o Código Cultural
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o Código Cultural
Nº 24 - Novembro 2012 E!ção de 1º Aniversá"o “O que fazemos não é pesquisa ou estudo de mercado tradicionais. O que fazemos é diferente e se chama Descoberta: nós descobrimos algo que se encontra ali, mas que não podemos enxergar e que é inconsciente.” Dr. Clotaire Rapaille Dr. Clotaire Rapaille Fundador e CEO da Archetype Discoveries Worldwide Entrevistado por Fernando Luzio O vídeo e áudio desta entrevista estão disponíveis em nosso site: www.luzio.com.br 1 Para celebrar o primeiro aniversário do nosso Programa, fomos a Nova Iorque especialmente para entrevistar Dr. Rapaille, fundador, CEO e chairman da Archetype Discoveries Worldwide. Tivemos a oportunidade de trabalhar com Dr. Rapaille por dois anos quebrando códigos estratégicos para empresas nos Estados Unidos e no Brasil. Estamos também celebrando a assinatura de um novo contrato que tornou a Luzio Strategy Consulting representante da Archetype Discoveries Worldwide no Brasil. Dr. (Gilbert) Clotaire Rapaille é conhecido internacionalmente como um expert em Arquétipos Culturais, Criatividade e Inovação. Em 1976, fundou a Archetype Discoveries Worldwide, com www.luzio.com.br base em Tuxedo (Nova Iorque) e com escritórios associados na Bélgica, China, Turquia, Inglaterra, Paris, México, Itália, Índia, Coréia do Sul, Sudeste da Ásia, Rússia e Brasil. Dr. Rapaille introduziu um conceito revolucionário no mundo corporativo: o Código Cultural, que provou ser uma metodologia poderosa para mais da metade das companhias Fortune 500, tais como Boeing, L'Oreal, General Motors, AT&T, Citibank, Chrysler, Colgate, Fox, Kraft General Foods. Sua abordagem singular em Marketing e Estratégia associa um estudo profundo do inconsciente humano com questões práticas do mundo dos negócios. Considerado um dos autores mais lidos em Criatividade, Comunicação e Cultura, Dr. Rapaille escreveu mais de 14 livros, dentre eles “O Código Cultural”, que ocupou a 9a posição no ranking dos mais vendidos da BusinessWeek, e que foi traduzido para 12 línguas – somente na Coréia, “O Código Cultural” vendeu mais de 250.000 cópias. Sua técnica e seu trabalho são uma extensão criativa e inovadora do trabalho de grandes pensadores do século XX, dentre eles Jung, na Psicologia Analítica; Laing na Psiquiatria; LéviStrauss e Ruth Benedict na Antropologia. Suas viagens ao redor do mundo e sua pesquisa extensiva em Marketing sobre arquétipos de produtos, serviços e marcas para corporações e governos, proporcionaram-lhe uma percepção aguçada sobre os CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 2 negócios nas Américas, Europa, Oriente Médio e Ásia. Nos últimos 30 anos, Dr. Rapaille acumulou uma rica base de dados e desenvolveu um processo poderoso para entender a pergunta de ouro: POR QUE as pessoas fazem o que fazem? Fernando Luzio. Dr. Rapaille, muito obrigado por esta oportunidade única, estamos honrados por entrevistá-lo em sua casa. Gostaríamos de iniciar nossa conversa pedindo-lhe que conte uma breve história de sua vida tão interessante. Dr. Rapaille. O prazer é meu. Tudo começou com meu interesse por crianças autistas e sua dificuldade de aprender qualquer tipo de língua, e passei a trabalhar em busca de um entendimento do processo mental implicado no aprendizado de qualquer palavra. Trabalhei na Suíça com crianças tentando aprender francês, alemão e italiano – as três línguas mais faladas naquele país. E, naquela época, fiz uma série de pequenas descobertas sobre o funcionamento do cérebro. Descobri que toda vez em que aprendemos uma palavra, há um momento em que imprimimos pela primeira vez seu significado – seja café, amor, trabalho, qualquer coisa. E quando imprimimos estas palavras, criamos um sistema mental de referências que continuamos usando para o resto da vida. Neste trabalho, compreendi que seja de origem francesa, suíça, italiana ou alemã, estas crianças falavam línguas diferentes, claro, mas ao mesmo tempo, tudo que experimentavam junto com a linguagem era diferente, também. De repente, elas descobriam um mundo através de uma palavra. Por exemplo: nas línguas francesa e alemã, existe uma diferença entre “o sol” e “a lua”– elementos muito importantes em qualquer cultura. Na França, aprende-se que o sol é masculino – le soleil – e le soleil é o Rei Sol Luís XIV; ele é brilhante e poderoso porque na cultura francesa os homens devem ser assim: brilhantes e dominantes. E a lua é feminina – la lune –, tem um poder oculto à noite, sobe e desce. Portanto, quando se é criança, aprende-se muito mais do que apenas as palavras “sol” e “lua”; aprende-se todo um sistema sobre as diferenças entre os gêneros masculino e feminino. E todas estas categorias mentais são inconscientes. Para um alemão, é o oposto: o sol é feminino – sonne. E qualquer alemão www.luzio.com.br Dr. Rapaille introduziu um conceito revolucionário no mundo corporativo: o Código Cultural, que provou ser uma metodologia poderosa para mais da metade das companhias Fortune 500. “O Código Cultural” ocupou a 9a posição no ranking dos mais vendidos da BusinessWeek e foi traduzido para 12 línguas – somente na Coréia vendeu mais de 250.000 cópias. diria “Claro, por que você pergunta, é óbvio?!”, pois é a mulher que brilha, que aquece e faz suas crianças crescerem, portanto o sol é feminino. Já a lua é masculina – mond – porque os homens alemães estão sempre mergulhados no oculto e nas coisas profundas, na Filosofia... Então, naquela época, minha descoberta foi que temos de ter cuidado, pois a tradução de uma palavra não significa nada, e se você traduzir “sol” do francês para o alemão, você perderá o significado profundo e poderoso por detrás desta palavra. E uma consequência banal desta falta de entendimento é que se eu quiser vender shampoo na Alemanha e na França usando o sol como referência, irei acionar uma resposta completamente diferente em cada cultura, sem ao menos ter consciência disso. Portanto, esta é uma questão chave. Um dia, um dos meus alunos pediu que seu pai fosse assistir à minha conferência na Universidade de Genebra. Ele trabalhava para a Nestlé e me disse “O que você descobriu aqui – o significado profundo da primeira impressão de palavras – poderá ser muito útil para nós, pois queremos vender café instantâneo no Japão e não estamos conseguindo mudar o hábito japonês do chá para o café”, o que obviamente não era a estratégia correta. Fizeram-me uma oferta irrecusável, fui ao Japão e quebrei o Código do café para os japoneses. Em seguida, a L’Oreal, associada a Nestlé, iniciou sua expansão global. Fui convidado a dar aulas em diversas escolas de negócio ao redor do mundo, publiquei vários livros e assim as coisas foram acontecendo. Fernando Luzio. Você poderia explicar o que é Código Cultural? Dr. Rapaille. Toda cultura préorganiza a maneira como você lida com os elementos dela. Defino “cultura” como um kit de sobrevivência herdado no nascimento, e em determinada época, deter minado ambiente e geografia, precisamos deste kit para sobreviver. Ele é transmitido de uma geração à outra e, depois de um certo tempo, nem o questionamos mais. A primeira vez em que se aprende o que é café na Itália, por exemplo, é muito diferente da primeira vez em que se aprende o que é café nos Estados Unidos, e é por isso que, nos Estados Unidos, bebemos litros e litros de café todo santo dia e sobrevivemos. Mas, se fosse um café italiano, já estaríamos mortos ao final do dia. Portanto, há uma grande diferença entre o significado do café na Itália e na América. Então, há uma primeira impressão marcante previamente organizada pela cultura. E durante este trabalho nos Estados Unidos, descobrimos que a primeira impressão profunda para café não é SABOR e sim AROMA. Isto é singular para a cultura norte-americana, o cheiro do café é muito forte, e sua primeira impressão marcante ocorre aos dois anos de idade, quando a mãe prepara o café da manhã na cozinha e provoca emoções do tipo: CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 3 eu vou ser alimentado, ela me ama, estou em casa e protegido – todas estas palavras são poderosas e muito positivas. Mas, este é o Código Cultural do café para os americanos, não para os italianos ou alemães. Como estratégia, decidimos que a Folgers deveria ser proprietária do aroma e esquecer o sabor. Deixe os concorrentes lidarem com o sabor porque o Código Cultural para café nos Estados Unidos é AROMA e tudo deve estar on code (sintonizado) com ele, ou seja: o design da embalagem (injetamos o aroma no pacote e quando você o abre, shshsh, o aroma vem direto em seu rosto) e todos os demais elementos comerciais devem estar on code com AROMA. Eu disse a eles que nunca gostaria de ver a marca Folgers associada a alguém bebendo café – de jeito algum! E eles ficaram surpresos: “Mas, nós vendemos café” e eu disse “Não, vocês não vendem café, vocês vendem AROMA. Deixe os outros venderem o sabor.”. Assim, defino Código Cultural como um sistema de referências (como por exemplo mãe, café da manhã, lar, segurança, etc.) impresso quando somos bem pequenos, por meio de uma energia emocional associada a ele. O Código aciona este sistema de referências – o Código do café é AROMA e AROMA ativa todo o sistema associado a ele. Fernando Luzio. Você poderia nos dar uma visão geral do processo da Descoberta do Código e explicar sua diferença com uma pesquisa de mercado tradicional? Dr. Rapaille. O que fazemos não é pesquisa ou estudo de mercado tradicionais. O que fazemos é diferente e se chama Descoberta: nós descobrimos algo que se encontra ali, mas que não podemos enxergar e que é inconsciente. E como fazemos isto? Seguimos o Princípio dos 3 Cérebros: nós temos 3 cérebros. O primeiro é o Córtex; o segundo é o Límbico; e o terceiro é o Reptiliano – a parte mais antiga. E minha teoria é que o Reptiliano sempre vence, não importa o que você faça. Se você tocar o Reptiliano, boom! O processo envolve grupos de pessoas que, durante sessões de 3 horas, são guiadas por nós até o primeiro momento de suas vidas em que foi profundamente impresso, com a energia emocional, aquilo que queremos descobrir. Para alcançarmos isso, devemos eliminar o Córtex durante a primeira hora, quando deixamos as pessoas falarem. Não nos importamos com o que é dito porque não acreditamos no que as pessoas dizem. A primeira hora funciona como uma lavanderia e, quando termina, todos estão contentes porque acreditam que deram uma grande contribuição ao trabalho – mas não há nada relevante e não aprendemos nada de novo nesta etapa. A segunda hora é mais emocional e se dá através do Límbico, onde se encontram nossas contradições e tensões. A melhor forma de explicar este mundo de tensões é por meio do meu trabalho ao redor do mundo sobre mães e sua forma de se relacionarem com seus filhos. Em qualquer lugar – China, Índia, Itália, França, Alemanha, Brasil –, as mães me dizem “Quero que meus filhos cresçam e se tornem independentes”; “Não quero que eles cresçam e se tornem independentes”; “Ah, eles são tão bonitinhos quando pequenos...”. Há uma tensão e toda mãe a sente: ela quer que seus filhos cresçam porque se trata de um programa, mas ao mesmo tempo não querem que eles partam. Quando as empresas me dizem “Queremos que nossos clientes amem nossos produtos”, pergunto “Por que? Vocês querem que seus clientes amem seus produtos e nunca os comprem, ou querem que eles odeiem seus produtos e sempre os comprem?”. Porque não há nenhuma conexão imediata entre as duas coisas. O elemento chave que queremos criar com o Código descoberto é um relaciowww.luzio.com.br namento intenso, e amor-ódio é algo muito poderoso que cria relacionamentos longos. Nesta segunda hora, vamos para o terceiro cérebro. Então as pessoas ficam confusas, não sabem mais o que estão fazendo ali e isso é bom. E na terceira hora, elas se deitam no chão e explicamos que queremos recriar o mesmo estado mental que experimentamos ao acordarmos pela manhã. Por quê? Porque logo nos primeiros 5-10 minutos em que acordamos, nosso Córtex ainda não está lá – normalmente ele se levanta tarde para o trabalho matutino –, então não há controle, ainda nos encontramos na conexão entre o Reptiliano e o Límbico e podemos nos lembrar de nossos sonhos. Mas, se não os anotarmos ou pensarmos neles imediatamente, 5-10 minutos depois já os perdemos. Portanto, este é o estado mental singular que queremos recriar na terceira hora. Depois do relaxamento, ainda deitadas no chão, coisas surgem na mente das pessoas e elas exclamam “Que incrível, lembrei de algo esquecido há 30-40 anos!”. Elas anotam suas primeiras histórias e o documento que temos no final do processo é manuscrito. Depois, estudamos a estrutura – o padrão existente em todas estas histórias. Buscamos o “espaço entre”, digamos assim. Meu professor, Lévi-Strauss, dizia que a mãe não é a mulher; a mãe é o espaço entre a mulher e o filho, portanto, sem mãe não há filho, e sem filho não há mãe. É o “espaço entre” que precisamos entender. Esta noção de estrutura é muito interessante: a música não é feita de notas; música é o espaço entre notas. Você pode tocar diferentes notas com a mão direita ou esquerda, no piano ou em outros instrumentos, porém a única coisa que você deve respeitar é o “espaço entre”, e é nisso que consiste nossas descobertas: qual é o espaço entre os diferentes elementos daquelas histórias? Qual é o “espaço entre” que cria o sistema inconsciente de referências, a melodia inconsciente que as pessoas usam e ativam quando pensam sobre uma determinada marca, um determinado produto, uma categoria, um país? E por se tratar de algo inconsciente, é fundamental seguir todo um processo para revelá-lo, já que não se pode vê-lo imediatamente. Algo muito importante desta metodologia é o anonimato. Já realizei diversas descobertas sobre temas que são verdadeiros tabus. Meu primeiro trabalho para a P&G (Procter & Gamble) foi sobre “papel higiênico”. Imagine-se convidado a participar de um focus group com 20 estranhos para falar durante duas horas sobre como você usa papel higiênico?! Não daria para obter muita coisa disso, provavelmente as pessoas diriam “Quero que ele seja macio e que esteja em promoção. Muito obrigada. Posso ir embora?”. Mas, quando realizei este trabalho, graças a todo o processo envolvido, o que descobrimos foi absolutamente incrível e poderoso, e a P&G ficou impressionada: “Nunca descobrimos nada igual” – depois disso, descobrimos mais de 30 Códigos para eles. Fernando Luzio. Somos fascinados pelos Códigos que você já quebrou, entretanto, 2 deles são muito provocativos e inspiradores, tanto para os indivíduos, quanto para as empresas. Você poderia compartilhar conosco um pouco de suas descobertas sobre os Códigos da Beleza e do Luxo? Dr. Rapaille. Vou compartilhar um pouco mais do que você poderia encontrar em meus livros porque já realizei mais trabalhos sobre estes temas. Beleza é algo muito Reptiliano. Somos programados para encontrar a Beleza que seja útil ao nosso cérebro Reptiliano – seja na Música, Arte, Ópera, Pintura e Escultura, sempre haverá algo ali muito Reptiliano. Por exemplo: a beleza feminina. Um casal indiano realizou uma pesquisa sobre o que há de mais belo no formato do corpo da mulher – toda e qualquer cultura se interessa por isso! Eles estudaram o corpo da mulher em diferentes culturas CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 e séculos, através da cultura propriamente dita e das pinturas dos egípcios, gregos, romanos, etc.. Espalharam eletrodos pelo corpo de um grupo de homens e lhes mostraram algumas imagens de mulheres a fim de descobrir qual os excitava mais. Estes homens não precisavam falar nada. Se o aparelho fizesse o som IHH, significava que eles estavam excitados; se o som fosse OHH, significava que não haviam se excitado. E com isso, encontraram uma estrutura inconsciente e global, um Código para a Beleza. Quando o corpo da mulher é reto, o aparelho faz soar um OHH, mostrando que ninguém ficou excitado, como um gatilho, uma mensagem para o cérebro Reptiliano, informando que aquele corpo não diz nada. Mas, se o corpo da mulher tiver a forma de uma ampulheta, o aparelho soa um IHH, mostrando que os homens ficaram excitados. Por quê? Em primeiro lugar, não somos tão idiotas assim, já que somos programados a encontrar uma mulher que nos dê uma chance maior de reproduzir nossos genes. Quando a mulher tem o corpo reto, não a desejamos porque isso seria uma perda de tempo. Mas, quando seu corpo tem o formato de uma ampulheta, a mensagem é “Uau, ela é a mulher”. E eles também descobriram outra coisa muito interessante: o gatilho é a relação entre a cintura e o quadril, e esta relação deve ser de 0,7. Então, se a razão entre ambos for de 0,7, soará IHH ao redor do mundo! Impressionante! E mais: descobriram que mulheres com 0,7 têm mais filhos, vivem por mais tempo e têm menos câncer. Novamente, não somos tão idiotas assim! Igualmente interessante é que não se trata de quão gorda a mulher é. Se ela for bem gorda e tiver 0,7, seu corpo ainda fará soar o IHH, pois não se trata da gordura e sim da distribuição da gordura ou aonde a mulher coloca sua gordura. Graças a esta descoberta, podemos entender a Moda: por que os egípcios inventaram o espartilho há 5.000 anos? Porque ele servia para apertar a mulher e fazer sua cintura ficar menor, até chegar aos 0,7. E por que os franceses inventaram aqueles vestidos volumosos? Novamente, para criar os 0,7. Então, tudo começa a fazer sentido. Não se trata de mero acaso ou acidente. Isto acontece porque, inconscientemente, temos uma percepção de Beleza que é chave. Existem muito mais elementos no Código da Beleza... Da mesma forma, o Luxo varia de uma cultura para outra. Por exemplo: na cultura francesa, o Luxo deveria ser algo sem utilidade; já na cultura americana, nada é inútil. Nos Estados Unidos, se você colocar um lenço em volta do pescoço é porque você não quer pegar um resfriado, e isso não tem nada de luxuoso. Mas, na França, se você jogar um lenço no ombro – não significa que seu ombro poderá pegar um resfriado, ele não precisa disso –, trata-se de algo inútil e, portanto, é a beleza da elegância. Se você precisar daquilo por algum motivo, ele deixa de ser elegante. “O futuro do LUXO será MÃO, e não ‘feito na França’ ou ‘feito na China’. Já não se trata apenas de Luxo, mas da paixão do artista, do artesão que faz algo à mão com muito cuidado e sob medida.” Dr. Clotaire Rapaille 4 www.luzio.com.br O mesmo acontece com a gastronomia na França: você não come porque precisa de alimento. Você come por prazer. Você não bebe vinho porque tem sede – se estiver com sede, beba água. O vinho é para o prazer. A cultura americana é bastante oposta: tudo precisa de um propósito. As percepções aqui são muito diferentes. A propósito, existem muitas semelhanças entre o Luxo na França e na China. A aristocracia e o Império chineses têm uma percepção da Beleza como algo muito puro, nada mundano. Recentemente, descobrimos algo muito interessante para nossos clientes: existe um Código global para o Luxo, e este Código se resume a uma simples palavra que nos leva a compreender o Luxo de forma global – e é esta a beleza do trabalho que fazemos. Qual é esta única palavra? MÃO. O futuro do LUXO será MÃO, e não “feito na França” ou “feito na China”. LUXO é FEITO À MÃO, customizado. Já não se trata apenas de Luxo, mas da paixão do artista, do artesão (artisan) que faz algo à mão com muito cuidado e sob medida. Hermès é um ótimo exemplo de uma empresa bem sucedida globalmente – e eles nem utilizam a palavra Luxo! Recentemente, conversei com eles em Paris e eles me disseram “Nós não estamos no negócio do Luxo, estamos no negócio do Artesanato”, de volta ao tempo medieval onde havia o artesão que ama seu ofício e que precisa trabalhar duro para se tornar um maître, um mestre em sua arte e no seu artesanato. Portanto, coisas feitas à mão: CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 5 impressionante! Por exemplo, o novo Rolls Royce: todo o couro por dentro dele é feito cuidadosamente à mão e sob medida – algo bastante importante. Algumas marcas não podem entregar isso de forma total e completa, mas podem sim oferecer alguns itens, como faz o Mini Cooper: você pode escolher algo especialmente só para você, pode colocar a bandeira inglesa no teto do carro, por exemplo. Esta é a direção do Luxo. Produção em massa não será, de forma alguma, Luxo. Apenas o que for feito à mão e de forma singular. Acabei de comprar um sofá Hermès na França e eles me disseram “Você deve nos pagar adiantado e a entrega irá levar 6 meses.”, porque criar algo luxuoso demanda tempo. De vez em quando eu posso ir lá ver o progresso do meu sofá – 3 pessoas estão trabalhando duro nele, fazendo-o à mão, testando um couro, depois outro... É uma obra de arte! Eles são artistas. Na França, “artesão” (artisan) e “artista” são quase a mesma palavra, o que eu gosto muito, pois valoriza o talento e a paixão, a dedicação e o comprometimento que algumas pessoas têm ao realizarem um bom trabalho. Por isso, acredito que a produção em massa não será mais interessante. Se por u m l a d o , o p r e ç o d o p ro d u t o massificado cai o tempo todo, o preço do Luxo aumenta ilimitadamente. Hoje em dia, você encontra um carro Bugatti custando US$ 2,5 milhões. Aonde está o limite? Isto é muito especial, muito singular. Fernando Luzio. E quanto aos indivíduos, podem ser descobertos? Eu possuo um Código Pessoal? Você conhece seu Código Pessoal? Dr. Rapaille. Claro! Isso é fascinante. Quando trabalhei com crianças, havia um elemento chave: quando bebês estão juntos e um começa a chorar, todos os outros também começam a chorar, pois eles não conhecem a diferença entre si mesmo e os outros. Depois, existe um momento na evolução da criança em que ela diz “Não” pela primeira vez, depois diz “Eu”, “Eu quero”, “Eu não quero”. E esta primeira descoberta da própria identidade é impressionante. Se você tem irmãos e irmãs ou é filho único, todo este sistema cria sua identidade, e é neste momento em que seu Código começa a ser impresso. Depois, há repetição e reforço, o ambiente ao seu redor e seus pais reforçam uma ideia sobre você mesmo que pode ser negativa, claro, como no caso dos neuróticos: “Você nunca será capaz de fazer nada, você é mau”; mas você www.luzio.com.br também pode receber um reforço interessante em outra direção, e aí você passa a se sentir mais autoconfiante. Entretanto, leva tempo para descobrir seu Código Pessoal. E é muito importante entendê-lo, pois a partir daí, provavelmente você não irá se enganar na escolha de sua profissão e irá trabalhar em algo on code com você. Você também poderá escolher o melhor lugar no mundo para morar, e tudo isso ajudará a reforçar seu próprio Código. O grande problema é que muitos indivíduos ficam confusos, desejam fazer isso e aquilo também, e o resultado é confusão e procrastinação – eles acabam não fazendo nada e nem tendo sucesso. Napoleão sabia exatamente quem ele era, e claro que, às vezes, isso pode ser perigoso (risos), mas o fato é que ele conhecia seu próprio Código. As pessoas lhe diziam “Você é louco, quem você pensa que é?!”, “Bem, eu sou o Imperador!”. E quando ele foi feito prisioneiro em sua ilha pelos Britânicos, seu grande sofrimento foi a recusa dos ingleses em lhe chamarem de “Imperador”. Então, é muito importante descobrir e conhecer seu próprio Código, e começar a gerir sua vida on code com ele. E sua pergunta “Você conhece seu Código?”, sim, claro que conheço, e muito bem. Tenho diversos modelos em minha vida, sendo o primeiro, Champollion, um jovem que foi ao Egito com Napoleão e que realizou algo que eu realizo todo dia: ele olhou para os hieróglifos que já existiam há 400-500 anos (não me recordo exatamente) e que ninguém era capaz de entender, e foi o primeiro a decodificá-lo. Passou a ler coisas que estavam ali e que mais ninguém enxergava. E assim é minha vida: olhar para algo que ninguém entende e decodificá-lo. De repente, uau, tudo passa a fazer sentido. Meu nome é Clotaire, que soa muito parecido com Voltaire – um outro modelo para mim. O que eu gosto nele é sua habilidade de ser filósofo, artista, poeta, cientista e, ao mesmo tempo, um excelente homem de negócios! Portanto, meu Código é Voltaire com um pouco de Champollion, Alexis de Tocqueville e assim por diante. Para resumir mais ainda, meu Código é SÉCULO XVIII FRANCÊS. Eu amo tudo que se refere ao século XVIII – não aprecio a forma como ele terminou, pois a Revolução Francesa foi um desastre que matou gente sem motivo – e é entre 1715 (morte de Luís XIV) e 1789 que encontramos as figuras mais fantásticas: Montesquieu, Voltaire, Mozart – a meu ver, a melhor música. Eu amo Mozart. O século XVIII é a arte de viver, a elegância, o estilo, a beleza, o prazer da vida. Sei que pode parecer superficial, mas o propósito central da cultura francesa daquela época era elegância e prazer. Isso é fantástico. Este é meu século e tenho certeza de que, em uma vida passada, fui um filósofo ali. Fernando Luzio. Sempre vi uma forte conexão entre Estratégia e Código Cultural. Definimos Estratégia como um conjunto de escolhas e renúncias que uma empresa deve fazer para gerar uma percepção de Singularidade na mente do cliente, e uma disposição a pagar, criando valor econômico. Atualmente, no ambiente de negócios em qualquer lugar do mundo, não se trata mais de uma batalha por produtos, e sim de uma competição acirrada entre Modelos de Negócios. É por isso que as empresas vêm desenvolvendo a capacidade de desafiar sua Estratégia, o que chamamos de “Inovação do Modelo de Negócio” (Business Model Innovation), que começa com um entendimento profundo das necessidades, aspirações e comportamento do cliente. Desta maneira, podemos desafiar a Proposição de Valor da empresa e desenhar formas mais convenientes de atingir o cliente, por meio de formatos alternativos de canais, estabelecendo relacionamentos mais apropriados com ele – alguns dos blocos construtores da Estratégia. Como podemos utilizar a Descoberta de um Código para revelar um retrato mais fidedigno das necessidades do cliente e, assim, gerar insights poderosos e vantagens competitivas para a empresa? Dr. Rapaille. É essencial entender o que as pessoas realmente desejam, mas ao mesmo tempo, não podemos acreditar no que elas dizem. Então, é óbvio que não adianta perguntar a elas sobre algo de que elas nem têm consciência. Portanto, toda empresa hoje deve entender o que não é dito, o que é inconsciente e as necessidades que ainda não foram endereçadas – o que os clientes desejam, sem saber? E se você quer estar à frente da competição, você precisa ser o primeiro a descobrir o que os clientes realmente querem. E é isso que nós fazemos. Deixe-me dar um exemplo: trabalhamos juntos na Boeing, um de meus clientes, que certo dia me disse “Vamos projetar aeronaves e, para estarmos à frente na competição com o Airbus europeu, queremos saber o que as pessoas realmente desejam em um avião.”. Durante o processo de Descoberta do Código, descobrimos que eles não faziam ideia alguma do que as pessoas queriam porque eles as escutaram, e suas CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 respostas foram “Quero espaço para as pernas, boa comida, bom entretenimento, bom serviço, todos os filmes e tudo o mais.”, e as companhias aéreas disseram “Ok, vamos fazer isso.”. Os europeus acreditaram no que os clientes disseram e construíram o grande Airbus (A380), no qual você irá morrer com outras 800 pessoas! Descobrimos que não era aquilo que os clientes queriam. Pessoas que têm dinheiro e viajam constantemente pegam jatos particulares, onde não existe espaço para as per nas, nem alimentação, entretenimento ou serviço de bordo, e pagam 10 vezes mais por isso. Por quê? Porque quando você usa jato particular, o que você ganha é NÃO-AEROPORTO. O que as pessoas realmente desejam é NÃO-AEROPORTO. Agora, pense na beleza desta descoberta quando todos estão construindo aeroportos cada vez maiores, sendo que eu previ que o que as pessoas querem é NÃO-AEROPORTO. Por quê? Porque costumo dizer que aeroporto foi algo projetado por engenheiros retardados, já que este é o pior lugar onde se deseja ir! A possibilidade de chegar com seu automóvel próximo ao jato particular em um único passo – do carro ao jato – é o ideal. Mas não, veja o absurdo destas companhias e aeroportos que ficam acrescentando, a cada momento, um passo a mais: agora você tem de ir lá pegar sua bagagem; depois você tem de ir ali; depois você tem de passar pelos seguranças; depois tem de tirar os sapatos... a todo momento, um passo a mais! Por isso, projetamos o Boeing 787 (Dreamliner), um grande sucesso da Boeing que compete com o Airbus. Se você quiser ir de Paris a Detroit de Airbus, você deverá fazer uma conexão em Chicago e trocar de aeronave; aí eles perdem sua bagagem; o voo está atrasado e tudo o mais. E o Airbus só pode seguir fazendo conexões porque precisa de muito mais espaço para pousar e decolar. O Dreamliner é o oposto, nele você pode ir de qualquer lugar a outro nonstop (sem paradas). Não eliminamos totalmente os aeroportos, mas MENOS AEROPORTOS tem sido a direção “...se você quer estar à frente da competição, você precisa ser o primeiro a descobrir o que os clientes realmente querem. E é isso que nós fazemos.” Dr. Clotaire Rapaille 6 www.luzio.com.br correta. Quando tenho de voar a trabalho, digo “Quero nonstop”, e às vezes eles tentam me enganar dizendo “É direto”, mas “Não, eu não quero direto, eu quero nonstop!” – pois eles dizem que é direto, mas você acaba tendo de trocar de avião em São Paulo (risos). E deixe-me dizer o que irá acontecer: a Índia é muito atrasada em termos de infraestrutura e começou a investir grandes volumes de dinheiro na construção de aeroportos tão grandes que, necessariamente, precisam estar afastados da cidade. É como o Aeroporto Internacional de Denver, que chamo de “O mais Débil Aeroporto Internacional do Mundo”, pois é tão distante de Denver que você precisa viajar por uma hora de carro para chegar lá – justamente quando o que as pessoas desejam é NÃO-AEROPORTO. E qual será o papel da tecnologia? Primeiro, já temos tecnologia suficiente para fazermos as aeronaves decolarem sem aeroportos, portanto não precisamos mais de aeroportos. Hoje a utilizamos exclusivamente com propósitos militares, mas de qualquer forma, podemos decolar do topo de qualquer edifício; segundo, temos tecnologia suficiente para construirmos aviões completamente silenciosos – nenhum ruído. Claro que isto custa muito dinheiro e ainda não chegamos lá, mas lembre-se que no início da história dos automóveis era preciso que alguém ficasse com uma bandeira e um trompete na frente do carro para atravessar uma cidade, e naquela época se dizia “Ah, isso nunca irá se propagar, não haverá carros em qualquer lugar porque para isso é preciso bandeiras e trompetes...”. Hoje, acontece o mesmo com os aviões: “Nunca teremos aviões assim porque custa muito caro desenvolvê-los.”. E, por último, agora estamos desenvolvendo jatos particulares por US$ 1,5 milhões: mais barato que um Bugatti! E serão cada vez mais baratos até se tornarem táxis. Táxis! CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 “...não gosto da palavra ‘Sustentabilidade’ porque não queremos sustentar; queremos aprimorar, queremos incrementar, queremos crescer. ‘Sustentar’ é como usar o freio e parar. Crescimento zero não é Reptiliano e é por isso que, em termos de slogan e filosofia, a Sustentabilidade não tem tido aderência, pois é como se desistíssemos do Reptiliano.” Dr. Clotaire Rapaille Residência do Dr. Rapaille em Tuxedo (Nova Iorque) Se eu quiser ir daqui a Detroit – o que não é tão longe –, levarei uma hora até o aeroporto; mais duas horas de antecedência para pegar o voo; mais uma média de 30 a 45 minutos de atraso nos voos; mais duas horas de voo, mais uma hora de espera pela bagagem na chegada, o que já somam quase 9 horas! Ora, este é o tempo que eu levo para chegar em Detroit de carro! Quando eu trabalhava para a GM, eu ia a Detroit de carro, o que era bem melhor, pois eu parava quando queria, levava quantas malas quisesse e não era insultado pelos seguranças. No futuro, terei um jato me pegando aqui e me levando ali, e um voo de 2 horas será um voo de 2 horas. Os clientes não calculam o tempo da mesma forma que as companhias aéreas – que te informam o tempo do portão do embarque ao portão de chegada. Não. Meu tempo é aquele da minha casa até meu encontro em Detroit! Então, o que os clientes querem? Eles querem que o tempo de viagem seja o tempo real, e não querem mais perder todo aquele tempo entre um destino e outro. E é isso que terá sucesso no futuro. Já podemos ver os produtores de pequenos jatos particulares fazendo fortuna. E você poderá me dizer “Ah, mas isso é para uma minoria”, sim, como os carros foram no início do século XX: só para uma minoria... Eu previ que, no futuro, todos estes aeroportos malucos que estão sendo construídos na Índia e China irão se tornar 7 www.luzio.com.br museus do passado porque ninguém irá para lá, ninguém irá precisar deles. O que aconteceu com os cavalos e as carruagens irá acontecer com os aeroportos! Novamente: o que as pessoas querem é NÃO-AEROPORTO. Aeroportos grandes com mais trânsito não têm razão de ser! Portanto, isto é evolução, e para se prever o futuro é preciso entender isso. Fernando Luzio. Diversos Modelos de Negócios tradicionais – como as indústrias de Mídia, Publicidade, Automóvel, Energia e outras – estão sendo desafiados e ameaçados por tecnologias desruptivas e outros fenômenos sociais. Por exemplo, na sua opinião, o livro físico irá desaparecer nos próximos anos? Como o processo de Descoberta do Código poderá ajudar estas indústrias a redesenharem seus Modelos de Negócio e a se readaptarem? Dr. Rapaille. É muito interessante, fui contatado pela Pinguin, em Londres. Estamos trabalhando juntos. Eles querem entender o Código para livros. O que é um livro? Por que precisamos do livro? Eu costumo dizer que o Reptiliano sempre vence e o livro é algo que você pode tocar, sentir, carregar; ele tem um peso e um som quando você o folheia. Existe toda uma relação sensível com o livro. Você não tem isso com um e-book ou com um iPod. Portanto, existe uma dimensão no livro que você não encontra em outros dispositivos. CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 8 Além disso, já realizamos muitos trabalhos sobre Internet e tecnologia, e é impressionante como se perde tempo nestas coisas! Se eu quiser ir à página 190 deste livro e você estiver com um iPod, chegarei lá antes que você. Então, perde-se tempo para ganhar tempo. Eu não perco tempo quando quero percorrer meu livro... Temos realizado inúmeros trabalhos sobre Criatividade e vimos como nosso cérebro é sensível ao ambiente e às coisas que se encontram ali, e que conscientemente não percebemos. Somos influenciados por este entorno. Quando estou na minha biblioteca com meus livros, sei exatamente onde eles se encontram, gosto de tocá-los, e isto estimula minha mente. Se olharmos com maior profundidade, na realidade, o mundo eletrônico é muito superficial. Rápido, mas superficial, nunca podemos nos aprofundar ali. Hoje, algumas pessoas que acessam a “Enciclopédia Britânica” na Internet querem vê-la na forma de livro, por isso é um erro mortal acreditar que o eletrônico irá substituir o físico. Em termos de cérebro Reptiliano, você até pode ver seus filhos pelo Skype, conversar com eles, mas isso irá substituir seu abraço? Beijá-los, tocá-los, comer com eles? Simplesmente nunca irá substituir! É impressionante assistir à evolução atual do Luxo em diferentes lugares da Califórnia e Europa, onde há hotéis sem nenhuma eletricidade e onde você não pode usar nem celular, nem computador. Só há velas, fogo na lareira e livros. E você paga US$ 1.000 a diária, apenas para ter o privilégio de não ser perturbado pelo “pim-pom-bin-bon”. É aí que vemos a necessidade de coisas reais. Passado um tempo, você precisa de meditação, precisa de tempo para pensar, de tempo para estar com seus filhos e fazer coisas simples, tocar as pessoas. E é por isso que o livro será feito à mão – por falar nisso, publiquei uma edição especial de aniversário do meu livro “O Código Cultural” que é assinada, numerada e que, no final, possui a impressão da minha mão –, o símbolo do Luxo: um livro feito à mão! De novo, isto é evolução. Tentamos criar livros de bolso sem nenhum valor e, ao mesmo tempo, temos encadernações de couro que são belíssimas. É mais do que conteúdo. Costumo dizer que “a estrutura é a mensagem”, então o fato de eu gostar de tocar este livro já é uma mensagem. E eu não tenho esta mesma sensação com a Internet. Agora, é ótimo ter acesso a Internet e a todo o sistema de referências que ela proporciona quando quero pesquisar coisas para meus livros, porém isto não muda o fato de que sei onde meus livros se encontram e de que eles são meus amigos na vida. Existe um ditado francês que diz “Uma casa sem livros é como um homem sem alma” – não acredito que a alma eletrônica irá substituir isso. Fernando Luzio. Como você já mencionou, Sustentabilidade é “a nova moral” das companhias contemporâneas. Temos testemunhado o desafio de diversas empresas educarem seus stakeholders e alinhá-los com uma mentalidade e atitudes sustentáveis. Como podemos imprimir Sustentabilidade na cultura corporativa das organizações modernas? Dr. Rapaille. Em primeiro lugar, não gosto da palavra “Sustentabilidade” porque não queremos sustentar; queremos aprimorar, queremos incrementar, queremos crescer. “Sustentar” é como usar o freio e parar. Crescimento zero não é Reptiliano e é por isso que, em termos de slogan e filosofia, a Sustentabilidade não tem tido aderência, pois é como se desistíssemos do Reptiliano. Para o cérebro Reptiliano, devemos criar relações de crescimento harmoniosas, e não apenas sustentar. Crescimento e mudança – uma coisa da qual temos certeza é que as mudanças nunca irão mudar, o mundo muda o tempo todo e www.luzio.com.br Sustentabilidade significa ser capaz de antecipar as mudanças e estabelecer uma relação de harmonia com elas. Prefiro mais a palavra “Harmonia” do que “Sustentabilidade” – um tipo de opressão. Eu gosto de movimento, de crescimento, inovação e progresso. Por isso, as noções de harmonia no longo prazo e crescimento recíproco são muito interessantes para mim. Reciprocidade é algo muito chinês. Quando descobrimos o Código da China, entendemos porque os chineses não gostam dos americanos, pois estes só usam aqueles para fazer uma venda, enquanto os chineses não. Para os chineses te respeitarem, é preciso falar em Reciprocidade com eles. Sustentabilidade no longo prazo significa eu cuidar de você e você cuidar de mim. Isto é Reciprocidade e uma abordagem Confucionista: devemos cuidar uns dos outros porque estamos em interrelação. Precisamos uns dos outros, então de que adianta eu ganhar, se você perder? Não se trata apenas de ganha-ganha, é mais do que isso: é crescimento constante, não somente entre pessoas, como também com o entorno e o Planeta. E algo muito importante atualmente é nosso antropocentrismo: pela primeira vez, os humanos estão modificando o Planeta sem prestar a devida atenção a isso. Buckminster Fuller disse : “O Planeta Terra é uma espaçonave sem piloto”. Mais do que proteger nosso Planeta, precisamos de um piloto, alguém que nos diga qual o caminho a seguir e o que fazer em direção ao crescimento da Terra. Fernando Luzio. Estratégia é algo intimamente relacionado a comportamento humano, pois para suportar a execução da Estratégia, as pessoas devem mudar a maneira com que habitualmente trabalham. E ao mesmo tempo em que as pessoas desejam mudar, elas resistem à mudança. Por quê? Você acredita que as pessoas realmente possam mudar? Como o processo de Descoberta do Código pode ajudar as empresas com os desafios da Gestão da Mudança? Dr. Rapaille. Este é um tema fascinante. Minha primeira reação é: sim, as pessoas podem mudar. Mas, às vezes é tão difícil que é bem mais fácil contratar outra pessoa. A piada é “Não mude as pessoas, mude de pessoas” – ou seja: contrate outra porque é mais rápido. Por que é tão difícil assim mudar? Porque normalmente as empresas querem que as pessoas mudem quando já é tarde demais – quando chegamos, é tarde... Voltando para minha experiência com aprendizado de línguas estrangeiras, eu falo inglês com sotaque porque aprendi a língua muito tarde. Já meu filho, Dorian, fala francês, inglês e espanhol sem nenhum sotaque porque aprendeu estas três línguas antes dos cinco anos de idade. Quando você aprende cedo, a impressão marcante logo acontece no seu cérebro e aí passa a ser muito difícil mudar. Meu paladar para queijos é francês. Já experimentei os queijos americanos, mas não vou e nem quero mudar de paladar porque gosto dos franceses. Existem elementos com os quais nos sentimos mais confortáveis; há uma zona de conforto na mente e no inconsciente de todos nós que nos faz não querer mudar. Então, mudar indivíduos é possível, mas muito difícil. O que podemos fazer é descobrir nossas tensões. Sempre há tensões em nós: amamos e odiamos ao mesmo tempo; há coisas que gostamos e coisas que não gostamos. E podemos nos mover nestes eixos, indo um pouco mais para um lado ou outro. Por exemplo: eu nasci na França e tenho diversas marcas profundas da cultura francesa. E durante a guerra, tive minha primeira marca profunda dos americanos: um tanque e os alemães fugindo. Imediatamente, imprimi no meu cérebro que todos os americanos eram os vencedores, os fortões e que eu queria ser um deles. CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 9 Depois disso, assisti aos filmes com Gary Cooper, John Wayne, Burt Lancaster e muitos outros com os quais me identifiquei. Desta forma, tenho imprints dos dois lados – francês e americano. Eu quero mudar? Bem, se eu quiser mudar no sentido de trabalhar mais arduamente, desloco-me para meu lado americano; se eu quiser curtir mais o luxo e o prazer, vou para meu lado francês. Isto não significa que estou realmente mudando, mas sim que estou me deslocando dentro do meu próprio eixo. Portanto, uma forma de fazer as pessoas mudarem é descobrir os eixos de tensão existentes em seu Código Pessoal, e ajudá-las a se moverem em uma ou outra direção dentro do eixo. Não é possível mudar os eixos, pois já não se imprime mais quando se tem 30, 40 anos – é tarde demais –, porém é possível descobrir estes eixos e a direção em que se quer seguir; descobrir os elementos que já se encontram ali, torná-los conscientes e se deslocar para a posição que se deseja. Aí sim, claro que você irá se mover. Mas, se alguém tentar lhe impor algo de fora, nada se moverá. E as empresas, podem mudar? Sim, elas podem mudar até mais rápido do que os governos e os políticos porque existe um voto diário: vender ou não vender seu produto. E uma forma bem sucedida de fazer as pessoas mudarem nas organizações é o que chamo de “feedback imediato”: elas devem conhecer imediatamente o resultado de suas ações. O problema é que se atrasa demais o feedback e a recompensa – experimente treinar um cavalo dando-lhe feedbacks uma vez por ano: você nunca irá treinar o cavalo, pois ele precisa disto imediatamente. Trabalhei para o Cartão de Crédito MBNA e disse a eles que, quando as pessoas estão tentando vender, elas devem ter uma meta clara diante delas, por exemplo: hoje, queremos vender 200.000 novos Cartões de Crédito, a equipe inteira. A partir daí, deve haver um placar no alto mostrando o quanto se atingiu naquele dia – 185.000, 190.000... –, assim elas poderiam ver imediatamente seu desempenho e alcançar os resultados. Quando se paga bônus aos funcionários no final do ano, não há incentivo imediato. Hoje, a tecnologia possibilita o feedback imediato que, em tempo real, ajusta o comportamento das pessoas de acordo com o que elas estão fazendo bem ou não. E nós não aproveitamos esta tecnologia. Nós burocratizamos e atrasamos – tudo errado. www.luzio.com.br “O elemento chave que indica se uma cultura terá sucesso no futuro é sua contribuição para o Planeta. (...) O que os brasileiros podem trazer ao mundo? Uma cultura feminina, o lado da mulher e a noção de ‘mulher guerreira’.” “Estou completamente convencido de que, no futuro, os líderes globais serão mulheres e precisamos começar a pensar como mulher.” Dr. Clotaire Rapaille Um outro exemplo: anualmente, 100.000 pessoas morrem nos Estados Unidos por má prática ou erros hospitalares – duas vezes mais do que durante a Guerra do Vietnã, anualmente. Como podemos mudar isso? Bem, não existe nenhum indicador do que os médicos estão fazendo. Não há medição, nem feedback da forma com que os médicos descartam o lixo; de como tratam de um paciente seguido do outro sem higienizar as mãos. Se você sinalizar toda vez que os médicos lavam as mãos antes de tratarem dos pacientes, eles visualizarão a curva de progresso. Quantos descartam corretamente o lixo hospitalar? Eles enxergariam isso e poderiam fazer melhor no dia seguinte. Afinal, as pessoas querem fazer o melhor que podem. E sinalizar que elas estão indo melhor do que ontem é uma recompensa. É simples. Mas, se você não mostra, elas ficam sem saber, então como é que elas irão mudar? Fernando Luzio. Você já quebrou o Código de diversas culturas. Qual é a sua percepção sobre as forças e fraquezas da cultura brasileira, e como elas afetam nossa competitividade ao fazermos negócios em um mundo globalizado? Dr. Rapaille. Existe o cliché “O Brasil é o país do futuro”, e ele tem sido o país do futuro há o que, 100 anos? Parece que o futuro nunca chega (risos), mas eu acredito que já está chegando. Fui ao Brasil pela primeira vez em 1969 para estudar os índios do Xingu (participei do Museu do Índio) e, desde então, tenho assistido à evolução do seu país. Percebo um potencial absolutamente incrível. O elemento chave que indica se uma cultura terá sucesso no futuro é sua contribuição para o Planeta. Exatamente isto: qual é a sua contribuição? Gostem ou não, a única coisa que a cultura francesa pode dar ao resto do mundo é Luxo – a única coisa que eles podem fazer: Cartier, Van Cleef, Champagne. O que os brasileiros podem trazer ao mundo? Uma cultura feminina, o lado da mulher e a noção de “mulher guerreira”, que significa: vou trabalhar duro todo santo dia para melhorar a condição de vida da minha família; sei que a vida é dura, sei que não tenho dinheiro suficiente, mas mesmo assim eu não desisto e trabalho um pouco mais a cada dia – a persistência combinada com um certo realismo e otimismo; a consistência com o trabalho duro e com o aprimoramento são muito fortes. Estou completamente convencido de que, no futuro, os líderes globais serão mulheres e precisamos começar a pensar como mulher. Atualmente, estou trabalhando com Educação Superior ao redor do mundo e, na maioria das escolas de negócio, não existem aulas sobre “como pensar como uma mulher pensa”. Um grande erro! Por quê? Porque nós só pensamos como homens e não entendemos que as mulheres pensam diferente. Qual é a grande diferença? Os homens definem as coisas assim: isto não, fora; isto não, fora. CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 10 Eliminando, eliminando e pronto, agora está definido – vale dizer que isto vem de uma base de dados e é fruto de trabalho ao redor do mundo. A mulher, por outro lado, define por inclusão: isto é também; isto é também; isto é também... e o que é difícil para o homem aceitar é que isto não tem fim. Você pode continuar incluindo, incluindo... O Brasil é uma cultura muito feminina e podemos aprender com esta dimensão inclusiva. Lembro-me do dia em que comemos uma feijoada juntos, e algo que aprendi sobre a feijoada é que você sempre pode adicionar mais água quando chegam mais pessoas para comer – e elas sempre são bem vindas. Isto não é exclusivo, é inclusivo. Idem no que se refere às raças. Lembro-me de uma linda brasileira, meio japonesa, meio africana e também suíça: ela tinha toda uma mistura e, uau, o resultado era fantástico! Neste exato momento, na Europa, existe um enorme perigo: assistimos à volta do racismo e fascismo. E isto não faz parte da mentalidade brasileira mais inclusiva e aberta. Acho interessante vocês terem uma Presidente mulher – e mesmo o Lula era mais feminino. Esta é uma das coisas que acho muito bacana na cultura brasileira, e esta “inclusividade” é a contribuição que o Brasil pode dar ao mundo. Fernando Luzio. Você mencionou sua preocupação com a Europa. Na visão de um Arquetipologista, como os americanos e europeus podem explorar o poder de seus Códigos Culturais, a fim de superarem a crise e darem a volta por cima? Dr. Rapaille. Hoje, vivemos a crise do domínio do Córtex. Os americanos foram muito bons durante séculos porque não são tão Córtex. O cliché é que os Estados Unidos têm uma forte propensão para a ação – não sabemos muito bem o que iremos fazer, mas vamos fazer! Os europeus, ao contrário, querem pensar, organizar, e aí o resultado é mais leis, mais regulação e lentidão nos processos. E o problema da administração do Obama nos Estados Unidos é que ele tem um jeito de pensar europeu, e aí cria mais leis, mais regulação, lentidão, um governo grande... Ele deveria olhar para a França, onde 65% do orçamento é do governo e de onde todo mundo está indo embora, pois ninguém quer gerar mais nada ali. A França tem um déficit de 100 bilhões de euros, enquanto os alemães têm um superávit de 200 bilhões. Qual é a grande diferença entre os dois? Bem, a rapaziada francesa não quer trabalhar, quer que o Estado cuide de tudo. E a ideia de colocar alemães e gregos no mesmo saco é absurda, nunca irá funcionar. É como tentar aplicar as mesmas leis entre girafas e elefantes: não tem como! Os europeus precisam entender e aceitar que estas culturas são diferentes e, antes de se tornarem uma única grande cultura – o que irá levar séculos para acontecer –, eles precisam mudar para uma nova estrutura que respeite as diferenças culturais. Os britânicos entenderam isso muito bem, sempre se sentiram diferentes, ainda possuem o pound, e não o euro. Um bom exemplo, a meu ver, é a Suíça: um país formidável e bem sucedido. Eles possuem 4 línguas oficiais e cada subcultura é respeitada. Portanto, é absolutamente possível criar algo assim. O problema dos Estados Unidos é mais sério porque não se trata apenas de uma questão entre republicanos e democratas; o problema são os políticos, e não se eles são democratas ou republicanos. O grande governo que temos hoje foi criado por republicanos. Os políticos loucos, visando sua reeleição, gastam, gastam, gastam. E se continuarmos assim, vamos nos transformar numa França. Já temos um dos maiores déficits do mundo e ainda teremos mais regulações. www.luzio.com.br Então, o que os americanos e franceses deveriam fazer? Eles deveriam imitar países bem sucedidos – aquilo que chamamos de “boas práticas” em governo. Já fazemos isso na indústria, por que não fazemos o mesmo no governo? E o exemplo número um para mim é Singapura. Escrevi um artigo em que eu dizia “O senhor Hollande (o novo Presidente francês) deveria fazer uma imersão em Singapura para aprender com os caras lá.”. O modelo de Singapura é único e muito bem sucedido. Eles têm 2% de desemprego, enquanto a Espanha tem 25%, então é óbvio que a Espanha deveria aprender algo com eles. Por que eles são tão bem sucedidos? Porque têm princípios Reptilianos. Antes de mais nada, eles não possuem gás, nem petróleo, nem terras, nem recursos naturais, nem nada. Eles não são como os pequenos e mimados países árabes que vivem de royalties. Eles não têm nada. Então, qual foi a primeira coisa que eles fizeram? Em 1965, quando a Malásia rejeitou Singapura, Lee Kuan Yew – o líder naquele momento – disse “OK, gente, não temos escolha. Temos de ser melhores do que os outros porque não temos recursos, somos pobres e temos de fazer o melhor que pudermos.”. E qual é a primeira coisa que devemos fazer? Limpar: uma prioridade Reptiliana. As mães sabem que seus filhos precisam estar limpos, que a comida deve ser limpa. Então, em Singapura, queremos as casas limpas, as ruas limpas, a comida, você e sua roupa limpos. Limpar, limpar e criar uma mentalidade, um first imprint (uma primeira marca profunda) de disciplina e exigência. E esta primeira coisa que Lee Kuan Yew imprimiu na mente de seu povo não está escrito; trata-se de dever – e uma das polêmicas da cultura americana é que os criminosos têm mais direito do que suas vítimas. A segunda coisa foi: você deve trabalhar duro – o que é muito chinês, uma dimensão Confuciana que diz que você deve trabalhar e aprender. Aprender, aprender, aprender e nunca parar de aprender. E depois, há uma noção de respeito: respeito por sua família, respeito pelo seu pai. Atualmente, a média da renda anual em Singapura é de aproximadamente USD 700 mil. Eles têm mais milionários ali do que em qualquer outro lugar do mundo. Com 5 milhões de pessoas, eles atingem 55 bilhões de superávit (entre importação e exportação) – 1/4 do que os alemães conseguem fazer com 80 milhões de pessoas. Você consegue imaginar isso? Não existe corrupção em Singapura, sabe por quê? Porque todos os funcionários públicos têm, em média, uma renda anual de US$ 1 milhão. Então, se você é Diretor de uma agência governamental, você não precisa de mais dinheiro quando já possui 1 milhão! É impressionante! E porque eles pagam muito bem seus funcionários públicos, os melhores querem se tornar funcionários públicos – novamente, um círculo virtuoso. Além disso, Singapura é um lugar seguro. Já estive lá diversas vezes e as mulheres podem andar à noite nas ruas sem problema algum. Também, não existe grafite porque você vai preso. Realizei muitos trabalhos lá e quando perguntei aos jovens “Vocês viveriam em outro lugar?”, eles responderam “Não. Prefiro morar em Singapura porque é muito melhor aqui.”. Portanto, os jovens amam aquele país, gostam de sua estrutura e segurança; os transportes são quase gratuitos; o metrô é muito bonito e seguro. Meu próximo livro se chama “O Código Global e a Mentalidade Global”, e nele, digo que os líderes globais deveriam observar as melhores práticas ao redor do mundo. E mesmo tendo criticado os franceses o tempo todo, a Medicina francesa é muito melhor do que a americana, em média. Na França, eles têm o dobro de bons resultados por 1/3 do preço (por pessoa) do que nos Estados Unidos. Os americanos vivem um desperdício absurdo. Portanto, eles deveriam aprender: o que os franceses estão fazendo melhor CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 no campo da Medicina? Fernando Luzio. Você conhece minha paixão pelo Japão, e me inquieta ver o que este país vem enfrentando. A economia japonesa experimentou uma enorme expansão depois da Segunda Guerra Mundial e, até a década de 90, liderou algumas inovações tecnológicas e algumas das modernas práticas de gestão – como o Sistema Toyota de Produção Enxuta, a Gestão da Qualidade Total, Just in Time e outras. Hoje em dia, o país vem enfrentando dificuldades para superar o blackout perturbador de criatividade e inovação, e para adaptar o modelo de negócios de suas grandes corporações; pois vem perdendo espaço para seus vizinhos asiáticos. Até mesmo a Toyota experimentou recentemente um recall traumático que colocou em dúvida seu legado de ícone da Qualidade. A indústria japonesa de cinema também perdeu espaço nos últimos anos para os recém-lançados filmes coreanos e chineses. Como podemos ajudar as empresas japonesas a darem a volta por cima e se readaptarem, recuperando assim seu papel relevante no cenário global? Dr. Rapaille. É por isso que o Japão precisa do Brasil, pois o Código japonês é quase o seu oposto. Venho estudando o Japão desde 1964, quando fui para lá pela primeira vez. Tive uma empresa durante um tempo e realizei diversos trabalhos por lá. A cultura japonesa é fascinante – para mim, uma das mais interessantes para estudar e decodificar. Por outro lado, os japoneses são o problema da cultura japonesa. Que problema é esse? Os coreanos que lá permaneceram por 3 gerações ainda são coreanos, ou seja, não houve integração. Os japoneses “japoneizam”, diferente da feijoada onde as coisas se misturam. A mentalidade japonesa é a da pureza da lâmina e da alta densidade do laser, por isso eles são tão bons em qualidade e intensidade, é isso que eles buscam e é por causa disso que, durante muito tempo, eles foram absolutamente melhores do que todo o mundo. Mas, num certo momento, esta alta densidade se tornou egoísta e autocentrada, fazendo-os esquecer do resto do Planeta. Hoje, as companhias japonesas estão tendo de enfrentar diferentes desafios. A Coréia foi ocupada pelo Japão por mais de 30 anos, e os coreanos foram forçados a pensar japonês, falar japonês, ter nomes japoneses; e quando os japoneses partiram do país em 1945, os coreanos voltaram a ser coreanos. Porém, eles integraram em sua cultura todas as coisas boas da cultura invasora, como a qualidade e a densidade. Eles são fantásticos, ao mesmo tempo italianos e japoneses – têm a paixão e a agitação dos italianos, e a densidade dos japoneses. Estes, por sua vez, não são nada italianos. Aliás, nunca integraram a dimensão italiana. As empresas japonesas ainda têm uma mentalidade imperialista. Elas querem impor o Japão e não conseguem se misturar com outras culturas. Por isso, vislumbro um futuro melhor para o Brasil do que para o Japão, infelizmente. Outra grande questão é o envelhecimento da população. Os japoneses têm um estilo de vida saudável, então eles vivem para sempre, nunca morrem, só que é preciso alimentá-los de qualquer forma. Por isso, há uma força tarefa no país para decrescer o envelhecimento da população. Existem muitas semelhanças entre o Japão e a Alemanha – a mesma estrutura inconsciente. Quando os japoneses precisaram criar uma burocracia, copiaram dos alemães. Hoje, eles têm em comum a indústria automobilística, bons soldados imperialistas e foram aliados durante a Guerra, portanto têm uma porção de similaridades. Porém, os alemães conseguiram se manter alemães e se reinventaram. Novamente, o Japão deveria olhar para os alemães e aprender com o modelo de sucesso deles, pois isso não seria off code (dessintonizado), já que ambos amam a abordagem sistêmica. Desta forma, o Japão poderia crescer. Fernando Luzio. Acho muito interessante que, sempre no início do processo da Descoberta do Código, você pergunta ao cliente “Se eu tivesse todas as respostas, quais seriam as suas perguntas?”. Então, gostaria de saber: se eu tivesse todas as respostas, quais seriam as suas perguntas? Que perguntas intrigantes você tem em mente, hoje em dia? Dr. Rapaille. Se você tivesse todas as respostas, minha pergunta número um seria “Onde se encontra o líder “Meu próximo livro se chama ‘O Código Global e a Mentalidade Global’, e nele, digo que os líderes globais deveriam observar as melhores práticas ao redor do mundo. (...) a Medicina francesa é muito melhor do que a americana, em média. Na França, eles têm o dobro de bons resultados por 1/3 do preço (por pessoa) do que nos Estados Unidos. Os americanos vivem um desperdício absurdo. Portanto, eles deveriam aprender: o que os franceses estão fazendo melhor no campo da Medicina?” Dr. Clotaire Rapaille 11 www.luzio.com.br CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012 12 global que poderia ser o piloto deste Planeta?”. E ele não pode ser um político. Talvez seja um rei filósofo, um mago, um sumo sacerdote, algo assim. O fato é que precisamos que um outro Arquétipo surja e nos guie. Neste momento, estamos seguindo por direções tão diversas, destruindo nosso Planeta, o que não é nada bom. Por isso, meu sonho é descobrir esta estrutura para além da política, da economia e das grandes corporações. Qual será o melhor piloto? Fernando Luzio. Para encerrar esta entrevista memorável, se você fosse escrever uma carta para os nossos filhos com seus aprendizados chave e suas recomendações sobre como se tornar um indivíduo e um profissional melhores, qual seria seu maior legado? Dr. Rapaille. Minha mãe era uma mulher muito especial e ela sempre me transmitiu uma simples mensagem que eu gostaria de retransmitir aos meus 2 filhos. Eu era meio maluco quando jovem – ainda sou, mas era uma loucura diferente: um dia eu estava tocando música e disse “Quero ser músico”; noutro dia, “Quero ser pintor”; depois, “Quero curar crianças”; “Vou ser médico”. E minha mãe sempre me dizia “Seja lá o que você for fazer, você será bem sucedido.”. Esta foi uma das melhores mensagens que alguém poderia ter me dado – especialmente por este alguém ter sido minha mãe –, porque isso me fez pensar “Uau, talvez ela esteja certa, talvez eu tenha mesmo sucesso no que eu decidir fazer.”. Então, gostaria que meus filhos tivessem esta autoconfiança. Não queiram fazer o que eu quero que vocês façam. Não queiram ser o que eu quero que vocês sejam. Não queiram ser o que qualquer outra pessoa queira que vocês sejam. E, seja lá o que vocês escolherem fazer, vocês terão sucesso. É equivocado dizer “Ah, quero que meu filho seja médico ou engenheiro”. Esqueça. Deixe seus filhos serem o que eles quiserem. Este é o melhor legado que se pode deixar para os filhos: “Seja lá o que você for fazer, você terá sucesso. Apenas acredite em si mesmo e faça o melhor que puder.”. Fernando Luzio. Seu legado da Descoberta do Código é fascinante e muito on code com o momento histórico de globalização que estamos vivendo, quando o mundo precisa aprender a reconhecer, respeitar e lidar com as diferenças. Sua empresa tem ajudado a educar grandes organizações ao redor do www.luzio.com.br Dr. Rapaille à esquerda; Fernando Luzio à direita mundo sobre como entender e valorizar as diferenças, usando-as a seu próprio favor, e não contra. E todos nós, da Luzio Strategy Consulting, estamos profundamente honrados e orgulhosos de fazermos parte da família ADW e compartilharmos sua Missão. Dr. Rapaille, muito obrigado pela entrevista. Dr. Rapaille. O prazer foi meu, muito obrigado. • O vídeo e áudio desta entrevista podem ser obtidos em nosso site www.luzio.com.br ou gratuitamente na iTunes Store • O PDF desta entrevista também encontra-se disponível em inglês PROGRAMA NOVOS INTÉRPRETES Idealização e Direção: Fernando Luzio e Renê Guedes Entrevistador: Fernando Luzio Tradução: Patrícia Luzio e Christiana Sparks Supervisão Editorial: Patrícia Luzio Edição e Fotografia: Robson Crociati e Henrique Pinto Produção: Luzio Strategy Consulting LUZIO STRATEGY CONSULTING Site: www.luzio.com.br / E-mail: [email protected] Tel: +55 (11) 3045-5651 Rua Afonso Braz, 473 - cj. 43 Vila Nova Conceição - São Paulo - SP 04511-011 Brasil
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