das competências

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das competências
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Instituto para a inovação
na formação
Instituto para a inovação
na formação
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Social e do Trabalho
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Assegurar a visibilidade
competências
existentes a percursos de aprendizagem
alternativos.
Noutros casos, o objectivo foi o de
promover a educação e a formação ao
longo da vida e de permitir aos indivíduos
que capitalizassem diversas formas e
diversos percursos de aprendizagem.
Noutros casos ainda, a identificação e a
avaliação das competências adquiridas de
maneira não formal serviram de
instrumentos destinados a melhorar a
qualidade da aprendizagem nas empresas
e nas organizações.
das
Desde há alguns anos, a questão da
identificação, da avaliação e do
reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não formal tem vindo a ocupar um
lugar de primeiro plano nos debates
europeus sobre a educação, a formação e
aprendizagem. Aos mais diversos níveis,
das empresas aos ministérios nacionais,
foram tomadas iniciativas para avaliar as
competências adquiridas fora do ensino e
da formação formais.
Em certos casos, o objectivo foi “abrir” os
sistemas de ensino de formação já
Colecção CEDEFOP
01
Assegurar a visibilidade
das competências
Identificação, avaliação e reconhecimento
da aprendizagem
Colecção CEDEFOP
não formal na Europa
Jens Bjørnåvold
Biblioteca Nacional Catalogação na Publicação
Bjøråvold, Jens
Assegurar a visibilidade das competências: identificação,
avaliação e reconhecimento da aprendizagem
não formal na Europa. (Cedefop : 1)
CDU 377(4)(047.3)
331.3(4)(047.3)
Ficha Técnica
Editor
Instituto para a Inovação na Formação
Local de Edição
Lisboa
Título
Assegurar a visibilidade das competências:
identificação, avaliação e reconhecimento da
aprendizagem não formal na Europa
Data
Fevereiro de 2003
Colecção
Colecção CEDEFOP
Autores
Jens Bjørnåvold
Tradução
Maria Teresa Gonçalves
Impressão
Facsimile, Lda
ISBN
972-8619-50-2
Depósito Legal
192048/03
Tiragem
1000 exemplares
Design
Multilogo, Imagem e Comunicação
Tel.: 21 272 27 22 e-mail: [email protected]
Primeira publicação em língua francesa com o título: Assurer la transparence des compétences
editada pela Repartição das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias 2, rue Mercier, L-2985
Luxemburgo [1999], [2000], [2001] Comunidade Europeia, [1999], [2000], [2001] Tradução
portuguesa: © INOFOR [2002] Tradução da responsabilidade exclusiva do INOFOR
Assegurar a visibilidade
das
competências
Identificação, avaliação e reconhecimento
da aprendizagem
não formal na Europa
Agradecimentos
O autor agradece aos colegas do Cedefop todas as apreciações feitas a propósito deste
relatório, em especial a Johan van Rens, Stavros Stavrou, Sten Pettersson, Burkart Sellin,
Barry Nyhan, Pekka Kämäräinen e Martina Ní Cheallaigh, que leram e comentaram as
diversas versões preliminares.
Agradece também a Danielle Colardyn pelas críticas construtivas e as importantes correcções durante as diferentes fases do trabalho.
Finalmente, um agradecimento especial a Bernadette Lovatt por ter conseguido transformar o texto numa linguagem clara e compreensível.
Índice
012
014
028
032
Prefácio
Síntese
1>Introdução
2>Premissas teóricas
2.1>Natureza contextual e tácita dos conhecimentos
adquiridos por via não formal
2.2>Testagem e avaliação no ensino e formação formais:
questões-chave e principais desafios
2.3>Necessidade de legitimidade e de aceitação social
048
3>Tendências europeias: evolução a nível nacional
3.1>A aprendizagem não formal no sistema dual:
Alemanha e Áustria
3.1.1>Alemanha
3.1.2>Áustria
3.1.3>Abertura à aprendizagem não formal através
do sistema dual?
3.2. A aprendizagem não formal nos países
Mediterrâneos: Grécia, Itália, Espanha e Portugal
3.2.1>Grécia
3.2.2>Itália
3.2.3>Espanha
3.2.4>Portugal
3.2.5>Uma abordagem mediterrânea?
3.3>A aprendizagem não formal nos países nórdicos:
Finlândia, Noruega, Suécia e Dinamarca
3.3.1>Noruega
3.3.2>Dinamarca
3.3.3>Finlândia
3.3.4>Suécia
3.3.5>Um modelo nórdico?
3.4>As NQV e a sua influência: Reino Unido, Irlanda e
Países Baixos
3.4.1>Reino Unido
3.4.2>Irlanda
3.4.3>Países Baixos
3.4.4>Um modelo «NQV»?
3.5>França e Bélgica
3.5.1>França
3.5.1.1>O balanço das competências
3.5.1.2>«Abrir» os diplomas e os certificados
3.5.1.3>Uma abordagem «ascendente» da
medição das competências
3.5.2>Bélgica
3.5.3>Os certificados formais em discussão?
3.6>Sistemas nacionais de identificação, de avaliação e
de reconhecimento dos saberes adquiridos por via
não formal determinantes e condições prévias
118
4>Tendências europeias: evolução a nível da UE
4.1>O Livro Branco sobre a Educação e a Formação:
Ensinar e Aprender: rumo à sociedade cognitiva
4.2>A avaliação automatizada
4.3>A abordagem Leonardo da Vinci em matéria de
identificação, de avaliação e de reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal
4.4>Um novo compromisso prático e político?
4.5>Uma abordagem comunitária da identificação, da
avaliação e do reconhecimento dos saberes
Adquiridos por via não formal?
142
5>combinar as peças: intervenientes, objectivos e soluções
5.1>Intervenientes, objectivos e soluções
europeu
5.2>Intervenientes, objectivos e soluções
nacional
5.3>Intervenientes, objectivos e soluções
sectores e dos ramos de actividade
5.4>Intervenientes, objectivos e soluções
Empresas
5.5>Definição de um ponto de partida
a nível
a nível
a nível dos
a nível das
152
6>Conclusão
6.1>Porquê?
6.1.1>Em busca da poção mágica identificação,
avaliação e reconhecimento das qualificaçõeschave
6.1.2 A>identificação, a avaliação e o
reconhecimento dos saberes adquiridos por
via não formal enquanto elemento de
reconfiguração dos sistemas de ensino, de
formação e de aprendizagem
6.1.3>Soluções em busca de problemas e
fornecedores em busca de clientes
6.2>Como?
6.2.1>Requisitos metodológicos
6.2.2>Requisitos políticos e institucionais para o
desenvolvimento de sistemas de identificação,
de avaliação e de reconhecimento dos saberes
Adquiridos por via não formal
166
7>bibliografia
anexo glossário
Nota de abertura
011
Colecção CEDEFOP
Ao promover esta edição em língua portuguesa, o INOFOR inaugura uma nova colecção
de publicações, consubstanciada na tradução para português de textos originais do
CEDEFOP, na sequência de um protocolo assinado pelas duas instituições, com esse
objectivo específico.
O tema deste primeiro número reconhecimento, validação e certificação de
competências adquiridas em contextos não formais e informais revela-se da maior
pertinência no momento em que em Portugal se repensa o papel da certificação no âmbito
do sistema de formação profissional.
O reconhecimento, validação e certificação das competências adquiridas em contextos
não formais e informais tem vindo a ganhar um lugar cada vez mais relevante no contexto
das sociedades do conhecimento, na justa medida em que o capital humano se tem vindo a
constituir o factor diferenciador do sucesso das organizações no contexto da
competitividade global.
O conceito de Aprendizagem ao Longo da Vida, englobando num processo permanente
de aprendizagem, toda e qualquer actividade empreendida com o objectivo de melhorar
conhecimentos e competências, independentemente do contexto em que a mesma
decorre, abriu a possibilidade ao reconhecimento das competências adquiridas fora do
contexto formal de educação e formação.
O CEDEFOP, no contexto do debate europeu sobre metodologias de identificação,
avaliação e reconhecimento dos saberes adquiridos fora do contexto formal,
desencadeou um estudo comparativo das experiências de 14 Estados-Membros, cujo
relatório, agora traduzido em Português, identifica as principais tendências detectadas e
põe em evidência os desafios cruciais que se colocam aos diversos intervenientes neste
domínio inovador e ainda pouco estabilizado.
Com esta edição, o INOFOR pretende contribuir para o debate nacional em torno das
questões relativas à construção de um sistema de reconhecimento e validação de
competências profissionais.
Maria Teresa Paixão, Presidente do INOFOR
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Prefácio
013
Colecção CEDEFOP
DESDE HÁ ALGUNS ANOS, a questão da identificação, da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal tem vindo a ocupar um lugar de
primeiro plano nos debates europeus sobre a educação, a formação e a aprendizagem.
Nos mais diversos níveis, das empresas aos ministérios nacionais, foram tomadas iniciativas
para avaliar as competências adquiridas fora do ensino e da formação formais. Em certos
casos, o objectivo foi o de «abrir» os sistemas de ensino e de formação já existentes a
percursos de aprendizagem alternativos, procurando evitar a repetição inútil de
sequências de aprendizagem. Noutros casos, o objectivo foi o de promover a educação e
a formação ao longo da vida e de permitir que os indivíduos capitalizassem diversas formas
e diversos percursos de aprendizagem, como, por exemplo, através da combinação da
aquisição de saberes fornecidos pela escola e pelo trabalho. Noutros casos ainda, a
identificação e a avaliação das competências adquiridas de maneira não formal serviram de
instrumentos destinados a melhorar a qualidade da aprendizagem nas empresas e nas
organizações.
O presente relatório oferece uma visão de conjunto das actividades realizadas na Europa,
neste domínio. A apresentação baseia-se em 14 relatórios nacionais encomendados pelo
Cedefop, durante o período de 1997-1999. Estes relatórios abrangem o conjunto dos
Estados-Membros da UE, à excepção do Luxemburgo. Além disso, foi recolhido um
conjunto substancial de informações a partir de outras fontes, entre as quais a Comissão
Europeia e diversos programas apoiados pela UE. Foi apresentada uma versão preliminar
deste relatório durante uma conferência internacional sobre este tema, organizada pelo
Cedefop, em cooperação com o ministério norueguês da Educação e da Investigação, em
Maio de 2000. Os comentários formulados durante essa conferência, que reunia representantes de 18 países europeus, foram integrados na versão final, que agora surge publicada.
Este relatório deve ser encarado como uma das interpretações possíveis da evolução
verificada neste domínio, procurando chamar a atenção para as principais tendências, bem
como pôr em evidência os desafios mais cruciais que os diversos intervenientes terão que
enfrentar neste terreno altamente inovador e ainda pouco estabilizado.
Esperamos que este relatório constitua um contributo positivo para os futuros trabalhos a
realizar na Europa acerca das questões relacionadas com as metodologias e os sistemas de
identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal.
Stavros Stavrou, Subdirector do Cedefop
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Síntese
015
Colecção CEDEFOP
O PRESENTE RELATÓRIO aborda a questão dos meios a implementar para melhorar a
visibilidade da aprendizagem efectuada fora dos estabelecimentos de ensino e de
formação formais. Enquanto a aprendizagem efectuada nos sistemas de ensino e de
formação formais é uma característica distintiva das sociedades modernas, a aprendizagem
não formal é muito mais difícil de detectar e de apreciar1. Esta falta de visibilidade é cada vez
mais encarada como um problema que prejudica o desenvolvimento das competências a
todos os níveis, desde o dos indivíduos ao da sociedade no seu conjunto.
Nos últimos anos, a maioria dos Estados-Membros da União Europeia realçou o papel
crucial da aprendizagem efectuada fora e como complemento do ensino e da formação
formais. Esta atenção particular traduziu-se num número crescente de iniciativas, tanto a
nível das políticas como a nível das práticas, que permitiram a passagem progressiva da
simples experimentação para o início da implementação.
A identificação, a avaliação e o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal
devem assentar em metodologias simples e pouco dispendiosas e numa noção clara da
partilha das responsabilidades institucionais e políticas. Mas, antes de mais, essas
metodologias devem ser capazes de fornecer o que prometeram, sendo, neste caso,
determinante a qualidade da «medição». Este relatório procura clarificar, por meio de uma
primeira análise teórica do tema, as condições necessárias para que se atinjam soluções
práticas e eficazes nesta área.
A natureza da aprendizagem
Quando se abordam as questões relacionadas com a identificação e a avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal, é fundamental levar em linha de conta a
natureza contextual da aprendizagem. Quando esta se realiza em contextos sociais e
materiais, os saberes e as competências são, em larga medida, o resultado da participação
em «comunidades de práticas». A aprendizagem não pode reduzir-se à recepção passiva
de «fragmentos» de saber. Esta perspectiva acentua não apenas a natureza relacional (papel
do indivíduo no seio de um grupo social), mas também a natureza negociada, empenhada
e responsabilizadora da aprendizagem (carácter comunicativo do processo). O formando
adquire a competência necessária para agir ao implicar-se num processo cognitivo
1
O termo «aprendizagem não formal» abrange a aquisição informal de saberes, que pode ser descrita como uma
aprendizagem não planificada em situações de trabalho e outras, mas também as fases de aprendizagem planificadas e
explícitas introduzidas nas organizações e noutros locais, que não são reconhecidas no seio do sistema de ensino e de
formação formais.
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permanente. Deste modo, a aprendizagem não é apenas uma reprodução, mas também
uma reformulação e uma renovação dos saberes e das competências.
Os resultados dos processos cognitivos, aquilo a que chamamos «competências», são, em
parte, de natureza tácita (Polanyi, 1967); por outras palavras, é difícil verbalizar e delimitar
cada uma das fases ou das regras intrínsecas de uma dada competência. Em certos casos,
os indivíduos não têm sequer consciência de que possuem determinada competência;
este aspecto deve, obrigatoriamente, entrar em linha de conta na avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal e deve reflectir-se nas metodologias. A
maioria dos nossos saberes-fazer foi adquirida pela prática e a pela experiência esforçada.
Um marceneiro experiente sabe utilizar uma ferramenta de um modo que escapa à
verbalização. Regra geral, consideramos tão natural estes saberes-fazer que não nos
apercebemos até que ponto eles estão presentes nas nossas actividades.
Requisitos metodológicos
O importante é determinar se é possível desenvolver metodologias que permitam
apreender as competências em causa (contextualmente específicas e em parte tácitas).
Enquanto a testagem e a avaliação no seio do ensino e da formação formais têm já uma
longa tradição de prática, de investigação e de teoria, em compensação, há ainda um longo
caminho a percorrer para se desenvolverem metodologias específicas de avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal. O actual alargamento da avaliação à esfera
do trabalho e dos tempos livres está inevitavelmente ligado a essa tradição. Temos razões
para acreditar que as novas abordagens se inspiram, em larga medida, nas metodologias
desenvolvidas nas áreas de aprendizagem mais estruturadas do sistema escolar formal.
Pelo menos, pensamos que alguns dos desafios e dos problemas são semelhantes nas duas
áreas de aprendizagem.
No ensino e na formação formais, a avaliação desempenha duas funções principais. A
função formativa procura apoiar o processo cognitivo. Nenhum sistema pode funcionar
correctamente sem uma informação frequente acerca do próprio desenrolar do
processo. Este aspecto é importante quer nas salas de aula quer nas empresas; quanto
mais variável e imprevisível for o contexto, mais necessário é um feedback. Numa situação
ideal, a avaliação deveria fornecer um feedback a curto prazo, para que as deficiências na
aprendizagem fossem imediatamente identificadas e corrigidas. A função somativa visa
comprovar o cumprimento de uma sequência de aprendizagem. Embora essa
comprovação possa assumir diversas formas (certificados, diplomas, balanços, etc.), a sua
finalidade é a de facilitar a passagem de um nível ou de um contexto para outro (de uma ra o
017
Colecção CEDEFOP
classe para outra, de um estabelecimento para outro ou da escola para o trabalho). Este
papel também pode ser formulado em termos de selecção e de meio de controlo do
acesso aos níveis, às funções e às profissões.
A confiança atribuída a um processo específico de avaliação está geralmente ligada aos
critérios de fiabilidade e de validade. A fiabilidade da avaliação depende da possibilidade de
reprodução dos mesmos resultados aquando de um novo teste avaliado por pessoas
diferentes. Em muitos aspectos, a validade pode considerar-se como um conceito e uma
preocupação mais complexos do que a fiabilidade. Em primeiro lugar, importa determinar
se a avaliação mede efectivamente aquilo para que foi preparada. A autenticidade é um
aspecto fundamental; um elevado grau de fiabilidade tem pouco valor se o resultado da
avaliação apresenta uma imagem deformada do domínio e do candidato em causa.
No entanto, os conceitos de fiabilidade e de validade não terão sentido se não estiverem
associados a pontos de referência, a critérios de apreciação e/ou a normas de desempenho,
etc. É possível identificar dois princípios essenciais utilizados para estabelecer esses pontos
de referência e/ou esses critérios. No ensino e na formação formais, é habitualmente
utilizada a referência à norma (em relação ao contexto do grupo considerado). A segunda
maneira de estabelecer um ponto de referência consiste em associar um dado
desempenho a um determinado critério. Para elaborar testes criteriais, é necessário, antes
de mais, identificar uma área de saberes e de competências e, em seguida, estabelecer
critérios gerais com base no desempenho observado nessa área específica.
A experiência em matéria de testes adquirida no sistema formal pode ajudar-nos a formular
um certo número de questões e de temas aplicáveis ao domínio da aprendizagem não
formal.
a) Quais as funções -formativas ou somativas a serem exercidas pelas novas metodologias
(e pelos novos sistemas institucionais) de identificação, de avaliação e de reconhecimento
dos saberes adquiridos por via não formal?
b) A diversidade dos processos cognitivos e dos contextos de aprendizagem levanta a
questão de se saber se é possível obter o mesmo tipo de fiabilidade nesse domínio e no
ensino e na formação formais.
c) A natureza contextual e (em parte) tácita da aprendizagem torna mais complexa a
procura da validade, e é conveniente determinar se as metodologias são correctamente
concebidas e elaboradas de forma a gerirem esta dificuldade.
d) A questão dos pontos de referência («normas») é um problema-chave a considerar.
Convém determinar se os limites dos domínios (incluindo o «alcance» e o conteúdo das
competências) são correctamente definidos.
inofor
Mantém-se em aberto a questão de se saber se a avaliação dos conhecimentos adquiridos
por via não formal implica a introdução de novos instrumentos e ferramentas ou se falamos
de velhas abordagens para dar resposta a novos desafios. Temos razões para acreditar que,
em certa medida, assistimos, pelo menos, a uma transferência de metodologias
tradicionais de testagem e de avaliação para este novo domínio.
Requisitos institucionais e políticos
O papel desempenhado pelos sistemas de avaliação e de reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal não pode limitar-se à questão da qualidade das
metodologias. Embora importante, não basta a presença de metodologias fiáveis e válidas
para garantir a confiança e a aceitação da avaliação por parte dos indivíduos, das empresas
e/ou dos estabelecimentos de ensino. Isto é especialmente verdade quando se atribui à
avaliação um papel somativo, conferindo uma prova de competência aos indivíduos em
posição de concorrência no mercado de trabalho ou para o acesso aos estabelecimentos
de ensino. Para que se possa atribuir um valor real a uma dada avaliação, é necessário que
se preencha um certo número de condições prévias, de ordem política e institucional, o
que pode ser realizado, em parte, por meio de decisões políticas que garantam a base legal
das iniciativas. Mas essas decisões políticas devem ser acompanhadas de um processo em
que têm que ser clarificadas as questões de «participação activa» dos intervenientes
envolvidos, de «controlo» e de «utilidade». Deste modo, a avaliação dos conhecimentos
adquiridos por via não formal será apreciada em função de critérios técnicos e
instrumentais (fiabilidade e validade) e de critérios normativos (legalidade e legitimidade).
Além disso, a aceitação da avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal é
uma questão não apenas de estatuto legal mas também de legitimidade.
Experiências nacionais e europeias
A situação europeia é apresentada a partir de exemplos recolhidos em cinco grupos de
países e das actividades realizadas a nível da UE. Embora os países que constituem cada um
dos grupos apresentem algumas diferenças nas respectivas abordagens e escolhas
metodológicas e institucionais, a proximidade geográfica e as semelhanças institucionais
019
Colecção CEDEFOP
parecem favorecer uma aprendizagem mútua e, em certa medida, a procura de soluções
comuns.
Alemanha e Áustria: a abordagem dual
As abordagens alemã e austríaca em matéria de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal apresentam numerosas
semelhanças. É interessante notar que os dois países nos quais a aprendizagem pelo
trabalho tem sido mais sistematicamente integrada no ensino e na formação (no quadro do
sistema dual) são precisamente aqueles que, até agora, têm manifestado uma maior
reserva em acompanhar esta nova tendência. Por um lado, este facto reflecte o sucesso do
sistema dual, cuja eficácia em termos quer de pedagogia (combinação de aprendizagem
formal e experiencial) quer de capacidade (elevada percentagem de acolhimento dos
diversos grupos etários) é geralmente reconhecida. Por outro lado, tendo em vista a clara
prioridade dada à formação inicial, o sistema, na sua forma actual, só parcialmente parece
capaz de alargar as suas funções à formação profissional contínua e de responder às
necessidades de formação mais diversificadas dos adultos. No entanto, observa-se uma
intensa actividade de experimentação baseada nos projectos e um crescente interesse por
estas questões. O debate sobre o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não
formal na Alemanha e na Áustria está estreitamente relacionado com o da modularização
do ensino e da formação.
Grécia, Itália, Espanha e Portugal: a abordagem mediterrânea
Na Grécia, na Itália, em Espanha e em Portugal, a atitude relativamente à introdução de
metodologias e de sistemas de aprendizagem não formal é, em geral, positiva. Nas esferas
quer públicas quer privadas, é claramente expressa a utilidade de tais práticas. A imensa
reserva de conhecimentos adquiridos por via não formal que constitui a base de
importantes segmentos da economia deve tornar-se visível. Trata-se não apenas de facilitar
a utilização das competências existentes, mas também de melhorar a qualidade das
mesmas. As metodologias de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por
via não formal podem considerar-se instrumentos que permitem melhorar essa qualidade,
inofor
não apenas em relação aos trabalhadores e às empresas mas também em relação a
sectores inteiros da economia. A situação nestes países também revela a distância que
ainda falta percorrer para que se passe das intenções à execução. As acções legislativas e
políticas exprimiram-se por meio de reformas educativas de extensão variável, mas a
introdução efectiva de práticas de avaliação e de reconhecimento não tem mostrado
progressos. Os próximos anos dir-nos-ão se as intenções positivas expressas quase
unanimemente nestes quatro países se traduzirão em práticas com efeitos e utilidade reais
relativamente aos indivíduos e às empresas.
Finlândia, Noruega, Suécia e Dinamarca: a abordagem nórdica
Não é possível falar de um «modelo nórdico», pelo menos num sentido estrito. A
Finlândia, a Noruega, a Dinamarca e a Suécia optaram por abordagens diferentes e
avançam com ritmos sensivelmente diversos. Apesar dessas diferenças, estes quatro
países encetaram acções práticas, graças a iniciativas legislativas e institucionais, com vista a
reforçar os laços entre o ensino e a formação formais e a aprendizagem efectuada fora dos
estabelecimentos escolares. Embora alguns dos elementos inerentes a esta estratégia
sejam mais antigos, as iniciativas mais importantes foram tomadas nos últimos anos,
essencialmente desde 1994/1995. A aprendizagem mútua entre estes países é importante
e tem vindo a reforçar-se ao longo dos últimos dois ou três anos, como o revela,
nomeadamente, a influência das abordagens finlandesa e norueguesa nos recentes
documentos suecos. É manifesto que a Finlândia e a Noruega estão a abrir-se à integração
institucional da aprendizagem não formal numa estratégia geral de educação e de
formação ao longo da vida. Os projectos apresentados na Suécia e na Dinamarca revelam
que estes dois países progridem na mesma direcção e que a questão da aprendizagem não
formal se vai tornar progressivamente prioritária durante os próximos anos.
Reino Unido, Irlanda e Países Baixos: a abordagem «NQV»
No Reino Unido, na Irlanda e nos Países Baixos, a tendência é claramente a da aceitação de
um modelo de ensino e de formação centrado nos resultados e baseado no desempenho.
Uma das características fundamentais destes países é que a aprendizagem efectuada fora
dos estabelecimentos de ensino e de formação formais é reconhecida como um percurso
tão válido e importante como os percursos formais de aquisição de competências. No
entanto, o que está em causa é o modo como se pode implementar tal sistema. As
021
Colecção CEDEFOP
experiências britânica e holandesa revelam alguns dos problemas institucionais,
metodológicos e práticos relacionados com o estabelecimento de um sistema capaz de
integrar a aprendizagem não formal no seu próprio quadro. A dificuldade em desenvolver
uma norma de qualificação aceitável parece constituir o primeiro e, talvez, o mais sério
obstáculo. A partir do momento em que a avaliação é considerada criterial, a qualidade da
norma passa a ser fundamental. As experiências britânicas revelam algumas das
dificuldades relacionadas com a procura de um equilíbrio entre os referenciais de
competências demasiado gerais e demasiado específicos. A segunda dificuldade
evidenciada pelas experiências britânicas e holandesas, mas que não é visível nos
documentos de que dispomos acerca das experiências irlandesas, relaciona-se com as
clássicas questões da fiabilidade e da validade da avaliação. Nos documentos que
consultámos, os problemas apresentam-se claramente expostos, mas as respostas,
quando existem, não aparecem tão nitidamente definidas. Estes três países possuem
sistemas de formação e de ensino profissionais modularizados, o que parece facilitar a
introdução rápida e em grande escala de metodologias e de instituições nesta área.
França e Bélgica: «abertura» dos diplomas e dos certificados
Em vários aspectos, a França pode considerar-se como um dos mais avançados países da
Europa no domínio da identificação, da avaliação e do reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal. A Bélgica, embora tenha desenvolvido uma menor
actividade, tomou um certo número de iniciativas durante os últimos anos, em parte
inspiradas em experiências francesas. Em França, as primeiras iniciativas foram tomadas a
partir de 1985, quando foi implementado o dispositivo do balanço de competências. O
balanço destina-se a auxiliar os empresários e os trabalhadores a identificar e a avaliar as
competências profissionais, tendo como objectivo, simultaneamente, o apoio aos
projectos profissionais e uma melhor utilização das competências dentro da empresa.
A segunda importante iniciativa tomada em França consistiu na «abertura» do sistema
nacional de ensino e de formação às competências adquiridas fora dos estabelecimentos
formais. Desde 1992, podem ser emitidos certificados de aptidão profissional (em
diversos graus) com base na avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal.
Uma terceira iniciativa importante foi tomada pelas câmaras de comércio e de indústria
francesas, a fim de estabelecer procedimentos e normas de avaliação independentes do
sistema formal de ensino e de formação. Esta iniciativa, que tem como ponto de partida a
norma europeia EN 45013 sobre os procedimentos de certificação de pessoal, permitiu a
aquisição de uma experiência substancial. Na Bélgica, decorrem actualmente actividades
paralelas, também fundamentadas na norma EN 45013.
inofor
Abordagens comunitárias
As iniciativas realizadas a nível comunitário contribuíram claramente para a tomada de
consciência deste problema por parte do público e dos responsáveis políticos. O Livro
Branco da Comissão Europeia sobre a Educação e a Formação: Ensinar e aprender: rumo à
sociedade cognitiva (1995) permitiu definir claramente a questão e, assim, apoiar os
processos a nível nacional e sectorial. Os programas posteriormente implementados
(sobretudo Leonardo da Vinci e Adapt) impulsionaram e financiaram actividades de
experimentação sem precedentes. Embora não intervenha directamente nos esforços
que visam o desenvolvimento dos sistemas nacionais, a UE contribuiu de forma clara para
aumentar o interesse despertado por esta questão, prestando um apoio prático à
experimentação metodológica e institucional. Isto não significa que a estratégia específica
do Livro Branco, centrada nas normas europeias e no modelo europeu de carteira pessoal
de competências, tenha sido implementada. Uma das razões fundamentais para que tal
não tenha acontecido reside na heterogeneidade dos objectivos definidos aquando da
concepção inicial da própria tarefa. Por um lado, a carteira pessoal de competências foi
apresentada como uma abordagem somativa, tendo em vista introduzir uma forma nova e
mais flexível de fazer prova das qualificações e das competências. Por outro lado, esta
iniciativa visava o desenvolvimento de novas metodologias de avaliação, necessitando,
para isso, de identificar e de utilizar uma base mais alargada de competências; por outras
palavras, tratava-se de um objectivo formativo essencialmente destinado a apoiar os
processos cognitivos. A partir das actividades de experimentação conduzidas no âmbito do
programa Leonardo da Vinci, verifica-se que o primeiro objectivo teve um
desenvolvimento e um acompanhamento limitados. Regra geral, quando é possível
detectar um elemento somativo, este remete claramente para os sistemas nacionais de
qualificação existentes ou abrange um sector restrito ou uma profissão determinada. Por
seu lado, o aspecto formativo impôs-se como problema fundamental, residindo a
dificuldade não no estabelecimento de sistemas supranacionais extensivos mas na criação
de instrumentos práticos adaptados aos diferentes empregadores e/ou trabalhadores.
Atendendo a que as iniciativas têm origem numa grande variedade de intervenientes, as
questões e as metodologias foram abordadas a um «baixo» nível institucional, onde
dominam as questões e as preocupações formativas. Por outras palavras, a actividade dos
projectos reflecte as prioridades das empresas e dos sectores e não as dos ministérios
nacionais.
023
Colecção CEDEFOP
Qual a razão deste interesse
pelos conhecimentos adquiridos por via não formal?
Quais os factores que motivaram esta vaga de actividades propagada, quase
simultaneamente, à maioria dos países europeus? Para responder a esta pergunta, convém
examinar atentamente os objectivos, a evolução e os desafios políticos e institucionais.
Debruçar-nos-emos, em particular, sobre três aspectos.
Reconfigurar o ensino e a formação
A implementação de um sistema que permita a aprendizagem ao longo da vida exige uma
melhor articulação entre diferentes formas de aprendizagem em diferentes domínios, em
diferentes fases da vida. Enquanto o sistema formal se mantém muito centrado na
formação inicial, um sistema de aprendizagem ao longo da vida tem que aceitar o desafio
de associar diversos domínios de aprendizagem, quer formais quer não formais. Esta
aproximação é fundamental para que se dê resposta às necessidades sentidas pelos
indivíduos relativamente à renovação contínua e variada dos diversos saberes e às
necessidades sentidas pelas empresas em termos de poderem dispor de um largo
espectro de saberes e de competências, de uma espécie de reserva de conhecimentos
que lhes permita gerir o imprevisto. Além disso, a questão da identificação, da avaliação e
do reconhecimento das competências também é crucial. As competências devem tornarse visíveis para que possam ser plenamente integradas numa estratégia alargada de
reprodução e de renovação dos saberes.
Qualificações-chave
Embora sejam normalmente abordadas como se de dois problemas distintos se tratasse, a
maneira de definir, de identificar e de desenvolver as qualificações-chave e a dificuldade em
avaliar os conhecimentos adquiridos por via não formal estão estreitamente ligadas. A
nosso ver, estes dois debates reflectem diferentes facetas de uma mesma questão. Em
ambos os casos, observa-se um interesse crescente relativamente às necessidades de
aprendizagem e de saberes numa sociedade que experimenta mutações organizacionais e
tecnológicas sem precedentes. As metodologias e os sistemas de identificação, de
avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal podem
considerar-se instrumentos que permitem melhorar a visibilidade das qualificações-chave r
inofor
e reforçá-las. No entanto, as expressões «conhecimentos adquiridos por via informal» e
«conhecimentos adquiridos por via não formal» não são, nestas circunstâncias, de grande
auxílio. O conceito de conhecimentos adquiridos por via não formal é «negativo», na
medida em que se trata da negação de qualquer coisa. Esta expressão não dá indicações
positivas relativamente ao conteúdo, ao perfil ou à qualidade. No entanto, esse conceito é
importante, dado que chama a atenção para a riqueza e a variedade das áreas e das formas
de saberes que podem ser adquiridos fora do ensino e da formação formais. Por isso, o
estabelecimento de relações mais estreitas com a questão das qualificações-chave poderá
revelar-se útil e imprimir a esta tarefa uma orientação mais clara. O estabelecimento de
relações entre os domínios de saberes formais e não formais pode considerar-se como um
meio de realização e de concretização dos objectivos expressos por meio das
qualificações-chave.
Soluções em busca de problemas
Um desenvolvimento conduzido pela oferta?
O desenvolvimento de metodologias de medição e de avaliação só raramente é induzido
pela procura ou por uma impulsão a partir da base. Se analisarmos os anos de 1995-1999,
período durante o qual esta tendência se afirmou e se reforçou, o lançamento de
programas como Leonardo da Vinci ou Adapt a nível europeu ou sectorial contribuiu para
estabelecer e para alterar o «plano de acção em matéria de avaliação». A possibilidade de
se dispor de «dinheiro fresco», associada a um conjunto limitado de prioridades
específicas, levou a que um certo número de estabelecimentos se empenhasse no
desenvolvimento de instrumentos e de ferramentas. Embora os resultados dos projectos
possam variar em termos de qualidade, não se deve subestimar o seu impacto a longo
prazo nos planos de acção das organizações e dos estabelecimentos envolvidos. Os
próximos anos dir-nos-ão se este movimento a partir da oferta irá encontrar utilizadores, a
nível dos sectores e das empresas, por exemplo, capazes de apreciar o esforço
desenvolvido.
Como identificar, avaliar e reconhecer
os conhecimentos adquiridos por via não formal?
O facto de conhecermos as razões para este crescente interesse pelos conhecimentos
adquiridos por via não formal não implica que saibamos como apoiar e reforçar os
025
Colecção CEDEFOP
elementos positivos dessa evolução. De acordo com as explicações teóricas fornecidas na
primeira parte do relatório, podemos dizer que os próximos desafios são de ordem,
simultaneamente, metodológica (como medir) e política/institucional (como garantir a
aceitação e a legitimidade).
Requisitos metodológicos
Quais as funções a desempenhar pelas novas metodologias (e os novos sistemas
institucionais) de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não formal? Estaremos a falar de um papel formativo no qual os instrumentos e as
ferramentas servem para orientar os processos cognitivos dos indivíduos e das empresas,
ou de um papel somativo, mais restrito, no qual os conhecimentos adquiridos por via não
formal são testados com vista a uma eventual inclusão no contexto do ensino e da
formação formais? O objectivo da avaliação, num contexto tanto não formal como formal,
é determinante para as escolhas metodológicas a efectuar e para o êxito final da própria
avaliação. O bom desenvolvimento de metodologias e de sistemas só é possível se essas
funções forem claramente compreendidas e combinadas ou separadas de forma
construtiva e realista.
Em virtude da diversidade dos processos e dos contextos de aprendizagem, é difícil
alcançar um nível de fiabilidade idêntico ao dos testes normalizados (por exemplo, os de
escolha múltipla). Como conseguir a fiabilidade (e que tipo de fiabilidade) nesta nova área?
A fiabilidade deve situar-se na optimização da transparência do processo de avaliação
(normas, procedimentos, etc.). A fiabilidade pode também apoiar-se na implementação
de práticas sistemáticas e transparentes de garantia da qualidade a todos os níveis e para
todas as funções.
O carácter altamente contextual e (em parte) tácito dos conhecimentos adquiridos por via
não formal torna mais complexa a procura da validade. O risco de se medir outra coisa
diferente da que tinha sido inicialmente prevista é real. Antes de mais, convém evitar que a
avaliação dê uma imagem deformada do candidato e da área e tender o mais possível para
a autenticidade. As metodologias devem reflectir a complexidade da tarefa a realizar e ser
capazes de apreender o que é específico de um indivíduo ou de um contexto.
A questão dos pontos de referência (ou «normas») reveste-se de um grande interesse
relativamente à avaliação dos conhecimentos adquiridos por via quer formal quer não
formal. Enquanto a referência à norma (utilizando o desempenho de um grupo ou /de uma
população) não for devidamente analisada no contexto da avaliação dos conhecimentos
adquiridos por via não formal (em virtude da diversidade das competências consideradas) a
inofor
questão da referência ao critério ou à área mantém-se no cerne do problema. A definição
dos limites dos domínios de competências (em termos de alcance e de conteúdo) e a
maneira como essas competências podem ser descritas no interior desses domínios são da
maior importância. Quanto maior é o alcance, mais difícil se torna a concepção dos
dispositivos de uma avaliação autêntica. Este facto remete-nos para a questão das funções
atribuídas à avaliação: queremos melhorar os processos de aprendizagem ou produzir
provas (documentos com determinado valor)? Ambos os objectivos são profundamente
legítimos e úteis. No entanto, o estabelecimento de pontos de referência difere
consideravelmente em função do objectivo seleccionado.
Requisitos políticos e institucionais
Logo que for satisfeita a primeira exigência metodológica -, isto é, quando forem
resolvidas as questões de objectivo e de função, a implementação institucional e política
pode ser apoiada por duas estratégias: uma centrada na «concepção institucional» e a
outra na «aprendizagem mútua».
Concepção institucional: é necessário cumprir determinados critérios fundamentais para
que possam ser aceites as provas que atestam uma aprendizagem por via não formal da
mesma maneira que são aceites as que atestam um ensino e uma formação formais. Em
primeiro lugar, todos os intervenientes envolvidos devem poder exprimir os respectivos
pontos de vista no momento da implementação e de execução de sistemas de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. Uma vez que esses sistemas
têm um efeito directo na fixação dos salários e na atribuição dos empregos e das funções
no mercado de trabalho, é claro que este aspecto abrange a questão do equilíbrio de
interesses. Embora a questão de se saber quais os intervenientes que devem ser
convidados a participar e quais os que devem ser ouvidos não tenha despertado, até à
data, muito interesse, durante os próximos anos vai revestir-se de uma importância
decisiva. Em segundo lugar, o processo deve ser alimentado por informações pertinentes.
No que diz respeito à questão da representação, a definição e a estruturação das normas e
dos pontos de referência (em particular) exigem informações adequadas e equilibradas.
Em terceiro lugar, a transparência das estruturas e dos procedimentos desempenha um
papel extremamente importante. É possível criar estruturas em que a repartição dos
papéis (estabelecimento das normas, avaliação, recursos, controlo de qualidade) seja
claramente definida e apresentada. A transparência dos procedimentos é condição
indispensável para a aceitação e a legitimidade. Nos próximos anos, todas estas questões
terão que ser objecto de reflexão tanto dos investigadores como dos decisores políticos.
027
Colecção CEDEFOP
Aprendizagem mútua: deve implementar-se e apoiar-se a aprendizagem mútua entre os
projectos, as instituições e os países. Grande parte da aprendizagem é já efectuada em
diferentes níveis. Como já referimos em várias ocasiões, nomeadamente quando fizemos
a análise das actividades realizadas a nível europeu, o potencial de aprendizagem mútua
ultrapassa em muito as realizações e as práticas observadas actualmente. O
estabelecimento de mecanismos neste domínio deve reflectir a variedade dos objectivos e
das funções. Por fim, é absolutamente indispensável que haja uma melhor coordenação
das actividades, bem como um maior apoio (a nível europeu e nacional), a fim de serem
capitalizadas as experiências adquiridas graças aos múltiplos projectos, programas e
reformas institucionais já empreendidos.
inofor
1>Introdução
029
Colecção CEDEFOP
O PRESENTE RELATÓRIO aborda a questão dos meios a utilizar para melhorar a
visibilidade da aprendizagem efectuada fora dos estabelecimentos de ensino e de
formação formais. Enquanto a aprendizagem efectuada nos sistemas de ensino e de
formação formais é uma característica distintiva das sociedades modernas, a aprendizagem
não formal é muito mais difícil de detectar e de apreciar2. No entanto, esta falta de
visibilidade é cada vez mais encarada como um problema que prejudica o
desenvolvimento das competências a todos os níveis, desde o dos indivíduos ao da
sociedade no seu conjunto3.
Esta publicação tem como objectivo proporcionar uma visão de conjunto acerca das
principais tendências europeias no domínio da identificação, da avaliação e do
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. Trata-se de uma tarefa difícil,
mas também de um desafio a enfrentar. A dificuldade reside na extrema rapidez das
mudanças e da inovação, em termos quer de metodologias quer de instituições e de
políticas. Nos últimos anos, a maioria dos Estados-Membros da União Europeia realçou o
papel crucial da aprendizagem efectuada fora e como complemento do ensino e da
formação formais. Esta atenção particular traduziu-se num número crescente de
iniciativas, tanto a nível das políticas como a nível das práticas, que permitiram a passagem
progressiva da simples experimentação para o início da implementação. Trata-se de um
desafio na medida em que falamos de uma evolução que ocorre em contextos diversos,
não apenas a nível europeu, nacional e regional, mas também a nível sectorial e a nível das
empresas. A interacção entre esses níveis nunca foi objecto de uma atenção específica e o
desafio consiste em determinar se é possível extrair desta soma heterogénea de
experiências um núcleo comum.
No Livro Branco sobre a Educação e a Formação: Ensinar e aprender: rumo à sociedade
cognitiva apresentado pela Comissão (Comissão Europeia, 1995) já era proposta a ideia
de uma abordagem europeia comum no domínio da identificação, da avaliação e do
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. A ambição desta proposta,
que consistia na introdução de uma «carteira pessoal de competências» e cuja
implementação ocorreria no âmbito de um «sistema europeu de acreditação de
competências», era a de desenvolver um instrumento e uma estrutura que permitissem
alargar o leque de competências utilizadas pelos indivíduos, as empresas e a sociedade no
2
O termo «aprendizagem não formal» abrange a aquisição informal de saberes, que pode ser descrita como uma
aprendizagem não planificada em situações de trabalho e outras, mas também as fases de aprendizagem planificadas e
explícitas introduzidas nas organizações e noutros locais, que não são reconhecidas no seio do sistema de ensino e de
formação formais.
3Cf. Glossário em anexo para a definição desta terminologia, bem como a de outros termos específicos do tema.
inofor
seu conjunto. Esta ambição de criar um instrumento único não chegou a ser concretizada.
Apesar dos múltiplos projectos-piloto centrados nas questões técnicas e organizacionais
em jogo que foram lançados neste domínio (programas Leonardo da Vinci, Sócrates e
Adapt), nem a ideia de uma «carteira pessoal de competências», nem a perspectiva de um
«sistema europeu de acreditação das competências» chegaram a traduzir-se em soluções
práticas e permanentes. O principal impulso dado a tal desenvolvimento situa-se a nível
nacional e, cada vez mais, a nível sectorial e a nível das empresas. Este facto reflecte,
provavelmente, a necessidade de descobrir soluções metodológicas e institucionais
adaptadas a necessidades e a utilizadores específicos. As necessidades de uma empresa são
radicalmente diferentes das necessidades das autoridades nacionais responsáveis pela
educação e/ou pelo emprego, e as necessidades dos indivíduos são radicalmente
diferentes das necessidades dos ramos e dos sectores de actividade. Esta circunstância
coloca-nos perante um paradoxo: na medida em que, por uma razão ou por outra, as
metodologias de avaliação se desenvolveram para aumentar a visibilidade das
competências não formais e para facilitar a sua transferência de um contexto para outro, o
desenvolvimento, a nível nacional e sectorial e a nível das empresas, de metodologias
destinadas a dar resposta a necessidades específicas e circunscritas não estará em contracorrente relativamente a esse objectivo geral de possibilidade crescente de transferência?
Este paradoxo não pode ser solucionado totalmente num único nível, seja ele nacional,
regional, sectorial ou das empresas. A questão de se saber se é possível encontrar soluções
europeias (graças a um quadro comum que permitiria ligar as iniciativas separadas)
mantém-se em aberto.
É importante sublinhar que os desafios relacionados com o desenvolvimento de métodos
e de sistemas que permitam identificar, avaliar e reconhecer os saberes adquiridos por via
não formal não podem reduzir-se ou limitar-se a questões puramente técnicas ou
instrumentais. Se interpretarmos as tendências mencionadas acima numa perspectiva
positiva, podemos dizer que esse desenvolvimento nos permite o acesso a uma grande
reserva de saberes e de competências que, até agora, só foi explorada de modo marginal e
não sistemático. Em compensação, se o interpretarmos numa perspectiva negativa, tratarse-á de uma intrusão da medição e da avaliação em domínios sociais que, até agora, mal
foram afectados por essas técnicas. Estas dimensões éticas da questão raramente são
abordadas. Corremos o risco de nos aventurarmos numa «zona de penumbra» da vida
privada e da natureza humana que não deveria ser nem medida nem avaliada. O
desenvolvimento de metodologias e de sistemas de alta qualidade neste domínio significa
que estamos prontos a colocar interrogações sobre essas fronteiras.
Para além desta introdução, o presente relatório comporta cinco capítulos. O capítulo 2
aborda questões teóricas fundamentais, tais como a natureza dos conhecimentos
031
Colecção CEDEFOP
adquiridos por via não formal e as implicações políticas da criação de sistemas neste
domínio. Aí são também apresentados alguns ensinamentos retirados das práticas de
avaliação no ensino e na formação formais. O capítulo 3 apresenta as iniciativas e a
evolução nos Estados-Membros. O capítulo 4 apresenta e analisa as iniciativas conduzidas
a nível comunitário, com uma atenção especial para a mensagem do Livro Branco sobre a
Educação e a Formação: Ensinar e aprender: rumo à sociedade cognitiva e para as
experiências do programa Leonardo da Vinci. No capítulo 5, tentaremos estabelecer
ligações entre alguns dos elementos introduzidos nos capítulos anteriores, apresentando
uma interpretação dos principais intervenientes, objectivos e soluções para os diferentes
níveis considerados. O capítulo 6 contém comentários de conclusão. O extenso campo de
análise apresentado nos cinco principais capítulos procura combinar a compreensão
teórica dos próximos desafios e a descrição empírica da evolução e das tendências.
Embora não tenhamos analisado pormenorizadamente cada iniciativa ou acção,
esperamos que esta abordagem contribua para uma melhor compreensão dos desafios a
enfrentar e das escolhas a fazer nos próximos anos.
inofor
2>Premissas teóricas
4
033
Colecção CEDEFOP
A QUESTÃO DA IDENTIFICAÇÃO, da avaliação e do reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal é de natureza profundamente prática. As metodologias
devem ser simples e não dispendiosas e assentar numa noção clara do modo de partilha
das responsabilidades técnicas, institucionais e políticas. Mas, antes de mais, devem poder
proporcionar aquilo que prometeram, sendo, por isso, determinante a qualidade da
«medição». Isto exige uma profunda compreensão da aprendizagem não formal enquanto
tal. Ao clarificarmos determinados aspectos teóricos envolvidos, esperamos poder
esclarecer alguns dos desafios práticos com que nos defrontamos.
2.1>Natureza contextual e tácita dos conhecimentos adquiridos por
via não formal
A fim de desenvolver metodologias realmente capazes de apreender, de maneira válida e
fiável, a aprendizagem realizada fora dos estabelecimentos de ensino e de formação
formais, convém analisar algumas das características fundamentais da aprendizagem. Em
primeiro lugar, a aprendizagem é de natureza contextual. Quando esta se efectua em
contextos sociais e materiais, os saberes e as competências são, em larga medida,
resultado da participação das «comunidades de práticas» (Lave e Wenger, 1991). A
aprendizagem tem sido, frequentemente, encarada como um processo pelo qual o
formando «interioriza» o saber, quer este seja «descoberto», «transmitido» ou «vivido» em
interacção com outrem. Mas a aprendizagem não pode reduzir-se à recepção passiva de
«fragmentos» de saber. Esta focagem na interiorização estabelece uma clara dicotomia
entre interior e exterior, sugere que a aprendizagem é algo que se opera exclusivamente
no interior do cérebro, sob a forma de um processo cerebral, e considera o indivíduo
como uma unidade não problemática de análise. Desta forma, a aprendizagem reduz-se a
um processo de absorção, a uma questão de transmissão e de assimilação. A abordagem
alternativa proposta por Lave e Wenger fornece uma base potencialmente melhor para a
compreensão e a identificação dos diversos aspectos da aquisição e da formação do saber,
na medida em que acentua não apenas a natureza relacional da aprendizagem (papel do
4
O presente capítulo baseia-se em dois artigos publicados na Revista Europeia «Formação Profissional» (nº 12, 1997).
Enquanto os textos de 1997 incidiam sobre desafios fundamentais, do ponto de vista metodológico e institucional, face
ao desenvolvimento e implementação de metodologias destinadas a avaliar e a reconhecer as aprendizagens não
formais, este capítulo procura estabelecer uma base teórica que permita compreender de modo adequado as iniciativas
realizadas em diversos níveis. Para uma apresentação mais pormenorizada das questões teóricas em jogo, consulte-se
também a nossa contribuição para o relatório Formation pour une société en mutation (Cedefop, 1999).
inofor
indivíduo no seio de um grupo social), mas também a sua natureza negociada, responsável
e empenhada (carácter comunicativo da aprendizagem). O indivíduo que aprende não
adquire um corpus discreto de saberes abstractos que reaplicará em contextos
posteriores. Pelo contrário, adquire as competências necessárias para agir, implicando-se
num processo cognitivo permanente. Deste modo, a aprendizagem não é apenas uma
reprodução, mas também uma reformulação e uma renovação dos saberes e das
competências. Como foi sublinhado por Engeström (1993, 1994 e 1996), quando o
formando é colocado perante uma nova situação ou um problema imprevisto, não pode
contar unicamente com a base estabelecida das suas competências; deve esforçar-se por
encontrar novas soluções e por desenvolver práticas alternativas. Esta observação
remete-nos para Herbert Simon (1973), que sublinha que, nas organizações, os
problemas mal estruturados são mais conhecidos do que os problemas bem estruturados.
Assim, o mais importante é saber gerir o imprevisto e poder compreender o inexplicável.
O bom desempenho do formando manifesta-se na capacidade de, não apenas, reproduzir
competências já existentes numa comunidade de práticas, mas também de pôr em causa
essas práticas e de as melhorar. A partir do modelo de aprendizagem «expansiva» de
Engeström, podemos identificar um certo número de elementos que convém ter em
consideração nas metodologias de avaliação:
a) a capacidade de pôr em causa os factos estabelecidos;
b) a capacidade para definir e para clarificar problemas;
c) a capacidade para cooperar e encontrar soluções possíveis;
d) a capacidade para formular e aplicar soluções.
Estas capacidades são aspectos importantes de uma atitude competente num contexto
profissional. Desta forma, a capacidade para aprender é acentuada enquanto qualidade
fundamental, que ultrapassa em importância até os elementos específicos de saber e de
experiência sobre os quais incide a aprendizagem. Voltando ao desenvolvimento de
metodologias de avaliação, esta importância mostra a necessidade de um equilíbrio entre a
atenção dispensada às capacidades de aprendizagem e a que é prestada às competências
factuais. Aprender a aprender, incluindo aprender a fazer face aos problemas imprevistos,
constitui um elemento-chave que convém levar em conta no desenvolvimento de
qualquer metodologia que vise a apreensão da essência dos conhecimentos adquiridos
por via não formal.
Em segundo lugar, as competências são, em parte, de natureza tácita (Polanyi, 1967). Por
outras palavras, é difícil verbalizar e delimitar cada uma das fases ou das regras intrínsecas
de uma dada competência. Em certos casos, os indivíduos nem sequer têm consciência de
035
Colecção CEDEFOP
que possuem esta ou aquela competência. Este aspecto deve, obrigatoriamente, entrar
em linha de conta na avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal e deve
reflectir-se nas metodologias. Quase todos nós sabemos andar de bicicleta, mas teremos
grande dificuldade em formular as regras específicas intrínsecas a essa competência. O
«saber-fazer» em causa foi adquirido pela prática e pela experiência esforçada. Um
marceneiro experiente sabe utilizar uma ferramenta de um modo que escapa à
verbalização. Regra geral, consideramos tão naturais esses saberes-fazer que não nos
apercebemos até que ponto ele está presente nas nossas actividades. Este facto verifica-se
talvez mais nas situações em que esses saberes-fazer nos abandonam, quando a nossa
atitude intuitiva e não reflexiva face a essas actividades é interrompida por uma qualquer
razão. Uma parte importante daquilo que incluímos na expressão «conhecimentos
adquiridos por via não formal» pertence a esta esfera do saber implícito. Normalmente,
um trabalhador experiente, colocado perante uma situação ou um problema novo, será
capaz, sem pensar muito no assunto, de fazer uso da soma dos saberes abstractos e das
experiências concretas que acumulou. A transformação desses saberes tácitos, implícitos e
intuitivos em unidades de saber oficialmente validados é difícil e arriscada. Difícil, porque
penetramos num domínio que escapa, em parte, à descrição, e arriscada, porque a
construção dos saberes-fazer que tentamos apreender pode revelar-se incorrecta. Além
disso, a possibilidade de apreender os saberes tácitos sob a forma de descrições formais
confronta-se com problemas de ordem económica e prática: quanto tempo e quais os
recursos a consagrar à avaliação de cada indivíduo? Corremos ainda o risco de nos imiscuir
em domínios que não se prestam à medição e de nos comprometer numa operação
problemática do ponto de vista ético, em que as actividades previamente definidas como
«trabalho», «tempos livres» e «vida familiar» são redefinidas em termos de
«aprendizagem». Se interpretarmos este aspecto numa perspectiva crítica, trata-se de uma
intrusão da medição e da avaliação em esferas sociais que, até ao momento, eram muito
pouco afectadas por essas técnicas.
A qualidade da avaliação assenta, assim, num certo número de factores. As metodologias
devem reflectir a natureza, quer individual e contextual quer tácita e implícita, dos
conhecimentos adquiridos por via não formal e estabelecer um equilíbrio entre esses dois
aspectos. Geralmente, a avaliação realizada num contexto de ensino e de formação
formais responde a critérios de fiabilidade (coerência) e de validade. Esses critérios são
igualmente importantes num contexto de aprendizagem não formal mas, sob vários
pontos de vista, é ainda mais difícil de lhes dar resposta do que num contexto de ensino e
de formação formais A questão da validade é crucial, pois as metodologias devem permitir
a apreensão da variedade e da heterogeneidade dos percursos e dos resultados de
aprendizagem. Considerando as dificuldades em termos de limitação de tempo e de
inofor
recursos, as metodologias devem, simultaneamente, dar resposta à necessidade de
normalização e de simplificação e reflectir uma atitude de abertura em relação ao que
escapa à norma e ao que é específico a um indivíduo ou a um grupo. Uma «medição» digna
deste nome implica uma abertura à riqueza e à complexidade da aprendizagem; é o mapa
que deve ser desenhado em função do terreno e não o terreno que deve ser descrito de
modo a corresponder ao mapa. Conseguir o equilíbrio entre a máxima validade e os
imperativos de normalização e de simplificação constitui um dos desafios fundamentais a
enfrentar. Também fundamental é a questão da fiabilidade (coerência). Os utilizadores
devem estar convencidos de que os resultados podem ser comparados e de que as
variações injustas nas práticas de avaliação foram tanto quanto possível evitadas. Qualquer
situação em que os candidatos sejam tratados de maneira diferente por falta de
transparência dos procedimentos e por interpretações divergentes por parte dos
avaliadores põe em risco a legitimidade do sistema.
Em geral, o desafio da avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal consiste
em registar, quer em papel quer, cada vez mais frequentemente, em cartões electrónicos
os resultados específicos de aprendizagem de indivíduos ou de contextos. Esta avaliação
deve ser realizada num contexto de procedimentos com vista à normalização e à
simplificação (em virtude dos recursos limitados e das legítimas exigências de coerência). É
este equilíbrio entre princípios aparentemente opostos que transforma esta tarefa num
desafio não apenas para os decisores políticos mas também para os investigadores e os
técnicos.
2.2>Testagem e avaliação no ensino e na formação formais: questõesChave e principais desafios
A avaliação constitui o tema central do presente estudo. Enquanto o ensino e a formação
formais têm já uma longa tradição de prática, de investigação e de teoria neste domínio, em
compensação, há ainda um longo caminho a percorrer para o desenvolvimento de
metodologias específicas de avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal. O
actual alargamento da avaliação à esfera do trabalho e dos tempos livres está,
inevitavelmente, ligado a essa tradição. Tudo leva a crer que as novas abordagens se
inspiram, em larga medida, nas metodologias desenvolvidas em relação aos domínios de
aprendizagem (relativamente) mais estruturados do sistema escolar formal. Pelo menos,
parece que alguns dos desafios e dos problemas são semelhantes nos dois domínios de
aprendizagem, formal e não formal. Antes de analisarmos os esforços desenvolvidos a
nível europeu destinados a avaliar os conhecimentos adquiridos por via não formal,
037
Colecção CEDEFOP
tentaremos apresentar uma síntese de alguns ensinamentos em matéria de avaliação e de
testagem retirados do ensino e da formação formais. Essa síntese pode considerar-se, em
certa medida, como um esforço para estabelecer um ponto de referência para a análise
das «novas» abordagens em matéria de avaliação e de testagem. Retomando uma questão
que já tínhamos colocado (Cedefop, Bjørnåvold e Brown, 2000): estaremos a utilizar
velhos instrumentos pintados com um novo verniz para resolver problemas novos?
No ensino e na formação formais, a avaliação desempenha várias funções principais (Black,
1998). O feedback constitui uma parte essencial do ensino e da aprendizagem, e a
avaliação pode desempenhar um papel formativo de apoio ao processo cognitivo.
Nenhum sistema consegue funcionar correctamente sem uma informação frequente
acerca do próprio desenrolar do processo. Este aspecto é importante quer nas salas de
aula quer nas empresas; quanto mais variável e imprevisível for o contexto, mais necessário
se torna um fedback. Numa situação ideal, a avaliação deveria fornecer um feedback a
curto prazo, para que as deficiências da aprendizagem fossem imediatamente identificadas
e corrigidas. A responsabilidade da avaliação formativa deve incumbir, normalmente, à
pessoa directamente implicada no processo de aprendizagem, que pode partilhá-la com
outras, de diversas maneiras. A avaliação desempenha também um papel somativo, pois
vai comprovar o cumprimento de uma sequência de aprendizagem. Embora essa
comprovação possa assumir diversas formas (certificados, diplomas, balanços, etc.), a sua
finalidade é a de facilitar a passagem de um nível ou de um contexto para outro (de uma
classe para outra, de um estabelecimento para outro ou da escola para o trabalho). Este
papel também pode ser formulado em termos de selecção e de meio para controlar o
acesso aos níveis, às funções e às profissões. Finalmente, as contas que os sistemas públicos
de ensino e de formação devem apresentar fundamentam-se, muitas vezes, nos
resultados (sintetizados) de avaliações. Esses sistemas devem dar cumprimento a diversas
normas de desempenho e de qualidade, e os testes ou a avaliação permitem «medir» se os
objectivos foram ou não atingidos. Normalmente, esses três principais papéis (ou funções)
de avaliação não apresentam, em relação uns aos outros, uma distinção clara e unívoca. As
funções formativa e somativa coexistem nas mesmas fases e dão, por vezes, lugar a
tensões.
Independentemente das funções diferentes e, em parte, contraditórias da avaliação, os
factores que determinam, em larga medida, se essas funções foram ou não
desempenhadas, são, entre outros, a confiança, a aceitação e o crédito. A confiança
atribuída a um estádio específico de avaliação está, geralmente, ligada aos critérios de
fiabilidade e de validade. A fiabilidade de uma avaliação depende da possibilidade de
reprodução dos mesmos resultados aquando de um novo teste avaliado por pessoas
diferentes. O carácter objectivo dos testes ou da avaliação é um elemento fundamental e
inofor
não deve poder ser facilmente afectado ou perturbado por factores externos. Em vários
aspectos, a validade pode considerar-se um conceito e uma preocupação mais complexos
do que a fiabilidade. Em primeiro lugar, importa determinar se a avaliação mede
efectivamente aquilo para que foi preparada. A autenticidade é um aspecto fundamental;
um elevado grau de fiabilidade tem pouco valor se o resultado da avaliação apresenta uma
imagem deformada da área e do candidato em causa. A teoria revela que existem
numerosas formas de validade. A procura da autenticidade diz respeito à validade do
conteúdo, tendo como objectivo reflectir de forma correcta o desempenho em relação a
uma determinada tarefa. Em compensação, a validade de construção procura medir,
indirectamente, uma entidade construída de forma teórica, como, por exemplo, a
«inteligência» (nos testes de inteligência). É possível identificar numerosas entidades deste
tipo: a «criatividade», a «capacidade de cálculo», o «raciocínio verbal», etc. Nos casos deste
tipo, é necessário clarificar o sentido da entidade construída (por exemplo, a «inteligência»)
e proceder a uma análise empírica, a fim de se determinar se esse conceito pode ser
tratado como uma característica e uma entidade comuns.
Os conceitos de fiabilidade e de validade não terão sentido se não estiverem ligados a
pontos de referência, a critérios de apreciação e/ou a normas de desempenho, etc. É
possível identificar dois princípios essenciais utilizados para estabelecer esses pontos de
referência e/ou esses critérios. No ensino e na formação formais, é habitualmente utilizada
a referência à norma. Graças a esse princípio, os resultados de um teste são calculados e
expressos em função da distribuição dos resultados numa amostragem de indivíduos5. Os
testes normativos devem levar em linha de conta dois aspectos essenciais. Em primeiro
lugar, a amostragem utilizada para estabelecer a norma reveste-se de importância crucial;
deve ser suficientemente vasta para ser pertinente e deve ser representativa da população
de referência. Em segundo lugar, a selecção dos itens utilizados no teste é importante. Têm
pouco valor informativo itens em que todos os candidatos tenham acertado, tal como
aqueles em que nenhum candidato acertou. Por isso, a dificuldade reside na identificação
dos itens que facultam um máximo de informação, para que se possa estabelecer uma
diferenciação em função da curva de Gauss dos resultados (que decorre da abordagem
estatística adoptada). Os testes normativos prestam-se a métodos de análise muito
aprofundados. O problema é que, embora seja possível classificar o conjunto da
5
Os testes de inteligência são uma forma clara de ilustrar esse princípio. Os testes deste tipo são realizados a partir de
uma vasta amostragem de população e atribui-se, normalmente o valor de 100 ao resultado médio. A escala dos
resultados é, em seguida, ajustada de modo a determinar um desvio normalizado de 15, o que significa que o resultado
de 2/3 da população varia entre 85 e 115. Isto permite determinar o significado relativo dos outros resultados.
039
Colecção CEDEFOP
população em relação a um valor médio 100, o valor informativo pode revelar-se
ambíguo: o que é que nos é indicado por esta ordem de classificação? A segunda forma de
estabelecer um ponto de referência consiste em associar um dado desempenho a um
determinado critério. Os testes criteriais implicam que se identifique um domínio de
saberes e de competências, depois, que se tente definir critérios gerais a partir do
desempenho observado nesse domínio específico. Embora os testes normativos e
criteriais possam apresentar uma margem substancial de sobreposição, podem observarse neles algumas diferenças essenciais. Em primeiro lugar, o relevo dado ao critério significa
que as questões são seleccionadas em função da sua pertinência relativamente ao
programa de ensino e de aprendizagem, pelo contrário, este aspecto não teria
importância ou seria mesmo, em parte, incompatível com os testes normativos. Uma
segunda diferença incide sobre o sucesso do candidato. No caso de um teste criterial, uma
taxa de sucesso de 80% a 90% confirmaria que os candidatos adquiriram uma
compreensão ou um domínio de base acerca do tema. Um teste normativo que revelasse
uma tal percentagem de sucesso não teria qualquer utilidade, pois não permitiria
estabelecer distinções entre a maioria dos candidatos. Uma variante dos testes criteriais é a
referência a um domínio (Popham, 1978). A experiência revela que a definição dos limites
de um domínio é uma tarefa crítica, em relação à qual é conveniente levar em linha de
conta tanto os limites como a extensão do domínio.
«A definição de um domínio só pode ser adequadamente formulada
quando essa definição especifica os seus limites, incluindo o
conteúdo e a forma como este deve ser expresso, manipulado ou
utilizado pelo candidato.» (Black, op.cit., p. 65)
Em 1956, Bloom trouxe um contributo determinante para a resolução desta dificuldade.
Com efeito, definiu seis objectivos educativos a considerar na elaboração de testes e que
são o saber, a compreensão, a aplicação, a análise, a síntese e a avaliação. Bloom organiza
estes seis objectivos de acordo com uma ordem hierárquica, considerando as últimas
categorias mais exigentes do que as primeiras. Além disso, as últimas categorias devem
incluir as primeiras, partindo do princípio que já estão adquiridas. A investigação empírica
efectuada a partir desta hierarquia não permitiu confirmar a existência de uma estrutura tão
clara. Em compensação, ficou manifesta a nítida distinção entre, por um lado, a categoria
«saber» e, por outro, as categorias «síntese» e «avaliação». Embora tenha sido criticada e
contestada a partir da sua publicação, a estrutura de Bloom foi adaptada e utilizada em
numerosos trabalhos de avaliação.
Para medir e avaliar o desempenho dos alunos e dos estudantes no ensino e na formação
inofor
formais, foi desenvolvido um vasto leque de ferramentas e de instrumentos, que
reflectem, explícita e implicitamente, os diversos princípios e funções já aqui apresentados
(formativos ou somativos, referência à norma ou referência ao critério). Reflectem
também considerações acerca de capacidade e de custo. Num extremo desse leque,
encontramos o que se pode chamar testes de respostas predefinidas, em que os
candidatos devem escolher de entre um certo número de opções (exemplo típico desta
forma são os testes de escolha múltipla). Em geral, os candidatos devem escolher entre
verdadeiro ou falso ou responder a questões de correspondência de pares. Para dar um
exemplo destas últimas, imaginemos um candidato a quem é pedido que seleccione, de
entre uma lista de cinco sábios, aquele que realizou uma das quatro célebres descobertas
propostas (Black, op. cit., p. 81). Graças à utilização de metodologias assistidas por
computador, foi possível desenvolver uma versão aperfeiçoada do teste de respostas
predefinidas (escolha múltipla). Os testes adaptativos informatizados permitem a
apresentação ao candidato de perguntas que reflectem a qualidade das respostas
precedentes. São numerosas as vantagens que explicam a popularidade desta abordagem.
Antes de mais, estes testes permitem abranger um leque de desempenhos mais vasto do
que outras formas de perguntas. Além disso, o desempenho não depende das capacidades
de escrita e a fiabilidade não pode ser posta em causa por uma notação subjectiva. No
entanto, também são vários os inconvenientes identificados. As respostas correctas
podem resultar de conjecturas e o teste não consegue revelar as razões que motivaram a
escolha daquelas. O valor formativo destes testes é, por isso, limitado. O recurso quase
exclusivo a este tipo de testes pode afectar o método predominante de aprendizagem e de
ensino e atribuir uma excessiva prioridade a uma abordagem «atomizada» da
aprendizagem. Os testes baseados em respostas fechadas propõem ao candidato um
leque relativamente mais vasto de opções. Exemplos comuns deste tipo de testes são
aqueles em que é fornecido um item, a saber, uma palavra ou uma frase, para se obter a
resposta requerida. Outras variantes consistem em pedir ao candidato para apresentar as
razões das suas respostas de escolha múltipla ou para formular, por palavras suas, uma
razão para um dado acontecimento ou para um fenómeno determinado. Em certos casos,
pede-se ao candidato que responda a uma lista de perguntas curtas, concebidas para testar
a sua compreensão acerca de um conjunto de dados ou de um texto. Esta variante tem
algumas das vantagens dos testes de respostas predefinidas (vasta cobertura, fiabilidade), e
um estímulo mais autêntico. No entanto, como no caso das respostas predefinidas, este
tipo de teste exige um grande cuidado na concepção e uma pré-testagem intensiva, a fim
de se evitar qualquer ambiguidade de compreensão resultante da estrutura e da
formulação do teste. Os testes de perguntas abertas com respostas longas dão lugar a
múltiplas respostas e a interpretações individuais. Permitem, muitas vezes, verificar a
041
Colecção CEDEFOP
capacidade do candidato na selecção, na explicação e na integração de diversos elementos
de conhecimento e de compreensão, bem como a sua capacidade para explicar, avaliar e
demonstrar criatividade. Nas avaliações formativas, essas funções podem ser reforçadas
graças à reacção do candidato face aos diversos elementos contidos no teste. Embora
apresente um grau relativamente elevado de validade, este tipo de avaliação apresenta um
nítido inconveniente em termos de fiabilidade. O problema fundamental consiste na
dificuldade em garantir a fiabilidade da notação. No entanto, tal facto só constitui um
problema na medida em que a redacção das respostas responde a um objectivo somativo.
Num contexto formativo, as respostas podem ser desenvolvidas em diversas direcções,
como, por exemplo, a partir de uma pesquisa documental, etc. É possível distinguir uma
outra categoria de testes e de avaliação, a que se poderia chamar «avaliação do
desempenho». Embora apresente numerosas variantes, o princípio unificador deste tipo
de teste consiste em avaliar actividades que podem ser modelos correspondendo
directamente à realidade, e não fragmentos ou substitutos isolados. Em vez de se pedir ao
candidato para dizer o que sabe fazer, pede-se-lhe que mostre o que sabe fazer (Airasian,
1991, pág. 252). A decisão mais criticável neste tipo de testes é talvez a que incide sobre a
escolha da tarefa a partir da qual o candidato será examinado: trata-se de determinar se
essa tarefa permite ao candidato fazer realmente prova das suas competências, assim
como o modo de superar as limitações em termos de tempo e de equipamento. Além
disso, importa determinar a maneira como devem ser definidos os limites do trabalho,
bem como o modo de comunicar os critérios de avaliação ao candidato. Neste tipo de
avaliação, podem ser utilizadas diversas formas de provas; nomeadamente, tanto é
possível observar o comportamento do candidato, como dar particular atenção aos
critérios de resultados. A experiência revela que, por vezes, é preferível deixar o candidato
fazer uma apresentação oral, a fim de permitir um diálogo acerca do processo e do
desempenho. Não há dúvida de que esta forma de avaliação joga a favor da validade,
desde que as tarefas e os limites sejam adequadamente definidos. Um outro elemento da
validade consiste no grau de informação do candidato relativamente à filosofia do teste. A
fiabilidade pode pôr um grande problema: nestas formas de avaliação, a questão da
correcção e da notação é delicada. Embora seja possível desenvolver modelos formais,
não há dúvida de que as competências e a experiência do avaliador desempenham um
papel extremamente importante. A experiência do Reino Unido revela que, para garantir a
fiabilidade, pode ser necessária a execução de um grande número de tarefas (Black, op.
cit.). Aparentemente, nenhum dos sistemas implementados no Reino Unido conseguiu
resolver plenamente estes problemas. A avaliação realizada a partir de um «portefólio de
competências» constitui um processo integrado em diversos graus em alguns sistemas
nacionais de ensino e de formação. Pode definir-se um portefólio como um conjunto de
inofor
trabalhos realizados, dos quais alguns foram ou serão utilizados para avaliar o
desempenho. A propósito das experiências do Reino Unido, Black comenta que os
esforços empreendidos para a inclusão do portefólio nas metodologias da avaliação foram
marcados por uma clara tensão entre as abordagens formativa e somativa (Black, p. 97).
Embora muito condensada, esta apresentação dos testes e da avaliação no contexto do
ensino e da formação formais revela-se extremamente pertinente em relação à nossa
análise da avaliação fora do domínio formal. Se tomarmos como ponto de partida a
estrutura da nossa apresentação, poderemos definir um certo número de questões e de
temas:
a) Quais as funções formativas ou somativas a desempenhar pelas novas metodologias (e
os novos sistemas institucionais) de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal?
b) A diversidade dos processos de aprendizagem e dos contextos de aprendizagem coloca
a questão de se saber se é possível conseguir o mesmo tipo de fiabilidade neste domínio e
no ensino e na formação formais.
c) A natureza contextual e (em parte) tácita da aprendizagem torna mais complexa a
procura da validade e convém determinar se as metodologias são correctamente
concebidas e elaboradas para gerir essa dificuldade.
d) A questão dos pontos de referência («normas») é um problema-chave a considerar.
Convém determinar se os limites dos domínios (incluindo o «alcance» e o conteúdo das
competências) se encontram correctamente definidos.
Mantém-se em aberto a questão de se saber se a avaliação dos conhecimentos adquiridos
por via não formal implica a introdução de novos instrumentos e ferramentas ou se falamos
de velhas abordagens para dar resposta a novos desafios. Como já referimos na introdução
deste capítulo, é legítimo acreditar que, em certa medida, assistimos, pelo menos, a uma
transferência de metodologias tradicionais de testagem e de avaliação para este novo
domínio. Neste caso, as experiências recolhidas no ensino e na formação formais revelarse-ão preciosas. Convém também ter em consideração as abordagens centradas nas
provas práticas. No entanto, importa evitar a reinvenção de abordagens já conhecidas.
Voltaremos a estas questões na última parte do relatório, a fim de determinar se a evolução
a ocorrer a nível europeu, nacional e sectorial e a nível das empresas corrobora esta
hipótese de transferência.
043
Colecção CEDEFOP
2.3>Necessidade de legitimidade e de aceitação social
O papel que os sistemas de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via
não formal são chamados a desempenhar não pode limitar-se à questão da qualidade das
metodologias. Embora importantes, as metodologias fiáveis e válidas não bastam para
garantir a confiança e a aceitação da avaliação por parte dos indivíduos, das empresas e/ou
dos estabelecimentos de ensino. Isto é particularmente verdade quando se confere à
avaliação um papel somativo, atribuindo uma prova de competência aos indivíduos em
situação de concorrência no mercado de trabalho ou para o acesso aos estabelecimentos
de ensino. Para que se possa atribuir um valor real a uma dada avaliação, é necessário que
se preencha um certo número de condições prévias, de ordem política e institucional, o
que pode ser realizado, em parte, por meio de decisões políticas que garantam a base legal
das iniciativas. Mas essas decisões políticas deveriam ser completadas por um processo no
qual têm que ser clarificadas as questões de «participação activa» dos intervenientes
implicados, de «controlo» e de «utilidade». Deste modo, a avaliação dos conhecimentos
adquiridos por via não formal será apreciada em função de critérios técnicos e
instrumentais (fiabilidade e validade) e de critérios normativos (legalidade e legitimidade).
Além disso, a aceitação da avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal é
uma questão não apenas de estatuto legal mas também de legitimidade. Tal como
acontece em relação aos certificados tradicionais emitidos pelos sistemas de ensino e de
formação formais, também a função da avaliação dos conhecimentos adquiridos por via
não formal pode comparar-se à moeda. Parson definiu a moeda como
«[...] um código, que transmite determinadas informações do
detentor para o destinatário. A moeda é válida num conjunto de
situações dadas, deve assentar num valor generalizado, aceite não
apenas num sentido legal, mas também pelo conjunto da população, e deve ser mensurável».
Se aplicarmos este ponto de vista à avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não
formal, surgirão numerosas situações paralelas. Tal como a moeda, também a avaliação
pode considerar-se um código, que transmite uma informação do detentor para o
destinatário. É possível ilustrar este tipo de situação por meio do exemplo de um indivíduo
que requer um emprego, fazendo valer a avaliação das suas aquisições. A informação,
enquanto tal, não é suficiente; para ser aceite, tem que ser apresentada sob a forma de um
código específico. Tal como a moeda, a avaliação é válida num contexto pré-definido de
determinadas situações, como, por exemplo, no mercado de trabalho, na hierarquia de
inofor
uma empresa ou no sistema de ensino e de formação. Tal como a moeda, a avaliação deve
assentar numa forma de valor generalizado, não apenas legal, mas também legítima. As
competências em causa devem ser aceites enquanto potencialmente válidas ou úteis fora
do seu estreito contexto de origem. Só a utilização real consegue demonstrar se esse valor
generalizado pode ser atribuído à avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não
formal. Ninguém pode garantir que o valor relativo da aprendizagem formal em relação à
aprendizagem não formal possa ser alterado pela introdução de metodologias e de
sistemas que permitam avaliar os conhecimentos adquiridos por via não formal. Os laços
estreitos entre o ensino e a formação formais e os processos de negociações colectivas
(que influenciam a fixação dos salários e o acesso aos empregos) ilustram a complexidade
deste processo. Finalmente, como no caso da moeda, a avaliação deve poder «medir».
Por outras palavras, os aspectos, quer quantitativos (tempo, volume), quer qualitativos
(conteúdo, perfil), da aprendizagem devem poder ser apreendidos de maneira tão válida e
fiável quanto possível.
A avaliação deve, por isso, poder armazenar informações, medir as aquisições de um
indivíduo e indicar o valor que lhe é atribuído no contexto alargado do mercado de
trabalho e do sistema de ensino e de formação, bem como da sociedade em geral.
Contrariamente à moeda, a avaliação não pode funcionar com base num código
unidimensional quantificado; deve, antes, utilizar textos escritos, a fim de apreender a
complexidade das competências que um dado indivíduo possui. A metáfora da moeda dá
relevo aos desafios que este novo «valor de troca» tem de enfrentar. Em primeiro lugar, a
interpretação da avaliação enquanto código que transforma um conjunto complexo de
informações (acerca das aquisições) numa linguagem normalizada e simplificada sublinha
os paradoxos metodológicos analisados anteriormente. Se a normalização e a
simplificação se tornam demasiado radicais, o valor informativo reduz-se, de tal forma que
a legitimidade da avaliação fica ameaçada. A força da moeda reside na sua capacidade para
simplificar e normalizar o que, caso contrário, seria uma operação complexa de troca e de
partilha. A fragilidade da avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal
poderia muito bem residir na mesma necessidade de simplificação e de normalização. A
legitimidade e o valor da avaliação são, além disso, definidos a partir do seu próprio valor
de uso. A nível teórico, podemos considerar que estas situações normalizadas ocorrem
quando os indivíduos procuram entrar no mercado de trabalho, aceder a um determinado
nível no sistema de ensino e de formação ou melhorar de posição na hierarquia interna de
uma empresa.
As questões de legitimidade e de aceitação estão, em parte, dependentes das actuações
políticas e jurídicas empreendidas pelo Estado ou por outras autoridades. A
implementação e a «concepção» de instituições e de procedimentos políticos são, por
045
Colecção CEDEFOP
isso, tão importantes como as considerações metodológicas que temos vindo a expor. Por
outras palavras, uma metodologia, por muito perfeita que seja, fica desprovida de valor se
não for acompanhada de um quadro institucional e político legítimo. Seria ingénuo pensar
que a concepção institucional bastaria para encontrar uma solução completa. No entanto,
seria igualmente ingénuo ignorar a importância potencial de uma abordagem deste tipo.
Para a construção de uma base institucional para as novas metodologias, é necessário levar
em consideração os seguintes critérios:
a) devem ser ouvidos os intervenientes envolvidos;
b) devem ser fornecidas informações pertinentes;
c) deve encontrar-se um equilíbrio entre os diferentes interesses;
d) deve ser publicitada a informação sobre as normas de competências ou de qualificações,
bem como sobre os procedimentos que se prendem com o seu estabelecimento;
e) devem ser introduzidos procedimentos transparentes que respeitem a integridade do
candidato.
A aceitação exige uma «participação activa», partilhada e equilibrada, entre os
representantes do sistema de ensino e de formação formais e os representantes dos
empregadores e dos sindicatos. Até ao momento, os aspectos institucionais e políticos da
avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal quase não foram
considerados, o que se explica pelo estatuto fragmentário e a novidade das iniciativas. Esta
questão é encarada como praticamente isenta de controvérsia, como um tema em relação
ao qual toda a gente estará de acordo. Num contexto em que as metodologias e os
sistemas de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via
não formal atingem um estádio de desenvolvimento avançado e dizem respeito a grupos
de população cada vez mais vastos, é possível que esta situação se altere. Este contexto
poderia aumentar o valor geral das competências adquiridas fora dos estabelecimentos de
ensino e de formação formais e influenciar as negociações colectivas, em termos quer de
fixação dos salários quer de acesso aos empregos.
As alíneas d) e e) apontadas acima estão, em parte, ligadas à «zona de penumbra» de que
falámos no capítulo de introdução. Os sistemas devem ser tão transparentes quanto
possível e qualquer indivíduo interessado deve ser informado dos procedimentos, da base
decisória e da possibilidade de contestar a avaliação. A participação activa dos
intervenientes envolvidos e a aceitação encontram-se intrínseca e mutuamente ligadas,
mas a aceitação de facto só é possível quando o processo é transparente. Quando esta
condição de transparência está assegurada, é talvez possível evitar, em parte, os potenciais
dilemas éticos.
inofor
A natureza da legitimidade varia em função da finalidade da avaliação e do nível em que esta
se realiza. Não há dúvida de que um sistema centrado nos aspectos somativos, seja a nível
europeu, nacional ou sectorial, deverá responder aos desafios mencionados acima. De
resto, estas questões mantêm a sua pertinência quando à avaliação é atribuído um papel
formativo. Para ter êxito, o processo adoptado a nível da empresa ou do sector deve ter
em conta as questões de aceitação e de legitimidade. Isto aplica-se especialmente ao
modo como é orientada a «concepção institucional»: quais os intervenientes envolvidos e
qual o grau de transparência do fluxo de informações?
3>Tendências europeias: evolução a nível
nacional
049
Colecção CEDEFOP
DE ACORDO COM EUROSTAT (1997), EM 1994, cerca de 25% da população europeia
frequentava um tipo de ensino ou de formação (todos os níveis incluídos). O
desenvolvimento da formação especializada e institucionalizada é uma das características
mais distintivas das sociedades europeias contemporâneas. Nesta perspectiva, o crescente
interesse pela aprendizagem realizada fora dos estabelecimentos de ensino ou de
formação formais pode parecer paradoxal. Numa situação em que os sistemas nacionais
de ensino e de formação enfrentam (em certos casos) um fenómeno de sobrecapacidade
e em que pessoas altamente qualificadas se encontram no desemprego, é legítimo
interrogarmo-nos sobre a oportunidade de investir em sistemas de «avaliação e de
reconhecimento das aquisições informais e não formais». E, no entanto, esses
investimentos estão a ser feitos. Durante os últimos dez anos, a maioria dos EstadosMembros da UE, bem como outros países não pertencentes à UE, empreenderam
acções para estabelecer metodologias e instituições destinadas a facilitar a identificação, a
avaliação e o reconhecimento da aprendizagem realizada fora dos estabelecimentos de
ensino e de formação formais. O interesse por essas questões, em relação às quais a
França desempenhou um papel pioneiro (lei de 1985 sobre o balanço de competências e
lei de 1992 sobre a validação das competências adquiridas pela experiência profissional),
tem aumentado de ano para ano. O presente relatório tem como objectivo fornecer uma
visão actualizada e uma interpretação dessa tendência6.
É possível afirmar, desde já, que não existe actualmente na Europa nenhuma abordagem
comum e unificada. O facto de terem sido empreendidas iniciativas em diversos períodos
e no seio de diferentes sistemas de ensino e de formação coloca-nos perante um conjunto
heterogéneo de abordagens adoptadas a nível nacional e sectorial e a nível das empresas.
Este capítulo centrar-se-á, essencialmente, nas iniciativas empreendidas a nível nacional,
mais ou menos na qualidade de partes integrantes das políticas públicas de educação e
formação. O que é importante é que a maioria das iniciativas parece estar centrada nos
mesmos desafios. Neste sentido, convém mencionar, em primeiro lugar, a reorientação
do ensino e da formação formais (sobretudo profissionais), que evoluíram de sistemas
estritamente centrados nos meios para sistemas centrados nos resultados ou no
desempenho. Em países como o Reino Unido e a Finlândia, dá-se relevo às competências
e não ao modo como estas são adquiridas. A partir do momento em que são aceites
6
A nossa apresentação baseia-se no material recolhido no quadro do projecto do Cedefop sobre «a identificação, a
avaliação e o reconhecimento da aprendizagem não formal», lançado em 1997. Foram encomendados quinze estudos
aos centros de investigação de catorze países e o presente relatório constitui um primeiro esforço para reunir os
resultados desses trabalhos. Para as referências pormenorizadas desses estudos e dos relatórios respectivos, consultese a bibliografia.
inofor
percursos de aprendizagem alternativos para além dos que são propostos pelas estruturas
formais, a questão da avaliação passa a ser central. Em segundo lugar, a crescente
prioridade atribuída à educação e à formação ao longo da vida implica um maior interesse
pelas relações entre as diferentes formas de aprendizagem em diferentes domínios, em
diferentes fases da vida. Enquanto o sistema formal se mantém muito centrado sobre a
formação inicial, um sistema de educação e de formação ao longo da vida tem que aceitar o
desafio de associar diversos domínios de aprendizagem, quer formais quer informais. Esta
ligação é fundamental para que se dê resposta às necessidades sentidas pelos indivíduos
relativamente à renovação contínua e variada dos diversos saberes e às necessidades
sentidas pelas empresas em termos de poderem dispor de um largo espectro de saberes e
de competências, de uma espécie de reserva de conhecimentos que lhes permita gerir o
imprevisto. Além disso, a questão da identificação, da avaliação e do reconhecimento das
competências também é crucial. As competências devem tornar-se visíveis para que
possam ser plenamente integradas numa estratégia alargada de reprodução e de
renovação de saberes. Além do mais, existem determinados factores económicos que
podem influenciar a decisão de se iniciar o desenvolvimento de metodologias e de
sistemas. Seria extremamente motivante se os poderes públicos introduzissem sistemas
de avaliação que evitassem a repetição inútil de sequências de ensino e de formação.
Em certos países, as metodologias que permitem identificar, avaliar e reconhecer os
conhecimentos adquiridos por via não formal são encaradas como instrumentos
indispensáveis para encetar novos percursos de aprendizagem. No entanto, esta questão
não deve limitar-se às modalidades de modernização e de revitalização dos sistemas de
ensino e de formação existentes. A experimentação metodológica e institucional também
pode ser olhada como reflexo das mudanças fundamentais operadas na nossa
compreensão da aprendizagem e das competências. O crescimento sem precedentes do
ensino e da formação formais acompanha um cepticismo cada vez maior relativamente
aos resultados do sistema formal. Cabe perguntar se um sistema harmonizado de
educação de massas será capaz de responder às necessidades de sociedades que se
tornam cada vez mais complexas, em termos quer de tecnologia quer de organização.
Tradicionalmente, os sistemas de ensino e de formação formais constituíam importantes
vectores não apenas de reprodução e de renovação das competências, mas também de
selecção a nível dos empregos e das funções. Hoje em dia, quando numerosos países
europeus vivem um duplo fenómeno de educação de massa e de desemprego de massa,
o papel da educação enquanto mecanismo de selecção torna-se mais problemático. Em
numerosos casos, verifica-se que o montante de educação e de formação necessária para
ter sucesso no mercado de trabalho vai aumentando, enquanto o valor relativo do ensino
e da formação formais vai, ao mesmo tempo, diminuindo. Este problema vai-se
051
Colecção CEDEFOP
exacerbando, pois que a estratégia do «mais do mesmo» não é exactamente aquilo que
interessa a um mercado de trabalho confrontado com rápidas mudanças e uma crescente
incerteza. Possivelmente, enquanto o desafio consistir na selecção dos indivíduos com as
competências mais bem adaptadas, os sistemas de ensino e de formação formais revelarse-ão cada vez mais inadequados, sendo cada vez mais inevitável o recurso a outras fontes.
Desde o início, centrámos os nossos trabalhos numa abordagem metodológica (Cedefop,
1997), visando determinar se é possível medir, de modo fiável e válido, a aprendizagem
realizada fora do ensino e da formação formais. A introdução de metodologias neste
domínio só pode ser entendida num contexto social e político mais vasto, enquanto
resposta à mudança de concepções relativas ao ensino e à formação. Isto define a nossa
perspectiva dominante, quando procuramos obter uma visão de conjunto sobre a
evolução nos países da UE/EEE. Para a apresentação da situação europeia, analisaremos
cinco grupos de países. Embora os países que constituem cada um dos grupos apresentem
algumas diferenças nas respectivas abordagens e escolhas metodológicas e institucionais, a
proximidade geográfica e as semelhanças institucionais parecem favorecer uma
aprendizagem mútua. A visão de conjunto apresentada neste capítulo é limitada, na
medida em que, antes de mais, está centrada em iniciativas emanadas do sector público.
Como veremos mais em pormenor nos capítulos seguintes, foram implementadas
importantes iniciativas suplementares a nível das empresas e dos sectores de actividade,
em parte, de modo autónomo e, em parte, graças ao apoio de programas comunitários,
tais como o Leonardo da Vinci e o Adapt.
Analisaremos, em primeiro lugar, o papel da avaliação e do reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal na Alemanha e na Áustria. Duas questões fundamentais
definem o âmbito desta apresentação: por que razão foram implementadas tão poucas
iniciativas nestes países e de que modo o sistema dual de formação e de ensino
profissionais (FEP) exerce influência nas actividades e nas iniciativas? O segundo grupo
abrange os países mediterrâneos: Grécia, Espanha, Itália e Portugal. Nestes países, devido
a tradições e a sistemas de ensino e de formação profissionais pouco desenvolvidos, a
aprendizagem não formal desempenhou e ainda desempenha um papel fundamental.
Numa situação em que o ensino e a formação formais se encontram, regra geral,
reforçados, o papel da aprendizagem não formal é posto em causa e modificado. Na nossa
análise ao terceiro grupo, que compreende a Finlândia, a Noruega7, a Suécia e a
Dinamarca, abordaremos a questão de saber se é possível identificar um modelo nórdico.
Os países nórdicos possuem uma longa tradição de aprendizagem mútua no domínio do a
7
A Noruega é o único país não membro da UE incluído neste estudo.
inofor
ensino e da formação. Mas aplicá-la à avaliação e ao reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal é outra questão. Na nossa análise ao quarto grupo de países,
composto pelo Reino Unido, a Irlanda e os Países Baixos, debruçar-nos-emos sobre as
experiências realizadas no Reino Unido, no quadro do sistema das NVQ (qualificações
profissionais nacionais), e sobre a sua influência. O sistema das NVQ despertou muito
interesse, sobretudo no estrangeiro. Apesar das críticas internas, este sistema, que dá
relevo à modularização e aos resultados, tornou-se um importante ponto de referência no
debate internacional. A Irlanda e os Países Baixos podem considerar-se países em que a
influência deste sistema se fez sentir de modo muito claro, nomeadamente no domínio da
evolução e do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. O quinto e
último grupo, que compreende a França e a Bélgica, é definido com base mais na
proximidade geográfica do que numa abordagem comum da aprendizagem não formal.
Como já referimos, a questão da aprendizagem não formal ocupa, desde há cerca de dez
anos, uma posição de primeiro plano no debate francês sobre o ensino e a formação. As
experiências francesas revestem-se de importância em termos quer de legislação quer de
prática. Na Bélgica, a questão da aprendizagem não formal só recentemente foi
introduzida na agenda política. Na comunidade flamenga, foi iniciada uma cooperação com
os Países Baixos, mas ainda é cedo para saber o rumo que o país seguirá.
Devido às diferenças entre os países, a extensão e a pormenorização das apresentações
serão variáveis. Tentaremos abordar três aspectos:
- qual o papel da aprendizagem não formal nos contextos político-institucionais existentes?
- será possível identificar neste domínio dispositivos metodológicos e/ou institucionais
estabelecidos numa base permanente?
- será possível identificar experiências, por exemplo, projectos, que visem desenvolver
metodologias ou instituições destinadas a avaliar e a reconhecer os conhecimentos
adquiridos por via não formal?
3.1>A aprendizagem não formal no sistema dual: Alemanha e Áustria
Na Alemanha e na Áustria, a aprendizagem não formal é uma questão nova e não
resolvida. Há cinco anos, praticamente não era referida. Hoje em dia, pouco a pouco, vaise desenvolvendo um debate acerca do papel da aprendizagem não formal (cf., por
exemplo, Dehnbostel et al., 1999). Foi também lançado um certo número de projectospiloto (centrados, nomeadamente, nas necessidades dos desempregados, das pessoas
que regressam ao mercado de trabalho, etc.), destinados a experimentar diversas
053
Colecção CEDEFOP
abordagens relativas à avaliação. É difícil prever, a longo prazo, quais serão as
consequências políticas e institucionais desse debate e dessa experimentação. No entanto,
pensamos que estes dois países, apesar da reserva que aparentam, constituem «casos de
aprendizagem» interessantes, que ilustram tanto as possibilidades e o potencial como os
obstáculos e os problemas.
3.1.1>Alemanha
Há um certo número de factores que explica as razões pelas quais, até à data, a questão da
aprendizagem não formal só desempenhou um papel limitado na Alemanha.
Em primeiro lugar, a procura directa de avaliação dos conhecimentos adquiridos por via
não formal é fraca. O sistema formal de ensino e de formação é muito vasto e, desde há
muito, abrange uma grande percentagem de pessoas de todos os grupos etários.
Podemos, assim, falar de uma base de ensino e de formação extremamente desenvolvida,
que reduz o número de pessoas susceptíveis de solicitar o reconhecimento de
competências adquiridas num contexto não formal. Em segundo lugar, o sistema de ensino
e de formação está extremamente centrado na formação inicial. No domínio profissional,
o estatuto do sistema dual foi e continua a ser muito elevado. Não existe uma tradição de
acompanhamento de outros percursos de aprendizagem, muito menos fora do sistema
formal. Em terceiro lugar, o facto de o sistema dual combinar a aprendizagem pela escola e
pelo trabalho implica que a vertente experimental da aquisição de saberes está, de alguma
forma, incluída no modelo oficial, o que vai reduzir a necessidade de avaliação dos saberes
adquiridos fora do sistema formal. Em quarto lugar, o sistema de ensino e de formação
formais baseia-se nos Berufsprofile (perfis profissionais), que representam um conjunto
claramente definido de qualificações ou competências. Cada Berufsprofil indica o que deve
ser aprendido, de que modo e em que local. Os perfis profissionais, que podem
considerar-se o «padrão» do sistema, estão, em certa medida, «orientados para os
meios». Ao definirem o percurso «apropriado» para uma dada qualificação, excluem, ao
mesmo tempo, outros percursos, como, por exemplo, aqueles que (em parte) se baseiam
na aprendizagem não formal. Em quinto lugar, a «profissão» (Beruf), subsequente ao final,
com aprovação, de um ensino e de uma formação formais, é um conceito que não apenas
especifica um dado percurso de formação, mas que está também ligado a determinados
níveis salariais e a um conjunto de regras que definem direitos e responsabilidades. Isto
significa que o sistema formal não diz unicamente respeito aos saberes e às competências,
mas constitui também um mecanismo que permite definir a repartição dos direitos e das
vantagens. O sistema formal constitui, assim, um meio para definir o valor implícito de
inofor
diferentes formas de aprendizagem.
O conjunto desses factores contribui para o elevado valor atribuído aos certificados
emitidos pelo sistema formal. As empresas e os sectores profissionais também se
mostraram relutantes em considerar outros percursos de aprendizagem, em virtude das
altas taxas de desemprego. A questão da aprendizagem não formal tem sido encarada (e
continua a sê-lo) com uma indiferença que parece também estar ligada à extrema
complexidade do sistema existente; é difícil descobrir alternativas num contexto em que
todas as fases estão planificadas e descritas pormenorizadamente e em que o estatuto
profissional, bem como o nível salarial, dependem da ultrapassagem dessas fases. No
entanto, como já referimos, esboça-se uma mudança de atitude, podendo explicar-se a
crescente tomada de consciência da aprendizagem não formal graças aos factores a seguir
expostos.
Censura-se o sistema tradicional de ensino e de formação por estar exclusivamente
centrado na formação inicial. A rigidez e a falta de flexibilidade que daí decorrem privam
este sistema do dinamismo necessário ao apoio à formação contínua e/ou à reconversão.
A aprendizagem não formal foi introduzida enquanto elemento necessário para
contrabalançar esta excessiva focalização na formação inicial. Em compensação, o
desenvolvimento do sistema de formação profissional contínua não acompanhou o
modelo profundamente estruturado e formalizado da formação inicial. O «sector» da
formação profissional contínua é heterogéneo e a sua coordenação pública ou tripartida é
limitada. As relações que mantém com o sistema de formação inicial são fracas e
relativamente arbitrárias. Esta situação veio pôr em relevo a importância de percursos
alternativos de aprendizagem; como as necessidades em competências não podem ser,
antecipadamente, planificadas de forma completa, os modelos flexíveis de aprendizagem
constituem as condições prévias para uma aprendizagem bem sucedida. A falta de
complementaridade entre os sistemas de formação inicial e contínua sublinha a
necessidade de soluções «de continuidade» que permitam, por um lado, explorar de
maneira mais ordenada o sistema de formação profissional contínua em expansão e, por
outro, estabelecer a ligação dos seus elementos com o «gigante» da formação inicial
existente. As metodologias de avaliação, bem como as instituições que permitem avaliar
de maneira válida e fiável um vasto leque de competências adquiridas em diferentes
contextos (quer formais quer não formais), são essenciais para o desenvolvimento e o
estabelecimento dessa função de continuidade.
Neste sentido, uma das iniciativas-chave consistiu no aumento da flexibilidade graças à
modularização. O principal argumento a favor desta abordagem consiste no facto de a
modularização permitir o estabelecimento de melhores ligações entre a formação inicial e
a formação contínua. Os candidatos poderão começar ou recomeçar um determinado
055
Colecção CEDEFOP
ensino ou uma formação em função das respectivas necessidades pessoais; os testes e a
avaliação incidirão unicamente sobre os módulos em causa e centrar-se-ão principalmente
nos resultados, o que estimulará os percursos alternativos de aprendizagem. Um
representante de uma das principais organizações de parceiros sociais comentava
recentemente (Görner, DGB, 1999):
«Das Prüfungswesen wird sich entsprechend verändern müssen.
Teilqualifiationen sind jeweils im Berufsbildungspass zu zertifizieren. Die Abschlussprüfung wird dadurch erheblich entschärft,
sogar überflüssig»8.
Este comentário sublinha a necessidade de uma abordagem mais flexível em matéria de
ensino e de formação, que permita combinar melhor os diferentes níveis e percursos de
aprendizagem. O exemplo da Alemanha é importante para compreendermos o contexto
geral da aprendizagem não formal. O ponto de partida não se situa ao nível das
metodologias nem das questões de fiabilidade e de validade na medição e na avaliação dos
conhecimentos adquiridos: trata-se de determinar de que maneira a evolução geral das
necessidades de ensino e de formação pode reflectir-se nas abordagens existentes em
matéria de ensino e de formação. O sistema dual não foi concebido como instrumento de
aprendizagem ao longo da vida, mas como instrumento de formação inicial. Numa
situação em que se acentua a reconversão e a renovação das competências, a fragilidade
deste modelo (muito eficaz noutras circunstâncias) é evidente. São três as questões que se
colocam: como conseguir a abertura do modelo existente; como estabelecer a ligação
com a formação profissional contínua; e como permitir uma maior variedade de percursos
que confiram as mesmas qualificações e competências? Uma evolução como esta exige
sistemas que permitam avaliar e reconhecer os saberes adquiridos, quer não formais quer
formais.
Apesar da reserva em empreender acções em matéria de avaliação e de reconhecimento
dos saberes adquiridos por via não formal, é possível identificar no sistema alemão
determinados dispositivos relacionados com esta ideia. Esses dispositivos revelam que a
questão da aprendizagem não formal só foi abordada num campo e num âmbito limitados.
O exame para candidatos externos (Externenprüfung) é talvez o mais importante
elemento «de continuidade» entre a aprendizagem formal e a não formal e constitui um
8
O sistema de exames será modificado. As qualificações parciais serão certificadas individualmente e registadas num
passaporte de formação e de ensino profissionais. Isto fará diminuir progressivamente a importância dos exames finais,
que poderão mesmo tornar-se supérfluos. [traduzido do Alemão]
inofor
elemento permanente do sistema dual. Trata-se de um teste que dá aos trabalhadores
com experiência o direito de se apresentarem a exame de final de formação
(Abschlussprüfung) como os formandos que fizeram o percurso tradicional de formação
no sistema dual. Apesar da sua importância, o Externenprüfung apenas dá a possibilidade
de apresentação a exame, não propondo qualquer metodologia independente ou
particular com vista a identificar e a avaliar aquisições específicas. O Externenprüfung é,
pois, concebido em função do conteúdo, dos princípios e da estrutura do percurso formal.
Por outras palavras, as competências adquiridas fora do sistema formal,
independentemente das diferenças que apresentam face às que são produzidas pelo
sistema formal, devem ser apresentadas e reestruturadas (pelo candidato) de acordo com
os princípios do sistema formal. Esta circunstância em nada reduz a importância do
Externenprüfung, visto que, no seio do sistema alemão, a proporção de candidatos que,
todos os anos se apresentam a exame depois de terem passado por este teste, situa-se na
ordem dos 5%.
Para responder às necessidades de grupos específicos (desempregados, mulheres
desejando reintegrar-se no mercado de trabalho, pessoas que abandonaram
prematuramente o sistema educativo formal, etc.), foi lançado, a título experimental, um
certo número de projectos. Um dos objectivos comuns à maioria destes projectos
consiste em facilitar o acesso destes grupos à formação profissional contínua e, em certos
casos, em permitir que reintegrem o sistema de formação inicial. O projecto BildungspassQualifizierungspass, lançado em 1974, constitui uma excepção. Este projecto, que
procurava dar resposta a objectivos mais gerais, consistia num portefólio de competências
que fornecia, através de um processo de descrição e de documentação, um quadro mais
vasto das competências possuídas pelo trabalhador. Acrescentava, assim, ao ensino e à
formação formais documentos que atestavam a experiência e a prática, apresentando uma
imagem mais completa da pessoa em causa. O Bildungspass não teve grande sucesso e
acabou por ser abandonado. O leitor poderá encontrar descrições de alguns projectos
noutros documentos (Cedefop, 1998, 1999); convém sublinhar que os projectos de que
damos conhecimento foram lançados e financiados pelos poderes públicos a nível
regional, nacional e europeu.
3.1.2>Áustria
A questão da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal
nunca mereceu grande atenção por parte da Áustria e são poucas as iniciativas práticas que
puderam ser identificadas. No entanto, tal como na Alemanha, observa-se actualmente
057
Colecção CEDEFOP
um interesse crescente por esta matéria. Hoje em dia, o papel dos conhecimentos
adquiridos por via não formal tem sido essencialmente abordado durante os debates
relacionados com a modularização do ensino e da formação. Embora praticamente
inexistente no ensino e na formação iniciais, a modularização faz uma tímida aparição na
formação profissional contínua. Neste âmbito, os programas lançados, por exemplo, pelo
Instituto de Promoção Profissional (Berufsförderungsinstitut) e pelo Instituto de Promoção
Económica (Wirtschaftsförderungsinstitut), sublinharam a necessidade de práticas
alternativas no domínio da avaliação e do reconhecimento das qualificações e das
competências. Este debate, que acompanha a tendência observada na maioria dos países
da Europa, está estreitamente ligado à questão geral de se saber se o sistema de ensino e
de formação existente será capaz de dar resposta à necessidade de um sistema mais
«flexível» que funcione para além dos limites e dos níveis tradicionais. A OCDE (1995,
p.84) comenta, a propósito do sistema austríaco de ensino e de formação:
«Na Áustria, a ideia de que há um tempo para adquirir saberes e
competências, se possível através de qualificações formais, e um
tempo para utilizar esses saberes num quadro profissional, não
parece estar ainda ultrapassada.»
Este comentário reflecte algumas das características fundamentais da abordagem austríaca
em matéria de formação e de ensino profissionais. Os elementos que explicam as razões
pelas quais o debate sobre a aprendizagem não formal se mantém, nos dias de hoje, ainda
marginal também revelam que as metodologias e os sistemas de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal terão, no futuro, um papel a
desempenhar. Essas características podem resumir-se como se segue.
Em primeiro lugar, a formação e o ensino profissionais iniciais ocupam uma posição muito
importante. O sistema austríaco, que assenta, em larga medida, no sistema dual (que
continua a receber 40% das pessoas de cada grupo etário), é extremamente especializado
e extremamente formalizado. Além disso, fundamenta-se numa complexa base legal e
administrativa, que define pormenorizadamente o conteúdo de cada perfil profissional
(Beruf), os procedimentos de avaliação e de exame, bem como a regulamentação
respeitante à ligação com (e a transferência para) outros perfis e níveis profissionais. Em
segundo lugar, o efeito de especialização muito acentuado traduz-se em perfis profissionais
relativamente estreitos (actualmente, se incluirmos todas as formas de ensino e de
formação, podemos identificar cerca de 700 perfis profissionais). Em terceiro lugar, o
sistema possui um carácter hierarquizado. Não existe nenhum sistema de «unidades
capitalizáveis», o que significa que uma formação parcialmente terminada num
inofor
determinado nível não é reconhecida, sendo o formando obrigado a retomá-la a partir do
nível mais baixo. Em quarto lugar, devido à natureza especializada do sistema, é muito
complicado fazer a transição, quer horizontal quer vertical, de um percurso profissional
para outro. Em quinto lugar, ao contrário da formação e do ensino profissionais iniciais, a
formação profissional contínua só mereceu uma limitada atenção política e está muito
pouco regulamentada. O «sistema» de formação profissional contínua caracteriza-se pela
concorrência entre intervenientes privados e por acções não coordenadas, emanadas de
diversos organismos públicos.
Pode, assim, dizer-se que o sistema austríaco de ensino e de formação profissionais é
muito avançado em termos de formação e de ensino iniciais. O sistema dual favorece
claramente a estreita ligação entre o ensino escolar formal e a aprendizagem pelo trabalho.
Esta circunstância cria, potencialmente, uma base sólida que assegura a ligação entre
competências formais e não formais em estádios posteriores da vida. No entanto, esse
potencial não foi ainda plenamente explorado. A ausência de dispositivos de continuidade
entre a formação inicial e a formação profissional contínua torna difícil qualquer transição
horizontal ou vertical entre profissões e/ou níveis de ensino. Em resumo, os sistemas de
reconhecimento das qualificações ou competências parciais mantêm-se pouco
desenvolvidos. A única excepção é o Berufsreifeprüfung, criado em 1997. Os candidatos
oriundos do sistema dual que obtiverem aprovação neste exame ou avaliação têm acesso
ao ensino superior. Este exame incide essencialmente sobre matérias gerais, tais como
Matemática, Inglês e Alemão. A aprendizagem não formal, no sentido que nós lhe damos,
não é considerada neste exame.
Com base no quadro traçado acima, os representantes dos parceiros sociais e de diversos
organismos de formação contínua foram convidados a manifestar-se sobre as futuras
perspectivas dos sistemas de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por
via não formal (Cedefop, 1999, op. cit.). Os resultados deste inquérito sucinto
corroboram os principais aspectos atrás analisados, mas fornecem alguns esclarecimentos
interessantes em relação à evolução futura. O representante dos empregadores exprimiu
o ponto de vista mais claro, mas também o mais pessimista: segundo ele, as competências
adquiridas fora do sistema formal que não forem registadas num certificado formalmente
reconhecido têm poucas hipóteses de ser aceites. Em conclusão, declarou:
«Lamento ter que dizer que somos muito formalistas e que
tomamos como ponto de partida que tudo o que não for certificado
não foi formalmente aprendido e, por consequência, não existe.»
059
Colecção CEDEFOP
Este mesmo ponto de vista foi expresso por outros representantes, e vários sentiram
dificuldade em reconhecer qualquer vantagem em tal sistema. A elevada qualidade e a
legitimidade do sistema de formação inicial foram apontadas como duas razões de peso
para que o reconhecimento das competências parciais e não formais encontre dificuldades
em penetrar no contexto austríaco. No entanto, este ponto de vista não é inteiramente
partilhado pelos representantes dos sindicatos, que sublinharam o papel potencialmente
positivo que esses sistemas poderiam desempenhar junto de pessoas candidatas a um
emprego. Em geral, o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal é
encarado como um factor susceptível de melhorar a situação dos trabalhadores.
Destas entrevistas recolhidas na Áustria, fica, como impressão geral, uma certa reserva: as
metodologias de avaliação das competências são, em parte, consideradas uma invenção
anglo-saxónica que reflecte uma situação em que uma percentagem relativamente
importante da população não possui uma base de qualificações profissionais digna desse
nome. Não é o que se passa com a Áustria, fizeram notar os entrevistados, onde, desde há
décadas, domina uma abordagem completamente diferente do ensino e da formação. No
entanto, praticamente todos os comentadores estão conscientes de que é preciso
aumentar a flexibilidade da formação profissional contínua. A necessidade de uma certa
modularização e, portanto, de novas abordagens em matéria de avaliação e de
reconhecimento parece, em parte, de aceitação pacífica, mas claramente limitada ao
âmbito da formação profissional contínua.
Em conclusão, pode dizer-se que a Áustria é um dos Estados-Membros da UE onde se
observa o cepticismo mais abertamente declarado relativamente à introdução de
metodologias e de sistemas. Os paradoxos identificados no seio do sistema de formação e
de ensino iniciais, bem como entre este e a formação e o ensino contínuos, podiam dar
origem a um debate mais amplo acerca de uma experimentação prática. De momento, é
difícil prever em que direcção se orientará a Áustria.
3.1.3>Abertura à aprendizagem não formal através do sistema dual
Como vimos acima, as abordagens alemã e austríaca em matéria de identificação, de
avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal mantêm uma
relação muito estreita. É interessante notar que os dois países nos quais a aprendizagem
pelo trabalho foi mais sistematicamente integrada no ensino e na formação (no quadro do
sistema dual) são os que, até agora, manifestaram maior reserva em acompanhar esta nova
tendência. Por um lado, este facto reflecte o sucesso do sistema dual, em geral
considerado eficaz em termos quer de pedagogia (combinação de aprendizagem formal e
inofor
experiencial) quer de capacidade (elevada percentagem de acolhimento dos diversos
grupos etários), não sendo reconhecida a necessidade de novas metodologias de
avaliação. No entanto, o sucesso do sistema dual pode ser encarado como estando na
origem de um crescente interesse pela avaliação e pelo reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal. É evidente que o sistema dual conseguiu estabelecer a
ligação entre a aprendizagem através da escola e a aprendizagem através do trabalho. A
questão consiste em saber como passar de um modelo de formação inicial para um
modelo de ensino e formação ao longo da vida. Contudo, o sistema existente,
essencialmente centrado nos jovens e na reprodução de saberes e de competências, só
parcialmente é capaz de dar resposta à crescente procura de renovação dos saberes e das
competências entre os adultos. O sistema dual não consegue, por si só, dar resposta à
necessidade de um sistema de ensino e de formação mais aberto, que permita estabelecer
uma ligação mais complexa e mais estreita entre profissões e níveis de ensino. É este o
contexto do crescente debate sobre a aprendizagem não formal que está em curso nos
dois países.
3.2.>A aprendizagem não formal nos países mediterrâneos: Grécia,
Itália, Espanha e Portugal
Em matéria de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por
via não formal, existem algumas características comuns à Grécia, à Itália, à Espanha e a
Portugal. Em relação aos países do norte da Europa, estes países (pelo menos algumas
regiões) têm muito pouca tradição no domínio do ensino e da formação profissionais. Só
recentemente, durante os últimos dez anos, mais ou menos, foram empreendidas acções
destinadas a colmatar esta lacuna. Primeiramente, a relativa debilidade do ensino e da
formação profissionais, no passado, era compensada pela importância do ensino geral e
teórico. Embora, nestes países, o ensino académico já não seja garantia de emprego, de
salário elevado ou de estatuto, mantém-se grande o valor atribuído aos certificados, em
geral, e aos títulos universitários, em particular. Os estudos revelam que, na Grécia, 70%
dos jovens preferem o ensino geral ao ensino profissional (Cedefop, Turner, op. cit.),
apesar da grave inadequação entre os resultados dos estabelecimentos de ensino superior
e a procura no mercado de trabalho. Em segundo lugar, devido à relativa deficiência do
sistema formal de ensino e de formação profissionais que se registava ainda há poucos
anos, a aprendizagem não formal (particularmente através da experiência profissional)
tornou-se o modo de reprodução e de renovação de competências (profissionais)
dominante. Existe, por isso, nestes países, uma vasta reserva de competências
061
Colecção CEDEFOP
experienciais não formais, nomeadamente na Grécia, no sul da Itália e nas regiões menos
desenvolvidas da Espanha e de Portugal. Para aproveitar essa reserva e renová-la
(quantitativa e qualitativamente), é preciso identificar e avaliar as suas forças e as suas
fragilidades. A qualidade das competências obtidas através da aprendizagem não formal
não pode nem deve ser considerada um dado adquirido. A criação de sistemas de
identificação e de avaliação dignos desse nome seria talvez o meio de resolver o problema
da qualidade e, se necessário, de indicar as acções complementares indispensáveis para
melhorar a qualidade e o direito ao reconhecimento. Talvez mais do que na Europa do
norte, isto revela a necessidade de identificação e de avaliação dos conhecimentos
adquiridos por via não formal. Apesar da tradição relativamente deficiente do ensino e da
formação profissionais e apesar de uma subvalorização profundamente enraizada das
competências profissionais, em geral, e das competências profissionais não formais, em
particular, verifica-se uma crescente vontade de mudança. Ao longo dos últimos dez anos,
estes quatro países procederam a reformas dos respectivos sistemas de ensino e de
formação profissionais e, nomeadamente, a Espanha, a Grécia (graças ao sistema dos KEK,
ou centros de formação contínua) e a Itália estão, neste momento, empenhadas numa fase
decisiva das reformas. As consequências em termos de metodologias e de sistemas de
«identificação, avaliação e reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal» são
grandes e pertinentes em relação aos países situados fora do espaço mediterrâneo. Apesar
dos desafios comuns que têm que enfrentar, os quatro países trataram os aspectos
metodológicos e institucionais de maneira diferente e com graus diversos de
empenhamento e de intensidade.
3.2.1>Grécia
A Grécia é o país da UE no qual o papel da aprendizagem não formal se assume como
dominante (em certa medida, partilha este primeiro lugar com Portugal). A Confederação
Geral dos Trabalhadores da Grécia calcula que apenas 30% da população activa grega
possui uma qualificação profissional formal9, o que significa que, neste país, uma grande
parte das competências profissionais foram e continuam a ser reproduzidas e renovadas
9Um estudo efectuado junto das PME gregas revela que 66% destas empresas não possuem, entre os seus empregados,
qualquer técnico especializado; 13% dos proprietários de PME têm um certificado de uma escola técnica; 44%
completaram os três anos do ensino secundário; 55% acham que não têm qualquer necessidade particular em termos
de formação profissional.
inofor
fora das estruturas formais. No entanto, foram poucas as iniciativas implementadas para
identificar e avaliar essas competências. Em 1994, o organismo encarregado da formação
e do ensino profissionais (OEEK) criou um grupo de trabalho a quem foi confiada a
realização de um estudo sobre «a acreditação da formação profissional (não formal) dos
adultos». Este estudo, que constitui, até hoje, a iniciativa mais prática tomada na Grécia,
apresentou propostas que recomendam a criação de um sistema que permita avaliar as
aquisições experienciais, identificar as lacunas nos saberes e instaurar um procedimento
que garanta o acesso a uma avaliação e a um reconhecimento adequados dos
conhecimentos adquiridos. Apesar do relevo dado à experiência, este grupo de trabalho
debruçou-se essencialmente sobre a questão da equivalência entre os diversos segmentos
do sistema formal. Alguns percursos são oficialmente reconhecidos, outros não; muitas
pessoas deparam com faltas de coerência, sendo-lhes impossível valorizar a formação que
adquiriram em segmentos não reconhecidos pelo sistema de formação. De entre os
elementos mais importantes da iniciativa do OEEK, destacam-se, nomeadamente, os
estudos-piloto efectuados junto de uma amostragem de (quatro) profissões. As pessoas
que exercem essas profissões foram avaliadas e testadas, revelando a estreita ligação que
une as aquisições formais e não formais. Até à data, essas experiências não foram
integradas, de modo permanente, no sistema grego.
No entanto, ao longo dos últimos cinco anos, tem-se mantido um debate político
permanente acerca destas questões e o Conselho de Ministros acompanha o diálogo
entre os organismos envolvidos M inistério do Trabalho e do Emprego, OEEK, Ekepis10 e
OAED11. Uma das prioridades consiste na criação de um completo sistema nacional, cuja
falta se faz sentir actualmente, e que integre sistemas e normas profissionais. O futuro
sistema encontra-se em fase experimental, estando a ser testado através de projectospiloto lançados em diversos sectores; esta experimentação baseia-se na utilização do
sistema britânico dos NQV, entre outros. O objectivo consiste em desenvolver perfis de
emprego (e correspondentes programas de formação) que permitam especificar o
conteúdo, o tipo e o nível das competências de um dado candidato. Os perfis de emprego
serão estabelecidos em diferentes níveis, especificando as competências requeridas para
cada profissão e especialidade, quer a nível de iniciação quer a nível avançado. Os perfis
10
Centro nacional de acreditação das estruturas de formação contínua (Elliniko Kentro Pistopiisis Domon
Synechizomenis Katartisis).
11
Organismo vocacionado para o emprego de mão-de-obra. No âmbito do terceiro quadro de apoio comunitário, foi
definido um certo número de critérios relativamente à acreditação das estruturas, dos formadores, dos programas e das
competências. O governo comprometeu-se a criar, no período compreendido entre 2000-2001, um sistema integrado
para o reconhecimento coordenado das aquisições formais e não formais.
063
Colecção CEDEFOP
serão traçados com a participação dos organismos sectoriais e dos parceiros sociais. Por
exemplo, no sector da hotelaria, as descrições de emprego serão elaboradas com a
participação dos sindicatos dos trabalhadores da hotelaria e do organismo sectorial
nacional (neste caso, o Centro do Turismo Helénico). Este procedimento permitirá a
criação de um quadro para um sistema nacional, no qual assentará a avaliação e o
reconhecimento. Graças a ele, poderão ser tidos em conta os conhecimentos adquiridos
anteriormente, tanto por via formal como por via não formal. O objectivo é o de permitir
que todos tenham acesso a esse sistema, sendo dado o maior relevo ao conteúdo e ao
nível das competências e não ao local e às modalidades de aquisição.
Até à data (Outono de 1999), não foram ainda tornadas públicas as modalidades de
«avaliação» dessas competências. É possível que venha a ser adoptada a abordagem dos
IEK (Institouta Epangelmatikis Katartisis - institutos de formação profissional) em matéria
de avaliação e de exames. Esta abordagem consiste numa combinação de exames teóricos
e práticos organizados por comissões «tripartidas». Embora possam ser utilizados num
futuro dispositivo elementos do sistema dos IEK, não será possível retomá-lo na íntegra.
Efectivamente, realizada no nível pós-secundário, a avaliação está directamente ligada ao
final de um curso e, por isso, não está aberta a quem seguiu outros percursos de
aprendizagem. Além disso, também foi posta em causa a qualidade do processo de
avaliação: embora se considere positiva a participação de representantes dos parceiros
sociais nas comissões de exame, estes não receberam qualquer formação específica em
matéria de avaliação, o que torna difícil a harmonização das práticas neste domínio.
Os estudos realizados pelo Cedefop (Cedefop, Turner, op. cit.) revelam que há
numerosas opiniões favoráveis à introdução de dispositivos institucionais e de
metodologias de apoio a esta área. Os licenciados pelas universidades e os sindicatos dos
diplomados pelo ensino pós-secundário não universitário que exercem profissões
regulamentadas manifestam uma certa reserva, em parte ligada à questão dos salários e
dos direitos adquiridos, susceptíveis de serem postos em causa por novas formas de
reconhecimento. É interessante verificar que o cepticismo identificado no contexto
austríaco não está tão claramente expresso entre as várias instâncias gregas implicadas
neste domínio. Em relação ao sistema austríaco, o sistema grego de formação profissional,
tanto inicial como contínua, está muito menos desenvolvido. Por isso, na Grécia,
considera-se mais pertinente a necessidade de reconhecimento de competências parciais,
formais ou não formais.
inofor
3.2.2>Itália
O sistema italiano de ensino e de formação, nomeadamente o de formação profissional e
contínua, é, actualmente, objecto de um notável processo de reforma. Graça aos acordos
assinados entre o governo e os parceiros sociais (em 1993 e 1996), é possível identificar os
contornos de um sistema mais vasto e mais nacional. Isto é particularmente evidente na lei
sobre a promoção do emprego (1996/1997), que define os princípios fundamentais de
um sistema de aprendizagem (profissional) ao longo da vida. A lei de 1996/1997 introduz o
princípio segundo o qual as competências podem ser certificadas independentemente do
modo como foram adquiridas. As competências adquiridas em contexto de trabalho
devem ser avaliadas e potencialmente reconhecidas tal como as que foram adquiridas nos
estabelecimentos de formação formal. Trata-se de um sistema que permite avaliar e
reconhecer «as competências parciais adquiridas por cada indivíduo no seu próprio
percurso pessoal».Para isso, a nova lei prevê uma combinação de medidas: um sistema de
formação modular, um sistema de unidades de formação capitalizáveis e processos de
avaliação e de certificação personalizados. Os objectivos consistem na integração e na
interligação dos diversos sistemas (de formação e de ensino profissionais iniciais e de
formação profissional contínua) e na «personalização» dos itinerários de aprendizagem.
Para a realização destes objectivos, foram criados instrumentos como um «registo
individual de formação» (que pode ser combinado com certificados formais para constituir
um portefólio de competências) e um «reconhecimento de competências». Este não
obedece a um modelo único centralizado e aplicado em todo o país, mas difere de região
para região.
Embora este sistema se encontre ainda numa fase inicial de implementação, não deixa de
provocar já algumas tensões. O sucesso da «personalização dos itinerários de
aprendizagem» dependerá, em grande parte, do processamento e das metodologias de
avaliação e de reconhecimento das competências. No centro das reformas em curso
situa-se a questão de se saber quem medirá o quê e por meio de que metodologias,
enquanto diversos grupos de interesse (estabelecimentos de ensino, empregadores,
sindicatos) acompanham circunspectamente as iniciativas e os progressos verificados.
Alguns observadores (Cedefop, Di Francesco, 1999) sublinham a predominância do
conteúdo e dos programas não profissionais nos processos de avaliação propostos. Esta
circunstância torna difícil o tratamento imparcial e válido dos elementos de aprendizagem
não formal (por exemplo, das competências adquiridas no local de trabalho). A partir do
momento em que a avaliação assenta exclusivamente em pontos de referência definidos
no seio do sistema formal, as experiências de aprendizagem que seguem uma lógica
diferente e que conduzem a um conteúdo diferente (por exemplo, as aquisições o, op.
065
Colecção CEDEFOP
profissionais) podem facilmente passar despercebidas ou não serem avaliadas pelo seu
justo valor. Outros observadores (Cedefop, Di Francesco, op. cit.) referem que, de
momento, estas abordagens se encontram numa fase muito problemática devido à
ausência de definições ou regulamentações claras relativamente aos instrumentos em
causa, bem como à falta de um sistema de normas nacionais que promovam práticas
coerentes e comparáveis. Embora a ausência de normas nacionais constitua o mais
importante obstáculo para uma avaliação fiável e válida, não é o único a ter que ser
ultrapassado. A exequibilidade da abordagem é também limitada pela falta de recursos,
que está, em parte, relacionada com o fraco prestígio social atribuído a este segmento do
ensino e da formação. Contudo, a base tripartida das reformas em curso em Itália poderia
contribuir em muito para que as decisões políticas pudessem ser traduzidas em práticas
institucionalizadas.
Como acontece na Grécia, a atitude geral relativamente a estas questões é positiva, facto
atestado por um estudo recente (Isfol, 1998), no âmbito do qual diversos gestores italianos
foram entrevistados sobre os elementos que consideram mais importantes para a gestão
das competências e para o desenvolvimento da formação contínua. Este estudo está
intimamente relacionado com as questões da aprendizagem não formal e do
desenvolvimento de metodologias e de instituições nesta área. O estudo centrava-se, em
larga medida, no modo de medir as competências, a fim de estas serem geridas e utilizadas
o mais eficazmente possível. Foram os seguintes os aspectos sublinhados:
a) quem deve avaliar as competências adquiridas por cada trabalhador, e de que modo?
Muitas empresas avaliam já as competências dos respectivos trabalhadores, mas a partir de
normas internas dificilmente transferíveis. Alguns empregadores receiam que uma melhor
visibilidade das competências conduza à perda das competências-chave da empresa. Daí,
a necessidade de se estabelecer um quadro comum que permita encontrar um equilíbrio
entre os interesses dos trabalhadores e os da empresa;
b) torna-se necessária a existência de um firme controlo público dos sistemas de avaliação
das competências. O objectivo consiste em reforçar as normas e garantir uma
representação adequada dos parceiros sociais. Caso as regras e os procedimentos sejam
claros, considera-se possível e útil a existência de uma estratégia em prol do
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal;
c) os sistemas de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal devem estar
associados a normas gerais passíveis de comparação. As normas não devem ser
demasiado específicas, pois é necessário levar em conta quer o contexto de uma
aprendizagem específica quer a grande diversidade de percursos e de formas de
aprendizagem possíveis;
inofor
d) muitos empregadores estão dispostos e prontos a experimentar procedimentos e
instrumentos, a fim de aumentarem a visibilidade e a transparência das competências.
Como já indicámos acima, para isso é necessário um quadro comum de controlo público.
Este interesse está ligado à questão da flexibilidade do sistema de ensino e de formação
enquanto tal, o que mostra bem que a abertura permitindo uma transferência de
competências entre o sistema educativo e a vida activa e entre os diferentes níveis de
ensino é um objectivo que deve ser obrigatoriamente atingido;
e) a ideia de um portefólio de competências, no sentido do reconhecimento de «unidades
experienciais», é encarada como uma via potencialmente prometedora.
Este estudo mostra à evidência que entre os gestores italianos existe a convicção de que a
aprendizagem pelo trabalho é importante, de que as competências adquiridas neste
contexto devem tornar-se mais visíveis e de que convém atribuir-lhes um valor
equivalente ao das qualificações e das competências adquiridas nas estruturas formais. A
situação italiana é, em parte, contraditória. Por um lado, verifica-se uma nítida evolução
para um sistema de ensino e de formação baseado nas competências, no qual diferentes
percursos de aprendizagem, tanto internos como externos em relação às estruturas de
formação formais, podem conduzir a qualificações formais. Por outro lado, há ainda
obstáculos quer de natureza prática e económica quer de natureza mais geral que têm de
ser ultrapassados. A ausência de pontos de referência (normas) nacionais pertence,
claramente, a esta última categoria e as medidas a tomar no futuro deverão procurar
resolver este problema de uma maneira ou de outra.
3.2.3>Espanha
O movimento de reforma empreendido em Itália no âmbito da formação e do ensino
profissionais e da formação contínua foi também levado a cabo em Espanha, de maneira
semelhante, ainda que mais extensiva. Desde 1990, foram tomadas três importantes
iniciativas legislativas e políticas. O Ministério da Educação introduziu, em 1990, uma lei
sobre a «regulamentação geral do sistema educativo» e o Ministério do Trabalho
introduziu, em 1993 e 1997, dois «programas nacionais para a formação profissional» (I e
II). O objectivo de todas estas iniciativas, que mantêm entre si relações mútuas, consiste
em integrar os diferentes subsistemas de formação e os diferentes modos de aquisição de
competências (isto é, aproximar «a formação inicial, a formação profissional dos
desempregados, a formação contínua e a experiência profissional»). Este esforço de
estabelecimento de uma continuidade entre os diferentes sistemas fundamenta-se,
067
Colecção CEDEFOP
claramente, numa abordagem da formação e do ensino profissionais centrada nos
resultados e nas competências. Também se pode dizer que se procura instaurar um
sistema de aprendizagem ao longo da vida. Até à data, o papel da aprendizagem não formal
no sistema formal espanhol tem-se mantido limitado, sendo difícil a transferência das
competências não formais, confinada ao nível da empresa. No entanto, a reestruturação
do sistema de ensino e de formação parece indiciar uma mudança. Há duas iniciativas que
oferecem um interesse particular. Em primeiro lugar, os serviços integrados para o
emprego (SIPE) estabelecem processos para a avaliação das competências dos
desempregados. Esses processos, que se baseiam numa combinação de «entrevistas
profissionais», destinadas a identificar o perfil profissional e o perfil de competências do
candidato, e de «testes de qualificações profissionais», procuram fornecer uma base mais
correcta à orientação profissional e permitir que cada pessoa compreenda melhor os seus
pontos fortes e as suas limitações. No entanto, esses processos não proporcionam
nenhum reconhecimento formal. Em segundo lugar, os certificados de aptidão profissional
representam um esforço para a certificação dos conhecimentos adquiridos por via não
formal. Este sistema, introduzido em 1995 (Decreto Real 787/1995), abrange
actualmente 185 títulos profissionais e cobre 22 sectores e áreas. Para a obtenção de um
certificado de aptidão profissional, são possíveis dois percursos: o «percurso de
formação», que é a fórmula dominante, e o «percurso de experiência profissional», cuja
importância ainda é reduzida. O Ministério do Trabalho, enquanto responsável por esta
iniciativa, definiu os objectivos seguintes:
a) identificar as características da competência profissional e assim objectivar a acreditação;
b) integrar a formação profissional num sistema que garanta a aquisição de competências
profissionais;
c) aumentar o conteúdo mínimo da formação dos trabalhadores;
d) atribuir uma validade nacional à certificação;
e) validar, com base nas aquisições experienciais, as qualificações dos trabalhadores
desprovidos de títulos formais.
O exame é conduzido por uma comissão de avaliação composta por sete observadores
externos seleccionados ao nível da província ou do sector. Alguns comentadores
(Cedefop, Castillo et al., 1999) consideram que as actividades de desenvolvimento neste
domínio são quase exclusivamente centradas no percurso formal de formação
profissional. Ainda que a base jurídica atribua o mesmo valor ao percurso formal e não
formal, a impressão dominante é que os candidatos à certificação com base na experiência
defrontam obstáculos cada vez mais numerosos. Hoje em dia, o estabelecimento de
inofor
metodologias e de dispositivos que permitem avaliar e reconhecer os conhecimentos
adquiridos por via não formal, em Espanha, depende do desenvolvimento paralelo de
«sistemas nacionais de qualificações», que constituem pontos de referência talvez capazes
de fornecer uma melhor base de integração e de interligação dos diversos modos de
aquisição de competências. Um sistema deste tipo estava já previsto no primeiro
«programa nacional para a formação profissional», de 1993, e encontra-se em
desenvolvimento desde então. O Instituto Nacional das Qualificações, criado em 1999, dá
apoio a este sistema, prevendo-se que, no futuro, venha a desempenhar um papel vital.
Para além dos elementos acima mencionados, as negociações colectivas são cada vez mais
utilizadas enquanto instrumentos de regulação do sistema de classificação das profissões.
As negociações colectivas a nível sectorial possibilitaram a realização de alguns progressos
no domínio da classificação das profissões. Graças aos acordos sobre as classificações
gerais, que permitiram romper com os quadros de referência específicos das empresas, foi
possível elaborar procedimentos para que os trabalhadores fossem avaliados e
remunerados em função das grelhas estabelecidas. Foi, sobretudo, nos sectores da
química e da construção civil que se verificaram progressos, tendo sido introduzida neste
último sector uma carteira de competências profissionais, ainda que de uso bastante
restrito. Os organismos sindicais encarregados da emissão dessa carteira queixam-se já
dos problemas de ordem prática com que se defrontam.
3.2.4>Portugal
Como na Grécia, em Itália e em Espanha, o papel económico da aprendizagem não formal
é importante em sectores-chave da economia portuguesa. Num artigo recente, Carneiro
(1998) compara dois sectores industriais portugueses: o do calçado e o dos componentes
electrónicos. Este último sector é de implantação recente no contexto português e
emprega trabalhadores que possuem um nível relativamente elevado de ensino e de
formação formais. Em compensação, a indústria do calçado emprega trabalhadores com
um nível extremamente baixo de ensino e de formação formais e é considerado como um
sector que se reproduz e se renova graças à «aprendizagem no posto de trabalho», ou
seja, aprendizagem não formal, de acordo com a nossa terminologia. Carneiro utiliza o
exemplo do sucesso da indústria do calçado em Portugal, caracterizada por uma
capacidade de renovação e de crescimento notável, para sublinhar o enorme potencial da
aprendizagem não formal. A conclusão que retira é que este modo de aprendizagem e as
competências daí resultantes constituem um recurso que deve ser explorado, no futuro,
de maneira mais consciente e sistemática.
069
Colecção CEDEFOP
Ainda se encontra em fase de desenvolvimento uma estratégia global de utilização
sistemática dessas competências. Ao nível do Ministério do Trabalho e da Solidariedade
Social e do Ministério da Educação, durante os últimos anos, foram lançados dispositivos
destinados a permitir que as pessoas desprovidas de qualificações formais pudessem
solicitar uma avaliação das suas competências reais. Com base em acordos entre os
parceiros sociais e o Governo (Acordo Económico e Social, de 1991 e Acordo sobre a
Política de Formação Profissional, de 1991), o Ministério do Trabalho e da Solidariedade
Social lançou um sistema de qualificações profissionais que está, em princípio, aberto às
competências adquiridas fora dos estabelecimentos de ensino e de formação formais.
Estes acordos gerais, considerados como esforços destinados a estabelecer a ligação entre
as políticas de ensino e de formação e a esfera mais ampla da política económica e social,
estiveram na origem de três leis sobre a formação e o ensino profissionais (401/91, 405/91
e 95/92). Os fundamentos do sistema de formação profissional foram lançados por estas
leis, que tinham como objectivo estabelecer «as condições para uma efectiva certificação
profissional». Foram nomeadas duas comissões para coordenarem a implementação do
sistema a nível nacional (Comissão Permanente da Certificação CPC) e a nível sectorial
(CTE). Os parceiros sociais estão representados nestes dois níveis. O Instituto do
Emprego e da Formação Profissional assegura assistência técnica e profissional a este
processo. Estes organismos estão encarregados de estabelecer perfis profissionais que
definam o alcance, o conteúdo e o nível de uma dada qualificação. Um certificado (CAP)
pode ou sancionar uma formação profissional tradicional adquirida na escola, ou ser
emitido após o reconhecimento de qualificações adquiridas noutros sistemas
(equivalência), ou corresponder à avaliação e ao reconhecimento de uma experiência
profissional.
A última possibilidade, que apresenta um interesse particular, é fundamentada num
decreto regulamentar (68/94) que define as condições gerais de emissão de um
certificado. Este processo, que se encontra ainda num estádio experimental, compreende
três fases principais, cujos elementos essenciais são apresentados seguidamente.
a) «Processo de aplicação e identificação prévia das competências». Durante esta primeira
fase, o dossier profissional do candidato é analisado a fim de se obter uma visão de
conjunto do seu percurso profissional, incluindo elementos de formação e de
aprendizagem formais e não formais. Também devem ser identificadas as necessidades
imediatas em formação. O candidato deve facultar provas adequadas acerca da sua
formação e da sua experiência profissional, de acordo com as exigências definidas pelo
sistema de certificação. Prevê-se que esta etapa «documental» seja seguida por uma etapa
de auto-avaliação acompanhada. Para explicar as actividades e as competências exigidas
inofor
pelo perfil profissional, os parceiros sociais designarão especialistas (não dispomos de
informação relativa ao modo como este aspecto será resolvido na prática). Este processo
deve permitir julgar da adequação ou da inadequação entre as competências que o
candidato possui e as exigências definidas nos perfis. A orientação será um elemento
determinante desta fase.
b) «Avaliação». Está estipulado que a avaliação pode assumir diversas formas, em que os
três principais elementos são uma análise formal do curriculum vitæ organizado durante a
primeira fase, uma entrevista de carácter técnico e testes elaborados de acordo com o
manual de certificação. A equipa técnica (composta por três membros), que verifica o
dossier, orienta a entrevista e supervisiona os testes práticos; pode ser composta por
representantes dos parceiros sociais («se necessário»).
c) «Certificação». Trata-se do acto formal que consiste na emissão de um certificado de
aptidão profissional comprovando que o seu detentor possui as competências necessárias
para exercer a actividade profissional em causa.
De acordo com as normas definidas pelos perfis de emprego, um manual de certificação
profissional indica as modalidades do procedimento a aplicar a cada área profissional
específica. Isto permite abrir o sistema sempre que é reconhecida a importância das
competências profissionais adquiridas fora do sistema de ensino e de formação formais,
seja no posto de trabalho ou noutro local. No entanto, a experiência prática é limitada. Em
casos isolados (formadores com intervenção na formação profissional, cabeleireiros e
esteticistas, motoristas de táxi, serviços de saúde e de segurança no local de trabalho,
engenheiros), os processos de avaliação e de reconhecimento das aquisições experienciais
já começaram ou vão começar proximamente (em 2000). Por exemplo, os engenheiros
podem, desde 1999, pedir a avaliação das suas aquisições profissionais de acordo com o
procedimento descrito acima.
Na esfera de competência do Ministério da Educação, podem identificar-se duas formas
principais de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. Em
primeiro lugar, pode proceder-se, com fins meramente profissionais, à avaliação e ao
reconhecimento da «aprendizagem de tipo escolar» informal. Por outras palavras, pode
conceder-se ao candidato um reconhecimento parcial para lhe permitir melhorar a sua
situação profissional, quer através de uma promoção interna, quer através de uma
mudança de carreira. No entanto, este reconhecimento não basta para garantir o acesso a
estudos complementares. Em segundo lugar, pode conceder-se o reconhecimento para
permitir a continuação ou a finalização do ensino a nível primário ou secundário. Para
ambos os níveis, o candidato deve submeter-se a uma entrevista e a um teste; se os
resultados comprovam que já adquiriu os saberes correspondentes a determinadas
071
Colecção CEDEFOP
unidades de uma ou de várias matérias, ser-lhe-á concedida uma equivalência e será
colocado no nível apropriado. No final de um processo de avaliação e de reconhecimento,
os candidatos cujo desempenho foi considerado satisfatório seguem percursos individuais,
de acordo com o seu próprio ritmo, e pedem a avaliação dos respectivos saberes quando
se consideram preparados. Foram muitas as pessoas que já tiraram partido desta
possibilidade. Em 1997/1998, mais de 10 000 pessoas pediram avaliação para o quarto
ano do ensino primário, 8 500 para o sexto ano de escolaridade e 41 000para o nono ano.
Deste total de cerca de 60 000 candidatos, 50% tinham mais de 20 anos. No nível
secundário, 35 000 pessoas foram avaliadas em 1997/1998. Este dispositivo não leva em
conta a experiência profissional dos candidatos. A avaliação está centrada nas matérias dos
programas escolares; as competências que ali não figuram não são abordadas de maneira
explícita. A avaliação não deve considerar o local de aquisição dos saberes, mas deve
determinar se esses saberes estão ou não adquiridos.
Para além dos esforços empreendidos em matéria de avaliação e de reconhecimento, no
quadro dos sistemas acima descritos (da responsabilidade do Ministério do Trabalho e da
Solidariedade Social e do Ministério da Educação), fora desses sistemas estruturados, foi
lançado um certo número de iniciativas. O objectivo é integrar progressivamente essas
iniciativas autónomas no quadro geral do sistema nacional de certificação profissional.
Num certo número de sectores, foram recentemente criadas comissões sectoriais (CTS)
para prepararem essa integração. De entre os grupos abrangidos por essas iniciativas,
podemos citar os trabalhadores dos transportes, da aviação civil, da electricidade de baixa
tensão, da marinha mercante, da hotelaria, restauração e turismo, bem como os
jornalistas. A característica comum a todos estes grupos é que as respectivas actividades
são regidas por procedimentos intra-sectoriais de reconhecimento dos conhecimentos
profissionais adquiridos. Nos transportes, por exemplo, a Direcção-Geral dos Transportes
Rodoviários emite uma «carta profissional» aos trabalhadores que ocuparam durante mais
de cinco anos um lugar neste sector e que foram aprovados num teste escrito. No
jornalismo, um ou dois anos de experiência são o suficiente (duração calculada em função
dos estudos prévios) para a emissão de uma «carta profissional» de jornalista.
A abordagem portuguesa em matéria de identificação, de avaliação e de reconhecimento
dos saberes adquiridos por via não formal pode ser considerada como inacabada. Foi
implementado um certo número de elementos que, a prazo, deveria facilitar o
aproveitamento das competências adquiridas fora dos estabelecimentos de ensino e de
formação formais. O sistema nacional de certificação profissional é, sem dúvida, o
elemento mais importante desta estrutura e deixa entrever uma abertura para percursos
alternativos. Os parceiros sociais deverão desempenhar um papel determinante nesta
estrutura, pois a missão destes foi sublinhada e claramente definida na legislação relativa às
inofor
reformas. Em todas as fases do processo, da definição dos perfis de emprego à própria
avaliação, os parceiros sociais são convidados a participar e, em princípio, participam.
3.2.5>Uma abordagem mediterrânea?
Como demonstrámos na análise dos Estados-Membros da Europa, é positiva a atitude
geral em relação à introdução de metodologias e de sistemas de aprendizagem não formal.
Nas esferas tanto públicas como privadas, a utilidade de tais práticas está claramente
expressa. A imensa reserva de conhecimentos adquiridos por via não formal, que constitui
a base de importantes segmentos da economia desses países, deve tornar-se visível. Tratase não apenas de facilitar a utilização dessa reserva, mas também de determinar o modo
como a qualidade dessas competências pode ser aperfeiçoada. Enquanto uma parte
importante da base de competências de uma sociedade se mantiver invisível, é
praticamente impossível determinar sobre que aspectos devem incidir as melhorias. As
metodologias de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal
podem, por isso, ser encaradas como instrumentos numa campanha de qualidade, não
apenas em relação aos trabalhadores e às empresas, mas também relativamente a
segmentos completos da economia.
Esta linha de argumentação ilustra as possíveis tensões entre a utilização da avaliação numa
óptica formativa e a sua utilização numa óptica somativa. As reformas dos sistemas de
ensino e de formação têm tendência a sublinhar o papel somativo, em detrimento do
papel formativo da avaliação. Aquele caracteriza-se essencialmente por uma focalização
directa sobre a prova (da sequência ou do resultado de uma aprendizagem) em prejuízo
do feedback (que permite alargar e melhorar uma determinada base de competências).
Embora esta focalização seja importante, no sentido em que permite responder à
necessidade de sistemas de formação mais abertos e flexíveis, as metodologias
desenvolvidas neste contexto não propõem, necessariamente, as soluções requeridas
noutros níveis (por exemplo, ao nível da empresa ou do sector).
A análise a este grupo de países também permite medir a distância que ainda falta percorrer
para que se passe das intenções à obra. As acções legislativas e políticas foram conduzidas
por meio de reformas educativas de extensão variável, mas a introdução efectiva de
práticas de avaliação e de reconhecimento não tem mostrado progressos. Em certos
países, este processo ainda se encontra em fase de planificação Os próximos anos dir-nosão se as intenções positivas expressas quase unanimemente nestes quatro países serão
traduzidas em práticas com efeitos e utilidade reais relativamente aos indivíduos e às
empresas.
073
Colecção CEDEFOP
Um aspecto extremamente característico comum aos quatro países mediterrâneos
consiste no importante papel desempenhado pelos projectos e programas financiados ao
nível comunitário. Os exemplos da Grécia, da Itália, de Espanha e de Portugal ilustram a
importância das iniciativas e do apoio comunitários. Um grande número de pessoas e de
estabelecimentos destes quatro países participaram em projectos e programas centrados
sobre as questões da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não
formal, o que, em certa medida, contribuiu para desenvolver as atitudes identificadas nesta
área. Retomando o exemplo da Itália, foi adquirida uma grande soma de experiências
graças a projectos e programas desse tipo, nomeadamente a partir de 1996/1997. Esta
«abordagem orientada para o projecto» pode qualificar-se como «ascendente», no sentido
em que não se conseguiu identificar qualquer direcção nem qualquer objectivo
centralmente definido. Os projectos em causa parecem basear-se nos interesses e nas
necessidades das pessoas e dos estabelecimentos envolvidos, e não nas políticas nacionais
gerais da área. Embora estes projectos permitam apoiar as práticas inovadoras e alargar o
campo da experimentação, parece existir um problema de implementação e de difusão.
Sem entrar em pormenor em todos os projectos em causa12, é possível dizer que a
maioria se centrava em três grupos principais: as mulheres, os desempregados de longa
duração e os trabalhadores ameaçados com o desemprego. Um desses projectos dizia
respeito aos jovens que abandonam a escola precocemente. No quadro desses projectos,
foi proposta e desenvolvida uma variedade impressionante de metodologias e de
instrumentos de identificação e de avaliação, baseados, sobretudo, em três dispositivos:
a) entrevistas individuais relativamente estruturadas, em que prevalece a exposição do
próprio candidato;
b) auto-avaliação das características pessoais por meio de instrumentos ad hoc;
c) auto-avaliação através de exercícios de grupo.
Dado que não existe qualquer quadro sistémico nem qualquer ponto de referência formal,
os sistemas de avaliação desenvolvidos por esses grupos são entregues a si próprios e o
grau de aceitação e de legitimidade da avaliação daí resultante é variável. O principal valor
desses projectos parece que reside na possibilidade de poderem servir como reserva de
experiências susceptível de aperfeiçoar os instrumentos de avaliação mais integrados no
sistema e que foram introduzidos numa base permanente.
Voltaremos a esta questão no capítulo 4.
12
Em 1997, 24 dos projectos italianos Leonardo da Vinci e 27 dos projectos italianos Adapt incidiam, pelo menos em
teoria, sobre questões relacionadas com a certificação/reconhecimento (Cedefop, 1999).
inofor
3.3>A aprendizagem não formal nos países nórdicos: Finlândia,
Noruega, Suécia e Dinamarca13
Em dois dos quatro países analisados nesta secção, a Finlândia e a Noruega, a questão da
aprendizagem não formal encontra-se na primeira linha dos debates sobre o ensino e a
formação e tornou-se objecto de experimentação e de importantes reformas
institucionais. Nos outros dois países, a Suécia e a Dinamarca, o interesse mantém-se, até
à data, limitado. No entanto, a situação parece estar a mudar, sobretudo na Suécia, onde,
em 1999, foi implementado um certo número de iniciativas da responsabilidade quer do
governo quer dos parceiros sociais. Os quatro países partilham importantes tradições
comuns no domínio do ensino e da formação. A aprendizagem mútua é um dos aspectos
fundamentais do desenvolvimento dos sistemas nacionais e, graças a um mercado de
trabalho comum aos países nórdicos, a mobilidade transfronteiriça das competências é
uma prática corrente e aceite. Dois elementos, em particular, merecem ser mencionados:
a) o ensino e a formação encontram-se fortemente institucionalizados e formalizados e
recebem a maior percentagem de cada grupo etário;
b) o ensino, nomeadamente o ensino profissional, e a formação constituem uma
responsabilidade claramente tripartida. As decisões em matéria de formação assentam na
participação e na influência quer dos empregadores públicos quer dos trabalhadores.
Durante as três ou quatro últimas décadas, contudo, estes países optaram por abordagens
diferentes em matéria de ensino e de formação. É, nomeadamente, o caso da formação e
ensino profissionais de nível secundário superior, onde, hoje em dia, é possível identificar
quatro modelos distintos. As diversas escolhas institucionais e organizacionais nos quatro
países relacionam-se, em certa medida, com os diferentes graus de prioridade atribuídos à
aprendizagem pelo trabalho. As mais recentes reformas empreendidas na Finlândia e na
Noruega sublinham nitidamente a importância da aprendizagem pelo trabalho ao
introduzirem mudanças institucionais que procuram reforçar essa forma de
aprendizagem. Essa importância não tem sido tão claramente evidenciada no contexto
sueco. A abordagem dinamarquesa pode comparar-se, em larga medida, às abordagens
alemão e austríaca. A prioridade essencial foi concedida à formação inicial no seio de um
modelo dual, o que é, em geral, considerado como suficiente para abranger os aspectos da
aprendizagem experiencial.
13
O quinto país nórdico, a Islândia, não foi incluído no estudo do Cedefop por razões de capacidade.
075
Colecção CEDEFOP
3.3.1>Noruega
No sistema norueguês de formação e ensino profissional, o aspecto da aprendizagem foi
recentemente reforçado. A experiência profissional passou a ser (desde 1994) um
componente obrigatório e integrado em todas as vias profissionalizantes do secundário
superior. Na Noruega, a formação profissional é composta por uma introdução inicial
(geral) à disciplina, no âmbito de um ensino e de uma formação na escola com a duração de
dois anos. Esta preparação inicial é seguida por um ciclo de dois anos em empresa ou numa
instituição, para a especialização ou o desenvolvimento de competências por meio da
experiência profissional (Cedefop, Pape, 1999). Recentemente, foi introduzida uma
reforma do sistema de formação contínua, destinada, sobretudo, a integrar neste sistema
as metodologias e os organismos de avaliação e de reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal (realkompetanse). Os trabalhos preparatórios para esta
reforma foram iniciados em 1996, tendo uma comissão apresentado as suas
recomendações em 1997, sublinhando a importância de se estabelecerem metodologias
e dispositivos de grande envergadura que permitam avaliar e reconhecer os
conhecimentos adquiridos por via não formal, em geral, e não apenas as aquisições
relacionadas com o sistema de aprendizagem. Com base nestas recomendações, o
Parlamento propôs e decidiu (no final da Primavera de 1999) uma reforma geral do sistema
de formação profissional contínua. O Ministério da Educação e da Investigação ficou
encarregado de desenvolver um sistema nacional de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal (ou realkompetanse) durante
os dois anos seguintes. Ao nível nacional e regional, foram lançados numerosos projectos a
fim de se definir as condições requeridas, quer em termos metodológicos quer em termos
institucionais, para a elaboração de um sistema de grande envergadura que permita avaliar
e reconhecer os conhecimentos adquiridos por via não formal. Os parceiros sociais
encontram-se muito envolvidos neste processo e as realkompetanse tornaram-se numa
prioridade no debate norueguês sobre o ensino e a formação. A proposta apresentada ao
Parlamento, que está na base das decisões formais e dos trabalhos de investigação e de
experimentação em curso, estipula que devem ser desenvolvidos dois tipos de «provas
documentais» (para fins de identificação, de avaliação e de reconhecimento): por um lado,
as provas centradas nas necessidades profissionais em diversas actividades ou sectores e,
por outro, as provas centradas na ligação com os sistemas de ensino e de formação formais
que oferecem a possibilidade de se pedir a avaliação e o reconhecimento das
competências adquiridas em contextos não formais. Esta focalização explícita sobre as
diferentes necessidades a que interessa dar resposta é interessante e não se encontra em
muitos outros países. Reflecte, provavelmente, o profundo empenhamento dos parceiros
inofor
sociais no debate sobre a aprendizagem não formal na Noruega. Tanto os empregadores
como os sindicatos sublinharam a necessidade de desenvolvimento das metodologias que
não apenas seguem a lógica do sistema de ensino e de formação mas que também dão
resposta às necessidades dos trabalhadores e das empresas. Por isso, o sistema deve levar
em conta as competências adquiridas em diferentes percursos de aprendizagem, incluindo
os conhecimentos adquiridos por via formal, as aquisições profissionais, bem como a
experiência adquirida no âmbito dos cuidados às crianças e/ou às pessoas idosas, de
actividades culturais e sociais, etc. Um outro ponto interessante incluído na proposta
apresentada ao Parlamento é o que respeita aos direitos legais. Qualquer pessoa poderá
apresentar um recurso contra as decisões de avaliação (junto de um organismo regional).
São os seguintes os objectivos formais do sistema:
a) permitir aos adultos a apresentação dos comprovativos das respectivas competências
correspondentes aos programas de ensino e de formação formais (com o objectivo da
certificação);
b) permitir o acesso ao ensino e à formação formais com base nas competências adquiridas
num contexto não formal (numa óptica de formação permanente);
c) permitir a dispensa de determinadas sequências de cursos de ensino e de formação
formais (a fim de se evitar a duplicação de trabalho);
d) proporcionar o acesso a determinadas profissões e actividades, estabelecendo que a
aprendizagem não formal não é inferior à aprendizagem formal, dado que permite atingir o
mesmo nível de qualidade e de competência.
A proposta apresentada ao Parlamento determina que o sistema deve ser autónomo e não
um simples «anexo» aos procedimentos tradicionais de avaliação em vigor no ensino e na
formação formais. Mais do que na maioria dos outros países, as recentes reformas estão
ligadas a uma certa tradição. O direito de certificação formal das competências adquiridas
fora do sistema de ensino e de formação formais foi estabelecido enquanto direito geral
pela lei norueguesa de 1976 sobre a educação dos adultos. No entanto, poucos
progressos se realizaram em termos de desenvolvimento de dispositivos institucionais e
de procedimentos. A lei de 1976 é o símbolo de uma intenção e não um instrumento para
a realização desse objectivo. A mais importante forma de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal na Noruega é aquela que
permite que um candidato se apresente ao exame final para aprendizes (exame de fim de
formação) com base na sua experiência profissional prática. Este dispositivo foi introduzido
em 1952, pela lei sobre a formação profissional. Na secção 20 desta lei estipula-se que
«qualquer indivíduo sem contrato de aprendizagem pode apresentar-se ao exame de final
077
Colecção CEDEFOP
de formação desde que comprove uma prática geral na actividade em causa por um
período de mais 25%, pelo menos, em relação à duração da aprendizagem». Durante as
décadas de 70 e 80, poucos candidatos se aproveitaram desta possibilidade. Nos anos 90,
a situação alterou-se e, em 1997-1998, este dispositivo conheceu um sucesso fulgurante.
Em cada um destes anos, apresentaram-se a exame de final de formação cerca de 14 000
candidatos, ou seja, o dobro de um ano considerado «normal». Como cada grupo etário
compreende cerca de 60 000 indivíduos, este número é extremamente elevado. Os
sectores dominantes são, sobretudo, a construção, os transportes, a indústria
electromecânica e os serviços médico-sociais. A popularidade deste dispositivo reflecte
sem dúvida, o nível relativamente baixo de formação formal nestes sectores, mas também
a pressão geral em matéria de formalização das qualificações, provocada, essencialmente,
por motivações salariais e de segurança de emprego.
O sucesso deste dispositivo revela que a aprendizagem não formal se encontra agora na
primeira linha do debate norueguês sobre o desenvolvimento das competências. De
acordo com um relatório publicado pelo FAFO (Instituto de Investigação para os
Sindicatos) (Skule e Reichborn, 2000), quatro trabalhadores noruegueses em cada dez
mostram vontade de sujeitar a avaliação e a reconhecimento as respectivos
conhecimentos adquiridos por via não formal. Logicamente, estão sobre-representados
neste grupo os trabalhadores com um nível relativamente baixo de ensino e de formação
formais. Os grupos que manifestam mais claramente esta necessidade de avaliação e de
reconhecimento são os trabalhadores do sector privado, com idades compreendidas
entre 30 e 40 anos e os trabalhadores do sector público com idades compreendidas entre
os 40 e os 50 anos. É interessante verificar que os trabalhadores que mostram mais
claramente a necessidade de acreditação das respectivos conhecimentos adquiridos por
via não formal revelam também necessidade de formação formal, o que sublinha que, por
um lado, estes sistemas devem ter uma função de continuidade entre a vida activa e o
ensino e que, por outro, convém evitar a repetição inútil das mesmas sequências de
aprendizagem.
3.3.2>Dinamarca
O sistema dinamarquês de ensino e formação profissional pode considerar-se de natureza
dual na medida em que assenta numa abordagem da formação pela aprendizagem. Este
sistema de formação inicial é completado por um sistema de formação contínua e está
profundamente integrado nas políticas do mercado de trabalho. Actualmente, encontra-se
em discussão uma ampla reforma no âmbito da educação de adultos
inofor
(Undervisningsministeriet, 1997; Cedefop, Niels, 1999). Esta reforma inscreve-se nas
tendências gerais já observadas na Noruega e na Finlândia, que insistem na necessidade de
repensar o papel da aprendizagem não formal, a fim de estabelecer um sistema de ensino e
de formação que permita a ligação entre os diversos níveis e percursos de aprendizagem.
Embora, na Dinamarca, não seja muito alargado o debate sobre a aprendizagem não
formal, é possível identificar no sistema existente alguns elementos que traduzem esforços
no sentido de levar em conta esse tipo de aprendizagem. O primeiro exemplo encontrase no programa de aprendizagem para os adultos (Voksenerhvervsuddannelsen - VEUD),
que permite que os adultos sejam dispensados de algumas sequências de formação inicial
formal em função da experiência educativa ou profissional anterior. As decisões em matéria
de dispensa são tomadas pela comissão profissional respectiva. O programa VEUD assenta
numa abordagem individualizada, que procura identificar a experiência de cada candidato
e, em seguida, elaborar um projecto de formação. A avaliação dos conhecimentos
adquiridos faz parte integrante do programa VEUD. Para cada formando adulto é
elaborado um projecto pedagógico, no qual são devidamente validadas as competências já
adquiridas. Os parceiros sociais participam no processo, visto que as responsabilidades
nessa matéria foram confiadas às comissões profissionais.
Desde 1992, já iniciaram uma formação no âmbito do programa VEUD cerca de 6 000
adultos. Além disso, as aquisições profissionais podem permitir uma dispensa no quadro
de um programa formal de ensino e formação profissional inicial. Se o pedido de dispensa
incidir sobre matéria escolar, a decisão é da responsabilidade do estabelecimento de
ensino em questão. Se a redução do tempo de formação for superior a quatro semanas ou
se a dispensa incidir sobre elementos práticos do programa, será consultada a comissão
profissional. As regras de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal são
definidas pelos regulamentos relativos a cada disciplina profissional. Em relação aos
programas médico-sociais, que dependem de legislação especial, as decisões em matéria
de dispensa serão tomadas a nível do município. Por recomendação do estabelecimento
de ensino, a autoridade pública envolvida pode conceder uma dispensa parcial com base
na experiência profissional prática, devendo levar em consideração todas as competências
possíveis.
Convém mencionar que a lei de 1995 relativa à formação no mercado de trabalho dá uma
maior prioridade ao papel da aprendizagem pela experiência profissional. Na sequência
desta lei, foram criados cursos destinados a apoiar as pessoas na identificação das
respectivas competências com vista a uma formação complementar. Estes cursos têm uma
duração de uma a três semanas e caracterizam-se por combinar avaliação e orientação
profissional.
É também de mencionar um outro dispositivo implementado na Dinamarca, que não está
079
Colecção CEDEFOP
directamente ligado às iniciativas descritas acima. Trata-se do sistema SUM (formação
estratégica contínua dos trabalhadores), introduzido na indústria, nos anos 90, pelos
parceiros sociais (Confederação das Indústrias Dinamarquesas e Organização Central dos
Trabalhadores da Indústria). Este sistema, que procura identificar («medir») as
competências nas empresas, foi criado no âmbito do acordo nacional concluído entre os
parceiros sociais, em virtude do qual todos os trabalhadores devem participar anualmente
numa formação profissional contínua com a duração mínima de duas semanas. Quando
este acordo foi assinado, nos finais dos anos 80, os parceiros sociais não tinham conseguido
chegar a um consenso acerca do conteúdo e do perfil desta formação, nomeadamente,
sobre quem decidiria quais os cursos que cada trabalhador deveria frequentar. Para evitar
qualquer conflito, foi criada uma «caixa de ferramentas» (o sistema SUS) destinada às
empresas, para lhes permitir analisar e descrever as próprias competências e as respectivas
necessidades em competências. A ideia subjacente era a de evitar potenciais conflitos,
propondo que as discussões fossem travadas a nível das bases. O sistema SUS assenta em
três princípios fundamentais:
a) os utilizadores do sistema são as próprias empresas, sem intervenção de terceiros
(peritos);
b) a utilização deste sistema baseia-se, antes de mais, no diálogo entre os empregadores e
os trabalhadores;
c) o sistema assenta numa abordagem «modular», de modo a que cada empresa possa
escolher entre diferentes elementos metodológicos, em função das suas necessidades
específicas.
O sistema SUM abrange a identificação e a avaliação das competências, mas não o
reconhecimento, na medida em que não está ligado a nenhumas qualificações formais. O
seu objectivo é claramente formativo, fornecendo às empresas um instrumento que lhes
permite recensear e validar os respectivos recursos em competências. A experiência do
SUM pôs em relevo certos problemas que esta abordagem pode colocar. A descrição das
competências, por vezes, afasta-se da terminologia indicada, o que dificulta a transparência
e a transferência. É interessante notar que, de acordo com o secretariado do SUM, nem os
trabalhadores nem os empregadores exprimiram claramente o desejo de que este sistema
se desenvolvesse mais, de modo a que se estabelecesse a ligação com os sistemas de
certificação formal. De acordo com a mesma fonte, os trabalhadores esperam manter-se
na empresa e não vêem utilidade em dispor de instrumentos de transferência; quanto aos
empregadores, receiam perder os trabalhadores mais competentes e, por isso, não são
particularmente favoráveis ao estabelecimento de sistemas transparentes capazes de
tornar mais fácil a transferência de competências.
inofor
3.3.3>Finlândia
O sistema finlandês de ensino e formação profissional caracteriza-se pelo facto de se
basear na competência (nos resultados) e por funcionar de acordo com uma estrutura
modular. Constitui elemento essencial deste sistema o facto de «as competências
profissionais, qualquer que seja o modo de aquisição, poderem ser demonstradas no
quadro de testes de aptidão». Foi criado um sistema de «linhas nacionais de orientação
para as qualificações», definindo as exigências a satisfazer. Em 1999, no âmbito deste
sistema, tinham sido estabelecidos referenciais para 66 qualificações de formação
profissional inicial, 146 qualificações de formação profissional complementar e 107
qualificações de formação profissional especializada.
Este sistema foi implementado por meio de uma nova lei sobre a formação profissional
votada em 1994 (L306/1994) e que abrange, como foi indicado acima, três categorias: as
qualificações profissionais iniciais, as qualificações profissionais complementares e as
qualificações profissionais especializadas (Cedefop, Haltia et al., 1999).
Os candidatos devem fazer prova de que possuem as competências profissionais de base
exigidas pela área em causa. Regra geral, são propostas ao candidato as seguintes opções
de avaliação:
a) avaliação baseada na apresentação de um portefólio de competências (amostras de
«produtos», projectos realizados, provas parciais, incluindo descritivos de tarefas
profissionais feitos pelos empregadores, e competência propriamente dita);
b) avaliação «autêntica» realizada no local de trabalho do candidato, completada por
entrevistas orais ou questionários escritos;
c) avaliação no estabelecimento de ensino que organiza o teste.
A avaliação está estreitamente relacionada com as «linhas nacionais de orientação para as
qualificações» mencionadas acima. Cada qualificação é apresentada num caderno que
inclui diversos elementos: 1) a estrutura da própria qualificação e as relações entre as
qualificações baseadas nas competências e o resto do sistema educativo; 2) os objectivos
do sistema de qualificações; 3) uma descrição da área profissional, com indicação das
aptidões gerais exigidas aos trabalhadores; 4) uma descrição das competências
profissionais exigidas para a qualificação e para os respectivos componentes ou módulos
(em regra, quatro a oito módulos); 5) uma descrição do modo como as competências
profissionais podem ser demonstradas e dos critérios a utilizar para a avaliação delas, tais
como a «eficiência», a «qualidade dos resultados do trabalho», etc. estes critérios variam
muito de área para área; 6) as modalidades de organização de uma eventual formação
preparatória.
081
Colecção CEDEFOP
Nos testes relativos às qualificações profissionais iniciais, a avaliação é classificada,
contrariamente aos testes relativos às qualificações profissionais complementares ou
especializadas, em que os candidatos são apenas admitidos ou reprovados. Embora as
linhas nacionais de orientação sigam a estrutura apresentada acima, não foi adoptado
nenhum formato rígido. Em relação ao sistema britânico, no qual as unidades, os
elementos, os critérios de desempenho e o âmbito das qualificações foram estabelecidos
de forma relativamente pormenorizada, a abordagem finlandesa é menos estruturada e
menos controlada a nível central. Na descrição inicial do sistema, estipulou-se que cada
sector profissional deve preparar as suas próprias linhas de orientação. Este facto reflecte o
reconhecimento das grandes diferenças que existem entre os diversos sectores
profissionais, tendo-se considerado potencialmente negativa a implementação de um
modelo unificado e normalizado. Alguns observadores (Cedefop, Haltia et al., op. cit., p.
18) sublinham o facto de as comissões de exame não terem recebido instruções muito
pormenorizadas:
«O que as comissões de exame realizaram depende, em larga
medida, das suas próprias actividades. Por exemplo, relativamente
à participação na organização e na supervisão dos testes de
aptidão, as comissões de exame tiveram uma grande liberdade de
acção.»
Além disso,
«No conjunto, as linhas nacionais de orientação para as
qualificações só dão instruções muito vagas para a organização dos
testes de aptidão e de avaliação do desempenho. Por exemplo, na
parte que descreve os critérios de avaliação, menciona-se a rapidez
de execução e a qualidade do trabalho, mas sem qualquer instrução
pormenorizada sobre o grau de rapidez ou as modalidades de
apreciação da qualidade. A definição mais pormenorizada dos
requisitos é, pois, deixada ao critério da comissão de exame e do
estabelecimento de ensino que organiza os testes de aptidão.»
Isto mostra que a introdução de linhas de orientação para cada qualificação não foi o
suficiente para evitar certas variações nas modalidades de avaliação. A investigação revelou
que os avaliadores tendem a confundir a «abordagem criterial» oficial de referência (cf.
capítulo 2.2) com a apreciação dos níveis de competência no seio do grupo específico
inofor
sujeito a avaliação. Por outras palavras:
«Os avaliadores estão, por vezes, um pouco hesitantes na tomada
de decisões e preferem ver o desempenho ou o trabalho de todos os
candidatos antes de se pronunciarem.» (Cedefop, Haltia, et al., op.
cit., p. 42)
Por isso, o nível de competência geral de um grupo de candidatos pode influenciar a
apreciação das fronteiras entre aprovação e reprovação, por exemplo. Este aspecto vem
sublinhar o problema fundamental da garantia de coerência e de fiabilidade. Embora, em
geral, se considere que as linhas de orientação têm uma qualidade relativamente elevada,
alguns membros das comissões de exame solicitaram linhas de orientação mais
pormenorizadas e mais precisas.
Para resolver este problema, foi lançado um projecto nacional, ALVAR14, a fim de garantir
que os testes, em determinadas áreas profissionais, sejam comparáveis a nível nacional e
que os níveis de exigência correspondam às necessidades profissionais. O projecto ALVAR
procura reunir e formar especialistas para prepararem as provas de exame. Também se
organizam acções de formação destinadas ao pessoal dos estabelecimentos de ensino que
orienta os testes. Finalmente, este projecto desenvolve e mantém um «banco de testes»
para apoiar a investigação de testes e de métodos de avaliação criteriosos e fiáveis. O
projecto ALVAR, que beneficia de um financiamento do Fundo Social Europeu, é um
exemplo interessante de controlo de qualidade na área da testagem e da avaliação.
Subjacente está a perspectiva segundo a qual é impossível especificar antecipadamente e
em pormenor as modalidades da avaliação. O modo mais correcto de garantir a fiabilidade
e a tão esperada validade consiste em promover a formação dos avaliadores e o seu
trabalho em rede. Embora demasiadamente recente para que se possa avaliar a sua
concepção, este processo parece ser promissor.
Retomando as diversas opções de avaliação propostas aos candidatos, os dados e as
experiências existentes revelam que a avaliação é realizada, na maioria dos casos, pelos
estabelecimentos de ensino. Raramente é utilizada a modalidade «portefólio de
competências». A investigação (Haltia e Hämäläinen, 1999) pôs em relevo as dificuldades
inerentes à organização de uma avaliação no local de trabalho. Numerosos empregadores
invocam a «falta de tempo» e mostram-se pouco dispostos a autorizar a avaliação. Os
14
Ammattitutkintojen laadunen VARmistus, ou controlo de qualidade das qualificações baseadas nas competências.
083
Colecção CEDEFOP
representantes dos estabelecimentos de ensino parecem encorajar esta tendência,
sublinhando as dificuldades em garantir a uniformidade e a fiabilidade. A reserva dos
empregadores baseia-se, provavelmente, no tempo que será necessário gastar para
aplicar este modelo. Uma «verdadeira» avaliação de uma qualificação completa, no local
de trabalho, demora, em geral, dois a cinco dias.
As qualificações baseadas nas competências tornaram-se claramente partes integrantes e
oficiais do sistema normal de ensino e formação profissional. Em 1998, mais de 10 000
candidatos recorreram a esta opção. As diferentes tarefas estão repartidas pelos diversos
organismos e níveis administrativos. Para além do nível superior, que compreende o
Ministério e as organizações nacionais dos parceiros sociais, a repartição das tarefas foi feita
da seguinte forma: grupos de especialistas, sob a supervisão da Direcção Nacional do
Ensino, estão encarregados da elaboração das «linhas nacionais de orientação», ou seja,
dos referenciais de nível e de desempenho para a qualificação em causa. No seio de cada
grupo de especialistas, devem estar representados, pelo menos, os parceiros sociais, os
docentes e, de preferência, os profissionais independentes. As comissões de exame (250,
ao todo) são responsáveis pela organização e pela supervisão dos testes, homologando as
qualificações e assinando os certificados. O estatuto das comissões de exame também lhes
permite supervisionar e assinar contratos para a elaboração dos testes e da avaliação com
estabelecimentos de ensino (ou outros) que tenham competência para isso. Os contratos
para a elaboração dos testes de aptidão incluem cláusulas relativas aos avaliadores do
desempenho, à manutenção e ao desenvolvimento da respectiva competência
profissional, bem como a outros elementos.
Embora se encontre ainda numa fase inicial, o sistema finlandês de qualificações baseadas
nas competências tornou-se parte integrante e permanente do sistema nacional de ensino
e formação profissional.
3.3.4>Suécia
O sistema sueco de ensino e formação profissional caracteriza-se por «se basear na
escola». Embora este sistema se esteja progressivamente a abrir para a aprendizagem, a
grande maioria dos formandos recebe formação profissional em estabelecimentos
especializados. Oficialmente, um dos objectivos consiste em proporcionar uma
determinada formação prática em empresa (cerca de 20% da duração da formação), mas
este objectivo tem-se mostrado de difícil concretização (Cedefop, Forsen et al., 1999).
Como já foi referido na introdução deste capítulo, as iniciativas suecas, no passado, foram
raras, e destinadas mais preferencialmente a grupos específicos (imigrantes, portadores de
inofor
deficiência, desempregados) do que ao conjunto da população. O projecto «imigrantes
como recurso» (PTVI), lançado em 1988, permitiu desenvolver um programa de testes
para os imigrantes possuidores de qualificações profissionais. Este projecto incluía uma
vertente prática e uma vertente teórica, com a duração total de 2 a 12 semanas. Depois do
teste, o candidato recebia um certificado escrito com a descrição dos níveis do sistema de
ensino e de formação da Suécia equivalentes às suas competências. Até 1992, a Direcção
Nacional do Trabalho estava encarregada de organizar testes profissionais para todos os
desempregados que desejassem solicitar a avaliação das respectivas competências. Depois
dessa data, este organismo foi descentralizado e as suas funções entregues às agências
locais para o emprego, o que se traduziu por um nítido recuo do processo. Hoje em dia, as
agências locais para o emprego são obrigadas a determinar o momento em que se devem
organizar esses testes e se se justifica a sua organização. As razões para este recuo são
complexas, mas o custo e a complexidade do próprio processo constituem,
provavelmente, as razões mais plausíveis.
Reconhecendo os problemas criados por esta situação, o Ministério da Educação sueco
iniciou, em 1998, uma investigação sobre os meios de avaliação e de reconhecimento das
qualificações «estrangeiras». Esta investigação deu origem a um certo número de
recomendações (SOU, 1998:165), que sublinham a necessidade de clarificar as
responsabilidades, a nível nacional e regional. Propõe-se a utilização dos programas do
secundário superior (Gymnasieskolans styrdokument för yrkesutbildning) como
referência para a definição de critérios a que devem corresponder os candidatos e os níveis
a atingir. Esta abordagem baseia-se nos resultados, no sentido em que não se exige
qualquer escolaridade ou certificado anterior. No último capítulo desse relatório, que não
se limita à questão das qualificações «estrangeiras», é referido que todos os adultos, e não
apenas os imigrantes, devem ter acesso a um sistema de avaliação e de reconhecimento
dos saberes adquiridos por via não formal. O Ministério decidiu adoptar essas
recomendações e lançou projectos-piloto em diversos sectores e regiões. O debate que
se seguiu à investigação promovida pelo Ministério revelou-se importante. Uma das
principais confederações sindicais (Tjänstmännens Centralorganisation -TCO) respondeu
com a publicação do seu próprio relatório (TCO, 1999), no qual exprime a necessidade de
se estabelecer um sistema de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por
via não formal, na Suécia. No entanto, a abordagem adoptada pelo Ministério é
considerada insuficiente e demasiado limitada. A TCO propõe o desenvolvimento de
esforços tripartidos destinados a criar, na Suécia, um sistema de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal a partir da experiência e das
boas práticas identificadas nos outros países nórdicos, bem como na UE em geral.
Até à data, as metodologias ensaiadas em diversas regiões visam, essencialmente,
085
Colecção CEDEFOP
aumentar a flexibilidade do secundário superior. Tanto a nível central como a nível regional,
é frequente afirmar-se que esta actividade tem por objectivo economizar tempo e
recursos, Os adultos não devem repetir as mesmas sequências de aprendizagem e os
estabelecimentos de ensino não devem desperdiçar recursos para ensinar aos adultos o
que eles já sabem. A estreita relação com o secundário superior é, simultaneamente, um
ponto forte e uma fragilidade. Como transparece no projecto-piloto do município de
Gotemburgo, a relação directa com os Gymnasieskolan permite desenvolver as
abordagens já aplicadas em matéria de avaliação (só os docentes participam na própria
avaliação) e, assim, avaliar um grande número de candidatos durante um período
relativamente breve. A forte modularização do sistema sueco de ensino e formação
profissional desempenhou um papel positivo. De acordo com os participantes do
projecto, ainda não foi colocado nenhum problema de monta na aplicação de «normas»
formais aos candidatos que adquiriram competências em contextos não formais. De facto,
a fragilidade do sistema talvez resida na relação demasiado estreita com os
estabelecimentos de ensino: se as competências adquiridas de modo não formal se
consideram semelhantes às que são desenvolvidas no ensino e na formação formais, é
possível que determinadas competências importantes sejam definidas como irrelevantes.
O desafio consiste em desenvolver uma abordagem da avaliação que favoreça mais a
equivalência do que a semelhança e que reconheça que as aprendizagens formal e não
formal são diferentes e podem ter resultados diferentes, mas de valor igual.
As iniciativas suecas em matéria de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não formal não se limitam a esses projectos e a essas experiências lançados a nível
central. Vemos também um certo número de iniciativas lançadas por intervenientes tanto
públicos com privados, que estão mais centradas nas competências adquiridas em
contexto de trabalho e pouco ligadas ao ensino e à formação formais. O programa sueco
de tecnologias da informação (SWIT) constitui um exemplo interessante de avaliação em
grande escala das competências adquiridas por via não formal. Neste programa (19972000), financiado pelo Ministério do Trabalho e da Indústria, para compensar parte da
penúria de mão-de-obra na área das tecnologias da informação, foi aplicado cerca de um
bilião de coroas suecas, tendo beneficiado de uma formação mais de 10 000 pessoas. Ao
todo, foram apresentados mais de 80 000 pedidos de formação, o que sublinha a
necessidade de uma metodologia de avaliação e de selecção de alta qualidade. O duplo
objectivo da metodologia consistia na identificação dos indivíduos aptos a seguir a
formação em causa e também das pessoas capazes de exercer diversas funções no
domínio das tecnologias da informação. Finalmente, foi utilizada uma metodologia assente
numa combinação de entrevistas e de testes altamente formalizados (incidindo sobre as
capacidades de cálculo e de lógica e sobre os conhecimentos linguísticos, bem como sobre
inofor
as competências sociais e relacionais). Os testes formais destinavam-se a servir de base a
entrevistas mais personalizadas com vista à selecção final dos candidatos.
Sem entrar em mais pormenores sobre os testes específicos e as metodologias utilizadas,
pode dizer-se que o programa SWIT mostra que é possível desenvolver com sucesso
sistemas de avaliação de elevada capacidade, pelo menos a acreditar nas avaliações
internas do programa. No entanto, é conveniente notar que a metodologia de avaliação
do SWIT se encontrava adaptada às necessidades específicas das empresas suecas de
tecnologia da informação e que foi desenvolvida em estreita cooperação com estas.
Contrariamente a várias iniciativas nacionais analisadas no presente relatório, o programa
SWIT conseguiu funcionar com um número relativamente restrito de critérios e a partir de
um ponto de referência estabelecido pelo mundo do trabalho.
A identificação dos conhecimentos adquiridos por via não formal está indirectamente
atestada por alguns dos projectos locais e regionais desenvolvidos no quadro da «iniciativa
em prol da educação dos adultos» (Kunnskapslyftet). Na região de Gotemburgo, os
esforços com vista à coordenação dos recursos de orientação e de aconselhamento
traduziram-se no lançamento de uma acção de inventariação sistemática das experiências
e das aptidões dos adultos. Embora não conduza ao reconhecimento formal, o processo
de identificação de competências mais ou menos escondidas é considerado determinante
na fase de aconselhamento. Equipas compostas por docentes, psicólogos e outros
especialistas elaboram, em conjunto com o candidato, um plano de estudos adaptado ao
caso particular deste último. Esta experiência revela que a relação entre orientação ou
aconselhamento e avaliação nem sempre é fácil de estabelecer e sublinha o papel
formativo da avaliação.
3.3.5>Um modelo nórdico?
Não é possível falar de um «modelo nórdico», pelo menos num sentido restrito. A
Finlândia, a Noruega, a Dinamarca e a Suécia adoptaram abordagens diferentes e avançam
com ritmos um pouco diversos. Apesar das diferenças, os quatro países empreenderam
acções práticas, por meio de iniciativas legislativas e institucionais, visando reforçar a
relação entre o ensino e a formação formais e a aprendizagem realizada fora dos
estabelecimentos de ensino. Embora alguns elementos desta estratégia sejam mais antigos
(nomeadamente a iniciativa lançada na Noruega baseada na secção 20 da lei de 1952), as
iniciativas mais importantes foram tomadas nos últimos anos, sobretudo desde
1994/1995. A aprendizagem mútua entre estes países é importante e foi ainda reforçada
durante os dois ou três últimos anos, como o demonstra, por exemplo, a influência das
087
Colecção CEDEFOP
abordagens finlandesa e norueguesa nos recentes documentos suecos.
As rápidas mudanças verificadas no contexto nórdico contrastam com a reserva observada
nos contextos austríaco e alemão, embora neste em menor grau. Tal como a Áustria e a
Alemanha, os países nórdicos possuem sistemas de ensino e formação profissional
extremamente desenvolvidos e altamente estruturados; além disso, o segmento da
aprendizagem faz parte integrante destes sistemas e ocupa neles um lugar importante
(muito mais nítido na Dinamarca e na Noruega, um pouco menos na Finlândia e menos
ainda na Suécia). No entanto, essas semelhanças não produziram os mesmos resultados.
A vontade de integrar os processos de aprendizagem não formal no sistema formal é muito
mais forte nos países nórdicos do que na Alemanha ou na Áustria.
O relatório dinamarquês sobre a identificação, a avaliação e o reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal (Cedefop, Nielsen, 1999) contém algumas reflexões
interessantes a propósito da abordagem específica adoptada pelos países nórdicos em
matéria de ensino e de formação, em particular, em matéria de educação dos adultos. A
clara influência da filosofia de Grundtvig sobre a educação dos adultos nos países
escandinavos, nomeadamente na Dinamarca, na Noruega e na Suécia, durante os últimos
150 anos, permite, certamente, compreender a evolução actual. Esta filosofia, centrada
numa «instrução popular» ampla e geral, assente num sistema de «escolas superiores
populares», deu origem a uma atitude positiva face à educação e à aprendizagem dos
adultos. As «escolas superiores populares» puseram, deliberadamente, de parte a
avaliação e a certificação formais para se concentrarem no processo cognitivo, enquanto
valor em si mesmo, importante em todas as camadas da sociedade e em todos os estádios
da vida. Retomando as palavras do Livro Branco sobre a Educação e a Formação da
Comissão Europeia, este movimento tinha como objectivo, desde as suas origens, o
alargamento da base de competências dos indivíduos e da sociedade. Esta estratégia de
«instrução popular» tem sido progressivamente integrada nos sistemas educativos dos
países nórdicos e, actualmente, é financiada, em larga medida, pelos fundos públicos. A
ideia de que os conhecimentos adquiridos não certificados são tão importantes como os
conhecimentos adquiridos certificados é, por isso, há muito, preconizada e desenvolvida.
Este factor, entre muitos outros, talvez ajude a explicar as razões pelas quais os países
nórdicos, neste domínio, têm avançado mais rapidamente do que a Alemanha e a Áustria.
Torna-se patente que a Finlândia e a Noruega se têm empenhado na via da integração
institucional da aprendizagem não formal, numa estratégia geral de educação e de
formação ao longo da vida. Os projectos apresentados na Suécia e na Dinamarca revelam
que estes dois países avançam na mesma direcção e que a questão da aprendizagem não
formal tornar-se-á prioritária durante os próximos anos.
inofor
3.4>As NQV e a sua influência: Reino Unido, Irlanda e Países Baixos
As qualificações profissionais nacionais (National Vocational Qualifications - NQV),
introduzidas no Reino Unido nos finais dos anos 8015, tornaram-se num eixo em torno do
qual se desenvolve um interessante processo de aprendizagem internacional. Numerosos
países observam atentamente o sistema britânico -que se apresenta modularizado e
flexível, procurando responder às necessidades quer dos sectores público e privado quer
dos indivíduos e das empresas -para ver se será possível implementar este sistema ou, pelo
menos, alguns dos seus elementos, nos respectivos contextos nacionais. Além disso, um
certo número de projectos-piloto (nomeadamente no quadro do programa Leonardo da
Vinci) tem utilizado elementos do sistema das NQV como ponto de partida. Outros países
têm tendência a utilizar este sistema como indicador do que querem evitar, sublinhando os
problemas relacionados com uma modularização demasiado radical. Desde o seu início,
este sistema teve de enfrentar o desafio da acreditação de uma multiplicidade de percursos
de aprendizagem, o que conduziu a iniciativas como a acreditação dos conhecimentos
adquiridos (accreditation of prior learning -APL) e a acreditação dos conhecimentos
adquiridos pela aprendizagem experiencial (accreditation of prior experiential learning APEL). Esta evolução exerceu uma profunda influência no desenvolvimento de
metodologias de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não formal. Embora o «grupo NQV» só inclua o Reino Unido, os Países Baixos e a
Irlanda, convém notar que, pelas razões evocadas, a experiência das NQV despertou a
atenção de numerosos outros países.
3.4.1>Reino Unido
Desde a sua introdução, o sistema britânico das NQV tem-se revelado o mais
surpreendente e o mais claro exemplo de um sistema de ensino e formação profissional
baseado nas competências e centrado no desempenho e nos resultados. Embora tenha
dado origem a controvérsias no Reino Unido, este sistema constitui um exemplo de
alternativa ao modelo tradicional de ensino e de formação escolares. Está, em princípio,
aberto a qualquer percurso de aprendizagem e a qualquer forma de aquisição de saberes,
com uma atenção particular à aprendizagem experiencial no local de trabalho. Como
aparece explicado nas apresentações do sistema (e retomado pelos países que adoptam a
15
Na Escócia: SNVQ.
089
Colecção CEDEFOP
mesma linha de pensamento), o que conta é o que foi aprendido e não a forma e o local da
aprendizagem. Se for fiel aos seus próprios princípios, um sistema como este deve estar,
sem dúvida, aberto à aprendizagem efectuada fora dos estabelecimentos de ensino e de
formação formais, ou seja, àquilo a que chamamos, neste contexto, «aprendizagem não
formal». Esta aprendizagem deve ser sujeita a uma identificação e a uma apreciação, por
isso, não causa estranheza que as questões de avaliação e de reconhecimento ocupem um
lugar central no debate sobre o actual estatuto do sistema das NQV e sobre as suas futuras
perspectivas.
Embora este sistema date de 1989, as «novas» metodologias de avaliação propriamente
ditas só foram introduzidas em 1991. Nesse ano, o Conselho Nacional para as
Qualificações Profissionais (National Council for Vocational Qualifications -NCVQ) e o seu
equivalente escocês, o Scotvec, solicitaram que a «acreditação das aquisições anteriores»
se aplicasse a todas as qualificações passadas por eles, ou seja, as NVQ e as qualificações
profissionais gerais nacionais, ou GNVQ). A introdução de uma avaliação especializada
para completar os procedimentos normais de avaliação e de testagem utilizados nos
percursos tradicionais e formais pretendia atingir os seguintes objectivos (Cedefop, Perker
et al., 1994):
a) reconhecer formalmente os saberes e as competências de que os indivíduos são já
possuidores, com vista a um novo emprego;
b) aumentar o número de indivíduos possuidores de qualificações formais;
c) reduzir o tempo de formação, evitando a repetição de aprendizagens que incidissem
sobre saberes já adquiridos.
É possível distinguir três fases no próprio procedimento. Durante a primeira fase, são
fornecidas ao candidato informações gerais sobre o processo de acreditação das
aquisições anteriores, normalmente por conselheiros que não são especialistas da
disciplina, na maior parte dos casos, com apoio de documentos escritos ou de vídeos. A
segunda fase, que é também a mais importante, consiste na recolha de documentação e na
preparação de um portefólio de competências. Não existe qualquer formato específico
para o portefólio, mas todos os justificativos devem estar relacionados com a qualificação
em causa. O portefólio deve incluir comprovativos de tarefas e de responsabilidades
profissionais exercidas, passados por antigos ou actuais empregadores, bem como
exemplos (provas) de «produtos» pertinentes. Também devem constar do portefólio os
resultados de testes ou de projectos específicos. A terceira fase corresponde à avaliação
propriamente dita do candidato. Como foi referido (Cedefop, Perker, op. cit., p. 17):
inofor
«O processo de avaliação dos conhecimentos adquiridos é quase
igual ao que é utilizado pelos candidatos a uma NVQ. Contudo,
para aquele, o candidato apoia-se mais na sua actividade passada
do que nas competências adquiridas durante uma sessão de
formação.»
O resultado da avaliação pode conduzir ao pleno reconhecimento, ainda que sejam
poucos os candidatos que possuem suficiente experiência anterior para o conseguir. Na
maior parte dos casos, a avaliação a partir do portefólio de competências permite que o
candidato seja dispensado de determinadas partes de um programa ou de um curso. Nos
últimos anos, o interesse suscitado pelas metodologias especializadas de avaliação dos
conhecimentos adquiridos tem vindo a diminuir um pouco no Reino Unido. Há quem
pense que a avaliação dos conhecimentos adquiridos se arrisca a ficar isolada e que seria
preferível integrá-la na avaliação normal, como uma prova entre outras (Cedefop, 1997,
op. cit., p. 9):
«O ponto de vista segundo o qual a avaliação dos conhecimentos
adquiridos é diferente e distinta traduziu-se por uma menor
utilização do que a prevista das provas de conhecimentos
adquiridos anteriormente e de níveis atingidos. Os avaliadores
receiam incluir esta forma de prova nos justificativos a apresentar
pelos candidatos e chegaram a tomar determinadas medidas para
evitar este tipo de provas.»
Chegámos à situação em que os organismos responsáveis tentam estabelecer um
equilíbrio entre as provas de conhecimentos anteriores e actuais e entre os
conhecimentos adquiridos por via informal e formal. Esta tarefa não é fácil; vários
resultados indicam que a avaliação dos conhecimentos adquiridos anteriormente é
considerada um «desvio», aplicado de modo menos rigoroso do que os dispositivos
tradicionais de avaliação. É difícil ter uma visão de conjunto da verdadeira utilização desta
forma de prova, quer seja através de processos explícitos de avaliação dos conhecimentos
adquiridos quer seja através de outros meios, mais integrados. Aos organismos de
certificação não é exigida a apresentação, no certificado do candidato, dos itinerários
alternativos de aprendizagem, incluindo a avaliação dos conhecimentos adquiridos
anteriormente. Por isso, é quase impossível determinar se a aprendizagem anterior ou
091
Colecção CEDEFOP
informal foi ou não utilizada como prova16.
Como já referimos a propósito das experiências mediterrâneas e nórdicas, a questão das
metodologias de avaliação não se pode dissociar da das normas de qualificações.
Quaisquer que sejam as provas reunidas, deve estabelecer-se um ponto de referência. É aí
que passa a residir o principal desafio das NVQ, em geral, e da prática da avaliação, em
particular.
Abordaremos esta questão por via indirecta, ao analisarmos algumas das hipóteses
subjacentes ao sistema das NVQ, bem como a sua tradução em medidas práticas. Hoje
em dia, o sistema assenta, em larga medida, em determinadas hipóteses fundamentais: a
legitimidade deve ser garantida por meio da adequação entre as normas profissionais
nacionais e as competências adquiridas em contexto de trabalho. A participação dos
sectores profissionais no que diz respeito à definição e ao estabelecimento das normas foi
um dos aspectos determinantes que permitiram, finalmente, ultrapassar as dificuldades
relacionadas com a aceitação. A realização da formação e da avaliação no local de trabalho
é, em princípio, garantia de validade. O objectivo consiste em reforçar a autenticidade dos
dois processos, evitando as situações simuladas de formação e de avaliação, que
prejudicam a validade. A fiabilidade é garantida pelos referenciais pormenorizados e
estabelecidos para cada qualificação (e para cada módulo). Este quadro, completado por
uma formação extensiva dos avaliadores, deve assegurar a coerência da avaliação e
permitir, no final, um nível aceitável de fiabilidade.
Numerosos observadores (Wolf, 1995; Eraut et. al., 1996) argumentam que essas
hipóteses dificilmente são defensáveis. No que respeita à legitimidade, é verdade que os
empregadores estão representados nos grupos profissionais e nos conselhos
encarregados de estabelecer as normas, no entanto, foram várias as fragilidades de ordem
quer prática quer teórica que se manifestaram. Em primeiro lugar, existem limites em
relação ao contributo de um grupo relativamente restrito de representantes de recisas
16
Convém mencionar que, no Reino Unido, foram criados sistemas de acreditação dos conhecimentos adquiridos por via
informal, que são utilizados no ensino superior. Os objectivos são os seguintes: permitir o acesso a um curso ou a um
programa e validar determinadas aprendizagens que serão levadas em conta aquando da passagem do diploma. São
utilizadas duas formas de acreditação: a acreditação dos conhecimentos adquiridos certificados (accreditation of prior
certified learning APCL) e a acreditação dos conhecimentos adquiridos em contexto de vida e de trabalho
(accreditation of prior experiential learning APEL); estes últimos correspondem àquilo que entendemos por
«conhecimentos adquiridos por via não formal», ou saberes adquiridos pela experiência mas não certificados. Em alguns
casos, a APEL também dá pelo nome de «reconhecimento dos saberes adquiridos» (recognition of prior learning RPEL).
Embora certas actividades empreendidas pelos estabelecimentos de ensino superior no domínio da APL/APEL
apresentem relações com o sistema NQV, a maioria dessas actividades parece estar confinada à esfera do ensino
superior. Não nos foi possível ter acesso aos dados que mostram em que medida a APL/APEL é utilizada neste nível de
ensino.
inofor
empregadores, tanto mais que os recursos e o tempo são escassos. Em segundo lugar,
regra geral, as organizações mais poderosas, que dispõem de mais saberes técnicos,
representam grandes empresas já activas no domínio da formação e exercem uma
influência dominante, enquanto as organizações mais pequenas, menos influentes, obtêm
resultados menos relevantes. Em terceiro lugar, as divergências de opinião no seio dos
diversos organismos e conselhos, independentemente de quem é representado, são mais
facilmente resolvidas pela inclusão do que pela exclusão, fazendo «inchar» o conteúdo das
qualificações. Geralmente, verifica-se um conflito de interesses intrínseco às normas
nacionais entre a vontade de descrever competências de validade universal e a vontade de
estabelecer normas tão específicas e precisas quanto possível. No que respeita às questões
de validade e de fiabilidade, já foi abordado no capítulo 2 o problema da definição dos
limites do domínio sobre o qual deve incidir a avaliação e a testagem. Só é possível fazer
uma avaliação de qualidade quando os domínios de competência forem claramente
delimitados; a validade e a fiabilidade só são possíveis quando as definições, os limites e o
conteúdo do domínio, bem como o modo como pode ser expresso esse conteúdo, se
encontram claramente formulados.
Como aconteceu na Finlândia, o Reino Unido foi imediatamente confrontado com um
problema nesta área. Embora inicialmente os esforços se tenham centrado numa análise
restrita das tarefas, verificou-se, pouco a pouco, uma evolução para uma análise mais
alargada das funções. Essa evolução reflecte a necessidade de criação de normas nacionais
para a descrição das competências transferíveis. Alguns observadores assinalaram que a
introdução das funções coincidiu com uma descrição pormenorizada de cada elemento de
cada função, especificando os critérios de desempenho e o conjunto das condições
necessárias para a realização desse desempenho. A dimensão e a complexidade do
processo de avaliação das NVQ, actualmente factores muito criticados, resultam dessa
«dinâmica». Como refere Wolf (op. cit.), parece que entrámos numa «espiral sem fim de
especificações». A propósito do desafio que o sistema de avaliação das NVQ tem de
enfrentar, alguns investigadores da Universidade de Sussex (Eraut, op. cit.) concluem que a
procura da perfeita fiabilidade conduz a uma avaliação desprovida de sentido; a procura da
perfeita validade conduz a uma avaliação que leva em conta todos os elementos
pertinentes, mas é muito demorada e deixa pouco tempo para a aprendizagem. Este
comentário reflecte as dificuldades que têm que ultrapassar todos os países que
introduzem sistemas baseados nos resultados ou no desempenho e assentes, sobretudo,
na avaliação.
«Medir as competências» consiste muito mais em estabelecer pontos de referência do que
em desenvolver instrumentos e meios. Nesse aspecto, o sistema das NVQ é um exemplo
particularmente pertinente, na medida em que as questões de normas são nitidamente
093
Colecção CEDEFOP
mais importantes que os instrumentos específicos desenvolvidos ao longo dos últimos dez
anos. E como referimos acima, as abordagens específicas, tais como a «acreditação dos
conhecimentos adquiridos anteriormente» (APL) e a «acreditação dos conhecimentos
adquiridos pela aprendizagem experiencial» (APEL), foram perdendo visibilidade à medida
que o sistema se foi impondo. Esta evolução é compreensível e absolutamente lógica, pois,
regra geral, qualquer processo de avaliação no sistema das NVQ tem de enfrentar o
desafio da aprendizagem experiencial, ou seja, da aprendizagem realizada fora do
contexto escolar formal. As experiências da APL e da APEL estão, pois, a ser integradas no
sistema das NVQ, embora seja difícil calcular a amplitude desta integração. Em certa
medida, este facto atesta a maturidade do sistema. O sistema britânico ilustra melhor do
que a maioria dos outros sistemas a dificuldade em avaliar e em reconhecer os
conhecimentos adquiridos por via não formal. Efectivamente, tendo sido o Reino Unido
um dos primeiros países a tentar construir um sistema baseado no desempenho,
estabelecendo relações entre diversas modalidades de aprendizagem formal e não formal,
já decorreu tempo suficiente para permitir a observação e o estudo sistemático dos
problemas e das potencialidades. O próximo desafio que o sistema britânico terá de
enfrentar pode resumir-se assim: quem deve participar na definição das normas, como é
que os domínios de competências devem ser descritos e como é que os limites devem ser
definidos? Quando houver respostas para estas perguntas será, então, possível conseguir a
uma avaliação de qualidade.
3.4.2>Irlanda
A abordagem irlandesa em matéria de acreditação dos conhecimentos adquiridos (APL)
está muito próxima da avaliação baseada no desempenho, adoptada no Reino Unido. Este
facto nada tem de surpreendente, pois a aprendizagem mútua entre os dois países tem
sido -e continua a ser -muito importante. No entanto, a experiência irlandesa apresenta
um carácter mais limitado do que a experiência britânica. A Agência Nacional de Formação
e de Emprego (FÀS) sempre foi e continua actualmente a ser o principal promotor e
iniciador neste domínio. A APL está integrada no quadro geral de certificação e obedece a
cinco princípios. Em primeiro lugar, a FÀS aplica uma «focalização sobre as competências»,
com vista à certificação das competências e dos níveis de competência e não dos cursos. A
abordagem baseada no desempenho e nos resultados, que encontramos nas NVQ e
noutras qualificações, está, pois, no centro do modelo irlandês. Em segundo lugar, aos
programas modulares de formação corresponde uma avaliação modular. Em terceiro
lugar, dá-se particular importância às competências práticas e pessoais, bem como aos
inofor
saberes correlacionados. Em quarto lugar, os referenciais de sector foram elaborados em
cooperação com os grupos de interesse em causa (empregadores, trabalhadores), a fim
de garantir que as práticas em vigor nos diversos sectores de actividade se encontrem
reflectidas nas normas profissionais de desempenho (Cedefop, Lambkin et al., 1998).
Finalmente, a avaliação deve ser criterial, e cada avaliação deve estar ligada aos objectivoschave que identificam as competências e os saberes de que o candidato deve fazer prova.
No entanto, a experiência prática da APL na Irlanda continua limitada. A partir de 1992,
foram lançados projectos nos sectores do comércio a retalho, da construção, dos serviços
à primeira infância e do fornecimento de electricidade; esses projectos permitiram adaptar
o modelo geral de avaliação desenvolvido pela FÀS às necessidades de cada sector. Este
modelo geral tem a seguinte descrição:
«O modelo é genérico na medida em que foi desenvolvido um
«tronco comum», que deverá ser aplicado independentemente das
diferenças entre os diversos domínios profissionais. Foram definidas
três fases comuns.» (Cedefop, Lambkin, op. cit., p. 12-14)
A primeira fase consiste num balanço de competências. O candidato indica uma
qualificação em relação à qual pretende demonstrar a sua competência, depois, submetese a uma verificação das competências (normas) requeridas para a profissão em causa e
identifica as áreas nas quais essas competências são exigidas. Durante esta fase, podem ser
utilizadas diversas metodologias. A FÀS propõe uma dupla abordagem: em suporte de
papel e em suporte electrónico (conforme o projecto Euroform da FÀS). O resultado é o
mesmo: o candidato apresenta uma lista de domínios de competências a avaliar para a sua
eventual acreditação e, se for caso disso, uma lista dos domínios em relação aos quais
pensa ter necessidade de uma formação complementar. A segunda fase incide sobre a
validação formal das competências reivindicadas pelo candidato. A metodologia varia um
pouco em função das diferenças entre as diversas áreas profissionais: é evidente que a
experiência profissional nos sectores do comércio de retalho, dos cuidados à primeira
infância e da construção implica provas diferentes. Apesar dessas diferenças, a FÀS é de
opinião que a organização de um portefólio de competências mostrou ser eficaz nos
sectores onde o método foi experimentado. No projecto da FÀS que tinha por objecto o
sector de fornecimento eléctrico («Linesmen»), a metodologia utilizada combinava a
organização de um portefólio de competências e os exames tradicionais. Durante a
terceira fase do processo, o avaliador analisa os justificativos apresentados no portefólio de
competências (ou outras formas de provas) e decide se o candidato obedece ou não às
normas. O avaliador é, geralmente, um especialista na área profissional em causa,
095
Colecção CEDEFOP
devendo também ter formação e estar familiarizado com as referidas normas. A própria
formação é descrita do seguinte modo (Cedefop, Lambkin, op. cit., p. 14):
«O avaliador examina a candidatura na óptica da sua adequação às
normas. A metodologia consiste em verificar se as provas fornecidas
correspondem a cada um dos objectivos de formação em termos de
pertinência, de autenticidade, de actualidade e de validade.»
A avaliação pode incluir uma entrevista com o candidato e uma visita ao seu local de
trabalho, conforme os casos e as características próprias ao sector profissional em questão.
É difícil prever o modo como evoluirá, no futuro, a avaliação e o reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal na Irlanda. Embora desempenhe um papel
importante, a FÀS só representa uma parte do cenário irlandês da certificação, e ainda é
cedo para dizer se a criação do Teastas (organismo nacional para a certificação), cuja função
é a de nacionalizar a certificação dos programas de ensino e formação profissional, irá ou
não modificar esse cenário17. Convém notar que a «abordagem centrada nos projectos»
adoptada pela FÀS, que procura promover a APL no quadro de projectos limitados no
tempo e com incidência em áreas ou sectores restritos, não garante a aplicação
permanente dessas metodologias. No entanto, é necessário reconhecer que esses
projectos da APL permitiram adquirir um somatório de experiências, completado pela
participação activa em diversos programas e projectos europeus. É interessante observar
os esforços que a Irlanda tem desenvolvido para «exportar» a sua experiência em matéria
de APL. Em 1995, foi iniciado um projecto na África do Sul, no qual a FÀS cooperou com as
autoridades envolvidas para lançar os fundamentos de um sistema de «reconhecimento
dos saberes adquiridos anteriormente» (RPL).
17
Para além das iniciativas da FÀS, são dignas de menção as actividades relacionada com a APL promovidas pelo
Conselho Nacional encarregado de passar certificados e diplomas (National Council for Educational Awards - NCEA),
que desenvolveu um programa destinado a dar aos formandos a possibilidade de adquirirem créditos capitalizáveis fora
dos estabelecimentos de ensino formais, como, por exemplo, através da experiência profissional. Com esses créditos, os
candidatos podem, depois, obter um título profissional ou inscrever-se em estágios posteriores. Uma outra iniciativa
permite que os candidatos apresentem justificativos sob a forma de um portefólio de competências, de forma a ficarem
dispensados de determinados módulos ou de determinadas disciplinas no âmbito de estudos em tempo parcial. Os
formandos devem fazer prova de que possuem 50% dos saberes exigidos para um dado módulo e a dispensa pode incidir
sobre até 50% de todo o estágio ou curso.
inofor
3.4.3>Países Baixos
Em certos aspectos, a abordagem holandesa em matéria de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal é comparável à abordagem
irlandesa. No entanto, embora seja manifesta a influência do sistema britânico das NVQ, o
sistema geral modular baseado no desempenho assumiu uma forma especificamente
holandesa.
Nos Países Baixos, o desenvolvimento de sistemas para a avaliação dos conhecimentos
adquiridos por via não formal remonta a 1993, ano em que o Ministério da Educação
nomeou uma comissão de «reconhecimento das qualificações adquiridas» (EVK)18. Os
trabalhos dessa comissão deram origem a um relatório intitulado Kwaliteiten erkennen
[Reconhecer as qualificações], que continha recomendações relativas ao desenvolvimento
de um futuro sistema e que definia os objectivos seguintes:
a) desenvolver uma infra-estrutura para as metodologias;
b) promover a aceitação social dos EVK;
c) desenvolver metodologias através de estudos-piloto.
O desenvolvimento concreto das metodologias foi confiado, em larga medida, ao
CINOP19 e seguiu a abordagem centrada nos estudos-piloto e recomendada pela
comissão, ou seja, as metodologias foram desenvolvidas e testadas num número limitado
de sectores (por exemplo, os cuidados à primeira infância e a indústria da construção). Esta
abordagem estava intimamente ligada e dependente da nova estrutura dos critérios
(«normas») profissionais definidos pela lei de 1996 sobre a formação e o ensino
profissionais (WEB). A metodologia propriamente dita divide-se em duas fases. Durante a
primeira fase, o candidato que pretenda ver reconhecidos os seus conhecimentos
adquiridos por via não formal deve reunir num portefólio de competências todos os
comprovativos que possua (certificados formais, documentos passados pelos
empregadores, exemplos de trabalhos realizados, etc.). Toda essa documentação é, em
seguida, confrontada com os critérios definidos pela estrutura nacional das qualificações, a
fim de ser tomada uma decisão relativamente à obtenção de uma qualificação parcial. A
esta primeira fase segue-se, normalmente, uma avaliação prática com vista a uma
certificação formal. A metodologia centra-se sobre uma tarefa prática a realizar e
compreende três sequências diferentes:
18
Erkenning Verworven Kwalificaties.
19Centrum voor innovatie van opleidingen [Centro de Inovação das Formações].
097
Colecção CEDEFOP
a) a planificação
b) a execução
c) a avaliação
Para avaliar cada uma destas sequências, são utilizadas diversas metodologias incidindo
sobre vários aspectos. Através de entrevistas criteriais e da observação dos preparativos
para a execução da tarefa, a primeira sequência tem, como objectivo, a avaliação das
competências metodológicas do candidato e da sua aptidão para planificar a tarefa a
realizar.
A segunda sequência centra-se na execução propriamente dita da tarefa. A avaliação incide
quer sobre a própria execução quer sobre as capacidades de reflexão do candidato e
baseia-se, simultaneamente, na observação do processo e do resultado e numa entrevista
criterial.
O objectivo da terceira sequência, que abrange a avaliação e o ajustamento, consiste na
avaliação das capacidades de reflexão do candidato. A este é pedido que examine a tarefa
executada, identifique os métodos alternativos de execução e defina as possibilidades de
aplicação do método escolhido a outras situações de trabalho. O quadro a seguir
apresentado esquematiza o processo de modo mais pormenorizado.
inofor
Figura1>Aspectos da avaliação
Sequência
de trabalho
Aspectos
da avaliação
Metodologias
de avaliação
Estratégia
pedagógica
Planificação
Competências
metodológicas
e capacidades
de planificação
Entrevista criterial
Análise de problemas
Avaliação das aquisições
profissionais
Execução
Resolução
Avaliação
e ajustamento
Capacidades
de execução e acção
Observação
do processo e/ou do
produto
Resolução
de problemas
Capacidades
de reflexão
Entrevista criterial,
avaliação
dos resultados
Avaliação
dos resultados
da aprendizagem,
da planificação
e do acompanhamento
Fonte: Cedefop, Klarus e Nieskens, 2000.
O destaque dado à avaliação e à reflexão é um aspecto interessante da abordagem
holandesa. Esta parte da avaliação assenta num questionário com quatro vertentes. Em
primeiro lugar, relativamente à preparação, por que motivo o candidato agiu de
determinada maneira e que outras opções eram possíveis? Em segundo lugar, em relação
ao próprio processo, por que razão o candidato agiu daquela forma e que outras opções
foram consideradas? Em terceiro lugar, quanto ao produto (ou ao serviço), como pode o
candidato dizer que cumpriu os critérios? Em quarto lugar, no que respeita à execução da
tarefa, por que motivo o candidato agiu daquela forma e que outras opções eram
possíveis. Este interrogatório demonstra que o processo se centra inequivocamente no
diálogo; o seu êxito baseia-se não apenas nos procedimentos e nas descrições formais,
mas também nas aptidões e na experiência do próprio avaliador.
Como já foi mencionado acima, a abordagem adoptada pelo CINOP está ligada à
estrutura das qualificações, definida pela lei de 1996 sobre a formação e o ensino
profissionais (WEB). As normas holandesas de qualificações baseiam-se na análise das
099
Colecção CEDEFOP
funções e das tarefas e caracterizam-se pelo facto de serem orientadas pela indústria (os
parceiros sociais participam, a todos os níveis, na definição das normas). Qualquer
qualificação deve ser estabelecida a partir de um perfil profissional claramente definido ou
de uma fonte de informação com a mesma legitimidade (Broekhoven e Herwijnen, 1999).
Os perfis profissionais, que devem reflectir as necessidades em termos de qualificações dos
sectores e dos ramos de actividade, encontram-se repartidos em cinco níveis: ajudante,
operário qualificado, operário especializado, quadro intermédio ou especialista e
diplomado pelo ensino politécnico superior. O quinto nível está em projecto, mas ainda
não foi implementado. Cada um destes cinco níveis encontra-se subdividido em
qualificações parciais, cujos objectivos são descritos em termos de requisitos em saberes,
em competências e em atitudes.
Tal como acontece no Reino Unido (Eraut, 1996), os problemas que se prendem com a
elaboração de referenciais e de normas impuseram-se imediatamente como uma das
maiores dificuldades na abordagem holandesa. Por um lado, as normas devem ser
suficientemente amplas para abrangerem a extrema diversidade mesmo numa única área
profissional das práticas existentes, mas, por outro lado, os referenciais demasiadamente
amplos arriscam-se a perder pertinência. Este problema, a que a teoria geral da avaliação
designa por «criterial» ou «de referência de domínio» (Popham, 1978; Black, 1998), foi
colocado a todos os países que tentaram desenvolver sistemas de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. Black descreve-o nos
seguintes termos:
«A definição de um domínio só pode atingir um grau suficiente de
especificidade quando fixa os limites, tanto de conteúdo como da
forma pela qual esse conteúdo deve ser expresso, ou manipulado,
ou utilizado pelo candidato.» (p. 65)
Black considera que a dificuldade da tarefa da avaliação é proporcional à amplitude do
domínio. Isto aplica-se, evidentemente, aos novos sistemas de ensino e de formação
baseados nos resultados e no desempenho, nos quais a definição dos domínios de
qualificações (qualificações parciais e/ou módulos) constitui um dos aspectos cruciais do
exercício. Estes sistemas constituem esforços ambiciosos para aproximar diversos
domínios de aprendizagem, nomeadamente o ensino e a formação formais e a
aprendizagem no local de trabalho. Esta aproximação, que torna possível o
reconhecimento dos saberes e das competências independentemente da respectiva
origem, requer metodologias adequadas que permitam apreender as qualidades de uma
multiplicidade de percursos de aprendizagem.
inofor
Uma definição inadequada, que atribua a um domínio de aprendizagem um maior peso do
que a outro, corre o risco de perder legitimidade. Assim se vê que a concepção de
metodologias de avaliação a nível nacional não pode reduzir-se a uma (simples) questão de
ferramentas e de instrumentos, mas que deve também assentar na compreensão do
quadro político e institucional no qual esses instrumentos devem funcionar.
3.4.4>Um modelo «NVQ»?
Para concluir a nossa análise aos três países agrupados neste capítulo, podemos dizer que a
muito grande aceitação do modelo de ensino e de formação centrado nos resultados e
baseado no desempenho é surpreendente. É perfeitamente visível a aceitação
generalizada da aprendizagem efectuada fora dos estabelecimentos de ensino e de
formação formais enquanto percurso para atingir as competências tão válido e importante
como os percursos formais. Em compensação, o que levanta dúvidas é a forma como esse
sistema se pode concretizar. As experiências britânicas e holandesas põem em relevo
alguns problemas institucionais, metodológicos e práticos relacionados com o
estabelecimento de um sistema capaz de integrar a aprendizagem não formal no seu
próprio quadro. A dificuldade em desenvolver uma norma de qualificação aceitável parece
constituir o primeiro e, talvez, o mais sério obstáculo. Enquanto se considerar que a
avaliação deve ter referenciais, a qualidade da norma manter-se-á crucial. As experiências
britânicas, que tendem a resolver o dilema entre referenciais de competências demasiado
gerais e demasiado específicos, puseram em relevo algumas dessas dificuldades. O
segundo problema evidenciado pelos casos britânico e holandês, mas que, de acordo com
os documentos de que dispomos, não se reflecte na experiência irlandesa, relaciona-se
com as dificuldades clássicas para garantir a fiabilidade e a validade da avaliação. Nos
documentos que consultámos, os problemas foram claramente expostos, mas as
respostas, caso as haja, não ficaram tão claramente definidas. Os finlandeses, graças ao
trabalho em rede e à formação dos avaliadores e do pessoal dos estabelecimentos
envolvidos, provavelmente identificaram uma estratégia possível: tendo concluído que,
em matéria de normas de qualificações, nunca se pode estabelecer um equilíbrio perfeito
entre os referenciais gerais e os referenciais específicos, concentram-se nas competências
dos avaliadores.
101
Colecção CEDEFOP
3.5>França e Bélgica20
Tal como aconteceu com o sistema britânico dos NVQ, as experiências francesas
influenciaram o debate geral europeu e o desenvolvimento deste domínio. O balanço de
competências talvez possa considerar-se o primeiro esforço para introduzir um sistema
de grande escala destinado a identificar e avaliar os conhecimentos adquiridos por via não
formal e através da experiência. A partir da introdução do balanço de competências, em
1985, tem-se observado um grande interesse em relação a estas questões. Em
compensação, a Bélgica ainda se encontra no primeiro estádio de desenvolvimento,
faltando-lhe definir claramente a sua estratégia.
3.5.1>França
Em vários aspectos, a França é o mais avançado país da Europa no domínio da identificação,
da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. A razão para
este avanço encontra-se na legislação nacional, nos dispositivos de financiamento da
formação profissional contínua, nas reformas do sistema de ensino e de formação e,
finalmente, nas iniciativas do sector privado.
Este interesse crescente pela aprendizagem não formal pode parecer paradoxal quando
pensamos na elevada cotação de que gozam, tradicionalmente, o ensino e a formação
formais. A França foi caracterizada como um caso extremo de «lógica do título académico»
(Merle, 1998). Como na Itália e na Grécia (cf. cap. 3.3), o diploma académico reflecte não
apenas o nível formal atingido por uma determinada pessoa, mas também as suas
qualidades e o lugar a que tem direito. Méhaut (1997) refere que, em França, um diploma
desempenha três funções: serve de norma interna para o sistema educativo, de norma
externa para o mercado de trabalho e de factor de identidade e de hierarquia. Esta «lógica
do título académico» encontra talvez a sua tradução mais extrema no sistema das grandes
écoles, mas também influencia os comportamentos noutros domínios, incluindo o do
ensino e formação profissional. O elevado valor atribuído em França ao diploma está
ligado, em grande medida, ao carácter nacional e homogéneo dos sistemas de ensino e de
formação. O ensino e a formação, incluindo o ensino e a formação profissional, são
20Normalmente, o Luxemburgo deveria estar presente neste capítulo, mas, após terem sido consultadas as autoridades
educativas luxemburguesas, o Cedefop concluiu que o nível de actividade, neste domínio, era insuficiente para justiçar
um estudo nacional distinto.
inofor
ministrados dentro de percursos nacionais, pré-definidos e completos, que deixam pouco
espaço à experimentação pessoal ou institucional. Embora tenham ocorrido mudanças ao
longo dos últimos dez anos, o sistema manteve-se calmo, o que contribuiu para a sua
legibilidade. Os indivíduos e os empregadores, na sua maioria, estão familiarizados com as
diversas qualificações atribuídas a nível nacional.
No entanto, durante os últimos dez a quinze anos, este sistema tem vindo a ser posto cada
vez mais em causa. Como é referido, a estabilidade também pode ser interpretada em
termos de rigidez. A homogeneidade do sistema pode muito bem tornar-se num
obstáculo à renovação dos saberes e das competências e à aceitação de formas alternativas
de aprendizagem, a pretexto de que estas não correspondem aos itinerários prescritos e
definidos pelo sistema nacional. Estas críticas, formuladas em numerosos contextos, têm
vindo, pouco a pouco a atingir a esfera legislativa e institucional, provocando reformas
destinadas a estabelecer uma ligação mais estreita entre o ensino e a formação formais e a
aquisição de saberes no local de trabalho. De facto, é possível distinguir dois conjuntos de
medidas legislativas, cujos perfis e objectivos são um pouco diferentes. A primeira medida
consistiu na lei de 1985 sobre o balanço de competências, que permite validar as
competências profissionais adquiridas fora do sistema educativo formal. O balanço de
competências pode ser da iniciativa da empresa ou do próprio trabalhador. Este direito foi
reforçado pela lei de Dezembro de 1991, que estipula que qualquer trabalhador tem
direito a uma licença para efectuar o balanço. A segunda medida legislativa, a lei de Julho de
1992, sobre a validação dos conhecimentos profissionais adquiridos, está directamente
relacionada com o quadro nacional dos diplomas e certificados e, por isso, reconhece a
igualdade legal entre as competências adquiridas no seio e fora das estruturas de ensino e
de formação formais. Em certa medida, este quadro pode considerar-se paralelo aos
sistemas baseados nas competências e nos resultados, apresentados acima, pelo menos
no sentido em que uma qualificação pode obter-se com base em diferentes percursos de
aprendizagem.
O balanço
balançode
decompetências
competências
3.5.1.1>O
A lei de 1985 sobre o balanço de competências introduz um sistema de validação das
competências profissionais adquiridas fora do sistema educativo formal. A iniciativa pode
partir da empresa ou do próprio trabalhador. Este direito foi reforçado pela lei de
Dezembro de 1991, que estipula que qualquer trabalhador tem direito a uma licença
especial (de 24 horas, ou seja, três dias de trabalho) para elaborar o balanço. A lei de 1991
define o objectivo do balanço de competências nos seguintes termos: «permitir que os
103
Colecção CEDEFOP
trabalhadores analisem as respectivas competências profissionais e pessoais, bem como as
respectivas aptidões e motivações, a fim de definir um projecto profissional e, se for o caso,
um projecto de formação». Tal como acontece com as abordagens apresentadas acima, o
balanço de competências é um dispositivo nacional definido e administrado de acordo
com a legislação nacional em vigor. Mas enquanto os «testes externos» e a avaliação
baseada nos resultados (nos Países Baixos, por exemplo) se encontram intrinsecamente
relacionados com os sistemas nacionais de ensino e formação formais, o balanço de
competências está centrado no mercado de trabalho e nas empresas. O decreto de
27.10.1992 (I. Drexler, 1997, p. 229) resume assim os objectivos do balanço:
«Confrontando o contexto profissional (o contexto da empresa ou
do mercado de trabalho em geral) com as suas próprias aptidões, o
beneficiário do balanço deve ser capaz de “organizar as suas
prioridades profissionais”, de “utilizar melhor as suas capacidades
nas [...] opções de carreira” e, de uma maneira geral, de “gerir o
melhor possível os seus próprios recursos”.»
Oficialmente, o balanço de competências possui um papel claramente formativo, pois
proporciona ao empregador ou ao trabalhador informações sobre questões de
competências para apoio de um projecto pedagógico ou profissional. Existem mais de 700
organismos e estabelecimentos acreditados como centros de balanço, competindo uns
com os outros no mercado dos pedidos de avaliação21. O perfil profissional e o estatuto
destas organizações variam muito. Dado o grande número de organizações e de linhas
orientadoras mais ou menos gerais fornecidas pela legislação nacional, a abordagem
metodológica também varia muito22. Os exemplos seguintes mostram a maneira diferente
como dois centros abordaram o processo.
21Em 1994, esses centros efectuaram 125 000 balanços, cujo custo foi calculado em cerca de 340 milhões de FRF. Três
quartos dos pedidos de balanços partiam de pessoas à procura de emprego; destes, 52% eram mulheres, 44% tinham
entre 16 e 25 anos e 47% entre 26 e 44 anos. Para cerca de 50% destes indivíduos, o objectivo principal consistia na
elaboração de um projecto profissional, para 20%, a procura de emprego e, para 21%, a procura de formação. Apenas
uma percentagem muito baixa (1,9%) declarou que se tratava de um primeiro passo para a validação de aquisições
com vista à obtenção de um certificado ou de um diploma do sistema de ensino e de formação formais.
22
Ingrid Drexel (1997) ilustra esta diversidade dando o exemplo de uma grande empresa que organizou um balanço de
competências para todos os seus funcionários. Ao anúncio de ofertas publicado por essa empresa, responderam cerca
de 700 organizações. O preço unitário do balanço ia dos 5 000 FRF a 50 000 FRF, a duração do balanço individual
variava entre as 2 e as 16 horas; o percurso metodológico estava centrado em aspectos que iam da neurolinguística à
psicologia e à pedagogia e o perfil profissional dos avaliadores compreendia tanto psicólogos (a maioria) como
professores e antigos gestores de empresas.
inofor
O primeiro desses centros, que é um organismo público de formação, decompôs o
processo em três fases. A primeira fase consiste numa entrevista preliminar, durante a qual
são identificadas as motivações e as necessidades do trabalhador e apresentados os
procedimentos e metodologias do balanço. Também se sublinha o carácter voluntário do
processo. A segunda fase procura analisar e recensear as motivações, os interesses
pessoais e profissionais, bem como as competências pessoais e profissionais do candidato.
Este centro utiliza uma bateria de testes normalizados, a fim de determinar diversos
aspectos, tais como o «temperamento» e as «preferências». Através de uma actividade
essencial, que consiste em reconstruir o percurso individual do candidato, procura-se
determinar se existe um «tronco comum de competências» que possa ser valorizado.
Finalmente, durante a terceira fase, são apresentados ao candidato os resultados das
análises, passando estes a ser utilizados como base de diálogo com vista ao
estabelecimento de um projecto de formação e de um projecto profissional. Esta fase
pode comparar-se, em certos aspectos, à orientação profissional, embora assente numa
informação mais completa a propósito das competências do indivíduo em causa. Após este
processo, o candidato recebe um documento de síntese que identifica claramente as suas
competências pessoais e profissionais, para o ajudar a determinar as modalidades de
realização dos seus projectos. Em virtude das disposições definidas no artigo R 900-1 do
Código do Trabalho, este documento só deve incluir as indicações relativas
a) circunstâncias do balanço (origem do pedido e condições de realização da prestação);
b) competências e aptidões da pessoa avaliada à luz das perspectivas de evolução em
causa;
c) elementos constitutivos do projecto profissional, bem como do projecto de formação;
d) principais etapas previstas para a realização desses projectos.
Este documento de síntese é propriedade do candidato e não pode ser utilizado por
terceiros sem o seu consentimento.
O segundo centro, que é uma empresa privada, decompõe o processo em seis fases
(cinco quando o cliente é um particular). A primeira fase (em empresa) consiste numa
entrevista com os representantes da direcção, a fim de lhes ser apresentado o processo do
balanço e de serem identificados os objectivos da empresa. Durante essa entrevista, o
centro de balanço procura recolher uma visão de conjunto dos projectos profissionais e
dos potenciais percursos de formação da empresa. Durante a segunda fase, começa o
«recenseamento» propriamente dito das competências do candidato. Este processo leva
em linha de conta um determinado número de critérios: descrição da situação profissional
do candidato, rede, problemas e tensões no local de trabalho, etc. Desta forma, procura-
105
Colecção CEDEFOP
se apreender as principais características do candidato e da sua situação profissional. Após a
entrevista, pede-se ao candidato que trace um balanço global das suas próprias
competências, adquiridas por via formal e não formal. Durante a quarta fase, este «trabalho
de casa» é utilizado como ponto de partida para determinar se as competências existentes
são plenamente utilizadas. O objectivo é definir de um modo mais preciso as
potencialidades do candidato, bem como os aspectos que poderiam ser melhorados.
Depois desta fase, o candidato deve submeter-se a um teste normalizado que incide sobre
os elementos mais importantes das suas competências. Na quarta e na quinta fases, a parte
analítica é utilizada como base de orientação. Entre estas fases, o candidato deve efectuar
diversos «trabalhos de casa» que têm como objectivo levá-lo a tomar mais consciência das
suas próprias potencialidades e possibilidades. O processo considera-se terminado na
sexta fase, durante a qual é entregue ao candidato o balanço propriamente dito. Em geral,
este documento contém três ou quatro propostas alternativas, mas relacionadas umas
com as outras, que dizem respeito à orientação a dar aos projectos. É difícil determinar em
que medida foram positivas as diversas abordagens do balanço e se umas foram mais
positivas do que outras. Não existe nenhum controlo institucionalizado dos resultados
desta iniciativa e, de qualquer forma, seria extremamente difícil definir os critérios para esse
controlo. Foram algumas as críticas formuladas:
a) o papel formativo do balanço de competências é insuficiente. O documento de síntese
raramente permite identificar projectos e perspectivas profissionais e, na maior parte das
vezes, só contém recomendações gerais incidindo sobre os projectos de formação;
b) apesar dos esforços para analisar as competências de cada candidato através de meios
quer formais quer não formais, numerosos documentos de síntese limitam-se aos
elementos formais, isto é, àqueles que podem ser atestados por certificados e por
diplomas;
c) em certos casos, parece haver uma «confiança cega» nos instrumentos normalizados e
automatizados, o que impede as análises personalizadas.
Esta fragilidade não vem retirar mérito ao facto de o balanço de competências ser um dos
raros sistemas de medição das competências a funcionar em grande escala. É também um
dos raros sistemas que funciona numa clara base formativa, visando, essencialmente,
identificar, de modo preciso, as potencialidades de uma pessoa. Esperemos que permita
apoiar a aprendizagem e melhorar as perspectivas de carreira.
O facto de o balanço de competências não visar um reconhecimento formal das
competências relativamente a uma norma de qualificação, distingue-o radicalmente dos
sistemas apresentados atrás. Os principais pontos de referência são os indivíduos e as
inofor
empresas, não sendo mencionada qualquer outra referência, pelo menos formalmente
(como já dissemos acima, é possível que existam normas informais que reflictam o perfil
profissional dos centros de balanço). Podemos, por isso, dizer que o papel somativo do
balanço é fraco. Caso utilizemos o termo «somativo» no sentido de «somativo para tornar
públicas as contas» (Black, 1998), que, em França, é uma das características centrais da
avaliação e dos exames tradicionais que conferem um diploma, tal não se aplica a este
sistema, pois não é esse o papel que deve desempenhar.
3.5.1.2>«Abrir»
«Abrir» os diplomas
diplomaseeos
oscertificados
certificados
A lei de Julho de 1992 sobre a validação das aquisições profissionais está relacionada
directamente com o quadro nacional dos diplomas e dos certificados e, por isso,
reconhece a igualdade legal entre as competências adquiridas no seio e fora das estruturas
de ensino e de formação formais. Esta lei, cuja aplicação depende do Ministério da
Educação, está relacionada com o sistema de formação inicial (que dá acesso a um
certificado de aptidão profissional [CAP] ou a um diploma de técnico superior [BTS]) e é
completada por um dispositivo de «avaliação das competências e das aquisições
profissionais» [EVAP], lançado pelo Ministério do Trabalho. Este dispositivo está associado
aos certificados de formação contínua emitidos pelo Ministério. Os certificados, emitidos
quer pelo Ministério da Educação quer pelo Ministério do Trabalho, baseiam-se em
referenciais (normas) estabelecidos em concertação com os parceiros sociais no quadro
de comissões parlamentares consultivas [CPS]. Em geral, as actividades das CPS
encontram-se intimamente ligadas a um curso específico de formação, mas a aceitação da
aprendizagem experiencial, enquanto percurso legítimo para a qualificação, implica que
esses referenciais também levem em conta esse aspecto experiencial. Contrariamente ao
balanço de competências, o potencial da lei de 1992 ainda não se concretizou. Merle (op.
cit.) considera que o sistema de aquisição de qualificações formais através da validação das
aquisições profissionais «tem arrancado lentamente e está longe de responder às
expectativas dos trabalhadores». Há quem pense (Colardyn, 1999) que cerca de 90% dos
requisitos para a obtenção de qualquer diploma académico do Ministério da Educação
podem ser preenchidos graças ao reconhecimento dos saberes prévios adquiridos por via
não formal, o que significa que podem obter-se por este meio todos os diplomas, mas
também que nenhum diploma se pode obter unicamente através da avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal. Em qualquer momento, qualquer pessoa
que deseje que, neste quadro, lhe sejam avaliadas as suas competências, pode obter um
diploma.
107
Colecção CEDEFOP
Enquanto as leis de 1985, 1991 e 1992 constituem importantes indicadores de uma
mudança de atitude em favor da aprendizagem não formal em França, as qualificações
emitidas pela Comissão Técnica de Homologação [CTH] e os certificados de qualificação
profissional [CQP] constituem alternativas ao sistema tradicional de certificação, na medida
em que estão mais ligados às competências (práticas) utilizadas nas empresas do que à
frequência de um curso. Até à data, os sectores industriais só muito prudentemente se
iniciaram na criação de certificados de qualificação profissional, cujo número raramente
ultrapassa os 4 000 por ano. Originariamente, os CQP foram concebidos para certificar as
qualificações dos jovens que tinham frequentado um curso de aprendizagem em
alternância. Hoje em dia, os sectores industriais que implementaram os CQP têm vindo a
atribuir-lhes funções muito diferentes: certificação complementar do sistema educativo
nacional, reconhecimento com vista a uma promoção e sistema de certificação profissional
paralelo ao sistema educativo nacional.
Como já foi mencionado anteriormente, a França é o país da Europa que detém a mais
duradoura e a mais vasta experiência em matéria de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. A base jurídica estabelecida
pelas leis de 1985, 1991 e 1992 indica, sem margem para dúvidas, que a aprendizagem
não formal é importante e que o seu lugar, relativamente à aprendizagem formal, deve ser
clarificado e reforçado. Igualmente importante é a experiência prática adquirida com o
balanço de competências. Em termos de experiência ligada ao equilíbrio entre o custo e a
capacidade e em termos de abordagem metodológica, o balanço de competências
também se revela importante fora de França. Em numerosos países da Europa, a
aprendizagem não formal passou a ocupar um lugar de relevo no debate político sobre o
ensino, a formação e o trabalho. Este tema é parte integrante das discussões políticas
nacionais entre os parceiros sociais, encontrando-se também na base de iniciativas da
responsabilidade do sector privado. A experimentação promovida, em 1998, pela
Assembleia Francesa das Câmaras de Comércio e Indústria no sentido de ser elaborado
um sistema «de medição e de reconhecimento das competências» merece um tratamento
mais pormenorizado.
3.5.1.3>Uma
Uma abordagem «ascendente»
«ascendente» da
damedição
mediçãodas
dascompetências
competências
Numa nota intitulada «Steps towards reliable measurement and recognition of skills and
competences of workers» [Para uma medição e um reconhecimento fiáveis das
qualificações e das competências dos trabalhadores], D. Colardyn (1999) analisa o
carácter um pouco paradoxal dos sistemas de avaliação dos conhecimentos adquiridos por
inofor
via não formal, em França. Durante a década de 90, todos os diplomas, em todos os níveis,
tornaram-se acessíveis graças ao reconhecimento da aprendizagem anterior efectuada
fora dos estabelecimentos de ensino e de formação formais. No entanto, um diploma
nunca pode ser obtido unicamente pela avaliação de conhecimentos previamente
adquiridos. Há um determinado momento, que varia de diploma para diploma, em que a
pessoa em causa tem de se sujeitar a um exame formal. De facto, embora a França, a
exemplo do Reino Unido, dos Países Baixos, da Finlândia e de outros, tenha aumentado a
flexibilidade do sistema, o ponto de referência continua a ser o sistema de ensino e de
formação formais. Por outras palavras:
«[...] o reconhecimento dos saberes adquiridos está totalmente
ligado ao conteúdo dos diplomas. Os conhecimentos previamente
adquiridos ou experienciais não podem ser reconhecidos enquanto
tal; só são reconhecidos enquanto partes de um diploma, enquanto
elementos introduzidos num processo que dá acesso a diplomas
emitidos pelo sistema educativo formal. Isto significa que os
indivíduos, particularmente os trabalhadores adultos e com
experiência, que não estiverem interessados na obtenção de um
diploma suplementar, não podem obter o reconhecimento dos
respectivos saberes previamente adquiridos ou experienciais.»
(Colardyn, op. cit., p. 4)
Em 1998, foi lançado um projecto cujo objectivo consiste no desenvolvimento de uma
metodologia e de um sistema que permita avaliar e reconhecer aquilo que uma pessoa é
capaz de fazer numa situação de trabalho, independentemente de qualquer contexto de
ensino. Este projecto tem como objectivo apreender, num contexto de trabalho, os
resultados dos diversos processos de aprendizagem seguidos por um trabalhador. Além
disso:
«A certificação das competências não tem qualquer relação com a
avaliação do desempenho. Esta questão poderia estar na origem de
um debate, pois depende essencialmente da definição das
competências e do desempenho. A avaliação das competências não
implica qualquer juízo sobre a qualidade de execução de um dado
trabalho. Este juízo deve remeter para o funcionamento interno da
empresa.» (Colardny, op. cit., p. 6)
109
Colecção CEDEFOP
Desde o início, houve 15 câmaras de comércio e indústria (CCI) e 24 empresas que
aderiram a esta iniciativa, tendo sido criado um organismo de certificação independente,
denominado Associação para a Certificação das Competências Profissionais, no qual estão
representadas as diversas CCI. A fim de englobar todas as partes interessadas,
(empregadores e trabalhadores), foi também criada uma Comissão de Certificação, que
desempenha um importante papel, na medida em que lhe são apresentados todos os
elementos respeitantes ao processo de avaliação, incluindo as normas de avaliação e os
comprovativos. Esta Comissão, de nível nacional, deveria contribuir, de modo
determinante, para garantir a qualidade e a legitimidade da abordagem. Este sistema
reporta-se à norma europeia EN 45013, que define «referenciais para os organismos de
certificação de pessoal». Essa norma, elaborada pela EA (European cooperation for
accreditation), tem o apoio de todos os organismos nacionais de acreditação
reconhecidos pelo Espaço Económico Europeu. Tradicionalmente, esses organismos
exerciam as respectivas actividades sobretudo nos domínios da testagem, da inspecção e
da aferição dos sistemas técnicos e administrativos e, pouco a pouco, foram estendendo
estas actividades à certificação de pessoal. O objectivo da norma EN 45013 consiste em
estabelecer um processo que permita especificar o que será avaliado, a fim de garantir a
transparência da avaliação a todas as partes envolvidas, bem como a imparcialidade, a
fiabilidade e a validade dessa mesma avaliação. Quando esta norma é aplicada ao contexto
francês, as câmaras de comércio e indústria põem em relevo três princípios essenciais:
a) a representação de todas as partes envolvida;
b) a separação da formação e da certificação;
c) a avaliação e a certificação efectuadas por terceiros.
A criação da Comissão de Certificação inscreve-se no esforço para a concretização do
primeiro princípio. O segundo princípio é aplicado por meio da focalização sobre os
resultados,
«[...] e não sobre os processos que permitem atingir os resultados.
O processo de avaliação e de certificação das competências é
independente de qualquer tipo de formação, seja qual for a sua
duração e o contexto no qual é efectuada.» (Colardyn, op. cit., P.7)
O terceiro princípio, a avaliação por terceiros, é um elemento determinante da
abordagem e diz respeito à qualidade, à fiabilidade e à validade do próprio processo de
avaliação. A avaliação de um trabalhador não pode ser feita pelo seu superior hierárquico
inofor
directo; deve ser efectuada por um especialista da área em questão, que seja formado e
certificado como avaliador. O trabalho do avaliador é controlado por um verificador
encarregado de supervisionar um grupo de avaliadores. Este sistema de verificação e de
controlo compreende também um terceiro e um quarto níveis: a nível nacional, a
responsabilidade pertence à Comissão Francesa de Acreditação (Cofrac) que serve de
organismo de recurso e a nível internacional, o controlo é exercido sobre as actividades
nacionais por uma equipa que aplica os procedimentos ISO. O dispositivo institucional,
determinante para a legitimidade do exercício, não consegue, por si só, resolver a questão
fundamental das normas de avaliação ou dos pontos de referência. As normas a serem
elaboradas pela Comissão de Certificação baseiam-se nos seguintes elementos:
a) descrição das competências e respectivos elementos;
b) lista não exaustiva de exemplos de provas extraídas de situações de trabalho em
empresa;
c) duração da validade;
d) referência às descrições de emprego elaboradas pela Agência Nacional de Emprego;
e) referência aos diplomas aos quais a avaliação dos conhecimentos adquiridos dá acesso.
As normas são submetidas à aprovação da Comissão de Certificação e, posteriormente,
publicadas, prevendo-se uma actualização periódica. De momento, a principal
experimentação (que é também a principal preocupação) incide sobre a maneira de reunir
as provas das competências de uma pessoa. Em 1998 e 1999, foram elaboradas normas
para 15 diferentes domínios. Cada uma dessas normas de avaliação foi elaborada com a
participação de nove empresas, que definiram as normas e as provas de competências.
Consideram-se três principais tipos de provas:
a) as provas que incidem sobre a situação de trabalho de cada empresa, e que constituem
as provas centrais visando a certificação das competências; devem reflectir as actividades
relacionadas com a situação de trabalho, não devendo ser considerado qualquer elemento
exterior. A existência das provas deve ser anterior à constituição do portefólio de
competências;
b) informações complementares, nomeadamente testemunhos de superiores
hierárquicos e de colegas e, se for necessário, utilização de testes;
c) informações suplementares, como, por exemplo, observação ou entrevistas para
verificação da autenticidade das provas fornecidas.
111
Colecção CEDEFOP
A importância atribuída às provas deu origem ao que se pode designar por «abordagem
ascendente» da elaboração de normas. As empresas empenhadas nesta iniciativa
organizaram listas de provas oriundas dos seus próprios contextos. A lista definitiva (mas
não exaustiva) de exemplos apresentada para cada norma atesta a variedade de provas
possíveis. No entanto, apesar das diferenças contextuais que ressaltam desta recolha, as
mesmas provas tendem a reaparecer em diferentes empresas. D. Colardyn refere
«a natureza das provas extraídas da situação de trabalho corrobora
a ideia segundo a qual as competências certificadas são
transferíveis de um trabalho para outro.» (Colardyn, op. cit., p. 11)
O relevo posto na segurança e no controlo da qualidade está ligado à questão da
fiabilidade. No cerne desta questão encontram-se a imparcialidade e a suficiente
objectividade do teste. Devido à natureza extremamente diversificada dos conhecimentos
adquiridos por via não formal, será difícil atingir-se o mesmo tipo de fiabilidade que se
consegue, por exemplo, nos testes de respostas pré-definidas ou de escolha múltipla.
Introduzindo em todos os níveis (e entre os diferentes níveis) o controlo de qualidade, é
possível reforçar consideravelmente a confiança nos procedimentos metodológicos. A
fiabilidade da avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal deve basear-se
num elevado grau de transparência, devendo todas as etapas ser comunicadas de forma
clara a todos os participantes.
3.5.2>Bélgica
Embora as instituições e a legislação belgas reconheçam, em certa medida, a importância
da aprendizagem não formal no contexto educativo geral, a prioridade e o interesse
prestados às questões relacionadas com a avaliação e o reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal têm-se revelado fracos. Em comparação com muitos outros
países europeus, a Bélgica possui um sistema de ensino e formação profissional com
poucas ligações a nível da empresa, como o atesta a fraca proporção de jovens que recebe
formação profissional no quadro da aprendizagem. É possível que esta abordagem,
essencialmente centrada na formação pela escola, tenha provocado menos interesse pelas
questões de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal do que noutros
países com situações comparáveis. No entanto, quer na Comunidade Francesa quer na
Comunidade Flamenga, verifica-se uma certa evolução e um crescente interesse por este
assunto, que se traduz por novas iniciativas.
inofor
Como aconteceu em vários outros países (Alemanha, Noruega, etc.), introduziu-se uma
certa flexibilidade no sistema, a fim de permitir que as pessoas fossem dispensadas de
determinadas partes de um curso formal, fazendo valer competências adquiridas no local
de trabalho ou noutros contextos. Os júris da Comunidade Francesa, sob a tutela do
Ministério da Comunidade Francesa, propõem exames alternativos às pessoas que
seguiram «itinerários de aprendizagem» diferentes dos da escolaridade formal. Esses
exames destinam-se, antes de mais, aos «autodidactas» ou «àqueles que abandonaram os
estudos» (Eurydice, 1998). Para se prepararem para esses exames, os candidatos têm
acesso aos necessários equipamentos nos estabelecimentos de ensino públicos ou
privados, bem como aos dispositivos de ensino à distância. As regras e as regulamentações
relativas à composição e às funções dos júris de avaliação encarregados de organizar os
exames são definidas por diplomas do executivo. No ensino secundário, pode obter-se
um certo número de qualificações por este meio:
a) quarto ano do certificado de ensino secundário (certificado de ensino secundário do
segundo grau), no ensino secundário geral, técnico, artístico ou profissional;
b) CESS (certificado de ensino secundário superior) no ensino secundário geral, técnico,
artístico ou profissional;
c) DAES (diploma de aptidão para acesso ao ensino superior) para os formandos que
terminaram o sétimo ano do ensino secundário profissional e para os estrangeiros com
equivalência oficial ao CESS, que dá acesso ao ensino superior curto;
d) diploma que permite o acesso ao exame em engenharia civil.
Além disso, é ainda possível, de acordo com as disposições regulamentares anteriores, a
apresentação a exames preparatórios de acesso à formação de técnico auxiliar de saúde
(ensino secundário profissional complementar) e a determinadas formações superiores no
domínio paramédico.
Os procedimentos elaborados pela Comissão de Homologação encarregada de analisar
os certificados que sancionam qualificações ou cursos parciais estrangeiros de nível
secundário oferecem também uma certa pertinência em relação ao assunto que nos
ocupa. Antes de qualquer decisão, o formando deve reunir todos os documentos que
tenha em seu poder, com base nos quais a Comissão irá verificar:
a) se os programas de estudo seguidos são estabelecidos e aprovados pelo ministro ou se
correspondem às normas equivalentes;
b) se o ensino e a formação dispensados estão de acordo com os níveis exigidos;
c) se o formando obedece às normas em vigor em matéria de admissão e de duração dos
estudos.
113
Colecção CEDEFOP
O CEES constitui a base sobre a qual assentam as decisões tomadas. A Comissão de
Homologação é composta por representantes dos estabelecimentos de ensino públicos e
privados, em igual número.
Na Comunidade Flamenga, foi introduzido um certo grau de flexibilidade no sistema.
Quando se apresentam a exames especiais, os adultos podem obter (com base nos
saberes adquiridos no local de trabalho ou noutro sítio) a mesma qualificação que os
indivíduos que seguiram um percurso tradicional. Este dispositivo aplica-se ao ensino
primário, ao ensino secundário inferior e superior e ao ensino superior. Os adultos podem
ainda optar por seguir um dos programas de formação contínua propostos pelo Ministério
do Ensino e da Formação da Comunidade Flamenga. Estes programas permitem a
frequência de cursos, à noite ou aos fins-de-semana, que, no final, dão qualificações
equivalentes às que são atribuídas pelos estabelecimentos de ensino secundário superior
(e a certas qualificações do ensino superior). Na sequência de uma reforma empreendida
em 1999 (decreto de 2 de Março de 1999, JO de 21.8.1999), pode ser concedida uma
redução dos períodos de estudos fundamentada numa experiência profissional
comprovada. Cabe ao director do estabelecimento de ensino decidir da dispensa, após ter
ouvido os pareceres dos professores das disciplinas em causa. É conveniente notar que,
contrariamente ao sistema normal, os programas flamengos de formação contínua são,
em grande parte, modularizados.
Uma iniciativa tomada em 1998 pelo Conselho da Educação e da Formação da
Comunidade Francesa revela uma vontade de reformar e de harmonizar o conjunto do
sistema de validação das competências profissionais, tanto a nível da formação inicial como
a nível da formação contínua. O Conselho apresentou propostas que mostram a
necessidade de se alargar o conceito de qualificação relativamente ao sistema existente:
uma qualificação deve ser definida como o conjunto de competências necessárias à
execução de uma tarefa ou de diversas tarefas requeridas para o exercício de uma
profissão. Esta abordagem das normas profissionais corresponde à que definimos atrás, e
que se baseia no desempenho ou nos resultados. Uma das propostas incide nas
competências adquiridas através da experiência profissional e sobre a potencial inclusão
dos conhecimentos adquiridos por via não formal nas práticas belgas de avaliação do
ensino e da formação. Embora esta proposta não esteja explicitamente relacionada com os
modelos franceses ou com outros modelos «estrangeiros», é manifesta a mudança de
perspectiva: a abordagem baseada nos meios evolui para uma abordagem baseada nos
resultados.
Para além disso, as autoridades flamengas preparam actualmente uma reforma do sistema
de formação profissional destinada a lançar um modelo modularizado, «baseado nos
resultados». No âmbito desta reforma, foi levantada a questão da avaliação e do
inofor
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal e, pela primeira vez,
introduzida na agenda política nacional (Comunidade Flamenga). Este projecto de reforma
traduz um esforço no sentido de aproximar os diferentes prestadores de formação
profissional da Comunidade Flamenga, nomeadamente os ministérios com a tutela do
ensino e da formação, do emprego e das pequenas e médias empresas. Actualmente, os
sistemas dependentes destes três ministérios não se reconhecem mutuamente. O
projecto de modularização visa estabelecer a aproximação graças ao desenvolvimento
comum de um conjunto de normas de competências. Os parceiros sociais têm-se
envolvido profundamente neste trabalho. Se esta reforma tiver êxito, qualquer pessoa
poderá passar de um sistema para outro sem precisar de arrancar do zero.
Embora o trabalho desenvolvido a nível da Comunidade Flamenga ainda se encontre
numa fase inicial, pode dizer-se que é fortemente inspirado nas experiências holandesas.
Tanto o sistema das normas de qualificações como as metodologias da APL desenvolvidas
nos Países Baixos durante os últimos anos têm constituído importantes pontos de
referência. Um acordo recentemente concluído entre o Ministério da Educação dos Países
Baixos e o Departamento do Ensino e da Formação da Comunidade Flamenga (acordo
GENT 5 de 7 de Fevereiro de 2000) insiste na necessidade de troca de informações em
matéria de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via
não formal, a fim de se promover a cooperação, a coordenação e a aprendizagem mútua.
Para além das práticas acima mencionadas, têm ocorrido numerosas iniciativas
relacionadas com a norma europeia EN 45013 relativa à certificação de pessoal (cf.
também o capítulo 3.5.1.3, onde são apresentadas as experiências francesas neste
domínio). Esta norma é gerida pelo Belgcert, organismo criado nos anos 90 e colocado na
tutela do Ministério Federal da Economia, participando na sua execução vários outros
organismos e instituições (serviços ministeriais federais e regionais, etc.). O papel da norma
EN 45013 pode ser ilustrado pelo exemplo do Instituto Belga das Técnicas de Sondagem:
as qualificações emitidas por este instituto são acreditadas de acordo com os critérios do
Belgcert e da norma EN 45013. Foram também desenvolvidas iniciativas semelhantes nos
sectores da construção, do aquecimento, da refrigeração, da metalurgia, da alimentação e
da restauração.
3.5.3>Certificados formais em causa?
Quer em França quer na Bélgica, as qualificações e os certificados aprovados a nível
nacional desempenham um papel importante. No caso da França, Merle (op. cit.) designa
esta especificidade por «lógica do título académico». A introdução de múltiplos dispositivos
115
Colecção CEDEFOP
de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não
formal põe em causa o papel e o estatuto dos certificados e dos diplomas tradicionais.
Embora tenha sido adquirida uma considerável experiência durante os últimos 10 ou 15
anos, os percursos de aprendizagem não formal não se impuseram verdadeiramente
como uma alternativa séria aos sistemas de ensino e de formação formais. O balanço de
competências desempenha um papel estritamente formativo e constitui mais uma oferta
de orientação e um feedback do que um reconhecimento oficial das competências. O
dispositivo lançado em 1992 pelo Ministério da Educação Nacional deve ser encarado
como uma abertura do sistema de ensino e de formação formais em relação às
competências adquiridas de maneira não formal. Trata-se, pois, de uma abordagem
limitada, na medida em que as normas são definidas e estabelecidas pelo sistema formal. A
experimentação efectuada pelos CCI franceses, bem como as iniciativas belgas, poderiam
inspirar o desenvolvimento de um dispositivo independente do ensino e da formação
formais, mais centrado nas necessidades e nas práticas do mundo do trabalho. Resta saber
se será possível, ou até útil, tentar reunir essas diferentes abordagens no seio de um
sistema nacional único. Qualquer que seja a resposta a esta questão, as experiências
francesas e belgas revelam que as soluções em matéria de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal devem ser procuradas na
variedade das abordagens e na aplicação de diversas metodologias como resposta a
diversos objectivos.
3.6>Sistemas nacionais de identificação, de avaliação
e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via
não formal - determinantes e condições prévias
À primeira vista, as diversas abordagens nacionais em matéria de identificação, de avaliação
e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal diferem imenso umas das
outras e, aparentemente, são mais o reflexo das tradições e das especificidades próprias de
cada contexto nacional do que a representação de uma tendência europeia comum. No
entanto, uma análise mais atenta revela um número limitado de factores que
desempenham um papel determinante no estabelecimento e no desenvolvimento das
metodologias e dos sistemas nacionais. Há dois factores determinantes que merecem ser
especialmente sublinhados:
a) qualquer esforço desenvolvido para estabelecer sistemas nacionais de identificação, de
avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal deve partir de
inofor
um ponto de referência ou de uma norma;
b) qualquer esforço desenvolvido para estabelecer sistemas nacionais de identificação, de
avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal deve considerar
a questão da modularização, de uma forma ou de outra.
O estabelecimento de metodologias e de sistemas de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal depende, em larga medida, do
modo como esses factores determinantes são geridos a nível nacional.
Tradicionalmente, as normas de qualificações, sob a forma de programas de estudos gerais
e/ou de programas mais específicos, por exemplo, são construídas em função de quatro
critérios: o conteúdo, o local, a duração e a metodologia. Esta abordagem, em parte
ilustrada pelos Berufsprofile alemães e austríacos, embora muito elaborada, não deixa de
ser, por isso, limitada. Só os estabelecimentos especificamente habilitados para «emitir» as
qualificações correspondentes a essas normas conseguem dar resposta às exigências em
termos de conteúdo, de local, de duração e de metodologia. As competências adquiridas
fora dos percursos oficiais e aprovados, provavelmente, não estão em conformidade com
um ou com vários desses quatro critérios definidos. A esta abordagem opõem-se as que
são baseadas nas competências ou no desempenho, nas quais o número de «critérios de
controlo» foi radicalmente reduzido. Os aspectos de local, de duração e de metodologia
são considerados menos pertinentes (e até, em casos extremos, desprovidos de qualquer
pertinência), enquanto o aspecto de conteúdo se torna determinante. Esses esforços
visando «libertar» as normas de competências dos constrangimentos institucionais
impeliram a questão da aprendizagem não formal para o nível nacional. É evidente que a
redução do número de critérios de controlo de quatro para um (o conteúdo) abre
caminho a novos modos de aprendizagem e a uma maior flexibilidade institucional.
No entanto, a credibilidade desta nova liberdade institucional assenta na sua capacidade
para definir os limites e as características das competências em causa. É evidente que o
estabelecimento de referenciais é impossível se a «dimensão» (amplitude, profundidade e
complexidade) das competências for demasiadamente grande. Por isso, os sistemas de
ensino e de formação que se baseiam em unidades capitalizáveis (modularizados)
constituem um determinante suplementar na elaboração de metodologias e de sistemas
de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não
formal. A maior parte das abordagens nacionais centradas nas competências associaram o
estabelecimento de novas normas à criação de sistemas de unidades capitalizáveis. Os
países empenhados nesta dupla via fazem, geralmente, parte do grupo pioneiro da
integração da aprendizagem não formal nos sistemas nacionais. Nesse aspecto, a Suécia é
um exemplo. Apesar da sua reserva inicial (comparada com a Finlândia e a Noruega), fez
117
Colecção CEDEFOP
grandes progressos em 1999 e 2000, atribuídos, provavelmente, ao carácter fortemente
modularizado (mais de 800 unidades capitalizáveis) e normalizado do sistema nacional de
ensino e formação profissional. Os projectos-piloto lançados em 1999 puderam utilizar,
como ponto de partida, as normas e as unidades existentes e não foi necessário encetar
mais amplas discussões a respeito das questões de base relativas à estrutura do sistema ou
aos procedimentos a executar para o estabelecimento das normas.
À luz das experiências nacionais aqui apresentadas, podemos dizer que as normas de
competências e um certo grau de modularização constituem as condições prévias ao
estabelecimento de sistemas permanentes de identificação, de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. É evidente que cada sistema
nacional deve desenvolver o seu próprio modelo de normas e de unidades capitalizáveis.
Do mesmo modo, parece evidente que os modelos baseados nas competências,
introduzidos no Reino Unido e na Irlanda, graças a uma maior flexibilidade institucional,
denotam uma vontade mais forte em adoptar novas abordagens de avaliação e de
reconhecimento. Além disso, determinadas qualidades integradas nos modelos mais
«holísticos» de ensino e de formação (ilustrados, nomeadamente, pelo sistema dual)
poderiam perfeitamente desaparecer se a prioridade incidisse exclusivamente sobre a
abertura e a flexibilidade institucionais. Convém associar a prioridade actual respeitante ao
conteúdo da aprendizagem com uma prioridade relativa às formas (o local) e às
metodologias de aprendizagem. Embora as metodologias de avaliação possam apoiar a
utilização dos resultados da aprendizagem efectuada fora dos estabelecimentos formais,
não podem substituir-se aos esforços permanentes para melhorar as condições e as
metodologias da aprendizagem nos contextos quer formais quer informais.
inofor
4>Tendências europeias: evolução a nível
da UE
119
Colecção CEDEFOP
COMO TEM SIDO ASSINALADO AO LONGO desta análise às diversas abordagens
nacionais, o papel da União Europeia no domínio da aprendizagem não formal tem-se
revelado interessante e importante. Em primeiro lugar, o Livro Branco da Comissão sobre
a Educação e a Formação: Ensinar e aprender: rumo à sociedade cognitiva contribuiu para
chamar a atenção para esta questão e sublinhou a necessidade de tornar visíveis as
competências adquiridas fora dos estabelecimentos de ensino e de formação formais. Os
programas Leonardo da Vinci e Adapt têm sido também importantes instrumentos
estimuladores da experimentação metodológica e institucional. Estes dois programas,
graças à participação de um elevado número de parceiros de projecto, têm também
apoiado um processo internacional de aprendizagem de grande importância potencial,
cujos resultados só serão perceptíveis a longo prazo.
Apesar da relativamente grande prioridade política atribuída à questão da aprendizagem
não formal a nível comunitário, têm sido raros os esforços para se proceder a uma síntese
das iniciativas. As ambiciosas propostas do Livro Branco mantiveram-se, em larga medida,
como declarações de política geral e tiveram poucos efeitos tangíveis nas estratégias
lançadas quer a nível comunitário quer a nível nacional. Os diversos programas de acção,
dos quais o mais importante é, de longe, o Leonardo da Vinci, constituem excepções a este
panorama geral. A partir de 1995, o programa Leonardo da Vinci, só por si, permitiu apoiar
centenas de projectos directa ou indirectamente ligados à identificação, à avaliação e ao
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal ou experiencial. É difícil
determinar se, e em que medida, essa actividade (de experimentação de projectos) terá
algum efeito nos sistemas de aprendizagem a nível nacional, sectorial ou empresarial. A
resposta a essa pergunta dependerá, em parte, das relações entre a actividade
experimental realizada no quadro dos programas e os objectivos de política geral definidos
a nível europeu e nacional. A finalidade geral deste capítulo será, então, a análise das
relações entre os objectivos políticos e a actividade desenvolvida no quadro dos
programas.
A primeira parte do capítulo centrar-se-á nos objectivos apresentados no Livro Branco e
nos diversos documentos a que deram origem. A segunda parte será dedicada ao
acompanhamento directo dado ao Livro Branco no quadro dos projectos de «testes
automáticos de avaliação dos conhecimentos e das competências». A esses projectos foi
dada uma particular prioridade e, em certa medida, indicam as prioridades da Comissão
Europeia. A terceira parte do capítulo dá uma visão de conjunto dos projectos Leonardo
da Vinci não incluídos no grupo de projectos dos «testes automáticos de avaliação». Esses
projectos representam, de longe, o maior grupo (já analisámos alguns deles na
apresentação das iniciativas nacionais, por exemplo, nos casos da Alemanha e da Itália).
inofor
4.1>O Livro Branco sobre a Educação e a Formação:
Ensinar e aprender: rumo à sociedade cognitiva
Em Novembro de 1995, a Comissão Europeia adoptou o Livro Branco sobre a Educação
e a Formação: Ensinar e aprender: rumo à sociedade cognitiva. O primeiro dos objectivos
definidos no Livro Branco consiste em encorajar «a aquisição de novos conhecimentos».
Trata-se de lançar uma estratégia destinada a «abrir novas vias para a validação das
competências» (p. 59), que pode ter os seguintes efeitos positivos:
a) desenvolver uma procura de ensino e de formação por parte dos jovens ou dos adultos
que não podem, ou não desejam, entrar num sistema formal de concessão de diplomas ou
de formação profissional inicial;
b) permitir que qualquer pessoa consiga ver reconhecidas as respectivas competências
parciais num sistema flexível e permanente de validação de unidades de saber;
c) identificar, avaliar e chegar a um acordo sobre essas unidades de saber;
d) estimular as pessoas para que elas próprias constituam as suas qualificações,
nomeadamente através da acreditação dos saberes elementares.
O instrumento fundamental proposto para a realização deste objectivo consiste na
introdução de uma «carteira pessoal de competências», no qual serão registadas as
competências e os saberes do interessado e que, de acordo com o Livro Branco, será
entregue a todos os que o pedirem. A carteira deve ser aplicada a determinados domínios
fundamentais de saberes e mesmo a determinados domínios profissionais
transdisciplinares. O Livro Branco apresenta a carteira pessoal de competência como um
«instrumento» ou uma «mola» destinada a estabelecer normas nos Estados-Membros:
«A finalidade desta acção não é a de conceber e de impor na Europa
uma carteira única, mas de contribuir para o desenvolvimento
desses instrumentos, para chegar, progressivamente, à definição de
padrões comuns, inclusivamente transprofissionais,» (p. 57)
Esta declaração reflecte as realidades políticas no seio da UE. As questões relacionadas
com o ensino e a formação são uma responsabilidade nacional, sendo excluída qualquer
harmonização da legislação e da regulamentação dos Estados-Membros na área da
educação e da formação. Qualquer desenvolvimento de instrumentos europeus neste
domínio deve basear-se num processo gradual e voluntário. A declaração reflecte também
as claras ambições da Comissão. É sabido que numerosos países europeus se têm
121
Colecção CEDEFOP
esforçado por identificar as «competências-chave» e por encontrar os melhores meios
para a aquisição, a avaliação e a validação dessas mesmas competências. No entanto, as
iniciativas nacionais terão sempre pouco valor num contexto de crescente mobilidade
europeia. A carteira pessoal de competências deve ser entendida como um dos
elementos-chave de um sistema europeu concebido para comparar e difundir os métodos
e as práticas de validação. Embora o Livro Branco não se detenha a pormenorizar este
aspecto, subentende-se que o êxito da carteira pessoal dependerá do reconhecimento e
da aceitação que merecer:
«Será implementado um sistema europeu de acreditação das
competências técnicas e profissionais, a partir de um trabalho de
cooperação entre estabelecimentos de ensino superior, sectores
profissionais, empresas, câmaras de comércio e parceiros sociais.
Finalmente, será dado apoio ao desenvolvimento de acordos de
qualquer natureza, a nível de empresa, de sector, de região, etc.,
integrando o princípio da carteira pessoal de competências.» (P.57)
O Livro Branco não pormenoriza as modalidades de introdução da carteira pessoal de
competências, mas foram dadas algumas informações num documento preparado pela
Comissão, pouco depois da apresentação do Livro Branco (Comissão Europeia, 1996). A
propósito do primeiro objectivo do Livro Branco, aquele documento refere que se
pretende «introduzir, em poucos anos, um sistema europeu de acreditação das
competências que permita a validação dos conhecimentos e dos saberes-fazer de
qualquer cidadão numa carteira pessoal de competências». Para isso, torna-se necessário
identificar um certo número de conhecimentos fundamentais, de conhecimentos
profissionais e técnicos e de competências-chave (transdisciplinares). Esses
conhecimentos devem estar claramente circunscritos e decompostos em unidades
elementares e coerentes, organizadas em níveis crescentes de dificuldade. De acordo
com o autor deste documento, seria, assim, possível avaliar um domínio de conhecimento
desde o nível mais elementar ao nível mais elevado. Admite-se não existir qualquer lista
rigorosa de conhecimentos e de competências que pudesse ser testada a nível europeu.
No entanto, o assunto deve estar relativamente estabilizado (ausência de controvérsias
importantes) e deixar pouco espaço à subjectividade nacional e cultural. A título de
exemplo, mencionam-se, seguidamente, alguns conhecimentos ou competências:
inofor
a) conhecimentos «fundamentais»: matemática, ciências, informática, geografia, línguas
estrangeiras;
b) competências profissionais e técnicas: marketing, técnicas de gestão de empresas,
contabilidade, etc.;
c) competências-chave: logística, técnicas de organização, comunicação, capacidade de
decisão, capacidade de previsão e de gestão dos riscos, capacidade de negociação,
capacidades relacionais.
A realização dessa tarefa a nível europeu deve basear-se em diversos elementos. Em
primeiro lugar, a avaliação e a validação das competências devem compreender um
conjunto de programas informáticos de validação de fácil utilização, ligados pela Internet a
um servidor central que, a pedido, fornecerá um teste interactivo, processará o resultado e
validará a competência no nível a que o candidato prestou provas. Em segundo lugar, os
testes estarão acessíveis aos candidatos que pretendam validar as respectivas
competências, em qualquer lugar na Europa e tantas vezes quantas as necessárias. Os
níveis de competências serão registados numa carteira pessoal de competências, que será
organizada de acordo com o ritmo e a vontade do seu portador. Logo que o sistema passe
a ser reconhecido, a carteira de competências poderá desempenhar o papel de
verdadeiro passaporte para o emprego, como complemento dos diplomas e dos
certificados. Como refere o documento, o objectivo é criar um sistema sobre o qual haja o
acordo dos Estados-Membros, para que a carteira pessoal de competências constitua um
instrumento europeu que permita aos cidadãos usarem das respectivas competências em
qualquer país da Europa. Não se trata de criar um teste europeu único (as diferenças
nacionais devem ser reconhecidas), mas a metodologia utilizada deve ser a mesma para o
conjunto da Europa e todos os testes devem estar disponíveis em todas as línguas da UE.
Deste ponto de vista, a carteira pessoal de competências é entendida como um dispositivo
que, a prazo, permitirá fazer uma avaliação somativa e que certificará conhecimentos e
experiências a utilizar no mercado de trabalho. Este conceito não corresponde,
necessariamente, às formulações mais gerais do Livro Branco, que dá muito mais
importância aos aspectos formativos da avaliação das competências.
A apresentação da carteira pessoal de competências e do sistema europeu de acreditação
das competências põe mais em relevo os desafios instrumentais e tecnológicos do que os
futuros desafios políticos e institucionais. Isto é particularmente evidente no que respeita à
elaboração do sistema europeu de acreditação das competências, em que a prioridade é,
sobretudo, dada ao desenvolvimento de programas informáticos e de redes telemáticas. A
base política, institucional e social das metodologias praticamente não é abordada (para
este aspecto, cf. também o capítulo 2). Embora seja necessário investigar o potencial das
123
Colecção CEDEFOP
novas tecnologias, a verdade é que a pouca atenção concedida às condições políticas e
sociais prévias pode vir a ter efeitos negativos.
Esta perspectiva limitada é repetida e confirmada num relatório recentemente publicado
pela Comissão (Comissão Europeia, 2000ª), que apresenta uma síntese do que se seguiu
ao Livro Branco. A abertura de «novas vias para a validação das competências» está
exclusivamente relacionada com os resultados dos projectos de «testes automáticos de
avaliação dos conhecimentos e das competências», apoiados pelos programas Leonardo
da Vinci e Sócrates (cf. o capítulo 4.2 subsequente). Para além de reiterar a visão geral do
Livro Branco (instrumento para os indivíduos e as empresas, para os trabalhadores e os
desempregados, para a formação inicial e a formação ao longo da vida), a Comissão
reconhece a necessidade de «[sensibilizar o] mundo socioeconómico para esta nova via de
aquisição de conhecimentos e de validação». O contraste entre a visão inicial do Livro
Branco de 1995 e o balanço das iniciativas efectivadas em 2000 pode parecer
decepcionante. No entanto, antes de chegarmos a essa conclusão, convém que
examinemos de mais perto os projectos de «testes automáticos de avaliação».
4.2>A avaliação automatizada
Como já foi referido, a consequência mais directa da proposta relativa ao cartão pessoal de
competências foi a organização de um quadro experimental no qual se desenvolveram (e
ainda estão a desenvolver-se) 18 projectos (10 deles no âmbito do programa Leonardo da
Vinci e 8 no âmbito do programa Sócrates) para a concepção dos «testes automáticos de
avaliação dos conhecimentos e das competências». Esses projectos dividem-se em três
grupos principais. As actividades do primeiro grupo centram-se na testagem e na avaliação
dos conhecimentos de base em matemática, física, biologia, química, estatística e
geografia23. As do segundo grupo centram-se nas necessidades de sectores específicos, tais
como os serviços bancários, a gestão de empresas, as indústrias transformadoras, o
fornecimento de água e a indústria alimentar24. As do terceiro grupo centram-se na
23
Os projectos, bem como os domínios respectivos, são os seguintes: AEVEM (LdV, matemática), MAC (LdV, física)
TEBE (LdV, biologia), EACC (Sócrates, química), Estatística para Engenheiros (Sócrates, estatística) e Geografia
(Sócrates, geografia)
24
Os projectos, bem como os domínios respectivos, são os seguintes: MESAS (LdV, marketing), Carteira de
competências bancárias (LdV, banca), MECAM (LdV, montagem), Media-Eval (LdV, processos industriais), Isocrates
(Sócrates, direito), Test-eau (Sócrates, ambiente/água) e Ciências da alimentação e ambiente (Sócrates,
alimentação/ambiente).
inofor
avaliação de competências transectoriais, por exemplo, a informática, a expressão escrita,
as línguas e as competências-chave25. A principal prioridade, que reflecte a do Livro
Branco, consiste em determinar até que ponto podem ser utilizadas pela auto-avaliação as
soluções informatizadas (a Comissão estabelece diferentes conceitos sobre a matéria, não
apenas a «avaliação», mas também a «validação» etc.; cf. igualmente o glossário em anexo).
O objectivo consiste em fornecer aos diversos utilizadores um instrumento que lhes
permita identificar e estruturar mais eficazmente as respectivas competências e, assim,
planificar as respectivas formações e evoluções de carreira. Esses projectos visam também
fornecer às empresas um instrumento de gestão dos recursos humanos. Como foi
referido acima, o objectivo fundamental da abordagem adoptada pela Comissão não é
muito claro; regra geral, verifica-se uma tendência para combinar um sistema de
reconhecimento das competências (através de provas transeuropeias) com um
instrumento que apoie os processos de aprendizagem dos indivíduos e das empresas. As
implicações metodológicas das abordagens somativas e formativas, embora não sejam
inteiramente contraditórias, não podem ser subestimadas. É importante sublinhar que
estas observações incidem sobre a abordagem europeia no seu conjunto e não,
necessariamente, sobre os projectos enquanto tal. Dos 18 projectos de «testes
automáticos de avaliação», muitos produziram resultados interessantes e promissores.
Utilizaremos um dos mais bem sucedidos, o «projecto de carta europeia de condução em
informática» (European computer driving licence -ECDL), para ilustrar essa «abordagem
automatizada».
A ideia de uma carta europeia de condução em informática teve a sua origem na Finlândia,
em 1988. O projecto foi lançado em 1994 e a Fundação ECDL, que actualmente reúne 14
associações nacionais das tecnologias da informação, foi criada em 1997. Para a obtenção
da carta europeia de condução em informática, os candidatos devem efectuar com êxito
uma série de testes que incidem sobre sete módulos. Um dos testes modulares incide
sobre a compreensão teórica desta área, enquanto os outros seis incidem sobre as
capacidades práticas na utilização de diferentes tipos de programas informáticos (sistemas
operativos, tratamento de texto e folhas de cálculo). Actualmente, os testes são
apresentados em dois suportes, a versão em papel e a versão electrónica; a primeira é, de
certo modo, mais flexível, pois podem ser utilizadas diferentes versões de programas.
Uma avaliação externa (cf. abaixo) concluiu que o projecto ECDL tem sido um êxito em
25Os projectos, bem como os domínios respectivos, são os seguintes: Evaling (LdV, expressão escrita), ECDL (LdV,
informática), MAPS (LdV, competências-chave), Referências (Sócrates, serviços ao cliente) e Dialang (Sócrates,
línguas).
125
Colecção CEDEFOP
vários aspectos. O número de candidatos tem vindo a aumentar regularmente, tendo-se
apresentado 146 000 pessoas em meados de 1998. De acordo com uma avaliação
externa efectuada em 1999 (Guildford Educational Services, 1999), este êxito prende-se
com a estrutura operacional do projecto, que permite organizar os testes em diferentes
países. Para isso, parece também ter sido determinante a participação das associações
nacionais das tecnologias da informação e as relações estabelecidas com estas. O relatório
põe em relevo os seguintes pontos:
a) o projecto ECDL tem um objectivo e um grupo-alvo bem definidos e responde
claramente a uma necessidade;
b) as relações com os centros de testes existentes são importantes;
c) existe um programa claramente definido, que especifica os conhecimentos e as
competências a avaliar (embora sejam necessárias actividades suplementares neste
domínio);
d) a possibilidade de se escolher entre duas versões de testes é considerada pertinente e
permite dar resposta às necessidades específicas de grupos mais restritos.
Embora tenham sido proferidas críticas, incidindo, sobretudo, sobre a formulação e a
elaboração de determinadas perguntas, o projecto ECDL é o único dos projectos de
«testes automáticos de avaliação» que conseguiu tanta popularidade e uma utilização tão
alargada. O sucesso que granjeou deve-se, em parte, às tarefas testadas que, em muitos
aspectos, se prestam particularmente a este tipo de abordagem informatizada. No
entanto, é possível que sejam também importantes outros factores mencionados no
relatório de avaliação: um objectivo e uma tarefa claramente definidos, um domínio de
avaliação bem identificado, uma especificação clara das competências a considerar e, por
último, mas não menos importante, relações estreitas com um contexto institucional
geralmente reconhecido como legítimo (as associações nacionais das tecnologias da
informação).
No que diz respeito ao êxito e à qualidade dos projectos, o relatório de avaliação fornecenos uma imagem pouco uniforme. Das conclusões mais gerais, é possível reter alguns
pontos interessantes, na medida em que põem em relevo as dificuldades relacionadas com
o lançamento de uma carteira pessoal de competências e de um sistema europeu de
acreditação das competências:
a) regra geral, é difícil desenvolver testes informatizados que sejam válidos e fiáveis nos
diferentes países europeus, em simultâneo. É difícil conseguir-se um acordo sobre o
conteúdo comum a todos os países, nomeadamente em determinados domínios
inofor
profissionais, como, por exemplo, a banca, e para certas disciplinas gerais, tais como a
matemática e a física, em que os programas variam de país para país;
b) mesmo quando é possível identificar um tronco comum a nível do conteúdo, as
perguntas dos testes têm que ser adaptadas às especificidades locais (ou
«contextualizadas», para retomar a terminologia utilizada no capítulo 2), para levar em
conta as diversas condições próprias de cada país;
c) é fundamental o bom funcionamento dos programas, deve ter acesso aos testes um
leque tão alargado quanto possível de utilizadores e devem ser preparados dispositivos de
segurança. As tecnologias modernas, nomeadamente a Internet, ainda colocam
problemas aos utilizadores dos sistemas;
d) é necessário criar uma infra-estrutura administrativa de apoio aos testes. Trata-se de
uma exigência fundamental, caso se pretenda que a avaliação conduza a uma forma de
certificação e/ou reconhecimento oficial, à qual o âmbito actual da iniciativa não permite
dar resposta;
e) a legitimidade da avaliação coloca um problema. Assim, o desenvolvimento de
metodologias de avaliação deve levar claramente em conta a procura e as necessidades,
deve ser realizado em cooperação com uma organização profissional que ofereça uma
garantia oficial ao processo, e, se possível, deve basear-se numa norma aceite a nível
europeu. Finalmente, o relatório sublinha que os utilizadores devem ter confiança na
validade e na fiabilidade dos testes e da avaliação, exigência que nem sempre é
inteiramente respeitada.
As conclusões deste relatório de avaliação são confirmadas por outros resultados de
investigação. O Tavistock Institute de Londres, que está estreitamente associado à criação
de um quadro experimental de «avaliação automatizada», foi convidado a analisar as
experiências realizadas nos Estados Unidos no domínio da «acreditação das competências
por cartão electrónico» (Cullen e Jones, 1997) e, com base nessa análise, a estudar a
exequibilidade de uma carteira pessoal de competências na Europa. A conclusão desses
trabalhos revelou que as experiências realizadas nos Estados Unidos, em certos aspectos,
muito mais avançadas do que as que se realizam na Europa, só em parte se prestam a uma
transferência directa para o contexto europeu. O Tavistock Institute põe em relevo as
diferenças socioculturais, institucionais, económicas e jurídicas fundamentais que dificultam
a transferência directa da teoria e da prática norte-americana para a Europa.
Os primeiros resultados dos projectos-piloto, tal como são referidos no relatório de
avaliação, põem, assim, em evidência as diferenças culturais entre os diversos contextos
geográficos, em matéria de definição e de utilização das competências. Essas diferenças
situam-se, essencialmente, a nível da interpretação das competências requeridas para o
127
Colecção CEDEFOP
exercício de uma actividade específica e da terminologia utilizada para descrever essas
competências (p. 7).
De acordo com o Tavistock Institute, os principais obstáculos não são de ordem
tecnológica. O desenvolvimento de uma carteira pessoal de competências ou de um
sistema europeu de acreditação das competências não coloca problemas técnicos de
maior; a infra-estrutura técnica já existe e os programas necessários já foram
desenvolvidos. A principal dificuldade reside na «contextualização sociotécnica» desses
sistemas, e o problema mais espinhoso a resolver prende-se com a incorporação das
tecnologias nos quadros institucionais e organizacionais apropriados. O Tavistock Institute
chega à conclusão que o êxito ou o insucesso do sistema vai depender da criação de
parcerias adequadas entre o governo, os empregadores e os representantes das
organizações sindicais. Além disso, essas parcerias deveriam ser apoiadas por inovações
em domínios como os referidos nas classificações das profissões e nas redes de acreditação
e de avaliação. Em conclusão, os investigadores do Tavistock Institute apresentam dois
«cenários» para ilustrar as diferentes orientações possíveis da carteira pessoal de
competências e do sistema europeu de acreditação das competências.
O primeiro cenário, intitulado «big bang», prevê um sistema paneuropeu global de
acreditação das competências, assente num banco de dados evolutivo dos títulos
profissionais, dos descritores e das definições das competências. Esse sistema seria
estruturado de acordo com um modelo de conteúdo correspondente à organização do
local de trabalho europeu. Tratar-se-ia de uma variante em relação aos esforços
empreendidos nos Estados Unidos para a criação de um sistema federal de normas de
qualificações26. Este cenário também prevê a criação de uma agência europeia de
normalização de competências, encarregada da recolha dos dados sobre diversas
competências, bem como a criação de uma agência europeia de acreditação, encarregada
de gerir ao mais alto nível as actividades realizadas nos planos nacional, regional e sectorial.
26
Tradicionalmente, as actividades empreendidas nos Estados Unidos no domínio das normas de qualificações foram
fragmentadas e não foram coordenadas a nível federal. Essa situação evoluiu um pouco em 1994, com a criação do
Conselho Nacional das Normas de Competências (National Skills Standards Board), que é orientado pelas empresas e
que deve impulsionar o desenvolvimento e a adopção de um sistema nacional de normas de competências de base
voluntária. Essas normas são consideradas como linhas orientadoras aplicáveis a largos sectores de actividade e são
definidas por grupos designados «parceiros voluntários». Em parte protegidas por esse «guarda-chuva», foram
empreendidas iniciativas para estabelecer taxinomias de domínios profissionais. Entre essas iniciativas, pode citar-se,
nomeadamente, o dispositivo O*Net, que é uma adaptação electrónica do Dictionary of occupational titles. Também
foram empreendidos esforços no sentido de ligar os diversos sistemas existentes nos Estados Unidos, sob a direcção do
Sistema Americano de Informação para o Mercado do Trabalho (America's labour market information system ALMIS) e
da Secretaria de Estado do Trabalho, dos Estados Unidos.
inofor
O segundo cenário denomina-se «cenário evolutivo» e, em vez da abordagem
«descendente» do «big bang», propõe implementar uma prática a partir das iniciativas já
desenvolvidas a nível nacional e local, no intuito de determinar em que medida um
dispositivo pan-europeu, como o sistema europeu de acreditação das competências,
pode ser transferido para diferentes contextos sócio-culturais e, a prazo, graças à
realização de projectos-piloto, num número limitado de sectores (para aquisição de
experiência). De acordo com o relatório, as principais vantagens do «cenário evolutivo»
residem na sua exequibilidade e no facto de mergulhar as raízes nos contextos sócioculturais existentes. Em muitos aspectos, este cenário segue mais a linha da evolução
observada durante o período de 1995 a 2000 (é controversa a questão de se saber em
que medida esta circunstância decorre de uma escolha consciente e de claros objectivos
políticos; há quem considere que este é o resultado de um fraco acompanhamento e de
uma falta de objectivos políticos. O relevo dado à experimentação num baixo nível
institucional vai claramente no sentido de um cenário «ascendente»).
Quer o relatório do Guildford Educational Services como o do Tavistock Institute criticam
explicitamente a tendência para o desenvolvimento das metodologias de avaliação isoladas
dos respectivos contextos sócio-culturais. A conclusão do Guildford Educational Services
relativamente à dificuldade na identificação de um «tronco comum» de conteúdo aplicável
a todos os países é particularmente interessante. O facto de este problema ter surgido em
disciplinas gerais como a matemática e a física, descritas no balanço da Comissão de
elaboração do Livro Branco como «domínios objectivos» de conhecimento, sublinha a
dimensão deste desafio. No entanto, ambos os relatórios põem em relevo uma
interessante e promissora evolução tecnológica, de ritmo crescente. Além disso, a
experimentação a decorrer no âmbito dos programas Leonardo da Vinci e Sócrates
conduzirá, sem dúvida, a experiências vantajosas.
Os testes «isolados», tais como os que foram efectuados no âmbito do projecto ECDL ou
de outros projectos de «testes automáticos de avaliação», são um desafio para uma
reflexão sobre as futuras estratégias. O desenvolvimento de uma multiplicidade de
metodologias isoladas, relacionadas com tarefas e tecnologias muito circunscritas, proporá
uma solução melhor do que o desenvolvimento de metodologias gerais a nível nacional e
europeu? A capacidade de definir os limites do domínio sobre o qual incide o teste foi
considerada (Black, op. cit.) condição prévia à fiabilidade e à validade da avaliação.
Exemplos como o projecto ECDL ou outros dispositivos específicos de uma tarefa ou de
uma tecnologia, inspirados nesse princípio, poderão estimular uma abordagem
«ascendente» da identificação, da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não formal? A crescente actividade a nível dos sectores e das empresas joga,
certamente, a favor desse tipo de evolução, na medida em que dá um impulso à medição
129
Colecção CEDEFOP
das competências. No entanto, esse impulso está, em grande parte, fora do controlo dos
poderes públicos e, nomeadamente, fora do controlo do ensino e da formação formais.
Não seria de admirar se esta evolução conduzisse a um debate sobre o papel dos poderes
públicos nacionais (e europeus) em matéria de avaliação das competências. Ainda que as
vantagens de uma abordagem «ascendente» sejam potencialmente consideráveis,
convém não descurar um certo risco de «fragmentação». Será possível evitar essa
fragmentação na ausência de um mínimo de enquadramento relativamente quer às
próprias normas quer aos procedimentos a seguir em matéria de desenvolvimento e de
definição das normas (veja-se também a experiência realizada em França pelas câmaras de
comércio e indústria)?
Além disso, os dispositivos como o do projecto ECDL podem ser motivo de censura por
só funcionarem na «periferia» de uma enorme reserva de competências desenvolvidas
através da aprendizagem não formal e de só «medirem» os fragmentos de conhecimento
e de experiência facilmente acessíveis. Por isso, mantêm-se invisíveis algumas
competências fundamentais, relacionadas, por exemplo, com a comunicação, a
cooperação e a resolução de problemas.
4.3.>A abordagem Leonardo da Vinci em matéria de identificação,
avaliação e reconhecimento dos saberes adquiridos por via não
Formal
O desenvolvimento de metodologias e de sistemas que permitam avaliar os
conhecimentos adquiridos por via não formal não aparece mencionado explicitamente
nos 19 objectivos da decisão do Conselho (94/818/CE) que cria o programa Leonardo da
Vinci. Apesar disso, o apelo a propostas, que está claramente relacionado com as
prioridades na matéria definida pelo Livro Branco (e que mantém a mesma estrutura
durante o período de 1995 a 1999) reflecte bem esse campo de actividade. Como se lê no
apelo a propostas lançado em 1996 (JO nº S 42 de 29.2.1996, ponto 18):
«As propostas deveriam procurar melhorar as perspectivas de
emprego através da adaptação dos métodos e dos conteúdos da
formação profissional às mudanças na organização do trabalho, aos
desenvolvimentos tecnológicos, às transformações sociais [...]
favorecendo a aquisição e a transparência das qualificações
profissionais a fim de incluir as competências-chave; desenvolvendo
as metodologias de acreditação para validar as competências-
inofor
chave a formação inicial, a experiência profissional e a formação
informal; e analisando os meios de aproximação das disposições
formais e informais no contexto da formação ao longo da vida e do
acesso a esta [...].»
Esta formulação foi alvo de uma atenção considerável em toda a Europa e levou ao
lançamento de uma multiplicidade de projectos centrados nos desafios relacionados com a
identificação e a avaliação das competências. À excepção de dez projectos oficialmente
reunidos sob o nome de «testes de avaliação dos conhecimentos e das competências»,
houve poucas iniciativas que dessem uma visão geral dos projectos ou que estabelecessem
ligações uns com os outros. Em certa medida, esses projectos representam uma reserva
não explorada de conhecimentos e de experiências sobre aquelas questões. Embora os
resultados sejam conhecidos pelos parceiros de projecto, são, em geral, de difícil
apreensão no seu conjunto e, por isso, de difícil utilização. Para se ter uma ideia da
dimensão e do conteúdo da experimentação realizada nesse domínio, efectuou-se uma
investigação electrónica em todos os projectos Leonardo da Vinci lançados durante o
período de 1995 a 199727. Essa investigação, feita a partir das palavras-chave mais
vulgarmente utilizadas nesse domínio28, terminou com uma lista de 598 projectos. Depois
de um primeiro escrutínio categorial desses resultados, foram analisados 388 projectos29.
A observação dos perfis e dos objectivos de cada um permitir obter uma visão de conjunto
das iniciativas incidindo directamente e/ou essencialmente sobre a identificação, a avaliação
e o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. Essa observação permitiu
identificar um total de 118 projectos 36 lançados em 1995, 42 em 1996 e 41 em 1997 que se podem repartir em quatro categorias principais. Num primeiro grupo, foram
incluídos 29 projectos centrados no desenvolvimento, na testagem e na implementação
de metodologias destinadas a avaliar e a testar as qualificações e as competências. A maioria
desses projectos está ligada a sectores e a ramos específicos e procura desenvolver
metodologias no quadro de uma abordagem mais ampla de formação e de
27
Essa investigação, bem como o acompanhamento dos projectos por carta ou por telefone, foi orientada por Litza
Papadimitriou, de Junho a Setembro de 1999.
28
Foram utilizadas as seguintes expressões e palavras-chave: avaliação, validação, acreditação, teste,
aquisição/aprendizagem informal e não formal, conhecimentos adquiridos por via experiencial, aprendizagem pelo
trabalho, avaliação profissional e experiência profissional. O largo campo da investigação reflecte a ausência de clara
abordagem conceptual neste domínio, e esta situação torna-se ainda mais complexa dada a diversidade de línguas
utilizadas no programa. Para uma análise mais pormenorizada do problema, cf. o glossário em anexo.
29
Foram eliminados da amostragem inicial 210 projectos incluídos na vertente «colocações e intercâmbios», o que
reduz o número dos projectos para 388.
131
Colecção CEDEFOP
desenvolvimento das competências. Os 24 projectos compreendidos no segundo grupo
pretendem desenvolver e implementar novos sistemas de aprendizagem e de formação.
Na maioria dos casos, foram incluídas metodologias de avaliação para medição das
competências existentes num determinado domínio profissional e introdução de
mecanismos de feedback nos processos de formação em fase de planificação e de
desenvolvimento. Os 14 projectos que fazem parte do terceiro grupo estão
explicitamente centrados nos módulos de formação e têm como objectivo o
desenvolvimento de diversos instrumentos de avaliação visando a introdução de módulos
a nível europeu. Um quarto grupo, que compreende 15 projectos, centra as suas
actividades nas normas de qualificações e competências, procurando desenvolver e
introduzir pontos de referência adequados à avaliação e à certificação em domínios
específicos. A maioria desses projectos põe em relevo a necessidade de se estabelecerem
normas europeias ou internacionais de qualificações ou de competências, o que reflecte
um interesse crescente pelas qualificações e pelas competências transferíveis a nível
transnacional. Para além dos projectos recenseados nestes quatro grupos principais,
verificou-se ainda a existência de um certo número que combina, de diversas maneiras,
dois ou mais dos aspectos referidos.
Para que se ficasse com uma ideia mais exacta dos resultados dos 118 projectos
inicialmente recenseados, estes foram sujeitos a uma análise com o intuito de identificar os
«projectos centrais» que se prestam a um acompanhamento mais aprofundado. A atenção
incidiu não apenas sobre as actividades centradas nos quatro temas principais acima
mencionados, mas também sobre o aspecto utilizador e/ou cliente: a quem devem servir
os instrumentos, os sistemas, as normas e os módulos em causa? Pediu-se aos
responsáveis de projecto que elaborassem um relatório e que reflectissem directamente
sobre os resultados das respectivas actividades, bem como sobre as questões de
implementação e de difusão.
Dos resultados dos projectos, depressa emergiram diferenças consideráveis, devido, em
parte, ao facto de nem todas as actividades de projectos terem terminado (os projectos
que tinham arrancado entre 1995 e 1997), bem como ao grau variável de qualidade e de
sucesso dessas mesmas actividades30. A cooperação entre parceiros de projecto revelouse, por vezes, mais difícil do que era previsto e, em diversos casos, foi necessário substituir
parceiros inactivos. Além disso, vários responsáveis de projecto fizeram notar que as
30Em quatro dos projectos seleccionados para um estudo mais aprofundado, foi impossível contactar qualquer um dos
parceiros, apesar dos esforços repetidos e sistemáticos desenvolvidos nesse sentido, durante um período de quatro
meses.
inofor
diferenças entre os diferentes sistemas nacionais de formação e de certificação constituem
um problema de peso. Nos projectos que utilizam como ponto de partida uma
metodologia ou um sistema nacional (o sistema britânico das NVQ é um exemplo
característico de «ponto de partida» desse tipo), foi, por vezes, difícil chegar a soluções
transnacionais. Apesar desses problemas, foi elaborado e apresentado, no âmbito desses
projectos, um número impressionante de soluções. Na maior parte das vezes, o
problema que se coloca é o da difusão dos resultados. Mesmo nos casos em que se
desenvolvem soluções promissoras, a passagem de uma experimentação limitada a uma
implementação permanente revela-se problemática. Pode observar-se, nomeadamente
nos projectos centrados a nível do sector ou do ramo, uma tendência para se «saltar» de
um programa para outro e para se «ajustarem» os objectivos em função do novo contexto
de financiamento. Alguns projectos arrancaram no quadro do programa Comett,
prosseguiram no quadro do programa Adapt e depois no quadro do programa Leonardo
da Vinci. Em certos casos, ainda se encara a possibilidade de continuar as actividades no
quadro da segunda fase do programa Leonardo da Vinci. Embora essas estratégias se
revelem muito úteis para apoiar as actividades de desenvolvimento a longo prazo, não
resolvem o problema fundamental da implementação.
A maioria dos «projectos centrais» foram definidos em função das necessidades dos
sectores ou dos ramos, como o demonstram as seguintes actividades:
a) desenvolvimento de metodologias para avaliar as qualificações na indústria alimentar
(GR1258);
b) validação das aquisições profissionais nos sectores do comércio de retalho e da
distribuição (F467);
c) estudo dos processos de validação das aquisições no ramo «comércio e reparação
automóvel» (F526);
d) desenvolvimento de metodologias de acreditação das competências em tecnologias da
informação (GR281729);
e) desenvolvimento de uma carteira de competências para o sector da hotelaria, inspirado
no modelo europeu de carteira pessoal de competências;
f) desenvolvimento de metodologias para a identificação das competências no sector da
manutenção, a fim de serem integradas nos contextos nacionais e no contexto europeu
(IRL2086).
Os projectos foram definidos não apenas em função das necessidades de sectores
específicos, mas também, na maior parte dos casos, pelos principais intervenientes dos
sectores envolvidos: empresas, representantes dos parceiros sociais, organismos de
133
Colecção CEDEFOP
formação especializados, etc. Em certos casos, as actividades foram iniciadas pelos
sectores e pelos ramos sem qualquer financiamento público, nem nacional nem
comunitário. Regra geral, como veremos na última parte deste relatório, a introdução de
dispositivos de financiamento parece motivar as actividades.
As actividades desenvolvidas no quadro do segundo grupo de projectos têm um âmbito
mais geral e não se centram em sectores, em ramos ou em tecnologias específicas. A maior
parte dessas actividades incide sobre o desenvolvimento de metodologias, como o
demonstram os exemplos seguintes:
a) análise dos instrumentos de avaliação existentes nas empresas (L3905);
b) desenvolvimento de instrumentos de avaliação para as empresas (projecto «Pave»,
UK3890);
c) desenvolvimento de sistemas de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos
por via experiencial (F3914);
d) perspectiva de conjunto dos instrumentos de avaliação assistida por computador no
local de trabalho (UK1188);
e) desenvolvimento de um «passaporte europeu das competências profissionais»,
inspirado, em parte, no modelo europeu de carteira pessoal de competências (IT4883);
f) desenvolvimento de um portefólio de competências (projecto «Eurofolio», F303).
A quase totalidade dos projectos tem como objectivo o desenvolvimento das
metodologias e dos instrumentos de avaliação interna das empresas. Também se
caracteriza por privilegiar uma abordagem claramente formativa, na qual as metodologias
são encaradas como um meio de informação e de feedback em matéria de recursos
humanos e de desenvolvimento de competências. Esse feedback é considerado
necessário para um desenvolvimento bem sucedido dos recursos humanos e/ou para o
controlo da qualidade. Alguns projectos, como o «projecto de manutenção» irlandês,
combinam as abordagens formativa e somativa e utilizam a avaliação como meio de
integração das competências específicas nos quadros nacionais de qualificações.
Utilizaremos o exemplo de dois projectos para ilustrar a riqueza e a variedade dos
resultados atingidos por esta vertente do programa Leonardo da Vinci.
O projecto britânico «Promover o valor acrescentado através da avaliação» (ou «Pave»,
UK3890) tem como objectivo dar conselhos práticos e sistemáticos às empresas
interessadas em utilizar metodologias de avaliação a fim de melhorar, a nível interno, a
formação e o desenvolvimento das competências. Esses conselhos (apresentados sob a
forma de um «programa de recursos» e de um manual) foram elaborados a partir de uma
investigação extensiva que procurava determinar o modo como os empregadores tinham
inofor
abordado a questão referida, até essa altura, e identificar as respectivas preferências sobre
a matéria. Com base num estudo efectuado nos cinco países participantes no projecto,
foram recolhidas 1 645 respostas de empregadores. Além disso, foram efectuadas 125
entrevistas telefónicas e fez-se um estudo aprofundado a 20 empresas. Os dados
recolhidos permitiram elaborar listas de controlo (Universidade de Plymouth, 1998) a ser
utilizadas nas empresas. Essas listas abrangem quatro fases de formação e de
desenvolvimento das competências, que vão desde a preparação inicial à reflexão final
sobre o resultado das actividades. As listas fornecem recomendações simples mas precisas
sobre os aspectos a pôr em relevo e as perguntas a colocar. O projecto «Pave», se bem
que inicialmente centrado sobre a avaliação dos esforços explícitos de formação, mantém
a sua pertinência num contexto mais alargado. Graças à sua sólida base empírica e à
simplicidade das suas recomendações, este projecto merece uma análise mais
aprofundada. É interessante verificar que uma esmagadora maioria dos empregadores
europeus inquiridos (95%) sublinha a necessidade de melhores instrumentos de medição
e de avaliação. Também é interessante notar, a partir dos vinte «estudos de caso», que as
empresas já desenvolveram numerosos dispositivos internos de avaliação, o que reflecte a
importância que atribuem a esta questão nas suas actividades correntes.
O segundo projecto que interessa mencionar neste contexto («Avaliação assistida por
computador no local de trabalho». UK1188), também originário do Reino Unido, procura
fomentar a utilização de instrumentos informatizados de testagem e de avaliação no local
de trabalho. Para atingir este objectivo geral, foi desenvolvido um certo número de
produtos, nomeadamente um guia de avaliação para as empresas, diversos suportes de
ensino à distância e um «banco de itens», que compreende questões de avaliação
incidindo sobre um determinado número de domínios e de sectores. Neste aspecto, esta
iniciativa pode comparar-se ao projecto «Pave», acima mencionado, pois ambos se
propõem fornecer às empresas conselhos práticos em matéria de avaliação. Um outro
aspecto interessante no presente contexto é a produção de um CD-Rom com mais de
250 testes e avaliações assistidos por computador, elaborados, na sua maioria, no Reino
Unido, na Alemanha, em França, em Espanha e em Itália. Trata-se, provavelmente, da mais
completa apresentação de instrumentos de avaliação «electrónica» jamais realizada na
Europa. Cada teste vem acompanhado de informações sobre o autor, o preço, o material
e os programas necessários, o tipo de teste e o principal ou os principais utilizadores, bem
como uma descrição pormenorizada do respectivo alcance e potencial. A partir desses
diferentes aspectos, podem efectuar-se diversas pesquisas. Duas secções do CD-Rom
fazem um inventário dos produtos particularmente pertinentes em matéria de
conhecimentos adquiridos por via não formal. Foram inventariados, no total, 26 produtos
incluídos na rubrica «Acreditação dos conhecimentos adquiridos»; muitos desses produtos
135
Colecção CEDEFOP
encontram-se estreitamente relacionados com o sistema britânico das NVQ e incidem
sobre numerosas disciplinas (a empresa IBM e o National Extension College são
responsáveis pelo desenvolvimento de 17 dos 26 testes propostos). Apenas um produto
foi desenvolvido por um organismo não britânico (um produto espanhol centrado sobre as
necessidades das empresas, no sentido de apoiar a criação de processos de formação e a
avaliação geral das competências). Na rubrica «Testes e avaliações informatizadas de
conhecimentos e de competências», foram inventariados, no total, 96 produtos. A maioria
dos projectos de «testes automáticos de avaliação» já referidos está incluída nesta
categoria. Para além destes, existem ainda numerosos produtos que incidem sobre
matérias específicas ou estão estreitamente relacionados com domínios ou matérias
(formais) específicas. Há ainda outros testes que incidem sobre as competências de base,
as competências-chave, etc. Uma empresa britânica desenvolveu um «programa de
medição das competências-chave», que é apresentado como um simples sistema de
avaliação das competências-chave individuais. Um banco de 400 perguntas permite, em
princípio, avaliar «todas as competências-chave acreditadas (organizadas em várias
categorias: comunicação, matemática, informática, trabalho em equipa e aperfeiçoamento
da própria aprendizagem). Em função das respostas a «perguntas directas», os candidatos
são colocados no «nível adequado» do sistema britânico das NVQ.
Este teste específico convida a uma reflexão sobre a avaliação de alguns aspectos das
competências, tais como a capacidade de «comunicação» e de «cooperação». Como já foi
referido no capítulo 2, a avaliação informatizada das capacidades de comunicação e de
cooperação facilmente coloca um problema de autenticidade e, por isso, de validade dos
resultados. Apesar da sua utilidade potencial, um instrumento informatizado não consegue
reproduzir com fidelidade um verdadeiro contexto de comunicação e de cooperação.
O número e a variedade dos produtos apresentados neste CD-Rom reflectem o seu
potencial comercial. Este aspecto é uma das características da situação nos Estados Unidos,
onde os testes de avaliação mereceram um considerável interesse comercial (gerando
também lucros consideráveis) durante os últimos dez anos. No entanto, como já foi
referido anteriormente, subsistem grandes diferenças entre a Europa e os Estados Unidos,
pois nestes últimos, o papel da avaliação e dos testes comerciais está muito mais bem
estabelecido e é muito mais importante. A maioria dos testes europeus apresentados no
CD-Rom desempenha um papel limitado, sem relação directa com processos formais
(somativos) de certificação. Na melhor das hipóteses, serve como instrumento de apoio a
uma preparação individual com vista à certificação formal e, como já foi dito, a maior parte
dos testes destina-se à avaliação formativa interna na empresa. Em compensação, os testes
elaborados nos Estados Unidos encontram-se muito mais estreitamente relacionados
com os processos de certificação em vigor a nível nacional, regional, sectorial ou
inofor
profissional (a título de exemplo, as metodologias utilizadas para testar os conhecimentos e
as competências dos enfermeiros foram desenvolvidos e são geridos por um dos principais
organismos privados de avaliação do país. Trata-se de um modelo praticamente
desconhecido numa Europa onde dominam os sistemas de avaliação e de certificação
controlados pelo sector público).
Voltando ao programa Leonardo da Vinci, a sua característica mais evidente consiste na
ausência de ligação entre os diferentes projectos. Salvo raras excepções, em todos os
casos que examinámos, dedicou-se muita energia e muito esforço à experimentação, o
que, frequentemente, deu origem a resultados interessantes e, em parte, inovadores, mas
os participantes desconhecem a existência de projectos paralelos ou afins. Aparte o quadro
dos «testes automáticos de avaliação» e uma reunião efectuada em Bruxelas, em
Novembro de 1996 (onde estavam presentes alguns dos responsáveis pelos projectos
lançados em 1995), nada foi feito a nível europeu para aproximar os projectos afins. Em
1999/2000, foram tomadas algumas iniciativas a nível nacional para se proceder a uma
síntese dos resultados dos projectos. No entanto, as actividades realizadas no âmbito
dessas iniciativas estavam, antes de mais, centradas nos projectos de cada um dos países e,
devido a essa abordagem nacional, não foi possível explorar o conjunto das
potencialidades apresentadas pelos 118 projectos identificados pela nossa pesquisa
electrónica (aos quais é preciso acrescentar os projectos lançados a partir de 1998). O
programa Leonardo da Vinci serve para ilustrar quer os pontos fortes quer os pontos fracos
intrínsecos à fórmula «projectos». Estes podem revelar-se úteis na criação de novas
associações de parceiros (e de ideias), na quebra das formas estabelecidas de actividades e
na identificação dos problemas e dos desafios específicos. Além disso, um programa com a
dimensão do Leonardo da Vinci permite uma forma única e extensiva de experimentação.
No entanto, a fragilidade dos «métodos de trabalho baseados nos projectos» revela-se
quando estes últimos entram na fase final, isto é, quando os resultados são apresentados e
os parceiros regressam às suas actividades habituais e permanentes. Do inquérito sucinto
que realizámos, vê-se claramente que muitos dos resultados dos projectos Leonardo da
Vinci dedicados à avaliação não serão difundidos junto dos parceiros interessados que não
participaram nos projectos propriamente ditos, e que esses mesmos resultados não serão
implementados sob a forma de soluções permanentes, públicas ou privadas. Em certos
casos, mas não em todos, a justificação reside na incapacidade de realização dos objectivos
previstos. Foi dada uma grande prioridade às fases iniciais do programa e dos projectos e
menor às fases finais, à utilização dos projectos e dos resultados do programa.
Os projectos apresentados neste capítulo parecem ter como ideia-mestra a avaliação
formativa a nível das empresas e das organizações. Embora seja incontestável que o
programa Leonardo da Vinci pode dar, a este nível, um importante contributo para o
137
Colecção CEDEFOP
desenvolvimento de instrumentos e de meios, a verdade é que, para isso, é necessário
que se reforcem as relações (a sinergia) entre os diferentes projectos e que haja uma mais
eficaz difusão e utilização dos resultados.
4.4>Um novo compromisso prático e político?
O Conselho da União Europeia, reunido em Março de 2000 (Cimeira de Lisboa), decidiu
introduzir dois novos instrumentos a nível europeu, ambos relacionados com a
identificação, a avaliação e o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal.
Em primeiro lugar, o Conselho decidiu criar um «diploma europeu para as competências
de base em tecnologias da informação», inspirado na experiência da carta europeia de
condução em informática (CCIE)31. Esse diploma, que será baseado nos «procedimentos
de certificação descentralizada», tem como objectivo «promover a cultura digital em toda a
União» (Conclusões da Presidência, ponto 26, alínea 4). Em segundo lugar, num sentido
um pouco diferente, foi decidido desenvolver um modelo comum europeu de curriculum
vitae, que será utilizado voluntariamente para facilitar a mobilidade, «ajudando os
estabelecimentos de ensino e de formação e os empregadores a avaliarem melhor os
conhecimentos adquiridos» (ponto 26, alínea 6).
Se esta decisão for efectivamente implementada, será o primeiro compromisso destinado
a assegurar que certos elementos do Livro Branco tenham um seguimento permanente e
pan-europeu. No entanto, o âmbito e o objectivo desta iniciativa são mais restritos que os
da abordagem inicialmente adoptada para a carteira pessoal de competências. Esta
iniciativa foi apresentada pela primeira vez no documento Estratégias para o emprego na
sociedade da informação (Comissão Europeia, 2000), no qual se afirma que «todos os
trabalhadores deverão adquirir novas qualificações em matéria de sociedade da
informação para assumirem o seu papel no local de trabalho». Essas qualificações referemse não apenas às operações técnicas, mas também aos conhecimentos profissionais, às
capacidades sociais e organizacionais, bem como às competências cognitivas e
estratégicas. No entanto, sublinha-se que, para a promoção e o desenvolvimento dessas
novas qualificações, impõe-se o desenvolvimento de modalidades de certificação
normalizadas e reconhecidas. Dado que o «domínio da sociedade da informação» se
adquire, em grande parte, fora do ensino e da formação formais, no local de trabalho ou
durante os tempos livres, é necessário criar uma avaliação gradual e sistemática. Esta
31
Projecto ECDL, cf. capítulo 4.2 (NdT).
inofor
conclusão geral é acompanhada por duas recomendações: no final de 2002, será
assegurado que todos os formadores possuirão competências verificáveis em matéria de
sociedade da informação e, no final de 2003, a todo o trabalhador será dada a possibilidade
de adquirir o domínio da sociedade da informação. Embora estas recomendações
traduzam um empenhamento mais profundo da parte da UE, infelizmente não trazem
soluções práticas quanto à forma como este desafio será ganho até ao fim de 2002 (para os
formadores) e até ao fim de 2003 (para os trabalhadores). O papel da CCIE, como sistema
simultaneamente pouco oneroso e de elevada capacidade, será fundamental. Mantém-se
em aberto a questão de se saber se a CCIE será capaz de dar conta das capacidades sociais
e organizacionais e das competências cognitivas e estratégicas mencionadas no
documento da Comissão. A inclusão destes aspectos num novo diploma europeu exigirá
numerosas alterações na abordagem CCIE, o que põe em relevo os problemas
relacionados não apenas com o estabelecimento de pontos de referência adequados, mas
também com a validade e a fiabilidade. Quaisquer que sejam as soluções práticas
escolhidas, a implementação em larga escala do diploma de competências em tecnologias
da informação proporcionar-nos-á importantes experiências em matéria de avaliação e de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. A tensão implícita entre os
objectivos somativos (certificação) e os objectivos formativos (aprendizagem) está
claramente presente nesta iniciativa. Por outras palavras, em que medida o investimento
em recursos para os testes e a avaliação permitirá aumentar as competências e em que
direcção deverão as competências ser desenvolvidas? O ensino e a formação serão
inevitavelmente afectados pela introdução de procedimentos de avaliação a uma tão
grande escala. Por isso, não se trata de um instrumento neutro, mas antes de um
«programa de estudos disfarçado», que contribuirá para determinar o que deve ser
considerado mais importante e menos importante no domínio das tecnologias da
informação.
A proposta de lançamento de um modelo comum europeu de curriculum vitae é
apresentado como sendo capaz de «favorecer a mobilidade». Como tem vindo a ser
repetido ao longo das últimas décadas, é indispensável facilitar e garantir a visibilidade
(transparência) das qualificações e das competências de forma a permitir que as pessoas se
instalem e trabalhem noutro Estado-Membro. Normalmente, um curriculum vitae
(europeu ou outro) é um instrumento destinado a apresentar, de maneira tão clara quanto
possível, as qualificações e a experiência de um dado indivíduo. A decisão tomada pelo
Conselho parece ir mais além ao indicar que um curriculum vitae deve também contribuir
para a avaliação dos conhecimentos já adquiridos, tanto no ensino e na formação como no
trabalho. Mas o modo como esse objectivo será realizado e os procedimentos a
implementar para apoiar essa função não estão clarificados.
139
Colecção CEDEFOP
As conclusões da Cimeira de Lisboa poderiam dar um novo impulso à avaliação e ao
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. No entanto, as modalidades
práticas para a sua efectivação não se tornaram óbvias nem nos documentos preparatórios
nem nas próprias decisões. Quaisquer que sejam as abordagens adoptadas num futuro
próximo, essas decisões irão permitir, a nível europeu, a clarificação dos objectivos, a
análise das tensões implícitas intrínsecas a essas propostas e a procura do maior equilíbrio
possível entre uma elevada qualidade, uma elevada capacidade e um baixo custo.
4.5>Uma abordagem comunitária da identificação, da avaliação
E do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal?
Independentemente das «ocasiões falhadas» na utilização dos resultados dos projectos
Leonardo da Vinci (à excepção, novamente, dos projectos de «testes automáticos de
avaliação»), as iniciativas realizadas a nível comunitário contribuíram claramente para que o
público e os responsáveis políticos tomassem consciência da importância desta questão. O
Livro Branco permitiu que a questão fosse definida com nitidez e, assim, que o processo
fosse apoiado a nível nacional e sectorial. Os programas comunitários, nomeadamente
Leonardo da Vinci e Adapt, impulsionaram e financiaram actividades de experimentação
sem precedentes. Embora a UE não intervenha directamente nos esforços para o
desenvolvimento dos sistemas nacionais, a influência do nível comunitário é evidente. Isto
não significa que a estratégia específica do Livro Branco, centrada nas normas europeias e
no modelo europeu de carteira pessoal de competências, tenha sido implementada. Uma
das razões fundamentais para esta não implementação reside na heterogeneidade dos
objectivos definidos na concepção original da tarefa. Por um lado, a carteira pessoal de
competências foi apresentada como uma abordagem somativa, destinada a introduzir uma
prova nova e mais flexível das qualificações e das competências. Por outro, esta iniciativa
propunha-se desenvolver novas metodologias de avaliação, invocando a necessidade de
identificar e de utilizar uma base mais ampla de competências; por outras palavras, tratavase de um objectivo formativo essencialmente destinado a apoiar os processos cognitivos.
Das actividades de experimentação realizadas no âmbito do programa Leonardo da Vinci,
verifica-se que o primeiro objectivo só alcançou um desenvolvimento e um
prosseguimento limitados. Regra geral, quando é detectado um elemento somativo, este
faz claramente referência aos sistemas nacionais de qualificações existentes ou incide sobre
um dado sector ou uma profissão restrita. Quanto ao aspecto formativo, este tornou-se
num problema importante, não por causa do estabelecimento de sistemas supranacionais
extensivos, mas devido à elaboração de instrumentos práticos adaptados aos diferentes
inofor
empregadores e/ou trabalhadores. Observamos, assim, uma certa divisão das tarefas: as
iniciativas nacionais, apresentadas no capítulo 3, incidem, essencialmente, sobre os
aspectos somativos, ou seja, sobre a questão das provas; em compensação, as iniciativas
comunitárias, apresentadas neste capítulo, incidem essencialmente sobre os aspectos
formativos, isto é, sobre as questões de feedback de apoio aos processos cognitivos. Esta
partilha das tarefas deve-se mais ao carácter «ascendente» dos programas do que a
decisões políticas tomadas conscientemente a nível da UE ou dos Estados-Membros.
Dado que as iniciativas emanam de uma multiplicidade de intervenientes, as questões e as
metodologias têm sido abordadas a um nível institucional «fraco», no qual dominam as
preocupações e os aspectos formativos. Por outras palavras, a actividade dos projectos
reflecte as prioridades das empresas e dos sectores e não as dos ministérios ou da
Comissão.
Esta partilha das tarefas poderia ser posta em causa pela decisão tomada na Cimeira de
Lisboa, no sentido de se criar um diploma europeu para as competências em tecnologias
da informação. Embora os principais argumentos apresentados incidam sobre o aspecto
formativo, isto é, sobre o desenvolvimento de competências em tecnologias da
informação, o referido diploma parece, de facto, desempenhar uma função mais somativa.
Não há dúvida de que se assiste a uma evolução interessante, na medida em que é a
primeira vez que um diploma de iniciativa comunitária é introduzido em grande escala.
Talvez seja também o primeiro sinal de uma contestação relativamente ao forte controlo
nacional em matéria de certificação.
5>Juntar o puzzle: intervenientes,
objectivos e soluções
143
Colecção CEDEFOP
A APRESENTAÇÃO DAS INICIATIVAS a nível nacional e europeu mostra-nos um quadro
um pouco confuso do «estado da arte» no domínio da avaliação e do reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal. Embora actualmente se preste muita atenção a
estas questões, tanto a nível político como a nível prático, não é imediatamente perceptível
a orientação tomada. Efectivamente, o número de intervenientes aumenta de dia para dia
e as respectivas actividades são muito heterogéneas, quer a nível dos objectivos quer a
nível das soluções. No entanto, a situação nada tem de surpreendente. Da análise
efectuada nos capítulos anteriores, verifica-se que nenhuma solução pode (e, de facto,
nem deve) dar resposta, simultaneamente, a todos os objectivos e a todas as necessidades.
Além disso, é evidente que o êxito depende de uma compreensão exacta dos objectivos a
alcançar, bem como da capacidade de adaptação das soluções metodológicas e
institucionais a esses mesmos objectivos. Neste capítulo, procuraremos apresentar uma
interpretação mais sistemática da diversidade dos intervenientes, dos objectivos e das
soluções que observámos até aqui. Sem pretendermos simplificar em demasia,
esperamos que esta interpretação contribua para destacar algumas realizações e alguns
dos mais importantes desafios. A estratégia analítica é simples e directa; as perguntas
colocadas são as seguintes:
a) quem são os principais intervenientes nos diferentes níveis; que instituições e que
organizações desempenham um papel activo?
b) a que (principais) objectivos dão resposta as actividades desses intervenientes?
c) que soluções propõem esses intervenientes?
Esperamos que a identificação dos intervenientes envolvidos, das razões pelas quais se
encontram envolvidos e das respectivas actividades contribua para estabelecer relações
entre as questões metodológicas e institucionais e políticas. A nossa análise incidirá sobre
quatro níveis institucionais e organizacionais:
a) o nível europeu,
b) o nível nacional,
c) o nível dos sectores e ramos,
d) o nível das empresas.
inofor
5.1.>Intervenientes, objectivos e soluções a nível europeu
Já foi sublinhada a importância do papel desempenhado pela Comissão Europeia na
promoção da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal.
Tanto o Livro Branco como o programa Leonardo da Vinci tiveram influência na evolução
da política e da prática. No entanto, a Comissão Europeia está longe de ser um órgão
homogéneo animado por um objectivo único neste domínio. Convém estabelecer uma
distinção essencial entre as Direcções-Gerais de «Educação e Cultura» (ex-DG 22) e de
«Emprego» (ex-DG 5).
O plano de acção da DG de «Educação e Cultura» transparece claramente nas propostas
do Livro Branco, nas quais a questão da avaliação e do reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal está associada a diversos objectivos (educação e formação ao
longo da vida, mobilidade, emprego, integração social e mudanças tecnológicas e
organizacionais). Embora esses objectivos sejam facilmente criticáveis por serem
demasiadamente extensos e vagos, reflectem, no entanto, uma apreciação legítima das
múltiplas responsabilidades que devem assumir as políticas de educação, de formação e de
aprendizagem. Os objectivos de cidadania e de integração social são tão importantes
como os objectivo de emprego e de crescimento económico. Este vasto plano de acção
encontra-se reflectido no programa Leonardo da Vinci, que depende também desta
direcção-geral. Os projectos Leonardo da Vinci desenvolveram uma experimentação sem
precedentes e, durante os últimos quatro ou cinco anos, as suas actividades centraram-se
na maioria dos objectivos que tinham definido. No entanto, como já foi mencionado
anteriormente (cf. capítulo 4.2), só uma pequena parte dessa experimentação teve
seguimento: os projectos de «testes automáticos de avaliação». Embora úteis em vários
aspectos, estes projectos não foram capazes de dar respostas adequadas no quadro do
plano de acção da Direcção-Geral de «Educação e Cultura». As metodologias destes
projectos, muito limitadas e fechadas, quase exclusivamente centradas nos testes de
respostas pré-definidas e nos testes de escolha múltipla assistidos por computador,
dificilmente conseguiram dar resposta aos objectivos gerais, que consistem no
estabelecimento de relações entre o ensino e o trabalho e na promoção das competências
adquiridas pela experiência.
O empenhamento da Direcção-Geral do «Emprego» em relação à identificação, à
avaliação e ao reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal tem sido menos
visível que o da Direcção-Geral de «Educação e Cultura». Contudo, este departamento
da Comissão, responsável pelo programa Adapt, tem apoiado a actividade experimental,
embora de forma menos extensiva do que o apoio concedido ao programa Leonardo da
145
Colecção CEDEFOP
Vinci. Só recentemente, graças, nomeadamente, à publicação do documento Estratégias
para o emprego na sociedade da informação (Comissão Europeia, 2000), foram
introduzidos, enquanto elementos integrantes e explícitos das políticas gerais do emprego,
metodologias e sistemas de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal. O
diploma de competências em tecnologias da informação (cf. capítulo 4.4), proposto nesse
documento, destina-se a servir de «prova» em relação às pessoas que quiserem melhorar
as respectivas situações no mercado de trabalho. Centradas neste objectivo somativo
menos ambicioso, as metodologias da nova certificação em tecnologias da informação
(provavelmente inspiradas nas experiências do PCIE) parecem destinadas a ter mais
sucesso.
É interessante o recente empenhamento do Conselho da UE neste domínio. Como já foi
referido, é a primeira vez que a UE decide unanimemente empenhar-se no sentido de um
«diploma» europeu comum. Este facto talvez revele um equilíbrio um pouco diferente
entre a Comissão e o Conselho em matéria de educação e de competências. Também
pode ser um indicador de que as questões relacionadas com as competências passaram a
ser parte integrante das políticas gerais do emprego.
Até à data, as organizações de parceiros sociais a nível europeu não tomaram iniciativas de
relevo. Algumas das opiniões comuns formuladas pelas principais organizações de
empregadores e de sindicatos (UNICE e CES) ressaltaram a importância do
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal, mas, até agora, não foi
apresentada qualquer iniciativa que permita avançar nesse sentido.
5.2>Intervenientes, objectivos e soluções a nível nacional
Na maior parte dos países, observamos uma partilha das tarefas entre as autoridades
responsáveis pelas questões ligadas à educação e as autoridades responsáveis pelas
questões do emprego. Quando estes dois domínios dependem de ministérios diferentes,
observa-se uma tendência para o desenvolvimento de metodologias e de sistemas
distintos de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos por via
não formal. Essa distinção reflecte as diferentes tarefas assumidas e, em muitos aspectos,
reproduz o mesmo esquema que existe entre as Direcções-Gerais de «Educação e
Cultura» e de «Emprego».
O principal objectivo prosseguido pelas autoridades educativas nacionais (ministérios e
organismos de certificação) consiste numa «reconfiguração» dos sistemas de ensino e de
formação formais. Em resposta às críticas de falta de abertura e de auto-referenciação
inofor
dirigidas ao ensino e à formação formais, as políticas acabam por se centrar em objectivos
secundários tais como a flexibilidade (para aceitar percursos alternativos de
aprendizagem), a abertura (a grupos mais amplos de estudantes) e a sensibilidade de
reacção (às necessidades do mundo do trabalho). A avaliação e o reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal constituem elementos intrinsecamente ligados a
todos esses esforços de reconfiguração. Em contraste com a situação a nível europeu,
onde se observa um desfasamento considerável entre os objectivos oficiais e as soluções
propostas, as abordagens a nível nacional parecem estar, regra geral, mais bem adaptadas
para executar com sucesso as tarefas com que são confrontadas. Na maioria dos casos, as
metodologias elaboradas a nível nacional tendem a combinar as avaliações de
desempenho baseadas no diálogo com as fórmulas baseadas no portefólio de
competências. Se analisarmos as alternativas metodológicas apresentadas no capítulo 2.2,
verificaremos que essas abordagens são, sem dúvida, as de mais complexa implementação
e gestão, mas também as que dão maiores garantias de validade dos resultados. Convém
notar, além disso, que a maior parte das metodologias e dos sistemas nacionais tem uma
função somativa. Preconiza-se o reconhecimento dos conhecimentos anteriores e
informais para tornar mais flexível o acesso ao ensino e à formação formais e, sem dúvida,
para melhorar a situação dos indivíduos no mercado de trabalho.
Até agora, as autoridades nacionais responsáveis pelo trabalho e pelo emprego,
exceptuando o caso notável da França, mostraram-se pouco activas. A experiência
francesa do balanço de competências e os debates a decorrer em vários países talvez
façam com que, nos próximos anos, aumente a atenção dedicada ao papel formativo das
metodologias de avaliação. A identificação e a avaliação dos conhecimentos adquiridos
anteriormente e por via não formal talvez sejam o primeiro passo no processo de
reconversão dos indivíduos, na medida em que indicam o local e as modalidades da
formação susceptível de reforçar as perspectivas de emprego de cada um. Essas
metodologias podem, pois, considerar-se elemento integrante das práticas de orientação
profissional. Se os intervenientes envolvidos a nível nacional formulassem esse aspecto
enquanto objectivo explícito, as metodologias poderiam ser concebidas de modo a pôr
em relevo a identificação (e não e reconhecimento) e o feedback (mais do que a
apreciação formal).
O grau de integração dos parceiros sociais no processo de estabelecimento das
metodologias e dos sistemas a nível nacional é variável. Os princípios organizacionais
aplicados à orientação de numerosos sistemas nacionais de ensino e formação profissional
traduzem-se, em geral, por uma participação dos parceiros sociais no estabelecimento de
normas de qualificações. Também não são raros os casos em que os parceiros sociais
147
Colecção CEDEFOP
participam directamente na própria avaliação, estão representados nos júris de exame,
etc. No entanto, poucos são os países em que os parceiros sociais tenham desempenhado
um papel decisivo a nível da iniciativa ou da elaboração das metodologias ou dos sistemas.
O que é surpreendente é que as consequências do reconhecimento dos saberes
adquiridos por via não formal raramente foram examinadas a nível das relações de trabalho
(salários, distribuição dos postos de trabalho). Esta circunstância talvez se deva ao carácter
«embrionário» dos sistemas existentes, que torna difícil uma visão de conjunto das
consequências.
5.3>Intervenientes, objectivos e soluções a nível dos sectores e ramos
Tanto quanto é possível confirmar, a maioria dos esforços para desenvolver metodologias
e sistemas de avaliação dos conhecimentos adquiridos por via não formal a nível dos
sectores e/ou ramos foi lançada e financiada no âmbito de programas com apoio
comunitário32. Foram poucas as iniciativas identificadas que se limitavam a um único
contexto nacional; a maior parte foi tomada a nível internacional e europeu. A experiência
realizada pelas câmaras de comércio e de indústria constitui uma excepção, mas,
efectivamente, tratava-se, de início, de um projecto Leonardo da Vinci lançado em
colaboração com outros parceiros europeus. Esta circunstância reflecte duas realidades:
em primeiro lugar, os programas europeus abriram possibilidades de cooperação que
antes não existiam e, em segundo lugar, e talvez mais importante, o desenvolvimento de
novas competências tende a ignorar as fronteiras nacionais (e as autoridades educativas
nacionais). A emergência de «competências internacionais» (muitas vezes adquiridas
através da aprendizagem não formal) sublinha a necessidade de outras formas de avaliação
e de reconhecimento para além das que são definidas e fornecidas pelos tradicionais
sistemas nacionais de certificação. Até à data, a esse nível, poucas soluções (permanentes)
foram implementadas. Na maior parte dos casos, observa-se uma certa actividade de
experimentação relacionada com a definição de normas transnacionais e com o
desenvolvimento de metodologias de testagem. Os objectivos são, muitas vezes,
formulados de um modo amplo, o que indica a necessidade de se promover a integração
das competências técnicas e sociais. Em muitos aspectos, a escolha das metodologias de
32Durante o período Primavera-Verão de 1999, foi efectuado um estudo sucinto junto de uma centena de organizações
sectoriais e de ramo, a nível europeu, a quem foi pedido que desse informações sobre qualquer iniciativa tomada para a
elaboração de metodologias de avaliação e/ou de normas de qualificações/competências. Foi sublinhado que, qualquer
iniciativa teria interesse, independentemente do nível de execução.
inofor
testagem e de avaliação pode comparar-se às escolhas descritas para o nível europeu. Os
testes são, frequentemente, do tipo de respostas pré-definidas e de escolha múltipla,
assistidos por computador, e privilegiam mais os aspectos somativos do que os aspectos
formativos da avaliação. Por vezes, tem-se a impressão de que os qualificativos «assistido
por computador» ou «automatizado» são usados como garantia de qualidade e de
«modernidade». Resta saber se essas metodologias normalizadas e relativamente estritas
serão capazes de dar resposta às expectativas quando confrontadas com outras situações.
Por outro lado, os factores de capacidade e de custo jogam a favor da introdução desses
instrumentos.
5.4>Intervenientes, objectivos e soluções a nível das empresas
O nível das empresas não é analisado em pormenor no presente relatório. É um ponto
negativo que poderá ser corrigido numa fase posterior33. É, no entanto, possível
apresentar, desde já, algumas reflexões sobre o papel das empresas. O inventário regular
dos recursos em competências faz, obviamente, parte das actividades de qualquer
empresa, seja ela grande ou pequena. Na maior parte das vezes, esse inventário não é
feito por meio de uma operação formal e sistemática, utilizando, por exemplo,
metodologias de testagem e de avaliação, mas inscreve-se naturalmente na coordenação
das actividades correntes da empresa. Existem alguns indícios que revelam que essa
abordagem informal e não sistemática, gradualmente, está a dar lugar a metodologias e
sistemas. Qualquer empresa que pretenda recrutar um novo empregado deve, em certa
medida, avaliar as competências adquiridas por via não formal do candidato. Para citar um
outro exemplo, as empresas que introduzam sistemas de controlo de qualidade devem
«recensear» as competências do respectivo pessoal e determinar se estas são apropriadas
para as novas funções a desempenhar. Por outras palavras, numerosas técnicas
desenvolvidas com o nome de «controlo de qualidade», «gestão total da qualidade»,
«desenvolvimento dos recursos humanos» e «rotação de tarefas», para só citar algumas,
contêm importantes elementos de identificação e de avaliação das competências. Os
instrumentos deste tipo foram desenvolvidos quase exclusivamente por razões
formativas, enquanto meios de identificação e de aperfeiçoamento das competências
33O Cedefop, em cooperação com a empresa BMW e a (antiga) Rover, lançou um projecto destinado a analisar
determinados aspectos relacionados com as práticas internas de avaliação das empresas. Esse projecto será
progressivamente alargado a fim de nele serem incluídas iniciativas efectuadas noutros sectores para além do sector da
indústria automóvel.
149
Colecção CEDEFOP
existentes. Para garantir a qualidade ou reorganizar um processo de produção, é essencial
avaliar as forças e as fragilidades das competências existentes. É unicamente a partir dessa
visão de conjunto que é possível formular recomendações razoáveis com vista às
mudanças e às melhorias.
As práticas observadas revelam, sem surpresa, que as grandes empresas são mais
susceptíveis de recorrer a dispositivos sistemáticos de «medição das competências». As
metodologias desenvolvidas pela Mercedes Benz por ocasião da abertura de uma nova
unidade de produção nos Estados Unidos, em meados dos anos 90, constituem um bom
exemplo do que acaba de ser referido. Para a abertura desta unidade, situada no Alabama,
região desprovida de qualquer tradição na indústria automóvel, foi necessário criar uma
mão-de-obra totalmente nova. Foram recebidas 60 000 candidaturas e foi especialmente
elaborada uma metodologia para se proceder à selecção. Para além da apreciação das
qualificações formais e da experiência anterior, foi criada uma complexa bateria de testes
teóricos e práticos (divididos em dez fases) para seleccionar os 1 200 candidatos mais
aptos a ocupar os diversos postos de trabalho previstos. É interessante notar que foram
privilegiadas as competências «organizacionais» e as competências «flexíveis», tais como a
cooperação ou a comunicação, em detrimento das tradicionais competências «duras»,
ligadas ao processo de fabricação propriamente dito.
O caso da Mercedes Benz é interessante para demonstrar que uma medição de elevada
qualidade das competências exige um determinado volume de recursos (em termos de
tempo e de dinheiro) e um certo nível de complexidade e de sofisticação metodológica.
Contrariamente às pretensões de certos instrumentos comerciais de testagem
apresentados atrás (cf. capítulo 4.3), nada garante que o uso exclusivo a metodologias
normalizadas, com base em testes de respostas pré-definidas ou de escolha múltipla,
ofereça uma imagem válida das competências adquiridas graças a experiências individuais.
Para as empresas que pretendem introduzir metodologias sistemáticas de medição de
competências, os objectivos mais importantes são de ordem formativa. Para se atingir
esses objectivos formativos, as metodologias devem ser capazes de fornecer mais alguma
coisa do que uma representação daquilo que qualquer um pode verificar sem precisar de
recorrer a instrumentos muito elaborados. Embora as metodologias assistidas por
computador possam, certamente, revelar-se úteis, as que fazem mais apelo ao diálogo e
que estão mais centradas no desempenho são, provavelmente, indispensáveis quando se
pretende um feedback de alta qualidade visando os processos de aprendizagem nas
empresas.
inofor
5.5>Definir um ponto de partida
O desenvolvimento de metodologias e de sistemas que permitam a identificação, a
avaliação e o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal deve ter, como
ponto de partida, a pergunta «porquê?». O que ressalta da análise efectuada às abordagens
nacionais e europeias é uma nítida impressão de que os objectivos das iniciativas
metodológicas e políticas e institucionais são demasiado numerosos e demasiado vagos.
Poucas são as vozes que se levantam para contestar a importância de uma melhor
utilização dos conhecimentos adquiridos por via não formal, no entanto, para alargar
efectivamente a base de competências, deve ser adoptada uma estratégia mais precisa.
Um dos pontos de partida para uma estratégia deste tipo consiste na reformulação e na
reordenação das três perguntas apresentadas no início deste capítulo:
a) que objectivos queremos alcançar?
b) que soluções metodológicas pode fornecer uma resposta?
c) que intervenientes, a nível político e institucional, devem colaborar na procura das
soluções?
6>Conclusão
153
Colecção CEDEFOP
A ANÁLISE A QUE ACABÁMOS DE PROCEDER revela que os esforços desenvolvidos
visando introduzir metodologias e sistemas que permitam a identificação, a avaliação e o
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal são intensivos, mas
extremamente diversificados. Embora as iniciativas se encontrem ainda numa fase
experimental, os intervenientes a nível europeu, nacional, sectorial e das empresas
parecem claramente motivados para progredir nessa direcção. De momento, qualquer
conclusão só pode ter um carácter provisório. Dito isto, tentaremos proceder a uma
síntese que dê resposta a duas perguntas: em primeiro lugar, porquê esta súbita
efervescência de actividade e de interesse em relação às questões que se prendem com os
conhecimentos adquiridos por via não formal? Em segundo lugar; como poderão os
elementos positivos dessa actividade ser apoiados em termos quer metodológicos quer
políticos e institucionais?
6.1 Porquê?
Por que razão a maior parte dos países europeus, seguidos pela própria UE e por
numerosas empresas, começaram a interessar-se de perto pelos conhecimentos
adquiridos por via não formal? Que factores motivaram essa vaga de actividades, que se
propagou, quase simultaneamente, à maioria dos países europeus? Para responder a estas
perguntas, convém examinar atentamente os objectivos, a evolução e os desafios políticos
e institucionais. Debruçar-nos-emos mais particularmente sobre três aspectos. O
primeiro diz respeito ao que nós designaremos por «procura das qualificações-chave», a
busca da «poção mágica» que nos permitirá defrontar os desafios que se prendem com a
rapidez das mudanças tecnológicas e organizacionais e sobreviver no mercado planetário.
O segundo aspecto diz respeito à necessidade de se proceder a uma «reconfiguração
institucional» e às relações entre a medição das competências e o reordenamento dos
sistemas de aprendizagem. O terceiro aspecto diz respeito à questão de se saber se nos
encontramos numa situação em que as soluções estão à procura dos problemas e se as
metodologias e os sistemas se desenvolveram num vazio institucional, sem fornecer
respostas às necessidades reais.
inofor
6.1.1>A busca da poção mágica identificação, avaliação
E reconhecimento das qualificações-chave
Embora normalmente abordados como dois problemas distintos, o modo de definir, de
identificar e de reconhecer as qualificações-chave e a dificuldade de avaliar os
conhecimentos adquiridos por via não formal estão estreitamente ligados. Em nossa
opinião, estes dois debates reflectem diferentes facetas de uma mesma questão. Em
ambos os casos, observamos um crescente interesse pelas necessidades em termos de
aprendizagem e de saberes numa sociedade que experimenta mudanças organizacionais e
tecnológicas sem precedentes. Independentemente das numerosas e, por vezes,
conflituosas interpretações acerca das qualificações-chave (Kämäräinen, 1999) e dos
conhecimentos adquiridos por via não formal (Bjørnåvold, 1999), uma das preocupações
comuns dos que se debruçam sobre estas questões é a procura de elementos de saberes
e de competências que transcendem as organizações e/ou as tecnologias específicas. A
capacidade de evoluir em novos contextos e de resolver problemas imprevistos revestese de um particular interesse, pois o objectivo consiste em preparar as pessoas para a
incerteza, através do alargamento das respectivas bases de conhecimentos e de
experiências. Dieter Mertens formula essa preocupação nos seguintes termos (1972):
«A capacidade mental não deve ser utilizada unicamente para
armazenar saberes factuais; deve, antes, ser considerada como
ponto de transferência (Schaltzentrale) de reacções inteligentes.
Por isso, a educação deve, antes de mais, visar o desenvolvimento
da capacidade de abordar e de resolver problemas.» (p. 15)
No seu esforço para definir e delimitar as qualificações-chave, Mertens identifica um
determinado número de elementos, vindo, assim, acrescentar conteúdo a esta
preocupação comum. As qualificações de base compreendem capacidades como o
espírito crítico e o espírito analítico, bem como a capacidade de cooperação e de
comunicação. As capacidades de classificação, de interpretação e de utilização da
informação existente em diversos contextos são consideradas qualificações horizontais.
Como a maioria das situações e dos problemas é altamente estruturada (Simon, 1973),
tem uma importância decisiva a capacidade para estruturar a informação e para distinguir o
que é importante daquilo que o não é. O domínio de competências práticas aplicáveis em
diversos sectores e empresas está incluído nos conhecimentos transversais
(Breitenelemente). Esta última categoria pode ser ilustrada pela utilização de instrumentos
155
Colecção CEDEFOP
informáticos de base em diversos contextos profissionais e pela implementação e o
lançamento de sistemas de qualidade (baseados, por exemplo nas normas ISO) nas
empresas34. As qualificações-chave incidem, pois, mais sobre a capacidade de aplicação
desse conhecimentos em contextos sociais, organizacionais e tecnológicos («saber
como») do que sobre o conhecimento de factos, de teorias e de regras («saber o quê»)35.
Nas décadas seguintes à publicação dos trabalhos de Mertens, o relevo dado aos
conhecimentos de base, horizontais e transversais foi traduzido em declarações de
princípio36 na maioria dos países europeus, bem como a nível da UE. Como já foi referido
no capítulo 4, um dos exemplos mais impressionantes neste domínio é o Livro Branco da
Comissão Europeia sobre a Educação e a Formação: Ensinar e aprender: rumo à
sociedade cognitiva, publicado em 1995. Dadas as dificuldades na previsão
pormenorizada das necessidades futuras em conhecimentos, o Livro Branco alerta para os
riscos de uma abordagem demasiado estreita do ensino e da formação:
«No futuro, as pessoas deverão ser capazes de compreender
situações complexas que evoluem de modo imprevisível [...]. Todos
serão confrontados com uma cada vez maior variedade de objectos
físicos, de situações sociais, de contextos geográficos ou culturais.
[...] o desenvolvimento da cultura geral, isto é, da capacidade de
apreender o significado das coisas, de compreender e de emitir um
juízo, é o primeiro factor de adaptação à evolução da economia e à
do emprego.» (p. 26-27)
De acordo com o Livro Branco, para enfrentar esse desafio, convém desenvolver e
estimular uma base de cultura geral mais sólida graças à combinação de aprendizagens
formais e não formais. A educação formal deve ser sistematicamente completada por
conhecimentos adquiridos fora do sistema educativo formal na família, na empresa e nos
tempos livres. Esta abordagem diversificada, que combina as qualidades de diferentes
34Martens também introduz um quarto elemento na sua definição das qualificações-chave: os factores geracionais, que
se relacionam com as diferenças de qualificações existentes entre as gerações num contexto de rápidas mudanças
organizacionais e tecnológicas. Os factores geracionais podem considerar-se qualificações-chave «negativas» indicando
saberes e competências que estão ausentes num grupo específico.
35Por isso, as qualificações-chave estão relacionadas com a evolução do estado de noviço para o de especialista,
descrita por Dreyfus e Dreyfus (1986), e podem considerar-se como uma transição para comportamentos competentes,
intuitivos e empenhados, baseados na acumulação de experiências concretas.
36O que não quer dizer, necessariamente, que as declarações de princípio sejam acompanhadas por políticas concretas
conduzindo a mudanças nesse sentido.
inofor
domínios de aprendizagem, é necessária para evitar que esta ganhe um carácter
unidimensional e demasiado estreito:
«De facto, prevalece ainda uma excessiva normalização do saber.
Dá a impressão de que tudo deve ser ensinado segundo uma ordem
lógica, privilegiando o domínio de um sistema dedutivo baseado em
conceitos abstractos, no qual a matemática desempenha um papel
predominante. Em certos casos, o sistema dedutivo pode chegar a
transformar o aluno num sujeito passivo e a reprimir a imaginação.»
(p. 29)
O interesse prestado às qualificações-chave e aos conhecimentos não formais pode ser
interpretado como o reflexo dessa procura geral de uma base de saberes mais alargada,
multidimensional. Se aplicarmos esta perspectiva às duas questões, ressaltam claramente
as relações entre os respectivos papéis:
a) as qualificações-chave podem considerar-se um conjunto de objectivos de
aprendizagem, aplicáveis a diversos níveis e, por isso, pertinentes relativamente aos
indivíduos, às empresas e aos estabelecimentos de ensino. As qualificações-chave são
intangíveis, no sentido em que são «metáforas» ou «construções teóricas» que chamam a
atenção para determinados aspectos da actividade humana, da comunicação e da
aprendizagem. Em vez de se considerar as qualificações-chave como «conjuntos» de
saberes a inventariar quando é necessário, seria melhor ver nelas linhas orientadoras para
a aprendizagem. Esse papel orientador é fundamental para que as qualificações-chave
sejam mais do que meros tópicos para debates académicos. Chamar a atenção para esses
aspectos menos visíveis das competências humanas talvez permita o desenvolvimento de
estratégias de apoio centradas na prática;
b) as metodologias e os sistemas de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal podem ser encarados como instrumentos para a
concretização dessas estratégias. No entanto, os termos «conhecimentos adquiridos por
via informal» e «conhecimentos adquiridos por via não formal» não constituem grandes
ajudas nesta matéria. O conceito de conhecimentos adquiridos por via não formal é
«negativo», na medida em que se trata da negação de qualquer coisa, abrangendo o que
não está incluído no ensino e na formação formais. Esse termo não fornece qualquer
indicação positiva em relação ao conteúdo, ao perfil e à qualidade. Todavia, é um conceito
importante, na medida em que chama a atenção para a riqueza e a variedade dos domínios
e das formas de saberes que podem ser adquiridos fora do ensino e da formação formais.
157
Colecção CEDEFOP
O estabelecimento de relações mais estreitas com a questão das qualificações-chave
podia, por isso, revelar-se útil e atribuir à prática uma orientação mais clara. Assim, o
estabelecimento de relações entre os domínios de saberes formais e não formais pode
considerar-se um meio de realização e de concretização dos objectivos expressos através
das qualificações-chave.
A aprendizagem efectuada fora dos estabelecimentos de ensino e de formação formais
apresenta-se, cada vez mais, como uma condição prévia para uma estratégia de
aprendizagem que permita que os indivíduos adquiram uma base de conhecimentos e de
competências mais alargada, transcendendo as organizações, as tecnologias, os contextos
e os problemas específicos. É evidente o papel central que tem sido atribuído às técnicas de
medição e de avaliação na tradução do discurso retórico para o nível do concreto.
6.1.2>A identificação, a avaliação e o reconhecimento
dos saberes adquiridos por via não formal enquanto
elemento de reconfiguração dos sistemas de ensino,
de formação e de aprendizagem
Como já foi referido em vários momentos da presente análise, nomeadamente no
capítulo 3, o ensino e a formação profissional estão a ser sujeitos a uma reorientação
substancial, da iniciativa do nível público, e que procura transformar os sistemas de ensino
e de formação formais (sobretudo profissionais) de sistemas exclusivamente centrados nos
meios em sistemas centrados nos resultados. Em muitos países, tem-se reafirmado que o
que conta são as competências, não as modalidades ou o local da respectiva aquisição.
Como os processos cognitivos estão fora da alçada das autoridades encarregadas da
certificação, os testes finais revestem-se de grande importância. Esta mudança de
prioridade realiza-se, actualmente, no seio de sistemas nacionais de ensino e de formação,
que diferem consideravelmente uns dos outros. Embora muitos países considerem o
Reino Unido como o principal representante (e divulgador) dessa abordagem, alguns
outros países europeus têm vindo a incluir, em graus variados, este princípio nos
respectivos sistemas. Em certos casos, tal integração não passou do nível retórico, mas, na
maior parte deles, tomaram-se iniciativas legislativas e práticas para tornar possível essa
evolução. Regra geral, a modularização faz parte integrante dos esforços de
reconfiguração. A decomposição de uma sequência de ensino ou de formação em
unidades mais circunscritas está intrinsecamente ligada ao desafio que é a avaliação.
Domínios de competências demasiado vastos tornam praticamente impossível assegurar a
inofor
fiabilidade e a validade dos testes. Por isso, é necessário definir domínios mais restritos e
mais homogéneos que possam ser avaliados com bom-senso.
Essa reconfiguração pode relacionar-se com a crescente prioridade atribuída à educação e
à formação ao longo da vida. O estabelecimento de um sistema que permita aprender ao
longo da vida requer uma melhor articulação entre as diferentes formas de aprendizagem
em diferentes domínios de aprendizagem, em diferentes fases da vida. Enquanto o sistema
formal se mantém muito fortemente centrado na formação inicial, um sistema de
aprendizagem ao longo da vida deve enfrentar o desafio de aproximar diferentes domínios
de aprendizagem, quer formal quer não formal. Esta aproximação é fundamental para se
poder dar resposta às necessidades sentidas pelas pessoas relativamente à renovação, de
modo permanente e variado, dos respectivos conhecimentos, e às necessidades sentidas
pelas empresas de disporem de um amplo leque de saberes e de competências uma
espécie de reserva de conhecimentos que lhes permita gerir o imprevisto. Também a
questão da identificação, da avaliação e do reconhecimento das competências se revela
fundamental. As competências devem tornar-se visíveis para serem plenamente
integradas numa estratégia tão ampla de reprodução e de renovação dos saberes.
Regra geral, o estabelecimento de sistemas flexíveis, centrados no desempenho, e os
esforços visando a promoção da aprendizagem ao longo da vida estão estreitamente
relacionados. No plano retórico (mas nem sempre no plano prático), estes desafios são
sublinhados em todos os países estudados. E em todos eles, sem excepção, as
metodologias de identificação, avaliação e reconhecimento dos saberes adquiridos não
formais são consideradas instrumentos necessários para a abertura desses novos
caminhos de aprendizagem.
6.1.3>Soluções em busca de problemas e fornecedores em busca
de clientes
O domínio da identificação, da avaliação e do reconhecimento dos saberes adquiridos
formais caracteriza-se pela existência de fornecedores de soluções extremamente
estruturados (a nível europeu, nacional e sectorial) e de utilizadores extremamente
discretos (os indivíduos e a maior parte das empresas). O desenvolvimento de
metodologias de medição e de avaliação só raramente é induzido pela procura ou por um
impulso vindo da base. Se analisarmos os anos entre 1995 e 1999, período durante o qual
se delineou e reforçou esta tendência, o lançamento de programas a nível europeu ou
sectorial, como o Leonardo da Vinci ou o Adapt, contribuiu para o estabelecimento e a
evolução do «plano de acção em matéria de avaliação». A disponibilidade de «dinheiro
159
Colecção CEDEFOP
fresco», aliada ao número limitado de prioridades específicas, levou a que numerosas
instituições se empenhassem no desenvolvimento de instrumentos e meios. Embora os
resultados desses projectos sejam de qualidade variável, o impacto que tiveram, a longo
prazo, nos planos de acção das organizações e das instituições envolvidas não se deve
subestimar. Os próximos anos dir-nos-ão se esse movimento a partir da oferta encontrará
utilizadores, por exemplo, a nível dos sectores e das empresas, capazes de apreciar os
esforços empreendidos.
A nível nacional, verificamos que os diversos grupos de países aprendem uns com os
outros e que o desenvolvimento de um instrumento metodológico num determinado país
atrai quase imediatamente a atenção dos países vizinhos. Por exemplo, a abordagem
irlandesa em matéria de acreditação dos conhecimentos adquiridos está muito próxima
dos esforços empreendidos pelo Reino Unido e ela não teria, provavelmente, sido
possível sem a inspiração do vizinho de leste. Durante três ou quatro anos, também o
sistema finlandês de avaliação baseado nas competências foi alvo de grande atenção por
parte dos outros países nórdicos. Em certa medida, é possível acompanhar o modo como
as formulações políticas «viajam» dos documentos de um país para os de outro (no caso
presente, da Finlândia para a Noruega e para a Dinamarca e depois para a Suécia). O facto
de esses documentos de política terem, em larga medida, dado origem a experimentações
e a reformas reforça ainda mais a importância do fenómeno.
A aprendizagem mútua é, em geral, positiva. Embora se tenha observado um importante
fenómeno de transferência ou cópia de metodologias e de abordagens, o grau de
modificação e de adaptação ao contexto local é considerável. No entanto, o carácter
essencialmente «descendente» das iniciativas é surpreendente; resta saber se as soluções
propostas encontrarão os respectivos problemas e utilizadores (já sem falar dos clientes).
6.2>Como?
Dar resposta à pergunta «porquê?» não responde à questão «como apoiar e reforçar os
elementos positivos dessa evolução?». No conjunto dos esforços para compreender e
definir os desafios que teremos de enfrentar (cf. capítulo 2), esta pergunta é,
simultaneamente, metodológica (como medir?) e política e institucional (como garantir a
aceitação e legitimidade?). No plano prático, é evidente que estes aspectos se encontram
estreitamente relacionados. Neste contexto, e para maior clareza de análise, tratá-losemos separadamente.
inofor
6.2.1>Exigências metodológicas
Embora tenham sido avançadas algumas respostas possíveis para a pergunta «porquê?», a
pergunta «como?» mantém-se em aberto. Por outras palavras, as abordagens
metodológicas e institucionais adoptadas actualmente em matéria de avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal serão capazes de dar resposta às
expectativas, quer em termos de instrumentos que permitam identificar as qualificaçõeschave, quer em termos de recursos que permitam reconfigurar os sistemas de ensino e de
formação?
Nos diferentes casos aqui apresentados, passámos em revista todas as variantes
conhecidas das metodologias de testagem e de avaliação utilizadas, desde as metodologias
de respostas predefinidas (de escolha mútua) assistidas por computador, utilizadas para a
carteira pessoal de competências, até à avaliação autêntica, baseada na execução de tarefas
e compreendendo a planificação, a observação e a avaliação, utilizada nos Países Baixos. As
abordagens alemã e norueguesa combinam a avaliação do desempenho e os testes de tipo
tradicional com respostas abertas e respostas longas, enquanto a carta europeia de
condução em informática se fundamenta, em grande parte, em testes de respostas
fechadas. O balanço de competências francês ilustra uma abordagem na qual é utilizado o
conjunto de metodologias tradicionais de testagem, dependendo as soluções do centro
que efectua o balanço. Comparando com o estado avançado em que se encontram os
métodos de testagem e de avaliação no ensino e na formação formais (Black, 1998), o
interesse pela aprendizagem não formal não deu origem (até à data) a importantes
inovações metodológicas. Por outro lado, a complexidade da tarefa provocou a
diversidade. Se interpretarmos essa diversidade numa perspectiva positiva, podemos
dizer que garante uma riqueza das abordagens, necessária para a apreensão da natureza
profundamente contextual e, em parte, tácita, dos conhecimentos adquiridos por via não
formal. Mas se interpretarmos essa diversidade numa óptica negativa, podemos dizer que
gera a heterogeneidade e a falta de coerência. As duas interpretações são possíveis.
À luz das experiências analisadas até agora, pensamos que há muitas iniciativas que visam
demasiados objectivos ao mesmo tempo. As metodologias, por vezes, são escolhidas
antes da compreensão nítida da tarefa a cumprir. Em muitos casos, as metodologias
desempenham funções simultaneamente somativas e formativas, sem que as potenciais
tensões entre ambas tenham sido esclarecidas. Em certa medida, podemos concluir que
conta mais a apreciação da tarefa a cumprir do que as metodologias. Da análise a que
temos vindo a proceder, ressalta claramente que a identificação, a avaliação e o
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal devem basear-se em múltiplas
161
Colecção CEDEFOP
abordagens metodológicas, combinadas de diversas maneiras em função da tarefa
específica em causa. Não existe nenhuma metodologia, por mais inovadora que seja, que,
sozinha, consiga enfrentar todos os desafios, nem a nível europeu, nem a nível nacional,
nem a nível sectorial, nem a nível das empresas. É preferível colocarmos algumas
perguntas, que já foram introduzidas no capítulo 2, na apresentação da avaliação e da
testagem no ensino e na formação formais. Certamente obteremos algumas indicações
acerca dos elementos que devem ser clarificados e sobre os aspectos que devem ser
aperfeiçoados, e talvez também consigamos encontrar a riqueza em vez da fragmentação.
a) Que funções devem desempenhar as novas metodologias (e os novos sistemas
institucionais) de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não formal? Estaremos a falar de um papel formativo, em que os instrumentos e os
recursos servem para orientar os processos cognitivos dos indivíduos e das empresas, ou
de um papel somativo, mais restrito, no qual os conhecimentos não formais são testados
com vista à sua eventual inclusão no contexto do ensino e da formação formais, ou ainda
de um papel somativo, no qual está em jogo a responsabilidade, centrado na utilização dos
recursos de competências a diversos níveis? As funções atribuídas à avaliação, quer num
contexto não formal quer num contexto formal, são determinantes para as escolhas
metodológicas a efectuar e para o êxito final do exercício. Como já demonstrámos
durante a análise realizada, nem sempre se faz uma distinção clara entre essas funções.
Frequentemente, observa-se uma tendência para combinar as funções formativa e
somativa, como se vê, particularmente, no modelo europeu da carteira pessoal de
competências. O desenvolvimento bem sucedido de metodologias e de sistemas só é
possível quando essas funções estão claramente compreendidas e combinadas ou
separadas de maneira construtiva e realista.
b) A diversidade dos processos e dos contextos torna difícil atingir-se um grau de fiabilidade
semelhante ao dos testes normalizados (de escolha múltipla, por exemplo). Trata-se de
determinar os meios para se atingir a fiabilidade neste novo domínio (bem como o tipo
específico de fiabilidade requerida). Será possível considerar uma fiabilidade baseada,
simultaneamente, num elevado grau de transparência em relação ao processo de
avaliação e na implementação de um controlo de qualidade sistemático, a todos os níveis e
em todas as funções? A experiência desenvolvida pelas câmaras francesas de comércio e
indústria revela-se, neste aspecto, interessante, na medida em que sublinha a importância
dos procedimentos de segurança de qualidade e de controlo de qualidade. Este tipo de
reflexão não mereceu grande atenção da parte das diversas abordagens da avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal, o que constitui uma deficiência que pode
inofor
pôr em risco a legitimidade das abordagens enquanto tal.
c) A natureza profundamente contextual e (em parte) tácita, dos conhecimentos
adquiridos por via não formal torna mais complexa a procura da validade. É grande o risco
de se medir uma coisa diferente da que foi inicialmente prevista. Convém, antes de mais,
evitar que a avaliação conduza a uma imagem deformada do candidato e do domínio e
tender, o mais possível, para a autenticidade. Será muito interessante saber se as novas
metodologias se centram na validade do conteúdo ou na validade da construção. No
primeiro caso, o objectivo seria o de representar, o melhor possível, uma tarefa
precisamente definida. No segundo caso, o objectivo seria o de apreender uma entidade
construída, por exemplo, as qualificações-chave, as competências em comunicação ou a
capacidade de cooperação. Dado que se trata mais de construções teóricas do que de
entidades empíricas, a avaliação deve assentar em provas indirectas. Como já foi referido
no capítulo 3, a procura de qualificações-chave constitui parte importante do exercício. Da
mesma forma que os testes de inteligência estão actualmente sujeitos a exames
minuciosos (o que é a entidade «inteligência?»), também as entidades construídas, tais
como as qualificações-chave e as competências em comunicação, deveriam ser sujeitas a
críticas construtivas. Trata-se de uma tarefa indispensável para se atingir uma validade
suficiente.
d) A questão dos pontos de referência («normas») reveste-se de particular interesse na
avaliação dos conhecimentos adquiridos quer formais quer não formais. Enquanto a
referência à norma (utilização do desempenho de um grupo ou de uma população como
ponto de referência) não chegou a ser seriamente analisada no contexto da avaliação dos
conhecimentos adquiridos por via não formal (devido à diversidade das competências
envolvidas), já a questão da referência ao critério ou ao domínio situa-se no cerne do
problema. A definição dos limites dos domínios de competências (em termos de alcance e
de conteúdo) e o modo como podem ser descritas as competências nesses domínios
revestem-se de uma importância crucial. Quanto mais vasto é o domínio, mais difícil se
torna conceber dispositivos de avaliação autêntica. Convém também determinar se o
objectivo consiste em testar um desempenho mínimo ou em atribuir uma nota precisa a
determinados níveis de desempenho. A avaliação dos conhecimentos adquiridos por via
não formal só é eficaz se forem estabelecidos esses pontos de referência. Em muitos
aspectos, isto remete-nos para a questão das funções a cumprir pela avaliação: queremos
melhorar os processos cognitivos ou produzir provas (documentos com um determinado
valor)? Ambos os objectivos são profundamente legítimos e úteis. No entanto, o
estabelecimento de pontos de referência difere consideravelmente em função do
objectivo seleccionado.
163
Colecção CEDEFOP
6.2.2>Exigências políticas e institucionais
para o desenvolvimento de sistemas de identificação,
de avaliação e de reconhecimento dos saberes adquiridos
por via não Formal
Não é possível determinar os meios de apoio à implementação política e institucional de
sistemas de reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal sem dar o maior
relevo ao contexto. O desenvolvimento de metodologias ou de instrumentos que
permitam identificar, avaliar e reconhecer os saberes adquiridos por via não formal só tem
sentido se for considerado o contexto cultural, social e político no qual essas metodologias
e esses instrumentos serão utilizados. Uma vez satisfeita a primeira exigência
metodológica -, isto é, quando as questões de objectivos e de funções (cf. acima)
estiverem resolvidas, a implementação política e institucional pode ser apoiada por meio
de duas estratégias: uma centrada na «concepção institucional» e a outra na
«aprendizagem mútua». Para finalizar o presente relatório, acrescentaremos uma terceira
estratégia, que indica os princípios de uma iniciativa prática, neste domínio:
a) Concepção institucional: como foi indicado em 2.3, e tal como foi também referido na
análise aos diversos «casos» nacionais, devem-se respeitar determinados critérios
fundamentais para que as provas confirmando uma aprendizagem não formal possam ser
aceites ao mesmo título que aquelas que atestam um ensino ou uma formação formais. Em
primeiro lugar, todos os intervenientes envolvidos devem poder exprimir os respectivos
pontos de vista durante o estabelecimento e o funcionamento de sistemas deste tipo. Este
aspecto está intimamente relacionado com o equilíbrio dos interesses. Os sistemas de
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal podem ter um efeito directo
na fixação dos salários, bem como na distribuição dos empregos e das funções no mercado
de trabalho. Embora a questão de se saber quais os intervenientes que devem ser
convidados a participar e quais os que devem ser ouvidos não tenha, até agora,
despertado qualquer interesse, terá, certamente, uma importância decisiva em anos
futuros. Em segundo lugar, o processo deve ser alimentado com informações pertinentes.
A definição e a estruturação das normas e dos pontos de referência (em particular),
intimamente relacionados com a questão da representação, exigem informações
adequadas e equilibradas. Em terceiro lugar, como o demonstra a experiência efectuada
pelas câmaras francesas de comércio e indústria, a transparência das estruturas e dos
procedimentos desempenha um papel importante. É possível criar estruturas onde a
repartição dos papéis (estabelecimento das normas, avaliação, recursos, controlo da
inofor
qualidade) esteja claramente definida e apresentada. A transparência dos procedimentos é
condição necessária para a aceitação da legitimidade. Nos próximos anos, quer os
investigadores quer os responsáveis políticos deverão debruçar-se sobre todas estas
questões.
b) Aprendizagem mútua: a aprendizagem mútua entre os projectos, as instituições e os
países deverá ser reforçada e melhorada durante os próximos anos. Como foi
demonstrado em 5.1.3, já se efectua um certo volume de aprendizagem em diversos
níveis. No entanto, como foi referido várias vezes, nomeadamente, na análise às
actividades realizadas a nível europeu, o potencial de aprendizagem mútua ultrapassa em
muito as realizações e as práticas. O estabelecimento de mecanismos de aprendizagem
mútua deve reflectir os diversos objectivos e funções definidos, bem como os diversos
níveis de actividade. É necessário, contudo, coordenar melhor e apoiar mais as actividades
(a nível europeu e nacional), a fim de se capitalizarem as experiências que foram adquiridas
graças aos múltiplos projectos, programas e reformas institucionais. Uma solução possível
consistiria na criação e no desenvolvimento de um local de encontro (rede, fórum, ou
outro), ao qual os Estados-Membros da UE/EEE e a Comissão dariam apoio. Caso se
consiga chegar a um acordo político de cooperação deste tipo, poder-se-iam adoptar,
como ponto de partida, as linhas orientadoras e os objectivos práticos apresentados
acima37.
c) Fórum europeu: este fórum ou rede consagrado à identificação, à avaliação e ao
reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal deveria funcionar numa
perspectiva de longo prazo e ter como objectivo o aperfeiçoamento progressivo da visão
de conjunto e da coerência neste domínio, a nível internacional. A sua base deveria ser tão
ampla quanto possível, procurando abranger os diferentes pontos de vista e reunir
representantes dos governos, parceiros sociais e outros intervenientes. O fórum deveria
servir de local de encontro onde as informações e as ideias sobre a identificação, a
avaliação e o reconhecimento dos saberes adquiridos por via não formal seriam reunidas e
permutadas. As actividades deveriam ser organizadas em função de quatro objectivos:
37
Esta proposta foi apresentada numa nota redigida por Jens Børnåvold (Cedefop), Ruud Duvekot (Ministério dos
Assuntos Económicos, Departamento da Política Tecnológica, Países Baixos) e Jef van Raepenbusch (Ministério da
Comunidade Flamenga, Departamento do Ensino, Serviço da Formação Profissional, Bélgica), durante a conferência
organizada em Maio de 2000 pelo Ministério da Educação e da Investigação, da Noruega, e o Cedefop, subordinada ao
tema «A identificação, a avaliação e o reconhecimento da aprendizagem não formal: experiências e soluções
europeias».
165
Colecção CEDEFOP
a) contribuir para uma aprendizagem mútua sobre as forças e as fragilidades das
metodologias e dos sistemas de identificação, de avaliação e de reconhecimento dos
saberes adquiridos por via não formal;
b) oferecer uma visão de conjunto deste domínio e criar, assim, uma base para
aperfeiçoamento das metodologias e dos sistemas;
c) estimular a inovação neste domínio;
d) fornecer conselhos práticos aos poderes públicos, nacionais e europeus.
A prioridade concedida à visão de conjunto assume a maior importância, pois a recolha e a
troca de experiências são determinantes para melhorar a qualidade das metodologias e a
legitimidade das instituições e dos sistemas.
inofor
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Anexo-glossário
Glossário referente aos temas identificação, avaliação e reconhecimento
das qualificações e competências e visibilidade e capacidade de transferência das qualificações
175
Colecção CEDEFOP
Introdução
OS CONCEITOS POSSUEM uma dimensão social que reflecte um nível de linguagem,
uma cultura e um nível específico de conhecimento e de experiência. Ao mesmo tempo,
os conceitos modelam a nossa compreensão do mundo e influenciam a nossa
interpretação daquilo que vemos e daquilo que não vemos.
Com base nesta asserção, tentámos elaborar um glossário que reúna um determinado
número de conceitos relacionados com o processo de aprendizagem e com o respectivo
resultado.
O glossário está dividido em cinco capítulos:
1> Conceitos relacionados com o conhecimento e a aprendizagem
2> Conceitos relacionados com o saber-fazer profissional, a qualificação e a competência
3> Conceitos relacionados com os saberes de base e as competências-chave
4> Conceitos relacionados com a identificação, a avaliação e o reconhecimento das
competências
5> Conceitos relacionados com a transparência e a capacidade de transferência
Bibliografia
Os conceitos de base a seguir descritos levantam, frequentemente, problemas de
interpretação susceptíveis de prejudicar a comunicação entre interlocutores de língua e de
cultura diferentes. Por, isso, tentámos apresentar definições «consensuais», cujo campo de
aplicação está isento das particularidades nacionais. Estamos conscientes de que as
escolhas feitas são discutíveis: é impossível encontrar definições universais para palavraschave como competência, qualificação ou capacidade. O glossário foi redigido,
inicialmente, em inglês, o que explica as frequentes referências à terminologia inglesa
correspondente.
Por favor, transmita os seus comentários e as suas sugestões para o serviço de
tradução/terminologia do Cedefop: Tel. (30-31) 490 110; fax (30-31) 490 099; correio
electrónico: [email protected]
inofor
1>
Conceitos relacionados com o conhecimento e a aprendizagem
177
Colecção CEDEFOP
Introdução
Saber / conhecimento (knowledge)
(Knowledge)
A noção de saber/conhecimento constitui o ponto de partida deste glossário. Importa
sublinhar o carácter heterogéneo do saber, que não se limita a diferenciar o que é
verdadeiro (na natureza) ou justo (na sociedade humana) ou ainda autêntico (na arte, etc.)
daquilo que o não é. Qualquer apreciação sobre a natureza do conhecimento refere-se a
critérios específicos e leva a definir os conceitos de maneira diferente. As definições
seguidamente propostas reflectem a diversidade das formas sob as quais o saber (saber
explícito, tácito, etc.) se exprime. Além disso, os conceitos de saber-fazer profissional (skill;
savoir-faire), qualificação, e competência (cf. capítulo II) podem ser interpretados como
tantas expressões diferentes da relação existente entre o conhecimento e o meio social
(por exemplo, a educação, o trabalho, etc.).
(Learning)
Aprendizagem (learning)
A aprendizagem é, geralmente, encarada como um processo cumulativo que permite que
os indivíduos integrem entidades de saber [cf. definição seguinte, a)]. Esta percepção da
aprendizagem conduz a definições centradas na capacidade de os indivíduos codificarem,
memorizarem e mobilizarem o conhecimento. Esta abordagem tende a ser suplantada
por uma concepção da aprendizagem (cf. definição 2 abaixo) considerada como uma acção
social ou como uma adaptação a um meio em evolução (Lave, 1991). Esta concepção põe
em relevo a importância do contexto da aprendizagem. A aprendizagem com carácter
profissional, por exemplo, não se limita à assimilação de entidades abstractas de saber;
deve também permitir que o indivíduo forje uma identidade social quando se integra num
meio profissional. Ao contrário da primeira abordagem acima descrita, que tende a reduzir
a aprendizagem a um processo mental, esta concepção sublinha a relação entre o objecto
da aprendizagem e a sociedade, bem como entre o indivíduo e o seu meio.
N.B.: Para três termos (saber/conhecimento, saber explícito e saber tácito), o capítulo seguinte propõe várias definições. Não
hesite em dar a conhecer os seus comentários. Tanto mais que a palavra inglesa learning designa, simultaneamente, o processo e o
resultado da aprendizagem.
inofor
Saber / conhecimento
DE: Wissen / Kenntis
EN: knowledge
FR: savoir / connaissance
Existem numerosas definições para o conceito de saber/conhecimento; todavia, as
grandes correntes modernas procedem a algumas distinções fundamentais:
a) Aristóteles estabelece uma distinção entre a lógica teórica e a lógica prática. Da mesma
forma, os teóricos modernos (Alexander et al., 1991) distinguem o conhecimento
declarativo (teórico) do conhecimento prático. O conhecimento declarativo compreende
as declarações relativas a acontecimentos ou a factos específicos assim como
generalizações empíricas ou ainda princípios mais fundamentais sobre a natureza e a
realidade. O conhecimento prático abrange diferentes elementos (heurística,
metodologia, planificação, procedimentos, acções de rotina, estratégias, tácticas, técnicas
ou astúcias) (Ohlsson, 1994);
b) É possível distinguir diferentes formas de conhecimento correspondendo a diferentes
métodos de «aprendizagem do mundo»: determinados estudos permitiram identificar
diferentes categorias de conhecimento, articuladas do seguinte modo:
1. conhecimento objectivo (natural/científico), julgado de acordo com o grau de certeza;
2.conhecimento subjectivo (literário/estético), julgado de acordo com o grau de
autenticidade;
3. conhecimento moral (humano/normativo), julgado com base na aceitação colectiva
(verdadeiro/falso);
4. conhecimento religioso ou divino, julgado com base na autoridade divina (Deus). Esta
distinção esquemática permite orientar as questões que colocamos, as metodologias que
utilizamos e as respostas que damos na nossa procura do conhecimento.
c) o conhecimento pode ser tácito ou explícito. O conhecimento tácito (Polayi, 1996)
define-se como o conhecimento (não necessariamente expresso ou consciente)
adquirido pelo aprendente, e que vai influenciar o processo cognitivo. O conhecimento
explícito corresponde ao conhecimento que pode ser mobilizado conscientemente pelo
aprendente, incluindo o conhecimento tácito, que se torna explícito ao torna-se «objecto
de pensamento» (Prawat, 1989).
179
Colecção CEDEFOP
Nota: (Def. 1.) O conhecimento declarativo é descritivo; não está relacionado com objectivos ou situações específicas e pode,
pois, aplicar-se a qualquer contexto: é consciente e exprimível; o conhecimento prático pode ser implícito (isto é, tácito e não
descrito). No domínio da formação profissional, o saber/conhecimento designa «o conjunto das aptidões de base e tecnológicas, o
conjunto das informações de que é necessário dispor para que se possa exercer adequadamente uma dada actividade
profissional» (AFPA, 1992).
Saber explícito
DE: explizites Wissen
EN: explicit knowledge
FR: savoir explicite
a) Saber acessível à consciência e que pode ser verbalizado ou expresso por outros meios
(efectuando ou não determinadas acções).
b) Saber relativo a um dado objecto ou a um determinado fenómeno estudado (saber
focal).
Nota: A distinção entre saber tácito e saber explícito foi, por vezes, expressa em termos de «saber como» (knowing-how) e de
«saber que» (knowing that) (Ryle, 1994) ou através de uma distinção entre o saber concretizado e o saber teórico.
Saber tácito
DE: implizites Wissen
EN: tacit knowledge
FR: savoir tacite
a) Saber adquirido de uma forma explícita e tornado tácito quando aplicado (por exemplo,
a utilização de um instrumento);
b) Qualquer saber prático ou teórico que resulta do contacto com uma determinada
forma de vida;
c) O tipo de saber que possuem os indivíduos que dominam de forma suficientemente
aprofundada um determinado assunto para compreender aspectos tanto implícitos como
explícitos;
d) O saber que intervém na elaboração de comportamentos e/ou estados mentais, mas
que a consciência não pode, habitualmente, mobilizar (Chris Eliasmith, 1998);
inofor
e) O saber utilizado como um instrumento visando abordar ou aprofundar o assunto
examinado.
Nota: A noção de saber tácito foi descrita por Polanyi (1966).
Aprendizagem/aquisição (de conhecimentos)
DE: Lernen
EN: learning
FR: apprentissage / acquisition (de connaissances)
Processo cumulativo por meio do qual os indivíduos assimilam progressivamente
entidades de um crescente nível de complexidade e de abstracção (conceitos, categorias,
esquemas de comportamento ou modelos) (Lave, 1997).
Nota: «A aprendizagem não é um simples processo de aquisição; constitui, antes, um processo de desenvolvimento evolutivo,
lógico, ligado à experiência» (Brown, 1990, in The international encyclopaedia of education).
Aprendizagem formal
DE: formales Lernen / formelles Lernen
EN: formal learning
FR: apprentissage formel
Aprendizagem que intervém num contexto organizado e estruturado (ensino formal,
formação em empresa, etc.), e claramente identificado como uma actividade de
aprendizagem.
Nota: A aprendizagem formal pode conduzir a um reconhecimento formal (diploma, certificado).
181
Colecção CEDEFOP
Aprendizagem não formal
DE: nicht-formales Lernen
EN: non-formal learning
FR: apprentissage non formel
Aprendizagem integrada nas actividades planificadas, não explicitamente identificadas com
actividades de aprendizagem, mas compreendendo uma parte importante de
aprendizagem.
Nota: Contrariamente à aprendizagem formal, a aprendizagem não formal abrange: (a) o que, por vezes, é descrito como
aprendizagem semi-estruturada, isto é, que inclui uma parte importante de aprendizagem (por exemplo, a gestão da qualidade);
e (b) a aprendizagem experiencial, que decorre das actividades da vida quotidiana (incluindo a profissional) e abaixo definida
como aprendizagem informal.
Aprendizagem informal
DE: informelles Lernen
EN: informal learning
FR: apprentissage informel
Aprendizagem que decorre de circunstâncias fortuitas ou relacionada com as actividades
da vida quotidiana (trabalho, família ou tempos livres).
Nota: A aprendizagem informal é diferente da aprendizagem não formal (ver def. Acima). Designa-se, por vezes, aprendizagem
pela experiência ou experiencial.
Aprendizagem pela prática
DE: Lernen durch Praxis / Praxislernen
EN: learning-by-doing
FR: apprentissage par la pratique
Aprendizagem adquirida através da execução repetida de tarefas, mas sem instrução
prévia.
inofor
Aprendizagem pela utilização
DE: «learning-by-using»
EN: learning-by-using
FR: apprentissage par l'utilisation
Aprendizagem adquirida através da utilização repetida de instrumentos ou de
equipamentos, mas sem instrução prévia.
183
Colecção CEDEFOP
2>
Conceitos relacionados com o saber-fazer profissional, a qualificação e a
competência
185
Colecção CEDEFOP
Introdução
A definição e a transcrição numa outra língua de conceitos fundamentais como saberfazer profissional, qualificação e competência (em inglês, skill, qualification e competence)
levanta diversos problemas. O termo inglês skill, por exemplo, descreve:
(a) quer a capacidade de um indivíduo para executar uma tarefa ou um conjunto de tarefas
correspondente ao seu emprego (acepção restrita);
(b) quer o seu nível de competência ou de especialidade (acepção ampla).
A fim de limitar as divergências de interpretação na utilização (e na tradução) desses
termos, optámos por defini-los de acordo com os seguintes três níveis hierárquicos:
a) o termo saber-fazer profissional (skill) foi reduzido ao contexto específico de um
emprego, e descreve as capacidades/formas de conhecimento requeridas para o exercício
de uma profissão ou para a execução de uma tarefa;
b) o âmbito do termo qualificação é mais amplo; inclui os requisitos para a ocupação de
um posto de trabalho e/ou o reconhecimento oficial de uma acção de formação formal;
c) o conceito de competência é mais vasto e engloba a capacidade efectiva de um dado
indivíduo para utilizar as suas capacidades ou os seus conhecimentos em situações
profissionais habituais ou novas. Na literatura, a crescente utilização da palavra
competência, em detrimento da palavra qualificação, traduz a tendência para a atribuição
de uma cada vez maior importância do capital humano face à mudanças no mundo do
trabalho.
Tarefa
DE: Arbeitsaufgabe
EN: task
FR: tâche
a) Trabalho que deve ser concluído num determinado prazo (Dicionário de Língua
Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa);
b) Conjunto de actividades com vista à realização de um determinado trabalho, de acordo
com processos técnicos e organizacionais precisos (AFPA);
c) Trabalho que se executa habitualmente (Dicionário de Língua Portuguesa
Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa).
inofor
Nota: o conceito de tarefa engloba, simultaneamente, o processo de trabalho (isto é, as diferentes etapas para se produzir um
bem ou fornecer um serviço) e a função (coordenação, comunicação, organização, etc.).
Saber-fazer profissional / capacidades profissionais
DE: spezifische bzw. Berufliche Fähigkeiten und/oder Fach-/Sachkenntnisse
EN: skill
FR: savoir-faire professionnel/capacities professionnelles
a) Os conhecimentos e a experiência requeridos para se executar uma tarefa ou para se
ocupar um posto de trabalho;
b) O resultado do ensino, da formação e da experiência que caracterizam, com o saberfazer, o conhecimento «técnico» próprio de um emprego.
Nota: O termo inglês skill é, muitas vezes, mal definido. Refere-se, parcialmente, a outros conceitos fundamentais e pode
traduzir-se em português, conforme os contextos, por saber-fazer profissional, capacidades profissionais, conhecimentos, e até
qualificação ou competência; em francês, por qualification, savoir-faire professionnel, aptitudes, capacités; e em alemão,
corresponde a berufliche Fertigkeiten ou Sachkenntnisse. Cf. com a definição de qualificação e competência.
Qualificação
DE: Qualifikation
EN: qualification
FR: qualification
a) Os requisitos para se ter acesso a uma dada profissão e para se evoluir num contexto
profissional;
b) Um documento oficial (certificado, diploma) comprovativo de que um dado indivíduo
frequentou com sucesso uma acção de formação ou que obteve resultados satisfatórios
num teste ou num exame.
Nota: O conceito qualificação varia de país para país. Por vezes, aparece mencionado formalmente nos contratos de trabalho ou
nas convenções colectivas para atestar que um indivíduo se encontra apto para o exercício de um emprego ou que possui as
exigências requeridas. O conceito de qualificação é também utilizado para designar o nível de ensino /de formação de um
indivíduo ou a sua capacidade para fazer face às exigências de um emprego (veja-se a definição de competência). A qualificação
confere um certo número de direitos e de prerrogativas que situam o nível hierárquico no respectivo meio profissional.
187
Colecção CEDEFOP
Competência
DE: Kompetenz
EN: competence
FR: compétence
A capacidade real e demonstrada de um determinado indivíduo para utilizar o seu saberfazer, as suas capacidades profissionais, as suas qualificações ou os seus conhecimentos face
a situações e a exigências profissionais habituais e novas.
Nota: A noção de competência pode definir, simultaneamente, a qualificação formal do indivíduo e a sua capacidade para
transferir um saber-fazer profissional ou um conhecimento para um novo contexto profissional (capacidade de inovação). O nível
ou o tipo -de competência de um indivíduo mede-se através da análise da capacidade para utilizar as suas aptidões profissionais.
As competências podem ser especializadas (isto é, técnicas, por exemplo, o controlo de processamentos digitais), metodológicas
(a capacidade de reflexão, de decisão ou de inovação) ou sociais (capacidades de expressão e de comunicação, espírito de
equipa).
«Realkompetenz / realkompetanse»
DE: Realkompetenz
A competência que resulta da aprendizagem não formal.
Nota: Este conceito é utilizado, sobretudo, na Alemanha e nos países escandinavos.
inofor
3>
Conceitos relacionados com os saberes de base e as competências-chave
189
Colecção CEDEFOP
Introdução
Como já foi sublinhado acima (capítulo II), nem sempre é fácil delimitar com exactidão o
conteúdo de termos como competência, qualificação e saber-fazer profissional (em inglês
competence, qualification e skill). Um estudo efectuado por Eurotecnet, em 1991, em
vários Estados-Membros, revela que os termos que definem as competências (ou as
qualificações)-chave ou transversais se sobrepõem parcialmente; no entanto, existe um
consenso geral sobre a natureza essencial dessas competências. As competências-chave
compreendem as aptidões, a motivação, as capacidades profissionais (skills), os saberesfazer e os conhecimentos (por exemplo, o tratamento de dados) que podem ser
transpostos de um contexto profissional para outro e que são indispensáveis para a
realização do trabalho.
A lista apresentada seguidamente (Comissão Europeia, 1994) fornece alguns exemplos de
termos utilizados em diferentes Estados-Membros, e que descrevem essa noção:
França: Compétences transversales
Reino Unido: Key/core skills
Alemanha: Schlûsselqualificationen
Portugal: Competências transversais
Não ignoramos que os conceitos competências genéricas, competências transferíveis e
competências transversais se sobrepõem parcialmente. No entanto, a definição de
competências-chave dada abaixo procura cobrir todos os aspectos dessas aptidões
«implícitas».
A validação dessas competências é factor essencial para a mobilidade dos trabalhadores.
Neste aspecto, o Sistema Europeu de Acreditação das Competências, proposto pela
Comissão Europeia (cf. Livro Branco sobre a Educação e a Formação: Ensinar e aprender
rumo à sociedade cognitiva) é uma tentativa para permitir que os indivíduos avaliem as
respectivas competências e possam mudar de contexto ocupacional.
inofor
Conhecimentos-base / aptidões-chave
DE: Grundfähigkeiten/Basis-, Kernqualifikationen
EN: basic skills
FR: savoirs de base / aptitudes clés
As capacidades requeridas para evoluir na sociedade contemporânea, isto é, ouvir, falar,
escrever e calcular.
Competências-chave
DE: Schlüsselqualifikationen/Schlüsselkompetenzen
EN: key/core competences
FR: competences clés
O conjunto das competências complementares das aptidões-chave, e que preparam o
indivíduo para:
a) adquirir novos conhecimentos e adaptá-los a novas exigências;
b) adaptar os seus conhecimentos às exigências da «organizações aprendentes» e
participar na definição de novos modos de «aprendizagem organizacional»;
c) adaptar-se às mudanças do mundo do trabalho e melhorar a respectiva mobilidade por
meio da aprendizagem ao longo da vida.
Nota: Na terminologia oficial utilizada no Reino Unido, a expressão core skills foi substituída recentemente por key skills; as
competências transversais compreendem a comunicação, o cálculo, a utilização das tecnologias da informação e da comunicação
(TIC), a capacidade para tomar decisões, o espírito de equipa e a capacidade para melhorar os respectivos conhecimentos.
As mudanças permanentes da nossa sociedade requerem uma cultura de aprendizagem organizacional (organisational learning)
para se poder gerir situações mais complexas e aumentar a capacidade de iniciativa visando a adaptação às novas formas de
organização do trabalho.
A mobilidade (alínea c) da definição) pode considerar-se, simultaneamente, um trunfo (flexibilidade) ou um constrangimento
(precariedade do emprego).
Termos próximos:
Há vários conceitos que se sobrepõem parcialmente à definição acima apresentada:
a) as competências genéricas permitem a aquisição de conhecimentos ao longo da vida e compreendem, nomeadamente, a
leitura, a escrita e o cálculo (isto é, as aptidões-chave), mas também a comunicação, a capacidade de decisão, o espírito de
equipa e de criação, a utilização da informática e as capacidades de auto-aprendizagem;
b) as competências transferíveis designam as competências que um dado indivíduo pode explorar no âmbito de um emprego
ou de uma profissão que não aquela que exerce ou que exerceu recentemente (adaptado de European Training Foundation,
1998).
191
Colecção CEDEFOP
4>
Conceitos relacionados com a identificação, a avaliação e o reconhecimento das competências
193
Colecção CEDEFOP
Introdução
O estudo da literatura da especialidade revela uma falta de coerência no emprego da
terminologia relativa ao reconhecimento da competência, que engloba dois aspectos
principais:
a) o aspecto do reconhecimento formal (de jure), que compreende a identificação, a
avaliação e a certificação. Tem como objectivo conferir uma visibilidade máxima às
competências do indivíduo, quer formalmente (graças a diplomas e certificados) quer
socialmente/institucionalmente (no mercado de trabalho);
b) o aspecto do reconhecimento social/profissional (de facto), que facilita a orientação
profissional, a procura de emprego e o desenvolvimento profissional, favorecendo a
promoção profissional. Esta segunda forma de reconhecimento leva em conta,
nomeadamente, as competências adquiridas através de acções de formação (por
exemplo, em alternância). O reconhecimento social/profissional das qualificações facilita a
transferência das competências no seio das organizações.
Identificação das competências
A identificação das competências visa definir os elementos de competência detidos por um
Sado indivíduo (ou por um grupo), ou requeridos para que tenha acesso à formação,
independentemente do modo de aquisição dessas mesmas competências.
Avaliação das competências
A avaliação das competências pode ser realizada de várias maneiras:
a) as competências resultantes da aprendizagem não formal ou informal (veja-se o
capítulo I) podem ser avaliadas por meio de diferentes métodos, critérios ou pontos de
referência, em função do nível considerado (empresa/ sector/ poderes públicos) e do tipo
de regulação (mercado de emprego ou sistema educativo);
b) as competências resultantes da aprendizagem formal são avaliadas por meio de
procedimentos (testes, exames) que conduzem à certificação.
inofor
Acreditação38 das competências
As competências podem ser acreditadas de duas maneiras:
a) a validação das competências não formais consiste em certificar que um dado indivíduo
adquiriu as competências requeridas para o exercício de um emprego, qualquer que seja o
meio pelo qual as competências foram adquiridas. Esta validação pode conduzir a uma
forma de reconhecimento mais formal, por exemplo, concedendo equivalências ou
créditos de unidades às pessoas que frequentarem uma acção formal de formação, ou
ainda através da emissão de certificados ou de diplomas;
b) a certificação das competências adquiridas formalmente é um processo que permite
que os organismos de formação ou as autoridades da tutela emitam certificados ou
diplomas ou concedam títulos destinados a validar formalmente as competências
adquiridas pelos indivíduos no âmbito de uma acção formal de formação.
Identificação (das competências)
DE: Ermittlung (von Kompetenzen)
EN: identification (of competences)
FR: identification (des compétences)
Processo que consiste em delimitar o alcance e o conteúdo das competências.
Nota: Este processo pode aplicar-se, por um lado, às competências adquiridas de um modo formal (no quadro de uma acção de
formação conducente à obtenção de um diploma) e, por outro, às competências decorrentes da aprendizagem informal ou não
formal (por exemplo, para se obterem unidades de crédito).
38A palavra inglesa accreditation foi inicialmente utilizada no Reino Unido. Além disso, surge nas versãoes francesa e
alemã do Livro Branco, Ensinar e aprender rumo à sociedade do conhecimento, publicado pela Comissão Europeia, em
195
Colecção CEDEFOP
Avaliação (das competências)
DE: Bewertung, Evaluation (von Kompetenzen)
EN: assessment (of competences)
FR: évaluation (des compétences)
Termo genérico que engloba o conjunto dos métodos utilizados para apreciar/julgar o
desempenho de um indivíduo ou de um grupo.
Nota: A avaliação pode aplicar-se tanto ao aprendente como ao formador ou à acção de formação. Em inglês, a avaliação dos
métodos de aprendizagem designa-se, por vezes, evaluation (e não assessment). O termo teste usa-se, habitualmente para
descrever as acções de avaliação efectuadas no âmbito de processamentos formais e específicos, procurando garantir o nível de
fiabilidade de um dispositivo.
Termos próximos:
Teste, exame.
Reconhecimento (das competências)
DE: Anerkennung (von Kompetenzen)
EN: recognition (of competences)
FR: reconnaissanse (des compétences)
a) Processo global que consiste em atribuir um estatuto oficial às qualificações adquiridas
por meios formais de formação (emitindo certificados ou diplomas; veja-se atrás definição
de certificação) ou às competências adquiridas de um modo não formal/informal
(concedendo equivalências, unidades de crédito, validação das competências adquiridas,
etc.). A este processo global dá-se, então, o nome de reconhecimento formal.
b) Processo efectuado pelos intervenientes socioeconómicos para reconhecimento do
valor das competências, recebendo, então, o nome de reconhecimento social/profissional.
Nota: O reconhecimento das competências difere do reconhecimento das qualificações, que designa o reconhecimento por um
Estado dos diplomas obtidos num outro país.
inofor
Acreditação (de competências)
DE: Akkreditierung (von Kompetenzen)
EN: accreditation (of competences)
FR: accréditation/validation (des compétences)
Processo de atribuição de documentos destinados a validar formalmente as competências,
independentemente do modo pelo qual foram adquiridas.
Nota: O processo de acreditação aplica-se quer às competências não formais quer às competências formais. Como foi referido na
introdução, a acreditação da aprendizagem formal conduz à certificação, enquanto a acreditação da aprendizagem não
formal/informal (baseada no trabalho) pode conduzir à validação (tendo como resultado documentos como o portefólio de
competências) ou a meios mais formais de acreditação (equivalência, unidades de crédito, validação de competências adquiridas,
etc.). O processo de certificação (veja-se definição seguinte) pode acompanhar a acreditação da aprendizagem não formal ou
formal. O conceito de acreditação de competências é usado, principalmente, no Reino Unido, embora também ocorra na
Comissão Europeia.
Certificação (das competências)
DE: Zertifizierung (von Kompetenzen)
EN: certification (of competences)
FR: certification (des compétences)
A certificação constitui um reconhecimento oficial e formalizado dos conhecimentos ou
das qualificações adquiridas, que atesta o sucesso de um dado indivíduo no final de uma
acção de formação ou de um exame. A certificação é um acto formalizado de
reconhecimento social, administrativo ou legal, com valor oficial (OCDE).
Nota: A certificação, sob a forma de um certificado ou de um diploma, possui um real valor social ou profissional. Oferece um
meio de actuação protegido pela lei e pode ter grande valor no mercado de emprego. A certificação pode reforçar a transparência
das qualificações, atribuindo um valor formal às competências adquiridas no quadro da vida profissional. Em França, a
certificação remete para uma norma formalizada «oficial» que garante que o portador do «certificado» adquiriu, de facto, os
conhecimentos e os saber-fazer propostos por um dado programa de formação, e que esses saberes adquiridos foram, realmente,
verificados. A certificação abrange três domínios: o dos diplomas, o dos títulos homologados e o dos Certificados de Qualificação
Profissional (CQP) (Cedefop).
197
Colecção CEDEFOP
Certificado (de qualificação profissional) / título (homologado) /
diploma
DE: Abschlußzertifikat/Befähigungsnachweis/Diplom
EN: certificate (of qualification)/diploma/degree
FR: certificat (de qualification professionnelle)/ titre (homologué)/diplôme
Documento oficial que atesta o nível de qualificação atingido por um dado indivíduo.
a) Certificado: documento que tanto atesta que um curso ou um programa de ensino ou
de formação foi frequentado regularmente, como prova que se realizou com sucesso um
exame sobre determinada matéria.
b) Diploma: documento emitido pela autoridade legal, com dimensão jurídica. Pode
condicionar o acesso a certas profissões ou a certos concursos (AFPA, 1992).
c) Título: emitidos por uma autoridade competente, os títulos possuem dimensão jurídica.
O título profissional atesta a aptidão do seu possuidor para o exercício de uma dada
profissão (Cedefop).
Homologação (dos títulos e dos diplomas)
DE: (staatliche) Anerkennung von Titeln und Diplomen
EN: accreditation (of training/ of a training organisation)
FR: homologation des titres et des diplômes
a) Processo de reconhecimento, nomeadamente, pelo Estado (ou, a nível regional, por
exemplo, pelas câmaras de comércio) de um título ou de um diploma.
b) Procedimento regulamentar de inscrição numa lista nacional de títulos ou de diplomas
do ensino tecnológico cujo nível foi previamente definido.
inofor
Validação da aprendizagem não formal
DE: Validierung nicht-formalen Lernens
EN: validation (of non-formal learning)
FR: validation de l'apprentissage non formel
a) Procedimento que consiste em reconhecer, na esfera da formação, do trabalho, da vida
social, etc., saberes, saberes-fazer e competências em sentido amplo, adquiridas ao longo
da actividade profissional, em estudos individuais ou organizados, em práticas associativas
ou de lazer, etc. (Cedefop, 1997).
b) Ponderação do capital de formação e de experiências que um dado indivíduo faz prova.
Nota: Este reconhecimento pode assumir formas muito diversas conforme o espaço no qual é mobilizada e conforme os
intervenientes que vão apreciar as competências adquiridas: acesso a formações para as quais não se dispõe do diploma
habitualmente requerido, dispensas de formação, bónus, promoções, apreciações, classificações, etc.
199
Colecção CEDEFOP
5>
Conceitos relacionados com a transparência e a capacidade de transferência
201
Colecção CEDEFOP
Introdução
O conceito de transparência, a seguir definido, constitui um elemento determinante nos
procedimentos de avaliação e de validação realizados no âmbito do reconhecimento das
qualificações (veja-se capítulo IV) a nível sectorial, regional ou internacional. A transparência
facilita:
a) A possibilidade de transferência das qualificações, tanto no mercado de trabalho como
no sistema educativo (por exemplo, estabelecendo pontes entre o ensino geral e o ensino
profissional);
b) A mobilidade e a empregabilidade dos trabalhadores;
c) A transparência/visibilidade e a possibilidade de comparação das qualificações no
mercado de emprego.
Transparência (das qualificações)
DE: Transparenz der Qualifikationen
EN: transparency of qualifications
FR: transparence (des qualifications)
Grau de visibilidade das qualificações que permite identificar e comparar os
respectivos valores nos níveis sectorial, regional, nacional ou internacional.
Nota: A transparência das qualificações permite que as empresas, os indivíduos, os autores de programas de formação e os poderes
públicos identifiquem as diferenças e as semelhanças entre os diversos sistemas de formação (regionais, nacionais e sectoriais),
determinando, por exemplo, os grupos de tarefas específicas de um emprego ou de uma profissão. A transparência das qualificações
permite racionalizar os investimentos consagrados à formação.
Termo próximo:
Visibilidade (das qualificações)
Comparabilidade (das qualificações)
DE: Vergleichbarkeit der Qualifikationen
EN: comparability of qualifications
FR: comparabilité (des qualifications)
inofor
Grau a partir do qual é possível estabelecer uma comparação entre o nível e o conteúdo das
qualificações a nível sectorial, regional nacional ou internacional.
Nota: A comparabilidade das qualificações reforça a empregabilidade e a mobilidade dos indivíduos. Não confundir este termo
com o conceito de equivalência das qualificações (que designa a equivalência de valor dos diplomas).
Empregabilidade (individual)
DE: Beschäftigungsfähigkeit (der Personen)
EN: employability (of individuals)
FR: employabilité (individuelle)
Capacidade de adaptação de que dá provas um dado indivíduo para procurar emprego,
conservá-lo e actualizar/melhorar as suas competências profissionais.
Nota: A empregabilidade de um dado indivíduo depende, simultaneamente, de critérios racionais (perfil profissional, aptidões,
saberes-fazer) e irracionais/implícitos (os critérios de recrutamento utilizados pelos empregadores). A empregabilidade de um
determinado indivíduo depende do seu nível de qualificação e da sua capacidade para adquirir novas competências, por outras
palavras, da sua «educabilidade». Este último conceito sublinha a capacidade do indivíduo de conduzir o seu desenvolvimento
pessoal, enquanto o conceito de empregabilidade insiste, sobretudo, na capacidade de adaptação às necessidades do mercado em
termos de rendibilidade.
Termo próximo:
«educabilidade»
Mobilidade (individual)
DE: Mobilität (der Personen)
EN: mobility (of individuals)
FR: mobilité (individuelle)
Aptidão de um indivíduo para se adaptar a um novo ambiente de trabalho.
Nota: A mobilidade pode ser geográfica ou «funcional» (mudança de função no interior da empresa). A mobilidade permite que o
indivíduo adquira novas competências e, assim, aumenta a sua empregabilidade.
203
Colecção CEDEFOP
Capacidade de transferência das competências
DE: Ubertragbarkeit von Kompetenzen
EN: transferability of competences
FR: transférabilité des compétences
Possibilidade de se transferirem as competências para um novo contexto, quer profissional
quer educativo.
Nota: A possibilidade de transferência das competências é um elemento-chave da mobilidade dos indivíduos e representa um
trunfo de peso no mercado de emprego. A possibilidade de transferência pode ser estimulada de diferentes maneiras,
nomeadamente, através da modularização dos programas de formação, da criação de centros de balanço e de portefólios de
competências, ou ainda pela validação da aprendizagem não formal. A possibilidade de transferência pode facilitar a transição
entre a formação profissional e as vias académicas e7ou superiores, ou a transferência de competências de um sector para outro.
inofor
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