Boletim Janeiro Sabores e Saberes
Transcrição
Boletim Janeiro Sabores e Saberes
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região | Ano VI . N° LXIV. Janeiro de 2013 EDITORIAL Acesse o Boletim online no site www.credivertentes.com.br FARISIANISMO Percebemos, por vezes – e quantas! – uma mentalidade farisaica, falsa e falseadora por parte de setores da sociedade ao avaliar comportamentos pessoais. Todos somos cúmplices e invigilantes ao julgarmos, ao condenarmos, ao apontarmos desvios, ao erguermos testemunhos contra o próximo, contra nossos irmãos. “A maledicência é o pior de todos os crimes sociais” (Dante Alighieri). Pessoas há que são usinas tóxicas ao gerar e fomentar críticas, boatos – verdadeiros ou não – sobre terceiros. São caçadoras de escândalos, proclamando aos ventos – hoje até pelas redes virtuais (internet, twitter, etc.) – quaisquer falhas e eventuais pecados alheios. Usam microscópios, vasculhando, aumentando – seja por maldade, por inveja, ciúme, vingança, desocupação, imperfeição – as ações dos vizinhos ou contemporâneos. Um embrutecimento, uma irracionalidade em nossa espiritualidade. “Quanto mais frágil é o caluniador, mais perigosas as suas ações. Não seja vulnerável aos espíritos fracos que não suportam ver um espírito forte” (Paulo Coelho) Hipocrisia pura, pois Deus, na Sua Suprema Misericórdia e Longanimidade, nos ordena sempre termos compaixão, exercermos permanentemente solidariedade e fraternidade, estarmos vigilantes, não sermos ou darmos motivos a escândalos, cuidarmos das travas e escamas que nos cobrem os próprios olhos (nossas imperfeições e erros) ao invés de apontarmos o cisco no olho alheio. Fragilidade de nossa personalidade, pois, ao nos entrincheirarmos e exteriorizarmos inveja, espinhos, cobranças, incapacidade de perdoar, tornamo-nos blasfemos, nos colocando acima da Divindade. Na verdade, enquanto estamos nos queixando, reprovando, externando ressentimentos, amarguras, presunções, orgulhos ou seja uma censura explícita a Deus; achamo-nos superiores, maiores e melhores do que os outros, que Deus nos é indiferente ou nos sonega algo de que, ingênua ou soberbamente, nos consideramos donos. AO PÉ DA FOGUEIRA Fatos pitorescos, históricos, lendários, folclóricos etc...de São Tiago e região 1Ô2 Certo político, figura controversa, exótica, administrador e curador de conhecida cidade da região - gestão marcada pelo populismo, clientelismo, laivos de coronelismo, bizarrices a gosto da massa,- é personagem de muitos e pitorescos “causos” e que compõem o rico folclore político eleitoral de nosso meio. Nosso heroico homem público, remanescente, em pleno século 21, de vigorosa e burlesca fauna da política nacional do passado, é abordado na rua por um cidadão, como centenas de tantos outros brasileiros transformados em “pedintes” alguns reconhecidamente aproveitadores ou espertalhões - o qual solicita-lhe uma ajuda para reforma de casa. O político, acostumado a essa cena de “cevar” eleitores, toma de papel e caneta e garatuja, um bruto circunflexo sobre o O - Entregar 1 Ô 2 saco de “simentu”... Assina a improvisada autorização e orienta, a seguir, ao “eleitor” que leve o bilhete até a loja X, fornecedora de material de construção, (aliás, uma pergunta: de onde saem os recursos para se custear tanta “bondade” e quanta “benevolência”?!) para receber a mercadoria. Algum tempo após, o político, ao fazer o acerto junto à loja, dos tantos “favores” e benesses concedidos aos cabresteados eleitores, assusta-se quando – ao ser-lhe apresentada a conta – que um único beneficiado levara 102 sacos de cimento. Diz, agastado, ao funcionário responsável: - cambada de analfabeto, não sabem ler um bilhete. Eu mandei entregar 1 ou 2 sacos.... INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO TIAGO 1- Você sabe de que lado da casa as árvores crescem melhor? 2- Nome de homem que lido de trás para frente deixa a noite clara. 3- Está no poço, mas não é água; está na cabeça, mas não é cabelo. O que é? 4- Nasci escondido, mas apareço para o mundo quando estou contente. Quem sou? Respostas: 1- Do lado de fora; 2-Raul; 3- cedilha; 4- Dente Provérbios e Adágios *A mordida não é, nem de longe, tão grande quanto o latido (muito vento, pouca chuva) *Mais risco corre o navio no porto do que em alto mar *Quem tem medo de bichos não vá à floresta. *Água remansosa, água perigosa. *Tatu não sobe em árvore; se está lá alguém o colocou. Dia 05 de Dezembro pp., em marcante solenidade no Salão Roda viva (Albergue Santo Antonio) de nossa cidade, sob a presidência da Profª Maria de Lourdes Rezende, foram oficialmente empossados os membros do Instituto Histórico e Geográfico de São Tiago-IHGST, presentes inúmeras e altas autoridades locais (dentre elas o Prefeito atual, sr. Denilson Silva Reis e o prefeito eleito, sr. Irimar José Mendes; presidente da Câmara Municipal, sr. Guaraci Vieira, vereadores, professores) e dezenas de são-tiaguenses que abrilhantaram o evento. Vários números musicais foram apresentados pelos alunos do Centro Cultural/ FOCEST e ainda pela música e cantora, srª Antonia Santiago ao violino e violão, sob aplausos. Foi apresentada, na oportunidade, por cada membro empossado do IHGST uma resenha biográfica e enaltecedora dos patronos/patronesses de cada cadeira, gerando reconhecimento e mesmo emotividade geral. INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO TIAG Cadeiras e respectivos ocupantes do IHGST: Fundado em 28 de maio de 2.007 - CNPJ 09.304.431/0001-16 Rua São José, 55 | Centro | Cep. 36350-000 | São Tiago | MG E-mail: [email protected] - www.portalsaotiago.com.br ___________________________________________________________________ CADEIRA, PATRONOS/PATRONESSES E SÓCIO DO IHGST CADEIRA, PATRONOS/PATRONESSES E SÓCIO DO IHG Para refletir: • • A vida é bela; que as gerações futuras a limpem de todo o mal (Leon Trotsky) Ao pobre faltam muitas coisas; ao avarento, todas (Publilio Siro) • O tempo é o móvel visível da eternidade (Platão) EXPEDIENTE EXPEDIENTE QUEM SOMOS: O boletim é uma iniciativa independente, necessitando de apoio de todos os SãoTiaguenses, amigos de São Tiago e pessoas comprometidas com o processo e desenvolvimento de nossa região. Contribua conosco, pois somos a soma de todos os esforços e estamos contando com o seu. Redação: João Pinto de Oliveira, Heloisa Helena V. Reis Oliveira e Marcus Antonio Santiago Apoio: Ana Clara de Paula e Angela Carolina Ribeiro Costa E-mail: credivertentes@sicoobcredivertentes com.br COMO FALAR CONOSCO: BANCO DE DADOS CULTURAIS/INSTITUTO SÃO TIAGO APÓSTOLO Rua São José, nº 461/A - Centro - São Tiago/MG CEP: 36.350-000 – telefone: (32) 3376-1107 Falar com Angela Carolina Ribeiro Costa CADEIRA 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 PATRONO/PATRONESSE Doutor José Gaudêncio Neto (Sócio correspondente) Maria dos Anjos de Melo Maria Luíza Vivas Joaquim Pinto Lara Professor José Augusto de Resende Henrique Pereira Santiago Doutor Augusto Viegas Brás Navarro Joaquim Vivas da Mata Luiz de Freitas Benjamin Amadeu de Almeida Doutor Júlio Ferreira de Carvalho Maria Teófila Navarro Octávio Leal Pacheco Padre José Manuel da Rosa Ribeiro Capitão João Pereira Santiago Padre José Duque de Siqueira Professora Maria José Lara Padre Tiago de Almeida Antônio de Andrade Reis Monsenhor Francisco Eloi de Oliveira Professora Rosália Alice de Carvalho Maria José dos Reis Domingos da Costa Afonso Joaquim Aleluia Mendes Vicente José Mendes SÓCIOS Adriana de Paula Sampaio Martins Ailton Alexandre de Assis Altair de Minas Caputo Antônia Geralda Santiago Décio Jonas Coelho Delza Assis Denílson Silva Reis Elena Maria Campos Flúvio Antônio Salomão Martins Glêdes Maria Vivas Leão Janete Aparecida Silva Vieira Costa João Batista Silva Coelho João Pinto de Oliveira Jordana de Minas Caputo José Alves de Oliveira José Faria Santiago Jucimara da Piedade Lara Luciane Aparecida Lopes Silva Lucy Lara de Andrade Marcus Antônio Santiago Maria da Conceição Silva Mata Maria de Lourdes Rezende Maria Ilza Mendes de Almeida Matta Maria Inês Vieira de Almeida Paulina Feliciana Viegas Tiago do Rosário Mendes Santiago Zely Rezende ADMISSÃO REGIST 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.04.2.010 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 19.11.2.009 28.04.2.010 22.03.2.011 28.05.2.007 28.05.2.007 22.03.2.011 28.04.2.010 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.05.2.007 28.04.2.010 28.04.2.010 22.03.2.011 28.04.2.010 28.05.2.007 INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO TIAGO/MG Fundado em 28 de maio de 2.007 - CNPJ 09.304.431/0001-16 Rua São José, 55 | Centro | Cep. 36350-000 | São Tiago | MG | E-mail: [email protected] - www.portalsaotiago.com.br Patrocínio: Realização: Apoio Cultural: 2 Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região 010710020710030710050710071010080710090710120710140910151010411111170710180710421111211010220710230710240710250710270710300710310710341010351010371111391010401010- “A POEIRA” E O RETRATO Vicente Mendes foi, entre nós, o principal chefe político do antigo Partido Social Democrata-PSD, agremiação que, juntamente com a União Democrática Nacional-UDN, polarizaram o mundo políticoeleitoral brasileiro no período entre 1945 a 1964, ano esse em que foram extintas pelo regime militar. Vicente era praticamente imbatível nas eleições paroquiais. Era o maior empresário são-tiaguense da época, a população dele dependia para quase tudo: locomoções e viagens (era ele proprietário de frotas de caminhões e ônibus, que se deslocavam para todos os lugares e rincões); comerciante varejista e atacadista, era ele quem abastecia quase todas as vendas, bitacas e portas abertas – rurais e urbanas – de toda a região adjacente; homem experiente, denodado, de iniciativas, correligionário e amigo pessoal de figurões da República como Tancredo Neves, Juscelino Kubitschek, Israel Pinheiro, frequentava palácios governamentais e as mais finas rodas sociais e políticas do País; resolvia problemas pessoais, funcionais e profissionais junto a repartições públicas e instituições privadas das centenas de pessoas que o procuravam, ao longo do ano. Homem carismático, porém senhorial. Fazia política dia e noite. Ao pé do ouvido, noite adentro ou ostensivamente, à luz do dia. Enquanto comprava e vendia mercadorias, transitava em seus veículos pelas estradas esburacadas do meio rural, prestava favores de toda ordem àquela população sofrida, carente, esquecida e afrontada pelo Estado e os poderosos: o transporte de um doente, uma carta de apresentação para um moço ou pai de família em busca de emprego, o aviamento de uma receita de medicamento raro ou caro na Capital do Estado ou mesmo no Rio de Janeiro e São Paulo, onde Vicente mantinha fortes negócios; solucionar um registro em cartórios; um sorriso, uma mão sobre o ombro, um agrado para uma criança, tudo era instrumento de captação de simpatia e de votos. Era, em suma, um prestidigitador, um mágico político de cuja cartola só saíam votos... A conta ou o resultado positivo disso vinha com as eleições. As pessoas gratas ou mesmo impotentes e sem opção despejavam votação cerrada nos candidatos indicados por Vicente. E alguns deles, façam o favor...Mas era só abrirem-se as urnas e as burras lá estavam cheias de cédulas pessedistas... Precavido, tomava, ademais, outras medidas, não muito cristãs e regulamentares. Munido de uma máquina Kodak dos anos 50, ele próprio deslocava-se para os cantos e recantos mais distanciados do município e além fronteiras, alistando eleitores, mesmo analfabetos ou semialfabetizados. À medida que parava o caminhão num povoado, num boteco de beira caminho, por ele abastecidos, Vicente oferecia seus préstimos de fotógrafo para que todos tirassem o título de eleitor. Levava o interessado, ou melhor, o cooptado, para detrás do caminhão, geralmente sujo pela poeira ou lama daquelas verdadeiras trilhas, fazia-o sentar-se Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região num engradado de cervejas, abotoava-lhe o botão da camisa ou paletó, corrigia-lhe rapidamente a postura e clicava. Mais uma foto tirada e decerto, mais um voto a aumentar o seu redil eleitoral para aquilo que os adversários esperneavam e chamavam de “curral do Vicente” Como não se anotavam os nomes de tantos eleitores fotografados, ao longo de tantas semanas e tantos lugares, missão difícil ou tida como desnecessária à época, dada a precariedade vigente, a hora em que os retratos chegavam do laboratório (para onde eram encaminhados os filmes a serem revelados), era quase impossível saber quem era quem. Fotos chegavam misturadas e sem qualquer identificação. Daí serem elas coladas, aleatoriamente, aos títulos e esses, quando entregues aos portadores, a reclamação era generalizada. - Mas, sêo Vicente, esse da foto aqui no título não sou eu... Vicente, maroto, tinha sempre uma resposta pronta, na ponta da língua: ora punha a culpa na máquina, ora no fotógrafo, ora no laboratório. Muitas vezes, dava-se um jeito de corrigir o problema, colando a foto real do eleitor. Certo dia, um cidadão de cor branca, tez muito clara, já quarentão, queixou-se a Vicente, exibindo o título com a foto apensa e que mostrava um rosto de um jovem e bem apessoado mulato. Vicente foi rápido, não dando tempo para muita fala: - É você mesmo. Foi a poeira, meu amigo. Deve ser que a lente da máquina tava suja de pó na hora em que tirei sua foto e eu não me apercebi... Mas é você mesmo, olha que belezura...Até te remoçou...Um galã de cinema, meu amigo, de fazer inveja a um Antony Quinn... Outra artimanha de Vicente, dentre tantas jogadas e malabarismos, era “importar” eleitores, arrebanhando-os em fazendas, povoados e periferias dos municípios circunvizinhos. Com isso, engordava o eleitorado são-tiaguense e por tabela o número de votos dos candidatos por ele apoiados e indicados. Em certo pleito, ano eleitoral, Vicente transferira, dentre outras tantas maranhas e maquiavelices, uns 20 a 30 eleitores da povoação dos Machados, no município de Bom Sucesso, habilitandoos a votarem em São Tiago. Um dos caminhões do Vicente, no dia da eleição, buscara-os pela manhã e os reconduzira à tarde. Cocoza, por sinal adversário político de Vicente, muito embora seu funcionário, fora o motorista encarregado do transporte. Encerrado o pleito, apurados os votos, o PSD, partido de Vicente vencera por pequena margem. Os adversários UDN, então derrotados, lembraram-se dos eleitores recambiados por Vicente do povoado dos Machados. Uma comissão udenista, dentre eles o sr. Antonio Alvim e o próprio Cocoza, desloca-se até lá, buscando colher subsídios que comprovassem a irregularidade. Os possíveis eleitores são abordados. Um nega que tenha votado em São Tiago, afirmando ser eleitor em Bom Sucesso (era comum alguns eleitores votarem em dois ou mais lugares diferentes, pois não havia o sistema de controle hoje existente). Outro diz nunca ter conhecido ou sequer sabia o rumo de São Tiago. Um terceiro desconversa, dizendo estar pescando no dia da eleição. Mesmo Cocoza reconhecendo vários deles, um a um se esquivavam, talvez orientados previamente pelo Vicente. Uma “desconversação” e uma escorregadela geral... Cocoza olha para os companheiros de partido e conclui: - vamos embora, estamos perdendo tempo: aqui não é só o voto, mas até a boca está comprada... 3 PERNAS, CANELAS E OLHADELAS JD foi um dos mais experientes motoristas que trabalhou nas empresas e Organizações Mendes de nossa cidade, de propriedade do Sr. Vicente José Mendes (1910/1994), conglomerado que atingiu o seu auge comercial e de negócios, em meados do século passado,( até as décadas de 1980, 1990).. JD. era natural de São Tiago, irmão do sr. Trombone. Caminhões e ônibus da empresa Mendes eram praticamente os únicos meios de transporte e locomoção, para quem, naqueles tempos, desejava ou necessitava se deslocar para outras cidades da região e ainda capitais como Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro. Pessoas mais abastadas, gestantes ou mães com crianças de colo, enfermos tinham o costume de viajar – pagando passagem ou por benesse do proprietário – na boleia (cabine) junto ao motorista, minimizando-se os traumas e desconfortos da viagem – estradas de terra esburacadas, empoeiradas ou enlameadas conforme a estação, repletas de curvas, crateras, mataburros e pontes geralmente quebrados, itinerários cansativos e longos. Uma verdadeira epopéia, principalmente para quem viajasse na carroceria. Mês de Janeiro. Inícios da década de 1950. Chuvas torrenciais. Caminhos semi-intransitáveis. JD ao volante de possante Chevrolet sai de São Tiago, pela manhã, rumo a São João Del-Rei. Como passageira especial, uma senhora de tradicional família local e frequentadora, ao lado do marido, da mais alta sociedade da região, do Estado e de outras capitais do País, em particular o Rio de Janeiro, então a capital do País.. Culta, viajada, refinada. O esposo, um alto empresário e executivo de renome e com trânsito livre nas mais elevadas rodas políticas e empresariais do País. 4 Eram aqueles tempos ainda de muito recato. O respeito social à mulher era uma praxe. Alterações da moda feminina, como o uso de calças compridas ainda demorariam alguns anos a surgir ou a serem aceitas em nossa cultura. A dama trajava longo e amplo vestido em tom bege, um tailleur rodado, moderno, vistoso, como nos figurinos e salões da high society de então. Como acessórios, luvas, fina bolsa a tiracolo, joias distribuídas pelo corpo em forma de colares, brincos, pulseiras, lenço de seda pendente do pescoço, perfume inebriante trescalando pelo ambiente. Já, ao adentrar a cabine, o movimento ou o impulso de subir, alto o estribo do veículo, fizeram com que tornozelos, panturrilha e até joelhos aparecessem. Sobressalto, expectativas para o motorista. Olhadelas a princípio , sutis., disfarçadas – de soslaio. Um frissom, um deleite. Dá-se início à viagem. Partida no motor. J.D., com um olho na estrada e outro ao menor movimento da senhora, direcionado às pernas da passageira.. Tornase repetitiva, ostensiva, visível a postura. Até que a senhora, de forma elegante mas firme, percebendo o fato, diz ao motorista: - “O que o senhor está procurando ?! Perdeu alguma coisa ?!” E com uma certa e maliciosa ironia: “ O que o senhor tinha que ver, canelas, curvas, o sr. já viu” Da forma como o senhor está se conduzindo, estrada perigosa dessas, daqui a pouco teremos um acidente! Concentre-se, pois, no seu serviço e... nas curvas da estrada!” Foi o bastante para que o atabalhoado e envergonhado condutor fixasse bem os dois olhos e toda a sua atenção na estrada, até chegar ao destino. E com extremo receio de que a dama levasse o fato ao conhecimento do patrão ou do marido, ambos poderosos. Estaria, sem dúvida, em maus lençóis... A MODA NAS DÉCADAS DE 1940/1950 A partir das décadas de 1940/1950, em especial encerrada a II Guerra Mundial, a moda feminina evoluiu significativamente. E com uma certa agitação, um retumbante frenesi. A mulher ocidental passou a se vestir de forma mais glamourosa, principalmente após os lançamentos dos modelos “New Look”, criados e lançados em 1947 pelo Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região estilista Christian Dior (1). A silhueta feminina viu-se então mais jovial, solta e com alguma – aliás, bastante – sofisticação, sempre com enfoque na aparência, na estética.. Maquiagem valorizando o olhar e realçando a intensidade e contorno dos lábios, daí surgindo uma infinidade de lançamentos de produtos para os olhos e também sucessivamente para os lábios, cabelos, face e pele. (rímel, sombra, lápis, cosméticos, tintas para cabelos, hidratantes etc.) Penteados acompanhando o estilo “rabo-de-cavalo”, inspirados na atriz Brigitte Bardot. Cabelos mais curtos, com mechas caindo no rosto e franjas dando à sua portadora um “ar de menina”. Dois estilos de beleza feminina marcaram os anos 50 – o das “ingênuas chiques”, encarnados por Grace Kelly e Audrey Hepburn, estilo natural, jovial; e o da mulher sensual, fatal encarnado pelas atrizes Rita Hayworth e Ava Gardner. Esses estilos viriam a ser confluídos e fundidos posteriormente por dois grandes símbolos da beleza da década de 1950: Marilyn Monroe e Brigitte Bardot, numa devastadora combinação de sensualidade e ingenuidade. Os modelos e peças femininas de então tornaram-se inconfundíveis como o famoso tailleur com guarnições trançadas, a requintada bolsa a tiracolo em matelassê, o escarpin bege com ponta escura, o lenço de seda, o prêt-a-porter. Figurinos da época incluíam paletas de cores e tons quentes, como o ocre, o café com leite, o bege. Os calçados tiveram igualmente uma grande evolução em termos de modelos, sendo famosos o “salto-agulha”, o “saltochique” (encurvado para dentro), o “bico chato”, o “quadrado” dentre outros e que atraíam as consumidoras. 1. Outros grandes estilistas e mestres da costura mundial desta época foram o espanhol Cristobal Balenciaga, Hubert de Givenchy, Pierre Balmain, Chanel, Madame Grés, Nini Ricci. Grandes lojas (maisons) bem como costureiros da alta moda se sobressaíram, Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região como Jacques Fath, Jeanne Paquin, Robert Piguet e Jean Desses tornaram a França o reino mundial da moda. Merece ênfase ainda o surgimento de revistas especializadas em moda feminina, como a Vogue e Elle. No Brasil, o nome mais badalado da época (década de 1950) foi o estilista Gil Brandão. OUTRO “CAUSO” JD tinha fama de namorador, de conquistador. Bom de conversa e de lábia. Adoçava bocas e corações. Daí o seu apelido, dizem. Certa vez, de amores com certa jovem local, buscava uma forma de beijá-la. Era ela uma bela morena, corpo escultural, a atrair a atenção e desejos de muitos jovens e marmanjos. Buscava aproveitar uma folga ou um descuido dos pais que, zelosos e dentro dos rígidos costumes da época, tinham o hábito de vigiar o namoro das filhas. Ensaiou, ansiou por um desses momentos. A moça parecia-lhe muito cândida, inocente, sorriso angelical. Olhava-o, porém, com olhos perturbadores, intrigantes. Até que certa noite,, luar exuberante nos céus, ao despedir-se da jovem à porta da residência, vigilância afrouxada dos familiares, JD, entre juras de amor, apontou o firmamento, dizendo à enamorada: - Olha, meu amor, quão bela a lua!... Tão logo a jovem volveu o olhar e o rosto para o alto, João aproveitou a oportunidade, beijando-lhe meigamente os lábios... A jovem acolheu o beijo, mas sem antes ponderar: “assim não vale....” A versão diz que a moça, então, agarrou o namorado, beijando-o freneticamente, compulsivamente e com bastante técnica, sensualidade e um voluptuoso repertório. Uma especialista na arte e nos encartes... O donjuan levou um garro e um sarro daqueles! Era ela muito mais viva e esperta do que parecia à primeira vista ou aos olhos do namorado. O ingênuo da história era o galanteador... 5 PRÁTICAS POPULARES DE CURA E REPRESSÕES A prática de curas, magias e sortilégios foi, em todos os tempos, uma constante da humanidade e obviamente com manifestações em nosso País e nossa região. São crenças coletivas, transmissíveis com o aval social e sancionadas milenarmente pela opinião pública. Via de regra, o curandeirismo – embora presente em todas as culturas – encontrou repressões por parte de algumas religiões convencionais, de setores ditos científicos e particularmente da legislação. O Código Criminal republicano brasileiro de 1890 passou a criminalizar os curandeiros e terapeutas populares. O artigo 158 desse Código proibia “ministrar ou simplesmente prescrever, como meio curativo interno ou externo e sob qualquer forma preparada, substâncias dos reinos da natureza, fazendo ou exercendo assim o ofício de curandeiro”. Uma repressão generalizada e institucionalizada, vedando desde terapia com ervas até práticas religiosas como espiritismo, cultos afroameríndios, práticas evangélicas de cura e outras, que passaram, ao contumaz e policialesco arbítrio do Estado, a serem perseguidas. Os códigos repressivos e “científicos” não distinguiam simples raizeiros, benzedores e sensitivos, receitadores de chás medicinais, ministros religiosos, que nada cobravam por seus serviços terapêuticos, daqueles charlatães, exploradores da crendice e credulidade popular, embusteiros e feiticeiros malignos. Todos eram colocados indistintamente no mesmo saco, havendo nos arquivos da justiça brasileira inúmeros processos contra humildes e honrados curadores., geralmente pessoas incultas, de boa fé, agentes sociais que realizavam e ainda realizam suas práticas curativas, de forma oral, por vezes ritualística. o que parece incomodar ainda hoje a muitos “donos” da fé.... O médico e antropólogo Nina Rodrigues, em seu clássico “Os africanos no Brasil”, afirma que o móvel da repressão e arbitrariedade legal “é o estúpido terror do feitiço” (pág. 247), estranhando o autor, ademais, a incongruência da legislação que punia o feiticeiro, mas não os que demandavam o feitiço. Provoca e ironiza o autor: “E como poderiam (as autoridades) se todos aqui se curam com ervas do mato?” (pág.78) A repressão a simples raizeiros e benzedores era fruto, obviamente, de preconceitos e resquícios inquisitoriais, por um lado, acrescido ao fato de que a República brasileira – aliás produto de um canhestro golpe de Estado – mantinha em seus primórdios larga influência positivista e cientificista. Os curadores e curandeiros, apesar do respeito e até temor que geravam junto à população, no mínimo foram vistos como uma ameaça à ordem religiosa, legal e científica. Para essa ordem, a demanda das classes populares aos curadores era algo condenável, censurável, atraso cultural, portanto não assimilado pelos cânones, normas e valores morais, moralistas e religiosos oficiais da época. Daí reivindicarem o monopólio da ciência e corporação médica, o que implicava em discriminação contra práticas de cura popular, mesmo inofensivas, tidas como crendices e superstições, incompatíveis, segundo tais próceres, com a modernidade e a ciência. O fato é que, dada a ânsia desmedida pela cura por parte das populações, sempre houve e sempre haverá, o seu exercício e a convivência de terapias, sejam amparadas cientificamente, sejam oriundas das tradições culturais e das práticas populares, com raízes que se perdem na noite do tempo. Umas consubstanciando as outras. O próprio Dr. Chernoviz, cujos livros eram de uso obrigatório legal nas farmácias, flexibilizava o emprego de ervas, raízes e até benzeções no tratamento de enfermidades. (1) A POSIÇÃO RELIGIOSA O preconceito tipicamente cristão contra o “sobrenatural”, a magia, a terapêutica popular tem suas origens principalmente na Idade Média. Incapaz de entender as causas das catástrofes (epidemias e doenças letais, como as pestes, que provocavam grandes mortandades e atingiam a Europa), os religiosos – muitos deles teólogos renomados, homens da mais elevada cultura e sabedoria, falando e incriminando em nome de Deus – passaram a atribuir tais fatos às “bruxas” e às religiões politeístas em especial a celta (druida), que foram barbaramente exterminadas. (2) 6 As mulheres, acusadas de feitiçaria, foram as grandes vítimas dessa sanha ginecofóbica. Muitas, nada mais eram que herbanárias, camponesas conhecedoras de chás, parteiras, pessoas inofensivas, essencialmente benéficas às comunidades de sua época, herdeiras de milenares tradições de cura, benzimento e aconselhamento. Uma medicina à base de ervas e rituais campestres. Fitoterapeutas, na linguagem de hoje. Mas para a Igreja, para a Inquisição – bruxas perversas que participavam de orgias, bacanais. Voavam. Dai as perseguições apavorantes praticadas e os estigmas que se estenderam até os dias atuais. Para a cultura teológica da época e ainda de alguns segmentos atuais (basta assistir a programas de alguns pregadores pela TV e os cultos de alguns prelados e dignitários de nosso meio), o mundo se dividia em duas forças indissociáveis: o bem e o mal. E quem ditava(m) as estruturas sociais, políticas, individuais, a ordem hierárquica familiar, e até o próprio Estado e o Universo? - Ora, a autoridade religiosa! Revestida do manto religioso e do “poder divino”, alguns setores degenerados da Igreja atribuíam aos “hereges”, “pecadores” e toda a “escória” o rótulo de “inimigos da fé e de Deus”, com a irretocável condenação de Mal. Para estes, as masmorras, torturas inomináveis e as fogueiras... E como complemento, o inferno escaldante e eterno! Na obra “As bruxas e seu mundo”, o arguto pensador espanhol Julio Caro Baroja relata processos contra mulheres acusadas, cruelmente ultrajadas e massacradas pela Inquisição, muitas queimadas vivas. Cenários de horror, hediondez e loucura religiosa. Escabrosos crimes de lesa-humanidade. Em um dos processos realizados em Toulosse (França) no século XV, certa senhora de nome Catarina, da aldeia de Delort, embora jurasse inocência, mas sob nefandas torturas, “Confessou a verdade pressionada pelos meios que estão ao nosso alcance” (autos da Inquisição): “que participava de sabás e orgias e em seus sortilégios e feitiços, fazia cair granizo sobre as plantações e campos das “pessoas de quem não gostava”, “fazia apodrecer trigais e vinhedos e matava animais”. Como sacerdotes eruditos, dominicanos em sua maioria, na prática verdugos sanguinários, celerados e apóstatas, poderiam acreditar em tais relatos, ainda que arrancados sob tétricos suplícios?! Como acreditar que pessoas pudessem voar, destruir, à distância, plantações e rebanhos ?! Tempos loucos, barbaridades e atrocidades em nome do Cristo, o Imaculado Cordeiro de Deus.... Alguns pensadores afirmam que o Cristianismo foi inicialmente uma doutrina de cunho e culto urbanos, estendendo-se posteriormente pelo meio campesino. Na Europa, deparou com crenças milenares, consideradas pagãs, que cultuavam a natureza e que foram impiedosamente massacradas A palavra “pagão,” cuja etimologia vem de “pagus” (aldeia), aliás, nomeava todos os não-adeptos da religião oficial. E para os “pagãos” medievais europeus, sobrou todo o peso da intolerância e da barbárie., o que viria ocorrer posteriormente com as civilizações indígenas da América, dizimadas e trucidadas impiedosamente. Vivemos hoje numa sociedade pluralista, laica, dita democrática. Cabe-nos ter e manter o respeito a todas as formas organizadas de cultura, muitas delas milenares como as indígenas e africanas, cultivadas e exercitadas ainda no interior do País. (3) A cultura, o conhecimento não são propriedades exclusivistas de ninguém. Muito menos, compete-nos ditar ou impor normas a outrem pela força, pelo terror, pela pretensa superioridade de nosso conhecimento, seja ele político, teológico, científico, econômico... NOTAS (1) Boticários, farmacêuticos e até médicos produziam extratos, elixires, poções, cataplasmas, pomadas, a partir de compostos minerais e vegetais. Basta uma leve consulta a jornais de final do século XIX e inícios do século XX. Época de interiorização da medicina acadêmica e que, de forma gradual, sanava as demandas de saúde da sociedade da época. Apesar da intolerância de autoridades públicas administrativas e judiciais, curandeiros e praticantes de formas alternativas de saúde e de cura (raizeiros, benzedores, parteiras, etc.) exerceram um importante papel no passado e que prossegue, de maneira geral, sob prismas mais modernos, até os diais atuais. (2) Em 1292, o Papa Inocêncio IV publicou o documento “Ad Exstirpanda”, no Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região qual diz que “os hereges devem ser esmagados como serpentes venenosas”, dandose início às perseguições oficiais contra os “inimigos” de Deus e da Igreja. Este documento foi renovado e confirmado por vários papas sucessores como Alexandre IV (1254-1261), Clemente IV (1265-1268), Nicolau IV (1288-1292) e Bonifácio VIII (1294-1303) Foi este último Papa quem em 1302 emitiu a súmula “Una sanctum” que declara oficial, secular e regiamente a Igreja Católica romana como a única e verdadeira Igreja, fora da qual ninguém se salva, ponto de vista cegamente praticado ainda hoje por certos prelados.. Historiadores protestantes e mesmo católicos classificam Bonifácio VIII como um homem iníquo, ambicioso, arrogante, impiedoso e devasso. Outro pontífice polêmico, tido como licencioso e corrupto, foi Roderigo Bórgia que administrou a Igreja sob o título de Alexandre VI (1492-1503). Tamanhas as turbulências vividas pela Igreja, neste período, que o notável Papa Júlio lll, em 1553, após estudos promovidos a seu pedido por brilhantes teólogos, perplexo, declarara que a “Igreja estava cheia de doutrinas antibíblicas”. (Fonte: “Babilônia, a religião dos mistérios” - Ralph Woodrow, págs, 99 a 103) Em 1546, o ilustre e erudito Cardeal Reginaldo Pole descreveu “Nós mesmos somos em grande parte, responsáveis pelo infortúnio ocorrido – pelo surgimento da heresia e o colapso da moralidade cristã -, pois não conseguimos cultivar o campo a nós confiado. Somos como o sal que perdeu o sabor. A menos que nos penitenciemos, Deus não falará conosco” (apud N.S.Davidson, “A Contra Reforma”, Ed. Martins Fontes, 1991, pág. 23) Enganam-se os que pensam ou apregoam até injustamente que abusos e atrocidades ocorreram apenas no seio da gloriosa Igreja Católica, perpetrados por alguns grupos de maus seguidores e potentados. A denominada Igreja Reformada (protestantismo) ou celerados em seu nome, igualmente cometeram desmandos e nefandas excrescências. Um dos mais escleróticos e obscurantistas líderes reformistas foi Calvino, cujos atos parecem ter sido copiados pelos retrógados, sanguinolentos e truculentos aiatolás que hoje governam o Irã. (ver box). Em 12/12/1532, Calvino determina que todo morador de Genebra declare sua religião, sob pena de expatriamento, prisão e sequestro de bens. (3) Tivemos, em nosso meio, no passado, célebres benzedores, raizeiros. Dentre eles Emídio do Bengo (próximo a S.João del-Rei); Antonio Mariano (Ouro Fino/Passa Tempo), José Machado de Souza (Córrego Fundo), Zé Licota ,(São Tiago),personalidades que atraíam milhares de pessoas, provindas das mais diversas localidades, em busca de cura. Antonio Lara Resende em sua obra “Memórias I” faz menção ao conhecido “médico” e boticário, Joaquim Leonel, tio do autor. “Muito ligado ao seu tio médico, Dr. Gervásio Pinto Cândido de Góes Lara, irmão de minha avó, com ele adquiriu Tio Joaquim longa prática e alguma teoria para ter na Lage a primeira botica. Acompanhava o tio nas visitas aos doentes, lia-lhes os tratados, observava e o auxiliava nas intervenções cirúrgicas que então se faziam nas próprias casas dos doentes, salvo casos excepcionais, quando este podia transportar-se para ambiente menos impróprio. Dizia-se que Tio Joaquim chegou a saber de cor o que, sobre diagnóstico e tratamento de doenças mais comuns, traziam os tratados que herdou do tio” (pág.375, op.cit.) “Morto o tio médico em 1893, o sobrinho e auxiliar, já então dentista e boticário, passou também a “surjão”, que era como o povo denominava os práticos no exercício da medicina. Em natural reação irônica, os formandos passaram, mais tarde, a chamá-los curandeiros, charlatães ou carimbambas...” (pág.376, id.) O memorialista também faz referência em suas “Memórias” a conhecido raizeiro da Lage (Resende Costa) de nome Chico Leopoldino (pags.150/153) CURIOSIDADE HISTÓRICA: Na secção “A pedidos” do jornal “O Arauto de Minas” de São João del-Rei edição Maio de 1879, um cidadão que assina O. Langgaard, escreve uma carta indignada à redação dirigida ao sr. Chernoviz, denunciando a abertura de uma farmácia no arraial de São Tiago, onde tanto o proprietário quanto o empregado não eram farmacêuticos. Trecho da carta: “”Sr. Chernoviz, Vossa Senhoria em certo tempo mostrou-se tão interessado pela saúde pública; pergunto-lhe agora se isto não será abuso e se não causará detrimento à saúde pública ? Primeiro: ter botica aberta sem ser pharmacêutico ou licenciado ou sem, ao menos, ter prática? Segundo: o mesmo empregado interessado da pharmácia receitar e manipula? V.Sª, como meu colega e que o leitor usa como pseudônimo, deve concordar comigo que isso é abuso demais!...”. Os personagens mencionados são o Dr. Chernoviz, médico polonês cujos Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região manuais, que incluía o uso de ervas e raízes e o autor da carta, o Dr. Otto Langgaard, farmacêutico dinamarquês, proprietário da Pharmácia Imperial em Campinas (SP) que vendia remédios importados alopáticos e homeopáticos e que diligentemente, apontava farmacêuticos não licenciados para exercer as funções de cura no interior do País. Esclareça-se que as atividades médicas e farmacêuticas, à época, eram regidas por legislação datada de 1850 e gerenciadas/fiscalizadas pela Junta Central de Higiene Pública. Esta Junta, por razões diversas (falta de profissionais habilitados no interior, força e poder político, etc.) acabava por autorizar pessoas práticas ou não habilitadas para o exercício das “funções de cura”. CRISTO E A TOLERÂNCIA “O Filho do homem não veio para perder as vidas dos homens, mas para salvá-las (Lc 9,56) “O que não é contra vós é a vosso favor” (Lc 9,50) CALVINO João Calvino (1509-1564), um religioso francês com sólida formação em línguas clássicas e humanística e depois convertido ao luteranismo, radicou-se em 1536 em Genebra (Suíça), onde impôs disciplinas rigorosas à população, em termos de vestuário, costumes sexuais, negócios temporais, frequência religiosa, comparecimento à Igreja. Delimitava rigidamente o que era certo e errado, até atos de cunho meramente pessoal, e considerava que todo sistema de vida embasava-se nas Escrituras Sagradas (obviamente, segundo a sua interpretação e o seu ponto de vista). Assim, na sua acepção, as Escrituras eram a única fonte de fé e sua interpretação guiada diretamente pelo Espírito Santo. Segundo alguns biógrafos, Calvino era de uma personalidade inquieta, irascível, conhecido desde a escola como “caso acusativo”, pois sempre criticava e censurava as falhas dos colegas e até de superiores. A religião passou a regular a vida política, social, e até a afetiva e íntima da população. Calvino defendia a tese da predestinação, na qual o homem jamais poderia conhecer sua sorte – salvação ou danação eterna – e em que a escolha de uns e a rejeição de outros era um sinal de mistério de Deus. A salvação, desta forma, é obra e virtude exclusivas da Livre Graça de Deus. O trabalho era visto como uma vocação divina e o sucesso um sinal da predestinação. A riqueza tornava-se assim um dos sinais exteriores da Graça Divina, razão pela qual os calvinistas e grupos de protestantes em geral adotaram uma severa disciplina moral em que todas as energias canalizavamse para o acúmulo de bens. Calvino radicalizou a interpretação bíblica. O homem seria, por sua origem, uma criatura miserável, corrompida, pecaminosa e somente a fé poderia salválo. E essa salvação era um atributo ou decisão exclusiva de Deus. Tornouse um ditador político, moral e religioso de Genebra. Formou um consistório (assembleia de pastores e anciãos) que vigiava rigorosamente os costumes, espionava e delatava a tudo e a todos e administrava a cidade inteiramente submetida à “Lei do Evangelho”. Diz-se que até as relações sexuais eram “controladas”. Eram proibidos qualquer tipo de jogo, danças, teatro. A vida privada era levada à esfera pública, à exprobação e à violência moral ou física. Qualquer pessoa tida como “herege” poderia ser excomungada, expatriada ou conduzida à fogueira ou ao patíbulo. Intolerante, intocável, perseguiu com rigor e terror todos aqueles a quem considerava “adversários” ou “libertinos”. Entre as suas vítimas, Jacques Gruet e principalmente o cientista espanhol Miguel Servet, que descobriu a dupla circulação do sangue, queimado por Calvino em 1553. O Calvinismo expandiu-se para outros países, como na Escócia, onde comandado por: John Knox (1505-1572) tornou-se a religião oficial sob a denominação de “presbiteriana”. Na França, os calvinistas foram denominados “huguenotes” e se envolveram em sangrentas guerras religiosas e políticas. O crescimento do Calvinismo deveu-se ao apoio que recebera de parte da nobreza, da época - muitos inescrupulosos e rapinadores - interessados em negócios (prática mercantilista) e ainda na pilhagem dos vastos bens da Igreja Católica. 7 Bolivar Silveira de Andrade Bolivar nasceu em 04/10/1954 e faleceu em 10/10/2012. Adoeceu desta forma: Em 1998 apareceu com furúnculos pelo corpo. Eu José Machado da Silveira Neto, levei-o a muitos tratamentos. Em 2009 ele sarou deste terrível mal que o atormentava. Clamava que doía, ardia e queimava muito. Passado algum tempo ele apareceu com terríveis dores de cabeça. Levei-o a vários médicos. Em São João del-Rei, levei-o ao Dr. Jorge Diogo e contei que, apesar de vários tratamentos, as dores de cabeça de meu irmão continuavam. As dores de cabeça eram tão fortes que me faziam pavor, eu acordava com ele em gritos de tanta dor dizendo: dor de cabeça gente, dor de cabeça gente ... depois dizia: dor de cabeça Senhora Aparecida, dor de cabeça Senhora Aparecida. O dr. pediu uns exames da cabeça e os resultados não acusaram problema nenhum. Ele receitou um remédio e pediu que eu voltasse com meu irmão (retorno) daí a 30 dias. Com a segunda receita o médico conseguiu curá-lo por mais de um ano e meio. Passado mais de um ano e meio, as dores retornaram. Eu voltei com ele mais duas vezes ao Dr. Jorge Diogo, mas não foi possível curá-lo, chagando ele a morte. Olhem e vejam bem: Morávamos na Florinda, eu José Machado da Silveira Neto, Nelson Silveira de Andrade e Bolivar Silveira de Andrade. Na doença do Bolivar eu até deixei de ir às festas para cuidar dele. Tudo de bom eu escolhia primeiro para eles. Sempre falava com eles: somos três irmãos, o dia que faltar um de nós os outros dois vão sentir muito. Quando chegar a faltar dois, o último vai ficar triste, passando da conta. E tudo isto veio cair em mim. Como aconteceu a morte do meu irmão: Saí de casa para a cidade para ver uns exames dele e chamei-o para vir comigo umas quatro ou cinco vezes, mas ele me disse que estava desanimado. Então pedi a Deus e ao Senhor Jesus Cristo que tomasse conta dele prá mim e saí tranquilamente. Voltando da cidade, antes de acabar de chegar, avistei-o andando no terreiro. Cheguei, cerca de dez minutos antes de acontecer a morte. Fui pegar um cavalo para buscar as compras na estrada e ele falou: - vou com você. Fui na frente, quando olhei para trás ele estava caído na estrada. Voltei correndo. Ele estava roxo, babando, sufocado. Puxei-o, fiz massagem, virei-o , tornei a virar, coloquei os dedos na boca dele. Mas Deus o chamava e não fui capaz de salvá-lo. Vou seguir então um dos melhores finais: Peço a Deus todo poderoso, a Senhor Jesus, a São Pedro que abram as portas do céu para meu irmão. Agradeço a todos que compareceram ao velório e ao sepultamento e a todos que não puderam comparecer. Irmãos: Noé Silveira de Andrade; Noeme Silveira de Andrade; Nivaldo Silveira de Andrade; Nair Nazaré de Andrade; Nilton Silveira de Andrade; Nelson Silveira de Andrade; Nicanor Silveira de Andrade; Nara Silveira de Andrade; José Machado da Silveira Neto; Bolivar Silveira de Andrade – filhos de Teodoro Gabriel de Andrade e Olímpia Conceição de São José. Um versinho em homenagem ao Bolivar e a todos vocês A flor do maracujá era branca igual a neve Hoje porém ela é roxa, mas não é da natureza Foi o sangue de Cristo que nela pingou E transformou sua beleza. José Machado da Silveira Neto - Novembro/2012 8 Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
Documentos relacionados
PREÂMBULO AO PÉ DA FOGUEIRA GESTOR CULTURAL
Histórico e Geográfico de São Tiago, Instituto Educ. São Tiago Apóstolo/Banco
de Dados Culturais, Focest e demais incentivadores.
O profundo agradecimento aos leitores, aos colaboradores anônimos q...