INTRODUÇÃO - Vacina contra os rotavírus
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INTRODUÇÃO - Vacina contra os rotavírus
Vacina pentavalente contra os rotavírus Recentemente foi licenciada no Brasil uma vacina pentavalente contra os rotavírus (RV) produzida pelo laboratório Merck Sharp e Dohme (internacionalmente conhecida como Rotateq). Até então estava disponível em nosso meio apenas a vacina monovalente do laboratório GlaxoSmithKline (internacionalmente conhecida como Rotarix), em uso no setor público e privado desde 2006. Ambas são vacinas orais, constituídas de vírus vivo atenuado e altamente eficazes na prevenção de diarréia grave causada pelos rotavírus (RV). Em informativo anterior apresentamos a vacina monovalente e aqui teceremos considerações sobre a vacina pentavalente. Apresentamos, também, alguns dados sobre a experiência recente, nacional e internacional, com a utilização das duas vacinas em esquemas rotineiros de imunização. VIROLOGIA Os RV, descritos pela primeira vez por Bishop e cols. em 1973, são a causa mais comum de gastroenterite grave em lactentes e crianças. A classificação em diferentes sorotipos baseia-se em duas proteínas estruturais da superfície externa, que têm grande importância na imunogenicidade viral, VP7 e VP4, ambas capazes de induzir anticorpos neutralizantes sorotipoespecíficos. A proteína VP7 é glicosilada (G) e os sorotipos por ela determinados são chamados tipos G. A proteína VP4 pode ser cindida pela protease (P) tripsina e os sorotipos determinados por esta são chamados tipos P. Atualmente utiliza-se uma nomenclatura binomial para classificação dos RV: os sorotipos são descritos indicando-se o tipo G seguido pelo P. Assim, por exemplo, o sorotipo mais comum de rotavírus em todo o mundo é classificado como G1P[8]. Figura. Rotavírus: estrutura esquemática Fonte: Enders & partner Acessado em www.labor-enders.de/287.0.html Cinco cepas virais são responsáveis pela maioria das infecções: G1, G2, G3, G4 e G9, apesar do sorotipo G5 também ser uma importante cepa emergente em nosso meio. O G9 é muito preocupante por apresentar maior capacidade patogênica, estando relacionado com infecções mais graves. Os dois tipos P mais comuns são o P8 e P4, e o sorotipo de rotavírus mais comum globalmente é o G1P[8]. EPIDEMIOLOGIA Os rotavírus são a causa mais importante de diarréia grave na infância em todo o mundo em crianças menores de cinco anos. A frequência de isolamento de rotavírus em crianças com diarréia aumenta de acordo com a gravidade dos episódios. Assim, uma recente revisão do Centers for Disease Control (CDC) indica que em 24 estudos com base comunitária, três estudos com base em clínicas e 72 estudos com base hospitalar, os rotavírus foram responsáveis por uma mediana de 8,1%, 18,8% e 21,3% dos episódios de diarréia nos três cenários, respectivamente. Dados atuais provenientes de estudos epidemiológicos nacionais, mostram grande variação regional de genótipos de RV em nosso país. Estudo recente (20052006) com base hospitalar, envolvendo crianças de zero a cinco anos de idade de quatro estados brasileiros (Goiás, Bahia, Rio Grande do Sul e São Paulo) com gastrenterite aguda e que necessitaram internação ou terapêutica de reidratação oral ou venosa, revelou que RV foram identificados nas fezes de 43,3% delas, com diferenças regionais não só quanto à positividade, mas também na sazonalidade e distribuição por faixa etária. Os genótipos circulantes encontrados também foram diferentes nestas quatro regiões, sendo o G9 predominante, presente em 51,65% das amostras, seguido pelos genótipos G2 (34,8%) e G1 (14,4%). Em relação aos genótipos P, foram predominantes P[4] e P[8], encontrados com a mesma frequência (43,9%). No Estado de São Paulo houve predomínio da combinação G9 P[8]. A conclusão foi que “a frequência de genótipos de rotavírus pode mudar dramaticamente de região para região e de ano para ano, especialmente em países de dimensões continentais como o Brasil. Desta forma, o monitoramento de genótipos é importante para determinar a ocorrência e a frequência de tipos de rotavírus, bem como detectar tipos incomuns após a introdução de programas de imunização”. A VACINA PENTAVALENTE CONTRA OS ROTAVÍRUS É uma vacina de vírus vivo, oral, pentavalente, composta por cinco cepas humano-bovinas rearranjadas. Quatro rearranjos expressam, além dos componentes de RV bovinos, uma das proteínas do capsídeo externo de RV humanos (G1, G2, G3 ou G4) e o quinto, a proteína de RV humano P[8]. Os cinco sorotipos utilizados na vacina foram selecionados por serem os causadores de 90% das doenças por rotavírus na América do Norte, Europa e Austrália e 88% em todo o mundo entre 1973 e 2003. O grande estudo de fase III (conhecido como REST) que permitiu o licenciamento dessa vacinas nos Estados Unidos (EUA) em 2006 incluiu cerca de 70.000 crianças saudáveis com seis a 12 semanas de vida na época da primeira dose, randomizadas para receber três doses da vacina ou placebo. Eficácia: Nas crianças que receberam as três doses conforme o esquema recomendado, a eficácia contra gastrenterite por RV (GERV) de qualquer gravidade foi de 74% (intervalo de confiança 95% (IC) = 67% - 79%), e contra formas graves foi de 98% (IC 95% = 95% - 100%). A definição de gravidade considerou valor > 16 em um sistema de pontuação de 24 pontos, baseado na intensidade e duração de febre, vômitos, diarréia e alterações de comportamento. A eficácia foi semelhante para os sorotipos vacinais analisados (G1, G2, G3, G4 e G9) e manteve-se elevada no segundo ano após a vacinação. A vacina modificou muito o impacto da doença, com redução de 86% do número de consultas médicas, 94% dos atendimentos de emergência e 96% das hospitalizações por GERV. Houve redução de 59% nas hospitalizações por gastrenterites de qualquer etiologia. No último ICAAC (Interscience Conference on Antimicrobial Agents and Chemotherapy, EUA, 2008) foram apresentados estudos provenientes de diferentes regiões dos EUA, para avaliar o impacto da introdução da vacina no programa rotineiro de imunizações. A conclusão foi unânime: a introdução resultou em significante e dramático declínio no número de casos de diarréia por rotavírus confirmados laboratorialmente. Apenas um exemplo: no Texas a comparação entre o número de casos de diarréia grave por RV internados em um hospital terciário (de referência) diminuiu 94% em 2007-8 em comparação com a média anual de casos antes da introdução da vacina na rotina. Também no ICAAC dados de um estudo finlandês (extensão do estudo REST) revelaram que independentemente do sorotipo (foram avaliados G1, G2, G3, G4 e G9) houve significante redução de gastrenterite, hospitalizações e consultas médicas devidas aos RV (82-94%) durante até três anos de seguimento após vacinação. Segurança: No estudo REST, nos primeiros 42 dias após qualquer das doses da vacina ocorreram 11 casos de intussuscepção (IS), sendo seis no grupo de vacinados e cinco no grupo placebo. Nenhum caso ocorreu em crianças nos 42 dias subseqüentes à primeira dose. No período de um ano após a primeira dose, houve 13 casos de IS em vacinados e 15 casos no grupo placebo. A conclusão foi que os casos de IS foram esporádicos, sem evidência de risco aumentado nos vacinados. Diarréia, febre, vômitos ou sangramento nas fezes foram verificados em frequência semelhante entre os vacinados e os que receberam placebo. A eliminação do vírus vacinal nas fezes foi rara, de curta duração, e ocorreu exclusivamente após a primeira dose. A baixa excreção viral é um dado adicional de segurança para o uso da vacina. O sistema de vigilância americano de eventos adversos (VAERS) publicou recentemente os dados de IS notificados entre fevereiro de 2006 e setembro de 2007, após introdução da vacina na rotina do programa de imunizações. Nesse período foram distribuídas mais de 9 milhões de doses e foram confirmados 160 casos de IS em vacinados, número compatível com a ocorrência de IS na população geral antes da introdução da vacina. Até o momento, portanto, os dados disponíveis não indicam aumento de risco de IS com o uso da vacina pentavalente. Contra-indicações: Hipersensibilidade grave a qualquer componente da vacina ou reação alérgica grave após uma das doses. Deve-se ter precaução em casos de imunocompetência alterada, portadores de doença crônica gastrintestinal pré-existente e casos de crianças que já tiveram intussuscepção, já que inexistem dados de segurança nestas condições. Em crianças com gastrenterite aguda moderada a grave deve-se aguardar melhora do quadro para vacinação; em casos leves não há contra-indicação. Amamentação, prematuridade ou administração simultânea com outras vacinas recomendadas em lactentes (inclusive a vacina oral contra a poliomielite) não mostraram influência sobre a eficácia vacinal. Esquema de administração: São indicadas três doses orais da vacina (apresentada em suspensão de 2ml). A recomendação do fabricante (de acordo com a bula) é que a primeira dose seja administrada entre seis e 12 semanas de vida, e as doses subsequentes a intervalos de quatro a dez semanas, devendo a última dose ser utilizada até 32 semanas de idade. Entretanto, em 2009 o ACIP (Comitê Assessor em Práticas de Imunização do Serviço de Saúde Pública dos EUA) alterou a recomendação para as vacinas contra os RV (Rotarix e Rotateq estão licenciadas nos EUA). A recomendação passou a ser: 1) A idade máxima para a primeira dose é 14 semanas e 6 dias. A vacinação não deve ser iniciada em crianças com 15 semanas ou mais de idade (isto é, 15 semanas e 0 dias ou mais). 2) Administrar a dose final da série até a idade de 8 meses e 0 dias. Ainda segundo o ACIP, a série de vacinas deve ser completada com o mesmo produto, sempre que possível. Entretanto, a vacinação não deve ser adiada se o produto usado para a dose anterior é desconhecido ou não está disponível. Nessa situação deve-se continuar ou completar a série com o produto disponível. Se qualquer das doses foi da vacina pentavalente ou se o produto for desconhecido em qualquer das doses do esquema, deve-se administrar três doses de vacina contra os RV. Uso da vacina monovalente no Brasil Recentemente dados do Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (acessados em 09/01/09 www.cve.saude.sp.gov.br) a respeito de surtos e casos de RV mostraram que comparando dados de 2004 e 2007 (pré e pós início da vacinação rotineira) o número de surtos de diarréia notificados no Estado caiu de 35 para 8. Entre os surtos com etiologia determinada, a participação dos RV caiu de 35,7% para 16,7%. Os RV responderam em 2004 por 88% do total de casos de diarréia em surtos com etiologia conhecida, caindo a incidência para 7% em 2007. A vacina contra RV foi introduzida no calendário vacinal no Estado de São Paulo em março de 2006 e até novembro de 2008 foram aplicadas 2 574 763 doses. Um sistema de vigilância para IS havia sido implantado em hospitaissentinela em todo o Estado. A taxa de IS em crianças menores de um ano de idade antes da introdução da vacina variou de 0,42 a 0,72 por 10 000 NV e após a sua introdução, de 0,39 a 0,88 por 10 000 NV (tabela). Assim, não se observou aumento na taxa de IS após a introdução da vacina. (Dra. Helena Sato, Divisão de Imunização, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, comunicação pessoal, 2009). Tabela: Taxa de intussuscepção 10 000 nascidos vivos (NV) em hospitais-sentinela. Estado de São Paulo, 2001-2008* Ano Pop < 1 ano de idade 2001 686.533 2002 644.859 2003 615.483 2004 628.008 2005 643.634 2006 634.191 2007 613.242 2008** 605.558 * dados preliminares **até julho/08 Nº. de invaginações 41 25 32 45 39 56 35 12 Taxa por 10 000 NV 0,60 0,42 0,52 0,72 0,61 0,88 0,57 0,39 BIBLIOGRAFIA 1. Castello AA, Arvay HL, Glass RI, Gentsch J. Rotavirus strain surveillance in Latin America. A review of the last nine years. Ped Infect Dis J 2004; 23: S168S172 2. Centers for Disease Control and Prevention. 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