O JOGO DA MALHA OU JOGO DA LINHA praticado por
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O JOGO DA MALHA OU JOGO DA LINHA praticado por
O JOGO DA MALHA OU JOGO DA LINHA praticado por indígenas do Amazonasanalise sob o ângulo da praxiologia motriz. SOARES, Artemis1 RESUMO É Este trabalho faz parte de uma pesquisa maior cujo foco centraliza-se sobre os jogos tradicionais praticados pelos povos indígenas da Amazônia. Neste artigo apresentamos o jogo da linha, praticados pelos indígenas das etnias Tikuna e Cambeba utilizando fio de tucum. Constatamos que as figuras mais apreciadas dos Ameríndios e que fazem parte dos seus patrimônios são os motivos animais, os utensílios da vida cotidiana ou as figuras dedicadas a caça e a pesca. Sem esquecer também os motivos característicos utilizados no artesanato a cada etnia. Constatamos também que os Tikuna e os Cambeba elaboram figuras idênticas as encontradas do outro lado do mundo, entre as quais certas figuras em três dimensões. Podemos concluir, de acordo com a Praxilogia Motriz, que o jogo da linha é uma atividade psicomotriz. Palavras-chave : Jogos, jogos tradicionais, jogos indígenas, praxilogia motriz. ABSTRACT This work forms a largest recherché and concerns the traditional games practiced by native people of Amazon. In this article, we present the « string figure » ou « cat ‘s cradle », practiced by the natives of the ethnic groups Tikuna and Cambeba, by using the wire of tucum. We can noted that at the Amerindians your figures more apparels and who form part of their inheritance well are the reasons for animals, of wool daily life utensils, or dedicated to hunting and fishing, without forgetting the reasons characteristic of specific artisan weaving to each ethnic group. It is also noted that Tukuna and Cambeba prepare identical figures that we have can also find in everywhere of the world, and among them certain figures in three dimensions. We can conclude, in accordance with Motor Praxiology, that the set of strings is a psychomotor activity. Key words: Traditional games, indigenous games, motor praxiology. 1 Professora na Escola de educação Física da Universitdade Federal do Amazona. 1 1. Considerações iniciais O jogo da Malha é uma jogo muito antigo cujos estudos e recolhas foram realizados no recente século passado. Esses trabalhos apresentam jogos provenientes de várias regiões do mundo e alguns contém a descrição de mais de uma centena deles. No dizer de Vandendriessche2, um jogo de linha pode sempre ser descrito por uma sucessão de gestos simples denominados de operações elementares, no sentido onde o corpus de todos os jogos poderá ser escrito invocando um certo número dentre eles. Propõe-se então olhar o jogo da linha como um procedimento composto de uma sucessão de operações elementares. 1.1. Princípio geral do jogo: Trata-se de um jogo que pode ser disputado com um ou dois fios e consiste em realizar uma sucessão de desenhos com uma linha/barbante fechada com um nó, em forma de circulo. Esta linha em circulo é manipulada, trançada com os dedos das mãos geralmente por um jogador, existindo também motivos, figuras que são realizados por dois jogadores. Em algumas situações os jogadores fazem uso dos dedos dos pés e até dos dentes para alguns procedimentos. O jogo possibilita evocar, com o fio, diferentes objetos/figuras através de uma série de manipulações e entrelaçamentos. É possível de criar toda sorte de figuras como animais, casa, pessoas, objetos e se termina com uma figura final mostrada aos outros. Essas operações são necessárias e exigem memorização de quem o pratica. Os estudiosos utilizam vários termos para designar cada operação, tendo como base a qualidade do procedimento e a ação que os dedos executam : operações elementares, transferência, são termos comumente utilizados. 1.2. Aspectos Culturais O jogo da Linha é igualmente conhecido no Brasil como « Jogo de Cordel » , « Jogo do fio » e « Cama de gato ». Para os habitantes das aldeias situadas na região do Alto Solimões, no extremo norte do Brasil é o « Jogo da malha ». Em outras etnias é chamado Jogo da Linha. 2 Vandendriessche, 2007. Disponível na página http://www.dma.ens.fr/culturemath/histoire 2 Fig. 1 Palmier tucum. Fig. 2 Fibres de tucum. Fig. 2 les brins de tucum sont torsadés. Pode ser praticado por crianças, jovens e adultos, individualmente e em dupla, e em forma de disputa. Pode ser realizado em qualquer local aberto ou fechado como a sala de aula, a casa de festas das aldeias, etc. O jogo é praticado em qualquer época, sem situação determinada e é disseminado através da prática entre crianças e jovens. Era praticado pelos adultos nas aldeias indígenas durante algumas festas e encontros chamados “ajuri”3, quando os adultos se reuniam para trabalhos conjuntos. E também o fazem quando alguma demonstração é solicitada, como no caso do encontro com pesquisadores, estudantes etc. E um jogo que é praticado no mundo inteiro. Os povos mais distantes como os da Nova Zelândia, os esquimós do Ártico, os indígenas da América do norte e as tribos africanas constroem figuras idênticas nesse jogo. Entre os japoneses são as mulheres que jogam, mas existem muitos homens de certa idade que são ágeis na construção de muitas figuras. Entre os esquimós a tradição diz que as mulheres jogam com os homens porque se os meninos jogarem, os dedos poderiam se entrelaçar nas cordas do arpão no momento da pesca. Há nomenclaturas próprias em cada sociedade tradicional com o objetivo de descrever o processo utilizado para a realização de figuras com a linha. Para Vandendriessche (2007), a criação dos jogos do fio parece relevar a matemática a vários níveis porque a elaboração dos procedimentos resulta de um trabalho intelectual de organização de operações elementares como os algorítimos com atividades de natureza geométrica em cujo senso está baseado o estudo de mudanças de certas configurações espaciais. 3 Ajuri, termo utilizado para significar reunião, ajuntamento. 3 Fig. 1 Palmeira do tucum. Fig. 2 - Fibras de tucum. Fig. 2 - Tecendo os fois de tucum. 1.3. Material Esse jogo é jogado com um fio de um a dois metros de comprimento, com suas duas extremidades fechadas por um nó. Esse fio pode ser feito de diversos tipos de material, dependendo da região onde o jogo é realizado e pode ter vários tamanhos. Há jogos que são feitos com dois círculos ao mesmo tempo. Entre a população indígena, o material utilizado é um fio de linha ou de tucum em forma circular unido por um nó. O tucum é um tipo de palmeira existente na região norte do Brasil. Da sua palma é retirada uma fibra, (a palama) a qual passa por processo de secagem ao sol. Essa fibra é o tucum, de onde é tecido o fio com o qual o jogo é feito. É um fio muito resistente, utilizado no dia a dia dos indígenas e na confecção de várias peças do seu artesanato como cestos, quadros etc. 3.2 O jogo da Malha – experiência com os Tikuna em Filadélfia e com os Cambebas em Livramento. A observação do jogo ocorreu na Escola Filadélfia, localizada na comunidade do mesmo nome, fincada no município de Benjamin Constant, na tríplice fronteira Brasil-PeruColombia. É nesta escola, onde os indígenas realizam seu curso de formação, que ocorrem as reuniões e os encontros para organizar as festas. Foi aí que fizemos a coleta e todo o registro dos jogos realizados pelos Tikuna. Igualmente observamos também e coletamos dados com alguns indígenas da etnia Cambeba em Manaus. 4 3.2.1 Preparação para o jogo. Cada jogador se prepara com seu fio nas mãos. A seguir coloca o fio entre os dedos polegar e mínimo passando pelo dorso das mãos para iniciar o jogo. Pode-se decidir por uma figura a ser construída ou pela criatividade dos jogadores no caso de uma figura nova. Fig 11 : Preparação. 3.2.2 O começo do jogo Quando autorizado, os jogadores iniciam a preparação, algo como uma abertura, colocando-se em posição para iniciar. Trata-se de colocar o fio numa certa posição inicial, depois aplicar uma série de operações elementares: tecer passando os dedos por entre os fios, dando voltas e entrelaçando com outras voltas. Por vezes eles usam os dentes para puxar uma das voltas. Outras vezes, usam os dedos dos pés, a cabeça ou o pescoço. 3.2.3 Desenvolvimento do jogo O jogo se desenrola através da manipulação constante do fio, que é feita de varias maneiras: as operações são denominadas elementares e passagens, as quais o jogador efetua até chegar à figura determinada. Esse trabalho requer concentração, paciência e habilidade motora para enlaçar e desenlaçar os dedos. Além disso um jogo pode exigir várias repetições das mesmas ações do jogador. A seguir, exemplos de figuras recolhidas entre os Tikuna, em Filadelfia-AM : 5 Fig 1 : Casa (vista de cima). Fig 3 : Malha de 5. Fig 2 : Malha de 2. Fig 4 : Ponta de pintinho. Fig 5 : Pé de galinha. E a seguir figuras recolhida entre os Cambeba : Fig 6: Peixe. Fig 8 : Um X. Fig 7 : Máscara do Zorro. Fig 9 : Boca de jacaré (caïman). ♦ Jogo a quatro mãos : Peixe 6 Fig 10 Fig 11 Fig 12 As figuras 10, 11 e 12 mostram o jogo feito por duas pessoas. Os jogadores executam uma sequência de vários gestos simples denominados operações elementares, mas que requerem cuidados ao retirar o fio das mãos um do outro. Cada um tece e passa ao outro, até formar a figura final. ♦ O Serrote Fig 13 Fig 14 Fig 15 Fig 16 7 Fig 17 Fig 18 As figuras de número 13 a 18 mostram uma sequência de movimentos para realizar o Serrote. A demonstradora, Mara Cambeba, explica os procedimentos: comprimento do fio: 2m. 1-sustentar o fio sobre a cabeça, cruzar os fios abaixo do pescoço ; 2-segurar lateralmente e abrir a figura formando um triângulo entre o pescoço e as duas mãos ; 3-Levar a base do triângulo à boca e sustentar com os dentes, mantendo os fios estendidos ; 4- Uma segunda pessoa puxa a parte do fio que está sobre a cabeça e o outros para a frente, sustentando-o ; 5-A seguir a pessoa movimenta as mãos para dentro e para fora e eis o serrote com o seu barulho ♦ Figuras em terceira dimensão : Fig 32 : Ninho de pardal. Fig 33 : Coelho. As figuras em terceira dimensão despertam interesse pelo seu aspecto real 3.2.4 O fim do jogo O jogo termina com a realização completa da figura ou desenho proposto. 3. Comentário sobre o jogo : 8 O jogo da linha exige do jogador uma boa coordenação motora para realizar a seqüência exata de movimentos que vão formar a figura que foi escolhida para a disputa. Entre os Tikuna e também entre os Cambeba verificamos que há uma predominância de figuras geométricas: as malhas, que são várias, de 2, 3, 4 etc., a boca do jacaré, o X, o peixe e o pé de galinha estão nessa classificação. A memorização da seqüência dos movimentos necessários para gerar a figura escolhida e a grande agilidade das mãos exige muita atenção e concentração do jogador. Esse conjunto de fatores possibilita uma maior segurança e velocidade da seqüência de procedimentos, o que pode definir o ganhador. 3.2.5. ANALISE PRAXIOLÓGICA O jogo da linha é uma atividade psicomotriz, classificada como -C A I , de acordo com Pierre Parlebas. As atividades se desenvolvem num meio físico estável e envolvem uma pessoa, sem a presença de Companheiro, sem Adversários e sem Instabilidade. O jogo também é realizado em dupla, mas essa não é a característica principal do jogo. 3.2.5.1 Em relação ao outro Neste jogo a relação com o outro se faz presente através do desafio e da criatividade. Não há confronto, mas há a disputa. Quando em execução, os jogadores são motivados a executar uma figura determinada, e o objetivo é executá-la a contento. Essa disputa é que gera o sentimento de desafio. E a relação com o outro esta vinculada a esse desafio, onde se põe à prova a capacidade de criar a figura solicitada, criar novas figuras vinculadas ou não à história dos grupos étnicos. O sucesso na execução muitas vezes é mais importante do que a disputa para ver quem acaba primeiro. 3.2.5.2. Em relação ao espaço O jogo do fio não requer tramas nem combinações para deslocamentos espaciais. É um jogo de desempenho pessoal onde a questão da utilização espacial não está presente no que concerne ao espaço físico, à área de execução. Nesse jogo o jogador não vive o espaço no sentido do ir e vir. Mas a lógica interna trabalha a questão espacial através savoir faire das figuras que são elaboradas ao tecer o fio criando as mais variadas combinações. Pelo que pudemos observar, a maioria das figuras são geométricas e algumas são figuras em três 9 dimensões. O vivenciar, a criação dessas figuras é um momento de relação com a questão espacial, embora em outra dimensão. 3.2.5.3. Em relação ao tempo Para jogar o jogo da linha o tempo e o espaço não tem importância. Para os Tikuna e os Cambeba, o importante é o prazer de jogar, criar , de estabelecer uma relação com sua capacidade de criatividade. A lógica interna desse jogo permite que ele se desenvolva na ausência de contagem de pontos, sem um sistema de perfeição acabamento, onde o princípio do tempo não se aplica. Entretanto, esse jogo pode ser disputado com critérios pré-estabelecidos, como por exemplo : 1-o vencedor será aquele que primeiro acabar de tecer a figura solicitada, dentre as já conhecidas; 2- No caso de novas figuras a ser inventadas: o vencedor será aquele que terminar primeiro ; ou o vencedor será aquele que criar a figura mais bonita, o que demanda julgamento de valor, já demonstrando que elementos da lógica externa estarão intervindo. Vai depender da apreciação de um grupo que funciona como jurados. Entre Tikunas e Cambebas não encontramos limitação do tempo para esse jogo. Eles jogam quando desejam, iniciam e param dependendo unicamente da sua vontade de se divertir e de apostar, de desafiar a criatividade do outro. 3.2.5.4 A relação ao material O material do jogo é algo muito simples : um fio variando de comprimento entre 1 e 2 metros, de espessura fina. Pode ser de algodão, fibra ou outro material e de qualquer cor ou cores variadas, quando se utilizar mais de um fio. Pode também ser de espessuras variadas de acordo com a vontade do jogador. Entre os Tikuna e Cambeba, em outros tempos utilizava-se o fio de tucum, material já caracterizado neste estudo. O uso do tucum pelos Tikunas e pelos Cambebas nos permite confirmar a relação totalmente cultural entre o jogo e a população onde ele é realizado, mostrando o valor dos fatores socioculturais e o uso de um material retirado da natureza. É a lógica interna incorporando os valores e simbolismo dessa cultura. 10 3.3 Considerações quase finais O jogo aqui estudado apresenta vários aspectos interessantes. Como jogo tradicional, sua lógica interna revela que é uma atividade que não depende de espaço delimitado, não tem tempo pré-determinado e nem regras pré-estabelecidas. É um jogo que se desenvolve por puro prazer e pela porfia, pela aposta, no sentido do criar o novo, inventar. A aposta, o desafio é então o traço principal, o elemento motivador, a mola mestra desse jogo. A sua execução exige dos participantes algumas qualidades como concentração, habilidade com os dedos, coordenação, memória e paciência, dentre outras. Para tecer e concretizar a criação de uma figura o jogador faz várias tentativas repetindo procedimentos e ações até conseguir. Entre os indígenas as figuras mais utilizadas e que já fazem parte do seu acervo, são desenhos de animais, de utensílios de caça, pesca e de caça, além da malha/traçado característico do artesanato das etnias. É o eu da cultura se manifestando através do jogo, como diz Pierre Parlebas (2001:203). Foi possível constatar que Tikunas e Cambebas constroem, há figuras idênticas a outra, e s feitas do outro lado do mundo dentre eles também se inventam figuras em terceira dimensão. É talvez uma questão de migração das praticas ludicas ou de paralelismo. O jogo da linha é uma atividade psicomotriz, onde o jogador evolui em solitário, portanto na ausência do sentimento de rivalidade e solidariedade. rivalité et solidarité. Entretanto, quando o jogo é feito entre dois jogadores, caso menos comum, esses sentimentos se fazem presentes, estabelecendo-se uma rede de comunicação entre a dupla. O movimento de um jogador é sempre na intenção de desfazer a ação do outro, impedindo-o de realizar seu jogo, e também de se sair bem na tentativa de concluir uma figura. Conclusão O jogo aqui estudado apresenta vários aspectos interessantes. Como jogo tradicional, a lógica interna revela que se trata de uma atividade que não depende de um espaço delimitado, de um tempo predeterminado, nem de regras preestabelecidas. Este jogo é praticado por puro prazer, pela vontade de criar algo. O desafio é o fator essencial da motivação, o elemento principal deste jogo. 11 A sua realização exige do participante qualidades tais como concentração, habilidade manual, coordenação, memoria e paciência entre outros. Para tecer e finalizar a elaboração de uma figura, o jogador fará várias tentativas, repetindo os encadeamentos, até obter o resultado desejado. As figuras mais apreciadas dos índios pelos indígenas e que fazem bem parte do seu patrimônio, são os motivos animais, os utensílios da vida cotidiana ou dedicados a caça e a pesca, sem esquecer os motivos ligados a objetos artesanais próprios à cada etnia. É o EU da cultura que se manifesta pelo jogo, como sublinha Pierre Parlebas (2001 : 203). Constatamos igualmente que os Tikuna e os Cambebas elaboram figuras idênticas aquelas que podemos encontrar também do outro lado do mundo, entre as quais certas algumas figuras em três dimensões. Pode ser uma questão de migração das praticas lúdicas ou se tratar de paralelismo. Segundo Thierry Lesage4, a “questão antropológica do paralelismo e do difusionismo” (p.419-429) nos dá elementos necessários a sua compreensão, as quais se encontram nas “semelhanças devido as coincidências (paralelismo) ou ligadas as transmissões culturais (difusão)”, (p.441). O jogo da linha é uma atividade psicomotriz na qual o jogador evolui solitário, logo, longe dos conceitos de solidariedade e de rivalidade. No entanto, quando o jogo é praticado em desafio, caso que não se apresenta muito frequentemente, esses sentimentos aparecem ao seio da rede de comunicação que se estabelece entre os dois jogadores. O movimento do jogador tem sempre o objetivo de desfazer o que o outro fez, para impedi-lo de ganhar a partida, tentando a seu tempo realizar uma figura. É uma situação identificada por Pierre Parlebas (1998) : “agir, não é somente reagir, mas principalmente pré-agir, ou seja, preceder o evento antecipando suas consequências”. Conclusão geral Os jogos são considerados como verdadeiros retratos da sociedade onde são praticados, são sempre associados a um contexto social e seus atores. Pierre Parlebas (2001 : 203) nos diz com muita exatidão que o EU de cada cultura se manifesta no jogo. Ele aborda a etnomotricidade como um campo de estudo, onde as praticas motoras são consideradas como um campo a partir de sua relação com a cultura e o meio social no qual eles se desenvolvem, 4 LESAGE, Thierry, 2006, Les jeux de paume et de raquette : filiations, logique interne et déterminants culturels, Tese doutoral em Ciências Sociais, Universidade Paris V. 12 sobretudo no que concerne sua lógica interna, e incorporam valores e o simbolismo dessa cultura. E nessa perspectiva elaboramos nossas considerações finais sobre os jogos tradicionais praticados numa comunidade amazonense. Encontramos jogos já conhecidos por sociedades variadas, mas praticados com características do meio social no qual se desenvolvem. É possível então compreender e conhecer a identidade desse povo através dos jogos praticados por eles. Aliás, é reconhecido que o estudo desses jogos pode ser feito sob diversos os ângulos e perspectivas. No caso dos jogos tradicionais indígenas, nos parece que a teoria da praxiologia motriz é uma das que mais se adapta. A partir das teorias de Pierre Parlebas nós poderemos explorar o estudo do jogo a partir de sua lógica interna e de suas relações com a lógica externa. Isso nos permitiu obter a identidade de um povo e suas características ludomotoras em conjunto com os jogos universais, os mesmos preconizados por ele. Ao final dessa pesquisa podemos afirmar que a escolha do emprego da teoria da praxiologia motriz foi pertinente. Partindo da análise da estrutura dos jogos tradicionais e apoiados sobre a base dessa teoria colocamos em evidência a identidade das etnias que constituem a população do nosso estudo. Tudo isso a partir da lógica interna dos jogos observados. O jogo aqui estudado faz parte da classificação das atividade psicomotoras realizadas sem a presença de Companheiros, sem Incerteza do meio e sem contato direto com Adversários. São as atividades que o atleta pratica sob o olhar dos outros, mas sua performance se desenvolve solitariamente. O estudo da lógica interna através da abordagem em relação ao outro, ao espaço e em relação ao tempo e ao material permite relevar a essência de um jogo que mostra as relações de poder que uma atividade provoca entre os praticantes. Isso nos mostra suas ligações com o espaço e o território individual e o coletivo além das interferências na questão temporal e material. Em certos aspectos da logica interna em relação ao outro, mesmo se não há confrontação corporal entre os adversários, há uma intenção não verbal em torno do desenvolvimento do jogo durante a competição. Os jogadores são então obrigados a 13 apresentar sempre uma boa performance afim de que um dentre eles possa ser declarado vencedor. Em relação a questão espacial, podemos dizer que o espaço ludoesportivo é sem duvida alguma um dos temas principais da reflexão praxiológica e um elemento determinante da ação motriz. O espaço “físico” determina o comportamento do jogador, permitindo ou limitando seu deslocamento na área do jogo, tudo como ele vai alternar o campo de ação no sentido onde o espaço é preestabelecido. Os jogos em questão se realizam num espaço determinado, mais ou menos grande (exceto o jogo da linha), mas os jogos tradicionais não têm nem sempre um espaço preestabelecido ou delimitado. Foi possivel obervar também que um numero elevado de indígenas que vivem no meio urbano assumem sua etnia demonstrando assim seu desejo de legitimar sua cultura. Hoje podemos constatar a preocoupação de certos organismos em atribuir aos jogos tradicionais um valor real de uma sociedade. Tanto é assim que a UNESCO vem trabalhando no sentido da preservação da promoção e do desenvolvimento dos jogos e dos esportes tradicioais a fim de que façam parte integrante das estratégias nacionais de desenvolvimento. Os jogos e os esportes tradicionais representam a herança intangível e um dos símbolos da diversidade cultural de nossas sociedades. São portanto, um meio eficaz de expressão deos valores, de soidariedade, de diversidade e de consciência cultural. REFERÊNCIAS • CALLOIS, R., 1958, Les jeux et les hommes, Paris : Gallimard. • DURING , B., 2001, Éducation physique, sciences & culture, Amiens, Centre régional de • • • • • documentation pédagogique de l’académie de l’Amien DURING, B., 2000, Histoire culturelle des activités physiques XIXe et XX e : siècles, Paris, Vigot. ELIAS, N. & DUNNING, E, 1994, Sport et civilisation, La violence maîtrisée, Paris : Fayard. ELIAS, N. & DUNNING, E., 1992, A Busca da Excitação., Lisboa : Difel. 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