Em 38 países do continente a homossexualidade
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Em 38 países do continente a homossexualidade
ANGOLA Diversificar a economia BRICS Libertação face ao dólar Nº 87 - julho 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15 Homofobia em África Em 38 países do continente a homossexualidade é criminalizada, em alguns dos quais com prisão perpétua ou pena de morte África21– julho 2014 1 2 julho 2014 – África21 Super Ordenado BAI CONDIÇÕES AINDA MELHORES té a o t i Créd e z K 0 0 , 0 0 0 r . a 0 g a 0 p ara 5.0 p S E S E 60 M O Banco de todos os momentos. Por que não remodelar a sua casa? Ou comprar uma mobília nova? Ou até mesmo iniciar os estudos? São até 5 milhões de kwanzas e 60 meses para pagar. Super Ordenado BAI. O dinheiro que precisa, agora. Angola • Cabo Verde • Portugal • África do Sul África21– julho 2014 3 sumário Angola, cooperação e diversificação económica Homofobia em África A queda nas receitas fiscais nos primeiros cinco meses do ano, decorrente de uma menor produção de petróleo, torna evidente a necessidade de diversidade económica, apoiada na cooperação internacional. Pedro Kamaka 22 Num continente onde a homossexualidade é considerada um crime em 38 dos seus países, todos os anos, milhares de homossexuais são discriminados, perseguidos, detidos ou mortos. 33 Miguel Correia Como vai a economia do Brasil BRICS e Não-Alinhados De 14 a 16 de julho, os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) vão reunir-se em Fortaleza, no Brasil, e pretendem adotar novas medidas que permitam às suas economias libertar-se do «imperialismo» do dólar. Nicole Guardiola 55 Depois dos bons índices económicos da primeira década do século XXI, o Brasil vive o padrão internacional de esfriamento da atividade industrial e financeira. Hoje, a manipulação dos indicadores económicos, por partidários e oponentes de Dilma Rousseff, dificulta a perceção sobre o real estado da economia brasileira. Carlos Castilho África21 Revista de Política, Economia e Cultura Propriedade Nova Movimento, Lda Sociedade de Marketing, Comunicação e Cultura Rua Frederico Welvitch, n.º 82 Bairro do Maculusso – Luanda, Angola [email protected] Editada por Movipress Uma divisão da Nova Movimento, Lda Diretor Carlos Pinto Santos [email protected] [email protected] Diretora Comercial Fernanda Osório [email protected] [email protected] Assistente Comercial Luzia Miguel Secretária Administrativa Zelia Veiga Representação em Portugal Triangulação, Lda Rua Bento Jesus Caraça, 16 – 2º Dto 1495-686 Cruz Quebrada Apartado em Lisboa: 19059 1990-999 LISBOA Diretora administrativa Marina Melo [email protected] [email protected] 4 julho 2014 – África21 Representação no Brasil Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda [email protected] Redação de Angola Adriano de Sousa, Alberto Sampaio, Carlos Severino, Luís Ramiro, António Dombele, Pedro Kamaka, Ruben Kamaxilu e Teixeira Cândido Redacção de Portugal João Carlos, João Escadinha, Miguel Correia, Nicole Guardiola, Nuno Macedo e Teresa Souto Redacção do Brasil Carlos Castilho e João Belisario Colaboradores permanentes Almami Júlio Cuiaté (Bissau), Augusta Conchiglia (Paris), Charles Shorungbe (Lagos), Emanuel Novais Pereira (Maputo), Fernando Lopes Pereira (Bissau), Gláucia Nogueira (Praia), Itamar Souza (Nova Iorque), João Vaz de Almada (Maputo), Juvenal Rodrigues (São Tomé), Luís Costa (Washington), Manrique S. Gaudin (Buenos Aires), Natacha Mosso (Praia), Paul Cooper (Houston) e Rodrigues Vaz (Lisboa) Colunistas Alves da Rocha, Conceição Lima, Corsino Tolentino, Fernando Pacheco, Germano Almeida, João Melo, José Carlos de Vasconcelos, Luís Cardoso, Odete Costa Semedo e Pepetela Fotografia Agência Angop, Agência Lusa, Agência France Presse, Arquivo África21, Arquivo Digiscript, Fernanda Osório, Jornal de Angola e Ruth Matchabe Projeto gráfico, paginação e pré-impressão Digiscript [email protected] Publicidade em Angola Movimídia Gestão e Comercialização de Meios Rua Frederico Welvitch, n.º 82 Bairro do Maculusso — Luanda, Angola Fernanda Osório [email protected] Paula Miranda [email protected] Distribuição e assinaturas em Angola Movipress Rua Frederico Welvitch, n.º 82 Bairro do Maculusso – Luanda, Angola Tel: 244 912 442 453 [email protected] Distribuição, Assinaturas e Publicidade no Brasil Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda. - ME CNPJ 08.629.179/0001-52 Estrada Rodrigues Caldas Nº 297 CEP 22.713-372- Taquara – Jacarepagua Rio de Janeiro- RJ Distribuição em Portugal URBANOS PRESS, S.A Rua 1º de Maio - Centro Empresarial da Granja Junqueira 2625-717 Vialonga 67 Publicidade e assinaturas em Portugal Triangulação [email protected] [email protected] Impressão em Angola: DamerGráficas Edifício Damer Gráficas Sector de Talatona CS8-GU15 Município da Samba LUANDA Impressão em Portugal: PrinTipo Alto da Boavista, Estrada de Paço de Arcos, nº 77 Pavilhão 20 – 2735-197 CACÉM Telefone: (351) 214 906 020 Impressão no Brasil: Set Print Grafica e Editora Ltda Rua Santos Rodrigues, 237 parte - estacio Rio de Janeiro - rj-cep: 20.250-430 Tel: (21) 2273-6946 Tiragem total: 11.000 exemplares Os artigos assinados refletem a opinião dos autores e não necessariamente da revista. Toda a transcrição ou reprodução, parcial ou total, é autorizada, desde que citada a fonte. A correspondência deve ser dirigida à Movipress Rua Frederico Welvitch, n.º 82 Bairro do Maculusso – Luanda, Angola. Tel.: 244 912 442 453 Portal www.africa21online.com aos leitores A aberrante discriminação sexual 6 Entrevista Miguel Prudêncio Investigar uma vacina para a malária João Carlos 38OPINIÃO Alves da Rocha 40CABO VERDE Analisar o futuro Natacha Mosso 44GUINÉ-BISSAU Procurar a confiança internacional Almami Júlio Cuiaté 50MOÇAMBIQUE Acidentes na estrada Emanuel Novais Pereira 52SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE Caminhos para o desenvolvimento Juvenal Rodrigues 59CPLP Balanço e desafios João Carlos 64CHILE As promessas de Bachelet Manrique S. Gaudin 86CINEMA A aventura de Nollywood Itamar Souza Rubricas 11 Antena21 20 Gente 75 Insumos 89 Cults 92 Livro do Mês 94 Ver, Ouvir Ler Crónicas 43 Corsino Tolentino 63 Luís Cardoso 85 José Carlos de Vasconcelos 96 João Melo São números enormes. Em África, 38 dos 54 países do continente têm legislação a punir os atos homossexuais considerados «crimes» que podem chegar, em alguns casos, à prisão perpétua ou até à pena de morte. [email protected] Estas aberrantes condenações são suportadas por leis recentes de vários governos, como acontece no Burundi, Sudão do Sul, Uganda, Libéria e Nigéria. Nestes países não estão legisladas (por enquanto?) execuções mortais. Mas a tortura e a morte para homens e mulheres homossexuais tem força de lei na Mauritânia, Somália e Sudão. Refira-se que, fora de África, a pena de morte também é autorizada na Arábia Saudita e no Irão. Quando o ministro dos Negócios Estrangeiros do Uganda foi eleito para presidente da Assembleia da ONU que vai assumir em setembro, isto desencadeou manifestações um pouco por todo o mundo. O ministro ugandês é acusado por várias acusações de corrupção, mas as origens das manifestações estão no seu posicionamento contra os homossexuais e no apoio explícito dado à lei que agrava a punição destes cidadãos, podendo ir até à prisão perpétua. Em direção oposta ao rumo recente do Uganda e da Nigéria, estão Madagáscar, Lesoto, Suazilândia, Níger e África do Sul, alinhados no respeito pelos direitos humanos. África do Sul foi o primeiro Estado do continente, e até agora o único, a legalizar a união civil entre pessoas do mesmo sexo, em 2006. Outro número espantoso deste século XXI é o facto de 76 países, 40% dos Estados-membros da Nações Unidas, ainda criminalizarem esta opção sexual. Face a esta situação, o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, afirmou que «cada pessoa tem o direito de gozar das mesmas regras elementares e de realizar uma vida sem discriminação baseada no valor e na dignidade». A reação dos governos homofóbicos ficou-se, como era de esperar, pelo silêncio total. Carlos Pinto Santos África21– julho 2014 5 Entrevista a Miguel Prudêncio, investigador do IMM Vários investigadores portugueses têm vindo a revelar-se e a serem distinguidos entre os cientistas empenhados nos esforços a nível mundial para o combate a doenças como a malária. A equipa de Miguel Prudêncio, que reúne cérebros com espírito de missão, procura com o apoio financeiro internacional alcançar uma vacina eficaz, capaz de minorar o sofrimento de milhares de pessoas que no mundo são vítimas desta endemia. João Carlos «A nossa proposta é desenvolver uma vacina contra a malária» África21. A sua equipa tem o apoio financeiro da Fundação Bill & Melinda Gates para o incremento da segunda fase de um projeto que visa estudar uma vacina contra a malária. Em que ponto está o projeto? MIGUEL PRUDÊNCIO. Este é um projeto especificamente para o desenvolvimento de uma nova estratégia de vacinação contra a malária. Começou há cerca de três anos com financiamento inicial da Fundação Bill & Melinda Gates e durante estes últimos três anos realizámos um conjunto de experiências no sentido de demonstrar que a ideia que estávamos a propor para uma nova vacina era credível e funcional. Ao fim destes anos de trabalho submetemos os resultados à Fundação e ela achou que os resultados eram promissores e resolveu renovar o apoio e ampliá-lo, o que nos permite prosseguir com a investigação. Neste momento, o projeto encontra-se numa fase bastante crucial, porque nós realizámos um conjunto de ensaios, denominados pré-clínicos, utilizando modelos de laboratório, inclusivamente animais, e obtivemos um conjunto de resultados que são encorajadores. 6 julho 2014 – África21 Até onde pode ir esta investigação? Até à obtenção de autorização para realizar ensaios clínicos em seres humanos. O que nós temos é uma ideia fora do vulgar em termos de uma estratégia possível para a vacinação contra a malária. Essa ideia baseia-se na utilização de parasitas da malária que não infetam seres humanos. A nossa proposta é desenvolver uma vacina contra a malária usando um parasita que infeta apenas roedores e não causa qualquer doença em humanos, mas que pode ser modificado geneticamente, de forma a ativar o sistema imunitário humano e ensiná-lo a combater o parasita da malária que infeta humanos. O nosso objetivo agora é entrar numa fase de ensaios clínicos em seres humanos. Para isto precisamos de realizar algumas experiências adicionais para consolidar os resultados alcançados e obter o pacote pré-clínico que nos permite avançar para ensaios em humanos. Precisamos também que as autoridades regulatórias competentes analisem a nossa proposta e deem o aval e a respetiva autorização para a realização destes ensaios. Este financiamento de 1,2 mil milhões de dr dólares (cerca de 900 mil euros) que obtivemos da Fundação destina-se precisamente a estes dois fatores principais. A probabilidade de sucesso destes estudos é de uma percentagem alta ou média? Isto é aquilo a que a própria Fundação Bill Gates chamou de um projeto de alto risco, mas que se funcionar terá uma elevada recompensa. Portanto, a probabilidade de tudo correr como o previsto não é muito elevada. Temos que ser realistas e perceber que isto é uma estratégia arrojada, diferente do habitual, mas que, por outro lado, caso se revele eficaz, é de extrema relevância. Eu diria que a probabilidade de nós conseguirmos avançar é bastante elevada, porque temos todas as experiências delineadas. Daqui para a frente, tudo depende dos resultados que obtivermos desses ensaios clínicos em seres humanos. Se forem bons e promissores, aí penso que temos uma margem de manobra muito grande pelo facto da Fundação ter expressado o seu interesse em continuar a apoiar o projeto. Se realizarmos ensaios em seres humanos e estes não se revelarem aquilo que nós esperamos, aí vai ser preciso repensar a estratégia. Este é mais um estudo, entre vários que existem a nível mundial. É de se considerar que estamos mais perto de uma vacina eficaz para o combate à malária? A nível mundial, há esforços muito sólidos nesse sentido, uns em fase mais avançada do que outros. E inclusivamente há uma vacina que está em fase de licenciamento. A GlaxoSmithKline (GSK) anunciou em novembro de 2013 que ia pedir licenciamento à European Medicines Agency, em 2015, para a utilização da primeira vacina contra a malária no mundo, em 2016. O problema é que esta vacina tem uma eficácia muito reduzida, cerca de 30% a 40%. Portanto, está muito aquém do desejável. Há, inclusivamente, um debate na comunidade científica sobre a sua viabilidade. Mas isto significa que não se pode abrandar, de forma nenhuma, os esforços que estão a ser desenvolvidos no sentido de se encontrar vacinas mais eficazes. Penso que é muito importante sermos realistas. Em qualquer dos casos estamos a falar de um Tudo depende agora dos resultados que obtivermos nos ensaios clínicos em seres humanos África21– julho 2014 7 período de estudo de vários anos até se chegar a essa vacina tão ansiada. Não é uma coisa que vá acontecer nos tempos mais próximos. Só para termos uma noção, esta vacina da GSK está a ser desenvolvida há cerca de 20 anos. Isto significa que são processos muito longos e extremamente morosos. Mas há perspetivas muito promissoras. Há bons resultados. Há razões para acreditar que as coisas vão avançar, mas não é realista dizer que vamos obter resultados já amanhã. Nós tivemos nos últimos quinze anos um desenvolvimento na qualidade da ciência em Portugal que é de assinalar Gerir competências em nome de uma causa mundial dr Miguel Prudêncio é o responsável por uma equipa de investigadores de experiência internacional, acolhidos pelo Instituto de Medicina Molecular (IMM). Concretamente neste projeto, conta com o know-how de instituições de craveira mundial, ligadas ao desenvolvimento de vacinas contra a malária, que, de acordo com as estimativas, é responsável pela morte de um milhão de pessoas no planeta. O projeto é coordenado a partir do IMM, em Lisboa, entidade beneficiária do financiamento, mas a equipa partilha o estudo com outras estruturas a nível mundial. «Temos colaborações com laboratórios nos EUA, Espanha, Holanda, de grupos que são líderes mundiais nas suas respetivas áreas de especialização, que dispõem de outro tipo de recursos e outras valências científicas que nós não temos», diz o investigador português. Esta é a primeira vez que, em Portugal, a Fundação Bill & Melinda Gates apoia um projeto nacional de investigação através de um financiamento no âmbito da Fase II do GCE, no valor de mais de um milhão de dólares. Para Miguel Prudêncio, este financiamento é o reconhecimento meritório do trabalho que a equipa tem desenvolvido ao longo dos últimos anos. Este projeto iniciou-se há três anos quando a Fundação Bill & Melinda Gates lhe atribuiu um financiamento de 100 mil dólares no âmbito da Fase I do programa GCE, destinado a demonstrar a prova de conceito da estratégia proposta. No final do segundo financiamento, dependendo da aprovação da realização dos ensaios clínicos com esta vacina, há a possibilidade de a Fundação apoiar a realização desses ensaios, o que poderá representar a continuidade de financiamento do projeto. Em dezembro de 2013, Maria Manuel Mota, outra investigadora do Instituto de Medicina Molecular, foi a vencedora do Prémio Pessoa, pela sua «excecional qualidade» da produção científica, com dez papers publicados nesse ano em revistas científicas de grande impacto e a investigação realizada na área da malária, uma das causas principais de mortalidade a nível mundial. 8 julho 2014 – África21 Os cortes nos orçamentos e nas bolsas em áreas como a da ciência estarão a pôr em causa a investigação em Portugal? Penso que sim. Nós tivemos nos últimos dez a quinze anos um crescimento e desenvolvimento sobretudo da qualidade da ciência em Portugal que são de assinalar. Chegámos a um patamar de qualidade e de reconhecimento que custou bastante esforço humano e financeiro. Aquilo que está a acontecer neste momento põe em causa esse esforço feito até agora. Evidentemente, a ciência portuguesa ainda não tem a maturidade suficiente para aguentar uma falta de financiamento prolongada e significativa, porque, ao contrário do que acontece noutros países europeus, registamos um processo de crescimento muito recente em que se atingiu o tal patamar, mas que ainda não é completamente estável. Se se desinvestir neste momento significa que tudo aquilo que se conquistou com muito esforço é posto em causa. No concreto, os cortes recentemente anunciados, nomeadamente a redução do número de bolsas atribuídas na área da investigação, são extremamente graves. Há razões para estarmos preocupados, porque já houve uma redução muito assinalável no número de bolsas de doutoramento e de pós-doutoramento. O argumento de que o corte nas bolsas de doutoramento não é tão significativo como se pensa, porque há o apoio dos programas doutorais, não é válido. Porque mesmo contabilizando as bolsas atribuídas no âmbito dos referidos programas, há um corte muito significativo, que também abrange as bolsas do pós-doutoramento na ordem dos 50% a 60%. Isso também afeta o desenvolvimento de alguns projetos de interesse para os países africanos de língua portuguesa? Penso que aquilo que está a acontecer é transversal. Os cortes em financiamento abrangem todas as áreas, incluindo as pessoas. Há projetos que não foram iniciados, apenas aqueles de natureza exploratória que não são necessários para se desenvolver ciência como deve ser. Portanto, por maioria de razão, afeta todas as áreas, nomeadamente da investigação, que tem impacto nos países africanos (PALOP). Afeta toda a investigação que é feita na área das doenças predominantes em África. Mesmo nas áreas de ciências sociais com relevância para esses países, tudo isso é afetado por igual. África21– julho 2014 9 10 julho 2014 – África21 Antena21 760.000 crianças com menos de 5 anos morrem todos os anos na sequência de doenças diarreicas; a diarreia é a segunda causa de mortalidade infantil nesta faixa etária “ Não pode haver um jornalismo de qualidade sem o cumprimento da ética e da deontologia da profissão JOSÉ LUÍS DE MATOS, ministro angolano da Comunicação Social FRANCISCO BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA Cabo Verde inaugura Escola de Artes e Ofícios a pensar no emprego e nos turistas Li Keqiang com José Eduardo dos Santos em Angola Angola aprofunda parceria com a China dr Além de concertações políticas sobre questões africanas e mundiais, na visita realizada a Angola em maio pelo primeiro-ministro da China, Li Keqiang, foram estabelecidos acordos no domínio financeiro entre os dois países que, segundo revelou o Presidente José Eduardo dos Santos em conferência de imprensa, «vão realmente suportar todas as ações de cooperação, na reabilitação, desenvolvimento e modernização das infraestruturas e também noutros domínios de interesse bilateral». O Presidente angolano quer incrementar e diversificar as relações económicas entre os dois países «dando mais espaço ao investimento direto das empresas chinesas na produção de bens de consumo em detrimento da prestação de serviços e da realização de empreitadas de obras públicas». Mas, durante a visita, Eduardo dos Santos também solicitou ao Governo chinês créditos com taxas de juro reduzidas, além dos comerciais, e mais rapidez nos processos para desbloquear os fundos. De forma a agilizar estes processos serão constituídas equipas de trabalho para o planeamento da cooperação nas áreas de infraestruturas, finanças e dos setores públicos e privados. O Governo angolano também quer assegurar linhas de créditos com taxas de juro mais reduzidas e em muitos casos em troca do fornecimento de petróleo. Cabo Verde inaugurou a Escola de Artes e Ofícios (EAO), para responder às exigências de emprego e formação profissional no setor do turismo. A EAO, na Cidade Velha, Património Mundial da Humanidade, deverá beneficiar 157 jovens das várias localidades do concelho da Ribeira Grande de Santiago. No início, vai formar jovens em Artesanato e Reciclagem, Gestão e Produção Cultural, Assistente de Ourivesaria, Fabricação e Manutenção de Instrumentos Musicais de Cordas e ainda Produção e Promoção de Produtos e Eventos Culturais. Na calha podem estar Construção Civil, Transformação de Produtos Agrícolas e Canalização. No ato de inauguração, o presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande de Santiago, Manuel de Pina, lembrou que «não faz sentido os turistas virem à Cidade Velha e não termos nada para oferecer: artesanato, uma peça de teatro, música ou poesia. Falta muito para apresentar e fazer, e espero que a escola potencie a área de prestação de serviços, para estarmos à altura do desenvolvimento turístico de todo o arquipélago». Já Mário Lúcio Sousa, ministro da Cultura, destacou na mesma ocasião que «a escola tem uma característica fundamental para as artes, que é o espaço físico, geográfico e paisagístico onde está inserida». Bolsa Família no Senegal O Governo senegalês adotou em 2013 um subsídio anual de 100.000 CFA (cerca de 210 dólares) para as famílias mais carenciadas. Perante o sucesso da experiência-piloto, que beneficiou 50.000 agregados, as autoridades decidiram arrancar com a generalização do Programa Nacional de Bolsas de Segurança Familiar com o objetivo de alcançar 250.000 beneficiários até 2017. O recenseamento e a identificação das famílias necessitadas são efetuados pela Agência Nacional de Estatísticas e Demografia em colaboração com as autoridades locais e comités populares criados para o efeito, que deverão fiscalizar a distribuição trimestral das bolsas e o cumprimento das obrigações ligadas à sua atribuição, nomeadamente a escolarização das crianças de ambos os sexos. Cidade Velha, Ilha de Santiago África21– julho 2014 11 “ 45,7 por mil Os Não-Alinhados podem e devem agir no seio da ONU para recuperar a sua soberania financeira e os seus direitos e combater a globalização injusta é a taxa de mortalidade de recém-nascidos na Guiné-Bissau; a de Angola é 45,4 por mil; os dois países ocupam o 3.º e 4.º na lista dos países mais difíceis para se nascer Lei angolana limita uso de armas de guerra Foi aprovada pela Assembleia Nacional de Angola a nova Lei que impede o uso de armas de guerra pelas empresas privadas de segurança. A lei, que revoga a legislação de 1992, determina que a partir desta altura essas empresas só poderão usar armas para autodefesa. A nova legislação foi aprovada com 154 votos a favor, nenhum contra e duas abstenções. A Polícia Nacional e amplos setores da sociedade angolana questionavam a posse de armamento pesado pelas empresas de segurança privadas. Em 2008, a Polícia Nacional estimava que cerca de 20 mil armas de guerra poderiam estar em posse das empresas privadas de segurança. Preocupa o facto de um grande número de armas de guerra encontradas na posse de marginais possam ter sido supostamente obtidas junto de trabalhadores destas empresas. Nos termos da lei ora aprovada, cabe ao comandante da Polícia Nacional, mediante análise de cada caso, limitar o número de armas a utilizar pelas empresas, bem como a formação e atualização profissional do pessoal das empresas privadas de segurança. A nova lei permite também a utilização de equipamentos eletrónicos de vigilância para a proteção de pessoas e bens, por parte de instituições e privados, desde que sejam salvaguardados os direitos e interesses constitucionais. 12 julho 2014 – África21 Censo angolano chega ao fim Com 99% das residências existentes no país visitadas pelos inquiridores, o recenseamento da população angolana terminou oficialmente ao final do último dia do mês de maio. A operação manteve-se ativa por mais sete dias para recolher os últimos dados em seis municípios do país. O atraso verificou-se nos municípios de Viana e Cacuaco (província de Luanda), Benguela e Lobito (Benguela) e Chitato e Lucapa (Lunda Norte). Na altura faltava contabilizar o equivalente a 1% das casas a recensear em todo o país, locais onde os recenseadores não conseguiram contactar com os agregados familiares. A linha telefónica e equipas móveis de apoio ao processo permaneceram ativas também por mais sete dias, para aqueles que, por uma ou outra razão, ainda não tivessem sido recenseados, pudessem fazê-lo. No total foram distribuídos e preenchidos mais de sete milhões de questionários, envolvendo mais de cem mil pessoas e todo o tipo de meios de transporte. Aguarda-se para os próximos meses um resultado preliminar onde já se possa, entre outros dados, conhecer o número exato da população de Angola. A última contagem da população angolana aconteceu há 44 anos. Esta foi a primeira a realizar-se após a independência. PAULO MULAZA/JORNAL DE ANGOLA ADÉRITO CORTÊZ CORTÊS/JORNAL DE ANGOLA SAMIR AMIM, economista egípcio Camilo Ceita, diretor-geral do Instituto Nacional de Estatística, fez o balanço de 15 dias de recenseamento no último dia do Censo Angola na Cimeira Mining on Top Angola apresentou a Estratégia do Governo para o setor mineiro na Cimeira Mining on Top que decorreu entre 24 e 26 de junho, em Londres. A comunicação, apresentada pelo ministro Francisco Queirós abordou a gestão pública dos recursos minerais, infraestruturas públicas de apoio ao Plano Nacional de Geologia, oportunidades de negócios assim como os resultados atuais. Organizada pelo Centro de Informação sobre Minas e Metais da SNL, o Mining On Top 2014 contou com a presença de outros ministros africanos (Congo, Mali, Namíbia, Moçambique, Gana, Lesotho, Tanzânia e Uganda), representantes das grandes empresas no continente e analistas especializados. DR de euros (81,6 milhões de dólares) foi o investimento de Cabo Verde em quatro parques eólicos Ramtane Lamamra, ministro argelino dos Negócios Estrangeiros Argélia defende o diálogo e a não intervenção militar Sujeita a fortes pressões para tomar uma parte mais ativa na luta contra as ameaças terroristas na África do Norte e no Sahel, a Argélia continua ferreamente agarrada ao princípio da não ingerência, mas a sua experiência é cada vez mais solicitada e apreciada. No fórum que se realizou à porta fechada em Argel, de 16 a 19 de junho, o chefe da diplomacia argelina, Ramtane Lamamra, não hesitou em confrontar a assistência constituída por especialistas norte-americanos do NESA (Centro de Estudos Estratégicos para o Próximo Oriente e Sudeste Asiático) e de especialistas egípcios, líbios, mauritanos, marroquinos e tunisinos, com o que Argel considera como erros estratégicos crassos, a começar pela intervenção militar da NATO na Líbia. Segundo Lamamra «as consequências diretas da guerra na Líbia traduziram-se num fluxo de armas de todo o tipo na África do Norte e no Sahel (…) alargando a zona de instabilidade e tornando as ameaças mais complexas devido ao cruzamento dos grupos terroristas locais com as redes do crime organizado». A Argélia, que «aconselha todas as partes envolvidas a favorecer o diálogo inclusivo», desempenha uma atividade diplomática intensa neste sentido, nomeadamente junto dos seus vizinhos imediatos, Líbia, Tunísia e Mali. Tratando-se deste último país, reuniu os representantes dos grupos independentistas tuaregues para os convencer a porem-se de acordo entre si e a negociar com o governo de Bamako. A fase preliminar acabou com uma declaração conjunta dos três movimentos armados a pedir a abertura de negociações formais no Mali. Está por ver se estes conselhos serão seguidos de efeitos na própria Argélia. Pela primeira vez na história do país todas as correntes da oposição, islamistas incluídos, juntaram-se a 10 de junho numa «conferência nacional pelas liberdades e a transição democrática» mas apenas um dos participantes, a Frente das Forças Socialistas, aceitou o convite da Presidência argelina para discutir o projeto de revisão da Constituição. “ Os media são o óleo que lubrifica a democracia, toda a tentativa para os calar é contraprodutiva RALPH AKINFELEYE, diretor de comunicação na Universidade de Lagos Angola, Cabo Verde e Moçambique entre os que mais cresceram em PIB per capita Angola, Cabo Verde e Moçambique estão entre os dez países africanos em que o rendimento per capita mais cresceu entre 2000 e 2012, segundo o Relatório do Progresso de África, realizado pela África Progress Panel (APP), entidade presidida pelo ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan. O relatório, revelado em maio, faz uma análise dos recentes progressos do continente e dos desafios a enfrentar. Uma das conclusões apresentadas é de que entre 2000 e 2012 havia 493 milhões de africanos a viver em países com taxas anuais de crescimento per capita iguais ou superiores a 3%. Entre estes países, Angola é o segundo com maior crescimento do PIB per capita (taxa média anual de mais de 6%), Cabo Verde é o quarto e Moçambique aparece em oitavo lugar. No extremo oposto surge a Guiné-Bissau, com uma taxa anual do PIB per capita negativa. É o sexto pior lugar do continente africano. A manter-se este cenário, os guineenses teriam de esperar mais de 76 anos para duplicarem o seu rendimento médio, enquanto os angolanos, cabo-verdianos e moçambicanos duplicariam os seus rendimentos médios em menos de 17 anos, conclui o relatório. O documento assinala ainda que os elevados níveis de crescimento económico não são um bom guia para aferir a severidade da pobreza. Por exemplo, o angolano pobre consome em média menos do que o etíope pobre, embora Angola seja já considerado um país de rendimento médio. Segundo o relatório, o pobre médio em Moçambique consome diariamente pouco mais de 70 cêntimos de dólar, o angolano quase 80, o guineense mais de 80, o santomense mais de 90 e o cabo-verdiano mais de um dólar por dia. Atualmente, diz o documento, quase metade da população da África Subsariana (413 milhões de pessoas) vive abaixo da linha da pobreza extrema (com menos de um dólar por dia), embora haja grandes discrepâncias entre países. DOMINGOS CADÊNCIA/JORNAL DE ANGOLA 60 milhões O pobre médio em Angola tem um consumo de 80 cêntimos de dólar por dia África21– julho 2014 13 1 milhão de empregos foram gerados no Brasil devido à Copa do Mundo “ Sei que o governo [de Angola] está muito empenhado em melhorar o nível de vida dos angolanos JOHN KERRY, secretário de Estado norte-americano Numa altura em que as violências sexuais e as mutilações genitais femininas são objeto de campanhas muito mediatizadas com a participação de figuras políticas e de estrelas de Hollywood, as mulheres portadoras de fístulas obstétricas continuam a sofrer em silêncio uma autêntica «morte social» que acaba frequentemente em suicídio. Incapazes de conter as urinas e as fezes que passam pela vagina em consequência de ruturas da parede vaginal durante o parto ou de violações brutais e repetidas, estas mulheres são repudiadas pelos maridos e famílias e excluídas dos lugares públicos ou de culto devido ao cheiro nauseabundo que as envolve. Consideradas e considerando-se como «amaldiçoadas», a morte é para elas a única solução quando uma cirurgia simples poderia curar mais de 80% destas infelizes. Segundo a OMS há atualmente mais de dois milhões de jovens mulheres afetadas por este flagelo e registam-se anualmente entre 50 e 100.000 casos, sobretudo em África e na Ásia do sudeste. Além do tratamento reparador que deve ser sistemático e gratuito, a OMS insiste na necessidade de prevenir as causas mais frequentes deste tipo de acidente que são as gravidezes precoces (50% das pacientes engravidaram antes dos 15 anos) e a falta de assistência médica durante a gravidez e o parto, particularmente necessária nas regiões onde a maioria das mulheres são excisadas. Cabo Verde é um dos onze países que em 1990 tinham altas taxas de mortalidade materna e conseguiram reduzi-las em 75%, atingindo já em 2013 um dos objetivos do milénio, que seria o de conseguir esse feito até 2015. A revelação consta de um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgado recentemente. Com 53 mortes maternas em cada 100 mil nascimentos, Cabo Verde é um dos dois únicos países da África Subsariana a apresentar uma taxa inferior a 100. O outro país é a Ilha Maurício, com 73 mortes. Prevê-se que muitos países não conseguirão atingir este objetivo do milénio. A Guiné-Bissau, por exemplo, apesar de algumas melhorias (redução de 40% desde 1990), permanece entre os quinze com taxas mais elevadas. Em 1990, eram 930 mortes por cada 100 mil nados vivos; em 2013 o número caiu para 560 (13.º lugar entre as piores taxas). Entre os restantes países africanos de língua portuguesa, Moçambique aparece na lista com 480 mortes de mães em cada 100 mil nados vivos e uma redução de 64%. Angola tem 460, tendo a taxa diminuído 68%. São Tomé e Príncipe, por sua vez, apresenta uma taxa de 210 mortes por 100 mil nados vivos, uma redução de 48% face a 1990. Serra Leoa é o país com a taxa mais elevada: 1100 mortes em cada 100 mil nascimentos. O relatório indica que mais de 800 mulheres morrem todos os dias devido a complicações na gestação e no parto. Contudo, aponta uma redução global de 45% na mortalidade materna desde 1990. 14 julho 2014 – África21 dr Cabo Verde atingiu objetivo do milénio de redução da mortalidade materna dr A tragédia silenciosa das fístulas obstétricas Nigéria e Argélia nos oitavos da Copa As seleções da Nigéria e Argélia são as representantes de África nos oitavos-de-final da Copa do Brasil, depois de Camarões, Costa do Marfim e Gana terem ficado pelo caminho. Numa Copa bem disputada, as surpresas foram aparecendo diariamente. No lote das dezasseis equipas que competem no «mata-mata», denota-se algumas ausências. Dadas como principais favoritas à conquista do título, Espanha, Inglaterra, Itália e Portugal saíram da competição precocemente, depois de más campanhas. O caso mais surpreendente foi mesmo o dos espanhóis, que dominavam o futebol europeu e mundial há mais de seis anos. Até esta fase, a Copa tem sido dominada pelas seleções americanas. Costa Rica e Chile surpreenderam ao carimbar a passagem aos oitavos-de-final, logo na segunda jornada, em grupos na teoria complicados. Num outro patamar, também a Grécia e a Suíça aparecem como outsiders na segunda fase da competição. Na segunda fase, a Nigéria vai ter pela frente a França, naquele que se antevê ser um jogo complicado para as aspirações nigerianas. Por sua vez, a Argélia defronta a Alemanha, que já mostrou credenciais nesta Copa, e que é uma das favoritas à conquista do título. foi a média semanal de acidentes com armas de fogo em escolas dos Estados Unidos da América nos últimos 18 meses Governo angolano quer fixar um preço médio para habitação social O governo angolano quer fixar em cerca de 4 milhões de kwanzas (cerca de 40 mil dólares), o preço das habitações sociais que estão a ser construídas em todo o país. A informação foi divulgada pela ANGOP, após o encontro mantido no princípio do mês de junho, em Luanda, entre o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, e os governadores das 18 províncias de Angola, para avaliar o grau de implementação do Programa Nacional de Luta contra a Pobreza e o Plano Nacional de Habitação. Atualmente estão em curso projetos que preveem a construção de mais de 120 mil habitações. O último plano prevê a construção de mais 200 bairros sociais, num total superior a 26 mil residências. No comunicado final, o Governo recomenda «acelerar o ritmo de construção das infraestruturas externas e equipamentos sociais, assim como a definição de um preço de aquisição que corresponda à capacidade de pagamento da maior parte da população, na modalidade de renda resolúvel». Em declarações à imprensa, no fim da reunião, a ministra do Comércio, Rosa Pacavira de Matos, que também é a coordenadora do Programa Nacional de Luta contra a Pobreza, confirmou a intenção do Governo em fixar em quatro milhões de kwanzas o «preço médio» de cada habitação construída ao abrigo deste plano. “ O Presidente José Eduardo dos Santos tem exercido um excelente papel de liderança FRED HOCHDERG, presidente do EXIMBANK dos EUA ROGÉRIO TUTI/JORNAL DE ANGOLA 1,37 A ministra do Comércio, Rosa Pacavira, coordena o Plano Nacional de Habitação Inaugurada primeira incubadora de empresas de Angola A província de Luanda alberga a primeira incubadora de empresas do país, inaugurada a 24 de junho pelo ministro da Juventude e Desportos, Gonçalves Muandumba. Orçada em cerca de dois milhões de dólares, a incubadora, localizada no município de Viana, no perímetro da Zona Económica Especial Luanda-Bengo, é constituída por cinco pavilhões com oficinas e escritórios. Para se candidatar a «residente» na incubadora é preciso que a empresa seja angolana, que não tenha mais de dois ou três anos de existência, seja promotora de projetos com alguma sustentabilidade e esteja certificada pelo Instituto Nacional das Pequenas e Médias Empresas (INAPEM). Os empreendedores habilitados vão passar a residir na incubadora de empresas por um período de até três anos, obtendo formação e consultoria para gestão de negócios de forma sustentada. Brevemente, em Luanda vai ser inaugurada uma outra incubadora do ramo das tecnologias de informação e comunicação com apoio da Chevron. Esses serviços serão estendidos a todo o país, estando para breve previstas a construção de incubadoras em Benguela e na Huíla. Os primeiros residentes na recém-inaugurada incubadora serão três dos dez vencedores do concurso «Ideia Brilhante», promovido pelo INAPEM, que atuam no ramo da indústria. África21– julho 2014 15 “ 10.000 milhões Não se veem mercados na Europa com tantos 4x4 de qualidade como em Angola de dólares é o valor global da procura de ajudas humanitárias de emergência em 2013 contra 6000 milhões em 2003 NUNO BORGES, presidente da Associação dos Concessionários de Equipamentos de Transportes Rodoviários de Angola dr O sírio Bashar al-Assad venceu as eleições presidenciais sírias de 3 de junho por mais de 80% dos votos num escrutínio que contou com a participação de 73,4% dos eleitores inscritos e de outros dois candidatos. O Ocidente qualificou de «farsa» estas eleições realizadas num país devastado por três anos de guerra civil, que já causou mais de 160.000 mortos e milhões de deslocados e refugiados. O Departamento de Estado dos EUA considerou, pelo contrário, que as eleições legislativas iraquianas de 30 de abril foram um sucesso e um passo em frente na consolidação da democracia. O xiita Nouri el Maliki foi proclamado vencedor e reconduzido no cargo de primeiro-ministro que ocupa desde 2006. Contudo, o seu partido elegeu apenas 92 dos 328 deputados do Parlamento de Bagdade, o seu pior resultado em três eleições sucessivas. Acusado de autoritarismo e sectarismo, Nouri el Maliki, que cumula a chefia do Governo com a pasta de ministro do Interior, não conseguiu restaurar a paz e a segurança no Iraque e recusa-se obstinadamente a incluir no Governo representantes das minorias sunita e curda. Nouri el Maliki, primeiro-ministro do Iraque …e as suas consequências Estes resultados não foram a causa exclusiva da situação dramática que vive o Iraque desde o início da ofensiva do Estado Islâmico no Iraque e no Levante (EIIL) mas é evidente que fragilizaram a posição de Maliki, transformando-o num alvo prioritário porque supostamente mais fácil de abater. A tomada de cidades como Mossul e Kirkouk e o avanço rápido dos combatentes do EIIL até às portas de Bagdade não teria sido possível se estes não contassem com o apoio das populações e tribos sunitas, de ex-militares e funcionários do regime de Saddam Hussein, e de cumplicidades no seio de defesa e segurança iraquianas. O único cimento desta coligação é o ódio ao atual homem forte de Bagdade, mas os danos podem ser irreversíveis para a unidade do Iraque e a estabilidade e segurança de toda a região. O embaraço de todos os países envolvidos no conflito iraquiano há mais de uma década é plenamente justificado. O Líbano, ainda sem Presidente, e a Jordânia podem ser as próximas vítimas da escalada das tensões e violências sectárias. Pelo contrário, Bashar al-Assad pode encarar com relativa confiança os próximos desenvolvimentos da crise. A sua defesa intransigente da unidade nacional e da laicidade da Síria e dos direitos das minorias já lhe permitiu averbar sucessos militares e políticos significativos face a uma oposição cada vez mais dividida e impotente. 16 julho 2014 – África21 dr Eleições na Síria e no Iraque… África do Sul na hora das opções difíceis Os cerca de 70.000 trabalhadores das minas de platina da região de Rutemberg regressaram ao trabalho a 26 de junho, pondo fim a uma greve iniciada a 23 de janeiro. O acordo salarial negociado pelo sindicato AMCU – que não pertence à confederação COSATU aliada do ANC – concede aos trabalhadores com os mais baixos salários o aumento de 100% que reivindicam, mas faseado em três anos. Os mais bem pagos aceitaram aumentos mais moderados. Ainda assim, as três multinacionais que dominam o setor vão ter de rever a sua estratégia para poder manter preços competitivos e estas mudanças poderão implicar despedimentos coletivos. Em pano de fundo, é toda a indústria mineira sul-africana que carece de uma reorganização para adaptar-se à concorrência internacional, sob pena de conhecer o mesmo declínio que a extração de ouro. À volta de Joanesburgo, as minas abandonadas são agora exploradas por desempregados e imigrantes indocumentados e a nacionalização do setor continua a ser o cavalo de batalha de Julius Malema, o turbulento dissidente do ANC e dos seus «combatentes pela liberdade económica» Há quem duvide que o Presidente Jacob Zuma tenha ainda força e capacidade para lidar com a situação. Hospitalizado no início de junho, devido a problemas cardíacos, o Presidente de 72 anos, que acaba de ser reeleito, apareceu muito cansado no Parlamento e a imprensa sul-africana especula sobre a sua possível renúncia antes do fim do mandato. 250.000 habitações novas serão distribuídas na Argélia antes do Ramadão Abdicações reais na Europa dr A abdicação do rei Juan Carlos de Espanha a favor do seu filho Felipe eleva para três o número de monarcas europeus que renunciaram ao trono para deixar o lugar à «geração mais nova». O rei dos belgas Albert II e a rainha Beatrix da Holanda tinham tomado a mesma decisão em 2013. Se a soberana holandesa seguiu a tradição familiar, retirando-se aos 75 anos, como a sua mãe Juliana e a sua avó Guilhermina, nos casos de Juan Carlos, 75 anos, e de Albert, 80 anos, os problemas de saúde provocados pelo peso dos anos não foram as razões determinantes. Ambos os monarcas, fragilizados por escândalos financeiros e casos de adultério, optaram pela «reforma antecipada» para salvar a instituição monárquica, considerada «obsoleta» por uma parte dos seus súbditos. Bhumibol da Tailândia e Isabel de Inglaterra, ambos com 87 anos, parecem pelo contrário mais determinados do que nunca a manter-se nos respetivos tronos. Na Igreja Católica, a idade da reforma é oficialmente de 75 anos para padres e bispos, mas o Vaticano estuda a possibilidade de aumentá-la para os 78 anos; quanto aos cardeais perdem o direito de voto nos sínodos passado os 80 anos. Exemplos que devem merecer reflexão em África, continente que conta o maior número de chefes de Estado «vitalícios». Felipe VI e o pai Juan Carlos África21– julho 2014 17 528 casos de febre de Ébola, dos quais 327 mortais foram registados até meados de junho na Guiné, Libéria e Serra Leoa “ O Conselho de Segurança deve mudar radicalmente de atitude em relação aos acusados de crimes contra a humanidade entre os quais o Presidente sudanês Omar al-Bashir FATIMA BENSUDA, procuradora-geral do TPI O Presidente da República de Angola e do MPLA, José Eduardo dos Santos, exortou os militantes do seu partido a acompanhar a evolução da sociedade angolana sob pena de «perder a confiança do povo». O alerta foi transmitido em Luanda na sessão de abertura da segunda reunião extraordinária do Comité Central do MPLA, que reuniu cerca de 300 membros daquele organismo para discutir a realização do congresso extraordinário deste ano. «Se o partido não acompanhar a evolução social e estagnar pode perder a confiança do povo e a liderança do processo de mudança», advertiu José Eduardo dos Santos, que também chamou a atenção para o populismo de forças políticas «que recorrem a promessas irrealistas, impossíveis de concretizar, com a intenção de enganar as massas populares». O presidente do MPLA lembrou que inserção social do partido é um «meio para a condução do processo de transformação social», fundamental para a concretização do programa partidário e chamou a atenção para a seleção e a integração de quadros técnicos e políticos ROGÉRIO TUTI/JORNAL DE ANGOLA Presidente exorta MPLA a acompanhar a evolução da sociedade no MPLA, assunto que deverá ser abordado no próximo congresso. A necessidade de tornar «mais regular» o diálogo «entre o topo, os escalões intermédios, as bases do partido e o povo» foi outro assunto lembrado pelo presidente e que o MPLA deve abordar no seu quinto congresso ordinário. O Presidente realçou também a promessa eleitoral de 2012, sobre uma «grande reforma do Estado», que envolve a legislação para a constituição das autarquias, e lançou o tema para a discussão no partido. MEDI 18 julho 2014 – África21 “ 10.000 Todos os atores envolvidos na ajuda humanitária internacional devem trabalhar em conjunto, de forma mais coerente e privilegiar as parcerias e a gestão dos riscos casos de tuberculose multirresistente são registados anualmente na África do Sul A sentença do tribunal do Cairo que condenou, a 23 de junho, jornalistas da cadeia de televisão Al-Jazeera a penas de prisão de 7 a 10 anos, está a causar escândalo. Os jornalistas britânicos lançaram uma campanha de solidariedade com o lema «jornalismo não é crime». Mas os governos ocidentais «chocados» limitaram-se a pedir ao Presidente egípcio que indulte os condenados, o que o marechal al-Sissi recusou, alegando respeitar a independência dos tribunais. Dias antes outro jornalista da Al-Jazeera, Abdallah Elshamy, em greve de fome desde janeiro, tinha sido libertado «por razões humanitárias» por decisão do Procurador-Geral. O australiano Peter Greste e o canadiano de origem egípcia Mohamed Fadel Fahmy, que dirigia os escritórios da Al-Jazeera no Cairo antes da sua ilegalização, foram condenados a sete anos de prisão; o egípcio Baher Mohamed apanhou 10 anos, a mesma pena aplicada a dois jornalistas britânicos e a uma neerlandesa que conseguiram fugir do Egito antes de serem detidos. Por terem divulgado «falsas informações» sobre a repressão dos partidários KHALED ELFIQI/EPA No Egito, jornalismo é crime? VALERIE AMOS, secretária-geral adjunta da ONU para os assuntos humanitários Peter Greste, Mohammed Fahmy e Baher Mahmoud, da televisão Al-Jazeera, três dos jornalistas condenados pelo tribunal egípcio do ex-Presidente Mohamed Morsi (condenado à morte), os jornalistas foram acusados de «cumplicidade com os Irmãos Muçulmanos» e julgados ao abrigo da legislação antiterrorista, cuja aplicação já deu lugar a centenas de condenações à pena capital. «Este veredicto mostra como os magistrados egípcios foram contaminados pela histeria anti-Irmãos Muçulmanos estimulada por Sissi», comentou a ONG Human Rights Watch. ICAL África21– julho 2014 19 “ As bases em que assenta a nação angolana em construção precisam de ser reformuladas LUSA DECLARAÇÃO POLÍTICA DA UNITA em 31 de maio de 2014 Protestos na Nigéria, em junho, contra os raptos da Boko Haram Guerra contra o terrorismo em África entre o caos e o pântano Apesar das intervenções militares da França e dos Estados Unidos, a guerra contra o terrorismo em África não registou avanços significativos nas últimas semanas em nenhuma das frentes atualmente abertas, do Sahel à Nigéria e ao Quénia. Na Nigéria, apesar dos enormes meios utilizados, as raparigas raptadas em abril continuam desaparecidas e novos ataques mortíferos atribuídos à Boko Haram causaram dezenas de vítimas suplementares com crescentes críticas contra as forças armadas e o Presidente Jonathan. No norte do Quénia – decretada zona de guerra pelos shebab somalianos – os atentados e assassinatos multiplicam-se e o Presidente Kenyatta acusa as forças políticas internas de estarem por detrás da escalada de violência. Na República Centro-Africana, a França anunciou o início da retirada das suas tropas, mas a insegurança continua a suscitar acusações cruzadas entre ex-seleka – muçulmanos – e anti-balaka (supostamente cristãos). A Líbia continua a sua descida aos infernos, apesar dos apoios árabes (nomeadamente o egípcio) e ocidentais à «operação dignidade» do general Khalifa Haftar. O país tem agora dois governos, o de Ahmed Miitig que tomou pela força em 4 de junho a sede do poder em Trípoli, e o do seu antecessor Abdallah al-Theni, que decidiu instalar-se com os seus (ex) ministros em El-Beida, no Leste. Mas ambos os executivos não têm poder nem dinheiro, dado que as instalações petrolíferas continuam nas mãos das milícias. Toda a região parece em vias de se transformar numa imensa Somália onde, por certo, também não acontece nada de novo ou relevante, além do anúncio da demissão do responsável máximo (chadiano) da AMISOM (Missão da União Africana na Somália). A AMISOM é constituída por tropas do Uganda, Burundi, Djibuti, Etiópia, Quénia e Serra Leoa. 20 julho 2014 – África21 Gente Albie Sachs O juiz sul-africano, que se celebrizou pelo seu papel na luta anti-apartheid, foi galardoado com o primeiro prémio Tang para o Estado de Direito, entendido como a versão asiática dos Nobel, pelo seu contributo para os direitos humanos e a justiça. Sachs, que perdeu um braço e ficou cego de um olho durante um atentado à bomba em Moçambique, em 1988, perpetrado por forças do apartheid, foi nomeado pelo Presidente Nelson Mandela para o Tribunal Constitucional da África do Sul, onde esteve até 2009. O júri da Fundação Tang reconheceu os seus esforços «para o Estado de direito numa África do Sul livre e democrática». O prémio tem um valor monetário de um milhão de dólares. Sachs, de 79 anos, começou a exercer advocacia aos 21 anos e defendeu diversas vítimas do regime do apartheid. Em 1966 exilou-se no Reino Unido, tendo viajado para Moçambique onze anos depois, onde contribuiu para a criação do novo sistema legal no país. O seu regresso à África do Sul ocorreu em 1990, após a legalização do ANC e a libertação de Mandela. Zelda La Grange A jovem africânder que foi durante 19 anos a secretária pessoal de Nelson Mandela atirou uma pedrada ao charco com a publicação do seu livro de memórias Good Morning Mister Mandela. A publicação do livro coincidiu na África do Sul com o fim do luto tradicional de seis meses de Madiba, falecido em dezembro de 2013. Além das lembranças da sua relação pessoal com o primeiro Presidente negro do país, La Grange revela aspetos da vida privada do clã Mandela, que incidem particularmente sobre os últimos anos de vida do patriarca e o seu casamento com Graça Machel. Segundo La Grange os filhos mais velhos manifestaram uma total falta de respeito e mesmo agressividade em relação a Graça e tentaram impedi-la de assistir ao enterro de Mandela na sua aldeia natal de Qnu. Lamido Sanusi O ex-governador do Banco Central da Nigéria, «despedido» pelo Presidente Jonathan por ter mandado investigar o suposto desvio de mais de 20.000 milhões de dólares de receitas petrolíferas dos cofres do Estado, voltou à ribalta a 4 de junho ao ser eleito emir de Kano, a segundo mais alta autoridade muçulmana do país. Além de ser um economista de prestígio internacional, Sanusi é também um teólogo, especialista no estudo da lei islâmica (sharia) e autor de obras de referência em que refuta as teses dos islamistas radicais, de inspiração wahabista. Segundo Sanusi, as autoridades muçulmanas têm todo o direito de fazer cumprir a lei mas esta aplica-se exclusivamente às questões de dogma. Sucede ao seu tio-avô, o emir Ado Bayero, e a sua eleição deu lugar a manifestações de protesto por parte dos partidários do filho do emir defunto que tinha também a preferência de Jonathan e do seu partido. O novo emir anunciou a sua intenção de não regressar à vida política ativa e de se dedicar exclusivamente ao seu papel de líder espiritual. Mas as suas declarações públicas sobre a incompetência e a corrupção da entourage do atual presidente da Nigéria não estão esquecidas. África21– julho 2014 21 discriminações A homossexualidade é crime em 40% dos Estados das Nações Unidas (ONU). São 76 países, dos quais 38 se encontram em África, o continente mais intolerante, e onde apenas a África do Sul legalizou a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Segundo a Amnistia Internacional, os ataques ho22 julho 2014 – África21 mofóbicos têm aumentado em diversos países e vários governos têm procurado leis mais rigorosas, como o Burundi, Sudão do Sul, Uganda, Libéria ou Nigéria. Casos há em que é aplicada a tortura, prisão perpétua e mesmo a pena de morte, como na Mauritânia, Somália e Sudão. Mas quando não são as leis, é parte da sociedade civil que, pelas mais mofóbicos, tal como o discurso de diferentes godiversas razões, discrimina, ostraciza e reprime a vernantes, que canaliza o desespero de muitos por comunidade homossexual. melhores condições de vida para o acirrar de ódios Estigmas como a relação entre o VIH e os atos contra franjas da população mais indefesas, como homossexuais ou certas crenças religiosas têm con- a comunidade homossexual. Miguel Correia tribuído para o aprofundar dos sentimentosCristiano ho- Ronaldo África21– julho 2014 23 discriminações O custo da diferença África é o continente mais homofóbico. Todos os anos, milhares de homossexuais são discriminados, perseguidos, detidos ou mortos. Mas mesmo perante as dificuldades, há quem continue a assumir a diferença e o ano passado registou-se na África do Sul o primeiro casamento homossexual na etnia Zulu. E stão abraçados, de bocas próximas. Olham-se mutuamente e a pose é íntima. Chamam-se Khnumhotep e Niankkhnum e estão de tronco nu, apenas de tanga. Aparentemente são um casal. Um casal egípcio. Viveram há 2400 anos, no norte de África, e para muitos investigadores a gravura em que se encontram, descoberta no seu túmulo, é considerada o registo mais antigo de um casal homossexual: Khnumhotep e Niankkhnum são dois homens. Questão que se perde no tempo, e que para o escritor e poeta Johann Goethe é tão antiga como a humanidade, a homossexualidade tem sido encarada das mais variadas formas pelas diversas culturas. Tem sido incentivada, aceite, criticada e combatida. No passado, como hoje. Se para algumas sociedades e em determinadas épocas foi considerada normal e até estimulada (na antiga Grécia, por exemplo), em muitas outras só no século XX deixou de ser considerada uma doença. A própria Associação Americana de Psiquiatria apenas em 1973 retirou a homossexualidade do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Mas se as sociedades, um pouco por todo o mundo, têm vindo nas últimas décadas a abrir as portas à livre opção sexual de cada um, o caminho tem sido lento e gradual. Setenta e seis países, 40% do universo dos Estados das Nações Unidas (ONU), ainda criminalizam a homossexualidade. Geralmente a de ambos os sexos, em alguns casos apenas a masculina, como no caso do Zimbabwe. Destes, mais de metade são africanos, assumindo-se África como o continente mais homofóbico. 24 julho 2014 – África21 Em 2013 realizou-se, na África do Sul, o primeiro casamento homossexual Zulu Exemplo recente que retrata a situação no continente é a vivida por dois homens, James Mwape e Philip Mubiana, detidos há mais de um ano na Zâmbia. Acusados de alegadamente terem mantido relações sexuais, estão presos, a aguardar julgamento, que os pode levar a 14 anos de prisão. A responsável da Amnistia Internacional na Zâmbia é clara: «Estes homens já passaram mais de um ano presos, sendo-lhes recusada a liberdade condicional num caso em que são acusados de algo que não deverá constituir crime. Deter pessoas com base na sua orientação sexual, real ou não, não é aceitável e constitui uma violação flagrante do direito internacional e da justiça». Diversas organizações governamentais e não-governamentais têm, nos últimos anos, levantado a questão da homofobia na generalidade dos países africanos e apresentado casos concretos de discriminação, tortura e mesmo morte. Umas vezes via legislação interna de cada Estado, noutros fruto da justiça feita na rua, à margem da lei, Neymar dr mas quase sempre incentivada pelos próprios governantes ou até por certas instituições religiosas. Para a ONU, a questão é simples: a aplicação da pena de morte na punição de crimes não violentos – incluindo relações sexuais entre adultos do mesmo sexo – constitui uma violação da lei internacional sobre direitos humanos. Se países como a África do Sul têm publicado legislação garantindo direitos aos homossexuais, outros há que nos últimos anos têm seguido o percurso inverso. Burundi e Sudão do Sul publicaram leis criminalizando o relacionamento com pessoas do mesmo sexo. E países como a Nigéria, Libéria ou Uganda aumentaram as punições. Sem alteração legislativa continua a situação na Mauritânia, Sudão ou Somália, onde aos considerados perante a lei culpados pode ser aplicada a pena de morte. A Pew Research Center desenvolveu um estudo sobre a homossexualidade, publicado em 2013. Na base do trabalho estava a pergunta: «A sociedade deve aceitar a homossexualidade?». Foram aus- Setenta e seis países, 40% do universo dos Estados das Nações Unidas, ainda criminalizam a homossexualidade cultadas 30 mil pessoas de dezenas de países de todos os continentes. Nos dez mais tolerantes não se encontrava nenhum país africano. Nos dez mais intolerantes, surgiu logo à cabeça a Nigéria com 98% da população a não aceitar a homossexualidade, e depois países como o Senegal, Gana, Uganda, Egito, Tunísia ou Quénia, com níveis de intolerância superiores a 90% da população. Crime ou libertinagem Enquanto Sam Kutesa, ministro dos Negócios Estrangeiros do Uganda, era eleito como presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas, cargo que assumirá em setembro, diversos locais em todo o mundo eram palco de manifestações a favor e contra a sua nomeação para o cargo. Kutesa tem várias acusações de corrupção, mas a causa principal para a mobilização residiu no seu posicionamento contra os homossexuais. O Uganda promulgou recentemente uma lei que pune de forma severa a homossexualidade, que pode ir inclusivamente até à prisão perpétua. Poucos dias depois, demonstrando que a lei era para cumprir, a polícia do Uganda entrou nos escritórios de uma organização norte-americana instalada no país, que auxilia homossexuais infetados com o VIH, alegando que o projeto Walter Reed prepara jovens para a homossexualidade. Os responsáveis da organização suspenderam as atividades, e passaram a dar apoio de forma individual e direta aos doentes, para que estes não interrompam os tratamentos. Mas estava dado o mote. Nos dias seguintes à publicação da lei e a este acontecimento, um jornal publicou uma lista com duas centenas de homossexuais, lançando uma caça às bruxas. Segundo informações de diversas organizações de direitos humanos, centenas de homossexuais e de acusados de o serem acabaram por fugir do país, onde existe um movimento denominado «Mate um Homossexual». A intolerância que parte da sociedade ugandense vive em relação à homossexualidade acabou por sair reforçada e sentir-se mesmo valorizada aos olhos do Estado, o que incentivou as perseguições e a verdadeira busca aos homossexuais que se instalou no país. Mas o caso do Uganda acaba por revelar uma das faces da homofobia em muitos outros Estados africanos: o envolvimento da religião, através de quem se aproveita dela, no cultivar da intolerância. Aliado dos Estados Unidos, país maioritariamente cristão, num continente em que a religião muçulmana tem vindo a ganhar terreno, o Uganda tem assistido à entrada de milhões de dólares de evangélicos norte-americanos. Se parte África21– julho 2014 25 Um jornal do Uganda publicou o nome de 200 homossexuais, o que motivou uma verdadeira caça às bruxas nham funções de reprodução e não de prazer, sendo a homossexualidade uma perversão, ao nível da masturbação ou do coito oral. A posição de censura manteve-se até hoje, servindo de base às atitudes mais radicais de diversos sacerdotes e de seitas que foram recolher ao cristianismo parte das suas ideias. Mas a posição crítica é comum a outras grandes religiões. O Alcorão contém condenações mais ou menos explícitas, e o facto é que o islamismo, em expansão em África, tem assumido posições extremas em relação à homossexualidade, fomentando a inscrição na lei da própria pena de morte em diversos países islâmicos. É o caso da Somália, Mauritânia ou Sudão, dr da verba vai para pastores e obras que se têm revelado importantes no combate à pobreza, outra fatia considerável acaba por cair nas mãos de líderes religiosos que defendem e cultivam a intolerância na sociedade, designadamente em relação a homossexuais ou bissexuais. A defesa, até às últimas consequências, de que tais pessoas não cabem na sociedade e são mesmo um perigo para a sua sobrevivência, «por serem pervertidos», acaba por arrastar com ela a violência e a exclusão. Não existem dados concretos, mas a Amnistia Internacional já levantou a questão, nomeadamente em relação à presença de evangélicos norte-americanos em diversas regiões de certos países da África Subsariana, questionando a razão da mensagem pouco tolerante que passam aos seus fiéis. A própria relação entre a homossexualidade e a religião tem variado muito ao longo dos tempos e dos lugares. A expansão do cristianismo trouxe com ele a perseguição às práticas homossexuais, e quando este se oficializou com a ascensão de Constan tino e a sua vitória na Batalha de Ponte Mílvio – tornando-o no primeiro imperador romano a professar o cristianismo –, a homossexualidade foi considerada uma ameaça institucional, nomeadamente por não contribuir para a sobrevivência e expansão através da procriação. Mas foi mais tarde, com Santo Agostinho, que a posição oficial da Igreja se institucionalizou. Os órgãos genitais ti- dr discriminações A reprovação social acompanha muitas vezes a própria detenção 26 julho 2014 – África21 Atualmente, em 38 dos 54 países africanos os atos homossexuais constituem crime Na Somália, Mauritânia ou Sudão as práticas homossexuais podem levar à pena de morte dr mas também de outros fora do continente, como a Arábia Saudita ou o Irão. No entanto, em países em que a comunidade islâmica tem peso, mas não é predominante, a situação dos homossexuais muçulmanos varia, e há Estados que assumiram mais tolerância em termos sociais e que não contemplam nas suas leis qualquer criminalização, como a Costa do Marfim ou o Mali. Atualmente, em 38 dos 54 países africanos os atos homossexuais constituem crime. São diversas as molduras penais, mas em alguns casos chega à prisão perpétua e mesmo à pena de morte. Por vezes são os próprios governantes e instigar a discriminação. Para a Amnistia Internacional os ata- O Uganda promulgou uma lei que pode levar à prisão perpétua quem for acusado de praticar atos homossexuais ques homofóbicos e as perseguições estão a aumentar, nomeadamente em toda a África Subsariana, atingindo já níveis considerados perigosos. «Estes ataques – por vezes mortais – têm que parar. Ninguém deve ser espancado ou morto pela atração ou envolvimento íntimo com pessoas do mesmo sexo», afirma Widney Brown, diretora de Política e Direito Internacional da Amnistia Internacional. Num relatório lançado em junho de 2013, a organização alertou para o agravar da situação. Focando casos concretos registados em países como Uganda, Quénia, Camarões ou na própria África do Sul, o trabalho conclui que «é tempo dos Estados africanos pararem de discriminar os indivíduos devido à sua orientação sexual ou identidade de género. Os direitos humanos representam a dignidade e a igualdade de todas as O medo e a ignorância têm contribuído, ao longo da História, para o desenvolvimento da homofobia, em África e nos restantes continentes pessoas». Remata Widney Brown: «À medida que as vozes que pedem o reconhecimento destas violações se erguem cada vez mais fortes, os Estados africanos devem parar de negar que a homofobia é um assunto de direitos humanos e devem reconhecer que os direitos LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros) são parte integrante da luta pelos direitos humanos. É responsabilidade dos Estados proteger, não perseguir». Também Ban Ki-moon, secretário-geral das Nações Unidas, se mostrou já este ano preocupado com as alterações legislativas em países africanos. Além do Uganda, Ban Ki-moon fez questão de manifestar, em fevereiro, a sua preocupação pelo caso da Nigéria, que votou no início do ano um projeto-lei que introduz diversas sanções, incluindo 14 anos de prisão para os casais do mesmo sexo que tentem legitimar a sua relação numa cerimónia, ou mesmo que simplesmente vivam juntos. Num comunicado, afirmou: «O secretário-geral lembra que cada pessoa tem o direito de gozar das mesmas regras elementares e de realizar uma vida sem discriminação baseada no valor e na dignidade». Da Nigéria, a resposta ficou-se pelo silêncio. Mas se as leis punem, há declarações que instigam à perseguição e mesmo à violência. E que mais graves se tornam, quando são os próprios governantes que as pronunciam. As afirmações de Robert Mugabe, há uns anos, tiveram repercussões na sociedade zimbabuana que ainda hoje perduram. Afirmou Mugabe que os homossexuais são «piores do que os cães e os porcos». A State-Sponsored Homophobia (homofobia patrocinada pelos Estados) parece andar, desta forma, em contraciclo em relação ao discurso generalizado da necessidade de defesa dos Direitos Humanos. Aliás, ao contrário de outros continentes, como na Europa ou América do Norte, em África são raros os governantes e políticos que assumem a sua homossexualidade. Zakhele Mbhlen, sul-africano da Aliança Democrática, é bem exemplo disso mesmo: foi nos últimos 15 anos o primeiro deputado eleito em eleições assumidamente homossexual em África. Em busca das causas A questão continua a suscitar dúvidas a sociólogos, antropólogos, psicólogos ou políticos: quais são as razões para que o continente seja, em geral, tão intolerante face à homossexualidade? As opiniões dividem-se. As posições de dirigentes como África21– julho 2014 27 discriminações ção e de alargamento do núcleo familiar, necessidades estas consideradas básicas, invalidam e levam mesmo à repressão das relações entre pessoas do mesmo sexo. Tal diversidade dificulta o enraizamento de perspetivas que rompam com regras já instituídas, nomeadamente nas questões sexuais. O próprio Presidente do Uganda, Yoweri Museveni, no dia em que promulgou a lei que criminaliza a homossexualidade, respondeu diretamente aos que no Ocidente o acusam de homofóbico, remetendo a questão para uma diferença de valores: «Há uma tentativa de imperialismo social, de impor valores sociais. Lamentamos ver que vocês [o ocidente] vivem da maneira como vivem, mas mantemos silêncio sobre o assunto». O medo e a ignorância têm contribuído, ao longo da História, para o desenvolvimento da homofobia, em África e nos restantes continentes. Foram diversos os episódios que facilitaram o seu enraizamento. Entre 1347 e 1351 a peste negra assolou a Europa, matando mais de 25 milhões de pessoas. O desconhecimento face à causa da doença e de tamanha mortandade levou a que o pecado em que os homens viviam, segundo o entendimento de então, aparecesse como a grande causadora do mal. A sodomia foi então dr Robert Mugabe, que tentam apagar as relações homossexuais da história das suas culturas, acusando simultaneamente os antigos países colonizadores de terem introduzido a homossexualidade nas suas sociedades, têm contribuído para um aprofundar da intolerância generalizada. Por outro lado, são múltiplas as abordagens que remetem também para o campo político as causas para a intolerância, principalmente a registada nas últimas décadas. O desespero face ao desemprego, à pobreza ou à desigualdade motivam, nesta perspetiva, que muitos governantes incentivem as suas populações a descarregarem a sua insatisfação no ódio a franjas da população mais fragilizadas, como a comunidade homossexual. Já para o antropólogo Américo Kwanonoka, e referindo-se neste caso especificamente a Angola, a homossexualidade é vista por muitos como um atentado às leis da natureza devido, entre outras questões, à origem bantu da maioria da população do país, que sustenta a perpetuação e o alargamento da família. A mesma leitura têm alguns investigadores em relação a um continente multicultural e com uma grande pluralidade de etnias, dispersas por diversos países, e que defendem de forma vincada valores muito próprios, onde a necessidade de procria- Têm-se multiplicado por diversos países africanos as manifestações contra a criminalização da homossexualidade 28 julho 2014 – África21 Já em pleno século XX, na década de 80, o VIH conquistou o título de «doença dos homossexuais», estigma de que ainda não se libertou dr A homofobia é muitas vezes incentivada nas próprias escolas um dos alvos privilegiados em algumas regiões da Europa. Em Florença, numa população de 40 mil habitantes, 17 mil foram incriminados e alguns milhares mesmo condenados. Já em pleno século XX, na década de 80, o VIH conquistou o título de «doença dos homossexuais», estigma de que ainda não se libertou, apesar de atualmente menos de 5% das infeções de VIH em Angola, por exemplo, acontecer por via homossexual, segundo um estudo epidemiológico do Instituto Nacional de Luta contra a Sida. Com a África Subsariana a apresentar os valores mais elevados do mundo de infetados, e a relação VIH/ gay presente, a homofobia tem tido um terreno farto para se afirmar. Mas neste caso, para os homossexuais a discriminação é dupla, pois além da social face à sua orientação sexual, são em muitos países marginalizados no tratamento da doença. Embora mais de 60% dos infetados estejam em África, um estudo denominado Off Map, desenvolvido pela Comissão Internacional para os Direitos Humanos de Gays e Lésbicas, concluiu que na maior parte dos países os homossexuais estão excluídos dos programas nacionais de luta contra o VIH/Sida, com as mensagens preventivas orientadas apenas para a população heterossexual. Apesar da posição de alguns governantes, que nos seus discursos defendem que a homossexualidade é não africana, que foi algo adquirido com a colonização, as investigações já realizadas provam que a prática homossexual se perde no tempo por terras de África. Há indícios vários de que cinco séculos antes de Abraão, já os egípcios realizavam práticas homossexuais. Também os antropólogos Stephen Murray e Will Roscoe já escreveram sobre as denominadas motsoalle, quando as mulheres do Lesoto se envolviam em relações eróticas prolongadas. Tal como os guerreiros Zandes, no norte do Congo, que tinham jovens rapazes como amantes, que praticavam sexo com eles e os ajudavam nas lides domésticas, prática esta que chegou até ao século XX. Curioso também o trabalho de Kurt Falk, antropólogo alemão que escreveu em 1923 sobre a vivência de duas pessoas do mesmo sexo em duas tribos de Angola, os Wawihe e os Ovigangellas. Escreveu ele que entre os Wawihe «havia níveis diferentes de prática e aceitação do amor entre pessoas do mesmo sexo», não só entre jovens, mas também entre adultos. Segundo Kurt Falk, este tipo de atração era negada quando em frente de estranhos, mas que depois de se criar alguma proximidade era admitida, reconhecendo então alguns homens da tribo que tinham parceiros masculinos. Também entre os Ovigangellas era aceite o relacionamento entre homens. Em troca de presentes, um homem mais velho podia pedir ao pai de um rapaz a sua mão. Em caso de concordância, era-lhes permitido viver juntos, Cinco séculos antes de Abraão os egípcios realizavam práticas homossexuais África21– julho 2014 29 discriminações Homossexual e albino, o duplo preconceito STEPHANE DE SAKUTIN/AFP Ser albino e homossexual em alguns países de África significa sofrer na pele um duplo preconceito. Além do estigma pela sua opção em termos de orientação sexual, os albinos são vítimas de discriminação, mas também de agressões várias. Considerados em diversos países, especialmente na Tanzânia – mas também noutros países, como no Quénia ou na própria África do Sul –, seres Em certas regiões de África, os albinos são alvo mágicos e com poderes de cura, de discriminação e violência são alvo de mutilações. O objetivo, macabro, passa pela venda dos seus membros, que se crê poderem dar sorte ou curar diversos males. Os albinos são pessoas com um defeito genético na produção de melanina, a substância que tem como principais funções a pigmentação e a proteção contra a radiação solar. É a melanina que dá cor à pele, olhos e cabelo. Para um albino é pois impossível passar despercebido. O seu assassinato tem sido relatado em diversos países subsarianos, mas é na Tanzânia, onde há um número anormalmente elevado de albinos, que se têm registado mais casos. Além dos assassinatos e dos mutilados, há ainda casos de violação, acreditando muitos que tal ato os pode curar do VIH. A consequência é a infeção das próprias mulheres pelo vírus. Se há casos de ataques para proveito próprio, a verdade é que está instalado um negócio que envolve somas já consideráveis. Por vezes com a conivência da polícia, o comércio está instalado, e a procura faz-se, principalmente das partes consideradas mais valiosas, como os genitais, braços, pernas língua ou dedos. Mas os usos são os mais diversos. Há pescadores do Lago Vitória que usam o cabelo dos albinos nas suas redes, há quem use os órgãos genitais das mais diversas formas para reforçar a potência sexual, ou quem use as suas peles para os mais diversos fins. Os relatos que chegam à comunicação social ou aos tribunais de diversos casos registados na Tanzânia são impressionantes. Há situações relatadas em Tribunal, onde muitos casos acabam por nem chegar, onde as vítimas, quase sempre crianças, são amputadas dos seus membros a sangue frio. Outras há em que são literalmente desmembradas, ainda vivas e conscientes. Há uns anos a morte dos bebés que nasciam albinos era mais frequente. Hoje é o simples abandono ou a reclusão das crianças em casa, para que não sejam vítimas de rapto ou abusos, ou simplesmente ostracizados, inclusive nas escolas. Além da perseguição ou marginalização de que podem ser alvo em diversas sociedades do continente, os albinos enfrentam uma série de problemas de saúde. O facto de serem muito sensíveis à luz faz com que muitos acabem com problemas graves de visão e mesmo cegos, além de poderem desenvolver cancro da pele ainda muito novos. 30 julho 2014 – África21 numa cabana própria. No caso do homem mais velho se casar, o mais jovem podia ficar como seu amante, até ele próprio constituir matrimónio. A abertura sul-africana Em África, na direção oposta à trajetória recente do Uganda ou Nigéria, estão países como Madagáscar, Lesoto, Suazilândia, Níger ou a África do Sul. Esta última, considerada uma das nações africanas mais alinhada aos direitos humanos internacionais, foi a primeira do continente – e até agora única – a legalizar a união civil entre pessoas do mesmo sexo, em novembro de 2006. Mas apesar da maior abertura em termos de leis, na prática há muito caminho a percorrer, pois a discriminação ainda existe, nomeadamente em certas empresas e organizações, mesmo do Estado, ou fora das grandes cidades. Contudo, sintoma de que algo está realmente a mudar na sociedade foi o primeiro casamento, o ano passado, entre dois homens de etnia Zulu. Tshepo Cameron Modisane e Thoba Calvin Sithol celebraram o seu casamento, numa cerimónia com cerca de 200 pessoas. Embora contestada pelos mais tradicionalistas, que entenderam o ato como um insulto para a cultura zulu, os dois assumiram o matrimónio. Tinham-se conhecido três anos antes, e depois de um encontro em Joanesburgo, passaram a viver juntos. Para eles, a grande diferença situa-se entre o campo, mais conservador, e as grandes cidades, como Joanesburgo, onde se sentem mais confortáveis quando juntos. O próximo desafio, afirmam, é terem um filho, através de uma barriga de aluguer. Desde então, o casamento de Tshepo e Thoba tem servido de exemplo para muitos outros homossexuais no país, que encontraram coragem para assumir publicamente as suas relações. Também o debate saiu reforçado, com a discussão de diversos temas relacionados com a união entre duas pessoas do mesmo sexo. Foram tornadas públicas investigações que, por exemplo, demonstram que é um tipo de união que conduz a uma expectativa de vida conturbada e a distúrbios psicológicos mais recorrentes, devido aos estigmas ainda existentes na sociedade. Certo é que a homofobia – e todas as questões práticas que levanta, como o preconceito e a exclusão –, é hoje um dos temas sociais mais relevantes do século XXI. Mas continua a ser negligenciado e pouco investigado, e raras vezes é abordado num contexto social mais alargado, onde cabem outras discriminações, como as raciais ou até as relativas à própria mulher. GANHE MULTIBÓNUS COM OS CARTÕES BNI Ganhe descontos ao utilizar o seu cartão BNI de débito ou de crédito, Visa ou Mastercard. 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José Eduardo dos Santos e Dilma Rousseff em Brasília O Export-Import Bank (Eximbank) dos Estados Unidos da América vai investir mil milhões de dólares (um bilhão, na terminologia brasileira) em dois projetos em Angola, o primeiro deles em infraestruturas (aquisição de locomotivas) e o segundo no fornecimento de energia elétrica. O facto foi anunciado no mês passado em Luanda pelo presidente da instituição, Fred Hochderg, após um encontro com o Presidente da República José Eduardo dos Santos. «Trata-se de dois projetos que vão marcar verdadeiramente o nosso primeiro passo de trabalho com a República de Angola no sentido do reforço da diversificação da economia», explicitou Hochderg. O Eximbank, note-se, já financiou a aqui- sição de dois Boeing 777 por parte da companhia de bandeira angolana, TAAG. Os entendimentos entre o Executivo angolano e o Eximbank norte-americano para a aquisição de locomotivas e fornecimento de energia elétrica foram finalizados na sequência da recente visita a Luanda do secretário de Estado dos EUA, John Kerry (ver África21 de junho). Na ocasião, Kerry, depois de assinalar que Angola está a atravessar um período de grande atividade económica e que tem «um potencial tremendo» para o seu desenvolvi- EUA estão interessados em participar no desenvolvimento de Angola Pedro K amaka mento, fez questão de sublinhar que o objetivo da visita era «estabelecer uma relação entre os dois povos e países e para construirmos uma parceria para o futuro». Cooperação abrangente Além do aumento da cooperação com os EUA, que começa a dar os seus primeiros passos, Angola mantém as suas relações com os seus parceiros tradicionais, com o objetivo de potenciar o seu desenvolvimento interno. A diversificação da cooperação é, aliás, a grande marca registada da diplomacia angolana. Assim, depois da visita de John Kerry, esteve em Luanda o vice-presidente do conselho de ministros de Cuba, Ricardo Cabrisas Ruiz, que discutiu o estado da África21– julho 2014 33 FRANCISCO BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA Angola no Top 10 dos mercados emergentes Angola faz parte dos dez principais países onde as multinacionais tencionam investir presentemente. De acordo com a nova edição do ranking anual dos «mercados de fronteira» (mercados emergentes) que suscitam interesse por parte das grandes multinacionais, publicado no mês passado pelo Wall Street Journal, a Nigéria ocupa a primeira posição a nível mundial, à frente da Argentina e da Arábia Saudita. No continente africano, os nigerianos são seguidos pelo Quénia e por Angola. O ranking foi estabelecido com base em informações recolhidas junto de 200 multinacionais, como a Coca-Cola, Novartis, General Electric ou Dell. O estudo avalia, desta forma, o nível de interesse manifestado pelas grandes multinacionais americanas e europeias em «mercados de fronteira» em todo o mundo. A classificação incorpora dois elementos principais: se por um lado é avaliado o sentimento atual das multinacionais que estão inseridas em mercados de fronteira, por outro a evolução do interesse das organizações aos mesmos. Com base na percentagem de multinacionais interrogadas, o estudo identifica também os «mercados promissores», ou seja, onde as organizações veem possibilidade de entrar. Com destaques regionais muito específicos, a África Subsariana é considerada, sem surpresa, o mercado mais promissor, com nove países que geram maior interesse mundial, de uma lista de vinte. Além da Nigéria, coroada pelas multinacionais americanas e europeias como o maior mercado de fronteira, com uma percentagem de 29,57%, seguida da Argentina (25,54%), Vietname (24,72%) e Arábia Saudita (24,69%), fazem igualmente parte do Top 10 outros três países africanos: Angola, Gana e Quénia. Em comparação com o estudo elaborado em 2013, uma das conclusões é que há países que estão a perder interesse, como é o caso da Argélia, e outros que sobem a uma velocidade vertiginosa, como é o caso de Angola, Nigéria, Costa do Marfim e Zâmbia. 34 julho 2014 – África21 José Eduardo dos Santos e o homólogo cubano Raul Castro testemunham assinatura de memorando entre Georges Chikoti e Ricardo Cabrisa Ruiz cooperação entre os dois países numa série de setores, da defesa e das relações exteriores à educação e à saúde, passando pelas finanças, construção, energia, águas, agricultura e transportes. Na sequência dessas discussões, o Presidente José Eduardo dos Santos visitou oficialmente Cuba de 17 a 20 de junho, tendo assinado com as autoridades cubanas um acordo para a construção de quatro aeroportos. São eles os aeroportos de Negage (Uíge), Jamba, Mavinga (ambos no Cuando Cubango) e Cahama (Cunene). Empresas cubanas serão contratadas para construí-los até 2017. Além disso, serão ainda encarregadas da manutenção dos aeroportos de Ndalatando (Cuanza Norte) e Cuíto Cuanavale (Cuando Cubango). Além dessas empreitadas, foi também discutida a possibilidade de formação de quadros angolanos no domínio dos transportes. O ministro angolano dos Transportes, Augusto Tomás, sublinhou ser imperioso considerar «a importância do capital humano» para a manutenção e a preservação dos avultados investimentos que o Estado está a realizar no setor. Durante a visita de Eduardo dos Santos a Cuba, foram igualmente discutidos aspetos relacionados com a cooperação existente tradicionalmente entre os dois países, como a da área da saúde. Assim, foi rubricado um acordo para que técnicos cubanos ajudem a formar parteiras angolanas, a fim de reduzir a taxa de mortalidade materno-infantil no país. «Fizemos um acordo com Cuba, com 17 profissionais que estão a trabalhar ao nível das escolas de formação de parteiras para melhorarmos e acelerarmos a formação de parteiras no país, de maneira a que isso venha a influenciar positivamente a redução da mortalidade materno-infantil», revelou o ministro angolano da Saúde, José Van-Dúnem. Antes de ter visitado Cuba, o Chefe de Estado angolano esteve também no Brasil, onde, além de ter assistido à abertura da Copa 2014, manteve conversações com a Presidente Dilma Rousseff sobre a cooperação bilateral entre os dois países. Segundo a embaixadora brasileira em Luanda, Maria Fontenele Reis, a visita serviu para discutir Angola aposta nas infraestruturas para diversificar economia o reforço da parceria estratégica entre os dois países em áreas como infraestruturas, energia e formação. «Especialmente na área de infraestruturas, financiamento para a construção de obras importantes de infraestruturas aqui em Angola, nossa parceria na área de energia, agricultura, educação, formação de pessoal no Brasil. Enfim, as possibilidades de cooperação são imensas», disse a diplomata. Durante a visita de José Eduardo dos Santos, a Presidente Dilma Rousseff confirmou ainda o apoio do Brasil à candidatura de Angola a membro não-permanente do Conselho de Segurança. Outro acordo estabeleceu que, doravante, os vistos entre os dois países passam a ter a duração de dois anos. Uma empresa que deixa marca O que transportamos? Combustíveis, Maquinaria Pesada, Produtos Frescos, Contentores, Mercadoria Diversa e Transportes Internacionais (Namíbia e África do Sul) www.antoniojsilva.com Parque Rua da Moagem Kwaba, Km 12 Viana – Angola Telefone: 222 013 805 – Fax 222 013 806 Telemóveis: 917 750 552 – 925 363 789 África21– julho 2014 35 36 julho 2014 – África21 África21– julho 2014 37 a opinião de alves da rocha Reflexões para a SADC sobre a instabilidade política da UE [email protected] As eleições europeias de 25 de Maio de 2014 acabaram por mostrar uma União Europeia descrente na única experiência bem-sucedida de integração económica até hoje existente A Professor Associado da Universidade Católica de Angola Alves da Rocha escreve de acordo com a antiga ortografia 38 julho 2014 – s elevadas taxas de abstenção e a subida, em alguns países inesperada, dos partidos mais radicais da esquerda e da direita representam sinais claros de que muitas coisas não têm corrido bem, sobretudo em matérias relacionadas com os níveis de vida dos cidadãos, a solidariedade inter-geracional e o funcionamento do Estado Social. Parece poder afirmar-se que a construção europeia está definitivamente posta em causa no seu modelo actual: austeridade, injustiça, divórcio entre políticos e cidadãos (decisões não discutidas nem partilhadas com os cidadãos que possuem um elevado nível de literacia económica e política), assimetrias regionais agravadas, empobrecimento dos países e das pessoas (Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda, Itália), etc. A Europa está a deixar de ser um projecto colectivo – visão inicial dos construtores desta integração económica, como Jean Monet – onde todos os países deveriam contar da mesma maneira e a solidariedade visando o desenvolvimento era uma parte relevante das estratégias de integração, para dar lugar à austeridade com empobrecimento e sem desenvolvimento, ao Tratado Orçamental rígido, à burocracia, ao predomínio do pensamento e dos interesses alemães, à fraqueza das instituições sediadas em Bruxelas e Estrasburgo, ao crescente eurocepticismo e à direita radical, contestatária dos valores mais humanistas do projecto europeu de Dellors e Monet. A construção europeia tem sido um processo muito difícil e complexo, com sucessos impressionantes em determinadas fases, quando as políticas de Jacques Dellors visavam, de facto, a convergência real das economias, a solidariedade África21 entre os povos, a ajuda aos países com problemas estruturais de crescimento e de capital humano. As instituições da SADC e os países e governos que dela fazem parte têm, a partir destas eleições para o Parlamento Europeu, muita matéria para reflexão. Volto a sublinhar que a construção de um espaço económico integrado na Europa, iniciada em 1956 com a assinatura do Tratado de Roma, continua a ser a experiência mais positiva de convivência económica conjunta e de solidariedade entre os países. Ao ter-se caminhado muito para além da eliminação das barreiras tarifárias ao comércio livre entre os países, significou a ultrapassagem de inúmeros problemas e a acumulação de um conhecimento profundo sobre como se proceder em direcção a uma integração completa e final. Evidentemente que falharam muitas coisas e a prova está no descontentamento da população. Ensinamentos e possibilidades O que é que se pode aprender relativamente à integração económica da SADC? Talvez seja aconselhável rever a velocidade com que se querem atingir as fases seguintes (depois da Zona de Livre Comércio), e em especial a da criação de uma moeda única sadciana, à imagem da África do Sul e do poder económico do rand. Parece que a SADC quer andar depressa demais, ignorando os graves desequilíbrios económicos e sociais existentes entre os países-membros da organização. A Europa não conseguiu resolvê-los em relação a Portugal, Espanha e Grécia, que continuam a ser das economias mais fracas da União, apesar dos fundos de apoio existentes. Como se sabe, estes fundos não existem na SADC, devendo cada país, por si só, fazer o seu trabalho PATRICK HERTZOG/AFP Manifestação frente ao Parlamento Europeu em Estrasburgo contra a extrema direita francesa Talvez a construção europeia esteja definitivamente posta em causa no seu modelo actual de casa. Hoje o euro é visto com muita desconfiança e não devemos esquecer que entre 2008 e 2009 – o pico da última crise económica e financeira mundial – muitos economistas de nomeada avisaram que uma das saídas da Europa poderia estar no retorno às moedas nacionais. Será que o Secretariado da SADC, quando fala no estabelecimento de uma moeda única neste espaço regional, tem em conta estes estudos e opiniões? Talvez reflectir muito profundamente sobre a consolidação duma SADC das Nações e dos Estados, antes de se entregarem às instituições comunitárias instrumentos de soberania e de estratégia das políticas económicas. A mensagem do regresso da Europa às Nações foi muito marcante em muitas das mensagens políticas destas eleições europeias. Talvez analisar com critério e rigor o estado das actuais assimetrias económicas e sociais entre os países e a sua natureza, deduzindo políticas nacionais e conjuntas capazes de as reduzir. São insuficientes, deste ponto de vista, os projectos conjuntos entre Angola – de resto, quem mais tem feito para o processo de criação de condições estruturais de convergência real como os seus mais directos vizinhos – a Namíbia e o Botswana. E mesmo com a Zâmbia. Talvez prolongar a actual fase de Zona de Livre Comércio em que se encontra a maior parte A SADC e os países que a integram têm nestas eleições para o Parlamento europeu muita matéria para reflexão dos países, de modo a permitir uma convergência real das suas economias, porque só assim os benefícios de um mercado mais alargado poderão ser equitativamente distribuídos (este parece ser de momento um dos aspectos mais criticáveis do modelo europeu: a sua incapacidade de distribuir mais equitativamente os benefícios da integração). A diferença entre o rendimento por habitante das Maurícias e da RDC é de 12 vezes, sendo, portanto, irrealista pensar-se que o livre comércio seja equidistantemente benéfico para os dois países. Talvez dar mais tempo para que as diferentes democracias nacionais se fortaleçam e sejam geradas instituições de representatividade e de participação efectiva dos cidadãos na discussão da criação de um projecto colectivo e com influência nas suas vidas e das gerações vindouras. Talvez fixarem-se metas de convergência nominal mais ajustadas à situação efectiva das diferentes economias, do que copiá-las pura e simplesmente dos critérios europeus, que de resto, como sublinhei acima, são uma das causas das dúvidas sobre se vale a pena prosseguir com o projecto de uma Europa de progresso igual para os seus povos. Talvez aprender muito mais com a experiência europeia, em todas as suas vertentes, de modo a evitarem-se os mesmos erros. África21– julho 2014 39 dr cabo verde Fórum Nacional de Transformação – Cabo Verde 2030 A busca de caminhos para o futuro Cidade da Praia Mudança de mentalidades dos cabo-verdianos, ousadia, inovação e aceleração do ritmo de transformação e parcerias estratégicas e oportunas. São estes os caminhos para o futuro do país, enquanto nação próspera, competitiva e inclusiva. Natacha Mosso PRAIA O país deve passar por uma autêntica revolução do Estado. Este é o entendimento do chefe do Governo cabo-verdiano, para quem, apenas dessa forma, Cabo Verde estará à altura das exigências do progresso e das aspirações dos cabo-verdianos nas ilhas e na diáspora. Discursando no final do II Fórum Nacional de Transformação – Cabo Verde 2030, José Maria Neves defende uma reconceituação pensada e construída do Estado como o caminho para o país ser mais cosmopolita, estar mais integrado na África e no mundo e ser mais compaginado com as diversas civilizações. «Este será um Estado para orientar as mudanças radicais e ruturas de que o país precisa para estar à altura da transformação para o desenvolvimento no horizonte de 2030 e que exige mudanças nas forças produtivas, nos segmentos empresariais e no setor privado», ressalvou Neves. 40 julho 2014 – África21 Por outro lado, o governante quer uma mudança de atitude e de comportamento, e o reforço da cidadania dos cabo-verdianos, fatores que considera relevantes para o sucesso do país. Reconhecendo os enormes desafios do arquipélago, o PM acredita que é exequível tornar Cabo Verde um país desenvolvido dentro de 16 anos, caso se invista fortemente no crescimento do rendimento per capita, na criação do emprego e na erradicação da pobreza. O fator de ancoragem A comunicação do Secretário Executivo das Nações Unidas para a África, o guineense Carlos Lopes, foi um momento bastante aplaudido do Fórum. Lopes fez um apanhado da situação de Cabo Verde, do ponto de vista económico e social, apontou os fatores estruturantes e que são, na sua ótica, mais-valias para Cabo Verde, como a qualidade governativa, a cultura administrativa, com foco no capital humano e no investimento, e por último, paz, segurança, coesão social e promoção do bem comum. O diplomata concentrou a sua alocução nos fatores fraturantes que, se não forem resolvidos, impedirão o crescimento e desenvolvimento do país. Desde logo, os custos enormes da democracia representativa e a polarização excessiva da política, que impedem decisões rápidas e competitivas, não ajudam na construção dos consensos nacionais e «promovem mais interesses pessoais que coletivos». A tradição jurídica e a descentralização exagerada são outros aspetos enumerados por Lopes que se juntam ao fator demográfico e à ancoragem. Sobre a demografia, Carlos Lopes afirmou que Cabo Verde verá a sua população jovem diminuir, colocando em risco a sustentabilidade do sistema da previdência social. Em 2030, metade da sua população será constituída por estrangeiros e o país terá que se preparar para esse cenário. E para um outro, que prevê que muita mão-de-obra qualificada deixará o país em consequência de falta de políticas que promovam o brain gain. Na opinião de Carlos Lopes, a ancoragem é o fator fraturante com que Cabo Verde mais se deve preocupar. Lançando a questão «Cabo Verde está ancorado a quem ou a quê?», Lopes criticou a excessiva aproximação do arquipélago à Europa – relações económicas, as ajudas ao desenvolvimento, o acordo monetário com a Zona Euro, entre outros –, para depois comparar as relações do país com a vizinhança imediata, o continente africano e apontar os seus custos. «Há o facto de Cabo Verde estar ancorado a uma zona em recessão, com problemas profundos e estruturais», alertou, sugerindo que Cabo Verde seja mais pragmático e aproveite as potencialidades da CEDEAO, uma região que cresce 6,55% ao ano e que viu o seu comércio externo aumentar 18% no último ano. Os clusters e a estratégia de transformação Desenvolvimento rural e agronegócio, economia marítima, turismo, tecnologias de informação e comunicação, e aeronegócio são os clusters definidos como estratégicos para o desenvolvimento do país e mereceram, por isso, especial atenção no fórum, com a realização de workshops. Estes espaços serviram para que os operadores económicos apontassem os reais entraves ao surgimento de negócios e crescimento do setor privado e, consequentemente, da economia. Para estes, o acesso ao crédito continua a ser o principal obstáculo ao reforço do papel do setor empresarial privado no crescimento da economia do país. O presidente da Associação de Jovens Empresários, Paulino Dias, diz mesmo que se trata de uma questão delicada e que tem «afetado o funcionamento das micro e pequenas empresas». Para este economista, a solução passa por reformas estruturais, a começar pela gestão do risco do país. Quem também partilha da mesma opinião é o presidente do Conselho Superior das Câmaras de Comércio de Cabo Verde. No entanto, Gualberto do Rosário previu bons cenários para o país e apontou potencialidades e oportunidades, particularmente no cluster do aeronegócio. O ex-governante acredita que Cabo Verde pode tornar-se numa plataforma de distribuição de combustíveis e altamente desenvolvida, com indústrias químicas e de transformação, assim como transformar a transportadora aérea nacional, os TACV, numa empresa pujante. Contudo, advertiu que a empresa deve ser privatizada por um grupo com capacidade financeira de gestão operacional e que consiga criar uma companhia quase de raiz, respondendo às exigências do mercado. Em resposta, o primeiro-ministro enfatizou que é chegada a hora de se «desestatizar as cabeças» dos cabo-verdianos e começar-se a privatizar as empresas do país, que precisam de um espírito «mais solto e mais ousado e de maior abertura» ao ambiente de negócios nacional e internacional, desde logo, ao mercado da sub-região africana e da lusofonia. Entende o governante que a transformação de Cabo Verde passa também por mais concertação social, maior capacidade de mobilização do crédito nacional e internacional e mais autonomia em relação aos riscos e financiamentos, a par da capacidade de construir joint-ventures e operacionalizar o mercado nacional. Reconhecendo que falta alguma capacidade de inovação, eficiência, produtividade e competitividade às empresas cabo-verdianas, José Maria Neves afirmou que torna-se imperativo ultrapassar a postura de lamentação e de culpabilização do outro e de se buscar espaços de articulação de políticas e de construção de soluções e de compromissos. O II Fórum Nacional de Transformação – Cabo Verde 2030 contou com a participação de membros de diversas instituições públicas e da sociedade civil, além de representantes de outros países e organizações internacionais, como as Nações Unidas. José Maria Neves quer uma mudança de atitude, de comportamento e reforço da cidadania dos cabo-verdianos Carlos Lopes prevê que a população jovem de Cabo Verde diminua colocando em risco a sustentabilidade do sistema da previdência social África21– julho 2014 41 Venha conhecer o Novo Site da Macon na Internet Transporte Interprovincial e Urbano Aluguer e Fretamento * Cargas e Encomendas Central de Atendimento 42 936 78 Á91 21 73 / 226 21 35 04 julho 2014 – frica www.macontransp.com planeja.com.br www.macontransp.com Águas Correntes Corsino Tolentino E Nós, a Crise e o Estado Social domínios da construção da paz e da segurança indivim junho voltei a Moçambique com um convite dual e coletiva, das eleições como via de acesso ao poder para festejar o aniversário do jornal O País, sentir a político, do crescimento económico, das políticas do aventura da SOICO (Sociedade Independente de Comugénero e da juventude, da construção de infraestruturas, nicação), criada há dez anos, ouvir a voz da juventude da integração regional, assim como da cooperação muninstruída e empreendedora e catar inspiração. A crise fidial. De acordo com a evolução destes indicadores é lenanceira mundial, as economias emergentes, a África gítimo continuarmos a sonhar com uma África pacífica, prometida daqui a 50 anos, o Estado Social, os recursos democrática, bem governada e bem representada no naturais, o crescimento económico e o desenvolvimento Governo do Mundo em 2063. foram os assuntos mais debatidos na confePara isso teremos de fazer da cultura rência celebrativa e nas conversas com amido mérito a regra geral, investir na educagos que há muito não via. ção de alta qualidade e promover o diáloPerguntaram-me se a crise financeira é go entre o Governo legítimo, o Capital um sinal de irreversível declínio do Estado limpo e os Sindicatos inteligentes. ChaSocial. Partilho com o leitor de África21 a memos a isto um Estado Social do sécuminha visão. Sendo Estado Social o tipo de lo XXI, que sabe que tem de contar com organização que reconhece na instituição a sociedade civil e tem a consciência de que detém o poder político o papel de proprecisar de boa comunicação entre as motor e defensor dos direitos económicos, partes. sociais e culturais dos cidadãos, cabe-lhe a Aqui, o que mais espanta é o contrasfunção de regulamentar a concorrência [email protected] te que existe entre o avanço do país nos através do diálogo entre o governo, as emplanos económico e social apoiado na bênção dos recursos presas, os sindicatos e as organizações da sociedade civil. naturais como o carvão e o gás natural, que recentemente Nasceu na Europa dos finais da II Guerra Mundial, sob o vieram juntar-se ao enorme potencial da agricultura, da impulso de Karl Gunnar Myrdal, Prémio Nobel de Ecopesca, da pecuária e do turismo, por um lado, e o atraso nomia em 1974. Hoje os partidos políticos que se dizem político que se traduz na coexistência da democracia forpartidários do Estado Social existem em todo o mundo. mal com a fuga recorrente para a confrontação violenta. Existem sinais de que, com mais ou menos danos, a Mas, voltando à questão do mérito, gostei de assistir à crise atual será vencida graças à combinação da livre conentrega do prémio de 2014 ao jovem empresário Salimo corrência com a ação reguladora do Estado, e um papel Abdulá, presidente da confederação dos empresários da mais corajoso das instituições internacionais, tais como o CPLP, que a maioria dos 300 colaboradores da SOICO Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial. escolheu como figura do ano. No discurso de agradeciCuriosamente, esta perspetiva apoia-se no próprio Nobel mento ele encaminhou a distinção para a mulher, os filhos que Gunnar Myrdal dividiu com o seu colega e adversário e os trabalhadores das suas empresas e sugeriu que a intenpolítico, Friedrich August von Hayek, um expoente do ção da escolha terá sido provar que os empresários tamliberalismo. São raros os investigadores e os políticos que bém fazem o país. Kanimambo, Daniel David! não aceitam combinar a livre concorrência com a regulamentação naquilo que se costumava chamar uma economia mista. Assim, o verdadeiro problema está em saber quais serão os níveis e os limites viáveis e aceitáveis. Zucman (A Riqueza Oculta das Nações), Piketty (O Capital no Século XXI) e Acemoglu com Robinson (Porque Falham as Nações – As Origens do Poder, da Prosperidade e da Pobreza) estão entre os jovens que produzem pensamento fresco e prospetivo sobre a matéria. O Estado Social exige reformas mas não está em vias de extinção. E que África daqui a 50 anos? Neste tipo de prospeção é inevitável registar os progressos, por exemplo, nos É legítimo continuarmos a sonhar com uma África pacífica, democrática, bem governada e bem representada no Governo do Mundo em 2063 África21– julho 2014 43 guiné-bissau Antes mesmo da sua investidura, o Presidente eleito guineense percorreu mais de uma dúzia de capitais estrangeiras, numa ofensiva diplomática para recuperar a simpatia externa e mobilizar apoios FLAGSTAFF HOUSE COMMUNICATIONS BUREAU [GHANA] Almami Júlio Cuiaté BISSAU O Gana e o encontro com o Presidente John Dramani Mahama foi um dos pontos da viagem do novo Presidente guineense, antes da tomada de posse À reconquista J da confiança internacional osé Mário Vaz, o novo Chefe de Estado guineense, que os seus compatriotas tratam por Jomav (a abreviação do seu nome), começou a sua digressão pelo Senegal, país fronteiriço cujos dirigentes caucionaram o regime de transição instalado após o golpe militar de abril de 2012, e que não viram com bons olhos a vitória de Mário Vaz. Nas eleições presidenciais de maio último, José Mário Vaz era o candidato do PAIGC, partido que ganhou as eleições legislativas, em abril. O regime 44 julho 2014 – África21 de Dakar sempre desconfiou que os responsáveis do partido libertador guineense têm simpatia pela rebelião separatista do Casamansa, região sul do Senegal fronteiriça à Guiné-Bissau. O Senegal também é hostil às estreitas relações entre Bissau e Luanda, e censurava o deposto primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior por conduzir uma política de costas viradas para o espaço regional oeste-africano. Numa reunião de Chefes de Estado da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), com sede em Abuja, na Nigéria, o Depois da ronda por onze países da África Ocidental, Jomav fez uma paragem em Marrocos e rumou a Portugal 2012 suspendeu a Guiné-Bissau dos seus trabalhos, já readmitiu o país nas suas fileiras e pediu às outras organizações internacionais que sigam o seu exemplo. Por isso, Mário Vaz presenciou a 23.ª cimeira da organização pan-africana, a 23 e 24 de junho, em Malabo, na Guiné-Equatorial, contrariando assim a sua promessa de não se deslocar ao estrangeiro nos primeiros cem dias do seu mandato, para se dedicar a visitar e conhecer as realidades dos diferentes recantos do território. Timor omnipresente em Bissau Em julho, um compromisso importante da sua agenda é a X Cimeira da CPLP, em Timor-Leste, cujo primeiro-ministro, Xanana Gusmão, foi o primeiro estadista estrangeiro a visitar a Guiné (6-10 de junho) após as eleições gerais, chamadas a pôr fim ao regime de transição. Nenhum acordo foi rubricado na ocasião, mas foram identificadas as áreas de futura cooperação, que serão formalizadas em Díli, à margem da cimeira lusófona. Depois do sucesso da missão timorense de apoio ao processo eleitoral, conjugada com as modestas, mas eficazes ações da Agência Timorense da Cooperação, a presença timorense no país é forte e deverá desenvolver-se muito mais com a visita este mês à capital de Timor do novo primeiro-ministro guineense, Domingos Simões Pereira, por ocasião da décima cimeira da comunidade lusófona. A União Africana readmitiu a Guiné-Bissau nas suas fileiras e pediu às outras organizações internacionais que sigam o seu exemplo MIGUEL A. LOPES ex-Presidente senegalês Abdoulaye Wade chegou ao ponto de evocar o «neocolonialismo angolano», ao referir-se à presença da Misang, a missão militar angolana de apoio à reforma do setor da Defesa e Segurança guineense, interrompida há dois anos pelo golpe de força. Assim, a ida à capital senegalesa, tal como à Costa do Marfim, Burkina Faso e Nigéria – os países suspeitos de conivência com o golpe do general Injai – além do objetivo oficial de convidar pessoalmente os seus homólogos para a cerimónia de posse, realizada a 23 de junho, era destinada mais a «tranquilizar» os seus interlocutores quanto ao desejo de Bissau em manter e reforçar os laços de vizinhança com os Estados da zona comunitária. Na sua digressão, o Presidente da República, o quarto eleito pelas urnas, visitou a Guiné-Conacri e a Gâmbia, cujas autoridades sempre foram bastante críticas para com a gestão da crise guineense feita pela CEDEAO. No Gana, que assegura a presidência rotativa da CEDEAO, Mário Vaz pediu apoio financeiro de urgência, nomeadamente para regularizar os cinco meses de salários em atraso dos funcionários públicos, e recebeu a garantia do seu homólogo John Dramani Mahama, do seu empenho pessoal na mobilização de fundos para o efeito. Foi ainda informado pelo Chefe de Estado ganense de que os membros da organização comunitária já estão a ser consultados a fim de contribuírem para um fundo de ajuda económica e financeira à Guiné-Bissau. Para o efeito, está prevista uma conferência de doadores em outubro. Depois da ronda por 11 países da África Ocidental, o mandatário guineense fez uma paragem em Marrocos, onde foi recebido pelo rei Mohamed V, antes de rumar a Portugal, cujo Presidente, Aníbal Cavaco Silva, foi seu professor na Faculdade de Economia de Lisboa, a quem disse ter solicitado «alguns conselhos e sugestões» nas suas funções presidenciais. Em consequência do regresso à ordem legal resultante das eleições gerais de abril último, a União Africana, que desde o golpe de abril de José Mário Vaz com o homólogo português e seu antigo professor, Cavaco Silva África21– julho 2014 45 dr As novas faces do poder As personalidades eleitas em abril e maio para os três órgãos da cúpula do poder na Guiné-Bissau são caras novas nestes postos, quer o Chefe de Estado, José Mário Vaz, como o presidente do Parlamento, Cipriano Cassamá, e o primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira. Outra caraterística comum é a de pertencerem todos ao PAIGC, a maior e mais antiga formação política guineense. Ao contrário da geração dos «históricos» que combateram pela independência, esta nova fornada de dirigentes do partido libertador, embora também tenha nascido e crescido sob a dominação colonial, fez o essencial da sua formação técnica e carreira política após a emancipação nacional. O mais idoso da troika é Mário Vaz (faz 61 anos em dezembro), um economista, cursado em Portugal e com passagem pelo Banco Nacional. Dedicou-se depois à iniciativa privada, com sucesso. Ex-presidente da Câmara do Comércio e do município da capital, ganhou galões sobretudo como ministro das Finanças (2008/2012), o que lhe abriu o apetite para mais altos voos. Desforrou-se da derrota na corrida pela liderança do PAIGC ao conquistar a magistratura suprema, contra todas as expectativas. Cassamá, o novo líder parlamentar (54 anos), é um sobrevivente dos regimes do general Nino Vieira, em que ocupou vários cargos ministeriais, incluindo a tutela do Interior (2008). Apesar de não gozar de muita simpatia nos meios políticos, este agrónomo que estudou na Argélia, é agora a segunda figura do Estado, graças a duas décadas de experiência parlamentar e aos compromissos na gestão do poder no seio do partido governamental. Por seu lado, o chefe do Governo, Simões Pereira, o mais jovem (50 anos), ex-Secretário Executivo da CPLP (2008/2012), é sem dúvida a figura de proa da elite política local. Líder do PAIGC desde fevereiro, este engenheiro de construção civil, doutor em Ciências Políticas e antigo ministro das Obras Públicas, fala várias línguas e tem tudo para triunfar. 46 julho 2014 – África21 Os membros da CEDEAO estão a ser consultados para contribuírem para um fundo de ajuda económica e financeira à Guiné-Bissau Para tal, também foi decisiva a diplomacia subterrânea do Prémio Nobel da Paz José Ramos-Horta, que após quase ano e meio da missão de pacificação da Guiné por conta das Nações Unidas, deixou o país em junho. Antes, as autoridades guineenses atribuíram-lhe a Ordem Colinas do Boé, a mais preciosa condecoração para personalidades estrangeiras. Quanto a Simões Pereira, ex-secretário executivo da CPLP, também se destacou no plano diplomático, com visitas a alguns países oeste-africanos, onde fez passar a mensagem de responsabilidade das novas autoridades de Bissau e realçou o seu apreço pela atuação da CEDEAO no processo de transição guineense. A posse da nova Assembleia Nacional Popular, o Parlamento, a 17 de junho, seguida cerca de uma semana depois pela investidura do Presidente da República, serviu de pretexto para a normalização das relações oficiais entre Bissau e Lisboa, ilustrada pela participação de Rui Machete, o chefe da diplomacia portuguesa. O governante luso foi precedido pelo seu secretário de Estado, Luís Campos Ferreira, cuja estada na capital guineense deu lugar a múltiplos contactos bilaterais e permitiu lançar bases para posteriores iniciativas de cooperação. Para começar, Campos Ferreira deu conta das intenções de Portugal em promover na Guiné-Bissau iniciativas de investimento no setor da exploração da madeira, na agroindústria e nas pescas, e assim como da decisão de aumentar o número de bolsas para cursos de pós-graduação, designadamente em matéria de Economia, com a criação desta especialidade na Faculdade de Direito de Bissau, a joia da coroa da cooperação luso-guineense. PUB 12 África21– julho 2014 47 48 julho 2014 – África21 África21– julho 2014 49 Sinistralidade rodoviária causa cinco mortes por dia ANTÓNIO SILVA/LUSA moçambique Com a taxa de mortalidade associada a acidentes rodoviários mais alta de sempre, Moçambique procura responder a um crescente drama social, que afeta anualmente milhares de pessoas Emanuel Novais Pereira Maputo Q uando os indicadores de 2012 apontavam uma ligeira, mas encorajadora quebra no número de mortes registado nas estradas moçambicanas, que, face a 2011, desceu algumas dezenas de casos, para 1574 vítimas, os dados da sinistralidade rodoviária referentes ao último ano, altura em que morreram 1744 pessoas, voltaram a revelar as fragilidades do sistema de mobilidade terrestre do país. «Os dados de 2013 são realmente preocupantes, porque todos os indicadores pioraram: tivemos mais acidentes, mais mortos e mais feridos», comenta à África21 Alexandre Nhampossa, presidente da Associação Moçambicana para as Vítimas de Insegurança Rodoviária (AMVIRO). No ano passado, as autoridades moçambicanas registaram 3197 acidentes de viação, num acréscimo de mais de uma centena de casos comparativamente a 2012. O número de feridos graves saldou-se em 2358 vítimas, enquanto 2341 contraíram ferimentos ligeiros. Uma média de cinco pessoas perdeu a vida nas estradas do país. Números da OMS Considerando o mais recente relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre a situação da sinistralidade rodoviária, que alerta para a tendência de crescimento do número de mortes associadas ao 50 julho 2014 – África21 fenómeno, percebe-se que Moçambique está em linha com as previsões da organização para os países em desenvolvimento, que têm «as mais altas taxas de fatalidade, especialmente os localizados no continente africano». De acordo com a OMS, cujo Relatório Mundial sobre Segurança Rodoviária – 2013 se baseia em indicadores de 2010, em Moçambique, o rácio de mortalidade com origem em acidentes de viação é de 18,5 mortes por cada 100.000 habitantes, num contexto populacional superior a 23 milhões de pessoas. Embora os dados do relatório não especifiquem a tipologia dos veículos envolvidos em acidentes com vítimas mortais, são os transportes públicos, sobretudo os semicoletivos, localmente denominados de «chapa 100» ou «my love», que mais preocupações levantam. «A nossa rede de transportes coletivos é precária: basta olhar para o transporte de pessoas em carrinhas de carga, os ‘my love’, para percebermos isto», nota Alexandre Nhampossa. Para o sociólogo, cuja perceção se baseia nos indicadores avançados pela Polícia de Trânsito, o «fator humano está na origem da maioria dos acidentes de viação», provocados por excesso de velocidade, manobras perigosas e condução sob efeito de álcool. O mau-estado dos veículos e das vias será também uma causa determinante, embora menos evidenciada pelas autoridades moçambicanas. Apesar de não estar documentado, o custo dos transportes, que nos meios urbanos se rege por tarifas sociais, é outro «tema sensível», levando os transportadores a entrarem em corridas desenfreadas contra o tempo e contra as normas legais estabelecidas para o setor. Os transportes públicos, sobretudo os semicoletivos, são os que mais preocupações levantam LACUNAS DO NOVO CÓDIGO DA ESTRADA A revisão do Código da Estrada (CE), no final de 2012, não foi acompanhada dos resultados esperados pelo Governo moçambicano, afirma Castigo Nhamane, da Fematro, que entende que a nova legislação «só trouxe um agravamento de multas desadequado» à realidade do país, considerando que a sua aplicação não está a ser dirigida aos condutores infratores. Cético sobre os resultados do novo CE, que diz conter «várias lacunas», Alexandre Nhampossa, da AMVIRO, sugere que o Governo promova um estudo de monitoria e avaliação, que «deve ser extensível aos vários instrumentos reguladores do país». 1774 morreram o ano passado nas estradas moçambicanas «O que se cobra neste momento não tem justificação: a atividade não dá lucro, o que impede o desenvolvimento de investimentos no setor dos transportes de passageiros. O Governo devia adotar uma tarifa adequada. Sabemos que o povo não tem dinheiro, mas cabe ao Estado compensar a atividade», diz à África21 Castigo Nhamane, presidente da Federação Moçambicana dos Transportadores Rodoviários (Fematro). «A sinistralidade está obviamente relacionada com a competitividade dos transportadores, que procuram maximizar o tempo e o número de pessoas que trans- portam, que se pode dizer quase ilimitado», refere Alexandre Nhampossa. Num relatório recente sobre as «causas ocultas» da sinistralidade rodoviária no país, o Centro de Integridade Pública (CIP) aponta a corrupção como um elemento endémico, que estará na origem dos altos índices de mortalidade que o país apresenta. Através de uma investigação que perscruta a atuação de autoridades reguladoras, como o Instituto Nacional de Transportes Terrestres (INATTER), das polícias de Trânsito e Municipal, assim como das escolas de condução, unidades hospitalares e centros de inspeção automóvel, o CIP alerta para o facto de a corrupção se ter institucionalizado em alguns destes organismos, notando que «chega a ser mais barato recorrer ao suborno», do que cumprir as normas legais. «A corrupção nas escolas de condução permite que as pessoas sejam habilitadas a conduzir sem terem passado pelas escolas de condução, a corrupção nos centros de saúde permite que pessoas inaptas obtenham certificados de exames médicos», lê-se no relatório da organização de probidade pública. Sobre os transportadores que conduzem sem habilitação para o efeito, Castigo Nhamane afirma que representam entre 35 a 40% do universo de motoristas do país, adiantando que a Fematro tem em curso um programa de formação e atualização das licenças de condução para os condutores interessados. O Ministério dos Transportes e Comunicações de Moçambique assim como o INATTER têm vindo a prometer apertar a fiscalização e punição às transgressões rodoviárias, numa ação que passa por aumentar a presença da polícia nas estradas, dotando-a de mais meios de controlo. Dentro das próprias corporações policiais será, no entanto, necessário promover uma ampla sensibilização, atendendo à complacência que alguns agentes aparentam demonstrar perante os abusos dos condutores. «Alguns agentes toleram situações em que deviam ser implacáveis, como o excesso de velocidade ou a condução sob efeito de álcool. Há fissuras no processo de fiscalização que, uma vez minimizadas, ajudarão a combater a sinistralidade rodoviária», antecipa o presidente da AMVIRO. A capacidade de resposta das unidades hospitalares é outro importante pilar para a redução da mortalidade associada à sinistralidade rodoviária. O Ministério da Saúde calcula em três milhões de dólares anuais o custo de operacionalização de um sistema de emergência médica, um valor consideravelmente inferior aos impactos provocados pelos acidentes de viação no país, estimado em cerca de 90 milhões de dólares. África21– julho 2014 51 são tomé e príncipe Estratégias para o desenvolvimento Promover a chamada economia azul é a principal novidade entre as cinco dezenas de recomendações saídas do Fórum dos Economistas realizado no país. As potencialidades turísticas têm sido referenciadas em diversas ocasiões, assim como transformar São Tomé e Príncipe numa economia de prestação de serviços. Juvenal Rodrigues SÃO TOMÉ A reflexão sobre o aproveitamento dos recursos marinhos começa, paulatinamente, a ganhar cada vez mais espaço em São Tomé e Príncipe. Aliás, é a parte do território de maior superfície comparado com os pouco mais de mil quilómetros quadrados da área terreste. Justifica-se por isso, como um dos temas do fórum, «O aproveitamento dos «Recursos Naturais da Terra e do Mar». Segundo informações divulgadas no encontro, existem no mar do arquipélago 29.000 52 julho 2014 – África21 espécies diferentes, desde variedades de lulas a grandes pelágicos. Na opinião de Olávio Aníbal, da Direção das Pescas, o mar é de grande importância económica para o país como fonte de emprego, principal fonte de proteína, fonte de recursos para o desenvolvimento industrial e, quando explorada de forma sustentável, é uma fonte inesgotável de divisas. O Fórum recomenda a promoção da «economia do mar com base num modelo integrado e sustentado de acordo com os critérios de crescimento azul arti- culado com o desenvolvimento da economia azul», bem como «apostar na industrialização das pescas». No caso do turismo, foi sugerido que se criasse um organismo, «com recursos suficientes, que se ocupe seriamente do turismo nacional». Propôs-se igualmente a recuperação do «património das roças para garantir a sustentabilidade do turismo com vista à redução da pobreza no interior das ilhas»; a criação urgente de «um hotel escola, com vista à formação profissional de jovens em áreas como restauração, cozinheiros, camareiras», bem como de «facilidades para a promoção do investimento privado (nacional e estrangeiro), sobretudo no setor de agroturismo» e de «linhas de crédito bonificado para o setor privado nacional voltadas para o turismo, agricultura e pecuária». Sugeriu-se ainda «aligeirar ou mesmo abolir o visto de entrada nas ilhas para fins turísticos. Esta medida pode ser compensada com a introdução adicional de uma taxa de turismo a ser cobrada nos hotéis». JUVENAL RODRIGUES Os recursos marinhos de STP, geridos de forma sustentável, permitem uma fonte inesgotável de rendimento mento e do prosseguimento de reformas macroeconómicas. Neste último campo, há quem reclame que os diferentes executivos têm-se preocupado sobretudo com índices macroeconómicos, deixando para segundo plano as reformas direcionadas à microeconomia. A governadora do Banco Central, Maria do Carmo Silveira, frisou que «a estabilidade macroeconómica, não é em si um fim mas apenas uma condição para promover-se o crescimento económico sustentável». Já o coordenador do Centro de Investigação e de Análise do Desenvolvimento (CIAD), disse à África21 que «a tendência de redução da taxa de inflação tem a ver com a gestão rigorosa das despesas públicas. O Governo tem estado a esforçar-se para financiar as despesas correntes com as receitas internas». Adelino Castelo David acrescentou ainda que «as reformas que o Execu- Os economistas sugerem aligeirar ou mesmo abolir o visto de entrada nas ilhas para fins turísticos Quanto a transformar STP numa economia de prestação de serviços, «em ambiente de cada vez maior circulação de capitais, exige uma política fiscal e parafiscal competitiva, que deve passar por uma baixa fiscalidade, ao nível da tributação de rendimentos do património e mais-valia de cada vez maior estabilidade e previsibilidade fiscais». O comércio, com grande peso na economia e na ocupação das pessoas, mereceu uma atenção particular. O Fórum entende que se deve «reforçar o contributo do comércio a nível nacional, implementar-se políticas que coloquem homens e mulheres de fracos recursos em contacto com as oportunidades de negócios». Macro e microeconomia Falou-se também de transparência na gestão dos recursos públicos, boa governação, fuga ao fisco, o alto índice de desemprego no país, do aproveitamento da cultura como pilar do desenvolvi- tivo vem fazendo com vista à melhoria do ambiente de negócios são mesmo para a microeconomia, como o Guiché Único para a criação das empresas, já em funcionamento desde 2010; a eliminação de alvarás para atividades económicas consideradas não perigosas». Ele admitiu, contudo, que «o Estado deve abrir espaços para que haja iniciativas», o que passa por «uma legislação flexível, uma administração pública moderna e forte, reformar o setor da Justiça e adotar mecanismos adequados de financiamento para promover o desenvolvimento, entre outros», para ajudar «a criar mais emprego» e «melhorar as condições de vida das populações». Segundo os especialistas, os créditos para os setores produtivo e turístico com taxas de juro superiores a 8% não são viáveis. De acordo com o primeiro-ministro, o país «precisa criar na próxima década cerca de trinta mil postos de emprego para absorver novas entradas». Neste sentido, «não podemos descurar a importância da definição de uma estratégia global de competitividade para um crescimento inclusivo liderado pelas exportações e gerador de emprego». Gabriel Costa entende que «o crescimento liderado pelas exportações pode corresponder a essa necessidade, se esforços forem feitos no sentido do seguimento de reformas favorecedoras da concorrência, independentemente das perspetivas em torno da exploração petrolífera». Referindo-se à concorrência, o Presidente da República sublinhou dois factos: a inauguração do Centro de Formação Profissional Brasil-São Tomé e Príncipe e o arranque da atividade comercial da UNITEL no país, como «dois projetos estruturantes para o futuro da economia santomense que importa registar. Um a montante na formação de mão-de-obra qualificada e outro a jusante na criação direta e indireta de postos de trabalho, gerador de concorrência num setor fundamental nas economias modernas como é o das telecomunicações». Manuel Pinto da Costa entende que «a liberalização deste setor com consequências a nível da qualidade de serviço prestado e da diminuição dos preços ao consumidor em geral, onde se incluem as empresas, vai certamente traduzir numa redução dos custos da insularidade que é um dos maiores constrangimentos ao crescimento económico». Os debates foram orientados no sentido de encontrar os caminhos mais acertados para promover o desenvolvimento e reduzir o desemprego, no quadro dos condicionalismos da insularidade e do contexto da conjuntura económica internacional. As recomendações deverão servir para orientar os decisores a adotar políticas económicas mais corretas. O encontro teve ainda como objetivo reativar a Associação dos Economistas. O PNUD patrocinou o evento organizado pelo Governo, através do CIAD. O Representante Residente da agência das Nações Unidas, José Salema, defendeu que «hoje mais do que nunca as oportunidades dadas a especialistas e formadores de decisão na esfera económica para discutir abertamente as questões que afetam o desenvolvimento económico do país, deve ser incentivada». África21– julho 2014 53 54 julho 2014 – África21 dr brasil A bipolaridade dos brasileiros diante da economia do país A maioria esmagadora dos brasileiros é contagiada pela síndrome da bipolaridade quando avalia a performance da economia nacional. Ora eles dão mais atenção a dados e fatos que apontam para o caos, ora segmentos da população preferem confiar em indicadores otimistas. Carlos Castilho FLORIANNÓPOLIS O resultado da síndrome da bipolaridade é um clima de incerteza gerado pela sensação de que nada é confiável quando se trata de economia. Numa circunstância como esta, indicadores como inflação, taxa de juros, PIB, renda per capita e cesta básica de alimentos confundem mais do que esclarecem não tanto pelo seu valor absoluto mas pelo seu significado. Os números passaram a ser manejados segundo contextos políticos, onde as eleições presidenciais de outubro próximo jogam um papel fundamental. Depois de registrar índices saudáveis durante a primeira década do século XXI, a economia brasileira tirou o pé do acelerador a partir de 2012 quando, embora sem entrar em recessão ou estagnação, passou a apresentar índices que seguiram o padrão internacional de esfriamento da atividade industrial e financeira após os traumas da crise bancária nos Estados Unidos e Europa em 2008. Até então o país recolhia os bons resultados do programa de redistribuição de renda chamado Bolsa Família, implantado em 2004, e que intensificou o mercado interno num momento em que no resto do mundo crescia a tendência à recessão. O aumento de poder de consumo das classes C e D permitiu que a produção e receitas da indústria, comércio e principalmente a agricultura crescessem no Brasil, apesar da queda da atividade econômica no mercado internacional. Mas o quadro mudou depois de 2008 e o Brasil, apesar de não enfrentar crises África21– julho 2014 55 dr como as da Grécia, Espanha e Portugal, teve que reduzir o seu ritmo de crescimento e os efeitos foram sendo sentidos de forma mais aguda com o passar dos anos até que se somaram ao das expectativas eleitorais. Hoje é difícil saber qual o real estado da economia nacional, tal o grau de disparidade entre os indicadores manipulados por adeptos e adversários do governo de Dilma Rousseff. A oposição conservadora e social democrática usa o comportamento do PIB, da inflação e da taxa de juros como armas para defender a tese de que o atual governo está levando o país para o caos. Em 2011, o Produto Interno Bruto (a soma de todos os bens e serviços produzidos no país) cresceu 2,7%, menos que a média mundial. Em 2012, o aumento foi de 0,9%, bem abaixo dos 4% previstos por Dilma. Em 2013, o PIB brasileiro subiu outra vez para 2,3%, o que equivale a uma produção nacional de bens e serviços num total de 4,84 trilhões de reais (2,1 trilhões de dólares) e uma distribuição do PIB per capita da ordem de 24,06 reais (10,6 dólares). Para 2014, o mercado financeiro prevê uma nova queda agora para 1,44% ao ano, 56 julho 2014 – África21 menor do que a previsão oficial de 1,50%. A inflação também registrou um comportamento geral de alta no período entre 2011 e 2014. Segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial, o custo de vida teve uma alta de 6,5% ao ano em 2011, subiu menos em 2012 com um índice anual de 5,84%. Em 2013, a inflação anual, também medida pelo IPCA, chegou a 5,91%, superando a meta oficial de 4,5%. Para 2014, o mercado financeiro trabalha com uma projeção de 6,47%. Outro indicador muito usado pelos oposicionistas é o da taxa de juros, que em 28 de maio foi elevada para 11% ao ano pelo Conselho de Política Monetária (COPOM) do Banco Central do Brasil, depois de ter sido fixada em 7,12%, em ja- O aumento de poder de consumo das classes C e D permitiu o crescimento da produção e receitas da indústria, comércio e agricultura neiro de 2013, após uma alta histórica para 12,42% em agosto de 2011, quando eram mais intensos os rumores sobre desestabilização econômica mundial, no seguimento da explosão da bolha financeira imobiliária nos Estados Unidos, em 2008. Em compensação, o governo usa outros indicadores como, por exemplo, o forte crescimento do mercado de capitais que colocou a bolsa de valores de São Paulo (BOVESPA) entre as dez maiores do mundo, com um portfólio de ações corporativas avaliado em um trilhão de reais (442 bilhões de dólares). Segundo o ministro da Fazendo, Guido Mantega, o investimento estrangeiro direto no Brasil saiu de um patamar de 20 bilhões de dólares, o 20.º lugar no ranking mundial, no início do século XXI, passando a 65,3 bilhões de dólares em 2012, mantendo-se acima dos 50 bilhões de dólares anuais desde então e situando-se entre os 10 países mais atraentes para investidores internacionais. O governo da presidenta Dilma também exibe com orgulho os índices de economia de recursos no setor público, que registrou em abril último uma redução da ordem de 16 bilhões de reais (7 bilhões de dólares). Além disso, o superavit primário (arrecadação menos despesas no setor público), no primeiro trimestre de 2014, registrou um aumento de 716% em relação ao mesmo período em 2013. O Banco Central divulgou também dados indicando que, apesar do superavit primário, quando o cálculo inclui o pagamento da dívida com emissão de títulos públicos, surge uma dívida líquida no valor de 1,69 trilhão de reais (748 bilhões de dólares) ou 34,2% do PIB, o mesmo valor de 2013 e abaixo do de 2012. Pesquisas e projeções A batalha de números esconde uma guerra política onde a oposição parece estar levando vantagem porque os indicadores de desencanto da população crescem embora sua repercussão ainda seja pequena no resultado das pesquisas de intenção de votos. Os grandes jornais do Rio e São Paulo (Estado de São Paulo, Folha de São Paulo e O Globo) bem como a revista semanal VEJA e a Rede Globo de Televisão tiveram um papel influente na divulgação dos indicadores negativos na economia, que prepararam o ambiente para o aumento do pessimismo, em especial nos segmentos mais ricos da sociedade brasileira. Segundo uma pesquisa da Federação do Comércio de São Paulo (FECOMÉRCIO) o índice de confiança da classe A no governo Dilma caiu 16,3% só nos meses de abril e maio. Neste mesmo período, os segmentos sociais com renda mensal inferior a 7300 reais (3231 O Brasil é dos 10 países mais atraentes para investidores internacionais dólares) registraram uma perda de confiança estimada em 8,7%. Em relação a maio de 2013, a queda foi de 25%, a maior dos últimos 10 anos. Outra pesquisa, realizada em junho, desta vez pelo Instituto Datafolha, vinculado ao Folha de São Paulo, afirma que 36% dos brasileiros esperam uma piora da situação econômica nos próximos seis meses e 64% acham que a inflação aumentará até o fim do ano. C M Y CM MY Mas apesar do clima depressivo entre os consumidores brasileiros, o Banco Central contrariou a tendência da população, interrompendo a alta da taxa de juros financeiros iniciada na metade de 2013 e sinalizou uma estabilidade na economia. A decisão do COPOM indicou que o órgão formado pelos principais especialistas do mercado financeiro nacional não espera uma inflação acima dos 5,5% ao ano em 2014, contrariando as projeções dos operadores do mercado financeiro que apostam num índice próximo a 6,5%. A disparidade dos números e das projeções mostra que, pelo menos nas atuais circunstâncias político-financeiras no Brasil, as versões acabam sendo mais decisivas do que os fatos no julgamento que os brasileiros farão do governo Dilma, no dia 5 de outubro. Por enquanto, ela está perdendo votos. Tinha 44% das preferências dos eleitores consultados em fevereiro, baixou para 38% em abril, para 37% em maio e 34% a 6 de junho. A sorte da presidenta é que seus adversários também caíram. CY CMY K África21– julho 2014 57 É possível encontrar infinitas maneiras de se definir a Paz. Esta é apenas uma delas. A Paz é a nossa maior riqueza. Está nos pequenos momentos das nossas vidas e nas grandes realizações do nosso país. É o que nos une e o que garante que sejamos um Povo cada vez mais forte no presente e no futuro. 58 julho 2014 – África21 Ministério da Comunicação Social dr cplp Moçambique faz balanço positivo Segurança alimentar nos desafios da nova Presidência Este mês, Moçambique passa a Presidência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa a Timor-Leste, com sentimento do dever cumprido, apesar do incumprimento de alguns dossiês. A «joia da coroa» do mandato moçambicano de dois anos, centrada em ações para garantir segurança alimentar às populações, deve ser seguida pelas autoridades de Díli. João Carlos Oldemiro Baloi, ministro moçambicano dos Negócios Estrangeiros O s desafios lançados por Moçamb ique para uma adequada segurança alimentar e nutricional nos países lusófonos vão prosseguir com a Presidência timorense. É este o desejo de Oldemiro Baloi, ministro moçambicano dos Negócios Estrangeiros, entrevistado pela África21, na qualidade de presidente em exercício do Conselho de Ministros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. A Presidência moçambicana pautou a sua ação, entre as prioridades assumidas pela organização, naquilo que Oldemiro Baloi considera ser «a joia da coroa» do mandato de Moçambique, em correspondência com o objetivo de erradicação da fome e da pobreza, que afetam cerca de 30 mil pessoas nos países lusófonos com tendência de aumento do número de vítimas de carência alimentar e nutricional. O chefe da diplomacia moçambicana, que faz um balanço na cimeira da CPLP, leva para Díli um plano estratégico de co operação multilateral e acredita que Timor‑Leste seguirá os passos dados por Moçambique para levar adiante os programas que visam erradicar a fome e a pobreza nos países membros. «É desejável que a presidência timorense assuma esta estratégia mesmo que não seja com a mesma formulação», afirma Baloi, que insistiu neste ponto nos contactos efetuados nas capitais lusófonas no âmbito dos preparativos da reunião magna dos Chefes de Estado e de Governo de 23 de junho corrente. O Secretariado em Lisboa, pela voz da diretora-geral da organização, Georgina Benrós de Mello, sublinhou ser esta uma das áreas prioritárias de atuação da organização. Tanto mais que a CPLP manifestou já a pretensão de obter o estatuto de observador no Comité Mundial de Segu- rança Alimentar. O braço direito do Secretário Executivo Murade Murargy defendeu pouco depois de tomar posse no início deste ano, o incremento da produção agrícola e de políticas de segurança alimentar no espaço lusófono para dar resposta à subsistência dos cidadãos. «Nós gostaríamos de realizar este plano e ir um pouco além», afirmou, a pensar na valorização da produção dos agricultores. Resultados mistos O presidente do Conselho de Ministros da CPLP regista um sentimento «Neste momento não tenho indicação que qualquer país lusófono consiga cumprir na íntegra os ODM», afirma Oldemiro Baloi África21– julho 2014 59 DR Cerca de 30 mil pessoas nos países lusófonos são vítimas de carência alimentar e nutricional Moçambique transfere, em 23 de julho, a Presidência da CPLP para Timor-Leste misto quanto a resultados alcançados neste domínio. Se por um lado foi possível despertar a visibilidade quanto ao problema, há, por outro lado, ações que ficaram por concluir, «devido ao relativo insucesso na mobilização de financiamentos para o programa», segundo as palavras do chefe da diplomacia moçambicano. Na reta final da campanha «Juntos pela Fome», foram alcançados alguns resultados, que terão repercussão durante a Presidência de Timor-Leste. Os desafios são enormes como reconhece Oldemiro Baloi, que admite haver áreas importantes em que se registou incumprimento. Mas considera que os países de língua portuguesa, independentemte da sua diversidade, não estão longe de atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), traçados pelas Nações Unidas, nomeadamente no que toca ao combate à pobreza. «Neste momento não tenho indicação de nenhum país que consiga cumprir na íntegra os ODM», adianta convicto, ao reafirmar que as metas estabelecidas são de longo prazo. «Por isso é que estamos empenhadíssimos na preparação da 60 julho 2014 – África21 agenda pós-2015, cujo conteúdo e objetivos visam colmatar as lacunas do programa que termina agora.» Com a Presidência moçambicana, a CPLP também ganhou tendencialmente «uma maior visibilidade», confrontada, entretanto, com a polémica à volta do processo de adesão da Guiné-Equatorial, a ser concluído na cimeira de Díli. A admissão, segundo Baloi, evita a marginalização de um Estado que manifestou vontade em se inserir no bloco dos países de língua portuguesa. E, acrescenta, corresponde a interesses económicos que se cruzam com os dos países africanos do grupo, entre os quais Angola e São Tomé e Príncipe, membros da União Africana e da Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC). Para Oldemiro Baloi, não são os interesses de natureza económica que determinam a admissão do país africano chefiado pelo Presidente Teodoro Obiang Nguema. «Não é essa a motivação que determinou a aceitação da Guiné-Equatorial no nosso seio como membro de pleno direito. Isso virá por acréscimo», explica. A vertente económica na comunidade começa a despertar cada vez mais força. A Presidência moçambicana ganha também o mérito de ter sido lançado no seu mandato o projeto de criação da União dos Bancos, Seguradoras e Instituições Financeiras, uma iniciativa que nasceu no âmbito do I Encontro promovido no mês passado, em Lisboa, pela Confederação dos Empresários da CPLP (CE-CPLP). O reforço da cooperação económica está na agenda defendida por Timor-Leste, que já propôs a constituição de um consórcio dos países de língua portuguesa para o fomento da chamada «lusofonia energética». Só na área da energia, a maioria dos países de língua portuguesa dispõe de um elevado potencial em hidrocarbonetos. As descobertas de importantes reservas de petróleo e gás dão outra dimensão aos recursos existentes e dão corpo à proposta timorense. A CPLP representa atualmente 4% do comércio mundial, englobando alguns países com as economias mais dinâmicas das regiões em que se inserem, ligadas a uma vasta rede de organizações regionais importantes. África21– julho 2014 61 62 julho 2014 – África21 A crónica de Luís Cardoso E Madre Coragem em Portugal. Teve de estabelecer uma disciplina férm minha casa vivia muita gente. Duas dezerea e regras precisas para que houvesse ordem no nas, contando irmãos, primos e afilhados do meio do caos. Quem entrasse pela porta deveria envelho enfermeiro, que foram chegando de Ataúro, tregar-lhe as armas, que guardou no seu quarto, Same, Fahinihan, Maubise e Lospalos. Vivíamos transformado num paiol. Ninguém era obrigado a numa espécie de torre de Babel. Lembro-me dela declarar o seu local de origem. Todos quando o Tio Xico a trouxe de Same deveriam utilizar o tétum como língua para fazer os estudos em Díli. Era made comunicação. E, desfazendo-se em gra, alta e pouco falava. Compartilhava sorrisos, explicou que a medida afinal o mesmo quarto, a mesma cama e o não disfarçava o que pretendia, dado mesmo cobertor com uma das minhas que o sotaque denunciava a origem do irmãs. Ainda hoje ambas se riem quanfalante. do se lembram que na disputa da manTeve de intervir para que muitos ta, em noites mais frescas, uma delas dos refugiados devolvessem todos os rebolava pelo chão. bens materiais que foram sendo subDepois da morte do pai, por causa traídos das lojas. Todos, exceto bens de ajustes de contas familiares a coberto alimentares. Não acha que seja pecado de diferenças políticas, andou pelas [email protected] roubar para comer, quando se tem montanhas durante o tempo da ocupafome. As provisões desapareceram em pouco tempo. ção e onde adquiriu força espiritual e firmeza de Teve de visitar paróquias em Singapura que de imeconvicções. Mais tarde entrou para as Canossianas e diato enviaram contentores com toneladas de arroz. ocupa neste momento o cargo de provincial desta Contou que no espaço de acolhimento nasceram organização em Timor-Leste. Muita gente terá ouvi165 crianças. Mas lamentou que tivessem vindo ao do o seu nome pela primeira vez, quando o Presidente mundo apenas cinco mulheres, lembrando-se de um da República José Ramos-Horta decidiu condecorá-la episódio em que um missionário lhe telefonou duranno dia 20 de maio de 2010, por ter salvado, durante te a noite para que fosse em sua ajuda, dado que o a crise de 2006, a vida de milhares de timorenses que seminário estava a ser atacado. Respondeu ao padre procuraram refúgio na sua comunidade em Balide. que ele era homem e contava com a ajuda de 150 raDe passagem por Lisboa, aceitou o meu pedido pazes. Perante o desespero do missionário, teve mespara que falasse na Biblioteca por Timor, sobre a educamo que ir sozinha resolver o assunto. ção e o combate à pobreza em Timor-Leste. Duas atiTinha fé de que nada lhe aconteceria. As pessoas vidades fundamentais da sua congregação, que se ainda precisavam dela. Num momento em que o Estamultiplica em várias escolas e clínicas médicas de apoio do, que tem por missão zelar pela segurança dos seus aos mais necessitados. Mas falou sobretudo da crise de concidadãos, estava fragmentado, com a polícia de um 2006. Não como forma de reivindicar alguma ação lado e os militares do outro. Ela corria a sanar contenheroica em busca de aplauso, mas como pedagogia das. Guilhermina Marçal, a Madre Coragem. para que Timor-Leste não volte a viver situação idêntica. Alertou os políticos que a pobreza e a desigualdade social poderão vir a causar instabilidade. Mas que a questão política foi a causa primordial da crise de 2006. Houve quem tivesse aproveitado a ocasião para semear discórdia entre timorenses, criando uma suposta divisão entre povos de Leste e de Oeste. Foi com emoção que relatou como durante esse período acolheu, no espaço exíguo da sua comunidade, mais de 23.000 pessoas, entre as quais alguns deputados, como a atual embaixadora de Timor-Leste Alertou os políticos que pobreza e desigualdade social poderão vir a causar instabilidade África21– julho 2014 63 chile ANDRÉS BRAVO/CITIZENSIDE Michelle Bachelet, temporada 2 No Chile, as grandes maiorias civis ainda vivem e atuam receosas de um improvável regresso das espingardas e das botas. Os militares já não estão para essas aventuras, mas há civis – os donos de tudo – que agitam esse fantasma. Isso fez com que em quase um quarto de século de democracia, nenhum dos cinco presidentes civis se tenha esforçado por modificar a herança da ditadura. Michelle Bachelet ameaça fazê-lo. Manrique S. Gaudin Buenos Aires 64 julho 2014 – África21 D epois de 24 anos, em que se sucederam cinco governos civis democráticos – entre eles o primeiro (2006-2010) da atual Presidente Michelle Bachelet –, tudo parece indicar que, finalmente, o Chile vai começar a desmontar a estrutura neoliberal construída a sangue e fogo durante os 17 anos da ditadura civil-militar (1973-1990). É impossível imaginar se nestes novos quatro anos Bachelet dará ao seu Governo o cariz revolucionário que Salvador Allende imprimiu ao seu em apenas três anos, e que começou ao promover a nacionalização do cobre, base da economia chilena. É certo que Bachelet não é Allende, no entanto, em meados de maio propôs um pacote de medidas e reformas que faz lembrar aquele líder latino-americano e anima a maioria que a elegeu em novem- bro de 2013. Este primeiro passo já fez surgir vozes de descontentamento, dos seus próprios amigos e de inimigos tão poderosos como a Igreja Católica. Entre as primeiras propostas está o fim do chamado «binominal», um sistema eleitoral perverso e antidemocrático que, além de perpetuar o bipartidarismo, impede que as minorias possam alcançar cargos legislativos. Foi imposto pela ditadura e funciona como uma garantia política para as minorias que detêm o verdadeiro poder ocultado por detrás das instituições. No mesmo nível, mas no plano económico, está o projeto que propõe a criação de uma empresa estatal gestora de fundos de pensões que funcionará em paralelo com um regime privado de pensões que tem significado grandes custos para o grosso da população. A estas duas ideias básicas, Bachelet junta outras no plano político e no social: promove o direito de voto à legião de chilenos que tiveram de emigrar nos anos da ditadura; propõe a despenalização do aborto em determinadas circunstâncias; pede ao Congresso que ponha fim ao chamado «direito de águas», através do qual foi privatizado em 1981 o uso e manejo deste recurso essencial e estratégico; e dá início a um processo de reformulação da política educativa – privada, exclusivista e elitista –, um ponto que nos últimos anos manteve mobilizada a sociedade chilena e se transformou num importante fator de deterioração da imagem do ex-Presidente Sebastián Piñera (2010-2014). Sistema binominal Para acabar com o sistema binominal, a iniciativa de Bachelet eleva o número de lugares nas duas câmaras do Congresso, reintroduz o critério de representação proporcional e favorece a igualdade de género, obrigando os partidos a apresentar um mínimo de 40% de candidatas do sexo feminino. Os senadores passam de 38 para 50 e os deputados de 120 para 155, «uma mudança que permitirá eleger mais parlamentares em cada distrito e circunscrição e, com isso, podem integrar o Congresso grupos minoritários que devem estar representados para que a democracia seja completa», como explicou Bachelet. Quando a Presidente falou de um sistema que se perpetua graças à exclusão, e disse que o Chile tem uma diversidade que deve estar refletida no Congresso, apelou a um exemplo que ilustra a essência antidemocrática do binominal: Santiago do Chile, a capital do país, tem quatro milhões de habitantes e elege quatro senadores, enquanto Aysen, cidade do sul com menos de 80 mil habitantes, elege dois. O que a ditadura procurou – faltou Bachelet dizer – foi dar uma participação maior a zonas com pouca população mas que tradicionalmente são de direita. Desde os finais dos anos 80 do século passado que o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial consideram o regime chileno como o melhor dos seus alunos, e assim o fizeram saber ao mundo, tudo por causa do seu programa selvagem de privatizações, que incluiu desde a água às aposentações (o cobre não, porque as formidáveis receitas que gera são administradas pelas forças armadas). Os militares excluíram-se do reino das gestoras de fundos de pensões e conservaram os seus próprios organismos de previdência. Homens e mulheres fazem contribuições idênticas, mas como elas se reformam aos 60 anos e têm uma esperança média de vida superior em cinco anos à dos homens, as suas pensões são mais reduzidas. As poupanças delas, que se reformam aos 60 e têm uma esperança média de vida de 82, devem cobrir 22 anos, enquanto eles só precisam de cobrir 12 anos, porque reformam-se aos 65 anos e têm uma esperança média de vida de 77 anos. O modelo foi pensado até ao pormenor e apenas para garantir lucros às gran- O critério de representação proporcional favorece a igualdade de género exigindo que os partidos apresentem um mínimo de 40% de mulheres candidatas Michelle Bachelet propôs medidas e reformas que fazem lembrar Salvador Allende des multinacionais proprietárias dos fundos de pensões. Tanto assim é que desde 2007, durante o primeiro mandato de Bachelet, o Estado chileno tem de transferir para essas entidades gestoras o equivalente a 100 dólares mensais por cada trabalhador que no futuro possa cobrar a sua mensalidade. Bachelet também anunciou que pensa fazer uma reforma tímida da política educativa. Ainda assim, só a menção à ideia gerou o protesto dos estudantes e uma forte oposição dos setores privados que gerem e lucram com os estabelecimentos de ensino. Nem o mundo financeiro reagiu contra a intervenção sobre as gestoras de fundos do modo como a Igreja Católica fez neste caso. A maioria das escolas primárias e secundárias está em mãos privadas – empresas e confissões religiosas – e recebe uma subvenção de 110 dólares por aluno. Além disso estão autorizadas a cobrar aos pais um copagamento de 150 dólares. Nas universidades, não existe ensino gratuito nem nas estatais, onde a licenciatura mais barata exige às famílias um pagamento mensal de 450 dólares. Bachelet propõe agora aumentar os subsídios aos privados em 1600 milhões de dólares para que os alunos não tenham de fazer nenhum copagamento. Os estudantes riem-se desta ideia «porque não é com mais subsídios que se acaba com o lucro empresarial». A Igreja Católica, que controla cerca de 20% das inscrições escolares, é a voz mais forte entre os opositores e enquanto convida os restantes empresários a juntar-se à sua cruzada também se prepara para combater o projeto de despenalização do aborto e o reforço do caráter laico do Estado neste Chile em que, por enquanto, se abrem as sessões do Congresso «em nome de Deus, nosso senhor». Tradução de Teresa Souto África21– julho 2014 65 66 julho 2014 – África21 FAROUK BATICHE/AFP economia Reunião ministerial do Movimento dos Não-Alinhados no mês de maio em Argel Dos Não-Alinhados aos BRICS Contra o imperialismo do dólar Reunidos em Fortaleza de 14 a 16 de julho, os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) vão adotar novas medidas para se libertarem do «imperialismo» do dólar. Como os Não-Alinhados, querem mudar a ordem do mundo. Nicole Guardiola E m junho de 1955, a conferência de Bandung enriqueceu o léxico geopolítico com uma mão cheia de conceitos novos: não alinhamento; terceiro mundo; subdesenvolvimento. Sessenta anos mais tarde, estas palavras caíram em desuso e o Movimento dos Não-Alinhados está à procura de um novo fôlego. O mundo mudou mas o poder financeiro permanece nas mãos das instituições criadas à saída da segunda guerra mundial, FMI e Banco Mundial, dominadas pelos Estados Unidos e a União Europeia. Mercados, bolsas e comércio mundial continuam a falar em dólares americanos, apesar do papel de locomotiva da economia mundial ter passado para os BRIC – acrónimo criado em 2001 por Jim O´Neil, economista da Goldman Sachs – há mais de uma década. Os «países emergentes» são vistos como os protagonistas do desenvolvimento no século XXI e não há governo do hemisfério sul que não prometa a emergência dentro de uma ou duas décadas. Conseguirão os BRIC (convertidos em BRICS pela cooptação da África do Sul em 2009) realizar o sonho dos participantes da cimeira de Bandung de uma ordem internacional mais justa ou diluir-se-ão na «economia mundo»? As apostas estão abertas e as opiniões divergem. A menos de um mês da sexta cimeira dos BRICS, que será realizada em Fortaleza (Brasil), a imprensa ocidental pinta o futuro destes países em cores sombrias. Diz que a desvalorização abrupta das moedas, o desÁfrica21– julho 2014 67 RAVEENDRAN/AFP Narendra Modi, o novo primeiro-ministro indiano, propõe que o futuro Banco dos BRICS fique sedeado na Índia calabro das bolsas, a fuga dos capitais e os conflitos sociais e laborais fazem prever o fim próximo do «milagre» e a implosão dos BRICS. Para os experts não houve «milagre» nenhum, os BRICS e as suas economias puxadas pelas exportações beneficiaram da explosão do comércio internacional provocada pela globalização. Depois de uma década ou duas a crescer ao ritmo mais rápido da história, estão a perder competitividade antes de terem superado as suas fraquezas intrínsecas: dependência das importações, infraestruturas deficientes ou obsoletas, enormes desequilíbrios na divisão das riquezas agravados por corrupção e má governação. Segundo os analistas mais otimistas, os BRICS poderão voltar a progredir, de forma mais lenta e também mais equilibrada e sustentável, mas os ajustes e reformas estruturais necessários podem adquirir contornos cataclísmicos para os regimes não democráticos (China e Rússia) e as elites corruptas (Brasil e Índia) Os novos emergentes Há também novos equilíbrios em formação no hemisfério sul e a leste, com «novos emergentes» a disputar os mercados dos BRICS. A imprensa e os bancos anglo-saxónicos, sempre criativos, já inventaram acrónimos para designar estes «países com forte potencial de crescimento económico». 68 julho 2014 – África21 A Rússia criou um sistema nacional de cartões de crédito para lutar contra o quase monopólio dos grupos Mastercard e Visa Falam dos PPICS (Peru, Filipinas, Indonésia, Colômbia e Sri Lanka), dos MINT (México, Indonésia, Nigéria e Turquia), dos CIVETS (Colômbia, Indonésia, Vietname, Etiópia, Turquia e África do Sul) ou ainda dos BENIVM (Bangladesh, Etiópia, Nigéria, Indonésia, Vietname e México). África no seu conjunto é identificada como «o continente emergente» com um cresci- Os países emergentes são vistos como os protagonistas do desenvolvimento no século XXI mento médio próximo dos 5% e vários países acima da média, como Nigéria e Etiópia, e uma segunda linha constituída por países de menores dimensões e mais dependentes das exportações de matérias primas, como Costa do Marfim, Gana, Angola e Moçambique. A economia de casino e o rei dólar Os BRICS têm uma outra visão da história. Culpam das suas dificuldades os «banksters» (neologismo formado a partir das palavras bancos e gangsters) de Wall Street e da City de Londres, especialistas em espe- culação, fraude e espionagem, e a «economia de casino» que domina o mundo atual. Têm tecnicamente razão ao apontar a FED (Reserva Federal, Banco Central dos EUA) como responsável principal da fuga de capitais que afeta atualmente os países emergentes, provoca o descalabro das suas moedas e bolsas e faz disparar a inflação. Depois do crash de 2008, em vez de refrear o frenesim especulativo, a FED deu-lhe asas pondo em circulação enormes quantidades de liquidez que os especuladores aproveitaram para investir nas bolsas dos países emergentes em busca de investimentos altamente lucrativos. Bastou que o Banco Central dos EUA anunciasse o progressivo fechar das torneiras – justificado pelo regresso do crescimento a 2% ao ano – para que enormes quantidades de capitais especulativos empreendam o caminho inverso, atraídos pelos grandes negócios da exploração do gás de xisto. Maus indicadores económicos e surtos de agitação social e laboral aceleraram a retirada dos capitais e geraram um ambiente de pânico irracional. Os cinco, que já tinham chegado anteriormente à conclusão de que não haveria maneira de escapar à «economia de casino», enquanto o dólar americano continue a funcionar como moeda comum, e anunciado a intenção de criar um sistema financeiro alternativo ao de Bretton Woods, passaram ao contra-ataque à medida que se KINDALA MANUEL/JORNAL DE ANGOLA Manuel Domingos Augusto, secretário de Estado das Relações Exteriores, representou Angola no encontro dos Não-Alinhados em Argel tornou evidente a intenção do Ocidente, com os Estados Unidos à cabeça, de isolar a Rússia e de «conter» a China. O anúncio da criação do Banco de Investimento dos BRICS fora acolhido com comentários sarcásticos. Segundo Simon Freementle, analista financeiro da Standard Bank, o «fracasso» era mais do que previsível porque os BRICS não passavam de uma coligação heteróclita e conjuntural de países com trajetórias diversas e interesses divergentes. E o seu banco nunca sairia da gaveta porque nenhuma das moedas dos cinco tinha força e credibilidade suficiente para sustentar uma instituição financeira capaz de rivalizar com o FMI e muito menos de competir com o dólar, a libra ou o euro como moeda de referência para o comércio mundial e de reserva para os bancos centrais. Apesar disto (ou talvez por isto) os BRICS avançaram. A 30 de maio concluíram o acordo para o financiamento do capital inicial do seu Banco de Investimento de 50 mil milhões de dólares, com contribuições de 10 mil milhões de cada um, acrescidas de 40 mil milhões de garantias bancárias. Criadas as condições para o lançamento efetivo do banco (o novo primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, pede para que a sede da instituição se instale na Índia) a cimeira de Fortaleza prepara-se para mais um passo: a adoção de uma unidade de contas comum, cujo valor será determinado por um cabaz das cinco moedas nacionais e com o renminbi chinês como esteio principal. A decisão de sair progressivamente do sistema do dólar também não é nova. Uma série de acordos bilaterais já permite aos BRICS efetuar até 25% das suas transações África é identificada como o continente emergente com crescimento médio de 5% e vários países acima da média como Nigéria e Etiópia nas suas próprias moedas. A crise ucraniana e as sanções económicas decretadas unilateralmente pelos Estados Unidos e a União Europeia sem o aval da ONU precipitaram o movimento encabeçado pela China e a Rússia. A 5 de maio, e como retaliação das medidas tomadas pelos EUA contra três dos maiores bancos russos, Vladimir Putin resolveu acabar com o quase monopólio dos grupos Mastercard e Visa sobre os cartões de crédito em circulação na Rússia (95% de 217 milhões) e criar um sistema nacional. A partir de 1 de julho todas as transações efetuadas no país deverão ser em rublos e os dois grupos americanos deverão pagar uma comissão trimestral ao Banco Central russo equivalente a 25% do seu volume de negócio. A disposição abrange o comércio (avaliado em mil milhões de dólares/ano): doravante os contratos deverão ser negociados em rublos ou nas moedas dos parceiros comerciais. Moscovo também adotou o modelo chinês de «comércio sem dinheiro à vista» para concluir um acordo com Teerão sem violar o embargo decretado contra o Irão e trocar 500 mil barris/dia de petróleo iraniano contra bens e serviços russos. E fechou numa semana as negociações em curso há cerca de dez anos sobre o fornecimento de gás siberiano à China. Se a moda pega, muitos «petrodólares» irão em breve ser reconvertidos em «gasorublos» ou em «petroyuan». A Nigéria já decidiu passar para outras moedas uma parte das suas reservas em dólares. Emergentes e não-alinhados Em 2013, a África do Sul convidara os outros membros da União Africana a participar na cimeira dos BRICS em Durban. Para a cimeira de Fortaleza, o Brasil convidou os membros da CELAC (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos). Com estas iniciativas os BRICS alargam a sua área de influência e África21– julho 2014 69 de negócios à quase totalidade do antigo Terceiro Mundo, apesar dos esforços do Ocidente para dissuadir os outros «países em desenvolvimento» de se juntarem à «conspiração contra o Ocidente», agitando o espantalho do «colonialismo» chinês. No entanto, os BRICS estão ainda longe de poder constituir uma alternativa política ao Movimento dos Não-Alinhados. A reunião ministerial efetuada em Argel no mês de maio para preparar a cimeira dos não-alinhados, que se realizará em 2015 em Caracas, pôs em evidência as diferenças e os pontos de convergência das dinâmicas dos dois movimentos. Ambos defendem princípios como a soberania, a não ingerência e o direito de escolher parceiros e modelos políticos e de desenvolvimento. Mas enquanto os BRICS querem substituir a atual arquitetura financeira internacional sem questionar a globalização, os não-alinhados continuam a lutar por «uma ordem mais justa» no quadro de um «multilateralismo efetivo e fecundo», como disse o chefe da diplomacia argelina. E que defenda os mais fracos e pobres contra os abusos dos fortes e poderosos, acrescentou o economista egípcio Samir Amim, que apela aos não-alinhados a unir-se contra a «globalização injusta». Sem solidariedade e objetivos políticos claros não é seguro que a nova ordem que os BRICS pretendem impor seja mais Os BRICS vão financiar o seu Banco de Investimento com um capital inicial de 50 mil milhões de dólares democrática e respeitadora dos direitos de todos do que a atual. «Numa altura em que recrudescem as ameaças de guerra e ações intervencionistas por parte das potências ocidentais congregadas e seus aliados, o Movimento dos Países Não-Alinhados pode desempe- nhar um importante papel a favor da resistência dos países e povos que lutam para defender a sua soberania e conjurar os perigos advindos das ações das forças externas», defendeu Manuel Domingos Augusto, secretário de Estado das Relações Exteriores de Angola, que representou o país na Conferência de Argel e aproveitou para angariar apoios para a candidatura de Angola a um lugar não permanente no Conselho de Segurança da ONU. Segundo Manuel Augusto, a contestação ao «hegemonismo das grandes potências» e ao neoliberalismo, bem como a defesa do «desenvolvimento sustentável» dos países menos avançados são prioridades que Angola sempre defendeu e defenderá no Palácio de Vidro. Timor-Leste esteve também em destaque em Argel ao ser eleito para a presidência do comité encarregue de coordenar as posições dos países não-alinhados em matéria de assuntos económicos e sociais. Honduras liderará outro, dedicado aos assuntos políticos. Gabinete de Apoio ao Cliente Internacional No final de 2012 a saúdecuf criou o Gabinete de Apoio ao Cliente Internacional, um serviço que visa responder ao crescente número de clientes residentes no estrangeiro que procuram cuidados de saúde em Portugal. O perfil do cliente do Gabinete Internacional da saúdecuf não abrange apenas os portugueses que, residindo no estrangeiro e necessitando de cuidados de saúde, escolhem a saúdecuf para se fazerem acompanhar em Portugal. Na verdade, este serviço é cada vez mais procurado por estrangeiros que optam por Portugal para as suas férias ou trabalho e também preferem ser acompanhados nas nossas unidades. Através do Gabinete o cliente tem acesso a toda a assistência necessária, desde uma simples marcação de exames ou consultas até ao acompanhamento integral da sua viagem e estadia em Portugal. Para isso, a saúdecuf formalizou parcerias com agências de viagens e unidades hoteleiras onde as necessidades de saúde dos clientes são tidas em conta. É caso para dizer que, mesmo convalescente ou portador de uma doença que exija cuidados regulares, o cliente sabe que em Portugal não lhe faltará nada, desde o atendimento nas unidades da rede saúdecuf aos cuidados prestados pela Domus Care no local onde estiver hospedado. A maioria dos clientes vem de Angola, Espanha, Brasil, França, Alemanha e Inglaterra. 70 julho 2014 – África21 No entanto, a aposta do Gabinete concentra-se nos países onde residem portugueses ou naqueles em que já existem clientes. Tendo em conta as boas experiências que têm tido nas clínicas e hospitaiscuf é natural que esses sejam os nossos clientes mais fiéis. Serviços especiais para Angola A saúdecuf criou dois serviços especiais para estes clientes, o Plano Maternidade e o Check-Up Prevenir. O Plano Maternidade foi desenvolvido para as futuras mães angolanas que pretendem ter o seu bebé em Portugal. Engloba não só o parto como também todos os cuidados, desde o primeiro dia da gravidez até ao regresso a casa, disponibilizando um serviço de apoio 24 horas a grávidas e recém-mães. Ao Plano de Maternidade podem ser adicionados módulos de consultas de Pediatria e serviços pós-parto, como por exemplo, massagem para bebés e recuperação pós-parto. Apostando na prevenção, o Check-Up Prevenir é um produto constituído por consulta inicial e outra final, exames e análises, de acordo com as necessidades e preocupações de cada cliente. O cliente pode compor o Check-Up base ou base sénior adicionando módulos específicos. N FIL LUANDA IDADE V O FIL DA LUANNGOLA ANGOLA A S UB -S A EK TA INSTALAÇÕES DA FILDA DAS 14H ÀS 20H O LÃO PR J PROJECTAR O FUTURO CONSTRUINDO O PRESENTE FEIRA INTERNACIONAL DE EQUIPAmENTOS E mATERIAIS PARA A CONSTRUÇÃO CIVIL, OBRAS PÚBLICAS, URBANISmO E ARQUITECTURA 23A26DEOUT2014 PROmOVA O SEU NEGÓCIO! Organização Apoio Institucional Patrocinador Patrocinadores Oficiais Parceiro Nacional Parceiros Internacionais Hotel Oficial Media Partners Empresa Oficial de Montagem ANUÁRIOANGOLA Eventos Arena T (+244) 226 433 360 M (+244) 943 029 480 / 497 / 498 F (+244) 226 433 361 [email protected] África21– julho 2014 71 www.eventosarena.co.ao publirreportagem Elite inova fórum de recrutamento Mais ferramentas para candidatos ao primeiro emprego Os jovens angolanos ganharam mais um parceiro na luta pelo primeiro emprego. Agora, quem desejar encontrar um emprego pode fazê-lo por intermédio de uma plataforma online oferecida pela Elite, a mesma empresa que organiza o mais prestigiado fórum de recrutamento de talentos angolanos para o mercado de emprego, com incidência no setor petrolífero, bancário e das telecomunicações. H á anos que a Elite organiza em Luanda e noutros pontos do globo o “Fórum de Formação Contínua e Desenvolvimento de Carreira”, evento que junta empresas interessadas em recrutar novos colaboradores e jovens ávidos por entrar no mercado de emprego. Porém, antes são sempre identificadas as necessidades das empresas e pré-selecionados os candidatos com as valias requeridas. Feito isto, esses candidatos são convidados para o Fórum onde decorre o contacto com os potenciais empregadores. Por via desse procedimento muitos jovens encontraram o seu primeiro emprego. A novidade é que, agora, o mesmo pode ser feito via internet, na plataforma recentemente criada pela Elite. “São eventos que nós organizamos através da internet onde permitimos que os nossos clientes, sem terem que se deslocar, possam entrevistar candidatos angolanos que estão a viver no Brasil, Canadá, EUA, África do Sul e Namíbia. Nós realizámos dois eventos destes este ano. Em janeiro fizemos um evento online para angolanos que estão a viver na África do Sul e Namíbia, onde 72 julho 2014 – África21 tivemos empresas que participaram. Elas receberam um username e um login e entraram na nossa plataforma online. Os candidatos receberam a mesma informação e durante o dia puderam interagir com as empresas, e fizeram a entrega dos seus currículos. A nossa plataforma tem também um chat, o que permite que os candidatos e as empresas comuniquem entre si durante o dia e realmente foi uma mais-valia para as empresas que participaram. Essa é uma iniciativa que nos enche de orgulho porque há vários anos que estudamos a possibilidade de apoiar os nossos clientes sem que eles tenham a necessidade de se deslocar aos países onde estão os angolanos”, detalhou Miguel Vieira, Diretor-geral da Elite. Miguel Vieira, que falava durante a realização do sexto Fórum da Elite em Luanda, revelou ainda que a sua empresa faz mais do que juntar candidatos e empregadores. “Em todos os nossos eventos, não só o de Luanda, nós damos apoio aos candidatos desde que se inscrevem até à realização dos eventos. Temos secções na nossa página web onde ajuda- mos a melhorar o seu curriculum, damos-lhes dicas de como devem comportar-se durante as entrevistas, que perguntas devem fazer, que estudos é que têm de realizar sobre as empresas. Durante o fórum, distribuímos o nosso guia do fórum Elite onde consta informação sobre todas as empresas”, disse. Para este último evento da Elite, que aconteceu entre os dias 14 e 15 de junho, inscreveram-se cerca de 10 mil jovens dos quais 3500 foram convidados a participar. “Nós não convidamos todo mundo a participar no fórum. Só podemos chamar aqueles candidatos que se encaixam no perfil das nossas empresas participantes. Neste ano convidámos mais candidatos que no ano passado. Este é um evento que abre portas a muitos candidatos angolanos que estão em Angola e não sabem como encontrar o seu primeiro emprego, nem como chegar a essas 40 empresas». Miguel Vieira acrescentou que o objetivo é «ajudar os jovens a encontrar a sua primeira oportunidade de carreira ou apoiar aqueles que já tem um trabalho mas que estão a procura de um novo desafio”. publirreportagem Toyota apresenta em Luanda décima geração do Corolla Disposta a manter a liderança em Angola no setor em que se insere, a Toyota apresentou o seu novo sedan, aquele que pode ser considerado o modelo com o qual o público angolano mais está familiarizado: o Corolla. D epois de já o ter feito em outras latitudes, a Toyota trouxe assim para Angola a décima geração do modelo mais vendido em todo o mundo pela construtora japonesa. Já foram comercializados mais de 40 milhões de veículos desde o lançamento da primeira versão, em 1966. Entre as principais novidades apresentadas estão o design e o conjunto tecnológico que inclui a nova transmissão automática Multi-Drive de sete velocidades. O novo Corolla também “cresceu”, tanto no exterior como no interior, apre- sentando uma bagageira com uma capacidade de 470 litros. Traz igualmente um motor a gasolina 2ZR-FE, Dual VVT-i DOHC, de 16 válvulas com potência máxima 103/6400. Quanto a velocidade, pode atingir os 240Km/h. Esteticamente as linhas fluidas conferem mais beleza e juventude ao veículo. A nova grelha confere agressividade e classe ao modelo que pretende atrair o público mais jovem. As mudanças vão além da aparência, segundo Manuel Menezes, Diretor da Toyota de Angola, que acrescentou que o novo Corolla incorpora também muito mais tecnologia a bordo. “Este modelo mantém a tradição da Toyota de comercializar veículos adaptados ao mercado angolano”, revelou Manuel Menezes. A altura mais elevada, as especificações em termos de temperatura e uma maior resistência ao pó, por exemplo, são algumas das suas características. Apresentado inicialmente em maio, na sede da empresa, o novo Corolla esteve também em exibição no evento de mostra automóvel “Angola MotorShow” e foi bem acolhido pelo público. África21– julho 2014 73 74 julho 2014 – África21 insumos Novo aeroporto internacional de Luanda vai custar quatro mil milhões de dólares ROGÉRIO TUTI/JORNAL DE ANGOLA O novo aeroporto internacional de Luanda, considerada a maior obra pública em Angola, vai custar perto de quatro mil milhões de dólares, segundo o contrato entre o Governo angolano e um fundo chinês já publicado em Diário da República. De acordo com o sumário do Despacho Presidencial n.º 46/14, de 2 de maio, o contrato comercial para a construção do novo aeroporto celebrado entre o Ministério dos Transportes e a Empresa China International Fund Limited - CIF, foi aprovado no valor de 3.828.609.665 de dólares. A construção do novo aeroporto de Luanda arrancou em 2004 mas continua a ser desconhecida a data da sua conclusão, sucessivamente prorrogada e com paragens nas obras. O projeto deveria ser financiado por fundos chineses englobados na linha de crédito aberta por Pequim para permitir a reconstrução de Angola, depois de terminado um período de três décadas de guerra civil. O China International Fund Limited, entidade que financia o projeto, mantém esse desígnio no seu site, afirmando que tem em mãos a construção do «maior aeroporto em África», referindo-se ao que estava previsto para a comuna do Bom Jesus, a cerca de 40 km de Luanda, já na província do Bengo. Maquete do novo aeroporto internacional de Luanda Lançada ligação Moçambique-Zâmbia-Malawi Uma composição ferroviária experimental transportando carga diversa ligou recentemente o porto de Nacala, província moçambicana de Nampula, à cidade de Chipata, na Zâmbia, com passagem pelo vizinho Malawi, perfazendo um percurso de cerca de 750 km no espaço de uma semana. Virgílio Ferrão, presidente do Triângulo de Desenvolvimento Zâmbia, Malawi e Moçambique (ZMM-TD), disse, em declarações ao matutino Notícias, de Maputo, que esta experiência enquadra-se nos esforços visando a utilização do Corredor de Nacala, numa iniciativa que envolve o Banco Mundial, Banco Africano de Desenvolvimento, União Europeia e a Trade Mark da África do Sul. Os promotores esperam que, no sentido descendente, o tráfego ferroviário seja constituído por algodão, milho, cobre, tabaco, entre outros produtos que a Zâmbia e o Malawi pretendam exportar através do porto de Nacala, de modo a impulsionar uma efetiva integração regional. Virgílio Ferrão explicou que a viagem foi difícil, pelo facto de ao longo do trajeto, nomeadamente num troço de 300 quilómetros, a via ter sido invadida por capim, o que acabou por ditar restrições de velocidade das duas locomotivas que puxavam o comboio experimental. O responsável salientou que o projeto é importante para os empresários do Triângulo, como meio animador de transportes e comunicações complementares entre os três países. Parceria estratégica Argélia-Rússia no setor energético O ministro argelino da energia, Youcef Yousfi, assinou em junho com o seu homólogo russo, Alexander Novak, uma carta de intenções visando consolidar a cooperação bilateral no setor da energia, promover o desenvolvimento das indústrias do petróleo, gás, eletricidade e energias renováveis e aprofundar as concertações existentes entre os dois países. O ministro argelino mostrou-se também interessado no estabelecimento de parcerias e de investimentos russos na indústria petroquímica e de combustíveis sofisticados. Youcef Yousfi teve igualmente conversações com o novo ministro de Estado do Petróleo e do Gás da União Indiana, Dharmendra Pradhan, que manifestou o interesse do seu país em reforçar as relações com a Argélia. Os encontros tiveram lugar à margem do XXI Congresso do Petróleo, que se realizou de 15 a 19 de junho em Moscovo, com a participação de representantes dos 69 países membros do Conselho Mundial do Petróleo, entre os quais uma forte delegação angolana. O congresso esteve marcado pelas tensões criadas pela crise da Ucrânia e as ameaças sobre o fornecimento de gás russo à Europa, bem como as incertezas acerca das produções petrolíferas do Iraque e da Líbia. Argélia e Rússia são os maiores fornecedores de gás da União Europeia. África21– julho 2014 75 insumos Reativada plataforma que processou petróleo durante oito anos em Angola Uma unidade flutuante de produção e armazenamento de petróleo que trabalhou durante oito anos consecutivos no offshore angolano vai ser reativada este ano, após dois anos de obras de conversão, informou a empresa proprietária. De acordo com a administração da OPS - Serviços de Produção de Petróleos, o caso da FPSO (Floating Production, Storage and Offloading, em inglês) N’Goma representa a «primeira conversão» de uma unidade deste género no país. As FPSO são plataformas flutuantes de grandes dimensões utilizadas na indústria petrolífera de operações offshore para processar, armazenar e exportar petróleo bruto ainda em alto-mar, sendo a principal atividade da angolana OPS. A FPSO N’Goma, formalmente denominada como Xikomba, foi a primeira unidade do género que a operadora Esso colocou em funcionamento em Angola, no bloco 15, e operou consecutivamente com «excelentes rendimentos» entre 2003 e 2011, de acordo com a OPS. Esta unidade, semelhante a um grande petroleiro (340 m x 50 m), tem capacidade para armazenar 1,5 milhões de barris de petróleo e de produzir 100 mil barris por dia. Após trabalhos de conversão e melhorias realizados nos últimos dois anos em Singapura, decorre agora a instalação de novos módulos no convés, nos estaleiros de Porto Amboim, no norte do país. A plataforma estará de regresso ao offshore, em Angola, «nas próximas semanas», indicou o diretor-geral da OPS, Fabrice Dumortier, referindo-se ao início da operação no bloco 15/06, em águas profundas (mais de mil metros de profundidade). Angola é quarto destino de investimento estrangeiro Angola é o quarto mais importante destino de investimento estrangeiro direto em África, segundo as conclusões de um estudo da consultora Ernst & Young, denominado «Atratividade de África 2014». Segundo o estudo, o interesse dos investidores decorre do «forte crescimento anual da economia do país». Os investimentos em curso ao nível das infraestruturas, nomeadamente em portos e aeroportos, a anunciada criação de um fundo de investimento soberano superior a cinco mil milhões de dólares e o lançamento de uma Bolsa de Valores em Luanda, constituem «sinais da melhoria da atratividade» angolana para investimentos privados. O estudo da Ernst & Young identifica Angola como o quarto maior recetor de investimento estrangeiro na África Subsariana, a mesma posição que o país ocupa no ranking da perceção dos investidores no que respeita às «localizações mais atrativas no continente». 76 julho 2014 – África21 A ilha da Boavista, um dos principais centros turísticos de Cabo Verde, poderá ganhar um oceanário. A intenção de construir essa estrutura foi manifestada pela empresa chinesa Qingdao Jinyitong que, além deste empreendimento, anunciou pretender construir um hotel e complexos residenciais naquela ilha. Em junho uma delegação da empresa chinesa visitou a ilha da Boavista para contactos com as autoridades municipais e com entidades ligadas ao turismo, com o objetivo de apresentar os seus projetos de investimento. Segundo a imprensa cabo-verdiana, numa primeira fase do empreendimento a empresa terá de adquirir cerca de 30 hectares de terreno. A ideia de construção de um oceanário em Cabo Verde já fora notícia na década de 1990, quando foi anunciado um projeto nessa área para a ilha de S. Vicente. O arquiteto norte-americano Peter Chermayeff, especializado em aquários e que projetou o Oceanário de Lisboa, entre vários outros no mundo, chegou a realizar o anteprojeto. Contudo, não houve seguimento. Ainda no ano passado o deputado António Jorge Delgado, ministro da Cultura na época da realização do anteprojeto, voltou a defender a sua construção naquela ilha, como forma de incrementar a oferta turística. DR DR Empresa chinesa quer construir oceanário na ilha da Boavista Moçambique ganha com investimento chinês DR Empresários chineses, associados na empresa pesqueira Yi Nuo, estão a investir na construção naval no distrito de Angoche, na província moçambicana de Nampula, revela a Cargonews. De acordo com o sócio-gerente, Xiao Guang Han, não obstante serem construídas em madeira as embarcações produzidas no estaleiro naval reúnem os requisitos exigidos pelas autoridades marítimas moçambicanas para exercer a pesca semi-industrial. As embarcações têm cerca de 20 m de cumprimento e cinco de largura e podem transportar, de acordo com a capacidade dos motores, dez toneladas de pescado capturado no alto-mar. A sua conservação é assegurada por equipamento de frio instalado em espaços previamente planificados. A licença emitida pelas entidades moçambicanas do setor das pescas a favor da empresa Yi Nuo destina-se à captura de camarão. Xiao Guang Han afirmou que duas das quatro embarcações construídas já estiveram em faina no alto-mar por um período de oito dias, tendo atracado em segurança. O sócio-gerente da Yi Nuo disse ainda que os engenheiros navais e carpinteiros recrutados na China estão a ser progressivamente dispensados e substituídos por trabalhadores moçambicanos que receberam formação durante o período laboral. Redes hoteleiras internacionais apostam na ilha do Sal Depois de vários adiamentos, foi colocada a primeira pedra da construção do Hotel Hilton em Cabo Verde, defronte à praia de Santa Maria, na ilha do Sal. A obra esteve inicialmente prevista para começar em 2009, depois em 2013. O edifício deverá ficar concluído em março de 2016. Cabo Verde é, assim, o primeiro país africano de língua portuguesa a acolher a marca Hilton, presente, no continente africano, em Marrocos, Argélia, Nigéria, Etiópia, Quénia, Camarões e África do Sul. O Hilton de Cabo Verde terá 240 quartos, três restaurantes, spa, centro de negócios e um casino – que será o primeiro de Cabo Verde. A licença para esta última atividade foi aprovada pelo Governo cabo-verdiano em abril de 2013 e dá a concessão do jogo à empresa para os próximos 25 anos. Durante o período de construção do hotel serão criados 360 postos de trabalho na ilha do Sal. O empreendimento tem um custo de 62,5 milhões de dólares. Outra rede internacional de hotéis que chega a Cabo Verde é o Grupo Meliá, que abre este ano o Dunas Beach Resort, também na localidade de Santa Maria. Este hotel, com 1100 quartos e capacidade para cerca de 2500 hóspedes, prevê receber 86 mil turistas ao longo de 2015. Deverá gerar à volta de 700 empregos permanentes. LEILÕES PETRÓLEO A Sonangol vai licitar no próximo ano 12 blocos para exploração de petróleo offshore, sete dos quais estão localizados na bacia do Namibe (Sul do país) e cinco na do Baixo Congo (Norte), confirmou fonte da petrolífera estatal. A estes acrescem outros dez em terra e já em processo de licitação, nas bacias terrestres dos rios Kwanza e Congo, que podem representar mais de metade das reservas conhecidas de Angola. O Executivo de Angola tem o objetivo de atingir uma produção diária de dois milhões de barris, com a entrada em operação de novos campos de produção e tendo em conta reservas estimadas superiores a sete mil milhões de barris. Nos últimos seis meses, Angola produziu cerca de 1,65 milhões de petróleo por dia, devido a problemas de manutenção e ruturas em alguns campos. AQUICULTURA A aposta no desenvolvimento da aquicultura em Angola é uma das prioridades do Executivo, de acordo com a ministra das Pescas. Na 31.ª Sessão do Comité das Pescas da FAO, decorrida em Roma, Victória de Barros Neto considerou que esta é uma atividade económica viável e rentável, com benefícios socioeconómicos e importante contributo para a segurança alimentar. As capturas de pesca excedem atualmente as 300 mil toneladas/ano, sendo 85% absorvidas pelo mercado interno, com um consumo per capita anual de 19 kg. ANGOLA-CHINA Entre janeiro e abril, Angola foi o segundo parceiro comercial da China entre os países da CPLP, a seguir ao Brasil, registando trocas comerciais no valor de 13.335 milhões de dólares. De acordo com o Fórum de Macau, isto significa uma subida homóloga de 9,26%. As trocas sino-angolanas representaram, naquele período, 32% do comércio entre a China e a CPLP. As vendas angolanas à China foram de 12.034 milhões de dólares e as importações totalizaram 1,3 mil milhões. BADEA O Conselho de Administração do Banco Árabe para o Desenvolvimento Económico em África (BADEA) aprovou o financiamento de novas operações de desenvolvimento estimadas em 60,6 milhões dólares. Deste montante, 57,5 milhões serão consagrados ao financiamento de projetos, enquanto 3,1 milhões irão para as operações de assistência técnica, revela o BADEA num comunicado transmitido no final da segunda reunião do seu Conselho de Administração, organizada de 11 a 13 de junho em Casablanca (Marrocos). Com esta nova aprovação, o total dos compromissos financeiros do BADEA para os países africanos estima-se em mais de 4,5 mil milhões de dólares desde 1975. África21– julho 2014 77 78 julho 2014 – África21 Nos próximos quatro anos, o Plano Nacional de Desenvolvimento vai actuar para melhorar a qualidade e a esperança de vida dos angolanos. Para além disso, o Governo de Angola vai desenvolver uma série de acções para combater as grandes endemias, reduzir a mortalidade materna e infanto-juvenil, aumentar o número de médicos nos hospitais públicos e melhorar a prevenção de cuidados de saúde. Se actualmente 86% das crianças angolanas com menos de 1 ano são vacinadas, em 2017, com a acção do PND, serão 95%. É assim que o PND vai contribuir para melhorar a vida de todos os angolanos. publirreportagem O sabão do Zango Restaurantes, hotéis, condomínios e outros locais podem doar o óleo de cozinha usado, contribuindo também para preservar o meio ambiente Programa de geração de renda desenvolvido pela área de responsabilidade social da ODEBRECHT em Luanda beneficia famílias de baixa renda, cresce e já começa a ser reproduzido em outras províncias. P ropriedade de uma cooperativa organizada pela Odebrecht há dois anos, com 21 famílias do Zango, a fábrica de sabão inaugurou suas instalações no dia 10 de junho deste ano. Até esta altura o empreendimento, cuja principal característica é ter como insumo óleo de cozinha usado, funcionava no quintal de um dos líderes do grupo e produzia 2000 barras de sabão por mês. Com uma sede própria, de 250 m2 e terreno que permite ampliação, composta por uma área administrativa e uma área de produção, pode produzir, estocar e vender uma quantidade bem superior. Os cooperativados já sonham em reciclar mensalmente 15.000 litros de óleo, o que dá para produzir cerca de 15 mil barras, e acreditam que no 2.º semestre deste ano o próprio número de cooperados também deve crescer. A fábrica já está a ser replicada com sucesso nos projetos da Odebrecht em Cambambe e no Lobito. A cooperativa que opera a fábrica tem origem num diagnóstico feito pela Odebrecht em 2011 na região onde é responsável por construções do projeto de realojamento das populações, o Projeto do Zango. Adriano Ramos, um dos integrantes da equipe de responsabilidade social da empresa, conta-nos que aquele foi um dos grupos surgidos espontaneamente das diversas oficinas de empreendedorismo realizadas pela Odebrecht. A equipa de responsabilidade social do projeto acompanha o grupo desde o início garantindo a sua sustentabilidade mas, seguindo a orientação da empresa, tão logo a cooperativa consiga caminhar sozinha deve desligar-se e apoiar outras iniciativas. A Odebrecht compartilhou com o grupo a metodologia, os processos e as formas corretas para a produção do sabão em todas as suas etapas. Também ofereceu treinamento em saúde e segurança, contabilidade, finanças, marketing e outros aspectos ligados à gestão de microempresas e agora construiu a sede. A fábrica é uma planta artesanal onde não há maquinarias e o processo de produção é relativamente simples. Para a sua construção contou-se ainda com o apoio do Programa Provincial de Habitação Social, da ONG Kambas do Bem, formada por familiares de empregados da Odebrecht; da congregação Filhas de Maria Auxiliadora e de uma empresa de comunicação visual, a Open Up. Atualmente o óleo de cozinha é doado por todos os projetos da Odebrecht em Luanda, pelo Belas Shopping e pelo Hotel Victoria Garden, além do que é coletado na propria comunidade. O sabão produzido pela cooperativa tem boa qualidade. Similar a alguns dos que são encontrados no mercado, porém não tem aroma e por ser reciclado chega ao consumidor por um preço um pouco mais competitivo. Análises clínicas atestam que o produto pode ser usado para a limpeza doméstica, sobretudo para a lavagem de roupas. Com a construção da sede e melhor estruturação da cooperativa os cooperadores poderão acessar o mercado formal e ampliar as suas oportunidades. Já constam no seu plano de negócio deste ano a produção do sabão em pó e a produção do sabão com aroma que podem ser vendidos com uma margem de lucro maior. Jorge Milagre África21– julho 2014 79 80 julho 2014 – África21 press release n Feira do ambiente - A aposta nas tecnologias verdes Syanga Abílio, secretário de Estado para as Novas Tecnologias e Qualidade Ambiental «Promover as tecnologias ambientais em todos os setores da vida nacional» foi o tema da IV Feira Internacional de Tecnologias Ambientais de Angola. O certame juntou cerca de 90 expositores de várias partes do globo, ávidos por mostrar as últimas novidades em termos de tecnologias verdes. A Enerser apresentou soluções para um melhor controlo da qualidade do ar em diferentes espaços (residencial, escritórios e espaços públicos), assim como uma solução que faz a contagem de consumos de água, gás e eletricidade num condomínio ou edifício. «O Enerbiz resulta da necessidade de, nos grandes edifícios, conseguir-se diferenciar o que cada apartamento ou escritório consome em termos de energia elétrica e água, seja da rede pública ou de fontes alternativas. Geralmente o que temos são contagens gerais de eletricidade e água. Com o Enerbiz cada um vai pagar só aquilo que consume», explicou o diretor comercial António Vieira. n Segunda edição do Motorshow A segunda edição do Salão do Automóvel e Veículos Motorizados de Angola, que decorreu na Baía de Luanda entre os dias 3 e 8 de junho, contou com a participação de 20 empresas e 26 marcas. O evento, também conhecido por Angola Motorshow, é organizado pela Associação dos Concessionários de Equipamentos de Transporte Rodoviário (ACETRO), em parceria com a Eventos ARENA. Durante a feira, a Angolauto lançou as plataformas Genie, uma marca da Terex, que comercializa equipamentos industriais para trabalhos em altura e movi- mentação de cargas. «A aposta nas plataformas aéreas GENIE no mercado angolano vai permitir-nos responder às necessidades dos nossos clientes e explorar novos segmentos de negócio», disse João Tomás, diretor de Marketing da Angolauto. Por sua vez, a Comauto, distribuidor oficial da marca Mercedes-Benz, aproveitou o evento para apresentar o novo Classe C para o mercado angolano. n Realidade aumentada na Expo-TIC’s 2014 Os conteúdos gráficos (posters, jornais e revistas) ganharam vida na Expo-TIC’S/2014, feira de tecnologias de informação e empreendedorismo digital, que decorreu em Luanda no mês de junho. A empresa Creative Step apresentou no certame a tecnologia de realidade aumentada que, basicamente, exibe uma espécie de conteúdo oculto em qualquer representação gráfica, acedido por intermédio de uma aplicação gratuita. A Edições Novembro foi a primeira grande empresa a aderir à tecnologia e transformou o Jornal de Angola no primeiro jornal em África a disponibilizar conteúdos adicionais à sua versão impressa (vídeos, áudio, galeria de imagem). Para tal basta o leitor, com ajuda de um smartphone ou tablet, carregar uma imagem do jornal no aplicativo da empresa. «A pessoa, no momento em que está a ver uma realidade gráfica, pode ter acesso a outras informações de forma imediata. Basta colocar o smartphone sobre a embalagem e com o aplicativo aceder a esses conteúdos adicionais», explicou Hugo Silva, da empresa Creative Step. n Prémio de Jornalismo da APO Estão abertas as inscrições para o Prémio de Jornalismo 2014 da APO (African Press Organization - Organização de Imprensa Africana), agência de distribuição noticiosa e líder global nas relações com os media para África. O 1.º premiado recebe 500 dólares por mês durante um ano, um computador portátil, um bilhete de avião intercontinental para um destino à sua escolha e acesso durante um ano a mais de 600 salas VIP de aeroportos em todo o mundo. O 2.º premiado recebe durante um ano 300 dólares por mês e o 3.º classificado 200 dólares durante o mesmo período. O Prémio de Jornalismo da APO celebra histórias brilhantes e inspiradoras sobre África. Pode tratar-se de uma história sobre um único assunto ou uma variedade de assuntos, incluindo, entre outros, negócios, economia, tecnologia, agricultura, saúde, energia, géneros, logística, turismo, automobilismo, aviação, organizações sem fins lucrativos, diplomacia, ambiente, mineração ou entretenimento. Informações em www. apo-opa.com. n Gestão por Competências em Moçambique A Let’sTalkGroup em Moçambique vai organizar, de 27 a 29 Outubro 2014, no VIP Grand Maputo Hotel, o seminário «Gestão por Competências», apresentado por Maria Odete Rabaglio, psicóloga organizacional com especialização em Recursos Humanos e Jogos Organizacionais. Rabaglio é pioneira no desenvolvimento e lançamento de ferramentas de Gestão por Competências no Brasil, e possui larga experiência na implementação de projetos de Gestão de Pessoas por Competências, Desenvolvimento Gerencial e de Competências, em grandes empresas públicas e privadas. Elisabete Tomé, diretora executiva do Let’sTalkGroup, afirma que «o principal objetivo deste seminário é dotar os profissionais de RH de conhecimentos que lhes permitam estruturar um plano de gestão que vincule os sistemas e RH à estratégia organizacional e que contribua efetivamente para a geração de mais-valias a todos os níveis». África21– julho 2014 81 publirreportagem HOTEL SERRA DA CHELA No coração das festas da N.ª Sr.ª do Monte V ocê está a planear ir ao Lubango e mergulhar nos mil encantos que esta urbe oferece nas Festas de N.ª Sr.ª do Monte que se realizam de 1 a 31 de Agosto de 2014, como aliás acontece todos os anos. Você quer desfrutar de tudo o que o programa oferece aos milhares de visitantes e peregrinos que a visitam nesta época, mas não quer aborrecer-se em vagarosos engarrafamentos, nem sair do verde luxuriante que o imenso parque oferece… …não pense mais! Hospede-se no Hotel Serra da Chela, um espaço onde tudo está preparado para a sua comodidade e conforto, ao mesmo tempo que 82 julho 2014 – África21 goza dos encantos que uma natureza quase virgem lhe proporciona. Situado ao sopé do Monte da Capela Esplanada e da capelinha, o Hotel Serra da Chela foi idealizado a pensar tão e somente em si. Cada um dos seus 148 quartos e 12 suites tem tudo o que você precisa para um descanso tranquilo e prazeroso: de camas, mesas de trabalho, Wi-Fi e TV com satélite, até às janelas panorâmicas a dar para belas paisagens verdejantes, é o ideal para uma boa temporada para si e para a família. A unidade apresenta igualmente diversas salas de eventos. A sala denominada Tundavala (uma das 7 Ma- ravilhas Naturais de Angola, situada a pouco mais de meia hora do hotel) com capacidade de até 100 pessoas e o Pavilhão de Conferências para até 2.000 pessoas. Por isso, o Serra da Chela tornou-se uma escolha incontornável no Lubango para reuniões de executivos de topo, assim como de festas de casamento ou aniversários. É que o Hotel prestigia os seus eventos com um ambiente ímpar, com o apoio de uma equipa experiente que presta a máxima atenção ao mínimo detalhe e faz de cada evento um sucesso. Situado no piso principal do Hotel, com uma maravilhosa vista sobre os jardins do Hotel e o Cristo Rei, está o restaurante “Omunda” (Monte em Língua local) que proporciona uma fusão de sabores internacionais com sabores locais, através de um serviço personalizado e em ambiente acolhedor que mexe com todos os sentidos, sendo acompanhado por uma criteriosa selecção de vinhos internacionais. Do Hotel Serra da Chela pode desfrutar da quase totalidade das actividades das Festas da Sr.ª do Monte sem precisar de retirar o seu carro do Hotel, podendo gozar de caminhadas em total segurança. Em 10 minutos, por entre um espaço relvado e sombreado por ver- des árvores, chega a pé à Feira, onde encontrará várias diversões, e onde terá lugar a famosa exposição e leilão de gado. Se for amante do desporto motorizado nem sequer precisa sair do recinto do Hotel; visto que a pista e a meta posicionam-se mesmo em frente à unidade hoteleira. O mesmo se for religioso e devoto de Nossa Sr.ª do Monte: a tradicional procissão de velas da noite do dia 14 de Agosto, que sai da Capelinha no cume da montanha, passa também defronte do pátio dianteiro. Basta abeirar-se do muro para tirar as suas fotografias ou, se quiser, juntar-se a ela até à Sé Catedral, no coração da cidade. E no dia seguinte, a procissão torna a passar pelo Hotel a caminho da Capela Esplanada onde se realizará a Missa Solene da Padroeira da cidade. Se lá quiser ir, basta juntar-se à procissão e caminhar alguns minutos. Tem ainda a opção de subir um pouco mais até à capelinha, de onde pode desfrutar de uma das vistas mais soberbas da cidade. Tudo isso está ali à mão de semear, com conforto, comodidade e sem as chatices do trânsito e sem precisar de guias. De que espera então para fazer a sua reserva? Ligue para o (+244) 930 970 878 ou envie email para o [email protected]. Ou visite o site www.serradachelahotel.com. Na certeza que não se vai arrepender. África21– julho 2014 83 ANGOLA Diversificar a economia Seja assinante BRICS Libertação face ao dólar A Nova Movimento – empresa angolana proprietária da África21 – montou um sistema de recolha de assinaturas regionalizado, a fim de poder atender melhor, com mais rapidez e de maneira mais vantajosa, os diferentes assinantes da revista. Assim, as assinaturas serão recolhidas, conforme os casos, em três centros: Luanda, Lisboa e Rio de Janeiro. Com exceção dos assinantes de Angola e Brasil, todos os demais receberão o seu exemplar pelo correio a partir de Lisboa. Como os custos de envio também são variáveis, conforme as regiões, o preço das assinaturas é igualmente regionalizado. Eis, a seguir, um quadro explicativo, com a tabela de preços das assinaturas e com os detalhes acerca dos centros onde os pagamentos deverão ser feitos, conforme os endereços dos assinantes. Nº 87 - JULHO 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15 Homofobia em África Em 38 países do continente a homossexualidade é criminalizada, em alguns dos quais com prisão perpétua ou pena de morte TABELA DE ASSINATURAS REGIÃO SEMESTRAL ANUAL BANCO Angola KZ 6.000 KZ 10.000 Keve Brasil R$ 120 R$ 200 Portugal € 20 € 35 União Europeia € 30 € 55 Resto do mundo USD 60 SWIFT BRDKAOLU 809026 ITAÚ Millennium BCP CONTA 69854-5 IBAN / AGÊNCIA AGENTE AO 06004700000080902615124 Movimento Agencia 0532 BELISAN BCOMPTPL 45371872997 PT 50003300004537187299705 Triangulação USD 100 Para começar a receber as revistas, basta enviar a ficha de assinatura, juntamente com o cheque ou o comprovativo do pagamento bancário, para os endereços abaixo indicados. Se preferir, pode escanear a ficha e o comprovativo do pagamento e enviá-los para os endereços eletrónicos indicados para cada local. Assinantes de Angola Movimento, Lda Rua Frederico Welwitschia, n.º 82 Bairro do Maculusso Luanda Angola [email protected] Tlm: 912 442 453 Assinantes do Brasil BELISAN EDITORA, Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda. - ME CNPJ 08.629.179/0001-52 Estrada Rodrigues Caldas Nº 297 CEP 22.713-372- Taquara – Jacarepagua Rio de Janeiro- RJ [email protected] Assinantes de Portugal, União Europeia e resto do mundo Triangulação, Lda Apartado 19059 1990-999 Lisboa Portugal [email protected] [email protected] q Desejo assinar a revista África21 por 6 meses q Desejo assinar a revista África21 por um ano Nome:____________________________________________________________________________________________ Morada:__________________________________________________________________________________________ E-mail:___________________________________________________________________________________________ Número de assinaturas:______ Início da(s) assinatura(s) (mês)__________________________________________ Vou efetuar o pagamento através de: q Cheque n.º _____________________ do Banco________________________ em nome de q Movimento, Lda______________ q BELISAN, Lda q Triangulação, Lda q Transferência Bancária para q Movimento, Lda______________ q BELISAN, Lda q Triangulação, Lda No valor de_______________________ (por extenso: __________________________________________________ ) Assinatura _____________________________________________________________ Data ___/___/___________ 84 julho 2014 – África21 A crónica de José Carlos de Vasconcelos Futebol de “língua portuguesa”... P Mas há muito mais, versos e/ou prosas tão variadas ois é. Quando julgava que, paciência, lá tinha de se como interessantes sobre o futebol: do imenso Drumaguentar o sacrifício de estar sempre a ser metralhamond ou de José Lins do Rego a Ferreira Gullar e Chico do com conversas de chacha, trivialidades, imbecilidades, Buarque, passando por Clarice Lispector, João Cabral de sobre o Mundial de Futebol, a seleção portuguesa, o Mello Neto, Nelson Rodrigues (o autor de À sombra das Cristiano Ronaldo, porque isso seria compensado pelo chuteiras imortais), Millor Fernandes, João Ubaldo Ribeigosto, o gozo, a emoção dos próprios jogos – e eis que ro, Luís Fernando Veríssimo, António Torres, Haroldo para princípio de vida temos uma péssima prestação e Maranhão, etc. Aliás, a exposição «Futebol na Ponta da acabamos de apanhar uma abada de 4 a 0 da Alemanha! Língua», agora patente no magnífico Logo da Alemanha, com a srª Merkel, que Museu da Língua Portuguesa, em São já nos anda a lixar a vida em tudo o resto, Paulo, disso dá expressivo testemunho. de pé, na tribuna, a aplaudir os seus teuE se é certo que a paixão pelo futebol tões (e eu a pensar na tristeza, se não hunão esmoreceu no Brasil, o que surpreenmilhação, das mais de duas centenas de deu todo o mundo foi a forte contestação milhares de portugueses emigrantes no à Copa, aos dinheiros gastos com a sua seu país...). organização e os estádios, exigindo o povo Bom, veremos o que vai acontecer a prioridade para os investimentos sociais, Portugal e ao Brasil, pelo qual, claro, em particular na Saúde e na Educação. As também estou sempre torcendo muito. [email protected] grandes manifestações por todo o país, Por todas as razões, incluindo a de aí o [email protected] antes da abertura da Copa, e no decorrer futebol para além dos estereótipos, ter dela (cujas dimensões e consequências vão uma funda raiz popular e uma identidade depender, agora, do Brasil a ganhar ou não), mostram própria, ser uma autêntica paixão. Durante décadas com que o povo brasileiro atingiu uma etapa superior de uma forma inconfundível de jogar, muito mais artística, consciência cívica e política. O que, se não erro, se deve espontânea e imaginativa do que qualquer outra, em esbastante às políticas do Presidente Lula, continuadas pela pecial a europeia, onde começou na velha Inglaterra. Presidente Dilma, que permitiram a mais de 40 milhões «Vá alguém estudar a fundo o jogo de Domingos (da de brasileiros sair da miséria, fortaleceram a classe média Guia, um craque da época, a que chamavam “o divino”) ou e aumentaram a escolaridade – Lula e Dilma que são dos a literatura de Machado que encontrará decerto nas raízes mais contestados em muitas dessas manifs… de cada um, dando-lhes autenticidade brasileira, um Ainda bem que o povo, ou grande parte dele, não pouco de samba, um pouco de molecagem baiana e até deixa o futebol embotar a sua capacidade crítica, de indigum pouco de capoeiragem pernambucana ou malandranação e de protesto – o que não exclui se goste de futebol, gem carioca. Com esses resíduos é que o futebol brasileiro se vibre com a equipa do nosso país, com o espetáculo, a afastou-se do bem ordenado original para tornar-se a arte ou o virtuosismo que, apesar de tudo, não morreram. dança cheia de surpresas irracionais e de variações dioniCom as vitórias e derrotas dos que jogam... em língua síacas que é» – sublinhou nos anos 30 do séc. XX, com portuguesa. justeza, Gilberto Freyre. Esta realidade mudou muito: o futebol industrializou-se, transformou-se num espetáculo e num negócio universais, movimentando verbas astronómicas, a eficácia na prossecução dos objetivos a suplantar a criatividade e a beleza. Porém, o Brasil ainda consegue manter um certo «toque» daquela diferença presente ou sublinhada em textos de grandes escritores e poetas. O belo soneto de Vinicius de Moraes, O anjo das pernas tortas, sobre Garrincha, o extremo, meio simples de cabeça, que tinha um drible prodigioso e fazia jogadas impensáveis, «pura dança», é dos melhores exemplos. A paixão pelo futebol não esmoreceu no Brasil, mas ainda bem que não embotou a capacidade de indignação e protesto do povo África21– julho 2014 85 cinema nigeriano A apresentação em abril, dos resultados da atualização das contas nacionais da Nigéria, a primeira em 26 anos, consagrou por um lado a economia nigeriana como a maior do continente, e por outro provou que a indústria nigeriana de cinema, conhecida como Nollywood, tem mais impacto do que se pode inferir da imagem projetada pela maioria dos seus filmes Improviso que vai longe Itamar Souza Nova Iorque É verdade que carecem de produção apurada e a natureza «rasca» da sua comercialização, ou seja, serem vendidos em qualquer esquina e sujeitos a elevada pirataria, sugere tudo menos seriedade. É verdade também que há muito improviso e alguma pressa na produção de filmes. Isto explica o facto de a produção de um filme levar em média dez dias, e que em cada ano cheguem ao mercado entre 1500 a 2000 filmes, quando se sabe que apenas existe um verdadeiro estúdio em todo o país. Apesar destes desafios e contradições, o levantamento feito pelo Bureau Nacional de Estatística da Nigéria sugere que Nollywod, uma analogia com Hollywood, pois claro, corresponde a 1,8% do PIB da Nigéria, o que é significativo numa economia cujo PIB em 2013 chegou a 509 mil milhões de dólares, e tratando-se sobretudo de um país que até aqui vivia obcecado com o petróleo. Compiladas pela «super-ministra» da Economia e Finanças, Ngozi Okonjo-Iweala, uma veterana de Bretton Woods, e amparadas pelo Banco Africano de Desenvolvimento e pelo Banco Mundial, as novas estatísticas oficializaram o que outros já tinham reparado: a indústria nigeriana de cinema não pode 86 julho 2014 – África21 continuar a ser ignorada. A sua influência começa a deixar marcas em África, sendo apontada como fonte de inspiração para «Ghallywood», o incipiente e emergente cinema ganense. Na realidade, o Governo nigeriano foi o «último» a perceber a dimensão atingida por esta indústria. Em 2006, investidores nigerianos lançaram no Reino Unido, o AMC - African Movie Channel, um canal de televisão alimentado essencialmente por filmes nigerianos, e que tem como principais clientes imigrantes da Nigéria e de outros países da África Ocidental. Há um ano, o AMC lançou o seu primeiro canal em África, um mercado onde tem a concorrência do Africa Magic Channel, canal que vive sobretudo do que se produz na África do Sul e também em Nollywood. Há três anos, documentários produzidos por realizadores ocidentais deram a Nollywood uma exposição nunca antes vista. Jamie Meltzer produziu Bem-vindo a Nollywood, centrado no papel dos realizadores Izu Ojukuw e Chi o Ejiro e na velocidade com que fazem filmes na Nigéria. Franco Sachhi produziu Isto é Nollywood, que se consubstancia numa conversa com vários atores. Original e Cópia, feito por realizadores dinamarqueses, retrata o custo da pirataria, tendo como base o facto de que a generalidade dos filmes ao invés de ir para os cinemas, vai diretamente para DVD, ficando expostos a duplicações. Direitos de autor e propriedade intelectual Algumas companhias aéreas perceberam igualmente o fenómeno. Aliás, foi por esta via que há três anos tomámos contacto com o cinema nigeriano. Viajando várias vezes entre Washington e Luanda, em voos curiosamente pouco «povoados» por passageiros da Nigéria, fomos surpreendidos pela volumosa oferta de filmes deste país. A British Airways, que é de quem se fala aqui, não está sozinha nesta cruzada. A Emirates que voa para várias cidades nigerianas também o faz; a Virgin Atlantic, outra companhia britânica, foi processada por exibir filmes nigerianos sem o respetivo licenciamento. Uma irmã virtuosa foi o primeiro. Seguiram-se A mulher do Bispo e outros. Todos eles se referem a estórias estruturalmente africanas no enredo e na interpretação. Hollywood foi bem-sucedido em filmes como Diamantes de Sangue, Amistad, Mandela, Hotel Ruanda, mas seguramente que teria dificuldades em oferecer uma boa história genuinamente africana como Nollywood o faz, apesar de descurar nos detalhes. Samuel Olatunje, respeitado publicista local, diz que são estórias com as quais qualquer africano se pode relacionar. O meu segundo «contacto» com Nollywood aconteceu em Washington num encontro com vários atores. Kanayo O. Kanayo, um dos principais símbolos de Nollywood, embora irradiasse entusiasmo manifestou-se preocupado com dois aspetos: redução da falsificação («é impossível acabar com ela») e melhores honorários para os atores. Se em relação à segunda aspiração, Kanayo O. Kanayo está coberto de razão, pois os atores nigerianos recebem muito pouco, em relação à primeira, a solução também passa pela rede de distribuição e pela qualidade dos filmes. O realizador Victor Okhai diz que o aumento das receitas está associado à melhoria na produção. «Filmes de péssima qualidade técnica podem ser vendidos em DVD mas nunca chegarão aos cinemas». Para ele a solução está na melhoria da qualidade dos filmes e no aumento do número de salas, hoje estimado em 60, num país que tem um potencial de mais de 70 milhões de consumidores. Existem 60 salas de cinema na Nigéria, país com um potencial de 70 milhões de consumidores Os números que Nollywod gera revelam outros contrassensos. Embora em termos de produção numérica apenas perca para Bollywwod, Índia, e apesar de gerar receitas que rondam os 250 milhões de dólares, os seus atores, salvo raras exceções, recebem em média 3000 dólares por filme, e o orçamento da maior parte das produções varia entre 17 mil e 25 mil dólares. Segundo a revista Venture Africa, o filme mais caro de sempre, Sol Meio Amarelo, custou oito milhões, para o que terá concorrido o facto de contar no seu elenco com o ator britânico de origem nigeriana Chiwetel Ejiofor, nomeado para um Óscar pelo seu desempenho no filme 12 anos escravo. Produzido a pensar em festivais de cinema na Europa e nos EUA e baseado em estórias sob a guerra no Biafra, devido à fraca circulação em salas, Sol Meio Amarelo deverá gerar retorno como outros filmes antes dele, ou seja, por via da A generalidade dos filmes ao invés de ir para os cinemas, vai diretamente para DVD, ficando expostos à pirataria venda de DVD. Segundo a Associated Press (AP), não é claro que consiga atingir um milhão de dólares de bilheteira, a melhor de sempre na Nigéria conseguida com o filme Ijé, a caminhada, do realizador Chineze Anyaene. De acordo com a AP, Nollywood dá emprego a um milhão de pessoas, suplantando assim o governo federal. Hamisu Lamido Tama, realizador e antigo presidente da Associação de Produtores e Realizadores, disse à África21 que o recurso frequente aos DVD decorre em parte de imposição do mercado: «Na verdade para a maior parte das pessoas até é mais cómodo adquirir o filme em CD do que em DVD. Perante isto, falar de cinema ainda é um desafio». Lamido defende como prioridade para o desenvolvimento de Nollywood, a fiscalização das violações às leis sobre direitos de autor e propriedade intelectual. Refletindo um pouco a matriz do país, com tudo o que isto representa politicamente, Nollywood viu crescer no norte um projeto rival que dá pelo nome de Kannywood. Instalado em Kano, produz filmes em língua hausa, numa contraposição ao que se faz no sul, de onde saem em regra filmes em inglês ou em yoruba, língua predominante no sul. África21– julho 2014 87 angola in 88 julho 2014 – África21 cults Alberto da Costa e Silva vence Prémio Camões 2014 P oeta brasileiro, memorialista, ensaísta, historiador, diplomata (foi embaixador do Brasil em Portugal nos anos sessenta) e especialista em África, Alberto da Costa e Silva confessou ter ficado surpreendido com a atribuição do Prémio Camões. Nas diversas conversas pelo telefone afirmou que não estava nas suas «cogitações» receber «um prémio que tem sido instituído aos maiores escritores de língua portuguesa», acrescentando que foi com «perplexidade mesmo, só depois é que me dei conta que devia ter manifestado minha alegria e meu grande orgulho por essa alta distinção que me foi agora dada». Sucedendo a Mia Couto, premiado em 2013, Alberto da Costa e Silva (83 anos) recebeu o galardão por voto unânime que o presidente do júri, Affonso Romano de Sant’Anna, justificou porque «mantém a mesma elevada qualidade literária em todos os géneros que praticou», e que a sua «refinada escrita costurou uma obra marcada pela transversalidade». E acrescentou: «A obra de Alberto da Costa e Silva é também uma contribuição notável na construção de pontes entre países e povos de língua portuguesa». Da sua vastíssima bibliografia (poesia, ficção, história, ensaio) refira-se aqui algumas obras sobre África e os africanos: A enxada e a lança; África antes dos Portugueses; As relações entre o Brasil e a África Negra, de 1822 a 1.° Guerra Mundial; A África e a Escravidão, de 1500 a 1700; Um Rio Chamado Atlântico. O valor pecuniário do Prémio Camões é de 100.000 euros (136.000 dólares). Escritor Lopito Feijó PAULINO DAMIÃO/JORNAL DE ANGOLA eleito membro da Academia Internacional de Artes do Brasil O escritor e poeta Lopito Feijó foi eleito membro da Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências do Rio Grande do Sul, no Brasil, onde tomou posse como académico titular da cadeira n.º 1 para estrangeiros. Esta cadeira tem como patrono o poeta brasileiro Mário Quintana, estando o poeta angolano António Jacinto também associado a esta categoria. Lopito Feijó disse, em nota de imprensa, que «se Quintana é tido como poeta das coisas simples, António Jacinto é para nós o poeta da vida simples cujo emblema sempre foi o desapego aos motivos materiais que nos rodeiam e aliciam». A academia internacional é uma instituição literário-cultural, científica e educacional sem fins lucrativos e tem como objetivos o incentivo e promoção da cultura, das ciências, artes e letras, tendo como missão fundamental o redimensionamento e a promoção da «palavra no século 21». João André da Silva Feijó, de nome completo, é membro da União dos Escritores Angolanos e presidente da Sociedade Angolana do Direitos de Autor. Era já membro correspondente da Academia Brasileira de Poesia. Doutrina (1987); Rosa Cor de Rosa (1987), Corpo a Corpo (1987) e Cartas de Amor (1990) são alguns dos diversos livros que publicou. África21– julho 2014 89 cults Mostra de cinema Olhares Sobre Angola em Lisboa A mostra de cinema Olhares Sobre Angola regressa a 2 e 3 de julho à Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, em Lisboa, para a sua terceira edição. Depois do sucesso da última edição, com várias sessões esgotadas, Olhares Sobre Angola volta a um dos mais nobres espaços de exibição cinematográfica da capital portuguesa, com uma programação integralmente dedicada ao cinema produzido em Angola. O primeiro filme a ser exibido é o documentário Angola, Ano Zero, de Ever Miranda Palácio, e está programado para as 19h00 de dia 2. Outros filmes em exibição serão Hereros Angola, de Sérgio Guerra (que é exibido na sessão oficial de abertura da mostra, às 21h30 de dia 2), Aprender a Ler Para Ensinar Meus Camaradas, do realizador João Marques Guerra (dia 3), ou Death Metal Angola, de Jeremy Xido (dia 3). Além dos filmes, há seleções de videoclips, vídeos experimentais e curtas-metragens – a secção «Olhares Sobre...», em estreia, dedica-se a Mariano Bartolomeu, contando com a presença do realizador e com um conjunto das suas curtas-metragens: Caribeando (1989), O Sol Ainda Brilha (1995) ou Uma Noite Perfeita para Falar de Amor (2008) são alguns exemplos. Todas as informações estão no site http://www.cinemateca.pt/. Moçambique Instituto do Livro e do Disco de Moçambique na Feira do Livro de Lisboa Ungulani Ba Ka Khosa E ventos como a Feira do Livro de Lisboa são uma oportunidade excelente para o intercâmbio de escritores e divulgação das respetivas obras. Foi com esta visão que Moçambique esteve representado pela primeira vez no evento com sete editoras e títulos de vários autores. A iniciativa partiu do Instituto Nacional do Livro e do Disco, que aproveitou a feira, realizada entre 29 de maio e 15 de junho, para promover obras dos autores conhecidos e da jovem geração. Saltam à vista, pelo estatuto que já alcançaram no mercado, nomes como Calane da Silva, Eduardo White, 90 julho 2014 – África21 Paulina Chiziane e Adelino Timóteo, ou Mia Couto e Ungulani Ba Ka Khosa, estes dois últimos considerados entre os 20 melhores escritores africanos do século XX. Dos jovens autores, refira-se Diogo Vaz e Lucílio Manjate. «Esta feira é uma oportunidade para intercâmbio e convívio com outros autores», disse à África21 Ungulani Ba Ka Khosa, autor de títulos como Ualalapi e Entre as Memórias Silenciadas, que, tal como Adelino Timóteo, fez algumas sessões de autógrafos. Para Ba Ka Khosa, a produção literária em Moçambique «está de boa saúde» porque «já existem editores e as livrarias estão a crescer». Entende que o surgimento de novas editoras é uma espécie de «porto seguro» para os escritores, que lhes permite produzir e divulgar as suas obras, tendo assinalado o crescimento de agentes com formação na área das letras e da produção livreira. Em contrapartida, diz faltar «aquela outra componente na cadeia da produção virada para a crítica literária, da análise dos livros». Ungulani lamenta a diminuição de análises literárias nos jornais, «em parte pela prevalência do discurso político» na imprensa escrita. Livros infantis para o público cabo-verdiano A fita cor-de-rosa é o título de uma obra para o público infantil que marca a estreia em livro do jornalista e blogueiro cabo-verdiano Odair Varela Rodrigues. É a história de uma gata janota que reinava sozinha numa ilha deserta e estava ansiosa por encontrar um amor. Um dia, consegue capturar um pombo que sempre quisera caçar. A ave promete-lhe que, se o deixar partir, irá voltar com um companheiro para ela. Mas o que traz é algo que ela não esperava… A história recebeu uma menção honrosa no Concurso Lusófono da Trofa, em 2013, na categoria de conto infantil, entre mais de 250 concorrentes, de todos os países lusófonos. Com 36 páginas, o livro é uma edição do próprio autor e encontra-se à venda em versões impressa e digital pelo site Amazon. Conta com ilustrações de Rogério Rocha, curiosamente o mesmo que ilustrou um outro livro sobre felinos, lançado no ano passado: O gatinho medroso, da autoria do antropólogo João Lopes Filho. Este último narra a história de uma velhinha que tinha um quintal cheio de gatos, pois alimentava e protegia os que en- contrava abandonados. Tem uma proposta pedagógica – pois procura sensibilizar as crianças para o respeito pela natureza e os animais – e é interativo, pois a história não termina: é o próprio leitor a inventar o fim que desejar. Depois de lançado no Mindelo, foi apresentado em junho na Praia, durante a Feira Municipal do Ambiente, numa iniciativa da Associação Bons Amigos, ligada à proteção dos animais. A história O de um país em memórias Portal de Memórias, romance histórico-biográfico da autoria do diplomata cabo-verdiano José Figueiredo Ramos, foi lançado em abril último em Portugal, depois de editado no ano passado em Cabo Verde. É a história de um jovem que, como outros cabo-verdianos da sua geração, foge da terra natal e junta-se aos que lutavam na época – década de 1960 –, fosse nos países da emigração ou em Cabo Verde e na Guiné, pela independência destas duas colónias. Dakar é o primeiro porto do percurso do personagem central do livro, Abel, que a seguir percorre outras cidades, como Abidjan, Antuérpia, Cidade do Cabo e Lisboa, antes de chegar a Nova Iorque, onde fixa residência e onde irá licenciar-se em economia. Nessa cidade, fará parte do comité fundador do núcleo local do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Tal como o autor do livro. Este só depois da independência regressará a Cabo Verde. Em 1978, ingressa na carreira diplomática, na qual se mantém até hoje depois de uma interrupção temporária. A história não se baseia apenas em memórias do autor, mas também em pesquisas que realizou sobre a emigração cabo-verdiana, que de resto se relaciona com a sua história familiar, dado que os seus avós se radicaram nos EUA no início do século XX. Esta é outra parte da história dos cabo-verdianos que a obra contempla, ficcionando-a. África21– julho 2014 91 livro do mês Exploradores Portugueses e Reis Africanos, de Frederico Delgado Rosa e Filipe Verde Expedições científicas a África tiveram fins políticos Este é um livro algo original sobre a história da exploração de África no século XIX, desenvolvida com motivos pretensamente científicos, mas que se destinou primordialmente a preparar a implementação do colonialismo europeu Rodrigues Vaz A mplamente ilustrada, esta obra, subintitulada Viagens ao coração de África no século XIX, recupera os relatos empolgantes destas viagens, que são hoje uma janela sobre um mundo desaparecido, em prelúdio da partilha de África pelas potências europeias. Diz-se na contracapa que «Alcançar o interior de África era o objetivo de todos. Exploradores portugueses, em rivalidade com os seus congéneres britânicos e de outras nações, procuravam realizar o velho sonho de ligar Angola a Moçambique, dando a conhecer os mistérios dos seus povos e da sua geografia.» Um desafio avassalador, dificultado pela fome, sede, cansaço extremo e doença. A milhares de quilómetros do seu mundo, envolvidos em querelas de vida ou de morte, no meio de estranhos com quem o mal-entendido era a regra, estes homens temiam morrer ou, no mínimo, enlouquecer. Ao longo do século XIX diversas viagens de exploração levaram homens como Serpa Pinto ou Capelo e Ivens a alcançar o estatuto de heróis, que ainda hoje perdura no imaginário coletivo. No caso de Serpa Pinto, como salienta a historiadora Soledade Amaro Rodrigues, no seu livro O mito do herói explorador, os relatos não bastariam para se ter forjado esse mito do herói explorador. «Foi a campanha 92 julho 2014 – África21 de propaganda, que teve visibilidade fundamental na imprensa periódica, com as receções fantásticas, as viagens ao estrangeiro, as rivalidades, relatadas com entusiasmo e pormenor, que o construiu. O principal responsável por essa campanha foi Luciano Cordeiro, que construiu em torno do amigo uma imagem de herói corajoso, patriótico, incompreendido, sem mácula». Outros houve, no entanto, que caíram no esquecimento, apesar de terem vivido aventuras igualmente extraordinárias. Nas faustosas capitais dos poderosos reinos africanos, cujos soberanos detinham um estatuto sagrado e um poder de vida e morte sobre os seus súbditos, há muito tempo que se ouvia falar do longínquo Muene Puto, o rei de Portugal. Ao chegarem a estes impérios, os exploradores portugueses despertaram enorme curiosidade. Mas, mercê do natural choque cultural e da incompreen- são das realidades locais, rapidamente se viam envolvidos numa teia de exigências, caprichos régios e intrigas palacianas das quais se libertavam com muita dificuldade. O livro está dividido em duas partes, sendo que a primeira é pautada pelo ensaio, abordando sobretudo a problemática do tráfico humano e do choque cultural, enquanto a segunda se ocupa de uma análise crítica às principais fontes que historizam as atribuladas viagens portuguesas pelo sertão africano. É pena que um livro tão bem elaborado no aspeto documental, com uma súmula de informações sobre o tema das explorações dos portugueses em África no século XIX, não contextualize as causas reais que estiverem no cerne das expedições. Na verdade, sabe-se hoje, que estas foram começadas a planear pela Royal Society de Londres, de que a Sociedade de Geografia de Lisboa foi uma das sucedâneas, ambas, por sua vez, produto de lojas maçónicas. O objetivo era bem claro: conhecer, analisar, catalogar, para bem explorar economicamente a seguir. Os objetivos científicos não passaram de meros pretextos. Aliás, os autores não deixam de reconhecer que estas expedições «desempenharam um papel por vezes muito importante, científico no nome, político no intento» (pág. 19). E, embora, dando-lhe pouco relevo, citam Lévi-Strauss, que afirmou que «bárbaro é aquele que acredita na barbárie», reconhecendo que «a África autêntica (…) era um lugar onde os seres humanos viviam em simbiose com o mundo a que pertenciam, em comunidades integradas e funcionais, com uma vida espiritual rica, usufruindo da prodigalidade da Natureza e desconhecendo os constrangimentos e regras artificiais com que a ‘civilização’ havia limitado a liberdade e gozo dos prazeres sensuais, estéticos e lúdicos vitais». Explorações mais e menos científicas No caso português, podemos afirmar que as primeiras explorações no início do século XIX, para além disto, também tiveram algo a ver com o feitio aventureiro lusitano, É pena que um livro tão bem elaborado não contextualize as causas reais que estiverem no cerne das expedições aliado a objetivos vagamente mercantilistas, pois os lucros nunca foram vastos nem com muitas esperanças de o virem a ser. De certo modo, como os autores deste livro salientam, o único caso à parte a merecer ser classificado mesmo de científico foi o de Henrique de Carvalho, tão rigoroso como meticuloso nos seus milhares de páginas de apontamentos e pela compreensão que teve dos africanos. Precocemente, como acentuam, tinha acentuado que «Os povos indígenas têm os seus hábitos já adquiridos, os seus laços sociais, e a sua família, as suas paixões e os seus amores, e as suas necessidades, subordinadas ao meio em que se encontram e onde nasceram, se educaram ou se aclimataram; e nós, sem os compreendermos, sem os estudarmos, ao menos para lhes fazermos justiça, penetramos nas localidades onde eles habitam e queremos logo ser compreendidos, imitados e servidos, como se fosse fácil a imposição de outros costumes e de outra religião, na vida mais íntima de um povo». É pena os autores não terem refletido nestas afirmações e não as levarem à letra, porque aceitarem acriticamente narrações como as do missionário MacKay, sobre o episódio do rei Metsa, do Buganda, pode ser uma mancha numa análise que até consideramos equilibrada. O livro destes dois antropólogos intenta uma releitura das viagens portuguesas em África durante o século XIX, visitando o calcorrear de Lacerda e Almeida, António Gamito, Rodrigues Graça, Silva Porto, Serpa Pinto, Hermenegildo Capelo, Roberto Ivens e Henrique de Carvalho, e contextualizando acertadamente o papel dos ambaquistas, cruzando o olhar da antropologia, da história e da literatura. Pensado não para especialistas mas sim para quem se possa e queira interessar, esta obra vale também pelo que nos conta sobre os reis africanos, em especialmente o Mwata Cazembe e os sucessivos Mwatiânvuas, cujos comportamentos aparentemente cheios de tergiversações, não deixavam nunca de ter uma lógica estatal muito acertada, nos seus planos. EM TEMPO: os autores optaram por utilizar o u na palavra Mwata, em vez do w. Tanto quanto sabemos é esta uma das divergências de Angola com o novo Acordo Ortográfico. Para quando uma clarificação neste ponto e na questão do apóstrofo como, por exemplo, na palavra N’soyo? Exploradores Portugueses e Reis Africanos - Viagens ao coração de África no século XIX Frederico Delgado Rosa e Filipe Verde Esfera dos Livros, 2014 FREDERICO DELGADO ROSA Nasceu em Lisboa em 1969. É doutorado em Etnologia pela Universidade de Paris X, tendo lecionado História da Antropologia na Sorbonne. É autor da obra L’Age d’or du totémisme. Histoire d’un débat anthropologique 1887-1929 (Centre National de la Recherche Scientifique e Maison des Sciences de l’Homme). Ao fim de sete anos em França, decidiu regressar a Portugal para se dedicar à investigação da carreira militar e política de seu avô, general Humberto Delgado. Coordenou o projeto do Arquivo Digital Humberto Delgado, no âmbito do Programa Operacional Sociedade do Conhecimento. É autor de Humberto Delgado e a Aviação Civil, edição comemorativa do Centenário do Nascimento de Humberto Delgado e do 60.º Aniversário da inauguração da Linha Aérea Imperial. Em 2008 publicou Humberto Delgado. Biografia do General Sem Medo. FILIPE VERDE José Filipe Pinheiro Chagas Verde, de seu nome completo, nasceu em 1961, fez a sua formação em Antropologia no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, onde é Professor Auxiliar, e é investigador do CRIA-CEAS. Publicou sete artigos em revistas especializadas, tem dois livros publicados Explicação e Hermenêutica. (Coimbra: Angelus Novus, 2009), e O Homem Livre: Mito, Moral e Carácter numa Sociedade, sendo este a sua pesquisa mais recente centrada num contexto clássico da etnografia ameríndia, os Bororo (Brasil), e na teoria e epistemologia da Antropologia. África21– julho 2014 93 vl o er uvir er A Rainha Ginga José Eduardo Agualusa Quetzal Editores, Lisboa, Junho 2014 A Rainha Ginga é o título do novo romance de José Eduardo Agualusa. Desde sempre que o autor angolano tinha o desejo de escrever sobre a Rainha Ginga. Só que lhe faltava coragem para concretizar o sonho, por considerar ser este «um tema demasiado difícil». Por um lado, devido à distância temporal; por outro, porque queria escrever o romance a partir da corte da monarca, considerada uma das mais singulares figuras da história de Angola, que soube impor-se num mundo feito de homens e colonos. Mais difícil ainda, justifica, seria contar a história numa perspetiva africana. Quando finalmente conseguiu ultrapassar esta espécie de barreira, foi muito mais rápido do que pensava transpor para o papel o que tinha em mente. Parte do enredo decorre na corte da Rainha Ginga, figura única pela sua profunda originalidade, que atraiu muita gente na sua época, e outra parte passa-se em Pernambuco, Brasil. O livro, publicado pela Quetzal Editores, é narrado por um padre pernambucano de origem africana, que acaba por se tornar secretário da rainha. «É ele que nos dá a ver esse mundo», descrevendo os primeiros passos dados pelos portugueses em Angola para negociar com ela face aos interesses atlânticos que manifestaram depois os holandeses. 94 julho 2014 – África21 «Quantas noites dura este martírio? A mulher já não sorri. Nem pestaneja. – Não é um martírio. É uma escolha. Cada um suporta o peso da espera que deseja. – Quantas noites? – Quinhentas. Mas você não estará aqui para saber o fim desta estória.» Ondjaki apresenta-nos um livro de contos, uma obra com narrativas com nomes de cidades. Muitas cidades, todas elas diferentes. Buenos Aires é assim: «Você nunca sonhou com um homem careca que atende pelo nome de Oriegn Artse? Gostaria de não ter respondido. De conseguir resistir e não dar continuidade à conversa. Mas talvez me fosse arrepender. Há dias – e pessoas – que se revelam mais poderosos do que bons momentos de ficção. – Nunca sonhou, ou não se lembra? Um tipo bem vestido, fala baixo. Faz lembrar aquele… Ben Kingsley, mas mulato. Nada? Por mim ficava a tarde toda assim, mudo, sorrindo ou em total abstração, a aguardar a progressão do relato. O homem tinha em si a estranhíssima serenidade de quem conhece o destino e a profundidade da sua missão. As suas perguntas não carregavam um pingo de exagero». Sonhos Azuis Pelas Esquinas Ondjaki Editorial Caminho, Lisboa, Junho de 2014 Composta por três volumes, Luanda e Justiça: Pluralismo Jurídico numa Sociedade em Transformação fecha a trilogia. O contexto sociopolítico de Angola, apresentado no primeiro volume, constitui um auxílio fundamental para uma melhor compreensão do tema. O estudo do sistema formal de justiça, contido no segundo volume, permite uma análise comparada com as instâncias extrajudiciais, caracterizadas agora no terceiro volume, que se centra sobre as instâncias locais – as «outras» justiças – que operam na sociedade angolana. O estudo apresenta, em vários municípios de Luanda, diversas instâncias que intervêm na resolução dos conflitos, colmatando os espaços que as estruturas formais não conseguem preencher. A criação de uma base credível de dados estatísticos, para várias das instâncias observadas, permitiu analisar a sua mobilização e alargar o campo analítico. A rede de justiças disponíveis em Luanda constituem referências centrais para um processo de criação de um «novo» direito angolano, numa capital que, enquanto janela de Angola, é um caso carismático de pluralidade jurídica. Luanda e Justiça: Pluralismo Jurídico numa Sociedade em Transformação – Volume III Maria Paula Menezes, Júlio Lopes (org.) Almedina/CES, Lisboa, 2014 Estendeu a sua sonoridade ao mundo, quando duas músicas suas foram divulgadas há uns anos no Microsoft Windows Vista. Melhor a música que o sistema operativo, que como se sabe foi um dos fiascos da empresa norte‑americana. Mas Habib Koité tem sabido que sons pisar, e a sua música chega-nos num novo álbum. Sons tranquilos, numa música simples, centrada na vivência do seu país, o Mali. Canta sobre os amigos, os vizinhos, o amor… mas também sobre alguns temas da atualidade do Mali, e que ele faz questão de manter sempre presente na sua música. O seu povo, a sua gente, marcam uma presença constante nas suas canções, que nos remetem com facilidade para os blues, ou mesmo para o flamenco. Consequência do uso que dá à sua guitarra, é certo, mas também à sua voz. Koité nasceu em 1958, filho de músicos. Percebe-se. Foi com eles que aprendeu a tocar, por observação, e a sua música chega-nos como se fosse uma constante observação do universo que o rodeia, tal a abrangência de temas que aborda. Soô Habib Koité Aqui está uma reunião provável, mas que nunca tinha acontecido: Toumani Diabaté, o génio da Kora (uma espécie de harpa com 21 cordas, nada fácil de manejar), juntou-se ao filho Sidiki e gravaram um álbum juntos. Conhecido como o mais exímio tocador de Kora, o pai estendeu a música ao filho, e o resultado é verdadeiramente surpreendente. Embora sem a carreira do pai, Sidiki conquistou já o seu próprio espaço na cena musical do Mali, com a vantagem de, embora tocando o mesmo instrumento, o fazer de forma diferente, com o seu estilo muito próprio. Diz Toumani: «Ninguém imagina um movimento rap com a força do movimento rap no Mali hoje. O meu filho tem a sua maneira de tocar kora e eu tenho a minha. Eu não lhe imponho nada. Nós apenas misturamos os nossos estilos. Este disco mostra algumas músicas muito antigas, mas tocadas com novas técnicas. É o encontro entre o passado e o presente, em direção ao futuro». Um futuro que é já hoje, acrescentamos. Toumani & Sidiki Toumani Diabaté, Sidiki Diabaté Uma viagem por África, Ásia e América do Sul; um passeio artístico através de ruas, praças, largos, pessoas. Mulheres. Uma forma diferente de contar histórias, de entrar no universo de gente e de com essa gente partilhar o passado, o presente e o futuro. Um documentário que nos traz a pluralidade da vida nos mais diversos países e continentes, que nos faz pensar sobre como é a vida de quem, muitas vezes com extrema dificuldade, tenta simplesmente levar o seu dia-a-dia para a frente, enfrentando as mais diversas adversidades. Uma realização cativante, com uma dinâmica de câmara que nos leva a mergulhar nos espaços, na multidão, na realidade que se pretende retratar. Um périplo de 80 minutos por um mundo que pensamos conhecer, mas que raramente enfrentamos. Uma partilha de sentimentos, de sensações, de vivências. Women are Heroes é isso mesmo, e heróis são todos os retratados no filme. Women are Heroes Realizador: JR Género: Documentário Os Grandes Acontecimentos da Natureza tem por trás os criadores da série O Planeta Terra, que tanto êxito teve mundo fora. Desta vez, o foco do carismático David Attenborough está na luta pela sobrevivência de diversos animais. A tecnologia, como tem sido hábito nos últimos anos em documentários sobre a vida animal, assume aqui um papel importante, ao possibilitar a captação de imagens até há pouco tempo difíceis de poderem ser visionadas. As transformações que, ao longo do ano, as paisagens vão sofrendo, com a consequente repercussão na fauna, aparecem-nos aqui sob as mais variadas perspetivas. São dois discos, 300 minutos de prazer e muitos episódios vividos pelas mais diversas espécies. A National Geographic tem marcado os documentários sobre a natureza. Mas a BBC, embora com uma produção em termos quantitativos bastante inferior, acostumou-nos, nos últimos anos, a séries de grande qualidade, quase sempre com a presença de Attenborough. Os Grandes Acontecimentos da Natureza Realização/apresentação: David Attenborough Género: Documentário África21– julho 2014 95 Última página A Copa [email protected] João Melo A Copa 2014, que decorre até ao dia 13 de julho no Brasil, está a confirmar uma vez mais – como se tal fosse necessário – que o futebol é o maior fenómeno de massas do planeta. Em que pesem as transformações introduzidas pela profissionalização e pela comercialização crescentes, trata-se de uma grande manifestação lúdica na qual participam, direta ou indiretamente (graças à televisão), milhões de homens, mulheres e crianças em todo o mundo. Nesse sentido, impõe-se um elogio à política da FIFA, que, década após década, está a levar o futebol a regiões onde, até há pouco, o mesmo era pouco conhecido, estimado e praticado. O aumento do equilíbrio competitivo a que se assiste de uma Copa para outra é a melhor demonstração prática do sucesso dessa política. A Copa do Brasil era aguardada, desde o seu anúncio há sete anos, com uma grande expectativa, por uma razão simples: afinal, o maior país sul-americano é conhecido, desde que venceu o seu primeiro campeonato, em 1962, como «o país do futebol». Nação do maior futebolista de todos os tempos (Pelé) e de outros craques que fizeram do futebol uma grande festa, o Brasil é o país que mais títulos mundiais conquistou. No entanto, até este ano, apenas tinha realizado uma Copa. Acresce que o país de Pelé, Garrincha, Didi, Gerson, Carlos Alberto, Jairzinho, Zico, Romário e Ronaldo chegou ao século XXI como uma potência emergente, ultrapassando a Inglaterra no ranking económico mundial. Além disso, o Brasil pode mostrar pela primeira vez resultados palpáveis e impressionantes na sua luta para começar a resolver os crónicos problemas sociais do país, herdados da longa colonização portuguesa e da sua lógica da casa grande e senzala, que se entranhou até ao presente nas elites brasileiras. Com efeito, nos últimos doze anos, quarenta milhões de brasileiros saíram da pobreza e transformaram-se em consumidores, primeiro passo para se converterem numa nova classe média. O sucesso das políticas sociais do país tem uma cara: Lula. Para tristeza, talvez, daqueles que se reveem unicamente no padrão loiro e oxigenado da TV Globo, a cara 96 julho 2014 – África21 do Brasil no exterior é de um preto (Pelé) e um ex-operário mestiço (Lula), sem falar do samba e do Carnaval, dois exemplos da herança africana que ajudou a construir e moldar o Brasil de maneira vincada e irredutível. A alguns meses do início da Copa 2014, uma série de manifestações irrompeu no Brasil, apanhando de surpresa não apenas os observadores externos, mas os próprios brasileiros. A primeira pergunta (e também a mais fácil) era: o que levaria pessoas cuja vida melhorou nitidamente nos últimos doze anos a sair para as ruas manifestando-se contra as autoridades? Na verdade, o impacto das manifestações brasileiras foi tal, que todos se esqueceram, no primeiro momento, que os seres humanos são, por definição, seres insatisfeitos. Ou seja, a cada nova conquista, novos desejos e novas reivindicações são formuladas. Alguns dos manifestantes não resistiram a estabelecer uma ligação entre as suas reivindicações e a Copa 2014. Para eles, por exemplo, os fundos usados nas obras dos estádios poderiam servir para construir escolas, hospitais e outros equipamentos sociais. Ora, como os que possuem verdades prévias e absolutas são imunes ao contraditório, de nada valem, para eles, os esclarecimentos de que o Estado não gastou um real nessas obras (apenas emprestou o dinheiro, que será devolvido com juros) ou os argumentos de que certas obras beneficiarão o país para além da Copa. Apesar dos profetas do mau agoiro, contudo, a Copa 2014 está a ser um sucesso. Isso confirma outra verdade: os seres humanos têm tanta necessidade de entretenimento como de satisfação das suas aspirações políticas, económicas ou sociais, sendo duvidoso que exista qualquer relação hierárquica entre elas. Só os chatos gritam «escolas, sim, futebol, não». Os homens querem as duas coisas. Ao mesmo tempo. Política e entretenimento não são antagónicos