Efeito Curinga
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Efeito Curinga
19º CONGRESSO BRASILEIRO DE PSICODRAMA “A Humanidade no século 21” EFEITO CURINGA: O TRIUNFO DO PAPEL IMAGINÁRIO ARTHUR HENRIQUE PEREIRA Resumo O imaginário é instituinte, e é por esse motivo que Moreno dizia que o imaginário é indispensável no psicodrama, pois é através dele que se pode criar e recriar fugindo das amarras das conservas culturais. Só que, para tal feito, o imaginário tem que contar com a espontaneidade e a criatividade que é “a capacidade de vivenciar a novidade, da renovação, de adicionar algo, ao invés da mesmice de sempre” (MORENO, 2001, p. 36). E para praticar a espontaneidade e a criatividade, dando liberdade ao imaginário, Moreno propôs o Psicodrama. Este é concebido como um espaço para a libertação e o treinamento da espontaneidade e da criatividade contra as conservas culturais, através do desempenho dos papéis psicodramáticos e imaginários. Assim, na busca de promover um ser saudável e coletivizado, Moreno desenvolveu um método para facilitar ao ser humano viver de uma forma espontânea e criativa consigo mesmo e com toda a sociedade. Porém, ao concluir tal reflexão, pensou-se na possibilidade do imaginário não ser somente protetor da subjetividade, mas na possibilidade do imaginário também ser alienante e enlouquecedor. E aí, descobre-se que os estudos realizados não foram suficientes para abarcar as complexidades que envolvem o imaginário, pois, há ainda uma grande lacuna nos estudos sobre o imaginário, principalmente em seu aspecto conceitual e a sua função na dimensão pessoal. Tal reflexão surgiu ao verificar que há pessoas que, em seus trabalhos profissionais lidam constantemente com o imaginário e que, em algum momento, se deparam com algum tipo de alienação, adoecimento ou enlouquecimento por se abstraírem da realidade. Dentre esses, destaca-se o ator que, ao desenvolver um personagem, busca em seu imaginário pessoal (que psicodramaticamente é chamado de papel imaginário) as referências sentimentais e comportamentais para a atuação. Ao vasculhar em seu íntimo em busca de referências humanas para construir o personagem, este, ao longo de seu desenvolvimento, vai tornando-se cada vez mais real e, diante do convívio diário do personalizador e imagineiro, o ator rompe temporariamente com a realidade conhecida e dá evasão ao imaginário pessoal (papel imaginário), que em muitos casos ganha autonomia. Autonomia que possibilita uma confusão na subjetividade do ator por onde os elementos subjetivos e comportamentais do personagem passam a se misturar com os de seu demiurgo (ator criador). E, sem perceber, o ator incorpora a intimidade do personagem em seu convívio cotidiano, mesmo após o término do trabalho teatral, novelesco ou cinematográfico. Para entender o imaginário nesse contexto e como lidar com ele, será escolhido como objeto de estudo o ator Heath Ledger no processo de preparação do personagem Curinga, do filme Batman – o cavaleiro das trevas, em que ele atuou. Tal escolha ocorreu devido ao fato de que, curiosamente, pouco tempo após Ledger terminar as filmagens do Curinga no presente filme, o ator apareceu morto num apartamento após ingerir acidentalmente um número excessivo de medicamentos para dormir. O fato ocorrido chamou a atenção da mídia, dos amantes do cinema, dos fãs do ator, de diretores e atores de cinema que acompanhavam a carreira de Heath Ledger, pelo fim trágico de um talento eminente. Desde então, discussões surgiram a respeito da preparação psicológica dos atores e da profundidade emocional dos personagens, em relação a como os atores deveriam lidar psicologicamente com os personagens, tanto na preparação e na atuação como na desconstrução. No exemplo de Heath Ledger, amigos e atores relataram que desde a preparação até o fim das filmagens, o ator desenvolveu pensamentos e comportamentos bem diferentes do que ele tinha, e, portanto, teria sido o Curinga que o teria levado à morte, situação que ficou conhecida como “efeito Curinga”. Investigar o imaginário em tal situação poderá contribuir para a construção de um melhor entendimento sobre a função do imaginário como papel desempenhado em contexto onde as referências da realidade são desconsideradas ou onde a convivência diária com a realidade é instituída. Ao término desse estudo, pretende-se refletir sobre uma forma de melhor preparar psicologicamente os atores em suas práticas, e se possível, entender tal forma a outros profissionais, tais como psicólogos clínicos e outros que lidam constantemente com situações imaginárias.