, sem levar em conta a construção social/histórica deste conceito refletindo as realidades próprias de cada sociedade nacional. Percebe-se que quase sempre se apegam a um conceito militante, geralmente inspirado no caso francês, que Demétrio Velasco chamou de laicidade de exclusão por substituição (In DA COSTA, 2006: 16), mas que passa atualmente por ampla revisão na própria França. Se a religião é uma das falas ausentes (ou silenciadas) no discurso acadêmico, na escola também o é, sem nunca ter sido. Sabemos que todos os envolvidos no processo docente transmitem, conscientemente ou não, ideias, valores e princípios aos educandos em todas as disciplinas. Embutidas neste imaginário encontram-se as idéias religiosas ou contra quaisquer religiões. Afinal, se a ciência não é neutra, a educação também não o é. Este debate possui algumas nuances interessantes. As duas vertentes acadêmicas que reconhecem a laicidade do Estado brasileiro e não admitem o ensino religioso confessional na escola pública não dialogam entre si e este é um dos fatores que tem aberto grande espaço para a vertente do ensino religioso confessional, como no caso dos estados do Rio de Janeiro e Bahia. Em nível de encontros, seminários, simpósios ou congressos acadêmicos, não se observam os representantes destas duas vertentes participando de mesas ou debates em defesa de suas posições. Apenas um dos lados se faz presente (o que talvez se justifique exatamente pelo pressuposto do silêncio/fala ausente da religião no âmbito acadêmico). Existe, na verdade, um diálogo de surdos. Uma vertente procede como se a outra não existisse. Não somente as palavras, como já dizia Bourdieu (2009), mas também o silêncio tem muito a dizer. De um lado, uma das vertentes, muito forte em nível das Pontifícias Universidades Católicas; de outro, acadêmicos de algumas universidades 420 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso públicas e representantes do campo jurídico. A segunda tenta justificar veladamente a posição da primeira afirmando que esta está ligada a instituições da Igreja Católica. Camuflada nesta crítica pode estar a idéia de que ―o religioso não pode estudar a religião‖ pela exigência de uma neutralidade científica. Percebe-se, nas entrelinhas, certa tentativa de colocar no mesmo barco a posição dos acadêmicos das PUCs e dos defensores do ensino confessional. Em alguns momentos em que parecem fazer certa concessão ao ensino religioso não confessional na escola pública, os contrários a ele admitem o estudo da religião dentro do sistema cultural como uma história das religiões, Mas indagamos, por que não a sociologia das religiões? A antropologia das religiões? A psicologia das religiões? Talvez se aproximando do projeto do estudo da religião na transversalidade dos conteúdos escolares, como alguns sistemas escolares encaminharam. Ou, ás vezes, imagina o ensino religioso na escola pública reduzido ao ensino da ética e da cidadania, função que deve estar presente em todas as disciplinas, sendo, portanto, desnecessária uma disciplina específica para isso, com o nome de ensino religioso. O convencimento sobre a conveniência do ensino religioso na escola pública se dá, pois, no âmbito geral de duas grandes questões. A primeira é a da laicidade do ensino que exclui os conteúdos religiosos como ameaça aos princípios fundantes do Estado Moderno. A segunda é a fundamentação epistemológica desse ensino como área de conhecimento. O convencimento sobre a primeira questão, sem levar em conta a segunda, acaba por abrir espaço para as confissões religiosas assumirem a condução do ensino religioso, uma vez que são detentoras, segundo a própria concepção dada pelo Estado, dos conhecimentos religiosos (e até a LDBEN consagra esta concepção quando passa para representantes de confissões religiosas reunidos em um conselho a responsabilidade de definição de conteúdos). Até agora todos os esforços realizados para se construir uma prática coerente dessa disciplina girou em torno da questão da confessionalidade religiosa e da laicidade do Estado. É possível hoje pensar um modelo que supere este impasse em nome da autonomia dos estudos de religião e da própria educação? O convencimento que deve ser feito é, assim, fundamentalmente de ordem epistemológica, ou seja, a demonstração do estudo da religião como área de conhecimento que pode gozar de 421 FONAPER autonomia teórica e metodológica, com todo o respeito aos sistemas laicos de ensino, sem nenhum prejuízo de suas laicidades, muito pelo contrário, a favor delas. Há de se destacar ainda a função teleológica dos saberes religiosas no âmbito escolar. Ensino religioso na escola pública para quê? Que papel ele teria no currículo escolar? Todas as disciplinas são ensinadas nas escolas com finalidades pedagógicas e possuem, portanto, crenças embutidas em seus programas. A educação não é neutra, pois tem uma função axiológica com base em princípios e valores a serem assimilados pelos educandos. A educação funda-se numa teleologia: num tipo de pessoa e de sociedade que se deve e se quer construir. Este é um objetivo de toda a educação. A composição curricular é o meio a ser percorrido para tal finalidade. É consenso que a escola deve ensinar o conhecimento acumulado pela humanidade no que diz respeito a todas as áreas da natureza, da técnica e das humanidades, incluindo as mais diversas expressões da cultura, como as linguagens, as artes. Mas não pode colocar a religião como objeto de estudo? Justamente a religião que é a matriz de todas as culturas e civilizações? Mesmo com a sua previsão legal e reconhecendo a religião como um fenômeno que, em vez de seu desaparecimento previsto pelos defensores da ―morte de Deus‖, pelo contrário, ocupa um lugar público cada vez mais reconhecido, principalmente na América Latina, África e Ásia? A questão da laicidade permanece como o pano de fundo de toda a controvérsia. Por isso, aprofundar nesta questão é essencial. Acreditamos que a discussão do Estado laico frente ao ensino religioso na escola pública é a porta de entrada do problema. E ela vem sendo feita por alguns círculos acadêmicos em torno de Sueli Carneiro e Anna Cândida da Cunha Ferraz, da USP, Débora Diniz, da UNB, Roseli Fischmann, da UMESP, Daniel Sarmento, da UERJ, Luiz Antonio Cunha, da UFF e de muitos outros. Mas quando ela avança nas críticas de certas experiências desenvolvidas em alguns sistemas estaduais de ensino, sua crítica enfoca particularmente o que há de notório e flagrante descumprimento da lei e de grave ofensa aos direitos fundamentais, no caso os estados do Rio de Janeiro e Bahia, com o seu projeto de ensino religioso confessional. Aquelas críticas passam ao largo de outras experiências como a do 422 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso FONAPER, do Paraná, de Santa Catarina e, de certa forma, do Rio Grande do Sul, com perspectivas bem diferentes. Ou se discute estas experiências, elas acabam sendo mal compreendidas e/ou mal explicitadas. Não há como desconhecer o fenômeno religioso na sociedade, os enormes deslocamentos internos deste campo, sua presença e intervenção cada vez maior no espaço público, independente de qualquer regulamentação legal. Isso interessa às ciências sociais e, de modo especial, às ciências da religião. Há de interessar também ao aprendizado escolar, inclusive das escolas públicas, não somente no sentido de informar sobre aquele fenômeno, mas de ter consciência de seu papel na sociedade, de ter opinião sobre ele, de se posicionar como cidadão crítico e consciente. O Estado laico, portanto, tem algo a dizer sobre os saberes religiosos na escola pública. Uma função teleológica para o ensino do fato religioso: uma proposta em construção No início da segunda parte deste trabalho, podemos lembrar aqui uma discussão muito comum nos meios acadêmicos em torno do estudo das religiões. Trata-se da proposta de alguns estudiosos da necessidade de certo ―ateísmo metodológico‖ para se garantir a neutralidade do estudo da religião do ponto de vista científico, em paralelo com o argumento de que a religião deve estar ausente da escola pública, pois, também pelas mesmas razões, a religião não caberia num ambiente de estudo das diversas ciências. Diante do ―horror do invisível‖, esse procedimento metodológico acaba justificando não uma perspectiva de neutralidade objetiva, mas de ―militância antirreligiosa‖. Não é preciso lembrar que esta visão pode ser encontrada não apenas nos meios acadêmicos, mas em vários outros segmentos da sociedade. Em alguns partidos de esquerda ou em tendências deles, em alguns movimentos sociais e sindicatos, podemos encontrar uma postura flagrantemente impermeável a qualquer crença religiosa e principalmente à sua presença no âmbito público, como nas escolas. Talvez seja um resquício de uma tradição marxista ortodoxa escudada no entendimento tradicional da religião como ―ópio do povo‖. Mas o interessante que em vários âmbitos políticos e acadêmicos reconhecidamente distantes da questão religiosa, seja pela sua postura 423 FONAPER filosoficamente ateia e/ou agnóstica, seja pela sua clara origem ideológica marxista, começa-se a esboçar outra visão sobre o ensino religioso na escola pública. Régis Debray, por exemplo, nos traz uma posição bastante surpreendente, vinda de quem vem. Interessante relatório seu, de 2002, propôs o ensino ―do fato religioso‖ ou ―do religioso‖ (l‘enseignement du religieux) em vez do ensino religioso na escola pública francesa, buscando uma aproximação ―descritiva, factual e nocional‖ das religiões em sua pluralidade, sem privilégios e exclusividades. A preocupação de Debray, ao fazer esta proposta, era com a ―incultura religiosa‖ dos estudantes das escolas públicas de seu país, decorrente principalmente da ruptura das identidades religiosas herdadas o que dificulta, para ele, a formação geral dos estudantes.2 Sua proposta se aproxima do projeto do sistema estadual de ensino do estado de São Paulo que nunca foi plenamente executado. O seu encaminhamento não se daria através de uma disciplina específica, mas através da ampliação do âmbito das disciplinas já existentes como Filosofia, História, Geografia e Línguas. Os professores receberiam uma preparação específica para ampliar a sua competência no manejo dos assuntos relacionados à religião. Não há nesta proposta nenhuma ruptura com a laicidade do Estado, na visão de Faustino Teixeira: A inserção do estudo ‗do religioso‘ não significaria romper com a tradição da laicidade francesa, mas passar de ‗uma laicidade de incompetência‘ (o religioso, por construção, não nos interessa) a uma ‗laicidade de inteligência‘ é nosso dever compreendê-lo. (In SENA, 2007: 72-73). Faustino Teixeira defende a possibilidade do acesso à reflexão apropriada sobre o religioso na escola pública, levando-se em conta a importância do fator religião na sociedade brasileira e de sua relevância para a compreensão da nossa própria cultura. Segundo ele, ―as ciências da religião constituem um canal importante para possibilitar este exercício 2 Sempre existiram crises de transmissão que hoje assumem, no entanto, uma mudança profunda de natureza. Hoje elas são lacunas que representam verdadeiras rupturas culturais que atingem a identidade social, a relação com o mundo e a capacidade de comunicação dos indivíduos. Observa-se um remanejamento global das referências coletivas, rupturas da memória (as sociedades atuais são cada vez menos sociedades de memória e cada vez mais sociedades do imediatez), reorganização de valores que questionam os próprios fundamentos dos laços sociais. E a religião, por mais que não seja percebida, está no centro de todo este processo que é social, religioso, mas, sobretudo, existencial. 424 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso reflexivo: de aperfeiçoamento da compreensão do religioso como ‗objeto de cultura‘, ou fenômeno de cultura‖. (In SENA, 2007: 73) As tradições religiosas são portadoras de um ―rico patrimônio espiritual‖ que para Teixeira justificam o seu estudo no âmbito escolar como área de conhecimento, mas, além disso, também um exercício de maior aproximação existencial, um contato mais estreito com elas. Teixeira avança ainda mais na concepção do ensino ―do religioso‖ em relação a Régis Debray, afirmando: E para isso, faz-se necessário também o aperfeiçoamento do ‗tato religioso‘, que favorece a superação de uma certa mentalidade que resiste em adentrar-se em esferas particulares da experiência humana, limitando-se a reduzir o engajamento vivido pelo outro a uma mera ‗rapsódia de observações exteriores e frias‘. Não há como compreender o contexto histórico das religiões, desconectando-o da ‗espiritualidade‘ que o anima. (In SENA, 2007: 75). Para Cristel Hasselmann (2006), diferentemente da teologia, a ciência da religião trabalha de maneira meta-confessional e independente. Isso significa que ela não toma partido a favor de uma determinada religião, e suas reivindicações de verdade e suas pretensões soteriológicas, nem de um conjunto delas que tenha a mesma matriz, numa visão ecumênica. Seu objetivo é o entendimento de uma religião abordada, mas não o consentimento com ela, o que seria um objetivo teológico. Também é insignificante a convicção pessoal de um cientista da religião sobre a existência ou não de Deus ou dos deuses. Pode-se compará-lo com um tradutor simultâneo ou um guia turístico, com a diferença de que ele desempenha o papel de um mediador entre diferentes religiões. Por tudo isso, o docente devidamente preparado para o ensino religioso, na visão de Hasselmann (2006), deve ser o cientista da religião, e não o teólogo. Danilo R. Streck3 defende a escolarização do conhecimento do fenômeno religioso como instrumento fundamental para o reconhecimento da diversidade e de afirmação do respeito para com o outro. Este respeito 3 Danilo R. Streck é doutor em Fundamentos Filosóficos da Educação pela The State University of New Jersey, Estados Unidos (1977) e professor titular da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo (RS), Brasil. Streck defende uma modalidade de Ensino Religioso na escola pública que não é propriamente a que nós defendemos, mas que tem uma larga tradição em alguns círculos ecumênicos, principalmente no Rio Grande do Sul e que constitui hoje uma das referências principais nos encontros acadêmicos sobre o tema. 425 FONAPER seria mais que tolerância, seria, na verdade, a aceitação do diferente, o conhecimento para a convivência, numa profunda relação de alteridade ―na esperança de contribuir para uma educação que ajude as pessoas a sentirem o mundo como sua casa (oikos) comum, em constante processo de construção para que todos e todas nela tenham lugar.‖ (STRECK, 1998: 39). Streck (1998) aponta a necessidade do ensino religioso na escola pública na formação de crianças e adolescentes, em particular para fazer frente ao crescimento dos mais diversos fundamentalismos4, inclusive religiosos. Teixeira acrescenta ainda que ele é também necessário para o ―aperfeiçoamento do olhar e da escuta do mundo e da alteridade e o respeito à sua dignidade, a percepção da riqueza e do valor de um mundo plural e diversificado e a recuperação da força espiritual das religiões.‖ (In SENA, 2007: 75-76). Alguns pensadores que se incluem nos Subaltern Studies Groups nos oferecem aportes interessantes nesta discussão. Jorg Rieger5 (2008), por exemplo, afirma que o estudo da religião é fundamental, não só porque ela foi a primeira sustentação das mais diversas formas de dominação econômica, social, cultural e política do colonialismo moderno, mas também porque ela é uma referência para as resistências locais a estas e a outras formas de dominação contemporâneas relacionadas a questões de raça, gênero, opções sexuais, religiosas, etc. Assim, não há como se pensar em um projeto político-pedagógico sem considerar o imaginário religioso de todos os envolvidos com o projeto pedagógico da escola pública. Sabemos que todos os impérios coloniais modernos foram justificados religiosamente. Por este motivo o estudo crítico da religião é crucial para investigações pós-coloniais. Rieger (2008) afirma que Walter 4 5 Existem fortes correlações existentes entre a ―volta do diabo‖ promovida por alguns grupos fundamentalistas e as diversas modalidades de demonização do outro através das quais se expressa em outras formas, não mais racionais, mas socialmente mais perigosas, o sentimento de não se ter nenhuma responsabilidade pessoal no mundo como ele é, nenhuma capacidade de agir sobre o seu futuro (a culpa é do diabo...). Jorg Rieger é professor de Teologia na Perkins School of Theology (SMU). Ele aborda geralmente em seu trabalho a relação entre política, a economia e a nossa atual crise de uma perspectiva bíblica e teológica. Por mais de duas décadas Jorg Rieger se esforça para reunir a teologia e as lutas por justiça e libertação que marcam nossa época. Seu trabalho enfatiza a importância da teologia para a vida pública, utilizando ferramentas de estudos culturais, teoria crítica, e estudos religiosos, e refletindo sobre o abuso de poder em política e economia. 426 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Mignolo foi muito feliz quando apontou que o cristianismo se tornou o primeiro desenho global do sistema mundial moderno/colonial, depois da bem-sucedida expulsão dos judeus e árabes da Espanha e da conquista das Américas. Para Rieger: Como tal, o cristianismo tornou-se uma base ideológica importante sobre a qual as estruturas coloniais de poder podiam ser construídas Uma religião que identificou Deus que está ao lado dos poderes coloniais, sejam eles os monarcas da Espanha e de Portugal, sejam os corpos governantes mais amplamente constituídos, sejam as tentativas dos Estados Unidos de ―civilizar‖ a América Latina póscolonial, deixou marcas para valer. Neste contexto, deixar de considerar o elemento religioso seria fechar os olhos para um dos motores do colonialismo. (RIEGER, 2008: 96). Sabemos que desconsiderar o religioso leva a perder não somente a oportunidade de retrabalhar uma parte importante da história colonial e pós-colonial. E mais: nos leva a perder também um elemento importante da resistência que continua em tempos pós-coloniais e chega até à contemporaneidade. Em muitos casos, os saberes religiosos e a intimidade com eles fornecem sementes de tal resistência. Muitas pessoas nas margens de nosso atual império levantam questões religiosas e são motivadas por elas – um fato que em algum grau é reconhecido também nos Subaltern Studies Groups. Em muitos lugares comunidades de fé têm se envolvido em resistir a estruturas coloniais, conduzindo as suas vidas de modo alternativo. Rieger conclui que ―enquanto a história do colonialismo olha o cristianismo mais de perto, a história da resistência exige um horizonte religioso muito mais amplo, que inclui interesse por outras religiões e diálogo inter-religioso‖. (RIEGER, 2008: 101). Assim, também numa perspectiva de formação para a tomada de uma consciência e de uma atitude que Rieger chama de pós-colonial, o ensino ―do fato religioso‖ na escola pública tem um papel a cumprir. Um papel de preparar os alunos, a partir do estudo da(s) religião(ões), para uma vida de resistência frente a toda onda de formas desumanizadoras da vida, típicas da civilização pós-moderna em que vivemos. Sabemos que aceitar o diferente não é apenas tolerá-lo. Mas sabemos também que aceitar o diferente vai muito além de uma postura neutra e indiferente. Ela exige uma profunda relação de alteridade que nos leva a tomar a posição ativa de solidariedade. Resta saber, na linha de 427 FONAPER raciocínio que adotamos até aqui, se estudar os saberes religiosos na escola contribui para uma formação para a solidariedade? Acreditamos que sim. Resistir às estruturas de dominação neocoloniais é uma postura que exigirá um compromisso de solidariedade com os dominados ou excluídos. Já ouvimos falar muito que a escola deve preparar para a vida. Entendemos que preparar para a vida signifique encontrar um sentido último para ela. A educação escolar deve se pautar pela busca deste sentido e isto supõe o discernimento entre os muitos mitos que povoam a sociedade contemporânea, alguns que nos levam a uma postura de vida humanizadora e solidária, outros, de vida desumanizadora e egoísta. Este sentido último para a vida não pode prescindir da solidariedade como um imperativo ético, como um valor, um movimento de ir ao encontro do outro, reconhecendo-se no outro sua própria dignidade humana numa profunda relação de alteridade. Solidariedade com o próximo e com os excluídos e vítimas da lógica sacrificial da idolatria do mercado (GIRARD, 1990). A educação para a solidariedade seria o caminho para ―reencantar a vida, ou seja, dar-lhe um sentido último, alcançar aquela situação em que se conclui que a vida vale a pena de ser vivida‖ (SUNG, 2002), independentemente de qualquer crença religiosa. No contexto do projeto político-pedagógico da escola, todas as disciplinas estão comprometidas com este objetivo. No entanto, os saberes religiosos ocupam uma posição de excelência. A experiência religiosa faz parte do acontecimento humano, com os fatos e os sinais que a expressam e por isso tem grande importância para o conhecimento teórico e para a tomada de uma posição diante da vida. Por isso, ela tem uma grande contribuição a dar para uma educação para a solidariedade, na busca de um sentido último para a vida. Educar para a solidariedade é uma tarefa e um objetivo de todas as disciplinas escolares, mas, uma tarefa tão especial como esta, precisa de uma disciplina específica que sistematize as contribuições feitas por outras e desenvolva temas e experiências que precisam de uma atenção especial. Morin, falando da necessidade de uma ciência antropossocial religada, que concebesse a humanidade em sua unidade antropológica e em suas dimensões individuais e culturais, reconhece que essa religação ainda está fora do alcance das ciências e que por isso é importante que o ensino de cada uma delas fosse orientada para a condição 428 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso humana. Isso inclui as ciências naturais, pois a condição humana é, ao mesmo tempo, físico-químico-biológico-antropológico-socialsimbólica. (SUNG, 2006: 41-42). Edgar Morin (2000) afirma que os saberes sobre os mitos e as religiões seriam orientados para o destino mítico-religioso do ser humano. De fato, as religiões, mitos e ideologias devem ser considerados em sua ascendência sobre as mentes humanas, e não mais como ‗superestruturas‘. Morin (2000) chama essa disciplina ou ciência de noologia e afirma que ela está ainda por ser construída. Mas, diríamos nós, os trabalhos dessa área, que já existem, pelo menos no campo dos saberes religiosos, precisam ser mais conhecidos e desenvolvidos. De qualquer forma, uma nova ciência não submetida à totalitária racionalidade ocidental. O estudo escolar dos saberes religiosos pode desde já resgatar o encanto por um sentido último da vida como quer Jung (2006). Para isso, aquele discernimento dos mitos que povoam o nosso tempo há de passar necessariamente pela dessacralização do mercado e pela crítica à idolatria sacrificial do capitalismo. Esta será a porta de entrada para se posicionar a favor de uma sociedade mais humana e solidária. Assim também será possível reconhecer-se o papel do estudo das religiões no âmbito escolar em uma sociedade marcada pela diversidade cultural, pluralidade religiosa e receptiva à laicidade do Estado. Considerações finais Duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADINs) sobre o ensino religioso na escola pública estão para ser julgadas pelo Supremo Tribunal Federal: a de nº 4439, focada na questão do Acordo Brasil-Vaticano, já aprovado pelo Congresso (o que tem força constitucional) e a de nº 3268 sobre o ensino religioso confessional instituído nas escolas públicas do estado do Rio de Janeiro. Vê-se, então, que se trata de uma questão política relevante e que traz várias outras implicações para a sociedade brasileira. Mas a questão fundamental é: há necessidade de uma disciplina tradicionalmente chamada de ensino religioso na escola pública? Este trabalho pretendeu, na verdade, iniciar uma discussão que busque dar uma resposta, ainda que parcial e provisória, a esta questão. Entendemos 429 FONAPER que um projeto de ensino religioso que busque realizar a leitura pedagógica da(s) Ciência(s) da Religião para a escola pública, como pretende o Sistema Estadual de Ensino do Paraná, poderá ter grande relevância para a educação. Ao finalizar este trabalho, podemos ressaltar algumas preocupações e alguns questionamentos que permanecem e nos obrigam a colocar esta modalidade de ensino religioso na escola pública na agenda da sociedade. O ensino religioso, como foi aqui colocado, contribui ou não para a formação do ser humano por inteiro? Sabemos que a religiosidade faz parte intrínseca da humanidade e que a educação parte do humano como razão fundante, se insere permanentemente em suas estratégias e a ele se destina em todos os seus objetivos. Por isso, há necessidade de tornar mais clara a relação entre a educação e as religiões e indagar que papel poderá exercer o ensino do religioso na formação dos educandos ao lado das demais disciplinas da escola. Esta disciplina na escola pública contribui ou não para a convivência social? Sabemos que a escola prepara a pessoa para o convívio social e a cidadania que a escola busca formar inclui informações teóricometodológicas, sensibilização artística, formação política e preparação para a vida em sociedade. O ensino religioso poderá contribuir com a formação da cidadania nesses diversos aspectos? As tradições religiosas são portadoras de éticas que orientam e disciplinam a vida de seus adeptos na convivência interna do grupo e na vida social. Então, podemos também perguntar: o ensino religioso poderá contribuir na explicitação de consensos éticos a partir das tradições religiosas? No dizer de Paulo Freire, a leitura de textos e a leitura da realidade devem ser simultâneas para que, de fato, formem o cidadão crítico e autônomo. Assim como se educam os olhares racionais, estéticos e éticos nas diversas disciplinas, o olhar simbólico sobre a realidade pode receber também receber um aporte do ensino religioso? E por fim, o ensino religioso pode ter algum papel na integração do conhecimento, já que os estudos atuais de epistemologia têm ressaltado a fragmentação das ciências em suas diversas áreas, de forma a perder a sua visão de conjunto? Os currículos escolares refletem também esta fragmentação. A construção de currículos interdisciplinares é desejável, mas ainda está longe de ser alcançada. O ensino religioso tem condições 430 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso de contribuir com a necessária integração dos conhecimentos pela sua natureza e objetivos? Ele tem condições de contribuir para a superação desta fragmentação do conhecimento, da desumanização da ciência e da construção de uma ética para todos os campos de conhecimento? Todos estes pontos sobre o ensino religioso são pautas da educação geral do cidadão. A educação laica para a cidadania não pode ignorar as religiões, pela sua forte presença e função social. É preciso decodificar criticamente as representações e práticas religiosas em nome da convivência sempre mais construtiva entre as pessoas e grupos, educar para a convivência social das diversidades confessionais, assim como tirar das tradições religiosas valores que contribuam com a vida humana na sua subsistência e convivência. Referências BOURDIEU, Pierre. A Economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2009. DEBRAY, Régis. L'enseignement du fait religieux dans l'école laïque. Paris: Odile Jacob, 2002. DINIZ, Débora, LIONÇO, Tatiana & CARRIÃO, Vanessa. Laicidade e ensino religioso no Brasil. Brasília: UNESCO, LetrasLivres e EdUnb, 2010. FISCHMANN, Roseli (org.). Ensino Religioso em Escolas Públicas. São Paulo: Factash Editora, 2008. GIRARD, René. A violência e o sagrado. São Paulo: Paz e Terra-UNESP, 1990. HASSELMANN, Cristel. Das nierdersachsische Unterrichsfach ―Werte und Normen‖; Zwichen Ideal und Wirklichkeit. Disponível em HTTP://fachverband-werte-und-normen.de/referate/unterrichtsfach.html acessado em 01.06.2006. MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. 431 FONAPER RIEGER, J. Libertando o discurso sobre Deus. Estudos de Religião (UMESP), Ano XXII, jan/jul 2008, n. 34, pp. 84-104. STRECK, D. R. Uma Educação Ecumênica: oito proposições sobre um tema controvertido. Estudos de Religião (UMESP), Ano XII, julho/1998, n. 14, pp. 35-48. SUNG, Jung Mo. Educar para reencantar a vida. Petrópolis: Vozes, 2006. ______. Conhecimento e Solidariedade. São Paulo: Salesiana, 2002. TEIXEIRA, Faustino (org.). A(s) Ciência(s) da Religião no Brasil: afirmação de uma área acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2001. ______. Ciências da Religião e ―ensino do religioso‖. In SENA, Luzia (org.). Ensino Religioso e Formação docente: ciência da religião e ensino religioso em diálogo. São Paulo: Paulinas, 2006, páginas 63-77. VELASCO, Demétrio. La construción histórico-ideológica de La laicidad. In DA COSTA, Néstor (org.) Laicidad en America Latina y Europa: repensando o religioso entre lo público y lo privado en el siglo XXI. Montevidéo: CLAEH/PUERTAS, 2006. 432 POR UM ENSINO RELIGIOSO NÃO RELIGIOSO: DESAFIOS NO CONTEXTO ESCOLAR Daniela Crusaro (UNOESC)1 Josiane Crusaro (ASPERSC)2 Lindamir Teresinha Bianchi Crusaro (UNIGRAN)3 Resumo: Ensino Religioso: área do conhecimento, que visa assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa brasileira pautando-se no estudo do Fenômeno Religioso e vedando-se quaisquer formas de proselitismo (Cf. art. 33 LDB/1996). Diante dessa nova proposta vislumbramos inúmeros avanços significativos que foram tecidos/elaborados para a identidade do componente Ensino Religioso, mas, ao mesmo tempo, identificamos que diante da insuficiência de profissionais habilitados para atuar no espaço escolar bem como o imaginário de que Ensino Religioso é aula de religião e/ou valores humanos, muito se tem a fazer no contexto atual para que as crianças brasileiras tenham a garantia de um Ensino Religioso não religioso. Por isso, nos dispomos a relatar a prática pedagógica utilizada nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental em uma escola municipal de Faxinal dos Guedes/Santa Catarina, em que as aulas de Ensino Religioso buscam propiciar a partir de diálogos, interações e mediações, a compreensão sobre a pluralidade cultural religiosa existente e importância das práticas alteritárias para a (con)vivência entre e na diversidade. Palavras-chave: Ensino Religioso; prática pedagógica; diversidade religiosa. Desafios para a garantia da aprendizagem O professor enquanto educador e mediador do processo ensinoaprendizagem é sujeito que precisa constantemente estudar, ler, escrever/registrar, aperfeiçoar-se, participar de encontros e eventos que dialoguem sobre a práxis pedagógica e desafios atuais para a garantia de 1 2 3 Acadêmica do Curso de Direito da Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC Xanxerê. E-mail: [email protected]. Graduação no Curso Ciências da Religião - licenciatura em Ensino Religioso pela Unochapecó (2012) e História pela Unoesc - Xanxerê. Professora de Ensino Religioso da Rede Pública Estadual de Santa Catarina e Vice-secretária da Associação dos Professores de Ensino Religioso do Estado de Santa Catarina – ASPERSC, Gestão 2011/2013. E-mail: [email protected]. Acadêmica do Curso de Pedagogia - UNIGRAN. Professora do Ensino Fundamental/Séries Iniciais da Rede Municipal de Ensino de Faxinal dos Guedes/SC. Email: [email protected]. FONAPER uma educação com qualidade. Destacamos que é importante compreender e entender que, nos dias atuais, o trabalho do professor não consiste simplesmente em transmitir informações ou conhecimentos, mas em apresentá-los sob a forma de problemas a resolver, situando-os num contexto e colocando-os em perspectiva de modo que o aluno possa estabelecer a ligação entre a sua solução e outras interrogações mais abrangentes (DELORS: 2001, p.150). Sabemos que vislumbrando os espaços escolares, identificaremos inúmeras tendências e teorias pedagógicas, porém entendemos que práticas permeadas pelo autoritarismo e submissão não propiciam/ favorecem o contato, o diálogo, as socializações entre os estudantes e professores, por isso, a necessidade/urgência do professor educador, utilizando da autonomia e das interações sociais no processo pedagógico. Perrenoud (1999, p. 82), destaca que: a maioria dos docentes foi formada por uma escola centrada nos conhecimentos e sente-se a vontade nesse modelo. Sua cultura e sua relação com o saber foram forjadas dessa maneira, e eles aproveitaram tal sistema, pois seguiram uma longa escolaridade e foram aprovados nos exames com sucesso. Conforme a pedagoga e psicopedagoga Barbosa (2013, on-line) ―a solução, com certeza, não é voltar à palmatória, ao uso dos grilhões, nem mesmo das varas; precisamos pensar sobre esse aspecto da questão em todas as instâncias da sociedade, e também na escola‖ de maneira que a mesma venha ser espaço de aprendizagens, mas também de acolhida, vivência e respeito para e com o outro. Por isso, ressaltamos que o atual e futuro educador precisam de competências e habilidades que desmistifiquem a prática do domínio e submissão de corpos, favorecendo a integração de todos os estudantes, não importando sua bagagem de aprendizados, mas entendendo que somos seres em construção, sempre abertos para o novo/desconhecido. Diante dessa perspectiva, em que o professor educador é democrático e permite a comunicação, a escuta e o diálogo entre sujeitos como fonte de aprendizados - Weffort (1997) destaca que o ambiente escolar, assim, se tornará favorável e propício à aprendizagem, demonstrando e corroborando sua importância enquanto espaço social. Defendendo essa ideia de educador mediador, Delors contribui ao afirmar: 434 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso a grande força dos professores reside no exemplo que dão, manifestando sua curiosidade e sua abertura de espírito, e mostrandose prontos a sujeitar as suas hipóteses à prova dos fatos e até reconhecer os próprios erros (2001, p. 150). Por sua vez, o autor e educador Rubem Alves (1994, p. 12) nos faz refletir sobre a vitalidade da educação e (re)lembra que, infelizmente, a mesma ―[...] fascinada pelo conhecimento do mundo, esqueceu-se de que sua vocação é despertar o potencial único que jaz adormecido em cada estudante‖, estando o educador incumbido de resgatar e proporcionar o prazer pelo aprender. Alves segue ainda relatando que ―o prazer é uma experiência qualitativa. Não pode ser medido. Não há receitas para suas repetições. Cada vez é única, irrepetível‖, no processo ensino-aprendizagem; daí o desafio constante de aproximar saber e sabor, aprendizagem e encantamento, conhecimento e alegria (1999, p. 125). E diante desse olhar, não podemos esquecer que embora cada professor educador contribua na autonomia, aprendizagem e criticidade do sujeito estudante, a escola precisa, urgentemente, ser ambiente/local: [...] de felicidade, de satisfação, de diálogo, onde possamos de fato desejar estar. Um lugar de conflitos, sim, mas tratados como contradições, fluxos e refluxos. Lugar de movimento, aprendizagem, trocas, de vida, de axé (energia vital) (ROCHA; TRINDADE: 2006, p. 55). Para os gregos o termo escola foi concebido como local/espaço de conhecimentos, de aventura, de liberdade para a construção de aprendizagens e saberes. No contexto atual pensar nesse viés, requer (re)pensar em estratégias e metodologias que propiciem e favoreçam a inserção, e ao mesmo tempo, a permanência dos estudantes na escola, para que ambos também atuem como protagonistas no processo ensinoaprendizagem. Por isso, enfatizamos aqui a tendência pedagógica crítico-social que ―entende a escola como mediação entre o individual e o social [...]‖ numa perspectiva de assimilação e mediação dos conteúdos, onde o ser mais experiente auxilia o menos experiente e o educador utiliza do diálogo na relação com o estudante (FERNANDES: 2012, p. 20). De acordo com Silva (2009, p. 249), 435 FONAPER há muitos espaços e lugares, para a construção da dignidade em nossa sociedade, porém, muitos deles não são aproveitados, ou simplesmente ignorados como espaços ou lugares que promovem e veiculam dignidade ao ser humano. E as unidades escolares enquanto instituições/locais/ambientes de aprendizagens, saberes e (con)vivência, podem/devem favorecer esse encontro, pois são consideradas um ―[...] um fértil espaço para criar relações de abertura e convívio respeitoso‖ (WITT; PONICK: 2008, p. 9). Para o autor e pedagogo Martins Filho, faz-se vital também: [...] pensar em um currículo para a diversidade que dialogue com os vários campos disciplinares do conhecimento [...] em um sentido, de expressar e ser promotor dos direitos sociais humanos [...] (2011, p. 78-79). Diante disso, podemos expressar o desejo da escola trabalhar na perspectiva da inter/trans/multidisciplinaridade elaborando e construindo conhecimentos, tornando a prática pedagógica significativa, favorecendo o convívio e a aprendizagem entre estudantes e educadores, tornando-os sujeitos protagonistas, autônomos e críticos do espaço que habitam. Para as autoras Veiga e Viana (2010, p.32), a partir desse enfoque, o professor educador precisa preparar seus estudantes para enfrentar as contradições sociais da conjuntura atual, [...] por meio de práticas inovadoras e atraentes, [...] que ofereça e provoque no aluno o desejo de adquirir e construir o conhecimento para responder aos desafios da sociedade. É preciso querer/desejar estar na escola, daí a necessidade da mesma estar promovendo uma dinâmica de aprendizados e saberes, proporcionando a acolhida às diversidades e ―[...] o entrelaçamento das relações afetivas entre os atores [...]‖ que compõe tal ambiente (SOUZA; CARDOSO: 2008, p. 94). Por fim, reafirmamos que ―[...] a educação tem como objetivo a formação de um cidadão‖, sujeito pleno para o exercício da cidadania, mas também para o convívio social, bem como sensibilidade e responsabilidade para as práticas alteritárias, (re)inventando o espaço que habita, tornandoo ambiente de coexistência (REYES: 2009, p. 235). 436 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Ensino Religioso no cenário educacional: percursos para a garantia da diversidade religiosa Pensar o Ensino Religioso enquanto área do conhecimento da educação básica (Cf. Resolução 04/2010 da CNE/CEB) desde o limiar da história brasileira, propõe refletir as diferentes concepções e entendimentos que o mesmo recebeu no processo e contexto educacional. De acordo com Bortoleto e Meneghetti (2010, p. 66), quando a temática do ER é abordada no conjunto de ações escolares formais, há uma questão de fundo que está presente e que merece atenção especial. Trata-se da distinção entre Ensino Religioso e Catequese, isto é, trata-se de considerar as naturezas distintas de um mesmo problema. No Brasil, destacamos que o regime do Padroado (união entre Igreja e Estado), que perdurou até 1889, definia a religião católica como oficial, por isso desde a vinda dos padres jesuítas se educava de acordo com os princípios cristãos, promovendo práticas de catequização e utilizando-se do proselitismo. Assim, ressaltamos que [...] o ensino religioso traz profundas marcas, por conta de um imaginário formado durante quase cinco séculos e sustentado pelas relações de poder e de saber das partes interessadas (CNBB: 2007, p. 26). Na educação, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº 4024/61) enfatizava o termo Ensino Religioso, porém, a prática pedagógica estava voltada ao caráter doutrinário, ao ensino da tradição católica romana, ou seja, ao ensino da religião (FONAPER: 2000, Caderno 1). A partir de 1970, com a nova LDBEN nº 5692/71, um novo direcionamento foi concebido ao componente, substituindo-se o enfoque catequético para o caráter ecumênico vivenciado as mudanças sociais e políticas no período (CECCHETTI; THOMÉ: 2007). Mas, avanços significativos - que proporcionassem novas lentes e olhares para com o Ensino Religioso - ocorreriam somente a partir do final do século XX através da LDBEN nº 9394/96 – com alteração do artigo 33 pela Lei nº 9475/97 que trouxe uma compreensão diferente acerca do componente e seu objeto de estudo. Os autores Bortoleto e Meneghetti (2010, p.71) destacam que ―[...] a Lei nº 9475/97, em seu art. 33 da LDBEN nº 9394/96, corrigindo um 437 FONAPER equívoco de compreensão dos termos confessional e interconfessional‖, foi de suma importância, pois proporcionou assegurar o respeito à diversidade cultural religiosa e vedar quaisquer formas de proselitismo. Pozzer, Cecchetti e Riske-Koch vêm a confirmar que diante desse novo enfoque, ―[...] criaram-se oportunidades de sistematizar o Ensino Religioso como disciplina escolar que não seja doutrinação religiosa nem se confunda com o ensino de uma ou mais religiões‖ (2009, p. 281). E, nessa nova compreensão, Holanda confirma a relevância do Ensino Religioso nas unidades escolares, pois: respeitar a diversidade cultural religiosa, que transita no cotidiano escolar, é permitir que todos os educandos tenham acesso ao conjunto de conhecimentos religiosos, que integram o substrato das culturas assumindo o compromisso de uma escola que proporcione o respeito e a tolerância religiosa (2010, p. 60). O FONAPER (2009, p. 35) enfatiza que ―todo o conhecimento humano torna-se patrimônio da humanidade‖, assim o conhecimento religioso também é, daí a necessidade deste estar disponível no espaço escolar, proporcionando a partir das socializações o conhecimento e respeito para com as escolhas, principalmente religiosas, de cada sujeito. Diante das significativas mudanças que foram/estão sendo tecidas, registramos que o Ensino Religioso, enquanto componente curricular, propõe ―[...] desafiar educandos e educadores para diferenciados olhares e leituras na perspectiva da construção de um outro mundo, melhor e possível [...]‖ diante do exercício da acolhida, respeito e vivência perante a diversidade predominante (DANELICZEN: 2007, p.239). Assim, professores educadores, continuemos na luta incessante para a garantia do componente Ensino Religioso - área do conhecimento - nos espaços escolares, visto que, abordado nesse novo viés, permite a reflexão sobre a prática da alteridade, da efetivação dos direitos humanos, do respeito e (con)vivência para com os seres que habitam o planeta Terra. Ensino Religioso e atividades de aprendizagem: relato de experiências pedagógicas Com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso - PCNER de 1997, o Ensino Religioso é caracterizado como componente curricular, considerado parte integrante da formação básica 438 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso do cidadão e veiculado a um conjunto de conhecimentos que buscam o entendimento do fenômeno religioso e a compreensão das diferentes formas de exprimir o transcendente. O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, precisa ser administrado nos horários normais das escolas e enquanto componente possui a ―função de garantir que todos os educandos tenham a possibilidade de estabelecer diálogo‖ no intuito de disponibilizar e oportunizar o acesso ao conhecimento onde este se dá através das pesquisas, estudos, socializações, relatos, comparações e interações (FONAPER: 2009, p. 45). Conforme as educadoras Oleniki e Daldegan (2003, p.29), ao assumir o Ensino Religioso pela via do conhecimento, os conteúdos deverão proporcionar o diálogo e a participação dos educandos, por meio de um procedimento que gera a atitude de alteridade em relação ao conhecimento religioso pessoal e o entendimento do outro, contribuindo para que o educando possa desenvolver-se sem preconceito e torne-se um cidadão que promova a paz. Diante desse olhar exposto pelas autoras, relataremos a prática pedagógica utilizada no segundo ano (2º ano) dos Anos Iniciais – Ensino Fundamental na Escola Municipal Santa Terezinha na cidade de Faxinal dos Guedes/Santa Catarina. Fundada no ano de 1995, a mesma está situada na Rua Presidente Dutra, número 22, centro e integra a Rede Municipal de Ensino contando com 480 estudantes provenientes do centro, bairros e interior (SANTA TEREZINHA, 2013). Todos os professores educadores que atuam na unidade escolar são habilitados, 95% são efetivos e os demais ocupam caráter temporário (ACT). A direção e coordenação pedagógica são elencados/nomeados através de acordos partidários políticos, mas identificamos que o espaço escolar é permeado pelo bom convívio entre o grupo que a compõe. Entendemos que devido à carência de profissionais habilitados na área Ensino Religioso, ausência de materiais adequados nos espaços escolares e, também, o entendimento que o componente foi recebendo no decorrer do processo histórico, não raras às vezes, a aula acaba sendo ministrada numa lógica de valores humanos e religiosos calcados numa única tradição religiosa. Embora saibamos que não há número suficiente de profissionais habilitados nessa área, destacamos a importância dos cursos de formação 439 FONAPER continuada – presencial e a distância; compreendemos que os mesmos não suprirão todas as defasagens e dificuldades encontradas para ministrar o componente, mas entendemos que permitirá aos professores educadores novos olhares para com esta área da educação básica. Frisamos ainda que o Ensino Religioso, bem como as demais disciplinas que constituem área do conhecimento e integram os currículos escolares, devem favorecer abertura à pluralidade cultural, permitindo-se uma ―[...] pedagogia da diversidade e do respeito às diferenças‖ que constituem e integram os seres vivos (ROCHA; TRINDADE: 2006, p.62). Assim, no principiar do ano letivo, nas aulas de Ensino Religioso, propusemos aos estudantes o projeto Nosso planeta é um presente! que teve/tem inúmeros objetivos, mas em especial, a compreensão sobre o cuidado e respeito para com a vida humana bem como com a natureza e demais seres que integram este habitat. Primeiramente confeccionamos um círculo e convidamos os estudantes para auxiliar na pintura, tornando-o multicores, representando a beleza que faz parte do universo. Foi maravilhoso! Várias mãos, cores, toques, olhares, sorrisos, concentrações, atenções e registros. Ao término, expomos a representação em um mural para darmos sequência ao trabalho proposto. Mas, o planeta não é vazio... Ele é representando pela diversidade de pessoas! Assim, realizamos a atividade Meu/minha amigo(a) secreto(a) é, que consistiu em registrar o nome num papel para que depois pudessem ser distribuídos entre os estudantes. Assim, após cada um(a) retirar um papel, ambos tiveram a incumbência ilustrar seu/sua amigo(a) secreto(a) para depois ser revelado a turma. Conforme relembra Silva (2007, p. 251) ―ir em direção, ao encontro do Outro, percebendo-o face a face [...]‖ é uma tarefa que nos fazer (re)conhecer, aprender e conviver com este outro/diferente, que faz parte da nossa vida, entendendo que é a partir dele que nos tornamos pessoas, pois não conseguimos (sobre)viver sozinhos. Por isso, foi tão bonito o momento em que os estudantes foram apresentando suas ilustrações e dialogando sobre as representações. Sem preconceitos e indiferenças fomos entendendo que cada um(a) é diferente, único, singular. Também aproveitamos no desenvolver do projeto para dialogar sobre as diferenças físicas, econômicas, sociais, culturais, bem como as etnias, religiões, ideias, gostos, escolhas que fazem parte da vida das pessoas. E, 440 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso buscando conhecer o que é do outro, principalmente no que compete a escolha religiosa, cada estudante foi convidado a registrar em uma tarja algo de bom que sua tradição religiosa ensina. Todos os estudantes da turma declararam-se cristãos, - católicos e evangélicos - e assim, anotaram a palavra no papel em branco. Quanta coisa bonita se aprendeu! Cada estudante apresentou seu trabalho final e aos poucos foram concluindo que não importa qual é a denominação religiosa, pois todas ensinam a prática do bem, da vivência, do amor, do perdão, do diálogo e da amizade. Mas então, porque tanto ódio, guerras, (pré)conceito e intolerância? Os estudantes foram instigados a pensar sobre isso e registrar em seu caderno o motivo de tantas desavenças na humanidade. Apontaram que dentre os fatores estavam o ―achismo‖, a falta de respeito, a ignorância, pois o homem se considera melhor que seu semelhante quando de fato não é. No limiar do bimestre, pensamos nos demais seres vivos que integram o planeta. Assim, contamos a história O reino das borboletas amar-elas que abordava o tema preconceito; dialogamos sobre o contexto atual bem como os desafios para um planeta diferente e melhor, onde cada qual deve fazer sua parte. Ao término, realizamos a dobradura da borboleta e cada qual coloriu representando a diversidade. Posteriormente, fomos expondo os trabalhos ao lado do planeta que ia ficando cada vez mais belo e diferente. Abordamos o tema Meio Ambiente, interligando também as demais disciplinas que compunham a grade escolar, analisando que ―a missão do ser humano não é estar sobre as coisas e outros seres vivos, dominando-as, mas ficar ao seu lado, cuidando deles, pois ele é parte responsável da imensa comunidade terrenal e cósmica (ALMEIDA; ALMEIDA: 2007, p. 258). Entendendo que a natureza é sagrada e que precisamos/devemos cuidá-la, pois nossa vida depende da mesma, os estudantes trouxeram copinhos descartáveis de iogurte para a sala de aula. Após seleção de diversas imagens das pessoas que compõe nosso planeta, os estudantes foram colando-as nos copos e ao redor passando papel verde. Juntos, confeccionamos uma grande árvore entendendo que somos nós que temos o poder de escolher qual futuro deixaremos para as próximas gerações. Foi um momento impar e significativo, pois cada estudante foi dando toques especiais para o resultado final; proporcionou 441 FONAPER também o (re)pensar e a (re)flexão sobre nossas práticas cotidianas. Por isso, o mural permanece na nossa escola, inacabado, porque depende de nós qual o percurso a ser construído. Considerações finais Poder sorrir, encantar-se, emocionar-se, sonhar, acreditar... Só quem é feliz sabe o que é felicidade! Por isso, lembramos os bons momentos que vivemos, aprendemos e construímos. Juntos, unidos, distantes, mas interligados pela mente, pelo desejo de aprender. Só quem vive essa sensação sabe explicar o quão importante é ter a garantia de um Ensino Religioso não religioso no espaço escolar, que provoque para o contato, convívio, diálogo, escuta e respeito entre as diferentes culturas que constituem nosso planeta. Um Ensino Religioso que nos propunha refletir também sobre o cuidado com a natureza, espaço sagrado/vital para nossa vivência/ existência que apela para a urgência das práticas alteritárias, da atenção e responsabilidade para com os seres vivos. Poder vislumbrar horizontes, olhar a partir de diferentes perspectivas, caminhar novos percursos... Desafios esses que nos tornam sujeitos humanos/cidadãos e nos sensibilizam para a vivência na diversidade que é imensa e embeleza o planeta Terra. Portanto lembremos: As sementes de esperança e mudança já estão lançadas! Estejamos unidos para, em breve, colhermos os bons resultados!! Referências ALMEIDA, Osmarina Ercídia de; ALMEIDA, Jesse Felipe de. Cuidados e preservação do meio ambiente: uma prática pedagógica no cotidiano escolar de Ensino Religioso. In: CAMARGO, César Camargo; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA Lilian Blanck de. (Orgs) Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007, Cap. 13, p. 258-266. ALVES, Rubem. A Alegria de Ensinar. São Paulo: Ars Poética, 1994. 442 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso ______. Entre a ciência e a sapiência O dilema da educação. São Paulo: Loyola, 1999. BARBOSA, Laura Monte Serrat. SE HÁ REMÉDIO, REMEDIADO ESTÁ? A ―medicalização‖ das dificuldades de e com a aprendizagem. Disponível em: <http://201.22.6.15/monteserrataprendizagem/remedio.htm>. Acesso em 30 de Jul. 2013. BORTOLETO, Edivaldo José; MENEGHETTI, Rosa Gitana Krob. Ensino Religioso e a Legislação da Educação no Brasil: desafios e perspectivas. In: POZZER, Adecir et al (Orgs). Diversidade Religiosa e Ensino Religioso no Brasil: Memórias, Propostas e Desafios. Obra comemorativa aos 15 anos do FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010 (Cap. IV, p. 63-82). BRASIL. Lei nº 9.475, de 22 julho de 1997. Dá nova redação ao art. 33 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jul.1997. ______. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010. Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. CECCHETTI, Elcio; THOMÉ, Ione Fiorini. Ensino Religioso em Santa Catarina: memórias e desafios de um percurso em constante construção. In: CAMARGO, César Camargo; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA Lilian Blanck de. (Orgs) Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap. 11, p. 141-157). CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Ensino Religioso no Cenário da Educação Brasileira. Brasília: Edições CNBB, 2007. DANELICZEN, Francisca Helena Cunha. Interculturalidade: desafio às práticas pedagógicas em Ensino Religioso. In: CAMARGO, César Camargo; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA Lilian Blanck de. (Orgs) Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap. 13, p. 235-240). DELORS, Jacques. EDUCAÇÃO Um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 6 ed, São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2001. 443 FONAPER FERNANDES, Magda Carvalho. A ação docente e a prática pedagógica. In: ______. Didática II. Aula 01 Guia de estudos do curso de Pedagogia EAD. Dourados: UNIGRAN, 2012, p. 9-29. FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirin, 2009. ______. Ensino Religioso Capacitação para um novo milênio. Ensino Religioso é parte integrante da formação básica do cidadão Caderno 1. Florianópolis, 2000. HOLANDA, Ângela Maria Ribeiro. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso: O currículo do Ensino Religioso em debate. In: POZZER, Adecir et al (Orgs). Diversidade Religiosa e Ensino Religioso no Brasil: Memórias, Propostas e Desafios. Obra comemorativa aos 15 anos do FONAPER. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2010 (Cap. III, p. 51-61). MARTINS Filho, Lourival José. Tem azeite na botija? A Docência e o Componente Curricular Ensino Religioso nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Florianópolis: UDESC, 2011. OLENIK, Marilac L. R.; DALDEGAN, Viviane M. Daldegan. Encantar: uma prática pedagógica no Ensino Religioso. Vozes, 2003. PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: ARTMED, 1999. POZZER, Adecir; CECCHETTI, Elcio; RISKE-KOCH, Simone. Ensino Religioso em Santa Catarina: exercícios na perspectiva de uma educação intercultural. In: OLIVEIRA, et al (Org.). Culturas e Diversidade Religiosa na América Latina. Blumenau: Edifurb; São Leopoldo: Nova Harmonia, 2009 (Parte III, p. 271-285). REYES, Pedro Alonso Puentes. Educação e a cidadania para um novo mundo. In: OLIVEIRA, Lilian Blanck de et al. Culturas e Diversidade Religiosa na América Latina Pesquisas e Perspectivas Pedagógicas. Blumenau: Edifurb; São Leopoldo: Nova Harmonia, 2009. ROCHA, Rosa Margarida de Carvalho; TRINDADE, Azoilda Loretto da. Ensino Fundamental. In: Ministério da Educação/Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2006 (p. 5375). 444 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso SANTA TEREZINHA. Projeto Político Pedagógico. Faxinal dos Guedes, 2013. SILVA, Rute Patrícia da. Escola: um dos lugares/espaços para a construção da alteridade – relato de uma experiência. In: CAMARGO, César da Silva; CECCHETTI, Élcio; OLIVEIRA, Lilian Blanck de (Orgs.). Terra e Alteridade Pesquisas e Práticas Pedagógicas em Ensino Religioso. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2007 (Cap.13, p.249-257). SOUZA, Ana Maria Borges; CARDOSO, Teresinha Maria. Organização Escolar. Florianópolis: UFSC/EAD/CED/CFM, 2008. VEIGA, Ilma Passos Alencastro; VIANA, Cleide Maria Quevedo Quixadá. Formação de professores: um campo de possibilidades inovadoras. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro; SILVA, Edileuza Fernandes (Orgs) A escola mudou. Que mude a formação de professores! Campinas, SP: Papirus, 2010 (Cap. I, p.13-34). WEFFORT, Madalena Freire et al. Educando o olhar da Observação. In: FREIRE, Madalena. Observação registro e reflexão. Instrumentos Metodológicos I. 2 ed. São Paulo: Espaço Pedagógico, 1997. WITT, Maria Dirlane; PONICK, Edson (Coords.) Dinâmicas para o Ensino Religioso. São Paulo: Sinodal, 2008. 445 ALTERIDADE E DIVERSIDADE CULTURAL RELIGIOSA: REFLEXÕES SOBRE O SER HUMANO Marcely Carnieletto Gazoni1 Leonel Piovezana2 Resumo: O trabalho tem por objetivo apresentar algumas reflexões e atividades sobre a alteridade e diversidade cultural religiosa do ser humano. Ao trabalhar culturas, tradições religiosas, reflexões de alteridade na disciplina de Ensino Religioso no Ensino Fundamental de uma escola pública do município de Chapecó-SC, oportunizamos aos educandos o reconhecimento e o respeito às diversidades individuais no ambiente escolar e na sociedade. Ao direcionarmos nosso olhar para os sujeitos em formação observamos a existência de vários estudos que apontam para a inclusão social e a valorização dos indivíduos nas diversas disciplinas do currículo escolar. Ademais, procuramos estabelecer pensamentos relevantes para a melhor compreensão da diversidade religiosa e cultural existente no Brasil, destacando a inclusão social que está em evidencia nos dias atuais e em todas as camadas da sociedade que abrange. Não haveria exagero em se afirmar que, a religiosidade é plural e diversificada, e esta se apresenta nas matrizes religiosas estudadas em sala de aula pelo professor de Ensino Religioso. Cabendo ao mesmo evitar o proselitismo e possibilitar através dos estudos sobre a religiosidade brasileira que os educandos possam se reconhecer como um ser único e diferente, para que o mesmo faça tal reconhecimento em relação ao outro. Apresentamos assim, alguns elementos da cultura e tradição religiosa pluralista brasileira. Através da atividade desenvolvida com os educandos em sala de aula com o conceito essencial: Ser humano, Alteridade e diversidade cultural religiosa, com o título: Eu sou eu! Que Legal!, obtêm-se uma experiência única e satisfatória quando os educandos assimilam e compreendem a alteridade, a coexistência, a inclusão e o (re)conhecimento da diversidade brasileira que manifesta-se através da religiosidade das diferentes matrizes religiosas que trazem em seu bojo os diferentes fenômenos religiosos que enriquecem a cultura brasileira. Palavras-chave: Culturas, Tradições Religiosidade, Alteridade, Diversidade. 1 2 Graduada (Bacharel) em Teologia pela UNIASSELVI; Licenciada em Ciências da Religião pela UNOCHAPECÓ; Acadêmica do 7º período de Licenciatura plena em História pela UNOCHAPECÓ; Pós – Graduanda Especialização Lato Sensu em Educação em Direitos Humanos e Diversidades: Uma abordagem Interdisciplinar. Professora da Rede Pública de Santa Catarina, voluntária na rede colaborativa de Ensino Religioso e de Cursos de formação continuada do Ensino Religioso para professores da Educação Básica, pela UNOCHAPECÓ. Professor Orientador. Doutor em Desenvolvimento Regional e coordenador do curso de Ciências da Religião da Unochapecó. FONAPER Alteridade e Diversidade Cultural Não haveria exagero em se afirmar que na disciplina do Ensino Religioso temos a possibilidade de trabalhar com a coexistência e a alteridade, direcionando um olhar para o outro como ser humano diferente que traz em seu bojo toda uma cultura e tradição de vivência diferente da nossa. Sendo assim, não somos todos iguais, pois temos modos diferentes de ver e de viver a vida, nossas crenças, costumes, vestimentas, dialeto e visões de mundo nos diferenciam e nos identificam como seres humanos únicos, diante de uma sociedade pluralista em seus modos de vida em relação ao outro. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso: O ser humano constitui-se num ser em relação. Na busca de sobreviver e dar significação para sua existência ao longo da história, desenvolve as mais variadas formas de relacionamento com a natureza, com a sociedade e com o Transcendente, na tentativa de superação da sua provisoriedade, limitação, ou seja, sua finalidade. Dilema que o desafia de forma marcante diante da complexidade da técnica, da industrialização, da urbanização, do racionalismo, da secularização: Quem sou? De onde vim? Para onde vou? Perante essas indagações, o ser humano desenvolve conhecimentos que lhe possibilitam interferir no meio e em si próprio. (PCNs, 2009, p. 31) Assim o ser humano, tem em si uma busca constante de identificação dentro da sociedade na qual o mesmo está inserido. A identificação e afirmação de ser alguém que tem valor muitas vezes leva-o a desvalorizar o outro como ser humano, colocando em primeiro lugar os bens materiais, na afirmação de que o Eu tem mais valor pelo que possui do que pela vida que possui, ocorrendo assim uma negação de valores éticos, morais, espirituais, e religiosos, negando assim a própria cultura e tradição, de si mesmo e do outro. Com olhares nos bens materiais ocorrendo uma inversão de valores e de identidade enquanto ser humano. Desse modo, a ação humana consiste em tornar a Transcendência sua companheira de todas as etapas de aventura como origem de projetos, enquanto desejo e utopia. A recusa à Transcendência é trágica para o ser humano, pois o torna resignado em sua mediocridade. (PCNs,2009, p. 32) Trabalhar O Eu e o Outro é necessário para que novos valores sejam integrados na vivência do educando em sala de aula e na sociedade no 448 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso qual o mesmo está inserido, desta forma quando olhamos o lado espiritual, valorizamos também o lado ético/moral, que não está incluído nos bens materiais. Ter um olhar de sensibilidade com relação ao outro é literalmente arrancar do meu Eu interior o egoísmo de que o mundo não gira somente em torno de nós mesmos. Mas existe um colorido de valores e significados que podem mudar o mundo, quando notados e valorizados com respeito e dignidade no qual foram concebidos pela humanidade conforme suas culturas e tradições que abarcam também os fenômenos religiosos. O Ensino Religioso necessita cultivar a reverência, ressaltando pela alteridade que todos são irmãos. Só então a sociedade irá se conscientizando de que atingirá seus objetivos desarmando o espírito e se empenhando, com determinação, pelo entendimento mútuo. Nessa perspectiva, o Ensino Religioso é uma reflexão crítica sobre a práxis que estabelece significados, já que a dimensão religiosa passa a ser compreendida como compromisso histórico diante da vida e do Transcendente. E contribui para o estabelecimento de novas relações do ser humano com a natureza a partir do progresso da ciência e da técnica. (PCN, 2009, p. 33) A atividade objetiva assim reconhecer-se como pessoa única e repleta de possibilidades, situada em um mundo que pode ser descoberto e compreendido. Aprender a lidar com os sentimentos e compreender que ser pessoa é amar, ser amada e ter o seu espaço numa sociedade plural, que traz em seu bojo um mundo de novidades no qual podemos desabrochar e resplandecer para a vida, bem como sentir que o perfume da flor que exala em torno de nós também pode ser do outro, quando temos a sensibilidade de notá-lo com sua bagagem de experiência, que nos ajuda a desenvolver nossa capacidade de refletir sobre o Outro. Ao observarmos as mudanças paradigmáticas no cenário da educação vemos a necessidade do reconhecimento e o respeito às diversidades individuais dentro do ambiente escolar. Ao direcionarmos nosso olhar para os educandos como sujeitos em formação de conhecimento científico e ―profissionalizante‖ preparação para a vida, observamos a existência de vários estudos que apontam para a inclusão social e a valorização dos mesmos nas diversas disciplinas do currículo escolar. No Brasil, essa mudança de postura pedagógica tem estado voltada para uma educação inclusiva que atenda a todos sem distinção, deste 449 FONAPER modo o Ensino Religioso tem por objetivo e finalidade a inclusão social e cultural das diferentes crenças religiosas que estão presentes em todo o âmbito nacional, de uma forma geral as culturas religiosas tem sua história e seus adeptos que estão presentes em toda a sociedade brasileira. Desde modo, o art. 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, alterado pela Lei n. 9475/97 esclarece que o ―Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo‖. Sendo assim, o espaço escolar, deve permitir as interações entre os educandos e as suas diferentes culturas dentre as quais sua religião, como forma de conhecimento e respeito praticando a alteridade. Entende-se também que a Escola é o espaço de construção de conhecimentos e principalmente de socialização dos conhecimentos historicamente produzidos e acumulados. Como todo o conhecimento humano é sempre patrimônio da humanidade, o conhecimento religioso deve também estar disponível a todos os que a ele queiram ter acesso. A Escola, por sua natureza histórica, tem uma dupla função: trabalhar com os conhecimentos humanos sistematizados, historicamente produzidos e acumulados, e criar novos conhecimentos. (PCNs, 2009 p.34). Nesse contexto, pensamos que o Ensino Religioso, como uma das disciplinas do currículo escolar contribui para desmistificar o preconceito à diversidade, através do respeito pelo diferente que são as diversas religiões com seus costumes e rituais que nos trazem vivências e experiências diversas para a sala de aula. Assim, o Ensino Religioso tem por objetivo aguçar a capacidade de respeitar o diferente que se apresenta nas diversas formas de cultuar um transcendente com muitos nomes e significados diferentes para cada cultura religiosa, que se fazem presentes tanto na escola, como na comunidade e nas diferentes culturas étnicas do povo brasileiro. O papel da escola tem sido árduo nos dias atuais, ao passo que o mundo caminha cada vez mais para um desenvolvimento econômico e tecnológico, o ser humano caminha cada vez mais para uma vida de correria e desmotivação desenfreada. A busca por uma vida melhor traz uma agitação cada vez maior, o capitalismo encontra-se na sociedade atual, o anseio por uma vida melhor 450 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso e com mais conforto tem tomado o tempo e a atenção dos pais para com seus filhos, que estão sendo educados por jogos eletrônicos de todas as formas - o problema é que estes jogos eletrônicos, em sua maioria, vêm instigando a violência, a criminalidade, o preconceito e uma vida desregrada, com poucos objetivos e sensibilidade para com o Outro, tornando nossas crianças e jovens em futuros adultos egoístas que não buscam um relacionamento pessoal com o Outro, pois o sistema de informação na qual vivemos hoje tem levado nossas crianças a um relacionamento virtual e sem contato pessoal, logo é difícil que a criança consiga envolver-se com o Outro de uma forma saudável, onde se possa identificar o Outro como um ser que tem seus valores morais/éticos, costumes e tradições religiosas diferentes da nossa, mas que tem sentido de vida para o mesmo. Assim, a concepção de mundo é a maneira como cada ser humano compreende o mundo. A concepção de mundo assume o papel de acolher ou rejeitar as respostas que se enquadram ou não na compreensão que se tem do mundo. A tradição religiosa, a política, a ideologia se apresentam como estruturantes da concepção de mundo. Em algumas pessoas, a concepção de mundo se apresenta com muita rigidez e inflexibilidade, noutras, mais aberta, e sem critérios de julgamento. Em determinados momentos, a tradição religiosa aparece como determinante da estrutura da concepção de mundo, noutros, aparece a ideologia, a política ou a tradição e o contexto sociocultural. (PCNs, 2009, p. 39) Neste ínterim, em que se encontra a sociedade atual, a escola em sua totalidade vem sofrendo mudanças e desfoco em seu papel de ensinar aos educandos na apropriação dos conhecimentos científicos. Este papel passou de ensinar para educar filhos de pais ausentes com seus compromissos paternos. O Ensino Religioso busca em suas práticas pedagógicas, construir uma educação voltada para a alteridade, buscando entender e compreender o Ser Humano, como um ser único e diferente, mas que demonstra seus sentimentos de relacionamentos com o Outro, ainda que este seja diferente de seus costumes, valores sociais ou familiares. Portanto, a escola é um espaço onde os diferentes se encontram e, ao mesmo tempo podem ser acolhidos, respeitados e dialogados para um entendimento e conhecimento da diversidade cultural, na qual todos educandos, professores e sociedade - estão inseridos. Desta forma o Ensino Religioso é essencial, pois este pode trabalhar as diversas 451 FONAPER questões humanas na esfera histórica, antropológica e sócio-culturais. Buscando um reconhecimento de identidades dentro do espaço escolar, trabalhar o diferente situar o educando no mundo de hoje é importante para que o mesmo possa desenvolver-se como um ser humano capaz de inserir-se na sociedade com integridade e cidadania, na prática do respeito e coexistência como experiências únicas que podem direcionar suas ideologias políticas, éticas, morais e religiosas. O Ensino Religioso é essencial interdisciplinar. Requer atividades interativas que proporcionem não só pesquisa rigorosa, reelaboração de dados, produção de formas literárias e artísticas do conhecimento adquirido e reflexão, como também experiências significativas na educação integral, pois nenhuma disciplina como o Ensino Religioso lida com as questões humanas universais. Estas, por sua vez, refletidas e dialogadas, podem iluminar questões particulares e coletivas e se transformar em construção da sabedoria de vida, que leva à cidadania e ao protagonismo na humanização e na transformação da sociedade (CARNIATO, 2002 p.10). Assim o trabalho realizado em uma das escolas estaduais de ensino fundamental e médio da cidade de Chapecó teve uma observação prévia onde se percebeu que os educandos são respeitosos com os colegas e professora, mas agitados, ansiosos, elétricos e com muita disposição e energia para aprender e relacionar-se com o Outro, porém, imaturos ainda nesta percepção, pois a pré-disposição em valorizar mais o ter do que ser acentua-se em determinados momentos, logo se buscou uma forma de trabalho que pudéssemos amadurecer melhor as questões da reflexão do ser humano através da alteridade e do mundo de diversidade no qual os mesmos estão inseridos. Assim, a problemática Eu sou eu! Que legal! Contribuirá para que reflitam sobre o Outro e o Eu, valorizar o ser e não somente o ter, o trabalho com os educandos foi dividido em duas etapas e o mesmo nos possibilitou uma experiência única diante de um mundo de diversidade que a escola nos apresenta, a cada dia, a cada momento, trabalhar a inocência e muni-la de instrumentos que promovam a paz, a igualdade, a fraternidade, e o diálogo inter-religioso e cultural é uma abertura para um mundo melhor e menos egoísta, levar os educandos a um relacionamento pessoal na busca da observação do Outro como ele é e de nos percebermos como somos, fará com que nossas crianças sejam adultos sensíveis. 452 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Assim o trabalho desenvolveu-se na primeira etapa de uma forma diferenciada, começando pela acolhida dos educandos com a música ―Segredo da felicidade‖, onde buscamos proporcionar aos mesmos um momento para que eles ouvissem a música como forma de ―quebra gelo‖ entre educandos e professores para que pudéssemos juntos, estabelecer um vínculo de relação em um momento de descontração e alegria proporcionado pela música. A temática trabalhada com os educandos ―EU SOU EU! QUE LEGAL!‖, foi desenvolvida através da história ―O patinho feio‖, a leitura do texto foi essencial para que os educandos fizessem um reconhecimento do diferente, do excluído, do mais forte, do mais fraco, do belo, do feio, e da forma como nós vemos o mundo e o outro, com seus costumes e tradições religiosas, bem como vestimenta, culinária, dialeto, ideologia e posição política. A dinâmica de reconstruir a história com as crianças fazendo sons e movimentos da fazenda, da estrada, da lagoa. Por exemplo, imitar a família de patos em que o pequeno cisne nasceu, imitar outros animais da fazenda, assobiar e balançar o corpo ao som do vento, lutar contra a tempestade, procurar proteger-se do frio, etc, levou-os a um momento de alegria e diversão, marcante por assim dizendo, pois fez diferença na aula marcando-os com a questão da inclusão social pelos olhos julgadores de uma sociedade com padrões de beleza, de físico, de culturas e costumes diferenciados dos padrões europeus estabelecidos desde a colonização do Brasil. As atividades foram sendo desenvolvidas conforme os educandos assimilavam a temática, quando propomos que cada educando desenhasse um patinho conforme seu gosto, de forma que possam ser coloridos e diferentes um do outro e logo após compartilhassem com os colegas, foi marcante, pois cada um liberou-se em momentos de risos e alegrias por ver que cada um tem uma forma e um pensamento de cor e modelo de pato, assim, começamos a trabalhar a inclusão e as diferentes formas de tradições religiosas. Ao colar os patinhos no painel da diversidade onde fora desenhado o lago da diversidade, cada educando pode visualizar melhor as diferenças entre os próprios desenhos coloridos que eles fizeram, logo ao verem o lago com todos os patinhos diferentes eles mesmos começaram a falar dos diferentes tipos de patos, uns grandes outros pequenos, cada um com sua cor, enfim o diálogo entre os educandos foi notório, percebeu-se que os mesmos viram as diferenças 453 FONAPER nos desenhos, porém salientamos que apesar das diferenças entre eles todos eram patos. Logo após o diálogo, foram coladas palavras de diferentes significados, tais como: feio, bonito, preto, branco, bondade, maldade, amor, ódio, paz, guerra, pequeno, grande, triste e alegre. E salientamos que no mundo onde vivemos, essas diferenças existem e, o que, para um é feio, para o outro, pode ser bonito e, assim com todas as demais palavras. Logo que os educandos perceberam as palavras que estimulam a guerra, o ódio e o preconceito perguntaram por que elas estavam no lago, e com a explicação de que no mundo existem tais ações humanas, os educandos tiveram a concepção de que as mesmas não deveriam fazer parte do mundo na qual nós vivemos então as mesmas foram riscadas como forma de protesto e indignação, pois a agressividade e o negativismo não deveriam fazer parte do nosso mundo de inclusão e reflexão sobre a alteridade e diversidade cultural. Com os educandos entendendo sobre as questões da alteridade da diversidade e da inclusão social trabalhamos com eles a dinâmica - A dança das cadeiras: organizamos as cadeiras em círculos, três a menos do que o número de crianças. Ao som de uma música, eles dançaram ao redor do círculo, ao parar a música, todos disputaram uma cadeira. Os três que ficaram de fora saíram da brincadeira e assim sucessivamente até que restaram apenas três crianças. Ao passo que as crianças iam saindo da brincadeira as mesmas receberam um canetão para que eles escrevessem o nome em cartazes, estes continham um desenho de carinhas de sentimentos, para que pudessem expressar os sentimentos no ato da exclusão da brincadeira, essas carinhas expressavam seus sentimentos em forma de desenho em semblantes de alegre, triste, enraivecido, temeroso ou sereno. Após a brincadeira concluída, abriu-se um momento de diálogo para que cada criança explicasse o motivo do sentimento que a mesma escreveu seu nome no semblante dos sentimentos. Todos puderam expressar seus sentimentos, alguns com exaltação por terem sidos excluídos, outros entristecidos e os que ficaram indiferentes puderam colocar suas sugestões com relação à brincadeira, o momento foi tenso para algumas crianças, pois a sensação de perda para alguns não foi agradável, o sentimento de fracasso de derrota instigou o lado mais sombrio de algumas crianças, estas expuseram vários motivos de sua perda, bem 454 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso como, dizer que o colega o empurrou derrubando-o da cadeira, de que o colega não o respeitara e que não foi justo o resultado, este momento foi o mais difícil com os educandos, pois a rivalidade acentuou-se em forma de racismo, exclusão e brutalidade, bem como os que não se importaram com os resultados dizendo que tudo não passava de uma brincadeira, e que como o patinho feio os mesmos não deveriam estar brigando e sim brincando. Assim, a dinâmica das cadeiras foi refeita novamente como forma de inclusão, os educandos que ficaram, colocaram três cadeiras na roda e eles convidaram outros três colegas para que entrassem na brincadeira e, estes três educandos convidados, foram convidando outros três e assim por diante, até que todos estavam novamente na brincadeira. Com o final da brincadeira refeita, o diálogo foi retomado, e foi impossível deixar de perguntar o porquê, apesar de cada um ter uma cadeira para se assentar os mesmos estavam ainda empurrando, correndo, tentando achar uma cadeira. Os educandos não souberam responder a não ser que eles não queriam ficar de fora da brincadeira, observou-se que mesmo que tivesse cadeiras de sobra eles inconscientemente continuariam a brigar pelas cadeiras, pois, a questão da disputa, da sensação de derrota, da exclusão está bem presente na sociedade inclusive nas crianças de tenra idade. Assim colocamos a musica ―Olhe eu Aqui‖ para que os mesmos ao ouvirem pudessem sentir-se importantes, como eles são e lhes foi dito que não havia motivos para agressividade e sentimentos de exclusão, pois, todos, mesmo sendo diferentes, têm lugar e espaço no mundo para que todos possam expressar sua cultura. Assim, trabalhamos até um segundo momento, pois, ao trabalhar a ideia de inclusão social, deixamos bem saliente as diferenças e as diversidades existentes no mundo e no meio social em que vivemos, trabalhamos a questão dos sentimentos dos educandos, relacionando com a história do Patinho Feio e a dança das cadeiras. Além de trabalhar o respeito mútuo, o respeito próprio e a questão de ser uma pessoa única no mundo e de que não podemos ser substituídos. Em um segundo momento, trabalhamos bem a questão cultural, ou seja, as diferentes culturas religiosas existentes no mundo. Para começarmos a segunda etapa, passamos para os educandos um texto sobre o que é cultura. Com explicação e exemplos, os educandos entenderam melhor o que significa cultura religiosa, passamos para eles 455 FONAPER de forma clara e objetiva como cada cultura religiosa se comporta no mundo e no meio social onde vivemos, salientamos ainda que em nossa sociedade existem muitas culturas religiosas, porém nem sempre, temos acesso a todas, logo não conhecemos todas, por isso, não podemos ter preconceito de nenhuma. Com a leitura do texto e diálogo sobre as diferentes culturas religiosas, os educandos fizeram um exercício sobre cultura, e cultura religiosa. Então os educandos receberam um texto sobre diversidade e uma atividade de caça-palavras para instiga-los à reflexão do que é diversidade cultural e religiosa. Foi passado para os alunos o slide da Tita: uma Coelha de uma orelha só, no qual eles viram mais uma vez a diversidade que existe no mundo, e como as pessoas podem se sentir por serem diferentes, tanto na maneira de falar, vestir, comer e ter fé. Também foi passado para os alunos um slide sobre povos africanos, onde ficou realmente bem saliente a questão cultural, pois este povo diferente contrasta e muito com a realidade de cada um, principalmente com a nossa cultura, o que fez com que os educandos pudessem encantar-se com o diferente, a forma diferente deste povo vestir-se, bem como a forma diferente dos mesmos cuidarem da natureza como que fazendo parte dela, ou seja, a natureza está intimamente ligada a cada ser que compunha tal tribo africana. Com o diálogo sobre o que viram os educandos receberam uma atividade de labirinto, para que os mesmos ajudassem o patinho encontrar o caminho da diversidade. Após esse momento, foi montado um painel das diversas religiões que compõem o mundo, cada educando colocou em uma tarja de papel o nome de sua denominação religiosa ou de uma denominação que os mesmos ouviram falar ou visitaram com seus pais, a dinâmica foi envolvente, pois, os educandos puderam relatar sobre algumas experiências religiosas que tiveram com seus pais, tiveram a liberdade de falar sobre sua denominação, o que os deixou alegres e entusiasmados em poderem relatar o que faziam e como as crianças são tratadas em sua denominação religiosa. Assim, desenhamos um globo e todos um a um colaram suas tarjas com o nome de sua denominação, e foi acrescentado ainda o nome de outras culturas e tradições religiosas que os mesmos não conhecem ou nunca ouviram falar, bem como foi colada uma tarja em branco sem nome o que chamou a atenção dos educandos que disseram ―como pode não ter religião ou não crer em Deus?‖, assim explicamos que 456 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso no mundo também tem lugar para os que não crêem em nada, e que cada um tem direito de ter ou não uma religião. Após apresentarmos para os alunos um slide, mostrando como algumas religiões expressam-se em reverência ao seu Deus. O objetivo foi mostrar que, cada povo e cultura religiosa, têm sua maneira e forma de expressar-se ou de comunicar-se com seu Deus e assim, devemos respeitar as diferentes formas de expressão ou comunicação com Deus. Portanto, assim como o Patinho Feio era diferente dos demais animais da fazenda, existem formas e religiões diferentes da nossa e; nem por isso, essas se tornam feias ou más, mas devemos respeitar, por que dentro da sociedade em que vivemos, temos semelhanças, mas temos diferenças na forma de crer e adorar Deus ou Transcendente. Como forma de avaliação e entendimento foi entregue para os educandos uma atividade, onde cada criança deve ligar a figura apresentada à religião correta. Fixando melhor o conhecimento adquirido através do slide ―As diferentes formas de comunicação com Deus‖. Foi dialogado com as crianças que, todos somos seres humanos respiramos o mesmo ar, compartilhamos a mesma luz solar, chuva, os benefícios alimentícios e outros que a terra produz, porém, somos semelhantes e ao mesmo tempo diferentes em cor de cabelo, olhos, pele, estatura, homem, mulher, pensamentos e da mesma forma vemos e conhecemos ―Deus‖ que pode ser o mesmo mas que vemos de forma diferente, logo podemos dizer. EU SOU EU, QUE LEGAL! Por que ninguém é igual ao outro. Valorizando assim a si mesmo e o outro como ser humano único e específico que não pode ser substituído por ninguém. Ao finalizar o trabalho, tivemos a oportunidade de montar uma sexta de balas de frutas, com cores diferentes e sabores diferentes, que foi entregue a cada educando, mostrando que assim como as balas são do mesmo tipo, ou seja, da mesma essência doce, as mesmas podem apresentar formas, sabores e cores diferentes e que, apesar das diferenças, a essência e o sabor são agradáveis. Portanto, o diferente só é diferente e insípido quando a gente quer. No fim da atividade desenvolvida com os educandos, foi tocando a canção ―Iguais‖ o que oportunizou que os mesmos pudessem refletir mais uma vez sobre a alteridade e a diversidade cultural religiosa bem como a reflexão sobre o ser humano. Assim pudemos mais uma vez dialogar sobre a experiência de como nos sentimos quando nos deixam de fora e não há lugar para nós? E 457 FONAPER quando deixamos outras pessoas fora? Será que pensamos nos outros em determinados momentos, ou pensamos somente em nós? Concluindo que cada pessoa é única e existe para ser amada, para ser feliz, para amar e fazer os outros felizes, e que é possível superar as diferenças sem ser preconceituoso em uma vivencia de alteridade e coexistência, pois, no mundo que é a fazenda, existe lugar para todos mesmo que este seja o ―Patinho Feio‖, pois em um determinado momento de nossa vida encontramos nosso lugar, bem como o Outro, sem tirar o direito de ninguém. Podemos dizer que todos nós temos muitas qualidades e somos pessoas belas e importantes em sua forma diferente de ser e de viver a vida que é colorida quando a mesma é respeitada, deste modo aprendemos que as religiões ensinam que todas as pessoas merecem amor e respeito por suas diferenças. Avaliação dos Educandos A avaliação é uma abordagem do conhecimento adquirido no período de administração das aulas. O Ensino Religioso como área do conhecimento visualiza articular, contextualizar, a permanente formação do educando em uma sociedade onde as transformações são inevitáveis. A avaliação tem como objetivo o registro de quais conceitos foram apreendidos, como os educandos perceberam e se apropriaram dos conteúdos e ideias e, observar o progresso de apropriação do conhecimento elaborado para os educando, averiguando se os resultados das ações e operações foram satisfatórios. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, a avaliação é um elemento integrador entre a aprendizagem do educando e a atuação do educador na construção de conhecimento. A avaliação foi dirigida da seguinte forma: a participação na brincadeira das cadeiras, a interação dos educandos nos momentos do diálogo, a participação na construção dos painéis, as atitudes que cada criança conseguiu viver durante as atividades, como cada criança se sentiu no grupo expressando suas ideias e sentimentos nos momentos das brincadeiras, como cada criança se sentiu ao ser excluída, como cada criança se sentiu ao ser convidada para fazer parte do grupo novamente, como cada um percebeu a importância de conviver com o próximo e respeitar o diferente como um ser único, mas 458 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso que, está carregado de diferenças em sua vida bem como a fé, o Deus que adora, o dialeto, a roupa, a culinária, e suas ideologias. Formação Específica de Professores Consideramos a partir desta experiência apresentada a necessidade de mais projetos e consolidação da disciplina do Ensino Religioso nas escolas de rede pública e privada em todas as séries. O desafio é grande, pois, o mesmo aponta o caminho para o desenvolvimento de outros projetos e produção de materiais didáticos específicos dos fenômenos religiosos como um direito do aluno para sua formação básica, conforme assegura a constituição de 1988: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximirse de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional. (CONSTITUIÇÃO, 1988, p. Web) A docência da atividade do Ensino Religioso em todas as séries depende de investimento público e privado. Faltam recursos didáticos, livros e outros materiais específicos para elaboração de atividades, bem como para a prática da docência no dia a dia dos professores, a falta de professores capacitados na área ocasiona um desleixo ainda maior, o não conhecimento correto da disciplina tanto por parte de professores como de educandos confunde o Ensino Religioso com a catequese, o proselitismo, a discriminação religiosa, e a ocupação das aulas do Ensino Religioso para 459 FONAPER a realização de qualquer outra atividade, desprovendo assim o educando de seu direito de ter sua aula de Ensino Religioso. A garantia do Ensino Religioso se fundamenta na legislação. Mas, que se priorize, principalmente, a qualidade humana, a competência profissional específica. Isto exige a seriedade de um plano de formação permanente das pessoas envolvidas com o Ensino Religioso. (FIGUEIREDO, 1995. P. 99) Quase todos os materiais utilizados foram desenvolvidos pela professora. Os livros utilizados são de propriedades da mesma, os vídeos foram baixados da internet, os slides foram produzidos pela professora. A restrição se dá em torno de conseguir material didático-pedagógico para trabalhar com os educandos, que ao contrario das demais disciplinas o Ensino Religioso é um desafio a cada dia e uma vitória a cada atividade elaborada e realizada com sucesso pelos professores que são autores e construtores da história do Ensino Religioso de caráter não proselitista, que apresenta a alteridade e o respeito ao diferente em sua forma de crença e cultura religiosa dentro do fenômeno religioso, que abarca as diferentes matrizes religiosas. Considerações Finais O desenvolvimento da atividade com a turma ocorreu de acordo com o projeto, consideramos que as atividades e linguagem foram adequadas. Aprendemos que praticar a docência é um desafio e nos arremete à importância de saber trabalhar com os educandos de forma que possamos prender a atenção dos mesmos em um assunto que lhes chame a atenção, aprendemos, portanto, como é importante ensinar sobre a diversidade cultural e os fenômenos religiosos na alteridade através da coexistência em um mundo de diversidade que abarca o fenômeno religioso, na formação de cidadães que promovam a liberdade de consciência e de crença, ensinar a convivência na perspectiva dos direitos humanos, foi um desafio. Sabemos que contamos com pouco material didático, e as elaborações das atividades é um desafio e uma realização para cada etapa, a colaboração dos educandos sempre é muito importante para que se possa alcançar os objetivos propostos nas atividades, portanto, poderíamos contar com, mais recursos audiovisuais, além de material 460 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso didático atrativo e de boa qualidade, o que ajudaria numa melhor resposta a prática da docência em Ensino Religioso. De forma geral fomos bem recebidos pelos educandos que agiram normalmente com nossa presença em sala de aula, ocorrendo uma cooperação melhor entre educandos e professor, o movimento diferente no início da aula causou excitação por parte de alguns. As brincadeiras realizadas envolveram os alunos de uma forma que puderam ser eles mesmos, expressaram suas ideias e atitudes, bem como dialogaram com relação ao diferente que até então existia, mas que, ainda não havia sido apresentado aos mesmos, a didática diferente e a temática causou estranheza e alguns momentos, o diálogo e a introdução foram momentos de reflexão pelos educandos que se deixaram envolver de uma forma natural. A faixa etária na qual a atividade foi desenvolvida tem muitas curiosidades, percebemos o quanto elas vivenciam suas convicções religiosas e culturais. Sabem manifestar suas crenças, acreditam com facilidade, possuem espiritualidade religiosa e gostam de manifestá-la. Ouvem com atenção o conteúdo proposto discorrem com seus olhos detalhadamente cada material disponibilizado a eles, inteirando-se de tudo o mais rápido possível, aprendem e assimilam o assunto com rapidez. A atividade nos possibilitou um contato amplo com a realidade escolar tanto de professores como dos educandos, o desafio é conseguir conhecer o mundo em que os mesmos vivem. O Ensino Religioso possibilita a convivência com as diferentes religiões e culturas de um modo geral, não só a religiosa, mas que se estende desde etnias, costumes, dialeto, vestimentas e ideologias. A atividade levou os educandos, e a todos os que a vivenciaram, a uma reflexão sobre o ser humano em uma abordagem de alteridade e coexistência. Os resultados foram satisfatórios, pois pudemos observar que os mesmos chegaram a um entendimento e raciocínio sobre culturas e tradições religiosas dentro do contexto social e escolar no qual os mesmos estão inseridos, pois quando trabalhado com os mesmos sobre o Eu e o Outro estes tiveram a oportunidade de visualizar o diferente, como um ser com direitos iguais que devem ser respeitados dentro de sua cultura e fé religiosa. 461 FONAPER Referências BRASIL: (1996). Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional nº 9.394/96 –Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília/DF/BRA: MEC. Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos. Constituição da República Federativa do Brasil de 1998. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > acesso em 28/06/2012 CARNIATO, Maria Inês Nós protegemos a vida: 2º ano: professor/Maria Inês Carniato- São Paulo: Paulinas, 2010. – (Coleção ensino religioso fundamental). Editora Paulinas. Diversidade religiosa <http://www.youtube.com/watch?v=lZuyqfmHJlM> Acesso em 05/11/12. Jornal Comunicação <http://www.jornalcomunicacao.com/Secoes.asp?Pagina=5&Act=Proxima& Secao=133> Acesso em 05/11/12 Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Religioso / Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. São Paulo: Mundo Mirim, 2009. Pensando o Ensino Religioso <http://pensandooensinoreligioso.blogspot.com.br/2012/05/construindoarvore-dos-eixos-tematicos.html> Acesso em 05/11/12. Regador <http://regador.blogspot.com.br/2011_10_01_archive.html> Acesso em 05/11/12. Santa Catarina. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Currículo: ensino religioso. - Florianópolis: SED, 2001. Sala de aula <http://piquiri.blogspot.com.br/2008/01/decorao-de-sala-deaula.html> Acesso em 05/11/12. Cultura <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura> acesso em 24/11/2011 Sua Pesquisa. com Cultura <http://www.suapesquisa.com/o_que_e/cultura.htm> acesso em 24/11/2011 462 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Diversidade Cultural <http://pt.wikipedia.org/wiki/Diversidade_cultural> acesso em 25/11/2011. 463 A QUESTÃO ATUAL DO ENSINO RELIGIOSO COMO CAMPO DISCIPLINAR: UMA PROPOSTA DE CONSCIENTIZAÇÃO PARA A COMUNIDADE ESCOLAR Terezinha de Souza Pacheco 1 - FCC Neusa Maria de Souza Trindade2 Resumo: A disciplina ensino religioso tem sido, por vezes, fator de resistência para seu efetivo desempenho no meio escolar, ainda que sua premissa seja um conteúdo mais alinhado ao conhecimento do fenômeno religioso e da sua historicidade. Grande parte dos atores que constituem o contexto escolar não tem clareza sobre as mudanças que ocorreram com esta disciplina e, por isso, muitos deles se mantêm em visões amparadas no proselitismo religioso e, como tal, desconhecem os avanços na legislação (Lei n. 9.475/97), como também a existência de um programa de ensino orientado para a compreensão do mundo contemporâneo. Isto posto, o foco deste estudo é apresentar as influências que movem a compreensão tendenciosa desse ensino pela comunidade escolar. Assim, a elaboração de um projeto cultural religioso para expor os conteúdos da disciplina ensino religioso foi realizada por meio de uma proposta pedagógica coordenada pelo professor de ensino religioso envolvendo alunos, gestores e demais professores, incluindo a participação indireta dos pais. Um dos objetivos foi refletir sobre este ensino nas perspectivas do respeito à diversidade cultural, do conhecimento sobre as origens das diferentes religiões e dos limites da legislação. Outra medida foi a aplicação de um dos instrumentos ―Associação Livre de Palavras- ALP‖ em uma pesquisa realizada com 53 sujeitos do ensino fundamental da educação pública. A base teórica contou com a análise de conteúdo (BARDIN, 1977) que organiza categorias semânticas, as quais, com o suporte da teoria das representações sociais idealizada por Serge Moscovici (1971), possibilitaram identificar alguns dos estereótipos que esses sujeitos construíram a respeito dessa disciplina. Este estudo pretende responder às perguntas: como desconstruir a compreensão proselitista dos atores da Comunidade escolar? O nome da disciplina influencia a Comunidade escolar na distinção do ―ensino religioso‖ do ensino da religião? A religião no contexto sociopolítico representado nas Constituições Republicanas Brasileiras (CF1824; CF 1891; CF1934; CF1937; CF1946; CF1967; CF1988) e o seu papel nas instituições escolares pode explicar, de certa forma, a resistência sobre essa disciplina. As políticas de educação, além da questão da formação docente, podem ser uma das dificuldades em adotar o novo conteúdo do ensino religioso. Por fim, este trabalho oferece algumas sugestões de superação no confronto das demandas que estão em jogo para que a disciplina ensino religioso seja, eficazmente, compreendida e desenvolvida. Palavras-chave: comunidade escolar, disciplina ensino religioso, representações sociais, prática pedagógica. 1 2 Mestra em Educação pela UNISANTOS. Pesquisadora Associada da Fundação Carlos Chagas, participando do CIERS-Ed (Centro Internacional em Representações Sociais e Subjetividade – Educação). E-mail: [email protected]. Especialista em ―Propedêutica às Ciências Sociais‖ pela Fundação Educacional – Coordenação de Extensão e Pós-Graduação CESSU. E-mail: [email protected]. FONAPER Introdução A hipótese de que a Comunidade escolar necessita de uma conscientização a respeito da área Ensino Religioso (ER) na escola pública tem como justificativa os desafios que se têm enfrentado e, que em última instância, dificulta a boa implementação deste ensino nas escolas públicas brasileiras. Acredita-se que a aproximação de todos os atores escolares no conhecimento da relevância do ER como possibilidade de ganho intelectual ajudaria a gerar uma nova interação escolar no sentido de envolver outras disciplinas e, também, de valorizar a diversidade religiosa construindo, assim, uma cultura de alteridade. Os alunos ao aprenderem sobre temas, fatos religiosos no contexto da história da civilização em que se tratam as diferentes culturas religiosas e suas características podem, dentro desta lógica, fazer um paralelo com o que ocorre na sociedade, na sua família e consigo mesmo. Nesta intercomunicação, eles podem compreender a disciplina ER como ferramenta de diálogo ao observar as intertextualidades que o tema religião propicia nas obras de arte, na música, na arquitetura, na própria organização sociopolítica do Brasil. Hoje, encontra-se no sistema educacional um quadro de desigualdade no funcionamento desta disciplina com abrangência em nível nacional, estadual e municipal, o que dificulta a construção de sua identidade. Estudiosos desta área (JUNQUEIRA, 2002; OLIVEIRA, 2006) têm apresentado pesquisas que mostram essas discrepâncias. Uma tentativa de explicar tal situação é pautando-se primeiro na legislação: a) Constituição Federal (CF) artigo 210, que aplica o caráter laico e facultativo para a educação religiosa na escola pública; b) LDBEN 9394/96 artigo 33 sob a redação da Lei 9475/97 que coloca este ensino como ―parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina nos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental...‖; c) Resolução CEB 02 de 2 de abril de 1998 que insere a disciplina ER não na base diversificada que é voltada para temas transversais (saúde, sexualidade, trabalho, meio ambiente, entre outros), mas a situa como área de conhecimento onde compartilham as disciplinas convencionais Língua Portuguesa, Matemática, Ciências Biológicas, entre outras. Percebe-se que a disciplina ER instalada como área de conhecimento, mas atrelada ao caráter facultativo traz uma intrínseca incoerência, pois ela é a única disciplina que não exige participação 466 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso obrigatória do aluno. Isto implica maior conscientização de todos os envolvidos para reconhecer, então, seu lugar epistemológico. Como incentivar políticas públicas que supere tal contradição? Qual a eficácia do ensino religioso nas escolas diante do caráter facultativo dessa disciplina? Ponto candente é a questão da formação docente cujas disposições legais oferecem lacunas quanto à qualificação deste professor. Assim, as aulas de ER são atribuídas àqueles profissionais da área de Ciências Humanas – história, geografia, sociologia. Na ausência desses, os demais podem assumir a disciplina. O ER requer uma compreensão interdisciplinar que passa por um esforço consciente de sua importância pedagógica. Os professores de ER têm ao seu alcance os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso - PCNER elaborados pelo Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso – FONAPER. São conteúdos disciplinares sob os eixos temáticos ―Culturas e Tradições Religiosas‖; ―Textos e Livros Sagrados: orais e escritos‖; ―Teologias‖; ―Ritos‖ e ―Ethos‖ os quais garantem para este ensino a perspectiva do fenômeno religioso. Certo que se deve considerar que alguns Estados como Paraná, Santa Catarina, alguns municípios isolados do território brasileiro já trabalham com professores especializados para o ER. Os investimentos neste sentido não são suficientes para dar uma unidade no sistema educacional relativo a este ensino. Portanto, um dos passos é conhecer o que pensam os professores que convive com a disciplina ER. Aportes teóricos Para identificar as representações que os professores possuem sobre E R, a Teoria das Representações Sociais - TRS desenvolvida por Serge Moscovici (1971) vem contribuir na medida em que ela desvela concepções, sistemas de valores, significados construídos pelos sujeitos. As representações sociais são conhecimentos do senso comum. Nas sociedades modernas somos diariamente confrontados com uma grande massa de informações. As novas questões ou eventos que surgem no horizonte social frequentemente exigem, por nos afetarem de alguma maneira, que busquemos compreendê-los, aproximando-os daquilo que já conhecemos, usando palavras que fazem parte do nosso repertório. Nas conversações diárias, em casa, no trabalho, com os amigos, somos instados a nos manifestar sobre eles procurando explicações, fazendo julgamentos e tomando posições. Estas interações sociais vão criando universos consensuais, no 467 FONAPER âmbito dos quais as novas representações vão sendo produzidas e comunicadas, passando a fazer parte desse universo não mais como simples opiniões, mas como verdadeiras teorias do senso comum, construções esquemáticas que visam dar conta da complexidade do objeto, facilitar a comunicação e orientar condutas. Essas teorias ajudam a forjar a identidade grupal e o sentimento de pertencimento do indivíduo no grupo (MAZZOTTI, 1994, p.61). Portanto, uma das características da TRS pode ser entendida como ―um processo cognitivo em que o sujeito se apropria da realidade em construção para integrar ao seu sistema de valores‖ (JODELET, 1994). Esta teoria permite interpretar os fatos porque ela tem o papel de orientar comportamentos, atitudes e práticas sociais. Assim, este estudo, contou com a participação de professores do EFII em uma pesquisa de Mestrado (PACHECO, 2012) com o objetivo de conhecer as representações que esses têm sobre ensino religioso. Uma análise do instrumento metodológico Associação Livre de Palavras - ALP realizado com 53 sujeitos do EFII revelou onde provavelmente estas compreensões estão ancoradas. Uma dessas ancoragens pode estar presente no percurso histórico do ER no Brasil. Sabe-se que a religião no contexto sociopolítico representado nas Constituições Republicanas Brasileiras - CF1824; CF 1891; CF1934; CF1937; CF1946; CF1967; CF1988 – é um dos tópicos debatido calorosamente desde a cisão entre a Igreja e o Estado. Esse ensino no Brasil-colônia gozava da hegemonia cristã católica apostólica romana e, portanto, a orientação era catequética e doutrinal. Porém, de ensino da religião para ER laico, as mudanças se deram ao sabor dos interesses políticos tal que em 30 de abril de 1931, pelo decreto nº 19.941, o Governo de Getúlio Vargas, instituiu o Ensino Religioso nos cursos básicos com exigência da justificação pelo aluno por sua opção facultativa. As CF. 1934 e a CF. 1946 incluíram no artigo 153 e artigo 168, respectivamente, um ensino que respeitasse a confissão religiosa do aluno. No período ditatorial militar (1964-1985), também se manteve estas prescrições para o ensino religioso relativizando, assim, a condição de Estado laico. O que a História constata é que o enfoque para um Ensino Religioso disciplinar definitivamente laico apoia-se na CF 1988 e nas Leis e Diretrizes e Bases 4024/61, 5692/71 e a 9.394/96. Esta última, em seu artigo 33 aprimorou-se com a redação de 22 de julho de 1997 sob a Lei 9.475/97: 468 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. Redação anterior - Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter: I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa. Este novo paradigma que se completa com o artigo 3º da Resolução nº2/98 do Conselho Nacional de Educação e Câmara de Educação Básica institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental as quais determina que os alunos tenham acesso a uma base nacional comum em nível nacional e a uma parte diversificada. Elas podem ser mais bem entendidas na classificação abaixo a seguir: a) a vida cidadã através da articulação entre vários dos seus aspectos como: 1. a saúde 2. a sexualidade 3. a vida familiar e social 4. o meio ambiente 5. o trabalho 6. a ciência e a tecnologia 7. a cultura 8. as linguagens b) as áreas de conhecimento: 1. Língua Portuguesa 2. Língua Materna, para populações indígenas e migrantes 3. Matemática 4. Ciências 5. Geografia 6. História 469 FONAPER 7. Língua Estrangeira 8. Educação Artística 9. Educação Física 10. Educação Religiosa, na forma do artigo 33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. O que está claro é que a disciplina ER ocupa uma posição curricular autônoma o que comporta uma atenção rigorosa em sua estruturação educacional quanto às políticas adotadas nas diferentes esferas institucionais. Fundamentação da proposta pedagógica Para fundamentar este estudo, foi feito um recorte na pesquisa de Mestrado (PACHECO, 2012) para analisar o contexto atual da disciplina Ensino Religioso no campo da docência pelos dados apontados pelo grupo de 53 sujeitos que participaram na pesquisa. Todos são professores do Ensino Fundamental II composto pelas diferentes disciplinas: Matemática = 11; Língua Portuguesa = 8; Arte = 6; Ciências = 6; Geografia = 6; História = 5; Inglês = 4; Ed. Física = 4; Informática = 3. Os cinco professores de Ensino Religioso atuam nas disciplinas de História (2); Geografia (1); Artes (1); Matemática (1). Estes professores estão vinculados à Rede Municipal da cidade de Santos/SP cujas escolas, ao todo 16, possuem na grade curricular a disciplina ER. Foi importante conhecer a denominação religiosa a que eles pertencem porque pode influenciar a visão que esses sujeitos têm sobre ER. Gráfico 1: Perfil dos professores do ensino fundamental II – denominação religiosa 470 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Este gráfico em que aparecem seis religiões mostra o contexto pluralista da cultura religiosa que caracteriza o espaço escolar e, por conseguinte, a sociedade. Estes dados também indicaram que a religião cristã é predominante na população investigada. O instrumento metodológico Associação Livre de Palavras - ALP possibilita conhecer a relação que os professores têm com o objeto ER. Eles, como sujeitos pesquisados, são convidados a evocar as primeiras quatro palavras que lhes vierem à mente ao ouvirem alguns termos. Esses termos são chamados de termos indutores, pois eles trazem à mente representações ligadas ao termo, que são então expressas por palavras. Os termos indutores selecionados foram: ensino religioso; ensino religioso e currículo; ensino religioso e diversidade; ensino religioso e escola. A ideia é que essa tarefa facilita a expressão, de forma espontânea, das imagens relacionadas aos termos indutores. Assim, foi solicitado da seguinte maneira: ―Escrevam as primeiras quatro palavras que lhes vêm à mente quando digo ‗ensino religioso‘‖. Após o término da escrita das quatro palavras, o pesquisador coloca o segundo termo ―ensino religioso e currículo‖ e espera o tempo necessário para que todos os sujeitos terminem de escrever, e, passa para o terceiro termo ―ensino religioso e diversidade‖ e, por último o quarto termo ―ensino religioso e escola‖. O caráter espontâneo – portanto menos controlado – e a dimensão projetiva dessa produção deveriam, portanto permitir o acesso, muito mais fácil e rapidamente do que uma entrevista, aos elementos que constituem o universo semântico do termo ou do objeto estudado. A associação livre permite a atualização de elementos implícitos ou latentes que seriam perdidos ou mascarados nas produções discursivas (ABRIC, 1994b, apud SÁ, 1988, p. 91). Para analisar as palavras ao cruzar dados como a frequência e a ordem de evocação, utilizou-se o software EVOC (2000) de análise textual foi elaborado por Pierre Vergès (1992) e popularizado após um trabalho acadêmico realizado no campo das representações sociais. Com ele é possível identificar os possíveis elementos centrais e periféricos das representações que os sujeitos pesquisados possuem e observar como esses elementos estão articulados. O conjunto de palavras emitidas foi tratado dentro de categorias semânticas orientadas pela análise de conteúdo (BARDIN, 1977) para 471 FONAPER classificar unidades de vocabulário em itens de sentido como pressupostos de interpretação. As palavras mais frequentes tornam-se importantes, pois a saliência de uma ideia pode ser observada e explicada pela frequência de aparição dessa ideia nos discursos dos componentes de um mesmo grupo. A frequência de evocação e a ordem média de evocação possibilita o levantamento dos elementos centrais e periféricos das representações (SÁ, 1996). O software gera uma tabela com quatro possíveis agrupamentos, ou quadrantes. Para o primeiro termo indutor, as palavras com alta frequência e prontamente evocadas foram apenas uma “Deus” e ocupa o primeiro quadrante. Elas indicam os elementos constituintes do núcleo central da representação. Elas foram as mais salientes pela alta frequência e pronta evocação. As palavras altamente frequentes, mas pronunciadas menos prontamente foram “Amor, Respeito, Valores‖ são do segundo quadrante. Elas correspondem aos elementos periféricos da representação. As palavras encontradas no 3º quadrante ―Crença, Espiritualidade, Ética, Religião” e são palavras com baixa frequência, mas pronunciadas prontamente. E as palavras “Conhecimento, Paz” foram as de baixa frequência e pronunciadas não prontamente (quarto quadrante). A palavra ―Deus‖ está no primeiro quadrante e indica sua centralidade na representação desse termo. É possível dizer que a representação está associada ao conceito de transcendente. A palavra amor, no segundo quadrante, indica que este sentimento humano se liga à ideia de um Deus. Já as palavras respeito e valores expressam que esse ensino promove uma consciência cidadã. No terceiro quadrante encontramos três possíveis significados. A palavra crença tem a ver com fé, enquanto que espiritualidade nos remeta à ideia de transcendência. A palavra ética já manifesta um sentido de princípio que rege as relações sociais. Embora no último quadrante, a palavra conhecimento indique uma referência à atual perspectiva deste ensino, é a palavra paz que sobressai e pode ser interpretada como expressando um desejo, uma expectativa de se alcançar esse estado de paz. Os professores do fundamental II lidam com as questões do ensino religioso mais fortemente, pois as escolas em que trabalham têm em seus planejamentos de curso a proposta de desenvolver essa disciplina. Mesmo que nem todos os professores lidem diretamente com ele, é possível que exista uma proximidade com o tema. A palavra ―conhecimento‖ no último 472 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso quadrante é significativa, pois esse ensino, tal como prevê a legislação vigente, deve trabalhar com conhecimentos sobre religiões. Interessante observar que os demais termos indutores: “ensino religioso e currículo”; “ensino religioso e diversidade”; “ensino religioso e escola”. tiveram no primeiro quadrante, ou seja, como núcleo central das representações dos sujeitos pesquisados as palavras “Respeito e Valores”. Possivelmente, elas ocupam este quadrante porque os sujeitos entendem que os conteúdos para este ensino devem tratar de temas formativos, ou seja, que respaldam questões de comportamento e de relacionamento que permeiam as discussões entre gestores e professores. Essas seriam ideias sobre esse ensino enraizadas nas culturas, nas tradições. Para a teoria do núcleo central, são ideias que possuem um caráter de rigidez, que dificilmente se transformam. Estão ligadas à memória coletiva, são consensuais e estáveis. Mudar o núcleo central seria mudar a própria representação (SÁ, 1996). Outro ponto de ancoragem pode ser encontrado na história desse ensino no Brasil. Ele foi visto, até pouco tempo, como um momento de formação catequética. Somente com o Parecer CNE/CBE no 2/98 este ensino adquiriu um caráter disciplinar e foi considerado como uma área de conhecimento, articulada com as outras áreas como Língua Portuguesa, Geografia, História, etc. Portanto, possivelmente, os professores ainda têm uma concepção de um ensino religioso ligado à catequese e à Igreja Católica. O perfil dos sujeitos nos mostra que eles são, em sua maioria, católicos. Portanto, a ênfase na catequese pode ser explicada por esse maior número de sujeitos ligados à religião católica, que tem sua história no Brasil vinculada ao ensino de uma específica religião no contexto escolar. Esta amostragem pode também refletir uma compreensão tendenciosa dos professores sobre o ensino religioso na escola pública de modo que uma proposta de conscientização do paradigma atual desse ensino vem ao encontro dos professores, gestores e dos demais participantes da instituição escolar para que a implementação desta disciplina alcance sua verdadeira identidade. Como, então, organizar uma proposta de conscientização para a Comunidade escolar, de forma democrática, visando a uma desmistificação em torno do ER como disciplina curricular da Educação Básica? Quem é essa Comunidade escolar? 473 FONAPER Proposta pedagógica A ideia de elaborar uma proposta, com tal objetivo, tornou-se premente frente à realidade retratada nas alegações acima sobre os percalços que têm acompanhado a implantação do ER nas escolas públicas. Ela deve ser direcionada aos professores, gestores, funcionários, alunos e pais, imbuídos do propósito de um envolvimento responsável em relação ao tema em si. Por meio da realização de vários encontros tendo em vista as diferentes posições dos pares que compõem a unidade escolar, optou-se pela seguinte logística de distribuição, a qual se constituiria em vários momentos: - 1º momento: um encontro entre os professores de ER onde irão discutir os PCNER1995 e demais materiais concernentes que tratam dos conteúdos dessa disciplina com vistas a um trabalho interdisciplinar abrangendo áreas afins para favorecer a integração de conteúdos. Esse encontro poderá se prolongar mais do que os outros, uma vez que estes profissionais é que estarão diretamente ligados ao trabalho, com o ensino propriamente dito. Todavia, é muito importante que os gestores (administrativo/ pedagógico) participem de todas as etapas, pois serão os facilitadores da desburocratização dando apoio para essa nova e dinâmica visão de prática escolar. Sabe-se que muitas variáveis interferem na condução de trabalhos de vanguarda na escola, exigindo, inclusive, mudança na estrutura física e adaptação do layout tradicional de cadeira uma atrás da outra para outras disposições mais ―dialógicas‖. Ainda por serem os coordenadores desta proposta, os professores de ER terão que ter bem claros os conceitos estruturantes dessa disciplina para poderem intercambiar com os das outras áreas afins. Em termos ideais, esse trabalho deveria ser desenvolvido com todas as áreas do conhecimento, pois é para o aluno que está na ponta do sistema educacional que são envidados todos os esforços pedagógicos, administrativos e legais. Enfim, tudo isso só fará sentido se o acesso à reelaboração e produção do conhecimento pelo aluno permitir uma compreensão mais globalizada do mundo no lugar de um ensino de disciplinas estanques e sem comunicação que produz fragmentação do saber de tal forma que o ensino tem se tornado sem significado e desinteressante. 474 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Nesta atividade é Importante destacar alguns conceitos que fazem parte do arcabouço teórico-prático da disciplina ER, os quais poderão servir de fio condutor para o desenvolvimento dos temas pertinentes a essa área curricular: Religião/ Religiosidade/ Espiritualidade/ Moral/ Ética/ Diálogo x Discussão/ Verdade/ Incerteza/ Condição humana/ Identidade Planetária/ Preconceito/ Alteridade/ Respeito. A clareza dos conceitos que envolvem os conteúdos dessa disciplina, após pesquisas e discussões, será imprescindível para o confronto e o diálogo diante da diversidade religiosa e cultural dos alunos que não tem sido levada em conta transformando o ER em aulas de catequese e atividades esotéricas. - 2° momento: um encontro dos professores de ER com os professores das Áreas afins para compartilhar ideias, opiniões e troca de experiências conduzindo à interação entre as áreas do conhecimento. Esse encontro, coordenado pelos professores de ER, deve ser pautado no trabalho conjunto entre ER e aquelas disciplinas cujos conceitos estruturantes possam dar uma dimensão mais totalizadora e, os conteúdos ou temas trabalhados, possam permitir ao aluno se conhecer melhor, seu espaço, localizar-se na sua comunidade e começar perceber a correlação dos conhecimentos. Com isso, sentir-se mais autoconfiante e capaz de atuar e contribuir na transformação do mundo. Cada área levantaria os conceitos, os temas centrais de suas disciplinas, sem, contudo, fazer apenas uma justaposição, e sim, um trabalho que amplie os horizontes de percepção do aluno, e que fiquem claras as possíveis interligações entre os conhecimentos das múltiplas disciplinas. Um ponto fundamental para o exercício da interdisciplinaridade e da conscientização das novas concepções do ER é o diálogo que deve existir numa perspectiva de horizontalidade permitindo aos professores, sobretudo, os de ER e os alunos, a oportunidade de vivenciar, substancialmente, os próprios valores os quais permeiam e fundem-se aos próprios conteúdos dessa disciplina. O fato de ER não ter uma ciência de referência, seus elementos estruturais e conceituais vão se erigir a partir do conhecimento da história das religiões que ao longo de toda trajetória da humanidade assumiu diferentes modos de relação com o invisível, com o mistério. No princípio, buscando explicação nos mitos, até chegar a formas mais complexas e institucionalizadas. Segundo, Karen Armstrong (2.006, p.16), ―um dos motivos pelos quais a religião parece irrelevante, hoje em dia, é que muita 475 FONAPER gente não tem mais a sensação de estar cercada pelo invisível. Nossa cultura científica nos educa para que concentremos nossa atenção no mundo físico e material que está diante de nós‖. 3° momento: um encontro dos professores de ER com os pais dos alunos. A presença dos demais professores seria interessante porque demonstraria uma escola comprometida com a formação do aluno. Esse encontro, por tratar de uma linguagem não acadêmica, pode iniciar o diálogo a partir de um ditado popular. É muito comum ouvir: ―Religião e Política não se discutem‖. Este seria um bom tema como sugestão para debate com os pais na expectativa de apontar as ideias estereotipadas existentes em torno dessa disciplina. Sob a coordenação dos professores de ER, os pais seriam encorajados a colocar suas impressões com relação ao ER na escola. O intuito, nesse momento, é perceber os níveis de aceitação e/ou resistência dentro da disciplina ER, e em seguida os professores exporiam o que preconiza a legislação atual do ER. Considerações finais Essa proposta de conscientização é audaciosa no sentido de propor mexer na infra (física) e super (mental) estrutura da escola, descentralizar o poder escolar propiciando uma experiência efetiva de autonomia dos próprios sujeitos. Essa ousadia envolve muito mais competência, expõe os pontos nevrálgicos da escola, valoriza a cooperação, resgata a dimensão mais totalizadora do conhecimento, protagoniza o diálogo dinamizando a comunicação, e dá mais significado ao conteúdo escolar. Os ―Encontros‖ como estratégias de trabalho são importantes na medida em que se abre um espaço de interlocução entre os participantes para que as visões e os estereótipos, sejam aos poucos desconstruídos. O que deve estar subjacente em todas as discussões, nesses encontros, é o como proceder às mudanças necessárias diante do quadro atual com suas contradições já diagnosticadas. Com referência à situação legal, hoje o ER tem o seu lugar na Escola como componente curricular, porém com opção facultativa para os alunos, deve ser laico e respeitar a diversidade religiosa dos alunos e ministrada uma aula, uma vez por semana, na maioria das escolas. Em face disso, cada sistema de Ensino irá deliberar e formular seus conteúdos disciplinares. 476 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Enfim, o trabalho deve propor uma nova visão do ER na escola e uma proposta metodológica de conscientização com os pontos levantados acima levando em conta o caráter laico do Estado brasileiro. Dentro dessa fisionomia, por que não sugerir a mudança do nome dessa disciplina com o compromisso de investigar até que ponto a própria nomenclatura Ensino Religioso tem contribuído para essa visão distorcida da disciplina, confundindo o conceito de Religião com o conceito de Ensino Religioso. Vale ressaltar que quando se quer uma mudança mais radical em busca de práticas mais substanciais buscando envolver todo o fenômeno, não basta mudar apenas o conteúdo, a mudança da forma também se faz necessária. Como sugestão, alguns nomes: ―Ciências Religiosas‖, ―Civilizações religiosas‖, ―Estudo das religiões‖. Referências ARMSTRONG, Karen. Uma história de Deus. São Paulo: Companhia das Letras. 2006. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988. _____. Decreto Nº. 19.941 - de 30 de Abril De 1931. Dispõe sobre a instrução religiosa nos cursos primário, secundário e normal. Senado Federal de Informações. Rio de Janeiro, 30 de abril de 1931. _____. LDBEN n. 9.394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996. _____. Lei 9.475. 22 jul. 1997. Brasília, 1997. _____. Parecer 04/98 e Resolução 02/98. Câmara de Educação Básica. FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso). Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso. São Paulo: Ave Maria, 1997. JODELET, Denise 1994, Menin e Shimizu. Educação e representação social: tendências de pesquisa na área – período 2000 1 2003.SãoPaulo: Casa do Psicólogo, 2005, p.93-130. 477 FONAPER JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. & ALVES, Luiz Alberto. O contexto pluralista para a formação do professor de ensino religioso. Revista Diálogos Educacional. Curitiba, v.5, n 16, set/dez 2005, p. 229-246. _____; & OLIVEIRA, Lilian Blanck. A construção histórica de um componente curricular brasileiro: ensino religioso. Anais do VI Congresso Luso-brasileiro: UFU, 2006, p. 278. MAZZOTTI, Alda Judith Alves, REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: aspectos teóricos e aplicações à Educação Em Aberto, Brasília, ano 14, n.61, jan./mar. 1994, p. 60-78. MOSCOVICI, Serge . Representações sociais: investigações em psicologia social. Petrópolis: Vozes, 2003. SÁ, Celso. Pereira de. Núcleo central das representações sociais. Petrópolis,RJ: Vozes, 1996. PACHECO, Terezinha de Souza. A visão dos professores sobre o Ensino Religioso: diversidade e interdisciplinaridade. Santos: Dissertação de Mestrado. Universidade Católica de Santos, 2012. VERGÈS, Pierre. L‟évocation de l‟argent: une méthode pour la définition du noyau central d‘une représentation. Bulletin de psychologie, Paris, Tomo XLV, 405, 203-209, 1992. 478 O ATEÍSMO NAS AULAS DO ENSINO RELIGIOSO Narjara Lins de Araújo1 /UFPB Resumo: Este artigo aborda a problemática da falta de materiais didáticos que apresentem conteúdos referentes ao tema relacionado ao ateísmo durante as aulas de Ensino Religioso. Sabe-se que assim como se deve respeitar a opção religiosa dos sujeitos, é preciso o respeito aos sujeitos não-religiosos considerados ateus e ateias que frequentam as aulas desta disciplina. Este trabalho teve como objetivo geral verificar se existem materiais didáticos que abordem o conteúdo voltado para o ateísmo em escolas públicas nas quais os alunos da graduação em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba- UFPB realizam estágio. E, como objetivo específico, levantar a existência de alunos ateus/ateias nessas escolas. Este trabalho faz parte de outra pesquisa maior que é de campo, quantitativa e qualitativa, cujo procedimento metodológico foi por meio de um questionário semiestruturado e com uma questão do teste de Associação Livre de Palavras de Coutinho (2003). Os resultados mostram que existem alunos ateus/ateias nas escolas envolvidas e na grande maioria delas não existem materiais didáticos que abordem o tema ateísmo. Palavras-chaves: Ensino Religioso; ateísmo; materiais didáticos. Introdução Atualmente se tem consciência da diversidade de alunos (as) religiosos (as) e não-religiosos (as) que ocupam as escolas públicas do Brasil. Existem vários projetos de Leis como é o caso da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) que declara o respeito e inclusão das características da diversidade cultural do povo brasileiro. O Ensino Religioso é a disciplina que trabalha diretamente com as questões que giram em torno dos fenômenos religiosos e consequentemente o ateísmo. Já existem Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNER), criados pelo Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER), que tenta abranger esta pluralidade religiosa dos alunos (as). Devido à credibilidade do FONAPER esta proposta vem sendo usada como base para os cursos superiores de formação de professores e na construção do currículo escolar do ER. (BRANDENBURG, 2004, P.62) Junqueira (2012) defende que o ER deve abordar a questão religiosa a partir da Ciência da Religião, segundo ele, só assim será possível 1 Pedagoga e mestranda da pós-graduação em ciências das religiões na Universidade Federal da Paraíba- UFPB. E- mail: [email protected] FONAPER compreender todas as dimensões presentes que a religião infere na sociedade, inseridas no cotidiano, posturas e discursos. Houve um aumento das Instituições Superiores para a formação de professores para atuarem no ER com bases na Ciência da Religião, cujo objetivo era tratar o fenômeno religioso como característica cultural dos povos e patrimônio da humanidade, passível de ser estudado e pesquisado. (JUNQUEIRA, 2012) Mas, e quando o assunto é a falta da religião? Como gerar o respeito e o entendimento deste termo em meio a tantas culturas religiosas? Os professores recebem formação específica para estes casos? E os estudantes que estão em processo de formação inicial em cursos superiores? Este trabalho teve como objetivo geral verificar se existem materiais didáticos que abordem o conteúdo voltado para o ateísmo em escolas públicas nas quais os alunos da graduação em Ciências das Religiões da UFPB realizam estágio. E como objetivo específico, levantar a existência de alunos ateus/ateias nessas escolas. Este trabalho faz parte de outra pesquisa maior que é de campo, quantitativa e qualitativa, cujo procedimento metodológico foi por meio de um questionário semiestruturado e com uma questão do teste de Associação Livre de Palavras de Coutinho (2003). O Ateísmo na Antiguidade Na Antiguidade os Gregos e Romanos também viviam num ambiente em que havia templos por todo o lado, os deuses adoravam as suas moedas, o calendário ia de festival em festival religioso e os ritos religiosos seguiam todas as grandes transições da vida. Por esse motivo, o ateísmo nunca se tornou uma ideologia popular. (BREMMER, 2010, p.19) O foco de ateísmo que existia nesta época, eram indivíduos excepcionais que se encorajavam a dar voz a sua descrença, ou filósofos corajosos que propunham teorias intelectuais sobre a origem dos deuses sem que, normalmente, pusessem as suas teorias em prática e sem que rejeitassem completamente as práticas religiosas. O que existia era um ateísmo ―frouxo‖ ou a imputação de ateísmo aos outros para desacreditar. (BREMMER, 2010, p.19-20) 472 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso É importante compreender que os cépticos e descrentes sempre existiram na humanidade, e estavam sujeitos às circunstancias históricas. Alguns períodos toleraram mais as pessoas consideradas ateístas, mas no geral o ateísmo era visto como teorias aceitáveis sobre os deuses e a origem da religião. (BREMMER, 2010, p.20) Por isso, temos de prestar mais atenção aos diferentes períodos em que o ateísmo de certo modo dissipou do jeito que os Gregos e Romanos posteriores interpretam os seus antecessores e as razões pelas quais as pessoas de uma dada época colocam o ateísmo aos contemporâneos que tem conceitos religiosos diferentes dos seus. (BREMMER, 2010, p.19-20) No período clássico houve um grande interesse pelo ateísmo, este termo classificava aqueles pensadores e pessoas que negavam a existência dos deuses. Publicações desta época são reescritas em edições mais modernas, e nos fazem perceber de forma diferente os antigos indícios gregos escritos no século XX. (BREMMER, 2010, p.20-21) O ateísmo surge visivelmente na Grécia durante esse período, de modo especial em Atenas, por volta do século V a.C. Ainda assim, o primeiro ―ateu‖ não foi desta região, ele veio a surgir por volta de c. 490-420, e era conhecido como Protágoras, este foi muitíssimo respeitado ao longo de sua vida por vários intelectuais da época, como, por exemplo, Platão. Assim como Protágoras, outros intelectuais como Xenófanes (c. 570495 a.C) e Heráclito (c.500 a.C) tentaram introduzir novas ideias sobre o divino, em vez de abolir completamente a ideia de divino. Mais tarde, no século III d. C, Diógenes Laércio, por exemplo, veio a complementar esta ideia revolucionária afirmando que ―o Sol era uma massa de metal ao rubro‖ quebrando com a representação do Sol como o deus Hélio, retirando assim a sua natureza divina. (BREMMER, 2010, p.22) Bremmer (2010) afirma que a conexão entre ateísmo e a especulação sobre a natureza dos céus é uma característica dos filósofos considerados ateus nesta época. Platão descreve bem este pensamento na Apologia: Há um homem sábio chamado Sócrates que tem teorias sobre os céus e que investigou tudo sob a terra, e que pode fazer o mais fraco argumento derrotar o mais forte. São estas pessoas, senhores do júri, os que disseminam estes rumores, que são os meus perigosos acusadores, porque quem os ouve supõe que quem investiga tais questões tem de ser um ateu. (BREMMER, 2010, P.23) 473 FONAPER Neste, Platão esclarece que o filosofo Sócrates era um grande sábio, que era discriminado por investigar além das bases filosóficas dadas pela religião, outras filosofias, não tendo a ideologia religiosa como pura verdade, sendo por isso considerado um ateu. O filosofo Pródico foi bem mais radical afirmando que os deuses da crença popular não existem, e as pessoas não sabem disso, mas o homem primitivo, os frutos da terra e praticamente tudo o que contribui para a sua existência. Continuou seu pensamento dizendo, que os primeiros conceitos de deuses começaram a surgir quando o homem primitivo passou a chamar de ―deuses‖ aos elementos da natureza dos quais mais dependiam como o Sol e a Lua, os rios e os frutos. Ou seja, para Pródico, houve um tempo sem deuses, apesar de o homem já existir. E a ideia de religião só veio surgir, posteriormente, com o início da agricultura. (BREMMER, 2010, p.24) Bremmer (2010) relata que o filosofo Sísifo (415 a. C), o grego mais esperto da mitologia, afirma que a religião foi inventada para assegurar o bom comportamento dos seres humanos. E Crítias (450-403 a. C) relata este pensamento, com a seguinte passagem: Houve um tempo em que a vida dos seres humanos era desordenada, semelhante a dos animais e regida pela força, não havendo recompensa para o virtuoso nem castigo para o perverso. Depois, penso que os seres humanos decidiram estabelecer as leis como castigo de modo a que a justiça pudesse governar mantendo o Crime e a Violência como escravos. E só castigavam quem continuasse a fazer o mal. Então, dado que as leis restringiam os actos de violência aberta, os homens continuaram a cometê-los em segredo; então, penso, um homem sábio e esperto inventou para os mortais o medo dos deuses, de modo a dissuadir os perversos, quando agem ou dizem ou pensam algo em segredo (...). (BREMMER, 2010, P.26) Sócrates (469-399 a.C) foi acusado pelos Atenienses de ―não reconhecer os deuses que a cidade reconhece e de introduzir poderes novos‖, colocando em dúvida os deuses tradicionais. Mas só após a morte de Sócrates, já em Platão (c. 429-347) é que a palavra grega atheos, cujo significado original é ―sem deuses, abandonado pelos deuses‖, realmente ganha força e desgasta cada vez mais as crenças tradicionais, tornando os ―verdadeiros‖ ateus um fenômeno raro no mundo grego. (BREMMER, 2010, P.29) Outro fato importante para a história do ateísmo na Antiguidade, além da abertura para a liberdade intelectual, foi que os Gregos, Romanos, 474 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso pagãos e cristãos utilizaram do termo ―ateu‖ como forma de rotular os seus inimigos. (BREMMER, 2010, P.32) O Ateísmo na Modernidade Na modernidade, período que predomina o ―desejo de um domínio omniabarcante da realidade por meios racionais e\ou científicos‖ o teísmo (a crença em deus) vai se perdendo, dando lugar ao ateísmo que passa a ser uma característica desse período, estimulando os novos filósofos a defenderem a necessidade de deixar para o passado os ideais culturais religiosos até agora firmados. (HYMAN, 2010, P.40) O termo ―ateísmo‖ vai sendo definido com menos limitações, como a ―crença de que Deus não existe‖, porém o entendimento desse conceito vai depender da concepção de teísmo que se tenha. O que significa que existirão tantas variedades de ateísmo quantas as variedades de teísmo. Isto é, o ateísmo será sempre uma negação de uma forma particular de teísmo. (HYMAN, 2010, P.41) Mais especificamente o termo ateísmo neste período, se caracterizava mais como uma negação da intervenção da providencia divina e não uma negação da existência de Deus, ou seja, se assemelhava a heresia e não uma negação sem rodeios do teísmo. Porém, esse significado rapidamente vai se moldando e ficando cada vez mais parecido com a definição que nos é mais familiar. Devido ao crescimento do ateísmo a todos os níveis sociais, este ganha importância, não apenas de todo um corpo de literatura, como também de políticas, sentenças judiciais e preocupações sociais contra os ateus, pois estes passaram a ocupar o centro da polêmica. O termo ―ateísmo‖ que até então era usado como uma forma de acusação, só vem a surgir como termo de autodefinição, uma declaração da nossa própria crença (ou ausência dela) no século XVIII entre os intelectuais parisienses. (HYMAN, 2010, P.42) Entre estes intelectuais, está Denis Diderot, o primeiro dos ateus, não apenas cronologicamente, como também o primeiro e principal defensor e influência. Seu argumento se baseava na física matemática de Descartes e a mecânica universal de Newton. A partir daí, apresentou ―a formulação inicial, mas definitiva‖ do ateísmo: ―o princípio de tudo é a natureza criadora, a matéria na sua autoactividade, produzindo eternamente toda a mudança e todo o desígnio‖. (HYMAN, 2010, P.43). O 475 FONAPER ponto importante a ser destacado é que Diderot chegou a suas conclusões ateias por meio da intensificação das ideias de Descartes e Newton, dos quais dependiam os cristãos para defenderem seus conceitos de fé. Devido o termo ateísmo estar ligado com a política revolucionária de extrema- esquerda e com as ideias de Karl Marx, muitos intelectuais, entre eles Huxley e os seus companheiros, que criaram um novo termo, o ―agnosticismo‖, que não representava um novo credo, mas um desconhecimento metafísico; esse passa a disputar com o ateísmo como disposição intelectual alternativa. (HYMAN, 2010, P.43) Apesar de todo este tumulto em torno do ateísmo, ainda existiam pessoas que lutavam para que este fosse aceitável e respeitável. Um que teve grande destaque foi Charles Bradlaugh, por volta do século XIX, ele foi o primeiro ateu explícito e confesso do Parlamento britânico, que lutou para que o ateísmo se tornasse aceitável na sociedade civil, e pelo direito dos ateus testemunharem em tribunal. (HYMAN, 2010, P.44) O ateísmo só vai ganhar mais impulso no final do século XIX, quando Friedrich Nietzsche e John Newman tomaram consciência que um novo espírito que se agitava e que teria grandes conseqüências, ou melhor, que ―a impotência religiosa, ou o desinteresse, não permaneceria um fenômeno privado ou isolado, que isso caracterizaria cada vez mais o intelecto instruído da Inglaterra, França e Alemanha e que a sua influência acabaria por se fazer sentir em todos os aspectos rotineiros da civilização‖. Porém, isso só veio acontecer sessenta anos depois, marcando o período como a ―era do ateísmo‖ e só veio a se enraizar nos últimos quarenta anos do século XX. (HYMAN, 2010, P.45) Esse novo ateísmo tinha características distintas dos conceitos anteriores, ou seja, algo de distintivo na negação contemporânea de Deus, tanto no que se refere ao seu alcance como a sua instituição cultural. A ligação do ateísmo com a modernidade, é que nesta última, houve um afastamento de um comprometimento religioso baseado na tradição, mas esse fato não gerou o ateísmo generalizado, pois o ateísmo era uma confissão minoritária, junto a outras alternativas de ―espiritualidades‖, que surgiam no mundo ocidental moderno. (HYMAN, 2010, P.46) A concepção de Deus a qual o ateísmo moderno se opôs é aquela que o ver como pertencente à mesma ordem ou qualidade dos atributos humanos, pois para eles Deus estava num grau maior. (HYMAN, 2010, P.56) 476 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso Pode-se perceber a ligação da modernidade e do ateísmo, desta forma com o ―fechamento‖ da primeira, o ateísmo e, consequentemente, o teísmo mais moderno, sofrem transformações advindas do pósmodernismo, podendo ainda regredir para formas mais medievais. Independente de qualquer um, o destino do ateísmo está ligado ao da modernidade. (HYMAN, 2010, P.59-60) Ateísmo e Religião De acordo com o argumento de Martin (2010, p.283), o ateísmo em si não é uma religião. Porém, existem três religiões mundiais, isto é, o jainismo, budismo e confucionismo, que são ateístas, ou melhor, a negação da existência de um Deus teísta. O ateísmo não se opõe às religiões teístas, mas depende do contexto histórico do qual foi construído. Independente da definição dada ao ateísmo, este não tem as exigências necessárias para ser uma religião, pois o ateísmo negativo, ou seja, não ter uma crença em Deus ou em deuses, não tem qualquer uma das características constitutivas de um conceito de religião. Já o ateísmo positivo, ou seja, a crença de que não há Deus, nem deuses, de acordo com algumas definições de religião também não é considerado uma religião. (MARTIN, 2010, P.288) De acordo com Martin (2010, p. 291), o argumento que o jainismo é uma religião ateísta, não é totalmente verdade, pois este é ateísta apenas em sentido restrito, devido aos seus deuses terem pouco poder e não desempenhar qualquer papel no objetivo jaina da salvação. Ou seja, os deuses poderiam ser eliminados do jainismo sem que se perda o essencial desta religião. Então, apesar de o jainismo não ser considerado de fato uma religião ateia no sentido lato, poderia ser ateia nesse sentido. (MARTIN, 2010, P.291) Já no caso do budismo, se existir realmente a crença nos deuses devas, então este não é uma religião ateia no sentido lato. E apesar desses deuses não terem um papel na via budista para a salvação, encontrada nas Quatro Nobres Verdades e na Nobre Via Óctupla, faziam parte da mundividência budista. Assim, como o jainismo, o budismo é uma religião ateia positiva com base em argumentos racionais. Como se sabe, a tradição intelectual budista faz uso de razões para não acreditar em um Deus teísta. (MARTIN, 2010, P.295) 477 FONAPER Assim como o jainismo e o budismo, existe desacordo entre os estudiosos sobre se o confucionismo é uma religião ateia. Os estudiosos jesuítas nos séculos XVII e XVIII argumentaram que, visto o confucionismo ser basicamente um sistema ético, os seus seguidores poderiam ser convertidos ao cristianismo sem abandonar as suas próprias perspectivas. Estudiosos protestantes missionários posteriores, como James Legge (1815-1897), argumentaram que apesar de o próprio Confúcio ser céptico quanto à religião, a perspectiva tradicional do Céu que as pessoas comuns tinham era o verdadeiro Deus da religião cristã. (MARTIN, 2010, p.296) Mas será que realmente existem religiões ateias? A resposta é a seguinte, apesar de existir algumas religiões ateístas no sentido estrito, o ateísmo não é contra necessariamente a religião. De acordo com Martin (2010): (...) apesar de o jainismo, budismo e confucionismo não serem ateias no sentido lato, parece possível eliminar qualquer Deus ou deuses destas religiões sem grande conseqüências, pois não parece que a via da salvação espiritual e a forma de vida especifica por estas religiões fossem significativamente afetadas ao eliminar todos os deuses. (MARTIN, 2010, p.299) Porém, saber-se que um ateísta é contrário às crenças teológicas da religião é coerente com outros aspectos da religião. Um ateísta pode apreciar os rituais de uma religião teísta por razões estéticas sem necessariamente defender que o código ético de uma religião teísta está correto, mesmo rejeitando a idéia de que Deus a criou. (MARTIN, 2010, P.299). Contextualizando o Ensino Religioso no âmbito escolar Acredita-se que as escolas precisem ter uma orientação racional, de conhecimento e análise da situação religiosa, quer dizer, durante as suas tarefas educativas deve-se refletir sobre a realidade a partir das referências oferecidas pelas ciências sobre os mais diversos elementos que dão forma a sociedade. De acordo com contexto o estudioso Passos afirma que: O ER assume, necessariamente, em suas definições curriculares, a crítica ao conhecimento tecnicista que instrumentaliza o conhecimento no domínio de algum aspecto restrito da realidade, a crítica ao 478 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso positivismo que coloca a ciência como a versão da verdade e a crítica a neutralidade das ciências como abordagem definitiva da realidade. (PASSOS, 2007, p.37 – 46). Isto porque na contemporaneidade a educação tem assumido uma concepção integral do ser humano, buscando superar teorias e posturas que privilegiam o racional, ignorando dimensões como a religiosa em relação ao desenvolvimento do educando e no processo de construção do conhecimento. Segundo Sena (2005), o Ensino Religioso na atualidade esta inserido na perspectiva de ―uma educação integral, que considera o ser humano na totalidade do seu ser, a religiosidade e suas diferentes expressões se apresentam hoje como uma dimensão humana relevante, manifestando os níveis mais criativos e profundos do ser humano‖. Devido ao importante papel da religião dentro das sociedades humanas como expressão da religiosidade, a educação nos dia de hoje: Não pode omitir a educação da religiosidade e o estudo do fenômeno religioso, objeto da disciplina de Ensino Religioso‖. Diante de situações-limite, do inexplicável, como o sofrimento e a morte, surgem perguntas existenciais para as quais a ciência não tem respostas. Essa a razão pela qual assistimos hoje o retorno da sensibilidade ao sagrado, a busca do misticismo de várias formas, a valorização do mistério, a busca de espiritualidade. O fenômeno religioso se impõe como um aspecto indissociável da vida humana, cujo estudo não pode ficar fora da escola. (SENA, 2005) Sabe-se que a principal função da instituição escolar é ―fornecer instrumentos de leitura da realidade, capacitando o educando para compreender melhor a si mesmo e ao mundo, e criar condições para a convivência entre pessoas‖. (SENA, 2005) Por este motivo, a inserção do Ensino Religioso no currículo escolar, como disciplina e área de conhecimento, visa desenvolver a espiritualidade presente no contexto espiritual ―preenchendo o vazio deixado por uma educação com predominância quase exclusiva no racional, no desenvolvimento científico e tecnológico do educando, deixando de lado as razões e as finalidades últimas da existência‖. (SENA, 2005) Partindo deste princípio, o Ensino Religioso visa desenvolver a religiosidade através do conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, partindo das experiências religiosas de cada aluno. 479 FONAPER O ensino religioso como área de conhecimento deve em seu fazer pedagógico partir de conhecimentos produzidos, acumulados e sistematizados historicamente de forma a possibilitar aos educandos conhecer o passado e o presente numa perspectiva de criar novos conhecimentos. (OLENIKI, 2005) Ou melhor, o fazer pedagógico no Ensino Religioso acontece por meio do serviço ao educando, no diálogo inter-religioso com o propósito de gerar a informação, a interpretação do conhecimento acumulado, a ressignificação de conteúdos e conceitos durante o processo de ensinoaprendizagem, em relação às diferenças, diversidades e pluralidade, numa ênfase histórica, que permite o entendimento de si e do outro, viabilizando a formação do cidadão. (OLENIKI, 2005) Qualquer área de conhecimento deve partir do ponto que ―ensinar exige respeito aos saberes e experiências de vida dos educandos. Sendo fundamental discutir com os alunos a razão de ser de alguns dos seus saberes em relação com o ensino dos conteúdos‖; (FREIRE, 2011, P.31) Logo, o Ensino Religioso que é reconhecido como área de conhecimento constituirá um referencial estruturado de leitura e interpretação da realidade a partir do seu foco de ação, do seu objeto de estudo destacando os elementos essenciais pra garantir a participação dos educandos como cidadãos na sociedade de forma autônoma. (OLENIKI, 2005) Este referencial metodológico deve possibilitar a abertura para um ato de ensinar que ―exija respeito à autonomia do ser do educando, e este saber vai contra uma prática docente autoritária, que tira a liberdade do aluno, para tanto é preciso desenvolver uma prática baseada no diálogo‖. (FREIRE, 2003, p.59) O ensino religioso como área de conhecimento será definido com base no seguinte foco teórico: Tradições e Culturas Teologias, Textos Orais e Escritos Sagrados, Ritos e Ethos; da adequação do teórico ao contexto comunidade escolar e do exercício ou fazer pedagógico na relação ensino aprendizagem junto aos educandos. Segundo Oleniki (2005), este processo será efetivado pela releitura e compreensão do religioso na sociedade de acordo com uma metodologia que permite realizar a partir dos conteúdos programáticos: a observação do fenômeno religioso em suas múltiplas dimensões, destacando-se desta observação a análise da ação, falta ou parte dela em seu contexto, e em 480 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso suas relações para explorar e trabalhar os conceitos básicos do Ensino Religioso; a informação enquanto aproximação de um aspecto do conhecimento religioso a partir do qual se torna possível ao educando ampliar seu conhecimento para construir instrumentos que possibilitem referenciais de interpretação ou análise efetivando-se a ressignificação de conceitos; reflexão como aspecto que oportuniza o confronto pedagógico do conhecimento teórico com a prática. É refletindo o fenômeno religioso dentro do contexto real do educando que se efetua uma aprendizagem significativa, possibilitando a construção de soluções para as dúvidas e problemas que surgirem relacionados ao aspecto religioso. Ou seja, ―ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção, sua construção‖ (FREIRE, 2005, p.24) Pode- se descrever o procedimento metodológico do Ensino Religioso como área de conhecimento a partir da caracterização do foco teórico, do fazer pedagógico que se concentram em torno de objetivos e conteúdos que remetem a metodologia de interação, entre os aspectos historicamente construídos nas diferentes tradições religiosas e a sua presença na cultura vigente. Sendo importante o tratamento metodológico se concretizar na ação - reflexão - ação promovida pela observação informação - reflexão. (OLENIKI, 2005) Isto é, no procedimento metodológico do Ensino Religioso assim como de qualquer outra disciplina do currículo escolar é necessário: Inserir o reconhecimento e a assunção da identidade cultural do educando; só assim teremos o conhecimento dos seres inacabados que somos. O próprio discurso teórico tão necessário para a reflexão critica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. (FREIRE, 2011, p.39 e 42) É preciso compreender que a linguagem do ensino religioso está dentro da formação básica do cidadão e ―alicerça nos princípios básicos da cidadania que se concretizam na formação integral do educando‖. (HOLANDA, 2005) Para tanto, pode-se tomar como parâmetro os princípios defendido pelas Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental e os princípios e fins da Educação Nacional da lei nº 9.394/96 cujo principal fim é orientar as escolas na elaboração de suas ações pedagógicas. 481 FONAPER De acordo com a professora Holanda (2005) no caso do ensino religioso esses princípios apresentam uma relação próxima com o campo de atuação deste ensino, podendo expressar muito bem a linguagem que é utilizada no desenvolvimento dos conteúdos, refletindo algumas questões básicas da educação. Se for ensino, continua a professora, ensina o quê? Na linguagem pedagógica do ensino religioso, podem ser observados os seguintes critérios e atitudes para a mudança e para a construção de valores, tais como: a valorização das experiências religiosas previamente construídas pelos alunos e alunas, favorecendo a capacidade de vivenciar uma relação emancipada com as diferentes culturas, considerando os princípios éticos da autonomia, da responsabilidade e do respeito ao bem comum; o exercício da criatividade e do respeito à ordem democrática em sala de aula, a partir da articulação dos conhecimentos, das discussões, debate e do desenvolvimento com base nos princípios políticos, caracterizados pelos direitos e deveres da cidadania e do respeito ao diferente que se manifesta nas culturas e tradições religiosas; a criação de condições para que cada educando(a) construa sua identidade, para saber acolher, conhecer, conviver e aprender a ser, valorizando e respeitando o outro, superando preconceitos que desvalorizam qualquer experiência religiosa, tendo como referência os princípios estéticos da sensibilidade e da criatividade. E acrescenta, que esta linguagem tem sentido de busca, de entendimento que responda às questões existenciais: Quem sou? De onde vim? Para onde vou? Diante dessas indagações o ser humano desenvolve competências para relacionar-se consigo, com a natureza, a sociedade e o transcendente, definindo seu projeto pessoal e coletivo de vida. No desenrolar dos eixos temáticos do ensino religioso e nos blocos de conteúdos apresentados nos Parâmetros Curriculares Nacionais, o entendimento dessa linguagem destaca a interação entre quem aprende e quem ensina para construção do conhecimento histórico cultural, devido à importância de toda cultura. Sabe- se que essa linguagem estimula o diálogo, a tolerância e a convivência pacífica com as manifestações religiosas, respeitando a pluralidade cultural religiosa brasileira. (HOLANDA, 2005) De acordo com a nova redação do art. 33 da LDB, com a sanção da Lei 9475/97, os sistemas de ensino terão maior responsabilidade na 482 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso definição de conteúdos para o ensino religioso, incluindo as características como cultos, movimentos, grupos, filosofias de vida e outras que integram uma sociedade pluralista, com as mais diversificadas tradições e manifestações culturais presentes no Brasil. (FIGUEIREDO, 2005) Os dois parágrafos contidos no art. 1º da Lei 9475/97 que destacam a definição das responsabilidades, referentes aos conteúdos do ensino religioso, são: ―§ 1º - Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso". (BRASIL, 1997). O processo de construção dos conteúdos para a disciplina de ensino religioso deve ser feito segundo a atual LDB, por meio da autonomia, incluindo o incentivo a participação da sociedade, especialmente da comunidade educativa, de forma ampla, em todo projeto políticopedagógico. Segundo o professor Antonio Boeing (2005) para se concretizar o Ensino Religioso destaca alguns aspectos fundamentais, tais como: as contribuições das áreas afins, como a antropologia, psicologia, pedagogia, sociologia, ciências da religião e teologias; a busca permanente do sentido da vida; a superação da fragmentação das experiências e da realidade; o pluralismo religioso; a compreensão do campo simbólico; e, a necessidade de evitar o proselitismo. Partindo desse contexto o Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER) pensando na efetivação desta área do conhecimento, definiu cinco eixos e os respectivos conteúdos: Culturas e Tradições Religiosas - desenvolve os temas decorrentes da relação entre cultura e tradição religiosa, tais como: a ideia Transcendente na visão tradicional e atual; a evolução da estrutura religiosa nas organizações humanas no decorrer dos tempos; a função política das ideologias religiosas; e, as determinações da tradição religiosa na construção mental do inconsciente pessoal e coletivo; Teologias - analisa as múltiplas concepções do Transcendente, dentre os conteúdos destacam-se: a descrição das representações do Transcendente nas tradições religiosas; o conjunto de muitas crenças e doutrinas que orientam a vida do fiel nas tradições religiosas; e, as possíveis respostas norteadoras do sentido da 483 FONAPER vida: ressurreição, reencarnação, ancestralidade, nada; Textos Sagrados e Tradições Orais - aprofunda o significado da palavra sagrada no tempo e no espaço, com destaque para: a autoridade do discurso religioso fundamentado na experiência mística do emissor que a transmite como verdade do Transcendente para o povo; o conhecimento dos acontecimentos religiosos que originaram os mitos e segredos sagrados e a formação dos textos; a descrição do contexto sócio- político religioso determinante para a redação final dos textos sagrados; e, a análise e a hermenêutica atualizada dos textos sagrados; Ritos - busca o entendimento das práticas celebrativas, por isso contempla: a descrição de práticas religiosas significantes, elaboradas pelos diferentes grupos religiosos; a identificação dos símbolos mais importantes de cada tradição religiosa, comparando seu(s) significado(s); e, o estudo dos métodos utilizados pelas diferentes tradições religiosas no relacionamento com o Transcendente, consigo mesmo, com os outros e com o mundo; Ethos analisa a vivência crítica e utópica da ética humana a partir das tradições religiosas, por isso considera: as orientações para o relacionamento com o outro, permeado por valores; o conhecimento do conjunto de normas de cada tradição religiosa, apresentado para os fiéis no contexto da respectiva cultura; e, a fundamentação dos limites éticos propostos pelas várias tradições religiosas. (Cf. FONAPER. Caderno Temático Ensino Religioso, nº. 1, p. 31-32). Tanto os eixos e como os conteúdos do Ensino Religioso foram elaborados a partir da concepção de que a atuação do ser humano não se limita às relações com o meio ambiente e as relações sociais, pois busca o transcendente. Os eixos e conteúdos do Ensino Religioso contribuem para que o ser humano inacabado, inquieto e aberto ao Transcendente. Já dizia Freire: É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida em que se reconheceram inacabados. Não foi a educação que fez mulheres e homens educáveis, mas a consciência de sua inconclusão é que gerou sua educabilidade. É também na inconclusão de que nos tornamos conscientes e que nos inserta no movimento permanente de procura que se alicerça a esperança. ―Não sou esperançoso‖, disse certa vez, por pura teimosia, mas por exigência ontológica. (FREIRE, 2003, p.58). 484 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso O Ensino Religioso sempre foi desenvolvido dentro da doutrina estabelecida pela religião católica romana deste os seus primórdios. Só na legislação de 1997 foi que houve mudanças significativas no modo de proceder com o Ensino Religioso. O modelo aderido para o desenvolvimento do Ensino Religioso na prática de sala de aula; a seleção e organização dos conteúdos; a pedagogia utilizada e a formação dos professores que atuam nessa área vão depender ―das condições legais, e, especialmente, da concepção que se tenha desse componente curricular e da interpretação que se faz do artigo 33 da LDB‖. (SENA, 2005) Dependendo destas escolhas os modelos a serem seguidos podem ser os seguintes: confessional- ofertado em coerência com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável e ministrado por professores qualificados pelas respectivas entidades religiosas; o inter- confessionalo ensino religioso passa a ser ministrado mediante um acordo estabelecido entre os diversos grupos religiosos de confissões cristãs. Tem como objetivo destacar o que é comum às diferentes Igrejas ou confissões e respeita as características especificidade de cada uma e o conteúdo que servira de base é fundamentado na Bíblia; supra- confessionalministrado nas escolas públicas, não aceita qualquer tipo de proselitismo religioso, preconceito ou manifestação em desarmonia com o direito individual dos alunos e de suas famílias de seguir um credo religioso ou mesmo o de não seguir nenhum, garantindo o respeito a Deus, à diversidade cultural e religiosa, e tomando como base princípios de cidadania, ética, tolerância e em valores universais existentes em todas as religiões; Disciplina curricular- nesse modelo o Ensino Religioso é visto como área de conhecimento, a ênfase não é nas crenças ou religiões, mas no seu objeto de estudo, o fenômeno religioso. Tem como principal objetivo desenvolver o humanismo e o respeito às liberdades individuais e a questão da tolerância para com os que explanam crenças diferentes a favor da pluralidade étnica e cultural da nação brasileira. Considerações Finais Os resultados para as perguntas da pesquisa referentes à temática deste artigo mostraram que existem sim alunos ateus/ateias nas escolas 485 FONAPER envolvidas e na maioria delas não existem materiais didáticos que abordem o tema e as questões referentes ao ateísmo. As respostas para a pergunta: Existe algum material didático voltado para alunos ateus\ateias na escola onde trabalha ou faz estágio? Foram as seguintes, entre os 30 sujeitos entrevistados, 28 falaram que NÃO e apenas 02 sujeitos falaram que SIM, que existem alunos ateus\ateias nas escolas onde atuam. E entre os dois que falaram SIM, foi pedido que respondessem qual era esse material didático, as respostas foram às seguintes: Sujeito 1 – ―Sim. O professor aborda as questões nos conteúdos‖ Sujeito 2- ―Sim. Através do processo em sala de aula. A respeito do assunto ateísmo‖ Porém, nenhum dos 02 sujeitos que responderam SIM, especificaram o material usado, apenas que a temática era abordada de forma mais geral nos conteúdos das aulas. Já para a outra pergunta, ou seja: Na turma de Ensino Religioso que você faz estágio ou trabalha existem alunos (as) ateus/ateias? Dos 30 sujeitos entrevistados, 11 falaram que SIM; 14 falaram que NÃO e 05 afirmaram que NÃO SABEM, se existem alunos ateus\ateias nas escolas onde atuam. Os resultados mostram que apesar de existirem alunos ateus\ateias nas escolas públicas da cidade de João Pessoa-PB, pouco é trabalhado dentro de matérias didáticos mais específicos no contexto da disciplina Ensino Religioso. Acredito que desenvolver estes materiais ajudariam a desenvolver o respeito a esta opção não-religiosa de vida, como também abriria espaço para que alunos com estas opções de vida se sentissem incluídos neste contexto e pudessem refletir a cerca da diversidade do mundo religioso. Referências BRANDENBURG, Laude E. A Interação Pedagógica no Ensino Religioso. São Leopoldo RS: Sinodal, 2004. BREMMER, J. O ateísmo na antiguidade. In: MARTIN, M. Um Mundo sem Deus. Ensaios sobre o Ateísmo. Ed. 70, Lisboa- Portugal, 2010. 486 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso FONAPER. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso (PCNER). São Paulo: Mundo Mirim, 2009. FONAPER. Caderno Temático Ensino Religioso, nº. 1, s/a. OLENIKI, M. L. R.; DALDEGAN, Viviane Mayer. Encantar. Uma prática pedagógica no Ensino Religioso. 2ª. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2005. HYMAN, G. O ateísmo na história moderna. In: MARTIN, M. Um Mundo sem Deus. Ensaios sobre o Ateísmo. Ed. 70, Lisboa- Portugal, 2010. JODELET, D. (Org.) As representações sociais. Rio de Janeiro, Ed.UERJ, 1989. JUNQUEIRA, Sérgio. A presença da religião nos processos educacionais. In: HUFF, J, ARNALDO, E. e RODRIGUES, E. Experiências e Interpretações do Sagrado: interfaces entre saberes acadêmicos e religiosos. São Paulo: Paulinas, 2012 (Coleção ABHR, v.9) MARTIN, M. Ateísmo e Religião. In: MARTIN, M. Um Mundo sem Deus. Ensaios sobre o Ateísmo. Ed. 70, Lisboa- Portugal, 2010. 487 POSSIBILIDADES METODOLÓGICAS PARA O ENSINO RELIGIOSO NO ENSINO MÉDIO EM SANTA CATARINA Eliston Terci Panzenhagen - UNOCHAPECÓ1 Resumo: Trabalho realizado no âmbito do curso Ciências da Religião – Licenciatura em Ensino Religioso - PARFOR/UNOCHAPECÓ. Objetiva estudar a possibilidade de uma proposta metodológica para o Ensino Religioso (ER) no Ensino Médio (EM). De início, busca-se uma compreensão introdutória do EM e seus indicadores no estado nos últimos anos, bem como do ER enquanto área do conhecimento e componente integrante da base nacional comum. Após, faz-se um levantamento sobre a presença do ER na matriz curricular do EM em Santa Catarina. Posteriormente, realiza-se análise da legislação, tais como LDB 9.394/96, CONAE-2010, PNE 2011-2020, Resolução CNE/CEB Nº 4/2010, Resolução CNE/CEB Nº 2/2012, que permitem visualizar perspectivas didático/metodológicas para o trabalho com o ER nessa modalidade de ensino e apontam possibilidades. Palavras-Chave: Ensino Religioso, Ensino Médio, possibilidades metodológicas. Por uma discussão introdutória Ao nos atermos a análise da realidade dos currículos escolares no Brasil e de alguns de seus indicadores nas últimas décadas, ou mesmo no último século, percebemos claramente que um grande debate faz-se necessário, assim como, o ―chão de sala de aula‖ se apresenta como problema de pesquisa cada vez mais intrigante e desafiador. Neste sentido, conseguimos estabelecer uma conexão bastante intensa entre as qualidades, os pontos críticos por assim dizer, e também as mudanças necessárias na educação com uma questão muito simples (ou complexa) que é o método (metodologia), ou seja, a forma pela qual conduzimos o(s) processo(s) ensino aprendizagem, tendo ciência de que, métodos (metodologias) derivam de uma concepção mais ampla que se desenvolve acerca dos processos educativos e que influenciam sua prática, e também, por sua vez, possibilitam o desenvolvimento de novas concepções. Para Dmitruck (2012, p. 186) 1 Graduado em Filosofia – UNOESC/SC; Graduado em Ciências da Religião – UNOCHAPECÓ/SC; Especialista em Filosofia – CELER FACULDADES/SC; Especialista em Gestão Escolar – UFSC; Mestrando em Educação UNOCHAPECÓ/SC. Email elistonp@unochapecó.edu.br FONAPER O método representa o ―caminho‖; define o ―o que fazer‖, as etapas a serem vencidas para alcançar os objetivos propostos. As técnicas se configuram como um conjunto de normas que orientam o ―como fazer‖, da forma mais adequada e precisa possível. [...] Portanto, pode-se afirmar que o método constitui um procedimento estratégico geral que pode abranger inúmeras técnicas, isto é, procedimentos específicos mesmo dentro das diversas etapas de um método. (DMITRUCK, 2012, p. 186) Compreendendo desta forma, que metodologia deriva de método, esta nos remete a uma discussão ampla, ou seja, diante dos inúmeros problemas pelos quais transita a educação brasileira, principalmente a pública, percebemos que um descompasso entre políticas educacionais e realidade educacional se desvenda, sendo que, em sua grande maioria das discussões, a questão metodológica aparece como foco central. Digo isto, partindo dos reclamos dos docentes, das notícias veiculadas na mídia diariamente e da realidade cotidiana de sala de aula com que convivo e com a qual convivem milhares de professores brasileiros bem como alunos e famílias, uma vez que, são muitos os movimentos que envolvem novos projetos, políticas, modelos, metodologias e porque não dizer, interesses e, contraditoriamente, muitas vezes, raras preocupações que têm como assunto principal a qualidade da educação brasileira; porém na realidade concreta e prática, a maioria destes não passam de experiências isoladas, modismos, movimentos circulares que nos dão a falsa impressão de movimento, ou ainda, planos de governo ao invés de projetos de Estado. Isto posto, não podemos querer insinuar e nem afirmar que a educação pública brasileira seja um lamaçal do qual, portanto, também fizemos parte. Muito pelo contrário, o interesse aqui é mostrar que existe e se torna cada vez mais visível que a educação não necessita ou pelo menos não sobrevive de falácias, de projetos e políticas que teoricamente sejam exemplares, mas na operacionalização, na trama diária do processo educacional que carece de investimento (de todas as ordens e esferas) de apoio pedagógico e de uma compreensão mais qualitativa do que quantitativa em relação à aprendizagem dos educandos, de forma que possamos qualificar a organização metodológica do processo educativo e da consequente construção do conhecimento e não conceber o educador como uma espécie de marionete que esteja a serviço de ideologias dominantes. É sabido que a questão metodológica do trabalho pedagógico requer fundamentação teórica, investimento em estrutura, formação e, além disto, 490 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso do estabelecimento de diversas parcerias, tanto que, o educador não é o único responsável pelo trabalho pedagógico que desenvolve assim como a escola não é o único espaço educativo. O trabalho pedagógico que a escola desenvolve, bem como a metodologia do trabalho docente, dependem de uma esfera mais ampla, emanando de determinada concepção que se tenha de educação, do qual deriva toda a estruturação e organização da(s) rede(s) e sistema(s) de ensino, e que, posteriormente vão veicular determinada compreensão de mundo. Por este motivo precisamos ao mesmo tempo em que falamos de metodologia ou possibilidades metodológicas, falar da formação docente e da necessária consciência crítica do educador. Esta consciência, por sua vez, significa desenvolver a capacidade de ir além do nível individual em que nos encontramos enquanto educadores, de compreender o contexto que nos envolve e transpor a subjetividade particular para estabelecer, gradativamente, uma compreensão global, de forma a perceber as necessidades humanas, as relações em seus diferentes níveis e também as formas pelas quais podemos transformar a partir do processo pedagógico, pois: Apesar de uma melhoria quantitativa ocorrida ao longo das últimas décadas, principalmente no século XX, o sistema educacional apresenta ainda hoje resultados que correspondem a um fraquíssimo desempenho e alto grau de seletividade, evidenciado no ensino fundamental a partir das altas taxas de evasão e repetência. (SANTA CATARINA, 2006, p. 71) Antes de prosseguir, é importante conceituar o que se compreende por processo ensino aprendizagem, que pode ser considerado como cenário ou palco onde se constroem ou desenvolvem os índices que neste momento pretendemos analisar. Neste sentido, a Proposta Curricular de Santa Catarina – Estudos Temáticos (2005, p. 5-6) contribui para esclarecer, dizendo que: O advento das novas tecnologias da informação e da comunicação proporciona o repensar do processo ensino-aprendizagem. O ensino circunscrito à sala de aula, pressupondo o domínio pelo professor de uma determinada disciplina ou área do conhecimento, avança na direção de um processo aberto de aprendizagem em que todos os atores têm oportunidades quase infinitas de acessar bases de informações e experiências que fluem de todas as partes do mundo pela rede informatizada de comunicações. [...] A transformação dos meios de comunicação leva necessariamente à mudança do processo 491 FONAPER de ensino-aprendizagem. Não há como ser um bom professor, ditando aos alunos trechos de uma apostila amarelada ou de um livro-texto que não acompanha a dinâmica de renovação das informações que fluem através das redes em permanente atualização. Essa mudança atinge todos os níveis e modalidades de educação. Desde crianças, as pessoas têm acesso a interações de alto conteúdo comunicativo. Os jovens e as crianças de hoje são sujeitos de aprendizagem ativos e rebeldes a uma prática pedagógica unidirecionada ao aluno. Cabe, então, ao professor de sucesso, exercer o importante papel de líder e facilitador do processo interativo de ensino-aprendizagem. As novas tecnologias têm transformado todas as organizações contemporâneas, inclusive a Escola. Por isso, torna-se necessário construir uma Escola diferente, gerida de forma diferente e com um outro processo de ensino-aprendizagem. O diferencial é sair do modelo autocrático, pautado pela relação autoritária de comando e obediência, na qual um manda e o outro obedece, um ensina e o outro aprende, para um processo democrático de educação em que as pessoas interagem e se comprometem de forma coletiva com os objetivos educacionais e com a direção de futuro desejada. (SANTA CATARINA, 2005, p. 5-6) Com base nesta compreensão de processo ensino-aprendizagem, e ao observarmos índices que demonstram e avaliam a aprendizagem escolar, percebemos que ainda é bastante difícil a uma escola conseguir alcançar 50% do que é esperado pelos sistemas de ensino em termos de avaliação, e desta forma, tem-se uma noção prévia do quanto ainda é necessário avançar para uma reconfiguração dos processos educativos a fim de que se alcance o sucesso do educando na escola. Porém, também não cabe aqui culpar demasiadamente a escola por todos os infortúnios dos quais é ou somos vítima. Sabe-se muito bem que o rendimento escolar e a aprendizagem não são dadas ou construídas unicamente na escola, ou como se, a escola fosse uma redoma de vidro, dentro do qual resguardássemos nossos educandos de tudo que ele vive ou viveria fora do contexto escolar. Neste sentido, cabe-nos compreender como se dão as diferentes relações no contexto da escola, considerando este como o lugar por excelência quando nos referimos a aprendizagem sistematizada, ou seja, organizada dentro de um ritual pedagogicamente organizado e estruturado, envolvido por diferentes espaços, tempos, compreensões e conhecimentos, ou seja, o currículo escolar. Precisa-se superar muito ainda e coletivamente crescer neste ambiente/espaço. Por muito tempo, e por diversos motivos, o conhecimento científico, por assim dizer, foi considerado como único conhecimento válido perante os olhos dos currículos escolares e das academias. Ao mesmo tempo, cabe lembrar que o conhecimento filosófico, o religioso, o mítico e o 492 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso conhecimento gerado pelo senso comum, foram e às vezes ainda são considerados como inaceitáveis ou inválidos perante a ciência. Até aqui, pouco se conseguiu tratar de assuntos filosóficos ou religiosos, por exemplo, num viés fenomenológico nas escolas públicas brasileiras. A ausência de disciplinas da área de ciências humanas nos currículos escolares favorece uma prática de ensino aprendizagem que não tenha como foco principal a contextualização, questionamento, ou reflexão acerca da presença e da ação do ser humano enquanto produtor e construtor do conhecimento e da sua própria realidade, com responsabilidade. Ou seja, a construção de um ser pensante, seja em nível de educador ou de educando, que se sinta integrante da realidade que o compreende e responsável pela mesma, tem recebido grande contribuição das disciplinas curriculares das ciências humanas. Desta forma, podemos afirmar que a área de ciências humanas e suas tecnologias, tem uma função de, na escola e na academia, propiciar um conhecimento amplo e integrado sobre o ser humano. Com base no que já dizia o próprio Sócrates ―Conhece-te a ti mesmo‖, vemos a escola como um dos espaços de construção, inclusive de construção humana e responsável do individual e do social. A análise e a reflexão de tudo que nos cerca, é tarefa fundamental das disciplinas das áreas humanas e do educador comprometido com sua prática. Igualmente, a presença destas disciplinas, como já percebido em outras épocas da história brasileira, podem caracterizar na escola uma ameaça às constantes práticas de subordinação, opressão e desconstrução da identidade e da racionalidade humana, seja por quaisquer dos aparelhos ideológicos que compõe a realidade social brasileira e que buscam na escola espaço para reprodução de verdades e ―in‖verdades cristalizadas no decorrer do tempo. Partindo mais especificamente do Ensino Religioso, no Brasil este foi motivo de diversos embates e discussões quanto a ser ou não componente curricular do Ensino Fundamental e Médio. Diferentes grupos têm se posicionado a partir de diferentes interesses e concepções de ER. Atualmente essas concepções e interesses perduram e volta e meia vêm à tona. Neste contexto, o FONAPER vem construindo uma concepção de ER que, ao estudar o fenômeno religioso, aborda epistemológica e pedagogicamente a diversidade cultural religiosa, sem proselitismo (Lei nº 9.475/97). 493 FONAPER No entanto, muito mais do que garantir a presença do ensino religioso na escola e o não proselitismo em sua prática de ensino, cabenos discutir algumas questões fundamentais que ainda impedem um processo de ensino aprendizagem pleno e eficiente no campo do Ensino Religioso, de forma que o educando possa compreendê-lo enquanto fenômeno universal e inerente à vida humana, independente de participar ou não de uma prática confessional em suas comunidades onde vive, e também compreender-se enquanto ser que vive, se relaciona, faz escolhas e é responsável pelas suas opções. Cabe-nos aqui, uma vez que se busca uma discussão acerca de uma possibilidade metodológica do ER no ensino médio, reforçar a ideia da escola e de educação como um espaço adequado para a discussão, o debate, o crescimento coletivo, a proposição de novos conhecimentos e o refutamento de outros que já não se adéquam mais ao tempo e espaço em que vivemos. A educação e a escola, desta forma, precisam oferecer ao educando uma possibilidade de interação, onde o sujeito cria e recria, pensa, sugere, questiona e se afirma no mundo em que vive, de forma que este mundo (espaço) não lhe seja hostil, ou seja, que o ser humano possa viver num mundo pensado e construído por ele mesmo, que se percebe detentor de direitos, deveres, responsabilidades e desafios. Uma vez que o educador tiver uma compreensão da educação e da escola enquanto uma oportunidade de construção e autoafirmação, este necessariamente tratatrá com atenção o seu fazer e suas escolhas metodológicas. Educar para e na contemporaneidade com responsabilidade, porém, nos traz outras tantas reflexões sejam de cunho físico, estrutural, pedagógico, entre outros. Com base em tudo isso, podemos procurar nos ater ao que nos enseja este trabalho, ou seja, qual a(s) possibilidade(s) metodológica(s) do ER enquanto componente curricular para toda a educação básica, a saber, também no ensino médio, nível de ensino em que, na atualidade, este componente não é trabalhado em grande parte dos estados brasileiros. O Ensino Médio e o Ensino Religioso – Uma possibilidade!? O Ensino Médio recebe diferentes conceituações e definições nos diversos contextos em que se apresenta. É etapa integrante (final) da 494 Anais do Congresso Nacional de Ensino Religioso educação básica. Segundo a Resolução Nº 4, de 13 de julho de 2010, do Conselho Nacional de Educação, que define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica: Art. 21. São etapas correspondentes a diferentes momentos constitutivos do desenvolvimento educacional: I - a Educação Infantil, que compreende: a Creche, englobando as diferentes etapas do desenvolvimento da criança até 3 (três) anos e 11 (onze) meses; e a Pré-Escola, com duração de 2 (dois) anos; II - o Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, com duração de 9 (nove) anos, é organizado e tratado em duas fases: a dos 5 (cinco) anos iniciais e a dos 4 (quatro) anos finais; III - o Ensino Médio, com d