relações de gênero em empresa familiar: estudo de caso
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relações de gênero em empresa familiar: estudo de caso
XXIV ENANGRAD GPT – Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho RELAÇÕES DE GÊNERO EM EMPRESA FAMILIAR: ESTUDO DE CASO Amanda Vieira Rocha Riza Alex Fernando Borges Alessandro Gomes Enoque Florianópolis, 2013 Área Temática: Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho (Código: GPT) RELAÇÕES DE GÊNERO EM EMPRESA FAMILIAR: ESTUDO DE CASO Resumo O presente trabalho tem por objetivo analisar as relações de gênero em uma pequena empresa familiar do setor de mecanização agrícola da cidade de Ituiutaba, Minas Gerais. Para tanto, o estudo baseou-se em uma abordagem qualitativa baseada. Foram feitas observações no âmbito da organização e foram realizadas entrevistas semiestruturadas com o fundador, sua esposa, a irmã do fundador e com o gerente de compras das três unidades da empresa estudada. Os dados foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo. A análise dos dados permitiu verificar que há forte resistência do fundador em aceitar a atuação de mulheres na empresa. Além disso, é possível observar que há disparidades entre os homens e mulheres no que diz respeito a aspectos como cargos, salários, dentre outras possibilidades. Há ainda uma subordinação das mulheres da família devido a uma cultura machista da empresa, levando-as a se desmotivarem, sobretudo por não terem espaço para conseguir maior liberdade e maior autonomia, e para a demonstração, de maneira clara e objetiva, de suas competências e habilidades. Conclui-se, com esse estudo, que a empresa familiar analisada apresenta dificuldades de separação dos ambientes organizacional e familiar, o que intensifica os conflitos de gênero existentes no âmbito da empresa, trazendo desafios para a sua gestão e continuidade futura. Palavras-chave: empresa familiar; relações de gênero; conflito. Abstract This paper aims to analyze gender relations in a small family business from the agricultural sector located in Ituiutaba, Minas Gerais State. In order to do so, this study is based in a qualitative approach. Data collection was conducted with observations techniques and also with interviews with the founder, his wife, his sister, and a manager. Content analysis was used as data analysis technique. The case showed that there is strong resistance in accepting women in managerial positions inside the family business. Moreover, there are gender discrepancies related to job positions, salaries, among others. In the family, there is also women subordination due to a sexist corporate culture, leading to women unwillingness, especially because there is no space to obtain independence and autonomy, and for a objective, clear demonstration of their competences and abilities. Our conclusion is that there are difficulties in separating family and organization, fact that intensify gender conflicts in the studied family business, which poses challenges to its management and its survival. Key-words: family business; gender relations; conflict. 1. Introdução Nos últimos anos, aumentou-se o interesse pelo estudo de empresas familiares. Sua contribuição socioeconômica para o país e a grande quantidade de empresas criadas a partir desta realidade são fatores que contribuem para este aumento. Neste sentido, observa-se um acréscimo significativo do interesse acadêmico pela problemática das empresas familiares, sobretudo quando se considera o crescente volume de produção científica sobre o tema (BORGES et al., 2012). Dentre as diferentes possibilidades de pesquisa sobre organizações familiares, uma questão a se destacar é a relação de gênero, buscando compreender como esta influencia no gerenciamento desse tipo de empresas, no relacionamento entre os indivíduos da família, no processo de tomada de decisão e nas interações diárias que ocorrem no ambiente da empresa e da família (LESCURA et al., 2012). A partir da abordagem desses dois pontos - empresas familiares e relações de gênero - a pergunta que norteia esta pesquisa é: Como as relações de gênero influenciam a dinâmica entre família e empresa em uma pequena organização familiar? Para responder a este problema de pesquisa, o objetivo geral deste trabalho consiste em identificar como as relações de gênero influenciam a dinâmica de uma empresa familiar situada na região do triângulo mineiro. Para se chegar a este objetivo geral, será necessária a identificação dos seguintes objetivos específicos: 1) Demonstrar a trajetória histórica da empresa em estudo; 2) Identificar as relações familiares existentes na empresa familiar; 3) Identificar as relações de gênero existentes na empresa familiar. Em um primeiro momento, a realização deste estudo justifica-se pela abordagem de uma empresa familiar. Ao longo dos anos esse modelo empresarial passou a ganhar mais destaque pela abrangência e contribuição para a economia local, regional e até nacional. Neste cenário, a base da economia de muitos países está alicerçada nas organizações familiares, mas sua representatividade na análise econômica pode mudar de acordo com o conceito de empresa familiar utilizado (MUHL et al., 2009). Na medida em que se reconhece essa importância e que o interesse científico voltado para a compreensão dessas organizações se torna crescente, surge a necessidade de realização de estudos reflexivos sobre o desenvolvimento deste campo de pesquisa (BORGES et al., 2012). Esta pesquisa também se justifica pela abordagem do gênero no âmbito de uma organização familiar, buscando averiguar como este influi, atualmente, neste tipo de empresa, as suas contribuições para a tomada de decisão, e as diferenças entre indivíduos de diferentes gêneros na gestão empresarial. Segundo Andrade et al. (2002), as relações de gênero podem ser analisadas não como uma imposição, mas como um processo dinâmico que só pode ser compreendido no contexto em que é estabelecido. Neste sentido, o aumento da diversidade e da complexidade nas organizações, provocado pelas diferentes dinâmicas de relações de gênero, faz emergir novos tipos de contradições e assimetrias nesses espaços de interação social (ANDRADE et al., 2002). Este trabalho está estruturado nas seguintes seções, além desta introdução: a empresa familiar; a questão de gênero no espaço organizacional; relações de gênero em empresas familiares; metodologia; a influência das relações de gênero em uma empresa familiar do setor agrícola; considerações finais; e referências. 2. A empresa familiar Nos últimos anos, foi visível o aumento dos estudos sobre empresas familiares no Brasil e no mundo. Cada vez mais, este tema se torna presente no cotidiano das organizações nacionais e internacionais, devido a sua importância e contribuição para a economia local. Essas empresas são extremamente peculiares, o que faz aumentar o interesse de estudo nesse segmento (LESCURA, 2009). Muitas das empresas familiares se enquadram na descrição de microempresas e pequenas empresas. Porém, existem as organizações que conseguiram se sobressair e se tornaram grandes e bem sucedidas empresas (PAIVA et al., 2008). No Brasil, a maioria dos negócios abertos são empresas familiares, e estas contribuem de forma significativa para a economia nacional, uma vez que é uma importante geradora de empregos, e consequentemente, de renda. Leite (2002) apud Paiva, Oliveira, Melo (2008) relata que as organizações familiares são responsáveis por 90% dos negócios e empregam mais de 60% da força de trabalho. Apesar de não existirem dados estatísticos que afirmem com precisão, é possível dizer que uma grande porcentagem das empresas mundiais sejam familiares, ou seja, seu controle é realizado por um núcleo familiar (LESCURA, 2009). Segundo Lescura (2009), as empresas familiares são singulares em sua essência, pois absorvem valores, crenças, ideologias, imagens, sentimentos, emoções, particulares, únicos de seus proprietários de origem familiar. Os gestores baseiam suas decisões em suas experiências, o que acaba por diferenciar uma empresa familiar de outra, tornando esse tipo de organização um espaço de representação da subjetividade. Vários conceitos permeiam este tipo de empresa, mais não há consenso específico sobre o que são as empresas familiares. Donneley (1964) defende que, para ser empresa familiar, a família necessita estar no controle da organização há pelo menos duas gerações, havendo uma influência recíproca dos interesses e dos objetivos da família na política geral da organização. Leone (1991) apud Castro (2009, p. 11) manifesta que: Há algumas especificidades desse tipo de organização: é iniciada por um membro da família; possui membros da família participantes da propriedade e/ou da direção; apresenta valores institucionais, identificando-se com um sobrenome de família ou com a figura do fundador e tem a sucessão ligada ao fator hereditário (LEONE, 1991 apud CASTRO, 2009, p.11). Segundo Litz (2008), empresa familiar é toda aquela que busca se apoiar e a depender de uma família, para desempenhar suas atividades. Ou seja, a empresa para manter-se em determinado mercado, depende da família, de seus recursos e de sua estrutura. Neste sentido, dependendo do critério utilizado, toda a organização é familiar (LESCURA, 2009). Porém, há muitos autores que seguem uma linha de que existem somente dois tipos de organização, a familiar e a não familiar. Para Sharma (2006) o problema dessa abordagem bipolar é que, na realidade, existem organizações mais e menos familiares, dependendo do grau de envolvimento da família no dia-a-dia das empresas. Bethlem (1999) apud Machado, Wetzel, Rodrigues (2008, p. 3) afirma que a definição de empresa familiar está normalmente associada à alta influência da família na gestão. Ou seja, segundo este autor, a empresa é familiar por ter uma forte influência da família no processo de tomada de decisões na organização. A empresa familiar apresenta em sua constituição vantagens e desvantagens. Como desvantagens, Longenecker, Moore e Petty (2007) apontam para os vínculos emocionais e as intensas relações entre os membros da família, que impactam na estrutura, comportamento e funcionamento da empresa. A família e a empresa são dimensões distintas, quando se referem à natureza e aos objetivos. A primeira baseia-se na proteção e aceitação dos membros da família, a segunda foca mais no indivíduo, na busca por melhores resultados para a organização. Assim, podese perceber que há uma confusão entre os objetivos organizacionais e os valores familiares, e a chave para a sobrevivência das empresas familiares, está em saber equilibrar os interesses individuais com as perspectivas empresariais (BORGES, 2012). Como vantagens, Longenecker, Moore e Petty (2007) identificam o acesso direto às informações que os herdeiros têm, por estar em constante contato com o proprietário/gestor, o que leva a um envolvimento intenso por parte dos futuros gestores, que por estarem vivenciando um ambiente familiar poderiam demonstrar mais lealdade e dedicação ao negócio por ser uma empresa da família. Devido a grande importância das empresas familiares na economia em que estão inseridas, há a necessidade de analisar os aspectos subjetivos existentes nessas organizações. Dentre tais aspectos pode-se destacar a relação de gênero dentro deste espaço organizacional, e as interferências que ocorrem neste ambiente devido às diferenças entre os indivíduos. Visto a importância desse aspecto para a gestão da empresa familiar, o próximo item abordará a evolução dos conceitos e como se dão as diferenças entre os indivíduos no espaço organizacional. 3. A questão de gênero no espaço organizacional As relações entre homens e mulheres rementem à antiguidade. Apesar de haver casos de mulheres que conseguiram alcançar uma posição de liderança na sociedade, neste período, a grande maioria era reprimida. A partir dos movimentos feministas e da busca por conhecimento, as mulheres tentam conseguir alcançar patamares, assumir funções, desempenhar atividades, antes ocupados apenas pelo universo masculino. A diferenciação entre os sexos masculino e feminino se dá na construção da história, ou seja, em como esses conceitos foram identificados em séculos anteriores (VILAS BOAS; PAULA NETO; CRAMER, 2001). O conceito de gênero passou por diversas modificações ao longo do tempo. Tal fato pode ser explicado pela evolução das definições propostas em relação ao conceito de gênero, de acordo com a influência de cada época e contexto na formação de cada perspectiva (CAPPELLE; MELO; BRITO, 2002). A sociedade, os padrões criados em cada período, e até as características biológicas, é que determinam como cada indivíduo será identificado. Em um primeiro momento, as características biológicas eram consideradas as responsáveis pelas desigualdades entre os sexos masculino e feminino. Segundo Acker (1990) apud Calás e Smircich (1997), a diferenciação dos indivíduos por causa de suas estruturas biológicas acontece de várias maneiras, em processos frequentes, que criam as hierarquias, e consequentemente, delimitam quem será o agente controlador e quem se submeterá as exigências. Porém, segundo Andrade et al. (2002), com a emergência do conceito de gênero a partir da década de 1970, houve uma evolução teórica que supera as análises restritas às características biológicas. Este conceito surgiu a partir de uma tentativa de entender a relação entre os sexos, e como o contexto em que os indivíduos (masculino e feminino) estão inseridos, ajudam a compreender a relação entre ambos (CRAMER; BRITO; CAPPELE, 2001). Neste cenário, passou-se a perceber que as diferentes experiências e o processo de socialização do homem e da mulher é que definiam o gênero (CAPPELLE; MELO; BRITO, 2002). Para Cramer, Brito e Cappelle (2001) o termo gênero passou a ser concebido como uma posição relacional, contextual/situacional e histórica, demonstrando que a diferenciação sexual é determinada social, cultural e historicamente. O termo gênero também retrata a maneira como são vistos os homens e as mulheres dentro de uma organização e como são vistos os papéis desempenhados por sexos diferentes dentro das áreas gerenciais. A relação de gênero é construída a partir da interação entre as pessoas e apresenta a possibilidade de mudança na relação entre homens e mulheres, ao longo do tempo, diferentemente do conceito de sexo, que apresenta estabilidade no tempo (PINHO; BERGAMASCHI; MELO, 2006, p.5). Além disso, segundo Alpern (1993) e Crompton e Sanderson (1990) apud Calás e Smircich (1997, p.295), o processo de imigração do campo para a cidade criou a separação entre o local de trabalho e o lar, e produziu uma estrutura de gênero em que homens e mulheres têm empregos diferentes. Com essa diferenciação de empregos, aparecem às diferenças nos cargos, nas oportunidades oferecidas a cada indivíduo e nos salários. Apesar de todo o contexto histórico criado em torno da mulher, o que pode ser encontrado de diferença, entre o sexo masculino e feminino, está identificado em processos de gestão das organizações, ao estilo de gerir, de liderar e não em diferenças biológicas entre homens e mulheres. Tais diferenças estariam associadas: Quanto ao estilo de liderança e decisão, as mulheres optam por ser mais democráticas; nas estratégias competitivas, a ênfase feminina está em oferecer menor número de produtos/serviços, porém com alta qualidade, enquanto os homens optam por estratégia de diferenciação, visando alcançar uma imagem de um negócio inovador e criativo. Já em relação aos objetivos empresariais, os homens se preocupam em controlar custos, e as mulheres, que as pessoas, recursos e equipamentos necessários estejam disponíveis para desenvolvimento de produtos e serviços (GIMENEZ et al., 2000 apud TAKAHASHI; GRAEFF; TEIXEIRA, 2006, p. 31). Para outros autores, as diferenças encontradas entre masculino e feminino, estão no estilo de administrar, na maneira como priorizam o planejamento estratégico e na adoção das estratégias empresariais (QUADRO 1). Quadro 1: Diferenças na maneira de administrar entre os sexos masculino e feminino: Estratégias Estilo Administrativo Planejamento Estratégico Empresariais Demonstram preferência pela Maior orientação para a Masculino hierarquia e estrutura formal. Há uma maior valorização por eficiência. dos homens em Articulam a visão da sua parte Maior preocupação com Feminino empresa de forma partilhada comparação com as mulheres. inovação. com os seus subordinados. Fonte: Adaptado de Pelisson et al. (2001) apud Takahashi, Graeff, Teixeira (2006, p. 31) Outro aspecto estreitamente associado às relações de gênero consiste na cultura organizacional. As crenças, valores e atitudes cultivadas na organização interferem na forma como as pessoas/funcionários aceitarão as decisões, independentemente se forem tomadas por homens ou por mulheres. De acordo com Fleury (1996) apud Andrade et al., (2002), o contexto cultural é fundamental para entender as redes nas quais as relações de gênero estão colocadas, pois a cultura tem uma relação com as formas de manifestação do poder dentro das organizações. Considerando a cultura como pano de fundo das construções das relações de gênero, é possível perceber que a hierarquia sexual e as diferenciações decorrentes desse processo não são uma fatalidade biológica, mas sim o resultado de um processo histórico, social e cultural (DEUS, 1995 apud ANDRADE et al., 2002). Mesmo com todo o processo evolutivo pelo qual o termo gênero passou ao longo do tempo, com o aumento da inserção de mulheres no mercado de trabalho e da constante luta por reconhecimento, igualdade e oportunidades, há ainda muita disparidade entre a realidade do homem e da mulher quanto à participação no mercado de trabalho, seja em níveis salariais, possibilidades de construção de uma carreira, reconhecimento pelo serviço executado. As desigualdades são visíveis em diversas situações. Sendo assim, há a necessidade de retratar as interferências das relações de gênero no contexto organizacional, seja nas relações de trabalho ou nas relações familiares. Portanto, o próximo item abordará como as dinâmicas de gênero influenciam a gestão de uma empresa controlada por um núcleo familiar, suas interferências e suas contribuições para o processo de gestão, e como a família consegue conciliar todos os fatos que ocorrem no dia a dia da empresa, mostrando como estes afetam ou não o seu relacionamento com os demais familiares. 4. Relações de gêneros em empresas familiares O gênero é dos pontos que podem ser utilizados para compreender o universo de uma empresa familiar. Esta questão, segundo Pinho, Bergamaschi e Melo (2006), demonstra um importante ponto para compreender a complexidade das relações que envolvem todo o âmbito da empresa familiar. As relações de gênero no espaço organizacional podem interferir em ações e comportamentos. Cappele et al. (2003) apud Pinho, Bergamaschi e Melo (2006, p.4) afirmam que as relações de gênero são percebidas como mecanismos e práticas sociais que são instituídas e instituem ações e comportamentos. Sendo assim, a inserção da questão de gênero é essencial no processo de compreensão das particularidades de empresas familiares. Como as representações sociais são coletivas, mulheres e homens compartilham ideias semelhantes quando relatam a importância da família (ANDRADE et al., 2002, p.10). Na gestão da empresa, essa união pode gerar cumplicidade, pela semelhança dos objetivos e pela busca de um mesmo ideal que favoreça a família, ou pode desencadear uma série de crises, por um não aceitar as ideias e propósitos do outro, tendo em mente que as ações propostas desestabilizem a situação socioeconômica da família. Com o declínio do modelo da família patriarcal, e as mudanças ocorridas no cenário contemporâneo, surgiu um novo contexto organizacional, com uma redefinição dos papeis sociais e revisão dos antigos estereótipos criados a respeito do gênero. Neste sentido, todo este cenário estabelece uma nova relação entre família e empresa. A partir dessas mudanças, é possível encontrar na sociedade atual uma empresa familiar em que se trabalham mãe e filha (MACHADO, 2003). A busca constante por educação, e sua especialização em diversas áreas, tem modificado a lógica da sucessão, onde agora há uma concorrência entre irmãos e parentes, de sexos diferentes, por cargos mais altos na empresa. A tendência educacional da mulher de apresentar mais anos de estudos que os homens está alterando os tipos de sucessão em empresas familiares onde irmãos e irmãs concorrem pelos cargos de alta gerência (ÉLVAREZ; SINTAS; GONZALVO, 2002 apud MACHADO; WETZEL; RODRIGUES, 2008, p. 3). Apesar das transformações ocorridas no mercado atual e do aumento no número de mulheres que possuem o seu próprio negócio, ainda existem muitas limitações à entrada de mulheres no processo de sucessão de empresas familiares. Muitas vezes as mães, como mediadoras, influenciam a entrada de suas filhas na empresa (MACHADO, 2003). Segundo Ram e Holiday (1993) apud Machado (2003), ainda as mulheres de família são invisíveis em seus papeis de gerentes das empresas. Apesar da dificuldade para entrada da mulher na empresa familiar, Cromie e Sullivan (1999) apud Machado (2003), mostram que a conciliação entre trabalho e família foi favorecida para as mulheres que trabalham nas organizações familiares. As dificuldades encontradas pelas mulheres são, geralmente, o impacto na relação social, derivados dos papéis de gerente, esposa e mãe, a disparidade de proventos entre os diferentes sexos, e a falta de um plano de carreira dentro destas organizações familiares (MACHADO, 2003). Outra possibilidade é quando há o compartilhamento do gerenciamento da empresa entre o casal. Esta é uma nova maneira de sociedade que está aumentando (MACHADO, 2003). Mesmo com pesquisas destacando a influência deste modelo de gestão, a influência das esposas na direção da empresa e sua contribuição para o processo de tomada de decisão, o seu papel ainda não é reconhecido como um poder legítimo, tanto pelo marido, quanto pelos funcionários da empresa (MACHADO, 2005). As discriminações que ocorrem no ambiente empresarial tem por base o processo histórico. A disparidade entre homens e mulheres e a diferenciação dos serviços executados por um ou por outro, ocorrem praticamente em todas as sociedades desde os primórdios da humanidade (ARAÚJO, 2003 apud PINHO; BERGAMASCHI; MELO, 2006). Um exemplo disso seria a crença de que os homens seriam mais aptos para ocupar cargos centrais nas organizações familiares (STEIL, 1997, apud PINHO; BERGAMASCHI; MELO, 2006). Porém, pode-se dizer que a cultura da empresa familiar interfere em como esta lidará com a questão do gênero e suas interferências na vida familiar dos gestores. Tanto o ambiente de trabalho quanto a cultura organizacional instalada estão fortemente ligados à família proprietária (GRZYBOVSKI; BOSCARIN; MIGOTT, 2002), e remetem a uma complexa dinâmica de influências e interferências nas relações entre família e empresa, sendo que a questão de gênero complexifica ainda mais esta problemática. Portanto, pode-se observar, que, apesar de toda a evolução de conceitos pelas quais o tema passou ao longo dos últimos anos, ainda há uma forte resistência por parte dos envolvidos no contexto organizacional de aceitar situações de trabalho conjunto, posições de poder e autoridade, bem como o papel de liderança e em processos sucessórios. Mesmo havendo, na economia atual, uma forte inserção das mulheres no mercado de trabalho, pode-se visualizar algumas discrepâncias, no que diz respeito aos cargos, salários e autoridade dessas. Pode-se observar também que a preocupação em manter a estabilidade do negócio, pois este é a fonte de renda familiar, pode interferir nas escolhas que ocorrem dentro da organização. O fato de ainda haver discriminações pode se dar ao fato de querer manter o negócio estável e manter, como na antiguidade, os papéis bem definidos entre homens e mulheres, nos quais os homens promovem o sustento da família e as mulheres cuidam do lar e dos filhos. Estes, e outros desafios, são reproduzidos e fazem-se presentes no âmbito de organizações familiares, revelando uma necessidade de investigações mais aprofundadas para lançar luzes sobre essa problemática tão relevante para a compreensão da natureza desses objetos. 5. Metodologia Este estudo baseou-se em uma abordagem qualitativa. Segundo Silva (2006), as investigações qualitativas tem se preocupado com o significado dos fenômenos e processos sociais, levando em consideração as motivações, crenças, valores, representações sociais e econômicas, que permeiam a rede de relações sociais. Este tipo de abordagem é caracterizado pela grande profundidade dos dados obtidos e pouca amplitude. Ela analisa o fenômeno em estudo através 'dos olhos das pessoas', ou seja, preocupa-se em saber como determinado fato ocorreu através do que as pessoas sabem sobre ele. Nesta abordagem, a produção do conhecimento acontece de forma interativa, intercomunicativa entre investigador e investigado, ocorrendo um processo de conhecimento circular e não tão linear como retratado no paradigma quantitativo (SILVA, 2006). Ou seja, há interação entre o entrevistador e o entrevistado. Esta pesquisa foi estruturada por meio de um estudo de caso de um grupo empresarial familiar, que atualmente encontra-se divido em três unidades, sem vínculos legais entre as empresas. As três empresas são atuantes no setor agrícola como prestadoras de serviços e, além disso, realizam o serviço rodoviário de transporte de cargas. Ventura (2007) afirma que o estudo do caso permite investigar as características importantes para o objeto de estudo da pesquisa. Ele consiste em reunir e examinar as informações sobre um indivíduo, família, grupo ou comunidade, com o intuito de estudar os aspectos da sua vida, baseado no assunto abordado na pesquisa desenvolvida (PINTO, 2010). A necessidade de usar esse tipo de estudo se gera a partir do desejo do pesquisador de explicar situações cotidianas, da vontade de compreender o que ocorre nas organizações: as interações sociais, o contexto no qual a empresa esta inserida, entre outros. Assim, o estudo de caso visa à investigação de um caso específico, bem delimitado, contextualizado em tempo e lugar para que se possa realizar uma busca circunstanciada de informações (VENTURA, 2007). A coleta de dados se deu, em um primeiro momento, através da observação, para que haja a compreensão do contexto organizacional, o comportamento dos entrevistados e como ocorrem suas interações. Esta observação foi participante, pois a pesquisadora assumiu determinadas funções dentro do estudo, por participar ativamente do dia a dia da empresa. Esta técnica, segundo Pinto (2010), consiste apenas em ver e ouvir, mas também em examinar fatos que se desejam estudar, utilizando-se de instrumentos para o registro das informações desejadas. A técnica da observação foi combinada com o uso de entrevistas semiestruturadas, a qual tem por objetivo compreender os pesquisados, visualizar as suas crenças e valores, para entender como estes lidam com o tema do estudo. A entrevista consiste numa técnica de conversação direta, dirigida por uma das partes, de maneira metódica, objetivando a compreensão de uma situação, requerendo do pesquisador uma ideia clara da informação que necessita (PINTO, 2010). As entrevistas foram realizadas com o fundador, que abriu três empresas no setor (Entrevistado 1 ± E1), a irmã do fundador e proprietária de uma das unidades (Entrevistada 2 ± E2), a esposa do fundador, que trabalha no setor administrativo da empresa (Entrevistada 3 ± E3) e o gerente de compras das empresas (Entrevistado 4 ± E4). Os dados coletados foram analisados a partir da técnica de análise de conteúdo. Segundo Campos (2004), a análise de conteúdo refere-se ao estudo tantos dos conteúdos nas figuras de linguagem, reticências, entrelinhas, quanto dos manifestos. Assim, percebe-se que a análise de conteúdo é a união das técnicas de análise de comunicações, que tem por objetivo superar as dúvidas e enriquecer a leitura dos dados coletados (MOZZATO; GRZYBOVSKI, 2011). Segundo Bardin (2006) apud Mozzato; Grzybovski (2011), a análise de conteúdo organiza-se em três fases: 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, interferência e interpretação. A pré-análise é a fase em que se organiza o material a ser analisado com o objetivo de torná-lo operacional, sistematizando as ideias iniciais [...]. A exploração do material constitui a segunda fase, que consiste na exploração do material com a definição de categorias e a identificação das unidades de registro e das unidades de contexto nos documentos [...]. Dessa forma, a codificação, a classificação e a categorização são básicas nesta fase. A terceira fase diz respeito ao tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Esta etapa é destinada ao tratamento dos resultados; ocorre nela a condensação e o destaque das informações para análise, culminando nas interpretações inferenciais; é o momento da intuição, da análise reflexiva e crítica (BARDIN, 2006, apud MOZZATO; GRZYBOVSKI, 2011, p. 735). 6. A influência das relações de gênero em uma empresa familiar do setor agrícola Neste momento do trabalho, será apresentado o estudo de caso, com a descrição histórica da empresa, as relações de gênero, a empresa familiar e a relação entre gênero e empresa familiar. 6.1. A história da empresa do setor de mecanização agrícola A empresa em estudo, prestadora de serviços do setor de mecanização agrícola, foi fundada em uma cidade do triângulo mineiro, no ano de 1995. Neste período, o fundador da empresa trabalhava na Beta Agrícola, como vendedor de produtos agrícolas. Mesmo estando em um emprego fixo, ele começou a realizar pequenos serviços relacionados à plantação de soja, com trator de sua propriedade, na região do triângulo mineiro. Com o passar do tempo, ele notou que não tinha vocação para o serviço em que estava trabalhando e com o pequeno retorno que estava obtendo com a plantação de soja, optou por investir na área de mecanização agrícola. As atividades da empresa começaram efetivamente em 1998, quando ele saiu do antigo emprego, e resolveu se dedicar inteiramente à empresa. Porém, somente em 2006 a empresa ganhou um espaço físico, ou seja, abriu a sede, em um local específico, no qual era possível realizar o controle dos serviços, os recebimentos e guardar os maquinários, que o proprietário havia adquirido ao longo dos anos. Essa característica dos anos iniciais da atividade empresarial pode ser identificada na fala dos entrevistados: O [fundador] sempre, a vida toda, ele falava que ia montar uma empresa, ele começou a trabalhar na Beta Agrícola e foi surgindo cada dia mais serviço pra ele, ele foi ingressando cada vez mais daí surgiu à necessidade e como se diz, a oportunidade de ele começou a, montou a empresa e ta aí até hoje (E3). Ela foi fundada em 2006, mas eu já mexia com maquina já em desde 98, ai vendo as oportunidades nesse seguimento de mecanização, tava crescendo, entrada das usinas, ai a lavoura tava ruim naquele momento, eu peguei e mudei o foco mais para... pra prestação de serviço... foi onde que começou (E1). Em 2006, a empresa 1, já trabalhava com uma maior diversidade de serviços na região. Porém, somente em 2008, o fundador fechou contrato com uma grande usina de açúcar e álcool da região (usina A), que se tornou o principal cliente da empresa. Nesse período, a empresa estava se desenvolvendo e adquirindo novos serviços, foi então que em 2009 a usina A começou a atrasar os pagamentos referentes aos serviços prestados. A crise se estendeu a todas as áreas da empresa, que possuía muitas despesas, e certo número de funcionários que precisavam receber. Devido a esse acontecimento a empresa entrou em crise, pois os demais serviços que realizava não supriam as necessidades financeiras da empresa. Com grande dificuldade de controlar as dívidas, o proprietário resolveu estender seus serviços para outras grandes empresas. Foi então que em 2010, ele fechou mais dois contratos, com duas empresas da região ± a usina B de açúcar e álcool e a fazenda F, nas quais seriam realizados serviços de adubação, aplicação de calcário e gesso, aplicação de herbicida, aração e gradiação de solo ± e assim, começou a regularizar a situação da empresa. Apesar de ter conseguido expandir sua área de atuação, o fundador ficou em um impasse: continuar prestando serviços para a usina A, de quem não estava recebendo e garantir o contato e a possibilidade de pagamento, ou interromper a prestação de serviços para a usina A. Diante desta situação, o proprietário resolveu continuar prestando os serviços para a usina A. Com a execução de serviços em dois locais específicos e com a realização de outros em menor proporção, a empresa viu o seu faturamento aumentar e consequentemente verificou a sua estabilização no mercado, neste período. Ainda em 2010, o fundador optou por abrir outra empresa para que os serviços fossem distribuídos entre as duas empresas. Então em julho de 2010, a empresa 2 foi aberta, em sociedade com a irmã do fundador. Apesar dessa sociedade, em que a irmã do fundador figurava, juridicamente, como a principal proprietária da empresa, era o fundador quem tomava as decisões e gerenciava as duas empresas, as quais passaram a funcionar em um mesmo estabelecimento. Com essa mudança, ambas passaram a serem gerenciados conjuntamente, sem a separação dos serviços, faturamentos, sistemas de contas e demais serviços executados. Com a criação da empresa 2, houve a divisão dos serviços que ficaram assim separados (QUADRO 2): Quadro 2: Divisão dos serviços entre as empresas 1 e 2: Empresa 1: Empresa 2: Usina A: a empresa não podia se desvincular desse cliente, Usinas B, C e D e a Fazenda F. uma vez que tinha dinheiro para receber deste cliente. Fonte: dados da pesquisa Com a maioria dos serviços transferidos para a empresa 2, já ao final de 2010, e com a expansão das atividades, o fundador começou a pensar na possibilidade de abertura de outra unidade. No segundo semestre de 2011, com o volume de serviços e o fechamento de um grande contrato com a usina D, o proprietário optou por abrir imediatamente outra empresa. Esta nova organização foi criada por meio de uma sociedade jurídica formada entre o fundador e sua filha, que não atua nas empresas. Assim, o pai e proprietário abriu a empresa 3, a qual passou a funcionar no mesmo lugar em que as demais funcionavam e passou a ser também controlada pelo fundador. Como anteriormente, os serviços foram redistribuídos entre as três empresas, como demonstrado abaixo no QUADRO 3. Quadro 3: Divisão dos serviços entre as empresas 1, 2 e 3: Empresa 1: Empresa 2: Usina A Usina B, Usina C e a Fazenda Usina B e Usina D. F. Empresa 3: Fonte: dados da pesquisa Até o ano de 2012, as empresas estavam mantendo a estabilidade financeira. Porém, logo no primeiro semestre, com um contrato de serviço feito entre as empresas 2 e 3 com a usina B, que trouxe prejuízo, a empresa começou a acumular dívidas novamente. Por um determinado período as empresas conseguiram se manter, com o pouco que recebiam dos serviços prestados e com o dinheiro que o administrador conseguia com pequenos empréstimos. Porém logo no início do segundo semestre de 2012, com a diminuição dos serviços e encerramento de alguns contratos, a empresa viu sua situação complicar novamente, só que desta vez com um agravante, o fundador teria que pagar seus empréstimos. Além disso, a usina B, única usina para a qual a empresa continuou a prestação de serviço nos meses de maio a novembro, começou a atrasar os pagamentos, o que prejudicou ainda mais as três empresas, que dependiam quase que exclusivamente desta para cumprir suas obrigações. Ao final de 2012 e no início de 2013, as empresas passaram a atrasar seus compromissos, como salário dos funcionários, fornecedores, dentre outros. Com isso, seu crédito foi cortado em diversos estabelecimentos, o que dificultou a obtenção de peças e assim o andamento dos serviços. Atualmente, a empresa passa por um processo de crise, com impostos, salários e demais contas em atraso. O proprietário vem se desfazendo de alguns pequenos implementos para conseguir dinheiro para cobrir as urgências, além de estar tentando receber o dinheiro devido pela usina A (desde 2009), e os pagamentos atrasados devidos pela usina B. A situação atual da empresa, [...] o segmento passa, vamos dizer assim, entre aspas, por uma crise, são algumas empresas que a gente não sabe o porquê, só vem a tona quando a gente vai ver o pagamento, a situação de faturamento e o pagamento não cair na conta. Bom então o que acontece hoje, a empresa realmente ta passando por certas dificuldades financeiras, apesar que continuamos trabalhando as vezes até com um nível, um nível bem interessante de serviço, mas realmente no que tange ao lado financeiro a coisa tá um pouquinho complicada, a gente tá trabalhando tocando a bola pra frente e vamo ver o que acontece aí no futuro (E4). Uai nos tamo passando por um momento crítico que é o setor sucroalcooleiro, as usinas tão em dificuldade, pararam um pouco de crescer, mas acredito que seja passageiro, que esses aumentos que estão tendo no petróleo já vai começar a abrir espaço para melhorar o preço do álcool e já vamos começar a crescer de novo (E1). 6.2. As relações familiares Como exposto no tópico anterior, a empresa foi criada em 1995. A abertura da empresa se deu por meio de uma sociedade entre o fundador e seu pai, na qual o fundador era o proprietário de 99% e o pai de 1% da empresa. O dinheiro investido para comprar a primeira máquina do estabelecimento veio da herança da esposa do fundador. A esposa tinha uma fazenda e o fundador resolveu vendê-la para abrir a empresa. Apesar de fazer parte da sociedade, o pai realizava apenas pequenos serviços, e não participava da gestão da empresa. Porém, devido a atritos entre ele e o fundador, ele parou de trabalhar na empresa. O proprietário e sua esposa oficializaram seu casamento em 1995. Quando começaram as atividades na empresa, ela trabalhava em outro estabelecimento e não mantinha relação com o que acontecia na empresa. Porém, após o nascimento de sua segunda filha, em 2002, e pelo fato de o marido não querer que ela trabalhasse fora de casa, ela começou a trabalhar no escritório junto com seu esposo, realizando funções de secretariado. Tal fato encontra respaldo na literatura sobre relações de gênero nas organizações. Segundo Hirata (1999) apud Cappelle et al. (2002), os trabalhos considerados mais centrais, ligados a cargos de chefia, habitualmente são ocupados por homens, enquanto os trabalhos com menor atribuição de responsabilidades, ou destinados a funções de atendimento, são destinados às mulheres. Em um primeiro momento, a partir dessa convivência dentro do ambiente empresarial e com o fato de ele não aceitar as opiniões da esposa, que tinha que agir conforme ele queria dentro da empresa, começaram a surgir conflitos. Com o surgimento desses desentendimentos, e após uma discussão, dentro do escritório da empresa, ela decidiu ficar somente em casa. Foi a partir desse momento que a esposa resolveu investir em outra área para ter a sua própria renda. Então, ela fez um curso de manicure e pedicure, e começou a trabalhar realizando seu serviço em casa. Porém, o marido nunca concordou essa atividade, falava que ela não precisava daquilo, mas mesmo assim ela continuou. Com os anos trabalhando neste serviço, ela conseguiu juntar uma quantia razoável, e conseguiu fazer uma poupança, da qual seu marido não sabia. Com o passar do tempo, e com o aumento das dívidas da empresa, ela emprestou todo o dinheiro que havia juntado com o seu trabalho, para o marido cobrir as despesas da empresa. Em meados do ano de 2007, a irmã do fundador, que morava em outra cidade, se separou do marido e voltou para Ituiutaba, para a casa dos pais, os quais residiam em uma casa no fundo da empresa. A partir de então, ela começou a realizar pequenos serviços de secretária no escritório, e com o passar do tempo começou a trabalhar permanentemente com seu irmão. Eu moro encostado na empresa, por acaso comecei a anotar recados, a atender telefone, por falta de funcionários, e assim comecei... abri uma empresa, chegava um funcionário novo eu dava uma assistência, e assim foi até a... abrir outra empresa e eu ta dentro ajudando (E2). Em 2010, o fundador resolveu abrir outra empresa e usou o nome de sua irmã para conseguir realizar seu objetivo. Porém, ela não possui nenhuma autoridade na tomada de decisões, ela até expressa alguma opinião sobre algum assunto, mas não pode tomar nenhuma decisão sem o consentimento do irmão. Fato este que acaba, em algumas situações, por gerar um mal estar entre eles. Eu sempre tenho que... às vezes eu tenho uma ideia, eu tenho que comunicar com o meu irmão pra ver o que ele quer, então geralmente as tomadas de decisões, é dele (E2). Ao final de 2010, devido à saída de alguns funcionários do escritório, por incompatibilidade de opiniões, a esposa propôs ao fundador contratar sua afilhada para ajudar no escritório. Então ela começou a trabalhar na empresa e a dividir opiniões a respeito do que ocorria. Assim que a afilhada entrou na empresa a esposa voltou a trabalhar no escritório, juntamente com a cunhada. Para isso, ela abriu mão de suas clientes e foi trabalhar para o marido, sem receber por isso um salário específico. Começaram algumas desavenças então entre a esposa e a cunhada, a respeito de divisão dos serviços. O que sempre chegava aos ouvidos do proprietário, e este não expunha sua opinião. Em 2012, a irmã do fundador casou-se novamente e engravidou. Assim que se casou, a irmã resolveu continuar morando na casa ao fundo da empresa, e com isso ela e seu marido não tinham despesa nenhuma, pois tudo era mantido pelo fundador. Tal fato deixava a esposa insatisfeita, pois a empresa já apresentava sinais de crise, e ela queria reduzir os gastos, para assim conseguir cumprir as obrigações da empresa. Assim, sempre que acontecia algum fato relacionado à cunhada e seu marido, a esposa discutia sobre o assunto com o seu marido, até que em uma dessas conversas com a esposa o fundador deixou claro que não iria cortar gastos e nem pedir para a irmã sair da residência localizada nas dependências da empresa, por ter usado o nome dela e criado dívidas em seu nome. Dentro da empresa, com a crise pela qual ela vivencia, sempre há discussões sobre o fazer, o que pagar, e com frequência o proprietário, sem saber o que fazer com a falta de recursos, desconta seus problemas no escritório. O dia-a-dia da empresa é discutido em casa com a esposa, que relata todos os acontecimentos do escritório para o proprietário, que fica a par de tudo. Já ocorreu de o proprietário ligar para a irmã de madrugada para cobrar uma explicação, pois a esposa contou que ela fez alguma coisa errada. Porém, segundo o proprietário, ele consegue administrar de maneira positiva o relacionamento dentro do escritório da empresa. Já o gerente de compras, observa que geralmente em uma empresa familiar há a mistura dos papéis, como exposto a seguir: Não, dentro da medida do possível, onde que muitas pessoas têm dificuldade em ter parente, funcionários trabalhando dentro da empresa eu consigo administrar isso dentro do que eu acho razoável (E1). Olha, eu já trabalhei em outras empresas que tem esse gerenciamento familiar, onde os membros da família estão envolvidos em todo o processo e eu vejo iguais as outras. O relacionamento às vezes deixa de ser um pouco profissional, há uma, vamos dizer assim, há uma mistura de a pessoa por exemplo, o marido e a mulher achar que estão em casa né, e aí eles trazem coisas a tona para dentro da empresa, e não que isso seja uma coisa ruim, não sei, mas eu acho que sempre há uma mistura, tem que separar um pouquinho do profissional com o pessoal. Num todo é isso, pelo menos nas empresas onde eu já estive sempre acontece isso, há um pouquinho da não separação do profissional com o social, vamos dizer assim, com o familiar (E4). Além do escritório, há familiares trabalhando no campo. Pode-se observar que o fundador da organização valoriza de modo diferenciado os funcionários que pertencem à sua família. Essa valorização pode ser visualizada pelo grau de confiabilidade depositada nos serviços executados por eles, mesmo quando não há o comprometimento desses funcionários com a gestão da empresa. Ainda nessa organização, os funcionários que fazem parte da família são os responsáveis pelos cargos que exigem mais confiança, como por exemplo, os encarregados de campo, que cuidam da execução dos serviços e do controle dos funcionários de nível operacional, ganhando um valor de remuneração mais elevado que os demais funcionários. Além disso, há parentes que desempenham atividades semelhantes aos demais funcionários e recebem um salário maior. Mesmo com essa ajuda dada pelo proprietário a seus familiares, não há o comprometimento de grande maioria desses indivíduos com a empresa. Esses são os responsáveis, em grande parte, pelos problemas de relacionamento existentes, devido ao fato de não saberem separar os ambientes familiar e empresarial. Os demais funcionários já abordaram essa diferenciação dada aos familiares com o fundador da empresa, questionando o fato de que alguns não têm a qualificação necessária e nem se preocupam com o crescimento da organização. Mesmo assim, o proprietário não reconhece os problemas que surgem pela diferenciação entre os funcionários, e sempre que há um problema entre eles, a credibilidade dos parentes são maiores que a dos demais funcionários. É comum, entre os familiares, não informar de maneira correta o que acontece no campo, não se disponibilizarem a passar informações necessárias ao escritório, culparem demais funcionários quando acontece algum problema, se posicionarem contra a empresa quando não recebem no dia combinado, como exposto a seguir: É, temos algumas pessoas, alguns membros da família que trabalham aqui na empresa. A gente pode destacar um ou outro ali que, vamos dizer assim, que veste a camisa da empresa, e já temos outros membros também que já, são pessoas que já, eu vou falar bem sério, eu acredito que já causem até uma, vamos dizer assim, uma má, que sejam maus formadores de opinião dentro da empresa, aquelas pessoas que trabalham contra mesmo. Ali tudo dá errado, tudo não serve, isso não é pra mim, isso não devia ser assim, o fulano não sei o que, o fulano e o beltrano é aquilo e aquilo outro, são pessoas que ficam ali né, que ficam de conversinha, que fazem rodinha, e geralmente são os que mais causam danos, vamos dizer assim, numa rotina da empresa. [...] mas ao mesmo tempo já tem outros que tentam dar uma contribuição mais positiva também (E4). Segundo a esposa do fundador, às vezes os familiares confundem os papéis dentro da empresa, e há a necessidade de conversa entre o proprietário e esses para analisar a situação e UHVROYHURSUREOHPD³jVYH]HVFRQIXQGHDVFRLVDVPDVDLFRPXPSRXFRGHFRQYHUVDHOHs chagam QRHL[R´-iRSURSULHWiULRQmRDYDOLDGHPDQHLUDSRVLWLYDRHPSUHJRGHIDPLOLDUHVQDHPSUHVDSRUpP ele vê a necessidade de manté-los na empresa para ajudá-los financeiramente. Uai eu não teria uma avaliação muito boa não. Mas eu vejo o lado social, o lado que a gente, [...] tá oferecendo, então não tem como, quando você pensa numa empresa familiar, você não olha só o resultado financeiro, você tem que olhar o que causa para as pessoas isso, então acaba que eu consigo administrar e ter eles... Eles tem a renda deles, eu acredito que eu mais sirvo eles do que eles me servem. Seria um ponto do lado social. Não é só o lado financeiro que eu olho (E1). Para analisar a empresa como familiar, retomou-se o conceito de Leone (1991) apud Castro (2009, p. 11). Há algumas especificidades desse tipo de organização: é iniciada por um membro da família; possui membros da família participantes da propriedade e/ou da direção; apresenta valores institucionais, identificando-se com um sobrenome de família ou com a figura do fundador e tem a sucessão ligada ao fator hereditário (LEONE, 1991 apud CASTRO, 2009, p.11). O que pode ser observado nessa organização, especificamente, é que há um administrador que toma conta de todas as empresas, que possui o auxílio de sua irmã, sua esposa, e de alguns tios e primos, para controle desta. Além disso, a empresa segue baseada nos valores da família, no que é aceitável, nas crenças, imagens, emoções, que surgiram primeiramente no âmbito familiar e que foram incorporados no ambiente empresarial. Nota-se, portanto, uma forte relação entre família e empresa, provocando influência mútua tanto positiva como negativa na configuração dessas duas instâncias que habituam o contexto de organizações familiares. 6.3. As relações de gênero na empresa familiar do setor de mecanização agrícola Na empresa estudada, as relações de gênero podem ser observadas nas interações entre as mulheres e o ambiente masculino no qual trabalham. Ainda podem ser observadas diferenças entre os dois sexos, e em algumas dificuldades das mulheres para conseguir igualdade, tanto no que diz respeito aos cargos desempenhados, ao poder de decisão e ao nível salarial. Neste setor agrícola a entrada do sexo feminino se deu nas áreas administrativas, desempenhando papéis de secretariado. No campo, ou seja, no ambiente no qual os serviços agrícolas são executados, não há pessoas do sexo feminino, e nem indicadores de que haverá a inserção de mulheres nesta área, por exemplo: No caso aqui da empresa, o segmento aqui é bem masculino mesmo, nós temos aqui na empresa os cargos de administração, que aí sim entra a ação das mulheres, mais a empresa aqui é basicamente masculina. [...] Ainda, eu acredito que ainda há um certo preconceito. Hoje na área de mecânica, na área de operação de máquina já existem uma abertura, você já vê mulheres trabalhando em todos os setores. Acho que pelo da gente ta no interior, e de repente a empresa, historicamente esse tipo de... principalmente na área de operação, historicamente é masculina então ainda tem um certo preconceito. Já ta tendo uma abertura, mas aqui na empresa ainda não vimos a possibilidade de ta mudando isso. Acredito que pra um futuro aí deva ter essa mudança, até espero que tenha (E4). As mulheres tá no escritório e os... no campo os tratoristas são todos homens. Então há isso daí né, o meu irmão homem na administração, as mulheres ajudando ele na administração, e no campo os homens (E2). De acordo com Fleury (1996) apud Andrade et al., (2002), o contexto cultural é fundamental para entender as redes nas quais as relações de gênero estão colocadas, pois a cultura tem uma relação com as formas de manifestação do poder dentro das organizações. Pode-se observar que apesar da abertura existente, hoje, no mercado, ainda há uma forte influência da cultura organizacional para a entrada de profissionais do sexo feminino na área agrícola da empresa familiar, fato este que pode ser remetido a um processo histórico, no qual o serviço de mecanização cabia aos homens. Retomando o trabalho de Lescura et al., (2010), junto com a criação de uma sociedade agrícola e de possibilidades de governo formal, se desenvolveu os sistemas de gênero, no qual houve a definição dos papeis de cada sexo. Neste contexto, pode-se observar a relação entre os membros da empresa quanto à tomada de decisões. No que diz respeito ao poder decisório do fundador, observa-se que é reconhecido dentro da empresa, seja pelos funcionários, seja pelos clientes, os quais aceitam e acreditam nas ordens feitas por ele. Situação essa que não pode ser observada em relação à esposa e à irmã do fundador. No caso da esposa, a sua autoridade não é reconhecida pelos funcionários, quando ela deseja fazer alguma coisa na empresa há a necessidade de comunicar o fundador, que se concordar com a ideia, dá a ordem de execução aos funcionários. No que diz respeito à irmã, há uma aceitação maior da sua autoridade por parte dos funcionários. Porém, ao realizar alguma tarefa por ela designada, os funcionários temem ser punidos pelo fundador, o qual pode não concordar com a atividade. Muitos desentendimentos ocorrem nesse momento na empresa, uma vez que o fundador acredita que tudo tenha que passar por suas mãos antes de ser realizado, e em muitas vezes ele só fica sabendo de alguma coisa depois que esta já foi realizada, iniciando situações de conflitos entre ele e a irmã. Analisando esta situação, Jimenez (2009) apud Albuquerque, Pereira, Oliveira (2012), destaca que as mulheres, para conseguir seu espaço nas organizações familiares, enfrentam grandes obstáculos. Com grande frequência elas se deparam com uma postura de ceticismo dos fundadores e demais familiares, que colocam em xeque sua competência e habilidade para assumir o negócio. Tal característica fica evidente a partir do relato da irmã do fundador, exposto a seguir: Esse eu sempre tenho que... as vezes eu tenho uma ideia eu tenho que comunicar com o meu irmão pra ver o que ele quer, então geralmente a... as tomadas de decisões é dele (E2). Os funcionários enxergam, nas mulheres que trabalham no escritório, uma pessoa com quem conversar, falar de suas necessidades, de seus problemas. Nesta empresa em questão, os funcionários em geral enxergam e até aceitam muito bem o trabalho das mulheres, para o qual eles têm mais liberdade de se abrir, expor suas opiniões, dar contribuições, fazendo com que eles tenham mais liberdade com essas funcionárias e sócias do que com o fundador. Geralmente, quando precisam de alguma coisa, primeiro falam com as funcionárias do escritório, que repassam para o fundador e esse decide se pode ou não atender ao seu funcionário. Não, eu até acho que eu sou respeitada. Às vezes os funcionários prefere chegar em mim pra conversar alguma coisa familiar, algum pedido, alguma sugestão então, por eu ser mulher é, eu acho que não tem nada a ver (E2). Não... os funcionários acho que até preferem que sejam mulher dentro da empresa... pra eles tá... as vezes até desabafa com a gente (E3). Além disso, pode-se observar que as atividades desempenhadas pelas mulheres, quando assumem um papel na empresa, são aumentadas uma vez que além do serviço na empresa familiar, realizam ainda outras atividades entre elas: o papel de dona do lar, esposa, mãe e em alguns casos o desempenho de outra atividade que ofereça remuneração. Nossa eu sou tudo, eu sou pau pra toda obra, sou mãe, esposa, dona de casa, e também sou autônoma... faço unha, mexo com cabelo, então... eu tenho meu ganho fora da empresa também (E3). Segundo a esposa, o desempenho dessas atividades juntamente com o trabalho no escritório, não são difíceis de serem conciliadas, e ela consegue lidar com a situação. Já no caso da irmã do fundador, que está grávida, e tem que conciliar a gravidez com as atividades do escritório, diz que às vezes, dependendo do seu estado de saúde, há a dificuldade de conciliação. É... as vezes com a gestação estando bem não há dificuldade, mas as vezes eu não to bem, to passando mal e tem que fazer alguma... vejo alguma coisa na empresa pra fazer então é difícil (E2). Apesar de algumas dificuldades a irmã continua realizando algumas atividades na empresa. Ainda sobre suas atividades ela acredita que o irmão e demais membros da empresa confiam no seu serviço, uma vez que suas responsabilidades se dão no acompanhamento bancário e controle de caixa da empresa. Confia, eu acho assim que poderia essa divisão de tarefas as vezes poderia até mesmo ser dividida comigo. Mas alguma coisa assim... questão de confiança, a gente faz até o serviço bancário, então confia (E2). Mesmo com a confiança do proprietário em sua irmã e em sua esposa, essas ainda não são responsáveis por resolver os problemas que aparecem na empresa. Aliás, apesar de a irmã do fundador ver como confiança o fato de ele deixar em sua responsabilidade os serviços bancários, a sua função resume-se a buscar o dinheiro no banco e a fazer os pagamentos autorizados pelo fundador. Já a esposa é responsável pelos serviços de secretariado e alguns serviços administrativos, tais como os de controle de contas a pagar e a receber. Entretanto, tudo o que é realizado tem que ser autorizado pelo proprietário da organização. Ainda não existe na empresa a construção de um processo de sucessão. O proprietário tem duas filhas, e ambas não desejam, até o presente momento, trabalhar e assumir responsabilidades no âmbito da empresa. Conforme abordado na entrevista com a esposa do fundador, ela não deseja que as filhas venham a trabalhar na empresa: Não, uma porque nenhuma tá querendo trabalhar na empresa, uma prefere fazer medicina e a outra engenharia civil (E3). Apesar de não haver na organização uma indicação de que, no futuro, uma mulher da família poderá assumir a empresa, o fundador vê a oportunidade de uma mulher conseguir gerir uma empresa na área de prestação de serviços agrícolas, apesar de não desvencilhar isso de possibilidades de discriminações e conflitos em função da questão de gênero. Sim, ainda haveria um pouco de discriminação, porque é um setor que tá bem ligado ao sexo masculino. Mais nada que uma pessoa competente não conseguiria desenvolver, com bom trabalho. Tá muito ligado com competência e não com o sexo (E1). A irmã do fundador, por sua vez, acredita que são fatores diferentes do sexo do indivíduo que determinam se este conseguirá ou não gerir a empresa. Se essa mulher tiver o discernimento, conhecimento é... na área, é maravilhoso, não tem nada a ver falar... ah é uma empresa de mecanização agrícola é uma empresa... é tem muito machismo no meio, mais não tem nada a ver, se a mulher tiver o conhecimento ela vai longe (E2). A esposa, porém apresenta uma opinião completamente oposta às opiniões do marido e da cunhada, conforme descrito abaixo: Bom no sentido se a empresa for de mecanização agrícola, eu acredito que uma mulher não daria conta não. Parece que o homem já tem o dom, a mulher não, a mulher parece que é mais meiga... situação assim eu acho que não daria conta não [...] principalmente no campo... como lidar no campo, não entende nada, tipo o chefe da nossa empresa, até os funcionários chega lá... os funcionários as vezes não sabe nada ele chega e já vê que tem alguma coisa errada e tudo, a mulher vai chegar lá e não sabe nada, então eu acredito que uma mulher não daria conta (E3). Nota-se que a esposa do fundador não acredita que uma mulher possa assumir um cargo de gestão em uma empresa do setor de mecanização agrícola. Neste sentido, pode-se observar que a esposa do fundador não se visualiza como tendo espaço para assumir o controle da empresa familiar. Esse fato pode ser explicado, em parte, pelo fato de o fundador colocar sempre em pauta que uma mulher não conseguiria realizar as atividades desempenhadas por ele. Segundo Machado (2003), apesar das transformações sociais e do aumento no número de mulheres empresárias, algumas restrições de ordem cultural, limitam o ingresso de mulheres no processo de sucessão de organizações familiares. E esses fatores de ordem cultural, estão presentes no ponto de vista da esposa, que segue a visão do marido, quando se aborda o assunto sobre a sucessão da empresa. Neste sentido pode-se observar que as diferenças entre os gêneros estão presentes neste ambiente organizacional, no qual elas têm dificuldades em colocar suas opiniões, efetuar mudanças, de se impor perante o fundador, funcionários e clientes. Analisado a empresa em estudo, pode-se visualizar que há certo preconceito sobre as atividades desempenhadas pelas mulheres dentro da organização. Mesmo havendo o envolvimento de membros da família há uma subjugação das atividades desempenhadas pelo sexo feminino, as quais já se acostumaram com a situação e não se vem na empresa sem o auxílio do fundador. Em alguns casos há o preconceito pelas próprias mulheres, que não acreditam que podem controlar a empresa e tomar decisões sem o auxílio do fundador. Com isso, não está definido como se dará o processo de sucessão dentro dessa organização, uma vez que as filhas do fundador não apresentaram intenção de trabalhar na empresa, tendo como agravante a resistência do fundador em passar o controle da organização para as mãos de uma mulher. 7. Considerações finais Com a constante mudança das organizações atuais, visando à estabilidade em um mercado cada vez mais competitivo, o estudo das relações de gênero em empresas familiares torna-se importantes para conseguir compreender facetas não adequadamente exploradas no âmbito desse tipo de organização. No setor de mecanização agrícola, podem ser verificadas implicações das relações de gênero no fato de as mulheres trabalharem apenas no escritório e de que as mulheres que trabalham na empresa possuem algum grau de parentesco com os membros da família. Adicionalmente, pode-se observar há uma subvalorização da mulher, de suas competências e habilidades, as quais não possuem autoridade e nem autonomia, para desempenhar suas atividades e nem de conseguir se sobressair, alcançando cargos mais elevados. A empresa, controlada por um homem, que apesar de acreditar que uma mulher consiga guiar um negócio na mesma área de sua atuação, não vê uma mulher assumindo o controle da sua empresa, mesmo que sua linha de sucessão seja formada apenas por mulheres. Assim, não há uma clara perspectiva de como a empresa ficará após uma eventual saída do proprietário, uma vez que não há sucessores identificados na família e nem fora dela. Portanto, no momento atual, há uma predisposição à dissolução da empresa após a saída do fundador. Visualiza-se nesta empresa, a função da mulher de apenas auxiliar o homem em seu negócio, não sendo essa habilitada para exercer a sua função. Ocorre também o fato de as mulheres serem submissas à autoridade do fundador, fato que as deixam receosas de ir contra suas ideias ou discutir um assunto da empresa. Quando tal fato ocorre, há a imposição da vontade do fundador. Elas se acostumaram com a situação a tal maneira que não se visualizam no controle da organização, e não veem uma mulher assumindo a direção das empresas no lugar do fundador. Essa situação demonstra que nessa empresa há uma submissão das mulheres, e há uma discriminação por parte dos demais integrantes em aceitar que elas assumam cargos mais elevados, ou consigam maior autonomia dentro da empresa. Tal aspecto é intrínseco da cultura organizacional da empresa e de seu fundador. Através deste estudo podemos perceber que apesar do aumento de mulheres no mercado de trabalho, ainda há certa discriminação a essa entrada e ainda há o fato de que há empresas que não reconhecem os papeis dessas nas organizações. Assim, há a necessidade de estudos posteriores que abordem o gênero dentro da realidade das empresas familiares, que contribuam para uma nova visualização do papel da mulher no âmbito dessas organizações. 8. Referências ALBUQUERQUE, A.L.; PEREIRA, R.D.; OLIVEIRA, J.L. Sucessoras invisíveis: a construção a construção social do gênero e a sucessão em uma empresa familiar. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E DE PESQUISAS EM ADMINISTRAÇÃO, 36, 2012, Rio de Janeiro. Anais..., Rio de Janeiro: ANPAD, 2012 (CD-ROM). ANDRADE, A.L.S. et al. Gênero nas Organizações: um Estudo no Setor Bancário. Revista de Administração de Empresas Eletrônica, v.1, n. 2. jul./dez. 2002. BORGES, A.F.; LESCURA, C.; OLIVEIRA, J.L. 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