Cabo Espichel, Cascais, Ericeira

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Cabo Espichel, Cascais, Ericeira
e-Terra
http://e-terra.geopor.pt
ISSN 1645-0388
Volume 21 – nº 5
2010
Revista Electrónica de Ciências da Terra
Geosciences On-line Journal
GEOTIC – Sociedade Geológica de Portugal
VIII Congresso Nacional de Geologia
_________________________________________________________
Minerais argilosos em sequências deposicionais do Cretácico
inferior da Estremadura (Cabo Espichel, Cascais, Ericeira)
Clay mineral associations of Lower Cretaceous depositional sequences
from Estremadura (Cabo Espichel, Cascais, Ericeira)
P. S. CAETANO – [email protected] (Faculdade Ciências Tecnologia da UNL, CICEGE)
C. LEZIN– [email protected] (Université de Toulouse, LMTG)
J. REY– [email protected] (Université de Toulouse)
F. ROCHA– [email protected] (Universidade de Aveiro, Departamento de Geociências, Geobiotec)
P. GONÇALVES– [email protected] (Universidade de Aveiro, Geobiotec)
RESUMO: Associações mineralógicas, em particular de minerais argilosos, têm sido largamente utilizadas
em estudos estratigráficos de índole multidisciplinar. Este trabalho apresenta os resultados obtidos do
estudo mineralógico de sequências deposicionais do Cretácico Inferior da Bacia Lusitaniana, na região da
Estremadura (Cabo Espichel, Cascais e Ericeira).
PALAVRAS-CHAVE: minerais argilosos, sequências deposicionais, Cretácico inferior, Estremadura.
ABSTRACT: Mineral associations, particularly of clay minerals, have been widely used in
multidisciplinary stratigraphic studies. This paper presents the results of the mineralogical study of
Lower Cretaceous depositional sequences from the Lusitanian Basin, in the region of Estremadura
(Cape Espichel, Ericeira and Cascais).
KEYWORDS: clay minerals, depositional sequences, Lower Cretaceous, Estremadura.
1. INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO
O Cretácico inferior na região em redor de Lisboa (desde Ericeira, a Norte, ao Cabo Espichel,
a Sul) é genericamente ocupado por domínio marinho, com plataforma submareal de
sedimentação predominantemente carbonatada; o depocentro da bacia encontra-se nas
proximidades de Cascais (REY, 1972).
A aplicação dos conceitos de estratigrafia sequencial à descrição das unidades cretácicas da
Estremadura permitiu o reconhecimento de 33 sequências deposicionais de 3ª ordem (REY,
1993; REY et al., 2003). Dada a analogia que apresentam, em termos de número e de idade, com
as sequências de 3ª ordem de outras bacias europeias, em particular as bacias de Paris e do Mar
do Norte, pode considerar-se que as sequências da Bacia Lusitaniana têm origem eustática (REY
et al., 2003).
Neste enquadramento geológico, o objectivo deste trabalho foi o de efectuar o estudo do
conteúdo mineralógico dos depósitos de modo a averiguar as características e o tipo de
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assinaturas mineralógicas presentes, tanto no contexto da organização sequencial das séries,
como no dos respectivos posicionamentos paleogeográficos. Por outro lado, os resultados
obtidos poderiam contribuir, também, para o refinar das interpretações já efectuadas e dar
resposta a algumas dúvidas existentes.
Deste modo, foram seleccionados diferentes cortes estratigráficos e sequências deposicionais
de 3ª ordem, correspondentes a contextos sequenciais e paleogeográficos diversos (figura 1):
Guia - sequências Va6 e Va7 (pro parte); Mexilhoeira - Va7 (topo), Ha1 e Ha2 (base); Cabo
Espichel - Ha3; Ericeira - Ha5; Guincho - Ha7; Crismina - Ap2.
Figura 1 – Geografia, contexto geológico e localização dos cortes estudados (in REY, 1972, mod.).
2. MATERIAIS E MÉTODOS
A amostragem efectuada resultou na recolha e selecção de um total de 217 amostras
distribuídas pelos diferentes perfis geológico seleccionados. A grande maioria das amostras
corresponde a calcários, embora alguns tipos litológicos distintos também fossem recolhidos:
calcários dolomíticos, dolomitos, margas e arenitos. Face às litologias presentes foi decidido
determinar associações mineralógicas de amostra total, de resíduo insolúvel e da fracção argilosa
em todas as amostras.
Os estudos mineralógicos, incluindo determinações semiquantitativas, de amostra total, da
fracção insolúvel e da fracção argilosa do resíduo insolúvel (<2 µm), foram efectuados por
difracção de Raios X, seguindo-se metodologia referida em F. Rocha (1993). Procedeu-se
igualmente à determinação do grau de cristalinidade das ilites (ICI) através do índice de
Kubler/Segonzac e dos critérios de H. Kisch (1991). Os resultados obtidos foram interpretados
com métodos estatísticos, através de análise em componentes principais e análise discriminante.
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3. RESULTADOS
Os resultados obtidos do estudo mineralógico permitem confirmar e até efectuar alguns
acertos no esquema sequencial proposto mas, principalmente, poderão ser considerados como
bons descritores do tipo de assinatura mineralógica que se obtém em cada um dos diferentes
contextos sequenciais e paleoambientais analisados. Assim, na tabela seguinte, apresenta-se uma
síntese destes resultados organizados em função das sequências analisadas.
Corte
Crismina
Sequências
(3ª Ordem)
Ap
2
HST
TST
HST
Guincho
Ha
7
TST
TST?/
LST?
Ericeira
Cabo
Espichel
Ha
5
Ha
3
•aumento gradual de ilite em relação a caulinite;
•ilites maioritariamente com elevada cristalinidade (ICI < 0,24).
•incremento de caulinite;
•ilites com cristalinidade elevada (ICI < 0,24);
•“mfs” com valores mínimos de ilite e máximos de caulinite, ilites com máximo de
cristalinidade (ICI = 0,05).
•limite de sequência assinalado por diminuição de filossilicatos, por abundância de ilite
em relação a caulinite (I/K > 1);
•aumento relativo de caulinite;
•ilites com cristalinidade média (0,24 < ICI < 0,42).
•HST caracterizado por aumento de caulinite.
TSTbase
•incremento de filossilicatos.
TST/HST
•correlação da curva de I/K e evolução de parassequências com sucessão de picos de
ilite no topo de cada uma;
•“mfs” marcado por forte incremento de filossilicatos;
•“mfs” marcado por pico de ilite (máximo de I/K = 2,78) e de ICI (= 0,50);
•associações mineralógicas do HST semelhantes às do TST;
•decréscimo relativo de ilite no HST, mas manutenção de picos de ilite no topo das
parassequências.
TST /
HST
Ha
1
LST
HST
Va
7
•correlação de flutuações de composição de associações mineralógicas com superfícies
de emersão (relacionadas com organização sequencial de ordem superior) com
destaque para picos de ilite.
•TST regista forte incremento de ilite, de baixa cristalinidade (ICI > 0,42);
•“mfs” é assinalado por maior abundância de filossilicatos.
TST/HST
TST /
LST?
Mexilhoeira
Principais Resultados Mineralógicos
TST
(topo)
TST
(base)
Guia
Va 6
•abundância de filossilicatos.
•TST caracterizado por aumento relativo de caulinite e da cristalinidade das ilites;
•“mfs” assinalado por pequeno incremento de ilite;
•topo do HST e limite de sequência de Ha2 assinalados por incremento de filossilicatos;
•primeiros níveis de Ha2 apresentam aumento relativo de caulinite (I/K <1).
•pico de ilite no limite de sequência;
•forte incremento de filossilicatos;
•predomínio de ilite sobre caulinite;
•ilites com baixa cristalinidade (ICI > 0,42).
•aumento relativo de caulinite;
•ilites mais cristalinas (ICI < 0,24).
•predomínio de caulinite sobre ilite até aproximação do “mfs”;
•“mfs” assinalado por pico elevado de ilite e menor cristalinidade das ilites (ICI > 0,42).
•aumento relativo de caulinite (I/K <1);
•cristalinidade das ilites com alguma tendência para aumentar (0,24 < ICI < 0,42).
• predomínio geral de ilite sobre caulinite (I/K> 1) e destes sobre M.A.E.;
• pico elevado de ilite imediatamente acima do “mfs”;
• ilites menos cristalinas (ICI > 0,42) ocorrem com a maior abundância de filossilicatos,
em especial logo acima do “mfs”.
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4. CONCLUSÕES
Numa apreciação geral, o conjunto dos resultados obtidos, com claro predomínio da ilite e da
caulinite sobre os minerais argilosos expansivos, está de acordo com o posicionamento
paleogeográfico dos cortes estudados, isto é, nas zonas mais proximais da bacia,
maioritariamente em domínios da plataforma. Assim, a proporção relativa entre esses minerais
argilosos deverá, reflectir, sobretudo, a acção das influências eustática e climática sobre os
ambientes de deposição. Do ponto de vista da organização sequencial, e na maior parte das
sequências (Va6, Va7, Ha1, Ha3 e Ap2), registam-se significativos incrementos de ilite, em
relação à caulinite, em torno dos máximos de inundação.
No entanto, as sequências Ha5 (Ericeira) e Ha7 (Guincho) não apresentam, em termos da
relação das associações mineralógicas com a organização sequencial, registo semelhante ao das
restantes sequências. No caso de Ha5, observa-se claro predomínio de caulinite sobre ilite em
quase toda a série sedimentar. Em relação à sequência Ha7, verifica-se ocorrência de pico de
caulinite junto ao máximo de inundação e com máximos de ilite a ocorrerem junto aos limites de
sequência. Estes resultados da sequência Ha7 estão, genericamente, mais de acordo com modelos
propostos para sucessões sedimentares originadas em ambiente profundos (e.g. Deconinck, 1993;
Daoudi et al., 1995), do que com modelos sugeridos para ambientes de plataforma. Esta
sequência apresenta ainda outras características pouco comuns quando confrontadas com as
outras sequências estudadas: uma invulgar uniformidade de fácies, uma elevada espessura
(superior a 40 m), cerca de 2,6 vezes a média de espessuras da generalidade das sequências
(Gonçalves, 2004; Caetano, 2004) e a presença de estruturas periódicas relacionadas com
variações de padrões orbitais (Lezin et al., 2009).
Referências
Caetano, P. S. (2004) – Mineralogia e geoquímica de sequências sedimentares do Jurássico-Cretácico da Bacia
Lusitaniana. Tese Doutoramento, Univ. Nova de Lisboa, 333 p.
Daoudi, L., Deconinck, J.-F., Witam, O. & Rey, J. (1995) – Impact des variations du niveau marin sur les argiles:
exemple du Crétacé inférieur du bassin d’Essaouira (Maroc). C. R. Acad. Sci. Paris, t. 320, série IIa, pp. 707711.
Deconinck, J.-F. (1993) – Clay mineralogy of the late Tithonian-Berriasian deep-sea carbonates of the vocontian
through (SE France). Bull. Centres Rech. Expl.-Prod. Elf-Aquitaine, Pau, vol. 17 (1), pp. 223-234.
Gonçalves, P. (2004) – Mineralogia e geoquímica da sequência Ha7 do Guincho (Bacia Lusitaniana). Tese
Mestrado, Univ. Aveiro, 139 p.
Kisch, H. J. (1991) - Illite crystallinity: recommendations on sample preparation, X-ray diffraction settings and
interlaboratory samples. J. Metamorphic Geol., Oxford, 9, pp. 665-670.
Lezin, C., Bonnet, L., Rey, J., Caetano, P. S., Gonçalves, P., Rocha, F. & Rocha, R. (2009) – Orbital forcing of
stratal patterns in an inner platform carbonate succession: an example from an Upper Hauterivian series of the
Lusitanian Basin, Portugal. Ciências Terra, Lisboa (no prelo).
Rey, J. (1972) – Recherches géologiques sur le Crétacé inférieur de l’Estremadura (Portugal). Mem. Serv. Geol.
Portugal, Lisboa, N.S., nº 21, 477 p.
Rey, J. (1993) – Stratigraphie séquentielle sur une plate-forme à sédimentation mixte: exemple du Crétacé inferieur
du Bassin Lusitanien, Comun. Serv. Geol. Portugal, Lisboa, t. 79, pp. 87-97.
Rey, J., Graciansky, P. C. de & Jacquin, Th. (2003) – Les séquences de dépôt dans le Crétacé inférieur du Bassin
Lusitanien. Comun. Inst. Geol. Min., Lisboa, t. 90, pp. 15-42, 17 fig.
Rocha, F. T. (1993) – Argilas aplicadas a estudos litostratigráficos e paleoambientais na Bacia Sedimentar de
Aveiro. Tese Doutoramento, Univ. Aveiro, 399 p.
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