V1, N°1, 2008
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V1, N°1, 2008
Excelência em Ensino Superior bem perto de você Revista da Farese v.1 n.1, 2008 REVISTA DA FARESE Revista interdisciplinar semestral Nota: As opiniões e conceitos emitidos, nos artigos publicados, nesta revista são de inteira responsabilidade dos seus autores. Tiragem: 500 exemplares INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DA REGIÃO SERRANA Coordenação Executiva: Sandra Maria Guisso Presidente Arildo Castelluber Revisor de redação: Luciene Perini Coordenação de Pesquisa e Extensão Sandra Maria Guisso Revisores de texto: Carlos Alberto Lima Gerlinde MerkleinWeber Coordenação de Licenciatura Arildo Castelluber Bibliotecária: Ana Müller Coordenação de Ciências Gerenciais Ozirlei Teresa Marcilino Arte e Impressão: Gráfica e Editora Quatro Irmãos Ltda. Conselho Editorial: Carlos Alberto Lima Gerlinde Merklein Weber Ismael Tressmann Jaquelini Scalzer Luciene Perini Ozirlei Teresa Marcilino Sandra Maria Guisso REVISTA DA FARESE. v.1, n.1, 2009. Semestral 1. Cultura – Periódico. 2. Educação – Periódicos. I. Instituto de Ensino Superior da Região Serrana – FARESE. CDU 002 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Faculdade da Região Serrana. SUMÁRIO 05 Arildo Castelluber Editorial 07 Luciene Perini Preconceito Linguístico: O que é, como se faz 10 Ismael Tresssann Pomerano: Uma lingua baixo-saxônica 22 Jaquelini Scalzer Educação: A pós modernidade desfaz ilusões e ou aponta possibilidades? 35 Eliete Borlot Martins Sandra Maria Guisso A música como ferramenta pedagógica no desenvolvimento da aprendizagem 43 Dulcineia Deleprane Rosimere Lins Plaster Ozirlei Teresa Marcilino Ensino e aprendizagem de matemática: discutindo história, conceitos e responsabilidades 56 José Renato Auler Confronto dos princípios contábeis versos global reporting initiative (GRI) 67 Normas para Publicação EDITORIAL É com muito orgulho que a FARESE - Faculdade da Região Serrana lança o número um de sua revista, concluindo suas atividades de divulgação de pesquisas e trabalhos desenvolvidos por nossa comunidade acadêmica em 2008. Os critérios de seleção dos artigos foram rigorosos, com revisão editorial anônima, buscando proporcionar aos leitores trabalhos de qualidade e relevância. A revista fez da programação da VI Jornada Científica da FARESE, que se tornou a maior produção acadêmica e cientifica do nosso município, durante uma semana inteira com eventos dos mais variados. Na perspectiva de divulgar a produção acadêmica contamos com artigos de diferentes áreas do conhecimento. O artigo da professora Jaqueline Scalzer, Educação: a pós-modernidade desfaz ilusões e/ou aponta possibilidades?, apresenta uma análise da educação e sua função no paradigma da pós-modernidade, e nos mostra que a crise que vivenciamos, sobretudo na educação, pode mostrar-se como um leque de resignificar a educação e o fazer educacional. Como base numa pesquisa, Dulcinéia Deleprani, Rosimere Lins Plaster e Ozirlei Teresa Marcilino discutem O ensino e aprendizagem de Matemática: discutindo a história, os conceitos e as responsabilidades. Ao empreenderem uma retrospectiva sobre a história da matemática, a análise de algumas razões que levam ao fracasso do ensino-aprendizagem da matemática e, ainda sobre a função do professor de matemática, as autoras constatam que além dos professores, alunos, sociedade, envolvidos no processo educacional, a deficiência didática do ensino desde os tempos remotos até a atualidade são responsáveis pelo fracasso do ensino-aprendizagem da matemática. O artigo de Eliete Borlot Martins e Sandra Maria Guisso, A música como ferramenta pedagógica no desenvolvimento da aprendizagem, apresenta as etapas da aprendizagem e, em seguida discute como a música auxilia o desenvolvimento da criança. As autoras finalizam o artigo abordando a utilização da música como instrumento didático a ser trabalhado em sala de aula. A professora Luciene Perini apresenta as principais idéias do livro Preconceito lingüístico: o que é, como se faz, de autoria de Marcos Bagno. Este examina e questiona os diversos mitos criados em relação à língua portuguesa, além de instigar os professores de português a refletirem sobre a sua prática. O artigo do professor Ismael Tressmann O Pomerano: uma língua Baixo-Saxônica, apresenta um estudo que aponta que o pomerano é uma língua baixo-saxônica, isto é, uma língua saxônica das terras baixas da região do Mar Báltico, Europa. Além de relatar a história do povo pomerano na Europa e no Brasil, o professor apresenta a história da língua pomerana e sua situação na Europa hoje. Em 2009, a imigração Pomerana no Brasil irá comemorar seus 150 anos, desse modo, este trabalho revela-se como um estudo de grande contribuição para a comunidade pomerana no Espírito Santo e no Brasil. Por fim, o artigo Confronto dos princípios contábeis versus Global Reporting Initiative (GRI), do professor José Renato Auler, vem alertar que o discurso de preservação ou conservação do meio ambiente não é mais uma opção, mas uma necessidade. Auler conclui que os princípios fundamentais da contabilidade têm total aderência com os relatórios do GRI, que tem como objetivo desenvolver um relatório de sustentabilidade aplicável, mostrando uma transparência e responsabilidade perante a sociedade e o meio ambiente. Agradecemos a todos os participantes desta 1ª edição, colaborando para se criar um canal de informações de alto nível, não só para a Região Serrana, mas para todos os interessados na busca dos saberes que permitam a resolução de problemas e no crescimento de nossa sociedade. Arildo Castelluber Diretor da FARESE PRECONCEITO LINGÜÍSTICO O QUE É, COMO SE FAZ Luciene Perini Professora de Língua Portuguesa. Mestre em Educação Linguag em pela Universidade Federal do Espírito Santo. Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 E-mail: [email protected] BAG N O, M a r c o s. P r e c o n c e i t o Lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 1999. 148 p. Marcos Bagno é doutor em língua portuguesa pela Universidade de São Paulo, mestre em Lingüística, poeta, tradutor e contista premiado. Possui diversos livros dedicados ao público infantil e juvenil, alguns dos quais considerados “Altamente Recomendáveis” pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Desde 1997, tem se dedicado à produção de obras voltadas para a educação, como Pesquisa na escola: o que é, como se faz (Ed. Loyola), Machado de Assis para principiantes (Ed. Ática), entre outras. Suas obras, no campo da lingüística, elegem, principalmente, as questões relativas à crítica do ensino da língua portuguesa baseado nos moldes tradicionais da gramática normativa, impregnados de preconceitos sociais. Em 2005, o livro Preconceito Lingüístico: o que é e como se faz, alcançou a 36ª edição e ultrapassou a marca de 150 mil exemplares vendidos. Em seu primeiro capítulo, vem examinar e questionar os diversos mitos criados pelo povo brasileiro em relação à língua portuguesa. O primeiro desses é o do não reconhecimento da diversidade do português falado no Brasil, sendo a escola a grande responsável em impor uma norma lingüística comum a todos os 160 milhões de brasileiros, independente de sua idade, de sua origem geográfica, de sua situação socio-econômica ou de seu Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 07 08 grau de escolarização. O segundo mito citado por ele é o de que “o brasileiro não sabe português, só em Portugal se fala bem português”, mostrando um complexo de inferioridade, uma visão colonialista e sentimentos de dependência. O terceiro mito é que o “português é muito difícil”, isto acontece devido ao fato de que as regras aprendidas na escola não correspondem à língua que realmente falamos e escrevemos no Brasil. Já o quarto mito analisado por Bagno é que “as pessoas sem instrução falam tudo errado”, deixando claro que a única língua aceita seria a ensinada nas escolas, “qualquer manifestação lingüística que escape desse triângulo escola-gramáticadicionário é considerada, sob a ótica do preconceito lingüístico, errada, feia, estropiada, rudimentar, deficiente [...]”. O quinto mito diz “O lugar onde melhor se fala português no Brasil é no Maranhão”. Isso se deu devido à utilização daquele povo do pronome tu, seguido das formas verbais clássicas com a terminação em –s, característica da segunda pessoa: tu vais, tu queres etc. Como sabemos, no Brasil, essa forma já não é usada por todos, deveria mesmo é entrar para o rol dos extintos. Além do mais, o autor nos mostra que apesar desse arcaísmo, no Maranhão também se utiliza o ti no lugar do te, como por exemplo: Esse é um bom livro para ti ler, forma esta não considerada “correta” para os tradicionalistas. Outro mito discutido por Bagno é que “O certo é falar assim porque se escreve assim”. Obrigando aos (às) alunos (as), principalmente, a pronunciarem do “jeito que se escreve”, como se essa fosse a única maneira “certa” de falar português. “É claro que é preciso ensinar a escrever de acordo com a ortografia oficial, mas não se pode fazer isso tentando criar uma língua falada “artificial” e reprovando como “erradas” as pronúncias que são resultado natural das forças internas que governam o idioma”. O sétimo mito é o de que “É preciso saber gramática para falar e escrever bem”, isto é simplesmente uma “propaganda enganosa”, pois, se fosse assim, “todos os gramáticos seriam grandes escritores (o que está longe de ser verdade) e os bons escritores seriam especialistas em g ramática”. E, finalizando o círculo mitológico, é muito comum encontrar pessoas que dizem: “O domínio da nor ma culta é um instrumento de ascensão social”. “Ora, se o domínio da norma culta fosse realmente um instrumento de ascensão na sociedade, os professores de português ocupariam o topo da pirâmide social, econômica e política do país, não é mesmo?”. A obra apresenta, ainda, mais dois capítulos, que dispõem sobre os seguintes assuntos: “o círculo vicioso do preconceito lingüístico”, no qual discorre sobre os três elementos que formam esse círculo: a gramática tradicional, que inspira os métodos tradicionais de ensino, e, que por sua vez provoca o surgimento da indústria de livros didáticos. Ainda, o autor nos afirma que as atitudes preconceituosas impregnam-se de tal maneira na mentalidade das pessoas que acabam se tornando parte integrante do próprio modo de ser e de estar das pessoas no mundo. Finalmente, no terceiro e último capítulo, propõe “a desconstrução do preconceito lingüístico”, por meio da mudança de atitude, elevando o grau de auto-estima lingüística, recusando com Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 veemência os velhos argumentos que visem menosprezar o saber lingüístico individual. Começando pelo professor que, ao invés de repetir doutrinas gramaticais normativas, deveria refletir sobre elas. Ainda, propõe a todos os professores que reflitam sobre as dez cisões - porque representam de fato uma cisão, um corte no cordão umbilical que sempre nos prendeu às velhas doutrinas gramaticais - para um ensino de língua não (ou menos) preconceituoso. Portanto, ao propor essa mudança de atitude aos professores, Bagno consegue fazer-nos refletir sobre nossa prática em sala de aula, nos perguntando o que é ensinar português e que objetivos realmente pretendemos alcançar nessa prática. A língua como uma essência não existe, o que existem são seres falantes da língua, e esta varia muito, pois, a linguagem é um fato social. As pessoas falam da maneira como seu contexto social fala. Não existe sociedade ou comunidade no qual todos falem da mesma forma. Enfim, o texto é claro, simples e bastante instigador. Talvez, só por essas reflexões já se tiraria proveito da leitura dessa obra: questionarmos, principalmente, em nós, professores, a verdade de nossas atitudes nas pequenas ações de cada dia, que mostram, na realidade, aquilo em que acreditamos. 09 Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 O Pomerano: Uma Língua Baixo-Saxônica Resumo Ismael Tressmann Professor Doutor em Linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 E-mail: O presente estudo aponta que o Pomerano é uma língua baixo-saxônica, isto é, uma língua saxônica das terras baixas da região do Mar Báltico. Também integram o grupo das línguas baixosaxônicas o Vestfaliano, o Platt Menonita, o Saxônio, o Neerlandês, entre outras. O Inglês e o Escocês são, por sua vez, línguas anglo-saxônicas, também aparentadas com o Pomerano. Já o Alemão pertence a um outro grupo de línguas; descende do Alto-Alemão (das regiões altas, montanhosas da Alemanha e da Suíça). As variedades linguísticas do Pomerano que mais se firmaram no Espírito Santo foram as provenientes da Pomerânia Oriental, trazidas pelos imigrantes procedentes daquela região a partir da segunda metade do século 19. Pa l a v r a s - c h a ve : L í n g u a s d e imigração, Baixo-Saxão, bilinguismo, linguística histórica. Apresentação 10 Este artigo pretende rever alguns trabalhos sobre a classificação genética da língua pomerana. Visa apresentar aspectos relevantes via de regra não considerados nas pesquisas voltadas aos estudos das línguas baixo-saxônicas, denominadas, imprecisamente, de baixoalemãs (“Baixo-Alemão”). O termo “Baixo-Alemão” (em Alemão Niederdeutsch, Plattdeutsch), embora muito popular na Alemanha, inclusive Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 entre os círculos de estudos, sugere que as línguas nativas das planícies da Europa Central proviriam do Alemão, ou seriam suas variedades dialetais. Neste sentido, postulamos que o termo Baixo-Saxão (Inglês: Low Saxon) é o mais acertado para identificar a subfamília linguística à qual pertence o Pomerano e as demais línguas das terras baixas da Europa Central. Em tese, as línguas baixosaxônicas bem como as anglo-saxônicas descendem do Saxão antigo, e o seu surgimento se deu de forma independente das línguas chamadas altoalemãs, nascidas nas regiões altas das atuais Alemanha e Suíça. Para a fundamentação teórica desta pesquisa, buscou-se alicerce nos estudos recentes da Linguística Histórica e da Etnolinguística. 1 Sobre os Pomeranos 1.1 A antiga Pomerânia A antiga Pomerânia situava-se nas costas do mar Báltico, entre as atuais Alemanha e Polônia e os países escandinavos. Na época em que os primeiros pomeranos imigraram para o Brasil, no final da década de 1850, a Pomerânia era uma Província da Prússia. A Província Prussiana da Pomerânia surgiu em 1817. Mais tarde, em 1871, com a união dos estados alemães, ela passa a fazer parte do Império alemão. Até 1945 a Pomerânia estava dividida entre Pomerânia Ocidental ou Anterior e Pomerânia Oriental. Stettin, a capital, separava o leste do oeste. Contava com uma superfície de 38.409km2, área inferior ao Estado do Espírito Santo. A topografia compreende campos, prados e ondulações. Com a derrota da Alemanha na II Guerra Mundial (1945), a Pomerânia Oriental é anexada à Polônia e a Pomerânia Ocidental passa a integrar o atual Estado de Mecklenburg oPomerânia Ocidental, Alemanha. Expulsa pelo Exército Vermelho, a população teve de deixar, às pressas, a sua terra natal e a grande maioria fixou residência, parte na Alemanha Ocidental e parte na Oriental. A partir daquele ano, a Pomerânia como tal desaparece do mapa da Europa. 1.2 O povo pomerano Os primeiros imigrantes pomeranos chegaram ao Espírito Santo em 28 de junho de 1859, época anterior ao processo de unificação da Alemanha do século 19. As maiores levas, provenientes, em sua maioria, porém, da Pomerânia Oriental, chegaram no início dos anos de 1870, época em que a imigração também cessou. A grande maioria dos pomeranos, todavia, imigrou da Europa para os Estados Unidos e para Austrália. Estimase que a população pomerana no Espírito Santo gire atualmente em torno de 120 mil e, em termos de Brasil, talvez, ultrapasse 300 mil indivíduos (cf. Tressmann: 1998). Os pomeranos são um povo camponês. Embora o Espírito Santo não receba mais imigrantes germânicos desde a década de 1870, eles mantiveram o uso da língua, as suas festas comunais com seus rituais e danças, além dos seus costumes culturais e maritais, os atos mágicos que acompanham os ritos de passagem como confirmação (crisma), casamento e morte e a continuidade da Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 11 narrativa fantástica da tradição oral camponesa. 2 Sobre a língua pomerana 12 A língua pomerana é falada no Brasil pelos descendentes de pomeranos em comunidades no Espírito Santo, Minas Gerais, Rondônia, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A maioria dos falantes é bilíngue em Pomerano e Português. Na Alemanha, o Pomerano é praticamente desconhecido (cf. Granzow, 1975), sendo falado somente no Brasil e nos Estados Unidos. Na primeira metade do século 12, com a chegada de colonizadores germanos provenientes do Norte da atual Alemanha, o quadro linguístico da Pomerânia começa a se modificar. A própria nobreza pomerana tinha interesses em atrair colonos, artesãos e comerciantes germanos. Com a promessa feita pelos duques pomeranos de possuírem feudos, os nobres germânicos levam consigo colonos provenientes da Baixa Saxônia, Vestfália e Renânia. Esses grupos levam junto suas respectivas variedades linguísticas, que pertencem à subfamília Baixo-Saxão, da família linguística Germânica. Aos poucos, as línguas eslavas Wendes e Cassúbio vão sendo cada vez menos faladas, dando lugar ao Pomerano. Alguns grupos, porém, resistem à colonização e à presença da língua baixo-saxônica, como o dos cassúbios. A partir do ano 1400, o Pomerisch ou Pomerano, formado a partir de línguas pertencentes à subfamília Baixo-Saxão, se solidifica e passa a ser língua corrente na Pomerânia. Esta é a língua que mais tarde foi levada para o Brasil, especialmente o Pomerano oriental. A entrada do Alemão na Pomerânia se dá mais tarde, a partir de 1530, com a Reforma luterana. O Alemão será aprendido na escola e utilizado no âmbito escolar e religioso (cultos e ensino confirmatório) e repartições públicas. A língua falada espontaneamente na esfera informal, na família e entre os vizinhos, no entanto, continuou sendo o Pomerano. É possível demonstrar a classificação genética do Pomerano mediante estudos da história dessa língua. Iniciaremos tecendo considerações acerca das famílias linguísticas. 3 As famílias linguísticas As línguas do mundo são classificadas em famílias segundo o critério genético. Uma família linguística, de acordo com esse critério, é um grupo de línguas para as quais se formula a hipótese de que tem uma origem comum, no sentido de que todas as línguas da família são manifestações diversas, que sofreram mutações no decorrer do tempo, de uma língua anterior, mais antiga. O conhecimento destas línguas é obtido mediante estudos históricoscomparativos. Esses estudos partem da descober ta de cor respondências regulares de sons, de palavras e de formas gramaticais entre duas ou mais línguas e for mulam hipóteses sobre as propriedades que devia ter uma língua ancestral para permitir e explicar a derivação diferenciada das línguas atuais. Na medida em que reconhecem origem comum para um conjunto de línguas, os especialistas constituem uma família linguística. Deste modo, na Europa, as línguas românicas ou neo-latinas - Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Português, Espanhol, Catalão, Italiano, Fr a n c ê s, Ro m a n ch e, Ro m e n o constituem uma família, cujos membros derivam de uma língua ancestral ou protolíngua bem conhecida e estudada - o Latim. Na maioria das vezes, porém, há pouca documentação por escrito das línguas ancestrais. De for ma análog a, a família Germânica é um conjunto de línguas que POME- Saxão Anglo- Neerlandês RANO antigo Saxão (Holandês) Sueco se reconhece descenderem de uma língua anterior, e pouco documentada historicamente. Vejamos, no quadro comparativo (1) abaixo, como se correspondem nessas línguas as palavras para alguns conceitos: Quadro comparativo (1) entre línguas germânicas Escocês Inglês Alto-Alemão Alemão antigo (Tradução) Português land land land land land land land lant Land blind blind blind blind blind blind blind blint blind terra cego huus hus hus huis, huus hus hoose house hus Haus casa muus mus mus muis, muus mus moose mouse mus Maus camundongo ijs is is ijs is ice ice is Eis gelo ik ik ic ik jag A I ih, ihha ich eu week - wicu week vecka week week wohha, wehha Woche semana dans - - dans dans dance dance tanz Tanz dança helpa - helpan helpen hjälpa help help helfan helfen ajudar morder bijta - bitan bijten bita bite bite bizzan beissen wåter watar woeter water vatten watter water wazzar Wasser água tung tunga tunge tong tunga tongue tongue zunga Zunge língua twai twene twain twee tva twae two zwene, zwo, zwei dois Vater pai zwei fåter fadar foeder vader far Observe-se que as línguas acima tratadas revelam parentesco sistemático. As correspondências regulares destas línguas são tantas e tais, que sugerem a hipótese de que elas tenham a mesma origem, como formas alteradas de uma língua comum. Em outras palavras, são línguas geneticamente relacionadas. Todas essas línguas descendem, hipoteticamente, do Germânico, uma língua hoje extinta. Por sua vez, as línguas g er mânicas, juntamente com as românicas ou neo-latinas, as eslavas e várias outras línguas da Europa, pertencem ao Tronco linguístico IndoEuropeu. Dentro de cada família linguística temos ainda ramificações, as vather father fater chamadas subfamílias. O quadro aponta, que o Pomerano, o Holandês, o Escocês e o Inglês, por exemplo, descendem de uma língua em comum: o Saxão antigo, que deu origem a várias subfamílias linguísticas. O Pomerano, especificamente, é uma língua baixo-saxônica, isto é, uma língua saxônica das terras baixas da região do Mar Báltico, Europa. Já o Inglês é uma língua anglo-saxônica, derivada do Saxão antigo e do Anglo, por isso aparentado também com o Pomerano. O Alemão, no entanto, pertence a um outro grupo de línguas; descende do Alto-Alemão antigo (das regiões altas, montanhosas da Alemanha e da Suíça), que se originou do Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 13 Gótico. Assim, constatamos que o Pomerano não descende do Alemão. O Alemão é uma entre várias outras línguas germânicas e as línguas da própria Alemanha. Ali existem cerca de 30 línguas nativas diferentes e, em sua grande maioria, ininteligíveis entre si. (cf. Grimes, 1984). Este fenômeno é antigo e na época da estandartização do Alemão-padrão, no século 16, possivelmente a variedade linguística naquele país fosse maior. Trata-se de um grande equívoco pensar que naquele país existe e se fala apenas uma língua, e que as demais são formas deturpadas, incompletas, agramaticais desta variedade prestigiada, que é o Alemão oficial. Desta maneira, o termo pomerano e recorrente em outras línguas huus ('casa') não se origina de Haus, e tampouco ijs ('gelo') vem de Eis. Do mesmo modo, twai ('dois') não provém de zwei, e nem week ('semana') origina-se de Woche. O quadro comparativo sugere, entre outras coisas, que o Pomerano é uma língua autônoma. 3.1 O Germânico Ocidental 14 A família linguística germânica compreende três grupos principais, a saber: Germânico Nórdico, Germânico Oriental e Germânico Ocidental. Línguas do Germânico Nórdico são, por um lado, o Norueguês e o Islandês e, por outro, o Sueco e o Dinamarquês. O Gótico, língua não mais falada, é o principal representante do Germânico Oriental. Os conjuntos de línguas que integram o Germânico Ocidental encontram-se divididos em quatro grupos, ou seja: Anglo-Saxão (Kêntico, Saxão e Anglo. O Inglês antigo formou-se a partir dessas duas últimas línguas); Frísio antigo; Baixo-Saxão antigo (Baixo-Francônio antigo, Baixo-Saxão antigo); e finalmente, o Alto-Alemão antigo (Médio-Alemão e Alto-Alemão). Nós nos ocuparemos, aqui, com os dois últimos blocos, que tratam do Alto-Alemão, o Médio-Alemão e o Baixo-Saxão, como visualiza o quadro abaixo. Os termos alto, médio e baixo designam a região onde cada um destes conjuntos de línguas são falados. Assim temos: (i) O Alto-Alemão, falado na região mais alta e montanhosa da Alemanha, ao Sul, está representado pelo Alemão padrão (língua oficial da Alemanha, Áustria e parte da Suíça), Alamânico, Suábio, Franco-renano meridional e o Francônio oriental e o Bávaro; (ii) o Médio-Alemão, falado mais ao centro da atual Alemanha, está representado pelo Hunsrückisch (das elevações do Hunsrück), Moselfränkisch e Pfälzisch; e o (iii) Baixo-Saxão, falado ao Norte, numa região de topografia mais plana, baixa. Na Holanda, as variedades d o B a i x o - S a x ã o, d e n o m i n a d a s genericamente de Nedersaksisch, são faladas nas seguintes províncias/regiões: D e v e n t e r, D r e n t h e , E n s c h e d e , Groningen, Oldeberkoop, Overijssel, Salland, Steenwijk, Stellingwerven, Ter Idzard, Twente e Wolvega. 3.2 A segunda mutação consonantal do Alto-Alemão A partir de 550 d.C se inicia um processo que, longe de aproximar as várias línguas germânicas dos grupos compreendidos entre os Alpes e o mar do Norte, os distanciou mais. A divisão do Ger mânico Ocidental nas áreas Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 linguísticas genéricas Alto-Alemão e Baixo-Saxão está baseada principalmente na assim chamada segunda mutação consonantal do Alto-Alemão (Lautverschiebung), ocorrida nos séculos 8 e 9. Esta mutação foi diferente da primeira, que fez com que as línguas germânicas se destacassem como grupo do restante das línguas Indo-européias. A mutação consistiu basicamente na passagem, em determinados contextos, das três consoantes oclusivas germânicas p, t, k a africadas pf, ts, kx e fricativas f/ff, s/ss, x. Esse processo teve início nas cidades do Sul, onde é falado o Alto-Alemão, e se expandiu para o Norte sem, porém, alcançá-lo. Os falares do Médio-Alemão foram apenas parcialmente atingidos pela mutação consonantal, enquanto que o Norte não recebeu influência da mesma. Em consequência disso, podemos constatar certo grau de uniformidade entre os léxicos, por exemplo, do Pomerano e o Neerlandês, e entre essas línguas e o Saxão antigo (e o AngloSaxão). A mutação consonantal pode ser visualizada no quadro (3) abaixo: Note-se que onde encontramos f (ou ff ou pf) e s (ou tz, (z)z, ou ss) no AltoAlemão antigo, nas outras línguas temos, respectivamente, p e t. Em posição final d e p a l av ra , n a s o u tra s l í n g u a s encontramos k, enquanto que no AltoAlemão antigo esses sons equivalem a h ou ch [x]. A mutação, todavia, não se deu de uma maneira simplesmente natural, mas, conforme nos sugere Romaine (1994:137), a extensão desta inovação foi determinada por fatores geográficos e sociais. Entre os fatores sociais, foi o prestígio social dos falantes urbanos, os quais usavam as formas novas. Além da mutação consonantal, com o passar do tempo estas línguas foram se tornando ininteligíveis também devido a outros fatores, como a mutação vocálica, lexical e da própria gramática. Passemos agora para a subfamília linguística Baixo-Saxão. 3.3 O Baixo-Saxão Documentado desde o século 8, o Baixo-Saxão ou Saxão das Terras Baixas formou-se a partir do Saxão antigo (do Norte). Os registros consistem de textos em prosa de vários gêneros (literatura Quadro (2) Saxão Alto- antigo Alemão Alemão Neerlandês POME- Sueco Inglês RANO (Tradução) Português antigo diop tiof tief diep daip djup deep (pro)fundo ff, opan offan offen open; op up öppen; upp open; up aberto pf oeppel apfel Apfel appel apel äpple apple maçã; fruta t, d ? s etan ezzan essen eten eeta äta eat comer zz (z, ss, lata lazzan lassen laten låta låta let deixar s) tid zit Zeit tijd tijd tid time tempo k ? kx coc kochon kochen koken kooka koka cook cozinhar x (hh, bok buoh Buch boek bauk bok book livro h, ch) thack dah Dach dak dak tak thatch telhado p? f, Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 15 16 religiosa e profana, com frequência t r a d u z i d a d o L a t i m ) . A d e m a i s, encontramos também outros documentos, como provérbios, fórmulas mágicas e benzeduras. Entre 1300 e 1500 ocorre o florescimento da língua conhecida como Baixo-Saxão medieval, da qual surgiram outras línguas. Os textos redigidos naquele período são de caráter literário e comercial. O termo Baixo-Saxão refere-se às variedades linguísticas faladas ao Norte da atual Alemanha, parte da Holanda e Norte da Bélgica (Vlaanderen, onde é falado o Vlaans, Flamengo). Abrange a região do baixo Reno, abaixo da linha de Aachen em direção a Wittenberg. Esta região é caracterizada por campos, planícies e pequenas ondulações. O adjetivo “baixo” em Baixo-Saxão referese, portanto, à região baixa, plana, da Europa onde é falado este conjunto de línguas . Já a expressão Alto-Alemão reporta-se às terras altas, aos alpes alemães e suíços. O vocábulo a que nos referimos como Baixo-Saxão ou Saxão das Terras Baixas é largamente conhecido como “BaixoAlemão” (Niederdeutsch, Plattdeutsch; Platdüütsch), especialmente com referência às suas variedades faladas na Alemanha. No entanto, como atesta Hahn (2002), apesar do fato de o termo gozar de popularidade na Alemanha, inclusive assim é muitas vezes referido na literatura linguística, a expressão “BaixoAlemão” não pode ser considerada a escolha mais acertada para nomear esta subfamília. Em primeiro lugar, BaixoSaxão e Alemão descendem de línguas diferentes, respectivamente, Saxão antigo e Alto-Alemão antigo. Além disso, antes de o Baixo-Saxão começar a perder prestígo em relação ao Alemão, muitos de seus falantes ainda se referiam à língua como “Saxão” (Sassysch) ou “BaixoSaxão”/ “Saxão das Terras Baixas” (Nedersassysch), até fins do século 19 e início do século 20. A maioria dos alemães, atualmente, reage ao nome “Baixo-Saxão” (Niedersächsisch) com desaprovação, especialmente porque tendem a associar o nome com o estado, relativamente novo, da Baixa Saxônia (Niedersachsen). Devido a isso, alguns começaram a usar o nome, emprestado do Neerlandês, Nedersaksisch no lugar do equivalente alemão (Niedersächsisch), especificamente em referência às variedades linguísticas saxônicas dos Países-Baixos. Até o início do século 16, o BaixoSaxão era língua franca em toda a costa do mar Báltico (Liga Hanseática), tanto na forma oral como escrita. 3.3.1 O Baixo-Saxão: língua franca na Europa medieval Na Europa medieval, o Baixo-Saxão era língua franca em toda a costa do mar Báltico e do mar do Norte, entre os anos 1200 e 1600, e também possuía escrita e todos os direitos de uma língua verdadeira. Na época, o Pomerano era também conhecido por Baixo-Saxão. No século 13, grupos de comerciantes falantes do Baixo-Saxão iniciaram a criação de uma aliança mercantil 'intermunicipal' conhecida como “Liga Hanseática”. Sua atuação centrava-se em cidades portuárias como Lübeck, Hamburgo e Bremen, espalhando-se, mais tarde, para outras cidades costeiras e também no interior, tais como, Groningen, Nijmegen, Zwolle, Deventer, Colônia, Dortmund, Osnabr ück, Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Brunswick, Magdeburgo, Berlin, Wismar, Rostock, Stralsund, Danzig (hoje Gdansk), Königsberg (hoje Kaliningrad), Cracóvia, Riga, Reval, Visby Kalmar e Estocolmo. A Liga chegou a dominar colônias costeiras ao longo do Mar Báltico e a ter escritórios nos Flandres (Brugge, 1347-1563), Londres (12821598), Rússia (metade do século 13 a 1494) e Noruega (Bergen, 1360-1754). O Baixo-Saxão medieval, baseado principalmente na variante de Lübeck, tornou-se a língua hanseática internacional do comércio. Seja de forma direta ou indireta, esta língua influenciou as línguas nativas de várias áreas, particularmente na Escandinávia, línguas bálticas, balto-finlandesas e línguas eslavas. O Alto-Alemão medieval (precursor do Alemão) também foi influenciado, de modo que há um número considerável de palavras no Alemão moderno que foram tomadas de empréstimo do Baixo-Saxão. Na época, o Baixo-Saxão era reconhecido como uma língua/idioma com todos os direitos; um acontecimento para o fortalecimento da escrita desta língua foi a tradução da Bíblia para o Baixo-Saxão, tarefa levada a cabo por Bugenhagen, colaborador de Lutero. Bugenhagen inclusive terminou a tradução da Bíblia para o Baixo-Saxão meio ano antes que Lutero divulgasse a sua tradução para o Alemão. Apesar do aumento do comércio e de algumas tentativas posteriores de ressurgir, o poder da Liga Hanseática declinou e acabou no final do século 16/início do século 17. Em consequência, o Baixo-Saxão perdeu terreno no cenário internacional como língua franca, e regionalmente, como língua escrita. A partir de então, as variedades do Baixo- Saxão ali faladas passaram a ser tratadas como “dialetos” locais, próprios de algumas comarcas. Além disso, ao mesmo tempo que a língua alemã - imposta como idioma oficial sobre as demais línguas da Alemanha - começou a se aproximar da Saxônia pelo sul, iniciando por instituição de ensino superior, escolas e Igreja, espalhando-se por círculos aristocráticos e outros de classe alta. O Alemão, assim, tornou-se uma língua de prestígio, e a língua nativa dos povos saxônicos logo veio a ser classificada como língua do proletariado (como o Pomerano, o Vestfaliano). Desprezado pela classe dominante, rejeitado pelos que buscavam status sociais mais altos, e banido da educação formal, o Baixo-Saxão veio a ser considerado por muitos como uma mera coleção de dialetos inferiores ao idioma alemão. Encontramos, porém, uma exceção no Neerlandês. Ao se separar, a partir de 1648, do Sacro Império RomanoGermânico, a variedade falada pelos holandeses passou a ter o status de língua oficial, e o Baixo-Saxão veio a ser considerado como um grupo pobre de dialetos do Saxão-Neerlandês, no leste daquele país. Este fato atesta a importância do poder político e a soberania das nações-estado em reconhecer uma variedade como língua mais do que um dialeto. 3.4 A situação da língua pomerana na Europa hoje A partir da II Guerra Mundial (19381945), o Pomerano na Europa tornou-se uma língua moribunda. Grande parte do seu território (oriental) passou a integrar a Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 17 18 Polônia, e a população foi viver em áreas alemãs ou emigrou para outros países. No mais, quando a maioria dos refugiados falantes do Alemão se instalou em comunidades anteriormente baixosaxônicas, a língua alemã, reforçada nas escolas e na mídia, veio a predominar e, assim, erodindo a posição da língua nativa de um dia para o outro. Como resultado dos parcos incentivos do governo à manutenção da língua nativa, muitos pais escolheram não passar a língua pomerana aos seus descendentes, especialmente nas áreas urbanas, onde o Alemão era sinônimo de status social e econômico. Além disso, não há mais comunidades de fala de língua pomerana na Europa, fator que colaborou para a sua quase total extinção. Em 1997, o Baixo-Saxão foi reconhecido oficialmente como “língua regional” no leste dos Países Baixos e, em 1999, no Norte da Alemanha, fator que poderá favorecer a manutenção e o fortalecimento das variedades linguísticas que compõem esta subfamília. Estima-se que na Alemanha há cerca de 10 milhões de falantes do Baixo-Saxão, e na Holanda o número de proficientes encontra-se entre 1,5 e 2 milhões (cf. Hahn, 2002). Na Alemanha, o Baixo-Saxão é oficilmente reconhecido em 8 estados (Bundesländer) da região norte: Schleswig-Holstein, Hamburgo, Baixa Saxônia, Bremen, Renânia do NorteVestfália, Meklemburgo-Pomerânia Ocidental, Saxônia-Anhalt e Brandenburgo. É, também, usado numa pequena área da região norte do estado de Hesse. Salientamos, no entanto, que não consideramos pertinente referir-nos à língua pomerana como Baixo-Saxão, pois esse não representa uma língua em si, mas uma subfamília linguística. O BaixoSaxão abriga várias línguas, a maioria das quais ininteligíveis entre si, faladas por gr upos que apresentam também diferenças culturais e, deste modo, identidades próprias. No Brasil, por exemplo, as línguas baixo-saxônicas Pomerano, Vestfaliano e Platt Menonita são incompreensíveis entre si, não podendo ser consideradas uma língua única. Conforme sugere Vandresen (1968), que estudou o Vestfaliano de Santa Catarina, língua pertencente ao Baixo-Saxão, nos dados que existem sobre língua alemã no Brasil, geralmente se incorre em grave erro: considerar todas as formas de expressão dos descendentes de imigrantes alemães como uma língua só, quando muitas vezes não há sequer intercompreensão entre falantes de 'dialetos' diferentes. De modo análogo, as línguas que compõem as demais subfamílias germânicas também são ininteligíveis entre si, e seus falantes entendem-se como pertencentes a grupos culturalmente diferenciados. Willems (1946:63) nos relata um episódio muito interessante quanto à dimensão dessa heterog eneidade. Um imig rante hunsrücker, ao ser perguntado se era alemão, respondeu prontamente: “Ora, eu não sou alemão, sou hunsbuckler [hunsrücker]”. No próximo item falarei sobre a entrada do Alemão na Pomerânia, língua que será utilizada principalmente na escola, no âmbito religioso e repartições públicas. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 4 O Alemão: norma imposta sobre a diversidade Em 1530, a Pomerânia torna-se luterana através de um colaborador de Lutero, Johannes Bugenhagen. A tradução da Bíblia por Lutero para uma das variedades do Alto-Alemão, do qual se originou o Alemão oficial, também chega à Pomerânia. A língua para a qual o Reformador traduziu a Bíblia, no entanto, não foi entendida pelos pomeranos. Os grupos germânicos do Norte, falantes igualmente de línguas do Baixo-Saxão, também tiveram dificuldades em ler a Bíblia no idioma proposto por Lutero. Assim, não só a Bíblia, mas também outros escritos luteranos tiveram que ser traduzidos para o Baixo-Saxão. Aos poucos, no entanto, o Alemão passa a ser ensinado à população pomerana, através da escola, com vistas principalmente à educação religiosa. Na Bíblia e no hinário em Alemão “se lê diariamente e neles treina-se a leitura. O catecismo de Lutero é ensinado pelo pastor. Como só poucos lêem, decoram-se muitos versículos bíblicos e hinos do hinário” (Rölke, 1996: 30). O impulso decisivo para a criação do Alemão atual é dado pela reforma luterana. O passo fundamental na afirmação da variedade que se tornou padrão sobre os demais dialetos e idiomas foi sua associação à escrita e, consequentemente, sua transformação em variedade usada na transmissão de informações de ordem política e cultural. A associação de uma variante à escrita começou num ambiente de poder. Sem dúvida alguma, o uso jurídico e burocrático da variedade linguística utilizada por Lutero foi determinante para fixar uma forma escrita. Em outras palavras, a variedade que passou a ser a língua oficial alemã, escolhida por Lutero, era aquela usada pela nobreza da Saxônia. Em suas “Conversas à Mesa”, Lutero certa vez afirmou: “Não possuo uma língua alemã determinada, própria, mas utilizo-me do Alemão comum, que pode ser compreendido tanto pelos habitantes do norte como do sul da Alemanha. Falo segundo o modelo da chancelaria da Saxônia, seguido por todos os príncipes e reis da Alemanha”. (Störig :1987, p. 131). No entanto, os grupos do Norte, como foi argumentado, não entenderam os escritos de Lutero, redigidos em Alemão. Aos poucos, esta variedade padrão impôs-se sobre os idiomas e dialetos até se fixar como variedade alta, legítima e prestigiada. Certamente, a política de unificação linguística na Alemanha não surgiu apenas para suprir as necessidades técnicas de comunicação entre as diferentes partes do território. Mas, utilizando as palavras de Bourdieu, “não se trata, em suma, apenas de comunicar, mas de fazer reconhecer um novo discurso de autoridade, com seu novo vocabulário político, termos de estilo e referência, metáforas, eufemismos e a representação do mundo social por ele veiculada”. Continuando, o autor conclui o seu pensamento: “Estando vinculado aos novos interesses dos grupos emergentes, esse discurso se revela indizível nos falares locais moldados por usos ligados aos interesses específicos dos g r upos camponeses”. (Bourdieu, 1996:34). O Alemão, então, nada mais foi do que um produto elaborado cuja função foi e ainda continua sendo uma norma imposta sobre a diversidade. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 19 20 5 Considerações finais Notas O estudo histórico-comparativo entre línguas germânicas nos possibilitou identificar o Pomerano como uma língua pertencente à família linguística Germânica (ocidental) e à subfamília Baixo-Saxão (oriental), que por sua vez originou-se do Saxão antigo. Preferimos o termo Baixo-Saxão a “Baixo-Alemão”, especialmente porque o Pomerano e o Alemão descendem de línguas diferentes, respectivamente, Saxão antigo e AltoAlemão antigo. Além disso, até fins do século 19 e início do século 20, muitos dos falantes do Baixo-Saxão ainda se referiam à língua como como “Saxão” (Sassysch) ou “Baixo-Saxão”/ “Saxão das Terras Baixas” (Nedersassysch). Ademais, o t e r m o “ B a i xo - A l e m ã o ” e n c e r r a conotações nacionalistas, sugerindo uma pretensa relação de superioridade/inferioridade entre a língua oficial alemã e as línguas baixo-saxônicas. Por outro lado, não tratamos o BaixoSaxão como uma língua propriamente, mas nos referimos ao mesmo como uma subfamília linguística. O Baixo-Saxão abriga várias línguas, a maioria das quais ininteligíveis entre si, faladas por grupos que apresentam igualmente diferenças culturais e, deste modo, identidades próprias. O Pomerano, o Vestfaliano e o Platt Menonita, por exemplo, são incompreensíveis entre si, não podendo ser considerados, portanto, uma língua única, ou seja, denominados genericamente de “Baixão-Saxão”, nem tampouco de “Alemão”, ou de “dialetos alemães” ou “línguas alemãs”. 1 [Do Wendes Po morje, 'terra junto ao mar' + Germânico –land, 'terra/país dos pomeranos'.] Latim e Inglês: Pomerania. Alemão: Pommern. Polonês: Pomorze. Stettin atualmente chama-se, em Polonês, Szczecin. 2 Estudos da influência do Eslavo sobre o Pomerano e outras variedades do BaixoSaxão encontramos em Teuchert (:1958). Segundo a pesquisa em andamento, constatamos que a influência do Eslavo sobre o léxico do Pomerano falado no Espírito Santo não mais se manteve, a não ser em nomes de famílias. São de origem Wendes, p. ex., os sobrenomes Binow, Burslaff, Piske, Reblin e Nitz. O sufixo ke, p. ex., é marcador de diminutivo. 3 O termo germânico ou germano(s) não quer dizer, a princípio, alemão, mas reporta-se a um conjunto de povos que compartilham tradições e línguas em comum. 4 A expressão em Pomerano plat pode significar tanto “plano”, “chato”, quanto o nome “chapa de fogão”. Em Alemão, nieder significa 'baixo', 'inferior'. Os holandeses autodenominam a sua língua oficial de Nederlands, e o país, Nederland ('terra/país baixo'). 5 A título de ilustração, citamos os seguintes termos do Alemão, tomados de empréstimo do Baixo-Saxão: Spuk ('fantasma'); Tonne ('tonel', 'pipa'); K aldaunen ('bucho'); Flieder tee ('sabugueiro'); Schnauze ('focinho'; 'nariz'); quarren ('rezingar', 'choramingar'); quatschen ('dizer Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 asneiras', 'tagarelar') 6 A partir de 2007, os municípios do Espírito Santo que integram o Programa de Educação Escolar Pomerana (Proepo) iniciaram o processo de co-oficialização da língua pomerana. Mediante a cooficialização, o Pomerano terá, ao lado do Português, o status de língua reconhecida oficialmente, com todos os direitos de uma língua oficial. Deste modo, será dado espaço e voz à língua pomerana não apenas nas escolas, como também em todos os setores públicos e privados. O poder público incentivará e apoiará o aprendizado e o uso do Pomerano nas escolas e nos meios de comunicação. 6 Referências BECKERS, H. Westmitteldeutsch lexikon der germanistischen linguistik. Tübingen, 1980. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas linguísticas. São Paulo:Edusp, 1996. GRANZOW, Klaus. Grün ist das tal am Rio Itajaí: pommeranos in Brasilien. Lübeck: Ed. Eugen Radtke,1972. GRIMES, Barbara F.(Ed.) Languages of the World. WBT. Dallas, Texas, 1984. HAHN, Reinhard F. Lowlands talk: an introduction to the language varieties of the Lowlands, 2002. HAMMERMEISTER, Michael. Pommersche mundarten. dialektgebiete pommers. In: Die Pommersche Zeitung. Jahrgang 49, Folge 48/99, Lübeck, 1999. RÖLKE, Helmar Reinhard. Descobrindo raízes: aspectos geográficos, históricos e culturais da Pomerânia. Vitória: UFES: Secretaria de Produção e Difusão Cultural, 1996. ROMAINE, Suzanne. Language in society. Oxford University Press, 1994. STÖRIG, F. Abenteuersprachen. München, 1987. 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Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 21 EDUCAÇÃO: A PÓSMODERNIDADE DESFAZ ILUSÕES E/OU APONTA POSSIBILIDADES? Jaquelini Scalzer Historiadora, especializada em História do Brasil, Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 E-mail: [email protected] 22 Resumo Este artigo tem como objetivo discutir a educação e sua função na perspectiva do paradigma da Pós-moder nidade. Portanto foi executado um panorama da Modernidade e da educação nos pressupostos da mesma, a seguir é relatada a Pós-modernidade e como a educação se constitui dentro desta. A discussão central (como e por que ensinar na pós-modernidade?) teve como base teórica Certeau, Denise Najmanovich, Boaventura de Sousa Santos e Hugo Assmann. Entretanto, tendo em vista a abrangência que o tema propõe, outros autores são trazidos para o debate teórico, bem como experiências do cotidiano da educação. Sem a menor pretensão de esgotar o tema ou trazer “receitas” e “verdades”, o que este artigo pretende é possibilitar uma reflexão, sobre o fazer educacional dentro de uma sociedade dita Pós-moderna. Tal reflexão possibilitounos concluir que a crise transitória que vivenciamos, sobretudo na educação, pode mostrar-se como um leque de possibilidades para ressignificarmos a educação e o fazer educacional, muito embora tal intento implique riscos e desafios inusitados. Palavras-chave: Modernidade – Pósmodernidade – Educação. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 A educação na sociedade moderna O paradigma da modernidade se efetivou com base nos pressupostos das ciências exatas e naturais, em um momento em que o cientificismo parecia poder explicar tudo. Modelo totalitário, surgido por volta do século XVI com o advento do Renascimento, não aceita outras formas de conhecimento que não o científico, se opondo ao senso comum e às humanidades. Mais do que um rompimento com o saber aristotélico e medieval, o paradigma da modernidade traz uma nova visão do mundo, do homem e da vida. Segundo este modelo de racionalidade (moderna), o conhecimento se faz reconhecer pela apresentação da verdade. E verdade, é tudo e somente aquilo que se pode provar e comprovar por meio de experiências possíveis de serem repetidas sempre que esta verdade for posta em causa. Assim, conhecer é quantificar, observar, reduzir a complexidade, formular leis, desconfiar sempre e sistematicamente, estabelecer controle. Como diz Santos, “o conhecimento científico é um conhecimento causal que aspira à formulação de leis, à luz de regularidades observadas, com vista a prever o comportamento futuro dos fenômenos”. O mundo é visto como uma máquina, cujo funcionamento se pauta nos encaixes e engrenagens, e na qual o mau funcionamento de uma peça, pode e deve, ser resolvido com a substituição desta, o que ocorreria sem implicar alterações no funcionamento da máquina. Neste contexto, todo conhecimento que se pretendesse científico deveria tomar como norte estes pressupostos modernos. Assim, no século XVIII, as ciências sociais passam a utilizar nas suas práticas tais pressupostos, aplicando no estudo das sociedades as leis formuladas para o estudo da natureza, o que ganha corpo com o positivismo conteano. Todavia esta tentativa das ciências sociais encontrou vários obstáculos, sobretudo porque o objeto de suas pesquisas e estudos não é estável nem previsível, pois a sociedade é historicamente condicionada e culturalmente determinada. A educação, como instituição constitutiva dessa sociedade moderna, traz para si e para sua prática, todos esses preceitos. O conhecimento ministrado nas escolas é tratado como verdade absoluta e inquestionável, enquanto o aluno, no máximo, traz um saber de senso comum. E a função da escola é substituir o senso comum pelo científico. A escola não é local de produção de conhecimento, pois esta prescindi de uma metodologia e uma rigorosidade que só os especialistas possuem; a ela cabe apenas divulgar o saber que o mundo da Ciência constrói. A frieza e o não envolvimento do sujeito em relação ao objeto, premissa essencial para a Modernidade na produção de conhecimento, são adotadas nas relações escolares, sobretudo na relação professor & aluno, na qual o professor se considera o sujeito detentor do conhecimento e controlador absoluto do processo ensino-aprendizagem, enquanto o aluno é o objeto passivo e manipulável do seu trabalho. As idéias de controle e previsibilidade talvez sejam as que mais se arraigaram na educação. O controle virou obsessão e sinônimo de aprendizagem. Tanto é assim que, toda a escola e sua estrutura, se organiza de acordo com seu modelo panóptico: muros autos com poucos lugares de entrada ou saída; pátio central; corredores com coordenadores Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 23 24 devidamente posicionados; salas de aula organizadas em filas indianas; o professor à frente dos alunos etc. A disciplina é exigida dos alunos como pré-requisito para a aprendizagem; e dos professores como característica de um bom profissional. Aliás, no caso do professor, a escola cobra não só disciplina consigo próprio, mas que ele saiba impô-la também aos alunos, utilizando-se da máxima “Professor competente é o que tem domínio de sala!”. A previsibilidade se expressa nas escolas por meio de leis e normas com suas respectivas punições. Romper as normas, transgredir as leis é sinônimo de rebeldia e falha no aprendizado, e deve ser punido exemplarmente aquele que se atreve a discordar do sistema. A organização dos saberes em disciplinas estanques, dissociadas, atuando isoladamente e ministradas por especialistas também reflete os preceitos da modernidade, pois foi o resultado da tentativa de se reduzir a complexidade do conhecimento. Dividir o conhecimento, fruto do desenvolvimento e patrimônio cultural da humanidade, em áreas distintas, foi o mecanismo utilizado para se aplicar na educação, uma das leis naturais: dividir para explicar. Ou seja, d i v i d i - s e o t o d o ( c o m p l e xo e heterogêneo) em partes (mais simples e homogêneas ou similares) e decifra-as separadamente. Depois, a soma das explicações das partes, equivale à explicação do todo. Todavia, independente da afirmativa que o todo é igual à soma das partes, esta etapa de unir as explicações das partes para entender o todo, não era feita pela escola, mas deixada a cargo do aluno; o qual, na maioria das vezes, nem era informado de que deveria fazer esta integração. O uso de uniforme, a divisão das aulas em tempo determinado, a aplicação de provas que supervalorizam a memorização e não dão espaço para a subjetividade, o estabelecimento de um currículo exterior à realidade local, o emprego de modelos (de aluno, de professor etc.), são outros traços da educação moderna que se forjaram sob a égide do cientificismo e do mecanicismo próprio do paradigma da Modernidade. Mas, para além do “como” a educação acontecia (e acontece ainda em muitas escolas), tem a questão da função, o papel atribuído à escola e à educação. Sem adentrar nas especificidades das correntes teórico-pedagógicas que se desenvolveram durante o período em questão, de modo geral, podemos identificar duas formas de ver a educação: uma que pensava a educação como a redentora da humanidade; aquela que poderia melhorar os homens e, conseqüentemente, o mundo. E a outra que acreditava que a educação atuava no sentido de reproduzir a organização já estabelecida, legitimando e perpetuando as desigualdades e injustiças. De qualquer forma, as duas correntes de pensamento atribuíam à escola e à educação o “poder” de interferir na organização e construção da sociedade, o que dá uma força significativa e ao mesmo tempo uma responsabilidade enorme à educação, seja para os otimistas que enxergam-na como instrumento de transformação, seja para os pessimistas que pensam-na como reprodutora de uma realidade social injusta e desigual. Pensando a si mesma como agente transformador da sociedade, capaz de, por meio de seu agir pedagógico, melhorar a vida das pessoas e do meio no qual estas atuam, a educação, mesmo que Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 não explicitamente, fez promessa de que “o estudo muda para melhor a vida das pessoas”. Essa promessa implícita da educação, veio no encalço das promessas da modernidade de liberdade, igualdade, justiça e controle da natureza. Dessa forma, a sociedade moderna passou a depositar uma confiança sobre medida não só na ciência e no progresso dela decorrente, mas também na educação. uma pluralidade de condições. (...) A primeira observação, que não é tão trivial quanto parece, é que a identificação dos limites, das insuficiências estruturais do paradigma científico moderno, é o resultado do grande avanço no conhecimento científico que ele propiciou. O aprofundamento do conhecimento permitiu ver a fragilidade dos pilares em que se funda. (SANTOS, 2001: 68) A educação na pós-modernidade O ritmo acelerado do desenvolvimento, sobretudo o científico, levounos a um momento em que os pressupostos modernos vêm sendo repensados, superados, desconstruídos, dando espaço a um novo paradigma que muitos chamam de pós-modernidade por considerar uma fase nova, que rompe com a anterior. Outros, por considerá-la uma fase específica da própria modernidade, chamam-na modernidade líquida ou fluída ou modernidade reflexiva e muitas outras denominações. Como nosso objetivo não é discutir a nomenclatura nem as premissas que estas envolvem, adotaremos aqui o termo pósmodernidade não no sentido de superação da modernidade, mas considerando todas as desconstruções que o paradigma atual, que Boaventura chama de paradigma emergente, traz para os pressupostos do paradigma anterior. A ciência que havia estabelecido todos os pilares da modernidade foi que, em função de seu desenvolvimento cada vez mais acelerado, acabou por abalar esses pilares. Sobre isso, Santos afirma que: A crise do paradigma dominante é o resultado interativo de Einstein e a teoria da relatividade; Heisenberg e Bohr com o princípio da incerteza; Göidel e o teorema da incompletude; Prigogine e a teoria das estruturas dissipativas e o princípio da “ordem através de f lutuações”, estabelecem os sistemas abertos que atuam com a auto-organização em situações de não-equilíbrio; constituem o que Boaventura chamou de os quatro rombos teóricos no paradigma da modernidade. De modo geral essas inovações significaram uma reviravolta nos preceitos modernos. Em vez do determinismo, a imprevisibilidade; em vez do mecanicismo, a interpenetração, a espontaneidade e a auto-organização; em vez da reversibilidade, a irreversibilidade e a evolução; em vez da ordem, a desordem; em vez da necessidade, a criatividade e o acidente; em vez da certeza, dúvidas e indagações; em vez da verdade única, absoluta e inquestionável, possibilidades a serem experienciadas. Se o mundo da ciência sofreu abalos e transformações, o mesmo ocorreu na sociedade como um todo, e em especial nas instituições que a compõem. O conhecimento, sua produção e a relação sujeito-objeto foram e continuam sendo repensadas. O saber já não é mais Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 25 constituído de certezas; as dúvidas acompanham não só seu processo de construção mas permeia sua efetivação, pois a verdade tornou-se relativa e opera com possibilidades. A produção do conhecimento não é tida mais como um processo metódico, mecânico e seqüencial, mas como um processo de interação entre sujeito-objeto-realidade e em constante construção-desconstruçãoconstrução. A relação sujeito-objeto também é tida em nova conta. Aquela imparcialidade que se cobrava do sujeito, sabe-se hoje impossível, pois um interage sobre o outro (sujeito-objeto), transformando e transformando-se ao longo do processo. A postura ética e profissional permanece, mas o sujeito tem consciência de que, a outrora tão exigida, “distância” em relação ao objeto é inatingível e inviável. Sobre isso, Santos diz: 26 Esta desumanização do objeto foi crucial para consolidar uma concepção do conhecimento instrumental e regulatória, cuja forma do saber era a conquista do caos pela ordem. Os pontos de vista do conhecimento emancipatório, a distinção entre sujeito e objeto é um ponto de partida e nunca um ponto de chegada. Corresponde ao momento da ignorância ou colonialismo, que é nada mais nada menos que a incapacidade de estabelecer relação com o outro a não ser transformandoo em objeto. O saber enquanto solidariedade visa substituir o objeto-para-o-sujeito pela reciprocidade entre sujeitos. (SANTOS, 2001:83) Dessa forma, as relações geradoras de conhecimento se encarnam e se humanizam, de modo que todo conhecimento torna-se auto-conhecimento. Talvez, o mesmo ocorria na modernidade, pois ninguém consegue se despir de sua subjetividade no momento da pesquisa, mas não se assumia este aspecto da produção do conhecimento. Outra mudança significativa é a percepção e a relação com a realidade. Enquanto na modernidade pensava-se na realidade como o império da ordem que, vez por outra, era abalado pelo caos, no paradigma emergente, ela é vista como complexidade caótica, cujos mecanismos de auto-organização atuam criando pequenas e momentâneas “ilhas de estabilidade”. Nessa realidade complexa o indivíduo ganha status de sujeito pela liberdade e possibilidade de ação, mesmo que esta esteja circunscrita ao poder da borboleta, e ao mesmo tempo se torna parte responsável pela realidade que ele ajuda a criar. Todavia, entre tantos setores transformados (e/ou abalados) por esta transição paradigmática, pensamos que a educação está entre os que mais têm sido atingidos; afinal, direta ou indiretamente, ela acaba abarcando, na sua formação e na sua prática, se não todos, uma grande parcela dos elementos ressignificados da pós-modernidade. Ela trabalha com o conhecimento, atua com o sujeito e no sujeito, insere-se e interage com a sociedade, lida com realidades plurais. Logo, se muitas instituições e atividades vêm sendo questionadas sobre suas práticas, suas finalidades e sua relevância no momento atual, a escola e a educação são freqüentemente colocadas na berlinda por alunos, pela comunidade/sociedade, pelos Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 professores, técnicos pedagógicos e por todos que se sentem ávidos por respostas, e refletem sobre as possibilidades. O conhecimento agora é passível de questionamento. Nada do que a escola, o professor e a internet trazem é encarado como certo e verdadeiro. É o tempo das dúvidas, das incertezas, das tentativas. Mas como trabalhar com estes princípios sem instaurar entre os alunos (e por vezes até no professor) a desilusão e o descrédito? O aluno deve ser sujeito atuante, dotado de autonomia e coprodutor de conhecimento em parceria com colegas e professores. O espaço escolar deve ser aprazível, acolhedor, flexível, afinal lida com o diferente, com a singularidade do indivíduo e, concomitantemente, com a pluralidade do coletivo. As regras, a disciplina e as normas tais como as conhecíamos devem ser abandonadas ou desconstruídas, a fim de dar espaço a um novo conjunto que dê conta da complexa realidade. A hierarquia já não é aceita a menos que a ela se chegue por discussão e consenso. A subjetividade ganha espaço nas produções, sejam elas científicas ou não; ela se torna o valor maior (mas jamais o único) do indivíduo e deve ser respeitada em todos os níveis e situações, inclusive em uma situação de aprendizagem. Mas como é difícil quantificar o subjetivo de alguém. E dos nossos alunos então? Não há nenhum sistema de mensuração ou método conceitual que aja com justiça quando se trata de avaliar tal aspecto. Todavia nosso sistema educacional continua a exigir uma avaliação, a qual, materializando-se em nota, conceito ou ficha descritiva, estará sempre emitindo um juízo de valor e em determinados momentos (vivenciados por todos que atuam ou já atuaram como professor) um veredicto final. Além desses, muitos outros elementos, constituintes do nosso sistema e da nossa prática educacional são altamente questionados pelo paradigma pós-moderno. O currículo é um exemplo: quem tem tamanha sapiência para selecionar/decidir o que os outros devem aprender/saber? Armazenar saberes construídos pela humanidade, na frieza dos laboratórios ou no fazer cotidiano, ao longo dos séculos, tem relevância para os alunos que vivem em um mundo cuja velocidade de transfor mação foi acelerada em anos-luz, e eles mal conseguem acompanhar tais mudanças? Quem pode decidir o que é relevante aprender/saber, num momento em que as informações brotam em cada esquina? Será que os professores, os técnicos pedagógicos, os especialistas? Quem? A organização da sala de aula, o posicionamento do professor indicando sempre que ocupa um lugar de poder, o nivelamento dos alunos nas séries, a fragmentação do saber em disciplinas estanques, a aula cronometrada, a homogeneização dos uniformes, o engessamento dos planos de curso que “têm” que serem cumpridos até o final do ano... Tudo isso é posto em questão pela pós-modernidade como práticas de uma época que já foi superada, mas que nosso fazer educacional reluta em abandonar. Talvez essa relutância venha por prenderse ao passado num saudosismo romântico e ingênuo; ou talvez (e é o mais p rov á vel ) el a a d ven h a d e u m a insegurança, de uma grande incerteza gerada pelo fato de sabermos o que estamos deixando para trás, mas sequer supomos o que nos espera. E quando arriscamos uma suposição, os presságios não são dos melhores. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 27 28 A própria sociedade e o aluno estão frustrados com a educação. Ela fez promessas como a modernidade o fez, e tal como a modernidade, não conseguiu cumpri-las. A educação prometeu melhorar a sociedade, diminuir as desigualdades, for mar indivíduos melhores, garantia de trabalho e conseqüentemente ascensão social e econômica, resgatar valores, desenvolver o moral... Enfim, a educação trouxe para si uma responsabilidade da qual ela não deu conta, provavelmente não por incompetência, mas porque a totalidade da dimensão social (sociedade) não pode ser transformada por uma única unidade, mesmo que esta se coloque no papel de redentora. Tal tarefa é impraticável na individualidade setorial, mesmo que este setor fosse o político ou o econômico. A complexidade da realidade exige uma ação conjunta. Diante desse quadro, muitos se decepcionaram com a educação e alguns até adotaram uma postura negativa e pessimista. Um expoente desse pensamento é Bourdieu, que vê na escola e na educação um aparelho ideológico do Estado (AIE) que atua no sentido de reproduzir e perpetuar a sociedade e seus males – desigualdades, injustiças, violências... Isso posto, um estado de desânimo, angústia e ansiedade toma conta de todos nós, especialmente dos que se envolvem de alguma maneira com a educação. Será que na sociedade contemporânea a educação instituída e intencional perdeu o sentido? Será que a escola é uma instituição falida e superada que nós insistimos em manter por não saber o que pôr no seu lugar? Será que na pósmodernidade não há mais um porquê e para quê ensinar? Será que com a superação da modernidade foram superados também os sonhos, anseios e objetivos de todos que se dedicaram à educação? Possibilidades da pós-modernidade Frente às questões colocadas, tomamos a liberdade de iniciar lembrando Denise Najmanovich, quando esta nos coloca a seguinte reflexão: “Será que a crise de que tanto se fala está nas coisas em si (educação, economia, política, sociedade...), ou na nossa maneira de apreciá-las, a qual é invariavelmente margeada pelos padrões da modernidade”? E é sobre essa premissa que abordamos aqui algumas possibilidades que se colocam para a educação diante do contexto apresentado. Como afirma Assmann, vivemos na sociedade da informação, onde os meios de comunicação possibilitam acesso ao fato passado e ao fato inédito quase na mesma hora em que este acontece. Logo, a escola e a educação não podem mais ter por base de ação o repasse de informações; outros meios fazem isto de forma mais eficiente. O elemento chave da prática educativa deve ser o conhecimento, o qual, conforme Najmanovich: É um produto um produto da interação humana com o mundo através de sistemas simbólicos, m ei o s técn i co s, es ti l o s relacionais e cognitivos que se dão sempre em um contexto multidimensional que inclui tanto a estética como a ética e o afeto (...) O conhecimento nesta Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 perspectiva, não é algo que está além do reino das verdades eternas, e sim aquilo que produzimos em nossa ação cognitiva, uma vez que somos capazes de produzir e de construir mundos de experiência mediante nossos sistemas simbólicos. (NAJMANOVICH, 2001:111) Uma vez realizada esta transposição da informação para o conhecimento, existe de novo a possibilidade de tornar o aprender significativo para o aluno, desde de que esse conhecimento seja procedente de uma experiência cognitiva, assumindo em alguns aspectos a idéia de LARROSA (2004) de se pensar a educação valendo-se da experiência. Mas a experiência por ele proposta não é a que se passa na neutralidade de um laboratório ou na demonstração que o professor faz aos alunos a fim de provar que seu discurso procede. É a experiência que invade, que toma conta do indivíduo, que se passa no indivíduo e pelo indivíduo de modo a tocá-lo, transformando-o em sujeito ativo-participativo e enchendo de sentido o vivenciado. Todavia Larrosa nos adverte sobre algumas práticas que dificultam e afastam a experiência e que, se analisarmos, são constantes no nosso fazer educativo. São elas: o excesso de informação, o excesso de opiniões, a falta de tempo e o excesso de trabalho.Se não afastarmos essas práticas do nosso cotidiano dificilmente viveremos a experiência, tão pouco, a proporcionaremos aos nossos alunos, pois o sujeito da experiência é aquele que dá lugar para os acontecimentos, é um sujeito que se expõe e se dispõe a provar (arriscar), a errar e a tentar. Essa idéia de fazer da sala de aula e da escola como um todo, o lugar da experiência (como forma e processo do/para o conhecimento) nos remete ao que Assmann denominou, apropriandose de Morin, de “ecologia cognitiva” ou nicho cognitivo, ou seja, fazer do espaço de aprendizagem um sistema interativo no qual todos os elementos atuem a fim de que a aprendência se concretize. Nesse espaço, como lembra Garcia, o medo deve ser visto como parte do aprender. A sala de aula, quando vencemos o medo de errar e aprendemos que sem erro não nasce o novo, pode efetivamente ser um espaço/tempo de ricas aprendizagens em que todos ensinam e aprendem e, mais que tudo, onde se cria novos conhecimentos. (GARCIA, 2001: 118) Em outras palavras, temos que desconstruir a visão negativa que tínhamos do erro como fracasso, fraqueza, incapacidade. Até porque sem esta desconstrução fica difícil trazer para o fazer educativo o sujeito encarnado descrito por Najmanovich como o sujeito contemporâneo, que já se expressa e conquista inúmeros espaços, e precisa estar também no espaço escolar. Quando se pensa/fala do sujeito encarnado, referimo-nos ao ser humano completo e complexo, sem dualismos e dicotomias (corpo/mente, razão/emoção...), que participa de uma dinâmica criativa de si mesmo e do mundo com que ele está em permanente intercâmbio. Tal sujeito, reconhecendo sua incompletude, suas limitações e Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 29 vendo-se como um devir humano, coloca-se com humildade, benevolência e perseverança diante do conhecimento, de si, do outro e do mundo. É este sujeito que está hoje nas nossas salas de aula; um sujeito que possui corporeidadee, aprende com essa corporeidade, de modo que o saber só se transforma em conhecimento quando é processado por todo o corpo do sujeito. Logo, para a aprendência ser efetiva, ela não pode ignorar este ou aquele aspecto do sujeito, na crença de que se aprende com o cérebro e que este age independente dos demais integrantes do sujeito. O aprender só fará sentido quando passar por todo o corpo do sujeito aprendente, numa interação deste com o ambiente circundante, no que Najmanovich chamou de inação. Esta (inação) seria a imersão sincrônica do sujeito e do mundo na experiência contextualizada, corporalizada e histórica, possibilitando s u j e i t o e mu n d o s e d e f i n i r e m mutuamente. Ora, se muda o aprender e o quê aprender, o avaliar também requer refor mulações. Avaliar como na modernidade medindo, isolando, quantificando se torna inviável quando tratamos de um sujeito encarnado e de um saber que se faz conhecimento pela corporeidade do aprendente, logo carregado de subjetividades. Pensando nessa questão educativa, Najmanovich coloca que: 30 É fundamental desenhar e legitimar modelos de avaliação que per mitam destacar a capacidade de analisar e comparar infor mações, produzir conhecimento e expressá-lo de maneira adequada em diversos meios, integrar conhecimentos de diversas fontes e disciplinas em narrações coerentes, gerar perguntas que orientem uma pesquisa produtiva e fértil, apresentar as próprias idéias de uma maneira rigorosa, criativa e convincente, que aceite uma diversidade de respostas adequadas possíveis e que seja uma instância de crescimento dentro de um processo e não um veredicto final e inapelável. (NAJMANOVICH, 2004:115). Diante de tal quadro, o professor deve repensar sua posição e colocar-se no processo de aprendência como um agente cognitivo, cujos atributos são: ser capaz de agir num ambiente; poder comunicarse e interagir com outros agentes cognitivos; dotar-se de intencionalidade; se comportar segundo parâmetros tendenciais; dispor de potencial variável (adaptabilidade); perceber seu entorno; captar e transformar informações internas e externas; continuar aprendendo; poder eventualmente reproduzir-se; sofrer confrontações; agir por tentativas, errando e acertando. Sem esta postura, querendo manter-se em lugar de poder que lhe foi próprio na modernidade mas que já está superado, o atual profissional da educação terá, senão a frustração e o desânimo dos que se sentem impotentes diante da realidade, dificuldades para efetivar a aprendência. Aliás, é bom lembrar que a realidade é, ela própria, uma construção do sujeito, logo passível de alterações. Uma questão também bastante discutida no paradigma da pósmodernidade é a rigidez da divisão dos Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 saberes e sua restrição à especialistas. Se o sujeito já é reconhecido como holístico, carregado de subjetividade e capaz de objetividade em determinadas situações, é no mínimo negligente insistirmos na idéia de redução de complexidade, dividindo o todo em partes, até porque, já se sabe pelo discurso dos sociólogos, que o todo é muito mais do que a mera soma das partes. Isso nos remete à idéia de Von Foerster do ponto cego. Cremos que um dos pontos cegos da educação está nesse engessamento dos saberes em disciplinas que não interagem; haverá sempre um ponto cego, ou seja, um saber que uma área pensa estar sendo tratado pela outra e vice-versa, de forma que ele se perca no processo de aprendência. Como possibilidade, a pós-modernidade nos coloca a interdisciplinaridade, mas não da maneira como a pensamos, ou seja, um mesmo assunto sendo tratado por diferentes áreas do conhecimento, e sim como um saber que emerge do trabalho conjunto da aplicação e contribuição das diferentes disciplinas, de modo a lançar sobre este uma visão holística desde o seu fazer inicial. Outra possibilidade para a educação vem de Michel de Certeau e seu trabalho com o cotidiano. Apesar dele tratar do cotidiano como campo de pesquisa da e na educação, ele termina por apontar o agir cotidiano e as experiências por ele proporcionadas, como uma possibilidade de trabalho educacional neste paradigma emergente. Na sua proposta ele traz uma nova face da educação, um novo sujeito (seja como aluno seja como professor) e uma nova forma de interação entre esses sujeitos e destes com o mundo, na produção de conhecimento. Conforme Certeau: Pensar o cotidiano é erguê-lo à condição de espaço e tempo privilegiado de produção da existência e dos conhecimentos, crenças e valores que a ela dão sentido e direção, considerandoo de modo complexo e composto de elementos sempre e necessariamente articulados. É colocar no mesmo grau de relevância a teoria e a prática; os saberes formais e os saberes cotidianos; os observadores e os observados; o conteúdo e a forma. (CERTEAU, 2000 :41): Ora, agir a partir de tal premissa, não como um pesquisador do cotidiano (que é a proposta de Certeau), mas como um agente cognitivo do cotidiano é dar sentido ao fazer educacional de modo que aluno e professor, atuando como sujeitos encarnados no vivido, sintam-se partícipes de experiências de aprendência, significativas para ambos, de modo a tornarem-se convictos de que a vida cotidiana não é apenas lugar de repetição e reprodução, mas um campo de possibilidades para se criar o novo. Além disso, Certeau nos lembra que nós, seres humanos, sempre encontramos uma maneira de agir a fim de se realizar aquilo que julgamos o mais acertado, mesmo que o instituído diga o contrário. É o que ele chama de astúcia; o agir sem “declarar guerra”, no terreno do inimigo, pelas brechas que ele deixa, sem sermos descobertos. Ora! Por que não lançarmos mão de tais astúcias na nossa prática educativa? A situação crítica e caótica nos dá mais espaço para a criatividade. É o momento de buscar o novo; de cremos nas possibilidades, mesmo que o engessamento do nosso sistema Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 31 32 educacional dificulte tal empreitada. Façamos uso das astúcias agindo pelas brechas que a modernidade e sua crise nos deixaram. Mas, como lembra Assmann, é essencial que o aprender seja dotado de prazer, principalmente na sociedade contemporânea, que o busca a todo tempo, de todas as formas e em todos os lugares. E esse sentimento é necessário na cognição porque processos cognitivos e processos vitais se entrelaçam numa completude e numa interação constante. Só sobrevivemos e evoluímos porque aprendemos. Só nos mantemos vivos porque aprendemos. Retirar o prazer do aprender é retirá-lo da própria vida. E esse saber deve colocar-se a serviço da vida, da construção de um mundo onde caibam todos, onde as diferenças reconhecidas sejam também acolhidas sem que se proceda juízos de valor. Essa é a proposta de Assmann, e que ele acredita ser possível concretizar: reencantar a educação, a fim de que o saber se faça com prazer e que, posto em ação de forma conjunta, faça do mundo um lugar melhor. E esta esperança aparece também, embora de maneira bem mais tímida e discreta, em Boaventura, quando ele fala do conhecimento emancipação como uma forma de (re)significar a educação, humanizar as relações e diminuir as desigualdades e injustiças. Como resultado do conhecimento emancipação teríamos, entre outras coisas, o desenvolvimento da solidariedade, a qual é vista como “ o conhecimento obtido no processo, sempre inacabado, de nos tornarmos capazes de reciprocidade através da construção e do reconhecimento da intersubjetividade”. Ele traz ainda a idéia de um “conhecimento prudente para uma vida decente”, o que em outras palavras significa um conhecimento que se constrói sabedor de sua incompletude e limitações, mas que uma vez construído, quer se tornar senso comum, ou seja, tornar-se utilitário dos sujeitos sociais, a fim de proporcionar uma vida decente à totalidade social. Sobre isso, Santos diz: ... o conhecimento emancipação tem de romper com o senso comum conser vador, mistificado e mistificador, não para criar um forma autônoma e isolada do conhecimento superior, mas para se transformar a si mesmo num senso comum novo e emancipatório. O conhecimento-emancipação tem de converter-se em senso comum emancipatório: impondo-se ao preconceito conservador e ao conhecimento prodigioso e impenetrável, tem de ser um conhecimento prudente para uma vida decente. (SANTOS, 2001:107) Essas palavras expressam crença na educação, a qual deve (re)estruturar-se a fim de adaptar-se e (re)integrar-se à sociedade contemporânea, e na melhoria das condições de vida por meio da produção e socialização do conhecimento. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Comentários finais Lembrando uma das lições do livro de Briggs e Peat “A sabedoria do caos”, que diz que é nas situações mais caóticas que a criatividade surge com todas as suas forças, atuando no sentido de autoorganização. Isso posto, a crise transitória que vivenciamos, sobretudo na educação, pode mostrar-se como um leque de possibilidades para (re)significarmos a educação e o fazer educacional. Os autores aqui abordados parecem acreditar nisso e, sem repetir as promessas da modernidade, acalentam aqueles que, como nós, ainda crêem na educação. O fio condutor de todas as falas pareceu-nos ser a humanização do agir educativo, aceitando e trabalhando com as subjetividades, abrindo-se aos desafios e às possibilidades de erros e fracassos que lhes acompanham, reconhecendo suas responsabilidades e limitações na complexa tarefa de viabilizar a aprendência. O que nos lembra uma fala de Ginzburg em uma entrevista, na qual ele assim se coloca: “sinto que ensinar é uma tarefa mais ou menos impossível, que é um processo difícil de ser articulado em palavras, mas que às vezes acontece”. Tenhamos, pois, a consciência da dificuldade que se impõe diante da complexidade da tarefa, mas não deixemos que a certeza de que algo pode ser feito se perca. Lembremos do efeito borboleta, onde um leve bater de asas em um continente pode causar um maremoto em outro mais longínquo. Dessa forma, sabendo que a temática proposta, bem como a vasta produção dos autores sobre a mesma não foi esgotada, encerramos com possibilidades reflexivas mais abrangente sobre a situação atual da educação e, de alguma forma, apontar caminhos para que os sonhos não se percam, mas que se transfor mem ações passíveis de concretização. Notas 1 Surge nesta época de maneira embrionária e vai se constituindo e fortalecendo com o desenvolvimento da ciência, chegando ao auge no século XIX. 2 Observar, quantificar, desconfiar, reduzir complexidade, provar com experiências, criar leis, controlar... (não exatamente nesta ordem). 3 Esse uso dos verbos VER e ENXERGAR como sinônimo de constatação da realidade, também é próprio da modernidade, que não questiona a veracidade daquilo que os olhos vêm. 4 Esse termo já é um termo tido como pós-moderno. Criado por Derrida, trata de uma forma legítima de superar algo, ou seja, ao invés de se criar o par dialético do que se quer superar, desconstrói-se tal objeto. 5 Baumann trata com este nome por trazer tal momento em oposição ao primeiro momento da modernidade, que ele chama de modernidade sólida, pois era rígida e sem possibilidades. Já a modernidade líquida é o momento da flexibilidades, do adaptável, das possibilidades. 6 É um tipo de saber remanescente da modernidade que, segundo Santos, pode Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 33 levar a um conhecimento prudente para uma vida decente. Nos aprofundaremos neste tema no próximo tópico. 7 Expressão utilizada por Briggs e Peat em seu livro A sabedoria do caos, como forma de entendimento da realidade e a forte presença do caos na mesma. 8 Giddens é o criador deste termo, por trazer a fase atual como uma fase em que a modernidade reflete sobre si mesmo e seus pressupostos, desconstruindo-os e reconstruindo-os. 9 O termo aprendência vem por sugestão de Assmann a substituir o termo aprendizagem, pois ele pensa que diante da complexidade do tema, o termo aprendizagem é simplista e se encontra per meado da idéia moderna de aprendizagem. 10 Como o próprio Assmann diz, corporeidade não é sinônimo de corporalidade, pois este subentende que se há o corporal há também o não corporal. O termo corporeidade pretende eliminar esse dualismo. Em um outro lugar muito distante. Tem base teórico na “teoria do caos”. Referências ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação: rumo à sociedade aprendente. 8. ed. Rio de Janeiro: Vozes; 2004. 34 BAUMANN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2001. BRIGGS, J e PEAT, D. A sabedoria do caos. Rio de Janeiro: Campus, 2000. CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. 2. ed. Rio de Janeiro: Vozes; 1996. FOERSTER, Heinz von. Visão e conhecimento: disfunsão de segunda ordem. In: SCHNITMAN, Dora Fried (Org.). Novos paradigmas, cultura e subjetividade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. GARCIA, Regina Leite. Da fronteira se pode alcançar um ângulo de visão muito mais amplo... embora nunca se veja tudo. In: ______Ensinar e aprender: sujeitos, saberes e pesquisa. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. GIDDENS, Anthony; BECK, U; LASH, Scot. Modernização reflexiva. São Paulo: Editora da UNESP, 1997. LARROSA, Jorge. Linguagem e educação depois de Babel. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. MORIN, Edgar. A cabeça bem feita: repensar a refor ma/refor mar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. NAJMANOVICH, Denise. O sujeito encarnado. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. SANTOS, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. São Paulo: Cortez, 2001. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Eliete Borlot Martins1 Sandra Maria Guisso2 A MÚSICA COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA NO DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM Resumo Licenciada em Pedagogia pela Farese. 1 Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 E-mail: [email protected] Doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo. 2 Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 E-mail: [email protected] Este texto foi realizado com o objetivo de compreender a importância da utilização da música como ferramenta pedagógica no desenvolvimento da aprendizagem verbal e psicomotora, envolvendo a lateralidade e o estímulo dos sentidos em crianças. Num primeiro momento, apresentamos o desenvolvimento da aprendizagem que é composto de etapas bem sucedidas da vida humana, partindo do desenvolvimento psicomotor que é um processo contínuo e extenso, por ocorrerem as mudanças mais importantes dos primeiros anos de vida, o d e s e nvo l v i m e n t o c o g n i t ivo q u e compreende as intelectualidades da criança e o desenvolvimento social, onde são previstos, em boa parte, o comportamento que a criança desenvolverá. Em seguida, discutimos como a música auxilia em todo esse desenvolvimento, ainda ressaltando a lateralidade, que é a capacidade de controlar os dois lados do corpo juntos ou em separado, e o estímulo dos sentidos. Para finalizar, abordaremos a utilização da música como instrumento didático e o papel do professor como mediador nesse processo. Palavras-chave: música, ensino fundamental, desenvolvimento psicomotor. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 35 Introdução 36 Antunes define inteligência como “a capacidade cerebral pela qual conseguimos penetrar na compreensão das coisas seguindo o melhor caminho. Permite ao sujeito resolver problemas sugerindo opções, escolhendo a melhor solução”(1998, p.11). Em outras palavras, ser inteligente é ter a capacidade de adquirir conhecimentos e encontrar a melhor maneira de aproveitá-los. Dessa forma, é possível afirmar que o ser humano possui diferentes inteligências, que segundo Armstrong (2001) são: a lingüística, que se destaca pela capacidade de usar palavras de forma efetiva; a lógicomatemática que privilegia a capacidade de usar os números para raciocinar bem; a espacial, que é a capacidade de perceber formas iguais ou diferentes em objetos; a corporal sinestésica, que se manifesta pela capacidade de resolver problemas ou elaborar produtos, utilizando o corpo e seus movimentos; a interpessoal, que é destacada pela capacidade de perceber e fazer distinções como, por exemplo, no humor; a intrapessoal, que é a habilidade para ter acesso aos próprios sentimentos e idéias; a naturalista, que é a competência para perceber a natureza de maneira integral e dentre elas podemos ressaltar a inteligência musical. De acordo com Gardner (1994), a inteligência musical é a que se desenvolve mais cedo e pode ocorrer em razão de a criança conviver num ambiente em que a música seja constante, principalmente quando utilizada para o aprendizado de instrumentos. Segundo Uriarte (2004), a música pode ser considerada como um fenômeno universal, trazendo conhecimento e união entre os povos. A utilização da música como uma ferramenta pedagógica, pode auxiliar o professor nas atividades cotidianas com as crianças, os conteúdos, muitas vezes pesados e cansativos, podem ser abrandados pela utilização da música. Outra questão interessante é o desenvolvimento das habilidades motoras da criança, de maneira lúdica e agradável. Para o professor das séries iniciais que trabalha todas as disciplinas com a criança, a música favorece a ligação entre os conteúdos, possibilitando o aprendizado. Nesse sentido, para Piaget (apud BECKER, 1993), a alfabetização musical propicia uma produção interdisciplinar. A música, quando bem selecionada, pode auxiliar o professor na tarefa de transformação da informação para o aprendizado. Através da música, é possível despertar a sensibilidade humana e suas emoções, além de desenvolver a expressão e a comunicação e colaborar para a alfabetização e o ensino de conteúdos. É necessário que o professor, ao fazer uso da música, assim como de qualquer outro recurso, faça um planejamento das atividades tendo consciência dos imprevistos que possam ocorrer. A música pode ser utilizada como uma excelente ferramenta para o professor realizar um diagnóstico da turma em que vai trabalhar, dessa forma, conhecerá as preferências, as dificuldades e as facilidades dos alunos, podendo assim, realizar um trabalho mais eficiente e efetivo com os mesmos. Nesse aspecto, a música, assim como outras ferramentas pedagógicas, é de fundamental importância no desenvolvimento, pois envolve diretamente os Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 aspectos sociais, motores, afetivos e cognitivos da criança. Segundo Rizzo (1989), através da música a criança desenvolve suas habilidades motoras de maneira lúdica e agradável. Além disso, ainda é possível despertar a sensibilidade humana e suas emoções, também desenvolver a expressão e a comunicação. As características musicais fazem com que a criança desenvolva aspectos da percepção auditiva, que serão muito importantes para a evolução da comunicação, favorecendo, assim, na integração social como um todo. É notório que bem antes de compreenderem o verdadeiro significado das palavras as crianças entendem melhor os sons que ouvem já no berço e depois em jogos e brincadeiras cantadas. Segundo Nogueira (2003), a música pode ser considerada uma linguagem universal que ultrapassa todos os obstáculos do tempo e do espaço, pois a música acompanha o ser humano em todas as situações vividas. E, atualmente, ela deve ser encarada como uma das formas importantes de comunicação. Para Ilari (2005), são experiências musicais de qualidade, realizadas dentro e fora da escola, que exercitam o desenvolvimento cognitivo. Não se questiona a grande influencia da música no desenvolvimento, pois, segundo Nogueira (2003), ainda no útero materno, os bebês reagem a estímulos sonoros. Nesse sentido, crianças que mantém vínculo com a música, desenvolvem com mais facilidade as regiões responsáveis pela audição, visão e controle motor. Além de todos os aspectos acima citados, a música ainda possibilita o relaxamento, a estimulação e a absorção de informa- ções, auxiliando na aprendizagem. Assim, a estimulação musical no desenvolvimento, segundo o autor, é como a prática de esportes para os músculos. A utilização da música para o desenvolvimento da aprendizagem cognitiva potencializa, ainda, o raciocínio lógico da memória, do espaço e do raciocínio abstrato. Ainda, ajuda a desenvolver o lado social da criança, fazendo com que esta se torne um ser socializado, respeitando o grupo onde está inserida. A partir de algumas músicas, a criança vai aprendendo regras sociais e se deparando com situações do cotidiano, que não são abordadas pela simples linguagem oral. Através da música e dos movimentos causados pela mesma, as crianças aprendem mais sobre seu corpo e sobre hábitos, são mais harmoniosas em seus movimentos e equilibradas em suas ações. Para Uriarte (2004), a música gera conhecimento e tem especial significado, pois opera com força total na percepção e na cognição humana. Através da mesma, pode-se alcançar o resgate da cidadania e a valorização de ser humano por meio da construção do conhecimento. 1 O uso da música no desenvolvimento da lateralidade e o estímulo dos sentidos A capacidade de controlar os dois lados do corpo juntos ou em separado é o que chamamos de lateralidade, ou ainda, a dominância de um dos lados cerebrais sobre o outro que caracteriza o predomínio motor de uma das metades de nosso corpo. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 37 38 De acordo com Meur e Staes (1991), se a criança perceber de uma forma natural que trabalha mais com uma determinada mão, ela vai memorizar sem dificuldade que esta determinada mão é a esquerda ou a direita. Por outro lado, se a criança hesitar em escolher, ela não terá segurança, irá confundir os termos e haverá lateralidade cruzada. É muito importante que haja percepção da diferença entre esquerda e direita. É preciso também que haja noção de distância entre elementos em posição tanto do lado esquerdo quanto do lado direito. O domínio ou conhecimento estável entre direita e esquerda só é possível aos cinco ou seis anos. Durante o crescimento, se define de uma forma natural a dominância lateral na criança em que um de seus lados será mais forte, mais ágil. Meur e Staes (1991), dizem também que a lateralidade corresponde a dados neurológicos, mas também é influenciada por certos hábitos sociais. Desenvolver a lateralidade é, sem dúvida, um aprendizado. Para que a criança desenvolva a lateralidade, ela necessita de atividades lúdicas que auxiliem este desenvolvimento. Além disso, as atividades promotoras do desenvolvimento da lateralidade precisam ser abordadas e desenvolvidas pelo professor da educação infantil e das séries iniciais. As atividades devem ser realizadas em conjunto com habilidades que precisam envolver coordenação motora, relação de tempo e espaço, domínio corporal e principalmente, a lateralidade. Dentro desta perspectiva, uma das dificuldades encontradas é na abordagem de noções de sentidos (audição e tato) e direção (direita e esquerda). O estímulo dos sentidos, ou seja, percepções visuais, auditivas, táteis, gustativas e olfativas, também devem ser abordados nas séries iniciais. Tudo que a criança absorve (aprende) é por meio dos sentidos. Em ciências, o primeiro conteúdo que precisa ser trabalhado em sala de aula, nas séries iniciais, está relacionado aos sentidos. A criança precisa se perceber, se conhecer e identificar de quê o mundo ou o ambiente que a cerca é formado, e, em quê este influi em sua vida. A criança precisa ver, sentir cheiros e gostos, tocar e ouvir. Para a criança aprender de uma forma concreta, ela precisa manusear materiais concretos, precisa tocar, manipular, ver, sentir e, se possível, cheirar e provar. Existem muitas maneiras de trabalhar a percepção, a lateralidade e a psicomotricidade das crianças, dentre elas é possível citar as brincadeiras e a música. Para Nicolau (1989), a linguagem musical oferece muitos benefícios na formação, desenvolvimento e equilíbrio da personalidade da criança. Esse recurso possibilita estimular, desenvolver e educar a criatividade, a interpretação e o ouvir da criança. Segundo Cotrim (1983), para as pessoas, cantar é uma forma universal de expressão de sentimentos. A música está ligada aos momentos que compõem a existência. Por meio dela expressa-se algumas das mais profundas experiências e entendimento do significado da vida. A música pode levar à mudança de estado de espírito pela alteração da química, isso porque o sentido da audição tem um efeito maior sobre o sistema nervoso autônomo do que qualquer outro sentido (MARQUES, 2005). Para Rizzo (1989), a música exerce um grande papel na educação. Sua utilização Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 deve ser feita como meio para alcançar uma série de objetivos como a sensibilização do ouvido e a expressão corporal, e que, além disso, explica que o desenvolvimento pleno das potencialidades inclui o despertar da capacidade auditiva. Com relação à expressão corporal, Rizzo (1989), afirma que a música desperta e conduz a um movimento que vem de dentro do indivíduo já que o desenvolvimento da expressão e a movimentação de todo o corpo é um grande veículo propiciador desses objetivos. Para Nicolau (1989), a música possibilita à criança mover-se e explorar o espaço. Segundo Krepsky e Barreto (2005), a musicalização favorece a cognição, a afetividade, a psicomotricidade, a comunicação e a cooperação, fatores essenciais na alfabetização. Além disso, facilita a integração intra/interpessoal e, ao mobilizar aspectos biopsicossociais, desbloqueia emoções, facilitando a emergência de situações conflituosas que podem ser então reelaboradas. A música e as expressões musicais, longe de simples repetição de cantos, sons e movimentos, devem propiciar às crianças um espaço de criação musical, de descoberta de sons, combinações rítmicas, melódicas e até harmônicas, às quais são fonte de prazer e satisfação para as crianças. Desde o nascimento as crianças experimentam, conhecem, descobrem, constroem e criam formas de expressão e manifestação cultural, num movimento intimamente relacionado ao ato de dar sentido, de atribuir significados. Contudo, não podemos utilizar a música de maneira pouco imaginativa e fora de contexto com os interesses dos alunos. Vale ressaltar que é por meio dos sentidos que o aluno aprende e nada melhor do que música para tornar este aprendizado mais interessante e concreto. 2 A música utilizada como instrumento didático e o papel do professor A música é uma fer ramenta pedagógica essencial nas séries iniciais, pois além de ser a primeira forma de expressão humana, ainda mantém forte vínculo com a ação do brincar. Ação esta que se perde quando a criança passa da educação infantil para o ensino fundamental. A utilização da música nas séries iniciais do ensino fundamental se faz necessária, pois as crianças estão em pleno desenvolvimento e aprimoramento das suas habilidades e percepções. Segundo Tiba (2004), a música, quando bem selecionada, pode auxiliar o professor na tarefa de transformação da informação para o aprendizado. Para Cunha (1999), as atividades musicais podem ser utilizadas pelo docente para desenvolver o processo de percepçãoexpressão- comunicação. A partir das atividades musicadas, a ação pedagógica deve possibilitar a descoberta do imaginário infantil. S e g u n d o Fe r r e i r a ( 2 0 0 5 ) , a combinação sonora é utilizada como suporte para a memorização e para o aprendizado de qualquer coisa em nossa vida. O professor precisa fazer uma reflexão sobre o uso da música, pois sabese que o uso desta, pode amenizar o estudo de alguns conteúdos, no entanto, o docente não encontrará facilidades para utilizar este recurso em todas as disciplinas. O que não impede de usá-la Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 39 40 em conteúdos menos afinados com a mesma. Existem muitos professores que utilizam a música para a fixação da matéria ensinada e exercícios, o que torna o aprendizado dos alunos mais agradável. A eficiência da música no ensino não se questiona. Trata-se de uma arte rica e que dispõe de um grande repertório acessível independente do lugar onde possamos estar. Muitas vezes quando falamos em linguagem ou inteligência musical, o que vem à nossa mente é o ato de cantar. Contudo, além disso, ela é também o ouvir. Assim como afirma Ferreira (2005), somos cercados por sons e músicas e por isso é muito importante que aprendamos a ouvir. Segundo Cotrim (1983), a escola, ao trabalhar a música, promove o amor à arte musical, incentiva a auto-confiança do aluno e o fortalecimento do sentimento patriótico. Além disso, a freqüência de atividades musicais no grupo desenvolve o sentimento de união entre os alunos, fazendo com que as pequenas diferenças e preconceitos, sejam amenizados. Segundo Nicolau (1989), por meio do acesso à música constróem-se possibilidades de criar, interpretar e ouvir, pois ela estimula, desenvolve e educa. Além disso, é fator indispensável no processo da leitura e da escrita e, por isso, são propostas muitas atividades lúdicas a partir de observações e exploração de sons do ambiente e sons de objetos para que a discriminação auditiva seja possível por meio de semelhanças e diferenças que existem em palavras ouvidas. O canto utilizado junto com histórias, teatros, movimentos corporais se torna uma maneira agradável de dar início e término a atividades diárias. A música possibilita a criança moverse e explorar o espaço, sendo conveniente o uso da mesma também nas aulas de educação física, pois é nesta disciplina, mas não só nesta, que as crianças adoram mexer o corpo, isso faz a criança se soltar, perder a timidez, pois está se exercitando, se desenvolvendo e se divertindo. A música ainda tem o poder de acalmar, fazendo assim, com que as crianças liberem as tensões do dia-a-dia. Para Kamii (1985), algumas canções ainda possibilitam a mudança de movimentos, fazendo o corpo responder rápido em alguns sons e vagarosamente em outros. O professor não pode apenas aplicar qualquer atividade lúdica sem nenhum objetivo, ele precisa refletir se a aplicação desta determinada atividade proporcionará aprendizado e desenvolvimento de algum dos cinco sentidos e ainda equilíbrio, personalidade, memória, concentração entre outros. Segundo Marques (2005), a seleção das músicas que serão utilizadas pelo professor é muito importante. Pois se escolhemos músicas pobres que falam de coisas insignificantes, afetará de forma negativa impedindo o ouvinte de pensar. Vale ressaltar que as músicas com conotação sexual muito forte, de livre acesso às crianças, podem intervir na formação da consciência de sexualidade das mesmas e levar à formação de préconceitos. Sendo assim, para Ferreira (2005), para que o professor selecione bem as músicas que utilizará em suas aulas, deverá desenvolver seu espírito crítico como ouvinte. Entendemos no Referencial Curricular (2002), que para se realizar um trabalho com música é necessário utilizar toda e qualquer fonte sonora, como Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 brinquedos e instrumentos musicais. Além disso, é interessante que os próprios alunos confeccionem seus instrumentos ou materiais a serem utilizados. Além de ser trabalhada em conteúdos comuns, a música auxilia na parte diversificada dos conteúdos. Esta ferramenta pedagógica pode ser trabalhada como um resg ate e apropriação da cultura local, transformando os rituais e as manifestações populares folclóricas da comunidade em que está inserida. Segundo Leonardi (2004), por meio da música, os alunos respeitam diferentes pronúncias regionais, provando, dessa forma, a necessidade de aprender a escutar e a respeitar as diferentes opiniões que possam surgir. O professor pode adaptar certas músicas para trabalhar em sala de aula, ser criativo e inovador. Dessa forma, qualquer conteúdo pode ser trabalhado com música, desde que o professor tenha pleno domínio do que esta fazendo, além disso, qualquer disciplina pode envolver a música como instrumento de aprendizagem, pois vários assuntos se interligam. Referências ANTUNES, Celso. As inteligências múltiplas e seus estímulos. Campinas: Papirus, 1998. ARMSTRONG, Thomas. Inteligências múltiplas na sala de aula. Porto Alegre: Artmed, 2001. BECKER, F. Da ação à operação: a caminho da aprendizagem. Educação e realidade. Porto Alegre: Palmarinca, 1993. BRASIL, Ministério da Educação. 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São Paulo Educar, 2004. 42 Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Dulcineia Deleprane1 Rosimere Lins Plaster 2 Ozirlei Teresa Marcilino3 Licenciada em Matemática pela Farese. 1 Licenciada em Matemática pela Farese. 2 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. 3 Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 3E-mail: [email protected] ENSINO E APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA: DISCUTINDO HISTÓRIA, CONCEITOS E RESPONSABILIDADES Resumo Esta pesquisa surgiu a partir da observação de avaliações de matemática como do Programa Internacional de Avaliação de Alunos - PISA (2003) e do Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB (1996), nas quais os estudantes de Matemática não obtiveram bons resultados. Logo, procurou-se interar do assunto relatando o fracasso do ensino e aprendizagem da matemática encontrado nas escolas nos dias atuais. Para isso foi feita uma retrospectiva sobre a história do ensino da matemática, algumas razões atuais (2007) que levam ao fracasso do ensino-aprendizagem da matemática, como por exemplo, a deficiência didática e a formação docente e, ainda sobre a sua função do professor de matemática. Verificou-se também alguns conceitos didáticos da matemática que estão relacionados à interação entre teoria e prática que tratam diretamente da didática da matemática e que ajudam a compreender, interpretar e descrever vários acontecimentos que surgem na sala de aula que estão ligados ao processo de ensino e aprendizagem. Dessa forma, objetivou-se, com este trabalho de conclusão de curso (TCC) de Matemática, esclarecer que os responsáveis por esse fracasso não são apenas os professores, alunos, sociedade, e demais envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, mas também a deficiência didática que vem se arrastando desde os tempos remotos até Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 43 os dias atuais, impedindo, dessa forma, que haja um ensino de matemática voltado para a prática. Palavras-chave: educação matemática, ensino e aprendizagem, fracasso escolar. Introdução Obser va-se, atualmente, uma defasagem significativa no ensino e aprendizado da matemática. Existe um quadro assustador, onde milhares de estudantes concluem o ensino básico sem os conhecimentos necessários ou sem conseguirem aplicabilidade para o que aprenderam em matemática. Muitos educandos possuem verdadeiro “pavor” a essa matéria, considerando-a de difícil aprendizado e acreditando que seja destinada a poucos. Quem detém seus conhecimentos são considerados “gênios”. Uma grande preocupação é com a situação em que se encontra a escola a respeito do fracasso do ensinoaprendizagem da Matemática. Sendo estudantes e educadores em Matemática, verifica-se que os discentes encontram dificuldades para relacionar a matemática estudada nas escolas e a matemática vivenciada no dia-a-dia. Isso indica que a escola está proporcionando uma matemática distante do cotidiano dos alunos, uma matemática abstrata, que não é possível ser aplicada diretamente à vida. 44 Ao que parece, não há muita continuidade entre o que se aprende na escola e o conhecimento que existe fora dela. Há crescente evidência de que a escolarização está contribuindo muito pouco para o desempenho fora da escola. Dificilmente se mostra para o aluno a relação direta e óbvia que há entre a escola e a vida (MOYSÉS, 2000, p. 60). De acordo com dados divulgados na Revista do Professor de Matemática, n.62, p.12 e na revista Veja 15/12/2004, p.120, onde apresentam o resultado da avaliação PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), constatou-se que a disciplina de Matemática no Brasil alcançou a penúltima posição em 2000 e a última em 2003. O PISA avalia a capacidade que os jovens de 15 anos possuem para empregarem os conhecimentos que tem para enfrentarem os desafios da vida real e não simplesmente avaliar o domínio que detém sobre o conteúdo do seu currículo escolar específico. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (2000, p. 29), no Ensino Fundamental, o conhecimento matemático deve ser empreendido da forma mais extensa possível. Mas para isso, concordamos que: [...] é importante que a Matemática desempenhe, equilibrada e indissociavelmente, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio dedutivo do aluno, na sua aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas curriculares. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Assim, pode-se questionar: como a didática do professor de Matemática contribui para o fracasso no ensino e aprendizagem? Refletindo sobre o assunto objetivou-se, com este trabalho, identificar se a deficiência didática contribui para o fracasso do ensino e aprendizagem da Matemática e assim reconhecer algumas dificuldades dos alunos em resolver situações-problema e a dificuldade que os alunos e os professores possuem de dar sentido e significado à simbologia matemática apresentada nas escolas, e por fim diagnosticar a situação que a aprendizagem da Matemática se encontra no momento. 1 Breve Relato Histórico Sobre o Ensino da Matemática no Brasil Por mais de 200 anos o ensino brasileiro foi ministrado pelos padres da Companhia de Jesus. As escolas seguiam a tradição clássico-humanista onde a educação era baseada apenas nas disciplinas da retórica, das humanidades e da gramática. A Matemática era reservada apenas ao Ensino Superior, mesmo assim era pouco estudada. Sabe-se que apesar de existir uma preocupação com o ensino da matemática, muitos a consideravam uma ciência vã. Em 1759, com a expulsão dos jesuítas do Brasil, o sistema educacional desmoronou-se. No ano de 1772, foram criadas as “aulas régias” que eram aulas de disciplinas isoladas e objetivavam minimizar os efeitos da expulsão dos jesuítas. Essa medida representou um retrocesso em termos institucionais, no entanto, somente nesta época alguns conteúdos começaram a ser modificados, como por exemplo, a introdução de novas disciplinas como a aritmética, a álgebra e a geometria no currículo. Como as aulas régias eram dadas isoladamente, isso não garantia que as aulas de matemática teriam procura. Durante o século XIX e início do século XX, novas idéias incendiaram uma discussão sobre o ensino secundário. Se de um lado havia defensores do ensino clássico-humanístico, do outro lado havia os defensores de uma nova tendência educacional mais preocupada com o desenvolvimento dos estudos científicos. Além de aulas avulsas, existiam os seminários e colégios mantidos por ordens religiosas, escolas e professores particulares e os recém-criados liceus das províncias. Porém, o objetivo comum desses estabelecimentos era a preparação para o ingresso nas Academias Militares e Escolas Superiores e ministravam somente aulas das disciplinas e conteúdos que eram exigidos pelos exames de seleção. Sendo assim, mais uma vez a Matemática acabava ficando restrita simplesmente a um limitado estudo da aritmética e geometria. Em 1827, a partir da carta outorgada por D. Pedro I em 1824, a Lei de 15 de Novembro cria as escolas primárias, que dentre outras coisas, estabelecia a gratuidade do ensino primário e que os professores ensinassem a ler, a escrever e a contar. Segundo Valente (1999, p.111), o texto original foi modificado a partir de debates na Câmara ficando a sugestão “ensinada a resolução prática de problemas da geometria elementar”. Em 1837, com a criação da primeira escola secundária pública o Colégio Pedro ll, no Rio de Janeiro foi apresentado um plano gradual e integral de estudos, em Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 45 que os alunos passariam a ser promovidos por série. Nesse plano de estudo, predominavam as disciplinas clássicohumanista, porém, as matemáticas, as línguas modernas, as ciências naturais e físicas e a história também fariam parte. No ano de 1890, o Sistema Educacional Brasileiro passou por uma reforma que ficou conhecida como Reforma Benjamin Constant. Na proposta dessa reforma, sete anos eram reservados para o ensino secundário e contemplava no seu currículo todas as partes que compõem a Matemática. Tal proposta foi muito criticada e o ensino continuou a ser entendido como uma preparação para as profissões liberais. A partir de 1930 iniciou-se uma proposta educacional conhecida como Movimento da Escola Nova. Algumas idéias básicas dessa corrente era o “princípio da atividade” e o “princípio de introduzir, na escola, situações da vida real”. Essas idéias provocaram mudanças no ensino das séries iniciais, e em especial no ensino da Matemática. Segundo Miorim (1998, p. 94) o objetivo do ensino de Matemática deixava de ser apenas o “desenvolvimento do raciocínio”, conseguido através do trabalho com a lógica dedutiva, mas incluída, também, o desenvolvimento de outras “faculdades” intelectuais, diretamente ligadas à utilidade e aplicação da Matemática. 46 Para que esses objetivos tornassem reais era necessário um ensino orientado de acordo com o grau de desenvolvimento mental, baseado no interesse do aluno, que deveria partir da intuição e apenas aos poucos ir introduzindo o raciocínio lógico, que enfatizasse a descoberta, e não a memorização. No entanto, esse ensino (da Matemática) deparou-se com muitas resistências, primeiramente por parte dos professores que não se sentiam seguros para ensinar a Matemática proposta, pois não havia material didático. Mas, na realidade, o maior problema enfrentado pela modernização partiu dos defensores do ensino clássico que criticavam o excesso de assuntos a serem desenvolvidos nas escolas. Até matemáticos clássicos criticavam essa forma de ensino moderno cujo ensino caracterizava-se por três aspectos, relatados por Sangiorgi (1964, p.6): 1º usar, por intermédio dos conjuntos e das relações, a linguagem que a estrutura mental, inata em cada um de nós, está a “pedir”; 2º dinamizar o pensamento lógico, aproveitando as analogias existentes nas diversas disciplinas que se estuda; 3º criar uma situação matemática através da correspondência revelada entre um sistema mental e um sistema matemático. Sabe-se que a Matemática Moderna não conseguiu resolver o problema do ensino da disciplina, que aconteceu de forma lenta e pausada. Segundo Helmer (2005, p. 106). O fracasso da Matemática Moderna aconteceu por não conseguir superar a abordagem pragmática e mecanicista da Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Matemática, contribuindo para a desestruturação do caráter cultural e instrumental na resolução de problemas, ou seja, a Matemática Moderna não conseguiu dotar o aluno de “capacidades” de aplicação dos conhecimentos adquiridos, tanto dentro da Matemática como na vida. Alguns professores alertaram para os riscos do movimento. As poucas pesquisas realizadas para identificar possíveis deficiências desse modelo contribuíram para a ineficiência e o fracasso do Movimento, entretanto, suas marcas ainda ecoam na educação matemática atual. 2 O Ensino da Matemática nos Dias Atuais A partir do desenrolar da história do ensino da matemática verifica-se que sempre existiram pessoas e/ou grupos que se preocupavam em fazer com que a matemática fosse aprendida desde as séries iniciais e que essa ciência fosse uma reflexão da prática cotidiana. Para os educadores atuais inúmeras barreiras ainda existem. Uma delas se encontra no poder que a escola possui de reproduzir o que a classe dominante pensa que é correto, não permitindo assim que os educandos sejam capazes de pensar criticamente a vida cotidiana, tornando-se sujeitos do sistema e reproduzindo o senso comum. Outra barreira encontra-se na própria formação do docente. Os professores que lecionam para o ensino infantil e séries iniciais de Ensino Fundamental são polivalentes, ou seja, lecionam todas as disciplinas (na maioria das escolas), não são licenciados em Matemática, possuem for mação em Pedag ogia, que dependendo da instituição habilitam-se para lecionarem de 1ª a 4ª série, Ensino Fundamental, Escolas especiais e Educação Infantil. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Matemática (2000, p. 24), nos afirmam que: Parte dos problemas referentes ao ensino de Matemática estão relacionados ao processo de formação do Magistério, tanto em relação à formação inicial como à formação continuada. Decorrente dos problemas da formação dos professores, as práticas na sala de aula tomam por base os livros didáticos, que, infelizmente, são muitas vezes de qualidade insatisfatória. Ainda, segundo o PCN de Matemática o professor deve “ter clareza de suas próprias concepções sobre Matemática, uma vez que a prática em sala de aula, as escolhas pedagógicas, a definição de objetivos e os conteúdos de ensino e as formas de avaliação estão intimamente ligadas a essas concepções” (2000, p. 37). Logo, em sua prática, os professores terão dificuldades no ensino e aprendizagem dessa disciplina. Sem contar que, por serem polivalentes, poderiam utilizar isso a seu favor, trabalhando interdisciplinaridade e, assim, aplicando conhecimentos matemáticos em todas as outras disciplinas que compõem o currículo escolar do Ensino Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental. Conforme Sadovsky (2007, p.16). Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 47 O principal problema dos professores, argentinos ou brasileiros, é a formação insuficiente. Não discuto se ela é boa ou ruim, mas tenho certeza de que é insuficiente porque os conteúdos são, hoje, mais complexos. Há 40 anos, esperava-se que um professor de Matemática ensinasse cálculos. Hoje as calculadoras fazem essa tarefa e a sociedade espera desse professor outras competências que possibilitem a formação de crianças autônomas, capazes de ler diferentes formas de representação e de elaborar idéias para novos problemas, além daqueles abordados em sala de aula. Isso tudo requer um profissional com pleno domínio do conteúdo. A questão é que o profissional polivalente (que atua nos primeiros anos da Educação Básica) não tem oportunidade de adquirir esse domínio em quatro anos de formação. [...] É preciso investir na formação continuada. 48 Os estudantes, após completarem as quatro séries iniciais, são inseridos em uma escola com “especialistas”, pois, a partir da 5ª série do Ensino Fundamental, as aulas são ministradas por um professor habilitado na área específica. Até pouco tempo, a disciplina de Matemática nas séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio era ministrada, em maior parte, por pessoas formadas em outras graduações como Ciências Contábeis, Administração e Economia. E assim, os contadores, administradores, economistas e outros, tornam-se educadores, muitas vezes com pouco ou sem nenhum conhecimento de conteúdo e, principalmente didático. Na realidade são muitas as exigências aparentes quanto ao ensino da Matemática, porém, os professores possuem pouco apoio didático, especializado e financeiro para se adequarem a essas exigências. Assim, os educadores em Matemática podem não ser responsáveis por essa situação, porém, tem o compromisso pela mudança da mesma. Sabe-se que somente com luta organizada, a mudança é possível. 3 O Fracasso Escolar e o Papel do Professor na Educação Em 1996, foram divulgados os resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) realizado em 1995, indicando que os alunos da 4ª série do ensino fundamental apresentaram um índice de rendimento correspondente a 29,5% do que deveriam saber sobre a disciplina de Matemática (CUNHA, 1999). No decorrer dos tempos os alunos tem tomado um verdadeiro temor à Matemática, o que contribui para um número significativo de evasão escolar. Isso se dá pelo fato dos alunos não conseguirem apreender conhecimentos matemáticos e, conseqüentemente, pensarem que a escola seria lugar para uma minoria dominante da sociedade. De acordo com o Guia Curricular (1997): O ensino da Matemática, ao longo dos anos, tem sido considerado o grande responsável pelo fracasso Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 escolar e, conseqüentemente, vem atuando como gerador da exclusão de significativa parte do alunado, conferindo à escola um papel elitista e discriminatório (apud CUNHA, 1999, p. 63). Uma escola tradicional caracteriza-se por separar objetivos: ensina-se primeiramente o conteúdo, mostrando toda a nomenclatura; em seguida aplicam listas e listas de exercícios de fixação para depois utilizarem o material concreto, buscando uma “certa compreensão” do aluno para aplicar a eles “problemas de aprofundamento”. O mais comum nessas escolas é a explicação do conteúdo terminando em exercícios de fixação (NETO, 1998). É importante salientar que os conteúdos de matemática deveriam ter como objetivo destinar aos alunos capacidades que os ajudarão a serem práticos e a terem competência para interpretar e agir sobre aspectos matemáticos referentes ao ambiente em que estão inseridos. Em muitas escolas, o ensino da Matemática se reduz à aplicação de conteúdos, símbolos, regras, expressões, fórmulas, técnicas e uso destes conteúdos em atividades de fixação onde não há contextualização. Concordando com Cunha (1999, p.64), “o ensino de Matemática, no Brasil, tem passado por mudanças, porém não muito significativas, a ponto de reverter a situação de descontextualização e de reprodução atribuídas à escola”. Sabemos que esse tipo de ensino favorece apenas à memorização, não contribuindo para a verdadeira aprendizagem. 3.1 O Papel do Professor na Educação Matemática A familiarização entre Matemática, os problemas e as necessidades sociais exige não só o domínio dos conteúdos de Matemática como também de ensinar. Por isso, é importante que o professor esteja ciente da sua função e que não trabalhe com indiferença. Além disso, as escolas pouco investem em atividades para o aprendizado do cotidiano. No jornal “A Gazeta”, no dia 25 de março de 2007, p. 11, o educador e pesquisador Júlio Machado, especialista em educação, critica dizendo que “[...] as escolas deixaram de ser educandários para ser estabelecimentos de ensino [...]. Os professores estão desmotivados porque perderam o senso da missão, transfor mando-se em um mero repassador de conteúdos [...]”. No momento em que o professor de Matemática for apenas um “repassador de conteúdos”, o próprio aluno fica desmotivado a estudar por não conseguir visualizar a importância de aprender matemática e isso atinge diretamente na e d u c a ç ã o. O p r o f e s s o r p r e c i s a conscientizar-se de que um dos objetivos da educação matemática é aprender a valorizar o raciocínio lógico e argumentativo; incentivar o hábito de fazer uso de seu raciocínio e motivá-lo a resolver problemas que valorizem a criatividade e admitam a arte de aplicar meios e recursos pessoais de pesquisa para alcançar o objetivo. Concordando com Castelluber (2003, p. 162) “as concepções, os saberes, as práticas, as atitudes, as vivências do profissional docente influenciam a forma como os currículos são levados à prática.” O professor precisa motivar o aluno a Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 49 buscar conhecimentos, levando-o a participar de uma diversidade de situações que lhe permita descobrir, identificar, construir, reconstruir, tratar teoricamente e perceber a natureza dinâmica do conteúdo matemático (CUNHA, 1999). Tudo isto para que reforce a capacidade crítica, a curiosidade e a insubmissão, para que sejam formadores de opinião, já que ensinar a pensar certo é um saber indispensável à prática docente (FREIRE, 2001). Assim, a respeito do ensino da Matemática: [...] o ensino da Matemática deve ir além de simples técnicas para sua compreensão (imediata); ele deve oferecer meios que g arantam ao aluno uma compreensão verdadeira dos conteúdos ensinados, através de reflexões, análises e constr uções, visando sua aplicação no cotidiano. Esta aplicação não está apenas no fato de executar cálculos do diaa-dia, mas de realizá-los de modo a compreender e analisar o que se está calculando (GUIA D E E S T U D O D E MATEMÁTICA, 1997, apud CUNHA, 1999, p. 65). 50 Tentar reverter esse quadro exige, certamente, clareza sobre: qual aluno queremos formar? E, consequentemente, uma redefinição do papel do professor, novos objetivos, conteúdos e estratégias metodológicas, de forma a conseguirmos mudanças significativas. O professor precisa compreender que a resolução de problemas ocupa um lugar de muita importância quando usado como uma atividade que realça os conteúdos matemáticos escolares. A prática da resolução de problemas no ensino da Matemática é importante porque contribui para o desenvolvimento do pensamento criativo e flexível, levando o aluno a encontrar várias possibilidades de solução além de possibilitar a aprendizagem de conteúdos que são significativos para a vida, desenvolvendo o pensar da realidade no modo matemático. Segundo os PCNs: O fato de o aluno ser estimulado a questionar sua própria resposta, a questionar o problema, a transformar um dado problema numa fonte de novos problemas, evidencia uma concepção de ensino e aprendizagem não pela mera reprodução de conhecimentos, mas pela via da ação refletida que constrói conhecimentos (PCN de Matemática, 2000, p. 45). É necessário lembrar que os problemas devem ser desafiadores e interessantes, a fim de que haja motivação para se buscar uma forma de resolvê-los. Ao contrário daqueles problemas que são como exercícios das operações e que só são solucionados dentro de um esquema aprendido, ou seja, por meio de repetições, como em exercícios de memorização. É preciso estar ciente de que muitas vezes o que interessa aos professores pode não interessar aos alunos, surgindo assim a necessidade de trabalhar de forma diversificada. A resolução de problemas e os jogos (o jogo pode ser considerado como um problema em movimento) Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 desenvolvem o pensamento, linguagem e afetividade ao interagir professor e aluno (MOURA et al, 2006). Segundo Marcilino (2005, p. 14): Resolução de Problemas tem um papel importante no ensino da matemática, pois envolve além dos aspectos metodológicos uma mudança de postura do que é ensinar e aprender. A Resolução de Problemas deve ser trabalhada i n ve s t i g a n d o o a l u n o a desenvolver suas capacidades de interpretação, formulação de hipóteses, conceitualização e criatividade. O u s o d e i m a g e n s m e n t a i s, representações, diagramas, descrições mentais e até mesmo operações gestuais são sugestões de Vigotsky e do pesquisador canadense Claude Janvier para se chegar à compreensão da situação matemática envolvida ou do problema a ser resolvido (MOYSÉS, 2000). Para a educação alcançar um nível elevado de qualidade, é necessário aperfeiçoar o conhecimento sobre o processo ensino-aprendizagem de forma a torná-lo capaz de responder às exigências deste novo tempo onde todos esperam respostas para a superação das dificuldades encontradas. O professor precisa ter precaução ao usar conhecimentos e linguagens próprios de uma única classe social, propiciando que apenas os estudantes desta classe obtenham êxito. Uma das exigências da educação docente é tornar real a forma que se fala. O modo de falar do professor e sua realidade precisam estar em coerência e o professor precisa estar sempre disposto a mudar seu modo de pensar em favor da aprendizagem (FREIRE, 2001). É preciso compreender que “ser professor de Matemática é, antes de tudo, ser professor, [...] ser professor é preocupar-se com o ser do aluno, tentando auxiliá-lo a conhecer algo que ele, professor, já conhece e que julga importante que o aluno venha a conhecer, também” (BICUDO, 2005, p. 48). É necessário que o professor se preocupe em conhecer o aluno. Daí surge a procura pelo modo de ser desse aluno que está ali para ser auxiliado, onde seu modo de ser está ligado ao mundo onde vive. Esta procura deve persistir ao longo de todo o trabalho docente, tentando compreender a situação de vida desse aluno. Portanto, o professor de matemática relaciona o ser do aluno com o ser da própria matemática, apresentando diferentes modos de trabalhar e de expressar o conhecimento adquirido, relacionando com várias outras áreas do conhecimento. Então, para que o professor desempenhe um bom trabalho, será necessário uma constante atualização em sua área de atuação e nas demais que contribuem e fazem ligação com a prática pedagógica. O profissional deve estar disponível a assumir novas práticas e metodologias, além de ser criativo e competente em relação ao domínio dos conteúdos a favor da aprendizagem do aluno. 4 Didática da Matemática 4.1 Conceitos da Matemática Didática da Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 51 A educação matemática se transformou, atualmente, em uma grande área de pesquisa, cujo enfoque é compreender, interpretar e descrever fenômenos ligados ao ensino-aprendizagem da Matemática, tanto em sua extensão teórica quanto em sua extensão prática. Entre as diferentes tendências que constitui a educação matemática, destacamos a didática da matemática. A compreensão da definição de didática da matemática é necessária. Segundo Pais (2001, p.11), a didática da matemática é: [...] uma das tendências da grande área de educação matemática, cujo objeto de estudo é a elaboração de conceitos e teorias que sejam compatíveis com a especificidade educacional do saber escolar matemático, procurando manter fortes vínculos com a formação de conceitos matemáticos, tanto em nível experimental da prática pedagógica, como no território teórico da pesquisa acadêmica. 52 A extensão teórica é resultante de várias pesquisas e a prática é o veículo do fazer pedagógico. Isso indica que deve haver interação entre os elementos do sistema didático que constitui em professor, aluno, conhecimento, planejamento, objetivos, recursos didáticos, instr umentos de avaliação, uma concepção de aprendizagem e metodologia de ensino; resumindo, a essência da disciplina didática, indispensável para a prática pedagógica. Para compreender as muitas ligações que há entre a teoria e a prática, torna-se necessário entender os conceitos didáticos nos quais se destinam a favorecer essa compreensão. 4.2 Transposição Didática O estudo do processo evolutivo por qual passa os conteúdos da educação matemática é uma das questões essenciais da noção de transposição didática, no qual pode ser vista como um caso especial de transposição dos saberes. Segundo Pais (2001, p.18) a noção de transposição, [...] pode ser analisada no domínio mais específico da aprendizagem para caracterizar o fluxo cognitivo relativo à evolução do conhecimento, restrita ao plano das elaborações subjetivas, pois é nesse nível que ocorre o núcleo do fenômeno. A conveniência em destacar essa dimensão da transposição de conhecimentos anteriores para a aprendizagem de um novo conceito. No desenvolvimento de toda prática educativa é necessária a seleção dos conteúdos que fazem parte do programa escolar. O conjunto desses conteúdos, conhecido também como saber escolar provém do saber cientifico o qual passa por um processo de transformações que determinam características particulares. Segundo Chevallard (1991) na definição para transposição didática: U m c o n t e ú d o d o conhecimento, tendo sido designado como saber a ensinar, sofre então um conjunto de transformações adaptativas que vão torná-lo apto a tomar lugar entre os “objetos de ensino”. O “trabalho”, que de um objeto da Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 saber a ensinar faz um objeto de e n s i n o, é ch a m a d o d e transposição didática (apud PAIS, 2001, p. 19). Concordando, esse processo seletivo ocor re através de uma extensa organização de influências, envolvendo diversos segmentos do sistema educacional que se constituem em cientistas, professores, especialistas, políticos, autores de livros e outros agentes da educação. Esses segmentos exercem também uma influência na hora de determinar os objetivos, valores e métodos que orientam o processo de ensino. A noção de transposição didática pode ser analisada a partir do saber científico, do saber a ensinar e do saber ensinado. O saber científico está inteiramente ligado no que é desenvolvido em instituições de pesquisa e universidades, mas sem nenhum tipo de relação com o ensino fundamental e médio. Os seus valores são sustentados pela cultura cientifica e apresenta-se através de artigos, teses, relatórios de pesquisa e livros especializados. O saber a ensinar está relacionado a aspectos que diz respeito ao interesse da atividade educacional. Segundo Pais “trata-se de um saber ligado a uma forma didática que serve para apresentar o saber ao aluno” (MACHADO et al, 2002, p. 23). O saber a ensinar se apresenta quase sempre em livros didáticos, programas e outros materiais de apoio. O saber ensinado trata daquele que é registrado no plano de aula do professor onde nem sempre coincide com aquele previsto nos objetivos planejados e isto tudo por causa dos desafios encontrados no processo de ensino no contexto da sala de aula. 5 Considerações finais A Matemática tem um papel fundamental: o de aumentar as capacidades intelectuais, compondo o pensamento e facilitando o raciocínio lógico dedutivo no estudante, porém percebe-se que essas faculdades mentais não estão sendo desenvolvidas. Existe uma série de fatores que levam a esse diagnóstico, assim como a formação dos professores e o próprio desenrolar da história, onde o ensino da Matemática sempre teve grandes obstáculos para se concretizar. A deficiência didática do professor de Matemática pode ser considerado como o principal fator que gera esta situação de descontento com a matemática apresentada na sala de aula. Este ensino se revela numa matemática mecânica que não contribui para um verdadeiro conhecimento exigido do mundo globalizado. Pais (2001, p. 28), nos diz que: A educação escolar deve se iniciar pela vivência do aluno, mas isso não significa que ela deva ser reduzida ao saber c o t i d i a n o. N o c a s o d a Matemática, consiste em partir do conhecimento dos números, das medidas e da geometria contextualizados em situações próximas do aluno. Assim, o ensino não pode reduzir-se a cópias fiéis do mundo real, como é o caso de professores que simulam mercadinhos, aplicam jogos e repetem vários exercícios para memorização. Não que isto seja errado, porém deve ser algo tomado com muito cuidado de forma que, aí, estejam realmente engajadas concepções matemáticas que Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 53 contribuirão para a formalização do ensino de Matemática. A formação pelo qual passa o professor nem sempre tem sido satisfatória e por isso, muitas vezes, o mesmo não consegue desenvolver aulas atraentes e voltadas para a prática dos conteúdos científicos estudados, pois estes são de suma importância para o desenvolvimento do pensamento matemático. Além disso, percebe-se que muitos professores que lecionam nas séries iniciais do ensino fundamental não se identificam com a disciplina de matemática e mesmo assim são obrigados a ensiná-la por serem polivalentes. Isso resulta em uma matemática “mal ensinada” onde os estudantes não sentem nenhum prazer em aprendê-la. Os educadores não podem ficar parados diante desta situação. Apesar de não terem disponíveis materiais que favorecem à prática do ensino da matemática, deve-se buscar livros didáticos e outros métodos de ensino, para assim conseguirem desenvolver um ensino de qualidade voltado para a necessidade do mundo atual. Um outro fator que também contribui para este fracasso é a deficiência didática. Assim, é evidente que uma boa formação acadêmica, materiais didáticos adequados e professores comprometidos com o ensino são importantes e necessários para mudar esta realidade. 54 9 Referências BICUDO, Maria Aparecida Viggiani. Educação matemática. 2. ed. São Paulo: Centauro, 2005. BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: matemática. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. CASTELLUBER, Arildo. 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MARCILINO, Ozirlei Teresa. Ensino e aprendizagem na educação índigena do Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Espírito Santo: a busca de um diálogo com a etnomatemática. Dissertação de mestrado, PPGE/UFES, 2005. MIORIM, Maria Ângela. Introdução à história da educação matemática. São Paulo: Atual; 1998. MOURA, Anna Regina Lanner et al. Resolver problemas: o lado lúdico do ensino da matemática. Brasília: MEC, 2006. Coleção Pró Letramento, fascículo 8. MOYSÉS, Lúcia. Aplicações de Vygotsky à educação matemática. 2. ed.Campinas: Papirus, 2000. VASCONCELLOS, Celso do Santos. Para onde vai o professor?: resgate do professor como sujeito de transformação. 8 ed. São Paulo: Libertad, 2001. WATANABE, Renate. Nossos alunos sabem pensar? Revista do Professor de Matemática, São Paulo, n. 62, p. 12, 1º quadrimestre 2007. WEINBERG, Mônica. Assim vai mal: Um ranking de educação junta-se a outros para mostrar que o Brasil precisa tomar jeito. 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Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 55 José Renato Auler CONFRONTO DOS PRINCÍPIOS CONTÁBEIS VERSUS GLOBAL REPORTING INITIATIVE (GRI) Resumo Mestre em Contabilidades Gerencial pela FUCAPE Instituto de Ensino Superior da Região Serrana Rua Hermann Roelke, 230 - Centro Santa Maria de Jetibá - ES - Brasil - CEP 29645-000 E-mail: [email protected] Em um mundo de transformações sócio-ambientais busca-se a harmonia entre o desenvolvimento econômico e o meio ambiente. Entende-se que o desenvolvimento sustentável é satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades. Isto requer dos contadores uma nova postura na publicação dos demonstrativos financeiros sobre as ações desempenha pelas empresas. Assim, busca-se relacionar, por meio do confronto dos princípios fundamentais de contabilidade com os elaborados pelo (GRI), se essas regras contêm aderência e conformidade com as normas contábeis. Palavras-chave: princípios contábeis versos GRI, relevâncias das informações. Introdução 56 O atual cenário econômico força cada vez mais as empresas a adotarem políticas e posturas responsáveis diante do meio ambiente. A entidade que pretende ser competitiva na era ambiental deve possuir uma relação harmoniosa com o meio sócio-econômico, procurando sempre demonstrar em seus relatórios e seus demonstrativos suas atitudes e ações de responsabilidade operacional, social e ecológica. Observa-se, que poucas Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 empresas no Brasil utilizam a contabilidade ambiental na sua gestão empresarial, mas a incluem em seus relatórios. Portanto, o objetivo da realização deste estudo é verificar por meio do confronto dos princípios fundamentais de contabilidade com os princípios em elaboração do GRI na conformidade das regras dos mesmos. A integração dos critérios contábeis com os ambientais requer uma nova postura das entidades econômicas para padronizar os procedimentos dos princípios ambientais. Esse novo pensamento precisa ser acompanhado por uma mudança de valores, passando da expansão para a conservação, da quantidade para a qualidade, da dominação para a parceria. Para que haja uma plataforma integrada dos princípios contábeis com os ambientais, criou-se o GRI, que busca elaborar e definir as diretrizes para elaboração de relatórios de sustentabilidade aplicáveis globalmente e voluntariamente. A gestão ambiental e social das empresas deve adequar-se a um desenvolvimento que seja sustentável economicamente, socialmente e ecologicamente. Precisa contar com executivos e profissionais holísticos nas organizações públicas e privadas que incorporem as diretrizes dos princípios dos relatórios do GRI, com novas tecnologias de produção, regras de decisão estruturadas e um conhecimento sistêmico exigido no contexto em que se inserem. Daí surge a seguinte questão de pesquisa: confrontar os princípios fundamentais de contabilidade por meio da resolução CFC NE 750, de 29 de dezembro de 1993, com os princípios elaborados pelo GRI. Assim, o objetivo deste artigo é relacionar por meio do confronto dos princípios fundamentais de contabilidade com os em elaboração do (GRI), se essas regras contêm aderência e conformidade com as regras contábeis. A contabilidade e a gestão ambiental produzem discussões em várias áreas sociais e empresariais - pois a preocupação em preservar o planeta é cada vez maior. Dentro desse contexto, será analisado o conteúdo dos princípios contábeis com os ambientais no que condiz com a integração aos parâmetros contábeis. Nota-se que, falar em conservar o meio ambiente não é mais opção, tornou-se uma necessidade. Martins e Ribeiro (1995, p.38): ... cabe a todas as áreas científicas e profissionais atuar na preservação e proteção ambiental. A área contábil pode e deve empenhar-se para que seus instrumentos de informação melhor reflitam o real valor do patrimônio da empresa, inclusive sobre o aspecto ambiental, dado que grande parte das alternativas que se tem apresentado para o seu controle e preservação são mensuráveis, portanto, passíveis de contabilização e informação à sociedade. Segundo Donaire (1995, p.106) “essas duas áreas, empresa e meio ambiente, devem trabalhar em sintonia para obtenção de uma melhor avaliação financeira da questão ambiental”. Logo, a contabilidade, os demonstrativos financeiros e outros relatórios anuais auxiliam este assunto por meio da identificação de valores de despesas Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 57 efetuadas pela empresa em relação à degradação e à poluição ambiental, bem como as implicações financeiras resultantes da preservação do mesmo. O momento vivenciado no cenário econômico, social e ambiental é extremamente dinâmico. O surgimento da globalização e a competição das organizações econômicas trouxeram à margem a necessidade de harmonização contábil em todo planeta. A contabilidade é considerada uma poderosa ferramenta para este processo de adequação e de harmonização, mas o que se observa na atual conjuntura das empresas do país é um baixo grau de conhecimento e aplicação da contabilidade ambiental. Este é o momento de adaptar-se a essa nova necessidade de sobrevivência no mercado mundial. Já que os princípios em elaboração do GRI, que serão aqui confrontados, parecem ter grande semelhança com a teoria usada pela contabilidade, tendo o profissional mais uma área de trabalho que poderá ser integrada ao nosso sistema contábil. Este enfoque de conservação e proteção do meio ambiente desloca, assim, a dimensão ambiental da visão em função de produção para se tornar parte na operacionalização da contabilidade e da administração. Objetivo da Informação Contábil 58 Nos primórdios da humanidade o homem passou a sentir necessidade de controlar seu patrimônio no instante em que passou a inventariar seus bens de forma rudimentar, surgia, de fato, a contabilidade como forma singela de controle e informação direcionada ao indivíduo de seu patrimônio. A contabilidade é considerada um sistema de informações que tem como objetivo auxiliar no processo de gerenciamento das entidades para que estas possam garantir sua continuidade. Para Iudícibus (2000, p.23) “o objetivo básico da contabilidade pode ser estabelecido como sendo o de fornecer informações econômicas para vários usuários de forma que propiciem decisões racionais”. Pode-se denominar a contabilidade como um complexo conjunto de normas, regras ou princípios, baseados em conhecimentos derivados da pesquisa, sendo essa caracterizada um processo metodológico representado por vários modelos, que tornaram úteis, por meio de hipóteses já testadas. Entende-se que a teoria é essencialmente um conjunto de hipóteses aceitáveis. A abordagem da contabilidade consiste em fornecer informações relevantes diferenciadas aos vários extratos de usuários. Essa base de dados contábil para ser útil à tomada de decisão, precisa ser simultaneamente confiável e tempestiva, mas na maioria das vezes tais relatórios não podem ser igualmente elevados, por terem suas próprias características, muitas vezes opostas. Diante dessa posição a informação contábil, em algum nível de sua operação dos eventos terá que combinar tais qualidades de uniformidade, em graus variados para não abdicar a uma delas em favor da outra. Desta forma, a suposição é de que a informação com essas características de preservação é vantajosa para a sociedade. Hendrinksen e Breda (1999, p.99) “a acumulação, a sintetização e a publicação subseqüente de informações contábeis deve ocorrer com Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 a maior rapidez possível para garantir a disponibilidade de dados atualizados aos usuários”. As demonstrações financeiras constituem uma forma de comunicação da empresa para com seu meio econômico, social e ambiental. Essa adaptação entre os dois pólos do processo empresa e usuários é importante ao pleno desenvolvimento da entidade e do mercado como um todo, isto para tomada de decisões racionais pelos agentes econômicos e stakeholders da informação podendo avaliar o adequado desempenho e continuidade da organização. A partir da constatação de que a informação contábil é útil, imediatamente ela deverá ser absorvida pelo mercado, isto é, a capacidade que a base de dados da contabilidade tem para fazer a diferença numa decisão. Quando se precisa tomar uma decisão e o conhecimento adquirido consegue fazer suprir suas necessidades naquele momento. O aspecto importante neste contexto diz respeito à contabilidade como instr umento fundamental no processo de mensuração e meio de divulgação ou, como tal, não pode dar margem à confusão ou interpretação equivocada. Dentro do processo de comunicação feito pela contabilidade, deve-se evitar os ruídos provocados por falhas na evidenciação dos eventos que possam existir no sistema contábil. Os conceitos e as demonstrações financeiras devem ser claros e concisas, de modo a serem corretamente entendidos pelos usuários. Pode-se perceber que a contabilidade não é propriedade do contador e nem a ele se destina. Compete a este importante profissional comunicar da forma mais apropriada e objetiva possível, a informação que possa auxiliar os tomadores de decisão. Deve essa informação ser simultânea, relevante, comparável, confiável, material e publicada - dentro dos devidos prazos, analisando o seu custo, benefício e também seu valor preditivo e como feedback. Segundo Hendriksen & Breda (1999, p. 97 e 98) há dois valores: Valor preditivo: ajuda o usuário a aumentar a probabilidade de prever corretamente o seu resultado de eventos passados ou presentes. Como? Se as informações causam reações, dados diferenciados, ações também serão diferentes. Não há uma mesma visão onde temos vários ângulos a serem observados. Valor como feedback: a informação tem papel de confirmação ou correção de expectativas anteriores. A informação a respeito do resultado de uma decisão, freqüentemente, é um dado essencial para a tomada da decisão. De que for ma, se não a simetria informacional a todos os usuários, permitindo que se façam um ajuste estratégico de seus investimentos. O foco da demonstração de relatórios da contabilidade está intimamente ligado no processo da informação ambiental, pois a empresa depende da sociedade e do meio ambiente para manter sua o p e r a c i o n a l i d a d e e m m a r ch a e continuidade no seu sistema econômico. Objetivo da Informação Ambiental A contabilidade é considerada um sistema de elementos em interação de informações com o objetivo de auxiliar os gestores empresariais e os usuários externos em seus investimentos Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 59 financeiros. Portanto, a área contábil pode ser caracterizada como sendo o de fornecer informações estruturadas de natureza econômica, financeira e física, de produtividade social e ambiental, isto para os usuários internos e externos. Segundo RIBEIRO (1992, p.56): ... a contabilidade, enquanto instrumento de comunicação ambiental e avaliação patrimonial, considerando os riscos e benefícios ambientais inerentes as peculiaridades de cada atividade econômica, bem como sua localização, poderá empresas e sociedade, estar inserida na causa da conscientização dos diversos segmentos de usuários das demonstrações contábeis sobre a conduta administrativa e operacional da entidade, no que tange o empenho da organização sobre a questão. 60 A contabilidade como sistema de informação deve preocupar-se em fornecer aos usuários maior clareza e transparência nos seus relatórios e notas e x p l i c a t iva s, r e f e r e n t e s à s u a responsabilidade sobre questões sócioambientais. A contabilidade ambiental é uma convivência eficaz que deve existir entre o capital e a natureza, e, esta é uma concepção que vem ganhando cada vez mais vigor. Pode-se notar que a própria pressão da sociedade faz com que a realidade se torne uma regulamentação com princípios, onde a publicação das informações de relatórios sejam mais fidedignas referentes às suas obrigações socioeconômicas. Diante da grande mobilização no mundo em defesa da preser vação do planeta, o GRI desenvolveu trabalhos em torno de diretrizes para a elaboração de relatórios d e s u s t e n t a b i l i d a d e , a p l i c á ve i s globalmente e voluntariamente. Esse é o desafio que o mundo enfrentará neste novo milênio de fazer com que as forças de mercado protejam e melhorem a qualidade do meio ambiente, com a ajuda de padrões baseados no desempenho e uso criterioso de instr umentos econômicos, num quadro harmonioso de r e g u l a m e n t a ç ã o. E s t a s s ã o a s características e as posturas do GRI, criar princípios ambientais voltados à expectativa de interagir com organizações que sejam éticas, com boa imagem institucional no mercado e que atuam de forma ecologicamente responsável. Global Reporting Initiative (GRI) É um acordo internacional, criado com uma visão a longo prazo, multistakeholder, cuja missão é criar e difundir as diretrizes para elaboração de relatórios de sustentabilidade aplicáveis globalmente e voluntariamente, pelas entidades que desejam dar informações sobre os aspectos econômicos, ambientais e sociais das suas atividades, produtos e serviços. O desenvolvimento sustentável implica usar os recursos naturais renováveis de maneira a satisfazer as necessidades da sociedade, sem degradá-los ou diminuir sua utilidade para as gerações futuras. Diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade - (2006). O GRI visa ajudar as organizações a elaborar os relatórios de modo que: ? Apresentem uma visão clara do Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 impacto ecológico e humano da empresa, para apoiar a tomada de decisão fundamentada quanto aos investimentos, compras e possíveis alianças; ? Proporcionem infor mações credíveis que sejam relevantes para as suas necessidades e interesses e que proporcionam um maior diálogo entre as partes interessadas; ? Proporcionem uma ferramenta de gestão para apoiar a organização na avaliação e melhoria contínua do seu desempenho e progresso; ? Respeitem critérios externos já estabelecidos e aceitos para elaboração de relatórios e os apliquem consistentemente nos sucessivos períodos informativos para garantir transparência e credibilidade; ? Se apresentem num formato que seja compreensível e que facilite a comparação com relatórios de sustentabilidade de outras organizações; ? Complementem, e não substituam outras formas de comunicação, incluindo financeira; ? Ilustrem a relação entre os três elementos da sustentabilidade – econômico (incluindo, mas não limitado à informação financeira), ambiental e social. Necessidade da GRI Esse órgão internacional tem interesse em criar e orientar relatórios com um conjunto de princípios e práticas comuns e de aceitação geral sobre o que deve ser comunicado – como, quando e onde. Seja qual for a sua filiação, os participantes do GRI partilham do ponto de vista que as informações sobre o desempenho devem ser elevadas até níveis ainda não atingidos de compreensão, credibilidade e exaustividade. Esse é o objetivo do GRI: desenvolver segundo as diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade - (2006). “Princípios de contabilidade da sustentabilidade, globalmente aceitáveis”. Relaçao dos Princípios dos Relatórios do GRI Segundo diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade – (2006), a todas as organizações que preparam relatórios GRI são solicitadas que adotem os princípios de elaboração a seguir: ? Princípio de Identidade: o relatório define claramente os limites da organização às quais são adaptados no relatório (comportamento correto, controle de direção, localização, empresa, grupo); ? Princípio do Âmbito do Relatório: o relatório torna claro o âmbito das atividades reportadas (questões: econômicas, ambientais, sociais ou apenas ambientais) e das explicações quanto a qualquer restrição na comunicação do âmbito; ? Princípio do Período Relatado: tanto quanto possível os impactos, acontecimentos e atividades relatadas são apresentados no período em que ocorrem; ? Princípio de Compromisso Contínuo: os resultados publicados refletem o pressuposto de que a organização relatora pretende continuar a atuar nesta direção num Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 61 futuro previsível, que é um compromisso de continuidade; ? Princípio da Precaução: os relatórios GRI só reclamam crédito para fatos que possam ser diretamente atribuídos à organização relatora. São cautelosos quanto a futuros resultados e expectativas do programa em curso; ? Princípio da Materialidade: a materialidade do demonstrativo, econômico, ambiental e social, depende do que é relevante tanto para as organizações relatoras como para as suas partes interessadas na informação, da evidenciação do conteúdo do relatório de sustentabilidade. Características Qualitativas dos Relatórios GRI 62 Segundo diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade – (2006), as características qualitativas servem para melhorar a credibilidade dos dados reportados no relatório das organizações. Entende-se como característica: ? Relevância: para ser útil, a informação contábil deve ser relevante para a necessidade da tomada de decisão aos diferentes grupos de usuários, reconhecendo as suas diversas expectativas e necessidades. ? Veracidade: a infor mação é confiável quando está livre de erros materiais e dupla interpretação. A característica de veracidade é apoiada por outras características como a validade das descrições, a essência, a neutralidade, a axaustividade e a prudência. ? Validade das Descrições: a via segundo a qual os vários aspectos informais são descritos para uma correta compreensão pelos utilizadores da informação; registrar o fato no momento de sua ocorrência lógica. ? Essência: é importante apresentar a informação de acordo com a realidade econômica e sua essência social e ambiental. ? Neutralidade: os relatórios do GRI não são neutros pela forma que a informação é selecionada, omitida ou apresentada – tem a intenção de influenciar a decisão ou o julgamento. ? Exaustividade: quanto mais e x a u s t iva m e n t e a s q u e s t õ e s econômicas, ambientais e sociais forem cobertas pelo relatório GRI, tanto maior será a sua relevância e a probabilidade de evitar acusações de parcialidade ou arbitrariedade. ? Prudência: a incerteza é o principal fator em todas as formas de divulgação pública das informações. Exercer prudência nos relatórios de sustentabilidade assegura que: - Os resultados incertos em termos econômicos, sociais ou ambientais não são prematuramente reportados (embora a sua discussão seja encorajada); - Os progressos positivos nas questões econômicas, sociais e ambientais não são indevidamente relatados – argumentando, por exemplo, prematuramente que a entidade é de algum modo sustentável. ? Clareza: a audiência dos relatórios ambientais é vasta e diversificada. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 Pede-se às organizações relatoras que assegurem que os seus relatórios sejam entendíveis por uma vasta gama dos usuários da informação; ? Comparabilidade: muitos dos utilizadores dos relatórios querem comparar os dados reportados com os dados anteriores e com os de outras organizações do mesmo setor. Por isso é essencial a consistência no reconhecimento, avaliação e apresentação da informação. ? Periodicidade: para dar aos usuários interessados informação com prazo determinado sobre tendências e resultados, os relatores devem elaborar os seus relatórios com regularidade. ? Verificabilidade: a verificabilidade aumenta a qualidade, utilidade e credibilidade de um relatório de uma organização. A verificação da auditoria independente fornece um grau adicional de garantia e exaustividade acerca da confiança e integridade dos relatórios. Confronto de Princípios Contábeis Versus Ambientais Princípio é a causa da qual algo procede. Tem como finalidade prática servir de guia ou parâmetro para direcionar o registro dos fatos e a elaboração de demonstrações com regras uniformes que facilitem o objetivo da contabilidade, que é o de bem informar. Para Iudícibus (2000, p.47), “os princípios propriamente ditos representam a resposta da disciplina contábil aos postulados, uma verdadeira postura filosófica e prática diante do que antes apenas contemplávamos e admitíamos (os postulados)”. Entende-se que os princípios constituem de fato o núcleo central da estrutura contábil. Procurando distinguir os princípios como regras gerais e não como normas específicas para constituir um lançamento ou a classificação de uma conta numa instituição financeira. Os princípios fundamentais de contabilidade conforme resolução conselho federal de contabilidade NE 750, de 29 de dezembro de 1993, e os princípios elaborados pelo GRI segundo as diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade - (2006), confrontamse com: Princípio da Entidade (CFC NE 750, de 29 de dezembro de 1993) Segundo o Art. 4º - o princípio da entidade reconhece o patrimônio como um objetivo da contabilidade e afirma a autonomia patrimonial, a necessidade da diferenciação de um patrimônio particular no universo dos bens e diretos existentes, independente de pertencer a uma ou um conjunto de pessoa, uma sociedade ou instituição de qualquer natureza ou finalidade, com ou sem fins lucrativos. Por conseqüência, nesta acepção, o patrimônio não se confunde com aqueles dos seus sócios ou proprietários, no caso de sociedade ou instituição. Comentários: observa-se que os dois princípios têm o mesmo objetivo, reconhecer a entidade como uma unidade individual seja ela uma empresa ou um grupo com ou sem fins lucrativos, que ela tenha controle e seja responsável ecologicamente. A entidade, cujo patrimônio ela observa e estuda, registrando os fatos nele ocorridos e fornecendo informações sobre seu Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 63 estado e suas variações. Para Iudícibus (2000, p. 47), a identificação da entidade contábil entende-se como, “a unidade econômica que tem controle sobre recursos, aceita a responsabilidade por tarefas e conduz a atividade econômica”. O Princípio do Âmbito do Relatório (GRI) conforme (Diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade – 2006) Comentários: Este não é um princípio contábil, mas sim, um dos princípios do relatório do GRI e que pode ser comparado com as notas explicativas usadas pela contabilidade para relatar mudanças de critérios contábeis. Forma de evidenciação e dimensionamento da qualidade e clareza da informação para que atendam as diretrizes do relatório e às necessidades dos usuários em determinado período. 64 Princípio da Competência (CFC NE 750, de 29 de dezembro de 1993). Segundo o Art.9º - as receitas e as despesas devem ser incluídas na apuração do resultado do período em que ocorrerem, sempre simultaneamente quando se correlacionarem, independentemente de recebimento ou pagamento. Comentários: O princípio do período relatado (GRI) pode ser comparado com o princípio da competência. Nos quais, todos os impactos ou conseqüências que ocorrerem devam ser reconhecidos no mesmo momento ou período, isto quando são relatáveis e mensuráveis. Esse princípio possibilita um conhecimento muito mais amplo e efetivo sobre a situação da entidade no momento em que eles ocorrerem e não somente quando da movimentação do caixa. Princípio da Continuidade (CFC NE 750, de 29 de dezembro de 1933). Segundo o Art. 5º - a continuidade ou não da entidade, bem com sua vida definida ou provável, deve ser considerada quando da classificação e avaliação das mutações patrimoniais, quantitativas e qualitativas. Comentários: o princípio de compromisso continuo (GRI), tem como base os mesmos parâmetros e objetivos do que o princípio da continuidade. A continuidade é um aspecto relevante a ser rigorosamente observado pelos usuários da informação, já que o simples fato de a entidade ou grupo ser capaz de continuamente realizar suas operações e obrigações ambientais e por si só adicionar valor ao negócio. O empenho em nova tecnologia por efeito menos poluente é um sinal de preservação que ressalta a importância de manter a entidade em marcha, sem degradar o meio ambiente. O Princípio da Precaução (GRI), conforme (diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade – 2006) esse princípio tem como objetivos a cautela e preservação ambiental diante dos fatos que abordaram tal situação em relação ao crédito reclamado da relatora. São cautelosos no processo em desenvolvimento para que não haja desvios do programa em curso. Princípio da Oportunidade (CFC NE 750, de 29 de dezembro de 1933). Segundo o Art. 6º - o princípio da oportunidade refere-se, simultaneamente, à tempestividade e à integridade do registro do patrimônio e das suas mutações, determinando que este seja feito de imediato e com a extensão Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 correta, independente das causas que as originaram. Comentários: O principio da materialidade (GRI): segundo (Diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade – 2006) esse princípio enfoca a mesma linha da contabilidade, onde a informação é considerada como um bem precioso que é demandado avidamente por diversos usuários, pode ser o responsável pelo sucesso ou fracasso de um negócio, percebendo-se assim a importância do seu reconhecimento e registro imediato, pois a natureza não espera por dias melhores. Características qualitativas dos relatórios GRI: (Diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade – 2006) observam as características qualitativas do relatório do GRI, que tem como base melhorar a credibilidade dos dados reportados no seu relatório. Estes quesitos podem ser comparados com as convenções (restrições) contábeis, onde a essência prevalece sobre a for ma, sendo necessários para fundamentar a doutrina e conseqüentemente a técnica contábil, bem como orientar os profissionais da contabilidade na utilização como guia de orientação para execução de seu trabalho. Portanto, podem ser comparados com as características qualitativas. Segundo Hendriksen e Breda (1999, p. 95) “são definidas como sendo as propriedades da informação que são necessárias para torná-la útil”. Os aspectos jurídicos que cercam o patrimônio não devem influenciar ou deixar de relatar a essência econômica, pois o objetivo da contabilidade é o de bem informar. As informações devem atender às expectativas do usuário, trazendo nelas objetividade, facilidade de interpretação e que tenha uma forma lógica e continua. Também, fala-se na neutralidade dos contadores no processo informacional no qual, ele não tem posição frente à empresa e do usuário em forma de tentar beneficiar alguém. Esses dados devem ser publicados sempre dentro dos princípios para que haja comparabilidade dos fatos de um exercício para o outro, e onde o usuário atesta sua relevância e veracidade de suas descrições em seus relatórios. Portanto, define-se comparabilidade como a qualidade da informação que proporciona aos usuários estabelecer semelhanças e diferenças entre dois grupos de fenômenos econômicos. Conclusão A pesquisa teve como objetivo confronto dos princípios fundamentais de contabilidade com os princípios elaboração do (GRI), se essas regras contêm aderência e conformidade com as regras contábeis. Torna evidente que a preocupação com a variável ambiental por parte das organizações é irreversível. A transformação e a influência ecológica nos negócios fazem-se sentir de maneira crescente e com efeitos econômicos muito profundos. Cabe aos profissionais da área contábil empenhar-se para que seus instrumentos de informação melhor reflitam o real valor do patrimônio das empresas, seus desempenhos e, ao m e s m o t e m p o, s a t i s f a ç a m a s necessidades de seus usuários. As organizações deverão implantar os indicadores de sustentabilidade em suas atividades de apoio e operacionais, no qual, podem ser utilizadas em seus portfolios como uma ferramenta de Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 65 marketing, mostrando assim, sua transparência e responsabilidade perante a sociedade e o meio ambiente. Inclusive sob o aspecto social e ambiental, buscando adaptarem-se às diretrizes dos relatórios de princípios elaborados pelo GRI, já que essas têm toda aderência e perfil com os princípios contábeis; estando assim, contribuindo decisivamente para o desenvolvimento sustentável mundial. Conclui-se, que os princípios do relatório do GRI têm toda a aderência com a estrutura contábil, e que juntos, poderão ter maior força para implantarem o desenvolvimento padrão de convivência harmoniosa entre os serem vivos do planeta. Falar em preservar ou conservar o meio ambiente não é mais opção, tornou-se uma necessidade. MARTINS, Eliseu e RIBEIRO, M. de Souza. A Informação como instrumento de contribuição da contabilidade para a compatibilização do desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente. IBRACON, boletim 208, São Paulo, 1995. RIBEIRO, M. de Souza. Contabilidade e meio ambiente. Dissertação (Mestrado) FEA/USP. 1992. Referências DONAIRE, D. Gestão ambiental na empresa. São Paulo: Atlas, 1995. GRI. Diretrizes para a elaboração do relatório de sustentabilidade 2006. Disponível em: < www.aberje.com.br>. Acesso em: 16 ago. 2008. HENDRINKSEN, E. & BREDA, M. F. Van. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 1999. I U D Í C I BU S, S. d e. Te o r i a d a contabilidade. São Paulo: Atlas, 2000. 66 IUDÍCIBUS, S. de. MARTINS, E. e GRLBCKE, E. R. Manual de contabilidade das sociedades por ações. São Paulo: Atlas, 2000. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 NORMAS PARA PUBLICAÇÃO 1 Normas editoriais 1.1 A Revista da Farese: o ponto de vista docente e discente, tem por finalidade divulgar a produção acadêmica do corpo discente e docente gerada a partir das atividades desenvolvidas. A revista é distribuída como permuta para instituições de ensino superior de todo o Brasil. 1.2 Poderão também ser publicadas contribuições enviadas por pesquisadores, professores e alunos de outras instituições de ensino superior em parceria com os professores da instituição, bem como por outros p r o f i s s i o n a i s, i n d e p e n d e n t e d e vinculação institucional, do Brasil e do exterior. 1.3 Os conceitos emitidos serão de responsabilidade exclusiva do (s) autor (es), não refletindo a opinião do Conselho Editorial. prazo de 90 dias, a contar da data de comunicação do resultado da avaliação. Após esse prazo, as contribuições serão eliminadas, garantindo-se nesse processo a total destruição. 1.7 As contribuições publicadas passam a ser propriedade da Revista da Farese: o ponto de vista docente e discente ficando sua reimpressão, total ou parcial, sujeita à autorização expressa dos Editores da revista. Cada autor receberá, gratuitamente, duas separatas do artigo que inclui sua contribuição. 1.8 Serão considerados para publicação trabalhos nas seguintes categorias: a)artigos teórico-científico; b)artigos de pesquisa; c)entrevistas transcritas. 1.9 Ao receber os originais, a Revista da Farese: o ponto de vista docente e discente não assume o compromisso de publicá-los sem antes submetê-los ao processo de avaliação. 2 Avaliação das contribuições 1.4 O texto deve ser inédito e não ter sido enviado a outra revista para publicação. 1.5 Os originais aprovados poderão sofrer alterações de ordem normativa, ortográfica e/ou lingüística, respeitando, porém, o estilo dos autores. Os originais publicados não serão devolvidos aos autores nem as provas finais serão reapresentadas, exceto em caso de extrema necessidade. 1.6 As contribuições recusadas ficarão à disposição do autor responsável pelo 2.1 O Conselho Editorial decidirá sobre a conveniência ou não da publicação dos originais, avaliando-os como totalmente, parcialmente ou não aceitos, bem como poderá sugerir modificações. 2.2 A Revista da Farese: o ponto de vista docente e discente não devolverá os originais. 2.3 As contribuições serão enviadas para avaliação sem identificação da autoria. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 67 3 Encaminhamento 3.1 A contribuição deve ser encaminhada aos editores da revista, acompanhada de: ? Carta de encaminhamento assinada por todos os autores, explicitando: a concordância com as condições e normas adotadas pela revista; e a indicação de apenas um autor como responsável pelo contato, incluindo seu endereço completo, inclusive telefones e endereço eletrônico; ? Declaração de Responsabilidade; ? Termo de Transferência de Direitos Autorais; ? Procedência do artigo com entidade financiadora; 4Estrutura das contribuições 4.1 É recomendável que a contribuição enviada esteja de acordo com as normas da ABNT referentes a artigos em publicação periódica científica impressa (NBR 6022:2203); citações em documentos (NBR 10520:2002); numeração progressiva de documentos (NBR 6024:2003) e resumo (NBR 6028:2003), bem como com a norma de apresentação tabular do IBGE, publicada em 1993 (última edição). 68 4.2 A contribuição deve ser redigida em português, espanhol ou inglês, com estilo de redação claro e coerente na exposição das idéias, observando o uso adequado da linguagem. Deve ser digitada em extensão ".doc" (Word), impressa em três vias e gravada em disquete (3½) ou CD-ROM. Na etiqueta do disquete ou CD-ROM deverão constar: título do trabalho, autoria. 4.3 O texto deve estar configurado para papel A4, digitado em fonte garamond 12, com margens superior, inferior, direita e esquerda de 3cm, folhas devidamente numeradas no canto superior direito, alinhamento justificado, parágrafo em bloco e entrelinha com espaço 1,5. 4.4 Na primeira lauda do texto deverá constar: a)título, digitado na mesma fonte do texto, em tamanho 14, em letras maiúsculas, com alinhamento centralizado e em negrito. Deve ser breve, específico e descritivo; b)nome completo do(s) autor(es), logo após o título na mesma fonte do texto; OBS: A titulação e vinculação institucional, endereço postal completo, telefones e endereço eletrônico dos autores, deve vir inseridos em notas de rodapé da primeira lauda. 4.5 Na segunda lauda deverá constar: a)resumo, de caráter informativo, expondo o objetivo, metodologia, resultados e conclusões da contribuição, contendo até 250 palavras, digitado em espaço simples, estruturado em um único parágrafo; b)palavras chaves, no mínimo 03 e no máximo 05, que identifiquem o conteúdo do artigo. 4.6 O texto, iniciado a partir da terceira lauda, deverá estar estruturado conforme as características específicas da contribuição (artigo, resenha, relato de projeto ou de pesquisa), com paginação numerada no canto superior direito. 4.7 As citações de fontes no texto podem ser diretas e indiretas devem conter sempre: sobrenome do autor, seguido do Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 ano de publicação da obra, observados os seguintes critérios de estrutura: ? com até 3 linhas, devem estar incluídas no corpo do texto, respeitando o tamanho da fonte do texto e entre aspas; ? com mais de três linhas, devem vir em parágrafo isolado, recuado da margem esquerda em 4cm, fonte tamanho 10, sem aspas e com entrelinha espaço simples. 4.8 As notas contidas no artigo deverão ser do tipo explicativo, usando chamada numérica para remeter para o final do artigo, limitando-se ao mínimo possível. 4.9 As ilustrações devem ser numeradas consecutivamente com algarismos arábicos, na ordem de citação no texto e de acordo com sua tipologia (tabelas, gráficos, quadros, desenhos, etc.) e apresentar título conciso. Devem ser utilizadas somente quando indispensáveis à compreensão e clareza do texto e na sua legenda deve ser usada fonte garamond tamanho 10 e entrelinha simples. 4.10 A lista de referências deve ser estruturada atendendo às regras da NBR 6023:2002, sendo de inteira responsabilidade do autor sua exatidão e adequação, devendo constar da lista apenas as obras que foram citadas no corpo do texto. Na indicação de autoria das obras citadas, o sobrenome dos autores deve ser em caixa-alta, com os nomes e prenomes apresentados de forma abreviada. As referências poderão sofrer alterações de ordem normativa, com vistas a manter o padrão mínimo exigido pela NBR 6023:2002 e deverão estar à disposição da revista para caso de consulta pela equipe de normalização. Exemplos de referências: a)Livros FEIL, I. T. S. Alfabetização: um desafio novo para um novo tempo. 13. ed. Petrópolis: Vozes, 1991. b)Capítulos de livro ou partes de coletânea FERREIRO, E. A escrita como sistema de representação. In: ____.Reflexões sobre alfabetização. 24. ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 10-16. c) Artigos em periódicos CASTELLAR, S. M. V. Educação geog ráfica: a psicogenética e o conhecimento escolar. Cadernos Cedes, Campinas, v. 25, n. 66, p. 209-225, maio./ago. 2005. d)Textos da Internet RIBEIRO, V. M. Alfabetismo funcional: referências conceituais e metodológicas para a pesquisa. Educação & Sociedade., Campinas, v. 18, n. 60, 1997. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?. Acesso em: 10 out. 2006. Revista da Farese, Santa Maria de Jetibá, ES, v. 1, n.1, jul./nov. 2008 69
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