temas livres - Rumo Aventura
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9 TEMAS LIVRES 10 “SURFE NÃO É SÓ ESPORTE, É ESTILO DE VIDA”: POR UMA ETNOGRAFIA DAS PRÁTICAS ESPORTIVAS NA NATUREZA Marília Martins Bandeira Universidade Federal de São Carlos - São Carlos, São Paulo, Brasil E-mail: [email protected] Resumo O objetivo deste trabalho foi compreender como os praticantes de modalidades esportivas se identificam enquanto membros de uma mesma coletividade, ou seja, se há uma identidade cultural no esporte, e no que ela consiste quando se trata de um esporte praticado na natureza, em específico o surfe. Entretanto, onde se esperava encontrar formulações sobre o esporte e a prática competitiva do surfe, surge um novo interesse de pesquisa trazido pelo campo. A idéia de que há esportes que não são só esportes. Estas práticas que dizem seus praticantes serem mais do que físicas e/ou competitivas, ao contrário do que diz a sociologia do esporte, são práticas entendidas por eles não como determinadas por sua classe social ou inseridas num sistema que articula outras práticas e consumos, mas como determinantes de todas as práticas e consumos possíveis ou adequadas para um surfista. Concluiu-se, então, que na formulação dos surfistas, a prática do surfe não é parte de um estilo de vida antes dado, ela vem primeiro, transforma e determina as condições para um estilo de vida próprio ao surfe que é aquele que relaciona natureza, saúde e felicidade. Palavras chave: surfe, estilo de vida e antropologia Introdução O título do presente artigo é uma frase de Jojó de Olivença, surfista profissional há vinte anos, bicampeão brasileiro e integrante da elite do surfe mundial por 5 temporadas, que diz ter sustentado a si e à família com o surfe, desde então, e ter realizado o sonho de um estilo de vida simples, saudável e próximo à natureza. Esta frase é formulação constante não só entre os surfistas, mas presente em matérias, filmes, entre outros materiais, que tem o surfe como tema. Quando me interessei pelos praticantes de surfe, observando surfistas amadores que saíam todas as semanas, nos mais diversos horários, em seus carros cheios de pranchas no teto do estacionamento do departamento no qual cursava a graduação na Universidade de São Paulo, munida de um projeto de 11 iniciação científica1 passei a me juntar a estas rápidas incursões para compreender como vinha a ser a prática de surfe para um paulistano, como se davam a construção de identidades, valores e rotinas necessárias para levá-la a cabo. Depois de um tempo de pesquisa e com algumas questões por resolver imaginei que não haveria metodologia mais adequada do que percorrer a trajetória dos surfistas, ou seja, me transformar numa praticante, para poder acompanhá-los mar à dentro e, assim, diminuir a influência de um olhar distanciado, de quem os vê e os estuda a beira da praia. Iniciativa semelhante, porque inspirada, naquela tomada por Loïc Wacquant (2002) em sua pesquisa sobre o boxe nos subúrbios de Chicago. Esta primeira fase da pesquisa trouxe elementos para pensar o contato com a natureza não só como motivação central de adesão à modalidade, como também relacionado à idéia de saúde e equilíbrio, e a possibilidade de mantêlos com a adoção de um estilo de vida, que é o que o surfe proporciona. Naquela época, eu havia estudado surfistas amadores2 e começava a me perguntar sobre que questões teriam os surfistas profissionais. Então, depois de aprender a surfar, passei a acompanhar o campeonato nacional de surfe, o Super Surf3, presencialmente em sua edição de 2005, observando as rotinas do surfe competitivo e conversando com os competidores.4 1 Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico pelo financiamento desta pesquisa na modalidade Pibic. 2 A primeira fase da pesquisa está apresentada em BANDEIRA, M. M.; Rubio, K. . PERSPECTIVAS CULTURAIS E SOCIAIS DO SURFE. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, no prelo. 3 Agradeço à comissão organizadora do Super Surf 2005, especialmente a Andrea Cortez e Evandro Abreu, por me permitirem acesso irrestrito ao evento, incluindo as áreas destinadas apenas aos atletas. 4 Talvez a compreensão corporal deste tipo de desempenho, o aprimoramento minucioso da destreza para um nível profissional do surfar e o acompanhamento dos surfistas dentro da água, como na primeira etapa da pesquisa, trouxesse novos e relevantes dados para esta discussão, contudo a configuração por baterias, entrada no mar de 2 à 4 surfistas por vez em áreas isoladas por bóias, nas quais a organização do campeonato não permite a entrada de não competidores não permitia que eu os acompanhasse no momento da prática a não ser como todos os espectadores, olhando da areia, às vezes com binóculos e ouvindo o narrador destacar os acontecimentos tidos como mais importantes e a apreciação dos juízes ao microfone. Às vezes entre os competidores de baterias anteriores ou posteriores ouvia 12 Verificar se é possível pensar um sentido para a prática e uma identidade cultural no esporte a partir da experiência do surfista era o intuito da pesquisa. A meu ver, os esportes praticados na natureza passaram a ter cada vez mais apelo na vida social e divulgação na mídia, mas ainda não estavam na agenda da antropologia brasileira. Este diferencial na prática esportiva, o desejo de estar na natureza, configurou-se como interesse principal desta pesquisa. Objetivos O objetivo primeiro deste trabalho foi, então, compreender como os praticantes de modalidades esportivas se identificam como membros de uma mesma coletividade, ou seja, se há uma identidade cultural no esporte, e no que ela consiste quando se trata de um esporte praticado na natureza, em específico o surfe. Entretanto, ao longo do desenvolvimento do projeto, o campo apresentava constantemente a noção de estilo de vida ao invés da idéia de identidade. Apesar do querer “tornar-se surfista” aparecer como algo que se deseja ser, o “como se quer viver” do surfista passou a ser investigado. Métodos Na primeira fase da pesquisa estudei surfistas amadores adultos, moradores de São Paulo, que surfavam em suas folgas, horários livres ou finais de semana, mas manifestavam o desejo de um dia viver para e do surfe. Ou seja, entre outras coisas, morar na praia. Como alternativa alguns deles passaram a trabalhar nas mais variadas funções em revistas ou sites especializados em surfe, outros em confecções ou lojas de surfwear5, outros se arriscaram a abrir pousadas ou restaurantes no litoral, escolinhas de surfe, tornam-se shapers6, outros ainda, emigraram para Austrália e EUA (Califórnia comentários e reações a cada manobra e condição de onda e histórias. Os momentos de treino poderiam ter sido acompanhados mais de perto se eu não tivesse sofrido uma cirurgia de joelho nesta fase da pesquisa. 5 Moda surfe, indústria das marcas de roupas especializadas para surfe ou para o visual do surfista. O modo de vestir dos surfistas é muito peculiar, as roupas devem responder a exigências específicas da prática e do meio, tais como conforto, mobilidade, leveza, resistir ao sol e à água salgada, secar rapidamente, proteger do frio ou se adequar ao calor excessivo. 6 Do inglês to shape, ou dar forma, aquele que confecciona a prancha. 13 ou Havaí) para lavar pratos ou trabalhar como pedreiros, mas estarem próximos as “melhores ondas do planeta”, ou, ao menos, ficando em suas cidades de origem, passaram a trabalhar em algo não relacionado, mas viabilizaram mais e melhores viagens de surfe. Mas percebi durante todo o campo um desejo, um tanto melancólico, de se ter tido talento ou oportunidade para tornar-se surfista profissional, enquanto era tempo. A descoberta do surfe aparece, então, como opção deliberada não apenas por uma prática de lazer, ou de esporte, mas por toda uma maneira de viver que se libera com a primeira experiência. Como caracteriza esse estilo de vida que diz ter o surfista profissional? Que maneira de viver tem o surfista que pôde chegar ao limite de sua intenção de viver para e do surfe? Ou ainda, como um campo pouco explorado como o surfe pode fazer repensar a teoria antropológica para o esporte? Os questionamentos supracitados remetem à dificuldade de estudar o surfe sem um quadro teórico já delineado. Sendo esta pesquisa e o texto que a reporta antes um exercício de aproximação e de entendimento do que um artigo com teses bem definidas7, não encontrei outra maneira, senão realizar uma etnografia e lançar mão de muitos trechos do caderno de campo e transcrição de conversas gravadas para dar demonstrar o que se propõe. Resultados: Você surfa de quê? Uma descrição do campo Para melhor compreensão da passagem de um objetivo de pesquisa a outro, apresentaremos o quadro geral do surfe no Brasil. Tentando me situar no campo percebi que existem distintas maneiras de surfar. O surfe de bodyboard utiliza a menor prancha ligada ao surfista pelo braço e o impulso de pés de pato, nesta modalidade se pega a onda deitado. O de longboard é a modalidade de surfe em pé na qual é usada uma prancha maior, de no mínimo 9 pés, em um estilo lento e elegante de surfar e as manobras são entendidas como clássicas por remeterem as origens havaianas da prática e às primeiras manobras desenvolvidas por surfistas americanos quando da adoção da 7 O desdobramento de pesquisa que apresento neste artigo é uma releitura dos dados à luz de discussões com Daniel Ramos da Fonseca, João Paulo Aprígio de Moreira e Messias Basques, novos colaboradores a quem devo meus agradecimentos. 14 modalidade, pode-se remar deitado ou de joelhos na prancha e a prancha está ligada à panturrilha do surfista. O stand-up é o surfe em que se rema sempre em pé na maior das pranchas com auxílio de um remo e assim se pega a onda. Mais recentemente o tow-in, surfe de ondas gigantes, foi desenvolvido com auxílio do jet ski que reboca o surfista já em pé, e com os pés fixos na prancha por alças, para uma onda tão grande que ele não teria velocidade para pegar “na remada”. O surfe de shortboard ou surfe “de pranchinha” pode ser considerado o mais popular, aquele do qual temos a imagem mais nítida. Com uma prancha que tem mais ou menos a sua altura, conectada ao tornozelo, o surfista rema deitado e desce a onda de pé. Pelo tamanho do equipamento, em relação ao longboard, ele adquire mais velocidade e mobilidade na parede da onda e assim maior variabilidade de manobras entendidas como mais radicais. O windsurf utiliza o vento por meio de uma vela para promover o deslocamento do surfista que, sempre de pé, a manipula, assim, ele pode ir além das ondas em mar aberto, velejar. E no kitesurf se utiliza uma pipa para promover o deslocamento do surfista que, com os pés fixos na prancha, pode realizar grandes saltos e pequenos vôos acrobáticos. Há quem diga que o elemento central nas duas últimas modalidades não são as ondas, mas o vento. E que, portanto, seriam alternativas de prática para dias sem onda, assim como o skate, o “surfe de asfalto”. Diante deste grande número de possibilidades do surfar, surgiu inicialmente a idéia de optar por uma única modalidade para delimitar o campo de pesquisa. Contudo, notou-se o trânsito de surfistas de uma modalidade à outra. E o constante interesse dos surfistas por tudo que se assemelhe e se relacione ao surfe. Outro exemplo não citado acima é o snowboard, que vem sendo apelidado de surfe de montanha, ou surfe na neve, e cada vez mais procurado pelos surfistas de mar, principalmente os que vivem uma oposição rigorosa verão/inverno. Os surfistas que fizeram parte do campo de pesquisa para este trabalho foram, então, surfistas profissionais, acompanhados no circuito nacional de surfe competitivo do ano de 2005. Dos cento e quatro inscritos com quem convivi, obtive conversas formais registradas por gravador com sete mulheres e dezessete homens. Embora estes surfistas competissem de pranchinha, vários 15 deles relataram praticar outras das suas modalidades, seja por divertimento, variação para aprimoramento do treinamento, ou para buscar novos e maiores desafios e prêmios, como é o caso do tow-in. O excerto abaixo ilustra esta idéia: Pra mim o surfista completo tem que ter radicalidade, graça, estilo, e também pegar onda grande. (Fabio Nunes) O Super Surf, como é chamado, é realizado pela Associação Brasileira de Surf Profissional (ABRASP). No ano de 2005 o campeonato foi realizado em cinco etapas das quais a primeira e segunda foram acompanhadas para este trabalho. A primeira etapa aconteceu na Praia do Rosa, Imbituba (SC) em abril, a segunda em Maresias, São Sebastião (SP) em junho, a terceira em Itaúna, Saquarema (RJ) em julho, a quarta na Costa do Sauípe (BA) em setembro e a quinta e última em Itamambuca, Ubatuba (SP) em outubro. No total de etapas participaram do campeonato 80 surfistas homens e 24 mulheres. O campeonato teve transmissão ao vivo pelo canal a cabo Sportv, com patrocínio da Editora Abril, Volkswagen, TIM e Sandálias Havaianas. Cada etapa dura em média quatro dias e é agendada de acordo com boletim meteorológico e previsão de ondas. Entretanto, com a antecedência a probabilidade de erro é grande e como a competição depende de condições de ondulação e vento favoráveis a performance dos surfistas, seu início pode ser adiado em vários dias ou pode ser transferido para outra praia próxima, até que se julgue satisfatório o quadro para o desempenho dos atletas. Durante todos os dias da etapa os atletas vêm e vão de seus hotéis e pousadas de acordo com o horário da sua bateria e se querem assistir a um amigo ou a um possível adversário. Normalmente em horários de não competição eles surfam em outros pontos da praia que não o do campeonato ou saem em busca de outras praias. A arena do campeonato é composta pelo palanque dos juízes, que normalmente é bastante alto e imediatamente à frente da área de competição marcada por bóias, onde o narrador e o dj também se posicionam, sala da assessoria de imprensa, tenda para os competidores - com massagistas, frutas e sanduíches naturais, mesas e cadeiras para assistir ao campeonato e local para descanso -, tendas dos patrocinadores com produtos promocionais e 16 materiais de divulgação, banheiros químicos, pódium ou pequeno palco para a premiação e muito freqüentemente alguma atração temporária como uma pista de skate, por exemplo, para demonstração de atletas convidados e uso da população local e espectadores. Na areia se misturam esportistas, imprensa e público que pode ou não estar identificado por pulseiras de cores diferentes que determinam seu acesso a certas partes da arena. Festas normalmente são oferecidas ao final da tarde na própria arena ou no encerramento do campeonato em um célebre estabelecimento local. O público disputa ingressos para estes eventos durante toda a etapa, quando os mesmos são distribuídos. A música é uma constante. Sempre que não há narração, há música nos alto falantes. O estímulo sonoro é muito importante para a competição. A música indica intervalo ou momento da bateria em que não se está pegando ondas. Um forte apito sinaliza a permissão para entrada no mar, em seguida um duplo apito indica o início da contagem regressiva dos minutos de duração da bateria8 e a permissão para pegar a primeira onda, um terceiro apito, duplo, indica os minutos finais da bateria, e um último apito o término da bateria e a impossibilidade de se pegar uma onda que contabilize para a pontuação do surfista. Os surfistas que compõem a bateria, durante a bateria anterior à sua, retiram com a organização do campeonato lycras9 coloridas, as vestem e se preparam na areia realizando alongamentos, aquecimentos e/ou observando as ondas. Eles são identificados pelos juízes pela cor de sua camiseta (normalmente verde, vermelha, preta, branca, amarela e azul) para a pontuação. Discussão: problemas que o surfe coloca às discussões teóricas Onde se esperava encontrar formulações sobre o esporte e a prática competitiva do surfe, surge um novo interesse de pesquisa trazido pelo campo. A idéia de que há esportes que não são só esportes. Estas práticas que dizem seus praticantes serem mais do que físicas e/ou competitivas, ao contrário do 8 9 Habitualmente dura 20 minutos. Camiseta justa utilizada para surfar por proteger o tronco do atleta tanto do sol como das escoriações da parafina. 17 que diz a sociologia do esporte, são práticas entendidas por eles não como determinadas por sua classe social, ou inseridas num sistema que articula outras práticas e consumos, mas como determinantes de todas essas outras práticas e consumos, possíveis ou adequadas para um surfista. Ou seja, na formulação dos surfistas, a prática do surfe não é parte de um estilo de vida antes dado, ela vem primeiro e determina as condições para um estilo de vida próprio ao surfe. O surfe transforma. O surfe na minha vida é como uma dança, fluindo, leveza em cima das ondas, sensação indescritível. O surfista é uma pessoa muito zen, por mais que ele possa se mostrar hardcore e tal, aquela coisa de rock, cheio de corrente, piercing e tatuagem ele tem um lado zen que só quem tá com a natureza direto que sabe como é gostoso o esporte que a gente pratica, e como é abençoado. Então, o surfista tem esse contato com a natureza que o transforma numa pessoa zen. (Andrea Lopez) Parece, então, que é o interesse pelos valores que o surfe põe em circulação, mas mais que isso, o gosto pela experiência corporal do surfe, que levam à busca por seu estilo de vida. Não seria uma predisposição a estes valores que encaixa a prática do surfe em um conjunto de outras que com ele combinam. É o surfe que abre a possibilidade para um estilo de vida totalmente temático. Pra mim o surfe é tudo, corre água salgada na minha veia. Tudo na minha vida gira em torno do surfe, tudo o que eu penso gira em torno do surfe, é dele que eu tiro o meu sustento, é nele que eu penso em trabalhar quando eu parar de competir... (Dunga Neto) O surfe ocupa muito espaço na minha vida, eu tive até que parar de estudar porque eu viajo demais... O surfe é minha vida, meu trabalho, meu sustento, é sobre o que eu falo com a minha esposa, é minha vida praticamente, eu faço tudo em função do surfe, né cara. (Alex Godoy) Por exemplo, é o desejo de surfar (e a percepção de um dito talento) que faz um jovem pobre do sertão de Pernambuco vender uma televisão para pagar a inscrição de um campeonato ou que o traz para uma república10 à 10 Repúblicas são residências - casas ou apartamentos - em que os moradores, sobretudo jovens, reúnem-se para diminuir os custos de acomodação, e ao mesmo tempo, constituir um círculo de afinidade. 18 beira-mar no Rio de Janeiro ou uma surfhouse11 no litoral norte de São Paulo e conseqüentemente o leva a conhecer o mundo. Ou então, é o surfe que faz com que um herdeiro abdique de dar continuidade aos negócios da família, ou um diplomado abra mão da carreira para viver modestamente, em algum ponto de surfe paradisíaco, seja uma cabana no northshore do Havaí na década de 60, ou uma pequena pousada na Bahia ou em Santa Catarina atualmente12. Nos dois casos o surfe é entendido como operador da felicidade e do que se quer para si na/da vida. Como toda pessoa precisa se alimentar eu preciso surfar, sou administrador de empresas, mas a minha formatura virou um titulo só pra prestar contas a sociedade. (Dunga Neto) Eu poderia estar ganhando milhões num escritório, mas eu prefiro estar ganhando o que eu ganho só pra viver esse momento do surfe que é muito importante. (Alex Godoy) Temos, então, que “a própria técnica corporal extrapola suas fronteiras de uso e vai moldar outros aspectos da vida social de seus praticantes” (BANDEIRA e RUBIO, no prelo, p. 28). O surfe, então, promove mudança, o surfista se adéqua às suas exigências, mas também se realiza com o que sua prática proporciona. A gente passa muita dificuldade, não tem muito patrocínio, morar fora de casa, longe da família, mas ao mesmo tempo é um privilégio muito grande, sensação gostosa, paz, harmonia com deus, porque deus fala pelas ondas, a voz dele vem pelo mar, a gente tem um grande prazer e uma grande satisfação que não tem como falar porque você tem que saber o momento de ler uma onda, de dar uma batida, de estar dentro de um tubo, a sensação de estar dentro de um tubo, nenhum milionário, nem nada pagaria. Viver do surfe é isso, saber lidar com o público e consigo mesmo, amar uma prancha e dar valor 11 Casa oferecida pelo patrocinador aos surfistas de sua equipe, similar a um centro de treinamento, é localizada em praias com boas condições para o surfe ou em locais específicos onde acontecem temporadas de competição ou peculiares condições para a fabricação de imagens excepcionais. Isto possibilita o treinamento diário e convívio entre atletas com diferentes experiências, às vezes acompanhados por equipe técnica, às vezes acompanhados por equipe de produção responsável pelas fotografias e filmes promocionais em que o atleta patrocinado exibe seu melhor desempenho utilizando os equipamentos e roupas da(s) marca(s) que o sustenta. 12 A trajetória de Mark Lund, apresentada na segunda parte deste artigo, exemplifica esta formulação. 19 a ela, porque ela vai te trazer coisas que você nem imagina: da volta 13 ao mundo ao prazer de dropar uma onda. (Flavio Costa) Surfe é um esporte muito ingrato porque se lida muito com o fator sorte, porque você tem vinte minutos pra pegar duas ondas boas que nem sempre aparecem. Mas eu sou muito feliz mesmo com essa ingratidão eu só mudaria uma coisa, começar a surfar mais cedo ainda. (Dunga Neto) É claro que esta mudança de vida, percepção das dificuldades e simultânea satisfação pessoal com o esporte não é novidade para atletas de alto rendimento, o encontramos entre praticantes das mais diversas modalidades14. Contudo, esta questão aparece com certas peculiaridades na fala e no cotidiano dos surfistas porque eles mesmos se preocupam em se diferenciar dos praticantes de outras modalidades esportivas, tidas como convencionais ou tradicionais. Surfistas são atletas que se preocupam não só com o bem do esporte, mas com todo um estilo de vida saudável que é o que eles tem. O surfe é das coisas mais importantes da minha vida, profissão e hobbie. (Andrea Lopez) É freqüente encontrar surfistas que reivindicam para a prática o estatuto de esporte. Muitos dos que ainda competem trabalharam no projeto de profissionalização do surfe no Brasil e trazem em suas falas a importância desta etapa da história da modalidade para sua configuração atual e para viabilizar uma carreira ao praticante talentoso, isto é, permitir que se viva exclusivamente de surfe, que é a aspiração de todo surfista. Entretanto, simultaneamente a este discurso encontramos outro que aproxima o surfe de uma prática artística, diferente do que se conhece como esporte, ela se pretende mais livre e mais expressiva. Aí entra aquela questão de arte e etc. O surfista é uma pessoa extremamente sensível. Mais sensível do que a média. Mais sensível do que o jogador de basquete. Quem é o surfista? O surfista é essa pessoa sensível, na minha opinião, ele é um artista nato que escolheu o surfe como seu meio, sua maneira de expressão. Ele poderia ter escolhido tela, fotografia, pintura, música, etc. Por algum motivo ele é o artista com um elemento físico um pouco mais carregado, então, ele precisa da expressão artística através do físico. Talvez, mais ou menos como um bailarino, né? Ele não se satisfaz só 13 14 Do inglês to drop, mesmo que descer, correr, pegar uma onda. Jogadores de futebol em Rial (2006) e brasileiros na NBA em Palmiéri (2009). 20 sentado em frente a um quadro pintando. Apesar, que você pode pegar muitos dos surfistas, como eu falei, tem hobbies de pintura essas outras coisas assim, mas a relação dele com a arte é alguma coisa mais física. Então eu acho que ele é um artista que nasceu desse jeito, se ele não fosse ser surfista ele seria um pintor ou músico, ou arquiteto, alguém que iria trabalhar com o lado direito do cérebro mais que o lado esquerdo. Ah! Por isso que o pessoal tira sarro que ele não sabe falar. Porque? Porque ele não opera com esse lado do cérebro! Aliás, eu acho que um grande crime foi feito em classificar surfista como esportista, porque você põe ele junto com esse painel de atletas olímpicas com os valores olímpicos, etc; e ele destoa, ele é o patinho feio da história. Você tira ele, o patinho feio, daquele cenário, e põe ele junto com o Van Gogh, Matisse, Picasso, ele se encaixa perfeitamente. Porque? Porque ele não é um atleta, ele tá do outro lado da cerca. E a injustiça é classificar ele como atleta. Nisso se dá o engano, classificar ele como atleta. (Mark Lund) No período desta pesquisa aconteceram as primeiras edições da Mostra Internacional de Arte e Cultura Surf realizado pela revista Alma Surf em São Paulo. Mais tarde o evento passou a ser itinerante, e a se chamar Festivalma em 200915. Participar deste evento, primeiro na Bienal do Ibirapuera, depois no Museu da Imagem e do Som e anualmente em suas edições subseqüentes até a Oca e de volta à Bienal me permitiu compreender a dimensão do que queria dizer Mark Lund com o trecho acima. Fossem surfistas anônimos ou profissionais com os quais eu já havia conversado, conheci nestas ocasiões, surfistas-escritores, surfistas-músicos, surfistas-pintores, surfistas-fotógrafos, surfistas-escultores, surfistas-produtores de cinema. E digo surfistas-algo porque sua arte é posterior e inspirada no surfe. Suas obras sempre temáticas configuraram, se não se pode chamar “escolas”, estilos, correntes, cada um em sua forma de arte, como a surfmusic16, por exemplo. Isto reforça a idéia que eles têm de que tudo passa a se dar em torno e por causa do surfe. Surfe é arte. Arte é surfe. E a arte de surfar e de viver se confundem. O surfe fez eu ser um cara mais calmo, talvez mais reflexivo, talvez mais sentimental, vamos dizer assim, né, devido a esse contato intenso com a natureza. O surfe é tudo pra mim, tudo que eu fiz e tudo que eu devo fazer por um bom tempo. Talvez a única coisa com a qual eu pudesse comparar o surfe seria a música. Porque ambos 15 Nesta edição houve um desdobramento em: Festival Osklen de Cinema, Mostra Nixon de Arte e Cultura, Festival Billabong de Música e Salão Internacional do Surf. Proposta e programação do evento podem ser acessadas em: <http://www.festivalma.com.br> 16 Estilo subdividido em surf rock como dos The Beach Boys e, mais atualmente, Ben Harper; e surf pop como o de Jack Johnson e Donavon Frankenreiter e no Brasil, Armandinho. 21 são formas de expressão onde a gente acaba passando a nossa verdadeira personalidade, e mesmo que tentasse tampar alguma coisa não conseguiria. O surfista jamais consegue tampar o estilo que ele tem. (Teco Padaratz) Além da considerada “plasticidade” da modalidade e beleza do cenário natural que inspira obras de arte, outra característica apontada como diferencial pelos surfistas é a convivência entre ídolos e admiradores, entre diferentes gerações, não importa se você surfa a 2 meses ou a 15 anos, o surfe é um esporte que tem muita magia porque ele une profissionais e amadores dentro d’água, é muito fácil você treinar do lado do seu ídolo, isso em outros esportes é difícil acontecer; ele une gerações... e o cuidado com a prancha; fora a beleza do surfe em geral que é. (Andréa Lopez) E o compartilhar de sensações de intensidade semelhante por praticantes em diferentes fases da trajetória do surfista, que descreve Andrea Lopez, reaparece freqüentemente em sua fala como um dos diferenciais do esporte, no excerto abaixo ela está relacionada à busca da onda perfeita que é outro fator a ser considerado. A onda perfeita é muita felicidade, satisfação pessoal muito grande quando tu sai da onda e quebrou, quando tu pegou um tubo irado, mesmo pra gente que é surfista profissional é muito raro, então é muita felicidade mesmo, isso é legal do surfe, deve ser a mesma sensação que um surfista que tá aprendendo. Talvez quando ele 17 consegue botar no corte e dar uma batidinha , a gente vai sentir a mesma coisa apesar de estar em níveis completamente diferentes de performance mas a satisfação interna da gente vai ser igual. (Marcelo Trekinho) Além do não isolamento e não diferenciação por categorias muito segmentadas existem outros aspectos que, para os praticantes, diferenciam o surfe de outras modalidades esportivas: É um esporte diferente de todos os outros esportes, se você vai pro futebol, você depende só de você, é uma bola, vai pra um lado, vai pro outro, no vôlei de praia também, então no surfe, ao meu ver, você depende do fator sorte. Se você tá ali na bateria e se não entrar onda 17 Manobra entendida como de nível primário, normalmente a primeira que se aprende. 22 pra ti, não adianta nada tu estar bem posicionado, bem condicionado, então é um esporte bem distinto de qualquer outro. (Dunga Neto) Outra característica que diferencia o surfista é o contato com a natureza. Ela vem articulada a outra constante em campo, a preocupação em legitimar a prática. O que é visto como vagabundagem e alienação por parte dos não surfistas, pode ser um modo de viver que, não é apenas avaliado como mais legal pelos surfistas, mas tem relação com um problema que não só está em voga, como é uma urgência real para eles, a crise ecológica planetária: O surfista é aquele que desliza em uma onda, que luta pela preservação do mar, que tem conscientização de preservar a natureza e que respeita os outros. (Pedro Muller) O surfista é um cara que representa a sociedade lá na rebentação, no mar, ele é o cara que pesquisa, estuda a filosofia das ondas, vamos dizer assim, como quebram as ondas, como se movimenta o mar e o poder físico e espiritual que ele tem sobre a gente. O surfista é esse cara como representante da sociedade. E ele é um cara que quer ser ouvido e compreendido. A ideologia do surfista é ter que aprender a ter um respeito à natureza, e é um respeito cúmplice, que poucas pessoas tem. Ele consegue tirar usufruto da natureza sem causar dano nenhum. Ele escorrega sobre as ondas. E isso faz ele descobrir uma maneira em que a natureza traz pra ele explicitamente felicidade e satisfação. E, talvez, ele seja mal compreendido porque ele não tenha palavras pra comunicar isso pras pessoas, entendeu? Ele não consegue arranjar um maneira de explicar o quanto é bom surfar. E daí ele é tido como um alienado. Talvez as pessoas não consigam compreender ele justamente por ele não conseguir explicar o quanto é maneira a vida que a gente leva. Mas, todo mundo no fundo, no fundo gostaria de saber como é a vida do surfista porque ele tá sempre sorrindo, sempre sarado, sempre a fim de pegar onda, sempre tá feliz. O que a gente quer é mostrar pras pessoas que o surfe não é uma pejoração, o surfe é um esporte muito sério, você tem que aprender a ter uma convivência muito, muito intensa com a natureza, e se você não tem isso normalmente você se dá mal, e talvez falar pras pessoas aprenderem a ter o mesmo respeito pela natureza que a gente tem, eu sei que é um caminho difícil e tudo mais, mas é instintivo, é isso o que o surfista sempre quer passar, a vontade de estar livre no mar pegando onda, e pra isso ele sabe que ele tem que preservar a praia, preservar as ondas, preservar a natureza. Até por uma questão espiritual... (Teco Padaratz) É no contato com a natureza, mas não somente, que consiste o argumento de que o surfe não é só esporte. Ele é essa fina sintonia com o oceano, que é promotora de felicidade e que por isso engendra todo um estilo de vida que a viabilize para que o surfista possa se manter feliz. Competir é uma necessidade, ou uma preferência, mas não primeira ou única motivação do surfista. 23 O surfista é aquele cara que ama o que tá fazendo, que ama tá dentro d’água, sabe? Eu sou surfista profissional, que faz o que gosta, que ama surfar e que via no surfe uma forma de trabalhar e de viver e construir minha vida. O surfista é o cara que independente de tá competindo ou não... não é aquele cara que tá fazendo uma coisa só pra mostrar que sabe fazer, sabe? É quem gosta de estar ali, quem gosta de sentir a água, de surfar a onda de sentir essa energia da onda. Eu acho que um cara que compete e tal, e é só competitivo e tudo, não deixa de ser surfista, só que pra mim o surfe mesmo é essa gozação, essa gozação de você querer surfar na onda, andar na onda, sensação que só quem surfa vai sentir e vai saber. (Pedro Henrique) Tem muitos surfistas locais que botam a gente pra fora, e isso pra mim não é ser surfista, é ser um cara fechado pro mundo. Ser surfista é você poder fazer amizades, é estar com a galera que você gosta, esse é o fim do surfe, é isso que faz o cara ser surfista, não o cara ser campeão mundial, isso não é, mas o que ele tem dentro dele é mais importante. (Alex Godoy) A comunhão com a natureza, com a magia das ondas, a preferência por destinos inóspitos, a simplicidade nas viagens, a felicidade encontrada no tubo, a saga não só pelo título mundial, mas pela onda perfeita, esta é a diferença, que o surfista aponta ter para com outros esportistas. O surfista são dois tipos, o que fala que é surfista e o surfista profissional que vive de surfe. Em comum eles tem a vontade de surfar uma onda boa seja numa sessão de free surf ou numa bateria. (Ricardo pereira) Apesar de que todos os competidores que você está entrevistando, etc. É toda uma parte competitiva do surfe que evoluiu também, mas isso pra viabilizar o surfe. Mas, como a gente tava falando antes, quem dá, quem autentica o surf, são os loc, não são os competidores, são os caras meio exóticos, meio fora, não conformistas. Então um dos meus ídolos, apesar que ele luta com essa coisa da sobrevivência financeira, é o Tom Curren. Ele pra mim era o soul surfer mais puro que passou pelo circuito mundial. E não é que ele foi ser um campeão do mundo, ele e os campeonatos cruzaram caminhos em uma determinada época e ele acabou sendo campeão mundial, mas o circuito foi pra lá, ele foi pra cá e... e se separaram. Então, acho que isso descreve mais ou menos o que é o surfista. Uma vez perguntaram pra um californiano chamado Mickey Muños, quem é o melhor surfista e ele deu uma das respostas mais cultuadas. E essa resposta ajuda a gente a balizar essa questão de competição e etc. Ele falou: - É aquele que tá se divertindo mais na água, esse é o melhor surfista! (Mark Lund) Não há saúde sem contato com a natureza, mas não há contato com a natureza possível se não se estiver saudável. Não há magia, ou sorte, sem contato com a natureza e a magia está relacionada à espontaneidade, a se manter na mesma vibração que a natureza, que a onda. Se não houver magia, não há possibilidade de vitória, então a primeira motivação do surfe deve ser o 24 exercício mágico de união com o oceano e não o título do campeonato. Mas vencer um campeonato é oportunidade de viver exclusivamente para o surfe. Embora, viver o mais intensamente possível o surfe seja ser surfista de alma, que é aquele que transforma uma habilidade, mágica ou técnica, de estar em sincronia com a entidade natural onda, em uma expressão artística de si, que não só no mar, mas na vida. O surfista é um amante da natureza, ecologista nato, é um cara que tem um estilo de vida bem diferente, quase como se fosse uma tribo, tem os seus costumes, os seus hábitos, sua maneira de viver bem própria, é um cara que geralmente sabe aproveitar a vida, sabe curtir a vida, e encontrou aí no surfe um estilo de vida, uma filosofia de vida: desfrutar o máximo da natureza, viver uma vida bem equilibrada, procurar contornar o stress da vida com a calma a paciência, procurar viver um estilo de vida o mais natural possível. (Jojó de Olivença) A felicidade não é possível para o surfista se não por meio de uma arte do viver, que é o surfe. E como todo artista o surfista reivindica um estilo. Que, então, não poderia ser apenas o de surfar, mas o de viver. Natureza, saúde, magia e arte conjugadas no surfe, através de um conhecimento de si, ganho pelas provações postas pelo mar; e do mundo, ganho com as viagens, levam o surfista a ter uma vida feliz. O surfe tem muito a ver com o que eu sempre quis fazer, que é viajar, não estar parado num lugar só, mas sempre estar com outras pessoas, outras culturas, então, o surfe pra mim é uma maneira de viver, assim é meu estilo de vida, entendeu? Acho que se eu não tivesse o surfe eu seria hippie ou alguma parada assim. Porque eu não gosto de ficar parado no mesmo lugar por muito tempo, entendeu? E o surfe me leva a outro lado, né cara, que é o lado esportivo, é o lado de você estar sempre se mantendo fisicamente bem, e a competição pra mim é o desfio, é o desafio de você estar ali bateria a bateria em disputa, é você superar a si mesmo, né, isso pra mim é muito importante. Enquanto eu tiver vida eu vou ser surfista, mesmo que eu estiver velhinho, assim se eu puder carregar a prancha eu vou querer entrar no mar, por causa dessa superação diária, né cara, você pegar uma onda diferente da outra a cada dia, acho que é essa a busca, o surfe nunca é igual todos os dias, né? Cada onda é diferente da outra, então acho que você superar esse limite de pegar uma onda diferente a cada dia é o que nos leva a ter esse feeling de acordar as 5, 6 horas da manhã no frio e falar, não, hoje o mar tá alucinante eu vou lá, na chuva, mó tempestade, eu acho que é isso cara... (Alex Godoy) O surfe é um estilo de vida: ficar viajando, conhecendo novas pessoas, fazendo novas amizades, a parte chata desse estilo de vida é ficar sem a família. (Adilton Mariano) 25 O trecho abaixo, nos convida a pensar em mais uma formulação muito presente na reflexão dos surfistas sobre sua prática, e que por isso, também é uma peculiaridade da experiência do surfista. A idéia de estilo de vida como maneira de viver que inclui formas de alimentar-se, relacionar-se, vestir-se e habitar está clara até agora, mas há também a idéia muito viva da uma impossibilidade de livrar-se do surfe. Uma vez encantado por ele, não há forma de viver sem ele. Quando eu penso em um dia feliz eu me penso surfando, me alimentando bem, dormindo bem, estando do lado das pessoas que eu amo. Eu já fiquei várias vezes bons tempos machucada e tive que me afastar do esporte do contato com a água, e eu descobri que é tão importante quanto as outras coisas que eu amo, me impedirem de surfar é como me impedir de respirar. O surfista é um eterno fissurado... (Andrea Lopez) Dá vontade de viajar pra pegar onda boa, fissura de pegar onda, acordar cedo pra pegar a melhor hora do mar, abandonar tudo, fazer viagens sem nada, só pra pegar onda. Surfe é uma paixão, desde que eu comecei eu surfo todo dia, o surfe virou parte da minha vida completamente, eu não acordo e deixo de ver o mar, por exemplo. Sempre que eu acordo, independente de onde eu tô eu quero saber como estão as ondas, virou meio que uma obsessão, mas uma obsessão saudável que me faz dormir cedo, me alimentar bem, virou um negócio bom pra mim, virou um estilo de vida mesmo, o jeito que eu gosto de viver é sendo surfista. (Marcelo Trekinho) Fissura, vício, obsessão, sempre com conotação positiva, são os termos que vêm explicar a motivação para uma constante busca, que eles verbalizam como a procura pela onda perfeita e impossibilidade de deixar o surfe. Esta busca sempre viva é o que confere valor às viagens, ao conhecimento de novos mares e “culturas”, e a necessidade de manter esse estilo de vida faz com que eles se descrevam freqüentemente como parte de uma tribo e não só isso, como nômades. Buscando termos que expliquem seu comportamento eles nos permitem notar que o encantamento que o surfe exerce sobre o surfista também instiga a ele próprio. O surfe é uma parada super saudável, saudável ao extremo. Uma válvula de escape pra certas pessoas, tipo um médico quando ele começa a pegar onda, ele não consegue parar, mesmo que ele não aprenda tudo, só surfar de lado já tá bom, é uma terapia pra certas pessoas, e mesmo que você começa a pegar onda você é contaminado por uma coisa que é aquele amor a primeira vista, você vai levar isso pro resto da sua vida, assim, uma coisa individual, um dia você tá cabisbaixo e você vai e você pega [a onda], e o surfe te dá essa alegria, tem uma magia no mar. Tem esse êxtase total 26 máximo do surfe, você faz uma manobra assim e fica contaminado, contagiado por aquilo ali, extasiado pelo surfe... (Fábio Nunes) O surfe pra mim é tudo, porque é profissão, lazer e terapia ao mesmo tempo. Pegar uma onda perfeita talvez seja dos maiores prazeres que a gente consegue experimentar na vida, conseguir pegar um tubo é uma sensação indescritível, talvez uma das melhores sensações que você possa ter na terra. (Pedro Muller) Da Magia à Fisiologia do surfe Acompanhando o Super Surf e conversando com atletas, organizadores e ex-atletas, muitas vezes, nomes de pessoas que poderiam esclarecer algo que acreditaram não ter podido responder me foram sugeridos. Quando os surfistas remetiam à história do surfe no Brasil para explicar como algo veio a ser, freqüentemente aconselhavam-me a procurar os responsáveis pela Revista Brasil Surf (1975-1979), a primeira do gênero no país. Não é demais lembrar que sempre que falamos em responsáveis por um veículo de comunicação ou qualquer outro empreendimento especializado desta época, falamos em surfistas de fato, e surfistas tidos como importantes para o país, neste caso, porque pioneiros. Conversei, então, com Fedoca, fotógrafo da revista, que iluminou diversos pontos sobre o princípio do surfe no Brasil e principalmente seu desenvolvimento no Rio de Janeiro, o que me permitiu entender muito da experiência atual do surfe brasileiro, principalmente a terminologia utilizada pelos surfistas. Outro nome que me foi sugerido foi o de Mark Lund, como alguém que poderia elaborar uma resposta um pouco mais longa que inexplicável ou indescritível sobre o que é o surfe. Mark Lund nasceu nos EUA e chegou ao Brasil com 11 anos em 1965. A adaptação inicialmente difícil passou à paixão pelo país e suas praias, segundo ele mesmo, dois anos depois, quando foi convidado a surfar no Guarujá. A identificação instantânea com a modalidade levou-o a freqüentar a cidade litorânea todos os finais de semana. Como era menor de idade, ia de carona e ficava hospedado na casa de amigos de seus pais. Com o tempo pequenas incursões, em carros de amigos, passaram a acontecer na direção norte do litoral, até então inexplorado. “The endless Summer18, tocou no ponto 18 Documentário de 1966 do pioneiro no gênero filmes de surfe Bruce Brown. 27 fundamental do surfe que é a busca da onda perfeita e estimulou a exploração do litoral norte de São Paulo”. Nesta época ainda não haviam estradas e se viajava pela areia da praia, onde também se dormia acampado. Então, era preciso revezar quem dormia e quem vigiava por que parte da areia passariam os ônibus que realizavam o transporte intermunicipal daquela região, para evitar acidentes. Para Lund, o Guarujá da época era high society e os surfistas eram, pelo seu jeito de ser, os rebeldes da contracultura. As pranchas pesadas sem cordinha19 que vez ou outra batiam nos banhistas, os Beatles com os cabelos compridos influenciando a aparência dos surfistas e o prazer como motivação primeira do surfista contrastando com a ideologia da necessidade de trabalho para dignificar o homem, levaram o surfe a ser proibido nas praias da cidade, o que intensificou a familiarização com o litoral norte, na busca por ondas perfeitas e praias vazias. Em 1970 Mark Lund chega à Maresias, onde, em 1996 ele abriria o Legends, lanchonete e museu de surfe, pelo qual é conhecido. Depois de cursar faculdade nos EUA e ter entrado no mercado formal de trabalho, aos 33 anos ele acredita ter chegado a hora de arriscar tudo e apostar na sua saúde e felicidade. Passa então a vender na praia a mousse que fazia em seu apartamento em São Paulo depois do expediente. Pede demissão, vende o apartamento e abre a doceria Le Moussier em um galpão de Boiçucanga. Nove anos depois surge o desejo de “fazer algo compatível com o espírito surfe da praia” de Maresias, de “construir algo para preservar os nomes da primeira geração do surfe brasileiro e que serviria como referência histórica para gerações posteriores”. O Legends se torna, então, um restaurante, mas museu do surfe que expõe o “o orgulho pelo esporte e pela arte que é o surfe brasileiro”. Para alimentá-lo Mark Lund passa a fazer viagens, no mínimo anuais, em busca de artefatos e contatos com grandes nomes do surfe mundial, sejam eles competidores ou soul surfers20, e como 19 Ou leash, equipamento de segurança que mantém a prancha conectada ao tornozelo do surfista. 20 Existem diversas classificações possíveis para um surfista. O “cara que pega onda” é o também conhecido surfista amador; o surfista profissional pode ser de dois tipos: o competidor, que concorre a premiações de campeonatos, além de seus patrocínios ou o free surfer, que recebe salário de patrocinadores pelos direitos concedidos de sua imagem realizada em sessões de surfe chamadas livres, em oposição às baterias, que são as sessões de surfe competitivo. E existe também o soul surfer, surfista de alma. Este é o surfista que sendo 28 diz, ele passa a estudar e refletir mais detidamente sobre o porque do surfe exercer tal fascínio sobre seus praticantes. Que que é o surf? Isso é o que é o amor, é uma coisa muito, muito ampla. Eu sempre respondi com um termo, que é inefável. Inefável é o termo utilizado pelos místicos quando eles tentam descrever como foi o transe que você acabou de ter, o episódio místico que você acabou de ter, essa revelação. Essa meditação tão profunda. E todos eles falam que não adianta tentar por em palavras porque é inefável [...] Agora já analisei, já pensei e acho que é uma série de coisas, uma delas sendo a imersão na água salgada, você tem o que chamamos de salmora. Quando você tem um tornozelo torcido, alguma coisa, você põe um salmora, você tem uma infecção você põe um salmora. E o que é aquilo? Aquilo é a água salgada. O surfista passa quatro, cinco horas dentro da água salgada. Que que a água salgada faz? Que que é o salmora? Salmora é uma característica de sal que é cloreto de sódio que tem a tendência de puxar a infecção, essas coisas, quer dizer, um químico ia poder te explicar melhor, mas ele chupa o mal, vamos supor. Então, você entrando no mar, você já está num ambiente terapêutico. A própria água salgada tem essa característica do sal e até acho que é por isso que na bíblia Jesus fala: - “Vocês são o sal da terra”. Porque a sua função é perdoar os pecados dos outros, até a doença dele você tem que puxar pra você. Você vai agir como o sal age. Então se você sai de São Paulo todo estressado, você entra na água salgada e você tem todo esse elemento terapêutico que por osmoses vai neutralizar a tua energia. Se você tem muita energia Yang, você está desequilibrado energeticamente, você vai entrar num corpo, muito maior do que o teu, e por osmose ele vai dar uma neutralizada energética, você vai entrar na sintonia energética do mar. Antes de pegar qualquer onda ele já se sente bem por ali. Os gregos e os romanos usavam esse mesmo conceito, você tem, os gregos chamavam de talassoterapia, talasso significa oceano em grego e os romanos pegaram dos gregos esse conceito e fizeram em Roma os famosos banhos romanos que era água salgada trazida do mar mediterrâneo pra cidade de Roma. Acho que esse é um elemento fundamental, o mergulhador vai te falar a mesma coisa, o cara que nada muito no mar vai te falar a mesma coisa, isso não é uma coisa exclusiva do surf. (Mark Lund) A água do mar cura o surfista. E mais, a falta da água do mar o faz adoecer. Mas, a terapêutica das águas não é a única explicação para a necessidade de manter-se surfando. Há também a terapêutica da alteração na percepção espaço-temporal. Desligar-se, esquecer de tudo, voltar à tranqüilidade, é forma de manter o equilíbrio. De manter-se são e feliz. profissional ou amador leva ao extremo o estilo de vida surfe e valores tais como espontaneidade, felicidade e tranqüilidade tanto na prática do surfe quanto em sua existência. 29 O segundo elemento que eu acho que dá o barato para o surfista é o nervo vestibular, que é o labirinto, a labirintite da pessoa, é questão de gravidade, nossa relação com a gravidade. E tendo analisado um pouco o adjetivo sobre o que é surfe, o que é a sensação do surfe, porque que a gente fica tão fissurado nisso; eu atribuo muito a esse estímulo que ele nos dá, no sentido gravitacional. Então, você pode analisar que quando você está na onda, você está indo, você está indo simultaneamente em três direções ao mesmo tempo. Isso para o cérebro gera um peripaque, assim, que é prazeroso. Você está indo com a onda sentido praia, certo? Mas simultaneamente você está cortando a onda para o lado, então você tá indo nessa direção sentido praia, mas ao mesmo tempo sentido paralelo a praia. Então, essas são as duas direções, a terceira direção que dá a terceira dimensão pra isso é o fato que você, relativamente falando, está em queda livre o tempo todo. Porque eu digo relativamente? Você pode estar parada em cima da prancha, você está indo, mas se você está na parede da onda, a água está subindo. Então, relativamente falando, você está em queda, entendeu? Então é quase como bungeejump ou paraquedas. Para o corpo você está em queda, para a análise do nervo vestibular você está caindo. E o tempo todo você está caindo. Porque, na verdade não é você que está caindo é a água que está subindo, mas a sensação que você tem é de queda. Então é quase como voar. Eu sempre falo que o surfe é a coisa mais próxima ao voar que o ser humano pode almejar. Então esses três movimentos acho que dá um tchan na cabeça do surfista. (Mark Lund) Sensação, sentimento que em lugar nenhum do mundo você vai ter fazendo outra coisa. Na onda perfeita é muito estranho porque tu esquece de tudo, de tudo mesmo, tu não lembra de mais nada, é só tu e a onda. Isso é manerão do surfe, o cara desliga mermo, fica só ligado na onda, ele pode sair do mundo e ficar nessa viagem só você e a onda, você e o tubo, e a onda é tranqüilidade e concentração. (Pedro Henrique) Considerações finais: apontamentos para uma etnografia das práticas na natureza A teoria21 para a explicação do fascínio, do vício, da fissura que o surfe provoca está relacionada a sua agência no corpo, mas também na alma. E é no surfista de alma, e na prática com a alma, além da com o corpo, que consiste a diferenciação do surfe de outras modalidades esportivas. Embora os sociólogos da modernidade tendam a dizer que o surfe hoje é um esporte moderno como qualquer outro, apenas alocado em cenário mais 21 “O que acontece se recusarmos ao discurso do antropólogo sua vantagem estratégica sobre o discurso nativo?” (Viveiros de Castro, 2002:115) 30 apelativo, a natureza. Os historiadores22 do surfe, principalmente os surfistas interessados na antiguidade havaiana diriam que o estilo de vida que quer ter o surfista o levam a praticar surfe como um esporte-arte, e mais, a adotar um esporte-vida. Ou melhor, sendo o surfe esporte, para seus praticantes contemporâneos, apenas em alguma medida, ele seria uma arte de viver que se tornou esporte em algum momento, ele seria mais uma arte-esporte, vidaesporte por necessidade. Então, se quisermos fazer uma Antropologia do surfe, seria adequado conferir ao surfe ou a seus praticantes enquanto sujeitos da pesquisa antropológica o mesmo tratamento teórico que o oferecido aos praticantes de modalidades convencionais desconsiderando sua experiência e suas próprias formulações sobre ela? Como dar conta antropologicamente de uma modalidade esportiva que se diz não esporte? Por hora, e para iniciar um estudo sistemático dos praticantes de surfe, admitir que os surfistas operam com a inversão da noção de estilo de vida, a que estamos acostumados, é o que se propõe. Estilo de vida que é antes determinado por uma única prática, que determinante de um conjunto delas. 22 Admitimos que a discussão sobre povos com história versus povos sem história estaria um tanto deslocada aqui. Contudo, é possível pensá-la como ajuda para nossa reflexão, já que os surfistas explicam sua experiência também por reconstruções históricas que eles mesmos empreendem. Seja buscando recortes de jornal, fotografias e livros antigos, artefatos de colecionadores ou conversas com pessoas que viveram o que se deseja conhecer, os surfistas-escritores e surfistas-documentaristas, muitos deles jornalistas de formação, criam narrativas e publicam artigos e livros e lançam filmes que circulam com estatuto de verdade entre eles. Mas, à produção destas pessoas, porque inseridas no contexto mais amplo da dinâmica ocidental cientificista e porque tão próximas, se não inseridas, em nosso cotidiano acadêmico e possíveis conhecedoras do conceito rigor é vetada a legitimidade. Tidos como “frouxos”, excessivamente informais ou descontraídos estes trabalhos não podem ser considerados, porque espera-se que alguém deste tipo saiba que há uma maneira de se fazer história tecnicamente válida. O que fazer, então, desse material e dessas citações constantes? A proposta seria conhecê-lo e acreditar nele, e considerá-lo também palavra do surfista. Dado etnográfico, ao invés de falácia mercadológica. Entretanto, o produtor do material ficaria surpreso em ver que foi citado em demonstrações etnográficas, mas não aparece nas Referências Bibliográficas. É preciso pensar sobre como lidar com esta questão da teoria e da prática. De uma teoria que se faz no encontro com o registro, mas mesclada com a vivência corporal daquilo que se procura teorizar. Como bem lembrou Mark Lund: Para ser um trabalho acadêmico assim que nem o seu, tem que ser alguém meio que de fora. Porque o surfista mesmo, mesmo que ele seja dedicado, você acha que se tiver dando onda ele vai ficar coletando entrevista? Ele não, ele vai é surfar mesmo, e com o cara que ele tava entrevistando. Tudo que não seja o surfe sempre pode esperar. 31 Nesta relação com o conhecimento, neste jogo discursivo entre estudante e estudado, com Viveiros de Castro (2002), procurei exercer uma antropologia que determina os problemas postos por quem se estuda e não procurar soluções para os nossos problemas. O outro foi tomado como a expressão de um mundo possível. E o mundo do surfista é aquele no qual o problema é ecológico, saúde é importante, uma experiência muda sua vida para sempre, surfar é saber sobre si mesmo, a felicidade está no mar, liberdade é viagem e estilo de vida é muito mais que esporte. REFERÊNCIAS BANDEIRA, Marília e RUBIO, Kátia. Perspectivas Sociais e Culturais do Surfe. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte. São Paulo: no prelo. PALMIÈRI, Júlio César. Futebol e basquete made in brazil: uma análise antropológica do fluxo de jogadores para o exterior. In: Visão de jogo: antropologia das práticas esportivas. Toledo, Luiz Henrique e Costa, Carlos Eduardo (orgs.), São Paulo: Terceiro Nome, 2009 VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. O nativo relativo. Mana - Estudos de Antropologia Social, Rio de Janeiro, volume 8, n. 1. p. 113-148. 2002 RIAL, Carmem. Jogadores brasileiros na Espanha: emigrantes porém... Revista de Dialectología y Tradiciones Populares, n.2, p. 163-190, jul-dez. 2006 WACQUANT, Loïc. Corpo e Alma: Notas Etnográficas de um aprendiz de boxe. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002. 32 A CARACTERIZAÇÃO DO BALONISMO POR PRATICANTES BRASILEIROS E JAPONESES Luana Mari Noda, Giuliano Gomes de Assis Pimentel GEL- Grupo de estudos do lazer - Universidade Estadual de Maringá E-mail: [email protected] Resumo O balonismo é um esporte aéreo em que o objetivo é decolar, pousar e arremessar marcas em locais predeterminados, utilizando as chamas para ascensão e as correntes de ar para deslocamento. No Brasil o primeiro campeonato ocorreu em 1988. O balonismo é uma prática restrita a poucas pessoas, especialmente porque os custos para aquisição e manutenção de um balão são altos e também se requer um apoio logístico com veículos apropriados. Esse é um dos motivos para não existirem estudos sobre esse esporte na Educação Física. Portanto identificar os pontos de pensamento comum entre balonistas japoneses e brasileiros, bem como analisar as características dos praticantes. A pesquisa foi composta 15 pilotos japoneses, e 20 pilotos brasileiros. O questionário utilizado “GEL 2008- Definição e Caracterização dos Esportes de Aventura” adaptado ao balonismo e a língua japonesa.Uma vez coletados os dados, estes foram tabulados e, depois, estabelecidas correlações das respostas – por meio de triangulação. Podemos concluir que os balonistas praticam a modalidade como uma opção de lazer, e relacionam o esporte a natureza tanto como atividade de aventura na natureza. As diferenças culturais influenciaram nos resultados, mostrando a importância de situar o objeto frente às especificidades dos grupos de praticantes e de seu contexto. Palavras chaves: balonismo, atividade de aventura, lazer. Introdução Há em alguns autores do lazer uma fixação nas atividades, a tal ponto de buscarem suas características em si mesmas. Tal recorte pode levar a reificação dessas práticas, consistindo na consideração do abstrato como se fosse concreto. Se lembrarmos que são os homens e mulheres os produtores de sua realidade, dialeticamente à medida de sua objetivação, talvez valha mais identificar uma atividade de aventura pela ação e representação de seus praticantes do que criar interpretações externas sobre os objetos. É neste sentido que o presente estudo busca iniciar uma compreensão do balonismo. O balonismo é uma atividade aérea que desperta a atenção seja pela grande dimensão do balão colorido que proporciona um espetáculo no céu ou por gerar curiosidade sobre seu funcionamento. Apesar de ser uma atividade com uma longa história, há poucos estudos científicos nesta área e não se 33 sabe muito sobre os seus praticantes. Este trabalho busca esclarecer algumas dimensões que permeiam esta atividade. Existem relatos que afirmam ter o grego Arquimedes anunciado, em 287 A .C., o princípio da ascensão dos balões. Porém a descoberta dos desenhos cunhados em um vaso de barro, encontrados no planalto de Nazca, no Peru e expostos no Museu de Lima, leva a crer que o primeiro balão de ar quente possa ter sido construído há mais de 2 mil anos, pelos índios Nazca segundo o site da Confederação Brasileira de Balonismo. O padre brasileiro Bartolomeu de Gusmão, em 1709 iniciou pesquisas sobre o balão a ar quente. O primeiro vôo de balão foi oficialmente registrado no Brasil em 1885, quando Edouard Heilt subiu por alguns segundos no Saco dos Alferes-RJ. Alguns anos após, em 1894, o brasileiro Augusto Severo de Albuquerque pilotou o balão Bartolomeu de Gusmão sobre o Realengo, no Rio de Janeiro. Em 1902, seu balão Pax chegou a subir 400 metros de altitude ((BITERNCOURT, NAVARRO, KOFF 2005). Hoje o balão é feito de material anti-inflamável e aquecido por chamas de gás propano. O balonista maneja as correntes de ar nas diferentes altitudes à medida que desloca o balão, a altitude é determinada pela força do elemento ar que provoca o vento, definindo a trajetória, acrescida da energia do elemento fogo, que sustenta o ar quente podendo voar rente ao solo ou até 16 mil metros de altitude (marca do recorde registrado). No Brasil o primeiro campeonato ocorreu em 1988, havendo atualmente cerca de 150 pilotos credenciados, entretanto no ultimo Campeonato Brasileiro- 2009 somente 24 pilotos participaram, na Copa Brasil de 2009 a média de pilotos nas etapas foi de 15 pilotos. Em 2010 no 2º Festival de Balonismo de Santa Maria- RS dos 34 pilotos participantes apenas 17 eram brasileiros. Em Maringá são realizadas provas de balonismo relativas aos seguintes eventos: Copa Brasil, Sul- brasileiro e Campeonato brasileiro, todos vinculados a Federação do esporte. Em 2008, em comemoração aos 100 anos de imigração japonesa no Brasil, foi realizado um evento especial denominado Campeonato nipo-brasileiro de balonismo, que ocorreu paralelamente a etapa do 21º. Campeonato Brasileiro. Para tanto, foram recebidos 13 pilotos japoneses, os quais estão classificados entre os melhores no mundo em balonismo. 34 O balonismo é uma prática restrita a poucas pessoas, especialmente porque os custos para aquisição e manutenção de um balão são altos e também se requer um apoio logístico com veículos apropriados, dificultando à adesão a prática. Esse é um dos motivos para não existirem estudos sobre esse esporte na Educação Física. Dadas essas considerações podemos questionar: para além de pessoas com recursos, quem são os balonistas? E quais são as percepções que os praticantes têm em relação ao balonismo? Objetivo do Estudo Comparar representações sobre balonismo entre praticantes japoneses e brasileiros, bem como analisar as características desses balonistas. Métodos A pesquisa foi composta 15 pilotos japoneses, sendo 5 do gênero feminino e 10 do gênero masculino com idades entre 30 e 58 anos e participantes do 1º Campeonato Nipo- brasileiro de Balonismo realizado em Maringá- PR nos dias 23 a 28 de junho de 2008 e por 20 pilotos brasileiros, sendo 3 do gênero feminino participantes da Copa Brasil de Balonismo de 2009 e do segundo Festival de Balonismo de Santa Maria- RS. O questionário “GEL 2009 - definição e Caracterização dos Esportes de Aventura” adaptado ao balonismo e a língua japonesa é composto por trinta questões divididas em dois blocos. O primeiro possui sete questões objetivas e de múltipla escolha que tem por objetivo a caracterização dos praticantes do balonismo. O segundo bloco trata do grau de concordância ou discordância dos praticantes sobre diferentes dimensões da prática do balonismo, abrangendo as próximas vinte e três questões objetivas com bases de respostas sim ou não. Na validação para a língua japonesa se percebeu a dificuldade dos mesmos com alternativas que envolvem parcialidade. Já a versão brasileira é composto por trinta e duas questões divididas em dois blocos. O primeiro bloco possui 9 questões objetivas, da primeira a sétima questões de respostas únicas a oitava e nona questões são de múltipla escolha. Que buscam estabelecer informações a respeito do sujeito. O segundo bloco é composto de 23 questões objetivas em que as respostas são divididas em 5 graus de concordância: 1- Discordo plenamente, 2- Discordo em 35 parte, 3- Não concordo nem discordo ou Não tenho opinião, 4- Concordo parcialmente e 5 - Concordo plenamente. Os pilotos foram convidados a participar da pesquisa e voluntariamente responderam os questionários que foram aplicados durante o campeonato no período entre provas, individualmente para cada piloto. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva, cujo objetivo básico é o de sintetizar uma série de valores de mesma natureza. Permitindo que se tenha uma visão global da variação desses valores, tal procedimento organiza e descreve os dados de três maneiras: por meio de tabelas, de gráficos e de medidas descritivas. (GUEDES, 2004). Os fatores que limitaram o estudo foram a dificuldade na tradução do instrumento em função das diferenças culturais e número da amostra, embora, no caso brasileiro ela represente quase metade dos praticantes em competições. Resultados Inicialmente iremos apresentar os resultados a respeito da caracterização dos pilotos. Na Figura 1 é apresentada a categoria dos balonistas: 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Brasileiros Japoneses AProfissional, patrocinado nas competições B- Amador, nível recreativo e competitivo C- Amador, nível recreativo Figura 1 - Categoria no balonismo D- Outra 36 A maior parte dos pilotos japoneses se coloca na categoria amador, nível recreativo e competitivo. Enquanto os brasileiros responderam em sua maioria profissional. Embora tenhamos esses resultados, os japoneses são tecnicamente superiores, mas talvez disponham de mais recursos para não necessitarem de profissionalização no balonismo para manterem sua prática. Brasileiros 10% 0% A- Até 20 anos 40% B- De 21 a 30 anos C- De 31 a 40 anos 35% D- De 41 a 60 anos E- Acima de 60 anos 15% Figura 2: Faixa etária dos pilotos brasileiros. Pode-se observar que a faixa etária que apresenta o maior número de praticantes são as faixas, entre 21 e 30 anos e 41 a 60 anos. Os pilotos japoneses possuem entre 30 e 58 anos e a média de 45, 6 anos. 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Brasileiros Japoneses 2º grau completo até Superior incompleto Figura 3: Grau de instrução. Superior completo Mestrado/Doutorado 37 Dentre eles apenas quatro pilotos japoneses e sete brasileiros não completaram um curso de graduação universitária. A- Até 4 salários 0%5% B- Acima de 4 até 5 salários 21% C- Acima de 5 até 6 salários D- Acima de 6 até 7 salários 0% E- Acima de 7 até 8 salários 74% F- Acima de 8 até 9 salários G- Acima de 10 salários Figura 4: Renda familiar do brasileiro. Nota-se que 74% dos pilotos brasileiros declaram que recebem acima de 10 salários. Esse resultado é parcialmente confiável, visto que, nesse tipo de instrumento, há tendência em se responder menos que os ganhos reais. Porém, os dados possuem razoável confiabilidade por serem coerentes com a renda pressumida à escolaridade da maioria dos praticantes, Ensino Superior completo. Também é condizente com o alto custo do balão e a necessidade de forte infra-estrutura terrestre. 12 10 8 Brasileiros 6 Japoneses 4 2 Figura 5: Freqüência com que pratica. m en te E- D ia ria en te em an al m en te DS en sa lm CM m en te -O ca sio na l B A -R ar am en te 0 38 Pode-se notar que os pilotos afirmam que não praticam o balonismo com freqüência, talvez pelo fato do balonismo depender de estrutura complexa e de condições de tempo propícia. A- Diversão 18 16 16 B- Amigos/ relações sociais 14 12 11 10 10 11 C- Enfrentar o medo 10 D- Sensação de superioridade 8 6 5 4 5 4 2 1 E- Sensação de adrenalina F- Contato com a natureza 0 1 G- Melhoria da qualidade de vida Figura 6: Motivos que levam a prática segundo pilotos brasileiros. Os pilotos brasileiros consideram o contato com a natureza um dos principais motivos que os levam à pratica enquanto para os pilotos japoneses o mais citado é a diversão (86%) seguido da adrenalina (13%), a qual pode ser interpretada como fortes emoções decorrentes do enfrentamento das incertezas relacionadas às forças da natureza. Caracterização do Balonismo Pelo Praticante Os resultados em relação aos graus de concordância foram divididos em categorias: natureza, preconceitos, lazer, características e conceituação. As respostas foram divididas em 5 graus de concordância: 1- Discordo plenamente, 2- Discordo em parte, 3- Não concordo nem discordo ou Não tenho opinião, 4- Concordo parcialmente e 5 - Concordo plenamente A seguir serão apresentados os resultados da caracterização da modalidade pelos praticantes. A primeira categoria apresentada é o balonismo e natureza na Tabela 1: 39 Brasileiros Balonismo e natureza Japoneses 1 2 3 4 5 Sim Não O contato com a natureza é algo que caracteriza o balonismo 0% 0% 0% 10% 90% 93% 7% O balonismo é uma atividade física de aventura na natureza 5% 5% 5% 20% 65% 100% 0% O balonismo gera impacto na natureza 75% 0% 5% 15% 5% 7% 93% Não existem causas sociais ou de preservação ecológica relacionadas com o balonismo 50% 10% 15% 20% 5% 87% 13% Tabela 1 – Nível de concordância na relação balonismo e natureza. Na tabela 1 podemos verificar que há uma grande relação entre balonismo e natureza. Para Dias (2007) a relação com a natureza pode ser vista como um dos elos fundamentais na caracterização das atividades de aventura. A seguir será apresentado na Tabela 2 o nível de concordância dos praticantes quanto a relação balonismo e preconceito: Brasileiros Japoneses 1 2 3 4 5 Sim Não Você se enquadra em alguma "tribo" de praticantes 45% 0% 10% 5% 40% 54% 46% É utlizado algum tipo de droga ao se praticar a atividade 100% 0% 0% 0% 0% 7% 93% Você já sofreu algum tipo de preconceito por ter escolhido essa atividade 60% 20% 0% 20% 0% 23% 77% Você acha importante a sua pratica ser abordada por programas de TV, rádio, artigos de jornais e revistas 0% 0% 5% 10% 85% 87% 13% 80% 10% 10% 0% 0% 100% 0% Balonismo e o preconceito No balonismo a mulher é menos capaz pela sua fragilidade Tabela 2 – Nível de concordância na relação balonismo e preconceito 40 Podemos notar que o resultado é bastante diferenciando entre brasileiros e japoneses na relação mulher e balonismo. Para os brasileiros não há diferença na capacidade entre gêneros enquanto para os japoneses 100% afirma haver diferença. Isso pode estar relacionado com as diferenças culturais. Para a sociedade japonesa há uma complexa visão da mulher na sociedade. “the women explain their marginality by reference to patriarchal Japanese tradition itself. That is they argue that precisely because women, under the terms of traditional patriarchal marriage: because girls are not as indulged as boys but forced to develop their own “inner resources”;…women insist, they are inherently marginal compared to men to the structures of Japanese family and economy and processed of an inmate “adaptability”. KELSLY, 2001. Na Tabela 3 está demonstrado o nível de concordância dos praticantes quanto a relação balonismo e lazer: Brasileiros Balonismo e lazer Japoneses 1 2 3 4 5 Sim Não Sua prática pode ser considerada uma opção de lazer 0% 0% 16% 21% 63% 100% 0% Sua prática tem como maior objetivo a competição 10% 25% 25% 15% 25% 47% 53% 5% 0% 11% 16% 68% 0% 100% 20% 10% 10% 30% 30% 36% 64% Sua prática é uma forma de aliviar o estresse do cotidiano Você é atraído pelo lazer de risco Tabela 3 – Nível de concordância na relação balonismo e lazer 41 Analisando a tabela 3 é possível notar que a maior parte concorda com a afirmação de o balonismo ser uma opção de lazer. Corroborando com isso, Marinho (2008) salienta que as atividades de aventura estão sendo entendidas como diversas práticas manifestadas, privilegiadamente nos momentos de lazer. É interessante verificar que 100% dos pilotos japoneses não consideram o balonismo como forma de aliviar o estresse. Talvez pelo fato da concepção de lazer para os japoneses ser diferenciada. In Japan Sunday traditionally has been a “day off” from school and office; the other days of the week have been work days. Consequently, the “Time Use” surveys distinguish between leisure activities on Sundays versus those of the other weekdays. Averaging across the 96 observations, it can be seen that expected weekday leisure time is 3.4 hours. Far and away, media activities account for most of the leisure time (2.1 hours per day, 62.3% of leisure time). Excluding these passive, media activities (time spent watching television, listening to radio, reading newspapers or magazines), expected leisure is only 1.3 hours per weekday. The most common “active” pursuits are hobbies and socializing, with roughly a half-hour per day for hobbies (0.5 hours) and little more than 20 minutes for socializing (0.4 hours). “Improving” 4 activities (volunteering and studying for self-improvement) account for 18 minutes per day (0.3 hours); the expected time playing sports is not even 10 minutes (0.15 hours). (SCOTT, pág 3, 2006). Em seguida na Tabela 4 será apresentado o nível de concordância dos praticantes na caracterização da prática do balonismo: 42 Brasileiros Caracterização da prática Japoneses 1 2 3 4 5 Sim Não 35% 15% 20% 10% 20% 67% 43% 5% 5% 0% 35% 55% 42% 57% O balonismo é uma atividade que depende de tecnologia para ser praticado 22% 22% 11% 17% 28% 87% 13% O balonismo exige um tipo corporal como mais adequado para sua prática 70% 0% 25% 0% 5% 43% 57% Você se sente um herói ao praticar essa atividade 45% 20% 20% 10% 5% 47% 53% 3% 3% 1% 2% 11% 36% 64% O medo é essencial para a aventura ocorrer na atividade que você pratica A aventura é algo que caracteriza o balonismo A atividade que você pratica traz experiências arriscadas incertas, traduzindo a atração pela novidade e o desafio Tabela 4 – Nível de concordância quanto a caracterização da prática Na Tabela 5 está demonstrado o nível de concordância dos praticantes quanto a definição do esporte: Brasileiros Japoneses 1 2 3 4 5 Sim Não O balonismo é um esporte radical 5% 25% 20% 40% 10% 64% 36% O balonismo é um esporte de aventura 0% 0% 10% 35% 55% 47% 53% 27% 26% 16% 26% 5% 20% 80% 5% 5% 5% 20% 65% 100% 0% Definição do esporte O balonismo é esporte de risco O balonismo é uma atividade física de aventura na natureza Tabela 5 – Nível de concordância quanto a definição do esporte 43 Nas questões que correlacionam o balonismo a natureza para os japoneses, 93% acreditam que o contato com a natureza é algo que caracteriza o balonismo, os pilotos foram unânimes em considerar o esporte como uma atividade de aventura na natureza, entretanto quando questionados se o balonismo é um esporte de aventura há um contra-senso assim como considerá-lo um esporte radical. E 80% dos entrevistados não consideram o balonismo como um esporte de risco. Conclusões Podemos concluir que o balonismo é uma atividade de aventura com custos altos que exige a capacitação de seus praticantes. A maior parte de seus praticantes possui nível superior completo e uma renda maior de 10 salários. Pode-se perceber também que são poucos jovens que o praticam. Os motivos que levam a pratica são diferenciados entre pilotos brasileiros e japoneses, para brasileiros o motivo mais assinalado é o contato com a natureza enquanto para os japoneses. Outra grande diferença entre os pilotos esta relacionado a posição da mulher no balonismo para 100% dos japoneses a mulher é menos capaz pela sua fragilidade enquanto 80% dos brasileiros discordam plenamente com a afirmação. Recomenda-se que estudo seja replicado com um maior número de praticantes, o que poderia resultar numa compreensão mais profunda e fidedigna deste fenômeno. Esta pesquisa faz parte de uma busca do GEL - Grupo de Estudos do Lazer de verificar a percepção e a caracterização dos esportes de aventura pelos praticantes. Diante dos resultados obtidos podemos concluir que as percepções dos praticantes variam de acordo com a modalidade, nacionalidade e tempo de prática o que destaca a importância do contexto nos resultados. REFERÊNCIAS BITENCOURT, V.;NAVARRO, P; KOFF J. Balonismo. In: DaCosta, L. P. (org.). Atlas do esporte no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2005. PEREIRA, D. W.; ARMBRUST, I.; RICARDO, D. P. Esportes radicais de aventura e ação, conceitos, classificações e características. Corpoconsciência, Santo André, v. 12, n. 1, p. 37-55, jan./jun. 2008. 44 MATTOS, M. G.; ROSSETO, J. R. A.; BLECHER, S. Teoria e Prática da Metodologia da Pesquisa em Educação Física. São Paulo. Phorte, 2004 GUEDES, T. A. et. al. Aprender fazendo estatística. Projeto de Ensino. Maringá, 2005. PIMENTEL, G. G. A.; SAITO, C. F. Caracterização da demanda potencial por esportes de aventura. Motriz, Rio Claro, v. 16, n. 1, p. 152–161, jan./mar. 2010. SILVEIRA, Julio César Fernandes. Esportes na natureza e formação profissional em Educação Física. In: SONOO, C. N.; SOUZA, C.; OLIVEIRA, A. A. B. Educação Física e Esportes: os novos desafios da formação profissional. 1 ed. Maringá: DEF, 2002, v. 1, p, 153 – 165. DIAS, C. A. G. Notas e Definições sobre Esporte, Lazer e Natureza. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 10, n. 3, dez/2007. SPINK, M J. P.; ARAGAKI, S. S.; ALVES, M. P. Da exacerbação dos sentidos no encontro com a natureza: contrastando esportes radicais e turismo de aventura. Psicologia: reflexão e crítica, Porto Alegre, v. 18, n.1, jan/abril 2005. KELSKY, K. Women an the verge japanese women, western dreams. Duke university press, Durman, 2001. SCOTT, M. Jr. Leisure time in Japan: how much an for whom? Discussion Paper, NO 2002, IZA, Germany, 2006. 45 A MOBILIDADE COMO AVENTURA NA CIDADE: JOGOS BASEADOS EM GEOLOCALIZAÇÃO (GPS) E APROPRIAÇÃO URBANA Juliana de Alencar Viana Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil E-mail: [email protected] Resumo Este ensaio pretende retomar algumas reflexões sobre o espaço público por meio de práticas corporais urbanas que utilizam tecnologias nômades, advindas dos dispositivos móveis. Para tal, recorro à produção multidisciplinar e de intersecção entre o campo do lazer e os estudos da comunicação e do espaço para elaborar algumas idéias sobre a mobilidade como aventura na cidade. A fim de reconhecer experiências, para além do mero consumo do discurso ecologicamente correto e/ou a utilidade da atividade física como promotora de hábitos saudáveis, percorro os jogos urbanos de mobilidade, como práticas culturais que estabelecem a partilha de experiência como vetores de subjetivação. A mobilidade produz espacialização e os lugares devem ser pensados como eventos em um fluxo de práticas sociais, de processos territorializantes e desterritorializantes, podendo reforçar uma experiência narrativa do espaço físico, o que fortalece a dimensão da experiência do contexto, do local, dentro de um fenômeno mundial. Assim, a mobilidade deve ser vista como produto cultural e oferece uma oportunidade para usos e apropriações do espaço para diversos fins, entre eles, o lazer. A esse respeito, algumas práticas corporais urbanas têm se utilizado dispositivos móveis e desenhado na cidade experiências por meio dos chamados wireless street games. Tais jogos promovem experiências no espaço urbano e representam desvios à lógica planejada da cidade. Essa prática crítica, denominada pelos situacionistas de deriva, leva a reflexão sobre o espaço público, em diálogo com o ciberespaço. Os jogos urbanos com dispositivos móveis parecem, portanto, agregar às experiências efêmeras de apreensão do espaço urbano através da proposta de novos procedimentos e novas práticas, como a deriva, expressando outra comunicação na cidade, revelando-a. Essa nova configuração de jogo vai disseminar práticas de nomadismo tecnológico, ao transformar o espaço público em cenário de jogo, causando profundas modificações na relação com o espaço, nas formas sociais e nas práticas culturais, funcionando como estímulo aos novos e velhos rituais sociais: trocas, informações, cooperação e estimulando mecanismos de confiança, de reciprocidades, compartilhamento de normas e valores pelas redes. A vivência desta experiência de jogo coloca em questão as possibilidades lúdicas por meio destas novas tecnologias, assim como apontam novas formas de apropriação urbana e a conformação de uma nova cultura urbana e de jogo através desta aventura. Palavras-chave: mobilidade, cidade, jogos urbanos. 46 Juliana de Alencar Viana23 Introdução Sem que se possa aprofundar isto aqui, pode-se dizer que o interesse culinário, o jogo das aparências, os pequenos momentos festivos, as perambulações diárias e o lazer não podem ser mais vistos como elementos sem importância ou frívolos da vida social. (MAFFESOLI, 2005, p. 12) As cidades modernas foram atravessadas por um urbanismo que elevou o lazer ao patamar de uma função urbano-social. Tal função carregava um reforço científico, devido aos saberes em ascensão, como fisiologia, a higiene e mais tarde, a psicologia social (a partir de 1940), que promulgava ações de melhoria da saúde pública por meio de procedimentos higiênicos aplicados ao corpo e à mente dos trabalhadores (NIEMEYER, 2002). Nesse sentido, especialmente a Higiene Social, atuava na prevenção, correção, controle dos corpos, aplicados para garantir a normalidade social. É dentro desse contexto que surgem, por exemplo, os parques infantis, espaço planejado nas cidades e destinado às crianças, comportando aí o que alguns autores denominam de pedagogias do corpo (FRAGA, 2006a). Nesse mesmo período, cabe registrar o surgimento, na literatura especializada do século XIX, da palavra stress, como uma força adversa e incontrolável a afetar o citadino, sendo associado frequentemente com a vida nas sociedades urbanas. A Higiene Social, portanto, integra-se ao urbanismo, requalificando parques públicos e uma nova ordem urbana como antídoto aos rigores da urbanização, incentivando práticas de lazer ao ar livre com aspecto funcional de promoção da saúde e higiene, segundo Niemeyer (2002). Sobre a atualidade, Maffesoli (2001, p. 22) questiona: “será que o drama contemporâneo não vem do fato de que o desejo de errância tende a ressurgir como substituição, ou contra o compromisso de residência que prevaleceu durante toda a modernidade?” Para o autor, a produção, os costumes, a saúde, a educação e tudo o mais que se convencionou chamar de “social” foi 23 Mestre em Lazer e membro do Oricolé - Laboratório de Pesquisa sobre Formação e Atuação Profissional em Lazer/UFMG. 47 domesticado, assentado no trabalho e destinado à residência, pela modernidade, pois, domesticar significa(va) fixar e, com isso, a possibilidade de dominar. É a partir do desenrolar desse cenário moderno que, hoje, no imaginário social, as práticas de lazer ao ar livre são cogitadas como mecanismo duplamente útil: como atividade física, de promoção de uma vida saudável, de reabilitação dos males da vida urbana e pela ação politicamente correta para com os recursos naturais, designada especialmente pelos prefixos “eco” e conceito de sustentabilidade, ao mesmo tempo em que representa um nicho de mercado para a indústria cultural, compreendido dentro do denominado “lazer ativo”. (FRAGA, 2006b) De outra forma, concordando com Villaverde (2003), a mobilidade, característica também presente na experiência turística, pode ser pensada pela teia de relações construídas e não somente pela dimensão do consumo. Por mais que o ecoturismo seja encarado pela ótica da indústria cultural e pela atividade saudável, é preciso pensar na construção das subjetividades que tais experiências propiciam. Dessa forma, a exacerbação moderna de lugar(es) renovou e atualizou o desejo por novas errâncias, já que aquilo que se move escapa à câmera sofisticada do panóptico (BENTHAM, 2008) ou, ao menos, subverte tal lógica e aponta desvios a partir das próprias ferramentas de domesticação. Nesse sentido, as tecnologias da informação e comunicação da era digital, especialmente os dispositivos móveis, permitem a pulverização de tecnologias nômades, promovendo e partilhando errâncias que testemunham um enriquecimento cultural ligado à mobilidade e às relações, nos espaços online e offline. Aqui, comunicação é mobilidade, significa deslocar-se e representa modos de estar junto. A errância, por sua vez, seria uma expressão de uma outra relação com o outro e com o mundo, menos ofensiva, mais carinhosa, um tanto lúdica (MAFFESOLI, 2001) e se torna mecanismo de socialização. Segundo este mesmo autor, a mobilidade carrega uma dose de aventura, já que, para ele, existir é sair de si, é um modo de se abrir ao mundo e aos outros. Dessa maneira, mais do que pensar a atividade física na natureza e o esporte de aventura nesses moldes, interessa a este trabalho trazer ao debate 48 os tipos de relações estabelecidas nestas experiências, a partir da mobilidade, seja no espaço urbano ou “natural”. Assim, surgiram algumas questões que nortearão este trabalho: é possível a aventura na cidade por meio das tecnologias da informação e comunicação? Qual o tipo de aventura elas proporcionam? De que formas as tecnologias nômades podem contribuir para uma aventura urbana? São provocações que instigam novos diálogos, dada as práticas de desvio na relação com a cidade contemporânea. Este trabalho pretende retomar algumas reflexões sobre o espaço público por meio de práticas corporais urbanas que utilizam tecnologias nômades, advindas dos dispositivos móveis. Além disso, busca reconhecer experiências para além do mero consumo de discursos politicamente corretos e/ou a utilidade da atividade física como promotora de hábitos saudáveis, percorrendo práticas culturais que estabelecem a partilha de experiências como vetores de subjetivação, de relação, portanto, de novas sociabilidades. Para tal, recorro à produção multidisciplinar e de intersecção do campo do lazer com os estudos da comunicação e do espaço para elaborar este ensaio. Poucos estudos têm operado na lógica interdisciplinar entre as referidas áreas. Com isso, espera-se que este trabalho possa ampliar diálogos entre estas produções, já que contribuem para compreender fenômenos culturais em toda a sua complexidade. Portanto, o compromisso ético-político de descortinar transformações socioculturais qualitativas e ampliar eventuais demonstrações de resistências às lógicas e à subjetividade dominantes, inclusive no contexto da atividade turística, deve, em minha opinião, ser assumido. Mesmo havendo uma notável incorporação destas práticas corporais pela lógica mercadológica turística ou esportiva, tal incorporação nunca é total, assim como nunca é total o enquadramento da subjetividade pelos poderes vigentes e dominantes, tal como têm demonstrado Foucault, Deleuze e Guattari, devendo-se ir em busca de "resistências moleculares", de pequenas "brechas", de "linhas de fuga", subjacentes a essas experiências humanas. (VILLAVERDE, 2003, p. 68) Seguindo esta lógica e interessada pela errância (JACQUES, 2006) urbana é que corroboro com Villaverde (2003), ao enfatizar que, as noções de amizade, cortesia, solidariedade, hospitalidade e respeito no espaço público 49 deveriam compor o quadro referencial de qualquer forma de vida e prática social humana, em especial o lazer e a atividade turística. Cidades, tecnologias nômades e mobilidade As profundas mudanças sofridas pelas cidades modernas devido aos processos de privatização e mercantilização contribuíram, paulatinamente, para o desaparecimento do ambiente público, o que traz como consequência o desaparecimento da vida urbana. A domesticação moderna das culturas se dissolve, as práticas culturais migram de seus locais habituais, se difundindo no espaço virtual da mídia. Essa midialização estimula a tendência de privatizar os eventos culturais originalmente públicos e sua percepção estética. Com isso reforça ainda mais a erosão progressiva dos ambientes públicos urbanos. (PRIGGE, 2002, p. 55) Dialogando com o autor, as tecnologias serviram e servem à permanência e conforto dos espaços privados, contudo, desvios e (re)apropriações do espaço público também se multiplicam em virtude dessas mesmas tecnologias. A inserção das tecnologias da informação e comunicação (TICs) inaugurou também novas formas de viver o urbano e a natureza, principalmente pelo avanço da cibercultura: o acesso, a conexão e formação de redes sociais. (ALENCAR VIANA, 2010) Segundo Lemos (2009, p.28), “os estudos de comunicação têm investido em análises sobre empresas de comunicação, estudos de recepção, consumo das mídias, mas muito pouco sobre a relação entre comunicação, espacialização e mobilidade”. A mobilidade produz espacialização e os lugares devem ser pensados como eventos em um fluxo de práticas sociais, de processos territorializantes e desterritorializantes (LEMOS, 2009), o que pode reforçar uma experiência narrativa do espaço físico, o que fortalece a dimensão da experiência do contexto, do local, dentro de um fenômeno mundial. Assim, a mobilidade deve ser vista como produto cultural e oferece uma oportunidade para usos e apropriações do espaço para diversos fins (lazer, comerciais, políticos, policiais, artísticos). 50 Para Lemos (2007b) estamos vivendo o avanço da cibercultura em direção ao “Dispositivo Híbrido Móvel de Conexão Multirredes”, pois, para ele: o que chamamos de telefone celular é um dispositivo (um artefato, uma tecnologia de comunicação); híbrido, já que congrega funções de telefone, computador, máquina fotográfica, câmera de vídeo, processador de texto, GPS, entre outras; móvel, isto é, portátil e conectado em mobilidade funcionando por redes sem fio digitais, ou seja, de conexão; e multirredes, já que pode empregar diversas redes, como: bluetooth e infravermelho, para conexões de curto alcance entre outros dispositivos; celular, para as diversas possibilidades de troca de informações; internet (wi-fi) e redes de satélites para uso como dispositivo GPS. Segundo o Comitê Gestor da Internet no Brasil (2009) e o Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação no país, a proporção de domicílios que possuem telefone fixo alcança a porcentagem de 44% e de telefone celular atinge cerca de 82%. Esses números nos indicam que a comunicação por tais dispositivos está em progressão – seja pela facilitação ao seu acesso, seu caráter híbrido ou pela mobilidade – e está superando, inclusive, as tecnologias de comunicação fixas, de menor funcionalidade e interatividade. A esse respeito, algumas práticas corporais urbanas têm se utilizado destes dispositivos e desenhado na cidade os chamados wireless street games (PEREIRA JUNIOR, 2006). Vale à pena dizer que existem inúmeros jogos possíveis pelos dispositivos móveis dos quais exige alguma mobilidade para a sua realização, ou seja, tais jogos promovem experiências no espaço urbano e representam desvios à lógica planejada da cidade. De acordo com Santos (2002), o espaço público se transforma em espaço crítico na medida em que é questionado pelo ciberespaço. Essa prática crítica, denominada pelos situacionistas de deriva, leva a reflexão sobre o espaço público, em diálogo com o ambiente virtual, já que tais jogos operam com territorialização e desterritorialização, transformando num espaço híbrido, implodindo oposições clássicas. Maffesoli (2005, p. 73), afirma que a estética, como “cultura dos sentimentos, simbolismo, ou, para empregar uma expressão mais moderna, como lógica comunicacional, garante a conjunção de elementos até então separados”. 51 Nesse sentido é que o espaço pode ser uma base de exploração. Aquilo que em compensação o torna flutuante, nebuloso, quase imaterial. É isso que, na esteira dos surrealistas, os "situacionistas" dos anos 60 tinham percebido muito bem praticando o que chamavam de deriva urbana ou a "psicogeografia". A cidade era, desde então, um terreno de aventura, em que o lúdico e o onírico tinham um lugar especial. Aventura que era um modo de viver experiências de toda ordem, de suscitar encontros, de fazer da existência uma espécie de obra de arte. (MAFFESOLI, 2001, p. 88) Para ele, seria um situacionismo geral todo esse interesse pelo presente, em oposição à regularidade do trabalho e da família, prevalecendo um tempo de desengajamentos, um tempo de instantes sucessivos, de sinceridades sucessivas, um tempo em que organizam-se grupos efêmeros, interessados na qualidade da participação sem a obsessão da continuidade. Esse apetite comunicacional não resulta unicamente do desenvolvimento tecnológico, pois seu valor encontra-se na experiência partilha na qual funciona como vetor de criação. Os jogos urbanos com dispositivos móveis poderiam, portanto, agregar às experiências efêmeras de apreensão do espaço urbano através da proposta de novos procedimentos como a psicogeografia e novas práticas como a deriva, construindo outra comunicação na cidade por modos que expressam uma cultura urbana de expressões múltiplas, revelando-a. Nessa esteira, os situacionistas foram um dos primeiros grupos “a criticar de forma radical o movimento moderno em arquitetura e urbanismo, principalmente seus maiores símbolos, o funcionalismo separatista da Carta de Atenas e a racionalidade cartesiana de seu maior defensor, Le Corbusier” (JACQUES, 2003, p. 14), ao opor-se à petrificação do espaço urbano e uma consequente museificação e patrimonialização dos centros históricos. O caminhar na cidade possibilita(va) criar uma narrativa da exploração das muitas cidades que existem em uma metrópole e, a partir dela, os situacionistas construíam mapas que traduziam uma organização afetiva ditada pela experiência da deriva (FONSECA, 2008), pois, segundo eles: As grandes cidades são favoráveis à distração que chamamos de deriva. A deriva é uma técnica de andar sem rumo. Ela se mistura à 52 influência do cenário. [...] A arquitetura deve se tornar apaixonante. [...] A valorização dos lazeres não é uma brincadeira. Nós insistimos que é preciso inventar novos jogos. (Debord e Fillon, 1954, apud JACQUES, 2003, p. 17) Tal prática surge por oposição a essas cidades-espetáculo que marcavam uma urbe estática e pouco convidativa à participação e criação. Para eles, a construção de situações seria a realização contínua de um grande jogo. Geocaching: construindo situações com jogos urbanos baseados em geolocalização (GPS) Geocaching é um jogo de caça ao tesouro hightech, presente em mais de 200 países, no qual jogadores equipados de dispositivos móveis com GPS24 buscam recipientes escondidos (geocaches) em espaços públicos por meio de coordenadas de geolocalização para, em seguida, compartilhar esta experiência online. Esta modalidade de jogo surgiu quando, em maio de 2000, o governo dos EUA liberou o acesso civil ao GPS. Pessoas começaram a testar a precisão dos receptores GPS. Dave Ulmer (membro de uma lista usenet sci.geo.satellite-nav) colocou um container em Portland, Oregon, e registrou suas coordenadas em um site. O recipiente foi encontrado pelos usuários do site, marcando sua visita tanto no logbook (diário de notas) quanto no ambiente online. Há mais de 2,7 milhões de jogadores registrados, crescendo a uma taxa de 2.500 novos registros por dia em 2009 (FARMAN, 2009). Existem atualmente 850 mil geocaches escondidos em todo o mundo (incluindo Antártica). Uma vez que os jogadores encontram a cache, assinam seu nome de jogador no logbook, juntamente com a data da descoberta. Esta 24 O Sistema de Posicionamento Global (do original inglês Global Positioning System ou do português “Geo-Posicionamento por Satélite"), inclui um conjunto de satélites e é um sistema de informação eletrônico que fornece via rádio a um aparelho receptor móvel a posição do mesmo com referencia às coordenadas de latitude e longitude. Saiba mais: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sistema_de_Posicionamento_Global Acesso em: 26 abr 2010. 53 assinatura física é uma exigência do jogo, para provar a sua presença no cache. Assim começou o geocaching, jogo de caça ao tesouro com GPS, que coloca em relação o espaço físico com o ciberespaço, evidenciando um espaço híbrido, uma realidade mista, de presença-ausência. Essa nova configuração de jogo vai disseminar práticas de nomadismo tecnológico, ao transformar o espaço público em cenário de jogo, já que o movimento na cidade é condição para sua existência, remetendo à ideia de deriva ou psicogeografia de Guy Debord. Segundo Leão (2004, p. 9) “a psicogeografia, proposta pelos situacionistas, no final dos anos 50, busca resgatar e redescobrir ligações entre os conteúdos afetivos e os espaços públicos, como registro da experiência de deambular, à deriva”. A inserção das novas tecnologias (nômades) causa profundas modificações na relação com o espaço, nas formas sociais e práticas culturais. Essas errâncias urbanas representam um tipo específico de apropriação do espaço público, que não foi pensando nem planejado pelos urbanistas, segundo Jacques (2006). Nesse sentido, o geocaching, como prática cultural, originada da convergência entre jogos populares e as tecnologias móveis, funcionam como estímulo aos novos e velhos rituais sociais: trocas, informações, cooperação, reforço da coesão, estimulando um capital social, ou seja, mecanismos de confiança, de reciprocidades, compartilhamento de normas e valores pelas redes, dados a convergência entre elementos tradicionais, como o jogo caça ao tesouro com as novas tecnologias de informação e comunicação contemporâneas (LEMOS, 2007b). Esta prática cultural, portanto, possui grande capacidade de socialidade e subjetivação, pelas suas próprias características de deriva, descobertas e partilha de experiência. Alguns passos para perseguir esta aventura incluem: o aprendizado do funcionamento do GPS; o registro da conta no site geocaching.com; a seleção de um cache, a partir das dificuldades de localização e de terreno, segundo o nível de experiência do grupo; a ação de esconder caches; o registro de suas coordenadas; a descoberta de uma nova cache, a assinatura no seu logbook, a ação de levar algo do cache e deixar algo no seu lugar (regra do jogo); o retorno para casa e compartilhamento desta experiência com os demais jogadores no site geocaching.com. 54 Segundo o site organizador do jogo25, as variações do geocaching incluem as diferentes formas dos recipientes: geocache tradicional, multicache, puzzle, cache-evento ou Cache In Trash Out Event. Quanto ao aspecto da dificuldade para localização e de acesso ao terreno, os níveis variam de 1 a 5, crescendo da menor para a maior dificuldade. Há um guia de uso no site no qual orienta que os geocaches devem ser guardados em lugares seguros; recomenda-se que não se coloque alimentos, explosivos ou objetos cortantes nos recipientes. Como uma prática cultural de aventura, o geocaching não está alicerçado exclusivamente pelo discurso da busca pela natureza ou pelo interesse na vida saudável, pois traz na mobilidade urbana a sua maior motivação, o que leva à deriva, descobertas e uma experiência compartilhada. No lugar de uma relação enérgica (Coelho dos Santos, 1997), comum às modalidades do esporte moderno (às quais correspondem noções como destreza muscular, força, potência, busca de resultados e performances, recordes, etc.), o que parece evidenciar-se na vivência das práticas corporais de aventura é uma relação estética com o corpo e com os elementos da natureza, os quais interagem no plano das ressonâncias, do estilo, da ludicidade, das composições e negociações. (VILLAVERDE, 2003, p. 67) Concordando com Villaverde (2003), opto por designar tal experiência como prática cultural, por considerar inadequado e por não atender, ao reduzir, exclusivamente, suas motivações pelo benefício físico ou pela característica competitiva típica dos esportes modernos. Considerações finais A vivência desta experiência de jogo coloca em questão as possibilidades lúdicas por meio destas novas tecnologias, assim como apontam novas formas de apropriação urbana e a conformação de uma nova cultura urbana e de jogo. Compreender essa dinâmica é fundamental para uma visão 25 Confira em: http://www.geocaching.com/, site mantido pela Groundspeak, Inc. A versão em português está em: http://www.geocachingbrasil.com.br/ 55 mais profunda do complexo processo comunicacional contemporâneo. Esperase que este trabalho possa dar visibilidade ao jogo e agregar novos participantes; estimular novas pesquisas e novas práticas no ambiente urbano, incentivar a deriva e promover encontros mediados (ou não) por meio desta aventura. Por meio de noções, ou metáforas, como orgia, socialidade, tribo, emoção, estética, pretendo mostrar que o laço social não é mais unicamente contratual, racional, simplesmente utilitário ou funcional, mas contém uma boa parte de não-racional, de não lógico, algo que se exprime na efervescência de todas as formas ritualizadas (esporte, música, canções, consumo, consumição, revoltas, explosões sociais) ou, em geral, totalmente espontâneas. (MAFFESOLI, 2005, p. 7) O que Maffesoli (2005) quer nos indicar com esta passagem é a ideia de religação, comum em diversas experiências efêmeras das quais promovem relações, marcam um espaço, favorecem conexões. Assim, os jogos urbanos dos dispositivos móveis parecem ampliar possibilidades de experimentar formas renovadas de sociabilidade e subjetividade. Para o autor, em processos de massificação constante acontecem condensações e organizam-se tribos mais ou menos efêmeras que comungam valores minúsculos e, num balé sem fim, chocam-se, atraem-se e repelem-se numa constelação de contornos mal definidos e totalmente fluidos. (MAFFESOLI, 2005) Essa é a principal característica das sociedades pós-modernas. E se o principal antídoto contra o espetáculo das cidades pode estar na sua apropriação e (re)criação pelos sujeitos, acredito na construção de outra cultura urbana, repleta de situações (jogos, deambulações, derivas) e desvios, apoiada pela assertiva de Jacques (2003, p. 13): O interesse dos situacionistas pelas questões urbanas foi uma conseqüência da importância dada por estes ao meio urbano como terreno da ação, de produção de novas formas de intervenção e de luta contra a monotonia, ou ausência de paixão, da vida cotidiana moderna. A crítica urbana situacionista permanece assim, em sua essência, pertinente. 56 Pensar, portanto, a inclusão pela aventura, seja no urbano ou na natureza, permanece uma questão central, atual, carecendo de novos estudos, pesquisas e análise sobre onde e como podemos coletar elementos para uma educação para/pelo lazer na cidade, considerando-o como campo possível de contra-hegemonia, pois só assim faz sentido pensar nos seus aspectos educativos e de inclusão. REFERÊNCIAS ALENCAR VIANA, Juliana de. Lazer e tecnologias da informação e comunicação (TICs): desafios para pensar a Animação Cultural na rede – um estudo da comunidade EstudioLivre.org. 2010. Dissertação. Programa de Mestrado em Lazer, Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. Disponível em: http://bazar21.wordpress.com/2010/03/22/dissertacao-demestrado-sobre-a-comunidade-estudio-livre/ Acesso em: 26 abr 2010. 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Houve uma redução do percentual de gordura corporal de 2,11 % e 3,14 % para os sujeitos do sexo masculino e feminino, corrspondendo a 2,09 e 2,08 Kg, respectivamente. Houve também um ganho de massa corporal magra de 5,22 Kg para o sujeito do sexo feminino e de 3,2 Kg para o sujeito do masculino. Os sujeitos da pesquisa atingiram reduções de percentual de gordura e ganho de massa corporal magra similares a praticantes de exercícios físicos após dois meses de atividades físicas regulares e de ultra-atletas submetidos a provas de intensidades altíssimas. Embora limitado a dois sujeitos, os resultados deste estudo tendem a concluir que o cicloturismo, além de uma atividade de lazer, pode alterar positivamente o perfil antropométrico de seus praticantes, reduzindo a gordura corporal e aumentando a massa corporal magra. Palavras-chave: Cicloturismo. Antropometria. Composição corporal Introdução Uma das melhores formas de explorar novos lugares é pedalando. É mais rápido que caminhar, não se compara ao estresse causado por dirigir um automóvel, não causa poluição e integra-se a natureza (SIDEWELLS, 2003). Não se sabe ao certo quem é o “pai” da bicicleta ou a data de seu surgimento. Pequini (2000) mostrou de forma minuciosa sua história, de um protótipo de madeira sem pedais e não dirigível a um dos meios de transporte mais utilizados no mundo, relatando sua evolução tecnológica e popularidade ao longo dos séculos. A descoberta do pneu a ar foi em 1887 pelo francês John Bloyd Dunlop fez a popularidade da bicicleta aumentar de tal forma que já existiam cinco mil ciclistas na França em 1890, e dez milhões em 1900. A 60 bicicleta também foi utilizada durante a guerra por soldados franceses, holandeses, belgas e espanhóis. O modelo era dobrável e era carregado nas costas como uma mochila. No início do século XX os países industrializados a adotaram como meio de transporte, o que já ocorrera em países da América, Ásia e África (BUSTO, 1992). Nos anos 80 os americanos revelaram para o mundo um esporte que pode ser praticado por pessoas de todas as idades: o mountain bike (bicicleta de montanha em inglês). Pequini (2005) enfatizou que os movimentos ecológicos muito populares nesta década colaboraram com a expansão do esporte, já que o mountain bike era basicamente praticado em descidas dentro de parques florestais americanos. No final do século passado a bicicleta passou a ser foco de estudos na área esportiva, fazendo com que as pessoas aumentassem seu interesse em ter uma bicicleta para praticar esporte, brincar ou locomover-se (PEQUINI, 2005). Atualmente a bicicleta de ciclismo é utilizada em diferentes modalidades, tais como provas de triatlo, contra relógio e Tour de France; e as bicicletas tipo mountain bike são utilizadas em provas tipo down hill e cross cowntry (NUMA, 1997). A bicicleta também é amplamente utilizada como meio de transporte, a exemplo da China que possui a maior frota de bicicletas do mundo. Outra maneira de utilizar a bicicleta é através da prática do cicloturismo, que pode ser definido como uma atividade de turismo que utiliza a bicicleta como o principal elemento na realização de um percurso turístico (ABNT, 2007), sendo uma viagem que pode ter a duração de um dia, caracterizando-se por um passeio a um determinado local; uma semana, conhecendo outras localidadades; ou uma viagem ao redor do mundo, utilizando somente a bicicleta como meio de transporte (SIDEWELLS, 2003). Grande parte dos cicloturistas utilizam bicicletas do tipo mountain bike, adaptadas para a prática da modalidade, acoplando acessórios indispensáveis tais com bagageiro e alforje traseiro, pára-lama, bolsas de guidão, bolsa de selim e cadeado. 61 Figura 1. Mountain bike adaptada para o cicloturismo. Fonte: do autor. Embora poucos trabalhos científicos tenham investigado o assunto, Schetino (2004) lembra que o aumento de participantes de cicloturismo é comprovado com o aumento do número de livros encontrados nas livrarias e de páginas na internet com relatos de viagens independentes. O objetivo da presente pesquisa é demonstrar as alterações antropométricas em dois ciclistas, de ambos os sexos, com idade entre 35 e 40 anos, após uma viagem de cicloturismo pelo Estado de Santa Catarina. Materiais e Métodos A pesquisa caracteriza-se como uma pesquisa pré-experimental com delineamento pré e pós-teste de amostras pareadas. Segundo Liberali (2008), pesquisa experimental é aquela que manipula as variáveis para verificar a relação de causa e efeito. Este estudo contou com a participação de dois cicloturistas, praticantes da modalidade desde 2002, com viagens pela Europa e América do Sul e praticantes de mountain bike desde 1990. Antes do início da coleta dos dados os ciclistas foram esclarecidos sobre os objetivos e a metodologia da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), conforme 62 preconiza a resolução nº 196 do Conselho Nacional de Saúde de 10 de Outubro de 1996. A coleta dos dados foi realizada em dois momentos, antes e após a viagem, na sala de antropometria do Laboratório de Esforço Físico (LAEF) da Universidade Federal de Santa Catarina. As variáveis mensuradas foram: massa corporal, perímetros e dobras cutâneas. Para a mensuração da massa corporal e da estatura, foram utilizados os procedimentos propostos por Alvarez e Pavan (2007). A massa corporal foi mensurada com uma balança digital com precisão de 100g da marca Filizola, modelo PL-200, e a estatura foi determinada com o uso de um estadiômetro da marca Sanny com precisão de 0,1 cm. A fita antropométrica utilizada para a mensuração dos perímetros corporais foi da marca Mabbis, modelo Gulick com precisão de 0,1 cm. As dobras cutâneas foram mensuradas pelo mesmo avaliador, com um adipômetro da marca Cescorf, com precisão de 10g/mm2. Cada dobra cutânea foi mensurada três vezes e, seguindo os procediementos de Benedetti, Pinho e Ramos (2007), a média aritmética de cada medida foi utilizada para estimar a densidade e o valor de gordura corporal. A composição corporal foi feita através do cálculo da estimativa da gordura corporal, a fim de fracionar o corpo em massa de gordura (MG) e massa corporal magra (MCM) (PETROSKI, 1995). Para o sujeito do sexo feminino, a equação utilizada para estimar a densidade corporal utilizada foi a de Jackson e Colaboradores (1980) para brasileiras com idade entre 18 e 55 anos: D=1,0970 – 0,00046971 (Σ7DC) + 0,00000056 (Σ3DC)2 – 0,00012828 (ID), onde: Σ7DC = somatório das sete dobras cutâneas (subescapular, tríceps, peitoral, axilar média, supra-ilíaca oblíqua, abdominal e coxa média), e ID = idade do sujeito da pesquisa. Para o sujeito do sexo masculino utilizou-se a equação de regressão de Petroski (1995) para brasileiros com idade entre 18 e 66 anos: D=1,10726863 – 0,00081201 (X4) + 0,00000212 (X4)2 – 0,00041761 (ID), onde X4 = somatório das quatro dobras cutâneas (subescapular, tríceps, supra-ilíaca oblíqua e panturrilha) e ID = idade do sujeito da pesquisa. 63 A equação de Siri (1961) foi utilizada para converter os valores de densidade corporal em percentual de gordura (%G): % G = 495 / D – 450, onde D = densidade corporal. Utilizou-se a estatística descritiva (média, desvio padrão) e tabelas de freqüência para analise dos dados. Considera-se como limitação deste estudo, a inexistência de um registro diário alimentar para determinação da ingestão calórica. O percurso escolhido para os praticantes desta viagem de cicloturismo foi um circuito de 498,2 Km pelas montanhas da Serra Geral de Santa Catarina. O percurso caracterizou-se pela existência de longas subidas, totalizando uma ascenção aproximada de 2.914 metros. Figura 2. Percurso realizado pelos cicloturistas. Fonte: Guia Quatro Rodas 2007. 64 Quadro 1. Percurso, distância, velocidade média, tempo de duração de cada etapa e altitude final de cada etapa. Dia Percurso Distância Velocidade média Tempo Altitude 1 Rancho Queimado 59,4 Km 13 Km/h 4h33 810 m 2 Santa Rosa de Lima 68,1 Km 12,7 Km/h 5h21 240 m 3 Grão-Pará 45 Km 16,3 Km/h 2h44 93 m 4 Lauro Müller 62 Km 10,9 Km/h 5h39 220 m 5 Cruzeiro 51,8 Km 10 Km/h 5h08 1245 m 6 Urubuci 50,3 Km 14,9 Km/h 3h21 980 m 7 Rancho Queimado 104 Km 14,8 Km/h 4h56 810 m 8 Florianópolis 57,6 Km 19,7 Km/h 2h55 0 Fonte: dados coletados pelo autor. Apresentação e Discussão dos Resultados O estudo foi realizado com dois sujeitos de ambos os sexos. Na tabela 1, apresenta-se os valores do perfil antropométrico. Tabela 1: Valores descritivos do perfil antropométrico dos sujeitos da pesquisa Variáveis Antes Depois Massa Corporal F 65,7 Kg 65 Kg Massa Corporal M 98,9 Kg 95,7 Kg Estatura F 1,70 m 1,70 m Estatura M 1,86 m 1,86 m IMC F 22,73 Kg/m2 22,49 Kg/m2 IMC M 28,66 Kg/m2 27,73 Kg/m2 Onde F refere-se a valores para o sujeito do sexo feminino e M para masculino. 65 A Tabela 1 apresenta os dados descritivos relativos ao perfil antropométrico dos sujeitos da pesquisa. Pode-se perceber que, embora não houvesse controle na ingestão alimentar, ambos os indivíduos tiveram uma redução na massa corporal total após o final da viagem de cicloturismo. Esta redução é mais evidente no sujeito do sexo masculino, correspondendo a 3,2 Kg de perda total de massa corporal, enquanto que o sujeito do sexo feminino perdeu um total de 700 g de massa corporal total. A perda de peso era esperada devido ao esforço intenso de diversas horas diárias sobre a bicicleta ao qual os sujeitos da pesquisa foram submetidos. A estatura dos sujeitos da pesquisa não foi alterada. Xavier e Colaboradores (2001) lembram que o uso da bicicleta não sobrecarrega articulações nem a estrutura da coluna vertebral, portanto não altera a estatura de seus praticantes. Houve pouca alteração no IMC dos sujeitos da pesquisa. O IMC do sujeito do sexo feminino foi de 22,73 Kg/m2 no início da viagem, para 22,49 Kg/m2 no término da viagem, totalizando uma redução de 0,24 Kg/m2. Para o sujeito do sexo masculino, o IMC foi de 28,66 Kg/m2 no início da viagem para 27,73 Kg/m2 ao final da viagem, reduzindo um total de 0,93 Kg/m2. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o sujeito do sexo feminino encontra-se dentro da faixa de normalidade esperada de IMC, que varia entre 18.50 Kg/m2 a 24.99 Kg/m2, enquanto que o sujeito do sexo masculino encontra-se na faixa sobre-peso, de 25 Kg/m2 a 30 Kg/m2. O Centro de Prevenção e Controle de Doenças, lembra que algumas pessoas podem ter o IMC alterado não somente pela quantidade de gordura corporal, mas ao alto desenvolvimento muscular, como no caso de atletas de certas modalidades. Tabela 2: Valores dos perímetros antes e depois da viagem. Perímetros (cm) Feminino Antes Masculino Depois Diferença 0 Braço relaxado 25 25 Braço contraído 25,7 26 Cintura 69 69 Abdome 74 72,8 Quadril 99,4 94 +0,3 0 Antes Depois Diferença 36,2 35,5 -0,7 39,5 38 92 89 97 94,6 110 108 -1,5 -3 66 Coxa média 53,5 50 Perna 35,5 36 -1,2 -4,4 57 52,7 37,9 38,8 -2,4 -2 -3,5 -4.3 +0,5 +0,9 A tabela 2 mostra os valores dos perímetros corporais de ambos os sujeitos da pesquisa antes e depois da viagem de cicloturismo. Pode-se observar que houve uma distribuição entre aumento e redução de valores em membros superiores, tronco e membros inferiores. Observa-se também, que os valores de perímetro de braço relaxado e de cintura para o sexo feminino, não mostrou alterações, enquanto que todos os valores para o sexo masculino mostraram algum tipo de alteração. A maior alteração de valor da variável no sujeito do sexo feminino foi o perímetro de quadril, seguido de coxa média e abdome, enquanto que o sexo masculino teve maior alteração de valores no perímetro de coxa média, seguido de cintura e abdome. De acordo com Raymond, Joseph e Gabriel (2004), os principais músculos envolvidos na pedalada são: gluteo máximo e médio, quadríceps femural, grastrocnêmio e sóleo na fase descendente, e iliopsoas, isquiotibialis e tibial anterior, na fase ascendente. Pode-se observar que um maior número de músculos envolvidos no ciclo da pedalada localizam-se na coxa, onde os valores de perímetro mostraram alterações para ambos os sujeitos da pesquisa dentre os três perímetros com maior variação de valores. Segundo Nahas (2006), a força muscular está diretamente associada à massa muscular envolvida na execução de determinado movimento. 67 Gráfico 1: Percentual de gordura (%G) antes e após a viagem de cicloturismo. 25 % de Gordura 20 15 Antes Depois 10 5 0 Feminino Masculino O Gráfico 1 mostra a redução do percentual de gordura corporal total (% G) de ambos os sujeitos da pesquisa. No início da viagem, os valores de percentual de gordura eram de 20,78 % e 20,28 % para os sujeitos de sexo feminino e masculino, respectivamente. Para o sujeito do sexo feminino, observou-se uma redução de 3,14%, o que representa um valor real de 2,09 Kg de gordura corporal após o término da viagem, resultando em um percentual de gordura de 17,64 %. Já o sujeito do sexo masculino terminou a viagem com um percentual de gordura de 18,17 %, reduzindo um total de 2,11%, ou seja, 2,08 Kg da gordura corporal total. Esta perda de gordura pode ser explicada pela intensidade do cicloturismo como atividade física. Powers (2005) explica que nos exercícios de baixa intensidade, porém prolongado, grande parte do consumo energético total provém das gorduras. Resultados de redução da massa e gordura corporal também foram encontrados nos sujeitos da pesquisa em dois estudos de Knechtle e Colaboradores. Em 2008, 17 atletas foram avaliados ao final de uma prova de Triplo Iron Man Triathlon, realizada na Alemanha em 2006. Os atletas foram submetidos a um total de 11,6 Km de natação, 540 Km de ciclismo e 126,6 Km de corrida. Em 2009, os mesmos autores mensuraram variáveis antropométricas em 28 ultra-ciclistas amadores do sexo masculino após uma prova com duração total de 600 Km. Ambos estudos resultaram em uma 68 redução de massa corporal total e de percentual de gordura, sendo que os autores concluíram que a redução no percentual de gordura foi associado com a alta intensidade das provas as quais os sujetos da pesquisa foram submetidos. Gráfico 2: Massa corporal magra (MCM) antes e após a viagem de cicloturismo. 90 Massa corporal magra 80 70 60 50 Antes 40 Depois 30 20 10 0 Feminino Masculino O Gráfico 2 mostra os valores referentes a massa corporal magra (MGM) dos sujeitos da pesquisa. Houve um ganho de massa magra para ambos os sujeitos, sendo que o sujeito de sexo feminino ganhou um total de 5,22 Kg de massa corporal magra e o sujeito do sexo masculino, 3,2 Kg de massa corporal magra. Um aumento de massa corporal magra significativo foi encontrado no estudo de Oliveira Filho e Shiromoto (2001). Após dois meses de exercícios regulares como natação, hidroginástica, ginástica aeróbica, os sujeitos da pesquisa do sexo feminino apresentaram aumento de 0,7 Kg, enquanto os sujeitos do sexo masculino apresentaram um ganho de 0,8 Kg de massa corporal magra, concluindo que o aumento dos valores de massa corporal magra foram a consequência dos esforços realizados. Conclusões O objetivo da presente pesquisa foi demonstrar as alterações antropométricas em dois ciclistas, de ambos os sexos, com idade entre 35 e 40 69 anos, após uma viagem de cicloturismo pelo Estado de Santa Catarina. Os sujeitos da pesquisa atingiram reduções de percentual de gordura e ganho de massa corporal magra similares a praticantes de exercícios físicos após dois meses de atividades físicas regulares e de ultra-atletas submetidos a provas de intensidades altíssimas. Embora limitado a dois sujeitos, os resultados deste estudo tendem a concluir que o cicloturismo, além de uma atividade de lazer, pode alterar positivamente o perfil antropométrico de seus praticantes, reduzindo a gordura corporal e aumentando a massa corporal magra. Entretanto, para comprovar estatisticamente que os resultados são significativos, é necessário a aplicação da metodologia em uma amostra. REFERÊNCIAS Associação Brasileira de Normas Técnicas. 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O presente estudo teve o objetivo de verificar se as AFAN estão sendo realizadas em uma escola publica da cidade de Bonito, MS (capital do ecoturismo do Estado); se os alunos do Ensino Médio as conhecem e/ou as praticam; e se esses saberes/práticas são adquiridos/realizados na escola ou de forma empírica. Para tanto se realizou uma pesquisa de natureza qualitativa do tipo Estudo de caso, tendo como participantes 44 alunos com idade média de 15 anos e meio, sendo 23 do gênero masculino e 21 do gênero feminino, regularmente matriculados no Ensino Médio. Os dados foram obtidos via questionário. A análise dos resultados encontrados indicou que os alunos pouco conhecem e/praticaram as atividades de aventura. As aulas de Educação Física permanecem enraizadas no desporto, sendo necessário uma ruptura de paradigmas para que as AFAN saiam do papel e sejam realmente implantadas na escola. Palavras-chave: atividade de aventura, escola, Educação Física. 1. Introdução A Educação Física escolar, embora legal, a LDB 9394/96, em seu artigo 26, parágrafo 3º a garanta na escola (BRASIL, 1996), sofre para alcançar seu lugar ao sol, pois nesse caso legalidade não é sinônimo de legitimidade. A comunidade docente não reconhece a importância desse componente curricular (SOARES, 2007). Visando essa legitimação várias atitudes vêm sendo tomadas, tendo como exemplo as ações das Secretarias de Estado de Educação do Estado de São Paulo e do Mato Grosso do Sul que buscaram sistematizar conteúdos, estratégias, objetivos para ser aplicada na Educação Física escolar e do 73 Estado do Paraná, que lançou um livro didático público para o ensino médio, de autoria de professores da rede estadual, incluindo a Educação Física. Nessa trajetória várias roupagens foram acrescentadas à tradicional Educação Física escolar, os conteúdos nas aulas ultrapassaram a barreira do paradigma desportivo, outras esferas do conhecimento ganharam destaque, várias pesquisas envolvendo a implementação de atividades físicas não convencionais na escola vem sendo desenvolvidas. Programas foram criados e avaliados envolvendo: as atividades circenses (ZAIM-DE-MELO, SOARES, 2007; AYALA, 2008), o desporto não tradicional / beisebol (ZAIM-DE-MELO, 2008) e a esgrima (ZAIM-DE-MELO, SOARES, 2009), as danças circulares (SOUZA, 2009), entre inúmeros outros. O campo da Educação Física na escola é amplo e deve ser mais bem explorado. O referencial curricular da educação básica da rede estadual de ensino do Mato Grosso do Sul para o Ensino Médio no que tange a Educação Física traz em seu corpo textual referências a atividades alternativas. Esportes e ou atividades de lazer na natureza (caminhadas, corrida de orientação, trilhas, noções de acampamento, mountain bike, entre outras); esportes urbanos e ou radicais (skate, patins, bicicross, escalada entre outras) (MATO GROSSO DO SUL, 2007, p. 72) Diante do exposto o presente trabalho teve o objetivo de verificar se essas atividades estão sendo realizadas em uma escola publica da cidade de Bonito, MS; se os alunos do Ensino Médio as conhecem e/ou as praticam; e se esses saberes/práticas são adquiridos/realizados na escola ou de forma empírica. Optou-se pela cidade de cidade de Bonito, pois a mesma é conhecida nacionalmente pelas suas belezas naturais; celeiro do ecoturismo sul-matogrossense. Tem entre seus atrativos o chamado circuito de aventura no qual os visitantes podem fazer trilhas interpretativas, descidas de rapel, de bóia cross pelo Rio Formoso, participar do circuito de arvorismo, e praticar mountain bike (BONITO, 2010). 74 O Município de Bonito, de acordo com Mariani (2003) apud Lobo e Moretti (2008) enquadra-se como uma área turística de caráter regional e nacional, em função do grande número de atrativos, principalmente naturais por ela oferecidos. 2. As Atividades Físicas de Aventura na Natureza (AFAN) As atividades de aventura, no princípio eram destinadas apenas àqueles que eram dotados de heroísmo e coragem (PEREIRA, ARMBRUST e RICARDO, 2008) e foram ganhando destaque na mídia em meados da década de 90 do Século XX (SOTO, 2007). Segundo Munhoz, Gonçalves Jr (2004) encontra-se na literatura várias nomenclaturas para as atividades de aventura, ainda não existindo um denominador comum: São muitas as nomenclaturas designadas a este tipo de atividade. A mais divulgada pela mídia é Esportes de Aventura, outros nomes comuns são: Esportes em Integração com a Natureza, Esportes Radicais, Esportes de Aventura na Natureza, Esportes Californianos, Esportes em Liberdade, Esportes Selvagens, Atividades Deslizantes de Aventura e Sensação na Natureza, Atividades Esportivas de Diversão e Turísticas de Aventura, Esportes Tecnológicos e Novos Esportes. Todas estas designações mostram alguma característica relacionada com as atividades desenvolvidas (p.2). As atividades de aventura são aquelas que trazem como experiência o risco (real ou imaginado) e a incerteza, encontradas em diferentes ambientes, podendo ser numa trilha interpretativa, numa descida de patins num declive acentuado e/ou em uma escalada indoor, sempre associadas a sensação de prazer. Existe uma aproximação com a natureza devido a imprevisibilidade do meio (PIMENTEL, SAITO, 2010). Betrán e Betrán (2006) definem as atividades de aventura como: 75 ... manifestações de caráter recreativo que nascem amparadas pela pós-modernidade, no tempo do ócio ativo e do turismo e surgem impregnadas desse espírito de emulação, risco, aventura e diversão (p.181). Para Tahara e Schwartz (2003) essas atividades possuem características que as levam a ser chamadas de radicais, destacando-se o risco, a vertigem, a ousadia e a superação de limites internos e externos. Esses riscos são, na medida do possível, calculados, embora não haja treinamento extenuante para tanto, como nos desportos tradicionais (MARINHO, 2006), permitindo assim a participação de pessoas tidas como anti-heróis, as crianças, os idosos e as mulheres, em função do auxilio de aparatos tecnológicos que muitas práticas necessitam (BRUHNS apud PIMENTEL, 2006). As atividades de aventura na natureza são divididas de acordo com os ambientes físicos em que são praticadas. Nos ambientes: terra, sobre um meio estável e curso bidimensional (vertical e horizontal) - skateboard, snowboard, montain bike, esqui acrobático, escalada livre, - água, meio instável e curso bidimensional - surf, hidrospeed, rafting, cascading – e ar, meio instável e curso tridimensional - rope swing, queda livre em pára-quedas, asa delta, parapente, bungee jump (BETRÁN e BETRÁN, 2006). Pereira, Armbrust e Ricardo (2008) incluem o meio urbano, abarcando assim as atividades feitas nas cidades que possuem as características semelhantes e/ou iguais as já descritas (exemplo: skate, patins in line, parkour, etc.) Betrán e Betrán (2006) afirmam que as atividades de aventura possuem três frentes de atuação: a turístico-recreativa, a de rendimentocompetição e a educativo-pedagógico. 3. Atividades de aventura: aspectos educacionais Em países como a Nova Zelândia26 e a Austrália os alunos possuem em seu currículo uma disciplina nominada outdoor education (educação ao 26 A Nova Zelândia é considera a capital mundial dos desportos de aventura. 76 livre) que visa oferecer aos alunos do ensino secundário o desenvolvimento pessoal e social com programas de atividades práticas realizadas ao ar livre. Neill (2001) usa o termo "educação ao ar livre" para todas as atividades educativas propositadamente concebidas em ambientes naturais ou novos, que visam o crescimento através da filosofia do desafio. Para o autor são situações típicas de aprendizagem que incluem a terra e/ou a água como lócus para sua realização e atividades como caminhadas ao ar livre, remar em um rio e/ou lago e acampar. O objetivo geral destes programas é o reforço das competências pessoais dos participantes e o desenvolvimento social, sendo que alguns programas também buscam resultados específicos, tais como a gestão de problemas de comportamento ou o aperfeiçoamento do desempenho acadêmico. A Outdoor Education (OE) foi incluída nos currículos neozelandeses (Health and Physical Education in the New Zealand Curriculum), para alunos a partir do 10º ano da escolarização, em 1999, com a reforma curricular, sendo uma das sete áreas de ensino/aprendizagem a ser ensinada (COSGRIFF, 2008). Uma das funções da OE que consta nesse novo currículo é a aprendizagem sobre as tradições, valores e heranças da sua própria cultura e de outros grupos culturais, incluindo os tangata whenua (povos da terra). Betrán e Betrán (2006) ponderam que as AFAN podem fazer parte dos conteúdos preconizados pela Educação Física presente na escola, uma vez que essas atividades conduzem ao desenvolvimento de padrões motores novos em contato direto com a natureza, pois esse tipo de ambiente (campos acidentados, montanhas, rios, etc.) produz certa incerteza motora. Outro fator apontado pelos autores que deve ser levado em conta relaciona-se com a educação ambiental27 o contato com o meio ambiente produz ou deveria produzir no aluno a consciência, a necessidade de preservação. Nesse contexto, mais um aspecto que não pode ser esquecido é a possibilidade da co-educação: 27 Um dos temas transversais à serem trabalhados em toda educação básica, propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1997). 77 Por ser um conjunto de práticas recente, de indiscutível corte pósmoderno e processo de execução personalizado, mas desenvolvido em companhia, realizam-se mediante uma autêntica co-educação sem distinções de sexo, nível motor, interesse competitivo, ou diferenciação cultural (BETRÁN e BETRÁN, 2006, p.183) Segundo Le Breton (2006) nas atividades radicais o praticante “penetra em outra camada da sua existência... se sente apaixonadamente vivo, experimenta a sensação de aceder ao real pela primeira vez na vida” (p. 105). Sendo assim as práticas radicais se enquadram na Ilinx28 – a busca pela vertigem, proposta por Caillois (1990). Para a Educação Física escolar a utilização de atividades de aventura se apresenta como um alento uma vez que, ao contrário dos esportes tradicionais (ainda conteúdo hegemônico das aulas) cujos elementos levam a práticas excludentes, “o tempo/espaço da prática é comum a todos independente do seu nível de aptidão física, já que este critério não é um elemento que orienta essas práticas” (DIAS, 2004, p. 4). Contemplando assim o princípio da não exclusão proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais para a Educação Física (BRASIL, 1998). 4. O trilhar metodológico A tipologia da pesquisa que norteou a execução do presente estudo é de natureza qualitativa do tipo Estudo de Caso, com orientações em Lüdke e André (1986), indicando que quando se quer estudar algo singular com valor em si mesmo deve-se optar por esse desenho metodológico. 4.1 Participantes Participaram deste estudo 44 alunos com idade média de 15 anos e meio, sendo 23 do gênero masculino e 21 do gênero feminino, regularmente matriculados no Ensino Médio, em uma escola da rede estadual de ensino da 28 Nessa categoria se enquadram os jogos realizados sobre muita velocidade, impactos, quedas, etc. 78 cidade de Bonito, MS. Na referida escola são oferecidas os três anos desta etapa da educação básica, nos período matutino (1° e 2º ano), vespertino e noturno (todos os anos), sendo atendidos 388 alunos. Para esta pesquisa entrevistou-se todos os discentes presentes na escola no período matutino. 4.2 Procedimentos para coleta de dados Inicialmente entrou-se em contato com a gestora da escola explicandose os motivos da pesquisa e a necessidade da sua realização na referida Instituição. Após o aceite da direção iniciou-se uma nova etapa: a aplicação de um questionário com questões abertas e fechadas abordando os interesses dos alunos pela Educação Física, bem como as Atividades de Aventura29. O questionário foi aplicado na presença dos pesquisadores, para que se sanassem as possíveis dúvidas existentes, o que aconteceu somente com o termo trekking, o qual os alunos conheciam apenas como trilha, que foi prontamente esclarecida. Aos alunos foi dada a liberdade de não participação no estudo. 4.3 Procedimentos para análise de dados Os dados obtidos foram analisados por meio do método de Análise de Conteúdo, utilizando como referencial teórico os estudos de TRIVIÑOS (1987). O objetivo da análise de conteúdo é compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações ocultas ou explícitas. Segundo TRIVIÑOS (1987), o método de análise de conteúdo deve seguir três etapas básicas: a pré-análise, a descrição analítica e a interpretação inferencial. Inicia-se com a pré-análise, etapa em que o material é organizado, buscando-se o recolhimento de dados e a estruturação das informações para análise posterior. Na fase seguinte – descrição analítica – visa a aprofundar o estudo, selecionar as partes essenciais e relevantes para a investigação, almejando-se sínteses coincidentes e divergentes de idéias, que não estão 29 Na questão referente às Atividades de Aventura, foram colocadas como opção todas aquelas que são oferecidas na cidade de Bonito, MS e ou são possíveis de acontecer como os desportos radicais urbanos. 79 especificamente unidas a uma teoria. A interpretação inferencial – último passo – é caracterizada por reflexões do pesquisador, visando a contemplar as questões norteadoras do estudo. Os conteúdos manifestos em cada questionário foram organizados em categorias, possibilitando o cruzamento das idéias dos sujeitos dentro de um mesmo tema. Desta forma buscaram-se relações que permitissem o entendimento do universo coletivo pesquisado 5. Resultados e Discussão Os dados obtidos foram categorizados, organizados e serão apresentados, ora em tabela, ora em gráficos, divididos em duas categorias: Educação Física no Ensino Médio e Atividades Física de Aventura. 5.1 Educação Física no Ensino Médio Tabela 1 – Gostar ou não Educação Física Gostar da Masculino Feminino Educação Física Sim 21 16 Não 2 5 Fonte: dados da pesquisa Os dados apontam um alto índice de aprovação da Educação Física, 84% dos entrevistados afirmaram gostar das aulas de Educação Física. Embora falar que o aluno gosta das aulas de Educação Física de certa maneira é “chover molhado”. A grande questão é reconhecer a sua importância enquanto componente curricular. Vieira (2007), ao pesquisar como os alunos do ensino médio, valoram a Educação Física encontrou dados significativos, pois, embora os alunos apreciassem as aulas, quando solicitados que classificasse as disciplinas escolares em ordem a importância, tanto discentes 80 do turno matutino quanto do turno noturno, colocaram a Educação Física em último lugar. 5.2 Atividades Física de Aventura As tabelas a seguir representam quais são as atividades físicas de aventura que os alunos conhecem e o local de aquisição desse conhecimento. Tabela 2 – Atividades conhecidas /vivenciadas Atividades na Natureza Conhecidas Vivenciadas Rapel 37 02 Bóia Cross 36 17 Canoagem 33 - Mountain Bike 25 05 Mergulho 18 03 Rafting 17 - Trekking 10 05 Corrida de Orientação 07 02 Atividades Urbanas Freqüência Skate 38 11 Escalada 28 - Patins in line 12 12 Fonte: dados da pesquisa Embora a cidade de Bonito seja o celeiro do ecoturismo sul-matogrossense, nem todos os alunos conhecem todos os seus atrativos que são realizados na natureza (merecem destaque o rapel, a descida no bóia cross, a canoagem e as trilhas com mountain bike), uma vez que não houve 81 unanimidade nas escolhas nenhuma das atividades apresentadas no instrumento de pesquisa. Nas atividades urbanas de aventura, o skate é o mais conhecido pelos alunos, um dos fatores que podem contribuir com esse resultado é o fato que esse desporto cresceu aproximadamente 210% em 04 anos e atrai constantemente a atração da mídia (GALLIANO, MAYER, 2009). 5.2.1 Local de aquisição do conhecimento Os conhecimentos relacionados à cultura corporal de movimento deveriam ser adquiridos na educação formal, pois o aluno teve no mínimo 07 anos de Educação Física escolarizada, a escola seria a fonte primaria desses saberes. A mídia e outras Instituições Sociais corroborariam para essa formação. Na prática observa-se que isso não ocorre com as atividades de aventura, pois, nenhum aluno indicou a escola como fonte de obtenção desse saber. Tabela 3 – Local de aquisição do conhecimento Local Freqüência Passeios 14 Mídia 26 Projetos sociais 02 Amigos 08 Familiares 03 Trabalho 02 Fonte: dados da pesquisa Com os desportos tradicionais que embora sejam “teoricamente” trabalhados na Educação Física, acontece situação semelhante, a escola pouco contribui com os alunos na aquisição desses saberes. Mundier Jr (2009) ao verificar o que concluintes do Ensino Médio sabiam sobre os quatro esportes coletivos mais trabalhados nas aulas de Educação Física (voleibol, 82 basquete, handebol e futebol), com um instrumento de pesquisa com questões simplificadas sobre os conhecimentos necessários para se praticar cada um desses desportos, encontrou dados alarmantes, pois o pouco que os alunos conheciam, era na maioria das vezes relacionado à dimensão procedimental dos conteúdos, não ultrapassando a barreira do fazer por fazer, o raro conhecimento relacionado à dimensão conceitual, tinha a mídia como fonte de aquisição. 5.2.2 Local de vivência das atividades físicas de aventura Com a relação à vivência das atividades de aventura, quer seja na natureza ou na cidade, não houve relato da mesma ter sido proporcionada nas aulas de Educação Física. Não pratiquei nas aulas de Educação Física porque na escola não são oferecidas atividades assim (Participante A). Não pratiquei nada, mal a Educação Física tem futebol (grifo nosso), imagina esses esportes, às vezes conseguimos praticar outra coisa como o basquete (Participante C). Um dos motivos que podem contribuir para que o aluno não tenha acesso às esses passeios (nome dado as atividades oferecidas em Bonito) é o alto custo cobrado (ver tabela abaixo), mesmo em baixa temporada, como afirma um dos participantes do estudo. Nenhuma, porém tem motivo não tem verba, nem transporte (Participante B). Tabela 4 – Preço de alguns passeios de Bonito na baixa temporada Passeio valor Abismo Anhumas - Rapel e Flutuação 360,00 83 Abismo Anhumas Autônomo - Rapel e Mergulho 530,00 Arvorismo Cabanas 75,00 Barra do Sucuri - Flutuação 65,00 Boca da Onça - Cicloturismo 102,00 Bóia Cross Cabanas 40,00 Bote Karajá (embarque Ilha Bonita) 50,00 Ceita Corê - Trilha e Cachoeira 74,00 Fonte: http://www.atrativosbonito.com.br/tabela_precos.php?cat=4 Embora a cidade de Bonito tenha o ecoturismo como base da sua economia, não oferece aos locais a oportunidade de experimentarem suas belezas. Cobra-se do bonitense o mesmo valor pago por um turista normal. Não existem políticas públicas voltadas ao atendimento do munícipe. Tabela 5 – Ter as atividades de aventura como conteúdo das aulas de Educação Física. AFAN como conteúdo Freqüência A favor 41 Contra 03 Fonte: dados da pesquisa A inclusão das atividades de aventura como conteúdo nas aulas de Educação Física é algo que os alunos almejam, dos 44 entrevistados apenas 03 afirmaram não querer dispor dessa prática. Essas atividades, nesse caso, assumem um duplo papel (são novidade e possuem o risco como característica) objetivando ativar o sistema de recompensa30 cerebral do 30 O sistema de recompensa é parte integrante do sistema límbico e um dos mais antigos componentes do Sistema Nervoso Central sendo responsável por criar uma expectativa positiva ante aos prazeres da vida, quando se pensa em uma comida apetitosa, em uma 84 adolescente, que de certa maneira, encontra-se preguiçoso, fazendo com que atividades que antes pareciam prazerosas, se tornassem tediosas (HERCULANO-HOUZEL, 2005). Para a autora todo o sistema de recompensa sofre uma grande baixa e por isso não é fácil deixar um cérebro adolescente satisfeito, sendo assim essa baixa na capacidade de ativação desse sistema sugere uma mudança nas atividades a serem ofertadas para os jovens. Se a busca por novidades arriscadas se manifesta, ela pode ser canalizada para riscos controlados: escalada indoor, acrobacias aéreas numa escola de circo, corridas de orientação, ciclismo cross-country e longas caminhadas com uma barraca dentro da mochila são opções mais seguras do que bungee jumping [...] ou pegas de carro. O fato é que adolescentes são por definição seres que correm risco. Se o risco é inevitável – e, na verdade desejado! -, melhor então descobrir como usá-lo ao seu favor (HERCULANO-HOZEL, 2005, p.131), Sendo assim, não adianta o professor se martirizar perguntando o que mudou? Aquele aluno que adorava sua aula agora não dá mais bola para a mesma. A solução é buscar na novidade a solução, pelo menos parcial, de seus problemas. As atividades de aventura cabem perfeitamente nesse contexto. 6. Considerações Finais As atividades de aventura, realizadas na natureza ou no meio urbano, pelos seus componentes: a incerteza motora (possibilita a ampliação do repertório motor), a liberação de adrenalina, a co-educação (indivíduo / ambiente), a não exclusão (os anti-heróis podem fazer parte do grupo) por si só grande quantia de dinheiro, ou no objeto da paixão: a dopamina, uma substância neurotransmissora, se encarrega da comunicação entre as partes que compõem o sistema de recompensa (CAMARGOS et all. 2009) 85 deveriam estar nas aulas de Educação Física. No estado do Mato Grosso do Sul já foi dado um passo para que isso aconteça, as atividades de aventura, veiculam nas orientações curriculares para os professores. Mas só a presença em documentos oficiais não é suficiente, os dados encontrados neste estudo provam que mesmo em cidades que possuem grande parte da sua receita no ecoturismo como Bonito isso não acontece, a proximidade com a natureza poderia ser um fator decisivo para a inclusão das AFAN nas escolas favorecendo a educação ambiental, essencial para que o município continue usufruindo da natureza. Os alunos pouco conhecem e/ou vivenciaram as AFAN, suas aulas de Educação Física, mesmo nos conteúdos tradicionais, ainda permanecem com a política do ”eu finjo que ensino e vocês fingem que aprende”. A situação encontrada sugere mudanças, faz-se necessário que haja uma ruptura de paradigmas, e os professores incorporem as AFAN em sua prática. O exemplo de países como a Nova Zelândia deveriam ser seguidos, ou como diria o célebre escritor brasileiro: Oswald de Andrade serem antropofagizados, trazendo o que é bom para a nossa realidade. REFERÊNCIAS AYALA, D.J.P. 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In: XI Seminário de Educação Física Escolar, 2007, São Paulo: EEFEUSP Junior, p. 110, Anais... 2007. 88 ESPORTES DE AVENTURA: ENTRE O URBANO E A NATUREZA Jarbas Pereira Santos - Graduado Educação Física - Faculdades Unidas do Norte de Minas – Funorte, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil Marilda Teixeira Mendes - Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil Michela Abreu Francisco Alves - Graduada em Educação Física pelas Faculdades Unidas do Norte de Minas-FUNORTE, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil E-mail: [email protected] RESUMO Os esportes de aventura têm se tornado cada vez mais comum nos dias atuais, despertando grande interesse na sociedade brasileira, onde novas modalidades surgem e concomitantemente aumenta o número de adeptos a essas práticas. As visitações na natureza, que expressam pelas manifestações do corpo, possuem influências que permeiam desde a questão ambiental, até questões pessoais, como a fuga da rotina e descanso. O estudo teve por objetivo investigar através de pesquisa bibliográfica, os esportes de aventura com ênfase na natureza como parte integrante da Educação Física e essa relação entre os seres humanos e o meio ambiente. Com base nos levantamentos obtidos acerca dos esportes de aventura em específico da prática na natureza, o indivíduo acaba por pensar coletivamente e individualmente, mas sendo parte de um todo comum, valorizando a cooperação e o companheirismo, uma vez que como seres humanos tornam-se mais sensíveis e autoperceptíveis, onde esses valores e interações na natureza acabam por serem retomadas na volta ao cotidiano. Os profissionais da educação física, uma vez interessados na atuação, por sua vez deverão ater a necessidade de uma formação e capacitação profissional específica para atuar na área. Palavras-chave: Esportes de Aventura; Natureza; Educação Física. Introdução Os esportes de aventura têm se tornado cada vez mais comum nos dias atuais, despertando grande interesse na sociedade brasileira, onde novas modalidades surgem e concomitantemente aumenta o número de adeptos a essas práticas. As visitações na natureza, que expressam pelas manifestações do corpo, possuem influências que permeiam desde a questão ambiental, até questões pessoais, como a fuga da rotina e descanso. As experiências íntimas do corpo com a natureza representam uma forma de comunicação, um diálogo entre o homem e o mundo natural. Diálogo 89 este, crítico ou não, dependendo da relação do homem com sua corporeidade expressa no movimento humano, os quais sofrem influências diretas de sua cultura e valores (BRUHNS, 1997b). Segundo Pimentel (2008) os esportes de aventura são adotados como opção de ócio ativo no tempo livre, especialmente entre a população púbere e adulta-jovem das grandes cidades. Para a saúde pública esse tipo de prática é um objeto contraditório, pois muitas pessoas são vítimas de acidentes fatais quando não agem com segurança, mas, por outro lado, a aventura é utilizada como uma forma lúdica de controle do estresse e de outros fatores de risco para diferentes padecimentos. Assim, praticar esportes de aventura pode ser um fator de risco e, ao mesmo tempo, uma forma de se adaptar às ameaças da vida cotidiana. Deve-se antes de tudo informar-se dos profissionais que atuam na área e de suas referências profissionais, equipamentos de segurança, treinamentos, entre outros, para que seja uma atividade de risco controlado e de vivência diferenciada e prazerosa na natureza. Diversas experiências humanas foram relatadas e documentadas sobre o tema que antes era destinado apenas aos seres dotados de heroísmo e coragem (STEINMANN, 2003; FERRERAS, 2005; HERZOG, 2001). O que tem se alterado e difundido desde o início da última década é a democratização dessas atividades, onde elas hoje são praticadas por uma diversidade de pessoas, em geral com pouco conhecimento sobre os aspectos técnicos e de segurança que elas exigem, mas que querem viver suas emoções (PEREIRA; ARMBRUST; RICARDO, 2008). O estudo teve por objetivo investigar através de pesquisa bibliográfica, os esportes de aventura com ênfase na natureza como parte integrante da Educação Física e essa relação entre os seres humanos e o meio ambiente. Esportes de Aventura Elias; Dunning (1992) acreditam ser necessário nos atermos para o fato de que, ao longo da evolução humana, sempre existiram práticas que envolvessem desafios e aventuras em que fortes emoções se faziam 90 presentes. Contudo, tais práticas não podem ser chamadas de "esportes de aventura", pelo fato, é claro, de que não eram atividades esportivas, pelo menos não no sentido que é atribuído hoje à expressão. E, por fim, estas não eram dotadas da função que o esporte assumiu mais recentemente em nossa sociedade (CANTORANI; PILATTI, 2005). Os esportes de aventura são conhecidos pela busca por sensações novas, com um caráter prazeroso, plenitude pessoal, evasão divertida e o contato com a natureza. No início da década de 90, pode-se observar uma maior esportivização dessas práticas, ou pelo menos, de grande parte desses “novos esportes”, que tiveram uma crescente procura como forma de lazer na década de 70 (BETRÁN, 2003). Cordeiro et. al (2008) exemplifica algumas atividades de esportes de aventura no ar, terra e água: As modalidades relativas ao ar: Pára-quedismo, Sky-surf; Base jump, Asa-delta; Parapente (infla e decola), Balonismo e Ultraleve. As modalidades relativas a terra: Espeleologia (exploração de cavernas), Excursionismo (caminhadas, trekking e hiking), Rallies (classe turismo), Bung jump, Rope swing (pêndulo c/ corda), Cavalgada, Orientação (caminhada e corrida), Canionismo (rapel e tirolesa), Montanhismo (escalada e caminhada), Ciclismo, Mountain bike (cicloturismo), Off-road (fora-de-estrada), Arborismo, Motocross, Sand board (prancha na areia). As modalidades relativas à água: Caiaque, Surf, Mergulho, Vela, Acqua-rider, Bóiacross, Rafting, Outrigger (canoa havaiana), Canoa, Windsurf, Moreybug (body boarding). Os características esportes de de aventura compromisso, despertam superação de em seus limites, praticantes autoconfiança, companheirismo, tolerância ao sucesso e ao fracasso, e são apontadas como sinônimo de prazer e bem-estar. A ação e a aventura são aspectos que encontramos inseridos no contexto de esportes de aventura, e para tanto devemos compreender os seus significados. O significado de ação é: movimento; atitude ou comportamento; manifestação de força e energia; capacidade de fazer algo (FERREIRA, 1989). Numa análise simples vemos que o símbolo dessas atividades está num 91 movimento importante a ser executado, um gesto técnico complexo que traduza a sua emoção, a chamada manobra. A atitude é sinônimo de ação e está ligada às tribos citadas por Uvinha (2001), pois os grupos que se relacionam no seio dessas práticas tendem a ter uma forma de linguagem, vestimenta, e comportamento que os unem. A palavra aventura do latim adventura quer dizer o que está por vir, com o sentido de desconhecido, imprevisível (FERREIRA, 1989). Esse sentido liga-se ao sentimento de buscar algo que não é tangível num primeiro momento, que é muito comum aos praticantes de modalidades na natureza, principalmente aquelas onde a distância, o clima, o esforço físico, a privação e a incerteza estão presentes. Os esportes de aventura aparecem como uma válvula de escape, considerando que os mesmos são uma forma de se escapar da pressão comportamental imposta pela sociedade. Conforme sucinta Schwartz (2006), esta dinâmica entre homem e natureza possibilita o confronto do indivíduo com suas próprias limitações e compreensão de seus comportamentos e escolhas, atingindo uma maior interação entre os processos de percepção e ação. Durante as visitações na natureza, os indivíduos deparam-se com diversas oportunidades de praticar atividades que se apresentam como espaços de reintegração entre os seres humanos e a natureza (INÁCIO et. al., 2005a). Esportes de Aventura e a Educação Física A Educação Física, sofre com a visão de um pensamento racional sobre o corpo como frisa Bracht (1999), mesmo tomando como exemplo no campo dos esportes de aventura a graduação de vias de escalada em rocha acerca da dificuldade exata para cada caminho escolhido como via de acesso ao cume das rochas, considerando as variáveis, dificuldade de movimentação, risco de queda, tempo de duração da escalada, quantidade de força exigida, qualidade das proteções, nível máximo de dificuldade do lance mais difícil da via etc, segundo FEMERJ (2007), continua existindo uma subjetividade que se baseia nos conceitos de cada indivíduo sobre o que é a escalada, uma vez que se devem levar em consideração alguns fatores como tipo de formação 92 geológica e geográfica, na inclinação natural da rocha, na história da comunidade escaladora local e até mesmo na vaidade pessoal de cada escalador que conquista uma via. A criação de regras nos esportes de aventura deve se basear na complexidade, o que vai de encontro ao pensamento de Souza (2001), quando adentra ao mundo da escalada para demonstrar uma forma de manifestação da inteligência humana: a inteligência corporal cinestésica. Completando esse raciocínio, Bracht (1999) acredita no momento de transição que a sociedade pós-moderna passa e que por esse motivo o desafio deve ser não simplificar, mas entender as relações complexas compreendidas no campo da Educação Física. A Educação Física também deve focar e não perder de vista uma de suas funções mais importantes que é o desenvolvimento integral do indivíduo, oferecendo-o situações novas e imprevisíveis existentes nos esportes praticados em meio natural. Hyder (1999), Freire; Schwartz (2005), acreditam inclusive nessas práticas como possibilidades educacionais e formadoras dos cidadãos. O que nos remete aos profissionais e educadores que necessitam se apropriar dessa nova cultura para contextualizar seus conteúdos a nova realidade da Educação Física. De acordo com Marinho; Gáspari (2003), considerando as demandas da sociedade atual, novos olhares têm se voltado ao ofício de ensinar, às condições e motivos pelos quais se ensina para quê se ensina e ao perfil do profissional que se pretende formar. Esses novos olhares são capazes de mudar, inclusive, o foco do que se entende por ensinar, aprender e ter como profissão. As pessoas que optaram por esta profissão interdisciplinar, muitas vezes não dão conta do universo de opções que ela oferece e os esportes de aventura é um deles. Os cursos de formação, nesse pressuposto, não podem mais estar atrelados à concepção de uma educação que se viabiliza apenas nos espaços formais da instituição, requisitando uma ampliação dos horizontes da ação educativa para além de seus muros e para além dos aspectos predominantemente cognitivos. Faz-se, premente, então, ousar e extrapolar na organização de estratégias pedagógicas que se utilizem dos espaços informais, 93 de modo complementar, com objetivo de focar o sujeito aprendiz por inteiro, ou seja, não apenas no cognitivo, mas também nos seus elementos afetivos e emocionais (MARINHO; GÁSPARI, 2003). Grezzana (2000) diz que o PCN (Parâmetro Curricular Nacional), evidencia a possibilidade de desenvolvimento das potencialidades humanas tendo como característica o risco, o desafio e a aventura. Sabidamente o desafio que se impõe à educação brasileira, neste século, passa pela gestão da qualidade, a partir de ações compromissadas, competentes e criativas, das quais podem emanar mudanças significativas quanto ao processo formativo dos futuros profissionais do lazer, do turismo, do ecoturismo e outros (MARINHO; GÁSPARI, 2003). Inclui-se também nessa temática os esportes de aventura pela necessidade de formação e capacitação dos profissionais de educação física para atuar na área. Conforme relata Marinho; Gáspari (2003), um profissional competente deverá estar sintonizado com outros indicadores de aprendizagem, de natureza emocional, igualmente importantes no processo de aprender a aprender. O RISCO NA AVENTURA Risco é também parte do pacote dos esportes de aventura que vem tornando-se cada vez mais populares. O risco costuma ser um tema complexo quando se fala de esportes na natureza, já que pressupõem a possibilidade de estar jogando com a própria vida. A partir do momento em que nascemos e somos apresentados ao mundo, estamos sujeitos aos problemas e contratempos que a vida oferece, ou seja, correr riscos é uma condição inerente a qualquer ser vivo (CARVALHO, 2005). Para Guzzo (2004), pensar o risco é geralmente pensar o movimento. Movimento caracterizado como ação de qualquer tipo, envolvendo escolhas que possam gerar conseqüências para o individuo que as faz. Correr riscos, em todos os sentidos, aparece como forma de ser contemporânea: coragem, adrenalina, medo, movimento. A aventura passa a ser envolvida por aparelhos de segurança, equipamentos específicos e constante monitoramento. O ingresso nesse tipo de modalidade de risco 94 mantém a tradição do fortalecimento do caráter, ou do mito do herói (GUZZO, 2004). É preciso deixar claro que, as práticas dos esportes na natureza de maneira geral exigem muita prudência, para que a experimentação do risco imaginário não se torne real. O perigo está sempre à espreita e exige atenção permanente (CARVALHO, 2005). Segundo Bartmann (2006), fisiologicamente quando a dopamina é liberada, ela excita os seus receptores e em situações de estresse e fadiga nos esportes que enfrentam essa situação, a mesma deveria diminuir a sua liberação, mas acontece o contrário, explicando a busca pelo risco. E na prática dos esportes junto à natureza, no meio selvagem, chamado de “Esportes de Aventura”, anda casado com a imagem de uma aventura cheia de valores do âmbito simbólico. Isto se dá pela associação da aventura lúdico-esportiva na natureza, onde cada objeto que a compõe (montanha, céu, abismo, nuvem, vento e etc.) assume um valor, fazendo assim uma conexão com o mundo objetivo subjetivo (BARTMANN, 2006). Há uma existência de uma dimensão positiva no enfrentamento dos riscos. Há uma velha conexão entre risco e aventura, valorizada pela ousadia passível de levar a descobertas e há também uma velha conexão entre risco e formação de caráter, expressa no valor educativo da aventura (SPINK et al., 2004). Podemos descrever valores que norteiam esse tipo de educação: aventura e desafio; compaixão e serviço; aprendizagem por intermédio da experiência; desenvolvimento pessoal; responsabilidade social e ambiental. Conforme Spink et al. (2004) os esportes de aventura ajudam primeiramente a conhecer-se melhor, depois o ensinam a abrir-se, possibilitando ajudar aos outros em sua equipe, onde essa combinação que o ajuda a ver as coisas com novos olhos e faz do esporte uma experiência incrível. Também a competição e a luta pela sobrevivência na sociedade ao mesmo tempo nos atraem e nos atemorizam, e percebemos que delas não podemos fugir. Percebemos então que o risco é um companheiro do cotidiano e que precisamos conhecê-lo, calculá-lo e controlá-lo (COSTA, 2000, p. 90). 95 Confome Cantorani; Pilatti (2005) com o grande desenvolvimento dos esportes de aventura, tanto em diversificação de modalidades quanto na organização dessas modalidades e em conseqüência, vem ocorrendo uma diminuição do nível de riscos envolvidos, pois nos últimos anos passou a contar, devido à demanda, com empresas especializadas em equipamentos de segurança, que, por sua vez, se tornam cada vez mais sofisticados. Na maioria dos esportes que envolvem altura, água e velocidade, não há espaço para erros e muito menos para desprezar equipamentos de segurança, já que a “vida” é uma só. Temos convicção de que ninguém busca os esportes na natureza com a finalidade de extirpar a própria vida. Acreditamos que a utilização de um termo mais abrangente para estes esportes, seja imprescindível para o desenvolvimento e difusão das modalidades e principalmente, para servir de ferramenta de acesso capaz de criar as condições necessárias a todos (CARVALHO, 2005). Em ambientes naturais e espaços urbanos ao ar livre, que envolvam emoções e riscos controlados, exige-se o uso de técnicas e equipamentos específicos, e a adoção de procedimentos para garantir a segurança pessoal e de terceiros e o respeito ao patrimônio ambiental e sociocultural. Esse mesmo risco, evidenciado pelas pessoas, parece afetar diferentemente a cada um, inibindo-as ou estimulando-as à prática de esportes de aventura. Qualidade da Atividade, Segurança e Consciência Ambiental A qualidade da atividade ou do serviço prestado aos iniciantes ou praticantes de esportes de aventura é o principal impacto do conceito no público consumidor será a qualidade no atendimento; a segurança e o conforto; e a consciência ambiental. É Importante que anexo a tudo isso esteja fundamentado a qualidade de vida na diferenciação do serviço. Quanto à garantia da segurança, mesmo sem um conhecimento profundo sobre as novas tecnologias e os novos equipamentos específicos que existem no mercado, voltados à prática de tais esportes, o iniciante, ou até mesmo os mais experientes devem prezar pela manutenção, certificação e 96 qualidade dos equipamentos, assim como pelas orientações específicas de segurança. É necessário o máximo de cuidado e formação, necessários para estas práticas fluírem com a segurança exigida e os sujeitos possam usufruir do prazer, na busca das emoções por meio do risco imaginário, uma vez que não garantida à segurança, pode-se acarretar transtornos inevitáveis à vida do homem. Conforme Nazari (2007) pode não parecer verdade, mas a grande maioria dos acidentes que ocorrem, acontece por erro humano, seja por falha de um equipamento que não foi usado de maneira adequada, ou por não haver qualquer tipo de manutenção neste equipamento, ou até mesmo por negligencia do praticante. É preciso que se questione sobre a atividade para que se tome conhecimento da mesma e dos riscos envolvidos. É extremamente importante que todos os equipamentos a serem utilizados tenham algum tipo de certificado de qualidade, pois é o que vai garantir a segurança do equipamento. Em qualquer esporte o praticante deve estar em boas condições físicas e mentais; planejar antecipadamente; possuir o equipamento adequado (Desde roupas até os equipamentos específicos do esporte); saber como utilizar o equipamento; levar apenas o necessário; nunca praticar sozinho; avisar outras pessoas para onde você esta indo; observar as condições meteorológicas; respeitar seus próprios limites e do companheiro; estudar antes a região que ira praticar o esporte; estar sempre acompanhado de alguém que tenha algum tipo de experiência no esporte; estar bem alimentado, entre outros (NAZARI, 2007). Na atualidade, os esportes na natureza têm desempenhado um papel tanto social como educacional e têm proporcionado algumas mudanças como a ocupação do tempo livre em uma sociedade tecnologicamente desenvolvida e conseqüentemente cada vez mais estressante; a revitalização de áreas rurais, antes em completa decadência; o despertar de interesses políticos e financeiros em todo o mundo, levando à criação de leis que regulamentam o acesso e utilização dos variados ambientes (CARVALHO, 2005). 97 Carvalho (2005) relata que o “tempo livre” é uma expressão dos tempos modernos, que reflete claramente o modo de vida das pessoas que tentam encontrar lacunas em suas vidas em busca de algo que se distancie das responsabilidades cotidianas. E elas vêm descobrindo nos esportes na natureza, formas rápidas de sentir novas sensações que aliviam de certo modo os sintomas do stress físico e mental. A velha expressão “eu tenho a vida inteira pela frente”, já não serve mais como referência nos dias de hoje. É preciso gerenciar o tempo. Outro fator importante dos esportes na natureza está relacionado com a revitalização de locais como fazendas e pequenas cidades interioranas, antes em completa decadência. O que antes era desprezado pelos proprietários como trilhas e cachoeiras, de repente tornou-se a maior fonte de renda destes locais, fazendo com que o turismo rural ganhasse força e se expandisse por todos os cantos do país agregando valor ao sustento das famílias e das propriedades (CARVALHO, 2005). Todo este novo e promissor movimento, também acabou gerando a necessidade de se criar uma legislação ambiental nacional que é considerada uma das mais completas e bem elaboradas do mundo. Infelizmente, também uma das menos respeitadas e mal aplicadas em função de interesses políticos (CARVALHO, 2005). Na formação da consciência ambiental, o corpo é concebido como receptor e emissor de informações, em uma relação acentuada pela contemplação, estimulando o aguçamento dos sentidos e filtrando-se em valores e concepções de estilos de vida (LAVOURA; SCHWARTZ; MACHADO, 2008). Lavoura; Schwartz; Machado (2008) relata que é neste “jogo das sensações”, possibilitado pela efetiva relação ser humano-natureza, que surge o espaço para a discussão da valorização e preservação do meio ambiente, sensibilizando, tocando e despertando, nestes praticantes, atitudes e condutas preservacionistas. Entretanto, há que se concordar com MARINHO (2004), quando a mesma afirma que a simples visita à natureza pode não ser suficiente para despertar nos indivíduos a consciência preservacionista. 98 É preciso que se tenha uma atividade de qualidade, onde a segurança seja primordial para as práticas de esportes de aventura, mas devemos em contrapartida, trabalhar a consciência ambiental que possibilite a conservação e preservação da natureza e a prática do desenvolvimento sustentável das áreas rurais e naturais. O Turismo Como Aventura O ecoturismo é um tipo de turismo na natureza que abrange em sua conceituação a experiência educacional interpretativa, a valorização das culturas tradicionais locais, a promoção da conservação da natureza e do desenvolvimento sustentável (KINKER, 2002). O turismo de aventura define-se, segundo Fennel (2002), como uma atividade de lazer ao ar livre que ocorre em um local de destino não usual, exótico, remoto ou de vida selvagem; envolve algum meio de transporte não convencional, e tende a ser associado a níveis baixos ou elevados de atividades. Conforme evidenciado nos estudos de Tahara; Schwartz (2002), os esportes de aventura oferecem a possibilidade de vivenciar sentimentos de prazer, em função de suas características que promovem, inclusive, a ampliação do senso de limite da liberdade e da própria vida. O turismo de aventura é um dos segmentos que atualmente mais cresce em todo o mundo e particularmente no Brasil, onde as belezas naturais e a grandiosidade do país permitem a realização de uma infinidade de atividades em diversos destinos turísticos. Inicialmente tratado como uma vertente do turismo de natureza, o turismo de aventura se disseminou pelo Brasil, desenvolvendo características próprias e resultando no surgimento de empresas e profissionais especializados (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2010). Ainda segundo o Ministério do Turismo, “o turismo de aventura compreende os movimentos turísticos decorrentes da prática de atividades de aventura de caráter recreativo e não-competitivo”. São as atividades recreativas que envolvem desafio e riscos avaliados e que proporcionam sensações diversas e novidade. Marinho (2001a) ao afirmar que, no turismo de aventura, as atividades as quais requerem os elementos naturais para o seu 99 desenvolvimento, de formas distintas e específicas, parecem realmente estar despertando maiores sensibilidades, em diferentes níveis. As intensas manifestações corporais, nessas práticas, permitem que as experiências na relação corpo-natureza expressem uma tentativa de reconhecimento do meio ambiente e dos parceiros envolvidos, expressando, ainda, um reconhecimento dos seres humanos enquanto parte desse meio. Por sua vez, o turismo de aventura ao conquistar mais espaços, a cada dia, enquanto campo de trabalho exige um novo perfil de profissional que, vencendo os desafios das diversas demandas sociais, reitere a validade desta proposta como uma estratégia criativa e lúdica, facilitadora do reencontro e da simbiose dos seres humanos com a natureza. Dessa forma, apontamos para a necessidade da existência de uma pedagogia capaz de incorporar aspectos lúdicos, potencializados por meio de uma educação para o lazer e a recreação (MARINHO; GÁSPARI, 2003). O Turismo Ecológico ou Ecoturismo surge como uma alternativa de se contrapor à lógica do turismo de massa (estandardizado e predatório), e procura cada vez mais defender a proposição de roteiros personalizados, preocupados com o mínimo impacto e com grande interesse paisagísticoecológico (SERRANO; BRUHNS, 1997). Para tanto devemos direcionar nossas preocupações em termos de planejamento, gestão e sustentabilidade. Aventura e Qualidade de Vida Em tais atividades, o fato de chegar a lugares, por ora inacessíveis (o cume de uma montanha, o escuro da caverna, a força dos ventos ou das corredeiras dos rios) permite que tais “aventureiros” experimentem uma gama de significados, por meio desta troca simbiótica entre corpo e meio, remetendo os sujeitos a novas sensações, sentidos, sentimentos e emoções (LAVOURA; SCHWARTZ; MACHADO, 2008). A busca pelos desafios aos limites, pelo alcance de metas, pela interação homem-natureza-atividade e pelo ingrediente do risco controlado salvaguardado pela segurança dos equipamentos configura a aventura. Qualidade de Vida é um conceito que nos parece próximo e ao mesmo tempo distante. Próximo por pretender abranger os incontáveis fatores que influenciam na vida dos seres humanos; distante pelo fato de que ao 100 querer dizer muito pode acabar dizendo nada (ZIMMERMANN, 2006). De acordo com a autora, qualidade de vida é sentir-se parte do ambiente, agente de transformação; é fazer o que se gosta, ou "pelo menos ter a possibilidade de". Para alguns praticantes de esportes de aventura, por exemplo, qualidade de vida pode não ser um conceito muito claro, mas está vinculada ao estresse, e combater o estresse é esquecer os problemas, quando o pensamento se dá no mesmo momento da prática. Da mesma forma, é freqüente a idéia de "troca de energias". O praticante não recebe passivamente novas energias, é preciso ser/estar na natureza, estar na ação. É interessante que para descansar a mente é preciso levar o corpo para passear, reconhecendo-se então uma unidade (ZIMMERMANN, 2006). Para Zimmermann (2006) a atividade física, qualquer que seja, está vinculada à saúde, e da mesma forma à qualidade de vida, mas não como uma pílula cujos efeitos podem ser controlados, e sim porque é uma forma de movimento, e enquanto nos movimentamos estamos vivos. Só é possível falar em saúde quando nos referimos à vida, pois saúde é uma certa forma de estar no mundo. Considerações Finais Com base nos levantamentos obtidos acerca dos esportes de aventura em específico da prática na natureza, o indivíduo acaba por pensar coletivamente e individualmente, mas sendo parte de um todo comum, valorizando a cooperação e o companheirismo, uma vez que como seres humanos tornam-se mais sensíveis e autoperceptíveis, onde esses valores e interações na natureza acabam por serem retomadas na volta ao cotidiano. Nos esportes de aventura, as sensações densas e excepcionais proporcionaram bem estar e vitalidade em situações de risco controlado. A prática de esportes de aventura está ligada à qualidade de vida do indivíduo, uma vez que o mesmo é levado à melhoria do condicionamento físico, do movimento, da cooperação e trabalho de equipe, da responsabilidade consigo e com o próximo, através de uma interação e respeito maior com a natureza. 101 O risco por sua vez, trabalha como uma ferramenta de atração aos esportes de aventura, trazendo atrelados aspectos como coragem, adrenalina, medo, movimento, fortalecimento do caráter, prudência, aventura e desafio, valor educativo, responsabilidade social e ambiental. Mas também vale ressaltar que o risco pode ser estimulador ou inibidor da prática, com a experiência vivenciada como um todo. O risco adquire um papel significativamente importante no que tange à satisfação com a experiência, sendo que o desejo de participar pode diminuir se tais riscos não existirem. Igualmente, o excesso de risco em uma aventura pode resultar na diminuição da satisfação e, até mesmo, na perda do desejo de participação. Os profissionais da educação física, uma vez interessados na atuação, por sua vez deverão ater a necessidade de uma formação e capacitação profissional específica para atuar na área. É recomendada a realização de estudos relacionados os esportes de aventura acerca da Educação Física, ou da Ciência da Motricidade para que se possa conquistar novos espaços e apresentar novas reflexões e aprofundamentos acerca dos conteúdos disciplinares e práticos. REFERÊNCIAS BARTMANN, F.J.D. O Perfil Técnico-Científico dos Instrutores de Esportes de Aventura de Escolas de Instrução no Estado do RS. Monografia submetida ao Curso de Educação Física, Universidade Luterana do Brasil, Canoas, 2006. BETRÁN, J. O. Rumo a um novo conceito de ócio ativo e turismo na Espanha: as atividades físicas de aventura na natureza. In: MARINHO, A., BRUHNS, H. T. 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Acessado em 09/04/2010. 105 ESPORTES NA NATUREZA: FRAGMENTOS CONTRADITÓRIOS DE UM OBJETO EM CONSTRUÇÃO Giuliano Gomes de Assis Pimentel GEL – Grupo de Estudos do Lazer Universidade Estadual de Maringá, Maringá-PR E-mail: [email protected] Resumo O objetivo deste texto é analisar o conceito Esportes na natureza. A discussão conceitual é espinhosa, pois envolve encontrar as orientações teóricas que possibilitaram ao conceito emergir. Uma questão difícil nessa problemática é saber encontrar uma base conceitual que englobe o maior número de experiências dentro da coerência interna e da totalidade dos fenômenos tradicionalmente estudados no campo. Neste sentido, cada novo termo proposto para organizar e decifrar as atividades de aventura requer antes a sua própria elucidação. Para o presente texto, o conceito Esporte na natureza é discutido nessa perspectiva dialética. Para tanto, as teses sobre Esportes na natureza são analisadas em sua lógica interna e confrontadas com sua antítese mais discrepante: a noção de Atividade de aventura. Defende-se que tal termo apresenta-se mais inclusivo em relação a duas classes de dinâmicas: as não-esportivizadas e as urbanas. Considerando, características como risco, imprevisibilidade, aventura, natureza, tecnologias e tendência histórica, a análise conclui pelo rigor e plasticidade do conceito Esporte na natureza, ao mesmo tempo em que realça suas aporias. Por fim, o estudo alerta para os perigos da especialização dos objetos, redundando na fragmentação do saber. Palavras-chave: esporte, terminologia, aventura. Introdução à problemática de análise Canoagem, voo-livre, parkour, arvorismo Tirolesa, surf, mergulho, escalada alpina Rafting, rapel, motocross, pára-quedismo E no pulso, fluem adrenalina e endorfina. A contemporaneidade experimenta, em tese, uma diversificação de atividades de aventura, as quais estão ligadas a sensações de risco e vertigem, exacerbações controladas das emoções e, em muitos casos, congraçamento com a natureza e com outras dimensões sensíveis que se encontram em um momento de revalorização (BRUHNS, 2003). 106 Em geral, são positivas as leituras sobre tal fenômeno, o que parece ser predominante nos trabalhos difundidos na área. A crítica é, em geral, acerca dos aspectos que descaracterizam a essência da aventura, como a competição exacerbada, o uso da natureza apenas como cenário ou o comportamento imprudente de alguns praticantes. Também há uma crítica voraz ao viés mercantil, especialmente presente no dito turismo de aventura, quando este não considera a sustentabilidade socioambiental. Porém, não seria o caso de tomar a aventura (seja na natureza ou não) como toda ela um artefato de consumo? Como outras atividades criadas ou reelaboradas no âmbito do capitalismo, há subsunção das mesmas à lógica da mercadoria (INÁCIO et. al, 2005). Assim, coerente com a multiplicação de práticas, há também a tentativa de criar um mercado consumidor de produtos específicos. Assim, mesmo sem muita coerência, surgem produtos especializados, condenados rapidamente a se tornarem obsoletos diante de uma nova tecnologia de aventura. A isto tenho chamado fetichismo tecnológico: um fascínio pelo uso de novos equipamentos. Os mesmos são geralmente justificados pela melhoria da segurança, diminuição da fadiga e aumento da velocidade. Estranhamente, ter um equipamento mais veloz costuma tornar a prática mais perigosa e aumentar o estresse em realizá-la (PIMENTEL, 2008). Todas essas características, mais presentes em contextos urbanizados e tecnologicamente desenvolvidos, podem ser percebidas na busca hedonística por experiências relacionadas à liberação de adrenalina, especialmente se envolvem o desbravar espaços naturais. É notório que muitos podem até se satisfazer com ambientes virtuais, mas parece haver um imaginário relativo ao comportamento heróico – mas sem sacrifício da vida – alimentando a busca pela aventura seja na forma de turismo seja na forma esportiva. A esse respeito, analogamente à apropriação e codificação dos jogos populares pelos reformadores burgueses no que viria a ser o esporte moderno (BOURDIEU, 1990), parece haver uma assimilação de manifestações esportivas convencionais para a formulação dos ditos esportes diferenciados: parkour, corrida de orientação, escalada, mergulho, rapel, skate, rafting, entre outros. 107 Esse afloramento da aventura no tempo livre é de tal pujança que não há contestação válida de que o fenômeno é instigador. Porém, não há clareza sobre sua identidade e para qual modelo de sociedade sinaliza, havendo tanto leituras situando-o como reflexo das sensibilidades pós-modernas quanto críticas sobre sua sujeição à lógica capitalista. Nesse debate, concorrem diferentes propostas de delimitação do objeto: AFAN - Atividades Físicas de Aventura na Natureza (BETRAN, 2003), Práticas corporais de aventura (INÁCIO et. al, 2005), Esportes radicais (UVINHA, 2001), Esportes na natureza (DIAS, 2007), entre outros. As características listadas para cada termo nem sempre coincidem, mas é bastante recorrente a denominação esporte, seguida por algum adjetivo como vertigem, risco ou aventura. Segundo Silva et. al. (2002, p. 76), essas atividades são assinaladas pelos seguintes aspectos: “têm como principal característica o desafio e, em grande maioria, o contato permanente com a natureza. Seu maior atrativo é a emoção. Todas as modalidades envolvem riscos [...].” Todavia, é questionável se esses atributos são adequados para distinguir os esportes de aventura de outras manifestações não-tidas nessa categoria mas que apresentam similaridades. Afinal, vejamos: O contato com o ambiente natural é, talvez, o componente implicitamente mais evocado para definir o objeto (que, para fins deste artigo, tomaremos como atividade de aventura, por ser mais ‘genérico’). Faz sentido, visto que o meio selvagem aumenta a imprevisibilidade (PARLEBAS, 1988). Porém, se a aventura é evocada pela natureza porque práticas urbanas como o parkour ou o skate são aventuras? Se o critério maior fosse a vertigem, estaria explicado. Será esse, portanto, o eixo central? Caso a vertigem ou as fortes emoções seja o que caracteriza esse objeto, por exemplo, a emoção ou vertigem presente nessas ‘novas’ práticas difere daquela produzida no turismo de aventura, parques de diversão e lazeres não usuais (drogas, rachas...)? Nesse sentido, o voo produzido pela heroína é bem diferente do voo heróico de asa-delta. Também, vale pensar que mesmo no campo esportivo, em diálogo com a tipologia de Caillois (2009) para as atividades lúdicas (mais especificamente o jogo: jeaux) é complicado diferir a vertigem (Ilinx) do esqui, como exemplificado pelo autor, da competência e da 108 técnica (Agôn) necessárias e desejadas para vencer nesse esporte. A questão do risco é também problemática. Para ilustrar, o boxe e o rodeio envolvem menos riscos que o pára-quedismo? Mas por que somente este é associado como um esporte de risco? A dimensão do risco, como uma categoria eminentemente moderna (SPINK, 2001), não pode ser lida dissociada da nova configuração social, nomeada por Beck e Guiddens como sociedade do risco. Será que essa dimensão seria exclusiva ou realmente predominante da aventura? De que risco se estaria falando e por que ele está presente nas atividades de aventura? Por fim, o aspecto que provoca mais reflexão é a tomada dessas manifestações corporais como se fossem todas, ou mesmo em sua maioria, de natureza esportiva. Seriam excluídas atividades como acampamento, birdwatching ou o arvorismo, por não serem esportes? Diversas práticas corporais de aventura estão dissociadas da categoria esporte, sendo melhor entendidas a partir de uma multiplicidade de formas de expressão da cultura corporal de movimento. Mesmo naquelas que possuem analogia ou familiaridade a algum esporte é mais fácil encontrar elementos próprios do turismo do que codificações notadamente esportivas (BRUHNS, 2003). Diante desses rápidos argumentos, é necessário admitir que os conceitos e caracterizações disponíveis na área são insuficientes para um consenso, para cercar o objeto sem criar um campo de exclusão. Se a atividade de aventura implica riscos, é possível incluir o virtual? Tido como esporte, o que se dirá da aventura não regulamentada? E se for ‘extremo’ ou ‘radical’, o que acontece quando essas práticas saem da margem e viram comuns? Poderíamos dizer que são práticas corporais de aventura, mas existe uma prática de aventura que seja não-corporal? É claro que recorri ao “exemplo”, que é um estratagema de pouca capacidade abstrativa, mas, que, empiricamente, alimenta nossa intuição para a insuficiência das categorias para explicar o fenômeno que se deseja delimitar. Diante destes e outros entraves ao estabelecimento de um consenso terminológico, há uma tendência em considerar que a área não evoluiu o suficiente para possuir consensos terminológicos para delimitar seu objeto. Esse ‘consenso da falta de consenso’ e especialmente a minimização dos supostos danos dessa indefinição às pesquisas na área poderiam resolver a 109 questão. Porém, segundo Dias (2007, p. 02), “a ausência de preocupações dessa ordem permite que sob a idéia de lazer esportivo na natureza proliferem muitos conceitos. Cada um deles descreve um campo muito amplo e variado de expressão desse fenômeno cultural.” Enfim, segundo esse autor, a imprecisão seria algo academicamente prejudicial e sua resolução merece ser tratada como relevante. Objetivo e Aspectos metodológicos O presente texto dialoga com o texto de Dias (2007), no sentido de questionar/afirmar suas teses, contrapondo-as com a abrangência presente na noção de atividade de aventura. O objetivo, pois do texto, é apontar limites e ganhos na definição de “esportes na natureza” evocada por Dias (2007) para se referir aos esportes desenvolvidos em contato com a natureza. Este ensaio é limitado ao texto “Notas e definições sobre esporte, lazer e natureza”. Este não é o único trabalho no qual o autor externa sua preocupação terminológica, mas representa um esforço de aprimorar e sistematizar os trabalhos anteriores (DIAS, ALVES JÚNIOR, 2006 e 2007; DIAS, MELO, ALVES JÚNIOR, 2007). Para o debate, utilizamos a versão imediatamente lançada na revista Licere, a qual preserva uma nota de rodapé justificando a motivação do autor: Embora este trabalho seja um esforço de aprimorar e sistematizar idéias que já haviam sido rascunhadas e mais ou menos anunciadas em outras oportunidades, a motivação definitiva para apresentá-lo nesses termos foi impulsionada, em larga medida, pelas discussões entabuladas nas conferências e pelas conversas informais estabelecidas nos bastidores do II Congresso Brasileiro de Atividade de Aventura. Nesse sentido, especial agradecimento aos amigos Giuliano Pimentel, Ricardo Uvinha e Alcyane Marinho que, com suas objeções e discordâncias, contribuíram para tais formulações. Imagino – e espero que continuamos divergindo de quase tudo que está colocado aqui. (DIAS, 2007, p. 01). Para análise e discussão do material utilizou-se a dialética, no seu sentido clássico, como procedimento filosófico de diálogo entre teses contrárias. O texto caracteriza-se como ensaio, isto é, uma reflexão descritivodiscursivo, dedicando-se à apresentação compreensiva e à discussão de um 110 determinado tema de interesse científico. Esportes na natureza: um conceito Primeiramente, Dias (2007, p. 09) não insere “esportes na natureza” como uma categoria geral para designar todas as práticas às quais outros autores tentam agrupar em termos como AFAN, esportes de aventura ou radicais. Seu alvo é “o esporte como uma prática que estabelece relações intersubjetivas com a natureza, a fim de extrair prazer dessa interação”. É justamente isso que o conceito possui de mais decepcionante e, ao mesmo tempo, mais producente. Não se propõe ao conjunto de práticas, mas àquelas que possuem a codificação esportiva nítida (mountain bike, voo livre, rafting, montanhismo entre outros) ou em potência. Em termos pragmáticos, em sua perspectiva, deve haver uma forma de, por exemplo, afirmar se descer o rio numa bóia é um esporte na natureza. Dias (2007), tendo o lazer como referência, foge do tipo ideal de esporte, proposto por Gutmann (1978) para quem o esporte moderno deve ter regulamentos, burocracia, profissionalização, secularismo, e recordes. Os critérios para o esporte na natureza são outros: baixo nível de previsibilidade, menor estereotipia dos movimentos, disposição ao risco, busca por emoções, presença de novas tecnologias e, claro, o contato com a natureza. Nesse caso, é aceitável como esporte na natureza até mesmo aquela experiência feita por meio de bricolagem de técnicas esportivas (bungee jumping, rapel, espeleologia, bóia-cross). Para o autor o critério mais forte seria o fato histórico: a Modernidade produziu, entre outros fenômenos, a busca pela natureza para a prática esportiva. Tal dinâmica seria forte para justificar um nexo entre diferentes esportes, visto que cada um deles “responde a um mesmo conjunto de demandas colocadas pelas mesmas circunstâncias históricas gerais” (DIAS, 2007, p. 26). Mas será que antes da modernidade não havia esporte na natureza? Entre os romanos eram comuns as idas (turísticas) ao campo e ao mar, como opção de ócio. Entre eles, esportes eram difundidos como diversão competitiva e dedicados aos deuses (boa parte deles ligados à natureza, como Diana e 111 Netuno). Em decorrência, a caça e natação não estão até hoje persistindo como esportes na natureza? Então, como Dias se atreve a tratar dos esportes na natureza como fruto de uma tendência moderna de aliar esporte e natureza? Tanto o que consideramos como esporte e natureza na atualidade foi mudando, até o ponto presente quando esses conceitos são apreendidos a partir de uma mentalidade moderna. Seguramente, nas sociedades ocidentais avançadas não é a mitologia ou a religião os filtros axi-teleológicos desse fenômeno. Portanto, o termo esporte na natureza, ao mesmo tempo em que pode ser remetido a predecessores arcaicos, diz respeito a algo conhecido e compreendido na atualidade. Cleber Dias não inova ao relacionar essas práticas com um mesmo movimento histórico, visto que outros autores, como Betrán (2003) em relação às AFAN na pós-modernidade, também situação essas práticas em unidade com o tempo presente. Porém, seu recorte é mais apurado, mais objetivo e, consequentemente, formal. Mas será isso suficiente? Primeiro se questiona a adoção do termo esporte. Recorrendo a estudo que abordou as pessoas comuns do cotidiano sobre o que entendiam por atividades de aventura, a maioria associa aos esportes e ao turismo de aventura, com pequenas citações a lazeres desviantes e a lutas (PIMENTEL, SAITO, 2010). Logo, a escolha pelo esporte é uma opção teórica por um fenômeno quase-hegemônico até mesmo entre a população não-praticante. Segundo, a escolha pelo adjetivo “na natureza” é melhor que o “de aventura”? Há de se notar que a aventura não é um fator central na análise de Dias, pois a aventura emerge – direta ou indiretamente – como desafio às forças naturais. Como se prioriza os esportes praticados em áreas naturais, poderia ser previsível, neste caso, uma apologia ao ambiente natural. Porém, com o necessário ceticismo, o autor nos livra da necessidade em colar o rótulo ecológico ou ambiental, ao esporte na natureza. Com felicidade o termo “na” situa mais uma localização do que uma identificação com causas ambientais. Isso rompe, em certa medida, a tradição de estudos a partir dos trabalhos e orientações de Heloisa Bruhns, os quais investigam aproximações de tais práticas com uma sensibilidade ecológica. Aliás, é possivelmente graças a tais estudos, relativamente pioneiros, que o enfoque ‘romântico’ sobre a integração 112 com a natureza sofreu relativizações. Outro problema relacionado à qualificação desse esporte como sendo na natureza, é o tom excludente ao universo urbano. Para Dias (2007, p. 09), mesmo havendo atividades em ambientes artificiais, como o skate, “boa parte dos seus símbolos foram produzidos originalmente em interface com as práticas desenvolvidas em ambientes naturais.” Porém, esse argumento corrobora para uma relação intrínseca entre urbano e natural que talvez fosse ser unificada por uma outra categoria. O próprio tema do V Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura (CBAA 2010) já é provocativo nesse sentido: “Entre o urbano e a natureza: a inclusão na aventura”. Dias não é enfático quanto à diferença entre “esportes de aventura” e “esportes na natureza”, mas parece compartilhar do entendimento que a natureza, pela imprevisibilidade e riscos, implicaria a aventura. Logo, se a aventura é uma categoria nativa, por que não esportes de aventura? Porque, “a aventura e o risco que se procura, realiza-se no enfrentamento dos desafios naturais tais como eles se apresentam. [...[ Enfim, a audácia e a aventura são favorecidas pelo encontro corporal do esportista com os elementos da natureza” (DIAS, 2007, p. 21). Um último questionamento é o motivo de um termo mais abrangente como “atividade” ou “prática” não ser preferido. Parece-me que “esporte”, por ser uma categoria acadêmica e nativa, além de ser histórica, daria mais força para aceitação ao invés de uma designação genérica. Em suma, a proposição de Dias é a de um objeto que, conforme suas fontes bibliográficas (de acadêmicos e de praticantes), vem para situar um determinado grupo de práticas: as esportivas e, mais especificamente, aquelas que acontecem na natureza. Seu conceito não é confuso, embora limitante. Trata historicamente das práticas ligadas à moderna fruição estética da natureza em parceria com a esportivização dos divertimentos. Assim, Grosso modo, ao falarmos do conceito de esportes na natureza estamos falando então de um conjunto de modalidades cuja posição dentro do espaço esportivo mais geral corresponde a um jogo regulamentado realizado na natureza e assentado na proeza física, em que níveis variáveis de seriedade e ludicidade, cooperação e competição, amadorismo e profissionalismo, sensibilidade e insensibilidade ecológica, 113 intervêm simultaneamente, variando de acordo com a perspectiva da atividade, mas sem nunca escapar a esse esquema geral. Tal definição diz respeito, portanto, ao fenômeno mais geral e não se restringe a técnica corporal. (DIAS, 2007, p. 26-27). Essa descrição revela uma dificuldade em situar sinteticamente a categoria. Não por menos. As categorias concorrentes trazem características muito próximas das postas por Dias. Sua solução diante do impasse foi mostrar os esportes na natureza diante de algumas polaridades: seriedade e ludicidade, cooperação e competição, amadorismo e profissionalismo, sensibilidade e insensibilidade ecológica. Logo, não pode ser essas características, na qualidade de variáveis, que venham a definir o esporte na natureza. Se visto sob esse pondo, esse conceito rascunhado não diz muito sobre o ser humano e nem sobre a dinâmica produzida na prática. Apenas situa uma tendência histórica em se praticar esporte na natureza. Extrapolando os argumentos do autor, isso pode ser ilustrado com o surf, ao qual se poderiam imprimir inclusões, exclusões e zonas de indefinição a serem resolvidas conforme a análise do contexto. Não há dúvidas em rotular o surf se ele é praticado no mar, no rio ou em outro ‘lugar natural’ (entramos na dificuldade, por vezes em decidir o que é cultural e o que é natural). Independente do contexto (competição, clube, hotel, escolinha) as variáveis não alteram o conceito. Todavia, o surf na piscina artificial ou no simulador já seria outra coisa? É um objeto rumo a autonomia (como o skate) ou mantêm relações com a prática de origem? Em caso da segunda alternativa, como pensar em dois objetos similares e complementares, mas que sejam conceitualmente diferentes só por conta do ambiente onde foram vivenciados? Portanto, embora olhe para o fenômeno mais geral ao invés do movimento em si, o autor recorta o esporte na natureza, exaurindo sua totalidade. Coerentemente, o mesmo, por exemplo, retira as interseções com o turismo de sua análise. Outras tantas práticas, ou são enquadradas num conceito mais aberto e inclusivo de esporte ou dirão respeito a um outro fenômeno. Para ilustrar como o tal do “impulso histórico” pode vir fragmentado no conceito de esporte na natureza, provocativamente, criei a seguinte 114 narrativa: PP e BJ são adolescentes cariocas, residentes no Morro da Formiga, favela ao lado do Parque Nacional da Tijuca. Nessa floresta, nossos heróis resolveram passar a noite acampando, tendo utilizado a tarde para fazer piquenique e passear pelas trilhas de aventura. PP saca uma trouxinha de maconha e junto com BJ resolvem fazer o consumo recreativo daquela droga. Estão contemplando as estrelas e o canto noturno dos pássaros, quando começa a chover, formando corredeiras. BJ tem a idéia de utilizar um pedaço de tábua para realizar uma espécie de surf morro abaixo. PP adere à prática, mas sem uso de material, desce rolando, tendo, inclusive ficado nu. Os dois são flagrados pela vigilância do Parque e perseguidos pela mata, tendo de subir em frondosas árvores e se camuflarem nelas. Passadas algumas horas, retornam furtivamente ao local do acampamento, tendo capturado um tatu pelo caminho que lhes servirá de refeição. Tal experiência não poderia ser tachada dentro de um esporte ou mesmo de uma nomenclatura específica. Diz respeito à dinâmica social ou à busca pela concretização de uma multiplicidade de interesses no tempo livre. De certa forma, experiências como essas abalam o entendimento dominante que foi construído sobre o conceito de lazer. Elas combinam, ludicamente, o lazer desviante, a aventura, a juventude, o risco, o contato com a natureza (seja como cenário ou como parceira; essa moralidade não importa). Por que, então, se as experiências reais divergem do próprio conceito de lazer, devemos construir uma barreira conceitual entre essas vivências na natureza e vivências de outra ordem ou codificação, que também ocorrem na natureza, às quais chamaríamos de esporte? Não se trata de miopia do autor. Ele sabe que o que está em jogo são perspectivas teóricas diferentes, que lutam por um modelo e um paradigma de padronização conceitual, participando desta disputa inclusive aqueles que participam do consenso de que não há consenso. Dias (2007, p. 29) concorda que “as multiplicidades e divergências, tanto entre os praticantes, quanto entre acadêmicos, remetem as disputas que toda estrutura semântica/linguística está submetida”. Mas, ainda assim, sua posição é pela busca da “objetividade nas operações conceituais”. Essa luta pelo conceito se justifica porque não é possível teorizar sobre algo sem o uso de conceitos. Enfim, como haver um 115 estatuto científico sobre algo que não conseguirmos nomear? Mas ao criar essa margem de exclusão, para assegurar um objeto mais ou menos limpo, se corre o risco de comprometer-se numa concepção racionalista de ciência, pois, faz assepsia das dinâmicas para chegar a um objeto puro. Tomando emprestadas as palavras de Maffesoli (2001, p. 47): “Ao nomear, com excessiva precisão, aquilo que se apreende, mata-se aquilo que é nomeado.” Procedimento este complexo de ser levado nas ciências humanas e sociais. Ainda segundo o mesmo autor, “nas ciências da natureza, o racionalismo puro e duro está em perfeita congruência com seu objeto. Este está imóvel, estável, há pouca ou nenhuma interferência entre ele e o observador que supostamente o analisa. Por conseguinte pode-se aplicar-lhe, do exterior, uma série de leis que são, também elas, impassíveis.” (MAFFESOLI, 2001, p. 48). Essa ponderação sobre os problemas datados no modo de produção do conhecimento na modernidade, não diz respeito especificamente à esclerose dos conceitos rígidos (o que não parece ser o caso de Dias). Até é fecundo ao conhecimento que os conceitos sejam construídos, mas também pode ocorrer de serem abandonados e re-significados com as mudanças no fenômeno. Diante desta premissa, cabe à comunidade acadêmica discutir quais conceitos são fundamentais para haver densidade teórica na análise das dinâmicas. Conclusão No atual estágio conceitual do campo, o movimento brasileiro é de notório ecletismo, com diversas correntes. Uma delas apresenta uma orientação crescente para acomodar o objeto como sendo atividade de aventura. Esse, sem dúvidas, é um outro conceito que poderia gerar debates. Para ilustrar a capacidade analítica desse termo, especialmente em relação à categoria espaço, componho a ilustração abaixo: 116 Proposta Eclética - com subdivisões por ambiente ATIVIDADES DE AVENTURA Atividades na Exemplo: Atividades urbanas Exemplo: Esporte na natureza O conceito atividades de aventura parece resguardar a reconhecida e problemática generalidade de experiências que podem estar ocorrendo no ambiente natural (turismo, educação ambiental, esportes, rituais indígenas) e no citadino (esportes, jogos, entre outros). Esse “e” está em destaque para realçar a possibilidade de a mesma manifestação ocorrer em mais de um meio. Interessa destacar que o termo, a exemplo de esporte na natureza, vai nomear práticas de lazer. Portanto, a aventura relacionada, por exemplo, às descobertas científicas, a exploração profissional de terras desconhecidas ou a tensão das profissões que envolvem risco, embora compartilhem de um mesmo impulso lúdico, não são objetos preferenciais de estudo. Atividade de aventura vai tratar da busca deliberada e no tempo livre por experiências as quais culturalmente apreendemos como sendo aventura (corriqueiramente associada a sair do cotidiano e entrar no imprevisto). Mais que um vocábulo ‘guarda-chuva’, atividades de aventura (apesar das críticas que o termo ‘atividade’ recebe na Educação Física) pode apenas tratar-se de uma solução provisória para uma comunidade que carece de discussão acumulada para alçar novos patamares conceituais. Embora o consenso seja de não haver consenso, não se pode fazer a apologia desse quadro. A comunidade precisa dar continuidade às buscas já iniciadas, como no caso da Comissão de esportes de aventura (CEAV) composta pelo Ministério do Esporte para discutir as políticas nesse segmento 117 e que, como primeira produção, teve de adotar conceitos para operacionalizar o diálogo entre os 19 integrantes da CEAV (MARINHO, 2007). O esforço de Dias em combater o ecletismo no campo não se anuncia como uma imposição semântica ou vaidade acadêmica. Sua justificativa epistemológica está em determinar, afinal, qual é o objeto a ser estudado: é o esporte ou algo mais amplo? Se for o esporte, é de qual tipo: aquele que ocorre na natureza, o relacionado ao não-convencional, o atravessado pelos signos do risco ou aquele que evoca aventura? Seja qual for a resposta, um será o eixo e os demais estudados como foco secundário. Nesse sentido, a preocupação com os conceitos é pertinente, pois poderá permitir uma identidade e um olhar mais preciso às pesquisas. Considerando o desenvolvimento teórico desse campo, o debate sobre terminologia, tipologia e paradigmas é obrigatório para evitar um objeto amplo destituído de profundidade. Essa não é, contudo, uma tarefa fácil, pois os termos refletem escolhas teóricas e epistemológicas. Se as categorias, em certa medida refletem a cristalização do pensamento, é necessário refinar o debate antes de se fazer as escolhas. A resposta de Dias foi buscar fontes nas literaturas acadêmica e nativa. Mas esse diálogo precisa ser aprofundado porque o estado da arte ainda não foi feito; e pode até não ser viável ainda. Em boa parte, tanto no exterior quanto no Brasil, os pesquisadores ainda se debruçam sobre a ‘forma’ do fenômeno. A cada novo movimento, novas definições e organizações do campo surgem. Isso significa ou que os pesquisadores estão ‘dando voltas’ em torno da superficialidade do objeto, sem encontrar sua ‘essência’, ou que realmente não se conhece toda a superfície. Porém, em um movimento negativo, não seria toda essa discussão precipitada ou, pior ainda, uma perigosa especialização dos objetos, redundando na fragmentação do saber? Eis o perigo de criarmos um pseudoobjeto, pura representação como se a força própria de nossas ideias determinasse a realidade. Como as verdades científicas são provisórias, vale relembrar a sabedoria dos gregos cuja Filosofia elegera a prudência como maior das virtudes. Logo, o consenso de não consenso, se não enraizado na preguiça intelectual, pode ser a medida da razão nestes tempos, necessitando haver mais explorações e debates antes de fechamentos teóricos mais 118 perenes. REFERÊNCIAS BETRÁN, Javier O. Rumo a um novo conceito de ócio ativo e turismo na Espanha: as atividades físicas de aventura na natureza. 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Nayara Maysa dos Santos, Fábio Alexandre Uema, Giuliano Gomes de Assis Pimentel, Amauri Aparecido Bassoli de Oliveira CNPq, Rede CEDES, Universidade Estadual de Maringá (UEM) E-mail: [email protected] Resumo Como é a aventura entre os Guarani do Paraná? Qual é sua forma de interagir ludicamente com a natureza? Para a realização desta pesquisa e obtenção de resultados foram visitadas nove terras indígenas. Com a pesquisa em andamento o trabalho busca diagnosticar as atividades físicas de aventura na natureza nas comunidades indígenas Guarani do Paraná. Por meio de pesquisa, entrevista, questionário e análise de documentos o projeto vem se desenvolvendo. Em algumas realidades, a pesquisa vem mostrando que, apesar de se possuir espaços físicos adequados para a prática de esportes na natureza, ela é quase inexistente, dando lugar à vivência de outras atividades e lazeres. Noutros grupos, o contato com o ambiente natural é corriqueiro desde a infância, mostrando uma inter-dependência dessa relação com diferentes esferas da vida. Palavras-chave: Aventura; natureza; Guarani. Introdução As atividades de aventura, ocorram elas em meio natural ou modificado, ainda expandem suas fronteiras de intervenção e, também, de pesquisa (embora não seja rigoroso estudar um fenômeno a partir dos rótulos comerciais, como é comum nas subdivisões dos segmentos do turismo). No presente texto, será discutida a interação lúdica com o meio natural dos índios Guarani de duas regiões do Paraná (Litoral e Rio Paraná). Um dos tópicos dessa análise são as similaridades e diferenças da aventura indígena com as formas ocidentais mais evidentes: o turismo de aventura e o esporte na natureza. A primeiro delas relaciona-se às viagens em busca de emoções e belas paisagens. O turismo de aventura no Brasil é um mercado quase inesgotável, devido aos 55.000 km de rios, chapadas, cachoeiras, 3.400 cavernas, 8.000 km de costa, a maior floresta tropical do planeta e montanhas de até 3.000 metros de altitude. A demanda em 2003 foi de 20.000 pessoas procurarando por pacotes de aventura nas quatro maiores empresas especializadas no ramo. Uma pesquisa feita pela Embratur numa feira anual de aventura – Adventure 121 Sports Fair – que recebeu 82.000 pessoas na última edição, revelou que quase metade dos visitantes praticava esportes radicais e que 90% sonhava em praticar. (MARCHI, 2004). Outra proposição conceitual é a dos “esportes na natureza”. Essa proposta concentra-se em vivenciar e pesquisar o esporte como uma prática que estabelece relações intersubjetivas com a natureza, a fim de extrair prazer dessa interação. E na medida em que a própria natureza é apontada como uma das suas motivações principais, seus simbolismos são permeados por uma espécie de mitologia do reencontro com a natureza selvagem. Pode-se perceber que estamos diante de uma indicação próxima daquela pretendida pelo conceito de “esportes de deslize” ou “esportes ao ar livre”. Aliás, um tanto próximo também da conceituação que opera sob o termo “esportes de aventura”. [...] Daí, o entendimento de que os chamados “esportes de aventura”, pelas suas origens, estivessem, num primeiro momento, associados às práticas na natureza, onde seu significado também poderia ser contrastado com os esportes mais convencionais, ao passo que nessas modalidades busca-se e valoriza-se a imprevisibilidade, enquanto que “nos outros”, buscase, pelo contrário, reduzir sistematicamente o risco através da domesticação do espaço. (DIAS, p.9-10. 2007). Ainda se focando na questão do lugar onde esses esportes se realizam, destaca-se a dimensão imprevisível e pouco demarcada, que produziria certo caráter inovador e diferencial. Em ambas as configurações é colocado que a natureza é fator catalisador porque gera superações frente a riscos imaginados. Como os praticantes de aventuras residem no meio urbano, esse contato é sempre cercado de expectativas e surpresas. Poderá, entretanto, a atividade na natureza constituir-se em aventura para grupos étnicos tradicionais no contato com a natureza? O que difere seu universo lúdico em relação ao contato com o meio natural? O presente estudo apresenta algumas descobertas, optando pela supremacia da descrição do real em confronto às leituras que folclorizam o índio a uma condição de eterno bom selvagem. Nos séculos XVI e XVII “Guaranis” era denominado como grupo que se encontravam desde a costa atlântica até o Paraguai e que obtiam a mesma língua, com a chegada dos espanhóis e portugueses o território que até então era ocupado pelos guarani passa a ser disputado. (LADEIRA, 2010). 122 Atualmente os guarani M’bya, Ñandeva (Xiripa) e Kaiowa, ocupam partes do Brasil, Paraguai, Argentina e do Uruguai. No Brasil os Kaiowa habitam na região sul do Mato Grosso do Sul, os Ñandeva (Xiripa) vivem em aldeias situadas no Mato Grosso do Sul, no interior dos estados de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Os M’Bya concentram-se no interior e no litoral do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. A população guarani no Brasil é estimada em torno de 34 mil pessoas, entre os Kaiowa (18 a 20 mil), Ñandeva (8 a 10 mil) e M’Bya (5 a 6 mil). (LADEIRA, 2010). Segundo Arruda e Diegues (2001, p. 32), as concepções de natureza para os indígenas, ao contrário do pensamento ocidental, compreendem “interligação orgânica entre o mundo natural, o sobrenatural e a organização social”. Indo ao encontro desse pressuposto, é importante para os Guaranis M’Bya ter um ambiente que apresente em seu conjunto, matas preservadas, solo para agricultura, nascentes, etc.. Para que possam exercer melhor o seu modo de ser e da mesma forma suas regras sociais. O tema abordado tem como justificativa ampliar os conhecimentos referentes às práticas de aventura dos índios Guarani, de forma a estabelecer diálogos multiculturais. Este artigo tem como objetivo analisar as atividades na natureza pelos índios Guarani nas terras indígenas, descrevendo como se manifestam. Aspectos metodológicos O presente trabalho é financiado com recursos da Rede CEDES/Ministério do Esporte e pelo CNPq (Edital Universal e PROBIC). Até abril de 2010 foram realizadas coletas em nove terras indígenas Guarani, a saber, Comunidade Laranjinha (Santa Amélia), Pinhalzinho (Tomazina), Ilha da Cootingá e Sambaquis Guaraguaçu (Paranaguá), Kuray Guata Porã (Guaraqueçaba), Araça-í (Piraquara), Ocoy (São Miguel do Iguaçu), Tekohá Anãtete e Tekohá Itamara (Diamante D’Oeste). Até dezembro de 2010 abrangerá as práticas corporais e as políticas públicas pertinentes aos grupos indígenas do Paraná, totalizando uma população aproximada de 10 mil pessoas em 21 comunidades, englobando etnias Guarani, Kaingang e Xetá. 123 O trabalho de campo contou com entrevistas, inventário, registro das imagens por filmagem e fotografia. No tocante à coleta de dados, esta seguiu o contato com caciques e autorização dos mesmos para incursão de campo. A equipe de trabalho realizou inventário sobre as condições estruturais da comunidade, seus rituais, religião, jogos, lazer, educação escolar e não-formal, presença de deficientes, dificuldades, além das políticas públicas e projetos estatais (dos poderes municipal, estadual e federal). Posteriormente, os líderes eram entrevistados sobre as categorias supra-mencionadas, bem como a equipe de trabalho realizava contato com crianças, jovens, idosos e adultos a fim de consultá-los sobre suas práticas. Em muitos casos, as pessoas compreendiam parcialmente a língua portuguesa (dos pesquisadores), sendo necessária a intervenção de líderes. Noutras essa dificuldade era resolvida quando as crianças, na dificuldade em porém suas práticas em palavras, resolviam o problema mostrando-as. Isso permitiu um rico material em imagens. O projeto vem sendo desenvolvido desde 2009 com comunidades indígenas no Estado do Paraná a partir de observação direta e pesquisa-ação. Significa que, finalizada a fase diagnóstico da coleta de dados, serão realizadas ações para melhorar a realidade esportiva e de lazer nas comunidades indígenas, conforme a vontade das lideranças consultadas. Desenvolvimento Vale considerar que o leitor necessitará de se despir das imagens congeladas de índio, como sendo aquela pessoa que vive nua e sobrevive isolada nas matas. Na atualidade, devido ao tamanho reduzido de suas terras e aos próprios benefícios do contato com a denominada civilização ocidental, as populações indígenas fazem uso de tecnologias e aparatos culturais diferentes dos seus tradicionais. Mas isso não significa que eles estejam deixando de ser índios. Também é importante lembrar das diferenças entre as etnias, que são tidas como grandes entre eles. Um exemplo é o processo de hibridação cultural dos Guarani que foi diferente dos Kaingang. Ainda que o contato com os colonizadores tenha sido mais tardio do que o ocorrido com outros grupos indígenas, na medida em que perderam seus terrirórios tradicionais, foram 124 aldeados em pequenas aldeias, tutelados pelo estado e tiveram que ressignificar suas tradições. (NASCIMENTO JUNIOR, 2009). O processo de trabalho produção organizado pelos colonizadores influenciou o modo de viver dos Kaingang nestes territórios de forma diferente de como afetou os Guarani, embora ambos os povos tenham sido expropriados de sua liberdade anterior. Ambos, por exemplo, tiveram reduzidos os locais para caça, pesca e a busca por sobrevivência. Sem poder exercer essas funções, com as facilidades que a modernização, a doutrinação cristão e os auxílios compensatórios que lhes são oferecidos não se sabe se o Guarani permanece identificado espiritual e ludicamente com a natureza ou mesmo se ela serve de momento de fuga do estresse, a exemplo de boa parte dos citadinos em busca de aventura na natureza. Das terras indígenas visitadas até então, foram observados espaços apropriados para a prática de aventuras na natureza, lugares que muitas vezes são alvos de procura dos não-índios para tal prática. É concebido que vivendo nesses espaços os indígenas não possuem o costume de praticar aventuras na natureza tal como são feitas pelos não-indígenas. Porém, muitas das formas tradicionais também não são mais feitas, conforme a preocupação dos mais velhos. A atual falta de atividades físicas de aventura na natureza, faz com que os moradores sintam falta das atividades que antes eram realizadas, conforme relata um vice-cacique que sente-se orgulhoso ao ter tido uma infância cheia de aventuras, quando desciam o rio na enchente boiando sobre jangadas feitas da bananeira, e quando também desciam as ladeiras da comunidade com carrinho de rolemã improvisado, com pneus maiores para enfrentar os pedregulhos e freios. As atividades não são praticadas como eram antes pelos moradores mais novos da comunidade, principalmente as brincadeiras originárias da cultura indígena. Em certos contextos isso é referente ao pouco espaço preservado. Noutros, o espaço é considerado relativamente grande para a prática de várias atividades, como é relatado por um dos professores da escola da comunidade: Antes, quando a gente era crianças entre 7 e 8 anos a gente brincava de caça, subia nas árvores, fazia jangadinha de bananeira, 125 brincávamos no rio com pinguela. E as mulheres brincava muito de bonequinha de milho. A nossa preocupação hoje é que às crianças não brincam mais, só assistem televisão e jogam vídeo-game. Durante as visitas foi possível constatar que a televisão e o vídeo-game preocupam os mais velhos. Em contraponto, tais opções não se constituem predominantes na preferência das crianças, pois em vários momentos se divertiam com a natureza. Mas na visão dos não-índios, diversões que não são de aventura na natureza, aquela que envolve o risco, adrenalida e o medo, envolvendo apenas o lazer. Para ilustrar, a aventura para duas crianças indígenas de 9 anos, é passar a tarde no rio pescando de tarrafo e pescando manualmente (enfiando o braço nos buracos dos barrancos). Para elas, a pesca não tem apenas o fundo de busca do alimento, e mais o prazer em estar no rio pescando e se refrescando, correndo o risco de em um desses buracos conter uma cobra. No final das pescarias esses pequenos índios se divertem ao subir em árvores, e a quase 4 metros de altura saltam no rio. A bicicleta que nos grandes centros urbanos é utilizada em maior escala durante os finais de semana pelos aventureiros, nas aldeias elas servem apenas como meio de transporte, o que é menos comum nas cidades urbanizadas. Mesmo dotado de trilhas e locais específicos para a prática de aventura na natureza com a bicicleta, os índios não a enxergam como objeto de lazer. Ao contrário dos não-índios aventureiros que usariam esse espaço para a prática do mountain bike, e possivelmente alguma outra modalidade, no caso o motrocross. Sem ser relacionado diretamente à natureza, os Guarani praticam atividades como: movimentos gímnicos, correr, saltar, parada de mão, rolamento; peteca; bolinha de gude; sinuca; bugalha; boneca; lutinha com galhos secos; e o futebol. Dentre essas atividades citadas, o futebol como em todo o país é o que tem mais adeptos, tanto das crianças e dos adultos, envolvendo a preferência também das mulheres. Das terras indígenas visitadas, as únicas que não possuíam campo de futebol foram aquelas que não tinham espaço físico adequado, morros, e poucas famílias morando na comunidade. As demais terras indígenas possuem 126 o campo de futebol com balizas e demarcações, não sendo ótimo o espaço, mas o suficiente para haver a prática do futebol, que é praticado semanalmente. O futebol tem grande importância entre os indígenas por permitir a interação entre índios de aldeias próximas, e também na interação com os nãoíndios moradores de cidades vizinhas. Uma vez que rotineiramente os times de futebol das comunidades participam de amistosos e campeonatos envolvendo os times da região. Por meio da interação que o futebol causa, sendo uma modalidade adaptada a qualquer biotipo de pessoa, e por ser praticada tanto de uma maneira não formal, ou seguindo as próprias regras do jogo, faz com que os índios tenham uma consideração a mais pelo futebol. A importância que é dedicada aos jogos de futebol indígena, faz com que haja a prevalência do fair-play, o jogar honestamente, criando respeito mútuo entre os participantes. No momento de uma falta, a regra é sempre aplicada, não havendo a ‘lei da vantagem’. Entretando, com a preferência do futebol os indígenas acabam não conhecendo outras modalidades, principalmente aquelas que podem ser praticada na natureza, não por falta de espaço, mas sim por falta de conhecimento e oportunidade. Conclusão Fora o futebol não se presenciou muito a realização de outros jogos e brincadeiras, até provenientes da cultura indígena. Talvez seja pelo fato da tecnologia e da aproximação com os povos não-índios. Como acontece com as crianças não- índias, há sempre a suspeita de uma perda da tradição. Em parte isso pode ser decorrente das novas tecnologias e do menor tempo que os familiares dispensam ao contato com os filhos. Outra hipótese para a falta de lazer visualizados nas comunidades, seria pelo limite de pouco tempo de permanência em algumas comunidades, quando as pessoas se sentem constrangidas pela presença de pessoas que não fazem parte do seu vínculo pessoal. Visto que os indígenas já vivem em meio a natureza, o conceito de aventura para eles é diferenciado dos não-índios, uma vez que muitos deles 127 usam da trilha, a escalada de morros como local para se locomoverem, um atalho, tornando-se uma atividade diária, rotineira. O que para os aventureiros seria um local para realizar esportes de aventura na natureza é, para eles, um lugar conhecido para diversas brincadeiras e atividades produtivas. Em muitos casos, os índios possuem paredes que poderiam ser utulizadas para escalada, cachoeiras que poderiam ser realizada para rappel, rios com correntezas para praticar rafting, trilhas para caminhar ou mesmo praticar mountain bike e motocross, entre outros. Mas esses espaços não são vistos por eles como local para prática de esportes em ambientes naturais, pela falta de conhecimento e costume dessas modalidades. Além da falta de materiais e instrumentos, é uma hipótese que lhes falte necessidade em consumir tais experiências estranhas ao seu modo de vida. Sua ludicidade é permeada por elementos da natureza, de forma já habitual. Se esse aspecto parece não estar perdido, a procura pela natureza é desnecessária. Por não lhes fazer falta, justamente essa aventura sequer lhes é percebida. Assim, em conclusão, há algo que escapa ao paradigma do esporte e do turismo de aventura, pois o Guarani parte de outra sensibilidade, transferindo a aventura para a totalidade de sua vida. Para muitos grupos não é totalmente assimilável a fragmentação do tempo, tendo em vista muitos ainda conviverem com uma marcação natural do tempo. Eis que, pois, para o Homem cuja vida é na e com a natureza, as atividades de aventura vão ocorrendo desde a infância e sobre diferentes esferas da vida. REFERÊNCIAS ARRUDA, Rinaldo S.V. e DIEGUES, Antônio Carlos (Org). Saberes tradicionais e biodiversidade no Brasil. Brasília: Ministério do Meio Ambiente; S. Paulo: USP, 2001. DIAS, Cleber Augusto Gonçalves. Notas e definições sobre esporte, lazer e natureza. Rio de Janeiro. 2007. LADEIRA, Maria Inês. Guarani M’bya. Disponível em: Http://pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani-mbya. Acesso em 10 de abril de 2010. MARCHI, Kátia Bortolotti. Atividades físicas de aventura na natureza: uma leitura sociológica a partir dos “jogos mundiais da natureza”. Curitiba. p. 8. 2004. 128 NASCIMENTO JUNIOR, José Roberto Andrade do. Jogos Indígenas: o futebol como esporte tradicional kaingang. Maringá: UEM. 2009. 129 O ENSINO APRENDIZAGEM DOS FUNDAMENTOS BÁSICOS NAS AULAS DE SKATE Matheus Martins Lopes dos Santos Universidade Estadual De Maringá (UEM) - Maringá-PR - Brasil E-mail: [email protected] Resumo No trabalho O ensino aprendizagem dos fundamentos básicos nas aulas de skate, o autor coloca a devida importância de se apresentar alguns métodos de ensino na realização das aulas de skate, tendo como objetivo salientar dúvidas para futuros planos de aula a serem ministrados nas aulas de skate. A metodologia utilizada nesse trabalho foi de caráter de revisão de literatura, buscando na literatura compreender algumas situações encontradas no ensino aprendizagem. Apontando alguns aspectos metodológicos exercidos nas aulas de Educação Física relacionando com a parte pedagógica, ressaltando a carência de trabalhos publicados na questão de ensino aprendizagem voltada ao skate. Não foi encontrado nenhum tipo de metodologia especifica para a realização de aula de skate. Palavras chave: Ensino aprendizagem, Fundamentos básicos e Skate. Introdução. Inicialmente o skate quando começou a ser praticado, ele era visto pela sociedade como uma “brincadeira” entre os adolescentes, na qual essa visão vinha juntamente com o fato de ser uma atividade realizada por marginais, que ao longo do passar dos anos, com muita insistência o skate ganhou seu espaço na mídia e assim começou a ser conhecido mundialmente. No Brasil o skate deu início na década de 60 com um pessoal que surfava relata Brito (2007), seu crescimento foi grandioso, levando assim o surgimento de fábricas de artigos relacionados ao skate. No seu início o skate era muito praticado nas ruas, surgindo assim uma das modalidades mais popular entre os skatistas o “street-style” segundo Figueiredo (2005) o skate de rua, no qual a utilização da paisagem urbana faz com que a criatividade dos praticantes torne-se um estilo próprio de cada um. Com o surgimento de jogos de videogames, brinquedos entre outros, o skate começou a expandir seus horizontes tanto na questão de estilo, musicalidade e a arte como o “grafite”, esse esporte faz parte de todas essas dimensões englobando muitos aspectos a serem abordados. 130 Devido essa expansão do skate nos dias atuais, existem escolas especializadas na prática do esporte, sendo que na maioria deles os instrutores são ex-skatistas que cursaram ou estão cursando Educação Física, ou mesmo apenas ex-praticantes, no qual o grande fator a ser colocado na elaboração de um projeto com aulas direcionadas ao skate é a falta de conteúdos de pesquisa na literatura, dificultando o trabalho para prescrever algumas atividades e na elaboração dos mesmos. No âmbito Científico do Esporte, em iniciação de treinamento desportivo Greco e Benda (1998), relatam que investigação mais especifica está direcionada a questão metodológica- didática no processo de ensinoaprendizagem-treinamento. No skate essa é uma das maiores discussões, pois a prática do esporte inicialmente era realizada com a cara e a coragem dos praticantes, onde não se havia nenhum método de ensino e muito menos professores específicos para esse esporte. Com o passar do tempo e com o surgimento das escolinhas de skate deu-se a importância de estar relacionando os aspectos metodológicos no ensino aprendizagem da prática dessa modalidade, sendo que na literatura encontram-se muito poucas informações com relação a esse foco, sendo o intuito desse trabalho a discussão de métodos correlacionados ao ensino aprendizagem nas aulas de skate. Objetivo. Através da literatura científica buscar salientar algumas dúvidas na questão do ensino aprendizagem e averiguação de métodos pedagógicos específicos para a realização das aulas de skate. Métodologia. Esse trabalho apresentado tem como característica revisão teórica por meio da análise das literaturas publicadas, a realização estrutural de conceitos para o desenvolvimento da pesquisa, resultando em um levantamento de análise sobre o ensino aprendizagem nas aulas de skate A Didática. O conceito de didática vem da expressão grega Τεχνή διδακτική (techné didaktiké), sendo sua tradução a arte de ensinar ou técnica, podemos definir 131 como uma ciência que tem como objetivo fundamentar as estratégias de ensino, relevando as questões de aprendizagem e da parte metodológica educacional (DIDÁTICA, 2008). A didática é entendia como uma atividade mediadora, entre a prática e a teoria educacional, relacionando o aluno e professor, dentro e fora da sala de aula com o conteúdo e a forma da educação (MELO E URBANETZ, 2008). Em meados do século XIX, a palavra didática entra no léxico português, que por sua vez ingressou também na língua europeia (HAMILTON, 2001). Assim manifesta Ghiraldelli Júnior: “A didática, a meu ver, é mediadora entre o pólo teórico (pedagogia) e o pólo prático (educação) da atividade educativa. O como ensinar, o que ensinar e quando ensinar e o para quem ensinar, quando ligados à pedagogia, estão impregnados dos pressupostos e diretrizes de uma determinada concepção de mundo que, por sua vez nutre tal pedagogia” O instrumento potencializador da didática é transformação social, a garantia da preocupação com a compreensão do processo ensino- aprendizagem e a busca de formas de intervenção na prática pedagógica. Atualmente a didática encontra-se com muitos desafios, segundo Candau (2005). O ser humano está em constantes mudanças e conflitos, devido à sociedade, onde abrange muitas caracterizas que são empregadas em suas vidas, assim Melo e Urbanetz (2008) explicam que o ponto inicial para se tornar um verdadeiramente humano é a interação homem sociedade, com isso, a natureza humana não é apenas algo que é dado e acabado. Dentro da didática existem alguns fatores a serem comentados, como o processo de ensino-aprendizagem, que em primordial está relacionado ao papel exercido do educador na sociedade, que segundo Veiga (2005) ainda não há clareza a respeito da função do educador. De acordo com Freire (1978), é necessário que haja uma reflexão pedagógica buscando questionar os métodos de ensino sendo que em muitos autores considerarem a educação como um elemento que transforma a 132 sociedade. Colocando o papel do educador como conservadora e reprodutora do sistema educacional. A procura de uma metodologia educacional é uma constante, porem existe classificações argumentadas por alguns autores da área pedagógica, como descreve LIBÂNEO (1983) que o ensino passou por muitas transformações e um dos períodos foi denominado como tradicional, no qual são encontradas muitas tendências como a Liberal Conservadora; Renovada Progressista e Renovada Não-Progressista. Métodos de Ensino na Educação Física. A Educação Física passou a ser reconhecida como uma matéria relevante na escola a partir do momento que fundamentou-se cientificamente, relacionando as práticas corporais com os conteúdos tematizados onde inicialmente os exercícios eram militaristas, assim os procedimentos metodológicos utilizados pela maioria dos professores era baseado no comando, tento o máximo de rendimento e de esforço (MENDES e MAIA, 2003). As aulas de Educação Física estão co-relacionadas a algumas propostas, a Tradicional, a Desenvolvimentista, a Construtivista, a CríticoSuperadora e a Crítico-Emancipadora, sendo que cada uma consiste em uma metodologia própria de ensino, sendo a Tradicionalista uma das primeiras concepções a serem abordadas no âmbito escolar, através de exercícios padronizados e recebendo ordens no qual visa apenas o corpo do ser humano como um objeto capaz de realizar as tarefas e cumpri-lás, contribuindo assim para eficiência do movimento mecânico (MOREIRA, 1995). Na educação Física a relação teoria e prática são mais uma das problemáticas, pois fica evidente o processo de formação dos profissionais da área da educação no sentido da relação harmoniosa entre a teoria e prática, pois essa relação não é a única preocupação dos educadores, pois para ocorrer uma boa aprendizagem é necessário fazer uma reflexão crítica dos fatores do âmbito escolar (CANDAU, 2005). A separação dessa relação Teórica e Prática é inevitável, pois a teoria serve como base na aplicação de atividades na prática, e nessa vivência que observa-se uma demanda de informações extraídas de diferentes modos, pois 133 uma estrutura de base teórica que lhe de suporte não deixa a prática tornar-se uma atividade imitativa. Segundo Candau (2005) a diferença entre os seres vivos e os seres humanos está direcionada às possibilidades de suas consciências devido a AÇÃO À REFLEXÃO, pois a atividade exercida será mais ou menos humana na medida em que vincula ou desvincula. Mesmo com aspectos metodológicos de caminhos diferentes, o objetivo é muito similar em todas as propostas, a de apresentar uma disciplina com muitos conteúdos significativos e de fundamental importância aos participantes nas aulas de Educação Física, onde uma expressão realizada pelo Prof. KUNZ (1994:131) que cita: “é necessário que cada disciplina se torne um verdadeiro campo de estudos e de pesquisa. Também, para a Educação Física. Afinal de contas os alunos visitam a escola para estudar e não se divertir (embora o estudo possa se tornar algo divertido) ou para praticar esportes e jogos (embora esta prática também tenha a sua importância”. Com essas palavras fica imprescindível uma retomada de ações metodológicas de conteúdos significativos, tendo como principal características o papel do professor devido à suma importância no âmbito escolar, já os conteúdos e metodologias são interdependentes, devido à necessidade mutua e a exigência da responsabilidade dos que estão envolvidos no processo de ensino aprendizagem (KUNZ, 1991). Métodos Específicos de Ensino Para dar Aula de Skate. Os esportes radicais e não tradicionais vem obtendo um grande crescimento na procura da prática dessas atividades e um aumento popular na sociedade, pois os esportes radicais estão co-relacionatos a aventura que por sua vez expressa um trama exterior global da vida na história pessoal. Uma das características dos esportes radicais é o desejo de aventura onde “Todo homem carrega em si o desejo de desafiar, desbravar, soltar-se das amarras da realidade para voar com a liberdade” (SOUZA, 2004, p. 65). 134 Englobado no emaranhado dos esportes radicais encontra-se o skate, um dos mais populares mundialmente, devido ao seu crescimento e seu espaço na mídia. Sabe-se que o skate demorou a ser denominado como um esporte, assim suas práticas com conteúdos pedagógicos não foram discutidas ainda, sendo que a dificuldade de encontrar algo na literatura é muito grande. Um aspecto discutido por Figueiredo (2005) é como se deve trabalhar com skate? As dúvidas colocadas pelos professores com relação ao esporte são: Como trabalhar com segurança? Como conseguir o material necessário? Entre outros questionamentos que estão referentes à escola ou lugar de prática. Não há uma regra ou até mesmo uma receita especifica para salientar essas dúvidas, tudo vai de acordo com a realidade que se encontra o professor, da escola, dos alunos e até da sociedade local. E sim realizar um direcionamento a fim de ampliar o conhecimento de técnicas e conhecimentos que forneçam aos professores alguns parâmetros para que o mesmo consiga diagnosticar a sua realidade e planejar suas atividades de uma melhor forma nesse esporte. Não se encontra nenhum tipo método especifico para prática de skate, mais podemos abordar alguns princípios para a realização de um plano de aula que possa ser aplicado na aula. Deve-se levar em consideração o objetivo do seu programa de ensino, especificando algumas atividades que possam ser utilizadas como base para futuros desafios encontrados, observar que tipo de metodologia será utilizada na sua turma e quantos alunos terá durante a realização das atividades. O ambiente também é um dos fatores a serem destacados no ensino aprendizagem das aulas de skate devido aos processo de informações que os indivíduos receberam em relação ao chão, ao espaço, aos obstáculos entre outros fatores que determinem a aquisição de dados obtidos. Segundo Figueiredo (2005) o skate ainda é considerado pelos pais e professores um esporte de risco, por ser considerado um esporte radical ele deixa alguns vestígios a serem discutidos mesmo havendo os equipamentos de segurança esse preconceito está direcionado ao esporte. A realização de uma aula ministrada de uma forma correta faz com que o número de risco na prática 135 do skate seja muito pequeno com relação a outros esportes de contato físico, movimentos corporais e jogos (FIGUEIREDO, 2005). Na parte metodologia de ensino a realização de atividades de nível mais fácil para o nível mais elevado é um dos meios de aprendizagem mais coerentes em relação á pratica de skate, colocando na vivencia algumas atividades que possam ser utilizadas futuramente nas mais complexas sempre levando em consideração a questão da segurança. Inicialmente é interessante apresentar a funcionalidade do skate para o indivíduo e fazer com que ele tenha um contado livre deixando o experimentar algumas situações diferenciadas encontradas, a realização de atividades diversificadas torna-se um atrativo para a realização da prática, colocando em situações como sentado, duas pessoas no mesmo skate sentados, deitado com a barriga sobre o aparelho, a utilização de alguns obstáculos para a realização de movimentos laterais. Alguns aspectos encontrados na escolinha de skate da UEM realizada pelo Grupo de Esportes e Lazer (GEL) colocaram em conta algumas questões, observando as aulas ministradas, notei que os matérias apresentados tem variações de estruturais na questão de qualidade, assim é realizado um rodízio de skate para os alunos tornando a aprendizagem mais diversificada, pois cada indivíduo tem um contato diferente com o skate pois cada um tem sua maneira de se locomover, tamanho, espessura das rodas fatores que fazem diferença na prática das atividades, que por sua vez é uma boa maneira de se estar adquirindo informações externas com complexidade diferente. O fator do material como foi citado por Figueiredo(2005) depende de cada instituição e professor, existem escolinhas de skate especificas que obtêm materiais de qualidade. Fundamentos Básicos da Prática de Skate. No skate encontramos alguns aspectos básicos que podemos abordar, sendo eles: O equilíbrio sobre o skate, a posição dos pés, a remada, o freio, a locomoção, “a batida” (movimentos laterais realizados sobre o skate). O primeiro contato com o skate a dificuldade apresentada é o equilíbrio sobre o aparelho, ou seja, ficar em pé sobre o mesmo, sendo uma das primeiras etapas que deve ser colocada em prática. Algumas atividades como 136 colocar uma corda no chão e transpassar sobre ele, podem auxiliar no ensino aprendizagem de equilíbrio, outra maneira o contato sobre o skate apenas com o shape (madeira do skate) sem rodas, e assim vai se acrescentando um pouco de dificuldade nas atividades conforme a evolução apresentada pela pessoa. A posição dos pés também é um fator muito importante na aprendizagem da locomoção do skate, existem dois tipos de posições sendo definida como regular quando regular, quando se utiliza o pé esquerdo à frente e goofy quando o pé dianteiro é o direito. O equilíbrio sobre o skate está relacionado à posição dos pés, pois devido uma má posição sobre o shape a apresentação de desequilíbrio é maior. Na remada está direcionada com o a posição dos pés, pois existem algumas maneiras de se locomover sobre o skate, a remada é a realização do movimento do indivíduo em relação ao chão colocando um dos pés no skate e o outro movimentando-se lateralmente ao corpo do individuo, esse é apenas um exemplo de remada não sendo necessariamente obrigatório a realização desse movimento para se locomover. O skate diferente de bicicleta não possui um sistema de freio específico para retardar a velocidade, obtendo algumas maneiras de frear sendo uma delas a realização de curvas largas para causar menos velocidade, outra maneira é a colocação do pé no chão friccionando ao solo, o tipo de freada está relacionado à decorrência do momento sendo assim, pode-se variar o estilo de freada. Conclusão Através da literatura observou que ha uma carência muito grande de trabalhos sobre a questão do ensino aprendizagem na prática de skate, obtendo apenas alguns contextos sobre o ensino aprendizagem empregados na parte didática e pedagógica. Podendo assim relacionar os tipos de métodos colocados nas aulas de Educação Física nas aulas de skate. O skate ainda é um esporte com muito pouca referência bibliográfica no âmbito escolar, assim a presença de métodos específicos no ensino aprendizagem de skate é muito relevante, pois com novos tipos de metodologia empregadas na vivencia do skate fará com que aumente sua demanda não 137 apenas na área escolar mais também em escolinhas particulares, beneficiando e melhorando os planejamentos de aulas. REFERÊNCIAS BRITO, R. G. P. Skate e fotografia: A contribuição das revistas especializadas para o desenvolvimento do skateboard como cultura. Trabalho de conclusão de curso Publicidade e Propaganda, Faculdade Pitágoras, Londrina-PR, 2007. CANDAU, Vera Maria (org.). Rumo a uma Nova Didática. 16ª ed. Petrópolis: Vozes, 2005 CHIRALDELLI JR.,P. O que é pedagogia? São Paulo: Brasiliense, 1987. MOREIRA ,WW. Corpo presente num olhar panorâmico. In Corpo presente. Moreira ,WW(organizador). Campinas: Papirus, 1995. DIDÁTICA: banco de dados. Disponível em: http://www.centrorefeducacional.com.br/didat.htm. Acesso em 16 de mar. 210 FIGUEIREDO. A. V. Aspectos psicomotores na prática do skate.Trabalho de conclusão de pós-graduação, Universidade Candido Mendes. Rio de Janeiro, 2005. GRECO,P.J.; BENDA, R.N (Org): Iniciação esportiva universal. Vol 1 Da aprendizagem motora ao treinamento técnico. Belo Horizonte: Ed.UFMG,1998. HAMILTON, David. A virada instrucional (construção de um argumento) e Da dialética à didática. São Paulo: PUC-SP, 2001. (Textos de trabalho para seminários apresentados em março de 2001). LIBÂNEO, José Carlos. Tendências pedagógicas na prática escolar. Revista da Associação Nacional da Educação - ANDE. São Paulo, ano 3, n.6, 1983. MELO. Alessandro de.; URBANETZ, S.T. Fundamentos de didática. 2ª.ed.Curitiba.2008 SOUZA, Fabiana R.de. O imaginário no rafting: uma busca pelos sentidos da aventura, do risco e da vertigem. São Paulo: Zouk, 2004. VEIGA, Ilma Passos Alencastro (coord.). Repensando a Didática. 22ª ed. Campinas: Papirus, 2005. KUNZ, Elenor. Educação Física: ensino & mudanças. Ijuí: Unijuí, 1991. 138 O SIGNIFICADO DE MEIO AMBIENTE PARA OS COMPETIDORES DE ETAPA DO CIRCUITO UESB/CACHORRO DO MATO DE MOUNTAIN BIKE NA CIDADE DE VITÓRIA DA CONQUISTA - BA Marcial Cotes1,5, Celeste Dias Amorim2, Marcia Morel3, Cauê Marques Magalhães4 1 Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) Departamento de Ciências Naturais Vitória da Conquista / Bahia / Brasil 2 UESB / Pró-Reitoria de Extensão Vitória da Conquista / Bahia / Brasil 3 Universidade Estadual de Santa Cruz Departamento de Ciências da Saúde Ilhéus / Bahia / Brasil 4 Bolsista do Projeto Ciclismo na UESB, Graduando do Curso de Comunicação da UESB Vitória da Conquista / Bahia / Brasil 5 E-mail: [email protected] Resumo A investigação procurou fazer uma análise do conteúdo das entrevistas aplicadas aos participantes de uma das Etapas do Circuito UESB/Cachorro do Mato de Mountain Bike, na cidade de Vitória da Conquista/BA quanto ao significado de Meio Ambiente (MA). Esta etapa contou com a presença de 92 competidores de ambos os sexos e faixa etária de 07 a 53 anos. O universo amostral da pesquisa computou 41 sujeitos entrevistados, sendo dois do sexo feminino e 39 do masculino. Na análise do conteúdo das entrevistas, considerando o significado para MA natural e construído, 14,5 % da amostra tiveram a resposta avaliada como correta, 29,6 % não souberam responder ou as respostas foram analisadas como erradas e 56,1 % das respostas foram consideradas incompletas. Os autores sugerem que possivelmente o conceito de Meio Ambiente está sendo ministrado para os alunos das instituições de Ensino Fundamental e Médio de forma equivocada, incompleta, ultrapassada ou ainda não está sendo abordado. Entretanto, para os entrevistados com Ensino Superior completo foi considerado satisfatório o resultado obtido. Palavras-Chave: Meio Ambiente, Mountain Bike, AFAN. Introdução A nomenclatura sugerida por Bentrán (1995) de Atividades Físicas de Aventura na Natureza (AFAN), no contexto da Educação Física, utiliza a ideia dessas práticas semelhante ao conceito de ecoturismo formulado por Serrano (2000), como uma prática dita “guarda-chuva” devido à diversidade de opções existentes que abrange uma série de práticas desportivas outdoor entre elas moutain bike, trekking, rafting, escalada, rapel, arborismo, mergulho, vela, voo 139 livre, estudos do meio, safári fotográfico, observação de fauna e de flora, entre outros. Lovisolo (2000) exemplifica em sua leitura antropológica das tribos na Educação Física a necessidade de divisão da área em institutos. O autor entende a tribo da potência e modelagem dentro da faculdade de esportes, a da conservação da saúde na de medicina preventiva ou social, a da Educação Física escolar na pedagogia ou educação. E a tribo que usa o meio ambiente natural para suas práticas de aventura com o imaginário do retorno aos braços da mãe natureza? Poderia ser considerado outro instituto, denominado, por exemplo, de atividade física no meio ambiente natural ou educação física e meio ambiente? Bruhns (2003, p.48) percebe a natureza como mãe e faz uma leitura interessante em relação às AFAN. A autora entende que a natureza vem [...] carregando todo um misticismo de abrigo, provimento, sensibilidade, acolhimento e fragilidade, como também de hostilidade e revolta (afinal deve haver alguma reação, pois nenhuma mãe é tão passiva quanto se supõe). E é no espaço da “mãe natureza” que essas práticas serão efetuadas. Se levarmos em consideração esta afirmativa de passividade que a autora aborda, estaríamos em meio ao processo de reação da natureza com as questões de aquecimento global tão discutida na atualidade. Lovisolo (2000) não categorizou a tribo que usa o Meio Ambiente natural para suas práticas, mas é perceptível a necessidade de estudos que venham analisar as questões referentes em relação às AFAN e o Meio Ambiente onde são praticadas. Estudos teóricos na sociologia ambiental apontam a estreita ligação entre desenvolvimento institucional com as diversas manifestações de problemas ambientais como: políticas verdes, organização institucional da sociedade movimentos moderna, desenvolvimento ambientalistas histórico, e manifestações de consciência ambiental, problemas ambientais (NELISSEN et al.,1997). Camps, Carretero e Perich (1995) ao elaborar aspectos normativos que incidem sobre as atividades físico-desportivas que utilizam o Meio Ambiente 140 natural na Espanha para suas vivências, apontam preocupações com as normas que regulam as atividades, estruturas de organização – públicas, associativas, fundações e mercantis –, titulações dos profissionais envolvidos e as regulamentações que regem as instalações utilizadas. Os autores concluem que esses espaços e os profissionais estão cada vez mais subordinados a fortes regulamentações. Eles apontam que tanto o Estado como as comunidades devem estar atentas as legislações que regulam essas práticas, com o intuito principal de proteção do Meio Ambiente natural. Nas AFAN existe uma dicotomia do que se prega e o que se faz. A mídia e os praticantes tentam representar nas AFAN, uma harmonia entre suas vivências e o ecossistema onde é praticado, o palco, a mãe natureza, onde o ser humano realiza o seu mais fugaz desprender dos sentidos obrigacionais da sociedade de consumo. No seu esperado fim de semana redescobre o seu poder de domínio sobre o cansaço físico e mental, as intempéries não previsíveis, os desconfortos e imprevistos que surgem durante as práticas de aventura no meio natural. Porém, este fugaz desprender, não passa de mais uma necessidade de domínio da natureza, da competição contra você e contra o meio ambiente, o adversário. Um claro processo de esportivização. Para Rybczynski (2000, p.187) “[...] o fim de semana moderno se caracteriza não só por uma obrigação de fazer alguma coisa, mas também de fazer direito”. Este estudo teve como campo de pesquisa o Projeto de Extensão “Ciclismo na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB): uma prática saudável e ecologicamente sustentável”. O projeto foi concretizado em 2009, e no ano de 2010 continua ativo. Em 2009 consistiu em dez ações: dois passeios ciclísticos, quatro palestras e quatro competições de ciclismo – duas de moutain bike, uma de duatlhon e outra de speed (COTES et al., 2009). O objeto da investigação foi um recorte dos dados levantados durante a aplicação da entrevista estruturada, para análise de conteúdo referente ao significado de Meio Ambiente em atletas do I Circuito UESB/Cachorro do Mato de Mountain Bike, primeira ação realizada pelo projeto no ano de 2009. 141 Definição de Meio Ambiente Optamos pela definição de Meio Ambiente sugerida por Dias (2004), este entende ser suficientemente didática para atingir todas as faixas etárias dentro do universo amostral da pesquisa. O autor percebe o Meio Ambiente ou puramente ambiente, não só como tradicionalmente é definido: flora, fauna, ar, solo e água. Dias (2004) defende que todas as atividades humanas sobre a “espaçonave terra” causam influência, ao ponto que a própria cultura das sociedades humanas devem fazer parte desta definição. Para tanto, Dias (2004) avalia aspectos políticos, éticos, econômicos, sociais, ecológicos e culturais que estão em constante interação evolucionária, influenciando fatores abióticos – água, ar, solo, energia etc –, fatores bióticos – flora e fauna – e a cultura humana – paradigmas, valores filosóficos, políticos, morais, científicos, artísticos, sociais, econômicos, religiosos entre outros, como definição de Meio Ambiente. Em nossas análises utilizamos este conceito para discutir a percepção de Meio Ambiente dos participantes do I Circuito UESB/Cachorro do Mato de Mountain Bike. Corroborando com o conceito, Guattari (2006) sinaliza uma articulação ético política, que denominou de ecosofia. Na visão do autor, deve haver uma harmonia entre o Meio Ambiente, as relações sociais e a subjetividade humana. MOUNTAIN BIKE Mountain Bike é o conjunto de bicicleta e atleta para percorrer os mais heterogêneos terrenos com subidas, descidas e obstáculos naturais em forma de competições nos estilos: cross-country, downhill, dual slalom, freeride, triptraill, up-hill, entre outras (TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007). A origem do desporto data da década de 30 do século XX, nos EUA, criado por Ignaz Schwinn. O registro das primeiras competições institucionalizadas de mountain bike surgiu em 1985, em Mamute Lake, na Califórnia. O primeiro campeonato mundial oficial aconteceu no Colorado em 1990, nos EUA. A modalidade tornou-se Olímpica em 1996 nos jogos de Atlanta (TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007). 142 O I Circuito UESB/Cachorro do Mato de Mountain Bike foi realizado dentro do campus da UESB de Vitória da Conquista, em um circuito heterogêneo, com subidas e descidas, onde os ciclistas percorreram áreas de mata de cipó, pasto, áreas de experimentos dos cursos de graduação e pósgraduação em agronomia e engenharia florestal, eucaliptos e pinos. É interessante pontuar que nenhuma trilha foi aberta para fazer o traçado do circuito, utilizando as pré-existentes. Procedimentos Metodológicos No I Circuito UESB/Cachorro do Mato de Mountain Bike, participaram 92 atletas de ambos os gêneros – predomínio do sexo masculino com 90 inscritos – nas categorias: turismo, juvenil, infanto, junior, máster A, máster B, máster C, sub 23, sub 30, elite e feminino. Foi aplicada entrevista estruturada com roteiro de 10 perguntas para 41 sujeitos – 39 do sexo masculino e dois sujeitos do sexo feminino (DENCKER, 2002; NETO, 1994). Durante a aplicação da entrevista os sujeitos preencheram um termo de consentimento livre e esclarecido, onde constavam informações exigidas para a coleta de dados, além de diretrizes éticas internacionais para pesquisa biomédica envolvendo seres humanos, segundo o Conselho Nacional de Estudo e Pesquisa (CONEPE) e o Sistema Nacional de Saúde (SNS). As perguntas foram gravadas em um MP4 marca Philco modelo PH-305 e posteriormente transcritas na íntegra para um computador. Adotamos a metodologia de análise de conteúdo de Pêcheux (1973) citado por Franco (2008, p.11), quando afirma que O objetivo da lingüística é a língua, quer dizer o aspecto coletivo e virtual da linguagem, enquanto que o da análise de conteúdo é a palavra, isto é, o aspecto individual e atual (em ato) da linguagem. [...] a análise de conteúdo trabalha a palavra, quer dizer, a prática da língua realizada por emissores identificáveis. A partir deste conceito, buscou-se analisar a percepção dos sujeitos entrevistados quanto ao significado de Meio Ambiente. 143 Resultados O universo amostral da pesquisa contou com a participação de 44,5 % do total de competidores. A faixa etária dos participantes ficou entre sete e 53 anos. A tabela 1 apresenta o nível de escolaridade dos participantes, onde podemos observar que 58,5 % dos sujeitos possuem Ensino Médio completo e somente 14,6 % concluíram curso superior e/ou ainda tem pós-graduação. É pertinente dizer, que dentro deste universo, os dois sujeitos do sexo feminino possuem Ensino Médio completo. Tabela 1 – Nível de escolaridade dos sujeitos entrevistados em % ESCOLARIDADE Ensino fundamental I e II incompleto % DE SUJEITOS 7,3 Nº DE SUJEITOS 3 Ensino fundamental I e II completo 17,1 7 Ensino Médio incompleto 2,4 1 Ensino Médio completo 58,5 24 3º Grau completo ou Pós-Graduado Total 14,6 100 % 6 41 Nos participantes quando questionados sobre o conceito de Meio Ambiente, identificou-se que seis sujeitos, ou 14,6 % dos entrevistados tiveram como resposta o meio que vivemos, incluindo ambientes naturais e construídos. Contudo, 23 sujeitos ou 56,1%, consideram como meio ambiente somente natureza, mato, floresta, ou seja; meio ambiente natural, e 12 sujeitos ou 29,3% não souberam responder ou não entenderam a pergunta. Tabela 2 – Conceito de Meio Ambiente dos sujeitos entrevistados Categorias Meio em que vivemos incluindo ambientes naturais e construídos % DE SUJEITOS 14,6% Nº DE SUJEITOS 6 Natureza, mato, florestas, rios, cachoeiras, meio ambiente natural 56,1% 23 Não souberam responder ou erraram a resposta 29,3% 12 Total 100 % 41 Discussão O município de Vitória da Conquista tem como população estimada 319 mil moradores – o terceiro maior do estado, – conta com 49.102 alunos matriculados no Ensino Fundamental, distribuídos em 13.671 escolas públicas estaduais, 29.370 municipais e 6.061 privadas em 261 instituições, sendo 27 públicas estaduais, 179 municipais e 55 privadas (IBGE, 2008). 144 No Ensino Médio são 13.520 alunos com 12.023 matriculados em escolas públicas estaduais, 298 em escola pública federal e 1.199 em escolas privadas. O total de escolas que oferecem o Ensino Médio no município são 29 com 18 escolas públicas estaduais, uma escola pública federal e dez escolas privadas (IBGE, 2008). Para o ensino superior o município de Vitória da Conquista conta com uma instituição estadual e federal e três privadas. No universo amostral da pesquisa existem dois sujeitos um com sete e outro com 12 anos que estão regulares no Ensino Fundamental I e II, e um sujeito de 26 anos que não completou o Ensino Fundamental (Tabela 1). Os três sujeitos que não tem Ensino Fundamental completo, não souberam responder o questionamento, ou tiveram a resposta considerada incompleta, ou equivocada. Como por exemplo, o sujeito 17: “Um lugar que você deve preservar e cuidar bem porque um dia você vai precisar dele” (S17). Para os sete sujeitos ou 17,1 % da amostra que possuem o Ensino Fundamental completo a resposta para o significado de Meio Ambiente foi errada ou incompleta, entendendo Meio Ambiente somente como a natureza ou Meio Ambiente natural. Dentre as respostas consideradas incorretas, podemos citar os sujeitos sete e 28 que verbalizaram, respectivamente: “Meio ambiente... meio ambiente é... Rapaz, eu sei é que a gente tem que preservar o que está ao nosso redor. O que a gente puder preservar em trilhas, a gente vai estar preservando” (S 7). “É um lugar que todo mundo disputa. A paisagem, entendeu? Se todo mundo tivesse a consciência de preservar, não jogar lixo no ambiente, o ar que a gente respira seria outro” (S 28). Podemos considerar parcialmente correta a resposta do S 11 quando afirma que: “Meio ambiente quer dizer tudo. Quer dizer qualidade de vida, quer dizer saúde, quer dizer que sem o meio ambiente a gente não vive”. Na análise das respostas para o significado de Meio Ambiente dos entrevistados que ainda não concluíram o Ensino Médio, encontramos somente um sujeito, ou 2,4 % da amostra, e consideramos sua resposta incompleta, 145 pois em seu entendimento o significado de Meio Ambiente é somente “natureza”. Os sujeitos que têm o Ensino Médio concluído, constituíram a maior amostra da pesquisa com 24 entrevistados, ou 58,5 % do universo amostral. Destes, cinco sujeitos ou 20,8 %, quando questionados do significado de Meio Ambiente tiveram suas respostas consideradas erradas, ou não souberam responder. Como por exemplo, os sujeitos oito e 19, respectivamente: “Meio ambiente para mim me deixa sem resposta” (S 8). “É a natureza bem cuidada. É o esporte que não polui” (S 19). Ainda na análise do significado de Meio Ambiente, para o universo que têm o Ensino Médio completo, identificamos 17 sujeitos como respostas incompletas, ou 70,8 %. Consideramos o maior percentual dentro deste nível educacional. Podemos citar como analisada incompleta a resposta do sujeito 15: “Meio ambiente é você estar preservando a natureza de forma não-agressiva. O mountain bike não está agredindo a natureza, é um esporte não motorizado, não é poluente e integra a saúde do ciclista. Assim, você preserva o meio ambiente” (S 15). Para as respostas do significado de Meio Ambiente dos sujeitos que têm o Ensino Médio completo, avaliamos que somente dois sujeitos entrevistados responderam corretamente, ou 8,3 % desta amostra. Ponderamos como corretas, por exemplo, a resposta do sujeito 37: “É todo o meio que nós convivemos que nós estamos. Quer seja numa trilha ou no centro da cidade. É qualquer lugar onde estiver gente. Onde está o ser vivente. Então, tem que ser preservado” (S 37). Na análise do universo amostral dos sujeitos entrevistados com 3º Grau completo quanto ao significado de Meio Ambiente, encontramos seis sujeitos. Deste universo amostral analisamos como corretas quatro respostas e duas incompletas. Podemos citar como incompleta a resposta do sujeito 27: “É o local onde os outros seres humanos interagem. A natureza de forma geral” (S 27). Em nossa avaliação das respostas consideradas corretas para o questionamento do significado de Meio Ambiente dos sujeitos com 3º Grau completo, podemos mencionar a resposta do sujeito 26: 146 “Meio Ambiente é todo lugar que você desfruta para sua sobrevivência. Pode ser dentro da sua casa, do apartamento, como pode ser na natureza” (S 26). Conclusão Avaliamos que 14,6 % ou seis sujeitos com respostas consideradas corretas é um percentual muito baixo dentro do universo amostral de 41 sujeitos. O número de respostas apreciadas como incompletas de 56,1 % ou 23 sujeitos pode ser considerado elevado (Tabela 2). Se juntarmos com os 12 sujeitos ou 29,3 % que não souberam responder, ou tiveram a resposta analisada como errada, o percentual de sujeitos que não tiveram a resposta considerada correta aumenta para 85,4 % ou 35 sujeitos, o que consideramos um percentual elevado. A partir das análises quantitativas sugerimos que o conceito de Meio Ambiente poderia estar sendo ministrado nas instituições de Ensino Fundamental e Médio de forma equivocada, incompleta, ultrapassada ou ainda não está sendo abordado. Aludimos esse caminho mesmo se considerarmos que o universo amostral não tem significância, pois não chega a um percentual de 10% de matriculados no Ensino Fundamental e Médio na cidade de Vitória da Conquista. Contudo, a variação dos dados quantitativos nos permite sugerir devido o universo amostral ter a característica de um estudo de caso constituído de sujeitos que completaram e/ou estão em processo de finalização do Ensino Fundamental e Médio. Os Parâmetros Curriculares Nacionais trazem em suas diretrizes a importância dos temas transversais na formação educacional dos alunos. No V Congresso Ibero-Americano de Educação Ambiental (2006) em suas recomendações é defendido a inclusão da disciplina para formação universitária em todas as graduações, como ferramenta educacional de esclarecimento e conscientização. A análise dos dados nos permite definir que os sujeitos com 3º Grau completo possuem um conceito satisfatório do significado de Meio Ambiente, pois dentro do universo amostral, dos seis sujeitos ou 14,6 % com 3º Grau completo, quatro tiveram as respostas avaliadas como corretas e dois incompletas. No entanto, quando avaliamos o restante do universo amostral da 147 pesquisa, referente ao Ensino Fundamental e Médio, observamos que dos 35 sujeitos ou 85,4 % da amostra, somente dois sujeitos ou 5,7 % deste total com Ensino Médio completo, tiveram a resposta considerada correta. Enquanto que 21 sujeitos ou 60 % responderam de forma incompleta e 12 sujeitos ou 34,3 % não souberam responder ou tiveram suas respostas analisadas como erradas. Estes dados nos permitem sugerir, mais uma vez, algum tipo de deficiência, ou mesmo ausência de abordagens. Faz-se necessário desenvolver conceitos referentes à relação da sociedade com o Meio Ambiente, apontando uma necessidade de inclusão da Educação Ambiental para estes níveis educacionais. Neste sentido, corroboramos com Casillo, Farjado e Funollet (1995) quando sinalizam a importância da Educação Ambiental de forma sistematizada, principalmente, para o Ensino Fundamental e Médio. Mas, sem esquecer que na educação superior a Educação Ambiental deve estar presente com outros enfoques e questões pertinentes a essa fase educacional. REFERÊNCIAS BETRÁN, J. O. Dossier las actividades físicas de aventura en la naturaleza: análisis sociocultural. Apunts: Educación Física y Deportes. Barcelona, n. 41, p. 5 – 8, 1995. 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Rio de Janeiro: SENAC 2007. 149 PERCEPÇÃO DOS SKATISTAS DO ESTILO “STREET” DA CIDADE DE MARINGÁ-PR EM RELAÇÃO A ESTRUTURA DOS LOCAIS DE PRÁTICA Guilherme Moraes Balbim, Kleber Nogueira Filho, Edalvo Garcia Junior Universidade Estadual de Maringá – Maringá – Paraná – Brasil E-mail: [email protected] Resumo Este estudo tem como objetivo analisar a percepção dos skatistas do estilo “street” da cidade de Maringá-PR em relação a infra-estrutura dos locais de prática. Utilizando a educação não-formal através do esporte vinculado à prática da modalidade. O skate é um dos esportes radicais mais conhecidos atualmente, deixando de ser apenas um esporte para se tornar um estilo de vida. E, nos locais, onde é praticado o skate, que esta pesquisa pretende fomentar-se, procurando discutir sobre acerca desta temática, identificando os pontos positivos e negativos, bem como apontamentos de melhorias, tudo na ótica dos praticantes. Os instrumentos utilizados foram dois questionários, sendo que um deles foi elaborado pelos pesquisadores, os quais abrangeram questões acerca dos locais onde é realizada a prática do skate, especificando os adjetivos de cada um, bem como o objetivo, intensidade e frequência com que o sujeito pratica a modalidade. Palavras-chave: Educação não-formal, Skate, Street, Lazer, Infra-estrutura. Introdução A educação não-formal define-se como qualquer tentativa educacional organizada e sistemática que, normalmente, se realiza fora dos quadros do sistema formal de ensino. (BIANCONI, 2005). De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (2009), a educação não-formal, traz diversas conceituações: 1. Atividades ou programas organizados fora do sistema regular de ensino, com objetivos educacionais bem definidos. 2. Qualquer atividade educacional organizada e estruturada que não corresponda exatamente à definição de "educação formal". 3. Processos de formação que acontecem fora do sistema de ensino (das escolas às universidades). 4. Tipo de educação ministrada sem se ater a uma seqüência gradual, não leva a graus nem títulos e se realiza fora do sistema de Educação Formal e em forma complementar. 5. Programa sistemático e planejado que ocorre durante um período contínuo e predeterminado de tempo. (p.1) 150 Dentro dessa perspectiva, uma área muito utilizada para o desenvolvimento desta educação não-formal é o lazer, onde se encontra o skate, que é considerado um esporte. O esporte pode ser considerado como um sistema ordenado de práticas com predomínio de componentes físico, motor e intelectual, que envolve atividades de competição institucionalmente regulamentada, que se fundamenta na superação de competidores ou de marcas/ resultados anteriores estabelecidos pelo próprio esportista. (GUEDES, 2004). Já Böhme (2003), conceitua o esporte como conjunto de denominação dada a todo movimento, jogo ou forma de competição expressa pelas atividades físicas do ser humano. Pode-se encontrar o esporte em três campos distintos, Esporte Educacional, que abrange o campo da Educação Física; Esporte de Rendimento, visando o entretenimento e os negócios; e, Esporte de Participação, que engloba o lazer e a recreação. (GUEDES, 2004). Dentro do último campo de esporte citado, Camargo (1989), traz o lazer como qualquer atividade que não seja profissional ou doméstica, enquanto Dumazedier (1976) define o lazer como: Um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais. (p.333) Nesta mesma linha de raciocínio de esporte e lazer encontra-se o esporte radical. A palavra “radical” geralmente encaminha o entendimento para dois sentidos: extremismo quando se aplicado no campo da política e raiz quando se busca o entendimento de algo, principalmente no campo da filosofia. O esporte radical parece ter começado se destacar no Brasil na década de 1980, desde então vem aumentando o número de participantes. O comum neste esporte é o gosto pelo risco e pelo prazer da aventura, e também com uma visão ecológica. A cada mês surgem novos tipos de esportes radicais, 151 sendo que a maioria são de origem norte americanas e européias. (UVINHA, 2001). Ainda com relação ao esporte radical, Pereira (2008) traz a seguinte classificação: ESPORTES RADICAIS MEIO Aquático AÇÃO Surf, windsurf Aéreo Base jump, sky surf Terrestre Bungee Jump, sandboarding Misto Kite surf Escalada indoor, skate, patins in line, bike (trial, bmx) Urbano AVENTURA Mergulho (livre e autônomo), canoagem (rafting, caiaque, aqua ride, canyonning) Paraquedismo, balonismo, vôo livre Montanhismo (escalada em rocha, escalada em gelo, técnicas verticais, tirolesa, rapel, arvorismo); mountain bike (down hill, cross country), trekking Corrida de Aventura Le parkour Com relação ao skate, é um dos esportes radicais mais conhecidos atualmente, sendo que nos últimos anos seu crescimento trouxe um grande número de patrocinadores e os campeonatos são cada vez mais disputados. Esta modalidade deixou de ser apenas um esporte e, hoje, é um estilo de vida. Os principais skatistas além de viverem do esporte, ditam moda. O esporte movimenta milhões de dólares todos os anos e sua indústria é uma das mais prósperas indústrias do esporte no mundo. O skate firma-se com uma das práticas mais populares do Brasil. Estimativas do mercado registram um mínimo de 2,7 milhões de adeptos do skate no Brasil. Este quantitativo originase do Instituto Datafolha (SP) em pesquisa domiciliar em capitais estaduais, encomendada pela Crail, empresa atuante no segmento de skate, em 2002. (ATLAS DO ESPORTE, 2005) Segundo pesquisa realizada em Setembro de 2006 pela Datafolha há quase 3.200.000 de domicílios brasileiros que possuem pelo menos um morador que tem um Skate, aproximadamente 6% dos domicílios brasileiros conforme o IBGE. Deste contingente 8% são do sexo feminino. Toda essa difusão do skate se deve também pelo fato da facilidade de praticar a modalidade, exigindo apenas uma área com superfície regular que 152 possibilite o deslocamento do skate, porque os obstáculos encontrados são utilizados, na maioria das vezes, como recurso para as manobras. Por isso, muitos skatistas frequentam as ruas das cidades para praticarem seu esporte. Mas existem também muitos locais especializados, conhecidos como skate parks, que oferecem pistas especiais e desenvolvidas especificamente para o esporte. Em especial, exploramos nesta pesquisa a modalidade street. Esta especificidade do skate de acordo Reed (2002) apresenta uma grande variedade de manobras. A maioria delas envolve um salto, ou é o próprio salto. As manobras podem conter giros do skate e ou do corpo do atleta. Podem ser realizadas para subir, descer, transpor um obstáculo, ou iniciar uma manobra de slide. Utiliza-se pistas pré-moldadas (skates parks) ou a área urbana propriamente dita, usufruindo-se das estruturas contidas na mesma, como por exemplo, corrimão de escadaria, canteiros, jardins, rampas, etc. E, é dentro desses locais, onde é praticado o skate, que pretendemos fomentar nossa pesquisa. Procurando discutir sobre estes, identificando os formais e informais, onde é encontrado o melhor e o pior lugar, as políticas para a utilização do local e também identificar os pontos positivos e negativos, bem como apontamentos de melhorias, tudo na ótica dos praticantes, construindo um roteiro desta prática, também levando em consideração, aspectos pessoais dos sujeitos que realizam essa modalidade; situados no perímetro urbano da cidade de Maringá-PR. Objetivo do Estudo O presente estudo tem como objetivo identificar a percepção dos praticantes de skate estilo “street” da cidade de Maringá-PR em relação a estrutura dos locais de prática. Procedimentos Metodológicos Conforme tipologia atribuída por Barros e Lehfelde (2000), segundo as formas de estudo do objeto, a pesquisa é classificada como descritiva, sendo do tipo estudo de campo. De acordo com os autores, na pesquisa descritiva, não há interferência do pesquisador, isto é, ele descreve o objeto de pesquisa, procurando descobrir a freqüência com que um fenômeno ocorre, sua 153 natureza, característica, causas, relações e conexões com outros fenômenos. Na pesquisa de campo, o investigador torna-se observador e explorador, coletando diretamente os dados no local (campo) em que se deram ou surgiram os fenômenos, havendo assim, o contato direto com o fenômeno de estudo. A população foi composta por skatistas do sexo masculino situados no âmbito urbano da cidade de Maringá-PR. Sendo 38 skatistas do sexo masculino com idade acima de 18 anos, com o tempo mínimo de um ano de prática de skate no estilo “street”. De acordo com Barros e Lehfeld (2000) amostragem será não-probabilística tipo intencional onde os elementos são escolhidos de acordo com uma estratégia adequada e se relacionam intencionalmente com as características estabelecidas. Para atingir os objetivos da pesquisa foi utilizado um questionário préestruturado pelos autores e outro questionário já existente elaborado pelo Grupo de Estudo de Lazer da Universidade Estadual de Maringá (BALBIM, OLIVEIRA e PIMENTEL, 2009). A coleta foi realizada durante o mês de Outubro e Novembro do ano de 2009, nos diversos locais identificados, sendo realizado um levantamento dos horários mais frequentados pelos praticantes, para que então fossem aplicados os questionários, sendo que todos assinaram o termo de consentimento livre esclarecido. Em relação à tabulação dos dados foram submetidos à estatística descritiva utilizando de frequência absoluta e relativa representados através de gráficos e tabelas. Resultados Aplicados os questionários acima citados, verificamos dois momentos de resultados, o primeiro faz relações com a identificação do skatista e aspectos sócio-demográficos, gráficos 1 a 7, já no segundo momento, são identificados fatores associados a percepção dos praticantes em relação a estrutura dos locais de prática da modalidade, quadros 1 a 4 e gráfico 8. No que se refere a faixa etária dos praticantes que participaram do estudo, construímos a figura 01. Ressalvando que a amostra contou com indivíduos do sexo masculino e idade superior a 18 anos, no entanto, a esta idade dos não ultrapassou a faixa dos 30 anos. 154 FAIXA ETÁRIA 39% 18-20 ANOS 21-30 ANOS 61% Figura 01: Média de idade dos praticantes. A figura 02 nos mostra a estimativa do tempo de prática de cada um dos indivíduos da amostra. TEMPO DE PRÁTICA 8 8 8 8 7 6 5 5 4 4 3 2 2 1 0 1-2 anos 3-4 anos 5-6 anos 7-8 anos 9-10 anos 11-12 anos Figura 02: Tempo de prática dos praticantes. Com relação a figura 03, este identifica a categoria em que o praticante se encaixa. 155 CATEGORIA 8% 8% 32% 52% Profissional, patrocinado nas competições Amador, nível recreativo e competitivo Amador, nível recreativo Outro Figura 03: Categoria dos praticantes. Na figura 04, podemos verificar o grau de instrução em que se encontram os participantes do estudo. Destacamos aqui, a predominância de indivíduos com ensino médio e a ausência de indivíduos com mestrado ou doutorado. GRAU DE INSTRUÇÃO 3% 5% 1°Grau completo 39% 53% 1º Grau completo até 2º grau incompleto; 2º Grau completo até superior incompleto: Superior completo Figura 04: Grau de instrução dos praticantes. E no figura 05, verificamos a renda familiar de cada praticante. Referente a este item, constatou-se que nenhum dos indivíduos enquadraram-se com renda familiar acima de dez salários mínimos. 156 RENDA FAMILIAR Até 4 salários mínimos 5% 21% 32% 18% 8% 16% Acima de 4 salários até 5 salários Acima de 5 salários até 6 salários; Acima de 6 salários até 7 salários: Acima de 7 salários até 8 salários; Acima de 8 sal. Até 9 sal. Figura 05: Renda familiar. No referente a figura 06, identificou-se a freqüência com que o indivíduo pratica o skate, sendo que ninguém o pratica raramente ou mensalmente. FREQUÊNCIA 16% Ocasionalmente Semanalmente 45% Diariamente 39% Figura 06: Freqüência de prática do skate. A figura 07 expõe os motivos que levam o indivíduo a praticar a modalidade street do skate. Figura 07: Motivos que levam os sujeitos da amostra a praticarem a modalidade. 157 diversão MOTIVOS amigos;relações sociais 2 8 enfrentar o medo 17 5 sensação de superioridade sensação de “adrenalina” 8 8 contato coma natureza 4 10 melhoria da qualidade de vida 5 7 desenvolvimento pessoal 8 rejuvenescer/estar Figura 07: Motivos que levam os sujeitos da amostra a praticarem a modalidade. Os indivíduos que participaram do estudo relataram os locais que mais freqüentam para praticar a modalidade de street do skate, dentre estes, destacaram os melhores e os piores, conforme pode ser visto no quadro abaixo: Quadro 01: Locais freqüentados pelos praticantes e suas opiniões acerca do melhor e pior local. Nº. DE PARTICIPANTES QUE CITARAM OS LOCAIS: LOCAL CITAÇÕES Vila Olímpica (pista) COMO PIOR COMO MELHOR 14 1 Vila Olímpica (área) 17 0 12 Praça de patinação (Banks) 23 5 9 Praça do Bairro Vila Nova 7 2 0 Praça da Prefeitura 19 8 2 Pista de Iguatemi 6 2 3 Country Clube de Maringá 5 0 5 158 Outros 6 6 6 Não responderam 1 1 0 84 38 38 TOTAL Os quadros 02 e 03 fazem referências as citações aferidas no quadro 01, ou seja, mostram a justificativa das opiniões dos indivíduos acerca do melhor e do pior local para praticar o skate na modalidade street. Quadro 02: Justificativas acerca dos melhores locais de prática de skate. Vila Olímpica Praça de Praça da Área Patinação (Banks) Condições adequadas 1 3 Espaço amplo 6 Amizade 2 JUSTIFICATIVA Pista Local novo 1 1 Clube Outros 2 2 1 4 1 3 TOTAL Prefeitura Iguatemi 1 Obstáculos adequados Não justificou Pista de Country 12 9 1 1 2 3 3 5 6 Quadro 03: Justificativas acerca dos piores locais de prática de skate. JUSTIFICATIVA Vila Olímpica (Pista) Praça de Praça do Bairro Praça da Patinação (Banks) Vila Nova Prefeitura Iguatemi Planejamento 6 Não justificou 3 1 Não tem espaço 1 2 Regras (difícil aceso) 4 Buracos Outros/ 1 1 Pista de 2 não opinaram 2 2 6 159 Obstáculos (poucos/precários) 1 1 Vizinhos dos locais reclamam 1 Sociabilização ruim 1 outros 3 TOTAL 14 5 2 8 2 Por fim, os indivíduos puderem dar sugestões para melhoria dos locais de prática, verificando tais argumentos no gráfico 08, onde traz o n de cada variável. E, também no quadro 04, expondo as razões de cada variável. SUGESTÕES PARA MELHORAR OS ESPAÇOS 30 26 25 20 15 7 10 2 5 3 0 Construir/Reformar Locais Socialibização Acabar o preconceito Outros Figura 08: Sugestões dos praticantes (em citações) para melhorar os espaços para a modalidade em Maringá. Quadro 04: Complementação da figuras 08 são as minutas das sugestões acima abordadas. 7 160 Construir/Reformar Acabar o Locais Incentivo da prefeitura. Sociabilização preconceito Tornar locais mais “Fama” dos acessíveis para prática. skatistas. Outros Liberar uso da pista da Vila Olímpica. União entre os Reformar (praças, obstáculos). sktatistas e mais eventos. Materiais mais baratos. Construir locais para prática do skate. Incentivo para crianças. Incentivo de patrocinadores. Incentivo do esporte para Construir e reformar locais. os praticantes. Mais amizade entre os praticantes. Acesso a prática da modalidade. Discussão dos Resultados A média de idade dos indivíduos que praticam o skate “street” na cidade de Maringá de acordo com o estudo foi entre 18 e 20 anos e de 21 até 30 anos de idade, predominando a primeira (Gráfico 01). Quando chegamos aos vinte anos de existência, podemos notar que estamos no ápice da juventude, sendo o gosto pelo risco e pelo prazer da aventura através de esportes radicais, (UVINHA,2001). Fazendo sentido no caráter que molda a personalidade do jovem de hoje. Após este intermédio da vida, o “tempo” encaminha o indivíduo para a fase adulta, pois “a juventude vista na sua condição de transitoriedade, na qual o jovem é um “vir a ser”, tendo no futuro, na passagem para a vida adulta, o sentido das suas ações no presente”, (SALEM, 1986). Observa-se que o tempo de prática desta modalidade esteve entre um e doze anos de vivência, porém predominando o tempo de prática de três a oito anos como mostra o gráfico 02. Sendo assim fica claro que conforme a média de idade podemos notar que os indivíduos da amostra começaram cedo sua participação no lazer não-formal levando em consideração o skate como um adjunto do esporte. Neste ponto, a média de idade referente ao início da prática na vida do entrevistado, que foi de 14,47 anos. Destaca-se como menor idade 161 de início aos 9 anos e como maior, 18 anos. E ainda, a idade que mais se repetiu foi a de 16 anos. Ao mesmo tempo em que identificamos a média de idade da amostra e o tempo de prática, podemos fazer relação com a categoria ou qual o nível de participação deste jovem na modalidade street, podendo ser profissional patrocinado em competições, amador recreativo e competitivo, amador apenas a nível recreativo e outros, uma vez que a “prática pelo exercício faz com que o ser humano possa encaminhar seus movimentos para perfeição”. Sendo assim observamos que 52% dos entrevistados encontraram-se no nível amador recreativo e apenas 8% em nível de competição com auxilio de patrocínio como mostra o gráfico 03. Ao verificarmos essa diferença entre o amador e profissional, podemos ensejar que sua origem vem principalmente da falta de incentivo e das dificuldades encontradas pelos praticantes na hora de utilizarem os locais apropriados para o treino, conforme fica destacado nos quadros 03 e 04, sendo que o primeiro traz as justificativas dos piores locais de prática do skate, como mal planejamento, pistas e obstáculos inadequados e em alguns casos burocracia para andar na pista existente. E, o quadro 04 aborda as sugestões para melhoria dos locais de prática, destacando-se neste momento, incentivo de órgãos públicos e patrocinadores, bem como a construção e reforma dos locais. Nesse sentido, faz-se necessário entender como o fator da condição sócio-econômico destes indivíduos e as políticas públicas para a utilização destes locais de prática podem influenciar nestes resultados. Observamos que em relação ao nível sócio-econômico dos participantes do estudo, 32% possuem uma renda de até quatro salários mínimos e 5% acima de oito salários (Gráfico 05), sendo assim vale ressaltar que o skate sendo uma prática de lazer e até mesmo de caráter profissional não encontra barreira econômica para sua participação, pois segundo pesquisa realizada em Setembro de 2006 pela Datafolha há quase 3.200.000 domicílios brasileiros que possuem pelo menos um morador que tem um Skate, aproximadamente 6% dos domicílios brasileiros conforme o IBGE. Partindo de princípio de que a renda não é um dos fatores mais importantes que interferem na grande diferença no percentual do nível profissional e amador, devemos partir para o vínculo das políticas públicas à 162 possibilidade de utilização da área de prática pelos skatistas. Com base nesse entendimento, nas sociedades aristocráticas, os homens não precisam unir-se para agir, porque já estão solidamente mantidos juntos. Nas democracias, pelo contrário, todos os cidadãos são independentes e ineficazes, quase nada podem sozinhos e nenhum deles seria capaz de obrigar seus semelhantes a lhe emprestar sua cooperação. Se não aprendem a se ajudar livremente, caem todos na impotência. (BOBBIO apud TOCQUEVILLE, 1990) Bobbio (1990) afirma que a capacidade de organização e ajuda mútua seria um pilar fundamental ao desenvolvimento da sociedade. Desta forma cabe a prefeitura do nosso município saber lidar com esta situação dando incentivo profissional a esse esporte, para que a sociedade fique livre de preconceito e que possa reconhecer os benefícios desta prática, através da união do órgão representante e população. Após o entendimento e o possível esclarecimento a cerca da diferença entre os níveis de partição dos indivíduos, precisamos analisar também o grau de instrução destes. Notamos que 53% dos pesquisados possuem segundo grau completo, porém superior incompleto e 3% possuem superior completo (Gráfico 04). Mesmo sabendo que a minoria dos entrevistados possui um diploma é interessante ressaltar pelo fato da população ser maioria jovem de 18 a 20 anos mais de 50% da amostra ainda estão engajados num sistema de ensino sendo ele privado ou público. Estes dados se tornam importante, pois podemos notar que há interesse pelos jovens de hoje possuírem um diploma, nos dando a entender que eles estão cientes das condições e exigências que o mercado de trabalho impõe sob aquele que almejam um futuro profissional. De acordo com o gráfico 03, podemos notar que 45% praticam o sktate diariamente contra 16% dos entrevistados praticando ocasionalmente. Para podermos compreender estes fatos, analisaremos quais os motivos que levam os pesquisados a praticar o skate na modalidade street conforme o gráfico 07, ele nos mostra que a opção “diversão” obteve 17 escolhas contra 4 votos da opção “enfrentar o medo”, porém existindo votações intermediárias como amigos/relações sociais, enfrentar o medo, adrenalina, sentimento de superioridade, etc. A motivação é um fator muito importante para que ocorra uma rotina de prática, pois segundo Bergamini (2006) a motivação é uma força 163 interior que se modifica a cada momento durante toda a vida, onde direciona e intensifica os objetivos de um indivíduo. Dentro das perspectivas que abrangem este artigo, uma delas é identificar os possíveis locais de prática da cidade de Maringá. Sendo assim conforme traz o quadro 01, identificamos sete locais mais freqüentados pelos skatitas, são eles: Vila Olímpica (pista); Vila Olímpica (área); Praça de patinação (Banks); Praça da Prefeitura; Praça do bairro Vila Nova; Pista de Iguatemi e Country Clube de Maringá. Entre estes locais citados, observamos conforme o quadro 01, a Vila Olímpica (pista) como um dos piores locais para praticar, pois sua estrutura e a forma como foi construída se faz inadequada de acordo com as medidas entre um “obstáculo” e outro. E conforme a tabela o melhor lugar citado pelos pesquisados foi a área da Vila Olímpica, por ser um espaço amplo e de fácil acesso, possibilitando inúmeras variedades de manobras, consoante com este aspecto, segundo Reed (2002), o “street” propriamente dito apresenta uma grande variedade de manobras. A maioria delas envolve um salto, ou é o próprio salto. As manobras podem conter giros do skate e ou do corpo do atleta. Podem ser realizadas para subir, descer, transpor um obstáculo, ou iniciar uma manobra de slide. Utilizam-se pistas pré-moldadas ou a área urbana propriamente dita, usufruindo-se das estruturas contidas na mesma, como por exemplo, corrimão de escadaria, canteiros, jardins, rampas, etc. Devemos levar em consideração e colocar em pauta algumas manifestações feitas pelos skatistas do município de Maringá em relação às sugestões para melhorar o espaço de prática, são elas: Construir/ reformar, sociabilizarão, “acabar” com os preconceitos, entre outros. Podemos destacar o fator construir/ reformar como mais citado, pois nós pesquisadores que fomos a campo, notamos que se necessita de reformas e novas construções para melhor distribuir os praticantes desta modalidade no perímetro urbano da cidade. Considerações Finais 164 Diante de todo o exposto, identificamos os locais de prática, caracterizando o praticante da modalidade de skate street e, compreendendo a opinião destes com relação as propostas estruturais e sistematizadas para o uso dos locais da prática, ou seja, tudo na ótica do praticante, analisamos a percepção dos skatistas do estilo street da cidade de Maringá-PR em relação a infra-estrutura dos locais. Desta forma, identificamos que existem locais que comportam os sktatistas da cidade, porém são defasados no que diz respeito as condições de prática. Fator este, segundo as informações dos entrevistados, decorrentes da inatividade e/ou ignorância dos órgãos públicos com relação a esta modalidade esportiva. Nesta perspectiva, há que se destacar esta inobservância por parte do Poder Público, pois com a realização da pesquisa pôde ser constatado esses fatores, como por exemplo, pista de prática e obstáculos inadequados, e ainda algumas vezes falta de segurança devido ao mau planejamento dos locais próprios de prática. Assim, observou-se que os locais próprios da prática do skate modalidade street não são utilizados e, o contrário é verdadeiro, ou seja, os skatistas praticam em locais considerados impróprios para a prática. Contudo, não observamos nenhuma movimentação mais acintosa do grupo com relação a uma mudança significativa. Não foi identificado nenhum tipo de organização que reivindique essas melhorias, assim, faz-se necessário um movimento do tipo para atingir as reivindicações. Os praticantes merecem locais adequados, mas não podem ficar inertes, esperando que essas benfeitorias cheguem por meio de iniciativa do Poder Público. REFERÊNCIAS BALBIM, G. M.; OLIVEIRA; R. M. S. 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São Paulo: Manole,2001. 166 PERCEPÇÕES E REPRESENTAÇÕES DE SURFISTAS DE TOW-IN EM ONDAS GIGANTES Ney Felippe de Barros Rodrigues Cocchiarale UNIGRANRIO, Duque de Caxias, RJ, Brasil Vera Lucia de Menezes Costa UGF, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Geovana Alves Coiceiro Cantuaria UNESA / BENNETTE, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Katia Cristina Montenegro Passos UVA, Rio de Janeiro, RJ, Brasil E-mail: [email protected] Resumo O presente estudo, de abordagem qualitativa, teve por objetivo investigar as percepções e representações de surfistas de tow-in em ondas gigantes através das associações mentais geradas pelo estímulo causado por dez palavras indutoras presentes no universo imaginário desses esportistas do extremo. O grupo investigado foi composto por onze surfistas de tow-in com experiência em ondas com tamanho superior a uma faixa de 25 a 30 pés (8 a 10 metros). Como estratégia metodológica, foi utilizada a técnica projetiva de associação de ideias que buscou as manifestações livres da subjetividade dos informantes, expressa nas associações verbais estimuladas pelas palavras indutoras. As respostas dos informantes possibilitaram a organização do mapa de associação de ideias que demonstra as relações e frequências dos pensamentos e imagens interligadas em torno de um estímulo específico (palavras indutoras). A partir da análise do mapa, organizamos dois grupos semânticos utilizando o critério de agrupamento por natureza coletiva: o das associações comuns e o das associações não-comuns. A análise dessas associações revelou uma relação de ambivalência entre o homem e a natureza, onde dualidade existente nesse contato com a natureza está presente na própria vida desses atores, em um jogo de opostos onde eles transitam entre o existir e a não existência de sentido para suas vidas. Suas referências de vida apontam para vivência da aventura, explorando lugares exóticos e desafiadores, em busca da maior onda, da competência para vencer os desafios e da felicidade. Palavras-chave: Imaginário; surfe de tow-in; ondas gigantes. Introdução Tanto no Brasil quanto no resto do mundo, os esportes de aventura e os esportes radicais têm arregimentado muitos adeptos, trazendo como fundamento o gosto pela aventura e pelo risco, que parece estar mais relacionado a uma busca pela experimentação do que, como pode parecer ao senso comum, à configuração de uma atividade destrutiva (UVINHA, 2001). 167 A busca do ser humano por essas novas modalidades, seja sob a ótica do lazer, seja pelo esporte de competição, é motivada pelo desafio, onde, segundo Costa (1999, 2000), ele vai testando e ampliando seus limites num jogo com forte valor simbólico, em uma relação com o meio natural que ora tende para o enfrentamento, ora para a comunhão. Sobre esse dualismo, Campagna (2006) corrobora com Costa (1999, 2000) ao esclarecer que há situações em que o aventureiro considera a natureza como extrínseca a ele, restringindo-se meramente a um cenário para as suas façanhas, onde há uma conotação de competição e enfrentamento entre homem e natureza, com um sentido de não pertencimento à natureza, mas de domínio sobre ela. Mas há, no outro extremo, uma natureza que é intrínseca ao homem, numa relação “Homem-Natureza [que] é concebida como unidade uníssona, (inter)dependente e complementar, desvelando-se como verdadeiros ‘parceiros’ nesta aventura” (CAMPAGNA, 2006, p. 215). O mesmo autor destaca que, nessa concepção, são estabelecidas relações de cooperação, solidariedade, empatia, cumplicidade e unicidade entre o homem e a natureza. Nesse sentido, Schwartz (2006) afirma que a busca ou a necessidade do homem do re-encontro consigo mesmo, com o outro e com a natureza, que é propiciada pelas atividades físicas realizadas em ambiente natural, é uma das formas que está mais em evidência entre as possibilidades do lazer contemporâneo. Para a autora, esses esportes de aventura, como são comumente tratados pela mídia, reforçam um apelo que vai além da atividade em si, de contemplação, da fruição, mas trazem, também, “legendas subliminares que envolvem, desde o colocar-se em risco para testar a própria auto-superação, até a perpetuação de padrões e modismos vigentes” (p. 25). O contato do homem com a natureza, propiciado pela prática de atividades no ambiente natural, possibilita vivências de emoções e de aventura que contribuem para uma harmonização do homem com a natureza pelo reconhecimento do seu espaço na sua relação com o mundo e, assim, com a possibilidade dele defrontar-se com a sua própria natureza humana e com a redefinição de valores sociais (COSTA; TUBINO, 1994; BRUHNS, 1997; COSTA, 1999). 168 Costa (2000) esclarece que a aventura vivenciada nos esportes na natureza é carregada de sentidos lúdicos já que seus praticantes aceitam correr riscos calculados cada vez maiores em um jogo de auto-superação. Uvinha (2001) nos traz essa mesma perspectiva quando diz que os praticantes desses esportes jogam a todo instante com o risco de ocorrer uma queda, um afogamento ou qualquer outra situação que possa até custar a sua vida. Mas esse é um jogo consciente, onde o risco é calculado e as possibilidades são analisadas segundo as experiências e habilidades do praticante. Ao se lançarem nessas aventuras, eles o fazem confiantes não só nas suas capacidades técnicas, mas, também, na sensação de segurança propiciada pela utilização de equipamentos desenvolvidos pela tecnologia. Desta forma, podemos considerar que o desenvolvimento tecnológico promoveu as condições necessárias para a busca de desafios cada vez maiores, através da criação e aprimoramento constante de equipamentos de segurança e de sistemas de informação e de pesquisa que permitem uma melhor previsibilidade, planejamento e cálculo do risco envolvido (COSTA, 1999; COCCHIARALE, 2007, 2010; COCCHIARALE; AZEVEDO; COSTA, 2008,). Contudo, mesmo dentro de uma ótica do risco calculado, alguns desses aventureiros extrapolam o limite da segurança quando lidam com situações extremas em que o preço a pagar pelo fracasso deixa de ser a frustração, algumas lesões ou um período de recuperação no hospital. Para esses esportistas do extremo o preço pode ser a própria vida. O presente artigo apresenta parte de uma Dissertação de Mestrado (COCCHIARALE, 2010) sobre o imaginário dos surfistas de tow-in em ondas gigantes, e teve o objetivo de investigar as percepções e representações desses atores através da manifestação livre de sua subjetividade, gerada pelas associações mentais ao estímulo causado por dez palavras indutoras, presentes no universo imaginário desses esportistas do extremo. Método O presente estudo utilizou uma abordagem qualitativa. Segundo Thomas e Nelson (2002), o método qualitativo tem sido usado por muitos anos em pesquisas nos campos da antropologia, da psicologia e da sociologia, mas a 169 sua utilização na área das atividades físicas é relativamente nova. Para esses autores, a característica mais significativa da pesquisa qualitativa é o seu conteúdo interpretativo, de onde ela “busca compreender o significado para os participantes de uma experiência em um ambiente específico e de que maneira os componentes combinam-se para formar o todo” (p. 323). Nesse sentido, Bauer e Gaskell (2002) pontuam que a pesquisa qualitativa trabalha com interpretações das realidades sociais. Desta forma, o uso da abordagem qualitativa possibilita a descrição e interpretação dos fenômenos sociais, buscando uma compreensão profunda de seus significados. Foi elaborada uma lista com dez palavras indutoras presentes no universo simbólico dos surfistas de tow-in, para serem utilizadas na técnica projetiva de associação de ideias, visando captar a subjetividade dos atores relacionada às lembranças espontâneas geradas por elas. A escolha dos informantes foi intencional, uma vez que são poucos os esportistas que se aventuram nesse esporte de risco extremo, e foram selecionados entre surfistas praticantes de tow-in que têm experiência em ondas gigantes, todos maiores de idade. Para definir o critério de inclusão, este estudo considerou como ondas gigantes aquelas com tamanho superior a uma faixa de 25 a 30 pés (8 a 10 metros) de altura. Esse critério levou em consideração que um dos principais eventos de tow-in que acontece no Havaí estipula como condição para a sua realização que as ondas atinjam um tamanho mínimo de 20 pés e, ainda, uma consulta feita ao Presidente da Associação Brasileira de Surfe Motorizado (ABRASMO), Romeu Bruno, que considera que as ondas são gigantes a partir de 30 pés. Segundo Romeu Bruno, essas ondas existem no Chile, Ilha de Páscoa, Havaí, Califórnia, África do Sul, Austrália, Norte da Europa e em outros lugares nos oceanos que são alvo de constantes monitoramentos que levam à organização de verdadeiras expedições para desbravar novos locais para a prática do tow-in. Os sujeitos foram convidados pelo pesquisador responsável e as entrevistas aconteceram em suas residências ou em local público que eles escolheram, não necessitando de autorização por parte de terceiros. Todos que aceitaram participar receberam esclarecimentos sobre todos os aspectos relacionados à pesquisa e assinaram um termo de consentimento livre e 170 esclarecido autorizando a divulgação dos resultados encontrados, conforme Resolução n.º 196/MS/CNS, de 10 de outubro de 1996. A pesquisa que deu origem a este artigo foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Gama Filho. Foram entrevistados onze praticantes do sexo masculino, sendo dez brasileiros e um do Peru. Esse quantitativo é expressivo, considerando que no Brasil, embora o número de adeptos do tow-in esteja crescendo rapidamente, existem, no momento desta pesquisa, aproximadamente 30 praticantes com experiência em ondas gigantes, que aparecem regularmente nas listas de convidados das competições organizadas pela ABRASMO. O informante peruano foi o pioneiro do tow-in em seu país e é considerado uma referência na modalidade por aqueles que buscam as ondas gigantes de Pico Alto, que é um local onde podem ser encontradas ondas acima de 20 pés no Peru. A idade dos informantes variou de 25 a 49 anos (M ± DP = 39 ± 7), sendo dois informantes com idades inferiores a 30 anos, 3 com idades entre 30 e 40 anos e 6 informantes acima de 40 anos de idade. Este dado revela que o tow-in em ondas gigantes reúne atletas de maior experiência, podendo ser uma alternativa para a continuidade competitiva quando a idade se torna um fator limitador de performance no surfe tradicional. Todos os informantes são surfistas profissionais, vivendo do esporte, e contam com patrocinadores que dão condições de realizar as suas viagens, aquisição e manutenção de equipamentos. Cinco deles também atuam como empresários, curiosamente os acima de 40 anos de idade, com negócios ligados ao surfe, como surf shop, fabricação e venda de equipamentos, aulas de surfe e produção de imagens aquáticas. Isso pode significar uma necessidade de estabilidade financeira não dependente de patrocínios que com o avançar da idade acabam se tornando cada vez mais difíceis de conseguir e podemos inferir, também, uma blindagem de imagem do surfista/marca/surfe favorecendo os negócios no esporte, uma vez que este, na atualidade, se apresenta como um grande mobilizador de bens e de consumo. Sete informantes concluíram o ensino médio, um possuía apenas o ensino fundamental e três informantes possuíam curso superior completo, mesmo assim, não atuavam na profissão para a qual se formaram. Esse dado pode ser explicado pela dedicação ao esporte que todos eles demonstraram, 171 com necessidade de viagens constantes, o que dificultaria a continuidade nos estudos. As Associações de Ideias Os informantes foram instruídos a expressar o primeiro pensamento produzido a partir de dez palavras indutoras: onda gigante; desafio; risco; corpo; medo; segurança; jet-ski; parceiro; limite; Jaws. As respostas dos informantes possibilitaram a organização do mapa de associação de ideias (Figura 1) que demonstra as relações e frequências dos pensamentos e imagens interligadas em torno de um estímulo específico (palavras indutoras). Figura 1 – Mapa de associação de ideias. A partir da análise do mapa, organizamos dois grupos semânticos utilizando o critério de agrupamento por natureza coletiva: o das associações comuns, construído a partir da reunião dos sentidos semelhantes que os sujeitos expressaram, relacionados a mais de uma palavra indutora ou da relação direta em que uma resposta gerada coincidia com outra palavra indutora; e o das associações não-comuns, cujos sentidos emergiram apenas de uma palavra indutora. O Quadro 1 apresenta a organização do grupo das associações comuns em ordem de frequência. 172 Quadro 1 ASSOCIAÇÕES COMUNS Sentidos Não existe/inexistente Presença constante/Sempre Confiança Prazer Minha vida/viver Excitante/estímulo Jaws Superação Cautela/comedimento Deus Onda gigante Parceiro Desafio Segurança Nº de respostas 13 12 10 08 06 04 04 04 03 03 02 02 01 01 Analisando as associações comuns, podemos verificar a maior concentração de respostas semelhantes em torno de dois sentidos opostos: não existe/inexistente e presença constante/sempre. Essa intensidade de respostas aponta para a percepção de que o prazer para esses surfistas do extremo caminha por um jogo de opostos – presença/ausência, que também encontramos em outros elementos das associações comuns: superação/cautela, desafio/segurança. Surfar ondas gigantes e estar na natureza é a própria vida, é a razão de ser desses atores, e não estar nesse ambiente é morrer em uma vida sem sentido, uma dualidade vida/morte que reflete as características de um ser dividido entre uma vida prazerosa, excitante e estimulante no mar e a monotonia da vida em terra. Esse dualismo carrega o simbolismo do mar, da dinâmica da vida, que tem a propriedade divina de dar e de tirar a vida. O mar é o lugar do nascimento, das transformações e dos renascimentos, de onde tudo sai e para onde tudo retorna. O mar é a água em movimento. Ele simboliza um estado transitório entre as possibilidades, uma situação de ambivalência, que é a da incerteza, da dúvida, da indecisão, podendo se concluir bem ou mal (CHEVALIER; GHEERBRANT, 2006). Ao entrarem no mar, os surfistas de towin renascem para a vida que lhes dá prazer, uma aventura cujo resultado é incerto, mas no qual se lançam com a confiança do sucesso. 173 O elemento confiança aparece como outro destaque nas associações comuns. Sem a confiança, não seria possível vivenciarem essas aventuras. Além de estar relacionada com o conhecimento de suas próprias capacidades e habilidades, essa confiança emana principalmente de seu parceiro e do uso do jet-ski. Essa combinação homem-máquina atua como o guia ou o auxiliar mágico que ajuda o herói a enfrentar os seus desafios. A máquina é a ferramenta que possibilita o prazer de surfar ondas gigantes, é o brinquedo que permite o jogo com a natureza, um objeto sagrado que é a segurança nos momentos difíceis, nos quais Deus aparece como um parceiro, uma força a mais para garantir o retorno das aventuras. Ainda nas associações comuns, encontramos Jaws, local relacionado à melhor onda do mundo, a mais poderosa, a mãe de todas as ondas. Surfar as ondas de Jaws, que já chegaram a 70 – 80 pés, é o sonho que excita, estimula e desafia esses aventureiros. Onde os medos interiores devem ser superados com cautela/ comedimento e os desafios devem ser vencidos com segurança. Não é por acaso que surgiu o sentido de mãe. Segundo Chevalier e Gheerbrant (2006), o simbolismo da mãe está ligado ao do mar na medida em que, ambos, são receptáculos e matrizes da vida. A mãe é que dá a vida, nutre e protege, mas também é a opressora, que sufoca e paralisa o desenvolvimento do eu através de um prolongamento excessivo da função de alimentadora e de guia. A atração que a onda de Jaws exerce sobre os atores do estudo provém de uma fascinação inconsciente, como a do filho que mantém uma forma de fixação na mãe. A interpretação da categoria das associações não-comuns possibilitou identificar os grupos de sentidos que se organizaram em torno de três novas categorias semânticas, que conduzem ao entendimento do que se oculta no inconsciente dos respondentes, trazendo respostas às seguintes indagações: Quais as minhas referências? O que eu busco? Quais os significados do meu corpo? O Quadro 2 mostra o grupo das associações não-comuns, organizadas em três novas categorias semânticas. As referências desses atores apontam para locais paradisíacos onde Teahupoo, no Taiti, e Ilha de Páscoa emergem como imagens de ondas desafiadoras e de lugares a serem desbravados, envoltos por mitos e misticismos que os sacralizam. Teahupoo, que na linguagem local significa 174 crânio quebrado, é um local de ondas extremamente perigosas e perfeitas que quebram sobre uma bancada de corais pontiagudos, com menos de um metro de profundidade, e que já fez várias vítimas. Laird Hamilton impressionou o mundo no ano 2000 ao ser o primeiro a surfar de tow-in uma onda gigante em Teahupoo. Ele surge como uma referência do verdadeiro homem do mar. Quadro 2 ASSOCIAÇÕES NÃO-COMUNS Novas categorias semânticas Minhas referências... O que eu busco... Meu corpo... Teahupoo A melhor onda/ a mais poderosa/ sonho Saudável Ilha de Páscoa Emoção/ realização/ perfeição Um presente Laird Hamilton Harmonia Todo quebrado 4 Tempos / ecologia Eu Sempre treinado Muita velocidade Morte Competente Ser feliz O contato com a natureza trás para esses atores uma preocupação ecológica e desenvolve atitudes voltadas para a manutenção das condições ambientais, como limpeza das praias, destinação adequada do lixo que eles produzem e o uso de um jet-ski menos poluente (motores 4 tempos). Essas atitudes, que acompanham a tendência mundial com a preservação do meio ambiente e de inquietação com o futuro do nosso planeta, visam principalmente garantir as condições de continuidade da sua atividade, do seu prazer. A busca é por seus sonhos, pela onda mais poderosa, pela perfeição, pela emoção da velocidade, da vertigem que imprime à consciência um pânico voluptuoso (CAILLOIS, 1990). É uma busca pela competência para lograr êxito no enfrentamento do risco extremo de surfar ondas gigantes. Em uma análise mais profunda, é buscar a felicidade e estar em harmonia com o Cosmos, em uma viagem interior ao encontro de si mesmo, do significado de sua própria existência. Nessa aventura, o corpo é um presente divino, é o elo que conecta a consciência ao mundo exterior, que possibilita a interação da razão com a 175 emoção. Como instrumento, o corpo precisa se manter saudável, apto para desempenhar a sua função de buscar o prazer, e para isso deve estar sempre treinado para corresponder aos elevados níveis de exigência do encontro com as ondas gigantes. Mas isso tem um preço: como uma máquina exigida ao extremo, esse corpo sucumbe ao desgaste. Lesões, dores, degenerações articulares acabam afastando, temporária ou definitivamente, esses homens do mar, do significado de suas vidas, e, nesse aspecto, o corpo representa a morte. Considerações Finais O desejo de aventura, o mesmo espírito que impulsionou as grandes conquistas da humanidade, parece repousar no íntimo do ser humano e se manifestar no risco espontaneamente assumido nas atividades realizadas na natureza. A cumplicidade do sujeito com seu corpo, transformando simbolicamente a imaginação na experiência corporal lúdica de deslizar sobre as ondas, por dentro de túneis de águas, sem ser tragado por elas, traz à imaginação e à vontade os sonhos de galgarem altos limites de sua condição humana, pondo em evidência a potência do surfista e mostrando que a maior glória é a conquista obtida com a perspicácia do ator, o equilíbrio do corpo em harmonia com a prancha, com o parceiro que o conduziu e a velocidade da onda. Os surfistas de ondas gigantes são então arrebatados por esse sentimento, sendo o risco deliberadamente assumido, porém menosprezado pela confiança em suas habilidades técnicas e em todo um aparato de segurança que vai dar suporte para as suas aventuras. Na busca por seus sonhos, o corpo precisa estar sempre preparado, treinado, numa busca também pela competência para surfar as ondas gigantes e garantir o seu retorno. Os discursos dos tow surfers constroem imagens de luta heroica, de expansão e liberdade onde os significados de aventura e risco apontam para a procura do prazer de encarar seus medos interiores, de se por à prova, de desbravar os mares do mundo, de enfrentar o desconhecido, com incerteza de resultado, mas confiante no seu sucesso. 176 O herói personificado por esses atores é aquele que aceita e enfrenta os desafios, combate monstros de água e reafirma a sua potência sobre os elementos da natureza. Por outro lado, também é o herói salvador de vidas, que arrisca a sua segurança para arrancar das garras da morte aqueles que estão em perigo. Na sua jornada, conhece a sua própria natureza e se reconhece como fazendo parte daquela. O combate dá lugar à comunhão, o enfrentamento à harmonia. A onda gigante deixa de ser algo a ser conquistado e transmuta-se em parceira que brinca com o surfista e se diverte com ele, ora impedindo a sua passagem, ora premiando-o com profundos túneis de água que o envolvem como um abraço terno e acolhedor. A dualidade existente nesse contato com a natureza está presente na própria vida desses heróis da pós-modernidade: homens com uma forte ligação com o mar, que para viverem o seu sonho se reconstroem com muita dedicação e perseverança. Verdadeiros empreendedores, eles não esperam por facilidades, ao contrário, criam os meios necessários para superarem todos os obstáculos. Mais do que atores, esses seres de dois mundos, com o corpo vivendo em terra e o coração e o espírito no mar, escrevem a sua própria história, uma vida dividida entre o mar e a terra, o sagrado e o profano, a vida e a morte. O jogo de opostos onde os atores transitam entre o existir e a não existência de sentido para suas vidas. REFERÊNCIAS BAUER, M. W.; GASKELL, G. (ed). 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Também foram indagados quanto a características deles, incluindo tópicos como faixa etária, renda, lesões e modalidade praticada. O instrumento de coleta, no survey, foi o questionário entregue no local da prática e respondido diretamente pelo praticante. Os resultados estão demonstrados em estatística descritiva. Introdução O skate é uma prática em crescente desenvolvimento no Brasil. Segundo o Atlas de Esportes no Brasil o Brasil é a segunda potência mundial em fabricação de produtos para a prática do esporte, atrás somente dos EUA, além de constituir o terceiro mercado consumidor do mundo (DA COSTA 2005). Portanto, dentre as atividades de aventura uma das mais praticados e conhecidas é o skate, se manifestando como um produto próprio da Modernidade (velocidade com tecnologia), sendo uma atividade com risco controlado, praticado predominantemente por jovens e com presença de tecnologia, mas de baixo custo (PIMENTEL, SAITO, 2010). Apesar deste visível desenvolvimento do skate, há uma grande deficiência bibliográfica, poucos estudos científicos nesta área e uma definição polissêmica. Pretendemos com esse artigo elucidar características a cerca da modalidade e de seus praticantes. O skate é uma atividade recreativa e esportiva popular entre os jovens, que são atraídos pela possibilidade em atingir altas velocidades e produzir grande variedade de manobras (RETHNAM, YESUPALAN, SINHA; 2008). Essa prática surgiu em meados dos anos 1960, na América do Norte, quando 180 surfistas californianos cansados de esperar as boas ondas, adaptaram rodas de patins em madeiras que imitavam pranchas de surfe. No início, era chamado de sidewalk surf (surfe de calçada), e somente em 1965, quando o número de praticantes já era grande, ganhou um nome próprio, skateboard (BITENCOURT, AMORIM; 2005). Com o grande desenvolvimento e ganho de popularidade do skate surgiram novas modalidades, dentre elas o skate downhill, que é uma modalidade em que os praticantes descem ladeiras em um skate de tamanho maior (a partir de 38,4 polegadas) e com shape (prancha) também diferente, chamado de longboard. O grupo de atividades que envolvem aventura, o risco, assim como o skate se depara com problemáticas de conceituação. Este grupo que agora chamaremos de atividade de aventura. “O conceito atividades de aventura parece resguardar a reconhecida e problemática generalidade de experiências que podem estar ocorrendo no ambiente natural (turismo, educação ambiental, esportes, rituais indígenas) e no citadino (esportes, jogos, entre outros). Esse “e” está em destaque para realçar a possibilidade de a mesma manifestação ocorrer em mais de um meio. Interessa destacar que o termo, a exemplo de esporte na natureza, vai nomear práticas de lazer. Portanto, a aventura relacionada, por exemplo, às descobertas científicas, a exploração profissional de terras desconhecidas ou a tensão das profissões que envolvem risco, embora compartilhem de um mesmo impulso lúdico, não são objetos preferenciais de estudo”. “Atividade de aventura vai tratar da busca deliberada e no tempo livre por experiências as quais culturalmente apreendemos como sendo aventura (corriqueiramente associada a sair do cotidiano e entrar no imprevisto).” Para Pereira, Armsbrust e Ricardo (2008), os esportes radicais, que aqui denominamos atividades de aventura, podem ser divididos em dois tipos distintos: ação e aventura. Para esses autores o skate é um esporte radical de ação, caracterizado pelas manobras que exigem força e velocidade, por ser praticado em espaços urbanos construídos e o publico alvo que se relacionam por meio de atitudes, vestimentas, comportamentos e linguagens. 181 Uvinha (1997) diz em seu estudo que pode parecer que as atividades de aventura são praticadas apenas por jovens, sendo uma atitude “típica da idade”, mas verificou que existem praticantes de todas as idades, movidas pelo que o autor chama de “espírito ou sentimento de jovialidade” que estas atividade podem proporcionar. Em relação ao perfil dos praticantes de skate Pimentel e Saito (2010) os colocam com uma característica específica de usar roupas largas, que fogem dos padrões esportivos. Outra característica do perfil desse grupo, é ser culturalmente associado ao universo masculino (FIGUEIRA; GOELLNER, 2009), mas as autoras lembram que a escassez de referências sobre mulheres no skate não implica afirmar a sua ausência nesta prática. Face ao exposto, o presente estudo tem como problemática: qual o perfil dos praticantes de skate da região noroeste do estado do Paraná e qual é sua caracterização da prática do skate? Objetivo do Estudo Identificar características de praticantes de skate da região noroeste do estado do Paraná e averiguar suas concepções a respeito dessa atividade de aventura. Métodos O método de pesquisa utilizado foi o descritivo-exploratório que tem como característica registrar, analisar, descrever e correlacionar fatos ou fenômenos sem manipulá-los. É um estudo exploratório, tendo a finalidade familiarizar-se com o fenômeno e obter uma nova percepção a seu respeito, descobrindo assim, novas idéias em relação ao objeto de estudo (MATTOS, ROSSETTO, BLECHER, 2004). A amostra foi composta por 93 skatistas, sendo todos do gênero masculino, com idades entre 16 e 60 anos. Estes foram selecionados de forma não-probabilística, pois não houve organização estatística para distribuição da amostra nas diferentes localidades de coleta, se exigindo apenas que os respondes deveriam possuir mais de 6 meses de prática A coleta foi realizada no período de março de 2009 a março de 2010 em locais públicos como pistas 182 abertas de skates, competições regionais e praticantes abordados nas ruas de cidades do noroeste do Paraná. O instrumento utilizado foi “Questionário GEL 2009 - Definição e Caracterização dos Esportes de Aventura”, adaptado ao skate, sendo composto por trinta e duas questões divididas em dois blocos. O primeiro bloco possui 9 questões objetivas, da primeira a sétima questões de respostas únicas a oitava e nona questões são de múltipla escolha. Que buscam estabelecer informações a respeito do sujeito. O segundo bloco é composto de 23 questões objetivas em que as respostas são divididas em 5 graus de concordância: 1Discordo plenamente, 2- Discordo em parte, 3- Não concordo nem discordo ou Não tenho opinião, 4- Concordo parcialmente e 5 - Concordo plenamente. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva, cujo objetivo básico é o de sintetizar uma série de valores de mesma natureza. Permitindo que se tenha uma visão global da variação desses valores, tal procedimento organiza e descreve os dados de três maneiras: por meio de tabelas, de gráficos e de medidas descritivas. (GUEDES, 2004). Na tabulação dos resultados o número de sujeitos apresenta variações (por aquele sinal de + e – e a quantidade que variou), pois ocorreu erro interavaliador permitindo que em alguns o instrumento ficasse incompleto. Resultados Caracterização dos Praticantes de Skate Inicialmente iremos apresentar os resultados a respeito da caracterização dos praticantes de skate. Na Figura 1 é apresentada a categoria dos skatistas: 183 Figura 1 – Categoria em relação ao skate como trabalho/lazer Obtivemos que o maior número de praticantes (47,37%) da amostra é de skatistas amadores, de nível recreativo e competitivo. Podemos observar também que houve uma baixa prevalência de praticantes profissionais que são patrocinados em competições, o que manteve coerência relativa ao número de atletas profissionais que existem no Brasil: 211, segundo Bittencourt, Amorim (2005). Na Figura 2 apresentamos as faixas etárias dos praticantes abordados: Figura 2 – Faixa etária do praticantes Pode-se observar que a faixa etária que apresenta o maior número de praticantes são as duas primeiras faixas, até 20 anos e entre 21 e 30 anos, o que demonstra que os praticantes de Maringá e região são em sua grande maioria adolescentes ou jovens adultos. Em seguida apresentaremos, na Figura 3, o grau de instrução dos praticantes: 184 Figura 3 – Grau de instrução Observa-se que o grau de instrução de grande parte dos praticantes é o Ensino Médio, sendo que apenas 10 pessoas tem o Ensino Superior completo. Existe coerência desses resultados com a faixa etária. A seguir na Figura 4 é demonstrada a renda familiar dos adeptos do skate: Figura 4 – Renda familiar Nota-se que um terço da amostra tem uma renda que não chega a 4 salários mínimos, faixa esta em que se concentra aproximadamente 66,4% das famílias paranaenses (POF, 2002-2003). Esse resultado é parcialmente 185 confiável, visto que, nesse tipo de instrumento, há tendência em se responder menos que os ganhos reais. Porém, os dados possuem razoável confiabilidade por serem coerentes com a renda pressumida à escolaridade da maioria dos praticantes, inferior ao Ensino Superior completo. Também é um discurso corrente entre ‘nativos’, que o skate é acessível pelo baixo custo, sendo praticado por diferentes grupos de renda. Na Figura 5 é apresentada a frequência com que a amostra pratica skate: Figura 5 – Frequência de prática do skate Podemos aproximadamente notar 79% que da a frequência amostra de pratica prática skate é alta, já que diariamente ou semanalmente, demonstrando que o skate em grande parte dos casos faz parte do dia-a-dia dos praticantes. Essa facilidade pode estar associada ao uso do skate como transporte, como afirma Vaz (2007, p. 8) “seus praticantes (skate) preferem considerá-lo como um estilo de vida, um meio de locomação e de expressão”. A facilidade em usá-lo em diferentes ambientes e sem muitos preparativos (quando comparado a outros esportes, que necessitam de alta tecnologia e viagens) também pode estar associado a isto. 186 Caracterização do Skate Pelo Praticante Os resultados em relação aos graus de concordância foram divididos em categorias: natureza, preconceitos, lazer, características e conceituação. As respostas foram divididas em 5 graus de concordância: 1- Discordo plenamente, 2- Discordo em parte, 3- Não concordo nem discordo ou Não tenho opinião, 4- Concordo parcialmente e 5 - Concordo plenamente. A seguir serão apresentados os resultados da caracterização da modalidade pelos praticantes. A primeira categoria apresentada é a skate e natureza na Tabela 01: Skate e natureza O contato com a natureza é algo que caracteriza o skate O skate é uma atividade física de aventura na natureza O skate gera impacto na natureza Não existem causas sociais ou de preservação ecológica relacionadas com o skate 1 2 3 4 5 11% 22% 14% 29% 24% 21% 83% 17% 6% 26% 4% 21% 6% 15% 1% 28% 9% 38% 11% 14% Tabela 01 – Nível de concordância na relação skate e natureza Analisando a Tabela 6 percebe-se que não existe um consenso entre os praticantes quanto a relação do skate com a natureza, exceto quando é colocado a geração de impactos na natureza decorrentes da prática de skate. Mas vemos o skate como uma modalidade que mesmo sendo urbana depende de alguns fenômenos naturais como o vento, empuxo e gravidade, elementos esses que segundo Dias e Alves Junior (2007) servem como propulsores dos deslocamentos e deslizes envolvidos nas ações esportivas. A proposta de descrever o esporte como uma prática que estabelece relações intersubjetivas com a natureza, a fim de extrair prazer dessa interação vem sendo discutida no meio acadêmico. A relação com a natureza pode ser vista como um dos elos fundamentais na caracterização das atividades de aventura (DIAS, 2007). Entretanto podemos observar que a afirmação que a prática do skate, que se caracteriza como urbana, tem contato com a natureza, não é de fácil apreensão para o praticante, uma vez que não há um consenso ao correlacionar o skate com a natureza. 187 A seguir será apresentado na Tabela 02 o nível de concordância dos praticantes quanto a relação skate e preconceito: Skate e o preconceito Você se enquadra em alguma "tribo" de praticantes É utilizado algum tipo de droga ao se praticar a atividade Você já sofreu algum tipo de preconceito por ter escolhido essa atividade Você acha importante a sua pratica ser abordada por programas de TV, rádio, artigos de jornais e revistas No skate a mulher é menos capaz pela sua fragilidade 1 38% 71% 2 15% 10% 3 15% 14% 4 16% 1% 5 16% 4% 13% 9% 11% 18% 49% 3% 63% 4% 10% 10% 12% 13% 9% 70% 6% Tabela 02 – Nível de concordância na relação skate e preconceito Em relação ao nível de concordância a respeito da existência de uma “tribo” de praticantes, nota-se que não há um consenso quanto essa existência, o que não corrobora com Uvinha (1998) que afirma que as pistas de skate se mostraram não apenas como um espaço determinado geograficamente, mas sim um território delimitado socialmente, onde uma teia de relações se manifestam, ou seja, local onde se concentra um grupo social, que podemos chamar de “tribo”. Honorato (2005) cita a existência de uma tribo, e a vê como um processo de individualização tem como componentes as configurações sociais (pistas de skate, ruas, praças, ‘picos’, escolas etc.), uma rede relacional de indivíduos (família, amigos, rappers, roqueiros, punks etc.) e um tempo disponível para exercício da modalidade skate. Quanto ao uso de droga durante a prática de skate mais de 80% da amostra discorda que é utilizada. Com base nesses resultados a questão do uso de drogas por parte dos skatistas pode ser algum tipo de preconceito devido a uma minoria que utiliza, é o que afirma Pimentel e Saito (2010). No estudo de Pimentel e Saito (2010) em entrevista a policiais, estes apontaram que não há uma ordem para abordar grupos de skatistas, mas devido ao fato de pequenos grupos de vandalismo classificarem-se como skatistas de rua, os praticantes muitas vezes têm sua imagem relacionada ao consumo de drogas e de delitos contra o patrimônio. Dessa forma, percebemos que devido a uma parcela de praticantes que têm atitudes ilegais, todos os praticantes são rotulados desta maneira, o que pode se caracterizar como um preconceito, já que há uma generalização dos fatos. Isso é demonstrado em nossos dados, em que metade da amostra concorda plenamente em já ter 188 sofrido preconceito por andar de skate. Esse fato é demonstrado também em estudo de Uvinha (1998) praticantes de skate apontaram que a modalidade é vista como marginalizada e associada à bandidagem e vida na “rua”. Apesar do fato supracitado, o skate vem ganhando espaço na mídia, é o que Uvinha (1998, p. 5) afirma: “a modalidade vem recebendo uma atenção especial da mídia impressa e televisiva, fato que tem empolgado alguns skatistas e causado um certo desconforto em outros”. Essa empolgação citada por Uvinha é demonstrada em nosso estudo, em que 83% vêem importância no fato de o skate estar presente na mídia. Quanto a questão da mulher ser menos capaz devido sua fragilidade, 73% da amostra discorda dessa afirmação, entretanto nenhuma praticante do sexo feminino respondeu ao questionário, o que mostra que poucas mulheres praticam, mesmo que os homens afirmem que as mulheres são capazes. Mas Figueira e Goellner (2009) afirmam que a escassez de referências acerca da existência de mulheres praticantes de skate não implica afirmar sua ausência nessa prática. Louro (2005) explicita que cada cultura estabelece o que é considerado o normal, o diferente e o excêntrico, por exemplo no que se refere ao gênero e à sexualidade. A autora também evidencia que a posição central é considerada a posição não-problemática, sendo que todas as outras posições de sujeito, de alguma forma, estão ligadas e subordinadas a ela. A posição central, nesse caso específico, é ocupada pela identidade masculina. Quanto à leitura sobre a mulher no esporte, é interessante notar que não há abertamente uma aceitação da desigualdade. Mas, estranhamente, nenhuma mulher foi encontrada para a coleta. A resposta foi dada exclusivamente por homens. Se a mulher, em termos físicos e motores, não é menos capaz, onde estão elas? Esse é um dado bastante curioso, visto que na Escola de Iniciação ao Skate que o GEL – Grupo de Estudos do Lazer realiza como extensão na Universidade Estadual de Maringá, há um número significativo de meninas e adolescentes aprendizes (35%). Na Tabela 03 está demonstrado o nível de concordância dos praticantes quanto a relação skate e lazer: Skate e lazer 1 2 3 4 5 189 Sua prática pode ser considerada uma opção de lazer Sua prática tem como maior objetivo a competição Sua prática é uma forma de aliviar o estresse do cotidiano Você é atraído pelo lazer de risco 4% 5% 8% 16% 67% 46% 16% 15% 12% 11% 5% 8% 5% 7% 5% 12% 14% 25% 71% 48% Tabela 03 – Nível de concordância na relação skate e lazer Podemos notar que mais de 80% da amostra concorda com a afirmação de o skate ser uma opção de lazer e ser uma forma de aliviar o estresse do cotidiano, o que geralmente ocorre nos momentos de lazer. Seguindo este pensamento os praticantes não consideram a competição como o maior objetivo da prática de skate. Corroborando com isso, Marinho (2008) salienta que as atividades de aventura estão sendo entendidas como diversas práticas manifestadas, privilegiadamente nos momentos de lazer. Isso não significa que a competição descaracterize o lazer. Pelo contrário, é um de seus elementos, especialmente no lazer esportivo. O que chama atenção no skate é que a configuração da vivência dele como lazer esportivo se baseia mais na liberação das tensões e na busca do desafio do que na superação do outro por meio de regras. Os resultados também reiteram as três dimensões teleológicas do lazer (diversão, desenvolvimento e descanso) presentes na percepção da motivação para esse esporte. Isso aponta para a necessidade de aprofundar o debate sobre a dimensão do lazer na experiência dos skatistas e a necessidade em contemplar outros esportes no estudo, de modo a estabelecer comparações. Constata-se também que mais de 70% dos praticantes concordam que são atraídos pelo lazer de risco. Em relação ao risco, este quando controlado e desejado vem sendo estudado como traço de personalidade que reflete a busca individual de sensações e experiências novas, variadas e complexas, e a disposição em correr riscos físicos e sociais para a realização dessas experiências (SPINK; ARAGAKI; ALVES, 2005). Dessa forma, os praticantes podem ter uma predisposição à procura de atividades que envolvam risco, dentre elas o skate. A questão do risco também está embutida no conceito de atividade de aventura, para Marinho (2008) são atividades cercadas por riscos e perigos, na medida do possível calculados. 190 Em seguida na Tabela 4 será apresentado o nível de concordância dos praticantes na caracterização da prática de skate: Caracterização da prática O medo é essencial para a aventura ocorrer na atividade que você pratica A aventura é algo que caracteriza o skate O skate é uma atividade que depende de tecnologia para ser praticado O skate exige um tipo corporal como mais adequado para sua prática Você se sente um herói ao praticar essa atividade A atividade que você pratica traz experiências arriscadas incertas, traduzindo a atração pela novidade e o desafio 1 2 3 4 5 19% 14% 12% 24% 31% 5% 10% 5% 29% 51% 31% 8% 12% 23% 26% 37% 20% 12% 21% 10% 63% 9% 8% 12% 8% 3% 6% 13% 23% 55% Tabela 4 – Nível de concordância quanto a caracterização da prática Para Dias e Alves Junior (2007) o surgimento de equipamentos de alta tecnologia, além de tornar as práticas de aventura menos tortuosas e muito mais seguras, permitiam também o surgimento de novas modalidades que iriam se somar à criação desse novo comportamento. Marinho (2008) diz que o surgimento de novas tecnologias criam novas possibilidades de vivências no lazer, e o skate se encaixa como uma dessas possibilidades, já que foi com a ajuda de uma nova tecnologia da época, as rodinhas de poliuterano na década de 1970, que fez com que aumentasse o número de praticantes (BITTENCOURT; AMORIM, 2005). Nota-se que quase 80% da amostra concorda que o skate traz experiências incertas, novidades e desafios. Essas três características são inatas à definição de atividades de aventura, Marinho (2008) cita que as atividades de aventura tem características inovadoras e Dias (2007) afirma que são modalidades dotadas e risco e incertezas, além da valorização do imprevisível em seus objetivos. Na Tabela 05 está demonstrado o nível de concordância dos praticantes quanto a definição do esporte: Definição do esporte O skate é um esporte radical O skate é um esporte de aventura O skate é esporte de risco O skate é uma atividade física de aventura na natureza 1 1% 3% 4% 2 1% 1% 9% 3 4% 14% 4% 4 11% 22% 20% 5 83% 60% 63% 21% 17% 26% 21% 15% Tabela 05 – Nível de concordância quanto a definição do esporte 191 Evidencia-se o não-consenso dos skatistas sobre um termo para identificar sua prática, apontando para entendimento polissêmico desse fenômeno. Noutras palavras, há um hiato entre as terminologias (tanto as acadêmicas e as comerciais) com as representações dos praticantes (inelutavelmente afetadas já pelos discursos midiáticos e científicos), gerando confusão conceitual. É predominante o entendimento de esporte radical. Os autores que partem dessa terminologia são Uvinha e Pereira et al. Para Pereira, Armsbrust e Ricardo (2008), os esportes radicais podem ser divididos em dois tipos distintos: ação e aventura. Para este autor o skate é um esporte radical de ação, caracterizado pelas manobras que exigem força e velocidade, por ser praticado em espaços urbanos construídos e o publico alvo que se relacionam por meio de atitudes, vestimentas, comportamentos e linguagens. Entretanto ao caracterizar o skate como esporte radical pode-se entender que esta nomenclatura seria de uso entre outras atividades de aventura, mas segundo Dias (2007) há recusa na adoção do conceito de esporte radical por parte de alguns esportistas, que julgam tal empreendimento como “uma denominação sensacionalista, criada pela mídia”. No limite, o conceito representa todo um universo de crenças e valores (competição, regulamentação, comercialização e etc.) que contraria as convicções hegemônicas estabelecidas entre a comunidade do montanhismo. Na Figura 06 está apresentado o nível de concordância quanto ao skate ser uma prática adequada para ser ensinada na escola 192 Figura 06 – Nível de concordância quanto ao skate enquanto prática pedagógica na escola Nota-se que 74% dos praticantes da amostra concorda que o skate é uma modalidade adequada para ser ensinada na escola. Para Armbrust (2008) os esportes radicais, de ação e de aventura é um fenômeno reconhecido pelos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais), mas que não se encontram no âmbito escolar. Para o autor, essas atividades sofrem pré-conceitos negativos por transgredir o que há de proposto, em que muitas vezes, o praticante não encara o ambiente como um ser pacato, mas como um ser ativo que interage com o meio, experimenta, reinventa, dá novo significado e aprende. Ainda existe uma resistência das escolas em adotar o skate como um conteúdo da educação física, isso pode ser devido ao fato de muitas instituições terem dificuldade de adotar práticas que não são interiores à prática escolar. Sobre isso, Honorato (2005) discute que é um grande desafio compreender os laços existentes entre a instituição escolar e as pessoas constituintes de seu sistema, bem como as práticas culturais exteriores a esta instituição, que também contribuem para a formação da singularidade e identidade das pessoas. Além disso, Honorato infere que os indivíduos ‘responsáveis’ pela escola, de um lado, reconhecem a existência da tribo skatista em seu interior; de outro, não se reconhecem na construção da tribo e denigrem os membros do outro grupo, não por suas qualidades individuais, mas devido a sua vinculação a uma tribo que eles julgam coletivamente inferior aos comportamentos do grupo/instituição ao qual pertencem. 193 Na Figura 07 serão apresentadas as lesões mais recorrentes nos praticantes de skate: Figura 07 – Lesões ocasionadas pela prática do skate Podemos observar que a lesão que mais ocorreu foi a abrasão (ralado) com 57,9% diferentemente do estudo de Forsman e Eriksson (2001) no Hospital Universitário de Umea, Suécia, em que houveram 147 lesões registradas, as mais recorrentes foram luxação (44%), fratura (29%), laceração (9%), contusão (9%), abrasão (6%) e concusão (3%). Como nosso estudo foi realizado diretamente nos locais de prática, o dano mais recorrente foi a abrasão, que pode ser considerado leve, em que geralmente não se busca atendimento hospitalar, ambiente este em que foi realizado o estudo sueco. Essa afirmação corrobora a afirmação de Rethnam, Yesupalan e Sinha (2008) sobre pacientes com lesões mais leves não serem registrados no hospital. Na Figura 8 estão representadas as partes do corpo que mais ocorreram as lesões: 194 Figura 8 – Partes do corpo em que ocorreram as lesões Podemos notar que as lesões ocorreram mais na parte inferior do corpo, esses resultados não corroboram com os estudos encontrados, como o de Rethnam, Yesupalan e Sinha (2008) e Macdonald et. al (2005), os quais, , respectivamente, identificaram que 74% e 60% das lesões foram em membros superiores. Nos referidos estudos, as lesões mais recorrentes nos membros superiores foram fraturas, enquanto que em nosso foram as abrasões. Finalizando, na Figura 9 temos os motivos pelos quais os praticantes disseram praticar skate: 195 Figura 9 – Motivos que levam a prática do skate Pode-se observar que o principal motivo que leva a prática do skate é a busca pelo prazer, atribuindo-lhe uma dimensão hedonista. Os dados empíricos corroboram com Schwartz (2006) que salienta que a prática dos esportes de aventura pode estar ligada a diversos motivos, dentre eles a alteração do significado do tempo, as necessidades de extravasamento de controle dos níveis de estresse, a procura por novidades fora do cotidiano, o acompanhamento de estilos preestabelecidos, a vivência de novas emoções, aprimoramento dos níveis de saúde, entre outros. A questão do prazer na prática do skate também foi abordada no estudo de Galliano e Mayer (2009), em que foram comparadas respostas de skatistas de dois estados (RS e PR) a respeito dos motivos que os levam para a prática, para 100% dos skatistas do RS o prazer é importante ou decisivo para a prática, e no PR 96,38%. Percebe-se assim que entre os praticantes do skate o prazer para a prática é imprescindível. Neste mesmo estudo as relações pessoais e amizades também são consideradas questões importantes para motivar a prática, mais de 80% dos praticantes a citaram como importante ou decisiva. Os autores citam que isso pode se dar devido ao fato do skate ser um esporte extremamente socializador, 196 apesar de ser um esporte individual, envolve o praticante em um círculo de amizades. Conclusões Diante dos resultados obtidos do GEL- Grupo de Estudos do Lazer na busca do grupo em verificar a caracterização das atividades de aventura podemos concluir que as percepções dos praticantes variam de acordo com a modalidade, nacionalidade e tempo de prática o que destaca a importância do contexto nos resultados. Acreditamos que os dados e as discussões impulsionam questionamentos sobre diferentes questões. A pouca presença das mulheres nas ruas e nas praças de skate confrontando com o interesse real delas é algo digno de estudos. Quem trabalha na perspectiva da inclusão de gênero, precisa entender quais são as barreiras para o gênero feminino na aprendizagem e prática sistemática do skate como lazer. Outro aspecto que merece desdobramentos, a partir dos dados, é a suposta pouca centralidade da emulação na prática do skate. Se competir não é o principal, o que é? Outros aprofundamentos podem ser feitos a partir dos dados coletados. Uma das utilizações possíveis dos survey é justamente dar cenários para estudos de profundidade. Ainda em relação aos desdobramentos, podem ser feitos estudos comparativos tanto intra-prática como comparando diferentes esportes de aventura. Dados preliminares, por exemplo, apontam que o skate tem diferenças previsíveis em relação ao pára-quedismo. Enquanto o primeiro tem custo reduzido e prática semanal ou diária, a outra aventura, por ser mais cara, é praticada mensalmente, por pessoas mais velhas, com maior escolaridade e renda. Porém ambos, concordam que essas experiências sejam lazer. Recomenda-se que estudo seja replicado com um maior número de praticantes que poderia resultar numa compreensão mais profunda e fidedigna deste fenômeno. 197 REFERÊNCIAS ARMBRUST, I. O skate associado às dimensões educacionais. In: III CONGRESSO BRASILEIRO DE ATIVIDADES DE AVENTURA, 2008, Santa Teresa/ES. ANAIS III CBAA, ES, 2008. BITENCOURT, V.; AMORIM, S. Skate. In: DaCosta, L. P. (org.). 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Objetivo do Estudo: O objetivo deste estudo foi verificar algumas representações relacionadas à prática do paraquedismo e ao perfil de seus praticantes, além de fomentar a discussão da relação homem-natureza nas AFANs. Método: A amostra foi composta por nove paraquedistas, oito do sexo masculino e um do sexo feminino, com faixa etária entre 16 a 60 anos, reconhecidamente experientes, que se reuniam na pista particular Ninho das Águias, na região rural de Maringá-PR. A coleta foi realizada em 2009. Utilizamos o “Questionário GEL 2008 - Definição e Caracterização dos Esportes de Aventura” adaptado ao paraquedismo, que é composto por 32 questões divididas em dois blocos. Para o presente texto foram utilizadas as questões 6 (Renda Familiar líquida Mensal) e 7 (Frequência com que pratica o PQD) do primeiro bloco e 3 (O contato com a natureza é algo que caracteriza o paraquedismo), 4 (Sua prática pode ser considerada uma opção de lazer) e 6 (O paraquedismo é um esporte de aventura) do segundo bloco. Os paraquedistas foram convidados a participar da pesquisa e responderam ao questionário no mesmo dia e local, voluntariamente. Após, os dados foram tabulados e estabeleceu-se correlação entre eles. Como limite verifica-se o baixo n e o fato dos entrevistados praticarem somente duas modalidades diferentes. Resultados: A maioria dos praticantes concorda que o contato com a natureza é algo que caracteriza o paraquedismo, que sua prática pode ser considerada uma opção de lazer e que o paraquedismo é um esporte de aventura. Também em sua maioria, praticam mensalmente a atividade e sua renda mensal líquida é, nunca inferior a 4 salários mínimos. Conclusão: Sugere-se que a faixa salarial influi na escolha da atividade. Quando a possibilidade financeira é pequena se tornam paraquedistas ocasionais, saltando esporadicamente. Todavia o fator mais determinante é devido à oportunidade da aventura com risco controlado associado –secundariamente– ao contato com a natureza. Com isso, o estudo recomenda trabalhos mais aprofundados sobre a qualidade da relação do homem com a natureza, visto que as motivações para a vivência do paraquedismo aparentemente apresentam motivações mais ligadas às emoções de superação individual pela aventura. 200 Palavras-chave: Paraquedismo, Natureza, AFAN Introdução: O paraquedas é um equipamento aerodinâmico que controla a aceleração e a queda de corpos no ar, após ser aberto (SANDRINI, 2005). Com estas características o paraquedismo se torna uma atividade que pode (ou só pode) ser praticada em ambiente natural. Segundo Bitencourt, et al, (2005), existem versões que atribuem a antiguidade chinesa o uso do paraquedas por acrobatas, que utilizavam objeto semelhante para saltar a muralha da china. Já segundo Sandrini, (2005), historicamente, há duas versões para seu surgimento. Em uma delas Leonardo da Vinci é apontado como seu idealizador. Na outra, historiadores atribuem a sua invenção ao mecânico francês Louis Sébastien Lenormand. O paraquedas embutido em uma mochila e acionado por uma corda surgiu no início do século XX e cada vez mais vem se aperfeiçoando. Nas 1° e 2° Guerra Mundial o paraquedas foi utilizado para s alvar vidas, enviar equipamentos e suprimentos em atividades aéreas e em operações táticas militares. Após as Guerras, os militares começaram a realizar competições esportivas com as habilidades adquiridas. (BITENCOURT, et al, 2005). Ainda segundo Bitencourt, et al (2005) foi o norte americano Spencer Stanley que realizou o primeiro salto de paraquedas no Brasil, na década de 1920 em São Paulo. Mas foi o francês Charles Astor que divulgou a prática nos pais, promovendo cursos de instrução para formação de paraquedistas civis em 1931 no Aero Clube de São Paulo. As AFANs (Atividades Físicas de Aventura na Natureza) vêm ganhando interesse especial nos últimos tempos, pois é uma forma de lazer contemporâneo que traz implícita a ele a necessidade do reencontro do homem consigo mesmo, com o outro e com a natureza. (MARINHO e BRUHNS, 2003). Como sugere Schwartz (2006), as AFANs contribuem para a harmonização do homem com a natureza e assim defronta-o com a sua própria natureza humana e com a redefinição das suas habilidades sociais. Essas práticas, comumente chamadas de esportes radicais ou de aventura, trazem outros significados alem da atividade em si, da contemplação, da fruição, mas também testa a própria auto-superação ou perpetua modismos 201 vigentes entre tantas outras significações inerentes a ele, segundo Schwartz (2006). Cleber Augusto Gonçalves Dias, (2007) no ensaio “Notas e definições sobre esporte, lazer e natureza” traz variados termos que tratam de esportes em ambientes naturais, que são utilizados por diversos autores no meio acadêmico, como Guzman e Boyero, (2001), que traz o termo “esporte de deslize”, que remete ao prazer oriundo a sensação de deslize que estas práticas promovem, Christian Pociello (1999), que chega a falar de “máquinas lúdicas” em uma alusão aos equipamentos utilizados nestas práticas, Flávio Lauro e Marcello Danucalov (2005) trazem o termo “esporte de prancha”, onde o equipamento utilizado é seu principal definidor, Sydnor; Rinehart, (2003), que usa o termo “esportes alternativos”, neste caso inciso a gama de possibilidades de movimentos que estas práticas trazem, Roszak, (1972) com “esportes californianos”, deixando clara a grande influência americana que estes esportes tem. Entre tantos outros termos, Dias (2007) relata que a opção por um termo não é gratuita, mas traz um entendimento teórico em relação ao objeto que se investiga. Escolhi, para este estudo, o termo AFAN trazida por Betrán (1995), o qual afirma que esta terminologia consegue abarcar todas as práticas que despertem instinto aventureiro e que tem uma profunda ligação com o meio natural fazendo com que o indivíduo seja um portador de sensações e emoções vivenciadas, fazendo assim com que o corpo seja um meio e não um fim, representando uma atividade de diversão em seu tempo livre (BETRÁN, 1995 apud TAHARA & FILHO, 2009). Esta definição me parece englobar tudo que compreendo por esportes em ambientes naturais. O Paraquedismo é uma destas práticas, que alem da utilização militar para salvamentos, vem ganhando adeptos no mundo todo como esporte. Ao todo se somam em torno de 11 modalidades (SANDRINI, 2005; GOUVEA e GORDINHO, 2009). São elas: FQL – Formação em Queda Livre: deve-se fazer o maior número de formações escolhidas aleatoriamente entre uma relação de figuras, cada figura recebe uma formação, os times são compostos por 2, 4, 6, 8 ou 16 integrantes mais o câmera. Esta é a modalidade mais praticada. 202 BIG WAYS: Aqui o objetivo é colocar o maior número possível de pessoas em um salto. O recorde mundial é 246 pessoas. FREE FLY: É uma modalidade recente. Aqui o paraquedista pode voar de diferentes maneiras como de cabeça para baixo (head down), de barriga para baixo (belly fly), de dorso (Back Track), de pé (standup), sentado (sitfly) entre varias outras maneiras. As velocidades aqui são altíssimas podendo variar entre 150 km/h à 400 km/h. PRECISÃO: É uma das modalidades mais antigas. Aqui o objetivo é atingir o centro de um alvo determinado. SALTO DUPLO (TANDEN): Esta é a maneira mais fácil do novato conhecer o paraquedismo. Aqui ele salto junto com um saltador experiente. ESTILO: Aqui o paraquedista salta da aeronave e inicia uma série de manobras no ar, chamada de “série de estilo”. Esta série é gravada e a análise das imagens permite a pontuação do atleta. O objetivo e terminar a série no menor tempo possível, o erro nas manobras é convertido em tempo e este se soma ao tempo total da execução. Esta modalidade, assim como a precisão, é bem tradicional. TRABALHO RELATIVO DE VELAME: Aqui o objetivo é reunir a equipe e formar o maior número de figuras no menor tempo possível. Esta prova é extremamente bela de se observar devido às diversas formas de figuras que são construídas no ar. FREESTYLE: Aqui os saltos são feitos em duplas e é escolhido um tipo de queda livre. Os giros e posições feitas nesta modalidade lembra muito a ginástica olímpica com seus saltos ornamentais. Nesta modalidade o “cameramam” interage com o saltador e a qualidade das imagens também são julgadas, assim como o desempenho do saltador. 203 SKYSURF: Como o nome sugere aqui o paraquedista surfa no ar. A prancha da uma possibilidade enorme de manobras e também aumenta a velocidade. Aqui, como no Freestyle o salto é feito em dupla e o saltador deve interagir com o “cameramam”. CROSS COUNTRY: Geralmente feita em dias de vento forte, aqui o objetivo é cobrir a maior área possível com o paraquedas aberto. Dependendo do vento é possível percorrer dezenas de quilômetros. WING FLY: Assim como o Free Fly, esta também é uma modalidade recente. Aqui o objetivo é percorrer uma grande distancia horizontal e seu grande atrativo é a alta velocidade. Para isto utilizam-se macacões especiais com asas que se inflam com o vento que ficam entre os braços e o tronco e entre as pernas. Os deslocamentos chegam a 160 km/h na horizontal com baixíssima velocidade vertical, isto faz a queda livre chegar a quase dois minutos. (SANDRINI, 2005; GOUVEA e GORDINHO, 2009). Objetivo do Estudo O objetivo deste estudo foi verificar algumas características relacionadas à prática do paraquedismo e perfil de seus praticantes, além de fomentar a discussão da relação homem-natureza nas práticas das AFANs. Método A amostra foi composta por nove paraquedistas sendo oito do sexo masculino e um do sexo feminino. Assinalaram faixas etárias nos dois extremos de 16 a 60 anos, reconhecidamente experientes, que se reuniam na pista particular Ninho das Aguias, na região rural de Maringá-PR. A coleta foi realizada em 2009. Participantes iniciantes, com menos de 6 meses de experiência, não foram incluídos na amostra. Provavelmente eles possuem conhecimentos incipientes, não sendo garantido que compartilhem das representações coletivas da comunidade de paraquedistas, no seu sentido mais amplo, e da tribo local de praticantes, em sua dimensão mais restrita. O instrumento utilizado foi “Questionário GEL 2008 - Definição e Caracterização dos Esportes de Aventura” adaptado ao paraquedismo, que é 204 composto por trinta e duas questões divididas em dois blocos. O primeiro possui nove questões objetivas e de múltipla escolha que tem por objetivo a caracterização dos praticantes de paraquedismo. O segundo bloco conta com 23 questões objetivas com resposta em escala Lickert de 5 pontos, sendo discordo plenamente (1), discordo em parte (2), não concordo nem discordo ou não tenho opinião (3), concordo parcialmente (4) e concordo plenamente (5), e trata do grau de concordância ou discordância dos praticantes sobre diferentes dimensões da prática do paraquedismo (BALBIM et al, 2009). Para o presente texto foram utilizadas as questões 6 (Renda Familiar líquida Mensal) e 7 (Frequência com que pratica o PQD) do primeiro bloco e 3 (O contato com a natureza é algo que caracteriza o Paraquedismo), 4 (Sua pratica pode ser considerada uma opção de lazer) e 6 (O Paraquedismo é um esporte de aventura) do segundo bloco. Os paraquedistas foram convidados a participar da pesquisa e responderam ao questionário, voluntariamente, no mesmo dia e local. Após, os dados foram tabulados e estabeleceram-se correlações entre eles. Entre os limites do estudo está o baixo número de pesquisados em função da estrutura do instrumento, cujos dados são mais críveis com um n significativo. Também abordou praticantes restritos ao estado do Paraná e relacionados a Trabalho Relativo de Velame e Free Fly. Resultados De acordo com tabulação dos dados podemos verificar que a maioria dos paraquedistas concorda que o contato com a natureza é algo que caracteriza o paraquedismo, que sua prática pode ser considerada uma opção de lazer e que o paraquedismo é um esporte de aventura, como segue abaixo. 205 Gráfico 3 - O paraquedismo quanto esporte de aventura Gráfico 1 - O Paraquedismo e o contato com a natureza Gráfico 2 - O paraquedismo como opção de lazer Caso a quantidade de sujeitos analisados fosse significativa, já poderíamos inferir que, se a visão dos “nativos” fosse influente, como deseja Dias (2007), para a seleção dos conceitos, pelo paraquedismo, primeiro viria a dimensão do lazer, seguida pela aventura e, após, a relação com a natureza (com um significativo percentual de ambiguidade). Em aparência, ao menos, o paraquedismo é visto como lazer pelos praticantes, havendo ascendência da aventura sobre o contato com a natureza. 206 Coerente com a seleção do paraquedismo como opção de lazer, também verificamos, na tabulação dos dados, que os praticantes entrevistados em sua maioria praticam mensalmente a atividade e que a renda mensal líquida deles é nunca inferior a 4 salários mínimos, como segue: Gráfico 4 - Renda Familiar líquida mensal Gráfico – 5 Frequência com que Pratica o paraquedismo 207 Os níveis de concordância, faixa salarial e freqüências de prática do paraquedismo que não apresentaram respostas (0%) não foram expostos nos gráficos. Sobre renda é praxe considerar que pesquisas survey não são eficientes para precisar os ganhos, pois é comum as pessoas afirmarem ter renda menor ao real. Ainda assim, a maioria afirma fazer parte de lares com renda superior a quatro salários mínimos. Como esse esporte envolve custos permanentes altos, mesmo após a compra de equipamento (o querosene aeronáutico tem custo elevado), sua experimentação freqüente é relacionada à disponibilidade de recursos. Segundo Martins (2007) a característica comum entre os praticantes de atividades de aventura é poder aquisitivo superior além de alta escolaridade, sexo masculino e idade jovem-adulta e que apenas 15% dos paraquedistas praticam a atividade frequentemente. Os outros 85% praticam o paraquedismo esporadicamente realizando apenas 10 saltos durante toda a vida. Os principais motivos para se tornarem paraquedistas ocasionais é a situação econômica, alem de falta de tempo, falta de lugares para saltar e perda da motivação (BREIVIK; ROTH; JORGENS, 1998 apud MARTINS, 2007). Associado a estes fatores acrescenta-se que o indivíduo praticante dos esportes de aventura e risco tem o desejo de experimentar o novo, superar limites pessoais, buscar autoconhecimento e estreitar a relação homemnatureza. Assim sensações fortes obtidas por meio da própria exposição a situações limites, marcadas pelo medo e excitação, deixam de ser situações em que o individuo foge; pelo contrário torna-se uma situação desejada por ele (MARTINS et al, 2008). Com estes dados entendemos que, se a prática do Paraquedismo é mensal, sua vivência está associada ao lazer, já que a maioria dos entrevistados não trabalha com esta atividade. Fato este que também pode ser verificado no gráfico 2 – o paraquedismo como opção de lazer. Um estudo interessante, não captado pelo presente, seria inventariar e compreender as demais experiências no tempo livre desses sujeitos. Como a maioria dos entrevistados concorda que o contato com a natureza é algo que caracteriza o Paraquedismo entendemos também que eles possuem um apreço por ela. A qualidade e importância dessa relação podem ser postas em dúvida, mas se deve considerar sua existência. Segundo Tahara 208 e Schwartz (2003), a busca pela aventura, longe dos grandes centros urbanos tem sido freqüente, pois, nota-se um aumento de vivências naturais, nas atividades físicas de aventura que tem um contato direto com a natureza, na busca de produzir uma melhora na qualidade de vida. E ainda, dentre as diversas maneiras de se vivenciar o lazer atualmente, este novo campo de estudo e investigações vem recebendo a atenção de diversos pesquisadores, entre eles Betrán (2003), Swarbrooke et al. (2003), Cater (2006) e Marinho e Bruhns (2006) que tratam da relação do lazer e da participação humana no meio natural, com o objetivo de experimentar diferentes práticas de aventura (TAHARA & FILHO, 2009). Um único indivíduo relatou não concordar que o contato com a natureza é algo que caracteriza o Paraquedismo, este também declara que o paraquedismo não é uma atividade física de aventura na natureza e que esta atividade não gera impactos nestes ambientes. Logo se percebe que algumas pessoas ficam tão focadas no risco e na adrenalina que suas representações negligenciam a natureza. De fato, nos esportes aéreos o mundo é a paisagem, sendo tudo visto de cima em composição: urbano, rural e natural. Onde, portanto, está a natureza no paraquedismo, se tudo se funde e se confunde na velocidade vertiginosa da queda? Essa discussão é sobremaneira profunda e costumeiramente cai em metafísica. Mas, para apontar uma solução, é importante realçar que os esportes aéreos tiram a pessoa de um estado físico mais sólido e de um elemento da natureza (a terra) para introduzir o ser humano no etéreo, no elemento ar (PIMENTEL, 2008). Ora, não se precisa do céu para a prática do paraquedismo? E não seria o céu, o vento, o ar, as nuvens elementos naturais? Como então fazer tais declarações com tanta propriedade? O ar tem mais relações com o sensível por ser um elemento “invisível”. No dia-a-dia, ele está despercebido e na prática das aventuras aéreas sua apreensão pode se dar mais como cenário de fortes emoções do que um parceiro com quem se brinca o desafio. Tal insensibilidade pode também ser lida como o reflexo da negação/negligência que muitos tem em relação a estes ambientes por valorizarem outros elementos, como aumento das áreas urbanas, a aquisição de cada vez mais bens de consumo, o crescimento da indústria, turismo entre 209 vários outros fatores, como analisam Tahara, Dias & Schwartz, (2006). Os autores dizem também que mesmo com o consumo da natureza é necessário que haja uma conscientização popular ao relacionar-se com estes ambientes para que aconteçam reflexos positivos vindos de tal interação, pois o ambiente natural tem vital importância na vida do ser humano ao longo de toda a história da humanidade (TAHARA, DIAS & SCHWARTZ, 2006). Estariam, pois os praticantes das aventuras no meio aéreo, condenados a viver relações superficiais com o meio? Pimentel (2010), investigando a percepção dos riscos, condicionamento corporal e interações sociais no vôo livre, verificou –por meio da observação, entrevista e registros de imagens de pilotos de asa-delta– que um dos aspectos importantes sobre o corpo no vôo livre é a comunicação constante com a natureza. Com isso é inegável o fato de que o paraquedismo, assim como o vôo livre – pois apresentam interações semelhantes com o meio – são atividades físicas de aventura na natureza e que é necessário o diálogo com ela para a realização desta atividade. Esse fator não garante uma conscientização ambiental, pois se é necessário criar uma preparação para se interar com o ambiente, a mesma pode ser somente do ponto de vista instrumental. Quando se vê as forças da natureza como algo a ser dominado, o treinamento se dá no sentido das técnicas de segurança e do aproveitamento das correntes de ar. Mas, conforme ponderam Tahara, Dias & Schwartz (2006) interagir conscientemente com a natureza é de vital importância humana, e possibilidades se abrem diante da crescente adesão a práticas que tem contato direto com o meio natural no campo do lazer. Já em relação à concordância de que o paraquedismo é caracterizado pela aventura e este fator relacionado à escolha desta prática, concordamos com Schwartz, (2006) sobre a necessidade de extravasamento de controle dos níveis de estresse, da procura por novidades fora do cotidiano, de vivências de novas emoções, de aprimoramento de níveis de saúde entre tantos. As atividades que promovem aventura com risco controlado e emoções dentro do lazer permitem um confronto do homem com suas limitações individuais e o entendimento dos seus comportamentos e escolhas, como afirma Little, (2002) apud Schwartz, (2006). E com isso, estas atividades permitem uma integração que vai além da contemplação, percepção e ação. Esta (re)aproximação do homem ao ambiente mais natural permite contato consigo próprio, com o outro 210 com a natureza, promovendo uma formação ética no conhecimento no respeito e no redescobrimento (SILVA, 2004). Em função dessa leitura, como sugere Grezzana (2003), a Educação Física deve estar envolvida nessas questões atuais, abrigar em seu currículo o constante surgimento de atividades de aventura, entre as quais se incluem conteúdos dos esportes na natureza. Não se trata apenas de inchar o currículo, mas de possibilitar ao indivíduo o aprofundamento em relação ao meio ambiente e às atividades físicas que se desenvolvem e remetem estes seres humanos na busca do afeto, emoção e prazer de viver sem alienação com o meio natural. Conclusão Primeiro é fundamental nunca se esquecer dos fatores limitadores, visto estarmos numa sociedade de classes. Segundo Tahara e Schwartz (2003), se teria o alto preço dos equipamentos, a dificuldade em deslocar-se aos melhores centros de prática, entre outros. Parece que mesmo assim o paraquedismo, assim como tantos outras AFANs, vem despertando interesse devido à oportunidade da aventura com risco controlado associado ao contato com a natureza. Sobre a AFAN o fascínio pela vertigem em atividades que promovem alto risco parece ser a “isca” que atrai tantos indivíduos que gostam de viver perigosamente em situações que provocam grandes desafios ao ser humano (TAHARA & FILHO, 2009). E ainda de acordo com Betrán (1995) apud Tahara e Filho (2009) as AFANs são uma mistura de prazer, diversão, emoção e aventura e estas práticas podem ser ilustradas por sensações que trazem bem-estar e prazer aos praticantes de aventura, sendo o contato com a natureza um importante catalisador neste sentido. O Paraquedismo traz consigo todos estes traços como característicos, da auto-superação, a busca pela adrenalina procurada por indivíduos que gostam de viver perigosamente, o prazer no lazer, o fascínio pela vertigem, o espírito aventureiro, tudo isso vivenciado em um ambiente natural. Logo, acreditamos que o paraquedismo se enquadra como uma AFAN e ele deve ser estudado dentro do âmbito das lógicas das AFANs. Esse parece ser o caminho mais aberto para elucidar os motivos/ensejos que levam o indivíduo buscar 211 esta prática, podendo determinar estratégias sociais, mercadológicas entre outras, que levaram a resoluções de problemas em relação a esta atividade. Ainda falando sobre paraquedismo, podemos sintetizar que a faixa salarial influi, mas que não é um fator determinante, pois verificamos que para a prática desta atividade a pessoa deve ter um desejo pelo risco e pela aventura. Dentro deste desejo, se a possibilidade financeira for pequena existe a perspectiva de se tornarem paraquedistas ocasionais, saltando esporadicamente. Esta questão influi no fato desta vivência se tornar uma prática de lazer crivada de desigualdades. Já sobre a relação com a natureza, desconsiderando o aspecto qualitativo, os dados e autores corroboram que o paraquedismo pode ser caracterizado pelo contato com a natureza. Então o indivíduo voa para reencontrar a natureza ou para superação dos seus limites, para o seu auto-encontro? Segundo Betrán (1995) apud Pimentel & Saito (2010), o homem das sociedades pós-indústriais se alimenta do retorno hedonista ao ambiente natural, sobretudo na juventude. Para Martins (2008) o indíviduo que busca praticar esportes de aventura, entre outros fatores, quer superar seus limites e buscar autoconhecimento. Com isso acreditamos que não dá para separar completamente um fator do outro. Eles são vivenciados como um mix. Alguns indivíduos podem apresentar um deles mais marcante do que o outro, como saltar pelo contato com o “ar”, vento, se esvaziar da sociedade urbana e outros podem saltar para experimentar o medo, o risco e assim superá-los. O reencontro com a natureza e o autoencontro associado a superação de limites nesta atividade não tem início e fim claramente identificáveis. Cada indivíduo exprimirá a sua necessidade, que no paraquedismo, sem dúvida, vai além da pratica esportiva. Repetimos: este estudo apresentou um baixo número de pesquisados. Com um n maior os dados poderiam ser presumidos com maior propriedade. Também foram abordados praticantes restritos ao estado do Paraná e a duas modalidades. As conclusões ora apresentadas são apenas indicativas. Para tanto consideramos relevante investir em estudos para elucidar os significativos e a amplitude do retorno ao meio natural. Ao desvendar a natureza pelo estudo do ser humano, em seu contexto social, político e econômico, poderemos avançar em formas mais pertinentes de ação/intervenção com AFANs no 212 âmbito das diferentes esferas sociais (trabalho, saúde, educação, lazer, meio ambiente). REFERÊNCIAS BALBIM, G. M.; NODA, L.; OLIVEIRA, R. M. S. B.; MOREIRA, V. F. R.; PIMENTEL, G. G. A.. Lesões ocasionadas pela prática do Skate. 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Atividades de Aventura na Natureza: investindo na qualidade de vida. Lecturas em Educación Física y Deportes, Buenos Aires, año 8, n. 58, mar. 2003. Disponível em: <<http://www.efdeportes.com>>. Acesso em 17 de abr. 2010. 214 PRODUÇÃO CIENTÍFICA DO CBAA Dimitri Wuo Pereira Universidade Nove de Julho – São Paulo – SP – Brasil E-mail: [email protected] Resumo As atividades de aventura desenvolveram-se bastante no Brasil, tal qual ocorreu no resto do mundo no fim do século XX e início do século XXI, tendo como suporte as áreas de atuação profissional da Educação Física e do Turismo. Mesmo assim ainda é incipiente a produção científica para atender a demanda do público que procura esse tipo de atividade. Uma das mostras de como essa produção pode ser realizada e disseminada foi a criação do Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura. Esse estudo pretendeu mostrar quais os resultados desse tipo de iniciativa. O método de pesquisa documental foi o escolhido para atingirmos o resultado esperado. Entre os 224 trabalhos apresentados nos quatro encontros anuais (2006 – 2009) verificamos que a área escolar tem um quarto deles, mostrando um interesse nesse tipo de prática acontecendo no futuro nas escolas por se acreditar no caráter formador do ser humano da aventura. Outro dado importante é a presença de grande número de pesquisas sobre áreas naturais, com poucos estudos falando do meio urbano, o que gera uma dicotomia. A competição e o rendimento são menos pesquisadas do que o lazer ou a educação, isso acarreta maior número de pesquisas qualitativas que por um lado mostram o caráter humano das atividades, mas cria um viés nessa área que deve ser refletido, para não fragmentar o conhecimento separando a natureza da perspectiva mais quantitativa, que também é necessária à pesquisa. Conclui-se esse trabalho reconhecendo suas limitações de abrangência, mas despertando o interesse em reconhecer o valor da produção científica em aventura no Brasil. Palavras chave: aventura, produção acadêmica, CBAA Introdução As atividades de aventura desde o final do século XX se tornaram populares e caíram no gosto principalmente de jovens e adultos como lazer, sendo inúmeras as formas em que acontecem em nossa sociedade. Cada vez mais vemos a ligação dos campos da Educação Física e do Turismo como agentes desse tipo de prática (PEREIRA e GARCIA, 2006) oferecendo seus conhecimentos e habilidades no desenvolvimento de práticas que envolvem o risco calculado quer seja na dimensão do lazer, do rendimento ou da educação (COSTA e TUBINO, 1999). 215 Com certeza em nosso país, ainda é incipiente a profissionalização dessas áreas, ocorrendo muitas vezes, a condução desse tipo de atividade por pessoas com conhecimentos vivenciais, porém sem formação específica ou acadêmica suficiente para atender a demanda dos novos consumidores da aventura (COSTA, 2004). Academicamente, ainda é difícil criticar o avanço mercadológico das atividades de aventura, pois pouco se conhece das relações entre marketing, aventura, esporte, educação física e turismo, para estabelecer uma análise aprofundada (STIGLIANO e CÉSAR, 2002) Um dos problemas acarretados por essa baixa qualificação profissional é o aumento no número de acidentes entre os praticantes, com a mídia explorando de forma bombástica esses acontecimentos, levando muitas pessoas a crer na impossibilidade de conhecer as atividades de aventura pelo risco potencial de morte que elas podem ocasionar. Muitas vezes, o alarde feito pela imprensa não contém informações relevantes sobre o assunto e nem profundidade científica para questionar a validade e o processo de segurança adotado. Em outras situações não se sabe nem quais os riscos da atividade nem os motivos que levam determinadas pessoas a escolherem pelo enfrentamento dos mesmos (PEREIRA, 2009). Por outro lado, há uma deficiência na formação acadêmica e profissional que não acompanhou a evolução e o crescimento do número de praticantes e de interessados. Somente nos últimos anos pudemos observar a criação de cursos de graduação e pós graduação nessas áreas. Essa situação começou a mudar no início desse século e um dos bons sinais dessa mudança foi a criação do CBAA, Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura, pelo LEL, Laboratório de Estudos do Lazer da UNESP de Rio Claro – SP. Organizado pelas doutoras Gisele Maria Schwartz e Alcyane Marinho, esse grupo idealizou em 2006 o primeiro encontro na cidade de Balneário Camboriú – SC, com o objetivo de incentivar e difundir os estudos e pesquisas na área da aventura no Brasil. Desde então mais três encontros foram realizados nas cidades de Governador Valadares - MG, Santa Tereza – ES e Mucugê – BA. Esse impulso inicial proporcionou discussões e trocas de informações importantes para a área, com o encontro de pesquisadores de todo o país se reunindo para avançar na busca de soluções para as questões que se apresentam à sociedade no campo da aventura. 216 A produção em aventura está muito ligada ao estudo do lazer, talvez porque esses estudiosos tenham percebido a forte relação entre as práticas de aventura e seus interesses acadêmicos e científicos. Inácio (2006) retrata um pouco das publicações sobre o tema citando o ENAREL, as teses e dissertações sobre aventura, os grupos de estudo e os periódicos nacionais. E conclui que precisamos: Identificar as matrizes epistemológicas dos estudos desenvolvidos nesta temática; a inserção desta temática nas grades curriculares dos cursos de formação; o cruzamento entre teorias e autores; as representações da relação ser humano natureza nos meios de comunicação; a inserção das PA’s no âmbito da Educação Física Escolar, entre outras (INÁCIO, 2006 p. 60). Objetivo Dessa forma, esse estudo dirige-se aos principais resultados encontrados nos quatro Congressos Brasileiros de Atividades de Aventura tentando elucidar alguns pontos relevantes já obtidos do ponto de vista científico nesses encontros, para que possamos compreender melhor os caminhos para a pesquisa na área de aventura no Brasil. Especificamente visa-se com essa pesquisa verificar: A quantidade de trabalhos apresentados; A abrangência pelo Brasil das pesquisas; A dimensão educacional de tais pesquisas; A dimensão social a partir da definição de Tubino (2002) para o esporte; Os campos de estudo por áreas de concentração; Método Essa pesquisa do tipo documental analisou os Anais do Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura para delinear as atividades de aventura 217 dos quatro encontros já realizados nos anos de 2006 a 2009. Foram analisados descritivamente os artigos e resumos. Resultados Número de trabalhos apresentados e a área escolar nos quatro últimos eventos: Encontros Trabalhos Área Escolar Área Não escolar 1 CBAA – SC 61 14 47 2 CBAA – MG 56 13 43 3 CBAA – ES 57 16 41 4 CBAA – BA 54 13 41 Total 224 56 168 Fonte: Anais CBAA I, II, III e IV A média de trabalhos por evento ficou em 56, número significativo para uma área pouco conhecida e com divulgação realizada sem grandes incentivos de órgãos de fomento da pesquisa no país. A observação entre a área escolar e não escolar (lazer, esporte competitivo, outros) nos faz crer que há interesse no estudo da aplicação das atividades de aventura nas escolas em mais de 25% das pesquisas. Esses dados significativos nos fazem crer que como ferramenta educacional as atividades de aventura se encontram como possibilidade de formação de pessoas nos seus mais diversos aspectos (sociais, afetivos, cognitivos, motores). A distribuição pelo país em relação aos estados: Estado 1 CBAA SC 2 CBAA MG 3 CBAA ES 4 CBAA BA SP 39 14* 9 17* RJ 2 16 16 8 218 MG 4 9 18 4* ES 6 5 5 8* 2 2 5 3* PR SC 5 1* RS 1 9 BA PE 1 2 1 3 AL 1 PB AM 5* 1 1 PA 1 TO 1 MS 3 DF 1* Fonte: Anais do CBAA I, II, III e IV * Algumas pesquisas foram realizadas em conjunto entre dois estados Como era de se esperar a maior parte das pesquisas foi realizada na região Sudeste, local onde há maior número de Universidades e Faculdades. Além disso, com as dimensões continentais do Brasil, não é fácil participar de um evento científico quando se vive a mais de 1.000 km de distância do local do evento. No CBAA, 15 estados e o distrito federal já apresentaram trabalhos, o que representa uma tentativa de se comunicar os interesses sobre aventura em quase todo o país. As pesquisas realizadas entre instituições de estados diferentes também mostra uma possibilidade de relacionar lugares com maior potencial com os de menor potencial auxiliando no processo de difusão do conhecimento através de intercâmbios. A diferenciação dos espaços de prática, o meio natural e o urbano. Encontro Natureza Meio Urbano Ambos ou sem 219 definição 1 CBAA 53 4 4 2 CBAA 46 3 7 3 CBAA 43 5 9 4 CBAA 46 2 6 Total 187 14 26 Fonte: Anais do CBAA I, II, III e IV Essas informações nos levam a crer que as atividades de aventura são consideradas principalmente pelo seu aspecto de envolvimento com o meio ambiente mais natural, isto é, mais ligado a situações fora das grandes cidades e das conurbações urbanas. A atenção dos pesquisadores à natureza, por vezes leva a crer numa dicotomia entre meio urbano e natural como se ambos não estivessem ligados. Isso não significa desconsiderar o outro meio, mais entendê-lo como não ligado, isto é, separado. Inácio (2006) discute esse assunto afirmando que a natureza é vista como externa ao humano: água, terra, flora e fauna, corroborando essa separação. Atividades de aventura acontecem nos dias de hoje nos meios urbanos simulando as atividades em seus ambientes originais. Isso dificulta ainda mais qualquer pensamento disjuntivo, como podemos ver em paredes de escalada que imitam as rochas, em parques com ondas para a prática do surf, nas modalidades de ciclismo que se originaram nas montanhas e são praticadas em pistas confeccionadas pelo ser humano, em pistas artificiais para descida de esqui e snowboard, entre outras. O skate e o parkour, por exemplo, duas práticas muito conhecidas e difundidas em todo o Brasil são alvo de apenas 6,5% das pesquisas. Houve alguma desconsideração dos pesquisadores sobre essas atividades apesar de sua expressividade social, o que choca com os dados relacionados a boa procura dos pesquisadores pela área escolar, afinal essas atividades talvez tenham grande possibilidade de se desenvolverem nas escolas. A aventura e o esporte segundo as dimensões sociais do esporte de Tubino (2002): 220 Esporte Encontro Lazer Rendimento Educação Não definido 1 CBAA 16 22 22 2 2 CBAA 30 9 17 1 3 CBAA 16 6 27 8 4 CBAA 16 4 25 9 Total 77 41 91 20 Fonte: Anais do CBAA I, II, III e IV Quando analisamos a partir da proposta de Tubino, encontramos alguns pontos importantes. A educação é a dimensão mais apresentada, pois muitos trabalhos não referem-se a escola, porém apontam para o processo educativo de práticas de lazer, ou então se referem ao próprio processo de produção de conhecimento ou de formação acadêmica. Como a maioria dos participantes é da área da educação física torna-se mais fácil de entender esse tipo de interesse. Houve nesse período uma diminuição dos trabalhos relacionados ao rendimento e a competição, isso pode ter ocorrido, pelo interesse desses pesquisadores pelas publicações indexadas que agregam mais ao currículo do que o CBAA que ainda não tem esse porte. Outra possibilidade é a observação de grande número de pesquisas sobe rendimento no primeiro evento, e analisando profundamente percebemos que nove entre as 22 pesquisas sobre esporte rendimento são de um único grupo e envolvendo uma mesma prática. Esses trabalhos desenvolvidos de forma conjunta e apresentados de forma separada aumentam significativamente os números, mas não representam necessariamente que houve um desinteresse momentâneo por esse tipo de pesquisa no evento, pelo contrário é uma mostra de que se mantém baixo o interesse dos pesquisadores pelas práticas competitivas de aventura no CBAA em relação às outras dimensões do esporte. Isso aponta para um modo diferente de se encarar o esporte como algo não competitivo ou metacompetitivo. Finalizando as pesquisas que enfocam a participação e o lazer tem uma continuidade nesse evento, talvez explicada pela origem do mesmo, em um grupo que estuda o lazer. Algumas pesquisas são difíceis de serem encaixadas 221 em uma única dimensão, apontando para uma abertura de outras formas de se classificar essas atividades além das propostas por Tubino. Áreas de concentração dos estudos apresentados. Área 1 CBAA 2 CBAA 3 CBAA 4 CBAA Total Pedagogia 16 18 25 17 76 Psicologia e Sociologia 17 11 9 8 45 Meio ambiente e Turismo 5 9 5 8 27 História, Filosofia e Legislação 7 4 5 9 25 Treinamento e Antropometria 12 4 4 2 22 Comunicação e marketing 3 2 6 3 14 Produção Cientifica 0 0 0 3 3 Fonte: Anais do CBAA I, II, III e IV Percebe-se uma necessidade de legitimar as atividades de aventura no campo pedagógico. Os estudos psicológicos e sociológicos envolvem questões de gênero, deficiência e do idoso na prática de aventura. Esses dados talvez sejam uma forma de mostrar a importância social na formação das pessoas, educando-as para a aventura e desmistificando essas práticas como atividades de loucos pelo perigo. Há uma minoria de pesquisas na área de treinamento. Esses utilizam dados quantitativos sobre desempenho na aventura, contrariando a maior parte dos estudos que se debruça sobre o caráter qualitativo dessas práticas de risco calculado. Corre-se o risco de encaramos a prática de aventura por um único prisma e com isso estreitar as possibilidades do conhecimento acreditando-o 222 como qualitativo e perdendo de vista suas quantidades, tão importantes para uma análise multidimensional do problema. Os dados apresentados começam a mostrar um panorama de como o CBAA contribuiu para a pesquisa e produção de conhecimento na área de aventura no Brasil. Porém a construção da informação não se baseia apenas em números, ela deve também tratar a informação como produção humana, portanto subjetiva (GONZALEZ REY, 2005). No último encontro na Bahia, três pesquisas trataram da produção na aventura em publicações do CBAA e de outros eventos e instituições. Dias et al. (2008a) concluíram ser muito baixa a produção científica nessa área, nos programas de Pós Graduação da USP, UNESP e UNICAMP, entre 2003 e 2008. Apenas 13 trabalhos é pouco para auxiliar no processo de organização, preparação profissional e preservação do meio ambiente, segundo os autores. Já em outro estudo, Dias et al. (2008b) pesquisando os três primeiros CBAA apontam ligeira predominância de pesquisas relacionadas a biomecânica e fisiologia, mas quando se somados os dados de outras áreas (sociologia, psicologia, política, educação) encontra-se maior número de pesquisas na somatória. Esses dados concordam com o que expusemos numericamente, pois no primeiro evento tivemos diversos trabalhos da área biodinâmica, mas esse número decresceu nos eventos seguintes. As autoras também apontam poucos estudos referindo-se a questão do risco, que é um tema central da aventura. Campagna et al. (2008) concordam com uma predominância de estudos ligados a área pedagógica como já foi exposto anteriormente. É apontada uma grande diversidade de interesses dentro da temática da aventura. Confirma-se a idéia já apresentada de que o desenvolvimento humano está muito presente nos interesses dos pesquisadores, quando se percebe que as áreas da educação e da psicologia são muito valorizadas nas pesquisas. Conclusão Concluímos esse trabalho apenas apontando que os dados apresentados contêm limitações em sua abrangência, pois não representam todas as pesquisas na área de aventura, mas que dão indicações sobre como essas pesquisas tem se desenvolvido no Brasil. Outro limite conhecido é o fato 223 de muitas dessas pesquisas apresentadas como resumo se tratarem de estudos em andamento, não conclusivos e, portanto abertos a variações em suas conclusões finais. A informação que se pôde produzir a partir dos dados levantados mostra que o tema da aventura começa a se consolidar cientificamente, mesmo que de forma tímida. Os interesses pela formação das pessoas através da aventura dão um sinal claro de uma preocupação humana com os rumos das pesquisas. Basta apenas não deixar de lado as contradições próprias da ciência para continuar produzindo ciência, reconhecendo a importância das diferentes áreas na compreensão do valor da aventura para os praticantes e juntando esforços para cumprir o papel social da pesquisa científica que é contribuir com conhecimento para um mundo melhor. Isso se faz de forma complexa, isto é, tecendo o conhecimento que outrora estava desligado. REFERÊNCIAS CAMPAGNA, J. et al. (Retro)perspectivando as trilhas do conhecimento sobre aventura. In: IV Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura. FTC. Mucugê – BA. Anais ... 01 – 04 jul. 2009. COSTA, V. L. M.; TUBINO, M. J. G. A Aventura e o risco na prática de esportes vinculados a natureza. Motus Corporis, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p. 96 -112. Nov. 1999. COSTA, C. S. C. Formação profissional no esporte escalada. Dissertação (Mestrado) Curso de Educação Física, UGF - RJ, 2004. DIAS, V. K. et al. Atividades de aventura e a produção do conhecimento em programas de pós graduação. In: IV Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura. FTC. Mucugê – BA. Anais ... 01 – 04 jul. 2009 (a). DIAS, V. K. et al. Produção científica sobre atividades de aventura em anais de eventos. In: IV Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura. FTC. Mucugê – BA. Anais... 01 – 04 jul 2009 (b). INÁCIO, H. L. D. Lazer, educação e meio ambiente: Uma aventura em construção. Pensar a prática. 9/1:45-63, jan./jun. 2006. PEREIRA, D. W. A complexidade da avaliação dos riscos na escalada em rocha. In: IV Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura. FTC. Mucugê – BA. Anais... 01 – 04 jul 2009. PEREIRA, D. W. e GARCIA, A. B. O esporte de aventura e a regulamentação da educação física. In: I Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura, Balneário Camboriú – SC. Anais ... jul. de 2006. 224 STILGIANO, B. V. e CÉSAR, P. A. B. Turismo de aventura: a busca de seu significado através da análise qualitativa de praticantes. Turismo – Visão e Ação. Ano 5, n,11, p. 41 – 50, abr./set. 2002. TUBINO, M. J. G. Dimensões Sociais do Esporte. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002. v. 11. 225 RESPONSABILIDADES AMBIENTAIS DE TRILHEIROS DO PARQUE NATURAL MUNICIPAL DE NOVA IGUAÇU - RJ Eduardo Rodrigues da Silva, Ulisses Vitorino dos Santos, Maria Regina de Menezes Costa, Nilda Teves Ferreira, Vera Lucia de Menezes Costa Universidade Gama Filho, Rio De Janeiro - Rj, Brasil E-mail: [email protected] Resumo Este estudo tem por foco de investigação a responsabilidade ambiental entre os trilheiros, praticantes de trekking como lazer, do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu - RJ (PNMNI). O meio ambiente resultante do convívio do homem com a natureza, sofreu e ainda sofre transformações devido à ação humana. Em alguns locais essa realidade vem mudando e o Parque vive a transformação, da terra, da água e do ar, ou seja, foi criado para o homem conviver com o meio ambiente, responsabilizar-se por ele e preserválo para a própria sobrevivência. Os objetivos do estudo foram mapear as opções de esporte-aventura presentes (praticadas) no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu / RJ e caracterizar as responsabilidades com o meio ambiente (percepções, hábitos e ações/procedimentos de respeito e preservação) dos trilheiros do Parque. A metodologia utilizada foi desenvolvida a partir de uma investigação exploratória, com abordagem quanti-qualitativa, onde há aspectos relacionados ao meio ambiente, vivenciados no universo dos praticantes de trekking. As estratégias metodológicas foram: (a) Mapear os locais disponíveis e as práticas de esportes de aventura do PNMNI; (b) Construir um histórico do PNMNI; (c) Construir e validar um roteiro de entrevista; (d) Aplicar a entrevista aos trilheiros do PNMNI; (e) Análisar e interpretar as informações coletadas; (f) Os dados quantitativos foram analisados por estatísticas descritivas (frequência absoluta e relativa) e os dados qualitativos por Análise de Conteúdo (BARDIN, 2000). Concluiu-se que os trilheiros do PNMNI utilizam as trilhas do Parque como articulação entre esporte, turismo e lazer, demandando o que Guattari (1990) chamou de ecosofia, uma articulação entre o meio ambiente, as relações sociais e a subjetividade humana. Manifestaram indícios de responsabilidade ambiental, de uma ética prática e especulativa e de potencial para o ordenamento territorial e ambiental do Parque, enquanto unidade de conservação. Palavras Chave – Meio Ambiente – Trekking – Lazer. Introdução Este estudo tem por foco de investigação a responsabilidade ambiental entre os trilheiros, praticantes de trekking, do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (PNMNI), isto é, dentre aqueles que escolhem caminhar por lazer pelas trilhas do Parque. O Parque faz parte da unidade de conservação do APA do GericinóMendanha, de domínio estadual, uma área de preservação ambiental 226 municipal, que procura estabelecer um tipo de interação com seus freqüentadores na qual explicita regras para utilização do espaço, placas de sinalização com esclarecimentos e localização, sempre visando uma melhor utilização por parte dos usuários que escolhem aquele lugar para desfrutar de suas opções recreativas e esportivas tais como banhos de cachoeiras, trilhas para caminhadas, opções de rappel, um vulcão extinto e rampa de saltos de voo livre, em meio a uma natureza exuberante. Sob a gestão da Secretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente da Prefeitura da cidade de Nova Iguaçu, a preocupação com o meio ambiente, preservação da rica biodiversidade e das belezas naturais se fazem notar no projeto, oficializado pelo DECRETO Nº. 7.428 DE 02 DE JUNHO DE 2006 que institui o programa de reflorestamento de proteção de áreas de interesse ambiental visando: (a) promover o reflorestamento; (b) proteger, desenvolver e acelerar a regeneração das florestas; (c) delimitar fisicamente as áreas de domínio público ou privado necessárias; (d) deter a ocupação irregular; (e) apoiar as iniciativas da sociedade; e (f) a geração de trabalho e renda e das populações vizinhas. O Parque se localiza na região de fronteira dos municípios de Nova Iguaçu, Mesquita e Rio de Janeiro, os primeiros localizados na Baixada Fluminense. Em se tratando da proximidade das cidades de Nova Iguaçu e Mesquita, a primeira, Nova Iguaçu, é uma cidade, que segundo Barbosa (2008), desfruta de uma atual situação de desigualdade e deterioração socioambiental cuja origem se deu em uma longa história de exploração de seus bens naturais e sociais, uma história-síntese da Baixada Fluminense, local de boa parte das “cidades-dormitórios” e das “zonas de sacrifício” do Estado do Rio de Janeiro. Para a autora isso é resultado de um histórico processo político-econômico que privilegiou uma minoria (que veio a se tornar também a elite política da região) e vitimou a imensa maioria de uma população que, aos poucos, foi perdendo sua auto-estima, mostrando-se aparentemente resignada com a condição de vida que lhe foi imposta. Esses mesmos grupos elegeram o Parque como uma instância privilegiada de lazer ecoturístico tornando-o significativo para seus moradores e visitantes. O Parque abriga valores históricos e culturais como a sede da Fazenda Dona Eugênia, conhecida atualmente como Casarão, construído no final do 227 século XIX; as ruínas do clube Dom Felipe, que funcionou até meados da década de 1960, que já indicava a vocação para lazer na natureza da área; e o Quilombo, área de ocupação quilombola perto da pedra da Contenda (ZEN, 2008). Esse patrimônio histórico-cultural da região possui um grande potencial natural, mas, as políticas públicas, segundo Barbosa (2008), provocaram o surgimento de graves problemas socioambientais, conduzindo a cidade a um baixo índice de desenvolvimento humano (http://www.cmni.rj.gov.br/nossa_historia/apresentacao/) e (IDH-M=0,762) a uma não identificação da questão ambiental como relevante por considerável parcela da população. O meio ambiente resulta do convívio do homem com a natureza, o ambiente sofreu e ainda sofre transformações devido à ação humana. Em alguns locais essa realidade vem mudando e o Parque vive a transformação, da terra, da água e do ar, ou seja, foi criado para o homem conviver com o meio ambiente, responsabilizar-se por ele e preservá-lo para a própria sobrevivência. O Parque retoma o interesse dos frequentadores pelo contato com a natureza, fazendo com que seus frequentadores, entre eles os trilheiros, encontrem no meio ambiente natural do local de suas caminhadas, o prazer de desfrutar do lazer, da aventura, de desafios e das emoções, conduzindo-os à experiências de bem estar e qualidade de vida. (PINHEIRO, 2008). Para conhecer a realidade e iniciar o estudo, dirigi-me para o PNMNI por vários finais-de-semana para mergulhar nos caminhos de quem por lá se exercita. Ao deparar com o fato de que o trekking acontece com menor adesão dos frequentadores no Parque do que os passeios para cachoeiras e para busca de atividade física prazerosa junto à natureza, a minha intenção enquanto pesquisador foi perceber o modo autônomo e independente com que vários desses caminhantes que se dirigem às trilhas na montanha, praticando um dos tipos de trekking ali encontrados, se ordenam nesse local, pois, muitos deles, ao invés de adentrar ao Parque pela via principal e dar ciência aos administradores responsáveis pela segurança, pela manutenção do espaço e por aqueles que o freqüentam, partem para ações à revelia da ordem existente. Estes escolhem vias alternativas que se constituem sem o devido controle. Tais procedimentos chamam a atenção em função desses comportamentos poderem denotar um espírito de aventura e risco ou, quem sabe, 228 procedimentos de transgressão à ordem estabelecida o que pode trazer malefícios ao meio ambiente e à própria segurança do praticante e daqueles que freqüentam o Parque, caso venha a lhes acontecer algo ou provocar danos ao meio ambiente, que podem se transformar em danos coletivos como as queimadas, por exemplo. Um novo olhar, então, sobre as observações no campo me levou ao diálogo com outras áreas do conhecimento e formular os questionamentos sobre as mobilizações das ações dos trilheiros em relação à aventura e à imaginação. Mas o que conduz essas pessoas a embrenhar-se pelo Parque? Sob que sentidos de aventura partilham com a natureza seus momentos naquele local? Afinal, diante de um ambiente privilegiado, da busca humana pelo lazer próximo à natureza e de conscientização da sociedade para com o valor das causas ambientais, busco investigar, quais os sentidos de aventura e de responsabilidade com o meio ambiente estão presentes no imaginário dos mais variados grupos de trilheiros que freqüentam o Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu. Dentro de cada um dos grupos, dos que passeiam pelo Parque rumo às cachoeiras e dos que se dirigem às trilhas na montanha, além dos interesses individuais, é possível que haja também interesses coletivos e ambientais e que tais interesses estejam mobilizados por um imaginário próprio da pós-modernidade no qual o nomadismo, a errância, as tribos, e o poder dos altares da atualidade, no caso, a natureza, entram no debate contemporâneo do espaço, do território, da urbanidade e do localismo (Maffesoli, 2000, 2001, 2001, 2004). Com isso, este estudo se apresenta como continuidade e aprofundamento das teses Caminhando nas trilhas do reencantamento da natureza – uma ecologia do corpo sagrado e errante (PASSOS, 2004) e de Os sentidos da aventura no lazer de caminhantes – peregrinos do Caminho do Sol (CARDOZO, 2006) desenvolvidas no grupo de pesquisas Lires-LEL. Passos (2004), falou sobre aproximação do homem com a natureza, a procura de identidades próprias, esportes de aventura na natureza, entre os quais se inclui a caminhada, o renascimento da vivência de aventura com força na sociedade pós-moderna, do valor simbólico e do novo sentido de espírito aventureiro substanciado na vida espiritual. O texto afirma que a natureza surgiu nos discursos sob diferentes atitudes perante ela, que deslizaram do 229 utilitarismo, em que a natureza fica reduzida a cenário da atividade física, passando pelo humanismo, pela mística e, por último, pela atitude naturalista, que entende o homem enquanto uma das muitas espécies do Cosmo na qual todas são merecedoras de igual respeito, apoiando-se ora em concepções antropocêntricas, ora em ecocêntricas. Na primeira concepção cabia à natureza servir ao caminhante como cenário, como energia para a vida. Na concepção ecocêntrica, ela é sentida como parceira, merecedora de respeito e de conservação, pois a sobrevivência do próprio homem, que também se percebe como natureza, depende de sua harmonia com ela. Para a autora há um desafio a ser vencido: o da construção de uma ética ambiental baseada na razão sensível, na compreensão do homem neste Cosmo. A necessidade de um pensamento policêntrico, que compreenda a interdependência entre indivíduo, sociedade e espécie, compreendendo a um só tempo a unidade e a diversidade do progresso planetário, suas complementaridades ao mesmo tempo em que seus antagonismos. Cardozo (2006) mostra que a caminhada de peregrinação de seus entrevistados supera a simples caminhada, tendo os sentidos deste tipo de caminhada estão voltados para o lazer/aventura/natureza/bem-estar espiritual. Estes atores vivenciam o sofrimento físico e também espiritual, uma dor que conduz ao resgate da sensibilidade dentro de si. São remetidos ao reencantamento do mundo, arrebatados pela magia e energia da natureza. Sentiram a solidão e novos sentimentos brotaram, a percepção de sua limitação física, sofreram, amaram, aprenderam a cuidar da natureza. Atualmente, a necessidade dos habitantes da região da Baixada Fluminense, zona urbana e metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, é a de alteração de rotina buscando no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu práticas de lazer, como passeios em trilhas, banhos em cachoeiras, vôo livre, escaladas, passeio à boca do Vulcão, chegada ao topo do monte. Buscam no Parque, opções de lazer junto à natureza, afastando-se dos centros urbanos. Afinal de contas, diferente daquela reserva, as ruas da Baixada Fluminense não apresentam praças nem ambientes naturais satisfatórios que possam resgatar as energias dispendidas nas rotinas do cotidiano. O Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu no Rio de Janeiro faz parte da Área de Preservação Ambiental do Gericinó-Mendanha, uma área de 10.500 hectares considerada 230 Reserva da Biosfera pela UNESCO em 1996. A freqüência ao PNMNI é de tal ordem que cerca de 1200 usuários/dia segundo Mello (2008) podem estar presentes em dias muito quentes. Mas o que leva esses trilheiros a buscarem este Parque? O que os motiva a caminhar por trilhas, a buscarem as cachoeiras ou a apreciar as belezas das paisagens de um Parque que surgiu há mais de 10 anos? Que impactos ambientais podem trazer os praticantes do trekking no Parque? Segundo Passos (2004, p. 11): Há uma mística no ato de sair caminhando para e pelas montanhas e florestas que introduzem o praticante no trekking. Este esporte é carregado de um certo ar de magia. À medida que o praticante penetra no mundo da floresta, algo lhe acontece. Tudo se transforma. Sons, cheiros, temperatura, animais, insetos, folhagens, um mundo de seres vivos vêm fazer-lhe companhia em sua jornada. [...] “Entretanto, o caminhar no trekking não é uma simples repetição de passos automatizados preso a caminhos constantes e iguais. O caminhar, nos esportes de aventura, adquire os sentidos de passear, viajar, explorar, desbravar e, às vezes, competir”. Os grupos de trilheiros no Parque compartilham a emoção do “pé na estrada”, o sentimento de contemplar a natureza e ou também se aproveitar ludicamente de seus atrativos como cachoeiras, trilhas a locais históricos, paisagens naturais e paisagens modificadas, vivenciar novas experiências, fugir de um cotidiano. O “prazer parece estar no contato íntimo com a natureza¨ (PASSOS, 2004, p. 13). O homem então começa a aproveitar esses lugares, vivenciar a liberdade de guiar seus caminhos pela natureza e desfrutar de um estado de tranqüilidade, dando emoção aos seus sentimentos. A opção gratuita de lazer, o fato de atingir um ponto alto que favorece uma vista privilegiada da cidade, a possibilidade de alcançar a chaminé de um vulcão extinto, a temperatura agradável, a sensação de liberdade junto à natureza, as opções de esportes de aventura, as peregrinações religiosas e o banhar-se em cachoeiras limpas na região podem ser algumas das motivações para a adesão ao Parque e o tornar-se prioridade para os moradores da região e de outras ao deslocar-se para lá. Beneficiados por uma gama de experiências vivenciadas no Parque, os praticantes do trekking, os trilheiros, possuem hoje todo um aparato que facilita 231 sua identificação tais como: vestimenta, calçado e cajado. Esses trilheiros, utilizando ou não equipamentos de navegação, mas sempre amparado pelas tecnologias que envolvem a confecção dos materiais mais utilizados no trekking: tênis ou botas, roupas especiais, mochilas, cordas, barracas, agasalhos, sacos de dormir e outros (PASSOS. 2004, p. 13). A tecnologia para os trilheiros aparece principalmente no trekking competitivo com os seguintes equipamentos: cartas de navegação, contador eletrônico ou manual de passos, notebooks, palm top, bússolas e GPS, mas não é dispensada por aqueles que penetram no Parque, dirigindo-se em especial aos lugares mais afastados da entrada principal, de maior risco e de menor procura. As responsabilidades ambientais decorrentes das práticas esportivas na natureza são importantes para a adoção de medidas que venham a prevenir, minimizar e eliminar possíveis danos. Utilizaremos a expressão “trilheiros” toda vez que nos referirmos a modalidade trekking dentro dos seus diferentes tipos, categorizados por alguns especialistas e citados por Passos (2004) como: trekking de regularidade ou enduro a pé; trekking de velocidade ou corrida de aventura; travessias ou trekking de longa distância (dias); trekking de um dia ou hiking; e peregrinações (caminhadas com fins religiosos). Os dois primeiros são caracterizados por uma atividade de competição, e dois últimos mais por uma atividade de expedição, contemplação, encontro e descoberta. Diante da desrotinização que pessoas, moradores em área urbana, vivenciam ao caminhar junto à natureza em programas de lazer se submetendo aos desafios das trilhas do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu /RJ, reconhecendo o valor deste Parque para a comunidade do entorno, sejam trilheiros, peregrinos religiosos, desbravadores das trilhas ou praticantes de modalidades esportivas de aventura no Parque, confiantes em suas habilidades e nos recursos tecnológicos, buscamos saber, que sentidos da relação homem-natureza, de aventura e de responsabilidade para com o meio ambiente são socializados nos discursos dos trilheiros do Parque. Sabe-se que, segundo Vieira (2004, p.04): 232 O contato com a natureza através do esporte apresenta um viés positivo e outro negativo. Por um lado pode, por exemplo, aumentar a consciência ecológica dos envolvidos com a prática esportiva, pode inibir a ação predatória em seus locais de prática e contribuir para a melhoria da qualidade de vida. Por outro, essas mesmas práticas esportivas podem interferir negativamente nos fatores ambientais, podendo ocasionar danos aos ambientes onde são praticados. O surgimento constante de novas modalidades esportivas da natureza, manifestadas como lazer ou competição, com o conseqüente aumento do número de praticantes, espectadores e infra-estrutura podem agravar o quadro de degradação ambiental. Desse modo parece conveniente explorar os sentidos de responsabilidade ambiental que demandam aos praticantes das trilhas, freqüentadores do PNMNI, suas percepções, hábitos e ações/procedimentos de respeito e preservação do meio ambiente em relação as normas de conduta em unidade de conservação, para que se possa prever possíveis desvios de interferência na qualidade de vida dessa simbiose homem/natureza e orientar no sentido de proteção e conservação do meio ambiente como necessidade de auto-preservação. Este estudo teve dois objetivos: (a) mapear as opções de esporteaventura presentes (praticadas) no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu / RJ; e (b) caracterizar as responsabilidades com o meio ambiente (percepções, hábitos e ações/procedimentos de respeito e preservação) dos trilheiros do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu /RJ. No que tange à metodologia o estudo se desenvolveu a partir de uma investigação exploratória, com abordagem quanti-qualitativa, onde há aspectos relacionados ao meio ambiente, vivenciados no universo dos praticantes de trekking. As estratégias utilizadas foram: (a) mapear os locais disponíveis e as práticas de esportes de aventura do PNMNI; (b) construir um histórico do PNMNI; (c) construir e validar um roteiro de entrevista; (d) aplicar a entrevista aos trilheiros do PNMNI; (e) analisar e interpretar as informações coletadas; (f) os dados quantitativos foram analisados por estatísticas descritivas (frequência absoluta e relativa) e os dados qualitativos por Análise de Conteúdo (BARDIN, 2000). 233 O instrumento utilizado no estudo foi um roteiro de entrevista. Buscamos nos estudos de Vieira (2004) e de Pinheiro (2008) os fundamentos para a elaboração e validação do roteiro de entrevista estruturado que utilizamos nesse estudo. A amostra, do tipo intencional, contou com 10 participantes. Utilizou-se como critério de inclusão a maioridade, o tempo de prática do trekking superior a 3 anos e a utilização das trilhas do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu - RJ. Os dados quantitativos foram analisados por estatísticas descritivas (frequência absoluta e relativa) e os dados qualitativos analisados por Análise de Conteúdos (BARDIN). A PESQUISA: A – Uma História do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu O Parque faz parte do ecossistema da Mata Atlântica, é uma unidade de conservação criada através do Decreto Municipal 6001 de 05 de Junho de 1998. Para ter acesso à área do Parque pode ser feito pelo Bairro Kaonze através da Estrada do Encanamento ou pelo do centro do Município de Mesquita, percorrendo-se aproximadamente 4500 metros entre uma via local por nome Avenida Brasil e a Estrada da Cachoeira. Outra referência importante é a existência de uma Represa Epaminondas Ramos, construída em 1948, junto à qual a Prefeitura da Cidade de Nova Iguaçu construiu uma guarita de controle e fiscalização daqueles que adentram o Parque por sua entrada principal. No interior a principal via de circulação continua a Estrada da Cachoeira que se estende da guarita do Portão de Entrada até as antigas instalações do Clube Dom Felipe, num total aproximado de 5500 metros (SANTOS, 2005). Na porção sul do município de Nova Iguaçu, localiza-se a área de proteção ambiental (APA) do Gericinó-Mendanha, unidade de uso sustentável administrada pelo Governo Estadual. Dentro dessa APA, encontra-se o Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu, unidade de proteção integral instituída pelo Poder Público Municipal. Este geoparque é uma área protegida com limites definidos que abrigam lugares de interesse geológico e de importância científica, singularidade ou beleza, representativos na história geológica da região, segundo a UNESCO 234 1996. A conservação desse patrimônio geológico é de importância educativa para o futuro das ciências da Terra (BRILHA, 2009). Segundo Mello (2008) a parceria com da Prefeitura da Cidade de Nova Iguaçu e universidades presentes no estado do Rio de Janeiro, o DRM-RJ iniciou, em 2004, a implantação do primeiro Geoparque do Estado na área do Parque Municipal de Nova Iguaçu. O patrimônio geológico a ser preservado são as rochas e estruturas relacionadas ao Vulcão de Nova Iguaçu, que foi descrito por Klein e Vieira (1980), inclui parte remanescente da suposta cratera. Na área da sede o PNMNI oferece os seguintes serviços oficiais: (a) Identificação, logo na entrada com apresentação das normas, verificação e contagem daqueles que adentram o local; (b) Segurança e Fiscalização; (c) Guias para atender as visitas programadas; (d) Manutenção; (e) Gestão. Na entrada principal do PNMNI é permitida a entrada mediante a apresentação de documento de identificação com foto e menores de 18 anos só entram com o responsável ou termo de responsabilidade por pelo menos um desses, assinado. Ocorre também verificação de mochilas, sacolas e bolsas, devido ser proibida a entrada de posse de objetos cortantes, bebidas alcoólicas, bronzeadores, cremes e água oxigenada e outros produtos químicos, além de instrumentos musicais. Na sede, a sinalização, com seus mapas de localização, é presente e os informes das restrições aos visitantes estão sempre disponíveis. As restrições do parque estão presentes nas placas: caçar e pescar, apanhar ou maltratar animais, apanhar plantas de qualquer espécie, entrar com animais domésticos ou qualquer outro, deixar lixo fora dos coletores, entrar nas trilhas sem autorização, montar acampamentos de qualquer espécie, depositar oferendas religiosas, danificar patrimônio natural ou construído. Tais procedimentos visam orientar a visitação ao parque e estão vinculados ao controle da insustentabilidade de nossos estilos de vida (LEIS, 1999), tentando reorientar interesses incompatíveis com a sustentabilidade ambiental, instaurar nova subjetividade capaz de reorientar valores individuais, sociais e para com a natureza. O Grupo Aventureiros de Nova Iguaçu descreve quatro das trilhas do parque no site http://www.aventureirosni.tur.br/proximoevento. A primeira, chamada trilha do Pau Pereira, possui aproximadamente 610 metros de 235 comprimento, descrevendo um arco à direita da Estrada da Cachoeira, passando por trás do Poço das Cobras. A trilha se localiza um pouco à frente da Parede das Brechas e Lavas Vulcânicas. Possui um mirante situado a 240 metros de altitude, de onde se avista a Cachoeira Véu da Noiva. O Mirante é pequeno, dando para 5 pessoas por vez e dá para ver o Véu da Noiva e o Casarão. Ao final dessa trilha todos os trilheiros descansam, contemplando ou banhando-se na cachoeira do Casarão. Na Trilha da Varginha o acesso tem início ao lado da entrada da Pedreira desativada. Seu inicio é um pouco íngreme e deve-se tomar cuidado com escorregões, principalmente na área do bambuzal logo no inicio. A trilha nos levará para o que seria a borda da "cratera" do vulcão de Nova Iguaçu, um maciço, de origem vulcânica, que apresenta crateras, chaminés e vestígios diversos de muitas erupções que, segundo os pesquisadores Victor Klein e André Calixto, tiveram intensa atividade entre 73 e 48 milhões de anos atrás. Naquela época, o maciço era uma ilha, seccionada pelo curso do Rio Guandu, que desemboca na Baía de Sepetiba (http://www.baixadafacil.com.br/cidades/iguacu.php). A Trilha do Mata fome é de nível fácil a médio por conta da extensão e topografia. Possui este nome por cruzar o vale e riacho do Mata-Fome. Seu inicio se dá em uma entrada à direita, uns 75 metros antes do Mirante do Alto. É uma trilha muito bonita, apesar de ter poucos mirantes. Próximo ao Matafome havia uma casa de taipa onde há algumas bananeiras, jaqueiras e outras espécies da Mata Atlântica. Esta trilha possui com aproximadamente 2500 metros. A Trilha para o Antigo Cassino é considerada a trilha mais difícil de todo o Parque. Com uma extensão de quase 7000 metros, realizados, em torno, de 3 horas de duração. A caminhada passa por pontos com atrativos consolidados de Nova Iguaçu, tais como: Poço das Cobras, Cachoeira do Véu da Noiva, Poço da Natureza (antigo Poço da Morte), até chegar ao Antigo Cassino. Este percurso fez parte do caminho percorrido na época do segundo império, século XIX. Abaixo segue um roteiro do PNMNI retirado do texto de Mello (2008): 236 O Parque, com tais sugestões, pode estar próximo de controlar os limiares críticos para os sistemas ambientais. A verificação histórica das formações e processos no ambiente são indicadores de deterioração. Reencontrar novos estados de equilíbrio parace fazer parte da preservação. É comum, segundo Mello (2008, p. 74), ao se abrir novas trilhas ou recuperar traçados, se encontrar vestígios de antigos caminhos como faixas de solos compactados, acidentes erosivos, espécies vegetais pioneiras e sinais de sub- 237 bosque recente. Se estabelecermos que o limiar de referência seja as características do solo e vegetação no traçado proposto, temos assim os sinais de limiares antigos ultrapassados (as marcas de sobreuso do solo e alterações na vegetação). Assim, a unidade de conservação PNMNI, ao associar ecologia, turismo e esporte como lazer, torna-se um irradiador de melhores práticas em visitação e conservação em áreas naturais para a região da Baixada Fluminense. B – O MAPEAMENTO DAS MODALIDADES DE ESPORTE AVENTURA PRATICADAS NO PNMNI A área do PNMNI favorece aos praticantes de esporte aventura desfrutarem da energia da beleza de suas paisagens enquanto se exercitam. Essa beleza, Schiller (1997) entende como um relaxamento para o indivíduo favorecendo-o com paz, harmonia e equilíbrio. Para os praticantes, segundo Corrêa e Rosenthal (1998) a paisagem não se apresenta como um cenário, mas enquanto uma individualidade portadora de significados, uma inter-relação entre homem e sítio florestal. Desse modo encontramos no PNMNI as seguintes práticas: PRATICAS ESPORTIVAS DE LAZER Modalidade Preferência dos Entrevistados Trekking 100% Caminhada (acesso a 80% cachoeiras) Rappel 60% Bicicross 40% Vôo Livre 20% C – RESPONSABILIDADES DOS TRILHEIROS COM O MEIO AMBIENTE C 1- CARACTERIZAÇÃO DOS RESPONDENTES 238 Dos trilheiros praticantes no parque entrevistamos 10 atores, 07 homens e 03 mulheres. Desconsiderando as questões relacionadas ao gênero, desses, 60% responderam que sua atividade no parque não causa impacto ambiental e 40% responderam que sim, sua atividade causa impactos ambientais, tais como, erosão, poluição, alteração ao ambiente local e carga na trilha. C 2- INSERÇÃO NO PARQUE Perguntamos aos entrevistados como foi o começo de sua prática do trekking no parque e nos discursos desses praticantes estiveram presentes a busca por cachoeiras, divulgação de grupos de praticantes, convite de familiares, divulgação na TV, colegas de academia e amigos. Sobre as trilhas realizadas os atores demonstraram ser diversificada sendo citadas todas as estabelecidas e/ou conhecidas do PNMNI, com destaque para Trilha do Vulcão. 80% dos trilheiros respondentes (08/10) demonstraram em seus discursos também procurarem o parque durante o ano todo, com algumas restrições ao horário na primavera e no verão, devido a altas temperaturas e sol em locais de baixa vegetação. C 3 – PLANEJAMENTO Dos entrevistados a pesquisa nos revela 50% dos atores procuram a administração do parque para obter informações sobre regulamentos e restrições do parque. Sobre as condições climáticas 70% dos atores informaram consultar as condições climáticas no local de sua prática. Com relação à prática acompanhada obtivemos um percentual equilibrado com 50% dos atores o fazem com menos de 5 pessoas e os outros 50% com grupos com mais de 5 pessoas. Não encontramos nesse segmento uma relação próxima entre os praticantes que procuram os lugares mais populares durantes as férias ou feriados prolongados, 70% responderam não fazerem. Um hábito “civilizado” dos praticantes foi à demonstração de que 100% dos atores tem o hábito de acondicionar seu lixo durante a prática. Ainda demonstram os atores serem suas escolhas das trilhas de acordo com seu condicionamento físico segundo 100% dos entrevistados. C 4 - RESPONSABILIDADE E SEGURANÇA Essa parte do questionário destina verificar o grau de imprudência durante as atividades, onde 50% dos atores revelaram já terem vivenciado algum tipo de risco em sua prática. 70% calcula o tempo de prática de sua 239 trilha, 60% não avisam o roteiro das trilhas a amigos ou familiares e 40% o fazem às vezes, avisando à administração do Parque sobre seu roteiro, experiência nas trilhas e número de pessoas do seu grupo. 100% possuem equipamentos para sua prática, 30% improvisam e outros 30% às vezes improvisam equipamentos nas trilhas. 80% verificam a validade de seus equipamentos. Dentre os equipamentos essenciais para consideraram: ALIMENTO 100% ÁGUA 100% CHAPÉU 90% PROTETOR 80% REPELENTE 80% CELULAR 80% RÁDIO COMUNICADOR 70% LANTERNA 60% AGASALHO 60% BASTÃO (CAJADO) 50% CANIVETE 50% CAPA DE CHUVA 50% BÚSSOLA 50% OUTROS (ÓCULOS, BINÓCULO, ...) 50% ESTOJO PRIMEIROS SOCORROS 40% MAPA 30% CORDA 30% GPS 10% FOGAREIRO 10% o trekking, 240 C 5 - CUIDADO COM AS ÁREAS DE PRÁTICA De acordo com os atores respondentes 50% utilizam de atalhos nas trilhas, sendo ainda uma taxa muito alta de esportistas que prezam pela melhora de seu tempo, sendo 40% aqueles que saem das trilhas e outros 40% que às vezes saem por ela estar escorregadia, molhada ou lamacenta, na relação com o acampamento foi oferecida a opção de não acampar, pois o Parque apresenta a maioria de suas trilhas por questões de horas, assim 80% dos respondentes confirmaram acampar, sendo que 70% não acampam respeitando os 60 metros de distância da água. Uma prática muito utilizada em acampamentos é a remoção ou utilização de vegetação como base ou apoio. 30% usam e outros 20% às vezes usam ou removem vegetação na sua prática. Com relação a cavarem valetas 20% admitem realizar e 10 % afirmam trazerem lembranças representativas do ambiente do parque, o que apresenta de forma positiva a preservação com relação a trazer lembranças. C 6 – LIXO A totalidade dos entrevistados revelou o retorno do lixo produzido pela prática do trilheiro (100%). Em relação a queimar ou enterrar o lixo, 90% não queimam e em relação a enterrar dejetos fora da área de 60 metros de distância da água, 70% não cumprem. Para a questão trazer o papel higiênico junto com o lixo, 70% assim o fazem, e quanto a utilizar sabão, sabonete, detergente ou xampu para limpeza de utensílios e higiene pessoal em fontes de água, 10% revelam que, às vezes, realizam. Pode-se dizer que, em relação à preocupação com o lixo, há indícios, neste grupo de responsabilidade ambiental. C 7 – FOGUEIRAS Segundo Pinheiro (2008, p. 144) “mesmo sendo proibidas, as fogueiras ainda são utilizadas durantes às atividades esportivas no meio natural.” Em nosso estudo, 10% dizem utilizar fogueiras e outros 20%, às vezes utilizam para cozinhar, iluminar ou se divertir durante sua prática no parque, enquanto 50% não conhecem as normas para confeccionar uma fogueira. Os dados indiciam ainda desconhecimento por parte da totalidade do grupo em atender à proibição legal de provocação de queimadas, seja de modo intencional ou casual e de suas conseqüências como o aquecimento global e a 241 grande perda de seres vivos da fauna e da flora, promovendo um profundo desequilíbrio ambiental. C 8 – FAUNA E FLORA As respostas a esse tema revelaram que 70% dos praticantes evitam se aproximar de animais silvestres, porém quando acontece, 80% tiram fotos e apenas 10% dizem apreendê-los. A conservação da biodiversidade e o respectivo equilíbrio ecológico, exigem uma nova consciência em direção ao desenvolvimento sustentável da região. Preservar os ecossistemas adquirem importância relevante para a sobrevivência do planeta. C 9 – EDUCAÇÃO COM A POPULAÇÃO LOCAL Com relação a este item o praticante do trekking no parque mostra o percentual de 90% no que tange à valorização do “som da natureza”, não utilizando aparelhos sonoros na prática; 100% não realiza a prática com animais domésticos. 60% utiliza roupas ou utensílios de cores fortes, justificados pela segurança, enquanto outros 20%, às vezes usam. Essa preocupação com a segurança desconsidera o desequilíbrio junto à fauna. C 10 – REPRESENTAÇÕES O grupo representou o Parque e as trilhas como cuidado e preservação (07/10). Dentre as falas encontramos: Me respeite; Preserve e volte sempre; Isto é feito para todos nós; Preserve-me e volte sempre; Encontrou-se também alguns que valorizam a apreciação da beleza e da paisagem: Vá devagar, aprecie o entorno. Leis (1999) lembra que novas subjetividades se fazem necessárias para que possamos revitalizar o ethos do ambientalismo, uma postura éticaamorosa para com a natureza. Pode-se depreender desse estudo que há uma tendência a preocuparem-se com a responsabilidade ambiental sobre o Parque. CONCLUSÃO: Pode-se concluir que os trilheiros do PNMNI utilizam as trilhas do Parque como articulação entre esporte, turismo e lazer, demandando o que 242 Guattari (1990) chamou de ecosofia, uma articulação entre o meio ambiente, as relações sociais e a subjetividade humana. Manifestaram indícios de responsabilidade ambiental, de uma ética prática e especulativa e de potencial para o ordenamento territorial e ambiental do Parque, enquanto unidade de conservação. 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Primeiramente foi realizado um breve histórico da atividade no Brasil e no mundo e a seguir uma análise sobre o Turismo de Aventura baseado em pesquisas bibliográficas e de campo. Para tanto, foi realizado um profundo mergulho no mercado do Turismo de Aventura, retratando a realidade deste segmento turístico que na visão de alguns autores, representa o surgimento do novo turismo. O artigo salienta os diversos momentos de organização, registrando a criação do trade de Turismo de Aventura do Brasil, em especial do Estado do Rio Grande do Sul, que com o trabalho orientado pela Secretaria de Turismo, Esporte e Lazer do Rio Grande do Sul conseguiu atingir o status de ser o primeiro Estado no Brasil a possuir uma legislação que regulamente este segmento. Além disto, está entre os 14 pólos de Turismo de Aventura identificados pelo Ministério do Turismo como locais promissores para o desenvolvimento desta atividade. Palavras-chave: Turismo de natureza; turismo de aventura; normatização. Introdução As atividades e viagens ligadas ao ambiente natural, sempre fizeram parte da vida do ser humano. Desde a época da pré-história, quando o homem ainda era nômade ele já realizava grandes peregrinações sobre a terra. Posteriormente, quando dominou a agricultura, suas viagens estavam ligadas ao comércio, onde o deslocamento era realizado para a troca de produtos; posteriormente, nas expedições exploratórias. A partir da evolução destas práticas, iniciou-se os deslocamentos em busca de lazer, ocorrendo assim o surgimento da atividade turística, que está ligado diretamente ao processo civilizatório da humanidade. A este processo também está ligado o surgimento do Ecoturismo e deste o Turismo de Aventura. Hoje chamamos de “aventura” as práticas que, no passado, muitas vezes garantiam a própria sobrevivência da raça humana. Afinal, no inicio de 245 sua trajetória na terra o homem, perambulava em busca de alimentos e abrigo, e a sobrevivência era a grande aventura a ser empreendida. A concepção de aventura não é física e palpável, mas é algo que, passando por um conjunto de sensações interligadas pela motivação e destreza, temperadas pelo obstáculo inesperado, chega ao prazer da conquista. O desfecho incerto e a proximidade do perigo, por menor que seja, diante da expectativa criada, formulam quadros de superação que, uma vez vencidos, tornam o homem mais confiante em si próprio (FONSECA, 2008). Diversas atividades com o meio natural, portanto, consideradas de aventura para o homem urbano, como remar um rio bravo, descer corredeiras, percorrer quilômetros dentro da mata, cruzar montanhas, ausentar-se por longos períodos em busca de caça para a tribo, entre outras ações, são parte natural das necessidades da nossa sobrevivência. Ao dominar a natureza com técnicas e equipamentos e a buscar o conforto, o homem de certa forma passou a se distanciar dela. À medida que as pessoas retomam o contato com estes ambientes, elas exigem roteiros mais autênticos, natureza pouco alterada e novos locais. As agências se profissionalizam e, aos poucos, a imagem do mochileiro cede lugar a famílias em busca de conhecer o Brasil, grupos de jovens que querem ver o que os livros apenas lhes apresentam rapidamente. Ao longo deste trabalho, o leitor poderá entender melhor o espectro do Turismo de Aventura e compreender vários de seus conceitos, características e peculiaridades, além de ter a oportunidade de familiarizar-se com uma atividade nova e diferente da rotina urbana, onde o homem se encontra com a natureza e consigo mesmo, através da superação de seus medos e limites, podendo lhe proporcionar assim muitos benefícios, tanto individuais como coletivos. No lastro teórico serão abordados uma série de conceitos que buscam contemplar a complexidade do mercado de Turismo de Aventura e o que ele representa, no país e também no mundo. Os autores que colaboram nesta fundamentação foram escolhidos pelo fato de transmitirem de forma clara e sucinta o contexto das atividades realizadas em ambiente natural, caracterizando assim o perfil deste segmento e configurando este mercado. 246 Para a realização deste artigo, foi usado como base principal o documento resultante de uma pesquisa cientifica realizada no Rio Grande do Sul e também diversas consultas a fontes literárias com a finalidade de agregar informações e conhecimentos a esta obra. A escolha do tema foi motivada pelo fato do pesquisador ser membro do trade do Turismo de Aventura do Rio Grande do Sul e ter percebido ao longo dos anos, que o conhecimento técnico cientifico sobre este segmento não é de apropriação do restante da cadeia produtiva do turismo e também de seus consumidores. Por este motivo é proposta do presente estudo colocar os principais conceitos e conhecimentos sobre este segmento a disposição da comunidade acadêmica, científica, gestora e consumidora para que possam refletir sobre eles, ampliando e disseminando assim o saber comum sobre estas atividades e as atribuições que as englobam. Objeto de Estudo Para melhor compreender a estruturação e normatização do Turismo de Aventura no Brasil e principalmente no Rio Grande do Sul, onde foi realizado um estudo sobre o processo pioneiro no país, se faz necessário a apresentação de outro segmento turístico que serviu de base para o Turismo de Aventura: o Ecoturismo. Na década de 1980, Lascuràin Ceballos, foi um dos primeiros estudiosos a definir a atividade de Ecoturismo como sendo basicamente o retorno do ser humano as suas origens, ou o reencontro do homem com a natureza em seu estado primitivo (COSTA, 2002). Ou seja, a industrialização está estreitamente envolvida com a fuga do homem para o ambiente natural. As pessoas que vivem nos países mais industrializados, são as que mais necessitam desta fuga. No caso do Brasil, onde a cidade de São Paulo surge como a maior metrópole do país e conseqüentemente a que apresenta os maiores níveis de estresse, poluição e caos urbano, a realidade não é diferente, pois também é a maior geradora de demanda de fluxo de turistas, tanto para viagens internas quanto para viagens externas. 247 Prova disto é a criação da primeira operadora de Ecoturismo do Brasil, a Free Way, com base na cidade de São Paulo no ano de 1983, oferecendo a seu público uma série de atividades em ambientes naturais. Para confirmar tal raciocínio, Mckercher (2002), fala ainda sobre a demanda do turismo de natureza, que nos mercados estrangeiros variam muito de acordo com o grau de industrialização da sociedade, onde a sociedade que sofreu maior impacto com ela busca mais as atividades desenvolvidas na natureza. Para que a sociedade ou visitante aproveite de forma agradável sua experiência nesta atividade, os agentes de viagens e as operadoras de turismo são elementos-chave na ligação entre o local de destino e o turista, tendo assim uma enorme influência e responsabilidade sobre as escolhas realizadas e os tipos de experiências vivenciados pelas pessoas na viagem (FENNELL, 2002). Se o agente de viagens não souber passar as informações corretas para os seus clientes, bem como aconselhá-lo a buscar um destino que esteja realmente dentro de sua realidade, ele pode além de causar grandes prejuízos financeiros, criar inclusive danos físicos e psicológicos a estas pessoas, bem como colocar em risco inclusive o seu próprio negócio. Este fato é agravado quando os destinos buscados envolvem locais ou situações mais complexas, como afirma Higgins, quando diz: “As operadoras de excursões na natureza mais remota, tem o papel mais importante na conexão dos clientes com os outros negócios e locais de destino ao redor do mundo, em particular em países não industrializados” (FENNELL, 2002, p.190). Uma recente evolução do segmento de turismo de natureza nos apresenta mais um importante ponto a ser observado; a figura do fornecedor de equipagem. Como diz Tims (1996 apud FENNEL, 2002): A equipagem remonta aos primeiros exploradores que empregavam as pessoas para um determinado serviço, em geral colocando o ser humano contra a natureza. Mais recentemente, a equipagem progrediu a ponto de assumir um status profissional no American Outdoors e no Instituto de Guias profissionais (PGI) [...] com a missão de identificar, melhorar e disseminar os conhecimentos de monitoria e 248 educacionais da indústria da equipagem, para que fornecedores de equipamentos e de guias possam oferecer serviços da mais alta qualidade para o público (TIMS apud FENNELL, 2002, p.186). Desta maneira, podemos dizer que inicia uma divisão no turismo de natureza ou do ecoturismo, dando o surgimento ao Turismo de Aventura, pois aqui, aparece a questão de colocar o homem contra os limites impostos pela natureza e utilizando-se para isto de equipamentos e técnicas específicas. Operacionalmente, a empresa deve ter uma quantidade de equipamentos e de estoque de produtos em geral para uso por parte dos clientes. “Além disto, deve ter manutenção adequada das instalações e equipamentos, a fim de produzir um padrão de qualidade aceitável, para que assim os clientes possam utilizar com segurança” por este motivo comentam ainda que “Os funcionários que manipulam os equipamentos devem conhecer como eles funcionam e se necessário saber como utilizá-los” (MCKERCHER, 2002, p 256). O que podemos identificar com o surgimento deste novo conceito na terminologia é que surge assim um novo campo de atuação que necessita de pessoas especialmente habilitadas para lidar com estes equipamentos. Desta maneira: Os tipos de experiência que interessam aqueles turistas que procuram os recursos naturais (p. ex. turistas de aventura e ecoturistas) tem exigido a inclusão de empresas preparadas para fornecer equipamentos e outros serviços especializados no turismo (FENNELL, 2002, p. 295). A operadora de viagens desempenha com isto o papel de facilitador, mentor e ponto de referência para os clientes. “Esse modesto nível de apoio reduziu o risco e a estranheza da aventura a um grau satisfatório para seus clientes” (MCKERCHER, 2002, p 236). Em outras palavras, as pessoas querem experimentar mudanças, mas com a segurança de sua própria bolha ambiental. Esta bolha ambiental é a manta de segurança pessoal que permite que elas experimentem a emoção da estranheza sem terem medo de serem dominadas por isto. 249 Assim, a comoditização do produto turístico possibilita que os clientes apreciem a novidade de uma área ou segmento, com pouco desconforto físico e emocional. Este fato faz com que um maior número de pessoas passem a consumir estes produtos e também os divulguem para que seus conhecidos também possam vivenciar esta experiência. Uma característica de suma importância do Turismo de Aventura é que as operações legais e organizacionais das empresas de turismo na natureza são regidas por várias leis, convenções e regulamentações governamentais determinadas pelo município e pelo Estado (MCKERCHER, 2002) De acordo com Metelka (1990), a regulamentação é o produto dos esforços de uma agência (governamental, internacional ou de negócios) autorizada a regulamentar os negócios em sua jurisdição. Historicamente, isso significa que o governo foi considerado apto a ditar as ações do setor – por exemplo, da aviação – em termos de políticas apropriadas relacionadas com a segurança (FENNELL, 2002, p. 245). Para ilustrar esta afirmação, podemos dar um exemplo prático e próximo de nossa realidade, que é na verdade o tema proposto neste projeto de pesquisa. A regulamentação Estadual do Turismo de Aventura no Rio Grande do Sul. Esta regulamentação foi criada no dia cinco de janeiro de 2005, quando o então governador do Estado (Germano Rigoto) assinou a lei de número 12.1228/05. Art.1º - O Turismo de Aventura no Estado do Rio Grande do Sul será realizado em observância às normas e diretrizes estabelecidas nesta lei, com a finalidade de ordenar a atividade, preservar os espaços naturais, garantir a segurança dos usuários e qualificar o pessoal envolvido na operação. Assim o Estado passou a ser o primeiro a ter regulamentação própria do Turismo de Aventura. (www.turismo.rs.gov.br/portal/index.secretaria). O intuito desta lei, conforme Machado (2008), foi justamente organizar o segmento de Turismo de Aventura no Estado, com a finalidade de proporcionar 250 qualidade e segurança para os turistas que freqüentassem o Rio Grande do Sul e estabilidade aos seus operadores. Ainda, conforme declaração de Machado (2008), este processo de regulamentação foi realizado através de um trabalho conjunto entre a Secretaria de Turismo do Estado do Rio Grande do Sul e os seus operadores, ao longo de quase oito anos de atividades, desde que foi realizado o primeiro encontro no município de Osório no segundo semestre de 2001. Várias outras reuniões, encontros e oficinas foram realizadas desde então, sempre contando com a efetiva participação dos operadores atuantes no processo. Consequentemente poucas agências de turismo tem políticas e sistemas de gestão formais e “a menos que seja previsto em lei, essas empresas só adotarão uma prática correta quando houver uma vantagem comercial indiscutível” (FENNELL, 2002; p.146). “O setor do turismo terá de se conciliar com a idéia do profissionalismo (sob qualquer forma) por causa do enorme interesse nesta área atualmente” (FENNELL, 2002, p.156). Desta forma as pessoas envolvidas com esta atividade, terão de estar realmente aptas para atuar neste segmento. Esta aptidão poderá ocorrer de diversas formas, com a finalidade de creditar a competência deste profissional, oferecendo assim maior qualidade e segurança nos serviços prestados. Para entender como o Turismo de Aventura é visto atualmente, Pires (2002) coloca que o Turismo de Aventura representa uma nova fronteira no turismo sob vários aspectos. O autor faz referência a uma nova fronteira por acreditar que nos últimos anos ocorreram várias inovações que parecem explicar e corroborar a idéia de que estamos diante da transição do velho turismo para o novo turismo (PIRES, 2002). Um exemplo para isto é apresentado por Swarbrooke (2003) quando afirma que, “estamos vivendo em uma época em que a clássica viagem de aventura em locais selvagens está sendo complementada por aventuras em ambientes artificiais criados pelo homem, frequentemente em áreas urbanas” (SWARBROOKE, 2003, prefácio), como por exemplo, em um shopping center, quando podemos nos deparar com um circuito de arvorismo, a disposição de jovens e adultos que queiram se aventurar nas alturas e tentar vencer os obstáculos suspensos oferecidos ao longo de cada etapa. 251 Assim, não se faz necessário ter de se deslocar até algum local afastado ou parque temático para ter acesso a esta atividade, pois com o auxílio das novas técnicas desenvolvidas pelo aperfeiçoamento do conhecimento e das experiências vividas é possível realizar uma situação de simulacro em praticamente qualquer ambiente. Parece claro que a aventura não é um conceito absoluto com o mesmo significado para todos. Trata-se na verdade de um conceito altamente pessoal, assumindo diferentes significados para diferentes pessoas. Uma atividade tida como corriqueira ou normal para uma pessoa pode representar uma aventura incomum para outra, dependendo de sua experiência ou personalidade de cada indivíduo (SWARBROOKE, 2003). Neste sentido diz o Ministério do Turismo: “Turismo de Aventura compreende os movimentos turísticos decorrentes da prática de atividades de aventura de caráter recreativo e não competitivo” (MTur, 2006, p.2). Porém, o conceito apresentado é muito vago e abrangente para os profissionais do segmento, por esse motivo os envolvidos diretamente com o setor, tentam mudá-lo para: Mercado turístico que promove a prática de atividades de aventura em ambientes naturais e espaços urbanos ao ar livre, que envolvam riscos controlados e assumidos, equipamentos específicos, adoção de procedimentos para garantir a segurança pessoal e de terceiros e o respeito ao patrimônio ambiental e sóciocultural” (Regulamentação, normalização e certificação em Turismo de Aventura; Relatório diagnóstico, p.10 Mtur. Brasília, 2006). Com esta definição, percebemos que ficam contempladas importantes características que compõem este segmento, dando assim uma clara visão de como seus profissionais identificam o segmento com que trabalham. Metodologia Para efetuar este estudo, foram utilizadas algumas técnicas de pesquisa, como por exemplo: experiência de vida, observação participante e entrevistas semi-estruturadas com o grupo focal identificado, pois de acordo com Gaskell (2002), estas metodologias permitem ao pesquisador ver com os olhos dos 252 entrevistados, possibilitando assim uma maior proximidade com a proposta do tema. Este tipo de técnica permite ao pesquisador explorar o espectro de atitudes, opiniões e comportamentos além de observar os processos de consenso e divergência, instigando assim o debate de assuntos de interesse público ou de preocupação comum. Desta forma a opção por uma pesquisa de caráter qualitativo foi pautada na crença de que esta modalidade se enquadra na busca dos objetivos almejados; pois de acordo com Triviños (1987), a pesquisa qualitativa tem fundamentos que apontam para o levantamento de dados históricos, baseados no campo da antropologia. A escolha pela entrevista semi-estruturada deu-se porque ao analisar as formas de levantamento de dados disponíveis, foi identificado ser esta técnica a que melhor se enquadra com a pesquisa qualitativa e também por oportunizar aos entrevistados dar maior número de informações pertinentes ao pesquisador. Por fim a técnica de grupo focal elegeu-se pelo fato de nos permitir a absorção de um maior número de dados e informações de relevância dos entrevistados, pois assim, quaisquer dúvidas que surgissem ao longo das entrevistas poderiam ser prontamente esclarecidas com seus envolvidos e também porque desta maneira, eles mesmos se instigam com novas informações, ressurgindo fatos esquecidos ou desconhecidos por alguns participantes. Conforme elucida Gaskell, o grupo focal é: Um debate aberto e acessível a todos: os assuntos em questão são de interesse comum, [...] e o debate se fundamenta em uma discussão racional. [...] O debate é uma troca de pontos de vista, idéias e experiências, embora expressas emocionalmente e sem lógica, mas sem privilegiar indivíduos particulares ou posições. (GASKELL, 2002, p.79) No grupo focal, questionou-se primeiramente sobre o surgimento das empresas de TA no RS. Logo em seguida debateu-se sobre os assuntos referentes a característica e ao contexto deste seguimento. Depois fez-se uma 253 analise dos fatos ocorridos e posteriormente uma síntese dos períodos pela qual o RS passou. A escolha dos procedimentos metodológicos ocorreu em função dos atributos de cada procedimento de pesquisa, que atendem às necessidades dos objetivos propostos. Resultados Ao longo do estudo identificou-se que existe uma média de 30 empresas atuantes no mercado e foi percebido que o Turismo de Aventura é dividido em três segmentos: ar, terra e água; onde em cada um destes ambientes são realizadas uma série de modalidades, que utilizam técnicas e equipamentos específicos para minimizar os riscos inerentes a este segmento. Verificou-se também que o desenvolvimento do Turismo de Aventura no RS passou por quatro fases distintas: no princípio como um esporte de “gurizada louca” que praticava atividade radical, posteriormente passou a ser chamado de Ecoturismo e logo em seguida como aventura até ser definida como o então Turismo de Aventura. Nos anos 1980, mais precisamente em meados de 1985 difundia-se uma série de atividades esportivas praticadas em ambiente natural no Estado do Rio Grande do Sul, como por exemplo, caminhadas de longo curso, travessias, escaladas, cavalgadas, vôos e canoagem. As caminhadas e travessias eram praticadas principalmente na região dos Aparados da Serra e Serra Geral, local onde atualmente se encontram os dois principais Parques Nacionais do Estado e um dos mais importantes atrativos do Brasil. Ali, jovens aventuravam-se nas encostas dos perais31, para cruzarem de ponta a ponta os maiores cânions do Brasil. As escaladas, que já ocorriam desde 1950, agora tinham em seus adeptos um núcleo conciso de praticantes que realizavam diversas atividades por vários cantos do RS, de norte a sul, conquistando rotas de escaladas e aprimorando suas técnicas. 31 Perais é um termo utilizado no Estado para designar um grande abismo, como por exemplo, os cânions. 254 Na cavalgada o Estado tem no sangue esta tradição, mas que agora tomava outros caminhos realizando travessias e expedições pelos Campos de Cima da Serra, cruzando rios, vales e montanhas, hospedando-se nas próprias sedes das fazendas por onde passavam. Na água através da canoagem, a cidade de Três Coroas se despontava, criando inclusive competidores olímpicos; que seriam poucos anos depois os futuros proprietários das primeiras operadoras de TA do RS. Mas somente por volta do ano de 1998, após o campeonato mundial de canoagem realizado no Estado, onde a mídia local, nacional e mundial estava presente, que esta atividade começou a ter respeito e ser reconhecida, tanto pelo público consumidor, como para os órgãos governamentais. Outro ponto observado, é que a maioria dos atores, pelo fato de terem iniciado nesta atividade muito jovens, nunca desempenharam outra atividade profissional e que suas características de empreendedorismo vieram aflorando com o passar dos anos, conforme iam crescendo, se especializando e percebendo as características e tendências de seu campo de atuação. Em relação a composição sexual do trade, percebesse que 98% dos atores são homens. Destes 50% são solteiros e os que são casados, suas esposas não possuem envolvimento nenhum com a atividade. Analisando a questão referente ao desenvolvimento e aperfeiçoamento que levaram o Estado a ser reconhecido pela sua competência, identificamos quatro momentos no contexto histórico do mercado de Turismo de Aventura no RS, que são eles: - Primeiro Momento: Surgimento – entre os anos de 1993 a 1997: Governador Antonio Britto do PMDB. Secretário de Turismo Roberto Oliveira e Günter Staub ambos do PMDM. O TA era visto de forma geral como uma atividade oferecida por jovens “loucos”, sem amparo nenhum dos órgãos governamentais. Onde não usufruíam de ofertas de equipamentos, nem de capacitações específicas, onde tudo era realizado empiricamente. No meio turístico as agências eram fechadas para eles, mas a mídia lhes dava uma grande atenção – o que fomentava a procura destas atividades por pessoas que queriam experimentar novos desafios. As dificuldades encontradas eram a aquisição de equipamentos; padrões de treinamento, capacitação e captação de público. 255 - Segundo Momento: Desenvolvimento – entre os anos de 1998 a 2001: Governador Olívio Dutra do PT. Secretário de Turismo Milton Zuanazi do PDT e depois PT. O segmento começava a apresentar um diálogo com a instituição governamental, mas seguia sem possuir abertura do meio turístico. Em compensação começava a ter uma certa oferta de equipamentos e acesso a informações referentes a capacitação além de passar a ser visto como algo não tão radical. Por outro lado a mídia começava a se fechar. - Terceiro Momento: Estruturação – entre os anos de 2001 a 2005: Governador Germano Rigotto do PMDB. Secretário de Turismo Luiz Augusto Lara do PTB. O trade começa a se organizar, é reconhecido oficialmente pelo Estado, mas passa por um grande abre e fecha de empresas; as agências de turismo começam a se abrir, mas a mídia segue se fechando. Neste momento o diálogo entre as próprias empresas começa a se aprofundar, inclusive pela convivência crescente através dos eventos que vinham participando. - Quarto Momento: Consolidação – entre os anos de 2005 a 2008: Governadora Yeda Crusius do PSDB. Secretário Luiz Augusto Lara e Heitor Gularte, ambos do PTB. O público está bem mais familiarizado com estas atividades, as empresas e proprietários já não são mais vistos como “loucos” e sim como profissionais, com grande acesso a equipamentos e capacitação, e as agências começam a se especializar e uma série de medidas são tomadas para a consolidação deste segmento. Ou seja, podemos dizer que o surgimento do Turismo de Aventura no RS, ocorreu no momento que foi aberta a Raft Adventure em 1993 na cidade de Três Coroas. O seu desenvolvimento se deu com a ocorrência dos campeonatos de canoagem realizados em 1996 e 1997, também na cidade de Três Coroas. A sua estruturação foi a partir da realização da I Oficina Estadual de Turismo de Aventura em 2001 na Cidade de Osório. 256 E por fim a sua consolidação se deu através da assinatura da lei 12.228/05 em 2005, quando o segmento passou de fato a ser reconhecido pelos órgãos competentes. Ao analisar o contexto do TA no RS, percebemos que os segmentos AR, TERRA e ÁGUA, possuem algumas atividades paralelas bem definidas em cada grupo, vejamos: AR: As pessoas que trabalham com a atividade de vôo, atuam também como professores de vôo. TERRA: As pessoas que trabalham com terra, atuam também com Alpinismo Industrial – alguns como professores de escalada, mas são a minoria. ÁGUA: As pessoas que trabalham com água, atuam, também, em uma série de atividades, relacionadas a vários âmbitos, que vão desde escola de canoagem, realização de campeonatos e eventos esportivos, empresas de turismo, e, também, em segmentos que nada tem a ver com o esporte. Outra observação realizada ao longo dos anos é que são todos muito profissionais e competentes, mas também são muito “loucos”; em vários sentidos, mas não no de irresponsabilidade. Talvez isto seja referente ao alto grau de responsabilidades que tem em suas mãos durante o “horário comercial”, pois estão a todo momento com a vida de pessoas em suas mãos, e que quando acaba o horário de trabalho, necessitam extravasar a tenção contida ao longo do dia. Referente a isto o pesquisador notou que existem alguns estereótipos bem definidos ligados ao que cada um dos grupos possuem, dependendo das atividades que realizam – mas que não serão lincadas aqui – pois existem aquele grupo que é o mais quieto, o outro que é o mais festeiro, também aquele que é o mais beberrão, dentre outros ainda existentes, criando assim uma interessante área de estudo para o campo da psicologia. Algumas das ações desenvolvidas pelos atores do Turismo de Aventura do Rio Grande do Sul merecem destaque: - I Oficina de Turismo de Aventura do Rio Grande do Sul em 2001. - Entrega de carta de intenções ao Secretário de Turismo em 2003. - Comitê Técnico de Turismo de Aventura de realizado em 2004. - Assinatura da lei Estadual em 2005. 257 - Cursos de Instrutores de Turismo de Aventura em 2005. - II Oficina de Turismo de Aventura em 2006. - Cursos de Condutores de Turismo de Aventura em 2008. Para uma comparação desta cronologia vivenciada no Estado, foi copiado abaixo, uma linha do tempo do Turismo de Aventura no Brasil, extraída do documento digital do Ministério do Turismo, apresentado em uma reunião juntamente com o trade, onde passa uma rápida idéia desta atividade no Brasil: - 1990: Crise no Setor devido ao Governo Collor. - 1992: Acontece a ECO 92 e sociedade volta-se ao meio ambiente. - 1993: Cresce o número de prestadores de serviços. - 1994: Boom no segmento, multiplicação das empresas de TA. - 1995: Início da ocorrência mais freqüente de acidentes envolvendo praticantes do Turismo de Aventura. - 1996: Criação do primeiro grupo voluntário de busca e salvamento. - 1998: Formalização das empresas de TA. - 1999: Realização da primeira Adventure Sport Fair em SP. - 2000: Declínio na demanda por serviços de TA nos pólos. - 2001: Realização da Oficina Nacional em Caeté. - 2003: Criação do GETA – Grupo de Empresários de Turismo de Aventura começa a definição do marco regulatório para o setor de Turismo de Aventura pelo Ministério do Turismo. - 2004: Criação da ABETA – Associação Brasileira de Empresas de Turismo de Aventura. - 2006: Processo de normatização em curso, elaboração de normas transversais e relativas a algumas das atividades de aventura. - 2007: Início Programa Aventura Segura. Podemos perceber que esta cronologia da realidade nacional do Turismo de Aventura, de maneira geral e salvo algumas exceções, aplica-se completamente a realidade do Rio Grande do Sul e também aos períodos que o ele passou durante todos estes anos. Conclusão Como podemos perceber, o Turismo de Aventura é um segmento novo, técnico e de múltiplas áreas envolvidas; ou seja, é necessário que as pessoas 258 envolvidas nesta atividade, tenham uma série de conhecimentos específicos, além dos tradicionais do turismo. Notasse que apesar de ser recente, ao comparar com outros segmentos, já possui um elevado grau de organização e profissionalização de seu trade, principalmente no Estado do Rio Grande do Sul, que já possui um grande caminho percorrido com esta preocupação. Ao analisar a pesquisa realizada no Rio Grande do Sul sobre o Turismo de Aventura, percebesse o quão interessante seria se outros Estados tomassem esta iniciativa e realizassem um estudo semelhante. O conhecimento sobre este segmento em sua região seria ampliado, trazendo dados muito pertinentes, auxiliando assim na prospecção futura sobre o mercado e seus comportamentos, podendo identificar suas vocações e necessidades, auxiliando assim para que se estruturarem adequadamente para o atendimento organizado e seguro de pessoas em suas regiões. Somente assim, estudando, identificando e analisando as características e princípios de cada segmento poderemos ter um maior conhecimento das atividades que estão surgindo e fazendo parte da cadeia turística. Desta maneira, serão beneficiando os empreendedores que terão maiores condições de investir em um empreendimento tendo o conhecimento sobre ele; para seus colaboradores que poderão indicar e auxiliar de forma correta os consumidores na hora de realizar suas compras, bem como os clientes que estarão mais informados sobre as características e peculiaridades de cada segmento, tendo assim a clareza e certeza de estarem adquirindo um produto que realmente satisfaça suas necessidades e concretize seus sonhos. REFERÊNCIAS BAUER, Martim W.;GASKELL George. Pesquisa Qualitativa com texto: imagem e som – Um Manual Prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. Petrópolis, RJ:Vozes, 2002. BERVAN, Pedro Alcino; CERVO, Amado Luiz. Metodologia Cientifica. 5 ed. São Paulo: Prentice Hall, 2002. 259 BRASIL Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Biodiversidade, Diretoria de Áreas Protegidas. Diretrizes para visitação em unidades de conservação. Brasília, 2006. ______ Ministério do Turismo. 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São Paulo: Atlas, 1987. 261 ATIVIDADES FÍSICAS DE AVENTURA NA NATUREZA E SAÚDE: REPRESENTAÇÕES DE ACADÊMICOS INGRESSANTES EM UM CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA Michel Binda Beccalli Escola Superior São Francisco de Assis – ESFA/NUAr Universidade Federal do Espírito Santo – UFES/PPGEF Bolsista CAPES E-mail: [email protected] Resumo O presente estudo objetivou identificar e refletir sobre as representações acerca da saúde e das AFAN, bem como a relação entre ambas, através da utilização de questionário com questões abertas, aplicados aos acadêmicos ingressantes no curso de Educação Física da Escola Superior São Francisco de Assis, demonstrando que tais representações encontram-se fortemente permeadas por um caráter biológico, embora haja indícios de que esse quadro tem se modificado timidamente, apontando para a carência de discussões/reflexões acerca da temática proposta, tanto no âmbito acadêmico quanto para além deste. Palavras-chave: AFAN, saúde, representações. Uma breve aproximação com a temática A saúde tem sido amplamente debatida no atual contexto, independente da concepção que se tenha acerca desta. Devido a tais discussões, ações preventivas tem ganhado expressividade no âmbito da dita Saúde Pública. Contudo, deve-se levar em consideração que o entendimento que se tem acerca da saúde carece de atenção e, portanto, de ser (re)pensado, uma vez que a compreensão que se tem acerca desta se embasa no conceito de doença, ou seja, a compreensão da saúde só é possível, teoricamente, se vinculado ao conceito de doença, sendo antagônico a esta. Embora a Organização Mundial de Saúde tenha dado um importante passo no sentido de assumir que a saúde transcende a doença, foi na I Conferência Internacional Sobre Promoção de Saúde que mudanças significativas acerca da compreensão de tal conceito começaram a se manifestar, embora timidamente disseminadas. A partir desse encontro, foi produzido um documento conhecido como Carta de Ottawa (WHO, 1986) que aponta para paz, habitação, educação, alimentação, renda, ecossistema saudável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade enquanto pré- 262 requisitos básicos para a saúde, a qual deve ser entendida enquanto instância independente e não-antagônica a doença. Nesse contexto, cabe ressaltar que, embora a discussão acerca da saúde se apresente longitudinalmente, a disseminação de tais concepções é dificultada, visto que vivemos em uma sociedade com moldes capitalistas, baseada no consumismo exacerbado, os quais transformam o setor dito de saúde – sendo essa a máscara assumida pelo que se poderia compreender por “setor doença”, conforme apontado por Lefévre e Lefévre (2007) – e a própria saúde – compreendida de maneira reducionista – em mercadoria, através da aquisição de produtos e serviços. Um dos meios para sustentar e potencializar esse nicho de mercado é a mídia, através da publicidade que, de acordo com Moreno (2008, p.8) [...] capta os desejos do público e desenvolve campanhas que captam a atenção, sensibilizam, emocionam. Os cidadãos e cidadãs, reduzidos à dimensão de consumidores, introjetam esses elementos e os transformam em aspiração. Ainda segundo a autora, tais estratégias constroem o que seria um ideal de beleza, o qual [...] cria um desejo de perfeição, introjetado e imperativo. Ansiedade, inadequação e baixa auto-estima são os primeiros efeitos colaterais desse mecanismo. Os mais complexos podem ser a bulimia e a anorexia, além de grande parte do orçamento familiar gasto em produtos e serviços ligados à estética. Moreno (2008, p. 13) Para além do exposto, é necessário destacar que a mercantilização da saúde é acompanhada por um processo de culpabilização do indivíduo por seus próprios hábitos e, portanto, por sua saúde, ou seja, o indivíduo se torna responsável por sua saúde através de seus hábitos de vida, sendo desconsiderada a influência social e ambiental presente na construção de tais hábitos, as quais são caracterizadas por um discurso (neo)liberal que encontra maneiras silenciosas de vigilância constante dos indivíduos, bem como de 263 indução de comportamentos a partir de um discurso normativo silencioso e que se torna “invisível” pelo excesso. Frente e tal realidade, nota-se uma necessidade de se (re)pensar o conceito de saúde em todos os âmbitos, inclusive no tangente ao ambiente escolar e, consequentemente, a Educação Física Escolar. Nesse momento, deve-se voltar as atenções para as Atividades Físicas de Aventura na Natureza (AFAN) enquanto uma possibilidade, no ambiente escolar, de desenvolvimento de reflexão crítica, objetivando fomentar um ambiente propício ao reconhecimento e desenvolvimento de saberes necessários à construção de uma autonomia, no sentido de reflexão crítica, voltada para a promoção de saúde ao invés de prevenção de doenças. Cabe, ainda, ressaltar que o conceito de Promoção de Saúde tratado nesse estudo se embasa nas idéias de Lefévre e Lefévre (2007) e Lefévre (1999) ao considerarem-na como uma proposta de um novo olhar sobre a realidade e os meios de produção de nossa sociedade, sugerindo um aprofundamento na compreensão das relações entre sociedade, saúde e doença. É necessário, ainda, destacar que o processo de ensino-aprendizagem é compreendido a luz de Freire (2009) e Morin (2000) como um espaço dotado de influências múltiplas e, portanto, complexo, e a relação entre Educação Física e Saúde é compreendida de acordo com considerações de Carvalho (2004) e, principalmente, Gomes (2009) ao tratar de tal relação a partir da análise da influência dos conselheiros modernos para a educação do indivíduo saudável, analisados a partir da vertente acadêmica e da vertente midiática. Assim sendo, a formação docente em Educação Física carece de estudos mais aprofundados, no sentido de verificar as inter-relações entre as representações acerca da saúde e das relações destas com as AFAN, visando (re)pesá-la e (re)significá-la através da sensibilização dos acadêmicos em formação inicial para as questões apresentadas até então. Objetivos O presente estudo tem como objetivo geral identificar e refletir sobre as representações acerca da saúde e das AFAN, bem como a relação entre ambas. 264 A partir do objetivo geral, os seguintes objetivos específicos foram estabelecidos: • Identificar as representações dos acadêmicos ingressantes no curso de Educação Física da Escola Superior São Francisco de Assis (ESFA), referente ao semestre letivo 2010/1, acerca da saúde e das AFAN, bem como as inter-relações entre estas; • Analisar as representações supracitadas, estabelecendo inter- relações entre estas, bem como tecendo considerações e reflexões acerca destas; • Tecer considerações e reflexões acerca da formação docente no âmbito da saúde, com ênfase nas possibilidades apresentadas pelas AFAN. Metodologia Caracterização metodológica Em relação a abordagem esse estudo se caracteriza como qualitativo, pois [...] trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.(MINAYO, 2002) Em relação aos objetivos, esse estudo é exploratório e explicativo, uma vez que proporciona maior familiaridade com o material com vistas a torná-lo explícito ou construir conceitos e novas abordagens de utilização. Em relação aos procedimentos técnicos esse estudo se constitui enquanto pesquisa de campo. Como instrumento de coleta de dados foi utilizado um questionário composto por questões abertas. O público-alvo deste estudo é composto por acadêmicos ingressantes no curso de Educação Física, modalidade Licenciatura, da Escola Superior São Francisco de Assis (ESFA) cursando a disciplina de Práxis dos Esportes de Aventura. Foram identificadas e analisadas as representações acerca da saúde e das AFAN, bem como a relação entre ambas, através do uso de questionário, aplicado ao público-alvo do estudo, no início do semestre letivo referente a 265 2010/1, entre os dias 22 e 25 de fevereiro de 2010, com vistas a estabelecer relações entre as representações e tecer considerações e reflexões acerca da formação docente. Para a análise de dados foi contemplada a análise de conteúdo proposta por Minayo (2002) Apresentação e Discussão dos dados A categorização dos dados se deu a partir do agrupamento em eixos temáticos que permeiam as discussões a serem apresentadas, a saber: representações no campo da saúde; representações no campo da Educação Física; representações acerca das AFAN; e A opção por esse tipo de agrupamento se deu a partir das categorias obtidas através dos questionários, bem como de temas recorrentes durante a análise de dados que pudessem proporcionar maiores esclarecimentos acerca da problemática proposta pelo estudo. Representações no campo da Educação Física Embora não seja objetivo desse estudo realizar uma análise aprofundada acerca das representações no campo da Educação Física, tal eixo foi elencado a partir da compreensão das influências que tais representações possam desempenhar nas demais, portanto, foi realizada apenas uma breve caracterização da temática. Na década de 1980 instituiu-se uma espécie de crise de identidade na Educação Física, abordada por Bracht (2003), a qual nos remete a um (re)pensar constante de nossa prática profissional. Contudo, se focarmos a imagem presente no imaginário social acerca da Educação Física, percebemos que esta tem sido vista de maneira precária e reducionista, no sentido de ser compreendida como estudo do movimento humano em diversos contextos, principalmente no esportivo. Tais elementos são explicitados em falas como “Educação Física é o estudo do corpo humano, prática de esporte, lazer”; “[Educação Física] é o estudo sobre esportes em geral”. A partir de tal caracterização, pode-se perceber alguns indícios de alguns elementos que podem permear as temáticas analisadas na seqüência como, por exemplo a visão esportivista e regulamentadora da Educação Física, no sentido de legitimar ou negar determinadas práticas corporais. 266 Representações no campo da saúde As representações apresentadas pelos acadêmicos ingressantes no curso de Educação Física demonstram que a saúde é vista de maneira restrita, com ênfase ao caráter eminentemente biológico do ser humano, apontando para a prática de atividade física, principalmente em seus moldes esportivistas, para que se obtenha saúde, demosntrando o atrelamento da atividade física à saúde para o qual Yara Carvalho (2004) faz um alerta, no sentido de buscarmos perceber as influências que nos levam a realizar tal vinculação, bem como a possibilidade de tal vinculação nem sempre se constituir, efetivamente, enquanto válida. É fundamental destacar que a idéia de se obter saúde está atrelada a uma mercadorização desta, transformando-a em um bem, o qual se tem ou não se tem, conforme nos alerta Lefévre (1999). Embora tal representação tenha sido expressiva (representando cerca de 92% do público-alvo), sendo recorrentes falas como, por exemplo, “saúde é estar bem com seu corpo, bem com seu peso e forma física, comendo de tudo de forma moderada e se exercitando regularmente” faz-se necessário citar que 8% dos entrevistados deixam indícios de uma “compreensão ampliada” no que diz respeito à saúde. Tal fato pode ser observado na fala que segue: “Saúde é estar bem com o seu corpo, com seu organismo sem mal estar, sem dores e principalmente sem tristeza; saúde é estar feliz” Nota-se que os indícios apontam para a eliminação de angústias, as quais são características de nosso modelo social, bem como de nosso tempo, através da intervenção dos chamados “conselheiros modernos”, tratados por Gomes (2009), os quais atrelam um determinado padrão estético e de estilo de vida a um ideal de felicidade. Ainda na perspectiva de Gomes (2009) pode-se inferir que a eliminação das angústias pode estar atrelada a um excesso de escolhas com as quais os indivíduos se defrontam no cotidiano. São muito presentes (72% dos entrevistados) falas que deixam transparecer o papel central do indivíduo em relação a suas escolhas e condutas frente a sua saúde, como, por exemplo, “saúde é cuidar de si mesmo, estar de bem com os outros e consigo mesmo. É levar uma vida correta [...]”; e “[...] não basta você ter saúde e não saber cuidar [...]”. 267 Tal realidade não distoa das constatações feitas por Beccalli e Silva (2009), em estudo realizado com turmas de Ensino Médio, no sentido da dificuldade de se transcender o discurso normativo acerca da saúde presente no imaginário social, apontando para as AFAN como uma possibilidade, nesse sentido. Porém, o estudo supracitado demonstrou que é possível modificar as representações acerca da saúde a partir de intervenções que utilizem as AFAN como meio, embora não devamos desconsiderar que deve haver cautela na utilização das destas atividades, no ambiente educacional, enquanto meio, para que não haja restrição destas a um caráter predominantemente utilitarista. Representações acerca das AFAN As AFAN foram caracterizadas majoritariamente (64%) como atividades com dispêndio energético praticadas em ambientes naturais. Talvez esse fato se deva a uma análise semântica do termo ou a uma recorrência ao conceito que circula no imaginário social, podendo ser observado em falas como “[as AFAN] São atividades físicas praticadas em ambientes naturais”; “[...] são atividades realizadas, como o próprio nome já diz, na natureza, com a finalidade de diversão [...]”. Na última fala destacada, pode-se perceber a relação estabelecida entre as AFAN e a informalidade inerente a sua prática, por não assumir caráter performático e/ou competitivo. Cabe ressaltar, ainda, que as AFAN foram citadas pelos 36% restantes da pesquisa como uma maneira de fugir do estresse presente na vida cotidiana, inerente à modernidade. Cabe ressaltar que o contato eminentemente acadêmico do público-alvo deste estudo com as AFAN está em fase inicial de construção, o que talvez contribua para a presença fortemente marcada por traços do imaginário social. Inter-relações AFAN e saúde A partir desse eixo temático, foi possível perceber a forte presença de contribuições das AFAN no campo da saúde a partir de benefícios eminentemente bio-fisiológicos, embora 16% dos pesquisados tenham apontado para benefícios na esfera psicológica através de falas como “[as AFAN] ajudam a fugir do estresse do dia-a-dia. Você sente um bem-estar muito grande quando pratica essas atividades”. Embora nosso meio nos conduza a uma restrição de compreensão acerca da saúde a moldes biológicos, a transcendência desse cerceamento é 268 fundamental para que se compreenda o meio social no qual vivemos. Estudos como o de Beccalli e Silva (2009) tem apontado para as AFAN como um meio para que ser humano e ambiente se (re)aproximem, através da (re)criação de laços de identificação e sensibilização dos indivíduos para as questões levantadas; e para que a saúde seja tratada de maneira holística nesse contexto. Contudo, deve-se ponderar que, embora fundamental, a discussão acerca das AFAN e suas influências no âmbito da saúde não devem restringirse ao meio acadêmico, havendo necessidade de transcendência para os mais diversos meios, inclusive, o ambiente escolar. Talvez a restrição das relações das AFAN no âmbito da saúde tenham se apresentado de tal maneira por uma restrição presente na compreensão acerca da saúde, conforme apresentado anteriormente. Contudo, é necessário ressaltar que a formação acadêmica do público-alvo deste estudo ainda se encontra em fase embrionária e, portanto, fortemente marcada pelas construções realizadas a partir da Educação Básica, a qual precisa ser repensada, principalmente no tangente à Educação Física. Considerações finais Ainda são raros estudos que busquem compreender as relações entre as AFAN e a saúde e acreditamos ser necessário que se compreenda como as representações aqui evidenciadas se desconstroem e se (re)constroem através da formação inicial, bem como a concretização de tais concepções no ambiente da práxis educativa, no espaço escolar e para além deste. As discussões acerca da saúde ainda carecem de atenção no ambiente acadêmico, bem como contextualizações desse tipo de discussão nos mais diversos âmbitos, inclusive no tangente à Educação Física e, conseqüentemente, às AFAN. As representações acerca da saúde, bem como das AFAN é fortemente marcada pelo discurso presente no imaginário social e que talvez possa ser atribuído a uma discussão/reflexão deficitária das AFAN no ambiente escolar e para além deste. A formação inicial pode representar um obstáculo em relação a esse ponto destacado, visto que a inclusão das AFAN na matriz curricular dos cursos de Educação Física no estado do Espírito Santo ainda se manifestam de maneira embrionária. Cabe ressaltar, também, o papel 269 fundamental do professor de Educação Física, o qual não deve limitar-se ao espaço e aos materiais que possui disponíveis para sua intervenção no espaço escolar, camuflando-se através da máscara da falta de apoio e materiais enfrentada no ambiente escolar. Contudo, não se quer transferir a responsabilidade única e exclusivamente ao professor, visto que esse necessita de apoio da comunidade escolar e dos órgãos governamentais para potencializar sua prática. Ou seja, o professor deve exigir condições mínimas para que possa atuar no ambiente escolar, porém, não deve cercear sua atuação pelos limites que lhe são impostos. Embora este estudo se limite a verificar as representações em voga em acadêmicos ingressantes no curso de Educação Física, carece de continuidade, no sentido de verificar as influências sofridas por estas – caso haja alguma – durante o processo de formação inicial. Portanto, as reflexões apresentadas não visam limita-se ao já alcançado, mas transcendê-las para que se tenha uma compreensão mais aprofundada da temática, ou seja, representa um primeiro passo de um logo caminho a ser trilhado. REFERÊNCIAS BECCALLI, M. B. e SILVA, A. Atividades Físicas de Aventura na Natureza e Saúde: novas perspectivas. In: IV Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura. Mucugê - BA, 2009. BRACHT, V. Identidade e crise da Educação Física: um enfoque epistemológico. In: BRACHT, V. e CRISORIO, R. (coord.). A Educação Física no Brasil e na Argentina: identidades desafíos e perspectivas. Campinas, SP: Autores Associados; Rio de Janeiro: PROSUL, 2003. CARVALHO, Y. M. O “mito” da atividade física e saúde. 3 ed. São Paulo: Hucitec, 2004. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo. Paz e Terra, 1996. GOMES, I. M. Conselheiros modernos: propostas para a educação do indivíduo saudável. Brasília: Thesaurus, CBCE, 2009. LEFÈVRE, F. Mitologia sanitaria: saúde, doença, mídia e linguagem. São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo, 1999. _______ e LEFÈVRE, A. M. C. Promoção da saúde: a negação da negação. Rio de Janeiro: Vieira e Lent, 2004. 270 MINAYO, M. C. S. (org). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 20 ed. Petrópolis: Vozes, 2002. MORENO, R. A beleza impossível: mulher, mídia e consumo. São Paulo: Ágora, 2008. MORIN, E. Os sete saberes necessário à educação do futuro. São Paulo: Cortez, Brasília: UNESCO, 2000. WHO 1986. Carta de Ottawa, pp. 11-18. In Ministério da Saúde/FIOCRUZ. Promoção da Saúde: Cartas de Ottawa, Adelaide, Sundsvall e Santa Fé de Bogotá. Ministério da Saúde/IEC, Brasília. 271 OS ESPORTES DE AVENTURA DA ESCOLA: O SLACKLINE Eliete Maria Silva Cardozo Universidade Estácio de Sá – RJ – Brasil Julio Vicente da Costa Neto Universidade Estácio de Sá – RJ – Brasil E-mail: [email protected] Resumo A partir do cenário esportivo da atualidade observamos que os esportes de aventura circulam na cultura brasileira fazendo parte do imaginário das crianças, jovens e adolescentes que frequentam as escolas e, consequentemente, podem estar inseridos no grupo de esportes desenvolvidas nas aulas de Educação Física escolar. Dentre os esportes de aventura optamos por estudar o slackline, um esporte que se realiza em suspensão, tendo como objetivo que o praticante se desloque em equilíbrio sobre uma fita esticada na horizontal, ancorada em dois pontos diferentes, distante do solo. Os objetivos da pesquisa estão relacionados a conhecer os sentidos da prática do slackline nas aulas de Educação Física escolar e relacionar a prática do slackline com os conteúdos da Educação Física escolar. O estudo tem o perfil de pesquisa descritiva e de abordagem qualitativa e a amostra do estudo é formada por um grupo de 40 alunos, do primeiro ao quinto ano, lotados em duas escolas do Ensino Fundamental, da rede pública e privada, localizadas na Zona Oeste e Zona Sul da Cidade do Rio de Janeiro. A primeira etapa da coleta de dados está relacionada à prática do slackline com os conteúdos sugeridos para este período do Ensino Fundamental. A segunda etapa, ainda em andamento, consta do registro de expressões que os alunos utilizam para representar os seus sentimentos no momento da prática. Para relacionarmos a prática do slackline com os conteúdos sugeridos para este período do Ensino Fundamental utilizamos como referência as habilidades motoras, sociais, afetivas, intelectuais, perceptivas e simbólicas, apresentadas na Reorientação Curricular de Educação Física (2006). No que diz respeito aos aspectos motores identificamos que a prática do slackline inclui as habilidades motoras de deslocamento e de estabilização. Os aspectos sociais marcaram a sua presença com a cooperação entre os participantes. Nos momentos iniciais discutimos temas como a agressividade e violência, posteriormente passamos a identificar traços de fraternidade e confiança. Os aspectos intelectuais se sobressaíram ao criarem táticas e recorrerem aos diálogos. As noções de tempo, espaço e do próprio corpo trouxeram a presença das habilidades perceptivas e, conforme amadureciam, a imaginação começou fluir. O slackline desenvolvido nas aulas de Educação Física escolar contribui para estimular o desenvolvimento das habilidades motoras, sociais, afetivas, intelectuais, perceptivas e simbólicas, atende aos interesses, desejos e necessidades dos alunos, em consonância com os conteúdos específicos das séries pesquisadas. É papel do professor identificar as atividades que circulam entre os diferentes grupos culturais, avaliá-las, relacioná-las com a realidade escolar, discutir com seus alunos e experimentar aquelas que forem consideradas adequadas para o momento. Nesse sentido, percebemos que o slackline é um 272 esporte relaltivamente novo, começa a fazer parte da cultura do carioca, os alunos demonstram interesse em praticá-los durante as aulas de Educação Física. Palavras-Chave: Slackline, Educação Física escolar, Esportes de Aventura da Escola. Introdução A transformação social ocorrida com o progresso científico e tecnológico mostra que há uma mobilidade que conduz as pessoas a viajarem, aproveitando-se de todas as oportunidades que surgem para fugir do cotidiano. Curtas ou longas escapadas em fins de semana, feriados ou férias, acontecem como se obedecessem a um chamado, seja da indústria cultural do lazer ou de um desejo de errância32, como sede do infinito (MAFFESOLI, 2001). Essas viagens de lazer parecem acontecer no dias atuais como uma tendência de aproximar o homem da natureza, como pode ser visto em Da Costa (1997), quando nos diz que “o retorno à ordem universal da natureza, antes postulada por Rousseau como um reencontro do homem consigo mesmo, tem se revigorado nas últimas décadas no interior do próprio conhecimento científico” (p. 62). Assim, a idéia de sair da rotina do estudo ou do trabalho sugere que os sujeitos busquem diferentes caminhos para atenderem a esse chamado. O homem contemporâneo demonstra ter experimentado uma vida que não permitiu a fruição de seus desejos e prazeres, limitando a sua capacidade sensível. O prazer de consumir, que passou a ocupar parte da vida do homem, parece não lhe satisfazer tanto; por isso, emerge o desejo de romper com a sociedade moderna, que organizou a sua vida racional e mecanicamente, e buscar o imaterial em diferentes caminhos (CARDOZO, 2006). Atualmente, surgem pistas de que o sentido de ocupar o tempo livre se desloca parcialmente para o esporte de aventura, repleto de sentidos lúdicos, que passa a ser uma tendência de vários grupos de diferentes lugares do planeta. Esses aventureiros transgridem os limites possíveis, confiando na sua 32 Para Maffesoli (2001), errância é a expressão de uma outra relação com o outro e com o mundo, menos ofensiva, mais carinhosa, um tanto lúdica, e seguramente trágica, repousando sobre a intuição da impermanência das coisas, dos seres e de seus relacionamentos. 273 capacidade de fazer e, por fim, resplandecer de excitação e prazer na sua realização (COSTA, 2000). A partir do cenário esportivo da atualidade observamos que os esportes de aventura circulam na cultura brasileira, fazendo parte do imaginário das crianças, jovens e adolescentes que frequentam as escolas e, consequentemente, podem estar inseridos no grupo de esportes desenvolvidas nas aulas de Educação Física escolar. Alguns documentos indicam pistas que respaldam esta inserção, como a Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, 1998), a Multieducação: O ensino de Educação Física (SME / RJ, 2008), entre outros. Nesse sentido passa a ser importante nos aproximaremos dos conceitos de esportes de aventura, esportes radicais e esportes na natureza, com a intenção de construirmos o cenário dos esportes de aventura no espaço da escola. Segundo Manuel Gomes Tubino, Fábio Mazeron Tubino e Fernando Antonio Cardoso Garrido, no Dicionário Tubino do Esporte, publicado no ano de 2007, mostram que os esportes de aventura, na natureza e radicais são entendidos como: Esportes de Aventura - são modalidades esportivas que se caracterizam pelo controle de grandes desafios relacionados a perigos, que são impostos aos praticantes por causa das incertezas pertinentes ao desenvolvimento das mesmas. O risco é uma das características marcantes dos esportes de aventura, são praticados na terra, água, ar, gelo/neve. Em todos os locais de suas práticas necessita-se de material adequado para a segurança e o desenvolvimento do mesmo (p.44). Esportes na Natureza - é um conjunto de modalidades esportivas praticadas na natureza, na perspectiva do lazer e do desempenho, com o compromisso de não prejudicá-la. Pode ser desenvolvido na terra, montanha, areia, ar, água, neve/gelo. Os esportes ecológicos, que conduzem os seus praticantes a uma convivência saudável, de respeito, preservação, para que se crie um vínculo entre ser humano e a natureza conscientizando aos seus usuários a importância da mesma para a vida humana (p.45). 274 Esportes Radicais - são esportes que se caracterizam pela ação arriscada e manobras arrojadas (radicais). São desenvolvidos individualmente, embora existam trabalhos em equipe. São desenvolvidos na terra, ar, água, neve e gelo (p.45) . Esses autores fazem a distinção entre Esportes de Aventura e Esportes na Natureza, mas por outro lado encontramos a Resolução n. 18 de 9 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Esportes, não fazendo essa distinção pelo fato de considerarem os Esportes de Aventura realizados em ambientes naturais conforme pode ser observado a seguir: Esporte de Aventura - conjunto de práticas esportivas formais e não formais, vivenciadas em interação com a natureza, a partir de sensações e de emoções, sob condições de incerteza em relação ao meio e de risco calculado. Realizadas em ambientes naturais (ar, água, neve, gelo e terra), como exploração das possibilidades da condição humana, em resposta aos desafios desses ambientes, quer seja em manifestações educacionais, de lazer e de rendimento, sob controle das condições de uso dos equipamentos, da formação de recursos humanos e comprometidas com a sustentabilidade sócio-ambiental. Esporte Radical - conjunto de práticas esportivas formais e não formais, vivenciadas a partir de sensações e de emoções, sob condições de risco calculado. Realizadas em manobras arrojadas e controladas, como superação de habilidades de desafio extremo. Desenvolvidas em ambientes controlados, podendo ser artificiais, quer seja em manifestações educacionais, de lazer e de rendimento, sob controle das condições de uso dos equipamentos, da formação de recursos humanos e comprometidas com a sustentabilidade sócio-ambiental. Em relação aos Esportes de Aventura desenvolvidos nas aulas de Educação Física Escolar utilizaremos os termos Esporte de Aventura na Escola Indoor, Esporte de Aventura na Escola Outdoor e Esporte de Aventura da Escola (EADE). O Esporte de Aventura na Escola Indoor acontece no contexto escolar com a intenção de atender aos conteúdos das aulas de Educação Física, mantendo a maior aproximação com as suas características e regras oficiais. 275 Por sua vez, o Esporte de Aventura da Escola Outdoor, é desenvolvido fora do contexto escolar, no seu ambiente natural, com a intenção de atender aos conteúdos das aulas de Educação Física. Por fim, o Esporte de Aventura da Escola (EADE) é transformado e adequado para o contexto das aulas de Educação Física, de acordo com a cultura local, procurando atender aos interesses, desejos e necessidades do educando e do contexto escolar, com a intenção de estar de acordo com os conteúdos das aulas de Educação Física. A prática dos esportes de aventura começa a se configurar como uma das oportunidades que os homens possuem de se afastarem, mesmo que temporariamente, das pressões do cotidiano. A vida moderna é cercada por normas e regras rígidas, que mantém os acontecimentos rigorosamente planejados e os compromissos do dia-a-dia aumentam cada vez mais. Todos têm muitos compromissos e parece que cumprem de forma automática, se afastando do prazer, do hábito de lidar com as coisas imprevisíveis e usar a imaginação para solucionar esse imprevisto. Assim, a inclusão desses esportes nas aulas de Educação Física escolar vai contribuir para que o aluno se afaste da rotina da escola, que nas últimas décadas não atende muito as suas necessidades. Para Le Breton (1996) a aventura “desperta a infância: sonhos imemoráveis de partida, explorações impensáveis, explorações inusitadas contrapostas a batalhas imaginárias; desejo de se livrar de si para ascender à plenitude, à incandescência de existir” (p.10). No mesmo caminho, o conceito de aventura defendido por Simmel (1988) está relacionado a uma misteriosa necessidade de o sujeito viver algo isolado ou acidental, que produz um sentido significativo para si, vinculando-se à sua essência e transcendendo aos encantamentos racionais da vida. Alerta ainda o autor que, para essa vivência, é preciso que o sujeito entre em jogo com o objeto da aventura, que se configura de forma acidental. O desejo de ser capturado pela aventura que invade as massas e os indivíduos demonstra ter a intenção de preencher o espaço dos desejos e dos prazeres reprimidos. Essa aventura rompe com a rotina do sujeito, levando-o a se emocionar e a se espantar com a história da sua própria vida, com os 276 acontecimentos que o cercam e com os sentidos que passam a fluir no ato da aventura, com a imaginação criadora (COSTA, 2000). Podemos perceber que na prática dos Esportes de Aventura o praticante é despertado por um desejo misterioso de livrar-se de si mesmo, entrando num espaço desconhecido onde o sujeito e o objeto jogam um com o outro, arrancando a sorte exterior de sua necessidade interna, um jogo que parece incitá-lo à busca de si mesmo junto à energia da natureza que envolve o ambiente natural em que o Esporte de Aventura é desenvolvido. Esses esportes podem ser praticados em diferentes ambientes naturais, como ar, a água, a neve, o gelo, a areia e a terra, que se subdividem em esportes de deslize, imersão, de verticalidade, de suspensão, de exploração e de vôo. O nosso estudo apresenta o slackline caracterizado como um esporte que se realiza em suspensão, tendo como objetivo que o praticante se desloque em equilíbrio sobre uma fita esticada na horizontal, ancorada em dois pontos diferentes, distante do solo. O slackline é um esporte relativamente novo e a partir de conversas com escaladores, entrevistas apresentadas na Rede Globo de Televisão, na Rede Sport TV, consultas a sites especializados em slackline, como o Multinauta, o Slackline.com, Slackline Brasil, Da o Beta, entre outros, identificamos que o surgimento do slackline ainda encontra-se em pesquisa, mas vale conhecer as informações constantes no site Multinauta mostrando a existência de indícios de que: O Slackline surgiu no ínicio de 1980 com o escalador Adam Grosowsky, na Califórnia, que, em 1983, acompanhado de Jeff Ellington, decidiu ancorar uma "fita" de escalada de seu equipamento em dois pontos distantes na posição horizontal no "Lost Arrow Spire" a 3000 metros de altura, no entanto não se arriscaram a executar a travessia. Em 1985, Scott Balcom realizou a travessia da, já famosa, linha de Slackline. Contudo, não podemos esquecer as informações que circulam entre os escaladores. Dizem que o slackline surgiu nos anos 80, na California, em um momento que não existia condição para a prática da escalada e um grupo de escaladores esticou suas fitas, fixadas em pontos distintos, utilizando as 277 técnicas de ancoragem e começaram a se equilibrar sobre essas fitas, descobrindo que estavam treinando para um melhor desempenho no momento da prática da escala. O slackline também aparece relacionado à atividade circense conhecida como “corda bamba”. Mas não importa, seja no picadeiro, entre duas estruturas de material processado, entre montanhas, sobre um cânion, entre árvores, sobre o mar, próximo ao solo ou muito distante, o importante é que essa atividade está conquistando adeptos em todo o mundo. O material utilizado inicialmente para a sua prática era o mesmo da escalada, as fitas, os mosquetões, as polias e os blocantes mecânicos para a execução do sistema para esticar a fita. Com a evolução do esporte foi preciso maior tensão para a fita e recorreu-se ao aço inoxidável no lugar do alumínio. Nos dias atuais o kit é formado por duas fitas de fixação reguláveis com fivelas de inox, uma com a fita tubular de 25 mm / 50 mm com 20 m e a outra com uma catraca para esticar a fita. Mesmo com toda a evolução do esporte, para iniciar a prática é possível recorrer aos equipamentos da escalada. O esporte slackline encontra-se organizado em modalidades e observase uma grande variedade, entre elas selecionamos o trickline, o waterline, o highline, o yoga slackline, longline e o jumpline. O trickline é a modalidade que prioriza as acrobacias realizadas sobre a fita, incluindo diferentes tipos de saltos e é também conhecido por ser o estilo livre do slackline, o freestyle slacklining. O waterline é realizado com a fita estendida sobre a água dos rios, lagos ou mares. Por sua vez, o highline, como o próprio nome sugere, acontece em local muito alto, proporcionando um risco visível e uma visão panorâmica deslumbrante. Na modalidade yoga slackline o praticante utiliza sobre a fita as técnicas de meditação e relaxamento usadas no yoga. O longline se caracteriza por ser realizada numa fita muito longa. E, por fim, o jumpline, ele utiliza uma corda elástica bem tensionada, onde o praticante pode executar diferentes tipos de saltos, inclusive os mortais e lembra as acrobacias realizadas em uma cama elástica. A movimentação corporal desenvolvida sobre a fita também começa a ganhar denominação e podemos citar o drop sentado, o jump e o yoga. No drop sentado o praticante parte da posição sentado na fita para a posição em pé, e em seguida inicia o seu deslocamento sobre a fita. O jump se caracteriza 278 pela execução de um salto e o retorno ao mesmo ponto de partida. O yoga está relacionado a executar algumas técnicas do yoga sobre a fita, entre outras denominações que começam a ganhar espaço. Apesar de toda a evolução das táticas, das técnicas e dos equipamentos, característica da velocidade com que as informações circulam no mundo tecnológico, vivenciar o slackline não é difícil, basta duas árvores no quintal, o espaço entre elas próximo a cinco metros, cruzar uma fita bem ancorada, aproximadamente a cinquenta centímetros do solo e em uma tarde é possível cruzar esse percurso. Outro ponto que vale ser destacado está relacionado aos sentidos produzidos a partir da prática do slackline, tanto para os iniciantes quanto para os veteranos do highline, todos são unânimes em relacionar esse novo esporte ao desenvolvimento da concentração, do equilíbrio estático e dinâmico, das técnicas de respiração, da capacidade de se distanciarem dos fatos do cotidiano, da paz de espírito e tudo isso tendo início com o desafio do deslocamento sobre a fita. Face ao exposto, observamos que o slackline passa a fazer parte da cultura esportiva do brasileiro e surge a necessidade de conhecermos os sentidos dessa prática esportiva no cotidiano escolar e as possíveis contribuições para o desenvolvimento dos conteúdos da Educação Física escolar. Objetivo • Conhecer os sentidos da prática do slackline nas aulas de Educação Física escolar. • Relacionar a prática do slackline com os conteúdos da Educação Física escolar Método O estudo tem o perfil de pesquisa descritiva e de abordagem qualitativa que, segundo Bauer e Gaskell (2002), “lida com interpretações das realidades sociais” (p.23). A pesquisa qualitativa busca compreender os significados e as características das situações apresentadas pelo estudo, apreendendo a dinâmica e a complexidade dos fenômenos sociais em seu contexto natural 279 (LÜDKE e ANDRÉ, 1986). Tal procedimento, de acordo com Peña e Echeverry (2000), possibilita a compreensão do conhecimento cultural, percebendo-o como uma dimensão ecológica do social, considerando a visão do interior da trama social e como esta à afeta. O estudo de natureza descritiva visa à busca do conhecimento de inúmeras situações e relações que ocorrem na vida sociopolítica-econômica e nos demais aspectos do comportamento humano, como de grupos e comunidades, descrevendo suas características, propriedades e relações existentes. A amostra do estudo é formada por um grupo de 40 alunos, do primeiro ao quinto ano do Ensino Fundamental, que freqüentam duas escolas, uma pública e outra privada, localizadas na Zona Oeste e Zona Sul da Cidade do Rio de Janeiro. As atividades tiveram início no mês de abril, uma vez por semana, intercaladas com as aulas que constavam no planejamento das turmas. A prática do slackline foi planejada a partir dos princípios do EADE (Esportes de Aventura da Escola), que segundo Cardozo e Costa Neto (2009) são entendidos como esportes de aventura reinventados para o contexto das aulas de Educação Física, de acordo com a cultura local, procurando atender aos interesses, desejos e necessidades do educando e do contexto escolar, com a intenção de estar de acordo com os conteúdos das aulas de Educação Física. O planejamento das atividades de aventura segue as cinco etapas sugeridas por Cardozo e Costa Neto (2009): a reflexão sobre o meio ambiente, os equipamentos utilizados, a movimentação básica, a análise do risco e a prática da atividade. Na primeira etapa refletimos sobre o meio ambiente, o local em que iríamos fazer fixação do slackline. As árvores foram protegidas com papelões, as demais estruturas foram analisadas para não causarmos danos e foram protegidas de acordo com a necessidade. Em seguida apresentamos o slackline, uma fita em nylon, de aproximadamente cinco centímetros de largura e a catraca que faz a tensão da fita. O equipamento foi manuseado e experimentado por todos os alunos. Passamos alguns filmes para que conhecessem a história do slackline e também tivessem a oportunidade de ver alguns praticantes experientes e 280 iniciantes executando a atividade, já que os professores envolvidos na pesquisa estavam experimentando juntamente com os alunos. Na terceira etapa iniciamos a progressão pedagógica. Simulamos situações de equilíbrio estático e dinâmico, explorando o espaço da escola. Nesse momento utilizamos caminhos de paralelepípedo, bancos, cordas, pernas de três simulando pontes estreitas e muito mais que a imaginação permitiu. A partir dessas experiências começamos a pensar nos riscos que envolvem a prática do slackline e logo foi identificada a necessidade de forrar com colchonetes para amortecer as possíveis quedas. A prática da atividade aconteceu inicialmente com a fita a 50 centímetros do solo e estamos seguindo a seguinte sequência: experimentar o equilíbrio sentado com os pés no chão, sentado sem os pés no chão, em pé sobre a fita apoiando em um colega, em pé sobre a fita recebendo o auxílio para o equilíbrio, em pé sobre a fita com deslocamento sem auxílio. A coleta de dados está acontecendo em duas etapas. A primeira etapa aconteceu durante as duas primeiras semanas de prática, os dois professores de Educação Física, regentes das turmas, relacionaram a prática do slackline com os conteúdos sugeridos para este período do Ensino Fundamental. A segunda etapa, ainda em andamento, é o período em que estão sendo registradas, em fichas criadas para cada turma, as expressões verbais que os alunos utilizam para representar os seus sentimentos no momento da prática. Para relacionarmos a prática do slackline com os conteúdos sugeridos para este período do Ensino Fundamental utilizamos as habilidades organizadas em motoras, sociais, afetivas, intelectuais, perceptivas e simbólicas, conforme consta na Reorientação Curricular de Educação Física (2006) quando apresenta: MOTORES - Motores de deslocamento – andar, correr, saltar, desviar, rolar, girar, abaixar, levantar, contornar, subir, descer e escorregar. Motores de manipulação – segurar, lançar, chutar, bater, rebater, equilibrar, apertar, afrouxar e tocar. Motores de estabilização – equilibrar-se, ficar em pé, ficar deitado, ficar agachado, apoiar-se e imobilizar-se. Motores desportivos – desarmar, driblar, fintar, cabecear, passar, finalizar, conduzir, antecipar e controlar. 281 SOCIAIS - Cooperar, solidarizar-se, organizar grupos, discutir temas, competir e construir regras. AFETIVOS - Amor, altruísmo, agressividade, violência, fraternidade e confiança. INTELECTUAIS - Táticas, diálogos, teorias, textos, tomada de consciência da prática, imitações e criações. PERCEPTIVOS - Sensibilidade, noção de tempo, noção de espaço e noção do próprio corpo. SIMBÓLICOS – Imaginação (p. 190). Os dados da segunda etapa, registro das expressões verbais que os alunos utilizam para representar os seus sentimentos no momento da prática, serão analisados seguindo a técnica da Análise do Discurso. Recorremos ao método de Análise do Discurso (AD) proposto por Orlandi (2001), procurando conhecer os nossos alunos como sujeitos que possuem uma linguagem própria e uma história que tem início nos primórdios de nossos ancestrais. O discurso é entendido por Orlandi (2001), de forma etimológica, como tendo em si “a idéia de curso, de percurso, de correr por e de movimento. O discurso é, assim, palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso escuta-se o homem falando” (p.15). Portanto, o aluno para discursar utiliza-se de um sistema de signos e regras formais, organizando sua comunicação verbal através da linguagem, fazendo a mediação entre ele mesmo e a realidade natural e social. Por sua vez, a AD vai compreender a linguagem como produtora de múltiplos sentidos, carregada de significado (sua parte invisível, indizível), levando em conta o homem e sua história. Resultados Parte da coleta de dados está em andamento e apresentaremos apenas os resultados da primeira etapa, a relação da prática do slackline com os conteúdos sugeridos para este período do Ensino Fundamental. No que diz respeito aos aspectos motores identificamos que a prática do slackline inclui as habilidades motoras de deslocamento e de estabilização. As habilidades motoras de deslocamento que mais se aproximaram da atividade estão relacionadas ao andar, saltar, girar, abaixar, levantar, contornar, subir e descer. Por sua vez, equilibrar-se, ficar em pé, e ficar agachado foram destacados nas habilidades de estabilização. 282 Os aspectos sociais marcaram a sua presença a partir do momento em que surgiu a necessidade de um aluno ajudar o outro para iniciar o equilíbrio sobre a fita, ficando evidente que sem a cooperação dos participantes a atividade não aconteceria. Em seguida foram construídas regras para que a atividade fluísse em harmonia e todos pudessem usufruir dos benefícios. Nos momentos iniciais discutimos temas como a agressividade e violência de alguns alunos, mas as dificuldades para executar de forma adequada a passagem sobre a fita, que surgiam a cada tentativa, contribuíram para que as atenções ficassem voltadas para a atividade e passamos a identificar traços de fraternidade e confiança. Os aspectos intelectuais se sobressaíram com a tomada de consciência das dificuldades encontradas para atravessar a fita, criaram táticas, recorreram aos diálogos, imitaram uns aos outros e criação começou a fluir. As noções de tempo, espaço e do próprio corpo trouxeram a presença das habilidades perceptivas e, conforme amadureciam, a imaginação começou fluir e chegaram a imaginar que estavam atravessando de uma grande montanha a outra. Conclusão O slackline desenvolvido nas aulas de Educação Física Escolar contribui para estimular o desenvolvimento das habilidades motoras, sociais, afetivas, intelectuais, perceptivas e simbólicas, atende aos interesses, desejos e necessidades dos alunos, em consonância com os conteúdos específicos das séries pesquisadas, de acordo com a Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, 1998) e a Multieducação: O ensino da Educação Física (SME / RJ, 2008). É papel do professor identificar as atividades que circulam entre os diferentes grupos culturais, avaliá-las, relacioná-las com a realidade escolar, discutir com seus alunos e experimentar aquelas que forem consideradas adequadas para o momento. Nesse sentido, percebemos que o slackline é um esporte relaltivamente novo, começa a fazer parte da cultura do carioca e os alunos demonstram interesse em praticá-los durante as aulas de Educação Física. 283 REFERÊNCIAS ALONSO, H. A. G.; CARDOZO, E. M. S.; SILVA, A. L. C. E. ; ESTEVES, A. C. B. Reorientação Curricular / Educação Física. In: Marta Feijó Barroso; Mônica Mandarino. (Org.). Reorientação Curricular. 1ª ed. Rio de Janeiro: Secretaria Estadual de Educação, 2006. BACHELARD, G. A terra e os devaneios da vontade. São Paulo: Martins Fontes, 1991. BAUER, M. W; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático, 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. 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EM CENA A OPINIÃO DOS EDUCADORES PARTICIPANTES DO PROGRAMA DE EXTENSÃO ESFA PORTAS ABERTAS Andréia Silva, Graciele C. Kippert, Jéssica A Merlo Escola Superior São Francisco de Assis, Santa Teresa – ES/Brasil E-mail: [email protected] O objetivo do presente artigo foi refletir sobre a opinião dos educadores participantes do programa ESFA Portas Abertas quanto as possibilidades pedagógicas das Práticas Corporais de Aventura na Natureza, além de discutir sobre as possíveis limitações e contradições presentes nessa inserção no contexto escolar. Através do referido programa analisamos essas opiniões, por meio de uma pesquisa qualitativa, do tipo exploratória e explicativa, com procedimento de pesquisa de campo. Como instrumentos de investigação utilizamos a análise documental, entrevista e observação participante. Através dos dados obtidos podemos considerar que o programa possui amplas possibilidades pedagógicas segundo a opinião dos educadores que, no entanto não são perpetuadas no dia a dia escolar. Fatores como discursos ecologicamente pedagógicos, perpetuações de modismos, formação profissional, infra-estrutura escolar, falta de equipamentos e o entendimento restrito sobre a área da Educação Física escolar são questões que merecem uma análise mais aprofundada para que possamos realmente falar de uma educação pela aventura através dessas práticas corporais, umas vez que, tais fatores influenciam em seu desenvolvimento. Atentamos ainda que, o programa ESFA Portas Abertas embora possibilite elementos pedagógicos, poderá tornar-se uma opção meramente recreacional para seus participantes se não levar em consideração a continuidade de suas ações para o cotidiano escolar em parcerias com essas escolas. Entende-se nesse processo que a educação para e pela aventura deva ser perpetuada no espaço escolar através de seus docentes. Palavras Chave: Práticas Corporais de Aventura na Natureza, Educação, Educação Física Introdução O presente artigo teve sua origem nos estudos realizados através do Programa de Iniciação Científica fomentado pela Escola Superior São Francisco de Assis/ESFA no ano de 2009, intitulado “A inserção das Práticas Corporais de Aventura na Natureza nas aulas de Educação Física Escolar: contribuições do Programa ESFA Portas Abertas.” Dentre a gama de resultados e debates obtidos nessa oportunidade, visamos polemizar a opinião dos educadores participantes do referido Programa, quanto as possibilidades e 286 limitações pedagógicas das práticas corporais de aventura na natureza PCAN’s. O Programa ESFA Portas Abertas possui 05 anos de existência e é desenvolvido atualmente pelo curso de Educação Física e Laboratórios da ESFA, atendendo anualmente cerca de 2.000 a 2.500 participantes, dentre eles, escolares de todos os níveis de ensino, empresas, ongs, dentre outros. Seu objetivo principal é proporcionar aos alunos da rede pública e privada da região centro-serrana do Espírito Santo, vivências nas PCAN’s e visitações/aulas nos laboratórios de química, anatomia humana, microbiologia, ecologia e fisiologia da Instituição, com o intuito de possibilitar atividades que venham a melhorar o processo educativo dessas escolas e o autoconhecimento desses alunos. O Programa destaca que o oferecimento das PCAN’s para as escolas tem como respaldo a necessidade de repensar o processo ensinoaprendizagem, não apenas como uma ação isolada e centrada no professor, mas como um processo de parceria onde docente, discente, comunidade e entidades, atuem em prol da melhoria qualitativa e quantitativa do ensino (SILVA e MILLI, 2005). Por se tratar de um Programa de extensão compreendemos que possui vários avanços, limitações e contradições. Diante disso ponderamos segundo contribuições de Freire (1992), que um programa de extensão não deve mostrar apenas a presença dos conteúdos estendidos, pois dessa forma não servirá para aqueles que o captam, uma vez que eles apenas os vêem, não praticam, portanto não podem utilizá-los. Dessa forma, o Programa visa, conforme explanado em seus objetivos proporcionar a vivência a todos os participantes, buscando estimular sensações, emoções, que podem iniciar um processo de sensibilização não só em relação a reflexão de valores, mas igualmente para novas relações com o meio ambiente. Pondera-se ainda que, muitas vezes o conteúdo apresentado, no caso as PCAN’s, não refletem a realidade de quem os assistem. Nesse sentido, é necessário possuir conforme relata o autor, uma percepção cultural sobre o público atendido, suas aspirações, histórias e, principalmente, da realidade escolar em que estão inseridos. 287 Através dessa compreensão e da construção de uma ação metodológica que a contemple é que poderemos realmente ultrapassar o discurso das possibilidades pedagógicas teorizadas das PCAN’s e, confrontar as experiências reais com as opiniões de quem vive, no caso dessa pesquisa, o dia a dia do espaço escolar: o professor. Acreditamos que a partir de tal confronto, será possível a construção de novas propostas, iniciativas e a quebra de paradigmas e discursos “ecologicamente pedagógicos”. Importante salientar que, enquanto educadores e pesquisadores da área do lazer de aventura acreditamos nas possibilidades pedagógicas das PCAN’s, as quais conforme afirma Marinho (2003), constituem-se em práticas promissoras no espaço educacional, podendo assumir um caráter inter e transdisciplinar, que contribui na construção do conhecimento mais amplo e assimilável, criando laços mais estreitos entre o ser humano e natureza. Poderamos, no entanto, que para atingir tais possibilidades dentro do espaço escolar, em específico nas aulas de Educação Física, torna-se necessário pensá-las, adequá-las e desenvolvê-las levando em consideração a realidade do espaço, do público, dos equipamentos disponíveis dentre outros. Deve-se igualmente, refletir sobre a formação dos professores, seu entendimento sobre as PCAN’s e ainda, o papel da Educação Física enquanto disciplina curricular potencial fomentadora dessas práticas. Nesse contexto, Uvinha (2004) nos diz que essas práticas possuem um importante papel na Educação Física Escolar, pois desenvolve dentro da disciplina, a participação ativa dos alunos nas atividades, atua colaborando com o fim das limitações e o desenvolvimento dos alunos; como: superação de barreiras, medos, adrenalina, desenvolvimento da motricidade, interação entre os alunos, conscientização a preservação do meio ambiente, entre outros. Acreditamos que tais possibilidades são verídicas, mas será que no dia a dia escolar tais intenções são realmente concretizadas? Será que o programa ESFA Portas Abertas está conseguindo criar novos espaços, visões e intenções pedagógicas quanto a essas práticas? Será que as PCAN’s poderiam ser consideradas as “salvadoras da pátria” no que tange a formação de novos valores e de indivíduos que possuem relações ecologicamente corretas com o meio ambiente? 288 As considerações apresentadas acima possuem sua vericidade na observação de que nas Escolas o que se verifica ainda é o desenvolvimento dos esportes tradicionais e, se as PCAN’s são conteúdos promissores, novamente nos questionamos o motivo de sua tímida apropriação. Nesse sentido, podem ser vários os fatores que dificultam essa apropriação, como por exemplo, falta de conhecimento do professor sobre esse conteúdo, falta de equipamentos específicos para a prática, a questão do risco implícita a elas, dentre outros. É necessário ressaltar ainda, conforme estudos realizados por Silva e Fernandes (2006) que as escolas tanto influenciam, quanto sofrem a influência dos contextos históricos em que estão inseridas, assim como possuem uma lógica própria, que as diferenciam uma das outras por meio das normas, códigos e valores que as identificam. Diante de tais indagações focamos nossos olhares aos docentes participantes do programa, e para tal construímos a seguinte problemática norteadora do artigo: Qual o opinião dos educadores participantes do Programa ESFA Portas Abertas referente as possibilidades pedagógicas das PCAN’s? Para tanto, estabelecemos como objetivo geral analisar e refletir sobre a opinião dos educadores participantes do Programa ESFA Portas Abertas no que se refere as possibilidades pedagógicas das PCAN’s. E, como objetivos específicos verificar o entendimento educadores sobre as PCAN’s; refletir e analisar a opinião dos educadores sobre as possíveis contribuições pedagógicas das PCAN’s na formação de seus alunos; ponderar sobre os possíveis avanços, limitações e contradições encontrados no programa em paralelo com a realidade escolar; repensar propostas pedagógicas para a inserção e o desenvolvimento de tais práticas dentro do espaço escolar. Metodologia Quanto à natureza nossa pesquisa se caracterizou como qualitativa, uma vez que foram pesquisados as ações e relações humanas, através de seu comportamento relacionado as vivências das PCAN’s, onde exploram a realidade para especificar atributos e qualidades do objeto de investigação dificilmente quantificáveis. (MINAYO, 2002, p. 22). Quanto aos objetivos foi caracterizada como exploratória, pois visou proporcionar maior familiaridade com o problema, considerando os mais 289 variados aspectos relativos as PCAN’s e suas possibilidades pedagógicas (GIL, 2007, p. 41). Possuiu também um caráter explicativo, pois buscou o aprofundamento do problema e o conhecimento da realidade (GIL, 2007, p. 42), nos possibilitando identificar os fatores relevantes que estivessem explicando as possibilidades e limitações sobre das possibilidades pedagógicas das PCAN’s e sua relação com o espaço da Educação Física Escolar. Quanto aos procedimentos caracterizou-se como pesquisa de campo, pois nossa coleta de dados foi realizada com envolvimento dos pesquisadores no desenvolvimento das atividades do Programa estudado e seus participantes, onde se tornou possível levantar dados e informações para captar explicações e interpretações do que ocorrem com o programa e os grupos objetos de estudo da pesquisa (GIL, 2007, p. 53). Utilizamos ainda, a pesquisa como documental. Segundo Mazzotti; Gewandsznajderb, (2001, p. 169) define documento, como qualquer registro escrito que possa ser usado como fonte de informação e fonte de dados. Assim, utilizamos documentos e relatórios do programa Portas Abertas, como objeto de estudos. Os instrumentos utilizados na pesquisa foram a observação participante e a entrevista. Segundo Ludke; André, (1986, p. 26) a observação participante possibilita um contato direto com as escolas que participaram da pesquisa, onde foi permitido acompanhar de perto algumas experiências vivenciadas pelos sujeitos da pesquisa, e para não interpretar o método de observação com uma observação pessoal ou distorcida, também foram utilizadas anotações detalhadas e organizadas para fazer validar as nossas observações. A entrevista semi-estruturada foi utilizada, segundo as contribuições de Ludke; André, (1986, p. 37) por permitir maior liberdade de respostas para os nossos entrevistados, realizada com total autorização dos mesmos, por meio de gravação direta utilizando um MP4 e um computador para as transcrições. Os sujeitos entrevistados de nossa pesquisa foram 06 escolas participantes do Programa, enfatizando os meses de Setembro e Outubro de 2009. A princípio a amostra era composta por 13 escolas que já haviam realizado o agendamento no Programa nesse período, porém, devido a alguns problemas referentes ao transporte desses escolares, bem como, o tempo 290 chuvoso, os quais provocaram cancelamentos, só foi possível acompanhar e entrevistar essa quantidade supracitada. As entrevistas foram realizadas de 02 de Setembro a 28 de Outubro de 2009 junto aos professores/responsáveis pelas escolas, obedecendo a todos os critérios éticos de concessão de direito pelas entrevistas concedidas. As falas foram destacadas em itálico ao longo do texto para sua melhor identificação. A análise de dados utilizada foi a Análise de Conteúdo – Modalidade Temática. Proposta por Minayo (1994), esta modalidade de análise e tratamento de dados qualitativos busca a compreensão de sentido que se dá na comunicação, e para tanto leva em extrema consideração o contexto histórico social no qual o indivíduo e os fenômenos estudados se inserem, buscando uma junção interpretativa entre as ciências sociais e a filosofia como forma de aprofundamento e entendimento das forças que movem o homem em suas relações com o meio. Posteriormente, foi realizada a articulação dos dados obtidos com o referencial bibliográfico do trabalho. Apresentação e Análise Parcial dos Resultados Em um primeiro momento realizamos observações relacionadas ao espaço, equipamentos e sistemática de desenvolvimento do programa. Buscamos a partir de tal instrumento compreender como o espaço está organizado e a influência de tal organização para os participantes e quais as relações estabelecidas entre participantes e monitores com esse espaço. Buscamos também, verificar a influência dos equipamentos para o encaminhamento da atividade e suas relações com o risco imaginário e real. Por fim, almejamos observar a dinâmica do desenvolvimento do programa e suas metodologias utilizadas. Importante ressaltar que, tais pontos vêm com o intuito de fornecer bases verídicas sobre o cotidiano do programa para confrontar com a opinião dos professores/educadores das escolas participantes. O Espaço Nessas observações verificamos que o Programa dispõe de espaço próprio, chamado área de aventura. Essa área está localizada em um local 291 arborizado preservado dentro da própria instituição basicamente constituída por árvores de grande e médio porte. O espaço é submetido a limpeza e retirada das folhas secas diariamente, no entanto, não possui lixeiras para o descarte de resíduos gerados para a visitação. O descarte é realizado nas lixeiras do pátio. No entanto, observa-se que, embora se trate de uma área natural modificada pelo homem, todas as escolas observadas não jogaram lixo no espaço, fazendo o condicionamento dos mesmos para descartá-los em local propício dentro da Instituição. Nesse espaço, além de três lances de arvorismo e uma parede de escalada artificial encontramos bancos confeccionados de tocos de madeira para que os visitantes possam sentar-se, colocar seus pertences e observar as atividades. As árvores presentes no local são utilizadas na adaptação de pistas de cordas para as escolas de educação infantil atendidas, bem como, servir de apoio para o oferecimento de outras atividades de lazer, como cama de gato, desafio da teia, dentre outros. Interessante notar que a constituição do espaço favorece o desenvolvimento das atividades propostas, uma vez que as mesmas, embora sejam desenvolvidas em estruturas artificiais, preservam a conotação da área natural, o que auxilia na perpetuação da idéia de aventura e risco concedido a essas práticas. Tal comentário faz-se pertinente uma vez que a rampa de rapel artificial não está localizada nesse espaço, mas em uma área próxima, sem, no entanto, ser cerceada de árvores, sendo essa totalmente aberta e localizada próximo ao campo de futebol da instituição. Tal localização, no entanto, não retira a percepção de aventura e risco, mas são freqüentes as comparações de como seria interessantes fazer o rapel agora em uma pedra que seria o local “de verdade” para a vivência. Por não ser uma rampa de grande altura observou-se que participantes do ensino médio relatam ser “moleza” a experiência e reforçam que o desafio maior seria ou realizá-lo em um uma altura maior ou em ambiente natural. Ponderamos aqui que a faixa etária, nível de vivência motora e prévio conhecimento da atividade podem influenciar nessa percepção apresentada por parte desses escolares. 292 Encerrando nossas observações referentes ao espaço, destacamos que as corridas de orientação e trekkings desenvolvidos pelo Programa utilizam toda a área externa da Instituição, a qual possui um espaço de pequenas trilhas, pomares e plantações que tornam o trajeto interessante e desafiador. A dimensão do espaço atrelada ao desconhecimento do local auxiliam na realização dessas propostas. Equipamentos O Programa dispõe de um vasto acervo de equipamentos de montanhismo compreendidos por cadeirinhas, capacetes, mosquetões, freios, ATCs, costuras, cordas dinâmicas e estáticas, roldanas, dentre outros. Com exceção das cordas K2, todo o material possui certificação da União Internacional da Associação dos Alpinistas (UIAA) e Comunidade Européia (CE). Além desses materiais, bússolas, GPs, mapas topográficos, picotadores e prismas são utilizados para o desenvolvimento de trekkings e corridas de orientação. A utilização desses equipamentos atrelados a qualificação técnica dos monitores envolvidos deve ser levada em consideração, uma vez que, sem os mesmos vários escolares não conseguiriam vivenciar as práticas propostas. Essa possibilidade oferecida e facilitada pelos equipamentos oportuniza, segundo Silva et. Al (2004) o desenvolvimento de questões pedagógicas, uma vez que possibilitam aos participantes a vivência de situações e a visitação de locais que seriam dificultados pelos mesmos, como por exemplo a copa das árvores. Dinâmica e Metodologias Utilizadas A equipe de monitores é composta por acadêmicos do 1º ao 8º períodos do curso os quais buscam o Programa por identificação com a área, para obterem horas destinadas as atividades acadêmico-científico culturais e por ter que se submeterem as avaliações previstas no Programa da disciplina práxis dos Esportes de Aventura. Todos possuem, independente se seus objetivos, experiência em estagiar com tais práticas, o que é obtido, segundo seus relatos, através da disciplina supracitada ministrada no 1º período, bem como, estágios 293 permanentes propiciados pelo Programa Portas Abertas, Programa ESFA na minha Escola, Festival da Cultura Corporal, Responsabilidade Social do Ensino Superior, aulões integrados junto as outras faculdades, cursos de extensão e estágios junto a campings pousadas e hotéis. O grupo de monitores para uma escola de 40 alunos é composto de 12 a 15 acadêmicos, os quais são distribuídos nas estações a serem desenvolvidas no dia da visitação. Antes de iniciar o atendimento a coordenadora do Projeto passa algumas instruções para os monitores, acompanhada pelos monitores de disciplina que complementam suas cargas horárias obrigatórias com esse Programa. A dinâmica do projeto desde sua marcação até realização é a seguinte: as escolas agendam junto à Coordenação de Educação Física ou Coordenação de Laboratórios da ESFA o dia de visitação, mediante ao agendamento, a escola informa o tempo de permanência da mesma na visitação e, também, as atividades que deseja vivenciar, para que a programação e a quantidade das atividades sejam organizadas de acordo com o tempo disponibilizado pela escola. Ao chegar, a escola deve se apresentar à recepção da ESFA, onde será acompanhada pelos monitores das atividades selecionadas. Os monitores, caso necessário, farão a divisão das turmas para melhor encaminhamento das atividades. São oferecidas atualmente as seguintes atividades: a escola dividida em grupos realiza visitações aos laboratórios, com a supervisão de um funcionário da ESFA capacitado, sendo que, juntamente ao grupo é indispensável à presença dos responsáveis pela escola visitante. Em seguida o grupo segue para a área de aventura onde são desenvolvidas as seguintes práticas: rapel, pistas de cordas e escalada. O programa possibilita também, atividades no ginásio poli-esportivo, campo de futebol e piscina. Dentre todas essas atividades oferecidas e citadas acima, os monitores do Programa tem o cuidado de direcionar as atividades às faixas etárias dos alunos visitantes, bem como, caso seja solicitado, ao tema, escolhido pela Escola. Em relação as relações estabelecidas entre visitantes e monitores foi observada em grande parte das visitações um tratamento afetuoso e cortês. 294 Destaca-se a facilidade dos monitores em atuar junto aos mais diversos públicos com simpatia e competência, o que ocasiona demonstrações de afeto e uma relação de segurança/confiança para as escolas visitantes. Não foram observadas avaliações sistematizadas junto as visitações observadas. Após o término da visitação é realizado apenas um agradecimento por ambas as partes e uma conversa informal sobre a opinião dos visitantes sobre a experiência. Não foram observadas o desenvolvimento de metodologias de Educação Ambiental no decorrer do Programa. Em nossa opinião tal possibilidade seria pertinente uma vez que, tais práticas são propícias a repensar a questão ambiental e a reaproximação homem natureza, o que pode ser concretizado também através dessas metodologias. Entrevistas Foram aplicados 06 entrevistas aos professores/responsáveis pelas escolas visitantes ao programa. Dos 06 entrevistados 05 são formados em Educação Física na modalidade de Licenciatura, com tempo médio de formação de 02 anos, atuando na rede particular e pública de ensino do Estado do Espírito Santo. O único entrevistado que não possui formação na área tem nível de Ensino Médio completo e atua no serviço público, através da Secretaria de Assistência Social. O questionário foi composto por 14 questões abertas que buscavam compreender o entendimento dos esportes de aventura, compreensão de suas possibilidades pedagógicas, influência do programa para a continuidade de tais atividades no espaço escolar, dentre outros. Iniciando nossa entrevista perguntamos aos entrevistados a respeito do conhecimento sobre os esportes de aventura. As respostas obtidas foram as seguintes: “Bom, na minha formação acadêmica tive o privilégio de praticar praticamente todos, inclusive tenho curso na área de aventura.” (Respondente 01) “Instruções básicas sobre acampamentos, rapel, pistas de cordas, etc” (Respondente 02) “Tive a matéria na faculdade, sei um pouco da prática e alguma vivência.” (Respondente 03) 295 “Relativamente bom, visto que tive esse conteúdo como disciplina integrante do meu currículo de formação acadêmica.” (Respondente 04) “Participei da disciplina na graduação e de uma pós-graduação de atividades de lazer e aventura ao ar livre. Tive a oportunidade de participar de estágios em escolas e hotéis voltados a essas práticas. E ainda, realizei artigos sobre o tema e participei de congresso na área.” (Respondente 05) A maioria dos respondentes aponta a formação universitária como espaço para o conhecimento e espaço de vivência para tais práticas. Em estudos realizados por Fernandes e Silva (2006) foi apontado que um profissional que tenha em sua formação superior o contato com tais práticas, poderá ter maior possibilidade de ampliar ou aprofundar seu campo de conhecimento, uma vez que esse tipo de ensino vale-se de saberes específicos e técnicos para desenvolver uma determinada prática, como de saberes que darão base para a formação humana, social, cultural, intelectual deste individuo. Nesse sentido, cursos de Educação Física e áreas afins que possuem em sua matriz curricular conteúdos ou disciplinas que contemplem tais práticas poderão formar profissionais que tenham conhecimentos fundamentais para o seu desenvolvimento e de suas possibilidades pedagógicas. Obviamente a qualidade dessa formação, confrontada ainda com a realidade escolar pode facilitar e/ou dificultar o saber teoricamente disponibilizado na formação. Em seguida questionamos se caso já tivessem tido tais conhecimentos se os mesmos foram suficientes no sentido de se sentirem seguros para ministrar aulas deste conteúdo. Das respostas obtidas 05 respondentes afirmaram que sim e 01 que não, uma vez que, nunca possuiu uma capacitação para esse conteúdo, apenas vivências de lazer aos finais de semana. Destacamos a seguir as respostas: “Tenho sim conhecimento para ministrar, só não tenho espaço e material suficiente.” (Respondente 01) “Algumas lições podem ser aplicadas para a Educação Física escolar do município de Santa Teresa, mas a escassez de equipamento é muito grande.” (Respondente 02) “Porque tivemos a pratica e a vivencia de forma didática e sempre observando como adaptar para a escola e como fazer dela um conteúdo atrativo para as aulas.” (Respondente 03) 296 “Pois além dos conteúdos ministrados em sala de aula, houve a participação em estágios e vivencias de algumas modalidades. Lembrando que, para ministrar determinadas práticas torna-se necessário a participação em cursos técnicos.” (Respondente 05) Em relação a falta de estrutura e equipamentos Coli et al. (2008) ponderaram que a mesma consiste em uma dificuldade enfrentada por grande parte das escolas, muitas das quais, não possuem minimamente uma quadra para seu desenvolvimento. Essa limitação atrelada a falta de materiais e o interesse/ou capacitação do professor para lecionar determinados conteúdos agrava a adoção dos mesmos. Cardoso e Felipe (2005) debatem essas dificuldades salientando que no contexto escolar a falta de apoio do próprio ambiente influencia negativamente na adoção de novos conteúdos ou metodologias de aulas. Atrelado a isso, ressaltam também, o desconhecimento do professor sobre as alternativas educativas para o desenvolvimento desse conteúdo, a formação deficitária, dentre outros. Apesar de tais dificuldades, vários profissionais e escolas buscam atualmente modificar esse quadro, sendo uma dessas ações a iniciativa em promover um Programa que disponibilize tais vivências, estruturas e equipamentos, como é o caso do Programa Portas Abertas, bem como, o interesse do professor em buscá-los através de parcerias. Nesse sentido, a própria iniciativa de conhecer o Programa constitui-se em um primeiro passo para a adoção desse novo conteúdo. Esse primeiro contato pode desmistificar uma possível dificuldade da adoção das PCAN’s: espaços e conhecimentos. Diante disso, concordamos com Libâneo (1994), que é preciso uma formação continuada por parte dos docentes e um planejamento adequado. Tais ações podem potencializar novas abordagens as PCAN’s e a adequação de suas vivências aos espaços específicos da escola e, também fora dela. Uvinha (2004) destaca nesse contexto, que para o desenvolvimento desse conteúdo, os materiais para sua vivência poderiam ser adquiridos através da solicitação do professor aos próprios alunos, à direção da escola e, em alguns casos, até mesmo a partir da contribuição da comunidade local. Sugere ainda, a parceria com empresas que subvencionem os 297 materiais/equipamentos em troca do aparecimento da logomarca no interior da escola. A próxima pergunta inquiriu se no decorrer do trabalho docente já haviam ministrados sozinhos ou em parceria com outros docentes/profissionais aulas de esportes de aventura para os alunos. AS respostas obtidas foram as seguintes: “Sim. Basicamente Corridas de orientação e treekking. “ (Respondente 01) “Sim. Tive a experiência no meu estágio, trabalhamos com português e biologia em uma atividade interdisciplinar” (Respondente 03) “Sim. Apresentei o conteúdo de forma teórica para os alunos, e após essa apresentação os levei em um local apropriado para a prática, como o trekkings que são mais simples pois consistem basicamente no caminhar.” (Respondente 04). “Não. Não realizei devido a faixa etária dos alunos e a estrutura da escola, o que impossibilitam a realização destes conteúdos, principalmente para o professor sozinho. Por isso a escolha do programa da ESFA para os alunos vivenciar tais atividades.” (Respondente 05) As respostas obtidas apontam desde o oferecimento de uma PCAN teoricamente “natural” ao movimento, como no caso os trekkings e as corridas de orientação. Interessante observar que o oferecimento de tais modalidades foram pesquisadas por Silveira et al. (2005) os quais se propuseram a verificar in locu as possibilidades pedagógicas de tais esportes e contextualizá-los através de sua historicidade. Com base em suas experiências os autores apontam que é preciso romper com as pedagogias tradicionais para construção de uma nova estrutura social. Não se pode escolher o trekking como conteúdo, somente porque é uma prática física que tem regras, técnicas, contagem de pontos ou porque existem campeonatos estaduais. As dificuldades de classificar o trekking como conteúdo e de avaliar a prática do mesmo pode ser superada a partir do momento, em que se compreende que é um elemento da cultura corporal. De acordo com os autores cabe ao educador compreender quais as conseqüências que levavam a esportivização dessa atividade, estabelecendo relações com a prática social e refletindo criticamente sobre as regras e técnicas. A inserção desse conteúdo segundo s mesmos só terá relevância social se o educando ler a realidade, 298 interpretar compreender, explicar e pensar sobre o seu fazer. A reflexão leva o indivíduo a pensar, superar e revolucionar seus conceitos. Apontamos ainda a adequação do oferecimento de tais práticas aos níveis de ensino, no caso a educação infantil, área essa que em nossa percepção carece de estudos mais aprofundados e relatos de experiências reais que culminem em novos debates, apontamentos e ações que desmistifiquem a apropriação de tais práticas apenas para essa determinada faixa-etária. Por se tratar da educação infantil, um público muitas vezes tratado de forma “romântica” pelos educadores, trazemos os estudos realizados por Lima Junior (et al (2007) onde o grupo buscou adequar as PCAN’s a um grupo de terceira idade, visando desmistificar a condição de que essas atividades seriam destinadas apenas a um público jovem e aventureiro, o que em nossa opinião é passível de parâmetro para a educação infantil. Em suas considerações os pesquisadores ponderam que: “[...] é possível desenvolvermos essa atividades para tal faixa-etária sem a preocupação de performance que trazemos dos esportes tradicionais. Através de nossas intervenção focamos o trabalho coletivo, demonstrado através da cooperação entre os participantes, do companheirismo, da união entre os mesmos, da ajuda mútua, do incentivo uns para com os outros. Foi possível trabalharmos o desenvolvimento pessoal, através da auto-estima, da alegria, do entusiasmo, da superação dos desafios manifestada pelos participantes. Trabalhamos o desenvolvimento cognitivo, através da autonomia na tomada de decisões diante dos objetivos a serem cumpridos, da oportunidade de criar e construir durante a atividade. E trabalhamos também o desenvolvimento físico, estimulando as habilidades motoras dos participantes, ao caminharem com os olhos vendados, ao atravessarem a Falsa Baiana andando por uma corda, ao prepararem os alimentos e etc.” Diante desse relato, os autores afirmam que o profissional da Educação Física deve buscar em sua intervenção resguardar a integridade física, proporcionar a realização pessoal, e respeitar à condição sócio-histórica de cada indivíduo. Inquirimos se as escolas que trabalham possuem infra-estrutura e equipamentos que potencializam o desenvolvimento dessas práticas e, em caso afirmativo, quais: 299 Buscamos a partir dessas primeiras colocações questionar se os entrevistados verificavam alguma possibilidade pedagógica nessas práticas. As respostas foram as seguintes: “Sim. O básico, respeitar a natureza, coorperar com os alunos, se superar.” (Respondente 01) “Sim. As sensações provocadas por eles.” (Respondente 02) “Sim. Trabalho em equipe, preservação do meio ambiente, vencer obstáculos, união em grupos, e tantos outros.” (Respondente 03) “Sim. Trabalho em grupo, confiança no outro (colega), desenvolvimento de concentração, e de tomada de decisão, contato com a natureza.” (Respondente 04) “Sim. Pois trata-se de um conteúdo da educação física, e que dependendo como será abordada pelo professor poderá auxiliar na formação integral dos alunos.” (Respondente 05) A fala ainda destaca as contribuições pedagógicas das PCAN’s e seus possíveis objetivos a serem alcançados. Nessa perspectiva Marinho (2004), apud Marinho, (2007, p. 63) enfatiza que: “A Educação Física no trato das PCAN’s deve potencializar estratégias de ação para desenvolver, nos alunos, habilidades motoras, capacidades físicas e, até mesmo, fundamentos esportivos específicos. Tais atividades podem ser utilizadas para atingir uma variedade de objetivos educacionais, oportunizando diferentes níveis de desenvolvimento: coletivo (habilidades cooperativas e de comunicação), pessoal (auto-estima), cognitivo (tomadas de decisão e resolução de problemas), físico (aptidão e desenvolvimento de habilidades motoras).” Freire (2006) ressalta ainda que, as PCAN’s facilitam o processo de assimilar o conhecimento e novos valores alcançados pela vivência lúdica da aventura, o que colabora para o desenvolvimento da inteligência e a apropriação valores sócio-culturais e éticos, atendendo as necessidades da nossa atual realidade e relações no mundo do trabalho. Como destacamos na seguinte fala: [...] “então essas atividade ajudam muito no que você quiser focar se você quiser trabalhar com eles a importância de trabalho em grupo exercer liderança, o que você quiser direcionar essas atividades tem condições de oferecer” (Respondente 5). 300 Essas possibilidades educacionais possuem também como pano de fundo as constantes transformações na organização social, as quais segundo Coimbra (2006) necessitam e buscam uma educação atualizada que atenda as necessidades do mercado de trabalho. Nesse sentido, a autora destaca ainda que: Atualmente, o mercado de trabalho cobra dos profissionais determinadas características, como saber trabalhar em grupo, manter boas relações sociais, ter um bom desenvolvimento nos níveis intelectual e físico, demonstrar velocidade de raciocínio e desenvoltura na resolução de problemas, entre outras (COIMBRA, 2006, p. 160). Essa perspectiva mercadológica da educação quando refletida no contexto da PCAN’s, não pode ser negada, mas sim, refletida pelo docente. Tal reflexão segundo Uvinha (2004) é baseada na necessidade de não nos limitarmos apenas a esse caráter utilitarista, mas também compreender que tal conteúdo pode não contribuir diretamente para a aquisição de habilidades necessárias para ser um engenheiro, por exemplo, mas potencializa questões de cooperação, confiança, liderança, dentre outras, que influenciam na formação integral do educando. Para além dessa perspectiva mercadológica, concordamos também com Marinho (2006), que diz que as PCAN’s apresentam elementos conceituais que acompanham e enriquecem esse universo de práticas que conduzem a uma educação, e constitui sólidas razões para integrar este conjunto de práticas na grade curricular da Educação Física. No entender de Bétran e Bétran (2006), as PCAN’s no âmbito da Educação Física Escolar, subsidiam novos padrões motores desenvolvidos em contato com a natureza, possibilitando diversos contextos ambientais, bem como proporcionam um entorno com altos níveis de incerteza motora, oportunizando a manifestação de diferentes situações emocionais em inúmeras circunstâncias. Os autores ainda enfatizam que tais atividades favorecem a conscientização e a sensibilização do aluno para com o meio ambiente e seus problemas, promovendo uma educação ambiental Coimbra (2006), destaca que as PCAN’s atreladas e essa educação ambiental constituí-se em uma nova forma de adquirir conhecimentos relacionados ao meio ambiente, através das informações corporais, que 301 possibilitam uma rica experiência de sensação e valores, além da construção de uma ética baseada no respeito e no redescobrimento. Partes dessas possibilidades pedagógicas foram constatadas no decorrer das observações feitas junto ao Programa Portas Abertas. Foram observadas situações de superação, cooperação, colaboração, além de aproximações ao meio ambiente. Indagamos se a vivência dos esportes de aventura no projeto ESFA – Portas Abertas iria auxiliar seus alunos em sua formação integral e o porquê: “Acho que vivenciar uma só vez não é o suficiente para auxiliar na formação integral do aluno, mas essa prática vivenciada constantemente com certeza pode auxiliar no processo de formação do indivíduo por meio das sensações vividas, e do desenvolvimento da responsabilidade, autonomia ,coorpeação decorrente da prática desses esportes.” (Respondente 04) “Sim pois durante o desenvolvimento das atividades aspectos para a formação integral são abordados: coorperação, coordenação, lateralidade,interação com o meio e com o outro, equilíbrio, emoções e sensações entre outros.” (Respondente 05) Debatendo um pouco mais sobre tais benefícios Uvinha (2004) contribui ressaltando, que aspectos como liderança, espírito de equipe vão surgindo no contexto das PCAN’s, o que pode resultar em uma mudança de atitude e comportamento. Como é apresentada na fala seguinte [...] “uma surpresa pra gente, que no final do projeto nós vimos que a turma que mais brigava, na hora de fazer o rapel ali na rampa, em ao invés deles quererem ganhar dos outros grupos, não, tinha sempre um menino que não queria descer de jeito nenhum, ficaram falando desce, vai, incentivaram até que no final ele quis fazer o rapel por incentivo deles, e o grupo não estava interessado se iam ganhar ponto ou não iam ganhar ponto, nada disso foi mais o interesse de fazer mesmo” (Respondente 4). Outros benefícios apontados pelos participantes do Programa também são destacados na fala a seguir: “[...] “as próprias atividades elaboradas exigem a questão da regra, comportamento dos alunos, além de estarem se divertindo ta interagindo um com o outro e o espaço diferente já é uma oportunidade [...] as atividades em si geram o espírito de equipe, 302 limites, regras, trabalho de grupo, eu acho tudo importante nessa fase que eles estão, é interessante, além do futebol” (Respondente 2). Essas mudanças constituem-se em uma rica possibilidade no que tange o caráter atitudinal, o qual é debatido por Schwartz (2006), que alerta para a importância de se refletir sobre essa formação de atitudes de forma séria adequadamente, buscando suas possibilidades de transformação. Beccalli e Silva (2008) em estudos realizados com o Programa Portas Abertas destacam a criação de laços mais estreitos indivíduo-indivíduo, podendo gerar relações de amizade pelo processo de identificação com o outro. Tal constatação vai ao encontro das considerações de Campagna (2006, apud BECCALLI e SILVA, 2008), o qual elucida que o que está em jogo, diferentemente das competições acirradas do dia-a-dia, não é outra coisa, senão, a satisfação única e intransferível de sentir-se em “sintonia fina” consigo mesmo e com o outro que, como “parceiro” na aventura, igualmente, busca, nestas atividades, sensações, expectativas, sentimentos de alegria e prazer similares à sua”. Segundo os estudos dos mesmos autores as PCAN’s desenvolvidas nesse Programa possibilitam um aspecto motriz amplo, o qual é solicitado nas atividades de rapel, escalada e pistas de cordas, possibilitando ao praticante um acervo de padrões motores amplos e enriquecedores. Esse padrão motor segundo Coimbra (2006) exige um apuramento das capacidades físicas e das habilidades motoras para sua realização, o que promove um desenvolvimento global. Finalizando questionamos se a vivencia dos esportes de aventura no projeto ESFA – Portas Abertas iria auxiliar a ministrar/perpetuar esse conteúdo em suas aulas de educação física. “Sim, na questão metodológica das brincadeiras como na corrida de orientação, a cama de gato a ponte de pneu e na lembrança da prática. Para mim é uma forma de reciclagem também e uma forma de quebrar o mito de ser perigoso esses esportes na escola junto a minha diretora e demais professores. ” (Respondente 01) “Sempre ajudou, pois percebi que algumas coisas podem ser adaptadas para a escola e, ainda, assuntos relacionados a meio ambiente podem ser debatidos com os alunos, então, eu posso não trabalhar os esportes de aventura na íntegra, mas outras coisas que 303 vem de sua prática podem e devem ter continuidade na escola” (Respondente 03) “Talvez na questão de superação de desafios nas atividades desenvolvida em aula. Isso sim pode ser perpetuado nas minhas aulas.” (Respondente 04) “Sim, em aspectos como equilíbrio, lateralidade, interação com o meio e com o aluno, emoções, sensações, coordenação motora global. Muitas idéias e aulas são possíveis depois que eu vi o projeto para essa faixa etária e pretendo colocar em minhas aulas no próximo ano”. (Respondente 05) Sim, mas vai depender do professor de Educação Física que não pode estar presente hoje [...] mas para mim aqui, o que deve continuar é o trabalho em equipe essa integração que é muito necessária para esses jovens” (Respondente 06) Diante das respostas obtidas apontamos que a apresentação de novas atividades constitui-se no principal fator a ser perpetuado nas aulas de Educação Física Escolar, atreladas a suas possibilidades pedagógicas. No entanto, tais intenções não se apresentam articuladas dentro de um planejamento mais amplo, que busque seu desenvolvimento nas dimensões conceituais, procedimentais e atitudinais. São intenções pontuais de aulas pontuais que a uma primeira análise parecem desconsiderar a historicidade dessa práticas, além de perpetuar discursos “ecologicamente pedagogizados”. De qualquer forma, o fato de conhecer já é um primeiro passo para quem busca inovar não apenas por modismo, mas por compromisso. Concordamos nesse contexto com Gadotti (1998), apud Uvinha, (2004), para o qual deve-se incentivar a experimentação pedagógica pelo novo, em um esforço contínuo, solidário e paciente. Sendo as PCAN’s um meio de efetivamente simbolizar essa busca por novas atividades, colaborando para docência de um conteúdo recheado de experimentações e inovações. Considerações Parciais A partir das questões levantadas e discutidas nesse estudo, compreendemos que as PCAN’s são um conteúdo com uma gama de possibilidades pedagógicas assim como os esportes ditos tradicionais. O que irá determinar, no entanto, a potencialização dessas possibilidades pedagógicas será o planejamento das mesmas, seu estudo e a constituição de uma proposta comprometida com a inovação dentro do espaço escolar. 304 Fatores como a formação profissional, espaço e equipamentos apropriados também são questões que sempre permearão seu desenvolvimento em maior ou menor escala. Essa constatação faz-se necessário uma vez que, caso minha escola não possua tal espaço e equipamentos, a mesma poderá se servir de empresas, programas e outras iniciativas para propiciar ao seu alunado essa experiência. A formação do professor por suas vez, pode ser conseguida através de cursos, palestras, enfim, através da formação continuada, da qual todo o profissional tem direito, ou deveria ter. A experiência advinda do programa deve ultrapassar a idéia de modismo, “aula diferente” e se concretizar através de sua historicidade dentro da cultura corporal. Essa consideração respalda-se na constatação de que a Educação Física como uma disciplina curricular, é uma área que congrega vários saberes, os quais podem ser potencializados através das PCAN’s. Porém, essas possibilidades somente serão realmente aproveitadas através de uma sistematização comprometida com a transformação e a promoção da autonomia do aluno. Em relação especificamente ao Programa pode-se afirmar que a descontinuidade das visitações, ou o grande espaço de tempo de retorno das escolas participantes dificultam suas propostas, o que não invalida seu objetivo maior. Ponderamos que se as escolas pudessem dar continuidade a essas vivências dentro de seus bimestres escolares o Programa poderia avançar em suas metodologias uma vez que atuaria com um público já educado para e pelas PCAN’s. Assim, a falta de continuidade de ensino dessas práticas corporais na escola, devidamente discutidas e refletidas pelos professores e pelos alunos e também a visão de um risco imaginário que são relacionadas as atividades são outros fatores que podem a longo prazo estagnar o Programa em apenas uma opção de recreação as escolas. Atrela-se ainda, a falta de apoio do poder municipal, estadual e federal que muitas vezes limita-se a uma política paternalista e compensatória, o que determina a perpetuação de uma educação adestradora e focada para o mercado. E ainda, a estagnação de vários teóricos da área da Educação Física que acreditam que falar das PCAN’s no espaço escolar não seja possível, uma 305 vez que elas não podem ser categorizadas dentro do universo da cultura corporal e logo, não devem ser tratadas pelo professor de Educação Física. Nesse sentido, como falar de Educação pela aventura se a aventura muitas vezes se concretiza no desafio de quebrar paradigmas e o medo do novo? Em um sentido mais amplo, como falar de educação pela aventura se a aventura maior é ter o direito a educação preservado? Se o direito muitas vezes é subjugado pela falta de compromisso, pela violência ou pela banalização de valores? Diante disso tudo, e com 05 anos atuando em um programa que acredita nas possibilidades educativas dessas práticas, temos que ponderar que estamos dentro de um sistema muito mais complexo que determina e é determinado por diversos fatores. Não queremos dizer que devemos deixar de atuar, ou acreditar, mas nos conscientizar que falar de possibilidades pedagógicas das PCAN’s ou de qualquer outro conteúdo que busquemos trabalhar, não pode ser considerado como um fator isolado e desconectado de nossa realidade. BILBIOGRAFIA BECCALLI, Michel Binda; SILVA, Andreia. Atividades físicas de aventura na natureza enquanto instrumento pedagógico de transformação social em projetos realizados pela Escola Superior São Francisco de Assis. 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Felipe Catelan Martins, Igor Armbrust FEFISA – Faculdades Integradas de Santo André, Santo André, SP, Brasil E-mail: [email protected] Resumo Sabe-se que ultimamente profissionais da saúde tem utilizado a prescrição de exercícios como estratégia para combater os malefícios impostos pela sociedade moderna. Por outro lado há um aumento considerável à procura por outras atividades que fujam do cotidiano, como é o caso dos esportes radicais e dentre as modalidades dos esportes radicais podemos destacar a escalada no qual é abordada por esta pesquisa cujo objetivo foi contribuir para este novo segmento dando embasamento teórico para profissionais e praticantes com o intuito de verificar até que ponto a escalada pode contribuir para a qualidade de vida das pessoas na sociedade moderna. O tipo de pesquisa utilizada neste estudo foi bibliográfica. A partir dos levantamentos obtidos, verificou-se que a modalidade pode contribuir para os profissionais de educação física fornecendo informações científicas para os praticantes, apontando benefícios sociais, físicos, psicológicos, transferindo as melhoras para o seu dia-a-dia, podendo aumentar a auto-estima, a confiança e até mesmo a superação de medos e limites. Os resultados apresentam que a escalada poderia colaborar com o aumento da expectativa de vida e desenvolver alguns benefícios, sendo eles: motor, cognitivos e/ou sociais. Palavras chave: Esportes Radicais, Escalada, Qualidade de Vida. Introdução A escalada é uma modalidade que está inserida nos esportes de aventura, que vem crescendo a cada dia, concomitantemente cresce também os fatores que a sociedade moderna traz, entre eles: a inatividade física, dietas muito calóricas e o desenvolvimento de algumas patologias diminuindo a qualidade de vida das pessoas. O interesse por esse assunto surgiu durante os anos da graduação em virtude de algumas vivências prazerosas que tive com esportes radicais e alguns questionamentos que surgiram durante a pesquisa na graduação em licenciatura em Educação Física. O presente estudo tem por objetivo verificar as possíveis contribuições para este “novo” segmento, dando embasamento teórico para profissionais e praticantes com o intuito de verificar até que ponto a escalada pode contribuir na qualidade de vida das pessoas da sociedade moderna. 309 O desenvolvimento do trabalho para que pudesse alcançar o objetivo da pesquisa, aconteceu através de uma pesquisa bibliográfica onde foram levantados alguns conceitos de esportes radicais, histórico da escalada, malefícios da sociedade moderna e as possíveis contribuições da modalidade sobre estas causas. O presente estudo tem como objetivo verificar a influencia dos possíveis benefícios da escalada enquanto atividade física na qualidade de vida dos praticantes para que profissionais e praticantes tenham informações científicas dentro da modalidade. Além disso, procurou-se pesquisar sobre a sociedade moderna e os benefícios físicos, cognitivos e sociais da escalada. Método Os esportes de aventura ainda é um assunto muito novo no meio acadêmico e principalmente quando se relaciona à qualidade de vida que é um conceito difícil de ser abordado. Portanto, a pesquisa irá ser realizada em apenas uma etapa. Sendo que para isso houve um levantamento bibliográfico, pois segundo Cervo e Bervian (1996, p. 48) “é feito com intuito de recolher informações e conhecimentos prévios acerca de um problema para o qual se procura resposta ou acerca de uma hipótese que se quer experimentar” e para Gil (2001, p. 65) “é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos, a partir da técnica de análise de conteúdo”. Hoje em dia pouco tem se falado sobre a escalada esportiva como um estilo de vida ativo por falta de referências, deste modo esta pesquisa visa contribuir para futuras pesquisas sobre o assunto e para ajudar os profissionais da área a ter mais conhecimento. Esta pesquisa utiliza a metodologia de pesquisa bibliográfica que segundo a autora Andrade (2001), “a revisão bibliográfica deve começar pelas obras de caráter geral: enciclopédias, anuários, catálogos, resenhas abstracts, que indicarão fontes de consulta mais especifica”. Segundo o autor Gil (1991), “deve ser procurada a partir de material já elaborado procede-se á pesquisa bibliográfica”, que ambos mostram o mesmo sentido em frases diferentes. Esportes Radicais 310 Segundo Pereira; Armbrust; Ricardo (2008), a prática dos esportes radicais existe há muito tempo, mas foi no início do século XXI que este fenômeno passou a tomar proporções consideráveis no âmbito acadêmico sendo discutido no segmento da educação física, porém até os dias de hoje, ainda geram muitas discussões em saber quais são os reais conceitos, classificações e características destes tipos de esportes. De acordo com Romanini e Umeda (2002), poucas coisas associam tão bem o útil ao agradável quanto os esportes de aventura. Praticar esportes faz bem à saúde, ajuda a combater o estresse e deixa o corpo em forma. A aventura na natureza, então, é uma benção para o espírito. Explorar a natureza, caminhar por trilhas no meio da floresta, entrar em contato com a riqueza da vida selvagem são prazeres que não tem preço. Não é qualquer esporte que consegue ser aceito pelo público, ele deve possuir aquele “algo mais”. Esse “algo mais” faz dos Esportes Radicais um atrativo para pessoas que buscam uma experiência diferenciada no esporte, e que querem sentir ou ter emoção acima de tudo e até correr um risco (calculado e com segurança), sentir o contato com a natureza e a adrenalina (QUINTIERI, 2002). Romanini e Umeda (2002) define que genericamente, pode-se dizer que a expressão “esportes de aventura” engloba toda modalidade esportiva praticada na natureza, que envolva treinamento prévio e equipamentos específicos. Nela estão incluídos desde caminhadas até esportes que empregam tecnologia de ponta e exigem uma técnica apurada do praticante, entre os objetivos dos esportes de aventura estão o contato com paisagens naturais, o bem-estar proporcionado pela atividade física e a superação dos limites físicos e psicológicos. Qualidade De Vida Em eventos científicos nacionais e internacionais realizados nos últimos anos observa um crescimento significativo no que diz respeito à prática de atividades físicas relacionadas à qualidade de vida, e muitas são as declarações documentadas neste sentido. 311 Sendo assim, nada mais justo conceituar o termo qualidade de vida. Mas seria tão simples o quanto parece? Por si só o termo “qualidade de vida” já traz uma imensa complexidade de entendimento. “Definir qualidade de vida não é tarefa simples, dada a complexidade da abrangência dessa expressão” (GÁSPARI, 2001, p. 109). Segundo Fleck e et al (1999), existe uma preocupação com o conceito “qualidade de vida” que tem como definição um movimento dentro das ciências humanas e biológicas no sentido de valorizar os parâmetros mais amplos que o controle de sintomas, a diminuição da mortalidade ou o aumento da expectativa de vida. O termo qualidade de vida aplicado na literatura parece não ter um único significado, já que a maioria dos artigos que utilizam ou propõe instrumentos para sua avaliação não tem uma própria definição para qualidade de vida. A Sociedade Moderna Sabe-se que o desenvolvimento industrial e a tecnologia trouxeram inúmeros benefícios para a sociedade moderna, no entanto, contribuiu também para a mudança de comportamentos tornando o ser humano cada vez mais sedentário (OLIVEIRA, 1996). Rosa e Vaz (2000) defende que a atividade física está sendo prescrita por muitos profissionais da saúde como instrumento para combater os malefícios da sociedade moderna, entre eles: colesterol elevado, asma, desvios da coluna, estresse, ansiedade, depressão e o principal que é o sedentarismo. Pimenta e Palma (2001), reforça que a escolha de um estilo de vida mais sedentário possa estar colaborando para o aumento da obesidade infantil, tudo isso em virtude da ausência da atividade física associada a dieta inadequada tais como: fast food’s, televisão, vídeo-game, computador, entre outros. O autor ainda destaca que normalmente, quando se assiste à televisão existe uma correlação com a vontade de comer, e ressalta que os alimentos ingeridos são de alto teor calórico (pipoca, batata frita, biscoitos, chocolates, doces, etc). 312 Estes hábitos estão diretamente relacionados com algumas patologias como: hipertensão arterial, diabetes mellitus, apnéia obstrutiva do sono e inúmeros tipos de câncer (OLIVEIRA, 1996). Ferreira, Matsudo e Matsudo e Braggion (2005) ressaltam que a vida moderna tende a ser pouco saudável, uma vez que provoca stress, alimentação inadequada e a não regularidade na prática de exercícios físicos, e que com todos esses fatores mencionados, a qualidade de vida da população fica bastante abalada, tanto em nível físico quanto psicológico. Esta problemática adquiriu tamanha dimensão fazendo com que autoridades médicas e governamentais criassem programas de educação para a saúde, que estimulem a prática da atividade física regular como fator de prevenção de doenças relacionadas à obesidade (OLIVEIRA, 1996). Associa-se então que o tempo destinado à prática de alguma atividade física muito provavelmente foi substituído pelos hábitos sedentários. Cabe então aos pais e profissionais da saúde intervir e orientar as crianças e adolescentes, no que diz respeito aos benefícios da atividade física, sabendo inclusive que hábitos ensinados nestas fases podem persistir até a fase adulta. Portanto, acredita-se que a educação física seria um meio promotor de hábitos físicos e/ou esportivos mais saudáveis e desta forma, contribuiria no processo de prevenção da obesidade (ZANELLA, 1998). Oliveira (1996), ainda acrescenta que: a saúde e a qualidade de vida do homem podem ser preservadas e aprimoradas através da prática regular da atividade física, e somente com a mudança de hábitos, sendo a introdução de uma vida fisicamente ativa associada à uma dieta adequada será possível lutar contra a verdadeira epidemia que se expande rapidamente pelo mundo chamada obesidade. E ainda reforça que é dever do profissional da saúde, independente de sua especialidade estimular a prática da atividade física como instrumento de promoção da saúde. Influência do Sedentarismo na Obesidade A redução da ingestão de alimentos preparados em casa, em detrimento de alimentos industrializados, o aumento do consumo de refrigerantes e de bebidas alcoólicas, a redução de atividade física, incluindo o gasto de energia 313 no trabalho e o uso crescente do automóvel tem aumentado a prevalência de obesidade nas populações urbanas do ocidente (CARVALHO, 2006). Rosa e Vaz (2000), diz que, se por um lado ainda é difícil resolver a problemática sobre o real papel do sedentarismo no desenvolvimento da obesidade, por outro lado existem poucas dúvidas sobre a relevância do exercício físico regular para o controle da obesidade e dos outros fatores de risco de doenças cardiovasculares associados a ela. Exercício Físico Regular e Obesidade De acordo com Zanella (1998), o excesso de tecido adiposo, que caracteriza a obesidade, ocorre pelo balanço energético positivo de forma crônica, isto é, uma ingestão calórica que ultrapassa o gasto calórico. Embora os mecanismos que determinam a obesidade não sejam totalmente conhecidos, sabe-se que a interação de alguns fatores acaba caracterizando a obesidade como uma doença multifatorial. Dentre os fatores ambientais, a abundância de alimentos saborosos de baixo custo é sem dúvida uma das causas que mais contribui para a obesidade. Outro consenso sobre a causa do aumento da obesidade no mundo industrializado está no consumo de grande proporção de calorias derivadas da gordura e no estilo de vida sedentário afirma Bray (1998). Segundo Carvalho (2006), ficou evidenciado que a maioria dos estudos prospectivos tem demonstrado uma relação significativa e inversa entre o nível habitual de atividade física e o ganho de peso ao longo dos anos de vida. A redução do gasto energético pela diminuição de atividade física habitual, associada à rotina da vida diária e ao aumento do tempo gasto em hábitos sedentários que já foram citados anteriormente (televisão, trabalhar no computador, jogar videogames, entre outros) tem levado as pessoas a se tornarem cada vez mais obesas. Bray (1998), diz que, aparentemente a estratégia para se reverter esse quadro seria muito simples, isto é, bastaria ter refeições regulares e saudáveis, evitando-se lanches com alta densidade calórica, beber água em vez de refrigerantes calóricos, diminuir o número de horas gastas na frente da televisão, andar mais e participar mais de atividades esportivas. Entretanto, essas condutas, em geral, contrariam as mudanças impostas pelo progresso da modernidade. 314 Para Negrão, Trambetta, Tinucci e Forjaz (2000), o assunto que merece ênfase, diz respeito ao efeito benéfico do exercício físico na manutenção, em médio prazo, do peso corporal. Se por um lado, o exercício físico provoca perda de peso corporal mais discreta e gradual que a dieta hipocalórica, por outro lado, ele evita o reganho de peso corporal em obesos, o que normalmente não ocorre com a dieta hipocalórica. Ainda Negrão, Trambetta, Tinucci e Forjaz (2000) em resumo, apesar da falta de estudos prospectivos definitivos que mostrem que um nível baixo de atividade física é um risco para o desenvolvimento da obesidade, e que, ao contrário, um alto nível de atividade física protege contra obesidade, o princípio que norteia o balanço energético, isto é, a relação entre a ingestão calórica e o gasto energético permite a suposição de que quanto menor o gasto energético maior o ganho de peso e vice-versa. Pode-se dizer ainda que o exercício físico regular ofereça um benefício independente nas várias comorbidades da obesidade, portanto, um estilo de vida ativa, com conseqüente aumento da capacidade física, pode atenuar o risco de morbidade e mortalidade em indivíduos com sobrepeso ou obesos. Estilo de Vida Ativa O estilo de vida fisicamente ativa inclui hábitos e comportamentos autodeterminados, adquiridos social ou culturalmente de modo individual ou em grupos. O próprio indivíduo tem controle sobre hábitos e atitudes prejudiciais a saúde, cabendo a ele ter consciência de buscar o incentivo e orientação necessária para a mudança dos maus-hábitos (ROUQUAYROL, 1999). Nessa ótica de reflexão, as academias de atividades físicas são espaços representativos desse novo olhar sobre a prática de exercícios, oferecendo, inclusive, para a população urbana, a possibilidade da prática regular, o que tem um papel decisivo no contexto na melhoria do bem-estar geral (SABA, 2001). O número de academias era pequeno no Rio de Janeiro entre a década de 30 e final da década de 50. Entretanto, as academias proliferaram nas principais cidades brasileiras na década de 60, tendo o auge de surgimento no início dos anos 70 (NOVAES, 1991). 315 Mas, foi a partir da década de 70, que aconteceu a expansão das academias, sendo tal fato considerado como um dos maiores fenômenos sociais ocorridos recentemente. A crescente aderência às atividades oferecidas nas academias tem motivos e fatores variados, conforme ressalta Marinho; Guglielmo (1997). Fato este que abriu oportunidade para que academias se especializassem em modalidades diferenciadas estando a escalada entre elas. Os indivíduos procuram as academias de ginástica com objetivos diversificados, da estética corporal à compensação ou correção de problemas físicos (MARINHO; GUGLIELMO, 1997). De forma semelhante, Okuma (1994) enfoca que obter benefícios para a saúde, como sentir-se bem, controlar o peso, melhorar a aparência e reduzir o stress, são os principais fatores que fazem com que determinado indivíduo adira a um programa de exercícios físicos regulares. As influências sociais da família e amigos são, também, de extrema importância à manutenção da atividade física, pois este suporte social incentiva o praticante a manter o interesse em continuar fisicamente ativo (DISHMAN, 1998). De acordo com Guarnieri (1997), a população está cada vez mais se preocupando com a melhoria da qualidade de vida através de um estilo de vida fisicamente ativa e também da conscientização, a respeito da importância do exercício físico. Atividade Física e Saúde Nesta linha, Matsudo e Matsudo (2000), afirmam que os principais benefícios à saúde, advindos da prática de atividade física referem-se aos aspectos antropométricos, neuromusculares, metabólicos e psicológicos. Os efeitos metabólicos apontados pelos autores são o aumento do volume sistólico; o aumento da potência aeróbica; o aumento da ventilação pulmonar; a melhora do perfil lipídico; a diminuição da pressão arterial; a melhora da sensibilidade à insulina e a diminuição da freqüência cardíaca em repouso e no trabalho submáximo. Com relação aos efeitos antropométricos e neuromusculares ocorre, segundo os autores, a diminuição da gordura 316 corporal, o incremento da força e da massa muscular, da densidade óssea e da flexibilidade. E, na dimensão psicológica, afirmam que a atividade física atua na melhoria da auto-estima, das funções cognitivas e de socialização, na diminuição do estresse e da ansiedade e na diminuição do consumo de medicamentos (NOVAES, 1991). Guedes e Guedes (1995), por sua vez, afirmam que a prática de exercícios físicos habituais, além de promover a saúde, influencia na reabilitação de determinadas patologias associadas ao aumento dos índices de morbidade e da mortalidade. Defendem a inter-relação entre a atividade física, aptidão física e saúde, as quais se influenciam reciprocamente. Estudos experimentais sugerem que a prática de atividades de intensidade moderada atua na redução de taxas de mortalidade e de risco de desenvolvimento de cardiovasculares, doenças degenerativas hipertensão, osteoporose, como as diabetes, enfermidades enfermidades respiratórias, dentre outras. São relatados, ainda, efeitos positivos da atividade física no processo de envelhecimento, no aumento da longevidade, no controle da obesidade e em alguns tipos de câncer (POWELL,1985; GONÇALVES,1996; MATSUDO E MATSUDO,2000). Com base nas informações anteriores acredita-se que indivíduos que optam por um estilo de vida ativa pode ter uma melhor condição em sua qualidade de vida quando comparados a indivíduos sedentários (POWELL,1985). Um exemplo marcante esta na escalada pois este esporte é uma prática que exige o máximo de força e concentração do atleta. Além disso, é necessário muita técnica, coragem e adrenalina para ter um bom desempenho no esporte. Mas, para isso a pessoa deve fazer um treinamento adequado e ter uma excelente alimentação. E as pessoas que querem praticar o esporte, mas não encontram muito tempo disponível, podem praticar nas paredes de escalada disponíveis em algumas academias. Isso irá ajudar muito a livrar a tensão e o estresse do dia-a-dia (PEREIRA, 2007). É importante para os praticantes de escalada suprir as necessidades do corpo com os nutrientes necessários para melhorar o rendimento físico, a forma física e aumentar a massa muscular, para ter força suficiente para 317 escalar melhor as paredes ou montanhas. Para isso, é importante ter uma boa alimentação (NOVAES, 1991). Estilo de Vida Ativa e a Escalada Seja jogando futebol ou vôlei, correndo, nadando ou pedalando, caminhando, andando de skate ou surfando, mergulhando ou escalando montanhas, um número cada vez maior de pessoas, de todas as idades, tem buscado no lazer ativo a realização pessoal e a compensação para o estilo de vida – predominantemente estressante e sedentário - das sociedades modernas. Mas uma parcela significativa da sociedade continua muito menos ativa do que o recomendável para a promoção da saúde, sendo em torno de 60% da população de trabalhadores da indústria no Brasil (DISHMAN, 1998). Pimenta e Palma (2001), afirma, sozinho ou em grupo com adversários ou desafiando a natureza, buscamos a superação, a vitória, o companheirismo, o relaxamento da tensão diária, a boa forma física e a saúde. Nem sempre nossas metas são atingidas, mas não há dúvidas de que o saldo, na relação atividade física – qualidade de vida é altamente positivo. Mesmo na forma de prática esportiva, muitas vezes referida como um risco para a saúde, mais amizades são construídas do que são desfeitas; muito mais alegria é derivada dessa prática do que tristeza; mais companheirismo que conflitos, mais formação que desvios, mais saúde e bem-estar do que lesões. Com boa orientação, os riscos são infinitamente menores que os benefícios da prática esportiva ou de qualquer outra forma de atividade física. Sendo assim, pode-se enquadrar a escalada como uma modalidade que traria benefícios a indivíduos já que é uma modalidade em que tem características que foram citadas anteriormente. Matsudo e Matsudo (2000) afirmam que para uma política para o esporte no Brasil deve ter por meta criar condições para motivar as pessoas para a prática esportiva e criar oportunidades para que esta motivação se torne em aplicação. Mais que uma ocupação do tempo livre, trata-se de um direito de todo cidadão brasileiro. De acordo com Pereira (2007), uma prática esportiva que exige o máximo de força e concentração do atleta é a escalada. Além disso, é necessário muita técnica, coragem e adrenalina para ter um bom desempenho 318 no esporte. Mas, para isso deve existir a pratica. E as pessoas que querem praticar o esporte, mas não encontram muito tempo disponível, podem praticar nas paredes de escalada disponíveis em algumas academias. Isso irá ajudar muito a livrar a tensão e o estresse do dia-a-dia. Um estilo de vida saudável representa um modo de viver que incorpora hábitos promotores do bem-estar e da qualidade de vida, e que tem por base a busca pelo equilíbrio pessoal e a harmonia com o ambiente. Trata-se, portanto, de um “processo” e não um “produto”; uma viagem e não um porto de chegada. Neste contexto, a prática de atividades físicas – seja no deslocamento diário, no lar, no trabalho e, principalmente no lazer – tem ganhado destaque no meio acadêmico e na mídia popular, passando a ser tema relevante de políticas públicas (PEREIRA, 2007). A elaboração de estratégias, os desafios encarados e o controle do medo e da ansiedade durante as escaladas ajudam a combater o estresse do dia-a-dia. O autor ainda cita que este esporte ainda traz alguns benefícios, entre eles: trabalha todos os músculos melhorando a coordenação motora e desenvolvendo a agilidade, regulariza o sistema nervoso, desenvolve a capacidade de concentração podendo ser transferida para atividades do cotidiano, como por exemplo: enfrentar desafios, desenvolver a disciplina, força de vontade, autoconfiança, coragem, memória, além de fazer bem para o sistema respiratório e ativar a circulação. A prática de atividades físicas tem sido altamente valorizada nos dias atuais. O stress das grandes cidades, questões ligadas ao sedentarismo, má alimentação, entre tantos outros fatores que já foram citados anteriormente, são elementos significativos que impulsionam as pessoas a procurarem “válvulas de escape”, capazes de minimizar esses efeitos deteriorantes da qualidade de vida. Este interesse humano na busca por qualidade de vida tem impulsionado muitas pessoas a usufruírem da potencialidade dos exercícios físicos, sejam eles realizados em instalações esportivas convencionais ou mesmo aqueles realizados em contato direto com o ambiente natural (como no caso da maioria modalidades de escalada). Considerações Finais 319 A partir das informações levantadas no decorrer dos capítulos anteriores, verificou-se que a sociedade moderna aumenta os seus malefícios a cada dia, tudo isso em virtude da tecnologia que a cada dia que passa está mais desenvolvida. Tecnologia esta, que torna os indivíduos cada vez mais sedentários e consumistas de dietas hipercalóricas, prejudicando diretamente na qualidade de vida das pessoas que consequentemente desenvolvem algumas doenças. Qualidade de vida, que por sua vez diverge opiniões de inúmeros autores, não tendo um conceito específico e coerente entre eles, porém, entendemos que para a obtenção de uma boa qualidade de vida, os indivíduos não dependem exclusivamente de um único fator, mas para que ela seja alcançada é necessário acontecer à soma de inúmeros fatores e não apenas levar em consideração a prática de atividade física. Por este motivo buscamos então o entendimento de estilo de vida ativa, relacionando com a escalada sendo ela um tipo de atividade física e se assim ela poderia colaborar nestas problemáticas. A adoção do estilo de vida ativa auxilia na melhoria do sistema imunológico, redução na pressão sanguínea, redução na quantidade da gordura corporal e é evidente os efeitos benéficos da atividade física sobre doenças como obesidade, osteoporose e diabetes, sendo a escalada uma opção de atividade física podendo favorecer o indivíduo a tais efeitos. Com os resultados levantados durante este estudo, acredita-se então que a escalada é uma opção diferenciada de modalidade esportiva e que o treinamento físico desta modalidade poderia colaborar com a diminuição de doenças, aumentar a expectativa de vida e desenvolver alguns benefícios, sendo eles: motor, cognitivos ou sociais. Por outro lado, sugerimos novas pesquisas, pois este estudo não suficiente para dar embasamento total, propondo novas pesquisas para abrir novos horizontes já que existem muitas limitações e poucos estudos que relacionam os dois temas. REFERÊNCIAS ANDRADE, Maria de Margarida. 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