LEIA AQUI - Universo IPA
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REVISTA do curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista IPA | Ano 1 | Edição 2 | Dezembro de 2006 | www.ipametodista.edu.br/sites/universoipa Movimentos ociais do Campo página 32 meio ambiente | Afogados na celulose ................................................................. 8 entrevista | meio ambiente | Esperança renovada no Arroio Dilúvio ...... 11 Chico Anysio sem limites cultura | Cultura voluntária ............................................................................................................. 48 página 3 Sumário ed i tor ed i tor i a l i al A construção da revista não é uma tarefa fácil, principalmente, para alunos de segundo semestre. Porém, o curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista apresenta um diferencial muito importante: conjugar teoria e prática desde o primeiro semestre. Esta publicação é a materialização deste diferencial. Estamos conscientes de que é uma revista laboratório, mas ela é motivo de muita satisfação, pois é realizada por alunos que freqüentam o primeiro ano de Jornalismo. Tal como a produção de um jornal, a revista também inicia com a reunião de pauta. Ou seja, os estudantes iniciam a discussão com os professores sobre as matérias que vão ser tratadas na edição. A opção, neste caso, foi por uma revista de variedades, com forte cunho para as demandas sociais. Não existe uma preocupação rígida de utilizarmos única e exclusivamente os gêneros jornalísticos que são passados na sala de aula. Como facilmente se depreende, os alunos têm a liberdade de escolher os assuntos e as matérias que vão ser editadas. O principal objetivo é que eles possam pôr em prática tudo aquilo que foram apreendendo na sala de aula. Este número do Universo IPA abarca uma variedade de matérias que por si só, enobrece a postura profissional de todos aqueles que um dia pretendem dedicar-se de corpo e alma ao Jornalismo. Sabemos que o Jornalismo passa por uma crise existencial pós-moderna, onde o tele-lixo e o sensacionalismo tomaram conta das audiências. Virá o dia em que as “massas” vão exigir um Jornalismo mais sério, honesto, investigativo, imparcial e respeitador da ética comunicacional. E, é nesse contexto que os alunos do Centro Universitário Metodista poderão afirmar-se como uma mais valia no mundo da informação. Esta edição de Universo IPA é uma tentativa neste sentido. Certos de que estamos no caminho de um outro Jornalismo, também reconhecemos que ainda há muito a aprender, muitas pautas carentes de cobertura. Por isso, como obra aberta, no sentido de Umberto Eco, estamos prontos a receber críticas, sugestões, contribuições de todo o tipo. Boa Universo IPA | Dezembro2006 leitura a todos. história | Ame-o ou deixe-o ................................................................................................................................... 5 meio ambiente | Água ou petróleo? ...................................................................................... 13 cidadania | Esperança que vem do lixo ..................................................................................... 15 Ciência | Admirável Nano ........................................................................................................................................... 16 saúde | O estresse nosso de cada dia .......................................................................................................... 20 saúde | Até onde vai a fé? .............................................................................................................................................. 22 religião | País abençoado: terra da Santa Cruz ..................................................................... 24 geral | O último lambe-lambe .............................................................................................................................. 26 moda | O lado dos brechós .......................................................................................................................................... 27 comportamento | A solidão que socializa ......................................................... 28 internet | Na mira das lan houses ............................................................................................................. 30 política | Assembléia Legislativa: um oásis político ...................................................... 31 profissão | O futuro das profissões ................................................................................................... 36 geral | Mundo dos negócios GLBT ................................................................................................................. 40 esporte | Contagem regressiva ....................................................................................................................... 44 esporte | Esporte radical conquistou o seu espaço ........................................................ 46 cultura | Porto Alegre, a Liverpool gaúcha ............................................................................... 52 cultura | Música made in Brazil ..................................................................................................................... 55 cultura | A sessão vai começar... Bom filme! ........................................................................... 58 cultura | A grande conquista cultural do pequeno arquipélago ........... 61 ENTREV IS TA en tr ev i s ta Chico Anysio Divulgação sem limites uma palavra na rádio Guanabara. Familiarizado rapi- “O reconhecimento aumenta, no artista, a necessidade de fazer a coisa direito”. damente, passou a exercer várias funções: rádio-ator, comentarista de futebol, locutor... Trabalhou, na década de 1950, nas rádios “Mayrink Veiga”, “Clube de Pernambuco”, “Clube do Brasil”. Assistiu de perto à ascensão da televisão no Brasil e acompanhou as evoluções dos meios de comunicação. Criador de mais de 200 per- Carlos xarão Poucos artistas transitam tão bem por tantas áreas. sor Raimundo e a sua Escolinha. Por anos, liderou a au- Ator, diretor, compositor, escritor, pintor, radialista e diência no comando de programas da “poderosa” Rede comentarista... (ufa!); Francisco Anysio de Oliveira Pau- Globo e encara o sucesso como “acidente de percurso”. la Filho, o Chico Anysio, é um artista sem limites. Nasceu Em entrevista ao Universo IPA, ele conta momentos na cidade de Maranguape, no Ceará, em 1931. Mudou- marcantes da carreira. Lembra, com carinho, os tempos se com a família para o Rio de Janeiro, com oito anos de românticos das décadas de 1950 e 60, fala de projetos idade, época em que sonhava em ser cobrador de ôni- para o futuro e garante que, mesmo “congelado” pela bus. Antes de encarar o rádio profissionalmente, elabo- Rede Globo, não pensa em parar com a comédia. Re- rou um número de imitações com 32 vozes e, com esse, lembrar a sua trajetória é ter informações suficientes colecionou muitas vitórias em todos os shows de calou- para contar a história dos meios de comunicação do ros do Rio e São Paulo. Silêncio em plena estréia! Nervo- Brasil e entender por que o mito do humorismo brasilei- so, Chico travou e estreitou, oficialmente, sem dizer ro está em plena atividade. Universo IPA - Quais as lembranças da vida em Maranguape, no Ceará, e os contrastes que sentiu com a mudança para o Rio de Janeiro aos oito anos de idade? Chico - Tudo, para mim, foi imperceptível, pois eu vim para o Rio com oito anos de idade, em 1939. Naquela época, quem tinha menos de 18 anos não sabia de nada. Universo IPA - Chico é um artista que jogava futebol, ou um jogador que virou artista? Chico - Sempre fui um artista. Apenas achava que não tinha lugar para mim. Ao aparecer a chance, eu apareci. Universo IPA - Futebol sempre foi e é uma das suas paixões. Que benefícios lhe trouxeram os tempos de comentarista? De que sente mais saudade? Chico - Benefícios, nenhum. Saudade eu não sinto de nada, porque eu cortei a saudade da minha vida. Se saudade prestasse, existiria em inglês. Universo IPA - Quais foram os momentos mais marcantes de sua atuação profissional? Chico - Todos. Universo IPA | Dezembro 2006 sonagens famosos – impossível não lembrar do Profes- entrevis en tr ev i s ta ta Universo IPA | Dezembro 2006 Universo IPA - Como foi trabalhar com Fernanda Montenegro e quais as maiores lembranças que o senhor tem da época em que ela esteve na Rádio Guanabara? Chico - As melhores. Fernanda sempre foi uma grande fera. É uma amiga que eu carrego no coração. Universo IPA - Como foi sua transição do rádio para a televisão? Chico - Foi lógica. Uma coisa estava acabando, naquele sistema, e outra começava. Começamos juntos. Universo IPA - E o sucesso? O que muda com o reconhecimento do público? Chico - Sucesso é um acidente de percurso. Eu o recebi com toda humildade, porque sempre soube que ele, do mesmo jeito que vem, vai. No meu caso, até que demorou, porque, só na Globo, eu fiz Chico Anysio Show (e a mesma coisa com outros títulos) durante 37 anos. Sempre liderando o Ibope e colocado entre os seis mais vistos. O reconhecimento do público aumenta, no artista, a necessidade de fazer a coisa direita. Universo IPA - Conte um pouco da sua relação com Haroldo Barbosa, nos tempos da rádio Mayrink. Quais as maiores lições que o senhor guarda dessa relação? Chico - Isso aí é um livro. Não dá para ser contado em uma frase. O Barbosa foi meu mestre, quem me ensinou os caminhos e as veredas do humor. Universo IPA - Qual foi a maior dificuldade no início da carreira? Chico - Fazer com que acreditassem em mim. Universo IPA - Os artistas daquela época não se limitavam apenas a interpretar os textos dos programas de rádio. O senhor mesmo escrevia, criava e interpretava as próprias criações. Todo esse envolvimento influi qualidade do trabalho? Chico - De modo algum. Escrever humor ou é fácil, ou é impossível. Universo IPA - As novas tecnologias modificaram a essência da TV? O que mudou, para os artistas, com esse progresso? Chico - As novas tecnologias não têm ne- nhuma culpa na falta de emprego para um mundo de atores. O que falta é um pouco de ousadia por parte das direções. Só querem fazer o que já sabem que dá certo. Então, tome novela. Mas todos os programas de humor que lançam dão certo. Então... Universo IPA - Chico Anysio é um artista sem limites. De onde vem tanto interesse por tantas áreas culturais? Chico - Porque eu sou um criador. Escrevo todos os dias, mesmo que seja para jogar fora. Se não tiver nada para escrever, pinto um quadro e, se não tiver uma tela à mão, faço uma música. O importante é não deixar aquele dia passar sem fazer nada. Universo IPA - Existe uma receita para criar um bom personagem? Chico - Que eu saiba, não. Será que existe uma receita para isso? “Nunca pensei em parar com a comédia. A Globo foi quem parou comigo”. Universo IPA - Existem diferenças entre ser ator e ser comediante? Chico – Ser comediante é mais difícil. Universo IPA - Com mais 10 mil shows por todo esse país e fora dele também, quais as diferenças mais notáveis entre o teatro e o humor de televisão? Chico – No teatro, eu posso ser o mesmo, porque a platéia muda. Na TV, eu tenho de mudar porque a platéia é a mesma. Universo IPA – Qual a sensação de ser considerado um ícone do humor? Chico – Quem é ícone? Nunca pensei em ser o melhor, nem nunca fui. Eu sempre quis ser “aquele que faz vários”, e consegui. Eu quis sempre estar na relação dos dez melhores, e acho que eu também consegui. Universo IPA - Cinqüenta dias em frente a máquina de escrever lhe renderam, de cara, três livros. Que espaço o mundo das letras representa na sua carreira? Chico – Um espaço pequeno porque a literatura não é uma fonte de renda, no Brasil, para mais de quatro ou cinco. O bom livro é aquele que fica. Universo IPA - Para o cinema, sua contribuição iniciou na década de 1950, com pouco mais de 20 anos, e escreveu mais de 18 roteiros. Entre eles, o último filme do Oscarito, na Atlântida, “Cacareco vem aí”, e até um filme para Os Trapalhões: “O Cangaceiro Trapalhão”. O que mudou no cinema brasileiro das décadas de 1960 e 70 para os dias atuais? Chico – O estilo do filme. Os filmes atuais são melhores, mas não são “aquela coisa brasileira” que a chanchada era. Universo IPA - O seu trabalho como roteirista de cinema é umas das atividades que lhe agradam. A sua produção ainda é ativa? Chico – A mais ativa de todas. Escrevo com dois parceiros. Meu parceiro brasileiro é o Elano Paula, meu irmão; meu parceiro americano é o Mick Hurbischerrier (professor da Screenplay e diretor no Hunter Collega e na New York University). Há roteiros nossos com Sally Fields, a Golden Hawn e com o Michel J. Fox. Há um filme meu (The Friar), passado na Irlanda do Norte, numa vila de pescadores, que está com o Sr. Hugh Hudsin, que dirigiu “Carruagem de Fogo”. Esse filme deve sair com Burt Reynolds no papel principal. Universo IPA - O senhor planeja voltar para rádio. Como serão os programas? Chico - Serão dois. A escolinha, às nove da noite, de segunda a sexta, e um programa semanal de duas horas aos sábados. Universo IPA - O senhor pretende firmar-se como ator de novelas? Quais as perspectivas para novas atuações? Chico – No momento, estou no elenco de “Pé na Jaca”. Universo IPA - O senhor realmente não pretende retomar as atividades humorísticas? Acredita que a sua missão, nesse campo, foi cumprida? Chico – Eu fui posto na geladeira pela Rede Globo. Nunca pensei em parar com a comédia. A Globo foi quem parou comigo. “Quem trabalha na TV não tem tempo de esperar pela INSPIRAÇÃO” Aline Torres Biz salienta a importância das pessoas se tornarem agentes da história e não objetos dela. Entre as críticas do professor, está o descompromisso da população com a atividade política: “queremos mudanças e, ao mesmo tempo, elegemos centenas de deputados comprometidos com o latifundiário, privatização de empresas estatais. O eleitor tem sua parcela de culpa”. Em contraponto, o professor de história Péricles Humberto Rocha, conhecido como Periko, acredita que a juventude de hoje é mais engajada nas questões sociais do que a juventude de seu tempo: “sinto na geração de hoje que os jovens querem saber mais, aprender para não cometer os mesmos erros, e sinto, em seus olhares, uma secreta admiração pelos que choraram, tombaram, sofreram naquele pesadelo”. *campanhas do governo. Cálice = Cale-se Durante as ditaduras brasileiras, a tortura foi o aparato utilizado pelos governos para sufocar revoluções e manter a massa passiva. No livro “Brasil Nunca Mais”, há relatos sobre as várias faces da tortura. Pau-de-arara, choque elétrico, afogamento e lesões físicas são alguns dos exemplos utilizados pelos torturadores para coagir os “subversivos”. Mulheres, gestantes e crianças não foram poupadas pelos porões do Dops. Pelo contrário, eram sequestradas, com freqüência, para obrigar os familiares interrogados a confessarem o que, muitas vezes, não tinham cometido. Esses métodos foram responsáveis por centenas de abortos e estupros. “Para as forças repressivas, as razões de Estado predominavam sobre o direito à vida. Muitas mulheres, que, nas prisões brasileiras, tiveram sua sexualidade conspurcada (corrompida) e os frutos do ventre arrancados, Universo IPA | Dezembro 2006 Alimentada por muitas lutas, revoluções e derramamentos de sangue, a democracia brasileira foi constituída. Entretanto, foi violada, duramente, em dois períodos da história: no Estado Novo, ditadura de Getúlio Vargas, entre 1937 e 1945, e a ditadura militar de 1964, que assombrou o país em 21 anos de corrupção, censura, torturas e mortes, condenando o povo à alienação e à descrença. “Em 64, a nação recebeu um tiro no peito. Um tiro que matou a alma nacional. Os personagens, que imaginávamos fazer parte da história brasileira (...), de repente, sumiram. Ou fora do poder ou presos ou mortos. Em seu lugar, surgiram outros, que eu nunca sequer percebera existir. Atores bárbaros. Aí me veio a clara percepção de que o Brasil tinha mudado para sempre”, assim depõe o soció logo Herbert de Souza, o Betinho. Hoje, 42 anos após o golpe, que deu início aos anos de chumbo, vivencia-se o completo desrespeito aos direitos humanos. “Ora, que tipo de democracia é a existente no Brasil, com um número espantoso de pobres e uma desigualdade social que nos coloca em segundo lugar em concentração de renda?”, indigna-se o jornalista e doutor em Comunicação Social, professor Osvaldo Biz, em seu livro “Jornalismo Solidário”. O professor questiona a democracia: “olhando a história do Brasil, descobrimos que, após o fim do Estado Novo, apenas quatro Presidentes da República terminaram seus mandatos: Eurico Gaspar Dutra, J.K., Sarney e Lula”. Assim, fica claramente evidenciada a falta de experiência dos cidadãos com o processo democrático. As pessoas foram ensinadas, no decorrer desses anos, que não podem exigir atitudes de seus governantes ou interferir na realidade social fazendo sua parte. his tóri a Ame-o ou deixe-o h is tóri a * h is tóri his tóri a a Universo IPA | Dezembro 2006 certamente, preferiram calar-se para que a vergonha suportada não caísse em público. Hoje, no anonimato, elas guardam, em sigilo, os vexames e violações sofridas”, relata o auxiliar administrativo José Ayres Lopes, torturado no Rio de Janeiro em 1972. Depois das denúncias de tortura e a confirmação, pelo Exame de Corpo Delito, de que a acusação era legítima, algumas vítimas relataram seus casos. O acesso, à pequena parcela de material disponibilizado, torna público casos como o do estudante José Almeida: “tive introduzido, em minhas narinas e na boca, uma mangueira com água corrente. Cada vez que eu tomava uma descarga elétrica, era obrigado a respirar e logo vinha o afogamento”, relembra. A cabeleireira Jussara Lins foi submetida a torturas com choques, drogas, sevícias sexuais (estupro com objetos pontiagudos e cortantes, pênis de boi, ácidos e choques nos órgãos genitais). Além de exposição a cobras e cães. Durante a primeira fase do interrogatório, foram colocadas baratas sobre o seu corpo, e uma introduzida em seu ânus”. Além da tortura, houve, como principal característica, a repressão a movimentos sociais e perseguição a ativistas: “esses movimentos, mais do que movimentos sociais, foram movimentos de resistência. A Guerrilha do Araguaia, idealizada e dirigida pelo PC do B (Partido Comunista do Brasil), foi a maior guerrilha rural do Brasil. As lutas dos estudantes, dirigidas pela UNE (União Nacional dos Estudantes), foram extraordinárias, assim como a resistência no meio artístico e cultural. Sua importância, além de histórica, é universal, pois representou a luta pela liberdade e pela defesa da democracia”, informa Periko. Um exemplo, é o caso Chico Mendes conhecido por representar a luta dos seringueiros em defesa da Floresta Amazônica. Francisco Alves Mendes Filho denunciou a trama dos grandes fazendeiros. Em 22 de dezembro de 1988, o seringueiro, sindicalista e ativista ambiental foi morto em Xapuri, Acre. Mendes foi assassinado, aos 44 anos, na porta da cozinha de casa, numa cidade de 5 mil habitantes: “ele vinha com as mãos na cabeça, todo vermelho de sangue”, contou a esposa, Ilzamar Mendes, que ouviu um estouro e correu para o marido. “Quando eu quis pegar no seu braço, ele caiu e ficou se debatendo. Aí vi que estava morrendo”, relata. Além de 18 perfurações no braço, ele fora atingido no peito direito por 42 grãos de chumbo de uma espingarda de caça. * Chico Buarque de Holanda Resistência e paixão “Eu me enfurnava em leituras e tentava saber o que estava acontecendo. Ninguém falava nada naquela época. Com 16 anos, me aproximei de um grupo de esquerda. Com 17, fui eleito presidente do grêmio estudantil. Fiz um discurso de posse com a fúria e a valentia da juventude. Na época, o que mais havia eram agentes infiltrados nos meios estudantis. Fui delatado e preso. Apanhei pra caramba e, no fim de algumas semanas, fui solto todo quebrado. Depois, entrei no Partido Comunista Brasileiro (PCB), onde mais pancadarias me aguardavam. Mas sempre tive divergências políticas dentro do partido e dos movimentos acadêmicos dominados pela imagem de Stalin, enquanto eu tinha muitas reservas ao velho líder. Com a abertura, continuei no PCB até as eleições presidenciais de 1989, apoiando nosso candidato Roberto Freire e saí no mesmo dia em que o PCB virou PPS (Partido Popular Socialista). Fui para o PT (Partido dos Trabalhadores), onde militei politicamente cheio de amor e ideais até 2001, quando o partido anunciou sua aliança política com o PL (Partido Liberal). Daí saí do partido e, hoje, não milito em nenhuma agremiação política. Atualmente, acredito apenas na revolução humana. Acredito que é necessário, antes de qualquer coisa, uma mudança aqui bem pertinho, no nosso íntimo. Temos de mudar. Não me conformo de ver as pessoas acreditando que política é uma profissão ou que as coisas No cenário nacional, cinco presidentes militares governaram o país. Como figura decorativa, Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara, governou o Brasil durante 13 dias. Em 15 de abril de 1964, o comando do Brasil foi assumido pelo chefe do Estado-Maior do Exército, o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. A sucessão do governo castelista dividiu os militares, pois, de um lado, encontram-se aqueles que eram oriundos da Escola Superior de Guerra, os denominados “grupos Sorbone”, e, do outro, a “linha dura”. Na luta entre os dois grupos, o último saiu vencedor com o general gaúcho Artur da Costa e Silva, que tornou o regime ainda mais autoritário. Costa e Silva faleceu em 17 de dezembro de 1969, vítima de enfarte. O general Emílio Garrastazu Médici governou até 1974. Do ponto de vista político, foram os anos mais duros do governo militar. Em seguida, assumiu a presidência o “General Ernesto Geisel, que teve de enfrentar dificuldades econômicas e políticas, as quais anunciavam o fim do “milagre econômico”. Assumindo a presidência em 1979, o general João Baptista Figueiredo aprovou a lei da anistia. Em novembro de 1983, iníciou o movimento pelas “Diretas Já!”, que lutava pela redemocratização do País. Em 1985, a ditadura acabou, ao menos a explícita, e levou com ela o espírito apaixonado e apaixonante que levou uma geração ao mais delirante sentimento de patriotismo. Hoje, indiferentes ao futuro e à sociedade, os jovens perderam a identidade e marcham cegos pela história. A questão é: até quando? “Arriscando a vida pela política, estávamos sendo salvos, historicamente, pela ética”, afirma o jornalista Zuenir Ventura. sociólogo e professor de história). Legião dos esquecidos* “O golpe, no Brasil, não foi uma execução de forças meramente militares contra à nação indefesa. Na verdade, ele contou com apoio da classe média brasileira. Outra questão importante, para dimensioná-lo no tempo, é recordar que o golpe se insere no contexto da Guerra Fria, ou seja, foi global às ações da repressão vinda de Washington, a partir da vitória da Revolução Cubana em 1959 e de sua opção pelo socialismo a partir de 1962”, depõe Periko. O professor Biz comenta que ”a mídia tomou posição muito forte contra Jango. O jornal Correio do Povo, por exemplo, chegou a colocar editorias de outros jornais para evidenciar que eles não eram os únicos a apoiar os militares em 1964”. Em 25 de agosto de 1961, Jânio Quadros, Presidente eleito por voto popular, renunciou ao cargo, acusando forças ocultas: “Hoje, a idéia que temos é de que ele tentou dar um golpe para receber apoio da sociedade e se tornar ditador, ou seja, fechar o Congresso Nacional e governar sozinho. Essas eram as forças ocultas”, revela irônico o professor. Em seu lugar, assumiu Jango. Goulart pretendia controlar as remessas de dinheiro para o exterior, dar canais de comunicação aos estudantes e permitir que os analfabetos, maioria da população, pudessem votar. O estopim do golpe militar aconteceu em março de 1964, quando Jango, após um discurso inflamado no Rio de Janeiro, determinou a reforma agrária e a nacionalização das refinarias de pe- Apesar de você * h is tóri a (Péricles Humberto Rocha, * Álbum Gonzaguinha his tóri a tróleo. Imediatamente, a elite reagiu: o clero conservador, a imprensa, o empresariado e a direita em geral organizaram, em São Paulo, a “Marcha da Família Com Deus pela Liberdade”. Universo IPA | Dezembro 2006 só mudarão com ele no poder. Isso leva ao personalismo, tipo Lula, Fidel, Stalin, que de esquerda e popular, se torna pessoal e perde o viço do ideal, se tornando uma figura opaca do que um dia foi. Acredito na eterna juventude dos sonhos e das utopias. Mas acredito, também, que ninguém é feliz sozinho. Felicidade é algo coletivo, nunca individual”. mmei ei o aomambi b i en teente Afogados na celulose Universo IPA | Dezembro 2006 Carlos Ismael Moreira Muito se ouviu, nos últimos meses, a respeito das plantações de eucaliptos, produção de celulose e empresas como a Aracruz, embora muitos ainda não tenham uma idéia clara do que está em jogo na ferrenha discussão que se trava quanto à propriedade ou não de se instalarem empresas desse tipo em solo gaúcho. A discussão opõe uma região pobre, afagada com esperanças de emprego e aquecimento da economia a curto prazo, contra ambientalistas que alertam para riscos devastadores que as florestas de eucaliptos e pinus (plantas exóticas, ou seja, não nativas do solo rio-grandense), espalhadas pelo Rio Grande do Sul (RS), podem causar. Alguns técnicos ambientalistas usam um paradoxo para definir a questão: florestas exóticas em território rio-grandense podem se transformar em um “deserto verde”, devido ao alto consumo de água dessas plantas e ao fato de uma floresta desse tipo restringir a possibilidade de desenvolvimento de outras culturas. Numa região constantemente agredida pela seca, outro paradoxo se forma na hipótese do Pampa Gaúcho acabar afogado na celulose. Da guerra de números e declarações alarmantes de parte a parte, fica a dúvida sobre se os ganhos econômicos compensam o impacto ambiental desse cul- tivo. O Universo IPA procurou as empresas produtoras de celulose, especialistas em meio ambiente e órgãos governamentais responsáveis para esclarecer os fatos e trazer as respostas a público. Os debates acerca da monocultura de eucaliptos envolvem três empresas – Aracruz Celulose, Votorantim Celulose e Papel (VCP), e Stora Enzo. A Aracruz plantou 35, 7 mil hectares (ha) em terras próprias, e mais 13,8 mil em parceria com terceiros. A VCP possui 20 mil ha. de plantação. Somadas, as áreas plantadas pelas duas empresas equivalem a 66,018 mil campos de futebol. Cada uma pretende atingir 100 mil ha. de base florestal no Estado. A Stora Enzo ainda não se instalou no RS, mas manifestou interesse em montar uma fábrica com meta florestal idêntica às outras empresas, 20 % em parceria com produtores locais. A opção pelo eucalipto e pelo pinus está baseada no curto período em que essas árvores ficam prontas para o processo industrial: de sete a oito anos em média. A área escolhida para o cultivo das plantas exóticas é a Metade Sul e abriga o Bioma (conjunto de características ambientais de uma região) Pampa. Conforme o Mapa de Biomas do Brasil, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) e do Ministério do Meio Ambiente, o Pampa possui 176, 496 Km2 de extensão, o que representa 63% do território gaúcho. A região abrange uma cen- tena de municípios e é separada do norte do Estado por uma linha imaginária, traçada a partir da BR-290, ao sul de Santa Maria, e estendese até as fronteiras com Uruguai e Argentina. Com uma economia local é deficitária, os pequenos e médios produtores enxergaram uma alternativa de revitalização econômica rápida, na venda e no arrendamento de terras para o plantio dos eucaliptos. O biólogo e professor titular do curso de Pós-Graduação em Biologia Animal da UFRGS, Ludwig Buckup, emitiu, no final de 2005, um parecer técnico que evidencia os impactos ambientais da monocultura de eucaliptos e pinus. O documento mostra que cada eucalipto elimina pela evapotranspiração – perda de água para a atmosfera, causada pela evaporação a partir do solo e pela transpiração das plantas – 36,5 mil litros de água por ano. O parecer mostra que, se as empresas atingirem as metas planejadas, serão 35 milhões de árvores plantadas, com uma evapotranspiração anual de 1,23 quatrilhão de litros de água por ano. O nível normal de precipitação de chuva anual na mesma área é de 1,05 quatrilhão, o que representa um volume 20% menor do que as árvores devem eliminar anualmente, numa região que sofre, constantemente, com danos de estiagem. A proposta se torna ainda mais alarmante com a divulgação da pesquisa do Instituto Nacional de Me- teorologia (INMET), em 20 de dezembro de 2005, que aponta uma grande redução no nível de chuva acumulada na área das plantações durante o ano passado. Além do problema da água, Buckup aponta outros impactos como a salinização e a inutilização do solo, e o perigo às espécies ameaçadas de extinção no ecossistema local. Ele mostra que as plantas exóticas absorvem, pelo menos, nove sais minerais do solo (K2O – óxido de potássio, Na2O – óxido de sódio, CaO – óxido de cálcio, MgO – óxido de magnésio, Fe2O3 – trióxido de ferro, P2O5 – pentóxido de fósforo, SO3 – trióxido de enxofre, SiO2 – dióxido de silício e Cl - cloro) e micronutrientes, que são extraídos com os troncos, sem haver reposição, o que causa a salinização da terra. Além disso, após a colheita, a área fica repleta de tocos, que não são removidos devido ao alto custo que o processo exigiria por causa das raízes longas do eucalipto. A decomposição dos tocos de forma natural, leva de oito a dez anos, durante todo esse período, a área ficará inutilizável para outra cultura. O Bioma Pampa possui cerca de três mil espécies de plantas, sete gêneros de cactos e bromeliáceas endêmicas, ou seja, que nascem exclusivamente nesse ambiente, além de 11 espécies de mamíferos raros, ou ameaçados de extinção, e 22 espécies de aves na m ei o a m b i en te Universo IPA | Dezembro 2006 De um lado, governo e empresas acenam com fomento da economia e geração de empregos. Do outro, ambientalistas alertam para os impactos ambientais desastrosos que a plantação de espécies exóticas podem causar. Confira a real situação desse impasse entre vantagens econômicas e preservação ambiental. mei o ambi ente Divulgação/NAT mmei ei o aomambi b i en teente mesma situação. Em seu estudo, Buckup ficar mais desprotegidas”, sustenta Schna“(...) mais de 95% da celulose mostra que esses perigos são elevados delbach. O projeto recebeu parecer confabricada aqui é exportada. com a monocultura de eucaliptos, pois, trário do relator da Comissão de Relações além do alto consumo de água, o somExteriores e de Defesa Nacional da CâmaIsso configura um processo breamento das florestas impede o dera dos Deputados, Francisco de Assis (PFL), de privatização de lucros pela senvolvimento de outras plantas. Outro no dia 12 de setembro de 2006. obtenção de celulose e sua ponto desfavorável é o alto nível de proBuckup considera duvidosa a geração dução do ferormônio, substância biolovenda no comércio internacional, de emprego e renda para a Metade Sul gicamente ativa, secretada pela planta proposta pelo governo e empresas: “a deixando para o nosso como mecanismo de defesa contra oumaior parte do processo de produção espaço os custos ambientais”. tras espécies. Isso ocasiona uma mudandessas empresas é mecanizado e utiliza ça radical no habitat dos animais que vipouca mão-de-obra humana, e mais de vem no campo, transtornando inclusive a cadeia alimentar. 95% da celulose fabricada aqui é exportada. Isso configura um proBuckup, viajou à Austrália, país de origem do eucalipto, e constatou que cesso de privatização de lucros pela obtenção de celulose e sua venlá os problemas ambientais apresentados não ocorrem, porque as paisada no comércio internacional, deixando para o nosso espaço os cusgens possuem, no máximo, cem árvores por hectare. Enquanto que, aqui tos ambientais”, afirma. no Estado, as plantações são feitas com um espaçamento de três metros A especialista em Licenciamento e Gestão Ambiental da Unidade entre cada árvore, um bloco maciço de 1,6 mil plantas por hectare. Guaíba da Aracruz, Maurem Alves, relata que, além dos estudos para o A engenheira agrônoma Carla Villanova Schnadelbach, mestre em EIA/RIMA, a empresa já monitora as interações dos plantios com o meio: Desenvolvimento Rural pela UFRGS e integrante do Núcleo Amigos da “além da manutenção e recuperação das áreas de preservação permaTerra (NAT), entidade que há 40 anos desenvolve projetos para sustennente e reserva legal, adotamos medidas de conservação do solo, pretabilidade ambiental, percorreu, com Luciana Picoli, também integrante venção de incêndios e treinamento dos trabalhadores para adoção dos do NAT, 4 mil quilômetros pelo Pampa gaúcho, para observar a situação cuidados ambientais indicados para cada operação”, explica. do cultivo de eucalipto no RS. Na viagem, Schnadelbach constatou irreA Companhia de Notícias (CDN), responsável pela assessoria de gularidades nas florestas como na localidade de São José dos Ausentes, imprensa da VCP, manteve contato com o UNIVERSO IPA durante uma com plantações na margem de rios, medida que descumpre a lei nº 4.771 semana, mas alegou que desta vez não poderia participar da matéria. de 15 de setembro de 1965, do Código Florestal, a qual determina limites de aproximação às margens, conforme a largura do rio. Buckup também denuncia outra irregularidade nas plantações: o desrespeito à zona de amortecimento definida pela lei nº 9.985, a qual determina que nenhum plantio pode ocorrer junto à mata nativa do Aracruz Celulose ecossistema local. A Aracruz é uma das maiores produtoras de celulose no Mesmo com todos os impactos ambientais apresentados, a Aracruz mundo. O Gerente Regional Florestal, Renato Rostilla, informa Celulose e a VCP conseguiram, junto ao governo, a liberação para as que, no RS, a empresa é proprietária de, aproximadamente, 75 suas plantações, sem a necessidade de estar concluído o Estudo de Immil hectares (ha.) de terra. Desses, 35,7 mil são destinados ao pacto Ambiental (EIA) das empresas, que deve ser enviado à Fundação plantio de florestas. O restante divide-se em áreas de preservação e infra-estrutura. Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM) para o Relatório de Impacto Além das plantações em terras próprias, a empresa planta em 13,8 mil ha. de floAmbiental (RIMA). A licença foi obtida através da assinatura de um Termo resta alheias, obtidas por parcerias com o Programa Produtor Florestal e com a emde Ajustamento de Conduta (TAC), no final de maio de 2006. No acordo, presa Boise Cascade. Outra parte dessas terras vem de arrendamentos. Rostilla firmado com Ministério Público Estadual e FEPAM, as empresas se comadianta que se pretende alcançar uma base florestal de 100 mil ha. no Estado. Outros prometem a retirar as árvores plantadas se o estudo da FEPAM apontar 188 mil ha. também estão sob propriedade da Aracruz, distribuídos entre Espírito qualquer tipo de prejuízo ambiental. “Esse termo é uma licença prévia Santo, Bahia e Minas Gerais. O Gerente Industrial da Unidade Guaíba, Paulo Silveira, para estragar a natureza”, classifica Buckup. Dia 20 de dezembro do ano responsável pela fabricação de celulose, mostra que a capacidade atual de produção passado, a FEPAM entregou a primeira versão do zoneamento ambiené de 430 mil toneladas por ano, e que a meta a ser atingida é de 1,8 milhões de tal. Conforme o site da fundação, o estudo deverá nortear os licenciatoneladas anuais. mentos ambientais da silvicultura no Estado, no entanto os resultados obtidos ainda são provisórios e estão em debate com prefeitos de muVotorantim Celulose e Papel nicípios da região, que temem perder os investimentos das empresas. A VCP é dona de 63 mil ha. de terra no RS, mais 260 mil Schnadelbach aponta outro fato que chama a atenção: a lei feha. em São Paulo. Dados do jornal Correio do Povo de 04 de deral nº 6634, de 2 de maio de 1979, determina que a faixa de fronsetembro de 2006 mostram que a empresa havia plantado 20 mil ha. de floresta até teira nacional é de 150 quilômetros e que empresas estrangeiras não o final de 2005. A empresa se estruturou para plantar 17 mil ha. por ano e pretende podem comprar terras nessa faixa. Por isso, a Stora Enzo ainda não atingir o total de 100 mil ha. cultivados até 2010. confirmou a sua instalação no Estado, pois a lei impede os planos de extensão do futuro plantio da empresa. No entanto, o deputado feStora Enzo deral reeleito, Nelson Proença (PPS), apresentou, em abril de 2006, A Stora Enzo é uma multinacional suecoum projeto que pretende reduzir a faixa de fronteira de 150 para 50 finlandesa e uma das líderes mundiais na produção e comercialização de celulose e quilômetros. O parlamentar argumenta, no texto do projeto, que a papel. A empresa tem manifestado interesse em instalar uma fábrica no Estado, com legislação atual impede a instalação de empresas que viriam a concapacidade para produzir 900 mil toneladas de celulose anualmente – a exemplo da tribuir para o crescimento econômico da região. “Essa medida vai Veracel, no sul da Bahia, que foi o primeiro investimento da Stora Enzo no Brasil, em prejudicar a soberania e a segurança nacional, uma vez que altera os parceira acionária com a Aracruz de 50% para cada uma. A meta prevista para o RS é a limites de fronteira de todo país. Áreas como a Amazônia e o Acre, plantação de 100 mil ha. de eucalipto e pinus, 20% em parceria com produtores locais. que sofrem constantes invasões para passagem de contrabando, vão Universo IPA | Dezembro 2006 Conheça as empresas 10 mei o ambi ente Arroio Dilúvio m ei o a m b i en te Esperança renovada do As águas límpidas que, um dia, abasteceram a população e serviram de lazer, hoje, são um canal de escoamento de resíduos para o Lago Guaíba. O arroio, que sempre esteve presente na vida dos porto-alegrenses, cortando a cidade de leste a oeste, sofre com sérios problemas de poluição. Mas o que vem sendo feito para reverter a situação? Por que é tão importante recuperar as águas do Dilúvio? “A bacia do Dilúvio, em área, não representa tanto em termos de município, mas em população, em torno de 500 mil pessoas. Então, imagina tu conseguir recuperar isso que, inclusive, é uma das fontes poluidoras do Lago Guaíba. Se a gente conseguir reverter a questão da poluição, vai ser bom”, diz a arquiteta da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAM) e coordenadora do Programa Pró-Dilúvio, Gislaine Lopes Menezes. O Programa Pró-Dilúvio surgiu, em 2005, como uma ação da Prefeitura de Porto Alegre, para integrar as diversas secretarias e departamentos que venham a ajudar na melhoria da qualidade das águas do Dilúvio. “Na medida em que a gente vai precisando desse apoio ou de ações que envolvam outras secretarias, a gente vai ampliando. Eles não participam formalmente da portaria do grupo, mas vão integrar. Pode ser que, no futuro, a gente amplie esse grupo e que eles participem, inclusive, de portaria”, destaca Menezes. A meta é devolver o Arroio Dilúvio à população. Para tanto, foi realizado um levantamento do que havia sido feito na Bacia do Dilúvio e de quais eram as carências dessa região, para assim intensificar as ações dentro da Bacia. Um exemplo é o Programa Esgoto Certo, do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE), em funcionamento desde 1994. Ele abrange toda a cidade, mas, hoje, prioriza os bairros da Bacia do Dilúvio. Não há um prazo para o resultado final, pois o projeto não está concluído. A previsão é de que, em 2012, o DMAE termine o levantamento de toda a Bacia, no que diz respeito aos esgotos cloacais. Esgoto certo concentra ações na bacia do Dilúvio Em 2005, o Esgoto Certo teve as ações ampliadas, com o objetivo de avaliar, encaminhar e realizar ações que aumentem a eficácia e a área de coleta de esgotos sanitários. Hoje, conta com dez projetos diferentes. O principal deles é o monitoramento das ligações das redes, realizado através do trabalho de campo, que consiste em visitar os prédios da Bacia do Dilúvio para identificar ligações sanitária irregulares. Em cada residência, é feito um teste, com corante de contraste, para verificar o destino do esgoto cloacal e pluvial. Segundo o coordenador do setor de avaliações do DMAE, Hildo da Rosa Gaspar, a maior dificuldade encontrada pelas equipes é a falta de divulgação do programa, pois as equipes precisam entrar nas casas dos usuários para fazer testes. Para o diretor geral da Divisão de Esgotos (DVE), Paulo Menegotto Kessler, “ao detectar e corrigir as ligações de esgoto incorretas, estamos encaminhando os esgotos cloacais para o seu destino adequado, que é a Ponta da Cadeia, aumentando o volume de esgotos a ser tratado, retirando esgotos, reduzindo a poluição do Arroio Dilúvio e melhorando o meio ambiente”. Universo IPA | Dezembro 2006 Stéphanie Perrone 11 mmei ei o aomambi b i en teente O Projeto Integrado Socioambiental (PISA) vem para corrigir uma deficiência da capital gaúcha na parte dos esgotos cloacais, que hoje são jogados in natura no Guaíba. Isso polui o lago e, nos verões, propicia o surgimento de algas, que provocam cheiro e gosto desagradável na água: “o programa busca elevar a capacidade de tratamentos de esgotos cloacais de Porto Alegre. Hoje, as estações de tratamentos de esgotos (ETEs) têm a capacidade de tratar até 27% do esgoto coletado. Na verdade, trata-se só 20%. Com o Socioambiental, a capacidade de tratamento de esgoto coletado vai para 77%. Isso vai trazer mudanças bastante positivas no que diz respeito aos impactos ambientais no Lago Guaíba, podendo, a longo prazo, devolver a balneabilidade do lago”, diz o diretor geral do DMAE, Flávio Presser. O projeto será viabilizado através de financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e contrapartida do DMAE, totalizando um investimento de US$ 160 milhões. As negociações com o BID estavam paradas, desde 2002, pelo fato de a Prefeitura apresentar sucessivo déficit financeiro, Hildo da Rosa Gaspar/arquivo DVE Negociações retomadas Acúmulo de lixo, nas águas do Arroio Dilúvio, é motivo de preocupação o que impede a tomada de empréstimos externos por parte do município. A expectativa é de que, em julho, o contrato seja assinado. O foco principal do programa é levar o esgoto coletado na Bacia do Dilúvio, que é lançado in natura na Ponta da Cadeia, sem nenhum tipo de tratamento, para a futura ETE do bairro Serralhia. Segundo Presser, “faltam algumas obras complementares ao arroio, porque é preciso retirar todo o esgoto. Os arroios são para receber só águas das chuvas. Eles não são para receber esgotos. Para isso, precisa ainda completar o interceptor do Arroio Dilúvio”. Atualmente, o Arroio Dilúvio tem 17 Km e corta a cidade de leste a oeste, de Viamão até o Lago Guaíba. “Existem 12 Km de interceptor, uma canalização para onde o esgoto chega sem que seja lançado nas águas do arroio, que vai recolhendo o esgoto e vai jogando lá na Ponta da Cadeia”, diz Presser. As obras do PISA estão previstas para iniciar em abril de 2007. O primeiro passo é a implantação da rede coletora de esgotos dos bairros Restinga e Ponta Grossa. O esgoto dessas regiões será tratado na Estação de Ipanema, que está em funcionamento. Futuramente, com a construção da estação de tratamento da Serralhia, ele passará a ser tratado ali. Em julho, começará a implantação da rede coletora de esgoto da Cavalhada. Universo IPA | Dezembro 2006 Maurício Levy 12 Porto Alegre, cidade cosmopolita, capital dos gaúchos. Quinta-feira, ao entardecer, a principal cidade do Rio Grande do Sul se prepara para ver mais um fenômeno da natureza: o famoso pôr-do-sol no Lago Guaíba. Turistas e moradores da cidade se deslocam em direção à orla. Mas, ao chegar, além de um belo pôr-do-sol, a população também avista uma série de problemas: faltam assentos, a margem está suja e a insegurança predomina. De possível ponto turístico, a orla do Guaíba se transformou, em algumas partes, em abrigo para mendigos e desabrigados. O estudante de Direito, Daniel Luft, assíduo freqüentador da orla, mostra-se entristecido: “a gente vem mesmo pelo contato com a natureza, com o sol. Mas não tem como não sair irritado com a sujeira que fica no chão. Fico chateado de ver nossa ‘casa’ assim”. Para o vendedor ambulante, Tom Moraes, o problema, realmente, é a insegurança: “parece que o pessoal da Brigada Militar só quer saber de passear por aqui”, critica. Com 75 km de extensão, a orla do Guaíba é considerada, pela Prefeitura Municipal, um dos principais pontos turísticos da cidade. A fim de revitalizá-la, a Secretaria Muni- cipal do Meio Ambiente lançou o projeto Guaíba Vive. Ele tem como objetivo qualificar e consagrar, ao longo da orla de Porto Alegre, um grande parque linear, da Usina do Gasômetro à Reserva Biológica do Lami, José Lutzenberguer. Em sua página na internet, a Assessoria de Imprensa da Secretaria afirma que “a reurbanização da orla, compreendendo projetos no Lami, Belém Novo, Ipanema, Ponta Grossa, Guarujá e Cristal, através da qualificação da área com instalação de vestiários, quiosques com churrasqueiras, higienização das áreas de praias, permitindo sua utilização em atividades de lazer e recreação”, é um dos principais objetivos do Guaíba Vive. O coordenador do projeto, o biólogo Rodrigo da Cunha, vai ainda mais longe: “esse programa também trabalha em outros aspectos como, por exemplo, o controle de invasões na orla. Além disso, estão sendo feitas parcerias público/privadas como as recuperações do Anfiteatro Pôr-do-Sol e da ciclovia, que vai da Usina do Gasômetro até o Sport Club Internacional”. Segundo o biólogo, a escassez de recursos também se torna um empecilho: “devido à atual situação financeira da Prefeitura, o Projeto Guaíba Vive tem trabalhado com poucos recursos. Estamos iniciando um traba- lho nas nascentes do Arroio Dilúvio, no Parque Saint´Hilaire, com financiamento do Fundo Nacional do Meio Ambiente, para a recuperação e educação ambiental, para a população entorno do parque”. Para a estudante Paola Astudilla, moradora do bairro Belém Novo, o Projeto Guaíba Vive não apresentou nenhuma solução ou está estagnado. “A gente tem, aqui em Belém Novo a Praia do Leblon, um lugar lindo para passear! Mas, quando a gente chega, vê lixo, obras inacabadas ou a ‘casinha do salva-vidas’ está sempre vazia. Sem contar a iluminação, que é precária. Quando o sol baixa, o perigo toma conta. Parece que o projeto está apenas no papel”, reclama. Luciano da Luz, residente do bairro Guarujá, discorda: “aqui a orla foi revitalizada. As pistas de skate e os campinhos de futebol estão bem conservados. Tudo muito atraente para um chimarrão de fim de tarde!”. Para Bruno Coronel, do bairro Centro, o problema não está apenas nas autoridades: “toda vez que vou lá, me certifico de que tudo que sujei, eu vou limpar. Sempre levo uma sacola plástica para utilizar como lixo. Acho que todo mundo tem de fazer a sua parte, tanto cidadão quanto prefeitura tem o dever de dar mais valor à nossa orla!”. Foto: Carlos Tiburski Os rumos do pôr-do-sol mei o ambi ente m ei o a m b i en te Fotos: Daiane Pajares A água existente em países como o Brasil pode ser, num futuro próximo, motivo de disputas econômicas como hoje é o petróleo Recurso não-renovável no meio ambiente, o petróleo será substituído, em algumas décadas, por outras fontes de energia Daiane Pajares De um lado, a água, mineral líquido essencial à vida no planeta e, do outro, o petróleo, substância importante para a atividade econômica. Qual deles vale mais? Para o desenvolvimento social, os dois. O preocupante é que a utilização desses recursos está visando cada vez mais a suprir interesses ao invés de atender às necessidades da população. O petróleo é um recurso finito, que pode ser substituído por outros combustíveis. Mas a falta de água limita a vida. O curioso é que a água, indiscutivelmente mais importante para a vida do que o petróleo, recebe um tratamento político, econômico e administrativo muito inferior ao conjunto de normas que gerenciam o petróleo. No Brasil, assim como a água, o petróleo é um bem público. Mas não é usado ‘in natura’. Ele é explorado e industrializado. Existe uma cadeia produtiva e um setor econômico industrial por trás dele, que movimenta bilhões de dólares: “uma sociedade, hoje, não vive sem o petróleo. Mas, se ele acabar, com certeza encontrarão outras alternativas. A questão do petróleo, hoje, é muito mais política do que técnica. Todos os conflitos que existem, as disputas internacionais por conta do petróleo são mais uma decisão política e de interesses econômicos”, explica o geólogo e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Antônio Pedro Viero. A água está tão presente no dia-a-dia, quando são abertas as torneiras, nos rios, na chuva, que ainda não se notou a importância desse recurso. O mau uso, a poluição e o desperdício estão fazendo dela um recurso mais valioso do que o petróleo, porque a água está se tornando cada vez mais insuficiente. Segundo Viero, ela é um recurso natural que se renova e, em termos globais, nunca vai acabar. O que pode acontecer e o que está acontecendo é a extinção da água de qualidade: “o problema maior dos recursos hídricos é a degradação da qualidade, muito mais do que a exaustão da quantidade”, diz o geólogo. Abundância No Brasil, apesar da abundância de água doce, ainda existem regiões, como o Nordeste, que sofrem com a falta e pouca qualidade desse líquido. O que acontece é que, enquanto uns esbanjam, outros precisam limitar o consumo de água. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), uma pessoa necessita de, no mínimo, 50 litros de água limpa por dia para sobreviver. Estimativas avaliam que se perdem de 40% a 60% de toda a água tratada por mau uso e desvio. Apenas cerca de 5% da água potável é realmente utilizada para beber e preparar alimentos. Mais da metade é jogada fora através dos ralos, chuveiros, vasos sanitários, calçadas e torneiras. O Brasil é auto-suficiente na produção de petróleo desde 2005, mas novas alternativas de combustíveis vêm sendo estudadas, como o hidrogênio, o biodiesel e o álcool. “O petróleo é um bem não-renovável e, daqui a 40 ou 50 anos, ele vai acabar”, afirma o professor da UFRGS, Ph.D. em Geologia Sedimentar, Michael Holz. A política do petróleo domina o mercado mundial. Para Holz, o mundo, hoje, não funciona sem petróleo, pois ele está nas roupas, nas tintas das canetas, nos combustíveis. Mas como seres morais e éticos, deve-se considerar a água como o bem físico de maior valor. “O mundo se fez sem petróleo. Seria possível sobreviver sem ele. A água é essencial”, constata Holz. Para muitos pesquisadores, a água será o novo petróleo do século 21. Acredita-se que, daqui a algumas décadas, as nações não vão brigar por petróleo, mas sim pelo líquido doce que restar no planeta. No Oriente Médio, existem casos de tensões geoplíticas geradas por conta da disputa pelo domínio e utilização de fontes de água. Mas, para Viero, a questão da água não terá uma abrangência universal como o petróleo. As disputas serão regionalizadas e os conflitos acontecerão onde existe falta de água. O fato de o Brasil concentrar em seu ter ritório uma das maiores reservas de água doce do mundo não deve ser motivo para despreocupação: “o maior problema da água está na qualidade, na falta de saneamento. A população precisa se mobilizar e cobrar iniciativas do governo”, diz o engenheiro agrônomo e consultor técnico da Federação da Agricultura no Rio Grande do Sul (Farsul), Ivo Lessa Silveira Filho. A questão da importância da água deve estar presente no cotidiano de cada um. Diminuir o desperdício de água tratada é o primeiro passo. Tanto a água como o petróleo são de extrema importância. Universo IPA | Dezembro 2006 Água ou petróleo? 13 mmei ei o aomambi b i en teente Mascotes ta e ian s Co El Desde 1997, a venda de algumas espécies silvestres é permitida no Brasil. A lei tinha como intenção diminuir o tráfico de animais, mas, na prática, a realidade é outra: a maioria das pessoas não está disposta a arcar com o custo de um animal de origem legal Universo IPA | Dezembro 2006 eliane costa 14 silvestres “É uma questão cultural. As pessoas ainda são muito egoístas e querem os animais cantando dentro de suas casas, ao alcance de suas vistas. Não se propõem a observar as aves soltas na natureza, não se dispõem a dar um passo em direção a um parque, para ver animais livres, se alimentando, fazendo seus ninhos, criando seus filhotes.“ Essa foi a resposta da Bióloga e Analista Ambiental do Núcleo de Fauna do Ibama/RS, Cibele Indrusiak, quando questionada sobre o motivo pelo qual tantas pessoas se interessam em prender e criar aves silvestres como animal de estimação. Desde 1997, é possível a venda desses animais no Brasil. Mas somente os criadouros registrados pelo Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) têm o direito de comercializar essas espécies. A regulamentação da venda dos animais tem como objetivo diminuir a pressão de caça/captura sobre as populações naturais e coibir o tráfico de animais. Mas, na prática, a realidade é outra. “A possibilidade de comprar animais silvestres legalizados, infelizmente, não atrai a maioria das pessoas, que não está disposta a arcar com o custo de um animal de origem legal “, explica Indrusiak. O proprietário de uma loja especializada em aves exóticas e silvestres, Alexandre Scotta, explica que as aves mais procuradas e vendidas são as da espécie dos psitacídeos - papagaios e araras. Segundo Scotta, as pessoas preferem essas aves por terem a possibilidade de criá-las fora das gaiolas, podendo ter um contato maior com o animal. A loja possui cer- ca de 20 espécies e os preços podem atingir R$ 6 mil. Scotta diz que as aves são preparadas, para o convívio com seres humanos, desde que nascem. São alimentadas por seus tratadores, longe do convívio da mãe. Na hora da venda, a loja faz recomendações quanto à alimentação correta e ao tamanho ideal das gaiolas. Os comerciantes apresentam ao Ibama, semestralmente, uma relação com a procedência do animal e o nome do comprador. Os dados são para possíveis fiscalizações. A moradora de Gravataí, Carla Rodenbusch, 28 anos, possui um casal de papagaios: a Lara e o Loro. Ela se diz favorável à criação de aves, em cativeiro, desde que sejam bem cuidadas, tenham algum tipo de liberdade, e que sejam adquiridas em um criatório legalizado. “Sou contra o comércio ilegal de animais porque muitos acabam morrendo para que um seja vendido”, confessa. Para ela, quem resolve adquirir uma ave deve ter consciência de que ela, como qualquer outro animal de estimação, gosta de muita companhia. Devido à imensa biodiversidade da fauna silvestre, o Brasil tornou-se alvo do interesse de traficantes. Conforme dados da Rede Nacional contra o Tráfico de Animais Silvestres (Renctas), o comércio ilegal de animais é a terceira maior atividade ilícita do mundo, perdendo apenas para o tráfico de drogas e de armas. Além disso, 70% desse comércio é só para consumo interno. Ilude-se quem pensa que o tráfico de animais, no Brasil, é feito por capturadores e clientes estrangeiros. Há mais dados que chamam a atenção: de cada dez animais traficados, nove morrem antes de chegar ao destino final. O Brasil ocupa o segundo lugar em número de espécies de aves ameaçadas de extinção. No ano passado, o Ibama, com apoio da Brigada Militar e da Polícia Federal, apreendeu cerca de sete mil espécies silvestres adquiridas e mantidas ilegalmente no Estado. A captura, compra ou venda de animal silvestre com origem ilegal é crime. As multas variam de R$ 500 a R$ 8 mil, ou prisão. Semanalmente, a polícia, as prefeituras e o próprio Instituto do Meio Ambiente recebem denúncias de maus tratos. A bióloga explica que os animais são mantidos em condições péssimas: “a crueldade e a ignorância são as companhias mais freqüentes da criação de animais”. Após a apreensão, os animais passam por uma triagem. Depois, são encaminhados a criadouros conservacionistas, que funcionam como abrigos. Mas ocorrem casos em que os animais são devolvidos aos infratores por meio de ordens judiciais, causando revolta por parte de setores que se preocupam com a fauna brasileira. “Há um mito infundado de que o animal apreendido morre de saudade da família. Bobagem. Nossa experiência comprova o contrário: os animais melhoram em todos os sentidos. Após serem encaminhados aos criadouros parceiros, recebem alimentação balanceada, atendimento A captura, compra ou venda de animal silvestre com origem ilegal é crime. A punição é multa que varia de R$ 500 a R$ 8 mil e até prisão. Saiba o que são Animais Silvestres São os pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham sua vida, ou parte dela, ocorrendo naturalmente dentro do Território Brasileiro e suas águas juridicionais. Exemplos: mico, onça, papagaio, arara, canário-da-terra, tico-tico, teiú, jibóia, jacaré, jabuti, tartaruga-da-amazônia. O acesso, uso e comércio de animais silvestres é controlado pelo Ibama. Animais Exóticos São aqueles cuja distribuição geográfica não inclui o Território Brasileiro. As espécies ou subespécies introduzidas pelo homem, em estado selvagem, ou domesticadas são consideradas exóticas. Também são as que tenham sido introduzidas fora das fronteiras brasileiras e suas águas juridicionais, ou as que entraram, espontaneamente, em Território Brasileiro. Exemplos: leão, zebra, elefante, urso, lebre-européia, javali, crocodilo-do-nilo, naja, piton, tartatuga-japonesa, tartaruga-mordedora, tartaruga-tigre-d’água, cacatua, arara-da-patagônia, entre outros. Animais Domésticos São os animais que, através de processos tradicionais e sistematizados de manejo e melhoramento zootécnico, tornaram-se domésticos, possuindo características biológicas e comportamentais dependentes do homem. Podem, inclusive, apresentar aparência diferente da espécie silvestre que os originou. Exemplos: gato, cachorro, galinha, pato, marreco, peru, avestruz, entre outros. Fonte: http://www.ibama.gov.br/fauna/ Bettina schünke O que você faz com a garrafa pet usada e descartável, com o papel, o plástico e o vidro que você usa e não serve mais para nada? Vai para onde quase tudo termina: na lata de lixo. O que para muitas pessoas parece ser o fim se torna o começo para outras. É o caso dos moradores da Vila Pinto, comunidade conhecida pelo elevado nível de pobreza e violência em Porto Alegre. Desde 1995, funciona, na Vila, um centro de triagem de lixo que está mudando os contornos da vida social dos moradores. O Centro de Educação Ambiental (CEA) veio com o intuito de ajudar as mulheres que moravam na Vila. A idéia foi da líder comunitária Marli Medeiros, mentora e presidente do CEA, que estava cansada de ver tanta injustiça social, especialmente, contra as mulheres da vila. Segundo a coordenadora do centro, Ana Cristina de Lima, “o projeto não foi planejado por técnicos. Foi pensado única e exclusivamente por pessoas da comunidade, cerca de dez anos atrás”. Com a separação do lixo reciclável, as mulheres, que, num primeiro momento rejeitaram a idéia por conta da discriminação que sentiam por morar na Vila e por trabalhar com o lixo, passaram a ter uma fonte de renda. Asfalto, luz, água, rede de esgoto, linha de ônibus, tudo o que existe hoje, no local, não existia. Foi conquistado graças ao esforço de Medeiros. Hoje, o CEA, além de ser um grande aliado das famílias contra a pobreza, é também um grande aliado contra a violência. Com a implantação do Centro Cultural James Kulisz no local, as crianças passaram a ter um lugar para lazer e recreação. “A cultura mudou o comportamento das crianças”, manifesta Lima com alegria. O Centro Cultural, inaugurado em 2002, possui sala de informática, sala de cinema, biblioteca, aula de teatro, dança, percussão e canto, além de uma escolinha de futebol, de costura e de cursos profissionalizantes. O CEA conta com a colaboração única e exclusiva de parceiros voluntários, que dedicam parte do tempo ensinando as crianças, dando apoio às famílias da Vila ou ajudando a manter a estrutura. Atualmente, conta apenas com repasse da Secretaria Municipal de Direitos Humanos. Em outubro deste ano, o CEA foi vencedor do “Prêmio Atitude Social”, promovido pela Rádio Farroupilha e Diário Gaúcho na categoria “Destaque Ambiental”. Oportunidade: essa é a palavra chave para o CEA, segundo Lima. Porque é através do CEA que muitas pessoas, hoje moradoras da Vila, têm oportunidade de lazer, esporte e cultura. Muitas pessoas estão deixando de se sentirem discriminadas e estão se sentindo cada vez mais incluídas na sociedade. Por isso, é apostando na mudança de atitude que todos podem fazer sua parte. Ao invés de ir para a lata de lixo, a garrafa pet, o vidro, o papel e plásticos podem se tornar importantes meios de inclusão social, abrindo oportunidades para construir uma sociedade mais justa. c i da dan i a que vem do lixo c i dadani a Esperança Bettina Schünke Mulheres da Vila Pinto buscam no lixo condições de inclusão social e melhor qualidade de vida Universo IPA | Dezembro 2006 veterinário e convivem com outros da sua espécie”, explica Indrusiak. A bióloga conta que muitas pessoas se arrependem e levam animais até o Ibama para que sejam reabilitados e soltos no seu habitat. No entanto, animais criados em cativeiro não podem ser soltos na natureza, porque não conseguiriam sobreviver. A possibilidade legal de criar animais silvestres em residências existe, mas é uma decisão que deve ser muito bem pensada. Isso requer tempo, dedicação e boas condições financeiras. Para Indrusiak, a população brasileira deve repensar a situação: “nossa sociedade já conseguiu fazer discussão séria e proibiu a farra do boi e a briga do galo, ambas atividades tidas como culturais. Quem sabe, no futuro, irão optar pela proibição de venda de animais silvestres?”. 15 Admirável Nano i ênc c icên cia ia Universo IPA | Dezembro 2006 Fotos: Rogério Soares 16 Roupas que não mancham. Vidros auto-limpantes. Carros com pintura anti-arranhão. Curativo para câncer. Batom que reflete luz. Isso lhe parece o futuro? Pois, então, o futuro chegou ALINE MARQUES Há alguns anos, construir materiais, átomo a átomo, era algo tão distante e inacreditável quanto construir um castelo de areia grão a grão. Hoje, graças à nanotecnologia – ciência que estuda a manipulação de partículas equivalentes à bilionésima parte do metro – cresce o número de produtos desenvolvidos para suprir, com eficácia, as necessidades cotidianas. A palavra “nano” tem origem grega, e significa “anão”. Podemos considerar que algo é nano quando uma de suas propriedades se altera em função do tamanho. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) é uma das líderes em pesquisa nessa área, com grande volume de trabalhos publicados e, inclusive, com depósito de patentes. O professor do Instituto de Física da UFRGS, Mário Baibich, desenvolveu, a partir da nanotecnologia, com colaboração da França, o Magneto-Resistência Gigante, trabalho presente em todos os discos rígidos de computadores com capacidade de 20 gigabyte. Segundo Baibich, a partir do controle do tamanho e da forma das nanoestruturas, é possível aprimorar as propriedades dos materiais, construindo dispositivos com características especiais, selecionadas a partir da necessidade das aplicações. Devido à imensa aplicabilidade dessa nova tecnologia, praticamente todos os segmentos produtivos estão incorporando soluções nanotecnológicas. Prova disso foi o resultado da Carta Convite do programa de Ações Transversais, publicado no site da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), onde empresas como Aracruz Celulose, Bünge Alimentos, Copesul, Gerdau e Sadia manifestaram interesse em participar como cofinanciadoras no apoio à cooperação entre o setor produtivo e Instituições Científicas Tecnológicas. No Brasil, as pesquisas em nanociência foram iniciadas de forma independente. Porém, hoje, a exemplo do que acontecia em países desenvolvidos, o governo brasileiro destina recursos especificamente à pesquisa nanotecnológica. Empresas privadas também participam dos projetos com subsídios, como parceiras. Na UFRGS, várias áreas de estudo trabalham com pesquisas em nanotecnologia. Visando a organização dessas áreas em torno da nanociência e da nanotecnologia, um grupo de professores se reuniu, em 2004, para a criação de um Centro de Estudos. Em junho deste ano, o Conselho Universitário da Instituição aprovou, por mérito, a iniciativa do Centro e, desde então, a professora do Instituto de Química, Adriana Pohlmann, foi nomeada coordenadora de implantação do Centro. Recentemente, o regimento do Centro foi concluído, e logo deve ser aprovado pela Reitoria. O país ganhará seu primeiro Centro de Nanociência e Nanotecnologia, como organismo de uma Universidade. Será um Centro de Estudos Interdisciplinares, conforme prevê o Estatuto da UFRGS. Conforme Pohlmann, a expectativa é de que, em seu início, o Centro conte com mais de cem credenciados - pesquisadores com trabalhos publicados ou patenteados ou, ainda, coordenadores de projeto de pesquisa financiados por Agências de Fomento. Um dos principais objetivos será facilitar o acesso ao incentivo à pesquisa na área de nanotecnologia. c i ênc i a c i ên c i a Mercado promissor Segundo a National Science Foundation (NSF) dos EUA, em 2015, o mercado global de produtos ligados à nanotecnologia será de US$ 1 trilhão. Pohlmann concorda com essa tendência. Ela diz que o desenvolvimento está acontecendo de forma acelerada. O período entre a concepção do projeto e o produto final é cada vez menor. Em razão disso, o seu pensamento é otimista. “Daqui a cinco anos, as pessoas saberão exatamente que, no creme anti-rugas que elas usam e até no avião em que elas viajam, há nanopartículas. De fa- Devido à aplicabilidade, estima-se que todos os segmentos produtivos incorporarão soluções nanotecnológicas Universo IPA | Dezembro 2006 Pioneirismo na UFRGS to, haverá diferentes respostas em cada setor econômico. Mas o que se visa é desenvolver produtos com uma performance cada vez melhor, atendendo cada um dos nichos de mercado que já existem. A estratégia é pensar em quem consome”, explica. Porém, alguns estudiosos alertam para os danos que a nanotecnologia pode causar. Se os custos de produção de armas e aparelhos de espionagem tiverem uma redução significativa, poderão ser fabricados produtos menores, potentes e numerosos. Com relação a essas especulações de que a nanotecnologia poderá ser a causa de uma nova corrida ao armamento entre países concorrentes, Pohlmann é categórica: “há liberdade para que qualquer pessoa diga o que quiser, mas deve haver consciência coletiva para que se faça bom uso tanto da nano, quanto de qualquer outra tecnologia.” Em diversas áreas, “a ciência do século 21” vem gerando benefícios significativos, que vão além do mundo industrial. Na área da saúde, por exemplo, a nanotecnologia está contribuindo para o aumento da expectativa de vida e o aumento da capacidade humana. Nas áreas da água e agricultura, está sendo usada para gerar sustentabilidade. Além disso, vem colaborando para o desenvolvimento de sistemas de iluminação de baixo consumo energético. Antigamente, o laser, que existia nas histórias em quadrinhos, era algo inimaginável na vida real. Era pura ficção científica. Hoje, é utilizado para inúmeras finalidades. Desde depilação até cirurgias. Da mesma forma, em 1970, nem a mais otimista previsão poderia afirmar que a arpanet se tornaria a internet essa rede mundial tão avassaladora e indispensável na vida moderna. 17 Bastante utilizada nos EUA e com efeitos comprovados, a zooterapia começou a ser estudada por médicos sasaúd úd e e e pesquisadores. A terapia, que Melhores amigos em todos os momentos Graziele Silva Corrêa conta com a ajuda de animais, não tem a capacidade de curar uma doença, mas seus efeitos colaboram, significativamente, na melhora dos pacientes: “o doente acaba esquecendo um pouco dos problemas e desvia a atenção para os animais”, esclarece a docente em Medicina Veterinária, Denise Schartz. Graziele silva corrÊA Quem gosta de animais sabe da alegria que eles podem proporcionar. O que muita gente não sabe é que eles podem ajudar em tratamentos de saúde. A Zooterapia ou Terapia Assistida por Animais (TAA) é antiga. Segundo a Presidente da ONG Zooterapia, Marisa Martinez Pereira, a utilização de animais, em tratamentos terapêuticos, vem desde o final do século 18, na Inglaterra. O médico neurologista, neurocirurgião, mestre em educação, coronel cavaleiro e fundador da Associação Gaúcha de Equoterapia (AGE), José Torquato Severo, garante que a procura aumentou, gradativamente, desde que começou de seu trabalho em 1995. No Brasil, as terapias auxiliadas por animais mais utilizadas são a equoClaudia Jobim Idosos com depressão são os maiores beneficiados na Cinoterapia terapia, feita com cavalos, e a cinoterapia, que utiliza os cães. Existem tratamentos que usam burros (assinoterapia), peixes, pássaros, gatos e coelhos. “Na TAA, os animais atuam como co-terapeutas ou motivadores terapêuticos na reabilitação dos pacientes”, explica a psicóloga e fundadora do Projeto Cão Amigo e Cia, em Curitiba (PR), Manuella Balliana Maciel. Universo IPA | Dezembro 2006 Cinoterapia 18 Co-terapeutas da TAA, os cães dóceis ajudam no tratamento Trata-se de uma técnica que utiliza cães como co-terapeutas. De acordo com a psicóloga especialista em cinoterapia, Samira Rocha, em entrevista ao site www.acessa. com, a prática da cinoterapia é indicada para o tratamento de crianças e adolescentes com dificuldades de comunicação e sociabilização, assim como o autismo ou agressividade. “O cão é uma ponte entre o paciente e o terapeuta. Durante a interação com o animal, são quebradas barreiras”, garante Rocha. Equoterapia A terapia, que utiliza o cavalo como motivador terapêutico, vem ganhando espaço em todas as cidades do país. Dr. Severo lembra que há novos programas que são aconselhados pela Associação Nacional de Equoterapia (ANDE). Ele junto com a AGE, criou uma parceria com a Prefeitura Municipal de Porto Alegre que atende cerca de 30 crianças e adolescentes com problemas de aprendizagem. Na área da saúde, os problemas mais encontrados são crianças, adultos ou idosos com debilidade mental, síndrome de down, comportamentos autistas, esquizofrenia, e depressão. A advogada, Jaqueline Souza Lopes, que é portadora de seqüelas de paralisia cerebral, os resultados superaram as suas expectativas. “No início não acreditava muito, mas comecei a ter uma visão diferente do mundo, percebi que posso contribuir com algo de bom para a sociedade, passei a ter mais confiança em mim mesma”, confessa a praticante. Sem saber a quantidade certa de tatuagens que tem no corpo, Karen Isabel de Souza Cabral diz: “acho que tem umas dez”. Em 2005, ela começou a tatuar seu corpo. Após fazer as tatuagens, começou a se interessar e tatuar também. Formou-se como body piercing. Ela acredita que a procura por piercing e tatuagens, no verão, é pela estética. Jaqueline Silva Requer, 25, tem tatuagens há seis anos e justifica que a tatuagem é uma extensão da personalidade. Requer comenta que preferia quando era um pessoal mais alternativo que tinha tatuagem. “Hoje, virou moda. As pessoas tatuam o que está na moda”, acredita. Com quatro tatuagens, ela conta que elas têm importantes significados em sua vida e que pretende fazer mais. “Tatuagem é uma coisa que vicia”, afirma. O estudante Pedro Henrique Ribeiro Gonçalves, 20, fez a primeira e única tatuagem, há dois anos, no braço por não querer um lugar muito exposto. Gonçalves escreveu o nome de seu irmão falecido em letra japonesa. “Coloquei o nome dele para fazer uma homenagem”, explica. Ele a fez no verão e admite que a estação o influenciou um pouco. A professora Paula Ferreira Santana, 24, fez sua primeira tatuagem há quatro anos. Hoje tem quatro. Uma delas tem um significado sentimental. “Fiz junto com outra pessoa”, revela. As outras foram por simpatizar com o desenho e por ficar legal na sua área de atuação. Santana trabalha com a Educação Física e diz que não atrapalha. Porém, como tem outro emprego, em uma área administrativa, ela procura não mostrar muito. Preconceito X Tatuagens Karen Cabral fez sua primeira tattoo em 2005 Hoje, a tatuagem está em todo o lugar, em qualquer corpo. Foi o tempo em que tatuagem era sinônimo de marinheiro ou presidiário. Isso virou piada. Mesmo assim, ainda têm omp or tamento c om por ta m en to pessoas que vêem com preconc e i t o quem tem tatuagens no corpo. Um dos principais tabus é em relação ao mercado de trabalho. Muitos deixam de fazer tatuagens por temer uma rejeição no emprego. Fávero comenta sobre a preocupação que tem em relação aos seus clientes e ao preconceito que ainda existe. “Eu avalio pela idade. Se o cara já é maduro, formado e tem uma profissão garantida e quer fazer uma loucura, eu faço. Mas se vem adolescente e gurizada que ainda não tem uma profissão, e não tem certeza do que quer, eu não faço”, relata. Júnior, também, tem a mesma posição em relação a emprego e tatuagem. “Eu induzo eles a fazerem em um local que eu acho que não vai prejudicar, onde a roupa possa esconder”, explica. Segredos da boa tattoo - E scolha bem o desenho. Faça algo que tenha um significado. Os riscos de se arrepender serão menores. Pesquise o desenho que você quer; - Procure um tatuador indicado por algum amigo. Saber como é o trabalho desse profissional é importante. E, principalmente, veja bem como é a higiene do estúdio. Exija material descartável e esterilizado; - C onverse com o tatuador e diga exatamente como você quer. Esteja aberto para escutar a opinião dele sobre sua idéia. Cuidados com cicatrização - N ormalmente, a tatuagem demora cerca de 15 a 20 dias para cicatrizar. Tenha muita higiene; - Lave o local com sabonete neutro; - U sar a pomada cicatrizante, indicada pelo tatuador, três vezes ao dia; - Não abafe. É bom evitar roupas justas e pesadas; - Não esfregar o local nem tirar a casquinha; - E vite a exposição ao sol, mar ou piscina durante a cicatrização; - Secar, levemente, a região da tatuagem. Não esfregue o local. Apenas encoste a toalha para absorver a água; - Por último, mesmo depois da cicatrização, é importante passar protetor solar. Universo IPA | Dezembro 2006 Tarsila Pereira Tatuados sim! ki Nos calendários, o verão começa em 21 de dezembro. Porém, para muitos, antes dessa data, a estação chega antes. Com as altas temperaturas dos meses de outubro e novembro, é possível ver as roupas diminuírem de tamanho, academias ficarem lotadas e, é claro, corpos bonitos. São braços, pernas, barrigas e costas à mostra, desfilando pelas ruas. Também se observam estrelas, dragões, fadas, golfinhos, tribais, rosas, índias e um infinito de tatuagens que, no verão, aparecem, formando, na pele, um atrativo para os olhares de quem passa. Na estação do sol, do calor, da praia e das férias, os estúdios de tatuagem ganham clientes. Quem garante isso é o tatuador, Ucari Feck Braga Júnior, 22 anos, há quatro nesse ramo. De dezembro a março, ele mantém estúdio na praia, em Torres, de terça-feira a domingo. Nas segundas, volta para Porto Alegre para tatuar. Júnior acredita que o aumento pela procura de tatuagens se deve à exposição do corpo. “O que empolga o pessoal a fazer é olhar o outro tatuado e querer ter também”, diz. Quem concorda com Júnior é outro tatuador, Geraldo Lemos Fávero, 44, na área há cinco anos. Segundo Fávero, a procura nos meses de verão chega a crescer 60% em relação ao inverno. Com estúdio em Porto Alegre, ele pensa na possibilidade de trabalhar na praia, no verão. “Neste ano, pensei em ir pra praia. Afinal, o pessoal está todo lá”, explica. Outra curiosidade sobre o universo das tatuagens é a fidelidade dos clientes com os tatuadores. Júnior tem clientes que voltam todo o mês para se tatuar. Para Fávero, a divulgação do “boca-a-boca” é a melhor maneira de ter novos clientes. “A clientela das tatuagens é fiel. É raro vir alguém que não conhece o tatuador. Sempre é por indicação”, acredita. rs ibu sT Tarsila pereira tattoos rlo Ca Na onda das 19 Universo IPA | Dezembro 2006 sasaúd úd e e O estresse 20 nosso de cada dia Marco Júnior marco júnior Em 1986, o filme Curtindo a Vida Adoidado trouxe Ferris Bueller, um estudante que, por não agüentar mais a rotina de estudo, decide tirar um dia de folga da escola para realizar um passeio com a namorada e o melhor amigo. Em 1992, no cultuado Um Dia de Fúria, William Foster, um trabalhador de Los Angeles, logo após ser demitido, deixa o carro no meio de uma avenida movimentada, com o intuito de ir ao outro lado da cidade a pé para ver a filha e tentar reaver o casamento. Durante o trajeto, enfrentou diversas situações violentas devido ao seu alto nível de estresse. Ambos os personagens geraram um grande nível de identificação com o público, que passou a considerá-los heróis, mesmo sabendo que tanto Bueller quanto Foster estavam errados nas atitudes. Os casos citados não passam de ficção. Mas, nos dias atuais, podem vir a acontecer devido às inúmeras responsabilidades que a vida moderna traz, juntamente com o tão falado e temido estresse. Porém, isso é compreensível numa sociedade onde, atualmente, as frases mais ouvidas são “hoje não tive tempo para nada” ou “hoje tenho que me virar em dez”. A maratona - trabalho, trânsito, fila, ônibus lotado, estudo e família - parece não acabar, pois o relógio costuma ser a única prioridade dentro do dia-adia, cada vez mais acelerado. O estresse não escolhe idade, religião, cor e posição social. Portanto, a lenda criada em camadas de baixo poder aquisitivo da sociedade, que somente pessoas de alto poder monetário sofrem de estresse ou que ele é falta de ocupação, é um mito. Aliás, o excesso de ocupações é uma das principais causas, de acordo com a psiquiatra Sandra Maltz. A tecnologia que, para muitos, é um aliado do ser humano, muitas vezes, é vista como um inimigo, pois a parafernália eletrônica impôs um ritmo muito imediatista à vida moderna e a humanidade ainda está a se adaptar a essa nova realidade. Para o médico Saul Berdichevski, a modernidade está trazendo consigo um número maior de enfermidades ligadas a estresses psicossociais como ansiedade, depressão e uma alta quantidade de casos de obesidade e má alimentação. “As necessidades que as pessoas têm, para en- Violência, falta de dinheiro, estudos e responsabilidades em excesso transtornam a saúde do indivíduo O ritmo de vida acelerado da sociedade atual, faz a população sofrer com as doenças ligadas ao estresse frentar o mercado de trabalho cada vez mais competitivo, faz com que tenhamos um aumento no número de doenças ligadas ao estresse”, afirma Berdichevski. Essa competição traz uma série de estímulos excessivos, acarretando alguns doenças como úlceras, enxaquecas, transtornos no sono e outras patologias que podem ser de controle mais difícil em situações em que a pessoa está submetida à estressores crônicos significativos, por exemplo, asma e hipertensão. Todo mundo está sujeito a ter um ataque de nervos. Por isso, cabe ressaltar que nem todo estresse é prejudicial. O bom estresse traz responsabilidades para execução das tarefas do cotidiano, faz com que as pessoas possam agir com mais rapidez em certas ocasiões e serve como alerta para que sejam reavaliadas atitudes tomadas em determinadas situações. Para o auxiliar de escritório, Rodrigo da Silva, o estresse é algo comum em sua vida. Dicas de prevenção - Reavalie o ritmo da sua vida. - Tenha um tempo para si mesmo, durante o dia de trabalho, com pausas de 15 a 20 minutos. - Pratique atividades físicas, como caminhar três vezes por semana, durante 30 minutos. Isso aumenta a capacidade cárdio-respiratória e garante maior Como é ser herói e, ao mesmo tempo, não saber se voltará com vida para casa? Camila Morales O que devemos levar em conta ao escolher uma profissão para exercer ao decorrer da vida? Pense bem e tome muito cuidado, pois há profissões que podem ser extremamente arriscadas e, ao mesmo tempo, roubar a sua vida. Uma profissão tradicional, que muitos querem desde criança, é a de policial. Sonham com esse trabalho que, além de ser arriscado, não é remunerado à altura pelo que faz e o quanto se expõe. O policial civil se coloca em muitas situações de risco, através da realização das investigações, entre várias outras atribuições que lhe cabem todos os dias, em espaços conflituosos. Em muitas dessas situações, pode ser agredido e correr risco de morte, em uma simples abordagem ou, até mesmo, em situações em que está “infiltrado”. O policial está sempre acompanhado do “medo”, podendo avaliar o momento em que o confronto está iminente. “É preciso possuir bom equilíbrio emocional para atuar nas adversidades de cada situação”, explica o inspetor e chefe de investigação, Luis Henrique Reis Jacques. Outra profissão de risco é a de Agente Penitenciário. Quando se fala em Sistema Penitenciário lembra-se logo em presídios e penitenciárias, pois é onde esses profissionais exercem as funções, trabalhando 24 horas nestes locais sujeitos a rebelião e motins. Na verdade, estes agentes, também, exercem outras atividades de alto risco: é a de “transporte de presos (escoltas, remoções, apresentações de presos em audiências no RS bem como em todo o Brasil)”, conforme o Agente Penitenciário, Valdemar E. Seixas, que trabalha há 15 anos no Sistema Penitenciário. Na Superintendência dos Serviços Penitenciários (SUSEPE) existe uma divisão Operacional do Departamento de Segurança e Execução Penal treinada especificamente para este fim: o Núcleo de Segurança e Disciplina (NSD). Os agentes dessa divisão trabalham, diariamente, com o transporte de presos, desde o considerado “ladrão de galinha” até os mais perigosos como, por exemplo, integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), assaltantes de bancos e outros. O Agente Seixas explica que, “com o crescimento do crime organizado, está cada vez mais comprometida nossa situação, pois vem crescendo o número de tentativas que foram concretizadas e colegas que foram covardemente assassinados”. p rofiss ão Profissão perigo prof iss ã o “Já saio de casa com raiva e pensando na hora de voltar”, afirma. Segundo Silva, os ataques nervosos são cada vez mais freqüentes, fazendo com que ficasse dois meses afastado do trabalho com o diagnóstico de depressão. Quando os ataques tornam-se freqüentes, a melhor solução é procurar ajuda médica. “As crises nervosas fazem com que a pessoa tenha um sofrimento importante que pode trazer distúrbios no sono, dificuldades de concentração durante o dia, estar mais propensa a acidentes e a desenvolver conflitos familiares e no local de trabalho, além de aumentar a pressão arterial e ocasionar problemas em todo o organismo”, explica a psiquiatra Maltz. Para o estudante do último semestre de Educação Física e funcionário de uma empresa de material esportivo, Marcelo Silveira, a sua rotina traz sentimentos de coragem, tristeza, insegurança e medo, muitas vezes, chegando ao limite da paciência. “Quando sinto que vou explodir, procuro ficar em silêncio e pensar nos malefícios e benefícios que uma reação explosiva poderia acarretar”, conta Silveira. Para Maltz, reprimir os sentimentos não faz bem. Em algumas situações, “é importante sempre avaliar bem cada situação e, dentro do possível, poder verbalizar os sentimentos de forma adequada e de acordo com o que se apresenta”, orienta. Mas melhor do que todas as receitas de como reagir quando o estresse se manifesta é tentar agir de uma forma em que se tente prevenir esse mal. Profissão amada, ora odiada bem-estar. - Invista no lazer, tente sempre agir de forma sincera com colegas e familiares. - Expresse suas angústias sempre que necessário. - Alimente-se evitando alimentos muito gordurosos. - Reconheça suas limitações. O corpo, muitas vezes, alerta quando se está passando do limite. Escute seu organismo e tenha sempre o controle de sua vida. - Caso as coisas saiam do comando, procure ajuda médica. Afinal, como disse Charles Chaplin, no famoso discurso final do filme O Grande Ditador, “não sois máquina, homem é que sois”. Os motoboys estão sempre a disposição, salvam o seu dia indo para todos os lados da cidade, entregando os documentos onde quer que seja, na quase totalidade dos serviços prestados, são pontuais. Pessoas amam esses profissionais, outros não gostam muito, como, por exemplo, motoristas que transitam pela capital e alegam, que estas pessoas os tiram do sério. “Eles são extremamente malucos e se enfiam na frente dos carros”, conta o motorista de caminhão, Márcio Perez. Ser profissional de entrega rápida é muito arriscado, mas ao mesmo tempo é uma adrenalina, confessa o motoboy, Renato Oliveira, há três anos na função. “Há um mês, estava apressado para entregar uma mercadoria e um motorista abriu a porta do carro e caí, tentando me equilibrar, acabei parando no meio da calçada, mas felizmente não me machuquei muito, só sofri arranhões. Adoro o que faço, é eletrizante”, diz. Universo IPA | Dezembro 2006 - Procure sempre dormir oito horas. 21 Rogério Soares sasaúd úd e e Sabrina Pitol Até onde vai a fé? Universo IPA | Dezembro 2006 sabrina pitol 22 Quando chega, questiona, faz repensar os valores, as encostar-se a um ponto da mama”, afirmou. Em poucos convicções, não dá aviso prévio e causa impacto na sua vida. dias, um exame de ecografia apontou ser tumor não perEssa pode ser uma das definições para o mal que constitui a ceptível ao toque. primeira causa de morte entre pessoas do sexo feminino. O Calcula-se de seis a oito anos o período necessário para Rio Grande do Sul é o estado que mais tem registros da doenque um nódulo atinja um centímetro de diâmetro. Existem ça como causa mortis, entre mulheres no período reprodutiquatro estágios do tumor e a lenta evolução possibilita a desvo. Na definição científica, são células que sofrem um descoberta, ainda cedo, das lesões, se as mamas forem examicompasso por razões ainda desconhecidas, e reproduzem-se nadas periodicamente. No caso da enfermeira Paese, históriem alta velocidade. co de constantes precauções, como se pode explicar o resulO processo faz com que surjam neoplasias, ou os cotado da biópsia, exame que retira uma parte da área lesionhecidos tumores. Geralmente, 50% dos casos, onde ocornada para análise, ter detectado que o tumor estava em nível reram mortes, os tumores foram diagnosticados em estátrês? “Quando descobri, queria tudo para ontem. Não queria gios avançados e numa proporção de cem casos femininos mais esperar”, desabafou. Essa é mais uma particularidade para um masculino. É ele, o câncer de mama, que surgiu, de da história de Paese, pois a principal causa da morte é a derepente, na vida de uma enfermeira, Vilma Paese, 52 anos, mora na descoberta, sendo que há mulheres que têm ciência que ministrava palestras sobre a importância da mamoda enfermidade e, provavelmente, por medo das ações do grafia e ensinava milhares de mulheres a fazer o auto-exatratamento, protelam para iniciá-lo. O câncer de mama pome de mama. Naquele momento, ela que defendia a prede apresentar metástases nos gânglios linfáticos das axilas, venção da doença, passava a faossos, fígado, pulmão e cérebro: “A espiritualidade e a fé, para zer parte dos 50% dos casos desmais um motivo para tratar da docobertos em estágio avançado: muitos pacientes, são como ença com brevidade, e, assim, evi“fazia exames de mamografia petar que esses outros órgãos sejam uma pequena muda de riodicamente e nada havia sido atingidos”, disse o médico oncoloárvore se desenvolvendo”. detectado, até a ponta do sutiã gista, César Pacheco. saúd e sa úd e Paese foi submetida à mastectomia, retimentos médicos padrões. “Ela atua como “Nos Estados Unidos, rada total da mama, procedimento comum analgésico para a redução da dor física e espiem torno de 70% das aos pacientes com o quadro. Iniciou as sesritual, tem efeito protetor contra a depressão sões de quimioterapia, tratamento o qual utie suicídio, além de proporcionar um imporfaculdades de Medicina liza remédios que eliminam células de câncer tante suporte psicológico no dia-a-dia das oferecem cadeira formadoras de tumores e metástases: “a prinpessoas envolvidas”, afirma o presidente da obrigatória ou optativa cípio, não apresentou reação. Mas, três dias Associação Médico-Espírita do Rio Grande do depois, fiquei sem forças e sentia muita vonSul, Gilson Luís Roberto. sobre espiritualidade”. tade de dormir“, contou. Sobre os momentos Trabalhos têm mostrado que as pessoas mais difíceis, guarda recordação do 14º dia que vivenciam experiências místicas pontuam após a primeira quimioterapia, quando ocorreu a queda do cabelo: “é menos em escalas de psicopatologia e mais em medidas de bem-estar um sentimento nada fácil de explicar. Tive apoio de familiares e amigos psicológico. “O Brasil possui uma grande diversidade religiosa. Com isso, próximos, mas parecia com uma sensação de solidão”. “Os pacientes foi fundado, no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculrecebem, durante o tratamento, atendimento do ginecologista, masdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), o Núcleo tologista e oncologista, que têm um papel importante, também, na de Estudos de Problemas Espirituais e Religiosos (Neper)”, de acordo área psicológica. Nesse momento, muitos procuram conforto na prócom o Neto e cols. Revista de Psiquiatria Clínica (USP). pria crença, seja ela qual for”, explica o médico Pacheco. A relação entre crença e tratamento é tida como essencial por alAinda, sobre a quimioterapia, Paese relatou que das oito sessões, guns pacientes. “Isso pode levar a complicações pela falta dos cuidados as três últimas foram as mais severas: “sentia fortes dores nas juntas. necessários”, diz Pacheco. A forma com que conduzem o problema, Meus músculos faziam constantes movimentos involuntários. Foi desde a descoberta, modifica o humor, reduz a depressão, melhora a quando tive vontade de desistir”. Ela teve instruções do médico para auto-estima. Assim, o organismo reage melhor aos estímulos dos remanter a rotina da forma mais comum possível: “mesmo me sentindo médios. Então, indiferente do meio que é utilizado, o corpo responde mal, levantava e fazia as refeições à mesa”. Após isso, vieram as 36 sesà química. Logo, é imprescindível a presença do tratamento médico. sões de radioterapia, mecanismo que destrói as células do tumor, através da irradiação de ondas de energia originadas de material radioativo. Hoje, ela está na etapa final, a da hormonioterapia. É mais um exemplo de algoz do câncer de mama. Traduz essa superação em três palaO pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, Adilson Schünke, vras: “força de vontade”. Em nenhum momento, se revoltou: “ninguém esclareceu que a crença em Deus, aliada ao tratamento médico, facilita é culpado”, explica. Nunca pensou em parar o tratamento alopata, mesa cura do doente: “sempre que pudermos fazer uso dos meios que Deus mo tendo recebido novenas e outras manifestações de amigos em prol colocou à nossa disposição, devemos fazê-lo. A medicina, com diversos da cura. Tem isso como complemento ao convencional, “tudo ajuda”. tipos de tratamento, é uma bênção para a humanidade. Devemos, porÀqueles que estão nesse processo, conforta: “tenham força para resistir, tanto, promovê-la e utilizá-la sempre que necessário”, explica. Para os que vai passar”. seguidores das religiões africanistas, o corpo humano está exposto há muitas agressões. Assim, fica velho, fraco, cansado e doente. A fé e a prática religiosa fortalecem o espírito e isso ajuda a sustentar o ser humano em uma eventual dificuldade mental ou física, além de fortificar espirituA espiritualidade e a fé, para muitos pacientes, são como uma pealmente. “A prática religiosa, somada aos tratamentos e acompanhamenquena muda de árvore se desenvolvendo, que traz esperança e os tos necessários aos cuidados com a mente e físico, faz com que se obtemotiva a vencer a batalha contra a doença. Cada vez mais, as pesquisas nha eficácia”, afirmou Andréia de Yemanjá do Ilê Oxum Docô. médicas demonstram que a prática da religiosidade e da espiritualidaO praticante da primeira Igreja Presbiteriana de Porto Alegre, Marde favorecem a cura e melhora a qualidade de vida dos pacientes. celo Name, elucidou que sua religião defende o tratamento convenNos Estados Unidos, em torno de 70% das faculdades de Medicina, cional, uma vez que Deus colocou à disposição do homem esse recurcomo as Universidades de Harvard e de Stanford, oferecem cadeira so, a fim de abrandar o sofrimento. A religião segue os preceitos do obrigatória ou optativa sobre espiritualidade. Novo Testamento da Bíblia. No caso da Igreja Evangélica dos TestemuNo Brasil, a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Cenhas de Jeová, que segue o Antigo Testamento, não são permitidas ará (UFC) foi a primeira a introduzir a disciplina “Medicina e Espiritualialgumas intervenções médicas como, por exemplo, transfusão de sandade” sob a coordenação da Professora adjunta de Histologia e Embriogue e alguns costumes ainda são cultivados como as mulheres que logia Humana, Dra. Eliane Oliveira. Outras faculdades de Medicina, no não podem cortar os cabelos e não podem usar calça. Assim, muitos Brasil, estão tomando a mesma iniciativa. As pesquisas demonstraram seguidores deixam o tratamento médico em nome da fé. A doutrina que a prática religiosa melhora o sistema imunológico, diminui a inciEspírita considera o atendimento médico convencional um grande dência do câncer, aumenta a sobrevida, os pacientes ficam menos anavanço no alívio dos males humanos, sendo também uma expressão siosos, menos depressivos, têm maior estabilidade nos relacionamenda misericórdia divina: “acreditamos que a religiosidade ou a espiritua tos, apresentam menos suicídios e menor abuso de drogas e álcool. A lidade vem ao encontro da ciência médica, colaborando no alívio e na fé, nas mais diversas manifestações, ajuda a reduzir o stress dos tratacura das patologias humanas”, concluiu Roberto. Com a palavra, as religiões Cientificamente A espiritualidade sempre foi associada à religião. Recentemente é que o termo é estudado de forma independente. No livro Scientific Research on Spirituality and Health, publicado pelo National Institute for Health Research, em outubro de 1997, fruto de painéis realizados por cerca de 70 profissionais da saúde, na maioria médicos e psicólogos, encontra-se o uso contemporâneo do termo “espiritualidade” separado da religião. De acordo com a obra, espiritualidade e religiosidade são estados emocionais ou condições psicológicas e conscienciais que independem da religião e da filosofia. Universo IPA | Dezembro 2006 Espiritualidade 23 eid iC rist i na Per e ira terra da Santa Cruz Universo IPA | Dezembro 2006 Fot o em on tag em : Cl reli r eli g i ãgoi ão País abençoado: 24 Cleidi Cristina Pereira Os portugueses realmente tinham razão! De certa forma, profetizaram o futuro religioso da terra descoberta em 1500 ao nomeá-la “Terra da Santa Cruz”. A cruz é um símbolo usado em diversas religiões, mas, principalmente, no cristianismo. Apesar do quadro de pluralismo religioso, ou seja, da diversidade religiosa presente não só em nosso país, mas no mundo, nove em cada dez brasileiros se consideram cristãos (católicos ou protestantes). Atu- almente, a situação religiosa pode ser comparada aos times de futebol ou partidos políticos, pois existem religiões, times e partidos para todos os gostos. É só escolher! Quem não concorda com alguns aspectos da Igreja Católica encontra apoio no protestantismo e, nele, pode aderir ao ramo que mais lhe agradar: luterano, anglicano, metodista, presbiteriano, adventista, pentecostalista, congregacionalista ou batista. Cada um com a sua estrutura organizacional, o seu modo de interpretar a Bíblia e de ver o mundo. Os que acre- ditam em orixás, “trabalhos”, carma e contatos com o mundo dos espíritos podem optar pelo candomblé, umbanda ou espiritismo. Também há a possibilidade de escolher entre religiões tradicionais e históricas como o judaísmo ou doutrinas orientais e mais “zens” como o budismo. O catolicismo foi trazido ao Brasil pelos portugueses e se manteve como religião oficial do país até a Proclamação da República, em 1889. No início, era uma religião de Estado. Isso significa que os não católicos ou os que eram contra o catolicismo eram considerados inimigos do Estado. O tempo passou e a situação atual da Igreja Católica é de deixar padres, bispos e o próprio Papa Bento XVI de “cabelo em pé”, pois o número de fiéis é cada vez menor. Conforme o censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), em 1980, os católicos representavam 89% da população brasileira. Em 1991, esse número caiu para 83% e, agora, com o último levantamento, em 2000, esse índice caiu para 73,6%. Entre os católicos que abandonam a sua religião, a maioria acaba migrando para outro ramo do cristianismo. As igrejas mais procuradas para a conversão são as protestantes. O fenômeno do protestantismo surge no Brasil com a chegada dos primeiros estrangeiros. Com a vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil e a abertura dos portos às nações amigas, comerciantes ingleses estabeleceram a Igreja Anglicana, em 1811, quando foi construído o primeiro templo protestante no país. Em 1824, chegaram os imigrantes alemães, que se instalam no Sudeste e no Sul do país, principalmente, nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Com eles, vem o luteranismo. Aos poucos, foram sendo introduzidas outras igrejas como a metodista (1835), presbiteriana (1869), batista (1882), pentecostal (1910) e adventista (1916), as quais foram trazidas por imigrantes dos EUA, com a finalidade de converter brasileiros. As Igrejas Evangélicas vêm se destacando pelo crescente número de adeptos. Os evangélicos, em 1980, eram insignificantes 6,6% da população. Esse número dobrou em 2000 e, atualmente, chegam a 15,4% da população brasileira. reli g i ão r eli g i ã o Lojas que vendem artigos esotéricos demonstram a diversidade religiosa presente no Brasil A diversidade religiosa e o sentido da vida A busca pelo sentido da vida não é algo novo. Como o homem possui consciência de sua finitude material, ele tenta transcedê-la, procurando calor, fraternidade e se refugiando nas seitas e religiões. É o que fala Zilles no livro “Religiões, Crenças e Crendices” (EDIPUCRS). Para ele, esse quadro de pluralismo religioso presente na sociedade revela que não se pode dizer que a espiritualidade é algo que possa ser facilmente superado. “Esse ponto de vista mostra que a dimensão religiosa existe independente de como ela é interpretada. O fato de haver tantas interpretações levará a um certo ponto em que as pessoas vão se perguntar: mas o que é que vale? Vai de cada um examinar”, afirma. Ele continua, explicando que “essa multiplicação de religiões está num contexto cultural, sobretudo no Ocidente, em vista do chamado Iluminismo francês. A Revolução Francesa centrou, simbolicamente, a deusa ‘razão’. O que vale tem de passar pelo tribunal crítico da razão, ou seja, o que não se pode provar ou compreender de maneira racional fica a cargo de cada um decidir. Então, se implorou para a subjetividade, a qual favorece a possibilidade de cada um fazer sua religião. Essa é uma conseqüência que ainda não superamos, pois ainda temos medo de discutir a religião”. O pastor Mello acredita que a diversidade é boa, mas não sabe dizer até que ponto esse número de variedades faz bem: “o excesso pode causar muita confusão na cabeça de um jovem. Ele se questionará: meu pai me ensinou de um jeito, a sociedade me ensina de outro. Talvez isso se explique pelo orgulho e egoísmo humano. Cada um quer ter a prerrogativa de estar certo, quer ter a premissa: eu sou o detentor da verdadeira religião e isso tem gerado muita diversificação”. Enquanto alguns vêem essa diversidade como algo negativo, outros acabam escolhendo o que seguir graças a ela. A médium de um centro de umbanda, Inês Barbosa, acabou se tornando umbandista graças à liberdade de escolha e ao fato de sua mãe, que pratica o espiritismo, colocá-la em contato com outras religiões: “nunca gostei do espiritismo, mas toda minha família era espírita. Só fui descobrir minha vocação, porque minha mãe me levava, de vez em quando, a um centro de umbanda. Então, foi aí que eu me encontrei. Tive a oportunidade de escolher. Não acho que a diversidade seja ruim, pois ela te dá essa opção de escolha”, finaliza. Para saber mais “Religiões, Crenças e Crendices” – Urbano Zilles (EDIPUCRS). “O livro das Religiões” – Jostein Garder, Victor Hellern e Henry Notaker (Companhia de Bolso). Universo IPA | Dezembro 2006 O fato de o número de religiões ter se multiplicado mostra que as igrejas tradicionais não se atualizaram para tratar os novos problemas de maneira adequada e convincente. Os jovens vêem um abismo entre o que se ensina na religião e o que realmente acontece. É o que pensa o teólogo e diretor da Faculdade de Teologia da PUCRS, Urbano Zilles, também doutor em Teologia Dogmática, mestre em Teologia, Bacharel em Filosofia e licenciatura em Filosofia e condecorado monsenhor pelo Papa João Paulo II, em 1981. De acordo com o teólogo, “é nesse abismo que surgem os novos fenômenos religiosos como a Universal do Reino de Deus, Deus é amor, Igreja Internacional da Graça, as chamadas pentecostais eletrônicas. Elas têm um sucesso porque, quando nasceram, estavam inseridos, na sociedade, os meios de comunicação de massa. Então, elas os usam com maior naturalidade, o que as igrejas tradicionais, muitas vezes, têm dificuldade de fazer. Então, para responder a esses novos desafios, não basta trazer respostas velhas para problemas novos”. Na opinião do professor aposentado de Biologia da UFRGS e colaborador da Sociedade Espírita Bezerra de Menezes, Cícero Marcos Teixeira, “as igrejas evangélicas estão apelando, inteligentemente, à valorização do ser humano. Enquanto que a Igreja Católica ficou muito na questão do castigo, do sofrimento e a questão do Reino de Deus, do céu ser na outra vida”. As opiniões divergem em alguns sentidos, mas todos os entrevistados atribuem a responsabilidade da diminuição de fiéis à própria Igreja Católica. Para o pastor de uma Igreja Pentecostal, Everton Ismael de Mello, o que explica esse fenômeno, além do vazio deixado nos corações dos homens, é o fato de que o catolicismo não responde aos anseios das pessoas, pois valoriza em demasia os métodos e as tradições, esquecendo que as pessoas precisam de esperança. O monsenhor Zilles acredita numa futura união entre católicos e protestantes, mas, para isso acontecer, não depende da vontade divina e sim da vontade dos homens: “hoje, o que separa luteranos e católicos não é tanto a doutrina. Se não fosse o peso de quatro séculos, creio que não seria o motivo da separação. É difícil reconhecer os erros que houve de ambos os lados, voltar atrás e fazer como se nada tivesse acontecido. Agora, há um peso que se criou historicamente, institucional e tantas outras formas. Acredito que, doutrinariamente, seria relativamente fácil chegar a uma união, não fosse a vaidade humana”. Cleidi Cristina Pereira CATOLICISMO X PROTESTANTISMO 25 Manoel Canepa O último g eral g er al lambe-lambe câmera lambe-lambe é atração na Capital Manoel Canepa Quem circula pelo centro da Capital, provavelmente, se depara, ali perto da estátua do escritor Mario Quintana, com um homem que atende pelo nome de Freitas. Natural de Porto Alegre, Varceli de Freitas Filho, 52 anos, carrega consigo o nobre título de ser o último fotógrafo de Lambe-lambe do Rio Grande do Sul. Função essa, que executa há 32 anos ininterruptamente, a qual diz ser a única desempenhada em toda vida. O mais interessante é que, se Freitas é o último, seu pai, Varceli de Freitas, foi o primeiro fotógrafo Lambe-lambe do Estado. Desde pequeno, acompanhava o pai em seus trabalhos, e a escolha de seguir operando essa charmosa câmera foi um processo inevitável, conta freitas. Essa herança familiar promete não parar por aí. O fotógrafo é auxiliado, em seus trabalhos, pelo filho e promotor de vendas Alexandre Machado de Freitas, 31. Mas é o caçula Liandro Machado de Freitas, 14, que desponta com maior força à sucessão ao ofício. Liandro, que demonstrou interesse em seguir os passos do pai, fotografa em pinhole (foto na lata), que tem processo de obtenção de imagem semelhante ao do Lambe-lambe de Freitas, pois não utiliza filme e registra as fotos direto no papel fotográfico. Pela ausência de filme, o papel fotográfico é de suma importância no processo lambelambe, sendo extremamente responsável pela qualidade final da imagem. Freitas diz que a falta de papel fotográfico e de outros materiais químicos é o principal problema enfrentado por ele no lambe-lambe, pois eles não são mais fabricados. Ainda na metade da Feira do Livro, acabou o papel que ele estava utilizando, o qual havia vencido em 2003. Por sorte, conseguiu, em uma loja do centro, papel fotográfico e químicos importados da República Tcheca. “Chega a ser engraçado. Para fotografar aqui em Porto Alegre, tenho de usar material lá do outro lado do mundo”, con- ta Freitas ao se referir à dificuldade enfrentada. Apesar das dificuldades, Freitas é convicto na escolha do lambe-lambe. Diz ter utilizado, por um tempo, o processo 35mm à filme, e também ter feito uso de câmeras digitais. Porém, não gosta delas. “Photoshop então nunca cheguei perto, nem quero”, exclama enfático Freitas. O curioso é que a maior maior parte dos fotografados são os jovens e não os mais saudosistas como poderia se imaginar, segundo o próprio fotógrafo. Freitas, que teve como ponto inicial o Chalé da Praça XV, onde, esporadicamente, fotografa até hoje, também pode ser encontrado, aos domingos, no Brique do Parque da Redenção, onde fotografa há mais de dez anos. Solitário nesse ofício, Freitas diz que tem contato com diversos fotógrafos, mas que nunca conheceu outro que utilizasse o mesmo processo. Tendo se dedicado exclusivamente a essa atividade, garante que irá até os últimos dias fotografando em sua câmera, assim como o pai. Ele resume a entrega ao ofício em poucas palavras: “lambe-lambe é minha paixão. Lambe-lambe é minha vida”. Universo IPA | Dezembro 2006 Bruno Marona 26 O baile funk é zoação. Esse é o lema de quem sai para se divertir nas noites gaúchas e, principalmente, nas noites de Porto Alegre, para curtir, ao som dos Mestres de Cerimônia (MC’s), uma festa cheia de animação e com um ritmo que vem crescendo cada vez mais nas baladas. O público são jovens de 14 a 20 anos. O funk nasceu nos Estados Unidos na década de 1960, com o pianista Horace Silver, que misturou o jazz e o soul music, e com James Brown, que deu ao ritmo a principal característica que conquistou o mundo: o swing. Chegou ao Brasil na década de 1970, onde logo surgiram as primeiras equipes de som do Rio de Janeiro, como a Furacão 2000 e a Soul Grand Prix, que organizavam os bailes funk na periferia da cidade. Chegando em Porto Alegre, em meados da década de1990, o funk obteve um rápido crescimento a partir dos anos 2000, com a criação dos grupos junto com a parceria dos DJ’s, os chamados animadores de festa. Eles são considerados os “promoters” dos “bon- des de funk” que, normalmente, são grupos independentes e sem espaço na mídia para a divulgação de suas músicas. A rotina de shows de um “bonde” de funk é muito árdua, com os grupos agendando até três shows por noite, em diferentes casas noturnas. Os cachês, às vezes, não passam de R$ 100 ou 150 por show, mas a dedicação e a vontade de vencer na vida, As coreografias e poses são as principais diversões dos funkeiros através do funk, faz com que os grupos cisa fazer academia, pois uma boa noite de baile, para ela, continuem na batalha diária. É o que conta o Mc Sabha, que vale como um dia de exercícios. Varcelo Alves, 16, morador faz pequenos shows durante os fins de semana, junto com do bairro Jardim Botânico, sai para o baile funk com os amialguns dançarinos que animam o público. gos. “Fazemos apostas com os amigos para ver quem beija O funk tem se tornado um estilo musical que agrada mais meninas durante a noite de festa”, relata o funkeiro. diferentes classes sociais, diferente do que acontecia no iníEssa é a prova real de como o baile funk não é mais uma cio, no Rio de Janeiro, na década de 1970. Juliana Molin, 16 festa de favela e sim de todas as classes sociais e diferentes anos, moradora do bairro Bela Vista, e Jéssica Silveira, 15, idades, onde todos vão com a mesma intenção: se divertir e moradora do bairro Restinga, saem para curtir o baile funk dar muito beijo na boca. para se divertir com as amigas. Silveira disse que nem pre- Bruno Marona Uh, é baile funk ! O lado dos m oda moda Brechós apostam em peças baratas e contemporâneas, para conquistar novo tipo de público No século 19, quando o comerciante português Belchior criou uma loja de roupas usadas, a idéia parecia absurda. Afinal, quem compraria roupas antigas e de procedência duvidosa? Desde lá, muito tempo se passou. As lojas de peças usadas, antes famigeradas e, hoje, chamadas brechós em homenagem ao comerciante precursor, se tornaram mania entre os descolados e entendidos em moda. Nos últimos anos, com a volta das tendências retrô, as lojas ganharam status de antiquário e os preços aumentaram. Em brechós mais requintados, podem ser encontradas relíquias, como os abrigos clássicos da Adidas, usados na década de 1970. Hoje, os abrigos alcançam valores que ultrapassam mil reais. “Algumas peças são únicas e só encontradas aqui (em brechós)”, explica a estudante e compradora assídua Julia Heinz. Em contrapartida, um novo tipo de brechó, com peças mais baratas e modernas, tem caído no gosto popular. Focados não só no resgate do passado, mas, principalmente, na qualidade e no decréscimo do valor das peças, esses brechós se multiplicaram e popularizaram a compra dos produtos em diferentes classes sociais. A proprietária de brechó, Silvia Geziorny, explica o processo: “hoje, nós temos dois públicos: um que procura uma roupa diferenciada, de época. E outro, de poder aquisitivo baixo, que procura roupas para o dia-a-dia”. As peças dos brechós populares custam, em média, de R$5 a R$100, podendo chegar, em promoções, a apenas R$1. Outro atrativo são as roupas e acessórios de grife, que podem ser achados por menos da metade do preço original. “Eu sempre tive vontade de comprar roupas de marca e, através dos brechós, encontro roupas de qualidade e de marcas famosas, com preços muito atraentes. Nas lojas, eu compraria uma peça. Aqui, com o mesmo valor, compro duas, no mínimo”, con- ta a compradora Fabiana da Silva. Além disso, grande parte das roupas não é datada, e podem ser encontrados modelos da própria estação, o que torna os produtos ainda mais interessantes para todos os públicos. Um fator comum entre os donos de brechós é a improvisação na criação das lojas. O custo de uma pesquisa por roupas antiquadas é bastante alto. Dessa forma, os comerciantes acabam recorrendo a amigos e familiares, pedindo doações para começar o negócio. “No início, pedia roupas a amigos e familiares. Abri o brechó com minhas próprias roupas. Mas, hoje, o negócio é muito rentável”, comenta a proprietária de brechó, Aliane Moura. O senso comum, que dizia que as roupas eram “todas oriundas de defuntos”. Os donos dos brechós modernos negam veementes. “O preconceito existia, mas, hoje, os brechós são muito procurados. Temos clientes fiéis, peças boas e baratas”, explica Moura, fazendo uma síntese do sucesso. Para o público descolado, saem de cena as roupas datadas. Entram as roupas de grifes populares e de forte apelo comercial Fernanda Bastos Universo IPA | Dezembro 2006 Fernanda bastos 27 c omp ormtame c om por ta en to nto Universo IPA | Dezembro 2006 28 A solidão Bruno*, 27, está apaixonado. Faz um “um dia, recebi um telefonema a cobrar. mês que fala todos os dias com a sua “naEra uma menina. Gostei da voz dela e tuTodos os dias, muitas pessoas, pelo morada virtual”. “Ainda não nos conhecedo mais. Então, comecei a puxar papo e fiquei um tempinho conversando com mundo, se conectam à internet. Pessoas mos. Mas, só de telefone, gastei R$800 esdas mais variadas idades, raças e classes te mês. Estou sendo correspondido e teela só por telefone. Nesse meio tempo de nho muitas expectativas quanto a ela. sociais. Algumas em busca de informação, conversa, mudei bastante. Algumas coioutras atrás de seus recados e contatos ou, sas para melhor, ouAcho que 90% das ainda, à procura de companhia e relaciopessoas, na net, são “Procuro mulheres lindas tras nem tanto, mas namentos. mudei”. sinceras. Teve uma e maravilhosas, sedentas vez que saí com uma “Eu entrei na ‘net’ para descansar um Depois disso, por sexo seguro. Sou mulher que dizia ter pouco do trabalho. Estava me sentido soCarlos ficou fascina33 anos e, no final, zinho e carente aqui”. Declarações como casado, mas sou sincero”. do por conhecer as me confessou que pessoas “de maneira essa, do programador de informática Felipe*, 32 anos, são comuns aos usuários de tinha 40. Apesar disso, acho que as pessointerpessoal e, logo após, pessoalmente”. O chats, as são salas virtuais onde pessoas se as são sinceras sim”, afirma. estudante continua: “mas, no caso da interconectam para conversar. net, só me encontrei uma vez com alguém. O funcionário púbico, Leonardo*, 37, procura relacionamentos casuais na interOs usuários entram para “arejar a cabeE pode ter certeza: é super desagradável, ça”, entram em função da solidão que senporque daí caí na real que é só pela ‘net’ net. Ele acha muito difícil encontrar algo tem. Recorrem à internet por motivos variamesmo a ‘paixão’. Chegando pessoalmente, sério. Sempre é sincero, pois para ele, dos, mas todos os entrevistados confessam mentir é perda de tempo e dinheiro. “É tem que olhar nos olhos e aí há falsidade. o sentimento de carência, seja ela amorosa uma minoria que mente na net, mas semPalavras e frases formadas saem do nosso ou não. É a falta de algo que leva essas pespre tem, pois a internet favorece isso já controle”. soas a buscar algo no mundo virtual. que as pessoas se escondem no anonimaQuestionado sobre a sinceridade no mundo virtual, ele comenta: “quando as A busca pode variar entre amor, amito”, observa. Saiu com, aproximadamente, 160 mulheres através de chats, mas se enpessoas mentem é porque estão com medo zades e sexo: “procuro sexo. Procuro mulheres lindas e maravilhosas sedentas por volveu somente com duas. Ele desabafa: de serem reconhecidas na rua. Na internet, “não tenho orgulho as pessoas e, principalmente, os jovens se sexo seguro. Sou casadisso. Queria ter acerabrem sobre sentimento e dúvidas que têm do, mas sou sincero. Só “Não tenho orgulho saí com umas quatro e que não conseguem tirar com pais ou irtado de primeira”. Ao disso. Queria ter mulheres daqui em mãos mais velhos. E mentem, também, final da entrevista, Leotrês anos, porque tem acertado de primeira”. nardo revela: “man”, te- quando se sentem enganados”. todo um trabalho de nho sempre cerca de Difícil mesmo foi conseguir depoimenconvencimento e não quero me expor. seis em contato para sair. Mais de seis é tos de mulheres. Diferentes dos homens, difícil de administrar”. pelos chats, elas não contam suas histórias Não quero amantes, só casos. Saídas de, no máximo, uma vez”, afirma o contador A internet virou uma opção, para coa outras mulheres. Nem dão chance de ennhecer pessoas, quando se tem pouco Tom*, 40. tender o que a reportagem queria. Todas tempo livre com a vida tumultuada dos as mulheres foram abordadas fora do munGarotos de programa usam o meio virtual para promover seu emprego e audo virtual, e só se abriram porque existiam tempos atuais. “Eu considero a internet, mentar a “carteira” de clientes: “faço prohoje, um meio bem viável de se conhecer laços de amizade com a repórter. gramas há um ano e meio. Só atendo mupessoas legais. Principalmente, pra mim A professora Fernanda*, 26, seguidaque, atualmente, tenho pouco tempo limente, conhece pessoas pela internet: lheres. Conheço elas pelo chat e, se rolar vre, pois o escritório e a faculdade me con“sempre que vou sair com alguém, deixo o um clima, saímos. Eu não sou daqueles que chegam, vão tirando a roupa, sobem somem, praticamente, 80% do meu dia número do celular com uma amiga, e compra cima da mulher, ficam transando, mal útil de segunda a sexta”, afirma o formanbino de ligar duas horas depois do encone porcamente, 15 minutos e vão embotro para ela saber que está tudo bem”. do em Direito, Gustavo*, 25. ra... Eu procuro conversar antes, tomar Nem todos têm experiências positiA estudante Rejane*, 24, não pensou um drinque, um banho a dois bem legal, em nada: “saí com um cara, nem pensei vas na internet. O agente publicitário, nos riscos que estaria uma massagem de repente! Eu já tenho Luis*, 43, recém se“Estava me sentindo parado, não enconcorrendo. Ele é conheoutro emprego, não cobro caro. Gosto mesmo é do momento, da satisfação. trou o que esperava. carente e sozinho aqui”. cido de um amigo, mas nem nos conhecíamos, Gosto que a pessoa com quem estou se “As pessoas não são e tudo foi combinado pela internet. Grasinta legal. Grana eu deixo em segundo o que dizem ser. Até as fotos enganam”, ças a Deus que ele era uma pessoa legal”, plano”, brinca Guilherme*, 31, “lover”, coreclama. O estudante, Carlos*, 18, tormo ele se denomina. nou-se um viciado em relações virtuais: lembra rindo. Luísa Aranha Foi dessa vez... “Tudo começou quando eu não queria mais sair. Só ficava em casa, no computador. Já tinha conhecido vários rapazes, mas sempre dava um bolo e saía fora. Um dia, conheci uma pessoa que me chamou a atenção com suas brincadeiras. Marcamos de ir ao cinema uma semana depois que falamos na internet. Foi legal. No início, parecia que ele era muito tímido, mas não era. Era muito apressado e, com isso, eu já queria ‘dar um fora’ nele no terceiro dia. Só que, depois de conhecer melhor, não queria mais sair de perto dele. Ele era muito companheiro, carinhoso e romântico. É difícil ver um homem assim. Começamos a namorar. Foi seis meses só de alegrias. Depois veio um presente, mas que deixou o Pedro* bastante nervoso. Eu engravidei. Ficamos com medo. Pedro* falava muita besteira e coisas que me deixavam triste. Depois que ele viu a Palavra de especialista “O relacionamento on-line é, hoje, uma realidade e penso que vai continuar”, afirma a psicóloga Nair Teresinha Gonçalves. Segundo a terapeuta, as pessoas sempre buscam um relacionamento, e a internet dá uma resposta mais imediata a esse desejo. Mas é muito importante que se construa pontes entre o mundo virtual e o mundo real. A busca exagerada por alguém pode demonstrar uma insatisfação consigo mesmo. “Possivelmente, as pessoas, que ficam sempre buscando, não encontram satisfação num espaço próprio, sentem-se inseguras. Então, estão sempre buscando fora delas e nunca se satisfazem”, alerta Gonçalves. “Isso torna as relações frágeis quando elas acontecem, pois há uma idealização da outra pessoa e uma crença de que ela vai resolver todos os problemas”, completa a psicóloga. Um aspecto negativo, apontado por Gonçalves, são as personagens criadas: “o ideal é que as pessoas se mostrem, como são, na internet. As pessoas que não se mostram, geralmente, têm uma carência muito grande, uma auto-estima baixa, não se aceitam, gostariam de ter uma outra vi- da. Então, se reinventam”. A reinvenção de si mesmo, como a psicóloga chama, demonstra uma insatisfação com a vida e dificuldades para mudar o que não se gosta: “é importante a pessoa se dar conta do que a está abafando, oprimindo e porque ela não põe em prática seus desejos”, aconselha. O perigo de se criar personagens é que, na hora de se estabelecer um relacionamento real, eles não vão em frente: “a pessoa com quem se está conversando recebe as informações e cria uma imagem do outro. Apaixona-se por essa imagem. E, quando vê, não é nada daquilo. A imagem desmorona na primeira troca de olhares, inclusive pela mentira. Elas enganam o outro, mas, principalmente, enganam a si mesmas”, comenta a terapeuta. As paixões virtuais ocorrem por novos paradigmas como explica Gonçalves: “para entendê-las, é preciso que se crie novos paradigmas, porque se ficarmos presos ao olho no olho, atração física, tom de voz, não vamos aceitar as relações amorosas pela web”. Segundo a terapeuta, o que possivelmente existe, na internet, é a cumplicidade, a troca de confidências, as fantasias compartilhadas. Não existe a presença física. “A internet está aí, e possibilita que as pessoas se conheçam e construam vínculos, antes de uma relação real. Abre caminhos, abre portas”, afirma Gonçalves. c omp or tame nto “Estava, um dia, batendo papo num chat para passar tempo. Conheci um cara e, em seguida, trocamos o e-mail do MSN. Passamos a nos falar sempre por ali. Uma semana inteira e, quanto mais ele me contava sobre sua vida e seu jeito, mais eu me encantava. Ele insistia para a gente se conhecer, mas fiquei receosa. Afinal, nunca tinha conhecido alguém assim, pela internet. Eu estava muito curiosa e confesso que apaixonada por ele. Mesmo sem conhecer pessoalmente, sonhava e fantasiava coisas com ele. Acabei topando sair. Fomos num barsinho bem conhecido e tomamos uma cerveja. A conversa rolou como se nos conhecêssemos há anos. Cada minuto que passava, ficava mais fascinada por ele e saímos juntos todos os dias naquela semana. Quando chegou sábado, ele disse que iria viajar, e eu mandei uma mensagem para o celular dele toda apaixonada. Meu celular tocou e eu atendi toda feliz. Mas não era ele e sim a namorada. Fiquei muito triste e confesso que com bastante receio da internet”. (Mariana*, 26, estudante). primeira foto do bebê, ficou todo animado e esqueceu tudo que havia falado e pensado em fazer. O tempo passou e chegou a hora do Matheus nascer. Foi uma loucura. O Pedro* estava trabalhando e eu com ele. Chegamos ao hospital em cinco minutos. Foi muita loucura e correria, mas o Matheus nasceu. Pedro*, que é branco, ficou mais branco e o médico não queria dar o bebê para ele segurar. Depois, Matheus foi crescendo e queríamos ter nossa casa. Foi um bom tempo de espera, procurando e vendo o que dava para pagar. Mas conseguimos e, hoje, temos nossa casa, nosso carro zero Km e nosso filhão, que, com um ano e quatro meses, está mais esperto do que o pai. Às vezes, da vontade de ir embora, de volta para casa de minha mãe por causa de umas briguinhas. Mas daí, bate uma saudade... Dizem que um casal tem de ter brigas, né?”. (Bianca*, 21, estudante). * Todos os nomes são fictícios para preservar a privacidade dos entrevistados. Saiba quando procurar ajuda - Quando você substitui o mundo real pelo virtual, e passa mais tempo na internet do que em outras atividades, deixando de lado outros compromissos. - Quando você se descreve diferente do que você ou sua vida é realmente. Isso é um alerta para si mesmo. - Q uando não consegue estabelecer pontes entre o mundo real e o virtual. Universo IPA | Dezembro 2006 Não foi dessa vez... c om por ta m en to que socializa 29 Na mira das lan houses nterne inIter n et t Universo IPA | Dezembro 2006 30 As casas de games para computadores, chamadas, hoje, de lan houses, cada dia tornam-se mais presentes na vida de crianças e jovens. A nova moda, nem tão nova assim, surgiu na Coréia do Sul, em 1995 e ganhou o mundo rapidamente. No Brasil, a pioneira do ramo foi a empresa Monkey em 1998, em São Paulo. A marca está em 32 lojas de diversas cidades. Cada uma tem, no mínimo, 30 computadores e fatura, em média, R$30 mil por mês. Hoje, no Brasil, existem, em média, mais de 2,5 mil. O investimento de uma lan house é alto e a atualização é necessária, pois os jogos solicitam cada vez mais computadores avançados. Na maioria das lan houses, o suporte é feito pelo proprietário, pois a manutenção é contínua. Segundo a proprietária de lan house, Ana Claudia Rico, “o investimento é bem alto. Estou aqui há dois anos e meio e ainda não tive retorno”. Para outro proprietário, Marco Aurélio Negreto, “o lucro depende de um bom ponto. Para os jogos, é essencial um equipamento muito atual, sendo um negócio que precisa, periodicamente, de atualizações”. Essas casas de jogos ficam abertas, em média, 14 horas por dia, de segunda à sextafeira, com valor de R$ 3 a hora. Há também os chamados “corujões” (noite inteira jogando) nas sextas, sábados e feriados. Sempre que fecha um grupo de pessoas para jogar na lan (computadores em rede, podendo jogar uns contra os outros), em média, é cobrado R$ 10 por jogador. Geralmente, no horário das 21h até as 7h. O tempo que cada freqüentador fica jogando, é duas horas dia. Há aqueles que ficam mais tempo. É o caso de William Cardoso da Silva, chamado de “Trakinas” pelo seus amigos de lan house, que começou a jogar com 15 anos. Hoje, tem 19: “cheguei a jogar de 14 a 15 horas por dia”, afirma. Os jogadores de lan house sempre têm um nick (apelido utilizado nos jogos e nas dependências do estabelecimento). Desde os mais ingênuos como Bob Esponja, Viper, Pipetinho, Sano, até nicks “bagaceiros”, ou o próprio nome. O público mais freqüente desses estabelecimentos são crianças de 12 a 15 anos, mas existem freqüentadores de todas as idades. No entanto, no Rio Grande do Sul, não existe nenhuma lei aprovada que restrinja a faixa etária de usuários das lan houses. Há um projeto de lei do deputado estadual Osmar Severo (projeto Maria Cristina Dornelles maria cristina dornelles 341/2006), que está na Comissão de Justiça, para receber parecer do deputado Iradir Pietroski e ser encaminhado para votação no Plenário. O projeto pode ser pesquisado no linck de proprosições do site da Assembléia Legislativa (http://www.al.rs.gov.br/). Ele tem como principal objetivo proibir a entrada de menores de 12 anos em lan houses sem a companhia dos pais, e de permitir o jogo de crianças e jovens de 12 a 18 anos somente com autorização dos pais ou responsáveis legais. Em São Paulo, as regras existem, baseadas na lei nº 12.228, de 11 de janeiro de 2006. Artista de games, Vitor Eduardo Arusievica explica que, na América do Norte, Europa e Japão, existem órgãos responsáveis por determinar a faixa etária à qual o jogo se destina, assim como funciona com filmes. ”Gostaria de acrescentar que é dever dos pais e não dos criadores de jogos, vendedores e donos de lan house controlar o tipo de conteúdo ao qual seu filho é exposto.”, argumenta Arusievica. Os games mais jogados dependem da moda do momento, porque todo grupo joga junto uns contra os outros nas lans. Mas a moda do momento é o estilo RPG como Mu e Ryl-Risk Your live. Um exemplo de que não há nenhum acompanhamento de alguns pais em relação ao que os filhos fazem na lan house é dado por Isabel Possenato Parmagnani, mãe de Gabriel Parmagnani Fernandes, nick Gabi Gordo. Fernandes gosta de jogar Mu (RPG). O menino, que tem apenas oito anos, joga desde os sete em lan house. Afirmou que joga GTA (game em que o jogador rouba carros, mata pessoas com bombas, fala com traficantes e prostitutas, tudo legendado em português). A mãe ficou apavorada: “nunca fui junto com ele, e não sei que tipo de jogo ele joga”. Fernandes joga de uma a duas horas por semana e nunca participou de corujão: ”me pediram autorização para jogar. Com essa autorização, jogo qualquer jogo, acesso MSN e tenho Orkut”, conta Fernandes. Rafael André Ferreira, nick Taz, 11, joga na lan house há dois anos: ”sempre aviso meus pais quando venho para jogar”. Ele explica porque gosta de ir à lan house: “porque tem gente para conversar. Porque, em casa, jogo sozinho”. Participou por diversas vezes de corujões. Fausto Maria Grezzana, 11, foi uma vez à lan house, mas não gostou. Pratica futebol desde quatro anos, influenciado pelo seu avô. Ele diz que não gosta muito de games: “é mais divertido jogar futebol. Não gosto de ficar parado”. Arusievica lembra o caso do atirador do cinema de São Paulo, que apontaram ter sido influenciado por jogos e, em pouco tempo, foi aprovada a proibição de certos títulos no território nacional: “o que tenho a dizer sobre esse tipo de censura é que, como os jogos são uma mídia relativamente nova (têm cerca de 30, 40 anos na melhor das hipóteses), não existem estudos sérios, no Brasil, sobre possíveis efeitos na psique das pessoas que jogam. Qualquer proibição é ato de políticagem oportunista de pessoas com poder sobre as leis, mas ignorância sobre o assunto. Por que não proibiram filmes violentos como Rambo ou Robocop?” Vale ressaltar que a natureza de muitos jogos de lan house é competitiva, onde um vai vencer e o outro, perder. Isso costuma envolver temáticas de combate, como guerras. Assim, criam esse tipo de situação de combate extremo em um ambiente virtual que não apresenta risco físico aos participantes. O que é RPG? A sigla RPG vem da expressão inglesa roleplaying game, que pode ser traduzida como “jogo de interpretação”. Nele, os jogadores interpretam os personagens que vão enfrentar os perigos de uma aventura ainda desconhecida. Ninguém sabe o que vai acontecer, exceto um jogador “especial” chamado de “Mestre do Jogo”. Só esse jogador conhece o roteiro da aventura. As mais diversas ambientações são possíveis. O Mestre apresenta uma nova situação. Assim, o jogo prossegue até o grand finale. um oásis político Mauro Schaefer/AL Apesar da principal função de um parlamentar ser a representação popular, há muitas adversidades que os impedem de governar melhor. Para o cientista político André Marenco, o principal problema são as limitações enfrentadas pelo Poder Legislativo, estabelecidas pela Constituição Federal. Segundo ele, toda a iniciativa sobre a matéria orçamentária, relativa à organização da administração pública ou que repercuta em gasto, é de competência exclusiva do Poder Executivo. “Isso faz com que, muitas vezes, a população não entenda”, destaca Marenco. Segundo o deputado Marco Alba (PMDB), o trabalho de um parlamentar deve ir além de legislar e fiscalizar: “devemos contribuir para a formação, conscientização e melhoria na vida da população. Nosso compromisso é com os gaúchos”. Deputados no Plenário da Assembléia Legislativa: propostas são a esperança de melhores oportunidades Para o deputado Raul Pont (PT), as principais atribuições do cargo é legislar e fiscalizar o cumprimento das leis pelos governantes. De acordo com Pont, são duas as principais dificuldades como deputado: a extensão das pautas com projetos para serem votados e a disputa política, a qual considera a maior. “Temos, na Assembléia, diferentes partidos políticos com programas bem nítidos, que podem ter interesses programáticos contrários a outro partido. Conforme o debate político, vão se formando maiorias e minorias na hora da votação, seja nas comissões, seja no plenário”, afirma. Segundo o deputado Paulo Brum (PSDB), também reeleito, os parlamentares são eleitos para defender os interesses dos cidadãos. Principalmente, na formulação de leis que melhorem a sociedade, e na fiscalização do Poder Executivo. “Quis trabalhar na política para batalhar por isto: trabalhar pela vida”, destaca. Apesar de todas as explicações dadas pelos parlamentares, a população ainda acredita que eles fazem pouco pelo Estado. “Depois de eleitos, muitos esquecem de seus eleitores. Lembram só de quatro em quatro anos”, ressalta a farmacêutica Juliana Mattos. Em contrapartida, os deputados alegam que os processos de aprovação são realmente demorados, pois todos os projetos, apresentados na Assembléia, devem seguir os trâmites administrativos. É feita uma análise pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que verifica se o projeto obedece a Constituição. Isso é feito por um deputado, que elabora um relatório e o coloca para votação dos demais participantes da CCJ. Se for considerada apta, a proposta segue a tramitação processual e entra na fila para votação dos 55 deputados. Um fluxo que, segundo eles, consome muito tempo. Para o estudante Alessandro Engroff Kochhann, que votou pela primeira vez na última eleição, a principal meta de um parlamentar deve ser defender os interesses de seus eleitores. Apesar do gosto pela política, o jovem também concorda que, na maioria das vezes, os políticos só lembram de seu eleitorado às vésperas da eleição. “Vêm só de quatro em quatro anos. Com o único fim de conseguir o voto”, desabafa Kochhann. Avanços políticos De acordo com Marenco, pode-se avançar em duas direções ao ampliar a participação do Legislativo na decisão sobre políticas públicas e melhorar seu trabalho na fiscalização do Poder Executivo. Por outro lado, ele diz que é preciso melhorar o controle e a responsabilidade exercidos pelo eleitor sobre os seus representantes. “Isso passa pelo fim de votações secretas e, principalmente, por processos que tornem mais fácil ao eleitor associar seu representante não apenas com questões particulares, mas com posições em relação às políticas mais importantes para o país”, salienta o cientista político. Universo IPA | Dezembro 2006 Funções X dificuldades polí ti ca marluci stein A população ainda desconhece a real importância dos parlamentares na política, segundo o Superintendente Legislativo, Enilto José dos Santos. “Os deputados nada mais são do que os representantes da sociedade que os elegeu. Os eleitores precisam cobrar ações deles”, complementa Santos. Segundo os artigos 31 e 32, do capítulo V, do Regimento Interno e Código de Ética Parlamentar da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, os deputados, no exercício do mandato, devem, além de outras funções, promover a defesa dos interesses populares e estaduais sem receber vantagens indevidas com isso. De acordo com a Superintendência Legislativa, não são apenas deveres que um deputado deve ter. Com muitos direitos, alguns são até questionados pela população. Os parlamentares gaúchos possuem um salário de R$ 9.540. Isso representa exatos 75% do valor recebido por um deputado federal. Eles ainda têm direito a exercer, com liberdade, o seu mandato em todo o território estadual, ingressar livremente em qualquer órgão ou repartição estadual ou municipal, da administração direta ou indireta e ter a palavra na Tribuna, na forma regimental. Podem examinar, em qualquer repartição, documentos que julgue de interesse para a atividade parlamentar e ainda gozar de licença de 90 dias. Governar, fiscalizar, julgar, instituir e constituir. Funções quase desconhecidas perante os gaúchos e os brasileiros. p olí ti ca Assembléia Legislativa: 31 soc s oc i a li al ociais do Campo 32 Jaqueline alves debastiane Universo IPA | Dezembro 2006 Manifestação do Grito da Terra Brasil, em 2004. Foram mais de 7 mil agricultores reinvindicando seus direitos Tranqüilidade nas vilas rurais, clima bucólico, contato com a natureza, nenhum problema que possa abalar essa vida singular. Engana-se quem pensa que só de tranqüilidade e ar puro vivem as pessoas do campo. Uma das questões mais evidentes é a luta para conseguir a base para sobrevivência, através do meio onde vivem, terra, a qual deveria ser patrimônio público e não apenas tratada como simples mercadoria. Todo esse cenário e um histórico de concepção de terra, sem políticas públicas, além da vontade dos agricultores de ver seus direitos garantidos, fazem com que o Rio Grande do Sul seja espaço político para a atuação de diversos movimentos sociais do campo. Como a história de lutas e conquistas começou? Tudo surgiu na década de 1960, com o Golpe Militar. A situação não era favorável. Todos estavam insatisfeitos e buscavam alternativas para o campo, o que originou o Movimento dos Agricultores Sem Terra (Master). Os integrantes reuniam-se apenas na calada da noite, pois não podiam aparecer por conta do Departamento de Ordem Política e Social (Dops). A estratégia do Master era fazer panfletos de valorização dos camponeses, para a cons- cientização das pessoas e distribuí-los nas escolas. Em contraponto, a Igreja Católica começou a ver que deveria dar atenção especial às causas sociais. Puxada pela Teoria da Libertação, com Frei Betto e Leonardo Boff, criaram a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Segundo Rodrigo Fritzen, que foi membro da CPT, e acompanhou todo o processo, eles tinham como objetivo, através da CPT e da Pastoral da Terra, organizar a sociedade camponesa. “Para isso, fazíamos exposições, dávamos palestras para os agricultores sobre agregação de renda, cooperativismo, ressaltando os seus direitos e deveres”, revela. Outra parte que representa os trabalhadores rurais é a Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (FetagRS). O presidente do Sindicato de Santa Maria do Herval e o Secretário da Fetag, Fritzen, através de seus sindicatos dos trabalhadores rurais, diz que a Federação nasceu em1963, por meio das lideranças, porque era necessário conseguir avanços que, para o campo, estavam sendo deixados de lado. “Conseguimos várias conquistas para os agricultores, camponeses. Tais como crédito fundiário (crédito de acesso à terra), habitação, formação e capacitação. Esse movimento tem significância, pois tiane Debas Reforma agrária Historicamente, a reforma agrária surge como uma proposta de superação de um conjunto de situações críticas que configuram uma determinada “questão agrária”. A luta pela terra e a concentração dos latifúndios são expressões vivas da forma como o mundo rural brasileiro está organizado. Esse é o outro lado do “sucesso” do moderno agronegócio brasileiro. Nesse contexto, um dos movimentos sociais que mais se destaca, na questão da reforma agrária, pela forma de agir, é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Para entender a sua forma de agir, é necessário conhecer a história, os instrumentos de ação e fazer uma reflexão crítica sobre esses lutadores da reforma agrária, como denomina o Superintendente Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no Ceará, Eduardo Martins Barbosa. O MST derivou da CPT, que era um braço de ação mais rápido, com atribuições específicas, Extensão de terra da COOPAN, cooperativa dos assentados da reforma agrária em Sertão Santana Airton José Hoschscheid Assessor de Política Agrícola da FETAG e agricultor Universo IPA - Qual sua avaliação sobre a atual situação do agricultor? Airton José Hoschscheid - Em termos de programas de políticas públicas, houve avanços significativos no decorrer dos últimos anos. Principalmente, a partir de 1994, com a implantação do Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), que possibilitou o acesso do pequeno agricultor aos recursos para financiamentos das atividades agrícolas, o que não impediu a grave situação financeira em que o mesmo se encontra hoje: completamente endividado e sem sustentabilidade de sua atividade, castigado por sucessivas frustrações de safra e preços agrícolas que não cobrem o custo de produção. Universo IPA - Qual o significado dos movimentos sociais do campo, perante às instituições governamentais? Airton - São elos entre o agricultor e os órgãos governamentais. São os responsáveis pela organização dos produtores e apresentação de propostas para políticas públicas que atendam às necessidades e os anseios dos mesmos. Universo IPA - Qual o papel da FETAG em tudo isso? Airton - O papel da FETAG, que representa mais de 1,5 milhão de agricultores familiares no Estado, insistente batalhadora, é ser um canal de negociações entre o produtor e o Governo Federal. Universo IPA - Qual o futuro do agricultor dentro da conjuntura dos movimentos sociais? Airton - O agricultor sente cada vez mais a necessidade de trabalhar de forma organizada. Nesse sentido, o movimento sindical tem atuado fortemente na defesa dos interesses de seus associados, propondo e defendendo políticas de apoio à agricultura familiar, a partir dos problemas sentidos e vividos. Se, atualmente, a agricultura familiar passa por uma crise financeira, certamente, sem a atuação dos movimentos sociais, principalmente das entidades sindicais que representam o setor, o quadro seria muito mais complicado. s oc i a l e Alves O mestre em Economia no Meio Rural, Nelsom Baldasso, que trabalha na Associação Rio Grandense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural-RS (Emater-RS), por possuir contato direto com a base de todos esses movimentos, acredita que ‘’a agricultura é o esteio do Brasil”. Ele afirma que duas questões devem ficar muito claras quando se mencionam os movimentos sociais ligados à questão da terra: eu quero terra (a posse)? E para que eu quero terra (função social)? Os movimentos são os “auto-falantes” do campo. É assim que Baldasso define outra função importante deles. “Quando o Estado e suas instituições não cumprem seu papel, alguém tem de ocupar esse espaço”, acreditaBaldasso. Para o especialista, “a proliferação desses movimentos aproxima as pessoas do processo democráticos. E, quando assumem uma devida pulverização, provocam a qualificação, tanto de instituições, quanto do público atingido”. soc i al Para que quero terra? Universo IPA | Dezembro 2006 n Jaqueli Fotos: conseguimos mobilizar o povo interessado e pressionar o poder público para a obtenção dos objetivos em prol do povo do campo”, completa. Outro movimento social significativo e de abrangência internacional é a Via Campesina. Sediada na Ásia, África, Europa e América, agrupa organizações camponesas de pequenos e médios agricultores. A organização desses camponeses tem como objetivo a relação respeitosa entre a natureza e o homem. Pode ser citado, nesse caso, a destruição do viveiro de mudas da Aracruz empresa de celulose que fere esses princípios. Os camponeses queriam chamar a atenção para o desenvolvimento rural sustentável. Para o jornalista, doutor em comunicação e estudioso da Via Campesina, Osvaldo Biz, outro ponto forte é a preservação do solo e a soberania alimentar, com a tradição da agricultura familiar. ‘’Só lutamos e discutimos tudo isso, pois o cerne está em como as terras, no Brasil, na época da colonização, foram divididas desde a divisão por capitanias hereditárias, o histórico de grileiros, a Constituição de 1946”, afirma Biz. Toda a luta dos movimentos sociais, principalmente pela terra, é justificada pelos 8,5 milhões de km2 de extensão territorial do País. Aí vem a fatídica pergunta: há condições de sobrevivência para o campo, através de uma distribuição justa por terra, com uma dimensão dessas? 33 soc s oc i a li al dentro da Igreja Católica. Em 1984, no Paraná, um engajado grupo de pessoas, ideologicamente comprometido com a questão da terra, realizou o primeiro congresso, onde deu-se início ao MST, como movimento organizado. Para o pesquisador em comunicação do Brasil, Pedrinho Guareschi, os movimentos sociais rurais tomaram essa proporção, pois lutam por uma causa legítima, concreta, palpável, que é a conquista da terra, por ser uma questão histórica e ter grande influência. O MST, no começo, foi organizado com apoio de várias entidades e da própria CPT, que foi o berço de sua origem. No Brasil, o MST é o principal representante do movimento Agricultores do RS em viagem de estudo a Mondaí, Santa Catarina, para discussão do abastecimento de água potável internacional, que é a Via Campesina, ligada a vários outros países. pessoas, pois, como declara o Guareschi: “ninmoradia, aos financiamentos e aos direitos Segundo Guareschi, a estratégia do MST guém irá conseguir derrubar o movimento. que, antes, lhe eram negados. é ocupar as terras. Mas enfatiza que eles só Se uma pessoa cai, há mais 21 para poder dar Ela era uma das mulheres integrantes da ocupam quando possuem absoluta certeza sustentação e seguir em frente”. invasão do horto florestal da Aracruz Celulose, de que são improdutivas, ou quando estão Ele afirma que os objetivos dos Sem Terra que a Via Campesina liderou e organizou. Seimpedidas por questões judiciais, devendo baseiam-se em princípios que possam garantir gundo a militante, elas queriam com esse ato, para o banco. O próprio movimento possui o reconhecimento social de suas lutas, e que mostrar o horror que vai se tornar o Rio grantécnicos que analisam todas essas questões. não há nada que aconteça no Brasil sem presde do Sul com a implantação desses compleO segundo passo é as pessoas, que estejam são. Um exemplo disso é que de cem assentaxos florestais e que as pessoas não tomaram ideologicamente comprometidas com a caudos, 90 são por causa das lutas do MST. consciência da dimensão que poderá se torsa, que desejam e necessitam de terras, entrar Como dizia Paulo Freire, “essas marchas nar os chamados “desertos verdes”. para uma “fila de espera”, e participar dos dos Sem Terra são autênticas andarilhagens “Com implantação dos complexos floresacampamentos. Essa espera pode durar de históricas de pessoas que lutam pelos seus tais, a água ficará prejudicada, a produção de seis meses a dois anos. direitos... Elas demonstram, mais uma vez, que alimentos comprometida, sem falar em todo Nesses acampamentos, eles passam por tosó através da mobilização é possível lutar cono lixo tóxico que será despejado na natureza. do um processo educativo de formação e militra uma vontade reacionária instalada em E o produto, o papel, que é a única coisa boa, tância: “Nos próprios acampamentos, há esconosso país, que resiste à mudança”. será exportado”, conclui ela. A mídia analisou las, onde se chegou a um número de 100 mil como sendo de impacto negativo a atitude, alunos e mais de 100 mil famílias”, analisa Guatomada pela Via Campesina, de invadir o horto. reschi. Quando perguntado sobre o envolviMas, como Becker analisa, a mídia focou por mento do MST com partidos políticos, a exem“O pequeno só é pequeno porque está de esse lado, pois os seus donos são os grandes plo do Partido dos Trabalhadores (PT), afirma, joelhos diante dos grandes”, é assim que a coproprietários do capital, muitas vezes, financiacom segurança, que eles têm muita clareza teordenadora do Movimento dos Pequenos dos por essas empresas. Para o movimento, foi órica, e não se envolvem com política partidária. Agricultores de Taquari (MPA-Taquari), ligado de grande sucesso. A partir desses aconteciMas elegem, através desses partidos, os seus reà Via Campesina, Marli Becker, descreve a caumentos, as pessoas começaram a tomar copresentantes, para poder ter voz e vez para consa de muitos agricultores não conseguirem o nhecimento e, desde então, a pensar no asseguir o que desejam e, principalmente, porque que desejam. sunto e refletir sobre a questão. Becker destaeles têm que defender a sua ideologia. Becker ajudou a montar o MPA-Taquari ca, ainda, que o movimento está em constanOutra questão importante, quando se em 1992, e diz, com entusiasmo comovente, te formação. Todo mês, fazem reunião com os analisa a estrutura do MST, é como ela está que sempre lutou pelas causas sociais e pelo coordenadores, há cursos em andamento paorganizada. Não existe apenas um mentor, ou direito dos trabalhadores rurais. Foi através ra os militantes e sempre estudam estratégias um chefe, é uma estância de decisão com 22 desse movimento que obtiveram acesso à para que o povo não fique parado e possam, Universo IPA | Dezembro 2006 Invasão da Aracruz 34 Entenda o contexto das siglas e os movimentos existentes no RS MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. MPA - Movimento dos Pequenos Agricultores MAB - Movimento dos Atingidos por Barragens Via Campesina - Movimento Internacional de apoio aos pequenos agricultores MMTR - Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais CPT - Comissão Pastoral da Terra, ligado à Igreja Católica FETAG/RS - Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul assim, conseguir os seus direitos. E tudo isso leva à plena convicção de que o reconhecimento dessas diversidades sociais, na formação do espaço rural brasileiro, cumpre um papel fundamental na definição de políticas públicas, na medida em que as ações, voltadas à construção do desenvolvimento sustentável, precisam estar balizadas pela existência dessas pluralidades. Pés no chão, ed ucaç ão olhos no ed uca ç ã o futuro Correndo atrás dos sonhos, jovens não poupam esforços Gabriela fofonka Gabriela Fofonka Com a data das provas se aproximando, alunos se esforçam cada vez mais para alcançar seus ideais forte de estresse, por isso é necessário manter com os pais um laço forte de amizade e sinceridade, para que eles percebam que estão sendo ajudados e não cobrados. “A cobrança dos pais, a comparação com os amigos e a insegurança são alguns dos motivos que tornam os processos seletivos em verdadeiros monstros para os jovens”, diz a psicóloga. Ansiedade Quando a data do concurso se aproxima, os jovens vestibulandos começam a se esforçar ainda mais e então que surge um velho conhecido chamado: o estresse. Essa doença pode atingir qualquer um de nós, mas, geralmente, é mais violenta nas pessoas que não param nunca. Aquelas que estão sempre correndo e, às vezes, esquecem até mesmo de comer. Sabemos que para conseguir bons resultados nas provas, os jovens não estão poupando energia, se dedicam ‘horas a fio’ e fazem de tudo para que todas as matérias, fórmulas e regras entrem na cabeça e não saiam de lá até o dia da prova. Mas não podemos esquecer que a vida continua e que é fundamental respeitar alguns limites. Os estudantes não podem abrir mão de atividades culturais e sociais, devem manter sempre o corpo e a mente em forma. A correria excessiva pode trazer muitos problemas à saúde, e o ritmo alto de estudos podem causar man- chas na pele, pressão arterial alta, gastrites, distúrbios do sono entre outros. Também, é muito importante, na adolescência, o tempo mínimo de sono que são de oito horas por dia. A diminuição desse tempo pode causar alguns danos ao aprendizado, gerando falhas na memória e dificuldades de assimilação. “Acho que ela administra bem o seu tempo. Mas, mesmo assim, a vejo super cansada. Não é um período muito saudável na vida dela”, afirma Mônica Baú, mãe de Débora Baú. A psicóloga diz, ainda, que quando o jovem começa a testar os seus próprios limites ele corre sérios riscos, que incluem baixa autoestima, irritabilidade, apatia e pode se transformar em depressão. Por isso, lidar com a pressão significa respeitar os limites do corpo e da mente, os jovens precisam manter uma rotina saudável. Isso significa dormir bem, ter uma boa alimentação e praticar atividades de lazer. Mas na ‘hora H’ fica bem complicado de manter a calma. Débora Baú diz que se sente mais calma escutando a sua música favorita, enquanto se dirige ao local da prova. Brandão prefere controlar a respiração e pensar no seu objetivo. Bertamoni aposta as suas fichas no velho companheiro: o chiclete. “Respiro fundo e mastigo um chiclete. Para fazer a prova você tem que estar em equilíbrio com tudo. Não basta só estudar, é preciso ter tranqüilidade para por em prática tudo que estudou o ano inteiro”, conclui. Universo IPA | Dezembro 2006 Com os olhos voltados para o futuro, a galera do cursinho sonha alto. Em busca de seus objetivos, os adolescentes não estão poupando esforços, com força de guerrilheiros eles estão na corrida e não vão deixar barato. Os sonhos são quase sempre os mesmos, conseguir entrar na universidade e então alcançar o almejado diploma, mas não é fácil. Os jovens guerreiros são bravos e nem a falta de tempo os abalam. Afirmam que, sabendo organizar o tempo, dá para ‘enfiar a cara’ nos livros sem esquecer das atividades prazerosas da vida. Gustavo Bertamoni, 18 anos, encara o vestibular pela segunda vez e diz estar bem mais preparado e tranqüilo, assim como Gabriela Brandão e Débora Baú. Os jovens, todos com a mesma faixa etária, estudam em média três a quatro horas por dia além do horário do cursinho pré-vestibular. Para relaxar, eles optam pela Internet, música, livros, academias e passeios ao ar livre. Mas mesmo nos horários de descontração acabam pensando no vestibular. É o caso de Débora Baú que, na hora de ler, acaba optando pelas leituras obrigatórias. Apostando todas as fichas no futuro, os jovens se sentem pressionados, mas essa pressão parte deles mesmo. “Estabeleci essa meta e vou até o fim, posso até estar errada mas nem penso em desistir”, afirma Brandão. Preocupados com o bem estar dos filhos, os pais estão sempre prontos para apoiá-los, colocam-se à disposição, procurando ouvir e incentivar os vestibulandos. A psicóloga, Elisângela Schardosim, afirma que, nessa fase da vida, é muito importante uma conversa franca com os pais, onde os jovens possam expor os seus medos, ansiedades, planos e sonhos. Às vezes, a cobrança leva o jovem a um estado 35 p rofi prof iss ãssão o Banco de Imagens Prodart Novas opções ganham espaço no mercado Universo IPA | Dezembro 2006 Priscila Bittencourte 36 Os dados mostram que os cursos de graduação mais procurados, em algumas instituições de Ensino Superior de Porto Alegre, são os tradicionais. Em 2006, o curso de Medicina ficou em primeiro lugar na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com 5.585 candidatos e na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com 1.444 candidatos. No Centro Universitário Metodista IPA, o mais concorrido foi o de Fisioterapia, com 1.042 candidatos. Embora essas áreas tenham grande procura, cresce o número de candidatos em cursos tecnológicos. No vestibular da UFGRS de 2006/2, o curso que ingressou com a primeira turma de Design Visual teve 588 candidatos, sendo que só havia 20 vagas. Na PUCRS, a procura no curso de Engenharia Mecatrônica aumentou, foram 158 candidatos. No Centro Universitário Metodista IPA, o curso de Design de Moda, que também é novo, teve 69 candidatos. É tímido o número de jovens que optam pelas áreas tecnológicas. Mas a Classificação Brasileira de Ocupação (CBO), em 2002, criou novas e reformulou antigas profissões, pois o Brasil vem sofrendo mudanças nas últimas décadas. Saindo do tradicional Os alunos da UFRGS, Carolina Poll, 18 anos, e Leonardo Centeno Selbach, 19, estão no segundo semestre do curso de Design - Habilitação em Design Visual. O curso tem, nas habilitações, Identidade Visual, Sinalização, Pictogramas, Produções Multimídias, Sistemas O futuro das profissões Visuais de Comunicação, entre outras. Selbach diz que esse curso serve para qualificar a comunicação. Trabalha linguagens publicitárias de uma forma subjetiva, com softwares, que tornam o programa mais intuitivo, mesclado com a funcionalidade. Na PUCRS, Bruno Cézar Bragagnolo, 22, optou por um curso nas áreas tecnológicas. Está no sétimo semestre de Engenharia Mecatrônica ou Engenharia de Controle e Automação. “A ocupação qualifica o profissional e torna-o ativo”, explica. A profissão serve para detectar problemas de maquinários de empresas e fazer otimização de equipamentos. A área é abrangente e oferece várias opções no mercado. Outra instituição que está investindo nas novas tecnologias em Porto Alegre, é o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). Existem, especificamente, na área tecnológica, os cursos de graduação que são: Sistema de Informação, Tecnologia em Marketing do Varejo e Tecnologia em Hotelaria. A gerente de educação profissional do Senac, Fabiane Franciscone, diz que o objetivo da escola, até pela demanda de mercado, é valorizar os tecnólogos. São cursos que têm dois anos e meio de duração. Os alunos recebem o diploma no final do curso, reconhecido pelo Ministério da Educação. “Por ser um curso específico, facilita ao aluno chegar mais rápido ao mercado de trabalho”, ressalta ela. Esses cursos vêm crescendo e a procura é de quatro alunos por vaga. A faixa etária regula entre 25 e 40 anos. “Isso comprova que, pela falta de maturidade e interesse dos jovens em ler e se informar, buscando saber sobre essas áreas, acaba fazendo com que a escolha profissional seja, às vezes, frustrada”, complementa Franciscone. Estudante do primeiro semestre do curso de Tecnologia em Marketing do Varejo, Cláudia Jucimara Garcia dos Santos, 32, afirma: “sinto que encontrei minha ocupação. O curso se aproxima muito da realidade do mercado”. O colega de Garcia Santos, Roberto Vicente, 33, também diz estar no caminho certo. Procurava especialização, pois trabalhava na área e viu que era uma exigência da empresa. “Muitos aqui apostam que essas ocupações terão bastante ênfase daqui a um breve período. E serão áreas concorridas, pois o futuro caminha para a tecnologia, e a função irá se consolidar ainda mais”, analisa. A decisão “Quero fazer contabilidade”, responde o estudante do terceiro ano do Ensino Médio da Escola Júlio de Castilhos de Porto Alegre, Elimar Queiroz da Silva, 18, decidido sobre a escolha do curso de graduação. Na escola onde estuda, fez teste vocacional e participou das feiras de profissões. Na época, sua escolha se inclinou mais para Engenharia e áreas de tecnologia. Hoje, tem certeza do que quer: prefere fazer Contabilidade, pois é o curso com que mais se identifica. A família procurou influenciá-lo para Administração, mas Queiroz da Silva teve autonomia para fazer a própria escolha. Para auxiliar os alunos, os orientadores vocacionais da Escola Júlio de Castilhos, Carmem Lúcia Belaguarda Flores e Joelso Marques de Orientação profissional O psicólogo vocacional, filósofo e educador social, Sérgio Moacir, orienta os jovens e ressalta a importância de observar quais são as profissões de demanda no mercado de trabalho, e a necessidade de associar os desejos e vontades na hora de escolher a profissão. Na hora da escolha, é complexa a decisão, pois existem influências familiares, influência do próprio convívio diário e o principal, que é a falta de informação. “Conjugando todas essas questões, constata-se que é preciso educação social”, afirma o psicólogo. Muitas vezes, o que impede a escolha pelas áreas tecnológicas é a velocidade em que as informações são transmitidas. Isso gera uma dificuldade de assimilação no processo de construção. Outra questão que não pode ficar de fora é o aspecto de trazer para perto do jovem a realidade social. Moacir sugere a divulgação através dos meios de comunicação e das instituições educacionais, familiarizando os jovens com as novas tecnologias. O psicólogo conta que, no atendimento aos jovens, a maioria não se decide na primeira escolha e, quando opta sem pesquisar sobre o curso, acaba se frustrando: “por não ter maturidade e por ter medo do novo, termina escolhendo o tradicional”, complementa Moacir. Priscila BIttencourte Roberto Vicente diz estar otimista com o curso Lucas Rivas Apesar dos esforços do Governo Federal em solucionar o problema do desemprego, verifica-se um crescimento de profissionais que estão trocando sua área de atuação. Essas mudanças acontecem nos mais diversos setores. Na atualidade, os profissionais estão optando por uma troca de emprego, na busca de um ambiente satisfatório no trabalho, outros, devido à obrigatoriedade para suprir suas necessidades. O chefe de cozinha, Francisco Jackson Rivas, era técnico contábil, atuou seis anos no ramo. Mesmo com uma boa remuneração, optou por mudar de emprego. Encontrou, na culinária, sua realização profissional. Trabalhou em diversos restaurantes e atua, há oito anos, nessa área. Ele afirma: “financeiramente, ainda, não cheguei ao nível desejado. Com o mercado muito competitivo, a exigência aumentou na minha vida profissional”. Mas ressalta “que o prazer em obter um elogio, um agradecimento por um bom serviço é muito satisfatório”. Outro exemplo é o de Ricardo Coimbra da Rocha, que trabalhava com pesquisas em engenharia elétrica. Direcionou sua vida profissional para a área da computação. Há oito anos, trabalha nesse ramo com direção de arte, criação de personagens, desenvolve jogos para PC, serviços de arte, programação e jogos de desenvolvimento. Afirma que o ambiente de trabalho é agradável, com um clima profissional bom. Considera que as tarefas a serem executadas favorecem para um bom desempenho profissional. Rocha considera “a área da informática como um ramo que paga acima da média. Existe uma flexibilidade com horários, e a liberdade para trazer à tona assuntos a serem discutidos”. Mais um caso é o de Marcus Vinícius Anflor, formado em Turismo e Economia. Atuou, diretamente, no se- tor do Turismo de 1984 a 2002, onde ainda atua como consultor. Atualmente, trabalha na Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE) como assessor da presidência e, também, na função de coordenar o marketing da empresa, e no setor de patrocínios e assessoria de comunicação. Atuando em duas áreas distintas, Anflor relata que “na área do turismo, não se ganha muito dinheiro. Em contrapartida, se tem a possibilidade de viajar com mais facilidades”. Em relação ao ambiente privado, “a disputa é maior pelo mercado e pela posição, pelas características do ambiente competitivo e de resultados. Algumas pessoas não conseguem conviver sob situações de estresse”. Hoje, trabalha no setor privado devido ao custo-benefício. As mudanças, na área profissional, são, para muitos, uma barreira a ser ultrapassada. Para outros, a mudança é essencial. Alguns desses fatores, que levam a mudanças, são causadas por “sinais de cansaço, alterações físicas e mentais, depressão, diminuição de rendimento nas atividades profissionais e sociais, impaciência e irritabilidade em situações do cotidiano”, como afirma a psicóloga Janice da Rosa Pureza. Importante ressaltar que, em muitos casos, as pessoas não têm a possibilidade de escolha: às vezes, têm que trabalhar nas atividades que conseguiram, pois necessitam sobreviver e sustentar suas famílias. E os sonhos acabam ficando para depois. Muitas pessoas estão mudando a área profissional em busca de benefícios para si mesmo. Muitos almejam uma vida profissional saudável. A psicóloga alerta que a principal questão é o que se quer, a satisfação, levando a realização profissional ou serviço, no qual restará um sentimento de frustração, compensada por um bom custo benefício. prof iss ã o Deixar ser levado pela vocação profissional, escolhendo um serviço gratificante, ou optar por ganhar dinheiro indiferente de qualquer situação num ambiente de trabalho? p rofiss ão Que opção seguir? Universo IPA | Dezembro 2006 Morais, dizem que faziam teste vocacional dentro da escola. Mas, ao longo do tempo, o número de alunos foi aumentando e a quantidade de orientadores diminuindo. A escola formou parceria com a UFRGS, PUCRS, Faculdades Rio-Grandenses (Fargs) e a Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos) para a visitação dos alunos nas feiras de profissões, que acontecem dentro das instituições, com stands mostrando um pouco sobre cada profissão. Outra aluna do terceiro ano do Ensino Médio da escola, Bruna Schatkoski, 18, sabe que é importante estar sempre em contato com a tecnologia, e que até mesmo um “agrônomo” tem de se qualificar frente às constantes mudanças. Ela pretende fazer Agronomia, pois gosta do contato com a terra: “dentro da instituição, nunca tive acesso às áreas de tecnologia. Acho que a responsável em abrir esse caminho é a própria escola”, afirma Schatkoski. 37 p rofiss prof iss ã o ão Apaixonadas pela profissão Evandra Jacques “Aqui fala o seu Repórter Esso, testemunha ocular da história”. Com essa vinheta de abertura, surgiu o primeiro jornal de sucesso da televisão brasileira, o Repórter Esso, que ficou no ar de 1953 a 1970, na extinta Tupi. Com as inovações tecnológicas importadas dos EUA na década de 1960, abriu-se estradas para o surgimento de um novo formato de telejornalismo, mais dinâmico, com reportagens internacionais via satélite, que se espalhou pelas diversas emissoras do Brasil. Desde a criação dos telejornais brasileiros, a luta das mulheres, ao longo da história, resultou no fim das barreiras que existiam entre as denominadas editorias femininas e masculinas. Com isso, houve um crescente domínio delas nas reportagens de política, que se espalhou pelas editorias de economia, negócios, cultura, ciência e tecnologia. No telejornalismo gaúcho, a forte presença feminina vem fazendo história e inspirando mulheres desde 1972, quando surgiu a primeira apresentadora da televisão gaúcha, Tânia Carvalho, à frente do Jornal do Almoço. Além de levar informação diaria- Universo IPA | Dezembro 2006 Arquivo pessoal 38 Vera Armando, âncora do Pampa ao Meio Dia mente à população, trazem um pouco de leveza e suavidade para a televisão. Estar atualizado, buscar melhores qualificações, criar ambiente favorável de equipe, e não se contagiar com o excesso de vaidade do meio são alguns itens indispensáveis para se manter no telejornalismo, segundo Vera Armando. Apaixonada pelo jornalismo desde pequena, começou a carreira no interior do Rio Grande do Sul, na cidade de Santa Maria e, atualmente, é a âncora do Pampa Meio Dia, exibido, diariamente, na TV Pampa. Projetos Além do trabalho no jornal, desenvolve projetos paralelos como congressos, eventos sociais e beneficentes. Apesar da forte ligação com o universo das socialites não se considera uma. “Não sou uma dondoca. Sou uma trabalhadora sem grandes sonhos de consumo, que não gasta além do que pode. Que não se deslumbra com futilidades. Freqüento a sociedade e convivo com pessoas legais”, explica. Esse contato interativo com o público, através dos eventos e do programa, criou um laço extremamente afetuoso, o qual é manifestado através de cartas, e-mails e até telefonemas. Ela comenta que, seguidamente, é abordada em diversos lugares. A rotina de quem trabalha na televisão é sempre muito dinâmica. Após o encerramento do jornal, é realizada uma reunião, onde são discutidos os erros e acertos, e a pauta do dia seguinte. Uma grande preocupação está em fazer a seleção das informações. “Antigamente, corríamos atrás da notícia. Hoje, a notícia corre atrás de nós. É necessário ter muito cuidado para não se satisfazer com isso”, explica Cristiane Finger, outra personalidade marcante no jornalismo gaúcho. Ela é Editora regional do SBT, Coordenadora do Curso de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e apresentadora do SBT Rio Grande, o primeiro telejornal gaúcho a conquistar o Prêmio Esso. Finger relata que, no início da carreira, foi complicado entrar no jornalismo, por ser um ambiente masculino na época, e que chegou a sofrer preconceito por ser mulher. “Hoje, acredito que ainda estejam faltando mulheres em cargos de chefias dos grandes veículos. Esse é um desafio a ser cumprido”, salienta. A editora regional do SBT passou por algumas emissoras e chegou a trabalhar no polêmico Aqui e Agora, que marcou história na televisão brasileira pela linha editorial policial nunca antes experimentada. Também, ressalta o cuidado que se deve ter ao trabalhar em televisão, pois há uma grande responsabilidade em passar credibilidade para o telespectador. Segundo ela, a principal função do jornalista é informar as pessoas, dando suporte para que elas possam tomar suas próprias decisões diante dos fatos que lhes são expostos. Além disso, fazer com que as instituições sejam fiscalizadas para assegurar a democracia no país. Para as entrevistas, talento independe do sexo, e capacidade profissional não está atrelada a um cromossomo “x” ou “y”. As mulheres estão conquistando cada vez mais o seu espaço no mercado de trabalho. Arquivo pessoal Cristiane Finger, apresentadora do SBT Rio Grande Eduarda Streb, 11 anos de RBSTV, cobrindo partida de futebol De salto alto, maquiagem e cabelo escovado, as mulheres entram em cena para mostrar que entendem de esporte tanto quanto os homens. Até pouco tempo, elas lutavam pela igualdade, reivindicavam, exigiam direito ao voto e a serem reconhecidas profissionalmente como os homens. Hoje, “invadem” um espaço dominado por eles e vêm se tornando reconhecidas não só pela beleza, mas, também, pelo conteúdo. Na redação do Zero Hora (ZH), as mulheres driblam o preconceito e mostram realmente entender do assunto. A editoria de esportes é composta por 15 homens e três mulheres. A repórter Daniella Peretti edita matérias sobre futebol. No esporte amador, a editora e repórter, Deca Ribeiro, na editoria de esportes desde 1999, e a jornalista Loraine Lus redigem matérias. Ribeiro também atua na cobertura de outros esportes como automobilismo e punhoball. Ela diz que foi vítima de preconceito apenas uma vez e que isso está mais na cabeça da mulher do que no próprio ato em si. O editor geral de esporte do ZH, David Coimbra, fala do possível preconceito existente no meio futebolístico: “acredito que exista um conceito de que mulher não entende de futebol, pois são poucas que realmente entendem desse assunto”. Coimbra cita, com carinho, as suas colegas jornalistas e diz que “Deca é a princesinha da editoria esportiva”. Não é só no jornalismo impresso que as jornalistas esportivas marcam presença. Por traz dos microfones do rádio, Paula Alvim, loira, alta, cabelos lisos, futebol na ponta da lín- gua, produz programas importantes da Rádio Gaúcha, como “Sala de Redação” e “Jornada Esportiva”. Ela revela que, desde pequena, gostava de esporte, e que, por estar há cinco anos na Rádio Gaúcha, conquistou o respeito de todos. Mesmo assim, diz que sofreu com o preconceito e, no primeiro mês na rádio, chegou a chorar e a dizer que nunca mais voltaria a trabalhar com esporte. “É muito complicado trabalhar só você em um meio cheio de homens”, confessa. Alvim dá uma dica para as mulheres que pretendem seguir a carreira: “é fundamental admitir que, provavelmente, a maioria dos homens entendem mais do que você sobre futebol e que é preciso ser humilde para perguntar e aprender com os colegas de trabalho”. É impossível falar de mulher no jornalismo esportivo sem citar aquelas que mais aparecem na mídia televisiva. A repórter e apresentadora Eduarda Streb, 11 anos de RBSTV, logo de manhã, acorda muitos gaúchos falando de esporte no Programa Bom Dia Rio Grande. Ela comenta situações interessantes e inusitadas pela qual passou: “em meu primeiro jogo como repórter de campo, éramos apenas eu e mais uma colega, cobrindo Inter e Figueirense, em Santa Catarina. Durante a partida, a produção nos informou de que vários homens estavam ligando para a TV indignados, pois não aceitavam que duas mulheres cobrissem futebol. Foi a única situação de preconceito pela qual eu já passei. Agente vai conquistando nosso espaço”. Duda, como é chamada por todos, confessa que uma das coisas que as pessoas mais têm curiosidade de saber é se ela entra no vestiário dos jogadores. Ela diz que não: “a única vez que entre- vistei um jogador, no vestiário, foi o Fabiano, do Internacional, mas ele estava coberto com uma toalha. Isso não existe mais. Hoje, já existem as salas para entrevista coletiva”. Na Bandeirantes, a presença feminina se destaca no programa “Toque de Bola”, apresentado pelo jornalista Leonardo Meneghetti. Débora de Oliveira enfrenta os seus colegas em debates sobre o futebol gaúcho. Oliveira também conquista o coração dos torcedores com notícias e reportagens direto do campo. Além disso, apresenta o programa “Esporte Total” na Rádio Bandeirantes. Na mídia que reúne áudio, vídeo e escrita, certamentamente, existem mulheres jornalistas falando de futebol. É no Blog “Clube das Bolinhas” que as gurias da RBS, Ana Acker, Cíntia Hohmann, Ana Rosa, Mari Hahn e Tati Lopes soltam o verbo. Elas falam de temas variados, de fofocas do mundo da bola até as notícias mais corriqueiras e comuns como “Inter vence o Grenal”. O interessante é esse outro enfoque que elas dão, notícias divertidas sobre o jeito de se vestir dos jogadores, os mais belos dos campos e outras. Segundo elas, o legal é que, por ser um blog, podem postar várias notícias no mesmo dia, a qualquer hora e onde estiverem. Além disso, ainda têm a possibilidade de receberem comentários, que dizem ser a maioria positivos. Para elas, é isto que difere a internet dos outros meios de comunicação: a possibilidade de notícias instantâneas e maior interatividade com o leitor. As jornalistas esportivas gaúchas vêm conquistando seu espaço na mídia nacional e tornando-se cada vez mais reconhecidas, provando que mulher pode sim ser bonita, inteligente e ainda entender de futebol. Universo IPA | Dezembro 2006 Bianca Bassani prof iss ã o p rofiss ão Arquivo pessoal Invasão feminina em campo masculino 39 eS dr to Pin res oa g eral g er al an Alexandre Soares Pinto lex s: A to Fo Mundo dos Pião multi-colorido representa a diversidade No turismo As empresas são diversas. Os gays e lésbicas têm, cada dia, mais opções para se divertir e usar serviços específicos sem preconceito. Porém, os empreendimentos, aqui no Estado, não resistem ao preconceito da sociedade tradicional gaúcha, diferente do que acontece pelo mundo. Disney, Beto Carreiro World, Wet Wild? Não, agora os gays, lésbicas e simpatizantes têm o seu próprio espaço para diversão, lazer e negócios. Agências de viagem, resorts, parques de diversão, boates, corretora de seguros e praias particulares têm os seus dias reservados para esses grupos. O secretário geral do Nuances, ONG gay, lésbica, bissexual e transexual (GLBT), Célio Golin, revela a existência de lugares exclusivos para eles. Na verdade, tudo começou no berço da aceitação de homossexuais, a cidade de São Francisco. Vendo que tudo poderia ser uma grande sacada, o resto do mundo aderiu a esse tipo de empreendimento. O turismo gay é forte em várias cidades do mundo: São Francisco, Los Angeles, Paris, Nova York, Amsterdã, Londres, Sidney, entre outras. Isso tudo é o que Golin e muitos sites estão demonstrando, empreendimentos trabalhando com um segmento criativo e exclusivo. Em junho de 2004, foi lançada, em São Paulo, a Associação Brasileira de Turismo Gay Lésbicas e Simpatizantes (ABRAT-GLS). O grupo recebeu apoio da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur). A associação pretende capacitar agentes e guias turísticos no Brasil e divulgar os destinos brasileiros no exterior. Em São Paulo, as portas, para esse empreendimento, estão abertas, diferente do que ocorre no Sul. Para o secretário geral do Nuances, os empreendimentos, aqui no Estado, têm muitas dificuldades. “Diferente de São Paulo, que é conhecido pelo mundo e que tem uma tradição de aceitar novas culturas”, disse Golin. O turismo, aproveitando essa onda de faturamentos promissores, cria pacotes específicos para esse público. Viagens em que os passageiros buscam calmaria, discrição e vivência de momentos felizes. Em Porto Alegre, não são muitas as empresas de turismo que estão fazendo um trabalho exclusivo para os gays, mas há empresas que abrem pacotes para esse fim. Uma empresa de turismo que, há dois anos, no Rio Grande do Sul, abriu o atendimento para esse segmento GLBT, revela que os clientes preferem locais especializados, como, por exemplo, os hotéis. A empresa informa que, como não há uma demanda muito grande por pacotes em grupo, as viagens individuais ainda são as mais vendidas. Universo IPA | Dezembro 2006 Nos seus direitos 40 No Brasil, os homossexuais ainda não têm o direito de se casar. Por isso, surgiu uma empresa com interesse em auxiliar esses casais a proteger o seu patrimônio. Há dois anos, em São Paulo, uma asseguradora de grande nome internacional lançou um produto exclusivo para casais gays. A auxiliar administrativa, Dilma Melo, e a sócia-gerente, Railda Lenhart, informam que, há cinco meses, esse produto passou a ser comercializado em Porto Alegre. O seguro tem a finalidade de amparar o falecimento ou invalidez, e auxílio funeral. O produto se destaca por oferecer um atendimento sem qualquer diferenciação. A única exigência seria com relação ao parceiro fixo. Ou seja, é necessária uma declaração comprovando a união estável do casal. Melo e Lenhart opinam sobre os negócios gerados pelos homossexuais como importantes para a economia não só nacional, mas internacional: “sem dúvida, o mercado gay cresce dia após dia, e, com certeza, se ampliará cada vez mais”, diz Melo. “O maior objetivo da empresa é a ampliação do serviço para o público gay e, com a ajuda de pessoas que rejeitam o preconceito, esse objetivo se tornará possível”, ressalta Lenhart. A divulgação do produto para casais gays é efetuada via folders, encartados em jornais e casas noturnas que atentem a esse público. Apesar de várias maneiras de mostrar o produto para os homossexuais, ela escolheu uma alternativa para chegar diretamente aos GLTBs. Dentre muitos sites de relacionamento, uma empresa que atua há cinco anos, em Porto Alegre, se destaca. Ela visa encontrar alguém para uma pessoa que está solteira e, por timidez, ou outros motivos, não consegue encontrar uma pessoa. Segundo a dona do empreendimento, Rita Fedon, o trabalho realizado é feito de forma tranqüila e minuciosa, pois, para encontrar um parceiro, o agrado deve partir dos dois. Há um ano, Fedon abriu as portas para o segmento GLBT. O serviço conta com passos importantes para se ter o perfil do cliente, além de psicólogos e outros profissionais que ajudam na escolha e na arte da paquera. O gasto de um cliente para esse serviço é de R$ 550 por ano. A proprietária informa, ainda, que a empresa quer melhorar o serviço para o público gay, disponibilizando advogado para o casal. Afinal, casais homossexuais não têm o direito de se casar. No entanto, existe a possibilidade de se fazer uma declaração de união estável, necessária para obter algum direito e, também, para fazer um seguro de vida, como foi dito, tudo para garantir e proteger o patrimônio do casal. No prazer Na Night No Rio Grande do Sul, há muitas empresas que trabalham com esse público, explorando o sexo. Essas casas seriam boates, saunas e vídeo locadoras. Para o Nuances, esses negócios existem por causa da discriminação: “como a sociedade é muito preconceituosa, essas pessoas procuram esses locais para se divertir”, revela Golin. “Existem muitas casas noturnas com especialidade de sexo heterossexual. Não é por isso que casas que trabalham com sexo homossexual devem ser mal vistas. Cada um tem o direito de pagar pelo que quiser”, é o que afirma o secretário geral do Nuances. Os sócios de uma casa, voltada para o público gay, oferecem um ponto de relax com sauna, sala de massagens e cabines particulares para relações sexuais. Eles afirmam que o público vê aquilo como um refúgio, onde os sentimentos e desejos se transformam em prioridades. Existem casas noturnas que propiciam diversão para os homossexuais. A música empolgante e com batidas diferentes são as atrações desses locais. Acontecem shows em um palco glamouroso com “drag queens” que apresentam atrações muito criativas. Isso tudo é visto por um grupo de amigos que se encontram para dançar e sair da rotina preconceituosa do mundo lá fora. Para o dono de uma casa noturna, Lolita Boomboom (nome artístico), os investimentos são muito necessários. Em torno de R$ 3 mil, é o que a casa gasta por mês com shows, atrações, novidades musicais e equipamento. Ele revela que um cliente, em média, não gasta muito. Porém, há aqueles que extrapolam gastando cem vezes mais do que a média. Todo esse dinheiro investido está garantindo emprego e faturamento para outros fins. Se for analisar, há uma gama de empresas e pessoas contratadas por essas casas noturnas. Dentro de uma boate, que tem capacidade para 500 pessoas, no mínimo, dez funcionários trabalham nas noites que a danceteria abre. Há, também, as empresas de decoração, que são beneficiadas, construtoras para reformar ou construir um ambiente novo, e os artistas que fazem espetáculos para a casa. g er a l Em 2004, surgiu, em São Paulo, a primeira webradio GLBT do Brasil. De acordo com dados do site, a rádio está firmando parcerias de sucesso com sites e portais regionais, disponibilizando a sua programação 24 horas, em tempo real, e propiciando maior permanência do internauta no site parceiro. Com uma linguagem jovem e clean, a rádio se comunica facilmente com os públicos jovem e adulto, formadores de opinião, consumidores em potencial e freqüentadores de eventos em geral, bem como aqueles que buscam entretenimento e diversão de forma simples e rápida, como em um clique. Há, também, muitos programas que estão abordando o tema homossexual. É o caso de novelas, programas especiais com peculiaridades gays, seriados, programas de auditório e muitos outros meios de atingir e cativar o público GLBT. As opiniões e empreendimentos que estão surgindo, com enfoque nesse meio, estão vivendo dificuldades. No entanto, a forma criativa e empreendedora desses negócios vem demostrando o quanto ele é importante para a sociedade. Os empregos que essas empresas vêm gerando e a circulação de dinheiro para investimentos conduzem o mundo a ter menos preconceito sendo atacado pelo bolso. Universo IPA | Dezembro 2006 Na conquista sentimental Na mídia g eral negócios GLBT 41 c omp ormtamento c om por ta en to Universo IPA | Dezembro 2006 eduardo iribarrem Elas arrasam, fazem a águia e, geralmente, são desprendidas na hora do sexo. São as mulheres-bichas, nomenclatura dada pelos próprios gays a uma tribo de mulheres que os adora tanto a ponto de assumir aspectos das personalidades dos homens homossexuais. As mulheres-bichas têm preferência por excentricidades e são seguidoras dos gays até mesmo nos lugares mais obscuros. A estudante de Relações Públicas, Aline Brustolin, 27 anos, há sete, deixou o mundo dos héteros para andar com os gays. Não é o mundo gay típico, com drag queens e boates onde a diva mor é Madonna. É um meio mais alternativo, onde as pessoas transpiram cultura e vão a festas descoladas de rock n’ roll. “Minha vida se divide em antes e depois dos gays. Casou com uma época em que comecei a fazer terapia e me encontrei mais como ser. Resolvi encarar as coisas que gosto e que me fazem bem e isso só foi acontecer com os gays”, explica Brustolin. Com a convivência, as mulheres abertas às novas experiências acabam explorando possibilidades e conhecendo um universo por onde antes não imaginavam passar. “Fui assistindo a filmes que talvez não tivesse visto se não fosse por eles. Conheci músicas e fui ampliando meus interesses. Uma coisa puxou a outra”, conta a estudante. Luxo, brilho, lantejoulas, maquiagem e fascínio por glamour sempre serviram como forma de magnetismo para muitas mulheres se sentirem atraídas pelo mundo gay. Quem pensa que esse negócio de “mulher-bicha” é de hoje se engana. A ex-vedete Carmen Verônica foi, por anos, considerada um ícone gay. Refinada e cheia de caras e bocas, ela ganhou, na década de 1950, o título de “Rainha da Frescura”, graças a sua voz melosa, sua maneira de ser. A atriz destacou-se, recentemente, por viver a personagem Mary Montilla na novela Belíssima, uma espécie de homenagem do autor Sílvio de Abreu à própria Carmen Verônica. A apresentadora Monique Evans é outra famosa considerada por muitos uma mulher-bicha. Ela é irreverente e não tem papas na língua. Desprendidas quando o assunto é sexo, as “MB” gostam de conversar com os amigos gays sobre suas relações sexuais. Comentar quando um “bofe” bonito passa na rua também é sempre um passa-tempo divertido. “É muito importante dividir opiniões sobre sexo com homem. É muito diferente das mulheres. Com elas, é um pouco difícil de chegar ao ponto escatológico da coisa, discutir tamanhos e espessuras. Me sinto muito mais à vontade com meus amigos”, confessa Brustolin. Para a psicóloga Lúcia Helena Campos, “esse comportamento está associado a uma carência de figuras masculinas. Os gays não têm interesse sexual pelas amigas. Aliás, muitas vezes, eles dividem os mesmos gostos. Pode ser apenas uma fase que se encerra quando a mulher arruma um namorado para sanar suas carências”. A classe gay, muitas vezes, também acaba preferindo a amizade com as mulheres a dos próprios homossexuais. “São poucos os amigos gays em que posso confiar. Entre nós, sempre existe algum tipo de disputa territorial. Com mulheres, não há isso, e o mesmo elas sentem em relação a nós. É muito difícil estabelecer relações de confiança, mas, com as MB, isso acaba funcionando melhor”, explica o estudante de moda Raphael Sholl. “Tenho tido problemas em aturar ‘mulherzices’. Realmente, não sinto falta do meio hétero, mas sim de homens cabeça aberta que aceitem os gays e freqüentem lugares alternativos. Tem muitos, mas ainda são poucos pra tanta mulher”, conta Brustolin. A estudante, assim como a maioria das MB, encontra, nos gays, uma família: “meus amigos são tudo na minha vida. Me vejo como uma mulher que, de repente, pode não casar. Vou ter minha família nos gays pro resto da minha vida e é uma coisa de escolha”. de tanto ouvir e repetir, nessa convivência quase diária, eu aprendi e incorporei ao meu vocabulário”, diz a estudante Aline Brustolin. Formada por Marisa Touch Fire e Dolores de las Dores, a dupla Las Bibas from Vizcaya é sucesso na internet. Elas conquistaram fama em boates de São Paulo, como o tradicional Club Aloca. Tornaram-se conhecidas no país inteiro e arrasaram ao lançar, no site de vídeos Youtube, uma versão dublada de cena da novela Vale Tudo. No vídeo, intitulado “Vale Tudo, Fia”, as Bibas dublam a voz de Odette Roitman (Beatriz Segall) e Heleninha (Renata Sorrah), incluindo termos como “toda cagada”, “cafuçu” (que se designa para homem) e “miguxinha”. Com vídeos, podcasts e músicas bombando na internet, a dupla lançou“The Greatest Mix Collection”, um disco com músicas bem humoradas e debochadas, no qual introduzem o novo vocabulário. “Bee faz a águia”, “Beshalinda”, “Você me incendeia”, “Agressiva” e “Kiridjinha” são alguns dos nomes das músicas que foram, inclusive, lançadas de forma independente na Europa. Responsáveis por expressões como “mágoa de cabocla” e “encosto de chacrete”, Las Bibas from Vizcaya disponibilizam seu acervo no site oficial www.lasbibasfromvizcaya.com. Graças a elas, um novo tchau, também, se popularizou. Não se surpreenda quando ouvir pessoas dizendo “um beijo e me liga” ao se despedirem. Uma nova linguagem “Aurélia, A Dicionária da Língua Afiada” é o nome do dicionário politicamente incorreto que traz, em 143 páginas, centenas de expressões usadas pelos gays (veja quadro acima). Grande parte dos termos se origina do bajubá, linguagem adotada pelas travestis, que se popularizou juntos aos outros gays. “Picumã” quer dizer “cabelo”. “Alibã” significa “policial”. “Oxanã” é o mesmo que “cigarro”. “Aqüendar” pode ser interpretado de várias maneiras. Significa “pegar” (algo ou alguém) ou, então, “prestar atenção” (em algo ou alguém). Mulher bicha que se preze tem de saber “aqüendar o bate” (falar com a linguagem gay). “Conforme fui convivendo com os gays, eu fui ouvindo palavras que eram inéditas pra mim. Fui perguntando e, A estudante de RP, Aline Brustolin, é uma mulher-bicha assumida Gabriela Casartelli 42 Ataque da mulher-bicha Rodrigo Pires O nascer de um grande clube Rodrigo Pires Na noite de São João, de 24 de junho de 1863, um grupo de pessoas com um forte sotaque alemão se juntou para firmar os seus costumes e a sua cultura, fundando a Gesellschaft Leopoldina. Os encontros começaram no número 185, da rua Dr. Flores, no centro da cidade, onde ficava o prédio da Sociedade dos Cantores Alemães. Posteriormente, esse prédio foi adquirido e obedeciam aos ditames da tradicional severidade germânica, punindo com multa os sócios que não compareciam às reuniões. Em 1880, a forte influência da história e cultura alemã fez com que todas as atas do clube fossem assinadas em alemão, língua que praticamente todos os seus integrantes dominavam. Foi quando João Raupp sugeriu a utilização do português como idioma, pois facilitaria a vida dos sócios de outras descendências, que haviam se integrado à Gesellschaft, porém a falta de um redator com domínio nos dois idiomas, fez com que esse plano atrasasse um ano. Em 1903, a pacata Porto Alegre pouco oferecia em termos de diversão aos jovens, ainda emocionados com a virada do século. Mas para que isso pudesse mudar, um grupo fundou o Club Recreio Juvenil, no dia 7 de outubro, aceitando como sócios apenas solteiros. Esses mesmos que vinham revolucionando o marasmo das tardes de domingo com reuniões-dançantes. A estudante de Administração da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), Catarina Collares,18 anos, sócia há mais de cinco anos do Clube Associação Leopoldina Juvenil (ALJ), conta que, desde os primeiros meses de associada, aproveita ao máximo as dependências do clube. Desde as canchas de tênis, passando pelo bar, piscina, sala de leitura e academia. Mas nem só de sócios recentes é formado o quadro social do clube. Yone Borba Dias, 81, personalidade do clube há 53 anos. Dias afirma que o clube é sua segunda casa, onde se acostumou a deixar os três filhos com o porteiro, seu Odorico, que os cuidava. Sua história no clube é significativa, dos tempos que participava de torneios de tênis, em diversas partes do planeta, sempre com a camisa da ALJ. A data de 14 de julho de 1913 pode ser um dia comum para a maioria das pessoas. Mas, nesse dia, nasceu um tradicional clube da capital gaúcha. Uma agremiação que desbravou o mundo e originou as categorias de base no Rio Grande do Sul. Esse mesmo, que hoje está tentando retornar à elite do futebol gaúcho. Chama-se Esporte Clube Cruzeiro, o Cruzeirinho para seus torcedores e simpatizantes. Nos primeiros 30 anos de existência, foi um clube que colocava medo nos adversários, e fazia a dupla Gre-Nal tremer. Chegou a ser reconhecido como a terceira força de Porto Alegre, atrás do Internacional e do Grêmio. Agora, perdeu essa posição para o São José, o Zequinha. O responsável pelo marketing e comunicação do clube, Paulo Roberto Barbosa, explica o porquê dessa situação de altos e baixos: “O Cruzeiro, por muito tempo, esteve com muitas dívidas, o que não deixava ao clube muitas saídas para voltar ao seu status de outrora”. Outro período áureo foi o pioneirismo em excursões para a Europa, Ásia e Oriente Médio, na virada de 1953 para 1954. Depois de 11 dias viajando de navio, jogaram contra times considerados grandes, como Real Madrid, Lázio, Fenerbahçe, Besiktas e Galatassaray, além da seleção do Israel e da Turquia. Tiveram resultados positivos. Voltaram com um aproveitamento de 55,55%. “A excursão foi proveitosa, além de ser desbravadora”, conta o estudioso do futebol, Mário Luiz Schemes. A excursão foi tão capacitada que o clube voltou, em 1960, à terra dos desbravadores. Voltaram com um aproveitamento parecido, 54,16%, jogando 24 partidas, com 11 vitórias, seis empates e sete derrotas. Com es- sa campanha, conseguiu um título: o Torneio de Páscoa de Berlim, um campeonato importante para a época. O Cruzeiro conseguiu a glória máxima para um time do Rio Grande do Sul. Em 1929, depois de ter conquistado a cidade por duas vezes, 1918 e 1921, conquistou o Estado, na primeira participação (participou, depois, dos campeonatos de 1961 a 1965, 1969 a 1972, 1976 a 1978). Entrando, assim, para o rol dos poucos clubes que ganharam o Campeonato Gaúcho de Futebol Profissional com um time formado por alunos universitários e estudantes da Escola Militar de Porto Alegre. Em 1929, apenas sete clubes tinham ganhado o campeonato. Além desses títulos, o Cruzeiro conta, na sua galeria, com o primeiro Torneio Internacional de Páscoa de Mar Del Plata, na Argentina, em 1961, e sagrou-se o primeiro Campeão da Taça Governador do Estado em 1970. O Cruzeirinho está numa situação complicada na Copa FGF (décimo numa chave que tem 12 clubes). O estudioso Schemes mostra toda a descrença dos sabidos da área: “o Cruzeiro está vegetando, está um negócio inacreditável. Não tem como ter projeto um clube que não tem sócios”. Ele dá uma dica para o clube crescer: “eles têm de fazer uma parceria com o Internacional ou o Grêmio para colocar os jogadores que não estão jogando na vitrine”. Para um clube com as dificuldades do Cruzeiro, ir para primeira divisão seria, como diz Moacyr Scliar no livro “A Colina dos Suspiros”: “os gols são raros, mas, quando acontecem, volto a sentir a emoção do garoto que chutava a bola nas ruas do Bom Fim: é como se eu tivesse conquistado a Copa do Mundo”. g er a l Jerônimo Pires Universo IPA | Dezembro 2006 Um clube com TÍTULOS e passagens magistrais pelo futebol nacional e internacional. Disputando a Copa FGF, ele está sempre buscando a GLÓRIA g eral Em busca da glória 43 Universo IPA | Dezembro 2006 44 Arquivo/Inema orte esesp porte Contagem regressiva Atletas gaúchos se preparam para competição Bernardo Dias Falta pouco. Em 13 de julho de 2007, começará, no Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, o maior evento esportivo realizado no Brasil desde 1963: os Jogos Pan-Americanos. E nada mais justo do que a escolha da “cidade maravilhosa” como sede dessa versão continental das Olimpíadas, que reunirá 5.550 atletas de 42 países. Segundo o amante dos esportes, professor de Ed. Física Miguel Cantori, 27 anos, os Jogos têm tudo para ser um sucesso. “O Pan será muito importante para o Brasil, pois, além de se tornar o centro das atenções, o país se beneficiará com a série de investimentos que estão sendo feitos”, afirma Miguel. Após uma fracassada tentativa de sediar os Jogos Olímpicos de 2004, a cidade carioca não se deu por vencida e foi a única que se credenciou em tempo hábil junto ao Comitê Olímpico Brasileiro (COB) para concorrer à sede dos Jogos. Depois de uma disputa acirradíssima contra a cidade de Houston, nos EUA, o Rio de Janeiro foi eleito, na Assembléia Geral da Organização Desportiva Pan-Americana (ODEPA), em 2002. Desde então, foi constituí da pela COB uma Organização Não-governamental chamada de CO-RIO, encarregada da organização e realização do evento. No Pan 2007, todas as modalidades olímpicas serão disputadas. Elas variam desde as mais tradicionais, como futebol, vôlei, basquete e natação, até as desconhecidas para muitos, como taekwondo, beisebol, softbol, badminton, entre outros. Mas, também, terá os esportes chamados de não-olimpícos, que ainda buscam esse reconhecimento para participar de uma Olimpíada valendo medalha. São exemplos desses esportes o squash, o boliche e até mesmo o futsal, aparecendo como novidade nesses Jogos. A escolha dos atletas, que representarão o Brasil nos Jogos, é de responsabilidade da Confederação Nacional de cada esporte. No atletismo, as vagas ainda estão indefinidas. Quem conta isso é o atleta gaúcho Fabiano Peçanha, 24, medalhista de bronze na prova dos 800 metros no Pan 2003, em Santo Domingo, na República Dominicana. Segundo ele, o Brasil, por ser o país sede, tem duas vagas garantidas para cada prova. Mas, só em 2007, A porto-alegrense Janice Texeira prepara-se para dar um tiro nos Jogos Pan-americano de Santo Domingo os classificados serão selecionados, logo após o campeonato brasileiro em junho. Visando uma dessas vagas, Peçanha explica a sua dura rotina de treinos, que varia entre um ou dois turnos onde é trabalhada força, velocidade, e coordenação motora. “Devo alcançar o auge da minha forma física em maio. Daí vou estar pronto para competir e lutar para representar o Brasil nos Jogos”, comenta o corredor. Natural de Cruz Alta, no interior do Estado, e colecionador de diversos títulos em várias categorias desde os dez anos, Peçanha nunca disputou os Jogos Olímpicos e quer concretizar esse sonho em Pequim, em 2008. Sobre o fato de o Pan-Americano ser realizado no Brasil, ele ressalta como será fundamental o apoio da torcida e destaca a responsabilidade de fazer uma boa prova. “Espero poder transformar essa pressão num fator positivo e fazer com que, tudo isso reunido, me faça ganhar um segundinho no final”, conclui o atleta gaúcho. Outra atleta que representará o Rio Grande do Sul, no Pan 2007, é a porto-alegrense Janice Teixeira, 44. Melhor brasileira disparada na sua modalidade, o tiro esportivo, Texeira tem a sua vaga garantida na competição por ser a única mulher no país que vem mantendo o índice pan-americano. Ganhadora da medalha de bronze na edição anterior dos Jogos, ela revela como foi emocionante a hora em que subiu no pódio, carregando a bandeira do Brasil. “Foi a sensação mais emocionante da minha vida”, diz a gaúcha. Patrocinada pela universidade onde estuda, Texeira viaja bastante, mas diz que não ganha dinheiro nos torneios, pois seu esporte é amador. A respeito de Jogos Olímpicos, a atiradora esportiva conta que tentou partici- par de alguns, mas esbarrou na dificuldade de se qualificar nos pré-olímpicos. Entretanto, o maior sonho dela não é disputar as Olimpíadas: “meu grande sonho é poder ver as crianças saírem das ruas e praticarem esporte, qualquer que seja a modalidade”. Peçanha e Teixeira não serão os únicos atletas que devem honrar o Estado na versão continental das Olimpíadas. A seleção masculina de vôlei possui três jogadores gaúchos no elenco: Gustavo, Murilo e André Heller, e a feminina possui uma jogadora gaúcha, a levantadora Carol Albuquerque. Provavelmente, esses atletas, que jogaram o último mundial no Japão pelo Brasil, irão disputar o Pan 2007. Porém, os gaúchos, nos Jogos Pan-Americanos de 2007, não param aí. Na equipe brasileira de canoagem de velocidade, quatro atletas do masculino e duas do feminino nasceram no Rio Grande do Sul, e vão competir pelo país nos Jogos. Por fim, o recente campeão mundial, o judoca João Derli, também deverá entrar em ação no Rio de Janeiro. Ele ainda briga pela vaga, tentando se unir ao seleto grupo de conterrâneos na competição. Com os locais das competições definidos e com as obras quase concluídas, os preparativos para o Pan 2007 estão na reta final. Mas, para dar um passo maior e sediar os Jogos Olímpicos, o mesmo Miguel Cantori não é tão otimista assim. Ele crê que a infra-estrutura necessária para a competição é muito maior, e, portanto, ele acha pouco provável a hipótese. “Num país onde existem necessidades básicas muito mais urgentes, não vejo nenhuma cidade capaz de corresponder às exigências de um evento desse porte, mesmo após o Pan”, conclui Cantori. Numa das instalações da centenária Lucas Ca instituição Sociedade Ginástica de Porto rdoso Alegre (Sogipa), no tatame do segundo desenvoltura impressionante, seqüências de golpes do esporte concebido pelo nipônico Jigoro Kano, em 1882. Esse homem responde pelo nome de João Derly e pode ser considerado uma das grandes revelações do esporte. Detentor de diversos títulos, regionais e es porte de 1,60m de altura exibe, com uma esp orte pavimento, um judoca de pouco mais nacionais, passou a ocupar um lugar de maior destaque no cenário esportivo, após ter se consagrado campeão mundial de Judô - o primeiro brasileiro da História - lutando na categoria meio-leve, até 66 kg, em Cairo no Egito (2005). É campeão! Lucas Cardoso Uma mostra do talento de Derly pode ser observada no fato de ter vencido, no mundial, quatro lutas por Ippon (golpe equivalente ao nocaute no Boxe), inclusive, na final contra o japonês, atual campeão olímpico, Masato Uchishiba, logo aos 42 segundos. Superação. Essa é a palavra que define o judoca. Depois de ter sido suspenso por Dopping, quando foi constatada a presença de diuréticos em seu organismo, em 2002/2003, mudou-se da categoria ligeiro - até 60 kg. Essa categoria exigia um esforço muito grande para a manutenção do peso ideal. “Tinha muita dificuldade em atingir o peso da categoria”, conta Derly. Teve que enfrentar, antes do mundial, uma distensão no abdômen que quase o impediu de viajar. E, o tempo todo, teve dificuldade em conseguir patrocínio. Derly diz que, só depois do título mundial, conseguiu bons patrocínios e que pode, agora, se dedicar somente aos treinamentos. Recupera-se de uma artroscopia (cirurgia de correção e/ou reconstrução de ligamentos) feita no ombro esquerdo e quer voltar a competir o mais depressa possível, visando a seletiva para os Jogos Panamericanos do Rio de Janeiro no ano que vem, e a participação, em setembro de 2007, do mundial de judô. Depois, o objetivo são as olimpíadas de Pequim em 2008. Nesse momento de recuperação, em que tenta apurar a forma física, os treinamentos seguem a todo vapor e o seu técnico, Antônio Carlos Pereira, o Kiko – há 18 anos treinando Derly – tem o cuidado de trabalhar com prudência. ”Não precisamos ter pressa. O que importa é voltar aos poucos, afastando a possibilidade de uma volta antecipada que acabe prejudicando a recuperação”, conta o técnico. O vencedor do Prêmio Brasil Olímpico de 2005 começou no Judô aos seis anos de idade, após ser aconselhado, por um médico, a praticar o esporte em decorrência do problema de asma que apresentava. Isso em 1988, ano em que Aurélio Miguel conquistou a medalha olímpica em Seul (ouro), servindo de referência e tornando-se o grande ídolo de João Derly. Aos 25 anos, o campeão mundial irá realizar um outro sonho. Inspirado no projeto Reação, desenvolvido pelo amigo judoca, medalhista olímpico (bronze), Flávio Canto, na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, onde ensina o Judô e noções de cidadania a crianças, está implantando o projeto social “Podium” em Porto Alegre e orgulha-se de poder atender às crianças carentes. O nome foi extraído de uma referência que Viviane Senna irmã do eterno ídolo Ayrton Senna - fez na entrega do prêmio Brasil Olímpico. Ela diz que, no pódio do esporte, só existe lugar para os três primeiros colocados. Mas, no pódio da vida, existe lugar para toda e qualquer pessoa que trilhe o caminho da humildade, da perseverança e do bom caráter. Por trás da baixa estatura, revela-se um grande campeão dentro e fora dos tatames, preocupado com os problemas sociais e possuidor de um senso de religiosidade. Ele sonha em viver outros momentos de glória como o da conquista do mundial no Egito em 2005, onde destaca a emoção inenarrável de ver a bandeira do Brasil no lugar mais alto do mastro e de ouvir o hino nacional. “É como se passasse um filme na cabeça, e vem a lembrança de tudo o que foi vivido e de todas as dificuldades superadas. Naquele momento, eu represento a nação que deu certo”, finaliza. Universo IPA | Dezembro 2006 “É como se passasse um filme na cabeça. Naquele momento, eu represento a nação que deu certo”. 45 orte esesp porte O esporte radical conquistou o seu espaço Cassia Marques O montanhismo surgiu, no Brasil, com os Bandeirantes, no século XVII. Entretanto, somente no século XIX iniciaram os primeiros registros de conquistas em montanhas, no território brasileiro. Em 1º de novembro de 1919, foi fundado o primeiro clube de montanhismo do Brasil no Rio de Janeiro, o Centro Excursionista Brasileiro (CEB). Para homenagear, como montanha-símbolo do CEB, foi escolhido o Pico de Deus, com 1.690 metros de altura. Desde o início da década de 1960, centenas de vias de caminhada e escalada continuam sendo deixadas à disposição dos montanhistas para a ascensão em montanhas novas ou que já tenham sido conquistadas. Para quem estava esperando uma novidade, aí vai uma: veicula, na Rádio Atlântida, um programa voltado para esse universo, “Radical Livre”, com duração de quatro horas, aos sábados. Com musicalidade alternativa, direcionado ao público praticante, com entrevistas com esportistas destacados em suas áreas. Contato com a natureza Assim define Orlei Júnior, 33 anos, formado em Educação Física, no IPA. Trabalha com montanhismo e escalada indoor desde 1995: “comecei como guia (hoje, esse trabalho custa R$100,00 por dia). Minha formação profissional veio a partir do esporte, pois eu já praticava montanhismo”, conta Júnior. Para atender melhor os clientes, ele quis complemenCássia Marques tar seus conhecimentos: ”então, por não existir formação de guia de montanha no Brasil, fiz um curso de resgate em montanha, e procurei a graduação em Educação Física”. Ele acrescenta que seria a formação mínima para quem quer trabalhar com esse “esporte fantástico”. Júnior ressalta a importância de um guia na prática dos esportes: “o guia é benéfico. Aumenta a segurança no esporte e lubrifica o aprendizado”. Segundo ele, quando o peso está acima do ideal, dificulta a escalada, pois é um esporte que luta contra a gravidade. É preciso carregar um mochila de equipamentos que pesa em torno de 20 quilos. “O esporte radical está crescendo no Rio Grande do Sul”, relata Júnior, que chegou a tirar o segundo lugar no Campeonato Gaúcho de Escalada Indoor. Um dos seus feitos foi ter escalado os sete cumes brasileiros. Ele acredita ter sido o primeiro gaúcho a realizar o projeto. Desabafa dizendo que demorou dez anos por falta de patrocínio. Agora, com um projeto ainda mais desafiador, quer “realizar a ascensão das sete maiores montanhas da América do Sul. Será necessário muito patrocínio”, relata Júnior. Ele tem um site (www.mundovertical. com) com nove mil acessos por mês, com objetivo de informar e formar montanhistas e escaladores. Universo IPA | Dezembro 2006 “Esporte é minha vida” 46 Afirma o estudante Edgar de Lima, 25, do quarto semestre de Educação Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ele pratica esportes radicais, profissionalmente, há quatro anos e meio. Começou com rafting, e a bike faz parte da sua vida há dez anos: “sempre fui viciado em andar de bicicleta”. Participou de competições de longa distância, e tirou lugares entre primeiro e quinto. Lima é instrutor de rafting da Radical Sul há mais de um ano: “sempre fui muito ligado à natureza”, afirma. “O esporte radical entrou na minha vida, através de uma palestra, que assisti na faculdade (IPA), com o dono de uma empresa de Ruan Arboleta, colombiano, há 3 meses em Porto Alegre, pratica escalada em rocha Superação = motivação Silviane Sebold, 30, conhecida por Kika, está no quarto semestre de Educação Física. Trabalha há quatro anos com esportes radicais. Optou por influência dos amigos. Kika conta que, na primeira vez que praticou o esporte, não gostou: “fiquei com muito medo. Depois de um tempo, voltei a praticar e adorei”. Hoje, ela tem uma academia de ginástica, onde tem espaço para a escola de montanhismo, que dá curso de escalada. Segundo ela, todos que trabalham na academia são estudantes ou formados em Educação Física. Kika diz que é necessário “um preparo físico diferenciado para ter resistência e força, e treinamento aeróbico”. Escalou, recentemente, o Dedo de Deus (1.690 metros) com 17 horas de atividade sem parar. Ela dá um recado aos iniciantes: “sempre tem que procurar um curso ou um profissional para evitar acidentes”. Ela diz que os acidentes acontecem, geralmente, na descida das montanhas, quando é feita a escalada. Victor Kerber Técnico em Informática e Eletrônica, 23, pratica esportes de ação há cinco anos (escalada, escalda livre e rapel). Conheceu os esportes no quartel e foi o único de sua época a segui-los. Desde então, procurou instrução profissional. Faz as atividades, em média, duas vezes por mês. Vitor gastou cerca de R$5 mil em equipamentos. Chegou em sétimo lugar, entre 20 participantes, em um torneio interno de corrida de escalada, realizado por uma loja de artigos esportivos. De acordo com ele, um dos principais locais para realização dos esportes, no Rio Grande do Sul, é Morro do Itacolomi. Segundo ele, a principal motivação pelo esporte “foi a questão de superação, convívio com as pessoas e o contato com a natureza”. Pensado e projetado por Está nascendo um novo espaço para os skatistas no Centro de Porto Alegre. De um projeto existente há dois anos, surge a Plaza, um pista com um conceito diferenciado de todas as outras existentes no Brasil. Baseada em uma pista de Nova York, a Plaza leva esse nome, pois além de uma pista para skatistas, também será uma praça para lazer e descanso, onde monumentos e bancos servirão como obstáculos para os atletas. A verba para construção da pista, um total de R$ 180 mil, foi liberada pelo Governo Federal, através do deputado federal Beto Albuquerque, que resolveu retomar o projeto após uma conversa com o skatista Guilherme Gnomo, 26 anos, profissional há seis. Hoje, Gnomo é um dos principais atletas envolvidos no processo de projeção, liberação e construção da pista, ao lado do presidente da Federação Gaúcha de Skate, Ricardo Menezes. Para que não fossem notados erros, ou falta de algum obstáculo, somente depois de pronta, a Plaza foi desenhada pelo skatista e arquiteto Fred e, também, sempre discutida em reuniões e, até mesmo, em churrascos, por diversos atletas. Isso deixará a pista o mais semelhante possível às ruas, o eterno local de treino de skatistas, e trará, para a pista, corrimãos e escadas de diversos tamanhos. Segundo Gnomo, “não adianta haver um corrimão pequeno e um grande, pois o moleque anda em um, mas não consegue andar em outro. Portanto, a Plaza terá todas as etapas. O skatista necessita de evolução para crescer no esporte”. Houve, também, a preocupação para que a pista ficasse boa para treinar, mas também perfeita para trazer a Porto Alegre grandes campeonatos. Hoje, isso não acontece, pois a mais completa pista do Rio Grande do Sul localiza-se em Novo Hamburgo. A escolha do local não foi à toa. A idéia da Praça Júlio Mesquita, no Centro, próximo ao Gasômetro, foi tomada para centralizar o grande número de skatistas do bairro, que andam nas Praças da Matriz e 15 de Novembro, e, também, para facilitar o treinamento dos atletas da Zona Sul. Hoje, o custo é muito alto para um deslocamento diário até o bairro IAPI, na Zona Norte, onde está a melhor pista da cidade. Assim, todos os atletas terão um lugar bem localizado, destinado ao esporte em Porto Alegre. Existem vários projetos para realização de oficinas, com total apoio e participação dos atletas profissionais, para meninos e meninas, após a inauguração da pista, prevista para maio. Uma novidade, para skatistas e admiradores do esporte, é discutida por atletas e pela Federação Gaúcha de Skate: a construção de uma pista, nas mesmas proporções da Plaza, ainda em 2007, na Zona Sul da Capital. Ivo Go nç alv es /PM PA Projeto da pista de Skate que será construída na Praça Júlio Mesquita es porte Nataniel Corrêa esp orte skatistas Universo IPA | Dezembro 2006 rafting. Adorei e entrei em contato com palestrante”, conta Lima. Como trabalhava no ramo, conheceu pessoas ligadas ao rapel e montanhismo. Teve possibilidade de aprender escalada na academia. Gastou cerca de R$400 em equipamentos básicos (cadeirinha, oito, saco de magnésio, entre outros). Por ter facilidade para perder peso, ele não liga muito para a alimentação, mas evita gordura e fritura. Faz todas as suas atividades de bicicleta por ser um transporte limpo, e fazer bem à saúde. “Na minha vida, eu faço o que eu amo fazer”, declara. Pretende continuar escalando até não ter mais condições físicas. Afirma ser a maneira de estravasar, liberar o stress do dia-a-dia: “se eu fico sem praticar, fico mal e estressado”. 47 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Arquivo do grupo Afro-Sul/Odomodê Através da dança e de outras oficinas como percussão e malabares, o grupo valoriza a cultura afro e facilita o acesso de crianças à arte Cultura voluntária vejam como cidadãos dignos, que se encontrem como um ser dentro da sociedade”, completa Caco. Para ele, o dia-a-dia com as crian“Em qualquer lugar, na casa de qualquer um. O Afro-Sul era nôças é o “carro-chefe” do Instituto, mas não exclui a possibilidade de made”. É assim que um dos fundadores, João Augusto Santos Silva, abrir oficinas para o público externo. O grupo mantém a dinâmica o Caco, define o início do Instituto Cultural Afro-Sul/Odomodê. Desdo nome original que é Sociedade de Ação Social Recreativa Benede 1974, o grupo promove a valorização da cultura negra no Rio ficente Cultural e Bloco Afro Odomodê. Grande do Sul, no Brasil e no exterior. Hoje, através da música, da Amiga do Instituto desde criança, Pâmela Viríssimo, hoje, trabadança e de outras oficinas, trabalham, com questões sociais e cullha como secretária e, também, na parte administrativa. Apesar de turais, com crianças de cinco a 13 anos, que estejam em situação de não trabalhar, diretamente, com as crianças, se envolve muito com vulnerabilidade. Crianças de outros lugares também são bem vinelas, pois passa a maior parte do seu tempo lá. Viríssimo foi criada na organização, participa do grupo de dança afro e os considera das: “não existe uma porta fechada”, esclarece Caco. uma família pelo vínculo forte com os alunos, professores e colegas De segunda a sexta-feira, das 8h30 até às 12h e das 13h30 às de trabalho. 17h30, são realizadas atividades no Afro-Sul/Odomodê. Desde capoeira, passando por artes plásticas, canto e dança, até os novos Para ela, “o trabalho do grupo ajuda 100% no desenvolvimento projetos que trabalharão culinária e vestuário. Caco explica que as das crianças já que tudo é cultura”. Com a capoeira, os malabares, a crianças mais novas, de cinco a oito anos, “fazem muitas brincadeidança, as aulas de educação física e a música, as crianças são inseras lúdicas. Deixamos eles mais à vontade assim do que estabeleridas na sociedade, além de desenvolver o corpo e a mente. O reforço escolar, aplicado nas disciplinas em que elas têm mais dificuldacendo regras”. Segundo ele, com os mais velhos – de nove a 13 anos – existe uma orientação mais incisiva, dando-os de, também ajuda e traz mudanças positivas nas “Elas são inseridas um incentivo e uma perspectiva para o futuro. notas do colégio. Ter boas notas é um pré-requisito para se apresentar e fazer parte dos grupos. O grupo acredita que cada voluntário, que dá na sociedade, um pouco da energia e do seu tempo para as De acordo com o artista e comerciante, Livio além de desenvolver Cardoso Schinoff, ser um arte-educador do Odocrianças, está ajudando-as a construir sua prómodê é poder trabalhar com as crianças “dando pria cidadania. Dessa forma, permite “que eles se o corpo e a mente”. Universo IPA | Dezembro 2006 Gabriela casartelli 48 especial cultura es pec i a l c u ltu r a ênfase aos malabares e à literatura, como software livre e incentivar os trabalhos que “Poucos, no planeta, têm poesia e teatro”. Schinoff dá aulas há um ano estavam sendo feitos anteriormente. Senoção de quanta cultura gundo Paulinho, “estão ajudando na estrue meio. Diz que é visível o crescimento do tura eletrônica das associações, institutos, projeto. Segundo ele, “poucos, no planeta, tem disponível. É infinita a têm noção de quanta cultura tem disponígrupos culturais e inserindo crianças no diversidade artística que a vel. É infinita a diversidade artística, e a genmundo da informática, além de disponibiligente leva para as crianças”. zar um acesso mais fácil à cultura digital pate leva para as crianças”. A relação do arteeducador com elas é relativa: “algumas gosra a comunidade”. tam de aprender tudo e outras é difícil fazer aprender coisas simNa opinião de Caco, “a informática abre caminhos para os jovens, ples”, afirma. crianças, velhos e pra todos os interessados em se desenvolver. O computador é uma exigência não só no mercado de trabalho, mas Mesmo que alguns tenham dificuldades, estão adquirindo muina vida ativa”. tas experiências que, segundo Schinoff, poderão ser utilizadas no Viríssimo conta que a inserção das crianças na cultura as torna futuro. “Com educação e cultura, eles vão poder se virar, nesse munpessoas que sabem se portar melhor diante do público e, também, dão, com uma cabeça mais aberta”, acredita o artista. “As crianças podem vir a ser educadores ou artistas, com uma participação social aprendem a ser mais respeitosas. Com uma biblioteca improvisada, positiva”, enfatiza. eles têm acesso a livros que são discutidos, posteriormente, com os educadores, nas oficinas. No primeiro trimestre de 2006, o Instituto foi conteplado Schinoff, por exemplo, dá aulas com leitura com sete computadores, pelo Ministério da Cultura e indica livros para serem levados para casa: (MinC). Após a inscrição pela terceira vez, foram selecionados pelo MinC, como um “ponto de cultura”. “eles já tocam, dançam, etc. Futuramente, os que quiserem estarão vinculados a gruOutro fundador do Afro-Sul/Odomodê, Paulo Ropos artísticos e buscarão mais sobre assunmeu da Cruz Deodoro, explica que existem cerca de 500 tos diferentes, maior compreensão sobre a pontos de cultura que recebem vida, que hoje ainda é difícil paapoio do governo através de equira a maioria das pessoas”. pamentos. O artista acredita que a maioria das pessoas não tem consciência básica e que, por seO objetivo do governo é reforçar a quesrem os adultos do futuro, essas crianças devem tão da informática trabalhar nesse futuro: “na minha opinião, muitos para trabalhar com deles seguirão fazendo arte”. “Com educação e cultura, eles vão poder se virar, nesse mundão, com uma cabeça mais aberta” Um grupo de amigos com uma paixão em comum: a música. Um simples, mas ótimo motivo para formarem um grupo e atuarem profissionalmente. No ano de 1974 são convidados a participar de um festival de música: “para época, foi uma apresentação bem interessante. O público se dividiu entre aplausos e vaias. Saímos sem título nenhum, mas a partir dali estabeleceríamos uma coisa nossa, uma identidade como grupo.” Assim, “se monta o grupo afro-sul”, com a característica de valorizar, difundir e promover a cultura negra, através da música e da dança. Odomodê, na língua africana Iorubá, significa jovem, novo, menino. O nome ideal para o grupo que dá oportunidade, às crianças de rua e de comunidades carentes, de aprender e praticar a cultura afro-brasileira. Em 1980, o Afro-Sul foi chamado como parceiro para a refundação da Escola de Samba Garotos da Orgia. Essa escola “tem uma incumbência que é tratar da difusão da cultura afro-brasileira, originalmente trabalhando com tema afro”, relata Caco. Durante 18 anos foi esse o trabalho feito pelos Garotos da Orgia, que depois desse tempo ficou sob a orientação do Afro-Sul. De acordo com Caco “a escola de samba naquele momento não era suficiente para criar uma estrutura cultural e social que pudesse se ater com algumas coisas importantes dentro da questão negra”. Ele acredita que o bloco afro veio então com essa tarefa e o Odomodê se tornou uma janela para a avançar na questão da cultura negra. “O Afro-Sul já fazia isso através da música e da dança, a escola de samba não tinha mais a serventia para execução do trabalho com a cultura negra”, relembra Caco. Em 20 de novembro de 2000, nasce o Instituto Cultural Afro-Sul/Odomodê, mantendo a missão inicial e passando a prestar serviço social como uma ONG ligada ao Terceiro Setor. Para Caco, serem independente do poder público e terem identidade própria sem vínculos político-partidários é vantagem, assim como a maior visibilidade como ONG. O trabalho do Instituto também é divulgado no site http://ong.portoweb.com. br/afrosul. Para doações e parcerias entre em contato pelo fone (51) 3384-3576 ou pelo e-mail: [email protected]. Universo IPA | Dezembro 2006 De “nômades” a Instituto Cultural 49 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Tunt, tunt, tunt Música eletrônica: euforia na batida certa Universo IPA | Dezembro 2006 rani vargas 50 Sem que muitos percebam, a música eletrônica (e-music) cresceu expressivamente, e seu público se multiplica a cada rave. O estilo é criativo e diferente, apresenta diversas vertentes e reúne uma gama de tribos distintas nas festas. As raves são, originariamente, ao ar livre. A palavra significa descontrole ou delírio. Atualmente, são popularizadas, com grande público. Além de música boa, durante a noite toda, também há shows de luzes e performances artísticas dos DJ’s. “A iluminação, combinada com o som do DJ, tem um efeito impressionante no público, pois é a junção de impacto sonoro com o impacto visual. O resultado é uma vibe muito mais densa. Um bom exemplo disso são os momentos de blackout da festa, quando a música, em determinado momento, vai ficando mais lenta e o volume vai diminuindo. Junto com isso, a luz vai apagando. Depois dessa parada, a música volta com tudo e a luz explode junto com ela. Poxa, a galera vibra muito! É uma gritaria só!”, diz o Light Jo- ckey (LJ), operador das luzes, residente da SpinClub, Erick Krau, considerado por grandes DJ’s como um dos melhores LJ’s do Brasil. Os DJ’s são a grande atração das festas. Muitos são Top Internacionais. O DJ gaúcho Fabrício Peçanha, da agência 3Plus – RS, é um exemplo. Recentemente, teve seu talento reconhecido. Foi eleito #242 do mundo, segundo a revista inglesa DJ Mag – onde, até hoje, poucos brasileiros ilustraram a lista. “Foi muito legal. Estar entre os 250 melhores do mundo é ótimo. E isso fez com que os gringos soubessem quem eu sou”, conta. Meio tímido, completa: “não sinto uma ‘fama’. Apenas o reconhecimento de um trabalho legal que faço, e que as pessoas têm curtido”. “Não vejo a música eletrônica como uma moda. Assim como qualquer outro estilo, uma hora iria estourar. Estamos numa ótima fase, e isso só tende a melhorar”. Devido à grande popularização da cultura eletrônica no Brasil, os eventos do estilo vêm sendo mais freqüentados por todas as tribos. Grande parte desse público, até então, não tinha o gosto voltado para esse tipo de música. Porém, com o tempo, acabou por ser mais assíduo às raves. “Freqüento a cena eletrônica há uns 13 anos, mais ou menos. E vejo que, hoje, a vibração é muito maior. Antigamente, era um pessoal mais underground (alternativo) e, hoje, tem tudo que é tipo de gente dançando e curtindo cada vez mais”, revela Fernando Moska, que é um rosto conhecido nas raves. Ele finaliza: “a galera deve transcender ouvindo a música, buscando uma evolução”. O carisma do DJ somado a uma música bem escolhida não tem outro resultado a não ser euforia completa do público. O DJ Gu, da agência 3Plus – SP, revela: “acredito que uma combinação entre os dois – música e carisma – seja essencial. Mas acho que carisma é o principal para poder desenvolver um bom set (o conjunto de músicas tocadas pelo DJ) com segurança. Fica mais fácil quando o público está receptivo”. Comercialmente Há os que não se satisfazem apenas com uma rave e partem para os chamados afters. São festas que, geralmente, acontecem após o término das raves. Ou seja, começam logo pela manhã e se estendem pelo resto do dia. Inicialmente, é notado um preconceito da sociedade para com os ravers (freqüentadores). De acordo com eles, a maioria das pessoas, sem conhecimento no assunto, vê as festas como sendo um bando de jovens loucos e drogados curtindo uma “mesma música” a noite toda. Como quaisquer outros eventos de música, as raves também têm um problema em relação às drogas. A má fama das festas se dá pela soma da grande circulação de ecstasy e a curiosidade do público em relação à “droga do amor”, como é conhecida: “tem gente que vai para usar droga. Isso de fato acontece. Mas esse conceito não deve ser generalizado. Tem muita gente que vai por gostar da música”, afirma o DJ Fabiano Veppo, da agência 3Plus – RS. No assunto música, a e-music possui vá- Grandes agências, como a 3Plus (de nível nacional) e Re:existência (de nível regional), promovem eventos com Top DJ’s, freqüentemente, no Rio Grande do Sul. A Fulltronic é um bom exemplo de evento que deu certo e, até hoje, mantém edições com grande público. Segundo o DJ Fabrício Peçanha, Porto Alegre ainda tem uma carência de casas noturnas voltadas à música eletrônica. Conta que está pensando em projetos para o próximo ano: “o pessoal quer ter opções. Escolher um lugar confortável, onde possa ver gente bonita e curtir uma música boa. Aqui em Porto, temos apenas a Spin. Está na hora de fazer algo mais”. Antigamente, as festas eram tidas mais como “alternativas”, e não possuíam grande número de simpatizantes. Muitos acreditam que as raves, hoje, estão buscando não a satisfação do público, mas sim os lucros visíveis que provocam. A opinião dos DJ’s é clara: música eletrônica é paixão, e não deve visar apenas o lucro. O deslumbre de empresários acaba tornando as festas, que antes proporcionavam o prazer dos freqüentadores, em mega eventos essencialmente comerciais. “A festa virou um ‘negócio’. Promotores de festas eletrônicas querem lucrar, como qualquer dono de casa noturna. Acredito que ainda se tenha especial cultura es pec i a l c u ltu r a amor pela e-music. Mas, no fundo, o lucro financeiro e institucional é o maior objetivo”, diz Jx. E completa: “hoje, a coisa está mais para uma semana de moda. Tipo ‘full donna tronic fashion’ (risos)”. Acredita-se que a e-music seja uma evolução sonora e cultural no mundo todo. Para Peçanha, tudo tem seu momento: “não vejo a música eletrônica como uma moda. Assim como qualquer outro estilo, uma hora iria estourar. Aqui no Brasil, não foi muito diferente de outros lugares do mundo. Estamos numa ótima fase, e isso só tende a melhorar”. Ele ressalta: “o RS está numa fase de explosão ainda, que é confundida com moda. Mas escuto isso desde que a e-music começou. Então, não acho que seja modismo, e sim um gosto que o pessoal está tomando por um som mais ‘fino’”. Completando, Veppo diz: “tudo está no seu tempo. Não é uma moda, é uma cultura que o Brasil e, no caso, o RS estão começando a vivenciar mais”. O DJ Gu brinca com a situação: “moda nada... Se fosse moda, já teria acabado há um tempo. Música eletrônica faz parte da nossa cultura, e acho que está melhorando cada vez mais. Toco há 16 anos, e ela nunca saiu de ‘moda’ (risos)”. Principais gêneros (Como diferenciar) House - voltado às pistas de dança, e que, de certo modo, atualizou com bases eletrônicas. Todos os elementos da house music influenciariam os gêneros que surgiram depois. Provavelmente, um dos sons eletrônicos mais tocados do mundo. Possui várias vertentes: Tech house, Deep House, Hard House e Progressive. Exemplos: Fabricio Peçanha, Rodrigo Ayala, Deep Dish, Gui Boratto e Christopher Lawrence. Trance - com batidas mais pronunciadas e mais rápidas. Tem como características o chamado breakdown (uma diminuída no ritmo, uma parada), quase sempre seguido de uma progressão empolgante - as tais “explosões”. O estilo se utiliza, muitas vezes, de sons etnicos, e tons repetitivos, que induzem um estado hipnótico, um transe. Também possui suas vertentes, como Progressive. Porém, a mais conhecida é o Psy trance. Os Dj’s mais conhecidos, internacionalmente, são Tiësto, Ferry Corsten e Armin Van Buuren. Psy - é o trance psicodélico, mais acerelaro e “enlouquecedor”. O gênero vem se popularizando no Brasil, e promove os maiores festivais. Dj’s mais populares são Rica Amaral, Infected Mushroom e GMS. Techno - mais pesado. É uma variação da House, porém com batidas mais furiosas e menos suaves, contendo batidas mecânicas e usando sons que vão desde sirenes apocalípticas a samplers de diálogos de TV ou filmes. O Tecno original é mais rápido.sRenato Cohen, Anderson Noise e Murphy. Universo IPA | Dezembro 2006 Maurício Zimermann rios gêneros e vertentes. Cada festa possui um estilo de música, e não se costuma misturar diversidades em uma única rave. Porém, não é impossível que haja eventos com tendas e pistas de diferentes gêneros, o que acaba confundindo quem não entende muito da cena. “Não é a mesma coisa. Quem entende sabe diferenciar um som mais ‘fino’ de um som mais poluído. A galera que curte mesmo sente a vibe”, explica Veppo. Da mesma maneira, Jx, (Moving Dj’s) DJ da Rádio Cidade – RS, reforça a idéia: “queremos mostrar que não é ‘tudo a mesma coisa’. Que não são, simplesmente, um bando de loucos e drogados escutando um ‘tunts’ a noite toda. Esse é o nosso objetivo como profissional das pick’ups também”. Só quem vivencia sabe o sentimento que a música eletrônica proporciona. O texto de divulgação da festa Life is a Loop cita: “a música eletrônica é construída através de diversas sonoridades repetitivas, marcadas sempre com oito tempos, denominados loops. Existe algo que é construído através de diversos sentimentos quase nunca repetitivos, que são marcados e definidos sempre por momentos denominados life. A nossa vida é uma volta que não pretende parar tão cedo! Life is a Loop”. 51 a Liverpool gaúcha Lisiane de Assis cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Porto Alegre, Banda Identidade, em Porto Alegre, relembra capa do clássico Abbey Road, disco dos Beatles da década de 1960 Universo IPA | Dezembro 2006 Lisiane de Assis 52 “Let it be… let it be … speaking words of wisdom, let it be”. Deixa estar... deixa estar... falando palavras de sabedoria... Porto Alegre é a Liverpool gaúcha. Calças justas, ternos redesenhados, cabelos acompanhando o desenho da testa. Acordes não tão complexos, mas que compõem melodias marcantes. Letras que descrevem um pouco do dia-adia, relatam experiências amorosas, por vezes de maneira doce, outras de forma ousada. Essa descrição poderia, facilmente, ser associada a Beatles ou Rolling Stones. Porém, não se refere à Inglaterra da década de 60, e sim a Porto Alegre dos anos 2000. c o Fotos: divulgação q u e , atravessando gerações, completa 26 anos de história: o bar Ocidente: “o Ocidente surgiu, em dezembro de 1980, sem nenhuma preten- especial cultura são. A idéia era, através da promoção de eventos, basicamente de teatro, que era nossa área de atuação, criar uma cronologia das noites na vida das pessoas que frequentavam a noite do Bom Fim”, conta o proprietário do bar, Antonio Augusto Pereira Barth, mais conhecido como “Fiapo”. Mais tarde, o jornalista Mauro Borba caracterizou o Ocidente como “um lugar lançador de modas e tendências na capital gaúcha”. Segundo Fiapo, passaram por lá clássicos do rock gaúcho como TNT, Replicantes e Graforréia Xilarmônica, que contribuíram para que o bar continuasse, até hoje, como um ponto certo de encontro do rock local. Ultimamente, quem tem marcado presença por lá são as bandas Pública, She’s OK e Os Efervescentes. Considerações e caracterização da cena rock da cidade feitas, permanece a incógnita: por que os porto-alegrenses têm predileção pelo rock sessentista? O jornalista Leo Felipe tenta desvendar o mistério: “acho que muito em função do chamado ‘boom do rock gaúcho dos anos 80’, que trouxe à tona bandas como TNT e Cascavelletes. Essas bandas eram muito influenciadas por Beatles e Stones. Nesse sentido, o Júpiter é figura chave nesse ‘revival sessentista’. O cara esteve à frente tanto do TNT quanto dos Casca e, depois, em carreira solo, trouxe de vez a lisergia para um contexto de rock gaúcho. Outro cara importante é o ‘Syd Barret dos pampas’, Plato Divorak. Desde o final dos anos 80, ele vinha citando e trazendo referências dos anos 60 para sua música. Finalmente, com o ‘fenômeno’ Cachorro Grande (super influenciado por TNT, Cascavelletes e Júpiter), a gurizadinha mais nova entrou em contato de vez com o som dos anos 60, ou parte dele. Daí o estrago estava feito.” Resta dizer que, se no século XVI, o Porto de Liverpool era “a principal porta de entrada para o mundo novo” e, em 1960, a cidade se tornou conhecida como a terra de uma das bandas mais emblemáticas do rock, Porto Alegre se concretiza como o portal do “mais novo-velho” rock and roll. es pec i a l c u ltu r a bandas. Ao que tudo indica, a escola rendeu boa formação, pois Frank Jorge segue a carreira musical até hoje e é acompanhado por um público de idades variadas. Aliás, o público, nessa história toda, merece boa parte do mérito. É ele que vai aos shows, compra os discos, enfim, faz as bandas acontecerem: “o público é tudo na vida de qualquer banda, porque tu queres tocar para ter público, para agradar as pessoas, para deixálas felizes. Não tem por que tocar se não é para tocar alguém, porque a s canções tocam as pessoas”, afirma Hanke. A voz do público é representada pela estudante Juliana Larsen: “Acho que Pública, Os Efervescentes, Cachorro Grande, Identidade, entre outras bandas, desempenham muito bem o papel que Who, Beatles ou Rolling Stones tiveram na sua época. Para mim, é como a retomada de um tempo que eu não vivi. Sem contar a vibração dos shows, que é algo único”, empolga-se a estudante. Mas nem só de bandas e público, público e bandas, sobrevive a cena. O pessoal do rock precisa de lugares que sediem suas festas e shows. Para essa finalidade, se prestaram Rocket 88, Taj Mahal e Crocodilos, bares extintos da década de 1980, que hoje dão lugar para o Beco, Mosh, Garagem Hermética e Dr. Jeckill. Sem esquecer do clássi- Universo IPA | Dezembro 2006 “É uma característica do Rio Grande do Sul essas influências. Talvez pela semelhança do clima frio”, é a explicação do guitarrista da Identidade e baixista do Júpiter Maçã, Lucas Hanke, para que a cena rockeira de Porto Alegre remeta tanto aos clássicos britânicos. Também, não era preciso nem dizer. O DVD dos Rolling Stones, que servia de trilha para nossa conversa, deixava evidente a influência sessentista. Difícil é enumerar os “culpados” que originaram a tradição de se fazer rock and roll na cidade. Há indícios de que, em 1967, só em Porto Alegre, havia uma centena de bandas que bebiam na fonte dos Beatles. Entre elas, os precursores do Liverpool, obviamente, muito influenciados pelo rock and roll que surgia na Inglaterra. Depois disso, vieram Musical Saracura e Bixo da Seda, em idos dos anos 70, que também carregam boa parte da responsabilidade. Porém, os inspiradores e mais lembrados pela última geração porto-alegrense são os oitentistas do TNT e Cascavelletes. Mas o que essas bandas deixaram de “herança” para as gerações posteriores? Justamente a vontade de tocar: “dentre vários fatores, elas serviram como influência pelo fato de ver uma banda tocando no palco e querer fazer o mesmo”, relata, por experiência própria, o baterista dos Faichecleres, Tuba. A banda, que apesar de ter sido formada em Curitiba, é composta por gaúchos, é muito presente na cena local. Mas como tudo começa? Bem, depois de um apanhado de referências, e unidos pelos mesmos ideais, grupos de amigos começam a formar as bandas. Dessa forma, ocorre a proliferação da cena que se dá de maneira natural, onde todos se conhecem. A única distinção entre músicos e público só é percebida na hora em que alguns sobem ao palco e empunham seus instrumentos. As festas e shows do pessoal do rock sulista são assim mesmo, caracterizadas por um clima de grande família. Mas isso não é de hoje. O jornalista Mauro Borba, no livro “Prezados Ouvintes (Artes e Ofícios)”, conta que, quando o músico Frank Jorge assistia aos ensaios da banda Expresso do Oriente, na década de 1980, ele se perguntava se, algum dia, tocaria em uma banda como aquela. O seu sonho era alimentado na famosa garagem da casa do músico Julio Reny, que serviu de berço para várias 53 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Divulgação/Anastácias Da esquerda para direita: Fernanda Ferreira, Claúdia Fontoura, Malizi Gonçalves, Denise Fontoura e Quênia de Moraes A voz do Rap feminino Universo IPA | Dezembro 2006 camila de moraes 54 Cultuada no Brasil, a escrava Anastácia ficou conhecida como heroína e símbolo de resistência. É uma das personalidades femininas mais importantes da história afro-brasileira. O grupo Anastácias surgiu, no Rio Grande do Sul, com intuito de mostrar sua realidade para o mundo. São seis mulheres negras heroínas que, através das letras de Rap, protestam contra a questão racial e de gênero, sempre procurando a identidade cultural do país sem desvirtuá-la. “Foi quando nós todas nos identificamos com a história de luta e garra dessa grande mulher negra chamada Anastácia, que jamais se calou e sempre lutou pelos seus ideais. É isso que o nome do grupo representa para nós”, relata uma das DJ’s do grupo, Quênia de Moraes. A banda, formada por Cláudia e Denise Fontoura, Fernanda Ferreira, Carla Joseane Padilha, Malizi Gonçalves e Quênia de Moraes, representa a nova versão desse movimento. São mestres de cerimônia (MCs), mestres do toca-discos (Dj’s) e grafiteiras que difundem seus pensamentos e indignações. Gurias que trilharam um caminho diferente no movimento Hip-Hop. Criada em 1999, a primeira formação tinha dez meninas, que costumavam sair juntas. As adolescentes de atitude que, com base na história de vida de seus familiares, principalmente das mulheres que lutavam contra todo o tipo de discriminação, vêem, no Rap, um espaço para falar sobre temas que norteiam seus caminhos. “O Rap te dá essa possibilidade de falar abertamente sobre esses temas. E é necessário que nos utilizemos dele. Precisamos deixar bem visível que o racismo existe no Brasil e mata, assim como o desrespeito e agressão à mulher. Matam pessoas, sonhos, oportunidades e a dignidade”, relata a MC Denise Fontoura. Através das músicas, tentam passar valores aprendidos na trajetória de vida. Segundo Ferreira, Anastácias serviu de exemplo para muitas pessoas. Com esse ideal, as garotas conquistaram um importante prêmio de Rap nacional, o Prêmio Hutus 2003, na categoria melhor música demonstração (demo) feminino, colocando o Rap gaúcho em alta. A experiência de ser reconhecidas, e ter o trabalho divulgado nacionalmente, ocasionou mudanças na rotina das “gurias do Sul”, que mudaram para a capital carioca. Lá fizeram algumas apresentações no Canecão e no Circo Voador. Também participaram da coletânea Made in Brasil, do selo norte-americano Wordsound. Gonçalves comenta que o prêmio projetou o grupo e que, apesar de todas as dificuldades enfrentadas, foi um momento único. Não podiam perder a oportunidade. As meninas têm projeto de gravar um CD demo com cinco músicas e vender shows para ter uma apresentação de qualidade e pagar as passagens, pois metade do grupo mora no Rio Grande do Sul e a outra, no Rio de Janeiro. Mesmo assim, o grupo continua a trajetória de resistência com a força de suas referências. Compõem esse repertório os mais diver- sos nomes da black music, soul, r&b, charme, Rap e samba, como Dona Ivone Lara e Cartola, além de seus familiares. Dizem que é preciso saber da onde se vem para saber aonde se vai: “identidade é necessário. Ponto de partida África, meu povo originário, resgatando referências, esbanjando orgulho. Não vendo, não troco minha cultura, meu mundo” (Letra da música Identidade). O Rap feminino passou por algumas situações de boicotes, fofocas e inveja, mas isso foi superado com o talento. Encontra, através das letras, espaço para expressar seus sentimentos perante a sociedade. É o que diz a letra de Identidade: “desde pequeno, negritude é sinônimo de macacada. Essa é a tática pra subjulgar, mas temos a nossa arma de força para lutar, para defender nossa afro-descendência, nosso jeito de ser. Igualdade de condições é o que a gente quer.” Fontoura acredita que, como a sociedade, o movimento Hip-Hop também enfrenta preconceito. O machismo e o racismo são alguns exemplos: “é necessário um debate longo sobre esse tema”, diz Moraes. Anastácias são jovens mulheres negras que traçaram o seu destino. Passam a atuar na sociedade com outro olhar sobre questões de gênero e raça. Gaúchas que não se contentaram com a realidade imposta e resolvem ir atrás de suas perspectivas através dos quatros elementos do movimento Hip-Hop que carregam no coração. São as garotas do grupo de Rap do Rio Grande do Sul e hoje para o mundo: “Anastácia não se deixou escravizar”. Roberto Menescal e Carlinhos Lyra na praia de Ipanema, berço do movimento bossa nova no Brasil A fusão: Samba e Jazz O que rola em POA Na década de 1950, no Rio de Janeiro, um grupo de jovens, insatisfeitos com a música e os cantores de até então, queria fazer uma música diferente, que seria a miscelânia do samba com o jazz americano. Ronaldo Bôscoli, Roberto Menescal, Carlinhos Lyra e os irmãos Castro Neves foram precursores do movimento bossa-novista. Porém, quem solidificou a “batida bossa nova” foi o baiano João Gilberto, criador de uma batida violonística totalmente diferente de tudo que havia sido feito até o momento. O marco para a bossa nova foi o lançamento do LP “Canção do Amor Demais”, de Elizete Cardoso, em 1958. O disco era todo dedicado às canções de uma nova dupla que, mais tarde, seria responsável pelas mais belas canções da música brasileira: Tom e Vinícius. Em 1959, João Gilberto gravou o disco “Chega de saudade”. Em 1960, foi lançado o segundo disco: “O amor, o sorriso e a flor”. Dois anos depois, a bossa nova havia conquistado o mundo e aterrissava no Carnegie Hall, em Nova York. Cantores como Frank Sinatra, Nat King Cole, Tony Bennett, Al Jarreau, Johnny Mathis, Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan e Ray Charles gravaram bossa nova. Até Elvis gravou. “Garota de Ipanema” rivaliza, com “Yesterday” de Lennon e McCartey, na casa dos cinco milhões de execuções. “Águas de Março” é apontada, pelos americanos, como uma das dez canções do século. O músico Mário Lúcio, amante da bossa nova, sempre cantou seu estilo predileto em bares como Fascinação, Blue Eyes, Arcabuz, entre outros. Sua relação com a bossa nova é de extremo amor: “quando ouvi João Gilberto pela primeira vez, cantando ‘baiana, que entra no samba, não fica parada’, algo transformou-se dentro de mim”. Para ele, Porto Alegre precisa de um ambiente que cultue bossa nova com qualidade, constância e caráter histórico. “O choro, para mim, é a música popular brasileira por excelência, onde nossos instrumentistas trazem todo seu sentimento e virtuosismo, através de melodias executadas com competência e maestria”, afirma o produtor e divulgador do Clube do Choro de Porto Alegre, Márcio Gobato. Segundo o comerciante Luiz Alberto Noronha – frequentador da escola de samba Bambas da orgia – o samba faz parte de sua vida: “sem o samba, não dá. Nele, encontro razão para ser feliz”. Em Porto Alegre, existem lugares que aproximam-se da segmentação bossanovista, como o Bar do Nito (Rua Lucas de Oliveira); Cidade Bossa (Rua Otávio Corrêa); Se Acaso Você Chegasse e o Café Concerto da CCMQ. Para os admiradores e amantes do choro, uma passada no Clube dos Caixeiros Viajantes, onde o regional do Clube do Choro se apresenta toda quinta-feira, é indispensável. Universo IPA | Dezembro 2006 O Brasil é o país do futebol. Único pentacampeão mundial, país de Pelé, de Garrincha e dos Ronaldos. Tem o nome sempre associado ao esporte. Será que futebol deve ser considerado o único motivo de orgulho para o povo brasileiro? Parece ser! Mas existe outra manifestação que credencia o Brasil como modelo a ser seguido e admirado internacionalmente: a música! Aqui é que ela parece não ter o devido reconhecimento. Talvez seja o complexo de vira-lata, descrito por Nélson Rodrigues, no qual só se enxerga o valor do que vem de fora. Três estilos musicais são reconhecidamente produtos “made in Brazil”. Dois deles surgiram por volta da metade do século 19, e o outro em meados do século 20. São eles: choro, samba e bossa nova, os quais podem ser considerados como ramificações um do outro, pois se aproximam muito. O choro é oriundo da mistura de ritmos europeus, principalmente da polca, com o africano lundu. Chegou ao Brasil, via Rio de Janeiro, a partir da abolição do tráfico de escravos, que fez a cidade crescer e melhorar. Surgiu uma classe média urbana, composta de funcionários públicos e pequenos comerciantes e, majoritariamente, por afro-brasileiros, o que forneceu não só a mão-de-obra ao choro, mas, também, o público consumidor desse tipo de música. Não existe uma data certa do nascimento. Para alguns pesquisadores, o período pode ser compreendido entre 1850 e 1870. O flautista Joaquim Antônio da Silva Callado é considerado um dos criadores do choro. Apesar de ter morrido cedo, aos 32 anos, foi decisivo para a fixação do gênero. Incorporou, ao solo de flauta, dois violões e um cavaquinho, que improvisavam livremente em torno da melodia. A maior parte dos brasileiros não sabe, mas existe o dia nacional do choro, 23 de Abril, data de nascimento de Pixinguinha, comemorado com reverência em países como França e Japão. O samba, para alguns pesquisadores, surgiu na Bahia. A palavra “samba” foi mencionada, pela primeira vez, em 1838, na revista pernambucana Carapuceira, e serviu para definir, como uma coisa só, vários tipos de música e de dança introduzidos, pelos negros escravos, no Brasil. O maxixe, o lundu e a modinha foram fontes que originaram o ritmo. O samba-amaxixado “Pelo telefone”, de Donga e Mauro de Almeida, é considerado o primeiro samba gravado. especial cultura Arquivo Pessoal Daniel Freire es pec i a l c u ltu r a Música made in Brazil 55 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Terra de chimarrão, erva, Vinicius Silveira toca, em bares, desde os 16 anos Leonel Tedesco Universo IPA | Dezembro 2006 Amanda Porterolla 56 Em 1978, Raul Seixas dizia que o diabo é o pai do rock. Mas até mesmo o Maluco Beleza sabia muito bem que o rock n’ roll é filho de um outro cara chamado blues. Entretanto, tudo isso tinha sido dito muito antes por Muddy Waters: “o blues teve um filho e o nome dele é rock n’ roll”. No Rio Grande do Sul, as bandas de rock da década de 1980, como Garotos da Rua e TNT, utilizavam elementos do blues em suas composições. Mas por volta da década de 1990 é que o blues gaúcho deu um salto e começou a ficar um “negócio sério”. O guitarrista Solon Fishbone foi um dos primeiros a fazer blues no Estado. Antes de ter a própria banda, tocava com o irmão, Andy Rodrigues, na Blues Makers. Em 1994, Solon Fishbone y Los Cobras gravaram o primeiro álbum, “Blues from Southlands”, que vendeu mais de 10 mil cópias. Em 1996, Fishbone alcançou reconhecimento nacional com o álbum “Heart & Soul”, produzido por Charles Gavin, baterista dos Titãs. Partiu para os Estados Unidos, em 1997 e, em 1998, para a América do Sul, onde conheceu o ar- gentino Adrian Flores. Com essa parceria, houve vários shows, pelo Brasil, com artistas afro-americanos como Phil Guy e John Primer. Em 1999, lançou “Blues Galore”. O último trabalho de Fishbone, “Instrumental Mood”, foi lançado em 2004 por um selo independente. Fernando Noronha também é um nome conhecido entre os apreciadores do blues gaúcho. Acompanhado pela banda Black Soul desde 1995, gravou seis discos e se apresentou pela Europa, América do Sul, e América do Norte. O seu último álbum é “Bring It”, lançado em 2005. Fernando Noronha e Black Soul trabalharam ao lado de grandes nomes como B. B. King, e os irmãos Phil e Buddy Guy. O gaitista Andy Boy participou da faixa título do primeiro álbum de Fernando Noronha, “Swamp Blues”, de 1997, e se apresentou com Solon Fishbone. Em 1996, Andy Boy e sua banda, The Blues Planets, participaram do CD “Blues 4POA”, uma coletânea com quatro bandas de blues de Porto Alegre, que ganhou o Troféu Açorianos em 1997. Foi no CD “Blues 4POA” que outro bluesman gaúcho apareceu na cena. Vinicius Silveira, que tocou ao lado de Fishbone, Fernando Noronha e do carioca Celso Blues Boy, tem quatro discos gravados, sendo o segundo, “Slidin’ n’ Harpin”, uma parceria com Andy Boy. “No blues, tu encontras muito mais do que a canção. São músicos que se dedicam porque gostam e as pessoas gostam porque sabem que o artista faz aquilo de coração”, afirma Silveira. Seu último trabalho é o álbum “12 Bar Blues”, lançado em 2004. A dupla Gaspo Harmônica e Oly Jr. também possui estrada. Lançaram o CD “Na capa da gaita”, cujas músicas estão disponíveis no site www.nacapadagaita.com.br, e estão com o segundo álbum gravado, com lançamento previsto para o primeiro semestre deste ano. O novo trabalho conta com a participação do harmonicista chileno Gonzalo Araya. Segundo Gaspo, os novos singles também vão estar no site. O blues não pára Outros nomes estão conquistando o seu espaço na cena gaúcha. É o caso da Walking Blues, formada em 2001, pelo guitarrista André Tubino. Após diversas formações, a banda conta hoje, na guitarra, com André Tubino, no vocal, Fernando Caminero, no baixo, Sérgio Selbach, nos teclados, Germano Paranhos e, na bateria, Jaques Trajano. Glaucia Civa e Marina Garcia fazem participações nos shows, dividindo os vocais de algumas músicas com Caminero. O responsável pela harmônica era o gaitista Alex Pardal, que saiu do grupo. “Quando o Pardal entrou, partimos para o West Coast Blues, ele foi muito importante para a banda”, diz Tubino. A Walking Blues tem uma faixa gravada no CD “Música na Casa 2005”, da Casa de Cultura Mario Quintana, que sairá no início deste ano. Também gravaram um CD de releituras com nove músicas, e pretendem lançar um álbum com músicas próprias. As músicas e o clipe da banda estão disponíveis no site www.walkingblues. com.br. Os guris abriram o show de Phil Guy, no Opinião, e de Greg Wilson dos Gabriela Di Bella Harmônica e Oly Jr. gravaram o CD “Na Capa da Gaita”, e vão lançar um novo trabalho em 2007 O nome “Azambujas” faz referência à Rua Azambuja Fortuna, em São Leopoldo, onde rolam os ensaios Pedras na estrada Viver de música é difícil, viver de blues então, nem se fala. Ainda mais no Brasil, terra de samba e futebol. Mas a cena gaúcha se mantém ao longo dos anos. Para Mutuca, apresentador do programa Hot Club do Mutuca, na rádio Ipanema FM, cada grupo de músicos deve batalhar por si mesmo. Silveira afirma que, no seu caso, dá pra viver de blues: “como toco sozinho, consigo tocar em lugares menores”. Ele é só- “Tem pessoas que chegam pra mim e dizem: cara, eu não sabia que isso é que era blues”. ruz aC d es err el T ni Da Banda Walking Blues, aindana antiga formação, com o harmonicista Pardal (de chapéu) Universo IPA | Dezembro 2006 Blues Etílicos, banda de blues do Rio de Janeiro, além de jams com Adrian Flores, Gonzalo Araya, e Andy Boy. Outra banda, que não poderia ficar de fora, é a Azambujas Blues Band, de São Leo poldo. Com Alice Azambuja nos vocais, a banda é formada por Arno na guitarra, Marcelo Walking Bass no baixo, Mário na harmônica, e Feijão na bateria. A banda tem um CD demo, “Passá o chapéu”, com três músicas próprias e releituras de Jimmy Reed e Steppenwolf. O nome “Azambujas” é uma referência ao nome da rua onde a banda ensaia. cio de Fishbone na Guitar Garage, uma loja que vende, troca e conserta guitarras, onde Silveira dá aulas de violão e guitarra. Há o problema da falta de espaço para as bandas. “Tem um pessoal que toca por hobby e aceita qualquer preço. Isso toma espaço de quem quer viver da música”, afirma Gaspo. Também há casas de shows que contratam uma única banda para tocar uma vez por semana, ao invés de dar espaço para bandas diferentes. “A gente toca mais no interior do que em Porto Alegre ou São Leo poldo”, diz a vocalista da Azambujas Blues Band. “O que mais nos incentiva é saber que o público tá aumentando e sai alegre do show. Já tocamos para cinco pessoas e até para nenhuma. Não pode botar dinheiro à frente do blues”, relata Caminero. Para Tiago Kautzmann, apresentador do programa Madrugada Blues, na rádio Unisinos FM, o blues sempre vai ter ouvintes. “Tem pessoas que chegam pra mim e dizem: cara, eu não sabia que isso é que era blues”, explica Caminero. Ele acrescenta que muitos têm a idéia de que blues é uma música triste. Quando, na verdade, o que falta é conhecimento. Há blues animados, pra dançar e se divertir. “O blues, por aqui, foi muito caracterizado como um som de elite. A nossa idéia sempre foi levá-lo para toda a massa. Sinto-me igual tocando na vila ou num hotel cinco estrelas. A felicidade de fazer um som é a mesma”, afirma Azambuja. Gaspo diz que muita gente não gosta de blues porque nunca ouviu. Mas é Caminero quem resume a história: “tu não escolhe tocar blues, tu é escolhido. Quando tu vê, já tá no blues”. especial cultura Giovani Paim es pec i a l c u ltu r a bomba e... blues, tchê! 57 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Universo IPA | Dezembro 2006 58 No desligar das luzes, começa o espetáculo. Na telona, imagens que fascinam os olhos. O cinema, em Porto Alegre, surgiu em 1896, com a primeira exibição projetada pelo “cinematógrafo” A sessão vai começar... Bom filme! Fotos: Claudia Jobim Claudia Jobim “Eu lembro que, nos meus tempos de juventude, ir ao cinema era muito mais segurodo que agora e muito mais barato também. As matineés de domingo passavam filmes de verdade e não essas modernidades, filmes pra encantar, emocionar e conquistar as moçoilas”, conta o aposentado, Adamastor dos Santos, 83 anos, ao relembrar, principalmente, o Cine Coral, responsável por boas lembranças da juventude. Na sua opinião, é muito difícil Porto Alegre ter de volta todo aquele glamour do cinema de rua, diante de toda a tecnologia que ainda pode aparecer. Tudo isso porque, hoje, as pessoas têm preferência por suas casas e seus aparelhos de televisão cada vez mais modernos. Assim como os cinemas de calçadas se extinguiram, os de bairro também não são escolhas para muitos habitantes da capital. O Baltimore é apenas mais um que dá seqüência à extinção dessas salas. Criado na década de 1930, o cinema estava localizado no Bairro Bom Fim e possuía quatro pavimentos. Quem foi o verdadeiro vilão para o assassinato em série das salas? Hoje, os melhores cinemas estão nos shoppings de Porto Alegre. Se você quer conforto e, ao mesmo tempo, segurança, eles oferecem isso e muito mais, mas com preços que fazem jus ao que propõem. As “regras” mudaram muito de uns tem- Cine Teatro Coliseu, inaugurado em dezembro de 1910 Bilheteria de um dos cinemas localizados dentro de um shopping da Capital pos para cá. Até meados de 1990, era possível entrar no meio da sessão, ficar e esperar o filme terminar, continuar na sala até começar a outra, para você assistir à metade que ainda não havia assistido. Hoje, você é convidado a se retirar. Mas só os shoppings são os responsáveis? E a era tecnológica que está sendo imposta? Aparelhos de TV de plasma é a nova moda no mercado e, para alguns, é possível montar seu próprio cinema em casa. Quem vai querer pagar uma sessão de R$12 no fim de semana se pode alugar um DVD na vídeo locadora mais próxima, que sai mais barato, e ainda comprar pipocas, refrigerante, chocolates, balas, enfim, tudo o que você pode encontrar na bomboniere dos cinemas? Assistir ao filme no conforto do seu lar, desfrutando da companhia de seus amigos ou Anúncio do Cine Teatro Coliseu, 1910 até mesmo daquele alguém especial. O Cinema sempre teve um lado romântico. Parece ser o local ideal para marcar encontros e também iniciar um namoro. As sessões da meia noite do Cine Avenida, Guion, o GNC do Shopping Praia de Belas e o Unibanco Artplex, que, em alguns lançamentos, faz a sessão da meia-noite aos sábados, acabam se tornando atrativos para o público, casais na maioria. De acordo com a jornalista e professora na FAMECOS, Susana Gastal, “Porto Alegre é a cidade, do país, com o maior número de salas de cinemas de variados estilos. Gente de todo lugar vem a Porto para apreciar a Cinema Central, inaugurado em março de 1921 Conforto e segurança Na década de 1970, as salas de calçada desapareceram por completo. Isso porque os ingressos se tornaram caros com o avanço tecnológico. O público se tornou mais segmentado, apenas a elite freqüentava o cinema. De acordo com a obra de Fabio Augusto Steyer, “O Cinema em Porto Alegre: 19861920”, as salas, que antigamente tinham até cinco mil lugares, diminuíram, gradativamente, o número de cadeiras por não haver maior demanda de espectadores paras as sessões. A grande mudança é o surgimento de salas com 200 a 300 lugares. Esse acaba sendo o perfil das salas que migraram para os shoppings. Por mais que esses sejam um dos motivos para a invasão dos cinemas nos shoppings, é preciso saber que, com essas mudanças, o número de contratações para se trabalhar nas casas cinematográficas reduziu consideravelmente. Antes, os cinemas empregavam muito mais pessoas do que hoje. Em 1913, trabalhavam, no Recreio Ideal, no mínimo, umas 15 pessoas: um gerente, dois operadores, um ajudante de operador, um bi- ciso se planejar para ir ao cinema. “Estamos em uma época em que os Centros Culturais estão na moda. É possível assistir a um bom filme, tomar café, contemplar mostras de arte e, até mesmo, realizar uma boa leitura. O cinema deixa de ser uma atividade isolada e passa a dividir espaço com outros atrativos de lazer”, comenta Gastal. No livro “Salas de cinemas: cenários porto alegrenses”, Gastal analisa a evolução do cinema na capital gaúcha e, também, comenta sobre o estado de alguns deles até o fechamento. “Tinha salas em que era preciso colocar os pés na poltrona, que não eram poltronas, mas sim cadeiras de última, porque corria água”, recorda. fatos históricos Projetor para filme de 16 mm da década de 1940. Museu Hipólito José da Costa - O cinema, na capital, surge em 1896, com a chegada do cinematógrafo. Patenteado pelos irmãos Lumière, o aparelho foi trazido pelo fotógrafo Georges Renoulean, responsável por uma das primeiras exibições de cinema na cidade. - A Rua dos Andradas ficou conhecida como o ponto de encontro para as demonstrações de imagens em movimento: a famosa Cinelândia. - O público era aquele que estava nas grandes feiras industriais e comerciais, festas religiosas, circos, teatros e cafés. Em todos os lugares em que o cinematógrafo passou, emocionou, assustou e surpreendeu o povo gaúcho. - Na metade do século 20, as sessões de cinema, na capital, eram realizadas por cinematógrafos ambulantes. - Havia locais destinados a projeções do cinematógrafo. O principal era o Theatro São Pedro, considerado o mais importante espaço cultural da época. Ele caracteriza um período em que Porto Alegre era considerada um centro cultural, por onde passavam várias companhias de teatro e ópera. - O Teatro Parque, localizado no Campo da Redenção, atual Parque da Redenção, foi inaugurado na Exposição Estadual de 1901, ano em que, segundo o historiador Jesus Pfeil, houve a feira de industriais e comerciais. Universo IPA | Dezembro 2006 variedade cultural que a capital gaúcha tem a oferecer”. Enquanto houver público que ainda goste de presenciar um bom filme e dividir essa alegria com outras pessoas, as salas vão existir. Só é preciso que o público queira conviver socialmente com outras pessoas e compartilhar o momento mágico que acontece, nas salas, com os movimentos no telão. lheteiro, dois porteiros, um maestro e mais os músicos da orquestra. Atualmente, cada sala gera cerca de cinco empregos. A divisão das salas por módulos, que ocorreu com o passar dos anos, exigia poucos funcionários. A cada três ou quatro cinemas, há uma cabine de projeção, onde dois funcionários podem tomar conta. O bilheteiro é igual como antes e isso apresenta baixo custo para o cinema. A principal propaganda, para promover as multisalas, era que, a qualquer hora, teria uma sessão. Você poderia chegar ao local, em qualquer horário, que o filme começaria na mesma hora. Mas, na realidade, não foi isso que aconteceu. É pre- Cine Teatro Rex, 1936 especial cultura Anúncio do Cinema Popular, 30 de agosto de 1931 es pec i a l c u ltu r a Cinema Capitólio, 1928 59 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra anonimato Em muitos lugares do Brasil e do mundo, há um jovem aprendendo a sustentar a primeira nota musical, seja qual for o instrumento. Logo após, muitos decidem montar uma banda ou apenas marcar um som com os amigos para se divertir. A idade básica para formar uma banda, geralmente, é na faixa dos 13 aos 21 anos, onde o jovem músico tem em mente ensaiar (com ou sem compromisso), gravar, fazer shows ou apenas se distrair. Segundo informações encontradas na maioria dos sites de formação de banda, nunca é tarde para começar. As bandas Alto Vox (rock) e Pancada de Vaneira (tchê music) foram formadas em 2006 e, mesmo com os diferentes estilos musicais, têm quase os mesmos problemas. A aparelhagem é ruim, a desorganização é grande e muita vontade de fazer o melhor, mas sem saber como. A Alto Vox diz que a maior dificuldade encontrada em montar uma banda é “descobrir” pessoas com a mesma sintonia musical. Relatam que os desentendimentos são o que mais leva uma banda a acabar. O grupo de rock relata que, há pouco tempo, produziu uma demo (música demonstração), mas que a qualidade ficou a desejar, tendo em vista que a gravação seria ao vivo no estúdio, o que diminuiria o custo de produção. Eles estão pensando em uma nova gravação. De acordo com os integrantes, ela terá mais qualidade. Enquanto isso, os meninos da Pancada de Vaneira, com a tchê music, contestam que são impedidos pelo tradicionalismo de tocar em CTGs. Relatam que o melhor show foi realizado no Parque Harmonia, neste ano, onde puderam expor o trabalho de uma forma organizada mostrando resultados positivos a um grande público. Ao contrário dos roqueiros, o grupo ainda não produziu as suas músicas, Bandas novas buscam a divulgação do trabalho através da internet. E gravadoras com futuro incerto procuram novas alternativas Universo IPA | Dezembro 2006 Natascha Montier 60 mas tem projetos para sua composição. O guitarista da Pancada de Vaneira, Jairo Wolff, revela que, em sua antiga banda, gravou um material de demonstração e que aconteceu o mesmo problema de qualidade da Alto Vox. Os sites, também, são meios de divulgação, o que é imprescindível para uma banda. As bandas entrevistadas têm essa noção. Estão montando páginas na web, para divulgar o trabalho, como é o caso da banda de metalrock, Guynevere, que tem como meta conquistar o coração de uma gravadora, mesmo sabendo das dificuldades encontradas na hora da contratação. “Acho que vão gostar do projeto, mas talvez tenham que escutar mais vezes para quererem investir”, é o que diz o guitarrista do grupo, Leonardo Moura. O produtor-musical e baterista da Rosa Tattooada (banda de hard rock que fez sucesso, em todo Brasil, no início da década de 1990, e chegou a abrir o show do Guns N’ Roses, em 1992, em São Paulo), Beat Barea, ainda lembra o tempo em que as bandas iam para um dos poucos estúdios que existiam, na época, para gravar as músicas em um rolo de fita que, depois, era gravado para a fita K7 e o Long Play (LP). Barea recorda, também, que conseguir uma boa qualidade de gravação independente era muito complicado. Porém, a facilidade de locomoção em busca de uma gravadora era mais fácil, pois a nostalgia e o mercado da época era mais acessível. Para onde vai a música? O guitarrista, Israel Fontoura, da banda Alto Vox Renato Brasil Entre o palco e o Renato brasil O rumo da música demonstra uma certa insegurança, pois muitos estilos e tendências foram surgindo, desde a música clássica até o rock and roll. Novas tecnologias vêm se aprimorando. Em meio século, rodamos do LP, para a fita K-7, Compact Disc (CD) e, agora, a mais nova moda: o Mp3 Player. O Mp3 parece mesmo estar tirando o sono das gravadoras aqui do Sul. Ele pode fornecer 1 GB (giga byte) de espaço, ou seja, mais de 500 músicas em um pequeno aparelho portátil. As grandes gravadoras nacionais estão utilizando suas últimas forças, com a venda de músicas em formato Mp3, para download, em seus sites. O preço varia de R$ 0,99 a R$ 2,50. Isso tudo para reparar os gastos financeiros com o artista em vendas de CD e divulgação. De acordo com Barea, as gravadoras, não só aqui do Sul, mas no país inteiro, estão a beira de um colapso. O maior motivo é a pirataria: “vai chegar um momento em que a gravadora não irá mais arcar com o gasto, em um estúdio de gravação, para o artista. Ela apenas funcionará como um selo de distribuição”, (repetido), explica Barea. Isso ocorre porque a gravadora tem um gasto enorme na hora em que os artistas contratados gravam. Dessa forma, acabam não tendo dinheiro suficiente para realizar a promoção e marketing do trabalho. E, se a divulgação é baixa, a venda de CDs também será baixa e com preço indesejável: “daqui a uns anos, os novos artistas irão gravar seus álbuns em seu próprio estúdio caseiro. E, se atingirem uma qualidade boa e o mercado for apropriado para essa tendência sonora, a gravadora apenas irá funcionar como selo de divulgação”, diz Barea (repetido). Ele afirma que, por um lado, a Internet ajuda muito na divulgação do artista, mas atrapalha demais nas vendas. E que, no momento, não existe uma solução para isso, a não ser que as pessoas sejam mais conscientes ao fazer download ao invés de ir a uma loja comprar o disco do seu artista preferido. tal. Desde a tecnologia de ponta até o lápis que você usa. As coisas legais que fazem no Oriente refletem aqui, pois lá o sol nasce primeiro. Chegando de mansinho, os japoneses garantem a inserção da sua cultura em todos os aspectos, a começar pela “tecnologia japonesa” bem conceituada por aqui. Filmes como “Os sete samurais”, de Akira Kurosawa, que ganhou o Leão de Prata do Festival de Veneza (1954), os mangás, a fi- especial cultura O que vem do Oriente é utilizado no mundo ociden- es pec i a l c u ltu r a Monique Hoffelder losofia e as artes marciais despertam a curiosidade e o interesse pelo misterioso mundo oriental. Quanto mais se estuda, mais enigmático ele se torna. Os eventos culturais despertam o interesse da população pela cultura oriental. Torna-se mais evidente o aparecimento de descendentes de japoneses em comerciais, programas de televisão, rádios, telenovelas e música. Basta caminhar pela cidade para notar seja nos gráficos, revistas, ilustração de livros, imagens vinculadas à publicidade, design de ambientes, nas novelas, nas técnicas de medicina, nos esportes, no Flit (arte de grafite inspirada em gráficos orientais). No cinema de Hollywood, os atores japoneses de figurantes passaram a protagonistas. Estampas kanjin nas camisetas e outdoors colaboram para as difusões culturais nipônica, que vai além do consumo e leva, em alguns casos, a aprofundar-se nos mitos, filosofias e conhecimentos da cultura japonesa. No mundo globalizado e capitalista, alguns valores e características culturais se perderam. No Oriente, a consciência ecológica levou o Japão a fabricar o primeiro carro com motor Hibrido. O país do shinkansen (trem bala), após a guerra, se desenvolveu com a mesma velocidade que inventaram as tecnologias de ponta. Até a pop star Madodo último álbum. A que se deve todo esse sucesso de um pequeno país com grandes valores culturais? Analise as notáveis evidências. A grande conquista cultural do pequeno arquipélago Universo IPA | Dezembro 2006 na adotou elementos da cultura oriental nos clipes 61 cultura esespecial pec i a l c u ltu ra Manifestação cultural Universo IPA | Dezembro 2006 Destaques 62 No meio artístico, cada vez mais se vê pessoas de olhos puxados. No teatro, na música e cinema há mais participações. A desmistificação da cultura oriental é evidente no Brasil. Os japoneses ganharam confiança para pôr em prática projetos e mostrar a face oriental sem ser motivo de piadas do tipo “abre o olho, japa”. Nos nomes de destaque, a atriz Juliana Kametani, a Suzi da novela Belíssima, ganhou mais espaço no folhetim. Sabrina Sato, ex-Big Brother, participa do programa Pânico da rádio Jovem Pan. Daniele Suzuki, a Miyuki em Malhação, apresenta um programa na Multishow e participou do filme Woman On Top (2000), com Penelope Cruz no início da carreira. O tenista Hugo Hoyama conquistou o Pan-Americano, Hexa Campeão Latino e Sul-Americano. Há também o guitarrista Mauro Motoki da banda Ludov, além do baixista das bandas CPM22 e Hateen, Fernando Takara. “Minha trajetória, de menino tímido a baterista de banda de rock, é exemplo de que os descendentes de orientais querem, tentam e estão se integrando à sociedade brasileira. Depois que me tornei bem sucedido no trabalho, todos passaram Monique Hoffelder Os imigrantes japoneses não trouxeram ao Brasil apenas o sonho de fazer fortuna e ser dono de um pedaço de terra. Trouxeram rituais, crenças e folclore, como Akimatsuri, festa de outono, celebrada por imigrantes e descendentes, na Colônia Japonesa de Mogi das Cruzes e Alto Tietê. Com o centenário da imigração no Brasil, os organizadores da festa pretendem realizá-la em local com maior capacidade. O Festiva Yosakoi Soran, segundo o diretor do evento, Francisco Sato, os primeiros participantes da dança eram descendentes de japoneses e, no grupo do Paraná, não há descendentes. Apreciado pelos ocidentais, foram incorporados o bonsai (árvore em bandeja), a prática de ikebana (a arte japonesa de arranjo floral), o origami (técnicas de dobraduras em papel), praticado em escolas para concentração e criatividade das crianças, e o kirigami (técnica de fazer cartões com cortes e dobraduras no papel). Outro elemento incorporado na cultura brasileira é o haiku, haikai ou haicai (poesia curta, 17 sílabas e três versos). Há praticantes de diversos idiomas, e foi introduzido no Brasil, em 1903, por Oliveira Lima, internacionalizado na tradução “Sendas de Oku”, de Matsuo Bashô (1644-1694), por Octavio Paz, Wenceslau de Moraes e Afrânio Peixoto. Os escritores gaúchos Érico Verissimo, Mario Quintana e Ricardo Silvestrin incorporaram haicai nas suas obras. a me respeitar. Até demais às vezes”, compara o baterista Japinha, que também se divide entre as bandas bandas CPM22 e Hateen. “A maioria dos descendentes sabem fazer bom uso da etnia e virtudes de ser oriental. Adoro ser o Japinha. O fato de ser mestiço ajudou a ver os dois lados”, confessa. O Japão está na moda Alguns estilistas japoneses revolucionam a moda mundial, nas passarelas, há 20 anos, a Rei Kawakubo, Yohji Yamamoto, Kenzo, Issey Miyake, Takashi Murakami, fez o design de bolsas para Louis Vuitton, a nikkei brasileira Érica Ikezili. O francês Paul Poiret, em 1914, inspirou o design de suas roupas no Oriente. Na literatura, o fenômeno mundial Banana Yoshimoto, com linguagem simples, lançou, com 22 anos, Kitchen, Japão (1988) e conquistou vários prêmios e traduções. Até no impenetrável mercado norteamericano a cultura japonesa teve forte influência. Uma referência é O Lobo solitário, Japão(1970), que chegou ao Brasil em 1988. Saga do Japão feudal influenciou Frank Miller, escritor de Batman-Cavaleiro das Trevas, levou a obra aos Estados Unidos. É a primeira obra japonesa traduzida para inglês. Influenciou Saga, Wolverine - Dívida de Honra, Demolidor, e Elektra. Tarantino em Kill Bill II faz referências ao Lobo: “há influência nipônica no mercado americano que é restrito a coisas estrangeiras, assimilam a cultura de quadrinhos, a produção de animação. Os estúdios Disney sofreram influência de mangá no filme O Rei Leão, que é plágio descarado do personagem japonês Kimbar. É um universo rico”, diz o ilustrador e cartunista Jeferson Vieira Barboza. Inspirado em publicações da década de 1990 de Lobo Solitário e Akira, Ed. Globo, dá cursos de quadrinho há 12 anos. Gueixas e samurais Desfazendo mitos, Paulo Gick protesta: “Nunca uma gueixa deixaria suas pernas a mostra, jamais usaria kimonos extravagantes, como uma rameira. Além do filme ser feito com atrizes chinesas”, Diz Gick, sobre o filme Memórias de uma Gueixa, de Rob Marshall, adaptação americana sobre gueixas. Direto da fonte, o filme A Música de Gion, de Kenji Mizoguchi (1953), narra o aprendizado de uma jovem de Kyoto para se tornar gueixa. O mestre samurai e médico Jorge Kishikawa, assistiu duas pré-estréias do filme O Último samurai, uma com brasileiros, outra com japoneses e viu o diferente ponto de vista das culturas. “Em algumas cenas, brasileiros riram e não havia menor graça, outras, os japoneses derramaram lágrimas e os brasileiros não perceberam nada. Mas confesso que, algumas vezes derramei lagrimas sozinho”. Kishikawa fundou o instituto Niten, dissemina o Kenjitsu, estilo de duas espadas criado pelo mestre Miyamoto Musashi, (1584? 1645). Aprendeu com seu pai, mestre samurai Yoshi Kishikawa no bairro Liberdade, São Paulo. Faz do Bushidô doutrina de vida, busca perfeição em tudo que faz. Os Samurais protegeram o Japão por mais de 700 anos, deixando um legado de honra e coragem que influenciou a cultura japonesa. vencedores da guerra, o Japão adotou a cultura americana no pós-guerra. Desatando alguns laços da cultura oriental, refletindo, na juventude, conceitos estéticos: “os jovens japoneses não têm imagem definidas deles mesmos. Querem se libertar de semelhanças, abraçando o diferente e exótico”, diz o médico de psiquiatria adolescente, Ken Ohira. O primeiro indício de ocidentalização aconteceu no periodo Kokugawa, com o fim dos samurais. No visual key, os jovens buscam expressão visual diferente, para resgatar a individualidade, assim como os samurais buscavam manter sua supremacia frente à ordem de serem padronizados. A insatisfação com a semelhança coletiva leva muitos japoneses a fazer operações plásticas para ter dobrinha nos olhos como os ocidentais, além de cirurgias no nariz e bronzeamento artificial. As mudanças são sentidas com mais intensidade em Tokyo, nas ruas dos bairros Harajuku e Shibuya, onde se encontram japoneses vestidos de uma maneira andrógina. “Com 20 anos, viram adultos, têm que trabalhar e estudar. Eles amam moda. De 16 a 20 anos, usam cabelos coloridos e acessórios gritantes. É um ato de libertação que acontece só aos domingos. Durante a semana, andam de uniformes, roupas de escola”, diz o diretor do Instituto Goethe, Reinhard Sauer. Como no Japão, fãs de visual key espalhados pelo mundo usam pseudônimo. No Brasil, é possível encontrar seguidores do estilo. Adriano da Silva (Malkav), 19, se veste no estilo Gothic Lolita, e assiste ao anime Full Metal Alshimist. Gosta de ouvir Malice Mizer, X-Japan e Larc en Ciel. Malkav prefere não apresentar o som aos amigos. Diz que pode virar moda, “quando atinge as massas, alguém critica o som. Eu não gosto que critiquem”. Da mesma maneira que escuta músicas em inglês, não vê problemas nas músicas em japonês. Para o professor José Roberto Vengardner Junior, 26, o interesse pelo Japão surgiu com Yamato, Patrulha Estelar e Cavaleiros do Zodíaco. A partir das bandas de j-rock, passou a ter contato com a moda japonesa. O visual key marca a diferença, curte estilo Gothic Aristocratic. Quando usa as roupas, em eventos, se sente bonito, diferente do dia-a-dia. Ele não usa o visual no cotidiano. As pessoas acham estranho, por ele não estar vestido como querem ver. especial cultura Nos últimos anos, surgiu, no Japão, jovens apaixonados por moda. São os “cosplays” ou “costume play”. Os fãs usam cosplay de personagens de desenho animado em Feiras de Anime. “É um momento em que você pode ser o que é, dar vida aos personagens”, disse Camila da Silva Reis, 21 anos. Ela fez cosplay de Mye-Red Mad Mye (empregada robô pequena). Filipi Miai, 19, sansei (neto de japonês) assiste animes desde os sete anos. Não teve oportunidade, mas gostaria de ir à terra do sol nascente. Ele acha que as pessoas nãojaponesas se atraem pela arte do anime pela filosofia da história e diferença cultural dos personagens. Para Miai, no anime, impera a igualdade cultural. Bruno Bruni, 17, fez quatro vezes o cosplay de Goku-Dragon Ball Z. Assiste a anime desde os seis anos. Vai aos eventos para relembrar os desenhos e participar. Cavaleiros do Zodíaco e Dragon Ball (animes de grande repercussão na TV aberta brasileira) estão entre os favoritos. O seu amigo Diorgene Belzarena, 18, fez cosplay de HyeiRagnarog e Yuyu Hakushou. Para Bruni, as feiras de anime são para se divertir: “aqui a única droga são os desenhos”. Ocidentalizado pelos Estados Unidos, es pec i a l c u ltu r a Os Cosplays e Visual Kei brasileiros Laís Micol “Descobri a animação japonesa quando tinha 12 anos, assistindo a um desenho chamado Sailor Moon. Para mim, foi amor à primeira vista”, assim, o mangá entrou na vida de Karine Himura. Mangá é um estilo de fanzine, uma forma de desenhar quadrinhos, uma linguagem narrativa e visual tipicamente japonesa em contraste com o traço ocidental. Surgiu entre 1814 e 1849. O artista japonês Katsushita Hokusai retratou cenas do cotidiano, com pessoas em situações e traços pitorescos. Essa coleção de caricaturas recebeu, na época, o nome de HOKUSAI MANGA. Assim, nasceu o primeiro trabalho que resultou nos atuais quadrinhos japoneses. O professor de desenho e história em quadrinhos, Jefferson Vieira Barboza, artista plástico autodidata, desenhista publicitário, ilustrador, cartunista, entre outras funções, acrescenta que, há muito tempo, quando ainda não existiam os animes, os japoneses tiveram a idéia de criar mangá, aqui, no Brasil, conhecido como HQ, ou seja, histórias em quadrinhos. Todos os animes, antes de ganhar animação, passaram por mangá até chegar à televisão. Muitos, como Dragon Ball, Cavaleiros do Zodíaco, e Laís Micol Pokémon tiveram muitos mangás lançados antes de chegar à telinha. Ministrando desde 1994, em Porto Alegre, o professor tem como público alvo os jovens de classe média, sendo eclético nos mangás. No Brasil, o mangá era lido pelos descendentes de japoneses, através da importação de distribuidoras. Os heróis japoneses surgiram, na televisão, em 1970, com o desenho Ultraman, na TV Tupi. Em 1984, nasceu a Associação Brasileira de Desenhistas de Mangá e Ilustrações (ABRADEMI) e, também, circulou o primeiro informativo sobre mangá. Himura relembra: “comecei a desenhar mangá sem saber o que era. Fui evoluindo e aperfeiçoando meu traço. Fiz um curso, em 2000, mais voltado à perspectiva e um curso de cartunismo que me deu noção de roteiro cinematográfico. Sempre me baseando em mangakas (quem desenha mangá), resolvi fazer uma produção independente de Start em 2006, quando ela completou 10 anos de existência”. O mangá possui as seguintes características: linguagem baseada no cinema e dramatização intensa, grande envolvimento emocional. O leitor se coloca no lugar do personagem, a representação gráfica dos sons integra a composição do desenho, e imagens em primeiro plano para aproximar o personagem do leitor. O desenho é estilizado, com olhos e cabelos de formato não-convencional, efeitos visuais no fundo para transmitir idéia de movimento ou emoção. Para Himura, deve-se educar o leitor para que não exista preconceito com esse tipo de arte alternativa. Vieira acredita que, até hoje, os mangás continuam fazendo o maior sucesso. Principalmente, porque muitos ganharam animação. Existem muitos mangás especiais, inéditos, exclusivos. Cada dia, eles se tornam mais populares. O Japão não pára de produzir mangás. Isso significa que, se todos os mangás que são lançados ganharem uma série de animação, ainda terá muitos animes daqui pra frente. Universo IPA | Dezembro 2006 A arte japonesa dos mangás 63 www.ipametodista.edu.br/sites/universoipa Rede Metodista do Sul Curso de Comunicação Social - Jornalismo convida para o evento JORNALISMO em 16 de março de 2007 | 10 e 19 horas Centro Universitário Metodista | Campus IPA | Auditório da Biblioteca Pauta JORNALISMO em Pauta