Arte Portuguesa do século XX1
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Arte Portuguesa do século XX1
Arte Portuguesa do século XX1 1. O cenário: política e sociedade Falar da Arte em Portugal no século XX implica, necessariamente, ter presente a realidade política que foi, de forma significativa, enformadora da realidade cultural e artística. Uma parte substancial do século XX português decorreu sob a orientação política da Ditadura Militar (1926-1933) e do Estado Novo (1933-1974). Se o primeiro quartel do século conheceu duas realidades políticas bem diferenciadas (o fim da Monarquia e a Primeira República), já o último foi vivido, ao menos em boa parte, ainda sob a influência doutrinária do Estado Novo. Se o regime político e constitucional mudou significativamente, já as formas de pensar e de agir fizeram perdurar as estruturas anteriormente criadas. De facto, este regime, tão longo no tempo, havia exercido tal esforço de endoutrinação que as suas raízes se mantiveram, e, de certas formas, ainda perduram. Não parecerá, pois, estranho, que a esse período se dedique atenção especial neste texto. Seguindo as teses da história estrutural, já foi usual afirmar-se que em Portugal o século XX teve início apenas em 1910. De facto, o dealbar do século ficou marcado pela fase final do regime monárquico e pela implantação da República2. Se é verdade que as alterações políticas e de regime foram marcantes, não menos é verdadeiro que o novo regime saído do 5 de Outubro de 1910 trouxe ao mundo da Arte, enquanto parte de uma esfera mais vasta (a da Cultura, da História e do Património) uma nova atenção legislativa e um novo conceito de defesa do património3. A essas novas preocupações 1 Por Sérgio Lira, Professor Auxiliar da Universidade Fernando Pessoa – Porto – Portugal; PhD University of Leicester (U.K.) 2 Acerca da história portuguesa deste século é de interesse a consulta de: MATTOSO, José (dir.) - História de Portugal, Lisboa, Ed. Estampa, vols. 7-8. 3 Já tivemos oportunidade de nos referir a este aspecto, especificamente no que se refere aos museus portugueses, em LIRA, Sérgio - "Linhas de força da legislação portuguesa relativa a museus para os meados do século XX: os museus e o discurso político" in Actas do V Colóquio Galego de Museus, Consello Galego de Museus, Melide, 1998 e em LIRA, Sérgio - "Portuguese legislation on museums during the Estado Novo: from the First Republic inheritance to the changes of the sixties." in Museological Review, Leicester, Museum Studies Department, vol. 6, 1999, p. 73-87. 1 corresponderam novas iniciativas legislativas que, ao longo da 1ª República, foram enquadrando o esforço desenvolvido no sentido de uma nova e mais eficiente preservação do património4. Se na letra da lei essas iniciativas legislativas parecem coerentes e dotadas dos mecanismos necessários à sua boa execução, já na prática o esforço da 1ª República se saldou muitas vezes por uma incapacidade operacional evidente e por uma fracasso pragmático difícil de admitir. De qualquer forma, os princípios evocados pela legislação deste período podem ser resumidos nas seguintes intenções principais: promover a salvaguarda do património nacional (especialmente no que respeita ao património histórico, artístico e arqueológico), evitar a exportação de bens culturais, suportar a reorganização e modernização dos museus nacionais e implementar a fundação de museus regionais. Após a queda da 1ª República, a 28 de Maio de 1926, a Ditadura Militar que se lhe seguiu e que preparou o Estado Novo, alterou a breve trecho o que havia sido feito entre 1911 e 1926, afeiçoando à ideologia nacionalista que se estava construindo a imagem do património5. De facto, se numa primeira fase adoptaram os governos da Ditadura Militar o esqueleto legislativo que haviam herdado da República, considerando-o inclusivamente como um modelo de virtudes6, numa segunda fase, e notoriamente sob a influência decisiva de António de Oliveira Salazar7, o regime ditatorial modificou profundamente essa 4 A última peça legislativa de importância considerável neste domínio, e que reflecte o espírito da legislação anterior, é a lei nº 1700 de 18 de Dezembro de 1924. 5 É exemplo desta viragem o decreto nº 20985, datado de 7 de Março de 1932. 6 Veja-se o que afirma o texto legislativo do decreto nº 15216 de 22 de Março de 1928 que se intitula "Reorganização dos serviços artísticos e arqueológicos". No prólogo afirma que a legislação portuguesa existente sobre a matéria havia sido "Vazada nos moldes das mais perfeitas organizações similares estrangeiras (...)" e tinha já dado boas provas. A título de exemplo aponta a constituição de museus regionais (que desempenharam um papel fundamental na salvaguarda dos valores artísticos e arqueológicos) e a organização do Museu Nacional de Arte Antiga "(...) que, de um armazém mal arrumado, se transformou num dos bons museus da Europa.". Neste contexto o Governo optou, não por preparar legislação completamente nova com "(...) os riscos de tudo o que é novo e imprevisto, mas sim modificar e melhorar a antiga.". 7 António de Oliveira Salazar foi Professor na área da economia na Universidade de Coimbra; presidiu aos destinos políticos de Portugal durante largos anos; iniciou a sua carreira política como ministro das finanças durante a Ditadura Militar e assumiu mais tarde o cargo de Presidente do Conselho (Primeiro Ministro) para não mais o abandonar. Acerca da sua biografia ver NOGUEIRA, Franco - Salazar, Porto, Livraria Civilização, 1977/81. Para algumas análises da vida e obra de Salazar ver: BRITO, José M. Brandão de - "Sobre as ideias Económicas de Salazar", in SILVA, Duarte et all. - Salazar e o Salazarismo, Lisboa, Pub. D. Quixote, 1989; FERRO, António - Salazar - O homem e a sua obra, Lisboa, Emprensa Nacional de Publicidade, 1933; GOMES, F. Matos - Salazar. Professor e educador de um povo, Porto, Edições Além, 1953; LIMA, Fernando Castro Pires de - Salazar no vértice de oito séculos de história, Porto, Domingos Barreira Editor, 1940; ROSAS, Fernando - "Salazar e o Salazarismo: Um caso 2 legislação e lançou as bases daquilo que viria a ser, sem posteriores alterações de monta, o edifício normativo respeitante ao património até aos anos cinquenta. Do mesmo modo procedeu em relação a testemunhos históricos e artísticos (monumentos, edifícios, peças de arte móvel, textos literários, entre outros). O Estado Novo, firmado no referendo que aprovou a Constituição de 1933, continuou essa linha de actuação, reforçando-a. Nas bases ideológicas do Estado Novo encontramos a tetralogia Deus, Pátria, Família e Trabalho que associados dão origem ao nacionalismo do regime8. Como conclusão ideologicamente sustentada, o nacionalismo entrega ao Estado Novo a responsabilidade da manutenção da dignidade, independência e integridade da pátria, afirmando-se claramente que apenas este regime o pode realizar com êxito. Nas bases do nacionalismo português encontramos, assim, a Nação, o Território e a História e Tradições que assumem o lugar de valores simbólicos para a ideologia prevalecente. Na qualidade de valores simbólicos assumem o papel de temas principais do discurso nacionalista e sobre eles se fundam muitas das actuações legislativas que ao património respeitam. O Estado Novo escolheu algumas das características destes temas principais e glosou-as na política patrimonial. Assim, a Nação era vetusta, orgulhosa da sua existência, reconhecida internacionalmente e importante em termos de civilização mundial; o Território era unido, indivisível e multi-continental; a História e Tradições eram respeitáveis, veneráveis e motivo de orgulho nacional. de longevidade política", in SILVA, Duarte et all. - Salazar e o Salazarismo, Lisboa, Pub. D. Quixote, 1989, p. 13-31; SILVA, Duarte et all. - Salazar e o Salazarismo, Lisboa, Pub. D. Quixote, 1989. No que se refere à história de Portugal sob a sua égide, ver MATTOSO, José (dir.) - História de Portugal, Lisboa, Ed. Estampa, vols. 7-8; ver também SERRÃO, Joel e MARQUES, A. H. de Oliveira (dir.) - Nova História de Portugal, Lisboa, Ed. Presença, vols. XI-XII. Para uma visão não portuguesa de Salazar, consultar: KAY, Hug - Salazar and Modern Portugal, London, Eyre and Spottiswoode, 1970; EGERTON, F. C. C. - Salazar, Rebuilder of Portugal, London, Hoddar and Stoughton Ltd., 1943; GALLAGHER, Tom - Portugal, A Twentieth-century interpretation, Manchester, Manchester University Press, 1983; GRAHAM, L. S. and MAKLER, H. M. (eds.) - Contemporary Portugal, The revolution and its antecedents, Austin and London, University of Texas Press. 8 A afirmação de Salazar a este respeito é exemplar: SALAZAR, António de Oliveira - Discursos e notas Políticas, Coimbra Editora, 2ª ed., vol. II, Coimbra, 1946, p. 130 a 135: "Não discutimos Deus; não discutimos a Pátria; não discutimos a Autoridade; não discutimos a Família; não discutimos o Trabalho." 3 A Nação era, no entendimento de alguma historiografia nacionalista do Estado Novo, anterior ao Estado9. À volta de Afonso Henriques ter-se-iam conglomerado as vontades das gentes, num espírito de independência bem anterior à sistematização das instituições e à formação do reino independente. Esse último passo, diluído entre 1143 e 117910, marcou a formação da independência política mais antiga e estável da Europa, resistente a todos os ataques e que se manteve nessa condição de independência até à actualidade. O Estado Novo sempre enfatizou a idade da independência nacional e a idade das fronteiras estáveis11 como um dos argumentos mais apologéticos da valorização da Nação. Em 1947 as comemorações da tomada de Lisboa foram um momento particularmente interessante no que respeita à divulgação desta forma de entender o nacionalismo. O culto do herói Afonso Henriques e a sua missão de dilatar a fé cristã foram temas centrais das comemorações. Esta última era, aliás, outra das importantes funções acometidas à nação portuguesa, segundo a óptica do Estado Novo: a propagação da fé e, consequentemente, da civilização. O Território, na sua dimensão Europeia, era apresentado como o mais antigo e estável território independente da Europa. Na sua dimensão ultramarina, os territórios apresentados como portugueses eram ditos posse de Portugal por direitos de descoberta e de conquista, referidos sempre como inalienáveis parcelas do todo nacional12. À imagem do todo continental, unido - 9 Veja-se, a título de exemplo, as tentativas exercidas na historiografia dedicada às crianças (HISTÓRIA de Portugal Verbo Juvenil, Lisboa, 1966) ou em obras declaradamente nacionalistas (como AMEAL, João - História de Portugal das origens até 1940, Porto, Livraria Tavares Martins, 7ª ed., 1974) de fundar em épocas remotas o impulso independentista. Tal era caminho contrário ao que havia defendido Alexandre Herculano na sua História de Portugal, onde a tese do sucesso político explicava a emergência de um novo país. 10 Datas, respectivamente, do tratado de Zamora e da Bula Manifestis Probatum, usadas pela historiografia portuguesa para determinar o início da independência, em função da atribuição a Afonso Henriques do título de rex. 11 Veja-se, a título de exemplo, as afirmações de Salazar a tal respeito em SALAZAR, op. cit., p 132: "... para nós portugueses que somos hoje velhos de oito séculos (...) não há (...) pedaço de soberania ou de terra que nos pese e estejamos dispostos a alijar de cansados ou de cépticos ...". 12 Cf. o Acto Colonial; veja-se ainda o que Salazar a firmou repetidamente a este respeito, em particular quando foram lançadas suspeitas de que Portugal estaria na eminência de "alugar" Angola à Alemanha nas vésperas da II Grande Guerra (29 de Janeiro de 1937): SALAZAR, op. cit., p 264: "Alheios a todos os conluios, não vendemos, não cedemos, não arrendamos, não partilhamos as nossas Colónias com reserva ou sem ela de qualquer parcela de soberania nominal para satisfação dos nossos brios patrióticos. Não no-lo permitem as nossas leis constitucionais; e, na ausência desses textos, não no-lo permitiria a consciência nacional.". 4 e existente porque unido - procurou o Estado Novo ministrar a ideia de que o todo português era também colonial13 e que não poderia deixar de o ser, sob pena de perecer a própria existência nacional. Aqui entronca a ideia de identidade: para o regime, Portugal era multi-continental não por capricho de momento ou, sequer, apenas por vontade ou desígnio político: Portugal era multi-continental por constrangimento histórico14 e a sua própria existência dependia da manutenção dessa característica identitária. De forma clara, o regime definia que esse "ser" colonial era um projecto a longo prazo, onde a presença das colónias não poderia ser entendida como simples acidente de percurso, mas sim como solução histórica. Tal era visto desta forma não apenas de uma óptica política ou institucional mas também sob um ângulo estritamente económico. As colónias deviam ser parte do todo económico nacional que corresponderia ao todo político15. Esta visão do Império era de tal forma arreigada que o regime não hesitava em afirmar de maneira absolutamente peremptória a sua inabalável decisão de o manter. Fundava tal decisão especialmente em dois factores: por um lado a base constitucional do próprio Estado Novo consignava – com o Acto Colonial – as possessões ultramarinas como territórios portugueses; por outro, o espírito nacionalista era avesso a qualquer possibilidade de alienação de parcelas territoriais16. Assim, este território - europeu na origem, atlântico por vocação geográfica e multicontinental por desígnio histórico e civilizacional - era uno por vontade política e indivisível por necessidade identitária. Portugal era, assim, um país, uma nação 13 SALAZAR, António de Oliveira - Discursos e Notas Políticas, Coimbra Editora, 2ª ed., vol. II, Coimbra, 1959, p 79 e 80: "Somos sobretudo uma potência atlântica, presos pela natureza à Espanha, política e economicamente debruçados sobre o mar e as colónias, antigas descobertas e conquistas. Nem sempre a nossa política se fez de Lisboa ou da parte continental, mas de outros pontos, tal a ideia de que a colónias não o foram à maneira corrente mas partes integrantes do mesmo todo nacional.". 14 SALAZAR, António de Oliveira - Discursos e Notas Políticas, Coimbra Editora, 2ª ed., vol. II, Coimbra, 1959,p 83: " Portugal constitue com as suas colónias um todo, em virtude de um pensamento político que se fez pelos tempos fora realidade política.". 15 SALAZAR, António de Oliveira - Discursos e Notas Políticas, Coimbra Editora, 2ª ed., vol. II, Coimbra, 1959, p 155: "Para alguns espíritos as Colónias deveriam constituir uma espécie de quaintas de luxo, a que demais não faltaria a vegetação luxuriante de plantas exóticas (...) Para outros seriam (...) campos ou indústrias de renda que permitissem ao absentista vagamente interessado a vida ociosa (...). [As economias da Metrópole e das Colónias] hão-de considerar-se complementares na formação do todo económico correspondente ao todo político nacional.". 16 SALAZAR, António de Oliveira - Discursos e Notas Políticas, Coimbra Editora, 2ª ed., vol. II, Coimbra, 1959, p 264: "Alheios a todos os conluios, não vendemos, não cedemos, não arrendamos, não partilhamos as nossas Colónias com reserva ou 5 e um estado, espalhado por variados territórios em todos os continentes. A unidade de partes tão diversas era explicada pela complementaridade que cada uma exercia relativamente às outras: no território Europeu cada província era uma parte de uma manta de retalhos que só fazia sentido quando associada às outras; este mesmo argumento era usado para explicar a unidade (tida por inevitável) de todo o império ultramarino. Do ponto de vista territorial Portugal era, desta forma, um grande país. Grande em termos territoriais, grande também em termos de efectivos demográficos e de influência internacional. A História e as Tradições foram usadas pelo Estado Novo em três vertentes fundamentais: a) primeiro, a criação de uma "tradição" de independência, afirmando-se a tese de que as populações que habitaram o actual território português Europeu sempre tiveram uma tendência para a independência territorial face ao resto da Península. Tal tese foi inclusivamente mote de alguns argumentos extremos que pretendiam ver em épocas préhistóricas – na tradição megalítica, nos concheiros de Muge – origens de vontade independentista, ou, para época mais recente, na resistência à ocupação romana liderada por Viriato a primeira expressão de uma vontade de independência política. b) segundo, a defesa da ideia de que alguns heróis nacionais, homens de excepcionais qualidades patrióticas e de liderança, mantiveram (quantas vezes à custa do sacrifício pessoal) a independência tão difícil e precocemente adquirida; nesta acepção se enquadra ainda a exaltação da época das descobertas marítimas dos séculos XV e XVI como a "idade de ouro" da existência de Portugal, uma época sem igual na história nacional e que deveria servir de modelo a uma grandeza desejada no presente. Desta forma, o Território fora conquistado e mantido (com sacrifícios incontáveis...) pela Nação. Assim fora herdado e dessa forma haveria de ser mantido. Dessa tarefa se fazia arauto o Estado Novo. Para tal o recurso às lições da História sem ela de qualquer parcela de soberania nominal para satisfação dos nossos brios patrióticos. Não no-lo permitem as nossas leis constitucionais; e, na ausência desses textos, não no-lo permitiria a consciência nacional." 6 surgia como natural: refazer a glória pátria (pisoteada pela "balbúrdia"17 do regime republicano), seguindo as pisadas dos portugueses de antanho, era tarefa que se poderia alcançar se se atentasse nos exemplos de que a História era pródiga. Olhar para trás, de forma obsequiosa, era pois atitude do regime, defendida como instrumento indispensável à realização de um dos seus escopos maiores: reafirmar uma respeitável portugalidade. As lições da História mostravam o que era ser verdadeiramente português, e nos exemplos dos heróis mitificados deveria ser encontrada inspiração para reerguer o orgulho de se ser português18. Esta utilização da história como argumento ideológico resultou na elevação à qualidade de herói do líder do Estado Novo: Salazar era o homem que havia sido capaz de resolver o mais grave dos problemas nacionais (o descalabro económico e financeiro) e de devolver à nação o sentimento de dignidade19. Em várias ocasiões este sucesso de Salazar foi exaltado em exposições nacionais e internacionais; nos finais da década de 30 fazia-se ressaltar o facto de Portugal ser um país de finanças equilibradas. Sobre este aspecto da actuação governativa de Salazar repousou uma parte importante da propaganda do regime. c) finalmente, e em terceiro lugar, a tradição foi usada na sua acepção popular, na exaltação da verdade nacional encerrada no mais vernáculo da cultura popular. Se alguns homens do passado haviam sido elevados à qualidade de heróis, e dessa forma glorificados, o regime encontrou um outro herói que trabalhou ideologicamente de forma consequente: um herói colectivo, o povo. Não o povo classe social de um marxismo temido e execrado20, mas o povo/nação, moldado ideologicamente por uma historiografia construída à luz de uma interpretação que dava aos condutores de multidões uma aura de santidade e às multidões, 17 O termo é empregue de forma pejorativa por AMEAL, João - História de Portugal das origens até 1940, Porto, Livraria Tavares Martins, 1940, na designação do capítulo relativo à Primeira República: "Balbúrdia Sanguinolenta". 18 Veja-se, a título de exemplo, alguns dos textos de Galvão in GALVÃO, Henrique - Álbum Comemorativo da Primeira Exposição Colonial Portuguesa, Porto, Litografia Nacional, 1934. 19 Veja-se a este respeito FERRO, António - Salazar - O homem e a sua obra, Emprensa Nacional de Publicidade, Lisboa, 1933. 7 ainda que eventualmente brutas e ignaras, um sentido de heroicidade nacionalista insuperável. Os exemplos históricos eram claros: quando Afonso Henriques funda o reino tem com ele o povo que luta bravamente contra o Castelhano e contra o Infiel; quando em 1383/85 o Mestre pugna pela manutenção da independência tem com ele o povo que odeia o estrangeiro e quer manter Portugal independente; quando o Infante D. Henrique lança Portugal no mar tem com ele um povo de marinheiros capaz das mais audaciosas viagens pela glória da pátria; quando em 1640 um grupo de nobres defenestra o lacaio espanhol tem com ele o povo que urge pela retoma da independência; enfim, quando em 1926 o país é salvo da República e Salazar assume a tarefa hercúlea de refazer a honra pátria, tem com ele o povo saturado de golpes e contra-golpes, de fome e de miséria, de ignomínia nacional, que o aplaude e apoia e que nele deposita uma fé sebastiânica inabalável... Este povo inventado pelo Estado Novo era essencialmente ignorante, justo, bom e nacionalista. Representava a verdadeira alma nacional, a sua versão mais pura e mais vernácula. Transportava com ele uma longa Tradição que o nacionalismo deveria ser capaz de honrar e de aproveitar. Desta forma, a Tradição integrava-se no esquema ideológico do regime, formando com a História a argamassa unificadora do presente com o passado. As raízes nacionais mergulhavam numa longa tradição de ruralidade. O país era rural; sempre tinha sido... não fazia sentido negar essa característica. Pelo contrário, o Estado Novo afirmou essa ruralidade de forma ideologicamente construída: como explicar que num rectângulo de área tão reduzida (Portugal Continental) desde há tanto tempo se houvesse afirmado vontade e realidade de independência? O país da Europa de mais velhas fronteiras estáveis; sempre o mesmo povo; sempre a mesma independência... e tanta diversidade interna! Do verde minhoto ao amarelo alentejano, sempre o mesmo povo 20 SALAZAR, António de Oliveira - Discursos e notas Políticas, Coimbra Editora, 2ª ed., vols. II, 1946, p 282: "(...) uma violenta luta está desenhada [na Europa] (...) entre as forças da ordem e as da desordem, entre a nação e o internacionalismo, entre o comunismo e a civilização.". 8 indomitamente vocacionado para manter a Nação e o Território. Como explicar? Simplesmente: Portugal encontrou na diversidade interna a razão e a força da sua unidade nacional. Complementaridade. O que falta num lado está no outro, o que míngua aqui sobeja ali. E não apenas de um ponto de vista material, de produtos agrícolas ou de recursos naturais: também de um ponto de vista das tradições populares, na gastronomia, na poesia, nas danças e cantares, nas lendas... enfim em tudo o que fazia de Portugal, Portugal21. Desta maneira, a argamassa unificadora do país não era a vontade política das elites (ou não era só, ou principalmente) mas sim o próprio povo. Cumprir Portugal seria cumprir essa vontade popular, de orgulho nacional e de pujante independência. O Estado Novo não fazia, pois, mais que cumprir o desígnio do povo, ou seja, da Nação. Que, aliás, havia sido claramente apontado pela História com todos os exemplos que dela se podia retirar. O Estado Novo assumia-se, nesta interpretação ideológica, como a única possibilidade de levar Portugal a ser o que verdadeiramente desejava, o que verdadeiramente tinha que ser: por imperativo histórico e por vontade da sua gente. A esta luz, as produções materiais do povo haveriam de ser coisa significativa. Não se entenderia bem que este povo, capaz de tais feitos históricos, de tais proezas morais, fosse pobre na sua materialidade. Ou por outra: pobre sim, em termos de valor fiduciário; mas culturalmente rico, pleno de significado e de potencialidade. Pobrezinho mas honrado... a panela de ferro pode não valer grande coisa no mercado, os tamancos podem ser de vintém, a roupa costurada do irmão mais velho ou do pai, mas (no romantismo ideológico do regime) a mão que os faz é culturalmente sublime; e portanto essas produções materiais valem pelo que representam, não pelo podem render ou custar na venda da aldeia. 21 Note-se que esta ideia foi divulgada de forma gráfica em mais que uma circunstância. A título de exemplo, o poster do SPN usado no pavilhão de Portugal na Exposição Internacional de Paris em 1937. 9 Era pois necessário fazer o encómio da cultura material do povo, ao lado da cultura material das elites. Ao lado verdadeiramente, não: eventualmente com a mesma dignidade, mas em locais diferenciados. No Museu de Arte Antiga cultura de elite, no Museu de Arte Popular cultura popular22. O mesmo nas exposições temporárias criadas para aclamar o regime, onde as secções dedicadas ao vernáculo foram parte substancial das áreas expositivas23. Desta forma, até ao eclodir da 2ª Grande Guerra o regime chamou a si a tarefa de assumir a arte e a cultura popular como um dos traços caracterizadores do seu nacionalismo. O conflito mundial veio perturbar os planos que Salazar tinha para a década seguinte24. Em vez de dez anos de "engrandecimento" houve que enfrentar as dificuldades inerentes à guerra e às alterações da situação internacional. E findo o conflito o regime não vê terminadas as dificuldades: o mundo que sai de 1945 é essencialmente diferente do da primeira metade do século e o regime português encontra acrescidas dificuldades em se manter fiel ao que havia edificado desde a década de 20. E no entanto tenta-o. Ao longo dos anos que se seguem à guerra, o Estado Novo continua a afirmar os mesmos princípios ideológicos que haviam sido as bases da sua construção inicial. Entre eles o nacionalismo. Entre eles a mitologia da arte e da cultura popular. Nacionalismo serôdio, mitologia deslocada. Mas operantes, um e outra, ao longo das décadas de agonia do Estado Novo. À medida que o regime previa cada vez mais claramente o seu fim, parece ter enveredado por um uso extremo dos instrumentos de propaganda que lhe haviam granjeado, em tempos, prestígio e aclamação. Entre eles podemos colocar os museus, mas talvez de forma mais notória as exposições temporárias. Quantas delas aparentemente sem nada de político ou de ideológico... Se bem que as artes 22 Analisámos estas duas instituições em LIRA, Sérgio – Museums and Temporary Exhibitions as Means of Propaganda: The Portuguese Case during the Estado Novo, tese de PhD apresentada ao Department of Museum Studies, Universidade de Leicester, 2002, policopiado. 23 Dedicámos já atenção a esta temática em: "Exposições temporárias no Portugal do Estado Novo: Alguns exemplos de usos políticos e ideológicos", comunicação que apresentámos a 26 de Novembro de 1999 ao Colóquio Nacional da APOM, "Balanço do Século", Museu da Farmácia, Lisboa. 24 Salazar, ao inaugurar a Exposição comemorativa dos 10 anos de revolução, profere um discurso intitulado "Era de Restauração, Era de Engrandecimento", onde defende que após a década de recuperação que havia passado, uma década de engrandecimento haveria de se seguir. 10 ao serviço da nação seja um título deveras sugestivo para uma exposição temporária de arte (Lisboa, 1966)25. Quantas exposições se realizaram, nos anos finais do regime, numa tentativa extremada de mostrar a pujança cultural do país26. O silogismo pretendido era óbvio: o país está culturalmente activo e prenhe; um país tão rico artisticamente não pode ser o cenário de um regime decadente; se o regime não está decadente não há razão para temer pelo futuro. De facto, o Estado Novo, ao menos desde os meados da década de 30, havia compreendido o poder potencial das exposições temporárias, em termos de propaganda ideológica e política. Até ao final do regime, esses eventos marcaram sempre o calendário político e cultural do país, sendo emergentes três temáticas fundamentais: Império Colonial e Descobrimentos Marítimos, Obra do Estado Novo e Cultura e Artes27. Se para o escopo deste texto os dois primeiros casos não serão do maior relevo, já o último interessa sobremaneira. A cultura e as artes foram temas recorrentes nas exposições temporárias organizadas sob o Estado Novo, muitas com intuitos de propaganda política e ideológica. De facto o Estado Novo entendia que o patrocínio da cultura e das artes era uma tarefa que incumbia a um Estado nacionalista; uma Nação que não cuida de si, que não cuida da sua cultura e das suas artes, dificilmente terá de que se orgulhar. E, sendo o orgulho nacional uma das próprias razões de ser do Estado Novo, era ideologicamente uma necessidade o apoio à cultura e às artes. Vejamos o exemplo de três exposições paradigmáticas do que acabámos de afirmar: em 1947 a exposição 14 anos da política do espírito; nos 25 Veja-se o catálogo: As Artes ao Serviço da Nação, Liaboa, SNI, Comissão executiva das comemorações do 40º aniversário da Revolução Nacional, 1966. 26 Vejam-se, por exemplo, os catálogos das exposições organizadas pelo SNI. Disponíveis no arquivo do Museu do Chiado, Lisboa. 27 Esta análise, como qualquer análise do tipo, é certamente uma imposição de um esquema a uma realidade que o não anuncia explicitamente; trata-se, assim, de uma comodidade de exposição que facilita o entendimento do fenómeno, e não algo inerente e explícito no fenómeno. Deste esquema estão excluídas muitas exposições temporárias que, apesar de algum vinco ideológico ou propagandístico não tinham nesses objectivos o seu foco. Tais eventos são, no entanto, e para o presente texto, de suma importância. Estão neste caso exposições relativas ao trabalho de artistas nacionais, retrospectivas e exposições de artes decorativas que, corroboravam o patrocínio do regime às artes. 11 finais de 1955 e inícios de 1956 a exposição Portuguese Art 800 - 1800; em 1966 a exposição As Artes ao serviço da Nação. A exposição 14 anos de política do espírito teve claros propósitos de propaganda ideológica. O nome escolhido esclarece com precisão acerca de que foi a exposição, ou seja, dos catorze anos de engrandecimento cultural patrocinados pelo Estado Novo. O SNI28 foi encarregado de organizar a exposição e uma parte significativa das vitrines do evento foi dedicada a publicitar as suas actividades29. Para além deste tipo de vitrines, a exposição incluía um vasto número de expositores. A etnografia portuguesa era uma das presenças mais evidentes e durante a exposição foi inclusivamente organizado um concurso de arquitectura onde se incentivava o uso dos modelos da arquitectura tradicional portuguesa, mas as actividades de lazer organizadas pelo SNI, o teatro, o cinema e o turismo tinham também alargada representação. Também a Mocidade Portuguesa estava presente na exposição, devido ao facto de as suas actividades serem entendidas como uma importante contribuição para o desenvolvimento dos jovens, especialmente nos campos da cultura, desporto, saúde, civismo e disciplina. A Mocidade Portuguesa era vista e apresentada como um dos contributos significativos para o desenvolvimento do "espírito" ao longo dos 14 anos celebrados. A mensagem da exposição era óbvia: Portugal tinha beneficiado imensamente com a instauração do Estado Novo; e não só de um ponto de vista material, económico, financeiro ou de obras públicas: Portugal tinha também beneficiado no "espírito", no desenvolvimento harmonioso da sua juventude, no combate ao analfabetismo e à falta de divulgação cultural. Numa palavra, Portugal, após 28 Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo 29 Na qualidade de exemplos, atentemos em duas legendas de partes da exposição: numa afirmava-se que "Os prémios literários do SNI constituíram já uma antologia riquíssima da literatura portuguesa actual."; sob a legenda estava uma vitrine onde se mostravam vários livros e outras publicações, exemplificativas do afirmado na frase. Uma outra legenda do mesmo tipo afirmava que "Com as missões culturais e as bibliotecas ambulantes o SNI leva o seu programa de divulgação cultural a todo o país."; em relação com a legenda estava organizada uma pequena mostra fotográfica dos meios utilizados para levar as bibliotecas ambulantes "a todo do país". Há várias fotografias relativas a esta exposição incluídas no arquivo da Fundação Gulbenkian, Lisboa, que foram feitas pelo fotógrafo Mário Novais e que merecem consulta 12 um período odioso de trevas republicanas, reencontrava finalmente, pela mão do Estado Novo, o seu "espírito". O esforço que o regime desenvolveu para apresentar Portugal como um país culturalmente rico e próspero não se ficou pela propaganda interna. No final do ano de 1955 e durante o início do ano seguinte, esteve patente na Royal Academy of London uma exposição intitulada Portuguese Art 800 - 1800. No seguimento da participação portuguesa em várias exposições internacionais (onde o país era sempre apresentado como um país rico, progressivo, de finanças sãs e economia próspera, liderado por um chefe incontestável e benéfico, capaz de ombrear com os países mais ricos da Europa) Portugal apresenta em Londres uma exposição que pretendia, para além de mostrar a arte portuguesa, patentear uma riqueza cultural sólida e um espólio artístico invejável. A exposição incluía escultura, pintura, ourivesaria e mobiliário para além de vários objectos artísticos como faianças, pratarias, tapeçarias, entre outros. A exposição reconstituía interiores históricos, expondo os objectos em contexto e conferindo-lhas uma dignidade apreciável. De uma forma implícita afirmava-se que Portugal não sé era cultural e artisticamente rico pela produção e posse de tais obras de arte, como o era também pela cuidada preservação que dedicava a essas peças. O país apresentava-se como um baluarte da conservação e tratamento do objecto artístico. Aliás de outro modo não poderia ser, pois apenas dessa forma se servia o espírito nacionalista que impunha o respeito e o orgulho pelo passado e pelos testemunhos memoráveis que dele tinham restado. A comemoração dos quarenta anos da Revolução Nacional, em 1966, contou, entre muitos outros eventos, com a organização da exposição As Artes ao serviço da Nação30. Esta exposição pretendia mostrar como o Estado Novo havia investido nas artes e como as artes haviam auxiliado na tarefa de reconstrução nacional. A exposição cobria as áreas da escultura, pintura e 30 Consulte-se As Artes ao Serviço da Nação, Liaboa, SNI, Comissão executiva das comemorações do 40º aniversário da Revolução Nacional, 1966. 13 fotografia como temas principais. O Estado Novo apresentava-se orgulhoso da obra feita no campo artístico. Finalmente, uma das questões que importa referir na caracterização deste período do século XX português é a da definição do que era entendido como "digno" de ser considerado peça artística ou de património, para a Ditadura Militar e para o Estado Novo. Independentemente das opiniões dos coleccionadores privados ou dos responsáveis pelas colecções de arte ou outras formas de património sob tutela do Estado, sempre difíceis (se não impossíveis) de apreender na sua globalidade, atenhamo-nos às definições que as peças legislativas relativas ao mundo dos museus incluíam. Como já acima afirmámos, a Ditadura Militar herdou uma construção legislativa relativamente complexa e completa da 1ª República. Po isso iniciamos a nossa análise por uma peça legislativa datada de 192431. Essa lei, nº 1700 vem na tradição das alterações que a República produziu relativamente à questão do património. Naturalmente a sua análise não faria sentido desligada da do Decreto que a regulamenta32. Ao longo do texto da Lei nº 1700 os termos "artístico e arqueológico" repetem-se inúmeras vezes, dando, numa primeira visão, a ideia de que património se resumia ao contido nessa expressão. O Capítulo V inicia com o artigo 38º, relativo ao "arrolamento das obras de arte e peças arqueológicas" onde se incluem, para efeitos do dito arrolamento, os "móveis e imóveis que (...) possuam valor histórico, arqueológico, numismático ou artístico, digno de inventariação". Alarga-se, assim, um pouco mais o âmbito do que é considerado merecedor do cuidados legislativos especiais, mas a definição permanece muito vaga. No que respeita ao móveis pertencentes a particulares, especifica-se que "(...) só serão incluídos no arrolamento aqueles que sejam de subido aprêço, reconhecido valor histórico, arqueológico ou artístico e cuja exportação do território nacional 31 Lei nº 1700, de 18 de Dezembro de 1924. Por uma questão de simplificação do trabalho de quem pretender consultar a legislação que citamos, indicamos sempre neste texto as datas de publicação no Diário oficial. 32 Decreto nº 11445, de 13 de Fevereiro de 1926. 14 constitua dano grave para o património histórico, arqueológico ou artístico do país"33. As preocupações desta Lei são, aliás, mais voltadas para as limitações a exportação e para as garantias dadas ao Estado de ter preferência na aquisição das peças postas à venda34, do que na determinação rigorosa do que fica abrangido pelo determinado na própria Lei. O Decreto nº 11445, que acima já referimos, vem tentar colmatar esta lacuna: no seu artigo 47º especifica que "Para efeitos gerais da lei consideram-se obras de arte ou objectos arqueológicos: as esculturas, pinturas, gravuras, desenhos, móveis, peças de porcelana, de faiança e de ourivesaria, vidros esmaltes tapetes, tapeçarias, rendas, jóias, bordados, tecidos, trajos, armas, peças de ferro forjado, bronzes, leques, medalhas e moedas, inscrições, instrumentos músicos, manuscritos iluminados e de um modo geral todos os objectos que possam constituir modelo de arte ou representar valiosos ensinamentos para os artistas, ou pelo seu mérito sejam dignos de figurar em museus públicos de arte, e ainda todos aqueles que mereçam o qualificativo de históricos". Sendo notória a convivência de elementos de uma estrema especificação com outros de uma abrangência total, este texto confirma as dificuldades, que podemos adivinhar, eram sentidas pelo legislador em matéria tão difícil. Se algumas peças passam a património artístico ou arqueológico sem qualquer margem para dúvidas, as formas vagas com que finaliza o artigo permitem a inclusão em tal conceito de praticamente tudo o que for considerado "histórico"... sem que tal termo seja definido. Por outro lado, em número considerável de artigos, o presente Decreto reitera a preocupação da Lei que acima referimos no que respeita à limitação da possibilidade de exportação de património artístico ou arqueológico e reafirma as prerrogativas do Estado no caso de venda pública, indo mais longe e passando a considerar que a simples colocação "para venda em leilão público de objectos artísticos, arqueológicos e históricos colocá-los 33 A semelhança de princípios com o sistema do Reino Unido, introduzido em 1952 e geralmente conhecido como "Waverlay Criteria", é digna de nota. Ver MAURICE, C. and TURNOR, R. - "The Export Licensing Roules in the United Kingdom and the Waverlay Criteria" in International Journal of Cultural Propety , nº 2, vol. 3, 1994, pp. 273-293; ver ainda FAHY, Anne (ed. by) - Collections Management, Routledge, Londres, 1995. 34 Vejam-se os artigos 38º a 43º da citada Lei nº 1700. 15 há, para todos os efeitos, nas condições dos inscritos no catálogo" desde que tal seja declarado por um representante do Estado35. Em linhas gerais era esta a situação legislativa do património quando em 1926 terminou a primeira experiência republicana e sobreveio a ditadura militar. Apenas em 1928, através do acima citado Decreto nº 15216, se retomou a questão. Conforme é patente no prólogo deste Decreto, não estamos perante alterações de fundo; trata-se apenas de manter o espírito da lei anterior, alterando-a pontualmente36. Uma nova achega à definição do que é património foi dada pelo Decreto nº 2056637 que determina não haver necessidade de qualquer acção formal de arrolamento por parte dos agentes do Estado para que as peças e objectos correspondentes ao especificado na lei fossem considerados arrolados. Tal determinação é o seguimento natural do que vimos acima. Este Decreto, considerando incompleto o determinado no artigo 47º do citado Decreto 11445, vem acrescentar à lista aí referida (e que citámos) "os incunábulos portugueses; as espécies xilográficas e paleotípicas; os cartulários e outros códices, membranáceos ou cartáceos; os pergaminhos e papéis avulsos de interesse diplomático, paleográfico ou histórico; os livros e folhetos considerados raros ou preciosos; e os núcleos bibliográficos que se recomendam pelo valor dos seus cimélios ou simplesmente pelo seu valor de colecção.". Não muda, pois, de tom a legislação: estamos ainda perante o espírito da lei que conhecemos até esta data e nele continuaremos em 1932 com a fundação da Academia Nacional de Belas Artes38 onde o património referido continua a ser o "artístico e arqueológico". O Decreto nº 20985, datado também deste ano de 193239, ainda que reorganizando os serviços artísticos e 35 Ver artigo 56º do Decreto nº 11445. 36 A única alteração evidente de política prende-se com o princípio da gratuitidade completa das entradas nos museus: neste Decreto consagra-se o princípio de que essas entradas devem ser pagas, com algumas excepções, para, apenas em 1931, através do Decreto nº 19414 de 5 de Março, se regulamentar o pagamento e colocar em prática o princípio. 37 Decreto nº 20586, de 4 de Dezembro de 1931. 38 Decreto nº 20977, de 5 de Março de 1932. 39 Decreto nº 20985, de 7 de Março de 1932. 16 arqueológicos, porque duvidando da eficácia da legislação anterior40 lhe não reconhecia capacidade para ser mantida em vigor, praticamente não altera o que temos vindo a observar no que respeita ao conceito de património. Uma vez mais, quando o legislador pretende estabelecer o conceito refere os móveis "que sejam de subido aprêço, reconhecido valor histórico, arqueológico ou artístico e cuja exportação do território nacional constitua prejuízo grave para o património histórico, arqueológico ou artístico do País.". Por outro lado, quanto às competências do recém criado Conselho Superior de Belas Artes e no que respeita às aquisições para os museus, uma vez mais se referem apenas "obras de arte e peças arqueológicas", como únicas aquisições dignas de menção legislativa. Mais à frente, no artigo 14º, ainda no que respeita às competências do dito Conselho, surge-nos a menção à necessária supervisão dos trabalhos de "recuperação de quadros, esculturas ou quaisquer outros objectos artísticos ou arqueológicos", mantendo-se assim, também a este respeito, o vago conceito enunciado antes. Outro aspecto a ter em conta e que pode contribuir para apreender o conceito de peça arte ou peça de património para o período que vimos analisando, prende-se com a formação exigida ao pessoal profissional dos museus nacionais. Conforme determinava o Decreto nº 2211041 para o acesso ao estágio dos conservadores tirocinantes, a funcionar no Museu Nacional de Arte Antiga, tomava-se como habilitação de preferência "o diploma de curso superior ou especial em que seja professado o ensino da história de arte". Tal facto parece significativo se se tiver em conta que tal estágio era motivo de preferência para o desempenho de funções de conservador ajudante nos museus regionais, independentemente das características das suas colecções. Em 195342 este regime de estágio é totalmente remodelado. Mantém-se, ainda assim, uma acentuada tónica nas questões de arte. Senão, vejamos: a habilitação de acesso é alargada para 40 Veja-se o próprio texto do prólogo: "Produziu os seus frutos a organização que ora se substitue, devido talvez mais ao desenvolvimento da cultura estética em geral do que à excelência do complexo sistema administrativo então criado.". 41 Decreto nº 22110, de 12 de Janeiro de 1933. 42 Decreto nº 39116, de 27 de Fevereiro de 1953. 17 qualquer curso superior ou da escola de belas-artes, mas exige-se um exame de aptidão aos candidatos. Tal exame constava de duas partes, uma teórica e uma prática, ambas sobre temas de arte (a primeira versando um "assunto", a segunda sobre uma "obra"). Ao longo do estágio era exigido aos candidatos a frequência de várias cadeiras universitárias, todas versando questões de História e História d'Arte43. Analisemos finalmente uma importante peça legislativa44 que veio alterar, ao menos na letra da lei, o sentido da existência dos museus nacionais. Tratase do Regulamento Geral dos Museus de Arte, História e Arqueologia. Apenas pelo título fácil se torna verificar que o legislador restringiu o universo dos museus a tratar. A única «excepção» é a inclusão do Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia (Museu Etnológico do Dr. Leite de Vasconcelos) que, apenas forçadamente, poderá integrar-se no âmbito da arqueologia. Todos os outros museus tratados por este Decreto são museus de arte, história e arqueologia, somente. Par além das apreciações (aliás deveras interessantes e profundamente inovadoras para a legislação portuguesa sobre museus) feitas no preâmbulo, o texto do Decreto é muito claro ao estabelecer, no artigo 5º, como primeira finalidade dos museus "Conservar e ampliar as colecções de objectos com valor artístico, histórico e arqueológico.". Verificamos, assim, que a tendência para a valorização da arte e dos aspectos históricos e arqueológicos, como «vocação» primeira dos museus, perpassa a mais importante legislação nacional que foi produzida desde a década de vinte até à de sessenta deste século, relacionada com estas instituições. A peça de património, o objecto digno de preservação, restauro, exposição, estudo e protecção legal, era o objecto artístico, aquele que 43 História Geral da Civilização, Epigrafia, Numismática, Esfragística, Paleografia e Diplomática, História de Arte e Arqueologia. 44 Decreto nº 46758, de 18 de Dezembro de 1965, normalmente referido como Regulamento Geral dos Museus de Arte, História e Arqueologia. 18 encerrava um qualquer valor histórico ou ainda o que provinha de escavações arqueológicas45. Após o 25 de Abril de 1974, e com o fim do regime do Estado Novo que durava há mais de quarenta anos, a política do património em Portugal conheceu novas orientações em que a ideologia e a influência política, no entanto, não deixaram de estar presentes. O nacionalismo tornou-se em algo de politicamente incorrecto, os heróis (mesmo os históricos) aclamados pelo Estado Novo receberam, ainda que temporariamente, o epíteto de "fascistas"; os museus passaram a fazer parte de um programa nacional de democratização da cultura e receberam incumbência, de forma explícita ou não, de promover novos valores políticos e sociais: democracia, liberdade de expressão, igualdade de direitos, entre outros. Um dos aspectos significativos desta mudança de regime foi o fim da censura prévia imposta em todos os campos da produção intelectual e artística. A publicação e exposição passou a ser livre, sendo a alteração notória em vários domínios: da literatura ao teatro, da pintura ao cinema. 2. As artes e os artistas46 Assim como o século político terá começado em 1910, o século artístico poderá ter tido o seu início em 1911. José Augusto França defende tal posição no Perfácio em que apresenta a sua Arte em Portugal no século XX47, evidenciando como primeira manifestação desse novo século a exposição de 45 O desenvolvimento desta temática foi feito por nós em LIRA, Sérgio - "Os Museus e o conceito de Património: a peça de museu no Portugal do Estado Novo", in Actas do Congresso Histórico de Amarante, Câmara Municipal de Amarante, Amarante, 2001. 46 Para esta parte do texto optámos por reduzir de forma significativa as notas, retirando peso ao aparato crítico para melhor centrar o texto principal. Assim, ao invés de colocarmos em rodapé notas biográficas sobre cada artista referido, decidimos arrumar por ordem alfabética de artistas uma série de fichas biográficas, no final do texto. Dos mais significativos artista referido ao longo desta parte, encontrará o leitor, no final, a respectiva ficha. 19 "arte livre" que no mês de Março desse ano teve lugar. De facto, o início do século ficou marcado pelo diluir do que havia sido iniciado no último quartel do século XIX, o naturalismo. Nesse delir se encontram as primeiras manifestações da corrente moderna nacional, com expressões futuristas, em especial nas artes plásticas. Este dealbar do modernismo em Portugal sedimentou-se ao longo das duas décadas iniciais do século, para ceder lugar a uma segunda corrente, consentânea com as alterações políticas emergentes: nos anos 30 e 40, a par do o desenvolvimento dos programas artísticos iniciado nas décadas anteriores, assiste-se em Portugal à presença neo-naturalista, correspondente à pressão do Estado Novo e encimada pela presença de António Ferro à frente do projecto cultural português de Estado. O neo-realismo, o surrealismo e o abstraccionismo farão a sua aparição ainda na década de 40 e por meados do século e desenvolver-se-ão nas duas seguintes. Ainda na década de 60, e de par com expressões nacionalistas serôdias, surgem as primeiras manifestações pop. Os anos 70 serão marcados especialmente pelas alterações políticas de meados da década com uma abertura a diversas manifestações artísticas e recurso a experimentação mais livre. As décadas finais do século ficaram marcadas por uma certa euforia característica dos anos 80, com larga multiplicidade de tendências e uma situação favorável no mercado da arte, e pela contracção desse mercado, nos anos 90, o que não impediu alguma interessante diversidade de explorações por campos artísticos de suportes menos tradicionais. Artes plásticas A pintura e a escultura, mas também a cerâmica ou o azulejo, ocuparam lugar de destaque no panorama artístico português do século XX. A herança pujante das expressões plásticas do século XIX, nomeadamente o naturalismo, que se prolongaram pelos anos iniciais do século XX com alguns artistas a 47 FRANÇA, José Augusto – A Arte em Portugal no século XX, 3ª ed., Venda Nova, Bertrand ed., 1991, p. 11. 20 produzir de forma significativa nas primeiras décadas do século48, haveria de marcar tanto algumas permanências como as tentativas de contraponto. Por outro lado, e também marcando a viragem do século, o simbolismo esteve presente na pintura portuguesa com alguns exemplos significativos49. O início do século surge com representações do chamado "humorismo". Talvez tenha sido, aliás, este o caminho mais precoce da modernidade artística em Portugal, usando o desenho, que não a pintura, como forma de afirmação50. De facto, a pintura era concebida de forma marcadamente academizada, sendo pois um terreno onde mais dificilmente se poderia vir a impor corrente de vanguarda. Já o desenho, e em particular o desenho humorístico, havia herdado, no início do século XX, toda a tradição de realização e publicação da caricatura e da ilustração dos finais do século anterior. O terreno fértil da caricatura política e da sátira social permitiu uma modernização dos traços, numa continuidade de utilizações que só aparentemente encobre a diferenciação formal que se pode ir observando. Tal utilização do desenho beneficiava da larga disseminação que as publicações periódicas, quantas efémeras, permitia. Eram um meio "democrático", não dependente das academias e com uma vasta aceitação, contrariando pela via do humor as várias censuras que os regimes políticos iam impondo. Não espanta, pois, que a modernidade nesta arte tida por "menor" se tivesse afirmado seguramente. Se mais não fosse prova, a realização, no virar da primeira década do século, do I Salão dos Humoristas seria evidência suficiente da pujança deste meio de expressão artística e política. Nomes como os de Christiano Cruz, Emmérico Nunes, Almada Negreiros, Leal da Câmara e Jorge Barradas surgem de forma notória neste universo primordial de desenhos de humor, logo seguidos de 48 Veja-se o exemplo de algumas obras de José Malhoa (Clara – 1903; Retrato de minha mulher – 1914; Praia das Maçâs – 1918) ou de Sousa Pinto (Efeito de Sol ao fim da tarde – 1913; Efeito de tarde – 1915). Publicados em MUSEU do Chiado. Arte Portuguesa 1850-1950, Lisboa, IPM, Museu do Chiado, 1994, pp. 90-93 e 100-101. Outro exemplo significativo será a obra de Bordalo Pinheiro, também no vértice cronológico e de "escola". 49 Estarão neste caso obras de Adriano Sousa Lopes, António Carneiro, Aurélia de Sousa, José Veloso Salgado e Luciano Freire. 50 Veja-se SANTOS, David – Desenho e Modernismo nas Colecções do Museu do Chiado. 1900-1940, s.l., IPM, Museu de Francisco Tavares Proença Júnior, 2001 21 António Soares, Stuart Carvalhais e Bernardo Marques, este último com trabalho que se alonga de forma significativa até aos anos 30. O modernismo na pintura e na escultura afirmou-se, nesta primeira fase, como um rompimento face ao trado-naturalismo que ainda eivava o início deste século nascente. A Exposição Livre ou dos Livres (1911) é referida sistematicamente como marco desse processo, até por oposição ao grupo Ar Livre, evidência dos valores estéticos da segunda geração naturalista portuguesa. Esta forma serôdia de naturalismo condizia com os valores sociopolíticos que Portugal conheceu no segundo quartel do século XX, e encontrou espaço de afirmação assinalável. A temática rural condizia também com a idealização do Portugal do Estado Novo, pelo que não será de espantar a longa previvência desta forma de naturalismo. Entre outros, de referir as obras de Carlos Reis, Artur Alves Cardoso e António Saúde. Como em muitos outros universos, a influência modernista de além fronteiras far-se-ía notar, embora de forma diferenciada, tanto na pintura como na escultura portuguesas. Se em ambas a presença de Paris parece ser uma tónica evidente e incontestável – até pela emigração dos artistas portugueses51 – já a pintura buscou também algo do expressionismo alemão com Christiano Cruz e do pós-cubismo picassiano com Mário Eloy e Almada Negreiros. Por outro lado, a pintura portuguesa desta época encontrou caminhos de uma vitalidade significativa, e de expressões individuais marcantes (Eduardo Viana, Mário Eloy, Carlos Botelho), embora uma súmula teórica tivesse ficado por realizar, pese embora as contribuições de Almada Negreiros e de Amadeo de Souza Cardoso. A escultura desta época, ao contrário da pintura, não conheceu um processo de ruptura com o academismo vigente. Pelo contrário, é possível detectar o prolongar dos cânones da escultura de época anterior – mesmo um efeito de tardo-naturalismo, notório nas temáticas ruralizantes de Artur Anjos 22 Teixeira ou de João da Silva – se bem que marcada por actualização. Avultam neste período os trabalhos de António Azevedo, Salvador Barata Feyo, Ernesto Canto da Maya, Diogo de Macedo, Francisco Franco e Leopoldo de Almeida. A maior presença política do estado na vida nacional a partir do início dos anos 30, com o Estado Novo a impor-se de forma iniludível, veio marcar a produção escultórica por encomendas públicas de carácter marcadamente nacionalista. Ainda relevante nesta primeira fase do século, foi o chamado futurismo, de que os portugueses tiveram primeiras notícias, uma vez mais, vindas de Paris52. Nos anos seguintes o futurismo foi penetrando o ambiente artístico português – com o nº 2 da Orpheu, com o número único do Portugal Futurista e com a apresentação pública em Abril de 1917 da I Conferência Futurista – alcançando algum alarde nos meios literários (que referiremos mais adiante) mas sem que lograsse revolucionar a produção plástica nacional. Terá sido pela mão de Santa-Rita Pintor que o movimento se fez representar de forma mais evidente nos meios portugueses. Uma vez mais, a presença do pintor em Paris e o contacto com as produções de artistas italianos coevos foi fundamental para o eclodir do futurismo nas suas obras. A sua breve vida, em particular os anos finais passados em Lisboa, exerceu alguma influência sobre Amadeo de Sousa Cardoso e Almada Negreiros. Aliás, será a morte do primeiro em 1918 que porá fim à vaga experiência futurista da pintura portuguesa. O que se anunciava com a apreensão censória do primeiro e único número do Portugal Futurista à saída da impressão, haveria de se colmatar com, uma década volvida, o fim da 1ª República e o início da Ditadura Militar. De facto, o ambiente político revolucionário de certas fases da República havia impulsionado ou permitido expressões plásticas de vanguarda; já o clima tendencialmente conservador das ditaduras (da de Sidónio Pais primeiro e da 51 52 Vejam-se as fichas biográficas no final do texto. Aquilino Ribeiro, numa crónica datada de 1912, dava conta da repercussão do movimento nos meios artísticos europeus. 23 resultante do golpe de 1926, depois) era cenário promissor de mais forte enquadramento das artes. Os princípios dos anos 20, pela mão literata de Almada Negreiros, confessavam já um nítido declínio do apogeu vanguardista da década anterior, e as expressões cada vez mais tímidas do futurismo ou do modernismo tinham menos ênfase e menos eco. Desinteresse dos poderes públicos, desinteresse dos periódicos e da crítica, desinteresse dos públicos, um Museu de Arte Contemporânea que recusava os mais contemporâneos dos artistas: as artes plásticas em Portugal nos anos 20 eram um marasmo quase completo. Nem o II e III Salões dos Humoristas vieram realmente alterar esse estado de coisas. De notar, no entanto, algumas exposições individuais53, mas que de forma alguma lograram animar verdadeiramente o ambiente. Ainda assim, Diogo de Macedo escrevia e desenhava de Paris alguma novidade nesta década relativamente estagnada, não fosse, fundamentalmente, a actividade de Almada Negreiros. De referir ainda a obra de Eduardo Viana que ao longo da década contribuiu com pinturas como A Pousada de Ciganos (1923), Nu e Sintra (ambas de 1925). Finalmente, breve referência ao que José Augusto França apodou de "Primeira Geração" que, para além de incluir Amadeo, Santa-Rita, Almada e Viana, contou também com os trabalhos de outros artistas significativos, que estenderam a sua produção artística por limites cronológicos mais vastos que o início do século, alguns deles já acima referidos. Neste grupo será de incluir António Soares, Jorge Barradas, Stuart Carvalhais, Dordio Gomes, Abel Manta, Manuel Bentes, António Carneiro e Sousa Lopes. Também neste grupo, em momentos diferentes e com percursos diversos, se fizeram notar as influências das correntes artísticas europeias, particularmente do ambiente parisiense. O encerrar da primeira fase do século coincide com o início dos anos 30 e com o Salão dos Independentes. Daqui, esta segunda fase do século irá, pela mão de António Ferro, desaguar na "política do espírito" e no patrocínio do 53 Veja-se FRANÇA, José Augusto – A Arte em Portugal no século XX, 3ª ed., Venda Nova, Bertrand ed., 1991, p. 101 24 SPN/SNI. A orientação política, ideológica e doutrinaria do Estado Novo exercerá de forma eficiente a sua influência sobre as artes, e será um acontecimento exógeno a Portugal, a II Grande Guerra, que virá interromper o ciclo. Dos anos 20 para os anos 30, pela mão de Bernardo Marques e nos seus desenhos (que aliás expôs em 1930 no I Salão dos Independentes) entrou em Portugal algo do ambiente de uma Europa mais a Leste que Paris; foi uma névoa de Berlim, visitada pelo artista em 1929, que perpassou a sua produção, libertada em parte do humorismo e carregada com as formas de uma consciência social e cultural mais forte. Nos seus desenhos desta época fica registada uma Lisboa vista de um ângulo particular e único. Também presente no I Salão dos Independentes, Mário Eloy produziu nesta época alguns desenhos marcantes, que assinalavam já o percurso que o artista iria tomar, povoado de fantasmas, pesadelos e morte e que terminaria na sua morte nos meados do século. O início da década, em Maio de 1930, ficou marcado pela realização do I Salão dos Independentes, onde se pretendia mostrar a maturidade de uma geração de modernistas, de diversas áreas artísticas: Concorreram pintores e escultores, escritores e poetas, jornalistas e arquitectos. Mas o que tinha por escopo ser um marco de arranque de uma modernidade enfim alcançada e consolidada foi, em algumas críticas da época, um final pouco eufórico de uma modernidade em vias de se encontrar demasiadamente desgastada para ser significativa. Não que as participações fossem menores, ou que o investimento artísticos estivesse depauperado, mas era evidente que algo estava em vias de mudar radicalmente no meio artístico português, e que o termo Independentes soltava o seu último verdadeiro alento – apesar da reedição do Salão no ano seguinte, claramente sem a pujança do original. Ao longo da década de 30, várias iniciativas do tipo, mais ou menos evidentes no panorama nacional foram surgindo: salões de pintura, artes plásticas, fotografia, este em Dezembro de 32 e com alguma franca novidade, ao menos a nível técnico, mas sem romper definitivamente com o que o I Salão havia traçado. Claramente já 25 de costas voltadas para a tendência oficial de António Ferro e de um SPN já dominante foi, em 1936, a exposição de Artistas Modernos Independentes, onde se evocaram Amadeo, Santa-Rita, Sá-Carneiro e Pessoa. Mas mesmo essa manifestação evidenciava o império da orientação de Estado. De facto, desde o início da década que se tornara evidente a manifesta intenção de o Estado vir a intervir no meio artístico de forma notória. A crise da arte, a falta de compradores que era reflexo da crise generalizada em Portugal, ficou patente no alarde com que António Ferro entrevistou Salazar em 1932. Como em tantos outros domínios a posição do político foi clara: primeiro o reequilíbrio das finanças públicas, depois – a seu tempo – o abrir dos cordões à bolsa e o promover do que não é, de forma absoluta, indispensável. O Estado Novo, que se instalava pela mão de Salazar, prometia vagamente apoio aos artistas e deixava uma ténue esperança, com as bolsas de estudo que o orçamento de 1933 previa já. Não cabe aqui analisar todos os passos dados pelo Estado Novo, mas o caminho da década de 30 foi evidente: arte e artistas, debilitados pela míngua generalizada, acolheram-se à sombra paternal do Estado e permitiram um enquadramento gizado por António Ferro, que havia crescido à luz do modernismo e que com os seus vinte anos embarcara também no Orpheu. A carreira de jornalista e as entrevistas famosas que conduziu deram-lhe notoriedade; a política do Estado Novo, no campo das artes e em parte da propaganda, foi-lhe entregue, com o SPN/SNI. A política de Ferro não foi a de negar a modernidade, de fazer apelo ao serôdio ou ao ultrapassado: pelo contrário, Ferro assumiu a tarefa não de consagrar mas de estimular e assim, ao longo de mais de uma década, o "seu" SPN/SNI marcou assinalável êxito. Tratava-se de enquadrar, de trazer para a barricada do Estado Novo forças ingentes da Nação – nas artes como em tantos outros domínios: aqui As Artes ao Serviço da Nação. Almada Negreiros foi disso exemplo, em várias produções ao serviço do nacionalismo, como os selos onde se afirmava Tudo Pela Nação, ou outras. Os salões do SPN/SNI foram em número significativo, os prémios distribuídos muitos e avultados, o eco nacional e internacional desta propaganda cuidadosamente programada e executada, 26 notável. No entanto, alguma crítica era ouvida: por exemplo Diogo de Macedo afivelava nos inícios da décda de 40 um texto sério e claramente desconfiado, expressando que os artistas produziam para os prémios, que não pela arte. O culminar desta política foi a Grande Exposição do Mundo Português, de 1940. Para a sua realização concorreram artistas nacionais de todos os ramos das artes plásticas, sob uma orientação comum, nacionalista. No planeamento arquitectónico esteve Cottineli Telmo. Aliás, as exposições temporárias estavam a ser ensaiadas como mecanismo de propaganda usando a produção artística, já desde pelo menos meados da década: faziam parte do esquema de propaganda montado por António Ferro e foram, indubitavelmente, eficientes54. Em 1940, no entanto, estamos perante a maior, mais grandiosa, mais cara e mais eficiente manobra de propaganda do Estado Novo, no que respeita a exposições temporárias. Todo o edifício do Estado Novo ali se encontra e, se não todos, uma parte muito significativa dos artistas portugueses coevos nela colaboraram e para ela concorreram. Eventualmente mais que a pintura, a face visível das artes plásticas sob o Estado Novo, nesta primeira fase, foi a estatuária, e em particular a estatuária monumental. Francisco Franco, Canto da Maia e Leopoldo de Almeida são dos nomes que avultam nesta fase. O marco normalmente apontado como início deste período é a estátua de Gonçalves Zarco de Franco. No mesmo tom, produziu Canto da Maia o conjunto de D. Manuel, Vasco da Gama e Álvares Cabral; e à frente do Pavilhão do Portugueses no Mundo estava a imponente Soberania de Leopoldo de Almeida. Todas estátuas que chamavam os portugueses a clamar a importância e o esplendor do Portugal de antanho, da época gloriosa das Descobertas, da Idade de Ouro nacional. Vértice dessa produção, o Padrão dos Descobrimentos, obra conjunta de Cottineli Telmo e de Leopoldo de Almeida, assinalava o local que foi o epicentro de toda esta 54 Já nos referimos a este tema, de forma alongada em LIRA, Sérgio - Museums and Temporary Exhibitions as means of propaganda: the Portuguese case during the Estado Novo, tese de PhD em Museum Studies, Leicester, 2002. Ver também o que afirma FRANÇA, José Augusto – op. cit., páginas 220 a 225. 27 produção: a Grande Exposição do Mundo Português, de 1940. Tal programa acertava naturalmente com a linha política do Estado Novo e com o tom nacionalista das manifestações historiográficas da época. Mas para além desse grandes portugueses de um passado algo longínquo, o Estado Novo celebrava também vultos mais recentes: pela mão de Barata Feyo, Bartolomeu Dias, mas também Almeida Garrett, Antero de Quental e Alexandre Herculano povoaram os jardins e locais públicos do país. Na viragem dos anos 30 para os anos 40 dois artistas plásticos marcaram a sua presença no ambiente português de forma notória: António Pedro e António Dacosta. O primeiro, tanto no desenho como na pintura e na escultura, foi notável pela novidade introduzida. Se tinha colaborado em eventos do SPN, não estava presente na Exposição de 1940. Mas abria uma exposição, ainda a efeméride de 1940 não havia encerrado as sua portas, juntamente com Dacosta, esse sim quase desconhecido. O surrealismo da Ilha do Cão de Pedro (1940) mostrava a Portugal uma dimensão ainda não conhecida da expressão artística e chocava de forma evidente com a monumentalidade nacionalista do teatro propagandístico de Belém. Dacosta também expôs nos salões do SPN e foi premiado, mas em 1949 estava presente na Exposição do Grupo Surrealista com obras correspondentes a essa sua fase (que vai grosso modo de finais de 30 a 1943) e que pode ser exemplificada com a Antítese da Calma datada de 1940. Este surrealismo encontrou também eco na obra de Cândido Costa Pinto, que viria no entanto a ser ostracisado em função da sua participação expositiva no SPN. O Grupo Surrealista produziu no final de 40 o Cadavre-exquis, obra colectiva de grandes dimensões que marca o panorama português da época como peça única. A par desta novidade, uma outra se evidencia, com o abstraccionismo de Fernando Lanhas, já em 1944 nas Exposições Independentes. Também o neorealismo se afirma nesta metade da década, em particular com as Exposições Gerais de Artes Plásticas que, a partir de 1946, marcam claramente posição no panorama português. Aí encontramos Júlio Pomar, que se demarcou pela obra de pintura e pelos desenhos (veja-se o Almoço do Trolha de 1947 ou a Menina 28 com um galo morto de 1948, ou os desenhos com que ilustrou a Guerra e Paz, datados de meados da década seguinte). Numa síntese interessante do surrealismo e do abstraccionismo geométrico topamos com Nadir Afonso, que numa primeira fase nos meados dos anos 40 trabalha numa senda surrealista para, uma década volvida, o encontrarmos dedicado a expressões abstraccionistas geométricas que parecem evocar espaços urbanos, nas suas cores primárias e evidentes, como em Espacilimité, datado de 1957. Já na escultura, o final da década de 40 e a década de 50 marcam, em alguns sectores, um rompimento com a estatuária monumental e nacionalista que registámos acima. Logo em 1948, Jorge Vieira realizou uma exposição individual que incluiu obras de traços surrealistas. A versatilidade de diversos materiais tornaram a sua obra uma referência para esta época (a título de exemplo os seus Mulher e Homem de 1952, as Duas cabeças, do mesmo ano, ou ainda a Figura Feminina, esta de 1960). No panorama da escultura não passam também em branco os nomes de João Cutileiro, com trabalho ainda na década de 50 final, mas mais evidente a partir do anos 60 (Anjo de 1960). Manuel Cargaleiro, por seu lado, representa a faceta ceramista das artes plásticas portuguesa desta época, e já nos anos 40 finais expôs no I Salão de Cerâmica Moderna do SNI (1949). Marcaram a década, no domínio da pintura, ainda os figurativos, movimento em que o nome de Júlio Resende avulta. Participou na I Exposição Independente, mas a sua descoberta de Goya foi determinante na produção subsequente. Não rompendo com a longa tradição da influência parisiense, Resende estagiou em Paris; na sua fase "alentejana" não deixou de se sentir influenciado pelo movimento neo-realista que então grassava em Portugal; nos finais de 50 cede às lições da arte abstracta. Um nome à parte na arte portuguesa do século XX é o de Vieira da Silva que, apesar de nascida portuguesa e em alguns traços das suas obras 29 evidenciar o clima de Lisboa, veio a naturalizar-se francesa em 195655, produzindo essencialmente em contexto não-português. Ainda assim, uma referência breve parece acertada, em função da sua vasta obra que se inicia nos anos 30 (ver por exemplo A Árvore Prisioneira de 1932) e se alonga até aos finais da década de 80, quando pinta (O Retorno de Orfeu, 1982-86) e se dedica também à obra da estação da Cidade Universitária do metropolitano de Lisboa, onde colaborou com Cargaleiro. Muitos dos artistas acima referidos, e que iniciaram a sua actividade nas décadas de 40 e 50, mantiveram o trabalho pelas décadas seguintes, tendo atravessado toda ou boa parte da segunda metade do século. Uns, na senda do que haviam iniciado, outros procurando caminhos mais arrojados ou vanguardistas. José Augusto França considerava, nos princípios da década de 90, que não havia ainda perspectiva suficientemente afastada sobre essa segunda metade da centúria para que uma síntese crítica das suas produções artísticas fosse sequer tentada. Naturalmente que é possível observar as tentativas de enquadramento que o Estado Novo teimou em realizar, por exemplo com a organização constante de exposições temporárias, quer temáticas quer de autor56. Mas a actividade do país escapava de forma cada vez mais evidente ao regime e em 1974 inicia-se, claramente, outro ciclo. A abertura permitida pela ausência de censura, mesclada com a crise económica, marcaram o mercado e a produção artística em Portugal na segunda metade dessa década. Na seguinte, uma certa euforia motivada pela recuperação e pela chegada a Portugal de influências diversas de formas de expressão plástica não nacionais, animaram o panorama artístico português com novidades constantes. No entanto, Vieira na pintura e Cutileiro na escultura continuaram a marcar um lugar de destaque. Houve, ao longo dos anos 80, uma nova geração de artistas pintores que afirmaram seiva nova nas artes portuguesas; tal tendência em parte foi mantida nos anos 90. Mas falta de 55 José Augusto França, na obra acima citada, página 13, considera mesmo que a situação de Vieira da Silva é de tal forma à parte, que a sua obra não pode nem deve ser analisada enquadrada numa lição sobre as arte em Portugal no século XX. 30 facto, neste capítulo como noutros da arte portuguesa contemporânea, tempo para maturar uma análise crítica consequente. Literatura As tendências da viragem do século O século XX literário português, de par com tantas outras formas de expressão artística portuguesas deste período, conheceu fortes influências estrangeiras, aliás na tradição do século anterior, que recebia a civilização, na forma ácida de dizer de Eça de Queiroz, de França, via Sud-Express. De facto, como vimos relativamente às artes plásticas, a permeabilidade do mundo cultural português às influências das correntes em voga na Europa, era muito grande. Desta forma o "parnasianismo", originariamente francês, teoria da arte pela arte, do culto da musicalidade e do trabalho escultórico da língua que se opunha, basicamente, ao romantismo humanitário, chegou tardiamente a Portugal, emiscuindo-se no seio literário nacional a par com tendências decadentistas e simbolistas (Gomes Leal, Gonçalves Crespo e António Feijó). Guerra Junqueiro, por seu lado, lançava-se num misto de panfletarismo anticlerical (A Velhice do Padre Eterno) e de nacionalismo romântico (Finis Patriae) a que não eram alheios nem o clima contrário à religião católica nem a ressaca do que havia sido o Ultimatum inglês e o sentimento republicano crescente. Por outro lado, o surto de decadentismo, notório em Guilherme de Azevedo, vinha-se afirmando, fundado em sentimentos de degeneração nacional acentuada. Eugénio de Castro foi dos maiores representantes dessa corrente decadentista, eivada já de simbolismo A revista A Arte foi o órgão deste movimento simbolista, tendo em Camilo Pessanha o seu representante maior. Cesário Verde, no rodar do século e associado tanto ao realismo quanto ao parnasianismo, foi dos poetas que fecundamente contribuiu para a renovação da língua portuguesa. Desenvolveu-se também no dealbar do século XX literário em Portugal uma corrente regionalista, ligada a aspectos 56 Consulte-se, por exemplo, a rica colecção de catálogos disponível no arquivo do Museu do Chiado – Lisboa. 31 folclóricos e pitorescos, de que se cita normalmente António Nobre como exemplo significativo, apesar de este autor se encontrar também ligado ao simbolismo e ao decadentismo. Intrinsecamente relacionado com o sentimento de decadência da pátria, uma corrente apodada de saudosista deu largas a uma visão metafísica, que pretendia encontrar no conceito da saudade (sentimento dito exclusivamente português e tema recorrente da lírica nacional) a essência espiritual do povo português. O seu principal autor, Teixeira de Pascoaes, congregou autores coevos em torno do movimento portuense que ficou conhecido como "Renascença Portuguesa", e cujo órgão foi a revista A Águia (1910-1930). Neste sentimento embarcou também Pessoa, exprimindo um misto complexo de saudosismo, sebastianismo e espírito profético, porventura rebuscados em raízes como o Bandarra ou António Vieira, e que desaguou de forma evidente na sua Mensagem (1934). O início do século conheceu várias publicações periódicas que pretendiam estar na vanguarda dos movimentos literários; assim, A Águia; e mais tarde a Seara Nova, em 1921, criada por um novo grupo formado em parte por antigos colaboradores dessa primeira revista, que pretendia marcar uma intervenção efectiva na vida portuguesa que o saudosismo, na opinião dos seu promotores, não lograra conseguir. Estava neste grupo Aquilino Ribeiro, um dos maiores prosadores da primeira metade do século, o qual apresentou nas suas obras uma literatura de cunho regionalista. Orpheu e Presença O modernismo na literatura portuguesa conheceu um dos seus primeiros momentos significativos com a publicação, em 1915, da revista literária Orpheu. Não era ainda o grito futurista que se seguiria, mas era uma evidente manifestação de vontade de sacudir, revirar, chocar, o pantanal em que os seus promotores (Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros) viam embebido o horizonte literário português. Aliás, a função provocatória da publicação era óbvia na pessoa de Almada, que vilipendiou o 32 que entendia como símbolo desse academismo desinteressante com o seu Manifesto anti-Dantas. Pessoa foi quem certamente mais ultrapassou de forma individual e na produção literária a esfera do Orpheu. Tanto ortónimo quanto os heterónimos marcaram o século XX português com uma variedade temática e de estilos inigualável. Sá-Carneiro, que tombaria vítima do dramas internos de personalidade que o levaram ao suicídio, recorreu a processos estilísticos inovadores e revolucionários, evidência do seu marcado futurismo. Foi, no entanto, necessário o eclodir de uma nova geração modernista, associada á revista Presença (1927-1940) para impor no meio literário nacional a geração de Orpheu que, apesar da revolução que levara a cabo, não havia desfeito a hegemonia de tendências anteriores acentuadamente académicas. Pela pena de José Régio, por exemplo, esta geração reclamava uma literatura viva, capaz de assumir a individualidade do artista como valor maior, recusando o peso excessivo da escola. Nesta afirmação, a revista foi de uma verdadeira presença, de assinalável papel doutrinário, tendo o ensaio literário aí tido lugar de forma afirmativa. Apesar de actuar à margem da Presença, um dos vultos excepcionais da literatura deste período foi Vitorino Nemésio, de origem açoreana e fortemente marcado por esse facto. A sua ausência do grupo da Presença não significava, de modo algum, oposição. Nemésio foi poeta e cronista, entrando pelos caminhos do romance e alcançando, mais tarde, lugar inigualável até em programas televisionados. Neo-realismo e surrealismo Numa análise ligeira poder-se-ía tentar ver no neo-realismo o repescar serôdio do que haviam sido o naturalismo e o realismo oitocentistas. No entanto, a realidade socio-política que contribuiu para a produção desta corrente era nova e exigia tratamento próprio. Assim, o neo-realismo surge em Portugal marcado de forma intransigente por uma vontade de intervenção, pelo escopo de fazer da literatura um poder actuante e não apenas descritor ou registador. Um dos precursores deste movimento, que podemos observar nas suas primeiras manifestações doutrinárias ainda nos anos 20 finais, foi Ferreira 33 de Castro com os seus Emigrantes, em 1928, assumindo o tema dos menos bafejados, dos miseráveis. Outros autores, já plenamente militantes no movimento, foram Soeiro Pereira Gomes e Alves Redol, que usaram o romance como meio, por excelência, de exposição dos conflitos sociais emergentes ou ingentes. Fernando Namora embarcou também na corrente neo-realista evoluindo depois por outras tendências, bem como Vergílio Ferreira. O neo-realismo em Portugal teve na revista Vértice, o seu orgão por excelência. Na década de 40 alguns movimentos de vanguarda, por exemplo na poesia, foram-se afirmando, por vezes de maneira efémera; estiveram associados a revistas de duração breve, que muitas vezes ultrapassavam os obstáculo censórios exactamente pelo facto de serem de curta duração. Jorge de Sena e Eugénio de Andrade devem ser referidos entre os autores que marcaram estes movimentos. António Pedro trouxe ao panorama literário português o surrealismo, que chegou tardiamante ao palco nacional. A seu lado esteve também Alexandre O'Neill, e não apenas na literatura, como Pedro. Mas, se no que respeita às artes plásticas, o surrealismo mostrou alguma pujança, na literatura, apesar dos artigos que Jorge de Sena publicou na Seara Nova, o surrealismo não encontrou raízes perenes. Aliás, neo-realistas e surrealistas enfrentavam-se no plano teórico de forma evidente. Pós-guerra As alterações verificadas com o fim da II Grande Guerra, também na literatura portuguesa tiveram marca. Se a primeira metade do século tinha ficado ainda assinalada por uma certa faceta de historicismo romântico, já no momento subsequente ao conflito mundial as expressões literárias sofreram alterações de monta. O teatro conheceu um impulso significativo com o eclodir de grupos amadores e experimentais (por exemplo o Teatro Experimental do Porto, 1953). Autores já conhecidos e reconhecidos exploraram a produção teatral neste período (José Régio, Jorge de Sena, Luís de Sttau Monteiro e Bernardo Santareno por exemplo). A influência estrangeira, uma vez mais se 34 fez sentir, com a presença evocada do teatro de Brecht, o que expôs autores, peças e companhias a uma actuação da censura com fins políticos perfeitamente evidente. O Estado Novo pretendia manter o status quo, e para tal julgava necessário coarctar certas expressões literárias que, de forma óbvia, pretendiam mudar o mundo, ou, ao menos, despertar consciências. Literatura na actualidade portuguesa Muitos dos autores que foram já citados acima, permanecem em produção, outros concluíram as suas vidas literárias há pouco. Não há, pois, ainda distância suficiente para uma análise interpretativa completa e abrangente, tanto mais que muitos percorreram caminhos diferentes das tendências iniciais. Ainda assim, torna-se importante citar (apenas citar, sem ensaio de crítica de qualquer espécie) alguns nomes. Dentre eles destacam-se Augusto Abelaira, Alçada Baptista, Luísa Dacosta, Mário Cláudio, José Saramago, Lídia Jorge e José Lobo Antunes. Ainda de referir que a literatura portuguesa tem conhecido, especialmente depois de 1974, algumas manifestações marginais, de vanguarda, aparentemente sem movimentos organizados ou perenes. Outras formas de expressão artística Música Erudita Na música erudita portuguesa, o neoclassicismo dos inícios do século surgiu representado principalmente por Luís de Freitas Branco. A sua presença como mestre de Joly Braga Santos fez com que essa faceta se notasse no discípulo, já nos anos 40, quando Braga Santos surge como um dos mais importantes compositores da sua geração. A actividade renovadora de Freitas Branco, por seu lado, ficou marcada pelo empenho contrário ao amadorismo, contribuindo, dessa forma, para, logo a partir da viragem do século, a 35 afirmação de uma geração de compositores portugueses de elevado nível técnico. Desde cedo, Luís de Freitas Branco avançou a determinação de não seguir o trabalho de outros compositores coevos, excepto para se enquadrar nos movimentos musicais do seu tempo, uma vez que tinha plena consciência das características específicas da sua composição, em face da sua meridionalidade portuguesa. No entanto, pesembora uma fase de associação ideológica ao Integralismo Lusitano, neste início de século turbado em Portugal por alterações políticas de monta, o seu percurso musical e ideológico – que acaba por classificar certas vias então em voga como de nacionalismo romântico e provinciano – vai aproximar-se do pensamento da Seara Nova, para o que muito contribuiu António Sérgio. No início dos anos 20, com Viana da Mota dirigindo o Conservatório, Luís de Freitas Branco assumiu a sub-direcção e participou na sua fecunda remodelação; mais tarde, por meados da década, deixado o Conservatório, dirigiu o Teatro S. Carlos: estava assim, à frente do ensino e da execução da música erudita em Portugal uma orientação que claramente pretendia conhecer e estudar as linhas europeias sem fazer fenecer identidade própria. O ambiente político português posterior ao golpe do 28 de Maio, também na música virá a manifestar, precocemente, a sua presença: logo no início da década de 30, Fernando Lopes Graça enquanto pretendia prestar provas no Conservatório foi sujeito a prisão pela polícia política (a que se terá oposto o júri, permitindo que as provas terminassem). Tal prisão nada tinha que ver com aspectos musicais, mas sim com a alegada actividade política do jovem músico. Aliás, a desconfiança do regime relativamente aos artistas que não conseguia enquadrar revela-se em muitas facetas. Por exemplo na negação da reforma do Conservatório, em que Freitas Branco havia trabalhado e submetera em 1935, aspirando a uma cultura musical nacional de maior nível; ou, de forma mais evidentemente política, quando no final da década de 30, o regime o sujeita a um processo disciplinar em função de alegadas irreverências religiosas proferidas nas aulas e o afasta do Conservatório. 36 No panorama da composição musical portuguesa dos anos 40, a figura que avulta é a de Joly Braga Santos, nesta fase (como acima referimos) ainda muito próximo das lições neo-clásicas de Freitas Branco. Na viragem para os anos 60, o estilo de Braga Santos assume renovadas direcções, sem no entanto delir de forma absoluta as raízes estilísticas com que se iniciara. Por outro lado, e como foi também observável em outros compositores contemporâneos, a inspiração dos temas populares e folclóricos está também presente na obra de Braga Santos (por exemplo na sua 4ª sinfonia). Esta faceta esteve também em evidência em Frederico de Freitas, não apenas no que respeita aos aspectos melódicos mas também no estudo das danças de raiz folclórica. Nesta senda esteve também Lopes Graça, um dos vultos da música erudita contemporânea portuguesa que mais se destacou pelo inconformismo relativamente ao peso político exercido pelo Estado Novo sobre as artes. Tal posicionamento granjeou-lhe, desde cedo, dissabores vários e estadas na prisão. A sua opção pela recolha e estudo das raízes musicais populares não deve ser vista sem essa tonalidade política que lhe era própria; a recolha etnográfica e a utilização dessa recolha na sua obra criadora não eram politicamente ingénuas, nem pretendiam passar por tal. Uma referência ainda a Jorge Peixinho, eventualmente o único compositor português verdadeira e indubitavelmente vanguardista da segunda metade do século, que conheceu as realidades europeias da composição musical mercê de bolsas de estudo que lhe permitiram viajar intensamente. As suas composições foram acolhidas nos meios eruditos portugueses com uma mescla de estranheza e apreço, pelo arrojo de que se revestiam num Portugal ainda, e apesar do trabalho dos compositores acima citados e do clima político essencialmente alterado, pouco decidido à novidade radical. Uma breve nota de referência para os intérpretes portugueses de música erudita, que, no século XX em território nacional e especialmente fora de Portugal, foram reconhecidos pelo seu virtuosismo. Nessa lista, necessariamente incompleta, avultam: José Viana da Mota, Sequeira Costa, Maria João Pires, Adriano Jordão e Pedro Burmester (pianistas), Guilhermina 37 Suggia (violoncelistas), Anabela Chaves (violetista) e Olga Pratts e Gerardo Ribeiro (violinistas). Cinema O cinema em Portugal estreou em Lisboa, pela vontade de Aurélio Paz dos Reis, ainda no século XIX, mesmo às portas da nova centúria (1896). Passado o século, logo em 1904 se inaugurou a primeira sala de cinema, chamada Salão Ideal, também em Lisboa. As primeiras experiências ocorreram ainda nesta década, sendo de destacar a primeira tentativa de cinema sonoro em 1907, pela mão de João Freire Correia. No início da década seguinte, o primeiro filme com enredo de acção foi dirigido por João Tavares: Os Crimes de Diogo Alves. Mas a primeira verdadeira geração de cineastas portugueses foi iniciada por Leitão de Barros, e dela fazem parte, ainda para esta fase inicial do século, Artur Duarte, António Lopes Ribeiro e Cottineli Telmo. Volvidas as duas primeira décadas da centúria, entrou o cinema português numa fase vulgarmente apodada de "idade de ouro", tanto pela quantidade como pela qualidade de algumas das películas então rodadas. A Canção de Lisboa, de 1933, foi um êxito pelo facto de ser sonoro e também pela maneira como iniciou o ciclo da comédia cinematográfica. Foi ainda o lançamento, aos olhos de um público cada vez mais vasto, de actores que se imortalizaram na tela e que eram chamariz de mais e mais adeptos para o espectáculo cinematográfico. A adaptação de temas populares e de clássicos da literatura portuguesa foi talvez uma das razões mais fortes para a atenção que o Estado Novo volveu sobre o cinema nacional, avaliando-lhe o potencial propagandístico nessa fase ainda precoce do seu desenvolvimento. Como em outras artes, também no cinema o Estado Novo cuidou de realizar estremado esforço de enquadramento, trazendo a si e à sua actividade endoutrinadora um meio de comunicação que se veio a revelar tão poderoso. A década de 40 viu aumentado o número de realizações e de público, dando inteira razão às previsões do Estado Novo. De facto, o Portugal retratado nas fitas de então correspondia a um arquétipo gizado pelo regime. O 38 cinema tinha um poder multiplicador de estereótipos como até então se não vira. O ambiente Lisboeta, o fado e os bairros populares citadinos surgiam como tema de eleição, mas outros cenários foram também usados e o Portugal que surgia nas telas era também rural, agrícola, provinciano. No entanto, era a comédia que mais atraía realizadores e público, e os grandes actores deste período ficaram conhecidos exactamente pelas suas participações em comédias celebradas e repetidamente visionadas. Uma nota de novidade, no entanto, saiu das mãos de Manoel de Oliveira, que com o seu Aniki-Bóbó, de 1942, mostrou um Porto que normalmente não saía das barreiras físicas da cidade, uma realidade quotidiana de muitos ignorada, tanto nos cenários quanto nas vivências infantis e adultas. Independentemente das rótulos que mais tarde lhe quiseram colocar (neo-realismo italiano avant la letre, ou realismo francês de sabor serôdio) Aniki-Bóbó é de um palpitar emotivo inegável e recorreu a técnicas inovadoras na procura dos efeitos desejados. Mas a comédia dos anos 40 praticamente esgotou o manancial de interesse que daí poderia vir. Na década seguinte assistiu-se a um declínio desse tipo de fitas, enveredando os realizadores por formas devedoras do neorealismo, que os afastaram do grande público que havia feito o sucesso das comédias anteriores. Se o estrangeiro olhava para Portugal procurando descobrir o trinómio Lisboa/Fado/Amália, no cinema nacional dos finais dos anos 50 e principalmente da década de 60 fazia-se sentir a presença da Nouvelle Vague, com Jean Luc Godard a ser conhecido e comentado, ao menos nos círculos eruditos. Esta nova vaga de cinema português pode ser conhecida no paradigmático Verdes Anos que Paulo Rocha fez surgir em 1962; também aí o som plangente da guitarra estava presente, mas nas mão de um tal virtuoso (Carlos Paredes) que marcou o filme de forma iniludível e de tal maneira que passadas décadas ainda se reconhece o trautear do tema principal, mas já muito poucos se recordam, sequer, do título do filme. Foram ainda os anos de intensa actividade de cine-clube, onde críticos, profissionais ou amadores se reuniam para ver, especialmente, filmes proibidos pela censura do Estado Novo. Cinematografia como a de Eisenstein, entre tantos 39 outros proibidos mais ou menos recentes, era consumida de forma clandestina, em salas semi-públicas ou em casas particulares, num desafio constante e algumas vezes quase provocatório à ordem estabelecida pelo Estado Novo . O final do regime censório, com 1974, trouxe dois fenómenos paradoxais ao cinema português: por um lado, uma total liberdade de realização com temas até então vedados a aparecerem nas telas pela mão de realizadores portugueses, como José Fonseca e Costa, entre tantos outros; por outro, um afastamento do público das salas onde havia cinema português com uma deriva extremamente rápida para os filmes até então proibidos e onde tinham papel de destaque os pornográficos. Algumas salas das grandes cidades assistiram a este processo (o caso do célebre Sá da Bandeira no Porto), mas mais notório foi nos Cine-Tetros que existiam em cada cidade de província, onde um público fiel deixou de estar e onde se deixou de ver cinema português. No meio erudito, para além da discussão teórica sobre o papel arte ou espectáculo que o cinema deveria desempenhar, Manoel de Oliveira saiu com o seu Amor de Perdição em 1976, que, para além das opiniões divergentes da crítica, lhe granjeou fama nada lisonjeira junto do público em geral. Os anos 80 assistiram à consagração internacional de Manoel de Oliveira sem que tal tivesse tido reflexos evidentes no público português. No entanto, alguns outros trabalhos foram atraindo as atenções, como Kilas – o mau da fita, de Fonseca e Costa, datado de 1981. Na mesma senda, mas com sucesso incomparavelmente maior, foi O lugar do morto que Pedro Vasconcelos deu ao público em 1984. Ao longo do resto da década, o interesse pelas películas portuguesas em Portugal tendeu a aumentar paulatinamente, havendo até alguns ensaios mais eruditos que penetraram num público relativamente vasto. Essa tendência acentuar-se-ía na década seguinte, com os prémios internacionais a chamar a atenção do público nacional para o que o cinema português estava a realizar. São os casos do Leão de Ouro do Festival de 40 Veneza conquistado por João César Monteiro com Recordações da Casa Amarela, em 1990, e o reconhecimento, no mesmo festival, da obra de Manoel de Oliveira. A crescente presença de filmes portugueses nos vários prémios internacionais, a par de um aumento de notoriedade interna dos seus realizadores, veio trazer maior destaque e maior presença do cinema português nas salas nacionais. Ainda assim, no final do século, a produção nacional é ainda olhada com alguma desconfiança por parte de um público que não superou o apodo erudito (ou pseudo-erudito) que o período dos anos 70 trouxe ao cinema nacional. Arquitectura A arquitectura portuguesa dos inícios do século não recebeu os impulsos inovadores que podemos observar nas artes plásticas ou na literatura. O país estava numa situação económica e financeira que dificilmente permitiria obras públicas de grande envergadura, e as obras particulares pautaram-se por um conservadorismo assaz regular. Apenas a cidade de Lisboa era verdadeiramente uma grande cidade, estando as outras concentrações urbanas nacionais francamente espartilhadas por um crescimento diminuto e por uma carência financeira óbvia. Ainda assim, no que respeita a projectos, houve nas duas décadas iniciais do século alguma inovação, senão em termos de estética, pelo menos em termos de planeamento e de projecto. No Porto, Marques da Silva projectou duas obras de grandes dimensões (a estação de S. Bento e o Teatro de S. João) e deixou o seu cunho nos projectos que realizou para várias moradias na cidade. A Avenida dos Aliados deve-lhe também algum do espaço que adquiriu. Já em Lisboa, se nota de forma mais evidente, ainda que tímida, a presença de uma arquitectura modernista. Nos finais da década de 20 iniciou-se um esforço de modernização da cidade, de que se não conheciam levantamentos desde o início da década anterior. A cidade necessitava, de forma cada vez mais evidente, de intervenções de fundo, mas essas só apareceriam, em termos de grandes obras públicas, com o Estado Novo e na 41 década seguinte. Algumas experiências isoladas foram realizadas pelos jovens arquitectos de 20, nas exposições internacionais em que Portugal participou (Cottineli e Ramos no Rio de Janeiro, logo em 22, por exemplo). A década de 30 veio trazer um novo e vigoroso alento à arquitectura portuguesa, especialmente no que respeita às encomendas de Estado. De facto, o Estado Novo tomava em mãos a obra de modernizar, rasgar novos espaços, edificar em grandeza e em estilo de propaganda. A situação financeira equilibrada permitia ao Estado Novo gastar em obras públicas, e as fachadas dos edifícios deveriam corresponder a uma visão ampla, grandiosa e anunciadora dos dez anos de prosperidade que Salazar esperava, após dez anos de reconstrução. Desta forma, as linhas de uma arquitectura moderna marcada pela mão do Estado haveriam de fazer a sua entrada em Portugal, para perdurar até à actualidade. À frente dos destinos da obras públicas em Portugal colocou Salazar Duarte Pacheco. A partir de 1932, este engenheiro com funções de ministro gizou e mandou executar projectos viários e urbanos e encontrou em alguns arquitectos portugueses projectistas que corresponderam aos seus planos. Logo no início da década, Carlos Ramos assina o projecto para o Liceu D. Filipa de Lencastre, que, de par com tantos outros projectos de Liceus nacionais, marcava um desejo de espaço, de ordenação dos volumes, de apego a linhas modernas e funcionais. Na mesma toada projectou para Lisboa o Pavilhão da Rádio, cujas fachadas evocam as produções de arquitectos europeus coevos, como Gropius por exemplo. De forma ainda mais evidente e ostentatória, Pardal Monteiro projecta o Instituto Superior Técnico de Lisboa, que haveria de concluir em meados dos anos 30, e onde deposita os ensinamentos da arquitectura da Italiana de Moussolini, que visitara. O mesmo estilo se pode observar no seu projecto para a Cidade Universitária. De outro cariz é a sua Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Lisboa, que projectou já para os finais dos anos 30, e onde a modernidade das linhas rompe com o classicismo que era apanágio das edificações do sagrado. Cristino da Silva, por seu lado, com os projectos do Teatro Capitólio e da Praça do Areeiro, entre 42 outros de sua mão, avança também com opções estéticas e volumétricas arrojadas, tanto no que respeita à planificação urbana, quanto no que concerne aos interiores. Cassiano Branco, numa linha que não se afasta substancialmente do que vem sendo descrito, interveio com os seus projectos do Teatro Eden e do Coliseu do Porto, mas terá sido o Portugal do Pequenitos, em Coimbra, que verdadeiramente o tornou conhecido e citado. Este jardim merece uma análise mais particular, uma vez que aí encontramos dois aspecto essenciais da arquitectura e da política monumental do Estado Novo; por um lado a importância dada aos monumentos nacionais e, por outro, a invenção de uma tradição que se chamará Casa Portuguesa, para a qual, aliás, Raul Lino muito haveria de contribuir57. No Portugal dos Pequenitos encontram-se miniaturas dos principais tipos de casa popular portuguesa, rapsódias de monumentos da metrópole mas não só: a entrada faz-se por uma área dedicada aos espaços ultramarinos, onde existem pavilhões específicos de cada um dos territórios de além-mar, recheados de fotografias, artefactos, mapas, informações. A passagem desta área para a relativa a Portugal continental faz-se passando por um planisfério que mostra rotas e territórios das Descobertas. Apenas depois se tem acesso ao Portugal continental miniaturizado. Nessa parte, por zonas geográficas, aparecem os principais monumentos portugueses e uma longa série de casas de arquitectura popular miniaturizadas. As crianças entram e saem das pequenas casas, espreitam às janelas e sobem escadas do seu tamanho; visitam as salinas de Aveiro e as casas alentejanas; observam um moinho na beira de um rio fingido e passeiam entre animais de criação doméstica existentes por todo o país. Todo o Portugal de arquitectura popular está presente, numa rapsódia que oferece a ideia implícita de que há uma casa portuguesa. Esta imagem colhia junto da política edificadora do Estado Novo, que pretendia ver nas grandes obras públicas uma arquitectura moderna e 57 As intervenções de Veiga de Oliveira, Benjamim Pereira e Fernando Galhano são de outra natureza, apesar de terem também contribuído para a construção teórica desse conceito. Ver OLIVEIRA, E. V. de e GALHANO, F. - Arquitectura 43 ostensiva e nas casas populares os traços de uma etnicidade afirmada e defendida. Estes dois processos vão desaguar no que se realizou em termos arquitectónicos, quer definitivos quer provisórios, para a Grande Exposição do Mundo Português de 1940. Aliás, no que respeita à arquitectura de pavilhões provisórios, já havia sido realizado um ensaio de sucesso, em 1937, quando Keil do Amaral projectou o pavilhão português da Exposição Internacional de Paris, tendo inclusivamente ganho um prémio por essa obra. Em 1940, toda a área de Belém sofreu intervenção, edificando-se um conjunto muito vasto de pavilhões, onde colaboraram vários arquitectos (entre os quais Cristino da Silva) sob o projecto de Cottineli Telmo (um desses pavilhões haveria de subsistir até à actualidade, albergando o Museu de Arte Popular) e dois conjuntos etnográficos: num extremo, as aldeias portuguesas, que em tamanho real recriavam os ambientes rurais de Portugal Continental; noutro extremo a Secção Colonial (que esteve a cargo de Cassiano Branco) e que pretendia representar o Império Colonial, nas suas construções, animais e habitantes nativos. A Grande Exposição do Mundo Português foi um vértice interessante da produção artística do Estado Novo, onde concorreram pintores, escultores, arquitectos, cineastas e fotógrafos, tanto na preparação como no registo do evento. Ainda para a década de 30 final, inícios da de 40, é devida uma palavra de referência a Viana de Lima que deixou uma obra notável, especialmente pela modernidade de algumas formas. Nesse caso está uma célebre vivenda projectada para a rua Honório de Lima, no Porto, com linhas que a aproximam das soluções projectadas por Rietveld, mais de uma década antes. Essa vivenda, na voragem da especulação imobiliária que atravessou Portugal nos anos 80 e 90, foi demolida estando em seu lugar um incaracterístico edifício de alguns andares. Como observação marginal, não deixamos também de Tradicional Portuguesa, Lisboa, Pub. D. Quixote, 1992 e OLIVEIRA, E.V. de, GALHANO, F. e PEREIRA, B. - Construções Primitivas em Portugal, Lisboa, Pub. D. Quixote, 1988. 44 registar, para o ano de 1940, a execução do projecto de Paulino Montez para o Museu José Malhoa nas Caldas da Rainha. Tal projecto e respectiva execução marcam na história da arquitectura portuguesa um momento importante, uma vez que se havia projectado e realizado de raiz um edifício especialmente destinado a uma colecção museológica de arte. O edifício seguia a lição do projecto teórico do museu de Dresden de Algarotti, e, apesar de ter vindo a ser ritmadamente alterado e aumentado, permite ainda perceber o projecto original. A sua construção deveu-se, antes de mais, a um momento político especial, 1940, com o Estado Novo a desembolsar verbas consideráveis na preparação do país para as comemorações nacionalistas. As décadas de 40 e seguintes não foram o engrandecimento que Salazar previra. Pelo contrário, a II Guerra Mundial, as dificuldades do pós-guerra, as crescentes complicações coloniais no início dos anos 60 e finalmente os choques petrolíferos não haveriam de deixar nenhuma brecha para que o Estado Novo pudesse novamente gozar uma grandiosidade como a que tinha conhecido na década de 30. Disso se ressentiu necessariamente a política de obras públicas levada a cabo. Também foi o encerrar de uma época no que respeita à direcção definida por Duarte Pacheco, que desaparecerá de cena vitimado por acidente de automóvel, mas que desapareceria de qualquer modo, vitimado pela mudança, necessária, de política. A partir de meados dos anos 40, uma nova geração de arquitectos, de que Fernando Távora se fez porta-voz, pretendia trazer a Portugal correntes modernas da arquitectura e refazer, de raiz, muito do que se defendia em Portugal em termos de projecto e edificação. Nos finais da década, aquando do I Congresso Nacional de Arquitectura, ouviram-se as vozes dos mais velhos, a geração que acima fomos identificando, mas também algumas vozes mais jovens (entre as quais ainda Keil Amaral e Viana, que também já referimos). No entanto, o tom geral do Congresso foi tudo menos revolucionário. As ideias da pureza tradicional da arquitectura portuguesa, e outras teses análogas estiveram em cima da mesa de forma evidente. Uma outra conclusão, essa mais rejuvenescedora, prendia-se com a necessidade de uma remodelação do 45 ensino da arquitectura e de uma perspectiva urbanista entendida como necessária. Deste Congresso saiu ainda uma outra ideia, que se executaria apenas no voltar da década seguinte: um Inquérito à Arquitectura Tradicional Portuguesa, que desmistificasse a visão romântica e nacionalista até então empregue. Em Lisboa, a pressão urbanística produzia dois efeitos principais: edifícios de dimensões consideráveis dentro da cidade (por exemplo nas Avenidas como a dos Estado Unidos da América, por meados do anos 50) e ocupação de áreas ainda livres de habitação nos arredores da cidade (por exemplo os Olivais, para onde se realiza plano no virar da década). Lisboa acentuava o papel de única verdadeiramente grande cidade do país, tanto em termos do número de habitantes quanto em termos de urbanismo. É verdade que o Porto crescera também significativamente o seu número de habitantes – andaria pelos trezentos mil em 1960 – e não seria menos verdade, pelo contrário, que a escola de arquitectura do Porto tendia a lançar as bases de uma afirmação que floresceria anos mais tarde. Mas a cidade era, ainda, muito pequena. Note-se, no entanto, entre outras, uma experiência que perdurou na cidade de forma significativa: demolido o antigo palácio de cristal, cuja despesa de manutenção nem a edilidade nem particulares foram capazes de manter, ocupou-se o espaço por meados do anos 50 com um edifício em betão, o Pavilhão dos Desportos (que o povo do Porto teima em chamar Palácio de Cristal). Tal obra era de uma novidade estrutural interessante para a cidade. Os anos 50 ficam ainda marcados por uma série de obras públicas algo isoladas mas marcantes: os Palácios da Justiça, fazendo ainda gala de manter a estética monumental do Estado Novo, espalharam-se por todo o país. Fernando Távora, já no final da década, tem uma intervenção fulgurante com o Mercado de Vila da Feira. Ainda nos anos 50, Álvaro Siza Vieira, inicialmente no atlier de Távora, começa a sua actividade projectista, que o viria a tornar conhecido mundialmente. Este é um arquitecto singular, mas a sua actividade é símbolo daquilo a que se começou a convencionar chamar a "escola do Porto", de onde saíram arquitectos significativos no plano nacional e internacional. Uma última, 46 e breve, referência para a entrada do pós-modernismo na arquitectura portuguesa, pela mão de Tomás Taveira. Tendo estagiado nos EUA, Taveira trouxe as formas e as cores do pós-modernismo para o ambiente revolucionário mas intrinsecamente conservador dos anos 70 em Portugal, e criou com isso uma polémica estética de forte pendor emocional. O seu edifício das Amoreiras, em Lisboa, e outros que se seguiram, atraíram ódios e amores que trouxeram para a discussão não-erudita as opções da arquitectura e do urbanismo. 47 Listagem de artistas referidos no texto, per ordem alfabética: Abelaira, Augusto José de Freitas (1926-). Natural de Ançã, Cantanhede, licenciado em ciências histórico-filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi professor e, posteriormente, como jornalista, director das revistas Seara Nova e Vida Mundial. Exerceu também o cargo de presidente da Associação Portuguesa de Escritores. Abraçou o neorealismo. Augusto Abelaira conta, entre os poetas e pensadores que mais o influenciaram, os nomes de Fernando Pessoa, António Sérgio, Montaigne e Tolstoi. Afonso, Nadir (1920-). Natural de Chaves. Formou-se em Arquitectura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto. Prosseguiu estudos em Paris, e colaborou com Le Corbusier (1948-1951) e com Óscar Niemeyer (1952-1954). Participou em inúmeras exposições, como por exemplo as Bienais de São Paulo de 1961 e de 1969. Recebeu o Prémio Nacional de Arte (1967), o Prémio Sousa Cardoso (1969), o Prémio da Crítica (1972) e a Medalha de Ouro da Vila de Chaves (1982). A sua pintura, de cariz geométrico, é frequentemente resultado da abstracção e depuração de conjuntos arquitectónicos urbanos. Almeida, Leopoldo Neves de (1898-1975) Natural de Lisboa. Estudou na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, onde foi professor de desenho e escultura. Participou na Exposição do Mundo Português (1940) com o Padrão dos Descobrimentos, obra realizada segundo o projecto de Cotinelli Telmo. É considerado um dos artistas oficiais do Estado Novo. Entre as suas obras mais significativas contam-se a estátua equestre de D. João I (na Praça da Figueira, em Lisboa), a estátua equestre de D. Nuno Álvares Pereira (junto ao mosteiro da Batalha). Em 1940 foi-lhe atribuído o Prémio Soares dos Reis. 48 Amaral, Francisco Keil do (1910-1975). Arquitecto português, natural de Lisboa. Formou-se em arquitectura na Escola Nacional de Belas-Artes de Lisboa. Dedicou-se à criação e recuperação de jardins públicos e parques de Lisboa, enquanto arquitecto da Câmara Municipal. São da sua autoria alguns edifícios do Parque de Monsanto (como o restaurante de Montes Claros) e do aeroporto de Lisboa. Recebeu a medalha de ouro da Exposição Internacional de Paris, de 1937, com o seu Pavilhão de Portugal. Andrade, Eugénio de (pseudónimo de José Fontainhas) (1923-). Natural do Fundão. Viajou para Lisboa aos 9 anos e aí permaneceu até aos vinte, altura em que partiu para o Porto. Abandonou a ideia de um curso de filosofia para se dedicar à poesia e à escrita. Camilo Pessanha foi forte influência do jovem poeta que, sem filiação em qualquer corrente literária, muito conviveu com neo-realistas. Foi galardoado com o prémio de poesia (APE) e o prémio de poesia Jean Malrieu. Recebeu, em 1996, o Prémio Europeu de Poesia. António Dacosta (1914-1990). Natural de Angra do Heroísmo. Estudou em Lisboa, na Escola Superior de Belas-Artes e, também, em Paris, onde acabou por se fixar em 1947 e acabaria por viver até à morte. Participou em várias exposições internacionais mas, a partir da década de 1950, passou a dedicar-se, sobretudo, à crítica literária. António, Lauro (1942-). Natural de Lisboa, licenciou-se em história pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi director de revistas, crítico cinematográfico e cineclubista. Dirigiu Manhã Submersa (1981), a partir do romance homónimo de Virgílio Ferreira. Baptista, António Alçada (1927-). Licenciado em direito pela Universidade de Lisboa em 1950; responsável pela livraria Moraes Editora e, em 1963, fundador da revista O Tempo e o Modo, onde colaboraram Mário 49 Soares e José Cardoso Pires. Entre 1971 e 1974, foi assessor para a cultura do ministro Veiga Simão. Dirigiu os jornais O Dia e Edição Especial. Ligado ao movimento personalista francês e ao espiritualismo de raiz cristã, a sua obra reflecte preocupações centradas na relação do homem com o mundo. É membro da Academia Internacional da Cultura Portuguesa. É autor de ensaios, memórias, crónicas e ficção. Barradas, Jorge Nicholson Moore (1894-1971) Natural de Lisboa. Frequentou a Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa e pertenceu à primeira geração dos modernistas portugueses. Nos anos 20, distinguiu-se como o mais popular ilustrador lisboeta, colaborando com jornais e revistas, em particular O Sempre Fixe. Participou na decoração do Bristol Club (1925) e executou duas telas para o café Brasileira, no Chiado. Estreou-se como ceramista em 1945. Na 1.a Exposição de Cerâmica Moderna (1949), obteve o Prémio Sebastião de Almeida. Na arte da azulejaria realizou figuras isoladas e painéis. A última fase da sua pintura é marcada pela viragem para uma tendência surrealista. Barros, José Júlio Marques Leitão de (1896-1967). Pintor, cineasta e jornalista português, natural de Lisboa. Estudou na Escola de Belas-Artes, frequentou a Escola Superior de Letras, a Faculdade de Ciências, a Escola Normal Superior de Lisboa e foi professor do ensino secundário. Entre 1934 e 1935, organizou em Lisboa os cortejos históricos das festas da cidade. Foi o secretário-geral da Exposição do Mundo Português (1940). A ele se devem os primeiros prémios (Bienal de Veneza) da cinematografia portuguesa. Bessa-Luís, Agustina (1922-). Natural de Amarante. Estreou-se, em 1948, com o romance Mundo Fechado. Residiu no Porto desde 1950, ocupou o cargo de directora do Teatro Nacional D. Maria II (Lisboa) e fez parte da Alta Autoridade para a Comunicação Social. É uma das mais importantes romancistas portuguesas. Recebeu o Prémio Nacional de Novelística (1967) e 50 o Prémio da Crítica do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários (1992), ambos pelo conjunto da sua obra. Botelho, Carlos (1899-1982) Natural de Lisboa, com estudos feitos em Lisboa e Paris. Participou na I Exposição da União Nacional (1934) e decorou o interior do pavilhão português da Exposição Internacional de Paris (1937). Premiado em Portugal e no estrangeiro, recebeu os prémios Sousa Cardoso (1938), Columbano (1940), Grand Prix da Exposição Internacional de Paris (1937) e da Exposição Internacional de San Francisco (1939). Branco, Cassiano (1898-1969). Arquitecto modernista português. Formou-se na Escola Nacional de Belas-Artes de Lisboa em 1926 e tornou-se um dos nomes mais marcantes da arquitectura nacional das décadas de 30 e 40. Foi responsável pelo Eden Teatro e pelas Avenidas Novas, em Lisboa, pelo Coliseu do Porto, pelo Portugal dos Pequeninos, em Coimbra, e pela estação ferroviária de Benguela, em Angola. Esteve responsável pelo projecto da Secção Colonial da Grande Exposição do Mundo Português (1940). Em colaboração com Trigo de Morais, foi ainda autor dos projectos de várias barragens. Branco, João de Freitas (1922-1989). Musicólogo, ensaísta e crítico musical português, filho de Luís de Freitas Branco. Frequentou o curso de matemática da Faculdade de Ciências de Lisboa e o curso superior de piano do Conservatório Nacional, onde veio a leccionar. Foi director do Teatro Nacional de São Carlos (1970-1974), professor de cursos musicais na Fundação Calouste Gulbenkian, presidente da Fédération Internationale des Jeunesses Musicales e secretário de estado da cultura (1974-1975). Branco, Luís de Freitas (1890-1955). Compositor e musicólogo português. O seu talento e interesse pela música surgiram de forma e conhecem-se composições suas feitas cerca dos nove anos de idade. Em 1910 51 partiu para o estrangeiro, onde estudou durante cinco anos. Iniciou uma carreira como professor no Conservatório Nacional de Lisboa em 1916. Foi fundador e director da revista Arte Musical e director da Gazeta Musical, tendo ainda dirigido a Academia dos Amadores de Música. Compôs música coral sinfónica, para orquestra de câmara e para piano e órgão. A suas masi antigas e principais influências estilísticas foram o impressionismo e expressionismo, tendo depois desenvolvido tendências neoclássicas. Canto, Jorge Brum do (1910-1994). Cineasta e crítico de cinema. Iniciou o curso de direito na Universidade de Lisboa, mas em 1927 passou a dedicar-se à crítica cinematográfica, tendo colaborado com O Século, Cinéfilo, Imagem, Kino, entre outras publicações. Dirigiu vários documentários (19321934). O seu lançamento definitivo aconteceu em 1938, com Canção da Terra, considerado a primeira manifestação neo-realista do cinema português. Cardoso, Amadeo de Souza (1887-1918) Natural de Manhufe (Amarante). Ingressou na Escola de Belas-Artes de Lisboa (1905) para estudar arquitectura. Abandonou o curso no ano seguinte. Seguiu partiu para Paris, onde se instalou. Iniciou-se na caricatura, mas o seu trabalho denotava uma sofisticação formal que o identificava à parte dos humoristas portugueses coevos. Conviveu com o pintor Amedeo Modigliani com quem realizou uma exposição (1911); nesse ano participou Salão dos Independentes. Esteve presente no Armory Show, exposição realizada em Nova Iorque, Boston e Chicago, englobando trezentos artistas europeus. A partir de 1912 experimenta várias tendências: esquematismo volumétrico, abstraccionismo geométrico, técnica pontilhista. Expôe em Londres e em Berlim e regressa a Portugal onde expõe também (Lisboa, 1917). Cargaleiro, Manuel Alves (1927-). Pintor, gravador, ceramista e ilustrador português. Frequentou a Faculdade de Ciências de Lisboa, que abandonou para se dedicar às artes plásticas. Ingressou na Escola Superior de 52 Belas-Artes de Lisboa, viajando por Itália e França, onde efectuou estágios em cerâmica. Iniciou a sua actividade artística, sob a orientação de Jorge Barradas, como ceramista, estreando-se no primeiro salão de cerâmica moderna (1949). Galardoado com o prémio nacional de cerâmica (1954) efectuou painéis cerâmicos para edifícios públicos e ilustrou livros de poesia, Entre 1954 e 1957, foi professor de cerâmica na Escola António Arroio (Lisboa). Instalou-se em Paris (1957) com uma bolsa da Fundação Gulbenkian, passando a dedicar-se quase exclusivamente à pintura. Recebeu o Diplôme d’Honneur de l’Académie Internationale de la Céramique (Cannes, 1955) e o primeiro prémio do concurso de cerâmica para a Cidade Universitária; foi agraciado com a ordem da Cruz de Sant’Iago de Espada (1982) e com o grau de Officier des Arts et des Lettres (França, 1984). Carneiro, António Teixeira (1872-1939) Natural de Amarante. Estudou na Academia Portuense de Belas-Artes e na Academia Julien, em Paris. O seu trabalho dos finais do século XIX, inícios do XX enquadra-se no simbolismo. Produziu inúmeros retratos de figuras da época bem como pinturas de paisagens (os trabalhos sobre a região de Leça da Palmeira, que frequentou entre 1906 e 1915 ou as telas da Figueira da Foz, de 1921, já com algum peso expressionista). Esteve ligado à revista A Águia (director artístico 1910-1932), e foi nomeado professor de desenho de estátua e modelo vivo da Escola Superior de Belas-Artes do Porto em 1918. Carvalhais, José Herculano Stuart Torres de Almeida (1887-1961) Natural de Vila Real. Aluno de Jorge Colaço, estreou-se no Século Cómico em 1906. Passou a editor de A Sátira, em 1911, tendo sido responsável pelo projecto de uma sociedade de humoristas portugueses, que fez com que se apresentassem três salões de exposição em Lisboa, onde se viram representados os artistas pertencentes à primeira geração de modernistas portugueses. Foi para Paris em 1912, onde se fixou durante um ano, tendo privado com Amadeo de Souza Cardoso e Almada Negreiros . Expôs individualmente uma única vez no Salão da Casa da Imprensa (1932). Nos 53 seus desenhos, predominam os temas rústicos e tipos tradicionais lisboetas. Foi o autor da primeira banda desenhada portuguesa, «As Aventuras do Quim e do Manecas» (1915), publicada no Século Cómico. Em 1949, recebeu o Prémio Domingos Sequeira. Castro, Eugénio de (1869-1944). Natural de Coimbra, formou-se em letras na Universidade de Coimbra. Iniciou a publicação de obras de poesia em 1884. Três anos mais tarde, foi colaborador do jornal O Dia. Eugénio de Castro ficou conhecido, sobretudo, como introdutor do simbolismo em Portugal. Após uma estadia em França, publicou algumas obras que pretendiam revolucionar, do ponto de vista formal, a poesia portuguesa. Estas primeiras obras suscitaram viva polémica, o que ajudou à difusão do simbolismo decadentista em Portugal. Castro, José Maria Ferreira de (1898-1974). Escritor português. Emigrou para o Brasil aos 12 anos, experiência que serviria ao seu mais famoso romance, A Selva (1930). Em 1919 regressou a Lisboa onde fundou a revista A Hora (1922) e o magazine Civilização (1928). A sua publicação de Emigrantes marca a transição em direcção ao neo-realismo. Nesta obra, o autor debruça-se sobre questões sociais e humanitárias de um grupo desfavorecido a que ele próprio pertencera. Cláudio, Mário (Pseudónimo de Rui Manuel Pinto Barbot Costa) (1941-). Natural do Porto. Licenciado em direito pela Universidade de Coimbra, fez ainda o curso de bibliotecário-arquivista e é Master of Arts pela Universidade de Londres. Tem colaborado em diversas publicações periódicas. A sua escrita é densa e complexa; algumas das suas obras, de fundo histórico ou biográfico, caracterizam-se por uma grande riqueza imaginativa. 54 Coelho, Ruy (1892-1986). Compositor português, natural de Alcácer do Sal. Fez os seus estudos no Conservatório Nacional de Lisboa e em Berlim (1909-1914) trabalhando com Humperdinck, Max Bende e Schönberg. Iniciou o bailado português com A Princesa dos Sapatos de Ferro (1918), com argumento de António Ferro. Obteve o 1º Prémio do Concurso Nacional de Madrid, com a ópera Belkiss (1924). Foi autor de uma longa obra de música dramática, sinfónica, coral-sinfónica, vocal e de piano e surge associado à ópera de características acentuadamente portuguesas. Compositor de grandes recursos no plano melódico, exerceu crítica musical e foi, também, maestro. Correia, João Freire (1881-1929). Fotógrafo português, natural de Lisboa. Nome prestigiado na fotografia, foi pioneiro na produção de cinema em Portugal. Foi o fundador da Portugália Filme. Costa, José Fonseca e (1933-). Cineasta português de origem angolana. Frequentou a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Em 1957 foi preso pela PIDE. Partiu para Itália, onde foi assistente de Antonioni em O Eclipse. Regressou a Portugal e foi preso (1961) em função da sua filiação no partido comunista, que viria a abandonar mais tarde. Na segunda metade dos anos 60 dirigiu curtas-metragens publicitárias e filmes documentais, regressando a Angola para a realização de Regresso à Terra do Sol. Foi crítico de cinema nas revistas Imagem e Seara Nova. Costa, Luís (1879-1960). Pianista e compositor português, natural de Farelães, Barcelos. Casado com a pianista Leonilde Moreira e Sá, foi pai da violoncelista Madalena de Sá Costa e da pianista Maria Helena Moreira de Sá e Costa. Estudou no Porto, onde foi aluno de Moreira e Sá (pai), e na Alemanha. Leccionou no Conservatório do Porto. Foi director do Orfeão Portuense a partir de 1924. Dedicou-se à composição, concebeu obras como Os Poemas do Monte, Telas Campesinas e, Fantasia. 55 Cruz, Ivo (1901-1985). Maestro e compositor português, de origem brasileira. Estudou direito na Universidade de Lisboa (1924), e fez cinco anos de estudos musicais na Alemanha. Em 1931, já em Portugal, fundou a sociedade coral Duarte Lobo e, posteriormente, a Orquestra de Câmara de Lisboa e a Orquestra Filarmónica de Lisboa. Deu grande impulso ao estudo e divulgação da música antiga portuguesa, e à execução de obras coraissinfónicas, como a Paixão Segundo São Mateus e a Paixão Segundo São João, de J. S. Bach. Foi nomeado director do Conservatório Nacional em 1938. Compôs diversas obras para orquestra e para piano. Cutileiro, João (1937-). Natural de Lisboa. Estudou na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa e na Slade School de Londres (1955-59), onde recebeu o prémio atribuído por essa escola. Foi assistente de Reg Butter até 1970. Recorrendo à articulação e justaposição de elementos em esculturas de grande porte, inaugurou nos anos 60 novas temáticas, com figuras de guerreiros, pares de apaixonados, elementos naturais transfigurados em formas antropomórficas e corpos femininos, constantes ao longo do seu trabalho posterior. Em 1975, a partir dos desperdícios de mármore de outras peças, o escultor viria a criar trabalhos utilizando a técnica do mosaico. Duarte, Artur de Jesus Pinto Pacheco (1895-1982). Natural de Lisboa. Fez estudos de teatro no Conservatório. Foi alternando entre o teatro e o cinema, até que, em 1934, passou para a realização como primeiro assistente de António Lopes Ribeiro no filme Gado Bravo. Dirigiu o seu primeiro filme, Os Fidalgos da Casa Mourisca, em 1938. Notabilizou-se posteriormente como mestre da comédia, num conjunto de filmes tendo como cenário bairros lisboetas, (O Costa do Castelo, 1943; A Menina da Rádio, 1944; O Leão da Estrela, 1946 e O Grande Elias, 1950). 56 Eloy, Mário (1900-1951) Natural de Lisboa. Estudou em Lisboa, na Escola Superior de Belas-Artes, em Madrid (1920), em Paris (1924-1927) e em Berlim, onde segunda permaneceu até 1932. Foi significativa a sua presença na geração de modernistas portugueses. Foi influenciado pelo expressionismo alemão, numa fase posterior à sua passagem por Paris e pelo período neoclássico de Picasso. Obteve o Prémio Sousa Cardoso em 1935. O seu temperamento desequilibrado levou ao internamento na Casa de Saúde do Telhal em 1945. Faria, Manuel Ferreira de (1916-1983). Compositor português, natural de São Miguel de Ceide. Tornou-se sacerdote em 1939 e cursou música em Roma, no Pontifício Instituto de Música Sacra, obtendo, em 1942, a licenciatura em canto gregoriano e, em 1944, o título de maestro em composição. Formouse também no Conservatório Nacional de Música de Lisboa. Como compositor, tornou-se um dos valores da música portuguesa criando música sacra, profana, coral, pianística e sinfónica. Deixou mais de meio milhar composições (entre trabalhos originais e arranjos) e diversas obras literárias. Ferreira, Vergílio (1916-1996). Natural de Melo (Gouveia). Aos dez anos de idade, ingressou no seminário do Fundão, que abandonou em 1932. Estudou filologia clássica em Coimbra, exercendo a partir de 1959 a profissão de professor do ensino secundário. Inicialmente ligado ao neo-realismo, acabou por se desligar deste movimento literário, evoluindo a sua obra no sentido de um existencialismo e de um humanismo. Ganhou, entre outros, o Prémio do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários (1985, conjunto da obra), o Prémio Fémina (1990), o Prémio Europália (1991) e o Prémio Camões (1992). 57 Ferro, António Joaquim Tavares (1895-1956). Jornalista e político português. Foi editor da revista Orpheu (1915). Dirigiu a Ilustração Portuguesa e fundou a Panorama. Foi nomeado (1933) director do Secretariado da Propaganda Nacional (Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo a partir de 1944). Foi comissário-geral das exposições internacionais de Paris (1935) e de Nova Iorque (1938), fundador do Museu de Arte Popular, do Grupo de Bailado Verde Gaio e presidente da Emissora Nacional (1941). A partir de 1950, foi ministro de Portugal na Suíça e em Itália. As entrevistas que fez a Salazar, publicadas em 1933, e que o catapultaram para o primeiro plano da vida política nacional, foram a sua obra de maior êxito. Feyo, Salvador Carvão de Eça Barata (1902-1990) Natural de Moçâmedes. Fez estudos na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa em 1929. Fornou-se em Itália com uma bolsa atribuída pelo estado (1933), e foi professor de escultura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto desde 1949. Aí passou a subdirector em 1958. Esteve na direcção do Museu Nacional de Soares dos Reis entre 1950 e 1960. Expôs no I Salão dos Independentes em 1930 e nas exposições de arte moderna do SNI. Apresentou trabalhos na Exposição de Arte Sacra Moderna (1949), colaborou na Exposição do Mundo Português (1940). A sua obra esteve submetida à pressão da encomenda pública, comemorativa do nacionalismo Fraga, Augusto (1910-). Jornalista e cineasta português, nascido em Lisboa. Foi redactor do jornal O Século e colaborou em diversas publicações especializadas em cinema, como as revistas Imagem, Animatógrafo e Cinéfilo. Foi realizador do primeiro filme português a cores, Sangue Toureiro (1958), e obteve o Grande Prémio do SNI com o filme Raça (1961). 58 Franco, Francisco (1885-1955) Natural do Funchal e irmão do pintor Henrique Franco. Fez os seus estudos na Academia de Belas-Artes de Lisboa (1900-1909), em Paris (1909-1914 e 1919-1922) e em Roma (1925). Foi um artista que marcou a sua época e introduziu alguns valores do modernismo na escultura portuguesa. Conseguiu, com o Monumento a Gonçalves Zarco (1928), impor-se no meio artístico. Foi solicitado constantemente por encomendas oficiais. A estátua Salazar, da Exposição Universal de Paris (1937) projectou-o internacionalmente. Freire, Luciano Martins (1864-1932) Natural de Lisboa. Fez estudos na Academia Real de Belas-Artes. Findo o curso, iniciou a sua carreira, expondo pela primeira vez. Desenvolveu actividades na área do ensino, leccionando na Escola de Belas-Artes a disciplina de modelo vivo. Foi exímio restaurador, conhecedo-se cerca de 500 intervenções suas no restauro de telas antigas, de que se salientam um São Pedro, de Vasco Fernandes, o retábulo da Sé de Viseu e o políptico Veneração a São Vicente, também conhecido por Painéis de São Vicente de Fora. Foi director do Museu dos Coches (1911). Freitas, Frederico de (1902-1980). Compositor e maestro português, natural de Lisboa. Teve formação superior de piano, violino e ciências musicais no Conservatório Nacional de Lisboa. Desenvolveu esforços significativos no sentido da divulgação da música no ensino liceal. Dedicou-se à investigação na área musical, deixando inúmeros e importantes ensaios de musicologia. A sua obra caracteriza-se pelo facto de ter acompanhado e assimilado as experiências vanguardistas da música erudita, tendo sido ele o primeiro (1923), na Península Ibérica, a explorar a bitonalidade, a politonalidade e a atonalidade. A sua obra de carácter erudito inclui peças de música vocal, sinfónica, para piano e para outros instrumentos. Recebeu diversas distinções pelo seu talento criativo, nomeadamente o Prémio Nacional de Composição (1926), o Prémio Domingos Bomtempo (1935) e o Prémio Nacional Carlos Seixas (1962). 59 Gomes, Dórdio (1890-1976) Natural de Arraiolos. Formado em pintura histórica na Escola de Belas-Artes de Lisboa, partiu para Paris, prosseguindo estudos na École des Beaux-Arts. Em 1921, voltou a Paris para um período de cinco anos de estudos. Durante essa época executou os trabalhos que enviou à Sociedade Nacional de Belas-Artes para a Exposição dos Cinco Independentes (1923). Estas obras, tal como Cavalos (Arraiolos, 1929), pela sua grande intensidade de composição, com o uso da cor a estruturar os planos, estavam muito próximas de um geometrismo volumétrico, onde era particularmente notória a influência de Cézanne. Regresso definitivamente a Portugal (1926), para Arraiolos. As telas executadas para a Câmara Municipal de Arraiolos (1932) marcam, tal como o Zarco do escultor Francisco Franco, o início do monumentalismo patente na arte portuguesa de características públicas. Em 1933, com residência no Porto, ocupando o seu tempo como professor da Escola de Belas-Artes, desenvolveu a sua última fase criativa, fortemente inspirada na paisagem do Douro não se aventurando na inovação estética num esforço de conciliação entre o modernismo e um tradicionalismo decorativista. Foi galardoado com o Prémio Columbano (1938), o Prémio António Carneiro (1944), o Prémio Nacional de Arte (1962) e o primeiro Prémio de Pintura da Fundação Gulbenkian (1967). Gomes, Joaquim Soeiro Pereira (1909-1949). Terminou, em 1930, o curso de regente agrícola, profissão que exerceu em África durante um breve período de tempo. Regressou a Portugal onde foi empregado de escritório numa fábrica, contactando com a vida operária e envolvendo-se em conflitos laborais. É normalmente considerado um dos iniciadores do neo-realismo português tendo publicou o romance Esteiros (1941), em que usa como cenário a vida dos adolescentes assalariados do Ribatejo. Graça, Fernando Lopes (1906-1994). Compositor e musicólogo português, nascido em Tomar. Estudou no Conservatório Nacional de Lisboa. Fez a sua estreia em 1929 com Variações sobre um Tema Popular Português, para piano. A sua actuação granjeou-lhe fama de subversivo, pelo que o 60 Estado Novo o proibiu de ensinar nas escolas públicas; chegou mesmo a ser preso diversas vezes. Saiu do país em 1937 rumando a França onde estudou musicologia na Sorbonne até 1939. Regressou a Portugal dedicando-se intensamente à composição, ao piano, à crítica musical e à organização e regência de coros populares. Fundou, em 1942, uma organização dedicada à promoção de concertos de música moderna, designada por Sonata. Em 1952, lançou no mercado a revista Gazeta Musical. Dedicou-se ainda e de forma aturada à investigação das tradições musicais populares e rurais, tanto em trabalho de campo (com Michel Giacometti, a partir de 1960), como em fontes eruditas de trabalhos de etnologia. Além da sua obra musical, deixou publicada vasta obra escrita, onde se destacam Introdução à Música Moderna (1942) e Bases Teóricas de Música (1944). Foi galardoado, em 1940, com o 1º Prémio para Piano e Orquestra do Círculo de Cultura Musical, com o seu primeiro concerto para piano e orquestra. Voltou a receber este prémio por três vezes, correspondendo aos anos de 1942, 1944, e 1952. Em 1986, foi galardoado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante. Jorge, Lídia (1946-). Natural de Boliqueime, Algarve. Estudou filologia românica na Universidade de Lisboa, dedicando-se, depois, ao ensino liceal e universitário. Os seus romances estão sobretudo ligados aos problemas colectivos do povo português e às circunstâncias históricas e mudanças da sociedade nacional após o 25 de Abril de 1974. Junqueiro, Abílio Manuel de Guerra (1850-1923). Natural de Freixo de Espada à Cinta. Frequentou a Faculdade de Teologia (1866-1868), que abandonou para se formar em direito (1873). Ligado ao grupo dos "Vencidos da Vida", veio a ser o mais popular poeta panfletário da sua época. Serviu-se dos seus dotes oratórios para, em textos de sátira violenta, quer ao clero (A Velhice do Padre Eterno, 1885), quer à dinastia de Bragança (Finis Patriae e Canção do Ódio, 1891), procurar a adesão popular aos ideais revolucionários. Constante nele também a presença de um certo visionarismo profético, face à 61 decadência nacional, que veio a influenciar grandemente o movimento designado por Renascença Portuguesa. Lanhas, Fernando (1923-). Natural do Porto. Formou-se em arquitectura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto. Optando pela pintura, introduziu em Portugal a questão do abstraccionismo. Em 1944, pintou 02-44, inicialmente designado Violino, exibido na Exposição Independente de 1945, em Leiria e Lisboa. A sua pintura caracteriza-se pela insistência de uma paleta quase monocromática e pela representação de formas bidimensionais, em composições associadas a uma estética fria. Obteve os prémios Marques de Oliveira (1949) e Fundação Calouste Gulbenkian (1968). Lino, Raul (1879-1974). Natural de Lisboa. Formado em Windsor (1890) e em Hanover (1897), regressou a Portugal neste último ano, pondo em prática, através de numerosas viagens pelo país, o seu interesse pela arquitectura tradicional portuguesa. Tentou estabelecer uma síntese entre elementos revivalistas ou Arte Nova e elementos rurais, num conceito de arquitectura doméstica designado por Casa Portuguesa. Os seus princípios tornar-se-iam crescentemente conservadores. Lopes, Adriano Sousa (1879-1944) Cursou na Academia de Lisboa e partiu para Paris em 1903. Expôs em Paris e em Lisboa, aqui em 1917. Normalmente de um academismo notório, passou um curto período expressionista nos anos 20. Em 1929 sucedeu a Columbano na direcção do Museu de Arte Contemporânea. A suas decorações da Assembleia Nacional (de 1937) são de um convencionalismo evidente. Macedo, Diogo de (1889-1959) Natural de Vila Nova de Gaia. A sua formação artística, que incluiu o curso de escultura da Academia Portuense de Belas-Artes, foi concluída em Paris, para onde foi em 1911. De regresso a Portugal, fixou-se no Porto e apresentou trabalhos que tentavam impor o 62 modernismo em Portugal. Voltou a Paris (1921-1926) e foi criando uma obra de estatuária, cuja orientação estética hesitante está patente em Torso de Mulher com que participou na Exposição dos Cinco Independentes, na Sociedade Nacional de Belas-Artes (1923). Regressado a Lisboa (1944), foi nomeado director do Museu Nacional de Arte Contemporânea, abandonando a prática da escultura e iniciando uma tentativa de reestruturação do museu, através da inclusão de obras de artistas jovens, o que lhe foi negado. Dedicar-se-ia também, entretanto, à historiografia, desenvolvendo uma obra de cerca de 50 títulos sobre várias temáticas. Entre 1938 e 1958, colaborou na revista O Ocidente, onde deixou uma série de interessantes crónicas com o título geral de «Notas de arte». Maia, Ernesto Canto da (1890-1981) Natural de Ponta Delgada. Deixou os Açores (1907), ingressando na Escola de Belas-Artes de Lisboa, frequentando o curso geral e, depois deste, o curso de arquitectura civil. O seu trabalho foi público pela primeira vez na I Exposição dos Humoristas Portugueses. Seguiu para Paris, onde frequentou a Escola de Belas-Artes e a Academia da Grande Chaumière, passando depois a Genebra (1914), onde estudou na Escola de Belas-Artes. Participou na II Exposição dos Humoristas, e na 11.a Exposição da Sociedade Nacional de Belas-Artes (Lisboa). Regressou a Ponta Delgada em 1916. Voutou a Paris em 1921. As décadas seguintes viriam a ser de grande actividade, premiada com medalhas em várias exposições francesas e reconhecida institucionalmente. A sua presença em Portugal foi marcada pela participação na Exposição do Mundo Português (1940). Malhoa, José (1855-1933) Natural das Caldas da Rainha. Teve formação académica, obtida na Academia Real de Belas-Artes. Expondo em 1881 com o Grupo do Leão, de que faziam parte pintores como Silva Porto, Columbano Bordalo Pinheiro, António Ramalho e Henrique Pinto, entre outros, adoptou os seus valores naturalistas. Malhoa acabou por significar uma representação (nem científica nem crítica) de valores etnográficos da realidade 63 portuguesa da época. A sua técnica pictórica ganharia, ao largo da sua carreira, maior liberdade de pincelada e maior luminosidade das cores, afastando-se de alguns condicionamentos românticos do início e salientandose na pintura de paisagem. Manta, Abel (1888-1982) Natural de Gouveia. A sua formação em pintura, na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, foi seguida de uma permanência em Paris (1919-1926) e de viagens pela Europa, incluindo a Itália, onde se fixou durante algum tempo. Voltou a Portugal, já com obras expostas nos salões de Paris de 1921 a 1923, ingressou no ensino técnico, leccionando na Escola de Artes Decorativas de António Arroio até 1958. A par com esta actividade, desenvolveu um trabalho à margem, quer de academismos, quer de vanguardismos, aliando à sua formação naturalista (com Carlos Reis) uma pesquisa da obra de Cézanne e dos impressionistas. Uma das suas obras mais conhecidas é o Jogo de Damas, onde a articulação espacial é dinamizada pela distorção perspéctica do chão ladrilhado, orientada na vertical e dando origem a um jogo de planos. Fez apenas duas exposições individuais, em 1925, no Salão Bobone e, em 1965, na Sociedade Nacional de Belas-Artes (Lisboa). Recebeu em 1942 o Prémio Silva Porto, em 1949 a primeira medalha em pintura da Escola Superior de Belas-Artes e, em 1957, o Prémio de Pintura da Fundação Calouste Gulbenkian. Esteve presente na 25.a Bienal de Veneza e na 3.a Bienal de São Paulo. Marques, Bernardo Loureiro (1899-1962) Natural de Silves. Pertenceu à segunda geração do modernismo português. Estreou-se em 1920 na III Exposição dos Humoristas Portugueses. Dedicou-se à caricatura da cidade de Lisboa tendo sido desenhador permanente da Ilustração Portuguesa, e desenvolveu algumas experiências na área da decoração no pavilhão português da Exposição Internacional de Paris (1937) e nos pavilhões de Nova Iorque e São Francisco (1939). Foi também colaborador artístico na decoração do pavilhão português da Exposição do Mundo Português (1940). Foi director 64 gráfico das revistas Panorama (1941-1950), Litoral (1944-45) e Colóquio (desde o primeiro número até à sua morte). Monteiro, João César (1939-). Natural da Figueira da Foz. Iniciou-se no cinema como assistente do cineasta Perdigão Queiroga. Em 1963 foi para Londres frequentar a London School of Film Technique. De regresso a Lisboa, estreou-se como realizador em 1968, com uma série de curtas-metragens. Conquistou diversos prémios:Prémio Leão de Ouro do Festival de Veneza (1989); Prémio Especial do Júri do Festival de Cinema de Veneza (1995) Monteiro, Luís de Sttau (1926-1993). Natural de Lisboa. Licenciou-se em direito dedicando-se depois ao jornalismo. Em Inglaterra contactou com alguns movimentos de vanguarda da literatura anglo-saxónica. Na sua obra narrativa, retrata ironicamente certos estratos da burguesia lisboeta e aspectos da sociedade portuguesa sua contemporânea. Destacou-se como dramaturgo com Felizmente há Luar! (1961), peça escrita sob influência de Brecht onde procurou denunciar da situação do país. Monteiro, Porfírio Pardal (1897-1957). Natural de Pêro Pinheiro, Sintra. A sua formação em arquitectura foi concluída aos 22 anos, com o curso da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa. Obteve o Prémio Valmor (1923), o que se repetiria em 1928, 1929, 1939 e 1940. Sendo-lhe dificultada a entrada, como professor, na Escola Superior de Belas-Artes, ingressou no Instituto Superior Técnico. Duarte Pacheco lançou, entre 1932 e 1940, uma política de obras públicas, destinada a combater o desemprego herdado da I República e a propagandear o regime. Pardal Monteiro trouxe de Itália algo da linguagem com que Moussolini edificava os grandes monumentos de Estado. Entre as suas maiores realizações arquitectónicas contam-se os edifícios do Instituto Superior Técnico, da Cidade Universitária, da sede do jornal Diário de Notícias e das gares marítimas de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos. 65 Motta, José Vianna da (1868-1948). Natural de São Tomé. Estreou-se publicamente, em 1881, num concerto apresentado no Salão da Trindade, em Lisboa. Após ter concluído o curso do Conservatório Nacional, partiu para a Alemanha (1882) onde viveu durante 32 anos. Ingressou no Conservatório de Scharwenka, em Berlim. Três anos mais tarde, tornou-se aluno de Liszt em Weimar e, em 1887, seguiu os cursos de Hans Von Büllow. Em 1917, regressou a Lisboa. A partir de 1918, assumiu a direcção do Conservatório Nacional, cargo que ocupou durante 20 anos, levando a cabo importantes alterações. Em esteve em Viena, para participar nas comemorações de Beethoven. O seu trabalho instrumental está marcado pela forte inspiração folclórica. A sua obra de música vocal para uma voz e piano distribui-se ao longo de 37 canções, sendo elas 25 lieder e 12 canções de câmara portuguesas. Mourão-Ferreira, David (1927-1996). Escritor e professor universitário português, natural de Lisboa. Licenciou-se em filologia românica em 1951. Foi professor do ensino técnico e do ensino liceal e, em 1957, iniciou a sua carreira de professor universitário na Faculdade de Letras de Lisboa. Afastado desta actividade entre 1963 e 1970, por motivos políticos, foi professor catedrático convidado da mesma instituição a partir de 1990. Após o 25 de Abril de 1974, foi director do jornal A Capital. Secretário de estado da cultura em vários governos (1976-1978), foi director-adjunto do jornal O Dia (1975-1976). A sua carreira literária teve início em 1945, com a publicação de alguns poemas na revista Seara Nova. Em 1954, foi um dos co-fundadores da revista literária Távola Redonda. Negreiros, José Sobral de Almada (1893-1970) Natural de São Tomé e Príncipe. Estudou no colégio jesuíta de Campolide e na Escola Nacional de Belas-Artes, em Lisboa. Estudou pintura em Paris (1919 - 1920). Viveu em Espanha entre 1927 e 1932. Colaborou nas revistas Orpheu, Contemporânea, Athena, Portugal Futurista e Sudoeste. Participou na I Exposição dos Humoristas Portugueses (1911) . Obras de referência: murais na gare 66 marítima de Lisboa, os trabalhos para a Igreja de Nossa Senhora de Fátima (mosaico e pintura) e o retrato de Fernando Pessoa. Foi pintor, trabalhou tapeçaria, dedicou-se à decoração e ao bailado. Foi ainda escritor, tendo publicado peças de teatro (Antes de Começar, 1919; Pierrot e Arlequim, 1924; Deseja-se Mulher, 1928); e romances (Nome de Guerra, escrito em 1925 e publicado em 1938), poemas (A Cena do Ódio, 1915) e uma série de textos de crítica e polémica (Manifesto Anti–Dantas) Oliveira, Manoel de (1908-). Natural do Porto. Estreou-se no cinema em 1931, com a curta-metragem Douro, Fauna Fluvial. Três anos mais tarde, participou, como actor, no filme A Canção de Lisboa (1934). A sua primeira longa-metragem foi Aniki-Bóbó (1942), um filme produzido por António Lopes Ribeiro, que muitos consideraram uma antecipação ao neo-realismo italiano, mas que, eventualmente, estará mais próximo do estilo realista francês característico dos anos 30. Obteve a Harpa de Ouro do Festival de Cork (Irlanda), o Prémio da Crítica no Festival de Veneza onde também foi distinguido com o Leão de Ouro pelo conjunto da sua obra e o Prémio David Donatello pelo conjunto da sua obra. Pacheco, Duarte (1899-1943). Engenheiro e político português, natural de Loulé. Foi uma figura emblemática do Estado Novo. Formado no Instituto Superior Técnico, aí permaneceu como professor (1922) e director (1924). Posteriormente, acumulou funções de presidente da Câmara de Lisboa e funções governativas nas áreas da educação e, sobretudo, das obras públicas, tendo sido ministro das obras públicas e comunicações a partir de 1932. Dirigiu os grandes trabalhos públicos do Estado Novo Pascoaes, Teixeira de (pseudónimo de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos) (1877-1952). Natural de Amarante, formou-se em direito em 1901. Em 1910, foi um dos fundadores da revista Águia, órgão do movimento cultural da Renascença Portuguesa e do saudosismo, e que veio a dirigir 67 (1912-1917). Marcado ainda pelo século XIX, por uma forte carga romântica e metafísica, Teixeira de Pascoaes foi, simultaneamente, poeta e pensador. Pedro, António (1909-1966) Natural da Cidade da Praia (Cabo Verde). Frequentou as faculdades de direito e de letras da Universidade de Lisboa, tendo ainda ingressado no Instituto de Arte e Arqueologia da Sorbonne, em Paris. Dedicou–se à pintura nas décadas de 30 e 40. Foi um dos introdutores do surrealismo em Portugal, expondo com António Dacosta e Pamela Boden em Lisboa. António Pedro iria participar activamente no grupo surrealista de Lisboa, a partir de 1947, dando origem a obras de feitura colectiva, como é o caso da obra realizada em 1948 por António Domingues, Fernando de Azevedo, Vespeira, Moniz Pereira e António Pedro, em tela de grandes dimensões. António Pedro expôs, pela última vez, com o grupo surrealista em 1949, deixando na tela Rapto na Paisagem Povoada (1946) a síntese da força imagética e da poética da sua pintura. Em 1949 passou a dirigir o Teatro Apolo. No ano seguinte, iria retirar–se para Moledo do Minho, onde viveria até ao final da sua vida. Começou então o seu envolvimento pleno na actividade teatral, como director, figurinista e encenador do Teatro Experimental do Porto, entre 1953 e 1961. Paralelamente, desenvolveu um trabalho teórico como ensaísta e crítico de arte. Tendo produzido regularmente crónicas para a BBC, em Londres, na década de 40 (actividade que o levaria a contactar com o grupo surrealista inglês), iria ainda fundar a revista Variante e colaborar com outras publicações periódicas, como Unicórnio, Mundo Literário e Aventura. Peixinho, Jorge (1940-1995). Compositor e pianista português, natural do Montijo. Formou-se em composição e piano no Conservatório Nacional de Lisboa, seguindo depois, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, para Itália, Suíça, Países Baixos e Alemanha, onde continuou os estudos. Leccionou composição e análise no Conservatório e na Escola de Música do Porto. É dito um dos músicos portugueses mais importantes da segunda metade do século XX, e será eventualmente o único compositor nacional que 68 fielmente representa a corrente modernista da música europeia, marcando a sua obra por um vanguardismo evidente. Pessanha, Camilo de Almeida (1867-1926). Natural de Coimbra, formou-se em direito em 1891. Três anos mais tarde, seguiu para Macau. Em 1900, ocupou o lugar de conservador do registo predial da cidade, tendo estado de novo em Portugal entre 1905 e 1909 e 1915 e 1916. Deve-se a João de Castro Osório e a Ana de Castro Osório a publicação do volume Clepsidra (1920), que reúne poemas de Pessanha, muitos dos quais ditados de memória pelo poeta. Geralmente é considerado o mais genuíno representante do simbolismo português. Embora tardiamente publicado e tendo uma obra escassa, Camilo Pessanha exerceu grande influência sobre os poetas do primeiro modernismo português, e mesmo posteriores. Pessoa, Fernando António Nogueira (1888-1935). Natural de Lisboa. Viveu na África do Sul (1895-1905), aí seguindo os estudos secundários. Frequentou ainda a escola comercial e a Universidade do Cabo. De regresso a Lisboa, frequentou o Curso Superior de Letras. Frequentava as tertúlias intelectuais dos cafés da capital, e envolveu-se nas discussões literárias e até políticas da época. Colaborou na revista A Águia. Em 1915, com Sá-Carneiro e Luís de Montalvor, lançou a revista Orpheu. Colaborou ainda nas revistas Portugal Futurista (1917), Contemporânea (1922-1926), Athena (1924-1925) e Presença. Os seus heterónimos mais conhecidos são Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos Pomar, Júlio Artur da Silva (1926-). Natural de Lisboa. Formou-se na Escola de Artes Decorativas de António Arroio e nas Escolas Superiores de Belas-Artes de Lisboa e do Porto. Expôs pela primeira vez em 1945, revelando uma tendência neo-realista. Realizou a primeira exposição individual em 1947 (Pomar, 25 desenhos) em Lisboa. A partir de 1957, impôs-se uma nova orientação na sua carreira, objectivada no abandono da sua postura didáctica 69 da mensagem neo-realista; em busca de uma autonomia de pesquisa plástica, caracteristicamente exposta em manchas pictóricas assentes num neofigurativismo lírico, as séries subsequentes abrangeriam temáticas como a tauromaquia (1962/63) ou os tigres (1979). Em 1960, trabalhou as suas primeiras esculturas em ferro, numa representação evocativa de D. Quixote. Partiu para Paris em 1963, onde se instalou até 1985. Entre 1968 e 1971 trabalhou essencialmente sobre os acontecimentos parisienses de Maio de 68 A partir de 1976, passou a uma nova abordagem artística trabalhando por assemblage de telas, texturadas através de técnica mista, previamente coloridas e recortadas. Foi galardoado com o 1º Prémio de Pintura da Fundação Calouste Gulbenkian (1961). Queiroga, José Manuel Nobre Perdigão (1916-1980). Natural de Évora. Começou a trabalhar na área cinematográfica em 1936. Entre 1940 e 1946 residiu nos EUA . Estreou-se como realizador em 1947 com o filme Fado com Amália Rodrigues e Virgílio Teixeira. A partir de meados dos anos 60, dedicouse ao jornalismo e à publicidade. Redol, António Alves (1911-1969). Natural de Vila Franca de Xira. Residente em Angola entre os 16 e os 19 anos, regressou a Portugal. Foi um dos iniciadores do movimento neo-realista em Portugal. Parte da sua obra inclui uma análise social fortemente documentada, sobre a qual estriba as afirmações socio-políticas que deseja veicular. Régio, José (pseudónimo de José Maria dos Reis Pereira) (19011969). Natural de Vila do Conde. Licenciado em filologia românica (1925), foi professor liceal primeiro no Porto e, a partir de 1928, em Portalegre, onde permaneceu mais de trinta anos. Com Branquinho da Fonseca e João Gaspar Simões fundou, em 1927, a revista Presença, que marcou o segundo modernismo português. Dedicou-se ao romance, ao teatro, à poesia e ao ensaio. É por vezes considerado um dos vultos mais significativos da moderna 70 literatura portuguesa. Recebeu postumamente, em 1970, o Prémio Nacional de Poesia, pelo conjunto da sua obra poética. Reis, Carlos (1863 - 1940) Natural de Torres Novas. Foi professor de pintura na Escola de Belas Artes de Lisboa, e foi significativa a sua influência na fundação da Sociedade Nacional de Belas Artes. Pintou numerosos quadros, alguns de grandes dimensões, como os painéis decorativos da Sala de Baile do Hotel do Buçaco e um retrato de D. Carlos, que se encontra no paço de Vila Viçosa. Outra obra de relevo encontra-se na Sala do Senado do Palácio de S. Bento. Resende, Júlio (Júlio Martins da Silva Dias) (1917-). Natural do Porto. Iniciou a sua actividade artística na área da ilustração, publicando os seus trabalhos, a partir de 1930. Cursou pintura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto e estagiou em Paris, como bolseiro do Instituto de Alta Cultura. A sua estadia em Paris iria ter grande influência na definição da tendência expressionista da sua obra. A este primeiro contacto directo com as obras de movimento, como o cubismo, juntar-se-ia a influência de Goya. Foi premiado com o Prémio Armando Basto (1945 e 1952), o Prémio Souza Cardoso (1949), o prémio especial da 1ª Bienal de São Paulo (1951) e o 2º Prémio da Fundação Calouste Gulbenkian (pintura, 1957). Ribeirinho (Francisco Carlos Lopes Ribeiro) (1911-1984). Natural de Lisboa. Em 1941, estreou-se na realização com O Pátio das Cantigas, um retrato típico das gentes de um bairro popular lisboeta. Ribeiro, António Lopes (1908-1995). Natural de Lisboa. Passou pelo teatro e pela rádio, foi escritor, jornalista, crítico de cinema e produtor. A ele se ficou a dever grande parte da história do cinema em Portugal. Conhecido como "cineasta oficial do Estado Novo" a partir do filme A Revolução de Maio (1937); realizou muitos outros documentários panfletários de propaganda. Foi 71 um dos realizadores mais eficientes no que diz respeito à comédia portuguesa (O Pai Tirano, 1941; A Vizinha do Lado, 1945). Produziu a primeira longa metragem de Manoel de Oliveira, Aniki-Bóbó (1942) e Camões (1946), de Leitão de Barros. Ribeiro, Aquilino (1885-1963). Natural de Carregal de Tabosa. Cursou no seminário de Beja tendo depois seguido para a capital e iniciado aí a sua actividade jornalística e política. Envolvido em movimentos revolucionários, viu-se obrigado ao exílio (1907). Em França estudou na Universidade da Sorbonne (1910-1914). De volta a Portugal, foi professor liceal e conservador da Biblioteca Nacional. Pertenceu à direcção da revista Seara Nova. Após o estabelecimento do Estado Novo, voltou a Paris, regressando pouco depois. Envolveu-se, em 1928, numa conjura revolucionária que o levou à prisão. Conseguiu evadir-se, fugindo uma vez mais do país. Voltou definitivamente em 1932. Foi autor de contos, novelas, romances, estudos etnográficos, biografias, ensaios, impressões de viagem, literatura infantil e traduções. Rocha, Paulo (1935-). Natural do Porto. Formou-se em realização no Institut d´Hautes Études Cinématographiques, tendo estagiado com Jean Renoir. Estreou-se como realizador com Verdes Anos (1963). O seu trabalho como cineasta assinala o movimento da nouvelle vague em Portugal, do qual é um dos mais significativos representantes. Sá-Carneiro, Mário de (1890-1916). Natural de Lisboa. Matriculou-se na Faculdade de Direito de Coimbra em 1911, mas não chegou sequer a concluir o ano. Em 1912 foi para Paris, onde deveria estudar direito, mas dedicou-se sobretudo à vida de boémia dos cafés e salas de espectáculo da capital francesa. Em 1915, era um dos membros do grupo de Orpheu, revista em que colaborou. A crise interior que o afectava levou-o, em 1916, ao suicídio. 72 Salgado, José Veloso (1864 - 1945) Natural de Lisboa. Foi professor na Escola de Belas Artes de Lisboa. A sua obra está marcada especialmente na pintura. Merecem especial destaque Amor e Psique, os painéis decorativos do Palácio da Bolsa e a Alegoria às Cortes de 1820, no Palácio de S. Bento. De sua autoria são igualmente o pano de boca e decoração do Teatro Politeama, em Lisboa. Santareno, Bernardo (pseudónimo de António Martinho do Rosário) (1924-1980). Natural de Santarém. Estudou medicina em Coimbra, (concluiu em 1950). Foi sobretudo como dramatugo que se notabilizou. Ligado a um fundo popular poético e supersticioso, de forte cunho religioso e erótico, explorou temas de marginalização moral a que se juntou um cunho de intervenção política. Notórias são as influências do teatro épico de Brecht. Realizou oposição ao Estado Novo. Santa-Rita Pintor (Guilherme Augusto Cau da Costa Santa Rita) (1889-1918) Natural de Lisboa. Frequentou a Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa onde fez estudos de pintura. Partiu para Paris (1910) e aí conheceu correntes artísticas mais radicais, dentre elas o movimento futurista e artistas como Marinetti, Picasso e Max Jacob. Regressou a Portugal em 1914 onde iniciou uma pesquisa orientada sobretudo em direcção à conceptualidade manifestada pela pintura futurista italiana. O seu temperamento exótico e agressivo tornou-se também visível na sua pintura, que exprime essencialmente uma vontade de ruptura vanguardista, contendo, em termos plásticos, referências cubistas notórias. Santa-Rita colaborou na Orpheu e foi responsável pelo número único de Portugal Futurista. Devido à sua morte prematura (com apenas 28 anos) e à vontade por si expressa e levada a cabo pela família de destruição das suas obras após a sua morte, o seu espólio artístico é muito reduzido. 73 Santos, Joly Braga (1924-1988). Compositor e maestro português, natural de Lisboa. Seguiu estudos no Conservatório Nacional até 1945. Partiu para Milão, onde veio a concluir estudos de direcção de orquestra e, posteriormente, viajou até Roma para completar a sua formação em composição e ciências musicais. Em 1964 passou a professor de composição no Conservatório Nacional. Exerceu o cargo de director da Orquestra Sinfónica do Porto. Escreveu sinfonias, óperas, aberturas sinfónicas, peças para orquestra e para coro e orquestra, entre outras. Recebeu em 1987 o Prémio de Composição Musical, atribuído pelo Conselho Português de Música. Saramago, José (1922-). Natural de Azinhaga (Golegã). Concluiu, em 1939 o curso de serralheiro mecânico. Colaborou em várias revistas e jornais, como a Seara Nova, o Diário de Lisboa, A Capital e o Jornal do Fundão. Em 1975, exerceu funções de director-adjunto do Diário de Notícias. Recebeu os prémios Internacional Literário Mondello (1992) e Literário Brancatti (1992, ambos italianos e atribuídos ao conjunto da sua obra), o Prémio Vida Literária da APE (1993), o Prémio Consagração SPA (1995) e o Prémio Camões (1995). Foi Prémio Nobel da Literatura. Sena, Jorge de (1919-1978). Natural de Lisboa, naturalizado brasileiro em 1963. Licenciou-se em engenharia civil, trabalhando na Junta Autónoma de Estradas entre 1948 e 1959. Neste último ano, exilou-se voluntariamente no Brasil, Em 1965 seguiu, também como professor, para a Universidade do Wisconsin (EUA). Entretanto, vinha desenvolvendo, desde finais dos anos 30, ampla actividade de crítica de arte, tendo colaborado, entre outras, nas revistas Presença, Cadernos de Poesia, Portucale, Seara Nova e Vértice. Jorge de Sena foi ainda poeta, dramaturgo, ficcionista e historiador da cultura. Não se filiando em nenhuma escola literária, foi influenciado por várias correntes (e notoriamente pelo surrealismo, sobretudo em aspectos técnicos). 74 Silva, José Marques da (1869-1947). Natural do Porto. Formou-se na Academia Portuense de Belas-Artes. Estagiou em Paris, regressando a Portugal para ser nomeado professor de Arquitectura da Escola de Belas-Artes do Porto (1907-1939), passando a director da escola em 1913. Os seus trabalhos foram premiados na Exposição de Paris (1900) e no Rio de Janeiro (1908). A sua obra arquitectónica encontrou-se sobretudo concentrada na cidade do Porto, sendo da sua autoria várias moradias e grandes construções como a estação de São Bento e o Teatro de São João (Porto) e a sede da Sociedade Martins Sarmento (Guimarães). Combinando estilos clássicos com um certo gosto contemporâneo, contribuiu para a modernização da cidade do Porto, nomeadamente da Avenida dos Aliados, para a qual projectou e executou alterações que permitiram a abertura de espaços e tornaram funcionais as vias de circulação. Silva, Luís Cristino da (1896-1976). Natural de Lisboa. Desenhou o Pavilhão da Honra e de Lisboa da Exposição do Mundo Português de 1940. Executou também os projectos do Café Portugal do Rossio, do Teatro Capitólio, da Praça do Areeiro e de uma dupla escadaria que liga os dois planos de jardins do Palácio de S. Bento. Cristino da Silva teve ainda um papel importante na concepção do Monumento aos Descobrimentos. Foi professor de arquitectura na Escola de Belas Artes de Lisboa. Silva, Maria Helena Vieira da (1908-1992). Natural de Lisboa e naturalizada francesa em 1956. Estudou escultura em 1924, seguindo para Paris, em 1928, onde se fixou e casou depois com o pintor húngaro Arpad Szenes (1930). Dedicou-se à pintura a partir de 1929, vindo a expor os seus primeiros trabalhos na Galeria Jean Buchet em 1933. Ocupando um lugar de destaque na segunda geração de modernistas portugueses, o seu trabalho integra-se nas problemáticas desenvolvidas pela Escola de Paris. O jogo de planos, a fragmentação dos espaços e dos objectos e a importância da linha, numa evocação do cubismo, são uma constante em Vieira da Silva. A sua abstracção impõe-se no sentido de síntese e recriação dos movimentos, dos 75 ritmos, da cor, da luz e da formalização do espaço sensível ou do espaço inteligível, da sua interioridade e exterioridade poéticas. Para além da pintura, dedicou-se ainda aos vitrais, tendo executado trabalhos para a igreja de Reims, e à tapeçaria, executando trabalhos para a Gobelins e Beauvais e para a Manufactura de Portalegre. Foi premiada por diversas vezes, tendo recebido o Grande Prémio de São Paulo (1953 e 1961), o Grande Prémio de Pintura (Mannheim, 1962) e o Grande Prémio de Paris (1963). Soares, António (1894-1978) Natural de um meio socio-cultural pouco favorecido, não cursou formação académica no meio artísticos. Participou no II Salão dos Humoristas e foi para Paris (1914) onde se manteve à margem doas artistas portugueses. Em 1916 participou na Galeria das Artes e em 1922 realizou exposição autónoma. No final dos anos 20 alcançou notoriedade nos círculos da crítica nacional, mas os inícios dos anos 30 e essa década foram de alguma dificuldade para o pintor. Ao longo do anos 40, 50 e 60 expôs diversas vezes, tendo visto a sua carreira, que correra entre o modernismo e o academismo, coroada, já no final, com algumas distinções de monta (Ordem de San'Tiago em 1958, prémio do Diário de Notícias em 1962). Sousa, Aurélia de (1865-1925) Natural de Valparaíso, Chile, Filha de emigrantes portugueses. Veio para Portugal com 7 anos. Em 1893 ingressou na Academia Portuguesa de Belas-Artes, onde se formou em pintura. Prosseguiu estudos em Paris, onde passou a residir em 1898. Na sua obra é notório o colorido expressionista das flores e o romantismo da intimidade de atmosferas familiares. Regressou ao Porto (1901), tendo-se instalado na Quinta da China, nas margens do Douro, numa geografia bucólica que inspirou diversos trabalhos paisagísticos. Ao longo do seu percurso artístico notam-se marcas do neo-impressionimo e de um realismo não sentimentalista. 76 Taveira, Tomás (1938-). Arquitecto português, natural de Lisboa. Tendo concluído a sua formação em arquitectura na Escola Superior de Belas–Artes de Lisboa, aí passou seguidamente a leccionar as cadeiras de arquitectura e teoria da arquitectura. Em 1977 fez um estágio nos Estados Unidos da América. A sua obra na área de arquitectura foi orientada pela liberdade estética do pós–modernismo. É disso exemplo o seu projecto para as Torres e Shopping das Amoreiras em Lisboa. Távora, Fernando Luís Cardoso de Meneses de Tavares e (1923-). Arquitecto português, natural do Porto. Formado na Escola Superior de BelasArtes do Porto, ali apresentou como tese o projecto Uma Casa sobre o Mar (1952). Na década de 50, tornou-se arquitecto municipal da cidade do Porto. Foi galardoado em 1987 com o Grande Prémio Nacional de Arquitectura. Telmo, José Ângelo Cotinelli (1897-1948). Natural de Lisboa. Concluiu o curso de arquitectura em 1920, na Escola de Belas-Artes de Lisboa. Entre as suas obras mais conhecidas encontram-se a Praça do Império, com a Fonte Monumental e o Monumento dos Descobrimentos. Venceu vários concursos públicos, com projectos como o Pavilhão do Rio de Janeiro (1922) e o Pavilhão da Exposição de Sevilha (1929). Foi o arquitecto responsável pela concepção e montagem da Exposição do Mundo Português realizada em Lisboa, em 1940. Manifestando grande interesse pela actividade cinematográfica (próximo de Leitão de Barros), estreou-se como realizador em 1933, com A Canção de Lisboa, marcando a história do cinema português por ter sido o primeiro filme sonoro produzido inteiramente em Portugal e por inaugurar o chamado ciclo da comédia à portuguesa. Torga, Miguel (pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha) (19071995). Natural de São Martinho de Anta (Trás–os–Montes). Após uma breve passagem pelo seminário de Lamego, emigrou em 1920 para o Brasil, onde durante cinco anos trabalhou na fazenda em Minas Gerais. Regressou a 77 Portugal em 1925, concluiu o ensino liceal e frequentou em Coimbra o curso de Medicina, que terminou em 1933. Em 1936, lançou outra revista, Manifesto, de breve duração. Várias vezes premiado, nacional e internacionalmente, foramlhe atribuídos, entre outros, o prémio Diário de Notícias (1969), o prémio Internacional de Poesia (1977), o prémio Montaigne (1981), o prémio Camões (1989), o prémio Vida Literária da APE (1992) e o prémio da Crítica (1993). Tropa, Alfredo (1939-). Natural do Porto. Frequentou a Faculdade de Ciências de Coimbra e, nesta cidade, iniciou a sua actividade cinematográfica, realizando curtas-metragens (1960). Partiu para Paris (1961) para seguir estudos no Institut d´Hautes Études Cinematographiques, onde se diplomou em realização. De regresso a Portugal (1968), ingressou na RTP (Radiotelevisão Portuguesa). Vasconcelos, António-Pedro de (1939-). Natural de Leiria. É uma das principais figuras do actual cinema português. Dirigiu, em finais da década de 50, o Cine–Clube Universitário de Lisboa. Estudou cinema na Sorbonne, em Paris. Foi professor na Escola de Cinema do Conservatório e colaborador assíduo de várias publicações especializadas, destacando–se a revista Cinéfilo. Após 1974, fundou com Paulo Branco a produtora V.O. Filmes. Foi galardoado com a condecoração da ordem do infante D. Henrique. Viana, Eduardo Afonso (1881-1967) Natural de Lisboa. Um dos mais importantes nomes da pintura portuguesa dos anos 20. Formou-se na Academia de Belas-Artes de Lisboa (1896 – 1905) partindo para Paris imediatamente. A sua carreira esteve marcada pelo «fauvismo», antes de 1914, e pelo «orfismo», e ainda pelo colorido de Amadeo de Souza Cardoso. Mantendo-se próximo das problemáticas de 1900, num itinerário pessoal de isolamento, acabou por restringir a sua prática de pintura à natureza-morta. Os seus últimos trabalhos possuem o impacto de um discurso pictórico puro. Integrado na primeira geração da arte moderna em Portugal, ao lado de 78 Almada Negreiros, Santa-Rita Pintor e Amadeo de Souza Cardoso, conseguiu com o seu naturalismo modernizado impor-se à geração seguinte. O momento mais relevante da sua evolução ocorreu em 1925, com os nus pintados para o Bristol Clube e as paisagens para a Brasileira do Chiado. Vieira, Álvaro Joaquim de Melo Siza (1933-). Natural de Matosinhos. Concluiu a sua formação em arquitectura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto com 20 valores. Iniciou a sua actividade profissional em 1955. O projecto para o Bairro da Malagueira (Porto) trouxe-lhe a primeira menção internacional. Após o incêndio da zona do Chiado (Lisboa), em 1988, recebeu o convite da Câmara Municipal de Lisboa para dirigir a reconstrução dessa zona. No Centro Galego de Arte Contemporânea, em Santiago de Compostela, mais uma vez afirma a procura dos elementos essenciais no trabalho de arquitectar, recusando a excessiva afirmação do edifício em relação ao seu conteúdo ou ao seu objectivo. Com uma crescente projecção internacional, foi premiado com o Prémio de Arquitectura da Associação Internacional de Críticos de Arte (1982), o Prémio da Associação dos Arquitectos Portugueses (1987), as medalhas de Ouro do Colégio de Arquitectos (Espanha), da Fundação Alvaar Aalto (Finlândia), o Prémio Pritzker (1992), o Grande Prémio Nacional de Arquitectura (1993) e o Prémio Secil de Arquitectura (1996). 79 Cronologia abreviada: Ano Nascimento de artistas referidos no texto 1850 Junqueiro, Abílio Manuel de Guerra 1855 Malhoa, José 1863 Reis, Carlos 1864 Salgado, José Veloso; Freire, Luciano Martins 1865 Sousa, Aurélia de 1867 Pessanha, Camilo de Almeida 1868 Motta, José Vianna da 1869 Castro, Eugénio de; Silva, José Marques da 1872 Carneiro, António Teixeira 1877 Pascoaes, Teixeira de 1879 Lopes, Adriano Sousa; Costa, Luís; Lino, Raul 1881 Correia, João Freire; Viana, Eduardo Afonso 1885 Franco, Francisco; Ribeiro, Aquilino 1887 Cardoso, Amadeo de Souza; Carvalhais, José Herculano Stuart Torres de Almeida 1888 Pessoa, Fernando António Nogueira; Manta, Abel 1889 Santa-Rita Pintor; Macedo, Diogo de 1890 Sá-Carneiro, Mário de; Branco, Luís de Freitas; Gomes, Dórdio; Maia, Ernesto Canto da 1892 Coelho, Ruy 1893 Negreiros, José Sobral de Almada 1894 Barradas, Jorge Nicholson Moore; Soares, António 1895 Ferro, António Joaquim Tavares; Duarte, Artur de Jesus Pinto Pacheco 1896 Barros, José Júlio Marques Leitão de; Silva, Luís Cristino da 1897 Telmo, José Ângelo Cotinelli; Monteiro, Porfírio Pardal 1898 Branco, Cassiano; Castro, José Maria Ferreira de; Almeida, Leopoldo Neves de 1899 Pacheco, Duarte; Marques, Bernardo Loureiro; Botelho, Carlos 1900 Eloy, Mário 1901 Régio, José; Cruz, Ivo Acontecimentos políticos / culturais 80 1902 Freitas, Frederico de; Feyo, Salvador Carvão de Eça Barata 1906 Graça, Fernando Lopes 1907 Torga, Miguel 1908 Oliveira, Manoel de; Silva, Maria Helena Vieira da; Ribeiro, António Lopes 1909 Gomes, Joaquim Soeiro Pereira; Pedro, António 1910 Fraga, Augusto; Amaral, Francisco Keil do; Canto, Jorge Brum do Proclamação da República 1911 Redol, António Alves; Ribeirinho Constituição Republicana; Exposição Livre Ditadura de João Franco Assassínio de D. Carlos 1912 I Exposição do Humoristas 1913 II Exposição do Humoristas 1914 António Dacosta 1915 I Exposição dos Humoristas e Modernistas 1916 Queiroga, José Manuel Nobre Perdigão; Faria, Manuel Ferreira de; Ferreira, Vergílio Entrada de Portugal na I Grande Guerra; II Exposição dos Modernistas 1917 Resende, Júlio Júlio Martins da Silva Dias) Ditadura de Sidónio Pais; Portugal Futurista 1918 Assassínio de Sidónio Pais 1919 Sena, Jorge de III Exposição dos Modernistas 1920 Afonso, Nadir III Exposição dos Humoristas 1922 Bessa-Luís, Agustina; Saramago, José; Branco, João de Freitas 1923 Andrade, Eugénio; Lanhas, Fernando; Távora, Fernando 1924 Santareno, Bernardo; Santos, Joly Braga IV Exposição dos Humoristas 1926 Abelaira, Augusto José de Freitas; Pomar, Júlio Artur da Silva; Monteiro, Luís de Sttau Golpe militar do 28 de Maio e início da Ditadura Militar; IV Exposição dos Modernistas 1927 Baptista, António Alçada; Cargaleiro, Manuel Alves; Mourão-Ferreira, David 1928 Salazar Ministro das Finanças 1930 Acto Colonial; I Salão dos Independentes 1931 II Salão dos Independentes 1932 António Ferro entrevista Salazar; Exposição da Indústria Portuguesa 1933 Costa, José Fonseca e; Vieira, Siza 1934 1935 Início formal do Estado Novo, com o referendo da Constituição I Exposição Colonial Portuguesa Rocha, Paulo I Exposição de Arte Moderna do SPN 81 1936 II Exposição de Arte Moderna do SPN, Exposição de Arte GentílicaI; Exposição do Ano X da Revolução 1937 Cutileiro, João Exposição Internacional de Paris, com participação portuguesa 1938 Taveira, Tomás Duarte Pacheco Ministro das Obras Públicas 1939 Monteiro, João César; Tropa, Alfredo; Vasconcelos, António-Pedro de 1940 Peixinho, Jorge 1941 Cláudio, Mário 1942 António, Lauro 1944 1946 Grande Exposição do Mundo Português Diogo de Macedo director do Museu de Arte Contemporânea Jorge, Lídia 1947 Cineclube do Poro 1948 Exposição 14 Anos de Política do Espírito; I Congresso Nacional de Arquitectura 1949 Campanha de Norton de Matos; I Exposição de Os Surrealistas; Exposição de Arte Negra 1950 II Exposição de Os Surrealistas 1951 Exposição de Arte Sacra Missionária 1953 Exposição 25 Anos do Governo da Nação 1955 Inquérito à Arquitectura Popular (até 1961) 1958 Campanha de Humberto Delgado 1961 Início da Guerra Colonial 1966 Exposição As Artes ao Serviço da Nação 1968 Governo de Marcello Caetano 1970 Morte de Salazar 1974 Golpe do 25 de Abril 1986 Entrada na CEE 82