DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO SUMÁRIO: 0
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DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO SUMÁRIO: 0
DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Hernâni Testemunho O. Carqueja de (Director da Revista de Contabilidade e Comércio, Consultor e Gestor de Empresas) SUMÁRIO: 0. Apresentação 1. O Futuro começou há muito 2. Acreditação ... por quem ? 3. Acreditação ... para que funções ? 4. Acreditação ... perante quem ? 5. Acreditação ... consequências 6. Acreditação ... para os clientes 7. Técnico de contas: como traduzir para outras línguas ou enquadramentos legais ? 8. Concluindo e reiterando o agradecimento DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 1 Exmo. Senhor Presidente do 1.º Congresso dos T.O.C. Exma. Comissão de Honra Exma. Comissão Organizadora Exmo. Senhor Presidente e Membros da Comissão Instaladora da ATOC Associação dos Técnicos Oficiais de Contas: Senhoras e Senhores Convidados: Colegas: 0. Apresentação Embora sem originalidade, porque são muitos os que dão idêntico testemunho, entendo dever formalizar o meu agradecimento profissional a todos os que, por não terem desanimado, criaram a oportunidade para este Congresso ou contribuíram para a existência da ATOC - Associação dos Técnicos Oficiais de Contas. Muito me honra e agradeço a oportunidade para solicitar, durante quinze minutos, a atenção dos presentes. Tenho consciência que os quinze minutos de cada um, adicionados, representam mais de três meses em horas de trabalho, o que acentua o meu agradecimento. Mas também me sinto apoiado pela presença de todos; a nossa presença traduz o melhor testemunho de esperança na dignificação e futuro da profissão. O meu recado, focado sobre duas ideias: uma, o futuro começou há muito, e outra que passa pela acreditação dos TOC, pouco pode acrescentar. Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 2 1. O Futuro começou há muito No seguimento das invocações feitas pelo Sr. Dr. Lopes Ribeiro, recordo um escrito do emérito Professor Gonçalves da Silva sobre o tema “A propósito da regulamentação dos técnicos de contas” (artigo publicado em 1949, no nº 67 da Revista de Contabilidade e Comércio) citando o frade beneditino Angelo Pietra que, em 1586, apontava como qualidades que deviam distinguir, e portanto acreditar, todo o contabilista —a competência, —a diligência, e —a lealdade. Na mesma nota, transcrevendo um outro testemunho, de 1558, o de Alvise Casanova, o emérito professor apontava como fonte do descrédito profissional: “.... os que, a si mesmos, se denominam contabilistas e que são presunçosos, inoportunos, audaciosíssimos, loquazes e desprezadores da perfeita e verdadeira arte. Eles andam, por toda a parte, prejudicando o bom nome dos que são peritos em tal arte e, posto que se gabem, não conhecem perfeitamente nem devedores nem credores. Mas como trabalham a preços baixíssimos, muitos são os que aceitam, fechando os olhos ao que é importante e necessário ....” Gonçalves da Silva termina as citações com a pergunta: “ Não serão dignas de meditação estas palavras ... ? “ Só podemos responder que são bem dignas de meditação, especialmente quando nos preocupamos com a Dignificação e Futuro da Profissão Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 3 de técnico oficial de contas. Este meu recado é um ensaio de resposta. 2. Acreditação ... por quem ? Os profissionais competentes, diligentes e leais, podem ser, e são confrontados, com a concorrência da audácia, improviso e presunção. Quais os mecanismos sociais e de mercado para atenuar esta possibilidade? O problema nada tem de novo e encará-lo conduz a pretender para os profissionais —acreditação, primeiramente justificado em situações em que o interesse público é relevante, mas que na actualidade ganhou realce como origem de vantagem competitiva. Quem não leu ou ouviu falar na acreditação de empresas conforme grelhas de requisitos formalmente definidos ? A empresa que quer produzir e vender, especialmente se quer vender para mercados onde não é conhecida, busca testemunhos sobre a sua competência, diligência e lealdade, suportando custos significativos para formalmente poder invocar o título da empresa certificada conforme a norma ISO 9000, ISO 9001 ou outra. Os técnicos de contas são profissionais que vivem do mercado onde vendem os seus serviços, como profissionais dependentes ou independentes. A conveniência da acreditação, quando só focados na procura dos seus serviços, não difere, quanto ao enquadramento concorrencial, do das empresas. A existência da ATOC significa que já existe a entidade a cujo testemunho de acreditação o mercado deve atender. Mas a existência de suporte legal não basta para que o mercado confie. Tal como as nódoas podem cair no melhor Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 4 dos panos, também o mais perfeito dos institutos jurídicos pode ser desvirtuado. É no dia a dia que o mercado aprecia a validade das certificações e será no dia a dia que o mercado julgará o desempenho da profissão de técnico de contas. Para o mercado são profissionais todos os inscritos na ATOC e só em apreciação globalizante acabará apreciada a profissão. A incompetência, falta de diligência ou deslealdade de qualquer de nós afecta todos os outros e é em nome desses outros que a ATOC terá que desempenhar a necessária e difícil missão de vigilância. A ATOC será socialmente acreditada se a acreditação que confere comprovar que justifica confiança. A ATOC não poderá desligar-se do desempenho profissional dos profissionais acreditados. Neste contexto de ideias, sou de opinião que a dignificação e futuro profissional passa pela dignificação e futuro da ATOC - Associação dos Técnicos Oficiais de Contas, o que é uma condição necessária mas não é suficiente: a condição última é o desempenho dos profissionais no dia a dia. 3. Acreditação ... para que funções ? A existência da ATOC - Associação dos Técnicos Oficiais de Contas significa uma conquista profissional e resposta a um anseio cuja legitimidade foi há muito reconhecida pelo nosso legislador. Na minha opinião pode ser o detonador não só de quase uma revolução na organização profissional mas principalmente da aceleração do progresso na construção de melhores soluções para os problemas a resolver pela profissão, em que os de informação financeira sobre a situação, evolução e fluxos patrimoniais merecem destaque. Há, entretanto, um entendimento legal que pessoalmente considero, além Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 5 de inconveniente e desajustado, perigoso para a profissão. Consta do artigo 2.º E está expresso nos termos seguintes: “São funções dos técnicos oficiais de contas assumir a responsabilidade pela regularidade fiscal das entidades sujeitas a imposto sobre o rendimento ...” O entendimento que pessoalmente tenho das funções, sejam elas desempenhadas como trabalhador dependente ou como prestador de serviços, seria melhor expresso pela redacção: São funções dos técnicos oficiais de contas a concepção e execução da contabilidade organizada das entidades que a devem possuir, assumindo responsabilidade pela sua regularidade, e assinando as declarações fiscais, conjuntamente com os representantes da entidade a que a contabilidade respeita. Existem diferenças fundamentais entre os dois conceitos, a saber: 1) O técnico de contas não assume a responsabilidade somente pela regularidade fiscal mas em geral pela regularidade da contabilidade, aliás em paralelo com qualquer outro trabalhador que assume responsabilidade pelas incumbências que aceita. 2) O técnico de contas é um técnico cujo desempenho profissional tem acreditação aceite para efeitos fiscais e, até por virtude da exigência e vigilância pública na fiscalidade, tal certificação é aceite para efeitos de reconhecimento de capacidade para a incumbência de organizar e manter a contabilidade. A redacção original do artigo 2.º quase sugere que o técnico de contas é um agente do fisco, o que não sendo correcto também não é aceitável como entendimento sobre a profissão. Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 6 3) Não só a correcta actuação social das empresas mas também e principalmente o sucesso e progresso das mesmas, implicam um relacionamento entre a sua gerência ou administração e o técnico de contas que impõe a este grande competência não só no domínio da contabilidade de custos como no dos sistemas de controlo interno. Além de em muitos casos encabeçar os serviços de auditoria interna é sempre interlocutor privilegiado com os auditores internos e interlocutor com especial responsabilidade perante os auditores externos. Nestas circunstâncias, e embora a acreditação de competência profissional tenha especial significado perante o fisco, parece-me redutora e inconveniente a redacção do artigo 2.º, tal como existe, do Estatuto. 4) Nos termos do artigo 28.º do vetusto Código Comercial ainda em vigor a obrigação de ter contabilidade organizada é do comerciante, que nos termos do artigo 38.º do mesmo código pode autorizar outra pessoa a fazê-la. A responsabilidade pela regularidade da contabilidade é em primeira linha sempre do comerciante, mesmo para efeitos fiscais. A dignificação e futuro profissional passam certamente pela alteração dos preceitos legais conducentes, ou oferecendo bases, para equívocos sobre a profissão. O técnico oficial de contas é acreditado para o exercício das funções correspondentes à concepção e execução da contabilidade, é garante da regularidade fiscal mas as suas funções são bem mais vastas. 4. Acreditação ... perante quem ? A pedra de toque da dignificação e futuro profissional está no dia a dia dos Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 7 profissionais, mas evitem-se situações legais incoerentes ! Não deve o legislador dar o exemplo de não atender ao reconhecimento da qualidade de técnico de contas. Quando muitas centenas de instituições não qualificadas como empresas, desde Câmaras Municipais a Hospitais, gerindo meios financeiros que lhes dão influência dominante na vida de todos nós, não são solicitadas a ter organização e a produzir informação contabilística com intervenção do técnico de contas, estão a desconsiderar a qualificação. Não deve o legislador desqualificar institutos legais que ele próprio reconhece de interesse público. Urge reorganizar carreiras profissionais de responsáveis pela organização e execução da contabilidade de instituições públicas, pelo menos das instituições com autonomia financeira. A lei tem pouca força moral quando não é respeitada pelo legislador e acompanhada pelo exemplo. A acreditação dos técnicos oficiais de contas face às empresas, mas não face às instituições públicas, lembra a virtude de “fazer o que eu digo mas não o que eu faço ...” 5. Acreditação ... consequências Não vou gastar o tempo de quem me ouve para justificar ou realçar o interesse público da profissão quando o reconhecimento de tal interesse há muito é consensual e agora é expressamente reconhecido pelo legislador. Contudo, atrevo-me sim a solicitar reflexão sobre algumas consequências de tal reconhecimento: o que seria uma norma moral — respeito pela ética na conduta profissional — transforma-se numa norma legal. Faltas de ética que poderiam só implicar reprovação social, quando muito objecto de reprovação profissional, são fontes de responsabilidade disciplinar. Mais uma vez o sucesso da profissão passa pelo sucesso da ATOC - Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 8 Associação dos Técnicos Oficiais de Contas, enquanto instituto jurídico e social. É com prazer que anoto que o Código Deontológico não só é um dos pilares deste Congresso como foi oportunamente enviada uma proposta de redacção aos associados, factos que traduzem a grande adesão que estas ideias colhem nos actuais responsáveis pela Associação. Atrevo-me a salientar a correspondência das qualidades enunciadas por Angelo Pietra com algumas disposições da proposta de código que nos foi apresentada: —Competência profissional é o título do artigo 7.º Além de constar da lista do corpo do artigo 3.º dos princípios deontológicos gerais. —Diligência profissional é aspecto em destaque na alínea d) do artigo 3.º, nos termos seguintes: “... exerçam a profissão de forma diligente, utilizando os conhecimentos e técnicas disponíveis para o efeito e respeitando a lei, os critérios éticos, os princípios contabilísticos e as práticas correntes da profissão.” —Lealdade profissional é também um dos princípios deontológicos gerais expressamente identificados no corpo do artigo 3.º Do corpo do artigo 3.º constam também outros princípios deontológicos que condenam o atrevimento incompetente e impensável, e os profissionais loquazes e presunçosos condenados por Alvise Casanova. A maturação ao longo de quatro séculos a profissão de princípios deontológicos justifica um código deontológico que é fonte de responsabilidade disciplinar. A acreditação terá consequências profundas e a ATOC não pode deixar de cumprir o seu papel de vigilante. Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 9 6. Acreditação ... para os clientes Considero errado o entendimento de que os técnicos oficiais de contas são agentes do fisco pagos directamente pelo contribuinte, enquanto os agentes das repartições são pagos indirectamente; penso que são profissionais que, entre outras acreditações, têm a acreditação fiscal. Antes de mais, ser técnico oficial de contas implica ser acreditado perante a entidade que confia a organização e ou execução da contabilidade e parece-me correcto entender que ao técnico de contas cumpre defender os interesses legítimos da entidade para quem trabalha. É tempo de reivindicar as funções de apoio e consulta que, em todas as empresas, mas especialmente nas PME, só um técnico de contas competente, diligente e leal pode prestar. É preciso ter a coragem de reconhecer que a acreditação legal perante o fisco, por interesse público, está na origem da acreditação profissional mas é aspecto menor no bom desempenho profissional. 7. Técnico de contas: como traduzir para outras línguas ou enquadramentos legais ? Com destino ao Jornal do Técnico de Contas e da Empresa, publicação que eu muito prezo, e em que os profissionais da contabilidade há muito se habituaram a confiar, tenho esboçado há já meses um pequeno escrito sobre o problema de traduzir a expressão “técnico de contas”. Os técnicos de contas portugueses não podem ser confundidos com mandatários fiscais: não têm representação perante o sistema judicial e em Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 10 actos declarativos actuam conjuntamente com os representantes da entidade a que a contabilidade respeita. Este facto tem especial significado quando a análise recai sobre a dignificação e futuro da profissão. Entender o técnico de contas como uma profissão cujo conteúdo só é explicável a estrangeiros referindo uma singularidade da lei portuguesa não me parece nem dignificante nem promissor de um futuro, especialmente dentro de uma evolução político-económica em que cada vez dependemos mais, não do que somos para nós mesmos, mas do que somos num contexto mais global. A profissão tem sido demasiado afectada por problemas terminológicos: não só tem sido consumidora do tempo dos estudiosos mas origem de equívocos que melhor seria evitar. Na década dos trinta a designação de contabilista equivalia a uma designação reservada como título académico. Somos povo de brandos costumes e a designação de técnico de contas evitou confrontos. Quando dentro dos técnicos de contabilidade se pretenderam identificar os portadores de reconhecimento, melhor dizendo da acreditação legal, recorreu-se à designação que temos, técnicos oficiais de contas. De facto, somos contabilistas se entendidos como profissionais que trabalham na contabilidade, somos contadores quando em conversa com brasileiros, ou accountants se o interlocutor for de língua inglesa. O recurso à designação de “controller” quando se pretendem destacar as funções do contabilista no planeamento e seguimento da gestão, evidencia bem não ser claro para todos que, em geral, tais funções sejam característica do técnico de contas. Pessoalmente, considero mais próximo o termo “accountants”. Parecendo um problema menor a tradução e esclarecimento da expressão Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 11 técnico oficial de contas tem uma importância grande ao implicar entendimento claro das funções que de facto nos identificam. Considero importante para a dignificação e futuro profissional esclarecer as funções caracterizadoras dos profissionais e tal esclarecimento é a parte importante do problema de tradução. 8. Concluindo e reiterando o agradecimento É minha opinião que A DIGNIFICAÇÃO E FUTURO PROFISSIONAL serão construídos: pela competência, diligência e lealdade dos profissionais; pelo reconhecimento de que os técnicos oficiais de contas são responsáveis pela regularidade do que fazem perante todos, e não só perante o fisco; pelo entendimento dos técnicos oficiais de contas como desempenhando as funções próprias dos contabilistas, independentemente de formação escolar em que se apoia a formação profissional; pela aceitação das consequências de reconhecer a existência de interesse público na profissão: normas morais passam a normas legais; pela acreditação social que a ATOC justifique, como base da sua competência para conferir acreditação; pela coerência do legislador, demonstrando acreditar na acreditação que prescreve ... e que não deve ser só para os outros. Termino reafirmando o meu agradecimento aos que ouviram o meu recado, Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41) DIGNIFICAÇÃO E FUTURO DA PROFISSÃO Pág. 12 pelo seu tempo e atenção, e aos responsáveis por este 1º Congresso dos Técnicos Oficiais de Contas pela oportunidade de expor estas reflexões. Junho de 1997 H. O. Carqueja Testemunho de H. O. Carqueja (TOC nº 41)