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S/N sans nom maio 2011 Urbanidade Reativa: a luz vem das ruas w w w . s t u d i o t o r o. com expediente sans nom lado a as ruínas que transformam a cidade no sweet home lado b muros ideológicos que separam vidas ürbe cai o maior treme-treme da América Latina art o corpo estampado é a tela da vez prato feito comidinhas do circuito popular ensaio aposte na desconstrução do look para arrasar! varais das paredes urbanas os grafites aportam na moda luxo reciclado a moda que vem dos lixos é moderna e funcional tour diminua o passo e curta esta gente incrível expediente editoras Adriana Brito [email protected] Patrícia Favalle [email protected] chefe de redação Ariana Brink [email protected] editor de estilo Ray Mendel [email protected] assistente de moda Tatiana Vieira [email protected] editor de fotografia Marcelo Guarnieri [email protected] produtores Franco Milani [email protected] Helen Pessoa [email protected] redação Sergio Martins [email protected] Paula Queiroz [email protected] Alex Mendes [email protected] estagiários Ana Luisa Linhares Daniel Froes designer visual Robson Lopes [email protected] ilustrador Orpheu Maia colaboradores Agência Fotosite, Ana Wesh, Cadu Alves, Christian Von Ameln, Daniel Malva, Felipe Chaves, Ford Models, Guilherme Matsumoto, Gustavo Scatena, JGor, João Marco Andrade Dia, Jons e Branca, Joy Models, Julia Rodrigues, Marcos Marla, Rafael Cañas, Raul Melo, Ruane Gracio, Sandi Dias, Thiago Monteiro, Tita Berg Urbanidade Reativa A primeira barreira foi quebrada – e cá estamos, cheios de ideias e com vontade de olhar para horizontes que quase ninguém vê. Mas a tarefa de concretizar o número seguinte de uma revista é sempre ingrata, pois nos obriga a continuar focados na edição que já havíamos deixado no passado. E superar justamente a estreia, marcada por mais de cem mil acessos, algumas críticas e muita adrenalina, é nos impedir de retroceder. Quando exaltamos a urbanidade – nosso tema levado às últimas consequências – entramos na esfera daquilo que é legítimo, que incomoda e ataca pelo tom desconcertante de sua antipoesia. Contracultura sem maquiagem e com sujeira nas pontas dos dedos, com odor acre e suor vertiginoso. Enquanto a gastronomia tupiniquim somava estrelas do outro lado do globo, a sans nom beliscava as comidinhas típicas do prato desta gente comum, colocando na linha de frente os seus melhores escudeiros (e provadores). No universo da tatuagem, tão marginalizada tempos atrás, descobrimos o interruptor que liga a luz no fim do túnel. Por outras bandas menos glamourosas, reviramos o lixo, afinal, a maior riqueza de uma cidade está naquilo que ela descarta. Munidos da curiosidade de abrir os sacos pretos, convidamos a dupla de fotógrafos Julia Rodrigues e Christian Von Ameln para registrar a beleza visceral do momento. Neste enredo, no extremo nordeste do País, Daniel Malva turbinou as lentes de sua supercâmera para clicar a face da desconstrução. O viés cosmopolita sofreu intervenções de grafiteiros feitas sobre roupas assinadas por estilistas bacanas, tudo pendurado no cortiço fictício montado por Gustavo Scatena. Subimos o som antes de equalizar a apoteose caótica que faz desta metrópole um destino de fragmentos incertos. De um rosto no meio da multidão veio a narrativa que transformou esta terra – tida como ingrata, que maltrata o retirante, expulsa o cidadão do berço e separa o quatrocentão do pé rapado – numa parada perfeita para contemplar a vida. sans nom lado a Por Adriana Brito Foto Tita Berg Ruínasem formação O elemento estruturante da forma e do processo de desenvolvimento da cidade é a rua, que define, na sua geometria de intersecções, o quarteirão, massa volumétrica e arquitetônica que confere corpo e imagem ao desenho mais ou menos uniforme dos arruamentos que o marcam.” Este trecho foi divulgado pelo periódico português Jornal de Notícias para descrever um dos distritos mais célebres do país, objeto do livro “O Porto Visto do Céu”, sobre a cartografia de vias medievais criadas no século 14. Por meio deste arremate nota-se que o que começou naturalmente para acomodar os povos fixados aqui e ali, logo foi conectado à noção de propriedade, selando de maneira definitiva a distância entre o público e o privado. Muito além dos debates jurídicos e constitucionais, o outside acabou ganhando tons pejorativos, a exemplo das expressões “morador de rua” e “street art”. Juntas, elas representam algo que pode ser excluído, descartado ou marginalizado, como também se constata nos dois milhões de crianças abandonadas à própria sorte nas vias brasileiras. Engana-se, porém, quem imagina que as calçadas mostrem somente o lado amargo das coisas. A boemia de Noel Rosa, Vinícius de Moraes e Adoniran Barbosa que o diga. Não fossem as áreas comuns, onde mais a artistália nacional se encontraria? E como desprezar os longos corredores de lojas especializadas, tão prestativas às economias, que oferecem vestidos de noivas, ferramentas, eletroeletrônicos, móveis, alimentos e outras traquitanas? Enfim, mesmo que estes logradouros sirvam de passeio para muitos e casa para alguns, vale um registro: não há nada mais democrático e festivo do que as comemorações feitas ao ar livre. Dos casamentos monárquicos às beatificações católicas, passando por carnavais, comícios e protestos, a rua sempre será para o coletivo o que foi a estrada que levou Dorothy à Oz – um caminho intrigante de pontilhados dourados. Se as ruas compõem um álbum de retratos de quem somos, então é possível que estejamos quase em coma nos Estados Unidos, como o Metropolitan e o MoMA. O plano deu certo e os trabalhos que ele inseria sorrateiramente chegaram a ficar vários dias expostos. Carregadas de conteúdo social e com crítica de sobra, as imagens que o artista-guerrilheiro fez no muro que separa Israel da Palestina, na Cisjordânia, satirizam a vida do outro lado da barreira. Quão ilegal é vandalizar um muro que é ilegal? A localização é parte fundamental da mensagem que Banksy tenta passar. Em um leilão online, um grafite feito na parede de um prédio em Londres foi arrematado por US$ 400 mil. A condição para a venda, foi que o comprador precisaria pagar pela remoção da parede onde ela foi feita. Quem se oferece para dar o start ao leilão da divisória da vergonha erguida por Israel para fronteiras ideologias? lado b Por Paula Queiroz Fotos Divulgação Muro da vergonha O marketing de guerrilha do artista londrino Banksy colore o muro que separa Israel da Palestina Político até o tutano, Banksy é o famoso mais desconhecido da atualidade. O artista nascido na cidade de Bristol, em Londres, já pintou paredes pelos quatro cantos do mundo, mas ainda mantém intacta a sua identidade. Uma figura enigmática, cheia de ironia, com um perfil mais do que arrojado. A fórmula do personagem fez sucesso e assim ele que começou a pintar paredes nas ruas, teve um trabalho vendido por meio milhão de dólares, num leilão em 2007. Banksy tem um jeito subversivo de chamar a atenção: desde colocar uma estátua de um prisioneiro de Guantánamo no meio da Disney World, até trocar 500 CD’s da cantora Paris Hilton em lojas do Reino Unido por cópias alteradas ao seu prazer. Outra ação que o deixou na mira dos holofotes foi as suas investidas em museus como o Louvre, em Paris, a Tate Modern, em Londres e alguns endereços ürbe Por Alex Mendes Fotos Tita Berg De véu transparente, o edifício São Vito – maior cortiço vertical de São Paulo –, deu os passos finais rumo ao funeral Noivo Cadáver Vestido com túnica de tarrafa, uma espécie de véu fúnebre, ele tanto balançou, que finalmente caiu. Acostumado a olhar São Paulo de cima, o São Vito tremeu o quanto pôde, e até tentou resistir do seu encontro derradeiro com o solo plano. Mas não deu. Tijolo por tijolo, parede por parede, aquele que já foi um símbolo da arquitetura moderna da capital, desmoronou em silêncio e findou aos poucos; sem alarde. Construído pelo escritório de arquitetura Kogan & Zarzur, em 1959, o edifício era um antigo residencial de 27 andares, localizado na Avenida do Estado, centro nervoso de Sampa, que abrigou na sua fase pouco áurea, mais de três mil pessoas espalhadas por 624 quitinetes. Endereço de trabalhadores informais, traficantes de drogas, prostitutas e travestis, o lugar se transformou numa ilha rodeada pela marginalidade. Conhecido como o maior cortiço vertical do País, o espigão ganhou cara de mau e destaque nas páginas policiais dos principais jornais da urbe – fazendo frente aos morros cariocas de hoje: nem os soldados armados entravam ali. Privadas eram arremessadas, literalmente, do vigésimo andar sobre as viaturas, além do lixo e dos restos de comida. Desde então, o prédio se tornou capítulo da lenda urbana, laureado por histórias que jamais saberemos se são reais ou não. Suicídios frequentes, andares inteiros reservados à prostituição e o número de duas mortes registradas por andar são pequenas faces que ajudaram a consolidar a sua fama de encrenqueiro. Estampado por pichações ou como preferem alguns, caligrafias urbanas, o São Vito não passava de um corpo cansado, cheio de tatuagens, feridas expostas e rugas; ele era o resumo de uma geração perdida nas entrelinhas, que deu o suspiro final no dia 19 de abril de 2011, aos 52 anos. Os supersticiosos olham para o vazio com a certeza de que o fantasma grandalhão, que assombrou as redondezas, hei de resistir. art Por Paula Queiroz Fotos Thiago Monteiro Desenhos Totó Severo Tattoo fast-food Existe luz no fim do túnel para quem observa a tatuagem como expressão da arte Uma das modificações corporais mais cultuadas do mundo, a tatuagem, existe desde os primórdios da humanidade. No período neolítico já aparecem registros de pigmentos impressos na pele, e entre 4 mil e 2 mil anos a.C. provas mostram que essas marcas já eram feitas por nativos da Polinésia, Filipinas, Indonésia e Nova Zelândia. Neste último destino, os Maoris ganharam fama pelos desenhos tribais esculpidos no rosto, e que indicavam o quão nobre era o seu detentor dentro daquela sociedade. Já no século 17, os membros da Yakuza, facção do crime organizado japonês, ficaram conhecidos por seus corpos completamente tatuados. Os trabalhos artísticos, que demoravam anos para serem finalizados, descreviam os clãs a que pertenciam cada integrante, assim como ainda ocorre nos presídios, onde os meliantes se distinguem pelas tatuagens que retratam as suas ações. Popularmente chamada de tattoo, o adereço – pessoal e intransferível, que já estampou rituais de passagem, símbolos religiosos, status e posição social –, hoje parece fadada à banalização. Cada vez mais empregada como recurso estético, a pintura figura com prazo de validade curto, ainda mais depois da invenção do laser (técnica que promete limpar a área dos arrependidos). Na semana que antecedeu o casamento real inglês, o site SWNS Reporter divulgou nota que rodou o mundo: “Um britânico pra lá de patriota, gastou mil libras esterlinas para tatuar nos dentes da frente os rostos do príncipe William e de Kate Middleton”. Na sociedade do fast-tudo, onde o homem vive sob o redemoinho de mudanças e renovações constantes, a tatuagem se tornou adorno muitas vezes superficial. Na contramão do consumo desenfreado, da produção em série de estrelas, fadas, golfinhos, dragões e carpas, num ateliê da zona leste de São Paulo, Totó Severo se encarregou de dar ao meio um quê de obra de arte marginal. Desenhista autodidata, grafiteiro por afinidade e tatuador por necessidade, o jovem buscou refúgio nos traços fortes para fazer valer a sua assinatura. Outro que apostou no filão da tatto-art foi o recifense Jun Matsui. Com descendência nipônica e muita influência sacada das ilhas do Pacífico, principalmente dos Maoris (aqueles citados algumas linhas acima), Jun tem um trabalho superautoral. Numa atmosfera zen, ele cria sem pressa os desenhos que logo estarão na tez dos frequentadores do seu estúdio. Matsui acredita que a tatuagem surge na vida através de uma circunstância extrema: “Quando o estresse se une ao consumismo ou num instante de total equilíbrio, solidez e confiança. O momento é o ponto exato que define quem é quem nessa história”. prato feito Por Patrícia Favalle Fotos Thiago Monteiro Sabor a toda prova Considerada a capital mundial da gastronomia de ponta, São Paulo também reserva espaço para matar a fome de gente apressada e pouco interessada em inventismos hypes Enquanto o bonitão (e estrelado) chef Alex Atala colocava o seu D.O.M. no sétimo lugar no ranking da revista Restaurant, importante publicação britânica do eixo copa-cozinha, a Sans Nom escalava o seu time de experts – Tati Vieira, Franco Milane e Ray Mendel – para se aventurar pelo centro paulistano atrás dos verdadeiros quitutes da culinária local. Longe de serem elevadas à condição de iguarias, as receitas que tomam as vitrines empapadas de suor dos botecos e das barraquinhas que se estendem pela Bela Vista e pelo Largo do Paissandu são capazes até de surpreender. Das ruas para os pratos bacanas faltam quilômetros de ingredientes e outros quê mais, entretanto, as guloseimas deitadas em gordura reutilizada e despidas daquele visual glam merecem, sim, um capítulo à parte. Os sete pecados da baixa-gastronomia: Churrasquinho Grego. A maçaroca que hipnotiza os transeuntes é feita de diferentes carnes sobrepostas, poluição in natura e um ingrediente mantido em sigilo por gerações de churrasqueiros. Os sandubas são recheados com fatias bem finas da iguaria e servidos com suco artificial de fruta (e custam R$ 2). Resultado: os comensais ficaram fascinados. Edgard (Rua Conselheiro Crispiniano, s/n). Carne de panela. A aparência não é convidativa – as peças ficam amontoadas num molho misteriosamente espesso por pelotas de óleo –, mas a textura até engana e faz o picadinho de segunda figurar no posto de filé mignon. Ganhou elogios e repetidas garfadas. (Avenida São João esquina com a Rua Dom José de Barros). Torresmo. Os nacos de tecidos adiposos retirados dos porcos são délicatesses nas bocas de muitos comedores, que preferem a especiaria acompanhada da cerveja gelada. Depois de esperar por quase 40 minutos – e testemunhar o ambiente ser invadido pelo cheiro da fritura –, a tigela versão pocket recebeu rusgas de desaprovação, mas o sabor baconzitos fez quase todo mundo lamber os dedos. Portella (Rua Prof. Sebastião Soares de Faria, 419, Bela Vista). Ovo colorido. Proteína das mais consagradas, a cria galinácea esbanja traquejo social e faz bonito em qualquer ocasião. Vale lembrar que o color egg é um acepipe em extinção, então, o jeito é optar pelo velho off-white para integrar o cardápio (Rua Teodoro Sampaio, altura do número 1.630). Batata temperada. As minibatatas cozidas e mergulhadas num misto de vinagre e ervas podem ser fatais para quem tem estômago sensível, mas são apreciadíssimas pela turma que faz parada nos botequins da urbe. Na avaliação dos nossos provadores oficiais, a porção de douradas servida no Portella (Rua Prof. Sebastião Soares de Faria, 419, Bela Vista) decepcionou por conta do azedume e da péssima apresentação. Dogão. Numa portinhola sinistra, as salsichas vão para a prensa com folhas murchas de alface, repolho acre e pão de banha. O clássico hot dog foi a única recusa do menu – e levou a pior nota da avaliação. SuperDog (Avenida Rio Branco com a Rua Dom José de Barros). Feijoada. Ok, as fartas cumbucas de barro se destacaram na quartafeira cinza – mas não puderam ser degustadas por um problema logístico, ou melhor, gástrico! Depois da farra indigesta, até o último dos moicanos só pensava em encerrar o dia numa salinha bem mais privée! (Avenida São João esquina com a Rua Dom José de Barros). ensaio Fotos Thiago Monteiro Edição de Estilo Ray Mendel Beauty Tati Vieira Desconstrução Fotos Daniel Malva Styling Marcos Marla Beauty Raul Melo Tire a tinta, arranque a massa e sinta cada vergalhão escancarado entre as aberturas do concreto antigo. Na rua, onde a construção aproxima e afasta as pessoas, os andaimes nus relevam as cenas da pobreza e da fortuna através de canteiros inundados pelo pó cinza que sobe do chão. A redenção quase benta vem do véu que cai da cobertura e protege os pedestres, numa alusão inquestionável ao tule branco que cobre o rosto das noivas, castas e maternais. Será que até mesmo elas são repletas de toda a satisfação? Cansados dessa rotina homens e mulheres se divertem num jogo marcado pelo embate entre o mestre de obra e a dona gostosa, cujas regras envolvem o assobio, as cantadas, os lábios inundados pela lascívia e o balanço geométrico das ancas femininas, estas sim verdadeiras obras divinas Modelos Ana Wesh e Ruane Gracio / Ford Models instalação Moda em Cordel Os varais são como cordéis ou grandes patchworks que contam trechos de histórias. Aqui, a cordinha pendurada nos moldes dos cortiços que fizeram a fama de Sampa, exibe as peças assinadas pelos estilistas Rodrigo Rosner, Wilson Ranieri e Morgana M. A base branca usada nas roupas serviu de convite para os grafiteiros Guilherme Matsumoto, JGor, Felipe Chaves e o casal Jons e Branca mandarem o recado urbano à moda. Fotos Gustavo Scatena Edição de Estilo Ray Mendel Produção Franco Milane Agradecimentos: Agência Fotosite e Cia. da Postagem moda Luxo Reciclado Fotos Christian Von Ameln e Julia Rodrigues Edição de Estilo Ray Mendel Produção Franco Milane O ar carregado de um centro de reciclagem em São Paulo é apenas o começo para embarcar numa aventura sem hora pra acabar. O que para muitos é considerado lixo, para outros é artigo de luxo – paradoxo que subverte a ordem em meio a bolsinhas Chanel, óculos Ray Ban e cadeiras by Mies van der Rohe. Ok, os rasgos, as trincas e a ferrugem estão bem ali para quem quiser ver, entretanto, em uma época condenada a tantos erres – da reutilização à revitalização –, que mal tem em desfrutar o lado glam do caos? tour Por Patrícia Favalle e Sergio Martins fotos Thiago Monteiro Circulandô Quem anda pelo centro de São Paulo quase sempre vai apressado – e perde a chance de conhecer o que há de melhor na cidade: sua gente Com mais de 80 anos, o ex-trompetista adotou São Paulo com todos os seus altos e baixos. “Sou carioca, mas hoje me considero um paulistano da gema!”, diz. Entusiasmado com a atenção dos jovens, ele se pôs a falar sobre a arquitetura desordenada da região, as péssimas condições em que se encontra o espigão de envergadura acentuada, assinado por Oscar Niemeyer, hoje tomado pela Secretaria de Habitação Popular, e o empobrecimento do Vale do Anhangabaú. “Isso aqui já foi a joia da coroa, hoje só tem bicho grilo e morador de rua. Uma pena que os governantes tenham deixado parte da história do País se perder para sempre.” Contrariado pelo trânsito de angolanos e chineses nas imediações, o músico faz questão de negar a aparente xenofobia. “Faço gosto de todo tipo de imigrante e migrante, eu mesmo não sou natural daqui; mas eles não amam esta cidade, só vem para sujar e piorar a situação.” Entre o bate-papo informal e as aulas de história da arte, desfilando algumas palavras em italiano, outras num inglês perfeito, ele deixa escapar trechos da sua biografia. “Quando retornei de Roma, depois de uma temporada de apresentações de jazz, fui trabalhar no Hotel Glória, no Rio. Lá me reencontrei com a atriz Greta Garbo*, de quem fiquei amigo na Europa. Ela me viu no meio daquela multidão e falou em bom som: ‘Guy, what you do here?’ Todos se entreolharam e os jornalistas me cercaram para saber como eu a conhecia. Disse de pronto que nós éramos primos distantes, e sai dali o mais rápido que pude.” Sem perder o jeito galã, Michel afogou a gargalhada, fez um elogio a única mulher da equipe, arrumou os óculos de sol e se despediu com ar de dever cumprido. “Pelo menos os hippies adoram jogar conversa fora.” *Greta Garbo realmente visitou o Brasil entre os anos de 1944 e 1946. Depois deste período, não há nenhuma referência sobre o assunto S/N
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