Português em contexo multilingue
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Português em contexo multilingue Pascal Paulus Análise das provas de Aferição da Escola e a resposta encontrada pelo Conselho Pedagógico. Português em contexo multilingue © Pascal Paulus - Carnaxide, 2002 Índice Introdução.......................................................................................7 Diagnóstico de uma situação........................................................9 Comparação com os resultados nacionais.......................................9 Na parte de compreensão............................................................11 Na parte do funcionamento da língua..........................................12 Na parte da escrita.......................................................................12 Organização da prova....................................................................15 Resultados parciais......................................................................16 Organização dos itens.................................................................20 Resultados na escola por resultados, em ordem decrescente......22 Compreensão da leitura...............................................................22 Funcionamento da língua.............................................................26 Português em contexto multilingue...........................................31 Ponto de encontro entre o Projecto Curricular da turma e a formação..................................................................................................31 As propostas da formação. .........................................................32 Construção de um tesouro...........................................................32 Incentivar o contar de histórias....................................................33 Trabalhar o léxico de referência..................................................34 Projecto curricular: trabalho de texto e de projecto........................35 Gestão do trabalho de texto.........................................................35 Gestão do trabalho de projecto....................................................36 Integração de algumas propostas..................................................39 Proposta do tesouro.....................................................................39 5 Proposta acerca da culturalidade................................................51 Histórias no teatro........................................................................56 O léxico referencial em projectos e em trabalho de texto..............59 Novas palavras e estruturas gramaticais nos projectos actuais e momentos de trabalho colectivos ...............................................60 Alguns momentos de trabalho de texto.......................................62 Intervenções em Conselho..........................................................72 Para terminar este capítulo............................................................73 Trabalhos dos alunos..................................................................77 Racismo..........................................................................................77 O trabalho....................................................................................78 Cabo Verde.....................................................................................83 O que descobrimos:.....................................................................84 Dois poetas.....................................................................................92 6 Introdução Este texto tem duas partes. Primeiro apresento a análise que me foi encomendado como presidente do Conselho Pedagógico para perceber as dificuldades dos alunos de 4º ano da nossa escola. Esta análise levou a encomenda de uma formação específica acerca do trabalho em contexto multilíngua. Para tal, convidou-se a Dulce Pereira, como formadora. A segunda parte do texto é baseado no meu relatório individual como formando nesta formação. 7 Diagnóstico de uma situação Comparação com os resultados nacionais A prova centrada sobre a compreensão da leitura e o funcionamento da escrita, estava concentrado sobre o texto inédito que transcrevemos: O Pedro e o João iam para a cama à mesma hora. Mas enquanto o João adormecia logo, o Pedro ficava acordado, encolhido entre os lençóis, cheio de medo. Medo de quê? Do escuro, dos estalidos da madeira e... sobretudo do vento. Sem conseguir fechar os olhos, ficava a ouvi-lo com muita atenção. Vuu... Vuu... Vuu... E tinha sempre medo. Quando soprava de mansinho, parecia-Ihe que um desconhecido queria entrar no quarto sem ninguém dar por isso, para lhe fazer mal; se rugia com força e 9 Diagnóstico de uma situação dava safanões nos vidros, punha-se logo a gritar: – Mãe! Mãe! A mãe ia ao quarto, aconchegava-lhe a roupa e ria-se: – É o vento, Pedro! Não vês que é só o vento? Ora isso sabia ele. Mas tinha tanto medo... Uma noite, estava encolhido entre os lençóis, como de costume, quando ouviu chamar lá fora: – Pst, Pst! Espantado, sentou-se na cama. Não estava ali ninguém. Quem lhe falava era o vento. Um vento grande, gordo, risonho. – Quem és tu? – Eu sou o vento do deserto. Chamo-me Siroco e sou muito quentinho. – Siroco? Mas os ventos têm nome? – Temos, sim. Somos uma família ventosa. O meu irmão é o Suão... Suão... Suão... O Pedro estava encantado. – Não tenhas medo de nós – soprou-lhe muito baixinho – fazemos barulho, porque andamos a brincar! Pelo ar... pelo ar... pelo ar... – Que é isto? Quem está aí? – perguntou de repente o João, que acordara sobressaltado. – É um vento meu amigo. O João até deu um pulo. – O quê? Surpreendido, encostou-se também ao parapeito. Mas o vento Siroco já lá ia... numa correria... numa correria... 10 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada (versão não publicada) A leitura atenta deste texto consistia a primeira parte da prova. Na parte de compreensão A segunda parte da prova, após leitura atenta do texto, consistia em responder a perguntas de interpretação. Compreensão da leitura respostas certas 65% 60% 55% 50% 45% 40% 35% Figura 1 escola regional nacional Eis a média da percentagem de respostas certas a este conjunto de perguntas: Mesmo ao nível mais básico da resposta “verbatim”, os alunos da nossa escola tem muitos problemas em perceber a pergunta e/ou responder a ela. Em média, só um aluno em 3 desenvolveu capacidade de compreensão de textos novos, durante os quatro anos de ensino já passado. Poderemos analisar em que medida isto se deve ao facto de os alunos, tanto os de origem africana como de origem português utilizarem um vocabulário muito reduzido, que não é forçosamente ampliado pelos manuais escolares. 11 Diagnóstico de uma situação Na parte do funcionamento da língua A terceira parte da prova consistia 70% num conjunto de 65% perguntas à partir 60% do texto, mas com 55% carácter morfológico e gramatical. As 50% perguntas testa45% vam conhecimen40% escola regional nacional tos linguísticas no uso da língua, Figura 2: como vem explicitamente referido no programa do 1º ciclo. Aqui, a comparação entre a escola e o país revela um resultado ligeiramente melhor do que na compreensão da leitura. Funcionamento da Língua respostas certas Pode haver um elemento sorte, já que muitas perguntas pedem uma escolha entre três opções. Pode também haver um elemento treino. Muitos manuais ocupam-se sobretudo em estruturar aspectos gramaticais. Mesmo assim, os resultados da escola são más. Ao nível nacional reforça a ideia que se investe mais no funcionamento da língua do que na compreensão da leitura. Nada de surpresas portanto... Na parte da escrita A prova escrita começa com uma folha de explicações: Durante este tempo, vais escrever uma pequena histó12 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue ria. Toma atenção às instruções. – Lê atentamente a página seguinte. – Respeita o que te é pedido. – Faz um rascunho a lápis, na folha própria. – Escreve um mínimo de 15 e um máximo de 25 linhas. – Dá um título à história, diferente dos que já te foram apresentados. – Revê com cuidado o rascunho e corrige o que achares que deve ser corrigido. – Copia o texto para a folha da prova, em letra bem legível, a tinta azul ou preta. – Se, por acaso, te enganares, risca e escreve de novo. Não uses corrector. A seguir a estes instruções, mal lidos por bastante alunos, que não se lembraram da primeira instrução e escreveram um texto qualquer, inventado, vinha a dica para o desenvolvimento da história: O Pedro e o Siroco ficaram amigos. Um dia, o vento convidou o menino a viajar com ele. – Imagina e escreve uma história em que contes uma aventura vivida por ambos. Podes falar dos lugares por onde passaram, das coisas que viram, das conversas que tiveram. Aqui, três parâmetros são avaliados: a construção da narrativa, a construção linguística do texto e a ortografia. Os resultados são apresentados em termos de médias alcançadas pelos alunos de uma escola. 13 Diagnóstico de uma situação Para a nossa escola, a construção da narrativa (Figura 3 ) consegue uma média de 50%, quando a média nacional ronda os 80%. Escrita da narrativa média obtida pelo conjunto de alunos 80% 75% 70% 65% 60% 55% 50% O vocabulário pobre, a falta de Figura 3 título e um desenvolvimento que desvia do pedido inicial podem explicar esta baixa nota. Não será estranho também não o facto de muitos alunos do 4º ano que fizeram a prova, continuarem a ser potencialmente analfabetas. 45% Escola Regional Nacional O segundo item, a construção linguística do texto ( Figura 4), que Construção linguística do texto avalia a utilização média obtida pelo conjunto de alunos correcta de aspec- 65% tos morfológicos e gramaticais, não é 60% muito mais anima55% dor. Registamos aqui uma realização abaixo dos 50%. 50% 45% Figura 4 14 Escola Regional Nacional Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Poderão ser origem desta baixa: problemas de conjugação do verbo, concordância masculino/feminino dos nomes e dos adjectivos, para os alunos que falam português como segunda língua. Aqui também são prejudicados os alunos que não dominam bem advérbios e adjectivos como elementos enriquecedores do texto. O terceiro aspecto, a ortografia (Figura 5 ), que parece ser mais bem treinado, não dá asa para muita alegria. Até ao nível nacional, poucos alunos escrevem sem erros, mas num texto de 25 linhas, mais de 60 % tem 5 erros ou menos. Na nossa escola, o desvio mantêm-se e há menos de um aluno em dois que escreve menos de 5 erros. Erros ortográficos % de alunos com até ... erros 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Escola 0 erros Regional 0-2 erros Figura 5 Nacional 0-5 erros Provavelmente, não damos suficientemente importância ao tratamento do erro, às listas de palavras, à actividade da escrita em si. São provavelmente aspectos fundamentais para ajudar os alunos a melhorar a sua escrita. Organização da prova Como anteriormente referido, a prova estava organizada em quatro partes: 15 Diagnóstico de uma situação 1. Leitura de um texto 2. Compreensão da leitura. 3. Funcionamento da língua 4. Produção escrita. Sobre cada um destes aspectos, apresento os resultados da escola (certo, parcialmente certo, errado) agrupado pelos grandes itens de cada uma destas partes. Os resultados referem-se aos pontos 2, 3, e 4, já que a avaliação da leitura está implicitamente presente na prova toda e não foi, por si próprio, alvo de avaliação. Resultados parciais Compreensão da leitura c ompreender a ideia princ ipal resultados da escola 60% 60% 40% 40% 20% 20% 0% errado parcial certo 0% c ompreender e realiz ar v erbatim errado 60% 60% 40% 40% 20% 20% 0% Figura 6 16 errado parcial parcial certo c ompreender e realiz ar inferênc ias c ompreender e realiz ar paráfras e certo 0% errado parcial certo Pascal Paulus - Português em contexo multilingue identificação de frases com o mesmo sentido Funcionamento da língua 60% 60% 40% 40% 20% 20% 0% errado conhecer categorias gramaticais resultados da escola parcial certo 0% errado conhecer a estrutura da palavra 60% 40% 40% 20% 20% errado certo conhecer a estrutura 60% 0% parcial parcial certo 0% errado parcial frásica certo Figura 7 As respostas certas, neste primeiro aspecto, de compreensão da leitura (Figura 6), concentram-se nas respostas “ad verbatim” (gráfico direito superior), isto é, do treino resulta sobretudo a capacidade de encontrar elementos no texto, e não de conseguir captar a ideia principal ou de poder contextualizar. Para isso, falta provavelmente a capacidade de avaliar situações em funções de outras vividas ou lidas. E uma das dificuldades é exactamente a ausência de situações vividas. O segundo aspecto, de funcionamento da língua (Figura 7), que, lembramos, fica na nossa escola em mais ou menos a metade das respostas certas ao nível nacional, quando estudado mais em pormenor, revela que a estrutura da palavra foi pelos vistos mais bem 17 Diagnóstico de uma situação trabalhado, em detrimento da percepção e da estrutura frásica. Mas esta dificuldade da percepção da estrutura frásica pode ter influência nos resultados em geral e nos resultados de matemática, quando se tem a ver com a interpretação dos elementos de um enunciado para um problema. Construção linguística do texto valor média dos alunos da escola total concordância com convenções relativas ao parágrafo e formas de discurso concordância com convenções relativas à construção do período concordância com convenções de pontuação articulação frásica concordância entre os vários elementos da frase diversidade do vocabulário adequado aos lugares diversidade do vocabulário adequado às personagens diversidade do vocabulário adequado à realidade a narrar 0% 20% 40% 60% Figura 8 Os gráficos da produção escrita (Figura 8 e Figura 9, página 18) apresentam-se no sentido de podermos avaliar os conhecimentos testados e as médias obtida. 18 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Construção da narrativa valor média dos alunos da escola total escolha pertinente do título identificação de personagens e lugares articulação acontecimentos de acordo c/ ordem lógica e/ou cronológica desenvolvimento da história numa sequência organizada correspondência da narrativa aos requisitos da prova 0% 20% 40% 60% 80% Figura 9 Por fim, repetimos o gráfico dos erros ortográficos para a escola (Figura 10, página 20), a partir dos dados fornecidos: em 61 alunos, 23, portanto um pouco mais de um terço, têm mais de 10 erros num texto que tinha no máximo 25 linhas, mas que no caso destes alunos, provavelmente tinha menos de 25 linhas. Lembramos também que mais de metade dos alunos ao nível nacional fazem menos de 5 erros, o que não é o caso na escola. 19 Diagnóstico de uma situação Erros de ortografia resultados da escola 24 22 nº de alunos num total de 61 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 10 erros ou mais 9 erros 8 erros 7 erros 6 erros 5 erros nº de erros 4 erros 3 erros 2 erros 1 erro nenhum erro Figura 10 Organização dos itens Antes de apresentar os resultados item por item, lembro a estrutura da prova: áreas de conteúdo Compreensão da leitura tipos de competências Compreender a ideia principal de um 1, 8, texto, identificar personagens, caracte- 10, 11 rísticas e sentimentos das personae 12 gens, e sequência cronológica da acção. Compreender e realizar verbatim; 20 itens 1, 2, 5 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue (identificar a informação necessária à e 6 resposta que se encontra no texto, exactamente com as mesmas palavras) Compreender e realizar a paráfrase; 3, 4 e (identificar a informação explicita no 5 texto e responder por palavras diferentes, também expressas no texto) Compreender e realizar inferências; (compreender a mensagem cuja informação não está explícita no texto) 5, 7, 9 e 11 21 Diagnóstico de uma situação áreas de conteúdo tipos de competências itens Identificação de frases com o mesmo senti- 1 do (sinonímia) Conhecimento de estruturas gramaticais 3, 4, 5, 6, 8e9 Conhecimento da estrutura de palavra 7 Conhecimento da estrutura frásica 2e 10 Funcionamento da língua Construção da narrativa (capacidade de or- A ganizar adequadamente um texto narrativo) Produção escrita Construção linguística do texto (capacidade B de utilizar vocabulário diversificado e em recorrer a frases simples e complexas) Ortografia Resultados na escola por resultados, em ordem decrescente Nas páginas a seguir, incluímos uma cópia das perguntas das provas, junto com os resultados obtidos pela escola. Lembro que se trata de 61 alunos, matriculados no 4º ano, no ano lectivo transacto. Compreensão da leitura Item 6 22 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Cotação Alunos 0 11 2 50 Item 2 Cotação Alunos 0 12 3 49 Item 7 Cotação Alunos 0 19 3 47 Item 12 23 Diagnóstico de uma situação Cotação 0 1 Alunos 30 31 Item 5 Cotação Alunos 0 2 1 4 2 5 3 20 4 30 Item 4 Cotação Alunos 0 32 3 29 Item 3 24 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Cotação Alunos 0 26 2 21 3 14 Item 11 Cotação Alunos 0 49 4 12 Item 10 Cotação Alunos 0 48 2 1 4 12 Item 1 25 Diagnóstico de uma situação Cotação Alunos 0 3 1 52 2 6 Item 8 Cotação Alunos 0 31 1 10 2 8 3 9 4 3 Item 9 Cotação Alunos 0 51 3 10 4 0 Funcionamento da língua Item 7 26 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Cotação Alunos 0 25 2 36 Item 3 Cotação Alunos 0 25 2 36 Item 6 Cotação Alunos 0 29 1 32 27 Diagnóstico de uma situação Item 4 Cotação Alunos 0 31 2 30 Item 2 Cotação Alunos 0,0 15 1,0 5 1,5 12 2,0 29 Item 1 Cotação Alunos 28 0 35 1 26 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Item 8 Cotação Alunos 0 35 2 26 Item 9 Cotação Alunos 0 46 2 15 Item 5 Cotação Alunos 0,0 21 0,5 0 1,0 2 1,5 3 2,0 13 2,5 18 3,0 4 29 Diagnóstico de uma situação Item 10 Cotação Alunos 0,0 45 0,5 8 1,0 1 1,5 1 2,0 3 2,5 1 3,0 2 A análise feita, optou-se investir com os professores na abordagem do Português como segunda língua. Muitos dos alunos da escola não falam, de facto, Português como língua materna, e outros, embora falando Português em casa, são muito influenciados pelos colegas. A Dulce Pereira trabalhou com a equipa durante 6 meses, dois anos depois deste diagnóstico, visto a lentidão com que são creditadas as acções de formação. 30 Português em contexto multilingue Ponto de encontro entre o Projecto Curricular da turma e a formação Estas folhas retratam algumas actividades e algumas reflexões decorrentes do projecto de formação orientada pela Dulce Pereira, por pedido expresso, formulado pelo Conselho Pedagógico no ano lectivo 1999-2000. O pedido foi feito depois de constatar como os professores da escola estavam mal preparados para diagnosticar e depois apoiar a resolver dificuldades de uma parte significativa dos alunos, devido ao facto de eles terem outra língua materna, que não a língua portuguesa. Penso que a interacção com a Dulce me foi extremamente útil. Se, por um lado, consolidou algumas actividades minhas que fazia de forma mais intuitiva, como a construção de listas de palavras em função de dificuldades com a concordância verbo - pessoa, por outro lado, ajudou-me em muito perceber determinadas reacções dos meus alunos perante palavras e frases que não me pareciam 31 Português em contexto multilingue muito violentas, mas que, no contexto crioulo, o são. Ajudou-me também a perceber e enquadrar melhor a influência da história da escravatura, presente em muitas formas de expressão, em festas, em algumas actividades religiosas e até em determinadas regras, como esta que diz que não se conta histórias antes do cair da noite. Dividi este documento em 3 partes: No primeiro ponto, foco aspectos da formação que influenciaram marcadamente o projecto de turma e a intervenção na sala de aula. No segundo ponto lembro alguns aspectos do Projecto Curricular da turma. Nos pontos à seguir, ponto três e ponto quatro, descrevo momentos da prática que ilustram a relação com a formação. As propostas da formação. Entre as sugestões que a formadora, Dulce Pereira, nos deixou, aproveitei algumas, integrando-as na prática da sala, que mais a frente descrevo através de alguns exemplos escolhidos. Para mais fácil leitura, explicito neste primeiro ponto as propostas utilizadas e que influenciaram significativamente o decorrer das actividades na sala de aula, reconduzindo para a respectiva parte do texto. Construção de um tesouro. Proposta: Aumentar a capacidade expressiva em português pegando em palavras e brincarmos com elas, coleccionando-as numa caixa (tesouro) para depois as aproveitar para trabalhar à volta delas (palavras portuguesas ou crioulas) 32 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue O que fizemos: Como não tinha tempo para trabalhar especificamente a ideia do tesouro, devido à preparação da nossa viagem à Bélgica, motivado pela correspondência interescolar, resolvi aumentar o trabalho de tradução na preparação desta viagem. A ideia do tesouro integrou-se portanto na preparação de um pequeno dicionário de apoio para os alunos, durante a estadia com as famílias de acolhimento, na Bélgica. O resultado está na página 40. Na descrição, que segue mais a frente, realço que as listas de frases e palavras tiveram assim um objectivo basicamente prático. O tesouro para nós, foi o conjunto de frases e palavras, que nós escolhemos, para podermos conversar uns com os outros, quando estivermos juntos, na Bélgica, com os nossos correspondentes. Incentivar o contar de histórias. Proposta: Contar histórias em português, para tentar obter uma recolha (?) de histórias, ou momentos vividos, em Crioulo. Facilitar a escrita destes contos. O que fizemos: Além de contar histórias, tentei juntar histórias dos próprios alunos, ou então ouvir a história deles. Refiro, na página 18, um trabalho desenvolvido a partir da feitura de fotografias, pelos alunos, tanto na escola como no bairro, em que cada um dos alunos tirou perto de 30 fotografias que depois descreveu. Também menciono como, quando se colocou a questão de fazer um trabalho de apresentação sobre Portugal, para os correspondentes, a Marlene ficou logo com a ideia de fazer uma apresenta- 33 Português em contexto multilingue ção do Cabo Verde1. Mostro, na página 54, como o trabalho explicitou também alguns aspectos acerca da proximidade da língua Portuguesa e Crioula. Como o ano passado, montámos uma peça de teatro. Relato, na página 56, como a nossa conversa acerca do Crioulo, despoletada depois do início da formação com a formadora, veio mesmo a calhar, para um trecho do texto, que foca um episódio de trabalho. Este ano, a peça contemplou também o reconto de uma história, que incluí a título de exemplo na página 58.2 Refiro ainda que não consegui mobilizar os alunos de origem Africana para me trazerem outras histórias, eventualmente contadas em casa, provavelmente porque em casa não é dado grande valor às histórias tradicionais. Por isso, fui eu as buscar nalgumas recolhas feitas por autores portugueses. Quero ainda focar uma conversa com a Ana Paula, que inclui na página 34 e que tem a ver com a distinção entre o Crioulo (como língua) e o Alentejano (como dialecto regional), por causa de uma história que ela tentava de escrever. Trabalhar o léxico de referência. Proposta: Analisar e anotar o ganho léxico e de objectos gramaticais dos alunos a partir dos temas temas actualmente trabalhados na sala de aula. Controlar o número de novas ocorrências no léxi1 Ver páginas 54 e 83. 2 O teatro inclui mais trechos em Crioulo, em Inglês e em Neerlandês, fruto do trabalho desenvolvido este ano. O texto completo saiu num Jornal Especial da turma. 34 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue co referencial dos alunos. Explicitar como são treinadas as novas aquisições. O que fizemos: A provocação da formadora para tentarmos anotar as mudanças no léxico referencial ao longo de uma semana de trabalho, fez-me anotar com alguma assiduidade as observações dos alunos acerca de novas palavras ou novas “formas de dizer”, durante duas semanas. A pequena lista que inclui nas páginas 60 e seguintes refere só as palavras e expressões que discuti individualmente ou em grupo, a partir do grupo de crianças que têm fortes influências crioulas. Incluí, na página 70, o texto da Ana Paula, porque ilustra como apareceram alguns trechos em Crioulo, depois de termos combinado traduzir as nossas frases para a viagem à Bélgica em 4 línguas. Exemplifiquei o trabalho de texto, porque, desde esta formação, quando se trata de um texto de um aluno Caboverdiano, tento fixar para mim os erros que penso serem influenciados pela língua materna. Fiz esta exemplificação com um texto da Marlene nas páginas 67 e seguinte. Por fim, ainda realço que só escolhi descrever aspectos do trabalho da turma que considerava ilucidativos para a importância que esta formação teve para a minha prática. Projecto curricular: trabalho de texto e de projecto. Gestão do trabalho de texto Geral: 35 Português em contexto multilingue Suporte a toda a escrita desenvolvida na sala, tanto para projectos, como para correspondência. Especificidade: – Escrita de histórias: uma rotina que envolve escrita no caderno pessoal, correcção, cópia para folhas formato A5 e respectiva ilustração, apresentação ao grupo, integração na biblioteca. Para diversificar o vocabulário, projectamos uma visita ao Teatro Infantil de Lisboa durante o primeiro período e a elaboração de um ficheiro de escrita. – Escrita de texto livre: uma rotina que envolve escrita no caderno pessoal, eleição de texto, correcção colectiva, encaminhamento para jornal, correspondentes e/ou livro de textos da sala. Pode implicar fichas de trabalho de gramática/ortografia. Ficheiro de língua: rotina de trabalho autónomo orientado pelo plano individual de trabalho discutido em conselho. – Ficheiro de leitura e biblioteca: rotina de leitura, implicando preenchimento de uma ficha de leitura e apresentações de várias formas: teatralizar, declamar, ler em voz alto, fantoche,.... Gestão do trabalho de projecto Racismo, escravatura, guerra e paz Com quem? Turma O que? Desenvolver o trabalho começado com a acção de solidariedade com as mulheres do Afeganistão. A partir da valorização que foi feita das nossas acções do ano passado (Tocha, Estrada, Afeganistão, Natureza, Presidenciais), continuaremos a contactar a comunidade e a devolver a ela o que 36 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue descobrimos. O racismo e a história de Cabo Verde ocupam aqui um lugar importante. Investigaremos mais aprofundado o trabalho e a escravatura infantil. Ficaremos atentos ao desenvolvimento do contraste Pobre-Rico entre as nações, analisando o clima conturbado deste início de ano lectivo Quando? Ao longo do ano lectivo, cada vez que a actualidade e os nossos interlocutores (correspondentes) nos dêem pistas de trabalho. Apoios: Beat Loeliger, Internet, Correspondência por correio electrónico. Correspondência internacional Com quem? Lovaina, Turma de Eddy Macquoy O que? Troca regular acerca do tema “nós e a natureza”, em moldes a definir. Previsão de troca de álbuns de pequenos projectos de investigação dos alunos Encontro com os correspondentes Quando? Frequência a definir. Envolve correspondência electrónico e correspondência em suporte papel. Apoios: A realização do encontro depende do financiamento encontrado. Natureza Com quem? Turma da Fátima Monteiro 37 Português em contexto multilingue O que? Visita ao Jardim Botânico Pequenas experiências com plantas Quando? Permanente. Apoios: Intervenção na comunidade. Com quem? Proposta lançada para as outras turmas do 4º ano. O que? Recolhas de dados, interpretação e devolução de resultados. O conteúdo pode ser diferente do sugerido a seguir, tomando em conta leituras de jornal ou acontecimentos nacionais ou internacionais importantes. Pretendemos montar uma exposição acerca de cada um destes temas. Quando? Setembro-Novembro: acerca do Euro e da história de Lisboa Novembro-Janeiro: acerca das autárquicas. Análise de resultados Apoios: Escola - material de desgaste. Experiências e projectos de Investigação Rotina de trabalho partindo de uma questão (jornal), um problema surgido ou uma ficha de proposta de trabalho em que sozinho ou em pares, o aluno: 1. Analisa o problema e escreve proposta ou hipóteses 2. Executa a(s) experiência(s) ou monta a investigação considerado necessária. 38 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue 3. Apresenta por escrito as conclusões. O trabalho de projecto, complementado com as investigações realizadas pelos alunos a partir de perguntas e interesses formulados por cada um (ver infra), permite assim abranger a área curricular disciplinar do Estudo do Meio. O trabalho permite que também parte dos conteúdos e das competências previstas nas outras áreas disciplinares sejam abordadas de forma integrada. Integração de algumas propostas Proposta do tesouro Não tendo tempo para trabalhar especificamente a ideia do tesouro, resolvi aumentar o trabalho de tradução na preparação da viagem para a Bélgica. Porém, devo aqui referir que esta ideia de criar um tesouro, associado a algumas propostas da “Gramática da fantasia”, não me é estranha. Durante a segunda metade do 2º ano, e durante o primeiro trimestre do 3º ano, recorri bastantes vezes ao que costumávamos chamar, na sala, o atelier de escrita, em que pegando numa palavra, desenvolvíamos um pequeno texto. Os jornais de turma daquela época trazem disso alguns exemplos.3 Entretanto, e voltando à preparação da viagem para a Bélgica utilizei a ideia da tradução em alguns cartazes, como na figura que segue, e como mostro mais a frente, no ponto a seguir. 3 Ver extracto do Projecto Curricular da Turma, página 9 e “Propostas da formadora”, página 6 39 Português em contexto multilingue A ideia do tesouro integrou-se também na nossa preparação de um pequeno dicionário de apoio para os alunos, durante a estadia com as famílias de acolhimento, na Bélgica, e do qual reproduzimos aqui uma adaptação. Palavras: Português Neerlandês Crioulo Inglês Afeganistão Afghanistan Afganiston Afghanistan Almôndegas Vleesballetjes Almonga Meatloaf Amigo Vriend Amigu Friend Batatas fritas Frieten Batata Frita Chips Boneco Pop Boneku Dolly Carta Brief Carta Letter Comboio Trein Comboi Train Corresponden- Corresponden- Correspondenti Correspondent tes ten 40 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Português Neerlandês Crioulo Inglês Desenho Tekening Desenho Drawing Escorrega Glijbaan Escorrega Slides Eu Ik Mi / N I Fotografia Fotografie Fotografia Photo Frango Kip Frango Chicken Jogador Speler Jogador Player Jornal Krant Djornal Papers/Periodical Molas Knijpers / Veren Mola Clips Mundo Wereld Mundo World Obrigado Dank je Obrigado Thank you Parque Speelplein / speeltuin Parki Play ground Pedra Steen Pedra Rock Pintura Schilderhoek / Pintura schilderij Picture Políticos Politici Political Politiku Listas de frases: 41 Português em contexto multilingue Português Neerlandês Crioulo Inglês A que horas vamos dormir e a que horas acordamos? Wanneer gaan Ki ora ki nu ata we slapen en deta i ki ora nu hoe laat staan ta labanta? we op? What time we go to bed and what time do we wake up? Até logo Tot straks Te logo See you later Boa noite Goede nacht /goede avond Bo noti Good night Boa tarde Goede namid- Bo tardi dag Good afternoon Como muitos doces, por isso... Ik heb veel zo- N komi tcheu ets gegeten, dose daarom… I’ve ate to much sweets. Como te chamas? Hoe heet je? Mo ki bu tcho- What’s your ma name? De onde és? Waar kom je vandaan? Di ondi ki bu e Where are you from? Dói - me a bar- Ik heb buikpijn A ta due-m ba- I have a stomariga riga ch-ache Dói – me a ca- Ik heb hoofdpijn A ta due-m ka- I have a headabeça besa che És fixe! Je bent “cool” Bu é fixe You are cool. És meu amigo Je bent mijn vri- Bu é nha ami- You are my friend gu end 42 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Português Neerlandês Crioulo Inglês És meu melhor Je bent mijn amigo. beste vriend Bu e nha med- You’re my best jor amigu friend Estas a fazer muito barulho A nhos sa ta fazi monti barulhu Je maakt veel lawaai. Estou cansado Ik ben moe You are making to much noise. N sta kansadu I’m tired Estou triste Ik ben verdrie- N sta triste tig Estou zangado(a) Ik ben boos I’m sad N sta ku raiba I’m angry Eu gosto de co- Ik bijna alles mer quase tudo graag A mi gosta kume kazi tudu. I like to eat almost everything. Estas a fazer muito barulho Je maakt veel lawaai. A nhos sa ta fazi monti barulhu You are making to much noise. Eu gosto de ir ao cinema, ver filmes de acção e bonecos. Ik zie graag actiefilms en tekenfilms, in de cinema. A mi gosta di bai sinema i odja filmi di akson i odja filmi di buneku. I like to go to the cinema, and see action movies and animated films Eu gosto de matemática, e tu? Ik hou van wis- A mi gosta di kunde, en jij? matematika i bo? I like mathematics, and you? Eu gosto de ou- Ik hou van pop- A mi gosta di I like to listen to 43 Português em contexto multilingue Português Neerlandês Crioulo Inglês vir música pop / muziek / klassi- ovi muzika pop pop / classic clássica eke muziek / klasika music. Eu gosto de Ik drink graag sumo com gás sap met prik. N gosta sumu I like juice with con gas “bubbles” Eu gosto mais de cães Ik zie liever honden. A mi gosta I am more fund mas di katcho- of dogs ru. Português Neerlandês Crioulo Inglês Eu leio muitos livros, mas gosto mais dos livros de acção e aventura Ik lees veel boeken, maar ik lees het liefst actie en avontuur. A mi ta le tcheu livru di akson i di aventura. I read many books, but I like most action and adventure. Eu pratica nata- Ik zwem en jij? A mi ta pratika I practice swimção, e tu? natason i bo? ming, and you? Eu sou de Portugal e tu? Faço anos em .... e tu? Ik ben van Portugal en jij? Ik verjaar op …. En jij? A mi e di Portugal i bo? N ta fazi anus en ... i bo? I come from Portugal and you? My birthday is on … and yours? Eu tenho 2/3/... Ik heb 2/3/… N ten 2/3 irmon I have 2/3 irmãos e tu? broers en zus- i bo? brothers (sissen en jij? ters) and you? Eu tenho 9 44 Ik ben 9 / 10 N ten 9 anu /10 I’m 9 years old, Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Português Neerlandês Crioulo anos /10, e tu? jaar oud, en jij? e bo Inglês 10, and you? Gostas da co- Eet je graag bij Bu gosta di ku- Do you like Mc mida do Mc Do- Mc Donald’s? mida di Mc Do- Donald’s food? nald’s? nald’s? Gostas de ir ao Ga je graag cinema? naar de cinema? Bu gosta di ba Do you like cisinema? nema? Hoje, corri, sal- Ik heb vandaag Odji N cori, N tei e agora... gelopen, gesalta i gosi... sprongen, en nu... Today I run, I jump and now... Ir à casa de ba- Naar het toilet nho gaan N (kre) bai Go to the bathkasa di banhu room Já lavei-me, es- Ik heb me al tou pronta gewassen, ik ben klaar. Dja-N laba, N sta pronta I’ve washed me, I’m ready. Já não quero ver televisão, por isso. N ka kre odja TV I don’t want to see TV anymore, so. Ik wil geen Tv meer kijken, daarom. Não gosto de Ik lust geen si- N ka gosta I don’t like sumo de laran- naasappelsap. sumu di laran- orange juice. ja. ja. Português Neerlandês Crioulo Inglês Não tens má- Heb je geen fo- Bu ka ten má- Don’t you have 45 Português em contexto multilingue quina fotográfi- totoestel? ca? Nunca mais falo contigo kina fotográfika? a camera? Ik spreek je no- N ka ta fala ku I never more oit meer bo nunka mas talk to you. O que é o jan- Wat eten bij het Kuzé ki djanta? What is the dintar? avondmaal? ner? O que fazem na escola? Wat doen jullie Kuzé ki nhos op school? sata fazi na skola? What do you do at school? O que gostam? Waar houden jullie van? Kuzé ki nhos gosta? What do you like? Onde é a casa Waar is de de banho? badkamer? Undi ki e casa Where is the di banhu? bathroom? Onde é o meu Waar is mijn quarto? slaapkamer? Undi ki nha ku- Where is my artu? bedroom? Onde há lojas? Waar zijn er winkels? Undi ki e lodja? Where are the shops? Porque gosto muito dela Omdat ik haar Pamodi N gos- Because I like erg graag zie. ta tcheu dela her very much. Porque não quero comer fruta Omdat ik geen N ka kre komi fruit wil eten. fruta Because I don’t want to eat fruit. Posso ir? Mag ik gaan? Can I go? N podi bai? Posso jogar ga- Mag ik game- N podi bai dju- Can I play gameboy ou boy of playstati- ga gameboy o mes? playstation? on spelen? playstation? 46 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Praticas algu- Heb je een ma actividade? hobby? Bu ta pratika Do you practice algun aktivida- some activity? de? Preciso ir às compras. Ik moet boods- N mesti bai chappen doen konpra I need to go to the shop Português Neerlandês Inglês Qual é a comi- Wat eet je het da que gostas liefst? mais? Crioulo Kal kumida ki What is your fabu gosta mas? vourite food? Qual é a tua Wat is je lieve- Ki “materia” di What’s your famatéria preferi- lingsvak op skola bu gosta vourite subject da na escola? school? mas? at school? Qual é o teu Wat is je lieve- Kal animal ki What is your faanimal preferi- lingsdier? bu gosta mas? vourite animal? do? Qual é o teu li- Wat is je lieve- Kal e bo livru vro preferido? lingsboek? prifiridu? What is your favourite book? Qual foi o dia mais feliz da tua vida? Wat was de beste dag van je leven? Kal foi dia mas What was the felis di bu vida? happiest day of your life? Quando fazes anos? Wanneer ben je Ki dia ku ta fazi When is your jarig? anu? birthday? Quantos anos tens? Hou oud ben je? Kantu anu bu teni? How old are you? 47 Português em contexto multilingue Quantos irmãos Hoeveel broers Kantu irmon ki How many tens? en zussen heb bu teni? brothers and je? sisters do you have? Que horas são? Hoe laat is het? Ki ora sta? What time is it? Que tipo de Naar welke mu- Ki muzika bu música gostas ziek luister je gosta di obi? de ouvir? graag? What’s the music you like Queres ir brin- Wil je gaan car? spelen? N kre bai brin- Will you play ka with me? Queres namo- Wil je mijn liefje Bu kre “namo- Do you want to rar comigo? zijn? ra” ku mi? be my boyfriend (girlfriend)? Quero comer Ik wil eten N kre kumi I want to eat Quero dormir Ik wil slapen. N kre durmi I want to sleep Português Neerlandês Crioulo Inglês Quero ir à casa Ik wil naar het de banho toilet N kre bai kasa I want to go to di banhu the bathroom Quero ir à rua. Ik wil naar de straat. N kre bai pa rua I want to go to the street Quero jantar. Ik wil avondma- N kre djanta len Quero mudar de roupa Ik wil van kle- N kre muda di I want to chanren veranderen ropa ge clothes Quero telefonar Ik wil naar 48 I want to dinner N kre telefona I want to phone Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Português Neerlandês Crioulo Inglês para a minha mama bellen, mãe porque te- want ik heb nho saudades heimwee. pa nha mai pa- to my mum, bemodi N teni so- cause I miss dadi. her. Quero tomar banho. Ik wil een bad nemen. N kre ba toma I want to have a banhu bath. Quero tomar o Ik wil ontbijten pequeno - almoço N kre toma pe- I want take brekenu almosu akfast Quero um bolo, Ik wil een koek, N kre bolu, pon I want a cake, pão brood bread Quero ver tele- Ik wil televisie- N kre odja tele- I want to see visão kijken vison TV Sim, obrigado Ja, dank je Sin, obrigadu. Yes, thank you. Têm campo de Hebben jullie futebol? een voetbalveld? Nhos teni kam- Is there a footpu di futibol? ball pitch around? Tenho de ir ao Ik moet naar hospital het hospitaal N ten ki bai os- I have to go to pital the hospital Tenho dores nos dentes Ik heb tandpijn N teni dor na dente I have a toothache Tenho fome. Ik heb honger I’m hungry N teni fomi Tenho sauda- Ik heb heimwee N teni sodade des da minha naar mijn fami- di nha família família em Por- lie in Portugal di Portugal tugal. I miss my family in Portugal. 49 Português em contexto multilingue Português Neerlandês Crioulo Inglês Tenho sede. Ik heb dorst N teni sedi I’m thirsty Tenho sono. Ik heb vaak N teni sonu I’m tired Tenho um den- Ik heb een ga- N teni denti fu- I have a hole in te furado atje in mijn tand radu my teeth Tens desperta- Heb je een dor? wekker? Tens namorado(a)? Bu ten desper- Do you have a tador? Heb je een lief- Bu teni namo- Do you have je? radu boyfriend (girlfriend Tens playstati- Heb je een ons) play-station? Bu ten playsta- Do you have tion? play-station? Tens vídeo? Heb je video? Bu tene video? Do you have VH? Torci o pé. Ik heb mijn voet N torsi pe verstuikt. I beat my foot. Tu és bonito(a) Je bent mooi Bu e bonitu You are pretty. Tu também és Jij (bent) ook. A bo tanben You as well. Vamos fazer um projecto We gaan een project maken No bai fazi un projektu Let’s do a project. Vamos para a rua We gaan naar de straat No ta ba pa rua Let’s go to the street Vou fazer os Ik ga mijn meus trabalhos huiswerk made casa ken N sa ta ba fazi I’m gonna do trabadju di my homework kasa 50 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Estas listas tiveram assim um objectivo basicamente prático. O tesouro para nós, foi o conjunto de frases e palavras, que nós escolhemos, para podermos conversar uns com os outros, quando estivermos juntos, na Bélgica, com os nossos correspondentes. Um pequeno tesouro que permite a comunicação entre quem fala línguas diferentes. Proposta acerca da culturalidade A formadora propôs contar histórias para juntar histórias dos próprios alunos, ou então ouvir a história deles. Não falo aqui de um trabalho desenvolvido a partir da feitura de fotografias, pelos alunos, tanto na escola como no bairro, em que cada um dos alunos tirou perto de 30 fotografias que depois descreveu. O trabalho resultante foi apresentado posteriormente, em parte em slide-show Powerpoint, construído em conjunto e enviado para os correspondentes. O resto foi apresentado em álbum durante a exposição de fim de ano. Ainda a preparação da viagem Uma outra forma para conseguir falar com os encarregados de educação e os alunos acerca de desejos, histórias, vivências e gostos, foi também desencadeada pela proposta do encontro com os alunos Belgas. Desde meados do ano passado, foram construídos laços e discussões, que me ajudaram a perceber melhor contextos e enquadramentos de alguns alunos, mesmo em termos de língua, referencial e espaço para viver a própria vida. A parte mais interessante deste trabalho todo foi com certeza conseguir que os alunos pudessem eles próprios mostrar e contar 51 Português em contexto multilingue como se organizam e movimentam, utilizando os instrumentos linguísticos para alcançar os seus fins. Fica claro, ao ler um pouco do Diário da Viagem: 21 de Fevereiro de 2002 Ao fim da tarde, recebemos os pais e as mães na sala. Cada um dos grupos escolheu um porta-voz para apresentar o trabalho que vai fazer. Demoramos mais com o grupo das autorizações e o grupo dos dinheiros, porque é aqui que precisamos já da ajuda das famílias. A Marlene explica que dos 1770 Euros que faltam, os colegas Belgas ainda prometem 650. Também contamos o que eles fazem para ganhar dinheiro: bolos, lavar carros “portar-se bem”.... Algumas mães sugerem: – fazer uma feira com comida; – vender brinquedos; – fazer um mealheiro com colegas de trabalho; – vender salgados; – vender postais feitos pelos alunos; – vender ovos de páscoa. 52 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Vamos fazer uma feira no primeiro ou no último sábado das férias da Páscoa, e convidar o bairro. 22 de Fevereiro de 2002 Esta manhã havia mais um apoio, através do correio electrónico. Um amigo da turma ofereceu 50 € e sugeriu mais um contacto. A Marlene e a Tatiana actualizam: Da Câmara 1247 Do projecto 550 Da RTP (vendas) 37 Do Sr Boaventura 250 Do Eddy (projecto) 500 Da turma do Eddy 100 Do H. 50 Total 2734 Entretanto, fazemos um cartaz para o nosso placar à entrada da sala com as fotografias da reunião de ontem. 53 Português em contexto multilingue O placar tem o seguinte título: Vamos à Bélgica – Reunião de pais: preparação da viagem. A nos nu sata bai Belgica – Reunion di pai i di mai – a nos sata prepara viaje. We gaan naar België – Oudervergadering om de reis voor te bereiden We are going to Belgium – Parents meeting to prepare our trip. Hoje tivemos também mais vendas, mas não deu para fazer as contas, porque o Conselho demorou muito tempo. À tarde, mesmo na hora da saída, havia uma carta da TAP para a Leila, pedindo mais informações. Já não tivemos tempo para responder. Projecto sobre Cabo Verde Um trabalho do ano passado, feito com a turma vizinha, e que recebeu o título de “À nossa volta...” abriu o apetite: fizemos uma recolha de histórias provenientes de vários países de onde os próprios alunos, ou os seus pais, provêm. Isto, porque um dos temas em estudo foi à volta da pergunta “De onde é que nós viemos?” Na altura já falámos das várias ilhas de Cabo Verde, procurámos saber de onde vieram os pais e onde ainda têm casas. Este ano, quando se colocou a questão de fazer um trabalho de apresentação sobre Portugal, para os correspondentes, a Marlene ficou logo com a ideia de fazer uma apresentação do Cabo Verde. 54 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Gisela, Ana Paula e Tatiana Helena juntaram-se, e acabaram por apresentar o trabalho “Cabo Verde”.4 Este trabalho, que por acaso ocorreu nos fins de Abril, e para qual encontrámos alguma informação na Internet, fez com que o grupo de alunos associasse com grande facilidade a Revolução dos Cravos com a Independência de Cabo Verde e de outros países Africanos. Lembraram-se muito bem da nossa visita ao Largo do Carmo, quando fomos a Lisboa. O trabalho explicitou também alguns aspectos acerca da língua: descobriram que Cabo Verde, tal como outros países Africanos mantém laços com os antigos colonizadores, e que isto influenciou a escolha da língua oficial na maior parte das antigas colónias. Houve uma certa curiosidade em ver, no mapa, de onde vêem algumas famílias, como também de encontrar lugares onde alguns alunos já estiveram. A Marlene achou, num texto acerca de Cabo Verde, muitas informações sobre músicas, danças e festas, que, para ela, têm grande significado, e das quais ainda não tinha visto nada escrito, até agora. 4 Ver infra página 83 55 Português em contexto multilingue Histórias no teatro A discussão acerca do teatro5, que tem como propósito reviver os 4 anos que os alunos estiveram no 1º ciclo, levantou novamente a discussão acerca do trabalho com a Embaixada da Suíça, contactada quando aprendemos que os alunos Portugueses eram afastados das turmas regulares em Roschbach, vila da parte Alemã do país, alegadamente por não falarem Alemão. A nossa conversa acerca do Crioulo, despoletada depois do início da formação com a formadora, veio mesmo a calhar, para este trecho do texto: Apresentador a: Foi então que leram no jornal... Apresentador b: ... que na Suíça havia crianças portugueses que não podiam ficar na sala. Aluno 1: Porquê? Aluno 2: Es ka flaba Alemon! Aluno 3: What? They didn’t speak German? Aluno 4: Neen, geen Duits. Aluno 2: Nho profesor flaba pa ês: Ka sata fla Alemon, ka sata entra scola. Apresentador c: Mas a turma não ficou quieta. Aluno 2: Temos que escrever. Aluno 3: A quem? 5 No fim do ano passado, apresentámos a peça “O Olho do Lobo”, uma adaptação do livro de Daniel Pennac, que tem como propósito a história de vida de um Lobo do Alasca e de uma criança Africana. O sucesso fez com que aumentou o entusiasmo para escrever uma peça acerca da própria vivência do grupo na escola e na sala, retomando alguns momentos marcantes. 56 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Coro: Aos políticos. Apresentador a: E escreveram uma carta ao presidente e à embaixada. Apresentador b: E depois? Apresentador c: Olha! Conselheiro: Recebi a vossa carta. O que aconteceu está mal! Vamos tratar disso. Aluno 4: As crianças portuguesas vão voltar para a sala? Conselheiro: cional. Vão. Já discutimos isso no nosso Conselho Na- Coro: Conselho? Nos também temos conselho. Conselheiro: Não é bem a mesma coisa. Aluno 3: O que é diferente? Aluno 5: No nosso conselho estamos todos Conselheiro: eleitos. E no Conselho Nacional, só estão alguns Suíços O teatro contemplou, este ano, também o reconto de uma história que tínhamos na nossa sala e que foi escrita e ilustrada por um grupo de crianças em Boston. Na versão desenhada, Nhu Lobu aparece como um lobo. Fiel à informação da Dulce, representámos, na nossa peça, o Nhu Lobu como um Ser qualquer “burro”, comilão, enganado pelo sobrinho dele, o Tchibinhu. A história não foi, por tanto, original, a transposição em teatro é que foi da nossa autoria.6 6 Embora não devemos ter sido os únicos a pensar em representar a história.... 57 Português em contexto multilingue Aluno 3: Conta a história do Tubinhu! Nho Lobu: Tubinho, kuzé sa ta pranta? Tubinho: Mandioka. Nho pranta di juntu. Nho Lobu: Si. Ami N gosta kume mandioka (virando para o público) Ma ka gosta di trabadja. (Tubinho afasta-se, Nho Lobu fica, finge comer a mandioca toda) Tubinhu: Undi sta mandioka ki dja N planta Nho Lobu: N ngana Tubinhu. Djá N kume tudu kel mandioka! Tubinho: N sa ta fika ku raiba! ku raiba! (afasta-se e volta com uma corda) Contador 4: Dos dia dispos. Tubinhu: Nho Lobu, un tenporal grandi sata benki sta ba mata tudu kuza ki ka sta maradu." Nho Lobo: Mara-m primeru! Contador 4: Tubinhu mara-l n'un arvi grandi. Tubinhu: Nho fica li pa un tenpu. Makaku: Ami gosta kume figu. Sa ta txeu bon. Nho Lobu: Bota-m un figu, makaku, N tené fómi. (o macaco manda um figo para o Nho Lobu) Nho Lobu: Dismara-m, makaku, dismara-m. (o macaco solta o Nho Lobu, que o pega pelo rabo e diz:) 58 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Nho Lobu: Ami (também) ta gosta kumé makaku.Makaku: Djudam, Djuda-m! Tubinhu: (chega a correr) Oh Nho Lobu, nho sabe midjor manera pa nhokume kel makaku? Nho Lobu: No. Mi conta. Tubinho: Nho mara-l se pé di juntu i nho bota-l pa riba. El ta kai dentu bóka di nho. Contador 4: Nton, Nho Lobu mara-l el bota-l pa riba. (o macaco rola para o lado, no momento em que o Nho Lobu o atira para o ar. Este fica de boca aberta) Tubinho: (apanha a mão do macaco) Kore, makaku, kore Contador 4: Nho Lobu fika la tudu dia ku se bóka abértu... ta spéra pa makaku kai dentu bóka. Ainda que tenho introduzido um momento de leitura em que conto histórias tradicionais Portugueses e do mundo, não consegui mobilizar os alunos de origem Africana para me trazerem outras histórias, eventualmente contadas em casa. O léxico referencial em projectos e em trabalho de texto A provocação da formadora para tentarmos anotar as mudanças no léxico referencial ao longo de uma semana de trabalho, fez-me anotar com alguma assiduidade as observações dos alunos acerca de novas palavras ou novas “formas de dizer”, durante duas semanas. A pequena lista que vem a seguir refere só as palavras e ex- 59 Português em contexto multilingue pressões que discuti individualmente ou em grupo, a partir do grupo de crianças que têm fortes influências crioulas. Novas palavras e estruturas gramaticais nos projectos actuais e momentos de trabalho colectivos Aumentar e enriquecer vocabulário e ajudar os alunos para desenvolver capacidades para uma escrita mais complexa, foi uma das minhas preocupações desde que comecei a trabalhar com esta turma, logo no 2º ano de escolaridade. Por isso insisti em idas ao teatro, em ateliers de escrita, baseados na “Gramática da Fantasia” e nas propostas que desenvolvemos no quadro das nossas reflexões no seio do Movimento da Escola Moderna, associação de professores da qual faço parte. Este trabalho é constante. Uma bela amostra deste ano lectivo é o resultado do estudo realizado por causa da nossa visita a Lisboa, em que a Ana Paula, a Leila e a Tatiana Helena fizeram um pequeno trabalho sobre Camões e Pessoa.7 Além de mostrar como foram tentar perceber alguns versos dos dois poetas, também demonstrem claramente que perceberam o sentido figurado do Ciclope ou do Adamastor. Regra geral, a explicitação das novas aquisições é feita, na altura, com os alunos que as fizeram, no sentido de preparar a passagem para o colectivo. Esta passagem, no caso dos trabalhos de projectos de investigação, ocorre depois, durante a apresentação do projecto, quando o grupo investigador devolve ao grupo todo as suas descobertas em função das perguntas que lhe foram feitos. 7 60 Ver infra, página Pascal Paulus - Português em contexo multilingue O Ruben, no seu trabalho sobre o racismo, encontrou outra faceta do estudo das palavras e das frases: ao querer fazer um inquérito sobre atitudes racistas, entre os colegas da escola, teve que definir primeiro – mesmo que provisório e/ou incompleto – o conceito de racismo. Tinha que dar sentido à pergunta que colocava a todos os colegas, que não tinham participado na discussão prévia que deu origem ao trabalho8. Por isso, depois de ler algumas definições, avançou com a sua própria definição: “Racismo é dizer mal ou agredir outra pessoa, porque tem pele diferente, cor diferente, a maneira como estuda diferente, cara diferente, etc.” De seguida, recordo, a título de exemplo, algumas aquisições lexicais nas semanas posteriores à sessão em que a formadora nos pediu explicitamente a anotação das mesmas. Semana de 15 até 19 de Abril Trabalho Cabo Verde Flexibilidade, iniciativa privada, rota de escravos, densidade populacional, um quilómetro quadrado (km2) Trabalho China Hong Kong, Cantão é província da China, número de habitantes Trabalho Microscópio O microscópio é feito com lentes e espelhos. As partes do microscópio não são a mesma coisa que o material de que é feito. Trabalho América América Central, América do Sul, América Latina 8 Ver notas em Intervenções em Conselho página 72 61 Português em contexto multilingue América latina significa América onde se fala Espanhol ou Português. Trabalho no Atelier de língua Leitura de livros: hei-de-saber (Tiago), charco - lago - lagoa (Tiago, Tatiana Helena) Escrita de texto livre: por cima, através de Semana de 22 a 26 de Abril Leitura de textos Tropeçou (Tatiana Helena), invadir (Ivan: em vez de envadir). Leitura de histórias Guadiana (é um rio???), sardão, ficar logrado, ardil, cegueira (no sentido figurado). Preparação viagem Bélgica Formulário E111, autorização notarial. Trabalho Cabo Verde Pelourinho, estandarte, deportação de escravos. Trabalho América Cidade, província, “County”, estado Trabalho China Rei, dinastia, presidente, invasor, Mongólia, muralha (Rui compara a informação do trabalho com o filme “Mulan”) Alguns momentos de trabalho de texto A escrita da Marlene, do Tiago e da Tatiana Helena está muito marcada pela língua materna, que é o Crioulo. 62 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Outros, como a Ana Paula, a Gisela, o Rui, o Ivan ou o Sérgio, que têm menos interferência em casa, porque não se fala Crioulo com os adultos (Gisela e Rui) ou se tem uma certa cultura que permite a fácil passagem de Crioulo para Português e vice versa (Ana Paula e Ivan). O Ruben e a Naomi têm, na escrita, mais influências do Inglês do que do Crioulo, embora o Ruben domine bastante bem o Crioulo, mas não como língua materna. A Naomi, bilíngue desde que começou a falar (Francês – Português) e trilíngue a escrever (teve a sua formação de iniciação a escrita na Inglaterra). Como referi mais acima9, o trabalho de texto obedece a rotinas, em que “caçamos” erros, depois do que tentamos melhorar o conteúdo do texto. Ilustro este trabalho semanal através de dois exemplos a partir de um texto do Tiago e de outro da Marlene. Incluí o texto da Ana Paula, porque ilustra como apareceram alguns trechos em Crioulo, depois de termos combinado traduzir as nossas frases para a viagem à Bélgica em 4 línguas. Tiago e o Siricacá Como muitos alunos têm muito poucas ideias para textos e histórias, criei, sob proposta de uma colega, um ficheiro de imagens provocatórias, às vezes acompanhadas por algumas frases, para lançar um texto. O Tiago, que sempre escreve histórias em que um rapaz encontra uma rapariga e a pede em namoro, depois do que 9 Ver página 36 63 Português em contexto multilingue se casam e têm muitos filhos, apresentou este texto, a partir de um cartoon, representando um dirigente futebolístico com cara de bola de futebol. Não tem nenhum contacto com a escrita em casa. Está a fazer grandes progressos ultimamente, mas continua com uma escrita muito fonética. Uma das dificuldades do Tiago, é saber quando e onde se coloca o pronome num verbo reflexivo. Assim escreve “que se chamase” deixando-me a escolha mais apropriada: “o Pascal é que diz”. Tal como a Marlene, escreve “mais” ou “maise” para exprimir “mas”. Outra expressão frequente é “vou conhecer ela” “vou falar a ele” “vou dar a ela” Coloca vogais de ligação em muitas palavras, porque ao falar, tal como no Crioulo, também as pronuncia: “rapetado”, “passeare”, “giritou”. Este texto do Tiago fez-nos falar acerca dos verbos (que costumamos identificar quando fazemos um trabalho de texto. Construí um pequeno exercício em que os alunos têm que preencher lacunas em frases que contêm pronomes e verbos reflexivos, ora são simples, ora compostas. Fizemos igualmente uma recolha de verbos que apresentámos no infinitivo, no presente, no futuro e no passado. Por fim, fizemos uma lista de palavras em que a letra -o- se pronuncia [o] e outra onde se pronuncia [u]. No fim, o texto aparece no Jornal da Turma, nº 21, de Fevereiro de 2002: 64 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Siricacá Era uma vez uma Bola macho que se chamava Siricacá. Ele vivia no ginásio do Benfica. Mas um dia o Siricacá foi passear e raptado por dois bandidos. O Siricacá mordeu os dois bandidos, gritou e fugiu para casa. E o Siricacá viu uma menina e disse: – Vou conhecê-la, e o Siricacá e ela viveram felizes. A polegarzinha da Marlene A Marlene continua à procura de algum mágico para resolver os problemas, embora com um certo realismo. É o que ela faz também na vida dela. Já desistiu da ideia de se tornar médica, mas continua a querer ir mais tempo para a escola. Neste momento não define muito bem o que ela quer fazer. Mas as irmãs mais velhas em casa, apontam para outro caminho, de dependência do namorado, aparentemente ficando com uma sustentação sem grandes esforços e preocupações. A Marlene ainda não sabe o que fazer, mas o trabalho custa, cada vez mais... Assim, depois de um empurrãozinho à menina que queria ser médica, texto que ela escreveu, e em que a fada ajudou a menina para se inscrever na faculdade, é agora a história tradicional “A Polegarzinha” que inspira para mais uma mistura de magia e realismo: 65 Português em contexto multilingue A própria Marlene passou o texto ao computador. Procurei os erros que penso serem influenciados pela língua materna (indico os em negrito) no texto que ficou assim: A polegarzinha. Era uma vez uma selhora que não tilha filhas. O que ela mais quiria era ter uma menina, mais ela não tilha marido para ter uma filha mais um dia vaiu uma menina que disse Se queres ter uma filha taes 66 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue de arranjar um marido e ela foi tratar de arranjar um marido mas todos já era comprometido o se não não podia ter filhos. E no dia segite a menina foi pegutar se achou um marido e ela disse não. Então toma essa lamparina de persente e ela tomou-a e como estava suja ela foi lipar e depois saiu de dentro da laparina um majico e o mazeco disse pede três desjos e ela disse quero três filhas depois de três dias ela ficou gravida de três menina e ela deu o nome de Marlene, Paula e Tatiana. Depois desta primeira “limpeza”, feita pela Marlene, corrigimos o texto em conjunto. Este trabalho foi feito a pares, havendo alunos que não falam crioulo misturados com alunos que falam crioulo. Numa cópia do texto, cada grupinho foi sublinhando as palavras mal escritas, propondo no caderno de escrita uma lista com as palavras corrigidas. Para o controlo final, ordenámos as palavras alfabeticamente, no quadro. Apareceu: desejos, lamparina, limpar, ou, mágico, mas, perguntar, presente, queria, seguinte, senhora, tens, tinha, veio. De seguida, tivemos a discussão na sala, para melhorar o texto: Paula: Pascal: Marlene: Mais está mal Pascal, é mas. Pois, mais, é quase como dizem os Brasileiros. Nós dizemos mas (pronuncia com um a muito aberto e um pouco mais prolongado) Margarida: Depois de “disse” é dois pontos. Gisela: E depois um tracinho! 67 Português em contexto multilingue Pascal: Onde pomos o travessão? Depois de disse, ou no início da frase que é dita pela pessoa? Gisela: O que é que pomos Pascal? Ruben: O travessão! Tiago: O que é isso? Gisela: Aquele tracinho. Adramane: Mais a frente há mais. Pascal: Depois de “Se queres ter uma filha”, falta algo. Sérgio: Uma vírgula. Pascal: Porquê? Sérgio: É outra parte da frase. Leila: Depois de “marido” tiramos o “e” e pomos um ponto. Margarida: E depois é letra grande! Paula: Maiúsculo! Rui: Ó Pascal, aqui está mal, há duas vezes não! Marlene: Então. Está certo. Ou se não..... não podia ter filhos. Gisela: Mas isto não dá, quando é outro que lê, não sabe que tem que parar! Pascal: A não ser? Ruben: Como assim Pascal? Pascal: O que podemos fazer para mostrar que se tem que parar? Vários: Um ponto! Marlene: Um ponto, no meio da frase? Pascal: Espera, pode ser também uma vírgula! Marlene: Ah! Assim está bem. Paula: Todos já era comprometido... falta o “s”. Sérgio: Aqui é estava, ou não, estavam! Pascal: E ela disse não. Aqui, podemos pôr uma palavrinha 68 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue para não termos que pôr dois pontos e o travessão. Margarida: Ela disse .... que não! Gisela: Pascal, não é toma como presente? Paula: É melhor! Leila: Não é limpar, é limpá-la! Pascal: Em vez de saiu um mágico e o mágico disse, podemos abreviar. Paula: E ele disse. Sérgio: Que disse. Rui: Faltam os dois pontos e o tracinho. Ruben: Na frase seguinte também. Pascal: Podemos dizer “três meninas, a quem deu ...” No fim da discussão, o texto tinha este aspecto: A polegarzinha. Era uma vez uma senhora que não tinha filhas. O que ela mais queria, era ter uma menina, mas ela não tinha marido, para ter uma filha. Um dia veio uma menina que disse: – Se queres ter uma filha, tens de arranjar um marido. Ela foi tratar de arranjar um marido, mas todos já estavam comprometidos ou se não, não podiam ter filhos. No dia seguinte a menina foi-lhe perguntar se achou um marido e ela disse que não. – Então, toma essa lamparina como presente. 69 Português em contexto multilingue Ela tomou-a e, como estava suja, ela foi limpá-la e depois saiu de dentro da lamparina um mágico que disse: – Pede três desejos. Ela disse: Quero três filhas. Depois de três dias, ela ficou grávida de três meninas a quem deu o nome de Marlene, Paula e Tatiana. O bêbado reinventado pela Paula A Ana Paula, que segue “Os Malucos do Riso” na televisão, mistura as anedotas que ela ouve, com o Crioulo que domina: a bebida torna-se “Grogue”, e ela pergunta-me como se chama o Crioulo que os Alentejanos falam. Falámos sobre a diferença que existe em dizer as palavras de outra maneira e falar outra língua. Ela tira daí a conclusão que para escrever “Alentejano” ela pode utilizar as regras de escrita do Português. Para o Crioulo não é bem a mesma coisa. Depois escreve esta história: 70 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Este texto foi copiado pela Paula, com a ajuda da Gisela, para o computador da sala, depois do qual vimos os dois algumas alterações a introduzir. Com a ajuda da formadora, transcrevo: O bêbado Era uma vez um senhor que falava Alentejano. Um dia ele bebeu 3 litros e meio de Grogue. Ainda era de manhã, quando, de repente, apareceu 71 Português em contexto multilingue um Cabo-Verdiano que lhe disse: – Nho sta moku. Nho sata paga 40 kontu. E o Alentejano respondeu: – Ó compadre! Vossemecê não sabe! Eu não vou pagar a multa, não senhor! – Uf! Kuze a bo so kre dja moku. Anton sata ba presa. – Não não! Porquê? – Pamodi Nho staba moku e staba anda zige zage. – Então, compadre, eu não vou preso! Porque se me prender, também tem que prender o mar! – Pamodi? – Porque está cheia de água e anda aos zigue zagues. E o bêbado nunca ia preso porque tinha sempre razão... O texto final apareceu no Jornal da Turma nº 23, mas ainda com algumas alterações. Tenho uma discussão com a Ana Paula, por causa do “Pamodi”, que ela quer com toda a força substituído por “Porquê”. Também não concorda com o “Zigue Zague”, mas faço ver que se trata de um compromisso entre o que se diz e o que se escreve. Intervenções em Conselho O Conselho é uma estrutura muito importante na sala, ao qual atribui grande valor. Refiro-me ao Conselho como ao organismo 72 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue que faz a lei, e regula o trabalho, sob proposta de cada um de nós, mas onde me reservo o direito de travar acontecimentos menos interessantes, como castigos desmesurados, por exemplo. O facto de termos prática de reuniões, em que discutimos em conjunto os assuntos, fez perceber como trabalham os orgãos representativos do Estado. Fez também perceber a diferença entre “democracia directa”, como na nossa turma, e a “democracia representativa”, como na maior parte dos estados que se denominam democráticos. Uma carta que recebemos da Embaixada da Suíça, que referiu ao Conselho Nacional, provocou o clique. Depois, com as várias perguntas já feitas a pessoas com carga política, a percepção tornou-se ainda mais fácil. O estudo do racismo e da escravatura aparece de vez em quando na sala de aula. Mas foi por causa de uma observação que estava na coluna “Acho Mal”, do nosso Diário de Turma, que o Ruben estudou o assunto de mais perto. Um dia, houve um aluno negro que chamou “macaco” a um aluno branco, este último nascido em África. Sentiu-se muito ofendido, porque achava que o outro o tinha chamado “macaco” por causa da origem dele. Deu origem àquele trabalho acerca do racismo, em que primeiro o próprio participou mas que depois foi desenvolvido pelo Ruben. Para terminar este capítulo Como referi na introdução, quis enquadrar algumas actividades exemplares que ilustram o desenvolvimento do trabalho na minha sala de aula e a influência que a presente formação teve nela. 73 Português em contexto multilingue Quis mostrar como integrei propostas de trabalho, feitas pela formadora da acção de formação, na minha prática, e como, de certo modo, o consegui porque parte das minhas propostas no Projecto Curricular de Turma eram uma boa base para o enquadramento que a Dulce Pereira nos deu nesta acção, focada sobre a Língua Portuguesa em Contexto Multilingue. Penso que todos, os alunos e eu, conseguimos caminhar, no sentido de viver o Crioulo, não como uma língua secreta, de defesa, mas como uma língua materna. Começamos, há dois anos, por constatar que a maior parte da turma, professor incluído, tinha uma língua materna diferente da língua oficial. No início, os meus alunos resistiam muito em me “ensinar” Crioulo, embora estavam sempre a querer saber como “isto” ou “aquilo” era dito em Neerlandês. Quando fazia contrapreguntas, recebia risos e recusas, às vezes algumas palvaras ditas em tom muito baixo. Houve uma caminhada para que os meus alunos percebessem que a língua deles valia a minha língua. Mesmo assim, numa certa altura, senti-me parado. Por mais que pedisse que alguém me ensinasse mais sobre o Crioulo, nunca recebia efectivamente apoio. O contributo da Dulce Pereira foi importante, no sentido que me ajudou a fazer ver aos meus alunos, com variadíssimos exemplos, mas sobretudo através de histórias, que o Crioulo é mais do que um conjunto de palavras insultuosas, que o insultado não entende, e por isso dá razão para gozo, ou então uma língua que os velhos falam, mas que não tem grande valor, por ser “antiga”. 74 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Fiquei muito contente por ver histórias Caboverdianos incluído no teatro, em Português ou em Crioulo, ao lado de histórias tradicionais e de histórias Portugueses. Espero que o trabalho deste ano lectivo, apoiado como foi por esta formação, ajudou e ajudará os meus alunos de origem Caboverdiana em valorizar culturalmente a sua língua materna. Espero que, com o trabalho desenvolvido, todos os meus alunos poderão entender que, para se valorizar plenamente, a cultura de um povo, qualquer que seja, necessite da língua materna que a sustente, logicamente enriquecida com palavras de outras línguas. 75 Trabalhos dos alunos Racismo Autor: Ruben Copia do projecto publicado no Sítio da turma. Contrato: (feito em 19 11 2001) O que já sabemos: Já sabemos que há homens fardados com máscaras que são racistas. Sabemos que eles só brincam com os brancos. O que o grupo quer saber: Como é que apareceu o racismo. Desde quando há racismo. Porque é que os racistas se disfarçam com fardas. O que a turma quer saber: Há lutas por causa do racismo? Donde vem a palavra racista? 77 Trabalhos dos alunos O trabalho 1. Desde quando há racismo? No tempo dos Gregos, os Númidas e os Lusitanos eram escravos. Agora, em França, os Portugueses e os Argelinos “trabalham barato”. No tempo dos Gregos, 500 anos antes de Cristo, já havia racismo, continua a haver agora. 78 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue 2. Há luta por causa do racismo? Os racistas dos Estados Unidos da América, são os Ku Klux Clan. Matavam e matam e não utilizavam a justiça. E houve um Francês que disse isto: “Aqueles a que me refiro são pretos dos pés à cabeça; e têm um nariz tão achatado que é quase impossível sentir pena deles” Foi em 1865 e ele chamava-se Montesquieu. 79 Trabalhos dos alunos 3. Porque é que os racistas se disfarçam? Porque os racistas são cobardes e não mostram a cara uns aos outros. Estas informações, encontrei-as no livro O racismo contado às crianças, de Georges Jean. 80 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue 4. De onde vem a palavra racismo? No dicionário da Porto Editora, encontrei: Substantivo masculino Pensamento que afirma a superioridade de certas raças e nela assenta o direito de dominar ou mesmo fazer desaparecer as outras. A palavra vem de raça + ismo, ou do francês racismo Descobrimos, numa página na internet, dum senhor que se chama Pedro Sette Câmara: “Pela palavra racismo entendemos, ou entendíamos, a discriminação segundo a raça. No entanto, hoje, os brancos tem a primeira escolha do racismo.”10 Combinámos perguntar em todas as turmas se os alunos já sentiram uma vez um acto de racismo, que definimos assim: “Racismo é dizer mal ou agredir outra pessoa, porque tem pele diferente, cor diferente, a maneira como estuda diferente, cara diferente, etc.” O gráfico mostra o resultado da nossa pergunta. As turmas A e B são primeiros anos, C, D e E são 2ºs anos, F, G e H são 3ºs anos e as outras são 4ºs anos. 10 Significa que, embora a discriminação é de uma raça para outra, na prática, actualmente normalmente são os brancos que discriminam em primeiro lugar os outros. (nota do professor) 81 Trabalhos dos alunos Na discussão que tivemos na sala, quando o Ruben apresentou o projecto, falámos – dos Gregos que tinham uma lenda em que explicam que as pessoas de África são brancos queimados pelo sol; – que os narizes têm formas diferentes por causa do clima onde as pessoas vivem; – que a cor da pele tem a ver com a produção de melanina (ver o nosso ); – que nem todos os racistas Americanos são do Ku Klux Clan, que há muitos Americanos que não são racistas e que o Ku Klux Clan ainda existe; – que há muitos meninos na escola (109 em 240!) que já sentiram o racismo. 82 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Nós gostávamos de saber o que pensam sobre o racismo. Alguém quer fazer um comentário? Cabo Verde Autoras Ana Paula, Gisela, Marlene, Tatiana Helena Contrato (em 09 de Abril de 2002) O que já sabemos: Já sabemos que Cabo Verde tem 9 ilhas e que se criou por um vulcão. O que o grupo quer saber: Quem descobriu as ilhas. Quem deu o nome Cabo Verde e porquê. A história de Cabo Verde. Escrever uma história escrevendo em palavras de Cabo Verde. O que a turma quer saber: Quantas pessoas existem em Cabo Verde. Quais são as festas tradicionais em Cabo Verde. Quantas origens há no povo de Cabo Verde. Quantas pessoas vieram para Portugal. Quantas crianças trabalham para sustentar os pais? Há escravos em Cabo Verde? 83 Trabalhos dos alunos Porque é que falam Português em Cabo Verde? O que descobrimos: Onde fica Cabo Verde? Fica em frente à Costa Africana Quantas ilhas tem Cabo Verde? As ilhas da maior para a mais pequena Santiago 992 km2 Santo Antão 754 km2 Boavista 622 km2 Fogo 477 km2 São Nicolau 342 km2 Maio 267 km2 São Vicente 228 km2 Sal 215 km2 Brava 65 km2 Santa Luzia 34 km2 A maior ilha de Cabo Verde é Santiago, a mais pequena é Santa Luzia. 84 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Tem ao todo 10 ilhas. As 10 ilhas. 85 Trabalhos dos alunos A bandeira tem 10 estrelas, pensamos que é uma para cada ilha. 86 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Santiago Brava Fogo Boavista Maio Sal sim não não não não não não não sim sim não sim não não não não não não não não sim não sim sim sim sim sim não não não não não não não sim S Vicente sim S Nicolau não sim Santiago não sim não Brava não não não não Fogo não sim não sim sim Boavista não não não sim não não Maio não não não sim não não não Sal não não sim sim não não sim S Luzia S Nicolau S Antão S Vicente Marítimo S Antão Ligações marítimas não não S Luzia 87 Trabalhos dos alunos 88 sim não não não não sim não sim sim sim sim não não não não não não não não não não sim não não sim sim não não não sim não não sim não não sim sim não não sim não não S Luzia não não não sim não Sal sim sim não sim não não não não não sim não Maio sim sim sim Boavista não sim Fogo sim Brava Santiago sim não sim não sim não não não S Nicolau S Antão S Vicente S Nicolau Santiago Brava Fogo Boavista Maio Sal S Luzia S Vicente Aéreo S Antão Ligações aéreas Pascal Paulus - Português em contexo multilingue A população: 341.607 habitantes Mulatos, Negros, e uma minoria branca. Português é a língua oficial, o Crioulo é a língua nacional, baseado no Português antigo e o Africano. A história de Cabo Verde As ilhas não eram habitadas, quando foram descobertas. Por causa do sítio onde estavam no oceano, os Portugueses utilizaram-nas como entreposto de escravos. No dia 1 de Maio de 1460, o António de Noli e Diogo de Gomes encontraram a primeira ilha. Inventaram o nome de Santiago, porque no dia 1 de Maio era festejado esse santo. Esses descobridores encontraram a ilha do Fogo, de Maio, do Sal, da Boavista. Diogo Afonso e Dom Fernando encontraram as outras ilhas em 1461 e 1462. 89 Trabalhos dos alunos Os Portugueses mandavam escravos de Serra Leoa, da Guiné, da Gâmbia, do Senegal, para Santiago. De Santiago mandavam os escravos para a América do Sul. Agora já não há escravos em Cabo Verde. No dia 25 de Abril de 1974, o governo Português foi afastado e os militares de Abril começaram a libertação das colónias. Em Cabo Verde, houve eleições para a Assembleia Nacional popular. Em 5 de Julho de 1975, Cabo Verde é um país independente. Em Dezembro de 1985, em Cabo Verde, torna-se mais fácil fazer algumas coisas por conta própria. 90 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Em Fevereiro de 1990, Cabo Verde tornou-se um estado com muitos partidos. Em 17 de Fevereiro de 1991, António Marcarenhos Monteiro vence as eleições presidenciais. Porque é que falam Português em Cabo Verde? Durante o século XIX os estados Europeus ainda mandavam em África. Quando os países Africanos ficaram independentes, faziam ligações com os países Europeus. Cabo Verde tinha ligação com os Portugueses e continuou a falar Português. Festas tradicionais San Jon, Tabanca, Pilão, Bandeira 91 Trabalhos dos alunos Dois poetas No quadro de um trabalho colectivo, Ana Paula, Leila, e Tatiana Helena juntaram: Na praça Luís de Camões, está o Luís de Camões Quando vamos ao Café “a Brasileira”, no Largo do Chiado, vemos o Fernando Pessoa. Em frente do Fernando Pessoa, está a estátua do Chiado. A vida de Luís Vaz de Camões Luís de Camões nasceu por volta de 1524 ou 1525, provavelmente em Lisboa. Em 1553 a casa real dá-o como “cavaleiro fidalgo”. Em 1548 perde o olho direito numa luta de espada contra os Mouros. Regressa a Lisboa em 1551. 92 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue Numa briga, em 1552, fere um funcionário da Cavalaria Real e é preso. É libertado em 1553 e embarca para o Oriente. Em 1554 parte para Goa. É preso por dívidas não pagas em 1562. Em 1570, volta para Lisboa e em 1572 sai a primeira publicação d’Os Lusíadas. Morre em 1579 ou 1580 de peste. Durante toda a sua vida, o Luís de Camões teve sempre muitas paixões. A vida de Fernando Pessoa. Nasceu em 13 de Junho de 1888 em Lisboa. Em 1896, circunstâncias de família (a mãe casa de novo com o homem português que representa Portugal na África do Sul), levam o menino Fernando, com apenas 8 anos a viver e estudar em Durban, na colónia de Natal. Fica lá até ter 17 anos. É portanto nesse período vivido fora de Portugal que Fernando Pessoa tem a sua formação na língua e no pensa93 Trabalhos dos alunos mento inglês. Mesmo assim, nunca deixa de se sentir muito Português. Os primeiros poemas que publica em livro são em Inglês, no livro Antinous 1918 (escrito em 1915). É também neste período que escreve textos de filosofia (1906-1916). O primeiro texto publicado é “Águia”, em 1912 Gigantes que metem medo. Descobrimos11 (*) 11 com o livro “Ulisses” de Maria Alberta Menézes e “Primeiro livro de Poesia” com uma selecção de Sophia de Mello Breyner Andresen 94 Pascal Paulus - Português em contexo multilingue O Homero fala do Ciclope Polifemo. O Luís de Camões fala do Adamastor. O Fernando Pessoa fala do Mostrengo. Os três são gigantes inventados que metem medo aos marinheiros. Dois poemas A Ana Paula copiou um poema de Camões, e outro de Pessoa, que metemos aqui com a explicação das palavras que não percebíamos e que Ana Paula procurou no dicionário com a ajuda do Pascal. De Luís de Camões: Descalça vai pera a fonte Lianor pela verdura; Vai fermosa e não segura. Leva na cabeça o pote O testo nas mãos de prata, Cinta de fina escarlata, Sainho de chamalote; Traz a vasquinha de cote, Mais branca que a neve pura. Vai fermosa e não segura Descobre a touca a garganta, Cabelos de ouro entrançado, Fita de cor de encarnado, Tão linda que o mundo espanta. Chove nela graça tanta, Que dá graça à fermosura. Vai fermosa e não segura O que não percebi Lianor Vai pela Fermosa O que encontrei Nome de pessoa Vai para Bela Escarlata Sainho Tecido de cor vermelho Chamalote Saia antiga de lã de camelo ou lã e seda vasquinha de cote casaco de mulher de uso do dia a dia. 95 Trabalhos dos alunos De Fernando Pessoa: O mostrengo que está no fim do mar Na noite de breu ergueu-se a voar; À roda da nau voou três vezes, Voou três vezes a chiar, E disse, “Quem é que ousou entrar Nas minhas cavernas que não desvendo, Meus tectos negros do fim do mundo?” E o homem do leme disse, tremendo, “El-Rei D. João Segundo!” “De quem são as velas onde me roço? De quem as quilhas que vejo e ouço?” Disse o mostrengo, e rodou três vezes. Três vezes rodou imundo e grosso, “Quem vem poder o que eu só posso, Que moro onde nunca ninguém me visse E escorro os medos do mar sem fundo?” E o homem do leme tremeu, e disse, “El-Rei D. João Segundo!” 96 ergueu-se de breu levantou-se muito escuro chiar gritar com som agudo desvendo mostro roço (roçar) quilha imundo escorro cortar ou esfregar uma peça forte e comprida no casco do barco obsceno, grosseiro corre, escoa. O autor Pascal Paulus nasceu em Oostende (Bélgica) e formou-se como professor de ensino primário em 1977. Trabalhou, na sua terra natal, com crianças e adultos até 1986, quando se estabeleceu em Portugal. Desde então tem alternado a sua intervenção na escola do 1º ciclo com a formação de professores e a participação em projectos de desenvolvimento local. Pertence, desde 2005, ao quadro de escola da Escola Básica Amélia Vieira Luís, na Outurela.