thamy evellini dias marques uso de gramíneas em consórcio com
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thamy evellini dias marques uso de gramíneas em consórcio com
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE BIODIVERSIDADE, EVOLUÇÃO E MEIO AMBIENTE THAMY EVELLINI DIAS MARQUES USO DE GRAMÍNEAS EM CONSÓRCIO COM LEGUMINOSAS PARA RECUPERAÇÃO DE VOÇOROCAS OURO PRETO 2011 i THAMY EVELLINI DIAS MARQUES USO DE GRAMÍNEAS EM CONSÓRCIO COM LEGUMINOSAS PARA RECUPERAÇÃO DE VOÇOROCAS Dissertação apresentada ao Programa de Pós - Graduação em Ecologia de Biomas Tropicais da Universidade Federal de Ouro Preto, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Ecologia de Biomas Tropicais. Área de concentração: Ecologia. Orientadora: Profª. Drª. Alessandra Rodrigues Kozovits Co-orientadora: Profª. Drª. Mariangela Garcia Praça Leite Co-orientador: Prof. Dr. Sebastião Venâncio Martins OURO PRETO 2011 ii DEDICATÓRIA Aos meus pais, Silvana e Carlos, pelo apoio, carinho e incentivo e ao meu padrinho Paulo, por desde minha infância fazer meus dias mais felizes e pelo seu exemplo de determinação. “Segue o teu destino, Rega as tuas plantas, Ama as tuas rosas O resto é a sombra De árvores alheias” Fernando Pessoa iii AGRADECIMENTOS À Deus pela conquista; À universidade Federal de Ouro Preto pela oportunidade; À Capes pela concessão da bolsa; À minha orientadora Profª. Drª. Alessandra R. Kozovits pela oportunidade, confiança e pelo aprendizado imensurável; À minha Co-orientadora Profª. Drª. Mariangela Garcia Praça Leite, pela imprescindível ajuda e pelo grande aprendizado, principalmente através da disciplina de Restauração Ecológica; Ao Prof. Venâncio da UFV pelas sugestões e ajuda; Aos inesquecíveis colegas e amigos do laboratório de Ecofisiologia Vegetal. Eduardo Valim, Hudson (“Gominho”), Gustavo, Aurinha, Tália, Letícia, Maurilinho, Nayara, Pedro e Simone. Vocês tornam nosso ambiente de trabalho além de agradável, um local de muito companheirismo e aprendizado. Obrigada a todos vocês! À Aurinha pela amizade, ajuda nos momentos de angustia e pelos bate-papos em que aprendi muito, em todos os aspectos. Minha querida, aquele jamais tão peculiar e aquela risada gostosa, jamais serão esquecidos. E obrigada, por se dispor em vir assistir minha defesa, imediatamente após a uma viagem tão longa. Não seria a mesma coisa, jamais, sem você. Você faz parte de tudo o que eu vivi em Ouro Preto; Ao Eduardo Valim, a melhor e mais doce companhia que eu poderia ter tido em Ouro Preto. Você é um amigo precioso, um irmão, por quem tenho muito carinho, amor e admiração. Edu, obrigada por estar sempre tão presente na minha vida durante esses dois anos tão intensos, sem você, não sei como teria sido; iv À Vivi Scalon, pela amizade, pelos conselhos, por sempre estar disposta a ouvir e ajudar e pela companhia durante a inesquecível viagem à Buenos Aires para o congresso binacional de Ecologia; Ao querido Rubens, secretário do curso de pós- graduação em Ecologia de Biomas Tropicais, por ser tão prestativo e por toda ajuda; À Profª. Drª. Mercedes M. C. Bustamante por gentilmente ceder equipamentos no laboratório da UnB e por toda ajuda em Brasília; À Viviane Miranda, pelo carinho e ajuda durante o tempo que estive em Brasília realizando parte do experimento; Aos meus pais, o meu especial agradecimento, por todo afeto, apoio e amizade, impossível de descrever; Aos irmãos Allan e Karla, pelo carinho e por sempre torcerem pelo meu êxito no mestrado e em Ouro Preto; Ao meu afilhado e irmão Lucas, pelo carinho, por tornar meus dias em Pouso Alegre mais felizes e tornar a casa dos nossos pais mais especial e acolhedora; À amiga Thécia por ter sido a principal incentivadora desse mestrado em Ouro Preto, e também por toda ajuda, atenção, carinho e amizade; Ao meu querido amigo e estagiário Eduardo Franco por toda ajuda em campo, em laboratório, pela iniciativa e por sempre estar disposto a ajudar; iv À minha querida amiga e estagiária Letícia, por toda ajuda e dedicação. Obrigada também por seu carinho, consideração e amizade, além de tantas risadas quando estávamos juntas que me valiam o dia. À Simone por dividir comigo expectativas e apreensões, além de toda ajuda em campo, com duvidas e material teórico. Obrigada, Si. Inúmeras vezes você foi meu ponto de apoio. To torcendo muito por você nessa etapa tão importante do seu doutorado! Aos meus queridos colegas de mestrado, em especial Lorena e Carine, pela amizade, apoio e carinho; Ao Valdir, pela amizade e por sempre estar solícito a ajudar; Ao Flavio, meu eterno “pai acadêmico”, orientador da graduação, por toda ajuda e conselhos que valeram durante o mestrado e sempre me valerão. Obrigada, Flavio, também pelo carinho e por ser sempre tão solícito. À amiga Fernanda do DEGEO, pelo carinho e atenção em todas as horas; À amiga Ju, que compartilhou comigo durante todo o mestrado tudo o que vivi em Ouro Preto e durante o mestrado, principalmente na parte mais difícil, que foi o final. Obrigada pela paciência, por sempre estar disposta a me ouvir, ajudar e pela doçura de amiga que é e sempre foi. Às amigas Marô, Morena, Naty, Pola e Má, que mesmo longe se fizeram tão presentes. Vocês fazem e sempre farão parte da minha vida. Obrigada por tudo! v SUMÁRIO RESUMO .................................................................................................................... 2 ABSTRACT ................................................................................................................ 3 INTRODUÇÃO GERAL ............................................................................................ 4 ÁREA DE ESTUDO ................................................................................................... 7 LOCALIZAÇÃO ........................................................................................................................................ 7 CLIMA ....................................................................................................................................................... 8 GEOLOGIA ............................................................................................................................................... 8 GEOMORFOLOGIA.................................................................................................................................. 9 SOLOS........................................................................................................................................................ 9 REDE HIDROGRÁFICA.......................................................................................................................... 10 VEGETAÇÃO .......................................................................................................................................... 10 HISTÓRICO DE USO DO SOLO ............................................................................................................. 11 REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................... 12 PROCESSOS EROSIVOS E FORMAÇÃO DE VOÇOROCAS ................................................................. 12 PAPEL E FUNÇÃO DA VEGETAÇÃO PARA ATENUAR PROCESSOS EROSIVOS............................. 14 ECHINOLAENA INFLEXA (CAPIM FLEXINHA) ................................................................................. 17 VETIVERIA ZIZANIOIDES (CAPIM VETIVER) ................................................................................... 17 CRATYLIA ARGENTEA (CAMARATUBA) - FAMÍLIA BOTÂNICA LEGUMINOSAE (FABACEAE) 19 CAPÍTULO 1- CRESCIMENTO DE ESPÉCIES NATIVAS DE CERRADO E DE VETIVERIA ZIZANIOIDES EM PROCESSOS DE REVEGETAÇÃO DE VOÇOROCAS.......................................................................................................... 23 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................... 24 OBJETIVOS ............................................................................................................................................. 25 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................................................... 26 RESULTADOS ......................................................................................................................................... 30 DISCUSSÃO ............................................................................................................................................. 38 CAPÍTULO 2- PARÂMETROS ALOMÉTRICOS DO SISTEMA RADICULAR DE VETIVERIA ZIZANIODES, CRATYLIA ARGENTEA E ECHINOLAENA INFLEXA E SEU POTENCIAL PARA ATENUAR PROCESSOS EROSIVOS ....................... 43 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................... 44 OBJETIVOS ............................................................................................................................................. 47 MATERIAIS E MÉTODOS ..................................................................................................................... 47 RESULTADOS ......................................................................................................................................... 51 DISCUSSÃO ............................................................................................................................................. 55 CONCLUSÃO........................................................................................................... 59 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 61 ANEXO ..................................................................................................................... 75 1 Resumo As voçorocas são grandes feições erosivas e apresentam um estágio avançado de degradação ambiental, constituindo um dos principais riscos ambientais no Brasil. Taxas de germinação de sementes, sobrevivência e crescimento são parâmetros essenciais para a caracterização do potencial biológico de plantas para uso em processos de recuperação e revegetação de áreas degradadas. Em áreas erodidas, como as voçorocas, deve-se dar preferência ao uso de plantas com atributos radiculares eficientes na retenção de solo e na prevenção e redução de processos erosivos. No entanto, a falta de conhecimento sobre tais aspectos em espécies nativas têm levado ao uso de plantas exóticas na revegetação de voçorocas em todo o Brasil. Nesse sentido, esse estudo teve como objetivos avaliar parâmetros de germinação, crescimento, alocação de biomassa e arquitetura de raízes das gramíneas Echinolaena inflexa (Poir.) Chase (espécie nativa do cerrado e ocorrente na área) e Vetiveria zizanioides (L.) Nash (espécie exótica) e de Cratylia argentea (Desv.) Kuntze (leguminosa nativa dos cerrados) quando semeadas/plantadas nos sedimentos acumulados dentro de uma voçoroca. A eficiência do sistema radicular da gramínea Echinolaena inflexa na retenção das partículas do solo foi avaliada durante experimento de chuva simulada (experimento de Inderbitzen). O estudo foi realizado em uma voçoroca de Santo Antônio do Leite, distrito de Ouro Preto, durante a estação seca de 2010 (período mais limitante para o estabelecimento de plantas), sem aplicação de fertilizantes e irrigação. Usou-se o delineamento de blocos ao acaso, em parcelas de 1 x 1 m, com sete repetições dos quatro tratamentos: plantio individual de E. inflexa ou V. zizanioides; e plantio consorciado de E. inflexa + C. argentea; ou de V. zizanioides + C. argentea. As duas espécies nativas de cerrado testadas, E. inflexa e C. argentea, assim como a gramínea exótica, V. zizanioides, mostraram-se tolerantes as condições de baixa disponibilidade de nutrientes e de água dentro da voçoroca, apresentando altas taxas de sobrevivência. Além disso, C. argentea e V. zizanioides mantiveram área foliar verde e crescimento significativo ao longo do período de estudo. Echinolaena inflexa, como esperado, reduziu sua área foliar ativa quase completamente durante o período seco, rebrotando, entretanto, logo após as primeiras chuvas. Não houve influência da leguminosa sobre o crescimento das gramíneas, provavelmente devido à ausência de nodulação das mesmas. A caracterização do sistema radicular das espécies revelou que E. inflexa foi mais eficiente quanto aos parâmetros de ocupação do volume de solo. Tal espécie também se mostrou muito eficiente na redução do carreamento de partículas do solo por erosão hídrica superficial. Espera-se que os resultados básicos obtidos nesse trabalho, que indicam grande 2 potencial de sobrevivência dessas espécies em áreas de colúvio de voçorocas, possam estimular estudos futuros de revegetação e estabilização de solos com espécies nativas. ABSTRACT Gully erosion is an advanced stage of soil degradation, constituting one serious environmental risk in Brazil. Rate of seed germination, seedlings survival and growth are essential parameters to characterize the plants biological potential for being use in the process of land reclamation. Moreover, in eroded areas, plants with root attributes that effectively contributes to the prevention and reduction of soil erosion are also required. However, the lack of knowledge about these attributes in native species has justified the use of exotic plants in revegetation of gullies in Brazil. The present study aimed to evaluate parameters of germination, growth, biomass allocation and root architecture of the grasses Echinolaena inflexa (Poir.) Chase (native cerrado species occurring in the area) and Vetiveria zizanioides (L.) Nash (an exotic species) and of Cratylia argentea (Desv.) Kuntze (native legume in cerrado) when sown/planted on the sediment accumulated within a gullies. The efficiency of E. inflexa root system for retention of soil particles under a water film flux was evaluated during a rainfall simulation experiment. The study was conducted inside a gully, located in Santo Antônio do Leite, an Ouro Preto district, during the dry season of 2010 (the most limiting period for plant establishment), without application of fertilizers and irrigation. A randomized block design was used, with 1m2 plots, in seven replicates of four treatments: individual planting of E. inflexa or V. zizanioides, intercropping of E. inflexa + C. argentea, or V. zizanioides + C. argentea. The two cerrado native species, E. inflexa and C. argentea, and the exotic grass, V. zizanioides, were tolerant to conditions of low nutrients and water availability within the gully, showing high survival rates. C. argentea and V. zizanioides maintained green foliar area and significant growth during the dry season. Echinolaena inflexa, as expected, reduced the active leaf area almost completely during the dry period, resprouting, however, soon after the first rains. There was no influence of the legume in the growth of the grasses, probably due to lack of nodulation. The characterization of the root system revealed that E. inflexa was more efficient in terms of soil occupation than other plant species. This grass was also very effective in reducing the carrying of soil particles by superficial water erosion. It is expected that the basic results obtained in this work, indicating a great potential for survival of the studied species in colluvial materials located inside gullies, may stimulate future studies of soil stabilization and revegetation with native species. 3 INTRODUÇÃO GERAL Segundo definição apresentada pelo IBAMA (1990), áreas degradadas são caracterizadas pela destruição, remoção ou expulsão da vegetação e da fauna nativas, pela perda, remoção ou soterramento da camada fértil do solo, e pela modificação da qualidade do sistema hídrico. Com relação ao solo, sua degradação resulta na redução ou ausência da sua capacidade produtiva, devido a modificações negativas nas propriedades físicas, químicas e biológicas do mesmo (Lal & Stewart 1992). Nesse sentido, as voçorocas são consideradas como exemplo de avançado estágio de degradação ambiental e representam riscos ambientais no Brasil, devido à sua ampla área de ocorrência (Guerra & Botelho 1996). Acredita-se que as voçorocas se originem a partir da concentração da água proveniente do excedente do escoamento superficial em um mesmo canal, levando a formação de grandes cavidades em profundidade e extensão, de difícil e onerosa estabilização (Guerra et al. 2007). Tanto a origem como evolução de voçorocas são fenômenos complexos que podem resultar da ação conjugada ou isolada de movimentos de massa, fluxos superficiais e subsuperficiais (Guerra et al. 2007). No entanto, para Morgan (2005), a principal causa de formação de voçorocas pode ser condicionada pela mudança nas condições hidrológicas do local, através de mudanças climáticas (como mudança no padrão de chuvas) e uso do solo de maneira inadequada (através de desmatamentos e remoção da vegetação). A presença da vegetação pode representar um importante componente na paisagem, atenuando ou mesmo evitando, ativa ou passivamente, os processos erosivos através da ação combinada da parte radicular e aérea das espécies vegetais (Ziegler & Giambelluca 1998, Rey et al. 2004). Assim, a vegetação pode interceptar a água da chuva, aumentar a infiltração de água no solo, reduzir a velocidade da água oriunda do escoamento superficial e reforçar mecanicamente as partículas do solo, exercendo um papel fundamental para o controle de processos erosivos (Rey et al. 2004). Além disso, quando há a instalação de processos erosivos, o carreamento de sedimentos erodidos para outras áreas pode ser evitado através da presença e atuação da vegetação na retenção de sedimentos no mesmo local (Rey et al. 2004). Estas feições erosivas são de difícil estabilização (Guerra et al. 2007), sendo sua recuperação um processo lento e em geral muito oneroso. O solo exposto, no entanto, pode ter o restabelecimento da cobertura vegetal de forma natural, a partir da reprodução de espécies, através de sementes que podem chegar até o local, germinar e se estabelecer (Almeida 2002). Porém, em voçorocas, o processo de regeneração natural pode não ocorrer, devido o intenso processo erosivo, à escassez de nutrientes e matéria orgânica, além de modificações no arranjo das partículas que compõe o solo e na 4 porosidade do mesmo (Stavi & Lal 2011), além da redução ou ausência de microorganismos naturalmente encontrados no solo (Gomide et al 2011). Sendo assim, se torna necessário medidas de revegetação antrópica em áreas erodidas como em voçorocas (Peters et al. 2006). Os processos de revegetação possuem como objetivo facilitar os estágios sucessionais da vegetação, sendo que o sucesso dessas intervenções e a consequente recuperação de áreas degradadas podem estar relacionadas ao conhecimento da biologia de espécies vegetais que apresentem potencial para se estabelecer e desenvolver em condições adversas como as encontradas em voçorocas (Barros et al. 2007). Nesse sentido, leguminosas e gramíneas são normalmente indicadas como eficientes para recuperação de áreas erodidas como voçorocas (Pereira 2006). As gramíneas promovem uma completa e perene cobertura do solo devido ao seu rápido crescimento, fornecendo proteção ao solo de maneira eficiente (Gylssels & Poesen 2003, Bindle 2003). Além disso, as gramíneas possuem uma rede densa de raízes entrelaçadas na camada superficial do solo que confere um reforço mecânico ao mesmo (Gylssels & Poesen 2003). As leguminosas, assim como as gramíneas, podem recobrir as áreas rapidamente, já que em geral, possuem elevada capacidade reprodutiva. Características do sistema radicular de leguminosas parecem ser vantajosas para a recuperação de áreas degradadas como a ancoragem natural do solo e a melhoraria de suas condições através da adição do nitrogênio a um custo biológico e economicamente compensador (Franco et al. 1995). Grande parte das leguminosas também pode se associar aos fungos micorrízicos e assim aumentar a absorção de nutrientes, tornando as espécies dessa família mais tolerante aos estresses ambientais (Faria & Campello 1999). Assim, o uso de espécies de leguminosas juntamente com espécies de gramíneas pode promover ação sinérgica para a melhoria das propriedades biológicas, físicas e químicas do solo, sendo considerada como uma estratégia fundamental para o êxito de processos de revegetação de áreas erodidas (Pereira 2006). Devido à relevante extensão territorial ocupada pelo cerrado, gramíneas nativas deste bioma possuem grande potencial para estabelecimento sob diversas condições edafoclimáticas, sendo apontadas como teoricamente eficientes para a recuperação de áreas degradadas, inclusive para o controle e estabilização de voçorocas (Martins 1996). No entanto, a biologia destas gramíneas é pouco estudada e não há registros de seu uso, até o momento, em processos de revegetação e recuperação de áreas degradadas. A maioria dos trabalhos que visam à recuperação de áreas no Brasil é realizada com gramíneas exóticas (geralmente de origem africana), em detrimento das nativas (Martins 2001). Da mesma 5 forma, espécies exóticas de leguminosas também são preferidas em processos de revegetação, e isso reflete, segundo Barbosa (2000), em reduzido conhecimento técnico e empreendedor sobre a biologia das espécies de leguminosas nativas com potencial para revegetação. Espécies exóticas podem gerar graves problemas à biodiversidade local devido à sua agressividade, sendo consideradas, em geral, competitivamente superiores às nativas. Elas ocupam ecossistemas naturais com grande facilidade e rapidez (Martins 2006), resultando em grande impacto no ecossistema e na descaracterização de fitofisionomias (Pivello 2005). Atualmente, a falta de conhecimentos básicos sobre as taxas de germinação, estabelecimento e desenvolvimento de espécies nativas é, sem dúvida, o maior impedimento para o uso de espécies nativas em processos de revegetação. Tal uso poderá representar uma grande contribuição para a manutenção da biodiversidade local, promovendo a proteção ou até mesmo expansão de fontes naturais de diversidade genética, além de proporcionar vantagens como barateamento dos custos de produção e transporte de mudas (Moreira 2002). Dentro desse contexto, o presente estudo foi estruturado em dois capítulos. O primeiro capítulo possui como objetivo principal testar o plantio de espécies das gramíneas Echinolaena inflexa (Poir.) Chase (espécie nativa do cerrado e ocorrente na área) e Vetiveria zizanioides (L.) Nash (espécie exótica) e de Cratylia argentea (Desv.) Kuntze (espécie nativa) nos sedimentos acumulados dentro da voçoroca para avaliação do estabelecimento e desenvolvimento das mesmas. Além disso, será avaliado se a leguminosa Cratylia argentea (Desv.) Kuntze influenciará o crescimento das espécies de gramíneas. Já o segundo capítulo, possui como objetivo principal caracterizar os sistemas radiculares (biomassa, diâmetro, comprimento total e volume radicular) das espécies do estudo e determinar se a gramínea Echinolaena inflexa (Poir.) Chase é eficiente na retenção de sedimentos durante experimento de chuva simulada. 6 ÁREA DE ESTUDO Localização O estudo foi realizado em uma voçoroca localizada em Santo Antônio do Leite (figura1), distrito de Ouro Preto (0636503, 7746575 UTM). Essa região está inserida no Complexo Metamórfico do Bação (área de aproximadamente 385 km2), situada na porção centro sul do Quadrilátero Ferrífero e pertencente à bacia do rio Maracujá (figura 2), um dos principais afluentes da margem esquerda do Alto rio das Velhas (Bacellar et al. 2005). A voçoroca em questão já foi alvo de estudos anteriores que a denominaram de Estação Holanda, devido sua proximidade com o córrego Holanda (Bacellar 2000). Figura 1: Voçoroca Estação Holanda (perímetro de 1.207,694 m) localizada em Santo Antônio do Leite, distrito de Ouro Preto, MG, Brasil. 7 Figura 2: Mapa de localização da área de estudo na bacia do rio Maracujá, no alto rio das Velhas (Modificado de Bacellar 2000). Clima Na região de Santo Antônio do Leite, assim como no Complexo Metamórfico do Bação, as estações climáticas são bem definidas, verão chuvoso (novembro a maio) e inverno seco (junho a outubro), tipo CWa de Koppen (Morais et al. 2004). A região é caracterizada por alta taxa pluviométrica anual (1352,83 mm), com mínima registrada de 1.024 mm e máxima de 1.744 mm. e temperatura média anual de 19, 2 oC (Bacellar 2000). O tipo de chuva é conhecido como chuva de relevo, caracterizada por ser intermitente e fina (Radambrasil 1983). As taxas mais elevadas de precipitação ocorrem no verão, deixando os solos com alto conteúdo de umidade, enquanto que no inverno há um déficit de água muito forte, ocasionando a presença de trincas no solo, colaborando para a instabilidade do mesmo e das voçorocas existentes na região (Santos 2001). Geologia A região do estudo está inserida em uma província geológica brasileira, denominada Quadrilátero Ferrífero, que tem nas rochas granito-gnáissicas e migmáticas do embasamento cristalino suas as bases geológicas (Bacellar 2000). Estas rochas são de idade Arqueana (Alkmim e Marshak, 1998) e apresentam história geológica complexa, marcada pela 8 superposição de vários eventos tectônicos constituindo o chamado Complexo do Bação (Endo 1997). O Complexo Metamórfico do Bação aparece como uma janela estrutural do embasamento cristalino, possuindo em seus limites cinturões alterados de rochas de natureza vulcanosedimentar e metamorfisadas (Santos 2002). Este complexo é constituído fundamentalmente por rochas granito-gnáissicas e migmáticas, apresentando respostas diferenciadas aos processos intempéricos quando comparadas aos metassedimentos vizinhos, devido a idade e constituição litológica (Figueiredo et al. 2004). Na bacia do rio Maracujá, os gnaisses que apresentam granulação mais fina, caracterizam saprolitos mais erodíveis, demonstrando uma relação, geralmente ocorrente entre rocha e erodibilidade dos saprolitos (Bacellar et al. 2001). Geomorfologia O Complexo do Bação está localizado em um domínio morfoestrutural restante de cadeias dobradas (Radambrasil 1983). A forma de relevo é representada por mares de morros e suaves encostas, rodeados por morrotes com íngremes vertentes (Santos 2001). Esta paisagem é formada por colinas e interflúvios nivelados que se encontram em altitudes que variam entre 1.040 m e 1.140 m, são recortados por uma rede de drenagem como os córregos Maracujá, Holanda e Mango (Fonseca 2000). Segundo Santos (2001), a região da voçoroca do estudo (Estação Holanda) está inserida em um relevo com predomínio de morros e colinas, com declividade de 15% a 45%. As voçorocas no geral se concentram na região com relevo plano e marginalmente aos topos, com relevo suave e em concavidades topográficas de áreas de cabeceira de drenagem (Bacellar et al. 2001). Solos Os solos derivados dos gnaisses do Complexo Metamórfico do Bação são extremamente alterados, resultantes de processos intempéricos, levando a formação de solos profundos (de até dezenas de metros) e considerados como solos saprolíticos (Sobreira 1998), com espessos mantos de intemperismo (Santos 2001). Na região, o solo é classificado como Latossolo vermelho-amarelo (Bacellar 2000, Santos 2001) caracterizado por horizonte A pouco alterado e espesso (raramente ultrapassa 50 cm), horizonte B silto-argiloso com média de 3 m de profundidade (porém, pode ultrapassar 6 m de profundidade) e horizonte C arenosiltoso com grandes espessuras que podem ultrapassar 30 m de profundidade (Sobreira 1998). 9 Devido a atividades antrópicas que datam desde o século XVIII, o horizonte A foi quase totalmente perdido (Parzanese 1991). O horizonte B é composto em maior parte por caulinita, oxiidróxidos de Fe e Al e quartzo e o horizonte C (saprolito) é composto predominantemente por quartzo e feldspato (alterado para caulinita, variavelmente), illita e muscovita (Parzanese 1991, Bacellar 2000, Sobreira 2000). Estudos como o de Parzanese (1991); Bacellar (2000), Santos et al. (2002) e Morais et al. 2004, concluíram através de experimentos que as camadas superficiais do solo dessa região são resistentes aos processos erosivos, enquanto que o horizonte C é friável e erodível e assim, para romper as camadas superficiais seriam necessários distúrbios ocasionados nas mesmas, o que de fato pode ter ocorrido na região, acarretando nas atuais grandes feições erosivas. Rede hidrográfica A rede hidrográfica da região de Santo Antônio do leite é composta pelos afluentes da cabeceira do rio Maracujá, sendo este rio em questão, um dos tributários da margem esquerda do alto rio das Velhas. Segundo Sobreira (1998), os principais córregos responsáveis pela drenagem da região são: Holanda e Mango, sendo que muitas nascentes que deságuam nestes córregos fluem do interior das voçorocas da região, principalmente na estação chuvosa devido à elevação do nível do lençol freático. Porém, mesmo na estação seca estas nascentes fornecem vazões o bastante para manter contínuo o fluxo do interior dessas voçorocas. Assim, na maior parte dos córregos e fundos de vales há presença de assoreamento resultado da grande quantidade de sedimentos oriundos das voçorocas existentes na região (Santos 2001). Vegetação A vegetação da região é classificada como de Floresta Estacional Semidecidual, com vegetação secundária (Radambrasil 1983). Esta região representa uma zona de transição entre os domínios vegetacionais do Cerrado e da Floresta Atlântica (Rizzini 1979), sendo a maior parte (em extensão) coberta por campo cerrado e pastagens degradadas, além de manchas de matas ciliares (Farias 1992). Também há presença de manchas de matas densas em locais com melhores condições de drenagem e maior aporte de nutrientes (Farias 1992). Geralmente, nos taludes de voçorocas estabilizadas da região, ocorre o desenvolvimento e estabelecimento de samambaias do gênero Gleichenia, que toleram condições de baixa fertilidade e acidez, além de grandes inclinações do terreno (Farias 1992). 10 Histórico de uso do solo Durante o ciclo do ouro não houve exploração aurífera na bacia do rio Maracujá, no entanto, apesar da baixa qualidade das terras do Complexo do Bação, os campos de cerrado dessa região foram utilizados para a produção agropecuária e agrícola (Gutersohn 1945) apud (Bacellar 2000). Nessa época, os solos já originalmente pobres em nutrientes eram submetidos à coivara (queima anual), sobrepastoreio e falta de adubação, levando a perda de camadas superficiais mais férteis. Já no século XIX, a exploração de minérios de ferro em Minas gerais, levou a destruição da vegetação remanescente em busca de madeira para construção de ferrovias e a exploração do carvão vegetal (Gutersohn 1945) apud (Bacellar 2000). Datam também do século XIX, as primeiras referências a voçorocas da região (Burton 1868) apud (Bacellar 2000). No século XX, a principal ocupação do solo já devastado por atividades deletérias foi a plantação de eucaliptos para uso como combustível em atividades de siderurgia. Atualmente a ocupação do solo tem sido com sítios (devido a localização próxima da capital do estado) e exploração de pedras preciosas como Topázio, areia e argila para utilização em material de construção civil (Bacellar 2000). Embora, feições erosivas façam parte da evolução natural do relevo (Bacellar 2000), o histórico de uso do solo ligado a atividades econômicas desde o final do século XVII pelos colonizadores portugueses (fazendas, aceiros, demarcação de terras via canaletas, estradas, pastagens e trilhas de gado) contribuiu fortemente para acelerar os processos erosivos, resultando no elevado número de feições erosivas na região do Complexo do Bação e bacia do rio Maracujá. Existe na área da bacia, um total de 173 voçorocas grandes e outras 212 feições, como voçorocas rasas e ravinas (aproximadamente 2,75 feições erosivas por km2) (Bacellar 2000). As voçorocas em questão atingem centenas de metros de comprimento e largura e dezenas de metros de profundidade, causando sérios impactos para região (Santos 2001). As atividades antrópicas podem estar relacionadas aos processos erosivos na bacia do rio Maracujá, no entanto, tais processos só ocorrem em regiões geomorfologicamente específicas (Bacellar 2000). A intensa atuação antrópica na região também tem acarretado na evolução de processos erosivos para zonas urbanas, sendo que a maioria da população da região afetada e o poder publico local convivem acomodadamente com as inúmeras feições erosivas e suas conseqüências (Santos 2001). 11 REFERENCIAL TEÓRICO Processos erosivos e formação de voçorocas Etimologicamente, a palavra erosão se origina do latim (erodere), expressando a idéia de corrosão e desgaste (Zackar 1982). A erosão do solo abrange a desagregação de partículas do solo e o transporte dessas partículas por agentes erosivos como água e vento (Morgan 2005). Normalmente, a erosão é um processo natural, considerado como agente geológico, modificador e modelador das paisagens terrestres (Zackar 1982). No entanto, a interferência antrópica pode alterar esse processo natural de erosão, acelerando e intensificando sua ação (Morgan 2005). A erosão hídrica acelerada é geralmente desencadeada por ações antrópicas tais como o mau uso do solo e o desmatamento, acarretando em um processo de rápida desagregação e remoção das partículas do solo através das águas das chuvas (Guerra et al. 2007). No Brasil, a erosão mais expressiva (em termos de território) é a erosão hídrica (Machado 2007), condizente com a posição geográfica do país, situado em regiões tropicais, submetido a altos índices pluviométricos (Zackar 1982). Na erosão hídrica, o processo erosivo tem início juntamente com a energia cinética e potencial, oriundas do impacto das gotas de chuva no solo (splash) e com o escoamento superficial, que estão estreitamente relacionados à duração e frequência da precipitação (Guerra et al. 2007). A ação do splash, também conhecido como erosão por salpicamento inicia o processo erosivo, já que as partículas do solo ficam propensas ao transporte, além de fornecer um selamento ao solo e, consequentemente, diminuir sua porosidade, o que aumenta o escoamento superficial das águas (Guerra & Botelho 1996). Ainda segundo estes autores, esse mecanismo pode acarretar na formação de crostas (através da ação das gotas da chuva) na superfície antes da atuação do escoamento superficial, e assim, na medida em que os agregados do solo se rompem, o solo pode se compactar e dificultar a infiltração da água. Posteriormente, com a saturação do solo pela infiltração da água, poças se formam na superfície, acarretando em aumento do escoamento superficial e na perda de solo (Guerra et al. 2007). O potencial de erosão hídrica varia de região para região, já que depende da erosividade da chuva, erosibilidade dos solos, características topográficas, cobertura vegetal e do uso e manejo do solo, sendo que cada fator tem uma contribuição diferente, em níveis maiores ou menores (Bacellar 2000, Lima 2003). A erodibilidade é a suscetibilidade do material a erosão e erosividade é o potencial do agente (Morgan 2005). Ou seja, o potencial 12 de erosão hídrica depende parcialmente da erosividade das chuvas que é descrita por características como duração, tamanho da gota e velocidade, que por sua vez variam espacialmente e temporariamente e ainda depende de outros fatores como a influência do vento durante as chuvas (Guerra et al. 2007). A erodibilidade do solo, por sua vez, também é um fator importante no potencial erosivo através de características do solo como textura, estrutura e concentração de matéria orgânica (Morgan 2005). Entre tais características a textura se destaca devido direta relação que a mesma possui com a coesão das partículas do solo. Assim, solos com alto percentual de areia fina e silte podem favorecer uma maior erodibilidade, enquanto que solos que são menos erodíveis, normalmente são os argilosos, pois permitem uma maior coesão das partículas e solos arenosos já que possuem uma maior permeabilidade e consequentemente promovem uma maior infiltração da água (Morgan 2005, Guerra et al. 2007). Os principais tipos de erosão hídrica são laminar e em canais. A erosão laminar se caracteriza pela remoção de camadas pouco espessas de solo, a partir do escoamento superficial da água, se distribuindo de forma dispersa pelas encostas (Guerra et al. 2007). Segundo Bacellar (2000), as principais conseqüências da erosão laminar são a exposição do terreno, a remoção dos horizontes férteis do solo e o assoreamento de rios e córregos. O poder erosivo da erosão laminar pode aumentar com a velocidade e concentração da água, dando início à erosão em canais (Bacellar 2000). Basicamente, a erosão em canais promove três tipos diferentes de forma erosivas: sulcos, ravinas e voçorocas, sendo que critérios dimensionais são usados para diferenciá-las. Os sulcos são definidos como canais rasos e com o aprofundamento desses canais do sulco há formação da ravina e segundo Guerra (2007 et al.) uma incisão erosiva maior que 50 centímetros de largura e profundidade já é considerada como uma voçoroca. A erosão em voçorocas pode ocorrer a partir do aprofundamento e alargamento e de uma ravina (Guerra & Botelho 1996), a partir da concentração do escoamento superficial no mesmo sulco durante um grande período de tempo e deslocando alta quantidade de massa do solo, acarretando em enormes cavidades (Morgan 2005). A partir disso, o lençol freático pode ser exposto e dar início a erosão por águas subsuperficiais. Ou seja, além da atuação de escoamento superficial, nas voçorocas pode ocorrer, a ação de processos de erosão subsuperficial, que promove, por sua vez, solapamentos, desabamentos e escorregamentos (Guerra et al. 2007). Voçorocas, conhecidas como gully na literatura internacional, ocorrem em diversos ambientes, de variadas formas. Segundo Valentin et al. (2005), a erosão por voçorocas tem 13 sido foco de estudos em todo mundo devido ao amplo impacto espacial e ambiental que este tipo de erosão provoca, já que este impacto não gera consequencias somente na área da incisão erosiva. Tais incisões são fontes poluidoras de sedimentos para corpos de água em localidades próximas e quando há formação de voçorocas em regiões semi-áridas, as mesmas podem a acelerar e intensificar o processo de desertificação (Valentin et al. 2005). Ainda segundo Valentin et al. (2005), em termos mundiais, além de regiões montanhosas e acidentadas, as voçorocas também ocorrem em solos arenosos como os do nordeste da Tailândia e zona do Sahel (região entre o deserto do Saara e terras férteis do sul do da África), solos sujeitos ao encrostamento como os de parte da Europa, China e América do Norte, além de solos naturalmente dispersíveis como os que são propensos ao pipping (como no caso do Brasil), entre outros. Embora a formação de voçorocas ocorra a partir de causa naturais (Botha et al. 1994, Ward et al. 2001, Avni et al. 2006), estudos como o de Bacellar (2000) e Archibold et al. (2003) relatam que o aparecimento de voçorocas tem sido acelerado e ampliado devido a fatores de origem antrópica, como desmatamento da vegetação nativa e modificações nas propriedades do solo devido ao seu uso e manejo inadequado, principalmente através de atividades agrícolas. O uso do solo para atividades agrícolas também é reportado por (Gyssels e Poesen 2003, Valentin et al. 2005, Vandekerckhove et al. 2000), como importante fator para o desenvolvimento de voçorocas. Uma vez desenvolvida a voçoroca, os estágios iniciais de seu desenvolvimento são rápidos e o processo de estabilização de suas características (largura, extensão, profundidade) são difíceis (Sidorchuk 1999). Na bacia do rio Maracujá (região do estudo), há centenas de voçorocas que podem atingir até 50 m de profundidade, 150 m de largura e de 400 a 500 m de extensão (Bacellar 2005). Vários estudos têm sido feitos nessa referida região para melhor entender os processos de evolução e formação das voçorocas encontradas na área (Farias 1992, Parzanese, 1993, Bacellar 2000, Sobreira 1998, Silva 2000, Morais 2003, Bacellar et al. 2005, Costa & Bacellar 2006, Drumond & Bacellar 2006). No entanto, não há nenhum estudo com revegetação no leito das voçorocas com objetivo de fornecer informações a respeito das respostas das espécies vegetais após o plantio das mesmas em uma área com condições inóspitas como as encontradas na voçoroca, sendo este trabalho um estudo pioneiro. Papel e função da vegetação para atenuar processos erosivos O papel desempenhado pela vegetação na proteção do solo contra os processos erosivos é bem reconhecido (Morgan 2005, De Baets et al. 2007). Segundo Gray & Leiser 14 (1982) apud (Menashe 1998), dentre os principais efeitos que a vegetação exerce no controle de processos erosivos do solo estão: (1) interceptação da chuva pela parte aérea e resíduos das plantas que dissipam a energia cinética presente nas gotas da chuva e assim, evitam ou reduzem a compactação do solo; (2) ancoragem das partículas do solo feita pelas raízes, enquanto folhas e caules podem agir como uma barreira ou filtro de retenção de sedimentos; (3) aumento da rugosidade do solo causado pela presença da biomassa aérea, o que pode diminuir a velocidade do escoamento superficial; (4) aumento da permeabilidade do solo e (5) captação e transporte da água entre o solo e atmosfera através da transpiração das plantas. Assim, a presença da vegetação pode representar um importante componente na paisagem, atenuando ou mesmo evitando, ativa ou passivamente, processos erosivos (Ziegler & Giambelluca 1998, Rey et al. 2004). Embora não haja dúvidas de que as raízes desempenham um papel chave no controle da erosão, não há ainda compreensão total sobre as características morfo-anatômicas e fisiológicas que seriam mais eficientes para a realização de tal função em diferentes ambientes (Zhou 2007, Reubens et al. 2007). Segundo Gyssels e Poesen (2003), um aumento na densidade de raízes em determinado local resulta em decréscimo exponencial nos fluxos erosivos, uma vez que o sistema radicular afeta mecanicamente e hidrologicamente o solo ao seu redor, modificando a estabilidade de agregados, capacidade de infiltração, densidade e textura do solo, conteúdo orgânico e químico (Morgan 2005). Assim, as raízes podem melhorar significativamente propriedades físicas do solo, através do aumento da sua porosidade, além da entrada de carbono e do estímulo à biomassa e atividade microbiana (Angers & Caron 1998). Os principais fatores que controlam a influência mecânica das raízes no solo são: grau de bifurcação, aparecimento de pêlos radiculares, atrito entre raiz e solo, distribuição de raízes no solo e diâmetro (Preston & Crozier 1999), além da orientação das raízes e variações do sistema radicular entre as espécies vegetais (Gray & Sotir 1996). O diâmetro das raízes é uma importante variável usada como ferramenta para explicar a redução da erosão e desprendimento de partículas do solo de acordo com a arquitetura radicular das espécies vegetais (De Baets et al. 2007). Em geral, raízes de pequeno diâmetro (raízes com menos de 3 mm de diâmetro) são consideradas mais eficientes para a fixação no solo do que raízes grossas, principalmente quando é considerada a resistência do solo à erosão hídrica (Gyssels e Poesen 2003). Segundo Coelho & Pereira (2006), o diâmetro das raízes, em geral, é inversamente proporcional à resistência radicular à tensão. Raízes finas possuem a vantagem não apenas de 15 possuírem altas resistências à tensão radicular, mas também maiores resistências ao arranquio, dada sua alta superfície específica se comparada a raízes de maior diâmetro. Raízes grossas cruzam o plano de cisalhamento e agem como âncoras individuais (Pollen 2007). Embora exista uma correlação positiva entre raízes finas e conteúdo e reforço do solo, não há ainda clareza sobre o papel que desempenham as raízes grossas (Cammeraat et al. 2005). Atributos ideais de raízes relacionados à redução de processos erosivos dependem de características intrínsecas dos diversos ambientes (De Baets 2007). Para controle de erosão em regiões áridas, por exemplo, um denso e profundo sistema radicular, principalmente nas fases iniciais de crescimento das plantas são características desejáveis (Gökbulak 2003). Para estabilização de encostas, padrões de raízes densas e profundas são igualmente consideradas ideais (Gray & Sotir 1996). Já para o controle de erosão hídrica, um sistema radicular denso, superficial e com ampla propagação lateral são caracterísiticas mais eficazes (Gyssels et al. 2005). Embora os estudos acima demonstrem a relevância do conhecimento de aspectos da arquitetura, anatomia e fisiologia de raízes e seus efeitos sobre o controle da erosão, há ainda evidente carência de dados nos mais diferentes ambientes e especialmente, com espécies nativas. A maior parte dos estudos envolvendo sistemas radiculares foi desenvolvido com plantas oriundas de cultivos agrícolas (De Baets et al. 2007). Segundo Reubens et al. (2007) a falta de informação sobre a função desempenhada pelo sistema radicular das espécies vegetais deve-se, em parte, a dificuldades metodológicas. As raízes normalmente não são visíveis e as metodologias empregadas no estudo de raízes são, em geral, maçantes e demanda de muito tempo. Isso é refletido nos modelos que simulam a redução de perda de solo devido à presença de vegetação, que normalmente só consideram a parte aérea da planta, enquanto que, na realidade, deveriam tratar da ação combinada das partes aérea e radicular (Gyssels & Poesen 2003). Após esta breve revisão, pode-se concluir que a redução dos processos erosivos depende do desenvolvimento conjunto da parte aérea e do sistema radicular, o que é resultado da genética de cada espécie e das características do ambiente (como estrutura e textura do solo, percentual de umidade, temperatura e competição com outras plantas) (Bischetti et al. 2005). Dessa maneira, a combinação desses fatores acarreta em uma ampla variação dos padrões arquitetônicos e funcionais dos sistemas radiculares e, por conseqüência, grande variação na eficiência da ancoragem e do controle de processos erosivos (Bischetti et al. 2005). 16 Echinolaena inflexa (Capim Flexinha) Echinolaena inflexa é uma gramínea pertencente à família Poaceae, nativa do cerrado brasileiro, com ampla distribuição geográfica (Munhoz 2003), sendo a espécie mais importante em alguns levantamentos fitossociológicos no estrato rasteiro do cerrado (Munhoz & Felfili 2006) e com relatos ainda de sua ocorrência em áreas degradadas e modificadas pelo fogo (Aires 2009). Popularmente conhecida como capim Flexinha, Echinolaena inflexa possui atributos que parecem ser adequados para o uso em recuperação de áreas degradadas, pois, além de alta abundância em diferentes condições edafo-climáticas, também apresenta alta produção de biomassa (Souza et al. 2005) e rápida taxa de colonização de áreas (Amaral 2008). Apesar disso, não há relatos de ter sido utilizada em estudos com objetivo de estabilizar processos erosivos (Martins 2001). E. inflexa é uma gramínea de metabolismo fotossintético do tipo C3, decumbente, perene e pode atingir de 20 a 50 cm de altura, formando grandes touceiras, sendo que a tendência no aumento do número de folhas e biomassa e consequentemente o crescimento dessa espécie, varia de acordo com a variação da pluviosidade (Silva & Klink 2001). O sistema radicular dessa gramínea é rizomatoso e possui alta resistência a escassez de água (Aires 2009). E. inflexa é resistente ao fogo, com relatos de crescimento em altura após 2 meses da passagem do fogo (Parron & Rey 1997). A produção de sementes de E. inflexa se inicia na época chuvosa e finaliza com a chegada da estação seca (Freitas & Pivello). No entanto, Munhoz & Felfili (2006), também encontraram produção de sementes realizada pela gramínea mesmo na estação seca. Experimentos conduzidos em laboratório demonstraram que a gramínea possui baixas taxas de germinação de 0 a 25% segundo estudo realizado por Giotto (2010) e de 32%, em estudo realizado por Klink (1996). Além do exposto, E. inflexa é a espécie de gramínea predominante que circunda o perímetro da voçoroca do presente estudo, tornando o plantio de touceiras dessa espécie na voçoroca, biológica e economicamente viável. Vetiveria zizanioides (Capim Vetiver) A gramínea Vetiver Vetiveria zizanioides (L.) Nash é uma gramínea perene, com síndrome fotossintética do tipo C4, pertencente à família botânica Poaceae (Dudai et al. 2006), exótica, de origem subtropical e tropical (Índia, Indonésia, China, Filipinas), que pode 17 formar moitas densas de 0, 5 até 1,5 metros de altura (Mickovski & van Beek 2009). As folhas dessa gramínea são alongadas com pontas pontiagudas, com relativa dureza e em geral, com largura de 2 cm na base (Pereira 2006). O sistema radicular é composto por raízes aromáticas, altamente ramificado e pode apresentar comprimento de até 3 metros (Hellin and Haigh 2002, Ke et al. 2003), o que acarreta em uma forte ancoragem da planta ao solo (Truong 1999). Vetiveria zizanioides possui características fisiológicas que lhe permitem tolerar diversas condições ambientais, como vários tipos de solos (arenosos e argilosos) (Dudai et al. 2006), alta alcalinidade e acidez (Dalton et al. 1996), grande concentração de alumínio (de até 68%) (Pereira 2006), presença de metais pesados (manganês, arsênio e níquel) e alta salinidade (Truong & Claridge 1996). Além disso, essa gramínea pode tolerar uma ampla faixa de temperatura (de −10°C a 48°C), escassez de água e condições de alagamento (Dalton et al. 1996, Truong and Loch 2004), sendo também resistente ao fogo, doenças e pragas (Zisong 1991). A península localizada no sul da Índia é considerada como o local de onde se dispersou para outros países do mundo devido ao seu potencial para produzir óleo aromático (Lavania 2000). Atualmente essa gramínea é cultivada em mais de 120 países com diversas finalidades: estabilização de encostas, sombra e abrigo em locais áridos, reabilitação de minas, estabilização e conservação de redes de drenagem do solo, além do controle e prevenção de processos erosivos (Truong & Loch 2004). A partir da década de 1970, Vetiveria zizanioides passou a ser usado como barreira viva, ou cerca viva, para combater processos erosivos, através de práticas e teorias estabelecidas desenvolvidas por pesquisadores como Paul Truong, John Greenfield da Nova Zelândia e o norte-americano Richard Grimshaw (Pereira 2006). Características dessa gramínea como talos eretos e duros, densas raízes que atingem grande profundidade, além de grandes touceiras formadas pela mesma, podem justificar sua utilização para atenuar processos erosivos (Truong & Hengchaovanich 1997). Além disso, essa gramínea pode controlar o efeito promovido pelo escoamento das águas superficiais, acarretando no acúmulo de sedimentos e infiltração das águas (Pereira 2006). A morfologia do sistema radicular de Vetiveria zizanioides pode auxiliar na estabilização de taludes e encostas, funcionando como um grampeador natural (Pereira 2006). As raízes dessa gramínea podem proporcionar alta resistência à tração (de 40 e 180 MPa para um diâmetro de raízes entre 0,2 e 2,2 mm) sendo que a media é de cerca de 75 MPa, e pode ser comparável a aproximadamente a 1/6 do aço doce, com diâmetro de raízes de 0,7 a 0,8 18 mm, sendo este diâmetro o mais comum para as raízes da gramínea (Truong & Hengchaovanich 1997, Pereira, 2006). De acordo com Truong (1999), V. zizanioides plantada em curvas de nível (o recomendado em encostas), reduziu o escoamento superficial do excedente de água (runnof) de 23.3 para 15.5%, e a redução de perda de solo de 14.4 para 3.9 t ha. Sudhishri et al. (2008) usaram V. zizanioides como barreira vegetativa na Índia, para controle de processos erosivos e encontraram um decréscimo em cerca de 68.6% no escoamento superficial (devido ao aumento na infiltração) e uma redução de perda de solo em 71%. Na Nigéria, Babalola et al. (2003) também comprovaram a eficiência da gramínea na redução em 70% do escoamento superficial, assim como no Quênia, com redução de 56%, além de uma redução na perda de solo em 92%. É importante ressaltar que apesar do amplo uso de V. zizanioides em diferentes países, essa gramínea não se tornou uma planta invasora, devido sua propagação ser através do plantio de mudas e não por rizomas, estolões ou germinação de sementes, ainda que possam apresentar inflorescência de cor avermelhada (Greenfield 2002) apud (Pereira. 2006). Assim o uso do Vetiver tem sido considerado um método eficiente, barato, ecologicamente sustentável, e de fácil replicação (Babalola et al. 2003). Não há estudos, entretanto, sobre seu papel na sucessão ecológica nas áreas onde foi plantado. Cratylia argentea (Camaratuba) - Família botânica Leguminosae (Fabaceae) A família Leguminosae (Fabaceae) possui aproximadamente 18.000 espécies e 714 gêneros (Sprent 2001) apud (Angie & Hau 2009), distribuídas em 3 subfamílias: Caesalpinioideae, Mimosoideae e Papilionoideae (Sprent 2000). As subfamilias Caesalpinioideae e Mimosoideae possuem cerca de 3.000 espécies cada, já a Papilionoideae representa o grupo mais numeroso com cerca de 14.000 espécies (Moreira & Siqueira 2006). As leguminosas estão entre as famílias de maior importância nos trópicos (Fontenele et al. 2009), com representação de espécies herbáceas, arbustivas e arbóreas, são encontradas nos biomas brasileiros e destacam-se no âmbito da sustentabilidade ecológica e sócio-econômica (Franco et al. 2000). A principal qualidade da maioria das espécies dessa família é o seu potencial para se associar simbioticamente com alguns microorganismos encontrados naturalmente no solo, sendo essa associação considerada como uma estratégia chave para que essas espécies se adaptem e ocupem diversos ambientes, incluindo os adversos (Douglas 1994). A associação se dá com bactérias de vida livre no solo, coletivamente chamadas de rizóbios, dos gêneros 19 Rhyzobium, Bradyrhizobium, Azorizhobium, Photorizhobium, Sinorizhobium (Taiz & Zeiger 2009), levando a formação de nódulos onde ocorre a fixação biológica de nitrogênio (Schultze & Kondorosi 1998). A formação dos nódulos ocorre nas raízes e raramente nos caules das plantas e necessita da interação ininterrupta entre os rizóbios e leguminosas além da troca de diferentes metabólitos e sinais (Patriarca et al. 2002). Após a formação do nódulo, as leguminosas fornecem fotoassimilados às bactérias, principalmente sacarose, que é fonte de energia usada para a atividade da enzima nitrogenase, e as bactérias, por sua vez, fornecem amônio para as plantas (utilizado por estas para a produção de compostos nitrogenados) (Kerbauy 2004). Características edafoclimáticas podem intervir nos processos de nodulação e fixação biológica de nitrogênio (Rumjanek et al. 2005). Os microorganismos que se encontram presentes no solo, assim como as raízes das plantas, devem estar adaptados as condições edáficas e microclimáticas locais ou possuir mecanismos para se adequar a essas condições (Silva et al. 2002). Dentre os principais fatores que comprometem os processos de simbiose entre os rizóbios e leguminosas estão a disponibilidade de nutrientes (Gualter el at. 2008) e o pH do solo (Straliotto 1999). Elementos como molibdênio (Mo), ferro (Fe) e enxofre (S) (Raven 2001), fósforo (P) e potássio (K) (Gualter el at. 2008) possuem grande influência sobre os processos relacionados a simbiose. O Mo, Fe e S fazem parte de grupos prostéticos que formam a enzima nitrogenase. O P é constituinte da molécula de ATP, sendo esta molécula intensamente utilizada e primordial para o processo de fixação de nitrogênio (Freire Filho et al. 2005). A deficiência de K afeta a fotossíntese e, como consequência, o envio de produtos fotoassimilados da planta para a bactéria (Sangakkara et al. 1996). O baixo pH (acidez) do solo pode afetar a fixação biológica de nitrogênio influenciando a sobrevivência e multiplicação do rizóbio no solo, o processo de infecção, desenvolvimento do nódulo e a própria atividade de fixação biológica do nitrogênio em si (Graham 1992). O efeito do baixo pH na fixação de N é indireto, ocorrendo através da elevação da disponibilidade de alumínio e manganês no solo, reduzindo a capacidade de trocas de cátions e a disponibilidade de nutrientes como Ca2+ , Mg2+ , P e Mo (Miguel & Moreira 2001). Além disso, a acidez do solo também afeta a troca de sinais entre rizóbios e leguminosas e o tamanho dos nódulos (Silveira et al. 2001). Segundo Miyasaka et al. (1984), além da capacidade de fixar nitrogênio atmosférico através da associação simbiótica com bactérias, as leguminosas possuem um sistema radicular ramificado que pode atingir grandes profundidades. As leguminosas também 20 apresentam tecidos (principalmente os foliares) com baixa razão C/N (em comparação a plantas de outras família botânicas), o que acarreta na decomposição da serapilheira e consequentemente na liberação de nutriente para as plantas de forma mais rápida (Zotarelli 2000). Plantas que expandem suas raízes para os horizontes profundos do solo absorvem os nutrientes presentes nas camadas subsuperficiais e com isso, há a liberação progressiva dos nutrientes para a camada superficial após o ciclo de vida dessas plantas, tornando os nutrientes que antes estavam indisponíveis em camadas mais profundas, disponíveis para plantas subseqüentes na camada superficial do solo (Fidelis et al. 2003). Assim, as leguminosas também possuem grande potencial em sistemas agroflorestais, para a reabilitação de áreas degradadas e para auxiliar a sustentabilidade dos solos (Franco e Faria 1997, Jesus et al. 2005). Sua presença pode melhorar a fertilidade dos solos e facilitar o desenvolvimeto de plantas ao seu redor, e reduzir as necessidades de aplicação de adubos minerais (Miyasaka et al. 1984, Fontenele et al. 2009). Cratylia é um gênero neotropical, pertencente à família Leguminoseae (Fabaceae) e subfamília Papilonoideae (taxonomicamente, ainda em processo de definição), sendo que Cratylia argentea (Desv.) Kuntze, é a que possui a mais ampla distribuição dentre as cinco espécies do gênero (Queiroz 1996, Pizarro et al. 1997). Esta espécie ocorre geralmente como um arbusto, podendo atingir entre 1,5 e 3,0 m de altura Há, porém, relatos de ter alcançado até 10,0 m de altura (Anderson 2006). O tronco apresenta-se muito ramificado desde a base, as folhas são trifoliadas, com folíolos membranosos ou coriáceos, flores com tamanhos de 1,5 a 3 cm com pétalas de cor lilás, e o fruto é uma vagem que contém de quatro a oito sementes (Queiroz & Coradín, 1995). Cratylia argentea, cujo nome popular é Camaratuba, é nativa das regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste do Brasil, e ocorre também na Bolívia, Peru e Argentina, em diferentes habitas como mata ciliar, cerrados, caatinga e florestas estacionais (Queiroz & Coradín 1995). Assim, esta espécie parece apresentar grande plasticidade fisiológica, suportando uma extensa faixa edafoclimática, como climas com longa estação seca (de 5 a 6 meses), solos pouco férteis, com baixo ou alto pH, alta concentração de alumínio, além de ambientes com altas altitudes (acima de 1.200 m.) (Maass 1996, Schultze-Kraft 1996). Cratylia argentea possui também grande capacidade de rebrota durante o período de estiagem devido fato de possuir um desenvolvido e vigoroso sistema radicular (Maass 1996). Cratylia argentea também produz sementes de forma abundante, com estabelecimento relativamente rápido, principalmente quando as condições climáticas e edáficas são 21 adequadas (Maass 1996), sendo que sua propagação poder ser facilmente feita através de sementes ou propagação vegetativa, embora haja relatos de insucesso da propagação vegetativa (Pizarro et al. 1997). A eficiência da propagação de Cratylia argentea por sementes depende de fatores como as condições e o tempo de armazenamento, e procedimentos de quebra de dormência (Ramos et al. 2003). A produção de matéria seca de C. argentea é alta, em média de 50 a 150 g/planta nos primeiros 8 meses e, após esse período, há um aumento para uma média de 110-330, já que a incorporação de biomassa é mais alta depois de seus primeiros meses de estabelecimento (Anderson et al. 2006). Em estudo realizado na Colômbia foi relatado que a produção de matéria seca é maior durante o período de chuvas em relação ao período de estiagem, sendo de 190 a 382 (média de 265 g/planta) no auge das chuvas e de 124 a 262 (média de 192 g/planta) no período mais seco, porém essa produção pode se modificar de acordo com distribuição e intensidade das chuvas e fatores edáficos, além do conteúdo de matéria orgânica do local (Anderson et al. 2006). Estudos previamente realizados mostraram que o gênero C. argentea pode apresentar nódulos ativos, mesmo sem inoculação na semente, geralmente apresentando relações simbióticas com bactérias do grupo Cowpea (de origem tropical), porém, a efetividade da nodulação poderá ser variável de acordo com vários fatores abióticos (Pizarro & Coradín 1995). Cratylia argentea é frequentemente usada como planta forrageira devido a sua adaptação a diferentes condições edafoclimáticas, como discutido anteriormente (Ramos et al. 2003). Experimentos de competição com outras espécies de leguminosas mostraram que C. argentea possui vantagem competitiva, mesmo sob condições de pastejo e regime de corte, mantendo suas folhas verdes, mesmo no auge da estação seca, devido principalmente, as suas raízes profundas e difusas (Ramos et al. 2003). Segundo Anderson (2006), esta leguminosa pode também ser usada para inúmeras outras finalidades, como cobertura viva do solo, fornecedora de sombra pra culturas jovens como cacau e café, além de aumentar a fertilidade do solo (funcionar como adubo verde) e prevenir erosão (funcionando como cerca viva). Porém, os estudos envolvendo C. argentea geralmente estão ligados ao seu alto valor nutricional explorado como planta forrageira e não há estudos com essa espécie para atenuar processos erosivos em voçorocas ou mesmo revegetar áreas. 22 CAPÍTULO 1- CRESCIMENTO DE ESPÉCIES NATIVAS DE CERRADO E DE VETIVERIA ZIZANIOIDES EM PROCESSOS DE REVEGETAÇÃO DE VOÇOROCAS 23 Introdução Voçorocas são grandes feições erosivas e representam um estágio avançado de degradação ambiental, constituindo um dos principais riscos ambientais no Brasil (Guerra & Botelho 1996). Impactos sócio-ambientais como assoreamento de rios e córregos, perda de hábitats naturais e redução do nível do lenço freático, são exemplos das conseqüências provenientes da formação de voçorocas (Bacellar 2000). Devido a características litológicas e geomorfológicas parte do Brasil, em especial, Minas Gerais, se localize em áreas naturalmente muito susceptíveis à erosão e a formação de voçorocas, grande parte dessas feições é resultante de atividades antrópicas ou intensificada por tais atividades (Bacellar et al. 2001). A não adoção de técnicas de conservação do solo e da água em áreas agrícolas, o desmatamento, os valos e estradas mal planejadas são apontadas como principais atividades antrópicas desenvolvidas no sudeste do Brasil que podem ser responsáveis por iniciar a formação de voçorocas (Bacellar et al. 2005). Além do mau uso do solo, em algumas regiões do Brasil como o sudeste, o longo período de seca (de 5 a mais meses) torna a vegetação mais escassa, deixando o solo sem proteção e assim, mais susceptível a formação de voçorocas (Parzanese 1991). De fato, atividades que modificam ou removam a cobertura vegetal podem deixar o solo exposto e desprotegido, facilitando a ação de processos erosivos (Munõz-Robles et al. 2010). A importância da cobertura vegetal do solo para atenuar processos erosivos já é bem conhecida (Morgan 2005, De Baets et al. 2006), entretanto, as condições encontradas dentro da voçoroca podem não permitir que haja um processo natural de colonização e estabelecimento de espécies vegetais (Cohen & Rey, 2005). Áreas degradadas como as de voçorocas dificultam a revegetação natural devido não só aos contínuos processos erosivos, mas também à escassez de nutrientes e matéria orgânica, além da possível ausência ou limitação de propágulos da comunidade vegetal anterior, sendo necessárias medidas de revegetação antrópica (Peters et al. 2006).Entretanto, há ainda poucos estudos que forneçam informações sobre as respostas das espécies vegetais frente às situações de estresse e distúrbio encontradas em áreas erodidas (Guerrero-Campo et al. 2008). Alguns estudos demonstram que gramíneas podem ser bastante eficientes para o controle de processos erosivos, devido ao seu rápido crescimento, promovendo uma completa e perene cobertura do solo (Gylssels & Poesen 2003; Bindle 2003). Em geral, 95% da biomassa das gramíneas são encontrados nos primeiros 30 cm do solo garantindo sua efetividade no controle de processos erosivos (De Baets et al. 2006). Além de gramíneas, 24 leguminosas são também consideradas boas alternativas para elevar rapidamente a qualidade do solo devido ao rápido crescimento e deposição de serapilheira de algumas espécies e as suas habilidades de associação com organismos fixadores de nitrogênio. Leguminosas possuem alto potencial de recuperar características biológicas, químicas e físicas do solo (Miyasaka 1984). Assim, o consórcio entre leguminosas e gramíneas tem sido considerado uma opção mais eficiente para reverter o processo de degradação de áreas, incluindo as erodidas (Silva e Saliba 2007). No Brasil, a despeito da diversidade e ampla distribuição de gramíneas e leguminosas nativas, a maior parte dos trabalhos que visam à recuperação de áreas degradadas é realizada com espécies exóticas (Martins 2001, Martins 1996, Barbosa 2000). A introdução de tais espécies pode causar sérios problemas à biodiversidade local (Martins 2006), impactar o ecossistema, descaracterizar fisionomias e modificar sua estrutura (Pivello, 2005). O relativo sucesso das espécies exóticas em recuperação de áreas degradadas no Brasil pode ser responsável, em parte, pelo conformismo acadêmico quanto à busca por alternativas mais ecologicamente viáveis, reduzindo o conhecimento técnico e empreendedor sobre a biologia das espécies nativas com potencial para revegetação (Barbosa 2000). A falta de conhecimentos básicos sobre as taxas de germinação, estabelecimento e desenvolvimento de espécies nativas é, sem dúvida, o maior impedimento para o uso de espécies nativas locais em processos de revegetacão. Tal uso poderá representar uma grande contribuição para a manutenção da biodiversidade local, protegendo ou mesmo expandindo as fontes naturais de diversidade genética, além de apresentar vantagens técnicas e econômicas, como barateamento dos custos de produção e transporte de mudas (Moreira, 2002). Objetivos 1- Caracterização química e física dos sedimentos encontrados dentro da voçoroca na área de plantio das espécies Echinolaena inflexa (Poir.) Chase e Cratylia argentea (Desv.) Kuntze, ambas nativas do cerrado, e da gramínea exótica Vetiveria zizanioides; 2- Comparar a concentração dos macronutrientes N, P, K e de matéria orgânica do solo da área de plantio no início e ao final do experimento; 25 3- Avaliar o estabelecimento e desenvolvimento de touceiras das gramíneas Echinolaena inflexa (Poir.) Chase, Vetiveria zizanioides (L.) Nash, e da leguminosa Cratylia argentea (Desv.) Kuntze dentro da voçoroca estudada; 4- Quantificar a taxa de germinação de sementes de Cratylia argentea (Desv.) Kuntze em condições de campo; 5- Verificar se Cratylia argentea irá formar nódulos de fixação biológica de N2 e desta forma, influenciar positivamente as taxas de crescimento e desenvolvimento das gramíneas Echinolaena inflexa e Vetiveria zizanioides; 6- Quantificar a biomassa seca das espécies, após remoção das mesmas ao final do experimento. Material e Métodos Características e escolha das espécies estudadas Para a escolha das espécies levou-se em conta: 1) disponibilidade de mudas e sementes; 2) baixo custo; 3) possível morfologia radicular eficaz em atenuar processos erosivos e fixar as partículas do solo; 4) características fisiológicas que permitem o crescimento e estabelecimento das espécies em condições edáficas adversas como alta acidez e baixo teor nutricional. Echinolaena inflexa- popularmente conhecido como capim Flexinha é uma gramínea nativa do cerrado brasileiro com alta abundância e produção de biomassa (Souza et al. 2005), com possível potencial para recuperação de áreas degradadas, porém nunca foi utilizada para esta finalidade (Martins 2001). Além disso, E. inflexa é a espécie de gramínea predominante que circunda o perímetro da voçoroca, tornando o uso de material vegetativo dessa espécie biologicamente e economicamente viável. Vetiveria zizanioides- popularmente conhecido com capim Vetiver é uma gramínea de origem indiana, que possui um sistema radicular altamente ramificado e profundo (até 3m de profundidade), o que pode acarretar em um “grampeamento” natural do solo (Ke et al. 2003), além de possuir características fisiológicas que a permite tolerar diversas condições edáficas 26 e climáticas (Dudai et al. 2006). São plantas estéreis e não se reproduzem através de rizomas ou estolões (se multiplicam através de perfilhos que crescem e desenvolvem até certo ponto) e por isso não possuem potencial para se tornar invasora (Pereira 2006). Cratylia argentea- é conhecida popularmente como Camaratuba, Copada e Cipó-prata (Ramos et al. 2003). Esta espécie é uma leguminosa nativa da América do Sul, de ocorrência predominante no cerrado brasileiro (Ramos et al. 2003). Apresenta adaptação a uma ampla faixa de climas e solos (Schultze-kraft 1996), alta produção de matéria seca e sementes, além de um desenvolvido e vigoroso sistema radicular (Maass 1996). Essa espécie pode apresentar relações simbióticas com bactérias do grupo Cowpea e como conseqüência disponibilizar nitrogênio no solo. Porém o potencial desta leguminosa tem sido aproveitado somente como planta forrageira e não há relatos de estudos da espécie para recuperação de áreas degradadas e/ou trabalhos de revegetação. Delineamento experimental O experimento foi implantado na voçoroca em blocos ao acaso, com sete repetições de parcelas de 1 x 1 m, distantes entre si por 1 m. Foram testados quatro tratamentos: 1) touceiras de Echinolaena inflexa crescendo sozinhas; 2) touceiras de Vetiveria zizanioides crescendo sozinhas; 3) touceira de Echinolaena inflexa em consórcio com Cratylia argentea; 4) touceira de Vetiveria zizanioides em consórcio com Cratylia argentea (figuras I.1 e I.2 anexo). O período de amostragem foi de março (fim da estação chuvosa) a outubro (fim da estação seca) de 2010. O período de estudo, em sua maioria concentrado durante a estação seca, foi delimitado em função da freqüência e intensidade dos eventos de chuva, que normalmente tornavam a área de estudo inacessível e o solo instável. No centro de cada parcela foi transplantada uma touceira de aproximadamente 0,5 m2 de E. inflexa ou V. zizanioides. Duas plântulas de 30 dias de idade da leguminosa Cratylia argentea (germinadas no laboratório em fitocelas contendo sedimento oriundo de dentro da voçoroca estudada) foram plantadas, a cinco centímetros em cada lado (Norte e Sul) da touceira das gramíneas. Além disso, foram semeadas quatro sementes de C. argentea (duas na direção Leste e duas a Oeste das touceiras de gramíneas). 27 Análise Granulométrica Este ensaio foi realizado segundo procedimentos descritos pela ABNT (NBR 7181/1984), Antes dos procedimentos, as amostras foram secas, homogeneizadas, quarteadas e cerca de 400g separados para as análises granulométricas. Nas análises via seca, 200g do material foi então colocado sobre um conjunto de peneiras, dispostas na seguinte sequência de diâmetros (mm): 2,00; 1,00; 0,500; 0,250; 0,125; 0,063. O conjunto de peneiras foi colocado sobre um fundo e agitado durante 20 minutos em um agitador eletromecânico tipo Ro-tap (SOLOTEST®). Finalizado o processo, o conteúdo de cada peneira foi pesado. Umidade do solo Mensalmente, amostras de sedimento de todas as parcelas foram coletadas e acondicionadas em sacos plásticos e transportadas em caixa de isopor até o laboratório. Em laboratório, a umidade do solo foi determinada pelo método gravimétrico que consiste na pesagem de amostras frescas de solo, sendo imediatamente levadas a estufa para secagem durante 48 horas a temperatura de 100 °C. Após a secagem as amostras foram novamente pesadas e a umidade contida em cada amostra, determinada em porcentagem. Análises nutricionais, químicas e pH do solo As amostras de sedimento da voçoroca coletadas na área do experimento foram enviadas ao laboratório de análise de solo do Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa (UFV) para a determinação de N, P, K, matéria orgânica (carbono orgânico pelo método Walkeyblack) e pH (em água e em KCl). A concentração de N total foi determinada através do método de Kjeldahl e a de P disponível e K foi quantificada através do método Mehlich. (Embrapa et al. 1997). A concentração total dos elementos presente nas amostras de sedimentos foram determinadas após digestão total (HF, HNO3, HCL) (Moutte 2003 ), através do Espectrômetro de Emissão Atômica via Plasma (ICP-OES) no laboratório de Geoquímica Ambiental do Degeo - UFOP. Germinação e semeadura de sementes de C. argentea 28 A quebra de dormência foi feita através da submersão das sementes em água destilada por 24 horas. A semeadura foi feita nos primeiros 2 cm da camada superficial do sedimento da voçoroca e o índice de germinação de sementes foi expresso em porcentagem das sementes germinadas ao longo do tempo. Sobrevivência e crescimento das plantas A sobrevivência das plantas foi avaliada quinzenalmente no campo. Foram feitas também medidas mensais do crescimento e observações quinzenais de fases fenológicas. O crescimento dos indivíduos de C. argentea foi estimado através de mensurações da altura do caule e do seu diâmetro basal com auxílio de régua e paquímetro digital. O crescimento da gramínea V. zizanioides foi estimado através da medida mensal da altura dos seus feixes de folhas, já o crescimento da gramínea E. inflexa foi avaliado através da estimativa da área de ocupação por folhas verdes em cada touceira. Para isso, a touceira foi dividida em 4 quadrantes e o percentual de ocupação de folhas verdes por quadrante foi estimado (com posterior soma dos percentuais dos 4 quadrantes). Quatro categorias de ocupação foram determinadas: De 0 a 25% de ocupação de folhas verdes na touceira- grau 1; 26 a 50% de ocupação grau 2; 51 a 75% de ocupação - grau 3; e 76 a 100% de ocupação - grau 4. Biomassa seca das espécies vegetais Ao final do experimento, em Outubro de 2011, todas as plantas foram coletadas. As partes aéreas e radiculares foram separadas, lavadas com água destilada em laboratório, colocadas em sacos de papel e colocadas para secar em estufa de circulação à 65°C por 72 horas. Depois disso, o material foi pesado para determinação da massa seca. Nodulação de C. argentea Após a coleta das plântulas de C. argentea suas raízes foram examinadas quanto à presença de nódulos de fixação biológica de nitrogênio. Análises de solos No início, antes do transplante das plantas para dentro da voçoroca, e no final do experimento, depois da coleta das plantas, 14 amostras de sedimento da voçoroca (de duas parcelas por tratamento) foram analisadas quanto à concentração de N, P, K, matéria orgânica e pH no laboratório de análises de solos da Universidade Federal de Viçosa. 29 Sub-amostras de solo coletadas no início do experimento foram destinadas a realização do ensaio granulométrico segundo procedimentos descritos pela ABNT (NBR 7181/1984). Amostras secas foram pesadas e colocadas em peneiras dispostas na seguinte seqüência de abertura de tamanho da malha em mm: 2,00; 1,00; 0,500; 0,250; 0,125; 0,063. O conjunto de peneiras foi colocado em um agitador mecânico durante 20 minutos, e seguiuse a pesagem da quantidade da amostra detida em cada peneira para determinação da porcentagem de cada fração granulométrica Análises Estatísticas Os dados foram submetidos ao teste de normalidade de Komogorov-Smirnov. Para verificar a variação no percentual de umidade entre os meses foi utilizado o teste de Kruskal Wallis. Para testar o crescimento das gramíneas V. zizanioides e E. inflexa e as diferenças entre os tratamentos foi feita Anova de medidas repetidas e modelos lineares mistos, respectivamente. O crescimento em altura e diâmetro de plântulas de C. argentea foi analisado através de modelos mistos e teste de Wilcoxon. Também foi usado o teste de Wilcoxon para testar se as concentrações de nutrientes N, P, K e matéria orgânica foram maiores ao final do experimento. Para analisar a razão da raiz: parte aérea da biomassa entre as gramíneas e leguminosas foi utilizada Anova Hierárquica e Anova simples. Resultados Caracterização do sedimento da voçoroca Os resultados dos ensaios granulométricos mostram uma grande variação granulométrica (textural) entre amostras de sedimentos coletadas na área de estudo, conforme apresentado na figura 2.1. A umidade mensal medida durante toda estação seca (de abril a setembro), também variou entre os meses, conforme apresentado na figura 2.2, mostrando variação significativa entre os meses amostrados (H4= 23,43; p<0,05). Os elementos detectados através da digestão total estão apresentados na tabela 2.1 e estão divididos em essenciais (macronutrientes e micronutrientes) e não-essenciais, conforme Marschner (1986). 30 FIGURA 2.1: Porcentagem média de representatividade das diferentes frações granulométricas (CA- cascalho (>4mm); AMG- areia muito grossa (>2mm); AG- areia grossa (>1mm); AM- areia média (>0,5mm); AF- areia fina (>0,125mm); AMF- areia muito fina (0,063mm); S/A – silte e argila (<0,063mm) em amostras de sedimentos da área de estudo, dentro da voçoroca. FIGURA 2.2: Umidade mensal (%) do sedimento acumulado dentro da voçoroca (das parcelas do estudo) durante a estação seca, mostrando variação significativa entre os meses. 31 TABELA 2.1: médias das concentrações dos elementos expressos em mg/kg e ± desvio padrão de macro, micronutrientes e elementos não essenciais presentes nos sedimentos encontrados dentro da voçoroca. Elemento Mg/Kg Macronutrientes Ca 106,93 (± 24,02) K 14402,67 (± 6573,06) Mg 2191,66 (± 890,51) P 247,86 (± 272,92) S 73,00 (± 38,08) Micronutrientes Cu 17,89 (±23,02) Fe 42016,33 (±8212,37) Mn 113,23 (±19,00) Zn 72,18 (±21,50) Não essenciais Al 216961,3 (± 20952,98) Ba 548,33 (± 255, 68) Co 10,38 (± 2,40) Cr 15,01 (± 1,35) Li 33,07 (± 13,44) Na 228,1 (± 76,86) Ni 8 (± 0,44) Sc 3,41 (± 0,51) 32 Sr 25,31 (± 25,08) Th 19,73 (± 2,61) Ti 4172.33 (± 1016.70) V 14,60 (± 19,10) Y 2,21 (± 0,58) Zr 419,06 (± 21,50) As concentrações de N, P, K e matéria orgânica não diferiram entre os tratamentos tanto no início quanto no fim e foram consideradas baixas, caracterizando um solo distrófico. Houve ampla variação entre as amostras de sedimento na área, especialmente para K (tabela 1). A média do pH foi de 4,52 (água) e 5,42 (em KCl). As concentrações de N (g/Kg) e K (mg/Kg) foram significativamente maiores no fim em relação ao início do experimento (Z= 1,85; P< 0, 05), ( Z= 2,66; P<0, 05), enquanto os valores de P (mg/Kg) e matéria orgânica não diferiram (Z= 0,13; P>0, 05), ( Z= 0,16; P>0, 05) (tabela 2.1). TABELA 2.2: Concentração média de N, P, K e matéria orgânica no sedimento no início do experimento (plantio das espécies) e ao fim do experimento (oito meses depois do plantio).* indica diferença significativa entre o início e o fim do estudo. Início Final N (g/Kg) 0.14 (± 0.06) 0.19 (±0.09) * P (mg/Kg) 1.29 (±0.24) 1.29 (±0.14) K (mg/Kg) 0.85 (±1.65) 6.50 (±9.11)* 0.19 (±0.17) 0.19 (±0.18) Matéria orgânica (dag/Kg) Germinação, estabelecimento e crescimento de C. argentea Altas taxas de germinação foram observadas para as sementes semeadas em fitocelas no laboratório (100%) e na voçoroca (93%) (tabela 2.3). A sobrevivência foi de 79% para plântulas que foram transplantadas do laboratório para o campo e de 73% para as plântulas 33 oriundas de germinação no campo. Ao final do experimento, foi observada a presença de nódulos de fixação de nitrogênio em apenas um indivíduo transplantado. TABELA 2.3: Falha na germinação de C. argentea (%) dentro da voçoroca até 120 dias (quando não há mais alterações no percentual de germinação). Tempo Falha na germinação até tempo t IC (95%) 30 60 90 120 0.42 0.24 0.1 0.03 0.29 a 0.55 0.11 a 0.36 0.01 a 0.2 0.0 a 0.07 Influência de Cratylia argentea no desenvolvimento das espécies Vetiveria zizanioides e Echinolaena inflexa Não foi verificado efeito significativo da presença de C. argentea sobre o crescimento das gramíneas E. inflexa e V. zizanioides (F4.52= 1,39 ; P > 0,05; F4.52= 0,24 ; P > 0,05). A razão da biomassa raiz:parte aérea também não diferiu entre o controle (tratamentos sem C. argenta) e os tratamentos de consórcio com a leguminosa para ambas as espécies de gramíneas (F2= 0,76 ; P > 0,05). Como não houve efeito do tratamento (presença de C. argentea) no desenvolvimento em geral das espécies de gramíneas, tal tratamento foi desconsiderado e todas as demais análises foram feitas considerando-se somente o crescimento das três espécies independentemente se foram transplantadas sozinhas ou em consórcio. Crescimento das plantas O crescimento em altura (cm) das plântulas de C. argentea entre abril e outubro, tanto provenientes de germinação na voçoroca (F1,5= 56,9; P < 0,05) como das plântulas que foram transplantadas (F1,5= 25,7; P < 0,05) foi significativo (figura 2.2). Assim como a altura, o crescimento das plântulas de C. argentea em diâmetro (mm) também foi significativo (Z11= 2,9; P<0,05). Todas as touceiras de V. zizanioides e E. inflexa sobreviveram após o plantio na voçoroca. No entanto, somente o crescimento de V. zizanioides foi significativo (F2,36= 77,4; P < 0,05), (F4.52= 3,045 ; P > 0,05) (figura 2.3) e (figura 2.4) . Grande variação entre as parcelas foi observada, sendo o crescimento mínimo dos feixes de folhas, ao longo dos seis meses de estudo, de 17,75 cm e o máximo de 74,25 cm, e o crescimento médio 48, 56 cm. O crescimento de E. inflexa, avaliado de acordo com o grau de ocupação de brotos verdes em 34 sua touceira, variou do grau 1 ao 3 no período, ou seja, de 0 a 75% de área verde, sendo que em nenhum dos meses de amostragem a ocupação dos brotos verdes de E. inflexa ultrapassou o percentual de 75% (grau 4). FIGURA 2.3: Crescimento em altura (cm) de plântulas de C. argentea que foram transplantadas para voçoroca (ponto vazio) e plântulas de C. argentea oriundas de germinação na própria voçoroca (ponto cheio), durante os meses de amostragem. FIGURA 2.4: Média do crescimento em altura (cm) de V. zizanioides mensurado a cada trinta dias após o plantio no campo (de Abril a Outubro de 2010). 35 FIGURA 2.5: Número (expresso em porcentagem) de touceiras de E. inflexa que apresentam os graus de 1 a 4 de ocupação de brotos verdes (de Abril a Outubro de 2010). Grau 1 representa 0 a 25% de ocupação de brotos verdes na touceira, grau 2 representa 26 a 50%, grau 3 representa 51 a 75% e grau 4 representa 76 a 100%. Biomassa seca das espécies A razão raiz: parte aérea variou entre as plântulas de C. argentea (figura 2.5). As plântulas mais velhas (transplantadas) apresentaram uma razão maior de raiz: parte aérea (F1= 97,2; P < 0,05), média de 1,02, enquanto que as plântulas mais novas (que germinaram na voçoroca) apresentaram uma menor razão (F1= 4,7; P < 0,05) média de 0,61. As duas espécies de gramíneas apresentaram, entre si, diferença significativa de alocação de biomassa (F1= 97,2; P < 0,05) (figura 2.6), entre raiz e parte aérea, sendo a razão de 0,45 em V. zizanioides, e de 1,5 em E. inflexa. A biomassa seca da parte aérea de V. zizanioides variou entre 8,99 g e 26,31 g (média de 18,48 g), enquanto a biomassa radicular variou entre 4,18 g e 21,4 g (média de 8,43 g). Para E. inflexa, a biomassa seca aérea variou entre 13 a 54 g (média de 42,33 g), e radicular entre 30 e 75 g, média de (51,95g). 36 FIGURA 2.6: Razão raiz: parte aérea da biomassa seca das plântulas de C. argentea transplantadas para dentro da voçoroca e das plântulas oriundas de germinação dentro da voçoroca. FIGURA 2.7: Razão raiz: parte aérea da biomassa seca das gramíneas E. inflexa e V. zizanioides coletadas ao final do experimento. 37 Discussão A grande variação encontrada nos dados de crescimento e biomassa seca dentro das populações estudadas pode ser reflexo da observada heterogeneidade das condições edáficas (granulometria, umidade e fertilidade) do local do plantio das espécies. Sedimentos encontrados dentro da voçoroca podem ser oriundos de diferentes horizontes do solo e de diferentes localidades, acarretando na diferenciação de atributos químicos e físicos desses sedimentos (Machado 2007). A heterogeneidade espacial pode levar a diferenciação na capacidade de campo do solo, entre outros aspectos relacionados à disponibilidade de água e nutrientes (Brady & Weil 2008). A maior fração granulométrica, em termos de porcentagem, encontrada nos sedimentos foi representada pela fração silte + argila. O alto percentual de silte encontrado nas amostras é resultado do acúmulo dos solos do espesso horizonte C (espessuras superiores a 30 m - Sobreira 1998), extremamente siltoso (Bacellar, 2000), e muito erodível (Sobreira 2000). O maior percentual de silte em amostras de sedimentos depositados dentro da voçoroca do estudo (chamadas de coluvio) foi encontrado em estudo realizado por Ribeiro et al. (2010). O intenso processo de lixiviação e erosão a que as voçorocas estão submetidas pode remover as camadas superiores do solo e juntamente com elas, os nutrientes, acarretando em decréscimo significativo da fertilidade do solo (Stavi & Lal 2011). De fato, as concentrações médias de N, P, K e matéria orgânica encontradas são muito baixas, mesmo quando comparadas a camadas superficiais de solos distróficos como os do cerrado, por exemplo, Haridassan (2000), Kozovits (2007). Adicionalmente, o baixo pH encontrado pode favorecer a deficiência de bases trocáveis como Ca, K e Mg, reduzir a capacidade de troca de cátions e elevar os níveis de Al disponível (Taiz et al. 2004). Tais fatos, associados à redução de atividade microbiológica de solo e instabilidade dos sedimentos acumulados dentro da voçoroca (Gomide et al. 2011), pode configurar um ambiente bastante restritivo ao estabelecimento e crescimento de plantas (Cohen e Rey 2005). Neste sentido, o desempenho das espécies estudadas foi bastante satisfatório, já que houve 100% de sobrevivência das populações de E. inflexa, V. zizanioides e C. argentea transplantadas para a área, mesmo durante a estação seca, fase mais crítica do ano. Após quinze dias do plantio da gramínea todas as folhas de V. zizanioides se tornaram amareladas e após um mês de plantio já havia presença de muitas folhas verdes em várias mudas. Com o início do inverno, as folhas se tornaram arroxeadas (principalmente nas pontas) à medida que iam crescendo, e isso se deve segundo Orozco (2009), possivelmente a 38 baixas temperaturas dessa referida estação. Quanto a E. inflexa, após 15 dias do plantio das touceiras dessa gramínea na área, praticamente todas as touceiras estavam secas. Após esse período, a ocupação de brotos verdes na touceira da gramínea variou de acordo com o avanço da estação seca, já que de Abril até Maio houve um aumento na ocupação brotos verdes, de Maio até Junho houve uma estabilização dessa ocupação, de Junho até Setembro queda, seguido por aumento imediato de brotos verdes em Outubro com após o início das primeiras chuvas. Entre as espécies do estudo, a gramínea Vetiveria zizaniodes é a única que é utilizada em diversos projetos com a finalidade de revegetar áreas e conter processos erosivos (Truong & Hengchaovanich 1997, Truong 1999). Castro (2007), em estudo com revegetação de taludes indica V. zizaniodes como uma eficiente gramínea para projetos que envolvam revegetação de áreas, principalmente devido à densa cobertura vegetal oferecida pela mesma. Características de V. zizaniodes como talos retos e enrijecidos, raízes que atingem grandes profundidades, além de grandes e densas touceiras formadas pela mesma, são algumas das características que podem justificar sua eficiência para atenuar a erosão do solo (Truong & Engchaovanich 1997). No entanto, não há relatos do uso de V. zizaniodes para revegetação de voçorocas, onde o processo erosivo é intenso e a remoção de material muito rápida, além de condições edafo-climáticas inadequadas para o crescimento e estabelecimento de vegetação. Chong & Chu (2007) verificaram que o crescimento em altura e a alocação de biomassa de V. zizaniodes tanto para parte radicular quanto para parte aérea foram prejudicados em condições de escassez hídrica. Quando tal gramínea é plantada em condições de baixa disponibilidade de água (de acordo com o local e período do ano), recomenda-se a prática de irrigação principalmente após a implantação das mudas (Truong & Hengchaovanich 1997). A fase inicial de estabelecimento da gramínea pode ser a mais prejudicada em situações de estresse hídrico, já que após o período crítico inicial do estabelecimento de V. zizaniodes a mesma pode sobreviver e se comportar como espécie xerófita (Dudai et al. 2006). O desenvolvimento de V. zizaniodes pode ser afetado pela escassez de água, devido à grande demanda que a espécie possui de água, já que segundo Pereira (2006), essa gramínea pode consumir até 6, 86 litros de água dia, para cada 1 kg de biomassa alocada. No presente estudo, a biomassa seca de V. zizaniodes variou entre 8,99 g e 26,31 g para a parte aérea, enquanto que a biomassa da parte radicular variou entre 4,18 g e 21,4 g em oito meses de estudo. Em estudo realizado por Chong e Chu (2007), ao longo de um ano foi 39 encontrada uma variação entre 40,0 g a 200,0 g da parte aérea e de 20,0 a 110,0 g da parte radicular, sendo que os maiores valores de biomassa seca estavam sempre relacionados ao maior suprimento de água para a gramínea. O crescimento final da espécie em altura variou entre 17,75 cm e 74,25 cm, com uma. Em um estudo realizado por Orozco (2009), em outro local sob condições de baixa precipitação (no período de Abril a Outubro), os valores encontrados para o crescimento em altura de V. zizaniodes variaram de 10,0 cm a 50,0 cm de altura. Contudo, enquanto no trabalho de Orozco (2009) houve a mortalidade de algumas mudas de V. zizaniodes, neste trabalho todas as mudas se estabeleceram e desenvolveram. Além da disponibilidade hídrica, a disponibilidade de nutrientes também contribui para o melhor desenvolvimento e crescimento de V. zizaniodes, conforme relatado por outros estudos (Dudai et al. 2006, Edelstein et al. 2009). No entanto, no presente estudo, a gramínea cresceu significativamente e manteve sua superfície fotossintetizante dentro da voçoroca durante a estação seca sem nenhuma prática cultural, adição de fertilizantes e irrigação, reforçando o potencial de sobrevivência e crescimento de V. zizaniodes sob condições edafoclimáticas . adversas. Ao contrário de V. zizanioides, não há estudos que predigam os limites de tolerância a certas condições ambientais pela gramínea E. inflexa. Entretanto, devido à sua ocorrência em diversas regiões e tipos de solos no país, acredita-se que esta gramínea possa ter grande plasticidade ecofisiológica, eventualmente a ponto de suportar as condições da voçoroca. Gramíneas da savana tropical podem adquirir e conservar água de maneiras diferentes (Amundson et al. 1995), mas geralmente, não toleram o período de estiagem, e como estratégia, reduzem sua a área foliar ativa para evitar a perda de água durante a seca estacional (Silva & Klink 2001). Segundo Dewar (1993), em condições de baixa disponibilidade hídrica e de nitrogênio, as espécies típicas do cerrado normalmente alocam mais recursos para parte radicular, resultando em alto quociente raiz: parte aérea, como observado neste estudo. O investimento em tecidos de reserva de água e nutrientes em órgãos subterrâneos é aspecto comum em espécies de cerrado e tem sido relacionado ao potencial de rebrota da parte aérea após o período de estiagem ou distúrbios como o fogo (Eiten 1972). Leite et al. (1997) verificaram que E. inflexa iniciou a produção de folhas verdes na transição entre as estações seca e chuvosa, apresentando o máximo de área foliar ativa no período de máxima precipitação. Silva e Klink (2001) também encontraram estreita relação entre precipitação e produção de folhas de gramíneas do cerrado, como E. inflexa . No interior da voçoroca, as touceiras de E. inflexa comportaram-se como esperado, reduzindo drasticamente o percentual 40 de ocupação de brotos verdes durante a estação seca, e, com o início das primeiras chuvas, apresentando imediata rebrota da parte aérea. Assim como o vetiver, o crescimento de E. inflexa também parece responder positivamente à adição de nutrientes, especialmente de nitrogênio (Miranda 2009, Brito et al. 2008). Porém, como não foi observada a nodulação nos indivíduos de C. argentea, não houve aumento da disponibilidade de N no solo e assim, o crescimento de E. inflexa não foi facilitado. Por outro lado, apesar das condições desfavoráveis, sem nenhum trato cultural a gramínea, também apresentou respostas esperadas de crescimento durante a estação seca e capacidade de rebrota com o início das chuvas. Cratylia argentea é uma espécie considerada tolerante a seca, sendo capaz de produzir cerca de 30% de sua biomassa anual no período de estiagem (Ibrahim et al. 2001). Porém, assim como as espécies de gramíneas, tal espécie também se desenvolve significativamente melhor sob condições de maior disponibilidade de água (Anderson et al. 2006). O efeito do déficit hídrico em plântulas de C. argentea pôde ser observado comparando-se o crescimento inicial das plântulas que germinaram em fitocelas no laboratório em sedimento da voçoroca, e irrigadas diariamente, com aquelas germinadas diretamente no campo, sem irrigação e sob alta radiação luminosa. As plântulas desenvolvidas em laboratório tiveram crescimento em altura em média de 6,0 cm no primeiro mês, enquanto que as plântulas que desenvolveram em condições de campo cresceram em média 1,5 cm. A variação da altura das de plântulas C. argentea, de forma geral, foi de 2,0 a 12,0 cm, sendo que um estudo feito por Anderson et al. (2006), a partir de oito meses de amostragem relataram uma variação no crescimento em altura para C. argentea de 16,0 a 22,0 cm . Essa discrepância entre os resultados também pode ser reflexo da escassez hídrica em que estavam submetidas às plântulas de leguminosa do presente estudo. No entanto, o período crítico de sobrevivência de toda espécie vegetal é o estágio de plântula (Raven 2001), e nesse sentido, plântulas de C. argentea, mesmo sob condições de escassez hídrica e baixa disponibilidade de nutrientes apresentou resultados satisfatórios em termos de germinação (93%) e sobrevivência (de 73 a 79%) dentro da voçoroca estudada. Segundo Anderson (2006), C. argentea pode apresentar associações com rizóbios do tipo Cowpea (presente em solos tropicais), o que foi observado em somente um indivíduo no campo. Assim, o esperado aumento da disponibilidade de N nas parcelas plantadas com a leguminosa não ocorreu, explicando a ausência de diferença nos parâmetros de crescimento de V. zizanioides e E. inflexa entre o controle e o tratamento (consórcio com a leguminosa). 41 A nodulação de C. argentea pode ter sido impossibilitada devido a interação de várias características edafo-climáticas que interferem diretamente na nodulação e fixação biológica de nitrogênio, como disponibilidade de elementos como Mo, Fe, S (Raven 2001), P e K (Gualter et al. 2008) e pH do solo (Raven 2001), além da ausência da microbiota necessária. Além da possibilidade de associação simbiótica com fixadores de nitrogênio, C. argentea também pode ser usada em trabalhos de revegetação e para atenuar processos erosivos devido a outras características, como estabelecimento relativamente rápido, alta retenção foliar, mesmo em grandes períodos de seca, e sistema radicular desenvolvido e grandemente ramificado (Maass 1996). A alta taxa de germinação das sementes, sobrevivência e crescimento de C. argentea no interior da voçoroca também indicam grande potencial para seu uso em projetos de recuperação de áreas como estas. No entanto, até o momento, C. argentea tem sido aproveitada somente como forrageira, devido a alta produção de biomassa e sementes, tolerância a seca estacional e a condições edáficas adversas (como baixa fertilidade e baixo pH), sem relatos de outros estudos dessa leguminosa em trabalhos de revegetação e recuperação de áreas degradadas. Em áreas erodidas como voçorocas, devido a intensos processos de lixiviação, as camadas superiores do solo onde os nutrientes estão contidos e ciclados foram perdidas, acarretando em um decréscimo na quantidade de nutrientes disponíveis para o uso das plantas (Stavi & Lal 2011). No entanto, a partir do estabelecimento da vegetação o conteúdo de matéria orgânica do solo tende a aumentar (Andreu et al. 1998), assim como a concentração de nutrientes como o K e N após a instalação da vegetação, em relação ao solo desnudo (Dass et al. 2011). No entanto, no presente estudo, o aumento da concentração de matéria orgânica e P no solo após o estabelecimento da vegetação (ao final do experimento) pode não ter sido significativo devido ao pouco tempo de experimento e devido ao fato de em solos ácidos, o P pode se ligar ao Fe e Al e formar compostos de baixa solubilidade. No caso da matéria orgânica, adicionalmente ao curto tempo de experimento, a ausência de decomposição de serapilheira ou ausência de serapilheira pode ter acarretado em tal resultado (Schlesinger 1997), já que a principal fonte de matéria orgânica para o solo é oriunda da decomposição serapilheira (embora a mesma não tenha sido medida). 42 CAPÍTULO 2- PARÂMETROS ALOMÉTRICOS DO SISTEMA RADICULAR DE VETIVERIA ZIZANIODES, CRATYLIA ARGENTEA E ECHINOLAENA INFLEXA E SEU POTENCIAL PARA ATENUAR PROCESSOS EROSIVOS 43 Introdução Na região do estudo, Bacellar (2000) identificou através de mapeamento de campo e do estudo de fotos (1: 10.000), um total de 173 voçorocas, que podem atingir até 50 m de profundidade, 150 m de largura e de 400 a 500 m de extensão, além de outras 212 feições erosivas. Ou seja, existem na área aproximadamente 2,75 feições erosivas por km2 (Bacellar 2000). O intenso desenvolvimento de voçorocas e demais feições erosivas na região é consequência, não só dos aspectos geológicos da área (presença de latossolos vermelhos com saprolitos muito erodíveis), como também do mau uso do solo, que data desde o século XVII, representado por sobrepastejo, desmatamento, trilhas, construção de estradas, trincheiras e valos, (Bacellar 2005). Segundo Bacellar (2000) e Drumond e Bacellar (2006), os principais processos erosivos formadores das voçorocas na bacia do rio Maracujá são a erosão hídrica superficial, extremamente intensa e efetiva nos períodos chuvosos, e os escorregamentos (rotacionais e planares), que além de ocorrerem durante a época chuvosa, também ocorrem na estiagem, apesar de menos frequentes. Os escorregamentos com movimentação de porções de solo ocorrentes dentro da voçoroca podem eventualmente ocasionar, queda de aglomerados de vegetação circundante, acarretando na presença de manchas de vegetação dentro da voçoroca. Essas manchas configuram uma oportunidade para se observar a capacidade de sobrevivência e expansão da vegetação nativa da área em um ambiente altamente restritivo ao crescimento de plantas, como o acúmulo de sedimentos dentro da voçoroca (Yadav & Bhushan 2002). Dentro da voçoroca, tais manchas podem atenuar parcialmente os processos erosivos, através da interceptação da água da chuva, aumento da infiltração e da atividade biológica do solo, além de se tornarem fontes de nutrientes e água para as áreas circundantes as manchas (Puigdefábregas 2005). Dessa maneira, a própria cobertura vegetal e a serapilheira fornecida pelas ilhas de vegetação pode melhorar as condições microambientais, tornando as áreas mais propícias para o crescimento e recrutamento de novos indivíduos de espécies vegetais (Zuazo et al. 2006). Pequenas ilhas de vegetação, entretanto, cobrem apenas uma ínfima parte da área interna da voçoroca, sendo necessárias intervenções humanas como obras de engenharia civil e processos de revegetação para acelerar o processo de contenção da erosão (Machado 2007). No caso da revegetação antrópica, as gramíneas são recomendadas para a manutenção e melhoria das propriedades do solo e para atenuar processos erosivos, devido ao seu rápido crescimento e eficiente cobertura do solo (De Baets et al. 2006). Leguminosas também são 44 recomendadas, já que também podem ocupar áreas de forma rápida e interferir na fertilidade do solo, através da sua capacidade de associação com organismos fixadores de nitrogênio (Angie & Hau 2009). Contudo, mesmo com ampla diversidade e distribuição de gramíneas e leguminosas nativas no Brasil, a maior parte dos trabalhos que possuem o objetivo de recuperar e revegetar áreas degradadas utilizam espécies exóticas (Martins 2006). A função estabilizadora que a vegetação exerce sobre o solo, prevenindo ou minimizando processos erosivos, se dá através da combinação de fatores mecânicos e hidráulicos (Gylsen & Poesen 2003). O reforço mecânico é realizado principalmente pelas raízes, através da ancoragem de camadas superficiais até camadas mais estáveis e profundas (Mattia et al. 2005). Raízes afetam propriedades do solo como a taxa de infiltração, estabilidade de agregados, umidade, matéria orgânica e força de cisalhamento (Gylsen & Poesen 2003). As raízes também seguram as partículas superficiais do solo durante o escoamento superficial e aumentam a rugosidade do solo, fornecendo grande capacidade de infiltração e reduzindo a velocidade do fluxo superficial (De Baets et al 2007, Gylsen & Poesen 2006). A combinação de características genéticas das raízes com características do ambiente como estrutura e textura do solo, percentual de umidade, temperatura e competição com outras plantas, pode determinar a eficiência do sistema radicular na fixação das partículas do solo (Bischetti et al. 2005). Essa combinação de fatores acarreta em ampla variação dos padrões de sistemas radiculares e, por consequência, em grande variação na eficiência da ancoragem do solo e no controle de processos erosivos (Bischetti et al. 2005). A influência mecânica exercida no solo pelas raízes pode depender de fatores como grau de bifurcação, aparecimento de pêlos radiculares, atrito entre raiz e solo, distribuição e diâmetro das raízes (Preston & Crozier 1999). O diâmetro das raízes e a força de tensão das mesmas estão diretamente relacionados, tornando a determinação do diâmetro radicular uma importante ferramenta para explicar a influência da arquitetura radicular das plantas na redução da erosão (De Baets et al. 2007). Em geral, raízes de pequeno diâmetro (< 3 mm) são consideradas mais eficientes para a fixação no solo do que raízes grossas, principalmente quando considerada a resistência do solo à erosão hídrica. Solos ao redor de uma densa rede de raízes finas se mostram mais resistentes à passagem da água (Gyssels and Poesen 2003). Raízes grossas cruzam o plano de cisalhamento e agem como âncoras individuais (Pollen 2007), mas não há, ainda, conclusões claras sobre seu papel no controle da erosão (Cammeraat et al. 2005). 45 Gramíneas são, em geral, apontadas como eficientes no combate a erosão devido a suas raízes rasas, densas e finas (Reubens et al. 2007). De Baets (2006) comprovou que as raízes das espécies de gramíneas aumentam a força de cisalhamento do solo e resistência à erosão hídrica. Além disso, segundo Stokes et al. (2009), a presença das raízes de gramíneas é eficiente em atenuar e prevenir a erosão superficial também devido a suas associações com fungos e bactérias que propiciam um aumento da coesão das partículas do solo. No entanto, existem poucos trabalhos que analisam o reforço fornecido ao solo através do sistema radicular das espécies de gramíneas, já que os estudos que quantificam esse reforço desempenhado pelas raízes geralmente são feitos com espécies arbustivas e arbóreas (Comino & Drueta 2010). As raízes das gramíneas são efetivas para reduzir a perda superficial de solo, enquanto que para conter deslizamentos oriundos de profundidades maiores são recomendadas algumas das espécies arbóreas e arbustivas (Comino & Drueta 2010). No entanto, de forma geral, a maior concentração da biomassa radicular das espécies vegetais se encontra na camada superficial do solo (Bischetti et al. 2005, Fan & Chen 2010). Este fato pode acarretar em baixa eficiência das raízes das espécies para impedir o arraste das partículas do solo em camadas mais profundas, onde a densidade radicular pode ser bem mais baixa, em comparação com camadas mais rasas (Reubens et al. 2007). Segundo Stokes et al (2009), através da capacidade de ancoragem do solo realizada pelas raízes de espécies arbóreas, as mesmas podem reduzir o movimento de massa de solo em até 2 m de profundidade, sendo que camadas mais profundas pouco são influenciadas por esse reforço radicular. O uso de plantas com atributos radiculares eficientes na retenção de solo e na prevenção e redução da erosão superficial é bem reconhecido (Fan & Chen 2010). Embora tais efeitos gerais da presença da vegetação sobre o solo já sejam amplamente aceitas, pouco ainda é sabido sobre os atributos do sistema radicular, por exemplo, que melhor se relacionam com o controle de processos erosivos nos mais diferentes ambientes. Além disso, a maior parte dos estudos foi realizada com espécies de interesse agrícola, acarretando em poucas informações sobre espécies naturalmente ocorrente nos ambientes (espécies nativas) (De Baets et al. 2007). 46 Objetivos 1- Comparar as concentrações de N, P, K e matéria orgânica entre a área de plantio (antes da instalação da vegetação) e a área onde há ilhas de vegetação que escorregaram dentro da voçoroca (manchas de E. inflexa, principalmente). 2- Quantificar a taxa de crescimento de manchas (aglomerados) da gramínea Echinolaena inflexa que caíram acidentalmente/naturalmente durante a época chuvosa de 2009. 3- Caracterizar os sistemas radiculares (diâmetro médio, comprimento total, biomassa e comprimento radicular específico) das espécies Echinolaena inflexa, Vetiveria zizaniodes e Cratylia argentea, após sete meses de plantio (período correspondente a toda estação seca) dentro da voçoroca. 4- Estimar a perda de solo por escoamento superficial da água de chuva simulada através do ensaio de Inderbitzen em amostras de solo indeformadas com e sem a presença de Echinolaena inflexa. 5- Verificar se há relação na biomassa total, radicular e aérea de Echinolaena inflexa e a perda de solo por escoamento superficial. Materiais e Métodos Delineamento experimental Em março de 2010, foi implantado um experimento dentro da voçoroca (figura 3.2) em blocos ao acaso, com 7 repetições de parcelas de 1 x 1 m, distantes entre si por 1 m, sendo testados 4 tratamentos: 1) touceiras de Echinolaena inflexa (gramínea nativa) crescendo sozinhas; 2) touceiras de Vetiveria zizanioides (gramínea exótica, de origem indiana) crescendo sozinhas; 3) touceira de Echinolaena inflexa em consórcio com Cratylia argentea (leguminosa nativa); 4) touceira de Vetiveria zizanioides em consórcio com Cratylia argentea. As touceiras das gramíneas E. inflexa e V. zizanioides, com área aproximada de 0,5 m2 cada, foram transplantadas para o centro das parcelas. Duas plântulas da leguminosa Cratylia argentea (germinadas no laboratório em fitocelas contendo sedimento oriundo da voçoroca 47 estudada) foram plantadas, uma no sentido norte e outra no sentido Sul, da touceira das gramíneas. Além disso, foram semeadas quatro sementes de C. argentea (duas no sentido leste e duas no sentido oeste). Análises nutricionais, químicas e pH do solo As amostras de sedimento da voçoroca coletadas na área do experimento foram enviadas ao laboratório de análise de solo do Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa (UFV) para a determinação de N, P, K, matéria orgânica (carbono orgânico) e pH (em água e em KCl). A concentração de N total foi determinada através do método de Kjeldahl, a de fósforo assimilável foi quantificada por meio do desenvolvimento do complexo fósforo-molíbdico e a determinação realizada através do em espectrômetro de massa. A concentração de K no solo foi conseguida através da dosagem em fotômetro de chama e o carbono foi medido através da oxidação da matéria orgânica, com dicromato de potássio em meio sulfúrico (Embrapa et al. 1997). Crescimento de manchas (aglomerados de E. inflexa) Mensalmente, de fevereiro de 2010 a janeiro de 2011, o crescimento das quatro manchas de E. inflexa que se estabeleceram acidentalmente/naturalmente dentro da voçoroca após escorregamento durante a estação chuvosa de 2009, foi medido através da determinação de suas áreas (figura 3.1). No centro de cada mancha, um ponto foi fixado e marcado com auxílio de uma vareta de madeira. Diversos palitos de madeira, coloridos e numerados, foram fixados delimitando o perímetro de cada mancha. A distância entre cada palito e o ponto central foi mensalmente mensurada. Tais dados foram usados para desenhar as manchas em papel milimetrado e para calcular suas as áreas. Determinação da biomassa radicular das espécies vegetais Também ao final do experimento, a partir da coleta das espécies vegetais, as partes aéreas e radiculares foram separadas e lavadas com água destilada em laboratório, colocadas em sacos de papel e colocadas para secar em estufa de circulação à 65°C por 72 horas. Depois disso, o material foi pesado para determinação da massa seca. 48 FIGURA 3.1: manchas de E. inflexa que se estabeleceram acidentalmente/naturalmente dentro da voçoroca após escorregamento durante a estação chuvosa de 2009. 1 2 FIGURA 3.2: voçoroca do estudo, sendo a área 1, o local das amostragem das manchas de E. inflexa e área 2 correspondente a área de plantio das espécies vegetais. 49 Análise do sistema radicular Em outubro de 2010, todas as plantas foram cuidadosamente coletadas (figuras I.3, I.4 e I.5- anexo) O sistema radicular de cada indivíduo (touceira) foi escaneado na Universidade de Brasília (UnB), com o scanner EPSON Perfection V700 Photo, e as imagens foram analisadas com o programa WinRhizo 2008a para determinação do comprimento total e diâmetro médio. O exemplo da imagem de uma raiz analisada pelo referido programa está em anexo (figuras I.6, I.7 e I.8). Comprimento radicular específico O comprimento específico de raiz foi determinado através do comprimento radicular total divido pela biomassa radicular. Segundo Stokes et al. (2009), para herbáceas um alto valor comprimento específico de raiz é o ideal para fornecer reforço mecânico ao solo. Ensaio de Inderbitzen Para avaliar o papel da presença da vegetação na erodibilidade do solo superficial, 10 amostras indeformadas sem vegetação e 10 amostras com presença da gramínea nativa (E. inflexa) foram submetidas ao ensaio geotécnico de Inderbitzen (1961). As amostras indeformadas contendo E. inflexa foram retiradas de manchas dessas gramíneas que caíram de forma acidental/natural dentro da voçoroca durante a estação chuvosa de 2009. No ensaio de Inderbitzen utilizou-se um fluxo controlado de água de 120 l/h (controlado com auxílio de um rotâmetro, marca Gmbh), passando continuamente sobre a superfície de uma amostra de solo indeformada, sendo o material carreado pela água coletado. O sistema permitiu a simulação da vazão máxima esperada para a chuva de maior intensidade identificada para a área assim como a inclinação média do terreno, que teve a declividade de sua rampa ajustada para 20 °. A amostra indeformada foi cuidadosamente colocada na parte central da rampa. As partículas arrastadas pela água foram coletadas e quantificadas em função do tempo. No presente estudo, o ensaio durou 30 minutos e o sedimento foi quantificado em 5, 10, 20 e 30 minutos. Vale destacar que todas as amostras foram submetidas ao embebimento para anular eventuais forças de sucção presentes nas amostras em seu estado natural. Contribuição da vegetação para evitar perda de solo Para se estimar a contribuição da vegetação sobre a perda de solo foi usada a seguinte equação: 50 CTV = SV- CV x 100 (adaptado de Zhou & Shangguan 2007). SV Onde CT é a contribuição total da vegetação, SV é a quantidade de sedimento carreados em amostras sem vegetação e CV é a quantidade de sedimentos carreados em amostras com vegetação. Quantificação da biomassa de E. inflexa Para verificar a relação entre biomassa vegetal e perda de solo, após cada experimento de chuva simulada (Inderbitzen), a gramínea presente na amostra indeformada foi lavada e separada em parte aérea e em sistema radicular. O material permaneceu em estufa de circulação a 65 °C durante 72 horas, sendo a massa seca então pesada. Análises Estatísticas Para comparar a concentração de nutrientes (N, P e K) e de matéria orgânica entre amostras de sedimento da área sem vegetação dentro da voçoroca (área do plantio das espécies vegetais) e das manchas de E. inflexa foi feito o teste de Wilcoxon. Para testar o crescimento das manchas (aglomerados) de E. inflexa foi feito test t. Para analisar a diferença na quantidade de sedimento carreado entre amostras com e sem vegetação foi feito teste de Mann Whitney. Para analisar a relação biomassa vegetal x perda de solo foi feita a correlação de Spermann Resultados Análises de solos As concentrações de N, P, K e matéria orgânica da área sem vegetação dentro da voçoroca (área onde foi feito o plantio das espécies vegetais) estão expressas na tabela 3.1. Como esperado, as concentrações de N e matéria orgânica foram maiores na área em que estão as manchas de E. inflexa em relação a área sem vegetação (Z= 2,3; P< 0, 05) e ( Z= 1,5; P<0, 05). Por outro lado, as concentrações de fósforo foram maiores na área sem vegetação (Z= 2,1; P< 0, 05). As concentrações médias de K não diferiram entre as áreas (Z= 1,5; P> 0, 05). 51 TABELA 3.1: médias das concentrações de N, P, K e matéria orgânica ± desvio padrão das áreas de plantio das espécies (sem vegetação) e área com manchas de vegetação (E. inflexa) N (g/kg) Área de plantio Manchas de vegetação (E. inflexa) P (mg/Kg) K (mg/kg) MO (dag/Kg) 0,14 (± 0,06) 1,29 (± 0,24) 0, 85 (± 1,65) 0,19 (± 0,17) 0,45 (± 0,10) 1,10 (± 0,08) 7, 00 (± 8,36) 0,96 (± 0,48) A média do pH do sedimento acumulado dentro da voçoroca (área do plantio das espécies vegetais) variou entre 4,52 (pH em água) e 5,42 (pH em KCl) e a média do pH do sedimento oriundo das manchas de vegetação variou de 4,60 (pH em água) a 5,27 (pH em KCl). Crescimento das manchas (aglomerados) de E. inflexa Manchas de E. inflexa apresentaram crescimento vegetativo em todos os pontos mensalmente medidos. No entanto, o crescimento final (após um ano) em área não foi significativo (t3= 2, 41; p> 0,05). Caracterização dos sistemas radiculares das espécies vegetais Todas as espécies apresentaram diâmetro médio de raízes menor que 2,0 mm, ou seja, os sistemas radiculares são caracterizados como predominantemente constituídos de raízes finas (tabela 3.3). A tabela 3.4 resume as informações sobre a biomassa, comprimentos, áreas superficiais e volumes totais dos sistemas radiculares, além de apresentar a contribuição de cada classe de diâmetro (<1,0; 1,0<2,0; 2,0<4,0 e > 4,0) para o comprimento total das raízes. Em V. zizaniodes e nas plântulas de C. argentea, o maior percentual (86,93 e 88,05 %, respectivamente) do comprimento radicular compreende raízes com até 1,0 mm de diâmetro, enquanto E. inflexa apresentou cerca de 45,6% do comprimento total de raízes com diâmetro inferior a 1,0 mm e 91,74% de raízes com diâmetro de até 2,0 mm. A gramínea nativa do cerrado apresentou maior comprimento total (9969,97 m) e diâmetro médio (1,20 mm) de raízes e, consequentemente, maior volume total (100,61 m3). A biomassa média do sistema radicular de cada touceira de E. inflexa foi de 51,59 g. O comprimento radicular específico (CRE) é definido pelo comprimento total pela biomassa radicular (CRE). Assim, o CRE para E. inflexa foi de 193,06, para V. zizanioides de 30, 43 e para C. argentea de 400, 03. 52 TABELA 3.3: diâmetro médio das raízes (± desvio padrão) e coeficiente de variação das espécies estudadas (V. zizaniodes, E. inflexa e C. argentea). Espécies Diâmetro Média V. zizanioides E. inflexa C. argentea 0,93 1,20 0,70 Desvio Padrão CV (%) 0,20 0,11 0,18 22,03 9, 64 54,71 TABELA 3.4: porcentagem do comprimento total de raízes em cada classe de diâmetros (<1,0; 1,0<2,0; 2,0<4,0 e > 4,0 mm. Espécies Biomassa radicular (g) V. zizanioides E. inflexa C. argentea 13, 41 51, 59 0,9 Comprimento Volume Comprimento total por total (cm) Total (cm3) classe de diâmetro (%) 4008,71 9960,97 360,03 17,61 100,61 0,35 D<1 1< D < 2 2<D<4 D>4 86,93 45,06 88,05 8,45 46,68 7,25 4,13 6,32 4,15 0,47 1,90 0,64 Efeito de Echinolaena inflexa sobre a perda de solo superficial A diferença na quantidade de sedimento carreado (g) entre as amostras indeformadas com vegetação (gramínea E. inflexa) e entre amostras com ausência de vegetação foi estatisticamente significativa. Amostras contendo E. inflexa apresentaram menores perdas de sedimento em relação a amostras sem vegetação (U= 187.5; P< 0.05), sendo que perda de sedimentos, de forma geral, diminui ao longo do tempo do experimento de chuva simulada (figura 3.2). De acordo a metodologia apresentada por Zhou & Shangguan (2007), a contribuição da gramínea E. inflexa para a redução da perda de solos e atenuar processos erosivos superficiais foi de 80,32%. Além disso, a contribuição da gramínea E. inflexa (em %) na redução da perda de solos em função do tempo está descrita na figura 3.3. 53 FIGURA 3. 2: perda de sedimento (expressa em gramas) de amostras com vegetação (E. inflexa) representada pela linha contínua e amostras sem vegetação (sem E. inflexa) representada pela linha pontilhada. 54 FIGURA 3.3: redução da perda de solo realizada pela vegetação (%) em função do tempo (expresso em minutos) Relação entre perda de solo e biomassa de E. inflexa Não houve relação entre a perda de solo no ensaio de chuva simulada (Inderbitzen) e a biomassa radicular e aérea (rs= - 0,51; p> 0,05), (rs= - 0,1; p> 0,05) (figura 3.4), além da biomassa total presente nas amostras indeformadas de solo, (rs= - 0,2; p> 0,05). FIGURA 3.4: relação entre perda de sedimento (g) e biomassa radicular (g) em amostras indeformadas contendo E. inflexa, retiradas de dentro da voçoroca do estudo. Discussão Conforme discutido no capítulo o material depositado dentro da voçoroca apresenta condições nutricionais e texturais bastante restritivas para o desenvolvimento vegetal. Tais resultados podem ser restritivos até mesmo para espécies de cerrado, que naturalmente se distribuem sobre solos distróficos e ácidos, entretanto, com maiores teores de matéria orgânica e de nutrientes, como encontrado nas manchas de E. inflexa. Nesse sentido, as manchas de E. inflexa quando escorregaram para dentro da voçoroca estavam presas à camada superficial do solo do entorno da voçoroca e aderida às raízes da gramínea, formando ilhas de fertilidade dentro da mesma (Bochet et al. 1999). Dentro da voçoroca, E. inflexa (que compõe as manchas) manteve seu ciclo fenológico semelhante ao observado no cerrado circundante à voçoroca, mas o crescimento, em termos 55 de ampliação da área ocupada após um ano de estabelecimento dentro da voçoroca, não foi significativo. Aparentemente, as condições edáficas e os processos erosivos intensos em que estavam submetidas, limitaram a expansão lateral de E. inflexa. Tal resultado sugere a necessidade de novos experimentos que testem o efeito da correção de solos e de fertilizações sobre o crescimento da gramínea. Embora não tenham expandido suas áreas de cobertura dentro da voçoroca, as manchas de E. inflexa podem funcionar como centros nucleadores de sucessão e biodiversidade, através da formação de microambientes adequados (núcleos) para casualidades como a chegada e o estabelecimento de outras espécies vegetais, além de diversas interações entre os organismos (Reis et al. 2006). Esta função, no entanto, deve ser observada em estudos de longo prazo. Outras funções devem também ser desempenhadas pelas ilhas de vegetação que se estabelecerem dentro da voçoroca, como a redução da perda de solo e do escoamento superficial, além do aumento da concentração de nutrientes e matéria orgânica (Andreu et al. 1998, An et al. 2010, Dass et al. 2011). A presença da vegetação nativa produz alta biomassa, favorecendo o aumento de matéria orgânica e a estabilidade do solo, evitando que os nutrientes presentes no solo sejam removidos juntamente com os mesmos. Em estudo realizado por Evans et al. (2006), foi constatado que a concentração de matéria orgânica foi diminuída em áreas submetidas a processos erosivos e sem vegetação. Nesse sentido, as gramíneas também podem ser eficientes para contribuir para o aumento na concentração de nutrientes em áreas erodidas (Dass et al. 2011). Além de melhorar as condições nutricionais do solo, a vegetação tem sido usada também para evitar processos de deslizamentos e atuar na sua estabilização em inúmeros projetos de bioengenharia em todo o mundo (Fan & Chen 2010). Identificar e entender quais as características das raízes que agem diretamente no reforço mecânico do solo é fundamental e pode auxiliar na compreensão de vários processos atuantes no solo, facilitando a escolha efetiva das espécies que devem ser usadas para estabilizar diversos tipos de solos (Stokes et al. 2009). No presente estudo, após oito meses de transplantio para dentro da voçoroca, os indivíduos de C. argentea e as touceiras de E. inflexa e V. zizanioides foram coletados e características radiculares consideradas relevantes para estabilização dos solos (Stokes et al. 2009), como diâmetro, comprimento e volume de raiz foram determinadas. Vários estudos demonstraram que quanto menor o diâmetro das raízes, maior o reforço exercido por elas sobre o solo (De Baets 2007, De Baets 2008, Fan & Chen 2010, Li et al. 1991, Mattia et al. 2005, Zhou & Shangguam 2007, Wu et al. 2000). Segundo Gyssels (2005), um pequeno número de raízes grossas fixa com menor efetividade as partículas de solo do que 56 um grande número de raízes finas. Nesse sentido, as variações de diâmetro das raízes das plantas não podem ser ignoradas em trabalhos que destacam a vegetação como um fator condicionante na redução de processos erosivos (Zhou and Shangguan 2007). As três espécies estudadas apresentaram diâmetros médios de raiz menores que 2 mm, no entanto, quanto à ocupação de raízes no solo e quanto ao comprimento, a espécie nativa E. inflexa se mostrou mais eficiente. As gramíneas, assim como as plântulas da espécie de leguminosa C. argentea apresentaram o maior percentual do comprimento total de raízes com diâmetro menor que 2 mm. Por outro lado, V. zizaniodes e C. argentea apresentaram a maior parte de seu comprimento de raízes na faixa de diâmetro menor que 1 mm, diferindo de E. inflexa.. O diâmetro médio de 0,93 mm das raízes da gramínea V. zizanioides encontrado nesse estudo foi um pouco superior aos valores encontrados para a espécie (0,7 a 0,8 mm) por Truong & Hengchaovanich (1997). Tal variação pode ocorrer em resposta a diversos fatores ambientais que interferem na arquitetura radicular das plantas. Um estudo conduzido por Hill et al. (2006) mostrou que algumas espécies podem modificar o diâmetro e comprimento específico da raízes em resposta a deficiência de nutrientes, como o fósforo, por exemplo. Os sistemas radiculares são extremamente plásticos em resposta a distribuição de nutrientes no solo (Mommer et al. 2010). O comprimento radicular total também influencia a resistência das raízes em processos de escorregamentos de solo (Stokes 2009). Assim, no presente estudo a gramínea E. inflexa apresentou o maior comprimento total entre as espécies estudadas., sendo considerado como ideal para a estabilização de solos, as raízes com elevados comprimentos. Outro bom descritor de característica necessária para atenuar processos erosivos é o comprimento radicular específico (Stokes et al. 2009). No presente estudo, C. argentea apresentou o maior comprimento específico de raízes devido ao baixo diâmetro médio, biomassa radicular e seu sistema radicular relativamente extenso. De Baets (2007), em estudo de características radiculares de espécies típicas do mediterrâneo, identificou que espécies com alta densidade de raízes finas possuem maior potencial em reduzir processos erosivos, principalmente na camada superficial do solo. De fato, variações na arquitetura radicular das plantas podem resultar em diferentes contribuições na estabilização do solo exercido pelas raízes (Fan & Chen 2010). No entanto, há poucos estudos que forneçam detalhes quantitativos da influência radicular das espécies vegetais no controle de processos erosivos (Zhou & Shangguan 2007), principalmente de espécies nativas. 57 No presente estudo, a presença de E. inflexa reduziu significativamente a perda de sedimentos por erosão superficial em comparação com amostras sem vegetação, demonstrando a efetividade da gramínea nativa para atenuar processos erosivos e para a estabilização dos sedimentos. A atuação da gramínea no controle do carreamento dos sedimentos foi mais alta ao início do experimento e diminuiu gradativamente ao longo do experimento. Este fato também ocorreu com as amostras sem vegetação. Segundo Cerdà (1998), a redução do carreamento de sedimentos com o decorrer do experimento de chuva simulada pode ser atribuído a maior disponibilidade de sedimentos propensos ao carreamento no início. A influência positiva da vegetação para atenuar processos erosivos e evitar a perda de sedimentos também foi relatada por outros diversos estudos como o de Cerdà (1998), Pan et al. (2006), Zuazo et al. (2006), Zhou & Shangguan (2007) e Xau et al. (2008). Áreas revegetadas apresentaram uma redução brusca e significativa na perda de solo em relação à mesma área sem vegetação (Zhou et al. 2003, Fleskens & Stroosnijder 2007, Marvin et al. 2010). Andreu et al. (1998) destacam ainda que, a vegetação nativa pode reter um percentual maior de sedimentos, em comparação com vegetação exótica, devido à alta produção de biomassa pela vegetação naturalmente ocorrente, correlacionando produção e presença de biomassa vegetal com perda de sedimento. Vários estudos como o de Zhou & Shangguan (2007) e De Baets (2007), encontraram correlação negativa entre perda de solo e biomassa radicular. Outros estudos destacam que a perda de solo devido a processos erosivos é atenuada através da ação conjunta entre a parte aérea e radicular, conforme concluído por Zuazo et al. (2006) e Gyssels and Poesen (2003). No entanto, nenhuma relação significativa entre a perda de solo e biomassa vegetal de E. inflexa da parte aérea ou radicular foi verificada no presente estudo. Em experimentos realizados em laboratório por Gyssels et al. (2006), a densidade radicular e perda de solo não mostraram-se relacionadas, possivelmente devido interações das amostras com o meio, causando por exemplo, o envelhecimento dessas amostras. Experimentos com chuva simulada em amostras contendo diferentes combinações de grupos funcionais vegetais destacam que a retenção de sedimentos foi mais efetiva entre as gramíneas (Marvin et al. 2010). Outro estudo destaca a relação entre matéria orgânica e vegetação, já que maior concentração de matéria orgânica em amostras contendo vegetação causa maior estabilidade de agregados do solo nessas amostras e menor perda de solo (Zhou & Shangguan 2007). No entanto, a ampliação dos resultados obtidos através de experimentos 58 de erosão, realizados em laboratório pode superestimar os processos erosivos (Fleskens & Stroosnijder 2007). CONCLUSÃO As duas espécies nativas de cerrado testadas, E. inflexa e C. argentea, assim como a espécie de gramínea exótica, V. zizanioides, mostraram-se tolerantes as condições de baixa disponibilidade de nutrientes e de água dentro da voçoroca, apresentando taxas de germinação e sobrevivência significativas ao longo da estação seca. Entre tais espécies, somente a gramínea E. inflexa não apresentou crescimento significativo. Tais resultados sugerem que as espécies possam ser utilizadas em programas de recuperação de áreas degradadas como voçorocas, praticamente sem nenhum trato cultural, embora novos estudos devam ser realizados para avaliar se práticas como fertilização, correção do solo e irrigação podem facilitar o crescimento e desenvolvimento das plantas. As condições edafo-climáticas dentro da voçoroca também não viabilizaram o estabelecimento da associação simbiótica entre a leguminosa C. argentea e organismos fixadores de N2. No entanto, a tolerância a condições adversas como restrição de umidade e nutrientes, sistema radicular extenso e ramificado, além da retenção foliar em situação de estresse hídrico pela a leguminosa demonstra que a mesma pode contribuir para projetos de revegetação de áreas degradadas e também atenuar processos erosivos. Enquanto, V. zizanioides possui maior investimento na parte aérea em relação ao sistema radicular, o contrário foi observado em E. inflexa. Qual destas características resultará em melhores resultados em termos de estabilização dos solos dentro da voçoroca cabe ainda investigar. A caracterização do sistema radicular das espécies revelou que o comprimento e para ocupação de raízes no solo a espécie nativa E. inflexa se mostrou mais eficiente. Por outro lado, todas as três espécies do estudo possuem o maior percentual do comprimento total de raízes com pequeno diâmetro (diâmetro menor que 2 mm). Uma vez que diâmetro das raízes é uma importante ferramenta usada para explicar o desprendimento de partículas do solo e processos erosivos de acordo com a arquitetura radicular das espécies vegetais, as espécies estudadas podem ser efetivas em reter as partículas do solo. Além disso, através do experimento de simulação de chuvas, ficou comprovada que a presença de E. inflexa contribui de forma eficaz para reduzir a produção e carreamento de sedimentos, sendo, de fato, eficiente para atenuar processos erosivos e combater a erosão hídrica superficial. 59 A área dentro da voçoroca, aonde foi feito o plantio das espécies vegetais, revelam baixas concentrações de nutrientes essenciais, como N, P e K, assim como matéria orgânica e baixo pH. Nas áreas contendo as manchas de E. inflexa a concentração de N e matéria orgânica foi maior em comparação a área do plantio das espécies. Tais manchas de E. inflexa, se estabeleceram dentro da voçoroca, mas não apresentaram crescimento significativo após monitoramento de um ano, possivelmente devido as condições erosivas e restritas de nutrientes e umidade em que estão submetidas. No entanto, essas manchas podem representar “ilhas de fertilidade” ou “centros nucleadores” dentro da voçoroca, atenuando parcialmente os processos erosivos e agindo como fonte de água, nutrientes, formando um microhabitat que pode ser propício ao recrutamento de outras espécies vegetais. Assim, espera-se que, com os resultados obtidos nesse trabalho, em termos de germinação e sobrevivência das espécies nativas E. inflexa e C. argentea, juntamente com a caracterização radicular das espécies aqui apresentadas, o potencial dessas espécies seja aproveitado em futuros trabalhos de revegetação e manejo em áreas degradadas, incluindo as erodidas através. 60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Aires, F. S. 2009. Desenvolvimento de técnicas de manejo, sem uso de agentes químicos, no controle da espécie invasora Melinis minutiflora P. Beauv. (capim gordura) para aplicação de áreas de campo sujo. Dissertação de mestrado. Universidade de Brasília, Brasília, DF. Alkmim, F. F., Marshak, S. 1998. 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