púrpuro prazer - Carlos Dignez Aguilera
Transcrição
púrpuro prazer - Carlos Dignez Aguilera
PÚRPURO PRAZER Carlos dignez Prefácio Púrpuro Prazer é, antes de tudo, uma declaração de amor à vida. Versos fortes e ousados dissecam e tratam com profundidade, às vezes até com certo sarcasmo, temas comuns a todos nós, mas que a grande maioria deixa escapar pelos vãos dos dedos frágeis do não--pensar. Salutar encontrarmos hoje, em meio à banalidade reinante do consumismo e da cultura fácil do entretenimento, homens como o poeta Carlos Dignez Aguilera, que nos presenteia com este diamante bruto, chamado Púrpuro Prazer: bruto, pela força e pela franqueza exposta a cada palavra, a cada verso, a cada mergulho passional que o leitor sentirá dentro do seu próprio peito; diamante, porque esta obra tem traços que devem desafiar o nosso tempo, na eternidade possível de nossas memórias. Ao leitor e à sua sensibilidade caberá extrair da força deste diamante a jóia oculta por cada metáfora, por cada verso desafiador, através, não meramente de uma simples leitura, mas sim de uma interação, que exigirá de cada um coragem e entrega total d’alma, para seguir a trilha dos versos do poeta e recolher suas próprias verdades. Púrpuro Prazer traz cento e vinte páginas de fragmentos de vida que Dignez, garimpeiro de emoções, recolheu durante anos na batéia da sua poesia, lavou nas águas quentes da sua ânsia clara por uma compreensão do caminhar humano e, agora, despeja em todos os olhos, às vezes conclusivamente, nos oferecendo ensinamentos para os nossos verdadeiros caminhos, às vezes confessando e dividindo com o leitor a impossibilidade da compreensão plena: “Meus braços estão vazios/ Aprendi a sonhar tão perfeitamente/ Que se fez desnecessário o sonho realizado... Ávido na incessante busca/ Avesso e incoerente/ Deliro e me desespero, febril/ Frágil arquiteto do tempo/ Que a vida me toma/ Entre porres hostis e malditos versos/ Infames escudos imaginários/ Dando guarda à minha covardia/ Ah, infante retórica/ Mergulhando fundo demais/ Para os meus frágeis pulmões”. Carlos Dignez Aguilera nos presenteia nesta obra com poesias absolutamente profundas, de uma densidade que desliza caprichosa e perigosamente pelos limites da tragédia. Em “Púrpuro Prazer”, o poema-título, o poeta retrata a assunção de um homem transtornado com a sua história de vida, com os valores sociais, confessando suas fragilidades, culminando com a incapacidade para lidar com o seu próprio cotidiano viciado, a ponto de encontrar prazer na opção absurda do suicídio, tudo traduzido de forma grave e densa: “Minha vocação para vilão/ Solta lastro e emerge do mar/ profundo/ Da inocência mal preservada/ Ensaia passos estranhos, enlouquecidos/ Numa coreografia vazia e infame/ Na falsidade do meu caminhar sobre as águas”. No mesmo poema, Dignez desfila maestria de poeta maduro, demonstrando um domínio invejável da capacidade de expressão, concluindo cada estrofe com versos insinuantes, verdadeiros achados poéticos: “Lúcido/ Ignoro pegadas cravadas na consciência (...) Ávido/ Desperto para a manhã que não construí(...) Náufrago/ Sobrevivo abraçado aos meus próprios destroços(...) Lúgubre/ Desvio olhos para uma explosão nuclear qualquer(...) Púrpuro/ O prazer se esvai... impune e suicida”. Sem dúvida, Dignez viaja por todo o seu universo temático com uma invejável competência, emprestando ao leitor o seu filosofar, busca e desafio ao conhecimento, em nome da compreensão de nossas vidas e de seus mistérios. Mas é o Dignez romântico, apaixonado, desesperado na busca pela mulher amada, pelas verdades do amor, que nos propicia pérolas de encantamento. No poema “Naufrágio”, o poeta confessa seu amor e conta o seu sofrimento: “Enlouquecido esculpi tua imagem no cume de uma montanha/ E celebrei rituais, os mais cruéis, todos os dias, todas as noites/ Até o limite do meu tempo... que não passou”. “Trôpego” mereceria a citação do poema completo, pois Dignez nos brinda com uma odisséia maravilhosa, retratando a luta em busca da mulher amada. Em “Consciência Tardia”, o poeta traduz a amargura e a dor de uma separação, de forma cortante, irradiando emoção passional: “Alerta, oculta debaixo dos tapetes enlameados/ Espiando pelas frestas da fragilidade reinante/ Nossa verdade arquiteta verbos delatores/ Entre drinques quentes e palavras frias/ Que é para não chocar nossa podridão/ Com a chegada tão tardia do adeus”. Púrpuro Prazer traz um poeta maduro, que desfila seu talento com a desenvoltura dos grandes mestres, de uma crítica social a um poema de amor rasgado, de uma canção a complexas viagens introspectivas, sempre com uma habilidade indizível no uso dos seus verbos, fortes e incisivos, corajosos e desafiadores. Suas construções e formulações nos trazem luz e esperança em forma de poesia. A melhor apresentação de Carlos Dignez Aguilera e de seu Púrpuro Prazer dispensa todo e qualquer prefácio, podendo ser resumida em poucas palavras: Leiam e reencontrem a nossa mais verdadeira poesia! VINTE E CINCO DE MARÇO Amargos e carrancudos Pelos cantos da minha covardia Os fantasmas que não pari Que brotaram nas frestas abertas Pelo impacto da tua ausência De repente ganharam vida Feito estranhas orquídeas Avessas, monstruosas No mórbido cenário Festim grotesco de revolução interior Meus pequenos monstros Saltitam desengonçados Festa de máscaras escondendo máscaras Na fundamental profundidade do vazio Meus duendes temíveis Já não têm cheiro de culpa Já não me cobram o escalpo Brincam à minha volta E me arranham a pele Em busca de ver sangrar Alguma coragem, alguma franqueza Prisioneiros do meu tempo Os fantasmas sentem o cheiro do vento Insinuando sua liberdade Desfilando pela avenida de um grito Que rasgue os meus frágeis pulmões Violente nosso silêncio ingênuo E ecoe pelos séculos estáticos Paralisados na tua lembrança Alguns gritam desafios temerários E avançam rebeldes pelo frágil universo Da minha consciência Outros atiram seus próprios destroços Contra a escuridão dos meus olhos abertos Sou o general dos meus próprios sonhos E meus fantasmas me cobram em desespero A mais solene declaração de guerra Que mova meus exércitos cansados Contra o inimigo forte do medo Que marche empertigado, soberbo Contra tudo que me distancia de ti Impassível no outro extremo Do insólito campo de batalha Minha incompreensão, inimiga maior Da luz que se insinua em nós Reina intocável sobre mim Dona da mais célebre paralisia Senhora absoluta da minha impotência Faz meus pés plantados, imóveis Feito o irremediável destino dos arranha-céus Faz meu corpo inerte, congelado Pelo frio seco do não-saber Esgueirando-se pelas sombras Da minha louca história Eis que surge a face heróica Do aventureiro que mora em mim Que liberta nações e enterra dragões Mas não cabe na rotina dos menores Que sobreviveu íntegro, tão esquecido Pelos escombros de uma vida Alimentando-se com as migalhas Dos sonhos que não soube construir Guerrilheiro romântico Desafia a sua própria maldição Com uma arma única que ninguém pode calar E num lance desesperado Marcha contra cruéis profecias Lança a pedra fundamental De um monumento erigido a ti Rasgando-se na mais pura emoção Picha na face gélida da maturidade O teu nome, num vermelho enlouquecido Que mais parece uma explosão Embaixo, num golpe fatal A expressão: — Eu te amo DOZE DE JUNHO Deixei o amor acorrentado A ferimentos lancinantes Cujas cicatrizes Compõem trágicas caricaturas Tatuadas no peito da armadura Protetora das alucinações Que não deixo fundir Com a pele do cordeiro Misturei em corpos de plástico Medo e céticas expectativas Implodindo sonhos alheios Calado, não recolhi os restos Dos olhos que parti Porque me equilibrava Nas rachaduras da rocha que não sou Inventei sentinelas para cada trilha Que desse acesso a uma fantasia Consciente do risco de nobres e ladrões Serem confundidos nos portões Da inacessível fortaleza Solitário senhor de muralhas Faço amor com mulheres mortas Anestesiado, troco dias e noites Pelas orgias frias entre os súditos Da moeda fraca que represento À espera da irremediável inquisição Sigo em cena mais um estúpido ato Gestual silencioso do meu louco monólogo Na platéia vazia, uma silhueta de mulher E o teu perfume brincando no ar AÇOITE E VINAGRE Teu sorriso É uma grade brilhante a me aprisionar É um túnel errante a me convidar Para uma amena perdição São sorrisos todos os dengos do teu corpo Teu olhar É um caçador infante a se procurar É armadilha gigante a me seduzir Olhos e coração São olhares todos os dengos do teu corpo Teus cabelos são uma floresta encantada No fim da estrada dos meus desejos Mal contada é essa história de Promessas e asfalto, de poeta meio alto Bebendo a tua imagem À margem de um botequim No teu tamanho, mulher Estão a culpa e o álibi Do crime que o meu coração comete No teu tamanho, mulher Estão o açoite e o vinagre Da tortura que a distância promete PRISÃO Ombros contra a parede Tentando remover O obstáculo à fuga Noutro extremo Tua enorme Figura pequena Amena e assustadora Exibe presas e garras Desando a gritar Enquanto quatro paredes Girando alucinadas Avançam ferozes Gritos maiores Paredes mais próximas Gritos maiores Paredes mais próximas Gritos maiores Paredes, paredes, paredes Silêncio! Suor escorre pelo corpo Ergo os olhos e encontro As paredes Quietas aos teus pés Cães fiéis e alertas Teu corpo instigante Envolto num vestido branco Transparente, torturante Teus olhos inexatos Insinuando aventuras Desafiadoras Eu, Mero amontoado de emoções BUSCA Meus braços estão vazios Aprendi a sonhar tão perfeitamente Que se fez desnecessário o sonho realizado Corpos alucinados em limites Desandaram a embriagar sarjetas Enquanto a magia da aura construída Mergulhou num segredo Desmanchou-se no prazer Sem cheiro, sem caprichos pequenos Sem frescuras Faço amor com ausência de promessas Com olhos, Deus e comigo morto Droga ficou um traço atrás do nada Retardatária da minha viagem Cigarros e alguns drinques bastam Para o meu suicídio minúsculo Quero um alvo para minha ira Anterior ao autoflagelo Construo tanta mulher numa mulher Que ela queda alquebrada Impotente ao primeiro coito Prometedor da loucura Que divido com o silêncio Ávido na incessante busca Avesso e incoerente Deliro e me desespero, febril Frágil arquiteto do tempo Que a vida me toma Entre porres homéricos e malditos versos Infames escudos imaginários Dando guarda à minha covardia Ah, infante retórica Mergulhando fundo demais Para os meus frágeis pulmões PÚRPURO PRAZER Minha vocação para vilão Solta lastro e emerge do mar profundo Da inocência mal preservada Ensaia passos estranhos, enlouquecidos Numa coreografia vazia e culpada Na falsidade do meu caminhar sobre as águas Lúcido Ignoro pegadas cravadas na consciência Febril, a cidade me abraça Desajeitada amante de rara vulgaridade Vomitando velhas feridas e prazeres No meu corpo recém-renascido Coberto de lama e cicatrizes Contorcido pela dor de não se saber Ávido Desperto para a manhã que não construí O sol agride meus olhos cegos De uma escuridão que vem do peito Frágeis pernas arrastam a ausência de sonhos Pelas avenidas frias dos homens Enquanto a mente insana Trama o próximo ato Náufrago Sobrevivo abraçado aos meus próprios destroços Olhos fixos nas intenções das mãos Sufoco o mundo entre dedos débeis Aflição explode em gestos autofágicos À margem de mim confusos signos humanos Se desmancham sem nenhum sentido Lúgubre Desvio olhos para uma explosão nuclear qualquer Os deuses que não me seduziram Digladiam-se pelos restos da falsa crença Na platéia santos pequenos brandem solenes O mais puro e franco desinteresse Velhas dúvidas rasgam o peito da elegia Púrpuro O prazer se esvai... impune e suicida CARLOS Imagens se agridem desesperadas Desorientando qualquer expectativa Mãos rudes remexem velhos baús Empoeirados, largados num canto da história Mal-acontecida, tão pouco construída Pássaro exaurido, asas frágeis Tomado em pleno mar aberto Pelo risco mortal da consciência Deita olhos em busca de terra firme Que justifique raízes, que mostre o caule Que acene os galhos e dê chance aos frutos Amnésico senhor do meu destino Criminoso e o mais perfeito crime Sem rastros, sem pistas, sem risco nenhum Uns poucos traços insistindo cenas bêbadas Bailando levianas entre o real e o pesadelo Coração e suas grandes mãos Cravando por dentro do peito a ira Prisioneiro cavando insólitos túneis Para dentro de uma velha prisão Signos da dúvida se diluem No ácido feroz dos segredos, sem respostas Sorrisos, lágrimas, tiros e corpos nus Personagens embriagados e caprichosos Desfilando gestos e textos inexpressivos No mesmo palco pequeno e pobre O autor aplaude o que não compreende No silêncio das luzes frenéticas E da infinita platéia... vazia. Aventureiro domador de palavras Jaz inerte ante o silêncio interior — Caçador, os impunes brandem a sua fome Atiro meu próprio fêmur para o alto Na minha odisséia sem espaço Entre estrelas manufaturadas Na fundamental falsidade dos cenários Ressurjo imponente em forma de computador — Sopro mortal sobre o barro da história Despojado de vértebras, sem o risco do pecado Reluzindo painéis apoteóticos Cibernético guru dono de todos os mistérios Mágicos teclados e grandes olhos terminais Com inscrições confusas e patéticas — Ah, infame milésima primeira noite Fazendo mais tangível o gosto pela resposta Dedos ágeis num balé ávido e trôpego Cravam dúvidas na instigante promessa Silêncio! terminais calados e vazios Minúsculas luzes coloridas Duendes translúcidos e agudos Expressam de mim o pouco que sei Posicionando cursor para as grandes dúvidas Gotas de suor brotam mansamente Insinuando pequenos riachos pelo peito A mente arde no fogo da ânsia Estáticos, os dedos repousam tranqüilos Transformados em armas poderosas À mercê do guerrilheiro pequeno que sou De pé a platéia brande um silêncio inquisidor Trêmulo, componho meu nome Nos terminais frios do saber Séculos de silêncio e uma fria expressão: — Não há registro VIDA VELOZ Vivendo rápido demais Reinventando pedras Saciando a sede voraz Das bocas da corte À mercê da minha sorte Discípulos da minha voz Audaz inesgotável gás Não estou morto Apenas torto ponteiro Desafiando o relógio dos mortais Faço amor com multidões Curro seus ancestrais Apressei a vida Ao ritmo alucinado Do mais célebre desvario Desfez-se a carne Ante a cólera Da sede dos olhos Sou apenas pele e ossos Com o mundo dentro de mim Barganhei corpo Para desmascarar fantasmas Estou grávido Vocês estão dentro de mim Construtores da morte Vou parir num puteiro Nas mãos de um meganha E de uma prostituta cega Para limpar seu carma Em transe Perco a noção do meu corpo Ou do risco de não tê-lo Esbarro nas feridas do país Seu sangue mancha As vestes brancas Da tramada inocência Cobro as glórias da impunidade Entre um uísque e uma canção Que não fala de um irmão morto Nas trincheiras do ofício Segue a vida Sua frenética dança Confiando segredos Trágicos e remotos À guarda do silêncio Que a incompreensão Impõe aos meus verbos — Não posso traduzir o vazio DESERTOR Balas zunindo Rastejo Desajeitado réptil humano Bunda e cabeça no mesmo plano Colados ao chão Na impossibilidade da fuga Amedrontado Verto orações Traindo minhas dúvidas Sobrevivo As balas silenciam Rotas de fuga Levam à Disney World Medalhas frias Decoram o peito do meu país Sem que eu conheça Os heróis que John Waine Me prometeu Balas Projéteis do absurdo Vomitados por olhos e bocas Calibre desespero Erram a carne Alojam-se na espinha da mente Trincheiras Cortes profundos No solo da consciência Nelas o infante soldado Se esvai em pesadelos Febril, indefeso Medalhas Grotescos torrões de açúcar Carinhos de dono Pendurados nos peitos Dos seus pequenos cães Ah, maldito fardo Curvando com seu peso secular O que a história erigiu Por qual caminho Terá se perdido a mulher Dona de minhas lágrimas? Que maldita diplomacia Terá me roubado Minhas próprias guerras? Que cor terão os monstros Que os homens forjam Pelos barrancos da violência No barro virgem das gerações? Onde estão os túmulos Dos meus mortos? Droga!!! O asfalto podre dessa estrada Já não suporta A brutal coerência Da minha loucura PRÓDIGO Negligente O mais esquecido Volto apóstolo do poço Volto o mais que posso Ferido e muito traído Por um triz não desabei Num amontoado de destroços Ruído de pura carne, não osso Não ouço o canto que cantei Sequer sei se o esqueci Eco não houve Eu mesmo não repeti MEUS HERÓIS Nem todos Os meus heróis Morreram De overdose Alguns Morrem de Aids Outros Estão no poder Que também não tem cura INVENTORES DA RAZÃO Cada rima louca e embriagada Que disparo no peito da sensatez Abre ferimentos, deixa cicatrizes Nos corpos dos astutos pensadores Esses putos inventores da razão Não tentem manter fragmentos Da minha loucura flutuando no formol Das dúvidas pequenas, em frascos grotescos Pelas prateleiras do estranho laboratório Da sua incompreensão de mundo Respostas, muitas vezes, desprezam A necessidade tola e frágil da inquisição A verdade não precisa ser de verdade Construo civilizações no capricho de um verbo Provoco guerras fratricidas Lacerando nações e povos famintos Embriagados pelo pecado que invento No átimo estranho de uma vírgula Na profundidade de uma paixão de carne No mundo inteiro resumido numa palavra Moldo amores na pedra bruta dos corações Garimpo a felicidade num olhar perdido Amo as prostitutas e as mulheres impolutas Faces astutas da verdade dissoluta De um mesmo delicioso mistério Rastreando as trilhas da minha loucura Discípulos babacas da quadratura das teorias Recolhem cacos do meu desvario, rotulam E brincam de saber o que não sabem Empertigados na verdade que não constroem Sorriem, dentes luminosos, corações vazios Não vasculhem tanto o meu vômito Não houve muito o que mastigar RUA QUATRO Paralelepípedos Cravados na terra Feito olhos pequenos Nas pernas grossas Da vizinha feia Portão de madeira Trópico do limite Reinventando horizonte Do tamanho da sede Infante alegria Me roubando do mundo Quintal dos vizinhos Goiabeiras e mandruvás O bom Rogaciano zelando Pela arte de mergulhar Nas profundezas da molecagem Colhedeiras e tratores Dissecados pelas mãos rudes Dos donos do sonho Terra cúmplice Fartura todo ano Mágico ritual Cheiro de terra e sal Construindo memórias Restos de peças velhas Graxa e ferrugem Meninos dedos Parindo brinquedos Um dia eu soube Reconstruir a vida Cheiro de café forte Estrela Luzia... um norte Família, pão quente e farra Melancia num canto de mato Colecionar vagalumes Perder sapato e Pisar solenemente descalço No limiar da nova idade Berço de aventuras Senhores Eu mentia Quando brandia Minha irremediável tristeza HÁLITO mensagem cifrada I Hálito De tão perto De tão dentro Cheiro são Sensual sensação No som Da palavra certa Aberta a fresta A intenção Dos olhos Ignora o Contato frio Da parede ferida Do outro lado Tênue A luz derrama Adrenalina Nas velhas artérias Do faraó mumificado Dentro de mim Franksteiniana criatura Reensaia vida Cético Continuo pelas pedras Sem rastros Em silêncio SUTIL mensagem cifrada II Paredes elásticas Suportam agonias Vôos calados Migrar de um sonho Abelha Rainha Singra o sol Das águas turvas Impune Desliza soberana Por entre O emaranhado Dos devaneios Alheios, alheios Uma taça Brinca Na boca do poeta Embriaga e Inquieta Arranca do homem Mudas confissões Roubaria um beijo Desejo De abelha minha Não fosse a morte Bailando sutil Entre uma flor E uma profecia OUTROS CORPOS mensagem cifrada III Invento caminhos Em busca De coisa nenhuma Tropeço no vazio Traço curso No desafio Dos recifes Acabo à deriva Em terra Cuido dos ferimentos Cicatrizes à parte Misturo cigarros Cristais e solidão Ao gosto forte Sem sorte Da crença insana Parca divindade Débil devoção Trocando altares Por sujos lençóis Sugo outros corpos Nos bastidores Dos milagres ESTÁTICO mensagem cifrada IV Pássaro aflito Alça vôo Desesperado Num ângulo frio Para o alto Pássaro quieto Larga corpo No pico do vôo E desaba No silêncio da queda Na ameaça do chão Como acrobata De velhos filmes De aviação Gira corpo Gira mundo E retoma o aflito vôo Estático Confiando no tempo O chão não desespera ECO mensagem cifrada V Caprichos da terra Frutos versos Avessos ao gesso frio Imposto pelo quebrar Do último osso Ausência de verbos Eco solene Do impacto da dúvida No peito franco da elegia Mágica fotografia Dor, cicatrizes e Um espinho único Na crença do pregador O GUARDIÃO mensagem cifrada VI Rotos Ratos de esgoto Disputam restos mortais Rasgando em vida A carne da ausência Dos eleitos Vêm à porta dos Meus segredos — Silêncio Feroz guardião Dos fantasmas Habitantes da minha Consciência Viro as costas Na sórdida cripta Dos pequenos malditos Vorazes presas Rasgam a inocência Eu... zelo pela tua ausência CALADO mensagem cifrada VII Adormecido Guerreiro do silêncio Sorri A carne da Mulher amada Mistura-se à sua Num balé desvairado Arrancando frutos ocultos No violento pudor Da realidade Adormecido Guerreiro do silêncio delira Palavras saltam do sonho Profecias travessas Inventando o futuro Desperto Guerreiro do silêncio sangra Calado! FORÇA mensagem cifrada VIII Madrugada, negra noite negra Derramando-se janela adentro Estranhas mãos Empunham cigarros Gesto tolo Driblar do vazio Estranhos lábios Tragam nuvens Feito um deus confuso Bebendo tempestades Estranhos olhos se perdem Em viagens inquietas Em buscas insanas Nada estranho O velho coração Pulsa forte no Capricho da noite O MONSTRO mensagem cifrada IX Liberdade Vôo cego em busca de ser Ave que sou Voando só Prisioneiro do horizonte Presa fácil Do ego traiçoeiro Serpente Metade gente Silêncio partilhado Com o vazio Peco pela ausência Que caça E transpassa A lucidez Pesco ogivas nucleares Nas gargantas, nos luares Nas crateras das mulheres Me embriago de mundo E no fundo o monstro sou eu BAILARINA O primeiro ato No capricho das mãos macias Das pernas translúcidas Castidade morta e ousadias Em passos atrevidos e sensuais Construía castelos de areia Na praia vazia do seu ego Dedilhou corpos e promessas Tramou sonhos e trapaças Num desfile viciado Na passarela pobre e grotesca De uma história de mentiras Trocou crenças Por descaminhos vulgares Segredou o próprio tempo Brincou virgindade Com o mundo entre as pernas Em aventuras silenciosas Madrugadas misteriosas Bebeu homens e mulheres Em palcos sórdidos, viciados e trágicos Colinas covardes, táxis vulgares Cantos de família, pecados de sangue Dissimulados em orações Lágrimas e pedidos de perdões A um Deus traído BAILARINA O segundo ato Desceu a ladeira escorregadia Da burguesia mal-ajambrada Desfilando charme manufaturado Destilando o veneno medíocre Dos seus valores distorcidos Corpo esguio na vitrine dos tesões Rebolado de menina fácil Arquitetou cada rima Requebrou cada esquina E bebeu o sangue morno Das sacanagens grosseiras Das taras ridículas, ocultas Nas traições, nos porões Das verdades mal-urdidas Drogou-se de adrenalina barata Emprestou seu corpo a fantasias Enquanto brincava de senhora Dona de todos os ritmos Verdades e sacramentos Distorcidos na mentira maior De não se saber Resolveu ir à luta Brincou de prostituta Bebeu o leite dos seus senhores E morreu toda manhã No vazio dos seus preconceitos BAILARINA O terceiro ato Ergueu as mãos E deu glória a Deus Entoou seus cânticos Vazios de qualquer sentimento Falsidade em forma de oração Lágrimas inundaram a catedral Dos seus descaminhos Da consciência corrompida Ao seu lado a carne viva Do ferimento construído Ergueu as mãos E deu glória a Deus Amarrou um porre voraz Nos mais repugnantes desejos Celebrou os ardis requentados Nos segredos das madrugadas Entre um ideal e o nada Leviana, riu e chorou A tragédia que construía Sem drinques, sem culpa, a seco Rasgou a vida entre a covardia E uma fugaz sabedoria que lhe dizia Vez por outra que o Espelho da alma jamais se trairia BAILARINA O quarto ato Por entre tanta farsa e Deslizes inevitáveis Caprichosas armadilhas do tempo Alguém chegou próximo demais Da podridão reinante Máscaras se dissolveram A princesa virou abóbora O príncipe nem virou sapo A fantasia virou um saco BAILARINA Não exatamente um fim No teatro silencioso da sua psicose Suas pernas brancas e insípidas Tentaram um gestual quase ingênuo Pelo espaço do palco imaginário Giros e acrobacias Suor brotando pela pele macia A mente insana na trama da liturgia De todas as sujas verdades... caladas A platéia vazia O prazer no colo de amores grotescos Garis, que recolhiam todo esse lixo Escondidos na coxia TRÔPEGO Trôpego, esbanjando fraquezas O homem cambaleou rumo Às suas próprias cicatrizes Deixou pelos cantos Os fardos pesados e encardidos De sua história mal construída Desnudou-se de alguns trapos ásperos Que já se faziam confundir Com sua pele grosseira E caminhou nu em meio à multidão Num balé às avessas Atravessou a avenida dos homens Entre gritos, maldições e bençãos E deixou para trás uma cidade maldita Construída sobre os restos mortais Da sua própria insensatez Escalou a montanha moldada Na argila dos seus sonhos E vomitou pedaço a pedaço Cada fruto proibido Devorado ao longo do caminho Purificou-se numa nascente mágica E ergueu uma catedral de cristais Erigiu um altar de ouro puro E celebrou a missa dos tempos Na solidão de sua crença Sentou-se numa rocha gigantesca À margem da estrada de uma promessa E verteu uma única lágrima Que escorreu pela encosta da montanha E transformou-se num oceano Construiu uma estranha embarcação Recolheu os restos de suas fantasias E voltou para o seu caminho Trôpego, esbanjando fraquezas Em busca da mulher amada NÁUFRAGO A brisa leve me traiu Transformou-se em tempestade Um deus de fúria soprou Seus horrores sobre meu barco No mar bravio agarrei-me ao nada Que restou da minha frágil emoção Náufrago dos meus próprios delírios Embriagados da tua aura estranha Traduzida na pior das distâncias — O silêncio imposto Entreguei-me aos caprichos da maré Subornei cada ameaça de resgate E morri mil vezes sob o sol do medo Arrastei-me pela areia áspera De uma ilha perdida no fundo de mim Na solidão implacável do vazio Construí um altar de pedra bruta E derramei todo o meu sangue Numa tola oferenda à tua ausência Enlouquecido esculpi tua imagem No cume de uma montanha E celebrei rituais, os mais cruéis Todos os dias, todas as noites Até o limite do meu tempo ... que não passou VITÓRIA Perdi a noção da realidade Virtual senhor das minhas fantasias Desafiei reis e deuses pequenos Numa batalha suicida Ridículos reis Enviaram exércitos de mortos-vivos Em busca de minha cabeça enlouquecida Deuses minúsculos Lançaram maldições e tempestades Para calar o meu coração de poeta Décadas de luta sangrenta No meio de um deserto inventado A cada passo, a cada tropeço Restaram corpos espalhados pelas dunas E uma trilha de sangue Pelo chão do meu tempo Misturando-se às minhas lágrimas Até o meu corpo, vivo, ereto Desafiando maldições, bebendo tempestades No horizonte surgiram bandeiras brancas Feito velas de covardia Içadas num barco de temor Clamando pela paz que desconheço Ridículos reis e minúsculos deuses Proclamando minha vitória Caminhei solene até meus inimigos Bebi séculos de prazer No barro impune de uma urna de vinho Enxuguei o suor nas bandeiras maltrapilhas Da paz que jamais conquistei Recitei um poema de amor E morri abraçado à tua lembrança MINHA IRA Séculos enlouqueciam o silêncio Cristais mágicos refletiam a Espetacular promessa de fuga A estranha fortaleza guardava Segredos trágicos nas suas muralhas infinitas Feito mistérios de fins de mundos O coração aprisionado num imenso vazio Flutuava entre o nada e o nada Enquanto o tempo mascava a vida Exércitos insólitos marchavam contra as muralhas A cada amanhecer, num ritual de morte Deixando corpos estendidos aos pés dos portões O tempo, infame carcereiro, arquitetava Requintes da mais cruel tortura Entre risos tresloucados e maldições banais Manso, o prisioneiro caminhava sobre espinhos Construindo uma história de não se contar Sorrindo pelos cantos da cela fria As paredes registravam fiéis O contar de luas e sóis em riscos vulgares Inexato diário de bordo Vida vivida no limite dos limites Construída por caminhos tão sem segredos Que nem era necessário caminhar Um dia brilhou um sol de mil sóis Uma luz invadiu a cela feito milagre Cegando olhos, medo e coração A luz devorou cada muralha da fortaleza E explodiu as trancas das celas rústicas Libertando prisão e prisioneiros O homem caminhou tranqüilo Por entre os escombros e pôs seus olhos No mundo que os séculos esconderam No alto da colina um cheiro de promessa A brisa suave acariciando a história E a tua silhueta deliciosa de mulher AMOR SEGREDADO Eu a amei Não apenas o seu sorriso Translúcido marfim Incrustado na face de bronze Espuma branca das ondas Rebentando numa praia sensual Na eterna noite do meu tempo Eu a amei Não apenas o seu corpo ardente Delicioso vulcão Queimando meus delírios de carne Moreno fruto desmanchando-se Na minha boca, nas minhas mãos Na imaginação do mais santo pecado Eu a amei Não apenas os seus olhos infinitos Túneis inexatos Por onde viajei minhas aflições Sólidas estrelas morenas Rebrilhando os segredos e mistérios Do desafio luminoso de sua promessa Eu a amei Não apenas a sua voz sedutora Caprichoso canto embriagado Seduzindo pássaros e horizontes No inebriante som De toda a poesia, fazendo o mundo Prostrar-se em solene silêncio Eu a amei A cada traço, a cada som A cada gota de suor Inventada num suspiro de tesão A todo cheiro sensual Seduzindo meu espírito Em rituais deliciosamente profanos Eu a amei Amei a mulher Que se escondeu nos escombros Dos seus próprios desastres Que não quis se conhecer E se perdeu por labirintos Segredada em meu peito CÉLIA Ela era o mais puro milagre Capricho endoidecido De um deus embriagado Que num átimo de lucidez Resumiu o mundo numa mulher Fios dourados de sol Deram forma aos seus cabelos Translúcida seda em réstias Tão finas como raios de luz O céu das mais célebres calmarias Foram condensados em dois prismas E incrustados nos seus olhos Refletindo a vida inteira A voz, numa receita mágica Misturou o canto apaixonado De um raro rouxinol E o jardim de todas as brisas Seus lábios vermelhos e generosos Faziam reviver a história torturante De um fruto desafiador e proibido Promessa inevitável de pecado Os seios de menina-moça Eram deliciosas colinas rosadas No horizonte do busto de mulher As curvas dos quadris eram rios Caudalosos e caprichosos Que contornavam um relevo solene E desaguavam num mar de encantamento O calor de seu corpo sedutor Era feito um vulcão domado Sentenciado a aquecer desejos Os mais tolos, os mais loucos Seu sorriso iluminava dias e noites E construía um tempo insólito Misturando luas e sóis No universo de sua face Nela moravam todos os amores A solidez de um coração cristão A embriaguez de uma ilusão menor De um sentimento carnal, fatal Homem e poeta infantes Trocaram tolos e insensíveis Sua gigantesca promessa de vida E morreram um pouco ali Homem e poeta errantes Seguiram embriagados tempo afora Mascando uma compreensível dor INTEIRA METADE Metade de você Deslizava mansamente pelas paredes Tragando mundos, amarrando os olhos todos Na sua silhueta torturante de mulher Pelos balcões, pelas janelas Pelos sujos lençóis dos amores comprados Pelas cartas marcadas no jogo da vida Por cada tortuosa estrada de fuga Tudo ficou pequeno Metade de você Deslizava mansamente pelas paredes Pelos porres malditos dos perdidos Pelo prazer inventado numa ilusão Pelos golpes de mestres dos fracassados Por cada um de todos os descaminhos Tudo ficou pequeno Metade de você Deslizava mansamente pelas paredes Pelas palavras maltratadas por promessas Pelos amores construídos na areia Pelos segredos vulgares dos impolutos Por cada traço de todas as mentiras Tudo ficou pequeno Metade de você Deslizava mansamente pelas paredes E as próprias paredes ficaram pequenas Enquanto no meu peito de homem Pulsava desesperado um coração de menino Metade de você Deslizava mansamente pelas paredes E todo o mundo tornou-se cúmplice da sua cena Enquanto a mente insana do poeta Construía o mais célebre de todos os pecados MEU TESOURO Entre ilusões manufaturadas Meu coração arrisca um sorriso Que a emoção traduz num verso Pelas catedrais incrustadas no medo Arquiteto uma oração Revelação da minha verdade Por Deus, te quero feliz Se nos teus dias A cada despertar Não couber uma lembrança minha Não importa Se no teu riso iluminado Não houver fragmentos meus Não importa Se nos teus sonhos mais ousados Não houver uma promessa minha Não importa Se nas tuas conquistas Não houver sequer a minha sombra Não importa Se nos teus beijos molhados Não houver o meu sabor Não importa Se nos teus gozos e urros de tesão Não houver uma só gota do meu suor Não importa Importa que vibre um sorriso teu Capaz de iluminar dias e noites Em meio às mais cruéis tempestades Farol trágico brincando destinos Ainda que eu sofra Minha dor é o meu tesouro Semente amarga do fruto que não dividimos FALTOU MORRER POR ELA Pari o meu espírito Sem estrelas, sem anunciação Dei à luz a mim mesmo Nasci nessa mulher Reinventei o mundo Cada palavra mal traçada Na página em branco da vida Converti em poemas para ela No seu colo bebi todas as promessas Chorei, verti infantilidade Meninice brotada em solo franco Na esperança da sua fertilidade Nas suas mãos plenas e poderosas Encontrei segurança e equilíbrio Para o atrevimento dos primeiros passos Que caminhei sempre rumo a ela Deixei desabrochar molecagens Moldei minha puberdade ávida Escondi do mundo pecados infantes Cresci nessa mulher Descobri seu corpo Seus seios macios, montanhas fortes Protegendo o ninho que sonhei Construí fantasias no corpo dela Conquistei suas fronteiras... algumas Violentei seus pudores e receios Entre suas pernas mágicas me perdi Tornei-me homem nessa mulher Decifrei segredos do tempo Da vida e do vento Em cada um dos nossos momentos Amadureci nos braços dela Meus poderes de herói pequeno Meus anseios de infante guerreiro Meu tesão e minha história Eu resumi nessa mulher Faltou apenas morrer por ela E ela sequer chegou a existir FANTASIA TRAÍDA Mascando corpos e cabeças Implodindo consciências, desorientando mundos Seguia o bravo guerreiro, ferido e maltrapilho Cambaleando suas certezas rumo a uma crença Pés cortados por séculos de caminhar Entre rimas heróicas e prazeres banais Corpo curvado sob o peso brutal das cicatrizes Tão vivas, tão abertas pela dor incessante Do fogo implacável do não-saber Seguia o bravo guerreiro sua sina estranha À beira do lago profundo da calmaria que não há Ergueu os olhos até o limite do seu próprio tempo Contemplou a silhueta sensual que as nuvens Formavam no horizonte marcado da sua história Caiu a noite, feito um manto a segredar a vida Uma estrela, gueixa de luz, invadiu os olhos O coração voraz desmanchou-se num sonho menino Cicatrizes cederam ao brilho mágico da promessa E os versos fluíram feito cascata inventando um rio Que cortou o chão árido de uma história dura e Desaguou tranqüilo no mar de uma promessa Catedrais suntuosas acenaram respostas As dúvidas já não desafiavam todas as crenças Dobrou o corpo, de joelhos diante da miragem Violentando o deus do seu coração guerreiro Em troca de preces débeis e promessas fáceis Despertou morto no ventre de uma farsa Refém da sua própria ilusão tão mal construída Empunhou uma espada, vomitou um grito de guerra E destroçou no peito o altar pagão do tolo equívoco Diluída no ácido da sua verdade vulgar A luz imaginária da estrela morta escorreu Para o esgoto fétido da sua pobre escuridão Renascido, corpo marcado por tantas aventuras O infante guerreiro ressurgiu do homem domado Desnudou o traje frágil do tolo equívoco Empunhou velhos sonhos e retomou a busca Insistindo novas sementes, acreditando frutos Deixando pelo caminho apenas cacos de fantasia traída NADA Estranhos cortejos Cortesãs e fantasias Beijos molhados, lambuzados Pela orgia valente dos impolutos Todas as raças vertidas Em taças desgastadas Pecados escancarados Por olhares furtivos Divindades pagãs buscando A oferenda tola da paixão Musas polacas, ninfetas babacas Louras e mulatas tecendo A trama tola de feitiços vãos Rastros de sereias Pela areia quente da minha praia Mas não tinham o canto dela Não tinham a aura dela Por isso parti Senhoras dissolutas Virgens, deusas e prostitutas Realeza de espíritos e corpos Retorcidos de tesão Por detrás das cortinas Gastas da pureza As mais tesas intenções Amores revelados Em versos e orações Gatas, beatas e malucas Nos descaminhos, na estrada Perdida da minha perdição Mascando meus olhos Numa teia de sedução Mas não tinham os olhos dela Não tinham as promessas dela Por isso eu parti Belas senhoras Donas de todas as horas Cicatrizes esquecidas Barganhadas com a vida No corpo dela Nos olhos dela Na aura dela Um sonho infante Que se tornou nada CONSCIÊNCIA TARDIA Dedos ágeis e trôpegos Deixam gotas de lágrimas e sangue Pela argila insólita do próprio tempo Moldando esculturas vazias Que não preenchem os espaços frios Dos recantos da cruel solidão Moldo a vida no barro estéril Da história que não construo Entre porres suicidas e ridículos Cambaleando dor e incompreensão Pelos sonhos e a farsa ardente De verbos domados no capricho menor De amantes mórbidas e vorazes Em cada passo da estrada que não piso Em cada ruído das camas amargas Onde faço fundir desespero e corpos mortos Na promessa tola de coisa nenhuma Entre um cigarro maltratado e o nada Vomito juras de amor e prazer Barganhando mentiras reluzentes Enquanto o pensamento vai distante Cobrar da vida um amor de verdade Com todas as verdades do amor Tão esquecidas pelas vielas escuras Pelas esquinas sujas do jogo dos mortais Na carne frágil de um corpo nu No brilho de um par de olhos fechados Na trilha débil da moral transfigurada Na crença mal posta na pessoa que não há Enrolo os trapos das dúvidas pequenas E sigo desempenhando a personagem banal Pelo palco viciado da trama mal construída Lá fora de nós, negros capuzes, tochas incendiadas A santa inquisição da minha consciência Troca a sentença de morte por tolerância Tornando-se cúmplice da heresia vivenciada Em forma de oração, no altar-mor Da catedral da falsidade mal resolvida Homem e mulher, mascamos desenganos Forjamos um ideal de amor e violentamos Nossos sonhos, agora mentiras desmacaradas Alerta, oculta debaixo dos tapetes enlameados Espiando pelas frestas da fragilidade reinante Nossa verdade arquiteta verbos delatores Entre drinques quentes e palavras frias Que é para não chocar nossa podridão Com a chegada tão tardia do adeus INQUISIÇÃO Recobrei os sentidos A luz agrediu meus olhos Cegos da escuridão Imposta pela pena macabra Dos anos aprisionado, trancado Nas masmorras frias de um amor Uma crença, um erro tolo Um tempo perdido Reergui meu corpo fragilizado Dolorido de uma tortura interior De joelhos, na areia áspera da realidade Bebi cada gota da imagem prometedora Da praia que me sorria uma esperança Na orla tropical do meu naufrágio Às minhas costas o mar Senhor absoluto dos meus destroços Ereto, voltei para a água, caminhei até Sentir as ondas lambendo minhas pernas Olhos postos no horizonte Fitando as entranhas do monstro do passado Feito inquisidor e suas próprias heresias Desafiei cicatrizes, reabri os ferimentos Fétido, o sangue dos equívocos Jorrou desafiador feito revelação E nos reflexos da poça que se formou Estranho espelho de aflições Desfilaram cenas esquecidas Da tragédia mal-acontecida Urros de tesão, amor de corpo A nudez triste da escuridão Paixão em forma de suor E um silêncio maior Calado por pura inexpressão Tanto gozo, tanto prazer de carne E um nada absoluto no coração Cravei meu olhar no mar azul Ao longe imperava um céu tranqüilo Feito a consciência dos impunes Verbos silenciosos e poderosos Riscaram meu peito de incompreensão Tanta luta, tanta paixão acreditada E a herança vazia... cenas frágeis Sustentadas pela nudez de um corpo morto Olhos apertados, rebusco o quarto escuro E empoeirado das lembranças Caço luzes, carinhos, momentos, vida... Busco um traço que justifique dor Feito fantasmas assombrando alguma culpa Por todos os quadrantes da escuridão Bailam somente lembranças de um corpo nu, Ardente, vulgar e... vazio Abro os olhos e o mundo está lá fora Faço uma oração embriagada Revelo ao deus da consciência Os pecados da crença desajustada Do amor inventado, mal plantado No solo estéril e desértico de uma mulher Que se perdeu sem se saber Volto os olhos para os ferimentos E os encontro fechados, feito magia Sem deixar sequer cicatrizes Caminho pela praia sem cambalear O corpo já não dói, pareço flutuar O instinto guia meus passos rumo a uma nascente Sacio na poesia a sede de séculos áridos Um manancial de energia brota da terra Jorra, feito em verdade, na forma de uma manhã Mergulho nas águas translúcidas e geladas Que acariciam meu corpo e lavam Todos os fragmentos, restolhos do nada Nu, revigorado, faço amor com minha consciência Redescubro o homem forte esquecido em mim E reabro os velhos caminhos do guerreiro Nas trilhas férteis de uma mulher absoluta O AMOR QUE AMO Eu amo! No meu amor resumo o mundo inteiro Cada gesto, cada pensamento meu Traduz-se na pessoa amada Amo um amor de corpo Que explode em desejo No sangue invadido pela Mais pura adrenalina Amo um amor de espírito Que cala suas dores Recolhe seus momentos Cultiva e zela pelo solo Fértil da vida No colo de um olhar Amo um amor atormentado Que quebra conceitos e Colide mortalmente com a razão Com a ética que a vida me impôs Com cada tabu que alimento no caminhar Sobre as águas turvas do meu dia-a-dia Amo um amor sereno Que se alimenta de si Na solidez da palavra calada Na angústia de saber que não Existe verbo capaz de Traduzir minha verdade de amor Amo um amor em Deus Traduzindo paz, vertendo Orações na celebração maior do Criador No vinho, no pão, no altar divino Em que transformo a mulher amada Amo um amor de dúvidas Que cobra sustentação, chão Para as raízes desse mágico sentimento Estourando limites, invadindo fronteiras Destruindo toda noção de mim mesmo Amo um amor de certezas Que de certo, mesmo, no final Fica apenas o amor que amo Mas que basta, que alucina E traduz o mundo Amo um amor ecológico Que preserva meu planeta Que salva o universo inteiro Que recolhe seres e matas Que captura rios e mares E os traduz, e os liberta Num verso de amor Amo um amor de pai Que protege a cria Que molda um tempo ideal Sangrando calado Dores que rouba para si Em troca do riso da mulher amada Amo um amor de filho, numa lágrima franca No aconchego do calor da maternidade projetada Enquanto o mundo espera que retome as forças E volte para a luta Amo um amor maior que eu Que me faz mero hospedeiro Estranha criatura que reconstrói Minha visão de mundo Posturas e anseios Que faz rever a vida inteira Através da lente generosa do amor Que desafia chão e intenção Ignora dor ou prazer Faz corpo e espírito reconhecerem Apenas a intenção do amor Amo um amor que me faz mais que homem Faz da minha amada muito mais que mulher Um amor que reconstrói o mundo Do tamanho que nos couber Amo um amor pleno Do silêncio ao coito Do vazio à plenitude de amar Amo o amor que amo MULHER ABSOLUTA Invadiste o espaço e o tempo trágico Foste brisa desafiando tempestade Acariciando cada dúvida com certezas caladas O riso explodiu em tua face de mulher Gêiser de carinho molhando e aquecendo O frágil e ressequido chão das minhas crenças Partiste deixando tua imagem flutuando Pairando sobre todas as tormentas Assombrando os recantos enlameados De bobagens que um dia ousei chamar amor Teu sorriso agudo, ardido, penetrante Ficou congelado no tempo Desafiando todos os verbos do meu silêncio Ninfetas e deusas menores se diluíram No suco fervente da tua verdade de amor Gueixas quedaram ante a tua força de mulher Instalada em silêncio no âmago do meu espírito Nos bastidores das tolas tragédias De tantos beijos vulgares e prazeres baratos Tua sombra elegante deslizou mansamente Misturando promessas e profecias Em versos atrevidos e silenciosos Soltei as amarras do meu barco libertário Rompi as correntes enferrujadas e viciadas De todas as âncoras, das mais frágeis tolices Icei as velas e abracei o vento da paixão Rumo ao teu porto de sólida calmaria Homem renascido, corsário das cicatrizes vazias Reinvento a toda manhã o meu próprio destino Navegando tranqüilo nas águas transparentes Do oceano definitivo da tua dignidade de mulher Teu sorriso é o norte da minha bússola Teu olhar é o meu horizonte infindável Teus beijos, a embriaguez do meu tempo Teu corpo, o mais instigante desafio Tua história é a promessa da minha história És a poesia renascida em versos doces ou trágicos És a verdade resgatada do guerreiro combalido És a plataforma sólida do homem reconstruído És a maior de todas as minhas verdades Tu és a minha mulher absoluta CELEBRAÇÃO Fascinado, permaneço estático Imobilizado pela sensação de êxtase Que me envolve e alucina Depois, feito menino e a Emoção do primeiro coito Desafio o tremor febril E ouso tocar seu corpo Caminho pelos seus segredos Conquistador de mundos Finco a bandeira de um beijo De um infinito desejo No topo da montanha Desafiadora do teu seio de mulher O suor, cúmplice passional Do estonteante balé proibido Compõe o gestual alucinante Do nosso teatro sensual Escorregamos os corpos Para dentro do peito Medos e taras fundem-se no Calor febril da fome de amor Enquanto o mundo espera Porque só impera a nossa cena Minha alma fervilha de emoção Enquanto uma multidão de Grotescos fantasmas Desprende-se das neuroses Das mais profundas cicatrizes Reconstruindo o hímen da Minha história violentada Por tantos equívocos Dentro de você Escondem-se todas as respostas Todas as preces e mãos postas Perdões e pecados de amor Deito meu espírito No seu colo de mãe, amante e mulher E disparo uma lágrima franca No peito de todos os temores Avenidas infindáveis abrem-se No horizonte marcado dos meus Olhos de poeta disperso Enquanto os pés cortados Mancham estranhos caminhos Com pegadas delatoras que confessam Os mais ousados crimes de amor Seu corpo é um altar Erigido à mais legítima divindade Nele sacrifico meus cordeiros E celebro a intocável e irremediável Crença no sacramento da vida Que ressurge, que rebrota Na terra ressequida do meu tempo Na magia da semente que colho Do fruto da sua anunciação em mim TROCA DE CALOR Razão, olhos e braços Sustentando Odisséia natural Olho por olho Dente por dente Sina enrodilhada Cobra na caçada Mascando sonhos Arquitetando vida Vida, braba vida Rústico ofício Brilhar entre ríspidas Tramas ocultas Olho por olho Dente por dente Célebres artesãos Tecendo o jogo Numa roleta de sorte Capricho do cassino Brutal do destino Vida, braba vida Ritual obscuro Sorrindo Enigmas lancinantes Instigando tolas ousadias Olho por olho Dente por dente Suor vira ouro Alquimia dos bravos Magia dos escravos Do sonho flamejante Vida, braba vida Revela onipotência guerreira Estrela revolucionária Invertendo origem Olho por olho Dente por dente Colheita de garimpo Aroma de terno limpo Arena outra Reluzindo luta Vida, braba vida Justiça ungida Absoluto ritmo Eterno zênite Olho por olho Dente por dente Mares raptando continentes Areia brincando No dorso das ondas Astros protegem Os parceiros do seu brilho Vida, braba vida Rosa oriental Sol atento Nascente intuição Olho por olho Dente por dente Todo norte É parte da intenção Estrela forte Faz a sorte Da navegação Vida, braba vida Rota obstinada Signo Astro único Reacendendo anunciação Ouro por ouro Gente por gente AMEAÇA Não cobre de mim Promessas feitas Durante um porre feroz Pode ser que eu prometa Pôr cercas no planeta e Me tornar astronauta Pode ser que eu prometa Invadir fronteiras E vomitar fantasias Pode ser que eu prometa Violentar toda carne e libertar Urros e sussuros inconfessáveis Pode ser que eu prometa Lapidar a lua e incrustar num anel de lata Para ornar o dedo de uma prostituta Pode ser que eu prometa Conjugar os mais célebres verbos de amor Nas esquinas, em qualquer canto vulgar Pode ser que eu prometa... Pior, pode ser que eu cumpra FUGA CONSCIENTE Ávida de luz A consciência me cobra Recobra os sentidos E emerge do dúbio mar Da covardia instalada Questiona todos os sonhos Descortina a realidade grosseira Colide com fugas Impostas pela dignidade traída Do guerreiro vencido Pela futilidade das guerras inúteis Rasga olhos e coração Com as garras violentas da verdade Guardada na calmaria das catedrais Por detrás da essência dos altares E entrega-me a escuridão Que batizarei mundo LIMITE Pés descalços Postos no mundo Rasgo peito, rasgo chão E arquiteto parreiras Pés descalços Pisando solenes Recolho o vinho Do sangrar das uvas Pés descalços Desafio caminhos E o sangue puro Das uvas, pés e peito Envelhecerá por si ... se tiver que ser LOUCURA Escala meu peito Desafia minha história Insiste suas garras Na carne podre dos receios Masca todo gomo de consciência E vomita fétida realidade Nos meus olhos cegos Mergulha no meu sangue Desbrava cada artéria Do meu corpo frágil e inerte Sinto sua presença circulando Feito um pivete bêbado Pelas entranhas da noite Ávido torturador Buscando o cerne do medo Da sua vítima pequena Alimenta-se voraz No prato farto das minhas tolices Da meninice maquiada Pelos séculos trágicos Da minha ínfima existência Destrói meus sonhos E se eterniza no meu destino Feito todas as pragas de todos os Egitos Ferida aberta na alma Avança firme a cada dia A cada noite vazia e infinda Está nas paredes rústicas Que sufocam meus olhos Nas cenas que a saudade insiste No nada em que me transformei Cresce com os segredos Que seus mistérios escondem Com tudo o que não sei da vida Revelando traições e dores Alucina num coquetel de maldade Faz de mim caçador tolo Artífice de todos os terrores Perdido, desesperado Pelas imagens cruéis que ela Arranca da ausência, do vazio De uma sinfonia de silêncio Deleita-se desvairada Com o sangrar imposto Pela frieza plantada em mim Em ásperas inquisições Em gélida condenação Ela me abraça E me arrasta morto por aí DESESPERO Morto Viagem negra Negra paisagem Inerte e branda Entorpecida, esquecida no luto Nada mudou Séculos são átimos confusos Na sua fugacidade Na escuridão de Todos os olhos abertos Nada mudou No peito frio de cada lápide Inscrições grotescas Cedem ao tempo Verdade metálica... insubornável Nada mudou Segue o mundo enfim Esquecido de mim PROCURA Onde estão aqueles olhos Que segredavam o mundo inteiro Num sorriso aberto, tão certo? Onde estão os dengos da menina Que se insinuavam sedutores Tão impunes quanto fatais? Onde estão os rastros das promessas Mal construídas pela embriaguez De um infante apaixonado? Onde estão os sóis castanhos Que nasciam a todo instante No horizonte do planeta da sua face? Onde estão os segredos transparentes Que transbordavam feito confissões Inundando olhos e corações? Onde estão aquelas luas tristes Que morriam todas as noites Invejando a sua luz de mulher? Onde está a tormenta feroz Que invadia a casa dos temores Transformando homens em meninos? Onde está o caminho do mundo Que arrastava nobres e ladrões De joelhos aos seus portões? Onde está você? VIVER Maldito mistério que envolve meus passos Trôpegos, embebedados da tua aura Que me arranca olhos e coração Num ritual pagão, corpo e espírito Oferendas minúsculas e trágicas Ardendo na cripta do teu prazer Das tuas loucuras e aventuras Arranho as paredes do mundo Desnudo dúvidas e temores cruéis Indefeso na força do amor esquecido Do tempo, da história que não há Rendo o dorso à chibata que corta E marca a pele por dentro Avessas cicatrizes, fiéis documentos Da insanidade mal instalada Escondido num canto, o tempo ri Das beatas que atiram sua castidade No peito do pecado que não cometi Em cada esquina ergue-se uma lâmina Desesperada pela ausência da noite Enquanto brilha o sol que invento E planto dentro do teu ser Sem eira Nem beira Arrasto-me morto Reaprendendo a viver SONETO À PALAVRA Palavras Armas ferozes De efeitos atrozes Virgens sensíveis De amores intangíveis Palavras Fragmentos de argila Nas mãos do artesão Apenas inexatidão No fundo da reflexão Áridas de sentido Ao sol da inexpressão Clamam por um pastor Ávido e sofrido Capturo-as na aflição De um verso de amor AMEAÇA DE VIDA A voz repulsiva ressoou pelos quatro cantos Vazios do quarto da minha história Fez estremecer as paredes e despertar As aranhas mortas nas entranhas do nada O velho lustre da consciência, farol de tantos Equívocos, balançou por séculos gelados Mas meu coração cristão, guardado na Fortaleza da crença no amor, não se abalou Recebi palavras de morte em Troca de uma proposta de vida Reabri todos os sombrios porões Em busca dos mais célebres pecados A estranha e solitária expedição Avançou para dentro da minha vida Em busca de um crime qualquer Que justificasse a sentença cruel Reencontrei todos os meus pecados Guardados na poeira do esquecimento Atados aos cúmplices da própria culpa Soterrados pela minha fé em Deus Surpresos com a minha visita Redesfilaram seus verbos venenosos Tentando revitalizar dores vencidas Personagens repugnantes de uma história Mal construída vieram à minha presença Revi cada carrasco, cada maldito construtor Das tramas de tantas intrigas Pelas margens dessa estranha estrada Algumas vítimas da minha incoerência Lançavam-me olhares silenciosos De alguma incompreensão, de algum perdão As garras da culpa exalada pelas Palavras de morte ainda não se saciaram E empurraram a insólita e solitária Caravana para mais fundo nos meus porões Caminhei tranqüilo até os cantos mais Escuros e empoeirados de mim mesmo E reabri cada funesto baú, alguns com Segredos guardados da própria consciência Cresci muito na busca Descobri que algumas velhas cicatrizes Podem ser maiores do que os ferimentos Que as construíram na carne da mente Cultivadas por uma quase eterna insanidade Provocada pela chantagem barata De uma culpa que na verdade não há Senão a culpa de ser humano... crescendo Fechei cada um dos baús, dessa vez Sem sequer me preocupar em trancá-los à chave Caminhei de volta para fora dos porões Da escuridão inviolável e da poeira fétida Que o tempo cuidou de impor a cada Ameaça de culpa dos desvairados ferimentos Ousei voltar um último olhar ao estranho Caminho e sequer percebi pegadas De volta à luz do meu próprio tempo Revi cada verbo da sentença de morte O som covarde que ressoava pelos recantos Mais profundos da minha indignação Agora traduzia apenas o silêncio e o vazio Temperos tolos de incompreenção e rancor Que só medram em corações bestiais Sem surgir um sinal que acenasse luz Ou mesmo a execução prometida Os insanos verbos de morte emudeceram COISAS Coisa-à-toa Molecagem ordinária, saltando leviana Pelo ritmo sacana de um samba maroto Jeito escroto, fazendo da mentira uma arma Apontada no peito da própria lucidez Gozando quantidade pela cidade Surgindo dos becos, com alguns trecos Camisas jeans e outros badulaques Enfeites de mesa, velhos e surrados achaques Disfarçando a culpa com um talão de cheques Afogando as mágoas num jogo qualquer Alambiques, corpo de homem, corpo de mulher Embalando a trilha sonora das madrugadas Coisa-ruim Pescoços cortados, pessoas usadas por aí Abraços apaixonados no caminho fácil E viciado de maldades sem sentido Morder a jugular da própria história vulgar Por não saber construir algo melhor Que não seja arranhar com veneno mortal O corpo sólido de qualquer chance de amor Coisa-feita Na encruzilhada da vida, bruxaria barata Encomendada pelo destino caprichoso Roupagem de graça divina Para limpar o carma de um anjo tolo Verbos cristãos, preces e orações Escondendo vampirismo e estacas nos corações A dor escorrendo pelo canto da boca Enquanto olhares desafiam os próprios limites Coisa-feia No álcool de todos pecados, corpo inchado Dissimulado nos babados mal tecidos Perdoado pela pose high-society Enquanto dentro da falsa fortaleza Pulsa um coração vulgar Coisa-linda A cidade sobrevivendo impune Ao fétido odor dos seus esgotos CANÇÕES Aqui poemas que nasceram com outra sina, que ganharam ritmo nos teclados, nos violões, no talento mágico de alguns parceiros especiais. OPÇÃO CLAUSURA Música: Cláudia Carvalho Só No vazio crítico De órbitas elípticas Em torno do silêncio Só Na transparência pura Da opção clausura No corpo de uma ave Sou Olhar e horizonte Corrente prisioneira Dos elos que sou Vôo É uma espécie de sonho Que às vezes estranho Nas nuvens onde vou Vou O mais longe que puder Viajar nesta mulher Meu medo de ficar só Só No vazio crítico De órbitas elípticas Em torno do silêncio PARTO Música: Cláudia Carvalho Céu Vôo da imaginação Gerando mistérios Descobrir-te nu e sedento Num tranqüilo atrevimento Te dar meu corpo Entregar-me à sorte da morte Por prazer, sem dor, sem te doer Chão Na palma da mão Frutos etéreos Recolher-te ventre adentro Expulsar-te a todo momento Parir quando quiser Tua deusa torta Mãe, amante e mulher Eu Mulher e coração Amores e ovários Meio morta no teu mundo Suicídio tão fecundo Para renascer Reacender o sol da raça Missão sem fim Dentro de mim MONTARIA Tributo ao Palhaço Música: R.J. e Paulistano Ê boiadeiro, ê montador Fica firme na sela No chão tu és perdedor Montou tem que ficar Em cima do corcoveio Se o chucro pular no lugar Ou galopar lá pro meio Ê boiadeiro, ê pegador Vê se fica por perto Pro caso de vir o pior O chucro que é traiçoeiro Corre pra cima da cerca Mas o peão verdadeiro Nem aí ele se aperta Ê boiadeiro, ê laçador Pode jogar tua corda Que o moço saiu vencedor Cortou desde o começo Até se classificar Peão quando é do avesso Não dá pra derrubar Vejam o palhaço Que brincalhão Fazendo graça na arena Protegendo seu irmão Palhaço, que brincalhão Palhaço protege o peão Palhaço, que brincalhão Palhaço protege o peão SAUDADE DE BARRETOS Música: R.J. e Paulistano Atrás da porta Um par de espora pendurado Transformado em enfeite de salão Inundando os meus olhos de passado Relembrando o meu velho alazão Êêê... lembrança que vai Maltratando o meu pobre coração Êêê... saudade que dói De Barretos e da Festa do Peão Da Alvorada virando a madrugada Dos amores varando os quatro dias Da festança marcando a temporada E da paixão que sempre florescia Êêê... lembrança que vai... Das viagens conduzindo as boiadas Da pousada com estrelas no sertão Da festança no recinto, a mulherada Aplaudindo minha fibra de peão Êêê... lembrança que vai... Da coragem nas rosetas das esporas Do perigo no lombo de um burrão Do turista festeiro a toda hora Repetindo comigo esta canção Êêê... lembrança que vai... PAIXÃO Música: Chico de Abreu Moço, Diga lá qual o segredo Que me faz tanto medo Tanto medo assim Cara, Não há nenhum mistério Nenhum sentido etéreo Só desejo ardendo em mim Moço, Tens um ar de açoite De magia da noite A me embriagar Cara, A noite não é um espelho Eu apenas me assemelho Um pouco ao seu luar Moço, Amanhã com outro homem Se eu lembrar o teu nome Eu vou ter que chorar Cara, Paixão é pra sofrer Senão pode esquecer Não vale a pena apaixonar Diga, Porque eu me entregaria A tanta fantasia Que crias aqui Cara, porque me esquecerias Por essas galerias Sem sequer morrer por mim ADEUS Música: Carlos Dignez Se aprochegue, meu dengo Eu vou me despedir E o amor na despedida É feito bala perdida Procurando a quem ferir Não se avexe, meu dengo Eu devo regressar Trazendo na bagagem Boa e velha malandragem Só pra lhe ensinar E nas terras, meu dengo Que eu for para visitar Levarei a sua imagem Feito estranha visagem A me abençoar E se de quebra, meu dengo Eu me apaixonar Faz que não faz mal Eu lhe mando um postal Só pra remediar PALHAÇO Música: Chico de Abreu Era sol e solidão Um anzol e aflição Era um fio d’água boa Um rio e uma canoa A pesca e o pescador Uma cachaça de sabor Era um fio de esperança Num pio de ave mansa A caça e o caçador Era o frio de uma trégua Era o chão de muitas léguas Era o apito de um trem Na saudade de alguém Era sol queimando céu O amor fazendo o cio Era laço e laçador Um palhaço e um amor Eu palhaço e o teu amor Eu palhaço e o teu amor CARA, TE AMO Música: Edgard Passos Vem, vem me encontrar E já vem nua para mim Vem, quero o teu corpo Transpirando e assim, assim Quebrar tuas defesas Entrar em teus segredos Violar tua beleza E saciar os teus desejos Quero desandar A ficar nua para ti Eu quero me entregar Até te confundir Romper as paliçadas Do medo e preconceito Louca e desvairada Me dar de qualquer jeito Te provar e comer Doce de mel prazer Te sugar e beber Cara, te enlouquecer Assim quando quiseres Libertar os teus anseios Botões ou um fecho eclair Vão-se abrir sem receios Romper tua fantasia Te lambuzar de orgia Plantar-me no teu ventre Te invadindo indolente Vem, traz os teus dentes Pra bem dentro dos meus seios Quero ser demente Mundana, sem asseio Pecar a noite inteira Rolar na tua esteira Meu corpo tão sedento Te tragando violento Te provar e comer... Vem, é dia posto Vem tirar a fantasia Vem gemer a todo gosto Gostoso de agonia Pecar, rolar Provar, prazer Sugar, gemer Gritar, morrer Te provar e comer... Cara, te amo. BOCAS Música: Chico de Abreu Uma boca salta pro canto Dá passagem pro andor e pro santo Que catam milagres madrugada adentro Nos sujos bilhares da boca do lixo Que catam milagres madrugada adentro Nos sujos bilhares da boca do lixo Ah, quantos sonhos traídos passaram aqui Vida boêmia que torna a se repetir Ah, quantos sonhos traídos passaram aqui Vida boêmia que torna a se repetir Essa boca que saltou pro canto Na passagem do andor e do santo Já fez seus milagres madrugada afora Nos antigos bares, nos becos da Aurora Já fez seus milagres madrugada a fora Nos antigos bares, nos becos da Aurora Ah, quantos sonhos traídos passaram aqui... Uma velha boca num canto Conta histórias de andores e santos Que nos braços fortes dos becos Tornam-se nobres velhas bocas Que nos braços fortes dos becos Tornam-se nobres velhas bocas Ah, quantos sonhos traídos passaram aqui... SIMPLESMENTE CORAÇÃO Música: Cláudio Matos Meu coração É uma ave migradora, uma moça sonhadora Que faz pouco da solidão Meu coração É uma velha senhora, que assim sem demora Explora a ilusão Meu coração É um artista sofredor Interpretando a dor Do seu próprio coração Meu coração É pimenta ardida Que age desmedida Nos pratos da razão Meu coração É uma flor tão aberta Que às vezes desconcerta O brilho do verão Meu coração É uma espada encantada História mal contada É simplesmente coração TEMPO INTERIOR Música: Irineu A chuva rompe A sua própria ausênsia Devagarinho No seio da plantação Um vento forte Assobia no quintal Uma canção sertaneja natural A saudade Vem de encontro à janela Violentar A minha solidão Casa de fazenda, fazenda já não é As coisas mudam O tempo tudo mudou Fogão a lenha Virou mesa ou ornamento Forno de barro desfeito ao relento Um lampião esquecido num canto As coisas mudam O tempo tudo mudou O que fará O tempo ao teu corpo vibrante? Fará apenas velhice Ou uma eterna meiguice? O que fará o tempo às tuas dores? Fará só esquecimento Ou um eterno tormento? Eu bem sei O que fará o tempo Fará lua e sol Noites e dias Indiferente à tua dor E no final Com toda sinceridade O que valerá de verdade Será teu tempo interior FALE DE MIM Música: Irineu Você fala de mim Por todos os lugares Nas esquinas, nos bares Fala de mim Sai pelas ruas Dizendo aos amigos Que sofreu comigo Mas fala de mim Você fala de mim Que já não faço falta Que você não foi feita Pra sofrer por tão pouco Fala de mim Diz que eu estou louco E na sua procura Fui mera aventura Mas fala de mim Fale de mim Até ficar rouca E lavar toda a roupa Da sua loucura Culpe a mim Por tudo o que quiser Seus fracassos de mulher Que sequer soube amar Fale de mim Até ter-me esquecido Ou não ter mais sentido Falar de mim AMANHÃ DE MANHÃ Não me peça que eu zele Pela sua ausência Quando a essência É mero vazio Não me peça que eu vele Pelos seus mortos Quando esses corpos Nem estão frios Não me cobre respostas Enquanto vira as costas Para os seus desafios Cuide de si, cuide dos seus Amor, adeus Amanhã de manhã As mesmas janelas vão-se abrir Para a luz do sol A vida continua Não há motivos para ser só Então eu lhe direi Amor, vou partir Pois confio na vida E ela, eu sei, Não irá me trair DISTÂNCIA Música: Carlos Dignez Aguilera O ronco dos motores Barulhos da cidade Gente que vai e que vem Mesmo na multidão Estou tão sozinho Distante do meu bem Na televisão Imagens desfilam E os meus olhos não vêem Pois meu pensamento Está numa pessoa Que esta cidade não tem Preparo uma bebida Para tentar vencer A cruel solidão Mesmo assim sua ausência Fere fundo no peito Machuca meu coração Meu Deus Há um misto de dor e prazer No sentimento que me faz sofrer Na distância essa grande dor Porque Essa dor me faz entender Que estou vivo e para viver Preciso muito deste amor CONFESSO Música: Cláudia Carvalho Confesso Todos os crimes que não cometi Ter-te traído sem te trair Assino em branco qualquer confissão Lamento Que todas as dores tivessem que doer Que todos os sonhos tivessem que ruir Tornando escombros o que fora amor Não peço Que releves a minha ilusão Nestes meus vôos impunes de chão Tem coisas que não dá pra dividir E hoje Inteiro e solto por outro caminho Sem jogos de culpa, tampouco sozinho Troco tua estrela por uma constelação MULHER Música: Edson Tadeu Mulher Vejo em teus olhos morenos Feiticeiros e tão serenos Sedução Nosso caso Casamento dos nossos vinhos Viverá mais que os velhos caminhos Do mundo No fundo Se diz, o amor sempre acaba A razão na ilusão desaba Por assim Mas nós dois Não seremos meros escombros Levaremos o sonho nos ombros Até o fim Quiném átomos Num átimo hipnótico Explodirá o nosso amor exótico Sem ferir Radiação Vai durar três milhões de anos Quase tanto quanto os meus planos De te fazer feliz JOGO FATAL Eu descobri você Meio de graça, meio sem querer Você de papel, recém-caída do céu Na esquina da palma da mão Eu tropecei num blues Ao sul do som deste seu sabor Verso cru versus meu planeta azul Inventando o meu próprio equador E decidi jogar Apostar mil graus de calor Ferver o mel, num jogo mortal Na roleta russa do amor Ah... agora viajo no céu No véu de um pecado maior Fantasia brincando cruel No brilho do olhar sensual Ah... agora eu era o céu O seu maluco inventor Astronauta, poeta, pinéu, Criador de um jogo fatal Eu inventei você Meio na raça, por puro prazer Você mulher, mesmo sem saber Pop star de um verbo indolor Eu mergulhei num blues Atei meus sons ao seu corpo nu Troquei os traços dessa fantasia Masquei o aço da sua aura macia E decidi jogar Marcar as cartas, fingir e blefar Burlar o mundo e se preciso for Me perder para ser seu vencedor AMEIXA Blues, o olho cego de um mundo azul Sentiu um toque que jamais sentiu Explosão de amor no coração vazio Blues, o surdo som que ninguém ousou Vibrou tão forte que o planeta abriu Perdeu o tom deste velho blues Gueixa, deixa eu te amar, me deixa Deixa eu cantar essa minha queixa Verbo feroz, meu coração não racha Não acho sequer que o mundo te mereça Ouça, vou-te trazer uma estrela persa Um sol hindu e flores virgens de ameixa Um velho blues e o puro mel de minha raça Te amar de um jeito que nunca me esqueça Teu, meu coração e essa estranha opção Pulsar tranqüilo na palma da tua mão Um prisioneiro e o amor pela prisão Teu, meu mundo inteiro resumido em ti Extrair o som, o dom de parir O sol de uma canção só pra te ver sorrir Gueixa, deixa eu te amar, me deixa... Não, não sei outro caminho que não o teu Já esqueci até quem não me esqueceu No teu amor, minha história se perdeu Não, não posso viver longe de nós dois As coisas da vida eu deixo pra depois O mundo inteiro está dentro de nós Gueixa, deixa eu te amar, me deixa... DOLORIDO CASTIGO Música: Carlos Dignez Aguilera Velhos baús, gotas de luz, ocultas nos cantos do silêncio Cicatrizes, matizes de ferimentos nem tão infelizes Fiz um bom prato, um retrato com recortes de confissões Pendurei no meu quarto, no surrado cabide das ilusões Nos cantos do palco, a dançarina vertia pura magia Eu era a sua platéia... e exagerava demais quando aplaudia Adivinhava seus passos, cada compasso me embriagava Insinuava desastres pelos becos velhos da minha covardia Ela fingia que se sabia feia, e me envolvia Nas tramas mortais de uma deliciosa teia Manhas de aranhas, manhãs estranhas Ela, às vezes, até fazia de conta que eu existia Brinca, meu tempo, brinca comigo Palhaços, piruetas, mocinhos e bandidos Algodão doce, armadilhas, puro perigo Me arrasta pela sarjeta do meu caminho antigo Mas se eu sonhar e puder te fazer um pedido, Faz dessa mulher o meu mais dolorido castigo Cantei para ela uma canção que nem sei se eu sabia Embrulhei o meu tempo, um pacote que sempre perdia Nas rodas da vida, me fiz criança, brinquei de esperança No colo da promessa que ela nem sequer me prometia Eu quis contar do meu amor, mas um temor me implodia Acariciei calado cada lágrima seca que sua boca vertia Num verbo mascado, na silhueta de um segredo remoto Desesperei noite e dia, em cada adeus, quando ela partia REBENTO DA TERRA Música: Cláudio Matos Rio, rio Que brotou nessa nascente Deixando nos olhos da gente Uma cor de esperança e paz Rio, rio A tudo farias verde Agora me faz triste ver-te Um animal ferido e nada mais Restará teu leito seco e vazio Um troféu débil e vadio Aos deuses sagrados pela ambição Restará gritar em minha poesia Que hão de te ressuscitar um dia Com lágrimas sangradas pela razão NOSSOS RITMOS Música: Carlos Dignez Aguilera Eu sou um bolero... você, um jazz Jamais tropeçaremos em compassos Nos passos da nossa viagem Pelos bailes da vida Dois para lá, dois para cá Deslizo na quadratura romântica Da minha canção de amor Ao sabor de uma Cuba Libre Enquanto você inventa sons E faz contorcer o seu mundo No compasso delirante De um sax embriagado Saboreando puro êxtase Agora você é um blues... eu, um rock A melancolia envolve seu salão Enquanto uma voz metálica, intimista Desliza por notas e dores inconfessáveis Tocando fundo feridas segredadas E reabrindo cicatrizes de paixões Impune, rasgo meus compassos Desafio verbos e profecias Sugo a jugular da minha própria alma Numa rebeldia povoada de temores Que escondem e delatam meus crimes De repente você é um rap Libertária senhora de todos os caminhos Rainha dos becos mais ocultos Nas profundezas da cidade do ego Transbordando ritmo e sensualidade Vomitando verdades no peito do mundo Eu sou um samba-canção Entre um drinque culpado e o sentido Nenhum de se morrer por amor Construo tragédias num canto de botequim Cambaleando minha história Entre um verbo mascado e um espelho Que insiste em me dar as costas Você é uma ária, transbordando poesia Pelas manhãs de um tempo esquecido Que ressuscita culpas e inventa perdões Enquanto o mundo segue impune Eu sou apenas um réquiem Um hino de adeus aos sonhos Que não soube construir