Confira aqui. - Chico Alencar
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Confira aqui. - Chico Alencar
Rio de Janeiro, sexta-feira, 4 de agosto de 2006 - ANO 2 - Nº 195 - FALTAM 5 para o Nº 200! LADRÕES QUEREM GRATIDÃO E HONRA POR SEUS CRIMES Criminosos em geral se escondem, praticam seus atos à sombra da noite e fazem questão de discrição, de anonimato. Mas certo tipo de criminoso alardeia os seus crimes e, não contente com isso, ainda exige agradecimento dos lesados. Numa ambulância, certamente superfaturada por um dos sanguessugas é possível ler numa faixa: “Deputado Pedro Henry, orgulho da região sudoeste, Pontes e Lacerda agradece!”. Veja também lista completa dos políticos nos quais você não deve votar em hipótese alguma e saiba porque. FRITZ UTZERI, Pg. 3 Guerra no Oriente Médio Eduardo Galeano pergunta: Até quando continuaremos aceitando que este mundo, apaixonado pela morte, é o nosso único mundo possível? Pg. 10 Nahum Sirotsky afirma: Os ventos políticos não parecem soprar em favor de Israel. Não se trata dos mais de duzentos morteiros lançados sobre o país na quarta, um numero recorde. Nem se questiona a superioridade militar de Israel, mas se será possível resistir às crescentes pressões políticas internacionais. Pg. 12 Leonardo Boff reflete: Os massacres absurdos de inocentes a que temos assistido por parte da máquina de guerra de Israel contra o povo do Líbano, mostrando impiedade diante de crianças inocentes, nos suscitam a questão do sentido da vida e da História. Pg. 8 VEJA AINDA: RUY PANEIRO, “enquanto houver ódio”. Pg.15 LambeLambe-Lambe : “A Guerra dos Seis Dias”, há quase 40 anos...Pg. 29 VEJA AS CATEGORIAS MAIS CORRUPTAS. J. R. WHITAKER PENTEADO apresenta a lista para você – Pg. 17 E ainda: Crítica de Cinema - NELSON RODRIGUES DE SOUZA critica “Cidade Perdida”. Pg. 22 e ANNA MARIA RIBEIRO em mais uma crônica. Pg. 30. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 2 FESTA DO MONTBLÄAT Atenção. A Festa do Montbläat será no próximo dia 26 de setembro, terça-feira, a partir das 19h 30m, no Rio Scenarium, à Rua do Lavradio, 20. Não será cobrado ingresso, nem haverá consumação mínima, couvert artístico ou seja lá o que for. Cada um pagará apenas o que consumir, graças ao generoso oferecimento de nosso assinante, Plínio Fróes, dono do boteco, quase tão famoso quanto o “Flor do Lavradio”. É indispensável confirmar presença. Durante a festa será apresentada a nova formatação do Montbläat e haverá um show com uma cantora californiana, que vive no Rio de Janeiro, KATHERINE ALLDIS (atenção nacionalistas, podemos descer o sarrafo nos norteamericanos por quase tudo, menos pela música). Nossa também assinante, Christina Thedim, que vem a ser filha do Capitão Sérgio do Parasar, faz a apresentação de Katherine: “Californiana, nascida em Santa Cruz, EUA, Katherine Irene Alldis sempre teve na música e na dança uma forma espontânea de comunicação. Dotada de uma natureza viva e apaixonada iniciou-se na dança aos quatro anos de idade. Aos sete, começou a estudar flauta. Participou de várias bandas e, por volta dos vinte anos, começou os estudos de ópera clássica, jazz, e música pop, aprendendo harmonia e fazendo solo num coral de capela. A dança Flamenca entrou em sua vida também de maneira natural e, após nove anos de estudo, tornou-se professora. Nos anos 70 foi para as montanhas com os pais viver numa comunidade de artistas. No fatídico ano de 1992 morre seu irmão, em trágico acidente, o que a fez afastar-se de tudo por um tempo. O aprendizado da “Linguagem de sinais americana” foi uma saída que encontrou para amenizar o trauma que esse acontecimento causou em sua vida, um recomeço. Em 1994 nasce seu filho Cody e a consciência feminina, da importância da mulher como ser, mais que gerador, criador de novas consciências, de novos seres, se amplia, unindo-se, mais que nunca, a música, a dança e a linguagem de sinais como intermediários nessa jornada interativa que abraça como um ideal de vida e ao qual dedica grande parte de sua energia. Escutar e observar a atuação dessa artista no palco é um encontro marcante, inesquecível! Imediatamente, nos vemos envolvidos por uma energia de amor e transportados por sua voz suave e melodiosa, através de canções que trazem mensagens de auto-conhecimento, auto-estima, amor universal e incondicional, paz e saúde emocional e espiritual, compostas, em sua maioria, por ela mesma. Katherine vive e respira o que canta. Há dois anos mudou-se para o Rio de Janeiro com seu marido brasileiro e seu filho. Agregar é a palavra de ordem para ela que, com a sua música pretende tocar a alma de um sem número de outras almas, principalmente femininas que, em sua opinião, serão as fontes diretrizes de uma nova era de seres humanos, mais plenos de compaixão e amor verdadeiro”. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 3 PROPAGANDA E GRATIDÃO PARA SANGUESSUGAS, ETC. A foto dá uma idéia da desfaçatez de nossas “elites” políticas. Veja a ambulância da prefeitura de Pontes e Lacerda, ambulância quase certamente superfaturada, já que o nobre deputado Pedro Henry (PPMT) está envolvido nos seguintes crimes: Formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e sanguessugas (escândalo das ambulâncias). Criminosos em geral se escondem, praticam seus atos à sombra da noite e fazem questão da discrição, do anonimato. Mas certo tipo de criminoso alardeia os seus crimes e, não contente com isso, ainda exige agradecimento dos lesados. Leiam na faixa: “Deputado Pedro Henry, orgulho da região sudoeste, Pontes e Lacerda agradece!”. Já aparecem na imprensa fotos de José Serra numa solenidade de entrega de ambulâncias com alguns dos sanguessugas, numa tentativa do governo de jogar a m... para o governo passado, enquanto a oposição já conseguiu envolver um ministro da Saúde do atual governo, mas tenta trazer a público o Sr. Humberto Costa, em cuja gestão – acredita-se – a corrupção tenha escalado aos níveis atuais. Os ministros sabiam? Não sabiam? A pergunta não tem saída. Se sabiam são criminosos, se não sabiam são incompetentes. Mas essa simples constatação não parece valer no Brasil. Desde que uma continuada sucessão de escândalos vem se sucedendo no seio do atual governo, o presidente da República alega que não tinha a menor idéia do que Dirceu, Palocci, Delubio ou Marcos Valério faziam numa sala vizinha à sua. “Não sei, não vi, não ouvi”, parecem desculpas bastante boas para escapar ileso até das más companhias. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 4 Confesso que estou cheio disso e não agüento mais ficar escrevendo sobre essas aberrações políticas que nos guiam. O problema é que no bojo da eleição presidencial (que não vai fazer muita diferença se o eleito for o Molusco ou o Alquimista) se escondem as demais eleições e é desse desinteresse pelo restante do pleito e da nossa alienação, que se aproveitam os bandidos que hoje infestam Congresso Nacional, fazendo do Legislativo a maior concentração de criminosos do país depois das cadeias. Não prestamos atenção principalmente nos deputados que elegemos e desse descaso resulta o aviltamento crescente da instituição. Dê uma olhada rápida na lista de candidatos a deputado. Não é preciso olhar muito ou analisar em profundidade para que se revele o verdadeiro grupo de marginais, ignorantes e pessoas de história duvidosa e propósitos obscuros que se candidatam, seja pensando em dar-se bem ou até para fugir da justiça, já que nesta república de “iguais perante a lei” qualquer quadrilheiro deputado tem tratamento diferenciado, mesmo se matar ou roubar escandalosamente os cofres públicos. É indispensável anotar os nomes e os partidos desses parlamentares bandidos e cobrar das autoridades que a proposta do deputado Miro Teixeira (a de não diplomar os corruptos) seja aprovada. Vejam a lista de parlamentares envolvidos em atividades criminosas (ambulâncias, mensalões, etc.) e anote nomes para mandá-los para casa em outubro e – uma vez em casa – exigir que passem a morar na cadeia. (vejam, a seguir, a lista de políticos em que não devemos votar de jeito algum). São 129 deputados, 14 senadores e 2 ex-ministros, 8 ex-deputados e um tesoureiro de partido, todos apostando em nossa tradicional falta de memória e preparando-se para voltar, como vários – vide ACM e Jader Barbalho – já o fizeram. Curioso é o volume de evangélicos presentes nas mamatas. Um dos sinais pelos quais acho que estou ficando velho é que sou de um tempo em que os protestantes eram chamados pelo termo “bíblia”. Esse termo, um sinal para avalizar a retidão, honestidade, integridade do qualificado. Mas “Bíblia” era batista, luterano, presbiteriano, e até alguns pentecostais. Hoje em dia o antigo “Bíblia” virou “evangélico” e com a proliferação das igrejas picaretas, “evangélico” está quase virando sinônimo de vigarista. M Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 5 Em Quem Não Votar!!! NOME CARGO Deputado Deputado Senador Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Senador Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado PARTIDO PFL-PR PDT-MG PL-MG PPS-PR PMDB-MA PTB-RR PTB-PR PL-CE PFL-RJ PL-SP PMDB-PR PMDB-CE PSDB-MT PSDB-SP PSDB-MA PP-AL PP-AP PMDB-PB PL-SP PMDB-MG Sonegação Fiscal Falsidade Ideológica Crime de Responsabilidade e Estelionato Peculato Apropriação Indébita Peculato, Formação de Quadrilha, Sanguessugas (Ambu Peculato Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Improbidade Administrativa Improbidade Administrativa Improbidade Administrativa e Formação de Quadrilha Crime de Responsabilidade Improbidade Administrativa Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Eleitoral Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Militar, Sanguessugas (Escândalo das Ambulânci Deputado Deputado Deputado PSDB-GO PP-SP PL-PR Lesão Corporal Crime Eleitoral, Peculato e Agressão Crime Eleitoral CIRO NOGUEIRA CLEONÂNCIO FONSECA CLÓVIS FECURY CORIALANO SALES DARCÍSIO PERONDI DAVI ALCOLUMBRE DILCEU SPERAFICO DOUTOR HELENO EDSON ANDRINO EDUARDO AZEREDO EDUARDO GOMES EDUARDO SEABRA ELIMAR MÁXIMO DAMASCENO EDIR DE OLIVEIRA EDNA MACEDO ELAINE COSTA ELISEU PADILHA ENIVALDO RIBEIRO Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Senador Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputada Deputado Deputado PP-PI PP-SE PFL-MA PFL-BA PMDB-RS PFL-AP PP-PR PSC-RJ PMDB-SC PSDB-MG PSDB-TO PTB-AP PRONA-SP PTB-RS PTB-SP PTB-RJ PMDB-RS PP-PB ÉRICO RIBEIRO FERNANDO ESTIMA FERNANDO GONÇALVES GARIBALDI ALVES GIACOBO Deputado Deputado Deputado Senador Deputado PP-RS PPS-SP PTB-RJ PMDB-RN PL-PR Crime Contra a Ordem Tributária e Prevaricação Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Contra a Ordem Tributária Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Improbidade Administrativa Corrupção Ativa Apropriação Indébita Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime de Responsabilidade Improbidade Administrativa Crime Eleitoral, Sanguessugas (Escândalo das Ambulân Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Falsidade Ideológica Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Corrupção Passiva Crime Contra a Ordem Tributária, Sanguessugas (Escân Ambulâncias) Crime Contra a Ordem Tributária e Apropriação In Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Eleitoral Crime Contra a Ordem Tributária e Seqüestro Deputado PSDB-PE Apropriação Indébita ABELARDO LUPION ADEMIR PRATES AELTON FREITAS AIRTON ROVEDA ALBÉRICO FILHO ALCESTE ALMEIDA ALEX CANZIANI ALMEIDA DE JESUS ALMIR MOURA AMAURI GASQUES ANDRÉ ZACHAROW ANÍBAL GOMES ANTERO PAES DE BARROS ANTÔNIO CARLOS PANNUNZIO ANTÔNIO JOAQUIM BENEDITO DE LIRA BENEDITO DIAS BENJAMIN MARANHÃO BISPO WANDERVAL CABO JÚLIO ACUSAÇÃO OU CRIME A QUE RESPONDE (JÚLIO CÉSAR GOMES DOS SANTOS) CARLOS ALBERTO LERÉIA CELSO RUSSOMANNO CHICO DA PRINCESA (FRANCISCO OCTÁVIO BECKERT) (FERNANDO LUCIO GIACOBO) GONZAGA PATRIOTA Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 GUILHERME MENEZES INALDO LEITÃO INOCÊNCIO DE OLIVEIRA IRAPUAN TEIXEIRA IRIS SIMÕES ITAMAR SERPA ISAÍAS SILVESTRE JACKSON BARRETO JADER BARBALHO Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado PT-BA PL-PB PMDB-PE PP-SP PTB-PR PSDB-RJ PSB-MG PTB-SE PMDB-PA JAIME MARTINS JEFERSON CAMPOS JOÃO BATISTA JOÃO CALDAS JOÃO CORREIA JOÃO HERRMANN NETO JOÃO MAGNO JOÃO MENDES DE JESUS JOÃO PAULO CUNHA JOÃO RIBEIRO JORGE PINHEIRO JOSÉ DIVINO JOSÉ JANENE Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Senador Deputado Deputado Deputado PL-MG PTB-SP PP-SP PL-AL PMDB-AC PDT-SP PT-MG PSB-RJ PT-SP PL-TO PL-DF PRB-RJ PP-PR JOSÉ LINHARES JOSÉ MENTOR JOSÉ MILITÃO JOSÉ PRIANTE JOVAIR ARANTES JOVINO CÂNDIDO JÚLIO CÉSAR Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado PP-CE PT-SP PTB-MG PMDB-PA PTB-GO PV-SP PFL-PI JÚLIO LOPES JÚNIOR BETÃO JUVÊNCIO DA FONSECA LAURA CARNEIRO LEONEL PAVAN LIDEU ARAÚJO LINO ROSSI LÚCIA VÂNIA LUIZ ANTÔNIO FLEURY LUPÉRCIO RAMOS MÃO SANTA MARCELINO FRAGA MARCELO CRIVELA MARCELO TEIXEIRA MÁRCIO REINALDO MOREIRA MARCOS ABRAMO MÁRIO NEGROMONTE MAURÍCIO RABELO NÉLIO DIAS NELSON BORNIER NEUTON LIMA NEY SUASSUNA Deputado Deputado Deputado Deputada Senador Deputado Deputado Senadora Deputado Deputado Senador Deputado Senador Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Senador PP-RJ PL-AC PSDB-MS PFL-RJ PSDB-SC PP-SP PP-MT PSDB-GO PTB-SP PMDB-AM PMDB-PI PMDB-ES PRB-RJ PSDB-CE PP-MG PP-SP PP-BA PL-TO PP-RN PMDB-RJ PTB-SP PMDB-PB Nº 195 6 Improbidade Administrativa Crime Contra o Patrimônio, Declaração Falsa de Imposto de Renda Crime de Escravidão Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Contra o Consumidor, Sanguessugas (Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Peculato e Improbidade Administrativa Improbidade Administrativa, Peculato, Crime Contra o Sistema Financeiro e Lavagem de Dinheiro Crime Eleitoral Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Falsidade Ideológica, Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Declaração Falsa de Imposto de Renda, Sanguessugas (Ambulâncias) Apropriação Indébita Lavagem de Dinheiro Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Corrupção Passiva, Lavagem de Dinheiro e Peculato Peculato e Crime de Escravidão Crime Ambiental Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Estelionato, Improbidade Administrativa, Lavagem de Dinheiro, Corrupção Passiva, Formação de Quadrilha, Apropriação Indébita e Crime Eleitoral Improbidade Administrativa Corrupção Passiva Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Contra o Sistema Financeiro Improbidade Administrativa Improbidade Administrativa Peculato, Formação de Quadrilha, Lavagem de Dinheiro e Falsidade Ideológica Falsidade Ideológica Declaração Falsa de Imposto de Renda, Sanguessugas (Ambulâncias) Improbidade Administrativa Improbidade Administrativa e Sanguessugas (Ambulâncias) Contratação de Serviços Públicos Sem Licitação e Concussão Crime Eleitoral Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Peculato Improbidade Administrativa Crime de Aborto Improbidade Administrativa Crime Eleitoral, Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Contra o Sistema Financeiro e Falsidade Ideológica Sonegação Fiscal Crime Ambiental Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Improbidade Administrativa Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 NILTON CAPIXABA Deputado PTB – RO OSMÂNIO PEREIRA OSVALDO REIS PASTOR AMARILDO PAULO AFONSO Deputado Deputado Deputado Deputado PTB-MG PMDB-TO PSC-TO PMDB-SC PAULO BALTAZAR PAULO FEIJÓ PAULO JOSÉ GOUVEIA PAULO LIMA PAULO MAGALHÃES PEDRO HENRY Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado PSB-RJ PSDB-RJ PL-RS PMDB-SP PFL-BA PP-MT PROFESSOR IRAPUAN PROFESSOR LUIZINHO RAIMUNDO SANTOS REGINALDO GERMANO REINALDO BETÃO REINALDO GRIPP REMI TRINTA RIBAMAR ALVES RICARDO BARROS RICARTE DE FREITAS Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado Deputado PP-SP PT-SP PL-PA PP-BA PL-RJ PL-RJ PL-MA PSB-MA PP-PR PTB-MT RODOLFO TOURINHO ROMERO JUCÁ ROMEU QUEIROZ RONALDO DIMAS SANDRO MABEL SUELY CAMPOS TATICO (JOSÉ FUSCALDI CESÍLIO) TETÉ BEZERRA THELMA DE OLIVEIRA VADÃO GOMES VALDIR RAUPP Senador Senador Deputado Deputado Deputado Deputada Deputado PFL-BA PMDB-RR PTB-MG PSDB-TO PL-GO PP-RR PTB-DF Deputado Deputada Deputado Senador PMDB-MT PSDB-MT PP-SP PMDB-RO VALMIR AMARAL VANDERLEI ASSIS VIEIRA REIS VITTORIO MEDIOLI WANDERVAL SANTOS WELLINGTON FAGUNDES ZÉ GERARDO ZELINDA NOVAES Senador Deputado Deputado Deputado Deputada Deputada Deputado Deputada PTB-DF PP-SP PRB-RJ PV-MG PL-SP PL-MT PMDB-CE PFL-BA Nº 195 7 Sanguessugas (escândalos das ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Apropriação Indébita Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Peculato, Crime Contra o Sistema Financeiro e Improbidade Administrativa Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Porte Ilegal de Arma Extorsão e Sonegação Fiscal Lesão Corporal Formação de Quadrilha, Lavagem de Dinheiro e Corrupção Passiva, Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime Eleitoral Lavagem de Dinheiro Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Estelionato e Crime Ambiental Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sonegação Fiscal Improbidade Administrativa e Formação de Quadrilha, Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Gestão Fraudulenta de Instituição Financeira Improbidade Administrativa Corrupção Ativa, Corrupção Passiva e Lavagem de Dinheiro Crime Eleitoral Crime Contra a Ordem Tributária Crime Eleitoral Crime Contra a Ordem Tributária, Declaração Falsa de Imposto de Renda e Sonegação Fiscal Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Improbidade Administrativa e Formação de Quadrilha Improbidade Administrativa e Crime Contra a Ordem Tributária Peculato, Uso de Documento Falso, Crime Contra o Sistema Financeiro, Crime Eleitoral e Gestão Fraudulenta de Instituição Financeira Apropriação Indébita Crime Eleitoral, Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Sonegação Fiscal Corrupção Passiva Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Crime de Responsabilidade Sanguessugas (Escândalo das Ambulâncias) Por precaução, aos nomes acima podem ser acrescentados também os seguintes... Ângela Guadagnin Deputada PT-SP Antônio Palocci Carlos Rodrigues Delúbio Soares José Dirceu Ex-Ministro PT-SP PL-RJ PT-GO PT-SP Ex-Deputado Tesoureiro Ex-Deputado Dançarina do Plenário da Câmara, comemorando absolvição de corrupto Quebra de Sigilo Bancário Bispo Rodrigues Ex Tesoureiro do PT Mensalão Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 José Genoíno Ex-deputado PT-SP José Nobre Guimarães Deputado Est. PT-CE Josias Gomes Luiz Gushiken Paulo Salim Maluf Deputado PT-BA PT-SP PPB-SP Paulo Pimenta Pedro Corrêa Roberto Brant Roberto Jefferson Severino Cavalcanti Valdemar Costa Neto Ex-Ministro Ex Deputado, governador Deputado Ex-Deputado Deputado Ex-Deputado Ex-Deputado Exc-Deputado PT-RS PP-PE PFL-MG PTB-RJ PP-PE PL-SP Nº 195 8 Mensalão, Dólares na cueca Dólares na Cueca (Agora Candidato a Dep. Federal) Mensalão, CPI dos Correios CPI dos Correios Corrupção, Falcatruas, Improbidade Administrativa, Desvio de Dinheiro Público, Lavagem de dinheiro Compra de Votos, Mensalão, CPI Correios Cassado em associação ao Escândalo do Mensalão, Compra de Votos Crime Eleitoral, Mensalão, CPI Correios Mensalão Escândalo do Mensalinho (Renuncio para evitar a cassação) Mensalão (renunciou para evitar a cassação) CRER APESAR DOS MASSACRES NO LÍBANO? O s massacres absurdos de inocentes a que temos assistido por parte da máquina de guerra de Israel contra o povo do Líbano, mostrando impiedade diante de crianças inocentes, nos suscitam a questão do sentido da vida e da História. Esta questão não pode ser banida de nossa consciência por mais que fiquemos perplexos face à crueldade. Ela pertence à metafísica do cotidiano como reconheceu Kant em seu "Prolegómenos a toda metafísica futura": "Que o espírito humano abandone definitivamente as questões metafísicas é tão inverossímil quanto esperar que nós, para não inspirarmos ar poluído, deixássemos, uma vez por todas, de respirar". Não são poucos os pensadores que confrontados com os absurdos da realidade afirmam o sem sentido da História. Jacques Monod em seu conhecido "O acaso e a necessidade" diz taxativamente: "É supérfluo buscar um sentido objetivo da existência. Ele simplesmente não existe. O homem é produto do mais cego e absoluto Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 9 acaso que imaginar se possa. Os deuses estão mortos e o homem está só no mundo". Claude Levy-Strauss, tão ligado ao Brasil, escreveu em seu admirável "Tristes Trópicos" estas desencorajantes palavras: "O mundo começou sem o homem e terminará sem ele. As instituições e os costumes que eu passei a vida inteira e inventariar e a compreender são uma eflorescência passageira em relação com a qual elas não têm sentido, senão talvez aquele que permite à humanidade desempenhar seu papel". Há muito de verdade nestas afirmações porque os absurdos são inegáveis. Mas será que é toda a verdade? Não se anunciam também sinais intrigantes que nos falam de um sentido latente nas coisas? Por mais que venhamos do caos originário do big-bang não podemos negar que na evolução se manifestou uma linha ascendente que nos levou da cosmogênese, à biogênese, à antropogênese e hoje à noogênese. Não se pode negar que há aí um sentido manifesto. Vamos ao cotidiano. Cada manhã levantamos, vamos ao trabalho, lutamos pela família e ansiamos por um mundo onde seja menos difícil amar. Há até situações em que chegamos a dar vida para salvar outras vidas. Que se esconde atrás destes gestos cotidianos? Esconde-se a confiança fundamental na bondade da vida. Ela vale a pena ser vivida. O conhecido sociólogo austríaco-norte-americano Peter Berger escreveu em seu livro "Um rumor de anjos: a sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural" que o ser humano tem uma tendência inata para a ordem. Ele só vive e sobrevive se conseguir organizar um arranjo existencial que lhe faça sentido. Essa tendência à ordem se mostra em cenas bem familiares como a da mãe que acalenta o filhinho. Dentro da noite ele acorda sobressaltado. Grita por sua mãe porque o estrondo das bombas lhe suscitaram terríveis pesadelos. A mãe se levanta, toma o filhinho no colo e no gesto primordial da "magna mater" lhe sussurra palavras doces:"Não tenhas medo meu filhinho, tudo vai acabar e vai estar em ordem". A criança soluça, reconquista a confiança e um pouco mais e mais um pouco adormece. Nem tudo está bem e em ordem. Mas sentimos que a mãe não está enganando o filhinho. No fundo ela testemunha: mesmo na desordem há uma ordem subjacente que a tudo preside. Ter confiança na bondade fundamental da vida e dizer-lhe Sim e Amém é o sentido primordial da fé que não nos deixa desesperar face ao horror da guerra. M Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 10 GUERRA NO ORIENTE MÉDIO ATÉ QUANDO? Eduardo Galeano (*) E m Canaã, onde Jesus converteu água em vinho para celebrar o amor humano, o ódio humano despedaça mais de 30 crianças num grande bombardeio. A guerra segue indiferente. Como de costume, dizem que foi um erro. Até quando os horrores continuarão sendo chamados de erros? (em espanhol errores, o que dá um sentido mais poético à frase). Esta guerra, esta carnificina de civis, desencadeou-se a partir do seqüestro de um soldado israelita. Até quando o seqüestro de um soldado israelita poderá justificar o seqüestro da soberania palestina? Até quando o seqüestro de dois soldados israelenses poderá justificar o seqüestro de todo o Líbano? A caça aos judeus foi durante séculos o “esporte” favorito dos europeus. Em Auschwitz desembocou um antigo rio de espantos que havia atravessado toda a Europa. Até quando os palestinos e outros árabes seguirão pagando por crimes que não cometeram? O Hezbollah não existia quando Israel arrasou o Líbano em suas invasões anteriores. Até quando continuaremos acreditando no conto do agressor agredido, que pratica o terrorismo porque tem direito de defender-se do terrorismo? Iraque, Afeganistão, Palestina, Líbano, até quando poderemos seguir exterminando países impunemente? As torturas de Abu Ghraib, que despertaram certo mal-estar universal, não têm nada de novo para nós, latino-americanos. Nossos militares aprenderam essas técnicas de interrogatório na Escola das Américas, que agora perdeu seu nome, mas não as suas manhas.. Até quando seguiremos aceitando que a tortura continue sendo legitimada, como o fez a Corte Suprema de Israel, em nome da legítima defesa da pátria? Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 11 Israel não deu ouvidos a 46 resoluções da Assembléia Geral da ONU e de vários outros organismos da ONU. Até quando o governo de Israel continuará exercendo o privilégio da surdez? As Nações Unidas recomendam, mas não decidem. Quando decidem, a Casa Branca impede que decidam, porque tem direito de veto. A Casa Branca tem vetado no Conselho de Segurança quarenta resoluções que condenavam Israel. Até quando as Nações Unidas continuarão atuando como se fossem outro nome dos Estados Unidos? Desde que os palestinos foram desalojados de suas casas e despojados de suas terras, correu muito sangue. Até quando o sangue continuará correndo para que a força justifique o que o direito nega? A história se repete, dia após dia, ano após ano e para cada 10 árabes mortos, morre um israelense. Até quando a vida de cada israelense continuará valendo dez vezes mais? Em proporção à população, os 50 mil civis, em sua maioria mulheres e crianças, mortos no Iraque, equivalem a oitocentos mil estadunidenses. Até quando continuaremos aceitando, como se fosse normal, a matança de iraquianos numa guerra cega que esqueceu os seus pretextos? Até quando continuará sendo normal que os vivos e os mortos sejam de primeira, segunda, terceira ou quarta categoria? O Irã está desenvolvendo a energia nuclear. Até quando continuaremos acreditando que isso baste para provar que um país é um perigo para a humanidade? À chamada comunidade internacional, não causa angústia o fato de que Israel tenha 250 bombas atômicas, mesmo sendo um país que vive à beira de um ataque de nervos. Quem guia o perigosímetro universal? Teria sido o Irã o país que jogou as bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki? Na era da globalização o direito de pressão pode mais que o direito de expressão. Para justificar a ocupação ilegal de terras palestinas, a guerra se chama paz. Os israelenses são patriotas e os palestinos são terroristas e os terroristas acionam o alarme universal. Até quando os meios de comunicação continuarão sendo medos de comunicação? A matança atual, que não é a primeira e – temo – não será a última, ocorre em meio ao silêncio. O mundo estará mudo? Até quando continuarão soando em vão as vozes da indignação? Estes bombardeios matam crianças, mais de um terço das vítimas e às vezes mais do que isso, como em Canaã. Quem se atreve a denunciar isso é acusado de anti-semita. Até quando continuaremos sendo anti-semitas ao denunciar os crimes do terrorismo de Estado? Até quando aceitaremos essa extorsão? São anti-semitas os judeus horrorizados pelo que é feito em seu nome? São anti-semitas os árabes, tão semitas como os judeus? Por acaso não há vozes palestinas que defendem a pátria palestina e repudiam o hospício fundamentalista? Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 12 Os terroristas se parecem entre si: os terroristas de Estado, respeitáveis homens de governo, e os terroristas privados, que são loucos à solta ou loucos organizados desde os tempos da Guerra Fria contra o totalitarismo comunista. E todos atuam em nome de Deus, chame-se esse Deus Jeová ou Alá. Até quando seguiremos ignorando que todos os terrorismos desprezam a vida humana e que todos se alimentam mutuamente? Não é evidente que nesta guerra entre Israel e o Hezbollah, são os civis, libaneses, palestinos, israelenses, que entram com os mortos? Não é evidente que as guerras do Afeganistão e do Iraque e as invasões de Gaza e do Líbano são incubadoras do ódio, que fabricam fanáticos em série? SOMOS A ÚNICA ESPÉCIE ANIMAL ESPECIALIZADA NO EXTERMÍNIO MÚTUO. Destinamos 2,5 milhões de dólares, por dia a gastos militares. A miséria e a guerra são filhas do mesmo pai: como alguns deuses cruéis, devora os vivos e os mortos. Até quando continuaremos aceitando que este mundo, apaixonado pela morte, é o nosso único mundo possível? m (*) Escritor e jornalista uruguaio, autor de As Veias Abertas da América Latina _____________________________________________________________________ VENTOS POLÍTICOS EM FASE DE DEFINIÇÃO Nahum Sirotsky I srael - Os ventos políticos não parecem soprar em favor de Israel. Não se trata dos mais de duzentos morteiros lançados sobre o país na quarta, um numero recorde. Nem se questiona a superioridade militar de Israel, mas se será possível resistir às crescentes pressões políticas internacionais, numa direção não compatível com aquela que a atual liderança israelense considera essencial para uma solução favorável de sua guerra com o Hezbollah. Desde os primeiros momentos do choque destacou-se o óbvio. O começo foi a notícia que devo lembrar: O Hezbollah entrou em território israelense e seqüestrou dois soldados. As forças israelenses da fronteira entram em território libanês em perseguição para libertar os seus recrutas. Não tiveram sucesso. E a perseguição escalou na atual guerra entre Israel e o Hezbollah, com as conseqüências sobre o Líbano. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 13 O Hezbollah força guerrilheira libanesa, da seita muçulmana xiita, a mesma do Irã criada por veteranos da guerra dos muçulmanos contra tropa soviética no Afeganistão, tropa que sustentava um governo comunista que, para os muçulmanos, sendo ateu é inimigo e ofende ao Deus único, Alá, e às suas mensagens divinas transmitidas ao mundo por Maomé, o seu profeta e mensageiro. Os soviéticos acabaram derrotados. E a tropa ao voltar para a União Soviética, desmoralizada, contribuiu para a derrocada do sistema comunista russo. E o Talibã subiu ao poder no Afeganistão e impôs um sistema teocrático, um governo de sacerdotes. No país assentou-se Bin Laden, exilado, um dos heróis da guerra, que passou a inimigo público numero um dos Estados Unidos e países não muçulmanos. Inspirou um dos maiores atos de terrorismo da História, a destruição da Torres Gêmeas de Nova Iorque. O governo Bush declarou guerra ao terrorismo, invadiu o Afeganistão e, posteriormente, o Iraque de Saddam Hussein, ditador que derrubou. A invasão do Iraque resultou na guerra que ainda não terminou. O Hezbollah, com apoio do Irã e da Síria, transformou-se num poder militar que ignora as leis do seu país cujo governo optou por não se arriscar a enfrentá-lo. Assumiu o controle do sul do Líbano, fronteira norte de Israel. Os choques entre o Hezbollah e a tropa israelense na fronteira passaram a ser freqüentes. O Hezbollah rejeita o direito à existência do Estado Judeu. Alega que ocupa terras sagradas, pois por tradição, foi da Colina do Templo que Maomé ascendeu a Alá, Deus, que lhe revelou o Corão, o Livro Sagrado do Islã. Foi classificado de organização terrorista pelo seu programa e qualificado de instrumento estratégico do Irã cujos líderes, os aiatolás, declaram ser seu objetivo a extinção do Estado Judeu e são inimigos mortais dos americanos..Ou eram... O estado de Israel tem antigo conflito com os árabes palestinos, seus vizinhos na Região Sul, Faixa de Gaza e Cisjordânia, o Braço Ocidental do Rio Jordão. Mas haviam chegado a um reconhecimento do direito a coexistirem. A discussão chegara à questão da fronteiras entre os dois tendo o “roteiro de paz”, aprovado pelos Estados Unidos, Rússia, Europa e Nações Unidas, como orientação.. O governo Bush, promovendo a tese da transformação dos estados árabes em democracias, pressionou os palestinos a realizarem eleições livres depois da morte do então maior líder palestino, Yasser Arafat. O Hamas, Partido de Resistência Palestino, ganhou as eleições, com um programa de criar um estado palestino islâmico e destruir o estado judeu, programa semelhante ao do Hezbollah, já caracterizado como organização terrorista devido sua tática de combater Israel com o emprego de homens-bomba, os suicidas, o Hamas foi isolado da Comunidade Internacional. E num ato audacioso seqüestrou um soldado israelense e declarou que o trocaria pela liberação de um número de prisioneiros palestinos. Israel rejeitou a proposta. E estava em choque com o Hamas, quando o Hezbollah cometeu o seu seqüestro. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 14 É óbvio que Israel, baseando-se em sua vivência das tradições do Oriente Médio, está convencido de que ao ceder às imposições do Hamas e do Hezbollah daria sinais de fraqueza aos seus inimigos na região. Sem o poder de dissuasão-deterrente da imagem de seu poderio, corre o risco de ser desafiado e ter de enfrentar mais uma guerra de âmbito regional e, certamente, as inúmeras organizações islâmicas com táticas terroristas. Os Estados Unidos com todo o seu imenso poder não conseguiram derrotar a insurgência no Iraque ou obter o respeito do Irã. É provável que Israel tenha imaginado poder enfraquecer decisivamente o Hezbollah com as mesmas táticas que vêm aplicando contra o Hamas. Em algum ponto de sua reação houve algum lapso. A sua superioridade militar é notória, mas não tem impedido que continuem chovendo mísseis e morteiros sobre a sua região Norte, na qual dois milhões de civis vivem e sofrem. Nem continuem caindo Qassams, morteiros de fabricação caseira palestina, em centros urbanos de sua região sul. Talvez sejam questões que só se podem resolver por meios políticos. Os meios militares extremos, de guerra total, são inaplicáveis no atual contexto mundial. No caso do Hezbollah o governo israelense anuncia que cessará suas operações militares no momento e que se concretize a hipótese de ser criada uma força internacional com poderes de atirar e que seria assentada ao longo das linhas de suas fronteiras com o Líbano. Mas existem pressões para que primeiro se decrete um cessar fogo que, sem dúvida alguma, considerando-se o passado da região, pode ser proclamado pelo Hezbollah como vitória sua e vir a ser modelo de ação para grupos afins agirem por todo o Oriente Médio para implantar governos de sistemas islâmicos como o Irã. E existe tal possibilidade se o cessar-fogo não for base para um acordo de longo prazo com o Líbano, retomada de negociações para a solução do conflito com os palestinos , talvez, uma aceitação por todo o mundo árabe da existência do estado judeu como um fato consumado..Tudo é possível mesmo que não muito provável . Algo deve ter convencido os Estados Unidos a aceitarem tal hipótese. Não se sabe o que, talvez cansaço físico e econômico de guerras... Mas, seja o que vier a acontecer, o seqüestro de dois soldados tende a mudar as relações internacionais no Oriente Médio, só ainda não se sabe se para melhor ou pior. m Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 15 ENQUANTO HOUVER ÓDIO... Ruy Paneiro F ritz: Entendo bem o estado de espírito a que você chegou, depois de receber bateladas de críticas, observações, acusações, opróbrios e vitupérios a respeito do embate no Oriente Médio. Embora não tenha lido os textos dirigidos a você (e ao Mont), posso imaginar a exacerbação do pessoal. É muito difícil, torno a dizer, “analisar o conflito entre Israel, Palestina e Líbano sem que se sinta na boca o repugnante gosto de sangue. É preciso o máximo de bom-senso, de racionalidade, de isenção para escapar ao ódio”. E volto a frisar, sublinhando para destacar o sentido que procurei dar: “Ódio tão intenso, que até conduz ao desejo insano de ver exterminados, de uma vez por todas, os autores do novo holocausto. Exatamente aqueles que há mais de 60 anos representam o papel de maiores vítimas do nazismo”. Insano. Desejo insano. Ao qual muita gente chega (não é o meu caso) diante da desproporcionalidade da reação israelense, em face do apoio, acobertamento e sustentação dos americanos e por conta da omissão dos demais países. Não significa, em absoluto, que eu pregue a pulverização de Israel e sua gente. Faço, sim, sérias restrições à direita israelense, à amálgama capitalista formada com os Estados Unidos e a política externa de ambos – muito semelhantes, por sinal, na prepotência, na arrogância e no sistemático desrespeito tanto à ONU quanto à soberania dos outros países. Mas aplaudo a democracia, a liberdade de imprensa, que permite a um Gideon Levy dizer o que pensa no principal jornal israelense. Por sinal, brilhante e muito peitudo, esse ex-assessor de imprensa do Shimon Peres. Da mesma forma, fico horrorizado com as barbaridades praticadas por muçulmanos e islamitas. Autoflagelação, fanatismo religioso, sectarismo, imposições sociais, até mesmo leis e punições absurdas, para dizer pouco. Mas a merda é que eles já estavam lá quando Israel foi criado e de forma impositiva. Como disse o Dines terça à noite na TVE, “essa guerra já tem 52 anos e pode durar 100”. E vai durar mesmo, se o ódio for adubado como vem sendo. Então meu amigo, a partir do próprio título (Enquanto houver ódio), o que eu procurei demonstrar e afirmei é que “Apesar de difícil, é imprescindível repelir o ódio”. Ódio que se espalha em processo de realimentação: “Tudo porque, um dia, as vítimas resolveram seguir o exemplo de seus algozes. E passaram a despejar, uns contra Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 16 outros, o ódio que aprenderam a cultivar”. “Ou a serenidade vence já a bestialidade, ou as crianças que sobreviverem à carnificina atual vão lastimar terem vivido para presenciar o inferno que o mundo será”. Tratados podem ser assinados, forças de paz instaladas, fronteiras estabelecidas. Enquanto houver ódio, falarão mais alto as diferenças culturais manipuladas e incrementadas pelo interesse maior do capital. E os cristãos maronitas, judeus e muçulmanos acabam embarcando nessa. Fazendo o jogo, matando e morrendo. Nada a ver (ou a comparar) a ação israelense com os métodos nazistas e mengelianos. Falta racionalidade às pessoas, como diz você. De fato, há milhares de anos ocorrem atrocidades na Terra e sacrificam inocentes. Só que algumas pessoas, aí eu me incluo, ainda se chocam. Aconteçam elas no Laos, na Coréia, no Vietnã, na Manchúria, no Japão, na China, na Rússia, na Alemanha, nos Bálcãs, no Afeganistão, no Iraque, em Ruanda, Angola, Biafra, Quênia, Moçambique, Etiópia, Argélia, Sudão, Costa do Marfim, Nigéria, Nicarágua, Honduras, El Salvador, Chile. No Carandiru, na Candelária, em Vigário Geral ou Carajás do Sul. Não importa o lugar: o ódio é que mata. E enquanto houver ódio… Ri muito quando há anos a turma do Casseta & Planeta defendeu a tese de que “para acabar com a violência, só dando muita porrada”. Parece até que a brincadeira foi levada a sério por Israel, na Palestina e no Líbano. Mas o ódio é uma coisa terrível e não dá para rir agora, quando se sabe que muita gente sofrerá no futuro as conseqüências do ódio que se desenvolve hoje. M Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 17 O CRIME REALMENTE ORGANIZADO “O crime não compensa... tanto quanto a política”. - Alfred E. Newman O s acontecimentos desses últimos meses - além de escandalizar a todos – comprovaram que existe ainda mais crime na esfera pública do que se suspeitava. Os números referentes ao mensalão e aos desmandos do Executivo, a quadrilha das sanguessugas e outras atividades nefastas sugerem que pelo menos 1/3 do nosso Congresso, se não mais, é composto por criminosos. Uma outra informação - esta do Monitor das Fraudes, um site que merece ser conhecido e divulgado, criado por um advogado de São Paulo, Lorenzo Parodi, (www.fraudes.org/indexjvs.asp) - lança mais luz sobre essa área escura, ao divulgar pesquisas que revelaram que os agentes públicos mais sujeitos a corrupção são, pela ordem, (1) policiais, (2) fiscais tributários, (3) funcionários ligados a licenças, (4) parlamentares, (5) funcionários ligados a licitações, (6) agentes alfandegários, (7) fiscais técnicos, (8) primeiro escalão do executivo, (9) funcionários de bancos oficiais e (10) juizes. Como não me convenceram as recentes invectivas da imprensa (e dos comunicadores) sobre as ações do “crime organizado” no Brasil e menos ainda, ao contemplar o primarismo dos indivíduos exibidos pelas nossas autoridades como seus líderes Marcola, por exemplo – tudo isso levou-me a uma pesquisa na internet, atrás de outra hipótese – que acredito mais próxima da verdadeira realidade - cujos resultados quero compartilhar com os leitores. Consultando sites diversos, descobri que há, no Brasil, além dos 513 deputados e 80 senadores, 5.560 prefeitos, 20.000 secretários municipais, 65.000 vereadores, 27 governadores, 300 secretários estaduais, 40.000 deputados estaduais, pelo menos 100 pessoas do primeiro escalão do Executivo Federal (os que foram afastados eram os chefes) e uns 1.000 juizes e altos funcionários do Judiciário. Somando-se a eles os cerca de 500.000 policiais civis e militares (dados da revista Veja), arredondando, chegamos a um total de 632.600 pessoas. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 18 Lidar com os números do funcionalismo público é mais complexo, pois não há uma fonte de referência única. A Secretaria de RH do Ministério do Planejamento indica cerca de 2 milhões, na área federal. O Banco do Brasil declara pagar os salários a 4,3 milhões – o que permite estimar que devem ser mais de 4 milhões, considerando os três níveis da administração pública. É claro que não há estatísticas disponíveis sobre os criminosos, uma vez que estão fora da lei. Mas, de acordo com a Human Rights Watch, a população carcerária do país é de 170 mil detentos; 95% são do sexo masculino e pobres; dois terços não completaram o primeiro grau e 12% são analfabetos. Digamos que os que estão presos representem 10% do total de criminosos de tempo integral do país, que seria, então, de 1,7 milhão. Estamos chegando. Pelas características descritas, é lícito supor que só uns 10 por cento dessa criminalidade pobre e inculta, de fato, teria condições de se organizar, o que poderia levar ao total de uns 170 mil. Agora o outro lado: o de dentro da lei. Mesmo aplicando hipóteses generosas, de que 90% dos funcionários públicos sejam honestos – e de que não passe de ¼ o percentual dos delinqüentes nos cargos eletivos, no judiciário e nas forças policiais, tudo parece indicar que o número dos criminosos “legais” ultrapasse o meio milhão. Além disso, embora haja escassa informação publicada sobre o assunto, parece certo existir uma área cinzenta – que é a da conivência e cumplicidade entre as duas facções criminosas, a que está fora da lei e a que age dentro dela. Nesse segmento – em que chega a ser arriscado e perigoso investigar (e a imprensa, geralmente, passa ao largo) – estão as atividades milionárias da contravenção e do jogo ilegal, das concessões de serviços públicos municipais e do multinacional tráfico de drogas, para citar as mais conspícuas. E isso para não entreabrir a caixa de Pandora, que é a discreta indústria da Segurança no país. Mesmo assim, descartando esses setores sinistros, restam cerca de 500 mil pessoas a roubar e delinqüir, no Brasil, sob a proteção de mandatos e uniformes, imunidades, cargos vitalícios e “de confiança”. Pior, usando os equipamentos, as armas e as facilidades adquiridas com o dinheiro dos nossos impostos para apropriar-se, todos os anos, de bilhões de reais deste dinheiro, que – repito – é nosso e devia ser destinado ao investimento e aos serviços públicos, mas não é. Essa gente, literalmente, ri-se e zomba da nossa indignação (às vezes, até dançam). Não dão a mínima. Muitos estão certos de que se vão reeleger em outubro para continuar na bandidagem. Isso sim é que é crime organizado. E o pior é que, deste, parece ser impossível nos livrarmos. M Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 19 ANISTIA Peter Wilm Rosenfeld O Art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988 estabeleceu que todos aqueles que se julgarem prejudicados por atos do governo motivados por razões políticas, a partir de 18/9/1946 até a data da promulgação da Constituição, podem requerer anistia, pedido que será julgado por uma Comissão de Anistia criada no Ministério da Justiça, cujos componentes serão nomeados por ato do Ministro. A declaração de anistiado, ainda de acordo com o já mencionado Ato, somente gerará efeitos financeiros a partir da data da promulgação da Constituição, ou do requerimento do punido, vedada a remuneração de qualquer espécie em caráter retroativo. A Lei 10.559, de 13/11/2002, regulamentou o citado Art. 8º. Note-se que essa Lei é decorrência da Medida Provisória 65, de 2002, e foi promulgada pelo então Presidente do Congresso Nacional, Senador Ramez Tebet. Com base nessa Lei, têm sido concedidas indenizações totalmente absurdas e despropositadas a muitas pessoas; em nenhuma dessas indenizações foi levado em conta o fato de que os beneficiados continuaram, depois de penalizados, exercendo as mais diversas funções, algumas sem vínculo, outras como empregados; muito poucos passaram dificuldades ou privações, exceto talvez nas primeiras semanas ou meses após a punição. O caso mais badalado foi o do escritor Carlos Heitor Cony, agraciado com uma remuneração mensal de cerca de R$ 19 mil, além do pagamento de uma parcela de mais de um milhão de reais. O Sr. Luiz Ignácio Lula da Silva foi premiado com uma remuneração mensal que hoje está em cerca de R$ 4,5 mil, apesar de ter ficado preso por apenas 20 dias, com todas as regalias possíveis, nunca tendo deixado de exercer sua atividade de líder sindical. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 20 Os valores pagos aos anistiados são isentos do pagamento de qualquer imposto ou taxas, contribuições, etc. Imposto de Renda nem falar! Em agosto de 2005 foi declarado anistiado o Sr. Hermano de Deus Nobre Alves, que havia sido cassado quando era Deputado Federal, tendo-lhe sido concedido um pagamento único de R$ 90.000,00, correspondentes a 300 salários mínimos (25 meses de salário mínimo!) mais pagamentos mensais de R$ 14.777,50 pela perda do emprego de jornalista; como já recebia R$ 2.095,54 do INSS, como aposentado (que aposentado marajá, com quase sete salários mínimos!), teve direito a R$ 12.681,96, perfazendo um valor de R$ 2.160.794,62, retroativo a 07.02.1992) . O que desejo comentar no presente texto diz respeito a: - A forma de calcular a indenização – A Comissão de Anistia analisa, a partir da situação do anistiado (posto, cargo no emprego, função se funcionário) ao ser punido, com a situação que teria se tivesse continuado na ativa, sempre supondo que teria tido direito a toda e qualquer promoção. Então, no caso do jornalista, é de se perguntar quantos empregados de jornais ganham hoje R$ 14.780,00? Quantos oficiais das forças armadas teriam sido promovidos aos postos mais elevados no período? Quantos empregados teriam sido promovidos a diretores das empresas em que trabalhavam? Sim, pois esse é o critério da Comissão. - Por que isenção de impostos? Se tivessem tido todas as promoções referidas no item anterior, pagariam impostos sobre suas remunerações como todos os demais cidadãos. - Por que remuneração vitalícia? Todas as pessoas empregadas, exceto militares e funcionários públicos) ao se aposentarem, passam a receber pelo INSS (se forem participantes de uma entidade privada, recebem uma complementação), em geral inferior à remuneração percebida quando em atividade. - Por que o ministro da Justiça acata, integralmente, a decisão da Comissão de Anistia? Não deveria se preocupar se a indenização lhe parecesse descabida? A Lei 10.559 estabelece que a reparação econômica o será em prestação única ou em prestação mensal (Art. 1º, inciso II). Não é o que tem sido adjudicado, pois tem sido única e prestação mensal. Enfim, entre tantos desmazelos existentes no Brasil, soma-se esse que é um saco sem fundos. Já foram adjudicadas algumas centenas de reparações e, ao que se sabe, há alguns milhares na fila. Não se sabe quando isso terminará. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 21 O cidadão comum, cumpridor de suas obrigações sociais e fiscais, só pode se revoltar com isso. Note-se que a quase totalidade, se não a totalidade, dessas indenizações foram adjudicadas no atual governo, já que a Lei 10.559 só foi publicada em 14.11.2002, portanto, no apagar das luzes do governo anterior. M _______________________________________________________________ COTAS NAS UNIVERSIDADES: EXCELENTE INSTRUMENTO PARA PROMOVER A SEGREGAÇÃO RACIAL Rodolfo Paranhos E ste debate sobre cotas está chegando ao limite da sandice e o pior desta excrescência é ser uma lei já aprovada (conforme afirmado dia 03/08 na discussão em Brasília). Pelo menos na mesma sessão (do Congresso acho) houve a fala de um representante de grupos “minoritários” veementemente contra as cotas. Ele defendia que qualquer recurso para cotas fosse investido em fazer uma escola pública de base tão boa quanto as melhores particulares. Esta é a única solução possível: educar bem desde o início. Estes alunos jamais vão precisar das cotas, vão por seus próprios méritos. Qualquer real investido na escola de base vai render zilhões de vezes mais do que o investido nas cotas. Nada contra, muito pelo contrário, a propiciar que alunos “carentes”, mas talentosos possam galgar os mais altos níveis educacionais, este tipo de oportunidade deve ser estimulada. Mas daí a oferecer cotas e encher a universidade de gente que não vai chegar nem à metade do curso... francamente, que lei mais míope. Sou professor universitário e vejo, a cada ano, alunos cada vez piores e menos interessados, e olha que trabalho com a “elite” do ensino superior (i.e. uma universidade pública em uma grande cidade, repleta de alunos oriundos das melhores escolas particulares - mas também temos muitos alunos bem humildes). Uma parte não desprezível destes, mesmo vindo de “boas” escolas, não tem a menor condição de cursar um curso de graduação. Imagina quem for jogado pela janela em uma universidade! Tenho escutado casos de uma crescente discriminação dos alunos que fazem vestibular contra os alunos cotistas. Este sistema só vai fomentar a discórdia, e em minha opinião é injusto, humilhante, racista e ineficaz. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 22 O mais surrealista nesta questão é a grande mistura racial existente no Brasil. Fora o Magu, quem aqui não tem um bom percentual de sangue negro e índio nas veias? Há alguém branco no Brasil? Arrisco afirmar que esta é uma discussão sem propósito. Enquanto a lei magna do país for a lei de Gérson... m CINEMA – Nelson Rodrigues de Souza “A CIDADE PERDIDA” de Andy Garcia “Sonho de ator cubano-americano redunda em “macumba para turista” A ndy Garcia (um dos policiais incorruptíveis de “Os Intocáveis” de Brian de Palma, dono de cassinos em “Doze Homens e Um Segredo” de Steven Soderbergh, junto com Dustin Hoffman, os protagonistas de “Herói por Acidente” de Stephen Frears, dentre outros trabalhos) nasceu em Havana em 1956. Neste ano Guillermo Cabrera Infante já era um jovem crítico de cinema. Com a revolução cubana, a família de Andy que era de classe média alta, fugiu em 1961de Cuba para Miami, com o menino tendo apenas cinco anos. Em entrevista o ator relata que isto ficou impresso em seu inconsciente. Daí sua vontade inquebrantável de 16 anos tentando realizar “A Cidade Perdida” (EUA-2005), com roteiro de Cabrera Infante, agora já escritor exilado em Londres e consagrado, principalmente pelo romance “Três Tristes Tigres”. Cabrera tornou-se um dos mais ferozes e irônicos críticos dos descaminhos da revolução cubana e da eternização de Fidel Castro no poder. Um filme que retratasse a transição entre dois mundos, a velha Cuba do ditador Fulgêncio Batista, com muitas casas noturnas, rum, mambos, rumbas, boleros e o impacto da revolução sobre os membros de uma família em 1958, um pouco antes e depois da tomada do poder por Fidel Castro e sua ditadura do proletariado, com toques de “Casablanca” (um dos filmes mais esmiuçados por Cabrera) e “O Poderoso Chefão II”, estaria em boas mãos, com a gana deste ator e o talento deste escritor. Tal não aconteceu. O roteiro original tinha 360 páginas. O que foi efetivamente trabalhado ao final, 120. Esta e outras simplificações que veremos adiante fazem de Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 23 “A Cidade Perdida”, rodado na Republica Dominicana, um dos grandes desperdícios de recursos e talentos nos últimos anos do cinema americano. Não fosse pelas inegáveis belas músicas que se ouve na trilha sonora, pesquisada exaustivamente por Andy Garcia, a obra poderia ser considerada um fiasco total. Em entrevista à Folha de S. Paulo de 28 de julho de 2006 para o jornalista Eduardo Simões, o diretor que fez seu primeiro longa metragem de ficção declarou: "A real motivação para o filme foi fazer um tributo à música e à cultura de Cuba, voltando o olhar para este momento específico em que houve uma mudança dramática na ideologia do país, algo que separou muitas famílias"; "Sou um produto desta história, sempre tive uma nostalgia profunda da cultura deste país que deixei quando ainda era uma criança. Daí o objetivo do filme ser contar essa história usando a música como seu protagonista". O equívoco já começa na proposta. Um filme, pelo que se vê no resultado nas telas, que pretende ser uma visão crítica tanto da era ditatorial de Fulgêncio Batista como dos desencantos com uma revolução que traiu seus ideais e não foi democrática, não pode ter a música como protagonista. Assim, o que resulta é um festival de seqüências onde paira a sombra incômoda da inautenticidade. Quando o filme se vale de cenas de arquivo da época retratada e até insere digitalmente Fico (Andy Garcia) e Aurora (Inés Sastre) entre homens do povo (seres cuja aura, o filme não consegue capciosa e tendenciosamente captar) a falsidade do que estamos assistindo se torna mais patente, quando não estamos no alívio dos números musicais. A Família de classe média alta Fellove é composta pelo pai, um professor universitário, Federico (Tomás Milián), a mãe Cecilia (Millie Perkins), o filho mais Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 24 velho Fico que administra um prestigiado clube noturno, “El Trópico” (baseado numa casa noturna real, A Tropicana), Ricardo (Enrique Murciano), Luis (Nestor Carbonell), sendo estes dois mais novos, francamente favoráveis à queda de Fulgêncio Batista. Luis chega a liderar um atentado ao palácio onde se instala o ditador. A resistência à revolução, a vitória de Fidel Castro, Che Guevara, os comandados e o encaminhamento desta ditarão o destino destes personagens. Como a música cubana é a menina dos olhos de Andy Garcia neste painel de contradições, esperanças e decepções que tenta montar, até mesmo a invasão do palácio tem como trilha sonora uma música dançante e vibrante, o que esvazia e de certo modo ridiculariza o potencial dramático destas cenas. Os personagens de modo geral são mal delineados. A história de amor entre Fico e Aurora, sua cunhada viúva, é muito frágil. Bill Murray faz um escritor que acompanha tudo à distância, emite suas boutades e platitudes, se escondendo às vezes atrás de um leque, acabando aqui por dar razão aos seus detratores habituais: como seu personagem é sub-aproveitado e construído temos realmente a impressão de que ele está simplesmente sendo ele mesmo, o que não acontece em “Flores Partidas” de Jim Jamursch, por exemplo, onde trabalha com uma sutil e aparente calma que camufla seu desespero, desamparo e solidão. Dustin Hoffman que está em destaque no cartaz do filme faz uma irrisória ponta como o mafioso Meyer Lansky, o que sugere muito mais a necessidade de dar uma força ao seu amigo ator, do que se constituir num personagem dramaturgicamente relevante. Batista (Juan Fernandez) nos é mostrado como completa caricatura. Se o filme não caminhava bem, quando a revolução se torna vitoriosa, desanda ainda mais. A visão que o filme apresenta dos revolucionários e principalmente de Che Guevara (Jsu Garcia) mostrando-os extremamante ridículos, torna-se também ridícula. Pode ter sido uma boa vingança do roteirista exilado Cabrera Infante, mas Che na visão de Andy Garcia só falta comer criancinhas. Não tem nuances. Não se pretende aqui que o filme apresente uma aura de santidade para este mito, mas o que se vê é uma caricatura grosseira. Para fazer o serviço completo do anti-castrismo feroz e inconseqüente faltou coragem para mostrar Fidel escovando a barba espessa enquanto um camarada fuzila alguém no paredón... Luis, agora vencedor, vai às terras do tio Don Donoso e lhe dá arrogantemente a notícia de que seu latifúndio agora é do Estado. O velho cai no chão de imediato acometido por um infarto ou um mal súbito. No afã de criticar a nova ordem, Andy Garcia faz, no seu épico musical malogrado, o que deveria ser trágico, tornar-se patético e um tanto cômico. Uma revolucionária vai ao El Tropico e proíbe o uso de saxofone, como uma vilã de novela da Globo, porque o instrumento é originário da Bélgica e este estava sendo um país colonialista... Cabreira Infante pode até ter presenciado cenas como essa enquanto ainda estava em Cuba, mas a forma como Garcia encenou é por demais (mais uma vez a palavra se torna imperativa) caricata. Um problema adicional se Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 25 junta aos já referidos: como há cubanos falando inglês neste filme! Será que é porque as pessoas comuns do povo estão ausentes? “Havana Blues” de Benito Zambrano (Espanha/ Cuba/2005), filme pouco visto, consegue ser ao mesmo tempo um crítico panorama dos impasses atuais de Cuba como também um belo painel da música cubana contemporânea. O clássico “Memórias do Subdesenvolvimento” (Cuba/1968) de Tomás Gutiérrez Alea se centra nas angústias e contradições de um intelectual burguês que se vê sozinho em Havana após a partida de sua esposa e de seus pais, na Cuba recém-revolucionada. “Soy Cuba” (Cuba/1964) de Mikhail Kalatozov nos mostra acontecimentos e os movimentos que antecederam a revolução com extraordinária beleza plástica. Já um grande filme que seja abrangente e que capture no tempo a Cuba de Batista e sua euforia, seu clima paradisíaco para os que têm dinheiro, os movimentos para a revolução propriamente dita, as ilusões perdidas com o regime autoritário recéminstalado, pelo que conheço, ainda está para ser feito. Andy Garcia sonhou com este filme. Sua inabilidade, ao dar ênfase constante à música cantada e dançada em detrimento de uma sólida estrutura dramática que deveria apresentar personagens sólidos (o professor é uma das raras exceções) o fez cair na cilada de fazer “macumba para turista”. Ou melhor, santeria para turista. Uma mulher em transe se aproxima de Fico e Aurora e sopra-lhes aos ouvidos o quanto estão inadaptados para os novos tempos. O mesmo se pode dizer em relação a este filme maniqueísta, sem alma e sem substância. O mérito do filme nos vem por via transversa: ele é útil para compreendermos como se forma o imaginário sobre Cuba, que até mesmo para americanos (ou cubanoamericanos) com cultura acima da média daqueles que confundem Brasília com Buenos Aires, é deformado segundo fantasmas narcísicos da eterna desconfiança em relação a esta ilha que ousou desafinar o coro dos contentes do consumismo desvairado, há mais de quarenta anos ainda intriga e cria suspense para muita gente, principalmente agora em que a saúde de Fidel requer muitos cuidados e um irmão mais novo deve governar. O título do filme, “A Cidade Perdida” tem conotações comprometedoras. Será que a cidade de Havana, com suas casas noturnas e bordéis de luxo (o que Garcia omite) para os ricos, com todos sob o tacão de Fulgêncio Batista, teve uma perda que se deve lamentar profundamente? Perdida para quem, cara pálida? m Ps1. O ator e diretor Mel Gibson, que se declarou em luta íntima com o alcoolismo, recentemente pagou 5000 dólares de fiança para não ser preso por dirigir embriagado a 160 Km/hora e assim esperar em liberdade o seu julgamento, o que já aconteceu outras vezes. Na terra de Tio Sam como aqui no Brasil, a lei favorece os ricos. O pobre, quando bêbado negligente e perigoso, já fica mofando direto no xilindró. Enquanto fatos como este ocorrerem, por mais defeitos que se possa encontrar na biografia de Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 26 Ernesto Che Guevara, por mais que seus pés mostrem o barro de que são feitos, muitos de seus ideais ainda serão eternos e prementes. Ps2 Se Andy Garcia conversasse com seu profícuo e versátil diretor na franquia “12 Homens e Outro Segredo”, Steven Soderbergh, que está realizando também um filme sobre os últimos meses de Che, mostrando o que aconteceu anos depois àquele menino sonhador de “Diários de Motocicleta” de Walter Salles, entenderia que Che é um ser muito mais complexo do que a raposa insensível que nos mostra em seu “A Cidade Perdida”. GUERRA LÍBANO X ISRAEL Meu caro Fritz. Por mais uma vez você dá vazão à sua indignação no texto em que questiona “Cadê a racionalidade do animal homem?” e o conclui se desculpando pelo desabafo. Desculpas plenamente dispensáveis, pois expressastes o que muitos sentimos. É atribuído a Martin Luther King o dito de que “Os homens aprenderam a nadar como os peixes, aprenderam a voar como os pássaros, mas não aprenderam a viver como irmãos”. Creio que isso responde parcialmente ao seu título indagativo. Em sua coluna desta semana em NoMínimo, Villas-Bôas Corrêa conclui afirmando com uma expressão muito feliz que “a raiva, bem utilizada, é um santo remédio. Cura até sem-vergonhice.” Antonio C. Sarkis Issa Não precisava se desculpar nem pelo word nem pelo desabafo. Não foi um problema ler em word e foi emocionante ler seu desabafo. Um abraço, Érima Caro Fritz: Parabéns pelo seu desabafo. Ele estava entalado na minha garganta também. Grande abraço. Walter Fontoura Querido Fritz - obrigada pelo maravilhoso "desabafo" que você acaba de fazer no Mont 194. Magnífica aula de História. Apesar de ser de ascendência judaica, é exatamente como penso e vejo o horror desta guerra.O que me entristece é o teu Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 27 desalento, em grande medida também meu. Mas a vida continua e o jeito é continuar lutando e indignando-se. Com certeza, estarei na festa dos 200, para te dar um abraço. Fanny Tabak Fritz. Acabo de ler o número 194. A respeito dos judeus, atualmente, parece-me que o que há tempos estão fazendo, compara-se ao que os nazistas fizeram. E, ainda por cima, ao invés de serem combatidos, com o beneplácito, aliás, não só beneplácito, mas apoio explícito da dupla B & B. Nostradamus não disse que o fim do mundo viria do oriente médio? Está começando... Ruy Barros. Cuiabá Prezado Fritz: Estava lendo os jornais de 5ª feira quando vi aquelas imagens de crianças mortas por foguetes de alto alcance, sem rumo e sem atingir o destino que deveria ter:o Hezbollah. Não deveria comparar o fato ao que os nazistas fizeram durante a guerra contra, principalmente, os judeus, incluindo experiências com crianças. Mas saber que hoje,Israel está atacando, não seus inimigos do Hezbollah, mas civis em seus refúgios... Hitler era um monstro, um cruel, um sangüinário... Dele tudo, por pior que fosse, pedia se esperar, mas dos judeus, que foram as principais vítimas dos nazistas, jamais se esperaria a perversidade de atacar campos de refugiados onde a maioria era formada por crianças, cujos pais para ali as levaram, julgando que estariam seguras. Com as mesmas armas que os americanos estão usando para acabar com o Iraque, como já o fizeram com o Afeganistão, Israel está acabando com o Líbano, sem por fim ao Hezbollah. Desculpe-me, afinal você foi vítima dos nazistas que impediram o casamento de seus pais. Mas, tendo D. Elsa como uma heroína, que defendeu o fruto de seu amor, você está vivo e em um país que, por pior que seja, não tem guerra feroz, nem terremoto, nem vulcão, nem furacão...e onde judeus, palestinos e árabes vivem em harmonia, principalmente em um lugar chamado Saara (sem ser deserto). Desculpe-me, mais uma vez, escrevi sob a emoção daquelas fotos. Analisando-as hoje, elas são menos cruéis que as daquelas crianças mortas, friamente, pelos americanos no Iraque, com tiros à queima-roupa, na cabeça; fato ocorrido recentemente. Você já sabe que sou fanática (?) NÃO! admiradora de Carlos Galhardo. Vou ouvi-lo agora para lavar minha alma e esquecer as mazelas de nosso país e do mundo. Há, também, bonitas coisas acontecendo por aqui. Você leu ontem, em "O Globo", que uma cientista escocesa chegou à conclusão que o Azul de nosso céu é o mais bonito do mundo? Já Alcir Pires Vermelho e David Nasser, pela voz de Francisco Alves, diziam: "aqui se encontra o meu país, o meu Brasil grande e tão feliz,onde o céu azul é mais azul..." Beijos, Norma Hauer Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 28 J.R. TEIXEIRA LEITE Caro Fritz: Dona Leneide tem toda razão ao elogiar o José Roberto Teixeira Leite. Foi puro prazer ler o artigo "Reformas Ortográficas".Quero mais! Já a questão da interminável guerra entre judeus e árabes foi magistralmente destrinchada por você no editorial "Cadê a racionalidade...". Infelizmente, para todos nós (porque nada impede que esta guerra acabe por nos atingir, como já fez com tantos civis inocentes em Nova York, Londres, Madri e tantos outros lugares - que Deus nos livre), não há solução à vista, apenas mais explosões e cadáveres. Marcílio Abritta Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 29 A GUERRA QUE NÃO ACABA Há quase 40 anos, no dia 5 de junho de 1967, estourou a chamada “Guerra dos seis dias”, que na verdade terminou em cinco, com a vitória esmagadora de Israel. Os israelitas resolveram atacar devido a uma aliança contra o Estado Judeu, formada pelo Egito, Síria e Jordânia, liderada pelo dirigente egípcio Gamal Abdel Nasser. Israel ocupou a Península do Sinai, a Faixa de Gaza, as Colinas de Golan e a Cisjordânia. O herói da guerra foi o general Moshe Dayan, com seu tapa-olho característico. Nasser começou a declinar como líder do mundo árabe e morreu três anos depois. Nas fotos vemos um judeu ortodoxo e um retornado do front, em trajes civis, mas com um “colar” sugestivo, ambos orando ante o Muro das lamentações. Na segunda foto vemos um soldado israelense observando uma refinaria egípcia em chamas. Na terceira, refugiados palestinos atravessam uma ponte sobre o Rio Jordão demolida na tentativa – inútil – de impedir a investida israelense. O conflito continua até hoje, mas naquela época o fundamentalismo islâmico ainda não existia. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 30 VERÃO DE 45 RESULTA NO INVERNO DE 2006 E m uma de minhas últimas crônicas a figura da velha tonta era – confesso – uma licença poética. Pensava eu! Mas diante do acontecido há poucas horas, vejo que não é. Parada à espera da abertura do sinal na Macedo Sobrinho com a rua Humaitá, ao lado de um jovem rapaz negro que fazia o mesmo, estava eu às voltas com a solução de um sério problema: ir primeiro à loja de ferragens e depois à padaria ou vice-versa. Podem imaginar vocês que isto não exigisse uma séria reflexão, mas ela – a reflexão - era, sim, necessária. Na padaria eu teria que, feitas as compras, pedir que entregassem em casa e não havia ninguém para recebê-las, portanto eu deveria sair correndo antes que o eficiente entregador as trouxesse. E correr ladeira acima hoje em dia é uma impossibilidade. Tudo parecia recomendar deixar a padaria para o segundo lugar. Mas ocorre que na loja de ferragens dar-se-ia a mesma situação. È óbvio que eu poderia pedir a ambos que retardassem a entrega. Melhor seria fazer este pedido na loja de ferragens porque na padaria eu compraria congelados e.... o sinal abriu, fechou de novo e eu nem me apercebi, perdida que estava em meus pensamentos. E eis que sinto a mão do jovem negro pousar em meu braço com delicadeza. Volto-me surpresa para ele: “A senhora está confusa, não está”? Sem me dar conta do que estava acontecendo respondo surpresa, ainda no tom de minha dúvida. “Estou mesmo. Não sei se vou à padaria ou à loja de ferragens”. Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 31 A voz mansa veio carinhosa junto com o apoderar-se firme de meu braço: “Não é melhor ir para casa? Eu levo a senhora...”. Só então me dei conta do que estava sucedendo. Minha gargalhada desconcertou o rapaz que desfeito o mal-entendido tentou desculpar-se, envergonhado. Tratei logo de deixá-lo à vontade, descartando as desculpas. “Não fica assim. Você foi muito legal, juro. Espero que esteja ao meu lado quando e se de fato acontecer o que você pensou que estivesse acontecendo. Eu estou muito agradecida, acredite. E olha, aceito seu braço para atravessar a rua”. Do outro lado, nos despedimos e ele se foi para esquerda e eu para direita. Mandei para longe a torrente de pensamentos que de mim tomou conta. Não posso me arriscar a uma segunda vez no mesmo dia, pensei. Melhor deixar pra pensar em casa. Guardadas as compras (primeiro as da padaria depois as da loja de ferragens) o telefone soa. Uma amiga, a quem relato o divertido incidente. Pasmei diante da reação. Ela ficou indignada: que desaforo! Pensar que você está gagá. Não houve jeito de convencê-la de que tudo levara a crer ao jovem que de fato eu estava completamente desorientada e que ele havia sido mais que gentil. E se tivesse sido verdade o que ele intuíra? Não seria incrível o preocupar-se em devolver à segurança da casa aquela confusa senhora? Mas não teve jeito. Ela não se rendia aos meus argumentos. E às tantas declara: você está ótima! Esta afirmativa entusiasmada evidenciou que isto era um feito memorável e que eu estava, contra todas as probabilidades, “ótima”. Mas o mais absurdo veio depois: “você fica achando graça neste rapaz détraqué!”. Sem se dar conta, com esta palavra, ela estava denunciando a idade. Ninguém mais diz isto! Détraqué?! Aquele simpático rapaz? Desisti de convencê-la e voltei às minhas elucubrações: eu havia perdido uma oportunidade única que provavelmente é oferecida a poucas pessoas. E se eu tivesse assumido o papel e fingisse que realmente estava totalmente desorientada? Poderia viver um episódio que se um dia de fato ocorrer, dele não vou ter consciência. Como é que Montbläat – sexta-feira, 4 de agosto de 2006 Nº 195 32 aquele rapaz conseguiria descobrir minha casa, minha família? Como é que reagiriam as pessoas a quem pedisse ajuda ou informações? Eu havia mencionado a padaria. Será que ele iria até lá me levando a reboque, buscando uma identificação? E como é que se comportaria aquela simpática moça que sempre me atende? Ela sabe meu endereço. Viria com ele até aqui? O dois me amparando ladeira acima? Não tendo ninguém em casa o que faria o novo porteiro que não é mais o Zé de tantos anos e mal que me conhece? Como é que durante todo este processo se relacionariam comigo? Seria como o ensaio geral de um futuro possível. E eu que perdi isto! Esta encenação seria, é claro, uma maldade e do maior mau-caratismo com aquelas boas almas que, tenho certeza, me ajudariam. Teria sido mau fazer isto. Mas para mim poderia ser uma experiência incrível e tenho certeza vivida por poucos. Volto a telefonar para a amiga para contar o que estava maquinando e eis que ouço dela numa voz indignada: “sabe de uma coisa? Você mereceu o desaforo. Está mesmo gagá!” m