Breves considerações sobre seis passeios micológicos
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Breves considerações sobre seis passeios micológicos
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE SEIS PASSEIOS MICOLÓGICOS REALIZADOS NO CONCELHO DO FUNDÃO José Luís Gravito Henriques Eng. Agrónomo Fundão, 2008 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE SEIS PASSEIOS MICOLÓGICOS REALIZADOS NO CONCELHO DO FUNDÃO No Outono, nos meses de Outubro e Novembro dos anos de 2006 e 2007, tive oportunidade de participar na orientação de 6 passeios micológicos, realizados em outras tantas aldeias do concelho do Fundão, promovidos em: - Alcongosta, pela Junta de Freguesia; - Alcaide, pela Liga dos Amigos do Alcaide; - Açor, Bogas de Baixo, Malhada Velha e Barroca do Zêzere, pela Associação de Desenvolvimento Pinus Verde. Os passeios desenvolveram-se próximo das localidades, com percursos basicamente em povoamentos florestais de pinheiro bravo de diversas idades. No entanto, nas deslocações aproveitaram-se as bermas de caminhos e estradas, áreas abertas de incultos e pastagens e, também se fizeram, quando existentes, algumas incursões em pequenas áreas de castanheiro, carvalho e sobreiro, com árvores de uma forma geral consociadas e muito dispersas. É claro que a diversidade fúngica e as quantidades de espécies de cogumelo encontradas reflectem estes ambientes, a época do ano e as condições climáticas ocorridas nas 3 / 4 semanas anteriores a cada passeio. Estes envolveram grupos de cerca de 20 pessoas de várias proveniências e ocupações, com interesses diversos, desde a curiosidade à intenção em conhecer as espécies comestíveis, desde o simples passeio pela natureza à preocupação em registar em fotografia todos os cogumelos avistados. Uns, os mais interessados, apareceram artilhados de máquina fotográfica, cesta de vime ou de castanho, navalha e pau aparelhado para desviar a folhagem e, os outros, os mais despreocupados, apresentaram-se de mãos a abanar apenas para ver no que aquilo ia dar. Depois das prévias apresentações e de uma abordagem, pela rama, da temática dos fungos e das suas frutificações, os cogumelos; lá nos embrenhámos pela floresta com o propósito firme de descobrir o maior número de espécies. Como o objectivo principal era a identificação dos cogumelos no seu habitat, a ordem para todos era procurar e, quando localizado um novo cogumelo, reunir o grupo para troca de impressões e explicação das características identificadoras observáveis mais salientes. Fig. 1 - Recolha Fig. 2 - Exposição Das espécies encontradas, eram recolhidos 2 ou 3 exemplares nos vários estadios de desenvolvimento para posterior caracterização a realizar em sala, pela tarde, e para figurarem, em exposição acessível à população interessada, até ao final do dia seguinte. 1 Ainda assim, houve uns elementos do grupo que aproveitaram para apanhar alguns cogumelos para consumir em casa. Os passeios decorreram na parte da manhã, durante cerca de 3 horas já que, com a aproximação da hora do almoço, depois do meio-dia, a larica entranhava-se e muito poucos ligavam às explicações sobre os cogumelos, atalhando a galgar matos e trilhos de cabras para chegar rapidamente ao local onde nos esperava o almoço. Concluído cada passeio, foi servido em campo ou em sala um repasto com cogumelos, silvestres ou não, mas sempre com cogumelos na ementa. Algumas das refeições conseguiram o pleno de integrar cogumelos na entrada, na sopa e no prato principal. Foi notório, na confecção e em particular na apresentação do manjar, o envolvimento dos representantes das instituições locais, sempre com a preocupação na escolha do cozinheiro mais requintado e experimentado na confecção deste produto. Houve até numa povoação, o prazer de ter a confeccionar para o grupo, um natural, profissional da restauração no Canadá, bem conhecedor do aproveitamento dos cogumelos na gastronomia internacional. Aconteceu no entanto, um caso em que imperou a micofobia da cozinheira. Esta, por não comer cogumelos, preparou-os à parte. Da feijoada de boletos que se pretendia, resultou uma panela de feijoada para um lado e um tacho de boletos para o outro. Lá tivemos de misturar no prato os boletos aos feijões, mas já com muito prejuízo no resultado gastronómico final. Nestas andanças não me vou esquecer de elogiar uma sobremesa de compota de figo e uma aguardente de medronho, oferecidas por dois anfitriões. A meio da tarde, já bem saciados, foi tempo de reunir o pessoal, retirar os cogumelos das cestas e proceder individualmente à sua caracterização e identificação. Depois, colocaram-se em exposição sobre bancadas preparadas para o efeito com musgo e folhagem, pedaços de madeira, pedras e, nalguns casos, com um centro de mesa composto por um arranjo floral de cogumelos. Fig. 3 - Exposição Fig. 4 - Exposição Ora bem, é sobre os exemplares encontrados que se vai aqui fazer uma breve abordagem, emitindo algumas considerações gerais ou analisando em particular certas características, dando conta, para cada cogumelo, do seu nome científico, do(s) passeio(s) em que foi encontrado, da sua ecologia e comestibilidade. Introduzindo o tema, os cogumelos são as frutificações dos fungos. Para promover a sua propagação, o fungo diferencia do micélio vegetativo uma estrutura macroscópica correspondente ao cogumelo, que se desenvolve acima dos substratos explorados, proporcionando assim uma eficaz dispersão dos esporos nela produzidos. 2 Os fungos, por não terem clorofila, são incapazes de sintetizar nutrientes orgânicos, sendo que, obtêm os nutrientes por absorção em solução aquosa. A obtenção de alimento é conseguida de diferentes formas e, consoante estas, assim se denominam os fungos de: - Sapróbios. A mobilização dos nutrientes faz-se a partir da exploração de substratos com matéria orgânica inanimada, como é o caso da manta morta e de troncos em apodrecimento. - Parasitas. Vivem em associação com outro organismo uma relação de antagonismo, em que só o fungo tira proveito, podendo levar ao definhamento e morte do hospedeiro. - Micorrizicos. Estes estabelecem uma relação de mutualismo com o hospedeiro, retirando ambos proveito. O micélio do fungo envolve as raízes, formando estruturas denominadas micorrizas. O fungo, mais versátil na adaptabilidade ao meio, ao prolongar a rede radicular dos vegetais, vai explorar maior volume de terra e proporcionar às plantas quantidades adicionais de água e sais minerais, aumentando-lhes de maneira significativa as suas capacidades de tolerância e resistência a condições de acidez, secura e de baixa fertilidade dos solos. As plantas, em contrapartida, vão fornecer ao fungo os nutrientes elaborados da fotossíntese. Fig. 5 - ESPÉCIES MAIS FREQUENTES FREQUÊNCIA (Nº.x) 7 6 5 4 3 2 1 A A m ma n Am ani ita c ta an m itr i ita u na Ar r u sca Hy G m b ri gr om illa esc a o p ph ri e h id a ns Hy or o ius me ph ps vi llea o l is a sci om u d u a ra s La fa ntia La cc sc ca c a ic u Ly tari ria l lar co us ac e M pe d el cat ac rd ic a ro on io Ph lep pe sus is io r la Rh o lit ta p tu m izo us r o p o tin ce r Ru go ctor a iu S s n Sc arc sul lute s a o o le r o do sa lu s de n i r d r m mb on a r i c ia p a Su olyr tus il h Tr Su lus izum ic ill be ho us ll i Xe lom bo nii v a ro i co co nus m los us su ba s di us 0 ESPÉCIE Regressando aos passeios (Apêndice I), no conjunto foram encontradas 116 espécies, das quais apenas 6 não foram identificadas para além do género. É um número muito considerável de espécies se tivermos em conta que 5 dos passeios foram efectuados no ano de 2007, o primeiro a 27 de Outubro e o último a 24 de Novembro; e que, de acordo com os dados observados num posto meteorológico da região, no período de 5 de Outubro a 18 de Novembro se registou uma desprezável precipitação de 1mm e durante todo o mês de Novembro ocorreram temperaturas mínimas negativas ou muito próximas do zero. Estas circunstâncias climáticas, excepcionais para a época, pelo menos no que se refere à falta de chuva, afectaram muito desfavoravelmente o aparecimento de muitas espécies de cogumelos de Outono, em Outubro e Novembro de 2007. 3 Fig. 6 - GÉNEROS COM MAIOR NUMERO DE ESPÉCIES A ga ric us A m an ita B ol et us C lit oc yb C or tin e ar i La us ct ar iu s Le pi st a Pa xi llu s R us su la Su ill Tr u ic ho s lo Xe r o ma co m us Nº. ESPÉCIES 14 12 10 8 6 4 2 0 GÉNERO Dos 58 géneros presentes, 12 géneros apresentaram 3 ou mais espécies, com destaque para os géneros: - Tricholoma com 12 espécies; - Russula com 11 espécies; - Amanita com 9 espécies; - Boletus com 4 espécies; - Cortinarius com 4 espécies; - Lactarius com 4 espécies; - Suillus com 4 espécies. No que respeita à frequência das espécies nos passeios, 20 espécies foram no mínimo observadas em 4 passeios, sendo que, as espécies Amanita citrina, Gomphidius viscidus, Higrophoropsis aurantiaca, Macrolepiota procera, Laccaria laccata, Sccleroderma polyrhizum e Suillus bovinus marcaram presença em 5 dos 6 passeios e, as espécies Amanita muscaria, Xerocomus badius e Lactarius deliciosus apareceram em todos os passeios micológicos realizados. Fig. 7 - DISTRIBUIÇÃO DAS ESPÉCIES SEGUNDO A SUA ECOLOGIA 7% MICORRIZICO 34% SAPROBIO 59% PARASITA Relativamente à distribuição de espécies inventariadas de acordo com a sua ecologia (Apêndice II), verificou-se que: - 68 (59%) são micorrizicos; - 40 (34%) são sapróbios; - 8 (7 %) são parasitas. 4 É de realçar a dominância observada dos fungos micorrizicos, tão importantes na sanidade e desenvolvimento vegetativo das árvores. Regista-se em particular, pela sua raridade, a identificação do Tricholoma roseoacerbum, que avistei aqui pela primeira vez, e da presença de Suillus elegans, sinónimo de Suillus grivelei, micorrizico específico e exclusivo de uma resinosa de folha caduca, o larice europeu (Larix decidua), pela existência de alguns exemplares destas árvores no perímetro florestal de Alcongosta. Os cogumelos sapróbios, além de alguns serem comestíveis, têm muito interesse pelo papel que desempenham na reciclagem dos nutrientes. Relativamente às espécies parasitas, refere-se que algumas destas podem virar a sapróbias depois de morto o hospedeiro (Schizophyllum commune) ou começarem por ser sapróbias, instalando-se de início em partes mortas, vindo posteriormente a parasitar os tecidos vivos (Armillaria mellea). Curioso é que o Hypomyces lateritius ao parasitar o cogumelo Lactarius deliciosus, embora conduza ao atrofiamento das lâminas e à aquisição de um cor esbranquiçada muito diferente da característica cor de laranja, melhora a qualidade gustativa deste último. No entanto, pelo aspecto e por desconhecimento, o Lactarius deliciosus é normalmente rejeitado na apanha quando se apresenta neste estado. Também interessante é o facto do Cordyceps militaris parasitar as pupas da processionária (Thaumetopoea pityocampa), podendo esta circunstância ser passível de utilização na luta biológica contra esta praga, tão difícil de controlar e que tantos estragos provoca nas agulhas do pinheiro. Fig. 8 - COMESTIBILIDADE DAS ESPÉCIES IDENTIFICADAS COMESTIVEL COMERCIAL 14% COMESTIVEL NÃO COMERCIAL 39% NÃO COMESTIVEL 47% Quanto à comestibilidade dos cogumelos identificados (Apêndice III), registaram-se 55 espécies (47%) não comestíveis, considerando que, a exemplo de alguns países da Europa, integrámos o míscaro amarelo (Tricholoma equestre) neste grupo. Esta condição pode ser surpreendente para a maioria das pessoas, já que o míscaro amarelo é o cogumelo mais apreciado em Portugal. Consumido desde tempos ancestrais por múltiplas gerações é, em algumas regiões, o único conhecido e colectado pelas pessoas. No entanto, foi recentemente considerado mortal em alguns países europeus, onde foi proibido a sua comercialização e o seu consumo. Embora não tenha sido detectada qualquer tipo de toxina, são-lhe atribuídos mecanismos que levam à destruição muscular (Rabdomiolisis) por fenómenos de acumulação. Nas prospecções de campo, já se encontraram, sobretudo em folhosas, exemplares com características algo diferentes para o mesmo vulgarmente designado míscaro 5 amarelo. Pessoalmente penso que, eventualmente à conta de alguma outra espécie muito semelhante mas problemática, o nosso tão querido míscaro amarelo esteja a sofrer as consequências. Em Portugal, o míscaro amarelo tem elevado valor comercial e continua com uma forte procura pela arreigada tradição que tem na dieta alimentar de grande parte das nossas populações rurais. De qualquer forma, retirando as necessárias ilações, importa não ignorar a informação que nos chega de países vizinhos e tomar algumas precauções, nem que seja só no que se refere a evitar consumos exagerados e muito repetidos desta espécie. Fig. 9 - Cogumelos limpos Fig. 10 - Cogumelos confeccionados Identificaram-se ainda 61 espécies (53%) comestíveis, sendo que algumas destas só se podem utilizar na fase juvenil e/ou mediante a observação de determinadas condições. Embora com escasso interesse culinário, podem ser consumidos de início apenas os exemplares jovens, quando pouco fibrosos (Meripilus giganteus e Armillaria mellea), na fase de ovo, uma vez eliminado o perídio (Phallus impudicus), quando a gleba interior se apresenta branca (Calvatia excipuliformis, Lycoperdon perlatum e Vascellum pratense) ou clara e compacta (Rhizopogon luteolus). Quando imaturo, o Phisolitus tinctorius, ainda que de mediocre qualidade, pode ser usado como condimento. Para o aproveitamento dos Suillus, fica a indicação da necessidade de retirar a cutícula pegajosa do chapéu, por esta ser muito indigesta. O Amanita rubescens, apesar de ser um bom comestível, optou-se por considerá-lo como não comestível no cartaz. Tal facto justifica-se por este cogumelo conter substâncias hemolíticas termolábeis (destruídas pelo calor), não podendo ser consumido mal cozido ou em cru, estados em que é tóxico. Nesta situação é imperativamente necessário proceder a uma prévia fervura em água (temperaturas superiores a 60º C). Depois de rejeitar a água da primeira cozedura, pode-se iniciar, sem objecções, a sua confecção. Salientar que 16 (14%) dos cogumelos identificados nos passeios, não considerando o Tricholoma equestre, têm importância pela inclusão na dieta da população local e/ou pela sua assinalável valia comercial. Estes valores revelam o enorme potencial que a região dispõe neste tipo de produto, ainda muito desconhecido e pouco explorado sobretudo pelos proprietários agro-florestais. Se algumas das espécies apenas tem mercado local (Tricholoma portentosum, Macrolepiota procera), outras como o Cantharellus cibarius, Lactarius deliciosus, Laccaria amethystina, Amanita caesarea, Boletus edulis, Boletus pinophilus, Boletus reticulatus e Boletus erythropus, têm enorme procura e exportação totalmente assegurada. 6 Na literatura surgem mais algumas das espécies identificadas, dadas como comestíveis, mas essas não apresentam nem interesse nem relevância na flora micológica local. De uma forma geral, verificou-se por parte da população, alguma micofobia como resultado de conhecimento da ocorrência, na região ou no país, da morte de membros de algumas famílias. A errada ideia de que os cogumelos com anel são comestíveis e de que, na confecção, o não escurecimento do alho, da moeda ou da colher de prata é confirmação e sinónimo da sua comestibilidade, ainda está arreigada na mente de grande parte da população. Em cada lugar normalmente as pessoas só apanham 1 a 3 espécies, empiricamente garantidas como comestíveis. Em algumas aldeias, regista-se o consumo recente por várias pessoas de Lactarius deliciosus, Hydnum repandum e por muito poucos individuos, de Tricholoma colossus, Tricholoma joachimii e Armillaria mellea. Comem porque já outros antes comeram sem problemas, fruto de informação e constatação obtida em algumas refeições em casa de familiares ou comesainas de grupo, proporcionadas por conterrâneos que são ou foram emigrantes sobretudo em França. Houve no entanto um indivíduo do grupo, embora ainda iniciante nestas lides, que se mostrou pouco temeroso e afirmou ter comido uma espécie apenas pela identificação de um livro de cogumelos. Felizmente que a espécie em causa, de acordo com as indicações dadas, embora mal identificada, não era tóxica. Chama-se a particular atenção para o facto de existirem por vezes algumas semelhanças entre espécies tóxicas e comestíveis. Nesta área não se podem correr quaisquer riscos. Para evitar que do seu consumo ocorram intoxicações muito graves ou envenenamentos mortais, a apanha de cogumelos deve ser feita apenas por pessoas conhecedoras, capazes de proceder à sua identificação com absoluta garantia. Foi-nos dado conta, de em tempo idos, durante a apascentação dos rebanhos, do entusiasmo e da correria das reses à procura do Rhizopogon luteolus e também dos pastores comerem em fresco (retirada a casca) este fungo hipógeo. Curiosamente, nalgumas localidades é designado por batarata dos pinheiros, por se encontrar associada ao pinheiro e pela semelhança com a raiz de uma planta cultivada para a alimentação de suínos, denominada batarata. Como os passeios visavam a identificação dos cogumelos com base nas suas características macroscópicas, abordam-se alguns dos aspectos visíveis mais determinantes que são por vezes fundamentais para a distinção das espécies, exemplificando com alguns dos exemplares encontrados. Fig. 11 - Câmpanula Fig. 12 - Bola Fig. 13 - Estrela Fig. 14 - Pêra Fig. 15 - Esponja Fig. 17 - Língua Fig. 18 - Falo Fig. 16 - Ostra 7 A maioria apresentava uma forma de guarda-chuva ou câmpanula (Amanita muscaria), mas também nos apareceram outros feitios interessantes, nomeadamente de bola (Scleroderma citrinum), de estrela (Astraeus hygrometricus), de pêra (Lycoperdon perlatum), de esponja (Sparassis crispa), de ostra (Pleurotus ostreatus), de língua (Fistulina hepatica) ou de falo (Phallus impudicus). Fig. 19 - Lâminas Fig. 20 - Aguilhões Fig. 21 - Pregas Fig. 22 - Tubos Na generalidade o himenóforo (local onde se encontram os esporos) dos cogumelos era constituído por lâminas (Tricholoma portentosum), mas houve-os com aguilhões (Hydnum repandum), pregas (Cantarellus cibarius), tubos (Boletus pinophilus) e gleba (Lycoperdon perlatum). Fig. 23 - Anel Fig. 24 - Anel e volva Fig. 25 - Alteração de cor Tivemos cogumelos sem anel (Russula sardonia), com anel (Macrolepiota procera), com volva (Amanita vaginata), com anel e volva (Amanita caesarea), com cortina (Cortinarius semisanguineus), com exsudação de leite (Lactarius deliciosus), com alteração de cor ao corte ou ao tacto (Boletus erythropus) e com odor característico (Clitopilus prunulus), a farinha nesta espécie em particular. A maior parte dos cogumelos não têm nome vulgar e o nome pelo qual alguns são conhecidos é muito diverso. Este, não só varia de concelho, como se altera de localidade para localidade limítrofe. Pelo que eu conheço, na nossa região o termo tortulho pode designar consoante o lugar, tanto o Macrolepiota procera, o Boletus edulis, o Tricholoma equestre, o Amanita ponderosa ou o Sarcodon imbricatus, como o conjunto de todos os considerados não comestíveis. Daí a necessidade dos nomes científicos em latim. Para melhor compreensão junta-se uma lista de nomes vulgares, relativa a alguns dos cogumelos mais conhecidos (Apêndice IV). Além da batarata dos pinheiros (Rhizopogon luteolus), recolhi algumas denominações interessantes, tais como, de gladiles para a Armillaria mellea, de lanaça e chaparra para o Sarcodon imbricatus e de tinge linhas ou pinta linhas para a Scleroderma polyrhizum. Foi-nos referido que, este último, no passado, fruto de um saber ancestral, era utilizado como excipiente de isco para matar ratos e para tingir lã e as linhas do sapateiro. Tendo como base as espécies identificadas nestes 6 passeios micológicos, elaborouse o cartaz “Cogumelos silvestres do concelho do Fundão” (Apêndice V). Claro que o cartaz não inclui o conjunto das espécies encontradas e apenas expõe uma mínima quota8 -parte dos cogumelos do concelho. Integra as espécies mais frequentes, todas as que apareceram em pelo menos 4 passeios, as espécies comestíveis com mais valor gastronómico e espécies que chamaram à atenção pela sua raridade. Apesar de condicionado aos cogumelos encontrados na altura, o cartaz consegue apresentar uma amostra muito significativa dos cogumelos com interesse comercial. Termino com a grande preocupação da actualidade, que é a da sustentabilidade dos recursos micológicos existentes. O nosso contributo é fundamental e passa também pela necessidade de, na recolha, se fazerem observar algumas práticas elementares, nomeadamente: - Evitar colher cogumelos pouco desenvolvidos ou muito velhos. Em ambos os casos o aproveitamento gastronómico é pequeno. Se apanhados muito jovens não permitimos a libertação dos esporos e quando muito velhos estes podem mesmo ser tóxicos. - Não colher todos os cogumelos presentes em cada local nem apanhar mais cogumelos do que os que se tencionam consumir. A apanha excessiva e sem regras, com intuito puramente comercial, pode levar ao desaparecimento das espécies. - Evitar os sacos de plástico. Ao colocar os cogumelos em cestas arejadas, além de outras vantagens, permite a disseminação dos esporos durante a deslocação no campo. - Procurar devolver os restos e desperdícios da preparação e limpeza ao local de colheita, pois estes são ricos em esporos. - Evitar fazer estragos na vegetação, manta morta e no solo. Depois de uma recolha, no mesmo local, novos e novas espécies de cogumelos irão surgir. - Não pisar ou destruir nenhum cogumelo mesmo que seja venenoso. Embora não comestíveis, estes são fundamentais para o equilíbrio dos ecossistemas. - No caso dos hipógeos ou dos que apresentam normalmente o pé um pouco profundo, devem-se desenterrar cuidadosamente os carpóforos, repondo a situação inicial do solo, tapando as poças, para evitar ao mínimo danos no micélio e nas raízes das árvores. Os passeios micológicos realizados nestas aldeias do concelho do Fundão, proporcionaram oportunidades para observar localmente alguns dos seus cogumelos e dos seus lugares mais recônditos. Com estas breves considerações, espero não só revelar parte de um mundo e de uma riqueza, ainda com pouca visibilidade na nossa região, mas também suscitar nas pessoas um aumento do apetite e da curiosidade pela temática dos cogumelos silvestres. 9 APÊNDICES 10 APÊNDICE I QUADRO I - ESPÉCIES PROSPECTADAS E IDENTIFICADOS NOS PASSEIOS MICOLÓGICOS.FREQUÊNCIA, ECOLOGIA E COMESTIBILIDADE 3 4 5 6 + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + ++ + + + + COMESTIBILIDADE Agaricus porphyrizon Agaricus sylvicola Agaricus xanthoderma Amanita caesarea Amanita citrina Amanita gemmata Amanita muscaria Amanita pantherina Amanita rubescens Amanita spissa Amanita submembranacea Amanita vaginata Armillaria mellea Astraeus hygrometricus Baeospora myosura Boletopsis leucomelaena Boletus edulis Boletus erythropus Boletus pinophilus Boletus reticulatus Calvatia excipuliformis Cantharellus cibarius Clavulina cristata Clitocybe geotropa Clitocybe rivulosa Clitocybe sp. Clitopilus prunulus Coprinus micaceus Cordyceps militaris Cortinarius mucosus Cortinarius sanguineus Cortinarius semisanguineus Cortinarius sp. Crepidotus applanatus Cystoderma amianthinum Entoloma sp. Fistulina hepatica 2 ECOLOGIA 1 FREQUÊNCIA PASSEIO MICOLÓGICO ESPÉCIE 1 1 1 2 5 1 6 3 4 2 1 1 4 1 1 2 2 3 2 2 1 1 2 1 1 1 1 1 1 3 1 1 2 1 1 1 1 S S S M M M M M M M M M P S S M M M M M S M S S S S M S P M M M M S S S P X C X C X X X X CX C C C CX X X X C C C C CX C C C X X C X X C X X X C X X C 11 Ganoderma applanatum Gomphidius roseus Gomphidius viscidus Gymnopilus penetrans Gymnopilus spectabilis Hydnellum caeruleum Hydnum repandum Hygrophoropsis aurantiaca Hygrophorus dichrous Hypholoma fasciculare Hypomyces lateritius Laccaria laccata Laccaria amethystina Lactarius chrysorrheus Lactarius controversus Lactarius deliciosus Lactarius rufus Lepiota clypeolaria Lepista inversa Lepista nuda Lepista panaeolus Lycoperdon perlatum Macrolepiota procera Macrolepiota venenata Marasmius androsaceus Marasmius scorodonius Megacollybia platyphylla Melanoleuca cognata Meripilus giganteus Paxillus atrotomentosus Paxillus involotus Paxillus panuoides Phaeolus schweinitzii Phallus impudicus Phisolitus tinctorius Pleurotus ostreatus Rhizopogon luteolus Rhizopogon roseolus Russula cyanoxantha Russula delica Russula foetens Russula fragilis Russula nigricans Russula olivacea Russula sardonia Russula sp. + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + ++ + + + + + 1 1 5 1 2 1 3 5 1 4 1 5 1 1 1 6 2 2 1 1 1 4 5 1 1 2 1 1 1 1 3 1 1 2 4 1 4 1 1 1 1 1 3 1 4 3 P M M S S M M S M S P M M M M M M S S S S S S S S S S S P S M S P S M S M M M M M M M M M M X C C X X X C C C X C C C X X C X X C C C CX C X X C X C CX X X X X CX CX C CX CX C C X X C C X X 12 Russula vesca Sarcodon imbricatus Schizophyllum commune Scleroderma citrinum Scleroderma polyrhizum Sparassis crispa Stereum hirsutum Suillus bellinii Suillus bovinus Suillus elegans Suillus luteus Trametes versicolor Tricholoma acerbum Tricholoma colossus Tricholoma equestre Tricholoma focale Tricholoma joachimii Tricholoma pessundatum Tricholoma portentosum Tricholoma roseoacerbum Tricholoma saponaceum Tricholoma sejunctum Tricholoma stans Tricholoma ustale Tricholomopsis rutilans Vascellum pratense Volvariella gloiocephala Xerocomus badius Xerocomus porosporus Xerocomus subtomentosus Xylaria hipoxylon TOTAL + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + 37 32 43 + + 45 28 40 1 4 1 3 5 1 1 4 5 1 1 3 1 4 3 1 2 1 1 1 1 1 1 1 1 1 3 6 1 2 1 M M S M M P S M M M M S M M M M M M M M M M M M S S S M M M S C C X X X C X C C C C X X C XC X C X C X X X X X C CX C C C C X Legenda: + - Presença; S - Sapróbio; M - Micorrizico; P – Parasita; C – Comestível; X – Não comestível; CX – Comestível sob condições; XC – Não comestível em alguns países da Europa Passeios: 1 Alcongosta - 28/10/07 2 Bogas de Baixo - 10/11/07 3 Açor - 27/10/07 4 Malhada Velha - 17/11/07 5 Barroca do Zêzere - 24/11/07 6 Alcaide - 24/11/06 13 APÊNDICE II Fig. 1 - DISTRIBUIÇÃO DAS ESPÉCIES SEGUNDO A SUA ECOLOGIA 80 68 (Nº.) 60 40 40 MICORRIZICO SAPROBIO PARASITA 20 8 0 APÊNDICE III Fig. 2 - COMESTIBILIDADE DAS ESPÉCIES IDENTIFICADAS 70 60 61 55 45 (Nº.) 50 40 30 16 20 10 0 NÃO COMESTIVEL COMESTIVEL COMESTIVEL NÃO COMERCIAL COMESTIVEL COMERCIAL 14 APÊNDICE IV NOMES VULGARES Amanita caesarea - Ovo de rei, ovo de rainha, sol da terra, laranjinha, obesó. Amanita citrina - Míscaro limão. Amanita muscaria - Raivoso, mata mosca, frade de sapo. Amanita pantherina - Pantera. Amanita rubescens - Amanita vinoso, pé vermelho. Armillaria mellea - Gladile, alfinete, armilária, taralhico. Boletus edulis - Boleto, cogumelo, seta, tortulho, míscaro, niscaro, cabeçudo, cepa, pé gordo, moncoso, tartulho, bolo podre, fedorento, gordo, niscarro, cepe. Cantharellus cibarius - Rapazinho, amarelo, cantarela, laranjinha, flor, friso, canário, crista de galo, girole. Fistulina hepatica - Língua de vaca, língua de boi, vitela, fígado de boi. Hygrophoropsis aurantiaca - Falso cantarelo. Hydnum repandum - Pata de borrego, pata de carneiro, pata de cabra, pé de borrego, língua de vaca, raivaca, patinha, língua de gato, carneirinha, febra. Lactarius deliciosus - Sancha, lactário, telheira, raivaca, verdete, seta, laranja, laranjinha, cenoura, cenourinha, pinheira, pinheirinha, vaca vermelha, cardela. Lepista nuda - Pé azul, pé violeta. Lycoperdon perlatum - Bufa de lobo, peido de lobo, bexiga de lobo, peido de velha, cagadela de raposa. Macrolepiota procera - Frade, fradinho, tortulho, roca, marroco, o da calcinha, carcomelo, agasalho, gaiteiro, chapéu-de sol, cogumelo, peneira, capão, moquinha, popinha, tartulho, púcara, cagumelo, pucarinha, parasol, fradelho, roque, marifusa, gasalho, capoa, choteiro, centieiro, cogordo, tortulho de calça, tortulho da calcinha, arneirinha, bagueiro, maçaneta, branco de anilha, pintado, o de chapéu. Paxillus involotus - Carneirinha, carneira. Phallus impudicus - Porra do lobo, picha de cão. Phisolitus tinctorius - Puf, pata de burro, regota, funga, bufa de lobo. Pleurotus ostreatus - Pleuroto, repolga, seta de choupo. Rhizopogon luteolus - Regota, terroelo, tubera, turva, trufa, batarata dos pinheiros. Russula sp. - Russula. Sarcodon imbricatus - Carda, raivaca, tortulha, sancha, lanaça, lanisca, lanasca lanuda, chaparra, ferssura de vaca. Scleroderma polyrhizum - Peido de velha, tinge linhas, pinta linhas, regota. Sparassis crispa – Couve - flor. Tricholoma equestre - Míscaro amarelo, niscaro, limão, amarela, tortulho, cogumelo dos cavaleiros, sancha amarela, canário, misco, sancha. Tricholoma joachimii - Míscaro branco. Tricholoma portentosum - Míscaro branco, míscaro cinzento, míscaro preto, rilhato, míscaro pardo, míscaro rocho, capuchina, cinzentinho. 15 APÊNDICE V José Luís Gravito Henriques, Eng.DO FUNDÃO COGUMELOS SILVESTRES DO CONCELHO Agaricus sylvicola Amanita caesarea Amanita citrina Amanita muscaria Amanita rubescens Armillaria mellea Boletopsis leucomelaena Boletus edulis Boletus erythropus Boletus pinophilus Cantharellus cibarius Cordyceps militaris Fistulina hepatica Gomphidius viscidus Hydnum repandum Hygrophoropsis aurantiaca Hypholoma fasciculare Laccaria laccata Laccaria amethystina Lactarius deliciosus Lepista nuda Lycoperdon perlatum Macrolepiota procera Phisolitus tinctorius Pleurotus ostreatus 44 9 Rhizopogon luteolus Russula cyanoxantha Russula sardonia Sarcodon imbricatus Scleroderma polyrhizum Suillus bellinii Suillus bovinus Suillus elegans Tricholoma colossus Tricholoma equestre Tricholoma focale Tricholoma joachimii - COMESTIVEL Tricholoma portentosum - NÃO COMESTIVEL Tricholoma roseoacerbum Xerocomus badius 16 Agradecimentos 1 - Institucionais Pelo envolvimento e disponibilidade manifestada: - Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Centro, Câmara Municipal do Fundão, Junta de Freguesia de Alcongosta, Junta de Freguesia do Alcaide, Junta de Freguesia da Barroca, Junta de Freguesia de Bogas de Baixo, Associação de Desenvolvimento Pinus Verde, Liga dos Amigos do Alcaide, Centro Social e Cultural de Bogas de Baixo, Associação Cultural e Recreativa da Malhada Velha e Associação Cultural e Recreativa do Rancho dos Pastores do Açor. 2 - Pessoais Pelos prestimosos contributos e empenhamento pessoal inexcedível: - Eng.ª Sandra Maria Baltazar Silva, António Joaquim Atalaia Pombo e Luís Manuel Santos Martins. Pelo interesse e compromisso que assumiu na publicação do cartaz de cogumelos do concelho do Fundão: - Dr. Paulo Alexandre Bernardo Fernandes. 17