gavagem como método de alimentação
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gavagem como método de alimentação
GAVAGEM COMO MÉTODO DE ALIMENTAÇÃO DO PREMATURO EM MEADOS DO SÉCULO XX O avanço no campo da neonatologia nos últimos anos contribuiu de maneira singular na redução da morbimortalidade do recém-nascido (RN) (MOREIRA, LOPES e CARVALHO, 2004). Entretanto, cabe destacar que esses avanços tiveram seu início ao final do século XIX e começo do século XX, quando o cuidado e a ideia de que o prematuro teria possibilidade de cuidado passaram a ser discutidas (PHILIP, 2005). Na primeira metade do século XIX, às crianças eram “ignoradas” pelo campo da saúde, existindo pouco ou mesmo nenhum local destinado ao atendimento a elas (TRAGANTE, CECCON e FALCÃO, 2010; OLIVEIRA e RODRIGUES, 2005; AVERY, 1984). Isto implicava nas formas de representação das doenças que se distinguiam em duas vertentes (ontológica e dinâmica), baseadas na unicausalidade (OLIVEIRA e EGRY, 2000). Com o objetivo de oferecer cuidados aos RN, o desenvolvimento de aparatos tecnológicos, foi destaque ao final do século XIX. Lussky (1999) afirma que, esses avanços levaram ao desenvolvimento significativo da prestação de cuidados ao RN. Assim, na década de 1920, ocorreu a consolidação e organização dos avanços tecnológicos surgidos na década anterior, levando a redução das taxas de mortalidade e o controle da infecção hospitalar (RODRIGUES e OLIVEIRA, 2004). Os pilares dos cuidados neonatais, no início e meados do século XX, caracterizavam-se pelos cuidados com a temperatura corporal, aliado aos cuidados na prevenção de infecções, olhar focado na alimentação e nutrição do prematuro (AVERY, 1984). O presente paper tem como enfoque os cuidados referentes à realização da gavagem, como método de alimentação do RN prematuro. Esse material foi descrito na perspectiva da micro-análise, visto ser a escolha de uma estratégia peculiar de observação com consequente obtenção de conhecimentos específicos (REVEL, 2010). Trata-se de observação, no sentido da “redução da escala de observação”, com o intuito de perceber aspectos, que de outro modo, não seriam percebidos, pois “não poupa os detalhes e investe no exame intensivo de uma documentação” (BARROS, 2007, p.170). Os documentos selecionados para atender o propósito do material foram quatro publicações da primeira metade do século XX, tendo por critério os cuidados direcionados à alimentação dos RN prematuros. O material foi encontrado na íntegra nos endereços eletrônicos “Neonatology on the web” e na Biblioteca de Chicago. Eles foram selecionados devido à importância dos três autores e suas publicações no âmbito do cuidado do prematuro à época, sendo os mesmos mencionados em literaturas das décadas de 80 a 90 do século XX, a saber: The Nursiling: the feeding ang hygiene of premature and full term infants (Obra publicada, em sua primeira versão em língua francesa no ano de 1900, e depois traduzida para o inglês em 1907. Autor: Pierre Budin); Principles and practice of infant feeding (Obra com a primeira edição no ano de 1918, e demais publicações em 1919 e 1922. Autor: Julius Hess); Premature and Congenitally Diseased Infants (Considerada a primeira publicação científica americana voltada para o cuidado do prematuro. A primeira edição data de 1922, porém outras edições foram publicadas posteriormente. Autor: Julius Hess); The Premature Infant: its medical and nursing care (Obra que teve a primeira publicação em 1941 e a segunda em 1949. Autores: Julius Hess e Evelyn Lundeen). A prática da alimentação era determinada pela capacidade do RN prematuro de sugar e deglutir (AVERY, 1984). A partir dessas concepções, os autores traçaram em suas obras rotinas, envolvendo o cuidado com a alimentação, ao incluírem os métodos de administração relacionados aos aspectos clínicos do RN, considerando peso e desenvolvimento físico. À época, havia o entendimento que, o alimento era a fonte de combustível e energia para a criança (BUDIN, 1907), e que os cuidados voltados à alimentação eram os responsáveis pelo sucesso ou fracasso da sobrevivência do RN (HESS e LUNDEEN, 1949). Nesse contexto, os RN considerados incapazes de se alimentar, por meio de sucção ao seio ou mamadeira, ou mesmo por meio de métodos como colher nasal e conta-gotas (métodos utilizados a época para os RN que possuíssem habilidade para sugar e/ou deglutir), utilizavam-se, então, do uso do catéter de alimentação (gavagem). Tal método possuía destaque nas publicações utilizadas. Citado como método simples, deveria ser instituído na ocorrência de cianose, fadiga e falhas em outros métodos de administração de dieta (HESS, 1922). Discussões a cerca do material, calibre e tamanho da sonda fizeram parte das descrições das quatro publicações. Sobre a inserção, propriamente dita, ilustrada na imagem n. 01. Pode-se deduzir que houve alguma modificação no comparativo das quatro publicações, além de melhoria na descrição detalhada da técnica ao longo dos anos, bem como houve direcionamento aos cuidados voltados à inserção da sonda e após à administração da dieta. Imagem 01: Passo a passo da descrição da técnica de inserção de sonda gástrica (sentido anti-horário) Fonte: HESS e LUNDEEN, 1949 Os cuidados relacionados à administração da dieta foram mencionados nas quatro publicações e os autores se referiam à necessidade de se comprimir o tudo entre os dedos. Para, então, colocar o leite no frasco graduado e depois liberar o cateter, quando o leite iria fluir, lentamente, e entrar no estômago do RN (BUDIN, 1907; HESS, 1918; HESS, 1922; HESS e LUNDEEN, 1949). A administração da dieta em si, também, merecia atenção. O funil ou copo graduado deveria ser posicionado, ligeiramente, acima do nível do corpo com a dieta, fluindo lentamente (HESS, 1918). Isto implicava na necessidade de elevação mínima para fluir o leite (HESS e LUNDEEN, 1949). A descida rápida do leite era entendida como perigosa, ou seja, possível de causar danos. O tempo necessário para a descida do era estipulado em uma média de 1 a 3 minutos (HESS, 1922; HESS e LUNDEEN, 1949). A dieta antes de ser administrada deveria ser medida em copo graduado e o registro da aceitação da dieta, bem como o tempo e a quantidade ingerida mereciam ser relatados (HESS, 1918). Ao término da administração da dieta, os autores afirmam que, o cateter deveria ser, firmemente, comprimido ou dobrado sobre si mesmo, evitando-se, dessa maneira, que o leite pudesse fluir para a faringe e, então, o mesmo deveria ser retirado (BUDIN, 1907; HESS, 1918; HESS, 1922; HESS e LUNDEEN, 1949). Entende-se que, até o final da primeira metade do século XX, a recomendação era que a sondagem gástrica seria realizada de maneira intermitente, exigindo experiência e destreza da enfermeira responsável pelo cuidado. A imagem n.02 ilustra o momento de realização da gavagem em um RN pela cuidadora. Imagem n.02: Realização de gavagem Fonte: HESS, 1918. Outro cuidado relativo à administração de dietas, comum em todas as quatro publicações, é o relacionado à pesagem, como método avaliativo da aceitação de dieta e cálculo para volume ingerido e, obviamente, ganho ponderal para as crianças amamentadas ao seio materno ou da ama de leite (BUDIN, 1907; HESS, 1918; HESS, 1922; HESS e LUNDEEN, 1949). Para os prematuros alimentados, sobretudo por outros meios de administração de dieta, a medição do volume a ser administrado, em copo graduado, era mencionada relevante em virtude de sua fisiologia e anatomia (HESS, 1918). Pode-se concluir que a atenção voltada à alimentação e nutrição do prematuro, durante a primeira metade do século XX, abrangeu aspectos para além dos métodos de administração em si, mas suscitou discussões a cerca dos intervalos de oferecimento e volume adequado a ser administrado aos RN. Isto possibilitou que diferentes rotinas fossem estabelecidas para alimentação, o que conduziu os autores evidenciarem os benefícios e vantagens de cada procedimento estabelecido. REFERÊNCIAS AVERY, G. B. Neonatalogia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Medsi, 1984. BUDIN, Pierre. The Nursiling: the feeding ang hygiene of premature and full term infants. London: Caxton Publishing CO, 1907. BARROS, José D’ A. Sobre a feitura da micro-história. OPSIS. 2007. 7 (9): 167–85. HESS, J. Principles and practice of infant feeding. Philadelphia, F.A. Davis Company, 1918. HESS, J. Premature and Congenitally Diseased Infants. Lea&Febiger Philadelphia and New York, 1922. HESS, J. H.; LUNDEEN, E. C.: The Premature Infant: its medical and nursing care. B. Lippincott Company, Philadelphia, 1949. LUSSKY, Richard C. A century of Neonatal Medicine. Minnesota Medical Association. 1999. Vol 82. Disponível em http://mnmed.org/publications/MnMed1999/December?Lussky.cfin?PF=1. Acesso em 01 de setembro de 2014. MOREIRA, Maria Elizabeth Lopes; LOPES, José Maria; CARVALHO, Manoel. O recém-nascido de alto risco: teoria e prática do cuidar. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2004. OLIVEIRA, Isabel Cristina dos Santos; RODRIGUES, Renata Gomes. Assistência ao recém-nascido: perspectivas para o saber de enfermagem em neonatologia (1937 – 1979). Revista Texto e Contexto de Enfermagem. 2005 14 (4): 498-505. OLIVEIRA, Maria Amélia de campos; EGRY, Emiko Yoshikawa. A historicidade das teorias interpretativas do processo saúde-doença. Revista Escola de Enfermagem da USP. 2000. 34 (1): 9-15. PHILIP, Alistair G. S. The evolution of Neonatology. Pediatrics. 2005. 58 (4): 799815. REVEL, J. Micro-história, macro-história: o que as variações de escala ajudam a pensar em um mundo globalizado. Revista Brasileira de Educação. 2010. 45 (15): 434 – 590. RODRIGUES, R. G.; OLIVEIRA, I. C. dos S. Os primórdios da assistência aos recémnascidos no exterior e no Brasil: perspectivas para o saber de enfermagem na neonatologia (1870-1903). Revista Eletrônica de Enfermagem, 2004. 6(2). Disponível em http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen. Acesso em 01 de setembro de 2014. TRAGANTE, Carla R.; CECCON, Maria Esther; FALCÃO, Mário Cícero. Desenvolvimento dos cuidados neonatais ao longo do tempo. Revista Pediatria. São Paulo. 2010, 32 (2): 121-30. Autores: Tatiana de Oliveira Gomes Tecnologista Junior, no cargo de Enfermeira Neonatal, no Instituto Fernandes Figueira / Fundação Oswaldo Cruz (IFF/FIOCRUZ). Enfermeira mestranda pelo Programa de Pós Graduação (PPGENF), da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Membro do grupo de pesquisa LACUIDEN e LAPHE. Fernando Rocha Porto Doutor em Enfermagem com Pós-doutoramento pela USP. Professor da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, PPGENF, PGENFBIO da UNIRIO. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Presidente da Academia Brasileira em História da Enfermagem (ABRADHENF). Membro dos grupos de pesquisa, LAESHE, LACENF e líder do LACUIDEN. Como citá-lo: GOMES, T.O; PORTO, F. R. Gavagem como método de alimentação do prematuro em meados do século XX. [internet]. Rio de Janeiro (Br); 2015 [Acesso em: dia, mês (abreviado) ano]. Disponível em: http://www.lacenf.com.br (completar com dados do site)